Download PDF
ads:
U
U
N
N
I
I
V
V
E
E
R
R
S
S
I
I
D
D
A
A
D
D
E
E
F
F
E
E
D
D
E
E
R
R
A
A
L
L
F
F
L
L
U
U
M
M
I
I
N
N
E
E
N
N
S
S
E
E
F
F
A
A
C
C
U
U
L
L
D
D
A
A
D
D
E
E
D
D
E
E
E
E
D
D
U
U
C
C
A
A
Ç
Ç
Ã
Ã
O
O
P
P
R
R
O
O
G
G
R
R
A
A
M
M
A
A
D
D
E
E
P
P
Ó
Ó
S
S
-
-
G
G
R
R
A
A
D
D
U
U
A
A
Ç
Ç
Ã
Ã
O
O
E
E
M
M
E
E
D
D
U
U
C
C
A
A
Ç
Ç
Ã
Ã
O
O
M
M
E
E
S
S
T
T
R
R
A
A
D
D
O
O
E
E
M
M
E
E
D
D
U
U
C
C
A
A
Ç
Ç
Ã
Ã
O
O
A
A
L
L
I
I
N
N
E
E
C
C
R
R
I
I
S
S
T
T
I
I
N
N
A
A
D
D
E
E
L
L
I
I
M
M
A
A
D
D
A
A
N
N
T
T
A
A
S
S
F
F
Ó
Ó
R
R
U
U
N
N
S
S
D
D
E
E
E
E
D
D
U
U
C
C
A
A
Ç
Ç
Ã
Ã
O
O
D
D
E
E
J
J
O
O
V
V
E
E
N
N
S
S
E
E
A
A
D
D
U
U
L
L
T
T
O
O
S
S
:
:
M
M
O
O
V
V
I
I
M
M
E
E
N
N
T
T
O
O
S
S
E
E
M
M
D
D
E
E
F
F
E
E
S
S
A
A
D
D
E
E
D
D
I
I
R
R
E
E
I
I
T
T
O
O
S
S
E
E
P
P
O
O
L
L
Í
Í
T
T
I
I
C
C
A
A
S
S
P
P
Ú
Ú
B
B
L
L
I
I
C
C
A
A
S
S
P
P
A
A
R
R
A
A
A
A
E
E
D
D
U
U
C
C
A
A
Ç
Ç
Ã
Ã
O
O
D
D
E
E
J
J
O
O
V
V
E
E
N
N
S
S
E
E
A
A
D
D
U
U
L
L
T
T
O
O
S
S
N
N
I
I
T
T
E
E
R
R
Ó
Ó
I
I
A
A
G
G
O
O
S
S
T
T
O
O
D
D
E
E
2
2
0
0
1
1
0
0
ads:
Livros Grátis
http://www.livrosgratis.com.br
Milhares de livros grátis para download.
2
U
U
N
N
I
I
V
V
E
E
R
R
S
S
I
I
D
D
A
A
D
D
E
E
F
F
E
E
D
D
E
E
R
R
A
A
L
L
F
F
L
L
U
U
M
M
I
I
N
N
E
E
N
N
S
S
E
E
F
F
A
A
C
C
U
U
L
L
D
D
A
A
D
D
E
E
D
D
E
E
E
E
D
D
U
U
C
C
A
A
Ç
Ç
Ã
Ã
O
O
P
P
R
R
O
O
G
G
R
R
A
A
M
M
A
A
D
D
E
E
P
P
Ó
Ó
S
S
-
-
G
G
R
R
A
A
D
D
U
U
A
A
Ç
Ç
Ã
Ã
O
O
E
E
M
M
E
E
D
D
U
U
C
C
A
A
Ç
Ç
Ã
Ã
O
O
M
M
E
E
S
S
T
T
R
R
A
A
D
D
O
O
E
E
M
M
E
E
D
D
U
U
C
C
A
A
Ç
Ç
Ã
Ã
O
O
A
A
L
L
I
I
N
N
E
E
C
C
R
R
I
I
S
S
T
T
I
I
N
N
A
A
D
D
E
E
L
L
I
I
M
M
A
A
D
D
A
A
N
N
T
T
A
A
S
S
F
F
Ó
Ó
R
R
U
U
N
N
S
S
D
D
E
E
E
E
D
D
U
U
C
C
A
A
Ç
Ç
Ã
Ã
O
O
D
D
E
E
J
J
O
O
V
V
E
E
N
N
S
S
E
E
A
A
D
D
U
U
L
L
T
T
O
O
S
S
:
:
M
M
O
O
V
V
I
I
M
M
E
E
N
N
T
T
O
O
S
S
E
E
M
M
D
D
E
E
F
F
E
E
S
S
A
A
D
D
E
E
D
D
I
I
R
R
E
E
I
I
T
T
O
O
S
S
E
E
P
P
O
O
L
L
Í
Í
T
T
I
I
C
C
A
A
S
S
P
P
Ú
Ú
B
B
L
L
I
I
C
C
A
A
S
S
P
P
A
A
R
R
A
A
A
A
E
E
D
D
U
U
C
C
A
A
Ç
Ç
Ã
Ã
O
O
D
D
E
E
J
J
O
O
V
V
E
E
N
N
S
S
E
E
A
A
D
D
U
U
L
L
T
T
O
O
S
S
D
D
i
i
s
s
s
s
e
e
r
r
t
t
a
a
ç
ç
ã
ã
o
o
a
a
p
p
r
r
e
e
s
s
e
e
n
n
t
t
a
a
d
d
a
a
a
a
o
o
P
P
r
r
o
o
g
g
r
r
a
a
m
m
a
a
d
d
e
e
P
P
ó
ó
s
s
-
-
G
G
r
r
a
a
d
d
u
u
a
a
ç
ç
ã
ã
o
o
d
d
a
a
F
F
a
a
c
c
u
u
l
l
d
d
a
a
d
d
e
e
d
d
e
e
E
E
d
d
u
u
c
c
a
a
ç
ç
ã
ã
o
o
d
d
a
a
U
U
n
n
i
i
v
v
e
e
r
r
s
s
i
i
d
d
a
a
d
d
e
e
F
F
e
e
d
d
e
e
r
r
a
a
l
l
F
F
l
l
u
u
m
m
i
i
n
n
e
e
n
n
s
s
e
e
,
,
c
c
o
o
m
m
o
o
r
r
e
e
q
q
u
u
i
i
s
s
i
i
t
t
o
o
à
à
o
o
b
b
t
t
e
e
n
n
ç
ç
ã
ã
o
o
d
d
o
o
t
t
í
í
t
t
u
u
l
l
o
o
d
d
e
e
M
M
e
e
s
s
t
t
r
r
e
e
e
e
m
m
E
E
d
d
u
u
c
c
a
a
ç
ç
ã
ã
o
o
.
.
O
O
r
r
i
i
e
e
n
n
t
t
a
a
d
d
o
o
r
r
:
:
P
P
r
r
o
o
f
f
.
.
D
D
r
r
.
.
O
O
s
s
m
m
a
a
r
r
F
F
á
á
v
v
e
e
r
r
o
o
N
N
I
I
T
T
E
E
R
R
Ó
Ó
I
I
A
A
G
G
O
O
S
S
T
T
O
O
D
D
E
E
2
2
0
0
1
1
0
0
ads:
3
Ficha Catalográfica elaborada pela Biblioteca Central do Gragoatá
D192 Dantas, Aline Cristina de Lima.
Fóruns de educação de jovens e adultos: movimentos em defesa de direitos
e políticas públicas para a educação de jovens e adultos / Aline Cristina de
Lima Dantas. – 2010.
119 f.
Orientador: Osmar Fávero.
Dissertação (Mestrado) – Universidade Federal Fluminense, Faculdade de
Educação, 2010.
Bibliografia: f. 115-119.
1. Educação de adultos. 2. Direito à educação. I. Fávero, Osmar. II.
Universidade Federal Fluminense. Faculdade de Educação. III. Título.
CDD 374
4
U
U
N
N
I
I
V
V
E
E
R
R
S
S
I
I
D
D
A
A
D
D
E
E
F
F
E
E
D
D
E
E
R
R
A
A
L
L
F
F
L
L
U
U
M
M
I
I
N
N
E
E
N
N
S
S
E
E
F
F
A
A
C
C
U
U
L
L
D
D
A
A
D
D
E
E
D
D
E
E
E
E
D
D
U
U
C
C
A
A
Ç
Ç
Ã
Ã
O
O
P
P
R
R
O
O
G
G
R
R
A
A
M
M
A
A
D
D
E
E
P
P
Ó
Ó
S
S
-
-
G
G
R
R
A
A
D
D
U
U
A
A
Ç
Ç
Ã
Ã
O
O
E
E
M
M
E
E
D
D
U
U
C
C
A
A
Ç
Ç
Ã
Ã
O
O
M
M
E
E
S
S
T
T
R
R
A
A
D
D
O
O
E
E
M
M
E
E
D
D
U
U
C
C
A
A
Ç
Ç
Ã
Ã
O
O
A
A
L
L
I
I
N
N
E
E
C
C
R
R
I
I
S
S
T
T
I
I
N
N
A
A
D
D
E
E
L
L
I
I
M
M
A
A
D
D
A
A
N
N
T
T
A
A
S
S
F
F
Ó
Ó
R
R
U
U
N
N
S
S
D
D
E
E
E
E
D
D
U
U
C
C
A
A
Ç
Ç
Ã
Ã
O
O
D
D
E
E
J
J
O
O
V
V
E
E
N
N
S
S
E
E
A
A
D
D
U
U
L
L
T
T
O
O
S
S
:
:
M
M
O
O
V
V
I
I
M
M
E
E
N
N
T
T
O
O
S
S
E
E
M
M
D
D
E
E
F
F
E
E
S
S
A
A
D
D
E
E
D
D
I
I
R
R
E
E
I
I
T
T
O
O
S
S
E
E
P
P
O
O
L
L
Í
Í
T
T
I
I
C
C
A
A
S
S
P
P
Ú
Ú
B
B
L
L
I
I
C
C
A
A
S
S
P
P
A
A
R
R
A
A
A
A
E
E
D
D
U
U
C
C
A
A
Ç
Ç
Ã
Ã
O
O
D
D
E
E
J
J
O
O
V
V
E
E
N
N
S
S
E
E
A
A
D
D
U
U
L
L
T
T
O
O
S
S
A
A
p
p
r
r
o
o
v
v
a
a
d
d
a
a
e
e
m
m
3
3
1
1
/
/
0
0
8
8
/
/
2
2
0
0
1
1
0
0
B
B
a
a
n
n
c
c
a
a
E
E
x
x
a
a
m
m
i
i
n
n
a
a
d
d
o
o
r
r
a
a
:
:
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
P
P
r
r
o
o
f
f
.
.
D
D
r
r
.
.
O
O
s
s
m
m
a
a
r
r
F
F
á
á
v
v
e
e
r
r
o
o
(
(
U
U
F
F
F
F
)
)
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
P
P
r
r
o
o
f
f
.
.
D
D
r
r
.
.
P
P
a
a
u
u
l
l
o
o
C
C
é
é
s
s
a
a
r
r
C
C
a
a
r
r
r
r
a
a
n
n
o
o
(
(
U
U
F
F
F
F
)
)
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
P
P
r
r
o
o
f
f
ª
ª
.
.
D
D
r
r
ª
ª
.
.
J
J
a
a
n
n
e
e
P
P
a
a
i
i
v
v
a
a
(
(
U
U
E
E
R
R
J
J
)
)
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
_
P
P
r
r
o
o
f
f
ª
ª
.
.
D
D
r
r
ª
ª
.
.
E
E
l
l
i
i
a
a
n
n
e
e
R
R
i
i
b
b
e
e
i
i
r
r
o
o
A
A
n
n
d
d
r
r
a
a
d
d
e
e
(
(
U
U
E
E
R
R
J
J
)
)
N
N
I
I
T
T
E
E
R
R
Ó
Ó
I
I
A
A
G
G
O
O
S
S
T
T
O
O
D
D
E
E
2
2
0
0
1
1
0
0
5
A
A
G
G
R
R
A
A
D
D
E
E
C
C
I
I
M
M
E
E
N
N
T
T
O
O
S
S
Aos companheiros dos fóruns que me fizeram compreender que a prática democrática é um
desafio cotidiano.
Ao meu querido orientador Osmar Fávero, pelo companheirismo, cumplicidade, pelos
ensinamentos e pelas palavras valiosas diante dos meus dilemas. Agradeço, principalmente
pela forma generosa e compreensiva com que sempre me tratou.
À minha querida amiga e mãezona Jane Paiva, responsável não pela minha iniciação
acadêmica, mas também por me mostrar um mundo de infinitas possibilidades. Agradeço por
me ajudar a ser uma pessoa melhor, pelo carinho, incentivo e por me estender a mão nos
momentos em que me senti perdida e insegura. A você devo tudo o que sou.
Ao Paulo Carrano pelo acolhimento, carinho, disponibilidade e por desestruturar minhas
convicções.
Ao grupo do Observatório Jovem pelas trocas e preciosas contribuições.
À querida amiga e poderosa Eliane Ribeiro Andrade (Lili) pela forma divertida e alegre com
que se sempre me apoiou e incentivou. Suas palavras de segurança foram determinantes nesta
minha trajetória.
À Coordenação de aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) pelo apoio
financeiro.
Às amigas Andréia Gomes e Anelize Reynozo por acreditarem em mim, mesmo nos
momentos em que eu achava que não conseguiria. Vocês são incríveis!
Ao meu amigo Charles Rosa pela amizade, confiança e pelas conversas sempre inspiradoras
na “mesa do velho”.
Ao super Luiz Padilha por me acolher de forma especial e carinhosa. Obrigada pela sua
generosidade e disponibilidade. É um privilégio ter sua amizade.
Às queridíssimas amigas Mariana Camacho e Tatiana Leite com quem compartilhei alegrias,
dúvidas e angústias. Obrigada por me tranquilizarem e por me ajudarem a me conhecer
melhor.
6
Às minhas mais novas amigas e companheiras Pâmella Passos e Alessandra Magalhães, que
me ajudaram a encarar os momentos difíceis de forma mais equilibrada. Agradeço pelo apoio
na reta final deste trabalho e por me proporcionarem momentos de diversão e reflexão. Vocês
são inspiradoras!
Às companheiras do IFRJ Rita Costa, Cintia Santos, Ana Beja pela escuta atenta, estímulo,
generosidade e por contribuírem, cada uma à sua forma, em minha formação pessoal e como
pesquisadora.
Ao querido Armando Maia, com quem passei a compartilhar alegrias e tristezas, agradeço por
me ajudar a ver a vida de forma mais leve e por torná-la mais musical. Sem sua compreensão,
sensibilidade, incentivo e os abraços sempre carinhosos não teria forças para seguir em frente.
À minha mãe Irinéia, à minha irmã Cláudia, aos Tios Marcelino e Cristina, à prima Vanessa, à
Nana e à minha querida avó (minha velhinha) por me possibilitarem a estrutura e o apoio
necessário para eu fazer minhas escolhas e a concretizar meus objetivos.
7
R
R
E
E
S
S
U
U
M
M
O
O
DANTAS, Aline Cristina de Lima. Fóruns de Educação de Jovens e Adultos: movimentos
em defesa de direitos e políticas públicas para a educação de jovens e adultos. Orientador:
Osmar Fávero. Niterói, Universidade Federal Fluminense, 31.08.2010. Dissertação (Mestrado
em Educação), 119 páginas. Campo de Confluência: Diversidade, Desigualdades Sociais e
Educação. Linha de Pesquisa: Práticas Sociais e Educativas e Educação de Jovens e Adultos.
Nas últimas décadas, a sociedade civil brasileira tem desempenhado papel relevante no
cenário público na busca por consolidar direitos, especialmente os ligados à Educação de
Jovens e Adultos (EJA). Neste sentido, busquei neste estudo compreender a ação dos fóruns
de EJA na luta pela educação de jovens e adultos, bem como identificar a capacidade desta
mobilização em interferir na política pública de EJA. Participação, direito à educação e
relação sociedade civil e Estado, na construção de políticas públicas foram categorias
relevantes a serem compreendidas, sobretudo pelo cenário de descrença nos tradicionais
espaços de representação política, de redefinição de papéis na construção/execução da política
pública e da forma ainda insuficiente de garantia do direito à educação. Procurei entender,
nos fóruns, os modos de ação e as formas de participação na luta pelo direito à educação. O
corpus da pesquisa foi constituído de relatórios e documentos produzidos pelos fóruns,
elaborados para os e nos Encontros Nacionais de Educação de Jovens e Adultos. Realizei
também entrevistas com integrantes do movimento, por intermédio das quais foi possível
reconstituir alguns fatos da história e da política de EJA de que os fóruns participaram.
Observei que os fóruns se valem da dimensão estratégica da rede, com a perspectiva de se
organizarem, articularem, trocarem informações e ampliarem a ação política na luta pela
efetivação do direito à EJA. A articulação em rede se materializa nos momentos coletivos de
interlocução entre os fóruns como: Encontro Nacional de Educação de Jovens e Adultos (de
caráter anual até 2009); Rede fóruns (grupo de discussão pelo e-mail yahoogrupos); Portal
dos Fóruns de EJA do Brasil (site www.forumejabrasil.org.br). Foi possível constatar que,
embora os fóruns assumam características distintas, possui um elemento que o distingue das
demais representações da sociedade, que passei a denominar de resistência propositiva.
Identifiquei que o movimento dos fóruns, para fazer prevalecer suas concepções, apropria-se
da guerra de posição, no sentido gramsciano, como estratégia de luta, para exercer influência
e interferir nos rumos das políticas de EJA. Apesar do movimento dos fóruns não possuir o
poder de mudar a realidade da educação de jovens e adultos e garantir o direito a esses
sujeitos, demonstra potencial para influir na elaboração das políticas públicas da área, como
foi possível verificar nos fatos relatados ao longo do estudo. Esta constatação realça,
inegavelmente, a importância da ão dos fóruns, como organizações da sociedade civil, em
conjunto com a sociedade política, na indução de políticas públicas de Estado para a EJA.
Palavras-chave: Educação de jovens e adultos; fóruns de EJA; direito à educação.
8
ABSTRACT
DANTAS, Aline Cristina de Lima. Young and Adults Education Forums: movements in
defense of public policies and rights for young and adults education. Counselor: Osmar
Fávero. Niteroi, Universidade Federal Fluminense, 31.08.2010. Dissertation (Master in
Education), 119 pages. Field of Confluency: Diversity, Social Inequalities and Education.
Research Line: Educational and Social Practices and Young And Adults Education.
In the last decades, Brazilian civilian society has developed a relevant role in the
public scenario in the pursuit to consolidate rights, especially those related to Young and
Adults Education (YAE). In this sense, I have set onto this paper comprehend the actions of
the YAE forums in the struggle for young and adults education, as well as identify the
capacity of this mobilization in interfering in YAE public policy. Participation, right to
education and the relation civil society and State, in the implementation of public policies
were important categories to be understood, chiefly because of the disbelief scenario in the
traditional spaces of political representation, of redefinition of roles in the
construction/execution of public policy and the way, yet insufficient of warranty to the right
of education. I have tried to understand, in the forums, the modes of action and the manners of
participation in the struggle for the right to education. The corpus of the research was
constituted by reports and documents produced by the forums, elaborated for and in the
National Young and Adults Education Summits. I have also done interviews with members of
the movement, through which was possible reconstitute some historical facts and YAE policy
of which the forums have taken place. I observed that the forums make use of the strategic
dimension of the network, with the perspective of organizing, articulating, exchanging
information among them and extend the political action in the struggle for the effectiveness of
the right to YAE. The articulation in network materializes itself in collective moments of
dialogue between the forums, such as: National Young and Adults Education Summit
(annually until 2009); Forums Network (discussion group through Yahoo groups); YAE
Forums Portal in Brazil (website: www.forumejabrasil.org). It was possible to perceive that,
although some forums assume different characteristics, there is an element that distinguishes
of the other representations of society, which I named Proposing Resistance. I identified that
the forums movements, in order to make their conceptions prevail, appropriates of the
position war, in the Gramscian sense, as a battle strategy to exert influence and interfere in the
orientation of YAE policies. Despite the forums movements do not have the power to change
the reality of young and adults education and guarantee the right to these subjects, it
demonstrates potential to have influence in the elaboration of the public policies in the area,
as it was possible to verify in the facts related throughout the paper. This finding, enhances,
undeniably, the importance of the forums actions, as civil society organization, in accordance
with the political society, in the induction of YAE State Public Policies.
Key-Words: Young and Adults Education, young and adults education forums, right to
education.
9
S
S
U
U
M
M
Á
Á
R
R
I
I
O
O
INTRODUÇÃO ...................................................................................................................................................10
1.
A INDISSOCIÁVEL RELAÇÃO ENTRE DESIGUALDADE E EDUCAÇÃO DE JOVENS E
ADULTOS...................................................................................................................................................14
1.1
R
ETRATOS DA DESIGUALDADE
:
OS INDICADORES DE
EJA
NA ATUALIDADE
..............................................16
1.2
D
IREITO À EDUCAÇÃO PARA TODOS
:
DESIGUALDADE REAL X DIREITOS PROCLAMADOS
.........................23
1.3
A
EJA
NA AGENDA POLÍTICA DA DÉCADA DE
1990:
A NEGAÇÃO DO DIREITO
...........................................27
1.4
D
A NEGAÇÃO DO DIREITO A UM NOVO ESPAÇO DE LUTA
:
O SURGIMENTO DOS
F
ÓRUNS DE
EJA .............33
1.5
A
EJA
NA PAUTA POLÍTICA DO GOVERNO
L
ULA
:
O FORTALECIMENTO DOS FÓRUNS DE
EJA..................37
2.
A SOCIEDADE CIVIL EM MOVIMENTO: OS FÓRUNS DE EJA.....................................................41
2.1
A
FORMA DE PARTICIPAÇÃO NOS FÓRUNS
...................................................................................................45
2.2
A
ARTICULAÇÃO DOS FÓRUNS EM REDE
......................................................................................................53
2.3
E
NCONTRO
N
ACIONAL DE
E
DUCAÇÃO DE
J
OVENS E
A
DULTOS
(ENEJA):
ESPAÇO DE ENCONTRO
,
MOMENTO DE DISPUTAS
...............................................................................................................................55
2.4
O
SENTIDO DO
ENEJA
PARA O MOVIMENTO DOS FÓRUNS
.........................................................................67
2.5
O
USO DO
P
ORTAL E DA REDE FÓRUNS
(
YAHOOGRUPOS
)
PARA DINAMIZAR A ARTICULAÇÃO EM REDE
...71
2.6
E
NTRE A MILITÂNCIA E A SOLIDARIEDADE
.................................................................................................74
3.
A PARTICIPAÇÃO DOS FÓRUNS NA CONSTRUÇÃO DA POLÍTICA PÚBLICA DE EJA.........77
3.1
A
CONQUISTA DE MAIS UM ESPAÇO DE INTERLOCUÇÃO
:
AS REUNIÕES TÉCNICAS DE REPRESENTANTES DE
FÓRUNS COM A
SECAD/MEC.....................................................................................................................89
3.2
A
PARTICIPAÇÃO DOS FÓRUNS NOS CASOS
ENCCEJA,
D
IRETRIZES
O
PERACIONAIS DE
EJA
E
VI
CONFINTEA ..............................................................................................................................................91
3.3
A
RELAÇÃO FÓRUNS E
E
STADO
....................................................................................................................99
4.
COMPREENSÕES DO MOVIMENTO DOS FÓRUNS DE EJA........................................................103
4.1
D
IREITO À EDUCAÇÃO PARA TODOS
:
BANDEIRA DE LUTA E ESSÊNCIA DO MOVIMENTO DOS FÓRUNS
....103
4.2
O
PAPEL DOS SUJEITOS PARA A AÇÃO DOS
F
ÓRUNS
..................................................................................107
4.3
A
MILITÂNCIA PELA
EJA
NOS FÓRUNS
:
NOVAS PRÁTICAS
?......................................................................108
4.4
F
ÓRUNS DE
EJA:
INSTÂNCIA FORMATIVA E POLÍTICA
.............................................................................110
4.5
A
LUTA PARA ALÉM DA REIVINDICAÇÃO
:
A GUERRA DE POSIÇÃO COMO ESTRATÉGIA
............................113
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.............................................................................................................115
10
I
I
N
N
T
T
R
R
O
O
D
D
U
U
Ç
Ç
Ã
Ã
O
O
Meu interesse em investigar a ação dos fóruns de educação de jovens e adultos (EJA)
surge a partir da minha experiência no curso de Pedagogia, como bolsista de extensão no
projeto Parceria com o Fórum de Educação de Jovens e Adultos do Estado do Rio de
Janeiro: novos conceitos e práticas. A atuação como bolsista de extensão e participante
resultou em meu trabalho final de curso denominado Fórum de Educação de Jovens e Adultos
do Estado do Rio de Janeiro: novas práticas políticas na esfera pública.
Nesse trabalho monográfico busquei investigar a metodologia de ação do Fórum
EJA/RJ, suas práticas, a relevância de seu papel para a EJA, compreendendo os fundamentos
de sua ação política. Esse movimento de investigação também permitiu ressignificar meus
saberes quanto ao amplo espaço educativo que o Fórum proporcionava aos sujeitos que dele
participavam, dadas suas práticas e ações construídas, cotidianamente. Foi ainda possível
verificar que o Fórum EJA/RJ atuava no campo político e ideológico, formulando estratégias
de ação e modos de gestão que apontavam para perspectivas de resistência capazes de
interferir, em muitos casos, nas políticas locais e até nacionais de educação de jovens e
adultos, sobretudo pela articulação com outros fóruns de EJA existentes no Brasil, o que
resultou numa articulação nacional e na realização de Encontros Nacionais de Educação de
Jovens e Adultos (ENEJAs).
Enquanto integrante do Fórum EJA/RJ pude participar do IV ENEJA, em Minas
Gerais (2002); do V ENEJA, em Mato Grosso (2003); do VII ENEJA, no Distrito Federal
(2005); do VIII ENEJA, em Pernambuco (2006); do X ENEJA, no Rio de Janeiro (2008) e do
XI ENEJA, no Pará (2009). Pelos ENEJAs acompanhei o surgimento e a construção de fóruns
como Amazonas, Ceará, Sergipe, Pernambuco, Mato Grosso do Sul, Rondônia, Distrito
Federal, Maranhão e Amapá. A partir do trabalho monográfico, aliado à minha participação
nos ENEJAs, uma questão passou a me inquietar: há identidade entre esses fóruns?
Para responder a questão propus-me a realizar uma nova investigação, no âmbito do
mestrado, com a perspectiva de dar continuidade à pesquisa iniciada com o Fórum EJA/RJ,
mas ampliando o foco para a articulação dos fóruns de EJA nacionalmente. Duas questões
principais guiaram este trabalho atual: a) identidade entre os fóruns de EJA? b) os fóruns
conseguem interferir nas políticas públicas de EJA nacionalmente?
A sociedade civil ganha papel relevante no cenário público na busca por consolidar
11
direitos, especialmente, os ligados à EJA. Mas, também se constata, segundo Paiva (2009, p.
214) que há avanços no campo jurídico, nas legislações, acordos, na ampliação do acesso e no
reconhecimento de novas práticas em que os sujeitos ganham centralidade nos processos
educacionais. Para a autora, a formulação e a execução de novas políticas públicas de EJA
acompanham um movimento da sociedade organizada, não como outorga do Estado, mas
como resistência e diálogo, levando à incorporação de direitos e, consequentemente, à
perspectiva de inclusão de uma diversidade de sujeitos.
Neste sentido, enquanto participante do movimento dos fóruns e pesquisadora
interessada pela sua ão, identifico que a importância do estudo realizado tem seu destaque
marcado pelo lugar alcançado por esse movimento na realidade brasileira, no que diz respeito
às contribuições que aportaram à formulação de políticas públicas de direito. Investigar as
ações dos fóruns de EJA na luta pelo direito à educação apresentou-se como possibilidade de
perceber e identificar desigualdades e contradições sociais ainda presentes na sociedade
brasileira.
Poucos são os estudos que se debruçam sobre essa temática, como as pesquisas
desenvolvidas por Silva (2005) e Ferreira (2008) que buscaram compreender as ações dos
fóruns da Paraíba e de Minas Gerais, respectivamente. Esses estudos, a partir da teoria dos
movimentos sociais, aproximam-se na busca de entendimento da natureza dessas
representações e do relevante papel que desempenham pela educação de jovens e adultos, mas
se diferenciam na forma de abordagem do tema, apresentando modos distintos de conceber os
movimentos sociais. Inegavelmente, ambas as pesquisas trazem contribuições relevantes à
temática. Contudo, ela não se esgota, principalmente por não haver estudos que privilegiem
compreender a articulação estabelecida entre os fóruns, como movimento da sociedade civil
na luta pelo direito à educação de jovens e adultos o que considero a “novidade” do meu
estudo.
Elementos como participação, direito à educação e relação da sociedade civil com o
Estado na construção de políticas públicas foram categorias relevantes a serem
compreendidas, sobretudo pelo cenário de descrença nos tradicionais espaços de
representação política, de redefinição de papéis na construção/execução da política pública e
da forma ainda insuficiente de garantia do direito à educação. Para que essas categorias
fossem por mim compreendidas, busquei dialogar com autores, entre outros, como Dagnino
(2004), Teixeira (2008) e Moroni (2005) no que tange à participação; Bobbio (1992), Cury
(2002) e Paiva (2009) a respeito do direito e do direito à EJA; e Coutinho (1992), Oliveira
12
(2004), Scherer-Warren (2002), Tatagiba e Teixeira (2006) e Gohn (2002) no tocante à
sociedade civil, ao Estado e à relação que estabelecem, por identificar pertinência com o
objeto e com as questões que surgiram ao investigá-lo.
Assim, entender a ação dos fóruns de EJA na luta pela educação de jovens e adultos
significou a possibilidade de compreender como suas práticas poderiam provocar mudanças
no espaço público, por meio da luta pelo direito à educação de jovens e adultos. Como Sader
(1988, p. 38), entendo que o relevante nos estudos sobre movimentos empreendidos pela
sociedade civil está em compreendê-los na sua essência, pois esses “sujeitos coletivos” criam
seus próprios espaços e exigem novas formas de inteligibilidade, para além do paradigma
clássico da reprodução. Por esse paradigma, segundo o autor, os movimentos tornam-se
resultado e atualização da estrutura e, assim, ao ocuparem um lugar de submissão não
permitem “examinar o fenômeno na sua originalidade”. Por meio dessa investigação, pretendi
perceber como se constroi e se efetiva o direito à educação de jovens e adultos, no diálogo
entre o movimento dos fóruns e o poder público.
Para tratar do meu objeto, optei por investigar nos fóruns modos de ação e formas de
participação na luta pelo direito à educação. O corpus da pesquisa foi constituído de relatórios
e documentos produzidos pelos fóruns, a partir de 2005, elaborados nos Encontros Nacionais
de Educação de Jovens e Adultos, por entender que nesses espaços os diversos fóruns
disputam concepções, negociam formas de ação e, neste sentido, podem trazer contribuições
relevantes sobre uma possível unidade e identidade de suas representações como grupos
sociais organizados.
Na tentativa de compreender como atuam e como se relacionam com o poder público
utilizei, em especial, o documento base preparatório ao X ENEJA, elaborado pela equipe do
Fórum EJA/RJ (organizadora do evento nacional) sistematizando contribuições dos demais
fóruns do país, e o relatório final desse encontro, cujo tema central foi História e memória dos
Encontros Nacionais dos Fóruns de EJA no Brasil: dez anos de luta pelo direito à educação
de qualidade social para todos. Ambos documentos primordiais para a apreensão da história,
organização, mobilização nacional, forma como o movimento se relaciona com o poder
público e contribuição prestada às políticas públicas de EJA.
Minha aproximação, como pesquisadora, se fez especialmente pelo acompanhamento
dos X e XI ENEJAs, quando pude identificar principais discussões, conflitos, disputas e a
articulação que instituíam entre si e com outras entidades.
13
Outro dispositivo relevante na constituição do corpus foi o portal dos Fóruns EJA
Brasil na Internet (www.forumeja.org.br), lugar estratégico de construção de concepções e
“bandeiras” em defesa do direito à EJA. Além desse, o grupo de discussão no yahoogrupos
(ao qual tenho acesso), compôs com o primeiro a possibilidade de capturar e conhecer a
dinâmica interna de funcionamento dos fóruns, principais discussões, estratégias de atuação e
mobilização, conflitos etc.
Também realizei quatro entrevistas com integrantes do movimento, pela importância
histórica e política de seus depoimentos para a ação dos fóruns. Por intermédio desses relatos
foi possível reconstituir alguns fatos da história e da política de EJA de que os fóruns têm
participado.
Para responder as questões dessa pesquisa, o estudo foi guiado pelos seguintes eixos:
a) Origem dos fóruns: motivações para seu surgimento; b) Participação nos fóruns:
características, organização, componentes, pautas de luta, estratégias de ação, forma como se
articulam nacionalmente; c) Participação dos fóruns no espaço blico: forma como
estabeleceram interlocução com o poder público, vias de diálogo utilizadas para discutir a
política de EJA, resultados da articulação com o poder público na construção da política de
EJA.
14
1
1
A
A
I
I
N
N
D
D
I
I
S
S
S
S
O
O
C
C
I
I
Á
Á
V
V
E
E
L
L
R
R
E
E
L
L
A
A
Ç
Ç
Ã
Ã
O
O
E
E
N
N
T
T
R
R
E
E
D
D
E
E
S
S
I
I
G
G
U
U
A
A
L
L
D
D
A
A
D
D
E
E
E
E
E
E
D
D
U
U
C
C
A
A
Ç
Ç
Ã
Ã
O
O
D
D
E
E
J
J
O
O
V
V
E
E
N
N
S
S
E
E
A
A
D
D
U
U
L
L
T
T
O
O
S
S
Neste primeiro capítulo busco apresentar o cenário em que se forjou o surgimento dos
fóruns de educação de jovens e adultos (EJA) e sua ampliação, nas décadas de 1990 e 2000,
para compreender as motivações que impulsionaram a organização de atores da sociedade
civil
1
na luta pela educação de jovens e adultos.
A histórica desvantagem educacional de jovens e adultos das classes populares, aliado
a fatores políticos e econômicos, atesta a indissociável relação entre desigualdade e EJA.
Relação esta que está associada a uma tardia política educacional (de qualidade) destinado às
classes mais populares, ao predomínio dos interesses elitistas e ao modelo capitalista adotado
pela sociedade brasileira. Este modelo é apontado por Frigotto e Ciavatta (2003, p. 1132),
como fruto da relação dialética entre o arcaico e o moderno favorecendo e privilegiando a
classe dominante que historicamente tem reiterado a profunda desigualdade econômica,
social, cultural e educacional.
Desde que a educação foi enunciada, pela primeira vez, na Constituição Federal de
1934, como direito de todos, devendo ser ministrado pela família e pelo Estado, foi assumida
pelo poder público segundo interesses políticos e eleitorais. Também não foi acompanhada
por investimentos financeiros suficientes a crescente demanda de ingresso na instituição
escolar pública. Posteriormente, acrescenta-se a isto a necessária adequação pedagógica às
mudanças que ocorreram na escola até então destinada às elites com o ingresso de
sujeitos com saberes e culturas distintos do que era valorizado, de modo a garantir a
permanência destes grupos no sistema escolar.
Esta realidade de insuficientes ações políticas na garantia de direitos, ou seja, a forma
desigual no desenvolvimento de ações para este campo numa sociedade de classes, não
permitiu a diminuição da desigualdade educacional, nem a superação do analfabetismo,
apesar de sua expressiva redução percentual nas últimas décadas. Este cenário motivou ainda
a produção de novos analfabetos e subescolarizados, deixando à margem grande parte da
população, pois estas não se apropriaram dos códigos de leitura e escrita essenciais às
sociedades grafocêntricas.
1
Estou usando o conceito de sociedade civil de Costa (2002, p. 62) que entende como um campo de relações
marcado por solidariedade e cooperação; e segundo concepção de Gramsci apud Coutinho (2006, p. 35) que
entende por sociedade civil organizações responsáveis pela elaboração e difusão de ideologias. Além de se
apresentar como um campo de diálogo e disputa por hegemonia.
15
Foi se formando, assim, um grande público demandante da educação de jovens e
adultos que, em vários momentos históricos, contou com ações específicas de atendimento
pelo poder público, mas ineficazes do ponto de vista da qualidade e que pudessem garantir
formação mais ampla das classes populares.
Na trajetória histórica da EJA, mobilizações da sociedade civil reivindicaram ações do
poder público diretamente ou colaborando nas campanhas de educação das classes populares.
Em alguns momentos, como no início da década de 1960, a sociedade civil assumiu o papel
de executora dessa ação, por meio de movimentos de cultura e educação popular. Estas
experiências, abruptamente interrompidas pelo golpe militar de 1964
2
, jamais foram
retomadas, principalmente no tocante às concepções e à produção de materiais destinados à
alfabetização e à formação mais ampla dos sujeitos jovens e adultos.
Constantes interrupções ocorreram no âmbito das políticas educacionais, em particular
produzidas pelas alternâncias no poder municipal. A recente expansão da escolarização — que
tornou evidente a fragilidade e a precarização da estrutura escolar — só intensificou as
desigualdades educacionais, pois embora a escola passasse a permitir o acesso de quase
totalidade das crianças na idade “própria”, não tem garantido sua permanência, nem sua
adequada formação.
Em termos mais amplos, a escola revelou-se não uma instituição reprodutora das
desigualdades sociais, mas também produtora de novas desigualdades (Bourdieu, 1975).
Criou novos mecanismos de exclusão no seu interior (Dubet, 2003) e deixou gradativamente
de fora sujeitos das classes populares que buscavam apropriar-se do capital simbólico da
educação, valorizado socialmente, utilizando procedimentos cada vez mais sutis, ou seja, de
“forma menos aparente” (Beisiegel, 2005).
As políticas voltadas para a educação das classes populares reforçam a tese, bastante
discutida, de tratamento político desigual no Brasil. De acordo com Peregrino (2008), a
realidade dessas políticas é impossível de ser entendida apartada da desigualdade. A autora
afirma ainda que a “lógica de distribuição dos direitos reproduz as desigualdades que, por
princípio, as políticas buscavam dirimir”. (Peregrino, 2008, p. 115).
2
O golpe militar caracterizou-se pela tomada do poder pelos militares, em 1964, e produziu uma ruptura política
no país. Segundo Di Pierro e Haddad (2000, p. 113) a ruptura política tentou acabar com as práticas educativas
que auxiliavam na explicitação dos interesses populares (os movimentos de educação e cultura popular). O
Estado exercia sua função de coerção, com a finalidade de garantir a “normalização” das relações sociais.
16
Não questionamento sobre o fato de o modelo educacional brasileiro, sobretudo
pela instituição escolar, buscar (o que faz ainda) a expansão e a universalização sem,
entretanto, fazer modificações estruturais necessárias para incorporar os sujeitos excluídos do
processo educativo, reproduzindo a desigualdade social no interior do sistema. Essa forma de
expansão gera novas desigualdades e exclui grande parcela de aspirantes à escola.
O produto final criado por este cenário vicioso de reprodução da desigualdade
aprofundou as questões que afetam a EJA. Gerou um público potencialmente demandante de
escolarização, negada pela incapacidade do sistema educacional, que passa a ter na EJA uma
forma de inclusão e de retorno aos espaços escolares. Contudo, esta modalidade
3
passou a
carregar a marca do estigma de fracasso e de insucesso como exclusiva desses sujeitos, que
passaram a assumir a culpa desse fracasso como sua, camuflando a fragilidade e a
incapacidade do Estado brasileiro de garantir para todos o direito à educação, independente da
idade.
1
1
.
.
1
1
R
R
e
e
t
t
r
r
a
a
t
t
o
o
s
s
d
d
a
a
d
d
e
e
s
s
i
i
g
g
u
u
a
a
l
l
d
d
a
a
d
d
e
e
:
:
o
o
s
s
i
i
n
n
d
d
i
i
c
c
a
a
d
d
o
o
r
r
e
e
s
s
d
d
e
e
E
E
J
J
A
A
n
n
a
a
a
a
t
t
u
u
a
a
l
l
i
i
d
d
a
a
d
d
e
e
Esta indissociável relação entre desigualdade e EJA permanece nos dias atuais e pode
ser verificada nos índices educacionais produzidos mais recentemente pelo Instituto Brasileiro
de Geografia e Estatística (IBGE), com os resultados da Pesquisa Nacional por Amostra de
Domicílios (PNAD, 2007). A desigualdade continua e se reproduz.
A EJA, como foi dito, reflete a desigualdade social e educacional historicamente
construída no país. Apesar das melhoras percentuais, em relação à diminuição da
desigualdade social e educacional constatada por Paiva (2009) — pela leitura de dados
educacionais desde o início do século XX até início do século XXI (dados oficiais até 2002)
a melhora brasileira ainda está muito aquém do esperado para que o país repare a dívida
social histórica, reconhecendo que deixou de efetivar o direito de todos à educação.
Os dados apresentados pela PNAD 2007, apontam algumas melhoras percentuais nos
índices educacionais, quando comparados aos dados anteriores, mas segundo Paiva (2009, p.
138), parafraseando Anísio Teixeira, “os números absolutos é que importam, não nos devendo
vangloriar com os percentuais em queda”. Neste sentido, a compreensão dos dados precisa
considerar os avanços reais na perspectiva dos números absolutos, por se apresentar como
indicador da eficácia das ações do poder público.
17
Apesar de, na década de 1990, a EJA ser colocada à margem das políticas públicas,
especialmente na segunda metade dos anos 2000 ganha novamente lugar e espaço na agenda
política, com maiores investimentos e ações. Contudo, os números evidenciam o quanto ainda
precisa ser investido na educação, pois, apesar da melhora nos índices da escolarização e na
taxa do analfabetismo nos últimos anos, alguns dados ainda apontam a necessidade de ações
mais efetivas para a solução de problemas recorrentes que afetam a EJA na perspectiva
escolar.
Em termos de escolarização, o Brasil ainda não conseguiu atingir a exigência
obrigatória de escolaridade nima que passou de 8 anos para 9 anos de estudos com a
aprovação da Lei n°. 11.274/06, cuja implementação gradativa está prevista até 2010. O
índice médio de 7,3 anos de escolaridade, em 2007, demonstra que o Brasil ainda está distante
do estabelecido em lei.
Outro fator de extrema importância é a falta de qualidade do sistema escolar público.
Inquestionavelmente a qualidade é muito baixa. Pesquisas oficiais revelam que o acesso ao
ensino fundamental está universalizado desde a década de 1990; no entanto, sua baixa
qualidade não vem garantindo a permanência dos alunos na escola. A situação de não
permanência vem sendo gerada, como dito anteriormente, no interior da própria escola,
aliada a aplicabilidade dos recursos, à formação precária dos professores, etc, gerando um
grande grupo que Dubet (2003) vai chamar de “os excluídos de dentro”. Este problema acaba
produzindo o público que terá como opção a modalidade EJA. Aliada aos sujeitos analfabetos
e sem escolarização mínima, produzidos historicamente pelas desigualdades sociais, formam
o quantitativo numérico expressivo da EJA.
Pela primeira vez a PNAD 2007 se debruçou de forma mais detalhada sobre os
indicadores da educação de jovens e adultos, com o levantamento suplementar Aspectos
Complementares da Educação de Jovens e Adultos e Educação Profissional, feito em parceria
com o Ministério da Educação (MEC). A pesquisa buscou evidenciar as características da
educação de sujeitos jovens e adultos com 15 anos ou mais de idade e, também, apresentou
dados relativos à educação profissional de pessoas com 10 anos ou mais de idade. Esses dados
ajudam a entender o cenário da desigualdade. A partir deste ponto, apresento várias reflexões
com base nos estudos da PNAD 2007.
3
A educação de jovens e adultos, na perspectiva da escolarização, na Lei de Diretrizes e Bases da Educação
Nacional n°. 9.394/1996 constitui-se uma modalidade da Educação Básica.
18
Dos 141,5 milhões de pessoas com 15 anos ou mais, pouco mais de 14 milhões, o
equivalente a 10% da população, segundo a PNAD 2007, não sabiam ler e escrever. Se a
análise considerar apenas este valor percentual, certamente dará a falsa impressão de que o
problema da alfabetização está sendo superado. Mas, se a leitura considerar os 14 milhões de
pessoas evidenciará uma quantidade expressiva da população que não goza plenamente de sua
cidadania. Este dado é um alerta e aponta que o grave problema do analfabetismo, apesar dos
muitos programas criados ao longo da história brasileira, não foi superado.
Desse total de pessoas com 15 ou anos ou mais, 1,7%, ou seja, 2,466 milhões de
pessoas, frequentavam ou frequentaram anteriormente um curso de alfabetização, sendo que,
deste contingente, apenas 547 mil pessoas, no momento da pesquisa, freqüentavam classes de
alfabetização, o que representa um índice muito baixo. Dos sujeitos atendidos, 246,15 mil
pessoas (45%) declararam não saber ler e escrever. Este número, associado aos 14 milhões de
analfabetos, revela o ciclo vicioso dos que entram e saem dos cursos de alfabetização sem
conseguir dominar a leitura e a escrita. Além disso, apontam para o empenho pouco efetivo ou
a ineficácia das ações na superação do analfabetismo, declarados, por exemplo, no último
Plano Nacional de Educação (PNE, 2000), que tinha como meta erradicar o analfabetismo até
2010
4
.
A gravidade que se coloca no tocante ao processo de alfabetização diz respeito à
continuidade. Do total da população com 15 anos ou mais, apenas 2,9 milhões, ou seja, 2% de
pessoas frequentavam algum curso de EJA. Haddad (2009, p. 366), também se valendo desse
mesmo conjunto de dados, aponta que de cada 100 pessoas apenas seis mantêm continuidade
em programas da educação de jovens e adultos. Em sua compreensão este é um problema
grave, pois os cursos de alfabetização apresentam-se como a primeira metade da
aprendizagem no ensino fundamental; sem continuidade no processo de alfabetização, os
sujeitos acabam regredindo em sua aprendizagem e tornam-se integrantes do grupo dos
analfabetos funcionais. Esta realidade também revela a pouca ou baixa articulação que ocorre
entre a alfabetização e a educação de jovens e adultos. Na falta de estratégias para essa
articulação, os avanços reais serão apenas um conjunto de boas intenções, como ocorreu com
as metas do PNE de assegurar a oferta de cursos de EJA referente aos quatro primeiros anos
do ensino fundamental, para 50% da população com 15 anos ou mais, até 2005; e a oferta de
4
Apesar de o Plano Nacional de Educação estabelecer a meta de erradicar o analfabetismo em 2010, o Estado
brasileiro não está conseguindo alcançá-la.
19
cursos de EJA para toda população, com 15 anos ou mais que tenham concluído as séries
iniciais, nas séries finais do ensino fundamental, até 2010 (Haddad, 2009, p. 367).
Em relação aos sujeitos presentes na EJA, a pesquisa aponta que dos 2,9 milhões de
pessoas que frequentavam cursos de EJA, a presença das mulheres, na faixa etária de 18 anos
em diante, representa 54%, ultrapassando a presença dos homens. Isto evidencia que as
mulheres, de forma geral, estão tendo mais condições de retomar os estudos. Cabe salientar
também que o grupo etário de 15 a 17 anos é a minoria nos cursos de EJA
5
, não confirmando
as recorrentes afirmações de que a EJA é um depósito de jovens dessa faixa etária.
Constata-se também que os que mais sentem os efeitos da desigualdade são os negros,
pois apresentam os índices mais baixos em anos de escolaridade, o equivalente a 6,3 anos de
estudo. Do total de pessoas que frequentavam a EJA, 1,3 milhões de pessoas (47,2%) se
declararam pardas e 308 mil (10,5%) pretas. Considerando que para o IBGE a população
negra é representada por pretos e pardos, significa que a população negra é a maioria na EJA
com o equivalente a 1,6 milhões de pessoas (57,7%); outros 1,2 milhões (41%) se declararam
brancas e 31 mil (1,1%) de outra raça e cor.
As disparidades educacionais vistas pelo ângulo regional também aparecem de forma
contundente. Comparando as grandes regiões do país com o total de pessoas com 15 anos ou
mais (141.513 mil), a região Nordeste, com taxa de analfabetismo de 20%, apresentou a maior
porcentagem de pessoas que frequentavam ou frequentaram cursos de alfabetização: 3,6%, ou
seja, 1,3 milhõe. O menor índice pertence à região Sudeste com 0,9%, representando 564 mil
pessoas. O combate à desigualdade entre as regiões brasileiras, sobretudo o Norte e o
Nordeste do país, desde a década de 1990, recebe recursos públicos por meio do Programa
Recomeço
6
. Este Programa, mesmo com a mudança de governo, não foi interrompido: em
2003, ampliou-se a todas as regiões, transformado em Programa Fazendo Escola e,
recentemente, seus recursos foram incorporados ao FUNDEB.
5
A quantidade de jovens de 15 a 17 anos representa 2% do quantitativo de sujeitos que frequentavam a EJA.
Este dado foi apresentado por Carlos Moreno do INEP que, a partir dos dados da PNAD, fez um estudo
apresentado em Power point, em grupo de trabalho denominado “Roda de conversa MEC/SEB/SECAD”,
reunido pela primeira vez em 19 de agosto de 2009, com o objetivo de “discutir princípios e diretrizes para a
política nacional de atendimento no Ensino Fundamental a adolescentes de 15 a 17 anos, com foco no direito à
educação para esses sujeitos”.
6
O Programa consiste no repasse de recursos financeiros pelo quantitativo de matrículas na modalidade EJA,
tendo como referencia para o repasse o censo escolar e o IDH, de estados e municípios situados em
microrregiões, com índice menor ou igual 0,500, para ampliar a oferta de vagas no ensino fundamental de jovens
e adultos.
20
Ações mais articuladas com a esfera municipal e estadual, em sintonia com as
características regionais, têm representado tendencialmente o compromisso de atuação
sistemática de superação do analfabetismo e continuidade da escolarização no ensino
fundamental, dando concretude ao direito à educação proclamado em nossa lei máxima.
Quanto ao perfil social dos alunos que frequentavam ou frequentaram anteriormente
os cursos de EJA, constata-se que a presença mais expressiva é composta por sujeitos com
renda per capita entre ½ a 1 salários mínimos (722 mil), seguido dos que ganham entre ¼ a ½
salário mínimo (622 mil). Cabe ressaltar que 487 mil pessoas ganhavam até ¼ salário
mínimo, o que confirma que são as camadas mais pobres da população que possuem maiores
dificuldades em obter a escolarização mínima obrigatória, sofrendo intensamente os efeitos
negativos das disparidades sociais e educacionais.
Outra característica importante da EJA, apontado pela mesma pesquisa, diz respeito à
frequência aos segmentos do ensino fundamental
7
. O segundo segmento foi o mais
frequentado, seguido do ensino médio. O quantitativo menor foi registrado no primeiro
segmento do ensino fundamental, mesmo havendo aproximadamente 29 milhões de pessoas
que não completaram os primeiros quatro anos deste nível de ensino. Ao fazer comparação
entre o segmento cursado pelas pessoas que frequentavam a EJA durante a pesquisa e o
segmento de pessoas que frequentaram anteriormente à realização da pesquisa, fica
evidente que o acesso aos cursos de EJA para dar continuidade à escolarização interrompida,
ou seja, ao segundo segmento, tem sido maior do que os que buscam cursos para
aprendizagens iniciais de consolidação do processo de alfabetização, o chamado primeiro
segmento.
O estudo também aponta as principais motivações que levam os sujeitos a frequentar a
modalidade EJA, ao invés do chamado ensino regular. A maior parte dos pesquisados
respondeu que o interesse foi para retomar os estudos, seguido de conseguir melhores
oportunidades de trabalho, adiantar os estudos e conseguir diploma. A esse respeito, Haddad
(2009, p. 15) aponta que essas respostas representam interesse maior por uma formação geral
do que um anseio instrumentalista da escola como meio de acesso a melhores oportunidades
de emprego, evidenciando a importância desta modalidade para a construção de cidadania.
O retrato da EJA na atualidade associa-se essencialmente à questão da permanência e
evasão no sistema de ensino regular. Sujeitos que frequentaram anteriormente a EJA
7
Estou utilizando o termo da PNAD “segmentos do ensino fundamental”, embora na atualidade a LDB os
nomeie como anos iniciais e anos finais do ensino fundamental.
21
relataram, no momento da pesquisa, algumas motivações para a não continuidade nos cursos:
horário de estudo não compatível com o horário de trabalho, dificuldades de acompanhar o
curso; não haver curso próximo à residência ou local de trabalho; falta de interesse em fazer o
curso; não ter conseguido vaga e outros não especificados.
Tais motivos apontam que a EJA, apesar da flexibilidade que lhe é atribuída
legalmente, ainda padece de antigos problemas, como o de não tornar os cursos compatíveis
com a vida dos sujeitos que deles necessitam. Essas questões demonstram a importância do
currículo de EJA estar em sintonia em relação aos tempos, às formas de abordagem das
disciplinas, ao itinerário formativo dos cursos, aos saberes e às experiências, entre outros; de
forma diferente do ensino regular, adequando-se à peculiaridade dos sujeitos que possuem
condições de vida diversas das dos alunos do ensino regular. Não há como pensar em aumento
de escolaridade e aprendizagens genuínas, ou seja, avanços reais no que tange a uma
educação de qualidade, sem pensar nas questões do currículo, da estrutura e das condições
que a EJA precisa possuir para garantir efetivamente o direito à educação plena e para todos.
Machado (2009), ao analisar os dados do Censo do Inep em relação às matrículas de
EJA, afirma que a diminuição ou pouca ampliação no número de matrículas no primeiro
segmento do ensino fundamental, em âmbito nacional, é um desafio para a gestão pública.
Afirma ainda ser necessária a criação de estratégias para garantir a continuidade no processo
de escolarização. Neste caso, devem-se evitar refluxos de aprendizagem, pois apesar dos
investimentos em programas de alfabetização e cursos de EJA, não haverá avanços genuínos.
Resultados positivos têm sido observados no âmbito municipal, no qual se constata o aumento
das matrículas de EJA e que está relacionado, segundo Machado (2009, p. 30), ao repasse
descentralizado de recursos, como o Fazendo Escola.
Mas apesar de experiências exitosas, o desafio é quanto à continuidade e à qualidade
do ensino ofertado, o que remete à questão das metodologias, currículos, como sinalizado
anteriormente, mas, sobretudo, à formação dos educadores. Cabe ressaltar também a
importância em se induzir políticas de formação dos gestores de EJA; mesmo com a
existência de recursos destinados à formação continuada de professores, por exemplo, muitas
prefeituras não os utilizam (em muitos casos) por simples desconhecimento de sua existência.
Os indicadores da educação de jovens e adultos revelam a dura realidade dos que não
tiveram o direito à escolarização ainda efetivado. Os dados falam por si, a EJA tem cor, classe
e região, já que os mais atingidos pelas desigualdades são negros, pobres e residentes nas
regiões Nordeste e Norte.
22
No plano mais concreto das ações políticas, estados e municípios possuem papel
primordial neste avanço, assumindo a responsabilidade de executores principais da EJA e
buscando aprimorar sua oferta curricular para além do antigo ensino supletivo e do ensino
regular noturno.
O dever constitucional de ofertar a EJA necessita utilizar recursos conseguidos, ao
custo de muita luta, no FUNDEB. Segundo o Secretário da SECAD, André Lázaro
8
, apenas
8% dos recursos, dos 15% disponíveis para EJA, vêm sendo utilizados. Isto pode ser
motivado por alguns fatores, como o pouco preparo dos gestores de EJA ou mesmo o
desconhecimento da disponibilidade desses recursos. Também representa um descompasso
entre as ações dos estados e municípios com as ações de âmbito federal, pois a União tem
feito investimentos importantes na EJA, no tocante à merenda, ao transporte, ao material
didático, à leitura e literatura etc.
De todo modo firma-se a necessidade de que os projetos pedagógicos desta
modalidade considerem e priorizem de fato a questão da diversidade e sejam mais flexíveis. O
desafio que se faz latente é pensar estratégias pedagógicas que garantam o sucesso na
trajetória educacional de cada sujeito — mesmo reconhecendo não ser tarefa fácil, pois
depende de outros fatores possibilitando-lhe formação geral que garanta condições de
exercer sua cidadania.
Sem dúvida houve algumas melhoras nos indicadores da situação de escolarização de
jovens e adultos com 15 anos ou mais, mas a PNAD também aponta que a EJA ainda não foi
tratada com a prioridade necessária e reconhecida, pelo poder público, como chave primordial
para o desenvolvimento da sociedade no século XXI, como aponta a declaração de Hamburgo
(1997), especialmente, na década de 1990, mesmo sendo o Brasil signatário desta declaração.
A ineficácia de políticas voltadas para a superação do analfabetismo e o aumento de
escolaridade é uma realidade histórica, ressalvadas algumas ações neste âmbito, mas apontaria
que, na história brasileira mais recente, sem dúvida, a política do governo FHC para a EJA foi
desastrosa, do ponto de vista das escolhas políticas que se alinharam com o projeto de
sociedade neoliberal que chega com ares de vitória à América Latina, apesar do fracasso na
Europa. O Estado brasileiro desse tempo, segundo a perspectiva do direito de todos à
8
Em discurso na cerimônia de abertura da Reunião de Trabalho da Agenda Territorial de Desenvolvimento
Integrado de Alfabetização e Educação de Jovens e Adultos, ocorrido em Brasília, de 10 a 12 de dezembro de
2008.
23
educação, desperdiçou oito anos de combate à desigualdade educacional, ao não assumir em
sua agenda política, com devida importância e valor, a educação de jovens e adultos.
1
1
.
.
2
2
D
D
i
i
r
r
e
e
i
i
t
t
o
o
à
à
e
e
d
d
u
u
c
c
a
a
ç
ç
ã
ã
o
o
p
p
a
a
r
r
a
a
t
t
o
o
d
d
o
o
s
s
:
:
d
d
e
e
s
s
i
i
g
g
u
u
a
a
l
l
d
d
a
a
d
d
e
e
r
r
e
e
a
a
l
l
x
x
d
d
i
i
r
r
e
e
i
i
t
t
o
o
s
s
p
p
r
r
o
o
c
c
l
l
a
a
m
m
a
a
d
d
o
o
s
s
Mesmo enunciado na lei, o direito à educação (na perspectiva da escolarização como é
entendida) não se efetivou para todos, sobretudo, pelo modelo desigual e excludente que
caracteriza o sistema educacional brasileiro.
A preocupação em afirmar o direito à educação para todos em marcos legais,
historicamente, demonstra a importância e a consciência de sua necessidade, o que resultou
em diversas lutas que se constituíram pela sua efetivação. É possível constatar esta
preocupação desde sua proclamação nas Constituições Federais de 1934 e 1946, em que o
direito à educação aparece como direito de todos e condição necessária para o melhor
desenvolvimento social e econômico e para a constituição e desenvolvimento dos sujeitos. O
direito à educação, posto como direito de “todos”, coloca a EJA no âmbito legal, mesmo que
não assumido efetivamente. Desde então, leis e acordos a respeito da educação, que se foram
produzindo e sendo assumidos pelo Brasil, contribuíram para que a EJA alcançasse a
condição de direito na contemporaneidade.
Como direito social, o direito à educação passa à condição de direito humano
fundamental, junto com os direitos civis e políticos, em 1948, pela Assembléia Geral das
Nações Unidas. A Declaração Universal dos Direitos Humanos surge no período pós Segunda
Guerra Mundial, em que se assiste, segundo Horta (1998, p. 9), uma considerável
democratização do ensino e um aumento da escolaridade obrigatória.
A referida Declaração influenciou normas legais de países signatários, como o Brasil,
e trouxe considerações importantes sobre a educação quando em seu artigo XXVI expressa
que “toda pessoa tem direito à educação. A educação deve ser gratuita, pelo menos no que se
refere à instrução elementar e fundamental. A instrução elementar seobrigatória [...]”. O
documento não enfatiza que o direito à educação é um bem que deve ser garantido para
todos, consequentemente sem distinções de idade, e ainda aponta a gratuidade e a
obrigatoriedade (mesmo no nível elementar), para que ele seja garantido a todos.
No Brasil, o direito à educação para todos é mencionado pela primeira vez na
Constituição de 1934. Segundo Chauí (1989, apud, Cury, Horta, Fávero, 2001, p. 12) a
condição de educação como direito não ocorre por acaso:
24
A prática de declarar direitos significa, em primeiro lugar, que não é um fato
óbvio para todos os homens que eles são portadores de direitos e, por outro
lado, significa que não é um fato óbvio que tais direitos devam ser
reconhecidos por todos. A declaração de direitos inscreve os direitos no
social e no político, afirma a sua origem social e política e se apresenta como
objeto que pede o reconhecimento de todos, exigindo o consentimento social
e político.
A educação como direito será consolidada na escrita da lei, muito tempo depois, como
fruto de um longo processo, sendo enfatizado com maior ou menor intensidade, de acordo
com o contexto histórico em que vão sendo redigidas as leis. Neste sentido, é na Emenda
Constitucional de 1969 que a educação irá aparecer, além de direito de todos, como preceito
universal e dever do Estado, sendo definitivamente incorporada na Constituição Federal de
1988, em seu artigo 205. O direito à educação, na Constituição cidadã, como ficou conhecida,
ganha conotação ampla, tornando-se condição necessária para o desenvolvimento pessoal,
coletivo e de qualificação profissional dos sujeitos, além de colocar a família, em conjunto
com Estado, com o dever de promovê-la.
Outra inovação que a Constituição Federal de 1988 apresenta é a condição de direito
público subjetivo. Este princípio estava presente na década de 1930, defendido pelo jurista
Pontes de Miranda e assumido na Assembléia Nacional Constituinte de 1933-1934 por Prado
Kelly; contudo, não foi incorporado na versão final da referida Constituição. Esta nova forma
de conceber a educação presente no artigo 208 da atual Constituição é assim expresso no seu
inciso 1º: “O acesso ao ensino obrigatório e gratuito é direito público subjetivo” e no inciso
2º: “O não-oferecimento do ensino obrigatório pelo poder público, ou na sua oferta irregular,
importa responsabilidade da autoridade competente.”
A condição da educação como direito público subjetivo permite ao cidadão defender
este direito quando estiver sendo lesado, por meio de ação judicial (como ação popular, ação
civil pública, mandado de segurança e mandado de injunção) contra o Estado. Ou seja, o
direito público subjetivo significa a possibilidade de o cidadão acionar judicialmente o
Estado, caso o direito à educação não esteja sendo garantido. Sua importância relaciona-se ao
fato de permitir a qualquer cidadão exigir judicialmente, frente ao poder público, o direito
devido (Duarte, 2004).
Este instrumento jurídico passou por algumas modificações até a versão definitiva que
não incorporou o mandato de injunção que, segundo Horta (1998, p. 27), “deixa em aberto a
definição do instrumento jurídico adequado para garantir o direito à educação”. Sabe-se que o
direito público subjetivo é pouco utilizado pelos cidadãos, sobretudo pelo desconhecimento
25
do poder deste instrumento legal, entre outros fatores. Mas, sem dúvida, este princípio
apresenta-se como mais uma forma de garantir o direito e uma possibilidade de reafirmação e
consolidação de uma educação democrática.
Somado a esta ampliação de sentido, a educação de jovens e adultos passa, em
definitivo, a ser reconhecida pela legislação, quando em seu parágrafo primeiro do artigo 208
afirma o “ensino fundamental, obrigatório e gratuito, assegurada, inclusive, sua oferta gratuita
para todos os que a ele não tiveram acesso na idade própria.”
Essa afirmação legal é uma conquista da sociedade e, sobretudo, representa o
reconhecimento pelo poder público da necessidade de promover ações para jovens e adultos
que não se escolarizaram, na idade dita “própria”. Contudo, as ações que ocorreram após a
promulgação da Constituição Federal de 1988, segundo Haddad (2007, p. 8), “limitaram a
concretização desse direito no contexto das reformas neoliberais implementadas nos anos
seguintes, inicialmente no governo do presidente Fernando Collor de Melo e posteriormente
no governo do presidente Fernando Henrique Cardoso”.
O setor econômico, importante indutor e viabilizador das ações do poder público, no
marco da globalização e neoliberalismo, especialmente nos anos de 1990, afluiu diretamente
na política educacional e dificultou a concretização desses direitos. A regulação das ações
para o setor educacional, a restrição das prioridades de atendimento nos sistemas públicos
afetaram diretamente a educação de jovens e adultos e produziram resultados negativos a
respeito da escolarização da população, o que indica que o direito à educação, apesar de
declarado, ainda se apresenta como direito não usufruído por todos, ou seja, reforça a
distância entre desejos proclamados e sua prática.
Em relação ao direito à EJA, essa constatação é possível de ser verificada por
intermédio de três medidas no âmbito legal. A aprovação do Fundo de Manutenção e
Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério (FUNDEF) no
Congresso, apesar de prever verbas para a EJA contabilizando as matrículas dos alunos
desta modalidade do ensino fundamental presencial recebeu vetos do presidente FHC que
destinou o fundo exclusivamente para a faixa etária entre 07 e 14 anos. Esta medida
desestimulou a oferta de EJA e a deixou refém de estratégias e à merda vontade política de
gestores nos estados e municípios. A Emenda Constitucional nº 14/96, segundo Haddad
(2007, p. 9) “suprimiu as disposições transitórias da Constituição, o compromisso da
sociedade e dos governos de erradicar o analfabetismo e universalizar o ensino fundamental
até 1998”. Por último, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN), mesmo
26
reconhecendo o direito à educação de jovens e adultos foi mal apropriada, por exemplo, pelo
governo FHC, o que restringiu as possibilidades de atendimento e de efetivação deste direito,
pois enfatizou para a EJA, de forma minimalista, o caráter supletivo.
Essas medidas representaram um pacote de desmonte em relação às ões para a
concretização da EJA, ao negar o texto da Constituição cidadã. Demonstraram também a
oscilação política quanto à forma de cumprimento do direito, quando inicialmente o direito à
EJA é reconhecido e acompanhado por medidas a serem desenvolvidas que demonstravam
real preocupação em concretizá-lo este direito e, no momento posterior, instrumentos e
disposições são criados para limitá-lo. A concretização do direito à EJA com o compromisso e
obrigação do Estado em promovê-la ficou ameaçada legalmente.
No entanto, sabe-se que o processo que envolve as questões legais da EJA é permeado
por contradições. Ainda no governo Fernando Henrique Cardoso foi aprovado no Conselho
Nacional de Educação o Parecer 11/2000 sobre Diretrizes Curriculares da Educação de
Jovens e Adultos que representa um marco conceitual importante para esta modalidade,
afirmando-a em definitivo como direito.
A partir de 2002, com a mudança política e a posse de Luís Inácio Lula da Silva, a
educação de jovens e adultos voltou à cena como uma das prioridades de sua política
educacional. Medidas criadas, invertendo a lógica excludente anterior do FUNDEF, como o
Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e Valorização dos
Profissionais da Educação (FUNDEB), por exemplo, aprovado em 2007, apesar de limites e
problemas, contempla fundos destinados não só para a EJA, mas para toda a educação básica,
da educação infantil aos 4 anos até o final do ensino médio, além das modalidades que a
educação básica admite; mudanças no Programa Brasil Alfabetizado que procurou,
inicialmente, financiar instituições que já faziam alfabetização e, desde 2007, destina 70% dos
recursos para as redes públicas executarem o Programa na rede pública, com a perspectiva da
continuidade no ensino fundamental; criação do Programa Nacional de Inclusão de Jovens:
Educação, Qualificação e Ação Comunitária (ProJovem) resultante da Política Nacional de
Juventude, em que se buscou oferecer, em parceria com os municípios, a elevação de
escolaridade, por meio da conclusão do ensino fundamental e em concomitância oferta de
qualificação profissional; a formulação do Programa de Integração Profissional Técnica de
Nível Médio ao Ensino Médio na Modalidade EJA (PROEJA), oferecido nas redes federais de
ensino ao público da EJA, entre outras. Longe de ser o ideal e únicas formas de resolver a
27
questão, sem dúvida, estes programas fortaleceram o Estado como principal indutor de
políticas públicas de direito para sujeitos jovens e adultos interditados ao direito à educação.
Apesar das inúmeras ações que se sucedem voltadas para a efetivação desse direito,
muitos são os cidadãos que foram e, ainda são, impedidos de usufruí-lo. Não há dúvida de que
esse direito, quando anunciado, resulta na aceitabilidade e convicção de sua necessidade por
todos. Contudo, quando se refere à sua prática, ressalvas e oposições acontecem, o que
segundo Bobbio (1992), gera o grande problema dos direitos: a distância entre sua enunciação
e sua efetivação. Neste caso, torna-se um problema político, pois não basta que o direito seja
enunciado, sem que seja garantido.
O Brasil, apesar de assumir o compromisso do cumprimento dos direitos firmados na
Declaração dos Direitos Humanos e, consequentemente, nas leis posteriormente elaboradas,
ainda não o faz na prática para todos, o que reitera a pouca efetividade do direito ao ser
somente proclamado na escrita da lei. Quando este desejo não vem acompanhado de vontade
política, planejamento e ação do poder público, o direito não se torna uma realidade concreta.
A emergência pela efetivação do direito à educação, na atualidade, passa a ser
condição indispensável à condição de cidadania e, de acordo com Cury (2002), o primeiro
passo para sua efetivação e garantia é pela escrita da lei. Contudo, esta escrita tem força
quando aliada a ações do poder público e, em alguns casos, quando acontece pressão por parte
da sociedade para a implementação de políticas públicas.
A lei não proclama o direito, mas traz consigo obrigações, pois o grande problema
dos direitos, especialmente os sociais, é a sua proteção. Embora o direito à educação seja
dever do Estado e da família, sabe-se que nem sempre essa enunciação legal é suficiente para
que se faça realidade. Nesse sentido, a condição de direito público subjetivo que a educação
passou a assumir, na Constituição Federal de 1988, representa um instrumento importante
para sua proteção. Contudo, esse procedimento pode ser insuficiente quando, segundo Santos
(1989, p. 43 apud Horta, 1992, p. 8) “a igualdade dos cidadãos perante a lei choca-se com a
desigualdade da lei perante os cidadãos”, ou seja, a efetividade da lei não depende somente
dos atributos de sua afirmação.
Somente a ampliação dos direitos não resultará na sua respeitabilidade numa
sociedade em que a letra da lei se faz para uns e não para outros. A desigualdade social,
cultural e econômica existente em níveis elevados é responsável pelo distanciamento dos
cidadãos ao aparato jurídico, o que pode colocar em risco a eficácia do direito público
28
subjetivo. Em se tratando de direitos sociais, no caso da educação, a presença do Estado se faz
cada vez mais necessária. É por intermédio de sua ação, ou seja, por meio de políticas
públicas que o direito pode efetivar-se.
1
1
.
.
3
3
A
A
E
E
J
J
A
A
n
n
a
a
a
a
g
g
e
e
n
n
d
d
a
a
p
p
o
o
l
l
í
í
t
t
i
i
c
c
a
a
d
d
a
a
d
d
é
é
c
c
a
a
d
d
a
a
d
d
e
e
1
1
9
9
9
9
0
0
:
:
a
a
n
n
e
e
g
g
a
a
ç
ç
ã
ã
o
o
d
d
o
o
d
d
i
i
r
r
e
e
i
i
t
t
o
o
Para os que lutaram pela educação de todos, independente da idade, na Constituinte de
1987, a década de 1990 representou frustração, apesar dos esforços destes sujeitos nos
diversos espaços de luta, e a impossibilidade de tornar vivo o direito à EJA expresso na lei
maior que, sem dúvida, apresentou-se como marco definitivo para a educação de jovens e
adultos.
A precarização da EJA, pós Constituição Federal de 1988, iniciou-se com a extinção
da Fundação Educar, ainda no governo Collor, quando, segundo Paiva (2009, p. 187), o então
ministro da Educação José Goldenberg afirmou categoricamente que “não valia a pena mexer
com o lugar ocupado pelo analfabeto, porque a prioridade era a de prevenir o mal, educando
as crianças”. Em sintonia com este pensamento, a autora resgata a celebre afirmativa de Darcy
Ribeiro; pronunciada no Congresso Brasileiro de Alfabetização, em São Paulo, em 1990:
“Deixem os velhinhos morrerem em paz”. Estes duas concepções sintetizam a postura política
assumida em relação a EJA no período, ou seja, a da negação do direito.
Esta conjuntura anunciava o que a EJA poderia esperar em termos de políticas
governamentais. As reformas educacionais promovidas pelo governo FHC contrariavam o
princípio posto na Constituição Federal de 1988 em relação à EJA e veio segundo Haddad
(2009, p. 3) “desregular o direito recém conquistado”.
Em meio às políticas neoliberais consolidadas no Brasil, a área social, principalmente
a educação, vivenciou um processo de intensos danos. O país foi pressionado a participar de
ações e acordos internacionais na área social, reafirmando os cânones da lógica capitalista,
produtora, pelo modelo de desigualdades geradas, das condições que determinam o
analfabetismo e a subescolarização.
A política de redução de gastos e atuação mínima do Estado no setor educacional
afetou diretamente a educação de jovens e adultos. De caráter minimalista, a política de EJA
baseou-se em ações voltadas essencialmente para a alfabetização numa perspectiva
“clientelista e compensatória”, conforme sinaliza Paiva (2006, p. 529).
29
O poder público federal gradativamente foi-se desresponsabilizando de seu dever
constitucional; ao centrar sua política em “programas”, sustentado pelo modelo de “parceria”
com a sociedade civil, redefiniu a relação público privado. Quando deixou de assumir e
coordenar a política de EJA, no âmbito nacional, a União considerou essa modalidade pouco
importante, sem prestígio e à margem das prioridades políticas da ocasião.
Na sequência de perdas, ainda no âmbito legal, a LDB (Lei 9394/96) representou a
chance perdida de ampliação do conceito e de tratamento mais adequado aos jovens e adultos
analfabetos e subescolarizados. Apesar do direito à EJA ser reafirmada, de passar a ser
concebida/denominada como modalidade da educação básica, expresso nos seus artigos 37 e
38, houve perdas substanciais em relação ao que expressava o projeto substitutivo elaborado
na Câmara dos Deputados por Jorge Hage. Este projeto atribuía papel mais ativo por parte do
poder público no tocante à chamada pública e às condições necessárias para que o aluno
pudesse frequentar a escola: a criação de escolas próximas ao trabalho e à residência, apoio a
programas de alimentação, saúde, material escolar e transporte; respeito à diversidade
regional quanto ao formato de oferta e aprendizado, incentivos fiscais às empresas etc. A
LDB, no tocante à EJA perdeu, segundo Haddad (2009, p. 3), a chance de ganhar adequada
amplitude.
Essas perdas legais vieram acompanhadas de uma política compensatória e
reducionista de atendimento à EJA. O modelo de parceria assumido pelo governo FHC
colocou em evidencia o papel mínimo do Estado no âmbito social, especialmente no setor
educacional. Seguindo à risca as orientações neoliberais, ditadas pelo Banco Mundial, o
governo brasileiro passou a afirmar que a responsabilidade pelas questões sociais também
deveria ser assumida pela sociedade civil, devendo colaborar na oferta dos serviços
educacionais. Contudo, o chamado para a colaboração tinha como objetivo escamotear a
verdadeira intenção neoliberal de gradativamente diminuir a responsabilidade do Estado com
as questões sociais, passando esse dever, em alguns casos, para o setor privado.
No desmonte da política de EJA, o FUNDEF apresentou-se como a maior perda. O
artigo referente à EJA, ao receber veto presidencial, não permitiu computar as matrículas
desta modalidade no ensino fundamental como também ocorreu com as matrículas da
educação infantil e explicitou a opção em focalizar as ações governamentais no ensino
fundamental para crianças de 7 a 14 anos. O veto foi justificado, segundo Paiva (2009, p.
192), pela falta de dados confiáveis de matrículas que garantisse o recurso pelo FUNDEF, o
que negava todo o trabalho de levantamentos feitos pelo INEP, no censo educacional anual.
30
Como afirma a autora, mais uma vez o direito ao ensino obrigatório firmado desde 1988 pela
Constituição Federal não se fez valer para analfabetos e subescolarizados fora da dita “idade
própria”.
Nesse período é selado o lugar marginal da EJA no âmbito ministerial, já que o
governo promovia um processo de descentralização da EJA, passando sua responsabilidade
para os entes federados e outras organizações. A exemplo desta ação é significativa a parceria
assumida pelo MEC com a organização não-governamental Alfabetização Solidária
(ALFASOL), instituindo o Programa Alfabetização Solidária (PAS), como política oficial.
Outras formas de parceria também foram desenvolvidas para atender a demanda por
esta modalidade de ensino sem, contudo, contar com uma política de coordenação e
articulação, assegurada constitucionalmente, a ser desempenhada pelo Ministério da Educação
(MEC), cuja função é esvaziada pela forma de parceria e financiamento adotada no período. A
este respeito Haddad (2009, p. 3) afirma:
[...] Ganharam relevância entidades de prestação de serviços, entidades
filantrópicas ou de caráter assistencial e verificou-se crescente interesse de
parte de grupos empresariais e do capital em geral nos rumos e no controle
das orientações e no atendimento educacional. Com enfraquecimento do
setor público em função da diminuição do corpo técnico das diversas
secretarias, pessoas e entidades privadas foram chamadas a produzir
materiais didáticos, treinar professores e atuar no plano das orientações
pedagógicas.
Com a EJA reduzida à alfabetização, sobretudo conduzida pelas mãos da iniciativa
privada, e com as restrições financeiras, os municípios, que passaram a ser responsáveis pelo
ensino fundamental, precisaram buscar soluções diversas para o atender a demanda por ensino
fundamental, como a ação gestada por Paulo Freire no município de São Paulo, cogestionada
com movimentos e entidades sociais: como o Movimento de Alfabetização (MOVA). Além
disso, a estratégia de alguns municípios para garantir recursos do FUNDEF foi assumir a EJA
como ensino regular noturno.
Essa realidade vivenciada por estados e municípios e a cobrança de gestores,
sobretudo, do Norte e Nordeste, acabou por alterar os rumos da política vigente até, então,
sendo criado, em 2001, o Programa Recomeço. Este programa, inicialmente intitulado
Programa Supletivo, foi criado no âmbito do FUNDEF. Apesar de sua importância no aspecto
do financiamento, ainda apresentava-se como política focal, deixando de atender e fortalecer
os demais estados municípios na oferta da EJA.
31
A falta de articulação do Estado brasileiro em relação à EJA é identificada pela
pulverização das ações e pela concepção assistencialista dos programas destinados aos
analfabetos e subescolarizados. O caso da educação profissional, neste sentido, é
emblemático. O MEC, ao não assumir a responsabilidade de indução da política de EJA,
deixou que este lugar passasse a ser ocupado pelo Ministério do Trabalho e Emprego (MTE)
que, passou a responsabilizar-se pela formação profissional de jovens e adultos.
Rummert e Ventura (2007) apontam que esta “divisão de tarefa” entre MEC e MTE,
resulta de uma nova institucionalidade criada à EJA com o Decreto nº 2.208/1997, que
subdivide em níveis independentes a formação profissional, sendo a de nível básico
desvinculada de qualquer nível de escolaridade, o que reiterou a desqualificação da EJA.
O Ministério do Trabalho e Emprego, utilizando os recursos orçamentários do Fundo
de Amparo ao Trabalhador (FAT) foi responsável, durante um tempo, pela política de EJA que
investiu recursos e ofertou educação profissional de nível básico, com cursos de curta duração
e desvinculado de uma escolaridade mínima, com sua execução realizada por instituições da
sociedade civil, como ONGs, sindicatos, SENAI etc.
Rummert e Ventura (2007) vão ainda afirmar que esta condição não alterou marcas
históricas como a de uma educação aligeirada e pedagogicamente frágil, destinada em grande
parte à correção da distorção idade-série e baixos níveis de escolaridade.
O pouco comprometimento do Estado em estabelecer no âmbito do Ministério da
Educação a indução, coordenação e articulação da política de EJA com outros ministérios,
resultou em políticas de caráter assistencialista e filantrópica, sendo pouco efetivas, no
aspecto da qualidade, da socialização do conhecimento e da efetivação do direito à educação
9
.
A situação da EJA poderia ter adquirido contornos diferenciados, caso não fossem
desperdiçados oito anos, no referido governo, com ações que viabilizassem a consolidação do
direito à EJA enunciado na lei. O desmonte político dessa modalidade se deu especialmente
no repasse quase inexistente de recursos financeiros. A forma de atuação do governo
FHC frente à EJA revelou o lugar de desprestígio ocupado na agenda política e fez com que
esta modalidade de ensino, nos anos de 2000, apresente indicadores ainda preocupantes que
continuam a atestar a persistente desigualdade educacional brasileira.
9
No entanto, por iniciativa da Central única dos Trabalhadores (CUT), por exemplo, foram elaborados e
realizados importantes programas de formação profissional integrados à educação geral.
32
No governo FHC assistiu-se à opção, nos documentos e nas ações, por políticas
educacionais voltadas prioritariamente para o atendimento do ensino fundamental para
crianças e adolescentes, evidenciando o caráter excludente dessas políticas, ao deixar de lado
outras faixas etárias. Aliam-se a esse contexto, os resultados pouco expressivos produzidos
pela escola, mesmo com a ampliação do atendimento, da política de currículo nacional
unificado
10
e de distribuição de livros de literatura pelo Programa Nacional Biblioteca da
Escola (PNBE) e de tecnologias educacionais.
A questão central ignorada pela política de Paulo Renato Souza, Ministro da Educação
por todo o período de dois mandatos de FHC, esteve localizada no desprezo aos profissionais
da educação, segundo o governo, despreparados, o que justificava a centralização na
formulação de políticas por grupos paulistas, que ditavam as “regras” para todo o país e
exigiam recursos que compensassem a má formação desses profissionais.
No que se refere à qualidade, não houve avanço e tampouco melhoria, pois a escola
passou a produzir número expressivo de jovens que a frequentam e não se escolarizam, tendo
como opção futura a educação de jovens e adultos. Esse movimento marcou não só a
realidade brasileira, mas a realidade de numerosos países que compartilharam conjuntura
semelhante, resultando na indispensável ampliação do conceito de educação de adultos para
educação de jovens e adultos, a partir de meados dos anos de 1980, haja vista a demanda de
jovens por esta modalidade de ensino.
A concepção minimalista e reduzida da EJA deixou de incorporar a construção feita a
partir da V Conferência Internacional de Educação de Adultos (CONFINTEA), na qual a
mesma passa a ser assumida como educação continuada, em sintonia com os avanços nas
diversas áreas do conhecimento, sobretudo na área tecnológica, passando a ter papel
estratégico no desenvolvimento social e econômico do país.
Este cenário de negação do direito e de políticas excludentes acabou por favorecer a
organização da sociedade civil em prol da EJA, em alguns casos, assumindo a
responsabilidade que o lhe cabia, principalmente na área da alfabetização. Alimentou o
espírito de militância dos que lutavam na ocasião pelo direito à educação, fazendo tomar
forma e corpo, novos formatos de luta contra a desigualdade.
O surgimento, na cada de 1990, de setores da sociedade civil que passaram a se
organizar sistematicamente na luta pelo direito à EJA, configurou-se nos fóruns de EJA do
10
Esta política materializou-se pelos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN), cujo objetivo era unificar o
33
Brasil. A adversidade da ocasião acabou por motivar e agregar atores antes dispersos em torno
da luta pela efetivação do direito à educação de jovens e adultos, principalmente motivados
pela preparação do estado brasileiro para participação na V CONFINTEA.
1
1
.
.
4
4
D
D
a
a
n
n
e
e
g
g
a
a
ç
ç
ã
ã
o
o
d
d
o
o
d
d
i
i
r
r
e
e
i
i
t
t
o
o
a
a
u
u
m
m
n
n
o
o
v
v
o
o
e
e
s
s
p
p
a
a
ç
ç
o
o
d
d
e
e
l
l
u
u
t
t
a
a
:
:
o
o
s
s
u
u
r
r
g
g
i
i
m
m
e
e
n
n
t
t
o
o
d
d
o
o
s
s
f
f
ó
ó
r
r
u
u
n
n
s
s
d
d
e
e
E
E
J
J
A
A
Na conjuntura de afirmação de políticas educacionais focalizadas, que contrariavam o
principio do direito a todos à educação, o Brasil é chamado a participar da V Conferência
Internacional de Educação de Adultos (V CONFINTEA), no ano de 1997, realizada em
Hamburgo, na Alemanha. Este encontro, realizado pela UNESCO, propiciou momentos de
discussão local, regional e nacional sobre a temática da educação de jovens e adultos, num
contexto em que a EJA não fazia parte da pauta política, possibilitando o encontro e o
reencontro de sujeitos e instituições atuantes na EJA. Apesar do foco deste estudo não ser a V
CONFINTEA, dois fatos ocorridos em torno de sua realização motivaram o surgimento e
consolidação dos fóruns de EJA.
As discussões levantadas nesses encontros preparatórios, somadas aos debates e aos
documentos produzidos na Conferência Internacional deram origem a concepções que
vislumbravam a ampliação do sentido e da importância da educação de jovens e adultos para
o desenvolvimento das diferentes sociedades, além de apontá-la como chave para o século
XXI. Todas as recomendações apontadas na Declaração de Hamburgo foram apropriadas
pelos fóruns de EJA como instrumentos norteadores da luta pelo direito à EJA no Brasil.
O primeiro fato motivador ocorreu no contexto que antecedeu o evento internacional.
Os fóruns iniciaram sua história com o surgimento do Fórum de Educação de Jovens e
Adultos do Estado do Rio de Janeiro, pela mobilização de pessoas atuantes e interessadas na
consolidação da EJA propiciada pela convocação da Delegacia Regional do MEC (DEMEC),
em 1996, recomendada pela Comissão Nacional de Educação de Jovens e Adultos (CNEJA) –
pouco ou nada operante na ocasião, face à concepção do governo federal como evento
preparatório à V CONFINTEA.
Esses primeiros encontros que ocorreram no Rio de Janeiro integravam a metodologia
de trabalho proposta pela Oficina Regional de Educação para a América Latina e Caribe
(OREALC), como primeira etapa preparatória à CONFINTEA e visava à elaboração de um
balanço das ações estaduais de EJA, sua sistematização em documento, indicação de
modelo pedagógico da educação no Brasil.
34
representantes de diferentes organizações governamentais ou não e da sociedade civil para,
como delegados, participarem das etapas subsequentes: encontro regional e encontro nacional.
Na etapa nacional, a proposta era escolher os integrantes da delegação que
representaria o Brasil no Encontro Regional Latino-Americano, precedendo a Conferência
Internacional de Hamburgo. Segundo Di Pierro (2005, p. 1130):
[...] os seminários preparatórios à V CONFINTEA acirraram as divergências
entre os representantes dos diferentes segmentos sociais e as autoridades
federais que, adotando um estilo vertical e delegativo de coordenação
política, optaram por fechar os canais de diálogo até então existentes.
Pela falta de coordenação da União na promoção de uma política pública para a EJA,
as instituições e pessoas envolvidas no encontro estadual do Rio de Janeiro sentiram a
necessidade de articulação entre elas, averiguada pela dispersão entre as ações e instituições
que proviam a EJA. Esta iniciativa se deu por intermédio de técnicos atuantes na DEMEC,
por não haver uma coordenação de EJA operante. Já que não havia uma Secretaria específica,
estes técnicos foram autorizados a fazer o chamado e a organizar o encontro estadual,
mobilizando diversos atores da EJA. O relato de um dos integrantes, participante da referida
equipe técnica, elucida como ocorreu este processo:
[...] Nós esperamos a SEE convocar e ela não convocou [...] A partir da
DEMEC nós fizemos essa convocação. Então fizemos um primeiro encontro
e vieram umas 30 pessoas. Nós ficamos perplexos, pois pensamos que não
viria ninguém. Aí veio o segundo encontro e mais pessoas estavam presentes
e no terceiro encontro mais ainda. E cada encontro vinha mais. Então,
pensamos que a partir desses encontros podíamos organizar um fórum.
Podíamos organizar encontros mensais (antes nem era fórum) para
discussões. Porque percebemos que a cada encontro mais pessoas falavam:
Que bom; eu pensava que eu era sozinho fazendo educação de jovens e
adultos.
O contraditório é que esta articulação ocorre no interior de uma instância
governamental pauta de um governo assumidamente negligente em relação a EJA por
meio de técnicos que se interessavam pela EJA e perceberam a necessidade de encontros
regulares dos diferentes atores dispersos por falta da coordenação política no âmbito estadual
e federal, assumindo posteriormente a Secretaria deste fórum que viria a se constituir. A
decisão de criação do rum fluminense foi assim justificada pelo entrevistado A, do rum
do Rio de Janeiro (Fórum EJA/RJ), participante deste momento:
[...] Não tinha uma rede. Até que veio a idéia de construir um fórum da EJA.
E a sua secretaria ficou na DEMEC. Isso tinha um poder muito grande
35
porque quando o MEC convoca é absolutamente poderoso [...] Cada
convocação que agente fazia vinha mais gente e as pessoas imaginavam que
era oficial. E as pessoas que iam chegando iam entendendo e muitos se
mantiveram ahoje, inclusive. Foi um processo interessante, porque não
veio de forma oficial, de cima para baixo... pessoas que trabalhavam na EJA,
sem cargos de poder que vão se reunindo e percebendo: Gente, estamos
precisando nos encontrar, estamos precisando pensar sobre a educação de
jovens e adultos.
Estas articulações e o formato de encontros assumidos nestes eventos em preparação à
V CONFINTEA acabou sendo determinante na forma de organização e participação dos
interessados, sobretudo, no desenvolvimento e na composição do Fórum EJA/RJ, conforme o
portal dos Fóruns de EJA Brasil
11
:
Os primeiros encontros deste fórum confirmaram a desarticulação entre as
esferas de poder federal, estadual e municipal, indicando, ainda, a falta de
informações sobre aspectos pedagógicos, financeiros e legais e um profundo
desejo, por parte dos participantes, de estruturar um espaço que
possibilitasse a troca de experiências e a construção de parcerias, apesar das
diferenças existentes de cunho político-pedagógico.
Gerido por pessoas que atuavam em instituições governamentais e não-
governamentais, movimentos sociais, sindicatos etc., o Fórum EJA/RJ consolidou-se por meio
de uma plenária mensal, como instância deliberativa e espaço de socialização de informações
e de formação política, visando ao fortalecimento dos profissionais para a luta em defesa do
direito e da qualidade de atendimento na área da educação de jovens e adultos.
A construção desse espaço de encontro permanente também ocorreu em decorrência
da postura de resistência por parte do grupo que então formava o Fórum EJA/RJ à negação do
direito à EJA. A afirmativa de priorizar a educação de crianças no ensino fundamental,
explicitamente assumido pelo governo brasileiro, sob a justificativa de alcançar porcentagem
elevada na terminalidade desse nível de ensino, sinalizava e reforçava que, desta forma,
prevenir-se-ia o país da necessidade da educação de jovens e adultos. Segundo Paiva (2009, p.
86) a EJA foi assumida em caráter corretivo no documento oficial brasileiro, denominado A
educação de jovens e adultos no Brasil, no contexto do ensino fundamental e encaminhado à
V CONFINTEA, além de evidenciar uma concepção compensatória e tutorial.
A experiência do Fórum EJA/RJ fez surgir muitas outras. Especialmente por
intermediação e articulação de seus representantes com atores de outros estados em espaços
como o GT 18 Educação de Pessoas Jovens e Adultas da Associação Nacional de Pós-
11
Site www.forumeja.org.br . Acesso no dia 9 de março de 2009.
36
Graduação e Pesquisa em Educação (Anped). A criação dos demais fóruns de EJA no Brasil
se deu de forma gradual e de acordo com o envolvimento, a organização e a articulação de
pessoas atuantes em instituições envolvidas com a EJA em cada estado. Para Di Pierro (2005),
esses fóruns iniciaram a organização de um movimento que pretendia estabelecer resistência
ao desmonte do direito à educação conquistado no processo de transição democrática
expresso na Constituição Federal de 1988.
A disseminação do modelo fórum iniciado no Rio de Janeiro impressiona, pois a cada
ano, após o seu surgimento, foram sendo criados sucessivamente novos fóruns, como é
possível observar no Quadro 1:
Quadro 1: Criação dos fóruns de EJA
Ano de Criação Fórum de EJA/Estado
1997 Rio de Janeiro
1998 Minas Gerais, Espírito Santo, Paraíba,
1999 Rio Grande do Sul, São Paulo, Santa Catarina,
Alagoas, Paraná
2000 Tocantins
2002 Rio Grande do Norte, Bahia, Goiás
2003 Distrito Federal, Amazonas, Rondônia, Ceará
2004 Sergipe, Pernambuco, Roraima, Mato Grosso, Acre,
Mato Grosso do Sul
2005 Maranhão
2006 Amapá
Presentes nos 26 estados da União e no Distrito Federal, além da existência dos 51
fóruns regionais, os fóruns expressam vertiginosa capacidade de organização. Por uma
articulação em rede dos fóruns do Rio de Janeiro, Minas Gerais, Espírito Santo, Paraíba, Rio
Grande do Sul e São Paulo surgiu a ideia estratégica de realizar, anualmente, desde 1999, o
Encontro Nacional de Educação de Jovens e Adultos (ENEJA), o que também serviu de
estímulo para a criação de outros fóruns no Brasil.
A organização da sociedade civil em fóruns de EJA resultou numa mudança expressiva
na forma de luta pelo direito à educação independente da idade, principalmente, pelo cenário
37
político favorável à EJA a partir de 2002, com o governo de Luís Inácio Lula da Silva, quando
os fóruns ampliaram-se e tornaram-se visíveis no espaço público.
1
1
.
.
5
5
A
A
E
E
J
J
A
A
n
n
a
a
p
p
a
a
u
u
t
t
a
a
p
p
o
o
l
l
í
í
t
t
i
i
c
c
a
a
d
d
o
o
g
g
o
o
v
v
e
e
r
r
n
n
o
o
L
L
u
u
l
l
a
a
:
:
o
o
c
c
o
o
n
n
t
t
e
e
x
x
t
t
o
o
d
d
e
e
f
f
o
o
r
r
t
t
a
a
l
l
e
e
c
c
i
i
m
m
e
e
n
n
t
t
o
o
d
d
o
o
s
s
f
f
ó
ó
r
r
u
u
n
n
s
s
d
d
e
e
E
E
J
J
A
A
Desde a criação do primeiro fórum de EJA, o cenário da política para esta modalidade
passou por mudanças. A postura mais popular e democrática adotada na condução política do
governo Lula favoreceu a criação de espaços de diálogo com a sociedade civil e, neste caso,
tornaram-se visíveis como interlocutores, frente à sociedade política, os fóruns de EJA. Neste
sentido, é no cenário político desse governo
12
que a EJA passa a ocupar um novo lugar nas
prioridades da agenda política e os fóruns passam a ser reconhecidos como interlocutores
pelas instâncias ministeriais
13
.
O quadro de desigualdade educacional, nos anos 2000, não sofreu modificações
expressivas e, consequentemente, não alterou o status da EJA como reflexo dessa condição
desigual. Contudo, é nesse período que se promove um quantitativo maior de ações no
combate ao problema da desigualdade social e educacional, como o programa Fome Zero e os
diversos programas implementadas no âmbito da EJA.
Apesar da expectativa e do desafio de rompimento com práticas políticas e concepções
de vertente neoliberal adotadas na década de 1990, Haddad (2009, p. 360) aponta que o início
da nova gestão mostrou conservadorismo no plano econômico, tentando acalmar o grande
capital e o setor financeiro. O governo Lula acabou optando, inicialmente, pela manutenção
da política econômica do governo anterior e pela condução da política pública por intermédio
de programas. Contudo, a postura política e as ações, em relação à EJA, mudaram
significativamente quando comparadas ao governo Fernando Henrique Cardoso, mesmo com
a manutenção de programas de ação.
Este é o caso, por exemplo, da atuação na área de alfabetização. No primeiro mandato
do governo Lula, o Programa Brasil Alfabetizado, lançado pela Secretaria Extraordinária de
Erradicação do Analfabetismo (SEEA), apresentou-se de forma conservadora, reproduzindo
uma concepção ainda minimalista do processo de alfabetização, principalmente quanto ao
12
Meu objetivo não é fazer uma compreensão ampla deste governo, mas procuro destacar fatos e ações
desenvolvidas na área de educação de jovens e adultos, ou seja, evidenciar o lugar ocupado pela EJA neste
período.
38
tempo de duração de seis meses, além do repasse financeiro em larga escala para
Organizações não governamentais e sem mecanismos de acompanhamento e avaliação.
Refletia modelo semelhante aos executados no passado.
Combatido intensamente pelas organizações da sociedade civil
14
que se dedicaram à
EJA, por apresentar modelo de financiamento que não fortalecia as ações do sistema público
de ensino e pela concepção minimalista do processo de alfabetização, o programa passou por
sucessivas modificações e assumiu caráter mais estatal: a maior parte dos recursos foi
destinado aos entes federados, ampliou-se o tempo do processo de avaliação,reforçou a
continuidade dos estudos, além da criação de formas de acompanhamento e avaliação.
Com a mudança do Ministro da Educação, em 2004, retomou-se a condução política
da EJA no âmbito federal, demonstrando concepção mais ampla do lugar da EJA no
Ministério da Educação, com a criação da Secretaria de Alfabetização, Educação Continuada
e Diversidade (SECAD) e uma coordenação de educação de jovens e adultos. Para Machado
(2009a, p. 31) a conquista de um espaço político administrativo mais autônomo teve como
objetivo a superação de práticas patrimonialistas:
O fato de ter como referência, na estrutura burocrática do MEC, a EJA numa
coordenação dentro da Secretaria de Ensino Fundamental, como ocorreu em
2003, a ver a política de EJA sendo traçada pelo Departamento de Educação
de Jovens e Adultos, depois de 2004, dentro da Secretaria de Educação
Continuada, Alfabetização e Diversidade revela uma diferença no âmbito da
gestão dessa modalidade. Um impacto visível no âmbito da gestão da EJA
nos Estados e municípios foi, por exemplo, a indução dos programas PBA e
Fazendo Escola na constituição de coordenação específica para o
acompanhamento dos programas.
Alia-se a esta mudança os incentivos e o enfoque na continuidade do processo de
alfabetização e aumento de escolaridade no âmbito da rede pública de ensino. Como também
se reviu a forma do Programa Recomeço, que se transformou em Fazendo Escola, sendo
posteriormente incorporado ao Fundo de Desenvolvimento da Educação Básica (FUNDEB).
A mudança na concepção do programa, com o repasse financeiro, de forma descentralizada a
todos os entes federados, com o Fazendo Escola, fortaleceu a modalidade na esfera
municipal, com aumento das matrículas nas redes
15
.
13
Analisarei como se estabeleceu esta relação mais estreita entre o Estado e os fóruns na construção da política
pública de EJA, em momento posterior da pesquisa.
14
Principalmente pelos fóruns de EJA.
15
Ver estudo de Machado (2009a).
39
No aspecto legal, a EJA foi incluída no FUNDEB ao contabilizar as matriculados de
EJA na definição do montante orçamentário a ser repassado para os sistemas públicos de
ensino. Contudo, este Fundo ainda apresenta limitações financeiras para a modalidade e
revela a discriminação ainda presente no seu tratamento, quando comparado as demais
modalidades do ensino fundamental, ensino regular e ensino médio. Além disso, aponta que
os sistemas de ensino poderão ter gastos de até 15% do recurso recebido na EJA. Dessa
forma, apesar do avanço, algumas barreiras ainda precisam ser superadas.
Por sua vez, estas medidas não foram suficientes para superar a falta de uma
coordenação interministerial, que venha a integrar e articular as numerosas ações e programas
destinadas a esta modalidade, como
16
o Programa Nacional de Educação na Reforma Agrária
(Pronera), sob a responsabilidade do Ministério do Desenvolvimento Agrário/Instituto
Nacional de Colonização e Reforma Agrária; o Plano Nacional de Qualificação gerido pelo
Ministério do Trabalho; o Programa Nacional de Inclusão de Jovens: Educação, Qualificação
e Ação Comunitária (Projovem), em suas diversas composições, coordenado pela Secretaria
Nacional de Juventude, ligada diretamente à Presidência da República; o Programa Nacional
de Integração da Educação Profissional com a Educação Básica na Modalidade de Educação
de Jovens e Adultos (PROEJA), coordenado pela Secretaria de Educação Tecnológica
(SETEC), no âmbito da rede federal de ensino; o Programa Nacional do Livro Didático para
Jovens e Adultos; o Programa Literatura para Todos e os Cadernos de EJA (SECAD); a
Agenda Territorial de Desenvolvimento Integrado de Alfabetização e de Educação de Jovens e
Adultos, no âmbito da SECAD; o Programa Educando para a liberdade, coordenado pelo
Ministério da Justiça/Representação da Unesco no Brasil/SECAD.
Todos estes programas, sem dúvida, apresentam-se como relevantes para atender as
diversas demandas de EJA, mas na tentativa de compreensão ampla e aprofundada destes
programas, concordo com Fávero (2009, p. 07) ao apontar que:
[...] a análise individual deles indica propostas emergenciais, com pequeno
grau de impacto frente à amplitude da demanda (metas de milhares, para
necessidades de milhões) e pouca efetividade (dispersão de esforços,
desconhecimento das reais potencialidades municipais, falta de entrosamento
entre e de coordenação dos programas, sobretudo quando vinculados a
diferentes ministérios, descontinuidade administrativa etc.). [...] Também
não se constituem em ações duradouras, que superem as “políticas de
governo” em direção a “políticas de Estado”, ou seja: que não se limitem ao
tempo de um governo e se firmem como ações permanentes.
16
Para conhecimento mais aprofundado dos programas aqui apresentados, ver Fávero (2009).
40
Neste sentido, a multiplicidade de programas mesmo que emergenciais e relevantes
revela a ainda persistente desarticulação das ações e fragmentação dos recursos no campo
da EJA.
Inegavelmente houve avanços na indução das políticas de EJA, em relação ao governo
anterior, o que ocorreu pela adoção de uma concepção mais ampliada da EJA e,
principalmente, por instaurar uma forma mais democrática na construção das referidas
políticas ao estabelecer canal de diálogo com a sociedade civil, em especial, com os Fóruns de
EJA.
A Comissão Nacional de Alfabetização e Educação de Jovens e Adultos (CNAEJA)
materializou-se como outro espaço de interlocução entre o Estado e a sociedade civil,
agregando diversas organizações que atuam na área da EJA alfabetização, educação
profissional, diversidades etc. além de um assento para um representante dos fóruns de
EJA. Este conselho, de caráter consultivo, tem-se mostrado importante espaço de diálogo com
os fóruns de EJA, cuja dinâmica e relevância seaprofundada em momento posterior neste
estudo.
A Coordenação de Jovens e Adultos da SECAD também tem promovido a realização
de reuniões permanentes com os representantes dos fóruns, estreitando cada vez mais o
diálogo. Enquanto na década anterior os fóruns faziam oposição ao governo, no atual contexto
político, os fóruns são identificados como parceiros, conforme afirma Haddad (2009, p. 361):
O movimento da EJA no governo Lula aproximou-se do governo federal,
acompanhando o movimento ocorrido em outros municípios e espaços
onde governos progressistas assumiram o poder [...] no governo Fernando
Henrique Cardoso, o movimento foi empurrado para uma postura de crítica e
oposição; agora no governo Lula, identifica-o como parceiro e por ele é
reconhecido como interlocutor.
Esta mudança no cenário político favoreceu o diálogo com governo federal na
construção da política de EJA, permitindo aos fóruns visibilidade e reconhecimento político, a
partir de 2004. Mas, afinal o que é esta mobilização pela EJA? Como se organiza e articula?
Como estes fóruns alcançaram lugar privilegiado na interlocução com o governo federal?
Estas questões são estratégicas para compreender, pela investigação do movimento dos
fóruns, as soluções encontradas pela sociedade civil para participar e influir na política
pública de EJA e a forma como estabelecem relação com o governo na construção de um
espaço público mais democrático e participativo.
41
2
2
A
A
S
S
O
O
C
C
I
I
E
E
D
D
A
A
D
D
E
E
C
C
I
I
V
V
I
I
L
L
E
E
M
M
M
M
O
O
V
V
I
I
M
M
E
E
N
N
T
T
O
O
:
:
O
O
S
S
F
F
Ó
Ó
R
R
U
U
N
N
S
S
D
D
E
E
E
E
J
J
A
A
Parto do pressuposto de que a participação da sociedade civil na luta por direitos
coletivos é a maneira de gerar inovações e saberes. Os fóruns de EJA, no cotidiano da luta
pela EJA, têm criado e recriado práticas de participação e organização, associando-se como
um coletivo nacional, visível politicamente, em defesa do direito à educação. A forma como
cada fórum se organizou revela formatos heterogêneos, mas alguns elementos comuns são
observados.
Neste sentido, busquei compreender os sistemas internos que sustentam cada um
desses fóruns e como são sustentados como um coletivo nacional, considerando como
elementos de análise: os sentidos desse coletivo, assim como a forma como se constituem e se
articulam.
Melucci (2001) afirma que estes elementos analíticos são significativos e possibilitam
reconstruir internamente o sistema de ação de um fenômeno coletivo. Para este autor,
considerar os modos como se constituem é relevante por tornar consistente a compreensão do
objeto, deslocando, assim, as análises habituais que conferem ao fenômeno coletivo
submissão a certa conjuntura.
Ao buscar os sentidos da ação dos fóruns de EJA, debrucei-me sobre o
termo/nomenclatura fórum. Segundo o dicionário Michaelis (Disponível em
www2.uol.com.br/michaelis. Acesso em 23 de março de 2009), esta denominação significa:
fo.ro
1
sm (lat foru)
1 Antig rom Praça de mercado, onde também se faziam as reuniões públicas
e se julgavam as causas nas cidades romanas. 2 por ext. Lugar onde se
exercem os debates judiciais e se trata dos negócios públicos.
Como o termo fórum está atrelado às cidades romanas, procurei resgatar o seu sentido
historicamente, entre gregos e romanos, pois foram estas civilizações, no esplendor de suas
realizações, nos diferentes setores do conhecimento humano, que notabilizaram a ideia dos
fóruns.
Na cultura grega, o significado de fórum esteve vinculado à ideia de lugar de debates
políticos, filosóficos, públicos etc. Embora o termo não fosse utilizado originalmente, este se
associava a ágora, ou seja, praça pública espaço de centralidade das cidades gregas onde
42
se debatiam interesses e problemas comuns entre seus habitantes. A partir da cidade-estado de
Atenas em seu período democrático é que se compreendem as ações relacionadas a espaços de
debate público com variedade de concepções e propostas.
Na cultura romana certamente influenciada pelos gregos os runs, a princípio,
constituíam-se como lugar do mercado ou de feira ao ar livre, local onde o povo se reunia
frequentemente. O Fórum Romanum foi o mais famoso e logo passou a constituir-se como
espaço político e judicial. Assim, com o decorrer do tempo, os fóruns romanos assumiriam
acepção voltada, especialmente, às questões políticas e às discussões sobre direito e leis.
A escolha da nomenclatura para a ação desses coletivos não se deu de forma aleatória.
Tinha-se clareza, em sua constituição, do sentido que se buscava imprimir ao adotar o termo
Fórum de EJA. Segundo a entrevistada A, do Fórum do Rio de Janeiro, esta escolha ocorreu
com o objetivo de abarcar um sentido de espaço aberto de discussão e troca, um espaço livre e
sem dono como relata abaixo:
[...] A gente pensava que tinha que reunir de alguma forma quem trabalhava
com a EJA [...] era o momento de dar visibilidade à EJA. Então, tinha que
ser a ideia de algo que não fosse formal, que não fosse prender ninguém, que
não tivesse cargo de poder. [...] uma reunião de pessoas que discutem a EJA
e lutam por políticas blicas. Obviamente que é um campo de disputa, tem
gente com posições diferenciadas, mas é exatamente num fórum que se
disputam posições em torno de uma temática.
A essência desses princípios é enfatizada, reforçada e até ampliada, em autodefinições
de alguns desses fóruns. Observe-se:
O Fórum Rondoniense de Educação de Jovens e Adultos (FREJA) é um
espaço democrático de discussões visando equacionar as questões
relacionadas à Educação de Jovens e Adultos no Estado de Rondônia. Esse
espaço envolve organizações governamentais, não governamentais e
sociedade civil organizada interessada. (Fórum de EJA de Rondônia).
[...] Com objetivo de oportunizar um espaço para a troca de experiências e
atualizar conhecimentos sobre novos paradigmas da EJA, buscando melhorar
a qualidade da oferta de ensino nesta modalidade e o reconhecimento de seu
alunado como cidadão. (Fórum de EJA de Roraima).
O Fórum Paranaense de Educação de Jovens e Adultos [...] tem caráter
democrático, plural (não partidário) e suprainstitucional, informativo,
formativo, propositivo, de discussão e intercâmbio de experiências. Tem
como objetivo constituir um espaço crítico de defesa e divulgação da
importância da Educação de Jovens e Adultos e acompanhar as políticas
públicas municipais, estadual e nacional. (Fórum de EJA do Paraná).
43
Outra perspectiva importante a se destacar é quanto ao caráter político. Presente no
sentido do termo fórum, característico do Fórum Romanum, e também nas definições que
emergem dos próprios fóruns, essas instâncias parecem preservar este princípio. Machado
(2008) também compartilha dessa opinião ao concebê-los como espaços políticos:
Os fóruns [...] são um espaço de mobilização, uma instância que congrega os
atores da Educação de Jovens e Adultos. [...] esse espaço do fórum é onde a
gente reúne esses vários atores, esses vários sujeitos, com uma perspectiva
de construir uma política pública num patamar diferenciado de uma série de
outras políticas que vem muito de cima para baixo. O fórum é uma instância
coletiva para a discussão da política e para a construção dos rumos da
política.
As visões dos fóruns de Goiás, da Bahia, da Paraíba e do Rio Grande do Sul, expressas
no documento preparatório ao X ENEJA, também explicitam essa característica:
A concepção norteadora da existência do Fórum Goiano é de se constituir
enquanto instância de mobilização e de tensionamento das políticas de EJA
no Estado. (Fórum de EJA de Goiás).
[...] A função dos Fóruns de EJA não é apenas a de discutir esse campo da
educação, mas também de propor ações de intervenção e conquista de
políticas públicas. (Fórum de EJA da Bahia).
[...] o Fórum [...] atua como espaço de discussão [...] e pressão em torno das
políticas estadual e nacional de EJA. (Fórum de EJA da Paraíba).
O Fórum de EJA do RS busca ser um espaço de formação político-
pedagógica, através da organização de agendas e pautas de trabalho [...].
(Fórum de EJA do Rio Grande do Sul).
Como explicitado em suas concepções, essas instâncias apresentam-se como espaços
cuja essência define-se pelo político, ou seja, espaços que se voltam para a ação política de
atores que discutem e tensionam as políticas públicas de EJA.
No mesmo documento em que são relatadas as diferentes visões dos fóruns estaduais
sobre o sentido do movimento, reitera-se essa característica política e, sobretudo, de espaço de
encontro e troca de diferentes concepções de EJA, conduzindo a afirmar que o movimento dos
fóruns de EJA, como unidade de pensamento e ação, pode ser caracterizado como:
[...] espaço plural, de discussão, reivindicação e troca de experiências sobre a
modalidade de ensino em questão, havendo uma articulação de várias
instituições, com interesses diversos, sendo um espaço [...] para a luta por
políticas educacionais que possam atender as necessidades das camadas
populares, historicamente relegadas pelas relações socioeconômicas da
sociedade em que se vive. (Documento preparatório ao X ENEJA)
44
No relatório do X ENEJA, o coletivo afirma:
Os Fóruns de EJA têm-se caracterizado como sujeitos socioculturais
coletivos relevantes, com repertórios que expressam interesses, aspirações e
lutas, que se unem não pela atuação em si, mas pelas temáticas algumas
circunstanciais, outras estruturais.
A pluralidade de concepções e a luta pela EJA evidenciam como os fóruns se
reconhecem e se autoidentificam no espaço público. Segundo Soares (2004, p. 30) os fóruns
têm sido um espaço plural, de diálogo entre os diversos atores que passam a ficar frente a
frente para planejar, organizar e propor encaminhamentos em comum.
Nessa perspectiva, os runs constituem instâncias de discussão, de troca e encontro
entre o diverso sujeitos e concepções sobre as mesmas problemáticas. A este respeito,
Paiva (2005, p. 530) afirma serem os fóruns tecidos conjuntivos agregadores que possibilitam
a troca, interpenetrações, parcerias e vínculos; reúnem diversos atores que, nestes espaços,
passam a se reconhecer e a estar em relação.
Os atores são identificados como elementos fundamentais, principalmente por serem
suas concepções e ações construídas coletivamente, o que determina a forma como essas
instâncias se constituem e se apresentam no espaço público. Imbricados, desde a base de
atuação direta na EJA até as instâncias que formulam e coordenam a política de EJA, os
atores, pela permeabilidade dos fóruns, permitem a tessitura de uma rede de diálogo e
intercâmbio de experiências entre os mais diversos espaços, sejam eles governamentais, não
governamentais, privados, públicos, formal, informal etc., que atuam, direta ou indiretamente,
com a EJA. (Paiva, 2005).
Numa perspectiva distinta, Machado (2009a, p. 33) aponta que os fóruns resultaram de
uma mistura de pessoas e instituições que atuam em EJA, tanto no campo dos governos como
no campo dos movimentos e instituições não governamentais. Para a autora integrante do
movimento os fóruns constituem uma organização social que congrega representantes do
Estado e da sociedade civil que lutam pela institucionalização de uma política pública de
direito à educação para jovens e adultos.
Por essa concepção, o foco da caracterização dos fóruns passa a se delinear como
representação entre Estado e sociedade civil, expressando seu caráter mais formal e,
conseqüentemente, apontando perspectiva institucional. Nessa mesma direção, Di Pierro
(2005, p. 21) aponta serem os fóruns uma articulação multi-institucional.
45
Haddad (2009, p. 367), por sua vez, sinaliza que os fóruns de EJA constituem-se como
espaços abertos, com baixo grau de institucionalidade, não partidário, reunindo organizações
não governamentais, movimentos sociais, entidades privadas e organismos governamentais.
Os fóruns, por sua diversidade de formas de organização e atuação, possibilitam
múltiplas interpretações e compreensões sobre seu sentido; pelas visões aqui explicitadas, no
entanto, pode-se perceber que prevalece a ideia de que são espaços participativos, de
discussão e troca de experiências, cuja principal característica é o caráter político, propiciando
o encontro de diversos sujeitos na luta pela educação de jovens e adultos.
2
2
.
.
1
1
A
A
f
f
o
o
r
r
m
m
a
a
d
d
e
e
p
p
a
a
r
r
t
t
i
i
c
c
i
i
p
p
a
a
ç
ç
ã
ã
o
o
n
n
o
o
s
s
f
f
ó
ó
r
r
u
u
n
n
s
s
Para compreender as formas de participação nos fóruns, coloquei-me a investigar os
modos como se organizam. Apesar de apresentarem elementos constitutivos comuns, os
fóruns têm demonstrado práticas diferenciadas, nas formas de participação, o que não
interfere na capacidade de permanência e de articulação entre eles, como pude identificar ao
estabelecer relações entre as características de cada fórum no tocante à organização, dinâmica
e a forma como se articulam.
Primeira observação: os fóruns não possuem formato único de organização e atuação,
e apresentam características peculiares e distintas. As práticas cotidianas de cada fórum,
associadas às experiências políticas e institucionais de seus integrantes, são determinantes nos
formatos e nas perspectivas políticas de cada um. Por exemplo, é possível encontrar fóruns
com visão e perspectiva de gestão mais coletiva, enquanto outros têm formato mais
hierarquizado e práticas burocratizantes.
De modo geral, os fóruns mantêm atuação autônoma nos estados e encontra-se na luta
pela EJA, o elemento comum a todos. Mas, sem dúvida, a diversidade apresenta-se como
característica principal, como também constatam alguns de seus integrantes:
[...] É um tipo de movimento muito diferente, tem características muito
próprias [...] é um movimento muito local, em cada estado tem sua
característica muito própria. O do Rio de Janeiro é diferente de São Paulo,
Minas Gerais, Paraíba etc. Eles são muito diferenciados, ou seja, em cada
local que ele chega ele vai se conformar de acordo com a visão que o grupo
leva do fórum. Então, eu penso que as características locais predominam,
embora o fórum tenha se tornado, de alguma forma, uma mobilização
nacional, por conta dos ENEJAs. (Entrevistado A, Fórum do Rio de Janeiro).
[...] Os Fóruns têm traçados, desenhos e perspectivas muito diversas. Eu
penso que eles mudam de caráter à medida que as pessoas lhe dão corpo, as
46
pessoas vão corporificando esse movimento inicial. [...] mas eu tenho clareza
que os fóruns são muito diferentes, que desenhos e desenhos de fóruns,
que esses desenhos não são construções imóveis, cristalizadas. Essas
construções têm muito a ver com as pessoas que assumiram a liderança dos
movimentos e que continuam tocando o movimento. (Entrevistado B, Fórum
Rio de Janeiro).
[...] Eu tenho clareza de que a gente tem espaços diversos de fórum, formas
de organização diversas. Isso, em certos momentos, dificulta nossa
definição, inclusive, do que é nossa pauta, de como é que nos organizamos, o
que nós efetivamente estamos defendendo. Por outro lado, revela aquilo que
a EJA é: efetivamente um espaço plural, que se constitui de diversos
sujeitos. Nele você tem que negociar, dialogar, você tem que construir,
minimamente, uma pauta que possa atender essa diversidade de quem está
mexendo com a EJA. (Entrevistado D, Fórum de EJA Goiás).
Esta diversidade na forma de atuação e organização dos fóruns explicitada por seus
integrantes conduziu-me a me debruçar sobre documentos produzidos pelos fóruns em
preparação aos ENEJAs
17
. A partir deles, pude estabelecer algumas aproximações e eixos, no
que tange à forma de organização, como princípio, forma, periodicidade e dinâmica, o que
me permitiu comprovar que os fóruns possuem formatos e meios de organização distintos.
Os princípios norteadores da organização apresentam-se como comuns a todos.
Apesar da diversidade, o desejo por consolidar um espaço de discussão, troca de experiência,
participação de diferentes atores e segmentos (instituições e entidades) apresentam-se como
anseios que norteiam a articulação e organização de cada fórum. Associada a estes elementos,
pode-se destacar a busca pela formação, informação e ação conjunta voltada para intervenções
nas políticas públicas que garantam a efetivação do direito à educação, independente da idade.
Quanto à forma de estruturação/organização, observo que nesse eixo dois
subeixos: o modelo organizacional e a representação por segmentos. O modelo organizacional
se subdivide em dois formatos: formal e informal. No primeiro, sua organização ocorre por
meio de uma secretaria executiva definida, com regimento ou estatuto. Também divisão de
tarefas e hierarquia, como pode ser constatado nos fóruns estaduais do Acre, Amapá, Bahia,
Distrito Federal, Rondônia, Mato Grosso, Pará e Pernambuco. No segundo, a presença de
coordenador ou representante, coordenação colegiada, grupo articulador ou comissão que
responde pelo fórum e este recebe apoio de colaboradores para a organização dos eventos. A
17
Os documentos produzidos pelos fóruns em preparação para o X ENEJA, em 2008, apresentam informações
sobre a organização e atuação de 16 fóruns. Vale lembrar que a produção de documentos pelos fóruns teve início
no VII ENEJA, em 2005, inaugurando metodologia de preparação dos encontros nacionais por meio de
relatórios, segundo algumas questões guias. Contudo, os encontros seguintes não conseguiram manter este
procedimento, sendo retomado somente no X ENEJA. Esses documentos são as fontes utilizadas para
compreender a forma de atuação dos fóruns.
47
tomada de decisões, num âmbito mais geral, fica a cargo das assembléias e decisões do grupo
participante nas reuniões periódicas. Esta forma foi identificada nos fóruns do Ceará, Espírito
Santo, Goiás, Minas Gerais, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, Roraima e Paraíba.
Pela estruturação é possível identificar fóruns com práticas mais participativas e
coletivas, enquanto outros apresentam formatos mais formais e hierarquizados, existindo,
inclusive, fórum com regimento e normas de participação. Mas revelam, por meio dos
segmentos, formato bem peculiar de organização e articulação interna dos integrantes. A
representação por segmentos foi criada como estratégia (iniciada pelo Fórum do RJ e mantida
até os dias atuais pelos demais fóruns) para reconhecimento das diferentes instituições e
espaços de atuação na EJA, sendo realidade comum a todos os fóruns. Os segmentos são
agrupamentos organizados pela inserção de cada participante em alguma instituição ligada à
EJA. Estes segmentos são identificados como universidade/instituição de nível superior,
administração pública, Sistema S, educadores, organizações não governamentais, educandos,
movimentos sociais, sindicatos etc. A maior ou menor presença, em cada fórum, de um
determinado segmento se dá justamente pela presença de pessoas que a ele estão vinculadas, o
que configura um determinante para as diferenças existentes entre os fóruns.
Este formato foi criado, inicialmente, segundo participantes que fundaram o fórum
fluminense, para que os que participavam do momento de sua criação pudessem conhecer as
diversas instituições que desenvolviam a EJA, justamente por estarem vivenciando um
contexto de total pulverização de suas ações. Este modelo foi consolidado e adotado por todos
os fóruns e incorporado na dinâmica dos encontros nacionais, esta estratégia que, de acordo
com os entrevistados, facilitou e ajudou não no reconhecimento dos que “fazem” a EJA,
mas, sobretudo, favoreceu algumas parcerias entre as instituições das quais são oriundos.
De forma geral, a participação dos sujeitos pela representação em segmentos não é
uma exigência, denotando os seus atores livre iniciativa no interior dos fóruns. Paiva (2009, p.
216), indica que os sujeitos dos fóruns têm autonomia nas deliberações que tomam,
independentemente de posições e cargos que ocupam em suas entidades, o que implica, para a
autora, uma “constante negociação dos desejos acordados nos fóruns com os limites expressos
pelos poderes constituídos em todos os níveis”, e atribui maior responsabilidade e poder de
iniciativa a cada sujeito no cotidiano do fórum do qual participa. Contraditoriamente,
fóruns que afirmam que a participação nestes espaços se faz pela representação institucional.
Nestes casos, identifico que há dupla representatividade.
48
A participação tem sido medida por intermédio dos segmentos que têm maior ou
menor representatividade em cada fórum estadual, de acordo com a capacidade e atuação dos
integrantes nos segmentos. Neste sentido, todos os fóruns explicitaram a necessidade de criar
estratégias para maior participação e envolvimento, por exemplo, do segmento de educandos,
com vista a auxiliá-los na própria transformação em sujeitos de ação política.
Em relação à periodicidade da articulação, os fóruns apresentam as mais variadas
estratégias temporais para a realização de seus encontros. Fica evidente que os encontros
acontecem de acordo com a disponibilidade e capacidade de articulação dos participantes e
infra-estrutura, como é possível identificar observando a periodicidade dos encontros de cada
fórum, no Quadro 2:
Quadro 2. Periodicidade da articulação dos fóruns
18
Fóruns estaduais Periodicidade
Acre Reuniões extraordinárias
Amapá, Espírito Santo, Pernambuco e
Bahia
Bimestral
Paraná Reuniões frequentes
Ceará, Distrito Federal, Goiás, Minas
Gerais, Rio de Janeiro e Mato Grosso
Mensal
Paraíba Quatro encontros anuais
Rio Grande do Sul Semestralmente
Rondônia
Em fase de estruturação, com previsão
de reuniões mensais
A periodicidade de encontros tem influenciado no maior ou menor preparo político dos
fóruns nos estados e, segundo participantes, também influencia na qualidade de participação
nos ENEJAs. O que se torna explícito é que os fóruns que mantêm agenda permanente ou
frequente de trabalho apresentam atuação mais qualificada e, consequentemente, mais ativa e
propositiva. Em contrapartida, há caso de fóruns que se reúnem somente para indicar a
delegação que participará do ENEJA anual, revelando a fragilidade do coletivo em sua
atuação no estado.
Em relação à forma de registro, é possível observar que os fóruns conseguem
sistematizar as reuniões por meio de atas, listas de frequência, pequenos relatos por meio de
notas no portal dos fóruns em que fazem, de forma geral, um balanço das discussões
18
Quadro baseado em modelo desenvolvido no documento preparatório ao X ENEJA, elaborado pelo Fórum
EJA/RJ, em 2009.
49
desenvolvidas no encontro —, relatórios, filmagens etc. O rum fluminense, por exemplo,
durante algum tempo, manteve em circulação um boletim mensal chamado “Notícias”, em
que buscava não fazer um relato dos encontros, mas também informar sobre
acontecimentos da EJA e da política educacional relativa a essa modalidade.
O quarto e último eixo refere-se à dinâmica das reuniões. Os fóruns organizam seus
encontros com dinâmicas bem diversas e buscam atender as demandas locais, sem com isso
perder o foco quanto às políticas de EJA. Quanto à forma de participação nas reuniões,
costumam ser livres ao interesse dos que participam, sendo o Fórum do Acre o único que
estabelece que o interessado faça uma solicitação formal que passará pela avaliação do
colegiado.
Em alguns fóruns a prática de apresentações no início das reuniões por
segmentos/instituições aos quais os sujeitos estão vinculados; também um momento de
informes ligados à EJA e a questões relativas à educação em geral. Reserva-se espaço para
troca de experiências desenvolvidas no âmbito da EJA e pessoas/especialistas são convidadas
para apresentarem e discutirem uma determinada temática com a plenária. A partir da
descrição dos próprios fóruns sobre a forma como atuam é possível conhecer com maior
detalhamento a dinâmica de cada um:
Espaço [...] de apresentação de demandas, de conciliação de reivindicações,
tendo o papel de analisar o contexto da EJA no estado, sua demanda
potencial, seus aspectos históricos e filosóficos, produzindo conhecimentos e
subsidiando as instituições que trabalham no sentido de implementar ações
coerentes com o que estabelecem as Diretrizes Curriculares para a Educação
de Jovens e Adultos. (Fórum de EJA do Acre).
[...] Fórum EJA Bahia tem as seguintes ações: apresentação das propostas de
Educação de Jovens e Adultos do estado e do município de Salvador;
realização de sessões científicas com apresentação de monografias,
dissertações e teses sobre EJA produzidas por componentes do Fórum;
exposição de ações que cada segmento tem realizado no Estado da Bahia.
(Fórum de EJA da Bahia).
Repasse de informações e organização de eventos. Além dos informes em
nossas reuniões ordinárias o realizadas palestras com temas de interesse
dos educadores que permitam o esclarecimento de temáticas tratadas na
atualidade, ou para dar conhecimento de leis, projetos, programas,
metodologias, planos de ação, sendo ministradas por alunos da pós-
graduação, secretários de educação, representantes de instituições, técnicos,
professores universitários. As reuniões são itinerantes para dar visibilidade
ao Fórum. Ao longo da sua existência temos realizado dois encontros anuais
que envolvem educadores de EJA, alunos de pós-graduação, gestores de
todos os segmentos. (Fórum de EJA do Ceará).
50
Como desdobramento da atuação do GTPA-Fórum EJA/DF, fóruns têm sido
organizados em cidades que compõem a região do Distrito Federal e entorno
[...]. Em nível de cidade tem-se um objetivo comum ao fórum geral: somar e
convergir esforços da sociedade política e civil na busca da alfabetização e
educação de jovens e adultos como parte de um processo de conquista de
maiores e melhores condições de vida e os aspectos específicos relativos às
necessidades de cada cidade. (Fórum de EJA do Distrito Federal).
Uma comissão formada por representantes dos segmentos que participam do
Fórum se reúne regularmente para discutir e articular os encontros
(bimestrais) e para encaminhar as deliberações que são propostas. (Fórum de
EJA do Espírito Santo).
Encontros temáticos no período noturno, que visam garantir a maior
participação de professores e alunos. Anualmente, realiza-se o Encontro
Estadual. [...] estão sendo realizados, ainda, encontros no interior do estado
para mobilizar a criação de outros fóruns regionais. (Fórum de EJA de
Goiás).
As plenárias realizadas mensalmente são encontros de debate e reflexão e, de
maneira geral, envolvem: apresentação cultural com vista a valorizar
trabalhos desenvolvidos por educadores e educandos da EJA; apresentação
de um tema por um ou mais convidados; tempo para debate e troca de idéias
entre os participantes e os convidados. Ao final, acontece uma
confraternização. Esses encontros reúnem pessoas vindas da capital, de
cidades próximas e, também, do interior. (Fórum de EJA de Minas Gerais).
As reuniões plenárias do fórum realizam-se periodicamente de forma
itinerante e contam com a presença dos representantes dos segmentos acima
citados e para a organização de eventos são formadas comissões. Temos
também a realização dos encontros estaduais contando com uma participação
mais ampliada de instituições e convidados, dentre os quais coordenadores
de políticas e programas, educandos e educadores desta modalidade. (Fórum
de EJA do Pará).
Compromete-se, em espaço plural, na discussão, fortalecimento e proposição
de caminhos para a educação de jovens e adultos, no âmbito do Estado de
Pernambuco. O fórum pretende ser, ainda, um articulador de parcerias e
alianças para enfrentar o grave problema do analfabetismo e da
subescolarização de jovens e adultos, especialmente buscando a formulação
de políticas públicas e o financiamento para as ações na área. (Fórum de EJA
de Pernambuco).
A primeira reunião do ano tem como ponto de pauta o levantamento dos
temas a serem abordados nos encontros que acontecerão ao longo do ano. Ao
longo do ano o feitos contatos com pessoas que podem auxiliar a
abordagem dos temas levantados. Portanto, a agenda de discussões é
bastante flexível e se constroi à medida que convidados ou os próprios
participantes do fórum possam articular a discussão com a plenária. Os
últimos encontros vêm sendo caracterizados pela socialização de
experiências e informes, tendo-se inclusive a presença de representantes do
MEC/SECAD com o objetivo de discutir a política de EJA em âmbito
nacional. (Fórum de EJA do Rio de Janeiro).
51
As estratégias de organização dos fóruns são diversas. Contudo, identifica-se o
interesse de seus participantes em se qualificarem quanto às questões e temas do campo da
EJA. Pelos relatos, identifico que a preocupação do movimento é quanto à preparação política
de seus integrantes e aprofundamento em temas da área de EJA.
A abordagem dos temas é feita em todos fóruns na forma de seminários, perpassando
desde o campo mais amplo das políticas, como financiamento e legislação, até temáticas mais
específicas como a formação de professores, currículo, metodologias, sujeitos etc. Buscam o
aprofundamento teórico metodológico na área, expressando não conhecer posicionamentos
existentes, mas a partir deles formular seus próprios posicionamentos.
Os fóruns evidenciam que estão em busca de maior fortalecimento e consolidação no
âmbito estadual, passando essa busca a adquirir contorno político geográfico. Verifica-se a
preocupação em buscar novos parceiros e participantes que não estejam somente no âmbito da
capital, havendo um movimento de interiorização, com reuniões e encontros itinerantes.
Este processo, inclusive, motivou a criação de fóruns regionais. Até a última
contagem, totalizavam 52, presentes, principalmente, em estados com grande extensão
geográfica, como Minas Gerais, Bahia, Mato Grosso, São Paulo e Rio Grande do Sul. Mas
também se encontram fóruns regionais em estados com extensões geográficas menores, como
Paraíba, Pernambuco, Santa Catarina e Rondônia, que sentiram a necessidade de criar outros
espaços de discussão para além da capital.
Com o objetivo de ampliar a discussão e agregar o maior número de participantes que
atuam ou se interessam pela EJA, o fortalecimento espacial/geográfico tem sido almejado, a
fim de capilarizar as ações em todo o território estadual. Esta disposição em ampliar a
participação pela causa da EJA foi apontada pelos entrevistados como resultante da disposição
política dos participantes que integram os fóruns.
A respeito da ampliação da participação nos fóruns, a divulgação da experiência de
participação na luta pela EJA e as reuniões que realizam permanentemente têm sido apontadas
como pontos estratégicos. Fóruns como os do Acre, Ceará, Goiás, Rio de Janeiro e Minas
Gerais, por exemplo, expressam que a divulgação por meio de mídia local, Internet e chamada
ampliada dos diversos sujeitos que atuam com EJA favorece maior participação nas reuniões,
além de maior visibilidade e disseminação da experiência de atuação de cada fórum.
52
Contudo, a manutenção cotidiana dessa mobilização não se sustenta somente pela
vontade de seus integrantes, sendo necessário algum suporte financeiro para garantir sua
sobrevivência. Quais as estratégias utilizadas na manutenção dos fóruns?
A capacidade financeira de um movimento interfere, inevitavelmente, na sua
capacidade de articulação e atuação no espaço público, mas por não possuírem fontes
próprias, estes movimentos buscam parcerias para o patrocínio de suas ações, como ocorre
com o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), por exemplo.
No caso dos fóruns não é diferente. Como não possuem recursos próprios, de forma
geral, encontram na parceria com instituições/segmentos representados nos próprios fóruns a
solução para se manterem. As estratégias são bem distintas. O Fórum fluminense, por
exemplo, foi beneficiado pelo projeto de extensão na Universidade do Estado do Rio de
Janeiro, formulado por um de seus integrantes, para parceria com o fórum, que durante um
largo tempo contribuiu para manter a sua secretaria executiva, com o apoio de dois bolsistas
de extensão, assim como a garantia de espaço físico. Em outro momento, a ONG ActionAid
Brasil aportou recursos financeiros que contribuíram para melhorar as condições de apoio ao
fórum, como assegurou as despesas de passagens aéreas em vários ENEJAs, dos delegados
representantes de segmentos sem orçamento próprio. Em moldes semelhantes o Fórum da
Grande Vitória tem apoio da Pró-Reitoria de Extensão da Universidade Federal do Espírito
Santo. Já o Fórum de São Paulo conta com o repasse de recursos feito por instituições como o
MOVA, além de se cobrar uma taxa dos participantes (Silva, 2005, p. 76).
A obtenção de recursos financeiros ou de parcerias para financiamento das ações
cotidianas tem sido apontada por todos os fóruns como um desafio, pois suas parcerias são
provisórias e, em muitas situações, fazem com que cada fórum crie alternativas para superar a
falta de recursos. Neste caso, a capacidade de articulação dos membros dos fóruns tem se
apresentado como determinante para a formalização de parcerias e, em alguns casos, na
sobrevivência dessas articulações.
Pelos mecanismos de manutenção que cada fórum utiliza, identifico formas criativas
de organização e participação. Pode-se afirmar que os fóruns de EJA têm-se apresentado
como articulação plural resultante de objetivos comuns entre sujeitos que estabelecem
vínculos e relações num campo de luta e disputas pela EJA.
53
2
2
.
.
2
2
A
A
a
a
r
r
t
t
i
i
c
c
u
u
l
l
a
a
ç
ç
ã
ã
o
o
d
d
o
o
s
s
f
f
ó
ó
r
r
u
u
n
n
s
s
e
e
m
m
r
r
e
e
d
d
e
e
Os fóruns de EJA, pela identificação com a luta pela EJA, ampliaram suas ações,
criando formas e mecanismos de mobilização coletiva, com vista à articulação das políticas e
com atores/instâncias externas, resultando no que reconheço como articulação em rede.
Segundo Scherer-Warren (2002) na perspectiva das organizações da sociedade civil, a
rede é pensada como meio real ou virtual, ou como nova forma de articulação solidária e
política. No pensamento científico, a perspectiva da rede é assumida como elemento da
sociedade da informação ou como nova forma de articulações entre os movimentos. A autora
sinaliza que para pensar ações coletivas como redes é relevante considerar as “dimensões
solidarísticas” e estratégicas das redes das organizações civis. Esta última dimensão bastante
apropriada em relação ao que percebo na prática dos fóruns.
A dimensão estratégica aponta que a rede pode ser entendida nos seus sentidos
morfológico, simbólico ou de empoderamento ou, ainda, na relação entre ambas. Mance
(2000, apud Scherer-Warren 2002, p. 63), observa que no sentido morfológico:
[...] trata-se de uma articulação entre diversas unidades que, através de certas
ligações, trocam elementos entre si, fortalecendo-se reciprocamente, e
podem-se multiplicar em novas unidades, as quais, por sua vez, fortalecem
todo o conjunto à medida que são fortalecidas por ele.
Scherer-Warren (2002), ainda com base no pensamento desse autor, aponta para a
ideia de rede que conecta grupos de um determinado movimento social (como o movimento
de mulheres, por exemplo); ou seja, ideia de que a articulação entre os movimentos fortaleça
cada movimento em particular pelas interações que passem a ocorrer entre eles, e que este
fortalecimento venha a contribuir para o surgimento de novos movimentos. Destaca que a
rede poderá assumir caráter propositivo, tendo em vista seu efeito multiplicador e
conseqüentes mecanismos de difusão simbólica de novos valores e empoderamento. Neste
sentido, conclui que a rede exerce papel estratégico, enquanto elemento organizador,
articulador, informativo e de empoderamento do movimento no âmbito da sociedade civil
com e contra poderes instituídos. (Scherer-Warren, 2002, p. 68).
Neste sentido, entendo que a rede é, então, uma forma de articulação que busca
conectar grupos ou organizações, com concepções ideológicas variadas, por uma demanda
específica, com o objetivo de ampliar a ação e obter mais força política de pressão.
54
Nesta perspectiva, percebo que os fóruns se valem da dimensão estratégica da rede,
com a perspectiva de se organizarem, articularem, trocarem informações e ampliarem a ação
política na luta pela efetivação do direito à EJA. A articulação em rede se materializa nos
momentos coletivos de interlocução entre os fóruns como: Encontro Nacional de Educação
de Jovens e Adultos (de caráter anual até 2009); Rede fóruns (grupo de discussão pelo e-mail
yahoogrupos); Portal dos Fóruns de EJA do Brasil (site www.forumejabrasil.org.br) e em
reuniões formais e informais realizadas com os representantes da rede quando de convocação
do MEC/SECAD (que reconhece a rede e a legitima como mais uma instância de escuta
social) em cumprimento de pauta proposta ou aproveitando espaços e momentos fora da pauta
para debates e encaminhamentos.
A articulação em rede dos fóruns, então, apresenta-se como meio de discussão,
diálogo, disputas de concepção, troca de experiências, produção de saberes e proposições
políticas que ocorrem entre fóruns e destes com demais atores políticos que atuam ou estão
ligados às questões da EJA. Busca-se nesta rede pensar as ações e a forma de atuação política
dos fóruns frente a alguma situação envolvendo a EJA, ou seja, por meio desta articulação , os
fóruns fortalecem a mobilização na luta pela EJA em âmbito nacional.
Para compreensão desta articulação em rede, busquei, no primeiro momento,
compreender a razão pela qual se articulam em rede. Em seguida, acompanhei a
movimentação dos fóruns no grupo de discussão da yahoogrupo e no Portal, bem como
mapeei os relatórios produzidos nos ENEJAs, além de registros feitos quando de minha
participação nos dois últimos encontros nacionais, com o objetivo de identificar principais
pautas de luta, principais discussões e sua contribuição para a consolidação da identidade dos
fóruns como um movimento nacional pela EJA. Por meio destes procedimentos foi possível
captar ações, tensões e conflitos vivenciados pelos fóruns.
55
2
2
.
.
3
3
E
E
n
n
c
c
o
o
n
n
t
t
r
r
o
o
N
N
a
a
c
c
i
i
o
o
n
n
a
a
l
l
d
d
e
e
E
E
d
d
u
u
c
c
a
a
ç
ç
ã
ã
o
o
d
d
e
e
J
J
o
o
v
v
e
e
n
n
s
s
e
e
A
A
d
d
u
u
l
l
t
t
o
o
s
s
:
:
e
e
s
s
p
p
a
a
ç
ç
o
o
d
d
e
e
e
e
n
n
c
c
o
o
n
n
t
t
r
r
o
o
,
,
m
m
o
o
m
m
e
e
n
n
t
t
o
o
d
d
e
e
d
d
i
i
s
s
p
p
u
u
t
t
a
a
s
s
Os fóruns de EJA têm procurado ir além da esfera local, na busca por maior
capacidade de articulação, visibilidade e diálogo com a sociedade política
19
, em prol da
efetivação do direito à EJA. Para alcançar os objetivos antes apontados, um dos espaços em
que assim atuam é o de realização sistemática do ENEJA. Este encontro tem servido como
espaço de articulação política, proposições e construção de saberes no campo da educação de
jovens e adultos entre os fóruns estaduais e regionais existentes e o governo federal,
principalmente.
Parto do pressuposto de que o ENEJA é espaço privilegiado para entender a dinâmica
do movimento dos fóruns no cenário político da EJA e a forma como se articulam
politicamente na luta pela EJA frente às instâncias que induzem políticas, executam e decidem
os rumos da EJA. Do mesmo modo, ao estudá-los é possível compreender como vêm se
forjando historicamente como espaço que busca ir além do debate e da troca de opiniões, para
se constituir como um movimento propositivo no campo dos conceitos pedagógicos e das
políticas públicas de EJA.
Neste sentido, situo historicamente o surgimento do ENEJA, passando pela forma de
organização, discussões, ação política, produção de saberes, articulação/diálogo que nele se
estabelece na aproximação com o poder público, até chegar ao seu sentido para o movimento
articulado dos fóruns.
O Encontro Nacional vem-se realizando, anualmente, desde 1999 até 2009, em sua
décima primeira edição
20
. O primeiro encontro, que reuniu nacionalmente estudiosos e
educadores de EJA, em realidade ocorreu no Paraná, por convocação da Oficina Regional da
Unesco para a América Latina e Caribe (OREALC), em 1998, tendo em vista a realizar um
balanço dos encaminhamentos brasileiros pós V CONFINTEA uma forma de pressionar o
país em relação ao acordo firmado em Hamburgo, com o qual o Brasil não estava se
19
Por sociedade política, neste caso, refiro-me aos governos das diferentes esferas de poder, mas também aos
Conselhos de Educação (nacional, estaduais e municipais) e até mesmo ao Congresso Nacional, pelas ações em
defesa da EJA que vêm sendo realizadas com vista ao novo PNE e garantia do cumprimento de acordos firmados
pelos países, durante a VI Conferência Internacional de Educação de Adultos (Belém, 2009), expressos no
documento Marco de Ação de Belém.
20
A partir do 11º ENEJA aprovou-se a alternância de encontros, passando a ser bienal, intercalado com
Encontros Regionais de EJA (por regiões geográficas), nos anos em que não acontecem os encontros nacionais.
O 12º ENEJA deverá ocorrer em 2011.
56
comprometendo
21
. Este, entretanto, não foi considerado como o primeiro ENEJA, embora
tenha sido esse espaço um estimulador da necessidade de reuniões anuais entre os
movimentos que, à semelhança do iniciado no Rio de Janeiro, já aconteciam em vários
estados
22
.
O I Encontro Nacional de EJA, apesar de ter sido pleiteado pelo Paraná, acabou
ocorrendo no Rio de Janeiro por pressão, segundo Soares (2004), do MTb (Ministério do
Trabalho), por entender que haveria maior visibilidade política.
A participação nesse evento faz-se por meio de delegações, segundo critérios de
representação, por segmentos, nos fóruns estaduais e regionais. O encontro tem duração de
quatro dias em média e uma dinâmica-base, que foi ganhando contornos diferenciados de
acordo com a realidade local e o preparo político do fórum responsável: cerimônia de
abertura, mesas de debates, reuniões de trabalho e plenária final dos fóruns.
Na cerimônia de abertura sempre uma mesa composta por representantes de
diferentes segmentos, autoridade local e a prática de um conferencista que aborda o tema
geral do Encontro. Nos dois dias subsequentes, acontecem mesas temáticas com a presença de
especialistas e representantes do poder público nacional, possibilitando interlocução direta
entre runs e Estado, além de reuniões de trabalho por segmento e região, momento em que
os diferentes fóruns podem conhecer a realidade e as estratégias utilizadas pelos demais. No
último dia, acontece a plenária final, na qual se faz a apresentação dos principais debates,
questões e proposições, sistematizados por uma equipe de relatoria. Este é um dos momentos
mais intensos do Encontro, quando se explicitam os conflitos, divergências políticas e
conceituais no campo da EJA intra e entre fóruns.
Esse formato tem reservado significativo espaço para a reunião e troca de experiências
dos fazeres dos fóruns. A plenária dos fóruns tem possibilitado não apenas reconhecer as
diferentes concepções, metodologias e estratégias de sua atuação, em direção ao sentido
democrático da luta pelo direito de todos à educação, mas também reforçar o conjunto de
ações nacionais.
21
Esta situação pode ser verificada pela política da época, de priorização do ensino fundamental de crianças, sem
atender o direito de todos como a Constituição preceituara. Era a política do governo FHC que não deixara de
assinar a Declaração de Hamburgo em 1997, mas declarara publicamente a prioridade de sua política,
entendendo que, ao longo dos anos, resolveria o analfabetismo adulto pela universalização do ensino
fundamental de crianças.
22
Ao final do encontro, alguns participantes integrantes dos fóruns existentes no período no Rio de Janeiro,
Espírito Santo, Minas Gerais e Paraíba — decidem realizar sistematicamente encontros nacionais de EJA.
57
Para a tarefa de organizar a luta nacionalmente, algumas estratégias foram gestadas no
âmbito desses Encontros: a figura de representantes de fóruns, para maior articulação entre os
demais fóruns, para a organização coletiva da luta em âmbito nacional e participação nas
reuniões com a SECAD; a figura de um representante de fóruns, criado para ocupar assento
na CNAEJA; a recente criação de uma coordenação colegiada nacional de fóruns composta
por cinco representantes, um de cada região do país, para articulação permanente, com vista a
construir um plano de ação, e busca de financiamento junto ao MEC para a realização dos
Encontro Nacionais, por exemplo.
O ENEJA não apresenta apenas a dinâmica de um seminário ou congresso, mas se
destaca por ser espaço de articulação política, sintonizado com o momento histórico, no
sentido de afirmar e consolidar estratégias, posições e compreensões acerca das políticas
públicas nacionais e dos movimentos internacionais que se fazem na área, de modo a interferir
nessas políticas, em defesa do direito de todos à educação.
Dois documentos o produzidos nesses Encontros Nacionais: um relatório síntese,
lido, discutido e aprovado com incorporações na plenária final, de caráter político conceitual,
e um relatório completo, sistematizando todas as atividades realizadas, assim como as
discussões e proposições surgidas durante o Encontro. Nele se faz um indicativo dos temas
e questões a serem desenvolvidas no ENEJA seguinte. Também são listados encaminhamentos
e moções a serem executados até o próximo encontro.
O movimento dos fóruns, especialmente no âmbito do ENEJA, demonstra
preocupação com a sistematização das discussões, que tem sido garantida por uma comissão
de relatoria, escolhida pela comissão organizadora nos primeiros dias do encontro. Esta
comissão fica responsável por participar de todas as atividades realizadas e sistematizar as
discussões. Esta tarefa tem sido preservada desde o primeiro encontro e tem possibilitado o
sucesso de todos eles.
Como consta em alguns relatórios finais, o indicativo desses documentos serem
encaminhados diretamente ao Ministro da Educação. De acordo com alguns participantes, não
se sabe ao certo se eles influenciam as tomadas de decisões no âmbito ministerial, mas sem
dúvida demonstram a capacidade de articulação e posicionamento político do movimento dos
fóruns sobre as questões que envolvem a educação de jovens e adultos.
O ENEJA também tem representado um esforço de articulação e capacidade de
mobilização dos fóruns. Em interlocução com múltiplos parceiros de nível nacional e
58
internacional — Unesco, MEC e entidades como Consed e Undime, o Sistema S, entre outros
—, todos com maior ou menor participação, em função da conjuntura política e em conjunto
com o empenho do coletivo do movimento, os fóruns conseguem mobilizar a cada ano um
número cada vez maior de participantes, aumento, contudo, que tem sido possível pelo
maior apoio financeiro conseguido por meio das parcerias realizadas com o poder público.
Paiva (2007, p. 80) aponta que a Rede de Apoio à Ação Alfabetizadora no Brasil
(RAAAB) apresentou-se como uma importante parceira, sendo responsável pela sustentação e
organização nacional dos fóruns em seu momento inicial, sobretudo, quando o poder público
mantinha-se afastado ideológica, política e financeiramente das ações a serem desenvolvidas
no âmbito da EJA.
Esta rede originária do Nordeste
em meados dos anos de 1980, em prol da
alfabetização empreendida por organizações não-governamentais [...] foi
perdendo o lugar protagônico da resistência em benefício dos fóruns, que na
prática conseguiram a adesão e a formação de uma rede muito maior e
potente do modelo com a qual a RAAAB se forjara. [...] Embora permaneça
associada aos fóruns e aos ENEJAs, com visibilidade inconteste para muitas
questões [...] em outros casos atua como coadjuvante. [...] Mas pode-se dizer
que a RAAAB sustentou a organização dos fóruns...
Ao longo de onze anos, a capacidade de mobilização e captação de recursos tem
alcançado uma marca que impressiona como é possível verificar no Quadro 3.
59
Quadro 3: Capacidade de mobilização e recursos para a realização dos ENEJAs
ENEJAS PARTICIPAN
TES
FÓRUNS
PRESENTES RECURSOS
I - Rio de
Janeiro
de 08 a 10 de
setembro de
1999
298 delegados
Rio de Janeiro, MG, ES, RS, SP
Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a
Cultura (UNESCO); Consejo de Educación de Adultos de América
Latina (CEAAL); Conselho Nacional de Secretários de Educação
(CONSED), União Nacional dos Dirigentes Municipais de
Educação (UNDIME); Conselho de Reitores das Universidades
Brasileiras (CRUB); Ministério do Trabalho (MTb) e Serviço
Social da Indústria (SESI).
II - Campina
Grande
de 07 a 09 de
setembro de
2000
109 delegados
Fóruns em 11 estados SESI, SESC, CEAAL, UNDIME, UFPB, UEPB, UNIPE, SEEPB,
Secretaria Municipal de Educação de João Pessoa
III - São Paulo
de 07 a 09 de
setembro de
2001
240 delegados de
19 estados e mais
700 professores
paulistas e 340
outros
participantes na
Cerimônia de
Abertura
Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Paraná, Rio de Janeiro, Espírito Santo, Minas
Gerais, São Paulo, Nordeste Paulista, Mato Grosso, Tocantins, Pernambuco, Alagoas
e da Paraíba além de comissões constituídas para implantação dos Fóruns de Goiás,
Bahia e Ceará.
Sem informações
IV - Minas
Gerais
de 21 a 24 de
agosto de 2002
400 delegados
14 fóruns estaduais (RJ, MG, SP, AL, PB, GO, PR, RS, RN, MT, TO, ES, SC, BA),
02 fóruns em processo de formação (CE, PE) e 3 regionais (Divinópolis, Leste de
Minas e Nordeste Paulista)
Sem informação quanto ao montante orçamentário total.
Pagamento de taxa de inscrição de R$45,00 por delegado.
V – Cuiabá
de 03 a 05 de
setembro de
2003
18 fóruns estaduais: AM, RO, TO, CE, RN, PB, PE, AL, BA, ES, MG, RJ, SP, PR,
RS, MT, GO, DF); 2 em formação (MS, RR) e 5 regionais (Regional Leste de Minas,
Oeste Paulista, Nordeste Paulista, Regional de Rondonópolis e Regional de Ijuí/RS)
Associação de entidades nacionais que repartiram os itens de
despesa MEC, MTE, PRONERA
VI - Rio
Grande do Sul
de 08 a 11 de
setembro de
2004
24 os Fóruns Estaduais presentes, 19 Fóruns regionais e uma comissão pró-Fórum e
apresentam a seguinte configuração nos estados e Distrito Federal: Região Norte —
Rondônia (RO) e Regional RO (Ji-Paraná), Roraima (RR), Amazonas (AM),
Tocantins (TO), Pará (PA), Comissão pró-Fórum do Acre; Região Sul — Rio Grande
do Sul (RS), Fóruns Regionais do RS (Serra, Litoral, Fronteira, Santa Cruz, Central,
Pelotas, Noroeste, Porto Alegre, Grande Porto Alegre), Santa Catarina (SC), Paraná
(PR); Região Sudeste — Espírito Santo (ES), Minas Gerais (MG) e Fóruns Regionais
de MG (Vale das Vertentes, Norte, Nordeste, Leste, Oeste e Zona da Mata), Rio de
Janeiro (RJ), São Paulo (SP) e Fóruns Regionais SP (Nordeste e Oeste); Região
Centro-Oeste — Mato Grosso (MT), Mato Grosso do Sul (MS), Distrito Federal (DF),
Ministério da Educação / SECAD; Fundação Abrinq; Natura
60
Goiás (GO); Região Nordeste — Bahia (BA), Fórum Regional BA (Extremo Sul);
Piauí (PI), Alagoas (AL), Sergipe (SE), Rio Grande do Norte (RN), Paraíba (PB),
Pernambuco (PE) e Ceará (CE)
VII - Brasília
de 31 de agosto
a 03 de
setembro de
2005
473 delegados
26 Fóruns Estaduais e 34 Fóruns regionais: Região Norte: Rondônia (RO) e Regional
RO (Ji-Paraná), Roraima (RR), Amazonas (AM), Tocantins (TO), Pará (PA), Acre
(AC); Região Sul: Rio Grande do Sul (RS), Fórum RS e Fóruns Regionais (Serra,
Litoral, Fronteira, Santa Cruz, Central, Pelotas, Noroeste, Porto Alegre/Grande Porto
Alegre), Santa Catarina (SC) e Fóruns Regionais (Grande Florianópolis, Concórdia e
Criciúma) Paraná (PR); Região Sudeste: Espírito Santo (ES), Minas Gerais (MG) e
Fóruns Regionais de MG (Vale das Vertentes, Norte, Sudeste, Leste, Centro-Oeste,
Inconfidentes e Zona da Mata), Rio de Janeiro (RJ), São Paulo (SP) e Fóruns
Regionais SP (Nordeste e Oeste); Região Centro-Oeste: Mato Grosso (MT) e Fórum
Regional Norte do Mato Grosso; Mato Grosso do Sul (MS), Distrito Federal (DF),
Goiás (GO); Região Nordeste: Bahia (BA), Fórum Regional BA (Extremo Sul);
Maranhão (MA); Piauí (PI), Alagoas (AL), Sergipe (SE); Rio Grande do Norte (RN),
Paraíba (PB), Pernambuco (PE) e Fóruns Regionais (Metropolitano, Litoral Sul, Mata
Sul, Mata Centro, Vale do Capibaribe, Agreste Meridional, Sertão do Moxotó-
Ipanema, Submédio São Francisco, Sertão do Araripe, Sertão Central e Vale do São
Francisco); Ceará (CE).
Secretaria de Educação Continuada Alfabetização e Diversidade –
SECAD/MEC, Secretaria de Estado da Educação do Distrito
Federal – GDF, Faculdade de Educação – Decanato de Extensão –
Universidade de Brasília – UnB, Organização das Nações Unidas
para a Educação, a Ciência e a Cultura – UNESCO, Sindicato dos
Professores no Distrito Federal – SINPRO/DF, União Nacional dos
Dirigentes Municipais de Educação – UNDIME, Secretaria
Especial de Aqüicultura e Pesca, Secretaria Nacional de Economia
Solidária – SENAES/Ministério do Trabalho e Emprego, Programa
Crer para Ver – Uma iniciativa da Fundação Abrinq e Natura
Cosméticos, SESI Nacional, SESC Nacional, Faculdade Cenecista
de Brasília – Faceb, Instituto Agostín Castejón – IAC, Editora
Educarte Ltda., Associação dos Servidores da Fundação
Educacional – ASEFE, Associação dos Servidores da Fundação
Universidade de Brasília – ASFUB, Associação de Pais e Amigos
do Deficiente Auditivo – APADA. R$227.477,36, além do apoio
com passagens, tradutores, reprografia
VIII – Recife
de 30 de agosto
a 02 de
setembro de
2006
598 delegados
26 fóruns estaduais e no Distrito Federal, além de 51 Fóruns regionais: Região Norte:
Rondônia (RO) e Regional RO (Ji-Paraná), Roraima (RR), Amazonas (AM),
Tocantins (TO), Pará (PA), Acre (AC); Região Sul: Rio Grande do Sul (RS), Fórum
RS e Fóruns Regionais RS (Serra, Litoral, Fronteira, Santa Cruz, Central, Pelotas,
Noroeste, Porto Alegre/Grande Porto Alegre), Santa Catarina (SC) e Fóruns
Regionais SC (Grande Florianópolis, Concórdia, Criciúma, Araranguá, Maravilha,
Ibirama, Mafra, Ituporanga, Chapecó, Canoinhas, Brusque, Itajaí, Campos Novos, São
Miguel do Oeste, Rio do Sul), Paraná (PR); Região Sudeste: Espírito Santo (ES),
Minas Gerais (MG) e Fóruns Regionais MG (Vale das Vertentes, Norte, Sudeste,
Leste, Centro-Oeste, Inconfidentes, Zona da Mata e Metropolitano-BH), Rio de
Janeiro (RJ), São Paulo (SP) e Fóruns Regionais SP (Nordeste e Oeste); Região
Centro-Oeste: Mato Grosso (MT) e Fórum Regional MT (Norte do Mato Grosso);
Mato Grosso do Sul (MS), Distrito Federal (DF), Goiás (GO); Região Nordeste:
Bahia (BA), Fórum Regional BA (Extremo Sul); Maranhão (MA); Piauí (PI) e Fóruns
Regionais PI (Picos e Parnaíba), Alagoas (AL), Sergipe (SE); Rio Grande do Norte
(RN), Paraíba (PB) e Fórum Regional PB (Sertão Paraibano), Pernambuco (PE) e
Fóruns Regionais PE (Metropolitano, Litoral Sul, Mata Sul, Mata Centro, Vale do
Capibaribe, Agreste Meridional, Sertão do Moxotó-Ipanema, Submédio São
Francisco, Sertão do Araripe, Sertão Central, Vale do São Francisco e Sertão do
Médio São Francisco); Ceará (CE).
SECAD/MEC, MTE, Secretaria Especial de Agricultura e Pesca
(SEAP), Secretaria de Educação e Cultura, UNDIME, Prefeitura
do Recife, Prefeitura Popular de Olinda, Prefeitura de Camaragibe,
Universidade Federal de Pernambuco, UNESCO, Centro Paulo
Freire, SESI, SESC, Alfalit Brasil, Escola Marista Champagnat de
Recife.
IX - Paraná
de 18 a 22 de
setembro de
540 delegados,
81 organizadores
e 13 participantes
26 fóruns e no Distrito Federal e 52 fóruns regionais: Região Norte: Rondônia (RO) e
Regional RO (Ji-Paraná), Roraima (RR), Amazonas (AM), Tocantins (TO), Pará
(PA), Acre (AC) e Amapá (AP); Região Sul: Rio Grande do Sul (RS), Fórum RS e
Agência de Desenvolvimento Solidário – ADS/CUT; APP-
Sindicato dos Trabalhadores em Educação Pública do Paraná;
Central Única dos Trabalhadores –CUT; Conselho Estadual de
61
2007
da economia
solidária
Fóruns Regionais RS (Porto Alegre e Região Metropolitana, Santa Cruz, Ijuí e Bagé),
Santa Catarina (SC) e Fóruns Regionais SC (Itajaí, Chapecó, Ibirama, Ituporanga,
Canoinhas, Concórdia, Brusque, Maravilha, Criciúma, Mafra, Araranguá, São Bento
Do Sul, Rio Do Sul, Grande Florianópolis, São Miguel Do Oeste, Tubarão, Caçador,
Videira, Campos Novos, Xanxerê, Palmitos, Joinville E De Blumenau), Paraná (PR);
Região Sudeste: Espírito Santo (ES), Minas Gerais (MG) e Fóruns Regionais MG
(Vale das Vertentes, Norte, Sudeste, Leste, Centro-Oeste, Inconfidentes, Zona da
Mata e Metropolitano-BH), Rio de Janeiro (RJ), São Paulo (SP) e Fóruns Regionais
SP (Nordeste e Oeste); Região Centro-Oeste: Mato Grosso (MT) e Fórum Regional
MT (Norte do Mato Grosso); Mato Grosso do Sul (MS), Distrito Federal (DF), Goiás
(GO) e Fórum Regional GO (Entorno Sul de Goiás); Região Nordeste: Bahia (BA),
Fórum Regional BA (Extremo Sul); Maranhão (MA); Piauí (PI) e Fóruns Regionais
PI (Picos e Parnaíba), Alagoas (AL), Sergipe (SE); Rio Grande do Norte (RN),
Paraíba (PB) e Fórum Regional PB (Sertão Paraibano), Pernambuco (PE) e Fóruns
Regionais PE (Metropolitano, Litoral Sul, Mata Sul, Mata Centro, Vale do
Capibaribe, Agreste Meridional, Sertão do Moxotó-Ipanema, Submédio São
Francisco, Sertão do Araripe, Sertão Central, Vale do São Francisco e Sertão do
Médio São Francisco); Ceará (CE) e Fóruns Regionais CE Quixeramobim (do Sertão
Central) e Iguatu (Centro Sul).
Educação do Paraná – CEE; Conselho Nacional
de Secretários de Educação – CONSED; Editora Educarte;
Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Mandaguari
(FAFIMAN); Faculdades Presidente Kennedy; Grupo de Trabalho
Pró-Alfabetização-GTPA-Fórum EJA/DF-Portal; Instituto de
Filosofia da Libertação – IFIL; MEC/SECAD; MJ; MDA;
MTE/SENAES; UNESCO; Pós-Graduação Faculdades Bagozzi;
Rádio e Televisão Educativa do Paraná (RTVE); Secretaria de
Estado da Cultura do Paraná; Secretaria Especial de Aqüicultura e
Pesca; Secretaria Nacional de Juventude/PROJOVEM; Secretaria
de Estado da Educação do Paraná, Secretarias Municipais de
Educação de Campina Grande do Sul, Campo Largo, Carambeí,
Castro, Curitiba, Fazenda Rio Grande, Fernandes Pinheiro,
Guamiranga, Guarapuava, Irati, Londrina, Maringá, Pato Branco,
Piraquara, Ponta Grossa, Prudentópolis, Rebouças; SESI; SESC;
Sindicato dos Petroleiros do Paraná e Santa Catarina
(SINDPETRO/PR/SC); Sindicato dos Servidores Municipais do
Magistério de Araucária (SISMMAR); TV Paulo Freire;
UNDIME; UnB; Universidade Estadual de Londrina; UFPR;
UTFPR/PROEJA.
X - Rio de
Janeiro
de 07 a 09 de
setembro de
2008
Sem informação MEC/SECAD; UFRJ; UERJ; CEFET-Campos; SEE/RJ; Prefeitura Municipal de Rio
das Ostras; Fundação Municipal de Educação de Niterói; SME Resende; Angra dos
Reis; Coordenação de EJA SME São Gonçalo; Coordenação de EJA SME Cachoeiras
de Macacu; SESC; UNESCO; MJ; MTE; DEGASE; SESC; SESI.
R$132.000,00 (MEC/SECAD); SETEC/MEC (passagens 27
estudantes, um de cada estado e DF); passagens para convidados
do MJ e MT.
XI – Pará
de 17 a 20 de
setembro de
2009
510 delegados
UNESCO; SECAD/MEC; Fundação Nacional de
Desenvolvimento da Educação (FNDE); SESI; SESC; Centro de
Convenções e Feiras da Amazônia (Hangar); Fundação Curro
Velho; Paratur; Secretaria Estadual de Governo do Pará;
Universidade Federal do Pará (UFPA); Instituto Federal do Pará
(IFPA).
63
Esta crescente introdução de recursos públicos na execução do ENEJA tem gerado
conflitos e tensões entre os participantes dos encontros, referentes à relação que os fóruns têm
com o MEC, intensificada nos dois últimos encontros, provocando a discussão da natureza e
caráter do movimento dos fóruns, como é possível perceber nos relatos abaixo:
[...] eu não vejo nenhum problema de a gente dialogar com o governo e
aceitar o dinheiro público. Primeiro, porque o dinheiro do governo, não é do
governo, o dinheiro é público. E se eles podem financiar nossa ação
pública... hoje a gente consegue fazer com que eles reconheçam o nosso
movimento e que patrocinem para irmos dizer o que pensamos. Não estão
fazendo outra coisa que não a obrigação, porque esse dinheiro é do povo e
nós estamos trabalhando em defesa dos interesses do povo. Agora, quem fica
com posicionamento contrário, não tem clareza sobre de quem é esse
dinheiro. Esse dinheiro não é do governo, não é do PT; esse dinheiro é o
imposto que o povo paga. (entrevistado B, Fórum RJ)
[...] a partir de 2004, o governo passa a financiar quase que integralmente a
realização do evento: o governo não vai ter uma mesa para dizer o que está
fazendo? [...] Eu não tenho dúvida de que a gente não tem que ser
capitaneado pelo MEC, não tem que ficar sendo financiado pelo MEC, não
depender economicamente do MEC. Por outro lado, eu não tenho dúvida de
que o dinheiro público tem que garantir espaços públicos de debate da EJA
como o caso do ENEJA, o seminário de formação de educadores, todos os
editais que estão saindo e que as universidades estão acessando. Foi tudo
pelo que nós brigamos, tudo que a gente brigou a vida toda: ponha o dinheiro
na mão de quem está na caminhada da EJA. [...] Não é pelo fato de você ter
um acordo e uma construção com o MEC que é parceiro no ENEJA
que o ENEJA perdeu o seu sentido, a sua significação. (entrevistado D,
Fórum GO)
Este conflito reflete as disputas de concepções quanto à relação entre movimento e
governo e a forma de parceria que estabelecem mas, intrinsecamente, envolve formas
distintas de conceber o Estado nas sociedades democráticas. Por um lado, grupos, como
explicitado pelas entrevistas, que defendem a maior participação na execução das ações do
Estado, propondo parcerias entre instâncias estatais e organizações da sociedade civil e, desta
forma, possibilitando maior democratização na condução de ações e questões de interesse
público.
Por outro lado, há grupos que defendem de forma contundente que as ações do
coletivo dos fóruns precisam estar completamente desvinculadas do Estado, não podendo ser
patrocinadas por ele, pois representaria cooptação do coletivo e, logo, perda de autonomia
política. Entretanto, contraditoriamente, esse mesmo grupo entende que se mantenha a
contribuição financeira do MEC na realização dos ENEJAs.
64
Apesar da polêmica, esta parceria entre Estado e fóruns tem gerado produtos
importantes para a história do movimento, como ocorreu no ano de 2004, com a elaboração e
o lançamento de um livro, primeiro volume da coleção Educação Para Todos, de iniciativa da
SECAD/MEC e UNESCO, com o título: Educação de Jovens e Adultos: uma memória
contemporânea (1996-2004), o livro traça a trajetória da mobilização nacional dos fóruns de
EJA, apresentando relatórios formulados em cada encontro e, ainda, documentos e
declarações de conferências internacionais na área, o que contribui para o registro da luta, dos
seus objetivos e das proposições do movimento dos fóruns.
Não se pode negar que o registro é um importante instrumento para a memória destes
coletivos, não na perspectiva de registro histórico, como para a avaliação e reflexão de
estratégias e práticas do movimento.
Silva (2005, p. 115), parafraseando Jara (1996, p. 37), afirma que ação de registro
permite que os fóruns possam “refletir, questionar, confrontar a própria prática, superar o
ativismo, a repetição rotineira de certos procedimentos, a perda de perspectiva em relação ao
sentido de nossa prática. [...] Torna-se um bom instrumento para melhorar a intervenção”.
Por intermédio dos registros produzidos nos onze ENEJAs, pude identificar também
os temas pautados que deram rumo ao evento e direção ao movimento. De forma geral,
explicitam, desde a década de 1990 até os dias atuais, as principais questões e problemas
enfrentados pela EJA e pelo movimento dos fóruns. Também evidenciam preocupação na
rotatividade de fóruns responsáveis pela organização do encontro, o que tem gerado uma
disputa criativa, entre os fóruns aspirantes a sediar o evento, no convencimento do coletivo
(que faz a escolha na plenária final do encontro). Esta metodologia tem possibilitado
rotatividade entre estados e regiões, como também conhecimento da capacidade de
mobilização e articulação do fórum anfitrião, como pode ser verificado pelo panorama dos
encontros, no Quadro 4.
65
Quadro 4: Principais temas/questões pautadas nos ENEJAs
Fórum anfitrião Principais questões abordadas
I ENEJA
Rio de Janeiro
Releitura da concepção ampliada de EJA discutida na V
CONFINTEA, para a realidade brasileira. Criação e
estruturação de outros fóruns
II ENEJA
Paraíba
Ampliação e melhoria da qualidade da educação de jovens e
adultos no Brasil
III ENEJA
São Paulo
Divisão de responsabilidades entre os organismos
governamentais das três esferas administrativas e as
organizações da sociedade civil para a consecução das metas
da educação de jovens e adultos previstas no Plano Nacional
de Educação
IV ENEJA
Minas Gerais
“Cenários em mudança”: a década da alfabetização, a
construção de diretrizes e bases da educação nacional, a
articulação dos fóruns estaduais e regionais de EJA e a
inserção da EJA nos planos estaduais e municipais de
educação
V ENEJA
Mato Grosso
Comprometimento do Estado em relação à formulação de
políticas públicas com o concurso efetivo da sociedade, na
reafirmação do direito à educação básica para todos
VI ENEJA
Rio Grande do Sul
Políticas públicas de EJA, financiamento, alfabetização e
continuidade
VII ENEJA
Distrito Federal
Diversidade na EJA, papel do Estado e dos movimentos
sociais nas políticas públicas
VIII ENEJA
Pernambuco
A EJA pensada como uma política de Estado: avaliação e
perspectivas
IX ENEJA
Paraná
Compromissos com o pensamento freireano na base das
políticas públicas de EJA
X ENEJA
Rio de Janeiro
História e memória dos ENEJAs, contextualização dos dez
anos de luta dos fóruns pelo direito à educação de qualidade
para todos
XI ENEJA
Pará
A EJA pensada pela identidade dos Fóruns de EJA:
conquistas, desafios e estratégias de luta
66
Os relatórios onze ENEJAs revelam a busca do movimento em produzir saberes e
trocar experiências sobre as principais questões que envolvem a área, nos últimos treze anos.
Para a compreensão mais precisa dos ENEJAs, analisei os relatórios dos últimos cinco
anos de evento. Esses relatórios mostram que os fóruns têm-se ocupado em fazer análise da
política educacional de EJA, em associação às iniciativas e suas próprias ações, num contexto
de constante tensão entre Estado e sociedade civil na construção da política pública. Também
aparecem nos relatórios discussões e debates em interface com a economia solidária; com a
educação inclusiva, gênero, raça; com a educação indígena; com a educação à distância; com
a educação do campo; com a formação de professores, currículo etc.
Os relatórios expressam postura reivindicativa por ações mais efetivas do Estado no
cumprimento do direito à educação, mas demonstram também postura propositiva.
preocupação nesses documentos em apontar problemas, ausências do Estado e, a partir disso,
propor caminhos e ações baseadas na prática e nas experiências dos diferentes segmentos que
atuam na EJA.
Nos últimos relatórios foi possível identificar as principais bandeiras de luta do
movimento, porque apresentados de forma recorrente. Também essas bandeiras podem ser
identificadas nos relatórios anteriores. São elas: a luta pela introdução definitiva nos estudos e
nas políticas da concepção ampliada de educação de jovens e adultos que passa a ser assumida
para além da escolarização — como educação continuada, enfatizando o aprender ao longo da
vida; a busca pela garantia do financiamento público à modalidade; a efetivação de uma
genuína política intersetorial; a busca por uma política efetiva de formação inicial e
continuada de professores para atuação na EJA. A luta pela efetivação do direito à educação
de todos independente da idade
23
é apontada, entretanto, como a principal bandeira de luta e
elemento que une e identifica a pluralidade dos fóruns.
A partir das pautas, a organização da luta tem-se concretizado, como revelam os
relatórios, pelo apontamento de diretrizes e linhas de ação para os fóruns nos estados; pela
elaboração de moções e carta pública com reivindicações e proposições, encaminhadas ao
poder público no âmbito nacional. Contudo, os próprios integrantes sinalizam que, por não
realizarem grandes mobilizações no sentido clássico dos movimentos sociais (passeatas,
marchas etc.), não estão conseguindo maior visibilidade e poder de pressão social.
23
A questão do direito à educação de todos como bandeira de luta será aprofundada em item mais à frente neste
estudo.
67
2
2
.
.
4
4
O
O
s
s
e
e
n
n
t
t
i
i
d
d
o
o
d
d
o
o
E
E
N
N
E
E
J
J
A
A
p
p
a
a
r
r
a
a
o
o
m
m
o
o
v
v
i
i
m
m
e
e
n
n
t
t
o
o
d
d
o
o
s
s
f
f
ó
ó
r
r
u
u
n
n
s
s
Como participante dos encontros nacionais desde 2002 e observadora/participante do
X e XI ENEJAs, pus-me a entender a importância do encontro para a mobilização dos fóruns.
O ENEJA apresenta-se como importante espaço para a articulação nacional dos fóruns
estaduais e regionais e, especialmente, como momento privilegiado para se reconhecerem
enquanto movimento que luta pela educação de jovens e adultos. Essa articulação nacional
passou a gerar novas significações para os runs que ampliaram suas pautas e visões
cotidianas restritas às localidades, alargando ações e conhecimentos sobre a realidade
nacional da EJA.
O sentido do ENEJA passa não pela questão de reconhecimento e articulação entre
os fóruns, mas tem também possibilitado a articulação com a sociedade política,
oportunizando ao movimento exercitar sua capacidade propositiva no campo das políticas de
EJA. A presença da SECAD/MEC nos ENEJAs tem sido constante em mesas de discussão,
além de sua participação enquanto financiadora do encontro, assim como a do Ministério da
Justiça, quando se trata de dialogar sobre o público penitenciário como sujeito de direito à
educação; com o Ministério do Desenvolvimento Agrário, quando se trata de aproximar os
sujeitos da EJA das alternativas de geração de trabalho e renda que a economia solidária
oferece.
Além disso, os encontros têm possibilitado aos sujeitos exercitarem princípios
democráticos como o respeito ao pensamento divergente, conforme aponta o próprio
movimento ao definir o ENEJA em seu site:
[...] um espaço em que se exercita a convivência com as diferenças e com
modos de pensar a EJA, produzindo, democraticamente, respostas a questões
candentes que precisam ser tratadas em nível nacional e articuladas em todo
o país, alterando o quadro das políticas, ainda fortemente marcadas, nos
níveis locais, por concepções escolares presas às praticadas nas escolas
regulares para crianças.
Apontado como espaço para práticas democráticas, os encontros anuais têm-se
apresentado como momentos de consolidação da identidade entre os diferentes fóruns, além
de momentos para discussão mais aprofundada de questões da EJA. Os dois últimos
encontros, principalmente, serviram para os fóruns refletirem sua própria essência, seu fazer e
suas práticas. A questão mais discutida nos X e XI ENEJA refere-se à natureza dos fóruns, o
que não ocorreu sem conflito.
68
Segundo o relatório síntese do X ENEJA, este dilema surge pelo papel que os fóruns
vêm desempenhando nos onze anos de luta pelo direito à educação, assim como pelo
reconhecimento desses fóruns, por parte do atual governo, como interlocutores na construção
da política de EJA, como foi abordado. A conquista desse lugar de reconhecimento vem
gerando, segundo os participantes dos ENEJAs, dilemas e conflitos sobre os rumos e postura
política dos fóruns. Essas discussões também evidenciaram o pouco aprofundamento temático
dos fóruns precedendo o encontro nacional, o que tem fragilizado a discussão. A questão não
se esgotou e o que se observa são posicionamentos bastante divergentes sobre a questão.
No XI ENEJA retomou-se a questão, para repensar a atuação dos fóruns de EJA e a
dinâmica de seus encontros nacionais, conquistas e derrotas, com a perspectiva de avaliar
limites e propor estratégias para superá-los. Como fruto das discussões, feitas em grupos de
trabalho, algumas questões emblemáticas foram apontadas. Primeiro, a difusa relação entre o
ENEJA e o MEC; as relações estabelecidas no interior dos fóruns estaduais e regionais e a
relação estabelecida com as administrações públicas. Chegou-se à conclusão que o incômodo
que se estabelece na relação com as instâncias de poder ocorre pela indefinição dos próprios
fóruns quanto ao caráter do movimento e o seu papel nessa relação. Apontou que, em parte,
essa problemática seria minimizada a partir da ressignificação do ENEJA e da maior
politização dos encontros.
Mesmo gastando parte do tempo para se autoavaliarem, os fóruns levantavam
questionamentos quanto às políticas governamentais, seus formatos, condução, além da
postura assumida em relação aos programas implantados, o que deverá ser aprofundado em
momento posterior.
Em virtude de seu próprio crescimento, a dinâmica do encontro não tem possibilitado
o aprofundamento e o avanço dessas questões e outras que são recorrentemente discutidas nos
encontros nacionais, fazendo surgir conflitos e críticas de seus próprios integrantes. O
encontro tem apresentado em vários momentos plenárias esvaziadas, segundo os próprios
participantes, pela falta de politização e rotatividade das delegações.
Eu te confesso, eu acho que virou algo monstruoso que não cabe, que não
tem necessidade. Eu acho que para fazer o ENEJA desse tamanho, tinha que
ser feito uma feira, como se fazia no Nordeste, aquelas grandes feiras da
EJA, tudo mundo vai lá ver, se informa. [...] Eu não vejo nenhuma discussão
aprofundada nos fóruns. O que vira o ENEJA? Uma multidão de pessoas, e
na hora de fazer uma discussão aprofundada é uma... confusão, uma zona... e
sempre os mesmos acabam falando. Eu não acredito mais nesse modelo de
ENEJA. (Entrevistada A, Fórum de EJA Rio de Janeiro).
69
[...] Eu acho que o desenho é frágil, o desenho não sustentação e não vai
nos levar a lugar nenhum, com aquele monte de reunião para aquilo e para
aquilo, aquilo, aquilo... mas a gente o sai do nosso próprio mundinho e
não tem visão estratégica. Nós não temos isso, nós estamos só vendo o nosso
cotidiano, a gente não tem o olhar de cima e acho que dali a gente não
consegue se organizar para nada. E eu fico lamentando muito, porque a
gente conseguiu levar dez anos de encontro e, no entanto, estamos perdendo
uma grande oportunidade. Acho que erros históricos que mais tarde a
gente vai ter que avaliar. (Entrevistado B, Fórum de EJA Rio de Janeiro).
Esta discussão resultou, no último ENEJA, na reestruturação do encontro e na
rearticulação do movimento nacionalmente. Como solução à falta de preparo político e
qualificado dos participantes, constatado pelo próprio movimento nos últimos encontros, os
ENEJAs passarão a ser realizados bienalmente, contando nos intervalos com encontros
regionais (EREJAs). Em relação à articulação entre os fóruns nacionalmente, identificou-se a
falta de uma coordenação para a articulação política nacional e, em decorrência, criou-se uma
coordenação colegiada nacional de fóruns.
Apesar de as discussões nos ENEJAs apontarem para a falta de aprofundamento
político e da qualidade do movimento, ao indagar os entrevistados sobre a importância do
ENEJA, estes afirmam que o encontro representa um momento importante de mobilização e
fortalecimento para o movimento dos fóruns e para a construção de identidade entre eles:
[...] O ENEJA é um espaço para fazer uma aproximação dos fóruns, uma
discussão mais aprofundada, política, pedagógica, discutir o que é a EJA
hoje, onde avançou, onde precisa avançar, para onde é melhor ir a luta, para
onde não é [...] Discutir a própria essência dos fóruns... (Entrevistado A,
Fórum de EJA RJ).
O ENEJA é, pelo menos deveria ser, um momento de síntese, de encontro,
de diálogo, das diferentes práticas, percursos e identidades que a gente tem
construído. E aí nós temos o nosso grande desafio de fazer dialogar as
diferenças, de construir uma pauta política que permita aos fóruns locais ter
como referência a pauta nacional, para construírem a pauta local. [...] Então
eu penso que o ENEJA representa ou deveria continuar representando essa
dinâmica de afirmar o lugar dessa diversidade... (Entrevistado C, Fórum de
EJA Espírito Santo).
O ENEJA é esse esforço de encontro nacional de várias experiências de ser
fóruns nos estados. E eu penso que o ENEJA ainda é um espaço que
alimenta esses fóruns na sua unidade. Reforça as pautas, define um pouco
melhor a nossa relação com o governo federal [...] é um espaço de diálogo
importante para fortalecimento dessa política. E é necessário manter o
ENEJA para manter a unidade dos fóruns. (Entrevistado D, Fórum EJA
Goiás).
70
Essas concepções apontam que o ENEJA é o espaço propício para que os fóruns, na
sua unidade e diferença, se reconheçam enquanto coletivo que luta por uma causa comum e
que, estando articulados, passam a afirmar a EJA como direito, na perspectiva de estabelecer
um movimento nacional pela educação de jovens e adultos, mesmo diante das diferenças.
Nesse sentido, por seus objetivos e produção, o ENEJA apresenta-se como um espaço
participativo-político-formador, no qual sujeitos de distintos espaços institucionais e de
movimentos, integrantes de fóruns estaduais e regionais, buscam debater e refletir a política
de EJA, além de buscarem influir nestas. Tem como prática a articulação política, a produção
de saberes no campo da EJA e, especialmente, tem, no exercício democrático, pela
convivência das diferenças e, em alguns momentos, divergentes formas de pensar essa
modalidade, uma característica marcante.
Segundo a entrevistada A do Fórum RJ, o ENEJA não é a união dos fóruns, mas é o
momento em que os fóruns expõem suas divergências de concepções quanto às políticas e às
práticas de EJA e buscam neste espaço, elementos comuns que possam guiar a luta
nacionalmente. No entanto, muitos dos apontamentos dos ENEJAs não são assumidos como
guias para os estados, o que dificulta uma ação mais coordenada e coesa entre eles.
O ENEJA apresenta-se, também, como espaço de diálogo com as instâncias
ministeriais, fazendo do encontro um momento importante para interlocução direta com o
governo na busca por soluções às questões inerentes à EJA, nacionalmente.
Em síntese, os encontros nacionais expressam um momento de maior diálogo e
proximidade entre os fóruns, mas se revelam, principalmente, como espaço/momento de
disputas, conflitos e tensões entre as diferentes visões políticas e posicionamentos no tocante
à EJA e à condução da luta dos fóruns.
71
2
2
.
.
5
5
O
O
u
u
s
s
o
o
d
d
o
o
P
P
o
o
r
r
t
t
a
a
l
l
e
e
d
d
a
a
r
r
e
e
d
d
e
e
f
f
ó
ó
r
r
u
u
n
n
s
s
(
(
y
y
a
a
h
h
o
o
o
o
g
g
r
r
u
u
p
p
o
o
s
s
)
)
p
p
a
a
r
r
a
a
d
d
i
i
n
n
a
a
m
m
i
i
z
z
a
a
r
r
a
a
a
a
r
r
t
t
i
i
c
c
u
u
l
l
a
a
ç
ç
ã
ã
o
o
e
e
m
m
r
r
e
e
d
d
e
e
O movimento dos fóruns encontrou na criação do portal (www.forumejabrasil.org.br)
e na rede fóruns pelo yahoogrupo maneiras para manter, constante e permanentemente, sua
articulação em rede. A utilização da Internet foi uma das soluções frente às distâncias
geográficas para a realização de encontros mais frequentes, como também caminho para
dinamizar a luta nacionalmente e para difundir experiência e ação.
O portal dos Fóruns de EJA foi criado no âmbito do VII ENEJA, em 2005, a partir da
constatação de que era preciso que os fóruns tivessem um espaço amplo de debates,
socialização, troca e articulação do movimento. O portal é produzido a partir de um software
livre, sendo desenvolvido por estudantes e professores da Universidade de Brasília (UnB) que
participam do Fórum de EJA/DF. Ainda que haja parceria com estudantes e professores da
área de tecnologia da universidade, o portal é administrado de forma coletiva pelos
integrantes dos fóruns de EJA, preferencialmente estudantes de pedagogia que, também em
rede, aprendem no fazer a ter domínio sobre a tecnologia e a construir/se valer de novos
ambientes de aprendizagem.
Este ambiente virtual disponibiliza um acervo multimídia com a publicação de textos,
artigos, teses, dissertações, banners, documentos, relatórios dos encontros, livros, links,
imagens, produções em áudio e audiovisual. Além do caráter informativo, o portal possibilita
a comunicação entre os participantes, fortalecendo uma rede de diálogo, surgindo a
possibilidade de produção de novos conhecimentos acerca das problemáticas da educação de
jovens e adultos e da própria tecnologia. Segundo o próprio portal
(www.forumejabrasil.org.br. Acesso em 17 de março de 2010), essa ferramenta tem como
objetivo “[...] buscar a conexão entre o movimento social pela EJA e as Tecnologias de
Informação e Comunicação (TIC´S), no momento em que se constitui como um ambiente
virtual interativo multimídia”. Este ambiente repleto de novos símbolos, estabelece novas
formas de interação entre os participantes e, consequentemente, uma nova forma de
organização. É uma forma de ampliar contatos e estar, constantemente, conectados.
Para manutenção desse espaço os fóruns têm conseguido apoio da UnB, bem como
conta com o apoio financeiro da SECAD/MEC. A estratégia de busca de recursos financeiros
para garantir infraestrutura permite à articulação dos fóruns maior independência e
72
fortalecimento para a constituição e consolidação em rede. Nesse caso, fazem movimento
semelhante, segundo Gohn (2002), ao dos novos movimentos sociais dos anos 1990, tornando
mais qualificada e organizada a ação que realizam.
A rede fóruns acontece por meio do yahoogrupos. Foi o primeiro meio virtual criado a
fim de ampliar a discussão dos fóruns para além dos espaços do ENEJA. O grupo,
inicialmente, ficava restrito a um número pequeno de participantes, representados pelas
lideranças históricas do movimento. Por essa ferramenta organizam-se, socializam
informações e expõem concepções e posicionamentos em relação à luta que travam em defesa
da EJA. Nesse espaço de discussão, do qual faço parte, pude também identificar como se
estabelecem articulações, discussões e conflitos.
Ao acompanhar as principais discussões no ano de 2009, percebi que a ferramenta
possibilita maior dinamicidade para o coletivo organizar suas ações, apesar da pouca
participação efetiva. O grupo contabilizava 986 integrantes e 2.532 postagens, em 31 de
dezembro de 2009. Na dinâmica estabelecida verifica-se que a participação e a contribuição
dos membros é oscilante. De forma geral, o número de associados que postam novas questões
e respondem às que são lançadas é pouco expressivo, pois em média não chegam a dez os
associados que interagem efetivamente. Muitos integrantes dos fóruns, em conversas
informais, questionam se este espaço de discussão tem efetivamente contribuído para a
articulação do movimento.
Quanto ao conteúdo, identifiquei que as postagens são destinadas a socializar
informações sobre ações que os fóruns fazem nos estados, sobre acontecimentos políticos no
âmbito da EJA, em que explicitam posicionamentos e concepções e estratégias da luta de
âmbito nacional. Apesar da pouca participação dos associados, muitos conflitos giram em
torno da forma de condução e organização dos fóruns, como ocorreu, por exemplo, com a
movimentação do grupo para fechar posicionamento em relação ao polêmico aumento de
idade dos sujeitos para ingresso nos cursos de EJA
24
.
Muitas mensagens são postadas solicitando agilidade nas informações e relatos de
integrantes que tenham representado o coletivo em algum espaço de diálogo com instâncias
do Estado (e que discutirei em momento posterior), como ocorreu em relação à participação
de integrantes do coletivo em eventos preparatórios à VI CONFINTEA, realizada em 2009 no
Brasil; em relação às reuniões do coletivo com a SECAD/MEC e com a CNAEJA. Apesar de
24
Este fato será relatado e aprofundado no próximo capítulo.
73
muitos integrantes de fóruns expressarem incômodo quanto ao repasse de informações sobre
as reuniões citadas, verifica-se que alguns participantes postam relatos desses momentos,
mesmo não o fazendo com a regularidade e a agilidade que alguns reivindicam. Segundo
alguns entrevistados, as reuniões presenciais de cada fórum ainda se configuram como o
ambiente mais utilizado para o repasse de informações.
Constata-se, também, que, em muitos momentos, os participantes fazem mau uso da
lista (como propagandas, correntes de autoajuda etc.), gerando conflitos e evidenciando
desconhecimento quanto aos objetivos do espaço interativo que dispõem para a articulação
política dos fóruns. Númerosas mensagens são postadas alertando quanto aos cuidados
necessários para evitar o uso inapropriado do espaço de discussão e da finalidade de ser o
grupo virtual uma ferramenta para discutir e organizar a luta dos fóruns.
Este ambiente virtual, de forma geral, tem facilitado e agilizado a organização de
encontros mais amplos como, por exemplo, o caso do X ENEJA, inaugurando modos mais
ampliados e coletivos na sua construção, visto que a construção do encontro fica sob a
responsabilidade do fórum anfitrião. Esse novo formato foi fruto do empenho do Fórum
Fluminense, o que não teve continuidade na construção do XI ENEJA, pelo fórum anfitrião, o
que acabou gerando a assunção desse lugar por um membro da lista, que mediou a relação dos
demais fóruns com o Fórum PA.
A rede fóruns, apesar de não ser amplamente utilizada por todos os associados, tem
servido como espaço para articulação da luta para além do ENEJA. Revela que, apesar da
fragilidade dos usos, apresenta-se como mais uma estratégia na tentativa de ampliar e
favorecer a participação de todos na condução do coletivo. As trocas, os conflitos e as
distintas concepções expressam maneiras como os fóruns exercitam práticas e fazeres de sua
organização. Apesar das limitações e problemas, é nesses espaços, talvez menos inibidores,
que os sujeitos expõem discursos, posicionamentos e estabelecem outras possibilidades de
participação.
A partir do acompanhamento do ambiente virtual em associação com o ENEJA foi
possível perceber que os fóruns gastam parte de sua energia tecendo fios integradores para a
manutenção e consolidação desta articulação em rede. Melucci (2001, p. 29) aponta que
“fenômenos coletivos são heterogêneos e fragmentados, que devem destinar muitos dos seus
recursos para gerir a complexidade e a diferenciação que os constitui”. Neste sentido,
identifiquei que o gerenciamento das diferenças entre os runs tem sido possível pela
74
disposição política, solidariedade e pelo comprometimento de sujeitos que, nesses espaços de
participação, militam pela efetivação do direito à EJA.
2
2
.
.
6
6
E
E
n
n
t
t
r
r
e
e
a
a
m
m
i
i
l
l
i
i
t
t
â
â
n
n
c
c
i
i
a
a
e
e
a
a
s
s
o
o
l
l
i
i
d
d
a
a
r
r
i
i
e
e
d
d
a
a
d
d
e
e
Os sujeitos que integram os fóruns são os responsáveis por tecer os múltiplos fios que
compõem a rede complexa de relações estabelecidas. Esses sujeitos encontraram, no espaço
dos fóruns, a forma para praticarem a militância pela EJA.
A militância está intimamente ligada ao envolvimento político e à convicção, que
provoca paixões por uma determinada causa e indignação contra injustiças. Como a
solidariedade, a militância manifesta afetividade e a sensibilidade de olhar e colocar-se no
lugar de outra pessoa, e apesar da ação autônoma dos sujeitos, a luta só é possível pelo
coletivo. (Silva, 2001, in: www.sedes.org.br/Centros/Cepis. Acesso em 28 agosto 2009).
Vinculada ao engajamento por uma causa, a militância também é apontada por Vinadé
e Guareschi (2007, p. 71) como “território de aquisições, crescimento pessoal e profissional”.
Identifico na característica militância que se constrói no espaço dos fóruns, participação e luta
qualificada, para além de um agir movido por uma paixão ou indignação frente à situação de
desigualdade educacional da qual a EJA é resultado.
No caso dos fóruns, percebo que o espírito de militância pela EJA se consolida no
cotidiano da luta, na relação entre sujeitos que se reconhecem, identificam-se na mesma
causa, mas, principalmente, pelo aprendizado político de princípios democráticos, de
convivência em grupo e de questões teóricas relacionadas ao campo da EJA, que se reflete na
atuação profissional de cada militante. Esse aprendizado é resultante da relação interpessoal e
da dinâmica de discussão por meio de temas/questões relacionados à EJA e estabelecida pelos
fóruns como estratégia de organização e luta.
A militância aliada à solidariedade fortalece nos sujeitos originalmente
heterogêneos uma identidade coletiva, que se movem por uma problemática comum. A
solidariedade e a militância, elementos articuladores das diferentes ideologias e concepções,
viabilizam essa identificação, pois esses diversos sujeitos compartilham e legitimam seus
distintos valores políticos e culturais, ideologias e concepções a respeito da EJA, o que os
conduz a se reconhecerem como parte de um mesmo grupo social, como os fóruns. A este
respeito Vinadé e Guareschi (2007, p. 71) destacam que a militância:
75
[...] surge como uma força de resistência que busca potencializar as
subjetividades em torno de objetivos coletivizados, procurando no grupo a
superação da cultura capitalista baseada em valores individuais, permitindo a
cooperação ao invés da competição. O coletivo é almejado na medida em
que os sujeitos percebem que na partilha poderão construir territórios de
cooperação que efetivamente tenham força.
A construção de um ambiente de cooperação — que se viabiliza pela solidariedade e a
militância é permeada por contradições e não esconde as diferenças, tampouco as
dificuldades, muitas vezes, de convivência na articulação dos fóruns.
São constantes os conflitos na condução da luta e na disputa por fazer prevalecer
concepções teóricas de cada fórum. Por trazerem consigo a experiência da entidade de origem
ou convicção políticas próprias, verifica-se, pela atuação dos sujeitos, nos respectivos
segmentos, a busca por lugares e papéis que denotam um determinado prestígio de uns em
relação a outros, mesmo não explicitamente.
Os sujeitos do segmento universidade, por exemplo, possuem papel de destaque e
liderança nas proposições e na articulação política dos fóruns, especialmente com as
instâncias de poder externas ao movimento. As principais lideranças, inclusive, provêem
desse segmento e é nele segmento que identifico com maior intensidade disputas de posição,
principalmente no que tange a concepções de EJA.
Apesar da circularidade do poder, não centralizado, este lugar de destaque do
segmento universidade tem gerado disputas em relação aos demais segmentos que,
continuamente, por seus componentes, procuram ocupar lugares de maior visibilidade no
interior dos fóruns, como tem ocorrido na escolha de representação de cada fórum, na
participação mais ativa nos espaços de discussão. Este cenário, inclusive, tem resultado no
aumento dos sujeitos nos segmentos dos educadores, estudantes e administração pública.
Essas disputas e convívio entre diferentes concepções têm ocorrido por serem os
fóruns abertos a todos que se interessam pela EJA, resultando em militantes oriundos de
diferentes representações/instituições. Mas essa configuração também possibilita uma visão
ampliada da EJA e o constante confronto entre diferentes ideias e posições políticas, não
significando, com isto, que os fóruns se posicionam de acordo com uma frente específica,
nem que anulam qualquer outra, não convergente. Pela negociação, os sujeitos sem perder
a essência do espírito militante — defendem e propõem ações conjuntas.
Essa é uma marca perceptível nos fóruns, especialmente pela forma como se
apresentam nos espaços públicos. Os discursos que articulam e as práticas que realizam criam
76
um “imaginário social” de homogeneidade, camuflando tensões e conflitos de ideias
vivenciadas pelos sujeitos, internamente, na articulação entre os fóruns. O movimento dos
fóruns, apesar da diversidade, divergências e disputas, possui elementos comuns, que
norteiam suas escolhas ideológicas, ação e prática política, criando imagem de unidade ao se
apresentarem nos espaços públicos.
77
3
3
A
A
P
P
A
A
R
R
T
T
I
I
C
C
I
I
P
P
A
A
Ç
Ç
Ã
Ã
O
O
D
D
O
O
S
S
F
F
Ó
Ó
R
R
U
U
N
N
S
S
N
N
A
A
C
C
O
O
N
N
S
S
T
T
R
R
U
U
Ç
Ç
Ã
Ã
O
O
D
D
A
A
P
P
O
O
L
L
Í
Í
T
T
I
I
C
C
A
A
P
P
Ú
Ú
B
B
L
L
I
I
C
C
A
A
D
D
E
E
E
E
J
J
A
A
Ao analisar os documentos e as entrevistas por mim realizadas, foi possível identificar
intensa articulação entre os fóruns e o governo federal. Essa proximidade com a instância
governamental sugere que os fóruns se valem do que reconheço como democracia
participativa, nas negociações que estabelecem em prol do direito à educação para jovens e
adultos.
Para melhor compreender essa perspectiva, assumo as características associadas à
concepção de democracia apresentadas por Oliveira (1991). O autor percebe na democracia
características relacionadas à forma, ao conteúdo e ao método, esta última bastante adequada
em relação ao modelo de sociedade capitalista em que vivemos, e na qual que se pensar a
participação democrática. Ao compreender a democracia como método, reconhece o
estabelecimento de regras por meio do conflito e do reconhecimento de alteridades. As regras
não são inalteráveis e, em essência, não asseguram nada; somente o processo, a possibilidade,
a administração. Os resultados dependem do processo e da capacidade dos sujeitos em
negociar segundo regras estabelecidas.
O método democrático se faz pelo estabelecimento de uma rede de ações pontuais, ao
longo de um processo. O alcance das ações decide-se pelos poderes e contrapoderes que se
formam nas relações sociais. O princípio democrático não supõe uma completa igualdade
entre os sujeitos, mas a ação propicia a possibilidade de anulação das desigualdades no plano
processual.
No âmbito das relações entre governo e sociedade, a complexificação e diversificação
das estruturas sociais e de seus interesses projetam-se na forma de ampliar as áreas de contato
e interpenetração que, sem retirar a tensão entre as duas esferas e a contradição, transforma-se
em trama mais densa e pontualizada. (Oliveira, 1991, p. 82).
Ao se valerem do método democrático, os fóruns buscam a ação recorrente, precisa, ao
longo do processo, para fundamentar as relações que estabelecem com o governo. Assim, pelo
método democrático, os fóruns têm a possibilidade de transformar cada ação pontual em parte
de uma trama de amplas relações sociais. Para Oliveira (1991) o resultado dessa ação pontual
transforma-se em pressuposto de nova ação, requerida pela própria dinâmica do processo da
democracia.
78
Para o exercício desse processo democrático, pressupõe-se a participação. Na
perspectiva política, a participação apresenta-se, como sinaliza Dagnino (2004), uma forma de
dividir o poder entre governo e sociedade, sendo exercitada pela capacidade de deliberação no
interior de novos espaços públicos. No caso dos fóruns, como no de demais atores da
sociedade civil, participar no âmbito político, segundo Moroni (2005) é a forma de
democratizar e publicizar a ação do Estado. Considero que participar é arquitetar junto, é
dividir responsabilidades na construção de um processo. E os fóruns se encaminharam pelo
viés da democracia participativa nos espaços públicos, para se relacionarem com o governo,
em busca de construir políticas públicas de EJA.
A possibilidade de participação direta tornou-se possível a partir da Constituição de
1988, quando a sociedade brasileira passou a constituir um espaço público de conflitos e de
negociação, ampliando o espectro democrático. A esse respeito, Dagnino (2004, p. 97) diz:
[...] a constituição dos espaços públicos de participação representa o saldo
positivo das décadas de luta pela democratização, expresso especialmente —
mas o pela Constituição de 1988, que foi fundamental na
implementação destes espaços de participação da sociedade civil na gestão
da sociedade.
Este cenário revelou que a participação, como inerente à condição democrática,
tornou-se central na sociedade brasileira, especialmente quando esta busca tensionar e forjar a
criação de espaços coletivos nos quais pode disputar com o governo os rumos da política,
contribuindo assim para o aprofundamento das condições democráticas da sociedade. Moroni
(2005) ao estudar a questão, afirma que a democracia moderna requer não apenas controle,
mas participação na formulação da política pública.
No atual momento histórico brasileiro, com a predominância do Estado democrático e
a consequente intensificação da participação na política, a sociedade civil, segundo Oliveira
(2004), deixa de lutar contra o Estado (no sentido estrito) e passa a travar uma “guerra de
posição” no “labirinto político”, mesmo não sendo oposição ao governo.
Na concepção de Gramsci, “guerra de posição” é assumida como estratégia de luta
utilizada pela sociedade civil, em democracias modernas, em substituição à “guerra de
movimento”, estratégia utilizada pela sociedade civil no enfrentamento ou no ataque frontal
em Estados absolutistas. Coutinho (1992, p. 89) afirma que a “guerra de posição” inicia-se no
âmbito da sociedade civil e “visa à conquista de espaço e posição da direção político-
ideológica”.
79
Oliveira (2004), por sua vez, sinaliza que na “guerra de posição” as organizações da
sociedade civil precisam agir de modo a obrigar o governo a tomar certas posições e a decidir
por certas políticas, o que reconheço nas tentativas de os fóruns influírem, por meio da
ocupação de espaço e convencimento de ideias, junto à instância governamental, na política
de EJA.
Isto é possível pela crescente socialização da participação política, em que novos
atores coletivos, como os fóruns, conquistam relevância no espaço público brasileiro
25
. Essa
relevância pode ser conferida aos fóruns, pois sua participação no espaço público, na luta pela
efetivação do direito à educação de jovens e adultos, iniciada na década de 1990, alcançou
patamares que impressionam. Do lugar de invisibilidade no governo FHC, os fóruns passaram
a ser reconhecidos, a partir do governo Lula, como interlocutores diretos da construção de
políticas públicas de EJA.
A ascensão do Partido dos Trabalhadores ao poder, cujas propostas incluíam a
educação para todos; a aposta que os fóruns creditavam nesse governo e a persistente
negociação que passaram a estabelecer fizeram, em princípio, a aproximação indispensável
para que o governo reconhecesse a instância dos fóruns como legítima representação dos
interesses da EJA. Assim sendo, passou a ser acatada a demanda dos fóruns por sua
representação em reuniões para diálogo e discussão da pauta política, como também para que
viessem a ocupar espaços formais de diálogo, o que aconteceu pela participação no Conselho
Nacional de Alfabetização (CNA), quando o movimento ganha escuta e espaço para expor
ideias e proposições, interferindo nas políticas de EJA.
Esta conquista de espaço começa a ser forjada pelos fóruns em 2003, no momento em
que a alfabetização de jovens e adultos deixa de ser concebida e gestada no âmbito da
Secretaria de Educação Infantil e Ensino Fundamental (SEIF), onde ocupava uma
coordenadoria, passando a ocupar um lugar de maior destaque na agenda política, ao adquirir
status de Secretaria Extraordinária de Erradicação do Analfabetismo (SEEA), por obra do
então Ministro da Educação Cristovam Buarque.
Segundo a entrevistada B, do Fórum EJA/RJ, os primeiros passos para o
estabelecimento do diálogo dos fóruns com o governo instalado acontecem quando a recém
25
Costa (2002, p. 26)
sinaliza que o espaço público, na perspectiva republicana, ganha elevada importância, pois
ele se transforma na arena de auto-organização da sociedade como comunidade política de iguais. Ainda aponta
que a sociedade civil deve se organizar para recuperar novamente o Estado.
80
criada SEEA lança o Programa Brasil Alfabetizado
26
. O Fórum EJA/RJ, ao identificar o
momento politicamente favorável à EJA, estrategicamente, com o apoio e a intermediação da
assessoria do Deputado Federal Chico Alencar
27
, consegue garantir a participação do
Secretário João Luiz Homem de Carvalho, à frente da SEEA, na primeira reunião do ano,
ocorrida no dia 17 de março de 2003.
A pressão exercida pelos participantes do rum EJA/RJ e de alguns poucos
representantes de outros fóruns existentes, também presentes à reunião no Rio de Janeiro,
junto ao titular da SEEA, nesta ocasião, resultou em dois acordos firmados com o Secretário,
iniciando a aproximação política dos fóruns ao governo federal: a garantia de indicação de um
representante para compor o CNA e o apoio financeiro do MEC à realização do V ENEJA
(com continuidade posteriormente assegurada aos demais Encontros Nacionais).
O assento no CNA formaliza-se quando o Secretário encaminha carta-convite,
expedida em 26 de maio de 2003, para a participação dos fóruns no Conselho, por meio de um
representante, o que estreita a relação fóruns-governo. A carta traça um breve panorama da
situação do analfabetismo no Brasil, apontando a pertinência do Programa Brasil Alfabetizado
e, neste momento, manifesta a importância de o Ministério ter os fóruns como parceiros,
como ilustra o trecho abaixo:
[...] Considerando que o conhecimento é, cada vez mais, determinante do
desenvolvimento e instrumento fundamental para o acesso a melhores
empregos, salários e qualidade de vida, o esforço de erradicação do
analfabetismo abrangerá todo o território nacional, sendo que sua primeira
etapa, em 2003, se concentrará nas regiões onde estão os mais elevados
percentuais de analfabetismo. Mais do que ensinar jovens e adultos a ler e
escrever, o Programa visa ao resgate da cidadania e à inserção social destes
milhões de brasileiros hoje marginalizados. Para isso, o Programa deverá
desenvolver ações que promovam a continuidade do processo de
aprendizado, especialmente por meio do incentivo ao hábito da leitura
previsto nas ações de Leituração.
Este esforço depende diretamente da participação ativa de toda a sociedade.
Visando ao estabelecimento de um estreito canal de diálogo e, para garantir a
transparência e agilidade do Programa Brasil Alfabetizado, o Ministro da
Educação, Cristovam Buarque, nomeará o Conselho Nacional de
Alfabetização de caráter consultivo, e com representação de diversos setores
comprometidos com a educação brasileira. Sendo assim, vimos solicitar que
esta coordenação promova conversações com as entidades que compõem os
26
O Programa Brasil Alfabetizado é realizado pelo governo federal desde 2003 e possui como objetivo
alfabetizar jovens, adultos e idosos. O Programa é desenvolvido em todo o país, com prioridade de atendimento
a municípios com taxa de analfabetismo igual ou superior a 25%.
27
À época, o Deputado Federal Chico Alencar era filiado ao PT, migrando posteriormente para o Partido
Socialismo e Liberdade (PSOL).
81
Fóruns de EJA para que sejam indicados um representante e um suplente
deste setor para compor o referido Conselho [...]
A iniciativa dos runs, ao tensionar e pautar o poder público na garantia de sua
participação em espaço formal de diálogo, demonstra que, ao exercitarem o princípio
democrático, buscavam não ampliar a participação do movimento na arena política, como
também a representação na democracia formal, passando a integrar o conjunto de
representantes da sociedade que praticam o direito de participação política e a co-gestão das
políticas públicas, nos espaços formais.
Teixeira (2008, in: www.diplomatique.uol.com.br/artigo. Acesso em 28 junho de 2010)
sinaliza que a ideia principal com a redemocratização era a garantia de participação efetiva de
setores organizados no rumo das políticas. A participação buscava radicalizar a democracia.
Segundo a autora:
Havia uma generosa aposta em jogo: a de que, junto com os representantes
do governo, a inclusão de atores da sociedade civil na definição das políticas
públicas levaria a maior equidade e justiça social. Por meio de tais
mecanismos acreditava-se então –, as políticas públicas se tornariam
universais de fato, garantindo maior cobertura e qualidade nos serviços
prestados à população, diminuindo as enormes desigualdades sociais.
Essa aposta de socialização do poder resultou numa proliferação de espaços
participativos consolidados nas diferentes esferas de governo e em relação às diferentes
políticas públicas.
O Conselho Nacional de Alfabetização compõe um desses espaços. Criado com o
primeiro governo civil em 1985, por falta de convocação, na continuidade, permanece
desativado, voltando a operar ao final da década de 1980, no governo Fernando Collor de
Melo, com a função de acompanhar o Programa Nacional de Alfabetização e Cidadania
(PNAC). Como o PNAC, natimorto, não foi adiante. No período FHC, o Conselho, assim
como a EJA, não eram prioridade, e somente no Governo Lula, pelo Decreto nº 4.834, de 8 de
setembro de 2003, é reativado, com o objetivo de assessorar o MEC no Programa Brasil
Alfabetizado.
Por ser um órgão consultivo, identificam-se algumas limitações na participação
política deste Conselho, pois não garantias de que encaminhamentos e propostas
deliberados sejam postos em prática. Moroni (2005) sinaliza que conselhos com este formato
tornam-se apenas espaços de interlocução entre governo e representantes da sociedade, mas,
82
no entanto, possibilitam alguma forma de controle social, sobretudo pelo acesso à informação
das ações desenvolvidas pela instância governamental.
Por meio das atas deste Conselho, bem como pelos relatos disponíveis no Portal dos
fóruns, elaborados pelos representantes dos fóruns de EJA desde 2003
28
, identificam-se, na
dinâmica de atuação dos fóruns, ganhos e possibilidades de interferência. Primeiro, como
Moroni indica, observa-se o acesso à informação, pois a pauta intensa de informes,
principalmente relativos aos recursos orçamentários dos programas na área de EJA põe os
membros em sintonia com os gastos públicos e a tomada de decisões. Outra possibilidade
positiva foi o Conselho tornar-se espaço privilegiado para discutir, acompanhar e, até mesmo,
interferir nas políticas públicas de EJA, como pode ser exemplificado pela discussão do
formato do Programa Brasil Alfabetizado.
Identifica-se, em ata da quarta sessão ordinária da Comissão, ocorrida em 03 de março
de 2004, por exemplo, uma participação propositiva da representação dos fóruns. Esta
representação não só aproveitou o momento para expor sua concepção de Educação de Jovens
e Adultos, invocando a Declaração de Hamburgo como fundamento como também manifestou
desacordo com o formato do Programa, restrito à alfabetização:
[...] foi dada a palavra à Professora Jane Paiva (representante dos fóruns de
EJA), que se manifestou em concordância com o Professor Moacir Gadotti e
acrescentou a questão da visibilidade na política de Educação de Jovens e
Adultos e da premissa básica de resgate do direito à Educação Fundamental
que é concedido a todos os cidadãos brasileiros, independente da idade, pela
Constituição Federal. Destacou os dois elementos citados anteriormente pelo
Presidente referentes à alfabetização e à educação continuada dispostos
numa agenda civilizatória e propôs que estes temas fossem tratados
conforme o que preceitua a Declaração de Hamburgo, que pensou a
educação de jovens e adultos na vertente da escolarização e do direito de
participar do sistema que coloca os indivíduos no mundo letrado. Além
disso, que não se trabalhasse propriamente com uma agenda civilizatória,
mas com o processo de educação continuada que abrange todas as
possibilidades do "aprender por toda a vida" (Declaração de Hamburgo) e
que dizem respeito a todos os homens e não apenas aos homens que não se
escolarizaram na época própria. [...] manifestou preocupações, ainda, com
relação à concepção inicial do Programa Brasil Alfabetizado e a sua
característica de centralização que mantinha o MEC como o grande condutor
da política em oposição à prática, na qual os municípios desempenham, ou
deveriam desempenhar, um efetivo papel de articulação das políticas de
alfabetização. Neste sentido, percebe-se a falta de suporte aos municípios
[...].
28
No portal dos fóruns, site www.forumeja.org.br há relatos de 2003 até 2009, mas não de todos os encontros.
83
As intervenções da representação dos runs nas reuniões do Conselho a respeito do
Programa, apesar de esta não ter sido a única interlocutora contestando o modelo, resultou
mais tarde na reestruturação, por exemplo, da participação majoritária de estados e municípios
no conveniamento ao programa, priorizando instâncias públicas e não mais organizações não
governamentais (ONGs) que trabalhavam com alfabetização, mudança especialmente
acionada pelo papel da dia em denunciar ONGs fantasmas e ações inexistentes, em nome
do Programa.
Após ampla discussão nas reuniões da Comissão, algumas mudanças foram realizadas
no Programa Brasil Alfabetizado, concretizadas por meio de resoluções, evidenciando poder
de influência do Conselho e, neste caso, dos fóruns, na gestão da política. A esse respeito
Machado (2009b, p. 5) afirma que:
[...] os resultados mais concretos que se evidenciam dessas discussões da
CNAEJA estão expressos em resoluções. Após o debate com os membros da
comissão, as propostas de resoluções, principalmente no caso do Programa
Brasil Alfabetizado, que representavam mais de 90% dos recursos
disponibilizados pelo MEC, através da SECAD/DPEJA, sofriam as
alterações acordadas e eram publicadas.
Pode-se afirmar que os fóruns, ao utilizarem como estratégia a ocupação de instâncias
de participação como o CNA, estão, implicitamente, questionando a eficácia da democracia
representativa, que a representação político-partidária apresenta-se de forma insuficiente,
pois não atende todos os segmentos, interesses e demandas da população, como no caso da
efetivação do direito à educação de todos independente da idade. A utilização de mecanismos
participativos e a participação nos processos de discussão das políticas de EJA contribuem,
segundo Moroni (2005), para que estas políticas deixem de ser apenas políticas
governamentais para se tornarem políticas públicas, elaboradas conjuntamente pelo governo e
pela sociedade civil.
Outro momento que exemplifica a participação propositiva dos fóruns foi durante a
discussão do papel do CNA. A representação dos fóruns reiterou em diversas reuniões a ideia
de indissociação entre a política de alfabetização e educação de jovens e adultos que, aliada a
posições similares de outros membros do Conselho, levou a instância ministerial a ampliar o
papel e as atribuições do CNA
29
. Este órgão passou, então, a articular e a discutir as políticas
da área de alfabetização e educação de jovens e adultos (em sentido amplo, nos termos do
84
acordo internacional V CONFINTEA), como prevê o decreto nº. 5.475, de 22 de junho de
2005:
Art. 2. Fica instituída a Comissão Nacional de Alfabetização e Educação de
Jovens e Adultos, órgão colegiado de caráter consultivo, com o objetivo de
assessorar o Ministério da Educação na formulação e implementação das
políticas nacionais e na execução das ações de alfabetização e de educação
de jovens e adultos.
A ampliação da concepção deste órgão evidencia que os fóruns aproveitam o espaço
para disputar concepções de EJA e exercer poder de influência sobre os rumos das questões
tratadas. Neste sentido, demonstram que sua estratégia não busca publicizar bandeiras de
luta, mas discussão qualificada e propositiva sobre a EJA.
Esta postura também pode ser observada na discussão sobre a concepção da SEEA no
âmbito deste Conselho. Os fóruns também contribuíram na construção de uma nova
concepção para esta Secretaria, ao expor que a educação de jovens e adultos não se restringia
à alfabetização e que o movimento ancorava-se na perspectiva de que a EJA, na atualidade,
assumia a perspectiva da educação continuada, do aprender ao longo da vida. Em 2004, a
Secretaria Extraordinária de Erradicação do Analfabetismo transformou-se em Secretaria de
Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade (SECAD)
30
, com uma mudança conceitual
que passou a atender aos anseios do movimento dos fóruns.
A ação reconfigurada desta Secretaria aprofundou a relação entre governo e sociedade
na promoção de uma política inclusiva para os sujeitos que não tiveram acesso à educação. A
SECAD estabeleceu maior articulação com o movimento dos fóruns e, também, com demais
instâncias governamentais e da sociedade civil atuantes em EJA, especialmente pela
constituição do Departamento de Políticas de Educação de Jovens e Adultos (DPEJA).
Ainda assim, as concepções e ações desse Departamento não correspondiam às
argumentações dos fóruns, por não conceberem a imbricação do processo de alfabetização na
educação de jovens e adultos. Constata-se que a política avança em passos lentos, pois apesar
29Além da expansão do alcance, também o organismo passou de Conselho à Comissão, cujo título expressa o
novo alcance, em consonância com o disposto na Declaração de Hamburgo: Comissão Nacional de Educação
Continuada, Alfabetização e Diversidade.
30
Essa mudança, que se seguiu à primeira quando da saída do Ministro Cristovam Buarque e assunção do
Ministro Tarso Genro, veio associada a uma crise no governo Lula, derivada da denúncia do mensalão do PT. O
recém nomeado Ministro foi novamente deslocado para assumir a presidência do Partido e tentar resgatar a
transparência e credibilidade, postas à prova sob o bombardeio da mídia e dos denunciantes, todos também
envolvidos. Para que o MEC não sofresse mais uma ruptura desastrosa um terceiro ministro em dois anos —,
uma negociação garantiu a indicação de um assessor/secretário executivo como Ministro (Fernando Haddad) e a
manutenção das equipes.
85
do diálogo do governo com a CNAEJA e fóruns, limitações no tocante a concepções de EJA
permanecem, pois a SECAD ainda manteve a alfabetização como carro chefe de sua política
de EJA.
No entanto, a DPEJA aumenta o diálogo com os fóruns, principalmente quando das
negociações que culminam com o convite da SECAD aos fóruns para responder pela
coordenação pedagógica do Departamento. Por indicação política, o titular do DPEJA passou
a ser um integrante do movimento, o que ainda mais estreitou os laços para a consecução da
política de EJA e da participação dos fóruns. A educação de jovens e adultos ganhou atenção
especial, possibilitando ações mais focais e específicas para atender esta modalidade. As
políticas implementadas pela SECAD, principalmente pelo Programa Brasil Alfabetizado,
mudaram de perspectiva, passando a atender algumas das reivindicações dos fóruns desde a
criação do Programa. Assim, não se limitaram à transferência de recursos às instituições
alfabetizadoras, embora continuassem a ter no apoio financeiro uma importante ferramenta de
ampliação da capacidade nacional de alfabetizar jovens e adultos; também ampliaram o tempo
de alfabetização de seis meses para oito meses.
A entrevistada D, do rum Goiano, esclarece que este cenário é fruto do poder de
pressão dos fóruns, o que possibilitou a criação de mais um espaço de diálogo, com a
realização de reuniões cnicas regulares entre a DPEJA/SECAD/MEC e representantes dos
fóruns estaduais (aspecto que será tratado mais à frente):
[...] A decisão de provocar reuniões com representantes de fóruns foi uma
decisão política dentro do MEC, não foi uma decisão desvairada. Foi uma
decisão política de constituir um espaço em que os fóruns pudessem ser
ouvidos e essa era uma reivindicação histórica do movimento: de que o
governo não ouvia, de que os projetos eram encaminhados… mas resolveu o
problema? Eu diria que não resolveu o problema, mas a relação que se
estabelece hoje entre os fóruns de EJA do Brasil e o governo federal é
completamente diferente. Então, nesse aspecto, eu não tenho nenhuma
dúvida em dizer: mudou. Para mim mudou essa relação e mudou [...] mudou
porque o movimento já tinha uma força para pressionar. Pressionou a ponto
de, na virada da extinção da Secretaria (Extraordinária) de Erradicação do
Analfabetismo, na criação da SECAD, se percebesse a importância desse
articulador, desse movimento que estava organizado nacionalmente. Então
esse é um aspecto que acho fundamental.
Essa nova situação gerou para os fóruns a possibilidade de pautar na agenda política
do Ministério bandeiras de luta acumuladas durante 12 anos de mobilização pela EJA e maior
escuta quanto às políticas formuladas. Por outro lado, fez emergir um dilema: estariam as
pautas do movimento dos fóruns sendo sequestradas pelo governo? Para Oliveira (2004, p.
86
71), essas contradições e ambiguidades ocorrem porque “indo ao governo, o PT leva com ele
a sociedade civil e suas agendas, as pautas políticas construídas nos últimos anos e por isso, o
governo é essa ambiguidade, ele é governo e oposição ao mesmo tempo”.
A configuração renovada gera tensões no interior dos próprios fóruns, mas a
entrevistada D, do Fórum Goiano, não como problema a participação de integrantes de
fóruns no governo, pois reflete como importante e relevante a pauta do movimento, construída
ao longo dos anos, estar na agenda política governamental.
[...] No meu entendimento, faço parte de um movimento e vou levar para
as discussões que o movimento está fazendo. E essa foi a tentativa de
trabalho que eu colocava o tempo todo. Quando estive na SECAD eram as
agendas que nós desenhamos esses anos todos nos fóruns de EJA, com todos
os conflitos internos que isso pode trazer para nós, mas para mim é essa a
perspectiva.
Em concordância, a entrevistada B, do Fórum do Rio de Janeiro aponta:
[...] eu não vejo outro caminho de aproximação com a sociedade política
senão via governo que está colocado. Porque... o que é o Estado? O Estado é
uma abstração se a gente não chegar a dar corporificação a ele pelas suas
instituições. E as instituições que compõem o Estado são ocupadas por um
governo. Eu não tenho outro jeito de ocupar esse lugar e construir um Estado
se não for dialogando com quem está nos aparelhos do Estado, nas
instituições do Estado, nos cargos de gestão do Estado. Então, eu não tenho
nenhum problema quanto a isso. Eu nunca deixei de dizer, por exemplo, o
que eu pensava do ENCCEJA junto com o governo, dizendo para ele,
participando de reunião. Eu nunca me furtei de ir: Não vou porque eu não
concordo. Não, eu vou para dizer que eu não concordo e por que eu não
concordo.
Oliveira (2004), entretanto, sinaliza ser imprescindível a manutenção de uma clara
fronteira entre sociedade civil e governo. Aponta que o conteúdo e a pauta da sociedade civil
não devem ser confundidos, porque, de outra forma, significaria retirar da sociedade civil a
capacidade de pautar o movimento do adversário. Para o autor, qualquer governo é adversário.
No caso dos fóruns, o governo não deixa de ser adversário, mas a perspectiva de ser
este adversário torna-se peculiar. Identifica-se que, diferentemente da década de 1990, no
período FHC, o principal adversário deixa de ser o governo e passa ser o não direito à
educação. Isto, porque há entendimento entre o atual governo e fóruns de que há uma situação
de desigualdade, propiciada pelo não cumprimento de um direito, sendo papel e dever do
Estado assegurar e promover ações de EJA que o efetivem. Verifica-se, por meio de atas da
CNAEJA, documentos do ENEJA etc., que governo e fóruns passaram a partilhar as mesmas
87
concepções de EJA. A divergência ocorre quando se trata de estratégias e de táticas, por
vezes escolhidas para implementação e condução das políticas que visem a efetivar o
direito à EJA. Neste sentido, ao disputarem a forma de condução das políticas, pode-se
afirmar que fóruns e governo tornam-se adversários. Ou seja, a questão do método no modo
como se constrói a vivência democrática é que está, mais uma vez, em jogo.
A proximidade com o governo trouxe ganhos à luta dos fóruns, especialmente pelo
permanente diálogo. Contudo, essa proximidade fez emergir uma importante questão para o
movimento: a sua autonomia.
A autonomia também está intimamente relacionada ao princípio democrático. Segundo
o dicionário Michaelis, significa autodeterminação política. Tatagiba e Teixeira (2006)
indicam que a autonomia apresenta-se como um valor e, por isso, sinalizam para os limites
que precisam existir na relação entre os movimentos e o sistema político, pois ao serem
“desobedecidos” os limites, pode resultar em instrumentalização e cooptação do movimento.
A questão da cooptação está ligada à desarticulação do movimento, o que para os
entrevistados não se evidencia no caso dos runs, pois apesar da proximidade com o
governo, não deixaram de fazer críticas e expor divergências e concepções próprias. A questão
relaciona-se mais à dependência, sobretudo financeira, que os fóruns criaram com o MEC,
principalmente para a realização dos encontros nacionais. A esse respeito, a entrevistada A, do
Fórum EJA/RJ, diz:
[...] Minha crítica não é em relação ao MEC, mas ao nosso movimento. Ele
está no conselho (CNAEJA), tem diálogo com o MEC, mas ele o pode
depender do governo. Tanto que alguns fóruns quando se reúnem, por
exemplo, falam: “vamos fazer o ENEJA [...] se o MEC bancar; se o
MEC coordenar isso”. Quando a gente fez o primeiro ENEJA foi uma
loucura. A gente pediu dinheiro a todo mundo, pediu favor para todo
mundo... e saiu [..], mas cada vez mais se tem preguiça. “É vamos ver se o
MEC paga tudo”. O MEC vem aportando dinheiro aos fóruns cada vez mais,
pelos ENEJAs.
A entrevistada D, do Fórum Goiano, por sua vez, afirma:
[...] as reuniões com os coordenadores estaduais de EJA, a briga com o
Brasil Alfabetizado para passar a estados e municípios e não ficar com as
ONGs... essas coisas todas que foram encaminhadas dentro do MEC, eram a
pauta dos fóruns também. Agora, você consegue fazer tudo? A política não
avança com o nosso desejo, mas com as condições concretas, reais que estão
soldadas aí, no contexto em que a gente está produzindo as políticas. [...]
essa relação que se estabeleceu em 2004 num outro patamar, de quem vai
ouvir, necessariamente, não vai implementar tudo que ouviu, mas vai dar a
88
cara a tapa para ser avaliado, para ser criticado… e eu penso que essa relação
que está posta se estabelece até hoje. Diferente de algumas pessoas, que
avaliam uma imposição do MEC sobre o movimento, eu acho que essa é
uma avaliação equivocada. O movimento o tempo todo teve sua autonomia
para definir a pauta do ENEJA. Agora, é óbvio que, a partir de 2004, o
governo passa a financiar quase que integralmente a realização do evento, o
governo não vai ter uma mesa para dizer o que está fazendo? Ele até precisa
dizer para ter o rebate de quem está na ponta e vendo que a coisa não está
funcionando assim. Então, eu acho que existe uma certa confusão entre
como é que nós vamos negociar agora. Como é que nós vamos dialogar
agora? Eu não tenho dúvida que a gente não tem que ser capitaneado pelo
MEC, não tem que ficar financiado pelo MEC, não depender
economicamente do MEC. Por outro lado, eu também não tenho dúvida de
que o dinheiro público tem que garantir espaços públicos de debate da EJA,
como o caso do ENEJA, o seminário de formação de educadores, todos os
editais que estão saindo e que as universidades estão acessando. Foi tudo
pelo que nós brigamos. [...] Então, eu não tenho esse conflito e acho que ele
precisa ser enfrentado. Não é pelo fato de você ter um acordo e uma
construção com o MEC, de que ele é parceiro no ENEJA, que o movimento
perdeu o seu sentido, a sua significação.
Tatagiba e Teixeira (2006) apontam que relações entre governo e sociedade são
marcadas por uma assimetria de recursos (organizacionais, informacionais, financeiros) que
limitam em muito as possibilidades de autonomia. No entanto, a questão que se coloca, no
caso dos fóruns, não é quanto ao uso dos recursos públicos, mas na possibilidade de não
articulação entre os fóruns pela falta de financiamento governamental, como apontaram as
entrevistadas.
A autonomia pode existir mesmo com o estabelecimento de relações com
representantes governamentais, já que esses vínculos são fundamentais. Não há nenhum
problema em a sociedade civil aliar-se ao governo para encaminhar suas lutas e demandas. O
problema é se esta relação está servindo mais ao governo do que aos movimentos. (Tatagiba,
Teixeira, 2006).
Como destacado nas entrevistas, a relação com o governo possibilitou ao movimento
dos fóruns: a concretização de algumas pautas por meio das ações executadas pelo governo;
diálogo e escuta - o que passou a acontecer sistematicamente, inclusive, com a presença do
governo nos encontros nacionais. Ainda: permitiu aos fóruns avaliar a política diretamente
com os representantes governamentais e a consolidar a mobilização nacional. Os runs não
deixaram de conduzir e construir suas próprias pautas de discussão, mostrando, sobretudo,
capacidade de defender seus interesses e a pautar na agenda política do governo a discussão
sobre as questões de EJA que consideram relevantes para a efetivação do direito à educação.
89
Gohn (2005) afirma que sujeitos ou grupos são autônomos quando buscam o diálogo
para uma aprendizagem que leve ao entendimento, construção de consensos, e não para
apropriar-se/apoderar-se do saber do outro, aniquilando-o. Observei na relação entre runs e
governo, que tem sido pautada pelo diálogo, esse processo de autonomização sem, contudo,
negar o conflito, necessário à obtenção de acordos e consensos. No entanto, compreendo que
um elemento que abala a autonomia dos runs fica restrito à condição financeira, pois, na
ausência de recursos governamentais, não se consegue organizar os encontros nacionais
(como aconteceu com os primeiros ENEJAs) e garantir articulação política, de forma
contínua, entre os representantes de fóruns. No atual momento, essa articulação presencial
acontece quando o governo convoca e financia as reuniões técnicas com o movimento.
3
3
.
.
1
1
A
A
c
c
o
o
n
n
q
q
u
u
i
i
s
s
t
t
a
a
d
d
e
e
m
m
a
a
i
i
s
s
u
u
m
m
e
e
s
s
p
p
a
a
ç
ç
o
o
d
d
e
e
i
i
n
n
t
t
e
e
r
r
l
l
o
o
c
c
u
u
ç
ç
ã
ã
o
o
:
:
a
a
s
s
r
r
e
e
u
u
n
n
i
i
õ
õ
e
e
s
s
t
t
é
é
c
c
n
n
i
i
c
c
a
a
s
s
d
d
e
e
r
r
e
e
p
p
r
r
e
e
s
s
e
e
n
n
t
t
a
a
n
n
t
t
e
e
s
s
d
d
e
e
f
f
ó
ó
r
r
u
u
n
n
s
s
c
c
o
o
m
m
a
a
S
S
E
E
C
C
A
A
D
D
/
/
M
M
E
E
C
C
A proximidade dos fóruns com o governo resultou na criação, pela DPEJA/SECAD, de
mais um espaço público de diálogo para a discussão das políticas de EJA, que se materializa
nas reuniões semestrais com representantes de fóruns de todos os estados. A constituição
desse espaço representa mais uma forma de socializar e descentralizar a política de EJA,
tornando-a mais participativa e, portanto, mais democrática.
A criação de mais este espaço de diálogo possibilitou maior participação; no entanto,
que se avaliar se o espaço constituiu-se para possibilitar uma “escuta forte”, como ocorre com
outros semelhantes, em que participação e diálogo entre sociedade civil e governo, como
sinaliza Teixeira (2008).
Por meio dos registros dessas reuniões e, ao acompanhar uma delas, ocorrida nos dias
16 e 17 de abril de 2009, pude identificar como tônica da participação a prestação de contas e
consulta por parte do governo e o tensionamento e convencimento de ideias pelos fóruns.
Observei que havia uma pauta de discussão intensa acordada, mas a pauta da SECAD,
prestando contas do que vem sendo feito pelo governo federal era muito longa. Na sequência
da apresentação, o espaço foi aberto ao debate das principais questões, quando então os
representantes de fóruns buscaram relatar a forma como ações e programas transcorriam nos
estados, apontando problemas e dificuldades. Pude, assim, verificar que os fóruns assumiam,
nesses momentos, o papel de controle social da política de EJA.
A instância governamental parecia reconhecer como sendo dos fóruns esta função, e
90
demonstrava assumi-los como interlocutores e consultores privilegiados na formulação e
gestão das ações para a EJA. Nessas reuniões, os representantes de cada fórum estadual
explicitavam posicionamentos e concepções sobre programas e ações da Secretaria, como
ocorria o desenvolvimentodo Programa Brasil Alfabetizado, do Exame Nacional de
Certificação de Competências de Jovens e Adultos (ENCCEJA), de questões envolvendo o
aumento de idade para ingresso nos cursos de EJA e da participação do Brasil na VI
CONFINTEA. Nessas ocasiões, buscavam influir e interferir no andamento das ações
desenvolvidas, pelo convencimento de ideias.
Essas reuniões têm-se apresentado como espaços de aprendizagem tanto para a instância
governamental quanto para os fóruns, pois apesar de terem como objetivo a construção e
gestão coletiva da política de EJA, interesses e concepções em disputa, mesmo não sendo
opostas, requerem esforço para a confluência de entendimentos comuns e consensuais.
Isto ocorre, sobretudo, pela dificuldade de diálogo, com a de 27 representantes,
principalmente, por conta dos diferentes posicionamentos externados. Por haver rotatividade
nas representações, tanto a prática política, quanto o acúmulo de conhecimentos/informações
se faz e refaz continuadamente, definindo o ritmo e os avanços do diálogo. Ao compreender
esse espaço, pode-se afirmar a heterogeneidade de concepções dos fóruns, mas também a falta
de articulação qualificada entre os representantes de fóruns em momentos anteriores às
reuniões com a SECAD, o que ocorre apenas timidamente pela rede runs, no yahoogrupos.
Essa questão me conduz a pensar o papel da representação de fóruns nesses espaços de
diálogo.
Toda participação desse tipo não acontece sem mecanismos de representação. Segundo
o dicionário Michaelis (site www2.uol.com.br/michaelis. Acesso em 26 de julho de 2010)
representação significa ato pelo qual alguém é legalmente autorizado a agir em nome de
outrem. Neste sentido, a representação está ligada à autorização, legitimando o escolhido a
falar em nome de um coletivo.
A representação de fóruns no espaço da CNAEJA, por exemplo, se faz por consulta; não
há eleição. No caso do representante de cada fórum estadual, os critérios são diversos,
dependendo da natureza política dos fóruns, da compreensão dos sentidos de participação, das
formas de organização da luta e lugar de seus membros. Esses representantes assumem papéis
distintos dentro e fora do movimento de fóruns.
Para a entrevistada C, do Fórum do Espírito Santo, o papel dos representantes locais
91
está em fazer a mediação com a articulação nacional, mas sinaliza que o movimento está
vivendo um momento difícil e precisa avançar no que tange aos interesses pessoais em jogo,
principalmente. Aponta que, ser representante de fóruns na CNAEJA é muito difícil, pois é
preciso falar em nome do movimento e para isso necessita de tempo para fazer a circulação
das informações para o coletivo.
A entrevistada D, do Fórum Goiano, por sua vez, entende que o representante de fórum
na CNAEJA precisa levar a posição do coletivo, e não de sua pessoa e, para isso, precisa
executar algumas ações, como expressa abaixo:
[...] O
representante dos fóruns na CNAEJA tem que ter uma ida e
vinda. Ele tem que saber qual é a pauta que ele tem que discutir com
os fóruns ou pelo menos remeter-se aos relatórios do Eneja para saber
no que nos posicionamos em relação àquilo, para ele ter segurança do
que ele está falando em nome do coletivo.
Fica explícito que a tensão quanto ao lugar desse representante de fóruns se coloca no
fato de se ele consegue, ou não, dar voz aos interesses do coletivo. Sobre essa questão,
Scherer-Warren (1993), reconhece que a representação não está isenta dessa contradição.
Contudo, enfatiza que os mediadores possuem grande importância para organizar e articular o
grupo e a manutenção de posturas contraditórias pode contribuir, em alguns casos, para o fim
de um movimento ou grupo, ou fomentar sua fragmentação.
Até que ponto os representantes levam questões próprias do movimento para os espaços
públicos de diálogo? Ao participar de uma das reuniões técnicas de fóruns com a
SECAD/MEC ficou difícil identificar se os representantes defendiam posições coletivas dos
próprios fóruns ou se, apenas, tratava-se de posicionamento individual.
3
3
.
.
2
2
A
A
p
p
a
a
r
r
t
t
i
i
c
c
i
i
p
p
a
a
ç
ç
ã
ã
o
o
d
d
o
o
s
s
f
f
ó
ó
r
r
u
u
n
n
s
s
n
n
o
o
s
s
c
c
a
a
s
s
o
o
s
s
E
E
N
N
C
C
C
C
E
E
J
J
A
A
,
,
n
n
a
a
s
s
D
D
i
i
r
r
e
e
t
t
r
r
i
i
z
z
e
e
s
s
O
O
p
p
e
e
r
r
a
a
c
c
i
i
o
o
n
n
a
a
i
i
s
s
d
d
e
e
E
E
J
J
A
A
e
e
n
n
a
a
V
V
I
I
C
C
O
O
N
N
F
F
I
I
N
N
T
T
E
E
A
A
O movimento dos fóruns tem demonstrado, ao longo dos anos 2000, não
capacidade de organização e mobilização, conseguindo conquistar espaços de diálogo com o
governo, como também revelou poder de interferência em algumas políticas de âmbito
nacional, como pode ser constatado no caso do Exame Nacional de Certificação de
Competências de Jovens e Adultos (ENCCEJA)
31
.
31
A interferência na política de EJA, no caso dos fóruns, se fez de forma direta, com mudanças de perspectiva em
algumas políticas, e de forma indireta, desmobilizando outros atores na adesão a ações governamentais.
92
O ENCCEJA foi instituído em 2002 pelo MEC, por meio da Portaria 2.270, de 14
de agosto e, posteriormente, regulamentado pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas
Educacionais Anísio Teixeira (INEP), por meio da Portaria 77. Sua criação pelo INEP foi
motivada pela justificativa de demanda de brasileiros residentes no exterior que necessitavam
de comprovação de escolaridade para ocupar postos de trabalho. Dá-se no bojo da política de
avaliações institucionais do governo FHC, promovidas pelo INEP que, pelos exames
propostos a estudantes, buscava diagnosticar a qualidade das instituições em diferentes níveis
de ensino. Segundo site do INEP (www.encceja.inep.gov.br. Acesso em 26 de junho de 2010),
o exame busca:
Avaliar as habilidades e competências sicas de jovens e adultos que não
tiveram oportunidade de acesso à escolaridade regular na idade apropriada.
[...] O exame também se propõe a oferecer às Secretarias de Educação uma
avaliação que lhes permita aferir os conhecimentos e habilidade dos
participantes no nível de conclusão do Ensino Fundamental e do Ensino
Médio. Espera-se ainda, por meio do Encceja, construir um indicador
qualitativo que possa ser incorporado à avaliação de políticas públicas da
Educação de Jovens e Adultos.
A certificação por exame é uma prática histórica do sistema educativo brasileiro e há
quarenta anos é ofertada sob a responsabilidade dos sistemas estaduais de educação. O MEC
não detém a responsabilidade por certificar, cabendo às unidades da federação fazê-lo; por
isso, quando o ENCCEJA foi lançado e realizado pela primeira vez, os fóruns, durante o
ENEJA ocorrido no Rio Grande do Sul, questionaram a validade do exame, embora não
tivessem, ainda, realizado discussões mais aprofundadas sobre essa questão. Cabe lembrar
que o exame fazia exigência à adesão dos estados, com o uso de recursos próprios de cada
um. Com esta prerrogativa, o INEP obteve uma baixa procura dos estados para firmar
convênios para promover o ENCCEJA.
Cabe ainda explicitar que um dos motivos da polêmica estava relacionado ao fato de,
no caso da EJA, a avaliação com vista à certificação passar a ser prerrogativa do governo
federal, diversamente do que é competência legal, e do que anunciava nas demais avaliações
promovidas: avaliar a instituição de oferta de EJA. Aqui, o foco era o próprio sujeito, que
passava a enfrentar ainda maiores dificuldades, por ser submetido a um exame nacional, igual
para todos os cantos e regiões do país, na contramão da luta pela EJA como direito à educação
para todos.
Em 2006, o INEP propôs a reedição do exame e, segundo a entrevistada B do Fórum
EJA/RJ, apesar do discurso de diferenciação e distanciamento entre o modelo a ser aplicado e
93
o da versão original, a mesma formulação continuava integrando a página eletrônica do INEP,
sem qualquer alusão a mudanças de concepção.
Nesse sentido, as estratégias dos fóruns, em oposição à implementação do exame,
materializaram-se por meio da articulação e convencimento de ideias em vários espaços. No
âmbito da CNAEJA, os conselheiros acabaram assumindo o posicionamento defendido pelos
fóruns, quando a Comissão questionou intensamente os representantes do INEP, convidados a
apresentar a proposta do ENCCEJA, solicitando que os recursos orçamentários (2 milhões de
reais) fossem utilizados para realizar estudos de mapeamento da EJA no país. Outra
importante ão dos fóruns ocorreu por meio de uma audiência com o Ministro Fernando
Haddad, realizada no dia 03 de maio de 2006. O relato da representação dos fóruns nesta
audiência revela uma postura de escuta do Ministro que, motivado pelo pedido de
cancelamento do ENCCEJA, questiona os motivos pelos quais os fóruns se posicionam de
forma contrária à sua realização. Após vários argumentos, o relato da representante dos fóruns
aponta:
[...] A principal ideia que prevaleceu e que tocou o Ministro: o nosso contra-
argumento de que a ação de indução do MEC de propor o ENCCEJA é
equivocada, por várias razões: Os estados oferecem os exames e
certificam. O papel do INEP seria o de, atendendo à solicitação dos estados,
contribuir para desenvolver e fortalecer, de forma ornica junto aos estados
que demandem, a formação de grupos que atuem na construção da avaliação,
considerando a diversidade dos diferentes contextos e grupos que a EJA
abriga. A forma como o MEC/INEP vem insistindo em propor o exame
desmobiliza a lógica do direito à educação e pode promover a desobrigação
dos sistemas públicos, a quem cabe o dever da oferta. Vários exemplos dessa
desobrigação foram sendo apresentados pelos companheiros, com ênfase em
situações concretas de negação do direito à educação em escolas dos
Sistemas de Ensino do DF e do estado de SP. Aos poucos a resistência foi
sendo minada e a escuta passou a tomar concretude.
O Ministro, além de revelar desconhecimento quanto à existência do movimento dos
fóruns de EJA no Brasil, diante dos argumentos apresentados evidenciou recuo quanto à
posição de adotar o ENCCEJA como política de EJA, como ainda sinaliza o relato:
O Ministro mostrou que desconhecia a composição do Movimento dos
Fóruns, hoje presente nos 27 estados da federação e no Distrito Federal, bem
como suas ramificações políticas em 34 fóruns regionais, e a nossa possível
capacidade de mobilização. Mais ao final, de forma mais próxima, abriu-se
para o grupo afirmando a ideia de que o MEC não vai tomar nenhuma
decisão que possa ser prejudicial e que demande gastos desnecessários para
os poucos recursos.
94
O movimento dos fóruns, ao apontar para o dirigente da maior instituição do campo
educacional no país o seu entendimento quanto ao papel do INEP em relação à EJA (que não
seria o de certificação, mas sim o de diagnóstico e pesquisa), em conjunto com a mobilização
dos coordenadores de EJA de todos os estados por meio de carta aberta
32
, com concepções
semelhantes à dos fóruns e endereçada ao Ministério acabou por desmobilizar a adesão ao
ENCCEJA, pois naquele momento grande parte dos estados recuou e, os poucos que
aderiram, o fizeram sem muita clareza e desconhecendo o movimento dos fóruns em seus
estados.
Apesar do enfraquecimento político do Exame e a baixa adesão dos estados, devido às
estratégias de mobilização dos fóruns e de outros atores, o MEC manteve a aplicação das
provas, demonstrando até que ponto admitia os limites da interferência e da participação na
gestão da política.
Outro exemplo de influência nas políticas, pelos fóruns, é expresso no processo de
discussão nacional, desencadeado pela SECAD, em conjunto com a Câmara de Educação
Básica do Conselho Nacional de Educação, sobre o Parecer CNE/CEB nº 36/2004 que
propunha a reformulação da Resolução CNE/CEB nº 1/2000 e do Parecer nº 11/2000.
Esta discussão surge nas atas da CNAEJA desde 2006, com maior ou menor
intensidade, e em todas ficou explícito o não consenso do movimento dos fóruns quanto à
questão. Na ata da reunião da CNAEJA de 04 de julho de 2008, há apontamentos da
realização de audiências públicas promovidos pelo CNE, sobre Diretrizes para a EJA, com
convite aos integrantes da CNAEJA, o que efetivamente aconteceu. Nessa mesma ata o
questionamento direto do representante da SECAD à representação do fórum quanto à
posição do movimento, cujas respostas mostraram não haver consenso entre os runs sobre
este assunto.
Os pontos mais polêmicos, discutidos nas audiências, foram a duração dos cursos; a
idade para ingresso na EJA; a certificação; e a EJA mediada pelas tecnologias. A proposta do
CNE era não reafirmar o que estava nas diretrizes do Parecer nº. 11/2000 elaborado pelo
Prof. Dr. Carlos Roberto Jamil Cury, então Conselheiro do CNE, mas apontar mudanças para
a gestão da EJA.
As discussões sobre estes pontos constaram em Parecer da Câmara de Educação
Básica do CNE de 2008, em que a conselheira relatora Regina Vinhaes Gracindo, em relação
32Disponível na íntegra no portal dos fóruns de EJA: www.forumeja.org.br.
95
à idade de ingresso na EJA, definia que a idade mínima para os cursos de EJA deveria ser a de
18 anos completos, tanto para o Ensino Fundamental como para o Ensino Médio.
Nas discussões mais recentes dos fóruns, especialmente as da rede fóruns, as posições
dividiam-se em duas correntes: 1) o apoio ao aumento da idade de ingresso em cursos de EJA,
para 18 anos, devido à alegada expressiva juvenilização da EJA, com a presença de alunos de
15 e 17 anos; 2) não aumento da idade, garantindo em qualquer instância o preceito
constitucional do direito à educação para todos, permanecendo somente a regulação de idade
para a realização de exames como previsto na LDB, visto que o sistema educacional, por não
oferecer estratégias pedagógicas de atendimento para os alunos de 15 a 17 anos, impediria a
continuidade no processo de escolarização, o que negaria o direito para esta faixa etária
33
.
A entrevistada B do Fórum/RJ, informou que, em conversa com o Secretário André
Lazáro da SECAD, expôs a posição do Fórum RJ de que o Ministro não poderia homologar
um parecer estabelecendo o aumento da idade de 15 para 18 anos nos cursos de EJA sem
pensar nas alternativas para atender a faixa etária de 15 a 17 anos, pois o parecer estaria
contrariando a Constituição e negando o direito.
O Secretário André Lazaro, de escuta atenta às disputas de posições das diferentes
correntes, oscilou entre ambas, em diversos momentos, até externar, publicamente,
posicionamento contrário ao aumento da elevação da idade para ingresso nos cursos de EJA
em algumas ocasiões, como na reunião de Construção da Agenda Territorial de
Desenvolvimento Integrado de Alfabetização e Educação de Jovens e Adultos, ocorrida em
Natal, em 10 de dezembro de 2008. O relato do movimento vivido pelo Secretário, tanto
quanto pelos integrantes de fóruns que se lançaram na disputa, aponta que, apesar do não
consenso no movimento de fóruns quanto à questão, a capacidade de convencimento e de
influência de alguns fóruns pode prevalecer também junto à sociedade política.
Em ata da 1ª reunião extraordinária de 12 de fevereiro de 2009 da CNAEJA, o
Secretário novamente explicitou que a homologação do parecer pelo Ministro não ocorreria
sem antes se ter a garantia de que os adolescentes de 15 a 17 anos seriam atendidos pelos
sistemas estaduais e municipais no seu direito à educação. Este posicionamento causou
indignação por parte dos fóruns estaduais de EJA e de alguns membros da comissão da
CNAEJA.
33
Como contribuição ao debate, e por não participar das audiências públicas, uma integrante de fórum redigiu um
paper publicado no Portal, com vista a argumentar em defesa do direito de todos e contra a fixação da idade, por
ferir a Constituição federal.
96
Nesse processo de discussão, a polêmica sobre o aumento da idade para ingresso na
EJA continuou intensa, não havendo consenso entre os fóruns, além da defesa contundente e
permanente do Fórum de EJA/RJ, contrária ao parecer. Estendeu-se à Conferência Nacional
de Educação (CONAE), quando os representantes reunidos decidem pela elaboração de
uma carta, com data do dia 05 de abril de 2010, destinada aos conselheiros do CNE, sobre a
qual não houve consenso quanto ao seu conteúdo e envio:
[...] nós participantes da Conferência Nacional de Educação/CONAE
(Brasília, 28/03 a 01/04), na condição de delegados e observadores,
representantes dos FÓRUNS de EJA, reafirmamos nosso posicionamento, no
que se refere aos parâmetros da idade para ingresso nos cursos de Educação
de Jovens e Adultos, destacados na proposta das Diretrizes Operacionais da
EJA. No contexto das audiências públicas, ocorridas no ano de 2007, que
subsidiaram a reformulação do Parecer CNE/CEB 11/2000, que define as
Diretrizes Curriculares Nacionais para a EJA e da atual Emenda
Constitucional 59, de 11 de novembro de 2009, que define em seu Art.
208 “que a educação básica obrigatória e gratuita dos 4 (quatro) aos 17
(dezessete) anos de idade, assegurada inclusive sua oferta gratuita para todos
os que a ela não tiveram acesso na idade própria”, avaliamos a pertinência de
alteração de ingresso dos educandos às turmas de EJA para a idade mínima
de 18 anos, definida por esse Conselho nas referidas Diretrizes Operacionais
de EJA que estão tramitando no Ministério de Educação, com a ressalva, a
bem da verdade, de que há Fóruns com posições divergentes desta, e pessoas
em Fóruns que também não compartilham dessa defesa que assumimos fazer
[...].
Diante da polêmica, o MEC negociou com o CNE a revisão da posição no parecer da
Conselheira Regina Vinhaes Gracindo. Essa negociação resultou em nova indicação feita pelo
CNE, constante do Parecer 03/2010, homologado finalmente em 03 de junho de 2010,
estabelecendo a idade de 15 anos para ingresso no ensino fundamental e 18 anos para o ensino
médio na EJA.
A versão final do referido Parecer contraria o posicionamento da maioria dos fóruns
mas, neste caso, a interferência se fez pelo protelamento da questão e por sua
problematização, especialmente, pelo posicionamento não consensual dos fóruns e pelo poder
político de alguns fóruns, como o do Fórum RJ, na busca de convencimento da sociedade
política, quanto ao erro político que seria cometido ao ferir a Constituição no que diz respeito
ao direito à educação independente da idade e ao fato de estar o próprio sistema agindo contra
o direito de adolescentes de 15 a 17 anos, sem conclusão de escolaridade no ensino
fundamental
34
.
34
Nem todos os argumentos que sustentam essa defesa são aqui apresentados, por não ser este o ponto focal da
pesquisa, mas deve-se registrar a complexidade do tema e dos argumentos que, ao longo de tanto tempo de
97
Outro exemplo de interferência e influência na política reflete-se na preparação do
Brasil à VI CONFINTEA. O Brasil, mais do que prepara-se para a participação, candidatou-se
para sediar a VI CONFINTEA, promovida pela UNESCO, e inaugurou um processo interno
de preparação qualificada amplamente participativo, envolvendo diversos segmentos atuantes
na EJA, diálogo e gestão participativa entre sociedade política e sociedade civil.
Nesse processo, destaca-se o fato de o Estado delegar aos fóruns de EJA o papel de
coordenar o processo preparatório ao evento nacional, juntamente com secretarias estaduais
de educação.
Nos encontros estaduais, realizados em março de 2008, e nos encontros regionais,
ocorridos em abril de 2008, fóruns e secretarias de estado de educação articularam a
organização e coordenaram a discussão das principais questões que atualmente envolvem a
EJA, a partir de um documento base produzido por comissão especialmente convidada pelo
MEC/SECAD para a tarefa e de um regulamento que visava a normatizar a igualdade de
participação e de interferência no texto final. Nessas etapas, o documento base nacional foi
amplamente debatido e os participantes puderam sugerir mudanças e acréscimos ao texto. Em
maio de 2008 ocorreu o Encontro Nacional Preparatório à VI CONFINTEA, organizado pela
SECAD em Brasília, com a presença de 300 participantes de todos os estados, escolhidos
como delegados nas etapas anteriores.
A participação dos delegados nos debates e na disputa de ideias foi fundamental para a
consolidação do documento final desse encontro, intitulado Brasil educação e
aprendizagens de jovens e adultos ao longo da vida, organizado em quatro eixos:
apresentação, diagnóstico da realidade da EJA no Brasil, desafios da EJA no Brasil e
recomendações.
Cabe ressaltar que no eixo referente às recomendações faz-se menção aos fóruns de
EJA, por meio de onze atribuições, representando uma demonstração da importância e do
reconhecimento do movimento para a EJA na atualidade:
1. Contribuir para maior divulgação e conscientização da população quanto
ao direito à educação de jovens e adultos.
2. Mobilizar a sociedade civil para participar na construção, monitoramento,
fiscalização e controle social das políticas públicas, em especial no que tange
à educação para jovens e adultos.
discussões e debates, foram construídos, mobilizando dados e informações que punham em cheque a deliberação
do primeiro momento.
98
3. Contribuir para a mobilização em torno de uma política nacional de
valorização da EJA.
4. Discutir e participar da formulação de políticas públicas elaboradas por
Conselhos de Educação.
5. Estimular a criação de mecanismos de incentivo à entrada ou retorno à
EJA, em parceria com a comunidade em geral, assegurando a mobilização
dos alunos na luta por seus direitos.
6. Fomentar a ampliação da participação de gestores públicos nos Fóruns,
contribuindo para efetivar o diálogo e promover a intersetorialidade.
7. Estimular a presença de representantes do movimento do campo nos
Fóruns da EJA, fomentando a discussão da educação no/do campo nos
Fóruns.
8. Contribuir para a mobilização e fortalecimento das comunidades locais,
estimulando a criação de grupos de apoio, centros comunitários e afins.
9. Apoiar reivindicações da União Nacional dos Conselhos Municipais de
Educação quanto à criação de sistemas municipais e fortalecimento da
autonomia financeira dos Conselhos Municipais já existentes.
10. Fortalecer o caráter formativo das atividades desenvolvidas pelos Fóruns
de EJA.
11. Pautar a discussão da certificação de educandos de EJA em eventos,
seminários e encontros, estimulando que o Conselho Nacional de Educação
aprove parecer que trate sobre a temática.
Contudo, algumas tensões surgiram nas reuniões técnicas dos fóruns com a SECAD,
em relação à participação no evento internacional VI CONFINTEA, sobretudo pelo não
atendimento à reivindicação do movimento de que fosse concedida a cada fórum a indicação
de cinco representantes. A argumentação governamental pautou-se na limitação de
participantes de acordo com as regras estabelecidas pela UNESCO. Os fóruns, por outro lado,
expressaram indignação ao pouco esforço do governo brasileiro em garantir e atender ao
pleiteado, que foram os responsáveis primordiais para a elaboração do documento
brasileiro. Após alguns embates, foi garantida aos fóruns a indicação de dois representantes
por estado.
Apesar do desgaste entre fóruns e representantes ministeriais, o processo preparatório
à VI CONFINTEA revelou o avanço da sociedade política em relação à política de EJA,
especialmente quando comparado ao descaso do governo brasileiro no momento preparatório
à V CONFINTEA. Os fóruns, do lugar de invisibilidade, no contexto político da década de
99
1990, tornou-se o protagonista no processo democrático e participativo construído junto à
sociedade política na condução da política de EJA na atualidade.
Pelas memórias disponibilizadas pelos representantes dos fóruns na CNAEJA e pelos
relatórios dos ENEJAs, identifico que uma relação tensa entre runs e governo. Não
consenso em relação a algumas pautas. Todavia, em concordância com Machado (2009b),
numa perspectiva histórica, pelo que ocorreu desde o surgimento do primeiro fórum até os
dias atuais, pode-se afirmar que a CNAEJA e as reuniões técnicas entre fóruns e
SECAD/MEC constituem espaços de interlocução importantes criados entre o governo federal
e os representantes de fóruns de EJA, resultando em proposições importantes para essa
modalidade, como a construção do documento brasileiro para a VI CONFINTEA, a
interferência no ENCCEJA etc. Todavia, “a realidade ainda exige abertura dos dois lados para
o aprendizado da gestão democrática e da construção coletiva”. (Machado, 2009b, p. 14).
3
3
.
.
3
3
A
A
r
r
e
e
l
l
a
a
ç
ç
ã
ã
o
o
f
f
ó
ó
r
r
u
u
n
n
s
s
e
e
E
E
s
s
t
t
a
a
d
d
o
o
Ao investigar essa complexa relação entre fóruns e Estado constata-se que o diálogo e
a disputa de concepções de EJA permeiam este formato peculiar de construir a política
pública.
A proximidade entre os fóruns e o Estado alterou a lógica de formulação das políticas
públicas de EJA para além dos gabinetes ministeriais e possibilitou aos sujeitos que militam
nos fóruns vivenciar uma experiência de participação genuína e de exercício democrático.
Suas práticas alteram não a relação Estado-sociedade; estrategicamente, os fóruns
constroem novas formas de agir e intervir, tematizando e redefinindo o espaço público.
Cabe destacar que o movimento dos fóruns se expressa pela presença, em espaços
institucionais e de audiências públicas. Vem instituindo e consolidando seu próprio espaço em
loci que propiciam o encontro e o diálogo de representantes públicos com representantes da
sociedade civil, viabilizando constante interlocução com os governos municipais e federais.
Esta prática tem sido permanente, e tem originado relevantes ações para a EJA.
Ao discutir essa questão, Gohn (2002, p. 301) esclarece que, com a ampliação da
relação entre o Estado e a sociedade civil, legitima-se a existência de um espaço ocupado por
uma série de instituições, com o papel de exercer a mediação entre coletivos organizados e
instituições do sistema governamental. Os fóruns, pela ação cotidiana, fomentam a vigência
desse espaço, promovendo em seus encontros momentos de embates e de discussões e, em
100
alguns casos, vendo incorporarem-se exitosamente contribuições de suas plenárias às
políticas, principalmente no âmbito nacional.
Este lugar conquistado pelos fóruns é fruto de um processo longo e árduo, pois ao me
reportar à trajetória de representatividade, no campo pela luta de direitos no país, percebo,
como Paoli e Telles (2000, p. 105) contradições e ambiguidades do percurso, que evidenciam
o penoso caminho na direção de uma sociedade mais igualitária e democrática. As autoras
citadas identificam que essa conquista se deu em meio a exclusões e à centralização do poder,
e enfatizam a importância dos movimentos da sociedade nesse jogo, vinculando-o não ao fato
de “alguma virtude política”, mas:
[...] pela constituição no terreno conflituoso da vida social, de arenas
públicas nas quais os conflitos ganham visibilidade como acontecimentos, na
qual os sujeitos coletivos se constituem como interlocutores válidos e nas
quais os direitos estruturam uma linguagem pública que baliza os critérios
pelos quais demandas coletivas são problematizadas e avaliadas nas suas
exigências de equidade e justiça.
Tal formulação permite-me entender que essa linguagem, enredada às práticas e às
diferentes significações, colocam para o movimento dos fóruns o intenso desejo de redefinir o
poder na sociedade, pois os novos significados e práticas que instauram fazem com que
entrem em cena novas culturas políticas que tensionam os lugares estabelecidos, os poderes e
desestabilizam os lugares “naturalizados como únicos e imutáveis.
O espaço público, constituído como campo de conflitos, pluralidade e descentrado do
que até então representava, desencadeia um fazer constante que possibilita a essa arena ser
refeita e redefinida quantas vezes forem necessárias, no mesmo compasso em que ocorrem os
conflitos.
O movimento dos fóruns, como espaços de representação, negociação e interlocução,
coloca em cena sujeitos que se fazem reconhecer como capazes de se pronunciarem sobre o
que é plausível, coerente, aceitável ou inaceitável para a educação de jovens e adultos, quando
reivindicam e propõem novos caminhos e alternativas.
Os sujeitos que determinam o fazer dos fóruns, ao reconhecerem sua capacidade como
interlocutores públicos, provocam, no cenário político, a desestabilização de “hierarquias
simbólicas” que tentam fixá-los como subalternos e sem legitimidade; colocam em pauta
“critérios de igualdade e reconhecimento e princípios democráticos de legitimidade”. (Paoli,
Telles, 2002, p. 106). Ao trazer questões referentes à EJA para a esfera política, considerada
101
em muitos momentos como pouco importantes para as deliberações públicas e para o
desenvolvimento social, os fóruns contribuem para a ampliação do campo político, do direito
e da cidadania de sujeitos historicamente excluídos.
O movimento dos fóruns representa, portanto, uma experiência positiva para o
fortalecimento e a consolidação da democracia, pois não coloca em cheque o poder da
sociedade política e vitalidade aos interesses populares, como também representa espaço
reconfigurado em que seus interesses podem ser construídos e reconstruídos. Dessa maneira,
os fóruns revelam-se como espaços nos quais a democracia está em contínua construção,
colocando em questão a possibilidade de repensar, expandir e ressignificar a democracia
brasileira, genuinamente.
O agir com base em princípios democráticos no espaço público que os fóruns vêm
buscando promover principalmente com a constante interlocução com o governo federal
exige reconhecer que a luta pelo direito à educação, no âmbito da educação de jovens e
adultos, é marcada por um campo de conflitos e de negociações.
Diferentemente da tradição autoritária e excludente, ainda presente em muitos espaços
institucionais deste País, o cenário atual vive um processo de mudanças e transformações,
geradas por representações da sociedade civil, como a dos fóruns, que se apresentam como
possibilidade de regulação democrática das relações sociais, por intermédio de espaços que
conferem legitimidade aos conflitos e negociações, capazes de reafirmar direitos, no
reordenamento da sociedade.
Os fóruns, na busca por manter sempre estreita a relação com a sociedade política,
tentam tornar a gestão das políticas públicas de EJA permeável às aspirações e demandas
advindas do coletivo, com vista a revisar a posse privilegiada, no sentido estrito do âmbito do
Estado, da definição de uma agenda de prioridades e problemas que assolam a vida em
sociedade, bem como a gestão da coisa pública.
Para isso, lutam para a modificação de políticas no que tange à EJA e têm enfrentado
difíceis embates que, em alguns casos, não alcançam resultados satisfatórios. Processos de
negociação, marcados por contradições e contrastes possibilitam experienciar inclinações
político-partidárias tanto de caráter popular quanto autoritárias e de indiferença a demandas
de coletivos que defendem populações pobres e desescolarizadas, porque mantidas apartadas
de direitos sociais. Por esses duros processos procuram estabelecer relações de parceria,
102
valendo-se do potencial e do conhecimento acumulado quanto a reais necessidades da EJA,
discutidas e rediscutidas em reuniões periódicas.
Como integrante do Fórum EJA/RJ, foi possível perceber o descaso com que as
autoridades tratavam/tratam a demanda da EJA, com políticas reducionistas e fragmentadas;
mas também pude presenciar, com a atual esfera federal, a condução de uma política, em
conjunto com os fóruns, antenada com a concepção ampliada de EJA. Os fóruns, com a
presença de representantes de ministérios, secretarias de educação e parlamentares travam,
pelo diálogo, embates sobre ações destinadas à educação de jovens e adultos, buscam
consolidar a gestão participativa da política, bem como legitimar espaços dos quais participam
como meio de articulação e condução da política pública.
Considero que a relação entre fóruns e governo concretude à perspectiva de Estado
ampliado de Gramsci (2006), pois o Estado no sentido estrito gerenciando e
implementando ações e os fóruns (sociedade civil) contribuindo e tensionando a
formulação e o acompanhando destas ações estão gestando e conduzindo (cada qual com
seu papel) a política de EJA em direção a uma perspectiva genuína do que tem sido
perseguido para a EJA: uma política de Estado.
103
4
4
C
C
O
O
M
M
P
P
R
R
E
E
E
E
N
N
S
S
Õ
Õ
E
E
S
S
D
D
O
O
M
M
O
O
V
V
I
I
M
M
E
E
N
N
T
T
O
O
D
D
O
O
S
S
F
F
Ó
Ó
R
R
U
U
N
N
S
S
D
D
E
E
E
E
J
J
A
A
Ao investigar a organização interna dos fóruns e a forma como participam no espaço
público, na sua articulação com a sociedade política, pude constatar que os runs
apropriaram-se do método democrático para se organizarem e criaram uma articulação em
rede, na qual estabelecem relações e identificam-se como movimento que luta pelo direito à
educação de jovens e adultos. Pelas estratégias instituídas, os fóruns ocuparam espaços de
diálogo com a sociedade política, conseguindo em alguns casos interferir nas políticas de
EJA.
Outras questões e fatos verificados durante a investigação do objeto surgiram, mas não
foram/serão abordados e analisados, pelos limites da pesquisa. Como inerente ao trabalho de
todo pesquisador, foi necessário fazer algumas escolhas. Como em toda escolha, tenho
consciência do risco de ter deixado de fora questões relevantes, na compreensão do objeto.
Optei, nesse último capítulo, por tecer reflexões a partir de questões/categorias que
julguei de maior relevância no foco de minha pesquisa, e por considerá-las elementos
peculiares e genuínos do objeto investigado. São elas: o direito à educação como bandeira de
luta, o papel e as práticas dos sujeitos militantes, o caráter político-formativo e as estratégias
de luta para interferir na política pública.
4
4
.
.
1
1
D
D
i
i
r
r
e
e
i
i
t
t
o
o
à
à
E
E
J
J
A
A
:
:
b
b
a
a
n
n
d
d
e
e
i
i
r
r
a
a
d
d
e
e
l
l
u
u
t
t
a
a
e
e
e
e
s
s
s
s
ê
ê
n
n
c
c
i
i
a
a
d
d
o
o
m
m
o
o
v
v
i
i
m
m
e
e
n
n
t
t
o
o
d
d
o
o
s
s
f
f
ó
ó
r
r
u
u
n
n
s
s
Na atualidade não se contesta a importância da educação para o desenvolvimento
social. O reconhecimento histórico do lugar da educação se concretiza em textos legais que a
exprimem na condição de direito. Expresso em lei, o direito à educação passa a ser princípio
fundamental para a cidadania e instrumento de luta pela democratização da educação, na
busca por sociedades mais igualitárias e justas, que propiciem condições mais iguais para
todos.
Para melhor entender o sentido de direito à educação, pus-me em busca, no primeiro
momento, do significado de direito. Encontrei em Bobbio (1992, p. 32) uma possibilidade de
compreensão do que representam os direitos:
Os direitos do homem são direitos históricos que emergem gradualmente das
lutas que o homem trava por sua própria emancipação e das transformações
104
das condições de vida que essas lutas produzem. [...] Sabemos hoje que
também os direitos humanos são produtos não da natureza, mas da
civilização humana; enquanto direitos históricos, eles são mutáveis, ou seja,
suscetíveis de transformão e de ampliação.
Os direitos são fruto de um processo histórico, criados para atender necessidades reais
e concretas dos sujeitos. Essas necessidades de um tempo, inegavelmente passarão por
mudanças, devido às transformações nas condições de vida em sociedade; ou seja, a
afirmação de um direito não se fará de um momento para o outro, mas será fruto de um
processo que está ligado intimamente às sociedades modernas e estará sempre em mudança de
concepção.
A questão do direito também está intimamente ligada ao princípio democrático, sendo
seu reconhecimento e proteção as estruturas fundamentais, e tem sido assumido pelas
Constituições nas sociedades modernas. A democracia, como sistema de governo que rege o
convívio em nossa sociedade, somente se consolida, possibilitando aos sujeitos a condição de
cidadãos, à medida que garanta determinados direitos fundamentais a todos.
O direito à educação é um desses direitos fundamentais. Sua importância se inscreve
num movimento de luta por melhores condições de vida, justiça e igualdade, o que evidencia
o processo contraditório desse direito, pois apesar do reconhecimento em lei, sua
concretização não se faz automaticamente. É diante desse contexto de contradição que a
importância e a luta pela proteção ao direito à educação acontece. No caso da educação de
jovens e adultos não é diferente, pois como alerta Paiva (2006, p. 521):
[...] a história não registra os movimentos de negação e de exclusão que
atingem esses sujeitos, mas se produzem a partir de um direito conspurcado
muito antes, durante a infância, negada como tempo escolar e como tempo
de ser criança a milhões de brasileiros.
A necessidade por educação de jovens e adultos, entre inúmeros motivos, se produziu
pelo direito não assegurado — historicamente sinalizado no âmbito legal, mas firmado,
explicitamente, de forma tardia na nossa recente Constituição Federal desde a infância.
Também não se pode ignorar a existência de adultos analfabetos e subescolarizados, aliada,
atualmente, à forte produção de jovens não concluintes do sistema regular de ensino que
demandam pela modalidade EJA. Outro elemento a ser considerado, segundo Paiva (2006) é
que os sujeitos da EJA, sobretudo os adultos, não se reconhecem como detentores deste
direito e não os reivindicam para si, embora o façam para seus filhos. São esses elementos que
105
propiciam a pertinência de movimentos que lutam pela educação de jovens e adultos
historicamente e que, na atualidade, têm como expressão os fóruns de EJA.
A proximidade com os fóruns de EJA permitiu-me perceber que, apesar da
heterogeneidade, algumas evidências indicam que a identificação entre esses fóruns (não
desconsiderando diferenças de intensidade) ocorre pela ideia força de efetivação e garantia do
direito à educação de jovens e adultos.
Parto do entendimento de que os fóruns expressam representações sociais de atores
que, em espaços organizados politicamente, assumiram a educação de jovens e adultos como
direito superando concepções muito recorrentes de que a EJA ocorre para repor um tempo
perdido a ser recuperado ou como resgate de uma dívida social. Segundo Paiva (2002, p. 520),
“a educação de jovens e adultos, em sociedades democráticas, assume a perspectiva da
inclusão e, esta inclusão, inevitavelmente, passa pela conquista de direitos”. Ancorada nessa
concepção, penso que os fóruns, ao assumirem a EJA na perspectiva do direito, na atualidade,
sinalizam que sua conquista é uma das formas de combater e diminuir as desigualdades
sociais.
A perspectiva da EJA como direito não é uma concepção que surge no momento
presente, mas vem se consolidando historicamente, como pode ser observado nos diversos
documentos legais de âmbito nacional e internacional. Os primeiros fóruns de EJA que
surgiram na década de 1990 assumiram esta concepção como bandeira de luta, especialmente,
a partir da Declaração de Hamburgo e da Agenda para o Futuro, em 1997 — acordos firmados
na V CONFINTEA. Por esses acordos, compreende-se a educação de jovens e adultos não
pela vertente da escolarização como um direito à educação básica a ser assegurado para
todos, visto que a educação apresenta-se como direito humano fundamental —, mas também
pela vertente do aprender por toda a vida, para além dos espaços formais de aprendizagem e
de escolarização dos sujeitos.
Embora a perspectiva do aprender por toda vida seja um ganho, em termos de
concepção para a EJA, ainda é um tema a ser aprofundado e enfrentado, pelos fóruns e pela
sociedade. Para que isso aconteça, é preciso ainda superar um problema: a educação básica
dos cidadãos que não usufruíram do direito à educação.
Neste sentido, baseada na concepção gramsciana de Estado ampliado, em que a
sociedade civil integra o Estado junto com a sociedade política, considero que a ação dos
106
fóruns de EJA é uma forma de pressão da sociedade civil junto à sociedade política para que
as políticas gestadas efetivem de fato o direito à educação para todos, independente da idade.
A ação do poder público tem apresentado muitas limitações que impedem a superação
definitiva do analfabetismo e da subescolarização e mobilizações como a dos fóruns fazem
com que a questão seja debatida e polemizada. Para a educação de jovens e adultos, que por
muito tempo se apresentou como marginal na agenda política, estes fóruns tensionam e
travam, nos espaços de diálogo que ocuparam e conquistaram junto à sociedade política,
discussões e ações que julgam importantes para a efetivação do direito à EJA na agenda
pública. Quando Bobbio (1992) afirma que o direito precisa ser protegido, acredito que essa
proteção, além dos procedimentos jurídicos, precisa acontecer pelo controle que a sociedade
civil, neste caso o movimento dos fóruns, exerce este controle quando reivindica, pressiona e
propõe ações ao Estado no sentido estrito.
As lutas protagonizadas pela sociedade civil pelo direito à educação, como a dos
fóruns de EJA, colocam em cena sujeitos que passam a ter consciência crítica da realidade
desigual em que se encontram, mas, sem dúvida, apresentam-se como instâncias que exercem
controle social e sinalizam para a não realização prática do direito, por quem tem o dever de
cumpri-la: o Estado. Mesmo reconhecendo que o poder público desenvolve ações no setor
educacional, por meio de programas e campanhas, para o atendimento de crianças, jovens e
adultos analfabetos ou pouco escolarizados, não é imprudente afirmar a insuficiência de sua
ação para sua efetividade.
Para além do desejo presente em lei, a efetivação do direito também está relacionada
com a situação social e a ação sistemática do poder público que Cury (2002, p. 247) assim
expressa:
[...] a realização dessas expectativas e do próprio sentido da lei entra em
choque com as adversas condições sociais de funcionamento da sociedade
em face dos estatutos de igualdade política por ela reconhecidos. É inegável
também a dificuldade de, diante da desigualdade social, instaurar um regime
em que a igualdade política aconteça no sentido de diminuir as
discriminações. Além disso, muitos governos proclamam sua incapacidade
administrativa de expansão da oferta perante a obrigação jurídica expressa.
O desejo em defesa do direito esbarra nos problemas sociais e, em muitos casos, na
inabilidade dos gestores em elaborar políticas blicas que visem à equidade e façam valer a
escrita da lei que tem origem no processo de luta dos sujeitos por melhores condições de vida.
107
E a educação, princípio fundamental para a cidadania, na atualidade, quando negada pelo
Estado fere um desejo não somente individual, mas coletivo.
Para Bobbio (1992, p 78), se os direitos ficam apenas restritos em marcos legais
constituir-se-ão apenas cartas de boas intenções ou, quando muito, diretrizes de ações para um
tempo futuro, sem a garantia de sua realização e dependente da boa vontade política dos
Estados para sua efetivação. A afirmação do autor implica que somente o desejo é insuficiente
para a efetivação e concretude dos direitos.
No enfrentamento da condição social adversa, que exclui e dificulta a efetivação do
direito, defendo que a sua concretização está intimamente ligada, não à elaboração de
políticas públicas pelo poder público, mas, em se tratando de direitos educacionais, ao diálogo
com a sociedade civil, como os fóruns de EJA têm buscado realizar, junto à instância
governamental. A experiência dos fóruns não tem o poder único e exclusivo de mudar a
realidade da educação de jovens e adultos e garantir o direito, mas se apresenta como
instância com potencial para reivindicar, cobrar e propor, além de apresentar evidências
concretas desse potencial para influir na elaboração de políticas públicas de direito. Esta
constatação realça, inegavelmente, a importância da ação dos fóruns, em conjunto com a
sociedade política, na indução de políticas públicas de Estado para a EJA.
4
4
.
.
2
2
O
O
p
p
a
a
p
p
e
e
l
l
d
d
o
o
s
s
s
s
u
u
j
j
e
e
i
i
t
t
o
o
s
s
p
p
a
a
r
r
a
a
a
a
a
a
ç
ç
ã
ã
o
o
d
d
o
o
s
s
F
F
ó
ó
r
r
u
u
n
n
s
s
Conhecer os fóruns no seu cotidiano possibilitado pela minha condição de
participante do movimento me fez perceber que os sujeitos dos fóruns deixam de ser
simples participantes, passando a exercer função mais reflexiva e ativa na sua ação militante
pela EJA.
Neste sentido, Gramsci (2006, p. 25), em discussão que desenvolve detidamente sobre
os membros do partido político, ajuda-me a compreender o papel que desempenham, ao
apontar que membros de organizações da sociedade civil, como é o caso dos fóruns,
desempenham a função de intelectuais.
Segundo esta concepção, todos os homens são intelectuais, independentemente da
atividade e da função que exercem. Como enfatizado em sua obra, é necessário fazer distinção
de graus em relação aos membros, mas, sem vida, estes se constituem como intelectuais.
Independentemente de “exercerem a função social da categoria profissional de intelectuais”
(Gramsci, 2006, p. 52), os membros dos partidos políticos e, nesse caso, também os
108
participantes dos fóruns de EJA, por se organizarem e lutarem por um fim, estão sendo
protagonistas da história e buscam um formato de sociedade menos excludente que
proporcione condições mais iguais para que seus cidadãos possam vir a ser dirigentes.
Os “sujeitos intelectuais” dos fóruns de EJA mobilizam-se, articulam-se e se
constroem na luta, a partir de situações concretas pela efetivação do direito à educação de
pessoas não alfabetizadas ou subescolarizadas, seus saberes e sua subjetividade.
Antes dispersos, esses sujeitos passaram a exercitar-se de forma ativa com a realidade,
ao discutirem a situação desigual e excludente em que se encontra parte da população.
Buscam intervir na realidade, por meio do diálogo com o poder público, a fim de exercer
alguma influência na condução da política local e nacional de EJA.
A subjetividade, elemento relevante nessa discussão, é para Semeraro (2006, p. 101),
“[...] uma concepção em que homens são sujeitos da história e não instrumentos passivos de
determinações materiais ou espirituais”. A participação nos fóruns, iniciativa livre e de
vontade própria, é a possibilidade que estes sujeitos encontraram de atuar como protagonistas
da história e, pela ão política que organizam, formar consciência crítica e “personalidade
individual e coletiva”, a partir da problemática pela qual lutam.
Coletivamente, os sujeitos ressignificam saberes, criam intersubjetividades e
constroem, na luta cotidiana, uma experiência que tem na participação e no exercício
democrático, a busca por consolidar a práxis democrática.
Nessa busca, identifico que na articulação dos fóruns formam-se novos sujeitos
sociopolíticos que passaram a trilhar caminhos alternativos de participação na sociedade,
negando a condição de sujeitos passivos e determinados por condições estruturais.
4
4
.
.
3
3
A
A
m
m
i
i
l
l
i
i
t
t
â
â
n
n
c
c
i
i
a
a
p
p
e
e
l
l
a
a
E
E
J
J
A
A
n
n
o
o
s
s
f
f
ó
ó
r
r
u
u
n
n
s
s
:
:
n
n
o
o
v
v
a
a
s
s
p
p
r
r
á
á
t
t
i
i
c
c
a
a
s
s
?
?
A militância que se construiu em torno da luta pelo direito à EJA, no espaço dos
fóruns, revelou que o envolvimento político e a participação qualificada é resultado de
aprendizagens por meio de interações e convivência na luta cotidiana. Aliado à solidariedade,
fez emergir um ambiente cooperativo que, no entanto, não camufla contradições.
Contudo, esta militância nos espaço dos fóruns introduziu uma nova cultura política?
Instituiu novas práticas? Essas são questões que tentei responder, tendo em vista a cultura
109
política da sociedade brasileira, em que percebo ao longo da história a perpetuação de
relações autoritárias.
Por meio da mobilização dos fóruns foi possível constatar que o movimento tem
potencial para a substituição de práticas autoritárias e excludentes, tão correntes na sociedade
brasileira. A esse respeito, Rezende (1985, apud Warren, 1993, p. 51) sinaliza o importante
papel de novas formas de organização da sociedade na mudança de tais práticas na cultura
política do país, e afirma que, por meio de novas práticas, questionam a centralização e a
burocratização, tão presentes em partidos políticos, por exemplo.
Identifico que nos fóruns são partilhadas ideologias contrárias ao autoritarismo e à
centralização do poder, não sem contradições, como era de se esperar. A participação é prática
mais facilmente experimentada pelos sujeitos, como pode ser constatado nas plenárias, nos
grupos de trabalho e nos ENEJAs. Os direitos à voz e à vez são enunciados e garantidos para
além da retórica, e muitos sujeitos fazem uso deste papel ativo, em maior ou menor medida,
de acordo com suas experiências políticas e de participação adquiridas dentro ou fora do
movimento dos fóruns. A discussão e elaboração coletiva dos relatórios nos ENEJAs também
exemplificam a construção feita por várias mãos, não sendo esta tarefa de um “escolhido” ou
de um “seleto grupo”. O fazer coletivo tem sido vivenciado e perseguido todo o tempo como
parte do método democrático.
A responsabilidade compartilhada e o compromisso com a colaboração evidenciam
que o poder não se concentra nas mãos de nenhuma representação ou sujeito, não havendo
hierarquias que privilegiem e demarquem posições.
As decisões, tomadas coletivamente, mesmo quando algumas não contemplam todas
as perspectivas e princípios, valem-se dos instrumentos da democracia, como por exemplo
votações, em que prevalece a vontade expressa da maioria.
A troca e a socialização das informações são práticas priorizadas nos encontros
nacional, que reserva, geralmente, momentos para informes, quando os sujeitos socializam
informações de cunho político, pedagógico, administrativo, financeiro etc., referentes à EJA.
A apresentação das especificidades dos diversos segmentos em reuniões é realizada para o
reconhecimento da pluralidade do grupo e fortalecimento de sua identidade.
110
Contudo, a expressiva renovação do quadro militante, faz recrudescerem posturas
autoritárias
35
e competitivas — expressas pela imposição de concepções e lideranças do grupo
—, revelando que tais práticas, contraditoriamente, convivem na articulação com a cultura
democrática que se busca consolidar na articulação dos fóruns.
Novas práticas, que nesse estudo identifico com o modelo democrático, são
experimentadas no âmbito do ENEJA pelos fóruns, não são isentas de contradições internas.
O convívio com práticas opostas, observadas no fazer dos fóruns, pode comprometer o
modelo democrático assumido como princípio na forma de organização, em termos de postura
política e nas relações entre os sujeitos.
Como Scherer-Warren (1993), que aponta ser possível promover a corrosão do
autoritarismo para a criação de uma sociedade mais democrática, por meio de ações concretas
no âmbito da sociedade civil, observei que os fóruns podem contribuir para esta
transformação, desconstruindo posturas e atitudes centralizadoras, adquiridas ao longo de
muitos anos em nossa sociedade. Para isso, a opção pelo princípio democrático pode ser o
caminho da consolidação de novas práticas já evidenciadas, mas sempre ameaçadas e à
sombra do histórico formato autoritário e conservador das relações entre os sujeitos, o que
exige atenta disposição de mudança, tomada de consciência constante e autocrítica
permanente na militância que se quer renovada.
4
4
.
.
4
4
F
F
ó
ó
r
r
u
u
n
n
s
s
d
d
e
e
E
E
J
J
A
A
:
:
i
i
n
n
s
s
t
t
â
â
n
n
c
c
i
i
a
a
f
f
o
o
r
r
m
m
a
a
t
t
i
i
v
v
a
a
e
e
p
p
o
o
l
l
í
í
t
t
i
i
c
c
a
a
A participação em diferentes espaços associativos da sociedade civil tem-se
apresentado como possibilidade de formação política e de luta de sujeitos sociais,
especialmente quando pensamos nas deficiências e lacunas deixadas pela escola local
privilegiado de formação não somente técnica, mas também política. Neste sentido, percebo
que os fóruns de EJA vêm se configurando como um desses espaços de participação com
poder formativo e organizativo na luta pela garantia do direito à educação de jovens e adultos.
A mobilização dos fóruns apresenta-se como experiência político-pedagógica na
formação de sujeitos. Os fóruns, ao se articularem em prol da garantia do direito à educação
de jovens e adultos, passam a desenvolver formas alternativas de autogestão, criam estratégias
para o diálogo e embates com o poder público e buscam instrumentalizar-se tecnicamente a
35
Segundo Scherer-Warren (1993) essas posturas m predominado na formação histórica reprodutora de
relações sociais autoritárias e conservadoras, seja no plano político institucional, seja no plano da sociedade
civil.
111
partir de concepções e informações sobre o tema em que estão envolvidos, para serem
hegemônicos no campo das ideias.
Na sua metodologia de ação, possibilitam troca de experiências e a construção de
novos conhecimentos. Essa troca de experiências configura-se como prática que possibilita
ampliar o conhecimento dos seus participantes, promovendo a coexistência dos múltiplos
fazeres na EJA, legitimando valores e experiências. O reconhecimento dessas práticas se
consolida nos fóruns, que se tornam referência para debates, estudos e aprofundamento
teórico.
Por constituírem espaço de integração de diversas experiências no âmbito da educação
de jovens e adultos, têm possibilitado ampla visão de como a área se constitui. Isto tem sido
possível a partir da indicação de temas que orientam os encontros periódicos, temas esses
fortemente ancorados na realidade e nos movimentos da área, e cuja inserção nas discussões é
realizada ao sabor dos acontecimentos, o que possibilita maior conhecimento da realidade
local, das formas como cada ator concebe a EJA, das práticas realizadas, dos problemas que
enfrentam etc.
Desta maneira, o movimento dos fóruns manifesta-se como instância que desempenha
papel complementar na qualificação e aperfeiçoamento técnico e profissional, oferecendo
subsídios para articular os conhecimentos com a realidade, instituindo-se em espaço
formativo. O crescimento dos fóruns de EJA ocorreu na mesma medida em que passou a
abordar, progressivamente, temas variados e abrangentes às questões urgentes do cotidiano
dos educadores, funcionando, especialmente, como espaço privilegiado de formação.
Por meio dos encontros, tem sido possível o reconhecimento de parcerias entre
pessoas e instituições que pensam a EJA de forma crítica, viabilizando, por exemplo, cursos
de formação continuada para educadores. Isso mostra que os fóruns têm sido palco para a
constituição de novos valores e de novas práticas, diante da realidade econômica e social. Em
particular, as transformações trazidas pelos avanços tecnológicos para os meios de
comunicação, cada vez mais presentes nos processos de formação de sujeitos, indicam a
necessidade de pensar novos caminhos e diretrizes para a formação dos educadores, como
também dos educandos.
Os fóruns têm contribuído expressivamente para uma nova visão sobre práticas
educativas que se estabelecem no cotidiano; para a ampliação da concepção relativa à
educação de jovens e adultos que vai além da alfabetização; como também contribuem para a
112
tomada de consciência de que, por meio de estratégias e ações construídas no coletivo, torna-
se possível a obtenção de resultados significativos nas políticas públicas destinadas à EJA.
O desenvolvimento do senso crítico quanto à importância da educação de jovens e
adultos para o avanço social, por representar uma grande parcela do país a ser atendida, como
direito de todos e processo de toda a vida, não restrita a períodos determinados, é a maneira de
lutar pela cidadania e por uma sociedade mais justa e democrática.
Como local de formação política, os fóruns ajudam a romper com a lógica de que só se
aprende em ambientes escolares e que esta aprendizagem acontece por meio da transmissão
de saberes. O conhecimento é construído num processo social e coletivo pelos indivíduos e
como aponta Gramsci (2006, p.53):
Em suma, todo homem, fora de sua profissão, desenvolve uma atividade
intelectual qualquer, ou seja, é um “filósofo”, um artista, um homem de
gosto, participa de uma concepção de mundo, possui uma linha consciente
de conduta moral, contribui assim para manter ou modificar uma concepção
de mundo, isto é, para fazer suscitar novas maneiras de pensar.
Os fóruns constituem um desses espaços de aprender de forma contínua, pois nele se
constroem saberes na luta que travam em prol da educação de jovens e adultos. E, assim, com
base nas reflexões de Paiva (2002), acredito que a “luta social” ensina e que o conhecimento,
do qual se apropriam os sujeitos, ressignifica-se nessa luta.
Portanto, o espaço educativo e educador que o movimento de luta implica, coloca
todos que se ocupam dessa problemática diante da necessidade de repensar os espaços formais
em que se educa, principalmente os representados pelas escolas, em que a formação política, a
participação social é ainda frágil e fragmentada, porque não formam o cidadão dirigente, ou
seja, o sujeito “especialista + político” como propõe Gramsci (2006).
A ampla rede de sujeitos criada, ao longo de doze anos, fez emergir uma vontade
coletiva em prol da educação, não na forma de sua organização, como no diálogo
estabelecido com o Estado no sentido estrito. Os fóruns, como representação civil, exercem
papel ativo, formativo e social no espaço público. A ação desses fóruns pode não ter o poder
de romper a estrutura sociopolítica vigente mas, sem dúvida, constitui resistência ao modelo
ainda desigual em que se encontra parte da população e influi na formação política de seus
integrantes.
113
4
4
.
.
5
5
A
A
l
l
u
u
t
t
a
a
p
p
a
a
r
r
a
a
a
a
l
l
é
é
m
m
d
d
a
a
r
r
e
e
i
i
v
v
i
i
n
n
d
d
i
i
c
c
a
a
ç
ç
ã
ã
o
o
:
:
a
a
g
g
u
u
e
e
r
r
r
r
a
a
d
d
e
e
p
p
o
o
s
s
i
i
ç
ç
ã
ã
o
o
c
c
o
o
m
m
o
o
e
e
s
s
t
t
r
r
a
a
t
t
é
é
g
g
i
i
a
a
Na busca empreendida por compreender os fundamentos da ação dos fóruns de EJA
constatei que o movimento não se utiliza de grandes mobilizações ou apresenta caráter
essencialmente reivindicativo, de que se valiam os movimentos sociais clássicos, na sua
participação/ocupação no/do espaço público.
Pela complexidade do tecido social, especialmente sob a égide do neoliberalismo,
vivencia-se um cenário sociopolítico marcado por tensões, conflitos e contradições. Diante
desse quadro, a sociedade civil reage, resiste e cria alternativas e incorpora novas práticas, já
que não basta apenas ser um ator “passivo reivindicante” (Gohn, 2005, p. 82).
Isto confere destaque ao movimento dos fóruns, pois assume características distintas,
inserindo um elemento que o distingue das demais representações da sociedade, o que
reconheci e passei a denominar de resistência propositiva. Em constante movimento, essa
representação luta pela garantia do direito à educação, propondo ações e práticas diferentes e
de compreensão ampliada em relação ao papel da EJA e o lugar que deve ocupar, objetivando
ser hegemônico no campo das ideias. Dessa forma, resistem às concepções e políticas que
reduzem a EJA à alfabetização e à reposição de escolaridade.
Percebo que para este movimento não basta apenas reivindicar maiores investimentos
e ações efetivas na área pela via da escolarização, já que a maneira como estas vêm sendo
oportunizadas, ao longo dos anos, não contempla o significado que a educação de jovens
assume para o desenvolvimento da sociedade contemporânea, como sinaliza a Declaração de
Hamburgo na V CONFINTEA.
Identifiquei que o movimento dos fóruns, para fazer prevalecerem suas concepções,
apropria-se da guerra de posição gramsciana como estratégia de luta, para exercer influência
e interferir nos rumos das políticas de EJA, como foi possível verificar nos fatos relatados ao
longo deste estudo.
Neste sentido, a “guerra de posição” constituiu estratégia dos fóruns na ocupação de
espaços políticos, no convencimento de ideias, na busca por fazer o governo a tomar
determinadas posições e ações, como identificado nos espaços formais de diálogo como a
CNAEJA e nas reuniões técnicas com a instância governamental.
114
Por meio dessa estratégia, buscam tensionar e exercer influência nas ações que o poder
público vem implementando na área como foi constatado nos casos apresentados nesse
estudo —, por meio de discussões locais e internacionais que, a partir da prática, esboçam
mudanças paradigmáticas do que seja a educação de jovens e adultos na contemporaneidade.
Os fóruns, por meio dessa estratégia, demonstram a capacidade, como sinaliza Oliveira
(2004), de determinar o “outro” (sociedade política), a assumir, como ocorreu em alguns
casos, seus saberes e ideias na construção e implementação da política de EJA.
O movimento fóruns, então, desenvolve mecanismos de participação política, na
tentativa de intervir de forma propositiva na formulação e gestão das políticas públicas.
Apresenta-se como uma nova institucionalidade, pois é palco de uma forma particular de ação
política. Sua pretensão não é somente cobrar e exigir, mas é, enquanto constituinte do Estado
(ampliado), construir coletivamente, junto aos que atuam na EJA e, principalmente, com os
que formulam as políticas para este segmento.
Por tal configuração, o movimento fóruns apresenta-se como espaço privilegiado de
participação, pois nele estão sempre presentes o diálogo, a formulação de propostas e o
estabelecimento, em alguns momentos, de parcerias na gestão da coisa blica, conferindo à
sua representação o status de ser espaço político-propositor.
Constato, por fim, que entre fóruns, como instância da sociedade civil e instâncias da
sociedade política entendimento comum de que a EJA deve ser assumida pelo Estado,
embora com divergências quanto a táticas e estratégias de como deve ser gestada a política de
EJA.
Os fóruns representam, no tempo presente, uma forma indiscutível de organização da
sociedade em defesa do direito à educação não de qualquer direito, mas de um direito para
o qual a própria sociedade não tem clareza de que deva assim exercido. Sua relevância,
portanto, reside no fato de, resistindo propositivamente e marcando posição em defesa da
legitimidade dos sujeitos de direito, manter-se no foco da cena política, tirando da
invisibilidade um campo marginal na história da educação brasileira.
115
R
R
E
E
F
F
E
E
R
R
Ê
Ê
N
N
C
C
I
I
A
A
S
S
B
B
I
I
B
B
L
L
I
I
O
O
G
G
R
R
Á
Á
F
F
I
I
C
C
A
A
S
S
ARANHA, Maria L. Arruda, MARTINS, Maria H. Pires. Filosofando: introdução à Filosofia.
2. ed. São Paulo: Moderna, 1993.
BEISIEGEL. Celso de Rui. A qualidade do ensino na escola. Brasília: Liber Livro Editora,
2005.
BOBBIO, Norberto. A era dos direitos. Rio de Janeiro: Campus, 1992.
BOURDIEU, Pierre, PASSERON, Jean Claude. A reprodução: elementos para uma teoria do
sistema de ensino. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1975.
COSTA, Sérgio. As cores de Ercília: esfera pública, democracia, configurações pós-
nacionais. Belo Horizonte: Ed. UFMG, 2002.
COUTINHO, Carlos Nelson. Gramsci: um estudo sobre seu pensamento político. 2. ed. Rio
de Janeiro: Campus, 1992.
COUTINHO, Carlos Nelson. O conceito de sociedade civil em Gramsci e a luta ideológica no
Brasil de hoje. In: Intervenções: o marxismo na batalha das idéias. São Paulo: Cortez, 2006.
CURY, Carlos Roberto Jamil. Direito à educação: direito à igualdade, direito à diferença. p.
245-262. In: Cadernos de Pesquisa. n. 116. São Paulo, jul. 2002.
CURY, Carlos Roberto Jamil, HORTA, Silvério Bahia, FÁVERO, Osmar. A relação
educação-sociedade-Estado pela mediação jurídico-constitucional. In: FÁVERO, Osmar
(org.). A educação nas constituintes brasileiras: 1823-1988. 2. ed. Campinas, São Paulo:
Autores Associados, 2001.
DAGNINO, Evelina. ¿Sociedade civil, participação e cidadania: de que estamos falando? In:
MATO, Daniel (coord.). Políticas de ciudadanía y sociedad civil en tiempos de globalización.
Caracas: FACES, Universidad Central de Venezuela, 2004. p. 95-110.
DI PIERRO. Maria Clara. Notas sobre a redefinição da identidade e das políticas públicas de
educação de jovens e adultos no Brasil. Revista Educação & Sociedade. n. 92. Campinas:
Cedes, out. 2005.
DI PIERRO, Maria Clara, HADDAD, Sergio. Escolarização de jovens e adultos. Revista
Brasileira de Educação, n. 14, São Paulo: Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa
em Educação, mai./ago. 2000. p. 108-130.
116
DUARTE, Clarice Seixas. Direito público subjetivo e políticas educacionais. p. 113-118. In:
São Paulo em Perspectiva. n.18. São Paulo, fev. 2004.
DUBET, François. A escola e a exclusão. p.1-14. Cadernos de Pesquisa. n. 119. São Paulo,
2003.
FÁVERO. Osmar. Políticas públicas de educação de jovens e adultos no Brasil. Trabalho
apresentado no XXIV Simpósio Brasileiro e III Congresso Interamericano de Política e
Administração da Educação. ANPAE/UFES. Vitória/ES, ago. 2009. (no prelo).
FERREIRA, Olavo. Ações em movimento: rum Mineiro de EJA – da participação às
políticas públicas. Dissertação de Mestrado em Educação. Universidade Federal de Minas
Gerais – UFMG. Faculdade de Educação. 2008. 123f.
FRIGOTTO, Gaudêncio, CIAVATTA, Maria. Educação básica no Brasil na década de 1990:
subordinação ativa e consentida à lógica do mercado. Revista Educação & Sociedade. vol. 24,
n. 82. p. 93-130. Campinas: Cedes, abr. 2003.
GOHN, Maria da Glória. Teorias dos movimentos sociais: paradigmas clássicos e
contemporâneos. São Paulo: Ed. Loyola, 2002.
_______. O protagonismo da sociedade civil: movimentos sociais, ongs e redes solidárias.
São Paulo: Cortez, 2005.
GRAMSCI, Antonio. Cadernos do cárcere volume 2. Ed. e trad. Carlos Nelson Coutinho. 4
ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2006.
HADDAD, Sergio. A participação da sociedade civil na educação de jovens e adultos e a
CONFINTEA. Revista Brasileira de Educação. vol. 14, n. 41. p. 355 369. Rio de Janeiro:
ANPEd, maio/ago 2009.
_______. Por uma nova cultura de educação de jovens e adultos, um balanço de experiências
de poder local. In: HADDAD, Sergio (org.) Novos caminhos em educação de jovens e adultos
- EJA: um estudo de ações do poder público em cidades de regiões metropolitanas brasileiras.
São Paulo: Global, 2007.
HORTA, Silvério Bahia. Direito à educação e obrigatoriedade escolar. In: Cadernos de
Pesquisa. Fundação Carlos Chagas: São Paulo, n.104, p. 05-34, jul. 1998.
IRELAND, Timothy, MACHADO, Maria Margarida, PAIVA, Jane (org.). Educação de
jovens e adultos: uma memória contemporânea, 1996-2004. Brasília: UNESCO: MEC, 2004.
117
IBGE. Aspectos complementares da educação de jovens e adultos e educação profissional
2007. Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios - PNAD 2007. Rio de Janeiro: IBGE,
2009.
LANG, Fernanda, TAMANINI, Carlos Augusto M. Fórum: contexto histórico. Disponível em
http://revistas.unipar.br/akropolis/article/viewFile/379/345. Acesso em 23 março 2008.
MACHADO, João Luis Almeida. Conhecendo os recursos de aprendizagem on-line: Fóruns
de discussão. Disponível em http:// artigo cientifico.uol.
com.br/uploads/artc_1215808600_16.pdf. Acesso em 23 março 2008.
MACHADO, Margarida. A educação de jovens e adultos no Brasil pós-lei n°. 9.394/96: a
possibilidade de constituir-se como política pública. p. 17-39. In: Em Aberto. vol. 22, n. 82.
Brasília: INEP, nov. 2009a.
_______. Diálogos necessários sobre gestão e financiamento da educação de jovens e
adultos. Apresentação no XXIV Simpósio Brasileiro e III Congresso Interamericano de
Política e Administração da Educação. ANPAE/UFES. Vitória/ES, ago. 2009b. (no prelo).
MELUCCI, Alberto. A invenção do presente: movimentos sociais nas sociedades complexas.
Petrópolis, Rio de Janeiro: Vozes, 2001.
MORONI, José. Participamos: e daí? Observatório da Cidadania. Ibase, 2005. Disponível em
www.ibase.br. Acesso em 22 de julho de 2010.
OLIVEIRA, Francisco de. A sociedade civil nas pautas políticas nacionais. p. 69-76. In:
ABONG. O papel da sociedade civil nas novas pautas políticas. São Paulo: Ed. Fundação
Peirópolis: ABONG, 2004.
_______. Uma alternativa democrática ao liberalismo. p. 77-92. In: IBASE. A democracia
como proposta. Rio de Janeiro: IBASe, 1991.
PAIVA. Jane. Tramando concepções e sentidos para redizer o direito à educação de jovens e
adultos. Revista Brasileira de Educação. Rio de Janeiro, v. 11, n. 33. p. 516-566. set./dez.,
2006. Disponível em: http://www.scielo.br. Acesso em 01 de dezembro de 2008.
_______. Os sentidos do direito à educação para jovens e adultos. Petrópolis, Rio de Janeiro:
DP et alii: FAPERJ, 2009.
118
_______. Onde a luta ensina: olhos de aprendiz no movimento social. In: Teias. Revista da
Faculdade de Educação. n. 6, p. 9-19. Rio de Janeiro: UERJ / Faculdade de Educação,
jul./dez. 2002.
PAOLI, Maria Célia, TELLES, Vera da Silva. Direitos sociais: conflitos e negociações no
Brasil contemporâneo. In: ALVAREZ, Sonia, DAGNINO, Evelina, ESCOBAR, Arturo
(org.). Cultura política nos movimentos latino-americanos: novas leituras. p. 103-148. Belo
Horizonte: Ed. UFMG, 2000.
PEREGRINO, Mônica. Desigualdade, juventude e escola: uma análise de trajetórias
institucionais. In: FÁVERO, Osmar, ZACCUR, Edwiges (org.) Pesquisas em educação:
diferentes enfoques. Niterói: EdUFF, 2008.
RUMMERT, Sônia, VENTURA, Jaqueline. Políticas públicas para educação de jovens e
adultos no Brasil: a permanente (re)construção da subalternidade considerações sobre os
Programas Brasil Alfabetizado e Fazendo Escola. In: Educar. n. 29, p. 29-45. Curitiba:
Editora UFPR, , fev. 2007.
SADER, Eder. Quando novos personagens entram em cena: experiências e lutas dos
trabalhadores da grande São Paulo 1970-1980. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1988.
SADER, Emir. Estado e democracia: os dilemas do socialismo na virada do século. p. 120-
130. In: GENTILI, Pablo, SADER, Emir (org.). Pós-neoliberalismo II: que estado para que
democracia? Petrópolis, Rio de Janeiro: Vozes, 1999.
SCHERER-WARREN, Ilse. Redes e sociedade civil. In: HADDAD, Sergio (org.). ONGs e
Universidades: desafios para a cooperação na América Latina. Minas Gerais: Ed. Fundação
Peirópolis, 2002.
_______. Redes de movimentos sociais. São Paulo: Ed. Loyola, 1993.
SEMERARO, Giovanni. Gramsci e os novos embates da filosofia da práxis. São Paulo Idéias
& Letras, 2006.
SILVA. Eduardo Lopes Jorge. Fórum de educação de jovens e adultos: uma nova
configuração em movimentos sociais. João Pessoa: Ed. Univ. UFPB, 2005.
SILVA, Ranulfo P. da. Resgatar o espírito de militância. Cepis, São Paulo, nov. 2001.
Atualizado em agosto/2002. www.sedes.org.br/Centros/Cepis . Acesso em 28 agosto 2005.
119
SOARES. Leôncio Gomes. O surgimento dos fóruns de EJA no Brasil: socializar, articular e
intervir. Alfabetização e Cidadania. Revista de Educação de Jovens e Adultos. Movimentos
sociais e educação de jovens e adultos. n. 17. p. 25-35. São Paulo: RAAAB, maio, 2004.
TATAGIBA, Luciana, TEIXEIRA, Ana Cláudia. Participação e democracia: novos e velhos
desafios. Revista de Ciências Sociais Civitas. Porto Alegre, v. 6, n. 1, jan./jun. 2006.
Disponível em: http://www.revistaseletronicas.purs.br. Acesso em 22 de julho de 2010.
TEIXEIRA, Ana Cláudia. Até onde vai a participação cidadã? Le Monde Diplomatique
Brasil. Ano 2, n. 7, p. 6-7.fev. 2008.
UNESCO. Declaração de Hamburgo sobre a Educação de Adultos e Plano de Ação para o
Futuro. In: CONFERÊNCIA INTERNACIONAL SOBRE EDUCAÇÃO DE ADULTOS 5,
1997. Hamburgo, Alemanha, 14-18 jul. 1997.
VINADÉ, T., GUARESCHI, P. Inventando a contra-mola que resiste: um estudo sobre a
militância na contemporaneidade. Revista Psicologia & Sociedade. n. 19, p. 68-75, 2007.
Disponível em: http://www.scielo.br. Acesso em 19 de maio de 2010.
Sites
www.forumeja.org.br. Acesso em 24 março 2009.
www.uol.com.br/michaelis.
Livros Grátis
( http://www.livrosgratis.com.br )
Milhares de Livros para Download:
Baixar livros de Administração
Baixar livros de Agronomia
Baixar livros de Arquitetura
Baixar livros de Artes
Baixar livros de Astronomia
Baixar livros de Biologia Geral
Baixar livros de Ciência da Computação
Baixar livros de Ciência da Informação
Baixar livros de Ciência Política
Baixar livros de Ciências da Saúde
Baixar livros de Comunicação
Baixar livros do Conselho Nacional de Educação - CNE
Baixar livros de Defesa civil
Baixar livros de Direito
Baixar livros de Direitos humanos
Baixar livros de Economia
Baixar livros de Economia Doméstica
Baixar livros de Educação
Baixar livros de Educação - Trânsito
Baixar livros de Educação Física
Baixar livros de Engenharia Aeroespacial
Baixar livros de Farmácia
Baixar livros de Filosofia
Baixar livros de Física
Baixar livros de Geociências
Baixar livros de Geografia
Baixar livros de História
Baixar livros de Línguas
Baixar livros de Literatura
Baixar livros de Literatura de Cordel
Baixar livros de Literatura Infantil
Baixar livros de Matemática
Baixar livros de Medicina
Baixar livros de Medicina Veterinária
Baixar livros de Meio Ambiente
Baixar livros de Meteorologia
Baixar Monografias e TCC
Baixar livros Multidisciplinar
Baixar livros de Música
Baixar livros de Psicologia
Baixar livros de Química
Baixar livros de Saúde Coletiva
Baixar livros de Serviço Social
Baixar livros de Sociologia
Baixar livros de Teologia
Baixar livros de Trabalho
Baixar livros de Turismo