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UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ
INSTITUTO DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS HUMANAS
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIAS SOCIAIS
MARLUCE RIBEIRO DE MENDONÇA
DESENVOLVIMENTO, PARTICIPAÇÃO E ALTERNATIVAS ECONÔMICAS:
Em discussão manejo de peixes ornamentais como meio de vida na RDS
Amanã (AM)
Belém/PA
2010
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MARLUCE RIBEIRO DE MENDONÇA
DESENVOLVIMENTO, PARTICIPAÇÃO E ALTERNATIVAS ECONÔMICAS:
Em discussão manejo de peixes ornamentais como meio de vida na RDS
Amanã (AM)
Dissertação de mestrado apresentada ao
Programa de Pós-Graduação em Ciências
Sociais, como requisito parcial para obtenção do
título de Mestre em Ciências Sociais (Sociologia).
Orientadora: Prof
a
Dr
a
Maria José da Silva Aquino
Belém/PA
2010
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Dados Internacionais de Catalogação-na-Publicação (CIP)
(Biblioteca de Pós-Graduação do IFCH/UFPA, Belém-PA)
Mendonça, Marluce Ribeiro de
Desenvolvimento, participação e alternativas econômicas: em discussão
manejo de peixes ornamentais como meio de vida na RDS Amanã (AM) / Marluce
Ribeiro de Mendonça; orientadora, Maria José da Silva Aquino. - 2010
Dissertação (Mestrado) - Universidade Federal do Pará, Instituto de Filosofia e
Ciências Humanas, Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais, Belém,
2010.
1. Desenvolvimento sustentável - Amazonas (AM). 2. Recursos naturais -
Conservação - Amazonas (AM). 3. Peixe ornamental - Criação - Amanã, Lago (AM).
4. Desenvolvimento econômico - Aspectos ambientais - Amazonas (AM). 5.
Reserva de Desenvolvimento Sustentável Amanã (AM). I. Título.
CDD - 22. ed. 363.70098113
DESENVOLVIMENTO, PARTICIPAÇÃO E ALTERNATIVAS ECONÔMICAS:
Em discussão manejo de peixes ornamentais como meio de vida na RDS
Amanã (AM)
MARLUCE RIBEIRO DE MENDONÇA
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais, como
requisito parcial para obtenção do título de Mestre Ciências Sociais (Sociologia).
Orientadora: Prof
a
Dr
a
Maria José da Silva Aquino
Data da defesa: 18 / 06 / 2010
Banca Examinadora:
_________________________________________
Prof
a
Dr
a
Maria José da Silva Aquino (Orientadora)
Instituição: PPGCS / IFCH / UFPA
_________________________________________
Prof
a
Dr
a
Neide Esterci (Examinadora Externa)
Instituição: PPGSA / IFCS / UFRJ
_________________________________________
Prof
a
Dr
a
Cristina Maneschy (Examinadora Interna)
Instituição: PPGCS / IFCH / UFPA
_________________________________________
Prof. Dr. Heribert Schmitz (Examinador Suplente)
Instituição: PPGCS / IFCH / UFPA
Belém/PA
2010
Agradecimentos
Gostaria de agradecer imensamente a todas as pessoas que contribuíram
direta ou indiretamente para a conclusão deste trabalho.
Ao CNPq pela concessão da bolsa de estudos.
Ao Projeto de Peixes Ornamentais pela oportunidade e apoio financeiro nas
atividades de campo. Aos membros do IDSM, especialmente, Ana Rita Alves, Helder
Queiroz, Isabel Sousa e Edila Moura pelas valiosas informações e esclarecimentos
sobre o IDSM e as ações desenvolvidas nas Reservas Mamirauá e Amanã.
A professora Maria José Aquino pela orientação dedicada e paciente, pelo poder de
tranqüilizar nos momentos de angústia e pelo estímulo em todas as nossas sessões
de orientação.
A Isabel Sousa pela orientação durante o período de permanência no IDSM e por
aceitar co-orientar este trabalho contribuindo com o olhar valioso de quem conhece
como poucos, as pessoas, a organização e os conflitos da realidade em estudo.
Aos professores do PPGCS, especialmente Luiz Cardoso e Heribert Schmitz pelas
sugestões e disponibilidade em ouvir e contribuir para refletir sobre as questões da
pesquisa.
Aos amigos do mestrado, em especial Dávila e Geldes, pela amizade, apoio,
disponibilidade para discussões muitas vezes por telefone que muito
contribuíram para esclarecer dúvidas do trabalho.
Aos amigos especiais que estão sempre comigo, mesmo quando estamos distantes,
Reinaldo, Veridiana, Raul, companheiros de horas felizes e outras nem tanto, que
estão sempre dispostos a ajudar.
Ao Maurício pelo esforço, incondicional, em auxiliar, tranqüilizar ou simplesmente
oferecer colo.
A minha família que sempre me apoiou e sem a qual não há razão em lutar.
Aqueles não mencionados, que certamente foram muitos.
A todos, muito obrigada.
A construção de uma racionalidade ambiental é um processo
de produção teórica e de transformações sociais. A
racionalidade ambiental é uma categoria que aborda as
relações entre instituições, organizações, práticas e
movimentos sociais, que atravessam o campo conflitivo do
ambiental e afetam as formas de percepção, acesso e usufruto
dos recursos naturais, assim como a qualidade de vida e os
estilos de desenvolvimento das populações. Esse conjunto de
processos sociais em que se entrelaçam as relações entre as
formações teóricas e ideológicas, a produção de saberes e
conhecimentos, a organização produtiva e as práticas sociais
induzidas pelos valores do ambientalismo orienta as ações
para construir uma nova racionalidade social e para transitar a
uma economia global sustentável.
(Enrique Leff, 2006, p. 240-241)
Resumo
A Reserva de Desenvolvimento Sustentável Amanã (RDSA) é uma categoria de
Unidade de Conservação que tem como proposta conciliar a conservação da
biodiversidade com o desenvolvimento sustentável das populações locais
tradicionalmente usuárias dos recursos naturais da área. Para atender aos princípios
desta categoria, o Instituto de Desenvolvimento Sustentável Mamirauá (IDSM) co-
gestor da RDSA vem implementando o manejo de recursos naturais como
atividade econômica de forma a complementar as atividades tradicionalmente
realizadas pelas famílias locais. Uma das novas propostas é o manejo sustentável
de peixes ornamentais, que está sendo desenvolvido em uma área onde a
população não tem tradição na captura e comercialização deste recurso. Pessoas
que até então comercializavam seus produtos oriundos da agricultura, do
extrativismo ou da pesca artesanal no mercado local, são postas diante do desafio
de comercializar no mercado regional um produto com demanda internacional. A
pesquisa compreende o processo de elaboração e desenvolvimento da proposta de
manejo de peixes ornamentais, implantado como atividade econômica
complementar dentro da RDSA, como resultado de práticas ambientalistas
associadas à idéia de sustentabilidade, marcando, assim, uma oposição à
concepção de desenvolvimento contrária à conservação dos recursos naturais na
Amazonia brasileira. Busca-se perceber de que forma essas “intervenções” estão
sendo sentidas e interpretadas pelos atores alvo dessas ações e quais arranjos
estão sendo produzidos nessa dinâmica, em termos de aprendizado e participação
política. Para a análise, entre agosto e outubro de 2009 foram entrevistados os
membros do Grupo de Manejadores de Peixes Ornamentais do Amanã (GMPOA) e
lideranças comunitárias do setor Amanã, na RDSA. Parte das informações que
subsidiaram o trabalho foram coletadas em entrevistas realizadas com famílias de
11 comunidades da mesma área, entre 2005 e 2006. Atualmente o GMPOA é
constituído por moradores de 08 comunidades localizadas no setor Amanã da
RDSA. A socioeconomia das famílias envolvidas no manejo de peixes ornamentais
demonstra não haver grande diferenciação entre as demais famílias das
comunidades quanto a importância das atividades produtivas. A agricultura
apresenta-se como principal atividade econômica na composição da renda familiar
mensal, aliada a outras fontes de renda como salários e benefícios sociais. As
informações sobre a percepção e opinião dos atores envolvidos, somadas aos
levantamentos existentes sobre a história e socioeconomia dessas comunidades
constituem importantes elementos para se compreender as expectativas dos
membros do GMPOA e das lideranças locais. Tais informações podem ser de
grande importância no processo de avaliação das ações que estão sendo
implementadas na RDSA.
Palavras-chave: Desenvolvimento Sustentável. Manejo. Participação. Reserva de
Desenvolvimento Sustentável. Recursos Naturais.
Abstract
Amanã´s Sustainable Development Reserve (RDSA) is a category of conservation
unit which proposes to reconcile biodiversity conservation and sustainable
development of local population traditionally users of natural resources of the area.
To attend the principles of this category, the Mamirauá Institute for Sustainable
Development (IDSM) co-manager of RDSA has implemented the natural
resource management as a complementary economic activity to the traditionally
performed by the local families. One of the new proposals is the sustainable
management of ornamental fish, which is developed in an area where the population
had no tradition of fishing and selling this resource. People who previously marketed
agriculture, extraction or fishing products in the local market, are put to the challenge
of marketing in the regional market a product with international demand. The
research includes the process of elaboration and development of the proposed
management of ornamental fish, deployed as complementary economic activity of
the RDSA, as a result of practices associated with environmental sustainability,
opposing to the concept of development contrary to preservation natural resources in
the Brazilian Amazon. This work seeks to understand how these "interventions" are
being perceived and interpreted by the targeted actors of the actions and what
arrangements are being produced in the dynamic, in terms of learning and political
participation. For the analysis, the members of the Group of Amana's Tropical Fish
Producers (GMPOA) and community leaders in the Amanã industry in RDSA were
interviewed between August and October 2009. Part of the information that
supported the study was gathered in interviews with families of 11 communities in the
same area between 2005 and 2006. Currently GMPOA consists of the population of
08 communities located in the sector of Amana RDSA. The socioeconomics of the
families involved in the management of ornamental fish show no great difference
comparing to the other families in the communities among the importance of
productive activities. Agriculture presents the main economic activity in the
composition of the family income, combined with other sources of income such as
wages and social benefits. Information on the perceptions and opinions of the
involved actors, added to existing surveys on the history and socioeconomics of
these communities are important elements to understand the expectations of the
members of GMPOA and local leaders. Such information may be of great importance
in the evaluation of the actions that are being implemented in the RDSA.
Keywords: Sustainable Development. Management. Participation. Sustainable
Development Reserve. Natural Resources.
Lista de Ilustrações
Figura 1: Mapa do Corredor Ecológico formado pelas RDS Mamirauá e Amanã e o
Parque Nacional do Jau ........................................................................................... 44
Figura 2: Exemplar de acará-disco (Symphysodon aequifasciatus) .......................... 51
Figura 3: Mapa da área de estudo do Projeto Peixes Ornamentais .......................... 53
Figura 4: Número de interessados em participar do manejo de peixes ornamentais
no setor Amanã ......................................................................................................... 57
Figura 5: Registro do primeiro evento de capacitação e formação do Grupo de
Manejadores de Peixes Ornamentais do Amanã (GMPOA) ..................................... 58
Figura 6: Viveiro sendo alocado na área de manejo, outubro de 2008... .................. 61
Figura 7: Viveiro já instalado, outubro de 2009 ......................................................... 61
Figura 8: Registro das técnicas utilizadas em reuniões nos primeiros anos da
Reserva Amanã... ...................................................................................................... 68
Figura 9: Distribuição das comunidades do setor Amanã - RDSA ............................ 92
Figura 10: Distribuição etária dos moradores de 11 comunidades do setor Amanã
RDSA ........................................................................................................................ 93
Figura 11: Atividades principais na composição da renda familiar no setor Amanã
Reserva Amanã ......................................................................................................... 98
Figura 12: Registro de alguns eventos de capacitação em 2007 e 2008 ................ 102
Figura 13: Membros do GMPOA na pesca experimental de peixes ornamentais
outubro de 2008 ...................................................................................................... 103
Figura 14: Cerco de galhada na captura de acará-disco, outubro de 2008 ............. 103
Figura 15: GMPOA com parte dos pesquisadores do Projeto Peixes Ornamentais
após a realização da pesca de 2009 ....................................................................... 104
Figura 16: Distribuição etária dos membros do GMPOA ......................................... 106
Figura 17: Nível de escolaridade dos membros do GMPOA ................................... 107
Figura 18: Composição da renda familiar mensal das famílias que compõem o
GMPOA ................................................................................................................... 108
Lista de Tabelas
Tabela 1: Associações comunitárias do setor Amanã - RDSA .................................. 94
Tabela 2: Número de adultos que pescam por comunidade e sexo Setor Amanã
RDSA ........................................................................................................................ 96
Tabela 3: Ordem decrescente de interesse no manejo de peixes ornamentais Setor
Amanã RDSA ......................................................................................................... 97
Tabela 4: Comunidades envolvidas no manejo de peixes ornamentais e número de
participantes por comunidade, outubro de 2009 ..................................................... 101
Lista de Abreviaturas e Siglas
AAGEMAM Associação de Auxiliares e Guias de Ecoturismo do Mamirauá
AAV Agente Ambiental Voluntário
CDRDSM Conselho Deliberativo da Reserva de Desenvolvimento Sustentável
Mamirauá
CEBs Comunidades Eclesiais de Base
CEUC Centro Estadual de Unidades de Conservação
CI Conservation International
CNPQ Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico
CNPT Centro Nacional de Desenvolvimento Sustentado das Populações
Tradicionais
CONAMA Conselho Nacional de Meio Ambiente
DAE Diretoria de Alternativas Econômicas
DEFRA Department for Environment Food and Rural Affairs
DFID Department for International Development
DMDS Diretoria de Manejo de Recursos Naturais e Desenvolvimento Social
DRP Diagnóstico Rural Participativo
EEM Estação Ecológica Mamirauá
FNS Fundação Nacional de Saúde
GMPOA Grupo de Manejadores de Peixes Ornamentais do Amanã
GPD Grupo de Preservação e Desenvolvimento
IBAMA Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis
IBDF Instituto Brasileiro de Desenvolvimento Florestal
IDH Índice de Desenvolvimento Humano
IDSM Instituto de Desenvolvimento Sustentável Mamirauá
INPA Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia
IPAAM Instituto de Proteção Ambiental do Estado do Amazonas
MCT Ministério da Ciência e Tecnologia
MEB Movimento de Educação de Base
MPEG Museu Paraense Emílio Goeldi
ONG Organização Não-Governamental
ONU Organização das Nações Unidas
PGC Programa de Gestão Comunitária
PNUD Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento
RDS Reserva de Desenvolvimento Sustentável
RDSA Reserva de Desenvolvimento Sustentável Amanã
RDSM Reserva de Desenvolvimento Sustentável Mamirauá
SCM Sociedade Civil Mamirauá
SDS Secretaria de Estado do Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável
SNUC Sistema Nacional de Unidades de Conservação
UFPA Universidade Federal do Pará
UNCED Confencia das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e
Desenvolvimento
UNEP United Nations Enviroment Program
UC Unidade de Conservação
UEA Universidade Estadual do Amazonas
ZSL Zoological Society of London
WCS Wildlife Conservation Society
WWF World Wide Fund for Nature
Sumário
Agradecimentos .......................................................................................................... 3
Resumo ....................................................................................................................... 5
Abstract ....................................................................................................................... 6
Lista de Ilustrações ..................................................................................................... 7
Lista de Tabelas .......................................................................................................... 9
Lista de Abreviaturas e Siglas ................................................................................... 10
Introdução ................................................................................................................ 14
Capítulo 1. Desenvolvimento, ambiente e participação na Amazônia brasileira:
concepções e críticas ............................................................................................. 19
1.1 Notas sobre os termos do debate ....................................................................... 20
1.2 Políticas de desenvolvimento na Amazônia e a proposta de desenvolvimento
sustentável ................................................................................................................ 24
1.3 O modelo de preservação que influenciou a criação de Unidades de
Conservação no Brasil .............................................................................................. 32
1.4 Sistema Nacional de Unidades de Conservação no Brasil: notas sobre a
instituição de uma lei ................................................................................................. 35
Capítulo 2. Mamirauá e Amanã: percursos em nome do “Desenvolvimento
Sustentável” na Amazônia brasileira .................................................................... 39
2.1 A criação das RDS Mamirauá e Amanã .............................................................. 40
2.2 SCM e IDSM: dinâmicas institucionais e implementação das Reservas ............. 44
2.3 “Alternativas econômicas”: entre complementar a renda das famílias e a
substituição de atividades econômicas ..................................................................... 47
2.4 Projeto de Manejo Sustentável de Peixes Ornamentais de Mamirauá e Amanã:
proposta de nova atividade econômica ..................................................................... 50
Capítulo 3. IDSM e comunidades locais: a questão da participação .................. 65
3.1 Os primeiros contatos.......................................................................................... 65
3.2 A escolha do modelo de gestão e a relação entre os atores ............................... 77
3.3 A percepção dos moradores locais quanto à criação da Reserva ....................... 83
Capítulo 4. Manejo de Peixes Ornamentais: práticas e percepções em
Amanã..... ................................................................................................................. 89
4.1 As comunidades locais: caracterização socioeconômica .................................... 89
4.1.1. O setor Amanã ................................................................................................ 91
4.2 Grupo de Manejadores de Peixes Ornamentais do Amanã: processo de
formação ................................................................................................................... 98
4.3 Grupo de Manejadores de Peixes Ornamentais do Amanã: aspectos
socioeconômicos ..................................................................................................... 105
4.4 A percepção dos moradores locais sobre a atuação do projeto de Peixes
Ornamentais em Amanã ......................................................................................... 109
Considerações finais ............................................................................................ 115
Referências ............................................................................................................ 120
Apêndices .............................................................................................................. 130
Apêndice A: Roteiro para entrevista com membros do GMPOA ............................. 131
Apêndice B: Roteiro para entrevista com lideranças comunitárias .......................... 134
14
Introdução
O interesse pelo tema aqui proposto resultou da experiência de quase três
anos atuando como pesquisadora e extensionista do Projeto de Manejo Sustentável
de Peixes Ornamentais em comunidades rurais nas Reservas de Desenvolvimento
Sustentável Mamirauá (RDSM) e Amanã (RDSA), no estado do Amazonas. Tal
projeto foi desenvolvido no âmbito do Instituto de Desenvolvimento Sustentável
Mamirauá (IDSM), organização social que, através de um convênio firmado com o
Instituto de Proteção Ambiental do Amazonas (IPAAM)
1
, faz a gestão das referidas
unidades de conservação.
As RDS Mamirauá e Amanã são unidades de conservação de uso
sustentável, que têm como proposta a conciliação de objetivos ambientais e sociais.
Para minimizar as eventuais perdas ocasionadas pelas restrições ao uso dos
recursos, impostas às populações locais, o IDSM vem desenvolvendo e
implementando várias atividades econômicas de forma a complementar a renda das
famílias e proporcionar melhores condições de vida. Entretanto, muitas vezes, ações
desta natureza provocam alterações em âmbito local que nem sempre estão
relacionadas aos anseios das populações alvo destas ações.
Neste sentido, o presente trabalho busca no âmbito de um debate sobre
desenvolvimento, no qual é ressaltado o desafio da sustentabilidade, compreender o
processo de elaboração e implementação de uma proposta de atividade econômica
dentro de uma RDS, como resultado de práticas ambientalistas, focando,
especialmente, os sentimentos e reações dos atores locais diretamente envolvidos
e/ou afetados por ações como esta e quais arranjos locais vão sendo produzidos
nessa dinâmica, em termos de aprendizado e participação política. O trabalho
centra-se na compreensão destes processos em uma região da Reserva de
Desenvolvimento Sustentável Amanã, onde vem atuando desde 2005 um projeto
1
O IPAAM foi criado em 1995 para coordenar e executar a política estadual de meio ambiente. Em
2003 passou a ser vinculado à Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento
Sustentável (SDS), portanto é o órgão executor da Política de Controle Ambiental do Estado do
Amazonas.
15
econômico, visando a implementação do manejo de espécies de peixes ornamentais
como atividade a ser desenvolvida pela população dessa região.
Ações desta natureza, como a criação de unidades de conservação e
implantação de projetos de desenvolvimento sustentável, resultam de
transformações que começaram a ser percebidas a partir da década de 1960,
quando se tornaram evidentes os limites do desenvolvimento do planeta e surgiram
muitas discussões sobre a degradação do ambiente e a preocupação em rever
valores e práticas da nossa civilização. Tais debates iniciaram de questões locais
que foram ganhando força a partir da coalizão de vários grupos “[...] que se tornaram
movimentos nacionais e, finalmente, um movimento multinacional” (MCCORMICK,
1992, p. 21). No centro das discussões desse movimento estava a idéia de que
para evitar a catástrofe seria necessário uma mudança nos valores, que pudesse
orientar a construção de uma nova realidade. Passaram a buscar, então, modelos
alternativos, identificados como mais sustentáveis no uso dos recursos. O debate
travado ao longo das últimas décadas contribuiu para que se chegasse à idéia de
desenvolvimento sustentável, idéia essa que vem sendo refinada nas diversas
experiências que buscam operacionalizá-la.
Os resultados dessas discussões são sentidos localmente com a criação de
unidades de conservação, ou de leis específicas de proteção ambiental, ou de
outras ações resultantes desse debate. Neste sentido, busca-se compreender a
percepção local sobre um projeto de intervenção econômica e social, como é o
Projeto de Manejo Sustentável de Peixes Ornamentais, que, geralmente, provocam
alterações no âmbito local. Pretende-se perceber como essas intervenções estão
sendo sentidas e interpretadas pelos atores alvo dessas ações.
Para a compreensão desses processos, a abordagem metodológica adotada
seguiu uma perspectiva qualitativa, conjugando a utilização de procedimentos como
a pesquisa bibliográfica, a documental e a de campo. A pesquisa bibliográfica foi
direcionada para algumas categorias de análise que nortearam as reflexões
desenvolvidas neste trabalho. Neste sentido, a discussão centra-se, essencialmente,
na noção de desenvolvimento sustentável, idéia que tem inspirado a ação de muitos
movimentos ambientalistas (Cf. AQUINO, 2003), na qual o IDSM também se
enquadra. Estes princípios orientam as ações desenvolvidas nas Reservas
16
Mamirauá e Amanã, buscando conciliar objetivos ambientais, sociais e econômicos,
idéia base do desenvolvimento sustentável. Antes, porém, houve a necessidade de
retomar o debate sobre desenvolvimento, conceito cuja evolução aponta para sua
complexificação (Cf. SACHS, 2008b) e ao qual foram sendo adicionados sucessivos
adjetivos impulsionados pelas novas problemáticas: econômico, social, político,
cultural, sustentável. Ao longo do desenvolvimento do trabalho outras categorias
contribuíram para refletir as questões em estudo e foram incluídas, como a noção de
racionalidade ambiental de Enrique Leff (2001a, 2001b, 2006) e de ambientalização,
este tendo como referência também Leff (2006) e Leite Lopes (2006).
Os dados empíricos foram coletados em dois momentos distintos: entre 2005
e 2006, ainda enquanto membro do projeto de peixes ornamentais, foram realizadas
entrevistas semi-estruturadas com 135 famílias de 11 comunidades do setor Amanã,
representando uma amostra de 91%. Essas informações foram importantes para
uma caracterização socioeconômica da área e das famílias envolvidas na atividade
de manejo de peixes ornamentais. Entre agosto e outubro de 2009, foram coletados
os dados referentes à percepção dos moradores quanto às ações de intervenção.
Nesse segundo momento, foram realizadas entrevistas semi-estruturadas com dois
grupos eleitos para a análise: um composto por todos os membros do Grupo de
Manejadores de Peixes Ornamentais do Amanã (GMPOA), representando aqueles
mais envolvidos nas atividades do projeto de peixes ornamentais; outro, formado por
lideranças comunitárias do setor Amanã, que representam os não envolvidos nessas
ações. A escolha das lideranças para a coleta de informações justifica-se por serem,
geralmente, aqueles que ouvem as queixas dos moradores de sua comunidade. Por
essa razão, acredita-se que possam ter conhecimento das possíveis insatisfações
dos membros das comunidades em relação à atuação do projeto ou do IDSM.
Ressalta-se, entretanto, que muitas informações resultam das impressões que
ficaram do contato anterior com as 11 comunidades visitadas durante o período em
que desenvolvia atividades ligadas ao projeto de peixes ornamentais.
Paralelamente, realizou-se levantamento documental na instituição co-gestora
da RDS Amanã. Estes dados, em conjunto com os demais, foram classificados por
categoria de documento. Nesta perspectiva, as fontes foram distribuídas em
categorias, como: fontes bibliográficas de temas relacionados às categorias de
17
análise; fontes bibliográficas relacionadas ao ambiente da pesquisa; fontes
documentais, como relatórios do projeto, relatórios da instituição, atas ou registros
de reuniões do projeto na instituição e nas comunidades, correspondências
eletrônicas, além das fontes não escritas, como as imagens e sons registrados.
O trabalho está estruturado em quatro capítulos, nos quais buscou-se retomar
os caminhos trilhados a a implementação da atividade de manejo de peixes
ornamentais no setor Amanã, enquanto atividade econômica a ser realizada pelas
famílias. No primeiro capítulo retoma-se a discussão sobre a noção de
“desenvolvimento” como ponto de partida para se chegar ao conceito de
“desenvolvimento sustentável”, este figurando como saída que busca conciliar o
desenvolvimento material com prudência ética. A partir de autores como Celso
Furtado, Ignacy Sachs, José Eli da Veiga e Enrique Leff, são apresentados os limites
e críticas a este conceito, passando por uma discussão sobre sua nova roupagem, o
desenvolvimento sustentável”. A partir daí, procura-se demonstrar as influências
destes pensamentos nas novas formas de gestão territorial no Brasil, traduzindo-se,
em termos de política pública, em unidades de conservação, principalmente na
Amazônia brasileira.
O segundo capítulo aborda o processo de construção da categoria de
Reserva de Desenvolvimento Sustentável (RDS), implementada inicialmente no
estado do Amazonas a partir da experiência da RDS Mamirauá e, posteriormente,
da RDS Amanã. São analisadas as ações realizadas para a implantação destas
unidades de conservação, a estrutura institucional criada para coordenar e
desenvolver os trabalhos de pesquisa e extensão, necessários ao modelo proposto,
e as estratégias utilizadas para atender aos princípios desta categoria de área
protegida, que procuram aliar a conservação da biodiversidade ao desenvolvimento
social. Ao final do capítulo apresenta-se o processo de formação de uma dessas
estratégias implantadas visando atender a tais princípios o Projeto de Manejo
Sustentável de Peixes Ornamentais de Mamirauá e Amanã, desenvolvido pelo IDSM
na RDS Amanã.
A intenção do capítulo três é apresentar como vem se construindo a relação
entre o IDSM e as populações que residem e/ou usam os recursos naturais das
Reservas Mamirauá e Amanã, dando atenção especial a estes processos na
18
Reserva Amanã. São apresentados os primeiros contatos com as comunidades, as
reações locais, a construção do modelo de participação implementado, e como a
população local analisa a criação desta unidade de conservação atualmente.
Conhecer este histórico permite compreender como hoje se processam as relações
existentes entre esses atores e como se aplicam as propostas de projetos para
essas áreas.
Por fim, o capítulo quatro direciona-se mais especificamente para a proposta
de manejar espécies de peixes consideradas ornamentais. Nele apresenta-se uma
caracterização socioeconômica das comunidades e famílias do setor Amanã onde o
projeto de peixes ornamentais realizou consultas e iniciou atividade de manejo.
Apresenta-se, também, o processo de formação do GMPOA, os aspectos
socioeconômicos do conjunto de famílias que formam o grupo, os procedimentos de
preparação para a pesca manejada através dos cursos de capacitação e, finalmente,
as impressões tanto dos membros do GMPOA quanto das lideranças comunitárias
do setor sobre a atuação do projeto de peixes ornamentais na área.
19
Capítulo 1:
Desenvolvimento, ambiente e participação na Amazônia brasileira:
concepções e críticas
Neste capítulo, a discussão está centrada, essencialmente, na noção de
desenvolvimento sustentável, idéia que tem inspirado a ação de muitos movimentos
ambientalistas (Cf. AQUINO, 2003), e na qual o IDSM também se enquadra,
enquanto organização social que tem por finalidade a conservação da
biodiversidade e o manejo participativo e sustentável dos recursos naturais da
Amazônia. Estes princípios orientam as ações desenvolvidas nas Reservas
Mamirauá e Amanã, buscando conciliar objetivos ambientais, sociais e econômicos,
idéia base do desenvolvimento sustentável. Antes, porém, torna-se necessário
retomar o debate sobre desenvolvimento, conceito cuja evolução aponta para sua
complexificação (Cf. SACHS, 2008b) e ao qual foram sendo adicionados sucessivos
adjetivos impulsionados pelas novas problemáticas: econômico, social, político,
cultural, sustentável.
A discussão parte de autores importantes no debate sobre desenvolvimento e
desenvolvimento sustentável, como Celso Furtado (1996, 2004), Ignacy Sachs
(1994, 2005, 2008a, 2008b), JoEli da Veiga (2005) e Enrique Leff (2001a, 2001b,
2006). São apresentados os limites e críticas a noção de desenvolvimento,
passando por uma discussão sobre sua nova roupagem, o desenvolvimento
sustentável. Procura-se demonstrar as influências destes pensamentos nas novas
formas de gestão territorial no Brasil, traduzindo-se, em termos de política pública,
em Unidades de Conservação, principalmente na Amazônia brasileira.
20
1.1 Notas sobre os termos do debate
A proposta de desenvolvimento, ainda hoje buscada pela maioria das nações,
sobretudo, aquelas que ainda não apresentam os níveis observados nos países
altamente industrializados, tem sido objeto de debate, especialmente a partir da
divulgação de estudos que mostraram que tal modelo tem gerado efeitos
desastrosos no ambiente.
Desde a segunda guerra mundial quando a busca do desenvolvimento
passou a ser, também, uma das razões de ser da Organização das Nações Unidas
(ONU), vem se arrastando ambigüidades ao se identificar o desenvolvimento com
crescimento econômico. O debate internacional sobre o sentido da noção de
desenvolvimento teve início a partir dos anos 1960, quando se observou que o
crescimento econômico ocorrido em diversos países semi-industrializados, entre os
quais o Brasil, não se traduziu em maior acesso das populações pobres a bens
materiais, à saúde e à educação. Neste sentido, em 1990 quando o Programa das
Nações Unidas (PNUD) lançou o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH),
buscava-se evitar o uso exclusivo da riqueza econômica como critério para mensurar
o desenvolvimento.
Além de se questionar esse modelo, quanto à capacidade de promover
melhores condições de vida às populações, outros aspectos passaram a fazer parte
do centro das discussões. De acordo com Furtado (1996), no início da década de
1970 a divulgação dos resultados de estudos sobre os limites do planeta trouxeram
“[...] para o primeiro plano da discussão problemas cruciais que os economistas do
desenvolvimento econômico trataram sempre de deixar na sombra” (FURTADO,
1996, p. 10). A partir de então muito se tem discutido sobre esse modelo e suas
formas de reprodução nas economias periféricas.
Veiga (2005) diz haver três respostas quando se questiona o
desenvolvimento: a primeira trata tal conceito como sinônimo de crescimento
econômico, relação que o autor procura desmistificar em seu trabalho; a segunda
afirma que o desenvolvimento não passa de ilusão ou manipulação ideológica. Para
Veiga (2005), os que aderem a essa segunda corrente ficam isentos de discutir o
21
“enigma do desenvolvimento sustentável, pois ele não passaria de uma nova
roupagem da quimera original” (VEIGA, 2005, p. 18). A terceira, entretanto, segundo
este autor, é o caminho mais complexo, trata-se dos que recusam as duas saídas e
tentam explicar o desenvolvimento não como quimera e nem como crescimento
econômico, mas como um caminho do meio, bem mais difícil de ser trilhado.
A primeira corrente apontada por Veiga (2005) faz referência à simples
identificação do desenvolvimento com o crescimento econômico. Até o início da
década de 1960, não se sentiu, segundo este autor, a necessidade de distinguir
estes dois conceitos, pois as poucas nações desenvolvidas haviam alcançado este
estado por meio da industrialização, ao passo que nos países que permaneceram
subdesenvolvidos, o processo de industrialização era incipiente ou nem havia
iniciado. No entanto, quando começaram a surgir evidências de que o crescimento
ocorrido naqueles países semi-industrializados não se traduziu em maior acesso de
populações pobres a bens materiais, como havia ocorrido nos países considerados
desenvolvidos, iniciaram-se debates buscando discutir o sentido da noção de
desenvolvimento. O Índice de Desenvolvimento Humano, lançado pelo PNUD no
Relatório de Desenvolvimento Humano em 1990, para evitar a utilização exclusiva
do aspecto econômico como critério de aferição, contribuiu para minimizar tais
ambigüidades. A partir desse momento, seria “[...] muito esquisito continuar a insistir
na simples identificação do desenvolvimento com o crescimento econômico”
(VEIGA, 2005, p. 18).
A segunda linha de pensamento tem como questão central a impossibilidade
de haver alguma mobilidade ascendente na rígida hierarquia da economia mundial.
Esta seria formada por um pequeno núcleo de países centrais, uma extensa
periferia, e uma semiperiferia formada por nações consideradas emergentes. Para
os autores dessa corrente, as chances de transposição das linhas que separam os
grupos de países são irrisórias, ou seja, “embora alguma mobilidade seja possível, é
altamente improvável que o núcleo orgânico absorva muitos desses países da
semiperiferia (VEIGA, 2005, p. 21). Neste sentido, a essência desta tese é a de
que o desenvolvimento é uma ilusão.
Furtado (1996) também partilhou desta opinião. Segundo ele, o estilo de vida
dos países centrais é de tal forma elevado, quanto aos custos de depredação do
22
mundo físico, que toda tentativa de generalizá-lo poderia levar ao colapso de toda
uma civilização, pondo em risco a sobrevivência humana. O autor conclui a partir
desta análise que:
[...] o desenvolvimento econômico a idéia de que os povos pobres podem
algum dia desfrutar das formas de vida dos atuais povos ricos é
simplesmente irrealizável. Sabemos agora de forma irrefutável que as
economias da periferia nunca serão desenvolvidas, no sentido de similares
às economias que formam o atual centro do sistema capitalista (FURTADO,
1996, p. 89. Grifos do autor).
Para Furtado (1996), o mito do desenvolvimento econômico desvia a atenção
das necessidades fundamentais da coletividade para concentrá-la em objetivos
abstratos, como o crescimento econômico.
Conforme mencionado, com o lançamento do primeiro Relatório de
Desenvolvimento Humano em 1990, deixou-se de considerar o crescimento
econômico como sinônimo de desenvolvimento. O crescimento passou a ser
entendido como um elemento dentro de um processo maior, uma vez que seus
resultados não se traduzem automaticamente em benefícios econômicos. Desta
forma, tornou-se evidente a necessidade de se estruturar as políticas de
desenvolvimento segundo critérios e valores além dos econômicos. Para Veiga
(2005), aqui está a mudança fundamental no modo de se conceber o
desenvolvimento a partir de então.
Mais recentemente, uma perspectiva semelhante é encontrada nos trabalhos
de Amartya Sen, especialmente em seu livro Desenvolvimento como liberdade, obra
de síntese, baseada em cinco conferências proferidas por Sen entre 1996 e 1997,
enquanto membro do Banco Mundial. Neste trabalho o desenvolvimento é
apresentado como um processo de expansão ou ampliação das liberdades reais dos
indivíduos. Nele o autor procura demonstrar a necessidade de se reconhecer as
diferentes formas de liberdade por meio do combate às privações. Desta forma:
o desenvolvimento requer que se removam as principais fontes de privação
de liberdade: pobreza e tirania, carência de oportunidades econômicas e
destituição social sistemática, negligência dos serviços públicos e
intolerância ou interferência de Estados repressivos (SEN, 2000, p. 18).
Estes se configuram, segundo este autor, como os maiores desafios ao
desenvolvimento, visto que embora se verifique um aumento na riqueza mundial,
23
observa-se, também, a negação de liberdades elementares à grande parte da
população. A expansão das liberdades é vista, assim, como o principal fim e o
principal meio do desenvolvimento.
Entre os autores que têm se dedicado ao problema do desenvolvimento nas
últimas décadas, Veiga (2005) destaca a importante contribuição de Ignacy Sachs.
De acordo com Sachs (2008b), a reflexão sobre o desenvolvimento tal como o
conhecemos hoje teve início ainda nos anos 40 do século passado, no contexto de
reconstrução da periferia devastada da Europa no pós-guerra. Como conceito
histórico e social, o pensamento dominante na época pregava que o
desenvolvimento seria alcançado por meio da intervenção do Estado nos assuntos
econômicos, priorizando o pleno emprego. Entretanto, dois avanços conceituais são
enfatizados pelo autor: o primeiro refere-se à atenção dada à problemática ambiental
desde os anos 1970, que levou “[...] a uma ampla reconceitualização de
desenvolvimento, em termos de ecodesenvolvimento, recentemente renomeado
desenvolvimento sustentável” (SACHS, 2008b, p. 36); o segundo foi influenciado
pelos trabalhos de Amartya Sen, onde “o desenvolvimento pode ser redefinido em
termos da universalização e do exercício efetivo de todos os direitos humanos:
políticos, civis e cívicos; econômicos, sociais e culturais; bem como direitos coletivos
ao desenvolvimento, ao ambiente etc.” (SACHS, 2008b, p. 37).
Sachs (2008b) resume a evolução do conceito de desenvolvimento nas
últimas décadas apontando para a sua complexificação. Foram sendo adicionados
sucessivos adjetivos impulsionados pelas novas problemáticas. Neste sentido, ao
conceito de desenvolvimento foram acrescidos os adjetivos: econômico, social,
político, cultural, sustentável. Mas, tanto Sachs (2005) quanto Veiga (2005) partem
da definição de Celso Furtado como a que melhor sintetiza a iia de
desenvolvimento. Conforme Furtado (2004):
o crescimento econômico, tal qual o conhecemos, vem se fundando na
preservação dos privilégios das elites que satisfazem seu afã de
modernização; o desenvolvimento se caracteriza pelo seu projeto social
subjacente. Dispor de recursos para investir está longe de ser condição
suficiente para preparar um melhor futuro para a massa da população. Mas
quando o projeto social prioriza a efetiva melhoria das condições de vida
dessa população, o crescimento se metamorfoseia em desenvolvimento
(FURTADO, 2004, p. 484).
24
Para Sachs (2005), a compreensão do conceito de desenvolvimento torna-se
importante na medida em que é necessário recorrer ao par “desenvolvimento/mau-
desenvolvimento” para que se possam definir políticas de saída do mau
desenvolvimento.
1.2 Políticas de desenvolvimento na Amazônia brasileira e a proposta de
desenvolvimento sustentável
Orientado por teorias centradas essencialmente no aspecto econômico do
desenvolvimento, o Estado brasileiro implantou na Amazônia ao longo das últimas
décadas do século passado, muitos projetos desenvolvimentistas com o propósito
de incorporar a região aos processos de reprodução do capital. Este processo foi
marcado por estratégias concebidas para atenuar a desigualdade inter-regional na
qual a Amazônia se encontrava em relação às outras regiões do Brasil. Entretanto,
de acordo com Lira, Silva e Pinto (2008), a inserção da Amazônia ao contexto da
economia nacional por meio dessas estratégias se deu de forma dependente,
subordinada à lógica das necessidades de reprodução desse capital no espaço
nacional. A estratégia nacional para promover o desenvolvimento da Amazônia foi
pautada na implementação de projetos intensivos em capital, baseados num modelo
de desenvolvimento desequilibrado, voltado quase que exclusivamente para
atividades e setores dependentes de demandas do mercado internacional. Os
investimentos realizados por esses projetos aceleraram o ritmo de crescimento da
produção regional, tanto que nas duas últimas décadas do século passado as taxas
de crescimento econômico foram superiores ao observado em nível nacional (LIRA;
SILVA; PINTO, 2008).
Ocorreu que essas políticas implementadas, visando diminuir a desigualdade
inter-regional, acabaram gerando desigualdades intra-regionais em virtude das
características dessas políticas: setoriais, restritas a área de localização e
dependentes de demandas extra-regional e extra-nacional. Assim, no século XXI o
desenvolvimento que ocorre na Amazônia é desigual e restrito a alguns subespaços
econômicos e bastante heterogêneos no que se refere à produção regional, situação
25
diferente de como se encontrava até sua integração ao mercado nacional (LIRA;
SILVA; PINTO, 2008).
A Amazônia é hoje reflexo das políticas desenvolvimentistas que
potencializaram ao mesmo tempo o crescimento econômico e as desigualdades
sociais. Esses projetos trouxeram com eles além das desigualdades intra-regionais
apresentadas, inúmeros conflitos sociais e prejuízos ambientais. Problemas que
podem ser observados na abundante literatura sobre esses processos na Amazônia
desde os anos 1970. Alguns trabalhos podem ilustrar essa questão, como: os efeitos
da construção de grandes rodovias demonstrados em bette (1991); os impactos
dos Grandes Projetos em termos de crise agrária na Amazônia (HALL, 1991); a
desestruturação socioambiental da comunidade de Laranjal em Barcarena no Pará,
com a implantação do complexo Albrás Alunorte para a produção de alumínio
(VASCONCELLOS, 1996); a desestruturação de engenhos de várzea no estuário do
Amazonas (ANDERSON, 1991); a construção da Usina Hidrelétrica de Balbina,
próxima à Cachoeira Balbina no rio Uatumã, estado do Amazonas, que inundou uma
área de cerca de 2.928,5 km
2
, incluindo parte do território dos índios Waimiri-Atroari,
e prejudicou todos os afluentes dos rios Uatumã e Abonari, tornando-os inabitáveis
em virtude da putrefação da floresta submersa (BAINES, 1994).
Além destes trabalhos, uma vasta literatura sobre a implantação dos grandes
projetos na Amazônia tem demonstrado que o caráter autoritário com que se
revestiu a ação do Estado acabou por ensejar conseqüências que marcaram
profundas alterações na organização do espaço geográfico amazônico. A Amazônia
é marcada por práticas que se baseiam nas idéias de progresso e de crescimento
econômico e, assim, pela implementação de um modelo exógeno, no qual a
população local tem sido excluída das discussões sobre projetos que, geralmente,
causam impactos sobre ela.
A avaliação dos resultados dessa forma de exploração do homem “civilizado”
sobre sociedades tidas como “inferiores” ou “primitivas” e sobre a natureza em várias
partes do mundo, levaram os cientistas de diversas áreas do conhecimento a
realizarem amplos debates ambientalistas. Neste sentido, a partir da década de
1960, com a crescente preocupação de cientistas, líderes políticos e organismos
internacionais com os limites do desenvolvimento do planeta, começaram a surgir
26
muitas discussões sobre a degradação do ambiente e a preocupação em rever
valores e práticas da nossa civilização.
Um marco desse processo foi a realização da Conferência das Nações
Unidas sobre o Meio Ambiente Humano, em Estocolmo em 1972. Segundo
McCormick (1992, p. 97), “foi a primeira vez que os problemas políticos, sociais e
econômicos do meio ambiente global foram discutidos num fórum
intergovernamental com uma perspectiva de realmente empreender ações
corretivas”. Entre os resultados mais significativos da Conferência em Estocolmo, o
autor destaca a criação do Programa de Meio Ambiente das Nações Unidas (UNEP)
como um produto tangível do evento. Esta foi a forma institucional criada para que
os princípios e plano de ação elaborados em Estocolmo se transformassem em
políticas e programas ativos e tivessem resultados práticos.
A partir de então, o debate foi ampliado e no caminho dessa discussão
ambiental, surgiu o conceito de ecodesenvolvimento. Este foi usado pela primeira
vez em 1973 pelo canadense Maurice Strong, primeiro diretor-executivo do UNEP
2
,
para caracterizar uma concepção alternativa de desenvolvimento, cujos princípios
foram formulados por Ignacy Sachs, segundo o qual, os eixos do desenvolvimento
seriam seis: satisfação das necessidades básicas; solidariedade com as gerações
futuras; participação da população envolvida; preservação dos recursos naturais e
do meio ambiente; elaboração de um sistema social que garanta emprego,
segurança social e respeito a outras culturas; programas de educação (Sachs,
1994). Estes princípios objetivavam fornecer subsídios principalmente para o
desenvolvimento das regiões menos desenvolvidas, com soluções mais adequadas
aos territórios locais envolvendo uma crítica à sociedade industrial.
Os resultados das discussões realizadas em diversos momentos ao longo das
últimas cadas, como a Declaração de Cocoyok, das Nações Unidas, em 1974; a
elaboração do Relatório de Dag-Hammarskjöld, pela fundação de mesmo nome em
parceria com a ONU, em 1975; e com a elaboração do Relatório Brundtland, em
1987, pela Comissão Mundial da ONU sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento
(UNCED), contribuiram para que se chegasse à idéia de desenvolvimento
sustentável. Este vem sendo refinado desde então.
2
Entre 1973 e 1975 (MCCORMICK, 1992).
27
De acordo com Leis (1999), o desenvolvimento pautado na sustentabilidade é
uma das principais questões discutidas em relação ao meio ambiente. Com a
divulgação do Relatório Brundtland em 1987, o posicionamento ético dos países,
quanto à utilização dos recursos naturais e ao compromisso com a qualidade de vida
das gerações futuras, passou a ser exigido. O desenvolvimento sustentável é visto
como uma “saída” que busca conciliar o desenvolvimento material com prudência
ética. Nesse relatório, o desenvolvimento sustentável foi definido como aquele que
satisfaz as necessidades do presente sem comprometer a possibilidade das futuras
gerações satisfazerem as suas (BRUNDTLAND, 1991). Em seu sentido mais amplo,
a estratégia de desenvolvimento sustentável visa promover a harmonia entre os
seres humanos e entre a humanidade e a natureza.
A partir deste sentido, atribuído ao conceito de desenvolvimento sustentável
no Relatório Brundtland, pôde-se perceber que o mesmo não diz respeito apenas ao
impacto da atividade econômica no meio ambiente, refere-se, principalmente, às
conseqüências dessa relação na qualidade de vida e no bem-estar da sociedade,
tanto presente quanto futura. Atividade econômica, meio ambiente e bem-estar da
sociedade formam o tripé básico no qual se apóia a idéia de desenvolvimento
sustentável. A aplicação desse conceito requisita, portanto, uma série de medidas
tanto por parte do poder público como da iniciativa privada, assim como um
consenso internacional. É preciso frisar, ainda, a participação de movimentos
sociais, constituídos principalmente na forma de Organizações Não-Governamentais
(ONGs), na busca por melhores condições de vida associadas à preservação do
ambiente e a uma condução da economia adequada a tais exigências.
No contexto específico das crises do desenvolvimento e do meio ambiente, a
busca do desenvolvimento sustentável remete, também, a um sistema político que
assegure a efetiva participação dos cidadãos no processo decisório; um sistema
social que possa resolver as tensões causadas por um desenvolvimento não-
equilibrado; um sistema de produção que respeite a obrigação de preservar a base
ecológica do desenvolvimento; um sistema internacional que estimule padrões
sustentáveis de comércio e financiamento; um sistema administrativo flexível e
capaz de auto corrigir-se.
28
Nestes termos, no Relatório Brundtland (2001) uma série de medidas que
devem ser tomada pelos Estados nacionais, são elas: a) limitação do crescimento
populacional; b) garantia de alimentação em longo prazo; c) preservação da
biodiversidade e dos ecossistemas; d) diminuição do consumo de energia e
desenvolvimento de tecnologias que admitem o uso de fontes energéticas
renováveis; e) aumento da produção industrial nos países o-industrializados à
base de tecnologias ecologicamente adaptadas; f) controle da urbanização
selvagem e integração entre campo e cidades menores; g) as necessidades básicas
devem ser satisfeitas. No nível internacional, as metas propostas são as seguintes:
h) as agências de desenvolvimento devem adotar a estratégia de Desenvolvimento
Sustentável; i) a comunidade internacional deve proteger os ecossistemas
supranacionais como a Antártica, os oceanos, o espaço; j) as guerras devem ser
banidas; k) a ONU deve implantar um programa de Desenvolvimento Sustentável.
Algumas outras medidas providenciais para a implantação de um programa o
mínimo adequado de desenvolvimento sustentável seriam: o uso de novos materiais
na construção; reestruturação da distribuição de zonas residenciais e industriais;
aproveitamento e consumo de fontes alternativas de energia, como a solar, a eólica
e a geotérmica; reciclagem de materiais aproveitáveis; não-desperdício de água e de
alimentos; menor uso de produtos químicos prejudiciais à saúde nos processos de
produção alimentícia.
Realizar um programa de desenvolvimento sustentável exige, portanto, um
alto nível de conscientização e de participação tanto dos governos e da iniciativa
privada quanto da sociedade civil. Para tanto, não se deve deixar que estratégias de
tal porte e extensão fiquem à mercê do livre mercado, visto que os danos que se
visam resolver foram causados justamente pelos processos desencadeados por um
modelo de capitalismo cada vez mais selvagem e desenfreado, indo de encontro a
um dos requisitos básicos do conceito de desenvolvimento sustentável que é a
satisfação das necessidades básicas da população. Essa participação da sociedade,
tão necessária nas discussões acerca do uso indiscriminado dos recursos naturais,
ganhou força a partir dos anos 1960, quando a prioridade do Estado e do mercado
nestes debates começou a ser questionada pela sociedade civil, que passou a se
organizar na forma de associações ou ONGs, “[...] com capacidade de intermediar e
29
limitar de forma efetiva tanto as ações do mercado como do Estado” (LEIS, 1999, p.
100).
Embora muito se tenha discutido ao longo das últimas décadas, de acordo
com Sachs (2008a), um elemento central da idéia de desenvolvimento sustentável
tem se mantido. Segundo este autor, “seja denominado ecodesenvolvimento ou
desenvolvimento sustentável, a abordagem fundamentada na harmonização de
objetivos sociais, ambientais e econômicos não se alterou desde o encontro de
Estocolmo [1972] até as conferências do Rio de Janeiro” (SACHS, 2008a, p. 54.
Grifo do autor). Ele acredita que tal abordagem ainda seja válida na recomendação
da utilização dos oito critérios distintos de sustentabilidade parcial: social, cultural,
ecológico, ambiental, territorial, econômico, político (nacional) e político
(internacional).
Uma perspectiva que procura radicalizar essa proposta de desenvolvimento
sustentável é apontada por Enrique Leff (2001a). De acordo com alguns autores
(BOEIRA, 2002; GONÇALVES, 2006; LOPES, 2009), o conceito de racionalidade
ambiental, elaborado por Leff, emerge da reflexão do autor sobre a crise ambiental e
os problemas que a causaram. A maioria dos problemas que hoje são enfrentados
pela humanidade teria suas origens na racionalidade moderno-colonial, na
racionalidade econômica, que mercantiliza a natureza e os valores culturais. Para
Leff (2006, p. 15), a questão ambiental surge, assim, como uma crise da civilização,
da racionalidade da modernidade, da “hegemonia totalizadora do mundo
globalizado”.
Leff (2006) observa que nem o mercado, nem normas ecológicas, nem uma
moral conservacionista, nem soluções tecnológicas foram capazes de reverter os
efeitos da racionalidade econômica, como a degradação ambiental, a concentração
de poder e a desigualdade social. Neste sentido, ele aponta a necessidade de se
pensar outra racionalidade, que seja capaz de integrar os valores da diversidade
cultural, os potenciais da natureza, a eqüidade e a democracia como valores que
sustentam a convivência social, e como princípios de uma nova racionalidade
produtiva, em sintonia com os propósitos da sustentabilidade, a racionalidade
ambiental. Segundo o autor, a construção desta nova racionalidade perpassa um
conjunto de processos sociais:
30
[...] é um processo de produção teórica e de transformações sociais [...]
[n]as relações entre instituições, organizações, práticas e movimentos
sociais, que atravessam o campo conflitivo do ambiental e afetam as formas
de percepção, acesso e usufruto dos recursos naturais, assim como a
qualidade de vida e os estilos de desenvolvimento das populações (LEFF,
2006, p. 240. Grifo do autor).
A degradação ambiental, a ampliação da pobreza e a crescente desigualdade
social que o mundo vivencia são conseqüências da ação predatória e centralizadora
da racionalidade econômica. Esses efeitos estariam, segundo Leff (2001b, 2006),
impulsionando a construção de identidades coletivas e a formação de novas formas
de organização social para enfrentar a crise ambiental. São movimentos que
buscam compreender as causas dessa problemática ambiental e solucionar os seus
efeitos nas condições de vida da sociedade. É a “[...] emergência de novos atores
sociais mobilizados por valores, direitos e demandas que orientam a construção de
uma racionalidade ambiental” (LEFF, 2001b, p. 96).
Como resultado das reflexões sobre as raízes éticas e ideológicas da crise
ambiental, que questiona o modelo de desenvolvimento capitalista, verificou-se a
constituição do paradigma ambiental. A partir desse cenário de reformulação de
critérios e de valorização social, aliado ao referencial ambiental, foi sendo conferida
à Amazônia importância científica e simbólica (LIMA; POZZOBON, 2005). Esse novo
referencial questiona o lugar da espécie humana na natureza e sua responsabilidade
pelo futuro da biosfera, e permitiu um novo olhar “[...] sobre as relações entre
populações humanas e o meio ambiente na Amazônia” (LIMA; POZZOBON, 2005, p.
46).
Com a atuação de ONGs e grupos de pesquisa na Amazônia, o tradicional
passou a ser valorizado, sobretudo, a partir da participação comunitária, por meio da
formação de associações com fins preservacionistas e constituição de organizações
de representação comunitária, como associações de moradores e centros
comunitários (CONCEIÇÃO, 2001). Segundo Conceição (2001, p. 146), a partir
dessas assessorias, alguns resultados puderam ser observados:
[...] ações pontuais interessantes para a preservação ambiental, como a
proposição de regulamentações e formas de controle na apropriação de
recursos escassos, especificamente a pesca de lagos, em determinados
períodos do ano [...] Começou-se a ver o conteúdo político das discussões
ambientalistas e preservacionistas reconhecendo finalmente o grau de
envolvimento nas ações e a disputa por decisões, apresentado pelas
31
populações ribeirinhas e tradicionais, agora em processo de organização e
presentes, de alguma forma, no cenário político.
Conforme Lima (2005), foi a primeira vez na história da Amazônia que o modo
de vida da população ribeirinha despertou tanto interesse político. A discussão
ambiental possibilitou aos ribeirinhos da Amazônia maior visibilidade por reconhecer
o conhecimento e a adaptabilidade dessas populações em relação aos recursos
naturais (Cf. CONCEIÇÃO, 2001) ou em razão de seu modo de vida essencialmente
ligado ao ambiente (Cf. LIMA, 2005). Esta autora destaca, ainda, que:
o reconhecimento do baixo impacto da produção familiar sobre o ambiente
transpôs a população ribeirinha da margem das políticas públicas para o
centro de uma política socioambiental que busca um novo paradigma para o
desenvolvimento que seja ambientalmente sustentável, socialmente justo e
democrático (LIMA, 2005, p. 338)
Diversos estudos buscaram demonstrar a valorização dos saberes das
populações locais sobre a natureza. Castro (1997) salienta que essa valorização é
proveniente de debates sobre a preservação dos ecossistemas e da biodiversidade,
pois “[...] reconhecem-se esses saberes e as formas de manejo a eles pertinentes
como fundamentais na preservação da biodiversidade” (CASTRO, 1997, p. 221).
A diversidade e a extensão dos saberes e das técnicas acumuladas por essas
populações para apropriar-se dos recursos do meio ambiente e adaptá-los às suas
necessidades básicas, alimentam-se em processo contínuo. Um exemplo dessa
integração do homem com o ambiente a fim de satisfazer suas necessidades sem
comprometer o ambiente, é visto entre os pescadores de peixes ornamentais na
região de Barcelos, no estado do Amazonas. Diferentemente do que ocorre em
outras atividades exploratórias, os “piabeiros”, como são localmente conhecidos (Cf.
SOBREIRO, 2007; PRANG, 2001), sabem que a manutenção da atividade depende
da conservação da floresta, por essa razão mantêm uma relação harmoniosa com o
ambiente.
Castro (1997) aponta que, em virtude de as formas de reprodução social
dessas populações demonstrarem uma integração harmoniosa com o ambiente,
utilizando formas apropriadas de manejo, a sociedade e muitos estudiosos
estabeleceram uma associação entre populações tradicionais e desenvolvimento
32
sustentável, uma vez que esse modo de vida contempla princípios de
sustentabilidade ambiental.
Autores como Diegues (1995), Sachs (1994), Leis (1999), Cavalcanti (2001),
Loureiro (2002) propõem a utilização desse novo conceito de desenvolvimento o
desenvolvimento sustentável como alternativa ao atual modelo, que não tem
conseguido solucionar os problemas provocados por sua forma de produção,
reproduzindo cada vez mais as contradições sociais existentes na sociedade.
O modelo de desenvolvimento baseado na acumulação capitalista, no qual se
sustentaram as intervenções na Amazônia, configurou-se num modelo equivocado,
uma vez que, na maioria dos casos, as ações baseavam-se em modelos exógenos
que desconsideravam aspectos não apenas ambientais, mas sociais e culturais da
região, gerando com isso graves problemas ambientais e sociais.
O que parece ser consenso na posição de muitos estudiosos da problemática
ambiental é a necessidade de se pensar uma nova forma de civilização conforme
pensa Sachs (2008a) ou uma “nova racionalidade no dizer de Leff (2001a, 2001b,
2006), que não busque somente o crescimento econômico, mas que comporte
princípios humanísticos baseados numa nova ética na relação dos homens entre si e
destes com a natureza, visando a solução dos problemas sociais. Tais princípios
inspiraram a construção de novas categorias de Unidades de Conservação de uso
sustentável, preocupadas não apenas com o ambiente natural, mas também com a
qualidade de vida da população que habita esse ambiente, é o caso das Reservas
de Desenvolvimento Sustentável.
1.3 O modelo de preservação que influenciou a criação de Unidades de
Conservação no Brasil
Anterior à idéia de desenvolvimento sustentável, outro ideal predominava
entre os que se preocupavam com as questões ambientais e, mais especificamente,
com a destruição de grandes espaços florestais. Em meados do século XIX, após a
consolidação e urbanização acelerada do capitalismo americano, o extermínio quase
total das comunidades indígenas e a expansão das fronteiras para o oeste, houve
33
uma inversão de valores sobre a natureza. Esta, antes detestável, passou a ser
admirada. Assim, segundo Larrère e Larrère (1997, p. 206), “nas últimas décadas do
século XIX, o movimento a favor da protecção das florestas „virgens‟ ganhou
amplidão, mas cindiu-se entre os partidários da „conservação‟ e os da
„preservação‟”. Os primeiros viam esses espaços como reservas de recursos,
“conservar era fazer um „bom uso‟ (wise use) da natureza” (LARRÈRE; LARRÈRE,
1997, p. 206). os partidários da “preservação” defendiam que a floresta deveria
ser mantida livre de qualquer intrusão humana.
Nesse embate, predominou a perspectiva preservacionista, que propôs
reservar grandes áreas naturais à disposição das populações urbanas para fins de
recreação. Em 1872, após a realização de vários estudos, foi criada a primeira área
com status de Parque Nacional do mundo, o Parque Nacional de Yellowstone, que
passou a ser uma região reservada e proibida de ser colonizada, ocupada ou
vendida, segundo as leis americanas (DIEGUES, 1994). Esta perspectiva via nos
Parques Nacionais a única forma de salvar partes de grande beleza da natureza
contra os efeitos devastadores do desenvolvimento urbano-industrial. Baseava-se
nas conseqüências do capitalismo sobre o oeste selvagem americano e nos efeitos
da mineração sobre seus rios e lagos. Desta forma, qualquer intervenção humana
na natureza era vista de forma negativa. Desconsiderava-se que os índios
americanos tinham vivido em harmonia com a natureza por muitos anos. Para os
defensores dessa proposta, todos os grupos sociais eram iguais e a natureza
deveria ser mantida intocada das ações negativas da humanidade.
Esse modelo americano acabou se espalhando pelo mundo numa perspectiva
dicotômica entre “povos” e “parques”. Partindo do princípio de que a presença
humana é sempre devastadora para a natureza, deixaram de ser considerados os
diferentes modos de vida das chamadas “populações tradicionais” existentes em
outros países como na América do Sul e na África. Essa postura preservacionista na
criação de Parques Nacionais, que desconsidera a existência e o modo de vida das
populações que habitam a área, acabou gerando conflitos afetando populações de
extrativistas, pescadores e índios em países do terceiro mundo (DIEGUES, 1994;
LARRÈRE; LARRÈRE, 1997).
34
De acordo com Larrère e Larrère (1997), essa perspectiva de proteção da
natureza foi criticada por geógrafos, antropólogos e ecólogos do terceiro mundo,
pois conjuga etnocentrismo e imperialismo. Para os autores, essa forma de proteção
[...] é um luxo de países ricos e desenvolvidos inacessível aos mais pobres, e
prejudica-os quando lhes é aplicada” (LARRÈRE; LARRÈRE, 1997, p. 207).
Seguindo, então, modelos de Parques e Reservas adotados em outras
realidades, o Brasil, assim como outros países, enfrentou e ainda vem enfrentando
muitos problemas e conflitos em decorrência desse processo. A criação de Unidades
de Conservação de proteção integral em lugares onde populações fazem uso social
dos recursos várias gerações é apenas um exemplo de tal problema. Chiozzini
(2005) ilustra essa questão com o caso de algumas comunidades localizadas no
Parque Nacional do Jaú, no Amazonas. Mesmo sendo uma categoria de Unidade de
Conservação que não permite ocupação humana, pois se trata de uma unidade de
proteção integral, que permite apenas o uso indireto dos recursos, essas
comunidades continuam residindo no Parque e fazendo uso dos recursos.
Vallejo (2006) aponta que essa problemática começou a ser considerada a
partir dos anos 1970, após a Conferência de Estocolmo (1972), consolidando-se,
efetivamente, a partir do III Congresso Mundial de Parques Nacionais, em 1982.
Houve uma evolução na abordagem do conceito de Parque Nacional, em relação à
integração com o desenvolvimento socioeconômico. Ficou estabelecido que os
Parques Nacionais e outras Unidades de Conservação teriam sentido com a
elevação da qualidade de vida da população, sem o que ela seria forçada a explorar,
de forma predatória, os recursos naturais.
Tornou-se imprescindível a reformulação das políticas de áreas protegidas, de
forma que as “populações locais tenham papel mais central do que deve ser
conservado, como e para quem” (PIMBERT; PRETTY, 2000, p. 210), reconhecendo
legalmente as reivindicações ancestrais da terra, beneficiando as comunidades
locais com o controle sobre os recursos naturais contidos nos Parques e outras
35
categorias de áreas protegidas. Em entrevista a Chiozzini (2005), Lúcia Ferreira
3
,
ressaltou que:
são necessárias mudanças substanciais relacionadas ao tratamento dado a
essas populações, inclusive considerando a hipótese de não retirá-las: em
curto prazo, é necessário democratizar o debate sobre a gestão dos
parques, com a participação oficial dos moradores no processo de tomada
de decisão (CHIOZZINI, 2005, p. 06).
A instituição do Sistema Nacional de Unidades de Conservação (SNUC),
juntamente com a criação de novas categorias de unidades de uso sustentável,
constituiu-se em um avanço nesse sentido. No entanto, torna-se cada vez mais
necessário que os debates em torno dessa questão se ampliem para que se tenha
no futuro, a mínima garantia à integridade do patrimônio preservado, mas com a
participação e decisão de todos os atores envolvidos.
1.4 Sistema Nacional de Unidades de Conservação no Brasil: notas sobre a
instituição de uma lei
Somente a partir do final dos anos 1970, sob influência de organizações
ambientalistas internacionais foi que se cogitou a possibilidade de criação de um
sistema nacional de unidades de conservação no Brasil. Até então as Unidades de
Conservação brasileiras eram “criadas de forma esporádica, casuística e
assistemática, de acordo com oportunidades surgidas em contextos e circunstâncias
políticas específicas” (SANTILLI, 2005, p. 169). Mas, somente em 1988 o Instituto
Brasileiro de Desenvolvimento Florestal (IBDF), hoje extinto, encomendou à
Fundação Pró-Natureza (Funatura), uma proposta de lei que instituísse um sistema
nacional de unidades de conservação. Tal proposta foi aprovada pelo Conselho
Nacional de Meio Ambiente (CONAMA) e encaminhada pelo então presidente
Fernando Collor de Mello ao Congresso Nacional, em maio de 1992. Após oito anos
de tramitação, o projeto foi aprovado em 2000 com alguns vetos presidenciais
(SANTILLI, 2005). Atualmente, as Unidades de Conservação são entendidas
3
Pesquisadora da Universidade Estadual de Campinas, com experiência em estudos sobre conflitos
sociais em Unidades de Conservação.
36
enquanto um sistema, não sendo consideradas como fragmento isolado, mas como
parte de um sistema de ordenamento territorial.
O histórico de tramitação da Lei que instituiu o Sistema Nacional de Unidades
de Conservação (SNUC) demonstra os embates e discussões entre
socioambientalistas e preservacionistas, nos quais se observou a prevalência de
uma inspiração socioambiental sobre os conceitos defendidos pelo
preservacionismo tradicional. Para Santilli (2005), embora o sistema não tenha
incluído duas importantes categorias de áreas protegidas que reconhecem o aspecto
social (os territórios indígenas e de quilombolas), percebe-se bastante presente em
todo o SNUC o conceito de bens socioambientais.
A autora destaca, entretanto, que o projeto original da Lei encaminhado ao
Congresso pelo presidente, à época, Fernando Collor de Mello, adotava uma
orientação claramente preservacionista, pouco voltado para a valorização social e
econômica da diversidade biológica e centrado na idéia de que a presença humana
representa uma ameaça à conservação da diversidade biológica. De acordo com
Santilli (2005), essa visão preservacionista era inspirada no modelo de conservação
americano, preocupado exclusivamente com o valor de espécies e ecossistemas e
com a perda da biodiversidade em si, sem atender às exigências e necessidades
humanas concretas.
A proposta original tendia a desconsiderar a contribuição das populações
tradicionais para a conservação da diversidade biológica e a possibilidade de
envolvê-las em tal objetivo. Suas atividades e práticas de uso da terra eram
consideradas como fatores de perda e diminuição da biodiversidade. O projeto
original também não previa mecanismos concretos de participação social na criação,
implantação e gestão das Unidades de Conservação ou de consulta e envolvimento
das comunidades locais. O projeto originariamente desenvolvido pelo Executivo
tendia a privilegiar a atuação do Estado por meio de órgãos ambientais
governamentais, tanto na definição e criação, quanto na gestão das áreas
protegidas.
Ao longo do processo de tramitação da Lei foram incluídos diversos
dispositivos visando orientar o SNUC para uma política que assegurasse a
participação das comunidades locais nos processos de criação, implantação e
37
gestão das Unidades de Conservação e incentivasse tanto as comunidades locais,
quanto organizações privadas, a participar da gestão das áreas. Entre os
acréscimos ao projeto de lei destacam-se a inclusão, pelo deputado Fernando
Gabeira, de novas modalidades de Unidades de Conservação, todas de uso
sustentável: “a reserva produtora de água, a reserva ecológico-cultural e a reserva
ecológica integrada” (SANTILLI, 2005, p. 172). Entretanto, destas, somente a
reserva ecológico-cultural foi mantida na versão final da Lei.
A proposta de inclusão da reserva ecológico-cultural partiu do Núcleo de
Apoio à Pesquisa sobre Populações Humanas e Áreas Úmidas Brasileiras, da
Universidade de São Paulo, coordenado por Antônio Carlos Diegues. Este modelo
tem como definição:
área natural, que abriga populações tradicionais, cuja existência baseia-se
em sistemas sustentáveis de exploração dos recursos naturais,
desenvolvidos ao longo de gerações e adaptados às condições ecológicas
locais, e que desempenham um papel fundamental na proteção da natureza
e na manutenção da diversidade biológica (SANTILLI, 2005, p. 172).
No entanto, esta categoria teve o nome substituído na versão final do projeto,
por Reserva de Desenvolvimento Sustentável”, graças, em grande parte, à
experiência da Reserva de Desenvolvimento Sustentável Mamirauá, no Amazonas.
Mas sua definição foi mantida nos mesmos termos, acrescentando-se, entretanto, a
possibilidade de se fazer a desapropriação de áreas particulares incluídas em
seus limites quando necessário.
Na Lei do SNUC está presente a compreensão de que as Unidades de
Conservação devem ser integradas ao planejamento regional e de que sua criação,
implantação e gestão devem envolver todos os atores sociais, mediante
instrumentos democráticos e participativos, sendo inviável, política e socialmente, a
sua imposição autoritária pelo poder público. O grande desafio é a efetiva
implantação e a gestão participativa das Unidades de Conservação. Grande parte
existe somente “no papel”, estando vulneráveis ao desmatamento ou transformando-
se em espécies de “ilhas” deslocadas dos contextos sociais, políticos, econômicos e
culturais em que se inserem.
Neste sentido, esta nova categoria de Unidade de Conservação, criada pelo
estado do Amazonas em 1996 a partir da proposta dos idealizadores da Reserva
38
de Desenvolvimento Sustentável Mamirauá e integrada ao SNUC em 2000, ainda
apresenta grandes desafios, conforme se pretende demonstrar nos próximos
capítulos deste trabalho. Mas esta experiência que busca conciliar a conservação
da biodiversidade sem desconsiderar as populações inseridas no contexto local e
regional da área circunscrita à unidade tem sido considerada bem-sucedida, tanto
por organismos governamentais, que apóiam financeiramente as ões
desenvolvidas na área, quanto pela mídia e outros organismos internacionais que,
freqüentemente, têm oferecido destaque aos trabalhos realizados no local.
39
Capítulo 2:
Mamirauá e Amanã: percursos em nome do “Desenvolvimento
Sustentável” na Amazônia brasileira
A demonstração dos limites do modelo de desenvolvimento vigente e
hegemônico até então, apontou a necessidade de superar barreiras a partir de uma
nova ética que possa orientar a relação entre os homens e destes com o ambiente.
Os princípios do desenvolvimento sustentável, relacionados a uma harmonização de
objetivos sociais e ambientais, assim como uma nova abordagem na relação entre
os saberes, inspiraram a implantação de algumas experiências de conservação na
Amazônia brasileira.
Pretende-se discorrer neste capítulo sobre o processo de construção da
categoria Reserva de Desenvolvimento Sustentável (RDS), implementada
inicialmente no estado do Amazonas a partir da experiência da RDS Mamirauá e,
posteriormente, da RDS Amanã. São analisadas as ações realizadas para a
implantação destas Unidades de Conservação, a estrutura institucional criada para
coordenar e desenvolver os trabalhos de pesquisa e extensão, necessários ao
modelo proposto, e as estratégias utilizadas para atender aos princípios desta
categoria de área protegida, que procuram aliar a conservação da biodiversidade ao
desenvolvimento social. Ao final do capítulo apresenta-se o processo de formação
de uma dessas estratégias implantadas visando atender a tais princípios o Projeto
de Manejo Sustentável de Peixes Ornamentais de Mamirauá e Amanã, desenvolvido
pelo Instituto de Desenvolvimento Sustentável Mamirauá (IDSM) na RDS Amanã.
40
2.1 A criação das RDS Mamirauá e Amanã
Esta pesquisa desenvolveu-se em comunidades rurais envolvidas em uma
atividade de manejo o manejo de peixes ornamentais, a ser detalhado mais à
frente neste trabalho localizadas no interior da Reserva de Desenvolvimento
Sustentável Amanã, no estado do Amazonas. Entretanto, para maior compreensão
dos processos que envolvem esta atividade e as relações entre os atores nela
envolvidos, convém antes retomar o caminho percorrido até a implantação desta
Unidade de Conservação e o início das atividades de manejo na área.
Anterior à idéia de criação de uma Reserva na região de Amanã, surgiu a
proposta de proteção de uma área de várzea localizada entre os rios Solimões e
Japurá, na qual o biólogo José Márcio Ayres realizou estudos sobre o macaco
uacari-branco (Cacajao calvus calvus) para sua tese de doutorado na década de
1980. De acordo com Aquino (2003), durante os estudos Márcio Ayres teria
identificado ameaças ao equilíbrio desse ambiente, ainda bastante preservado
quando comparado a outros lugares do mundo onde ocorrem os mesmos
ecossistemas. A necessidade de transformar a área em Unidade de Conservação
justificava-se pela representatividade em termos de biodiversidade elevada e pelo
fato de ainda ser um dos poucos espaços ocupados por um ecossistema deste tipo
em estado de conservação privilegiado.
Preocupado com as transformações que estavam ocorrendo em virtude da
pressão sobre os recursos que colocava em risco de extinção várias espécies,
Márcio Ayres elaborou uma proposta para que ali fosse criada uma Unidade de
Conservação. Vários fatores contribuíram para a aprovação da proposta. O contexto
era favorável, a questão ambiental passava a ocupar lugar de destaque nas
discussões políticas internacionais e nacionais e o Brasil se preparava para uma
conferência internacional sobre meio ambiente, a Eco-92 (INOUE, 2003; AQUINO,
2009). Assim, em resposta à proposta de Ayres, em 1990 o então governador do
estado do Amazonas, Amazonino Mendes, decretou a criação da Estação Ecológica
Mamirauá (EEM). A área de abrangência da EEM foi maior do que a pretendida
inicialmente, se estendendo até o rio Auati Paranã, incluindo áreas ocupadas por
diversos grupos populacionais (AQUINO, 2009).
41
Esta categoria de Unidade de Conservação prevista pelo código ambiental
brasileiro dispõe que 10% do território sejam utilizados para investigação científica e
fiscalização, enquanto os demais 90% devem permanecer intocáveis e livres da
presença humana. A disposição como Estação Ecológica era incompatível com as
pretensões dos idealizadores da proposta em termos de princípios ordenadores,
porém foi um passo considerado imprescindível no sentido de assegurar a
legalidade da área e a preservação que seria colocada em prática (REIS, 2005).
Contudo, a permanência dos moradores continuava ilegal e com ela a
proposta dos mentores e executores. De acordo com Marise Reis (2005)
pesquisadora que entre 1991 e 2001 ajudou na construção da RDSM, trabalhando
na organização das comunidades ribeirinhas em toda essa fase, os idealizadores
da proposta articularam os órgãos federais e estaduais até o estabelecimento dos
limites e dos propósitos pretendidos pelos primeiros. Buscava-se um modelo que
suplantasse os impedimentos legais de habitação e manejo dos recursos previstos
para as Estações Ecológicas e que pudesse contemplar as populações usuárias
destas áreas e do seu entorno. O desafio de conjugar a sobrevivência humana com
a preservação dos recursos naturais revelou que uma relação mais harmoniosa com
a natureza se constrói a partir do estabelecimento de novas relações entre os
próprios homens. A autora considera que:
graças a estas premissas e aos resultados positivos obtidos na conjugação
destes fins na prática, a área teve sua classificação alterada em 1996 para
Reserva de Desenvolvimento Sustentável. Este fato ampliou sensivelmente
as possibilidades de implementação institucional e administrativa da
Unidade, alterando o ânimo da população e das agências parceiras em
apoiá-la e determinando, finalmente, o seu reconhecimento (REIS, 2005, p.
44-45).
Deste modo, seis anos depois do primeiro decreto, a recategorização para
Reserva de Desenvolvimento Sustentável Mamirauá (RDSM) permitiu aliar a
preservação da biodiversidade aos propósitos precípuos de permanência e de
inclusão da população usuária e residente nestas áreas no manejo sustentável dos
recursos (não contemplados na categoria na qual foi inserida inicialmente) e teve por
base a realidade que vinha se consolidando em Mamirauá. A definição desta nova
categoria foi importante no sentido de respaldar juridicamente a conjugação dos
interesses sociais e ambientais.
42
Portanto, a categoria RDS
4
foi criada pelo estado do Amazonas em 1996, a
partir da proposta dos idealizadores de Mamirauá e, posteriormente, em 2000
passou a integrar o Sistema Nacional de Unidades de Conservação (SNUC). Esta
categoria que teve a RDS Mamirauá como a primeira sob a nova legislação, tem
como proposta conciliar a conservação da biodiversidade com o desenvolvimento
sustentável das populações locais tradicionalmente usuárias dos recursos naturais
da área (MAMIRAUÁ, 1996).
Em 1998, outra RDS foi criada a partir dos trabalhos coordenados por Márcio
Ayres, desta vez a Reserva de Desenvolvimento Sustentável Amanã (RDSA), criada
pelo governo do estado do Amazonas através do decreto nº 19.021 de 04 de agosto
de 1998. Mas esta proposta parece não ter partido exclusivamente dos cientistas.
Durante a realização do trabalho de campo para esta pesquisa, foram entrevistadas
lideranças comunitárias da região do lago Amanã na RDSA onde se desenvolve a
atividade de manejo que este trabalho tem por objeto de estudo. Um dos
entrevistados relatou que a proposta de criação da Reserva partiu de um pedido seu
a Márcio Ayres durante a realização de uma Assembléia Geral de Moradores da
Reserva Mamirauá para que se criasse, também, uma Reserva na região do lago
Amanã, pois sofriam com freqüentes invasões na área em busca dos recursos,
sobretudo, pesqueiros. Os registros de presença do evento confirmam a participação
desta liderança na Assembléia Geral do ano de 1997. Os registros desses eventos
5
também demonstram que a área vinha sendo estudada desde o final da década
de 1970 e, a partir de 1990, Márcio Ayres iniciou levantamentos de caça, primatas e
botânicos na área. Neste sentido, a solicitação do morador veio ao encontro de um
movimento que estava ocorrendo. Curiosamente, a elaboração e envio da
proposta de criação da Reserva Amanã ocorreu no mesmo mês de realização da
assembléia.
4
Esta categoria de Unidade de Conservação tem como objetivo básico “preservar a natureza e, ao
mesmo tempo, assegurar as condições e os meios necessários para a reprodução e a melhoria dos
modos e da qualidade de vida e exploração dos recursos naturais das populações tradicionais, bem
como valorizar, conservar e aperfeiçoar o conhecimento e as técnicas de manejo do ambiente,
desenvolvido por estas populações” (BRASIL, 2000: Art. 20, § 1
o
).
5
Atas das Assembléias Gerais de Moradores da Reserva Mamirauá (Documentos não publicados).
43
Em entrevista a Inoue (2003), Ayres apontou a criação de Amanã como passo
seguinte à formação da Reserva Mamirauá. Mas o início deste movimento o foi
planejado ou premeditado. A autora afirma que:
[...] para os atores envolvidos, essa idéia foi quase uma „decorrência natural‟
da experiência do grupo de pessoas, entre os quais Márcio Ayres e
Déborah Lima, e não algo premeditado, ou planejado desde o início. De
acordo com Ayres, as primeiras conversas foram iniciadas por um grupo
ligado por laços de amizade e relações acadêmicas, enquanto estavam na
Inglaterra, como pós-graduandos e pesquisadores de Cambrigde e Oxford.
Quando a Estação Ecológica Mamirauá EEM foi criada em 1990, pelo
governo do estado do Amazonas, decidiu-se que seria mais viável
implementar a reserva e propor a criação de Amanã como passo seguinte
(Márcio Ayres, entrevista pessoal, Belém, 23 de julho de 2001 e correio
eletrônico 27 de janeiro de 2003 apud INOUE, 2003, p. 206).
Essa proposta faz parte de um conceito que procura evitar o isolamento de
Unidades de Conservação, transformando-as em “ilhas biológicas”. A intenção é a
criação de “corredores biológicos” interligando áreas protegidas sob diferentes
categorias de proteção, onde se possam integrar ações conservacionistas (AYRES
et al, 2005). A criação da Reserva Amanã foi considerada por Queiroz (2005) um
passo importante para a consolidação do embrião do Corredor da Amazônia Central.
Localizada entre as bacias do rio Negro e do baixo rio Japurá, a RDS Amanã
conectou a RDS Mamirauá ao Parque Nacional do Jaú, formando o maior bloco de
floresta tropical protegida do planeta (Figura 1) com cerca de 5.766.000 hectares
(AMAZONAS, 1998).
44
Figura 1: Mapa do corredor ecológico formado pelas RDS Mamirauá (em verde) e Amanã (em
vermelho) e o Parque Nacional do Jau (em azul), destacando sua localização na Amazônia.
Fonte: Banco de Imagens do IDSM.
Os trabalhos de implementação e gestão da RDS Amanã vêm sendo
desenvolvidos pelas mesmas instituições responsáveis pela proposta da RDS
Mamirauá e sua gestão, a Sociedade Civil Mamirauá (SCM) e o Instituto de
Desenvolvimento Sustentável Mamirauá (IDSM). As ações desenvolvidas
inicialmente em Mamirauá estão sendo replicadas e adaptadas à realidade de
Amanã.
2.2 SCM e IDSM: dinâmicas institucionais e implementação das Reservas
Para a coordenação dos trabalhos nas Reservas, uma estrutura institucional foi
criada antes mesmo da recategorização da Estação Ecológica Mamirauá para RDS.
Em 1991 foi criado o “Projeto Mamirauá”, com o objetivo de coordenar as atividades
de pesquisa e de desenvolvimento social tendo em vista a implantação da Reserva.
Mas, de acordo com Inoue (2003), “durante o processo de estabelecimento da rede
45
de relações de cooperação [...], percebeu-se a necessidade de se criar uma ONG
para administrar o projeto” (INOUE, 2003, p. 210).
Segundo esta autora, quando a proposta começou a ser construída por
pesquisadores ligados, principalmente, a instituições de pesquisa da Amazônia
(Museu Paraense Emílio Goeldi MPEG; Universidade Federal do Pa UFPA;
Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia INPA), estes já tinham conhecimento
do apoio do governo britânico a projetos ambientais no âmbito do Museu Goeldi.
Porém, havia o receio de vincular o Projeto Mamirauá a esta instituição pelo fato de
pessoas ligadas a ela estarem sendo acusadas de desviar recursos de um projeto
apoiado por uma agência britânica em Caxiuanã. As ONGs internacionais que
apoiavam o projeto (Wildlife Conservation Society WCS; World Wide Fund for
Nature WWF) também manifestaram o desejo por outro arranjo institucional. Neste
sentido, muitas discussões e troca de correspondências entre instituições brasileiras
e internacionais
6
ocorreram até que se chegasse a um arranjo aceitável para todas
as partes. Mamirauá tornou-se [...] um dos projetos sob responsabilidade do CNPq,
ligado à mesma diretoria em que estavam as unidades de pesquisa como o INPA e
o próprio Museu [Goeldi]. Uma ONG seria criada para gerir os recursos
internacionais” (INOUE, 2003, p. 213).
Assim, a criação da Sociedade Civil Mamirauá (SCM) em 1992 aconteceu em
parte para responder a exigências formais das agências financiadoras. Entre as
responsabilidades da SCM estavam a gestão dos recursos do governo britânico,
WWF/Reino Unido, WCS e Conservation International (CI), e implementar as
atividades de campo (INOUE, 2003). Estes trabalhos foram coordenados por Márcio
Ayres, juntamente com a antropóloga Deborah Lima, que planejou e supervisionou
as atividades da parte social até 1995. Ayres permaneceu na coordenação dos
trabalhos até 2003, ano de seu falecimento.
Nos primeiros anos foram realizados levantamentos de dados para
fundamentar a elaboração do plano de manejo e criar bases para atuar na região e
envolver a população usuária da Reserva, atores sociais e instituições. As pesquisas
6
Para maior conhecimento sobre os arranjos institucionais construídos durante as primeiras fases de
Mamirauá veja os capítulos 7 e 8 de Inoue (2003).
46
iniciais voltaram-se para o estudo de recursos chaves, considerados do ponto de
vista ambiental e social. De acordo com Reis (2005), nesta fase:
os programas sociais dedicavam-se a promover ões de desenvolvimento
humano e incentivar a participação dos setores envolvidos enquanto,
paralelamente, investigavam os aspectos sociais, antropológicos e políticos
das comunidades e da região, visando orientar as abordagens que seriam
adotadas (REIS, 2005, p. 46).
De acordo com Inoue (2003) essa fase foi até 1996 quando o Plano de
Manejo da RDSM foi aprovado. Após esse período a autora caracteriza como a
“Fase II” do Projeto Mamirauá, quando inicia o processo de implementação do Plano
de Manejo. Esse momento caracterizou-se pelo aumento da importância das
atividades de extensão, tendo os recursos da principal agência financiadora
direcionados para esse fim, pois nessa fase “[...] seria necessário fortalecer a
extensão e o sistema de fiscalização e começar programas de alternativas
econômicas para a população local” (INOUE, 2003, p. 247).
Um importante passo nessa fase foi a criação, em 1999, do Instituto de
Desenvolvimento Sustentável Mamirauá (IDSM)
7
como forma de garantir a
continuidade e maior estabilidade aos trabalhos desenvolvidos. A criação do IDSM
8
foi resultado do desejo dos membros de Projeto Mamirauá e do maior envolvimento
do CNPq por meio do empenho pessoal de José Tundisi, presidente do CNPq entre
1995 e 1998, que “[...] começou a estabelecer as condições para isso e seis meses
depois que ele saiu do CNPq, o IDSM foi criado, em 04 de junho de 1999(INOUE,
2003, p. 250). Segundo a autora, um dos reflexos do estabelecimento do Instituto
9
foi o aumento dos recursos repassados pelo componente brasileiro. O Ministério da
Ciência e Tecnologia (MCT) ao qual o Instituto está vinculado tem garantido grande
parte dos recursos por meio de um contrato de gestão firmado entre estas duas
instituições a partir de março de 2001 (IDSM, 2002). Em 2007 esses repasses
7
O IDSM é uma pessoa jurídica de direito privado, legalmente constituída em abril de 1999 e
qualificada como Organização Social através de Decreto Presidencial em junho de 1999. Es
sediada na cidade de Tefé, no estado do Amazonas. “Tem por finalidade a conservação da
biodiversidade com o manejo participativo e sustentável dos recursos naturais da Amazônia” (IDSM,
2007: 11)
8
Agradeço imensamente a valiosa contribuição da Diretora Geral do IDSM, Ana Rita Alves, em
fornecer alguns esclarecimentos sobre o processo de constituição do IDSM.
9
Sempre que mencionar “Instituto” estarei me referindo ao IDSM.
47
representaram 65,15% dos recursos totais arrecadados pelo Mamirauá (IDSM,
2008).
2.3 “Alternativas econômicas”: entre complementar a renda das famílias e a
substituição de atividades econômicas
Para atender aos princípios de conservação da biodiversidade associada ao
desenvolvimento social que orientam a categoria de RDS, desde a criação da RDSM
e, sobretudo, após a aprovação do plano de manejo em 1996, o Instituto vem
desenvolvendo pesquisas que possam subsidiar a implementação de atividades
econômicas complementares para as famílias das Reservas Mamirauá e Amanã. De
acordo com Reis (2005) e Moura (2007), as pesquisas iniciais priorizaram, entre
outros recursos, aqueles importantes do ponto de vista econômico, como algumas
espécies de peixe bastante valorizadas (como o pirarucu e o tambaqui) e algumas
espécies madeireiras. Tais pesquisas deram suporte às atividades de pesca e
manejo florestal, iniciadas por volta do ano 2000.
Para gerir essas atividades foi criado o Núcleo de Apoio à Produção
Econômica (NAPE), um dos diferentes núcleos ligados à Coordenação de Extensão
do IDSM. Seu objetivo era “introduzir novas práticas de organização da produção e
comercialização dos produtos econômicos, com uso sustentado dos recursos
naturais, como medida compensatória às normas restritivas estabelecidas no Plano
de Manejo” (IDSM, 2002, p. 43). Segundo Ana Rita Alves
10
, diretora geral do IDSM,
com a criação do Instituto, houve a possibilidade de se constituir diretorias, assim,
em maio de 2002 foi criada a Diretoria de Alternativas Econômicas (DAE) para
coordenar os vários programas de manejo que vinham sendo implantados, além dos
programas de organização política e de qualidade de vida. Em outubro de 2005 a
DAE passa a ser Diretoria de Manejo de Recursos Naturais e Desenvolvimento
Social (DMDS). Para Ana Rita Alves as alterações na nomenclatura não foram
mudanças de visão do Instituto em relação às alternativas econômicas, elas foram
ocorrendo para atender à estrutura funcional do IDSM. Foram [...] adaptações de
10
Informações obtidas por meio de correio eletrônico em maio de 2010.
48
nomes para a diretoria que coordena essas atividades que „manejam os recursos
naturais [...], geram lucros e estes são absorvidos pelos habitantes das reservas‟”
(Ana Rita Alves, maio de 2010). A alteração para Diretoria de Manejo de Recursos
Naturais e Desenvolvimento Social foi proposta por Isabel Sousa então diretora da
DAE e atualmente na direção da DMDS por achar que assim iria abranger melhor
as atividades desenvolvidas nesta área nas duas Reservas.
O processo de implementação de “alternativas econômicas”
11
decorre das
dificuldades apresentadas pelos moradores da Reserva Mamirauá durante suas
Assembléias Gerais
12
, em cumprir as normas estabelecidas no plano de manejo
aprovado em 1996. A implementação do plano de manejo da RDSM resultou em
duas medidas: o zoneamento, indicando as zonas de uso e preservação; e as
normas de manejo, que orientam as regras de extração das espécies utilizadas. O
processo de negociação dessas normas foi realizado nas assembléias gerais, que
ocorrem anualmente e todas as comunidades da Reserva se reúnem com
representantes de instituições que atuam ou possuem interesse na área para discutir
o manejo dos recursos e o sistema representativo.
Entre as dificuldades apresentadas ainda nos primeiros anos, destacaram a
falta de “alternativas” de renda que pudessem garantir o sustento da família nos
períodos em que devem evitar a realização de uma atividade, como o período de
defeso de algumas espécies de peixes, impossibilitando aos pescadores
desempenhar sua principal atividade econômica e satisfazer as necessidades de
suas famílias. Nos registros da V Assembléia Geral, em 1997, um ano após a
aprovação do plano de manejo, novamente, a falta de alternativas de renda foi
11
Este termo vem sendo paulatinamente alterado nos relatórios e publicações do IDSM para
“atividades complementares” ou “manejo de recursos naturais”, entre outros. Um exemplo foi a
mudança na definição de um dos macroprocessos que representam as diferentes vertentes de
atuação do IDSM no quadro de indicadores e metas pactuado com o Ministério da Ciência e
Tecnologia. Entre 2002 e 2005 o macroprocesso 3 era definido como “Desenvolvimento de
Alternativas Econômicas com Uso Sustentado dos Recursos Naturais”. A partir de 2006 a
denominação desse macroprocesso mudou para “Desenvolvimento de Programas de Manejo
Sustentado de Recursos Naturais” (IDSM, 2003, 2004, 2005, 2006b, 2007).
12
Modelo político escolhido e reconhecido pelos comunitários (Cf. REIS, 2005). As assembléias são
realizadas anualmente pelos residentes e usuários da RDSM e, posteriormente, foi incentivada a
realização na RDSA. Na RDSM, a primeira ocorreu em fevereiro de 1993, em março de 2010 foi
realizada a XVII edição do evento. Na RDSA, ocorreram apenas duas desde a criação da Reserva
em 1998, a primeira em 2001 e a segunda em 2009.
49
apontada como uma das razões para o não cumprimento de normas estabelecidas
no plano de manejo.
Esse tem sido o desafio desta forma de conservação da natureza que aliou ao
componente ambiental à preocupação com o elemento social. Pois, “[...]
diversamente das categorias ambientais que são orientadas, mais prioritariamente,
para satisfação das necessidades dos grupos locais, como é o caso das reservas
extrativistas [...]” (REIS, 2005, p. 49), os comportamentos e práticas permitidos nas
novas unidades de desenvolvimento sustentável, não devem ser arbitrários. O uso
dos recursos naturais deve ser orientado por planos de manejo fundamentados em
pesquisas científicas, como observa esta autora:
Estão sujeitos a uma „administração ecológica‟ [...]. O „governo ecológico‟
[...] é aquele que rege o funcionamento das unidades de conservação
baseado nas leis da natureza, e orienta a utilização dos recursos pelos
usuários através de um plano de manejo embasado nas pesquisas
científicas, que garante a reprodução dos ecossistemas em jogo. Tendo por
princípios proteger a natureza e promover a melhoria das condições
humanas, estas novas unidades conciliam estes dois objetivos através do
manejo sustentável e participativo dos recursos. (REIS, 2005, p. 49-50).
Para atender a esses princípios e, deste modo, minimizar as perdas
ocasionadas por restrições no uso dos recursos, desde a criação das Reservas os
seus idealizadores têm realizado estudos a fim de conhecer os recursos naturais e
possibilitar a inserção de atividades de manejo que garantam a conservação da
biodiversidade, ao mesmo tempo em que atendam às necessidades dos moradores.
De acordo com Inoue (2003), essas ações devem ser pensadas em uma perspectiva
global, “[...] pois trata-se de repartir os custos para conservar a biodiversidade, vista
como um valor para a humanidade como um todo” (INOUE, 2003, p. 251).
Assim, ao longo desses anos têm sido propostos vários projetos de pesquisa
buscando conhecer os recursos para a implantação de atividades que possam gerar
renda para as comunidades locais. Estes têm recebido apoio tanto de instituições
nacionais quanto internacionais, proporcionando a implementação de muitas
atividades econômicas nas comunidades de Mamirauá e Amanã. De acordo com o
último relatório disponível no site do IDSM
13
, em 2007 o Instituto contava com cinco
13
INSTITUTO DE DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL MAMIRAUA. Relatório Anual do Contrato
de Gestão celebrado entre o MCT e o IDSM/OS. Exercício de 2007. Parte I. Tefé/AM, 2008.
Disponível em www.mamiraua.org.br Arquivo acessado em 20/02/2009.
50
programas de manejo de recursos atuando nas duas Reservas: Manejo de Pesca,
Manejo Florestal, Agricultura Familiar, Artesanato e Ecoturismo, atendendo, em
conjunto, um total de 13 comunidades na Reserva Amanã e 31 na Reserva
Mamirauá.
Como forma de ampliar e diversificar as atividades realizadas nessas áreas,
outros projetos de pesquisa têm sido desenvolvidos e implementados pelo IDSM nas
Reservas mencionadas, visando à criação de outras atividades econômicas a serem
realizadas pelas famílias das comunidades locais. Entre eles está o Projeto de
Manejo Sustentável de Peixes Ornamentais de Mamirauá e Amanã.
2.4 Projeto de Manejo Sustentável de Peixes Ornamentais de Mamira e
Amanã: proposta de nova atividade econômica.
O processo de criação e implementação do Projeto de Manejo Sustentável de
Peixes Ornamentais de Mamirauá e Amanã
14
é resultado de demandas locais,
particularmente de comunidades do setor
15
Jarauá da Reserva Mamirauá, durante a
assembléia geral de 2003. Os moradores argumentavam que no plano de manejo
estava estabelecida a proibição da captura de acará-disco
16
(Symphysodon
aequifasciatus) (Figura 2) a o ano 2000 e, por essa razão, solicitavam que o
Instituto realizasse pesquisas sobre essa e outras espécies de peixes para averiguar
se os estoques já haviam se recuperado.
Nas áreas das comunidades que reivindicavam tais estudos, houve entre o
final da década de 1970 e durante toda a década de 1980 uma intensa exploração
de algumas espécies de peixes comercializados como ornamentais (MENDONÇA;
14
Doravante sempre que mencionar Projeto estarei me referindo ao Projeto de Manejo Sustentável
de Peixes Ornamentais de Mamirauá e Amanã.
15
Os setores são parte da organização política das comunidades e constituem conjuntos de
assentamentos localizados próximos uns dos outros, que usam em comum uma mesma área, por
isso tomam decisões conjuntas sobre o manejo dos recursos e sobre questões políticas locais. As
formas de organização comunitária nas Reservas Mamirauá e Amanã serão melhor detalhadas nos
capítulos três e quatro deste trabalho.
16
Espécie de peixe de grande importância no mercado como ornamental, sendo a principal espécie
comercializada na região do médio Solimões e uma das selecionadas para compor o plano de
manejo de peixes ornamentais da RDSA (Cf. HERCOS; QUEIROZ; ALMEIDA, 2009; SOUZA;
MENDONÇA, 2009).
51
CAMARGO, 2006). Estudos realizados por Crampton (1999) a partir de 1992
mostraram que os acarás estavam presentes em densidades muito menores que a
maioria dos ciclídeos nos lagos do Jarauá, onde ocorreu a exploração. O autor
acredita que a aparente escassez de indivíduos reprodutores da espécie tenha sido
conseqüência da sobrepesca desse período. Além da redução dos estoques,
Crampton (1999) acredita que tal fato tenha afetado, igualmente, o comportamento
reprodutivo normal da espécie na RDSM. Estes estudos embasaram a construção
do plano de manejo da Reserva Mamirauá e recomendaram a proibição da captura
da espécie acará-disco até o ano 2000 para permitir a recuperação dos estoques.
Estes deveriam ser reavaliados após esse período para que se pudesse decidir se a
pesca seria reaberta em pequena escala ou se seria necessário conceder mais
tempo para os estoques se recuperarem.
Figura 2: Exemplar de acará-disco (Symphysodon aequifasciatus), uma das espécies
mais comercializadas como ornamental na região do médio rio Solimões.
Foto: Henrique Lazzarotto.
Na Reserva Amanã, Mendonça e Camargo (2006) apontaram evidências de
também ter existido uma atividade de captura de peixes ornamentais em período
bastante curto no final da década de 1990. Esta exploração teria ocorrido em
algumas comunidades próximas ao lago Amanã. Segundo os autores, as evidências
indicam que nestas áreas houve capturas da espécie acará-disco, embora não tenha
52
havido o estabelecimento da atividade de pesca ornamental, como ocorreu em
Mamirauá e na região de Tefé. Nesta última, a atividade teve início no final da
década de 1970 e permanece até os dias atuais, representando importante
incremento na renda de muitas famílias (Cf. SOUZA; MENDONÇA, 2009).
Neste sentido, vários fatores contribuíram para se pensar no uso sustentável
de espécies de peixes com potencial ornamental para complementar a renda das
famílias em Mamirauá e Amanã: o histórico de exploração de algumas espécies na
região, inclusive nas Reservas; a solicitação das comunidades em 2003, na X
Assembléia Geral de Moradores da RDS Mamirauá; e os resultados dos estudos
realizados até então e das experiências conhecidas em outras partes do Amazonas,
que demonstravam que a captura em pequena escala de algumas espécies de
peixes ornamentais poderia ser alternativa para diminuir a pressão de atividades
menos sustentáveis (Cf. CRAMPTON, 1999; MENDONÇA; CAMARGO, 2006).
Diversas pesquisas sobre a biologia dessas espécies vinham sendo
realizadas mesmo antes da solicitação das comunidades. Mas em 2005, uma
parceria firmada entre o IDSM e a Zoological Society of London (ZSL) possibilitou a
formação do Projeto de Manejo Sustentável de Peixes Ornamentais de Mamirauá e
Amanã e permitiu ampliar a abordagem que se desenvolvia até então, mais voltada
aos aspectos relacionados à biologia destes recursos. Neste sentido, o projeto foi
formado por uma equipe interdisciplinar, objetivando verificar a viabilidade, não
apenas ambiental, mas também social e econômica da atividade. Criado a partir da
parceria entre IDSM e ZSL, o projeto teve o apoio da Darwin Initiative DEFRA/UK
17
com duração total de três anos, além de recursos obtidos por outras fontes, como
MCT, Petrobrás e CNPq.
Os primeiros contatos com as comunidades das áreas onde se pretendia
realizar estudos foram realizados ainda em 2005. Para a seleção das comunidades
foram considerados os acordos de uso das áreas entre as comunidades. A equipe
responsável pelo levantamento da ictiofauna tinha estudos em andamento em
alguns lagos usados por todo o setor Mamirauá na RDSM, em razão disso, a equipe
de extensão deveria realizar pesquisas em todas as seis comunidades desse setor.
Em Amanã foi mantida a mesma forma de seleção, realizando levantamento
17
Departamento de assuntos agrícolas e da paisagem do Governo Britânico.
53
socioeconômico em todas as comunidades usuárias dos igarapés onde a equipe de
biólogos pretendia desenvolver pesquisas, baseadas em estudos anteriores que
indicavam áreas potenciais. A partir dessa forma de seleção a equipe de extensão
realizou levantamento socioeconômico em 11 de um total de 13 comunidades dessa
área da Reserva Amanã. Deste modo, as pesquisas foram realizadas em igarapés e
lagos de dois setores nas duas Reservas: o setor Mamirauá na RDSM e o setor
Amanã na RDSA (Figura 3).
Figura 3: Mapa da área de estudo do Projeto de Peixes Ornamentais: Setores Mamirauá
(na RDSM) e Amanã (na RDSA) destacados em amarelo.
Fonte: Banco de Imagens, IDSM.
Antes, porém, que os estudos fossem iniciados, a equipe do projeto realizou
reuniões com todas as comunidades dessas áreas, e estas foram consultadas tanto
sobre a possibilidade de realização das pesquisas em suas áreas de uso, quanto
sobre o interesse em participar do manejo, caso os resultados dos estudos
demonstrassem que a atividade era viável. A consulta às comunidades antes de
realização das pesquisas é uma orientação do IDSM e uma prática da maioria dos
54
projetos desenvolvidos nas duas Reservas
18
. Com a anuência das lideranças e
moradores é possível realizar os trabalhos. No setor Amanã, na RDSA, onde o
projeto realizou grande parte das pesquisas, além das reuniões informando os
objetivos do estudo, as comunidades exigem que uma cópia do projeto seja deixada
na comunidade.
As informações dos levantamentos biológicos, econômicos e sociais
realizados pelo projeto permitiram a tomada de decisão pela implantação do manejo
de peixes ornamentais na área pesquisada da Reserva Amanã. A prioridade dada à
Reserva Amanã para iniciar o manejo deveu-se, principalmente, ao fato de haver
maior concentração de espécies de peixes com potencial ornamental nessas áreas.
Mas a intenção do projeto é que brevemente a atividade seja estendida para
Mamirauá (HERCOS; QUEIROZ; ALMEIDA, 2009).
Para maior clareza sobre a escolha dessa área, é importante esclarecer como
foram selecionadas pelo projeto as espécies de peixes consideradas com potencial
ornamental. A seleção contou com três fontes de dados: abundância local, valor de
mercado e situação no marco legal. O objetivo foi aliar as três fontes de informação
em uma única análise. As espécies selecionadas deveriam apresentar alta
abundância nas áreas potenciais de captura (informações levantadas pelos estudos
ictiológicos); alcançar valores de mercado atraentes o suficiente para serem
promissoras no quesito da viabilidade econômica; e ter sua comercialização e
exportação como ornamental oficialmente autorizada pelas normatizações
publicadas regularmente pelo IBAMA (QUEIROZ; HERCOS; ALMEIDA, 2008).
Nota-se a partir dessas informações, que a definição de quais espécies de
peixes podem ser consideradas como ornamentais envolve vários fatores. Mas ela
varia, principalmente, de acordo com o local de origem e com o mercado
consumidor. Um exemplo que pode ilustrar essa questão refere-se ao uso do aruanã
branco (Osteoglossum bicirrhosum) como ornamental. No Brasil esta espécie tem
sua comercialização como ornamental proibida, pois a mesma tem importância para
alimentação humana. Enquanto a Colômbia e o Peru, dois outros importantes
18
Ocorrem alguns casos em que pesquisadores entram em áreas de uso das comunidades sem
comunicar aos moradores. Freqüentemente essas situações provocam insatisfação entre os locais e,
em alguns casos, os pesquisadores são “convidados” a dar informações em reuniões comunitárias ou
setoriais.
55
exportadores de peixes ornamentais da Amazônia (Cf. PRANG, 2007) permitem a
exportação dessa espécie como peixe ornamental (LIMA; PRANG, 2008).
Outro fator que pode influenciar essa classificação é o mercado, que pode
variar ao longo do tempo. O comércio do aruanã branco, que vem sendo exportado
como ornamental pelo Peru desde o final da cada de 1970 para atender às
demandas dos países asiáticos, vem sofrendo alterações nos últimos anos.
Conforme analisaram Lima e Prang (2008, p. 20), foram colocadas restrições ao uso
dessa espécie para fins ornamentais em alguns dos tradicionais mercados
consumidores. Essas mudanças se devem a vários fatores, como as dificuldades no
cuidado com o animal, pois quando adulto ele pode chegar até um metro de
comprimento; e as críticas de grupos de direitos dos animais, por considerarem “[...]
uma crueldade manter o animal preso em espaço tão reduzido para manobrar”.
Neste sentido, Pinheiro (2007) questiona o que determina se um peixe ou
outro organismo aquático é ou não ornamental. Ornamental é o que é “próprio para
ornamentar”, segundo a definição no dicionário Aurélio Buarque de Holanda. A partir
dessa perspectiva Pinheiro (2007, p. 4) aponta que:
na prática, a maioria das espécies de peixes pode ter uso ornamental ou ser
alvo de coleta com essa finalidade, seja pela beleza ou por causar
estranhamento; sempre existe alguém interessado em fazer uso ornamental
de alguma espécie diferente. Colecionadores mundo afora mantém dezenas
ou centenas de espécies diferentes que o são freqüentemente
exploradas, mas tem uso na aquariofilia.
Essa ampla possibilidade leva, segundo Pinheiro (2007), a uma mudança do
foco no momento de elaborar as normas que regulam essa atividade, deixando de
focar o animal para normatizar o uso. Por meio da Instrução Normativa n. 203/2008,
o IBAMA ordena a captura, o transporte e comercialização de peixes com finalidade
ornamental ou de aquariofilia de peixes nativos de águas continentais. Pinheiro
(2007) destaca a importância dessas normas, “[...] pois várias espécies podem ter
usos múltiplos e uma legislação voltada a peixes ornamentais poderia abrir brechas
para ilícitos ambientais ou inviabilizar outras atividades envolvendo essas espécies
(PINHEIRO, 2007, p. 4).
Procedendo a análise a partir dos três critérios estabelecidos, o projeto de
peixes ornamentais chegou a uma lista com 19 espécies com potencial ornamental.
56
Para complementar as informações e compor o plano de manejo deste recurso para
a região do setor Amanã, foram realizados estudos sobre a reprodução dessas
espécies que, entre outros objetivos, permitiram conhecer o período mais adequado
para a realização do manejo ao longo do ciclo sazonal. Além desses, as demais
pesquisas realizadas no âmbito do projeto, incluindo um levantamento
socioeconômico e estudos de mercado, subsidiaram a construção do plano de
manejo.
A partir da conclusão dos primeiros estudos (biológicos, econômicos e
sociais), no início de 2007, os resultados foram apresentados a todas as
comunidades investigadas em Mamirauá e Amanã. Na ocasião, as comunidades de
Amanã foram, novamente, consultadas sobre o interesse em participar da atividade
de manejo de peixes ornamentais. Embora elas tenham demonstrado amplo
interesse durante a consulta inicial, realizada em 2006 (Figura 4), somente sete de
11 comunidades existentes na área estudada decidiram participar do manejo.
Posteriormente, uma comunidade que não havia participado da consulta inicial
19
solicitou vagas no grupo de manejo e também foi inserida.
19
Identificada pelos seus moradores como “comunidade”, esta não foi consultada pelo projeto, pois
no período da pesquisa, residiam apenas duas família na área, as quais estavam ligadas a outras
duas comunidades existentes, uma localizada nas proximidades (Bom Jesus do Baré) e outra
muito distante desse local (Bom Socorro), mas que reivindicam o direito de uso da área. Trata-se de
uma situação delicada existente no setor Amanã discutida nas assembléias realizadas em 2001 e
2009, sem que se chegasse a um acordo entre os envolvidos.
57
Figura 4: Número de pessoas que se disseram interessadas em participar
do Manejo de Peixes Ornamentais no Setor Amanã, RDSA.
Fonte: Mendonça, 2007.
Em razão de a atividade estar em processo de implementação, o projeto
optou por realizar pequenas retiradas das espécies a serem manejadas. Assim, o
número de participantes para compor o grupo de manejadores formado para iniciar
o processo de preparação para a atividade, por meio de oficinas de capacitação
20
foi restrito inicialmente. Cada comunidade de escolher até três moradores para
participar da atividade. O grupo formado inicialmente contava com aproximadamente
22 membros
21
, dos quais três são mulheres. Após essa fase, na qual as
comunidades decidiram quais de seus moradores iriam participar da atividade, em
junho de 2007 foi realizado o primeiro encontro para formação do Grupo de
Manejadores de Peixes Ornamentais do Amanã (GMPOA) (Figura 5).
20
Esse processo será descrito mais detalhadamente no capítulo quatro deste trabalho.
21
O projeto pretendia que cada vaga fosse ocupada por membros de domicílios diferentes, de forma
a atender o maior número de famílias. Entretanto, a escolha dos participantes foi deixada para que as
próprias comunidades decidissem, a partir de seus critérios e de suas discussões nas reuniões
comunitárias. Em razão disso, em muitas comunidades as vagas foram preenchidas por moradores
do mesmo domicílio, em alguns casos, por falta de pessoas interessadas em participar da atividade.
58
Figura 5: Registro do primeiro evento de capacitação e formação do Grupo de
Manejadores de Peixes Ornamentais do Amanã (GMPOA), em junho de 2007.
Foto: Henrique Lazzarotto.
Nesse encontro, foi realizada a primeira das várias oficinas de capacitação
que o projeto realizou com o grupo. As discussões nos vários eventos versavam
sobre: (1) associativismo, buscando o fortalecimento do grupo, visto que este era
formado por pessoas de diferentes comunidades, o que dificultava a organização;
(2) contabilidade, buscando prepará-los para um melhor registro das operações de
comercialização realizadas pelo grupo, tornando-as mais transparentes para os
membros do mesmo; (3) identificação, captura e manuseio de peixes ornamentais,
em razão desta não ser uma atividade realizada tradicionalmente na área da
Reserva Amanã, portanto os participantes têm poucos conhecimentos sobre as
espécies e as formas de manuseá-las; entre outras.
Esse processo ocorreu durante todo o ano de 2007 e continuou em 2008. Ao
final de 2008 o grupo de manejadores realizou sua primeira experiência de captura
de peixes ornamentais. Após a conclusão da pesca, alguns representantes do
grupo, acompanhados de extensionistas do projeto, viajaram a Manaus com o intuito
de negociar a venda dos peixes capturados. Entretanto, não conseguiram fechar
59
negócio com nenhuma das empresas exportadoras sediadas em Manaus. O produto
desse evento de manejo foi vendido para um atravessador
22
que os procurou em
Tefé. O fechamento dessa comercialização ocorreu em dezembro do mesmo ano,
quando o comprador esteve na Reserva Amanã para receber os peixes.
O estudo desenvolvido por Gregory Prang membro do projeto de peixes
ornamentais ligado à instituição parceira, a ZSL para subsidiar o plano de negócios
do manejo de peixes ornamentais de Amanã, previa a eliminação de alguns dos
pontos tradicionais da cadeia produtiva da atividade, de forma a reter uma maior
porção do valor do produto para os pescadores. Mas, para isso, seria necessário
maior investimento financeiro e de tempo dos membros do grupo. Por essa razão,
nos dois eventos de manejo realizados até aqui (2008 e 2009), o grupo procurou
negociar com compradores que assumissem as despesas e responsabilidades pelo
transporte, mesmo que deixassem de ganhar um pouco mais pelo produto.
No final de 2008 o falecimento de um extensionista do projeto afetou não
apenas aos colegas de trabalho como, também, o ânimo do grupo de manejadores.
Estes ficaram desarticulados até meados de 2009, quando as atividades foram
retomadas com o grupo. O trabalho foi direcionado no sentido de fortalecer a
organização dos manejadores, e teve como produto a atualização do regimento
interno, no qual foram inseridas novas normas, sobretudo, relacionadas à entrada de
novos membros. O grupo apresentou esta necessidade em virtude de muitos
comunitários terem manifestado aos atuais membros do grupo de manejo o desejo
de, também, fazer parte da atividade.
Em outubro de 2009, houve dificuldades em agendar o período de realização
da pesca manejada em virtude de metade dos membros do GMPOA estar envolvida
em outra atividade de manejo, o de pirarucu (Arapaima gigas), pois ambos ocorrem
no mesmo período do ano, nos meses de seca, mais especificamente entre
setembro e outubro. O manejo de pirarucu é uma atividade que gera uma renda
importante para comunidades de outros pontos da reserva, o que deixou os
manejadores preocupados caso houvesse a necessidade de optar entre os dois.
Após reunião entre o projeto e a diretoria do GMPOA, a data foi marcada de forma
22
Figura que representa um dos elos da cadeia produtiva tradicional dessa atividade (Cf.
MENDONÇA; CAMARGO, 2006).
60
que permitiu aos envolvidos nos dois grupos de manejo participar de ambas as
atividades.
No final de outubro iniciaram a pesca. Em razão do pouco tempo
disponibilizado para a realização do manejo, apenas uma semana, o grupo decidiu
capturar apenas uma espécie de peixe ornamental, aquela mais valorizada no
mercado regional, o acará-disco. A cota estabelecida para o ano de 2009 foi de 2000
exemplares da espécie. O grupo, até então com 16 membros, teve a participação
somente de 15 na pesca, pois uma das três mulheres do grupo estava com bebê e
não poderia se ausentar por muito tempo de casa. Entretanto, para surpresa de
todos, em dois dias conseguiram extrapolar a cota estabelecida, pescaram 2102
peixes. Os peixes foram deixados em viveiros submersos (Figuras 6 e 7) construídos
em um dos igarapés manejados e ficariam nesse local até a venda, quando seriam
entregues ao comprador.
O processo de comercialização foi mais difícil. Como após terem realizado a
pesca, os manejadores ainda não tinham um comprador definido, que não
conseguiram contatar o mesmo que adquiriu o produto da pesca no ano anterior,
iniciaram a busca por interessados em seu produto ligando para empresas
exportadoras de peixes ornamentais sediadas em Manaus.
O projeto adotou uma política de não interferir nas negociações, como forma
de exercitar a autonomia do grupo, visto que este, ao longo dos treinamentos,
recebeu orientação para a comercialização. Os extensionistas do projeto atuaram
com suporte técnico, subsidiando o grupo com informações de preços de mercado e
disponibilizando o contato dos exportadores, além de disponibilizar os recursos
necessários para o contato, como os telefones e computadores da sala do projeto na
sede do IDSM em Tefé. Após algumas tentativas, o representante de uma das
empresas se mostrou interessado e solicitou fotos dos peixes. Com a assessoria do
projeto, foi enviado e-mail com informações sobre a Reserva e a atividade de
manejo, além de fotos de exemplares de acará-disco. A empresa enviou as fotos
para um de seus clientes na Europa que, logo escreveu diretamente para o projeto
mostrando-se interessado tanto em adquirir os peixes, quanto em manter um dos
princípios estabelecidos no plano de manejo da atividade, a possibilidade de
61
rastreamento que permite ao comprador conhecer a origem do peixe e o seu
percurso até o consumidor final.
Figura 6: Viveiro sendo alocado em um dos igarapés da área de manejo,
outubro de 2008.
Foto: Arquivo do Projeto de Peixes Ornamentais.
Figura 7: Os viveiros já instalados, outubro de 2009.
Foto: Marluce Mendonça.
62
A partir daí teve início o processo de negociação dos preços.
Tradicionalmente, na comercialização local, os preços desta espécie variam
segundo o seu fenótipo ou “qualidade do peixe” (Cf. MENDONÇA; CAMARGO,
2006) que, para alguns grupos de pescadores na região de Tefé pode ter várias
categorias, numa escala que vai do mais barato ao mais caro. Embasado em
pesquisas que monitoraram o movimento e as práticas desta atividade na região de
Tefé entre 2004 e 2008
23
, o GMPOA estabeleceu três categorias: comum, pintado e
royal. Seus preços variam nesta ordem crescente, onde o royal, mais raro, é mais
valorizado.
Os valores propostos pelo GMPOA para cada categoria também foram
baseados nesse monitoramento entre os pescadores desta espécie, onde se
verificou entre outros aspectos da atividade, os preços praticados na região de Tefé.
Os preços propostos pelo GMPOA variaram entre R$ 4,00 e R$ 50,00 de acordo
com a categoria
24
. A empresa européia por intermédio da empresa exportadora de
Manaus lançou a proposta de comprar todo o lote capturado por R$ 13.000,00,
proposta que logo foi aceita pelo grupo. Mas o processo foi lento e necessitou da
assessoria constante dos membros do projeto. A cada e-mail recebido, a informação
era repassada via rádio até chegar a um representante do grupo de manejadores na
Reserva. Esse processo se estendeu por todo o mês de novembro de 2009. No
início de dezembro, um representante da empresa de Manaus que estava
intermediando a compra esteve na Reserva para ver os peixes. Após essa visita, o
comprador europeu enviou e-mail baixando o valor ofertado para R$ 8.000,00.
Depois de vários e-mails trocados entre o coordenador do projeto e a empresa
européia, onde aquele argumentava a importância e o valor desse produto “verde”, o
valor subiu para R$ 11.500,00, o qual foi novamente aceito pelo grupo de
manejadores.
Em razão do baixo nível da água dos rios, comum nesse período do ciclo
sazonal, a entrega dos peixes precisou ser adiada para o final do mês de dezembro,
quando seria possível a entrada de embarcações maiores na área. Entretanto, o
23
Trabalhos de iniciação científica realizados por estudantes de graduação em Biologia da
Universidade Estadual do Amazonas (UEA), orientados por pesquisadores do IDSM, membros do
projeto de peixes ornamentais.
24
R$ 4,00 para comum, R$ 40,00 para pintado e R$ 50,00 para royal.
63
início da enchente trouxe prejuízos ao grupo. O lago Amanã e seus igarapés estão
localizados entre a bacia do rio Solimões de água branca e a bacia do rio Negro de
água preta. Com a cheia dos rios a água preta dos igarapés do Amanã foi tomada
pela água branca do Solimões, o que provocou a morte de vários exemplares de
acará-disco que estavam em viveiros submersos nesses igarapés. Para evitar a
morte dos peixes, o grupo decidiu soltar todos. Este episódio encerrou o processo
de comercialização, mas o comprador manifestou interesse em adquirir o produto
dos próximos eventos de pesca.
Este fato demonstra as dificuldades que o GMPOA tem enfrentado em lidar
com um recurso novo que possui um mercado restrito e distante de sua realidade. A
fase de comercialização tem se mostrado a mais difícil para os pescadores, embora
esta dificuldade não pareça ser exclusividade da comercialização de peixes
ornamentais. A experiência dos outros programas de manejo do IDSM mostra que
são necessários muitos anos de acompanhamento até que a atividade se fortaleça.
Amaral (2007) relatou quase dez anos depois de iniciada a atividade de manejo de
pirarucu, as dificuldades e desafios enfrentados pelos manejadores dos setores
Jarauá, Tijuaca e Coraci, nas Reservas Mamirauá e Amanã. Sabe-se que pelos
próximos anos ainda será necessária a assessoria do projeto ou do programa de
manejo de pesca que deve assumir a atividade a partir deste ano no processo de
captura e comercialização de peixes ornamentais, como ocorre com o manejo de
pirarucu.
Pelo exposto nota-se que para se compreender uma experiência de
intervenção socioeconômica, sobretudo, realizada no interior de uma Unidade de
Conservação localizada na Amazônia, faz-se necessário analisar tal realidade como
resultado de processos e decisões tomadas em contextos políticos, econômicos e
sociais mais amplos. Neste sentido, este trabalho tem buscado refazer o caminho
das discussões em torno dos problemas ambientais que resultaram em alterações
na realidade das populações locais da Amazônia. Alterações essas, traduzidas
localmente na criação de unidades de conservação, ou de leis específicas de
proteção ambiental, ou de outras ações resultantes desse debate. A partir daí,
busca-se compreender como esses processos estão sendo recebidos e percebidos
64
por essas populações locais e quais arranjos estão sendo praticados para se
ajustarem à nova realidade.
65
Capítulo 3:
IDSM e comunidades locais: a questão da participação
A intenção deste capítulo é apresentar como vem se construindo a relação
entre o Instituto e as populações que residem e/ou usam os recursos naturais das
Reservas Mamirauá e Amanã, dando atenção especial a estes processos na
Reserva Amanã. Pretende-se apresentar como foram realizados os primeiros
contatos com as comunidades, as reações locais, a construção do modelo de
participação implementado e como a população local analisa a criação desta
unidade de conservação atualmente. Conhecer este histórico permite compreender
como hoje se processam as relações existentes entre esses atores e como se
aplicam as propostas de projetos para essas áreas.
Para a elaboração deste capítulo, foram utilizados documentos institucionais,
como relatórios e atas de reuniões e eventos comunitários, a exemplo das duas
assembléias gerais realizadas pelos moradores de Amanã em 2001 e 2009. Foram
utilizadas, ainda, as importantes contribuições de Deborah Lima e Marise Reis para
a melhor compreensão da construção do processo de participação nessas
Reservas. Ao final do capítulo, apresenta-se, a partir dos dados de campo desta
pesquisa, como a população de Amanã avalia a criação da Reserva e o processo
para sua implementação.
3.1 Os primeiros contatos...
No mesmo dia de publicação do decreto de criação da Reserva Amanã, 04 de
agosto de 1998, um grupo de extensionistas constituído de dois integrantes do
antigo Núcleo de Apoio à Produção Econômica e Integração Política
25
, Marília
25
De acordo com a estrutura institucional da época, o “Núcleo de Apoio à Produção Econômica e
Integração Política” estava ligado à Coordenação de Extensão da SCM. Atualmente as atividades de
extensão e manejo dos recursos naturais são distribuídas em várias coordenações (Qualidade de
Vida; Gestão Comunitária; Manejo de Pesca; Manejo Florestal Comunitário; Agricultura Familiar;
Artesanato e Ecoturismo) dentro da Diretoria de Manejo de Recursos Naturais e Desenvolvimento
Social do IDSM.
66
Sousa e Firmino Valter (Vavá) da Sociedade Civil Mamirauá e uma pesquisadora
contratada especificamente para trabalhar no Projeto Amanã
26
, Niele Bezerra
realizou uma viagem à Reserva Amanã para fazer os primeiros contatos com as
comunidades da área. A intenção neste primeiro momento, segundo Bezerra (1999),
foi esclarecer as dúvidas relacionadas à criação da Reserva, informar às
comunidades sobre as atividades que seriam desenvolvidas, além de observar a
reação dos moradores quanto à compreensão e aceitação da proposta.
De acordo com Bezerra (1999), o plano de trabalho proposto para os
primeiros três anos de atividade do Projeto Amanã previam: desenvolver infra-
estrutura básica com aquisição de equipamentos e instalação de casas flutuantes
em pontos estratégicos da Reserva para apoiar as atividades; fortalecer o
desenvolvimento comunitário, que estabelecia desde os primeiros contatos até a
realização de levantamento socioeconômico; mapeamento da Reserva; estratégias
de marketing; e elaboração de projetos visando apoio técnico e financeiro para
implantação da Reserva.
Além das ações desenvolvidas na Reserva, a equipe responsável pelos
primeiros trabalhos em Amanã procurou firmar parcerias com diversas instituições
locais. Entre elas estavam: o Grupo de Preservação e Desenvolvimento (GPD),
Prelazia de Tefé, Fundação Nacional de Saúde (FNS), Movimento de Educação de
Base (MEB), Superintendência e Posto local do IBAMA e Parque Nacional do Jaú. A
intenção além de somar esforços, era buscar “[...] apoio político, público e financeiro
para a proteção e conservação da RDS Amanã” (BEZERRA, 1999, p. 10)
Após 15 meses de atividades haviam sido realizadas ações nos diversos
aspectos propostos:
(i) implantação de infra-estruturas básicas; (ii) reuniões de familiarização com
a população local, através de um diálogo preliminar estabelecido para
identificação de atores (líderes comunitários) relevantes para o
gerenciamento da reserva e definição de interesses. [...] houve um começo
das discussões de forma aberta sobre o que realmente queremos e o que
eles querem, ou seja, formas de melhorias com base em discussões
conjuntas; (iii) participação comunitária; (iv) fortalecimento da organização
26
O Projeto Amanã estava inserido em um programa específico da Sociedade Civil Mamirauá e tinha
entre seus objetivos, segundo Bezerra (1999, p. 4), “[...] promover desenvolvimento comunitário das
populações que habitam a área da reserva, com prioridade para o combate à pobreza e a melhoria
das suas condições de vida, além de garantir a proteção dos recursos ambientais e sócio-culturais
existentes na área [...]”.
67
comunitária existente, através da realização de reuniões, participação em
treinamentos, intercâmbios, outros; (v) elaboração de projetos; (vi)
mapeamento do Lago Amanã; (vii) inicial trabalho de fiscalização no Lago
Amanã e alguns Paranás; (viii) levantamentos preliminares populacional e
sócio-econômico no Setor Amanã, São José e Coraci (BEZERRA, 1999, p. 4).
Entre as realizações de infra-estrutura, uma teve importância significativa para
os moradores do setor Amanã
27
, a instalação da casa flutuante localizada
estrategicamente na entrada do lago Amanã para dificultar o acesso de pescadores
e caçadores, além de fornecer suporte às atividades de pesquisa e extensão. Um
dos primeiros resultados verificados foi a diminuição das invasões, informado por
uma das lideranças locais à Niele Bezerra durante uma de suas reuniões. Segundo
ele, “desde que o flutuante chegou no lago ficou mais difícil os peixeiros entrarem.
Este ano não houve invasão na época da seca” (apud BEZERRA, 1999, p. 18).
Os trabalhos desenvolvidos basearam-se no modelo de gestão comunitária
aplicado na Reserva Mamirauá. A equipe procurou utilizar metodologias
participativas que eram empregadas tanto nas reuniões comunitárias e setoriais,
quanto nas oficinas realizadas. Utilizavam dinâmicas e técnicas de Diagnóstico Rural
Participativo (DRP) para facilitar a participação e envolver os comunitários nas
discussões, como pode ser verificado nos registros de alguns desses momentos
(Figura 8).
27
As Reservas Mamirauá e Amanã têm suas áreas divididas politicamente em setores. Estes são
conjuntos de assentamentos localizados próximos uns dos outros, que usam em comum uma mesma
área, por isso tomam decisões conjuntas sobre o manejo dos recursos e sobre questões políticas
locais. A organização social e política das Reservas Mamirauá e Amanã será melhor detalhada no
próximo item deste capítulo e no quarto capítulo deste trabalho.
68
Figura 8: Registro das técnicas utilizadas em reuniões nos primeiros anos da Reserva Amanã.
Fotos: Niele Bezerra.
Bezerra (1999) registrou, nas diversas reuniões que realizou com as
comunidades, alguns comentários dos participantes nesse primeiro momento de
contato. São trechos que demonstram tanto as dúvidas que existiam entre os
moradores, quanto os anseios e expectativas por melhorias na qualidade de vida. As
falas fazem referência às árvores e animais, mas revelam o medo de que houvesse
mudança nas suas formas de reprodução social e, também, o desejo por serviços
básicos, como saúde e educação, além de ansiarem por um futuro melhor para suas
comunidades. Os trechos a seguir ilustram alguns desses medos e expectativas:
“Que a reserva possa contribuir para que o seja extinto os animais e a
floresta; que em frente e tenha um futuro melhor para que a comunidade
desenvolva [...]; melhoria da comunidade e mais apoio para o agente
ambiental voluntário; que os peixes (tambaqui) não se acabem; que a
comunidade tenha um agente de saúde; que as árvores e as aves possam
produzir mais; apoio as comunidades cumprindo com as promessas”
(BEZERRA, 1999, p. 12).
“Daqui alguns anos ninguém vai poder mais pescar, caçar e nem plantar
porque a equipe de preservação não vai deixar” (Ibidem, p. 12-13).
“[...] agora com a reserva [não pode] plantar mais que uma quadra
(100X100m) e pescar somente quando muito necessário, que nem com
caniço poderiam” (Ibidem, p. 13).
Apesar do temor verificado, sobretudo, quanto a possíveis normas
relacionadas ao uso dos recursos e, somado a isso, de não haver, segundo Bezerra
(1999, p. 18), uma “preocupação elevada” com a sustentabilidade dos recursos, a
autora afirmou ter havido grande aceitação “[...] na preservação de lagos e
proibições de pescadores profissionais e moradores de outras comunidades, além
do interesse em obter benefícios para suas comunidades”. Por essa razão,
69
buscaram desenvolver trabalhos de “[...] organização política, capacitação e
educação ambiental, pois entre os objetivos da RDSA está o correlacionamento
direto entre participação comunitária [...] e estratégias de meios de vida mais
eficazes” (BEZERRA, 1999, p. 18).
A observação de Bezerra (1999), quanto à aceitação das comunidades em
preservar os lagos, embora a autora não tenha percebido uma “preocupação
elevada” com a sustentabilidade dos recursos por parte dessas comunidades, traz
para a discussão um aspecto discutido por Lima (2005) sobre a associação entre
ambientalistas e as populações da Amazônia. De acordo com Lima (2005), essa
pareceria é baseada em “[...] pontos comuns entre as proposições ecológicas e as
sociais [...]” (LIMA, 2005, p. 340). Entretanto, a autora destaca que tais parcerias não
foram analisadas adequadamente, pois entre outros aspectos desconsiderados,
estava uma interpretação romântica de que a resposta positiva dessas populações
relacionava-se à sua economia baseada em uma prática ecológica consciente. Lima
(2005, p. 342) observa que:
a motivação ecológica encontrada entre os ribeirinhos não é obviamente a
mesma dos ambientalistas, defensores do ambiente em si, mas é orientada
por valores sociais que regem um modelo de compartilhamento comunitário
e horizontal dos recursos naturais [...] São contra a invasão de seus
territórios por pescadores de fora‟ e criticam moralmente a pesca intensiva,
vista como equivalente a um „roubo‟.
Essa motivação responde a uma lógica e a uma moral que adota uma
perspectiva de médio e longo prazo no uso dos recursos, o que os diferencia dos
pescadores profissionais. Neste sentido, Lima (2005) complementa que “os que
defendem o fechamento dos lagos e o manejo da pesca [...] têm em comum com os
ambientalistas o interesse em garantir a sustentabilidade do ambiente ao longo do
tempo, embora difiram em motivações e entendimentos” (LIMA, 2005, p. 347)
O conjunto de ações que vinham sendo realizadas para implementar a
Reserva ganhou impulso em 2000 com a aprovação de um projeto junto ao
Department for International Development (DFID), órgão do governo britânico. Esse
financiamento possibilitou a ampliação da equipe e infra-estrutura e,
conseqüentemente, das atividades realizadas. Inicialmente constituído de duas
pessoas (coordenador geral e coordenadora de campo), o Projeto Amanã passou a
contar com o apoio de mais nove membros, totalizando onze pessoas. Além de
70
outros profissionais, entre os quais um sociólogo, a equipe passou a contar com a
contribuição de promotores comunitários, lideranças locais contratadas para atuar na
organização comunitária dos setores da Reserva Amanã.
De acordo com Bezerra (2000, p. 4) as atividades nesse momento focaram,
principalmente: a (i) organização comunitária, (ii) mapeamento/zoneamento, (iii)
implantação de infra-estruturas, (iv) contatos com parcerias, (v) contratação da
equipe, (vi) divulgação e (vii) consultoria. Segundo a autora, desde a criação da
Reserva Amanã a participação comunitária ocupa lugar de destaque nos objetivos
da Reserva. Isto, no sentido de legitimar o processo de tomada de decisão e
elaboração do plano de manejo pelos diversos atores sociais envolvidos.
Esse período foi marcado pelo intenso trabalho de participação em reuniões
comunitárias, setoriais; incentivo à formação de comunidades, à criação de grupos
de jovens e de mulheres; realização de cursos, intercâmbios e treinamentos; entre
outros. Esse conjunto de ações visava contribuir para a consolidação dos objetivos
da Reserva e estabelecer mecanismos que pudessem proporcionar às comunidades
o empoderamento necessário para que suas demandas/sugestões direcionassem as
ações do projeto (Projeto Amanã). Como resultado dessas ações houve segundo
Bezerra (2000, p. 9):
[...] maior envolvimento dos (as) comunitários (as) na negociação de conflitos
de lagos, maior organização interna, melhoria da participação nos eventos da
RDSA e melhor entendimento/envolvimento dos objetivos do projeto, maior
efetividade na preservação de lagos comunitários, entre outros resultados
[...].
Com o estímulo da organização comunitária e dos setores e as
transformações que estavam ocorrendo, houve um crescimento do interesse
comunitário em discutir questões relacionadas aos problemas vivenciados pela
população, como invasões e uso dos recursos. Desta forma, em agosto de 2001,
apoiados pelo Projeto Amae outras entidades locais, realizaram a I Assembléia
Geral de Moradores da Reserva Amanã. O evento teve a duração de quatro dias e
participaram moradores dos três setores
28
da Reserva onde o Projeto Amanã
28
Segundo Bezerra (2000), nesse período as comunidades estavam organizadas em seis setores:
dois que fazem parte das comunidades usuárias da Reserva Mamirauá, um que era usuário da
Reserva Amanã, e outros três de comunidades moradoras da Reserva Amanã (Coraci, São José e
71
vinha desenvolvendo atividades , representantes de diversas instituições, como
Prelazia de Tefé, Centro Nacional de Desenvolvimento Sustentado das Populações
Tradicionais (CNPT), Secretaria de Educação de Maraã, Colônia de pescadores de
Tefé, IPAAM, além de representantes do IDSM e de comunidades da Reserva
Mamirauá.
A realização da assembléia foi de fundamental importância para discutir entre
os setores o que vinha sendo debatido pela equipe de extensionistas do Projeto
Amanã nas comunidades e internamente em cada setor. Os pontos destacados para
discussão nesse evento fiscalização, zoneamento e avaliação dos três anos da
Reserva revelam tanto o que era de interesse das comunidades, com questões
difíceis, mas necessárias, como zoneamento, quanto de interesse do Projeto
Amanã, buscando avaliar a percepção local sobre os trabalhos desenvolvidos.
O primeiro tema discutido foi o Zoneamento. Os promotores comunitários
informaram que um trabalho de esclarecimento e discussão sobre o tema foi
realizado ao longo do ano nas comunidades e explicaram novamente a importância
de se fazer um zoneamento. Apresentaram algumas dificuldades encontradas no
decorrer das discussões, entre as quais, a existência de propriedades particulares e
a não participação dos moradores de sítios isolados. Após novos esclarecimentos
sobre zoneamento e sua importância para que se conheçam as áreas de uso das
comunidades, o grupo foi dividido por setor para que as comunidades discutissem
entre e si e, ao final, cada grupo (setor) apresentou suas propostas.
O que se verificou em diversas áreas foi a necessidade de se realizar mais
debate entre as comunidades para que fossem resolvidos conflitos ou firmados
acordos de uso; enquanto em outras, estavam sendo confirmadas as propostas
debatidas nas comunidades. As comunidades em conflito por áreas de uso, que não
chegaram a um acordo durante a assembléia de 2001, deveriam continuar as
discussões após o evento. Mas o que se verifica é que alguns deles permanecem
sem solução, inclusive, também fizeram parte da pauta da assembléia geral de
2009, sem que tais divergências fossem resolvidas (IDSM, 2009).
Amanã). O Projeto Amanã priorizou as atividades dos primeiros anos nos setores das comunidades
de moradores.
72
Além da divisão de áreas e lagos por comunidade, foi discutida a divisão
política dos setores, onde estes apresentaram por meio de mapas os limites de suas
áreas. Em seguida, estes mapas foram contrastados para identificar pontos de
conflitos intersetoriais. A intenção era discutir e tentar apontar soluções para os
conflitos ou, em alguns casos, continuar as discussões nas comunidades e setores.
Entretanto, não foram identificados conflitos entre setores (BEZERRA, 2001). Esta
divisão foi votada e aprovada por todos, e ainda permanece nos dias atuais.
As áreas formadas pelos três setores e apontadas como de uso de suas
comunidades foram chamadas de “área focal”
29
. A partir da identificação das áreas
de uso, iniciaram o debate para definir as áreas destinadas à preservação
permanente. Através de um mapa destacando as áreas utilizadas pelas
comunidades de uma cor e o restante da reserva em outra, os moradores
verificaram que a área que não usam é maior que sua área de uso. Por essa razão,
disseram que não precisaria de área de preservação permanente na área focal. Os
membros do Projeto Amaexplicaram que diferente do que ocorreu em Mamirauá,
onde a área subsidiária também apresentava comunidades fazendo uso dos
recursos, levando os gestores da Reserva e comunidades a negociarem áreas de
preservação permanente sobretudo aquelas importantes do ponto de vista
ambiental para a reprodução de algumas espécies animais , em Amanã, essas
áreas não utilizadas pelas comunidades ao invés de serem classificadas como
subsidiária, seriam definidas como áreas de preservação permanente, em razão de
serem áreas de difícil acesso e de não se ter conhecimento sobre comunidades
nessas áreas (BEZERRA, 2001).
Outro tema de discussão da assembléia de 2001 foi a fiscalização. Esta
questão causou polêmica durante o debate. Em algumas comunidades estavam
atuando os agentes ambientais voluntários (AAVs)
30
, mas os representantes destes
29
Na Reserva Mamirauá a área focal refere-se à área onde foram concentrados os trabalhos de
pesquisa e extensão nos primeiros anos. O restante da Reserva foi chamado de área subsidiária para
onde as atividades estão sendo gradativamente replicadas, conforme os resultados experimentados
na área focal. Na Reserva Amanã, essa também foi a área onde foram concentrados os primeiros
trabalhos de pesquisa e extensão.
30
Categoria criada pelo Conselho Nacional de Meio Ambiente (CONAMA) através da Resolução
03/88 e, posteriormente, o IBAMA criou o Programa Agente Ambiental Voluntário através da Instrução
Normativa 19/01. Segundo Amâncio (2006), tal programa atua na formação e capacitação de
73
locais informaram que estavam com dificuldades, pois muitos desistiam por não
terem apoio financeiro, o que seria necessário, uma vez que precisam deixar suas
atividades e se deslocar para outras comunidades. Surgiram, durante o debate,
vários questionamentos, entre os quais, o porquê de trabalharem de forma voluntária
se os fiscais do IBAMA, que já recebem salário, precisam ganhar diárias quando seu
apoio é solicitado para acompanhar a fiscalização. Começaram a interrogar, então,
por que os promotores comunitários, contratados pelo IDSM, também recebem
salários, se tanto os AAVs quanto os promotores estariam cuidando de algo que é
deles? A grande preocupação parecia ser receber um salário. Em razão da
polêmica, decidiram que seria ampliada a discussão sobre fiscalização nas
comunidades pelo coordenador de fiscalização do IDSM para esclarecer as dúvidas
dos moradores.
Reivindicações semelhantes foram apontadas por Pantoja (2005) entre
agentes ambientais voluntários da região do médio Amazonas, uma vez que o
trabalho consome muitas horas de dedicação dos agentes. Segundo a autora, após
estas reivindicações, que se mostraram explícitas durante o I Fórum Integrado de
Gestão Participativa de Recursos Naturais da Várzea, realizado em Parintins/AM em
2003, estes tiveram seu papel reconhecido e consideradas legítimas suas
reivindicações por maior apoio e remuneração.
Lima (2005) destaca que ações como estas de não remuneração de agentes
ambientais voluntários, partem de uma representação equivocada de ribeirinhos e
populações tradicionais. Segundo a autora:
[...] entre mediadores e instituições ambientalistas a idéia de que a
iniciativa de promover a preservação de lagos partiu de uma população com
uma cultura pouco inclinada à mudança e a ganhos materiais [...] Nessa
parceria entre ribeirinhos e o Ibama, a delegação de atribuições não
remuneradas é um exemplo de expectativas para comportamentos e
aspirações da população ribeirinha que não correspondem aos seus próprios.
Em várias ocasiões, os agentes ambientais têm solicitado que sua atuação
passe a ser remunerada, apontando, como justificativas, a responsabilidade
envolvida, o custo da fiscalização, o tempo despendido e principalmente os
conflitos locais (que vão da cobrança ao desacato) que a atividade implica
(LIMA, 2005, p. 349).
lideranças comunitárias, que após o treinamento, são credenciadas e passam a atuar como
educadores ambientais e na fiscalização do uso dos recursos naturais.
74
Atualmente as ações desenvolvidas tanto pelos agentes ambientais
voluntários da Reserva Mamirauá quanto por aqueles da Reserva Amanã recebem
apoio do IDSM em combustível e alimentação para a atividade. Durante alguns anos
em que o programa de fiscalização teve várias fontes de recursos financeiros, além
do apoio que é oferecido atualmente, os AAVs recebiam diárias como forma de
compensar os dias em que estavam envolvidos na atividade de fiscalização. Hoje a
atividade não é remunerada, somente quando missões de fiscalização que
ocorrem a cada três meses os AAVs participantes recebem diárias
31
.
Outro ponto importante discutido durante a assembléia em 2001 para
direcionar as ações que estavam sendo desenvolvidas na Reserva Amanã, foi a
avaliação dos três anos de trabalho do Projeto Amanã na área. Os extensionistas
apresentaram um resumo das atividades desenvolvidas no período. Os promotores
comunitários também expuseram uma síntese dos trabalhos que realizaram. Para
avaliar a atuação do Projeto, os participantes da assembléia foram divididos por
setores e estes deveriam responder as seguintes questões: o que acham da atuação
do Projeto Amanã? Quais as dificuldades encontradas nos setores? O que esperam
da Reserva Amanã?
As respostas foram diversificadas, o setor Amanã foi o que apresentou
maiores dificuldades e mais demandas. Mas pontos comuns nas respostas dos
setores foram observados. Sobre a atuação do Projeto Amanã, os três setores
destacaram como positiva a atuação referente à organização comunitária. Segundo
eles, o apoio do projeto contribuiu para maior organização das comunidades e maior
participação dos moradores nas reuniões, tanto comunitárias, quanto setoriais.
Apesar desse aumento da organização comunitária, em resposta à segunda
pergunta, a falta de participação das comunidades foi apontada como umas das
maiores dificuldades enfrentadas, associada a isto, havia, segundo eles, a falta de
organização das comunidades. No que se refere às expectativas em relação à
Reserva, além de apoio nas dificuldades apresentadas, como continuar o trabalho
de organização comunitária, os moradores manifestaram o desejo de que com a
Reserva tenham maior apoio em serviços básicos, como saúde e educação.
31
Informações obtidas via correio eletrônico com Paulo Roberto Souza, coordenador do Sub-
programa de Fiscalização do IDSM.
75
No encerramento da Assembléia, a coordenadora de campo do Projeto
Amanã informou algumas mudanças
32
. A partir daquele momento as atividades do
Projeto Amanã seriam integradas às do Instituto Mamirauá. Com isto, as atividades
desenvolvidas na Reserva Mamirauá seriam estendidas para a Reserva Amanã, e a
coordenação exclusiva de Amanã deixaria de existir. Nesse processo as metas
tiveram que ser ajustadas e as equipes redistribuídas. A coordenadora de campo do
Projeto Amanã assumiu a coordenação do Programa de Agricultura e o
extensionista que atuava na área de Amanã continuou sua atividade nos três setores
(Amanã, Coraci e São José), porém se reportando à coordenação e
subcoordenação de extensão do IDSM. Os promotores comunitários continuaram
com seus trabalhos em áreas específicas da Reserva Amanã, mas os demais
funcionários do Instituto atuariam, a partir de então, em Mamirauá e Amanã.
Esta transição de uma situação onde havia um “Projeto Amanã” e um “Projeto
Mamirauá” para uma condição em que estavam integrados ocorreu por várias
razões. Segundo Helder Queiroz (comunicação via correio eletrônico, maio de
2010), diretor técnico científico do IDSM, as mais importantes teriam sido: 1) as
dificuldades em conduzir os trabalhos em Amanã após o afastamento de Márcio
Ayres em 2001 por problemas de saúde. O “Projeto Amanã era uma coisa muito
próxima ao Márcio, a quem a equipe se reportava diretamente”, quando ficou doente
“ele não pôde mais supervisionar as atividades, que tiveram que ser passadas para
o grupo de pessoas que ajudava a conduzir o IDSM”; 2) o aumento da demanda das
comunidades por apoio em várias áreas, além da participação comunitária e
agricultura familiar, onde os trabalhos estavam centrados inicialmente. O IDSM não
possuía recursos para replicar a estrutura dos programas já existentes, de forma que
pudesse existir um para cada Reserva; 3) o contrato de gestão firmado em 2001
com o MCT “[...] reunia apenas um quadro de indicadores e metas de performance e
não dava para dividir [...] entre as duas reservas”, portanto os recursos financeiros
não poderiam ser separados por reserva.
32
Informações obtidas nos seguintes documentos: IDSM. Ata da I Assembléia Geral da Reserva de
Desenvolvimento Sustentável Amanã, agosto de 2001; IDSM. Ata da Reunião de Integração
Mamirauá/Amanã, setembro de 2001; Isabel Sousa, comunicação via correio eletrônico, abril de
2010; Helder Queiroz, comunicação via correio eletrônico, maio de 2010.
76
De acordo com Helder Queiroz, esse conjunto de fatores, aliado a um
problema político, contribuiu para encerrar o Projeto Amanã e integrar as atividades
por este desenvolvidas às ações do IDSM. O conhecimento sobre esse problema
político esclarece as divergências entre uma liderança muito forte do setor Amanã e
o IDSM. Conforme o depoimento, tal problema emergiu quando se tornaram
evidentes as diferenças na maneira de fazer conservação e gestão de RDS entre o
IDSM e o GPD, um grupo local que atuava em Amanã e que tinha entre seus
membros aquela liderança do setor Amanã. As ações desse grupo eram dirigidas ao
desenvolvimento das pessoas e comunidades e não apresentavam uma base
teórica para o uso sustentável dos recursos naturais. Muitas vezes foram propostas
atividades que se mostraram inadequadas para a sustentabilidade ecológica de
Amanã. Isso se tornou evidente quando o grupo buscou apoio de um financiador
para uma dessas atividades sem comunicar aos gestores da Reserva (Estado e
IDSM). Apoiado pela coordenadora de campo do Projeto Amanã, que assinou o
documento sem consultar a diretoria do IDSM, o grupo conseguiu aprovar o
financiamento. Ao tomar conhecimento do fato, a diretoria do IDSM enviou ofício
questionando sobre a proposta e lembrando que se tratava de uma Unidade de
Conservação com gestor e co-gestor e, portanto, não se poderiam realizar
atividades sem a anuência desses órgãos. Em resposta o grupo informou que faria o
que desejasse, pois não reconhecia o direito do governo do estado em realizar a
gestão da área.
Embora não tenha sido predominante, esse fato contribuiu, juntamente com
os outros fatores, para o fim do Projeto Amanã e a integração das atividades das
duas reservas. O mesmo também deu origem à irritação daquela liderança em
relação ao Instituto, pois todos os extensionistas que o apoiavam acabaram saindo
aos poucos do IDSM. Essa desavença continua a ter implicações nas atividades
desenvolvidas na área do setor Amanã, pois freqüentemente o mesmo líder que
atualmente ocupa a função de presidente do setor Amanã e também conseguiu
eleger-se vereador pelo município de Maraã nas últimas eleições municipais tem
dificultado a realização de pesquisas no setor, mais especificamente na área da
comunidade onde reside. O próprio projeto de peixes ornamentais não pôde realizar
levantamento ictiológico na área desta comunidade porque não teve autorização
dessa liderança, que na ocasião também ocupava o cargo de presidente de sua
77
comunidade. O mesmo autorizou inicialmente e permitiu a realização do
levantamento socioeconômico, no entanto, no momento em que os demais membros
do projeto tentaram entrar no igarapé de uso da comunidade para iniciar a pesquisa,
foram impedidos.
De modo geral, o que se observou nos relatórios dos primeiros anos de
atuação na Reserva Amanã, foi uma concentração da atenção às atividades de
participação comunitária. É possível perceber uma correlação entre essas ações
realizadas nesse período inicial e os efeitos apontados pelos moradores durante as
entrevistas para este trabalho, descritos no último item deste capítulo. A ênfase nas
atividades de organização comunitária e formação de lideranças observadas nesses
documentos, assim como na avaliação realizada na assembléia geral em 2001,
possibilitaram aos moradores locais ampliar o acesso a informações que, segundo
eles, influenciaram positivamente nas formas de organização das comunidades.
3.2 A escolha do modelo de gestão e a relação entre os atores
O modelo de conservação da natureza implantado em Mamirauá, que
reconhece a importância de conciliar conservação e desenvolvimento social, foi um
fator importante para o processo de aceitação da proposta por parte da população
local. De acordo com Lima (1996), em razão da área está localizada em um
ambiente de várzea, no qual os recursos pesqueiros, madeireiros e agrícolas
possuem grande importância econômica para a região, o fechamento total da área
afetaria não apenas a população local, mas também a economia regional, o que
geraria oposição política e inviabilizaria sua implementação, demandando maiores
esforços para a fiscalização da unidade.
Entretanto, embora o modelo tenha contribuído para a aceitação da Reserva
Mamirauá, Lima (1996) aponta que a participação da população local na gestão dos
recursos e na elaboração do plano de manejo levou tempo, e foi ajustada às normas
de organização existentes. A elaboração de um sistema de participação
comunitária foi facilitada pela existência não do movimento de preservação de
78
lagos
33
, como também pelo fato de haver uma organização política nas
comunidades, incentivada pelo Movimento de Educação de Base (MEB) a partir da
década de 1960.
As comunidades de Mamirauá e Amanã, assim como grande parte das
comunidades do médio Solimões, foram formadas a partir do estímulo da Prelazia
de Tefé, através das ações do MEB, que objetivavam não apenas a evangelização,
mas também o despertar político da população ribeirinha, conforme vemos no
depoimento de Protázio Pessoa, ex-supervisor educacional do MEB em Tefé, a
Delma Pessanha Neves:
[...] também [objetivava] fazer com que o homem se promovesse, sentisse
que tinha valor, sem aquela estrutura de dominação [...], sem a escravidão.
Isso era necessário para fazer o homem pensar como reagir. Então esse
movimento de educação de base fazia esse primeiro contato (Protázio
Pessoa apud NEVES, 2003, p. 32-33).
Entre as atividades estimuladas pelos agentes educacionais do MEB
destacam-se a construção de escolas e casas comunitárias, objetivando o
fortalecimento e o engajamento político das comunidades. Além disso, era
incentivada, ainda, a limpeza da comunidade e a criação de campos de futebol para
o lazer dos moradores nos finais de semana. Tais práticas podem ser observadas
ainda hoje na maioria das comunidades, na realização de ajuris para limpeza dos
espaços comuns a todos ou na existência de campos de futebol em quase todas,
pois representa uma importante área de lazer para os moradores, independente de
sexo ou idade.
Seguindo o modelo político estabelecido pelo MEB desde a década de 1960,
essas comunidades passaram a se organizar através da formação de associações
comunitárias, que representam oficialmente os moradores. De acordo com Neves
(2005), essa forma de organização inaugura para os ribeirinhos a convivência com a
representação delegada em vários níveis. Em primeiro plano o líder da associação
ou da comunidade responde pelos moradores junto às lideranças de outras
33
Movimento incentivado pela Prelazia de Tefé na década de 1980, que consistia na regulação do
acesso e uso de lagos comunitários, em razão da intensificação da pesca nos lagos de várzea e de
terra firme por pescadores comerciais. Intencionava-se resolver os conflitos entre estes e moradores
locais e evitar a degradação dos estoques pesqueiros e a conseqüente falta de alimento para as
comunidades (OLIVEIRA; CUNHA, 2001; NEVES, 2003).
79
comunidades com as quais se relacionam pela delimitação de um setor. E num
plano de maior amplitude de relações sociais, era reconhecido pelos demais líderes
de comunidade, assim como pelos representantes de instituições governamentais e
não governamentais. Neste sentido, além da organização em comunidades, estas
também foram agrupadas politicamente em setores
34
, de forma a facilitar as
decisões políticas e de uso dos recursos. Essa forma de organização social e
política se mantêm ainda hoje e contribuiu significativamente no processo de
construção do modelo de participação em Mamirauá.
A partir do conhecimento desse histórico e da compreensão do modelo
político incentivado pelo MEB, que culminou no movimento de preservação de lagos,
na década de 1980, pode-se compreender o modelo de participação e
representação idealizado pelas comunidades. Houve ainda, segundo Reis (2005),
um esforço dos programas sociais de Mamirauá em investigar os aspectos sociais e
políticos das comunidades de forma a orientar as abordagens que seriam adotadas.
Desta forma, entre os anos de 1992 e 1994, avanços relacionados à
organização comunitária foram evidenciados. Um modelo político foi escolhido e
reconhecido pelos comunitários, no qual anualmente todas as comunidades da
reserva se reúnem em assembléia geral com representantes de instituições que
atuam ou possuem interesse na área para discutir o manejo e o sistema
representativo. Além desses encontros anuais, reuniões bimestrais o realizadas
nos setores
35
para discutir os problemas locais de uso dos recursos. Nas
assembléias gerais, as diversas lideranças discutem, entre outros assuntos, o
zoneamento e as normas de uso dos recursos da área. Lima (1996) salienta que
apesar desses momentos envolverem a participação decisiva das lideranças, nem
sempre as decisões tomadas foram mantidas pelas comunidades, uma vez que são
processos dinâmicos. Houve casos de mudanças quanto às categorias de lagos de
uma assembléia para outra, e disputas entre comunidades por lagos. Para a
34
Os setores são conjuntos de assentamentos localizados próximos uns dos outros, que usam em
comum uma mesma área, por isso tomam decisões conjuntas sobre o manejo dos recursos e sobre
questões políticas locais.
35
A população de Mamirauá organiza-se em comunidades, e estas, se agrupam em setores (conjunto
de comunidades próximas que fazem uso conjunto dos recursos) para discussão dos problemas
políticos locais e das normas de uso dos recursos.
80
autora, a mediação desses conflitos requer a compreensão do histórico e da
organização social dessas comunidades.
Reis (2005) analisa o modelo político de participação eleitos pelas
comunidades. Segundo a autora:
o modelo funcionou de forma flexível, horizontal e igualitária, permitindo a
participação aberta e o voto de todos os participantes. Foi assim definido: as
comunidades são as menores unidades políticas da área e se reúnem
internamente uma vez por semana, sob a coordenação dos seus
presidentes e representantes comunitários (que pode ser ou não a mesma
pessoa) para discutir suas propostas e problemas; unidades maiores,
denominadas de setores, que se constituem de grupos de cinco a treze
grupamentos próximos de usuários da Reserva, se reunindo de dois em
dois meses para discutir os assuntos levantados nas reuniões comunitárias
ou no próprio setor; e finalmente as assembléias gerais anuais que reúnem
todos os setores de comunidades com seus representantes comunitários e
setoriais. Duas lideranças denominadas de representantes comunitários,
eleitos por localidade; dois comunitários chamados coordenadores de setor,
indicados para a articulação de cada setor e por representá-lo nas
instâncias de decisão são responsáveis pela mobilização dos moradores no
processo de participação (REIS, 2005, p. 142).
Para ela, este sistema político favorece a participação ampla, pois o mesmo
está livre da hierarquia. A existência de cargos de presidentes e representantes
comunitários, não impede que os demais participantes desses eventos expressem
sua opinião. “Na prática, o sistema eleito pelos usuários de Mamirauá funciona de
maneira flexível e livre de uma hierarquia restritiva ou excludente” (REIS, 2005, p.
143). Mas, a partir de 2002, houve a necessidade de rediscutir as formas de
representação e voto das comunidades. No ano seguinte os participantes aprovaram
o regimento interno mantendo a abertura de participação, entretanto, restringindo o
voto aos representantes comunitários designados previamente pelas comunidades.
Reis (2005) acredita que a estrutura representativa eleita durante estes anos
pelos usuários de Mamirauá, caracteriza-se pela abertura e flexibilidade, o que
facilitou a participação. No entanto, algumas limitações foram observadas, como: “a
falta de preparo das lideranças, as dificuldades comunitárias de lidar com as
contradições internas, de trabalhar seguindo critérios institucionais (...)” (REIS, 2005,
81
p. 143). Tais dificuldades encontradas foram ampla e coletivamente discutidas entre
os protagonistas desse processo.
Atualmente, além do modelo político de organização descrito, a Reserva
Mamirauá possui também outra instância de tomada de decisão, o Conselho
Deliberativo, conforme disposto no parágrafo 4
o
do Artigo 20 do SNUC:
A Reserva de Desenvolvimento Sustentável será gerida por um Conselho
Deliberativo, presidido pelo órgão responsável por sua administração e
constituído por representantes de órgãos públicos, de organizações da
sociedade civil e das populações tradicionais residentes na área, conforme
se dispuser em regulamento e no ato de criação da unidade (BRASIL, 2000:
Art. 20, § 4
o
).
Assim como o modelo de organização social e político descrito anteriormente,
o processo de formação e implementação do Conselho Deliberativo da Reserva
Mamirauá levou tempo. As discussões com as comunidades e instituições para
esclarecimento sobre o Conselho começaram a partir de 2004 em várias instâncias
de organização: em reuniões comunitárias; encontros de setor; assembléias gerais;
oficinas de relações de gênero; e cursos de capacitação.
Nas reuniões comunitárias debateram a importância da nova organização e
de que forma as comunidades poderiam participar. As discussões nos encontros de
setor definiram as formas de representação no Conselho, no qual cada setor
escolheu um representante titular e um suplente. Nas assembléias gerais discutiram
as representações das entidades e o funcionamento do Conselho. Além desses
debates realizados nas três instâncias de organização das comunidades, foram
promovidos encontros de grupos espeficos visando incentivar a participação.
Neste sentido, reconhecendo a importância de se considerar as relações de gênero
nas formas de representação política, foram realizadas as Oficinas de Relações de
Gênero, nas quais discutiram a participação das mulheres nas decisões e como
fazer para envolvê-las nesta organização.
Após a escolha dos representantes dos setores e instituições participantes,
iniciaram os cursos de capacitação de conselheiros, nos quais discutiram as formas
de ação dos membros e a elaboração do regimento interno como forma de exercício,
além de levantar propostas de atuação do Conselho na reserva. O primeiro curso foi
realizado em janeiro de 2005 e ocorreram outros ao longo do mesmo ano. Em
dezembro de 2005 o Conselho Deliberativo da Reserva de Desenvolvimento
82
Sustentável Mamirauá (CDRDSM) foi instalado pelo órgão gestor da unidade, o
IPAAM, responsável pela execução de políticas ambientais do Estado do Amazonas.
Em 19 de dezembro de 2009 o CDRDSM foi constituído e em 05 de fevereiro de
2010, a Secretaria de Estado do Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável
(SDS) formalizou a sua criação em diário oficial por meio da portaria número
015/2010 (Cf. AMAZONAS, 2010). O CDRDSM é composto por 32 representantes
titulares e 34 suplentes, de diversas instituições do Estado, nas quais estão incluídas
as prefeituras da área de influência da reserva; instituições da sociedade civil; e
representantes dos diversos setores da reserva, assim como do Grupo de Mulheres
da Reserva Mamirauá e dos Agentes Ambientais Voluntários.
As reuniões do Conselho ocorrem a cada quatro meses, coordenadas pela
instituição presidente. O Conselho Deliberativo configura-se como órgão maior para
tomada de decisão das questões relativas à reserva, no entanto, as assembléias
gerais continuarão, e pretende-se que sejam fortalecidas para poderem levar
propostas ao Conselho, ficando este responsável pelas decisões finais.
Na Reserva Amanã o Conselho ainda não foi constituído. As ações de
esclarecimento e preparação para formação do Conselho Deliberativo iniciaram em
fins de 2006 em reuniões com lideranças dos vários setores da Reserva e foram
ampliadas para reuniões comunitárias e setoriais, inclusive, sendo um dos temas de
debate da assembléia geral de Reserva Amanã realizada em 2009. Nesse evento foi
encaminhado que seriam realizadas capacitações de preparação de conselheiros
mesmo processo realizado em Mamirauá a partir de novembro do mesmo ano e
tais capacitações ficariam a cargo do IDSM e do Centro Estadual de Unidade de
Conservação (CEUC). De acordo com o representante do CEUC na assembléia de
2009, o que se espera é que o Conselho seja criado antes do Plano de Gestão da
Reserva Amanã, cuja finalização está prevista para o final de 2010, pois é o
Conselho que aprova o Plano de Gestão da Unidade.
Pelo exposto, nota-se que a construção de um modelo de participação é um
processo lento e enfrenta inúmeras dificuldades ao longo do caminho, como as
verificadas por Reis (2005) durante o processo de implementação da Reserva
Mamirauá ou como observado na instabilidade durante o processo de constituição
do CDRDSM em virtude da troca freqüente de representante das instituições e das
83
comunidades. Neste sentido, a análise de Lima (1996) dos primeiros seis anos de
trabalho de construção de um modelo participativo parece refletir, ainda, a realidade
de hoje, vinte anos depois da criação da Reserva Mamirauá. Segundo a autora, a
experiência com o envolvimento de populações locais desenvolvida em Mamirauá,
não seguiu nenhum modelo rígido. Ao contrário, foi sendo construído e, ainda está
em processo de construção. Ao longo do processo de interação com as populações
locais, as demandas e costumes locais vêm sendo ajustadas à intenção de construir
um sistema de uso sustentado da várzea, de forma que combine a preservação da
biodiversidade e a qualidade de vida da população.
3.3 A percepção dos moradores locais quanto à criação da Reserva
Um dos aspectos que este estudo buscou investigar foi a percepção da
população local quanto a possíveis efeitos das transformações territoriais ocorridas
na área em razão do decreto de criação da Reserva. Os entrevistados foram
divididos em dois grupos: um de pessoas ligadas ao Projeto de Manejo de Peixes
Ornamentais (que foram chamados de envolvidos) e outro formado por lideranças
comunitárias (não envolvidos). Os resultados demonstraram não haver diferenças
significativas nas posições dos entrevistados quanto à criação da Reserva,
independente de estarem diretamente envolvidos ou não em uma atividade de
manejo proposta pelo IDSM.
Questionados sobre como tiveram conhecimento de que a região havia sido
transformada em Reserva, a maior parte dos membros do GMPOA (69%) disse ter
recebido tais informações de pessoas externas, geralmente pesquisadores ligados
ao Instituto. Os demais disseram terem sido informados por moradores das
comunidades da área. As lideranças comunitárias também destacaram essas duas
fontes de informações, entretanto as respostas foram mais equilibradas e houve
ainda um líder que informou ter sido ele próprio responsável pela solicitação de
criação da Reserva, fato que foi confirmado posteriormente
36
.
36
Este morador esteve presente na V Assembléia Geral de Moradores e Usuários da Reserva
Mamirauá, realizada em 1997. Durante o evento ouviu relatos dos moradores sobre as melhorias que
84
Embora tenha havido o pedido de um morador, o que se observa é que o
movimento para a criação da reserva foi externo, como foi mencionado no segundo
capítulo sobre as pesquisas que vinham sendo realizadas na região antes mesmo
da criação da Reserva Amanã e a importância estratégica dessa área para a
consolidação do Corredor da Amazônia Central (Cf. QUEIROZ, 2005). Isto pôde ser
observado, também, nas entrevistas quando se questionou como chegou a notícia
de criação da reserva. Tanto os membros do GMPOA quanto lideranças
comunitárias informaram que tiveram conhecimento por meio de pesquisadores do
Instituto, que chegavam à área, justamente, para informar sobre o decreto e iniciar
os trabalhos de extensão.
Com a notícia de criação Reserva diversas outras informações foram
chegando aos moradores. Muito se especulou sobre o que aconteceria após a
criação da Reserva e o que se percebe em todos os depoimentos é que havia
muitas dúvidas. Ao mesmo tempo em que ouviam que a “Reserva” traria coisas boas
e que haveria uma melhoria na vida da população, também ouviam que tudo seria
proibido, que “os estrangeiros” levariam tudo embora. Os trechos a seguir, retirados
de algumas entrevistas demonstram a insegurança gerada:
Algumas pessoas falavam que não ia poder mais fazer roça, que não ia mais
pescar, isso era conversa de gente que não entende. Outros diziam que ia
melhorar, que ia ter fartura, que os peixeiros não iam poder entrar. Então
eram notícias boas e ruins. Outros diziam que o pessoal do Mamirauá ia levar
os bichos, os peixes-boi, mas depois a gente foi vendo que não era o que
eles diziam” (Homem, presidente da comunidade Santo Estevão, líder do
GMPOA).
"Sempre falavam que não ia poder tirar nem uma vara pra poder fazer um
caniço, porque os macaqueiros não iam deixar [...] Muita gente quando achou
que era reserva dizia assim: „tu lascado‟. As pessoas que diziam isso eram
de Tefé, mas tinha muita gente da região que também ficou chateado. Mas
não sei o que eles pensam porque se hoje nós não pensarmos no futuro,
coitado de nós. O presente somos nós, o futuro são essas crianças" (Homem,
presidente da comunidade Boa Esperança).
“A notícia que corria era isso mesmo que acontecendo, que não ia entrar
peixeiro, que a Reserva era sustentável, que o trabalho dos agricultores não
ia parar. Mas tinha muita gente que era contra, aos poucos eles foram
entendendo que como reserva não ia parar de tirar, mas ia tirar controlado,
porque o pessoal antes tirava o tanto que queria (Homem, morador da
comunidade Vila Nova, membro do GMPOA).
vieram com a criação da Reserva Mamirauá e solicitou ao Márcio Ayres que tentasse criar uma
Reserva também na área de Amanã para que pudesse resolver o problema das invasões de
peixeiros.
85
“O pessoal falava que era pra prejudicar, que os estrangeiros iam levar as
coisas e a gente ficava perturbado (Homem, presidente da comunidade Belo
Monte).
“Diziam que ninguém ia ter mais direito de nada. o iam poder tirar uma
vara para mosquiteiro, que até os peixes pra gente comer teria que ser
pesado. Acho que por isso que o pessoal ficou contra. Agora aqueles que
eram contra o os que estão mais envolvidos" (Mulher, tesoureira da
comunidade Monte Sinai, secretária do GMPOA).
“Primeiro eles diziam que depois que se criasse reserva ninguém ia poder
mais fazer nada. E depois quem ia mandar aqui era o pessoal de fora, não
era mais as comunidades. Mas eu não entendia por esse lado, eu sempre
entendi que se a reserva ia ser criada era porque a gente vivia aqui (Homem,
presidente da comunidade Boa Vista do Calafate, vice-presidente do setor
Amanã).
“[...] não só as pessoas daqui [Moradores da Reserva] como as pessoas lá de
fora que diziam „rapaz, vocês vão se dar mal, vocês não aceitem porque não
vai ficar fácil, vocês não vão poder tirar uma vara e vão sair de sem direito
a nada‟. E as conversas eram essas, a maior parte. Outras depois diziam
„não, vai melhorar e a gente viu que aqui e acolá uma melhorada, foi
melhorando, foi melhorando e o pessoal foi acreditando que o era
realmente o que o pessoal dizia” (Homem, presidente da comunidade Bom
Jesus do Baré).
“O que as pessoas falavam é que esse trabalho de criação da reserva era
para beneficiar outros países, principalmente os Estados Unidos, e que
estavam enganando as pessoas de
37
(Mulher, moradora da comunidade
Vila Nova, membro do GMPOA).
Passados onze anos desde a criação da Reserva Amanã pelo governo do
Amazonas, os moradores parecem não ter dúvidas de que houve transformações.
Questionados se perceberam mudanças após a criação da Reserva, todos os
entrevistados, tanto membros do GMPOA quanto as lideranças comunitárias
disseram ter observado mudanças em diversos aspectos. O aspecto mais
mencionado pelos entrevistados de ambos os grupos, foi sobre as invasões. De
acordo com os depoimentos, antes de a área ter sido decretada Reserva, ocorriam
invasões freqüentes de peixeiros vindos das cidades. Percebe-se aqui, que o
sentido atribuído pelos moradores ao “peixeiro”, refere-se à categoria descrita por
Lima (2005). De acordo com a autora, na região do médio Solimões os pescadores
urbanos são classificados em “peixeirinho” e “peixeiro”:
37
A entrevistada fez referência a “as pessoas de lá”, pois a mesma é natural de Tefé, mudou-se para
a Reserva Amanã quando se casou com um morador de lá, anos depois da criação da Reserva. Mas
no período da entrevista tinha voltado a morar em Tefé pelo menos um ano. Tal fato não impediu
que ela e o marido participassem das atividades de manejo de pesca e manejo de peixes
ornamentais, uma vez que uma das normas de ocupação estabelecidas pelas comunidades é que os
moradores que deixam as comunidades perdem os direitos de uso somente após dois anos.
86
o primeiro reside nas sedes dos municípios próximos à área que explora,
viajando em pequeno motor de centro, pescando e negociando com
comunitários a troca de peixe ou de outros produtos [...]. O segundo vem de
cidades maiores, como Manaus e Manacapuru, são donos de grandes
embarcações, têm pouco contato com as comunidades e atuam na calha
dos rios (LIMA, 2005, p. 344).
Os depoimentos, em sua grande maioria, fazem referência a este último. Os
relatos são de que se formavam filas de barcos pesqueiros no paranã
38
que
acesso ao lago Amanã. A pressão sobre os recursos pesqueiros exercida pelos
“invasores” estava ocasionando a diminuição deste recurso, tornando a pesca mais
difícil para os moradores. Com a Reserva, os pescadores das cidades deixaram de
entrar na área, o que contribuiu para que os estoques pesqueiros se recuperassem
de acordo com a percepção dos moradores. O trecho a seguir ilustra a opinião da
maioria dos entrevistados: “[...] antes entravam os peixeiros e tiravam tudo que eles
queriam. Agora que não entram mais, a gente pega peixe de malhadeirinha
39
até no
porto [de casa], pega muito” (Homem, morador da comunidade Bom Jesus do Baré,
membro do GMPOA).
A diminuição da pesca não se restringiu apenas aos pescadores “de fora”. De
acordo com alguns depoimentos, os próprios moradores foram reduzindo a
quantidade pescada e/ou deixando de pescar aquelas espécies mais ameaçadas,
como podemos observar em alguns fragmentos desses relatos:
“[...] os pescadores daqui mesmo que pescavam peixe-boi foram parando de
pescar” (Homem, presidente da comunidade Vila Nova).
“[...] a gente trabalhava mais em pesca. Agora a gente não pode mais fazer
isso, na agricultura mesmo, porque foi feito um acordo entre as quatro
comunidades de tirar o peixe no manejo
40
, a não ser que comunique as
comunidades e fale de quanto está precisando” (Homem, presidente da
comunidade Boa Vista do Calafate, vice-presidente do setor Amanã).
38
De acordo com Sousa (2005, p. 87), os paranãs ou paranás seriam braços de rios que
conduzem águas desviando-se do curso normal do volume de maior substância, muitos deles usados
como atalhos nas viagens”.
39
Instrumento utilizado para a pesca de peixes pequenos, na maioria dos casos para própria
alimentação. O tamanho da malha é menor que as malhadeiras convencionais, geralmente de 35 a
60 mm (6 a 12 cm). * Informações fornecidas em 2006 por Saíde Pereira, morador da Reserva
Mamirauá que foi por muitos anos membro do Programa de Manejo de Pesca do IDSM.
40
Acordo firmado entre as comunidades Boa Vista do Calafate, Monte Sinai, Santo Estevão e Vila
Nova, que dividem a mesma área de uso, segundo o zoneamento acordado na Assembléia Geral de
Moradores em 2001. Decidiram preservar algumas de suas áreas para realizarem manejo de pesca,
sobretudo de pirarucu. Em novembro de 2009 realizaram o primeiro manejo de pirarucu na área.
87
Outro aspecto de mudança relatado pelos moradores refere-se ao acesso a
informações. Estas foram ampliadas com o início das atividades de extensão após a
criação da Reserva. Nas reuniões realizadas pelos extensionistas do IDSM, os
moradores passaram a receber informações sobre o funcionamento de uma RDS,
discutir e estabelecer normas de uso dos recursos, organização comunitária,
pesquisas científicas, treinamentos para atividades de manejo, entre muitas outras
informações que passaram a ter acesso, para que se pudesse atender aos
princípios que regem a categoria RDS.
Na maioria das falas, sobretudo entre aqueles que se destacam como
lideranças em suas comunidades como se pode observar nos trechos abaixo , foi
possível perceber esse aspecto como fator de mudança na vida pessoal dos
entrevistados, o que parece estar contribuindo para o fortalecimento da organização
comunitária:
“Ah, mudou, mudou em vários sentidos. Pra mim eu me sinto mais protegido,
eu me sinto mais orientado, com mais informação, porque eu não tive
oportunidade de estudar [...] e eu ganhei essa prática participando [...] fui
em Brasília, já fui em Manaus quatro vezes e nunca paguei passagem,
recebo minhas diárias, só mesmo pra participar porque o pessoal acha que
eu sou importante pra participando das coisas, então pra mim melhorou"
(Homem, presidente da comunidade Boa Esperança).
“Mudou [...] primeiro em relação à articulação e conhecimento de organização
e amadurecimento na vida de comunidade como liderança. Certo que 50% foi
esforço meu, mas 50% teve o apoio das pessoas que vieram de fora”
(Homem, presidente da comunidade Boa Vista do Calafate, vice-presidente
do setor Amanã).
“Antes eu participava das reuniões da igreja como catequista, depois comecei
a participar das reuniões de setor, que antes eram pela igreja, depois
passaram a ser de organização comunitária. E participando dessas reuniões
depois fui escolhido presidente da comunidade, e tudo isso foi trazendo mais
conhecimento que fizeram com que minha vida fosse como é hoje (Homem,
presidente da comunidade Santo Estevão, líder do GMPOA).
“Na vida mudou mais em termos de organização comunitária porque a gente
teve mais orientação (Homem, presidente da comunidade Belo Monte).
Pelo que se pôde observar, embora a solicitação para a criação da Reserva
Amanã não tenha partido de um consenso entre as lideranças das comunidades
locais, mas do pedido de um morador, influenciado pelo que ouviu durante a
Assembléia Geral de Moradores da Reserva Mamirauá em 1997, e também, ter sido
a proposta elaborada por pesquisadores (SCM/IPAAM/INPA), os resultados dos
88
trabalhos desenvolvidos até o momento pelo IDSM e seus parceiros, parecem ter
contribuído para conquistar o apoio da população.
O apoio à criação da Reserva foi unânime entre os entrevistados. Tanto
membros do GMPOA quanto as lideranças comunitárias, afirmaram que apoiariam a
criação da Reserva Amanã caso esse processo ocorresse hoje. Neste sentido,
percebe-se que ainda muitas dúvidas entre os moradores, quanto às pesquisas
realizadas, ao que é feito com os materiais coletados na área, mas atualmente a
insegurança parece ser menor porque os resultados podem ser sentidos e,
muitos, são destacados como positivos, o que de certo modo tranqüiliza os
moradores.
Vale lembrar que todo o processo de construção do modelo de organização e
participação comunitária das Reservas Mamirauá e Amanã é resultado, também, de
um trabalho forte de organização e apoio comunitário dirigido por membros da Igreja
Católica, atuante na região desde a década de 1960. A ação da Igreja na articulação
desses grupos humanos foi extremamente importante para que se chegasse à forma
de organização existente atualmente nessas comunidades. A este aspecto
voltaremos no próximo capítulo.
89
Capítulo 4:
Manejo de peixes ornamentais: práticas e percepções em Amanã
Este capítulo direciona-se mais especificamente para a proposta de manejar
espécies de peixes consideradas ornamentais. Nele apresenta-se uma
caracterização socioeconômica das comunidades e famílias do setor Amanã onde o
projeto de peixes ornamentais realizou consultas e iniciou atividade de manejo.
Apresenta-se, também, o processo de formação do GMPOA, os aspectos
socioeconômicos do conjunto de famílias que compõem o grupo de manejadores, os
procedimentos de preparação para a pesca manejada através dos cursos de
capacitação e, finalmente, as impressões tanto dos membros do GMPOA quanto
das lideranças comunitárias do setor sobre a atuação do projeto de peixes
ornamentais na área.
4.1 As comunidades locais: caracterização socioeconômica
A organização dos assentamentos das margens dos rios na região do médio
Solimões em comunidades, remonta à atuação da Prelazia de Tefé junto à
população rural. De acordo com Neves (2005), no início da década de 1970 a
Prelazia de Tefé criou as Comunidades Eclesiais de Base (CEBs), a partir de uma
nova concepção de Igreja, na qual “[...] o trabalho missionário foi transferido para os
agentes pastorais e expandido para e pela constituição de aglomerados fixados às
margens dos rios e lagos, desde então reconhecidos como comunidades” (NEVES,
2005, p. 125). A intenção, segundo a autora, era que os ribeirinhos, mais próximos,
pudessem construir e usufruir de equipamentos institucionais como capela e
associação comunitária, além de facilitar o atendimento às demandas por serviços
públicos, como saúde e educação.
Deste modo, quando as Reservas Mamirauá e Ama foram criadas
existiam muitos assentamentos organizados segundo este modelo de integração
social e político, estimulado pela Prelazia de Tefé. De acordo com o último
levantamento populacional realizado pelo IDSM, na área focal da Reserva Mamirauá
90
existem atualmente 78 localidades distribuídas tanto nas margens dos rios Japurá e
Solimões quanto em seu interior (IDSM, 2006a). Nesta categoria de “localidades”
são incluídos tanto aqueles assentamentos denominados de comunidades, quanto
os chamados sítios, localidades que, segundo Moura (2007), são caracterizadas
pela existência de poucas famílias, variando de uma a quatro. as comunidades,
são aglomerados maiores, descritos por Lima-Ayres e Alencar (1994) como
assentamentos constituídos em média de 13 domicílios. Bezerra (2005)
complementa definindo-os como “assentamentos rurais formados de unidades
domiciliares geralmente ligadas entre si por laços de parentesco” (BEZERRA, 2005,
p. 23)
Na Reserva Amanã, segundo o mesmo censo, a população de moradores e
usuários da RDSA era de 3.259 pessoas naquele ano, residentes em 514 domicílios,
distribuídos em 69 localidades, que se distribuem tanto nas margens do rio Japurá,
quanto nos lagos e paranás no interior da Reserva (IDSM, 2006a). As atividades
para implementação da Reserva concentraram-se, inicialmente, em três setores:
Coraci, São José e Amanã. Os grupos de famílias dessas áreas também estão
organizados em comunidades, em razão das mesmas influências verificadas em
Mamirauá.
Alencar (2007), em estudo sobre o processo de ocupação da área da RDSA,
caracteriza a ocupação recente
41
da região de Amanã em dois momentos históricos:
o primeiro, entre o início do século XX até década de 1960, em que se verificou a
ocupação das áreas de terra firme para a realização de atividades extrativistas e a
exploração de rios e lagos para a pesca; o segundo, dos anos 1960 até o presente,
caracteriza-se pela formação das comunidades, pela agregação de famílias que
antes residiam de forma dispersa. Cada momento corresponde a um padrão de
ocupação, no qual o primeiro era marcado pela “[...] mobilidade sazonal de
indivíduos para trabalhar na extração do látex e na coleta da castanha [...]”
(ALENCAR, 2007, p. 29). No segundo as atividades produtivas centram-se na
agricultura e no manejo dos recursos.
41
No estudo de Alencar (2007, p. 28) as informações foram coletadas em entrevistas “[...] até onde foi
possível alcançar a memória dos moradores [...]”, deste modo, a história remete a um período de
aproximadamente cem anos, entre 1900 e 2005.
91
Nos últimos cem anos o fator que determinou a forma de ocupação do
território em Amanã foi o fator econômico, influenciando na ocupação do espaço, na
escolha dos locais para construção dos povoados, assim como na dinâmica
populacional. Os períodos que registraram a formação do maior número de
povoados foram as décadas de 1930, 1980 e 1990, destacando-se o período a partir
da década de 1930 como o período mais fértil. Alencar (2007, p. 72) enfatiza que:
esse momento é lembrado pelos moradores, como sendo de grande
movimentação de embarcações de comerciantes que percorriam rios, lagos
e igarapés aviando mercadorias e recolhendo a produção, e também pela
entrada de pessoas oriundas da área urbana, ou de outras regiões, para
trabalhar no corte da sorva e da seringa.
Atualmente, considerando as áreas de várzea e terra firme, as principais
atividades produtivas desenvolvidas na região são a pesca, o extrativismo vegetal e
a agricultura, destacando-se nesta, o cultivo da mandioca para a produção de
farinha (ARAÚJO, 2006; ALENCAR, 2007). A maioria dos assentamentos está
localizada em área de terra firme, sobretudo, em torno dos lagos Amanã e Urini. De
acordo com o zoneamento provisório da RDSA afirmado em assembléia geral em
2001 e reafirmado em 2009, as áreas desses lagos são reconhecidas como
pertencentes ao setor Amanã. É nesta área que vem sendo desenvolvidas as ações
do Projeto de Peixes Ornamentais.
4.1.1 O setor Amanã
O setor Amanã localiza-se no interior da RDSA e tem a maioria de suas
comunidades fixadas às margens do lago que deu origem ao seu nome. O tempo
médio de viagem, a partir de Tefé, para essa área da Reserva é de 3 a 4 horas, se
realizada em lanchas rápidas com motor de 40 hp. Se o deslocamento é feito em
pequenas embarcações, com motor de centro ou motor rabeta como são
regionalmente conhecidas as embarcações de pequeno porte com motor de popa de
baixa potência e de baixo consumo de combustível mais comum entre os
moradores da região, a viagem pode durar até 12 horas.
Essa área é constituída atualmente por 13 comunidades, das quais 11 situam-
se nas proximidades dos dois principais lagos do setor, Amanã e Urini: estão
92
distribuídas ao longo desses lagos e no paranã do Amanã. A figura 9 ilustra esta
distribuição e apresenta as fronteiras políticas das comunidades ou grupos de
comunidades, que usam em comum uma mesma área, estabelecidas no sistema de
zoneamento em 2001.
Figura 9: Distribuição das comunidades do setor Amanã (RDSA), com destaque para as áreas de uso
das comunidades e aquelas participantes do manejo de peixes ornamentais nos retângulos
vermelhos.
Fonte: Banco de imagens do IDSM.
De acordo com levantamento realizado em 2006, essas comunidades
possuem em média 13 famílias, com número médio de seis membros por unidade
familiar (MENDONÇA, 2007). A população é predominantemente jovem, estando,
grande parte, nas faixas de 0 a 19 anos (Figura 10). Somadas estas faixas
representam 61% dos moradores e, quando consideradas somente as faixas de 0 a
9 anos, estas representam um terço da população da área.
93
Figura 10: Distribuição etária dos moradores de 11 comunidades do setor Amanã,
RDSA, 2006.
Fonte: Elaborado a partir de informações disponibilizadas em Mendonça (2007).
As formas associativas adotadas pela maioria das comunidades do setor são
as representações por meio da formação de associações comunitárias. Estas podem
atuar em várias esferas representando os moradores junto aos órgãos
governamentais, nas decisões políticas e nas reivindicações comunitárias (ARAÚJO,
2006; MENDONÇA, 2007). Quando estas exigências são amplas e envolvem outras
áreas, o nível de discussão amplia-se, conforme o modelo de participação descrito
no capítulo anterior, no qual as comunidades e/ou as associações que as
representam fazem parte de uma estrutura organizacional onde figuram como as
menores unidades políticas, sendo necessárias reuniões setoriais ou intersetoriais.
Entretanto, estas representam a base dessa estrutura política e têm fundamental
importância nos processos de organização local.
Reconhecendo a importância desses processos no âmbito da comunidade
para o fortalecimento da participação comunitária, muito esforço tem sido
despendido desde a formação da Reserva para a organização das comunidades.
Nessa perspectiva, muitas perceberam a necessidade constituir formalmente suas
associações visando ganhar maior legitimidade nas situações descritas acima. A
94
tabela 1 indica esse movimento de formalização das associações comunitárias do
setor Amanã.
Tabela 1: Associações comunitárias do setor Ama RDSA
Comunidade
Nome da Associação
Município
Fundação
Registro
Boa Esperança
Ass. Com. Boa Esperança
Maraã
------------
Registrada
Santo Estevão
Ass. Com. Santo Estevão
Maraã
------------
Registrada
Boa Vista do
Calafate
Ass. Com. Boa Vista do
Calafate
Maraã
30/06/2004
15/03/2006
Belo Monte
Ass. Com. Belo Monte
Maraã
25/06/2004
9/08/2004
Santa Luzia do
Juazinho
Ass. Com. Santa Luzia do
Juazinho
Maraã
2/11/2003
7/07/2004
Bom Jesus do
Baré
Ass. Com. Bom Jesus do
Baré
Maraã
31/07/2000
18/10/2000
Vila Nova do
Amanã
Ass. Com. Vila Nova do
Amanã
Maraã
20/06/2004
Em processo
Monte Sinai
--------------------
Maraã
------------
Em processo
São José do
Urini
--------------------
Maraã
------------
Em processo
Santa Luzia do
Baré
--------------------
Maraã
------------
------------
Monte Ararate
--------------------
Maraã
------------
------------
Fonte: Mendonça (2007).
A partir de informações obtidas junto ao Programa de Gestão Comunitária
42
(PGC) do IDSM, Mendonça (2007) verificou que até 2006, seis associações
comunitárias, entre 11 comunidades estudadas no setor Amanã, tinham registro em
cartório. Além das seis, outras três estavam em processo de formalização. Essas
associações apresentam uma diretoria que assume as mesmas funções das demais
diretorias comunitárias, sendo que se diferenciam por estarem registradas em
cartório e/ou na Receita Federal como pessoa jurídica, muitas vezes, podendo
representar os moradores em operações de comercialização de seus produtos.
Em Amanã não foram observados grupos de trabalho, representando
atividades econômicas dentro das associações como ocorre em algumas
comunidades de Mamirauá. Nesta, notou-se a existência de grupos de trabalho que
utilizam a associação comunitária para negociar seus produtos, a exemplo das
comunidades Boca do Mamirauá e Vila Alencar, que possuem grupos internos
42
Programa do IDSM que, entre outras atividades, presta assessoria às associações comunitárias e
grupos de produtores, em razão das dificuldades que encontram em gerenciar as obrigações das
associações.
95
utilizando esse mecanismo como forma de comercializar artesanato ou madeira
manejada, pois para isso precisam de uma pessoa jurídica que possa representá-
los. Acredita-se que esta estratégia comece a ser adotada pelas comunidades do
setor Amanã, uma vez que as atividades de manejo de recursos naturais estão
começando a ser desenvolvidas na área. Um exemplo da adoção de tal estratégia
foi a comercialização do produto da pesca de peixes ornamentais de 2008 por meio
da Associação Comunitária Belo Monte. Enquanto o GMPOA não tem uma pessoa
jurídica que possa representá-lo nas operações comerciais, foi estabelecido no
plano de manejo da atividade que, como alternativa, estas poderiam ser viabilizadas
por meio da associação de uma comunidade envolvida nas atividades
preparatórias e que esteja associada a uma das áreas potenciais de captura.
As análises de Araújo (2006) e Mendonça (2007) relacionadas ao aspecto
econômico indicam que a maioria das comunidades do setor Amanã identifica-se
como agricultora. A principal atividade produtiva é voltada para o cultivo de
mandioca, especialmente para a produção de farinha, destinada tanto para o
consumo familiar quanto para a comercialização. Secundariamente outras culturas
são cultivadas, “[...] como macaxeira, milho, banana, abacaxi, cará, cupuaçu,
pupunha, abacate e algumas verduras” (ARAÚJO, 2006, p. 17). A produção de
farinha que, geralmente, representa a maior fonte de renda das famílias, é
comercializada em Tefé, principal mercado consumidor.
A pesca tem pouco ou nenhum destaque como fonte de renda das famílias,
sendo praticada essencialmente para a subsistência alimentar. Isto reflete na forma
de organização dessas famílias para pesca, com características mais individualistas.
Do total amostrado por Mendonça (2007) em Amanã (N=94), 79,8% disseram que
preferem ou costumam pescar sozinhos. Utilizam instrumentos como a malhadeira,
principal aparelho utilizado na área, e costumam deixá-la em igarapés a caminho da
roça. No retorno do trabalho, retiram os peixes que estiverem presos na malha. Os
moradores disseram só sair para pescar quando não conseguem obter peixes dessa
maneira (MENDONÇA, 2007).
De modo geral, verificou-se que a atividade é mais direcionada para
satisfação das necessidades familiares representando apenas 6% da renda das
famílias no setor , salvo em algumas comunidades da área de várzea do setor
96
Amanã, como Belo Monte e Vila Nova do Amanã, onde a pesca representa 30% e
17%, respectivamente, da renda familiar. Embora a atividade não represente
grandes ganhos financeiros sobretudo em razão da maioria das comunidades
estarem localizada em área de terra firme, dedicando-se principalmente à atividade
agrícola , a pesca possui importância significativa para a subsistência das famílias,
é uma atividade que envolve um número expressivo de pessoas nessa região.
Conforme levantamento realizado por Mendonça (2007) em 2006, 62% dos homens
acima de 16 anos dedicam-se à atividade de pesca, seja ela destinada à
subsistência ou para comercialização. Em algumas comunidades a atividade
envolve quase 80% dos homens adultos (Tabela 2).
Tabela 2: Número de adultos* que pescam por comunidade e sexo
- Setor Amanã - RDSA
Comunidade
Homens
N=
%
Mulheres
N=
%
Boa Esperança
44
58
76%
0
47
0%
Bom Jesus do Baré
13
21
62%
0
15
0%
Boa Vista do Calafate
8
15
53%
0
10
0%
Monte Ararate
6
9
67%
0
8
0%
Monte Sinai
9
20
45%
2
11
18%
Santa Luzia do Baré
10
14
71%
0
7
0%
Santa Luzia do Juazinho
9
20
45%
0
9
0%
Santo Estevão
10
20
50%
0
12
0%
Vila Nova do Amanã
9
21
43%
0
11
0%
Belo Monte
10
15
67%
0
11
0%
São José do Urini
21
27
78%
0
27
0
Total do Setor
149
240
62%
2
168
1%
* Pessoas com idade igual ou superior a 16 anos.
Fonte: Mendonça (2007).
Salienta-se que o maior envolvimento na atividade não implica que esta seja a
atividade mais importante do ponto de vista financeiro. Um exemplo é visto na
comunidade Santa Luzia do Baré, que possui 71% dos homens adultos envolvidos
na pesca, no entanto, esta atividade nem aparece entre as responsáveis pela renda
das famílias. Em contrapartida, Belo Monte que apresentou um percentual
ligeiramente menor que Santa Luzia do Baré, 67% de adultos envolvidos, tem na
pesca sua principal atividade, responsável por 30% da renda das famílias.
As informações sobre o envolvimento na atividade pesqueira forneceram
elementos interessantes para buscar compreender o maior ou menor interesse no
97
manejo de peixes ornamentais que estava sendo proposto para as comunidades. O
resultado da consulta inicial realizada por Mendonça (2007) entre 2005 e 2006,
demonstra que, embora esta não seja uma atividade tradicional no setor, onde se
verificou que apenas uma comunidade já havia trabalhado nesta atividade, um
percentual considerável de entrevistados disse estar interessado em participar da
atividade, representando 79%. Em números reais, 102 dos 129 entrevistados no
setor disseram que gostariam de integrar o grupo de manejo (Cf. Figura 4, p. 57
deste trabalho). Esse levantamento permitiu observar, a partir da consulta por
comunidade, que o interesse pela atividade, teve pouca relação com a quantidade
de pessoas envolvidas na pesca. A comunidade que demonstrou maior interesse no
manejo (Tabela 3) encontra-se entre as que possuem o menor número de pessoas
envolvidas na atividade de pesqueira (Cf. tabela 2).
Tabela 3: Ordem decrescente de interesse no manejo
de peixes ornamentais Setor Amanã RDSA.
Boa Vista do Calafate
100%
Bom Jesus do Baré
92%
Vila Nova do Amanã
89%
Santa Luzia do Juazinho
87%
Monte Sinai
83%
Belo Monte
82%
Boa Esperança
82%
Santo Estevão
78%
São José do Urini
70%
10º
Santa Luzia do Baré
56%
11º
Monte Ararate
50%
Fonte: Mendonça (2007).
O estudo realizado por Mendonça (2007) nas 11 comunidades da área de
atuação do projeto de peixes ornamentais permitiu conhecer as atividades
produtivas realizadas pelas famílias do setor e a importância delas na composição
da renda familiar. Entre as atividades de maior destaque aparecem a agricultura,
sobretudo os produtos da mandioca, como a farinha; os benefícios sociais, como
aposentadorias, auxílio doença, bolsa família, seguro defeso; e os salários e diárias.
Estes se configuram como os maiores provedores de renda para as famílias do setor
Amanã (Figura 11).
98
Figura 11: Principais atividades na composição da renda familiar, setor Amanã, RDSA, 2006.
Fonte: Mendonça (2007).
Baseado nesse levantamento estima-se que o conjunto de atividades
desenvolvidas pelas famílias do setor Amanã gerem uma renda média de R$ 774,00
mensais por unidade familiar. Para que se possa comparar tais informações em
longo prazo, calculou-se o poder de compra das famílias, baseado no valor da cesta
básica local, verificando o número de cestas que a família seria capaz de adquirir
com a renda mensal. A média do valor da cesta básica no período de pesquisa de
Mendonça (2007) foi de R$88,85. Deste modo, o poder de compra das famílias do
setor Amanã foi de 8,7 cestas básicas ao mês.
4.2 Grupo de manejadores de peixes ornamentais do Amanã: processo de
formação
Para fornecer elementos que pudessem contribuir no processo de formação
do grupo de manejadores de peixes ornamentais que se pretendia constituir em
Amanã, o projeto buscou investigar, juntamente com os aspectos socioeconômicos
das comunidades locais, as formas de organização social e de produção econômica
praticadas nas comunidades. A partir das informações coletadas, foram planejadas
99
ações objetivando a implementação da atividade de manejo de espécies de peixes
ornamentais na área.
Um aspecto analisado por Mendonça (2007) para subsidiar a escolha da
forma de representação do GMPOA, foi a forma de organização social das
comunidades ou grupos de manejo visando representação econômica. O estudo
apontou que as associações que podem representar os moradores em sua atividade
econômica principal estiveram mais presentes na memória dos entrevistados, ou
foram mais facilmente lembradas. Um exemplo que ilustra a questão foi a
constatação de que a Associação de Auxiliares e Guias do Ecoturismo do Mamirauá
(AAGEMAM) que representa importante forma de organização entre os
prestadores de serviço da Pousada de Ecoturismo Uakari em Mamirauá foi a forma
associativa mais lembrada pelos entrevistados no setor Mamirauá. O fator que
contribui para confirmar a hipótese é que a atividade de Ecoturismo figura entre as
mais importantes quanto à geração de renda para as famílias do setor Mamirauá, na
RDSM (Cf. BEZERRA, 2005; MENDONÇA, 2007).
De posse dessas informações, o projeto propôs, para organização dos
pescadores de peixes ornamentais e o desenvolvimento da atividade, a criação de
uma associação específica para a atividade, de forma que os pescadores pudessem
sentir-se representados enquanto categoria e ganhassem maior visibilidade no
mercado. Embora os extensionistas do projeto tivessem conhecimento das
dificuldades de gerência de uma associação por parte da população local,
verificadas a partir da experiência de outros programas de manejo do IDSM, havia a
necessidade de uma pessoa jurídica para efetivar os processos de comercialização
da produção. Uma associação específica para a categoria poderia fazer essa
função, ao mesmo tempo em que poderia proporcionar maior coesão ao grupo.
Em discussões com membros do grupo de manejo e lideranças comunitárias
do setor Amanã em reuniões de preparação para formação do GMPOA, o projeto
tomou conhecimento de que havia sido iniciado um movimento de organização
desse setor para a criação de uma única associação que pudesse representar
juridicamente o setor Amanã e todas as atividades econômicas desenvolvidas pelas
comunidades da área. Em razão disso, no primeiro encontro dos membros do Grupo
de Manejadores de Peixes Ornamentais, estes decidiram pela criação de um grupo,
100
organizado internamente, mas que funcionaria como um grupo de manejo dentro da
associação a ser criada no setor Amanã, processo semelhante a outros grupos de
manejo da Reserva Mamirauá.
A preparação do grupo de manejo com realização de oficinas quase dois anos
antes de iniciar a atividade, devia-se em grande medida às experiências dos outros
programas de manejo de recursos naturais do IDSM. Ao longo do processo de
implantação das várias atividades de manejo desenvolvidas pela instituição houve a
necessidade constante de capacitação e treinamento, conforme relatou Amaral
(2007) sobre esses processos relacionados ao manejo de pirarucu. A maioria das
associações, tanto comunitárias quanto dos grupos de manejo de recursos, recebe
assessoria mais de cinco anos e ainda não consegue gerenciar sozinha nem a
associação, nem as atividades necessárias para o manejo de recursos naturais.
Visando diminuir as dificuldades de gestão da associação, além dos cursos sobre
melhores técnicas de captura e boas práticas de manejo de peixes ornamentais,
necessários para que a atividade fosse realizada dentro dos critérios científicos de
manejo, foram realizadas oficinas sobre associativismo, gestão de associações,
noções de contabilidade e estratégias de mercado e comercialização.
Para compor o grupo a ser capacitado pelo projeto para realizar a atividade
de manejo, cada comunidade pôde escolher até três moradores para participar. O
grupo constituído inicialmente contava com aproximadamente 22 membros (Figura
5). Em razão dos procedimentos de capacitação terem se desenvolvido durante um
longo período, houve durante o processo a desistência de alguns membros, ao
mesmo tempo em que outros manifestaram interesse e solicitaram a entrada no
grupo. No final de 2008, quando ocorreu o primeiro evento de pesca, o GMPOA
contava com a participação de 15 membros de oito localidades do setor Amanã
(Tabela 4). Um ano depois o grupo conta com a participação de 17 membros, pois
em 2009 um membro que havia saído pediu para retornar e foi aceito pelo grupo.
Outro solicitou entrada após a realização da pesca de 2009. Esse movimento mostra
a instabilidade da atividade que, provavelmente, irá despertar maior interesse
entre os moradores quando estes observarem ganhos financeiros reais com a
atividade.
101
Tabela 4: Comunidades envolvidas no manejo de
peixes ornamentais e o número de participantes
por comunidade em outubro de 2009
Comunidade/Localidade
N. Membros
Comunidade Belo Monte
1
Comunidade Boa Vista do Calafate
3
Comunidade Bom Jesus do Baré
2
Comunidade Monte Sinai
3
Comunidade Santo Estevão
3
Comunidade Santa Luzia do Juazinho
1
Comunidade Vila Nova do Amanã
3
Localidade do Ubim
1
Uma síntese das fases de atuação do projeto no setor Amanã, demonstra os
vários momentos de interação entre este (representado pelos pesquisadores e
extensionistas do mesmo) e os membros do grupo de manejadores e as lideranças
locais. Entre os anos de 2005 e 2006 foram realizados os primeiros contatos com as
comunidades e foi o período de desenvolvimento da maioria das pesquisas de
campo que subsidiaram o plano de manejo da atividade, embora outros trabalhos
importantes de pesquisa tenham sido realizados após esse período.
Ao longo dos anos de 2007 e 2008, no âmbito dos trabalhos de extensão,
foram realizadas várias oficinas de capacitação com os membros do grupo,
buscando orientá-los sobre diversos aspectos necessários à realização e
consolidação da atividade (Figura 12).
No plano de capacitação proposto os temas relacionavam-se aos aspectos de
gestão e sustentabilidade da associação; monitoramento e melhores práticas de
manejo; e elaboração do regimento interno do grupo. Este último desenvolveu-se em
vários momentos, inclusive, em 2009, uma vez que se refere a normas
estabelecidas pelos membros do grupo de manejo, o que implica um processo de
reavaliação sempre que necessário.
102
Figura 12: Registro de alguns eventos de capacitação em 2007 e 2008. Em sentido horário:
membros do GMPOA identificando as espécies que compõem o plano de manejo; confecção
dos utensílios de pesca; oficina sobre gestão de associação; prática de métodos de captura
de peixes ornamentais.
Fotos: Marluce Mendonça.
Em outubro de 2008 o grupo realizou sua primeira experiência de captura de
peixes ornamentais (Figuras 13 e 14). Após a realização da pesca, os membros do
grupo buscaram comercializar o produto. Neste sentido, em novembro do mesmo
ano, alguns representantes do grupo, acompanhados de pesquisadores e
extensionistas do projeto, foram a Manaus negociar a venda dos peixes capturados.
Nessa viagem não conseguiram vender a produção, sendo esta realizada em
dezembro do mesmo ano para um intermediário que atua nessa atividade na região
de Tefé.
103
Figura 13: Membros do GMPOA na pesca experimental de peixes
ornamentais realizada em outubro de 2008.
Foto: Alexandre Hercos.
Figura 14: Cerco de galhada na captura de acará disco, outubro de 2008.
Foto: Arquivo do projeto de peixes ornamentais.
Em 2009 os trabalhos com o GMPOA centraram-se, sobretudo, na tentativa
de fortalecer a organização do grupo. Entre maio e outubro foram realizados vários
encontros buscando atender às necessidades apresentadas pelos membros. Nesse
processo, um aspecto importante trabalhado como grupo foi a atualização do
104
regimento interno do GMPOA. Esta demanda foi apresentada, pois após a captura
experimental realizada no final de 2008 outras pessoas do setor manifestaram o
interesse em participar da atividade. Entretanto, o grupo ainda não havia discutido
em assembléia quais os critérios e procedimentos para a entrada de novos sócios. A
discussão e finalização desta versão do regimento ocorreram em agosto de 2009.
Foi ressaltado na ocasião, que por tratar de normas estabelecidas pelo grupo, este
documento deveria ser revisado sempre que necessário considerando as normas
praticadas, para que possa estar mais próximo da realidade de seus membros.
Em outubro de 2009, o GMPOA se organizou para realizar o manejo (Figura
15). Esta foi considerada a primeira pesca do grupo, uma vez que em 2008 por ser o
primeiro evento, foi experimental, realizado muito mais para testar o desempenho
dos pescadores no desenvolvimento da atividade e os instrumentos de
monitoramento. Por essa razão a pesca em 2008 foi subsidiada pelo projeto. Em
2009, todas as despesas para realização da captura foram de responsabilidade dos
membros do grupo de manejo (gasolina para os deslocamentos até os igarapés,
alimentação para o grupo, pilhas e algumas ferramentas para o trabalho). O projeto
arcou com as despesas para o monitoramento dos aspectos físico-químicos da água
e monitoramento dos custos de produção.
Figura 15: O GMPOA reunido com parte dos pesquisadores do projeto de
peixes ornamentais após a realização da pesca de 2009.
Foto: Arquivo do projeto de peixes ornamentais.
105
O processo de comercialização da produção, como relatado no segundo
capítulo deste trabalho, parece ser um dos maiores desafios da atividade. Tanto em
2008 quanto em 2009 os manejadores enfrentaram dificuldades para comercializar o
produto da pesca. Baseado nas outras experiências de manejo desenvolvidas nas
duas Reservas, esse ainda será um dos muitos desafios dos próximos anos.
4.3 Grupo de manejadores de peixes ornamentais do Amanã: aspectos
socioeconômicos
Embora não apresente diferenças significativas em relação às demais famílias
do setor Amanã, as famílias dos atuais membros do grupo de manejadores de
peixes ornamentais tomadas conjuntamente apresentam alguns aspectos
interessantes que ajudam a compreender melhor o envolvimento na atividade de
manejo.
O GMPOA está composto por 17 membros, de oito localidades da área do
setor Amanã na RDSA. São 14 famílias envolvidas na atividade de manejo de peixes
ornamentais, isto em razão de haver três casos de mais de um participante de uma
mesma família. Nestes três casos foram incluídas mulheres, cônjuge ou filha, em
razão de não haver outros interessados na comunidade em participar da atividade.
O GMPOA é formado em sua maioria por chefes de família, que representam 62%
dos membros. A média de pessoas por domicílio entre as famílias participante do
grupo é a mesma observada para todo o setor Amanã, seis indivíduos.
Contrariando uma hipótese inicial do projeto, que acreditava que a nova
atividade atrairia, principalmente, os mais jovens e solteiros, a média de idade
observada foi de 31 anos, variando entre 19 e 60 anos. Embora se observe uma
distribuição equilibrada nas faixas entre 30 a 44 anos, destaca-se uma concentração
nas faixas de 20 a 29 anos (44%), conforme a figura 16.
Quanto à origem dos membros do grupo, verificou-se que metade deles é
originária da própria região do setor Amanã. Os demais vêm de outras comunidades
de fora da RDSA ou de cidades como Tefé e Coari, lugares distantes do setor, mas
importantes economicamente, seja para a comercialização dos produtos da região
106
(Cf. ARAÚJO, 2006), seja para buscar oportunidades de emprego. O tempo médio
de moradia dos membros do grupo no local onde atualmente vivem é de 15 anos.
Entretanto, se forem consideradas as mudanças internas no setor, este tempo sobe
para 23 anos, o que demonstra a existência de fortes vínculos com a área, havendo
mobilidade internamente, muito em razão da plantação de roças ou sítios, ou ainda,
em virtude da criação de animais.
Figura 16: Distribuição etária dos membros do GMPOA.
Fonte: Dados da pesquisa de campo, 2009.
No aspecto educacional, embora se tenha observado muitas dificuldades,
tanto em haver ensino em níveis acima da 4
a
série do ensino fundamental em todas
as comunidades, quanto dos próprios moradores freqüentarem a escola à noite após
um dia de trabalho na roça, verificou-se que 69% dos membros do GMPOA têm, no
mínimo, o ensino fundamental completo, como pode ser observado na figura 17.
Este aspecto pode ser bastante representativo de uma postura adotada na
maioria das comunidades. O aspecto educacional parece ser um dos critérios
utilizados na escolha dos representantes das comunidades nos eventos de
discussão, nos cursos de capacitação ou nos grupos de manejo. Durante as
entrevistas, todos foram questionados sobre quais critérios foram utilizados em suas
comunidades para a escolha das pessoas que participariam do grupo de manejo. Na
maioria das respostas, tanto dos membros do GMPOA quanto das lideranças
comunitárias, afirmaram que a escolha havia sido por critério de interesse em
107
participar. Entretanto, ao longo das conversas com alguns dos entrevistados,
sobretudo, com as lideranças, revelavam que procuram escolher aquelas pessoas
que tenham capacidade de repassar para os demais membros da comunidade as
informações recebidas. Observa-se que em duas comunidades onde foram
verificadas dúvidas em relação às atividades desenvolvidas ou mesmo posições
contrárias à atuação do projeto, são as comunidades de membros do grupo que
apresentaram os níveis mais baixos de escolaridade dentro do GMPOA.
Figura 17: Nível de escolaridade dos membros do GMPOA.
Fonte: Dados da pesquisa de campo, 2009.
Na socioeconomia das famílias que compõem o grupo de manejadores de
peixes ornamentais, embora permaneçam as três fontes de renda mencionadas
como as mais significativas para as famílias do setor Amanã (agricultura, benefícios
sociais e salários/diárias), percebe-se uma leve alteração nesse quadro, a
agricultura ganha maior importância na composição da renda e os benefícios sociais
e salários têm suas posições alternadas, conforme demonstra a figura 18.
Baseado no levantamento realizado por Mendonça (2007) sobre as atividades
realizadas e a importância que ocupam na composição da renda familiar, estima-se
que o conjunto de atividades realizadas pelas famílias envolvidas no manejo geram
uma renda média de R$ 1538,00 por unidade familiar, valor bastante superior ao
observado para o conjunto do setor que foi de R$ 774,00. Salienta-se, no entanto, a
108
grande variação na renda dessas famílias, o desvio padrão de R$ 1662,00 reflete
essa diferença, onde o mínimo foi de R$ 273,00 e o máximo de R$ 5918,00.
Figura 18: Composição da renda familiar mensal das famílias que compõem o GMPOA
Fonte: Elaborado a partir de informações disponibilizadas em Mendonça (2007).
Apesar do perfil econômico dos membros do grupo não indicar ganhos
financeiros significativos oriundos da atividade pesqueira, esta aparece entre as
mais mencionadas pelos manejadores entre as atividades que desenvolvem.
Ressalta-se, entretanto, que esta atividade tem se destinado basicamente a
satisfação das necessidades da família. Algumas comunidades do setor começaram
alguns anos a se organizar para o manejo de pesca, especialmente de pirarucu
(Arapaima gigas), que em 2009 teve o primeiro evento de manejo na área. Embora
este seja realizado apenas em um período bastante curto do ano, acredita-se que
nos próximos anos a atividade pesqueira ganhará maior importância na composição
da renda familiar no setor. Esta possível alteração pode ser ampliada entre algumas
famílias do GMPOA, que além de participarem do manejo de espécies de peixes
ornamentais, também estão participando do manejo de pesca. Nota-se que 11 dos
17 membros que atualmente participam do grupo que maneja peixes ornamentais
também estão envolvidos no manejo de pirarucu.
Para conciliar as várias obrigações que envolvem a atividade de manejo que
passaram a desenvolver com as tarefas que vinham sendo realizadas, os
manejadores disseram que procuram se programar, que, geralmente, as
109
atividades são agendadas com antecedência. Observou-se que alguns arranjos são
praticados conforme a posição que ocupam no grupo doméstico. Os solteiros, ou
que trabalham conjuntamente com os pais, disseram que podem se ausentar
quando precisam, pois outras pessoas assumem o trabalho. Mas a maioria entre
os quais estão todos os chefes de família afirmou que adianta o trabalho quando
sabe que precisa se ausentar, deixando para o período aquelas atividades que
podem ser conciliadas.
4.4 A percepção dos moradores locais sobre a atuação do projeto de Peixes
Ornamentais em Amanã
A abordagem de um dos aspectos que este estudo buscou investigar a
percepção local sobre ações que têm provocado alterações no cotidiano dos
moradores da área da RDS Amanã, mais especificamente dos habitantes do setor
Amanã, a partir da transformação da área em Unidade de Conservação foi
analisada a partir de dois enfoques: o primeiro abordou a percepção local quanto às
possíveis transformações decorrentes da criação da Reserva Amanã, relatado no
capítulo anterior; o segundo trata das impressões dos moradores da área sobre
algumas ações desenvolvidas a partir da criação da Reserva, direcionando-se
especificamente para as ações de um projeto de manejo, o Projeto de Peixes
Ornamentais, que será detalhado neste item.
Os moradores da área são representados neste estudo por dois grupos de
pessoas: as lideranças comunitárias do setor Amanã e os membros do GMPOA. A
variável utilizada para tentar identificar possíveis diferenças de opinião, entre estes
grupos, a respeito do processo de intervenção foi o grau de envolvimento com o
projeto: por um lado os membros do GMPOA que estariam mais envolvidos, por
outro, as lideranças comunitárias representariam os não envolvidos do setor.
Ressalta-se que entre os membros do GMPOA estão três lideranças comunitárias.
São presidentes na organização de suas respectivas comunidades e também têm
uma atuação importante no setor. Entretanto, para a coleta e análise de dados,
estes não foram incluídos no grupo de lideranças do setor (grupo de não
110
envolvidos), mas no grupo de envolvidos nas atividades do projeto, justamente por
fazerem parte do GMPOA.
Um aspecto interessante observado nas comunidades do setor foi a
diminuição do interesse demonstrado em participar da atividade de manejo de
peixes ornamentais. No início das pesquisas do projeto, na primeira consulta
realizada entre 2005 e 2006, foi manifestado grande desejo por parte da população
em participar da atividade. Das 129 pessoas entrevistadas, 79% afirmaram ter
interesse no manejo, outros 17% não souberam responder e somente 4% não
gostariam de participar (MENDONÇA, 2007). Porém, na fase de seleção para
compor o grupo de manejo em 2007, o que se observou foi uma diminuição do
interesse em algumas comunidades. Das 11 consultadas inicialmente, somente sete
decidiram fazer parte do grupo de manejo. Posteriormente uma comunidade que não
havia sido consultada solicitou vagas no grupo (Cf. nota 19 deste trabalho). Mesmo
entre as que aceitaram participar, houve dificuldade em atingir o número de três
vagas disponibilizado para cada comunidade. Algumas questões da pesquisa
buscaram respostas para esse comportamento. Uma hipótese inicial foi que o pouco
interesse estaria relacionado ao fato de a atividade não ser conhecida da maioria
dos moradores, o que teria gerado certa desconfiança. Outra suposição foi que,
talvez, o limite de vagas estabelecido inicialmente tenha contribuído para o
desinteresse.
Deste modo, as questões buscaram conhecer entre outros aspectos, se havia
informações sobre a atividade de pesca ornamental em momento anterior à chegada
no projeto; o que pensaram da proposta de fazer manejo desse recurso; o que
acharam de haver limite de participante no grupo de manejo; como foi a relação com
os pesquisadores do projeto; que impressão tiveram deste, a partir das ações
desenvolvidas.
Os resultados indicaram que a pesca de peixes ornamentais era conhecida
da maioria dos entrevistados. Entre os membros do GMPOA, mais da metade (54%)
já tinha ouvido falar desse tipo de pescaria, embora muitos destes admitissem
conhecer superficialmente, conforme pode ser observado no fragmento de uma das
entrevistas: Sabia que existia esse comércio, mas por alto. Sabia também que o
pessoal da cabeceira do lago [Amanã] pescava acará-disco, mas não conhecia
111
bem esse comércio não” (Homem, presidente da comunidade Santo Estevão e líder
do GMPOA). Já entre as lideranças, todos afirmaram já ter conhecimento sobre essa
categoria de pesca antes da chegada do projeto de peixes ornamentais à área. Tal
fato talvez tenha contribuído para o projeto ter maior aceitação entre algumas
lideranças, como pode ser observado no depoimento de um dos líderes mais
atuantes do setor Amanã:
tinha ouvido falar, principalmente do acará-disco. Até tinha visto
alguns pescadores aqui, mas como a gente não sabia da importância e do
potencial que tinha, os pescadores de fora vinham e pescavam. Às vezes,
até tinha gente acompanhando, mas sem ganhar nada, então era péssimo
isso. E depois que começaram a acompanhar com o projeto a pesquisa isso
ajudou muito. Muitas pessoas ficaram assustadas "ah isso não vai dar certo,
não vai funcionar". Mas como a gente viu os próprios comunitários
envolvidos e o interesse era muito forte, eu tinha certeza que ia dar certo. Ia
ser trabalhoso, ia, porque precisa de uma capacitação, precisa de uma
experiência pra se descobrir isso. E para se descobrir o potencial que tem
se for com uma pesquisa mesmo. E acima da pesquisa tem que ter o
interesse de quem participando. E acompanhando os meninos da
comunidade, eu vi que eles têm o interesse em aprender e continuar na
atividade” (Homem, presidente da comunidade Boa Vista do Calafate, vice-
presidente do setor Amanã).
De acordo com os depoimentos das lideranças, 71% acreditaram logo nas
primeiras reuniões, entre 2005 e 2006, que o manejo seria possível, conforme nota-
se em uma das falas: “[...] a gente sabia que tinha bastante, a gente via que,
principalmente o acará-disco, tinha bastante [...] então eu sempre acreditei que ia
pra manejar sim” (Homem, presidente da comunidade Boa Vista do Calafate, vice-
presidente do setor Amanã). Entre os membros do GMPOA quase 70% também
eram otimistas quanto à realização do manejo. Os demais de ambos os grupos ou
não acreditavam, como afirmou uma das mulheres que atualmente participam do
GMPOA: “achava difícil acontecer porque a gente não tinha experiência nenhuma.
Mas depois que tudo aconteceu acho que valeu a pena a gente esperar” (Mulher,
tesoureira da comunidade Monte Sinai, secretária do GMPOA), ou não haviam
participado das primeiras reuniões e, por isso, não tinham informações sobre o
assunto.
Quanto ao processo de formação do grupo de manejadores para iniciar as
atividades de orientação para o manejo, inicialmente foi estabelecido um limite de
três participantes por comunidade. Tal decisão foi adotada em razão de a atividade
estar em processo de implementação, devendo realizar pequenas retiradas das
112
espécies a serem manejadas. Questionados sobre o que acharam do projeto ter
limitado o número de participantes no grupo de manejo para três pessoas por
comunidade, a maioria de ambos os grupos avaliou como satisfatório (94% dos
membros do GMPOA e 57% das lideranças), considerando que a atividade está
iniciando. A fala de uma das lideranças entrevistadas é bastante representativa da
maioria das respostas.
Eu acho que de bom tamanho, sabe por quê? Porque nem todo mundo
se envolve, quando acha três da comunidade pra participar é uma beleza.
Agora, quando eles começam a participar e as pessoas vão vendo, porque
nem muitos acreditam, às vezes, no que vão fazer. três participando e
eles vendo o que acontecendo, a renda que ele tá tendo, vai querer
ganhar também e vai envolvendo mais pessoas. Não adianta começar a
casa de cima pra terminar pra baixo. É melhor começar de baixo pra
terminar pra cima. Se começar de cima a casa vai cair em riba dele. Aí faz o
alicerce pra poder levar a casa, ai começa de um, dois, três e aí vai
envolvendo mais gente. E quando as pessoas estão envolvidas o negócio
fica mais bacana (Homem, presidente da comunidade Boa Esperança).
Ressalta-se, porém, que alguns manifestaram o desejo de que pudesse
envolver toda a comunidade. A ampliação do número de participantes é, inclusive,
uma demanda do setor, manifestada por várias lideranças aos membros do
GMPOA. Este foi um dos fatores que levaram os manejadores a solicitarem revisão
do regimento interno do grupo, uma vez que a primeira versão, finalizada em junho
de 2008, não previa critérios para a entrada de novos cios no grupo de manejo. A
nova versão foi discutida e aprovada em agosto de 2009, e os critérios inclusos
serviram de orientação para a entrada dos membros mais recente no GMPOA.
Um aspecto determinante para a formação da opinião local a respeito da
atuação do projeto refere-se ao relacionamento com os pesquisadores do projeto de
peixes ornamentais. Como foi a relação dos pesquisadores e extensionistas com as
comunidades e se estas têm queixas dessa relação. Novamente a maioria, de
ambos os grupos entrevistados (94% dos membros do GMPOA e 57% das
lideranças), afirmou que teve boa relação com os pesquisadores. Nota-se que o
percentual de aprovação entre os membros do grupo de manejadores é
significativamente maior que entre as lideranças, embora estas, em sua maioria,
também tenham aprovado as ações dos pesquisadores. Baseado nesta observação
percebe-se que aqueles que tiveram maior contato com os pesquisadores, entre os
quais, os membros do GMPOA e algumas lideranças, são os que manifestaram
113
maior apoio. Talvez em razão destas pessoas terem tido maiores oportunidades,
nesses momentos de contato, de fazer perguntas e esclarecer dúvidas, conforme
pode ser observado no depoimento de uma das mulheres participantes do grupo de
manejadores.
“A relação foi boa, porque pelo tempo que eu convivi com as pessoas deu
pra ver que não era o que os outros falavam, que diziam que se a gente
desse brecha eles iam tomar tudo da gente. Depois eu vi que não era o que
o pessoal dizia, gente que até tava no começo do grupo com a gente. Acho
que essas pessoas hoje estão arrependidas” (Mulher, tesoureira da
comunidade Monte Sinai, secretária do GMPOA)
O que se observou, de modo geral, nos depoimentos dos dois grupos
entrevistados, foi a manifestação de apoio ao projeto de peixes ornamentais e à
nova atividade de manejo proposta. Questionados se apoiariam o projeto caso este
ainda não tivesse iniciado suas atividades de pesquisa no setor, todos os membros
do GMPOA afirmaram que ofereceriam apoio. Entre as lideranças essa adesão
representa 71% dos entrevistados. Apesar do apoio manifestado pelos participantes
do grupo de manejadores e pelas lideranças locais o que demonstra estarem
satisfeitos com o que vem sendo desenvolvido vale lembrar que a atividade ainda
está em seus primeiros passos, muitos desafios ainda precisam ser superados pelo
projeto e pelos manejadores. Os trechos a seguir revelam algumas opiniões,
aprendizados, expectativas, desafios...
“A opinião é que o projeto deve continuar e nos ajudar, porque a gente sabe
caminhar com as nossas pernas, mas acho que o projeto deve fortalecer
cada vez mais o grupo, assim como o grupo tá tentando se fortalecer
buscando envolver outras comunidades” (Homem, presidente da
comunidade Santo Estevão, líder do GMPOA).
O projeto não atrapalhou nada, até porque os peixes que trabalham são
peixes que a gente não usava. No caso de pesquisadores, foi dos projetos
que mais respeitaram porque vinha sempre com a gente, falava com os
membros, mas também com os presidentes de comunidade. Porque outros
vão direto com a pessoa que eles vão trabalhar e, muitas vezes, essas
pessoas não sabem repassar para a comunidade, fica individual e o
em grupo” (Homem, presidente da comunidade Belo Monte).
A minha opinião é que ele tá trazendo um recurso pra gente, porque é uma
renda. Acho que se não fosse isso a gente nunca ia saber que tinha esses
peixes ornamentais, então acho que é uma coisa boa(Homem, presidente
da localidade do Ubim, membro do GMPOA).
“Pra mim foi bom porque não conhecia peixe ornamental, ouvia falar de
acará-disco. E com o projeto a gente teve mais conhecimento não só da
terra, mas também das coisas que tem na água e foi bom pra gente
conhecer a nossa riqueza e isso diminui o nosso trabalho na roça(Mulher,
tesoureira da comunidade Monte Sinai, secretária do GMPOA).
114
Através do projeto a gente conheceu as pessoas e trouxe conhecimento.
Através das oficinas a gente conheceu os pesquisadores, então não tenho
nada contra o projeto não (Homem, presidente da comunidade Monte
Sinai, vice-líder do GMPOA).
Eu acho que até agora não foi 100% porque não tem como ser. Então a
gente tinha que passar por isso, porque é uma pesca diferente, não é como
a do pirarucu que todo mundo sabe pegar. Então hoje a gente já sabe como
fazer a pesca pra os peixes não morrerem. E o Leo [extensionista do projeto
falecido em 2008] fez questão de levar o Mário [pescador de peixes
ornamentais da região de Tefé] pra gente aprender a classificar e o
comprador não enganar a gente. Hoje eu sei que tudo que a gente passou
foi aproveitado pra hora que a gente tiver na coleta. Tem uma coisa
que eu não sei se era possível o projeto trazer pra nós que era o preço. É
por isso que nós estamos desse jeito, que é uma coisa que a gente não tem
nem idéia(Homem, morador da comunidade Vila Nova do Amanã, membro
do GMPOA).
115
Considerações finais
Este trabalho buscou no âmbito de um debate sobre desenvolvimento, no
qual foi ressaltado o desafio da sustentabilidade, compreender o processo de
elaboração e implementação de uma proposta de atividade econômica dentro da
RDS Amanã, como resultado de práticas ambientalistas, focando, especialmente, os
sentimentos e reações dos atores locais diretamente envolvidos e/ou afetados pelas
ações de intervenção e os arranjos locais que estão sendo produzidos nessa
dinâmica, em termos de aprendizado e participação dos residentes tradicionais
numa iniciativa identificada com o desenvolvimento sustentável.
Para tanto, foram retomados os caminhos que levaram à transformação da
área de Amanã em Unidade de Conservação, o que alterou a relação dos habitantes
com os recursos naturais. Relação esta, agora, sujeita a normas estabelecidas em
discussões entre os gestores da área e a população local. Tais discussões o
características importantes do modelo de conservação proposto para as RDS,
inspirado em uma concepção alternativa de desenvolvimento, na qual a efetiva,
ainda ideal, participação da população nos processos de decisão e a satisfação das
necessidades básicas se configuram como elementos essenciais e necessários à
conservação de exemplar ecossistema de várzea bastante preservado.
De acordo com Queiroz e Peralta (2006), “[...] o Modelo RDS está
fundamentado na permanência e participação das populações locais e na formação
e manutenção de uma forte base científica (QUEIROZ; PERALTA, 2006, p. 454).
Estes seriam os dois pilares fundamentais que, conjuntamente, criariam as
condições necessárias para consolidar as normas de manejo aceitas pela
população. Os autores, ambos pesquisadores integrantes do corpo científico do
IDSM, apontam estes e outros elementos como componentes do modelo de RDS,
são eles: gestão participativa; pesquisa científica; sistema de zoneamento; normas
de uso dos recursos; e alternativas econômicas. Ações integradas desses diversos
aspectos geraram num médio prazo, conforme estes autores, resultados
significativos relacionados tanto à conservação da biodiversidade quanto à melhoria
das condições de vida da população local.
116
As reações manifestadas, apreendidas pela pesquisa base deste trabalho, em
sua maioria, de apoio à implantação da Reserva Amanã ou à atuação do projeto de
manejo de peixes ornamentais relacionam-se, em grande medida, aos resultados do
conjunto de ações descrito por Queiroz e Peralta (2006). As lideranças locais e os
envolvidos na atividade de manejo analisada apontaram efeitos positivos dessas
intervenções, apesar das restrições impostas, ressaltando como significativos, o
acesso a informações e os aprendizados obtidos no processo de implementação da
Reserva e das diversas atividades de manejo, entre as quais o de espécies de
peixes ornamentais.
O uso dos novos aprendizados se configura como uma das estratégias
utilizadas, sobretudo, pelas lideranças em outros espaços de participação política. O
que se observou a partir de algumas falas foi a adoção do discurso ambiental como
estratégia buscando fortalecer os argumentos nos processos políticos de exigências
por melhorias das condições de vida locais. Parece estar ocorrendo nessa área, o
processo de ambientalização apontado por Leite Lopes (2006), onde se verifica a
interiorização de questões relativas ao meio ambiente como forma de fortalecer seus
argumentos nas reivindicações por melhores condições de vida, sobretudo nos
aspectos relacionados às suas necessidades básicas, como saúde e educação.
Embora o trabalho de Leite Lopes (2006) esteja relacionado ao processo de
ambientalização em áreas urbanas, referente à poluição urbano-industrial, o que
Barretto Filho (2005) chama de “agenda marrom”, suas conclusões também podem
ser apropriadas para pensar as agendas “verde” (florestas e biodiversidade) e “azul”
(águas) (BARRETTO FILHO, 2005), onde o envolvimento das populações afetadas
e a gestão participativa dos recursos se constituem em elementos importantes
nesses contextos.
Moura (2007) relata um processo similar na Reserva Mamirauá, onde
verificou-se o interesse de alguns moradores em participar de capacitações e
palestras desenvolvidas pelo IDSM, de forma a obterem informações que possam
subsidiar suas relações políticas ou econômicas. O processo de interiorização de
referências ambientais aos argumentos, descritos por Moura (2007), pode ser
referido à dinâmica analisada por Leite Lopes (2006) no processo de
ambientalização. Moura (2007) observou que:
117
as informações construídas sobre as práticas do manejo dos recursos são
incorporadas aos argumentos que alguns dos produtores camponeses da
RDSM usam nos espaços públicos, apresentando os resultados dos
programas de manejo sustentável, reivindicando maior apoio dos
governantes para as demandas sociais (saúde, tecnologias sociais) de suas
localidades, ou nas negociações em suas comunidades ou nas reuniões de
setores. O interesse em participar dos shopshops(workshops), o preparo
de informações em gráficos de “beiju” (gráficos de pizza), ou gráficos de
poste (gráficos em colunas) registros fotográficos e contabilidade dos
ganhos com o manejo dos recursos, entre outras ações, denotam o esforço
de alguns produtores locais na organização e utilização desses dados que
eles passam a considerar como importantes recursos para um diálogo mais
simétrico com outros agentes sociais no mercado e nas instituições públicas
(MOURA, 2007, p. 223. Grifos da autora).
Estudos na década de 1990 faziam referência a um processo de
ambientalização. O termo “ambientalização” aparece nas reflexões de Leff (2006)
relacionadas ao discurso onde se inscrevem as lutas de populações indígenas e as
reivindicações de grupos camponeses. Segundo o autor, esse discurso veio se
“ambientalizando” no processo de construção da sustentabilidade a partir de suas
identidades e culturas. Leff (2006) identifica traços de um novo ambientalismo social
nas demandas e práticas dos processos produtivos desses grupos. Mas as formas
de organização e o processo não hierárquico e participativo nas decisões dos
movimentos indígenas e camponeses “[...] adquirem tonalidades e ressonâncias
ambientalistas, embora muitos deles ainda o expressem suas raízes
ambientalistas em demandas concretas de reapropriação e autogestão de seus
recursos naturais” (LEFF, 2006, p. 462).
A melhoria da qualidade de vida, indicador de desenvolvimento humano, ou
desenvolvimento como liberdade (Cf. SEN, 2000), das populações das Reservas
Mamirauá e Amamostra-se como uma condição importante para a manutenção
do apoio político dispensado pela população local às ações desenvolvidas pelo
IDSM. Tal apoio pode ser ameaçado se esses aspectos deixarem de ser
considerados nos processos de intervenção fundados na razão científica que têm
sido implementados nessas áreas, e geraria uma ameaça igual ou maior para a
conservação da biodiversidade. O respeito às necessidades de reprodução social e
econômica das populações locais fortalece o desejo de conservar os ambientes
naturais dos quais são dependentes. Conforme observaram Viola (1987) e Fuks
118
(1998), a preocupação com a questão ambiental é mais forte em ambientes em que
a população tem satisfeitas as suas necessidades básicas.
A experiência das Reservas Mamirauá e Amanã vem mostrando que o
processo de implantação de uma unidade de conservação é contínuo e não tem um
ponto final. As transformações da sociedade envolvente e as mudanças nas
condições naturais decorrentes da implantação das Reservas implicam na
necessidade de sucessivos ajustes, definidos a partir de um monitoramento das
condições sociais e naturais e da manutenção do diálogo com a população.
Embora existam muitos desafios a serem superados quanto à implementação
da proposta e as ações desenvolvidas para sua manutenção, na opinião de alguns
autores (LIMA, 1996; VELLASQUEZ, 2004; REIS, 2005) que desenvolveram
trabalhos sobre essa experiência no interior da Amazônia, a Reserva de
Desenvolvimento Sustentável Mamirauá, antecedente de Amanã, constitui-se hoje
em uma importante experiência de gestão participativa em unidades de conservação
de uso sustentável. Essa forma de gestão vem se desenvolvendo de igual forma na
Reserva Amanã. O trunfo por esta se configurar como uma experiência bem
sucedida, talvez esteja relacionado ao envolvimento e valorização das populações
locais.
O sucesso das políticas de proteção ambiental depende significativamente de
não desconsiderar as necessidades das populações atingidas por tais políticas. No
processo de criação, implementação e gestão de unidades de conservação, torna-se
cada vez mais necessário a participação das populações locais e da sociedade civil,
para que se tenha a garantia à integridade do patrimônio preservado, com a
participação e decisão de todos os atores envolvidos.
Para a efetiva participação das populações nos processos decisórios quanto
ao uso dos recursos naturais é necessário, segundo Leff (2006), o fortalecimento
político das comunidades “[...] dotando-as, ao mesmo tempo, de uma maior
capacidade técnica, científica, administrativa e financeira, para a autogestão de seus
recursos produtivos” (LEFF, 2006, p. 497). Apesar do esforço despendido pelo IDSM
e pelo projeto de manejo de peixes ornamentais nesses processos de organização,
as falas de algumas lideranças do GMPOA apresentadas no final do último capítulo
deste trabalho “[...] o projeto deve continuar a nos ajudar [...] o projeto deve
119
fortalecer cada vez mais o grupo [...]” ou “[...] uma coisa que eu não sei se era
possível o projeto trazer pra nós que era o preço. É por isso que nós estamos desse
jeito, que é uma coisa que a gente não tem nem idéia” refletem que estes ainda
são os grandes desafios das experiências de desenvolvimento sustentável,
introduzidas numa sociedade em que tais práticas ainda não são hegemônicas.
As dificuldades observadas, quanto à instabilidade de uma nova atividade,
ainda em seus primeiros anos ou, sobretudo, as dificuldades relacionadas à fase de
comercialização da produção um dos maiores desafios das várias atividades de
manejo desenvolvidas tanto na Reserva Amanã quanto na Reserva Mamirauá
denotam que a superação destes problemas passa, essencialmente, por uma
valorização e fortalecimentos da capacidade organizativa das comunidades e grupos
de manejadores, permitindo que estes possam melhorar suas condições de vida e
aproveitar os recursos de forma sustentável, possibilitando a satisfação de suas
necessidades básicas anseio maior atual conservando seu patrimônio de
recursos para as gerações que ainda estão por vir.
120
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130
APÊNDICES
131
APÊNDICE A Roteiro para entrevistas com membros do GMPOA
Objetivo: Compreender o processo de elaboração e desenvolvimento de uma
proposta de atividade econômica complementar na RDS Amanã como resultado de
práticas ambientalistas, focando, especialmente, a percepção dos atores envolvidos
no processo e os arranjos locais produzidos.
ROTEIRO PARA ENTREVISTAS COM MEMBROS DO GMPOA
DATA: ___/___/______ Entrevistador:____________________________
1. PERFIL DO ENTREVISTADO
1. Nome:____________________________________________________________
2. Idade: __________ 3. Sexo: M ( ) F( ) 4. Estado civil:____________________
5. Local de nascimento:________________________________________________
6. Localização da moradia (acrescentar uma referência): ____________________
___________________________________________________________________
7. Há quanto tempo reside nesse local?___________________________________
8. Quantas pessoas moram na sua casa?_________________________________
Nome
Idade
Parentesco
Escolaridade
Atividades que realiza
2. PERCEPÇÃO DO ENTREVISTADO SOBRE AS INTERVENÇÕES E O
PROJETO PEIXES ORNAMENTAIS
2.1. O que sentem em relação às intervenções
PEIXES ORNAMENTAIS: Aspectos sobre a implantação de um projeto de
desenvolvimento sustentável na RDS Amanã/Am
132
2.1.1. Como você soube que essa área havia sido transformada em reserva?
Como foi pra você essa notícia? Foi um pedido das comunidades?
2.1.2. Quando soube da criação da reserva, quais eram as informações que
tinha do que iria acontecer?
2.1.3. Mudou alguma coisa depois da criação da reserva? O que mudou na
sua vida com a criação da reserva?
2.1.4. Se pudesse decidir essa área teria se tornado reserva? Por quê?
2.2. Opiniões sobre os pesquisadores e o projeto de peixes ornamentais
2.2.1. Antes do Projeto de Peixes Ornamentais chegar aqui você tinha
ouvido falar nesse tipo de pesca/comércio? Acreditava ser possível
vender esse tipo de peixe?
2.2.2. Você conhece ou conheceu alguém que tenha trabalhado com esse
tipo de pescaria?
2.2.3. Em 2005 quando o Projeto de Peixes Ornamentais chegou com a
proposta de fazer pesquisa para ver a possibilidade de manejar “essas
piabinhas” o que você achou disso?
2.2.4. Depois, com os resultados das pesquisas mostrando que o manejo era
possível aumentou seu interesse ou não fez diferença?
(Lembrar que depois do retorno dos dados começaram as
capacitações...)
2.2.5. O que você achou da decisão do projeto de, no início, limitar o número
de participantes no manejo a três pessoas por comunidade?
2.2.6. Na sua comunidade, além dos que participam ou participaram havia
outros interessados em participar do grupo de manejadores?
2.2.7. Se o número não fosse limitado essas pessoas estariam participando?
2.2.8. Como foi a escolha dos participantes do grupo de manejo na sua
comunidade? Quais os critérios que vocês utilizaram?
133
2.2.9. Como foi ou tem sido sua relação com os pesquisadores do projeto?
2.2.10. Você ou alguém de sua comunidade teve problema com algum
pesquisador do projeto? Ficou chateado com algo que algum
pesquisador tenha feito aqui?
2.2.11. Para você, o projeto foi transparente (claro) nas ações que tem
desenvolvido aqui no setor?
2.2.12. Você ou sua comunidade foi atendido quando solicitou esclarecimento
de alguma informação sobre o projeto?
2.2.13. Como você vê o projeto hoje? Qual a sua opinião sobre ele?
2.2.14. Se dependesse unicamente de sua decisão, o projeto de peixes
ornamentais teria realizado ou não suas pesquisas na área do setor?
2.3. Arranjos locais para a realização da atividade
2.3.1. Além dos peixes ornamentais, em que outras atividades você trabalha?
Na seca e na cheia. (Tanto atividades produtivas quanto de
organização comunitária).
2.3.2. Como você faz com as outras atividades quando tem que participar dos
cursos e reuniões do grupo de manejo?
2.3.3. E no período da coleta ano passado como fez?
2.3.4. Quanto de renda você obteve com o venda dos peixes na coleta do ano
passado?
2.3.5. Foi o que esperava?
2.4. Percepção sobre as transformações em andamento
2.4.1. Mudou alguma coisa aqui no setor com o início das atividades aqui?
Se sim, o que mudou? Houve alguma interferência na sua vida?
134
APÊNDICE B Roteiro para entrevistas com lideranças comunitárias
Objetivo: Compreender o processo de elaboração e desenvolvimento de uma
proposta de atividade econômica complementar na RDS Amanã como resultado de
práticas ambientalistas, focando, especialmente, a percepção dos atores envolvidos
no processo e os arranjos locais produzidos.
ROTEIRO PARA ENTREVISTAS COM LIDERANÇAS COMUNITÁRIAS
DATA: ___/___/______ Entrevistador:____________________________
1. PERFIL DO ENTREVISTADO
1. Nome:____________________________________________________________
2. Idade: __________ 3. Sexo: M ( ) F( ) 4. Estado civil:____________________
5. Local de nascimento:________________________________________________
6. Localização da moradia (acrescentar uma referência): ____________________
2. PERCEPÇÃO DO ENTREVISTADO SOBRE AS INTERVENÇÕES E O
PROJETO DE PEIXES ORNAMENTAIS
2.1. O que sentem em relação às intervenções
2.1.1. Como você soube que essa área havia sido transformada em reserva?
Como foi pra você essa notícia? Foi um pedido das comunidades?
2.1.2. Quando soube da criação da reserva, quais eram as informações que
tinha do que iria acontecer?
2.1.3. Mudou alguma coisa depois da criação da reserva? O que mudou na
sua vida com a criação da reserva?
2.1.4. Se pudesse decidir essa área teria se tornado reserva? Por quê?
PEIXES ORNAMENTAIS: Aspectos sobre a implantação de um projeto de
desenvolvimento sustentável na RDS Amanã/Am
135
2.2. Opiniões sobre os pesquisadores e o projeto de peixes ornamentais
2.2.1. Antes do Projeto de Peixes Ornamentais chegar aqui você tinha
ouvido falar nesse tipo de pesca/comércio? Acreditava ser possível
vender esse tipo de peixe?
2.2.2. Você conhece ou conheceu alguém que tenha trabalhado com esse
tipo de pescaria?
2.2.3. Em 2005 quando o Projeto de Peixes Ornamentais chegou com a
proposta de fazer pesquisa para ver a possibilidade de manejar “essas
piabinhas” o que você achou disso?
2.2.4. Depois, com os resultados das pesquisas mostrando que o manejo era
possível aumentou seu interesse ou não fez diferença?
(Lembrar que depois do retorno dos dados começaram as
capacitações...)
2.2.5. O que você achou da decisão do projeto de, no início, limitar o número
de participantes no manejo a três pessoas por comunidade?
2.2.6. Na sua comunidade, além dos que participam ou participaram havia
outros interessados em participar do grupo de manejadores?
2.2.7. Se o número não fosse limitado essas pessoas estariam participando?
2.2.8. Como foi a escolha dos participantes do grupo de manejo na sua
comunidade? Quais os critérios que vocês utilizaram?
2.2.9. Como foi ou tem sido sua relação com os pesquisadores do projeto?
2.2.10. Você ou alguém de sua comunidade teve problema com algum
pesquisador do projeto? Ficou chateado com algo que algum
pesquisador tenha feito aqui?
2.2.11. Para você, o projeto foi transparente (claro) nas ações que tem
desenvolvido aqui no setor?
136
2.2.12. Você ou sua comunidade foi atendido quando solicitou esclarecimento
de alguma informação sobre o projeto?
2.2.13. Como você vê o projeto hoje? Qual a sua opinião sobre ele?
2.2.14. Se dependesse unicamente de sua decisão, o projeto de peixes
ornamentais teria realizado ou não suas pesquisas na área do setor?
2.3. Percepção sobre as transformações em andamento
2.3.1. Mudou alguma coisa aqui no setor com o início das atividades aqui?
Se sim, o que mudou? Houve alguma interferência na sua vida?
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