Pelos olhos de um observador estrangeiro – Ivan Paganotti
4. Expectativas e receitas idealizadas
interesse indireto de empresas que operam nesse mercado, pois essa cobertura pode
atrair novos viajantes para o país e, com isso, mais capital para quem lucra com os
negócios em hotelaria, transporte ou outros serviços turísticos – os mesmos que são
apresentados nos guias publicados por Rohter no New York Times.
Até mesmo a exclusão social pode ser fonte de lucros para a indústria do turismo,
como visto no trecho a seguir, que, aparentemente, segue as sugestões de Jorge Amado
ao visitar a “pureza das favelas”:
Like it or not, Rio de Janeiro is famous not just for its beaches and the giant
statue of Christ that looks down on the city from atop Corcovado Mountain
but also for its favelas. These hillside squatter slums sprawl over some of the
choicest pieces of real estate in Rio and in other Brazilian cities. But as
symbols of glaring social inequality and rampant urban violence, they have
traditionally been considered off limits to tourists.
In recent years, though, a pair of for-profit companies -- Jeep Tour and
Favela Tour -- have been conducting daily excursions, both focusing on
Rocinha, the largest of the city's 800 or so favelas, with more than 150,000
residents. I have often visited favelas as a reporter, but in mid-March, just as
Brazil's summer season was ending, I entered Rocinha on trips with both
companies, riding as a passenger in a jeep with a group of about 10 tourists
from countries like the United States, Germany, Sweden, Israel, Switzerland
and Russia. Few knew much about favelas beyond the rather romanticized
portrayal offered in films like the 1959 movie ''Black Orpheus.''
After riding with Jeep Tour to the very top of Rocinha, not far from the
American School, the first group I accompanied got out, was directed to a
narrow concrete passageway and began the steep descent. The stench of
urine hung in the air, stray dogs barked at us and each other, garbage was
piled on the ground, samba, gospel and Brazilian hillbilly music blared from
radios, and all around us the walls were daubed with boastful graffiti: ''I love
life, but I'm flirting with death,'' one phrase proclaimed.
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O território das favelas que antes estava “fora dos limites dos turistas”, agora é
reinserido simbolicamente na trama dos relatos turísticos oficiais sobre o Rio de Janeiro.
Não é sem surpresa que esse relato parte mais uma vez do imaginário já esperado pelos
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ROHTER, Larry. “Rio's Squatters, By Guided Tour”. The New York Times, Nova York, 20/05/2001.
Tradução do autor:
Pelo bem ou pelo mal, o Rio de Janeiro não é famoso somente por suas praias e pela gigantesca estátua
do Cristo que olha do topo do Corcovado, mas também por suas favelas. Essas ocupações de morros se
estendem por algumas das melhores propriedades do Rio e outras cidades brasileiras. Mas como
símbolos da evidente diferença social e violência urbana crescente, elas tradicionalmente estiveram fora
dos limites dos turistas.
Em anos recentes, contudo, duas empresas – a Jeep Tour e a Favela Tour – têm conduzido excursões
diárias, ambas para a Rocinha, a maior das 800 favelas da cidade, com mais de 150 mil moradores. Eu
frequentemente visitei favelas como um repórter, mas no meio de março, com o final do verão
brasileiro, eu entrei na Rocinha em visitas com as duas companhias, passeando como passageiro em um
jipe com um grupo de cerca de 10 turistas de países como EUA, Alemanha, Suécia, Israel, Suíça e
Rússia. Poucos sabiam mais sobre favelas além dos retratos romantizados oferecidos em filmes como
“Black Orpheus”, de 1959.
Depois de andar com o Jeep Tour até o topo da Rocinha, não muito longe da Escola Americana, o
primeiro grupo que acompanhei saiu, foi levado a uma viela e começou a descer. O cheiro de urina
pairava no ar, cães vadios latiam para nós e uns para os outros, o lixo se empilhava no chão, samba,
gospel e música sertaneja gritava dos rádios, e ao redor as paredes estavam cheias de grafites
impactantes: “eu amo a vida, mas estou flertando com a morte”, uma frase proclamava.