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Trata-se de um relacionamento pessoal, de tanta intimidade, que permite a Shirley se
mostrar por inteiro: não existe vergonha de pedir, de implorar. A Espiritualidade é, portanto,
reconhecida como companhia que acolhe tanto o que é pedido, implorado, quanto a própria
fragilidade de quem solicita ajuda. Por isso não há sentido em ficar escondendo. Além disso,
a Espiritualidade sabe de tudo, das nossas necessidades. Deus está aí, Jesus
está no [leme], para compreender, e a Espiritualidade para nos dar o
amparo. Com certeza a gente tem uma afinidade muito gostosa com a
Espiritualidade, sabe que pode contar. O quanto que a gente é amparada e
não sabe! Se a gente pudesse ter olhos de ver o trabalho que é feito aqui [na
Casa]…
Para Shirley, a Espiritualidade é presença que sabe das nossas necessidades e pode dar
o amparo, mas que não pode ser desvinculada de Deus, que está aí, e de Jesus, que está no
leme. Vislumbramos aqui a expressão de uma hierarquia entre Deus, Jesus e a Espiritualidade,
da qual podemos depreender que cabe à última executar o trabalho de amparar. Enquanto
sente receber esse amparo, mesmo que não seja capaz de enxergar tudo o que é feito na Casa,
Shirley reconhece uma afinidade com a Espiritualidade, a qual é vivida como gosto e como
confiança: sabe que pode contar.
E sabe porque já viveu, mais de uma vez, situações dramáticas em que a presença e o
amparo invisível se tornaram evidentes para ela:
Quando minha mãe adoeceu, quando o médico confirmou que ela estava
com um tumor nos rins, aquilo assim… meu mundo caiu. Porque (…) eu que
ficava naquele envolvimento dela e o médico comunicou a mim. Nossa
Senhora, eu entrei no desespero. E eu fui para o carro pedindo a Deus:
“pelo amor de Deus, que me desse a oportunidade de cuidar dela”. Eu não
importaria de abrir mão de nada da minha vida. Por isso que eu te falo,
parece que a Espiritualidade fica tão próxima que eu não tenho vergonha de
pedir nada. E de repente eles me deram essa oportunidade. Você entendeu?
De repente me deram. E foi tão interessante porque ela ia fazer uma
cirurgia, ia ter que tirar um rim, e acabou quebrando o fêmur. Caiu no
banheiro e quebrou o fêmur. Então o rim ficou para dois anos depois que
ela recuperou da cirurgia da perna. (…) Quer dizer, e a gente achando que
o rim é que iria primeiro [risos]. Ainda teve esse episódio da perna. Então
assim, é muito interessante para você ver como que as coisas acontecem,
como que a Espiritualidade a todo o tempo mostra presença. Eu mesmo não
vejo, mas sinto, percebo a presença deles, o amparo. Mesmo não vendo eles,
vejo a coisa acontecer, e saber que foi através deles, que foi por eles que
aconteceu. Em momento algum a gente, assim, desacreditava.
E eu fui muito beneficiada porque em 1995 eu tive esclerose múltipla. De
uma certa forma, me deram uma prorrogação! Um segundo tempo para que
eu pudesse chegar onde eu estou, porque com certeza de lá pra cá muitas
coisas se renovaram dentro de mim. Então foi uma oportunidade que,
graças a Deus, eu despertei para ela e vi que estava em minhas mãos, que a
oportunidade estava me sendo dada, que o segundo tempo estava me sendo
dado, e que eu precisava fazer algo a mais!