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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO
PUC-SP
Edson Nalon Silva
A defesa no processo penal militar
MESTRADO EM DIREITO
SÃO PAULO
2010
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1
PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO
PUC-SP
Edson Nalon Silva
A defesa no processo penal militar
MESTRADO EM DIREITO
Dissertão apresentada à Banca Examinadora da
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, como
exigência parcial para obtenção do título de MESTRE
em Direito, área de concentração de Direito das
Relações Sociais - subárea de Direito Processual Penal,
sob a orientação do Professor Doutor Marco Antonio
Marques da Silva.
SÃO PAULO
2010
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2
Banca Examinadora
______________________________________
______________________________________
______________________________________
3
AGRADECIMENTOS
Primeiramente, e acima de tudo, a Deus por minha vida, saúde e tudo que tem me
concedido neste plano e a toda minha família, em especial à minha esposa, Simone Chiosini,
e meu filho, Enrico Chiosini Nalon Silva, pelo apoio e incentivo nas horas mais difíceis e por
estarem sempre ao meu lado.
Ao Professor Doutor Marco Antonio Marques da Silva, por acreditar e incentivar
nosso trabalho, mais que um orientador, um exemplo de homem a ser seguido.
4
RESUMO
As quase vinte anos de serviço ativo na Milícia Bandeirante paulista e diante de
uma escassez de doutrina no Processo Penal Militar, entendemos ser necessário tratar de
alguns aspectos da Lei Castrense, como o histórico da Justiça Militar no Brasil e em São
Paulo, os Princípios Constitucionais orientadores do Processo Penal e do Processo Penal
Militar, a composição da Justiça Militar Estadual, a competência da Pocia Judiciária Militar,
mas, acima de tudo e principalmente, discutir o bem jurídico penal militar e a defesa no
Processo Penal Militar, destacando temas pouco visitados pelos pesquisadores acadêmicos,
como espécies de defesa, direitos do acusado, a fiança e a liberdade provisória, espécies de
recursos, a defesa no Direito Administrativo Militar, o crime de deserção e a defesa do
desertor, conhecer alguns tipos de prisões previstas na legislação penal militar e a questão da
defesa no Inquérito Policial Militar.
Palavras-chaves: Processo Penal Militar. Defesa. Militar. Garantias Militares.
Direitos no Processo Penal Militar
5
ABSTRACT
After almost twenty years of active service in the Military Police of São Paulo before
a shortage of doctrine of Military Criminal Procedure, we believe it is necessary to deal with
some aspects of the Military Law, as the history of Military Justice in Brazil and São Paulo,
the Constitutional Principles guiding the Criminal Procedure and the Military Penal
Procedure, the composition of the State Military Justice, the jurisdiction of the Military
Judicial Police, but, above all and mainly, discuss the legal and military criminal defense in
the Military Penal Procedure, highlighting themes rarely visited by academic researchers,
such as types of defense, rights of the accused, bail and parole, kinds of resources, defense in
Military Administrative Law, crime of desertion and defense of the deserter, knowing some
types of prisons under military criminal law and the issue of defense in the Military Police
Inquiry.
Keywords: Military Penal Procedure. Defense. Military. Military Guarantees. Rights in
the Military Criminal Procedure.
6
LISTA DE SIGLAS E ABREVIATURAS
CF Constituição Federal
CMT Comandante
CPM Código Penal Militar
CPPM Código de Processo Penal Militar
ONU Organização das Nações Unidas
PM Polícia Militar
STM Superior Tribunal Militar
TJ Tribunal de Justiça
TJM Tribunal de Justiça Militar
7
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ............................................................................................................... 9
1 HISTÓRICO DA JUSTIÇA MILITAR ........................................................... 13
1.1 História da Justiça Militar no Brasil ................................................................ 17
1.2 História da Justiça Militar do Estado de São Paulo......................................... 19
2 PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS ORIENTADORES DO PROCESSO
PENAL E DO PROCESSO PENAL MILITAR .............................................. 22
2.1 Princípios Constitucionais ................................................................................. 23
2.2 Princípios Constitucionais do Processo Penal .................................................. 25
2.2.1 O princípio do devido processo legal ................................................................ 27
2.2.2 O princípio da ampla defesa e do contraditório ............................................... 30
2.2.3 O princípio do juiz natural ............................................................................... 32
2.2.4 O princípio da publicidade................................................................................ 33
2.2.5 O princípio da obrigatoriedade......................................................................... 34
2.2.6 O princípio da presunção de inocência ............................................................. 36
2.3 Relevância Constitucional e a Emenda Constitucional45 ........................... 38
3 COMPOSIÇÃO DA JUSTIÇA MILITAR ESTADUAL ................................. 42
3.1 Os Conselhos da Justiça Militar ....................................................................... 43
3.1.1 O Conselho Permanente de Justiça .................................................................. 44
3.1.2 O Conselho Especial de Justiça ......................................................................... 45
4 A POLÍCIA JUDICIÁRIA MILITAR FUNDAMENTAÇÃO
CONSTITUCIONAL ........................................................................................ 47
4.1 Concorrência do Poder de Polícia ..................................................................... 49
4.1.1 Crimes dolosos contra a vida praticados contra civil e a atuação da Polícia
Judiciária Militar .............................................................................................. 50
5 BEM JURÍDICO PENAL ................................................................................. 52
5.1 Bem Jurídico Penal Militar ............................................................................... 54
5.2 O Bem Jurídico Administrativo e o Bem Jurídico Administrativo Militar .... 56
5.2.1 A desclassificação do crime militar para transgressão disciplinar .................. 58
5.3 Cabimento de Habeas Corpus na Punição Administrativa Militar ................. 60
6 A DEFESA NO PROCESSO PENAL MILITAR ............................................ 64
6.1 A Defesa como Garantia ................................................................................... 65
6.2 Espécies de Defesa ............................................................................................. 67
8
6.3 O Acusado e seus Direitos no Processo Penal Militar ...................................... 69
6.3.1 A fiança e a liberdade provisória no Processo Penal Militar ........................... 70
6.3.2 A lei nº 9.099/95 no âmbito da Justiça Militar ................................................. 73
6.4 Dos Recursos no Direito Processual Penal Militar Conceito ........................ 76
6.4.1 Espécies de recursos no Processo Penal Militar e suas peculiaridades ........... 78
6.5 O Direito Administrativo Militar à Luz da Justiça Militar ............................. 80
6.5.1 Conceito de Direito Administrativo e Direito Administrativo Militar ............ 81
6.5.2 Processo e procedimento administrativo militar .............................................. 84
6.5.3 A defesa no Direito Administrativo Militar...................................................... 86
6.6 O Crime de Deserção......................................................................................... 88
6.6.1 O direito de defesa no crime de deserção ......................................................... 90
6.6.1.1 A prescrição do crime de deserção...................................................................... 90
6.7 A Menagem e Outros Tipos de Prisões ............................................................. 92
6.7.1 O presídio da Polícia Militar “Romão Gomes” e a Lei de Execuções
Penais ................................................................................................................. 95
6.8 O Inquérito Policial Militar e sua Natureza ..................................................... 98
6.8.1 Características do inquérito policial militar..................................................... 100
6.8.2 A defesa no inquérito policial militar ............................................................... 105
CONCLUSÃO ................................................................................................................. 108
REFERÊNCIAS .............................................................................................................. 111
9
INTRODUÇÃO
A presente pesquisa tem como objetivo analisar a norma Processual Penal Militar com
o enfoque na defesa, realizando uma releitura sob o prisma da Dignidade da Pessoa Humana e
os Direitos Fundamentais consagrados na Constituição da República Federativa do Brasil.
Em 05 de outubro de 1988, a Assembléia Nacional Constituinte estabeleceu uma nova
ordem jurídica no Brasil, fundada na soberania, na cidadania, na dignidade da pessoa humana,
nos valores sociais do trabalho e da livre iniciativa e no pluralismo potico.
Essa nova ordem jurídica constituiu a República Federativa do Brasil, formada pela
união dos Estados, dos Municípios e do Distrito Federal, os quais formam um Estado
Democrático de Direito, em que todo poder emana do povo, que o exerce pelos seus
representantes eleitos.
Neste contexto estão inseridos os ordenamentos jurídicos infraconstitucionais, como o
Direito Penal Militar e o Direito Processual Penal Militar, que não podem se afastar destes
regramentos constitucionais.
O Direito Militar é para muitos um ramo desconhecido do Direito, suas características,
chavões e peculiaridades causam em muitos profissionais do Direito carência e, ao mesmo
tempo, sede de conhecimento.
Neste diapasão é que surgiu a vontade de um estudo aprofundado da matéria, que
contemplasse profissionais e leigos do Direito, no tocante a esse ramo jurídico tão pouco
discutido nos centros acadêmicos.
Vimos que há necessidade de um trabalho que mostre os detalhes da Justiça Militar no
que tange à defesa e que explique como funciona e o que significa os institutos peculiares
desta justiça especializada, no âmbito estadual, numa visão Constitucional. Visão esta que
deve se pautar nos princípios constitucionais orientadores do Direito Penal e do Direito
Processo Penal que aqui se refletem no Direito Penal Militar e no processo penal militar.
Estes princípios são as fontes de um direito garantista como o é nossa Carta Magna.
É importante salientar que o Código Penal Militar, Decreto Lei nº 1.001, de 1969, está
dividido em três partes: a parte geral, como o é o Código Penal comum, a parte que trata dos
10
crimes militares em tempo de paz e a terceira parte que trata dos crimes militares em tempo de
guerra.
Este trabalho baseia-se somente na primeira e segunda parte do Código Penal Militar
ao tratar de crimes militares, não sendo objeto do estudo os crimes praticados em tempo de
guerra.
Muito mais do que trazer temas do Direito Militar, o objetivo é desenvolver ideias e
discutir decisões controversas da Justiça Militar, sua jurisdição no âmbito estadual e os
princípios constitucionais que o orientam.
A história da Justiça Militar no mundo, sua chegada no Brasil e a construção da Justiça
Militar no Estado de São Paulo são picos necessários a serem abordados, pois servem de
alicerce para um estudo do Direito Penal e Processual Penal Militar.
O Direito Militar e suas relações com outras áreas como o Direito Constitucional
Militar, o Direito Penal Militar, o Direito Processual Penal Militar e o Direito Administrativo
Militar se mostram relevantes para um entendimento simples e único aos leitores.
A defesa no processo penal militar é um tema complexo, seja pelas peculiaridades
oferecidas pelo Código de Processo Penal Militar, seja pela prática forense, aliado ao fato da
pesquisa científica não ser abundante sobre o tema, o que dificulta os estudantes e
profissionais do Direito a entenderem melhor os detalhes deste ramo do Direito.
Nos bancos acadêmicos, o tema é discutido sem profundidade, e, um número reduzido
de Universidades possui a cadeira de Direito Militar, não incentivando o entendimento dos
institutos da Justiça Militar.
A procura por cursos de extensão na área do Direito Militar tem aumentado nos
últimos anos, o que levou algumas Universidades a acrescentar em suas grades curriculares
essa disciplina.
As Universidades, por vezes, discutem os assuntos castrenses, procurando dirimir
dúvidas, o que nos incentivou a abordar o tema, juntamente com a pretensão de tratar da sua
relevância Constitucional, trazendo à tona discussões para despertar nos estudiosos do Direito
a curiosidade e simpatia por este ramo ainda pouco explorado do Direito, bem como cecear a
fome pelo conhecimento daqueles que nos procuram com muitas dúvidas.
11
É importante ressaltar, também, que, o Código Penal Militar e o Código de Processo
Penal Militar entraram em vigência no auge da ditadura militar em nosso país, através dos
Decretos-Leis nºs 1.001 e 1.002, de 21 de outubro de 1969 e, desde então, não passaram por
atualizações legislativas, assim, vimos uma necessidade de estudar o atual texto e, confrontar
com a Constituição Federal de 1988, com o propósito de verificar a aplicabilidade e a
constitucionalidade de alguns dispositivos destas leis infraconstitucionais.
O presente estudo tem como escopo, ainda, apresentar peculiaridades do Direito
Processual Penal Militar, a atuação da defesa no processo penal militar, bem como entender
determinados conceitos desta jurisdição castrense.
Relacionar o Direito Processual Penal Militar ao Direito Constitucional Militar,
encontrar seus limites e expansões, e os princípios que regem estes ramos do Direito, também,
estão atrelados aos objetos deste trabalho.
E, ainda, encontrar um denominador comum na interação do Direito Militar e do
Direito Administrativo Militar, focando a defesa e sua atuação, discutir a atuação da Polícia
Judiciária Militar e a defesa no Inquérito Policial Militar, tema ainda bastante controverso na
Justiça comum, ainda mais perante a Justiça Militar.
O procedimento no crime de deserção, bem como a prescrição neste instituto do
Direito Militar e a defesa do desertor, a menagem e outros tipos de prisões, suas definições,
cabimentos e locais de cumprimento, são alguns dos tópicos abordados neste trabalho.
O bem jurídico penal militar, a criminalização da conduta militar, seu conceito, a
desclassificação do crime militar para transgressão disciplinar e a comparação com o bem
jurídico na Justiça comum, os prazos no Direito Processual Penal Militar e uma breve
comparação com os prazos da Justiça comum, serão discutidos de forma ampla.
A abordagem sobre a Justa Militar dos Estados e a formação dos Conselhos
Permanente de Justiça e Especial de Justiça, suas características, a forma de atuação e suas
competências, se faz necessário para se entender sua necessidade.
Em todas as áreas o enfoque será sempre o Constitucional, os direitos e garantias que o
ordenamento jurídico brasileiro trazem ao encontro da Justiça Militar.
O presente trabalho não busca esgotar os assuntos aqui mencionados, mas levar aos
estudiosos do Direito, em especial, do Direito Militar, um compêndio mais aprofundado dos
12
temas propostos, facilitando a pesquisa e a compreensão de uma área pouco discutida nos
bancos acadêmicos.
13
1 HISTÓRICO DA JUSTIÇA MILITAR
Podemos afirmar que a história da Justiça Militar tem suas origens na própria hisria
da humanidade. Identifica-se ela com a história das grandes concentrações humanas, erigidas
em exércitos de conquistas ou de defesa, sujeitos aos rígidos princípios de disciplina e
hierarquia. A necessidade do resguardo e vigilância de tais princípios, indispensáveis a
existência das corporações armadas, é que deu margem e ensejou a implantação da Justiça
Castrense.
1
Renato Astrosa Herrera
2
afirma que em determinados povos antigos, os julgamentos
dos militares eram realizados pelos próprios militares:
[...] existem antecedentes históricos que permitem deduzir que, em determinados
povos civilizados da antiguidade, tais como a Índia, Lacedemônia, Atenas, Pérsia,
Macenia, Cartago, era conhecida a existência de certos delitos militares e era
aceito, às vezes, seu julgamento, pelos próprios militares, especialmente em tempo
de Guerra.
Contudo, constatões como “já se tornou cediça a afirmação segundo a qual o Direito
Militar e com ele a Justiça Militar datam do aparecimento dos exércitos permanentes”
3
, ou
por imperativo dos fatos mesmos, a jurisdição penal militar aparece, na mais remota
antiguidade, quando surge, conjuntamente com o Estado, o corpo armado [...].
4
Getúlio Corrêa
5
afirma que fatos que hoje se tem como crime militar eram apontados
no digo de Enammu
6
, a mais antiga lei conhecida, mas sem uma jurisdição militar, e sim
submetidos à vontade do Rei, o seu maior chefe.
O Código de Hammurabi
7
também apresentava normas de caráter militar, assim como
antigas leis assírias e egípcias.
1
Foram os romanos que, primeiramente, deram consistência e imprimiram racionalidade aos preceitos
normativos do Direito e da Justiça Militar. Foi o Direito Romano o inspirador das leis militares dos povos
cultos, como acentua Esmeraldino Bandeira, em notável trabalho em as penas aplicadas aos oficiais e soldados
do Exército Romano (BRASIL. Tribunal de Justiça Militar do Estado de São Paulo. Imprensa Oficial do
Estado. História da Justiça Militar do Estado de São Paulo. São Paulo: IOE, 1976. p. 9.).
2
HERRERA, Renato Astrosa. Derecho Penal Militar. Santiago de Chile: Jurídica de Chile, 1971. p. 15.
3
PARANHOS, Carlos Alberto Teixeira. A Justiça Militar no cenário internacional. Revista do Superior
Tribunal Militar, Brasília, v. 10, n. 1, 1988. p. 36.
4
SOTOMAYOR, 1973, apud CORRÊA, Getúlio. Direito Militar História e Doutrina. Florianópolis:
Associação dos Magistrados das Justiças Militares Estaduais, 2002. p. 9.
5
CORRÊA, Getúlio. Direito Militar História e Doutrina. Florianópolis: Associação dos Magistrados das
Justiças Militares Estaduais, 2002. p. 9.
6
Ibid., p. 9. Ur-Nammu, da cidade de Ur, fundador da III Dinastia de UR, na antiga Mesopotâmia.
7
Hammurabi, sexto rei da Babilônia, governou por 43 anos. A partir da descoberta da escrita cuneiforme, graças
a Sir Henry Rawlinson, militar, diplomata e orientalista, pôde-se conhecer as leis do rei Hammurabi, que viveu
14
Nelas, as “suas prescrições de justiça, onde anematiza aquele que negligenciasse o
cumprimento dos preceitos inseridos no Código, que tomou seu próprio nome, escreveu: Que
samas, o grande Juiz do céu e da terra, aquele que conduz retamente os seres vivos, o senhor,
meu refúgio, derrube a sua realeza, não promulgue o seu direito, confunda o seu caminho,
faça cair a disciplina do seu exército etc..
8
Contudo, para a maioria da doutrina foi na península itálica que a justiça castrense
teve seu desenvolvimento e se mostrou para o mundo civilizado, influenciando-o.
9
Getúlio Corrêa afirma que a Justiça Militar teve origem dentro da própria organização
militar, de início, ao estabelecerem algumas regras de conduta para os militares, as quais
previam severos castigos àqueles que as não cumpriam.
10
Mas foi em Roma que percebendo a sustentação de sua glória e a consecução de mais
conquistas que pretendesse, estariam dependentes de suas legiões, fixou princípio para a
Justiça Militar, com delitos e penas, os quais até hoje servem de base para o Direito Militar no
mundo.
11
José da Silva Loureiro Neto
12
assevera também que foi em Roma que o Direito Penal
Militar adquiriu vida própria, considerado como instituição jurídica.
Chrylito de Guso
13
entende que a evolão histórica pode ser dividida em quatro
fases:
a) Época dos Reis, em que os soberanos concentravam em suas mãos todos os
poderes, inclusive o de julgar.
b) Segunda fase, em que a Justiça Militar era exercida pelosnsules, como poderes
de imperium majus. Abaixo dele, havia o Tribuno Militar, que possuía o chamado
imperium militae, que simbolizava a dupla reunião da justiça e do comando.
c) Terceira fase, época de Augusto, em que a justiça militar era exercida pelos
prefeitos do pretório, com jurisdição muito ampla.
d) Quarta fase, época de Constantino, em que foi instituído o Consilium, com a
função de assistir o Juiz Militar. Sua opinião era apenas consultiva.
entre 1728 e 1686 a.C. (CORRÊA, Getúlio. Direito Militar História e Doutrina. Florianópolis: Associação
dos Magistrados das Justiças Militares Estaduais, 2002. p. 9.).
8
PINHEIRO, 1986/1987, apud CORRÊA, Getúlio. Direito Militar História e Doutrina. Florianópolis:
Associação dos Magistrados das Justiças Militares Estaduais, 2002. p. 9.
9
CAMPOS JÚNIOR, José Luiz Dias. Direito Penal e Justiça Militares - Inabaláveis Princípios e Fins. Curitiba:
Juruá, 2001. p. 49.
10
CORRÊA, Getúlio. Direito Militar História e Doutrina. Florianópolis: Associação dos Magistrados das
Justiças Militares Estaduais, 2002. p. 27.
11
Ibid.
12
LOUREIRO NETO, José da Silva. Direito Penal Militar. São Paulo: Atlas, 1999. p. 20.
13
GUSMÃO, 1915, apud LOUREIRO NETO, Jo da Silva. Direito Penal Militar. São Paulo: Atlas, 1999. p.
20.
15
José Luiz Dias Campos Júnior afirma que na primeira fase, a Justa Militar romana,
que tal como nos primórdios da Grécia antiga, não possuía autonomia em relação à civil, era
exercida pelo Rei Romano, com o auxílio de um conselho de patrícios, concentrando-se,
porém, na majestade de toda a sorte de poderes.
14
Com o transcorrer dos tempos, na Justiça Militar, ora centralizada, ora não, passou-se
a admitir a provocatio ad populum, isto é, a decisão dos recursos criminais em última
instância pelo povo e sob a direção dos duoviri perduellionis, bem como a sujeição quase
absoluta das tropas ao seu comandante, os tribuni celerum. Inicia-se a segunda fase.
No princípio, os Cônsules
15
julgavam, além das causas civis, as militares.
Posteriormente, estas couberam àqueles somente; aquelas, aos Pretores. Entretanto, nas causas
respectivas, os Cônsules não podiam, sem consultar previamente seus companheiros militares,
impor a pena de morte à soldadesca.
Imediatamente abaixo dos nsules, havia os Tribunos que, nomeados por aqueles e
pelo povo, exerciam o imperium militae que simbolizava uma dupla reunião: a participação
no comando militar e na administração da justiça. Na sequência, respeitando-se a ordem
hierárquica, exercia-se a jurisdição disciplinar.
Com o império teve início o terceiro período da Justiça Romano-Militar. Nessa fase,
mesmo já havendo a delegação de poderes aos promagistratus, Augusto confiou aos prefeitos
do Pretório um poder ilimitado, salvo, apenas, nas causas relativas ao oficialato superior.
Competindo-lhes o conhecimento de todas as apelações, suas decisões, antes recorríveis,
passaram a ser inatacáveis, restando aos condenados a indulncia imperial.
Nas províncias do Imperador, havia uma divisão qualitativa, de maior ou menor grau,
relativamente ao julgamento dos casos criminais. Ao legatus, comandantes das legiões,
competiam o julgamento e punição destes. Aqueles, ao presidente da Província.
Quanto às Províncias do Senado, aos Procônsules competia a jurisdição militar, sendo
que, relativamente à condenação a pena capital, somente a poderiam infringir se por
delegação do Imperador.
14
CAMPOS JÚNIOR, José Luiz Dias. Direito Penal e Justiça Militares - Inabaláveis Princípios e Fins.
Curitiba: Juruá, 2001. p. 49.
15
Ibid., p. 49. Aqueles que exerciam o imperium majus, que eram representantes do governo.
16
À época de Constantino
16
, verifica-se o epílogo da história da justiça militar da Roma
antiga. Em virtude da grande força política que as legiões romanas haviam adquirido, o
imperador, visando a quebrantá-la, multipartiu-as, quebrando-lhes a consciência da própria
força. Por corolário, houve a necessidade de modificação na Justiça Militar, o que se fez
retirando-se o poder militar dos prefeitos do Pretório e delegando-o a duas espécies de Juízes:
os magistri peditum e os magistri equitum, que com o passar dos tempos foram confundidos
sob a denominação de magistri militum, sendo auxiliados por um Consilium, cuja
manifestação, em que pese obrigatória por vezes, era meramente consultiva. Os magistri
militum apreciavam quase todos os recursos pertinentes aos soldados, inclusive causas da
esfera civil de menor gravidade, pois as de maior importância eram destinadas aos magistri
per províncias.
Quanto às causas secundárias, seus julgamentos cabiam aos Condes e Duques,
assistidos pelo consistorium, auditorium, meramente consultivo.
17
Desta forma, José da Silva Loureiro Neto
18
conclui que a organização militar se
modificou com o respectivo direito quando o império romano estendeu mais longe suas
conquistas e no período gallo-franco, quando os francos, os burguinhões, os visigodos, etc.
invadiram a Gallia levaram, não sua organização militar, porque não se pode chamar assim a
formação de bandos desordenados de bárbaros, mas o modo de combater os romanos.
Para o autor é inquestiovel que as origens históricas do Direito Criminal Militar,
como de qualquer ramo de Direito, são principalmente as que nos oferecem os romanos e, sua
política se caracterizava pela forma de dominar antes de tudo os povos pela força das armas e,
depois, consolidar a conquista pela justiça das leis e sabedoria das instituições.
19
16
Constantino: primeiro Imperador romano cristão, era filho de Constâncio Cloro e de sua concubina, Helena,
cresceu na corte do Imperador Diocleciano e teve educação esmerada, em 305, juntou-se ao pai, então
nomeado Césardo Ocidente, e participou das campanhas da Britânia (Grã-Bretanha). No ano seguinte, com
a morte de Constâncio Cloro, foi aclamado imperador pelas legiões que comandava. O título, porém, não foi
reconhecido em Roma. Em 303, após muitas batalhas e lutas políticas, Constantino conseguiu derrotar seus
oponentes, passando a dividir o império com Licínio, no mesmo ano foi promulgado o edito de Milão,
reconhecendo oficialmente a religião cristã. Em 325, Constantino convocou o concílio ecumênico de Nicéia,
que normatizou os cânones cristãos. Em 326, o Imperador iniciou a construção de Constantinopla (atual
Istambul), com o fim de transferir para a sede oficial do governo, que sempre havia sido Roma. A nova
cidade foi inaugurada em 330. Dali, Constantino governou até a morte, em 337 (IMPERADOR romano
Constantino. UOL Educação, Biografias, São Paulo. Disponível em: <http://educação.uol.com.br/biografias>.
Acesso em: 17 mai. 2010.).
17
GUSMÃO, 1915, apud CAMPOS NIOR, José Luiz Dias. Direito Penal e Justiça Militares - Inabaláveis
Princípios e Fins. Curitiba: Juruá, 2001. p. 49
18
LOUREIRO NETO, José da Silva. Direito Penal Militar. São Paulo: Atlas, 1999. p. 20.
19
Ibid.
17
1.1 História da Justiça Militar no Brasil
Para melhor entender a história da Justiça Militar no Brasil necessário se faz dividir
em Justiça Militar Federal e Justiça Militar Estadual, explicando-as separadamente.
Com a vinda da família real para o Brasil em 08 de março de 1808, Dom João, entre os
inúmeros atos que lhe foram atribuídos, como por exemplo, a criação da Real Academia de
Guardas-Marinha, atualmente Escola Naval, criação da Imprensa Régia, que após a
independência passou a chamar-se de Tipografia Nacional, criação do Banco do Brasil,
destacou-se a criação, pelo Alvará de 1º de abril do mesmo ano, o Conselho Supremo Militar
e de Justiça, princípio do atual Egrégio Superior Tribunal Militar.
20
O Conselho Supremo Militar e de Justiça compunha-se no início de nove Conselheiros
de Guerra e de três Vogais, possuindo amplas atribuições de cunho administrativo, e o
Supremo Tribunal de Justiça, formado pelos mesmos Conselheiros e Vogais além de outros
três Juízes Togados, com funções circunscritas ao conhecimento, em reexame necessário, dos
processos oriundos dos Conselhos de Guerra. A Justiça Militar Federal ostenta a condição
de primogênita da judicatura nacional”.
21
Contudo, José Luiz Dias Campos Júnior afirma que, analisando-se a Carta Imperial de
25 de março de 1824, no Título V (Do Imperador), Capítulo III (Da Força Militar), artigos
145 a 150, e no Título VI (Do Poder Judicial), Capítulo Único (Dos Juízes e Tribunais de
Justiça), artigos 151 a 164, não se constata qualquer referência àquela Justiça.
O autor salienta, ainda, que no tocante à primeira Constituição republicana, de 24 de
fevereiro de 1891, bem como em suas emendas de 1925 e de 1926, embora não pertencente ao
Poder Judiciário, conforme a análise do Título I (Da Organização Federal), Seção III (Do
Poder Judiciário), artigos 55 a 62, a Justiça Militar Federal estava prevista, sobretudo no
tulo IV (Dos Cidadãos Brasileiros), Seção II (Declaração de Direitos), artigos 77, e §§ 1º e
2º, que reproduzimos, in verbis:
22
20
A esse respeito confirmam COSTA, 1978. p. 17; BAPTISTA, NONAK, 1997, apud CAMPOS JÚNIOR, José
Luiz Dias. Direito Penal e Justiça Militares - Inabaláveis Princípios e Fins. Curitiba: Juruá, 2001. p. 52.
21
BRASIL. Tribunal de Justiça Militar do Estado de São Paulo. Imprensa Oficial do Estado. História da Justiça
Militar do Estado de São Paulo. São Paulo: IOE, 1976. p. 11.
22
CAMPOS JÚNIOR, José Luiz Dias. Direito Penal e Justiça Militares - Inabaláveis Princípios e Fins.
Curitiba: Juruá, 2001. p. 53.
18
Art. 77. Os militares de terra e mar terão foro especial nos delitos militares.
§ 1º. Este foro compor-sede um Supremo Tribunal Militar, cujos membros serão
vitalícios, e dos conselhos, necessários para a formação da culpa e julgamento dos
crimes.
§ 2º. A organização e atribuições do Supremo Tribunal Militar serão reguladas por
lei (grifo nosso).
Conforme o texto acima, ressalta-se que, apenas, houve mudança na denominação
do Tribunal, pois foram mantidos todos os componentes do antigo Conselho Supremo Militar
e de Justiça, despojados de seus títulos nobiliárquicos, e denominados, genericamente,
Ministros”.
23
A Carta de 1934 inovou a matéria. A par de incluir a Justiça Militar no rol dos órgãos
do Poder Judiciário, tirando-lhe o caráter administrativo que até então possuía, estendeu o
foro militar aos assemelhados e mesmo aos civis, nos casos definidos em lei para a repressão
dos crimes contra a segurança externa do país, ou contra as instituições militares.
A Carta de 1937 manteve o status quo estabelecido pela Constituição de 1934
relativamente à Justiça Militar, quer quanto à forma, quer quanto à sua posição e conceituação
como órgão do Poder Judiciário.
A Constituição de 1946, a par de manter os preceitos estabelecidos pelas Constituições
de 1934 e 1937, introduziu alterações na Justa Castrense. Mudou a denominação de
Supremo Tribunal Militar para Superior Tribunal Militar, do órgão cúpula da justiça castrense
do país; reservou o título “Supremo”, com todo o acerto, ao Supremo Tribunal Federal, que é
o único óro de superposição da justiça brasileira.
A Revolão de 31 de março de 1964 trouxe mudanças significativas para a justa
castrense através dos Atos Institucionais, principalmente no tocante ao julgamento de civis,
autores de crimes contra a seguraa nacional, além dos crimes contra as instituições
militares, também esta Carta firmou a competência da Justiça Militar para apreciar os crimes
contra o Estado e a ordem potica e social, previstos na Lei nº 1.802, de 5 de janeiro de 1953,
competindo-lhe processar e julgar, nesses delitos, os governadores e secretários de Estado.
O diploma potico de 1967 não operou grandes transformações na Justa Militar,
introduziu como grande inovação, o recurso ordinário ao Supremo Tribunal Federal das
decisões proferidas pela justiça castrense, nos casos expressos em lei, contra civis,
23
HISTÓRIA do STM, fundação. Superior Tribunal Militar, Brasília, p. 1. Disponível em:
<http://www.stm.gov.br>. Acesso em: 10 set. 2009.
19
governadores e secretários de Estado. Cumpre notar, como matéria de relevância, que o Ato
Institucional nº 5, de 13 de dezembro de 1968, suspendeu a garantia constitucional do habeas
corpus” nos crimes políticos contra a segurança nacional, a ordem potica e social e a
economia popular.
A Constituição de 1969 o trouxe modificações ou alterações à Justiça Militar, tal
como foi conceituada pelas Constituições anteriores.
24
Finalmente, na atualidade, a Constituição de 05 de outubro de 1988, contempla a
Justiça Militar Federal no artigo 92, VI, perpetuando-se a fidelidade com a renovação do
Texto de 1934, da Seção I (Disposições Gerais), do Capítulo III (Do Poder Judiciário), do
tulo IV (Da Organização dos Poderes), e nos artigos 122 a 124 e seu parágrafo único, da
Seção VII (Dos Tribunais e Juízes Militares), dos mesmos Capítulo e Título. De sua leitura,
constata-se que compõem a Justiça Castrense: o Egrégio Superior Tribunal Militar (artigo
122, I); os Tribunais e Juízes Militares instituídos em lei (artigo 122, II).
25
Quanto à competência, encontramos no artigo 124 da Magna Carta sua definição, sem
o qual não teria sentido tal justiça castrense, estando-o assim definido:
Artigo 124. À Justiça Militar compete processar e julgar os crimes militares
definidos em lei.
Parágrafo único. A lei disporá sobre a organização, o funcionamento e a
competência, da Justiça Militar.
1.2 História da Justiça Militar do Estado de São Paulo
Podemos observar que até a Constituição de 1934 não foi citada a Justiça Militar
Estadual nas Leis Maiores de nosso País. Somente após a Constituição de 18 de setembro de
1946 é que a Justiça Castrense Estadual passou a ocupar a posição que hoje desfruta como
óro do Poder Judiciário dos Estados.
26
No entanto, JoLuiz Dias Campos Júnior diz que com o surgimento do embrião da
Polícia Militar, institda pela lei de 06 de junho de 1831, sob o simples nome de Guardas e a
24
BRASIL. Tribunal de Justiça Militar do Estado de São Paulo. Imprensa Oficial do Estado. História da Justiça
Militar do Estado de São Paulo. São Paulo: IOE, 1976. p. 11 a 13.
25
CAMPOS JÚNIOR, José Luiz Dias. Direito Penal e Justiça Militares - Inabaláveis Princípios e Fins.
Curitiba: Juruá, 2001. 2001. p. 55.
26
BRASIL. Tribunal de Justiça Militar do Estado de São Paulo. Imprensa Oficial do Estado. História da Justiça
Militar do Estado de São Paulo. São Paulo: IOE, 1976. p. 14.
20
aglutinação dos departamentos principiológicos dos Bombeiros Militares, já havia um
prenúncio para seus controles.
27
A Constituição de 1934,
[...] embora não dispondo expressamente sobre a Justiça Militar Estadual, conferiu à
União competência privativa para legislar sobre a organização, instrução, justiça e
garantias das forças policiais dos Estados, e condições gerais de sua utilização em
caso de mobilização ou de guerra (artigo 5º, XIX, letra I).
28
As quase dois anos, as pocias militares foram reorganizadas por lei
infraconstitucional, lei nº 192, de 17 de janeiro de 1936. [...] e foi justamente essa lei que
autorizou a organização da Justiça Militar nos Estados, conforme dispõe o parágrafo único
do artigo 19: Cada Estado organizará a sua Justiça Militar, constituindo, como órgão de
primeira instância os Conselhos de Justiça e de segunda instância, a Corte de Apelação ou
Tribunal Especial‟..
29
Impulsionada pelo dinamismo fático que lhe propiciava a positivação, somente em
1946 essa Justiça alcançaria o ncaro hierárquico como órgão do Poder Judiciário.
30
Art. 124. Os Estados organizarão a sua justiça com observância dos artigos 95 a 97
e também dos seguintes princípios:
[...]
XII - A Justiça Militar estadual, organizada com observância dos preceitos gerais
da Lei federal (art. 5º, XV, letra f), terá como órgãos de primeira instância os
conselhos de justiça e como órgão de segunda instância um tribunal especial ou
Tribunal de Justiça.
no Estado de São Paulo, desde 1892, havia um prelúdio de uma Justiça Militar
Estadual com a Auditoria da Força Pública, composta de um Auditor e de Conselhos de
Justiça. As decisões do óro eram revistas pelo presidente do Estado, cargo que corresponde
ao atual Governador de o Paulo.
31
27
CAMPOS JÚNIOR, José Luiz Dias. Direito Penal e Justiça Militares - Inabaláveis Princípios e Fins.
Curitiba: Juruá, 2001. p. 59.
28
Ibid., p. 59.
29
BRASIL. Tribunal de Justiça Militar do Estado de São Paulo. Imprensa Oficial do Estado. História da Justiça
Militar do Estado de São Paulo. São Paulo: IOE, 1976. p. 14.
30
CAMPOS JÚNIOR, op. cit., p. 60, nota 27.
31
A história da Justiça Militar Estadual nos mostra que, antes mesmo da Lei Estadual nº 2.856, de 8 de janeiro de
1937, que calcada na Lei Federal 192, de 17 de janeiro de 1936, criando a Justiça Militar, São Paulo
possuía um incipiente ordenamento castrense, não integrado ao Poder Judiciário. A situação perdurou até o ano
de 1936. Com o advento da Lei Federal nº 192, de 17 de janeiro daquele ano, quando foi criada a Justiça
Militar nos Estados, como foi dito. O Governo do Estado, através da Lei Estadual nº 2.856, de 8 de janeiro
de 1937, criou o Tribunal de Justiça Militar, com a denominação de Superior Tribunal de Justiça Militar
21
Mas foi pela lei 333, de 8 de julho de 1974, que a estrutura da Justiça Militar
Estadual se aproximou do que é hoje, foram criadas a Terceira e Quarta Auditorias, sendo que
a Terceira Auditoria passou a funcionar em substituição aos Conselhos Extraordinários, cujo
prazo de vigência expirava.
Com a Emenda Constitucional número quarenta e cinco então, determinou-se as
competências que hoje regem o Tribunal de Justa Militar Estadual.
E, sendo a Polícia Militar do Estado de São Paulo resultado da fusão entre a Guarda
Civil e a Força blica em 1970 e por ser força auxiliar e reserva do Exército à época,
também foi submetida ao mesmo instituto penal, obedecendo ao que preconiza o artigo 6º do
Código de Processo Penal Militar.
(HISTÓRIA, competência e composição. Tribunal de Justiça Militar do Estado de São Paulo. Disponível em: <
http://www.tjm.sp.gov.br>. Acesso em: 10 set. 2009.).
22
2 PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS ORIENTADORES DO PROCESSO PENAL E
DO PROCESSO PENAL MILITAR
Em um Estado Democrático de Direito, direitos e garantias devem estar expressos na
Lei Maior, que é justamente o que ocorre no Brasil, que é um ps humanista em sua essência,
pois enfatiza a dignidade da pessoa humana, destacando-a na Constituição Federal no artigo
1º, inciso III.
Sendo o Direito de Processo Penal, e porque não dizermos que o Direito Processual
Penal Militar também, a ferramenta garantista de um Estado Democrático de Direito, ou seja,
a Constituição aplicada, necessário se faz discutirmos os princípios constitucionais que os
regem, que podem ser vistos como alicerce das normas processuais.
O processo penal militar é um ramo do Direito que também busca aplicar as garantias
de um Estado Democrático de Direito, assim sendo, podemos afirmar que os mesmos
princípios que regem o processo penal, regem, também, o processo penal militar.
Ao discutirmos os Princípios Constitucionais do Processo Penal e, assim, do processo
penal militar, estaremos tratando de um tema amplo e importante, que nos leva a refletir sobre
os principais conceitos constitucionais e bases de outros ramos do Direito.
Desta forma, os Princípios Constitucionais do Processo Penal e do Processo Penal
Militar a serem estudados são: Devido Processo Legal, Ampla Defesa, Contraditório, Juiz
Natural, Publicidade, Obrigatoriedade e Presunção de Inocência.
O processo penal e o processo penal militar, além de instrumento de aplicação do
Direito Penal e Penal Militar material, é também instrumento da realização da Justiça, daí a
importância desses ramos do Direito, que não agem isoladamente, mas se completam com
outros ramos do Direito.
O constituinte, em 1988, dada a importância do Direito Processual Penal, fez inserir na
Constituição cidadã, inúmeras normas deste ramo do Direito, outro objetivo o teve, se não o
de valorar normas processuais penais na Lei Maior de nosso País.
23
Alberto Silva Franco
32
cita em sua obra Código de Processo Penal e sua interpretação
jurisprudencial que:
O Processo Penal é um complexo de relações Jurídicas que tem por objeto a
aplicação da Lei Penal. Não há partes, pedido ou lide, nos termos empregados no
processo civil. Juridicamente, acusação e defesa conjugam esforços, decorrência do
contraditório e defesa ampla, para esclarecimento da verdade real. Ninguém pode
ser condenado sem o devido processo legal.
2.1 Princípios Constitucionais
Ao afirmarmos que o Processo Penal é a Constituição aplicada, nos vimos obrigados a
buscar o conceito de princípio a partir da Lei Maior para solidificarmos uma base de estudo
no cerne da questão.
No que tange o processo penal militar, este também tem seu quinhão de
responsabilidade quanto à aplicação da Constituição Federal, quando falamos em crime
militar, é o processo penal militar que deverá instrumentalizar a lei penal militar no caso
concreto, desta forma, este ramo do Direito não pode se distanciar de nossa carta política e de
seus princípios informadores.
Entendemos por princípio o início, onde tudo se principia, é a estrutura, a base como
alicerce. O princípio não aparece, mais sustenta as leis (Federais, Estaduais, Ordinárias, etc.),
existindo para dar validade a elas.
Para Luiz Alberto David Araújo e Vidal Serrano Nunes Junior
33
não é possível
estudar o texto constitucional positivo de qualquer Estado sem antes identificar os princípios
que informaram tal documento.
É Jorge Miranda
34
quem explica a importância que existe entre os princípios e sua
carga valorativa para o intérprete:
32
FRANCO, Alberto Silva; STOCO, Rui. (Orgs.). digo de Processo Penal e sua interpretação
jurisprudencial. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001. p 1.
33
ARAUJO, Luiz Alberto David; NUNES JÚNIOR, Vidal Serrano. Curso de Direito Constitucional. São
Paulo: Saraiva, 2006. p. 66.
34
“Se assim se afigura em geral, muito mais tem de ser no âmbito do Direito Constitucional, tronco da ordem
jurídica estadual, todo ele envolvido e penetrado pelos valores jurídicos fundamentais dominantes na
comunidade e, sobretudo, tem de ser assim na consideração da Constituição material como núcleo de
princípios e não tanto de preceitos ou disposições articuladas” (MIRANDA, Jorge. Manual de Direito
Constitucional. Portugal: Coimbra, 1983. v. 2, p. 198.).
24
Os princípios não se colocam, pois, além ou acima do Direito (ou do próprio Direito
positivo); também eles numa visão ampla, superadora de concepções positivistas,
literalistas e absolutizantes das fontes legais fazem parte do complexo
ordenamental. Não se contrapõe às normas, contrapõem-se o somente aos
preceitos; as normas jurídicas é que se dividem em normas-princípios e normas-
disposições.
Para José Afonso da Silva a palavra princípio é equivocada, pois aparece com sentidos
diversos. Apresenta a acepção de começo, de início. Norma de princípio (ou disposão de
princípio), por exemplo, significa norma que contém o início ou esquema de um órgão,
entidade ou de programa, comoo as normas de princípio institutivo e as de princípio
programático.
O autor não entende ser nesse sentido que se acha a palavra princípio da expressão
princípios fundamentais”, do Título I, da Constituição, para ele, princípio exprime a noção
de “mandamento nuclear de um sistema”.
As normas são preceitos que tutelam situações subjetivas de vantagem ou de
vínculo, ou seja, reconhecem, por um lado, a pessoa ou entidade a faculdade de
realizar certos interesses.
35
Por outro lado, Celso Antonio Bandeira de Mello
36
define princípio da seguinte forma:
Princípio é um mandamento nuclear de um sistema, verdadeiro alicerce dele,
disposição fundamental que se irradia sobre diferentes normas, compondo-lhes o
espírito e servindo de critério para sua exata compreensão e inteligência, exatamente
por definir a lógica e a racionalidade do sistema normativo, no que lhe confere a
tônica e lhe dá sentido harmônico.
Assim, os princípios são ordenações que se irradiam e imantam os sistemas de normas,
são núcleos de condensações nos quais confluem valores e bens constitucionais. Os
princípios que começam por ser a base de normas jurídicas, podem estar positivamente
incorporados, transformando-se em normas-princípio e constituindo preceitos básicos da
organização constitucional.
Os princípios e as regras também possuem distinção entre si, os princípios são
genéricos, podendo ser expressos ou tácitos, enquanto as regras são sempre expressas.
Ao diferenciarmos princípios de regras podemos dizer que, sabe-se que os princípios,
ao lado das regras, são normas jurídicas. Os princípios, porém, exercem dentro do sistema
normativo um papel diferente dos das regras. Estas, por descreverem fatos hipotéticos,
35
SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. São Paulo: Malheiros, 2007. p. 91.
36
MELLO, Celso Antonio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. São Paulo: Malheiros, 2003. p. 450.
25
possuem a tida função de regular, direta ou indiretamente, as relações jurídicas que se
enquadrem nas molduras típicas por elas descritas. Não é assim com os princípios, que são
normas generalíssimas dentro do sistema normativo.
2.2 Princípios Constitucionais do Processo Penal
Segundo Marco Antonio Marques da Silva
37
, os princípios constitucionais do Direito
Penal cumprem uma função fundamentadora da intervenção do Estado Democrático de
Direito na privacidade e intimidade das pessoas, através do poder de punir, estabelecendo os
limites deste.
Já no Processo Penal, os princípios constitucionais proporcionam as regras segundo os
quais o fato deve ser produzido e considerado válido para poder determinar consequências
jurídicas.
Assim, o processo não é apenas um instrumento técnico, refletindo em si valores
políticos ideológicos de uma nação, espelha-se em um determinado momento histórico e nas
diretrizes básicas do sistema político do país.
José Frederico Marques
38
afirma que, dentro desse quadro, a jurisdição penal tem
condições de atuar, através dos juízes e Tribunais de modo a fazer do processo, dentro das
contingências humanas, um instrumento de garantia da liberdade e do status dignitatis” dos
acusados, com um procedimento que não seja meio e modo de perseguições indevidas, mas,
ao reverso, a configuração do processo justo em que a lei penal seja aplicada, dando-se a cada
um o que é seu.
Marco Antonio Marques da Silva
39
assevera ainda na mesma obra que, a Constituição
da República Federativa do Brasil, promulgada no dia 5 de outubro de 1988, trouxe grandes
modificações no campo do Direito Processual Penal, regulamentou ainda mais o papel do
Poder Judiciário na aplicação da Lei Maior, estabelecendo ainda novas garantias individuais e
coletivas, além de criar mecanismos que tornem o processo e seus procedimentos mais
céleres.
37
SILVA, Marco Antonio Marques da. Acesso à Justiça Penal e Estado Democrático de Direito. São Paulo:
Juarez de Oliveira, 2001. p. 15.
38
MARQUES, José Frederico. O processo penal na atualidade. In: PORTO, Hermínio Alberto Marques; SILVA,
Marco Antonio Marques da. (Orgs.). Processo Penal e Constituição Federal. São Paulo: Acadêmica, 1993.
p. 20.
39
SILVA, op. cit., nota 37.
26
Desta forma, o Direito Processual Penal é o ramo da ciência jurídica que tem por
conteúdo os princípios, institutos e normas concernentes à Administração da Justiça em
matéria penal.
Cumpre, pois, ao Direito Processual Penal e ao Direito Processual Penal Militar, a
sistematização dos preceitos que disciplinam os órgãos e funções da Justa Penal e da Justiça
Penal Militar.
Por essa razão, ele abrange em seu estudo, não apenas o processo penal propriamente
dito, mas, também, o processo penal militar e os procedimentos prepararios que antecedem
a propositura da ação penal.
De outra parte, as leis e regras da organização judicria criminal, e aquelas sobre a
estruturação dos órgãos estatais não judiciários, que atuam em área da Administração da
Justiça em matéria penal, abrangidas também estão no Direito Processual Penal.
Marco Antonio Marques da Silva
40
ressalta a importância dos princípios
constitucionais, norteadores do processo penal, que é o Direito Constitucional Aplicado, e,
destaca oito subitens dos princípios constitucionais do processo penal que são:
Princípio do Due Process Of Law (Princípio do Devido Processo Legal); Princípio do
Contraditório e da Ampla Defesa; Princípio Acusatório e Juiz Natural; Princípio da
Publicidade; Princípio da Obrigatoriedade; Princípio da Presunção de Inocência; Princípio do
in dúbio pro réu e Princípio da Verdade no Processo Penal.
Para Alberto Silva Franco e Rui Stoco
41
as garantias existem não por acaso, mas para
serem respeitadas, porque faz-se necessárias as realizações do indivíduo em sociedade e são
indispensáveis ao bom funcionamento de uma ordem democrática, pois:
A submissão de uma pessoa à Jurisdição penal do Estado coloca em evidência a
relação de polaridade conflitante que se estabelece entre a pretensão punitiva do
Poder Público, de um lado, e o resguardo à intangibilidade do Jus Libertatis
titularizado pelo réu, de outro.
40
SILVA, Marco Antonio Marques da. Acesso à Justiça Penal e Estado Democrático de Direito. São Paulo:
Juarez de Oliveira, 2001. p. 16.
41
FRANCO, Alberto Silva; STOCO, Rui. (Orgs.). digo de Processo Penal e sua interpretação
jurisprudencial. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001. p 1.
27
2.2.1 O princípio do devido processo legal
O princípio do devido processo legal foi expressamente abrigado pelo inciso LIV, do
artigo , da Constituição da República de 1988
42
, dizendo que ninguém será privado da
liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal.
Devido Processo Legal é uma expressão que deriva do inglês “due process of law”,
este princípio obriga à obediência aos ditames legais de nosso ordenamento jurídico, ou seja,
a lei é o caminho a ser seguido no curso do processo, constituindo, basicamente, a garantia de
que o conteúdo da jurisdicionalidade é a legalidade, nullus actum sine lege, ou seja, o rigor de
obediência ao previamente estabelecido na Lei.
Para Nelson Nery Junior,
[...] bastaria a norma constitucional haver adotado o princípio do due process of law
para que daí decorressem todas as conseqüências processuais que garantiriam aos
litigantes o direito a um processo e uma sentença justa. É, por assim dizer, gênero do
qual todos os demais princípios constitucionais do processo são espécie.
43
O autor salienta que, guardada fidelidade à matriz norte-americana, o princípio do
devido processo penal possuiria um sentido genérico material e processual caracterizado
pelo trinômio vida-liberdade-propriedade. Em outras palavras, significaria o direito à tutela, a
esses bens jurídicos em seu sentido mais amplo.
Entretanto, a doutrina e a jurisprudência brasileira tem empregado o princípio num
sentido eminentemente processual. Neste específico, o devido processo legal traduziria,
segundo o precitado autor, um princípio-mãe, que implicaria a observância estrita das
seguintes regras:
a) direito a prévia citação para conhecimento do teor da acusação;
b) direito a um juiz imparcial;
c) direito ao arrolamento de testemunhas e à elaboração de reperguntas;
d) direito ao contraditório (contrariar provas inclusive);
e) direito à defesa técnica;
f) direito à igualdade entre acusação e defesa;
42
ARAUJO, Luiz Alberto David; NUNES JÚNIOR, Vidal Serrano. Curso de Direito Constitucional. São
Paulo: Saraiva, 2006. p. 183.
43
NERY JÚNIOR, Nelson. Princípios do processo civil na Constituição Federal. São Paulo: Revista do
Tribunais, 2004. p. 27.
28
g) direito de não ser acusado ou processado com base em provas ilícitas;
h) privilégio contra a autoincriminação.
Ressalta, nesse sentido, a regra constitucional de proibição das provas ilícitas. A
ilicitude de uma prova decorre da forma de sua obtenção ou do momento ilícito de sua
introdução no processo. No primeiro caso, denomina-se a prova materialmente ilícita. No
segundo, formalmente ilícita.
Tanto em um caso, como em outro, as provas ilícitas são vedadas pelo nosso
ordenamento jurídico, seja na lei infraconstitucional, seja na Lei Maior, não cabendo
contestões.
O devido processo legal não se destina tão somente ao intérprete da lei, mas já informa
a atuação do Legislador, impondo-lhe a correta e regular elaboração da lei processual penal.
Em outras palavras, o juiz está submetido e deve submeter as partes à norma processual penal
vigente, o que caracteriza a garantia constitucional.
44
Por outro lado, obedecido o devido processo legal, além de assegurar-se a liberdade do
indivíduo contra a ação arbitrária do Estado, busca-se uma correta atuação do poder
jurisdicional, evitando-se as nulidades do processo. Desse modo, em uma outra insncia, é o
próprio processo que fica garantido.
O devido processo legal importa num amplo espectro de garantias que dele devem
necessariamente decorrer para que se atenda a exigência do Estado Democrático de Direito. O
tratamento das partes será sempre paritário, em razão do princípio da isonomia, pois, perante
o Estado Jurisdição, não pode haver parte com destaque de importância. Autor e réu têm,
enquanto partes, os mesmos direitos e deveres.
Antonio Scarance Fernandes
45
assevera que, como centro irradiador do Direito
Processual e a inclusão do procedimento no âmbito do processo, foram feitas para justificar a
conclusão de que os estudos do processo constitucional devem ser lidas a partir das garantias
do devido processo, ou, mais especificamente, a partir das garantias do devido processo penal
e, ainda, para justificar a inclusão de garantias de ordem procedimental neste título.
44
SILVA, Marco Antonio Marques da. Acesso à Justiça Penal e Estado Democrático de Direito. São Paulo:
Juarez de Oliveira, 2001. p. 17
45
FERNANDES, Antonio Scarance. Processo Penal Constitucional. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005. p
45.
29
Mais recentemente começou a ser dado destaque ao estudo separado das garantias do
processo penal. Este se insere dentro do amplo estudo da genérica garantia do devido
processo legal.
A garantia do devido processo legal tem como antecedente remoto o artigo 39 da
Magna Carta, outorgada em 1215 por João Sem-Terra a seus Barões na Inglaterra. Fala-se
inicialmente em Law of the Land.
46
Passo importante dado para alargar o universo das garantias do devido processo
consistiu na introdução, nas Constituições, em acréscimo às garantias explícitas, de regra
genérica destinada a assegurar a garantia do devido processo legal, posta como uma “garantia
inonimada”.
Nesse quadro amplo insere-se o devido processo penal, que examina as mesmas
garantias do devido processo legal em face do processo penal.
47
No Processo Penal Militar, igualmente ao Processo Penal comum, o princípio do
devido processo legal” deve ser obedecido para que haja uma instrumentalização justa
quando da aplicação da lei penal militar.
A observância das normas do Código Penal Militar e do Código de Processo Penal
Militar em consonância com a Constituição Federal, respeitando o direito a prévia citação
para conhecimento do teor da acusação, o direito a um juiz militar imparcial, no caso de crime
militar contra civil e do Conselho de Justiça no caso de crimes propriamente militares, o
direito ao arrolamento de testemunhas e à elaboração de reperguntas, o direito ao
contraditório (contrariar provas inclusive), o direito à defesa técnica, o direito à igualdade
entre acusação e defesa e, ainda, o direito de não ser acusado ou processado com base em
provas ilícitas.
46
Foi esse o primeiro documento jurídico a fazer menção a esse princípio, quando no seu artigo 39, utilizou a
locução “per legem terrae”, redigida em latim e mais tarde traduzida para “law of land”, ou seja, “lei da terra”.
Essa expressão importava, antes e tudo, na vinculação dos direitos às regras comuns por todos aceitas,
decorrentes de precedentes fáticos e judiciais (SILVA, Marco Antonio Marques da. Acesso à Justiça Penal e
Estado Democrático de Direito. São Paulo: Juarez de Oliveira, 2001. p. 16.).
47
FERNANDES, Antonio Scarance. Processo Penal Constitucional. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005. p.
46.
30
2.2.2 O princípio da ampla defesa e do contraditório
Em decorrência do devido processo legal dá-se às partes os direitos ao contraditório e
a ampla defesa. Direitos esses que estão proclamados na Declaração Universal dos Direitos do
Homem, na parte final do artigo 11, inciso I e no artigo 8º, nº 2, letras b, c e f.
48
Quando citamos a ampla defesa, de forma genérica, estamos na verdade tratando de
um instituto em sentido latu, pois fazem parte da ampla defesa o contraditório e a ampla
defesa (esta em sentido strictu). Podemos dizer que o contradirio é o direito que tem o
acusado de contradizer tudo que lhe é imputado, contrariar as acusações alegando a sua
verdade aos fatos, negando os fatos ou sua participação neles. a ampla defesa em sentido
strictu diz respeito a todas as formas de defesa existentes, ou seja, o acusado tem direito a
fazer todos os tipos de provas, desde que lícitas, para sua defesa, entre elas pode-se colher o
testemunho de pessoas, que seria a prova testemunhal, colher provas materiais através de
perícias, solicitar diligências, etc.
Em nosso ordenamento jurídico, as garantias do contraditório e da ampla defesa estão
previstas no artigo, inciso LV, da Constituição Federal:
[...] aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral,
são assegurados o contraditório e a ampla defesa, com os meios e recursos a ela
inerentes.
O princípio do contraditório é absoluto, ou seja, qualquer violação leva a existência de
nulidade processual. A ampla defesa é um corolário do processo como modo de garantia
individual. A defesa, tal como a ação, é também um direito constitucional e processualmente
garantido.
Desse modo, como no processo a acusação é exercida por um órgão que possui
conhecimentos técnico-jurídicos, também ao acusado deve ser proporcionada idêntica
oportunidade de se ver representado em juízo por quem tenha igual formação a do órgão de
48
[...] toda a pessoa acusada de delito a que se presuma sua inocência enquanto não se comprove legalmente sua
culpa. Durante o processo, toda pessoa tem direito, em plena igualdade, às seguintes garantias mínimas: b)
comunicação prévia e pormenorizada ao acusado da acusação formulada; c) concessão ao acusado do tempo e
dos meios adequados para a preparação de sua defesa; (...) f) direito da defesa de inquirir as testemunhas
presentes no tribunal e de obter o comparecimento, como testemunhas ou peritos, de outras pessoas que
possam lançar luz sobre os fatos [...] (SILVA, Marco Antonio Marques da. Acesso à Justiça Penal e Estado
Democrático de Direito. São Paulo: Juarez de Oliveira, 2001. p. 17.).
31
acusação, sob pena de violar-se o tratamento paritário que é uma imposição do princípio do
devido processo legal.
49
Deve ser mencionado, ainda, como uma garantia da ampla defesa a proibição da
reformatio in pejus, como objetivo de impedir que haja uma modificação da situação jurídica
consubstanciada em uma decisão inexistente de recurso da acusação ou norma de ordem
pública a ser aplicada. A pretensão concreta delimita a alçada e predetermina o objeto de
alcance do juiz superior, devendo ele desenvolver sua função dentro do conteúdo material.
50
Decorre ainda dos princípios do contraditório e da ampla defesa, a imposição
constitucional da publicidade dos julgamentos e da motivação das decisões judiciais, prevista
no artigo 93, IX, da Carta Magna.
Entre nós, o princípio do contradirio é dogma constitucional. Na verdade, dispunha a
Constituição de 1967, com redação dada pela Emenda Constitucional I/69, no § 15 do
artigo 153, que a lei assegurará aos acusados ampla defesa, com os recursos a ela
inerentes”. E, em seguida, no § 16, determinava: A instrução criminal será contraditória.
51
No processo penal militar, a ampla defesa e o contraditório encontram acento nos
artigos 71 e 241, onde está escrito:
Art. 71. Nenhum acusado, ainda que ausente ou foragido, será processado ou
julgado sem defensor; e
Art. 241. Impõe-se à autoridade responsável pela custódia o respeito à integridade
física e moral do detento, que terá direito à presença de pessoa da sua família e a
assistência religiosa, pelo menos uma vez por semana, em dia previamente
marcado, salvo durante o peodo de incomunicabilidade, bem como a assistência
de advogado que indicar, nos termos do art. 71, ou, se estiver impedido de fazê-lo, à
do que for indicado por seu cônjuge, ascendente ou descendente.
Desta forma, o processo penal militar assegura o direito ao contraditório e a ampla
defesa ao acusado através de um defensor devidamente constitdo, ou quando,
impossibilitado de fazê-lo, devidamente indicado por pessoa do seu convívio familiar.
49
SILVA, Marco Antonio Marques da. Acesso à Justiça Penal e Estado Democrático de Direito. São Paulo:
Juarez de Oliveira, 2001. p. 20.
50
Ibid, p. 21.
51
TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Processo penal. São Paulo: Saraiva, 2000. v.1, p. 48.
32
2.2.3 O princípio do juiz natural
A garantia do Juiz natural se insere no princípio do Estado de Direito e se apresenta
como uma imposição do princípio do due process of law.
Este princípio expressa a preocupação do Estado em não permitir que alguém seja
processado e julgado senão por Juízes integrantes do Poder Judiciário e que sejam investidos
de atribuições jurisdicionais de acordo com os preceitos da Lei Maior.
52
São rias as denominações utilizadas para a garantia a ser examinada: garantia do
Juiz natural, do Juiz legal, do Juiz competente. No Direito espanhol usa-se a denominação
Juiz competente”, enquanto Juiz legal” é a usada no Direito aleo. Entre nós, a
denominação mais utilizada é a de “Juiz natural.
53
É com essa garantia que fica assegurada a imparcialidade do juiz, vista não como
atributo do juiz, mas como pressuposto da própria existência da atividade jurisdicional. Com
isso, a garantia não é mais enfocada em face do conceito individualista de garantia da parte,
mas como garantia da própria jurisdição.
54
Juiz natural é o órgão previsto, explicita ou implicitamente, pela Constituição, como
aquele de competência genérica para espécie de infração penal que se apresenta.
Dentro dos campos de atuação da jurisdição competente, que poderá ser comum ou
especial (como a Justa Militar ou a Justiça Eleitoral), o Legislador ordinário tem um campo
de ordenação possível, de tal sorte que poderá estabelecer normas destinadas a regulamentar a
distribuição do poder jurisdicional entre os órgãos que componham cada uma dessas justiças.
Ao Legislador ordinário é vedado, porém, por uma impossibilidade constitucional, de atribuir
competência para o processo e julgamento de infrações penais desrespeitando a anterior
demarcação constitucional, que determina uma separação de funções das justiças especiais
como a justa comum.
52
SILVA, Marco Antonio Marques da. A vinculação do juiz no processo penal. São Paulo: Saraiva, 1993. p.
39.
53
FERNANDES, Antonio Scarance. Processo Penal Constitucional. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005. p.
131.
54
Ibid., p. 132.
33
De outro lado, o princípio do juiz natural não é derrogado pelas modificações de
competência, contidas em nossa lei processual, nem tão pouco os desaforamentos e as
prorrogações de competência.
Completando o princípio do juiz natural, estão vedados, pelos dispositivos
constitucionais, os chamados tribunais de privilégio ou exceção. O propósito constitucional é
impedir a criação dentro da Justiça comum e da Justiça Especial os órgãos ad hoc ou a
designação de juízes especiais para o julgamento desta ou daquela infração.
55
2.2.4 O princípio da publicidade
O princípio da publicidade é incorporado nos principais textos internacionais como
garantia processual fundamental, sendo considerada uma das garantias mais importantes do
processo, em especial do processo penal.
56
Fernando da Costa Tourinho Filho
57
diz que os atos processuais são públicos e que tal
princípio é próprio do processo de tipo acusatório.
Fernando da Costa Tourinho Filho citando Eberhard Schmidt, explica que o
significado da Justiça Penal é tão grande; o interesse da comunidade no seu manejo e em seu
espírito é tão importante, a situação da Justiça, na totalidade da vida pública, é tão
problemática, que seria simplesmente impossível eliminar a publicidade dos debates judiciais,
e arremata:
[...] se isto ocorresse, poderia significar o temor da Justiça à crítica do povo, é a
chamada “crise de confiança na Justiça seria algo permanente (Derecho, cit. P.
102).
Em nossa Constituição Federal, a previsão do princípio da publicidade está inserida no
artigo 5º, inciso LX, da seguinte forma: a Lei poderá restringir a publicidade dos atos
processuais quando a defesa da intimidade ou interesse social o exigirem.
O autor salienta, ainda, que foi a atual Carta Magna, de 5 de outubro de 1988, que
elevou à emincia constitucional a garantia da publicidade dos atos processuais.
55
CRETELLA JÚNIOR, apud SILVA, Marco Antonio Marques da. Acesso à Justiça Penal e Estado
Democrático de Direito. São Paulo: Juarez de Oliveira, 2001. p. 22.
56
SILVA, Marco Antonio Marques da. Acesso à Justiça Penal e Estado Democrático de Direito. São Paulo:
Juarez de Oliveira, 2001. p. 23.
57
TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Processo penal. São Paulo: Saraiva, 2000. v.1, p 46.
34
O tema, antes era cuidado apenas pelo Código de Processo Penal, no artigo 792.
Assim, apesar de o estar antes na Carta Constitucional, a garantia estava incorporada à
cultura do processo brasileiro, encontrada nos códigos.
58
Marco Antonio Marques da Silva
59
salienta que não é um direito absoluto, podendo a
lei estabelecer, como exceção, e desde que esteja motivado, um certo sigilo naqueles casos
que poderá afetar de forma irretratável direitos de terceiros, mas jamais poderá estabelecer o
sigilo com relação ao réu, sob pena de infringir o princípio da publicidade.
2.2.5 O princípio da obrigatoriedade
O princípio da obrigatoriedade, também chamado da legalidade por alguns autores,
tem por fundamento a necessidade de se dar uma resposta jurídica, nos termos da lei, a um
fato com características de crime ou contravenção.
No âmbito militar essa resposta vem através da Justiça Militar quando ocorre um
crime militar tipificado na legislação castrense.
No Estado Democrático de Direito, a regra é que ao Estado caiba a aplicação de
sanção penal, que é irrenunciável, por não pertencer à parte acusadora, no caso o Ministério
Público.
60
O princípio da obrigatoriedade teve vigência até o advento da lei nº 9.099/95, de forma
quase absoluta, excetuado tão somente pelos crimes de ação penal privada e blica
condicionada à representação ou requisição.
No caso do processo penal militar isto não ocorre, pois não existe a figura da ão
penal privada, de acordo com o artigo 29, do Código de Processo Penal Militar, que assim
dispõe: A ação penal é pública e somente pode ser promovida por denúncia do Ministério
Público Militar.
E, também, pelo fato de não se aplicar à Justiça Militar a lei 9.099/95, que instituiu
os Juizados Especiais, que de acordo com o artigo 90-A desta Lei, o Legislador vedou a
58
FERNANDES, Antonio Scarance. Processo Penal Constitucional. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005. p.
71.
59
SILVA, Marco Antonio Marques da. Acesso à Justiça Penal e Estado Democrático de Direito. São Paulo:
Juarez de Oliveira, 2001. p. 23.
60
Ibid., p. 24.
35
possibilidade da pessoa que comete crime militar, seja ela civil (somente no âmbito da Justiça
Militar Federal) ou militar (Federal ou Estadual) de ser “beneficiado” por esta Lei.
Na Justa Militar Federal não se tem notícia de ação privada subsidiária da pública, o
que vem demonstrar o zelo e a responsabilidade do Ministério Público Militar, dono da ação
penal.
61
Mesmo a opção do Ministério Público pelo arquivamento sempre foi interpretada não
como uma faculdade, mas como um modo de se evitar um abuso de poder por parte do
Estado. Isso se justificava, ainda, com fundamento no fato de que mesmo quando o Ministério
Público requeria o arquivamento do inquérito policial, ele deveria fundamentá-lo na
inexistência de indícios suficientes da existência ou da autoria da infração penal.
62
O Direito Penal é deixado para atuar somente naquelas áreas onde comprovadamente
haja fracassado sua regulação por outras instâncias do controle social. Este fato ocorre,
atualmente, como as questões atinentes ao âmbito econômico e ao meio ambiente.
Nesse mesmo movimento o processo penal necessariamente deve sofrer mudanças, aí
o princípio da obrigatoriedade vai sendo substituído em um número cada vez maior de
legislações pelo princípio da oportunidade, como uma forma inicial de seleção dos
comportamentos, que, necessariamente, deverão ser submetidos aos rigores de uma
persecução penal.
63
O princípio da obrigatoriedade pode ser visto com duas vertentes, a primeira é que este
princípio se dirige à autoridade policial, obrigando-a a instaurar inquérito policial sempre que
souber da ocorrência de crime apurável mediante ação penal blica; e a segunda é que se
dirige ao Ministério Público, obrigando-o a promover a ação penal em crimes de ação pública,
sempre que tiver os elementos mínimos, necessários para tanto.
Numa comparação deste princípio com a legislação estrangeira, podemos observar que
em outros países existe o princípio da oportunidade”, largamente utilizado, pelo qual se
faculta ao órgão do Ministério Público promover ou não a ação penal, com possibilidade de
negociação.
61
ASSIS, Jorge César de. Comentários ao Código Penal Militar. Curitiba: Juruá, 2008. p. 122.
62
SILVA, Marco Antonio Marques da. Acesso à Justiça Penal e Estado Democrático de Direito. São Paulo:
Juarez de Oliveira, 2001. p. 24.
63
Ibid., p. 25.
36
No Brasil, o princípio da oportunidade ou conveniência, é aplicado nos casos de ação
penal privada, porquanto, o titular do direito ofendido ou seu representante legal, têm
discricionariedade para dispor da ação penal.
Nos casos de ação penal pública não que se falar em oportunidade ou conveniência
por parte dos Membros do Ministério Público, não possibilitando a negociação nem lhe
facultando o oferecimento da denúncia.
2.2.6 O princípio da presunção de inocência
O princípio da presunção de inocência tem fundamento na máxima de que ninguém
será considerado culpado até que se prove o contrário.
64
A bem do rigor, a mens constitutiones foi atribuir ao autor da ação penal de regra, o
Ministério Público o ônus de provar a existência do fato criminoso e a sua autoria. A falta
de demonstração probatória desses elementos, a ação penal deve ser julgada improcedente,
senão com outro fundamento, com base na insuficiência de provas.
Ao tratarmos da presunção de inoncia, necessário se faz lembrarmos que esta é
originada do instituto do in dúbio pro reo, onde o réu é poupado diante da menor dúvida sobre
sua culpabilidade em relação aos fatos do qual é acusado.
Ricardo Alves Bento
65
salienta a distinção do princípio da presunção de inocência da
o culpabilidade do acusado, para o autor, aquele coloca o réu em situação positiva,
enquanto este o deixa em posição neutra dentro do processo, complementando:
Para esse dualismo existente no processo penal em que, de um lado, o processo
existe para punir o delinqüente e, de outro, para evitar que sejam castigados os
inocentes, neste prisma, a presunção de inocência aparece como princípio orientador
de todo o processo penal, equiparado a um Direito Fundamental do Estado
Democrático de Direito brasileiro.
Este princípio nada mais representa que o coroamento do due process of law: é um ato
de no valor ético da pessoa, próprio de toda sociedade livre, assevera Antonio Castanheira
Neves.
66
64
ARAUJO, Luiz Alberto David; NUNES JÚNIOR, Vidal Serrano. Curso de Direito Constitucional. São
Paulo: Saraiva, 2006. p. 185.
65
BENTO, Ricardo Alves. Presunção de inocência no processo penal. São Paulo: Quartier Latin, 2007. p. 16.
37
mais de cem anos, a Constituição Francesa proclamava:
Tout homme étant présumé innocent jusqu’a ce qu’il ait été déclaré coupable; s’il
est jugé indispensable de l’arrêter, toute rigueur Qui ne serait nécessaire pour
s’assurer de sa personne, dopit être sévèrement reprimée par la loi.
O que significa dizer que “todo homem é considerado inocente, até o momento em
que, reconhecido como culpado, se julgar indispensável a sua prisão; todo rigor
desnecessário, empregado contra a pessoa, deve ser severamente reprimida pela lei”.
Tal princípio se espraiou pelo mundo civilizado, ditado pelo pensamento jurídico-
liberal, e, em 1948, a Declaração Universal dos Direitos do Homem, da Organização das
Nações Unidas (ONU), o proclamou em seu artigo 11.
67
O artigo 11, da Declaração Universal dos Direitos do Homem, adotada pela Resolão
217, inciso III, da Assembléia Geral das Nações Unidas, em sessão realizada em Paris, em
10.12.1948, prevê a presunção de inocência, dizendo:
Todo homem acusado de um ato delituoso tem o direito de ser presumido inocente
até que sua culpabilidade tenha sido provada de acordo com a lei, em julgamento
público no qual lhe tenha sido asseguradas todas as garantias necessárias à sua
defesa.
Portanto, o princípio da presunção de inocência teve sua proclamação na França, na
Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, sendo reconhecida pela sociedade
internacional através da Declaração Universal dos Direitos do Homem, no artigo acima
citado, e na Convenção Européia dos Direitos do Homem, no artigo 6º.
68
Na Constituição Federal, o princípio da presunção de inocência está previsto no artigo
5º, inciso LVII, dizendo: ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de
sentença penal condenatória.
Contudo, a expressão não foi explicitada, mas decorre da conceituação normativa que
se trata de uma garantia constitucional, que necessita, diante da sistemática do nosso Direito,
de uma determinação de seu conteúdo.
66
“Assenta no reconhecimento dos princípios do direito natural como fundamento da sociedade, princípios que,
aliados à soberania do povo e ao culto da liberdade, constituem os elementos essenciais da democracia”
(NEVES, Antonio Castanheira. Sumário de processo penal. Coimbra, 1967. p. 26.).
67
TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Processo penal. São Paulo: Saraiva, 2000. v.1, p. 65.
68
SILVA, Marco Antonio Marques da. Acesso à Justiça Penal e Estado Democrático de Direito. São Paulo:
Juarez de Oliveira, 2001. p. 25.
38
Com relação à determinação da computada, a presunção de inocência impõe que
somente possa ser considerada provada a responsabilidade do acusado, quando estiver de
acordo com a lei processual.
Esta lei estabelece os modos e condições para que os fatos possam ser considerados
provados, para fins de processo penal, e para derrubar a presunção de inocência que vige a
favor do imputado, até o trânsito em julgado da sentença.
2.3 Relevância Constitucional e a Emenda Constitucional 45
Desde a vinda da família real para o Brasil, no início do século XVIII, houve uma
preocupação em criar e manter uma Justiça Militar em nosso país.
69
A criação do Conselho Supremo Militar e de Justiça pelo alvará de 1º de abril de 1808,
a previsão de um foro especial para os militares de terra e mar na primeira Constituição
Republicana, de 24 de fevereiro de 1891, no artigo 77, §§ 1º e 2º, a inclusão da Justiça Militar
no rol dos órgãos do Poder Judiciário, na Constituição de 1934 e, finalmente, a atual
Constituição da República Federativa do Brasil, de 05 de outubro de 1988, contemplando a
Justiça Militar a partir do artigo 92, assim, confirmam a importância desse ramo da Justiça
para nosso país.
Não foi por acaso que o constituinte manteve a previsão da Justiça Militar em nossa
Carta Política entre os mais relevantes, destacamos a necessidade da mantea de uma Justiça
Especial ao se tratar da Justiça Militar Federal, e de uma Justiça Especializada ao se tratar da
Justiça Militar Estadual.
O objetivo não foi outro, senão o de possuir um colegiado especializado no Direito
Penal Militar e no processo penal militar para atuar nos casos de crime militar, ou seja,
Magistrado e Membros do Ministério Público com conhecimento específico numa área pouco
conhecida.
É importante ressaltar que os Magistrados, tanto em âmbito federal como em âmbito
estadual, são juízes togados, ou seja, juízes de carreira, concursados para atuarem na Justiça
69
O Superior Tribunal Militar e, por extensão, a Justiça Militar brasileira, foi criado, em 01 de abril de 1808, por
alvará com força de lei, assinado pelo Príncipe-Regente D. João, com a denominação de Conselho Supremo
Militar e de Justiça. É o mais antigo Tribunal Superior do país (MIGUEL, Claudio Amin; COLDIBELLI,
Nelson. Elementos de Direito Processual Penal Militar. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2009. p. 1.
39
Militar, os Membros do Ministério Público não, somente o Ministério blico Federal
possui a especialização Militar, concursados para atuarem na Justiça Militar Federal, no
âmbito estadual, a carreira é única e, o mesmo representante do Ministério Público que atua
na Justa comum pode ser designado para trabalhar junto à Justiça Militar Estadual.
A necessidade de se conhecer o Direito Penal Militar e o processo penal militar
profundamente, aliado às peculiaridades da vida em caserna que o militar leva, caracterizando
condutas típicas, trejeitos, hábitos, motivaram a Justiça Militar e, também, o ideal de se julgar
os militares por seus pares, mesmo princípio do Tribunal do Júri, àqueles que convivem num
mesmo nicho social ao se falar dos Conselhos Militares de Justiça, para que se busque uma
maior isonomia no julgamento ao avaliar o bem jurídico militar.
Eduardo Augusto Alves Vera Cruz Pinto
70
, também, compartilha do entendimento da
necessidade de uma justiça especializada e seu regramento constitucional ao afirmar que o
Poder Judiciário reconhece a necessidade da especificidade da sociedade castrense, dizendo:
O jurídico reconhece a especificidade da sociedade castrense e a necessidade de
adaptar os conceitos e regras jurídicos às idéias estruturais de missão, hierarquia,
disciplina e coesão que caracterizam as Forças Armadas e constituem condição
essencial para o normal funcionamento da instituição militar. Existe um sistema de
valores jurídicos comuns, de matriz constitucional, que tem de estar ínsito, numa
ordenação axiológica, ao sistema normativo interno auto-erigido pela tradição
militar.
Destaca-se, ainda, a Emenda Constitucional 45, de 08 de dezembro de 2004,
chamada de Reforma do Judiciário”, a qual reestruturou todo o Poder Judiciário, inclusive a
Justiça Militar.
No que concerne à Justiça Militar Estadual, a Emenda trouxe inúmeras modificações,
como, por exemplo, acresceu os §§ 3º a 7º ao artigo 125 da Carta Magna.
Desta forma, temos que: o § do artigo supra citado da Carta Magna, possibilita que,
os Estados membros, através de proposta do Tribunal de Justiça, criem a Justiça Militar
Estadual, distinguindo em primeiro e segundo grau, em primeiro grau pelos Juízes de Direito
e pelos Conselhos de Justiça, e em segundo grau, nos Estados em que o efetivo militar for
superior a vinte mil integrantes, o Tribunal de Justiça Militar.
70
PINTO, Eduardo Augusto Alves Vera Cruz. Os Tribunais Militares e o Estado de Direito Democrático. In:
MIRANDA, Jorge; SILVA, Marco Antonio Marques da. Tratado luso-brasileiro da dignidade humana. São
Paulo: Quartier Latin, 2008. p. 57.
40
Vale ressaltar que apenas os Estados de São Paulo, Minas Gerais e Rio Grande do Sul
possuem atualmente Tribunal de Justiça Militar.
Nos demais entes da Federação, o crime militar é processado e julgado, em primeira
instância, pelas Auditorias Militares criadas para este fim, e nos Estados que o as possuem,
são processados e julgados pela própria vara criminal.
Contudo, exceto os Estados mencionados anteriormente, em segundo grau, a
competência é do próprio Tribunal de Justiça daquele Estado.
A competência da Justiça Militar Estadual está no § , do artigo 125, da Constituição
Federal, afirmando que compete à Justiça Militar Estadual processar e julgar os militares dos
Estados, nos crimes militares definidos em lei e as ações judiciais contra atos disciplinares
militares.
A alteração que o Legislador fez com refencia à competência foi quanto ao exame
pelo Judiciário dos atos disciplinares militares, que antes era de competência da Vara da
Fazenda Pública apreciar tal ação.
Neste parágrafo, ainda, destaca-se que foi mantida a supremacia do Tribunal do Júri
sobre a Justiça Militar Estadual, nos casos de crimes dolosos contra a vida praticados contra
civil, contudo, se a tima for outro militar, cabe à Justiça Castrense o processo e julgamento
do militar.
No § foi feita a distinção da competência do juiz singular e do Conselho de Justa,
o que antes não havia, sendo que compete ao Juiz de Direito, (antes chamado de Juiz Auditor,
por causa das Auditorias Militares), julgar os crimes militares cometidos contra civis e as
ações judiciais contra atos disciplinares, e compete ao Conselho de Justiça, sob a presidência
do Juiz de Direito, (antes a presidência era do oficial de maior patente), processar e julgar os
demais crimes militares.
Essas alterações fortaleceram a Justiça Militar Estadual, ampliando o rol de
competência e definindo melhor as atuações dos Juízes de Direito e dos Conselhos de Justa.
Destarte, muito se questiona acerca do Tribunal de Justiça Militar ser juízo de
exceção, e que este estaria combatido pela Constituição Cidadã, todavia, os militares, embora
sejam pessoas iguais a todos os brasileiros, têm missão e compromisso com a defesa e a
preservação da ordem pública da Nação e sua respectiva soberania.
41
A previsão constitucional da Justiça Militar, desta forma, afasta a forma de tribunal
ad hoc” ou de exceção, e garante a legalidade de sua exisncia e o fim para o qual foi criada.
42
3 COMPOSIÇÃO DA JUSTIÇA MILITAR ESTADUAL
Quanto à necessidade de se ter um corpo jurisdicional especializado para submeter os
militares, quando do cometimento de um crime militar, a um julgamento legalista, permeado
de características próprias, não se discute.
Eduardo Augusto Alves Vera Cruz Pinto
71
afirma que o Tribunal Militar não é um
direito dos militares, mas um dever deles para com a comunidade e para com o poder político,
quando democraticamente exercido.
Vez que, os Estados Federativos do Brasil, com acento constitucional, constituem
parte de suas polícias como um corpo militar, estes Estados também devem provir justiças
especializadas para julgar seus delitos, que, por vezes, possuem características diferenciadas
dos delitos cometidos pelos civis.
Independente do crime cometido ser próprio ou impropriamente militar, se cometido
por militar, no âmbito estadual, cabe à Justiça Castrense julgá-lo.
Desta forma, estudaremos a Constituição e a composição deste ramo especializado da
Justiça, no âmbito estadual, em especial do Estado de São Paulo, sua previsão legal e
competência constitucional, bem como os Conselhos da Justiça Militar, Especial e
Permanente.
A Justiça Militar Estadual, fruto do histórico já visto neste trabalho e com base fática
na Constituição da República Federativa do Brasil, em seu artigo 125, §§ e 4º, constitui
uma Justiça Especializada.
Formada pelos Juízes de Direito do Juízo Militar em primeiro grau, em quatro
Auditorias e pelo Tribunal de Justiça Militar em segunda instância, esta sediada na Rua Dr.
Vila Nova, nº 285, Vila Buarque, São Paulo, Capital.
71
Assim, a existência de tribunais militares não é um direito dos militares é um dever deles para com a
comunidade e para com o poder político quando democraticamente exercido. É o povo através dos seus
representantes, que decidiu ter uma Força Armada que exige, porque não pode prescindir que assim seja
condição necessária da condição potica e jurídica de ter Forças Armadas), que os militares sejam
disciplinados e obedientes à hierarquia na execução das ordens do poder político. os tribunais militares
podem garantir com êxito esse desiderato porque pode julgar com acerto quem tem um saber feito de
experiência e uma formação jurídica adequada para, competentemente, subsumir os factos às regras na criação
da solução justa e eficaz que constará da sentença (PINTO, Eduardo Augusto Alves Vera Cruz. Os Tribunais
Militares e o Estado de Direito Democrático. In: MIRANDA, Jorge; SILVA, Marco Antonio Marques da.
Tratado luso-brasileiro da dignidade humana. São Paulo: Quartier Latin, 2008. p. 60.).
43
Esta sede da Justiça Militar Estadual foi inaugurada em 12 de janeiro de 1976,
contudo, a história mostra que, antes mesmo da Lei Estadual n
o
2.856, de 08 de janeiro de
1937, calcada na Lei Federal n
o
192, de 17 de janeiro de 1936, que criou a Justiça Militar
Estadual, São Paulo possuía um incipiente ordenamento castrense, não integrado ao Poder
Judiciário.
72
3.1 Os Conselhos da Justiça Militar
Jorge César de Assis esclarece que a existência dos Conselhos de Justiça Militar
perde-se no tempo do processo penal pátrio.
73
O Conselho de Justiça ou Escabinato é um órgão judicante colegiado de primeira
instância sui generis, composto por um Juiz Togado (juiz de carreira, concursado) e quatro
juízes militares, conforme dispõe a Constituição Federal em seus artigos 122, inciso II
mbito federal) e 125, § 3º (âmbito estadual).
O autor acrescenta ainda que é sui generis em razão de sua divisão prevista no artigo
16, da lei 8.457/92, aplicável igualmente à Justiça Militar Estadual.
Por se tratar da primeira instância da Justiça Militar, existe também o Juiz Substituto,
que auxilia o Juiz de Direito do Juízo Militar e, na sua ausência, o substitui, presidindo o
Conselho.
Vale lembrar, que a Emenda Constitucional 45 de 2004, alterou a nomenclatura do
Juiz atuante na Justiça Militar, que era chamado de Juiz Auditor, (por causa das Auditorias
Militares), para Juiz de Direito do Juízo Militar, como o é na Justiça comum, da mesma
forma, assim é chamado o Juiz Substituto.
A Emenda Constitucional, também, alterou a Presidência do Conselho na Justiça
Militar Estadual, que antes era do Juiz Militar de maior Patente, como o é na Justiça Militar
Federal, passando agora a Juiz de Direito.
72
HISTÓRIA, competência e composição. Tribunal de Justiça Militar do Estado de São Paulo. Dispovel em:
<http://www.tjm.sp.gov.br>. Acesso em: 17 set. 2009.
73
“Já pelo vetusto Regulamento Processual Criminal Militar, de 16.07.1895, a justiça criminal militar era
administrada pelos Conselhos de Investigação, pelos Conselhos de Guerra e pelo Superior Tribunal Militar”
(ASSIS, Jorge sar de. Direito Militar: aspectos penais, processuais penais e administrativos. Curitiba:
Juruá, 2008. p. 182.).
44
O Juiz de Direito do Juízo Militar, ingressa na carreira através de concurso blico de
provas e títulos, gozando de todas as prerrogativas que a Constituição Federal reserva aos
Magistrados no artigo 95, com as vedações de seu § único, e tem como função precípua no
Conselho, a partir da Emenda Constitucional nº 45, a Presidência do Conselho.
A competência do Juiz de Direito e do Conselho de Justa estão descritos no artigo
125, § 5º, da Carta Magna, nos seguintes termos:
Compete aos Juízes de Direito do Juízo Militar processar e julgar, singularmente,
os crimes militares cometidos contra civis e as ações judiciais contra atos
disciplinares militares, cabendo ao conselho de justiça, sob a presidência do Juiz de
Direito, processar e julgar os demais crimes militares.
os quatro Juízes Militares que compõe o Conselho de Justa são sorteados dentre
os Oficiais da ativa, ressalvada a obrigatoriedade do Oficial ser superior hierárquico do réu.
Em São Paulo, o sorteio é por meio eletrônico do próprio Tribunal de Justiça Militar,
com base numa listagem fornecida pela Corregedoria da Pocia Militar, onde são
selecionados Oficiais da ativa que não possuem antecedentes criminais, que os
incompatibilizem com as funções de Juiz Militar, trabalhando, no máximo a 100 km da
Capital, e que o pertençam a Unidades Especiais.
A principal característica dos Conselhos de Justiça é fazer com que o acusado de
prática de crime militar seja julgado o pelo Magistrado, mas, também, por aqueles que
convivem no ambiente de caserna, como é a vida do militar, conhecendo seus chavões,
costumes e maneiras do dia-a-dia.
Os Conselhos de Justiça dividem-se em Conselho Permanente de Justiça e Conselho
Especial de Justiça, de acordo com suas competências para julgamento.
3.1.1 O Conselho Permanente de Justiça
O Conselho Permanente de Justiça, composto por um Juiz Togado (Juiz de Direito
concursado), mais quatro Juízes Oficiais da ativa, tem por competência jurisdicional para
processar e julgar os crimes militares cometidos por praças ou civis (este somente no âmbito
federal).
45
Reunidos por um período de três meses, sem que os Juízes Militares se vinculem ao
processo nesse período, apenas o Juiz de Direito do Juízo Militar, porém, os Juízes Militares
mantêm vínculo com o Tribunal de Justiça Militar Estadual.
O Conselho Permanente tem por competência, no Estado de São Paulo, somente o
julgamento dos Praças Policiais Militares que cometerem crimes propriamente militares e que
o forem contra civis.
Os Juízes de Direito do Juízo Militar por possuírem as prerrogativas do artigo 95, da
Constituição Federal, são fixos em suas Auditorias Militares, sendo que no Estado de o
Paulo existem quatro Auditorias.
os Juízes Militares, que são quatro Oficiais da ativa, entre Oficiais Superiores
(Coronel, Tenente Coronel e Major), Intermediários (Capitães) e Subalternos ( e
Tenentes), são sorteados a cada três meses, dentre os Oficiais que não respondem ou
responderam a crime que o incompatibilizem com a função, que trabalhem numa distância
menor de 100 km da Capital e que não atuem em órgãos especiais da Pocia Militar do
Estado de São Paulo, ficando à disposição do Tribunal de Justiça Militar.
Paralelamente ao sorteio dos quatro Juízes Militares por Auditoria, é realizado o
sorteio de dois Oficiais suplentes para cada uma delas, com o objetivo de, em havendo
necessidade de substituir qualquer um dos Juízes Militares, e as sessões de julgamento não
sofrerem prejuízos, contudo, uma vez realizada a substituição, o Oficial substituído não
retorna à função de Juiz Militar naquele trimestre.
Os Juízes Militares investem-se na função (e não no cargo) após terem sido sorteados,
nos termos dos artigos 19 e 23, da lei 8.457/92. São Juízes de fato, não gozando das
prerrogativas afetas aos Magistrados de carreira.
74
3.1.2 O Conselho Especial de Justiça
O Conselho Especial de Justiça tem a competência de julgar Oficiais da ativa ou da
Reserva, que cometerem crimes militares, que não sejam contra civis.
74
“Isoladamente, fora das reuniões do Conselho de Justiça, os Oficiais que atuam naquela Auditoria, não serão
mais Juízes, submetendo-se ao regulamento e normas militares que a vida de caserna lhes ime” (ASSIS,
Jorge César de. Direito Militar: aspectos penais, processuais penais e administrativos. Curitiba: Juruá, 2008.
p. 184.).
46
Sua composição é igual a do Conselho Permanente de Justiça, um Juiz de Direito do
Juízo Militar (Juiz de Direito concursado) mais quatro Juízes Oficiais, não necessariamente da
ativa, pois a necessidade do Oficial ser de Posto superior ou mais antigo do que o réu,
nesse caso, se o réu for um Coronel da ativa e não houver nenhum outro mais antigo que ele
no serviço ativo, será revertido um Coronel da Reserva ao serviço ativo para que atue no
Conselho Especial.
Essa previsão tem como escopo a hierarquia e disciplina das Forças Militares, onde
jamais um superior hierárquico submete-se às ordens ou julgamento de um subordinado.
A atuação do Conselho Especial de Justiça não tem a duração de três meses como o
Conselho Permanente, mas se prolonga no tempo enquanto durar o processo, ou seja,
constitui-se no momento em que se inicia o processo no qual o acusado é um Oficial e
dissolve-se ao término desse processo.
Os Juízes Militares neste tipo de Conselho não ficam à disposição do Tribunal de
Justiça Militar, reúnem-se apenas quando da sessão de julgamento do processo em que atuam,
vinculando-se desta forma, apenas ao processo.
Desta forma, os Oficiais Juízes que compõem o Conselho Especial de Justiça
vinculam-se ao processo em todos os casos, atuando do início ao término daquele processo
determinado ao qual foram sorteados para conhecerem e julgarem.
Porém, vinculam-se ao Tribunal de Justiça Militar Estadual somente quando da sessão
do processo, ou seja, os Oficiais Juízes se vinculam ao TJM quando convocados para
atuarem no processo ao qual estão julgando, não havendo subordinação ao Tribunal quando
o estão em sessão de julgamento.
47
4 A POLÍCIA JUDICIÁRIA MILITAR FUNDAMENTAÇÃO CONSTITUCIONAL
A Constituição da República Federativa do Brasil, promulgada em 05 de outubro de
1988, estabelece no Capítulo III, destinado a Segurança Pública, no artigo 144, caput, o dever
do Estado e tem como finalidade a preservação da ordem pública e a incolumidade das
pessoas e do patrimônio, instituindo os óros públicos responsáveis.
Nesse sentido, não necessidade de tecer comentários sobre as atribuições de cada
óro integrante do sistema de Segurança blica do País, todavia, cabe salientar que pela
vedação de apuração de infrações penais militares pela Pocia Civil contida no § 4º, in fine,
do artigo 144, da Carta Maior, a expressão exceto as militares (grifo nosso), outorgou a
competência de registro e apuração das infrações previstas no artigo , do digo Penal
Militar, à Polícia Judiciária Militar.
Polícia Judiciária é a Pocia repressiva, porque atua após a eclosão do ilícito penal,
funcionando como auxiliar do Poder Judiciário. É regida pelas normas de Direito Processual
Penal e incide sobre as pessoas.
75
Neste sentido, a Polícia Judiciária Militar pode ser definida como órgão ou autoridade
militar incumbida, por lei, do dever de desenvolver toda a atividade necessária para o
fornecimento ao Ministério Público, em funcionamento na Justiça Militar, dos elementos
necessários ao conhecimento judicial do fato, que em tese configure crime militar.
76
A própria Constituição Federal, descreve, como já foi dito, quais são os órgãos
responsáveis pela Segurança Pública e a incumbência de cada um deles, sendo que o exercício
da Polícia Judiciária coube a Policia Federal e a Polícia Civil nos Estados, sendo que estas
tem a incumbência da Pocia Judiciária ressalvada a competência da União e as infrações
penais Militares.
Portanto, a competência da Pocia Judiciária Militar está prevista de forma implícita
no artigo 144, § 4º, da Carta Magna, quando assevera que as Pocias Civis, dirigidas por
Delegados de Pocia de Carreira, incumbem, ressalvada a competência da União, as funções
de Polícia Judiciária e a apuração das infrações penais, exceto as militares.
77
75
LAZZARINI, Alvaro. Direito Administrativo da Ordemblica. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1987. p. 36.
76
MARTINS, Eliezer Pereira; CAPANO, Evandro Fabiani. Inquérito Policial Militar. São Paulo: LED, 1996.
p. 22.
77
ASSIS, Jorge César de. Código de Processo Penal Militar Anotado. Art. 1º ao 169. Curitiba: Juruá, 2008. v.
1, p. 32.
48
Desta forma, ao tratarmos da previsão constitucional da competência da Pocia
Judiciária, o constituinte deixou claro que as infrações penais militares são de competência da
Polícia Judiciária Militar.
O exercício e a competência da Autoridade de Polícia Judiciária Militar estão descritos
no Código de Processo Penal Militar em seus artigos 7º e 8º.
O artigo 7º, do digo de Processo Penal Militar, elenca nas letras a” a “h”, as
autoridades que chamamos de “Autoridades Originárias” no tocante à Polícia Judiciária
Militar, que, no caso de crime militar (artigo 9º, do Código Penal Militar) devem atuar de
ofício, incumbindo-a de apurar os crimes militares, bem como os que por lei especial, estão
sujeitos à jurisdição militar.
Os §§ ao do mesmo artigo trazem a figura da delegação de exercício, explicando
quando e a quem pode ser delegada a função de Autoridade de Pocia Judiciária.
Portanto, podemos afirmar que temos dois tipos de Autoridade de Pocia Judiciária: a
Originária e a Delegada, diferenciando, neste primeiro momento, da Autoridade de Pocia
Judiciária comum.
78
É importante ressaltar que a atividade de Pocia Judiciária Militar não é função
precípua dos óros militares, conforme afirmação de Cláudio Amin Miguel e Nelson
Coldibelle
79
, a destinação constitucional das Forças Armadas é a defesa da Pátria e a das
Pocias Militares, a preservação da Ordem Pública, apenas, excepcionalmente, atual como
Polícia Judiciária Militar.
Ronaldo João Roth
80
assevera que, diferente da Lei Adjetiva Penal comum, no que se
refere à atuação dos Delegados de Pocia como autoridade policial, o digo de Processo
Penal Militar enumera quais as autoridades militares exercem a Pocia Judiciária Militar
(artigo e suas alíneas).
78
“A investidura para atos de polícia judiciária militar requer como pressuposto básico a delegação prevista no §
do artigo do Código de Processo Penal Militar, diversamente do que ocorre com o exercício da polícia
judiciária comum, onde o Delegado de Polícia não age por delegação de autoridade imediatamente superior,
mas sim, amparado na competência originária que o reveste quando é investido no cargo” (ASSIS, Jorge César
de. Código de Processo Penal Militar Anotado. Art. 1º ao 169. Curitiba: Juruá, 2008. v. 1, p. 33.).
79
MIGUEL, Claudio Amin; COLDIBELLI, Nelson. Elementos de Direito Processual Penal Militar. Rio de
Janeiro: Lumen Juris, 2009. p. 27.
80
ROTH, Ronaldo João. Temas de Direito Militar. São Paulo: Suprema Cultura, 2004. p. 111.
49
Permite o estatuto processual castrense que aquelas autoridades especificadas
deleguem as suas atribuições a Oficiais da ativa para fins especificados e por tempo limitado
(§ 1º, do artigo 7º, do Código de Processo Penal Militar).
Portanto, cabe a ela, Autoridade de Pocia Judiciária Militar, a confecção do Auto de
Prisão em Flagrante Delito, a instauração de Portaria de Inquérito Policial Militar e, ainda, o
Auto de Deserção, quando e como for o caso da infração penal Militar.
Também é de competência da Autoridade de Polícia Judiciária Militar pedir ao Juízo
Militar a prisão temporária para militar estadual que cometa crime militar, nos casos previstos
em Lei.
Nos casos de crimes dolosos praticados por militar nas condições do artigo 9º, do
Código Penal Militar, contra a vida de civil, a solicitação da prisão temporária deverá ser
solicitada à Justiça comum, conforme Lei número.
Cabe ainda à Autoridade de Polícia Judiciária Militar adotar todas as medidas
previstas no artigo 8º, do Código de Processo Penal Militar, como por exemplo, na letra “b”,
onde está previsto que:
Art. 8º [...]
a) [...]
b) prestar aos órgãos e Juízes da Justiça Militar e aos membros do Ministério
Público as informações necessárias à instrução e julgamento dos processos, bem
como realizar as diligências que por eles lhe forem requisitadas; entre outras
funções.
4.1 Concorrência do Poder de Polícia
A concorrência do Poder de Polícia no tocante à Polícia Judiciária está dirimida no
artigo 9º, do Código Penal Militar, ao descrever o que são crimes militares e, nos artigos 7º e
8º, do CPPM, ao tratar da Autoridade de Pocia Judiciária Militar e suas atuações.
Por ser o Decreto-Lei 1.001, de 21 de outubro de 1969, uma Lei Especial, e pelo
princípio da especialidade aplica-se o Código Penal Militar em detrimento do Código Penal
comum, quando da ocorrência de infração penal militar.
50
Para tanto, necessidade de se entender os crimes militares, que se dividem em:
crime militar em tempo de paz e em tempo de guerra, conforme os artigos 9º e 10º, do Código
Penal Militar.
Os crimes militares em tempo de paz estão subdivididos em: crimes propriamente
militares e crimes impropriamente militares e, são estes, que mais causam divergências no
momento do registro dos fatos.
O artigo 9º, inciso I, do Código Penal Militar, define os crimes propriamente militares,
que são aqueles tipificados no digo Penal Militar, não possuindo igual definição no
Código Penal comum.
Os crimes impropriamente militares são aqueles que possuem igual definição no
Código Penal comum e no digo Penal Militar, porém, serão considerados crimes
militares se forem praticados de acordo com as condutas previstas nas letras de a” a “f”, do
mesmo inciso II, artigo 9º, ou sejam:
a. por militar em situação de atividade ou assemelhado, contra militar na mesma
situação ou assemelhado; b. por militar em situação de atividade ou assemelhado,
em lugar sujeito à administração militar, contra militar da reserva, ou reformado,
ou assemelhado, ou civil; c. por militar em serviço, em comissão de natureza
militar, ou em formatura, ainda que fora do lugar sujeito à administração militar
contra militar da reserva, ou reformado, ou assemelhado ou civil; d. por militar
durante o período de manobras, ou exercício, contra militar da reserva, ou
reformado, ou assemelhado ou civil; e. por militar em situação de atividade, ou
assemelhado, contra o patrimônio sob a administração militar, ou a ordem
administrativa militar; f. por militar em situação de atividade ou assemelhado que,
embora não estando em serviço, use armamento de propriedade militar ou qualquer
material bélico, sob sua guarda, fiscalização ou administração militar, para a
prática de ato ilegal; [...].
Não resta dúvida quanto à atuação da Polícia Judiciária Militar, que é guiada pelo
crime militar, não cabendo, no caso de infração penal militar, que outra Autoridade de Pocia
registre os fatos ou tome qualquer providência, cabendo, neste caso, a anulação dos feitos por
se tratar de autoridade incompetente.
4.1.1 Crimes dolosos contra a vida praticados contra civil e a atuação da Polícia
Judiciária Militar
A lei 9.299/1996 acresceu o § único ao artigo 9º, do digo Penal Militar, tratando
da competência para julgamento dos crimes dolosos contra a vida de civil, com os seguintes
dizeres:
51
Os crimes de que trata este artigo (crimes militares em tempo de paz), quando
dolosos contra vida e cometidos contra civil, serão de competência da Justiça
comum.
Há quem advogue que nestes casos, crimes dolosos contra a vida de civil cometido de
acordo com o que preconiza o artigo 9º, do Código Penal Militar, seria de competência da
Autoridade de Pocia Judiciária comum o registro dos fatos, em especial, a Prisão em
Flagrante Delito por se tratar da Justiça comum a competência para julgamento.
A nosso ver, esta posição não prospera, vez que, a mesma lei também alterou o Código
de Processo Penal Militar, em seu artigo 82, acrescendo o § 2º, determinando à Justiça Militar
encaminhar os Autos do Inquérito Policial à Justiça comum quando se tratar de crimes
dolosos contra a vida, praticados contra civil, com o seguinte texto:
Artigo 82, § 2º - Nos crimes dolosos contra a vida, praticados contra civil, a Justiça
Militar encaminhará os autos do Inquérito Policial Militar à Justiça comum.
O texto demonstra que o Legislador previu a atuação da Polícia Judiciária Militar na
instauração do Inquérito Policial Militar com encaminhamento à Justiça Militar.
Destarte que, se a autoridade de Polícia Judiciária Militar é competente para
instauração do Inquérito Policial Militar, também o é para a Prisão em Flagrante Delito nos
casos de crimes dolosos contra a vida, praticados contra civil, com remessa à Justiça
Castrense, que ao reconhecer a competência do Tribunal do Júri, encaminhará à Justiça
comum, obedecendo ao que preconiza o § 2º, do artigo 82, do Código de Processo Penal
Militar.
Portanto, cabe à Autoridade de Polícia Judiciária Militar atuar, mesmo quando se tratar
de crimes dolosos contra a vida, praticado por militar contra civil.
52
5 BEM JURÍDICO PENAL
Claus Roxin
81
afirma que é função do Direito Penal a proteção dos bens jurídicos e
define bem jurídico como circunstâncias reais dadas ou finalidades necessárias para uma vida
segura e livre, que garanta todos os direitos humanos e civis de cada um na sociedade ou para
o funcionamento de um sistema estatal que se baseia nestes objetivos.
Para entender o bem jurídico penal faremos aqui uma breve observação do bem
jurídico à luz da Constituição Federal com o objetivo de esclarecer melhor a importância da
relação do Direito Penal e Processual Penal Militar com a própria Carta Magna no que tange
ao bem jurídico tutelado.
O homem, destinado a viver em coletividade, representada por uma sociedade
constituída por seus costumes, suas tradições, seu modo de comportar-se perante as
adversidades mais comuns, viu-se num determinado momento de sua história, compelido a
erigir normas de conduta para todo o grupo.
O conjunto dessas regras foi designado com o título de regra social, que é segundo
Wilson Donizete Liberati
82
, “aquela que uma sociedade elabora para fazer imperar o Direito e
impor a seus membros a noção do justo e do injusto que nela predomina.
No Direito Penal Militar não é diferente, podemos repetir as palavras de Mauricio
Antonio Ribeiro Lopes e Wilson Donizete Liberati, afirmando que o bem jurídico militar é
aquele que uma sociedade elabora para fazer imperar o Direito Militar e impor a seus
membros a noção do justo e do injusto que nela, sociedade, predomina.
Dessa forma, cabe ao Direito Penal exercer o controle social para assegurar a
submissão forçada daqueles que não aceitam a imposição legal.
Considerando o bem jurídico o conjunto de elementos imprescindíveis que,
concretamente, permitem uma pacífica coexistência entre os semelhantes, é, tamm ele,
apreendido em um sentido mais complexo, de instituidor de uma política criminal
identificadora dos anseios humanos de segurança e proteção do próprio sistema normativo.
81
ROXIN, Claus. A proteção de bens jurídicos como função do Direito Penal. Organização e Tradução de
André Luiz Callegari e Nereu José Giacomolli. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2006. p. 18.
82
LOPES, Mauricio Antonio Ribeiro; LIBERATI, Wilson Donizete. Direito Penal e Constituição. São Paulo:
Malheiros, 2000. p. 157.
53
Buscamos em Luiz Regis Prado a definição para o tema, o qual nos ensina que a noção
de bem, do latim bonum, é multímoda, apresenta-se, prima facie, como um problema
vocabular e filosófico. Assim, tem-se uma definição semântica de bem, uma definição da
ideia de bem e uma definição real de bem.
Para o autor, em sentido amplo, bem vem a ser tudo que tem valor para o ser humano,
a saber:
[...] o que possui valor sob qualquer aspecto; o que é objeto de satisfação ou de
aprovação em qualquer ordem de finalidade, o que é perfeito em seu gênero, bem
sucedido, favorável, útil: é o termo laudativo universal dos juízos de apreciação;
aplica-se ao voluntário ou ao involuntário.
83
É inerente a esse conceito a peculiar utilidade do objeto, sua aptidão ou propriedade
para satisfazer a necessidade humana.
Podemos afirmar que a ideia de bem jurídico é de extrema relevância, já que a
moderna ciência penal não pode prescindir de uma base empírica nem de um vínculo com a
realidade que lhe propicia a referida noção.
Hans Welzel
84
afirma que o bem jurídico é um bem vital ou individual que, devido ao
seu significado social, é juridicamente protegido [...]. Bem jurídico, é, pois, toda situação
social desejada que o Direito quer garantir contra lesões.
Assim, a função primordial do Direito Penal é a proteção dos denominados bens
jurídicos, portanto, partindo-se do princípio de que a Lei Maior traz em si os princípios
máximos da Justiça, que se quer impor, qualquer ofensa a bem jurídico, protegido
penalmente, terá que ser cotejado com os princípios constitucionais, deixa, assim, a ofensa
aos citados bens, de ter relevância penal, se os princípios constitucionais não restarem por ela
arranhados.
Como afirma Márcia Dometila Lima de Carvalho
85
, consequentemente, o bem
jurídico, protegido pela norma penal, deve sofrer um processo de avaliação diante dos valores
constitucionais de âmbito e relevância maiores, sendo certo de que o Direito Penal, como
parte do sistema global tutelado pela norma maior, dela não poderá afastar-se.
83
PRADO, Luiz Regis. Bem jurídico penal e Constituição. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003. p. 19.
84
WELZEL, apud LOPES, Mauricio Antonio Ribeiro; LIBERATI, Wilson Donizete. Direito Penal e
Constituição. São Paulo: Malheiros, 2000. p. 157.
85
CARVALHO, Marcia Dometila de Lima. Fundamentação Constitucional do Direito Penal. Porto Alegre:
Sergio Antonio Fabris, 1992. p 34.
54
Para Luiz Regis Prado
86
, o conteúdo essencial dos direitos fundamentais, que é o
limite dos limites, é um marco intransponível pelo Legislador, e assevera que:
[...] trata-se de uma fronteira que o legislador não pode ultrapassar, delimita um
terreno que a lei limitadora não pode invadir sem incorrer em inconstitucionalidade,
a liberdade, a dignidade pessoal do homem, qualidades que lhe são inerentes, e a
possibilidade de desenvolver-se livremente, constituem um limite infranqueável ao
Estado. Não se pode esquecer jamais que a pessoa humana não é um objeto, um
meio, mas um fim em si mesmo e como tal deve ser respeitada.
Portanto, temos que o bem jurídico é algo essencial ao homem, e como tal deve ser
protegido, tutelado, salvaguardado da melhor forma possível, e porque não fazê-lo na
Constituição? O que obriga o Direito Penal, que tem como objetivo proteger o bem jurídico,
o se afastar da norma constitucional, parâmetro maior a ser seguido pelo ramo do Direito,
dele o podendo se esquivar nem contrariá-la.
Daí temos que, os bens jurídicos imprescindíveis estão definidos na Lei Maior,
Constituição Federal, enquanto que a garantia de tutelá-los estão no Direito Penal guiado pelo
Processo Penal.
Da mesma forma, ao tratarmos da norma militar, assim estão definidos, primeiro na
Constituição Federal e depois na Lei Militar, o que observaremos a seguir.
5.1 Bem Jurídico Penal Militar
Faz-se necessário conhecermos sobre os bens juridicamente tutelados no Direito Penal
Militar para compreensão da observância e aplicação do Direito Processual Penal Militar,
sempre com observância da Constituição Federal.
Se o Direito Penal presta-se a proteger o bem jurídico penal, o Direito Penal Militar
o é diferente, contudo há um algo mais, que na esfera Penal Militar ocupa-se, também, da
hierarquia e disciplina das organizações militares.
Como afirma Cícero Robson Coimbra Neves e Marcello Streifinger
87
, após suas
primeiras considerações sobre o bem jurídico, vários são os bens jurídicos tutelados pelo
Direito Penal e que, também, encontram acento no Direito Penal Militar, contudo, a este são
acrescidos a hierarquia e disciplina, hoje elevadas a bem jurídico tutelado pela Carta Maior.
86
PRADO, Luiz Regis. Bem jurídico penal e Constituição. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003. p. 83
87
NEVES, Cícero Robson Coimbra; STREIFINGER, Marcello. Apontamentos de Direito Penal Militar. Parte
Geral. São Paulo: Saraiva, 2005. v.1, p. 15.
55
É importante ressaltar, desta forma, que ambos tem a obrigatoriedade de obedecer ao
texto Constitucional, e, nesse tocante, salientamos o Princípio Constitucional da “Dignidade
da Pessoa Humana”, enfatizado no artigo 1º, inciso III, da Carta Magna.
Os bens juridicamente tutelados no Direito Penal Militar estão baseados, portanto, nos
mesmos bens do Direito Penal comum, pom, no primeiro ramo o adicional que é a
condição de militar, que exige da pessoa o conhecimento das normas, a obediência e o
respeito, maior do que para o cidadão comum.
Estas características, no meio militar são definidas como hierarquia e disciplina, as
quais, constituem as bases que sustentam as instituições militares, perenes e que, quando,
eventualmente, determinados óros falirem, as instituições militares estarão prontas e
preparadas para suprir suas faltas.
Esses são os motivos pelos quais as instituições militares tendem a ser
autossuficientes, possuindo seus próprios médicos, dentistas, ambulatórios, centro de
subsistência, hotel de trânsito, entre outros mecanismos capazes de dar sustentação à
sociedade, como por exemplo, numa greve de motoristas de coletivos, como ocorreu, onde
Policiais Militares assumiram a direção dos veículos coletivos, satisfazendo a necessidade
mínima da sociedade paulistana no transporte coletivo.
Daí entender o motivo pelo qual a Constituição da República, em seu artigo 142, § ,
inciso IV, proibir o direito à greve aos militares federais, estendido aos militares estaduais,
por força do artigo 42, § 1º, alterado pelas Emendas Constitucionais nºs 18 e 20,
respectivamente, e, portanto, para ambos, a paralisação configura crime militar tipificado no
artigo 149, do Código Penal Militar, motim ou revolta.
Do artigo 24, da Lei Penal Castrense, extrai-se o princípio de que para efeito da
aplicação da Lei Penal Militar, sempre o superior e o subordinado, pois o militar que, em
virtude de função, exerce autoridade sobre o outro de igual posto ou graduação, considera-se
superior.
Nesse sentido, a obediência, própria dos ambientes onde há separação hierárquico-
funcional, faz com que o militar respeite as normas e siga fielmente os princípios da
Instituição em que serve.
56
Destaca-se, ainda, o respeito às leis e às pessoas, pois na hipótese de um crime de
homicídio simples, praticado pelo militar, a pena cominada é igual ao do Código Penal
comum, mas, se o militar prevaleceu da situação de serviço, o inciso IV, do § 2º, do artigo
205, do Código Penal Militar, qualifica o delito, fato atípico no Código Penal comum.
Esta tipificação existente na Lei Penal Militar e inexistente na Lei Penal comum tem
como escopo a mantença da regularidade das instituições militares, ou seja, o respeito à
corporação, à hierarquia e à disciplina para que haja a mesma sustentação dos princípios que
regem estas instituições.
Sendo o objetivo do Direito Penal Militar a preservação do bem jurídico militar, cabe
ao Processo Penal Militar garantir a efetiva aplicação deste Direito Material, tutelando assim,
a dignidade da pessoa humana, e por que não dizer, que essa efetividade é buscada, quando no
decurso do Processo Penal Militar, na defesa do acusado?
5.2 O Bem Jurídico Administrativo e o Bem Jurídico Administrativo Militar
O Bem Jurídico Administrativo caminha no mesmo sentido do Bem Jurídico Penal no
tocante à administração pública, garantir o bom andamento da gestão pública, devolvendo à
sociedade uma prestação de qualidade do serviço público.
Contudo, não se pode confundir aquilo que se procura proteger com seus institutos, os
bens tutelados são diversos e a diferença não é de grau, mas de substância, conforme Hely
Lopes Meirelles.
88
Mas antes de falarmos do Bem Jurídico Administrativo, necessário se faz citarmos o
Direito Administrativo e sua relação com o Direito Administrativo Militar, pois o Militar está
sob a égide tanto do Direito Administrativo como Militar, leis administrativas que regem o
Militar.
Lembrando o que nos ensina Hely Lopes Meirelles
89
sobre a definição do Direito
Administrativo: Conjunto harmônico de princípios jurídicos que regem os órgãos, os agentes
e as atividades públicas tendentes a realizar concreta, direta e imediatamente os fins desejados
pelo Estado.
88
MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo brasileiro. São Paulo: Malheiros, 2000. p. 115.
89
Ibid., p. 34.
57
Assim, apoiando-se na definição de Hely Lopes Meirelles, podemos entender o Direito
Administrativo Militar como o conjunto de princípios jurídicos militares, que regem os órgãos
militares e seus contingentes tendentes a realizar concreta, direta e imediatamente os fins
desejados pelo Estado no tocante aos militares.
Desta forma, os regulamentos, normas e ordens das instituições militares vinculam os
militares ao seu fiel cumprimento com o propósito de atingir seus objetivos como instituições
militares.
O Bem Jurídico Administrativo está pautado exatamente na necessidade de se cumprir
os objetivos estabelecidos pelo próprio Direito Administrativo, como os princípios básicos da
administração (legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência) e no poder
do administrador público, motivos pelos quais os Bens Jurídicos Militares baseiam-se no
Direito Administrativo Militar, que seguem os mesmos princípios.
Quando tratamos do Bem Jurídico Administrativo Militar, acrescentamos a
importância dos valores da hierarquia e disciplina da instituição militar aliado à necessidade
da prestação de serviço, sua regularidade e relevância institucional, como reserva do Estado
em situações emergenciais.
A hierarquia está fundada no conjunto de poderes funcionais, estruturada em graus do
menor ao maior poder funcional, onde quem possui um cargo mais elevado é
hierarquicamente superior ao que possui um cargo menor, desta forma, o subordinado, de
menor cargo ou função, deve respeito e obediência ao superior.
Entre as rias definições do que vem a ser hierarquia, Hely Lopes Meirelles
90
, ao se
referir ao poder hierárquico, a seguinte definição: “[...] hierarquia é a relação de
subordinação existente entre os rios órgãos e agentes do Executivo, com a distribuição de
funções e a gradação da autoridade de cada um.
Dessa conceituação entende-se que as instituições militares, que estão subordinadas ao
Poder Executivo, aplica-se a definição acima citada.
90
MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo brasileiro. São Paulo: Malheiros, 2000. p. 112.
58
Já a disciplina esta pautada na leal obediência à autoridade e seus mandos, nos
regulamentos, normas e regras da instituição, trata-se de um conjunto de prescrições e leis
destinadas a manter a boa ordem e regularidade em qualquer entidade, pública ou privada.
91
Hely Lopes Meirelles ao tratar do poder disciplinar, o define como sendo: a faculdade
de punir internamente as infrações funcionais dos servidores e demais pessoas sujeitas à
disciplina dos órgãos e serviços da administração”.
92
Assim, ao entendermos a importância das instituições militares e suas estruturas
administrativas, podemos ver a necessidade de regulamentos e normas que sustentem a
perenicidade e a importância do fiel cumprimento.
A Pocia Militar paulista, dada a importância de se possuir uma lei que definisse todos
os direitos e obrigações dos militares estaduais, através da Assembléia Legislativa deste
Estado, publicou em 09 de março de 2001, a Lei Complementar 893, conhecido como
Regulamento Disciplinar da Pocia Militar do Estado de São Paulo.
O Regulamento Disciplinar da Pocia Militar do Estado de São Paulo trata da
deontologia Policial Militar, disciplina, violação de valores e deveres, das sanções possíveis,
dos recursos, competências e procura prever todas as situações para que, através das
disciplinas, haja a regularidade da Instituição Policial Militar.
5.2.1 A desclassificação do crime militar para transgressão disciplinar
O Direito Penal Militar possui ainda um outro instituto muito interessante e distinto da
Lei Penal comum, que é a possibilidade do Juiz de Direito do Juízo Militar desclassificar o
crime militar para transgressão disciplinar.
Este instituto, próprio do Direito Penal Militar e inovador, têm como objetivo tratar do
chamado “Princípio da Insignificância”, que, para uma Lei Penal, sua sanção é muito pesada,
por outro lado, a sanção administrativa é mais coerente e surte melhor efeito na reeducação do
militar.
91
COSTA, Alexandre Henriques da; NEVES, Cícero Robson Coimbra; COSTA, Marcos José da; ROCHA,
Abelardo Júlio da; SILVA, Marcelino Fernandes da; MELLO, Rogério Luis Marques de. Regulamento
Disciplinar da Polícia Militar do Estado de São Paulo. São Paulo: Suprema, 2007. p. 27.
92
MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo brasileiro. São Paulo: Malheiros, 2000. p. 115.
59
Considerando que alguns tipos penais, ainda que parecidos, possuem acento no
Código Penal Militar, como, por exemplo, a lesão corporal levíssima, artigo 209, § do
CPM
93
, considerado insignificantes, quis o Legislador que o Direito Administrativo Militar
cuidasse dessa seara.
Alguns crimes tipificados no Código Penal Militar já trazem a desclassificação como
possibilidade do Juiz de Direito do Juízo Militar adotar tal medida, esta medida é possível nos
seguintes casos:
Lesão corporal de natureza levíssima (art. 209, § 6º); furto atenuado ou mínimo (art.
240, §§ e ); apropriação indébita atenuada (art. 248 e 249 e o seu parágrafo único, de
acordo com o art. 250); estelionato e outras fraudes atenuados (art. 251 e seus §§, de acordo
com o art. 253); dano atenuado (art. 260, parágrafo único) e cheques sem fundos 2º, do art.
313), tudo do Código Penal Militar.
Existem dois momentos para que ocorra a desclassificação do crime militar para
transgressão disciplinar, através da decisão judicial, de acordo com Ronaldo João Roth
94
, um
é quando o representante do Ministério Público, atuando na Justiça Militar, recebe o Inquérito
Policial Militar ou o Auto de Prisão em Flagrante Delito e verifica de pronto tratar-se de
um dos delitos acima descritos, solicitando ao juiz o arquivamento do Inquérito e propondo ao
Magistrado sua desclassificação.
O outro momento que pode ocorrer essa desclassificação é após a ação penal e
encerramento da instrução criminal, das diligências processuais requeridas pelas partes e todo
o contraditório e ampla defesa, ocasião em que se resolve o mérito do processo com o
julgamento, considerando o fato de natureza disciplinar, que implica também na absolvição
do réu, nos termos do artigo 439, letra “b”.
Jorge César de Assis não concorda com este instituto da desclassificação, afirmando
ser confuso e de tratar de esferas distintas, a penal e a disciplinar, am do Princípio da
Imediatidade, que possui a pena disciplinar para o pronto restabelecimento da disciplina,
contrariado quando a desclassificação ocorre ao final do processo.
93
Pequenos hematomas e escoriações orbitárias da vítima, provocados por um soco, são lesões levíssimas,
devendo o fato ser considerado como transgressão disciplinar, na forma do § 6º, do art. 209, do CPM. TJM/RS
Ap. nº 2.383/90, Rel. Juiz Cel. Antonio Claudio Barcellos de Abreu, Acórdão de 17.10.1990 (ASSIS, Jorge
César de. Comentários ao Código Penal Militar. Comentários, Doutrina, Jurisprudência dos Tribunais
Militares e Tribunais Superiores. Curitiba: Juruá, 2008. p. 452.).
94
ROTH, Ronaldo João. Temas de Direito Militar. São Paulo: Suprema Cultura, 2004. p. 215.
60
Busca-se um Direito Penal mínimo ou de ultima ratioe um Direito Administrativo
sancionador com mais eficiência, neste instituto do Direito Militar é o próprio Direito
Administrativo ocupando seu espaço com uma resposta mais rápida.
Ronaldo João Roth
95
afirma que o Direito Penal moderno possui tendência de tornar a
pena cada vez mais humanitária, confirmando assim o caráter inovador do Direito Militar ao
deixar para o Direito Administrativo sancionador preocupar-se com as infrações de menor
relevância.
Para nós, a possibilidade de desclassificação do crime para transgressão disciplinar é
uma evolução, pois possibilita a reeducação do militar de forma mais ágil, principalmente se
se proceder de acordo com o primeiro momento definido por Ronaldo João Roth.
Pode-se afirmar que trata-se de uma evolução, pois este instituto, previsto no Código
Penal Militar, de 1969, não deixa de apurar uma possível falta militar sem, contudo, mover
toda a máquina do Judiciário em virtude de um delito de menor importância penal militar.
Não há que se falar aqui, também, em comparação com a substituição da pena por
pena alternativa, suspensão condicional nem, tão pouco, aplicação da lei nº 9.099/95.
Nos dois primeiros casos nãoinstauração de processo, logo não se tem condenação,
portanto não se aplica a suspensão do processo nem da pena quanto à aplicação da lei
9.099/95, não é possível por força do mesmo dispositivo legal, em seu artigo 90-A, acrescido
pela lei 9.839/99 com os seguintes dizeres: As disposições desta Lei não se aplicam no
âmbito da Justiça Militar”.
5.3 Cabimento de Habeas Corpus na Punição Administrativa Militar
O “habeas corpus” trata-se de uma garantia da efetivação do direito à liberdade.
Previsto na Constituição Federal no artigo 5º, inciso LXIII, foi copiado das declarações
universais de direitos, com a seguinte definição:
95
No Direito Penal moderno verifica-se a tenncia de tornar a pena cada vez mais humanitária, vendo-se com
progresso a substituição da pena privativa de liberdade pela pena restritiva de direitos e pecuniária, quando o
agente é primário e o crime o é de maior gravidade. Tudo isso visa, sem retirar o caráter de retribuição
punitiva ao infrator, a possibilidade que ele não sofra demasiadamente no cárcere ao lado de contumazes e
perigosos delinquentes, dificultando sua reeducação e ressocialização (ROTH, Ronaldo João. Temas de
Direito Militar. São Paulo: Suprema Cultura, 2004. p. 216.).
61
Conceder-sehabeas corpus sempre que alguém sofrer ou se achar ameaçado de
sofrer violência ou coação em sua liberdade de locomoção, por ilegalidade ou
abuso de poder.
Vicente Greco Filho
96
afirma que é o mais eficiente remédio para a correção do abuso
de poder que compromete a liberdade de locomoção, definindo-o da seguinte forma: Sua
finalidade é a proteção da liberdade de locomoção, a liberdade de ir e vir, natural e primária
atingida ou ameaçada por ato ilegal ou abusivo.
O autor explica, ainda, que a compreensão de seu nome se dá os contornos básicos do
instituto. Habeas corpus significa “tome o corpo”, isto é, submeta-se o paciente à vista do
Juiz para que verifique a coação e o liberte, se for o caso. A liberdade protegida é a liberdade
física.
Na Carta Magna o embasamento fático da proibição de “habeas corpus” nos casos de
punições administrativas no âmbito militar vem previsto no artigo 142, § 2º, afirmando que:
Não caberá habeas corpus em relação à punições disciplinares militares”.
Quanto aos militares dos Estados e Distrito Federal, polícias e corpos de bombeiros
militares, aplica-se o mesmo dispositivo por força do artigo 42, § , dispositivos alterados
pelas Emendas Constitucionais nºs 18 e 20 respectivamente.
O Código de Processo Penal Militar também trata do assunto no artigo 466, ao falar do
cabimento do habeas corpus e no parágrafo único, letra “b, excetua o cabimento nos casos
de punições aplicadas aos Oficiais e Praças das Polícias e dos Corpos de Bombeiros Militares,
de acordo com os respectivos Regulamentos Disciplinares.
Alguns autores, como veremos a seguir, entendem este artigo constitucional /
inconstitucional, por estar previsto na Carta Magna, pom, contrariando outros dispositivos
constitucionais, outros dizem tratar-se de flagrante inconstitucionalidade, por violar, por
exemplo, o Princípio da Igualdade.
Defendendo a tese de inconstitucionalidade deste dispositivo está Paulo Lopo
Saraiva
97
, ao tratar das garantias constitucionais, entendendo que a liberdade individual do
militar é igual a do civil, portanto, o dispositivo do artigo 142, § 2º, da Constituição da
República, violaria o Princípio da Isonomia.
96
GRECO FILHO, Vicente. Manual de Processo Penal. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 422.
97
SARAIVA, Paulo Lopo. Manual de Direito Constitucional. São Paulo: Acadêmica, 1995. p. 49.
62
O § do artigo 142 da Constituição Federal é inconstitucional, pois veda a
concessão de habeas corpus para os militares. A punição disciplinar militar cerceia a
liberdade individual do mesmo modo que a civil. Não diferença de liberdade de
um militar e a de um civil. O princípio constitucional da liberdade é um só.
Defendendo o descabimento de habeas corpus em sede de punição disciplinar militar
está Jorge César de Assis
98
, entendendo a necessidade de não se ter a apreciação de um
Magistrado sobre a decisão da autoridade administrativa militar, com pena de abalar ou
enfraquecer a hierarquia e a disciplina, vigas mestras das instituições militares.
A maioria dos doutrinadores é acorde no sentido de que o cabe habeas corpus
contra aplicação de punição disciplinar militar. A razão é simples e óbvia. Instituídas
com base na hierarquia e disciplina, as forças armadas e as polícias militares teriam
suas vigas mestras duramente atingidas se fosse possível questionar judicialmente a
validade da punição disciplinar aplicada, visto que os Regulamentos Disciplinares
prevêem uma série de recursos adequados à espécie.
Célio Lobão
99
, também, entende que não cabe habeas corpus na punição disciplinar,
somente se houver incompetência da autoridade que impôs a punição ou se foi aplicada com
inobservância do Regulamento Disciplinar. Não cabe habeas corpus na punição disciplinar,
imposta pela autoridade competente, em conformidade com os Regulamentos Disciplinares
das Forças Armadas, Pocias Militares e dos Corpos de Bombeiros Militares, conforme o
caso [...]”.
Fernando da Costa Tourinho Filho
100
entende ser incabível a impetração de habeas
corpus salvo se for para corrigir a incompetência de quem puniu, o excesso de prazo da
98
ASSIS, Jorge Cesar. Direito Militar: aspectos penais, processuais penais e administrativos. Curitiba: Juruá,
2008. p. 30.
99
LOBÃO, Célio. Direito Processual Penal Militar. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2009. p. 507.
100
E se se tratar de punição disciplinar? A Constituição atual dispôs no § 2º, do art. 142, não caber habeas corpus
nas transgreses disciplinares militares. Esclareça-se, contudo, que tal proibição não impede seja o remédio
heróico impetrado. Se, por exemplo, quem puniro tiver autoridade para fazê-lo, se houver excesso de prazo
da medida constrangedora, se não houver previsão legal, o habeas corpus é impetrável, tal como o era quando
a Constituição anterior o vedava para as transgressões disciplinares, consoante lição de Pontes de Miranda
(Comentários à Constituição Federal de 1946, 3. ed. Borsoi, 1960. Tomo 5, p. 257.). Nesses casos, cabível é
o habeas corpus. Impetrável perante quem? Desenganadamente, ao Tribunal de Justiça Militar, onde houver.
Não havendo, ao Tribunal de Justiça (que atua como se Tribunal de Justiça Militar fosse). Tratando-se de
punição imposta por membros das Forças Armadas, o remédio heróico deve ser impetrado ao Superior
Tribunal Militar. Note-se que a Constituição Federal, art. 124, após dizer competir à Justiça Militar processar e
julgar os crimes militares definidos em lei, prevê no respectivo parágrafo único: “a lei disporá sobre a
organização, o funcionamento e a competência da Justiça Militar”. Pois bem: o digo de Processo Penal
Militar, tratando do habeas corpus, dispõe no art. 469 competir ao Superior Tribunal Militar o conhecimento
de habeas corpus. Nenhuma dúvida, pois. Há algumas decisões escoteiras proferidas pela Justiça Federal
dando-se por competente. Não nos parece correto. Entre os militares, a hierarquia e a disciplina são sagradas, e
não teria sentido pudesse a Justiça Federal intrometer-se em assunto que não lhe diz respeito. Aliás, a Lei
Maior não lhe traz poderes. Insta observar que, quanto à Justiça Militar dos Estados, a Emenda Constitucional
45/2004 solucionou o problema, introduzindo no art. 125, da CF, o § : “Compete aos juízes de direito do
juízo militar processar e julgar, singularmente, os crimes militares cometidos contra civis e as ações judiciais
contra atos disciplinares, cabendo ao Conselho de Justiça, sob a presidência do juiz de direito, processar e
63
medida constrangedora ou se não houver previsão legal, lembra, também, quem é o órgão
competente para apreciação de tal remédio, não é a Justiça comum, mas a Justiça Militar, seja
ela Estadual ou Federal.
Luiz Alberto David Araújo e Vidal Serrano Nunes Júnior
101
reforçam a ideia da
impossibilidade de cabimento de habeas corpus pela própria previsão constitucional baseado
nos alicerces da hierarquia e disciplina das instituições militares.
O § do artigo 142 da Constituição estabelece o não-cabimento de habeas corpus
em relação às punições disciplinares militares, demonstrando, desse modo, que as
corporações militares hão de estar alicerçadas em dois princípios básicos, a saber: a
hierarquia e a disciplina.
Destarte, entendemos não haver possibilidade de se falar em inconstitucionalidade,
pois a norma está em plena vigência, não sendo objeto de aprecião da Suprema Corte
brasileira a apreciação de Ação Direta e Inconstitucionalidade a respeito.
Quanto ao cabimento do remédio constitucional habeas corpus contra punição
administrativa militar, entendemos ser vedada sua impetração conforme dispõe a Carta
Magna, ratificada no Código de Processo Penal Militar quanto ao mérito da prisão, contudo,
segundo Fernando da Costa Tourinho Filho e Célio Lobão, se houver irregularidade na forma,
é possível sua apreciação pela Justiça Militar, Estadual ou Federal, nunca Justiça comum.
A apreciação do mérito pela Justiça Militar infringiria a autodeterminação da
autoridade militar que impôs a punição, aquelas previstas no artigo 31, da lei 893
102
, abalando
a hierarquia e disciplina, alicerces das instituições militares, enfraquecendo estas instituições,
além do que, o próprio Regulamento Disciplinar da Pocia Militar do Estado de São Paulo,
Lei Complementar 893, de 09 de março de 2001, possui os recursos cabíveis quando da
punição administrativa militar, como veremos no capítulo específico da defesa no Direito
Administrativo Militar.
julgar os demais crimes militares”. Silenciou quanto à Justiça Militar da União (TOURINHO FILHO,
Fernando da Costa. Manual de Processo Penal. São Paulo: Saraiva, 2009.p. 918.).
101
ARAUJO, Luiz Alberto David; NUNES JÚNIOR, Vidal Serrano. Curso de Direito Constitucional. São
Paulo: Saraiva, 2006. p. 349.
102
Lei nº 893, de 09 de março de 2001, Regulamento Disciplinar da Polícia Militar do Estado de São Paulo.
Artigo 31. A competência disciplinar é inerente ao cargo, função ou posto, sendo competente para aplicar a
sanção disciplinar: O Governador do Estado; O Secretário de Segurança Pública e o Comandante Geral a
todos os militares estaduais, exceto ao Chefe da Casa Militar; O Sub Comandante PM a todos os militares da
ativa ou inativo; Os Oficiais da ativa do Posto de Coronel a Capitão.
64
6 A DEFESA NO PROCESSO PENAL MILITAR
O direito de defesa é um dos pontos mais importantes nos ordenamentos jurídicos dos
Estados democráticos de direito onde o Processo Penal constitua instrumento de aplicação da
Constituição.
Desde que se tem notícia da existência do homem, a vida em sociedade é característica
deste ser e, com ela, surgem as discordâncias e quebras de regras sociais, ensejando a
necessidade de corrigir os desvios que, para determinada sociedade, configura o que
chamamos de “crime”.
103
Também é inerente ao ser humano, acusado de cometer qualquer ação ou omissão, que
possa ensejar uma recriminação, a contestação desta acusação.
A esta contestação, quando discutida no plano do Direito Penal, damos o nome de
defesa”, portanto, a defesa ou a contestação de uma acusação criminal, é o extinto humano
de se defender de uma imputação criminal.
Antonio Scarance Fernandes
104
afirma que, em nosso ordenamento jurídico, a defesa
vem expressamente garantida na Constituição, no artigo 5º, inciso LV, contudo, trata-se de
cláusula presente nas Constituições anteriores.
Desde o Império, é ela mencionada: 1824, artigo 179, § 8º; 1934, artigo 113, 24;
1937, artigo 122, nº 11, segunda parte; 1946, artigo 141, § 25; 1967, artigo 150, §
15, e, com a Emenda de 1969, artigo 153, § 15. Ora esteve ligada a nota de culpa
(1824, 1891, 1937 e 1946), ora veio relacionada com a instrução criminal (1937 e
1946). Essa vinculação à nota de culpa ou instrução criminal levava a se sustentar
que a garantia se aplicava ao processo penal. O novo texto espantou qualquer
dúvida, estendendo-a qualquer processo judicial ou administrativo.
103
É inegável o acerto da seguinte afirmação: o homem, como ser de natureza e feição eminentemente sociais,
jamais de viver e nunca viveu à margem da sociedade. Desde o início da vida social humana, no
entanto, atos antissociais eram praticados [...]. Porém, os crimes sempre trouxeram consigo, em interesse
adverso ao de seus autores, a busca à sua repreensão [...]. Evoluindo o direito punitivo substantivo,
paralelamente desenvolveu-se sua forma adjetiva ou instrumental, vislumbrando-se o surgimento das
primeiras codificações. Punia-se o autor do ato delituoso sem que lhe contemplassem ensanchas ao uso da
palavra [...]. Discorre Vicente de Paulo Vicente de Azevedo que: “Já nas primeiras páginas da Bíblia, no
Velho Testamento, encontramos esta lição admirável: no primeiro julgamento que se realizou na Terra, ao réu
foi garantido o direito de defesa: Deus não condenou Adão sem ouví-lo [...]. neca, que viveu e floresceu
três séculos antes de cristo, deixou, entre outros, este pensamento admirável: julgar alguém sem ouví-lo é
fazer-lhe injustiça, ainda que a sentença seja justa”. Daí remarcar Faustin Hélie que a defesa não é privilégio,
tampouco uma conquista da humanidade. É um verdadeiro direito originário, contemporâneo do homem, e
por isso inalienável (PEDROSO, Fernando de Almeida. Processo Penal. O direito de defesa: repercussão,
amplitude e limites. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001. p. 15.).
104
FERNANDES, Antonio Scarance. Processo Penal Constitucional. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005.
p. 247.
65
Pouco tem se escrito sobre o tema, dada sua relevância, principalmente quando
tratamos do Direito Processual Penal Militar, que possui escassez de obras por sua
natureza.
Fato pelo qual motivou o desenvolvimento deste trabalho e as teses e discussões no
entorno da defesa no Processo Penal Militar, começando da Lei Maior, nossa Constituição
Federal, até chegarmos à Lei Castrense, o Código de Processo Penal Militar, bem como uma
abordagem na defesa durante o Inquérito Policial Militar, no Crime de Deserção e no Direito
Administrativo Militar.
A menagem e outros tipos de pries, tipos de defesas e recursos, bem como o
cumprimento do mandado de liberdade provisória também serão abordados neste capítulo,
objetivando traçar um paralelo entre a Constituição Federal e o Código de Processo Penal
Militar numa visão garantista.
6.1 A Defesa como Garantia
No Brasil, como já foi dito, esta previsão encontra acento na Constituição Federal, no
artigo 5º, incisos LIV e LV com os seguintes dizeres:
LIV Ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo
legal; e
LV Aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em
geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a
ela inerentes.
Desta forma, a previsão Constitucional vem não como um direito, mas, também,
com uma garantia aos acusados, seja em processo judicial ou administrativo, complementada
pelos: Código de Processo Penal, em seu artigo 564, inciso III, letra “c” e Código de Processo
Penal Militar, no artigo 500, inciso III, letra “f”.
Em ambos os digos, a nomeação de defensor ao acusado presente e de curador a
menor de 18 anos, consiste em condição de procedibilidade do Processo Penal, a não
nomeação torna nulo o processo.
Amula nº 523, do Supremo Tribunal Federal, também, prevê a nulidade absoluta do
processo no caso de ausência ou vício do ato defensivo, contudo, sua deficiência só o anulará
se houver prejuízo para o réu.
66
No processo penal, a falta da defesa constitui nulidade absoluta, mas a sua
deficiência só o anulará se houver prova de prejuízo para o réu.
105
Fernando da Costa Tourinho Filho
106
assevera que a defesa do acusado é tão
importante no processo que sua falta torna o processo nulo:
A defesa é, pois, necessária. Tão necessária é a defesa que o legislador, estadeando a
garantia mandamental, sancionou com pena de nulidade insavel a não nomeação
de Defensor ao réu presente, que o não tiver, ou ao ausente, e de curador ao menor
de 21 anos.
Podemos dizer que a defesa é o direito que tem o acusado de contra argumentar tudo
que lhe é imputado de ilegal ou ilícito, seja no processo penal, penal militar ou administrativo.
Antonio Scarance Fernandes
107
diz que a defesa é a forma de reagir à ação contra si
proposta, a fim de perseguir decisão favorável, e, assim, preservar direitos substanciais
questionados no processo, afirmando ainda que:
No processo penal, o titular do direito de defesa pretende evitar a condenação e
imposição da pena. Como a pena pode restringir sua liberdade, bem fundamental, a
defesa é necessária e indeclinável. Assim, embora o acusado ainda não deseje se
defender, impõe-se que alguém o faça e, para garantia de igualdade e equilíbrio no
interior do processo, é mister que esse alguém seja pessoa habilitada, técnica. Nem
se admite simples defesa formal, mera resposta aos termos da proposta acusatória,
exigindo-se defesa substancial, efetiva reação à acusação.
Para o autor, essa visão da defesa como direito, é incontestável e é ampliada quando
a defesa é analisada numa perspectiva constitucional, o mais presa ao círculo restrito de
uma ótica individual, revelando-se, então, como garantia fundamental da própria sociedade.
Diogo Rudge Malan
108
, ao tratar da defesa, afirma que esta é uma das mais relevantes
regras do devido processo legal, para ele a sociedade tem tanto interesse na absolvição do
105
Súmula nº 523, do Supremo Tribunal Federal.
106
TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Manual de Processo Penal. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 380.
107
FERNANDES, Antonio Scarance. A reação defensiva à imputação. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002.
p. 25.
108
A garantia da defesa é um dos mais relevantes cânones do devido processo legal. Temos que o Legislador do
Código de Processo Penal interpretou essa garantia de forma equivocada, ao reduzi-la, na Exposição de
Motivos de Francisco Campos, a unilateralíssima interesse pessoal dos criminosos (item XI). Trata-se de
basilar princípio de Direito Administrativo a primazia do interesse público, em detrimento daquele privado.
Não se pode, contudo, importar esse conhecido princípio para o âmbito de eventuais choques entre o poder
dever de punir do Estado e as garantias do réu, pois essa ponderação de interesses deve ser feita
casuisticamente, e não com base em um dogma de primazia de interesses estatais imanentes à persecução
penal. Hoje em dia se fala em perfil objetivo ou institucional da garantia processual da defesa. Essa
perspectiva considera a defesa um requisito indispensável para a legitimidade da prestação jurisdicional,
mesmo quando exercida contra a vontade expressa do réu. Com efeito, a sociedade tem tanto interesse na
absolvição do inocente, quanto na condenação do culpado; na possibilidade de se imputar um fato criminoso a
67
inocente, quanto na condenação do culpado, não podendo se confundir o direito de defesa
com a regra do Direito Administrativo que sobrepõe o interesse público sobre o privado.
Marco Antonio Marques da Silva
109
, ao tratar das partes no Processo Penal, lembra
com maestria que o acusado ou imputado deve ser reconhecido como parte no processo,
principalmente ao considerar seus direitos fundamentais constitucionais assegurados,
complementando:
O acusado ou imputado deve ser reconhecido como parte, principalmente tendo-se
em vista seus direitos fundamentais constitucionais assegurados: direito de defesa e
contraditório e o direito à presunção de inocência até o trânsito em julgado da
condenação.
No tocante ao direito de defesa, o autor destaca que ele importa que sejam postos à
disposão do acusado todos os concretos direitos de que ele legalmente dispõe de
codeterminar ou de moldar a decisão final do processo.
É com a igualdade entre as partes no processo que o Estado-Juiz poderá dizer o direito
a ser aplicado ao caso concreto.
6.2 Espécies de Defesa
Não são muitas as espécies de defesas apontadas pela doutrina, contudo, suas
distinções são bem claras.
Entre as distinções, encontramos a de Fernando de Almeida Pedroso
110
, que afirma ser
a defesa compreendida nos sentidos subjetivo e objetivo.
Para o autor, a defesa subjetivamente considerada, é a faculdade, em abstrato, de
contrair a ação penal e o que nela se deduz.
alguém quanto na de o acusado ter todas as possibilidades de se defender dessa imputação. Em última análise,
idêntico interesse social na persecução estatal e na efetiva defesa em juízo (MALAN, Diogo Rudge. A
sentença incongruente no processo penal. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2003. p. 51.).
109
Sob o prisma do direito de presunção de inoncia é que todas as medidas de coação somente podem ser
aplicadas quando comunitariamente aceitáveis diante da concreta possibilidade de serem dirigidas a um
inocente. É daí a exigência de que nenhuma medida de coação seja aplicada sem que se levem em conta os
princípios da necessidade, proporcionalidade, subsidiariedade e precariedade que informam a privação da
liberdade enquanto inexistente sentença condenatória transitada em julgado (SILVA, Marco Antonio Marques
da. Acesso à Justiça Penal e Estado Democrático de Direito. São Paulo: Juarez de Oliveira, 2001. p. 130.).
110
PEDROSO, Fernando de Almeida. Processo Penal. O direito de defesa: repercussão, amplitude e limites. 3.
ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001. p 35.
68
a objetiva, denota a defesa efetivamente exercida em um processo, a faculdade
corporificada em concreto, é o conjunto das matérias, provas e argumentos de fato ou de
direito que o acusado aduz em seu favor.
Fernando da Costa Tourinho Filho
111
citando Fenech, considera duas espécies de
defesa, a material ou genérica e a processual ou específica.
A genérica ou material seria quando, levado a cabo pela própria parte, mediante atos
constitutivos de ações ou omissões, no sentido de fazer prosperar ou impedir que prospere a
atuação da pretensão punitiva.
Já a específica ou técnica é aquela promovida por pessoa especializada, que tem como
profissão o exercício dessa função técnico jurídica de defesa das partes, atuando no Processo
Penal para realçar seus direitos.
Em ambos os casos, podemos observar que há uma convergência no sentido de haver
dois tipos de defesa, uma anterior, de contra argumentar as imputações feitas em desfavor do
acusado, sem cunho técnico jurídico.
Outra, por sua vez, mais elaborada, por defensor técnico ou a própria autodefesa,
quando o acusado possuir habilitação técnico jurídica e patrocinar sua própria defesa, neste
caso, de forma mais elaborada e científica.
Não podemos confundir aqui como diferenciação de espécies de defesa: a defesa
pessoal ou autodefesa com defesa técnica.
Espécies de defesa é a forma e o momento de contra argumentar as acusações
imputadas ao acusado.
A defesa pessoal ou autodefesa é o patrocínio pessoal do acusado que, possuindo
habilitação técnica jurídica, postula e debate em causa própria.
a defesa técnica é aquela patrocinada pelo profissional da área jurídica,
devidamente habilitado para o exercício da sua profissão, quando o próprio acusado o
possuir tal qualificação.
Portanto, a diferenciação da defesa técnica e da autodefesa está na pessoa de quem vai
exercer o patrocínio na esfera processual penal em favor do acusado.
111
TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Manual de Processo Penal. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 379.
69
6.3 O Acusado e seus Direitos no Processo Penal Militar
Não é possível falar de defesa no Processo Penal Militar sem se falar nas partes do
processo, em especial, do acusado.
São partes no Processo Penal Militar: o representante do Ministério Público, o
assistente de acusação, o acusado, o defensor e o curador, artigos 54, 60, 69, 71 e 72 do
Código de Processo Penal Militar. o ofendido, seu representante legal ou seus sucessores,
foram acrescidos por força da Constituição Federal, artigo 5º, inciso LIX.
O acusado é aquele a quem é imputado a prática de infração penal militar em denúncia
recebida, conforme o artigo 69, do Código de Processo Penal Militar. O acusado não tem
obrigação de colaborar no processo”, de prestar esclarecimentos que possam prejudicá-lo.
112
Sendo o acusado parte no Processo Penal Militar, este goza dos mesmos direitos
fundamentais, estabelecidos na Carta Magna, que o acusado no Processo Penal comum, pelo
Princípio da Isonomia, entre os quais podemos elencar os seguintes direitos:
Direito ao devido processo legal, artigo 5º, inciso LIV;
Ao contraditório e a ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes, artigo
5º, inciso LV;
Ao respeito à integridade sica e moral, artigo 5º, inciso XLIX;
À presunção de inoncia, artigo 5º, inciso LVII;
De não ser preso senão em flagrante ou por ordem escrita e fundamentada da
autoridade judiciária competente, ressalvados os casos de transgressão militar ou
de crimes propriamente militares, definidos em lei, artigo, inciso LXI;
De ter sua prisão comunicada imediatamente à autoridade judiciária competente, à
sua família ou à pessoa por ele indicada, bem como o de ser assistido por um
advogado, artigo 5º, incisos LXII e LXIII;
Ao silêncio, artigo 5º, inciso LXIII;
À assistência judiciária gratuita, artigo 5º, inciso LXXIV; e
Vedação às provas ilícitas, artigo, inciso LVI.
Estes são alguns dos direitos constitucionais assistidos aos acusados no Processo Penal
comum e militar.
112
LOBÃO, Célio. Direito Processual Penal Militar. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2009. p. 94.
70
O acusado que for citado para início da instrução criminal, ou intimado para qualquer
ato do processo penal militar, em que sua presença for indispenvel, e não comparecer, sem
justa causa, será considerado “réu revel”, neste caso, o juiz nomeará curador especial que
poderá recair no advogado constitdo, ou no Defensor Público, ou outro defensor designado
pelo juiz, artigos 411 a 413 do Código de Processo Penal Militar.
113
Com relação ao ônus da prova, este recai a quem alegar o fato, em regra, à acusação,
contudo o § 1º, do artigo 296, do Código de Processo Penal Militar, prevê a inversão do ônus
da prova quando a lei presume o fato até que se prove o contrário.
O § 2º, do mesmo artigo, afirma que ninguém é obrigado a produzir prova que o
incrimine, ou ao seu cônjuge, descendente, ascendente ou irmão, salvaguardando, assim, o
princípio da presunção de inocência.
6.3.1 A fiança e a liberdade provisória no Processo Penal Militar
A Constituição Federal dispõe no artigo , inciso LXVI que “ninguém será levado à
prisão ou nela mantido, quando a lei admitir a liberdade provisória, com ou sem fiança”.
A fiança é um instituto processual penal previsto apenas no digo de Processo Penal
comum, no Capítulo VI, que trata da liberdade provisória com ou sem fiança, a lei processual
penal militar o contempla este instituto.
O artigo 330, da mesma lei, define que a fiança, que será sempre definitiva, consisti
em depósito de dinheiro, pedras, objetos ou metais preciosos, títulos da vida blica,
federal, estadual ou municipal, ou em hipoteca inscrita em primeiro lugar.
O valor em que consistir a fiança será recolhido à repartição arrecadadora federal ou
estadual, ou entregue ao depositário blico, juntando-se aos autos os respectivos
conhecimentos, assim determina o artigo 331.
Em caso de Prisão em Flagrante Delito, a autoridade que presidir os feitos é que será
competente para conceder a fiança, porém a fiança poderá ser prestada a qualquer termo do
processo, enquanto o transitar em julgado a sentença condenatória, artigos 332 e 334 do
Código de Processo Penal.
113
LOBÃO, Célio. Direito Processual Penal Militar. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2009. p. 95.
71
Desta forma temos que, a raiz do termo “fiança” é a mesma que origina o vocábulo
confiança”, trata-se, de início, de uma garantia pessoal, um compromisso firmado por pessoa
tida por confiável, no sentido de que pagaria determinada quantia caso o afiançado se
evadisse.
114
Atualmente, a natureza da fiança é diversa, constituindo uma caução, termo, que por
sua vez, aparentado etimologicamente a precaução. Trata-se de garantia real, independente,
portanto, da idoneidade de quem a presta, consistente na entrega de bens ao Estado, com o
fim de assegurar a liberdade do indiciado ou réu durante a persecutio criminis, e,
secundariamente, também, para garantir o pagamento de custas processuais e ônus a que
estiver sujeito o réu.
115
O valor a ser arbitrado pela autoridade que a conceder está previsto no artigo 325, do
Código de Processo Penal, sempre estabelecido em salários nimos vigentes no país,
determinado os limites da seguinte forma:
Letra a: de 1 (um) a 5 (cinco) salários nimos de refencia, quando se tratar de
infração punida, no grau máximo, com pena privativa de liberdade, até 2 (dois) anos;
Letra b: de 5 (cinco) a 20 (vinte) salários mínimos de referência, quando se tratar de
infração punida com pena privativa de liberdade, no grau máximo, até 04 (quatro) anos; e
Letra c: de 20 (vinte) a 100 (cem) salários mínimos de referência, quando o máximo
da pena cominada for superior a 04 (quatro) anos.
Contudo, o parágrafo 1º, do artigo 325, do referido diploma, determina que a condição
do acusado será levada em consideração, podendo ser reduzida até o máximo de dois terços
ou, aumentada, pelo juiz, até o décuplo.
Como já dissemos, a lei processual penal militar não contempla o instituto da “fiança
por diversos motivos, entre os quais podemos citar o bem juridicamente tutelado, que, nos
casos dos militares, contemplam, além do bem jurídico do próprio tipo penal, a hierarquia e
disciplina das instituições militares, bem como alguns crimes que atentam contra a
autoridade ou disciplina militar”.
114
MIRABETE, Julio Fabbrini. Processo Penal. São Paulo: Atlas, 2005. p. 441.
115
BONFIM, Edilson Mougenot. Curso de Processo Penal. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 433.
72
No Processo Penal Militar não de se falar em fiança por não caber a cauçãoou a
garantia”, pois é inimaginável conceder uma liberdade com base em um valor monetário
como garantia de comparecimento e acompanhamento do Inquérito Policial Militar ou do
Processo Penal Militar, ao qual o acusado responde.
Contudo, a liberdade provisória não foi esquecida pelo Legislador Castrense,
salvaguardando o direito de responder em liberdade nos casos em que a lei processual militar
permitir.
Vicente Greco Filho
116
afirma que a liberdade provisória é a situação substitutiva da
prisão processual, é o contraposto da prisão processual, ou seja, se, de maneira, antecedente,
fundamento para a prisão proviria, esta não se efetiva ou se relaxa se houver uma das
situações de liberdade provisória.
para Antonio Scarance Fernandes
117
, a expressão liberdade provisória o é
adequada, apesar de consagrada na Constituição Federal e no digo de Processo Penal, traz
a ideia de uma liberdade que pode, a qualquer momento, vir a cessar.
No Código de Processo Penal Militar, as previsões da liberdade provisória estão nos
artigos 253 e 270, da seguinte forma:
Artigo 253 - quando o juiz verificar pelo auto de prisão em flagrante que o agente
praticou o fato nas condições dos artigos 35, 38, observado o disposto no artigo 40,
e dos artigos 39 e 42 do código penal militar, poderá conceder ao indiciado
liberdade provisória, mediante termo de comparecimento a todos os atos do
processo, sob pena de revogar a concessão.
Artigo 270 - o indiciado ou acusado livrar-sesolto no caso de infração a que não
for cominada pena privativa de liberdade.
118
José da Silva Loureiro Neto
119
afirma que como no ordenamento processual militar
o é previsto o instituto da fiança, restou somente a liberdade provisória com temperamento
116
se disse que a liberdade provisória é uma antecipação da liberdade definitiva. Todavia essa explicação é
imprópria, porque a liberdade definitiva ou pura é a que temos todos nós não sujeitos à coação processual, que
é o que acontece, por exemplo, ao acusado definitivamente absolvido, ou mesmo ao acusado que não teve,
contra ele, nenhum motivo de prisão provisória. Este último, durante o processo, se não esteve em nenhuma
situação de prisão proviria, permaneceu sempre em liberdade pura ou definitiva, tendo, apenas, ônus
processuais, e, durante o processo, não se pode dizer que esteve em liberdade proviria (GRECO FILHO,
Vicente. Manual de Processo Penal. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 266, 267.).
117
FERNANDES, Antonio Scarance. Processo Penal Constitucional. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005.
p. 334.
118
Decreto Lei 1.002, de 21 de outubro de 1969 digo de Processo Penal Militar. Artigo 253 e 270.
119
Contudo, o autor salienta a importância de o se confundir a liberdade provisória e relaxamento da prisão.
Este último caso decorre, também, de preceito constitucional, a saber “a prisão ilegal será imediatamente
relaxada pela autoridade judiciária” (artigo , LXV). Ocorre o relaxamento da prisão quando o auditor,
73
ao rigor da custódia preventiva, prevista na Constituição Federal em seu artigo 5º, inciso
LXVI.
O autor cita, ainda, que outra causa de concessão da liberdade provisória é prevista,
também, no artigo 253, do Código de Processo Penal Militar, que dispõe:
Quando o juiz verificar pelo auto de prisão em flagrante que o agente praticou o
fato nas condições dos artigos 35 e 38, observado o disposto no artigo 40, e dos
artigos 39 e 42, do código penal militar, poderá conceder ao indiciado liberdade
provisória, mediante termo de comparecimento a todos os atos do processo, sob
pena de revogar a concessão.
Refere-se o dispositivo legal às causas de excludentes da ilicitude e da culpabilidade, o
que é de se louvar, ao contrário do estatuto processual comum que excluiu as dirimentes no
artigo 310.
No Processo Penal Militar, portanto, existem duas situações de concessão da liberdade
proviria, a do artigo 253 e a do artigo 270 que, segundo lio Lobão
120
, classifica-se em
obrigatória e facultativa, sendo a regra do artigo 270, do digo de Processo Penal Militar,
uma concessão obrigatória e, a regra do artigo 253, do mesmo diploma militar, a facultativa.
O autor ressalta, também, que a liberdade provisória não se confunde com a menagem,
pois esta consiste na liberdade com restrição de permanência em determinado tio, o que
trataremos em capítulo próprio deste trabalho, enquanto àquela é uma liberdade relativizada
pelas condições impostas nos artigos 253, 270 e 271, do Código de Processo Penal Militar.
6.3.2 A lei nº 9.099/95 no âmbito da Justiça Militar
A lei 9.099, de 26 de setembro de 1995, criada com base no artigo 98, inciso I, da
Constituição Federal, estabeleceu a criação no âmbito da União, Distrito Federal e Estados,
dos Juizados Especiais Civis e Criminais.
mediante despacho, ou o Tribunal castrense, em ardão oriundo de habeas corpus, concedem a liberdade ao
indiciado ou ofendido por não mais subsistirem as razões que a determinaram ou por não ter a prisão
obedecido aos preceitos legais. Neste caso, não deveres ou obrigações para o acusado, como ocorre na
liberdade provisória [...] (LOUREIRO NETO, José da Silva. Processo Penal Militar. São Paulo: Atlas, 2010.
p. 91.).
120
Segundo a lei processual penal militar a liberdade provisória é obrigatória ou facultativa. A obrigatória é
imposição legal, é direito do acusado ou indiciado, enquanto a facultativa pode ser concedida pelo juiz ou
pelo Conselho, nos casos autorizados na lei (LOBÃO, lio. Direito Processual Penal Militar. Rio de
Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2009. p. 329.).
74
Em 1999, foi acrescido no artigo 98, da Carta Magna, através da Emenda
Constitucional 22, o parágrafo único estabelecendo que: Lei federal disporá sobre a
criação de juizados especiais no âmbito da justiça federal”.
Esta Emenda Constitucional possibilitou que em 12 de julho de 2001 fosse, então,
criada a lei nº 10.259, que implantou o Juizado Especial em âmbito da Justiça Federal.
Com a publicação da lei 10.259/2001, o artigo 61, da lei 9.099/95, foi alterado,
passando a ter a seguinte redação:
[...] consideram-se infrações penais de menor potencial ofensivo, para efeitos desta
lei, as contravenções penais e os crimes a que a lei comine pena máxima não
superior a 2 (dois) anos, cumulada ou não com multa.
Com a edição da lei 10.259/2001 criou-se uma polêmica em relação aos Juizados
Especiais Criminais, pois o artigo do novel diploma criou o Juizado Especial somente no
âmbito federal, portanto, a definição de crime de menor potencial ofensivo igual àquele cuja
pena máxima não fosse superior a dois anos estaria valendo apenas para os crimes federais?
Para solucionar esta polêmica foi editada a lei 11.313/2006, que regulamentou o
artigo 2º, da lei nº 10.259/2001 e os artigos 60 e 61, da lei 9.099/95.
Esta Lei tem como finalidade a busca da conciliação entre as partes e, estabelece, em
seu artigo que o processo orientar-se pelos critérios da oralidade, simplicidade,
informalidade, economia processual e celeridade, buscando, sempre que possível a
conciliação ou a transação”.
De acordo com o artigo 60, da referida Lei, o Juizado Especial Criminal, provido por
Juízes Togados ou Togados e leigos, têm competência para a conciliação, o julgamento e a
execução das infrações penais de menor potencial ofensivo, respeitando as regras de conexão
e continência.
A vedação da aplicação desta Lei no âmbito da Justiça Militar está expresso no artigo
90-A, foi inserida na lei nº 9.099/95 através da lei nº 9.839, de 27 de setembro de 1999, com a
seguinte redação: “as disposições desta Lei não se aplicam no âmbito da Justiça Militar”.
Contudo, muito tem se discutido quanto à vedação da aplicação desta Lei no âmbito da
Justiça Militar, sendo considerado tal dispositivo incompatível com nossa Lei Maior ao
afastar o militar deste benefício.
75
Porém, Cícero Robson Coimbra Neves e Marcello Streifinger
121
afirmam que a
construção acerca do bem jurídico penal militar é fundamental para justificar o afastamento da
aplicação da lei nº 9.099/95, no âmbito da Justiça Militar, ainda com a superveniência da lei
10.259/2001.
Luiz Gonzaga Chaves
122
, também, afirma que não se aplica a lei 9.099/95, no
âmbito da Justiça Militar, em razão de uma interpretação sistemática.
Para o autor, a discussão a propósito desta Lei e sua aplicação nas Justiças Militares
têm-se centrado no fato de que a Lei dos Juizados Federais não faz menção à restrição aos
procedimentos especiais, o que pode levar à conclusão pela aplicabilidade da lei 9.099/95
às Justas Militares.
Todavia, como assevera Luiz Gonzaga Chaves, “não é o procedimento que é especial
na Justiça Militar, mas a própria justiça o é, pelos aspectos diferenciadores que a distinguem
da Justiça Ordinária”.
A Justiça Militar é especial, em razão dos princípios basilares que a regem, a
disciplina e a hierarquia, que a diferenciam da justiça comum, tanto que o juízo é
formado pelos pares do infrator, que conhecem as peculiaridades da função militar
para julga-lo. Então, não é o procedimento que é especial, mas a justiça que o é. A
Lei 9.099/95 veio disciplinar o procedimento comum, que constitui a grande maioria
dos processos. Sua finalidade foi esvaziar as cadeias, que estavam cheias de presos,
por crimes de menor potencial ofensivo e tinha que se dar uma resposta mais efetiva
à criminalidade mais violenta.
123
Como vimos, a lei 9.099/95 não foi criada para ser aplicada no âmbito da Justiça
Militar, mas para desafogar os Tribunais dos processos que não necessitavam de uma resposta
com pena privativa de liberdade ao fato praticado pelo infrator da lei.
O artigo 90-A, da lei nº 9.099/95, veio para confirmar este pensamento, vez que, como
disse Cícero Robson Coimbra Neves e Marcello Streifinger, o bem jurídico tutelado pelo
121
Como aduzimos, não transicionar bens jurídicos tão complexos como os tutelados pelo Direito Penal
Militar, sendo esse, em nosso enfoque, o golpe fatal para afirmar a inaplicabilidade dos Juizados Especiais
Criminais aos crimes militares, e isso não no que concerne aos conceitos, a exemplo do de infração penal
de menor potencial ofensivo, mas, também, aos institutos processuais (NEVES, Cícero Robson Coimbra;
STREIFINGER, Marcello. Apontamentos de Direito Penal Militar. Parte Geral. São Paulo: Saraiva, 2005.
v.1, p. 271.).
122
CHAVES, Luiz Gonzaga. Aplicação da Lei 9.099/95 na Justiça Militar, as a Lei 10.259/01. Revista Direito
Militar, Florianópolis, Associação dos Magistrados das Justiças Militares Estaduais, ano VIII, n. 43, p. 31,
set./out. 2003.
123
CHAVES, Luiz Gonzaga. Aplicação da Lei 9.099/95 na Justiça Militar, as a Lei 10.259/01. Revista Direito
Militar, Florianópolis, Associação dos Magistrados das Justiças Militares Estaduais, ano VIII, n. 43, p. 31,
set./out. 2003.
76
Direito Militar não pode ser transicionado, se assim o fosse, colocaria os princípios da
disciplina e hierarquia em “cheque”.
6.4 Dos Recursos no Direito Processual Penal Militar Conceito
A Constituição Federal prevê em seu artigo , inciso LV o duplo grau de Jurisdição
ao declarar que são assegurados aos litigantes o contraditório, a ampla defesa com os meios e
recursos a ele inerentes.
Com isso, quis o Legislador constitucional que a todos fossem dado o direito de
recorrer à instâncias superiores das sentenças do juiz monocrático.
Na Justiça Militar não é diferente, o réu tem direito de recorrer da sentença de primeira
instância, seja ela prolatada pelo Juiz Singular ou pelo Conselho de Justiça Militar conforme
funções já definidas anteriormente.
várias definições para o que vem a ser o recurso, como as que veremos a seguir,
contudo, todas levam à definição de uma nova apreciação do processo.
Fernando da Costa Tourinho Filho
124
afirma que no seu sentido estrito, recurso nada
mais é do que o meio, o remédio jurídico processual pelo qual se provoca o reexame de uma
decisão.
Para o autor, os recursos estão intimamente ligados ao tema do duplo grau de
jurisdição e, em regra, são encaminhados à instância superior da qual proferiu a sentença para
julgá-lo, contudo exceção, como no caso do Recurso de Embargos Declaratório, que deve
ser encaminhado ao próprio órgão prolator da decisão recorrida.
De acordo com a teoria geral dos recursos, um órgão jurisdicional contra o qual se
recorre, que é denominado juízo a quo, e outro órgão jurisdicional para o qual se recorre,
chamado juízo ad quem.
De acordo com Vicente Greco Filho
125
, o sistema processual prevê dois tipos de
instrumentos para a reforma de decisões judiciais: recursos e ações, sendo que a hisria do
124
TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Manual de Processo Penal. 11. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p.
803.
125
Historicamente, a partir do Direito romano, primeiro surgiram as ações, em virtude da inexistência de uma
estrutura judiciária hierarquizada que tivesse a previsão de órgãos de primeiro e segundo graus. Todavia,
existia o anseio, que é da natureza humana, de corrigir, ou pelo menos rebelar-se contra, a decisão ilegal ou
77
Direito Processual demonstra que a utilização das ações é maior ou menor segundo as
restrições ou ampliações do sistema recursal.
Os recursos, porém, ocupam maior espaço no processo moderno, em virtude da
complexidade da estrutura judiciária, decorrente da estrutura estatal complexa, especialmente
em país na dimensão do nosso.
Os recursos, porém, dependem de pressupostos estabelecidos na lei, objetivos e
subjetivos, para que seja recebido na 1ª Instância e admitido na 2ª Instância.
Ao ser interposto o recurso, o Juiz a quo examina se estão satisfeitos os pressupostos
recursais, é o juízo de prelibação ou juízo de admissibilidade, que se renova no juízo ad quem
a fim de que o recurso seja admitido.
Segundo lio Lobão
126
são pressupostos objetivos a previsão legal, adequação,
tempestividade e regularidade procedimental. Os pressupostos subjetivos são a legitimidade
para recorrer e a sucumbência.
Não faremos comentários aqui quanto aos pressupostos objetivos, por entender não ser
objeto deste trabalho, porém comentaremos os pressupostos objetivos que encontraram
divergência na doutrina.
Quanto aos pressupostos subjetivos, portanto, trataremos primeiro da legitimidade
para recorrer, sendo que a possui no Processo Penal Militar o Ministério Público, o réu e seu
defensor constituído, o Defensor Público ou o defensor designado pelo juiz, e o assistente,
este último de forma restrita, como veremos a seguir.
Apesar da justificada omissão do Código de Processo Penal Militar, por ter sido
editado antes da Constituição Federal de 1988, que institui a ação penal privada subsidiária da
injusta. Daí a querella nullitatis, ação para declarar a nulidade de uma decisão, anterior a um sistema recursal
estruturado. Com a organização do Império Romano, especialmente por obra do Imperador Adriano, surgiu a
apelação, porque o Imperador avocou a si “todas as magistraturas”, inclusive com o poder de rever decisões
dos Magistrados. A estrutura complexa do Império e o desenvolvimento do Estado, posteriormente,
admitiram recursos para autoridades hierarquizadas em graus, instituindo-se, então, um sistema recursal. Com
isso, os recursos passaram a ter maior imporncia como instrumentos de impugnação de decisões judiciais,
mas convivem com as ações, como a revisão criminal, o habeas corpus, os embargos de terceiros dos artigos
129 e 130, o mandado de segurança, isso em matéria criminal (GRECO FILHO, Vicente. Manual de
Processo Penal. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 327.).
126
LOBÃO, Célio. Direito Processual Penal Militar. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2009. p. 559.
78
ação penal pública, incluem-se o querelante e o querelado dentre os legitimados para recorrer
(artigos 511 e 530 do CPPM e 5º, LIX, da CF).
127
Os recursos no Processo Penal Militar, segundo Esdras dos Santos Carvalho
128
, em
linhas gerais seguem idêntico disciplinamento previsto no Processo Penal comum, com
algumas peculiaridades, a serem observadas a seguir.
O autor destaca que somente have possibilidade de levar ao conhecimento do
Superior Tribunal de Justiça as decisões judiciais, latu sensu, da esfera militar estadual ou
eventual conflito de competência entre órgãos distintos do Poder Judiciário, visto que as
decisões da Justiça Militar da União da primeira instância seguirão para o Superior Tribunal
Militar (STM), por não existirem, na esfera militar federal, tribunais regionais.
6.4.1 Espécies de recursos no Processo Penal Militar e suas peculiaridades
Os recursos previstos no Código de Processo Penal Militar (CPPM) contra decisões
proferidas na Justiça Militar Federal estão enumerados no Título II, do Livro III, sendo eles:
Recurso em sentido estrito, dos artigos 516 a 525; apelação, dos artigos 526 a 537;
embargos, dos artigos 538 a 549; revisão, dos artigos 550 a 562; recurso ordinário de decisões
denegatórias de habeas corpus, artigos 568 e 569 e artigo 102, II, a, da Constituição Federal;
recurso extraordinário, artigos 570 a 583; reclamação, artigos 584 a 587.
Célio Lobão
129
afirma que na Justiça Militar Estadual são cabíveis os mesmos recursos
acima, incluindo-se o recurso especial, recurso de decisão proferida em mandado de
segurança e recurso ordinário de decisão denegatória de habeas corpus (artigo 105, II, a e b,
da Constituição Federal), bem como, reclamação para o Tribunal de Justiça Militar ou para o
Tribunal de Justiça nas unidades federativas em que o TJ é órgão de insncia da Justiça
Militar.
127
LOBÃO, Célio. Direito Processual Penal Militar. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2009. p. 562.
128
CARVALHO, Esdras dos Santos. O Direito Processual Penal Militar numa visão garantista. A
conformação do processo penal militar ao sistema constitucional acusatório como instrumento de efetivação
dos direitos fundamentais na tutela penal militar. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010.
129
LOBÃO, op. cit., p. 557, nota 127.
79
Quanto à peculiaridade do Processo Penal Militar, o autor salienta, a respeito da
legitimidade do assistente para recorrer, tem sido alegada, em recurso interposto ao Superior
Tribunal Militar, a inconstitucionalidade do artigo 65, parágrafo , do Código de Processo
Penal Militar, em sua parte final: não poderá, igualmente, impetrar recurso, salvo de
despacho que indeferir o pedido de assistência”, por outro lado, o artigo 530, ao indicar quem
tem legitimidade para apelar, não inclui o assistente da acusação e sim, tão somente, o
Ministério Público e o réu ou seu defensor, aos quais o autor acrescenta o querelante e o
querelado, na ação penal militar privada.
Portanto, diante da lei processual penal militar, o assistente o tem legitimidade para
apelar, mesmo na omissão do Parquet, ou para interpor recurso em sentido estrito.
130
Outra peculiaridade a ser abordada é a respeito da restrição de recurso de apelação ao
defensor do réu revel, estabelecida pelo artigo 414, do digo de Processo Penal Militar,
última parte.
O referido artigo dispõe que o curador do acusado revel se incumbirá de sua defesa até
o julgamento, podendo interpor os recursos legais, excetuada a apelação de sentença
condenatória.
Esdras dos Santos Carvalho
131
assevera que a defesa do réu revel deve ser ampla,
assim como a do acusado presente, não podendo a norma ordinária reduzir a garantia
constitucional da ampla defesa, do contradirio e do duplo grau de jurisdição.
Para o autor, a parte final do artigo 497, do Código de Processo Penal Militar, que
dispõe não ser possível ao réu revel embargar sem que se apresente à prisão, não foi
recepcionado pela norma constitucional vigente.
Viu-se que o acusado revel, além de poder ofertar todos os recursos disponíveis no
ordenamento jurídico processual penal militar pelo viés da atuação de seu defensor,
uma vez que a restrição imposta ao recurso estabelecida no artigo 414 do Código de
Processo Penal Militar não sobreviveu ao exame acusatório sob as lentes garantistas,
poderá igualmente embargar das decisões definitivas ou com força de definitivas,
unânimes ou não, proferidas pelo Superior Tribunal Militar, independentemente de
recolhimento ao cárcere.
130
LOBÃO, Célio. Direito Processual Penal Militar. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2009. p. 564.
131
CARVALHO, Esdras dos Santos. O Direito Processual Penal Militar numa visão garantista. A
conformação do processo penal militar ao sistema constitucional acusatório como instrumento de efetivação
dos direitos fundamentais na tutela penal militar. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010. p. 183
80
Outra exincia, a nosso ver, em desalinho com nosso ordenamento jurídico, é o
recolhimento à prisão para poder recorrer, esta questão deve ser analisada com cuidado, pois
vai de encontro ao Princípio da Presunção de Inocência.
Prevê o artigo 527, do Código de Processo Penal Militar, que o réu o poderá apelar
sem recolher-se à prisão, salvo se primário e detentor de bons antecedentes, reconhecidas tais
circunstâncias na sentença condenatória.
Esdras dos Santos Carvalho
132
afirma, também, que:
Condicionar o direito de apelar à submissão ao cárcere não está em harmonia com o
sistema constitucional acusatório, em especial com a garantia da presunção de
inocência, tampouco com a excepcionalidade da prisão antes do trânsito em julgado
da sentença penal condenaria. A regra deve ser o inverso, para que o réu se
submeta à custódia cautelar, visto que não título judicial definitivo a lastrear a
prisão, deve o magistrado apontar na sentença os elementos concretos e
indispensáveis para a ocorrência de medida constritora excepcional de modo a
mitigar a garantia constitucional da presunção de inoncia.
A mula 11 do Superior Tribunal Militar alterou o artigo 527, com a seguinte
redação: O recolhimento à prisão, como condição para apelar (artigo 527 do Código de
Processo Penal Militar), aplica-se ao réu foragido e, tratando-se de revel, é aplicável se a
sentença houver negado o direito de apelar em liberdade”.
Neste caso, percebe-se que o artigo 527, do Código de Processo Penal Militar, não se
confortou no atual sistema processual penal brasileiro, onde o próprio Supremo Tribunal
Federal, em acórdão recente, reconhece que não basta a prisão estar prevista somente em
dispositivo legal, de ter fundamentação para decretá-la (HC 91.183/SP, Relator Ministro
Ricardo Lewandowski, julgamento: 12/06/2007).
6.5 O Direito Administrativo Militar à Luz da Justiça Militar
O Direito Administrativo Militar possui relevância em nosso estudo à medida que
veremos a previsão constitucional deste instituto, as possibilidades de prisões administrativas,
o direito de defesa e os recursos previstos na lei estadual paulista, que estabeleceu o
Regulamento Disciplinar da Polícia Militar do Estado de o Paulo, bem como a apreciação
da punição disciplinar pelo Poder Judicrio.
132
CARVALHO, Esdras dos Santos. O Direito Processual Penal Militar numa visão garantista. A
conformação do processo penal militar ao sistema constitucional acusatório como instrumento de efetivação
dos direitos fundamentais na tutela penal militar. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010. p. 187.
81
A prisão administrativa para militar esta prevista na Constituição Federal, no artigo ,
inciso LXI, onde o constituinte a colocou como uma exceção às prisões, destacando assim a
importância da prevenção aos bens jurídicos militares:
[...] ninguém será preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e
fundamentada de autoridade judiciária competente, salvo nos casos de transgressão
militar ou crime propriamente militar, definidos em lei.
133
(grifo nosso).
Essa exceção deixa clara a importância dada à tutela da hierarquia e disciplina militar,
princípios basilares das instituições que tem como missão precípua a defesa do Estado.
Contudo, a lei infraconstitucional não abandonou, e nem poderia, o direito à defesa ao
militar acusado de infringir norma administrativa, este direito e as peculiaridades da norma
administrativa militar veremos a seguir.
de se ressaltar, porém, o o cabimento de habeas corpus em sede de punição
administrativa militar, Constituição Federal, artigo 142, § 2º, conforme discutido no
capítulo 5.3 deste trabalho.
6.5.1 Conceito de Direito Administrativo e Direito Administrativo Militar
Vários são os conceitos doutrinários dados ao Direito Administrativo pela doutrina
nacional e estrangeira, diversificando de acordo com a escola de origem do autor.
Entre os conceitos na doutrina nacional, buscamos na obra de Hely Lopes Meirelles
134
um dos quais nos guiará neste estudo:
O conceito de Direito Administrativo Brasileiro, para nós, sintetiza-se no conjunto
harmônico de princípios jurídicos que regem os órgãos, os agentes e as atividades
públicas tendentes a realizar concreta, direta e imediatamente os fins desejados pelo
Estado.
133
Constituição da República Federativa do Brasil, artigo 5º, inciso LXI. 5 de outubro de 1988.
134
Conjunto harmônico de princípios jurídicos significa a sistematização de normas doutrinárias de Direito (e
não de política ou de ação social); que regem os órgãos, os agentes indica que ordena a estrutura e o pessoal
do serviço público; e as atividades públicas isto é, a seriação de atos da Administração Pública, praticados
nessa qualidade, e não quando atua excepcionalmente, em condições de igualdade com o particular, sujeitos
às normas do Direito Privado; tendentes a realizar concreta, direta e imediatamente os fins desejados pelo
Estado: aí estão a caracterização e a delimitação do objeto do Direito Administrativo, os três primeiros termos
concreta, direta e imediatamente afastam a ingerência desse ramo do Direito na atividade estatal abstrata,
que é a legislativa, na atividade indireta que é a judicial, e na atividade mediata que é a ação social do
Estado. As ultimas expressões da definição fins desejados pelo Estado estão a indicar que o Direito
Administrativo não compete dizer quais são os fins do Estado, outras ciências se incumbirão disto [...]
(MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo brasileiro. São Paulo: Malheiros, 2000. p. 34.).
82
De acordo com o autor, portanto, é o Direito Administrativo que cuida dos órgãos,
agentes e atividades blicas, nos quais a atividade de Pocia se enquadra, pois a
Constituição Federal, no Título V Da Defesa do Estado e das Instituições Democráticas
em seu Capítulo III Da Segurança Pública , artigo 144, incumbiu ao Estado, como dever,
prover tal serviço, através de óros públicos.
No caso dos Estados Federativos, cabe às Polícias Civis e Militares tal mister, ficando,
portanto, estas instituições regidas pelo Direito Administrativo brasileiro.
Para Maria Sylvia Zanella Di Pietro
135
, o conceito de Direito Administrativo depende
do critério adotado pelo autor, que são diversos, como por exemplo, a escola do serviço
público, o critério do Poder Executivo, o critério das relações jurídicas, o critério teleológico,
o critério negativo ou residual, o critério da distinção entre atividade jurídica e social do
Estado e o critério da Administração Pública.
A autora define o Direito Administrativo, partindo de um conceito descritivo, o qual
abrange a administração pública em sentido objetivo e subjetivo, como:
O ramo do direito público que tem por objeto os órgãos, agentes e pessoas jurídicas
administrativas que integram a Administração Pública, a atividade jurídicao
contenciosa que exerce os bens de que se utiliza para a consecução de seus fins, de
natureza pública.
Esta definição, além de afirmar tratar-se de um ramo do direito público, define como
objeto do Direito Administrativo: órgão, agentes e pessoas jurídicas que integram a
Administração Pública.
Maria Sylvia Zanella Di Pietro
136
, ao falar dos militares, afirma que esta classe
abrange as pessoas sicas que prestam serviços às Forças Armadas Marinha, Exército e
Aeronáutica (artigo 142, caput, e § 3º, da Constituição), e às Pocias Militares e Corpos de
Bombeiros Militares dos Estados, Distrito Federal e dos Territórios (artigo 42), com vínculo
135
DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. São Paulo: Atlas, 2009. p. 47.
136
A partir dessa Emenda (nº 18/98), ficaram excluídos da categoria, só lhes sendo aplicáveis as normas
referentes aos servidores públicos quando houver previsão expressa nesse sentido, como a contida no artigo
142, § 3º, inciso VIII. Esse dispositivo manda aplicar aos militares das Forças Armadas os incisos VIII, XII,
XVII, XVIII, XIX e XXV, do artigo e os incisos XI, XIII, XIV e XV, do artigo 37. Vale dizer que os
militares fazem jus a algumas vantagens próprias do trabalhador privado: décimo terceiro salário, salário
família, férias anuais remuneradas, licença à gestante, licença paternidade e assistência gratuita aos filhos e
dependentes desde o nascimento até seis anos de idade em creches e pré-escolas, e estão sujeitos a algumas
normas próprias dos servidores públicos: teto salarial, limitações, forma de cálculo dos acréscimos salariais e
irredutibilidade de vencimentos (Ibid., p. 515.).
83
estatutário sujeito a regime jurídico próprio, mediante remuneração paga pelos cofres
públicos.
E, que, até a Emenda Constitucional 18/98, eram considerados servidores públicos,
conforme artigo 42, da Constituição, inserida em seção denominada servidores públicos
militares.
A autora, ao afirmar que as Pocias Militares e Corpos de Bombeiros Militares
possuem nculo estatutário e regime jurídico próprio, nos remete às legislações
infraconstitucionais que tratam destas instituições: criação, organização, direitos e deveres.
A criação e organização das Pocias Militares e Corpos de Bombeiros Militares são
baseadas no Decreto-Lei nº 667, de 2 de julho de 1969, que trata da organização, competência
e, principalmente, determina a justiça e disciplina destas instituições, no Capítulo V, artigo
18, que determina: As Polícias Militares serão regidas por Regulamento Disciplinar
redigido à semelhança do Regulamento Disciplinar do Exército e adaptado às condições
especiais de cada corporação”.
Com base neste Decreto-Lei é que surge o Direito Administrativo Disciplinar Militar,
que se expressa através do Regulamento Disciplinar, no Estado de São Paulo, Lei
Complementar nº 893, de 9 de março de 2001, objeto de nosso estudo, para podermos
entender a responsabilidade do militar estadual, a infração administrativa, as possíveis
punições e a defesa no Direito Administrativo Militar.
O Regulamento Disciplinar da Polícia Militar do Estado de São Paulo, Lei
Complementar nº 893, de 9 de março de 2001, possui 14 (catorze) capítulos com 89 (oitenta e
nove) artigos, “trouxe inúmeros avanços e veio adequado aos preceitos já estabelecidos na
Constituição Cidadã, eliminando inúmeras faltas disciplinares previstas nos antigos
regulamentos, que não eram apenadas, pois se encontravam ultrapassadas pelo tempo ou
mesmo afrontavam dispositivos constitucionais”.
137
O Regulamento estabelece em seu artigo primeiro que a hierarquia e a disciplina são
bases da organização da Pocia Militar e o artigo 6º define a deontologia policial militar
como sendo constituída pelos valores e deveres éticos, traduzidos em normas de conduta, que
137
SANTINON, Clóvis. Apresentação. In: COSTA, Alexandre Henriques da; NEVES, Cícero Robson Coimbra;
COSTA, Marcos José da; ROCHA, Abelardo Júlio da; SILVA, Marcelino Fernandes da; MELLO, Rogério
Luis Marques de. Regulamento Disciplinar da Polícia Militar do Estado de São Paulo. São Paulo:
Suprema, 2007. p. 8.
84
se impõem para que o exercício da profissão policial militar atinja plenamente os ideais de
realização do bem comum, mediante a preservação da ordem pública.
138
6.5.2 Processo e procedimento administrativo militar
Os procedimentos ou processos administrativos previstos na lei nº 893, de 9 de março
de 2001, que tem como objetivo apurar as infrações administrativas cometidas pelo militar
estadual, são de duas espécies:
Aquele que tem por objetivo apurar as transgressões disciplinares mais simples, que
são todas as faltas disciplinares tipificadas no artigo 13, da lei 893, chamado de
Procedimento Disciplinar”, cominando em sanções de advertência, repreensão, permanência
disciplinar e detenção, de acordo com o artigo 14, do Regulamento Disciplinar.
E outro, mais complexo, chamado de “Processo Regular”, que tem como objetivo a
demissão ou expulsão do militar, de acordo com os artigos 23 e 24 do Regulamento
Disciplinar.
Os processos regulares são de três espécies, o Processo Administrativo Disciplinar,
instaurado para apurar a conduta grave da praça com menos de dez anos de serviço.
O Conselho de Disciplina, instaurado para apurar a conduta grave da praça com mais
de dez anos de serviço.
E o Conselho de Justificação para os Oficiais que cometerem transgressão disciplinar
de natureza grave.
A natureza da transgressão disciplinar pode ser leve, média ou grave, de acordo com a
tipificação que o Legislador apontou em cada transgressão tipificada nos 132 incisos do artigo
13, da lei 893.
Para se instaurar o processo regular o basta que o militar tenha infringido uma
transgressão de natureza grave, mas tem que haver a combinação de um dos incisos dos
138
Este dispositivo está relacionado à observância, por parte dos policiais militares, de valores cultuados,
existindo para tanto, obrigações éticas que, no exercício das atividades de polícia ostensiva e preventiva,
devem ser observadas para que se atinja o ideal buscado pelo Estado: o bem comum (COSTA, Alexandre
Henriques da; NEVES, Cícero Robson Coimbra; COSTA, Marcos José da; ROCHA, Abelardo Júlio da;
SILVA, Marcelino Fernandes da; MELLO, Rogério Luis Marques de. Regulamento Disciplinar da Polícia
Militar do Estado de São Paulo. São Paulo: Suprema, 2007. p. 8.).
85
artigos ou do Regulamento Disciplinar, ou seja, tem que haver também violação dos
valores ou dos deveres policiais militares.
O que diferencia a instauração de um procedimento ou de um processo regular é a
sanção a ser imposta ao militar. O procedimento militar possui rito mais simples, logo, presta-
se para aplicação das sanções mais simples previstas no Regulamento, já os processos
regulares possuem rito mais complexo, prestando-se a aplicar, se culpado for o militar,
sanções mais severas, como a demissão e a expulsão.
A normatização da aplicação dos processos administrativos obedecem ao que dispõe o
artigo 88 deste Codex: O Comandante Geral baixará instruções complementares,
necessárias à interpretação, orientação e fiel aplicação do disposto neste regulamento”.
Desta forma, o Comandante Geral da Polícia Militar do Estado de o Paulo, através
de Portaria, criou as I-16 PM, ou seja, Instruções 16 (dezesseis) da Polícia Militar, para
orientar e normatizar o Regulamento Disciplinar.
Alexandre Henriques da Costa assevera que o termo procedimento disciplinar,
previsto no Capítulo 7, da lei nº 893, Regulamento Disciplinar da Pocia Militar do Estado de
São Paulo, é inapropriado, pois contraria o significado da palavra “procedimento”, quando na
verdade quis-se dizer “processo”:
In limine, inapropriado o emprego da expressão procedimento disciplinar.
Considerando que o direito funda-se na precisão terminológica e que, a rigor,
procedimento expõe significância limitada, não abarcando a relação processual
contraditória, nada mais inoportuno que a acolhida do termo para a denominação
deste verdadeiro processo. Ademais, independentemente da diferenciação conceitual
doutrinária entre processo e procedimento, vê-se que em exame contrariou tendência
atual de generalização dos feitos administrativos sob a denominação de processos e
não de procedimentos.
139
Superado o problema da terminologia, esclarecemos que nosso objeto de estudo está
centralizado no procedimento disciplinar quanto à defesa, porém, os processos regulares
possuem um rito de defesa muito parecido com o que veremos a seguir.
139
COSTA, Alexandre Henriques da; NEVES, Cícero Robson Coimbra; COSTA, Marcos José da; ROCHA,
Abelardo Júlio da; SILVA, Marcelino Fernandes da; MELLO, Rogério Luis Marques de. Regulamento
Disciplinar da Polícia Militar do Estado de São Paulo. São Paulo: Suprema, 2007. p. 195.
86
6.5.3 A defesa no Direito Administrativo Militar
A defesa no Direito Administrativo Militar, de acordo com o Regulamento Disciplinar
da Polícia Militar do Estado de São Paulo e sua normatização, é composto de manifestação
preliminar, defesa prévia, defesa final e recursos (ordinários e extraordinários).
A manifestação preliminar é o momento em que o militar, de forma antecipada ao
procedimento instaurado, informa à autoridade disciplinar os fatos que levaram-no a cometer
a conduta da qual é acusado, tendo o Policial Militar o prazo de três dias para se manifestar.
Não pode se falar neste momento, que houve transgressão disciplinar, pois, existe a
possibilidade de uma inexistência de transgressão no caso de o ter ocorrido a conduta ou,
ainda, se não foi o manifestante quem a cometeu, ou, também, pode ser justificada a conduta
se comprovado a existência de uma das justificativas do artigo 34, do Regulamento
Disciplinar.
140
Se a manifestação preliminar não afastar a conduta transgressional do militar, a ele
será imputado, de maneira formal, uma transgressão disciplinar, a qual deverá se enquadrar
em uma das cento e trinta e duas condutas, previstas no artigo 13, do Regulamento
Disciplinar.
Neste caso, a autoridade disciplinar competente
141
assinará um Termo Acusatório,
descrevendo a conduta, o dia, a hora e o local do fato, e relacionando a uma transgressão
disciplinar, prevista no Regulamento Disciplinar, artigo 13.
Ao tomar conhecimento do Termo Acusatório, o Policial Militar tem o prazo de cinco
dias para elaborar sua defesa prévia, onde deverá relacionar as testemunhas que deseja que
140
Artigo 34, do Regulamento Disciplinar da Polícia Militar do Estado de São Paulo: Não haverá aplicação de
sanção disciplinar quando for reconhecida qualquer das seguintes causas de justificação: Inciso I: motivo de
força maior ou caso fortuito, plenamente comprovado; Inciso II: benefício do serviço, da preservação da
ordem pública ou do interesse público; Inciso III: legítima defesa própria ou de outrem; Inciso IV:
obediência a ordem superior, desde que a ordem recebida não seja manifestamente ilegal; e Inciso V: uso de
força para compelir o subordinado a cumprir rigorosamente o seu dever, no caso de perigo, necessidade
urgente, calamidade pública ou manutenção da ordem e da disciplina. Lei nº 893, de 9 de março de 2001.
141
Artigo 31, do Regulamento Disciplinar da Polícia Militar do Estado de São Paulo: Da Competência: A
competência disciplinar é inerente ao cargo, função ou posto, sendo competente para aplicar a sanção
disciplinar: Inciso I - O Governador do Estado; Inciso II - O Secretário de Segurança Pública e o Cmt
Geral a todos os militares estaduais, exceto ao Chefe da Casa Militar; Inciso III - O SubCmt PM a todos os
militares da ativa ou inativo; e Inciso IV - Os Oficiais da ativa do Posto de Coronel a Capitão, lei nº 893, de
9 de março de 2001.
87
sejam ouvidas a seu favor, fazer o pedido de juntada de documentos que comprovem sua
inocência e, se for o caso, solicitar diligências ao presidente do feito.
As a Administração Pública, através do presidente do procedimento disciplinar,
cumprir o solicitado pelo acusado, será dado novas vistas para que, também, no prazo de
cinco dias, seja elaborada a defesa final, onde o acusado deverá, com base nas provas
carreadas, alegar sua inocência de fato e de direito.
Mantida a acusação de que o Policial Militar tenha cometido uma transgressão
disciplinar, o presidente do feito elaborará uma planilha de enquadramento, onde deve
constar o dia, a hora e o local do fato, bem como justificando a decisão com base no
afastamento de toda defesa elaborada pelo acusado.
Após a decisão da autoridade disciplinar passar pela análise de pelo menos mais uma
autoridade militar, imediatamente superior da qual aplicou a sanção, esta será publicada em
Boletim Interno da Corporação, em se tratando de Sargentos ou Oficiais, o Boletim deverá ser
reservado, onde o subordinado o toma conhecimento de punição de superior.
As a publicação, deverá ser dada ciência ao acusado, que no prazo de cinco dias
poderá interpor recurso à Administração Pública Militar, em forma de pedido de
“Reconsideração de Ato”, conforme o artigo 56, do Regulamento Disciplinar, mediante Parte
ou Ofício, documento próprio da Administração Pública Militar à autoridade que praticou o
ato ou que lhe aprovou, possuindo efeito suspensivo.
As recebido o recurso, a autoridade imediatamente superior àquela quem aplicou a
sanção terá o prazo de 10 (dez) dias, a contar da data do recebimento do mesmo, para sanear e
dar solução ao recurso, dando conhecimento ao interessado, mediante despacho
fundamentado, que deverá ser publicado, conforme § 3º, do artigo 57, do Regulamento
Disciplinar.
O acusado, após tomar conhecimento formal do indeferimento de seu recurso de
reconsideração de ato, no prazo de cinco dias, poderá interpor “Recurso Hierárquico”, por
uma única vez, de acordo com o artigo 58, do mesmo Regulamento, também, com efeito
suspensivo, à autoridade disciplinar imediatamente superior àquela que não reconsiderou o
ato.
88
Solucionado o recurso hierárquico e indeferido seu pedido, o resta mais recurso
próprio ao acusado, remetendo-o ao artigo 30, do Regulamento Disciplinar, que prevê a
“Representação”, aceito como um tipo de recurso administrativo impróprio na Administração
Militar: Artigo 30. Representação é toda comunicação que se referir a ato praticado ou
aprovado por superior hierárquico ou funcional, que se repute irregular, ofensivo, injusto ou
ilegal.
142
Os recursos até aqui apontados não afastam a possibilidade do acusado, a qualquer
momento, recorrer ao Poder Judiciário, de acordo com a Carta Magna, artigo 5º, inciso XXV.
6.6 O Crime de Deserção
A deserção é um crime propriamente militar, ou seja, previsto no Código Penal
Militar, no artigo 187, com casos similares nos artigos 188, 190, 191, 192, 193 e 194, tudo do
Capítulo II, do tulo III da lei militar, que trata Dos Crimes Contra o Serviço Militar e o
Dever Militar”.
Lembrando que os crimes propriamente militares são aqueles só previstos na Lei
castrense, ainda que o sujeito ativo possa ser um civil, contudo, como já foi dito, não cabe à
Justiça Militar Estadual julgar o civil que cometa fato típico do Código Penal Militar.
Este crime se constitui em o militar ausentar-se, sem licença, da Unidade em que
serve, ou lugar que deva permanecer, por mais de oito dias. A pena prevista para este delito é
a detenção de seis meses a dois anos, e se se tratar de Oficial, a pena é agravada.
143
Segundo José da Silva Loureiro Neto
144
, deserção vem de desertio, que por sua vez
deriva deserere, que significa abandonar, desamparar. o podendo ser confundido com o
emansor, que é o ausente, ou seja, aquele que excede o tempo de ausência sem consumar o
prazo correspondente ao delito de deserção.
O ausente é aquele que não faltou ao serviço no qual estava escalado, mas deixou
completar vinte e quatro horas do dia subsequente ao qual estava escalado.
142
Capítulo VII, Seção II, Artigo 30. Da Representão. Regulamento Disciplinar da Polícia Militar do Estado de
São Paulo: Da Representação. Lei nº 893, de 9 de março de 2001.
143
Código Penal Militar, Decreto Lei 1.001, de 21 de outubro de 1969. Artigo 187.
144
No caso, o militar ausentar-se (de ausentar-se, afastar-se, desaparecer, retirar-se) sem licença, ou seja,
indevidamente (trata-se de elemento normativo do tipo), da Unidade em que serve, ou do lugar que deve
permanecer, por mais de oito dias (LOUREIRO NETO, José da Silva. Direito Penal Militar. 2. ed. São
Paulo: Atlas, 1999. p. 152.).
89
Assim, dizemos que o militar está ausente entre a zero hora do primeiro dia
subsequente à falta ao serviço até as vinte e quatro horas do oitavo dia, contados
ininterruptamente.
Célio Lobão
145
conclui que o momento consumativo do crime de deserção é a zero
hora e um minuto do nono dia de ausência sem autorização.
Não podemos confundir a conduta do artigo 187, que é ausentar-se”, com as
condutas do artigo 188, do Código Penal Militar, que são não se apresentar inciso Ie
deixar de se apresentar”.
O artigo 188, da Lei Castrense, trás os casos assimilados ao da deserção, sendo
aplicadas as mesmas penas previstas no artigo 187.
A objetividade jurídica neste crime, segundo Cícero Robson Coimbra Neves
146
, está
em tutelar o serviço militar afetado pelo fato de o agente não estar presente. Para o autor,
protege-se, ademais, o dever militar, o comprometimento, a vinculação do homem aos valores
éticos e funcionais da caserna e de sua profissão.
O prazo de oito dias estabelecido na Lei Penal Militar, segundo José da Silva Loureiro
Neto
147
, varia de país para país; na França, por exemplo, é de seis dias para os que têm mais
de três meses de serviço e de um mês para os recrutas; na Itália o prazo é de cinco dias; na
Alemanha é de três dias; na Bolívia o prazo é de três dias em tempo de guerra e de seis dias
em tempo de paz e de dez dias quando finda uma licença determinada; no Chile o prazo é de
oito, quatro ou três dias, conforme o caso.
Trata-se de um crime de mera conduta, cujo sujeito ativo é o militar da ativa,
classificado como crime instantâneo de efeito permanente e que se consuma à zero hora do
nono dia de ausência.
145
LOBÃO, Célio. Direito Processual Penal Militar. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2009. p. 379.
146
NEVES, Cícero Robson Coimbra; STREIFINGER, Marcello. Apontamentos de Direito Penal Militar. Parte
Especial. São Paulo: Saraiva, 2007. v. 2, p. 253.
147
LOUREIRO NETO, José da Silva. Direito Penal Militar. São Paulo: Atlas, 1999. p. 153.
90
6.6.1 O direito de defesa no crime de deserção
Como já tratamos, o crime de deserção ocorre quando o militar não está presente, ou
seja, pela ausência por mais de oito dias ininterruptos, sem autorização, trata-se de crime
propriamente militar, tipificado no Código Penal Militar.
A Constituição Federal prevê as condições em que o agente poderá ser preso, em
regra, quando transitado e julgado ação penal, devidamente fundamentado pelo Juiz de
Direito, e nos casos de flagrante delito ou nos crimes propriamente militar (sem ordem
fundamentada do juiz), artigo, inciso XVI.
Tratando-se a deserção de um crime propriamente militar, enquadra-se na última
hipótese, neste caso, ao se capturar um desertor não se lavra o Auto de Prisão em Flagrante
Delito, mas sim o Termo de Captura de Desertor, especificando se o desertor foi capturado ou
apresentou-se espontaneamente.
A deserção ou o crime de deserção é um delito ao qual não se aplica o instituto do
sursis, que é a suspensão condicional da pena, conforme preo artigo 88, do Código Penal
Militar.
Considerado um crime grave, que atenta contra o serviço militar e o dever militar, o
Legislador previu uma pena de seis meses a dois anos de detenção e, segundo Ronaldo João
Roth
148
, embora sendo severa a pena privativa de liberdade, quis o Legislador que a pena
aplicada ao caso concreto fosse cumprida efetivamente, dado o fato de esse tipo penal atentar
gravemente contra a regularidade administrativa e o dever militar.
6.6.1.1 A prescrição do crime de deserção
A prescrição do crime de deserção tem previsão própria no artigo 132, do Código
Penal Militar, que prevê a extinção da punibilidade de acordo com o artigo 123, inciso IV,
considerando a idade do desertor.
148
Curioso notar que o sursis, incorporado pela lei penal militar em 1969, portanto, 45 anos depois da legislação
penal comum, levou, ainda, o Legislador ao cuidado de excluir aquele benefício do delito de deserção (artigo
187, do Código Penal Militar), atos de libidinagem (artigo 235, do Código Penal Militar) etc., pois reputou
essas categorias de delito como de maior lesividade à vida em caserna (ROTH, Ronaldo João. Temas de
Direito Militar. São Paulo: Suprema Cultura, 2004. p. 57.).
91
No caso das praças, cuja graduação atinge os Subtenentes, Sargentos, Cabos e
Soldados a idade de 45 (quarenta e cinco) anos e para os Oficiais, cuja patente são Coronel,
Tenente Coronel, Major, Capitão e Tenente, a idade prevista para prescrição é de 60
(sessenta) anos, ressaltando que estas graduações e patentes são adotadas pela Polícia Militar
do Estado de São Paulo.
Aqui verifica-se que o Legislador optou pelo duplo mputo para o lculo da
extinção da punibilidade na modalidade prescrição, seja a prescrita no tipo penal (caput do
artigo 125, do Código Penal Militar), seja a sentenciada (§ 1º, do artigo 125, do Código Penal
Militar), adotando, além da regra do artigo 125, do Código Penal Militar, a idade do desertor
como parâmetro.
O duplo conceito de prescrição causa divergência na opinião dos operadores do
Direito Militar, sendo alegado por alguns que deveria aplicar a regra do artigo 125, do Código
Penal Militar somente, motivo pelo qual, em 13 de junho de 2005, o Tribunal de Justa do
Estado de São Paulo editou a Súmula 001/2005, que dirimiu qualquer vida quanto à
prescrição do crime de deserção, confirmando a aplicabilidade do artigo 132, da Lei
Castrense, assim sumulando:
Em plenário do Tribunal de Justiça Militar do Estado de São Paulo, sem voto o
Senhor Juiz Presidente, DR. PAULO ANTONIO PRAZAK, e vencido o Senhor Juiz
Lourival Costa Ramos, por maioria (3x1), reconheceu-se a incidência do artigo 132
do CPM, não se operando a prescrição, enquanto não atingida a idade limite ali
prevista, em relação a desertores.
O prazo para início da contagem prescricional ocorre quando da captura do deserto,
conforme Jorge Cesar de Assis
149
:
[...] todavia, o militar, mesmo passando à condição de desertor sobre o qual pairava
a regra do artigo 132 do CPM, sendo ele reincluído e tendo passado à condição de
réu do processo por crime de deserção (o que pressupõe o recebimento da
denúncia), a partir da data em que foi capturado e reincluído é que começará a correr
o prazo da prescrição, do artigo 125, inciso VI, do CPM, na exata dião do artigo
125, § 2º, letra “c”, do mesmo Código, que tem seu correspondente no artigo 111,
inciso III, do Código Penal comum.
149
ASSIS, Jorge César de. Comentários ao Código Penal Militar. Comentários, Doutrina, Jurisprudência dos
Tribunais Militares e Tribunais Superiores. Curitiba: Juruá, 2008. p. 274.
92
6.7 A Menagem e Outros Tipos de Prisões
Em um trabalho com o foco na defesa, alguns poderão questionar o porquê tratar da
menagem e outros tipos de pries neste momento?
A resposta é simples, ao falar de defesa, esta também ocorre no local de cumprimento
da pena e, principalmente, na sua progressão, e se não conhecermos as formas de penas e
locais de cumprimento destas, como exercer a efetiva defesa?
A menagem é um instituto que diz respeito ao local de cumprimento da pena e é
prevista no Código de Processo Penal Militar, inicialmente no artigo 263, da seguinte forma:
Artigo 263. A menagem poderá ser concedida pelo juiz, nos crimes cujo ximo da
pena privativa de liberdade não exceda a quatro anos, tendo-se, porém, em atenção
a natureza do crime e os antecedentes do acusado.
150
Contudo, a definição de “menagem não está no Código de Processo Penal Militar,
mas na doutrina processual penal militar, buscando-se na história seu surgimento, como
veremos.
Célio Lobão
151
explica que o instituto da menagem remonta o século XIV, onde D.
Diniz, em 1356, e D. Pedro I, em 1360, legislaram sobre o seguro, a homenagem e a fiança,
sendo que a “homenagem” era um privilégio particularmente concedido à nobreza:
Foi aprovado nas rtes dElvas no tempo de D. Pedro I e daí passou para as
Ordenações Afonsinas e delas para as posteriores [...]. As homenagens eram
concedidas pelo Desembargo do Paço e consistiam na licença deferida ao Réu, em
sua qualidade pessoal, para estar solto em juízo debaixo de sua promessa [...]. Por
homenagem era dada a própria casa ou o Castelo da cidade [...]. Não tinha lugar nos
crimes puníveis com pena de morte natural ou civil, no crime de desafio para duelo
[...]. A Ord. L. V., título 120 e posteriores Alvas regularam este modo de
livramento, que hoje é concedido, em casos militares, aos oficiais das forças
armadas, sob a denominação de menagem.
Assim, a previsão que temos hoje no artigo 263, Capítulo V, do Código de Processo
Penal Militar, da “menagem” é uma evolução histórica do instituto da “homenagem”,
concedida aos nobres na época da monarquia.
150
Seção III, Capítulo V, Artigo 263. Da Menagem. Código de Processo Penal Militar. Decreto Lei nº 1.002, de
21 de outubro de 1969.
151
LOBÃO, Célio. Direito Processual Penal Militar. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2009. p. 337.
93
A menagem, como esta prevista hoje, entra no hol das espécies de prisões provisórias
fora do cárcere, pois restringe o direito de ir e vir do acusado sem que, contudo, mantenha-o
na prisão.
Por outro lado, o instituto, também, guarda relação com a liberdade proviria ou a
fiança, pois o acusado não é recolhido ao cárcere, o que denota duplo sentido no que tange à
sua natureza jurídica.
Neste sentido, Ronaldo João Roth
152
afirma que o instituto da menagem tem dupla
face, ora como forma de prisão proviria (menagem-prisão), ora como forma de liberdade
proviria (denominando-a menagem-liberdade), dependendo a forma como o juiz a aplique.
A menagem, se for concedida em cidade ou residência, é uma forma de liberdade
provisória, a qual prefiro denominar menagem-liberdade, ao passo que a menagem
concedida em quartel, navio ou estabelecimento delimitado é uma forma de prisão
provisória, sem os rigores do cárcere, a que prefiro denominar menagem-prisão. A
menagem-liberdade é uma sub-rogação da prisão provisória, portanto, é liberdade e
é medida contracautelar. A menagem-prisão, mutatis-mutandis é medida substitutiva
da prisão-provisória por ser medida mais branda que aquela, logo, é, ao meu ver,
verdadeira prisão especial, ou seja, medida de caráter cautelar. Pode ser aplicada
assim àquele que se encontra em liberdade ou que esteja preso, provisoriamente. No
primeiro caso equivalerá a prisão temporária e no segundo caso equivalerá a
liberdade proviria.
Para o autor, é importante identificar a natureza do instituto, pois a menagem-prisão
terá reflexos no mputo da pena, para ele o que irá determinar a natureza da menagem é a
forma de sua concessão pelo Juiz e o local de seu cumprimento.
O local de cumprimento da menagem, de acordo com o artigo 264, do Código de
Processo Penal Militar, obedecidos os requisitos do artigo 240, do mesmo diploma, podem
ser:
A menagem a militar poderá efetuar-se no lugar em que residia quando ocorreu o
crime ou seja sede do juízo que o estiver apurando, ou, atendido o seu posto ou
graduação, em quartel, navio, acampamento, ou em estabelecimento ou sede de
órgão militar. A menagem a civil será no lugar da sede do juízo, ou em lugar
sujeito à administração militar, se assim o entender necessário a autoridade que a
conceder.
153
José da Silva Loureiro
154
Neto afirma que a menagem constitui uma espécie de prisão
proviria fora do cárcere e que o Código da Justiça Militar a previa em seu artigo 157,
152
ROTH, Ronaldo João. Temas de Direito Militar. São Paulo: Suprema Cultura, 2004. p. 171.
153
Artigo 254, do digo de Processo Penal Militar. Lugar da menagem. Decreto Lei 1.002, de 21 de outubro
de 1969.
154
LOUREIRO NETO, Jo da Silva. Processo Penal Militar. São Paulo: Atlas, 2010. p. 85.
94
sendo que sua origem remonta a Grécia e Roma, referente à homenagem, concedida a
determinada categoria de pessoas que se beneficiavam da liberdade em consequência das
situações expostas a seguir.
O autor salienta que sua concessão está vinculada a três preceitos previstos no artigo
263, do Código de Processo Penal Militar, sendo eles:
a) que a pena privativa de liberdade cominada ao crime não exceda quatro anos;
b) tendo em atenção a natureza do crime; e
c) os bons antecedentes do acusado.
Para o autor, a segunda condição “tendo em atenção a natureza do crime”, constitui
conceito vago e impreciso, sendo que a legislação anterior trabalhou melhor o tema ao exigir
que o auditor tivesse em consideração a gravidade e as circunstâncias do crime (artigo 158, §
).
A solicitação da menagem está prevista inicialmente no artigo 18, § único, do Código
de Processo Penal Militar, onde o encarregado do inquérito, durante o prazo de sua instrução
(quarenta dias prorrogáveis por mais vinte, artigo 20) solicitará, se entender necessário, a
decretação da prisão preventiva ou de menagem do indiciado.
Célio Lobão
155
afirma que a menagem judicial pode ser concedida, também, de ocio
pelo Juiz de Direito do Juízo Militar, ou mediante requerimento do Ministério Público, ou,
ainda, do acusado ou indiciado, desde que obedecidas as regras do artigo 263, do Código de
Processo Penal Militar, e que não se façam presentes um dos requisitos do artigo 255, do
mesmo diploma legal (casos de decretação da prisão preventiva).
O artigo 268, do Código de Processo Penal Militar, trata da contagem do tempo de
menagem no mputo da pena do réu, afirmando que a menagem concedida em residência ou
cidade não será levada em conta no cumprimento da pena.
Desta forma, o Legislador diferenciou a menagem cumprida em residência ou cidade,
daquela cumprida em quartel, navio, acampamento, ou em estabelecimento ou sede de órgão
militar.
Para o Legislador, de forma tácita, há detração nos casos de menagem concedida
em quartel, navio, acampamento, ou em estabelecimento ou sede de órgão militar.
155
LOBÃO, Célio. Direito Processual Penal Militar. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2009. p.
339.
95
Fica clara, portanto, a distinção de dois tipos de menagem, como afirmou Ronaldo
João Roth, a menagem-liberdade e a menagem-prisão, em que a distinção se faz pelo local
destinado ao seu cumprimento.
A concessão da menagem para cumprimento na residência ou cidade é, portanto,
considerada uma liberdade provisória, ou seja, um benefício para o acusado.
Enquanto que, a menagem concedida em quartel, navio, acampamento, ou em
estabelecimento ou sede de órgão militar é considerada uma prisão provisória ao acusado,
devendo-se aplicar o instituto da detração, conforme determina o artigo 589, do mesmo codex.
6.7.1 O presídio da Polícia Militar Romão Gomes e a Lei de Execuções Penais
O artigo 61, do digo Penal Militar, determina que a pena privativa de liberdade
superior a dois anos, aplicada a militar, deverá ser cumprida em penitenciária militar e, na
falta dessa, em estabelecimento prisional civil, ficando o recluso ou detento sujeito ao regime
conforme legislação penal comum, de cujos benefícios e concessões, também, poderá gozar.
Deste artigo extrai-se que o militar deverá cumprir sua pena em presídio separado,
preferencialmente, contudo, não se exclui a possibilidade de cumpri-la em presídio comum.
Destarte, neste artigo, in fine, a aplicação da legislação penal comum no tocante à
execução, ou seja, o Legislador não elaborou nova legislação para regular a execução penal
do preso militar, mas previu que será adotada a mesma legislação do civil, inclusive os
benefícios e concessões nela previstos.
Neste caso, a legislação penal comum de que trata o artigo 61, do Código Penal
Militar, é a Lei de Execução Penal 7.210, de 11 de julho de 1984, que revogou a lei
3.274, de 2 de outubro de 1957.
A Lei de Execução Penal vigente determina, em seu artigo 2º, parágrafo único, que,
aplicar-se-á igualmente ao preso provirio e ao condenado pela Justiça Eleitoral ou Militar,
quando recolhido a estabelecimento sujeito à jurisdição ordinária.
Portanto, fica o recluso militar sujeito à Lei de Execuções Penais (comum), não
legislação especial para disciplinar o recolhimento do militar quando condenado à pena
96
privativa de liberdade, provisória ou definitiva, vinculando ainda o Juiz de Direito do Juízo
Militar das Execuções Penais sua aplicabilidade.
No Estado de São Paulo, Policiais Militares e Corpos de Bombeiros Militares, quando
condenados à pena privativa de liberdade, são encaminhados ao Presídio Militar denominado
Presídio da Pocia Militar “Romão Gomes.
O presídio militar foi instalado provisoriamente em 21 de abril de 1949, por ato do
Comandante Geral da Força Pública do Estado de São Paulo.
Em 15 de dezembro de 1975, por força do Decreto 7.290, passou a ser denominado
Presídio da Pocia Militar Romão Gomes”, em homenagem ao Coronel Dr. Romão Gomes,
Ilustre Militar e participante do movimento Constitucionalista de 1932.
156
Este presídio militar, que serve a todo o Estado, está situado na Avenida Tenente Júlio
Prado Neves, 451 - no bairro do Tremembé, próximo a Serra da Cantareira, na Invernada do
Barro Branco.
157
O Presídio da Pocia Militar Romão Gomes é um órgão de apoio de pessoal,
subordinando-se administrativamente à Pocia Militar, através da Corregedoria da Pocia
Militar do Estado de o Paulo e para fins de execução penal, ao MM. Juiz de Direito Auditor
Corregedor Permanente do Tribunal de Justiça Militar do Estado de São Paulo.
158
O presídio tem capacidade para 350 internos, possuindo 189 presos atualmente, e há
quase dez anos não registra fugas e nunca houve rebeliões.
Trata-se do único presídio no Brasil certificado pelo ISO 9001 de gestão de qualidade,
em razão da forma como é administrado, pois ao chegar ao presídio, o detento é submetido a
exames para determinar seu perfil.
156
Relatório de Gestão do Sistema de Gestão da Qualidade do Presídio da Polícia Militar “Romão Gomes” da
Polícia Militar do Estado de São Paulo, 2004.
157
A Invernada do Barro Branco é uma área intitulada patrimônio ambiental através do constante do artigo 4º, do
Decreto 30.443, de 20 de setembro de 1989, chamada de invernada da Polícia Militar do Estado de São
Paulo, é uma área de preservação ambiental composta de 50 (cinquenta) alqueires, onde além do Presídio
Militar Romão Gomes existem as seguintes Unidades da Polícia Militar do Estado de o Paulo: APMBB
(Academia de Polícia Militar do Barro Branco); HPM (Hospital da Polícia Militar); Canil da Polícia Militar;
COE (Comando de Operações Especiais); CSM/MTel (Centro de Suprimento e Manutenção de Material de
Telecomunicação); CSM/MInt (Centro de Suprimento e Manutenção de Material de Intendência); e
CSM/MObras (Centro de Suprimento e Manutenção de Materiais de Obras).
158
Relatório de Gestão do Sistema de Gestão da Qualidade do Presídio da Polícia Militar “Roo Gomes” da
Polícia Militar do Estado de São Paulo, 2004.
97
Segundo as estatísticas do próprio presídio, 50% dos militares internos é composto por
criminosos ocasionais; 35% tem problemas de convívio social e 15% tem perfil de
psicopáticos, transtornos de personalidade e outras patologias.
Entre os delitos mais praticados pelos presos militares estão: o roubo, o homicídio, a
extoro, o estupro e a extorsão mediante sequestro.
O segredo da qualidade do presídio está em não se misturar grupos diferentes,
evitando submissões entre presos, discussões e grupos dominantes, sendo que a triagem é
realizada por um psicólogo logo na chegada deste ao presídio.
Outro fator determinante para a organização do presídio é a disciplina de seus
detentos, diferente do que se imagina, por se tratar de um presídio militar para abrigar
Policiais e Bombeiros Militares não corporativismo, no Presídio Militar Romão Gomes o
Soldado e o Coronel presos são tratados da mesma forma, não há mordomias ou tratamentos
privilegiados naquele local.
Todos têm que obedecer fielmente ao regulamento interno, que consiste em normas de
boa convivência, como acordar cedo, entrar em formação militar quatro vezes ao dia, cantar
hino, manter sua cela e demais locais limpos, entre outras.
Outro fator importante que diferencia o Presídio Militar Roo Gomes dos demais
presídios é que um percentual muito grande dos internos trabalha e estuda durante o
cumprimento de sua pena.
Estima-se que 90% dos reclusos realizam algum tipo de atividade durante o
cumprimento de sua pena, são trabalhos oferecidos no interior do presídio, como tapeçaria,
mecânica, apicultura, suinocultura, entre outros, possibilitando a remição prevista no artigo
126, da Lei de Execuções Penais.
Em contra partida, os presos militares ficam recolhidos em celas mais espaçosas, pois
o superlotação, recebem três boas refeições diárias e possuem espaço para cultos
religiosos.
Tudo isso faz com que este presídio seja o único no Brasil certificado como ISO 9001,
diferenciando-o dos demais e servindo de exemplo a ser seguido.
98
6.8 O Inquérito Policial Militar e sua Natureza
O Inquérito Policial Militar possui acento no Código de Processo Penal Militar, no
tulo III, Capítulo único, sendo que o artigo 9º traz sua finalidade, que é a apuração sumária
do fato, que, nos termos legais, configure crime militar, e de sua autoria.
O artigo acrescenta, ainda, que tem o caráter de instrução provisória, cuja finalidade
precípua é a de ministrar elementos necessários à propositura da ação penal militar.
Caracteriza-se por tratar-se de um procedimento escrito, que tem como objetivo reunir
elementos ou provas que esclareçam crimes militares, suas autorias e materialidades.
O Inquérito Policial Militar é dispensável para a propositura da ação penal militar
desde que o titular da ação penal, o representante do Ministério Público, possua elementos
suficientes para o oferecimento da denúncia, de acordo com o artigo 28, nas suas alíneas a, b
ou c:
a. quando o fato e sua autoria já estiverem esclarecidos por documentos ou outras
provas materiais;
b. nos crimes contra a honra quando decorrem de escrito ou publicação, cujo
autor esteja identificado; e
c. nos crimes previstos nos artigos 341 e 349 do Código Penal Militar (desacato e
desobediência a decisão judicial).
159
É importante ressaltar que, no âmbito estadual, não existe Ministério Público Militar,
óro especializado e constituído somente no âmbito da Justiça Militar Federal.
Caracteriza-se, também, por ser inquisitivo e sigiloso, porém o artigo 16, do Código de
Processo Penal Militar, permite que do inquérito tome conhecimento o advogado do
indiciado, sendo ratificado pela mula Vinculante nº 14, que determina:
É direito do defensor, no interesse do representado, ter acesso amplo aos elementos
de prova que, já documentados em procedimento investigatório realizado por órgão
com competência de polícia judiciária, digam respeito ao exercício do direito de
defesa.
160
O Inquérito Policial Militar assemelha-se muito ao Inquérito Policial comum, por
possuir os mesmos objetivos, apurar autoria e materialidade de um delito, o que os
diferenciam é o tipo de delito a ser apurado, o Inquérito Policial presta-se a apurar os crimes
comuns, enquanto que o Inquérito Policial Militar presta-se a apurar os crimes militares.
159
Código de Processo Penal Militar, Decreto Lei nº 1.002, de 21 de outubro de 1969. Artigo 28.
160
Súmula Vinculante nº 14.
99
Contudo, a natureza dos dois inquéritos é a mesma, sendo ela a natureza
administrativa, que tem como escopo subsidiar o oferecimento e denúncia, configurando-se
numa fase pré-processual e inquisitiva.
Fernando da Costa Tourinho Filho
161
explica que a natureza do Inquérito Policial é
administrativa, sendo seus caracteres: ser escrito, sigiloso e inquisitivo, já que nele não há o
contraditório.
É verdade que o inciso LV do artigo 5º da Constituição Federal dispõe que “aos
litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são
assegurados o contraditório e ampla defesa, com os recursos a ela inerentes”. Nem
por isso se pode dizer ser o inquérito contraditório. Primeiro, porque no inquérito
não acusado; segundo porque não é processo. A expressão “processo
administrativo tem outro sentido, mesmo porque no inquérito não há litigantes, e a
Magna Carta fala dos “litigantes em processo judicial ou administrativo [...]”. O
inquérito é medida preparatória para o exercício da ação penal e, por sinal,
dispensável, dês que o titular da ação penal disponha de elementos que o autorizem
a ingressar em juízo.
Fernando Capez
162
conceitua o Inquérito Policial como um conjunto de dilincias
realizadas pela pocia judiciária para a apuração de uma infração penal e de sua autoria, a fim
de que o titular da ação penal possa ingressar em juízo.
Trata-se de procedimento persecutório de caráter administrativo instaurado pela
autoridade policial. Tem como destinatários imediatos o Ministério Público, titular
exclusivo da ação penal pública (Constituição Federal, artigo 129, inciso I), e o
ofendido, titular da ação penal privada (Código de Processo Penal, artigo 30); como
destinatário mediato tem o juiz, que se utilizados elementos de informação nele
constantes, para o recebimento da peça inicial e para a formação do seu
convencimento quanto à necessidade de decretação de medidas cautelares.
Ressaltando que na Justiça Militar, a ação penal é pública, somente, de acordo com o
artigo 121, do Código Penal Militar, assim sendo, o Inquérito Policial Militar sempre se
prestará a subsidiar o Ministério Público e não ao ofendido, titular da ação penal privada.
No âmbito do Direito Militar, José da Silva Loureiro Neto, conceitua o Inquérito
Policial Militar como sendo, segundo o artigo 9º, do Código de Processo Penal Militar, o
conjunto de diligências realizadas pela Pocia Judiciária Militar para apuração de infração
penal militar e de sua autoria.
Para o autor, somente é feito quando o fato praticado por civil ou militar estiver
subsumido, isto é, constando no Código Penal Militar. Infere-se, pois, que o Inquérito Policial
161
TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Manual de Processo Penal. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 69.
162
CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 67.
100
Militar destina-se à apuração de fatos que deverão ser apreciados somente pela Justiça
Castrense.
163
Realmente o sistema processual adotado pelo Código, como se vê pela própria
Exposição de Motivos no item 7, preconiza sua necessidade como instrução
provisória antecedente à propositura da ação penal. Isto se justifica, pois é no
inquérito que se obtêm elementos, como exames periciais que seriam difíceis de se
obter na instrução judiciária. Veja que essas provas técnicas como as periciais em
geral, os exames de: corpo de delito, arma de fogo, balística, local de crime, e as
avaliações, etc., mormente não renováveis, porém vigoram no processo dado o seu
caráter instrutório (parágrafo único do artigo 9º do Código de Processo Penal
Militar), tendo em vista que sua realização atende ao princípio da oportunidade e
necessidade por parte do encarregado pelas investigações, todavia, nada obsta serem
refeitos na fase judicial caso exista vício comprovado ou serem complementados a
critério do juiz. Sua finalidade, como consta, é fornecer ao órgão da acusação
elementos de convicção para a propositura da ação penal, através da elaboração da
denúncia.
164
Desta forma, conclui-se que, o Inquérito Policial Militar é um instrumento
administrativo, escrito, inquisitivo, sigiloso, instruído em fase pré-processual, por autoridade
judiciária militar, quando da suspeita de ocorrência de crime militar, para apurar autoria e
materialidade com o propósito de subsidiar o titular da ação penal blica a oferecer
denúncia, bem como, formar convicção do Juiz Militar, atendendo ao Princípio da
Oportunidade e da Necessidade.
6.8.1 Características do inquérito policial militar
Como já vimos, a natureza do Inquérito Policial Militar é a mesma do Inquérito
Policial comum, bem como suas finalidades tamm se convergem, tendo como objetivo
único, a apuração e colheita de provas de crimes, comum ou militar, para se chegar às suas
autorias.
Contudo, as características de cada inquérito divergem, pois os prazos, encarregado,
escrivão, delegação, relatório, entre outros aspectos possuem características próprias.
163
Os Tribunais de Justiça Militar dos Estados (órgãos de segunda instância da Justiça Militar estadual, existentes
nos Estados de São Paulo, Minas Gerais e Rio Grande do Sul), e auditorias, não poderão julgar civis, em face
do preceito constitucional contido no artigo 125, § 4º, que na sua primeira parte dispõe: “Compete à Justiça
Militar estadual processar e julgar os militares dos Estados, nos crimes militares definidos em lei e as ações
judiciais contra atos disciplinares militares, ressalvada a competência do júri quando a vítima for civil,
cabendo ao tribunal competente decidir sobre a perda do posto e da patente dos oficiais e da graduação das
praças.” Esclareça-se que os crimes militares definidos em lei são aqueles constantes no Código Penal Militar,
de acordo com a regra estabelecida no artigo 9º. Por outro lado, apenas a Justiça Militar Federal é que tem
competência para julgar além dos militares, também os civis desde que cometam crimes militares (artigo 124,
da Constituição Federal) (LOUREIRO NETO, José da Silva. Processo Penal Militar. São Paulo: Atlas, 2010.
p. 1.).
164
Ibid., p. 2.
101
Começaremos por explicar o exercício da Polícia Judiciária Militar, que está
delimitada no artigo 7º, do Código de Processo Penal Militar, que será exercida pelas
autoridades ali elencadas, conforme as respectivas jurisdições.
Artigo 7º. A polícia judiciária militar é exercida nos termos do artigo 8º, pelas
seguintes autoridades, conforme as respectivas jurisdições:
a) pelos ministros [...];
b) pelo chefe do Estado-Maior [...];.
c) pelos chefes de Estado-Maior [...];
d) pelos comandantes de Exército [...];
e) pelos comandantes de Região Militar [...];
f) pelo secretário do Ministério do Exército [...];
g) pelos diretores e chefes de órgãos [...];
h) pelos comandantes de forças, unidades ou navios.
165
Em regra, é o Comandante de Unidade (letra h, do artigo 7º mencionado), no caso da
Polícia Militar do Estado de São Paulo, quem normalmente instaura a Portaria de Inquérito
Policial Militar (letra a, do artigo 10, do Código de Processo Penal Militar).
Célio Lobão
166
afirma que nos Estados, o Secretário de Segurança não exerce função
de Polícia Judiciária Militar, somente os Comandantes Gerais das corporações estaduais.
Na Polícia Militar e no Corpo de Bombeiros Militares, a polícia judicria militar é
exercida pelo Comandante-geral da corporação militar estadual, em relação aos
militares integrantes dos quadros da referida corporação sob seu comando; pelos
oficiais que exercem comando ou chefia, em unidades ou repartições militares
estaduais. O Secretário de Segurança, como servidor civil, mesmo que a corporação
militar lhe seja subordinada, não exerce função de polícia judiciária militar.
Uma das primeiras características do Inquérito Policial Militar é a possibilidade de
delegação, uma vez instaurado pela autoridade competente, acima citada, esta poderá delegar
sua instrução a oficial da ativa, da reserva, remunerada ou não, ou ainda, oficial reformado,
obedecendo as normas regulamentares de jurisdição, hierarquia e comando, conforme
determina os §§ 1º e 2º, do artigo 7º, do Código de Processo Penal Militar.
Ressalta-se que o Inquérito Policial Militar pode funcionar com autoridade delegante e
autoridade delegada, a autoridade delegante é aquela que tem a competência para instaurar o
inquérito, prevista no artigo 7º, do digo de Processo Penal Militar, enquanto que a
autoridade delegada é aquela quem instrui o feito, o encarregado do inquérito, de acordo com
o § 1º, do artigo 7º e o artigo 15 da Lei Castrense.
165
Código de Processo Penal Militar, Decreto Lei nº 1.002, de 21 de outubro de 1969. Artigo 7º.
166
LOBÃO, Célio. Direito Processual Penal Militar. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2009. p. 46.
102
A delegação das atribuições do exercício da Polícia Judiciária Militar não é
obrigatória, havendo possibilidade de a autoridade instauradora instruir o Inquérito Policial
Militar.
Dadas as circunstâncias em que o Inquérito Policial Militar é instaurado, ou seja, para
apurar crime militar e, considerando que, por vezes, o acusado trata-se de um militar, da ativa
ou da reserva, e que, no âmbito estadual, somente poderá ser indiciado o militar pelo
cometimento de crime militar, pois como já dissemos, o artigo 125, § 4º, excluiu a
competência da Justiça Militar Estadual de processar e julgar civil que venha a cometer crime
militar, é importante observar a hierarquia para a apuração destes delitos.
Observando, ainda, as regras de delegação, o digo de Processo Penal Militar
ressaltou a necessidade do encarregado do inquérito ser um oficial de patente superior ao do
acusado, conforme dispõe o artigo 15 da Lei Castrense:
Artigo 15. Será encarregado do inquérito, sempre que possível, oficial de posto não
inferior ao de capitão ou capitão-tenente; e, em se tratando de infração penal
contra a segurança nacional, sê-lo-á, sempre que possível, oficial superior,
atendida, em cada caso, a sua hierarquia, se oficial o indiciado.
167
(grifo nosso).
Quis o Legislador que a hierarquia e a disciplina fossem obedecidas, inclusive no
momento da apuração de um crime militar, motivo pelo qual o se admite que um
subordinado ou oficial de menor patente interrogue ou admoeste um superior sobre nenhum
assunto, ainda mais se for acusado de um crime militar.
de se ressaltar, também, que, em que pese o Legislador ter deixado para o
encarregado nomear o escrio do inquérito, quando não for feita pela autoridade instauradora
daquele, há restrições a serem observadas para tal.
O artigo 11, do digo de Processo Penal Militar, determina que a designação de
escrivão para o inquérito caberá ao respectivo encarregado, se não tiver sido feita pela
autoridade que lhe deu delegação para aquele fim, recaindo em segundo ou primeiro Tenente,
se o indiciado for Oficial, e em Sargento, Subtenente ou Suboficial, nos demais casos.
Outra característica que difere o Inquérito Policial comum do militar são os prazos,
sendo os prazos para terminação do Inquérito Policial comum 10 (dez) dias para quando o
167
Código de Processo Penal Militar, Decreto Lei nº 1.002, de 21 de outubro de 1969. Artigo 15.
103
indiciado estiver preso (por prisão em flagrante delito ou preventivamente), ou de 30 (trinta)
dias, quando estiver solto, artigo 10, do Código de Processo Penal.
No Inquérito Policial Militar os prazos são de 20 (vinte) dias, se o indiciado estiver
preso, contado esse prazo a partir do dia em que se executar a ordem de prisão, ou no prazo de
40 (quarenta) dias, quando o indiciado estiver solto, contados a partir da data em que se
instaurar o inquérito, artigo 20, do Código de Processo Penal Militar.
O Inquérito Policial comum não possui prorrogação de prazo, somente prevendo a
solicitação do retorno dos autos para ulteriores diligências, quando for de difícil elucidação e
o acusado estiver solto, artigo 10, § 3º.
No Inquérito Policial Militar, de acordo com o artigo 20, § 1º, há a previsão, no caso
de indiciado solto, de prorrogação após os quarenta dias, por mais vinte dias, que será
autorizado pela autoridade militar superior àquela que o instaurou, desde que o estejam
concluídos exames ou perícias iniciados, ou haja necessidade de diligências indispensáveis
à elucidação dos fatos.
Observa-se que o Inquérito Policial Militar destina-se à Justa Militar, contudo, é a
autoridade militar imediatamente superior a que instaurou o inquérito a competente para
prorrogar o prazo do feito, por uma única vez e no prazo de vinte dias, findo este prazo o
inquérito deverá ser relatado e encaminhado à Justiça Militar constando no relatório as
diligências faltantes, mencionando, se possível, o lugar onde se encontram as testemunhas que
deixaram de ser ouvidas por qualquer impedimento, conforme § 2º, do artigo 20, do Código
de Processo Penal Militar.
Por fim, como diferença entre o Inquérito Policial comum e o militar, citamos o
relatório das investigações, sendo que o Código de Processo Penal comum, em seu artigo 10,
§ 1º, determina que a autoridade encarregada do inquérito deverá confeccionar minucioso
relatório do que tiver sido apurado e enviar os autos ao Juiz competente.
O relatório do Inquérito Policial Militar, além de constar as dilincias feitas, as
pessoas ouvidas e os resultados obtidos, com a indicação do dia, hora e lugar onde ocorreu o
fato delituoso, deverá o encarregado dizer se houve infração disciplinar a punir ou indício de
crime, pronunciando-se, neste último caso, justificadamente, sobre a conveniência da prisão
preventiva do indiciado.
104
Estas determinações estão previstas no artigo 22, do Código de Processo Penal Militar,
cuja exigência do relatório final do inquérito é mais completo do que o previsto no artigo 10,
do Código de Processo Penal comum e, ainda, prevê a indicação de infração administrativa
relacionada ao fato delituoso.
Motivo pelo qual entendemos que o fato delituoso anda paripasso à transgressão
disciplinar, contudo, não podemos esquecer que, assim como, o Inquérito Policial é um
procedimento administrativo pré-processual, não podendo gerar efeitos ao acusado, a simples
indicação do cometimento de infração administrativa, indicada pelo encarregado do inquérito,
também, não pode.
necessidade, nestes casos, do encaminhamento do relatório do Inquérito Policial
Militar à autoridade disciplinar competente (artigo 31, da Lei Estadual nº 893, de 2001,
Regulamento Disciplinar da Pocia Militar do Estado de São Paulo) para instauração do
procedimento administrativo legal, onde será dado o direito ao contraditório e a ampla defesa.
Não há possibilidade alguma de se punir o militar administrativamente com base
somente no apontamento do encarregado do Inquérito Policial Militar que, durante ação
criminosa, o militar tenha cometido infração administrativa.
Findo o inquérito e confeccionado o relatório, outra característica é que, se este foi
delegado, conforme § 1º, do artigo , ele deverá ter como destino a autoridade instauradora,
que, como já dissemos, normalmente é o Comandante da Unidade responsável pela área onde
os fatos ocorreram, conforme determina o § 1º, do artigo 22, do Codex Militar.
A autoridade instauradora deverá confeccionar uma conclusão com base nas provas
carreadas nos autos do Inquérito Policial Militar, concordando com o relatório do encarregado
do inquérito, discordando e determinando novas diligências ou discordando somente, sendo
que no primeiro e no último caso os autos do inquérito deverão ser remetidos ao Tribunal de
Justiça Militar do Estado de São Paulo para apreciação.
Se o inquérito foi instruído pela própria autoridade de Pocia Judiciária Militar,
entendemos, neste caso, ser dispensável a conclusão, sendo necessário somente o relatório
circunstanciado e sua remessa à Justiça Militar.
Como vimos, várias são as características que diferenciam o Inquérito Policial Militar
do comum, seja a delegação, sejam os prazos, seja o relatório, o fato é que a autoridade de
105
polícia judiciária militar deve estar atenta para realizar um trabalho técnico e cuidadoso na
colheita de provas e elucidação dos fatos, de forma imparcial e com o objetivo de se chegar na
verdade do ocorrido, auxiliando da melhor forma possível a Justiça Militar.
6.8.2 A defesa no inquérito policial militar
Não é fácil tratar do tema da defesa no Inquérito Policial Militar, pois ainda há muita
controvérsia doutrinária a esse respeito, na medida em que se entende ser o inquérito uma fase
pré-processual e exigir-se que o acusado possa ter direito ao previsto no artigo 5º, inciso LV,
da Carta Magna, o direito ao contraditório e à ampla defesa.
Se por um lado temos que o Inquérito Policial Militar é mera peça administrativa, que
tem por objetivo subsidiar de informações o parquet para formação da opinio delicti, por
outro, o acusado sofre toda a carga de responder por um delito ainda não comprovado,
maculando-se seu nome a repulsa social.
Este dilema traz à tona a discussão das garantias constitucionais na fase de
investigação criminal em resposta à intromissão do poder do Estado de se apurar um crime na
reputação, bom nome e vida privada do acusado.
Não iremos discutir aqui as definições dos atributos do acusado, nem tão pouco as
características do Inquérito Policial Militar que foram vistas no subitem anterior.
O objetivo é entender o alcance que o contraditório e a ampla defesa, que são
princípios constitucionais do Processo Penal Militar, possuem quando da instauração do
Inquérito Policial Militar.
Para Marta Saad, ainda que ausente o contraditório, é possível falar-se no exercício do
direito de defesa no Inquérito Policial, para ela, defesa e contraditório são autônomos e não se
confundem.
Assim, reconhecida a existência de acusação no inquérito policial, entendida esta
como sendo atribuição ou afirmação de ato ou fato delituoso a alguém, corolário
imprescindível é o exercício do direito de defesa, aqui compreendido de forma
ampla como sendo resistência de modo a permitir a contraposição das acusações,
com assistência de advogado, a possibilidade de guardar silêncio e a admissibilidade
de produção de provas, indispensáveis à demonstração de sua inocência ou da sua
culpabilidade diminuída.
168
168
SAAD, Marta. O direito de defesa no inquérito policial. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004. p. 223.
106
Desta forma, podemos entender que a defesa não é feita somente através do
contraditório, como bem afirma Marta Saad, mas através de outros pressupostos que garantem
ao acusado a possibilidade de não se autoincriminar.
Defendendo o afastamento total do contraditório na fase inquisitorial, está Vicente
Greco Filho que afirma: A atividade que se desenvolve no inquérito é administrativa, o se
aplicando a ela os princípios da atividade jurisdicional, como o contraditório, a publicidade,
as nulidades, etc.”.
169
Mais contundente ainda é Jo da Silva Loureiro Neto
170
, ao tratar do caráter
inquisitivo do Inquérito Policial Militar, afirmando que este é inquisitivo, não existindo a
figura do contradirio, podendo o oficial encarregado dirigir as investigações como entender
convenientemente, sem ater-se a um procedimento prévio a ser obedecido.
Entendemos ser o Inquérito Policial Militar um instrumento de busca da verdade, e,
por ter um caráter administrativo investigatório, numa fase pré-processual, o cabe os
princípios do contraditório e da ampla defesa, próprios da fase processual.
Contudo, nada obsta, como afirmou José da Silva Loureiro Neto, que o encarregado
ouça o acusado e seu defensor, ao indicarem novas testemunhas do fato, gerador da acusação,
ou busque novas perícias para melhor elucidação do fato.
O Inquérito Policial Militar não pode ser visto apenas como uma ferramenta de
incriminação e produção de provas contra o acusado, mas um instrumento de busca da
verdade.
O encarregado deve ter como objetivo auxiliar a administração militar de forma
imparcial, para tanto, ao nosso ver, deve considerar todas as possibilidades existentes, o
169
O inquérito policial não é nem encerra um juízo de formação de culpa ou de pronúncia, como existe em certos
países que adotam, em substituição ao inquérito, uma fase investigatória chamada “juizado de instrução”,
presidida por um juiz que conclui sua atividade com um veredicto de possibilidade, ou não, de ação penal. No
sistema brasileiro, o inquérito policial simplesmente investiga, colhe elementos probatórios, cabendo ao
acusador aprec-los no momento de dar início à ação penal e, ao juiz, no momento do recebimento da
denúncia ou queixa (GRECO FILHO, Vicente. Manual de Processo Penal. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 78.).
170
Assim, exemplificando, poderá ouvir quantas testemunhas entender necessárias ao esclarecimento do fato.
Veja que a garantia do contraditório e da ampla defesa é assegurado aos litigantes em processo judicial ou
administrativo e aos acusados em geral, artigo 5º, inciso LV, da Constituição Federal, e o inquérito policial
constitui-se em procedimento administrativo investigatório onde inexiste acusação. A despeito daquelas
garantias não serem de incidência obrigatória no inquérito policial militar, nada obsta que em determinadas
hipóteses isso seja conferido por parte do encarregado das investigações como da participação da defesa nos
quesitos para formulação da perícia, ou quando exista pedido para oitiva de testemunhas para esclarecer o fato
investigado, isso na hipótese do indiciado se fazer acompanhar de advogado (LOUREIRO NETO, José da
Silva. Processo Penal Militar. São Paulo: Atlas, 2010. p. 2.).
107
a que incrimina o acusado, mas, também, como um procedimento que possa reunir elemento
de prova que demonstre a inoncia do acusado, ainda que estas sejam elencadas pelo próprio
acusado ou seu defensor.
Todas as vertentes devem ser levadas em consideração, o caráter inquisitivo e sigiloso
do inquérito o retira dele o objetivo maior, o da busca da verdade, ressaltando que, mesmo
em sede de inquérito, ninguém deve ser acusado injustamente.
108
CONCLUSÃO
1. O estudo da Defesa no Processo Penal Militar impõe pesquisar os princípios
constitucionais orientadores do Processo Penal Militar.
2. Constata-se que a compreensão da história da Justa Militar e seus limites, confundem-se
com a própria existência da humanidade.
3. No Brasil os direitos e garantias estão expressos na Constituição Federal e, são os
Direitos Processual (comum) e Processual Penal Militar as ferramentas de tutela
decorrentes de um Estado Democrático de Direito, ou seja, formam a Constituição
aplicada na persecução penal.
4. Para um efetivo exercício de defesa no Processo Penal Militar necessidade de
delimitar a competência do exercício da Pocia Judicria Militar, que está disciplinada
no artigo 144, parágrafo in fine, da Carta Magna, nos casos de crimes militares
definidos pelo artigo 9º, do Código Penal Militar.
5. Por este motivo não que se falar em conflito de competência, nem positivo nem
negativo, seja entre a Polícia Civil ou a Polícia Federal e a Polícia Judiciária Militar, pois
a delimitação está na própria legislação.
6. O bem jurídico tutelado no Direito Penal Militar é o mesmo que o do Direito Penal,
aquele eleito pela sociedade como o mais importante, acrescidos dos fatores da hierarquia
e disciplina, que são colunas de sustentação do militarismo, características de instituições
perenes.
7. O objetivo do Direito Penal Militar e do Processo Penal Militar não é o de tutelar o
bem jurídico militar, mas o da efetividade da Justiça, na qual a liberdade do inocente deva
ser o alvo principal a ser acertado pela Justiça Militar.
8. Observamos que os institutos do Direito Penal Militar possuem características únicas,
próprias para garantir a existência de Instituições perenes e que m finalidades
específicas.
109
9. As Instituições Militares não são comuns, não podem ser extintas e, de acordo com a
vontade de qualquer um, criada outra em seu lugar; devem ser duradouras e confiáveis,
para tanto há necessidade de controle com normas e leis próprias não arbitrárias.
10. O conhecimento das normas e leis militares se fazem necessários por dois motivos, ora
para cumpri-las no exercício da atividade jurídica, ora para entender o funcionamento e a
necessidade das Instituições Militares.
11. Existem críticas quanto à rigidez das normas e leis militares, porém, poucas são feitas
com conhecimento e o estudo necessário para entender a necessidade de se controlar um
grande contingente de pessoas armadas e que tem como missão a defesa da pátria e do
cidadão, muitas vezes, com o sacrifício da própria vida.
12. Concordamos que alguns institutos da Lei Castrense não foram recepcionados pela
Constituição de 1988, sendo necessária uma atualização do Código de Processo Penal
Militar, assim como acontece com o Código de Processo Penal comum.
13. Devemos perseguir o status libertatis do cidadão de forma intransigente. A prisão de um
cidadão, militar ou civil, deve obedecer ao devido processo legal, com todas as garantias
decorrentes da ampla defesa devidamente asseguradas.
14. O Processo Penal Militar, assim como o Processo Penal comum, não pode, nem deve em
algum momento, afastar-se da nossa Lei Maior, assegurando, sempre, os direitos e
garantias nela inseridos.
15. Não há dúvidas de que o direito de defesa é um dos pontos mais importantes nos
ordenamentos jurídicos dos Estados Democráticos de Direito, no qual o Processo Penal
constitua instrumento de aplicação da Constituição.
16. No Processo Penal Militar, assim como ocorre no Processo Penal comum, o acusado deve
ser reconhecido como sujeito de direitos e o como um objeto do Estado, a quem
obrigatoriamente, o Estado imporá uma saão.
110
17. Este reconhecimento baseia-se nos direitos constitucionais fundamentais, que são os
direitos de defesa e do contraditório e, ainda, o direito da presunção de inoncia, até o
trânsito em julgado da condenação.
18. No tocante ao direito de defesa, é importante salientar a necessidade de se colocar à
disposão do acusado todos os concretos direitos de que ele legalmente dispõe de
codeterminar ou de moldar a decisão final do processo.
19. É com a igualdade entre as partes no processo que o Estado-Juiz poderá dizer o direito a
ser aplicado ao caso concreto.
20. Por fim, concluímos que os limites e expansões do Processo Penal Militar estão na
própria Constituição da República Federativa do Brasil, pois é na Lei Maior que podemos
encontrar os direitos e garantias do cidadão, militar ou não.
111
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