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UNIVERSIDADE DO VALE DO RIO DOS SINOS UNISINOS
UNIDADE ACADÊMICA DE PESQUISA E PÓS-GRADUAÇÃO
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM DESIGN
MESTRADO
Paul Cristina Visoná
DESIGN ESTRATÉGICO E DESIGN DE MODA:
CONSTRUÇÃO DE PRINCÍPIOS METODOGICOS PARA
O ESTUDO DE TENDÊNCIAS
Porto Alegre
2010
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UNIVERSIDADE DO VALE DO RIO DOS SINOS UNISINOS
UNIDADE ACADÊMICA DE PESQUISA E PÓS-GRADUAÇÃO
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM DESIGN
MESTRADO
Paula Cristina Visoná
DESIGN ESTRATÉGICO E DESIGN DE MODA:
CONSTRUÇÃO DE PRINCÍPIOS METODOLÓGICOS PARA
O ESTUDO DE TENDÊNCIAS
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação
em Design da Universidade do Vale do Rio dos Sinos
UNISINOS, como requisito parcial à obtenção do tulo
de Mestre em Design Estratégico.
Orientador: Professor Dr. Fabio Parode
Porto Alegre
2010
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V832d Visoná, Paula Cristina
Design estratégico e design de moda: construção de princípios
metodológicos para o estudo de tendências / por Paula Cristina Visoná. --
Porto Alegre, 2010.
167 f. : il. ; 30 cm.
Dissertação (mestrado) Universidade do Vale do Rio dos Sinos,
Programa de Pós-Graduação em Design, Porto Alegre, RS, 2010.
“Orientação: Prof. Dr. Fabio Parode, Escola de Design”.
1.Design estratégico. 2.Design estratégico Moda. 3. Moda Cultura.
4.Cultura Aspectos sociais Moda. 5.Moda Tendência. I.Parode, Fabio.
II.Título.
CDU 7.05
7.05:391
391
Catalogação na publicação:
Bibliotecária Carla Maria Goulart de Moraes CRB 10/1252
Dedico esse trabalho a todas as pessoas
que me acompanharam nesse período,
compreendido entre maio de 2008
até o momento atual.
Agradeço especialmente ao Eduardo, que
me conduziu pelo caminho dos intertextos,
facilitando meu encontro com outros
universos interrelacionais.
El diseñador piensa en formas sucetibles de seducir
a un público bien delimitado o s amplio, eso depende e
interviene en la vida social teniendo en cuenta un cierto
número de elementos; no hace falta forzar mucho
las cosas para ver en él a un especialista de la
antropoloa aplicada.
Marc Augè
RESUMO
A presente pesquisa apresenta a construção de um método para o estudo de tenncias baseado
nos procedimentos metodológicos do design estratégico e no conceito de intertextualidade.
Pretende abordar de forma transdisciplinar os signos emergentes no meio sociocultural,
antecipando os sinais representativos de mudança constituinte de tenncias, a fim de operar na
elaboração de estratégias projetuais. Parte-se do princípio que a antecipação dos sinais
emergentes do meio sociocultural, permite identificar tendências e aprimorar as decisões
estratégicas, contribuindo para a criação de diálogos entre organizações, indivíduos e artefatos
de design. A perspectiva de comunicabilidade entre insncias de representação de
subjetividades, tal como arte, cinema, moda, etc., é fundamental para esse estudo, e o
desdobramento teórico-metodológico da mesma permite a construção do escopo ferramental
constituinte do método proposto.
ABSTRACT
The following research presents the construction of a method for trend studies based on the
strategic design methodological procedures and the concept of intertextuality. It intends to
approach in a transdisciplinary way the emerging signs from the sociocultural environment,
anticipating the representative signals of constituent change of trends in order to work towards
the development of projectual strategies. It considers the understanding that the anticipation of
emerging signs from the sociocultural environment allows the identification of trends and the
improvement of strategical decisions, contributing the creation of dialog between
organizations, individuals and design artefacts. The communicability perspective between
representation instances of subjectivities such as art, film, fashion, etc is essential for this study,
and its theoretical and methodological unfolding allows the framing of the tools that constitutes
the proposed method.
LISTA DE ILUSTRAÇÕES
Ilustração 1: Obra ...................................................................................................................... 105
Ilustração 2: Colão Seditioners de Vivienne Westwood, 1976 ......................................... 108
Ilustração 3: Look de Zandra Rodhes lançado na década de 1980 ........................................ 108
Ilustrações 4 e 5: Imagens dos artefatos utilizados por Rosenbaum para compor
o lounge Nice!.............................................................................................................................. 123
Ilustração 6: Imagem de um projeto arquitetônico de Hadid: Performing
Arts Centre de Saadiyat Island nos Emirados Árabes .............................................................. 140
Ilustração 7: Imagem do calçado de pstico desenvolvido pela marca Melissa
em parceria com Hadid ............................................................................................................... 141
Ilustração 8: Imagem de abertura do documentário produzido por Fleck, inédito
em plataformas de disseminação de conteúdos visuais ............................................................ 145
Ilustração 9: Imagens das capas dos discos de grupos e artistas relacionados aos
estilos musicais acima citados .................................................................................................... 147
Ilustração 10: Imagens vinculadas às plataformas acima relacionadas ................................. 148
Ilustração 11: Imagens das figuras icônicas acima citadas ..................................................... 151
Ilustração 12: Imagens da gravadora Optimal‟s Records ....................................................... 151
SUMÁRIO
1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS ................................................................................................ 9
CAPÍTULO I
1.1 Design como projeto: o design e sua perspectiva estratégica .............................................. 22
1.2 Design estratégico: o metaprojeto e a implementação da cultura do projeto ...................... 25
1.3 Estratégias e a inovação em nível de significados ................................................................ 28
1.4 Cultura e moda ........................................................................................................................ 34
1.5 Moda enquanto discurso e a disseminação sígnica através das tendências ......................... 41
1.6 Signos, sinais e o esrito do tempo ....................................................................................... 46
1.7 Sensibilidades emergentes e os fluxos criativos ................................................................... 52
1.8 Vetores de emissão de sinais e as dinâmicas de disseminação sígnica para a construção
de novos significados .................................................................................................................... 57
CAPÍTULO II CONSTRUÇÃO DA METODOLOGIA
2.1 Observação do meio sociocultural ......................................................................................... 67
2.2 Formas de observação............................................................................................................. 76
2.3 Método de observação em ambientes digitais ....................................................................... 79
2.4 A intertextualidade como operador na identificação de sensibilidades emergentes ........... 82
2.5 Pesquisa Blue Sky e a constituição de enredos projetuais .................................................... 89
CAPÍTULO III RELAÇÕES ENTRE A METODOLOGIA PROPOSTA E CASOS
PRÁTICOS................................................................................................................................... 97
3.1 Relações entre a metodologia proposta e perspectivas macrossociais .............................. 101
3.2 relações entre a metodologia proposta e macrotendências ................................................. 115
3.3 Relações entre a metodologia proposta e narrativas projetuais para artefatos de moda... 125
3.4 Relações entre a metodologia proposta e microambientes de mercado ............................ 144
4 CONSIDERAÇÕES FINAIS .............................................................................................. 157
REFERÊNCIAS ........................................................................................................................ 162
9
1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS
O design, segundo Flusser (2007), é uma área de conhecimento que busca associar arte
e técnica, possibilitando o estabelecimento de pontes relacionais entre essas insncias e o
socius, a partir do ato de projetação de artefatos.
Nesse sentido, o design, na perspectiva do Design Estratégico, visa o desdobramento
do ato de projetação de artefatos concomitante a uma lógica de estratégias envolvidas com as
necessidades do mercado e os contextos de produção e consumo. Visto sob essa perspectiva, é
possível projetar de forma sistêmica, produtos, serviços e experiências, bem como, a
comunicação e a distribuição associadas aos mesmos. A relação entre essas etapas
corresponde a uma forma abrangente de compreender as implicões do design junto às
empresas contemporâneas e, segundo Celaschi e Deserti (2007), a associação entre essas
instâncias em um projeto levam ao desenvolvimento de uma nova área de conhecimento, que
pode ser intitulada de mercadologia.
Nesse sentido, pressupõe-se que um projeto de design além do ato de projetação de
um artefato em si: é importante permear a projetação com elementos que possibilitem o
desenvolvimento de estratégias mercadológicas, desenvolvidas de modo a posicionar
empresas, organizações e marcas, aliando know how interno a variáveis diversas, de ordem
social, cultural e econômica, dentre outras. Para tanto, mostra-se pertinente desenvolver
métodos e ferramentas, possibilitando aos designers vistos, sob essa lógica, como projetistas
caminhos para o desenvolvimento de mudanças significativas, no que diz respeito às mais
variadas características que serão assumidas por um projeto. Essas mudanças podem ser
entendidas como inovações, e essas inovações podem se estabelecer em diferenciados âmbitos
correspondentes a projetação de artefatos.
Nesse ínterim, queses relativas a perspectivas intangíveis, como necessidades
latentes e desejos condizentes aos indivíduos a quem o projeto será destinado, contribuem
sobremaneira no desenvolvimento de aspectos projetuais, bem como, podem sinalizar
caminhos para a inovação, pois, segundo Verganti et. al, a inovação também pode ser
entendida como um processo que prevê o desenvolvimento de conhecimentos sobre
necessidades dos usrios e sobre linguagens dos produtos. A transformação desses
conhecimentos em aspectos intrínsecos aos artefatos compete aos envolvidos no ato de
10
projetação, extrapolando a dimensão forma e função tradicionalmente associadas ao design.
(VERGANTI ET AL., 2006, p. 163-164).
Partindo, pois, da premissa que o Design Estratégico visa tanto o desdobramento das
etapas de projetação de artefatos, como um novo entendimento acerca do design junto às
organizações contemporâneas, objetiva-se a problemática geradora dessa investigação: a
configuração de uma metodologia, a partir do Design Estratégico, para a identificação de
sinais emergentes e a posterior constituição de tendências que sirvam de orientação
estratégica para o Design de Moda. Essa problemática embasa-se em uma perspectiva
transdisciplinar, de modo a oferecer caminhos para a configuração de cenários que
possibilitem desdobramentos de inovações de significados para a projetação de artefatos de
moda.
Seguindo pressupostos condizentes com o desenvolvimento de etapas processuais do
Design Estratégico, essa problemática se desenvolve na fase p-projetual, também intitulada
de fase metaprojetual, portanto, a fase anterior ao projeto de design propriamente dito. Nessa
instância metaprojetual, a relevância de aspectos como coleta de dados, análise de mercado,
pesquisa de estímulos e criação de possíveis vínculos inovadores é privilegiada, bem como, a
análise da subjetividade condizente às necessidades verbalizadas ou o dos usuários a
quem o projeto será destinado. Nessa fase, questões micro e macro-ambientais são analisadas
de modo a sinalizar caminhos para o desenvolvimento de estratégias para empresas e
organizações, privilegiando um modo de entendimento que parte, muitas vezes, do indivíduo
(usuário) e suas relações no meio sociocultural.
Nesse sentido, essa investigação privilegia questões relativas a problemática da
formalização do que é intangível, e questiona se essa prática pode apontar caminhos para o
desenvolvimento de inovações que permitam a constituição de novas relações semânticas.
Parte-se do pressuposto de que inovações possam se dar através de relações entre os artefatos
e as construções de sentidos que esses constroem junto aos usuários, e às
organizações/empresas. Para tanto, avalia-se a importância de diálogos verbais e não verbais,
fragmentados no processo de semiose cultural que permeia o meio social. Esses diálogos
podem ser percebidos através de sinais e signos, sendo esses potenciais emissores de
significados, portanto, aqui entendidos como códigos geradores de significados, que cumprem
o desígnio, segundo Flusser (2007) de substituir fenômenos operantes. Organizados segundo
11
uma lógica que permita a configuração de sentido, esses códigos podem objetivar relações
sígnicas distintas, desdobrando significações conforme sua organização discursiva.
Desse modo, chega-se a um dos objetivos dessa pesquisa: a premissa de leitura do
contexto sociocultural a partir de arranjos sígnicos, constitutivos em artefatos, permitindo
vislumbrar níveis de mediação simbólica entre esses os artefatos , os indivíduos e as
relações que se desdobram no meio social. Nesse sentido, se está considerando o
entendimento de texto (ou discurso), de modo amplo, portanto, a união entre signos e a
geração de significados. Retoma-se a premissa de diálogos em níveis verbais e não-verbais,
visto que a associação sígnica poder ocorrer em ambas as insncias. A perspectiva de análise
da cultura material, assim, pode levar ao entendimento do atual esgio do imaginário
coletivo, proporcionando meios de efetivar leituras lineares que proporcionem a compreensão
do devir cultural. Nesse ínterim, está se argumentando que os artefatos são meios de
materialização de subjetividade, e que esta se desdobra em várias áreas de mediação
simbólica. Esses campos de formalização que também podem ser entendidos como áreas de
representação da subjetividade, tendo, como um dos objetivos, a materialização da potência
criativa que se desdobra entre indivíduos. Entende-se a moda como um desses campos, e a
partir dessa consideração, buscam-se convergência analíticas para a constituição de discursos
amlificados.
Nesse contexto, considera-se que a projetação de artefatos de moda é permeada por
aspectos relativos a outras áreas de representação simbólica, e a convergência de diálogos
entre essas pode levar ao desenvolvimento de características projetuais que amplifiquem o
sentido do próprio artefato de moda. A perspectiva dessa prática é o desenvolvimento de
cadeias de valor entre usrios (indivíduos), empresas/organizações e artefatos, e a
investigação dessa dinâmica também se apresenta como um dos objetivos desse estudo. Parte-
se da consideração de que a moda é, pois, um sistema sígnico e, portanto, o resultado de suas
fases projetuais podem objetivar artefatos que constituam diálogos o-verbais entre usrios,
organizações e o processo de representação simbólica presente no meio social.
Nesse sentido, admite-se que a competência estratégica de uma possível metodologia
que intente antecipar o devir cultural mostra-se relevante para a execução projetual, e
investigar esse processo é o objetivo maior desse estudo. Têm-se como premissa de fundo o
entendimento de que discursos podem servir para a elaboração de estratégias diversas, visto
que fragmentos discursivos dispersos no meio sociocultural podem contribuir para a
12
formalização de artefatos com import simbólico significativo, potencializando instâncias de
reconhecimento da subjetividade imanente a diversos indivíduos em projetos de moda. Essa
dinâmica permite o reconhecimento do teor de inter-subjetividade operante no meio
sociocultural, aproximando essa investigação do que poderia se caracterizar como percepção e
apreensão do intangível. Para tanto, supõe-se que configurar narrativas carregadas de sentido,
partindo da multiplicidade discursiva presente no meio sociocultural, pode se caracterizar
como uma vantagem estratégica para as organizações que atuam projetualmente no campo da
moda. Assim, esse estudo busca desenvolver ferramentas metodológicas e conceitos que
possam ser operantes para a prática projetual, procurando dar conta da organização de códigos
e do seu potencial relacionamento com sensibilidades emergentes no contexto sociocultural.
Em vista disso, parte-se do pressuposto que essas sensibilidades podem estar desdobrando
características conforme o desenvolvimento cultural da sociedade, ou seja, permeando
relações e acontecimentos (fenômenos) que se desenvolvem entre os indivíduos em
sociedade, emitindo sinais passíveis de análise, ou seja, decomposições que embasem
posteriores composições, permitindo, atras dessa prática, inovações em níveis de
significados pelas associações efetivadas, a posteriori, no conjunto.
Para cumprir tal dinâmica, portanto, para proporcionar meios de decompor e recompor
códigos, essa investigação baseia-se na orientação epistemológica circunscrita ao
estruturalismo. Essa orientação serve como base de configuração de aportes analíticos
desenvolvidos no estudo, visto a preponderância da geração de significados implicada no
processo de construção e desconstrução de estruturas.
Segundo Puillon, como estrutura pode-se compreender tudo aquilo que nos revela a
análise interna de uma totalidade, seja essa totalidade um corpo vivo, um mineral, um
discurso, etc. As relações entre os elementos que compõe essa totalidade dão conta de um
sistema, e esse sistema traduz-se em uma estrutura (PUILLON apud COELHO, 1996, p.3).
Entende-se, pois, que esse fundamento teórico pode corroborar na investigação do
processo de constituição de relações entre arranjos sígnicos, mediação simbólica e inovação
em vel de significados. Segundo Barthes, estrutura é, pois, de facto, um simulacro do
objecto, mas um simulacro dirigido, interessado, uma vez que o objecto imitado faz aparecer
alguma coisa que permanecia invisível, ou, se se preferir, inteligível ao objecto natural.”
(BARTHES apud COELHO, 1996, p.21).
13
Ora, a decomposição de estruturas pode, eno, levar ao teor de simulacro envolvido
no ato de projetação e, conforme considerações de Barthes, esse simulacro é o próprio homem
e as relações que o envolvem. O novo, nessa perspectiva, pode se dar através de uma alteração
realizada no conjunto de variáveis presentes em uma ou mais estruturas, e essa alteração
pode ser efetivada através de mecanismos interpretativos, relativos tanto aos designers
(projetistas), como aos próprios indivíduos.
A teorização estruturalista também pre a relação entre estruturas distintas, algo
central nessa investigação, visto que, conforme foi anunciado, a projetação de artefatos de
moda pode ser permeada por convergências sígnicas, relativas a campos distintos no processo
de semiose cultural. Essa convergência pode se dar pelo nível de comunicabilidade entre
códigos relativos a formalizações efetivas (estruturas), sendo que as mesmas visam
tangibilizar as relações subjetivas estabelecidas pelo teor de mediação envolvido em artefatos
que dêem conta desse processo.
Compor e decompor as estruturas o formas de encontrar os simulacros nos quais se
inserem os códigos, assoc-los é, pois, perceber as interrelações que se engendram entre os
signos e os significados, para, por fim, conhecer os meios de objetivação do intelecto humano.
Assim, a análise do teor relacional que se constrói entre o sistema da moda e outros
sistemas (outras estruturas e suas complexidades), pode ser configurada a partir da
identificação de códigos e das potenciais replicações dos mesmos em formas de representação
distintas, como arte, música, cinema, mídias, dentre outras. O sentido que se opera a partir
dessa dinâmica, tanto serve para legitimar a moda como forma de representação de aspectos
subjetivos inerentes ao meio sociocultural, como pode servir para renovar sua sistemática de
atuação junto aos indivíduos.
Devido ao teor de intangibilidade das variáveis implicadas nessa investigação, a
mesma se inscreve no quadro metodológico característico de pesquisa de cunho qualitativo.
A partir dessa sistemática de investigação, utiliza-se o estudo de caso e a coleta de
dados como forma de: “[...] apreender a totalidade de um situação e, criativamente, descrever,
compreender e interpretar a complexidade de um caso concreto (MARTINS E
THEÓPHILO, 2007, p.61).
Nesse sentido, entende-se que esse formato analítico pode levar, segundo Martins e
Theóphilo, ao desenvolvimento de coletas e análise de dados concretos, potencializando
encadeamentos de evidências e avaliações da teoria previamente admitida e desenvolvida na
14
investigação, com a finalidade de construir uma teorização que conta de insncias
implicadas na constituição de um estudo (MARTINS; THEÓPHILO, 2007).
Para poder investigar a problemática dessa pesquisa, desenvol-la teoricamente e dar
conta dos cruzamentos de dados e análises a partir de exemplos casos concretos, elegeu-se
quatro casos distintos. Em cada um desses casos, buscou-se as semelhanças entre as
metodologias de constituição de tendências aplicadas e o escopo ferramental/metodológico
proposto por esse estudo. Ao mesmo tempo, procurou-se contemplar cruzamentos de dados
entre os mesmos, de modo a demonstrar as semelhanças existentes nas práticas metodológicas
operantes, independente da queso temporal implicada no processo de configuração de
tendências. Apenas no último exemplo no quarto caso foi empregada uma formulação
distinta, visto esse se constituir como um exemplo aplicado da metodologia proposta nesse
estudo.
Nesse ínterim, buscou-se a inclusão dos seguintes casos no desenvolvimento dessa
investigação: metodologia de constituição de tendências de ciclo longo, correspondendo ao
título de Perspectiva Macrossociais, desenvolvida pela socióloga Susana Saulquin. Esse caso
foi escolhido devido ao fato que Saulquin trabalha com a constituão de tendências para
períodos longos, compreendidos em até dezoito anos. Suas considerações se dão em
plataformas analíticas de três de uma tendência.Para a socióloga, a moda constitui-se como
um campo de análise de complexidades, permitindo a configuração de análises do devir em
nível macro-social. Procurou-se esse caso também pelo fato de Saulquin analisar as relações
existentes entre acontecimentos sociais e características arranjadas em objetos (artefatos),
visto esse ser um dos pressupostos fundamentais para o estudo a partir do escopo teórico e
ferramental do mesmo. Para esse estudo, essas características assumem o status de códigos,
passíveis de decodificação e assimilação por instâncias projetuais.
Outro caso incluído no desenvolvimento dessa investigação circunscreve-se a
metodologia empregada pela empresa de comercialização de conteúdos de tendências,
WGSN. A inclusão desse caso contempla a constituição de tendências concomitantes a outra
abordagem temporal. Analisou-se, assim, a configuração das chamadas Macrotendências,
elaboradas a cada dois anos pelo time de experts da empresa. A metodologia empregada pela
empresa, para efetivar tal tarefa, busca relacionar acontecimentos (fenômenos) operantes na
atualidade a diversas áreas de projetação, tendo a moda como um dos campos de atenção e
convergência analítica. As Macrotendências constituídas pela WGSN, assim, partem das
15
relações entre campos de representação de subjetividades e visam a futura configuração de
insights criativos a projetos, tanto de moda, como de outras áreas. Ao eleger tal caso para a
coleta de dados, buscou-se a constituição de cruzamentos entre apontamentos feitos por
Saulquin e as orientações teóricas que fundamentam o escopo ferramental da metodologia
construída nesse estudo. Essa prática visa oferecer subsídios de como a metodologia proposta
nessa investigação constrói relações com distintas abordagens de constituição de tendências.
Nesse sentido, entende-se que, independente da dimensão temporal implicado no processo, as
etapas apontadas nesse estudo podem auxiliar na configuração de estratégias para projetos de
moda.
O terceiro caso, incluído no desenvolvimento dessa investigação, diz respeito ao
método de análise de dados para a composição de uma temática central de desenvolvimento
projetual que, a título dessa investigação, convencionou-se chamar de narrativas projetuais.
Esse método é circunscrito aos projetistas da marca de calçados de plástico Melissa, e esse
caso foi escolhido por se inscrever de forma relevante no campo da moda atual. Buscou-se,
assim, compreender os possíveis cruzamentos entre os pressupostos de orientação desse
estudo e outra dinâmica temporal de constituição de tendências, compreendida no prazo de,
praticamente, um ano. Essa dimensão temporal, segundo os projetistas da marca, começa a ser
considerada de modo retroativo, sempre tendo em conta o lançamento de uma nova coleção
de calçados Melissa. Partindo desse pressuposto, engendraram-se novos cruzamentos entre
dados e aportes tricos, potencializando a configuração de relações entre os casos
predecessores e a teorização fundamental da metodologia de constituição de tendências
proposta nessa investigação. Nesse sentido, procurou-se entender quais as implicações entre
sensibilidades emergentes no meio sociocultural e a projetação de artefatos de moda, mesmo
que circunscritos a uma área específica de atenção ( no caso, calçados de plástico).
O quarto e último caso busca demonstrar as relações entre micro e macro-ambientes
socioculturais, embasando esse cruzamento a partir do desenvolvimento de conteúdo para
uma área específica do portal de pesquisa de moda Usefashion. Essa área do portal chama-se
Tribos Urbanas e prevê, periodicamente, o desenvolvimento de conteúdo analítico sobre um
coletivo urbano determinado, um potencial nicho de mercado: um microambiente relacional
que exponencialmente aponta para o devir cultural a partir de sensibilidades emergentes
relacionadas a um número reduzido de indivíduos. A inclusão desse caso deveu-se ao fato do
mesmo demonstrar, de modo operativo, o funcionamento das etapas que compõe a
metodologia de constituição de tendências proposta nessa investigação, além de contemplar
16
um dos objetivos de estudo dessa pesquisa, ou seja, investigar como o devir sociocultural é
passível de ser projetado tanto em vel macro, quanto micro ambiental Parte-se do
entendimento que ambos possuem relações entre si, convergindo para novos entendimentos
quanto a projetação de futuros artefatos de moda com inerente import simbólico.
Para contemplar a coleta de dados dos três primeiros casos, foram realizadas
entrevistas com diversos profissionais. Essas entrevistas corresponderam a formalização semi-
estruturada, pois entende-se que essa modalidade de entrevistas pode dar subsídios para
encontrar respostas às proposições levantadas ao longo desse estudo, bem como, auxiliar na
fundamentação e constituição de uma metodologia de Design Estratégico para o design de
moda.
Essa modalidade de entrevistas também possibilita a percepção de aspectos subjetivos,
construindo uma importante relação com pressupostos fundamentais desse estudo e os casos
eleitos.
O escopo de perguntas, fundamentalmente, correspondeu às seguintes questões:
1) Qual a metodologia de identificação de sinais, e fragmentos discursivos, que
potencialmente podem levar à constituição de tendências, empregada (pela
empresa, pelos projetistas ou, pela profissional que trabalha com a projetação do
devir)?
2) Quais o os passos constitutivos dessa metodologia e quais os pressupostos de
orientação (existe uma perspectiva de relevância de acontecimentos operantes,
fenômenos de transformação, ou aporte analítico implicada no processo)?
3) É possível analisar, a partir dos artefatos (independente da área de representação
que o mesmo esteja circunscrito), características que apontem para acontecimentos
operantes em nível sociocultural? Qual a implicação dessa análise na constituição
de tendências, macrotendências ou narrativas projetuais?
4) Qual a dimensão temporal implicada no processo de constituição de tendência
empregado pela empresa, pelos projetistas ou pelo profissional?
5) Existe uma dimensão estratégica posicionamento de mercado, direcionamento
projetual, ou outra implicada no processo de constituição de tendências,
macrotendências ou narrativas projetuais empregada?
17
6) Qual a importância de configurar caracterizações projetuais a partir da percepção
do intangível?
7) É possível circunscrever algumas áreas de representação, para a posterior análise e
relevamento de dado que permitam a constituição de cenários de projetação do
devir?
Esse escopo de questionamentos serviu de orientação prévia para a coleta de dados
fundamental dos casos Perspectiva Macrossociais, relativo à socióloga Susana Saulquin,
Macrotendências, relativo à empresa WGSN, e narrativas projetuais, circunscrito à marca de
melissa. Tendo essas perguntas por base, foram efetivados novos questionamentos, sendo
esses realizados conforme o desenvolvimento das entrevistas no momento de realização das
mesmas. Essa liberdade de relevância corresponde ao método de entrevistas eleito para tanto
como foi anunciado anteriormente nesse trabalho. Nesse sentido, novos e importantes
dados foram oferecidos. Para cada entrevista realizada, foram eleitos os dados mais
significativos, no intuito de proporcionar a melhor compreensão da imporncia desse estudo
para o campo do design de moda e, conseqüentemente, para a configuração de análises que
permitissem compreender como é possível projetar o devir e, assim, configurar estratégias de
projetação.
Por sua vez, as análises construídas a partir do quarto exemplo o caso relativo ao
conteúdo periódico construido para o portal de pesquisa de moda Usefashion caracterizam-
se a partir da prática com os instrumentos metodológicos que compõe o escopo ferramental
proposto ao longo dessa investigação. Nesse sentido, o quarto caso, realizado com a
colaboração da mestranda em design Ana Bender, pode ser considerado uma experimentação
do método, permitindo um formato de visualização do funcionamento operativo das etapas
que constituem a metodologia de constituição de tenncias aqui proposta.
A metodologia, que visa oferecer soluções a problemática desse estudo, constitui-se a
partir das seguintes ferramentas e conceitos ativos:
1 Observação de contextos de mediação simbólica. Essa observação pode ser
efetuada através dos métodos de etnografia e netnografia. Entende-se, pois, que ambas formas
de observação possibilitam a análise do teor relacional existente entre objetos (artefatos) e
indivíduos, permitindo a constituição de um discurso que conta de antecipar
desdobramentos intersubjetivos. Desse modo, entende-se que contextos concretos e não-
concretos (virtuais) de fruição apresantam-se como ambientes de promoção de trocas
18
simbólicas entre artefatos e indivíduos. Assim, a realização de observões orientadas, no
sentido de perceber aspectos subjetivos, podem levar a construção de análises a respeito do
teor comunicacional entre sensibilidades emergentes no contexto sociocultural e sinais
desdobrados em várias plataformas de representação.
Esses contextos de observação tanto podem ser relacionados a campos circunscritos
como arte, arquitetura, música, cinema e mídias como a espaços de socialização entre
indivíduos (microambientes relacionais), que também podem atingir o status de
acontecimentos preponderantes, instaurando interconexões entre necessidades latentes
relativas aos indivíduos e perspectivas projetuais. Esses microambientes relacionais se
desenvolvem em plataformas de objetivação de trocas, como comunidades sociais (presentes
no ambiente digital), sites, blogs e microblogs.
2 Intertextualidade: esse conceito operativo apresenta-se de suam importância na
configuração do método proposto nessa investigação. Inclui-se a intertextualidade por
entender que o meio sociocultural é permeado por signos que visam gerar significados, e que
essa dinâmica se estabelece a partir da necessidade de dar vazão à subjetividades latentes.
Nesse sentido, o teor dialógico que existe entre arranjos sígnicos e o meio sociocultural pode
ser percebido através de fragmentos textuais artefatos relativos a diferentes áreas de
formalização de subjetividades arranjados de modo a formalizar ideias que fluem entre
indivíduos. Embasada, pois, no dialogismo bakhtiniano, a intertextualidade permite duas
operações fundamentais: a decomposição das estruturas discursivas e a posterior configuração
de relações entre as mesmas, de modo a proporcionar a geração de novos sentidos. Essa
prática pode atuar a partir de cruzamentos sincrônicos e anacrônicos, permitindo replicações
de códigos em dinâmicas relacionais tanto horizontais, como helicoidais.
A primeira empresa visa desvelar a esncia comunicacional de um texto (um
discurso), possibilitando chegar até a unidade dialógica fundamental, que, a preceito desse
estudo, relaciona-se com a potencia criativa que liga indivíduos, podendo ser entendida como
a ideia que fundamenta um representação. Nesse ínterim, entende-se que existam potenciais
sensibilidades emergentes no meio sociocultural. Estas, por sua vez, podem estar ligadas a
necessidades latentes e desejos relativos a indivíduos.
a segunda empresa, relacionada a intertextualidade, visa possibilitar a configuração
de composições em torno da unidade dialógica fundamental, constituindo interrelações entre
19
fragmentos textuais de modo a gerar novos sentidos a partir de alterações no conjunto,
segundo as palavras de Barthes (1996).
3 Pesquisa Blue Sky: componente do escopo ferramental do Design Estratégico, a
pesquisa Blue Sky permite a busca por estímulos criativos, particularmente imagéticos, nas
mais diferenciadas áreas. Constitui-se, pois, uma relação de complementaridade entre a
intertextualidade e essa ferramenta: se a intertextualidade permite a decomposição e posterior
composição de estruturas, a pesquisa Blue Sky atua como mecanismo de procura de exemplos
imagens, principalmente no intuito de desdobrar o entendimento do sentido constituído a
partir da unidade dialógica fundamental identificada. Temáticas e categorizações podem advir
dessa prática, possibilitando o desenvolvimento de novos vínculos direcionados a projetação
de artefatos (tanto de moda, como de outros campos). Discussões e seções de brainstorming
se configuram como meios de chegar até essas considerações, podendo esses formatos ser
entendidos como metodologias de apoio, úteis a essa ferramenta.
4 Cenários: pressupondo que estruturas podem ser decompostas e recompostas,
entende-se que tendências são constituídas e, assim, funcionam como narrativas que visam
desdobrar futuros projetos de moda. Para esse estudo, portanto, tendências são cenários de
projetação, partindo do pressuposto de que a percepção do devir sociocultural embase esse
processo de representação e formalização de sentidos. Dessa forma, a configuração de
cenários permite antecipar complexidades envolvidas nessa prática, proporcionando, aos
designers, eleger as variáveis que nortearão formalizações futuras. Portanto, cenários
configuram-se como narrativas que possibilitam vislumbrar estratégias projetuais para o
design de moda.
Desse modo, esse estudo busca demonstrar a atuação tanto de cada uma dessas
ferramentas, como a converncia entre as mesmas no sentido de solucionar a problemática
geradora do mesmo. Entende-se, pois, que antecipar desdobramentos relativos ao meio
sociocultural mostra-se como um amplo terreno para o desenvolvimento de estratégias, a
partir da lógica de projetação do design. Essa perspectiva apresenta-se como uma das
justificativas desse trabalho, embasando a mesma na relevância desses aspectos para a
configuração de posicionamentos mercadológicos para empresas, organizações e marcas.
Justifica-se também o empreendimento desse estudo o fato de existirem poucas
investigões acerca de metodologias que dêem conta do tema proposto: tenncias para o
design de moda. O tema tenncias assumiu grande foco de interesse na atualidade, devido a
20
necessidade de se prever o futuro a fim de permitir o desenvolvimento de estragias que
possam lidar com as instabilidades do mercado. Entretanto, os caminhos para o entendimento
de como isso é possível ainda apresentam-se carentes de análises e reflexões teóricas,
principalmente no tocante ao campo da moda e, também, do design.
A constituição desse trabalho estruturou-se em três catulos de desenvolvimento. O
primeiro capítulo parte de conceitualizações importantes para esse estudo, como Design
Estratégico, moda como design, inovação, estratégias e inovações em nível de significado.
Após esses pressupostos introdutórios, o mesmo capítulo aborda questões como cultura e
moda, construindo um raciocínio que procura localizar a moda como um sistema sígnico,
relacionando essa perspectiva às queses que se desdobraram para que a moda assumisse o
status de campo gerador de cultura no meio social. A partir desse entendimento, procura-se
argumentar acerca da moda enquanto meio de constituição de discursos e alguns formatos de
disseminação sígnica configurados ao longo do tempo pelo sistema da moda, como formas de
associar indivíduos e aspirações às suas sistemáticas de atuação. Analisando a questão sob
esse prisma, chega-se a signos, sinais e o espírito do tempo. A inclusão dessas considerações
busca configurar modos de entendimento a respeito da moda como campo de convergência de
aspectos latentes e intangíveis, desdobradas em outras instâncias de representação de
subjetividades relativas aos indivíduos. A partir do entendimento desses fatores, incluiu-se
análises a respeito do que vêm a ser sensibilidade emergentes no meio sociocultural e a
relação dessas aos fluxos criativos desdobrados entre os indivíduos, visto que essas
considerações podem levar a importância de identificação tanto dos chamados emissores de
sinais, como do que conveniou-se chamar ideia fundamental. Nesse sentido, entende-se que
esses pressupostos estão associados às questões relevadas anteriormente, e que existe uma
dinâmica íntima de relação entre a emissão de sinais fragmentados no processo de semiose
cultural e a configuração de outros formatos de disseminação sígnica para a construção de
novos significados.
O segundo capítulo desse estudo apresenta cada uma das ferramentas e dos conceitos
operativos que compõe a metodologia proposta. Para tanto, busca-se a conceitualização desse
escopo ferramental, de modo a demonstrar, nessa prática, a perspectiva operativa do mesmo.
Nesse sentido, entende-se a importância de localizar cada uma das etapas que compreendem o
método proposto, demonstrando, num primeiro momento, o funcionamento de cada
ferramenta proposta, para após argumentar acerca do funcionamento concatenado das
mesmas. Entende-se, também, que o método apresentado se caracteriza como um modus
21
operandi de vários aspectos relevados no primeiro capítulo desse estudo, configurando-se
análises sobre essas prerrogativas ao longo da construção da metodologia. Cruzamentos
analíticos são objetivados de modo a desdobrar essa perspectiva, potencializando o
entendimento da forma operativa tanto das ferramentas em si, como do método composto por
estas.
O terceiro capítulo de desenvolvimento dessa investigação busca abordar casos, em
diferentes formatos, no intuito de demonstrar a partir de análises e cruzamentos de dados a
utilização do método de constituição de tendências proposto na problemática geradora desse
estudo. A escolha dos casos demonstra tanto as semelhanças operativas das metodologias
utilizadas pelos projetistas de cada caso em separado, ao escopo ferramental proposto nessa
investigação, como apresenta a configuração prática do método em si. Nesse sentido, busca-se
encontrar subsídios que tanto permitam contemplar soluções ao problema central desse
estudo, como, de demonstrar a importância estratégica de projetar o devir. A culminância
dessas análises também procura solucionar questões levantadas ao longo dessa investigação,
convergindo para a construção de uma lógica premente ao longo da mesma, ou seja, que no
contexto atual tendências são artifícios ficcionais que dão conta de localizar e relacionar
subjetividades, de modo a permitir o desenvolvimento de estratégias projetuais aptas a
posicionarem instâncias mercadológicas. Essa prática apresenta-se perpassada pela
constituição de diálogos relacionados a representações subjetivas, permitindo a instauração de
níveis de comunicabilidade entre indivíduos (usuários), empresas/organizações e artefatos de
design de moda.
22
CAPÍTULO I
1.1 DESIGN COMO PROJETO: O DESIGN E SUA PERSPECTIVA ESTRATÉGICA
Partindo da perspectiva fenomenológica como forma de entendimento do design na
contemporaneidade, Bertola (2006) e Celaschi e Deserti (2007) conceituam essa disciplina
como um meio de associar instâncias diversas relativas ao interno e ao externo das
organizações. O usuário e suas necessidades, os valores sociais emergentes e a capacidade de
interpretação desses e também, de associação dessas variantes ao escopo de valores de
orientação interna das empresas/organizações propiciam novos desdobramentos para o
design. Nesse sentido, a perspectiva dicotômica, instaurada ao longo da história, que
conceitua o design como meio de concatenar forma e função aos artefatos, parece encontrar-
se superada.
Segundo Verganti et al.: Corporations are loking for an approach for developing
products that are not only functionally as superior but that also create an emotional link
between the product and the consumer(VERGANTI ET AL., 2006, p.154)
1
.
Quando fala-se em desenvolver características emocionais, agregando interfaces que
extrapolem a funcionalidade dos produtos, é possível que se reconheça o design como um
meio de criar vínculos entre campos distintos de conhecimentos e práticas. Para tanto, pode-se
considerar o design como uma disciplina projetual, que subentenda etapas processuais, e que
as mesmas visem o desenvolvimento de caractesticas diversas para projetos.
Esse raciocínio encontra eco tanto no conceito de design oferecido pelo sociólogo
Dario Caldas, em seu livro Observatório de Sinais, como em suas considerações tecidas
acerca, especificamente, de design de moda. Para Caldas, o termo design éGeralmente
utilizado com sentido de projeto, isto é, o planejamento de etapas coordenadas para obter um
resultado (objeto, produto, ambiente ou serviço)” (CALDAS, 2004, p.212).
Dessa forma, é possível compreender que a perspectiva do design enquanto projeto
pode, também, extrapolar a projetação de produtos físicos, subentendendo a importância
1
A tradução de Verganti é livre, ou seja, da autora:As corporões estão procurando por uma abordagem para
desenvolver produtos que são não somente superiores funcionalmente, mas que também criem uma ligação
emocional entre o produto e o consumidor”.
23
também de projetar serviços e experiências. Essa forma de compreender o design permite ir
além de atributos estéticos-formais dos objetos que também podem ser considerados
artefatos possibilitando a inserção de perspectivas intangíveis ao ato de projetação.
Para Celaschi e Deserti (2007), esse pressuposto é possível a partir de uma nova forma
de abordagem relativa aos artefatos de design. Esse entendimento passa pela prerrogativa do
design como meio de projetar mercadorias contemporâneas, e essas visam atender dinâmicas
de fruição que vão além da premissa de funcionalidade objetual.
Oggi, si parliamo di merci all‟interno delle discipline dell‟innovazione design
driven, includiamo sicuramente tutte le forme di bene tangibile, i servizi e el
esperienze. In buona sostanza ci occupiamo di tutto cio che può diventare strumento
di soddisfazione di um consumatore atraverso la sua programmata e progettabile
messa “in forma di mercê”, che transforma un bene qualsiasi in matéria di scambio
di mercato (CELASCHI; DESERTI, 2007, p.16)
2
.
Partindo dessas noções, pode-se considerar que o design se estabelece de fato como
projeto e, sendo assim, visa satisfazer novas demandas, que partem dos usuários, portanto, dos
indivíduos, e que permitem às empresas e organizações a geração de novas interfaces entre o
mercado e as mercadorias.
Essas considerações também conribuem para o entendimento do design como uma
disciplina que busca criar vínculos, e que esses vínculos visam a geração de novos canais de
comunicação entre usuários, empresas e artefatos. A geração de vínculos, portanto, pode se
dar no momento em que o design atua como associação entre conhecimentos, visto que para a
geração dos citados canais de comunicação, mostra-se importante a associação de
competências distintas. Ou seja, o design como projeto permite a assimilação, e
funcionamento concatenado, de múltiplas disciplinas.
Para o filósofo Flusser (2007), o design pode ser visto como um meio de associar arte
e cnica, de modo que é possível estabelecer, através do ato de projetação, uma espécie de
ponte entre essas instâncias do conhecimento. Essa argumentação de Flusser parte da
compreensão dos desdobramentos de significado que a palavra design sofreu conforme a
interferência da cultura social. Nesse sentido, no contexto atual: [...] as palavras design,
máquina, técnica, ars e Kunst eso fortemente relacionadas; cada um dos conceitos é
impensável sem os demais, e todos eles derivam de uma mesma perspectiva existencial diante
2
A tradução de Celaschi e Deserti é livre, ou seja, da autora: Hoje, se falamos de mercadorias nas disciplinas de
inovão dirigidas pelo design (design driven), incluímos seguramente todas as formas de bens tangíveis, os
serviços e a experiência. Em essência nos ocupamos de tudo aquilo que pode tornar-se instrumento de satisfação
de um consumidor através de sua programada e projetável aposta em formas de mercadorias”, que transforma
um bem qualquer em material de comércio no mercado.
24
do mundo” (FLUSSER, 2007, p.183). para Krippendorff in Verganti et al., é possível
compreender o design da seguinte forma:
The etymology of design goes back to the Latin de + signare and means making
somenthing, distinguishing it by a sign, giving it significance, designating its
relation to other things, owners, user or goods. Based on this original meaning, one
could say: design is making sense (of things) (KRIPPENDORFF apud VERGANTI
ET AL., 2006:157)
3
.
Ora, se o design pode se constituir como uma plataforma projetual que construa
significados a partir de marcas, pode-se avaliar suas perspectivas: primeiro, que decompor
essas marcas pode levar ao entendimento de quais são os significados que estão sendo
configurados no projeto, bem como, o que eles comunicam e para quem; segundo, que
partindo desses pressupostos, considera-se que a orientação epistemológica estruturalista
mostra-se apropriada para o entendimento dessa dinâmica, proporcionando formas de
compreender como é possível construir novos vínculos a partir da associação entre estruturas,
levando em consideração a implicação dessa prática em atos de projetação de artefatos.
Entende-se, pois, que as marcas designadas em um projeto o configuradas como signos
constitutivos do mesmo. Esses signos, portanto, podem estar destinados à constituição de
sentidos, e, quando arranjados, propiciam a compreensão do discurso que embasa o projeto
em si. Esse discurso pode se relacionar a diversas insncias, como tecnológica, funcional,
social, cultural, ou, formal. Cada uma dessas instâncias pode apontar tendências de
projetação, entretanto, para esse estudo, entende-se que demandas socioculturais possam
auxiliar na geração de sentidos e, assim, levar à constituição de inovações em nível de
significados.
Portanto, tratando-se de design estratégico, quais etapas seriam necessárias para
desenvolver conhecimento acerca de demandas socioculturais e, a partir das mesmas,
identificar e tornar visíveis marcas que possam traduzir complexidades relativas às tendências
de forma e significado?
A próxima seção desse estudo ocupar-se-á de buscar respostas a esse questionamento.
3
A tradução de Krippendorff in Verganti et al. É livre, ou seja, da autora: A etimologia da palavra design
remonta do latim de + signare e significa fazer alguma coisa, distingui-la com um sinal, dar a ela significância,
designando uma relação às outras coisas donos, usrios ou bens. Baseado neste significado original, pode-se
dizer: design é tirar sentido (das coisas).
25
1.2 DESIGN ESTRATÉGICO: O METAPROJETO E A IMPLEMENTAÇÃO DA
CULTURA DO PROJETO
Segundo orientações centrais de alguns teóricos que se ocupam do que vem a ser o
Design Estratégico, o mesmo pode ser dividido em duas grandes fases. A primeira fase,
intitulada Metaprojeto, pode ser entendida como a fase das pesquisas, onde questões relativas
à empresa, ao setor onde essa atua, aos potenciais usuários da mesma e às questões relativas
ao meio sociocultural são relevadas, de modo a proporcionar novas soluções ao briefing
original do projeto. Essa forma de construir um olhar amplo e processual permite a
constituição de concepts de projeto, que servem como meio de orientar a construção de
cenários de desdobramento projetual. Realizadas essas etapas, é possível vislumbrar qual o
melhor caminho ou, qual a melhor solução ao briefing, ou seja, ao problema original de
projeto e, assim, parte-se para a etapa de concretização de uma determinada solução,
conhecida como Projeto. Desse modo, torna-se possível o desdobramento das características
de um designer/projetistas segundo as orientações do DE, que são: ver, prever e fazer ver.
(CELASCHI; DESERTI, 2007, p.09-122).
Segundo Celaschi e Dessserti, a fase Metaprojetual pode assim ser entendida:
Per trattegiare i confini dell‟ambito disciplinare di cui ci occupiamo, come docenti,
come consulenti e come studiosi, utilizziamo il termine meta-progetto”
conferendogli il valore di um articulato e complesso sistema di conoscenze ed
esperienze che riguardano del processo di progettazione più che la natura del
risultato (CELASCHI; DESERTI, 2007, p.9)
4
.
Portanto, compreende-se que a fase Metaprojetual se trata do momento em que vários
conhecimentoso interrelacionados, no sentido de oferecer novas visões ao projeto. Trata-se,
pois, do momento de constituição de vínculos, sendo que os mesmos podem ser desdobrados
em rumos distintos, dependendo do briefing original e das necessidades apontadas pela
empresa/organização.
A articulação desses conhecimentos distintos em torno da busca de soluções também
pode gerar a reproblematização do projeto, sendo essa uma dinâmica que permite aos
designers/projetistas o desenvolvimento de vínculos de projetação praticamente inéditos.
4
A tradução de Celaschi e Deserti é livre, ou seja, da autora: Para pontuar limites da especificação para a qual
nós, como professores, consultores e acadêmicos utilizam o termo “meta-projeto” que o valor de um sistema
complexo e articulado de conhecimentos e experiências sobre o processo de design mais do que para a natureza
do resultado.
26
Essa reproblematização visa proporcionar a concepção de estragias mercadológicas
diversas, visto ser o Metaprojeto um momento de questionamentos e de configuração de
visões projetuais futuras. Consoante Moraes:
Metaprojeto: que vai além do projeto, que transcende o ato projetual, trata-se de uma
reflexão crítica e reflexiva sobre o próprio projeto a partir de um cenário aonde se
destacam fatores produtivos, tecnológicos, mercadológicos, materiais, ambientais,
sócio-culturais e estético-formais, tendo como base análises e reflexões
anteriormente realizadas através de prévios e estragicos recolhimentos de dados.
Pelo seu cater abrangente, o metaprojeto explora toda a potencialidade do design,
mas não produz out-puts como modelo projetual único e soluções técnicas pré-
estabelecidas. Neste sentido, o metaprojeto pode ser considerado o “projeto do
projeto”, ou melhor dizendo, o “design do design” (MORAES, 2006, p.2).
Nesse sentido, a implementação dessa fase, que pode ser entendida como o “design do
design”, segundo o autor, ressalta a importância de envolver vários setores da
empresa/organização de modo a buscar soluções onde sejam associados conhecimentos
distintos, privilegiando abordagens diferenciadas ao briefing projetual. Buscar, pois, a
agregação de conhecimentos em vista da constituição de nculos de projetação é uma
importante perspectiva para o design enquanto projeto. Dessa forma, a incorporação de uma
cultura projetual nas empresas evidencia-se fundamental, e a mesma pode contribuir para o
desenvolvimento de estratégias mercadológicas diversas.
A cultura de projeto pode permitir o cruzamento entre conhecimentos relativos a
setores como marketing, gestão, humanidades, engenharias, comunicação e distribuição, e o
encontro entre essas perspectivas distintas pode auxiliar na construção de novas soluções
projetuais, direcionando soluções criativas e inovadoras ao briefing. Essa perspectiva parte da
análise do projeto como um todo concatenado, onde as interrelações de conhecimentos e
informações possibilita a configuração de in-puts projetuais. Essas relações entre
conhecimentos, então, permitem a constituição de características diversas em artefatos,
potencializando diálogos que poderão ser perceptíveis a partir dos arranjos sígnicos
constituídos em um determinado projeto marcas que visam a constituição de sentido.
Portanto, a construção de estratégias a partir da lógica de projetação do design pode
estar associada a essa dinâmica de cruzamento de conhecimentos, ou seja, à perspectiva de
associar visões diversas em torno do briefing original. Ao reproblematizar o briefing, os
projetistas não apenas eso oferecendo suas soluções ao problema, mas também estão
abrindo a possibilidade para que a empresa/organização se reposicione frente à concorrência
do mercado, embasando suas considerações em uma plataforma multidisciplinar de
constituição projetual que busca a inovação.
27
Mas, o que vem a ser inovação?
Segundo Tidd, Bessant e Pavitt (2005), inovação é um processo que se estabelece a
partir da mudança:
O que entendemos por “inovação”? Estamos basicamente falando de mudança, e
esta pode assumir diversas formas. [...] Inovação de produto mudança nas coisas
(produtos, serviços) que uma empresa oferece; Inovação de processo mudanças na
forma em que produtos/serviços são criados e entregues; Inovão de posição
mudanças no contexto em que produtos/serviços são introduzidos; Inovação de
paradigma mudanças nos modelos mentais subjacentes que orientam o que a
empresa faz (TIDD, BESSANT e PAVITT, 2005, p.30).
Segundo os autores, a inovação é movida pela habilidade de estabelecer relações,
detectar oportunidades e tirar proveito das mesmas (TIDD, BESSANT E PAVITT, 2005).
A possibilidade de se inovar a partir do estabelecimento de relações entre
conhecimentos e competências distintas é também considerada por Verganti et. al., para quem
a inovação trata-se de um processo onde é necessário relacionar três tipos distintos de
conhecimentos:
[...] knowledge about user needs; knowledge about technological opportunities; and
knowledge about product languages. The last component concerns the signs that can
be used to deliver a message to the user and the semantic context (socio-cultural
models) in which the user will give meaning to those sign (e.g., the symbols,
indexes, and icons a designer might choose to deliver a message of a “human light”
to the user) (VERGANTI ET AL., 2006, p. 163-164)
5
.
Analisando a questão sob esse prisma, é possível considerar que existem diferentes
formas de tangibilizar mudanças, sinalizando inovações em níveis distintos, podendo cada
qual comunicar seu âmbito de atuação. Nesse sentido, considera-se pertinente a esse objeto de
estudo a perspectiva de como é possível inovar em vel de significados, ou seja, como é
possível comunicar novos pressupostos simbólicos a partir de projetos de design. Nesse
ínterim, considera-se que a identificação de necessidades latentes relativas aos usuários é
fundamental para a configuração do que Verganti et. al. classificam como sinais.
Inovar significados: ressignificar, re-interpretar códigos. Está se falando sobre meios
de tangibilizar mudanças, e essas pode estar ocorrendo no meio social. Nesse sentido,
tangibilizar mudanças relaciona-se com tornar perceptíveis fenômenos socioculturais
operantes, e que essa dinâmica pode estar relacionada à configuração em códigos. Esses
5
A tradução de Verganti é livre, ou seja, da autora: […]conhecimento sobre as necessidades dos usuários,
conhecimento sobre as oportunidades tecnológicas; e conhecimento sobre linguagens de produto. O último
componente diz respeito aos sinais que podem ser usados para transmitir uma mensagem ao usrio e ao
contexto semântico (modelos sócio-culturais) no qual o usuário dará significado àqueles sinais (por exemplo, os
símbolos, índices e ícones que um designer poderá utilizar para transmitir uma mensagem de uma “luz humana”
ao usuário).
28
códigos visam substituir, estruturadamente, fenômenos operantes (acontecimentos). Essa
empresa possui um teor de subjetividade associada, primeiramente, á substituição e, após, à
representação dessa. Nesse sentido, torna-se passível o entendimento de certas mudanças
comportamentais através de decodificações decomposições das estruturas. Como argumenta
Flusser, códigos podem ser entendidos “[..]como um sistema de símbolos. Seu objetivo é
possibilitar a comunicação entre os homens. Como os mbolos são fenômenos que
substituem (“significam”) outros fenômenos, a comunicação é, portanto, uma substituição
[...]” (FLUSSER, 2005, p.130).
Nesse contexto, questiona-se: a perspectiva de constituir marcas em projetos - que,
após a contribuição de Flusser, podem ser entendidas como meios de sinalizar fenômenos
operantes pode vir a se caracterizar como uma plataforma para o desenvolvimento de
estratégias projetuais, levando o design a potencializar a geração de valor para as
empresas/organizações?
A seção seguinte desse estudo buscará conceitualizar estratégia para, a partir desse
pressuposto, oferecer respostas a esse questionamento.
1.3 ESTRATÉGIAS E A INOVAÇÃO EM NÍVEL DE SIGNIFICADOS
O entendimento de estragia pode assim ser introduzido:
Uma estratégia é o padrão ou plano que integra as principais metas, políticas e
seqüências de ão de uma organização em um todo coeso. Uma estragia bem
formulada ajuda a organizar e alocar os recursos de uma organização em uma
postura única e viável, baseada em suas competências e deficiências internas
relativas, mudanças antecipadas no ambiente e movimentos contingentes por parte
dos oponentes inteligentes (QUINN, 2006, p.29).
Ora, analisando o que vem a ser uma estratégia, pode-se afirmar que o design, na
forma como ele es sendo articulado por alguns teóricos na contemporaneidade, oferece
meios de desenvolvimento desta (ou, destas). Nesse interím, a fase Metaprojetual, com suas
pesquisas constitutivas, parece também proporcionar caminhos para planejamentos
estratégicos, principalmente quando se analisa a perspectiva de mudanças antecipadas no
ambiente. Portanto, é possível que o desenvolvimento de estratégias projetuais sejam
articuladas quando aspectos subjetivos, relativos aos usuários (indivíduos), sejam associados
29
às etapas processuais, viabilizando a criação de cadeias de valor que ultrapassem as
caracterizações tecnológicas, formais e produtivas de artefatos.
Segundo Celaschi e Deserti, a mercadologia contemporânea a disciplina que busca
compreender as implicações relacionadas às mercadorias como bens de consumo pode ser
dividida em três esferas de relevância, sendo que uma dessas esferas se ocupa em
compreender os pressupostos fenomenológicos envolvidos ao valor das mercadorias. Nesse
sentido, pode-se considerar que esses pressupostos contemplem questões relativas aos desejos
e necessidades dos usuários, levando, por fim, a constituição de cadeias de valor em nível
simbólico, principalmente quando arranjados as necessidades e os desejos - de modo a
configurar ligações com fatores relevantes e operantes no meio sociocultural (CELASCHI e
DESERTI, 2007, p. 21).
Retoma-se aqui o pressuposto de que o design constrói sentido e deixa marcas, e que
essas marcas, podem ser entendidas como signos constitutivos de projetos. Esses signos
relacionam-se a sinais, podendo esses anunciar mudanças prementes no contexto
sociocultural. Nesse sentido, os sinais podem ser entendidos como códigos, que, após a
contribuição de Flusser, podem levar ao entendimento do teor de substituição simbólica
implicada no processo. Essas mudaas vigentes, então, podem ser caracterizadas como
fenômenos, ocorrendo em diversas insncias relativas aos indivíduos, podendo estar sendo
articulados no meio sociocultural como forma de ligação com necessidades latentes. Essas
mudanças também podem ser entendidas em relação a esse estudo como necessidades não
verbalizadas e, por isso, o quantificáveis, apreensíveis quando da realização de pesquisas
que busquem identificar sinais de transformações operantes entre indivíduos no contexto
social.
Desse modo, extrapolar a tradicional dimensão forma e função de um artefato de
design parece apontar caminhos para o desenvolvimento de estragias que procuram associar
pressupostos simbólicos ao projeto.
Segundo Celaschi e Deserti:
Senza entrare in una ormai sorpassata polemica sulla relazione tra forma e funzione,
possiamo certamente affermare che oggi i fattori di sucesso dei prodotti sono
difficilmente attribuibili alla loro funzionalità. È oggettivamente dificile contestare il
fatto che nessuno acquisti più un prodotto solo per la sua funzionalità: che Il
prodotto funzioni è dato per scontato e la capacitá di assolvimento della funzione
prima non è determinante nella sua scelta. Ciò che conta è semmai la capacitá di
30
piacere, stimolare l‟immaginario, soddisfare i gusti, antecipare un bisogno latente,
emergere, distinguersi [...] (CELASCHI e DESERTI, 2007, p.98-99)
6
.
Os autores apresentam rumos para novos posicionamentos das empresas/organizações
frente ao mercado contemporâneo e, por conseguinte, aos usuários (indivíduos): prazer,
imaginação, satisfação de gostos, necessidades latentes e antecipáveis. Esses aspectos podem
contribuir para o reposicionamento tanto de um problema projetual, como de uma empresa.
Nesse sentido, a premissa de antecipação de necessidades parece despontar também
como meio de unificar metas e planos organizacionais.
Segundo Quinn, as estratégias envolvem objetivos ou metas -, políticas e programas,
levando as organizações à tomarem decisões estratégicas (QUINN, 2006).
As metas (ou objetivos) estabelecem o que vai ser atingido e quando os resultados
devem ser obtidos, mas não [...] como os resultados devem ser atingidos. [...] As
políticas o regras ou diretrizes que expressam limites dentro dos quais a ação deve
ocorrer. [...] Os programas especificam a seqüência de ações passo a passo,
necessária para atingir os principais objetivos. Expressam como os objetivos o ser
atingidos dentro dos limites estabelecidos pelas políticas (QUINN, 2006, p.29).
Já sobre decisões estratégias o autor considera que:
[...] as decisões estratégicas são aquelas que determinam a direção geral de um
empreendimento e sua viabilidade final à luz das mudanças previsíveis,
imprevisíveis e irreconhecíveis que podem ocorrer nos principais ambientes
adjacentes (QUINN, 2006, p.29).
Analisando a questão sob o prisma da inovação e da concorrência de mercado, para
que uma empresa/organização possa constituir um plano de estratégias, o princípio de
antecipação de mudanças relacionadas ao ambiente externo das mesmas se mostra
fundamental. Esse ambiente externo é caracterizado por variáveis diversas, e a perspectiva de
transformações socioculturais interfere de modo significativo no mesmo.
Segundo o sociólogo Dario Caldas, prever as modificações operadas no meio social é
preciso visto que [...] quanto mais complexa se torna a sociedade, maior a necessidade de
planejar e prever e, ao mesmo tempo, mais difícil” (CALDAS, 2004, p.35).
Considera-se, aqui, o princípio de que as relações desdobradas entre os indivíduos
apontam caminhos para o entendimento de suas necessidades latentes, e que as mesmas
6
A tradução de Celaschi e Deserti é livre, ou seja, da autora: Sem entrar em uma já ultrapassada polêmica sobre
a relação entre forma e função, nós certamente podemos dizer que hoje os fatores de sucesso dos produtos são
facilmente atribuíveis à sua funcionalidade. É difícil contestar, objetivamente, o fato de que a compra do produto
se não apenas pela sua funcionalidade: que o produto funciona é um dado adquirido e a capacidade de
executar a primeira função não tem efeito sobre sua escolha. O que importa sim é a capacidade de sentir prazer,
estimular a imaginação, satisfazer gostos, necessidades latentes e antecipáveis, emergentes, que distinguem. [...].
31
podem ser percebidas a partir da compreensão de femenos socioculturais operantes,
objetivadas através de códigos que busquem comunicar esses pressupostos.
Para Celaschi e Deserti, as necessidades latentes se desdobram a partir do que pode ser
considerado desejo, portanto, de condicionantes mutáveis a sujeitos e influenciados por
múltiplas variáveis ambientais. Nesse sentido, as necessidades latentes também podem ser
consideradas ocultas, e tendem a se caracterizar como solicitações não expressas pelo
consumidor, portanto, inesperadas e que são difíceis de quantificar. Podem estar ligadas ao
devir cultural da sociedade, ou seja, aos fenômenos que cercam os indivíduos no meio social
e, desse modo, tendem a incidir sensivelmente sobre a satisfação dos usuários de modo a
surpreendê-los caracterizando-se como caminhos significativos à capacidade de inovação
das empresas (CELASCHI e DESERTI, 2007, p. 99-101).
A percepção de quais são os fenômenos operantes no momento atual (atual em relação
ao ato de projetação de um novo artefato de design), assim, mostrar-se uma forma de
desenvolvimento de estragias, e a geração de interfaces projetuais, segundo esse
entendimento, pode levar a constituição de significados, potencializando a criação de canais
de comunicação em vel não verbal entre artefatos, usuários e empresas/organizações. Por
fim, essa dinâmica visa permitir o desenvolvimento de cadeias de valor que extrapolam a
relação quantificável (diga-se, precificável), relativa a um determinado projeto.
Nesse sentido, antecipar necessidades mostra-se um prática que pode estar associada a
perspectiva de identificação de sinais fortes e fracos fragmentados no processo de
semiose
7
cultural. A identificação desses sinais e sua organização (colocá-los em relação),
potencialmente oferecevínculos projetuais importantes, no tocante ao condicionamento de
características simbólicas que comuniquem os femenos sociais contemporâneos, permitindo
aos usuários o reconhecimento dessas prerrogativas nos artefatos, gerando, portanto, meios de
vincular subjetividade e projetação, através da formalização, ou, do desenvolvimento de
outras características projetuais.
Segundo Verganti et. al., a inovação em nível de significados pode ser considerada
como um caminho para a configuração de canais de comunicação não verbal entre usuários e
artefatos. Para tanto, extrapola abordagens tradicionais no que diz respeito às necessidades
7
Segundo Vitor Manuel de Aguiar e Silva, o processo de semiose pode assim ser entendido: “todo o processo
em que algo (veículo gnico) funciona como sinal de um designatum (aquilo a que o sinal se refere),
produzindo um determinado efeito ou suscitando uma determinada resposta (interpretante) nos agentes
(intérpretes) do processo semiótico [...]” (AGUIAR E SILVA, 2004, p.181).
32
dos indivíduos e ao mercado, estando mais associada à percepção dos sussurros fragmentados
no meio sociocultural, portanto, a sinais diversos, que, quando unidos e colocados em relação,
podem permitir a construção de visões de futuro (VERGANTI ET AL., 2006, p.166-167).
Sobre essa perspectiva, Verganti et al. também afirmam que a inovação em nível de
significados pode ser alcançada através do entendimento, antecipação e influência sobre
necessidades emergentes. Desse modo, observar as modificações operantes no meio
sociocultural visa antecipar, por representação e simulação, quais serão os desdobramentos
futuros das mesmas, permitindo vislumbrar o devir associado a essas modificações. Essa
prática evidencia caminhos de desenvolvimento de estratégias frente às complexidades
mercadológicas contemporâneas, no sentido de antecipar potenciais desdobramentos
socioculturais. Assim, a interpretação de sinais, e a posterior associação entre os mesmos e a
visão da empresa, pode acarretar a configuração de artefatos que possuam características
simbólicas que comuniquem instâncias emergentes. Esse conhecimento é tácito, e depende do
entendimento e da implicação de vários atores no processo. Esses atores tanto podem ser os
próprios usuários de quem podem advir as emergentes necessidades latentes a serem
interpretadas, relacionadas a sinais emitidos como de todo um amplo sistema de relações,
caracterizado pelas empresas/organizações e seus recursos humanos, pelos fornecedores, pelas
instituições de ensino e treinamento, etc. O resultado dessa dinâmica pode ser a modificação
do cenário onde a empresa/organização se insere, em nome da construção de novos e
particulares plataformas de desdobramento projetuais (VERGANTI ET AL., 2006, p.167).
Ou seja, essa modificação de cenário mostra-se como um meio de constituir
estratégias, orientando um plano de ações que vise configurações de sistemas de nculos
projetuais, passíveis de serem tangibilizados em artefatos de design. Ao interpretar os sinais
fragmentados em instâncias de representação relativas ao meio sociocultural, os
designers/projetistas tendem a oferecer caminhos que vinculem transformações operantes aos
projetos, despertando princípios interpretativos aos quais se destinam os artefatos projetados,
comunicando mudaas e o premente devir cultural.
Nesse sentido, considera-se que, antecipar o devir cultural se relaciona à identificação
de necessidades latentes relativas aos usuários (indivíduos), e que essa dinâmica pode se
estabelecer a partir da perspectiva de associação entre essas (as necessidades latentes) e
fenômenos operantes, comunicados através de códigos fragmentados no processo de semiose
cultural. A estruturação dessas variáveis pode objetivar estratégias de orientação a projetos,
33
permitindo a configuração de artefatos de design que estabeleçam canais de comunicação em
nível o verbal, corroborando a perspectiva de ligação entre empresas/organizações,
designers/projetistas e usuários (indivíduos).
Assim, objetiva-se para a problemática central desse estudo: a configuração de uma
metodologia, a partir do Design Estragico, para a identificação de sinais emergentes e a
posterior constituição de tendências que sirvam de orientação estratégica para o Design de
Moda. Essa problemática embasa-se em uma perspectiva transdisciplinar, de modo a oferecer
caminhos para a configuração de cenários que permitam desdobramentos de inovações em
nível de significados para a projetação de artefatos de moda.
A partir da introdução da problemática central desse estudo, faz-se necessário
compreender o que vem a ser moda, design de moda e, obviamente, sinais. O entendimento
dessas prerrogativas possibilita o desenvolvimento da formulação acima citada, além de
apresentar caminhos para a geração de novos questionamentos que auxiliarão no
desdobramento desse estudo.
Analisando a queso sobre o prisma do design como projeto, portanto como meio
relacional complexo que subentende etapas processuais, pode-se considerar a moda como
uma plataforma de desenvolvimento de processos projetuais, no sentido de configurar
vínculos marcas a partir de códigos que sinalizem fenômenos, comunicando
transformações vigentes na sociedade.
Segundo Dario Caldas, a moda apresenta-se como um campo fértil para o
entendimento das modificações operadas na sociedade, visto que os artefatos com a alcunha
de moda permitem compreender como questões comportamentais estão sendo articuladas
entre esferas e indivíduos, apesar da aparente dinâmica de obsolescência implicada no
processo de objetivação de artefatos de moda. A análise de questões de artefatos de moda,
portanto, podem estar construindo relações com o devir, que também pode ser entendido
como o espírito do tempo que se desenha, ou, o l’air du temps, cabendo aos artefatos de moda
bem como, das artes decorativas e da arquitetura, por exemplo - apresentar certos aspectos
que dêem conta de tangibilizar essa variante anímica presente entre os indivíduos e, portanto,
na sociedade (CALDAS, 2004).
A presente pesquisa ressalta os fatores que visam representar o processo de
modificação de uma determinada variante anímica que permeia o meio social, considerando
que o design pode se configurar como uma plataforma de desenvolvimento de cultura, e que a
34
interferência da cultura pode determinar a conformação de novos sinais, potencializando a
identificação de mudanças vigentes, levando à constituão de tendências. Conseqüentemente,
considera-se importante desenvolver a não de cultura, bem como, analisar o processo de
interferência da mesma na configuração de uma sistemática que permitiu o desdobramento da
obsolescência controlada para o desenvolvimento de artefatos de moda.
1.4 CULTURA E MODA
Consoante Arendt, o termo cultura surgiu na antiguidade romana, sendo seu conceito
cunhado a partir da palavra colere, significando, portanto, cultivar, habitar, tomar conta, criar
e preservar. A palavra cultura possuía relação, primeiramente, com o trato do homem com a
natureza, atuando tanto no sentido de organizá-la, como no sentido de preservá-la,
possibilitando a habitação humana. Assim, não se tratava de uma atitude de dominação, mas,
ao contrário, de práticas onde estivessem previstos cuidado e carinho para com o ambiente
natural. Desenvolvendo a perspectiva de cultura a partir do princípio de cuidado, a palavra
acabou por extrapolar a premissa de cultivo apenas do solo, desdobrando-se de modo a
designar, igualmente, o culto aos deuses entidades que, no entendimento romano, estavam
ligadas às forças da natureza. Já, a associação entre a palavra cultura e a idéia de cultivo
espiritual, ou anímico, surgiu a partir das reflexões de Cícero (poeta e político da antiguidade
romana, que viveu de 106 A.C. a 43 A.C.). Partindo do entendimento construído por cero, a
cultura animi pode desenvolver-se no fazer intelectual do homem, sendo os artefatos meios de
materialização do espírito cultivado. Assim, os bens intelectuais podem funcionar como
expressão dessa perspectiva, considerando-se, segundo Cícero, a importância clássica do
cultivo espiritual que a civilização romana desenvolveu a partir dos gregos (ARENDT, 2007,
p. 265-266).
Nesse sentido, considera-se que a ideia de cultura confunde-se com a ideia de cultivo,
sendo que o mesmo pode se dar tanto em ambiente natural algo caro para os romanos
como no ambiente intelectual. Nesse contexto, o termo cultura com o passar do tempo acabou
sendo confundido com o fazer artístico, visto a carga simbólica que os artefatos de arte
emanam.
35
Por sua vez, Bourdieu oferece outra abordagem do conceito de cultura. Segundo ele,
cultura possui relações com os costumes que atravessam o tempo e as civilizações, podendo,
pois, vincular aspectos comportamentais, sendo intitulada pelo sociólogo como o habitus.
[...]a história no seu estado incorporado, que se tornou habitus. Aquele que tira o
chapéu para cumprimentar reactiva, sem saber, um sinal convencional herdado da
Idade Média no qual, como relembra Panofsky os homens de armas costumavam
tirar seu elmo para manifestar as suas intenções específicas. Esta actualização da
história é em conseqüência do habitus, produto de uma aquisição histórica que
permite a apropriação do adquirido histórico (BOURDIEU, 2007, p.82-83).
A perspectiva de Bourdieu encontra eco nas considerações do antropólogo Marc Augè.
Segundo Augè, a cultura no contexto etnogfico clássico configura-se a partir de uma
soma de representações, passadas de geração à geração. Cultura, pois, é antes cosmologia,
sendo um meio de organizar o mundo e a sociedade onde o indivíduo se insere (AU, 2001,
p. 104).
Portanto, se para Arendt, a idéia de cultivo da alma acaba por ligar-se ao
desenvolvimento artístico do homem, sendo uma forma de compreensão do devir social; para
Bourdieu e Augè, a história incorporada, o habitus, as representações que atravessam
gerações e reverberam insncias simbólicas de organização do contexto, definem os nculos
que configurarão a cultura. Esses pressupostos acabam por funcionar como meios de ligação
entre indivíduos através do tempo, caracterizados como vínculos que extrapolam o aspecto
formal, carregando de sentido as relações interpessoais. Nesse sentido, a cultura material
serve como forma de análise e configuração de interpretações acerca dos desdobramentos do
teor anímico que perpassa indivíduos em sociedade.
Para Augè, a cultura material é individual e coletiva ao mesmo tempo, sendo os
artefatos uma forma de compreender o valor de mediação simbólica com o sistema
cosmológico global (AUGÈ, 2001, p. 105).
Nota-se, pois, a perspectiva de trocas que podem ser estabelecidas: a partir da
definição de Arendt, essas trocas se articulam através do intelecto materializado, para
Bourdieu e Augè, essas trocas se estabelecem tanto através de gestos, fatores, menções que
evidenciam a história vivenciada através do tempo, como por meio de objetos e bens
constituídos pelo homem.
Ora, se a moda pode ser entendida como uma plataforma de desenvolvimento de
aspectos que visam comunicar fenômenos sociais operantes, portanto, como uma área de
representação que busca comunicar esses aspectos em caracterizações estético-formais, pode-
36
se entender que o campo da moda promove o estabelecimento de trocas, seja através de
artefatos, seja através de signos constitutivos desses. Desse modo, a moda também pode servir
como meio de embasamento para do a antecipação de desdobramentos socioculturais, visto
ser uma área articulada como um campo, metáfora oferecida por Bourdieu (2007), ou seja,
como sistema.
Entendida como sistema, pode-se compreender que as relações estabelecidas entre os
artefatos de moda e os indivíduos reverberam instâncias simbólicas diversas, visando a
constituição de meios interpretativos do imaginário coletivo. Nesse sentido, a moda como
sistema opera, parece operar as perspectivas de cultura supra apresentadas: cultivo, habitus-
filiação e mediação simbólica.
Nesse contexto, são pertinentes as considerações acerca da moda como sistema
instituído de modo a proporcionar a legitimação cultural de uma classe emergente e depois
dominante - no meio social: a burguesia. Para esses indivíduos, a moda permitiu o
reconhecimento e a participação em esferas sociais a partir dos artefatos utilizados,
potencializando, pela imanência simbólica, trocas sob-reptícias e replicadas, estabelecidas
através dos arranjos sígnicos constituintes dos mesmos.
Segundo Caldas: Admite-se que a moda, no sentido estrito de “rotação acelerada do
ciclo da vida das roupas”, só nasce por volta dos séculos XIV e XV, na Europa Ocidental”
(CALDAS, 1999, p.31).
Ainda segundo o sociólogo, esse fator foi alavancado por importantes mudanças
socioculturais e econômicas, que permitiram a emergência do indivíduo, e acabaram por
serem representadas através da forma de vestir (CALDAS, 1999, p.31-32).
Essa centralidade no indivíduo acarretou mudanças [...] cada vez mais aleatórias e
freqüentes, na indumentária. É o nascimento da moda, como a definimos hoje, na sociedade
ocidental” (CALDAS, 1999, p.31).
As modificações socioculturais apontadas por Caldas podem ser localizadas na
emergência da burguesia como classe social influente, visto essa não possuir fatores como
antecedentes aristocráticos, sendo essa uma forma de exercer influência política, econômica e
comportamental, assim, necessitando de elementos que permitissem a comunicação dos níveis
de poder que a mesma estava atingindo.
37
Para tanto, a moda passou a atuar como forte aliada do burguês emergente, pois,
segundo Treptow, conforme a burguesia foi se organizando em torno de esferas de poder, e
assim, obtendo maior influência na sociedade mercantil, sua indumentária foi despertando o
interesse de indivíduos pertencentes a outras classes, pois os mesmos ansiavam por
constituírem uma imagem de semelhança aos burgueses, agora vistos como indivíduos
influentes e, portanto, detentores de insncias simbólicas de poder (TREPTOW, 2003, p.25).
Essa dinâmica de constituição de significados - incorporada pela classe burguesa nas
palavras de Barthes, explicitam as premissas de funcionalidade e diferenciação estabelecidas
pela aristocracia, visto que moda, para a classe aristocrática:
[...] é um facto de carácter sinalético do vestuário ser mais declarado e, se assim se
pode dizer, mais inocente na antiga sociedade do que na nossa; a sociedade
monárquica considerava abertamente o seu vestuário como um conjunto de signos, e
não como produto de um certo mero de razões: o comprimento de uma cauda
assinalava exactamente uma condição social, e nenhuma existia para converter esse
léxico em razão, para sugerir, por exemplo, que a dignidade ducal produzia o
comprimento da cauda, como a igreja fria produz o bolero de vision branco; os
trajos antigos não jogavam com a função, ostentavam o artifício das suas
correspondências... o homo significans põe a máscara do homo faber, isto é, do seu
contrário (BARTHES, 1967, p.296).
O que se ressalta nas considerações tecidas por Barthes, é que a moda contemporânea
parece necessitar do vínculo funcional para justificar sua imanência simbólica. Nesse sentido,
é como se fosse possível justificar o arranjo de certos elementos em nome de um fim, que
corrobore o nível de trocas que podem ser articuladas pelos códigos que constituem um
determinado artefato, inicialmente formulado e constituído como vestuário. É a justificativa
para a atuação do poder simbólico relativo ao campo, legitimando e, ao mesmo tempo,
potencializando interpretações que possam advir dos signos constitutivos de artefatos de
design de moda.
Partindo, pois, da perspectiva que a moda opera no meio social como um sistema,
portanto, um campo composto por vários agentes e esferas, e que esses visam articular certos
aspectos representativos no intuito de legitimar, e renovar, a atuação de uma sistemática,
ressalta-se o princípio de buscar compreender a moda a partir de suas estruturas formadoras.
Dessa forma, um dos objetivos desse estudo constitui-se na investigação das estruturas do
sistema da moda, no intuito de buscar um entendimento a respeito de suas dimicas de
funcionamento junto e a partir do meio social, visto que esta não está descolada da sociedade
e sua atuação acaba, por fim, replicando certas práticas de outros domínios, o que potencializa
o poder simbólico da mesma, permitindo que o design de moda opere como uma plataforma
38
de constituição de cultura. Segundo Bourdieu o poder simbólico é “esse poder invisível o qual
pode ser exercido com a cumplicidade daqueles que o querem saber que lhe eso
sujeitos ou mesmo que o exercem” (BOURDIEU, 2007, p.7-8).
Analisando a questão sob esse prisma, pode-se considerar que a moda se caracteriza
como um meio de produzir e disseminar cultura, e que essa prática perpassa a configuração de
artefatos, sendo que os mesmos são compostos por códigos que visam comunicar tanto
aspectos imanentes aos indivíduos classe social pertencente e outros aspectos como criar
meios de identificação das transformações articuladas no meio sociocultural.
Dessa forma, pode-se compreender que o poder simbólico, a partir de Bourdieu,
caracteriza-se como um meio de legitimar ambas perspectivas: comunicar pressupostos
relativos a classe social a qual pertence o indivíduo (mas, também, outros aspectos que
contribuam para explicitar a diferenciação social, como grupo ao qual pertence, etc); bem
como, forma de identificação de transformações operantes pela constituição de artefatos que
sinalizem esses pressupostos, ou, seja, que permitam o estabelecimento e reconhecimento de
trocas simbólicas operativas. Nota-se uma aparente arbitrariedade nessa dinâmica, visto que
essas trocas podem corresponder a interesses daqueles que articulam esferas elevadas do
campo, caso da burguesia emergente em outros tempos.
Desde a concepção de um artefato de design de moda, até sua reprodução em rie,
vários fatores e agentes são intermediários no processo, e a perspectiva de constituição de
trocas operativas entre os mesmos é pertinente. Para entender tais dinâmicas, Barthes oferece
um termo que pode conduzir ao entendimento das mesmas.
O termo shifters é utilizado por Barthes (1967) para designar os elementos de
intermediação entre os códigos intnsecos ao sistema da moda. Esses mecanismos podem
propiciar a replicação de códigos de representação, associando os mesmos a outros domínios
de conhecimento, ou seja, outras estruturas de representação. Esses shifters podem atuar na
produção de certos significados, associados aos digos funcionais dos mesmos, ou seja, aos
signos inaugurados a cada novo ciclo de atuação da moda no meio social.
Para compreender melhor essa dinâmica, recorre-se ao que o teórico classifica como
fuões-signos, portanto, o entendimento para o que sejam códigos:
A função-signo é a testemunha de um duplo movimento que cumpre analisar. Num
primeiro tempo (esta decomposição é puramente operatória e não implica uma
temporalidade real), a função penetra-se de sentido; tal semantização é fatal: desde
que haja sociedade, qualquer uso se converte em signo desse uso: o uso da capa de
39
chuva é proteger da chuva, mas este uso é indissociável do próprio signo de certa
situação atmosférica; [...]. A função-signo tem pois provavelmente um valor
antropológico, que é a própria unidade em que se estabelecem as relões entre o
técnico e o significante (BARTHES, 2006, p.45).
Nesse sentido, considera-se que a decomposição de códigos pode levar a compreensão
das significações imanentes aos mesmos, sendo essas arranjadas tanto de modo funcional
portanto, permitindo o entendimento da questão prática implicada no processo (caso da chuva
para a capa) como para dar conta de ligar subjetividades, de modo a relacioná-las a trocas
que visem a configuração de outros sentidos. Além disso, se está considerando que
ressignificações podem ser engendradas conforme a interferência de shifters, e que essas
podem sinalizar para inovações em vel de significado, principalmente no que diz respeito às
meidações que se estabeleçam como meio de estabelecer correspondência com sentidos sub-
reptícios, permitindo a constituição de certas estratégias a partir dessa dinâmica.
Ou seja, a produção de significados é uma prática inerente ao meio social, permeando
conhecimentos de áreas diversas e, além disso, propiciando a configuração de interrelações
entre disciplinas distintas. Portanto, os arranjos sígnicos constituintes de um artefato de design
podem construir vínculos de comunicação com códigos de outros domínios de conhecimento,
outras disciplinas. Porém, essa replicação o é, necessariamente, evidente, pois muitas vezes
o resultado final a representação possui características distintas, emitindo mensagens
diversas, gerando novos significados conforme interpretações engendradas (a interferência de
shifters).
Analisando a questão sob esse viés, é possível considerar que a moda, enquanto campo
de estabelecimento de trocas simbólicas e representação de subjetividades, pode constituir
diálogos com outras áreas que também engendram essa prática. A perspectiva de diálogo
entre a moda e outros domínios pode se dar a partir do momento em que estabeleçam relações
entre estruturas, vistos, no contexto desse estudo, como vínculos discursivos/textuais através
dos signos constitutivos de artefatos.
Portanto, a leitura de uma estrutura gnica configurado em um objeto pode levar a
compreensão de outra estrutura, e o reconhecimento dos códigos que se replicam de uma para
outra pode vir a gerar discursos interpretativos: meios de organizar o conhecimento e as
imanências simbólicas que perpassam indivíduos.
40
A associação entre texto e vestuário, bem como entre o significado da palavra texto e a
perspectiva relacional com articulações de linguagens representativas, pode ser melhor
compreendida a partir das argumentações oferecidas por Pierre Lévy:
Os coletivos tamm cosem, através da linguagem e de todos os sistemas simbólicos
de que dispõem, uma tela de sentidos destinada a reuni-los e talvez protegê-los dos
estilhaços dispersos, insensatos, do futuro; uma capa de palavras capaz de abrigá-los
da contingência radical que perfura a camada protetora dos sentidos e mistura-se, à
sua revelia (LÉVY, 1993, p. 73).
para Foucault, a constituição de discursos prevê a arbitrariedade, correspondendo a
instâncias de poder daqueles que engendram os discursos (FOUCAULT, 2008). Essas
considerações encontram eco ao que Barthes afirma sobre a arbitrariedade inerente à moda:
O signo é a união do significante com o significado, do vestuário com o mundo, do
vestuário com a Moda... a Moda é tirânica e seu signo é arbitrário, ela tem de o
converter em facto natural ou em lei racional: a conotação não é gratuita; ela tem, na
economia geral do sistema, a tarefa de restaurar uma certa ratio (BARTHES, 1967,
p.291).
Visto sob esse prisma, o discurso arbitrário da moda instala-se como um meio racional
de associação entre signo e significados a perspectiva de composição de arranjos sígnicos
para a configuração de artefatos intensificando a constituição de códigos, no intuito de
engendrar trocas através da linguagem de sua linguagem (verbal ou não-verbal). Além disso, a
moda também liga o vestuário, artefato objetivo de seu design, ou seja, o significante, ao
mundo, potencializando novos desdobramentos textuais dessa estrutura no meio sociocultural,
partindo da ligação entre os signos constitutivos de um artefato de moda aos que se
configurem em artefatos de outros domínios, ou seja, de outras estruturas de representação. A
identificação de arranjos sígnicos, ou códigos de representação acabam, por fim, conferindo
sentido às estruturas, oferecendo meios de legitimar a atuação sistemática do campo.
Essa dinâmica pode ser entendida a partir de um breve exemplo configurado por
Barthes. Para ele, a prática de ligação entre estruturas da moda e outras estruturas, bem como,
a sistemática de construção de significações a partir de arranjos sígnicos que visem substituir
(comunicar) fenômenos, pode assim ser entendida: “[...] a ganga azul de trabalho (blue jeans)
tornou-se mais signo de ociosidade, etc [...] isso explica que a sociedade moderna, tecnicista,
possa, facilmente, separar o signo da função e impregnar os objetos que fabrica de variadas
significações (BARTHES, 1967, p.293).
Ao deslocar, portanto, o signo de sua função elementar, o sistema da moda possibilita
a ressignificação dos artefatos, produzindo novos sentidos conforme a interferência da
dinâmica temporal, como o que ocorreu com o jeans outrora roupa de trabalho, hoje símbolo
41
de ociosidade e de status. Nesse sentido, a moda atua concomitante ao desenvolvimento
cultural e reflete as expressões do meio e das relações sociais operantes. Para tanto, utiliza-se
das potencialidades emergentes ao longo de temporalidades definidas de estilo e
comportamento, indicando novas premissas culturais, instaurando outros discursos
constituídos a partir de combinações entre estruturas, visando a reinterpretação das mesmas.
Essa consideração reforça a ideia de que o design pode operar como uma plataforma
de representação para a produção de artefatos que visam comunicar o devir cultural, portanto,
que o design de moda permite a constituição de artefatos que possibilitam o entendimento das
transformações ocorridas, ou operantes, no meio social.
Para o melhor entendimento desse pressuposto, a perspectiva da construção de
discursos em diferentes áreas do conhecimento diferentes campos de representação
simbólica parece fundamental. Analisar como podem ser construídos nculos de
significação entre artefatos pertencentes a campos distintos pode, assim, levar ao
entendimento da importância do estudo de tendências, portanto, de identificação de sinais
fragmentados no processo de semiose cultural e a posterior organização dos mesmos em
plataformas de geração de sentido.
Para tanto, analisar a moda como discurso parece ser um caminho essencial a ser
desenvolvido. Porém, antes disso, é preciso compreender como se estabeleceram as forças
socioculturais relativas aos agentes constituintes do campo da moda nas últimas décadas, de
modo a buscar formas para o entendimento da prática de arbitrariedade dessa área de
formalização de subjetividades.
1.5 MODA ENQUANTO DISCURSO E A DISSEMINÃO GNICA ATRAVÉS DAS
TENDÊNCIAS
Se as tendências podem ser entendidas como mecanismos de geração de simulacros e,
assim, como formas de replicar signos comuns aos indivíduos, o entendimento de moda
enquanto discurso passa pela compreensão do que vem a ser tendência.
Como afirma Caldas, o termo tendência deriva do latim tendentia, sendo um
substantivo originário do verbo tendere, que possui, dentre outros significados, tender para e
ser atraído por. Segundo ele, com o passar do tempo, e o desenvolvimento cultural da
42
sociedade ocidental, o termo foi adquirindo novos significados. Ao migrar para o francês, a
palavra acabou significando inclinação, porém, no início esta significação estava atrelada ao
amor romântico aspecto desenvolvido pela cultura medieval. Portanto, a palavra tendência
denotava inclinação por alguém. Com o advento do iluminismo, e com o desenvolvimento do
pensamento científico, novos significados foram associados ao termo, que passou a possuir
co-relação com dinamismo, força, esforço e impulso (CALDAS, 2004, p.23-26). O sociólogo
também argumenta que, essa composição auxiliou na construção da idéia de que tendência
subentende movimento, e que à partir do século XIX o termo passou também a significar
predisposição e propensão.
Portanto, após anos de interferência cultural, hoje, a palavra tendência:
[...] define-se sempre em função de um objetivo ou de uma finalidade, que exerce
força de atrão sobre aquele que sofre a tendência; expressa movimento e
abrangência; é algo finito (no sentido que se dirige para um fim) e, ao mesmo
tempo, não é 100% certo que atinja o seu objetivo; é uma pulsão que procura
satisfazer necessidades (originadas por desejos) e, finalmente, trata-se de algo que
pode assumir ares parciais e pejorativos (CALDAS, 2004, p.26).
Partindo das considerações desenvolvidas, é possível entender tendência como um
fenômeno que opera segundo um objetivo ou uma finalidade, exercendo força de atração
sobre aquele que sofre a tendência. A palavra tendência também possui a significação
correlata a movimento o que a coloca no cerne da questão de mudança constante que o
sistema da moda incorporou, ou seja, sua característica de obsolescência programada.
Tendência também supõe algo que é finito, possuindo um ciclo de desdobramento e, ao
mesmo tempo, o apresenta a certeza de atingir este fim (ou objetivo). Além disso, o termo
simboliza a pulsão do desejo, buscando satisfazer necessidades prementes, além de,
finalmente, estar relacionada à idéia de evolução necessária, fruto do pensamento positivista
oriundo do século XIX.
Nesse sentido, é possível considerar que a instância de poder simbólico imanente às
tendências reside na potencialidade de operação concatenada das esferas que constituem o
campo da moda. O organismo operante instituiu, assim, uma forma de vincular sua
arbitrariedade a outros domínios socioculturais, fazendo valer uma lógica de signos e
significados que, durante muito tempo, parece ter sido compreendida apenas pelos iniciados,
ou seja, aqueles que comandavam os âmbitos de organização sígnica, ou seja, que constituíam
discursos para alimentar o sistema. Visto sob este prisma, essa lógica de atuação novamente
43
encontra eco nas considerações tecidas por Bourdieu acerca do mercado de bens simbólicos,
pois:
o princípio da eficácia dos atos de consagração reside no próprio campo e nada mais
seria mais o que buscar a origem do poder “criador”, essa espécie de mana ou
carisma inefável, incansavelmente celebrado pela tradição, em outra parte que não
nesse espaço de jogo que progressivamente se instituiu, isto é, no sistema das
relações objetivas que o constituem, nas lutas das quais ele é o lugar e na forma
específica de crença que aí se engendra (BOURDIEU, 1996, p.195).
Contudo, os mecanismos de previsão (as tenncias) - o sistema de relações objetivas
entre os artefatos de moda e as esferas constituintes do campo - iniciaram um caminho rumo a
fragmentação do poder centralizador, visto que novos comportamentos sociais passaram a
permear as relações simbólicas no meio sociocultural. Na verdade, intensificando essa prática
de centralização do discurso, também se intensificam as tensões e, nesse sentido, as
considerações de Foucault (2008) a respeito do novo mostram-se esclarecedoras.
Segundo o filósofo, o novo o está no que é dito, mas no acontecimento de sua
volta” (FOUCAULT, 2008, p.26).
Partindo da premissa de enfraquecimento da centralização discursiva, objetiva-se o
entendimento da multiplicidade de elementos discursivos da qual também fala Foucault, visto
que:
É justamente no discurso que vêm a se articular poder e saber. E, por esta mesma
rao, deve-se conceber o discurso como uma série de segmentos descontínuos, cuja
função tática não é uniforme nem estável. Mais precisamente, não se deve inaugurar
um mundo do discurso dividido entre o discurso admitido e o dominado, mas, ao
contrário, como uma multiplicidade de elementos discursivos que podem entrar em
estratégias diferentes (FOUCAULT, 1988, p.93).
De fato, a moda, sendo um sistema sígnico por excelência, passa a assimilar uma série
de elementos discursivos distintos, operantes conforme estratégias circunscritas a
determinadas situações, e que, ao final, tendem a construir diálogos entre fatores subjetivos e
os artefatos. Essa prática possibilita a constituição de co-relações entre o campo da moda e o
fator amico relacional intangível e presente no meio sociocultural, que pode ser entendido
como o espírito do tempo. Tais considerações ressaltam a importância de se compreender o
que o está explícito no discurso dominante dinâmica esta o relevante às definições de
tendências fomentadas pelos birôs de estilo durante muito tempo. Ora, Quem poderia
predizer, em 1975, no auge da moda retro e ainda de forte acento hippie, que um movimento
como o punk, no ano seguinte, viria possibilitar o surgimento de padrões estéticos
radicalmente diferentes?” (CALDAS, 2004, p.49).
44
Portanto, para perceber essas modificações, mostram-se importantes a observação de
contextos onde transformações emergentes sejam operativas no meio sociocultural. Essas
transformações que podem estar sendo comunicadas através de plataformas comportamentais,
artísticas, estéticas ou formais. A antecipação de necessidades parece assim subentender a
relação entre como essas transformações estão sendo comunicadas e as relações interpessoais
que eso sendo engendradas no contexto social, fator importante para a constituição da
inovação nos âmbitos do Design Estragico segundo Deserti e Celaschi (2007), Bertola
(2006) e Verganti et al (2006).
Nesse contexto, observar o desenvolvimento das mediões operantes entre
subjetividade e formalização pode levar ao entendimento do espírito do tempo que se
desenha. Portanto, dinâmicas de interconexão entre campos se estabelecem, potencializadas
pelas formas de representação do imaginário individual e coletivo. Essa perspectiva pode,
por fim, conferir maior sentido à moda, e, automaticamente, desencadear relações de valor
entre os artefatos de moda e outros domínios, e também entre a moda e os indivíduos. Para
tanto, considera-se como uma premissa de análise a lógica que se constitui a partir dos
intertextos.
Essa prática pode ser melhor compreendida a partir das considerações tecidas por
Verónica Massonnier, psicóloga e analista de mercado. Para Massonnier:
un punto clave en la observación de las tendências es la capacidad de asociar lo que
va ocurriendo en diversos terrenos, para así intentar “leer” las interconexiones.
Cuando vemos que vários de esos signos están em sintonia y apuntan en una misma
dirección, podemos suponer que se trata de un proceso que va más allá de um
femeno singular (MASSONNIER, 2008, p.14)
8
.
A intertextualidade, conceito operativo oriundo da lingüística, desponta como forma
de análise da pertinência de certos sinais e o atual estágio de relações representativas
desdobradas no contexto sociocultural, principalmente no tocante a construção de relações
entre campos distintos e a perspectiva de antecipação do devir cultural.
Compreender como os textos estão sendo articulados, portanto, como os signos estão
sendo colocados em relação de modo a gerarem sentidos, pode levar a identificação de
necessidades latentes, possibilitando a constituão de tendências, e, assim, a configuração de
8
A tradução de Massonnier é livre, ou seja, da autora: um ponto chave na observação das tendências é a
capacidade de associar o que está ocorrendo em diversos terrenos, para assim tentar ler as interconexões. Quando
vemos que vários desses signos estão em sintonia e apontam para uma mesma direção, podemos supor que se
trata de um processo que está além do fenômeno singular.
45
cenários para desdobramentos projetuais que potencialmente apontem para caminhos de
inovação.
Segundo Laurent Jenny:
A intertextualidade levada às últimas conseqüências, arrasta não só a desintegração
do narrativo como tamm do discurso. A narrativa esvai-se, a sintaxe explode, o
próprio significante abre brechas, a partir do momento em que a montagem dos
textos deixa de se reger por um desejo de salvaguardar, a todo preço, um sentido
monológico e uma unidade estética (JENNY, 1979, p.28).
Duas perspectivas apresentam-se a partir das considerações tecidas por Jenny,
lingüista e teórico da intertextualidade: primeiro que sendo o significante uma das partes
constituintes do signo e se, visto sob o prisma da teoria dos intertextos, o significante pode
abrir brechas, é possível considerar que o aspecto formal (a parte concreta dos signos),
também pode oferecer interpretações novas, potencializadas a cada nova análise contextual.
Segundo, que é possível construir associações com outros domínios, visto que os signos
presentes nestes podem estar articulando dlogos profusos, criando relações de sentido
subliminar e simbólico, entre um campo e outro, e entre o contexto relativo a uma estrutura
específica e o mundo. O sentido monológico se desfaz, em nome de uma multiplicidade
estética: os fragmentos textuais operam conforme estratégias estabelecidas.
Nesse sentido, retoma-se a não de interrelações entre estruturas distintas,
objetivadas a partir dos pressupostos simbólicos representativos arranjados em artefatos.
Diálogos podem estar sendo articulados entre estruturas, o que leva à importância do design
de moda como plataforma de comunicação de múltiplos fragmentos discursivos, orientados
segundo estratégias concomitantes às necessidades latentes de usrios, percebidas pelos
projetistas a partir da observação do processo de semiose cultural. A configuração de
narrativas a correlação entre unidades dialógicas acaba por caracterizar-se como a
identificação de indícios que permitam uma leitura do devir cultural, fragmentados entre os
indivíduos. Portanto, a constituição de tendências, ou melhor, a identificação dos fenômenos
desdobrados entre os indivíduos e suas associações a signos (que também podem ser
entendidos como sinais de transformações operativas), apresenta-se como a perspectiva
estratégica desse estudo, contribuindo para a construção de cenários (enredos, novamente,
narrativas) que permitam o desenvolvimento de projetos, no intuito de criar relações de valor
entre artefatos, usuários e empresas/organizações.
Considera-se necessário compreender como pode se dar essa dinâmica, bem como,
qual a implicação desse pressuposto na configuração do espírito do tempo, anunciado
46
anteriormente a partir de Caldas, e a possível interferência desse pressuposto na configuração
de inovações de significados.
1.6 SIGNOS, SINAIS E O ESPÍRITO DO TEMPO
Partindo do pressuposto de que design pode deixar marcas que funcionam como
espaços de comunicações entre artefatos, necessidades latentes e usuários, a prévia
identificação de signos emergentes pode levar a configuração de inovações em nível de
significados.
Considera-se que os indivíduos apontam caminhos para o reconhecimento de suas
necessidades latentes a partir da configuração de signos, e que esses estão associados a
fenômenos mais complexos, sendo os signos formas de operacionalizá-los pela comunicação
através de códigos, carregados de temporalidades que permitem compreender o atual estado
de interações socioculturais.
Se, segundo Barthes, O signo é a união do significante com o significado
(BARTHES, 1967, p.291), e que essa prática estabelece diálogos, pode-se argumentar que
várias unidades dialógicas estejam sendo articuladas para expressar uma mesma ideia. Assim,
essa ideia pode ser identificada em seu estágio inicial partindo da relação engendrada entre
sinais representativos desdobrados no processo de semiose cultural. Nesse sentido, o meio
social pode funcionar como um vetor de emissão de sinais, e a identificação e compreensão
desses sinais podem viabilizar estratégias para o desenvolvimento de artefatos com inerente
teor de trocas simbólicas.
Muito se argumentou sobre a importância da constituição de cadeias de valor entre
usuários, artefatos e empresas. Para Celaschi e Deserti, essa dinâmica pode ser objetivada a
partir da implementação da cultura de análise de tendências internamente nas empresas e
organizações, ou seja, a relevância de fatos culturais caracterizados por sinais configurados
em artefatos de artes figurativas, cinema, literatura, música, etc., pode contribuir para a
percepção do atual estágio imaginário coletivo, portanto, para o atual esgio de relações de
trocas estabelecidas entre esferas de representação simbólica (CELASCHI e DESERTI, 2007,
p. 48).
47
Nesse intem, relacionar sinais pode ser um meio de encontrar caminhos para a
projetação, e a observação de várias áreas representativas pode se configurar como forma de
desdobramento dessa dinâmica nas organizações.
Segundo Caldas,
[...] sinal é indício, vestígio, aviso, prenúncio algo, enfim, que indica a existência
ou a verdade de uma outra coisa, à qual está ligado. [...] Em todas as definições [...]
existe a idéia de que um sinal, de algum modo, antecipa aos sentidos e entendimento
algo que ainda não se deu a conhecer por completo. [...] Do mesmo modo que o
organismo dá sinais de cansaço [...], também as correntes socioculturais e a evolução
dos valores, que desenham o “espírito do tempo”, são detectáveis, apreensíveis (às
vezes em seus estágios de formação) e, por isso, “antecipáveis”, por meio de sinais
emitidos pelas diversas esferas da cultura (CALDAS, 2004, p.92).
Ainda segundo o sociólogo, o trabalho a partir da identificação de sinais recolhidos no
meio sociocultural pode levar à perspectiva de recortes da realidade, pois é preciso trabalhar
com sinais de modo a construir hiteses de trabalho (CALDAS, 2004, p.93).
Essa orientação aproxima-se da análise que se está buscando nesse estudo, ou seja, de
que tendências podem se caracterizar como histórias possíveis, criadas a partir da ligação
entre sinais coletados no processo de semiose cultural, de modo a objetivar sentidos,
chegando ao que Barthes (1996) intitulou o homem como produtor de sentidos (o Homo
Significans).
Desse modo, vários fragmentos textuais podem estar operando de modo concomitante,
e a leitura e interpretação dos mesmos pode acarretar o entendimento do estágio atual do
imaginário coletivo, portanto, de uma espécie de ânima fluido que liga os indivíduos em um
dado momento de desenvolvimento histórico. Esse ânima pode ser entendido como o espírito
do tempo, cujo conceito, segundo Caldas, o possui validade científica, porém, uma coisa é
inegável: que as diversas manifestações da moda e o grau de desenvolvimento tecnológico de
uma época o fatores decisivos para o desenho dos traços e dos contornos que definem o
“espíritode um tempo” (CALDAS, 2004, p.73).
Um exemplo de como é possível caracterizar a convergência de fragmentos
discursivos, no intuito de objetivar uma leitura do momento cultural que permeia os
indivíduos, pode ser oferecida a partir dos pressupostos simbólicos que orientaram o estilo
predominante entre o final do culo XIX e primeiros anos do culo XX, peodo também
conhecido como belle èpoque: “a silhueta feminina em S, conseguida à custa do espartilho
rígido, era a manifestação da sinuosidade que a arquitetura alcançava nas estruturas de ferro
retorcido e que os objetos art nouveau ecoavam” (CALDAS, 2004, p.73).
48
Potenciais diálogos o operados entre áreas de representação de subjetividades, e
esses podem estar comunicando fenômenos que interconectam indivíduos e artefatos, de
modo a caracterizar ideias coletivas, orientadas segundo aspectos latentes que se relacionam
coletivo e individual. As significações que serão construídas a partir dessa dinâmica parecem,
assim, dar conta da construção de um discurso abrangente, que proporcione sentido aos
fragmentos textuais a partir da interrelação entre unidades dialógicas, aqui consideradas como
os arranjos sígnicos que permitem a construção de significados coletivos. Um determinado
estilo como o art nouveau cumpre essa fuão, proporcionando o reconhecimento do tipo
de comportamento que está sendo construído em um dado momento histórico.
Segundo o antrologo Marc Augé, os designers podem ser considerados
antropólogos aplicados, sendo que os artefatos que projetam e constituem são permeados
por símbolos e significados que remetem às vontades de determinados grupos, vistos como
diferenciados consumidores, ou usrios (AUGÉ, 2001, p. 103-111).
Portanto, a análise e entendimento desse magma intangível, ou seja, dessa variante
anímica (o espírito do tempo), mostra-se importante, pois permite a identificação, dentre a
multiplicidade discursiva, de uma idéia prevalecente, podendo servir para a configuração de
narrativas que busquem proporcionar sentido à projetação de artefatos de design, mais
especificamente, de design de moda.
Consoante Caldas:
É inegável a existência desse o-sei-quê que pousa sobre as coisas e define l’air du
temps (um equivalente francês para a mesma idéia), que só os narizes mais treinados
são capazes de farejar e só os artistas mais geniais, de antecipar. Sendo assim, por
que seria impossível tentar agarrar o impalpável, aquilo que está surgindo como
sinal forte, como traço marcante de personalidade de uma época, desenhando os
contornos de uma sensibilidade emergente? (CALDAS, 2004, p.89).
Antecipar ou, caracterizar os contornos de sensibilidades emergentes parece ser o
potencial resultado dessa prática, e a observação de campos orientados para representações
figurativas, mostra-se uma prática que visa apontar caminhos para a constituição de artefatos
que produzam sentidos coadunados com as tendências desdobradas.
Ao mesmo tempo, revela-se importante a análise de fenômenos artísticos, visto que
“toda arte autêntica opera uma revolução em si(ADORNO, 1970, p.256). Nessa perspectiva,
a arte pode instaurar novos códigos comunicacionais, contribuindo para a formalização de
aspectos não verbalizados relativos aos indivíduos.
49
Para Bourdieu, existem instâncias da arte, ou melhor, formas do fazer artístico
contemporâneo que podem cumprir essa espécie de desígnio. A idéia de transgredir padrões
vigentes, então, confunde-se com a prerrogativa de ir além do tempo, operar na vanguarda.
Segundo o sociólogo, “marcar época é, inseparavelmente, fazer existir uma nova posição para
além das proposições estabelecidas, na dianteira dessas posições, na vanguarda e,
introduzindo a diferença, produzir o tempo” (BORDIEU, 1996, p.181).
Nesse sentido, produzir o tempo relaciona-se com a perspectiva de inaugurar uma
nova forma de posicionamento, abordagem e representação que pode ser relacionada às
necessidades latentes condizentes aos indivíduos. Devolvida à sociedade, essa perspectiva
visa proporcionar a geração de significados novos. Novamente, a ideia de análise e
identificação do espírito do tempo que se desenha se mostra pertinente, dada a importância
dos códigos engendrados no contexto sociocultural, por vezes, alternativos e transgressores.
Assim, esses digos podem permitir a constituição de discursos múltiplos, possibilitando a
instauração do novo, no sentido proposto por Foucault (2008), ou seja, como agenciamento da
multiplicidade. Nesse sentido, fragmentos textuais atuam de modo a convergirem para algo
semelhante a um hipertexto
9
, oferecendo múltiplas formas de ligação conceitual, portanto, de
leitura e representação.
A perspectiva de hipertexto liga-se à ideia da superpalavra, tal como colocada por
Jenny. Segundo o autor “o estatuto do discurso intertextual é assim comparável ao duma
superpalavra, na medida em que os constituintes deste discurso não o palavras, mas sim
coisas ditas, organizadas, fragmentos textuais. A intertextualidade fala uma ngua cujo
vocabulário é a soma dos textos existentes” (JENNY, 1979, p.21-22).
O fato é que a intertextualidade permite uma leitura pelos vários estratos de linguagens
presentes no processo de semiose cultural, possibilitando o entendimento do nível de
convergência sígnica que pode estar sendo engendrado de modo tanto sincrônico, quanto
anacrônico. Nesse sentido, considera-se que a superpalavra pode levar ao texto fundamental,
ou seja, à identificação da ideia fundamental que será replicada em fragmentos textuais
diversos, que serão, posteriormente, articulados em nome da configuração de um discurso
uníssono.
9
Termo cunhado por Theodor H. Nelson, que o propôs pela primeira vez em 1965, numa comunicação
apresentada à Conferência Nacional da Association for Computing Machinery, nos Estados Unidos. O hipertexto
é uma forma não linear de apresentar a informação textual, uma espécie de texto em paralelo, que se encontra
dividido em unidades básicas, entre as quais se estabelecem elos conceptuais (Disponível em:
<http://www2.fcsh.unl.pt/edtl/verbetes/H/hipertexto.htm>).
50
De fato considera-se que o meio sociocultural possui interferência na projetação de
artefatos de moda. Sendo assim, seria a pré-identificação de diálogos inerentes ao processo
de semiose cultural um meio de objetivar a geração de artefatos com inerente import
simbólico, visando a constituição de vantagens estratégicas para as empresas e
organizações?
10
.
Segundo Caldas, existem dois tipos distintos de tendências, que podem ser
caracterizadas como tendências efêmeras portanto, de ciclo curto e tendências de fundo,
que possuem ciclos longos de desenvolvimento. No tocante às tendências de fundo, as
mesmas podem ser embasadas por valores e sensibilidades emergentes e, assim, demonstrar
os caminhos de configuração do l’air du temps que es se organizando, permitindo a
identificação do mesmo em seu estágio inicial (CALDAS, 2004, p.31-116).
para Celaschi e Deserti, a constituição de tendências pode se dar em vel macro e
micro, e a relação de ambos com setores vinculados a uma lógica de obsolescência controlada
caso da moda é relevante no processo de identificação do ritmo da inovação. Nesse
sentido, analisar setores mercadológicos orientados pela moda; bem como, fatores de
costumes que caracterizam experiências locais endêmicas, que potencialmente podem vir a se
caracterizarem como fenômenos epidêmicos, sendo disseminados por diversos indivíduos em
contextos distintos aos originais; e aspectos formais objetivados por sujeitos-chave na
articulação de pressupostos subjetivos a partir de artefatos (artistas psticos proeminentes,
arquitetos, designers, comunicadores, etc), o relevantes no processo de identificação de
sinais que levarão à constituição de tendências. Outra importante fonte de investigação é a
pesquisa do tipo transversal, ou seja, a ligação entre esses pressupostos e o contínuo processo
de desenvolvimento cultural de aspectos comuns ao comportamento humano em sociedade,
intitulado, pelos autores, de superconstantes. (CELASCHI; DESERTI, 2007, p.48).
Ainda segundo os autores, le superconstanti sono parte del nostro vivere quotidiano e
nel contempo sono elementi che progressivamenti sono stati isolati dallo studio che numerose
discipline hanno portato ad emergere(CHELASCHI; DESERTI, 2007, p.50-51)
11
.
10
O termo import simbólico vem das considerações tecidas por Bourdieu acerca das características subjetivas
simbólicas imanentes aos objetos de representação tanto artísticos, como de outros domínios: Ao contrário dos
objetos fabricados com import simbólico fraco ou nulo (sem vida cada vez mais raros, na era do design), a
obra de arte, como os bens ou os serviços religiosos, amuletos ou sacramentos diversos, recebe valor apenas de
uma crença coletiva com desconhecimento coletivo, coletivamente produzido e reproduzido” (BOURDIEU,
1996, p.198).
11
A tradução de Celaschi e Deserti é livre, ou seja, da autora: As superconstantes são parte do nosso cotidiano e
tamm são elementos que progressivamente foram isolados do estudo que várias disciplinas emergentes.
51
Nesse sentido, as superconstantes podem ser consideradas como valores que se
mostram fundamentais para os indivíduos, como liberdade, segurança e estabilidade, por
exemplo. O fato é que, com o desenvolvimento das relações sociais e, concomitantemente, da
cultura, esses valores embasam representações distintas. São valores que servem de vínculo
entre indivíduos, independente do contexto no qual se desdobram as interrelações.
A partir dessas considerações, retoma-se a ideia de que a prévia identificação da
relação entre fragmentos textuais pode levar ao entendimento do discurso que está sendo
configuradode modo amplificado, potencializando a compreensão das interrelações que estão
sendo articuladas entre estruturas distintas.
Partindo da premissa de que o meio sociocultural é determinante na projetação de
artefatos de moda, a análise de domínios que ultrapassem o campo da moda parece
fundamental. Se a moda é uma forma de representação que acaba por replicar códigos
presentes em outros domínios, gerando novos significados, novos discursos, buscar construir
relações interdisciplinares pode se apresentar como um meio de antecipar o devir cultural.
Desse modo, observar sinais emitidos em áreas de representação de subjetividades
como arte, cinema, arquitetura, música, dentre outras, pode contribuir para a construção de
narrativas carregadas de sentido, permitindo que o processo de projetação de artefatos de
moda constitua nculos dialógicos entre usuários e empresas, embasando essa prática em
arranjos sígnicos que em conta de comunicar femenos que se desdobram no meio
sociocultural. As unidades dialógicas ou, os fragmentos textuais que permitirão a
efetivação dessa dinâmica podem auxiliar na construção de estratégias mercadológicas, que
serão futuramente desenvolvidas pelas empresas e organizações, orientadas de modo a
objetivar vias de comunicação entre sensibilidades emergentes relativas aos indivíduos e os
valores internos das organizações.
Nesse contexto ressalta-se a necessidade de definir quais ferramentas podem ser
utilizadas para operar tal dinâmica, de modo a caracterizar uma metodologia de trabalho pré-
projetual tendo como foco a identificação de sinais que possam leva à constituição de
tendências. Porém, antes disso, o entendimento do que potencialmente significam
sensibilidades emergentes prementes nas relações sociais, e a ligação dessas a uma ideia
fundamental, mostra-se pertinente. O entendimento dessa perspectiva pode servir embasar a
importância de constituir macrotendências e tendências de fundo, incorrendo na implicação
entre esses pressupostos e a concepção de artefatos com import simbólico.
52
1.7 SENSIBILIDADES EMERGENTES E OS FLUXOS CRIATIVOS
Segundo Simmel, entendido em seu sentido mais amplo, o conceito de sociedade
significa a interação psíquica entre os indivíduos (SIMMEL, 2006, p.15). Ora, partindo da
noção de sociedade a partir do interrelacional psíquico, podemos considerar que a noção de
realidade compromete-se de forma significativa pela subjetividade, e que esse teor intangível
potencialmente proporcione laços de ligação que podem ser materializados em artefatos.
Conforme Simmel, essas interações servem como magma para a constituição de
relações duradouras, caracterizadas tanto por instituições que viabilizem a configuração das
mesmas, como por formalizações o oficiais, fragmentadas e abrangentes, que podem levar
ao entendimento dos fenômenos operantes em vel individual, potencializando a geração de
outras interações que permitirão novas formalizações (SIMMEL, 2006, p. 13-17). Para ele,
“os laços de associação entre os homens o incessantemente feitos e desfeitos, para que
sejam refeitos, constituindo uma fluidez e uma pulsação que atam os indivíduos mesmo
quando não atingem a forma de verdadeiras organizações” (SIMMEL, 2006, p.17).
Essa perspectiva de laços associativos incessantemente feitos e desfeitos no campo
social também é considerada pelo sociólogo Mafesolli como o cimento que une os indivíduos,
funcionando como um ânima fluido que permite a construção de caracterizações estéticas que
dêem conta de comunicar o teor relacional entre os mesmos. Como diz Maffesoli, “o todo se
exprime neste nós que serve de cimento, e que ajuda, precisamente, a sustentar o conjunto.”
(MAFESOLLI, 2002, p.101).
Nesse sentido, evidencia-se a importância da identificação e formalizão de aspectos
subjetivos para o entendimento de como podem ser constituídos valores e sensibilidades
emergentes no meio social. A formalização desses aspectos pode, assim, permitir a
visualização do atual esgio imaginário do coletivo, potencializando a compreensão do teor
de cultura que essendo desenvolvido entre os indiduos, levando à construção de laços de
comunicação em vel verbal e não verbal, acarretando, ao final, a constituição de cadeias de
valor quando do reconhecimento desses fatores latentes nos artefatos.
Instala-se aqui um teor analítico dicotômico, caracterizado pela subjetividade e pela
objetividade. A implicação dessa premissa na configuração de uma fluidez relacional, que
perpasse as interações individuais e permita constituições estéticas e formais, pode ser
entendida a partir de alguns estudos realizados pelo filósofo Friedrich Nietzsche.
53
Em suas análises acerca da tragédia grega, Nietzsche concebeu dois pólos de força, ou,
duas formas de caracterizar a dinâmica da vontade de potência individual e de sua afirmação
numa forma qualquer, portanto, num dado limite de representação. Por um lado, a potência do
desejo, esse algo caótico que, para os gregos da antiguidade, era um modo de entendimento
das forças naturais o possui limites e, assim, não possui forma. Esse estado caótico,
segundo o filósofo, permeia as relações entre os indivíduos, como uma espécie de vontade
fluida, unindo os indivíduos através de fluxos ainda não codificados e, portanto, ainda
carentes de compreensão. Essa força pode se evidenciar na criatividade, visto que essa
permite a construção de relações com o estado indomável apontado pelo filósofo. Portanto,
não está passível de circunscrever-se ao domínio de uma área em específico, ou de um
indivíduo apenas: está livre, e pode vir a desenvolver-se em uma ou mais formas de
representação (NIETZSCHE,2004: 19 66).
Consoante Nietzsche:
Transforma-se pela pintura o hino à alegria de Beethoven num quadro artístico e,
deixando curso livre à imaginação, contemplem-se os milhões de seres frementes,
prosternados na poeria: nesse momento está próxima a embriaguez dionisíaca.
Então o escravo é um homem livre, porque se quebram todas as barreiras rígidas e
hostis que a miséria, a arbitrariedade ou o “modo insolente” haviam estabelecido
entre os homens. (NIETZSCHE, 2004: 24)
Segundo o filósofo, se por um lado existe essa força indomável, por outro existe a
necessidade de organizar o caos, de modo a proporcionar sentido ao que parece destituído
deste. Nesse ínterim, objetiva-se a apreensão dessa fluidez em contextos de formalização,
estabelecendo uma prática de sublimação do estado caótico que advém das necessidades
individuais prementes, caracterizando-se como uma afirmação do estado imaginário coletivo,
proporcionando certos limites ao que parece indomável. Assim, nos limites circunscritos por
uma dada representação, a força inconstante e ilimitada encontra um modus operandi,
permitindo a posterior manipulação e assimilação, contextualizando-a conforme os meios
interpretativos condizentes com o estágio de desenvolvimento intelectual de um determinado
coletivo. Essa dinâmica embasada em aspectos dicotômicos é caracterizada pelo filósofo
como dionisíaco e apolíneo, sendo a primeira nomeação um meio de relacionar o caos e a
fluidez criativa, e a segunda uma forma de compreender a necessidade de sublimação da
potência criativa. (NIETZSCHE, 2004: 19 66).
A sublimação também pode ser entendida como formalização, portanto, representação
e, assim, como domínio sígnico (passível de organização de códigos, visando uma ordenação
concatenada dos mesmos para gerar, por fim, um discurso). Esse domínio sígnico permite a
54
assimilação e o entendimento do atual estado imaginário coletivo, circunscrevendo limites aos
fluxos criativos que perpassam as relações individuais. Essa prática potencializa a geração de
novos códigos de organização conforme o teor interpretativo empregado por outros indiduos
em busca de outros meios de representar a mesma fluidez criativa.
Nesse contexto, pode-se construir relações entre os fluxos criativos e uma ideia,
portanto, um estado caótico imperativo e passível de assimilação, formalização e codificação.
O estado caótico argumentado pelo filósofo, eno, subsidia várias maneiras de representação,
ou, de interpretação. Analisar formalizações dessa fluidez criativa, então, pode levar à
identificação do ponto onde subjetividades se interconectam: a sensibilidade que emerge do
contexto sociocultural, a ideia fundamental.
Como diz Mafesolli, “podemos dizer que, conforme as épocas, predomina um tipo de
sensibilidade, um tipo de estilo destinado a especificar as relações que estabelecemos uns com
os outros” (MAFESOLLI, 2002, p. 101). Para o sociólogo, essa sensibilidade emerge das
fusões entre necessidades individuais, geradas a partir da unificação de pontilhados,
permitindo que se estabeleçam relações de interações e retroações, viabilizando a
materialidade e levando à preponderância do imaginário (MAFESOLLI, 2002, p.102-104).
Ainda segundo o sociólogo:
O homem não é mais considerado isoladamente. E mesmo quando admitimos, [...], a
preponderância do imagirio, não devemos esquecer que ele resulta de um corpo
social e que, de retorno, volta a materializar-se nele. Não se trata, exatamente, de
auto-suficiência, mas de constante retroação. Toda a vida mental nasce de uma
relação e de seu jogo de ações e retroações (MAFESOLLI, 2002, p.104).
Os artefatos de design, inclusive os de moda, podem ser compreendidos como meios
de vincular esses pressupostos através de características estilísticas-formais, e podem, então,
construir relações com outras áreas de representação, visto serem estruturas que permitem a
organização de forças de ações e retroações, levando ao entendimento de quais são as
sensibilidades que estão emergindo no campo social.
Um exemplo disso nos é oferecido a partir das considerações acerca da coleção New
Look de Dior, concebida em 1947. A instituão de um limite formal permitiu a viabilização
de um discurso, possibilitando que vários indivíduos se reconhecem nos signos constituintes
do mesmo, comunicando que um novo período poderia estar sendo construído no campo
social. As significações decorridas nesse processo permitiram re-interpretações dos digos
estabelecidos a da ideia que subsidiou os artefatos de Dior, proporcionando outras
interpretações conforme as relações entre as estruturas representativas a posteriori. O estado
55
do imaginário coletivo encontrou no design de moda, objetivado pelo estilista, um espaço de
tangibilização e limite.
Retoma-se, aqui, a perspectiva de que a inovação em nível de significados pode se dar
a partir da dinâmica de pré-identificação de necessidades latentes, portanto, que a constituição
de tendências pode advir da assimilação de fragmentos discursivos aptos a serem utilizados
em estratégias diversas.
Outro exemplo de como é possível compreender a implicação de necessidades latentes
para a concepção de artefatos de design, e qual a relevância desse processo no sentido de
compreender as sensibilidades que emergem no campo social, pode ser oferecida a partir dos
preceitos de orientação do design caracterizado como escandinavo.
As considerações que surgem a partir dessa perspectiva permitem compreender a
importância da história incorporada para a definição de um estilo de formalização estético. A
relação entre o habitus referenciado por Bourdieu (2007), e os artefatos projetados para um
determinado coletivo, possibilitam o entendimento das sensibilidades e valores que embasam
as relações entre os indivíduos que compõe esse corpo social específico. Nesse sentido,
podemos considerar que os objetos de design comunicam os fenômenos sociais que
perpassaram as relações durante gerações, reverberando considerações construídas a partir de
Augè (2001). Essa perspectiva permite o entendimento de que determinadas necessidades se
atualizem para a constituição de um estilo próprio, servindo de referência para outras formas
de representação em locais diversos. Os significados configurados nos artefatos de design
característicos desse coletivo traduzem o ânima fluido que os perpassa (sua fluidez criativa),
potencializando a constituição de novos significados a partir de re-interpretações advindas de
outros contextos e indivíduos o circunscritos à sociedade escandinava, mas que
compartilham das mesmas necessidades que a embasam. Nesse sentido, os diálogos que se
estabelecem giram em torno de sensibilidades semelhantes, objetivadas para dar conta de
sublimar vontades potenciais que se desdobram entre indivíduos vários, amplificando os
sentidos primeiros do discurso instituído num determinado coletivo.
Considera-se que a observação e o esforço de representação do meio sociocultural,
pode conduzir ao entendimento do atual estágio do imaginário coletivo, portanto, de quais
sensibilidades estão emergindo nas interações relacionais entre indivíduos. Embasada por esse
raciocínio, a prática de constituição de tenncias reverbera pressupostos de configuração
sígnica que se desdobram em estágios contínuos, oferecendo novas interpretações conforme
56
os limites que se configurarem para dar conta de formalizar a criatividade fluída presetnte no
meio sociocultural. Essas formalizações buscam circunscrever a potência da afirmação
criativa em estruturas distintas, de modo a objetivar sentido ao estado caótico ou dionisíaco
presente. Associar os desdobramentos formais desse ânima fluido pode levar ao
entendimento do l’air du temps que se configura e, portanto, à amplificação do sentido que
está sendo constituído no momento presente. Chega-se, assim, à perspectiva de que essa
prática tanto visa permitir a identificação do que Caldas (2004) chamou de tendências de
fundo, como do que Celaschi e Deserti (2007) intitularam de macrotendências. Além disso, os
preceitos que orientam essa análise também permitem a compreensão da importância de gerar
sentido a partir da associação entre estruturas, retomando a perspectiva do homem gerador de
sentidos, considerada a partir de Barthes (1996).
Desse modo, parte-se da premissa que existem vários vetores de emissão de sinais,
vários agentes de formalização do estado caótico operante. Nesse ínterim, a identificação dos
mesmos lança as bases para a constituição de tendências que visem períodos longos de
desdobramento simbólico, permitindo a geração de múltiplas narrativas que buscarão embasar
a construção de novos sentidos conforme as unidades dialógicas que forem relacionadas. Essa
dinâmica pode possibilitar a configuração de cenários de projetação, embasados, por um lado,
pelas sensibilidades emergentes identificadas, e por outro, pelas estragias que
potencialmente podem advir dessa prática. O resultado é a projetação de artefatos de moda
com inerente import simbólico, gerando níveis de reconhecimento entre a ideia fundamental
desdobrada entre os indivíduos e os artefatos.
De fato, a geração de sentido pode ser caracterizada como uma importante estratégia,
podendo estar embasada pela configuração de relações entre estruturas, apontando para
caminhos que proporcionem a construção de novos significados.
Desse modo, o entendimento tanto de quais o as sensibilidades que eso emergindo,
bem como, onde as mesmas eso sendo objetivadas através de sinais, mostra-se importante.
Nesse sentido, busca-se compreender quais o as atuais dinâmicas de disseminação
sígnica operativas na atualidade. O entendimento dessas práticas pode levar ao
monitoramento da emissão de sinais, e a implicação desse pressuposto pode acarretar a
apreensão do que Verganti et. al. (2006) caracterizaram como sussurros presentes no meio
sociocultural.
57
1.8 VETORES DE EMISSÃO DE SINAIS E AS DINÂMICAS DE DISSEMINÃO
SÍGNICA PARA A CONSTRUÇÃO DE NOVOS SIGNIFICADOS
Segundo Caldas:
Maquiavel dizia que governar é fazer crer. Do mesmo modo, para que uma
tendência exista, ela depende da crença naquilo que se quer fazer crer. Esses dois
pólos estabelecem um contrato fiducrio, que, por sua vez, depende de um processo
comunicativo: a tendência é a mensagem; o pólo emissor de um sinal é o que
chamamos de vetor de tendência, que emite a mensagem e quer “fazer crer” [...]
(CALDAS, 2004, p.113).
As considerações tecidas por Caldas permitem compreender o nível de poder que se
estabelece a partir da perspectiva de emissão de sinais: fazer crer é a premissa que orienta essa
prática, e isso implica na institucionalização de uma mensagem comum a vários indivíduos e
estruturas. Essa prática reverbera as argumentações de Bourdieu (2007) sobre a forma de
funcionamento do poder simbólico entre estruturas de representação e a moda, visto o teor de
arbitrariedade que acarreta sua dinâmica de obsolescência controlada, mostrando-se como
uma ampla plataforma de desdobramentos dessa instância de poder.
Nesse sentido, para que se constitua um discurso uníssono, que permita a projetação
de artefatos que visem criar relações de valor, demonstra-se importante observar várias
formas de emissão de sinais, bem como, os mecanismos de disseminação sígnica engendrados
por esferas, agentes e indivíduos.
Ainda segundo o sociólogo:
[...] o que mais informa sobre o minimalismo predominante ao longo dos anos 1990
não são as cores em si (os beges e cinzas, etc.), mas o próprio discurso produzido
sobre o minimalismo, que envolve e justifica essa escolha (busca por discrição,
invisibilidade, menos é mais”, etc.) e que traduz, por sua vez, toda uma visão de
mundo compartilhada por determinados grupos (CALDAS, 2004, p. 116).
Portanto, se a moda dos anos 1990 representou esses pressupostos a partir da
constituição de artefatos destituídos de adornos, outros setores representativos também o
fizeram, de modo a possibilitar o reconhecimento de uma idéia prevalecente, que, através da
unificação de vários fragmentos textuais (os artefatos representativos), propagou um discurso,
estabelecendo um padrão estilístico a ser seguido.
Nesse sentido, é possível argumentar que a constituição de um estilo pode se dar a
partir de vários vetores discursivos, e sua disseminação também.
58
Consoante Caldas, a mídia com todas as suas plataformas de difusão de informações
os eventos profissionais (salões e feiras, semanas de desfiles, exposições em locais
prestigiados), enfim, todas as instituições legitimadoras, podem ser consideradas como
vetores de emissão de sinais de uma determinada tendência (CALDAS, 2004, p. 112-113).
Recupera-se, aqui, a premissa de disseminação sígnica a partir de uma lógica vertical
de cima para baixo gotejamento anteriormente tratada e devidamente intitulada trickle
down, ou trickle effect.
Essa dinâmica de disseminação pode ser melhor entendida a partir das considerações
oferecidas por Treptown:
O efeito trickle down coma no topo da elite da moda, com um lançamento de alta-
costura ou o estilo de uma estrela pop, como Madonna, por exemplo. As pessoas que
estão mais próximas dessas celebridades e formadores de opinião adotam o mesmo
estilo primeiro. Assim que é notado pela imprensa, o estilo passa a ser divulgado e
algumas marcas independentes comam a reproduzi-lo. Valorizado pela exposição
na mídia, o estilo tamm se copiado por redes de lojas e marcas que atuam em
mercados mais populares, adaptando materiais para conseguirem fornecer o mesmo
estilo a um preço mais em conta para o mercado de massa. Por último chega-se a
produção em larga escala e acesso ao público geral (TREPTOW, 2003, p. 28).
Durante muito tempo, foi essa a lógica de disseminação sígnica predominante no
sistema da moda, e sua vinculação com a alta instância de lançamento de novos padrões
estético-formais a alta-costura um meio de corroborar tal efeito vertical descendente.
Nesse sentido, buscar o monitoramento do que os criadores de moda estavam propondo
mostrava-se premissa usual de orientação, e a interpretação dos sinais emitidos pelas
apresentações organizadas por estes os desfiles sazonais de lançamento de coleções um
meio de antecipar os possíveis desdobramentos sígnicos que seriam engendrados pelas esferas
constituintes do campo da moda.
Essa forma de atuação também foi o meio pelo qual os birôs de estilo buscaram
difundir suas informações, organizando as mesmas a partir das percepções discursivas
oferecidas pelas altas esferas de geração e institucionalização do discurso no sistema da moda.
Entretanto, segundo Parode et. al, na década de 1980 essa dinâmica perdeu força,
devido a mudanças significativas ocorridas tanto no sistema da moda, como no meio
sociocultural (PARODE; VISONÁ, SOPCOM, 2009).
Consoante Caldas, a partir desse período, outros agentes passaram a funcionar como
disseminadores de sinais, contribuindo sobremaneira para a constituição de tendências. Por
exemplo, os grupos jovens viabilizaram que a moda, e, conseqüentemente, a informação de
59
moda se tornasse mais acessível. Nesse sentido, os parâmetros de geração de novos discursos
sofreram alterações significativas, pois, sabe-se que um determinado estilo, portanto um
discurso institdo, carrega uma mensagem, permitindo a decodificação do mesmo por vários
indivíduos, inscrevendo-os em algum nicho dentro do quadro das multiplicidades dos padrões
estilísticos que embasam desdobramentos culturais.
Analisando a questão sob esse prisma, é possível identificar uma outra forma de
disseminação sígnica operante, atuante a partir de um funcionamento contrário ao efeito
trickle down.
Essa perspectiva, segundo Treptown, intitula-se bubble up, e predifusões sígnicas
de baixo para cima nas estruturas:
O efeito bubble-up faz o caminho contrário, elevando na escala social um estilo
surgido nas ruas, como foi o caso dos estilos punk e grunge. Um grupo desenvolve
um estilo de vestir específico. O mercado de moda atribui um nome a este estilo e
começa a divulgá-lo em revistas e mídia eletrônica. Formadores de opinião tomam
conhecimento do estilo das ruas e adotam versões mais sofisticadas do mesmo. Por
último, versões exclusivas inspiradas no estilo original aparecem no mercado de
luxo e nas passarelas (TREPTOWN, 2003, p. 28).
As considerações construídas por Treptown reverberam as argumentações oferecidas
por Mafesolli, no sentido de relevar a importância de análise da aparência figurativa que os
indivíduos assumem no meio social. Segundo o sociólogo a aparência tem importância
fundamental como vetor de agregação. Para ele os matizes da vestimenta, os cabelos
multicoloridos e outras manifestações [...], servem de cimento. A teatralidade instaura e
reafirma a comunidade (MAFESOLLI, 2002, p. 108).
Dessa forma, considera-se que possa ocorrer um deslocamento da instância de poder
simbólico: se antes o mesmo estava nos agentes constituintes das altas esferas na estrutura do
sistema de representação, agora esse poder parece migrar para a margem do sistema, portanto,
para além do discurso institucionalizado pelos tradicionais emissores de sinais.
Essa dinâmica de desdobramento encontra eco com a perspectiva de geração do novo
a partir de Foucault, que considera que o novo es no acontecimento em torno do discurso,
portanto, naquilo que ainda o faz parte do discurso estruturalmente institucionalizado.
(FOUCAULT, 2008, p. 28).
Segundo Manzini, no atual cenário social, dinâmicas de baixo para cima ou bottom-
up tendem a privilegiar o surgimento de comunidades criativas, orientadas conforme
desejos, anseios e necessidades comuns a indivíduos. Nesses casos, as representações
60
projetuais buscam dar conta desses pressupostos, viabilizando caminhos para a inovação
(MANZINI, 2007, p.18).
Considera-se que a troca de informações entre indivíduos que possuem as mesmas
necessidades latentes viabilize a formalização de sensibilidades circunscritas a certos
coletivos, orientando para a constituição de códigos que busquem dar conta dessa interação.
Nesse sentido, os indivíduos buscao comunicar os pressupostos interrelacionais nos seus
coletivos, orientando-se para a constituição do que, segundo Mafesolli, podem ser chamados
de Tribos (MAFESOLLI, 2002). Os ambientes de geração desses códigos encontram-se fora
do sistema institucionalizado, portanto, à margem, porém, funcionam com sua própria
dinâmica de modo concomitante ao mesmo. Entretanto, a legitimação dos códigos
circunscritos a esses coletivos à margem do centro, revela dependência na constituição do
valor com relação às esferas constituintes do sistema da moda, que busca assimi-los e
disseminá-los, potencializando novas linguagens representativas. Essa dinâmica visa
alimentar os próprios ciclos de obsolescência programada do sistema e, dessa forma,
sobressai-se uma relação de dependência entre margem e centro do sistema.
Os ambientes para a geração desses códigos relativos a coletivos tendem a se
configurarem na Urbe, devido à importância que os espaços urbanos assumiram a partir do
final do século XVIII.
Desse modo, as relações deflagradas nesses ambientes passaram a sinalizar
pressupostos de identificação e diferenciação entre indivíduos, permitindo o surgimento de
estilos próprios, vinculados às múltiplas linguagens coletivas. Assim, surgiram termos como
tribos urbanas, que visam identificar, a partir de arranjos sígnicos determinados, quais os
fatores comunicacionais que estão sendo organizados por alguns indivíduos.
Sendo assim, a busca pela renovação, característica do sistema da moda, conduz à
necessidade constante de monitorar os sinais emitidos a partir de coletivos específicos
dispersos no ambiente urbano, que potencialmente estarão re-organizando os signos
representativosexistentes, em nome da geração de códigos próprios.
Associando as considerações de Foucault acerca das instâncias de poder e saber que
se articulam através da formulação e institucionalização de discursos, ao que se busca
evidenciar nesse estudo, pode-se considerar que os artefatos representativos dos coletivos
específicos são fragmentos de um texto que funciona como agente unificador nesse coletivo.
Na perspectiva de Caldas, várias são as formas de perceber como estão sendo comunicados os
61
fenômenos que ligam alguns indivíduos (sica, objetos cultuados, fanzines, etc.), e as
significações que se constituírem nas relações entre esses artefatos e o meio sociocultural
podem proporcionar a amplificação de sentido ao discurso circunscrito ao coletivo.
Considera-se que a identificação de uma estrutura pode levar a compreensão de outra
estrutura, e o reconhecimento dos códigos que se replicam de uma para outra podem gerar
novos discursos, cumprindo o que Laurent Jenny (1979) chamou de amplificação do discurso.
O fator estético, assim, pode funcionar como um meio de comunicar a fluidez criativa
que perpassa os indivíduos que constituem uma determinada tribo urbana, permitindo a
visualização das sensibilidades emergentes que orientam esse micro ambiente relacional.
A dinâmica de disseminação sígnica que pre esse funcionamento de baixo para
cima bubble up estabelece uma importante relação de observação das sensibilidades e
estéticas que emergem em coletivos espeficos (tribos urbanas). O meio sociocultural, com
sua dinâmica de forças entre vários indivíduos potencializa a geração dessas sensibilidades e
de novas estéticas, que serão o elo de ligação de alguns, permitindo a visualização das
referências que emergem de um dado imaginário coletivo. De fato, nota-se uma relação de
interdepenncia e interrelação permanente entre macro ambiente e micro ambiente, entre
centro e periferia, corroborando a perspectiva de interação entre essas duas insncias
conforme argumenta Massonnier: Las tendencias son movimientos que suceden siempre en
nível “macro (macroeconômico, macrosocial) pero se expresan em la vida de cada uno, em
la microhistoria, em las conductas de todos los dias” (MASSONNIER, 2008, p.16)
12
.
A percepção como operação na identificação de tendências na relação entre micro e
macro ambientes contribui para que, assim que um discurso marginal seja identificado e
assimilado pelo sistema da moda, diga-se, valorizado, a disseminação sígnica se inverta, ou
seja, a ebulição torna-se gotejamento (trickle down). Segundo Caldas, talvez o melhor
exemplo desse processo seja o que aconteceu com o movimento punk, desde seus primórdios
como movimento de expressão da revolta e do niilismo dos jovens das periferias inglesas, até
chegar às vitrinas mais cobiçadas do planeta, em looks “estilizados como sinônimo de
modernidade” (CALDAS, 1999, p.92).
Nesse processo utilizam-se os signos arranjados por um determinado coletivo de modo
a os ressignificar, desdobrando estratégias de significação que visem extrapolar o discurso de
12
A tradução de Massonnier é livre, ou seja, da autora: As tendências são movimentos que acontecem sempre
em vel macro” (macroeconômico, macrossocial) porém se expressam na vida de cada um, na microhistória,
nas condutas de todos os dias.
62
referência, ligando micro ambiente à macro ambiente para, por fim, amplificar o sentido do
discurso circunscrito a uma determinada tribo urbana.
Essa pretensa relação entre ambientes relacionais pode levar à constatação de uma
outra dinâmica de disseminação sígnica, centralizada no indivíduo isolado. Nesse contexto,
considera-se que as relações entre coletivos específicos a formação de tribos urbanas
desdobra-se de tal forma que permita sua fragmentação, desenvolvendo-se de modo a
privilegiar a perspectiva individual, permitindo que o indivíduo se torne um potencial emissor
de mensagens originais. Essa dinâmica, é nomeada a partir de Barros e Moraes (2006) como
tkickle across, já para Manzini, recebe o nome de peer-to-peer.
Conforme Manzini (2008), a partir dessa dinâmica, as trocas podem ocorrer entre
pares, dispensando uma rie de agentes e esferas que compõem os sistemas, permitindo o
surgimento de meios de projetação flexíveis e difusos, abertos e horizontais, promovendo a
colaboração contínua em empreendimentos sociais.
O princípio de horizontalidade funcional é o ponto de partida para o entendimento de
como funciona essa dinâmica, que, numa primeira análise, sugere promover trocas constantes,
não necessitando da organização em esferas de difusão para ocorrer.
Segundo Barros e Moraes, o trickle across é um processo contínuo de trocas de
referenciais, alavancado pelo intercâmbio de códigos entre grupos. Os meios de comunicação
contemporâneos, como redes sociais digitais, por exemplo, funcionam como plataformas de
desempenho dessa prática, permitindo que os arranjos sígnicos sejam disseminados sem a
necessidade de agentes legitimadores no processo (BARROS E MORAES, 2006, p. 9).
segundo Caldas, essa prática horizontal de difusão es ligada à perspectiva de
constituição de uma identidade própria, ou, de uma identificação, que acaba sendo fruto da
falta de referências precisas que opera na contemporaneidade:
As profundas mudanças verificadas no último quartel do século XX refletem-se de
modo particularmente sensível na constituição da identidade dos indivíduos. Fala-se
de uma “identidade estilhaçada”, sem um centro de referência preciso. Daí a idéia de
que o indivíduo conduziria suas ações e escolhas de acordo com as “identificações”
mais ou menos duradouras entre ele e as coisas (CALDAS, 1999, p.115).
A partir de tais pressupostos, pode-se considerar que a perspectiva de estilhaçamento
de identidades privilegie a multiplicidade de códigos, transformando o indivíduo em um
constante agente de disseminação sígnica. Nesse contexto, observar a multiplicidade de estilos
presentes no meio sociocultural se mostra importante para a identificação de sinais de
63
sensibilidades emergentes a partir da interpretação oferecida por essa forma de representação
simbólica em si (o estilo assumido por um determinado indivíduo), potencializando a
constituição de novas leituras do devir cultural.
Consoante Massonnier: en cada uno de nossotros está todo, y creo que esta és la
perspectiva con la que debemos analizar los fenómenos de cambio” (MASSONNIER, 2008,
p.19).
13
Ora, se o todo está em cada um dos indivíduos, a observação das relações individuais
pode levar à identificação de sinais que permitirão a geração de uma tendência,
proporcionando a constituição de narrativas a partir da perspectiva de que o micro ambiente
caracterizado, nesse caso, pelo indivíduo possui interferência nas futuras mudanças do
macro ambiente caracterizado pelo meio sócio-cultural.
Nesse sentido, um indivíduo apenas pode iniciar um processo de renovação sígnica,
disseminando seus códigos a partir de plataformas de comunicação em massa (redes digitais,
por exemplo), levando outros indivíduos a se identificarem com esses digos. Sobre essa
perspectiva, Penn e Zalesne dizem que: nas atuais sociedades de massa, basta que 1% dos
indivíduos façam uma escolha contrária à maioria para criar um movimento que pode
mudar o mundo” (PENN; ZALESNE, 2007, p.17).
O efeito trickle across permite que as relações horizontais se dêem de modo aleatório
ao sistema da moda. Porém, faz parte da lógica operativa do sistema a apreensão de novos
códigos, no intuito de alimentar sua dinâmica de obsolescência controlada, assimilando e
buscando propagar as modificações para legitimar sua arbitrariedade inerente. Ou seja, o
indivíduo antes vinculo final da esfera de disseminação sígnica a partir da lógica vertical do
gotejamento passa a ser foco de atenção da estrutura do sistema de representação pela moda,
e o monitoramento das linguagens representativas oferecidas por este, uma forma de prever os
desdobramentos sociais futuros. Desse modo, o indivíduo torna-se um vetor de emissão de
sinais primeiramente fracos, porém, potencialmente transformadores.
Analisando a questão sob esse prisma, é possível afirmar que os fenômenos que
engendrarão novos códigos que gestarão novas tendências estejam sendo construídos em
diversas esferas do tecido social. A observação das relações interpessoais pode levar ao
entendimento de quais fenômenos serão determinantes na constituição de narrativas que
13
A tradução de Massonnier é livre, ou seja, da autora: Em cada um de nós está o todo, e creio que esta é a
perspectiva com a qual devemos analisar os fenômenos de transformação.
64
permitam desdobramentos projetuais. Assim, as altas esferas do sistema da moda podem ser
monitoradas, mas, as distintas formas de manifestação do devir cultural também,
independente das mesmas serem identificadas em coletivos específicos tribos urbanas - ou
em alguns indivíduos. Os artefatos objetivados nesses ambientes independente de suas
configurações apresentam-se como meios de identificação das linguagens e possibilitam a
interpretação dos seus códigos.
Nesse contexto, parece se estabelecer um jogo de construção de hipóteses como
método de trabalho, e o pressuposto de ligação entre sinais monitorados, um meio de
constituir tendências que privilegiem aspectos orientados para estratégias específicas.
Segundo Caldas, “O jogo torna-se mais rico quando a pergunta possibilita, por meio da
identificação do interlocutor e combinada com outros sinais, o delineamento de uma
sensibilidade ou de um comportamento novo, abrindo oportunidades para as empresas
trabalharem com pesquisa aplicada.” (CALDAS, 2004, p.117) Para empreender tal tarefa,
privilegia-se métodos de cunho qualitativo. Nesse sentido, a observação do devir cultural
mostra-se atrelada a observação das áreas de representação simbólica que permeiam as
relações engendradas na sociedade e que permitam ligar subjetividade e limites formais.
Nesse sentido, identificar onde os sinais estão sendo emitidos, ou seja, qual área
representativa se sobressai em um determinado momento, comunicando o estado do devir
cultural a partir de digos, pode mostrar-se como ferramenta e método de identificação e
constituição de tendências. sica, cinema, literatura, artes: esses são alguns exemplos de
quais outras linguagens podem ser observadas. A convergência entre os diálogos pode se dar a
partir das interrelações que foram identificadas entre as estruturas, privilegiando os
fragmentos discursivos pertinentes ao processo de inovação em nível de significados para
uma determinada empresa/organização. Essa tarefa visa a configuração de narrativas
projetuais, privilegiando uma ampla leitura do processo de semiose cultural, levando à
compreensão do estágio de desenvolvimento das relações sociais e qual a implicação disso na
configuração de discursos que visam proporcionar a modificação de significados.
A construção de interrelações estruturais pode levar a configuração de novos sentidos
ao discurso que estiver sendo articulado, ligando micro e macro ambientes relacionais,
potencializando o desdobramento de cenários que visem oferecer nculos de projetação que
amplifiquem o sentido discursivo original.
65
Considera-se, assim, a percepção de quais os fenômenos sociais relevantes, e essa
tarefa demanda a compreensão de dimenes não quantificáveis. Nesse sentido, justifica-se
ampliar a abordagem, como aponta Massonnier:
Sin Duda, estudiamos comportamientos y podemos cuantificarlos, pero el análisis de
las tendências requiere otra mirada. [...] las creencias y valores se organizan en
forma sistêmica como respuesta a una visión del mundo ( y de uno mismo) que nos
guia de manera mucho s profunda y abstracta.[...] Los procesos de cambio van
apareciendo a principio a través de señales pequeñas y sutiles. Son percebidos por
aquellos que están muy atentos (MASSONNIER, 2008, p. 24-25).
14
.
Ainda segundo Massonnier, essa forma ampla de perceber as modificações que se
operam nas relações sociais, pode ir além do tipo de abordagem proposto nesse estudo ou
seja, o princípio de identificação de sinais a partir dos arranjos sígnicos constituídos pelas
áreas de representação simbólica (MASSONNIER, 2008, p. 23).
Desse modo, pode-se considerar que os sinais de transformação, que embasarão a
constituição de tendências, surjam de vários níveis de relações interpessoais, e que a
constituição de narrativas pode oferecer um novo olhar sobre esse pressuposto, reiterando
alguns fatores e, ao mesmo tempo, oferecendo um novo sentido aos sinais relacionados, visto
que os mesmos eso sendo objetivados em arranjos sígnicos entre os indivíduos. Nessa
perspectiva, os artefatos de design de moda podem funcionar como meios de reconhecimento
da multiplicidade discursiva operante entre as relações pessoais, potencializando a geração de
fatores comunicacionais significativos e devolvendo aos usuários interpretações de suas
próprias necessidades latentes, sendo essas fruto das sensibilidades que emergem no meio
sociocultural, portanto, permeando relações diversas.
Se está considerando que a identificação de sinais que visem a construção de cenários
projetuais, contemporaneamente privilegia dinâmicas de disseminação sígnica dos tipos
bubble up (ou, bottom-up) e trickle across (ou, peer-to-peer). A configuração de narrativas
ou seja, as interrelações que serão constituídas entre várias unidades dialógicas no sentido
de configurar tendências para o design de moda visando a renovação do discurso operante no
sistema engendrará ao final do processo uma dinâmica de cima para baixo, visto que, a
partir desse entendimento, os códigos emergentes no meio sociocultural já foram devidamente
identificados e interpretados, servindo como aporte de projetação de estratégias
14
A tradução de Massonnier é livre, ou seja, da autora: Sem vida, estudamos comportamentos e podemos
quantificar-los, porém, a análise das tendências requer outra abordagem. [...] as crenças e valores se organizam
de modo sistêmico como resposta a uma vio do mundo (e de um mesmo) que nos guiam de maneira muito
mais profunda e abstrata. Os processos de transformação vão aparecendo no princípio através de sinais pequenos
e sutis. São percebidos por aqueles que estão mais atentos.
66
organizacionais que permitam a ressignificação dos múltiplos discursos que eso sendo
articulados entre os indivíduos.
Analisando a queso sob esse prisma, mostra-se relevante acompanhar as
transformações socioculturais que estiverem sendo engendradas à margem do sistema,
portanto, à margem das estruturas dominantes. Essa perspectiva pode corroborar a
importância de observar metodicamente a dinâmica da intertextualidade cultural, ou ainda, o
processo de semiose, como meio de identificar sensibilidades emergentes, levando à
constituição de tendências que potencialmente se desdobrarão em períodos longos, oferecendo
vínculos duradouros de desenvolvimentos narrativos para empresas e organizações.
Considera-se, assim, que várias são as formas de sublimação dos fluxos criativos individuais,
e que a fragmentação de uma idéia pode nos levar a outras formas de representação simbólica.
Nesse sentido, busca-se compreender a o papel de representação de tendências que
existe entre imaterial e material, e como o devir cultural se desenha a partir dessa dinâmica.
Consoante Flusser:
[...] o mundo dos fenômenos, tal como percebemos com os nossos sentidos, é uma
geléia amorfa, e atrás desses fenômenos encontram-se ocultas as formas eternas,
imutáveis, que podemos perceber graças à perspectiva supra-sensível da teoria. A
geléia amorfa dos fenômenos (o mundo “material”) é uma ilusão e as formas que se
encontram encobertas am dessa ilusão (o mundo formal”) são a realidade, que
pode ser descoberta com o auxílio da teoria. E é assim que a descobrimos,
conhecendo como os femenos amorfos afluem às formas e as preenchem para
depois fluírem novamente ao informe (FLUSSER, 2007, p.24).
Partindo das observações de Flusser, considera-se que a construção de uma
metodologia que permita a constituição de tendências para o design de moda pode levar à
configuração de cenários de projetação, potencializando o desdobramento de estratégias
organizacionais a partir de possíveis caminhos projetuais, visando o desenvolvimento de
inovações em nível de significados para artefatos de design de moda.
67
CAPÍTULO II CONSTRUÇÃO DA METODOLOGIA
2.1 OBSERVAÇÃO DO MEIO SOCIOCULTURAL
Observar quando, onde e como os digos emergem permeando e atravessando o meio
sociocultural e as relações inter-individuais, e identificar o sentido que está se configurando, é
condição sine qua non para a constituição de tendências. O potencial simbólico que se
evidencia a partir de diversas formas de representação sinaliza o estágio do imaginário
coletivo. A identificação de sinais, e a posterior relação entre os mesmos, permite perceber e
tangibilizar uma leitura formal do sentido da atualidade. Como afirma Caldas, “as correntes
socioculturais e a evolução dos valores, que desenham o espírito do tempo”, são detectáveis,
apreensíveis [...] e, por isso, antecipáveis, por meio dos sinais emitidos pelas diversas
esferas da cultura” (CALDAS, 2004, p. 92).
Fala-se, portanto, de cultura material, e essa perspectiva pode ser entendida atras
dos arranjos sígnicos constituintes de artefatos, que vinculem a construção de significados,
potencializando a comunicação do devir social a partir de interpretações posteriores. Segundo
o antropólogo Marc Augè, a cultura material permite a vinculação de aspectos simbólicos,
visto que:
La cultura material es colectiva e individual a la vez (unida a la suerte, a la vida y a
las preocupaciones de cada uno). És pues una cultura en acción, una cultura
practicada con unos fines alimentarios, sanitários, sociales o religiosos, lo qual no
quita ningún valor a su significado global, sino al contrario, desde este punto de
vista, los detalles ornamentales o los gestos singulares tienen un valor de “mediación
simbólica” en relación com el sistema cosmológico global (AUGÈ, 2001, p.105)
15
.
As considerações de Augè conduzem à compreensão de que os artefatos funcionam
como mediação simbólica entre instâncias. Nesse sentido, observar sinais no presente e
desenhar o devir sociocultural, parte da decomposição dos signos configurados em formas de
representação simbólica, levando à identificação de re-arranjos estruturais, potencializando
leituras dos fenômenos de transformação operantes no momento atual. Ao desdobrar esses
fenômenos a partir dos códigos que visam comunicá-los em artefatos, é possível compreender
15
A tradução de Augè é livre, ou seja, da autora: A cultura material é coletiva e individual ao mesmo tempo
(unida pelo destino, pela vida e pelas preocupações de cada um). É, pois, uma cultura em ão, uma cultura
praticada com fins alimentícios, sanitários, sociais ou religiosos, que não recolhe nenhum valor em relação ao
seu significado global, senão ao contrário, desde este ponto de vista, os detalhes ornamentais ou os gestos
singulares tem um valor de “mediação simbólica” em relação com o sistema cosmológico global.
68
quais são as relações que estão sendo articuladas, possibilitando, ao mesmo tempo, antecipar
os desdobramentos que seo construídos no futuro.
Segundo Celaschi e Deserti, a observação da realidade permite a identificação de
sinais fortes e fracos e, como foi visto em momentos anteriores, a implicação desses na
constituição de tendências é fundamental. Essa dinâmica, segundo as orientações que
fundamentam o Design Estratégico, se estabelece na fase metaprojetual, sendo apontada como
uma importante ferramenta de construção de estratégias para a inovação, estando associada a
uma perspectiva qualitativa de análise de dados. Essa observação pode tanto ocorrer de modo
direto, ou seja, com a intervenção de indivíduos em contextos de fruição de bens, como a
partir do recolhimento de dados que se relacionem com aspectos sociais emergentes.
(CELASCHI; DESERTI, 2007, p. 38-39).
Podemos considerar que observar os fenômenos culturais, seus desdobramentos
signicos e suas implicações nas práticas do coletivo, contribui de forma a organizar o
planejamento durante o processo de afrontamento entre o problema fundamental de um
projeto e as variáveis que se apresentam na configuração de estragias de projetação. Essa
perspectiva pode advir da percepção tanto das relações entre usuários e artefatos, quanto da
convergência relacional existente entre fenômenos sociais operantes e os arranjos sígnicos
conformados em bens de distintas áreas de representações simbólicas, portanto, em distintos
campos de geração de cultura. Nesse sentido, construir estratégias projetuais relaciona-se com
o antecipar, seja a forma como o usuário irá se relacionar com um determinado artefato, seja o
nível de mediação simbólica entre os significados de um artefato e o contexto global.
Ressalta-se, contudo, que ao identificar sinais fragmentados no meio sociocultural se
está buscando compreender a construção de significados implicados nesse processo, portanto,
se está procurando identificar os múltiplos discursos operantes em um determinado contexto.
Ao relacionar esses fragmentos, é possível tangibilizar tendências como um discurso amplo
que se projeta, potencializado por interpretações sígnicas engendradas entre agentes
operadores e os indivíduos observados, de modo a construir novos sentidos.
Segundo Verganti et. al., essa prática, para o design e portanto, para os designers
pode assim se estabelecer:
As many designers know, a product‟s aesthetic appearance (its style) is but one
many ways it can bring messages to the user. What really matters to the user, in
addition to functionality, is a product‟s emotional and symbolic value its meaning.
If functionality aims at satisfying the operative needs of the customers, the product
meaning tickles their emotional and socio-cultural needs. Product meaning proposes
69
to users a system of values, a personality and identity, that may easily go beyond
style (VERGANTI ET AL., 2006, p.157)
16
.
Ou seja, muitas são as formas de comunicar e, portanto, perceber o estágio do
imaginário coletivo, e as características estéticas, que buscam determinar parâmetros de estilo,
apresentam-se como um potencial vínculo de análise, porém, não definitivo. É o significado
que cria relações, vinculando necessidades emocionais e socioculturais. Segundo Augè:
[...] todos los objetos de la vida cotidiana están producidos industrialmente, casi
consigue identificarse con la idea de entorno, si bien, cualquiera que sea la escala en
que se sitúen, dichos objetos están siempre creados desde una misma preocupación
por la forma. A partir de este momento, los objetos se allan sujetos a una triple
obligación, cuya existência hoy en dia todos los analistas del diseño reconocen: una
obligación técnica vinculada a su función, una obligación estética vinculada a los
gustos del público y una obligación cultural (que precisamente define el margen
dentro en cual el creador puede jugar más o menos con los costumbres y tradiciones
que se le suponen al consumidor). A partir de todo lo dicho, se concibe la
possibilidad de que puedan ir sucediéndose diferentes modas, de que a veces lleguen
incluso a sobreponerse. (AUGÈ, 2001, p.103-104).
17
.
Conforme as argumentações do antropólogo, é a partir da obrigação cultural,
envolvida na projetação de artefatos de design, que podem ser renovadas as linguagens
representativas sendo essas consideradas, para Augè, como modas, que podem se suceder
ou se sobrepor. Dessa forma, a análise dos objetos materiais relacionados a áreas que visem
articular signos e significados como arte, música, cinema, arquitetura, literatura, etc.
permite o entendimento do tipo de convergência que se estabelecerá entre os artefatos
pertencentes a essas estruturas e os artefatos de design de moda. A decomposição dos códigos
constitutivos, portanto, pode levar ao entendimento da mediação simbólica articulada através
dos objetos, possibilitando a identificação do espírito do tempo presente, potencializando a
constituição de enredos, narrativas nominadas como Tendências.
Desse modo, observar e selecionar os signos emergentes é o primeiro passo antes de
analisar. Co-relacionar e identificar o sentido a médio e longo prazo, parte de uma percepção
16
A tradução de Verganti et. al. é livre, ou seja, da autora: Como muitos designers sabem, a aparência estética de
um produto (seu estilo) é apenas um dos muitos meios de levar mensagens para o consumidor. O que realmente
importa para o usuário, além da funcionalidade, é o valor emocional e simbólico do produto seu significado. Se
a funcionalidade visa satisfazer as necessidades operacionais dos consumidores, o significado do produto mexe
com suas necessidades emocionais e socioculturais. O significado do produto propõe aos usrios um sistema de
valores, uma personalidade e uma identidade, que facilmente pode ir além do estilo.
17
A tradução de Augè é livre, ou seja, da autora: [...] todos os objetos cotidianos são produzidos industrialmente,
quase permanece a idéia de identificação com o ambiente, mas seja qual for a escala de transferência, esse
objetos são criados a partir da preocupação com a forma. A partir desse momento, os objetos estão sujeitos a
uma tríplice obrigação cuja existência hoje em dia todos os analistas de design reconhecem: uma obrigação
técnica relacionada a sua função, uma obrigação estética ligada ao gosto do público e uma obrigação cultural
(precisamente definindo a margem dentro da qual o criador pode jogar mais ou menos com os costumes e
tradições que supõe corresponderem ao consumidor). A partir de tudo isso, é possível conceber que podem
sucederem-se diferentes modas, e que as vezes cheguem inclusive a se sobrepor.
70
e compreensão do que está sendo comunicado por quem e para quem, exigindo para tal, a
articulação de conhecimento de varias áreas. Essa prática pode partir do indivíduo, ou seja, da
observação de contextos de geração de relações entre usuários e artefatos, bem como, da
observação dos fenômenos operantes em nível macro ambiental, recuperando, novamente, o
pressuposto de que a comunicação se estabelece a partir da prática de substituição de
fenômenos por códigos representativos.
Conforme Massonnier (2008) e de Penn e Zalesne (2007), várias o as instâncias que
comunicam o devir sociocultural, sendo que as mesmas podem operar em nível macro ou
micro, e que ambas perspectivas acabam por construir relações com sensibilidades
emergentes correspondentes a articulações engendradas entre indivíduos no campo social.
Nesse sentido, é possível considerar que a observação possa acontecer a partir da
seleção de algumas áreas de interesse. Ressalta-se a necessidade de identificação de quais
poderiam ser essas áreas, ou seja, quais o as estruturas relevantes a serem decompostas, de
modo que a efetivação de uma observação permita a identificação de códigos que
potencialmente constituirão relações afins e, assim, possibilitem configurar novos sentidos,
gerando desdobramentos estratégicos vindouros a projetos de design de moda.
Nesse ínterim, considera-se que o teor simbólico envolvido em um artefato visa
apontar caminhos para o entendimento das transformações operantes no meio sociocultural, e
que essa prática busca permitir a compreensão das relações entre macro e micro ambientes
entre indivíduos e coletivos. Segundo Augè:
Los objetos obedecen a esta doble exigência y la segunda es tan simbólica como la
primera, si bien lo es diferentemente: etimológicamente, el mbolo es lo que une a
dos individuos, a dos partes comerciales, por ejemplo, en la que una posee un
fragmento del mbolo previamente dividido. El lenguaje, que implica el
intercambio de palabras, es simbólico en este sentido, al igual que lo es cualquier
persona, porque habla, o cualquier relación, porque implica al menos dos seres. De
esta forma, todos los objetos corrientes, en la medida en que son el médio para una
relación entre personas, también son simbólicos por este concepto
18
(AUGÈ, 2001,
p.106).
Para o antropólogo, portanto, a correspondência cultural entre indivíduos seatravés
do teor simbólico que se estabelece nas trocas entre os mesmos, visto que cada ser conforme
colocações do antropólogo possui uma parte do símbolo, uma divisão do mesmo.
18
A tradução de Au é livre, ou seja, da autora: Os objetos obedecem a essa dupla exigência e a segunda é tão
simbólica quanto a primeira, mesmo que diferente: etimológicamente, o símbolo é o que une dois indivíduos,
duas partes entidades comerciais, por exemplo. A linguagem, que implica a troca de palavras, é simbólica nesse
sentido, igualmente para qualquer pessoa, porque fala, ou para qualquer relação, porque implica ao menos dois
seres. Desta forma, todos os objetos correntes, na medida que se caracterizam como um dio de relação entre
pessoas, também são simbólicos por esse conceito.
71
Pode-se, eno, retomar as argumentações de Massonnier, para quem o todo está em
cada um, e que a partir dessa perspectiva é possível analisar os fenômenos de transformação
socioculturais. Desse modo, a observação está relacionada ao pressuposto de gerar
associações entre terrenos diversos, possibilitando a leitura das interconees entre sinais
significativos (MASSONNIER, 2008, p.14-19 ).
Ainda segundo Massonnier: Cuando vemos que varios de eses signos están en
sintonia y apuntan en una misma dirección, podemos suponer que se trata de un processo que
a más allá de um fenómeno singular” (MASSONNIER, 2008, p.14).
19
Para a pesquisadora de mercado, o pressuposto simbólico, considerado por Augè,
acaba promovendo sintonia entre âmbitos sociais diversos. A direção pode ser dada a partir da
leitura das interconexões, permitindo a compreensão do teor de transformações que está sendo
configurado no presente, levando ao entendimento de desdobramentos futuros, gerando canais
não verbais de comunicação entre relações individuais e sinais (signos).
Busca-se, assim, analisar comunicações verbais e o verbais, visto que essas
constituem uma ampla rede de interligações entre os indivíduos e artefatos. O fato é que a
perspectiva racionalista, predominante no mundo ocidental, acabou por enfatizar as
comunicações verbais, deixando de observar as situações silenciosas que se desenvolvem no
seio da sociedade, e que podem promover modificações significativas.
Segundo Mafesolli, “o Exis ou o Habitus‟, tão bem descritos por M. Mauss,
determinam os usos e costumes que nos constituem, determinam o meio no qual nos
banhamos como num plasma nutriente. Ora, estes últimos são tudo menos conscientes. [...]
Nós os vivemos sem verbalizá-los (MAFESOLLI, 2002, p.127).
Logo, compreende-se que a constituição de códigos e, portanto, de potenciais formas
de linguagem que apontem o teor interrelacional entre áreas de representação simbólica
objetivadas por indivíduos, não necessariamente dependem de vínculos verbais para se
manifestar, pois a correspondência de significância entre artefatos e as transformões
operantes no tecido social pode se dar de diversas formas. O que parece ressaltar nessa
perspectiva, é o grau de reconhecimento entre necessidades latentes provenientes do meio
sociocultural e os signos constitutivos dos artefatos e, a preceito da análise que se está
19
A tradução de Massonnier é livre, ou seja, da autora: Quando vemos que rios signos estão em sintonia e
apontam para uma mesma direção, podemos supor que se trata de um processo que está além de um fenômeno
singular.
72
construindo nesse estudo, dos signos constitutivos de artefatos representativos de áreas como
mídias, arte, moda, por exemplo.
Analisando a queso sob esse prisma, várias são as características referentes ao meio
sociocultural que podem ser relevadas, retomando, nesse momento, a importância de
monitoramento de vários vetores de emissão de sinais, algo já argumentado no capítulo
anterior. A configuração do próprio habitus, que Bourdieu (2007) analisa com tanta
propriedade, e que Mafesolli replica em suas argumentações, é algo que diz respeito às
estruturas profundas presentes na sociedade, visto que: o pequeno grupo [...] tende a
restaurar, estruturalmente, a eficácia simbólica” (MAFESOLLI, 2002, p.117).
Ou seja, a análise dos códigos configurados por coletivos espeficos tribos urbanas
mostra-se importante no processo de identificação de sinais que possam levar à constituição
de tendências. Como foi argumentado anteriormente, esses códigos podem se replicar de
várias maneiras, construindo relões entre os indivíduos que pertencem ao coletivo a ser
analisado e os artefatos gerados para dar vazão à potência de afirmação criativa relativa aos
mesmos. Portanto, ambientes de confraternização, sicas, fanzines recuperando alguns
apontamentos de análise oferecidos por Caldas (1999) podem auxiliar na identificação de
fragmentos discursivos. O teor de conexão das relações entre esses coletivos e o ambiente
macro pode, assim, permitir a identificação de interpretações diferentes, apontando para
novos meios de organização discursiva das transformação operantes em nível social. Ou seja,
apontando para outras formas de perceber o l’air du temps que se configura.
Desse modo, analisa-se o devir cultural a partir do indivíduo em grupo, que pode,
através das argumentações construídas a partir de Caldas (1999), possuir múltiplas
identidades, ou, conforme considera Mafesolli (2002), compartilhar da dimensão do
imaginário circunscrito a um coletivo específico, construindo uma nebulosa afetual.
Relacionando esses pressupostos a estudos realizados por Nietzsche sobre a tragédia
grega, pode-se considerar que esse preceito se potencializa na formação do coro trágico (que
pode, a respeito desse estudo, ser visto como os coletivos específicos que se desdobram no
ambiente urbano, ou seja, nas tribos urbanas), visto que este é “o fenômeno dramático
primordial: ver-se a si próprio, mas transformado, e atuar então como se tivesse realmente em
outro corpo” (NIETZSCHE, 2004, p.56).
O coro trágico, que é o meio pelo qual a potência dionisíaca, apontada pelo filósofo
como uma das forças que permeiam as relações entre indivíduos, pode encontrar formas de se
73
manifestar, funciona como um corpo uníssono, embevecido pelo mesmo desejo, o de
fragmentar-se no todo e ser atravessado pelos mesmos digos. Essa dinâmica, que se inicia
de modo endêmico, pode atingir outros indivíduos, circunscritos a domínios diversos.
Tornando-se um fenômeno disseminado, os códigos originais de um determinado coletivo
acabam por se replicar e construir novos significados, objetivando re-codificações distintas,
permitindo o surgimento de múltiplos discursos. Apesar de se replicarem, é possível que os
códigos mantenham sua dimensão de comunicação primordial, e os significados constituídos
a partir dos mesmos podem gerar novos signos, operando sob uma perspectiva de movimento
helicoidal, que pode, inclusive, ultrapassar a dimensão espaço/tempo. A força dessa dinâmica,
ou seja, a força de renovação inerente aos significados primordiais e suas ressignificações,
acaba por despertar a atenção das esferas constituintes do sistema sistema da moda, no caso
específico desse estudo. Essa perspectiva acaba proporcionando meios de apreensão dos
fragmentos textuais, relativos a um determinado coletivo, em nome da construção de um
discurso uníssono, que vai, por fim, comunicar os fenômenos de transformação contidos em
unidades dialógicas conformadas em novos artefatos, atingindo a população em geral intuito
maior das esferas que compõe esse sistema.
Nesse sentido, está se considerando que essa dinâmica parte do indivíduo ou seja, do
usuário, levando em conta que se es buscando analisar vínculos simbólicos através de
objetos que circundam o cotidiano da vida em sociedade, ou, em grupos, novamente, da
cultura material o que corrobora a importância de compreensão do efeito Bubble Up como
dinâmica de disseminação sígnica, argumentado no capítulo anterior a partir de Treptow
(2003). Ora, se o todo está em cada um dos indivíduos, o macro ambiente torna-se um reflexo
das necessidades e desejos atuantes em vel micro. Nesse sentido, a constituição de
tendências pode também construir correspondência com as potenciais trocas constantes
operadas entre indivíduos em diferentes contextos de socialização, e as plataformas sociais
operantes em ambientes digitais também podem oferecer caminhos para o entendimento de
como se efetiva essa dinâmica. -se, na contemporaneidade, uma prática de
complementaridade entre trocas horizontais (ou efeito peer-to-peer) e o efeito Bubble Up.
Essas considerações convergem à lógica da formação social em rede apontada por
Mafesolli, que se configura como “[...] conjunto inorganizado e no entanto, sólido, invisível,
porém servindo de ossatura a qualquer conjunto, seja ele qual for” (MAFESOLLI, 2002,
p.119).
74
A constituição dessa lógica associativa, para o sociólogo, encontra seu auge na forma
de estetização que os indivíduos concebem, sendo que os pressupostos estéticos que
caracterizam um determinado grupo podem permitir o entendimento do teor de mudanças que
está se configurando em âmbito social. É uma construção de sentido que opera de modo
arbitrário, correspondendo à geração de significados circunscrita à forma de interpretação
objetivada pelos indivíduos, gerando cultura à margem das esferas que compõe o sistema.
Assim, a estetização da vida diária, que parte antes do indivíduo, para depois atingir um
grupo, acaba por representar um fator de transgressão na atualidade, pois possibilita que se
operem trocas horizontais, entre alguns indivíduos ou entre grupos, sem, para tanto, haver a
interferência de uma estrutura dominante. Essas relações funcionam em paralelo às estruturas
constituídas, portanto, em paralelo ao poder simbólico que emana das instituições que
legitimam discursos.
Para Benjamin (1994), essa dinâmica se iniciou a partir do advento da
reprodutibilidade técnica e, mais especificamente, a partir do desenvolvimento da escrita
autoral por parte de vários indivíduos, que podiam contribuir com seus textos a seções
específicas dos jornais, ainda na década de 30. Essa descentralização do discurso, fruto, pois,
da reprodução seriada na sociedade, acabou gerando uma tensão de forças que produziu a
valorização fictícia do indivíduo pela democratização. Essa premissa atuante, num primeiro
momento, nas relações relativas a escritos sobre a vida profissional, potencializou a
fragmentação autoral, levando à perspectiva de que, no futuro (futuro relativo ao momento de
análise acerca da reprodutibilidade constituído por Benjamin, portanto, cada de 30), todo o
indivíduo pudesse reivindicar a autoria textual:
A cada instante, o leitor está pronto a converter-se num escritor.[...] cada indivíduo
se torna bem ou mal em um perito em algum setor, mesmo que seja num pequeno
comércio, e como tal pode ter acesso à condição de autor. A democratização,
advinda da reprodutibilidade, também levou ao preceito de que: cada pessoa, hoje
em dia, pode reivindicar o direito de ser filmado (BENJAMIN, 1994, p. 183).
Ora, se cada leitor pode converter-se em um escritor, cada indivíduo pode converter-se
em um meio de originar digos e, portanto, em um potencial emissor de sinais de
transformações retomando pontos que foram construídos para explicar a atuação da
dinâmica engendrada pelo efeito trickle across (ou, peer to peer). Portanto, a o
necessidade de interferência de estruturas dominantes para a legitimação de novas linguagens
representativas acaba contribuindo para a afirmação criativa dos indivíduos, gerando tensões
entre os sistemas instituídos e os fragmentos discursivos operantes às margens destes.
75
Nesse sentido, a formação de coletivos pode corresponder ao nível simbólico
articulado entre as linguagens representativas objetivadas em estruturas distintas, e a
apreensão e posterior disseminação de códigos que comuniquem o devir cultural pode se dar a
partir da configuração de um discurso que permita a replicação sígnica dos mesmos, visando a
renovação de formas representativas existentes, no intuito de re-alimentar o poder imanente
ao sistema e, no caso dessa investigação, ao sistema da moda. Desse modo, a inovação de
significados para o design de moda pode passar pela identificação dos sinais emitidos por
esferas diversas de cultura, para depois construir relações com indivíduos e, por fim, a alguns
coletivos constituídos por esses. A observação de ambientes de desdobramento interrelacional
(a saber, locais de confraternização, publicações midiáticas segmentadas, plataforma de
compartilhamento de músicas no ambiente virtual, sites, blogs, etc), pode, eno, ser
considerada uma importante ferramenta para a configuração de cenários futuros de projetação
de artefatos de moda.
Segundo Massonnier,
[...] estos colectivos son una expressión extrema de la segmentación. Aparecen
como grupos en los que la identificación entre los que pertenecen es máxima (y se
expresa a través de signos visibles como la vestimenta, los tatuajes, etc.) y la
distancia con todos los demás es también máxima. Homogeneidad hacia el interior,
diferenciación hacia afuera (MASSONNIER, 2008, p.37)
20
.
A diferenciação, caracterizada pela estética coletiva, é embasada pela perspectiva de
promover a distinção com o que é externo ao coletivo, portanto, com as linguagens que não se
circunscrevem aos indivíduos que compõe uma determinada tribo urbana. Se o grupo é seu
próprio absoluto, também o indivíduo o é, configurando uma relação de interdependência
entre o indivíduo e os grupos, e entre os grupos e o ambiente macro. Partindo do pressuposto
que as trocas podem ser operadas de modo fluido e horizontal, a identificação dos códigos de
distinção acaba, quando alinhados e operando correspondência, construindo um sentido que
extrapola a lógica do grupo em si, proporcionando a compreensão dos níveis dialógicos
construídos com formalizações diversas estruturas - potencializando afinidades
interrelacionais (novamente, identificações).
A perspectiva de recolhimento de dados na fase metaprojetual do Design Estratégico,
relaciona-se com a observação das transformações operantes no meio sociocultural. Nesse
20
A tradução de Massonnier é livre, ou seja, da autora: [...] estes coletivos são uma expressão máxima da
segmentação. Surgem como grupos onde a identificação entre os que pertencem é máxima (e se expressa através
de signos viveis coma a indumentária, as tatuagens, etc.) e a dinstância com todos os demais é tamm
máxima. Homogeneidade interna, diferenciação para fora.
76
sentido, busca-se pela aproximação dos métodos em Design Estratégico e observação de
sinais, a constituição de uma nova metodologia que pretende dar conta da necessidade de
pesquisa de tendência para se projetar estrategicamente. Porém, há que se diferenciar as
formas de observação, bem como, o que é possível observar, onde e para quê.
2.2 FORMAS DE OBSERVAÇÃO
Segundo Martins e Theóphilo:
A Oservação é uma técnica de coleta de informações, dados e evidências que utiliza
os sentidos para obtenção de determinados aspectos da realidade. Toda observação
deve ser precedida de alguma teoria que lhe fundamentos e embasamento
suficiente para que a técnica seja adequadamente aplicada aos propósitos do estudo
(MARTINS E THEÓPHILO, 2007, p.84).
A observação, circunscrita à ciência, é fruto do desenvolvimento de procedimentos
empíricos e sensoriais, e sua validade investigativa depende da pré-elaboração de um
protocolo de observação, visto que difere da observação da rotina diária. Esse protocolo de
observação, que também pode ser entendido com um plano, servirá como um delimitador da
observação. Como dizem Martins e Theóphilo, o plano delimitará o fenômeno a ser
observado, indicará o que se deve observar, as maneiras de se observar, a duração, a
periodicidade, o modo de registros e controles para garantia da validade e confiabilidade do
material levantado” (MARTINS E THEÓPHILO, 2007, p.84).
Além disso, o observador deve partir do pressuposto de que a coleta e análise dos
dados e evincias deve ser efetuada de modo imparcial, sem contaminá-los com suas
próprias opiniões e interpretações. Portanto, a pré-constituição de um escopo teórico que
permita a realização dessa modalidade de investigação é fundamental, haja visto que se faz
necessário circunscrever tanto o que se observado, como a forma que se dará essa
observação.
Nessa modalidade investigativa, não esprevista a participação do observador, e esse
limita-se a acompanhar os fenômenos sem interferir no contexto, ou seja, sem declarar suas
intenções ao acompanhar os desdobramentos que se estabelecem nos contextos selecionados a
serem observados.
77
Por sua vez, a observação participante caracteriza-se como uma modalidade de
pesquisa para coleta de informações, dados e evidências a partir de estudos antropológicos.
Nessa modalidade investigativa, o observador-participante não é apenas um observador
passivo, “ao contrário, o pesquisador pode assumir uma variedade de funções e de fato
participar dos eventos e situações que estão sendo observados(MARTINS; THEÓPHILO,
2007, p.85).
Essa modalidade investigativa é fruto de estudos antropológicos engendrados com o
intuito de compreender dimicas culturais estabelecidas em contextos delimitados,
potencializando tanto a análise de pressupostos simbólicos, quanto objetivos. Trata-se de um
método onde a cultura material permite o entendimento das relações que se desdobram no
entorno, vinculando percepções, relações e impressões, permitindo a análise dos vínculos
relacionais que extrapolem informações verbalizadas pelos indivíduos, principalmente quando
em contextos de fruição de artefatos.
Nesse sentido, trata-se de um método que busca compreender o outro, visto esse ser o
interlocutor na perspectiva de construção de canais de comunicaçãoo verbal.
Segundo Caldas, a pesquisa de observação participante caracteriza-se como uma
pesquisa de campo, sendo considerada um dos instrumentos mais criativos postos em prática
pela antropologia no século XX. Nesse sentido, prevê uma imersão do observador no contexto
cultural escolhido para ser analisado, e a prática instrumental permite que o pesquisador pense
e compartilhe dos valores e da cultura do objeto em estudo, mostrando-se como uma eficiente
alternativa para conhecer grupos ou potencias mercados de atuação (CALDAS, 2004, p. 104).
Assim, por exemplo, o observador-participante pode atuar efetivamente em um
determinado grupo social, sendo que também pode atuar de modo periférico ao mesmo.
Entretanto, considera-se que a premissa de desenvolvimento de relações entre o meio e o
observador é importante, de fato, “trata-se de alocar o investigador no contexto sico a ser
estudado, e de criar condições para a coleta de informações, dados e evidências através dos
olhos e percepções do pesquisador” (MARTINS; THEÓPHILO, 2007, p.85).
A observação participante circunscreve-se, na antropologia, à pesquisa etnográfica, e
essa forma de investigar contextos de desenvolvimento de relações leva em conta aspectos
tanto relativos aos indivíduos constituintes de determinados grupos, como as percepções
desdobradas pelo pesquisador em seus momentos de investigação. O nível relacional que se
estabelece permite a compreensão dos vínculos simbólicos mediados através dos artefatos,
78
possibilitando o deslocamento das formas de mediação que se o no contexto de estudo para
outros contextos, potencializando o desenvolvimento de novas relações a partir do
entendimento das formas de fruição que se estabelecem entre agentes diversos.
Nesse sentido, a etnografia permite problematizar o recorte da realidade feito pelo
observador, através do método de observação, seja participante ou não, delimitando um
contexto de análise para tal buscando, portanto, relacionar esse preceito à realidade que
circunda um contexto específico de observação, que, nesse estudo, podem ser caracterizados
como áreas de representação simbólica, que visam associar aspectos subjetivos a
formalizações. Desse modo, são previstos limites de observação que podem ser
circunscritos a determinados objetos, por exemplo permitindo a assimilação e posterior
compreensão da inter-subjetividade envolvida no processo de vinculação entre fenômenos
sociais, artefatos e o devir cultural.
Segundo Laplantine: “Atividade e observação, a etnografia é antes de tudo uma
atividade visual, ou, como dizia Marcel Duchamp acerca da pintura, uma „atividade
retiniana‟” (LAPLANTINE, 1996, p. 10).
Trata-se, assim, de uma forma ampla de olhar, levando em conta questões que partem
da observação pura e simplesmente para chegar a veis de entendimento do que está
por trás da materialidade observada a memória, a imagem, o imaginário, a forma, a
linguagem, o sentido: a geração de sentido, a vivência dos sentidos pelos indivíduos.
Desse modo, o investigador o etnógrafo é convidado a estabelecer outros veis de
entendimento acerca dos desdobramentos culturais que o cercam, privilegiando meios de
compreender os preceitos estruturais que estão sendo vinculados à materialidade configurada
por indivíduos que possuem seus códigos próprios de substituição de femenos sociais. A
decomposição desses códigos, e das esferas estruturais que os delimitam, pode ser efetivada
através do olhar e do questionamento - para após serem construídos relatos, depurações,
análises e categorias, possibilitando a coleta de informações que visem gerar novas soluções
às hipóteses de investigação relevadas, sendo essa uma forma de promover um recorte na
realidade, portanto, uma forma de eleger determinados fragmentos textuais operantes. Trata-
se, portanto, de um modo de identificar sinais orientados por recortes pré-estabelecidos,
visando a identificação também dos significados que eso sendo articulados a partir desses.
Essa prática permite a construção de discursos, orientados para o estabelecimento de
79
interconexões entre formas representativas distintas, potencializando, a preceito dessa
investigação, a constituição de tendências para a projetação de artefatos de moda.
Cercando-se de elementos de interpretação, os designers podem interferir nas relações
sociais, estabelecendo nculos entre a materialidade (o projeto) e a potência de afirmação da
criatividade que perpassa as relações individuais. Cumpre-se, assim, a obrigação cultural
vinculada aos objetos e renova-se a dinâmica de estabelecimento de canais de comunicação
em vel e não verbal entre artefatos, indivíduos e fenômenos de transformação social.
Potencializa-se, dessa forma, o entendimento do espírito do tempo que se desenha na
sociedade.
Mas, se o método de observação participante visa, justamente, a observação das
relações que se estabelecem em contextos de geração de cultura, e se a etnografia permite o
entendimento de pressupostos subjetivos estabelecidos a partir de contextos de fruição, seriam
as comunidades operantes em contextos digitais formas de praticar outro tipo de observação
das relações sociais, portanto, de identificação de fenômenos operantes de transformação? Ou
seja, a observação desses contextos de socialização pode levar à identificação de sinais e à
constituição de posteriores relações entre micro e macroambientes, auxiliando no processo de
projetação de artefatos de moda?
A próxima seção desse estudo buscará apresentar meios de contemplar esses
questionamentos.
2.3 MÉTODO DE OBSERVAÇÃO EM AMBIENTES DIGITAIS
A etnografia, que se desenvolve a partir da metodologia de observação de contextos
culturais delimitados sendo essa observação participante ou não possui um
desdobramento para relevar dinâmicas de relações engendradas em ambientes digitais. Esse
desdobramento se intitula netnografia, e se caracteriza como uma técnica:
[...] privilegiada para alcançar o entendimento de valores e símbolos que norteiam as
diversas subculturas do ambiente tecnológico criado pelos meios de comunicação de
massa, particularmente a Internet. Buscam-se entendimentos sobre comunidades
virtuais, ou seja, particularidades das operações on line das e-tribes. (MARTINS e
THEÓPHILO, 2007, p.75).
80
Considera-se que esses ambientes virtuais desdobrem outros níveis de trocas
simbólicas entre indivíduos, devido ao desenvolvimento de novas formas de socialização.
Está se considerando, assim, que as associações estabelecidas em ambientes on-line
também possam ser observadas, e que essa forma de investigação também pode contribuir
para a identificação de fragmentos textuais que possam ser colocados em relação e, assim,
construir sentido, potencializando a constituição de tendências e a posterior configuração de
cenários de projetação para artefatos de moda. Portanto, que possam auxiliar no
desdobramento de estratégias projetuais ao design de moda.
Segundo Kozinets, o método de etnografia aplicado a ambientes on line a
netnografia pode ser definido como uma investigação derivada da técnica etnográfica
oriunda da antropologia, e sua utilização tem crescido devido ao teor de complexidade que se
desdobra em comunidades digitais ou, sociedades digitais (KOZINETS, 2002).
Vale considerar ainda que para Kozinets, a netnografia se apresenta como uma
interessante ferramenta para o estudo de comportamentos de consumo, portanto, para o
entendimento das dinâmicas interrelacionais que se estabelecem entre indivíduos e artefatos,
possibilitando o entendimento de questões subjetivas envolvidas no processo de fruição de
bens, auxiliando, por fim, na compreensão de quais estratégias podem ser articuladas para
aprimorar relações entre usrios (consumidores) e objetos (artefatos). (KOZINETZ, 2007).
Sem aprofundar o estudo sobre o que poderiam ser considerados territórios virtuais,
por o ser parte do escopo de nossa pesquisa, busca-se, contudo, argumentar minimamente
sobre os mesmos a partir de considerações de Augè, que propõe que esses ambientes são fruto
da super-modernidade, e que podem ser caracterizados como: “grandes superfícies de
distribuição [...], redes a cabo ou sem fio, que mobilizam o espaço extraterrestre para uma
comunicação tão estranha que muitas vezes põe o indivíduo em contato com outra imagem
de si mesmo (AUGÈ, 1994, p.75); considera-se, assim, que a observação também pode ser
efetiva em contextos ditos virtuais, visto os mesmos possibilitarem mecanismos de criação de
vínculos entre indivíduos e artefatos. Essa prática potencializa a geração de cultura, o que
permite que intercâmbios simbólicos sejam estabelecidos, senão pela articulação da
linguagem comunicacional direta, pela geração de imagens que representam artefatos e que
permitem a articulação de canais de comunicação em nível não verbal portanto, pela
correspondência de nculos a partir de imagens que possibilitem o reconhecimento de
81
mecanismos associativos entre subjetividade e indivíduos. Ou seja, como ambientes que
servem de plataformas relacionais intersubjetivas.
Nesse sentido, entende-se que tanto a observação de contextos concretos, como a
observação de ambientes virtuais, podem levar a identificação de sinais que apontem para
sensibilidades que emergem no campo social, ou seja, para estruturas que permitam leituras
de códigos representativos do devir sociocultural. Se, em contextos concretos a análise dos
pressupostos simbólicos de ligação se através da materialidade, em contextos virtuais a
análise pode se dar através de imagens e outras formas de representação, como música, por
exemplo que, ao fim, buscam comunicar os mesmos significados relativos a artefatos
tangíveis, gerando novos desdobramentos de significados a partir de arranjos sígnicos:
permitindo outros desenvolvimentos do processo de semiose cultural.
Se está considerando, assim, que a observação, na contemporaneidade, pode ocorrer
em diferenciados ambientes de socialização, e que as formas representativas objetivadas
através de mecanismos interrelacionais psíquicos, podem se desdobrar tanto em artefatos
materiais, como em imagens desses, comunicando fenômenos de transformações sociais
através de vários formatos. O que se ressalta, nessa perspectiva, é a forma de leitura e
interpretação dos códigos que constituem essas representações, ou seja, a forma como serão
feitas as identificações dos potenciais fragmentos textuais que poderão subsidiar a geração de
um discurso amplificado e carregado de sentido, recuperando a perspectiva de convergência
entre micro-ambiente e macro-ambiente, ou seja, entre unidades dialógicas e superpalavra;
entre a idéia e seus desdobramentos em várias estruturas representativas; entre as
sensibilidades que emergem do meio cio-cultural e a caracterização em formas que
permitam compreender o espírito do tempo que se desenha.
Nesse momento, recupera-se a noção de intertextualidade como conceito operador a
ser incorporado na metodologia que se busca constituir nesse estudo. A forma de utilização
desse conceito será tratada na seção seguinte dessa investigação, que visa ligar a perspectiva
de observação dos desdobramentos engendrados através do processo de semiose cultural em
diferentes âmbitos, no intuito de objetivar narrativas carregadas de sentido para a projetação
de artefatos de design de moda.
82
2.4 A INTERTEXTUALIDADE COMO OPERADOR NA IDENTIFICAÇÃO DE
SENSIBILIDADES EMERGENTES
Conforme afirma Kristeva ao tratar de intertextualidade, “todo texto se constrói como
mosaico de citações, todo texto é absorção e transformação de um outro texto.” (KRISTEVA,
1974, p. 64).
Analisando a perspectiva de texto como práticas que visem ligar signos a significados
sendo esses relativos a significantes, ou seja, a representações concretas é possível
considerar que a intertextualidade aponte para caminhos de entendimento de quais textos
estão sendo utilizados para substituir fenômenos de transformação, portanto, de quais arranjos
sígnicos estão sendo utilizados como vínculos de construção para novos sentidos. Considera-
se que a intertextualidade tanto pode permitir a identificação de sinais que comuniquem
transformações operantes em contextos específicos de observação e análise, como, a
identificação das replicações desses em estruturas representativas diversas, relativas a outros
contextos de estruturação da subjetividade. Potencializa-se o fator de comunicações em níveis
não verbais, constituídos através da operação de discursos relativos a micro e macro-
ambientes, a indivíduos e ao coletivo.
A intertextualidade, como método de análise de influências presentes em textos
relativos a autores diversos, surgiu em 1969, sendo utilizada por Kristeva quando de seus
estudos sobre o dialogismo de Bakhtin:
O termo intertextualidade surgiu e foi reutilizado por Julia Kristeva em 1969 para
explicar o que Mikhail Bakhtin, na década de 20, entendia por dialogismo. Ou seja,
são duas variações de termos para um mesmo significado. Para Bakhtin, a noção de
que um texto não subexiste sem o outro, quer como uma forma de atração ou de
rejeição, permite que ocorra um diálogo entre duas ou mais vozes, entre dois ou
mais discursos (ZANI, 2003, p.122).
A intertextualidade enquanto teoria surge a partir dos estudos Bakhtin, no intuito de
contextualizar a chamada por ele mesmo polifonia de vozes presente no discurso. Essa
teoria foi objetivada no sentido de engendrar estudos sobre a obra de Dostoiévski, que, para
Bakhtin, fundamentou uma nova estética arstica, baseada na multiplicidade de fragmentos
textuais, evidenciando a fluidez da idéia por entre os personagens de sua obra.
Segundo Bakhtin:
A essência da polifonia consiste justamente no fato de que as vozes, aqui,
permanecem independentes e, como tais, combinam-se numa unidade de ordem
superior à homofonia. E se falarmos de vontade individual, então é precisamente na
83
polifonia que ocorre a combinação de várias vontades individuais, realiza-se a saída
de princípio para além dos limites da vontade. Pode-se dizer assim: a vontade
artística da polifonia é a vontade de combinação de muitas vontades, a vontade do
conhecimento (BAKHTIN, 2008, p.23).
Desse modo, a teoria fundamentada para compreender a multiplicidade de vozes
presentes na obra de Dostoiévski reverbera no estatuto intertextual como meio de vincular
ideias, portanto, de potencializar formas de ligação entre vontades independentes e de operar
transformações a partir de fragmentos discursivos distintos. Partindo desse preceito,
considera-se a ideia como o teor subjetivo que opera como dispositivo interrelacional,
materializada em representações engendradas por indivíduos, visando o estabelecimento de
trocas simbólicas. Sendo assim, é possível conceber a polifonia de vozes de Bakhtin como
meio de configurar interconexões subjetivas presentes no meio sociocultural, portanto, como
método de identificação da inter-subjetividade operante.
A partir do entendimento desses pressupostos, pode-se considerar que a ideia é o
vínculo de ligação entre estruturas representativas, levando, pois, ao entendimento do estágio
atual do imaginário coletivo, potencializando a compreensão da relação entre consciências
individuais. Recupera-se, pois, a perspectiva da ideia como vínculo fluido entre indivíduos,
como ânima relacional, reverberando considerações construídas através de Simmel(2006),
Nietszche (2004) e Mafesolli (2002).
Sendo a consciência algo que está em constante crescimento portanto, construindo
vínculos sincrônicos e anacrônicos a partir de ideias fragmentadas existe a premente
característica de fluidez relacional, sendo possível construir meios de ligação entre
consciências distintas, que, ao final, reverberam (e dão corpo) a uma idéia central, mesmo que
existam tensões entre as consciências (BAKHTIN, 2008, p.36).
Essa argumentação oferece caminhos ao entendimento sobre a importância do
fenômeno dramático primordial, apontado, anteriormente, a partir de Nietszche, como meio
de possibilitar ao indivíduo sua transformação, sua atuação em outro corpo (NIETZSCHE,
2004, p.56).
Relacionando essa perspectiva à polifonia de vozes de Bakhtin, é possível considerar
que o fenômeno dramático fundamental referido por Nietzsche, assuma o lugar da relação
entre consciências individuais, unidas através de uma ideia essencial, que se transforma
quando relacionada às formas de interpretação construídas por cada indivíduo circunscrito a
84
um contexto de materialização. A atuação em outro corpo, assim, se através da
interpretação da ideia.
Retoma-se, aqui, a perspectiva de sublimação do ânima fluido que vincula formas de
representação simbólica, caracterizado por Nietszche (2004) como a potência do desejo
relativa aos indivíduos, e por Bakhtin como a idia, verdadeira herna na obra de Dostoiévski
(BAKHTIN, 2008, p.25).
Essa dinâmica de ligação entre vontades desejos e, sua possível sublimação em
algo material, pode assim ser compreendida:
O pensamento humano se torna pensamento autêntico, isto é, idéia, sob as
condições de um contato vivo com o pensamento dos outros, materializado na voz
dos outros, ou seja, na consciência dos outros expressa na palavra. É no ponto desse
contato entre vozes-consciências que nasce e vive a idéia (BAKHTIN, 2008, p.98).
Parte-se do princípio que a palavra é um dos modos de sublimação da consciência,
portanto, de uma forma de tangibilizar aspectos imagéticos e de arranjá-los em estruturas. A
preceito desse estudo, a palavra assume a forma de signos, que podem ser vinculados a
artefatos, emanando significados que visam associar múltiplas vozes-consciências,
constituindo mediações simbólicas (canais de comunicação que podem se transformar em
cadeias de valor), entre indivíduos e artefatos. É a ideia que toma corpo, sendo replicada
através de estruturas distintas, vinculando novas interpretações conforme o contato que se
estabelece entre vozes-consciências fragmentadas no processo de semiose cultural.
Nesse sentido, as interrelações entre vozes podem apontar caminhos ao entendimento
das necessidades latentes, portanto, àquilo que pode se configurar como sensibilidades
emergentes e que, para o sociólogo Dario Caldas (2004), possuem importância fundamental
para a constituição de tendências de ciclo longo de desdobramento.
Segundo Bakhtin:
Enquanto artista, Dostoivévski não criava suas próprias idéias do mesmo modo que
criam os filósofos ou cientistas: ele criava imagens vivas de idéias auscultadas,
encontradas, às vezes adivinhadas por ele na própria realidade, ou seja, idéias que
m vida ou que ganham vida como idéias-força. Dostoiévski tinha o dom genial de
auscultar o diálogo de sua época ou, em termos mais precisos, auscultar a sua época
como um grande diálogo, de captar nela o as vozes isoladas mas antes de tudo
as relações dialógicas entre as vozes, a interação dialógica entre elas. Ele
auscultava também as vozes dominantes, reconhecidas e estridentes da época, ou
seja, as idéias dominantes, principais (oficiais e não-oficiais), bem como vozes ainda
fracas, idéias ainda não inteiramente manifestadas, idéias latentes ainda o
auscultadas por ningm exceto por ele, e idéias que apenas começavam a
amadurecer, embriões de futuras concepções de mundo (BAKHTIN, 2008, p.100-
101).
85
Portanto, a construção das narrativas de Dostoiévski se dava através das relações entre
unidades dialógicas fragmentadas em seu tempo (sua contemporaneidade), relacionadas
devido à percepção dessas em contextos de análise distintos. Essa perspectiva pode permitir o
entendimento da dinâmica metodológica que se propõe nesse estudo. Ou seja, a observação de
contextos concretos e não-concretos (virtuais) de estabelecimento de relações entre indivíduos
e artefatos, caracterizados como plataformas de geração de vínculos formais entre
subjetividades e representações, pode permitir a identificação das unidades dialógicas
operantes entre consciências distintas, potencializando a criação de narrativas que visem
associar essas unidades, de modo a configurar novos sentidos. O desdobramento desses
sentidos pode ocorrer através de interpretações construídas por meio da decomposição das
estruturas que caracterizam as representações de uma ideia em específico, presente na
essência sob vários formatos. Essas unidades dialógicas as representações de uma mesma
ideia - visam comunicar fenômenos, são códigos. A interconexão entre as unidades dialógicas
permite relacionar significados, potencializando a geração de novos sentidos conforme o
desenvolvimento de vínculos entre artefatos relativos a áreas distintas, levando a constituição
de narrativas que embasem a projetação de artefatos de design de moda, proporcionando, por
fim, a criação de canais de comunicação o verbal entre esses (os artefatos de moda) e
indivíduos. Gera-se, assim, novosnculos simbólicos, permitindo o reconhecimento das
múltiplas vozes-consciências em narrativas (tendências), ligando necessidades latentes a partir
de recortes que efetivem essa dinâmica. Portanto, uma ideia pode ser caracterizada como uma
unidade dialógica fundamental.
Nesse sentido, as argumentações oferecidas por Bakhtin mostram a importância de
perceber os sussurros fragmentados no meio sociocultural (auscultar as várias vozes), algo
apontado no capítulo anterior como meio de objetivar para a configuração de artefatos com
imports simbólicos, permitindo o desdobramento de inovações de significados e, assim,
possibilitando o reconhecimentoo verbal de necessidades latentes relativas a usuários
(indivíduos) através de arranjos sígnicos fragmentos discursivos.
Além disso, a teoria da polifonia de vozes parece oferecer meios de identificar o novo
aquilo que não está previsto no arranjo discursivo conforme referido por Foucault (2008).
Nesse sentido, vale questionar-se: de que modo a intertextualidade portanto, a teoria
que elevou o estatuto polifônico a novos entendimentos pode auxiliar na identificação de
sinais e posterior constituição de tendências para a projetação de artefatos de design de moda?
86
Parte-se, pois, do pressuposto apontado por Kristeva para apresentar a teoria
intertextual a partir dos estudos realizados por Bakhtin:
[...] o dialogismo bakhtiniano designa a escritura simultaneamente como
subjetividade e como comunicatividade, ou melhor, como intertextualidade; em face
desse dialogismo, a noção de pessoa-sujeito da escritura começa a se esfumaçar
para ceder lugar a uma outra, a da ambivalência da escrita (KRISTEVA, 2005,
p.71).
Portanto, a ideia central do estudo intertextual é encontrar as relações entre as vozes,
ou, entre os discursos: a comunicatividade. A ambivalência da escrita, da qual fala Kristeva,
pode ser entendida como a coexistência de formas de interpretação e representação de uma
mesma idéia (de uma mesma unidade dialógica fundamental), e essa coexistência pode
objetivar para a construção de um texto uníssono, que potencialize o sentido entre as unidades
dialógicas múltiplas apresentadas por Bakhtin, e aqui entendidas como fragmentos textuais.
Essa prática pode se dar através da leitura de textos, sendo que, no escopo desse
estudo, texto é toda a prática que une signo a significados, que pode ocorrer de modo verbal
ou não verbal.
Segundo Dall‟Alba:
À leitura de um texto precedem outras leituras de outros textos. Desse modo, um
texto moderno tem, na sua estrutura, possivelmente, a marca de textos anteriores.
Estes, por sua vez, possuem as marcas de textos precedentes e, assim,
sucessivamente, numa cadeia que atravessa tempos e modas, épocas e gostos
(DALL‟ALBA, 1996, p.21).
Nesse sentido, considera-se que a intertextualidade aponte caminhos para a
identificação das vozes que reverberam nos textos, bem como, quais os potenciais diálogos
que eso sendo firmados entre as mesmas. Portanto, a intertextualidade atua como conceito
operador, diga-se, ferramenta conceitual importante para desvelar ligações discursivas, pois:
“o que caracteriza a intertextualidade é introduzir um modo de leitura que faz estalar e
linearidade do texto” (JENNY, 1979, p.21).
A intertextualidade também proporciona análises de modo sincrônico e anacrônico,
visto que o mosaico de citações, referido por Kristeva, pode estar construindo
correspondências em épocas distintas, algo característico da contemporaneidade. Além de
identificar esses mosaicos a partir de épocas distintas operando, pois, de modo a permitir a
constituição de discursos que atravessem a dimensão espaço/tempo a intertextualidade
também pode auxiliar na identificação do texto centralizador, possibilitando ainda, no
contexto aqui proposto, o entendimento do domínio de geração do mesmo, pois “a
intertextualidade designa o uma soma confusa e misteriosa de influências, mas o trabalho
87
de transformação e assimilação de vários textos, operado por um texto centralizador, que
detém o comando do sentido” (JENNY, 1979, p.14).
Esse texto centralizador pode, no sentido dessa investigação, ser caracterizado como a
ideia identificada, portanto, a unidade dialógica fundamental que sedesdobrada segundo
interpretações de interlocutores, sendo materializada em arranjos sígnicos constituintes de
artefatos por exemplo, um filme, um objeto de arte ou, através de caracterizações estético-
formais que reverberem os códigos engendrados por um coletivo específico, por uma tribo
urbana. A linearidade do texto, da qual fala Jenny, se dá no momento em que o texto
centralizador construa relações com outras unidades dialógicas (fragmentos textuais), ligadas
pela pertinência de comunicação (substituição) de um determinado fenômeno social, em nível
micro ou macro. Constroem-se pontes imaginárias, embasadas pelo vel de significações
convergentes, ligando cultura material e indivíduos, artefatos e meio social.
Nesse contexto, a intertextualidade não apenas pode ser utilizada como uma
ferramenta conceitual que auxilie na identificação dos códigos, e suas possíveis replicações
em instâncias simbólicas diversas, mas pode, também, proporcionar a geração de novos
sentidos, constituídos a partir do texto centralizador identificado e da utilização desse em
estratégias determinadas. Essa geração de sentido objetiva a constituição de tendências, que,
no contexto aqui proposto, se circunscreve como forma de construir diálogos entre a unidade
dialógica essencial e fragmentos textuais convergentes, portanto, como forma de estruturar
relações, como uma narrativa.
Partindo das reflexões de Caldas, a respeito da constituição de tendências, é possível
perceber que as mesmas podem ser objetivadas a partir de sinais podendo esses ser
entendidos como signos que constituem códigos que levarão a abordagens coerentes a partir
de hipóteses. Segundo afirma Caldas, em termos práticos, para a abordagem das tendências é
preciso trabalhar com os sinais de modo a construir hipóteses de trabalho (CALDAS, 2004,
p.93).
A configuração de hipóteses, na perspectiva de constituição de correspondências entre
essas e um recorte do real, revelam a dinâmica arbitrária operante na moda, visto que o
próprio corte pode ser entendido como uma arbitrária seleção de fragmentos textuais. Essa
seleção arbitrária corrobora a perspectiva de constituição de narrativas, pois, busca-se eleger
determinados elementos que permitam a criação de um enredo plausível, onde haja o
reconhecimento da medição simbólica que está sendo engendrada para tal. Retomando as
88
argumentações oferecidas por Foucault (1988) sobre fragmentos textuais, poder e estratégias,
a configuração de hipóteses acaba por cumprir a objetivação de estratégias, que podem
responder a determinadas necessidades latentes percebidas quando da observação de
ambientes concretos e não-concretos de geração de cultura, proporcionando meios de criar
vínculos entre empresas/organizações e indivíduos.
Enquanto dinâmica, essa arbitrariedade também pode ser percebida no processo de
problematização de um projeto, algo importante na perspectiva de meta-projeto referente ao
Design Estratégico, pois, a possibilidade de configuração de um recorte da realidade pode
advir da identificação de potenciais sinais fortes e fracos emitidos por distintas esferas de
cultura, percebidos através da observação do meio social. Para que se configure essa prática,
ou seja, para que se crie hipóteses a partir da observação do meio sociocultural e, assim, se
objetive um recorte da realidade, fundamenta-se uma perspectiva transdicisplinar de
investigação.
Retoma-se aqui a importância do estudo polifônico, constituído por Bakhtin, como
meio de identificação de sensibilidades emergentes, que, para Caldas (2004), também são
formas de percepção do espírito do tempo que se desenha, portanto, meio de configuração de
tendências de fundo entendidas também como tendências de ciclo longo.
O dialogismo apresentado por Bakhtin se dá, pois, a partir da linguagem e, no tocante
a esse estudo, pode-se entender essa premissa como os vínculos em vel não verbal entre
sinais e os indivíduos, entre relações estabelecidas no contexto social, visto sinais serem
formas de apontar indícios de mudanças, portanto, de constituir digos que busquem
comunicar substituir fenômenos, proporcionando caminhos para inovações em nível de
significados.
Consoante Bakhtin:
Toda a vida da linguagem, seja qual for o seu campo de emprego (a linguagem
cotidiana, a prática, a científica, a artística, etc.), está impregnada de relações
dialógicas. [...] Essas relações se situam no campo do discurso, pois este é por
natureza dialógico [...] (BAKHTIN, 2008, p.209).
Vista sob esse prisma, a intertextualidade pode proporcionar pontes de sentido entre
sinais, contribuindo para a construção de discursos que dêem conta de interrelacionar a
subjetividade imanente aos indivíduos, portanto, de proporcionar meios de relacionar as
unidades dialógicas que potencializarão novos sentidos às consciências individuais. Esses
laços de ligação objetivam para a configuração de narrativas coerentes, orientadas segundo
89
hipóteses, acarretando, por fim, a constituição de tendências embasadas na identificação de
unidades dialógicas fundamentais e na constituição de vínculos entre fragmentos textuais
convergentes, atravessando o tecido de relações entre indivíduos na sociedade, permitindo
vislumbrar cenários de projetação para artefatos de moda com inerente import simlico.
Sobre essa perspectiva, Caldas diz que Frequentemente, quando se procura estabelecer
pontes entre campos diferentes, não é o mesmo sinal que vemos manifestar-se, mas a
insistência de uma mesma idéia, a renovação de uma mensagemobservada, mas com outra
roupagem ou expressa de outro modo” (CALDAS, 2004, p. 119).
Portanto, é a ideia o que vincula representações as formalizações e a mensagem é o
modo de chegar até as significações dessa ideia. A geração de novos sentidos, assim, passa
pela forma como as significações serão articuladas. Pode-se, a partir dessa perspectiva,
considerar que a ideia a unidade dialógica fundamental se configure como uma
sensibilidade que emerge no campo social, construindo relações de sentido conforme a
interferência de interlocutores no processo de formalização da mesma.
Constata-se uma aproximação entre intertextualidade e pesquisa Blue Sky, própria do
Design Estratégico, logo, procede-se a seguir a uma análise e questionamento dessa
ferramenta quanto às suas potencialidades e possibilidades de diálogo com o procedimento de
análise intertextual. Nesse sentido, busca-se incluir também essa forma de pesquisa no escopo
de ferramentas que objetivam para a construção da metodologia proposta na problemática
fundamental desse estudo.
2.5 PESQUISA BLUE SKY E A CONSTITUIÇÃO DE ENREDOS PROJETUAIS
A pesquisa Blue Sky é uma modalidade de investigação oriunda do arsenal de
ferramentas desenvolvido pelo escopo teórico do Design Estratégico, fazendo parte do
método de pesquisa de tendências circunscrita a essa teorização. A utilização da Blue Sky
pressupõe ir além do contexto de investigação de um determinado projeto de design, no
sentido de buscar elementos que permitam despertar o processo cognitivo dos
designers/projetistas.
Segundo Castro e Menezes, o termo cognição‟ vem do latim, vir a saber‟ e diz
respeito aos processos de compreensão, de entendimento, e ao produto
90
(representação/imagem/sentido/significado) relativo à coisa conhecida.” (CASTRO E
MENEZES, 2006:5). Portanto, se a intertextualidade, fundmentada no dialogismo, permite a
identificação do texto centralizador (da ideia, da unidade dialógica fundamental),
materializado em códigos que visam comunicar fenômenos operantes no contexto social, e a
posteriori, as replicações dialógicas do mesmo, a pesquisa Blue Sky atua de modo a identificar
imagens que correspondam a esses códigos (formalizações de uma mesma ideia fundamental,
roupagens assumidas por essa, para utilizar uma metáfora oferecida por Caldas), operando
rumo à constituição de exemplos e esmulos (nos mais variados formatos) a fim de, por
transferências através de raciocínios analógicos, obter-se indicativos do que poderão ser
cenários para a construção de respostas a um problema de design” (SCALETZKY e
PARODE, 2008, p.1).
Segundo Celaschi e Deserti, essa modalidade ferramental, também entendida como
uma forma de pesquisa em si, procura expandir sua área contextual, no sentido de identificar
novas direções e oportunidades ao problema de design, organizando elementos que propiciem
insights para a inovação. Esse momento da pesquisa constitui-se na fase metaprojetual e busca
construir um olhar amplo, que extrapole o setor de referência e proporcione estímulos
criativos aos envolvidos no projeto. Desse modo, a pesquisa Blue Sky visa, como resultante,
um dossiê de cenários de inovação. Esses cenários, por sua vez, podem ser entendidos como
ambientes heterogêneos, no sentido de configurar estragias a partir da identificação e
organização de sinais fortes e fracos, servindo como caminhos sugeridos para desdobramentos
projetuais relativos a qualquer instância do design (CELASCHI e DESERTI, 2007, p.58-59).
Desse modo, a pesquisa Blue Sky pode também atuar na constituição de tendências,
associando a problemática geradora de um projeto a outros contextos produtivos, organizando
os sinais percebidos sob categorias de desenvolvimento.
Essa pesquisa possui uma dimensão estratégica aliada a uma dimensão que envolve
“fazer ver”, exteriorizar possíveis atmosferas para a construção das primeiras idéias
de projeto. A pesquisa blue sky, nesse sentido, constrói metáforas que buscam
definir espaços conceituais que não pretendem a elaboração direta de resultados
concretos para o projeto (SCALETSKY e PARODE, 2008, p.2).
Ainda segundo Scaletsky e Parode (2008), a organização dos conceitos-chave para a
elaboração de categorias projetuais pode se dar através de técnicas como: brainstorm e
discussões com os membros da equipe que trabalha nessa etapa dita „metaprojetual‟.
Processos de refinamentos dos múltiplos conceitos gerados o, pouco a pouco, definindo
esses conceitos (SCALETSKY e PRODE, 2008, p.3).
91
Consoante Cautela, o foco central dessa modalidade de pesquisa é a de contaminação e
fertilização de idéias, partindo do contexto projetual e, portanto, do problema gerador do
projeto. Nesse sentido, a Blue Sky permite que esse processo se estabela a partir da
identificação da lógica que perpassa vários campos produtivos, am de permitir identificar o
ritmo de inovação, associando esse aspecto a possíveis estruturações relacionais com a
demanda. O objetivo, assim, é oferecer vantagens sobre quais reflexões podem ser ativadas no
contexto do projeto a partir de informações coletadas na fase metaprojetual, estimulando e
direcionando a criatividade dos envolvidos nessa fase caso dos designers rumo a soluções
possíveis para a problemática projetual. Assim, conforme Cautela, a pesquisa Blue Sky
permite vislumbrar aspectos relativos a parâmetros estéticos que extrapolam uma área de
atenção, potencializando a constituição de correlações perceptivas, através de dinâmicas
organizativas que associem imagens a categorias conceituais (CAUTELA, 2007, p. 95-97).
Nesse contexto, pode-se considerar que existe uma relação de complementaridade
entre a intertextualidade e a pesquisa Blue Sky. Ora, se a intertextualidade permite a
identificação do texto centralizador, portanto, da unidade dialógica fundamental concomitante
aos níveis de significações que essa possa estar operando no contexto sociocultural,
desdobrando replicações em fragmentos textuais; a pesquisa Blue Sky pode operar como meio
de amplificar o sentido relativo a essa prática, tornando a ideia (a unidade dialógica
fundamental) passível de categorização a partir da identificação de conceitos potencialmente
presentes e ativos, que também podem ser entendidos como temáticas. Correlaciona-se, assim,
sensibilidades emergentes a contextos produtivos, extrapolando o contexto original do
problema de modo a buscar outras convergências relacionais. Esses conceitos ativos orientam
o olhar, ou seja, a observação a ser realizada em ambientes de representação diversos,
permitindo aos designers/projetistas encontrarem novas soluções a problemática fundamental
de um projeto, independente da instância do design relevada.
A dinâmica que pode seguir a essas etapas busca organizar categorias, de modo a
propiciar a constituição de enredos projetuais estruturando elementos, portanto, construindo
narrativas coerentes ligando os fragmentos textuais de modo a potencializar novos sentidos
aos envolvidos em projetações de artefatos de design (e, no contexto dessa investigação, aos
artefatos de design de moda). Essa prática pode levar a construção de novos significados,
visto que inovar é tangibilizar mudanças,ou, em outras palavras, ressignificar aspectos que
traduzam possíveis transformações operantes no meio sociocultural, configurando essas em
arranjos sígnicos caracterizados em artefatos de design. Retoma-se a perspectiva de mediação
92
simbólica entre artefatos, indivíduos e empresas/organizações, sendo que, assim, a pesquisa
Blue Sky se constitui como outra forma de desdobrar imports simbólicos que visem criar
canais de comunicação entre as instâncias distintas.
A correspondência, pois, entre os códigos e o potencial sentido que os perpassa, pode
resultar em cenários de desenvolvimento para a inovação de significados. Essa dinâmica visa
permitir desdobramentos futuros aos artefatos, construindo conexões entre questões relativas
aos usuários e os fragmentos textuais relacionados formas de representação simbólica que
estão comunicando uma mesma ideia. Portanto, é possível argumentar que essa prática
busque a constituição de vários enredos à projetação, cabendo aos envolvidos no projeto
eleger qual enredo se o mais apropriado.
Nesse sentido, cenários podem ser entendidos como tendências de desenvolvimento
contextual, visto que são espaços o necessariamente materiais, mundos possíveis, aonde o
designer poderá „atuar‟ na busca de respostas ao brief (SCALETSKY, 2008, p.1137).
Conforme Visoet al. um cenário é concebido de modo a representar um mundo
possível de atuação, possuindo um roteiro de orientação e, ao mesmo tempo, apresentando
objetivos claros para a constituição/atuação de um artefato” (VISONÁ ET AL., 2009, p.5).
Nesse sentido, ressalta-se a dimensão arbitrária na perspectiva do estudo de
tendências, visto a importância de configuração de hipóteses a partir de um recorte operado
quando da observação de vários contextos concretos ou o concretos de fruição. Esse
recorte, que se objetiva através da correspondência com a problematização e, no caso do
design estratégico, reproblematização do projeto, se engendra na fase metaprojetual,
proporcionando a constituição de possíveis mundos (cenários) de desdobramento projetual e,
assim, permitindo a constituição de estratégias, visto que:
[...] um dos instrumentos metodológicos mais interessantes, criados para dar conta
da questão das tendências é a construção de cenários, que permitem lidar com a
evolução de sistemas complexos sob diversas hipóteses. A rigor, não se trata de
previsão, mas de um exercício que ajuda a avaliar as possíveis conseqüências
acarretadas por um tipo de escolha (CALDAS, 2004, p.41).
As considerações oferecidas por Caldas encontram correspondência nas
argumentações construídas por Celaschi e Deserti ao tratarem da utilização dessa ferramenta
(a geração de cenários) para o design.
Consoante os autores, cenários também podem ser entendidos como instrumentos
qualitativos, que visam o cruzamento entre o escopo que fundamenta as Macrotendências
93
portanto, valores, estilo de vida e a constituão do devir sociocultural às tendências
efêmeras, disponibilizadas em instrumentos como trend books, por exemplo. Essa dinâmica
permite avaliar o ritmo atual de inovação engendrada em um determinado setor, contribuindo
para a configuração de possíveis caminhos para o desenvolvimento de artefatos de design,
baseados na análise de pressupostos estéticos, formais, tecnológicos, mercadológicos e
linguagens, ligando essa análise a aspectos oriundos das transformações socioculturais que se
engendram (CELASCHI e DESERTI, 2007, p.118-119).
Analisando a questão sob esse prisma, também é possível afirmar que o designer, ou
projetista, buscará possibilidades de materialização destes cenários, agindo como um autor
textual, pois, segundo Foucault, [...] o autor é aquele que à inquietante linguagem da
ficção suas unidades, seus nós de coerência, sua inserção no real” (FOUCAULT, 2006, p. 28).
Entende-se, pois, que o designer/projetista visa antecipar o futuro, construindo formas
de representação através de vies sobre desdobramentos narrativos, onde a atuação de um
artefato possa ser inserida. Assim, o ato de projetação de um novo artefato poderá
corresponder a uma determinada tendência, desenvolvida em um cenário, onde signos e
significados serão associados de modo a permitir a constituição deste.
Nesse sentido, parte-se da perspectiva que tendências podem operar sob formatos
delimitados por um objetivo, conforme já argumentado quando se discorreu sobre o conceito
de tendência e as significações associadas a esse termo a partir da interferência da cultura
social. Portanto, o fator de arbitrariedade, orientado por objetivos, se desdobra na constituição
de narrativas que busquem gerar sentido à multiplicidade discursiva operante no momento de
identificação de potenciais sensibilidades emergentes. Nesse contexto, a constituição de
tendências de fundo busca relacionar transformações percebidas no macroambiente social à
fenômenos operantes em microambientes (coletivos específicos, comunidades sociais,
associações entre indivíduos e, por fim, o próprio indivíduo), de modo a objetivar para a
configuração de ambientes imagéticos que possibilitem vislumbrar quais desdobramentos
projetuais podem ser construídos. Logo, tendências podem ser entendidas como narrativas que
visam gerar novos sentidos, buscando satisfazer necessidades latentes relativas aos
indivíduos, passíveis de serem identificadas a partir de observações que considerem a
tangibilização de fenômenos de transformação social em signos representativos códigos.
Ao dimensionar a ideia de cenários com tendências, é possível perceber que ambas
modalidades operam de forma a delinear movimentos de atuação para a inovação, propiciando
94
a visualização de um futuro possível, embasado em desejos de materialidade de artefatos, que
poderão, ou não, se configurar. Sendo assim, conclui-se que as tendências, enquanto sistemas
sígnicos e, portanto, passíveis do desdobramento de novos significados, podem servir como
meios de constituição de discursos amplificados, onde a operação de sentido se dará devido a
organização dos sinais percebidos através da análise de alguns contextos de materialização
dialógica. Essa prática busca auxiliar na formalização de interpretações construídas pelos
envolvidos na fase metaprojetual, com o propósito de oferecer formas tangíveis de
entendimento de suas percepções acerca do problema gerador de um novo projeto de design,
proporcionando meios de vislumbrar estratégias que correspondam a problemática
fundamental de um projeto.
A possível redução desse aspecto portanto, a potencial validação das informações
coletadas passa por uma necessária associação entre códigos percebidos em áreas diversas,
visto que a replicação e os desdobramentos dos mesmos pode levar ao entendimento do nível
de ruptura operante com valores vigentes. Essa dinâmica visa corroborar a perspectiva de
construção de relações entre estruturas, de modo a perceber os significados assumidos por
determinados códigos em outros contextos, proporcionando sentidos novos no momento em
que se ligam subjetividades (fluxos criativos, sensibilidades emergentes) e formalização.
Nessa perspectiva, considera-se que o desenvolvimento dessa prática pode levar ao
entendimento da moda como uma área de convergência das representações coletivas, como
uma plataforma representativa para o entendimento das complexidades que orientam o
indivíduo em sociedade.
Tendo em vista que a identificação de sensibilidades emergentes que permeiam as
relações socioculturais podem estar presentes nas interrelações entre textos, o sentido pode se
dar a partir de recortes que se estafazendo no processo de semiose cultural. Essa prática
visa o apenas envolver os implicados no processo de projetação de artefatos com inerente
import simbólico, mas também à outros interlocutores envolvidos, caso dos usuários
(indivíduos). Na perspectiva que se propõe nessa investigação, esses interlocutores podem ser
considerados tanto aos indivíduos que fazem parte de uma tribo urbana, como os usuários
finais de um determinado artefato. Dessa forma, considera-se que, para constituir tendências,
no intuito de gerar narrativas carregadas de sentido que embasem mundos possíveis de
atuação de artefatos de design de moda, mostra-se pertinente construir um modo de olhar
amplo, que contemple o campo da moda, mas que também contemple outros campos de
95
formalizações de subjetividade, que possam ser relacionados a essa pelos vínculos imagéticos
convergentes: pela identificação da ideia e suas outras roupagens assumidas.
Desse modo, busca-se compreender o que vem a ser o sentido, ou seja, o que pode ser
operado a partir dessa prática. Assim, é possível considerar, conforme Barthes (2006) que
sentido é algo que se instaura quando da relação das funções-signos ou, ainda, como afirma
Caldas à partir da ideia de que as coisas só assumem significado quando em relação umas às
outras. O alto é percebido como tal porque existe o baixo, da mesma forma que o preto não
possui o mesmo valor se contraposto ao branco ou ao marrom” (CALDAS, 2004, p.119).
Assim, está-se considerando que a configuração de sentido entre os objetos, a serem
analisados para a constituição de tendências para o design de moda, se pela dinâmica das
relações que forem construídas entre eles, sendo que as mesmas podem potencializar para
novas leituras acerca dos próprios objetos selecionados, ou seja, para narrativas que visem
unir signos e significados. As ressignificações, engendradas a posteriori, são fruto de
interpretações constitdas, primeiramente, por designers/projetistas, depois, pelos próprios
usuários.
O que se busca argumentar é que a inovação de significados pode se dar no momento
de interpretações de aspectos relativos a sensibilidades emergentes oriundas do meio
sociocultural sendo esse objetivado através de formalizações e representações, ou seja,
através de uma dinâmica que busque oferecer uma visão de algo latente, que pode estar
significando o novo.
Ainda sobre a constituição de sentido a partir de sinais fragmentados, Caldas
argumenta:
[...] sinais recorrentes devem ser “arquivados” e cuidadosamente avaliados, pois são
como aquelas figuras de publicações infantis, produzidas a partir de pontos
numerados: aparentemente inexpressivas quando isolados, os pontos vão produzindo
sentido e contando toda uma história, quando unidos pelos traços que o lápis vai
desenhando (CALDAS, 2004, p.119).
O questionamento que se objetiva é: o que deve ser observado? Portanto, como é
possível identificar fragmentos textuais que levem até a unidade dialógica fundamental,
permitindo a produção de sentido de modo a constituir narrativas que possibilitem o
desdobramento de cenários para a projetação de artefatos de design de moda?
Muito foi argumentado sobre isso em momentos anteriores desse estudo e, assim,
retoma-se a perspectiva de que uma mesma ideia pode se desdobrar em plataformas
96
representativas diversas, tais como música, cinema, mídias, objetos decorativos, literatura,
arte, vestuário... O que ressalta nessa orientação é a configuração de relações interrelações
e isso é algo que pode ser configurado através de características comunicacionais, que
também se desenvolvem em nível não verbal. Compreender o que es sendo comunicado e
para quê, pode, assim, levar a construção de estratégias, posicionando empresas e
organizações frente o devir cultural, permitindo que as mesmas construam nculos
imagéticos através de mediações simbólicas, objetivadas em artefatos quando da utilização de
narrativas projetuais tendências.
Decompor estruturas de modo a interpretar os fenômenos sociais que estão sendo
substituídos por códigos representativos, para depois recompô-las de modo a oferecer novos
sentidos: essa é a perspectiva que se objetiva a partir de uma análise desse tipo. Essa
perspectiva pode levar ao reconhecimento de sensibilidades emergentes que visam desenhar o
espírito do tempo através de artefatos relativos a áreas de representação simbólica,
contribuindo para a constituição de artefatos de design de moda com inerente import
simbólico, ou seja, com inerente nculo de mediação entre os indivíduos e as transformações
operantes em vel sociocultural. Se está buscando, pois, formas de construir diálogos, ou,
meios de efetivar plataformas de comunicação que permitam o reconhecimento da
subjetividade, gerando cadeias de valor que extrapolem o que pode ser quantificável. Desse
modo, se esconsiderando que a cultura material permita a constituição de tendências de
fundo, partindo da perspectiva de ligação entre individual e coletivo, chegando, pois, a
ligações entre margem e centro de sistemas: entre aquilo que ainda é latente e o que poderá
ser amplificado.
A próxima seção desse estudo buscará apresentar como esses pressupostos podem ser
desenvolvidos, partindo da realização de entrevistas com diferentes indivíduos envolvidos na
identificação de sinais que possam embasar a constituição de narrativas para a projetação de
artefatos de design. A utilização de exemplos também é contemplada, de modo a permitir
vislumbrar como a constituição de interrelações entre instâncias simbólicas distintas e
artefatos de design de moda pode ser engendrada.
97
CAPÍTULO III RELAÇÕES ENTRE A METODOLOGIA PROPOSTA E CASOS
PRÁTICOS
Partindo-se da problemática geradora desse estudo, portanto, a configuração de uma
metodologia, a partir do Design Estragico, para a identificação de sinais emergentes e a
posterior constituição de tendências que sirvam de orientação estratégica para o Design de
Moda, buscou-se identificar e apontar possíveis ferramentas, operadores, conceitos-chave, no
intuito de compor tal metodologia. A construção da metodologia proposta, portanto, extrapola
a área do design e, além disso, a própria disciplina conhecida como Design Estratégico.
Entende-se, no entanto, que essa metodologia visa uma forma de orientação, que sirva como
uma escie de protocolo de fundamentos para empresas e organizações interessadas em
compreender como é possível partir da noção que Bourdieu (1996) intitulou como import
simbólico, para uma apropriação de linguagem de projeto, deslocando essa perspectiva para
artefatos de design de moda. Essa premissa desenvolve-se, nessa investigação, a partir do
entendimento de como é possível desdobrar níveis de mediação simbólica entre artefatos e
indivíduos, sendo essa mediação o estabelecimento de trocas, atuando como forma de atingir
inovações de significados. Tratando-se de significados, procurou-se a configuração de
argumentações acerca da constituição de artefatos como discursos, e, sendo assim, compostos
por digos que visam substituir fenômenos, ou seja, que visam comunicar relações que se
desdobram no meio sociocultural.
Nesse sentido, a construção dessa metodologia parte de uma abordagem
transdiciplinar, no tocante a intenção de relacionar conhecimentos e transformá-los em novos
códigos, passíveis de interpretações que levem à geração de insights criativos para designers e
projetistas que atuem no complexo campo do design de moda. Essa orientação se constrói
através de interrelações entre áreas, de modo a apontar como o imaginário coletivo se
manifesta no momento presente a partir de plataformas de representações diversas, sendo esse
um meio de engendrar possíveis leituras de algumas esferas de geração de cultura. Essas
leituras visam a constituição de narrativas (tendências), que possibilitem o desenvolvimento
de estratégias, embasadas em desdobramentos do devir cultural, potencializando a projetação
de artefatos de moda com inerente import simbólico: nculos imagéticos tangibilizados em
características projetuais.
98
Nesse contexto, busca-se embasamento em alguns apontamentos da teorização
estrutural, ao menos no sentido de cumprir parte da metodologia proposta, ou seja a
decomposição e composição de estruturas. Nesse ínterim, se es visando compreender a
essência do que se pretende comunicar a partir dos códigos constitutivos de formalizações
distintas (esturutas), ou seja, de arranjos sígnicos configurados em representações simbólicas
de campos diversos.
Segundo Barthes:
A actividade estruturalista comporta duas operões típicas: decomposição e
composição. Decompor o primeiro objecto, aquele que é dado à actividade de
simulacro, é encontrar nele fragmentos móveis cuja situação diferencial engendra
um certo sentido: o fragmento não tem sentido em si, mas é, no entanto, de tal
ordem que a menor varião sofrida pela sua configurão produz uma mudança do
conjunto [...] (BARTHES IN COELHO, 1996, p.23).
Ora, muito se argumentou acerca da perspectiva de utilização de fragmentos
textuais - união entre signos e significados - conforme a necessidade de desenvolvimento de
estratégias, algo apontado anteriormente a partir de considerações tecidas por Foucault
(1988). Para tanto, procurou-se encontrar uma ferramenta também entendida como um
conceito ativo, que proporcionasse meios de cumprir essa premissa e, produzindo uma
mudança no conjunto, conduza a geração de novos sentidos.
Para essa investigação, essa ferramenta é a intertextualidade, que parte da teorização
configurada por Bakhtin, que propôs o estudo do dialogismo como forma de compreender um
pressuposto estético constituído por Dostoievski, portanto, a estética do fragmento, das
unidades dialógicas que num primeiro momento podem o possuir relação, mas que estão
intimamente ligadas por uma ideia. Essa ideia, a preceito desse estudo, é reconhecida com
unidade dialógica fundamental, e, na perspectiva da intertextualidade, pode ser também
compreendida como o texto centralizador, que proporcionará sentido a um discurso
amplificado.
Chegar até a ideia, ou seja, até a essência do que se pretende comunicar a partir de um
arranjo sígnico, portanto, de como um texto centralizador pode ser desdobrado em um
artefato: esse é o primeiro passo na construção dessa metodologia e, para tanto, novamente se
mostra importante decompor e compor estruturas. Essa prática visa a ligação de sinais,
dispersos no processo de semiose cultural e potencialmente vinculados pelo teor de
significações relacionadas. Porém, para compreender quais são as estruturas que podem servir
a esse propósito, mostra-se importante identificá-las, e, nesse sentido, incluiu-se a atividade
99
de observação de ambientes ditos concretos ou não-concretos como passo inicial da
proposição dessa investigação.o é uma observação aleatória, mas sim, uma observação que
possa cumprir o que Laplantine considerou como fundamental para a atividade da etnografia
(também netnografia) a saber, meio pelo qual a observação de contextos configurados como
relacionais entre indivíduos e cultura material serve à antropologia para compreender
pressupostos subjetivos que se interconectam relacionar o olhar, a memória, a imagem e o
imaginário, o sentido, a forma e a linguagem (LAPLANTINE, 1996, p.11).
Entende-se, assim, que a observação de algumas instâncias correspondentes ao meio
sociocultural possa levar à identificação do nível relacional de significações que esteja sendo
engendrado entre estruturas, e que essa empresa possa convergir à apreensão do teor
comunicacional de uma ideia fundamental: do ânima que flui entre diversos indivíduos. Esse
ânima visa estabelecer vínculos entre transformações operantes na sociedade e formalizações
(sublimações), e a compreensão desse pressuposto pode desencadear o entendimento acerca
do espírito do tempo que se desenha, apresentando formas de identificação das sensibilidades
que estão embasando essa prática. Essa perspectiva visa gerar canais de comunicação entre
empresas/organizações, artefatos e indivíduos (usuários), estabelecendo cadeias de valor para
além das questões quantificáveis, ou seja, que extrapolam o que se percebe como tangível em
projetos.
Parte-se do entendimento que os fragmentos textuais as unidades dialógicas
presentes em vários discursos instituídos, que podem ser entendidos como áreas distintas
possam ser associados de modo a gerar novos sentidos, portanto, inovações de significados.
Para tal, é preciso organizá-los em categorias, construindo correspondência entre as unidades
dialógicas e conceitos ativos e presentes (temáticas), que visem orientar a criatividade dos
envolvidos na projetação de artefatos de moda. Para solucionar essa lacuna, incluiu-se uma
nova ferramenta, oriunda do escopo teórico-metodólogico do Design Estratégico, conhecida
como pesquisa Blue Sky. Essa ferramenta visa extrapolar a área de atenção de um projeto no
caso desse estudo, o design de moda de modo a relacionar imagens a palavras (conceitos),
no intuito de gerar, por dinâmicas de cruzamento, esmulos que orientem à inovação,
independente de como essa se configure.
Ao final, a associação entre essas variáveis, direcionadas ao projeto a partir de recorte
feitos na realidade (portanto, da escolha arbitrária de fragmentos textuais convergentes a uma
ideia), pode levar a configuração de uma narrativa, que possui aproximação com a geração de
100
cenários, pois, visa criar mundos possíveis de atuão para artefatos, partindo de uma forma
estruturada de lidar com as complexidades existentes na contemporaneidade. Desse modo,
entende-se que uma tendência se constitui como um enredo, e que esse permite associar
fragmentos textuais (unidades dialógicas) a uma unidade dialógica fundamental, um texto
centralizador, uma sensibilidade emergente percebida no meio sociocultural. Cumpre-se,
assim, os passos operantes da metodologia que pretende-se nessa investigação e, por esse
motivo, convencionou-se anunciar constituição de tendências, ao ins de identificação de
tendências, visto que, para esse estudo, uma tendência é algo que se constituiu a partir do
cumprimento dessas etapas, e não algo que se identifica de modo aleatório. Os sinais os
indícios de mudanças correntes, os arranjos sígnicos e suas significações, os digos que
substituem fenômenos, os fragmentos textuais são identificáveis, podendo esses ser
articulados de modo sincrônico ou anacrônico, construindo correspondência entre
sensibilidades que emergem no meio social (uma unidade dialógica fundamental, uma ideia) e
o devir cultural.
O vínculo de ligação entre essas etapas é o indivíduo (o usuário), e a configuração de
narrativas (cenários) visa incluir a perspectiva tamm desse, de modo que seja possível
construir um reconhecimento entre os arranjos signicos que irão ser configurados em um
artefato de design de moda e suas necessidades latentes. Nesse sentido, está se considerando
tanto ir ao encontro do que Barthes (1996) intitulou como Homo Significans, portanto, não o
homem rico em sentido, mas o homem gerador de sentidos; como encontrar meios de atuação
do que Flusser (2007) chamou de Homo Ludens, que pode ser entendido como o homem que
vivencia os sentidos:
O novo homem não é mais uma pessoa de ações concretas, mas sim um performer
(Spieler): Homo ludens, e não Homo faber. Para ele, a vida deixou de ser um drama
e passou a ser um espetáculo. Não se trata mais de ões, e sim de sensações. O
novo homem não quer ter que fazer, ele quer vivenciar (FLUSSER, 2007, p.58).
Para compreender como essa metodologia pode ser posta em ptica, buscou-se a
realização de entrevistas semi-estruturadas, por entender que esse método permite maior
liberdade ao entrevistador/investigador. Segundo Moreira, através dessa modalidade de
entrevistas, algumas questões são pré-determinadas, mas cada questionamento pode levar a
novas questões, o que permite um teor de liberdade relativamente grande ao entrevistador.
Busca-se, portanto, relevar aspectos suplementares através das respostas, sendo que isso pode
surgir no momento de realização da entrevista, levando à questionamentoso previstos
originalmente (MOREIRA, 2004, p.55).
101
O escopo fundamental de perguntas utilizadas nas entrevistas está anunciado na
introdução desse trabalho, servindo como orientação para os questionamentos mais
pertinentes ao mesmo, ou seja, quais metodologias e ferramentas são operativas para os casos
selecionados. Entretanto, como foi anunciado, quando da realização das entrevistas, novos
questionamentos foram objetivados, no intuito de melhor compreender dinâmicas operantes
de antecipação do devir.
Procurou-se, assim, a realização de entrevistas com alguns atores-chave no processo
de identificar e interpretar a relevância de aspectos correspondentes aos princípios centrais
dessa investigação. Entende-se que essa modalidade de entrevistas pôde dar subsídios para
encontrar respostas às proposições levantadas nesse estudo, bem como, auxiliar na
constituição de um modelo mais preciso, que reúna as etapas propostas para a metodologia
que se está constituindo.
3.1 RELAÇÕES ENTRE A METODOLOGIA PROPOSTA E PERSPECTIVAS
MACROSSOCIAIS
Para iniciar essa fase do estudo, parte-se de algumas considerações apontadas em
entrevista realizada em dezembro de 2009 com a socióloga argentina Susana Saulquin.
Saulquin, dentre outras atividades, desenvolve projetos junto a instituições e empresas, sendo
seu trabalho com tendências intitulado de Perspectivas Macrossociais um dos ramos de
desenvolvimento de seu olhar amplo a partir da moda para a sociedade.
21
Saulquin, a partir da
orientação de seu trabalho como Perspectivas Macrossociais, busca relacionar
desdobramentos de macro-conceitos a imagens, coletadas em diversos contextos de fruição.
Esses desdobramentos visam relacionar o devir sociocultural a projetações, em peodos
longos de desenvolvimentos de sentidos (de três a cinco anos).
Saulquin também é a curadora intelectual do Proyecto Por La Calle, projeto que
possui subsídios governamentais destinados a partir do Observatório de Tendências do
Instituto Nacional de Tecnologia Industrial (INTI, com sede em Buenos Aires, Argentina), e
subsídios de instituições não-governamentais, como a Fundación Pró-Tejer, também com
sede em Buenos Aires. O projeto, iniciado no ano de 2005, visa transformar a Argentina em
um país gerador de tendências para o design de moda, sendo essa perspectiva embasada na
21
Algumas informações sobre Saulquin estão disponíveis no endereço eletrônico:
<http://www.susanasaulquin.com.ar/homess.htm>.
102
grande quantidade de designers e empresas que investem no caracterizado diseño de autor
como forma de constituir novos sentidos.
22
Desse modo, uma das questões levantadas procurou compreender como é possível
identificar sensibilidades emergentes no meio social, ou seja, como a entrevistada busca
identificar essa premissa, de modo a construir relações com sinais que levem a constituição de
tendências para o design de moda. Saulquin argumentou que, para cumprir tal feito, é preciso
exercitar o alerta dos sentidos, visto esses serem interfaces com mundo constituído.
23
Encontra-se ligação entre essa perspectiva e considerações tecidas por Flusser, visto
que os sentidos, portanto, podem auxiliar a identificar fenômenos operantes. Segundo o
teórico:
[..] o mundo dos fenômenos, tal como percebemos com nossos sentidos, é uma
geléia amorfa, e atrás desses fenômenos encontram-se ocultas as formas eternas,
imutáveis, que podemos perceber graças à perspectiva supra-sensível da teoria. A
geléia amorfa dos femenos (o “mundo material”) é uma ilusão, e as formas que se
encontram encobertas além dessa ilusão (o mundo formal”) são a realidade, que
pode ser descoberta com o auxílio da teoria. E é assim que a descobrimos,
conhecendo como os femenos amorfos afluem às formas e as preenchem para
depois afluírem novamente ao informe (FLUSSER, 2007, p. 24).
Obviamente, Flusser ressalta a importância de uma teoria que permita organizar, em
suas palavras, a geléia amorfa que constitui os fenômenos. Para tanto, vale utilizar a resposta
dada por Saulquin quando questionada sobre que tipo de método poderia auxiliar a organizar
o que os sentidos percebem. Para a socióloga, realizar tal feito corresponde a desconstruir
fenômenos em suas palavras, acontecimentos para voltar a construí-los, sendo que,
utilizando-se esse método, é possível que se identifique tendências no processo.
24
Retoma-se, assim, a perspectiva que, para chegar até a essência do que está sendo
comunicado através dos digos, ou seja, dos sinais emitidos por várias esferas de geração de
cultura, é preciso decompor estruturas discursos chegando até as unidades dialógicas que
compõe um discurso, potencializando novas construções e sentidos, a partir da configuração
de interrelações entre as mesmas.
Assim, foi questionado à socióloga se a premissa de existência de diálogos entre áreas
de representação simbólica como arte, arquitetura, cinema, dentre outras pode auxiliar na
22
Mais informações sobre o projeto podem ser conferidas no site: <http://www.xlacalle.com>.
23
A tradução da reprodução de resposta de saulquin é livre, ou seja, da autora : Eu creio que existe metodologia
que se possa usar, primeiro acredito que uma metodologia é a partir de um alerta dos sentidos, quero dizer, os
sentidos são interfaces entre o mundo e a exterioridade.
24
A tradução da reprodução da resposta de Saulquin é livre, ou seja, da autora: [...] porém, necessitas
desconstruir para voltar a construir, para detectar tendências dentro do processo.
103
constituição de tendências para o design de moda. Sobre isso, Saulquin argumentou que a
função da arte é como a fuão do luxo, portanto, de uma transformação espiritual. A arte,
para tanto, busca a vivência de uma transformação do espírito em alerta, ajudando a
compreender a essência da sociedade, das idéias e do que passa no mundo. Para Saulquin, a
arte o é algo intelectual puramente, mas algo vivenciado, que ajuda a compreender novas
realidades, nos transformando. Porém, isso o acontece com esse campo de
conhecimento, também acontece com a arquitetura, e isso permite uma leitura de certos
fenômenos.
25
Nesse sentido, questionou-se à socióloga como pode se dar, em primeiro lugar, uma
forma de observação dos femenos operantes no meios social e, em segundo lugar, um meio
de perceber o diálogo que existe entre os mesmos. A resposta de Saulquin foi a seguinte:
[..] eu creio que outra metodologia interessante, nas tendências, é cruzar o
diacrônico com o sincrônico, então você vai fazendo uma leitura permanente entre a
diacronia e a sincronia, intercalando cada momento, o diálogo entre o diacrônico e o
sincrônico é extremamente interessante. É uma metodologia que eu emprego para
poder entender-me, [...] pois permanentemente trabalhar com ciclos, [..] como posso
te dizer, segmentos de ciclos diacrônicos, porém estes segmentos cíclicos, eu vou
colocando com o que ocorre no contexto, e entre as duas coisas me a leitura da
evolução e me permite prever o que vai acontecer.
26
Questionou-se à socióloga se isso poderia ser entendido como uma leitura helicoidal,
portanto, de modo anacrônico e cruzamento sincrônico, ao que a mesma respondeu que sim.
Desse modo, é possível entender que os sinais emitidos no presente, que podem ser
identificados e associados de modo a levar à constituição de tendências, podem estar
construindo correspondência com fenômenos ocorridos, portanto, com ressignificações de
uma mesma ideia uma mesma unidade dialógica fundamental - sendo articulados através de
outros fragmentos textuais. Essa perspectiva liga-se com o que Flusser considera acerca da
comunicação através do espo/tempo, permitindo formas de entendimento de uma
linearidade textual que visa estabelecer mecanismos de troca mediação. Para o teórico:
Cada diálogo pode ser considerado uma série de discursos orientados para a troca. E
cada discurso pode ser considerado parte de um diálogo. Por exemplo, um livro
científico pode, isoladamente, ser interpretado como um discurso. No contexto de
outros livros, ele pode ser interpretado como parte de um diálogo científico. E,
25
A tradução da reprodução da resposta de Saulquin é livre, ou seja, da autora: [...] a função para mim da arte, é
como a do luxo em transformar espiritualmente, é uma transformação espirutual. A partir da arte busca uma
vivencia de transformação de espiritual em alerta para compreender muito mais as essências. As essências da
sociedade, as essências das idéias e do que passa no mundo.[...] o bom da arte é que não é algo intelectual
puramente, mas sim é algo muito vivenciado onde te leva a ir trabalhando e compreendedo as novas realidades,
mas isso não ocorre com a arte, a arquitetura por exemplo, me permite a leitura, por exemplo, vamos supor,
tudo o que estava acontecendo em Dubai, a arquitetura de Dubai tão enloquecida e tudo mais [...].
26
A tradução da reprodução da resposta de Saulquin é livre, ou seja, da autora.
104
considerando de uma distância ainda maior, pode ser compreendido como parte de
um discurso científico que flui desde a Renascença e que caracteriza a civilização
ocidental (FLUSSER, 2007, p.97).
Nesse ínterim, para chegar até o teor fundamental da ideia, ainda que auscultada no
momento atual para utilizar termos tecidos por Bakhtin acerca da análise do dialogismo na
obra de Dostoiévski parece pertinente perceber as pontes relacionais que existem não apenas
entre distintas unidades dialógicas, mas também em tempos diferentes. Esse raciocínio
associa-se à proeminente fuão da intertextualidade como forma de construir sentido entre
diálogos atras de textos de modo anacrônico ou sincrônico.
Para exemplificar essa leitura anacrônica, pode-se utilizar como exemplo as
prerrogativas que fundamentaram a Anti-Arte, relativa ao movimento dadaísta, e a Anti-Moda,
relativa ao movimento Punk. O fato é que, em ambos os casos, os signos constitutivos de
algumas formas de representação obras de arte, no caso dos dadaístas, e indumentária, no
caso dos punks serviram para comunicar o teor de subversão que embasava tanto preceitos
estéticos, como comportamentais. O fator de distração, apontado por Benjamin (1994) como
algo que passou a atuar no campo da arte com o advento da reprodutibilidade, foi utilizado de
modo a criar um desconforto àqueles que não compartilhavam da ideia que fundamentava
ambos coletivos visto que, a princípio, os dois casos se caracterizavam como coletivos de
indivíduos unidos em torno de uma mesma ideia, um texto centralizador.
Consoante Benjamin:
Na realidade, as manifestações dadaístas asseguravam uma distração intensa,
transformando a obra de arte no centro de um escândalo. Essa obra de arte tinha que
satisfazer uma exigência básica: suscitar a indignação pública. De espetáculo
atraente para o olhar e sedutor para o ouvido, a obra convertia-se num tiro. Atingia,
pela agressão, o espectador (BENJAMIN, 1994, p.191).
Para cumprir tal desígnio, expoentes dadaístas se utilizavam de materiais ordinários
para compor suas obras, subvertendo a relação entre criador e obra. Um dos exemplos
operativos dessa dinâmica é a obra A Fonte (1917), de autoria de Marcel Duchamp (1887-
1968), que se caracteriza pela utilização de um urinol como meio de expressar a subjetividade
do artista. Essa obra serviu para caracterizar preceitos dadaístas, comunicando, ao blico em
geral, o teor de subversão de valores estéticos, artísticos e morais proposto pelo movimento.
105
Ilustração 1: Obra
Fonte: Marcel Duchamp (1917)
Essa perspectiva era o cerne da chamada Anti-Arte, e a constituição de artefatos
artísticos a partir da utilização de materiais ordinários acabou permitindo ressignificações
dentro do campo da arte, sendo esse princípio utilizado posteriormente pelos artistas Pop, que,
segundo Smith (2000), se auto intitulavam neodadás (SMITH apud STANGOS, 2000).
Decompondo a estrutura, configurada como artefato artístico pelas os de Duchamp,
é possível chegar à ideia de ligação entre os dadaístas, portanto, a unidade dialógica que
fundamentou o discurso que os unia enquanto coletivo criativo. Essa ideia era a subversão de
valores culturais instituídos, e os artefatos configurados pelos expoentes desse movimento
visavam comunicar esse preceito de várias formas.
A Anti-Moda, relativa ao Movimento Punk, acabou também servindo como forma de
suscitar a indignação, e a composição da indumentária, relacionada a indivíduos desse
movimento, se dava a partir da utilização de materiais oriundos do lixo industrial e urbano,
unindo elementos de modo a subverter os valores estéticos e formais do período, provocando
o choque com linguagens representativas instituídas.
Porém, a forma de representação simbólica que tornou o Movimento Punk conhecido
no mundo ocidental foi sica, sendo a estética caracterizada pela indumentária algo
assumido a posteriori, como forma de traduzir, utilizando uma outra plataforma
representativa, os princípios de ligação entre os indivíduos que compunham esse coletivo
urbano.
Segundo Galvão e Kastilhos:
106
[...] grupos de roqueiros londrinos, frustrados com os sistemas de tradição cultural
inglesa, apareceram em cena em janeiro de 1976 [...]. Pretendendo inverter os
valores das elites dominantes, os punks ao invés de se apresentarem no palco [...]
misturavam-se à audiência, e ao invés de tocar e cantar, gritavam, cuspiam e
profanavam imagens religiosas daquela cultura (GALVÃO; KASTILHOS, 2003,
p.185).
Sete cadas separam os movimentos, porém, a ideia a subversão dos valores
culturais vigentes, seja no campo das artes, seja no meio social para, por fim, atingir a moda
servem de modo a construir ligões entre os fragmentos textuais representativos de ambos os
movimentos. A subversão, nesse contexto, caracteriza-se como sensibilidade emergente entre
os indivíduos que compunham cada um dos coletivos, sendo representada através de artefatos
específicos a cada um dos mesmos. Portanto, é outro nível de ligação entre as linguagens
pertencentes a esses campos: a forma como os dois movimentos buscaram substituir
necessidades latentes, originadas devido a fenômenos operantes no momento em que cada
coletivo foi organizado, objetivando comunicar os mesmos através do apelo simbólico
constitutivo dos artefatos mencionados.
No caso dos dadaístas, os signos de subversão, constitutivos de artefatos artísticos,
estavam embasados na perspectiva de tangibilizar o descontentamento com as políticas
sociais, econômicas e governamentais do peodo pós 1° Guerra Mundial, privilegiando a luta
contra os estertores e delírios morais daquele período. Política, e arte foram questionadas
em seu cerne:
Dadá visou destruir as razveis ilusões do homem e recuperar a ordem natural e
absurda. Dadá quis substituir o contra-senso lógico dos homens de hoje pelo
ilogicamente desprovido de sentido.[...] As filosofias têm menos valor para Dadá do
que uma velha escova de dentes abandonada [...]. Dada é a favor do não-sentido, o
que não significa contra-senso. Dadá é desprovido de sentido como a natureza. Dadá
é pela natureza e contra a arte. Dadá é direto como a natureza. Dadá é pelo sentido
infinito e pelos meios definidos (ARP APUD ADES apud STANGOS, 2000, p.101).
os punks buscaram mostrar sua indignação com o sistema político, econômico e
social vigentes na cada de 1970, primeiramente, em alguns países do hemisfério Norte e,
mais precisamente, em solo britânico. Desse modo, a estética assumida através da
indumentária, e de elementos como maquiagem, corte de cabelo, etc, possibilitava o
reconhecimento das condições precárias a que uma determinada classe social estava
submetida. Segundo Morais e Portinari:
A ausência de futuro, a desesperança, o desemprego, as condições inóspitas de vida,
a política de desestatização de Thaetcher, entre outros fatores que os destituíram de
boa parte dos serviços públicos que dispunham, fizeram desses jovens, em sua
maioria oriundos de classes trabalhadoras do subúrbio, estabelecessem nos arredores
de uma loja de artigos sadomasoquistas, situada num região que não dispunha da
107
prosperidade que as demais regiões de Chelsea ofereciam, lugares de sociabilidade,
onde poderiam subverter, exteriorizar sua sensação de estagnação e exílio social
(MORAIS; PORTINARI, 2006, p.81).
Portanto, as transformações e condições inerentes ao meio social em ambos os
períodos acabou gerando artefatos que visavam construir mediações simbólicas entre os
indivíduos e a sensibilidade que os unia o texto centralizador, a unidade dialógica
fundamental: a subversão de aspectos culturais instituídos. A construção de dlogos que
permitem a configuração de sentido entre as formas de representação objetivadas para efetivar
essa prática nos dois movimentos, acabou levando às ressignificações engendradas após a
ocorrência dos mesmos, visto que ambos acabaram oferecendo meios de renovar o discurso
instituído pelo sistema, seja em nível sociocultural, seja da arte ou da moda. Nesse sentido,
além de uma leitura de modo anacrônico, portanto, uma leitura que permita construir uma
narrativa através de fragmentos textuais relativos a peodos distintos, também é possível
realizar uma leitura de modo sincrônico, principalmente no caso dos fragmentos textuais
(artefatos constituídos) relativos ao discurso inaugurado pelo Movimento Punk, que permitiu
a configuração, no sistema da moda, de significações até os idas atuais, visando recodificar os
códigos de subversão no intuito de oferecer interpretações destituídas do sentido primevo que
as caracterizou.
108
Ilustração 2: Coleção Seditioners de Vivienne Ilustração 3: Look de Zandra Rodhes lançado
Westwood, 1976 na década de 1980
Fonte: MENDES; DE LA HAYE (2003) Fonte: MENDES; DE LA HAYE (2003)
A imagem relacionada a Coleção Seditioners (1976), um design de moda de autoria da
estilista inglesa Vivienne Westwood, mostra as primeiras representações da subversão punk
em artefatos de moda. a imagem de Zandra Rodhes (década de 1980), ilustra como os
códigos que comunicavam a subversão circunscrita ao movimento foram sendo
reinterpretados, servindo para ressignificar artefatos direcionados ao seleto círculo de usuários
de alta-costura internacional. Portanto, como o texto centralizador relativo ao universo punk
serviu para embasar um discurso amplificado, desprovido do teor comunicacional original,
transformado e recodificado, operando novas trocas simbólicas. É, também, um bom exemplo
de como o movimento Bubble Up opera no sistema da moda: elevando o discurso gerado à
margem do sistema em nome de inovações de significados para as altas esferas que compõe
esse sistema.
109
O exemplo também serve para embasar como a inovação de significados pode ocorrer
em um sistema instituído, visto que, segundo Caldas (2004), quem poderia esperar que nesse
período década de 1970 pudesse surgir uma estética o diferente da operante, que era
embasada por caractesticas étnicas diversas, reverberando aspectos comportamentais
instituídos a partir do final dos anos 60 (CALDAS, 2004, p.49).
Os arranjos sígnicos constitutivos dos artefatos de design de moda de Westwood
serviram para romper com paradigmas estéticos e formais instituídos pelo sistema,
possibilitando que outras combinações entre fragmentos textuais fossem engendradas no
futuro, ainda que desprovidas do sentido inerente à unidade dialógica fundamental que serviu
de mediação simbólica entre a designer, os artefatos de sua autoria e o meio sociocultural: a
subversão.
Esse exemplo também mostra a importância de observar as ocorrências socioculturais
operantes, sendo esse um meio de identificar sinais que possam auxiliar na constituição de
tendências, contribuindo, inclusive, para a construção de uma correlação entre os
apontamentos metodológicos feitos por Saulquin e a utilização da intertextualidade como um
conceito operador, uma ferramenta ativa no cumprimento da metodologia que se es
propondo nesse estudo. Desse modo, nota-se a complementaridade que existe na prerrogativa
de realização de observações de contextos concretos, ou não concretos, no sentido de perceber
o nível relacional entre indivíduos e artefatos (cultura material), de modo a efetivar uma
análise que permita localizar a unidade dialógica fundamental que liga essas relações,
servindo como vínculo de mediação simbólica para a construção de novos sentidos. Portanto,
a complementaridade existente entre a ferramenta de observação de contextos de fruição
(anunciadas anteriormente: etnografia e netnografia), e o estatuto analítico intertextual.
Sobre como Saulquin elege o que é importante observar para identificar sinais de
transformações operantes, que potencialmente constituam tendências, a socióloga propôs a
seguinte formatação:
Acontecimento 1: eu coloco num pedacinho da minha cabeça, um acontecimento,
um choque, um barco que se mexe, uma modelo que se move na passarela. Quando
acontece pela segunda vez, isso pode ser uma casualidade ou não, um acontecimento
ou não, mas quando ocorre pela terceira vez, esse é um acontecimento poderoso.
Isso é uma metodologia. É a repetição em três: a primeira vez o acontecimento, a
segunda pode ou não ser uma coinscidência, a terceira é tendência.
27
27
A tradução da reprodução da resposta de Saulquin é livre, ou seja, da autora.
110
Para a socióloga, essa forma de observação leva às chaves, que podem também ser
entendidas como os conceitos ativos e presentes, que visam gerar categorias relacionais,
portanto, que possuem uma aproximação íntima com o funcionamento da pesquisa Blue Sky,
ferramenta também anunciada anteriormente e que faz parte do escopo metodológico que se
busca construir nessa investigação.
Nesse sentido, está-se considerando que um acontecimento um fenômeno e a forma
como o mesmo pode ser substitdo por códigos serve de modo a circunscrever aspectos
relacionais, levando a uma leitura de algo emergente (uma sensibilidade). Sobre essa
perspectiva as considerações de Foucault mostram-se esclarecedoras:
Pode-se, creio eu, isolar outro grupo de procedimentos. Procedimentos internos,
visto que o os discursos eles mesmos que exercem seu próprio controle;
procedimentos que funcionam, sobretudo, a tulo de princípios de classificão, de
ordenação, de distribuição, como se se tratasse, desta vez, de submeter outra
dimensão ao discurso: a do acontecimento e do acaso (FOUCAULT, 2008, p.21).
Portanto, pode-se considerar que um acontecimento seja uma forma de perceber os
nculos relacionais entre uma ideia e o contexto sociocultural, a saber: classificação,
ordenação, distribuição. O acaso, relacionado pelo filósofo, mostra-se como forma de
mudanças operarem, permitindo que se cumpram as etapas estabelecidas para a configuração
de um discurso. Portanto, um acontecimento (um fenômeno) é também um meio de delimitar
relações estruturais.
A partir dessas considerações, questionou-se à socióloga se as tendências surgem dos
indivíduos, visto esses poderem ser considerados como autores textuais ativos, ou, nas
palavras de Foucault: “[...] o autor como princípio de agrupamento do discurso, como unidade
e origem de suas significões, como foco de sua coerência(FOUCAULT, 2008, p.26); ao
que Saulquin respondeu que também surgem das pessoas em sociedade, do indivíduo em
grupo.
28
Nesse sentido, foi considerado qual o vel de importância da realização de
observações de espaços urbanos para a identificação de indícios de mudanças significativas,
no sentido de perceber supostas interconexões, ou interrelações, que possam estar sendo
constituídas entre os indivíduos e os artefatos nesse ambientes. Para tanto, Saulquin apontou
um exemplo:
28
A tradução da reprodução da resposta de Saulquin é livre, ou seja, da autora. Eu te diria também que surge das
pessoas em sociedade.[...] Do individuo em grupo.
111
Eu vou te dar um exemplo banal, que vai marcando para onde vai as ideias e para
onde vai a sociedade. Há quase 30 anos os bebês, as es levavam eles num
carrinho, sendo que os bebês estavam olhando para as mães, contato visual com a
mãe. Logo apareceu a civilização da imagem, e aconteceu mudanças e os bebês
passaram a olhar para o mundo. A doze anos isso vem mudando novamente, e se
deram conta que os bebês se acalmam e estão muito mais tranquilos porque
necessitam ver a sua e, e não estar em contato o tempo todo com o mundo. Ou
seja, existe como uma transição, a não acumulação de acontecimentos, porém sim a
vivência de uma relação muito forte e social com a mãe. Assim o bebê volta a mudar
para o simples, sendo que o carrinho aponta a uma tendência social. Eu me fixo
nisto, nestas coisas, os objetos o que fazem é traduzir as necessidades do momento
social. O que acontece é que tens que estar muito atenta para se dar conta que este
simples detalhe de dar volta é o que vai vir como tendência.
29
Demonstra-se, através do exemplo proposto pela socióloga, a perspectiva de mediação
simbólica através dos artefatos, e retoma-se a importância de observação de contextos de
geração de cultura para identificar sinais que sirvam para a configuração de uma narrativa
uma tendência.
Considera-se novamente, nesse momento, os apontamentos feitos por Augè, para
quem os objetos (tratados como artefatos nesse estudo), possuem uma dupla obrigação, visto
que operam como meios de desenvolvimento cultural do homem e, além disso, permitem
mediar relações que extrapolam o contexto verbal, desdobrando possibilidades de
entendimento tácito entre os indivíduos: “de esta forma, todos los objetos corrientes, en la
medida en que son el médio para una relación entre personas, también son simbólicos por este
concepto”
30
(AUGÈ, 2001, p.106).
O que ressalta, nessa análise, é a importância de utilização da observação como forma
de objetivar um recorte na realidade, levando para a geração de hipóteses de trabalho, que
servirão como vínculos entre o que está sendo observado a cultura material e a mediação
simbólica inerente à mesma e a construção de diálogos entre áreas de representação
simbólica (a partir de seus digos constitutivos, que cumprem o desígnio de substituição de
fenômenos, de acontecimentos). Aprimorar os sentidos para engendrar tal tarefa, que, segundo
Saulquin, caracteriza-se como um meio de exercitar a atenção, pode associar-se a percepção
da fluidez criativa (dionisíaca) entre os indivíduos, levando à identificação de uma ideia, algo
29
A tradução da reprodução da resposta de Saulquin é livre, ou seja, da autora.
30
A tradução de Au é livre, ou seja, da autora: Desta forma, todos os objetos correntes, na medida em que são
o meio de ralação entre pessoas, também são simbólicos por esse conceito.
112
anteriormente apontado nesse estudo através de considerações relevadas a partir de Nietzsche
e Bakhtin.
31
Nesse sentido, perceber sensibilidades emergentes é observar relações interpessoais,
objetivando relevar, através de características comportamentais ativas que podem se
desdobrar em contextos de geração de cultura, como ambientes urbanos, por exemplo - o
estado do imaginário coletivo no presente, ainda que circunscrito a um fenômeno ordinário
como um carinho de bebê e sua posição em relação à mãe.
A iminência de observação desses acontecimentos pode levar ao teor de ruptura com
certos paradigmas culturais estabelecidos, repercutindo as análises construídas quando da
leitura anacrônica engendrada entre Anti-Arte e Anti-Moda.
Saulquin mais de uma vez, frisou a importância de constituir leituras dos
acontecimentos para trás ou para a frente, visto novos, e mais importantes fenômenos, estarem
comunicando sinais de tenncias no momento presente.
32
Trata-se, pois, de uma forma de ler e interpretar sinais correntes, e isso reverbera
considerações tecidas por Flusser sobre formas de olhar, e compreender, as coisas:
Outra maneira de olhar as coisas, do ponto de vista formalístico, é encarar os
processos como dimensões das coisas. O primeiro método de olhar as coisas as
decompõe em fases (é um todo diacrônico). O segundo método reúne fases e
formas (é um método sincrônico) (FLUSSER, 2007, p. 123).
Diacronia e sincronia: leituras através e leitura linear. Essa forma de construir um
raciocínio estruturado, que permita a atuação de artefatos: uma narrativa, um cenário; parece
ser algo inerente aos profissionais que visam constituir tendências, portanto, aos indivíduos
que aplicam isso de modo prático. Nota-se a objetivação de um método que visa
compreender o que es sendo comunicado pelos artefatos, no intuito de chegar até a ideia que
embasa um determinado arranjo sígnico, que consiste em um texto em si. A intertextualidade,
a partir do embasamento teórico oferecido pelo dialogismo, permite a efetivação dessa
prerrogativa, indo ao encontro da unidade dialógica fundamental a sensibilidade que emerge
do meio social, portanto, a ideia fluida que relaciona indivíduos e se desdobra em plataformas
31
Essas considerações estão assim relacionadas nesse trabalho: Retoma-se, aqui, a perspectiva de sublimão do
ânima fluido que vincula formas de representação simbólica, caracterizado por Nietszche como a potência do
desejo relativa aos indivíduos, e por Bakhtin como a ideia, verdadeira heroína na obra de Dostoiévski
(BAKHTIN, 2008, p.25).
32
A tradução da reprodução da resposta de Saulquin é livre, ou seja, da autora: Agora há acontecimentos mais
importantes, que estão constituindo como tendências, outras e devem ser usadas como um alerta muito forte em
teus sentidos, diâcronia para traz ou para a frente [...] e sincronia das tendências, isso é uma metodologia, é uma
forma de permanentemente analisar os acontecimentos.
113
de projetação: artefatos. A observação do meio sociocultural é o ponto de partida para
engendrar tal tarefa, segundo Saulquin, e o recorte na realidade a escolha por áreas de
atenção, por áreas de representação simbólica de acontecimentos (fenômenos sociais
operantes), por artefatos que visem construir mediações simbólicas entre o texto centralizador
e os indivíduos uma forma de eleger estruturas que possam ser decompostas, levando a
composição de outras estruturas, engendrando novos sentidos.
Segundo Flusser (2007), essa perspectiva associa-se a necessidade do homem
contemporâneo de criar ilusões através dos códigos, portanto, de ludibriar uma existência sem
sentido, fadada a finitude, à morte (FLUSSER, 2007, p.60-91).
Para tanto, um artifício é a geração de mundos alternativos, que podem, a preceito
desse estudo, ser entendidos como cenários. Nesse sentido, a constituição de tendências o
apenas atende a perspectiva de gerar caminhos para o desdobramento de estratégias
projetuais, potencializando prever o devir cultural de modo a oferecer meios de construção de
canais de comunicação (substituição, mediação) não verbal entre artefatos de design de moda
e indivíduos. Também permitem cumprir a fuão de proporcionar espaços alternativos de
desenvolvimento de relações, seja entre indivíduos e artefatos, seja entre artefatos e
empresas/organizações, seja entre todas essas esferas que compreendem a complexidade de
um sistema institucionalizado: do sistema da moda. Consoante Flusser, “antes, o objetivo era
formalizar o mundo existente; hoje o objetivo é realizar as formas projetadas para criar
mundos alternativos (FLUSSER, 2007:31).
Para cumprir essa tarefa, Saulquin aponta a importância de uma mente questionadora,
que não releva a realidade como fatos pré-determinados, mas que busque ir além do que es
sendo comunicado na superfície, de modo a encontrar o sentido íntimo entre as relações
engendradas, sendo esse um meio pelo qual é possível construir novos sentidos, novos
significados.
33
Buscando compreender se essa relação pode ser objetivada a partir da leitura, e
interpretação, das relações que se desdobram em coletivos específicos micro ambientes
relacionais - organizados no ambiente urbano tribos urbanas Saulquin respondeu que sim,
33
A tradução da reprodução da resposta de Saulquin é livre, ou seja, da autora: [...] tens que estar com a mente
permanentemente aberta aos estímulos, a tudo o que está acontecendo, e ter uma atitude de criança de três anos
[...]. Tudo o que você , pedir o “por que”, nada é pré determinado ou pré digerido. Uma resposta automática
não existe na tendência. Isso eles tem que entender e suspender tudo que está automático, e estar
permanentemente questionando, é uma personalidade questionadora, aquele que sabe as tendências. Porque está
questionando a sociedade, para poder ver como está a transição e porque a sociedade vai mudando [...].
114
isso é possível, principalmente no tocante a inovação social. Entretanto, também considerou a
importância de assumir uma postura cuidadosa quando dessa empreitada, visto que existem
tribos que realmente estão apontando para o novo, assim como algumas que desenvolvem
linguagens representativas para corresponder à efemeridade dos ciclos da moda.
34
Recupera-se, aqui, a importância das comunidades criativas como meios de engendrar
inovações sociais, algo anteriormente apontado como dinâmica relacional de baixo pra cima,
através de considerações tecidas por Manzini (2007).
Seguindo adiante na entrevista, Saulquin novamente ressaltou a importância de
empreender diacronia e sincronia entre os acontecimentos, relacionando isso como uma
metodologia eficaz para a leitura dos sinais. Segundo ela, acontecimentos e a constituição de
tendências, é o modo pelo qual é possível identificar quais sensibilidades estão emergindo no
campo social. Além disso, também ressaltou a importância de relacionar os sentidos entre os
acontecimentos e os artefatos, quando questionada se as tendências surgem dos indivíduos e
voltam aos indivíduos, empregando um modo de leitura que busque o fundamento social que
está sendo articulado, sendo os objetos uma forma de tangibilizar esse aspecto, formalizando
o sentido que es sendo constituído em cada época.
35
Retoma-se, assim, a perspectiva de identificação do espírito do tempo a partir da
efetivação de em escopo metodológico que permita a interpretação dos fenômenos operantes
no campo sociocultural através de arranjos gnicos constitutivos de artefatos, algo que
converge para considerações tecidas por Caldas (2004), quanto às esferas de geração de
cultura e a configuração do l’air du temps através da caracterização de artefatos relativos a
diferentes áreas de representação e o comportamento social operante em um determinado
período. Demonstra-se, novamente, a perspectiva de medição simbólica através dos artefatos,
sendo essa uma pertinente forma de engendrar leituras que visem a identificação do devir
cultural.
34
A tradução da reprodução da resposta de Saulquin é livre, ou seja, da autora: Totalmente...penso que é bom ter
cuidado para observar os grupos urbanos e ver como eles captam o que vai vir e ter cuidado para interpretar
dentro dos grupos, das tribos, as tendências, as que são moda e as que são realmente autênticas.
35
A tradução da reprodução da resposta de Saulquin é livre, ou seja, da autora: Estas acompanhando a
metologia? Porque tem uma metologia, estás acompanhando ou não? A metodologia começa pelo diacronico e o
sincronico, pela construção dos sentidos nos artefactos e pela leitura das formas....[...] E qual é a relação da
tendencia? Sociologicamente se diz que cada época tem um sentido e dá um sentido para o produto [...].
115
3.2 RELAÇÕES ENTRE A METODOLOGIA PROPOSTA E MACROTENDÊNCIAS
No sentido de encontrar maiores subsídios analíticos para corroborar a constituição de
um modelo que rna as etapas metodológicas propostas para a solução da problemática
geradora dessa investigação, buscou-se também entrevistar indivíduos que trabalhem com a
comercialização de tendências para o design de moda, e para outros campos de projetação de
artefatos. Para tanto, realizou-se entrevistas semi-estruturadas com profissionais que atuam no
escritório nacional da empresa de pesquisa de tendências intitulada WGSN
36
, por entender
que essa empresa, que se configura como um meio midiático de disseminação de informações,
oferece plataformas de composição de tendências narrativas principalmente em vel
macro, portanto, Macrotendências. As Macrotendências, apresentadas no endero eletrônico
da empresa, o elaboradas respeitando ciclos de dois anos de antecipação, sendo que, nesse
período, sofrem análises que apresentam novos desdobramentos, permitindo que os clientes
da empresa acompanhem o desenvolvimento dos aspectos primordiais de elaboração das
mesmas.
Para analisar questões relativas à metodologia empregada pela empresa, foram
entrevistadas duas pessoas, a saber Martina Pinho, trend research specialist (literalmente,
especialista em investigação de tenncias), e Andréia Bisker, head of South America
(literalmente, chefe das operações na América do Sul). Ambas apresentaram formas de
composição da metodologia utilizada pelos agentes que constituem o time de experts da
empresa, permitindo formas de cruzar as informações coletadas com Saulquin, as proposições
tecidas nesse estudo e as etapas processuais utilizadas pela WGSN na constituição de
tendências de dois anos de desenvolvimento.
A WGSN é um empresa internacional, com sede em Londres, que atua no mercado de
disseminação de informações de tendências para vários segmentos, sendo o design de moda
um desses. Sua relação com o mercado é em vel global, e seus colaboradores se encontram
em diversas partes do planeta. A informação disponível em sua plataforma de disseminação
de conteúdo um sítio de internet é comercializada para empresas de portes distintos, e as
36
Mais informações sobre o site podem ser coletadas no seguinte endero:
<http://www.wgsn.com/public/pdf/wgsn_pt.pdf>. O endero, um arquivo em PDF, permite vislumbrar serviços
oferecidos pelo site que também pode ser considerado um birô de investigação possibilitando o entendimento
da complexidade de atuação das informações relacionadas ao mesmo.
116
operações engendradas no Brasil, segundo Bisker, correspondem a 5% do total de
faturamento da empresa.
As entrevistas, realizadas no s de setembro de 2009, permitiram compreender a
importância de certos pressupostos relevados nesse estudo. Nesse sentido, um dos
questionamentos propostos às entrevistadas, consistiu em como o time de identificadores de
sinais da empresa atua em busca do que é relevante para a constituição de tenncias e, mais
do que isso, em busca do novo. Desse modo, Pinho, respondeu o seguinte:
É difícil, e digamos assim, nem sempre o novo é interessante. O que acontece?
Talvez algo antigo, que vem aparecendo mais, nos sinalize algo importante. Vamos
supor, um movimento que eu posso ter visto ultimamente: “Yoga pela paz”, que
mobilizou aqui, sei lá, 5 mil pessoas, não sei quantas mil pessoas, no Parque
Ibirapuera, muita gente lá, 7 horas da manhã de um domingo. E yoga não é nada
novo. O que é novo naquilo? Aquilo, a demonstração em massa, de todo tipo de
classes sociais, etnias, ligadas ao yoga pela paz, que não é uma maratona, não é nada
disto, é fazer silêncio, você não está ali de curioso, realmente estava com um
propósito, mostra o que está acontecendo em São Paulo, entendeu? A gente preza
muito o consumidor. Tudo começa com a atitude do consumidor na WGSN. Desde
as artes, tudo [...] do momento. O que é que está acontecendo para ter um monte de
pessoas lá, que é uma coisa eufórica, a gente nunca tinha visto isto em São Paulo.
“Yoga pela paz, via internet, existem... Sabe isto é uma coisa interessante na
WGSN, porque isto está acontecendo?
37
Notam-se dois aspectos que convergem com a metodologia que está se propondo nessa
investigação e, ao mesmo tempo, com os apontamentos relevados a partir de dados oferecidos
por Saulquin. Primeiro: que a constituição de tendências para a WGSN parte da
identificação de aspectos operantes no meio sociocultural, e que os mesmos estão associados
a fenômenos vigentes (acontecimentos). Segundo, que a perspectiva do indivíduo relevado
na entrevista como o consumidor é o nculo de construção de análises de observações
engendradas em contextos de geração de cultura, sendo essa a perspectiva que liga ao
questionamento proposto no final da resposta dada: porque isto está acontecendo?
Nesse sentido, percebe-se uma preocupação em entender a relação entre os
acontecimentos e o posicionamento do indivíduo o consumidor, que, a preceito desse
estudo, é visto como usrio. Associa-se a isso a potencial necessidade dos profissionais da
empresa de encontrar o ponto de ligação entre estruturas (por que isto está acontecendo?)
fenômenos e indivíduos ou seja, de compreender a ideia que flui e integra essas instâncias,
portanto, qual a unidade dialógica fundamental que permitirá compreender o vel relacional
operante, auxiliando na geração de narrativas posteriores tendências para a projetação de
artefatos de moda.
37
A resposta de Pinho está reproduzida em sua integridade, conforme degravações realizadas após a entrevista.
117
Mais adiante na entrevista, foi considerado à Pinho que as informações,
disponibilizadas no site da empresa, são em nível macro e que, assim, extrapolam o campo da
moda. Ao que a entrevistada respondeu que essa informação macro não é de moda, é de
atitude de consumidor.
38
Dessa forma, novamente é possível perceber a importância do indivíduo no processo
de constituição de tendências. Para a WGSN, a perspectiva do consumidor (do usrio, do
indivíduo) é o ponto de partida de construção de considerações futuras sobre o devir cultural e
sua correlação com desdobramentos em artefatos.
Retoma-se aqui considerações construídas por Mafesolli (2002), para quem a
observação do indivíduo e, principalmente, das relações entre indivíduos em grupos, podem
levar ao entendimento dos usos e costumes que constituem os mesmos, como uma espécie de
aura que envolve as relações, que não é consciente, sendo vivenciada sem a necessidade da
verbalização (MAFESOLLI, 2002, p.127).
Ainda segundo o sociólogo, essa prática se caracteriza como um meio de estabelecer
laços de afeição entre indivíduos: essa nebulosa afetual” permite compreender a forma
específica assumida pela socialidade em nossos dias: o vaivém massas-tribos.
(MAFESOLLI, 2002, p.107).
Retoma-se a dinâmica de complementaridade existente entre os efeitos de
disseminação Bubble Up e Trickle Across (ou, peer to peer), sendo ambos embasados em
formas de introduzir novas perspectivas a partir da margem do sistema instituído, algo
relevado em capítulo anterior a partir de Treptow (2003), Barros e Moraes (2006) e Manzini
(2007).
Para compreender melhor como funciona essa perspectiva na construção dos
conteúdos que o comercializados pela empresas, foi questionado a Bisker como se
relacionam indivíduos, femenos socioculturais operantes e artefatos, na configuração da
metodologia empregada pela empresa. Também questionou-se a relação do campo da moda
nessa perspectiva. Para tais apontamentos, a entrevistada relevou os seguintes aspectos:
Na verdade é muito simples. Eles tem estas grandes reuniões de brainstorming, se
reúnem duas vezes por ano e durante duas semanas cada um dos editores chefes...
Vocês viram a WGSN? Então, você tem lá varejo, você tem rua, temos a
graphics que são ilustrações, você tem business, tecnologia, ciências. Eles o nos
principais encontros do mundo inteiro. Aí os editores chefes, junto com esta equipe,
fazem um grande resumo do que eles viram nos últimos 4, 5, 6 meses. Aí eles
38
A resposta de Pinho está reproduzida em sua integridade, conforme degravações realizadas após a entrevista.
118
trazem para os cabeças do WGSN, que é o coração, o tanque de idéias, trends, que é
o diretório que está logo abaixo digamos na cadeia do time, é um ou dois anos de
antecedência, hoje cada vez menos.[...] Esta turma absorve esta informão e ela
entra num segundo processo que é botar esta informação na mesa, na parede, no
chão, no teto, então entender onde estão as difereas, os padrões, ou as
semelhanças.[...] E aparentemente não tem nenhum sentido, onde estas pessoas
que são observadoras, na maioria designers... A WGSN não tem sociólogos,
psicólogos, tem psicólogos talvez [..] Então é um entendimento interessante. É
muito intuitivo, na minha percepção. Aí eles começam a costurar o que para eles
começa a ser o tal do zeitgeist que é o espírito do momento. [...] O que reflete, e o
que na concepção deles vai influenciar, o consumo vai influenciar as pessoas, o
mundo, e descartam aquilo que não foi tão forte assim, [...].
39
Nota-se, nas considerações construídas pela entrevistada, uma aproximação com
alguns apontamentos configurados anteriormente nesse estudo. Primeiro, que várias o as
plataformas de mediação simbólica observadas como graphics, business, tecnologia, ciência
o que leva ao entendimento das diferenças, semelhanças e padrões, ou seja, o que converge
para a identificação dos diálogos existentes entre distintas áreas de representação simbólica.
Segundo, que o método conta com a colaboração de vários experts que podem, a preceito
desse estudo, serem considerados projetistas, visto que estão buscando projetar soluções a um
briefing inicial: qual a próxima Macrotendência (ou, Macrotendências) a ser configurada pela
empresa e, posteriormente, comercializada a seus clientes? Esse é um aspecto inerente a fase
metaprojetual relativa ao Design Estratégico, o que potencializa o entendimento do vel de
pesquisas que pode ser engendrado nesse momento de um projeto. Para tanto, esses experts
realizam seções de brainstorm, de modo a iniciar a construção de suas considerações para o
desenvolvimento de trends (macrotrends). A realização dessas seções de brainstorm é algo
que foi considerado como pontual, podendo constituir um dos passos para o
desenvolvimento da pesquisa Blue Sky
40
, segundo apontamentos construídos no capítulo
anterior a respeito dessa perspectiva. Ou seja, existe uma aproximação com a metodologia
empregada pela empresa e ferramentas apontadas por esse estudo. Terceiro, que o alerta dos
sentidos, algo amplamente apontado por Saulquin como importante para a identificação de
acontecimentos (femenos), que levem à identificação de sinais e que permitam a
configuração de uma tendência, é algo que também se efetiva pela equipe de profissionais
ocupados em elaborar as tendências para a WGSN, sendo essa uma forma de perceber o
zeitgeist que se engendra, ou seja, o espírito do tempo que se desenha.
39
A resposta de Bisker está reproduzida em sua integridade, conforme degravações realizadas após a entrevista.
40
Conforme já foi abordado, a pesquisa Blue Sky pode empregar a realização de brainstormings e discussões
com os envolvidos em um projeto para a elaboração dos conceitos-chave e das categorias projetuais que
norteao a busca por estímulos criativos (SCALETSKY; PARODE, 2008, p.3).
119
O ponto de partida para a construção desse raciocínio, da antecipação do devir cultural
de modo a oferecer desdobramentos para estratégias de projetação de artefatos de áreas
distintas, realiza-se, para a WGSN, a partir do mundo constituído, portanto, do que Flusser
(2007) também considera como uma outra faceta da cultura: “o mundo da „cultura‟, das coisas
disponíveis (zuhanden), informadas” (FLUSSER, 2007, p. 60).
A metodologia empregada por esses profissionais parece respeitar uma dinâmica
sincrônica, ou seja, uma leitura por entre distintas áreas de medição simbólicas, em um
mesmo tempo. Porém, o resultado visa efetuar a perspectiva anacrônica, permitindo que as
informações compiladas sejam cruzadas em um período de até dois anos além do momento de
relevância das informações.
Sobre a importância do campo da moda em tal empreitada, algo que não ficou
exatamente claro nas considerações anteriores, Bisker argumentou o seguinte: “o principal, o
carro chefe da WGSN, o posicionamento, é muito partindo da moda para entender o
comportamento de expressão sociocultural”.
41
A perspectiva que ressalta dessa argumentação mostra a importância do campo da
moda como plataforma de mediação simbólica entre fenômenos socioculturais e indivíduos.
Existe uma relação de convergência que é relevada, e essa relação, para a empresa, parte do
campo da moda para poder desenhar o devir para outras áreas de projetação.
Em outro momento da entrevista, Bisker apresentou como essas informações o
transformadas em uma tendência, portanto, em uma narrativa que possibilite relacionar
unidades dialógicas percebidas a partir da observação de certos acontecimentos fenômenos
e suas possíveis configurações em representações simbólicas, orientadas segundo um texto
centralizador, uma idéia.
Nesse momento, a entrevistada relatou como foi a composição de uma das três
Macrotendências direcionadas ao inverno 2010 pela WGSN, intitulada Nice!
42
Para tanto, a
equipe de experts da empresa iniciou suas considerações a partir de uma exposição de
fotografias que aconteceu na Palestina, que mostrava pessoas de diferentes raças e credos
compartilhando as mesmas funções de trabalho. A exposição buscava ressaltar o que havia de
comum entre essas pessoas, independente dos conflitos milenares que as dividem
41
A resposta Bisker está reproduzida em sua integridade, conforme degravações realizadas após a entrevista.
42
Mais informações sobre essa Macrotendência objetivada pela equipe de experts da empresa WGSN podem ser
conferidas nos seguintes endereços eletrônicos: <http://blog.ondequando.com/moda/2009/01/wgsn-conta-
segredos.html> e <http://blusas.detrico.com.br/video/9-tendencia-de-inverno-2010-wgsn-nice-leg/>.
120
ideologicamente. Isso foi ressaltado como os primeiros sinais na composição dessa tendência,
ao que, após, foi associado o acontecimento de um garoto que ficou milionário por ter
resgatado uma receita de geléia de sua ae, também, a aspectos relativos a um coletivo de
idosos que se encontrava para produzir peças de tricô, bem como, outras manifestações que
buscam revelar aspectos comportamentais latentes, que vão desde representações artísticas a
outros meios de comunicar os preceitos de orientação que embasaram o raciocínio da
Macrotendência Nice!
Realizadas essas identificações, fruto da observação de várias plataformas de
mediação entre artefatos e meio social, os envolvidos na projetação de tendências buscaram
construir alguns formatos visuais para vincular a idéia essencial dessa Macrotendência às
representações que irão comunicar o que é Nice! para os clientes da empresa. Portanto, inicia-
se o processo de composição de uma estrutura que dê conta de criar relações entre fragmentos
textuais distintos e a unidade dialógica fundamental desse enredo: a ideia a saber, a
perspectiva do que é legal, em uma tradução literal do termo para o português, mas, além
disso, do otimismo. O grupo responsável por esse trabalho, segundo a entrevistada, é o que
compõe a área do graphics, sendo que esse mesmo grupo se ocupa de propor uma estética
para a tenncia que es sendo constituída, compondo, inclusive, a logotipia que se
vinculada a todos os elementos relevantes dessa narrativa. Para tanto, também segundo
Bisker, utilizam-se de muitos exemplos relacionados ao campo das artes. Após, o
engendradas decupagens, que visam desdobrar essa Macrotendência em três subtemas, cada
um relacionado à ideia central que serviu para constituir a plataforma Nice!
43
Analisando os aspectos relevados na entrevista, é possível perceber que o método
empregado pela WGSN busca, a partir da observação de acontecimentos que vinculam
43
A resposta de Bisker está reproduzida em sua integridade, conforme degravações realizadas após a entrevista:
Então eles o identificam, Nice [...] seria o verão de agora. Já. Era o 2010. Então são as pequenas grandes
coisas da vida, fazem muito mais sentido do que uma coisa grandiosa. É uma frase assim. Aí eles mostram da
onde vem. [...] Desta exposição, daí teve aquele fotógrafo, um belga, um francês, que foram lá em Israel, na
Palestina, e teve o muro que divide a cidade. Fotografaram o mesmo judeu, e o mesmo israelense, o mesmo
palestino que tem as mesmas funções, dois marceneiros, e buscando ressaltar aquilo que estas pessoas tem em
comum, e não as suas diferenças. [...] Sinais. É um garoto que ficou milionário porque descobriu, resgatou a
receita da avó de geléia. Aí o coletivo de senhores que tricotam, vários exemplos, que vão das artes, de
manifestações, para te contar da onde este grupo tirou que este é um movimento relevante para a próxima
temporada. Aí você já tem a cor, uma das coisas mais importantes a gente faz partes de alguns comitês, tem os
especialistas que aí já é coisa com BASF, com empresas [...], aí tem o time de graphics que pega estes
movimentos e fala : ok. Então Nice! Como é que é a estética do Nice? Como é que é a logotipia do Nice e tem
quilos, e quilos, e quilos de exemplos que vem, eu diria assim em 80%, das artes. Dentro disto tem três
subtemas, acho que é velocidade também... Como é que é hoje? Mudou estação mudou completamente, uma
evolução. A gente tem uma análise que a gente fez desta evolução.
121
plataformas de mediação simbólica a indivíduos, a identificação de sinais que possam estar
comunicando transformações operantes no campo social, algo já anteriormente relevado como
importante para a composição da metodologia que se pretende nessa investigação. Esses
sinais, que tanto se relacionam a artefatos como meio de efetivar trocas em nível simlico
caso, por exemplo, da exposição fotográfica que serviu como embasamento para a busca por
novos acontecimentos convergentes como a configurações de micro ambientes relacionais
unidos em torno de uma ideia como os idosos que se unem para produzir peças de tri
acabam levando a constituição de uma narrativa que visa comunicar o que é legal na ótica da
WGSN, relacionando essa perspectiva do que é legal à uma aura de otimismo latente no meio
sociocultural. Essa é a unidade dialógica fundamental da narrativa efetivada, construindo
relações com os fragmentos textuais eleitos para dar coerência ao enredo proposto sob o título
de Nice!. Portanto, legal e otimismo o a ideia, o texto centralizador desse discurso que se
configura como uma Macrotendência. Essa unidade dialógica essencial é a que detém o
comando do sentido para a geração da narrativa, permitindo a configuração de novos sentidos
conforme interpretações daqueles que se utilizam das informões oferecidas pela empresa.
Essa forma de encontrar ligações entre fragmentos textuais reverbera, novamente, na
perspectiva de utilização do estatuto intertextual como conceito ativo na constituição de
tendências para o design de moda sejam elas, Macrotendências (que também podem ser
consideradas tendências de fundo), ou tendências efêmeras. A preponderância da
transformação dos textos é praticada a partir de hipóteses, que são geradas devido à
capacidade que os membros da equipe da empresa - os autores dessa narrativa - possuem de
auscultar vários diálogos existentes em sua época, assim como aponta a teoria formatada por
Bakhtin para compreender a fragmentação discursiva em Dostoievski.
Está se falando, portanto, de comunicatividade a partir da subjetividade, ou seja, de
intersubjetividade: em ligações engendradas através das significações relacionadas a arranjos
sígnicos, e que visam, ao fim, convergir para um discurso que amplifique o sentido do texto
centralizador original, no caso específico do exemplo oferecido pela entrevista, a ideia que
embasou a Macrotendência Nice!: o que é legal, o otimismo vigente.
Um outro momento da metodologia utilizada pela WGSN pode ser configurado como
uma grande pesquisa Blue Sky, que visa relacionar exemplos, em formatos diversos, de modo
a gerar estímulos criativos em torno de brief projetual. Os possíveis conceitos ativos e
presentes que advirem dessa prática, ou, das seções de brainstrom anteriores ao processo
122
conforme foi relatado nesse estudo como algo que faz parte do método empregado pela
empresa para a constituão das primeiras noções sobre a configuração de uma tendência
podem servir para a construção dos subtemas, que serão relacionados e orientados à
Macrotendência, possibilitando outros desdobramentos, convergindo, novamente, para o texto
centralizador e o sentido construído a partir desse.
Por fim, os elementos constitutivos de toda essa plataforma de desenvolvimento de
conteúdo, acabam, como já foi colocado, gerando uma narrativa. Essa narrativa permite
relacionar a decomposição das estruturas que serviram para constituir a Macrotendência,
potencializando desdobramentos projetuais para os clientes da empresa conforme a geração de
sentidos engendradas a posteriori. Desse modo, enredos são efetivados cenários e a
atuação de artefatos de design se pela vinculação entre problemas projetuais específicos
(caso das empresas/organizações clientes da WGSN) e as soluções oferecidas por esses
mundos possíveis objetivados pela equipe de profissionais da WGSN.
A inovação de significados, aqui, encontra-se na associação entre as unidades
dialógicas de modo sincrônico, possibilitando a ressignificação do próprio texto centralizador
a perspectiva do que é legal, do otimismo - para a constituição de nculos de mediação
através de um artefato de design de moda, por exemplo, em um tempo posterior ao
lançamento da Macrotendência, portanto, uma leitura anacrônica.
Os exemplos visuais associados ao texto centralizador os exemplos do
desdobramento da ideia fundamental, em diferentes formatos visam, assim, a geração de
estímulos criativos aplicáveis aos mais variados campos de projetação.
Um exemplo dessa perspectiva pode ser oferecido através da interpretação realizada
pelo arquiteto e designer Marcelo Rosenbaum
44
para a Macrotendência Nice!. Durante a
realização do evento de moda o Paulo Fashion Week, ocorrido no s de junho de 2008
(portanto, quando a empresa WGSN começou a disseminar informações relativas a essa
Macrotendência), Rosenbaum mostrou como é possível construir novos sentidos a partir dos
códigos oferecidos para comunicar legal e otimismo. Para tanto, o arquiteto projetou um
lounge: um espaço direcionado ao lazer e confraternização de pessoas que estivessem no
evento. Nesse espaço, foram reunidos vários artefatos de design interiores, principalmente
no intuito de auxiliar as pessoas a compreenderem o que estava sendo comunicado através da
44
Mais informações sobre o trabalho de Rosenbaum podem ser conferidas no endereço eletrônico:
<http://www.rosenbaum.com.br/>.
123
Macrotendência Nice!. Para melhor realizar essa tarefa, foi idealizado um indivíduo, uma
persona, sendo essa uma caracterização que visou a vinculação entre o imaginário do próprio
projetista e as informações oferecidas pela WSGN.
Segundo Rosenbaum:
Imaginamos como mora uma mulher jovem Nice. Ela se apropria de sua casa de um
modo peculiar, personaliza móveis e objetos, como as portas dos armários revestidas
de papel estampado ou as poltronas que ela mesma resolve colorir. Pode trabalhar
em casa e sugere seu jeito de viver em cada detalhe
45
Ilustrações 4 e 5: Imagens dos artefatos utilizados por Rosenbaum para compor o lounge Nice!
Fonte: Disponível em: <http://www.tokstok.com.br/ >.
Partindo-se desse exemplo, é possível compreender que uma tendência visa permitir
desdobramentos projetuais distintos, e que essa dinâmica podeser engendrada conforme a
construção de sentido que cada projetista, empresa ou organização realizar. Retoma-se as
considerações de Foucault a respeito do sujeito responsável pela origem de significações de
um discurso: o autor (FOUCAULT, 2008, p.26).
Nesse sentido, tanto o time de experts da WGSN funcionam como autores textuais,
como os projetistas que irão utilizar as informações a posteriori. A perspectiva de
significações fica, assim, associada a interpretações sobre coisas informadas para retomar
apontamentos tecidos sobre o entendimento de cultura para Flusser (2007). A intenção, tanto
da empresa WGSN, como do arquiteto Rosembaun, é a criação de canais de comunicação
45
Informações coletadas no endereço eletrônico: <http://www.tokstok.com.br/app?page=MostraJeito&service=
page&ps=4,41,53004,53272,53351>
124
entre indivíduos usuários, também tratados como consumidores na perspectiva da empresa
e empresas, organizações, ou projetistas, e isso perpassa pelas trocas em nível simbólico,
engendradas através dos artefatos, visto esses servirem de plataforma para a configuração de
arranjos sígnicos que possibilitam o reconhecimento da ideia que embasou um discurso
(portanto, da unidade dialógica fundamental que permitirá a geração de dlogos entre as
instâncias citadas). Essa dinâmica extrapola a área do design de moda objeto de estudo
desse trabalho operando relações de convergência entre campos de representação simbólica
diversos.
Portanto, a ideia reverbera uma sensibilidade que emerge no campo sociocultural,
permitindo leituras acerca do espírito do tempo que se desenha, independente da área de
geração de cultura que estiver sendo relevada. Essa é uma das formas que a empresa WGSN
encontrou para oferecer a configuração de estratégias de projetação para seus clientes: a
composição de tendências que permitam relacionar o devir cultural a projetos, a partir de uma
sensibilidade que emerge. Essa perspectiva converge para apontamentos oferecidos por
Caldas (2004), que considera o seguinte: “se embasado por valores ou sensibilidades fortes, o
discurso levado pela marca, pela coleção ou por um simples objeto, tomados como sinais, tem
maiores possibilidades de tocar o seu público-alvo e o passar desapercebido” (CALDAS,
2004, p.116).
Viu-se, até momento, como isso é possível realizar essa empreitada na perspectiva de
uma socióloga (Saulquin), para após relacionar os dados levantados por esta na construção da
metodologia empregada por uma empresa (WGSN) que opera comercializando informações
sobre a relação entre sensibilidades que emergem e o devir sociocultural. Em ambos casos, a
intenção é clara: prever é possível e serve como plataforma de desdobramento de estragias
para a projetação de artefatos, sejam de moda, sejam de outras áreas do design. Busca-se,
portanto, demonstrar como artefatos relativos a distintas áreas de representação da
subjetividade podem servir de veículo na construção de diálogos, permitindo a geração de
novos sentidos conforme a associação entre os arranjos sígnicos constitutivos desses. Desse
modo, os códigos conformados relacionam uma ideia unidade dialógica fundamental a
fragmentos textuais, permitindo que projetistas possam constituir novos artefatos, tratando de
organizar os fragmentos textuais de modo a gerar novos sentidos. Nesse caso, chega-se a
perspectiva de uma configuração dialógica: entre projetistas e indivíduos, portanto, o
anunciado público-alvo considerado a partir de Caldas. Esses projetistas podem estar
configurando plataformas projetuais para empresas, organizações ou marcas, partindo dessas
125
narrativas as tendências para comporem suas próprias narrativas outros enredos de
projetação, novamente, cenários. Essa dinâmica possibilita a ressignificação da ideia,
contribuindo para que exista uma instância de reconhecimento entre a sensibilidade emergente
que embasa uma tendência (a unidade dialógica fundamental), e os indivíduos. Os artefatos
projetados são o meio de construir esse reconhecimento, e a ligação que se dá entre indivíduos
e esses contribui para a geração de cadeias de valor que extrapolam o que pode ser
verbalizado, proporcionando formas de configuração de posicionamento de empresas,
organizações e marcas.
Demonstra-se, assim, meios de se constituir a análise construída por Au, que
considera os designers (projetistas) como antropólogos aplicados, visto que buscam traduzir
variáveis subjetivas, relacionadas a um grupo circunscrito a determinados parâmetros
culturais, em objetos, revelando meios de efetivar mediações simbólicas nessa prática
(AUGÈ, 2001, p.110).
3.3 RELAÇÕES ENTRE A METODOLOGIA PROPOSTA E NARRATIVAS
PROJETUAIS PARA ARTEFATOS DE MODA
Viu-se, nos casos anteriores, abordagens que visam disseminar informações a outros
agentes, cada qual correspondendo a períodos distintos de projetação do devir cultural. No
caso de Saulquin, os desdobramentos das Perspectivas Macrossociais se desenvolvem por
períodos longos (avinte anos), e a convergência de acontecimentos socioculturais encontra
nos artefatos mediações que visam comunicar esse olhar amplo. Já no caso da empresa
WGSN, o desenvolvimento de Macrotendências subentende desdobramentos de peodos de
dois anos, e a correlação entre o imaginário coletivo se observa através de diversas
plataformas de geração de cultura, o que permite a construção de um raciocínio analítico que
visa oferecer caminhos de projetação para os clientes da empresa. Em ambos casos, o design
de moda é uma das áreas de atenção, porém, o abrange a totalidade das complexidades
envolvidas nesse campo. Ao menos, não visam a geração de narrativas pontuais para o setor,
sendo o campo da moda um meio de constituir análises que permitam evoluções analíticas a
posteriori.
126
Nesse ínterim, parte-se das considerações tecidas ao final da seção anterior portanto,
da perspectiva de atuação dos designers como antropólogos aplicados no intuito de buscar
construir novas relações entre a metodologia que se está propondo nesse estudo e um outro
exemplo, ligado diretamente a projetação de artefatos de moda. Nessa perspectiva, introduz-se
análises compostas a partir da mesma metodologia de entrevistas aplicadas aos casos
supracitados, realizadas com profissionais ligados a marca de calçados de plástico Melissa. A
escolha dessa marca deveu-se ao fato da mesma possuir uma vasta performance no campo
da moda, contando com uma história de existência de trinta anos. Durante esse período, várias
foram as ressignificações engendradas em torno da própria marca, contribuindo para a
geração de canais contundentes de comunicação entre os artefatos com a alcunha Melissa e o
seu público-alvo (a saber, mulheres de diferentes faixas etárias).
Nesse sentido, as entrevistas visaram a construção de considerações a partir de
aspectos apontados como relevantes por três profissionais que atuam diretamente na
projetação de várias interfaces relacionadas a marca, portanto, o gestor da marca Melissa
Paulo Pedó Filho o designer responsável pela configuração de artefatos para a mesma
Edson Matsuo e o gerente da Galeria Melissa, reconhecidamente, a Flagship Store
46
da
marca Fernando Serrudo.
As entrevistas, efetivadas entre os meses de novembro de 2008 e junho de 2009, foram
realizadas no intuito de relacionar vários aspectos levantados por esse estudo à existência de
uma metodologia própria da marca para a identificação de sinais emergentes de transformação
no meio sociocultural, convergindo na interrelação desses pressupostos aos lançamentos de
artefatos Melissa, engendrados a cada novo ciclo de estações (portanto, as coleções ofertadas
no mercado). Nesse sentido, busca-se, também, a constituição de interconexões entre esses
apontamentos e as considerações tecidas a partir de Saulquin, Pinho e Bisker, no intuito de
evidenciar os cruzamentos metodológicos que possam existir entre os casos a agora
analisados.
De modo a construir essas conexões, elegeu-se os questionamentos mais pertinentes,
bem como, as respostas efetuadas para contemplá-los. Um dos questionamentos realizados diz
respeito quanto ao aspecto da temporalidade, portanto, qual a antecedência que vigora no
46
O termo Flagship Store é utilizado, correntemente, para caracterizar as chamadas lojas conceituais de uma
determinada marca, portanto, os espaços onde são construídos universos que visam relacionar orientações
relativas a marca e seus artefatos. São, portanto, espaços onde a exposição de “[...] um mix de pensamento,
atitude, informação, decoração, arquitetura e até mesmo lazer”, conforme informações retiradas do blog dbstudio
(<http://dbstudio.blogspot.com/2007/08/lojas-conceituais.html>).
127
engendramento de dinâmicas de procura por referenciais de interpretação para a projetação de
artefatos da marca. A resposta, concedida tanto por Pe Filho, quanto por Matsuo,
corroborou a existência de um período relativo a praticamente um ano antes do lançamento de
uma colão, contando o mesmo do momento presente (presente relativo ao início de um
novo projeto), até o lançamento de novos artefatos, ou seja, correspondendo a perspectiva de
construção de uma dinâmica anacrônica de relações, entre os pressupostos de orientação a
projetação e a objetivação dos mesmos em artefatos.
47
Nesse contexto, encontra-se paralelo com considerações tecidas anteriormente tanto
por Saulquin, quanto por Pinho e Bisker. Diga-se, a questão de previsão do devir cultural é
uma tarefa que se realiza a partir de leituras sincrônicas, entretanto, a dinâmica de efetivação
dessa perspectiva se constitui de modo anacrônico, engendrando plataformas relacionais que
visam cumprir práticas helicoidais de configuração de sentido, algo previsto a partir da
utilização da intertextualidade como conceito ativo para a constituição de tendências.
Nesse ínterim, considera-se, novamente, que é possível prever desdobramentos
projetuais futuros a partir da relencia de aspectos operantes, considerados por Saulquin,
Pinho e Bisker, como acontecimentos (fenômenos) vigentes.
No intuito de compreender as etapas processuais que subsidiam a efetivação de um
novo projeto, questionou-se acerca de uma possível metodologia de identificação de
referenciais para a projetação de artefatos utilizou-se a palavra referenciais apenas como um
correlato a fragmentos textuais (ou, unidades dialógicas), contribuindo para a compreensão
mais pontual, para os entrevistados, do que se configuram como sinais na perspectiva dessa
investigação. Esse questionamento buscou também relacionar as instâncias internas e
externas, ou seja, como os envolvidos na projetação de artefatos para a marca operam para
construir relações entre fragmentos textuais, portanto, se existe a perspectiva de utilização de
observações contextuais e como as mesmas interferem na composição de um arsenal sígnico
que embase a concepção de novos produtos.
Segundo o gestor da marca, essa metodologia, basicamente, opera da seguinte forma:
47
As respostas de Pedó e Matsuo estão reproduzida em sua integridade, conforme degravações realizadas após a
entrevista: [...] Por exemplo, uma coleção, nove meses antes da coleção a gente tem definido qual vai ser o tema
desta coleção [...]. (Resposta dada por Pedó quanto a relação temporal de definição de referenciais de orientação
para uma nova coleção).
[...] Põe aí, a gente tem um padrão de nove a onze meses... Mas isso é um processo de estudo preliminar, só que
não começa do zero. O estudo votem na cabeça, isto é um processo que tem um estudo preliminar para
projetar [...]. (Resposta dada por Matsuo quanto a relação temporal de definição de referenciais de orientação
para uma nova coleção).
128
A gente tem uma metodologia Melissa. Que se apóia... tem alguns birôs que
trabalham para a gente, e tem o trabalho interno que é basicamente que dá o tom, o
ritmo das coisas. Por exemplo, uma coleção, nove meses antes da coleção a gente
tem definido qual vai ser o tema desta coleção. Este tema é definido por viagens,
informações de revistas, birôs, enfim, um emaranhado de informações que acabam
virando um tema específico.
48
Segundo Matsuo, a configuração desse processo acontece da seguinte forma:
[...] Mas antes tem reunião de curadoria, tem reunião do grupo criativo, tem... Olha
eu não tenho isto escrito, mas é mais do que onze meses. E é contínuo, porque você
estuda uma coleção, fala da outra, então é um processo muito informal sem muito...
Senta o grupo, discute, passa, é uma coisa muito mais leve, do quê... Tem
compromisso, [...] Datas, mas tem isso, o grupo se junta, fala, as idéias, então é
um grupo criativo. [...] O briefing é construído, não é alguém dita o briefing e
acabou.
49
Em ambas respostas, percebe-se uma aproximação com alguns apontamentos
relevados em outros momentos dessa investigação. Ressalta-se, pois, a perspectiva de
realização de seções de discussões entre os envolvidos no processo de projetação,
convergindo para um dos fatores relativos a efetivação da pesquisa Blue Sky. Existe apenas
um deslocamento de operação, ou seja, em relação a pesquisa Blue Sky as discussões entre os
projetistas visam encontrar novos caminhos para a solução de um briefing projetual, sendo
que no todo operante para a marca Melissa essas discussões, segundo os entrevistados, visa
a construção de um brief, ou, segundo Pedó Filho, de um tema específico. Porém, ainda
buscando compreender como é possível construir relações entre a ferramenta Blue Sky e a
metodologia da marca, percebe-se uma convergência: o tema específico.
quanto à converncia da intertextualidade, embasada na perspectiva do
dialogismo, percebe-se que a constituição de relações entre informações diversas, coletadas
em diferentes ambientes, permite a configuração de um tema específico (utilizando-se, aqui,
as considerações oferecidas por Pedó Filho quanto ao questionamento). Esse tema pode,
portanto, ser considerado a unidade dialógica fundamental de projetação de uma nova
coleção, possibilitando que sejam efetivadas interrelações entre fragmentos textuais
convergentes, ou seja, entre as informações relevadas e a configuração de aspectos sígnicos
relativos aos artefatos futuros. Essa dinâmica, assim, potencializa o reconhecimento da ideia
através da mediação simbólica efetivada pelos artefatos lançados, periodicamente, pela marca.
Portanto, caracterizam-se como plataformas de ligação entre a subjetividade de vários
agentes, operando trocas em nível simbólico quando da efetivação dessa prática.
48
A resposta de Pedó Filho está reproduzida em sua integridade, conforme degravações realizadas após a
entrevista.
49
A resposta de Matsuo está reproduzida em sua integridade, conforme degravações realizadas após a entrevista.
129
Busca-se, para tanto, embasamento nas considerações tecidas por Augè, quanto a
perspectiva do design como forma de relacionar artefatos e cultura:
Teniendo en cuenta que los efectos del diseño son efectos de masa, éstos crean unos
universos que, en aparência, se asemejam a lo que los antropólogos tienen por
costumbre estudiar. Me refiro a universos culturales. La cultura, dentro de un
contexto etnográfico clásico [...] es antes todo cosmología, una suma de
representaciones transmitida de generación en generación y portadoras de la génesis
y la orgnización del mundo y de la sociedad. [...] Pero una cultura en ación también
es una cultura abierta abierta a las iniciativas de los creadores individuales y a los
encuentros con el exterior una cultura en movimiento (AUGÈ, 2001, p. 104-
105).
50
Nesse sentido, para que seja possível haver a articulação de aspectos culturais
operantes em artefatos de design portanto, para que se dê a mediação simbólica entre
indivíduos (usuários) e artefatos a correspondência entre a unidade dialógica fundamental e
acontecimentos operantes no contexto social (fenômenos) parece iminente. O reconhecimento
dessa perspectiva pode se dar, como já foi amplamente argumentado nesse estudo, por
arranjos sígnicos, correspondendo a decomposições de códigos fragmentos em contextos de
geração de cultura (novamente, contextos concretos e não-concretos de fruição). A percepção
dessas estruturas de geração de significados esses códigos que visam substituir fenômenos
permite a composição de narrativas, ligando fragmentos textuais em torno de um texto
centralizador, que detenha o comando do sentido (o tema específico), e que permita a geração
de novos sentidos conforme a interferência de outros interlocutores autores, ou, na visão da
Augè, criadores individuais. Pois, conforme Foucault (2008), esses atuarão como unidade e
origem das significações de um discurso, buscando a coerência de articulações estruturais
para engendrar tal tarefa (FOUCAULT, 2008, p.26).
Desse modo, retoma-se a perspectiva de que, para efetivar a tarefa de identificação de
uma ideia uma unidade dialógica fundamental, uma sensibilidade emergente, o ânima que
flui entre indivíduos a observação de instâncias presentes no meio social, que contemplem
trocas simbólicas, embasadas em formalizações representativas, mostra-se relevante.
Quanto a buscar outros meios de entendimento dessa premissa, procurou-se questionar
onde os referenciais de interpretação, que embasam a constituição de uma temática de
projetação para os artefatos da marca Melissa, eram procurados.
50
A tradução de Augé é livre, ou seja, da autora: Tendo em conta que os efeitos do design são efeitos da massa,
estes criam uns universos que, em aparência, se assemelham ao que os antropólogos tem por costume estudar.
Me refiro a universos culturais. [...] A cultura, dentro de um contexto etnográfico clássico, é antes de tudo
cosmologia, uma soma de representações transmitidas de geração a geração e portadora de gênesis e da
organização do mundo. Porém, uma cultura em ação é também uma cultura aberta aberta às iniciativas dos
criadores individuais e aos encontros com o exterior uma cultura em movimento.
130
Nesse sentido, Pedó Filho argumentou que isso se no ambiente urbano (na rua), e
que essa busca se inicia um ano antes do lançamento de uma nova coleção. A tarefa é
engendrada por profissionais de distintas áreas de projetação da marca, e visa buscar
informações em lugares considerados diferentes.
51
Essa prática encontra eco nas considerações do sociólogo Dario Caldas (2004 e 1999),
quanto a importância de monitoramento de vetores de emissão de sinais, algo já anteriormente
considerado nesse estudo. Pode-se, assim, concluir que a busca por informações em lugares
considerados diferentes visa o estabelecimento de raciocínios a partir de sinais emitidos por
esses ambientes, sendo esses também considerados espaços de geração de cultura.
Imediatamente, foi questionado se isso estava associado a uma gica de cool hunter,
que, segundo Massonnier (2008) pode ser traduzido, literalmente, como os caçadores do que
está na moda. (MASSONNIER, 2008, p.22).
Segundo o gestor da marca:
Tipo um cool hunter. isso volta, coloca tudo isso mais referência de tema, do que
de produto, coloca tudo isso no liquidificador, e transforma isso numa coisa nova,
por exemplo, Secret Garden... Love Robots, era tecnologia humanizada, tinha toda
uma questão falando de robôs, na época tinha Eu robô, tinha um filme, o
Inteligência Artificial tinha toda esta questão da tecnologia fofa que a gente colocou
no tema Love Robots.
52
Vale, nesse momento, compreender melhor o que vem a ser um cool hunter:
Son personas que se dedican profisionalmente a detectar en todo el mundo cuáles
son las vanguardias, qué usa la gente en la calle, cómo van evolucioando las
preferências. Un verdadero cool hunter está atento a los libros que se leen, las
películas que resultan s atractivas, los heróes de la pantalla, la moda, los titulares
de la prensa y la evolución de los liderazgos políticos. Debe estar atento al mundo en
un sentido integral, a sus matices, a los indicadores sutiles antes de que se
transformen en realidades apabullantes (MASSONNIER, 2008, p. 22-23).
53
51
A resposta de Pedó Filho está reproduzida em sua integridade, conforme degravações realizadas após a
entrevista: É na rua. Tem uma pessoa a Raquel que é coordenadora de marketing, o que significa isso? Tem duas
pessoas, uma de comunicação e uma de produto trabalhando com ela, nesta sala de marketing. Ela junto com o
DPD, um ano antes, começa a viagem internacional... Não é para pegar referências do que está acontecendo na
loja, e transforma num novo produto. Mas sim buscar input na rua, nos lugares strange ...
52
A resposta de Pedó Filho está reproduzida em sua integridade, conforme degravações realizadas após a
entrevista.
53
A tradução de Massonnier é livre, ou seja, da autora: São pessoas que se dedicam profissionalmente a detectar
em todo o mundo quais são as vanguardas, o que as pessoas estão usando nas ruas, como evoluem as
preferências. Um verdadeiro cool hunter está atento aos livros que se lêem, às películas que são mais atrativas,
aos heróis das telas, à moda, aos titulares da imprensa e a evolução das lideranças políticas. Deve estar atento ao
mundo em sentido integral, a suas matizes, aos indicadores sutis antes que se transformem em realidades
esmagadoras.
131
O que se percebe, é que a perspectiva de observação de plataformas de trocas
simbólicas alia-se a percepção, no processo de semiose cultural, de quais os arranjos sígnicos
e as significações que estão sendo constituídas, permitindo a identificação de digos que
estejam comunicando acontecimentos relevantes no meio social. Portanto, quais plataformas
sígnicas estão sendo articuladas para dar conta do atual estágio do imaginário coletivo. Nesse
sentido, as relações que se engendram entre os artefatos constituídos para tangibilizar esse
estado subjetivo no caso, as duas obras cinematográficas citadas pelo entrevistado: Eu Ro
e A.I. Inteligência Artificial
54
servem para exemplificar como é possível relacionar a
observação de campos de cultura material e a constituição de tendências (narrativas) para a
projetação de artefatos de moda.
O que se potencializa na construção dessas relações é a identificação dos fragmentos
textuais que visam desdobrar a unidade dialógica fundamental para a constituição tanto nas
obras cinematográficas, como dos artefatos da marca. Essa empresa se estabelece, portanto, a
partir da identificação do teor comunicacional contido nessas plataformas de mediação os
filmes citados e a construção de interconexões com o devir cultural. Observa-se contextos
de geração de cultura para compreender potenciais desdobramentos de uma ideia.
Engendrando essa dinâmica, foi possível decodificar os arranjos sígnicos que visavam
construir significações a partir da ideia (unidade dialógica fundamental), que aqui se apresenta
como tecnologia amigável, sendo representada, primeiramente e de maneira distinta, em
ambas obras cinematográficas. A identificação dessa unidade dialógica nessas plataformas de
mediação simbólica permitiu a geração de uma narrativa que proporcionou o desdobramento
projetual de uma determinada coleção da marca Melissa Love Robots laada no ano de
2005.
55
Investigando a geração de sentido constituída para permitir esse desdobramento
tangível, é possível perceber a convergência com outros sinais, outras roupagens, da mesma
idéia (tecnologia amigável), e novas pontes podem ser estabelecidas a partir da análise do
pensamento formalizado por Pierre Lévy, em algumas de suas obras. Em suas análises, Lévy
aponta para formas de construção de mediações emocionais através de plataformas
54
O filme Eu, Robô, lançado em 2004, é baseado na obra de ficção científica de Isaac Asimov. A direção do
filme é de Alex Proyas. o filme A.I. Inteligência Artificial, foi lançado no ano de 2001, e apresenta a
perspectiva de desenvolvimento de emoções em protótipos robóticos. O filme circunscreve-se nas categorias de
aventura e ficção científica, e a direção é de Steven Spielberg.
55
É lançada a coleção Melissa Love Robots na SPFW de janeiro como forma de abordar a questão da
tecnologia humanizada.”reprodução de texto encontrado no site: <http://www.melissa.com.br/tudomelissa/
index.php?secao=historico_ano>.
132
tecnológicas, chagando a abordar a Inteligência Artificial como um meio de construção de
uma cultura coletiva, embasada na perspectiva de desenvolvimento de um hípercorpo, por
exemplo.
56
Estabelecendo uma leitura de modo anacrônico, visto que nem os filmes, nem as obras
literárias de Lévy e, tampouco, a coleção Melissa Love Robots foram objetivados no mesmo
período, ou, no mesmo ano, pode-se considerar que a unidade dialógica fundamental
tecnologia amigável se estabelece como uma sensibilidade que emerge do meio social, tendo
nos artefatos (os filmes, os livros e a própria coleção de calçados), meios de efetuar trocas
entre uma vertente do estado do imaginário coletivo contemporâneo e indivíduos.
Portanto, ao construírem uma colão de calçados que visava materializar esse
pressuposto anímico, os projetistas da marca Melissa estabeleceram vínculos de
reconhecimento entre os indivíduos e um aspecto subjetivo latente, uma sensibilidade,
tangibilizando questões relativas a necessidades latentes através dos artefatos, ou seja,
cumprindo o princípio de configurar imports simbólicos nos objetos, como diria Bourdieu
(1996).
A geração de novos sentidos, a partir do desdobramento da ideia (tecnologia
amigável) permitiu a criação de canais de comunicação em nível o-verbal, estabelecendo
diálogos entre o presente (relativo ao lançamento da coleção Love Robots) e o devir cultural.
Considera-se, nesse caso, como novos sentidos os significados configurados a partir dos
arranjos sígnicos constitutivos dos artefatos, sendo as significões geradas uma forma de
estabelecimento de ligações subjetivas, ou seja, um meio de reconhecimento da inter-
subjetividade, permitindo ressignificações conforme a interpretação de diferentes
interlocutores (nesse caso, tanto os projetistas da marca, quanto os próprios usrios).
São várias instâncias de gerações de sentido e, mais que isso, o várias formas de
vivenciar os sentidos, sendo o artefato o calçado de plástico um meio de cumprir esse
desígnio.
Vivenciam-se os sentidos através dos artefatos, que funcionam como forma de
vincular diálogos por entre digos e através, permitindo a geração de narrativas tanto para
desdobramentos projetuais, como para interpretações individuais de uma mesma ideia.
56
Os apontamentos construídos para introduzir a análise sobre o pensamento formalizado de Pierre Lévy
baseiam-se nos livros: O que é o Virtual (Ed. 34, 1999), A Máquina Universo (Ed. Artmed, 1998) e As
Tecnologias da Inteligência (Ed. 34, 2004).
133
Percebe-se, novamente, a aproximação com aspectos relevantes anteriormente argumentados
a partir de Saulquin, ou seja, da importância de efetivar decomposições de acontecimentos,
para voltar a compor estruturas que busquem o sentido íntimo relativo aos mesmos.
Quando questionado sobre como isso poderia ser construído através do design
portanto, da projetação de artefatos de marca Matsuo argumentou o seguinte:
O produto é o suporte. O que fica para ti é a experiência, o valor.[...] O conceito de
desmaterialização que é você não ver um produto como maria, mas como
experiência.[...] O simbolismo está nisto que fica, é a experiência... Na história que
você cria, e a história que fica contigo. Com a pessoa, você pode criar, ou a história
que você está criando com a pessoa, que é esta que tem mais valor.
57
Entretanto, a forma de observação de instâncias de geração de cultura presentes no
meio social, efetivada pelos projetistas da marca, também busca identificar potenciais
parceiros para a elaboração de novos artefatos, baseando essa premissa na convergência de
aspectos latentes relacionados a vários campos de emissão de sinais de transformações
operantes. Dois exemplos podem ser citados nessa perspectiva: a coleção Create yourself e a
parceria efetivada com a arquiteta Zaha Hadid.
No primeiro caso, a relação partiu da construção de um tema específico, para as
buscar a inclusão do usrio no processo de projetação de novos artefatos. Novamente, a
constituição de uma narrativa projetual partiu da decodificação de certos fragmentos textuais
específicos, permitindo a geração de novos sentidos conforme a interpretação desses
fragmentos por vários interlocutores. Uma dinâmica horizontal de trocas sígnicas, estimulada
pela própria marca, foi operada, corroborando a perspectiva de disseminação de códigos entre
pares, convergindo para os pressupostos de orientação do efeito Trickle Across (ou, peer-to-
peer), relevado como importante na contemporaneidade, a partir de considerações oferecidas
por Barros e Moraes (2006) e Manzini (2007).
Segundo Pedó Filho, a sistemática de construção da coleção Create yourself se deu da
seguinte forma:
Foi uma coisa assim. Naquele processo de criação que a gente define o tema o que a
gente estava vendo no cenário internacional. A volta do punk muito forte, da
linguagem punk muito forte. E junto com esta coisa do punk, a do rock. O que era o
punk? O punk eram quatro amigos que se reuniram numa garagem e ninguém sabia
tocar nada e eles queriam produzir alguma coisa. Então eles produziam música de
colagem. Muito básica. Então era essa a idéia da história do punk. Vo mesmo gera
seu conteúdo. Do it yourself [...]. Chegando neste tema Do it yourself o que a gente
pensou, estava começando a explodir esta coisa de blogs, e fotologs e estava
começando a se criar algumas personalidades virtuais. Celebridades virtuais. Estas
57
A resposta de Matsuo está reproduzida em sua integridade, conforme degravações realizadas após a entrevista.
134
celebridades virtuais, elas não apareciam na Caras, mas elas tinham setenta mil hits
por semana. Era um absurdo o que estas meninas tinham de fluxo de usuários no site
delas. O que a gente pensou? Vamos fazer uma campanha, onde quem cria esta
campanha são as próprias consumidoras. Além de criar a campanha, elas o
participar da estratégia e vão criar produtos dentro da Melissa, e elas tem que ser...
Tem que funcionar como grandes divulgadoras deste projeto como um todo. Aí
nasceu o Create yourself, a gente escolheu estas quatro meninas levando em
considerão primeiro geografia, uma é do sul, uma do Rio, outra de São Paulo, e
uma do nordeste, de Pernambuco acho que ela é... Dentre estas meninas... Isso tudo
foi pesquisa na internet, orkut, fotologs delas, a gente escolheu a Marimoom, que
acabou virando DJ, parece. Esta foi a mais marcante delas. A campanha era assim,
cada uma fez o seu anúncio, claro que tinha alguns limites que elas poderiam
montar, até limites técnicos, para poderem fazer o anúncio. E o último anúncio era
uma gina em branco onde as meninas que estavam vendo a campanha, poderiam
criar o seu anúncio com alguns adesivos que a gente tinha no site, e enviar para a
Melissa [...] era um concurso... E o anúncio era veiculado na Capricho. É essa mais
ou menos a história do Create yourself, baseada na coisa do punk [...].
58
Portanto, a observação de várias instâncias relativas ao processo de semiose cultural
permitiu a identificação, novamente, de uma unidade dialógica fundamental: Do it yourself,
que, em uma tradução literal para o português, significa faça você mesmo. Nesse contexto, as
linguagens vinculadas ao punk, percebidas quando da busca por novos referenciais de
projetação, serviram como meio de identificação de uma potencial sensibilidade emergente no
campo social. Ou seja, a ideia Do it yourself embasou a geração de um enredo,
estruturando os fragmentos textuais decompostos a a constituição do tema específico:
Create yourself. Toda a plataforma projetual gerada a partir da unidade dialógica fundamental
(a sensibilidade) convergiu para o desdobramento de interpretações do faça você mesmo,
resultando na materialização da ideia, tanto nos calçados correspondentes à coleção Create
yourself (lançada em 2007), como em outras interfaces projetuais. Além disso, a inclusão do
usuário no processo de criação dos artefatos acabou reverberando o princípio de promover
interações horizontais como foi anunciado em capítulo anterior potencializando a
configuração de bricoulers projetuais.
Nesse contexto, o exemplo também corrobora a premissa de observação de contextos
não-concretos (virtuais) de geração de cultura, como importantes meios de identificação de
sinais convergentes na constituição de tendências para a projetação de artefatos de moda. No
caso citado, essa observação foi realizada no sentido de associar a emergência de formas de
trocas entre indivíduos à ideia que permitiu o desenvolvimento da narrativa projetual da
coleção. Essa observação foi realizada em ambientes virtuais de estabelecimento de trocas
entre indivíduos blogs, fotologs, Orkut, etc. servindo como exemplo de como é possível
58
A resposta de Pedó Filho está reproduzida em sua integridade, conforme degravações realizadas após a
entrevista.
135
operar identificações de fragmentos textuais a partir da utilização da netnografia como
ferramenta de observação. Recupera-se a perspectiva de que tendências se constituem como
formas de estruturar sinais emitidos em várias esferas culturais, e que essas buscam dar conta
de veicular aspectos comportamentais latentes, sendo essa uma forma de identificação do
espírito do tempo que se desenha. A inclusão do usrio no processo de projetação, portanto,
reverbera princípios ativos de desdobramentos de conteúdos via meios digitais de
configuração e disseminação, ptica conhecida como WEB 2.0.
Sobre essa perspectiva, Matsuo argumentou que a coleção Create yourself buscou
trazer o usrio para dentro do processo de projetação de uma nova coleção de modo a buscar
outras formas de criação colaborativa, deslocando um princípio pertencente ao universo da
tecnologia para a concepção de interfaces projetuais diversificadas.
59
O outro exemplo citado acima, a parceria efetivada com a arquiteta Zaha Hadid,
corresponde a uma dinâmica recorrente à marca, que é a criação colaborativa. Nesse caso,
não foi elaborada uma colão, mas sim um artefato espefico: um calçado que partiu da
criação da arquiteta, e se materializou através da constituição de colaborações entre vários
projetistas da marca.
No sentido de compreender melhor essa prática, foi questionada a existência de uma
intenção deliberada em transgredir o contexto moda e renovar linguagens de projetação a
partir da associação com outros domínios de desenvolvimento criativo. A reposta ao
questionamento corroborou esse raciocínio e permitiu o entendimento do que levou os
projetistas da marca a buscarem o estabelecimento de uma parceria com Hadid. Segundo
Matsuo: [...] Aliás, este projeto foi muito desafiante, porque o seguinte: fazer prédio acho
que é até relativamente a um calçado, tem lá as suas dificuldades. Mas o problema é quando a
gente faz um prédio que você enfia o pé, e quem coloca reclama se não dá certo...”
60
Sobre a perspectiva de trabalhar essas relações entre disciplinas distintas algo
também inerente ao escopo trico relativo ao Design Estratégico, que prevê a construção de
soluções projetuais através de dinâmicas constantes de trocas entre conhecimentos Pedó
Filho argumentou o seguinte:
59
A resposta de Matsuo está reproduzida em sua integridade, conforme degravações realizadas após a entrevista:
Isto é um conceito de web 2.0. [...] A gente está trazendo coisas de computador para a operação. Então esta
diversidade é muito importante. [...] Isto faz a diferença. Então isso aqui é importante. E outra coisa, esta
questão, eu acho que você precisa identificar. Mas o melhor é você criar junto.
60
A resposta de Matsuo está reproduzida em sua integridade, conforme degravações realizadas após a entrevista.
136
É isto que a gente faz quando a gente está fazendo alguma curadoria de design.
Então a gente não pegou Zaha Hadid gratuitamente. Ela foi escolhida primeiro
porque a primeira mulher, isto é outra coisa importante neste trabalho, acaba sendo
uma ruptura, ela traz o feminino para a arquitetura. É a primeira mulher a ganhar o
prêmio equivalente ao Prêmio Nobel de arquitetura. O trabalho dela vai ficar muito
forte daqui a cinco anos, porque os prédios estão comando agora. Então daqui
cinco anos ela deve ter uns dez, doze prédios, no mundo. É uma mulher que está
redesenhando o futuro. É uma soma de valores, que não tem muito a ver se é de
moda, se é um estilista, ou se é um artista plástico, um designer, um arquiteto [...].
61
O que o entrevistado considera como “traz o feminino para a arquitetura”, em uma
análise mais detalhada, está relacionado às linhas conceituais que subsidiam o trabalho
arquitetônico de Hadid, baseado no princípio do desconstrutivismo, que acaba, através da
interpretação da arquiteta, assumindo uma formalização que pode ser traduzida como
orgânica. Mas, o que se percebe, em ambas respostas, é que, além das possíveis dificuldades
em transformar um prédio em um calçado de plástico, a observação do processo de semiose
cultural acaba permitindo a identificação de um projetista que busca traduzir um preceito
simbólico pertinente, que, no caso da Hadid, converge para a orientação trica da
desconstrução.
Segundo Matteo Zambelli (2007), a desconstrução teorização relativa ao filósofo
francês Jacques Derrida (1930 2004) permitiu o desenvolvimento do raciocínio
desconstrutivista na arquitetura, sendo esse cunhado a partir do ano de 1988. Para Zambelli,
ambos termos refletem aspectos relacionados ao espírito do tempo presente portanto, a
sensibilidades que emergem do contexto sociocultural. Para Derrida, a desconstrução parte da
subversão dos sistemas instituídos, gerando meios de desvelar discursos instituídos através da
decomposição das camadas de sentido que os constituem. Essa perspectiva converge para a
multiplicidade de significados que podem ser associados a uma forma, uma estrutura.
Portanto, as estruturas não são estáticas, assim como a forma de construção e interpretação de
discursos e sentidos também não o é. A arquitetura desconstrutivista busca aplicar esse
princípio em projetos, partindo da subvero das estruturas esveis, gerando uma
“deformação” que não é, senão, um outro modo de representar a multiplicidade que fala
Derrida. Assim, o geometrismo impuro, resultante de um projeto desconstrutivista, visa
refletir a inquietação frente a padrões estáveis de constituição de sistemas convergindo para
os discursos e suas camadas de sentido. Desse modo, o desconstrutivismo, enquanto estilo
arquitetônico, busca questionar o universo determinado e constante, trazendo, para o projeto,
61
A resposta de Pedó Filho está reproduzida em sua integridade, conforme degravações realizadas após a
entrevista.
137
o imprevisível (a deformação). O resultado acaba viabilizando uma visão similar a um
organismo, permanentemente em ação e transformação (ZAMBELLI, 2007, p. 11-28).
Portanto, a unidade dialógica que embasa a arquitetura desconstrutivista é a
desconstrução, e o sentido dessa ideia é a subversão dos sistemas, em nome da multiplicidade
de sentidos portanto, da diversidade operante de linguagens e de significações. Assim, ao
efetivar a parceria projetual com Hadid, objetivou-se a constituição de vínculos relacionais
com essa sensibilidade emergente a subversão dos sistemas e o artefato projetado pela
arquiteta para a marca. Novamente, trocas em nível simbólico se efetivaram, sendo os
arranjos sígnicos conformados no caado Melissa + Zaha Hadid um meio de formalizar
subjetividades relativas a indivíduos que se vêem envolvidos por esse ânima (a
desconstrução). Essa perspectiva demonstra-se como um pertinente meio de incorporação de
imports simbólicos em artefatos de design de moda: o reconhecimento de subjetividades que
acabam reverberando em algo que está sendo constituído no presente e que pode proporcionar
desdobramentos de novos sentidos no futuro, possibilitando através de associações sígnicas
o entendimento do devir cultural que se desenha. A antecipação dessa perspectiva, a
constituição de narrativas que possibilitem essa prática, propiciam a elaboração de estratégias
que visam posicionar empresas, organizações e marcas. O import simbólico, portanto, se
configura como a potencial interpretação da unidade dialógica fundamental identificada a
partir da observação de várias insncias de geração de cultura, e a correlação entre essa e os
fragmentos textuais convergentes, permite a geração de estratégias em vários níveis.
Sabe-se que, ao efetivar tal tarefa, o reconhecimento dos pressupostos subjetivos será
restrito a poucos indivíduos, visto os mesmos compreenderem de modo subliminar a
mensagem que está sendo articulada a partir de um determinado fragmento textual (um
artefato de representação simbólica circunscrito a qualquer área que busque tangibilizar a
subjetividade, como a arquitetura, por exemplo). Entretanto, a geração de sentidos que
advirem desse processo - as inovações de significados que serão construídas - acabam por
cumprir o que Bourdieu (1996) considerou como algo relevante ao mercado de bens
simbólicos: marcar época é, inseparavelmente, fazer existir uma nova posição para além das
proposições estabelecidas, na dianteira dessas posições, na vanguarda e, introduzindo a
diferença, produzir o tempo (BOURDIEU, 1996, p.181).
Recupera-se, a partir dessa argumentação, o potencial estratégico da metodologia que
está sendo constituída nessa investigação: a compreensão de que sensibilidades emergentes
138
podem desenhar o futuro e, sendo assim, contribuir para a criação de vínculos entre arranjos
sígnicos articulados em artefatos de design (de moda, no caso específico desse estudo), as
empresas/organizações e os indivíduos. A geração de sentidos esimplicada nesse processo,
através de plataformas de mediação projetual que busquem associar as sensibilidades
emergentes identificadas no processo de semiose cultural (as unidades dialógicas
fundamental), fragmentos textuais convergentes (portanto, outras instâncias que comuniquem
a mesma ideia, de modo sincrônico ou anacrônico) e as relações desdobradas no meio social
(os acontecimentos e suas interferências no processo de construção de significados).
Novamente, se esconsiderando que tendências se constituem, e que podem ser configuradas
como narrativas, intentando promover desenvolvimentos projetuais para artefatos de moda:
cenários que lidem com a complexidade de modo a estruturar soluções que levem à futuras
atuações de artefatos, envolvendo questões relativas a macro e microambientes. Se está,
assim, privilegiando uma lógica de posicionamento mercadológico, ou seja, que contribua
para a introdução da diferença através de artefatos de design de moda, produzindo o tempo na
dianteira das posições.
Convergindo com essa argumentação, ressalta-se a forma como Matsuo entende essa
busca por parceiros que possam contribuir para o desdobramento de novas sensibilidades a
partir da projetação de artefatos para a marca: a Melissa é praticamente uma curadoria, mas
não é uma curadoria, a gente é simplesmente uma facilitadora de intervenções, para tirar
aquela visão só de um lado, ou da moda, ou de alguma coisa.
62
Vale considerar que, na opinião do gestor da marca Melissa, a parceria com a arquiteta
visa, justamente, corroborar a perspectiva de marcar época a partir da reconfiguração das
linguagens representativas do trabalho de Hadid (como foi argumentado, o
desconstrutivismo), deslocando essas linguagens para a concepção de calçados de plástico.
Aos construir relações entre esses preceitos e as orientações que permeiam a concepção de
carros conceito (concepts cars), o entrevistado deixou claras as inteões do projeto com a
arquiteta: o estabelecimento de um novo paradigma mercadológico para o setor, entendendo
que isso acabará sendo compreendido apenas por uma parcela de indivíduos (usrios), mas
que essa perspectiva contribui para a configuração de um posicionamento de destaque.
63
62
A resposta de Matsuo está reproduzida em sua integridade, conforme degravações realizadas após a entrevista.
63
A resposta de Pedó Filho está reproduzida em sua integridade, conforme degravações realizadas após a
entrevista: Quando a gente começou o projeto com ela, a idéia foi comprar uma obra de arte. Então a gente
comprou esta obra de arte, e isso funcionou como divulgão. Então se ela não vender muito, não é o grande
139
Entende-se, pois, que essas migrações de linguagens de outros campos representativos
auxiliam na projeção da marca, estabelecendo outros meios de compreender como podem
operar os shifters elípticos, considerados a partir de Barthes (1967), em seção anterior desse
estudo. Para dimensionar essa perspectiva com relação à percepção do usuário portanto,
para compreender como se podem estabelecer canais de comunicação não verbal entre
usuários (indivíduos) e artefatos buscou-se questionar ao gerente da Galeria Melissa,
Fernando Serrudo, como os consumidores que freqüentam a loja se comportam frente a
produtos com um apelo simbólico inerente (caso da Melissa + Zaha Hadid). Nesse contexto,
buscou-se entender se isso se tornava perceptível em termos de comercialização, ou seja, se é
possível quantificar essa geração de valor através dos artefatos, que também pode ser
considerada como agregação subjetiva:
Eu não acho que seja tanto pela venda, porque ok., a gente faz um sapato
maravilhoso, ele é um Campana, tá, vende horrores. Mas tem um ponto que as
pessoas, puxa é um Campana!
64
[...]. É interessante então a gente conhecer mais a
fundo, porque isto tem realmente a informão para a pessoa. [...] Agrega porque
tem muito uma resposta da pessoa chegar perguntando eu quero o fulano, eu quero
isso. Então tu vês que às vezes chega assim, eu quero aquela da estilista inglesa. A
pessoa não sabe o nome, mas sabe que é uma estilista inglesa, tem isso. O que eu
digo é conhecer mais a fundo, mais abrangente de uma forma interessante. Aque
ponto no interior da Bahia a pessoa viu, puxa Zaha! Vou entrar no google, sabe,
isto que eu acho interessante saber se realmente acontece. Aqui realmente a gente
sabe que acontece.
65
A resposta dada por Serrudo considera também a apropriação de conhecimento dos
profissionais que atuam no local, visto ser importante disponibilizar informações relativas,
não apenas aos artefatos que estão sendo oferecidos no local, mas também dos parceiros
criativos e de suas linhas conceituais de trabalho. Nesse sentido, percebe-se que existe uma
dimensão de reconhecimento dos potenciais simbólicos gerados a partir dos artefatos, ainda
que essa insncia o seja de total conhecimento do indivíduo que adquire um objeto da
marca. Ora, nota-se, assim, desdobramentos de recepção e interpretação da idéia vinculada
aos artefatos. Desse modo, mostra-se pertinente a perspectiva de diálogos entre vozes-
consciências na identificação do simbolismo inerente a um artefato de design de moda,
corroborando apontamentos oferecidos pelo dialogismo bakhtiniano: [...] materializado na
negócio dela. O objetivo deste projeto com ela é estar na frente, mostrar conceito. É mais ou menos como
concept car. A indústria automobilística cria carros pra daqui a 20 anos, mas são conceitos hoje. A Zaha é um
pouco isso, é um conceito que dá para usar. Uma parte da população vai usar.
64
Serrudo, nesse momento, se referiu a parcerias efetivadas entre a marca e os Irmãos Campana, que são dois
designers brasileiros com trabalham principalmente com mobiliário, tendo suas expostas em alguns museus
internacionais de design. A dupla de designers se destaca pela utilizão de materiais ordinários, compondo
arranjos que desvinculam os mesmos de suas funções primordiais.
65
A resposta de Serrudo está reproduzida em sua integridade, conforme degravações realizadas após a entrevista.
140
voz dos outros, ou seja, na consciência dos outros [...]. É no ponto desse contato entre vozes-
consciências que nasce e vive a ideia (BAKHTIN, 2008, p.98).
Portanto, a premissa de reconhecimento de subjetividades, constituídas pelos
indivíduos, se opera em nível imaginário, construindo relações com as argumentações tecidas
anteriormente a partir de Zambelli (2007), que considera o desconstrutivismo como um
desdobramento dos princípios da desconstrução formulados por Derrida, e que ambos termos
refletem o espírito do tempo presente, portanto, um sentido latente no meio sociocultural. Ou
seja, como foi argumentado em seção anterior a partir de considerações de Verganti et. al
(2006), é a instância de significação que relaciona necessidades emocionais e socioculturais,
sendo esse pressuposto algo que é percebido pelos usuários. A sensibilidade que emerge dos
indivíduos, e de suas relações no meio sociocultural, assim, se materializa em linguagens
representativas, ressignificando-se conforme a atuação de interlocutores no processo.
Retoma-se a prerrogativa de que sensibilidades ligam-se a necessidades latentes, e que
os artefatos de design de moda podem devolver interpretações dessas aos usuários.
Compreender isso pode estar além da competência dos usrios, porém, não pode passar
desapercebido de quem visa projetar narrativas projetuais carregadas de sentido, independente
da área do design que esteja sendo relevada.
Ilustração 6: Imagem de um projeto arquitetônicoi de Hadid: Performing
Arts Centre de Saadiyat Island nos Emirados Árabes.
Fonte: Disponível em: <http://www.dezeen.com/2007/01/31/more-images-
of-hadids-emirates-centre/>.
141
Ilustração 7: Imagem do calçado de plástico desenvolvido pela marca Melissa em parceria com Hadid.
Fonte: Disponível em: <http://lookmelissa.wordpress.com/2009/12/28/retrospectiva-2009/>.
Considera-se, pois, que a observação de aspectos simbólicos inerentes a áreas de
formalização arte, cinema, arquitetura, sica, literatura, etc. possibilitam o
reconhecimento de sensibilidades emergentes no meio social (de ideias, do ânima que flui por
entre as relações, de unidades dialógicas fundamentais), demonstrando meios de cumprir os
desígnios que fundamentaram o dialogismo de Bakhtin (2004), permitindo o desdobramento
da intertextualidade como conceito ativo, e, no caso específico desse estudo, como ferramenta
constitutiva da metodologia que se propõe nesse trabalho. Auscultar os diálogos operantes
mostra-se, assim, uma forma de construir interconexões entre vozes-consciências,
relacionando essas a fenômenos vigentes (acontecimentos), que são substituídos por códigos
(arranjos sígnicos). Essa prática permite a identificação de sinais, independente da instância
de emissão dos mesmos. A leitura desses sinais leva à decomposição das estruturas, algo
muitas vezes apontado por Saulquin como fundamental para a constituição de tendências,
proporcionando novos meios de ligação entre a unidade dialógica fundamental (a ideia) e os
fragmentos textuais convergentes (outros códigos que visam comunicar a mesma ideia). A
convergência comunicacional entre as estruturas pode ser estabelecida de modo sincrônico ou
anacrônico, gerando novos sentidos conforme a construção de relações entre a unidade
dialógica fundamental e o conjunto. As ressignificações engendradas por essas plataformas
142
projetuais o conjunto, a nova composição; portanto, a tendência, a narrativa permite a
interferência de novos interlocutores (projetistas) no processo, que desdobrarão estratégias a
partir de categorizações efetuadas a posteriori (a temática advinda desse processo). Essa
dinâmica visa a criação de mundos possíveis de atuação de artefatos, privilegiando a
configuração de caminhos que permitam a projetação de objetos carregados de significações,
potencializando o apenas a geração de sentido, mas a vivência desses para os indivíduos a
quem os artefatos estão destinados. Novamente, outras significações são articuladas, ligando
usuários e arranjos sígnicos conformados em artefatos, permitindo também a interferência
desses no processo, senão de modo participativo, de modo interpretativo (os usrios também
são autores, analisando a questão sob esse prisma). O vínculo entre todas essas instâncias é o
import simbólico, e a posterior geração de cadeias de valor entre empresas, organizações,
marcas e usuários é o reconhecimento dessa variante subjetiva através dos artefatos.
As argumentações tecidas até o momento visam apontar caminhos para a problemática
geradora dessa investigação, sendo a formalização de um modelo metodológico (que o seja
estanque, mas, que permita visualizar o funcionamento das etapas estruturantes propostas), a
culminância de todas as análises feitas a partir dos exemplos vinculados ao estudo. Esses
exemplos repercutem formatos ativos segundo a visão de uma socióloga Saulquin - que
trabalha com Perspectivas Macrossociais, orientando esse raciocínio para a projetação de
artefatos relativos a distintas áreas, tendo o campo da moda como potencial motriz de análise
de transformações vigentes no contexto social. Como já foi visto anteriormente, para Saulquin
o campo da moda funciona como meio de compreensão de aspectos socioculturais latentes.
Nesse sentido, relacionou-se o funcionamento das ferramentas constitutivas do método que se
propõe com as considerações oferecidas por Saulquin, buscando construir interconexões entre
a metodologia utilizada pela socióloga e as orientações funcionais do escopo ferramental
proposto nessa investigação. O trabalho de Saulquin visa a identificação de sinais a partir de
acontecimentos, que servem de modo a gerar categorias relacionais, no intuito de prever
desdobramentos do devir cultural de modo amplo (por isso, Perspectivas Macrossociais).
Outro exemplo verificado buscou as mesmas constatações a partir da metodologia de
configuração de Macrotendências utilizada pela empresa WGSN. Viu-se, assim, que a moda
também se mostra como um campo importante para a construção de alises que visem a
geração de informações sobre tendências de ciclo longo de atuação, prevendo, segundo relatos
oferecidos por Pinho e Bisker, o desdobramento de dois anos para cada plataforma relacional
(a saber, para cada Macrotendência constituída pela equipe de profissionais da empresa
143
implicada no processo de materializar percepções emergentes). Buscou-se, am disso,
realizar cruzamentos entre o escopo ferramental constituinte desse estudo e a metodologia
objetivada por Saulquin, de modo a oferecer novos e maiores subsídios para a convergência
de argumentações a respeito de formas de construir no presente uma visão de
desenvolvimento do devir cultural.
O terceiro exemplo procurou relacionar esses pressupostos com as orientações
projetuais de uma marca que atua no campo da moda: Melissa. Viu-se, assim, que a premissa
de observação do processo de semiose cultural permite a constituição de narrativas projetuais
específicas, e que essa relação acaba também reverberando o apenas o construto
metodológico proposto nessa investigação, mas vários apontamentos construídos ao longo
desse estudo, servindo como meio de vincular argumentações rumo a possíveis sínteses
analíticas. Nesse sentido, pode-se considerar que tendências servem como enredos de
projetação, articulados de modo a criar vínculos entre subjetividades latentes e coleções
lançadas no mercado de modo sazonal. Portanto, tendências são narrativas projetuais.
Nos três casos foi possível argumentar que a perspectiva de identificação de
sensibilidades emergentes potencializa a geração de novos sentidos, privilegiando a
configuração de interrelações entre ideias, fenômenos de transformações operantes no meio
sociocultural (acontecimentos) e representações simbólicas, de modo a criar plataformas que
estabeleçam diálogos entre unidades dialógicas fundamentais (a ideia) e fragmentos textuais
convergentes. A resultante desse processo, a narrativa (a tendência), busca dar subsídios para
a projetação de artefatos com inerente import simbólico, e, no tocante a essa investigação, a
artefatos de design de moda.
Objetivou-se a construção de questionamentos acerca das interconexões entre macro e
microambientes, chegando a relevar a importância do próprio indivíduo no processo de
configuração de sinais que visem comunicar transformações, convergindo para apontamentos
oferecidos por Massonnier (2008), para quem o todo está em cada um de s, sendo que essa
forma de construir relações pode levar a importantes constatações quanto aos fenômenos de
transformação vigentes na sociedade (MASSONNIER, 2008, p. 19).
Porém, essa investigação ainda se mostra carente no tocante a verificar a interferência
de coletivos urbanos específicos, micro ambientes relacionais tribos urbanas no processo
de constituição de tendências para a projetação de artefatos de moda. Retoma-se, para tanto,
as argumentações relevantes de Penn e Zalesne (2007), que consideram que “nas atuais
144
sociedades de massa, basta que 1% dos indivíduos façam uma escolha contrária à maioria
para criar um movimento que pode mudar o mundo” (PENN; ZALESNE, 2007, p.17).
A próxima seção dessa investigação buscará apresentar meios de constituir relações
entre a metodologia proposta nesse estudo e a eminência de microambientes de geração de
cultura.
3.4 RELAÇÕES ENTRE A METODOLOGIA PROPOSTA E MICROAMBIENTES DE
MERCADO
Partindo do pressuposto que é possível identificar sinais convergentes de
transformações operantes no meio social através da cultura material, portanto, de artefatos que
visam materializar uma ideia correspondentes a áreas de representação simbólica como arte,
arquitetura, música, literatura, cinema, dentre outras busca-se a inclusão de um último
exemplo, como forma de oferecer novos subsídios para a constituão do modelo de
funcionamento da metodologia proposta nesse estudo. O exemplo também visa relacionar
questões relativas a micro e macro ambientes, permitindo o desdobramento de questões
relativas a identificações de sinais a partir do processo de semiose cultural, que pode se dar
tanto através de linguagens institucionalizadas pelo sistema, como de linguagens que estejam
emergindo à margem deste.
Para tanto, parte-se da análise de um material específico, elaborado para o portal de
pesquisa de moda Usefahion. O portal um site de internet busca a elaborão de conteúdos
a partir de vários segmentos relativos ao campo da moda, oferecendo informações sobre moda
e suas vertentes contemponeas para empresas de portes diferenciados. As informações são
construídas por distintos profissionais, intitulados consultores, visando a disseminação dessas
(as informações) em plataformas que possam auxiliar os clientes da empresa na projetação de
artefatos de moda.
66
Dentre os conteúdos vinculados ao portal, situa-se a construção de raciocínio analítico
sobre Tribos Urbanas, sendo que, periodicamente, um coletivo específico urbano relevante é
investigado. A investigação desses coletivos visa demonstrar a importância dos mesmos no
66
Mais informações sobre os conteúdos e informações do portal Usefashion podem obtidas pelo endereço
eletrônico: <http://www.usefashion.com/Categorias/Home.aspx>.
145
presente, oferecendo subsídios para a compreensão do teor de influência que micro ambientes
relacionais possuem na contemporaneidade. Nesse sentido, as análises oferecidas também
funcionam como plataforma de estruturação de fragmentos textuais, permitindo que os
clientes da empresa objetivem suas próprias interpretações, vinculando-as em futuros projetos
de moda.
Para realizar a análise proposta nessa investigação, inclui-se o conteúdo de Tribos
Urbanas vinculado ao portal Usefashion no mês de outubro de 2009, que apresentou
considerações sobre um coletivo urbano emergente, intitulado Vinileiros. A análise sobre a
tribo, configurada pelas consultoras do portal de pesquisa de moda Usefashion, Paula Visoná
e Ana Bender, partiu da visualização de um documentário (ainda inédito em meios
midiáticos) produzido por João Pedro dos Santos Fleck, sendo esse trabalho vinculado à
pesquisa acadêmica realizada por Fleck (sua dissertação de mestrado), ainda sem previsão de
publicação. No documentário, Fleck mostra o fenômeno de venda de vinis para indivíduos de
distintas faixas etárias, buscando compreender a relevância desse comportamento de consumo
nos dias atuais. Para tanto, foram realizadas entrevistas com diferentes indivíduos, que
apresentaram suas impressões e predileções no tocante ao ato de consumir discos em vinil.
Ilustração 8: Imagem de abertura do documentário produzido por Fleck, inédito em
plataformas de disseminação de conteúdos visuais.
Fonte: da autora
Relacionando as análises oferecidas no documentário, as consultoras do portal
Usefashion buscaram construir o perfil de estilo de um emergente vinileiro, constituindo
conexões de modo sincrônico e anacrônico para tal. Nesse sentido, procuraram relacionar
informações atuais, oferecidas em sites, blogs e comunidades sociais, de modo a encontrar
subsídios para a configuração analítica de referenciais que pudessem proporcionar o
146
entendimento do vínculo de ligação entre indivíduos que se identificam com esse
comportamento de consumo na atualidade. Para tanto, partiram de apontamentos oferecidos
por Fleck em seu estudo, que considerou que o vínculo de ligação entre indivíduos
reconhecidamente vinileiros é o sentimento de nostalgia, sendo o artefato (disco de vinil) o
modo de materializar esse sentido latente.
67
Desse modo, foram relevadas questões acerca do crescente consumo desse artefato por
uma parcela populacional que o teve contato com o mesmo de modo efetivo. Essa parcela,
conhecida como geração IPod, é responsável, atualmente, pela re-introdução de discos de
vinil no mercado musical, e, segundo dados constituintes da análise construída pelas
consultoras, esse fator se deve a quatro fatores centrais:
1- O produto está envolto em uma aura retrô, que é muito atraente ao olhar jovem;
2- A qualidade sonora é superior à do mp3 com o qual estão acostumados;
3- A qualidade gráfica e dos encartes que acompanham os discos é impactante;
4- O disco de vinil é mais propício a ser ouvido em conjunto com os amigos.
68
Nessa perspectiva, partiu-se para a identificação da unidade dialógica fundamental
para a constituição do discurso vinileiros. Esse pressuposto visa o entendimento dos vínculos
simbólicos entre os indivíduos que se identificam com esse comportamento de consumo e a
geração de uma narrativa que dê conta de associar fragmentos textuais convergentes para a
projetação de artefatos de moda. Analisando tanto as considerações construídas por Fleck,
como do cruzamento de informações relacionados pelas consultoras, pode-se considerar que o
ponto que relaciona os indivíduos caracterizados como vinileiros é a nostalgia, corroborada
pela perspectiva de uma aura retrô em torno do artefato e suas interfaces, como os elementos
gráficos relativos aos encartes dos discos.
Nesse contexto, busca-se compreender melhor o que vem a potencializar essa unidade
dialógica a nostalgia e como ela pode operar como texto centralizador para a construção
de interconees com outros fragmentos textuais relevantes para a configuração de um estilo
representativo, uma estética que tangibilize pressupostos relacionais desse coletivo específico.
Segundo Holbrok e Schindler (2003), a nostalgia pode ser entendida como uma
preferência, uma forma geral de gostar que se traduz em uma atitude positiva ou em um efeito
favovel relativo a objetos pessoas, lugares ou coisas mais comuns em outros períodos
67
Conforme informações relacionadas no endereço eletrônico: <http://www.usefashion.com/TribosUrbanas/
vinileiros.aspx>.
68
Conforme informações relacionadas no endereço eletrônico: <http://www.usefashion.com/TribosUrbanas/
vinileiros.aspx>.
147
(juventude, adolescência ou infância e, em alguns casos, até mesmo antes do nascimento do
indivíduo que diz possuir nostalgia) (HOLBROK; SCHINDLER, 2003, p.330).
Nesse ínterim, pode-se considerar que a nostalgia funciona como sensibilidade
emergente entre os indivíduos que desenvolvem esse comportamento de consumo, sendo que
essa ideia (a nostalgia) acaba funcionando como forma de produzir transformações no
conjunto, sobre a decomposição de estruturas e a geração de novos sentidos de acordo com a
perspectiva proposta por Barthes (1996). O artefato em si o disco de vinil funciona como
mediador entre subjetividades, possibilitando a geração de novos sentidos a partir das
percepções engendradas por indivíduos que não se relacionaram com o objeto em outros
períodos.
Para estruturar um raciocínio que permita a composição de uma narrativa, as
consultoras buscaram subsídios em informações relativas ao período de maior consumo de
discos de vinil na sociedade ocidental. Nesse contexto, foi identificado que o ano de 1977
serviu para a superação de vendas do artefato, e que os estilos musicais mais comercializados
correspondiam a punk, disco e rock. Esses estilos, no ano em questão, caracterizavam os tipos
de músicas concebidas por alguns grupos e artistas, podendo citar, dentre esses, Sex Pistols,
ABBA, Donna Summer e Queen, dentre outros.
69
Ilustração 9: Imagens das capas dos discos de grupos e artistas relacionados aos estilos musicais acima citados
Fonte: Disponível em: <http://www.usefashion.com/TribosUrbanas/vinileiros.aspx>.
Aqui tem-se subsídios para construir relações intertextuais: o texto centralizador foi
identificado a nostalgia e os fragmentos textuais convergentes relativos aos estilos
musicais predominantes no ano de 1977 punk, disco e rock permitem uma leitura que
69
Conforme informações relacionadas no endereço eletrônico: <http://www.usefashion.com/TribosUrbanas/
vinileiros.aspx>.
148
interligue períodos passado e presente potencializando a constituão de um estética
correspondente a um emergente vinileiro. A dinâmica anacrônica potencializa a identificação
de outros sinais, permitindo uma disposição sincrônica de códigos que visem oferecer
subsídios para novas codificações a composição de um estilo representativo visual da tribo,
ou estilos.
Nessa perspectiva, os estilos musicais elencados funcionam como categorias,
permitindo a busca por imagens que visem compor um vinileiro contemporâneo. Para tanto,
as consultoras relacionaram imagens oriundas de várias plataformas de disseminação de
arranjos sígnicos constituintes do campo da moda, como standes de feiras internacionais, uso
nas ruas, vitrines de pontos de venda de várias partes do mundo e desfiles
70
. Todas essas
imagens visam apresentar exemplos que correspondam às interpretações atuais sobre formas
de representação circunscritas aos estilos musicais anteriormente relacionados, permitindo a
amplificação do discurso construído a partir do texto centralizador e, também, demonstrando
caminhos para o entendimento da estética assumida por emergentes vinileiros.
70
Conforme informações relacionadas no endereço eletrônico: <http://www.usefashion.com/TribosUrbanas/
vinileiros.aspx>.
149
Ilustração 10: Imagens vinculadas às plataformas acima relacionadas.
Fonte: Disponível em: <http://www.usefashion.com/TribosUrbanas/vinileiros.aspx>.
Nota-se, pois, a utilização, primeiramente da intertextualidade, partindo do dialogismo
para após constituir uma leitura linear ligando sincrônico e anacrônico. Cumprida essa etapa,
portanto, identificadas a unidade dialógica fundamental e os fragmentos textuais
convergentes, as consultoras realizaram uma ampla busca de imagens, de modo a constituir
parâmetros de construção para os pressupostos estéticos assumidos por vinileiros
contemporâneos. Nesse ínterim, foi realizada uma pesquisa Blue Sky, sendo que as imagens
selecionadas potencialmente correspondem aos estilos musicais identificados, que funcionam
como categorias relacionais. Entretanto, antes de efetuar essa modalidade de pesquisa, as
consultoras do portal Usefashion buscaram compreender melhor como poderia ser a estética
de um vinileiro, engendrando observações de contextos o-concretos de trocas simbólicas
comunidades sociais presentes no ambiente digital. Esses ambientes proporcionaram novos
caminhos para a geração de vínculos entre as categorias relacionais (os estilos musicais) e a
busca por exemplos representativos. Alguns desses ambientes de trocas simbólicas eso
citados no final da composição do trabalho.
150
Figuras icônicas do cenário artístico mundial atual também foram incluídas no escopo
do material elaborado, de modo a configurar paralelos entre os fragmentos textuais
identificados como convergentes à ideia central da narrativa (a nostalgia) e as imagens
representativas de distintas áreas do campo da moda. Essa figuras icônicas também acabam
servindo como vínculo de mediação entre os indivíduos contemporâneos que se identificam
com o consumo emergente de discos de vinil, proporcionando o reconhecimento do texto
centralizador a partir dos arranjos sígnicos utilizados para compor suas representações
estéticas.
Recupera-se, nesse momento, a perspectiva apontada por Mafesolli (2002) como
forma de agregação de indivíduos, para quem a constituição de elementos estéticos visa
proporcionar meios de reconhecimento de aspectos subjetivos, associando indivíduos em
torno de uma estruturação imagética que vincule ligações inconscientes, potencializados pela
idealização de uma persona coletiva, que serve de vínculo agregador entre vontades latentes,
oferecendo novas formas de reconhecimento de convivências sociais (MAFESOLLI, 2002, p.
1001-142 ).
Nesse sentido, foram identificadas as cantoras Lady Gaga e Karen O (Karen
Orzoleck) como figuras icônicas que servem de referência para a visualização de certos
pressupostos de agregação de potenciais vinileiros contemporâneos. Essas personas coletivas
foram identificadas após observações participantes realizadas em ambientes virtuais, sendo as
mesmas citadas por vários indivíduos que se relacionam nesses ambientes. Essas observações
privilegiaram a relevância de dados e informações a partir de mensagens e posts de indivíduos
que se relacionam aos aspectos centrais da identificada geração Ipod que consome vinil, ou
seja, jovens que o se relacionaram com o artefato vinil em outros momentos de suas vidas,
até o presente.
Duas figuras centrais podem ser consideradas uma espécie de síntese para a Geração
iPod que ama vinil: Lady Gaga e Karen O (Karen Orzolek), vocalista da banda
YeahYeahYeahs. Ambas personificam essa mistura entre punk, rock e disco nas
suas formas de constituírem suas “personas artísticas”. No caso da
YeahYeahYeahs, o próprio som elaborado é considerado retrô, misturando rock e
punk a batidas eletrônicas. Lady Gaga está mais para o disco, mas seria uma lástima
deixá-la de lado, visto que possui vários requisitos que contribuem para sua inserção
no universo imagético da tribo.
71
71
Conforme informações relacionadas no endereço eletrônico: <http://www.usefashion.com/TribosUrbanas/
vinileiros.aspx>.
151
Ilustração 11: Imagens das figuras icônicas acima citadas.
Fonte: Disponível em: <http://www.usefashion.com/TribosUrbanas/vinileiros.aspx>
Além desses elementos de composição, as consultoras buscaram a inserção de um
breve histórico sobre a evolução da instria fonogfica, proporcionando outros elementos
de compreensão do atual interesse pelo consumo de discos de vinil. Nesse momento, também
incluíram informações relativas a uma gravadora alemã a Optimal‟s Records que não
deixou de produzir o artefato desde sua fundação, em 1982; e informações sobre a reabertura
de uma importante fábrica de vinis brasileira, que retomou a fabricação do artefato em
meados de 2009, devido ao reaquecimento do mercado direcionado ao item.
72
Ilustração 12: Imagens da gravadora Optimal‟s Records
Fonte: Disponível em: <http://www.usefashion.com/TribosUrbanas/vinileiros.aspx>
Têm-se, assim, a configuração da narrativa intitulada vinileiros. Percebe-se que os
vínculos utilizados para relacionar os elementos constitutivos dessa narrativa permitem a
compreensão do atual estágio do imaginário coletivo de um determinado número de
indivíduos, que se relacionam um pressuposto anímico a partir de um artefato, portanto,
vivenciam uma sensibilidade atras da cultura material. Esse imaginário é permeado pela
emergência da nostalgia, e essa unidade dialógica serve para criar interconexões com
72
Conforme informações relacionadas no endereço eletrônico: <http://www.usefashion.com/TribosUrbanas/
vinileiros.aspx>.
152
fragmentos textuais de modo sincrônico e anacrônico, gerando um cruzamento de sentidos
que permite a composição de novos significados: a geração IPod que ama vinil. As
ressignificações engendradas a partir dos estilos musicais elencados como importantes na
época de maior comercialização do artefato 1977 constituem a base para a compreensão
dos preceitos estéticos que ligam os indivíduos identificados a partir do comportamento de
consumo de discos de vinil, servindo também como fragmentos textuais convergentes para a
constituição da narrativa, visando revelar a estética assumida na atualidade por um micro
ambiente de mercado emergente. Essa perspectiva se desdobra no meio sociocultural,
utilizando plataformas concretas e não-concretas para vincular artefatos e percepções. Essa
dinâmica faculta a configuração de figuras icônicas que acabam servindo como mediação para
novos desdobramentos subjetivos: personas coletivas. O artefato (o disco de vinil) torna-se,
assim, nculo de trocas em nível simbólico para um determinado micro ambiente relacional,
potencializando o desenvolvimento de novas interfaces comportamentais, configuradas em
áreas de representação simbólicas específicas (nesse caso, a música). A estruturação dessas
informações refletem a vivência de uma sensibilidade atual (a nostalgia), subsidiada pelo ato
de consumir discos de vinil, sendo que essa temática possibilitou a criação de um
documentário ainda inédito em circuitos de visualização - portanto, de uma outra plataforma
de representação, que proporcionou as noções iniciais do teor de emergência de uma
necessidade latente identificada. Nesse contexto, as observações partiram de dois aportes
materiais: o disco de vinil em si, e o documentário objetivado por Fleck. Nesse último caso,
têm-se a importância de constituir observações a partir da cultura material para a configuração
de narrativas projetuais (tendências): as informações disponibilizadas no documentário
viabilizaram a busca por outros elementos representativos relevantes para a constituição da
possível estética assumida por um determinado coletivo emergente.
Para oferecer caminhos projetuais aos clientes da empresa de comercialização de
informações de moda, o portal Usefashion, foram selecionadas imagens que vinculassem as
categorias específicas (os estilos musicais mais relevantes no ano de 1977) de modo
anacrônico e sincrônico, oferecendo meios de potencializar insights criativos rumo a
constituição de uma estética de agregação entre indivíduos uma premente tribo urbana.
Essa estruturação permitiu o reconhecimento de um mundo possível de projetação de artefatos
de moda um cenário facilitando o reconhecimento de códigos que poderão ser
decodificados por projetistas e, assim, gerar novos arranjos sígnicos com inerente import
153
simbólico (nesse caso, a perspectiva da nostalgia associada às estéticas construídas a partir
dos estilos musicais pertinentes). Essa dinâmica visa ligar artefatos de moda a subjetividades
latentes, relacionadas, em primeira insncia, a um coletivo específico urbano.
A premissa de compreensão dos elementos constitutivos dessa narrativa possibilitou o
entendimento não apenas do atual esgio imaginário de uma tribo urbana relevada, mas
também o devir cultural veiculado a esse micro ambiente relacional. Esse raciocínio se
embasa na perspectiva de futuros desdobramentos da indústria de discos de vinil, direcionada
tanto aos colecionadores do artefato, como a uma geração que se vê envolta pelo ânima da
nostalgia: a geração IPod.
A influência, portanto, da tribo Vinileiros na projetação de futuros artefatos de moda
mostra-se pertinente, e os elementos estruturados na narrativa de mesmo nome portanto, na
ligação entre os sinais que permitiram a constituição dessa tendência podem proporcionar
formas de posicionamento a empresas, organizações e marcas, permitindo que artefatos com
inerente import simbólico ( a nostalgia e seus desdobramentos estéticos conforme o
entendimento desses indivíduos), criem canais de diálogos que extrapolem o micro ambiente
relacional em si. Essa perspectiva visa ressignificar fragmentos textuais distintos,
contribuindo para a geração de novos sentidos conforme a interpretação e amplificação do
texto centralizador que embasa esse comportamento. Inova-se o significado dessa unidade
dialógica fundamental (a nostalgia), auscultada no meio de tantos outros diálogos existentes, a
partir de arranjos sígnicos constituintes em artefatos de design.
Apresentam-se, assim, formas de desdobrar os desígnios apontados por Au (2002),
quando de suas considerações sobre as três obrigações dos objetos, destacando-se, a preceito
desse estudo, a obrigação cultural dos mesmos, sendo essa a instância que permite ao designer
jogar mais ou menos com os costumes e tradições relacionadas ao consumidor (AUGÉ, 2002,
p. 104).
Para engendrar a tarefa de constituição da narrativa Vinileiros, foi elaborado um
protocolo de observação. O mesmo partiu da fundamentação teórica oferecida por Holbrock e
Schindler (2003), relativa ao entendimento da unidade dialógica fundamental identificada,
portanto, a nostalgia. Nesse sentido, o protocolo de observação foi constituído no intuito de
relacionar macro e micro ambientes relacional e mercadológico possibilitando a busca por
subsídios e elementos que contribuíssem para a configuração da estética assumida por
emergente vinileiro. Esse protocolo, constitdo por questionamentos fundamentais, serviu
154
para efetivar um exercício netnográfico de coleta de dados e, nesse sentido, inclui-se o mesmo
no escopo desse estudo:
- Qual o ano em que o artefato vinil foi lançado?
- Qual o ano em que o artefato vinil teve Record de vendas no mercado ocidental?
- Quais foram os álbuns mais vendidos nesse peodo?
- Quais eram os estilos musicais mais populares no mesmo período?
- Quais as características estéticas dos artistas e bandas populares nesse período?
- Como a geração Ipod reconhece o artefato vinil hoje?
- Como os artistas e bandas contemponeos estão se relacionando com o emergente
comportamento de consumo de discos de vinil?
Finalizadas essas considerações, busca-se apresentar, de modo sucinto, a proposição
do modelo de funcionamento da metodologia de constituição de tendências que se pretende
nesse estudo.
1 - Observação de plataformas de representação simbólica, de modo a identificar, a
partir de arranjos sígnicos constituintes de artefatos, a eminência de fenômenos operantes de
transformação na atualidade. Essa prática leva à decomposição dessas estruturas, de modo a
perceber o teor de comunicabilidade entre as mesmas. Essa observação pode ser efetuada em
contextos concretos ou não-concretos de fruição, estimulando a análise de aspectos subjetivos
através de métodos como etnografia ou netnografia. Essa empresa visa a percepção de
vínculos simbólicos entre artefatos, acontecimentos operantes (fenômenos) e indivíduos,
potencializando ligações entre subjetividades materializadas em arranjos sígnicos que visam a
geração de significados conforme dinâmicas interpretativas efetivadas. Fala-se, pois, de
observar várias áreas de representação simbólica, de modo a identificar o atual estágio
imagético através do processo de semiose cultural. Nessa perspectiva, entende-se que esses
pressupostos levem ao entendimento de potenciais sensibilidades emergentes, construindo
relações entre essas e necessidades latentes fragmentadas no meio sociocultural,
possibilitando o reconhecimento da ideia que funciona como ligação entre diversas instâncias.
Está-se tratando de cultura material, portanto, inclui-se modalidades de observação
como música, artes, arquitetura, cinema, arquitetura e mídias (visuais, impressas e digitais).
Citou-se, anteriormente, a inclusão dos todos de etnografia e netnografia no escopo
ferramental dessa investigação, por entender que é possível construir relações convergentes
155
em ambientes de fruição, independente do contexto no qual essa prática se desdobra. Nesse
sentido, também incluem-se ambientes que podem se caracterizar como espaços de
confraternização de indivíduos, por exemplo, plataformas relacionais existentes no ambiente
virtual, como blogs, comunidades sociais digitais, micro blogs, dentre outras.
2 - Intertextualidade: considera-se que os artefatos são textos arranjos discursivos
portanto, estruturas que podem ser decompostas. A decomposição dessas estruturas visa a
identificação da unidade dialógica fundamental que serve de vínculo primordial para a
constituição de ligações entre fragmentos textuais ( a ideia que funciona como ligação entre
várias instâncias). Nesse sentido, a intertextualidade visa a configuração do texto
centralizador, que deterá o comando do sentido da narrativa que se construirá a partir de
novas composições dialógicas: alterações efetivadas no conjunto. Nesse contexto, se es
considerando que os artefatos servem como veículos de mediação simbólica entre indivíduos,
e que essa se efetiva de modo a permitir trocas entre instâncias, potencializando leituras tanto
sincrônicas, quanto anacrônica. Essa prática visa a ligação entre a unidade dialógica
fundamental (novamente, a ideia, a sensibilidade emergente) e fragmentos textuais
convergentes, sendo esses entendidos dessa forma devido ao grau de comunicabilidade
relacional entre os mesmos e a ideia. Nesse sentido, sinais derivam de textos diversos, e as
transformações engendradas a partir dessa dinâmica permitirão a composição de novos
sentidos, possibilitando a interferência de interlocutores no processo (primeiro, os projetistas,
depois, os usuários). Compreende-se, pois, que a ideia é o ânima que flui (a sensibilidade
emergente) por entre relações desdobradas no contexto sociocultural, e que a formalização
desse pressuposto anímico fala sobre o próprio indivíduo, ou seja, de seus desejos e
necessidades latentes.
Entende-se que esse pressuposto de estruturação a ligação entre a unidade dialógica
fundamental e os fragmentos textuais convergentes permite o desdobramento de estratégias
projetuais, permitindo que o devir cultural possa ser constituído a partir da prática de
cruzamento entre leituras sincrônicas e anacrônicas, potencializando dinâmicas helicoidais de
geração de sentido.
3 - Pesquisa Blue Sky: a ligação entre a unidade dialógica fundamental e os
fragmentos textuais convergentes pode levar à configuração de categorizações, que servem
como meio de subsidiar a busca por novos estímulos criativos aos envolvidos no processo de
projetação de artefatos de design de moda. Esses esmulos podem corresponder a imagens,
156
servindo como novos vínculos representativos da ideia identificada. Discussões e seções de
brainstorm podem ser realizadas antes da busca por esses esmulos (imagens), permitindo a
procura por elementos convergentes a partir de raciocínios laterais, evidenciando a
configuração de caracterizações estéticas presentes em distintas áreas de representação de
subjetividades, relevantes à constituição de um cenário de projetação de artefatos de moda. A
efetivação da pesquisa Blue Sky visa, assim, a relevância de mais elementos narrativos,
proporcionando caminhos para a geração de raciocínios tanto analíticos, quanto metaricos
aos projetistas.
4 - Cenários: partindo da perspectiva de que o contexto atual é caracterizado por
complexidades, e que as mesmas podem ser estruturadas de modo a permitir vislumbrar
caminhos projetuais, inclui-se cenários como ferramenta no escopo metodológica dessa
investigação. Entende-se sua aproximação com uma narrativa, portanto, convencionou-se
cha-la dessa forma. Nesse contexto, um cenário se caracteriza como um enredo, embasado
na perspectiva de atuão futura de artefatos. Portanto, cenários podem ser entendidos como
uma narrativa que visa proporcionar sentido à problemática geradora de um projeto de moda,
propiciando caminhos que buscam desdobrar novas interpretações, conforme a interferência
dos projetistas nesse processo. Se es considerando que tendências, no contexto
contemporâneo, são narrativas, e que as mesmas o constituídas de modo a ligar fragmentos
textuais aptos a desdobrarem estragias, conforme orientações de empresas, organizações e
marcas que atuem no campo. Nesse contexto, se está argumentando que o devir cultural é
projetável, e que pode ser embasado pela capacidade de decompor e recompor estruturas, e
que a alteração no conjunto (no sentido) visa o desenvolvimento de artefatos de design de
moda com inerente import simbólico, portanto, com inerente vínculos de ligação entre
usuários, suas necessidades latentes e sensibilidades emergentes no contexto sociocultural.
Essa prática busca desdobrar formas de comunicabilidade o-verbal, que potencialmente
desdobrarão cadeias de valor em vel de significados, permitindo o reconhecimento do atual
estágio do imaginário coletivo a partir de características constituintes em artefatos. Essas
características podem ser entendidas como arranjos sígnicos, que serão desdobradas em
futuros artefatos de design de moda, conforme interpretações engendradas por projetistas a
partir dessas plataformas de configuração de estratégias projetuais, portanto, a partir de
tendências.
157
4 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Conclui-se que tendências o constituídas a partir de sinais configurados em diversas
plataformas de comunicação de subjetividades latentes, relativas aos indivíduos e suas
relações desenvolvidas no meio sociocultural. O trabalho de organização entre os sinais
entre os signos e seus potenciais significados pode produzir novos sentidos, dependendo da
forma como os mesmos serão postos em relação. Essa prática se estabelece a partir da
percepção da comunicabilidade que está sendo construída entre os sinais, e essa premissa
envolve um pressuposto de arbitrariedade inerente ao processo.
Essa arbitrariedade nasce da interpretação empregada por aqueles que atuam como
autores dessas estruturas de convergência, as tendências. Nesse sentido, resgata-se dois
enunciados de Foucault (2006 e 1988) relacionados ao tema da arbitrariedade no discurso: que
os autores são aqueles que proporcionam os nós de coerência aos discursos, e de que os
fragmentos discursivos estão aptos a desdobramentos de estratégias diversas. Portanto, ligam-
se autores e estratégias, e a antecipação do devir, frente à multiplicidade (ou, frente à
polifonia de vozes, conforme Bakhtin, 2008), é uma empresa que se opera a partir de recortes
da realidade, reforçando a arbitrariedade inerente ao processo.
Essas postulações levam a afirmar que artefatos e acontecimentos operantes no meio
sociocultural conversam entre si: comunicam relações entre indiduos e suas necessidades
latentes através de signos de-signam algo, são marcas destinadas a representar o teor
anímico relacional. Assim, perceber o fundamento do que está sendo comunicado, e o para
que disso, é o viés que orientou a metodologia de constituição de tendências desenvolvida
nesse estudo. Busca-se decompor arranjos comunicacionais para se chegar ao cerne de suas
significações e, a partir disso, o entendimento de diálogos operantes entre distintas áreas de
representação de subjetividades, convergindo para a construção de cenários tendências -,
como meios de configuração de estratégias mercadológicas. Portanto, encontrar a unidade
dialógica essencial é encontrar a essência do discurso o sentido primevo e, a partir disso,
construir um raciocínio estratégico para a configuração de interrelações entre fragmentos
textuais convergentes, proporcionando formas de reconhecimento das subjetividades
relativas aos indivíduos por meio de novos arranjos estruturais. Essa prática visa
proporcionar nós de coerência que subsidiem desenvolvimentos projetuais para o Design de
Moda, mas também es apta a subsidiar vínculos de projetação para outras áreas do design.
158
A unidade dialógica essencial é uma ideia latente, verbalizada ou não. A ideia, então,
assume o status de sensibilidade que emerge no meio social, e sua convergência com a
perspectiva de entendimento do espírito do tempo que se desenha na atualidade é uma
dinâmica possível a partir da percepção da replicação da mesma em diferentes plataformas de
representação simbólica. o estruturas que o conta de gerar cultura, portanto, espaço de
estabelecimento de mediações que visam caracterizações inter-subjetivas. Pois, segundo
Bakhtin, a ideia vive e opera nesse contato vivo entre pensamentos, entre consciências: “É no
ponto desse contato entre vozes-consciências que nasce e vive a ideia” (BAKHTIN, 2008,
p.98).
Os artefatos assumem, a partir dessa perspectiva, o papel de vincular vozes-
consciência, portanto, de formalizar a fluidez criativa premente entre indivíduos. Trata-se,
pois, de entender quais o as ideias que estão surgindo ou seja, quais o as sensibilidades
que estão emergindo e qual seu ponto de contato. Trata-se ainda de identificar e desenvolver
imports simbólicos em artefatos de design de moda, desdobrar a ideia em caracterizações
formais (ou, a preceito desse estudo, em arranjos sígnicos), considerando que essa é uma
dinâmica que parte do indivíduo, e que passa por combinações estruturais interpretativas, que
serão devolvidas para o indivíduo sob novos formatos. Esses novos formatos podem ser
entendidos como novos sentidos, que visam a ressignificação de uma ideia a partir de outros
pontos de vista.
Considera-se que a arbitrariedade assume papel relevante na caracterização do projeto.
O projeto visa circunscrever certos domínios de vinculação entre variantes diversas referentes
ao brief projetual, ou seja, busca caracterizar certas hipóteses de trabalho. A problematização
da constituição de tendências que permitam o desenvolvimento de projetos de moda também
se dá pela eleição de hipóteses, para que se possa configurar relações de vínculos futuros.
A possibilidade de encontrar a unidade dialógica entre textos convergentes através do
design, mais especificamente, através do estudo de tendência no design, é geradora de
vínculos de significação e pode operar construindo estratégias mercadológicas que serão
posteriormente estruturadas. Pretende-se que, ao se chegar nesse nível de interpretação, possa-
se articular criticamente relações entre os fenômenos operantes, de modo a construir
interpretações com maior fundamentação, visto que projetistas (de tendências e de artefatos),
podem viabilizar narrativas (estruturas) que dêem conta de desdobrar a ideia em imports
159
simbólicos, gerando, através dessa prática, canais de comunicação entre artefatos,
empresas/organizações, marcas e usuários (indivíduos).
As tendências, assim, o subsídios para o desdobramento dessa dinâmica. Portanto,
espaços ficcionais que visam permitir o reconhecimento do teor de comunicabilidade entre
micro e macro ambientes. O indivíduo é o principio e o fim do processo, e o entendimento das
mediações estabelecidas através dos artefatos um modo de compreender o estágio atual do
imaginário preponderante no meio social. A cultura material, segundo essa gica, permite a
leitura desse pressuposto, orientando para o estabelecimento de desdobramentos projetuais
futuros. Encontram-se os nós de coerência através de dinâmicas que cruzem sincronia e
anacronia, permitindo a construção de análises que extrapolem a dimensão espaço/tempo,
orientadas pela linearidade presente entre fragmentos discursivos e suas relações dialógicas.
Extrapolar a área de atenção nesse caso, a moda é o ponto de partida para a
constituição de tendências segundo o método proposto nesse estudo. Fechar a lógica de
constituição de novos sentidos na área em si é, portanto, uma forma limitada de encontrar
caminhos projetuais que visem a construção de cadeias de valor entre artefatos, indivíduos e
organizações. Ir am, enxergar através dos limites do campo, conectar estruturas: essa
empresa permite a configuração de um discurso amplificado, potencializando a geração de
estratégias diversas, orientadas conforme o teor de arbitrariedade inerente a projetos e
projetistas, indiferente da área do design. Para tanto, formulam-se categorizações, sempre de
modo convergente a unidade dialógica essencial, servindo como desenvolvimentos temáticos
conceituais que permitam a geração de novos vínculos interpretativos. Raciocínios analógicos
e metaricos são os resultados subsidiados a partir dessa prática, estimulando a configuração
de inovações em nível de significados. O profissional que trabalha com a projetação do devir
torna-se, assim, o operador de filtros reflexivos, orientando outros projetistas a atingirem
novos níveis interpretativos conforme seus entendimentos acerca do que foi relacionado nessa
estruturação.
Tendências, nesse contexto, o narrativas que ligam signos, significados, dimensões
temporais e subjetividades. Para arranjar todas essas complexidades, são criados mundos
possíveis cenários onde possam ser concebidas estratégias aptas a atender variáveis
mercadológicas, direcionadas segundo nichos de mercado circunscritos a coletivos
específicos, ou a ambientes mais abrangentes. Independente da gica de orientação de
mercado, o fato é que essa prática possibilita unir tangível e intangível, oferecendo meios de
160
compreender as transformações operantes no meio sociocultural, muitas vezes silenciosas. É
preciso auscultar vozes, indiferente de onde elas estiverem sendo articuladas, questionar o que
elas estão falando e criar formas de arranjá-las de modo a permitir interpretações. Os sentidos
criados, assim, funcionam como espaços de associação, possibilitando a inserção também das
vozes de outros interlocutores: os projetistas.
Pode-se, assim, concluir que tendências o universos ficcionais objetivados de modo
a constituir sentidos, e que esse processo é possível a partir da união entre códigos, criados
com o intuito de mediar o homem e a realidade que o cerca, substituindo suas próprias
vivências e os acontecimentos implicados nesse processo. Portanto, tendências são espaços de
mediação em si, e um dos seus objetivos é a ressignificação da própria realidade que engloba
os indivíduos.
Isto posto, conclui-se ainda que as significações associam-se, tanto através de práticas
intersubjetivas, como de espaços que vinculem essas relações às vivências e percepções dos
projetistas (sejam de tendências, sejam de artefatos de design de moda). Existe, assim, a
implicação de formas de expressão de cultura, seja através da história incorporada, seja
através das formalizações que visem tangibilizar o estágio de desenvolvimento do intelecto
individual e coletivo como, por exemplo, a construção de tendências. De fato, os artefatos
são meios de mediação, e o simbolismo envolvido no processo, mecanismos de entendimento
dessas duas variantes de produção de sentidos. Relacionar códigos interconectar estruturas
é uma empresa que busca desvelar essas mediações, fazendo estalar a linearidade entre os
textos, amplificando o sentido do discurso e construindo replicações que potencializem o
reconhecimento do magma que flui entre os indivíduos, construindo dinâmicas helicoidais de
entendimento (portanto, ligando leituras sincrônicas e anacrônicas).
A perspectiva do pintor apontada por Flusser (2007, p.154) segundo a qual ele ele se
esforça em seu espaço privado para juntar a esse código geral, intersubjetivo, aquilo que é
específico para ele (suas próprias vivências, etc.)” é o embasamento do estudo realizado:
encontrar as relações, desdobrá-las e configurar novas relações entre códigos é algo inerente a
representações simbólicas, visto que essas ligam o homem ao mundo (o indivíduo aos
acontecimentos que o cercam). A moda é um desses campos de representação, assim como a
arte, a arquitetura, o cinema, a sica, as mídias... Sempreo teor intersubjetivo ao lado da
percepção individual (da interpretação, da própria construção de sentidos). Ao mesmo tempo,
espaços de socialização independente de serem em ambientes concretos ou não-concretos
161
são caminhos que funcionam como outros contextos de mediação, e os artefatos gerados
nesses ambientes (escritos, imagens, etc.), potencializam a configuração de novas
codificações, passíveis de serem decompostas e também re-associadas.
Envolver todas essas variantes de modo a proporcionar vínculos que ressignifiquem o
próprio brief projetual é um dos objetivos da metodologia proposta nessa investigação. Essa
prática visa a criação de cadeias de valor entre instâncias (artefatos, organizações e
indivíduos), e essa dinâmica pode embasar o posicionamento estratégico de empresas,
organizações e marcas, devido ao teor de comunicabilidade envolvido em todo o processo.
Diálogos não verbais: esse é um dos nculos para as considerações construídas ao longo
desse estudo, e essa é, também, a maior perspectiva estratégica da metodologia de
constituição de tendências constituída nessa investigação. Entende-se, pois, que esses diálogos
podem ser operados em vários níveis, e que a associação entre eles pode servir para a geração
de caracterizações projetuais que estabelecerão posicionamentos de destaque para artefatos de
moda, portanto, para organizões que atuam nesse campo, ou que entendam o campo da
moda como um universo de convergências diversas.
162
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