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planejado, racional ou não racional
38
. As cidades portuguesas na
América se moldam ao território, a custa de um menor rigor geométrico
em relação às espanholas. As ruas adaptavam-se as condições
topográficas, e tendiam a se organizar como ligação entre pontos, sem
intenção de ordenação geométrica
39
. Com o tempo, os traçados
desregulares e as ruas tipicamente estreitas iam se mostrando
inadequados, então um novo núcleo se fundava ao lado do antigo, o que
é atestado pela presença dos chamados centros históricos ou antigos nos
centros urbanos brasileiros
40
.
Verifica-se em geral no Brasil uma primeira etapa de
urbanização vernácula
41
, onde o traçado urbano realmente seguia
espontaneamente às exigência do território, e uma segunda etapa (séc.
XVIII), onde, após a publicação da Provisão Real de D. João V
(01/08/1747), a colonização é orientada por algumas normas
urbanísticas. A partir do início do século XVIII, a vida dos principais
centros urbanos adquire uma nova escala, suficiente para justificar o
emprego de padrões urbanísticos mais elevados. Segundo Peluso Junior
38
“Se as cidades portuguesas não apresentavam por vezes um carácter absolutamente
geométrico, isso não significa que não houvesse os conhecimentos técnicos suficientes para o
fazer, mas antes que da cultura urbana portuguesa fazem também parte outras tradições, outros
princípios e outras concepções urbanas que não tinham necessariamente uma base geométrica e
que ao longo dos tempos sempre permearam os seus traçados” (Teixeira, 2000).
39
“É verdade que o esquema retangular não deixava de manifestar-se – no próprio Rio de
Janeiro já surge um esboço – quando encontrava poucos empecilhos naturais. Seria ilusório,
contudo, supor que sua presença resultasse da atração pelas formas fixas e preestabelecidas,
que exprimem uma enérgica vontade construtora, quando o certo é que precedem, em sua
generalidade, dos princípios racionais e estéticos de simetria que o Renascimento instaurou,
inspirando-se nos ideais da Antiguidade. Seja como for o traçado geométrico jamais pode
alcançar entre nós, a importância que veio a ter em terras da Coroa de Castela: não raro o
desenvolvimento ulterior dos centros urbanos repeliu aqui esse esquema inicial para obedecer
antes às sugestões topográficas” (Holanda, 1984. p.75-76).
40
Ainda sobre isso, coloca Marx (1980, p. 24-25): “Como as cidades medievais, acomodando-
se em terrenos acidentados e à imagem das portuguesas, as povoações brasileiras mais antigas
são marcadas pela irregularidade. [...] É constante a presença de ruas tortas, das esquinas de
ângulos diferente, da variação de largura nos logradouros de todo o tipo, do sobe-e-desce das
ladeiras. O sítio urbano, geralmente, decide e justifica esses traçados irregulares. [...] os
corações históricos das maiores e mais transformadas aglomerações atuais são exemplos desta
característica, nossa velha conhecida”.
41
“A componente vernácula corresponde, na maior parte dos casos, às primeiras fases de
implantação urbana, feitas sem técnicos especializados e em que se observa uma estreita
relação do traçado urbano com as características topográficas dos seus locais de implantação. A
componente erudita está geralmente presente em posteriores fases de desenvolvimento, quando
o crescimento urbano ou a importância da cidade justificavam a participação de técnicos
especializados, detentores de uma formação teórica” (Teixeira, 2000).