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Emprega, deste modo, um riso
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que, partindo da função social que exerce,
promove formas contrárias de poder, uma quebra de hierarquias que presenteia a
vida a quem ri, sinalizando, um escapar da opressão ditado pelo poder oficial da
sociedade. Riso que, segundo Minois (2003), faz parte das respostas fundamentais do
homem confrontado com sua existência ao passo que faz abalar o sério. Um riso que
tem aspecto individual e coletivo, que busca romper com o curso ordinário das coisas,
sinalizando para uma outra realidade, ou talvez, para uma utopia em que o homem
não estaria mais confiando nos quadros sociais determinados. Riso que para Bérgson
(2001) sinaliza para algo vivo, modelando-se em de um conhecimento prévio e íntimo
do qual só existe dentro do que é propriamente humano e essencialmente social.
Em seus textos, a dramaturgia não encontra demarcações, nem tão pouco
sua poética pode ser definida. O que se tem de exato em suas produções é a firmeza
e seriedade desta autora em representar os que estão à margem do sistema e que
tomam forma e voz à luz da sua escrita. Homens e mulheres constituídos de medos e
anseios, de bravuras e reconhecimentos por meio da maneira séria e cômica, trágica
e ardilosa, avessa em muitas vezes à ordem vigente com tom de carnavalização.
Diante das inúmeras descrições dos traços que definem a marca escritural desta
autora, é possível apontar o cerne que carrega suas produções como alicerçada
numa concepção de mundo liderada pelas emoções e riquezas que definem a cultura
popular, os tipos que a compõem e a vida que palpita nesta autora, que encontramos
expressos em seus textos e vividos em inúmeras encenações, desde a cidade
interiorana que reside no Nordeste brasileiro, até a extensão de países europeus:
Neste mundo de encantamento recriado por Lourdes Ramalho a partir do
imaginário popular nordestino percebe-se, claramente, o olhar crítico de
quem, embora estranhamente ligada à tradição, seja a vivida, seja a
simbólica, nela não se cristaliza e, em seu ofício de poietés, a reinventa com
fragmentos do velho agregando-lhe o novo suscitado pelas dinâmicas do seu
tempo e da sua cultura (ANDRADE, 2007, p.,221).
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O riso é uma fonte de benefícios para o corpo e para o espírito e faz surgir um mundo festivo ligado a inversão. O
riso é um jogo, uma utopia que consiste num ato que cria uma situação inesperada, desestruturante, chocante,
procede da mesma idéia, é sempre a perda da individualidade que esta em causa. È o homem dionisíaco que
procura assimilar e conferir sobre o que não conhece e deseja.”Rir é participar da recriação do mundo, nas festas
dionisíacas, nas saturnais, acompanhadas de ritos de inversão, simulando um retorno periódico ao caos primitivo,
necessário à confirmação e á estabilidade das normas sociais, políticas e culturais [...] Essa vida representativa do
riso corresponde aos fins superiores da existência: um renascer na universalidade, a liberdade, a igualdade, a
abundancia. É uma franquia provisória, mas anunciador da libertação definitiva em relação a regras, valores, tabus
e hierarquias” ( MINOIS, 2003, p.630 e 157).