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Não podemos pensar mais, assim como foi pensada outrora, de formas deterministas,
associando a sociedade aos espaços urbanos, como um todo, nem sempre as coisas se dão
desse modo. O fato de uma pessoa morar na periferia não quer dizer que a mesma,
necessariamente, segue os mesmos moldes culturais dos grupos locais, o mesmo se diz das
pessoas residentes no centro. Na verdade, dentro de cada espaço, existe uma diversidade de
modelos culturais, que serão apreendidos de diferentes formas pelos seres humanos, como
lhes for conveniente.
Nos processos socioespaciais, ocorrem interações culturais, numa perspectivas
circular, entre populares e elites, seja através de conflitos abertos, no caso, com o uso da
violência física, ou nos conflitos coercitivos, uso da violência simbólica, aproveitando-se do
aparelho estatal, criando leis orgânicas (Códigos de Posturas Municipais), que censuravam
quaisquer manifestações populares no perímetro urbano, salvo raras exceções, quando os
brincantes se sujeitavam a solicitar licenças para poderem sair com suas brincadeiras nas ruas
de São Luís. Ao mesmo tempo em que tais medidas eram uma uma forma das autoridades
monitorarem para reprimirem; por outro lado, havia uma resistência sutil por parte dos
brincantes, quando insistiam em continuar desfilando, com ou sem autorização.
Os discursos elaborados constituíam representações de uma elite minoritária, mas que,
embasada em paradigmas da “hegemoneização” cultural, buscava se autoafirmar e legitimar-
se perante as classes populares, impondo, arbitrariamente, seus sistemas de valores, hostis aos
sistemas daquelas classes.
Na prática, não houve, de forma completa, esse domínio sobre os espaços, pois uma
parcela da sociedade resistiu e ainda resiste a tais mudanças. A resistência faz parte do
cotidiano desses populares, que souberam constituir sua identidade no espaço e um espaço de
identidade, criando suas próprias dinâmicas, de acordo com o seu lugar social, ou seja, um
“macro dentro do micro”.
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Retomando a idéia de que nem sempre a cidade projetada, de
acordo com pensamento de muitos engenheiros do referido período (1890-1920), é a
vivenciada pelos habitantes, diz uma autora “Os critérios do urbano dependem não só da
política administrativa ou da prosperidade econômica, mas dos conceitos de apreensão do
lugar por partes de seus habitantes”(SALGUEIRO, 2001, p.25). Há sempre uma força agindo
no sentido inverso dessa perspectivas, manifestada na resistência dos habitantes, numa espécie
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Grifo nosso, Esse termo, usamos apropriando-o da micro-história, na qual procuramos nos fundamentar. Em
um determinado recorte que estabelecemos em nossas pesquisas, tomado como ponto de analise, seria um micro,
entretanto, no interior do recorte, no caso, o espaço, existe toda uma dinâmica social, que somando ao contexto
geral, forma uma “historia como um todo”. Porém, quando digo um macro dentro do micro estou argumentando
a existência de um “todo social” inserido no micro, no sentido metafórico.