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Universidade do Estado do Rio de Janeiro
Centro de Ciências Sociais
Faculdade de Serviço Social
Gisele Martins Horta
NO MEIO DA TRAVESSIA.
A PRÁTICA DOS ASSISTENTES SOCIAIS NOS SERVIÇOS DE SAÚDE DA AERONÁUTICA/RJ
Rio de Janeiro
2009
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1
GISELE MARTINS HORTA
NO MEIO DA TRAVESSIA.
A PRÁTICA DOS ASSISTENTES SOCIAIS NOS SERVIÇOS DE SAÚDE DA AERONÁUTICA/RJ
Dissertação apresentada, como requisito
para obtenção do Título de Mestre, ao
Programa de Pós-Graduação em Serviço
Social, da Universidade do Estado do Rio
de Janeiro. Área de concentração:
Trabalho e Política Social.
Orientadora: Profª. Drª. Ana Maria de Vasconcelos
Rio de Janeiro
2009
I
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2
HORTA, Gisele Martins
No Meio da Travessia. A prática dos Assistentes Sociais nos
serviços de saúde da Aeronáutica/RJ
Gisele Martins Horta, Rio de Janeiro: UERJ/CCS, 2009.
183 páginas
Dissertação Universidade do Estado do Rio de Janeiro, CCS.
1. Assistentes Sociais/Aeronáutica. 2. Prática Profissional
Saúde. 3. Dissertação (Mest.-UERJ/CCS). I. Título.
II
3
GISELE MARTINS HORTA
NO MEIO DA TRAVESSIA.
A PRÁTICA DOS ASSISTENTES SOCIAIS NOS SERVIÇOS DE SAÚDE DA AERONÁUTICA/RJ
Dissertação apresentada, como requisito
para obtenção do Título de Mestre, ao
Programa de Pós-Graduação em Serviço
Social, da Universidade do Estado do Rio
de Janeiro. Área de concentração:
Trabalho e Política Social.
Aprovado em: ______________________________________________________
Banca Examinadora:
Profª. Drª. Ana Maria de Vasconcelos (Orientadora)
Faculdade de Serviço Social da UERJ
Profª. Drª. Yolanda Aparecida Demetrio Guerra
Faculdade de Serviço Social da UFRJ
Profª. Drª. Maria Inês de Souza Bravo
Faculdade de Serviço Social da UERJ
Rio de Janeiro
2009
III
4
A meus pais Gilson e Irma,
com amor e gratidão.
Aos meus irmãos Fred e Luís, cunhadas e sobrinhos
pelo apoio, carinho e compreensão.
A amiga Rosenária,
apoio incondicional e sempre presente no processo de construção do conhecimento.
A amiga Ozana,
uma luz que iluminou as decisões nos momentos mais difíceis.
Aos Assistentes Sociais
dos serviços de saúde da Aeronáutica,
pela contribuição para avançarmos no debate da profissão.
IV
5
AGRADECIMENTOS
Fácil é ser colega, fazer companhia a alguém, dizer o que ele deseja ouvir.
Difícil é ser amigo para todas as horas e dizer sempre a verdade quando for preciso.
E com confiança no que diz (Carlos Drummond de Andrade).
Agradeço a todos os amigos que de perto e de longe torceram e colaboraram
de alguma forma.
Às queridas amigas do tempo miúdo do trabalho cotidiano, Lúcia, Márcia,
Bernadete e Asenate, que compreenderam as minhas mudanças de humor e
deram forças para continuar essa caminhada.
À nova amiga Giselle
pelo apoio incondicional na reta final deste trabalho.
Às minhas queridas amigas, Fafá, Lu e Ycrad
que, acima de tudo, compreenderam minha ausência.
Às amigas do CRESS/MG, Rosa Helena, Denise Donizette e Graça Sampaio,
que acompanharam e torceram na caminhada ao mestrado.
Às amigas Adrianyce e Daniela
por participarem da gestação deste trabalho.
À amiga Lucimar Grizendi com a qual compartilho alegria, respeito e
admiração.
À minha orientadora Ana Vasconcelos por ter acreditado e confiado em mim
e por haver me inspirado com sua coerente trajetória profissional de luta e atitude
crítica.
Aos professores doutores
que aceitaram participar da banca de qualificação e defesa da dissertação Yolanda
Guerra e Maria Inês Bravo,
agradeço a fecunda contribuição, atenção e disponibilidade.
Não precisa correr tanto; o que tiver de ser seu às mãos lhe há de ir.
(Machado de Assis)
V
6
Digo: o real não está na saída e nem na chegada: ele se dispõe para a gente
é no meio da travessia.
Guimarães Rosa, Grandes Sertões: Veredas.
VI
7
LISTA DE TABELAS
Tabela 1 Formas de Admissão
Tabela 2 Função Exercida
Tabela 3 Utilização dos Aparatos Legais
LISTA DE GRÁFICOS
Gráfico 1 Faixa Etária
Gráfico 2 Estado Civil
Gráfico 3 Ano de Formação
Gráfico 4 Natureza da Instituição formadora X Assistentes Sociais civis/militares
Gráfico 5 Tempo de exercício profissional
Gráfico 6 Tempo de exercício profissional na instituição
Gráfico 7 Função que exerce
Gráfico 8 Participação em Entidade da Categoria
Gráfico 9 Trocaria de emprego
Gráfico 10 Carga Horária cumprida
Gráfico 11 Possui outro vínculo empregatício no Serviço Social
Gráfico 12 Satisfação com a profissão
Gráfico 13 Satisfação com a profissão X Possui outro vínculo empregatício
Gráfico 14 Necessidade de preparação especial para supervisionar
Gráfico 15 Conhece o Código de Ética
Gráfico 16 Código de Ética da Relação com os usuários
Gráfico 17 Autores de Referência
Gráfico 18 Autores de Referência
Gráfico 19 Constituição de 1988 - Importância para a prática
Gráfico 20 Concepção de Saúde
Gráfico 21 Projeto Ético-Político no âmbito militar
Gráfico 22 Conhece o Código X Viabilidade do Projeto Ético-Político
VII
8
Gráfico 23 Projeto de Prática
Gráfico 24 Conhece o Código X Tem projeto na Instituição
Gráfico 25 O Serviço Social tem projeto na Instituição
Gráfico 26 Especificidade do Serviço Social na Aeronáutica
Gráfico 27 Quanto à Qualificação Profissional
Gráfico 28 Especialização/Capacitação Profissional
Gráfico 29 Conhecimento necessário para uma atuação qualificada
VIII
9
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
AAB
ABESS
ABEPSS
AFA
AI
AIS
AMAN
AMH
AMHC
ANAS
ARENA
CBAS
CBCISS
CFAS
CFESS
CGABEG
CIAAR
CNBB
COMAER
COMAR
CONASEMS
COSEMS
CRESS
DIRINT
DIRSA
EAOT
ECA
EEAR
ENESSO
Aliança Anticomunista do Brasil
Associação Brasileira de Ensino em Serviço Social
Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social
Academia da Força Aérea
Ato Institucional
Ações Integradas de Saúde
Academia Militar de Agulhas Negras
Assistência Médico Hospitalar
Assistência Médico Hospitalar Complementar
Associação Nacional de Assistentes Sociais
Aliança Renovadora Nacional
Congresso Brasileiro de Assistentes Sociais
Centro Brasileiro de Cooperação e Intercâmbio em Serviços Sociais
Conselho Federal de Assistentes Sociais
Conselho Federal de Serviço Social
Casa Gerontológica de Aeronáutica Brigadeiro Eduardo Gomes
Centro de instrução e Adaptação da Aeronáutica
Conferência Nacional de Bispos do Brasil
Comando Maior da Aeronáutica
Comando Aéreo Regional
Conselho Nacional de Secretarias Municipais Saúde
Colegiado dos Secretários Municipais de Saúde de Minas Gerais
Conselho Regional de Serviço Social
Diretoria de Intendência
Diretoria de Saúde
Exame de Admissão de Oficiais Temporários
Estatuto da Criança e do Adolescente
Escola de Especialidades de Aeronáutica
Executiva Nacional dos Estudantes de Serviço Social
IX
10
EPCAR
FAB
FAS
FFAA
FIOCRUZ
FUNSA
COMGEP
HAAF
HCA
HFAG
HIV
HU
ICA
INAMPS
ITA
LOAS
LOS
MDB
NOB/SUS
NOS
NPA
NUGG
OAB
OM
OSA
PASIC
PDS
PSDB
PDT
PP
Escola Preparatória de Cadetes do AR
Força Aérea Brasileira
Fundo de Assistência Social
Forças Armadas do Brasil
Fundação Oswaldo Cruz
Fundo de Saúde da Aeronáutica
Comando Geral de Pessoal da Aeronáutica
Hospital de Aeronáutica dos Afonsos
Hospital Central da Aeronáutica
Hospital de Força Aérea do Galeão
(Sigla em inglês) do Vírus Humano da Imunodeficiência
Hospital Universitário
Instrução do Comando da Aeronáutica
Instituto Nacional de Assistência Médica da Previdência Social
Instituto Tecnológico de Aeronáutica
Lei Orgânica da Assistência Social
Lei Orgânica da Saúde
Movimento Democrático Brasileiro
Norma Operacional Básica do SUS
Norma Operacional de Saúde
Norma Padrão de Ação
Núcleo de Geriatria e Gerontologia
Ordem dos Advogados do Brasil
Organização Militar
Organização de Saúde
Programa de Promoção Familiar
Partido Democrático Social
Partido Social Democrático Brasileiro
Partido Democrático Trabalhista
Partido Progressista
X
11
PT
PTB
PUC
QCOA
QFO
SAD
SARAM
SAS
SDEE
SESSUNE
SISAU
SSA
SUDS
SUS
UFJF
UFRJ
UFRN
UGF
UVA
UGG
UNATI
UNE
UTI
Partido dos Trabalhadores
Partido Trabalhista Brasileiro
Pontifícia Universidade Católica
Quadro de Oficiais Temporários da Aeronáutica
Quadro Feminino de Oficiais
Serviço de Atendimento Domiciliar
Subdiretoria de Aplicações dos Recursos para Assistência Médico-Hospitalar
Sistema de Assistência Social
Subdiretoria de Encargos Especiais
Subsecretaria de Estudantes de Serviço Social da UNE
Sistema de Saúde da Aeronáutica
Serviços de Saúde da Aeronáutica
Sistema Único Descentralizado de Saúde
Sistema único de Saúde
Universidade Federal de Juiz de Fora
Universidade Federal do Rio de Janeiro
Universidade do Rio Grande do Norte
Universidade Gama Filho
Universidade Veiga de Almeida
Unidade de Gerontologia e Geriatria
Universidade Aberta da Terceira Idade
União Nacional dos Estudantes
Unidade de Tratamento Intensivo
XI
12
RESUMO
O presente trabalho analisa a realidade da prática dos assistentes sociais
nos serviços de saúde da Aeronáutica/RJ, tendo como referência o projeto ético-
político profissional do Serviço Social expresso no Código de Ética do Assistente
Social, na Lei 8.662/1993 que regulamenta a profissão, bem como nas Diretrizes
Curriculares da ABEPSS. O interesse em realizar este estudo em um espaço
profissional, pouco debatido no meio acadêmico, define-se pela necessidade de uma
investigação teórica que possibilite analisar, revelar e divulgar um segmento da
categoria, muitas vezes desconhecido e estranho ao conjunto dos profissionais do
Serviço Social. Entendemos que este estudo apresenta um caráter
predominantemente exploratório. Para uma melhor compreensão do universo militar
da Aeronáutica, tornou-se imprescindível, captarmos na realidade concreta, os
limites e as possibilidades do movimento do real na sua historicidade. Para tanto,
tivemos como alicerce o referencial teórico marxista crítico-dialético que possibilita ir
para além da aparência dos fatos. É certo que uma instituição cujo funcionamento se
aproxima do modelo de instituição ―fechada‖ e conservadora, fundamentada nos
princípios da hierarquia e da disciplina, sinalize, a priori, uma inviabilidade real de
um projeto profissional emancipatório. Ao realizarmos uma análise dos depoimentos
das assistentes sociais entrevistadas, buscamos considerar a cotidianidade da
prática profissional, que revela presenças e ausências, aponta problemas imediatos
desvela/oculta, caminhando do particular para o universal. Este estudo teve com
lócus de investigação os Hospitais da Aeronáutica do Rio de Janeiro: HAAF, HCA e
HFAG. Tem-se nesses espaços, uma atuação desafiante para aqueles profissionais
que buscam romper com práticas burocráticas e conservadoras e que visam
fortalecer práticas democráticas e coletivas de atendimento às demandas no
contexto institucional.
Palavras-chave: Prática Profissional; Assistentes Sociais, Saúde; Aeronáutica;
Projeto Ético-Político do Serviço Social.
XII
13
ABSTRACT
This paper examines the reality of practice of social workers in the health services of
the Air / RJ, with reference to the ethical-political project of professional social
services, expressed in the Code of Professional Ethics, the Law which regulates the
profession, and as guidelines for curriculum ABEPSS. The interest in performing this
study in professional areas, little discussed in academic circles, defined by the need
for theoretical research that enables analyze, develop and disseminate a segment of
the class, often unknown and alien to all those working in Social Service . We believe
that this study presents a predominantly exploratory nature. For a better
understanding of the universe's military Air Force, it is essential to receive "in reality,
the limits and possibilities of the real movement of its historicity. To this end, we had
the foundation to the theoretical critical-Marxist dialectic that allows to go beyond the
appearance of facts. It is true that an institution whose function is close to the model
institution "closed", positivist and conservative, based on the principles of hierarchy
and discipline, signal, a priori, an impossibility of a real professional emancipatory
project. When we conduct an analysis of the statements of social workers
interviewed, we tried to consider the everyday professional practice, which reveals
presence and absence points to the immediate problems reveals / hides, moving
from the particular to the universal. This study aimed to research the locus of the Air
Force Hospital in Rio de Janeiro: HAAF, HCA and HFAG. It is in these spaces, an
action challenging for those professionals who seek to break bureaucratic practices
and conservative and aimed at strengthening democratic practices and collective
fulfillment of the demands in the institutional context.
Keywords: Practical Professional; Social Workers; Health; Aeronautics; Project
Ethical-Politician of the Social Service.
XIII
14
SUMÁRIO
APRESENTAÇÃO .................................................................................................... 15
INTRODUÇÃO .......................................................................................................... 17
CAPÍTULO I ESTADO, SAÚDE E SERVIÇO SOCIAL .......................................... 23
1.1 Os militares e o Estado: o significado do golpe de abril de 64 ...................................................24
1.2 O processo de redemocratização do Estado: os movimentos sociais e o Serviço Social .....37
1.3 A interface do Serviço Social com a Saúde: breve histórico .......................................................47
CAPÍTULO II A PRÁTICA PROFISSIONAL DOS ASSISTENTES SOCIAIS NA
SAÚDE ...................................................................................................................... 65
2.1 A prática dos assistentes sociais e o projeto ético-político profissional: desafios e
polêmicas postos na atualidade ..............................................................................................................65
2.2 A configuração da prática profissional dos assistentes sociais na saúde ...............................72
CAPÍTULO III A PRÁTICA PROFISSIONAL DOS ASSISTENTES SOCIAIS NOS
SERVIÇOS DE SAÚDE DA AERONÁUTICA/RJ ..................................................... 79
3.1 Aeronáutica: uma instituição militar das Forças Armadas do Brasil .........................................79
3.1.1 A profissão militar ........................................................................................................................84
3.1.2 O Sistema de Saúde da Aeronáutica .........................................................................................89
3.2 O lócus de investigação e o seu cenário: os serviços de saúde da Aeronáutica/Rio de
Janeiro ..........................................................................................................................................................97
3.3 Os assistentes sociais inseridos nos serviços de saúde da Aeronáutica no Rio de
Janeiro/RJ .................................................................................................................................................. 104
3.3.1 Perfil profissional ........................................................................................................................ 104
3.3.2 Referências de conhecimento .........................................................................................135
3.3.3 Prática Profissional .................................................................................................................... 146
3.3.4 Aperfeiçoamento Profissional .................................................................................................. 157
CONSIDERAÇÕES FINAIS .................................................................................... 164
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ....................................................................... 173
ANEXOS ................................................................................................................. 184
15
APRESENTAÇÃO
Este é tempo de divisas, tempo de gente cortada...
É tempo de meio silêncio, de boca gelada e
murmúrio, palavra indireta, aviso na esquina.
Carlos Drummond de Andrade
Era então fevereiro de 2004, quando, como assistente social, entrei pela
primeira vez em uma unidade militar da Aeronáutica, na capital mineira, no Centro
de Instrução e Adaptação da Aeronáutica CIAAR.
Em meio a toda agitação, correria e falação dos concursados (ao todo
formávamos 147 profissionais, distribuídos nas áreas de exatas, humanas e saúde),
o inusitado: um militar munido de um megafone ordena a todos que entrem em
formação para marchar. Assim, começa o dia no Centro de Instrução e Adaptação
da Aeronáutica em Belo Horizonte (MG).
Durante 13 semanas de curso e adaptação à vida militar, foram ministradas
aulas de armamento, munição e tiro; segurança militar; treinamento físico; legislação
e instrução militar; educação cívico-militar; poder aeroespacial, entre outras
disciplinas.
Segui o curso até 30 de abril de 2004 quando, enfim, recebi o diploma e a
nomeação de Segundo-Tenente Assistente Social do Quadro Complementar de
Oficiais da Aeronáutica, sendo designada a atuar no Hospital de Força Aérea do
Galeão/HFAG, no Rio de Janeiro (RJ). Surgiu, então, uma grande inquietação: E o
Serviço Social?
Como disse célebre personagem de Guimarães Rosa: “o real não está na
saída e nem na chegada ele se dispõe para gente é no meio da travessia”
1
.
1. ROSA, J. Guimarães. ―Grande Sertão: veredas‖ In: João Guimarães Rosa. Ficção Completa. Vol. 2. Rio de
Janeiro: Nova Aguilar, 1994. p. 46.
16
Destarte, minha inserção na Aeronáutica se deu pela formação profissional,
como a maioria dos profissionais que estavam, e não por uma vinculação cívico-
militar.
Afinal, a conjuntura atual
2
coloca desafios mais complexos ao mundo do
trabalho. O assistente social como trabalhador se realiza quando sua força de
trabalho é vendida no mercado por intermédio de determinações das condições e
relações de trabalho, meios e mediações
3
·.
Aliás, segundo Costa (2000), a atividade do profissional de Serviço Social,
como tantas outras profissões, está submetida a um conjunto de determinações
sociais inerentes ao trabalho na sociedade capitalista, quais sejam: o trabalho
assalariado; o controle da força de trabalho e a subordinação do conteúdo do
trabalho aos objetivos e necessidades das entidades empregadoras.
Ora, ao término do curso de formação militar, o que de relevante se colocou
foi a constatação de que, desde o ano de 1998, a Aeronáutica vem requisitando,
anualmente, através de Concurso Público para o Quadro Complementar de Oficiais
Temporários da Força Aérea Brasileira, um número expressivo de assistentes
sociais
4
.
Ante tal circunstância, nos pautamos na assertiva de Netto (1992, p. 68) ao
afirmar que:
um mercado não se estrutura para o agente profissional mediante as
transformações ocorrentes no interior do seu referencial ou no marco de
sua prática; antes, estas transformações expressam exatamente a
estruturação do mercado de trabalho, posto que uma profissão não se
constitui para criar um dado espaço na rede sócio-ocupacional, mas é
a existência deste espaço que leva à constituição profissional”. (grifos
nossos)
2 Nunca é demais notar que as transformações operadas nos países capitalistas (centrais e periféricos) nos
últimos trinta anos, oriundas da crise estrutural do capital, produzem alterações no mundo do trabalho.
3 Cf. GUERRA, Yolanda. O projeto profissional crítico: estratégia de enfrentamento das condições
contemporâneas da prática profissional. In Serviço Social e Sociedade 91. Ano XXVIII. Cortez Editora, São
Paulo, 2007.
4 Atualmente, 67% dos assistentes sociais inseridos na Aeronáutica são provenientes dos Quadros de Oficiais -
QCOA (Quadro Complementar de Oficiais Temporários) e QFO (Quadro Feminino de Oficiais de Carreira); 33%
dos assistentes sociais são servidores civis concursados e contratados. FONTE: Subdiretoria de Encargos
Especiais/SDEE da Diretoria de Intendência/DIRINT do Comando da Aeronáutica, 2009.
17
INTRODUÇÃO
A crítica arrancou as flores imaginárias que enfeitavam as cadeias,
não para que o homem use as cadeias sem
qualquer fantasia ou consolação, mas para que
se liberte das cadeias e apanhe a flor viva.
Karl Marx
A presente dissertação tem como objetivo analisar a prática dos assistentes
sociais nos serviços de saúde da Aeronáutica no município do Rio de Janeiro. Tem
como referência o projeto ético-político profissional do Serviço Social expresso no
Código de Ética profissional, na Lei que regulamenta a profissão (nº 8.662/93), bem
como nas diretrizes curriculares da ABEPSS.
O interesse em realizar um estudo junto aos assistentes sociais inseridos nos
serviços de saúde da Aeronáutica (RJ) define-se pela necessidade de uma
investigação teórica que possibilite analisar, revelar e divulgar um segmento da
categoria, muitas vezes desconhecido e estranho ao conjunto dos profissionais do
Serviço Social.
Destarte, percebermos ser esta temática ainda pouco debatida no meio
acadêmico. Chegamos a esta conclusão através da busca pela bibliografia sobre o
tema prática profissional dos assistentes sociais nas instituições das Forças
Armadas, em específico, na Aeronáutica.
Entendemos que este estudo apresenta um caráter predominantemente
exploratório. Desse modo, faz-se pertinente nutrir o debate atual do Serviço Social,
principalmente, se levarmos em consideração que: a prática profissional no campo
militar ainda o é uma área discutida e publicizada no interior do Serviço Social,
não tendo, portanto, destaque nos debates atuais da profissão.
Para uma melhor compreensão desse espaço, torna-se imprescindível,
captarmos na realidade concreta, os limites e as possibilidades do movimento do
real na sua historicidade. Para tanto, faz-se necessário uma reflexão tendo por
alicerce o referencial teórico marxista crítico-dialético que possibilite ir para além da
aparência dos fatos.
18
Com aporte em Behring, podemos dizer que a investigação marxista
caracteriza-se, assim, por não se deixar enganar por aspectos e semelhanças
superficiais presentes nos ―fatos‖, procurando chegar à essência do fenômeno.
(MARX in BEHRING, 2006:39).
De acordo com Vasconcelos (1995):
(...) as tendências, limites e possibilidades estão na realidade e o na
cabeça dos homens e, para chegar a reconhecê-las é necessário um
método que dê conta do movimento da realidade, ou seja, que capte a
verdade desse movimento.
Para Vasconcelos (2007), o método é uma relação necessária entre sujeito
que pesquisa e objeto pesquisado, possibilitando ao sujeito reproduzir o movimento
do objeto (realidade social); relação necessária na medida em que é a única que
permite ao sujeito conhecer realmente o que se passa com o objeto.
Assim, ao analisar a prática dos assistentes sociais nos serviços de saúde da
Aeronáutica/RJ, buscamos considerar que o momento atual vivenciado pela
categoria dos assistentes sociais defronta-se com o desafio de uma determinada
cultura profissional calcada no ressurgimento do conservadorismo profissional, sob a
forma de um neoconservadorismo como é destacado na produção teórica de
diversos autores, a exemplo de Iamamoto (1998) e Netto (1996), bem como
apontado pelas entidades da categoria como o Conjunto CFESS / CRESS
5
,
ABEPSS e ENESSO.
Portanto, acreditamos que a ação de pesquisar está situada entre as
exigências postas ao Assistente Social na contemporaneidade e que imprime uma
necessidade de romper com a prática espontaneísta, superando a dicotomia entre
investigação e intervenção.
É certo que uma instituição cujo funcionamento se aproxima do modelo de
instituição fechada‖ e conservadora, fundamentada nos princípios da hierarquia e
5 O Conselho Regional de Serviço Social - Região e o Programa de Pós - Graduação da Faculdade de
Serviço Social da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) trouxeram a público a discussão do Serviço
Social Clínico - um dos temas polêmicos do debate profissional na atualidade - em junho de 2002. A refleo
acerca do Serviço Social Clínico, entretanto, não se inicia aí. Ela remonta ao protagonismo do Conjunto
CFESS/CRESS, desde 1996, na condução das discussões quanto às atribuições profissionais do assistente
social.
19
da disciplina
6
, sinalize, a priori, uma inviabilidade real de um projeto profissional
que traga contribuição em processos emancipatórios.
Será mesmo? Não podemos cair numa postura fatalista da profissão
7
, de que
nada pode ser feito dentro das amarras das instituições ‗fechadas‘ e burocráticas‖.
Para alguns autores, essas interpretações fatalistas têm levado uma parcela dos
assistentes sociais a minimizar a dimensão operativa e política da sua prática,
reduzindo-as a uma questão de subordinação e até de desvalorização profissional.
Vasconcelos in Mota (2007), ao analisar a viabilidade do projeto hegemônico
no debate teórico da categoria profissional através da pesquisa realizada junto aos
assistentes sociais da Secretaria Municipal de Saúde do Rio de Janeiro
8
afirma:
―(...) É pelo conjunto da prática dos assistentes sociais que a profissão de
Serviço social é reconhecida ou o, valorizada ou não, respeitada ou não,
conquistando sua autonomia e espaços ou não. (...) Assim, explicitamos o
grave momento por que vem passando a prática profissional dos
assistentes sociais. (...) a fratura entre prática profissional realizada pelos
assistentes sociais e as possibilidades de prática contidas na realidade
objeto da ação profissional.” (grifo no original).
Nesse marco, situamos a importância da perspectiva de historicidade que nos
permite compreender a dialética relação passado/presente.
Suscitada então, pela realidade complexa e contraditória da prática
profissional do assistente social na saúde/Aeronáutica/RJ, questionamentos e
inquietações vieram à tona, delimitando o objeto de pesquisa. Ante tal circunstância,
nos atentamos para a assertiva de Otávio Cruz (apud, Minayo,1994), ao falar sobre
a postura do pesquisador em relação à problemática a ser estudada. Para o autor,
às vezes o pesquisador entra em campo considerando que tudo que vai encontrar
serve para confirmar o que ele considera já saber, ao invés de compreender o
campo como possibilidade de novas revelações.
Assim, a pesquisa e análise sobre a prática dos assistentes sociais tiveram
como objetivos específicos, quais sejam:
6 Para hierarquia (leia-se: ordenação da autoridade em níveis diferentes dentro da estrutura das Forças
Armadas) e para disciplina (leia-se: condição necessária ou conjunto de regras, mantendo-se submissa a elas o
militar). Cf. Estatuto dos Militares - Lei nº 6.880 de 9/12/80.
7 Para Iamamoto, o fatalismo é ―inspirado em análises que naturalizam a vida social, traduzido numa visão
‗perversa‘ da profissão. Como a ordem do capital é tida como natural e perene, apesar das desigualdades
evidentes, o Serviço Social encontrar-se-ia atrelado às malhas de um poder tido monolítico, nada lhe restando
fazer. No máximo, caberia a ele aperfeiçoar formal e burocraticamente as tarefas que são atribuídas aos quadros
profissionais pelos demandantes da profissão. Cf. Iamamoto, 1992:115.
8 Para maiores informações consultar Vasconcelos, Ana Maria. A prática do Serviço Social, cotidiano, formação
e alternativas na área da saúde. Cortez Editora, São Paulo, 2002.
20
Identificar o perfil dos assistentes sociais que atuam nos serviços de saúde da
Aeronáutica/RJ;
Identificar as referências de conhecimento teóricas e ético-políticas dos
assistentes sociais;
Identificar se os assistentes sociais buscam aperfeiçoamento e/ou
aprimoramento profissional, visando uma capacitação que possa responder
as demandas do Serviço Social.
Inicialmente, foi realizado o levantamento bibliográfico sobre a temática
prática dos assistentes sociais nos serviços de saúde das Forças Armadas
(Aeronáutica, Marinha e Exército), com ênfase no município do Rio de Janeiro, bem
como o aprofundamento teórico sobre a prática dos assistentes sociais na saúde,
com ênfase em hospitais.
Esse levantamento desenvolve-se através de pesquisa em distintas
bibliotecas: UERJ, UFRJ, UFJF, PUC-RJ; pelas ferramentas de busca da internet
(Scielo); pelo banco de teses do site www.assistentesocial.com.br.
Contudo, não foi encontrado nenhum estudo voltado à temática prática dos
assistentes sociais nos serviços de saúde da Aeronáutica, assim como da Marinha
e/ou do Exército; foram encontrados estudos no tocante à Política de Assistência
Social da Marinha (PUC-RJ) e no que se refere à temática do Idoso e de sua
internação em uma instituição geronto-geriátrica: estudo realizado na Casa
Gerontológica de Aeronáutica Brigadeiro Eduardo Gomes (UNATI/UERJ).
No tocante ao procedimento de pesquisa, colhemos e analisamos os dados
sobre a prática dos assistentes sociais, através do instrumento formulário de
entrevistas
9
, na busca de dados qualitativos e quantitativos. Para tanto, foi solicitado
prévia autorização junto ao Serviço Social da Subdiretoria de Encargos Especiais
(SDEE) da Diretoria de Intendência (DIRINT), do Comando da Aeronáutica
10
, bem
como utilizado o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, devidamente datado
e assinado pelas profissionais entrevistadas, e pesquisadora.
9 Formulário ANEXO I.
10
Autorização para aplicação de formulário de entrevistas junto às assistentes sociais dos serviços
de saúde da Aeronáutica/RJ, através de documento fax destinado a SDEE em 25/03/2009.
21
Portanto, as entrevistas foram anotadas e gravadas com o consentimento
prévio das entrevistadas, posteriormente, digitadas em um banco de dados da
pesquisa, em programa que permite a análise detalhada dos dados.
Ressalta-se que somente a partir do mês de dezembro de 2009, que a
Comissão de Ética e Pesquisa (CEP) do Hospital de Força Aérea do Galeão,
(unidade na qual esta pesquisadora encontra-se inserida), efetivou devido
credenciamento junto ao Conselho Nacional de Ética e Pesquisa (CONEP), com
previsão de atuação para o ano de 2010.
Este estudo teve com lócus de investigação os serviços de saúde da
Aeronáutica/RJ, junto aos assistentes sociais que atuam nessas instituições, em
específico, nos Hospitais do município do Rio de Janeiro, quais sejam:
Hospital de Aeronáutica dos Afonsos/HAAF (localizado no Bairro
Sulacap);
Hospital Central da Aeronáutica/HCA (localizado no Bairro Rio
Comprido);
Hospital de Força Aérea do Galeão/HFAG (localizado no Bairro Ilha do
Governador).
Ao realizarmos uma análise dos depoimentos dos assistentes sociais
entrevistados, buscamos considerar a cotidianidade da prática profissional, que
revela presenças e ausências, aponta problemas imediatos, desvela/oculta,
caminhando do particular para o universal. Embora a prática cotidiana do assistente
social se efetive por aproximações, desvios, soluções para resolver dificuldades
imediatas, isso não significa que o saber necessário para a ação no serviço social se
restrinja ao cunho utilitarista ou imediatista. Significa, sim, que, seja qual for seu
objeto, direta ou indiretamente, o profissional poderá procurar encaminhar suas
reflexões e seus resultados em um sentido histórico, social, político e técnico de
produção de conhecimentos que tem em vista uma prática mais conseqüente
(BAPTISTA, 2006).
Visando subsidiar a etapa de análise empírica do nosso objeto, valemo-nos,
tamm, de um roteiro de observação (técnica de observação direta
11
), que
possibilita captar o movimento das unidades de saúde; identificar as demandas
11 A técnica da observação direta, ou pessoal, consiste, portanto, na verificação in loco de tudo o que acontece
no ambiente em que se desenvolve o processo em estudo, de forma sistemática e planejada.
22
institucionais e da população usuária e as possibilidades de prática para o Serviço
Social. Ao realizarmos uma análise dos depoimentos das assistentes sociais
entrevistadas, buscamos considerar a cotidianidade da prática profissional, que
revela presenças e ausências, aponta problemas imediatos desvela/oculta,
caminhando do particular para o universal.
Tem-se nesses espaços, uma atuação desafiante para aqueles profissionais
que buscam romper com práticas burocráticas e conservadoras e que visam
fortalecer práticas democráticas e coletivas de atendimento às demandas no
contexto institucional.
Este estudo configurou-se da seguinte forma:
No Capítulo 1, buscamos fazer um resgate do período sócio-histórico do
regime ditatorial (1964 a 1985), até a retomada das bases federativas do Estado
brasileiro, apresentando as análises feitas sobre a significação do golpe militar de 64
e a implantação da ditadura no país e as conseqüências desta na configuração do
Estado brasileiro. Em seguida, abordamos o processo de redemocratização no país
com a vital participação dos movimentos sociais, bem como a histórica interlocução
do Serviço Social brasileiro, com estes, em específico, com o movimento sindical-
operário. Abordamos, tamm, a trajetória da política de saúde no Brasil e o
processo de descentralização da saúde ante ao conjunto de reformas político-
institucionais iniciadas na cada de 80, com destaque para a constituição de um
Sistema Único de Saúde ao final dos anos 80.
No Capítulo 2, objetivamos refletir sobre a política de saúde nos anos 90 e no
governo Lula, culminando nos desafios atuais postos para esta, bem como para o
projeto ético-político do Serviço Social. Em seguida, apresentamos a configuração
da prática profissional dos assistentes sociais na saúde.
No Capítulo 3, destacamos, inicialmente, os procedimentos metodológicos
utilizados para a conformação deste estudo. Em seguida, apresentamos as análises
suscitadas a partir das respostas das assistentes sociais entrevistadas.
23
CAPÍTULO I ESTADO, SAÚDE E SERVIÇO SOCIAL
Dormia a nossa Pátriae tão distraída
sem perceber que era subtraída em
tenebrosas transações”.
Chico Buarque de Hollanda
Neste capítulo, mergulhamos nos determinantes sócio-históricos do regime
ditatorial com a instauração do golpe de abril de 64, procurando apreender seu
sentido e significado, pois, embora o Brasil celebre 24 anos de democracia depois
de 21 anos de ditadura militar, podemos dizer que o regime militar brasileiro marcou
profundamente a todos, sejamos contemporâneos ou não, protagonistas ou não de
um processo doloroso e assustador da história do país. Na verdade, os resquícios
desse período ainda se fazem sentir.
Isto nos permite compreender que a instauração da ditadura militar no pós-64
expressou a derrota das forças democráticas no Brasil. O Estado vai intervir na
questão social por meio do binômio repressão assistência, burocratizando e
modernizando a máquina estatal com a finalidade de aumentar o poder de regulação
sobre a sociedade, de reduzir as tensões sociais e de conseguir legitimidade para o
regime (BRAVO e MATOS, 2004).
Percorremos pelo movimento de redemocratização do país com a vital
participação dos movimentos sociais e do Serviço Social. Posteriormente,
discorremos sobre a interface do Serviço Social com a Saúde através de um breve
histórico. Vamos encontrar uma política de saúde no período de 1964 a 1974, que
privilegia o setor privado, articulada às tendências da política econômica implantada.
Nesse marco, situamos que o Serviço Social no pós-64 sofreu profundas
transformações, que tiveram rebatimento na prática profissional do assistente social
na área da saúde. É o que veremos mais adiante.
24
1.1 Os militares e o Estado: o significado do golpe de abril de 64
De acordo com D‘Araújo (2001, p. 325), definir o papel e os limites da ação
dos militares no Brasil é sempre uma questão importante e por várias razões. Em
primeiro lugar, desde a Proclamação da República, as Forças Armadas são uma
instituição central na definição dos rumos políticos do país. Em segundo, porque os
militares desenvolveram projetos próprios acerca de segurança e desenvolvimento
nacionais, o que ficou expresso em movimentos como o Tenentismo em 1920, o
Nacionalismo dos anos 50 e o Anticomunismo dos anos 60. Em terceiro, porque
sempre fizeram parte do cálculo político de partidos e grupos políticos que
permanentemente viram nas Forças Armadas um aliado importante para a conquista
e manutenção do poder ou a derrubada de grupos concorrentes.
Assim, as Forças Armadas Brasileiras efetivaram a dominação autoritária do
Estado em nome de um denominado projeto de ―Brasil Futuro‖, que buscava a
aceleração do desenvolvimento capitalista e a incorporação do Brasil ao espaço
econômico, cultural e político das nações capitalistas centrais. Sinalizam, assim, um
padrão de desenvolvimento econômico associado subalternamente aos interesses
imperialistas, com uma integração mais dependente do sistema capitalista.
Para Netto (1996), nunca escapou aos analistas da ditadura brasileira que
sua emergência inseriu-se num contexto que transcendia largamente as fronteiras
do país. Movendo-se na moldura de uma substancial alteração na divisão
internacional capitalista do trabalho, os centros imperialistas sob o hegemonismo
norte-americano patrocinaram, especialmente nos anos sessenta, uma
contrarrevolução preventiva
12
, principalmente no chamado Terceiro Mundo, onde se
desenvolviam, diversamente, amplos movimentos de libertação nacional e social.
Segundo o historiador e militar da reserva Nelson Werneck Sodré
13
, que
apresenta em sua obra uma análise crítica quanto às condições para a implantação
da ditadura no país (denominada pelo autor de regime fascista
14
), a influência do
12 Cf. NETTO, José Paulo. Ditadura e Serviço Social: uma análise do Serviço Social no Brasil pós-64. São
Paulo: Cortez, 1996. (p. 16-25).
13 Cf. SOD, Nelson Werneck. Vida e Morte da Ditadura. São Paulo: Vozes, 1984.
14 Regime político de caráter totalitário que surge na Europa no entre-guerras (1919-1939). Originalmente é
empregado para denominar o regime político implantado pelo italiano Benito Mussolini entre 1919 e 1943. O
fascismo nasce oficialmente em 1919, em Milão, quando Mussolini funda o movimento intitulado Fascio de
Combatimento, cujos integrantes, os camisas pretas (camicie nere), se opõem à classe liberal. Pretendem tomar
25
imperialismo dos Estados Unidos na constituição e consolidação do golpe de abril de
64 arraiga profundas marcas na história do regime militar como parte de uma tríplice
aliança entre as Forças Armadas brasileiras, a burguesia nacional e a burguesia
estrangeira.
Fernandes (1987), através de uma interpretação sociológica da Revolução
Burguesa no Brasil e de um exame detalhado do processo que culminou no golpe de
abril de 1964, teceu sua análise na perspectiva de entender o movimento histórico
das transformações econômicas, políticas e sociais desde o início da consolidação
da hegemonia burguesa na sociedade brasileira.
O período do regime militar apresentou considerável crescimento econômico,
concentração de riqueza, empobrecimento relativo dos trabalhadores em geral e
empobrecimento absoluto do operariado. Foi marcado, ainda, pela implantação de
um amplo e complexo sistema de gestão e regulação estatal dos conflitos sociais em
que a política social integra o conjunto das estratégias do governo.
De um lado, o estímulo à produção e à concentração de riquezas e, de outro,
a legitimação de um modelo de desenvolvimento apresentado como o melhor para a
nação, sob o lema da segurança nacional contra as ameaças internas e externas de
instauração, no país, de outro modo de pensar e de organizar a sociedade, que
fosse contrário aos interesses capitalistas dominantes (SILVA, 1999, p. 63).
Segundo Bravo (2007), o Estado utilizou para sua intervenção o binômio
repressão - assistência, sendo a política assistencial ampliada, burocratizada e
modernizada pela máquina estatal com a finalidade de aumentar o poder de
regulação sobre a sociedade, suavizar as tensões sociais e conseguir legitimidade
para o regime, como tamm servir de mecanismo de acumulação do capital.
De acordo com a assertiva de Netto (1996, p.17), “a significação do golpe de
abril, sem menosprezo da contextualidade internacional da contrarrevolução
preventiva, deve ser buscada na particularidade histórica brasileira.
Sublinha o autor,
As linhas de força que mais decisivamente contribuíram para perfilar esta
particularidade o conhecidas: a construção, desde o período colonial [...]
de atividades econômicas básicas internas cujo eixo de gravitação era o
mercado externo, o mercado, mundial em emergência e, ulteriormente, em
consolidação (PRADO Jr., 1963 e 1965); a ausência de uma nuclear e
o poder militarmente e ocupam prédios públicos e estações ferroviárias, exigindo a formação de um novo
gabinete.
26
radical ruptura com o estatuto colonial (FERNANDES, 1975), [...] (NETTO,
1996, p.17).
De acordo com Fernandes (1982, p. 10), a busca no passado recente da
história do Brasil torna-se a chave explicativa para as origens da atual configuração
do Estado brasileiro. Como afirma:
[...] não se pode dissociar o Estado, o governo e a sociedade; se isso fosse
feito, não se poderia entender as origens, os limites e as funções do Estado
e como este é determinado socialmente e se transforma historicamente e
como o governo surge e cresce como uma forma política destinada a
reproduzir, a defender e a impulsionar a evolução progressiva (ou
regressiva) de certo tipo de Estado.
O autor parte do pressuposto de que o regime político brasileiro teria duas
caras, dois lados de uma mesma moeda: a democracia burguesa e a república
institucional.
Para Fernandes (1982), o que explicaria a existência da "república
institucional" seria a incapacidade de a "classe burguesa" manter o poder por si
mesma. Esta incapacidade derivaria do caráter predatório e parasitário do
capitalismo brasileiro, uma característica comum aos países periféricos de
desenvolvimento tardio. Portanto, tímida, assustada e muito preocupada, a
burguesia nacional o assumiria seu papel de levar à frente uma revolução
burguesa profunda, que implicaria a sua independência em relação ao capitalismo
monopolista internacional e o estabelecimento de uma democracia de massas com
ampla participação dos sindicatos e partidos de esquerda.
Fernandes (ibidem) afirma que, devido ao seu temor e pânico, a burguesia
nacional terminaria por pedir a ajuda aos militares, os quais implantaram um regime
repressivo e autoritário.
O Golpe
Podemos dizer que o início da década de 60 foi marcado por uma ampla
efervescência dos grupos de esquerda
15
e dos movimentos culturais. O governo
João Goulart era visto com receio: temido por apresentar uma direção política mais
15 O movimento estudantil da época era reconhecido por ser ativo e bem articulado, com grande impacto na
opinião pública. Igualmente, o movimento operário se destacava por sua autonomia sindical através do CGT
(Comando Geral dos Trabalhadores), um tipo de diretório central, que organizava greves, bem como
reivindicava, constantemente, a ampliação dos direitos trabalhistas. Cf. José Murilo de Carvalho. Forças
Armadas e Política no Brasil. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editora, 2005.
27
afinada com as bases de esquerda, despertando um significativo número de
oposicionistas, e (re)considerado por alguns um governo populista e reformista
burguês, sem reais preocupações com transformações de ordem econômico-social.
Como informa Carvalho
16
(2005, p.118):
[...] Era grande a politização do mundo estudantil. Em consonância com o
que passava na política nacional. Muitos de nós acreditávamos
ingenuamente que o país caminhava para o socialismo e queríamos fazer
parte da jornada. O presidente João Goulart era visto com suspeita, mas
acreditávamos que o movimento popular, os operários, os estudantes, os
camponeses, operariam a mudança com ou sem ele
Aos 13 de março de 1964, no Rio de Janeiro, o ―Comício das Reformas‖
realizado por Jango, juntamente com o apoio do Comando Geral dos Trabalhadores
(CGT), em praça pública, foi o assombro para a burguesia nacional. A eclosão de
movimentos organizados da sociedade civil terrificava cada vez mais a burguesia
nacional, que não demorou a se manifestar.
Em 19 de março, os inimigos do presidente - com o intento de criar uma
atmosfera favorável à intervenção militar, bem como de incitar as Forças Armadas
ao golpe de Estado - reuniram cerca de 500 mil manifestantes que saíram pelas ruas
de São Paulo, em favor da ―Marcha da Família com Deus pela Liberdade‖.
Incentivados por políticos do Partido Social Democrata PSD e da União
Democrática Nacional - UDN (representantes dos grandes proprietários de terras e
setores conservadores da Igreja Católica), os setores da classe média e da
burguesia, em defesa da propriedade, da moral cristã, da religiosa e a favor do
anticomunismo, saíam às ruas nas maiores capitais do país contra o governo
Goulart.
Em de abril de 1964, não havia mais dúvidas, o golpe fora consolidado,
fruto do triunfo de um movimento histórico que vinha se estruturando desde a
década de 50.
Segundo relato de Carvalho (2005),
Contemplávamos, perplexos, a alegria dos que celebravam a vitória e
assistíamos, assustados, ao início da violência contra os derrotados. Alguns
16 O autor José Murilo de Carvalho era aluno em 1964 do curso de Sociologia e Política da Faculdade de
Ciências Econômicas, da antiga Universidade de Minas Gerais e militava na Ação Popular, grupo de esquerda
católica. Cf. José Murilo de Carvalho (idem).
28
alunos da faculdade, partidários do golpe, andavam armados pela cidade
caçando os colegas de esquerda. O sonho do socialismo esboroava-se
como um castelo de areia.
De acordo com Netto (1996, p. 25), o desfecho de abril foi a solução política
que a força impôs:
a força bateu o campo da democracia, estabelecendo um pacto
contrarrevolucionário e inaugurando o que Florestan Fernandes qualificou
como “um padrão compósito e articulado de dominação burguesa17
[...], expressou a derrota das forças democráticas, nacionais e populares;
todavia, o seu significado histórico-social era de maior fôlego: o que o
golpe derrotou foi uma alternativa de desenvolvimento econômico
social e político que era virtualmente a reversão do já mencionado fio
condutor da formação social brasileira. (grifos nossos).
Para o autor, o fulcro dos dilemas brasileiros no período 1961-1964 pode ser
sintetizado na constatação de uma crise da forma da dominação burguesa no Brasil,
gestada fundamentalmente pela contradição entre as demandas derivadas da
dinâmica do desenvolvimento embasado na industrialização pesada e a modalidade
de intervenção, articulação e representação das classes e camadas sociais no
sistema de poder político. Conforme afirma o autor:
[...] sabe-se em que sentido os setores burgueses resolveram os seus
dilemas: deslocaram-se para o campo da antidemocracia. Tal
deslocamento, como ocorreu em abril de 1964, implicou, em relação ao
passado recente da formação social brasileira, um movimento
simultaneamente de continuidade e ruptura. (NETTO, 1996, p.26).
A continuidade se expressa no resgate das piores tradições da sociedade
brasileira a heteronomia
18
e a exclusão. Entretanto, as dimensões principais do
sistema autocrático que se ergue a partir do golpe de 64 o as que transcendem a
pura reiteração dos traços consagrados na formação brasileira são exatamente as
que determinam os traços que caracterizam a novidade do que se constituiu
precisamente em centro articulador e meio coesionador da autocracia burguesa, o
seu Estado. Continuando o autor afirma:
[...] O Estado que se estrutura depois do golpe de abril expressa o rearranjo
político das forças sociais econômicas a que interessam a manutenção e a
continuidade daquele padrão de acumulação que garante a prossecução de
tal padrão, mas, isto é crucial, readequando-o às novas condições internas
18 Heteronomia: Condição de pessoa ou grupo que receba de um elemento que lhe é exterior, ou de um
princípio estranho à razão, a lei a que se deve submeter.
29
]e externas que emolduravam [...]. O Estado erguido nos s-64 tem por
funcionalidade assegurar a reprodução do desenvolvimento dependente e
associado, assumindo, quando intervém diretamente na economia o papel
de repassador de renda para os monopólios, e politicamente mediando os
conflitos setoriais em benefício estratégico das corporações transnacionais
[...]. (1996, p.28).
O golpe militar de 1964 não apenas representou um contramovimento às
transformações culturais e políticas, mas também apresentou, clara e nitidamente,
um objetivo muito específico: implantar legitimamente no país uma política de terror
com vistas ao aprofundamento do capitalismo monopolista.
Carvalho (2005) menciona que foram estabelecidas diversas tentativas de
atribuir ao golpe de 1964 a sua inevitabilidade. Para o autor, a maioria dessas
tentativas surgiu no seio da própria esquerda, como uma justificativa para seus
―erros políticos‖. Ainda de acordo com Carvalho, a explicação mais difundida foi a de
que o golpe resultou de uma conspiração por parte do imperialismo norte-americano.
Assim, no que se refere à interferência norte-americana, deve-se notar que a
documentação sobre ela foi conhecida muito depois, quando foram abertos os
arquivos do presidente norte-americano Lyndon Johnson
19
. Soube-se, então, que a
operação Brother Sam
20
consistia em plano de interferência a ser posto apenas no
caso de haver guerra civil em que os golpistas necessitassem de apoio
21
.
Carvalho (2005) não desconsidera que os Estados Unidos estavam
interessados na derrota do presidente João Goulart, pois havia dinheiro americano
no Instituto Brasileiro de Ação Democrática (IBAD) e a CIA
22
não descansava. Para
19 Lyndon Baines Johnson (1908- 1973) foi o trigésimo sexto presidente dos Estados Unidos da América, de
1963 a 1969.
20 A Operação Brother Sam foi desencadeada pelo governo dos Estados Unidos da América, sob a ordem de
apoiar o golpe de 1964 caso houvesse algum imprevisto ou reação por parte dos militares que apoiavam Jango,
consistindo de toda a força militar da Frota do Caribe, liderada por um porta-aviões da classe Forrestal da
Marinha dos Estados Unidos e outro de menor porte, além de todas as belonaves de apoio requeridas a uma
invasão rápida do Brasil pelas forças armadas americanas. Cf. Endereço eletrônico. http://pt.wikipedia.org.
Acesso em 13/12/2008.
21 Em 1997, foi oficialmente divulgada nos EUA a transcrição de fitas gravadas de conversas do presidente
Lyndon Johnson, a respeito do Brasil. Em uma delas, no dia 20 de dezembro de 1963, o presidente Johnson diz
para o senador Mike Mansfield (líder do governo): "Preciso sentar e conversar com você sobre o que está
acontecendo no Brasil. Preciso contar o que está acontecendo no Vietnã. Acho que você não sabe. Não creio
que você saiba como é séria a situação". Em outra, na noite de 30 de março de 1964, com o assessor George
Reedy, o presidente afirma: "Com certeza, se explodir nesta noite, você saberá amanhã de manhã". E Reedy:
verdade. E então vamos precisar de uma reação. Mas, se não explodir nesta noite, acho que devemos ficar no já
previsto‖. (...) Outro trecho, já pós-golpe (em 3 de abril), mostra diálogo do presidente com o subsecretário de
Estado para Assuntos Interamericanos, Thomas Mann. "Espero que você esteja tão feliz com o Brasil quanto
eu", diz Mann. "Estou", responde o presidente. "Creio que é a coisa mais importante que aconteceu no
hemisfério nos últimos três anos", torna Mann. E o presidente: "Espero que nos dêem crédito, em vez de nos
infernizarem". Cf. Veja on-line: http://veja.abril.com.br. Acervo Digital. “O embaixador e o golpe”, de Eurípedes
Alcântara em 15/10/1997.
22 Central Intelligence Agency (CIA), em português Agência Central de Inteligência, é um serviço de inteligência
(serviço de informações) dos Estados Unidos da América.
30
o autor (ibidem, p.121): “tudo isso no máximo encorajou os golpistas, mas a
conspiração foi interna como internas as causas de seu êxito”. Nas palavras de
Carvalho:
[...] Para os golpistas, foi boa notícia, para a esquerda, foi um choque.
Como fora possível uma vitória tão fácil? Onde estavam os sindicatos, os
estudantes, o movimento popular, os generais do povo, o dispositivo militar?
[...] O presidente denunciava o golpe da oposição de direita, que
denunciava o golpe do presidente; a esquerda radical, liderada por Brizola e
seus Grupos dos Onze
23
, denunciava o golpe do presidente e da direita, era
acusada por ambos de preparar o próprio golpe. Mas ninguém esperava um
desfecho tão rápido (2005, p.119).
Para Dreifuss (1981), a implantação do golpe teria por objetivo a conquista da
hegemonia, da fração multinacional e associada da burguesia. Ou seja, segundo o
autor, as elites foram capazes de assegurar o poder econômico e administrativo,
transformando o aparelho do Estado em um objeto dos interesses monopolistas.
O autor assevera:
O poder de classe dos interesses multinacionais e associados foi
expressado, depois de abril de 1964, através da hegemonia para eles
estabelecida dentro do aparelho de Estado, do controle direto das agências
de formulação de diretrizes políticas e de tomada de decisão e da presença
pessoal dos representantes desses interesses econômicos na
administração em geral (1981, p.419).
Segundo o autor, a queda do governo do presidente João Goulart ocorreu não
por um golpe das Forças Armadas Brasileiras, mas sim em decorrência de um
movimento civil-militar. Os articulistas do golpe seriam as classes dominantes, os
latifundiários, os grandes empresários e banqueiros, liderados por associações de
classe sob a coordenação e a cobertura ideológica do Instituto Brasileiro de Ação
Democrática (IBAD) e do Instituto de Pesquisas Econômicas e Sociais (IPES).
Em contraponto, Carvalho (2005, p.126) considera que o desfecho do golpe
de 64 se deu muito mais pelas ações e omissões de agentes políticos, do que pelas
grandes causas sociais. Segundo o autor, explicadas ou não as surpresas de 1964,
a responsabilidade principal pelo golpe foi dos que o deram e não dos que o
sofreram. Como afirma: “os vencedores contaram, no entanto, com a ajuda dos
perdedores”.
23 Brizola, em fins de novembro de 1963, pregava a formação de "grupos de onze companheiros" ou "comandos
nacionalistas". O ―Grupo dos Onze tinha como objetivo lutar pela implantação das reformas e a libertação do
Brasil da espoliação internacional. O movimento previa o lançamento de um periódico denominado ―Panfleto‖,
que teve o seu primeiro mero impresso. Brizola continuava sua caminhada pela esquerda radical,
despontando como o principal líder rebelde no Brasil. Cf. Endereço eletrônico: (http://www.pdt.org.br ) Link
Memória trabalhista/nossos lideres/LeonelBrizola.
31
Ao explicitar sua tese, o autor utiliza-se de expressões de Maquiavel
24
: como
virtù (para designar a predominância das ações) e fortuna (para os fatores não
controláveis). O golpe e sua rápida vitória não foram determinados pela presença da
fortuna, mas pela ausência de virtù: “não me parece que o processo democrático
que se construía às duras penas tenha sido interrompido por fatores independentes
da ação humana” (idem, p.127).
Na assertiva de Carvalho, os militares tinham e m interesses próprios.
Desse modo,
―havia um interesse corporativo e um interesse nacional, industrializante,
que se combina com o projeto de algumas elites civis. Havia uma aliança,
sem vida, mas não só. Tanto que, logo depois do golpe, vários aliados de
véspera começaram a romper‖ (2005, p.127).
Carvalho (ibidem) apresenta uma análise centrada na valorização do papel do
militares. Menciona que suas apreciações se distanciam das demais análises da
intervenção militar. Nesses termos, o autor dialoga com as análises marxistas que,
segundo o autor, atribuem às intervenções militares o papel de instrumento da
burguesia industrial para ganhos econômicos e políticos, haja vista os fatores
estruturais da sociedade tais como a posição do país no sistema capitalista; a
natureza da luta de classes; o tipo de modernização em vigor.
Pois bem. Com base nas análises aqui apresentadas, podemos dizer que o
golpe de 1964 é oriundo de vários fatores, de precedência política, econômica,
ideológica. As estratégias de legitimação da larga duração da ditadura militar foram
implacavelmente atinentes ao aprofundamento do capital internacional no país.
É fato que inúmeras interpretações para o fenômeno‖ do golpe de 64 foram
exaustivamente trabalhadas no debate político-social do país. De acordo com a
literatura, as principais e mais sólidas teses explicativas do fenômeno podem ser
agrupadas em três correntes, quais sejam: as tentativas de teorização da Ciência
Política, as análises marxistas e a valorização do papel dos militares.
Reiteramos que a perspectiva teórica que nos orienta é o materialismo crítico-
dialético, o que nos permite compreender o regime político ditatorial como um
processo e resultado de relações complexas e contraditórias que se estabelecem
entre Estado e sociedade no âmbito do conflito de classes.
24 Cf. MAQUIAVEL, Nicolau. O Príncipe. Escritos Políticos. Edição Os Pensadores. Editora Nova Cultural Ltda:
Tradução Olívia Baudh. São Paulo, 2004.
32
As disparidades, desigualdades e contradições colocam-se, desde o começo,
como momentos nucleares das relações, processos e estruturas de dominação
política e apropriação econômica que produzem e reproduzem a sociabilidade
burguesa. A contestação está implantada em nível das estruturas, do funcionamento
e das transformações dessa sociedade de classes, nascida do capitalismo industrial
(IANNI, 2004).
Fernandes (1982) menciona que o regime ditatorial e a vinculação dos
militares aos setores sociais dominantes - tendo em vista as muitas intervenções
realizadas por eles no decorrer da história do país - não foram iniciativas isoladas de
certos membros da Forças Armadas. A intervenção militar se deu em vários
momentos após a realização de contatos e articulações com determinados setores
da esfera civil, como os políticos conservadores e certos grupos do empresariado
nacional e multinacional.
O autor em outra obra de 1987 considera que a revolução burguesa
desenvolve-se de forma lenta e contraditória, sempre pelo alto, excluindo ou
limitando bastante as conquistas democráticas que possam representar a presença
do trabalhador da cidade e do campo nos diferentes círculos em que organiza o
poder.
Para Netto (1996), na verdade, a ditadura militar reeditou a modernização
conservadora como via de aprofundamento das relações sociais capitalistas no
Brasil, de natureza claramente monopolista. Para o autor, o Estado ditatorial e o
regime político que o expressa haveriam de se constituir num processo dinâmico e
contraditório, plasmado pela intercorrência dos conflitos e tensões entre os parceiros
do pacto contrarrevolucionário, pelas formas de oposição e resistência que
encontrariam na afirmação do novo bloco dominante e suas políticas e das novas
colisões derivadas das suas iniciativas econômicas e sociais. Assim, o ciclo
autocrático burguês recobre três momentos nitidamente diferenciados, quais sejam:
de abril de 1964 a dezembro de 1968; de dezembro de 1968 a 1974 (envolvendo
basicamente o fim do governo Costa e Silva, o intermezzo da Junta Militar e todo o
governo Médici); e o governo Geisel (1974-1979).
O primeiro momento (1964-1968) é singularizado, ainda de acordo com Netto
(ibidem), pela inépcia da ditadura legitimar-se politicamente, em articular uma ampla
base social de apoio que sustentasse as suas iniciativas. Portanto, a aceleração do
33
processo político foi potencializada por dois fenômenos: o movimento operário e
sindical retomou ações significativas e o movimento estudantil, expressão
privilegiada da pequena burguesia urbana, assumiu ruidosamente a frente da
contestação à nova ordem.
Logo, os militares reagiram. O novo governo passou a governar por decreto, o
chamado AI (Ato Institucional). O presidente baixava o AI sem consultar ninguém e
todos tinham de obedecer. O AI-1 determinava que a eleição para presidente da
República fosse indireta. Posteriormente, o AI-2 acabava em definitivo com as
eleições diretas para presidente da República, bem como com os partidos políticos
tradicionais. O PSD, o PTB, a UDN foram proibidos de funcionar, podendo existir
somente dois partidos políticos: a Arena (Aliança Renovadora Nacional), o partido do
governo e o MDB (Movimento Democrático Brasileiro), o partido da oposição.
A partir do ano de 1968, o que fora, até então, uma ditadura reacionária, que
conservava, segundo Netto (1996), um discurso coalhado de alusões à democracia
e uma prática política no bojo da qual ainda cabiam algumas mediações de corte
democrático parlamentar, converte-se num regime político de nítidas características
fascistas
25
”.
O começo do ano de 1968 foi palco de mobilização estudantil; os estudantes
tinham conseguido rearticular um centro de resistência, a União Nacional dos
Estudantes (UNE), que, após a morte do estudante Edson Luís
26
, manifestou o
repúdio às ações repressivas dos militares com a passeata dos ―Cem Mil no Rio de
Janeiro, a qual mobilizou a Igreja Católica e a classe média.
As passeatas de estudantes passaram a ser violentamente reprimidas pelas
próprias Forças Armadas e muitos estudantes foram feridos. O congresso secreto da
UNE, em Ibiúna (SP), foi dissolvido e, como resultado, 1.240 estudantes presos.
Nesse marco, situamos, no âmbito da esquerda, que a militância em oposição
à ditadura militar brasileira não foi homogênea; diferentes projetos societários se
articulavam e se confrontavam, dando origem a inúmeros partidos políticos e
25 Arendt faz uma importante diferenciação entre os regimes ditatoriais e os totalitários. A autora considera que
nas ditaduras se tem a supressão da liberdade política, enquanto que a vida privada não é afetada. Nos
governos totalitários, todas as esferas da vida são afetadas; logo, a dominação não se estende somente à esfera
da política. Cf. ARENDT, Hannah. Responsabilidade e Julgamento. 1º. ed. São Paulo: Companhia das Letras,
2004. 375 p.
26 Em 28 de março de 1968, o estudante secundarista, filho de operários, foi morto durante uma passeata perto
da Igreja da Candelária (RJ), onde a polícia atirara indiscriminadamente contra uma multidão de manifestantes
que protestavam contra o fato de o governador haver retirado os subsídios para a alimentação dos estudantes no
Restaurante do Calabouço (RJ).
34
movimentos de diversas orientações político-ideológicas.
Vamos encontrar na literatura, a análise de que o ano de 1968 tornou-se um
ano enigmático porque foi o ponto de partida para uma série de transformações
políticas, ideológicas e culturais que afetaram as sociedades da época de uma
maneira irreversível tanto nos países sob regime autoritário, como em nações
formalmente democráticas.
É possível então, baseando-nos na historiografia do ano de 1968, afirmar que
trabalhadores e estudantes se levantaram no mundo inteiro. Em Paris, os operários
fizeram greve geral e os estudantes entraram em combate com a polícia. Nos muros
da capital francesa, os grafites anunciavam o novo mundo: É proibido proibir‖, ―A
imaginação no poder!‖, ―Amor e revolução andam juntos‖.
Nos Estados Unidos da América, atacava-se o racismo. Tempos de Martin
Luther King e de Malcolm X, grandes líderes negros. Os estudantes norte-
americanos também sonhavam com socialismo e milhares deles protestariam contra
o absurdo de a máquina de guerra ianque agredir o povo do Vietnã. Na América
Latina, sonhava-se com guerrilhas libertadoras. A Cuba revolucionária de Fidel
Castro e Che Guevara mostrava o caminho para os jovens latino-americanos:
guerrilha, revolução popular e socialismo.
No Brasil, a esquerda voltava a crescer e a luta era contra a ditadura militar e
o aprofundamento de um capitalismo monopolista. Segundo a historiadora Maria
Aparecida de Aquino
27
, o engajamento era maior entre os jovens. E, nesse caso,
grande parte era formada por estudantes. A atividade política nas universidades
acontecia antes mesmo do golpe de 1964
28
.
Nesse contexto, surge, em 13 de dezembro de 1968, o Ato Institucional 5
(AI-5), principal instrumento de arbítrio da ditadura militar e descrito como a mais
abrangente e mais repressora das medidas de segurança interna do governo até
aquela data. Tavares (1999) afirma que o AI-5 representou a perda da vergonha da
ditadura. Na verdade, muitos analistas políticos brasileiros encararam o AI-5 como
“um golpe dentro do golpe”.
O ano de 1969 foi marcado por um período de exacerbada violência e
27 Professora da USP (Universidade de São Paulo), em entrevista a Folha On-Line em 30/04/2008, às 17h57.
Cf: Endereço eletrônico: http://www1.folha.uol.com.br/folha/brasil/.
28 De acordo com a professora Maria Aparecida de Aquino (USP), ―um ano antes, José Serra foi interrogado na
CPI sobre a UNE (União Nacional dos Estudantes). A entidade que ele presidia era acusada de subversão e de
receber financiamento da então União Soviética‖. Cf.: Disponível em: http://www1.folha.uol.com.br/folha/brasil/.
Acesso em 17/12/2008.
35
repressão que se seguiu durante mais cinco anos. Nesse percurso, foi engendrado
um movimento de resistência contra as práticas violentas e repressoras
protagonizadas pelos militares, tendo como fio condutor a transformação da
sociedade vigente naquele período.
A literatura destaca que, desde 1968, já existiam no Brasil ações guerrilheiras
com diferentes objetivos e estratégias
29
. Contudo, foi entre 1969 e 1973 que grupos
e organizações de luta armada apresentaram-se mais proeminentes, a saber: o VPR
(Vanguarda Popular Revolucionária), o MR-8 (Movimento Revolucionário Oito de
Outubro), a ALN (Ação Libertadora Nacional), o PCBR (PCB Revolucionário), o PC
do B, a VAR- Palmares.
A maioria dos guerrilheiros foi presa antes de começar a luta armada no
campo e que a guerrilha se restringiu ao espaço urbano sem maior repercussão. No
início dos anos 1970, a ditadura acaba com as guerrilhas; a repressão do governo
agia com muita eficácia e rapidamente os grupos foram desmantelados, o que
obrigou os estudantes a mudarem de métodos. No entendimento de alguns autores,
a única tentativa que teve alguma consistência foi a Guerrilha do Araguaia, que se
desenvolveu mais ou menos entre 1972 e 1974, organizada pelo PC do B
30
.
Fernandes (1982) considera que o processo de violência na ditadura,
“violência que vem de cima”, é legitimado no âmbito do direito positivo e da ação
unificadora do Estado. Segundo o autor, a civilização industrial moderna possui uma
sociedade na qual a massa de violência passa a ser ―rotinizada‖ e concentrada nas
instituições-chave de dominação direta e indireta de classes e, reciprocamente, nas
29 Vide por exemplo que para alguns autores, apesar de sonharem com a revolução proletária, havia poucos
operários ou camponeses no interior dessas organizações. Os líderes geralmente eram antigos comunistas,
rompidos com o Partidão, porque o PCB estava contra a luta armada. Ainda tinha um grupo importante de
militares desertores do Exército Brasileiro.
30 No começo dos anos 70, as grandes empresas do Sudeste e multinacionais investiram em pecuária extensiva
na região do Tocantins-Araguaia. Quando chegaram lá, havia pequenas roças na mão de camponeses
posseiros que não tinham documentos legais da propriedade da terra, apesar de trabalharem nelas havia muitos
anos. As empresas passaram a fazer grilagem das terras tomar ilegalmente. As lutas de classes entre os
grileiros e os posseiros tornaram-se muito fortes. O PC do B quis aproveitar esse potencial de revolta e chegou
na região para montar uma base de treinamento. Foram descobertos pelo Exército, que deslocou para região
milhares de soldados contra uns 60 guerrilheiros. Numa região isolada do país e com a imprensa censurada, a
sociedade sabia alguma coisa através de boatos. Na região do Araguaia, até hoje, as pessoas humildes se
recordam do que aconteceu. Muitos militares abusaram do poder e espancaram brutalmente os trabalhadores
rurais para que revelassem os esconderijos dos guerrilheiros. Os prisioneiros eram torturados de forma bárbara e
muitos encontraram a morte depois que o corpo virou uma massa de pedaços de carne e sangue. Os
guerrilheiros mortos foram enterrados em cemitérios clandestinos e até hoje as famílias procuram seus corpos.
Em 1974, a guerrilha do Araguaia estava destruída. Cf.: Disponível em:
http://www.culturabrasil.pro.br/ditadura.htm. Acesso em 12/04/2009.
36
instituições de autodefesa - órgãos criados para regular ou conciliar os conflitos de
classes em escala individual e coletiva.
Todo o processo civilizatório da nossa sociedade contribui, lamentavelmente,
mas não surpreendentemente, com a revitalização de uma sociedade estamental,
que aposta na idealização da paz social ligando-a à violência. Assim, Fernandes
com aporte em Marx, pontua:
[...] o regime de classes é o mais violento de todos, tudo esligado ao
modo de produção, que coloca nas mãos da burguesia quase toda a
riqueza, prestígio e poder [...]
a burguesia necessita de uma forte
institucionalização da dominação, visto que a massa de violência é funcional
para a preservação da ordem inerente à sociedade de classes (1982, p.p
127-133).
Segundo Netto (1996, p. 34), o ciclo autocrático burguês recobre três
momentos nitidamente diferenciados. Se o ano de 1968 marcou uma inflexão para
cima do ciclo autocrático burguês, o ano de 1974 marcou-o para baixo, devido ao
aprofundamento da crise do milagre econômico‖, potencializada inicialmente pela
conjuntura internacional e a crise estrutural do capitalismo no Brasil. É no governo
Figueiredo que o projeto de autoreforma do regime ditatorial e a sua mais ambiciosa
proposta de institucionalização fracassam. Diz o autor:
[...] nele a resultante do confronto entre a estratégia aberturista do regime e
as aspirações e tendências à democracia, que operavam no seio da
sociedade brasileira, é a impossibilidade de o regime impor as suas regras.
É apenas neste sentido que tomamos o início do governo Figueiredo como
o marco derradeiro do ciclo autocrático burguês. (NETTO, 1996, p. 35).
O fim do ciclo autocrático burguês o corresponde à emergência de um
regime político democrático. Segundo o autor, o que o governo Figueiredo
demarcou, claramente e de modo inédito, no bojo dos instantes finais do ciclo
autocrático, foi a incapacidade de a ditadura reproduzir-se como tal, em face do
acúmulo de forças da resistência democrática e da ampla vitalização do movimento
popular, devido ao reingresso da classe operária urbana na cena política.
(NETTO, ibidem).
Fernandes (2006), ao analisar o processo de transição democrática, afirma:
―(...) a fantasia é como a mentira, ela pode ser usada à vontade. No Brasil, com
frequência a fantasia serve para encobrir a mentira‖. Segundo o autor, um bom
37
exemplo procede da chamada conciliação conservadora, que foi entendida como
uma transição democrática. Assinala o autor:
[...] De fato, ela nunca passou de uma feia nefasta negociação política, pela
qual a distensão e a abertura dos generais Geisel e Figueiredo ganharam
foros civis. [...] Os fatos reais não transpiram. [...] Na verdade, foi feita uma
conspiração, pela qual os senhores fardados do poder cederam uns passos
a mais na liberalização progressiva, para evitar uma ―conturbação social‖; e
compuseram um ―governo de transição‖, no qual teriam mais poder e
capacidade de decisão que antes. que com uma visibilidade reduzida e
tendo à frente um ―presidente‖ que endossa com prazer o cronograma
político-militar da ―transição lenta, gradual e segura‖ (2006, p.38).
1.2 O processo de redemocratização do Estado: os movimentos sociais e o
Servo Social
Na análise de Fernandes (1982) e (1987), a transição democrática no Brasil
se deu de forma gradual e longa, diferentemente dos países que viveram na época a
mesma situação de ditadura militar. No Brasil, esta se caracterizou por avanços e
retrocessos que visavam conter demandas democráticas mais ousadas. E mais, a
transição brasileira foi liderada pelos militares no poder, o que configurou uma
situação conhecida pela literatura como ―transição pelo alto‖.
Embora existam concepções de Estado desvinculadas das classes sociais,
partimos do pressuposto de que o Estado deve ser entendido como uma instituição
que se manifesta e se realiza devido à existência de classes sociais distintas e
antagônicas. Nesse sentido, o Estado pode ser entendido como um mediador entre
as classes sociais, levando em conta os interesses de suas respectivas frações.
Assim, ao exercer sua função ou tarefa mediadora no decorrer da história, o Estado
se insere na dinâmica da produção e expropriação do sistema capitalista de
produção.
A continuidade da autocracia burguesa, sob nova forma, tornava-se mais
imperiosa. Para o autor, com um olhar mais atento para o ―começo do fim da
ditadura, descobre-se um ardor democrático tardio e epidérmico das elites, que
38
indicaria uma articulação burguesa para novas oportunidades de assalto ao poder
do Estado e ao comando da Nação (FERNANDES, 1982).
Não obstante, a possibilidade de retomada das bases federativas do Estado
brasileiro a ―abertura‖ consistia, na verdade, em conceder determinados direitos
à população, mas sem abrir deliberadamente o acesso às esferas políticas do
regime.
Trata-se da ―liberalização outorgada‖, que, metaforicamente, segundo
Fernandes (1982), seria algo como abrir as porteiras e soltar o gado no pasto‖.
Seria conduzir o país a uma “volta à democracia”, sem revolução, sustentando as
coisas como estavam apesar dos aparentes rumos libertários que a nação parecia
tomar.
Destarte, a ditadura solapou a evolução natural dos partidos e incutiu um
fictício quadro institucional dominado por dois pilares da ordem: um oficial e outro de
―oposição consentida‖; contudo, ambos sem forças para tocar na influência inibidora
de outra debilidade orgânica do país: a relação entre capital estrangeiro e capital
nacional, sendo esta submissa ao modelo de desenvolvimento do capitalismo
monopolista.
Na crítica de Fernandes (1982), o futuro da democracia no Brasil não
dependeria da ―abertura democrática‖. A ordem burguesa abrirá à democracia de
participação ampliada, se ela for transformada nesse sentido pela atividade política
organizada e independente das classes trabalhadoras. Portanto, tudo depende de
que como a classe trabalhadora se constitua em partidos próprios, deixando de ser
caudatárias e instrumentais dos partidos burgueses. Dito de outro modo, os partidos
operários não podem nascer como partidos alternativos ao ―radicalismo burguês‖ e
muito menos ―partidos da ordem‖. O autor aponta a necessidade de uma clara
associação com o socialismo proletário: uma transparente vinculação com a luta de
classes nas condições concretas existentes”. Sem conteúdos socialistas nítidos,
afirma o autor, os partidos “oscilariam facilmente para a submissão dócil, o
aburguesamento‟ das lideranças e a conciliação política como recurso de
sobrevivência, deixando as classes trabalhadoras entregues a si próprias e sem
bússola política (1982, p.82).
As greves de 1978-1979 foram o elemento essencial de desgaste acelerado
da ditadura militar. A esse respeito, Moisés (1985) assinala: era inevitável a
39
emergência, especialmente no Rio de Janeiro e na região metropolitana de São
Paulo, de novas formas de participação social e política dos setores das classes
populares urbanas.
Com efeito, é na conjuntura do final da cada de 1970, início da década de
1980, que os movimentos sociais foram reconhecidos como sujeitos do processo de
democratização, seja por suas lutas específicas por melhores condições de vida e
atendimento de suas necessidades sicas, seja pelo papel mobilizador de amplas
parcelas da população nas manifestações de resistência e enfrentamento ao regime
militar.
Os setores combativos no interior do movimento operário, juntamente com
outros setores da classe trabalhadora e setores progressistas da sociedade,
empreendem a luta de resistência contra a ditadura e pelas liberdades democráticas.
Neste processo, dirigentes sindicais são perseguidos, sindicatos são fechados, ou
sofrem intervenção direta do Ministério do Trabalho. A classe trabalhadora constrói
um movimento que vai ampliando a sua organização. Retoma-se o processo de
implantação da democracia sindical que vem a se constituir em um dos elementos
básicos da organização sindical. Haja vista o forte impacto do golpe militar de 1964,
que lhe havia deixado pouco espaço de ação para reivindicações formais a não
ser tentativas pontuais de contestação.
Surgiu, então, uma nova fase da ação sindical no país, com o denominado
―novo sindicalismo‖ de corte progressista, cobrando a ampliação dos espaços
públicos para a representação dos interesses da classe trabalhadora. Este
movimento teve início como uma crítica dos sindicatos dos metalúrgicos da região
do ABC
31
paulista sobre a política social e econômica do governo federal, bem como
uma ruptura com os sindicatos corporativistas e burocráticos dos pós-45. Assim
sendo, um ―novo sindicalismo‖ surge a partir de 1978, como um marco na vida
histórica e de luta da classe trabalhadora do país.
O novo sindicalismo‖, no Brasil, foi uma resposta e uma oposição ao
sindicalismo populista e burocrático vigente na época. Esse sindicalismo combativo
de massas se contrapõe ao sindicalismo ―oficial‖ de cunho corporativista, herdado do
31 O ABC Paulista é uma região tradicionalmente industrial do Estado de São Paulo (parte da região
metropolitana de São Paulo), porém, com identidade própria. A sigla vem das três principais cidades da região:
Santo André (A), São Bernardo do Campo (B) e São Caetano do Sul (C). Ocasionalmente, a região também é
referida como ―ABCD‖, pois o município de Diadema, contíguo a São Bernardo do Campo, é tamm um
populoso e importante centro industrial.
40
período getulista, caracterizado como ―pelegos‖, cujas bases ideológicas eram
atreladas ao Estado e sob seu controle, sem organização de ―base popular‖. Assim,
esse ―novo sindicalismo‖ vai se construindo na perspectiva de romper com o
atrelamento do sindicato ao Estado, bem como na organização independente dos
trabalhadores, o que recoloca na ordem do dia o sindicato como instrumento de luta
dos trabalhadores.
De acordo com Sader (1988), o impacto dos movimentos sociais, em 1978,
levou a uma revalorização de práticas sociais presentes no cotidiano popular,
ofuscadas pelas modalidades dominantes de sua representação, ou seja, novos
atores/sujeitos sociais coletivos começavam a ocupar os espaços públicos.
Com esse panorama, a anistia política configurou o primeiro passo para o
alívio da pressão social. A lei foi promulgada em 1979, como resultado de longas
negociações com a oposição. O setor duro das Forças Armadas viu nela um
retrocesso, uma demonstração de desmerecimento pelo trabalho‖ realizado em prol
do saneamento da política nacional e temia que servisse de brecha para a
exploração dos excessos do regime.
De acordo com D‘Araujo in D‘Incao (2001), para controlar esses temores, os
militares chegaram a um entendimento com a frente das oposições no sentido de
que a anistia deveria ser ampla, geral e irrestrita, ou seja, deveria ter o dom de
passar uma borracha no passado, "virar uma gina da história‖.
Deu-se início, na década de 80, à estruturação de um partido de forte
enraizamento nos movimentos sindicais e populares, impulsionado pela
popularidade do movimento operário do ABC paulista com as greves de 1978-
1979 ; pelo retorno de diversos militantes de esquerda em exílio, com a Política da
Anistia, em 1979; e pela ascensão do movimento de base da Igreja Católica,
inspirado na Teologia da Libertação
32
. Nasce em fevereiro de 1980
33
, em São Paulo,
o Partido dos Trabalhadores (PT), que reuniu grande parte da esquerda brasileira.
32 A Teologia da Libertação foi desenvolvida na América latina; no Brasil, destacaram-se os irmãos Leonardo e
Clodóvis Boff. A partir das orientações do Concílio Vaticano II, de 1964, e do Congresso de Medelín, na
Colômbia, em 1968, a Teologia reorganizou as práticas religiosas católicas. O cotidiano das pessoas passou a
ser discutido à luz dos ensinamentos da Bíblia. Alguns princípios da análise marxista relativos às estruturas de
dominação foram incorporados à Teologia da Libertação. Cf. Gohn (2000).
33 De acordo com o Manifesto de Fundação do PT - Aprovado pelo Movimento Pró-PT, em 10 de fevereiro de
1980, no Colégio Sion (SP), e publicado no Diário Oficial da União de 21 de outubro de 1980. Cf. Manifesto de
Fundação do Partido dos Trabalhadores/Diretório Nacional, 2009.
41
Teve como berço as primeiras grandes manifestações populares no país
desde o fim dos anos 60 em São Bernardo do Campo, onde aconteciam as
assembléias do sindicato dos metalúrgicos do ABC, cujo líder sindical, Luiz Inácio
Lula da Silva - o Lula liderava os metalúrgicos em suas greves. O PT cresceu e o
mesmo ocorreu com partidos ideológicos de esquerda, como o PCB, o PC do B,
PSB e o PDT (FERNANDES, 2006).
Para o autor, a estigmatização, como cnica de aniquilamento desses
partidos, dissolveu-se no limbo, a função de Luiz Inácio Lula da Silva ganhou
saliência, inclusive como galvanizador do processo político no plano eleitoral. A sua
imagem e a sua linguagem dificultarão ―retrocessos conservadores‖ e ―recaídas
populistas‖, pois a sua presença será central para impregnar o debate político de
conteúdo ideológico proletário e socialista naquela data.
O movimento sindical retoma a discussão sobre a unidade ou unicidade de
sua organização. Seguindo os influxos de conflitos operários e sindicais que,
naquela cada, agitaram os principais centros urbanos do país, surgem as centrais
sindicais a exemplo da Central Geral dos Trabalhadores/CGT e a Central Única
dos Trabalhadores/CUT, embasadas no novo sindicalismo classista que ocuparam
o cenário público brasileiro, debatendo questões cruciais à conquista e ampliação
dos direitos de cidadania.
Telles e Paoli (2000) consideram que, para além desse registro estritamente
político e sindical, os movimentos sociais se ampliaram e diversificaram, trazendo
para o debate público um amplo leque de temas e questões das mais diversas
dimensões da vida social: questões relativas às discriminações de gênero, raça e
etnia; ecologia e meio ambiente; violência e direitos humanos.
Estas passaram a compor, no decorrer da década de 80, a agenda pública de
debates, projetando, na esfera política, concepções ampliadas de direitos e
cidadania que incorporam as exigências de equidade e justiça nas dimensões
societárias e culturais que afetam identidades, existências e formas de vida.
De acordo com Gohn (2000), surgiram concepções diferenciadas para definir
os movimentos sociais. Assim, dessas concepções, formulou-se uma definição
ampla para o conceito de movimento social, a saber:
movimentos sociais o ações coletivas de caráter sociopolítico,
construídas por atores sociais pertencentes a diferentes classes e camadas
sociais. Eles politizam suas demandas e criam um campo político de força
42
social na sociedade civil. Suas ações estruturam-se a partir de repertórios
criados sobre temas e problemas em situações de: conflitos, litígios,
disputas. As ações desenvolvem um processo social e político-cultural que
cria uma identidade coletiva ao movimento, a partir de interesses em
comum. Esta identidade decorre da força do princípio da solidariedade e é
construída a partir da base referencial de valores culturais e políticos
compartilhados pelo grupo. (GOHN, 1997 in GOHN, 2000).
De acordo com Gohn (1999), o autor espanhol Manuel Castells
34
redefiniu os
movimentos sociais no Brasil, como “ações coletivas propositivas as quais resultam,
na vitória ou no fracasso, em transformações nos valores e instituições da
sociedade” (CASTELLS, 1997, apud, GOHN, 1999).
O ano de 1984 foi um marco na história sociopolítica do Brasil com o
movimento Diretas : a sentença de morte para o regime militar. Contudo, a
realização das eleições diretas para Presidente da República só veio a acontecer em
1989.
Nesses termos, diversos movimentos populares foram surgindo para
reivindicar políticas blicas referentes à habitação, saneamento, saúde, ensino,
entre outros. Destinados a atender seus direitos sociais e de cidadania e que os
tornaram, naquele período, sujeitos políticos, construtores da sua própria história,
merecem destaque: o movimento contra a carestia; a luta dos moradores de favelas
por ligação de água e luz em seus barracos e pela posse de terra dos já ocupados; o
movimento das mulheres por creches públicas.
Um segmento da vanguarda do Serviço Social descobre nos movimentos
sociais, uma espaço alternativo de atuação. Segundo Matos (2007, p. 41), o trabalho
dos assistentes sociais junto aos movimentos sociais se deu, na sua maioria, por
meio da criação de campos próprios de estágio para graduandos em Serviço Social.
Entretanto, neste processo de encontro do Serviço Social com os movimentos
sociais, é ratificada uma negação com o desenvolvimento de comunidade
35
. Tal
negação, segundo Matos (2007), é justificável, pois, naquela época, a possibilidade
de um trabalho com comunidades pautado em outros pressupostos que o seja o
34 O autor é radicado nos Estados Unidos e tornou-se a principal influência trica nos estudos produzidos
sobre os movimentos sociais no Brasil, nos anos 70 e 80. Cf. ibidem.
35 O desenvolvimento de comunidade é introduzido, no Brasil, por organismos norte-americanos de cooperação
nos anos 1940, mas é a partir da década seguinte, com o fim da 2ª Guerra Mundial, que o mesmo passa a ser
disseminado pela ONU de maneira sistemática. Entendido como uma estratégia de controle ideológico da
população contra a possibilidade do comunismo.
43
de ajustamento social inexistia; o que expressava o anverso do que buscava o
Serviço Social
36
.
Segundo a literatura, os Assistentes Sociais que atuavam junto à população
pobre da periferia das grandes cidades foram vítimas de desconfiança e de
perseguição dos agentes da ditadura, que os vigiam no ambiente de trabalho e, em
alguns casos, foram punidos com demissão.
Em entrevista à Revista Em Pauta
37
, a ex-prefeita de São Paulo pelo PT Luiza
Erundina de Souza
38
assinala: (...) os „olheiros‟ do regime militar sabiam da
influência e da força desses profissionais junto ao povo, conscientizando-o sobre
seus direitos e estimulando-o a lutar por eles”. Luiza Erundina ainda ressalta:
(...) ao mesmo tempo em que participavam ativamente de todas essas lutas
e movimentos, enquanto trabalhadores e como cidadãos, os Assistentes
Sociais organizavam politicamente a própria categoria, criando associações
profissionais e sindicatos para lutar por seus direitos e conquistar espaço de
ação política na sociedade. (Revista EM PAUTA, nº19, 2007).
Os movimentos populares e sindicais avançaram em suas lutas. Ampliam-se
os caminhos para a classe trabalhadora construir seu projeto político de
transformação da sociedade.
Ante a esses desafios, a categoria dos assistentes sociais, como parte da
classe trabalhadora inserida neste processo, compreende o Serviço Social como
uma profissão historicamente determinada na divisão social e técnica do trabalho, a
qual possui um caráter interventivo no âmbito da questão social. Avança
significativamente, através de suas instâncias organizativas e sindicatos, no
processo de reflexão e aprofundamento do debate sobre questões estruturais e
conjunturais da sociedade brasileira, bem como na articulação com as lutas dos
trabalhadores contra o processo de dominação da acumulação capitalista.
36 Para uma melhor compreensão, ver Matos, Maurílio de Castro e Bravo, Maria Inês. Assessoria Consultoria &
Serviço Social. Rio de Janeiro: 7 Letras. FAPERJ, 2007, p. 40-44.
37 Entrevista Coletiva, coordenada pela Prof.ª Dra. Rose Serra, membro do Comitê Editorial da Revista EM
PAUTA, Profª Adjunta da faculdade de Serviço Social da UERJ. Artigo Democracia e Serviço Social. Revista EM
PAUTA número 19, ano 2007, p.181-201.
38 Deputada Federal do PSB (Partido Socialista Brasileiro), 2007/2010; 2003/2006 e 1999/2002. Presidente da
Associação Profissional dos Assistentes Sociais do Estado de São Paulo (APASSP), 1978/198, Coordenação da
Comissão Executiva Nacional das Entidades Sindicais de Assistentes Sociais, 1979/1981. Prefeita de São Paulo
pelo PT, 1989/1992. Deputada Federal do PT, 1995/1998.
44
Assim, o Serviço Social inscreve-se, através do movimento sindical dos
assistentes sociais, entre os novos sujeitos‖ que no dizer de Eder Sader entram
em cena no Brasil neste período.
Recorreremos a Abramides e Cabral (1995), para elucidarmos sobre a
relação entre a categoria de assistentes sociais e o movimento sindical-operário no
país. As autoras nos revelam que o processo de análise da organização político-
sindical dos assistentes sociais compreende o período de 1978 a 1988, o qual
encerra um ciclo da trajetória dessa categoria.
Os segmentos combativos da categoria profissional trazem para o interior da
profissão as lutas concretas e os embates políticos e ideológicos vividos pelo
conjunto da sociedade brasileira e conquistaram a hegemonia dos movimentos dos
assistentes sociais. Os assistentes sociais, como parte da classe trabalhadora,
reiniciam a sua organização por meio da reativação de suas entidades e pré-
sindicais em todo o país a partir de 1977.
O rebatimento desse novo sindicalismo na organização da categoria dos
assistentes sociais é a criação, estruturação e solidificação das entidades sindicais
da categoria nos estados e, em nível nacional, com a criação da Comissão
Executiva Nacional de Entidades Sindicais de Assistentes Sociais CENEAS (1978
a 1983) e da Associação Nacional dos Assistentes Sociais ANAS (1983 a 1988),
mostrando-nos a trajetória de luta e organização dessa categoria profissional no
marco do novo sindicalismo no Brasil (ABRAMIDES E CABRAL, 1995).
Nesse percurso, a CENEAS e a ANAS atuam juntamente com o movimento
sindical de forma a dar repostas organizadas à situação de exploração e miséria da
classe trabalhadora. A CENEAS recebe influência direta do novo sindicalismo na
construção da sua concepção e toda a sua configuração.
As lutas específicas da categoria na década de 80 foram bastante
significativas em todo o país, sempre com a presença marcante das entidades
sindicais de base, da CENEAS e da ANAS, e com a participação da categoria no
processo de luta por suas reivindicações.
Contudo, a trajetória emblemática da organização político-sindical dos
assistentes sociais do Estado de São Paulo encerra-se em 1992, data em que o
Sindicato de Assistentes Sociais deixa de existir por deliberação da assembleia da
categoria no mês de maio do referido ano. Outras entidades sindicais deixaram de
45
existir neste período por um processo de esvaziamento e de distanciamento junto à
base dos assistentes sociais. Cabe ainda registrarmos que muitos sindicatos
estaduais vivenciaram direção única, com os CRAS - Conselhos Regionais de
Assistentes Sociais.
Portanto, no que se refere à organização política dos assistentes sociais, o
despontar de um Serviço Social crítico e renovado remonta ao III Congresso
Brasileiro de Assistentes Sociais ocorrido em São Paulo, em 1979 , marco histórico
da profissão com a ruptura pública e coletiva da prática conservadora - quando, de
forma organizada, uma vanguarda profissional destituiu a mesa de abertura
composta por nomes da ditadura, trocando-a por nomes advindos do movimento dos
trabalhadores.
Conhecido como ―Congresso da Virada
39
, é o marco histórico de
compromisso político e coletivo da categoria com a classe trabalhadora. O
Congresso significou, portanto, um momento de ruptura da categoria, sob a direção
das entidades sindicais, com as posições conservadoras que estavam à frente do
evento e, muito, detinham as direções do então conjunto CFAS Conselho
Federal de Assistentes Sociais/CRAS Conselho Regional de Assistentes Sociais
(ABRAMIDES E CABRAL, 1995).
Nesse sentido, as entidades sindicais, ao intervirem organizadamente,
captaram a insatisfação dos profissionais e estudantes presentes, que repudiaram
com veemência os representantes da ditadura militar que compunham paiis nas
mesas de abertura e encerramento.
De acordo com Abramides e Cabral (ibidem), a forma autoritária e elitista de
organização do Congresso é quebrada quando da realização de assembléias
permanentes, - fóruns de discussão do significado social da profissão e do
profissional naquela conjuntura -, o que deu um novo rumo ao Congresso.
Assim sendo, as autoras definem o novo caráter do Congresso, deliberado
soberanamente junto à categoria, com propostas que contextualizaram e
explicitaram claramente o momento histórico nacional, bem como a inserção da
categoria na luta mais ampla da classe trabalhadora, colocando a questão
democrática como elemento crucial para a organização da categoria.
39 Em novembro de 2009 nos dias 16 e 17, a categoria dos Assistentes Sociais realizou evento comemorativo
dos 30 anos do Congresso da Virada, no sentido de analisar os determinantes do mesmo e seus
desdobramentos.
46
O III CBAS se transformou em um marco histórico da categoria, espaço vivo
de debates, rupturas com posturas conservadoras e expressão do processo da luta
política e social que fora travado na sociedade brasileira naquele período em que os
trabalhadores como sujeitos coletivos ocuparam o cenário nacional em grandes
mobilizações e greves a partir da região do ABC paulista (ABRAMIDES E CABRAL,
1995).
Nesta direção, a categoria de assistentes sociais, ao afirmar seu
compromisso histórico com as classes trabalhadoras, dá um passo decisivo para
fortalecer a construção do seu projeto profissional, uma vez que, no seio
profissional, emerge a condição necessária para romper com o quase monopólio do
conservadorismo no Serviço Social.
Ora, em uma retrospectiva histórica do Serviço Social brasileiro, encontramos,
explicitamente, um Serviço Social pautado por uma ética liberal burguesa, que toma
a ordem social capitalista como um dado natural e inquestionável e que põe, como
objetivos profissionais a adaptação e o ajustamento dos indivíduos a ela
40
.
Este fato nos é revelado na gênese do Serviço Social brasileiro, dada a
relação entre o Serviço Social e o ideário católico, que iimprimir à profissão o
caráter de apostolado, fundado em uma abordagem da questão social como
problema moral e religioso numa intervenção que prioriza a formação da família e do
indivíduo na solução de problemas e atendimento de suas necessidades materiais,
morais e sociais (YAZBEK, 2000).
No nosso entendimento, a interlocução do Serviço Social brasileiro com o
movimento sindical-operário, através da organização política e sindical dos
assistentes sociais, é igualmente significativa e rica. Posto que se insere na história
de organização e luta da classe trabalhadora, sob a orientação política do novo
sindicalismo, plasmada na trajetória histórica dos movimentos sociais nas décadas
de 70 e 80.
40 O tradicionalismo profissional no Código de Ética de 1947 é muito evidente. Entre seus princípios e diretrizes
ético-morais, encontramos o ―respeito à lei de Deus‖, ao ―bem comum‖ e à ―dignidade da pessoa humana‖. Como
função social do Serviço Social, o mesmo preconizava o ―tratamento de pessoas desajustadas‖. O compromisso
com o bem comum aparece também no Código de Ética de 1965. Não muito distante desta perspectiva está o
Código de 1975 que adiciona ao velho tradicionalismo profissional uma matriz teórica moderna estrutural-
funcionalista que defende uma postura aparentemente asséptica ao preconizar que o assistente social deve
agir como ―um perito, com isenção de ânimo e imparcialidade‖. Cf. BONETTI, Dilsea Aldeodata et alii (orgs.).
Serviço Social e Ética: convite a uma nova práxis. São Paulo: Cortez/CFESS, 1995.
47
Diríamos que a gênese do projeto profissional do Serviço Social é produto,
tamm, da ascensão das forças democrático-populares (manifestações de
organização política de sujeitos coletivos), no cenário político nacional, desde a
segunda metade dos anos 70 até fins dos anos 80.
De acordo com o CFESS, o então conjunto CFAS/CRAS (Conselho Federal
de Assistentes Sociais e Conselho Regional de Assistentes Sociais), ingressa, na
década de 90, numa outra fase, em que foram superadas as suas características
iniciais, tipificadas no corporativismo e no burocratismo no que se refere à condução
do aparato político-institucional dessas entidades.
Nesse sentido, o atual conjunto CFESS/CRESS (Conselho Federal de Serviço
Social e Conselho Regional de Serviço Social), informa cumprir sua atribuição
precípua de fiscalização do exercício profissional, que a partir da década de 90,
tenta potencializar sua inserção e intervenção junto aos profissionais ao investir na
qualificação teórico-prática.
Sinalizamos, portanto, que a relação do Serviço Social brasileiro com o
movimento sindical-operário contribuiu, sobremaneira, para uma nova perspectiva
para a categoria dos assistentes sociais que pretendia uma ruptura com o
conservadorismo profissional.
1.3 A interface do Serviço Social com a Saúde: breve histórico
Cremos que, agora, após apresentarmos um resgate do período sócio-
histórico do regime militar até o processo de redemocratização do país com a vital
participação dos movimentos sociais e do Serviço Social, estamos aptos a discorrer
sobre a interface do Serviço Social com a Saúde.
Portanto, ao retornarmos um pouco na trajetória histórica do Brasil, podemos
48
dizer que o desenvolvimento do capitalismo conhecido pela sociedade brasileira no
pós-1930 e, de forma mais específica, após a industrialização que se inicia em
meados dos anos 50, fora acompanhado pelo surgimento de uma série de
contradições sociais e políticas que insidia sobre a sobrevivência da população e
conduziu um deslocamento do pólo da economia para os centros urbanos e gerou
uma massa operária que deveria ser atendida pelo sistema de saúde.
Isso permite compreender por que a inserção dos assistentes sociais na área
da saúde se de forma expressiva desde os primórdios da profissão no Brasil. De
acordo com Bravo e Matos (2004), é no bojo do processo histórico-econômico e
político que marcou a conjuntura dos anos 30 que ocorre a formulação da política de
saúde, de caráter nacional, como as demais políticas sociais e organizada em dois
subsetores: o de saúde pública e o de medicina previdenciária. O subsetor de saúde
pública foi predominante até meados de 60 e centralizou-se na criação de condições
sanitárias mínimas para as populações urbanas e, restritamente, para as do campo.
O subsetor de medicina previdenciária virá a sobrepujar o de saúde pública a
partir de 1966 (BRAVO, 1991, apud, BRAVO E MATOS, 2004).
Com a formulação da política nacional de saúde nos anos de 1930, a
requisição por profissionais de Serviço Social foi expressiva, com a inserção destes,
inicialmente, em espaços institucionais como hospitais e ambulatórios. Diríamos,
então, que, gradativamente, a área da saúde tornou-se a que mais emprega
assistentes sociais.
Bravo e Matos (2004), principais interlocutores no que se refere às pesquisas,
estudos e publicações sobre a temática Serviço Social e Saúde, sinalizam que, a
partir de 1945
41
, a ação profissional nesta área expandiu-se significativamente e
transformou-se no campo que mais absorveu os assistentes sociais. Para os
autores, tal expansão ocorreu devido a adoção de um conceito ampliado de saúde
cunhado pela Organização Mundial da Saúde (OMS) em 1948, dando enfoque ao
trabalho em equipe multidisciplinar, o qual requisitou a atuação de diversos
profissionais, entre eles, os assistentes sociais.
Coube, então, ao Serviço Social enfatizar ―a prática educativa com
intervenção normativa no modo de vida da ‗clientela‘, com relação aos hábitos de
41 Dada às exigências e necessidades de aprofundamento do capitalismo no Brasil e às mudanças que
ocorreram no panorama internacional, em função dormino da Segunda Guerra Mundial.
49
higiene e saúde‖, e atuar em programas estabelecidos pelas normatizações da
política de saúde (BRAVO e MATOS, 2004, p. 29).
Vale enfatizar que a Política Nacional de Saúde vigente naquele período não
era de caráter universal, acarretando em um processo de seletividade e exclusão
nos atendimentos, haja vista a incongruência entre demanda e oferta de serviços. A
seu turno, o Serviço Social tem por escopo viabilizar o acesso dos usuários aos
serviços de saúde e benefícios da previdência, em que o assistente social é
demandado para atuar em hospitais, interpondo-se entre a instituição e a população
usuária.
Apesar de surgirem nos Estados Unidos, nas décadas de 1950 e 1960, a
medicina integral, a medicina preventiva e a medicina comunitária influenciaram os
rumos da saúde no Brasil. Os assistentes sociais prosseguiram trabalhando em
hospitais e ambulatórios, concentrando suas ações prioritariamente no nível curativo
e hospitalar.
As condições políticas para a hegemonização de um novo modelo de sistema
de saúde ocorreram a partir do movimento de 1964. Do ponto de vista político,
incrementou-se o papel regulador do estado e a expulsão dos trabalhadores do
controle da Previdência Social. O autoritarismo militar rompeu com o padrão de
proteção social construído nos anos 30.
Segundo Vianna (1998, p.142), antes de 64, a manipulação dos benefícios
oferecidos pelo Estado se restringia a uma clientela que, embora pequena e
estratificada, estava incorporada ao universo da cidadania, participando,
politicamente, inclusive de decisões importantes através de suas lideranças. A
modernização iniciada com a criação do Instituto Nacional da Previdência
Social/INPS desmontou os mecanismos de integração e inibiu a trajetória alemã do
sistema previdenciário
42
.
O modelo médico-assistencial privatista que se consolida nos anos 70 inicia-
se a partir da previdência social brasileira com a organização dos Institutos de
Aposentadoria e Pensões, estruturados por categorias profissionais. Esse momento
42 Na Alemanha, Otto Von Bismarck criou uma série de seguros sociais, objetivando, na verdade, amenizar a
tensão existente entre as classes trabalhadoras. Assim, em 1883, foi instituído o seguro-doença. Tal benefício
previdenciário era custeado pelas contribuições dos empregados, dos empregadores e pelo Estado. Em 1884,
fora instituído o seguro contra acidentes do trabalho, através do financiamento por parte dos empresários. Em
1889, criaram-se os seguros de invalidez e velhice, custeados pelos trabalhadores, empregadores e pelo Estado.
50
é determinado por um modelo de cidadania regulada
43
, uma vez que a garantia dos
direitos sociais dependiam, fundamentalmente, da inserção dos cidadãos no
mercado de trabalho.
Contudo, ao mesmo tempo em que se ampliava a ação da Previdência Social,
revelava-se o caráter discriminatório da política de saúde, enquanto ficavam claras
as desigualdades, tanto quantitativas, como qualitativas, entre as diferentes
clientelas urbanas e entre estas e as rurais.
Observa-se, no período burocrático-autoritário, que apesar das modificações
ocorridas, tamm se excluem parcela significativa de brasileiros ao direito à saúde,
pela vinculação deste direito à contribuição previdenciária, afetando àqueles que não
estavam inseridos formalmente no mercado de trabalho. Nota-se ainda que neste
período desenvolvem-se ações individuais e médico-hospitalares que privilegiam o
setor privado da assistência médica.
Desse modo, o país apresentava um projeto hegemônico: o modelo médico-
assistencial privatista, que se constituía de quatro subsistemas, quais sejam:
subsistema de alta tecnologia; subsistema privado de atenção médica supletiva;
subsistema privado contratado e conveniado e subsistema estatal.
Em 1975, a Lei Nº. 6.229 institucionalizava o modelo médico-assistencial
privatista, definindo as competências das instituições públicas e privadas e propunha
mecanismos de integração e coordenação.
A seu turno, somente no ano de 1975 é que os assistentes sociais foram
inseridos na equipe formada por médicos, enfermeiros e visitadores. Para Bravo e
Matos (2004, p. 30), tal fato os levou a seguinte indagação: Por que os assistentes
sociais na saúde priorizam suas ações no nível curativo e hospitalar? Para
responder à questão, os autores trabalharam algumas hipóteses, quais sejam:
a exigência do momento concentrava-se na ampliação da assistência
médica hospitalar e os profissionais eram importantes para lidar com a
contradição entre a demanda e o seu caráter excludente e seletivo. Nos
centros de saúde, os visitadores conseguiam desenvolver as atividades
que poderiam ser absorvidas pelo assistente social. Outro componente
relaciona-se à pouca penetração da ideologia desenvolvimentista no
trabalho profissional na saúde. Uma ação considerada importante para os
assistentes sociais é a viabilização da participação popular nas instituições
e programas de saúde. Esta atividade, entretanto, só teve maior
repercussão na profissão nos trabalhos de desenvolvimento de
comunidade. O Serviço Social Médico, como era denominado, não
43 A cidadania está embutida na profissão e os direitos do cidadão restringem-se aos direitos do lugar que ocupa no
processo produtivo, reconhecido por lei. Aqueles cuja ocupação a lei desconhecem, tornam-se p-cidadãos.
51
atuava com procedimentos e técnicas do Desenvolvimento de
Comunidade, mas sim, e prioritariamente, com o Serviço Social de
Casos, orientação inclusive da Associação Americana de Hospitais e da
Associação Americana de Assistentes Médico-Sociais. A participação
era visualizada na dimensão individual, ou seja, o engajamento do
“cliente no tratamento”. (grifos nossos).
Segundo ou autores, o Serviço Social sofreu profundas transformações, no
pós-1964, que tiveram rebatimento no trabalho do assistente social na área da
saúde. Até aquela data, a profissão seguia direcionamentos estabelecidos pelo
chamado bloco conservador hegemônico que dominava a produção do
conhecimento, as entidades organizativas
44
da profissão e o trabalho profissional.
Contudo, esta situação começou a se modificar, ao surgir debate na profissão que
questionava o seu conservadorismo.
Os assistentes sociais com posicionamentos progressistas, questionadores
do Serviço Social conservador, começam gradativamente a produzir debates
respaldados pelas ciências sociais e humanas. O tema dessas discussões estava
pautado no desenvolvimento e nas repercussões do Serviço Social na América
Latina, cujo eixo do debate centrava-se na constatação do Serviço Social importado
com práticas assistenciais e ajustadoras (BRAVO E MATOS, 2004).
Concomitantemente ao movimento iniciado pelos assistentes sociais com o
objetivo de repensar a profissão no Brasil, outro movimento - na área da saúde -,que
tamm tinha cunho de mudança e luta por direitos, ganha corpo e materialidade na
sociedade, qual seja: o Movimento Sanitário.
Assim, a configuração do modelo médico-assistencial privatista já esgotado
muda de forma a reciclá-lo num contexto de luta política entre projetos sanitários
alternativos. Assim, nos anos 80, a partir da instalação do governo de transição
democrática, o país passa a vislumbrar a retomada de suas bases federativas.
Nesse percurso, a crise da Previdência Social na cada de 80 será marcada
por propostas de políticas alternativas para o sistema de saúde, movimentos
grevistas dos profissionais, análises e divulgação da política previdenciária de
assistência médica e pelo bloqueio a qualquer proposta de mudança que viesse
penalizar os setores capitalistas envolvidos. Ou seja, o modelo implantado na
Previdência Social atendia prioritariamente às necessidades de reprodução do
44 Bravo e Matos (2004) se referem à entidade da categoria - Associação Brasileira de Assistentes Sociais
(ABAS), criada em 1940, e a Associação de Ensino (ABESS), criada em 1946.
52
capital em detrimento das reais necessidades de saúde da população, portanto, a
atividade médica estava inserida no contexto da lógica capitalista.
Emergem, portanto, na arena sanitária, novos sujeitos sociais portadores de
ideais diferenciados e que conformam dois projetos político-sanitários alternativos: o
contra-hegemônico (Reforma Sanitária) e o hegemônico (Projeto neoliberal). Assim,
todo o movimento organizado pelo projeto contra-hegemônico (Reforma Sanitária)
seja nos níveis político, ideológico e institucional, desde o início dos anos 70, vai
confluir na VIII Conferência Nacional de Saúde, realizada em Brasília em março de
1986.
Essa Conferência, marco histórico na trajetória da política de saúde blica
de saúde neste país, traduziu o corte epistemológico da concepção de saúde,
assegurando-a como direito. O relatório desta Conferência, transformado em
recomendações, serviu de base para as negociações dos defensores da Reforma
Sanitária na formulação da Constituição Federal de 1988 (BRAVO e MATOS, 2004,
p. 32).
O estabelecimento de novas relações do Estado com os sujeitos sociais
consegue assegurar na Constituição de 1988 os princípios essenciais da Seguridade
Social voltados à universalidade, equidade, irredutibilidade nos valores dos
benefícios, uniformidade, equivalência, gestão democrática descentralizada e
participativa. A partir desse momento, estes princípios, norteadores da Seguridade
Social, que englobam as áreas da saúde, previdência e assistência social, são
tomados como questão pública e de responsabilidade do Estado.
Diante dos avanços obtidos neste período, a área da saúde passa a ser vista
como um processo de convergência das políticas sociais e assegurada como direito
de cidadania.
A Constituição de 1988 incorpora de fato um conjunto de princípios, diretrizes,
conceitos e propostas dentro do ideal da Reforma Sanitária. Com relação à questão
da saúde, a Constituição ressalta aspectos fundamentais, a saber: o conceito de
saúde concebido como perspectiva de uma articulação de políticas sociais e
econômicas; a compreensão do conceito saúde como um direito social universal
derivado de uma cidadania plena: as ações e serviços de saúde como serviços de
relevância pública; a criação do Sistema Único de Saúde, organizado segundo
diretrizes de descentralização e atendimento total, sendo imprescindível a
53
participação da comunidade e a integração de saúde no espaço amplo da
Seguridade Social.
Assim, os principais pontos constitucionais incorporam: a saúde, como um
direito de todos e dever do Estado; a ampliação do conceito de saúde; o Sistema
Único de Saúde entendido como universalizado e comportando em seu bojo a
integralidade da atenção, igualdade, direito à informação, incorporação do modelo
epidemiológico, participação da comunidade e descentralização político-
administrativa. A Constituição de 1988, no entanto, não consegue abarcar
dispositivos reguladores do setor privado.
Ora, o Serviço Social recebe influências dessa conjuntura; porém está voltado
ao processo interno de revisão e negação do Serviço Social Tradicional (anterior à
década de 80). O processo de renovação da profissão está interligado com as
questões postas na conjuntura daquele período e tinha por escopo a busca por uma
mudança nos rumos societários a serem seguidos. No entanto, destaca-se o fato de
que o processo de renovação voltou-se completamente para uma revisão interna,
não permitindo sua articulação com outras questões de grande relevância na
sociedade. Bravo e Matos (2004, p. 34) asseveram:
O processo de renovação do Serviço Social no Brasil está articulado às
questões colocadas pela realidade da época, mas, por ter sido um
movimento de revio interna, não foi realizado um nexo direto com outros
debates, também relevantes, que buscavam a construção de práticas
democráticas, como o movimento pela Reforma Sanitária. Na nossa
análise, esses o os sinalizadores para o descompasso da profissão com
a luta pela assistência pública na saúde.
De acordo com a assertiva de Bravo (1996), apud Bravo e Matos (2004, p.
34), esses são os sinalizadores para o descompasso da profissão de Serviço Social
com a luta pela assistência pública na saúde. Assim, admite a autora:
É importante identificar como se deu a relação do Serviço Social com o
Movimento de Reforma Sanitária, na década de 1980. É imposvel falar
do Serviço Social sem referenciar aos anos 80. Estes são fundamentais
para o entendimento da profissão hoje, pois significa o início da
maturidade da tendência atualmente hegemônica na academia e nas
entidades representativas da categoria intenção de ruptura e, com
isso, a interlocução real com a tradição marxista.
Eis a chave da questão. Os profissionais desta vertente se inserem, na sua
maioria, nas Universidades, onde, dentro do processo de renovação da profissão,
pouco efetivamente intervêm nos serviços, ou seja, a nova base teórico-
54
metodológica aderida oficialmente pela profissão não se refletiu ou o se fez ativa
no plano dos serviços (NETTO, 1994 e BRAVO, 1996).
Assim, Bravo e Matos (2004) destacam a intenção de superar tais
disparidades ocorridas nos anos de 1980, nos quais o Serviço Social cresceu na
busca de fundamentação e consolidação teóricas, apresentando poucos resultados
na intervenção; é necessário voltar-se para a ação profissional cotidiana e fazer dela
prioridade. Para os autores, este fato repercute na atuação do Serviço Social na
área da saúde; como ressaltado o maior campo de trabalho para os assistentes
sociais.
Contudo, apesar das lacunas no fazer profissional, Bravo e Matos (ibidem)
avaliam que ocorreram algumas mudanças de posições, a saber: a postura crítica
dos trabalhos em saúde apresentados nos Congressos Brasileiros de Assistentes
Sociais de 1985 a 1989; a apresentação de alguns trabalhados nos Congressos
Brasileiros de Saúde Coletiva; a proposta de intervenção formulada pela então
ABESS, ANAS e CFAS no Serviço Social do INAMPS; e a articulação do então
CFAS com outros conselhos federais da área da saúde (BRAVO, 1996, apud
BRAVO e MATOS, 2004, p. 34).
São mudanças consideradas insuficientes pelos autores, pois, o Serviço
Social adentra a década de 1990 com incipientes alterações da prática institucional;
continua como categoria desarticulada do Movimento da Reforma Sanitária e, com
isso, sem nenhuma explícita e organizada ocupação na máquina do Estado pelos
setores progressistas da profissão; e insuficiente produção sobre ―as demandas
postas à prática em saúde‖.
Simultaneamente ao início dos anos 90, um novo governo, portador de um
discurso aparentemente modernizante e articulado com as grandes massas - sem
sustentação política em partidos tradicionais -, acaba por instalar-se em março de
1990. Era o fim da Nova República e o início do Governo Collor de Mello, o qual
remexia no ―entulho sanitário‖ que, por ora, fora substituído pelo aparato legal:
Constituição Federal de 1988; Constituições Estaduais e Leis Orgânicas Municipais;
Lei nº. 8.142/90 e Lei nº. 8.080/90 na qual fica também garantida a implantação
legal do Sistema Único de Saúde.
Configura-se, assim, a trajetória do Sistema de Saúde na década de 80,
sendo que um novo caminho começa a se consolidar ao longo dos anos 90, em que
55
é imponente a presença de um projeto neoliberal de saúde, reciclando a proposta
conservadora de um modelo médico assistencial privatista adequado à lógica
capitalista.
A reestruturação mundial do capitalismo acompanhada de uma ruptura do
“compromisso social” entre capital e trabalho assumidos pelo Estado, especialmente
nos países centrais, desfaz o Welfare State - pacto que implicava como tendência o
pleno emprego, o expressivo sistema de políticas sociais, a proteção dos direitos
trabalhistas, a regulação das condições de trabalho.
Desse modo, segundo Iamamoto, as transformações no mundo do trabalho
vêm acompanhadas de profundas mudanças,
(...) na esfera do Estado, consubstanciadas na Reforma do Estado, exigidas
pelas ―políticas de ajuste‖, tal como recomendadas pelo Consenso de
Washington. Em função da crise fiscal do Estado em um contexto recessivo,
o reduzidas as possibilidades de financiamento dos serviços públicos; ao
mesmo tempo, preceitua-se o ―enxugamento‖ dos gastos governamentais,
segundo os parâmetros neoliberais. (1998, p. 34).
Nesses termos, o Brasil, não tendo experimentado o Welfare State ou Estado
de Bem-Estar Social na sua completude, viveu o que Oliveira já denominou de
Estado do Mal - Estar Social (IAMAMOTO, 1998, p. 30).
Portanto, nos marcos da reestruturação dos mecanismos de acumulação do
capitalismo globalizado, terreno fértil para o avanço da regressão neoliberal a qual
erodiu as bases dos sistemas de proteção social e redirecionou as intervenções do
Estado, em relação à questão social , as políticas sociais m sendo objeto de um
processo de reordenamento subordinado às políticas de estabilização da economia
e a opção neoliberal. Na área social, passa pelo apelo à filantropia e à solidariedade
da sociedade civil e por programas seletivos e focalizados de combate à pobreza no
âmbito do Estado.
Portanto, as políticas sociais, nesta década, se circunscrevem num cenário de
estabilização e ajustes neoliberais, remetendo ao trinômio: privatização,
descentralização e focalização.
Assim, a decorrente privatização dos serviços sociais e, em particular a
saúde, remete a regulação a mecanismos de mercado, penalizando os que menos
podem. Dito de outra forma, as transformações operadas globalmente no mundo do
trabalho, na esfera do Estado, na sociedade civil e na cultura impulsionadas
política e ideologicamente pelo neoliberalismo acirram na sociedade brasileira a
56
desigualdade social que é sentida pela população no o acesso aos bens e
serviços, principalmente no que se refere à saúde, assistência e previdência,
rompendo com o ―pacto social‖ assegurado pela Constituição Federal Brasileira de
1988.
A descentralização propõe a redução do Estado em busca de um Estado
Mínimo para o social e máximo para o capital. Isso nos remete a dois aspectos
cruciais: o aspecto de fragilização do papel reitor do Estado sobre as políticas
sociais e da diminuição de seu papel redistributivo.
A focalização, por outro lado, é decorrente do fato de que os gastos sociais
públicos chegam, em pequena e reduzida proporção, aos setores mais pauperizados
da sociedade, mas, para eles, deveriam ser dirigidos, prioritariamente, os recursos
para os programas sociais. Assim, com destaque para a área da saúde, a
focalização aparece, com clareza, nas propostas de atenção primária seletiva em
suas diferentes versões.
A emergência do projeto neoliberal -se num contexto de dificuldades
econômicas e de abertura política, tendo como pano de fundo‖ uma profunda crise
orgânica do Estado. A universalização consagrada na Constituição de 1988, quando
se instituía o preceito da Seguridade Social, consolidava-se nas tendências das
políticas redistributivas, com as quais pretendia a inclusão de todos nos benefícios
do sistema público de saúde.
A eliminação da contribuição previdenciária como condição para o acesso aos
serviços públicos de saúde provoca uma ruptura com o modelo corporativo do
benefício como direito de quem paga por ele e viabiliza uma efetiva redistribuição de
recursos, ainda que limitada ao interior da população assalariada.
Porém, essa expansão da universalização do sistema de saúde vem
acompanhada de racionamento e queda de qualidade dos serviços públicos, que
expulsa do sistema público segmentos sociais de camadas médias e do operariado
mais qualificado, capturados pelos planos de saúde.
Todavia, a constituição de um Sistema Único de Saúde, ao final dos anos 80,
foi a mais importante decisão de reforma na área social daquela década. Não
somente por ser a única das políticas sociais em que se reuniram condições
institucionais para que se tomassem decisões em favor de uma reforma efetiva, mas
tamm pelo conteúdo desta reforma, pela natureza, importância e extensão das
57
decisões tomadas (ARRETCHE, 2000).
Costa (2000) sinaliza que, com a implementação do SUS, a partir da cada
de 90, mudanças de ordens tecnológica, organizacional e política passaram a exigir
novas formas de organização do trabalho em saúde, determinadas pela
hierarquização, descentralização e democratização do sistema, imprimiram novas
características ao modelo de gestão e aos processos de trabalho, vindo a compor
novas modalidades de cooperação, qualificadas por Nogueira
45
―de cooperação
horizontal e vertical‖.
Congrega-se a isso, o verdadeiro ―desmonte da nação”, orquestrado pelo
governo Fernando Henrique Cardoso
46
, onde, nos anos 90, assiste-se ao
redirecionamento do papel do Estado, influenciado pela Política de Ajuste Neoliberal.
A reforma do setor de saúde seguiu a proposta do Banco Mundial, que subordina os
princípios de equidade aos de eficiência, efetividade e economia nos gastos
públicos. Segundo Lesbaupin e Mineiro (2002, p.43), ―é a partir desta lógica que está
inserida a preocupação com seletividade e focalização das políticas de proteção
social‖.
Na perspectiva do Banco Mundial, a saúde o é vista como um direito ao
qual todos devem ter acesso gratuitamente. Para esta instituição, é preciso
―aumentar a focalização do gasto público (em direção aos mais pobres), incluindo a
cobrança dos que podem pagar por certos benefícios e o estímulo à oferta pelo setor
privado de certos serviços‖ (COSTA, 1996; CARVALHO, 2002, apud LESBAUPIN e
MINEIRO, 2002, p. 43).
A lógica do ajuste fiscal penetrou tamm a política de saúde; aqui, também,
a saída para uma suposta crise é a privatização. De acordo com Lesbaupin e
Mineiro (2002), na ótica neoliberal, o mercado cuida melhor de tudo: tanto de
empresas siderúrgicas, petrolíferas como da previdência, da educação e da saúde.
Para os autores, ao longo dos seus dois mandatos, o governo de Fernando
Henrique Cardoso conseguiu realizar uma façanha que nenhum de seus
antecessores havia conseguido até então: destruir ou atingir seriamente parte
45 Cf. NOGUEIRA, Roberto Passos. O trabalho em serviços de saúde. Adaptação do texto apresentado no
seminário O choque teórico‖, promovido pela Escola Politécnica Joaquim Venâncio. Rio de Janeiro, Fiocruz,
1991. (Mimeo).
46 Fernando Henrique Cardoso foi o trigésimo quarto presidente da República Federativa do Brasil, cargo que
exerceu por dois mandatos consecutivos, de de janeiro de 1995 a de janeiro de 2003. Foi também o
primeiro presidente reeleito da história do país. É cofundador e, desde 2001, presidente de honra do PSDB
(Partido da Social Democracia Brasileira)
58
considerável do que havia sido construído ao longo de 60 anos de história
republicana brasileira, dos anos 30 ao fim dos anos 80. Desde serviços públicos até
a legislação trabalhista e a Constituição Federal de 1988, promovendo um
verdadeiro desmonte da nação. Apesar de tudo, asseveram os autores: “este
governo não conseguiu destruir o Brasil, o conseguiu destruir o povo brasileiro
(LESBAUPIN E MINEIRO, 2002).
Não obstante, o SUS, visto como um modelo de política pública de saúde vive
um processo de ataques da mídia e da política neoliberal, que o responsabiliza pela
má situação da saúde pública e pelos decorrentes males pelos quais passa a
população. Tal crítica isenta as autoridades de suas responsabilidades.
Aliam-se a este quadro: a falta de recursos; o uso político clientelista das
políticas de saúde por parte das esferas federais, estaduais e municipais; a intensa
campanha neoliberal para desmoralizar qualquer ação competente por parte do
setor público em que impera a máxima: tudo que é público é ruim e não presta”,
além da ausência de uma legislação adequada à importância das políticas sociais e
da frágil estrutura tributária dos governos municipais, que convivem com uma grande
retração dos gastos federais e estaduais no setor.
Ressaltamos que o Sistema Único de Saúde/SUS tem sido marcado por
intensos debates que refletem a presença de interesses antagônicos em relação a
sua consolidação, tanto como política pública calcada na universalidade, equidade,
integralidade, participação da população e dever do Estado, quanto no que se refere
às dificuldades para construir modelos assistenciais ancorados na concepção
ampliada de saúde que foi a base do processo de proposição do próprio SUS
(NOGUEIRA E MIOTO, 2007).
A categoria dos assistentes sociais como parte da classe trabalhadora
inserida neste processo, compreendendo-se o Serviço Social como uma profissão
historicamente determinada na divisão social e técnica do trabalho (a qual possui um
caráter interventivo no âmbito da questão social) ao romper com uma visão
endógena da profissão, prisioneira em seus muros internos, alarga os horizontes
para o movimento das classes sociais e do Estado em suas relações com a
sociedade, não para perder ou diluir as particularidades profissionais, mas, ao
contrário, para ilumi-las com maior nitidez; extrapolar o universo do Serviço Social
para melhor apreendê-lo na história da sociedade da qual ele é parte e expressão
59
(IAMAMOTO, 2007).
Isso nos permite compreender que a discussão a política pública de saúde e o
SUS está presentes no Serviço Social através de produções bibliográficas, segundo
Nogueira e Mioto (2007), apreendidas sob duas perspectivas: uma que pauta o
debate de forma mais intensa no eixo ético-político e outra que direciona análise
para a prática profissional no âmbito do SUS.
No que se refere ao eixo-político, destacam-se os estudos de Bravo (1996) e
de Nogueira (2002, 2004, 2007), os quais relacionam os riscos quanto às
possibilidades da ação profissional no sentido da garantia de direitos universais ao
analisarem o cenário atual, sinalizando as ameaças presentes no confronto entre o
projeto privatista de cuidados de saúde e o projeto da reforma sanitária.
A concepção ampliada de saúde assumida na Constituição de 1988, através
da determinação da implantação do SUS, foi um importante passo para uma
mudança significativa no modelo assistencial e na tradução das necessidades de
saúde da população brasileira. Ou seja, verifica-se que o atendimento das
necessidades de saúde remete ao atendimento das necessidades humanas
elementares, dentre as quais se destacam o trabalho, a alimentação, a habitação, o
acesso à água potável, aos cuidados primários de saúde e à educação.
A partir do exposto, postula-se que não é possível apreender ou definir as
necessidades de saúde sem levar em conta que elas são produtos das relações
sociais e destas com o meio físico, social e cultural.
Isso permite compreender que a adoção dos determinantes sociais como
estruturantes dos processos saúde-doença possibilita que as ações profissionais
dos assistentes sociais tenham maior centralidade, assinalando um novo estatuto ao
Serviço Social no campo da saúde.
que se considerar nessa breve apreciação a situação adversa às
propostas de democracia social, decorrentes dos ajustes macroeconômicos da
década de 90 no Brasil: as políticas de redução do Estado, as privatizações e o novo
papel desempenhado pelo mercado como provedor das necessidades de saúde.
Nas palavras de Nogueira e Mioto (2007, p.233), “foram a pedra de toque para as
dificuldades que ora se apresentam”.
Nesse marco, situamos a importância da eleição de Luiz Inácio Lula da Silva,
em 2002, para a Presidência da República, como resultado da reação da população
60
brasileira às medidas implantadas no período anterior. Sem dúvida, a eleição de
Lula
47
significou um marco político na história do país.
Isto posto, alguns aspectos devem ser abordados. Para tanto, recorremos a
Braz (2004) que ao analisar o governo Lula e os rebatimentos deste no projeto ético-
político do Serviço Social, aborda sobre três grandes questões a serem salientadas
quando pensamos a natureza do governo Lula: A primeira diz respeito ao significado
político da eleição de Lula; marco político indiscutível na história do Brasil, primeiro
represente legítimo da classe operária brasileira com forte experiência de
organização política.
Como asseverou Coutinho (2003, p. 23), apud Braz (2004, p. 49):
[...] foi a vitória de um projeto político, representado, sobretudo, por um
partido que soube crescer nos quadros de um processo de
redemocratização do qual foi, de resto, um dos maiores protagonistas.
Para Braz (2004, p. 49), a vitória de Lula tem significado mais que simbólico:
ela só foi possível a partir de um nível ampliado de articulação política que
envolveu os mais distintos estratos da classe trabalhadora em torno de um
projeto. [...] venceu pela primeira vez, o projeto que não representava em
sua origem e em sua totalidade os interesses hegemônicos das classes
dominantes no Brasil [...] envolveu, também, espectros amplos da
sociedade civil organizada.
A segunda questão refere-se ao contexto nacional e internacional das lutas de
classes, sobretudo ao perfil da classe trabalhadora que se encontra numa postura
defensiva frente à ofensiva do capital, em que as formas organizativo-políticas
encontram-se cada vez mais recortadas em ―identidades‖ fragmentárias (BRAZ,
2004).
Quanto à terceira questão, Braz (ibidem) esclarece que esta se relaciona
diretamente à segunda. Envolve o giro à direita dado pelo governo, aproximando o
PT a setores conservadores, de forma a torná-lo palatável às classes dominantes,
embora encontremos elementos que fomentem a conclusão de que este processo
de direitização se configurara bem antes da chegada de Lula no poder.
47 Luiz
Inácio Lula da Silva é um político e ex-sindicalista brasileiro, trigésimo quinto e atual presidente da
República Federativa do Brasil, cargo que exerce desde o dia 1º de janeiro de 2003. Lula, forma hipocorística de
"Luiz", é sua alcunha desde os tempos em que era representante sindical. Posteriormente, este apelido foi
oficialmente adicionado ao seu nome legal para poder representá-lo eleitoralmente.
61
Tais pontos supracitados corroboraram uma vitória das tendências mais
"moderadas", que negaram o projeto político do PT, que, na sua gênese
,representava, nas palavras de Braz (2004, p. 53), "o polêmico 'socialismo
democrático' para um reformismo sequer social-democrata".
É possível, então, com aporte em Bravo (2008), afirmarmos sem ilusões que
as propostas e reformas defendidas pelo governo Lula, após o seu primeiro governo,
dão sequência à contrarreforma do Estado iniciada na gestão de FHC, encolhendo o
espaço público democrático dos direitos sociais e ampliando o espaço privado não
nas atividades ligadas à produção econômica, mas tamm no campo dos
direitos sociais conquistados.
No entanto, no programa do governo Lula, a saúde é entendida como um
direito fundamental e o compromisso em garantir o acesso universal, equânime e
integral às ações e serviços de saúde.
Segundo Bravo (2007), o Ministério da Saúde tem apontado como principais
desafios: a incorporação da agenda ético-política da Reforma Sanitária; a
construção de novos modelos de fazer saúde com base na integralidade, a
intersetorialidade e a atuação em equipe; o estabelecimento da cooperação entre
ensino-gestão-atenção; controle e a supressão dos modelos assistenciais verticais e
voltados somente para a assistência médica.
De acordo com a autora, algumas estratégias também m sido ressaltadas
para a viabilização dos objetivos e metas a serem alcançados, cabendo destacar: a
política de educação para o SUS (mudança na prática e formação); a capacitação
continuada de conselheiros de saúde; o acesso à informação; a ênfase na educação
de saúde e a efetivação de outras contratações profissionais; e o fortalecimento do
Programa de Saúde da Família (BRAVO, 2007).
A análise que Bravo (2007) faz, ante o exposto, é que, após esses anos de
governo, a política macroeconômica do governo anterior foi mantida. As políticas
sociais continuam fragmentadas e subordinadas à lógica econômica.
Ainda que não seja o objetivo deste capítulo traçar um panorama detalhado
das políticas sociais no Governo Lula, não podemos deixar de apresentar alguns
aspectos fundamentais da estratégia governamental na área social.
Machado (2007) afirma que a grande prioridade conferida no primeiro governo
Lula é o combate à pobreza, inicialmente por meio do Programa Fome Zero e, logo a
62
partir de 2004, pela priorização de um imenso programa de transferência direta de
renda, com condicionalidades, o Programa Bolsa Família.
É certo que as estratégias de combate à pobreza em nada colidem muito
pelo contrário com as agendas de reforma de inspiração neoliberal, o grande
destaque do Programa Bolsa Família no Governo Lula gera críticas de vários tipos,
como acusações de ser ―assistencialista‖, ―populista‖ e ―eleitoreiro‖ (MACHADO,
2007). Todavia, faz-se necessário ponderarmos que, no contexto atual do
capitalismo mundial, os programas de transferência de renda podem exercer um
papel relevante na proteção social, dadas as concretas dificuldades de expansão
maciça nos níveis de emprego e renda, bem como as perversas tendências de
aumento da exclusão social (MACHADO, 2007).
Em que pesem alguns avanços, a questão que se coloca é o risco de certo
esgotamento desse efeito de redução das desigualdades e o alerta de que a
potencialização dos efeitos sociais desse tipo de programa passa, necessariamente,
segundo Machado (2007), pela valorização de outras políticas sociais, com inserção
em um sistema mais abrangente e integrado de proteção social.
Para autora, nenhum outro programa social teve destaque comparável ao do
Bolsa Família, ainda que, no interior de algumas áreas sociais, seja possível
identificar estratégias prioritárias que apresentaram avanços. Houve restrições de
financiamento de várias políticas sociais e situações de contingenciamento de
orçamentos de algumas áreas em prol da expansão de outras particularmente da
expansão do programa Bolsa Família.
A política de saúde não constitui uma exceção, embora possam se observar
iniciativas de mudanças e esforços de superação de problemas em áreas
estratégicas, anteriormente apontadas por Bravo (2007).
No que concerne ao conteúdo das políticas, um movimento relevante de
mudança, segundo Machado (2007), é a conformação de duas novas secretarias: a
de Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos; a de Gestão da Educação e do
Trabalho em Saúde. Ainda que represente mudanças de caráter administrativo, a
criação dessas secretarias tem significado como esforço de maior institucionalização
de dois campos estratégicos de atuação do Estado na saúde: o de insumos e o de
recursos humanos.
Nesse aspecto, as iniciativas mais importantes se deram no fomento à
63
pesquisa em áreas relevantes para a saúde, sendo as ações da nova secretaria no
âmbito do apoio ao desenvolvimento e provisão de insumos estratégicos para a
saúde mais tímidas no período (MACHADO, 2007:12)
No que se refere à segunda secretaria, registram-se esforços na formação de
recursos humanos, em que existiam iniciativas anteriores, mas que foram
expandidas por meio de parcerias e novas articulações com gestores locais,
universidades e setores do Ministério da Educação. Outra subárea que representou
uma nova vertente de ação mais coerente foi a de regulação do trabalho em saúde.
Embora com dificuldades e resultados ainda incipientes no primeiro governo Lula
(MACHADO, ibidem). Abordando, ainda, esse aspecto de possíveis mudanças, a
autora considera que um importante movimento foi a elaboração de um Plano
Nacional de Saúde, lançado em 2004, visto que, durante toda a década de 1990,
não havia sido feito nenhum plano abrangente e de longo prazo pelo Ministério da
Saúde.
Todavia, ainda que avanços institucionais tenham sido observados na política
de saúde, em 2002, ainda persistiram distorções estruturais do sistema e graves
lacunas de atuação federal.
Para Machado (2007), a análise da política nacional de saúde no primeiro
Governo Lula permite identificar elementos de continuidade e mudança em relação
aos anos 1990. Assim, a política de saúde no período 2003-2006 não representou
em seu conjunto uma prioridade do governo federal, ainda que tenha havido
esforços e iniciativas de mudança em alguns âmbitos estratégicos para a
implantação do SUS, com destaque: a escolha de José Gomes Temporão para
Ministro de Saúde, no período de transitoriedade (2007), um nome de peso do
movimento sanitário brasileiro (principal legado desse período de transitoriedade).
Contudo, Bravo e Menezes (2008) identificam uma mudança de discurso dos
protagonistas do projeto de Reforma Sanitária, construído nos anos 80,
principalmente, a partir de 2007, com a escolha do Ministro da Saúde. As autoras
asseveram:
uma flexibilização de suas proposições pautada nas possibilidades de
ação no atual contexto brasileiro. Diversos sujeitos sociais do Movimento
Sanitário não têm enfrentado a questão central do governo que é a
subordinação da Política Social à política macroeconômica. [...] Os
defensores da Reforma Sanitária e do Projeto Democracia de Massas
conseguirão contribuir para reverter as profundas desigualdades existentes
na atual conjuntura brasileira aliando-se a um amplo movimento de massas
que exija a redução do fosso entre a política macroeconômica e as políticas
64
sociais com a elaboração de uma agenda que defenda a garantia nas
esferas da economia, da política e da cultura (2008, p. 21).
O que se pretende destacar aqui é a atual disputa de dois projetos existentes
na saúde: o projeto da Reforma Sanitária versus o Projeto Privatista. Segundo Bravo
(2007), o atual governo ora fortalece o primeiro projeto e ora mantém focalização e o
desfinanciamento, características do segundo.
Assim, refletir sobre a ação profissional do assistente social no campo da
saúde implica fazer opções sobre os recortes a serem abordados, uma vez que o
caminho percorrido e os desdobramentos atuais da interface do Serviço Social com
a saúde são amplos e diversificados.
Nogueira e Mioto (2007) consideram que esse recorte permite reconhecer a
tradição do Serviço Social e a riqueza do arsenal teórico e técnico da experiência
acumulada na interface com a área da saúde e, partindo desse patamar, contribuir
para a densidade teórico-metodológica das ações desenvolvidas. Isso contribui para
delimitar, de forma mais explícita, o espaço profissional do assistente social,
inscrevendo a profissão igualmente no campo da saúde, face ao adensamento
desse campo nos últimos anos.
65
CAPÍTULO II A PRÁTICA PROFISSIONAL DOS ASSISTENTES SOCIAIS NA
SAÚDE
A prática é o fundamento e limite do conhecimento e
do objeto humanizado que, como produto da ação,
é objeto do conhecimento”.
Adolfo Sanches Vázquez
Tendo como referência os aspectos anteriormente discutidos, neste Capítulo,
procuraremos apresentar a configuração da prática dos assistentes sociais na área
da saúde. Buscaremos apreender o seu sentido e a sua direção na
contemporaneidade, bem como sinalizar os desafios e as polêmicas postos na
atualidade para uma prática dos assistentes sociais mediada pelo projeto
profissional hegemônico do Serviço Social brasileiro.
2.1 A prática dos assistentes sociais e o projeto ético-político profissional:
desafios e polêmicas postos na atualidade
As profundas mudanças operadas na profissão nas últimas décadas,
capitaneadas em seu projeto ético político profissional, são resultado de um
processo histórico da sociedade brasileira de lutas e resistência à ordem dominante.
Na verdade, uma resposta “à exigência da sociedade brasileira, em sua luta pela
democracia e pela cidadania: o reconhecimento, pelo serviço social, do usuário e
dos seus direitos” (CFESS, 2004, p. 45).
Como sublinha Iamamoto
o projeto profissional é histórico e dotado de caráter ético-político, que eleva
esse projeto a uma dimensão técnico-profissional. Isto porque ele
estabelece um norte, quanto à forma de operar o trabalho cotidiano,
impregnando-o de interesses da coletividade (2007, p. 227)
66
Logo, o projeto profissional do Serviço Social brasileiro é construído
coletivamente ao longo das últimas três décadas, assumindo um claro vínculo com
um projeto societário cujos valores e pilares estão expressos no Código de Ética
Profissional de 1993, na Lei de Regulamentação da Profissão e nas Diretrizes
Curriculares aprovadas em 1996 pela ABESS (Associação Brasileira de Ensino em
Serviço Social), hoje ABEPSS (Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em
Serviço Social).
Assim, este projeto é fruto de uma ampla discussão operada dentro do
espectro profissional pois expressa interesses particulares de um determinado
grupo social, como o dos assistentes sociais se relacionando com as diversas
particulares que envolvem rios interesses sociais presentes na sociedade
brasileira.
Através de sua direção social o projeto ético-político do Serviço Social
brasileiro coloca-se vinculado a um projeto de transformação da sociedade. Essa
vinculação se dá pela própria exigência que a dimensão política da intervenção
profissional impõe. Além disso, o projeto ético-político é bem claro e explícito quanto
aos seus compromissos éticos profissionais. Nas palavras de Netto (1999):
Ele tem em seu núcleo o reconhecimento da liberdade como valor ético
central - a liberdade concebida historicamente, como possibilidade de
escolher entre alternativas concretas; daí um compromisso com a
autonomia, a emancipação e a plena expansão dos indivíduos sociais.
Conseqüentemente, o projeto profissional vincula-se a um projeto societário
que propõe a construção de uma nova ordem social, sem dominação e/ou
exploração de classe, etnia e gênero (pp.104-105).
Cumpre ressaltar as concepções que fundamentam o Código de Ética de
1993. Duas preocupações nortearam a análise e a produção do Código de 93 quais
sejam: torná-lo um instrumento efetivo no processo de amadurecimento político da
categoria, bem como um aliado na mobilização e qualificação dos assistentes
sociais diante dos enormes desafios e demandas da sociedade brasileira, ou seja,
urgia transformá-lo num mecanismo efetivo de defesa da qualidade dos serviços
prestados pelos assistentes sociais; e constituí-lo como um instrumento eficaz de
defesa do exercício profissional, fornecendo respaldo jurídico à profissão
(BARROCO, 2001).
De acordo com a autora, buscou-se, pois, na elaboração do Código de Ética
Profissional de 93, através de um esforço coletivo, a tradução e materialização de
67
diversas situações inerentes ao processo de trabalho do assistente social, no intuito
de abranger os dilemas éticos. Houve, neste âmbito, um empenho para melhor
definir e precisar a objetivação dos valores e princípios éticos universais no seio do
cotidiano da profissão. Nas palavras da autora
48
(...) O Código de 93 obteve um salto de qualidade muito grande, pois,
possui uma fundamentação ética e filosófica e consegue operacionalizar de
forma objetiva os onze princípios fundamentais que balizam o projeto e os
compromissos ético-profissionais.
O Código de Ética Profissional, além da parte normativa necessária em
qualquer código profissional , apresenta um projeto de profissão e de sociedade.
Ou seja, am das normas, elege valores e princípios a serem defendidos pelos
profissionais na sua prática cotidiana. Ao definir-se como um projeto que implica
meios e instrumentos para sua realização , o Código de Ética de 93 rompe com as
funções tradicionais de um Código de Ética profissional, pois estabelece valores e
princípios que ultrapassam as normas geralmente impostas para o exercício
profissional propriamente dito
49
.
O Código de 93 representa a superação das debilidades teóricas e políticas
do Código de Ética de 1986
50
, ao explicitar o compromisso profissional a favor da
emancipação humana e da construção de uma sociedade pautada na liberdade e na
justiça social. Expressa também o grau de apropriação da teoria social marxista pela
profissão. Portanto, fundamentado na ontologia social de Marx, o Código de 1993
48 Palestra proferida por Maria Lúcia Barroco com a temática, ―10 anos do Código de Ética de 93”. Realizada em
agosto de 2003, na cidade de São Paulo (SP), no Encontro Descentralizado Sudeste - encontro preparatório
para o XXXII Encontro Nacional CFESS/CRESS.
49 Cf. Vasconcelos [et al.] Profissões de saúde, ética profissional e seguridade social.In: Bravo (orgs).Saúde e
Serviço Social. São Paulo: Cortez; Rio de Janeiro:UERJ, 2004.
50 O Código de Ética de 1986 foi elaborado ao longo de aproximadamente três anos, a partir de um processo de
discussão envolvendo os segmentos representativos da categoria e, posteriormente, homologados pelo
Conselho Federal de Serviço Social. Superando a concepção do ―técnico imparcial‖, o Código de 86 buscou
garantir a ação profissional pautada nos parâmetros de capacitação, para pesquisar, elaborar, gerir e decidir a
respeito das políticas sociais e programas institucionais. Assim, o Código de 86 representa um avanço,
inserindo-se no âmbito das discussões éticas contemporâneas na busca de uma ética que pudesse responder
aos desafios da sociedade. Dessa forma, três dimensões de mudanças colocadas no Código de 1986 a
negação à neutralidade, aos pressupostos metafísicos e idealistas e ao papel profissional tradicional com
vistas a uma prática que tenha como pressuposto o real, e não modelos ideais abstratos. O Código de Ética de
86 alarga os horizontes éticos do Serviço Social, na medida em que se afirma o caráter do homem enquanto ser
histórico, social, prático e criador. Tem-se, a partir de tal construção ética e normativa, um posicionamento a
favor da classe trabalhadora. Todavia, apesar do avanço, o Código de 86 apresenta resquícios de uma visão
estática e unilateral ao explicitar uma vinculação profissional a determinada classe social (no caso a classe
trabalhadora) e, com isto, perdendo em eficácia ao não atentar para a totalidade da prática profissional do
assistente social. Cf. BONETTI, Dilsea Aldeodata et alii (orgs.). Serviço Social e Ética: convite a uma nova práxis.
São Paulo: Cortez/CFESS, 1995.
68
concebe, nas palavras de Ortiz (2009, p.131), a liberdade como um dos resultados
da práxis humana, e, por conseguinte, não consistindo em um fenômeno natural,
mas um produto histórico gerado a partir do trabalho”.
Com efeito, o Projeto Ético Político do Serviço Social não pode ser
compreendido somente como uma decorrência de fatores internos da profissão;
posto que, por uma ótica, é fruto de um processo de organização política da
categoria dos assistentes sociais e, por outra, é tamm produto da ascensão das
forças democrático-populares no cenário político nacional - marcado pela reativação
do movimento operário-sindical e pela efervescência dos movimentos populares que
contribuíram, sobremaneira, para uma nova perspectiva àqueles assistentes sociais
que pretendiam uma ruptura com o conservadorismo profissional (PACHECO in
SOUZA, 2007).
Cabe lembrarmos que entre as vertentes presentes no circuito de Renovação
do Serviço Social (Ortiz, 2009), é a chamada ―intenção de ruptura‖, conforme Netto
(1996), que abriu a radical possibilidade, pela primeira vez na trajetória do Serviço
Social, da superação com o histórico conservadorismo. Entretanto, o autor sinaliza
que a consolidação do movimento de ruptura não significa a superação do
conservadorismo no interior do Serviço Social, ao contrário:
(...) significa, apenas, que graças aos esforços que vinham, pelo menos,
de finais dos anos setenta, e no rebatimento do movimento da sociedade
brasileira posicionamentos ideológicos e políticos de natureza crítica e/ou
contestadora em face da ordem burguesa conquistaram legitimidade para
se expressar abertamente. É correto afirmar-se que, ao final dos anos
oitenta, a categoria profissional refletia largo espectro das tendências ídeo-
políticas que tencionam e animam a vida da sociedade brasileira
(NETTO,1999, p.111).
É sabido que o conservadorismo no Brasil tem seu perfil marcado pela
inserção periférica da economia brasileira no mercado mundial. Este fato determina
a forma própria de desenvolvimento do conservadorismo nas diversas esferas
sociais e, particularmente, na produção dos saberes.
O Serviço Social, por sua vez, tem no conservadorismo um elemento central
da sua constituição ídeo-teórica e histórica, torna-o um terreno fértil para
proposições antimodernas e conservadoras, que se expressam na
contemporaneidade no pensamento pós-moderno.
O pensamento pós-moderno dá por suposto e de forma simplicista que lhe é
peculiar o fracasso das promessas da modernidade. De acordo com Sousa (2005,
69
p.23), este pensamento coloca em questão as noções clássicas de verdade, razão,
identidade e objetividade, a idéia de progresso ou emancipação universal e a
liberdade dos homens.
Logo, para a autora, trata-se de uma mistificação elaborada pelos autores
pós-modernos que não são capazes de perceber na atualidade o desenvolvimento
das contradições próprias da moderna sociedade burguesa.
Ressaltamos que o novo impulso do conservadorismo profissional com base
no neoconservadorismo pós-moderno tem especificidades derivadas o do
momento histórico leitura fragmentada e epistemologista da realidade
contemporânea , mas, sobretudo, do enfrentamento posto pelo movimento
realizado no Serviço Social, de ruptura com o conservadorismo. Ou seja, o
conservadorismo irá se fortalecer no processo de desqualificação da vertente crítico-
dialética e o faz do ponto de vista teórico, incorporando as críticas pós-modernas ao
marxismo; e do ponto de vista ídeo-político, na deslegitimação do projetotico-
político-profissional, expressão da direção social estratégica que aponta a ruptura
com o conservadorismo.
Portanto, nas respostas dadas pela profissão às necessidades sociais
oriundas da relação entre capital e trabalho, as vertentes teórico-profissionais
interpelam na atualidade um confronto ideo-político, que fora sinalizado por Netto
(1996), e aparecem configuradas nas seguintes linhas de desenvolvimento:
1. manter a continuidade da vertente que se iniciou com a intenção de
ruptura com influência da tradição marxista e no marco da direção social
estratégica explicitada na abertura dos anos 90; 2. registrar um novo alento
de uma vertente de cariz tecnocrático, herdeira daquela que foi a
―perspectiva modernizadorados anos sessenta e setenta, mas renovada
pela ofensiva neoliberal e reciclada por outras teorias sistêmico-
organizacional... 3. a persistência (...) da vertente do conservadorismo
tradicional, que recorreu, nos anos setenta e oitenta, à fenomenologia; 4. o
desenvolvimento de uma vertente neoconservadora, inspirada fortemente
na epistemologia pós-moderna, afinada com as tendências da nova moda
das chamadas ciências sociais e tendo seu gume crítico apontando para a
revisão dos substratos das conquistas anticonservadoras dos anos oitenta,
muito provavelmente promovendo, por um lado uma retronização das
práticas tradicionais, oferecendo-lhes um discurso legitimado de natureza
cultural, e por, outro, estimulará, respaldando o apelo à sociedade civil e a
cidadania ações focais de no marco de petições solidárias e parcerias de
todos os níveis; 5. o florescimento de vertentes aparentemente radicais,
abertamente desqualificadoras da teorização sistemática e da pesquisa
rigorosa fundada num anticapitalismo romântico de inspiração católica, seja
na repulsa anarcoide ao universalismo da modernidade, seja no
irracionalismo aberto, seja no relativismo mais primário (pp.126-127).
70
Percebemos que passados treze anos dessa afirmação, há possibilidade
regressiva em termos da profissão e da ligação desta com a nova forma de
conservadorismo que está representada na teoria pós-moderna se faz presente nas
relações fragmentadas do capitalismo, que ganhando novas nuances na
contemporaneidade.
Nesse marco, o contexto neoconservador contemporâneo, objetivamente
expresso no processo de crise do grande capital e seus desdobramentos no âmbito
público-estatal (marcado pelo progressivo processo de contrarreforma do Estado),
econômico e sociocultural, as tendências conservadoras - sempre presentes, ainda
que subliminares nas últimas décadas - na profissão se fortalecem e se ampliam
aquecendo a chamada ―luta dos contrários
51
(ORTIZ, 2009).
Conforme assevera a autora: é neste cenário que o Serviço Social entra no
século XXI, no qual se torna imprescindível, não apenas o reconhecimento das
ameaças possíveis, mas, principalmente, sob pena de francos retrocessos, a
reafirmação do caminho da “‟intenção de ruptura percorrido por esta profissão até
aqui (ORTIZ, 2009, p. 134).
Do exposto, tomemos aqui as polêmicas e os desafios que se objetivam na
atualidade para a prática dos assistentes sociais mediada pelo projeto profissional
hegemônico do Serviço Social brasileiro.
De início, podemos dizer que, diante desse contexto de incertezas, alguns
autores do Serviço Social têm nutrido o debate acerca da existência e permanência
da hegemonia do projeto ético-político, a exemplo de Netto (2007) e Braz (2007)
52
.
Contudo, ainda que a indagação se o projeto ético-político é (ainda) hegemônico ou
não esteja sobre a mesa de debates (Ortiz, 2009), alguns aspectos dessa discussão
tendem a impactar, sem dúvida, o projeto ético profissional
53
.
Segundo Bravo (2007), a crítica à tendência da intenção de ruptura não se
apresenta como antimarxista e sim afirmando que o marxismo não apresenta
respostas para o conjunto dos desafios postos à profissão pela contemporaneidade.
51 A autora sinaliza a existência de traços renovados conviverem dialeticamente com aqueles vinculados às
chamadas ―marcas de origem da profissão. Esses traços renovados e tradicionais fundados em claros e
antagônicos valores e princípios éticos-políticos. Colidem entre si cotidianamente numa aberta ―luta dos
contrários‖. Cf. ORTIZ, 2009.
52 Os autores apresentam argumentação nos respectivos artigos. Netto. Das ameaças à Crise, pp.37-40 e
Braz‖. ―A hegemonia em xeque‖. Projeto ético-político do Serviço Social e seus elementos constitutivos, pp.5-10.
CFESS, Revista Inscrita - Ano VII nº novembro de 2007.
53 Cf. ORTIZ, Fátima Grave. Serviço Social e Ética: a Constituição de uma Imagem Social Renovada. In Forti e
Guerra et alii (orgs.). Ética e Direitos: ensaios críticos Coletânea Nova de Serviço Social, Editora Lumen Juris.
Rio de Janeiro, 2009,pp.133-136.
71
Como nos mostra Netto (1996), ao realizar uma análise prospectiva da profissão.
A inflexão neoconservadora pós-moderna tem fortes influências acadêmicas e
no próprio Serviço Social, geralmente voltado à desqualificação do marxismo,
através de críticas formais e assumi dois compósitos:
1) uma crítica à ortodoxia (que, para os críticos, é sinônimo de
dogmatismo) dos marxistas brasileiros no Serviço Social; 2) uma crítica às
lacunas (e não aos equívocos) existentes nos seus trabalhos. No primeiro
caso, a crítica se dirige no sentido de ―ampliar‖, ―abrir‖, ―flexibilizar‖ a
perspectiva teórica, incorporando os autores que sejam do gosto crítico
(Habermas para uns, Foucault para a maioria) e as tendências mais
prestigiadas e mais up to date nos rculos acadêmicos e na indústria
cultural (os s-modernos). No segundo, constatando-se que a elaboração
nos anos oitenta não lavrou sobre um amplo rol de objetos (questões de
gênero, de cultura, de minorias etc.) insinua-se que isso se deve a uma
espécie de inépcia imanente às correntes marxistas para enfrentá-los
(1996, p. 114).
Na saúde, onde esse embate claramente se expressa, assegura Bravo (2007,
p. 211):
a crítica ao projeto hegemônico da profissão passa pela reatualização do
discurso da cisão entre o estudo teórico e a intervenção, pela descrença da
possibilidade da existência de políticas públicas e, sobretudo, na suposta
necessidade da construção de um saber específico na área da saúde, que
caminha tanto para a negação da formação original em Serviço Social ou
deslancha para um trato exclusivo de estudos na perspectiva da divisão
clássica da prática médica.
No texto acima a autora sinaliza três expressões que merecem destaque, a
saber: a primeira é a constatação de que ainda existe na categoria segmentos de
profissionais que, ao realizarem a formação em saúde pública, passam a assumir
uma auto-reapresentação de sanitaristas, não se identificando mais como
assistentes sociais; a segunda tendência mais expressiva na atualidade é resgatar
no exercício profissional o privilégio da intervenção no campo da subjetividade dos
sujeitos, autodenominada pelos seus executores como Serviço Social Clínico
54
.
Finalizando, percebe-se gradativamente o discurso da necessidade de
fóruns/entidades de capacitação dedicados à importância da produção do
conhecimento sobre o Serviço Social nas diferentes áreas de especialização da
prática médica.
Nas palavras de Netto (1999, p. 95), o projeto profissional do Serviço Social:
54 Esta proposta é decorrente de um movimento composto de um grupo de assistentes sociais com formação
especializada em diversas abordagens clínicas: holística, bioenergética, psicodrama, terapia familiar sistêmica,
transpessoal. É um grupo heterogêneo que reivindica das entidades da categoria e unidades de ensino o
reconhecimento do caráter clínico ou terapêutico do exercício profissional. Cf. Parâmetros para a atuação de
Assistentes Sociais na Saúde, versão preliminar, CFESS, Brasília, março de 2009.
72
(...) É entendido como conjunto de valores que a legitimam socialmente,
delimitam e priorizam seus objetivos e funções, formulam os requisitos
(teóricos, institucionais e práticos) para o seu exercício, prescrevem normas
para o comportamento dos profissionais e estabelecem as balizas de sua
relação com os usuários de seus serviços, com as outras profissões e com
as organizações e instituições sociais.
Compreendemos que não existem rmulas prontas na construção de um
projeto democrático e a sua defesa, nas palavras de Bravo e Matos (2007, p. 214),
“não pode ficar acuada frente aos obstáculos que se apresentam na atualidade e
nem desconsiderar que há um leque de pequenas, mas não menos importantes
atividades e alternativas a serem desenvolvidas pelos profissionais de Serviço
Social”.
Mais do que nunca, os assistentes sociais são provocados a enfrentar a
defesa da democracia, das políticas públicas e consubstanciar um trabalho, no
cotidiano e na articulação com outros sujeitos que compartilhem destes princípios,
que faça frente ao projeto neoliberal, já que este macula direitos e conquistas
defendidos pelos seus fóruns e pelas legislações normativas da profissão.
2.2 A configuração da prática profissional dos assistentes sociais na saúde
Cumpre ressaltar que, ao falarmos de prática profissional, nos remetemos à
concepção cunhada pela tradição marxista. Ou seja, a de que a prática profissional é
uma especialização da práxis social
55
. Marx, ao apresentar suas Teses sobre
Feuerbach, afirma na I Tese que
o principal defeito de todo materialismo até aqui (incluindo o de Feuerbach)
consiste em que o objeto, a realidade, a sensibilidade o apreendidos
sob a forma de objeto ou de intuição, mas não como atividade humana
sensível, como pxis, não subjetivamente.
Na perspectiva apontada por Vázquez (1977, p. 154), ―a práxis é o
fundamento e limite do conhecimento e do objeto humanizado que, como produto da
ação, é objeto do conhecimento‖, ou seja, a práxis é o ponto de partida e o alicerce
55
Embora o objetivo deste capítulo, o consiste em discutir se o Serviço Social é considerado
trabalho ou não. Cabe-nos informar sobre a existência dessa polêmica teórica posta ao Serviço
Social.
73
para aferir e validar o conhecimento, bem como estabelecer o critério de sua
verdade, necessitando, para tanto, ―plasmar-se, adquirir corpo na própria realidade,
sob a forma de atividade prática‖. Portanto, a atividade teórica em si não é práxis,
ela só adquire plenitude na prática concreta dos homens (VÁZQUEZ, 1977).
Segundo Vázquez (ibidem), a práxis pode apresentar-se sob diversas formas:
produtiva, criativa e social ou revolucionária. Mas todas elas são concordantes no
fato de se tratar da transformação (...) e da criação de um mundo de objetos
humanos ou humanizados.
Nas palavras do autor,
A matéria-prima da atividade prática pode mudar, dando lugar a diversas
formas de práxis. O objeto sobre o qual o sujeito exerce sua ação pode ser:
produtos de uma práxis anterior que se convertem, por sua vez, em matéria
de uma nova práxis, com os materiais já preparados com que trabalha o
operário ou com que cria o artista plástico; o humano mesmo quer se trate
da sociedade como matéria ou objeto da práxis política ou revolucionária,
quer se trate de indivíduos concretos. Em alguns casos, como vemos, a
práxis tem por objeto o homem e, em outros, uma matéria não
propriamente humana: natural nuns casos, artificial nos outros (VÁZQUEZ,
1977, pp.194 -195).
Baptista (2006, pp. 28-29) considera que o que particulariza o
conhecimento produzido pelo Serviço Social é a inserção de seus profissionais
em práticas concretas
O assistente social se detém frente às mesmas questões que os outros
cientistas sociais, porém o que o diferencia é o fato de ter em seu horizonte
certo tipo de intervenção: a intervenção profissional. Sua preocupação é
com a incidência do saber produzido sobre a sua prática: em serviço social,
o saber crítico aponta para o saber fazer crítico.
Tomemos aqui a pesquisa realizada por Vasconcelos (2002) com os
assistentes sociais da Secretaria Municipal de Saúde do Rio de Janeiro (RJ). Esta
demonstrou, nas palavras da autora: uma fratura entre a prática profissional
realizada pelos assistentes sociais e as possibilidades de prática contidas na
realidade objeto da ação profissional.
De acordo com Baptista (2006), é importante entender que o saber que deriva
da prática profissional não se coloca imediatamente de modo pronto e acabado, mas
é um conhecimento que se constrói: desenvolve, traduz, codifica e decodifica um
conjunto de questões que se colocam à prática profissional em determinado
momento e delas extrai um saber.
74
Vasconcelos (2002) considera que a prática dos assistentes sociais inseridos
na Secretaria Municipal de Saúde do Município do Rio de Janeiro (RJ) ainda
permanece atrelada aos ideais conservadores e tradicionais, os quais colaboram
para manutenção de práticas reiterativas e burocratizadas no meio profissional. A
compreensão e o entendimento da direção social da profissão pelos profissionais
ainda são substancialmente reduzidos.
No tocante à prática propriamente dita, a autora nos esclarece que os
assistentes sociais da Secretaria Municipal de Saúde/RJ a organizam através de
plantões, programas e projetos; entretanto, esta organização se processa
(...) independentemente do tipo de unidade de saúde, das diferenças entre
os usuários e das demandas dirigidas ao Serviço Social, os assistentes
sociais da SMS seguem uma lógica de organização do trabalho
estratégia de ação que pode ser percebida nas ações mais ou menos
padronizadas que realizam, tanto no conjunto das equipes profissionais
quanto individuais.(...). (VASCONCELOS, 2002, p. 160).
(grifo no original).
O plantão é a configuração comum de trabalho dos assistentes sociais na
Secretaria Municipal de Saúde, conforme sinaliza Vasconcelos (2002, p. 165):
O que chama a atenção (...) é a prioridade dada às atividades no plantão
em todas as unidades pesquisadas e o número expressivo de assistentes
sociais que afirmam trabalhar a partir de uma inserção majoritária em
plantão, independentemente do tipo de unidade de saúde e dos usuários.
Esta questão é crucial tendo em vista as características dos serviços
prestados no plantão, características estas que, freqüentemente,
determinam a respeitabilidade, a subalternidade, a aceitação, a força e/ou a
influência que o Serviço Social possa ter na unidade como um todo, na
direção das suas ações e na qualidade dos serviços prestados.
Nos Serviços de Saúde da Aeronáutica/RJ, os plantões do Serviço Social são
espaços para resolução imediata dos problemas e das demandas dos usuários;
neles, a demanda se apresenta sob variados contornos: pedidos de orientações
diversas; acesso aos serviços da unidade; reclamações quanto à dificuldade de
marcação de consultas; encaminhamentos para consulta médica; orientações sobre
o SARAM e FUNSA; solicitação de ambulância/viatura para transporte de usuário
acamado para consulta e/ou tratamento e internação; solicitação de apoio e
orientação quanto aos cuidados e tratamento de paciente acamado e restrito ao
leito; solicitação de ressarcimento de fisioterapia domiciliar; solicitação de inscrição
de paciente idoso no Serviço de Atendimento Domiciliar/SAD; solicitação de
Alojamento para familiares e acompanhantes (sem vínculo familiar) de pacientes
75
oriundos de outros estados e que não podem permanecer no leito quando os
pacientes encontram-se internados em UTI
56
; orientação quanto aos procedimentos
no que se refere à Junta Regular de Saúde, bem como isenção de desconto do
imposto de renda, auxílio invalidez acidente de trabalho; orientação quanto à pensão
militar, exclusão de dependentes do SARAM; encaminhamento para recebimento de
passagens terrestres ou reas após alta hospitalar e retorno para a unidade de
origem
57
; orientação previdenciária; inserção na rotina da unidade; apoio, ficha
social, laudo social, conhecimento da rotina e/ou recursos da unidade, acesso aos
serviços da unidade/externos, visita domiciliar, espaço para falar, mediar conflitos,
asilamento, relacionamento/conflito familiar, cesta de alimentos, atenção à família do
paciente psiquiátrico; declaração de atendimento realizado/ comparecimento na
unidade; agilização de atendimentos de emergência; orientações a familiares de
dependentes químicos e de idosos portadores de Alzheimer.
Assim, o plantão é uma atividade desenvolvida por todos os assistentes
sociais dos serviços de saúde da Aeronáutica/RJ. Em sua maioria, a prática no
plantão não segue uma sistematização, não possui uma estatística de atendimento e
um perfil de público alvo, não é uma atividade pensada, planejada ou organizada.
De acordo com Vasconcelos (2002, p.518):
―A questão decisiva que se coloca para os assistentes sociais, diante da
complexidade da realidade, é conhecer sob quais condições o Serviço
Social tem possibilidade de contribuir na construção de formas de acesso
aos recursos e informações sociais e culturais tendo em vista uma nova
forma de produção e reprodução social. Para que isso se torne possível, os
assistentes sociais terão de avançar para além das medidas paliativas e/ou
imediatas, destinadas somente a ‗quebrar galho‘, fazer remendos,
solucionar momentaneamente o que o tem solução: a questão social
produto da economia capitalista‖.
Dessa forma, a autora sinaliza que a prática profissional no plantão, exige
uma apreensão crítica e criteriosa da realidade social, bem como captar o que
56 É norma e rotina institucional que, no ato de transferência de paciente do leito para UTI, que os
acompanhantes não permaneçam no leito. Portanto, os familiares e acompanhantes residentes no Rio de
Janeiro, retornam aos seus domicílios acompanhando o paciente somente no horário de visitas. aqueles
familiares e acompanhantes de fora do Rio de Janeiro não têm para onde se encaminhar, utilizando os serviços
de Alojamento feminino e masculino dos Hospitais ou, os Hotéis de Trânsito para militares sediados nas Bases
Aéreas. Na falta de vaga nestes, é o assistente social que se articula para alojá-los.
57 É de responsabilidade da Unidade de Saúde que recebe o paciente (de fora do Rio), após alta hospitalar o
encaminhar para a Unidade de origem.
76
não está aparente nas demandas trazidas pelos usuários. Assim como, exige uma
prática coletiva no atendimento às demandas, rompendo com práticas
burocráticas e pontuais que fragmentam as ações profissionais do Serviço Social.
Nesse marco, situamos que o projeto privatista na saúde é radicalmente
opositor não somente ao projeto da Reforma Sanitária como ao projeto ético-
político do Serviço Social, por requisitar dos profissionais ações como: seleção
socioeconômica dos usuários; atuação psicossocial por meio de aconselhamento;
ação fiscalizadora aos usuários dos planos de saúde; assistencialismo através da
ideologia do favor e predomínio de abordagens individuais.
Ora, em contraponto, o projeto de Reforma Sanitária apresenta como
demandas para o assistente social que este trabalhe com as seguintes questões:
busca de democratização do acesso às unidades e aos serviços de saúde;
atendimento humanizado; estratégias de interação da instituição de saúde com a
realidade interdisciplinar; ênfase nas abordagens coletivas; acesso democrático
às informações e estímulo à participação cidadã.
Bravo (1999, p. 113) considera que:
A universalidade do direito um dos fundamentos centrais do SUS e
contido no projeto de Reforma Sanitária é um dos aspectos que tem
provocado resistência dos formuladores do projeto Saúde Voltada para o
Mercado. Esse projeto tem como premissa concepções individualistas e
fragmentadoras da realidade, em contraposição às concepções coletivas e
universais do projeto contra-hegemônico.
No entendimento de Bravo e Matos (2007), o trabalho do assistente social na
saúde deve ter como eixo central a busca criativa e incessante da incorporação dos
conhecimentos e das novas requisições à profissão, articulados aos princípios dos
projetos da reforma sanitária e ético-político do Serviço Social. Segundo os autores,
é sempre na referência a estes dois projetos que se poderá ter a compreensão se o
profissional está de fato dando respostas qualificadas às necessidades
apresentadas pelos usuários.
Pensar hoje uma atuação competente e crítica do Serviço Social na área da
saúde requer segundo Bravo e Matos (2007, p. 214):
- Estar articulado e sintonizado ao movimento dos
trabalhadores e usuários que lutam pela real efetivação do
SUS.
77
- Facilitar o acesso de todo e qualquer usuário aos serviços de
saúde da Instituição, bem como de forma compromissada e
criativa não submeter a operacionalização de seu trabalho aos
rearranjos propostos pelos governos que descaracterizam a
proposta original do SUS de direito, ou seja, contido no projeto
de Reforma Sanitária.
- Tentar construir e/ou efetivar, conjuntamente com outros
trabalhadores da saúde, espaços nas unidades que garantam a
participação popular e dos funcionários nas decisões a serem
tomadas.
- Elaborar e participar de projetos de educação permanente,
buscar assessoria cnica e sistematizar o trabalho
desenvolvido, bem como temáticas relacionadas à saúde.
A citada a pesquisa na Secretaria Municipal de Saúde/RJ de Vasconcelos
(2002), demonstra que, apesar do avanço teórico-político engendrado pelo Serviço
Social brasileiro, nas décadas de 80 e 90, este não tem encontrado ressonância na
prática profissional dos assistentes sociais no cenário atual. Segundo a autora, o
trabalho do Serviço Social na Secretaria Municipal de Saúde do Rio de Janeiro
manm-se atrelado a uma perspectiva tradicional e conservadora do fazer
profissional.
Cumpre ressaltar que, embora Vasconcelos (2002, p. 238) tenha identificado
práticas que não reproduzem o ethos conservador da profissão, no entanto, elas
envolvem uma parcela imperceptível ante ao conjunto dos assistentes sociais
entrevistados. A autora nos esclarece:
(...) passados mais de vinte anos do processo de Reconceituação do
Serviço Social, que, pela primeira vez no Brasil, aponta para a possibilidade
de ―um projeto de intervenção social respaldado em forças sociopolíticas
inscritas nos movimentos populares de massa...‖ e quinze anos da primeira
proposta de formação profissional engendrada pela ABESS, calcada nos
fundamentos deste projeto, podemos caracterizar o trabalho realizado pelos
assistentes sociais da SMS como tradicional‖, no sentido indicado por
José Paulo Netto: ―uma prática empiricista, reiterativa, paliativa e
burocratizada, que, na sua vontade/intenção, aspira a uma articulação com
as necessidades e interesses da sociedade brasileira, mas, na sua ação,
es parametrada por uma ética liberal burguesa, sua teleologia
consistindo na correção numa ótica claramente funcionalista de
resultados psicossociais considerados negativos ou indesejáveis, sobre o
substrato de uma concepção (aberta ou velada) idealista e/ou mecanicista
da dinâmica social, sempre pressuposta a ordenação capitalista da vida
como um dado factual ineliminável‖ (grifo no original).
É neste cenário problemático e contraditório que se configura a prática dos
assistentes sociais na saúde. De acordo com Vasconcelos (2002, p. 113),
78
amaterialização/efetivação dos princípios e valores do projeto ético-político
profissional na prática profissional dos assistentes sociais sinaliza a condição
sine qua non para sua manutenção no plano teórico-político. Nas palavras da autora:
(...) a prática, tendo em vista a condição de profissão do Serviço Social, é
determinante na mudança de direção e legitimação dessa direção não só
o debate teórico, que hoje contribui, rebate e conta com mais legitimidade e
reconhecimento acadêmico e no campo das Ciências Sociais do que no
meio profissional.
79
CAPÍTULO III A PRÁTICA PROFISSIONAL DOS ASSISTENTES SOCIAIS NOS
SERVIÇOS DE SAÚDE DA AERONÁUTICA/RJ
Não é o caso interado em si,
mas a sobrecoisa, a outra coisa
Guimarães Rosa, Grande Sertão: veredas.
3.1 Aeronáutica: uma instituição militar das Forças Armadas do Brasil
A Força Aérea Brasileira (FAB) - Aeronáutica Militar ou, simplesmente,
Aeronáutica - é a maior Força Aérea da América Latina em contigente, número de
aviões e poder de fogo. Componente aérea das Forças Armadas de um país que
são constituídas, também, pelo Exército e pela Marinha.
Foi criada em 20 de janeiro de 1941, quando o então presidente Getúlio
Vargas assinou o Decreto 2961, criando o Ministério da Aeronáutica e
estabelecendo a fusão das Forças Aéreas do Exército e da Marinha numa
corporação denominada Forças Aéreas Nacionais. Pouco depois, em maio de
1941, um novo decreto mudou o nome da recém-nascida Força Aérea para Força
Aérea Brasileira (FAB), nome que permanece até os dias de hoje.
Nos anos seguintes houve um crescimento do setor aeronaútico brasileiro,
tendo sido criada uma significativa infra-estrutura por todo o país, o que
possibilitou o aumento da capacidade tecnológica e organizanizativa de toda a
aviação civil e militar.
O Ministério da Aeronaútica manteve-se atuante até 10 de junho de 1999,
quando foi criado o Ministério da Defesa. A partir de então, passou a ser
denominado Comando da Aeronáutica.
Ao Comando da Aeronáutica cabe: formular e conduzir a política
aeronáutica nacional, civil e militar; propor a constituiição, organização dos
efetivos, bem como aparelhar e preparar a Força Aérea Brasileira; contribuir para
80
a fomulação e condução da política nacional de desenvolvimento das atividades
aeroespaciais; operar o Correio Aéreo Nacional; orientar, coordenar e controlar as
atividades de aviação civil; incentivar e realizar atividades de pesquisa e
desenvolvimento relacionadas com as atividades aeroespaciais; estimular a
indústria nacional; prover a segurança da navegação aérea; formular o
planejamento estratégico e executar ações relativas à defesa do país, no campo
aeroespacial.
O Comando Militar da Força é exercido pelo Comando Maior da
Aeronáutica/COMAER, ao qual estão subordinados quatro Comandos-Gerais,
dois Departamentos e diversos outros órgãos relacionadas com o funcionamento
e administração da aviação brasileira, tanto civil como militar, e da pesquisa e
desenvolvimento aeroespacial.
Os quatro Comandos Gerais são: o Comando-Geral de Operações Aéreas;
o Comando-Geral de Apoio; o Comando-Geral de Pessoal; o Comando-Geral de
Tecnologia Aeroespacial sendo este, composto pelo Departamento de Controle
do Espaço Aéreo e pelo Departamento de Ensino da Aeronáutica.
Assim, as Unidades Aéreas são as organizações militares que reúnem os
meios operacionais da força. Cada unidade possui uma função específica além de
aeronaves, pessoal e instalações que assegurem o seu funcionamento. As Bases
Aéreas, por sua vez, estão organizadas através de uma divisão regional do
território brasileiro, onde cada região (num total de sete) fica subordinada a um
Comando Aéreo Regional (COMAR). São eles:
I COMAR - com sede em Belém e jurisdição sobre os estados
do Pará, Amae Maranhão.
II COMAR - com sede em Recife e jurisdição sobre os estados
do Piauí, Ceará, Rio Grande do Norte, Paraíba, Pernambuco,
Alagoas, Sergipe e Bahia.
III COMAR - com sede no Rio de Janeiro e jurisdição sobre os
estados do Rio de Janeiro, Minas Gerais e Espírito Santo.
IV COMAR - com sede em São Paulo e jurisdição sobre os
estados de São Paulo e Mato Grosso do Sul.
81
V COMAR - com sede em Canoas e jurisdição sobre os
estados do Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Paraná;
VI COMAR - com sede em Brasília e jurisdição sobre o Distrito
Federal e os estados de Goiás, Mato Grosso e Tocantins.
VII COMAR - com sede em Manaus e jurisdição sobre os
estados do Amazonas, Roraima, Acre e Rondônia.
No último levantamento estatístico de 2005
58
, a Força Aérea Brasileira
contava com o efetivo de 73.500 pessoas, sendo 66.020 militares e 7480 civis. O
efetivo militar era assim distribuído:
- Homens: 61.880 (93,74%)
- Mulheres: 4.140 (6,26%)
Deste quantitativo temos:
- Oficiais: 8.416 (12,75%)
- Suboficiais e Sargentos: 25.437 (38,53%)
- Cabos, Soldados e Taifeiros: 29.064 (44,02%)
- Alunos: 3.103 (4,7%)
No que se refere ao efetivo, é interessante ressaltar que no ano de 1982 foi
permitido o ingresso de mulheres na Aeronáutica, através da criação do Quadro
Feminino de Oficiais (QFO).
De acordo com o estudo apresentado pela autora Lauciana Rodrigues ao
discutir a participação das mulheres nas Forças Armadas Brasileiras
59
, a principal
razão para a implantação deste corpo fica claro nas palavras do coronel
60
, primeiro
comandante do curso de formação dos oficiais e dos graduados:
A meu nível de conhecimento um órgão na Aeronáutica, o Comando Geral de
Pessoal (CGP) que assessora o Ministro da Aeronáutica em assunto de pessoal.
Nesse órgão, um grupo de trabalho de recursos humanos que, a pedido do
Ministro, elaboraram uma forma de aumentar o efetivo da Aeronáutica sem alterar a
58 Os levantamentos estatísticos são realizados em longos intervalos, haja vista as especificidades da área
militar, como: promoção de oficias, baixas, militar indo para a reserva ou reforma, processos de admissão, data
de praça dentre outros.
59 As Forças Armadas Brasileira teve a inserção feminina tardiamente na década de 80, uma vez que boa parte
dos exércitos ocidentais passou a admitir mulheres em suas fileiras a partir da década de 1970. A Marinha do
Brasil, dentre as três Forças, foi à primeira em aceitar mulheres em seu Corpo. Em 1982 ocorre o ingresso das
mulheres na Aeronáutica. No Exército, a entrada das mulheres ocorre em 1992 na Escola de Administração
do Exército. Cf. SANTOS, Lauciana Rodrigues. A Participação da Mulheres nas Forças Armadas Brasileiras: um
debate contemporâneo. In: III Encontro Nacional da Associação Brasileira de Estudos de Defesa (ABED), 2009,
Londrina. Anais Online, 2009. Disponível em:<http://www.abed-defesa.org/files/programaenabed-iii.pdf.>
60 A autora em questão não cita o nome do Coronel.
82
Lei de Fixação da Força Militar. Somente por necessidade e se aprovado pelo
Congresso é que pode haver o crescimento da Força através dessa Lei. Assim
sendo, os sistemas militares usam um artifício, que são elementos que permanecem
nas Forças Armadas por um tempo menor, e que se destinam à reserva da
Aeronáutica. O Corpo Feminino foi aproveitado nessa brecha. O estudo inicial
previa que nós, em cerca de quatro anos, teríamos 2.000 mulheres na
Aeronáutica, 400 oficiais, e 1.200 sargentos. Este foi o projeto inicial; o corpo
feminino seria então uma força de reserva com a permanência máxima de 8 anos na
ativa e podendo haver renovação de contrato. O grupo achou que, para atender às
necessidades da Aeronáutica, a mulher seria mais eficiente, dado o tipo de
trabalho que ela exerceria e devido às condições de entrada para o setor
militar e também porque, baseado nos estudos da Marinha, de que o Corpo
Feminino estava dando certo. Em síntese, o corpo feminino aumentou o efetivo da
Força (2.000 mulheres de 1981 a 1984), sem extrapolar os recursos disponíveis,
além de suprir as deficiências nas áreas administrativas e técnicas. (p. 4 e 5, grifos
da autora.)
Para a autora, fica evidente que a mulher foi requisitada buscando suprir a
deficiência de pessoal nas áreas técnicas e administrativas e que há uma
reprodução no interior do espaço militar da divisão sexual e social dos papeis
desempenhados por homens e mulheres fora do âmbito militar.
Segundo Carvalho (1990) in Santos (2009), havia domínios bem delimitados e
estabelecidos para homens e mulheres militares no interior da caserna e um
discurso legitimador para isso seria a criação de mecanismos legais através de Leis,
decretos e portarias.
Diante desse contexto a autora chega à conclusão de que não se deve
considerar a instituição militar como um novo espaço de atuação da mulher, pois
apesar da nova configuração, esta se apresenta com papéis tradicionalmente
exercidos por homens e mulheres na sociedade contemporânea.
Em 1996, a Aeronáutica admite mulheres como cadetes na Força Aérea
Brasileira (FAB) no quadro de Intendência, carreira administrativa da FAB, passando
a ter a mesma formação masculina. Desta forma, na primeira turma, ocorre o
ingresso de 17 cadetes femininos na AFA Academia da Força Aérea
(Pirassununga/SP) para o quadro de Intenncia, área administrativa e financeira da
FAB
61
.
Em 2006 formou-se a primeira turma de aviadoras do país. O quadro de aviação é
a atividade fim‖ dessa instituição, uma vez que cumpre a destinação primordial, que
é voar. Vale dizer que, apesar desses avanços, ainda muitas restrições, já que o
61 Os cursos de formação de oficiais na AFA se dividem em três: Curso de Oficiais Aviadores (CFOAv); Curso
de Oficiais Intendentes (CFOInt) e Curso de Oficiais de Infantaria (CFOInf) todos com duração de quatro anos.
83
quadro de Infantaria da Aeronáutica é o único da Academia da Força Aérea (AFA)
que ainda não conta com a presença feminina.
Atualmente, profissionais formados em diversas áreas do conhecimento
podem ingressar na FAB como oficiais temporários ou de carreira, por meio dos
seguintes exames de admissão: Curso de Adaptação de Médicos, Dentistas e
Farmacêuticos (CAMAR/CADAR/CAFAR); Estágio de Adaptação de Oficiais
Engenheiros (EAOEAR); Estágio de Instrução e Adaptação de Capelães (EIAC);
Estágio de Adaptação de Oficiais Temporários (EAOT);
O EAOT
62
admite, para compor o Quadro Complementar de Oficiais da
Aeronáutica (QCOA), conforme a necessidade do Comando da Aeronáutica,
profissionais com nível superior nas especialidades sinalizadas no quadro abaixo.
ESPECIALIDADES DO EAOT/QCOA
Administração Biblioteconomia
Agronomia
Ciências Contábeis
Análise de Sistemas
Comunicação Social,
Arquitetura
Educação Física
Arquivologia
Economia,
Enfermagem,
Engenharia Cartográfica
Engenharia Civil
Engenharia Clínica
Engenharia de Telecomunicações
Fonte: Portaria DEPENS Nº 216-T/DE-2, de 04 de agosto de 2009.
No que se refere à formação militar, a Força Aérea Brasileira mantem as
seguintes instituições de ensino:
62 O candidato, no momento da matrícula, mediante ato do Comandante do CIAAR, será designado Segundo-
Tenente Estagiário do EAOT, designação essa a ser mantida durante o Estágio de Adaptação. O estagiário que
concluir com aproveitamento o EAOT será nomeado, mediante ato do Comandante da Aeronáutica, Segundo-
Tenente da Reserva, integrará o Quadro Complementar de Oficiais da Aeronáutica (QCOA) e será convocado a
servir, obrigatoriamente, por um período de dois anos, como Oficial Temporário. O Segundo-Tenente do QCOA,
caso demonstre interesse em permanecer na ativa após a conclusão do período inicial de dois anos obrigatórios,
poderá ter o tempo de sua convocação prorrogado anualmente, a critério do Comando da Aeronáutica, até
completar oito anos de efetivo serviço, quando, então, selicenciado (dispensado). O Segundo-Tenente ou o
Primeiro-Tenente que não obtiver prorrogação do tempo de convocação será licenciado do serviço ativo e
incluído na Reserva não Remunerada da Aeronáutica, no mesmo posto em que se encontrava. Cf. Portaria
DEPENS Nº 216-T/DE-2, de 04 de agosto de 2009.
84
- Escola Preparatória de Cadetes do Ar- EPCAr (Escola de ensino médio pronta
para receber futuros cadetes da AFA);
- Academia da Força Aérea - AFA (Instituição de Ensino Superior especial que
forma Aviadores, Intendentes e oficiais de Infantaria da FAB);
- Instituto Tecnológico de Aeronáutica ITA (Instituição de Ensino Superior que
forma Engenheiros militares e civis em diversas especialidades);
- Centro de Instrução e Adaptação da Aeronáutica - CIAAR (Centro de
planejamento, coordenação, controle e execução dos planos e programas de ensino
relativos à adaptação militar de pessoal para a Aeronáutica);
Escola de Especialistas de Aeronáutica - EEAR (Escola de preparação de
Sargentos especialistas da Aeronáutica
63
).
3.1.1 A profissão militar
Reportando-nos a gênese da profissão militar, encontramos o entendimento
de profissão como: ―um tipo peculiar de grupo com características altamente
especializadas‖. Tendo como característica o tipo de desempenho de que ela se
incumbe, sendo estas: capacidade, responsabilidade, corporatividade, permanência,
retribuição, atividade, caráter social e espírito cívico. Porém, a atividade profissional
militar versará, prioritariamente, na capacidade, responsabilidade e corporatividade.
Os militares profissionais se distinguem dos civis, por terem uma capacidade
fundamental: ―participação no manejo, no emprego ou na administração da força que
constitui monopólio do governo nacional‖. A função de uma Força Armada é o êxito
no combate. (LIVI ILHA, 1988).
De acordo com a doutrina militar
64
, quanto maiores e mais complexas forem
às organizações de força que um militar seja capaz de dirigir e quanto maior for o
63 Com sede na cidade de Guratinguetá (SP). Prepara Sargentos Especialistas em várias áreas como Controle
de Tráfego Aéreo, Mecânica de Aeronaves, Eletrônica, Música, Enfermagem, Infantaria, dentre outras.
64 Essa afirmação encontra respaldo no documento didático elaborado pelo Departamento de Ensino da
Aeronáutica, material de suporte da disciplina ―A Profissão Militar‖, constante dos currículos dos Cursos ou
Formação de Estágios de Adaptação Militar. (1988) elaborado pelo Coronel Aviador Reformado Hélio Livi Ilha.
85
número de situações e condições sob as quais ele possa ser empregado, mais
elevada será a sua competência profissional. Portanto, a capacidade do militar
profissional impõe-lhe uma responsabilidade social.
Segundo a visão militar
65
, enquanto todas as profissões são, até certo ponto,
reguladas pelo Estado, a profissão militar é monopolizada pelo Estado.
Quanto ao caráter corporativo, a profissão militar tem aspectos de um serviço
público burocratizado. O direito legal de desempenhar-se ou exercer a profissão está
limitado aos membros de cada Força Armada. Esses membros são cuidadosamente
selecionados, definidos e distribuídos pelos Corpos de Oficiais e de Graduados
66
da
respectiva Força.
Historicamente, a profissão militar tem sido uma característica da cultura
ocidental e produto da sociedade moderna. O surgimento do Corpo de Oficiais
ocorreu por volta do ano de 1900, tendo como as três maiores potências que
influenciaram o seu surgimento: a Prússia, França e a Inglaterra. (LIVI ILHA, 1988).
Embora se saiba que os exércitos e armadas eram comandados antes de
1.800, por oficiais mercenários
67
(tipo dominante desde o fim do feudalismo - c.
XVII). As mudanças evolutivas desses foram acompanhadas pelo desenvolvimento
de uma ética profissional que foi proporcionado explicação e justificação racional
para o novo tipo de militar oficial aristocrata
68
(exércitos e armadas permanentes
como resultado da consolidação do poder das monarquias nacionais) e suas
instituições profissionais, com destaque somente a partir de 1900.
A profissionalização militar teve seu maior desenvolvimento em dois períodos
do século XIX, a saber: durante e imediatamente após as Guerras Napoleônicas; e
entre 1850 a 1875, quando se ajustaram os processos de seleção e promoção,
organizaram-se Estados Maiores e criaram-se instituições educacionais militares
avançadas.
As instituições militares brasileiras, encarregadas de preparar oficiais, são
bastante antigas. Segundo Ludwing (1998), a Escola Naval surgida em 1886,
65 Cf. Estatuto dos Militares Lei nº 6.880 de 9/12/80. Reproduzido na Subdivisão de Instrução do CIAAR (MG),
2004.
66 Referindo-se aos soldados, taifeiros cabos e sargentos.
67 Sob o sistema mercenário, o oficial podia possuir ou não alto grau de competência, o êxito não era referido a
padrões profissionais e sim à realidade de serviços que mereciam maior ou menor recompensa pecuniária. Era
essencialmente um empresário que preparava militarmente um grupo de homes, cujos serviços punha à venda.
68 Para conseguir os oficiais, os monarcas recorriam à nobreza feudal, que ainda estavam submetendo à sua
vontades. Os nobres eram compelidos (como na Prússia) ou subornados (como na França) para entrar a serviço
do rei.
86
recebeu muito antes dessa data as denominações de Academia Real dos Guardas-
Marinha, Academia Imperial dos Guardas-Marinha e Escola de Marinha. A Academia
da Força Aérea aparece com esse nome na década de setenta, mas existia
com o nome de Escola de Aviação desde 1919. Entre esses dois períodos recebeu
tamm a denominação de Escola de Aeronáutica. A Academia Militar de Agulhas
negras (exército), por sua vez, tem sua origem no ano de 1810, porém com o nome
de Real Academia Militar.
Para o autor, a história do Brasil, há muitos decênios, manm-se atrelada à
conduta dos ―funcionários fardados‖, haja vista os vários momentos em que os
militares saíram dos quartéis para se envolverem em problemas de ordem política,
conferindo às Forças Armadas um papel intervencionista por tradição (1998, p.07).
Segundo Ludwing (1998), o processo de formação dos militares, no
decorrer da história brasileira, tem contribuído para forjar um tipo de profissional das
armas com tendências interventoras. Para o autor, tal suposição se aplica,
principalmente, ao segmento mais elevado das Forças Armadas: o corpo de oficiais,
pois são elementos desse grupo que geralmente participam das articulações
golpistas, mobilizam contingentes de apoio aos conspiradores e lideram subalternos
no combate aos movimentos perturbadores da ordem social.
De acordo com o autor, não se trata a partir dessa suposição, desconsiderar
fatores conjunturais ou estruturais ligados a situações política e econômica do país,
e sim incluir o processo da oficialidade da profissão militar, como uma importante
variável elucidadora do fenômeno intervencionista.
As considerações aqui sinalizadas permitem algumas inferências quanto à
formação da oficialidade brasileira, do Exército, Marinha e Aeronáutica. A prática
pedagógica castrense, além de apregoar no psiquismo dos alunos a ideologia
arbitrária da corporação bélica, introjeta, simultaneamente, Ludwing (1998), a
ideologia da classe hegemônica, isto é, as concepções e valores desse segmento
social‖.
O autor considera que o ensino militar, hoje, agrega um conjunto de
atividades capaz de solidificar no cadete (aluno) a ideologia dominante. Essas
atividades que incluem a tarefa de planejamento, processo de administração, ensino
de determinadas matérias, sistema de avaliação, uso de tecnologia educacional etc.,
são responsáveis pela transmissão das idéias que prevalecem na sociedade. De
87
acordo com o autor, por meio dessas atividades o aluno assimila os valores de
obediência, submissão, dependência, paternalismo, assiduidade, pontualidade,
racionalidade e meritocracia. Adquire também a concepção de mundo e de vida em
sociedade eminentemente estável e harmoniosa, isto é, uma visão de mundo
determinista-funcionalista. (1998, p.22-23).
Ludwing (1998) considera que a profissão militar confere certo status ao
indivíduo: proporciona-lhe um salário razoável, mantém a estabilidade empregatícia,
cria oportunidades para viagens de estudo e de trabalho tanto no país quanto no
exterior. Portanto, o apego à idéia de mobilidade social é muito forte nesse
segmento, e a estrutura hierárquica, baseada no mérito, vigente na instituição militar,
viabiliza esse desejo de ascensão.
Podemos considerar que, a educação militar vista pelo ângulo histórico, tem
contribuído para formar um quadro de oficiais alinhado aos setores dominantes da
sociedade. (LUDWING, 1998).
No tocante ao campo dos valores institucionais das Forças Armadas, os
princípios da disciplina e da hierarquia são os dois elementos de sustentação da
estrutura militar. Quando atingidos, por menor que seja o dano sofrido, provoca o
desencadeamento de todo um mecanismo de autodefesa, que se consubstancia no
Poder Punitivo, seja penal, seja disciplinar.
Mas afinal em que consiste esse binômio hierarquia e disciplina muito
falado e nem sempre compreendido?
O Regulamento Disciplinar da Aeronáutica (RDAER), aprovado em 1975, pelo
então presidente Ernesto Geisel versa sobre como o militar deve manter sua
conduta nas relações com seus superiores hierárquicos e pares no interior da
instituição e na vida social em geral. Este regulamento prevê tamm que atos e
omissões que caracterizem inadequação ao meio militar ou transgressão disciplinar
sejam passíveis de punição.
O respeito à hierarquia é consubstanciado no espírito de acatamento à
seqüência de autoridade. Segundo o Estatuto dos Militares, a hierarquia militar é a
ordenação da autoridade em níveis diferentes, dentro da estrutura das Forças
Armadas
69
‖. O dispositivo estatutário abrange todos os componentes do organismo
69 Lei nº 6880, de 9 de dez 1980, § 1º do art.14.
88
militar, do soldado ao general. Assim, não a autoridade, mas também, a
responsabilidade cresce com o grau hierárquico.
Institucionalmente vinculada à hierarquia, a disciplina se constitui em
condição necessária ao perfeito funcionamento da organização militar. Disciplina é a
rigorosa observância e o acatamento integral das leis, regulamentos, normas e
disposições que fundamentam o organismo militar e coordenam seu funcionamento
regular e harmônico, traduzindo-se pelo prefeito cumprimento do dever por parte de
todos e de cada um dos componentes desse organismo.
Contudo, novas configurações se fazem presentes no interior dos quartéis. O
aumento na procura do Judiciário por militares que buscam a anulação de punições
disciplinares, o que passou a ser encarada como um problema para a administração
militar.
O acesso dos militares à Justiça tem evoluído rapidamente, em especial após
a Constituição Federal de 1988; apesar de o Estatuto dos Militares ainda prever que
o militar poderá recorrer ao Judiciário depois de esgotados todos os recursos
administrativos, esse dispositivos há muito não é observado. (Arruda, 2007).
As reivindicações atuais se restringem à insatisfação com o que os graduados
e praças (soldados, cabos e sargentos), consideram excessos por parte de alguns
oficiais, ao aplicar-lhes as punições disciplinares: transferências repentinas, sendo
estas justificadas como interesse do serviço; anotações negativas nas avaliações
para promoções entre outros excessos.
As ferramentas utilizadas pelas praças, através da Associação Nacional de
Praças das Forças Armadas/ ANPRAFA são as mesmas permitidas e ao alcance do
cidadão sem farda: Ministério Público e Judiciário. Contudo, o rigor com que são
tratados os integrantes das associações de praças mostra que a reação o visa a
defender a disciplina, pois essa também é atingida quando a manifestação parte dos
clubes de oficiais.
A diferença é segundo Arruda (2007, p.39), que as manifestações da
oficialidade incomodam o governo, enquanto as críticas feitas pelas praças
perturbam os comandantes. Nas constatações do autor
70
, atualmente, para cada
70 Estudo sobre ―Valorização do Subtenente e do Sargento‖, com comparativo de escolaridade realizado por
Arruda em 2004.
89
oficial (tenente/capitão) existem dois sargentos freqüentando ou, já possuidores de
curso superior (principalmente o Curso de Direito).
De acordo com Arruda (2007), os oficiais têm como foco prioririo o
aprendizado e ao seu redor uma atmosfera permanentemente voltada para a
obediência; os sargentos respiram o ar da liberdade que estimula a pesquisa, a
controvérsia e o diálogo. Portanto, maior qualificação gera outro problema para a
administração: a saída prematura de militares de carreira em busca de atividades
civis.
Para o autor, merece reflexão o conteúdo da formação acadêmica de cada
um dos segmentos oficiais e sargentos. Os oficiais após quatro anos de Escola
Militar de nível superior são bacharéis em Ciências Militares (apreendendo os
valores, atitudes e comportamentos apropriados à vida militar). Os sargentos, por
outro lado, com curso superiores ou egressos das faculdades públicas e privadas
grande parte da área das ciências sociais e humanas - salvo quando estão de
serviço e pernoitam no quartel, mantêm contato diário com o chamado “mundo dos
paisanos” (ARRUDA, 2007).
As questões acima suscitadas visam contextualizar a atual configuração do
espaço institucional da Aeronáutica. Conhecer os nexos, as relações históricas,
influências e como essas questões repercutem na prática dos assistentes sociais
nos serviços de saúde.
Estas questões tornam-se pertinentes uma vez que o Serviço Social se
constrói e se reconstrói historicamente, tendo sua prática relacionada com a
realidade cotidiana.
3.1.2 O Sistema de Saúde da Aeronáutica
O Sistema de Saúde da Aeronáutica (SISAU) atende aos militares e seus
dependentes em todo o território nacional e obedece a um modelo de autogestão.
Possui uma rede própria, composta de Hospitais de Força Aérea, Hospitais de Área,
Hospitais de Base, Odontoclínicas; uma Casa Gerontológica e um Laboratório
Químico e Farmacêutico. Disponibiliza, também, ao usuário do sistema uma rede
90
complementar contratada, (com hospitais, clínicas, laboratórios e médicos) na falta
ou indisponibilidade de procedimentos e especialidades da rede própria. Além disso,
efetua ressarcimento de despesas médicas e odontológicas ao usuário em situações
específicas quando a rede própria e a rede contratada não disponibilizam os
recursos necessários ao usuário e, sempre com autorização prévia da Subdiretoria
de Aplicações dos Recursos para Assistência Médico-Hospitalar (SARAM).
O SISAU também se vale da estrutura de apoio à saúde da Marinha e do
Exército, nas localidades desprovidas de serviços de saúde da Aeronáutica, de
acordo com a necessidade e o interesse da instituição e dos usuários, num tratado
de reciprocidade entre as forças
71
.
Os beneficiários do SISAU o os militares da ativa e da inativa e os
pensionistas dos militares que, nas condições definidas em Instrução específica,
contribuem com percentuais sobre o seu soldo, ou cota parte do soldo (pensionista)
e de acordo com o número de seus dependentes, como beneficiários da Assistência
Médico-Hospitalar Complementar (AMHC).
Em linhas gerais, se o militar for da ativa, terá seu tratamento médico-
hospitalar custeado integralmente pelo SISAU. Quanto aos seus dependentes, estes
terão seus tratamentos custeados através do Fundo de Saúde da Aeronáutica
(FUNSA), desde que sejam declarados beneficiários pelo militar.
Os soldados de e classe não contribuem para o FUNSA, assim como
tamm não contribuem os cadetes, os alunos da Escola Preparatória de Cadetes
do Ar (EPCAR), dentre outros alunos de Escolas Preparatórias da Aeronáutica.
Estes o têm direito ao custeamento de seus exames e/ou tratamento externo e
seus dependentes não estão sujeitos à assistência médica do SISAU.
Da mesma forma, não terão suas despesas médicas custeadas, os
pensionistas que deixarem de contribuir.
Ressalta-se que o Fundo de Saúde (FUNSA) é mantido pela contribuição dos
militares, variando de acordo com o posto ou graduação. A contribuição é obrigatória
a todos os militares da ativa, para os da reserva, reformados e pensionistas a
contribuição é facultativa.
É importante destacar que o SISAU qualifica duas formas de vinculação dos
dependentes ao sistema, quais sejam:
71 Cf. Subdiretoria de Aplicações dos Recursos para Assistência Médico-Hospitalar (SARAM), Rio de Janeiro,
2009.
91
A AMHC
72
que é a assistência médico-hospitalar complementar parcialmente
indenizável pelo Comando da Aeronáutica com recursos financeiros de arrecadação
própria, oriunda de contribuições obrigatórias dos militares da ativa e na inatividade,
e dos pensionistas de militares. São eles:
O cônjuge ou o(a) companheiro (a) do militar;
Filho(a), enteado(a), tutelado(a) do militar contribuinte, menor de 21 (vinte e um )
anos ou menor de 24 (vinte e quatro anos), desde que não receba remuneração;
Menor que esteja sob guarda, sustento e responsabilidade do militar;
Os pensionistas;
A mãe do militar, desde que viúva e não receba remuneração;
A mãe soleira do militar, desde que viva exclusivamente sob sua dependência
econômica e sob o mesmo teto físico e não receba remuneração
O custo do atendimento é (80%) financiado pelo FUNSA e (20%) pelo
usuário, com base em tabelas pré-estabelecidas. Entretanto, o estão sujeitos à
co-participação:
Casos de acidente em serviço;
Casos de doença profissional;
Inspeção por Junta de Saúde, realizadas por interesse da administração;
O militar da ativa e da inativa quando hospitalizado em Organização de Saúde da
Aeronáutica. (OSA)
O AMH é a vinculação dos demais dependentes. Neste caso não
contribuição para o FUNSA, o qual, não ampara suas despesas. O militar
responsável assume a integralidade dos gastos. Consideram-se dependentes, para
o FUNSA, aqueles que vivem sob a dependência econômica e sob o mesmo teto
físico do militar e ser expressamente declarados e comprovados na sua Unidade de
Vinculação. São eles:
A filha, a enteada e a tutelada, nas condições de viúvas, separadas judicialmente ou
divorciadas, desde que não recebam remuneração;
A mãe separada judicialmente ou divorciada, a sogra viúva, ou soleira, a madrasta
viúva, desde que não recebam remuneração;
O pai maior de 60 (sessenta anos) e seu respectivo cônjuge desde que ambos não
recebam remuneração;
72 Cf. ICA 160-24 Instruções Reguladoras da Assistência Médico-Hospitalar e Portaria 41/GM3, de abr.
1975, e Art. 14 do Regulamento do Fundo de Saúde da Aeronáutica pela Portaria 506/GM6, de 29 mai. de
1987.
92
A irmã, a cunhada e a sobrinha, solteiras, vvas separadas judicialmente ou
divorciadas, desde que ambos não recebam remuneração;
A pessoa que viva no mínimo há cinco anos, sob a exclusiva dependência econômica
do militar, comprovado judicialmente.
De acordo com a Subdiretoria de Aplicações dos Recursos para Assistência
Médico-Hospitalar (SARAM), também é considerada beneficiária da AMH a ex-
esposa com direito à pensão alimentícia estabelecida por sentença, enquanto não
contrair novo matrimônio.
O FUNSA é administrado pela Diretoria de Saúde (DIRSA), por intermédio da
SARAM, a qual determina como os atendimentos irão ser cobertos com os recursos
financeiros disponíveis, Nesse sentido, cabe a SARAM estabelecer normas e
delimitar uma rede complementar necessária para atender a todos os seus
beneficiários.
É de competência da DIRSA assegurar a diretriz de atendimento aos usuários
do SISAU, bem como padronizar procedimentos, equipamentos, material de saúde e
as instalações médico-hospitalares da Aeronáutica e Sistema Nacional de Saúde;
suprimir material de saúde as OSA‘s; incentivar a pesquisa e o desenvolvimento
tecnológico, na área da saúde, que sejam de interesse do Comando da Aeronáutica
e efetuar a ligação de outras Organizações ao Comando da Aeronáutica nos
assuntos de saúde. É responsável, tamm, pelo processo de aquisição de veículos
adequadamente equipados para o transporte de pacientes, em especial nos casos
de emergência, contribuindo para a sobrevida de doentes e acidentados.
Quanto à ação "Manutenção dos Serviços Médico-Hospitalares e
Odontológicos a Cargo da Aeronáutica", a DIRSA é a responsável pela ação e pela
destinação dos recursos a serem aplicados na aquisição de material de consumo,
equipamentos e utensílios médico, odontológico, laboratorial e hospitalar, bem como
na contratação de serviços de pessoas físicas e jurídicas, todos diretamente
decorrentes do atendimento aos pacientes e beneficiários do SISAU.
Destacamos do Estatuto dos Militares - Lei nº 6.880/80 do Art. 50, inciso IV a
seguinte alínea:
e) A assistência médico-hospitalar para si e seus dependentes, é assim
entendida como o conjunto de atividades relacionadas com a
prevenção, conservação ou recuperação da saúde, abrangendo serviços
profissionais médicos, farmacêuticos e odontológicos, bem como o
93
fornecimento e a aplicação de meios, cuidados e demais atos médicos e
paramédicos necessários. (grifos nossos)
Ressaltamos que o SISAU difere significativamente de um modelo privado de
saúde por não ser comercializável e ter administração pública, além de não
considerar faixas etárias no estabelecimento dos valores dos serviços (o valor
da contribuição é vinculado ao respectivo soldo do contribuinte responsável
73
). Difere
substancialmente da proposta do SUS, pois, este representa um grande avanço no
tocante às políticas públicas, apresenta propostas e práticas claras de controle
social, transparência administrativa, gestão participativa e democratização
(conselhos de saúde foram criados e consolidados em praticamente todos os
municípios do país), além de assegurar a universalidade do acesso e a
integralidade da atenção. Contudo, é percebida uma real distância entre o direito
legal e sua expressão no cotidiano.
É inconteste que o SUS é um marco jurídico no contexto da seguridade social
brasileira e um instrumento apto a promover, preservar e recuperar a saúde
individual e coletiva. Entretanto, a possibilidade de efetiva concretização das
propostas do SUS tem sido tensionadas pela disputa entre dois projetos: o da
Reforma Sanitária e o Privatista, anteriormente mencionados.
No que se refere ao Sistema de Saúde da Aeronáutica, segundo diretriz da
DIRSA, busca-se: proporcionar a adequada assistência médico-hospitalar aos
militares (ativos e inativos) e aos seus dependentes, assegurando o acesso e a
humanização do atendimento na saúde e efetuar o controle das condições de
saúde de aeronavegantes militares.
Em 2002, por orientação da DIRSA foram realizadas pesquisas
74
nas
Organizações de Saúde da Aeronáutica e constatou-se que as queixas foram se
reduzindo e a satisfação com o atendimento crescendo, a cada pesquisa feita. As
pesquisas foram realizadas de duas formas. A primeira consistiu na "Busca Ativa"
que é a entrevista com os pacientes ambulatoriais, com os internados e seus
acompanhantes. A outra consistiu na "Busca Passiva" que é a coleta de opiniões em
caixas específicas.
73 Cf. Lei 6.880, de 9 de dezembro de 1980 - Estatuto dos Militares.
74 Disponível em acesso on-line <http//:www.abrasil.gov.br/avallpa/site/conten/av//>. Acesso em 21/10/09.
94
Através dessa pesquisa, foi observada a inadequação dos recursos humanos.
O efetivo de médicos, dentistas e farmacêuticos do quadro da ativa está aquém das
necessidades. Destaca-se o aumento do efetivo de oficiais em enfermagem e de
graduados de várias especialidades de saúde para guarnecer e suprir as
necessidades das Organizações de Saúde da Aeronáutica e dos beneficiários do
SISAU.
Em relação ao efetivo do SISAU, a pesquisa realizada pela DIRSA mostra
que é significativa a participação de oficiais temporários (R2): 55% dos médicos,
70% dos dentistas e 55% dos farmacêuticos, causando uma distorção em relação
aos profissionais disponibilizados ao atendimento aos usuários, em função da alta
rotatividade e da qualificação do início de carreira.
O Comando da Aeronáutica implantou em 2002 o Sistema Integrado de
Planejamento e Gestão - SIPG, que possibilita a captação de dados gerenciais de
forma padronizada e abrangente, atingindo todas as unidades que compõem sua
estrutura organizacional. O objetivo do sistema é aumentar a qualidade,
homogeneizar o tratamento e tornar confiável e tempestivo o acesso às informações
gerenciais administrativas, logísticas, orçamentárias, financeiras e operacionais,
visando à eficácia na aplicação e no controle dos seus recursos humanos, materiais
e financeiros.
Todavia, embora a pesquisa mencionada linhas atrás, realizada no ano de
2002, aponta a satisfação do usuário quanto ao atendimento do SISAU, destaca-se
que em 2004, em página da internet voltada aos militares da inativa, - usuários do
sistema
75
- a insatisfação quanto ao atendimento do SISAU se fazia presente.
Perguntou-se: Os serviços de saúde da Marinha, Exército e Aeronáutica atendem a
você e a sua família de forma conveniente? Por quê? Seguem alguns depoimentos:
“Que o serviço de saúde está precário para determinadas enfermidades, é fato
notório. Os "excelentes profissionais aqui citados, certamente não estão lotados
fora do eixo Rio de Janeiro/Brasília. Entretanto, o maior pecado, o que nos magoa
mais, é o fato dos Comandantes Militares o denunciarem de público, não
protestarem, o fato do contingenciamento de cerca de 40% das contribuições para os
fundos de saúde das três Armas que vão para o tesouro nacional. Afinal, esse
dinheiro é nosso! Notadamente, é um heroísmo manter ainda em funcionamento o
serviço, mas a omissão é uma doença mais grave e letal”. (01/11/2004, J. O -
Natal/RN).
75 Disponível em http://www.reservaaer.com.br/megafone/arquivo, acesso em 11 de novembro de 2009.
95
“A FAB tem excelentes profissionais na área de saúde. O grande problema é
simplesmente a militarização e a confusão burocrática que as organizações médicas
tem. O médico tem muitas funções extras que o atrapalham na dedicação ao
atendimento. O médico deveria pensar mais como tal e menos com os”galões" o que
infelizmente mais acontece, como presenciei um interromper o atendimento ao
último paciente somente porque o diretor o estava chamando em sua sala, o seria
mais ético dizer para o chefe, que também é médico, que assim que terminasse o
último atenderia ao seu chamado? (coisas de milico). Mas são bons profissionais,
tanto que eu sempre sou bem atendido por eles no Hospital da Base e minha esposa
que tem UNIMED faz questão de ser atendida por muitos deles em seus consultórios
particulares, evidentemente fugindo da complicação de ter que madrugar na fila da
base ou aguardar dias e mais dias para ser atendida. Eu me submeto a isso mas para
ela prefiro dá-lhe mais conforto, afinal a penar basta um... (21/10/2004, J.M. M,
Natal/RN)”.
“Acredito que o sistema de saúde das FFAA
76
esta inadequado ao fim que se destina.
Acho que as três forças deveriam ter um único sistema abrangente e que daria um
atendimento em qualquer localidade que houvesse uma das três forças. Ao passar
para reserva o atendimento se complica devido à saturação nos centros onde existe
atendimento. O militar na reserva é obrigado a permanecer vizinho as
organizações para ter possibilidade de usar o sistema de saúde. Após passar
30 ou mais anos contribuindo e com o avançar da idade é quando tornasse
maior a necessidade de uso do atendimento e mais precário es o
atendimento, não devido à qualidade de seus médicos e sim a quantidade. Se
as três Forças se unissem em um sistema ampliaria o atendimento, e se aos
reservistas fosse oferecido um atendimento no tipo dos convênios médicos, mas
criado e independente desses existentes, destinados a atender localidades distantes
das organizações militares, liberaria os reservistas da necessidade de permanecer
vizinhos e saturando os órgãos de saúde. (...) Não tenho os dados para comprovar
mais acredito que o percentual de atendimento destinado aos reservistas deva ser
entorno de 70%, com a descentralização de atendimento, melhoria tanto para os
órgãos de saúde com para seus usuários. Nos dias atuais em que os grandes centros
estão cada vez mais violentos seria muito vantajoso que o pessoal da reserva
pudesse viver em pequenas cidades, provavelmente as de origem ou escolha onde
teriam um padrão de vida mais saudável e seguro. Quero deixar claro que não estou
trabalhando em causa própria porque a cidade em que moro a 8 anos, no interior de
SC, possui um SUS que funciona e atende perfeitamente as minhas
necessidades a exemplo de todo o estado de Santa Catarina, só lamento que os
outros estados da União não ajam da mesma forma, e que o estado SC seja
uma exceção no contexto nacional”. (23/10/2004, N.C, Timbó/SC).
Apesar de não termos conhecimento de pesquisa mais recente sobre o
Sistema de Saúde da Aeronáutica e/ou o nível de satisfação do usuário, ante o
exposto, algumas questões se colocam: existe uma aplicação privilegiada de
76 FFAA é a abreviatura de Forças Armadas, a repetição do "F" e do "A" indica o plural, mesmo que não seja
previsto na normatização da língua portuguesa, é uma forma empregada em Leis e normas para indicar o plural,
no Estatuto dos Militares, por exemplo, é constante o emprego do termo FFAA, então repete-se o F para indicar
Forças e A para indicar Armadas.
96
recursos de custeio nos níveis de maior complexidade, em detrimento da atenção
primária? Será que a atenção primária do SISAU é ampliada, é eficaz? Atende aos
problemas de saúde individuais e coletivos, cuidando da qualidade da saúde, e não
apenas sendo capaz de tratar das doenças e acometimentos graves com risco à
vida?
Temos como parâmetro os princípios assistenciais do SUS (LOS, Art. 7º),
como a universalidade de acesso em todos os níveis de assistência e a participação
da comunidade, através dos Conselhos nas suas diferentes instâncias. Destaca-se,
além desses princípios: a equidade, com vistas a garantir a igualdade da assistência
à saúde, sem preconceitos ou privilégios de qualquer espécie; e a integralidade da
assistência. Apesar do texto constitucional o utilizar a expressão integralidade;
mas “atendimento integral, com prioridade para as atividades preventivas, sem
prejuízo dos serviços assistenciais” (Brasil 1988, art.198). O termo integralidade tem
sido utilizado para designar exatamente essa diretriz.
Apreendemos, que a integralidade, no contexto do Sistema Único de Saúde,
pode ser vista como uma crítica: a atitude médica fragmentária; a um sistema que
privilegia a especialização e segmentação; a atitude médica reducionista; bem como
a busca em compreender o conjunto das necessidades de ações e serviços de
saúde que um paciente apresenta para além da atenção individual curativa, mas, a
incorporação de ações de promoção e prevenção na atenção à saúde e articulação
com ações curativas e reabilitadoras - tomada a partir do referencial da Medicina
Preventiva. Ou seja, sinaliza um modo de organizar o processo de trabalho em
saúde, de modo a otimizar o seu impacto epidemiológico articular atenção à
demanda espontânea coma oferta programada de atenção à saúde.
Pois bem. Enfatiza-se que as ações de saúde na Aeronáutica para estarem
em consonância com o SUS, devem ser conjugadas e voltadas ao mesmo tempo
para prevenção e a cura. De acordo com o texto do Estatuto dos Militares a saúde:
“(...) é entendida como o conjunto de atividades relacionadas com a prevenção,
conservação ou recuperação da saúde” (Lei 8.668/80).
Percebemos que, as ações de promoção, proteção e de recuperação formam
um todo indivisível que não podem ser fragmentadas. E a integralidade, não é
apenas uma diretriz do SUS definida constitucionalmente. Ela é uma “bandeira” de
luta dos sujeitos sociais.
97
Os usuários do SISAU contribuem para o Fundo de Saúde da Aeronáutica
77
e,
portanto, têm direito não à complementação de suas despesas pelo Fundo, como
tamm, o acesso integral aos serviços por ele oferecido.
Inferimos que a existência de um direito social não determina que se tenha
acesso a ele como tal. Nas de palavras de Vasconcelos (1997):
O direito existe formalmente, mas, dependendo da forma como se usufrui
dele, transforma-se num objeto de favor, doação, constrangimento, troca...
O acesso a um recurso por um cidadão um sujeito social crítico,
consciente, é que transforma o direito formal em direito real. (p.134).
Aliás, importa considerar que entre os pressupostos contidos no digo de
Ética do Assistente Social, na Lei de Regulamentação da Profissão que
consubstanciam o Projeto Ético- Político do Serviço Social, podemos observar
princípios que se articulam à garantia dos direitos sociais: ampliação e consolidação
da cidadania e gestão democrática de serviços, programas e políticas sociais;
defesa do aprofundamento da democracia enquanto socialização da participação
política. Do mesmo modo, com em relação aos deveres do assistente social com
relação aos usuários, destaca-se o contribuir para a viabilização da participação
efetiva da população usuária nas decisões institucionais (CFESS, 1993).
3.2 O lócus de investigação e o seu cenário: os serviços de saúde da
Aeronáutica/Rio de Janeiro
No que concerne aos procedimentos metodológicos, temos como norte o
método histórico e dialético, o qual possibilita estabelecer aproximações sucessivas
com a realidade na qual nos inserimos, bem como captar a verdade desse
movimento através das devidas mediações para uma melhor apreensão do real e
suas contradições.
77 Vide o exemplo: um militar no posto de tenente da ativa, com um soldo mensal de R$ 4.584,00, contribui
ao FUNSA, ao final de 12 meses, com um valor aproximado de R$ 972,00.
98
Isto permite compreender que que se pensar a prática a partir de uma
metodologia que seja capaz de aprendê-la em suas articulações e em sua dinâmica,
considerando que esse movimento é operado pelo assistente social, tomado como
um ser de relações.
Portanto, elaborar categorias analíticas que permitam analisar a intervenção
profissional, como produto humano, um processo dialético, contínuo de (re)
construção, inserida num contexto sócio-histórico e cultural, produto das relações
sociais concretas existentes em cada sociedade e do patrimônio de conhecimentos,
saberes e práticas construídas pela categoria profissional, em articulação ativa e
crítica com a realidade social (BAPTISTA, 2006).
De acordo com Marx, capturar o movimento do objeto não é tão simples como
retratar a realidade. Se a aparência dos fenômenos coincidisse com a sua essência,
não precisaria de conhecimento nem de teoria, bastaria olhar a realidade que se
conheceria. Assim, a aparência tanto revela quanto oculta, tanto mostra quanto
esconde, necessitando de um esforço intensivo da razão para, partindo da
aparência, ir além dela e capturar o movimento interno dos fenômenos.
Nesses termos, não concebendo o real como algo estático, mas em contínuo
movimento, nos debruçarmos sobre a prática dos assistentes sociais nos serviços de
saúde da Aeronáutica - RJ, em específico, nos Hospitais do município do Rio de
Janeiro, quais sejam:
Hospital de Aeronáutica dos Afonsos/HAAF (localizado no Bairro
Sulacap);
Hospital Central da Aeronáutica/HCA (localizado no Bairro Rio
Comprido);
Hospital de Força Aérea do Galeão/HFAG (localizado no Bairro Ilha do
Governador).
No que se refere à caracterização geral dos Hospitais da Aeronáutica/RJ, faz-
se necessário, destacar que, segundo a Diretoria de Saúde da Aeronáutica/DIRSA,
sediada no prédio do antigo Ministério da Aeronáutica, na cidade do Rio de Janeiro
(RJ), são subordinados a ela todas as 15 (quinze) Organizações de Saúde da
Aeronáutica/OSA
78
.
78 Dados da DIRSA. Dispovel em: <http: // www.dirsa.aer.mil.br> Acesso em 10 de outubro de 2009.
99
O HCA é o hospital mais antigo (criado em 1942), seguido pelo HAAF
(inaugurado em 1950) e HFAG (inaugurado em 1980). A estrutura destes permite
fornecer assistência hospitalar de média e alta complexidade
79
.
O HCA e o HFAG possuem uma média de efetivo de 1.000 (mil)
trabalhadores entre servidores civis contratados e estatutários e militares da ativa,
temporários, além de residentes e estagiários de diversas especialidades. Já o
HAAF possui uma média de efetivo de aproximadamente 650 civis e militares.
Os hospitais HCA e HFAG dispõem em média 160 leitos hospitalares cada, o
HAAF é o hospital que disponibiliza o menor número de leitos. Entretanto, os
hospitais oferecem serviços de emergência, ambulatório e internação, Unidade de
Tratamento Intensivo, Centro de Tratamento de Queimados (HFAG), Maternidade
(HCA) e ala de pacientes crônicos (HAAF), Unidade de Geriatria e Gerontologia
(HAAF), Núcleo de Geriatria e Gerontologia (HCA). Os atendimentos prestados são:
Alergologia, Anestesiologia, Angiologia, Cardiologia, Cirurgia Cardíaca, Cirurgia
Cabeça e Pescoço, Cirurgia Geral, Cirurgia do Tórax, Cirurgia Maxilofacial, Cirurgia
Pediátrica, Cirurgia Plástica, Cirurgia Vascular, Clínica Médica, Dermatologia,
Doenças Infecto-Parasitárias, Endocrinologia, Enfermagem, Epidemiologia,
Fisioterapia, Fonoaudiologia, Gastroenterologia, Geriatria e Gerontologia,
Ginecologia, Hematologia e Hemoterapia, Infectologia, Nefrologia, Neurocirurgia,
Neurologia, Nutrição e Dietética, Oftalmologia, Oncologia, Ortopedia e
Traumatologia, Otorrinolaringologia, Pediatria, Pneumologia, Proctologia,
Psiquiatria/Psicologia, Reumatologia, Serviço Social, Terapia Ocupacional e Urologia
No que concerne às necessidades de saúde da populão atendida, esta se
caracteriza pela predominância de problemas relacionados à hipertensão, às
doenças crônico-degenerativas, tais como: neoplasias e cardiopatias, assim como
79 Conjunto de procedimentos que, no contexto do SUS, envolve alta tecnologia e alto custo, objetivando
propiciar à população acesso a serviços qualificados, integrando-os aos demais níveis de atenção à saúde
(atenção básica e de média complexidade). As principais áreas que compõem a alta complexidade do SUS, e
que estão organizadas em ―redes‖, são: assistência ao paciente portador de doença renal crônica (por meio dos
procedimentos de diálise); assistência ao paciente oncológico; cirurgia cardiovascular; cirurgia vascular; cirurgia
cardiovascular pediátrica; procedimentos da cardiologia intervencionista; procedimentos endovasculares
extracardíacos; laboratório de eletrofisiologia; assistência em traumato-ortopedia; procedimentos de
neurocirurgia; assistência em otologia; cirurgia de implante coclear; cirurgia das vias aéreas superiores e da
região cervical; cirurgia da calota craniana, da face e do sistema estomatognático; procedimentos em fissuras
lábio palatais; reabilitação protética e funcional das doenças da calota craniana, da face e do sistema
estomatognático; procedimentos para a avaliação e tratamento dos transtornos respiratórios do sono; assistência
aos pacientes portadores de queimaduras; assistência aos pacientes portadores de obesidade (cirurgia
bariátrica); cirurgia reprodutiva; genética clínica; terapia nutricional; distrofia muscular progressiva; osteogênese
imperfeita; fibrose cística e reprodução assistida. Cf. Ministério da Saúde. O SUS de A a Z, edição, Brasília
(DF), 2009.
100
as denominadas ―causas externas‖ que estão atreladas à violência urbana e social
(acidentes de trabalho, de trânsito), bem como as doenças relacionadas ao processo
de envelhecimento da terceira idade (doenças cardiovasculares, diabetes,
demências, Alzheimer).
Os usuários atendidos são encaminhados pelos Esquadrões de Saúde
(pequenas unidades de saúde de atendimento ambulatorial) e dos demais Hospitais
de Força Aérea, Hospitais de Base, Esquadrões de Saúde distribuídos pelos
estados brasileiros que compõem a rede de atendimento do SISAU.
Assim, para alcançarmos o objetivo de analisar a prática profissional dos
assistentes sociais na saúde da Aeronáutica/RJ, foram entrevistados 10 (dez)
profissionais do universo de 13 (treze) assistentes sociais
80
, distribuídas nos
Hospitais: HAAF, HCA e HFAG.
No intuito de cumprir os objetivos aqui propostos, nos valemos de algumas
estratégias durante o processo de investigação. Inicialmente, realizamos uma busca
nas produções teóricas dos assistentes sociais arquivadas nas unidades de saúde,
bem como nos trabalhos apresentados em Congressos, Simpósios, Encontros,
Seminários e publicações de artigos.
No que se refere ao levantamento de produções teóricas foram encontrados
parcas produções, sendo estas, voltadas para a discussão na área da assistência
social como:
De Amélia Maria de Souza Casqueiro Cap.QFO ASS.
Síntese da Trajetória Histórica da Assistência Social e do
Serviço Social no Sistema de Assistência Social da
Aeronáutica, 2001. Discussão voltada para a Política de
Assistência Social. A autora faz um resgate histórico da
sistematização da Assistência Social na Aeronáutica, assim
como a criação do Sistema de Assistência Social /SAS, sem
maiores questionamentos teóricos acerca do Serviço Social na
Aeronáutica.
80 O processo de pesquisa de campo, através das entrevistas, foi realizado entre março a setembro de 2009.
Portanto, nesse período, o quantitativo de assistentes sociais nos serviços de saúde do Rio de Janeiro era de 13
(treze) assistentes sociais. Atualmente, são 14 (quatorze) assistentes sociais, Nov.2009.
101
De Nádia Regina O. Q. de Souza [et al.] (orgs.). Política
de Assistência Social no Brasil: desafios para o assistente
social, 2007. Na verdade, esta publicação é uma
sistematização dos conteúdos discutidos no II Simsio do
Serviço Social do COMAER em 2007, dando origem à
publicação de uma coletânea de artigos, dirigida ao público em
geral e, especificamente, aos assistentes sociais do COMAER,
cujo conteúdo é nutrido pelos artigos de intelectuais do Serviço
Social como: Elaine Rossetti Behring; Mavi Pacheco Rodrigues
e Sara Nigri Goldman dentre outros.
De Deolinda P. da Silva [et al.] . Construindo o Projeto
Profissional do Serviço Social na Casa Gerontológica de
Aeronáutica Brigadeiro Eduardo Gomes In O Desafio
Multidisciplinar: um modelo de instituição de longa
permanência para idosos, 2006. Trata-se de uma publicação
com uma concepção multidisciplinar sobre a Casa
Gerontológica da Aeronáutica/CGABEG, onde o Serviço Social
integra-se ao modelo assistencial desta instituição. Apresenta o
trabalho realizado junto aos cuidadores de Idosos e propõe
uma discussão sobre o Projeto Profissional do Serviço Social
na CGABEG. É importante mencionarmos que, tal artigo
apresenta algumas colocações equivocadas no que se
refereao entendimento por parte dos profissionais quanto aos
preceitos do Código de Ética Profissional dos Assistentes
Sociais. É mencionado por este, que o trabalho em texto (pp-
157) baseia-se em princípios éticos e científicos, na busca
da melhoria da qualidade de vida dos idosos e de seus
familiares. “(...) tendo como premissas básicas a autonomia e
a busca de melhor qualidade de vida e bem-estar social.
(...) a busca e consecução dos objetivos baseando-se no
acolhimento, respeito da pessoa humana, à procura de
novos horizontes, perspectivas e referenciais para o
crescimento pessoal de cada um. (pp -187-188). Ora, o
102
Código de Ética Profissional dos Assistentes Sociais, em vigor,
não visa a melhoria da qualidade de vida dos idosos e
familiares. Além do mais, o perfil do assistente social para
atuar nas diferentes políticas sociais, de acordo com o código,
deve afastar-se das abordagens tradicionais funcionalistas e
pragmáticas, que reforçam as práticas conservadoras que
tratam as situações sociais como problemas pessoais que
devem ser resolvidos individualmente (CFESS, 2009). De
forma sucinta, e, não desconsiderando o caráter plural e
heterogêneo da categoria, sinalizamos nossa preocupação
sobre um possível descompasso entre a direção social inscrita
no projeto ético-político e profissional do Serviço Social e
prática profissional desenvolvida nesse espaço ocupacional.
De Altair Silva Moreira assistente social civil (a qual
implementou o Serviço Social no HFAG). Visão Teórica do
Serviço Social no HFAG, 1981. Época, aliás, em que vigorava
o Código de Ética de 1975, onde o valor central de fundamento
ao Serviço Social é a pessoa humana; concepção personalista
que permita ver a pessoa humana como centro, objeto e fim da
visa social (ORTIZ, 2009:127). Altair S. Moreira apresenta uma
análise detalhada do Hospital de Força Aérea do Galeão, seus
setores, suas finalidades, funcionamento e apresenta os
objetivos do Serviço Social na instituição: dar atendimento
integral à população de clientes e funcionários; promover uma
melhor identificação da Organização Militar com interesses
sociais da comunidade externa. E quanto às finalidades: (...)
objetiva trabalhar com o homem isolado ou em grupos, para
remoção de bloqueios, liberação de potencialidades, utilização
de seus próprios recursos e do meio, tendo em vista o
aperfeiçoamento dos servidores desta Organização Militar,
bem como o da clientela que recorra ao Serviço Social, visando
alcançar atendimento de suas necessidades sociais.
103
E de uma forma mais geral, tece considerações gerais sobre o
Serviço Social no campo da saúde, ancorada no conceito de
saúde preconizado pela Organização Mundial de Saúde (criada
em 1948), que definiu a saúde como o bem estar integral
físico, mental e social e não uma mera ausência de doença.
De forma sucinta, podemos dizer que, naquele momento, a ação profissional
refletia a forte influência do pensamento conservador e da Doutrina Social da Igreja
Católica. Destaca-se entre os postulados advindos do neotomismo, bem como do
positivismo que comparecem nos Códigos de 1947, 1965 e 1975 o trato da ―pessoa
humana‖ com um ente abstrato, a-histórico, portadora de direitos naturais.
Durante o processo de levantamento de produções teóricas, encontramos,
tamm, publicações em Anais de Congresso Brasileiro de Assistentes Sociais dos
anos de 2004 e 2007 abordando as temáticas de Seguridade Social/Assistência
Social, Velhice, Relações de Trabalho e Espaços Sócio-Ocupacionais do Assistente
Social, com destaque para o trabalho que apresenta a participação do assistente
social em um Programa de Obesidade Mórbida e Cirurgia Bariátrica de um Hospital
da Aeronáutica.
Na reconstrução empírica do objeto, utilizamos o instrumento formulário de
entrevista (Anexo 01), contendo perguntas abertas e fechadas sobre o perfil
profissional, referências de conhecimento, prática profissional e aperfeiçoamento
profissional, buscando uma abordagem qualitativa e quantitativa das questões. A
preocupação que nos moveu na elaboração do formulário foi a de realizar uma
reflexão que faça ponte entre as questões cruciais com as quais se debatem os
assistentes sociais e os aspectos que, de uma forma ou de outra, vêm balizar, direta
ou indiretamente, o conjunto de noções que afetam a prática cotidiana naquele
espaço.
104
3.3 Os assistentes sociais inseridos nos serviços de saúde da Aeronáutica no
Rio de Janeiro/RJ
3.3.1 Perfil profissional
Apresentamos a seguir os dados capturados da realidade daqueles
profissionais que atuam nos Serviços de Saúde da Aeronáutica /RJ (SSA/RJ) a partir
do nosso referencial empírico, ou seja, do conjunto das assistentes sociais
entrevistadas.
De um total de 13 (treze) profissionais atuando na saúde, foram entrevistadas
10 (dez) assistentes do sexo feminino
81
. Não foram identificados homens atuando
nos SSA/RJ. Confirmando a tendência histórica da profissão, a categoria dos
assistentes sociais, ainda é predominantemente feminina
82
.
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Assistentes Sociais SSA/RJ
Fonte: HORTA, G.M. No Meio da Travessia. A prática das assistentes sociais nos serviços
de saúde da Aeronáutica/RJ, 2009.
O Gráfico 1 mostra que as assistentes sociais estão numa faixa etária que
varia entre 27 e 55 anos de idade. No entanto, são 40% que têm mais de 50 anos e
30% têm entre 41 e 50 anos. Apenas 20% têm entre 31 e 40 anos de idade. As
81
Das três assistentes sociais não entrevistadas: (01) uma encontrava-se em processo de desligamento da
Aeronáutica; 01 (uma) em período de férias e 01 (uma) optou em não participar da entrevista.
82 Cf. Edição virtual, da pesquisa Assistentes sociais no Brasil: elementos para o estudo do perfil profissional
realizada no ano de 2004 e publicado em maio de 2005 em edição impressa. A presente pesquisa é o resultado
do convênio firmado entre o Conselho Federal de Serviço Social CFESS e a Universidade Federal de Alagoas
UFAL, que por meio do grupo de pesquisa Serviço Social, Trabalho e Direitos Sociais desenvolveu este
trabalho contando com a colaboração de todos os 24 Conselhos Regionais na coleta dos dados. A pesquisa teve
a coordenação geral do CFESS. Disponível em : <http: www.cfess.org.br/pdf/perfilas_edicaovirtual2006.pdf.
10%
20%
30%
40%
até 30 anos
entre 31 e 40 anos
entre 41 e 50 anos
mais 50 anos
105
profissionais entrevistadas são, em sua maioria (40%), formadas mais de 20
anos: Vide (Gráficos 3 e 5).
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Assistentes Sociais SSA/RJ
Fonte: HORTA, G.M. No Meio da Travessia. A prática das assistentes sociais nos serviços de
saúde da Aeronáutica/RJ, 2009.
Os dados mostram que 40% das assistentes sociais o casadas, 20%
solteiras e 40% declaram estar divorciadas
83
. Com relação ao ano de formação, o
Gráfico 3 mostra que 70% das assistentes sociais se formaram entre os anos de
1977 a 1995 e apenas 30 % se formaram entre os anos de 1996 a 2002.
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Assistentes Sociais SSA/RJ
Fonte: HORTA, G.M. No Meio da Travessia. A prática das assistentes sociais nos
serviços de saúde da Aeronáutica/RJ, 2009.
83 As entrevistadas que declararam estarem divorciadas, confirmam terem passado pela etapa anterior a esta,
ou seja, a separação judicial.
10%
30%
30%
0%
30%
1977
1981 - 1988
1989 - 1995
1996 - 2002
20%
40%
40%
solteira
casada
Divorciadas
106
O Gráfico 3 mostra que 40% das assistentes sociais se formaram entre os
anos de 1977 a 1988 e 60% se formaram entre os anos de 1989 a 2002. Isso
sinaliza que parcela significativa das profissionais entrevistadas teve como
referência, no seu processo de formação acadêmica, os princípios e as diretrizes
contidas nas novas Diretrizes Curriculares para o Curso de Serviço Social, sob a
coordenação da Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social
ABEPSS. Com apoio das outras entidades categoria e oriundo de um amplo debate
realizado pelas Unidades de Ensino a partir de 1980, este processo culminou com
sua a primeira proposta de Currículo publicada na Revista Serviço Social e
Sociedade 14/Editora Cortez. Uma proposta que passa por reformulações em
1993 e 1996, quando são aprovadas as Diretrizes Curriculares para o Serviço
Social.
84
A partir daí vem ocorrendo, em todo o país, a revisão dos currículos de
Serviço Social sob essas novas diretrizes, que aprofundam as bases do processo
de revisão curricular de 1982
85
, quando a formação profissional do assistente
social rompeu com suas bases conservadoras, assumindo uma perspectiva
histórico-crítica de profissão. Assim, a ABEPSS, em 1996, estabelece um perfil
profissional indicando que o assistente social
―(...) atua nas expressões da questão social, formulando e implementando
propostas de intervenção para seu enfrentamento, com capacidade de
promover o exercício pleno da cidadania e a inserção criativa e propositiva
dos usuários do Serviço Social no conjunto das relações sociais e no
mercado de trabalho‖ (Diretrizes curriculares para o curso de Serviço
Social/2002).
84
Atualmente as Unidades de Ensino vêm se deparando com duas Diretrizes Curriculares para o Serviço Social:
as Diretrizes Curriculares da Comissão de Especialistas, que representa o pensamento da ABEPSS, e as
Diretrizes oficiais aprovadas pelo MEC que, esvaziadas de conteúdo, têm favorecido o ensino privado e a
implantação de Cursos à Distância no Serviço Social.
85
O projeto curricular de 1982, cujo referencial foi a pesquisa sobre a formação profissional realizada pela então
ABESS Associação Brasileira de Ensino em Serviço Social. Em consonância com o debate profissional dos
anos 80 pontuada por uma ―grave crise econômica, acompanhada de rearticulação política da sociedade civil‖ -
a pesquisa aponta para uma determinada perspectiva de análise da realidade e do próprio Serviço Social. Cf.
ABEPSS. Proposta básica para p Projeto de Formação profissional. In: Serviço Social e Sociedade 50, Ano
XVIII, São Paulo: Cortez, abril de 1996.
107
Na verdade, o processo de discussão desencadeado nacionalmente pela
então, Associação de Ensino em Serviço Social (ABESS), teve como ponto de
partida o projeto de formação profissional construído e implantado a partir do início
dos anos 80. O marco da redefinição do projeto profissional dos anos 80 foi o
tratamento dispensado ao significado social da profissão, enquanto especialização
do trabalho coletivo, inserido na divisão social e técnica do trabalho.
Assim, o primeiro projeto de formação profissional da ABEPSS é do ano de
1982, o qual começa a ser viabilizado pelas Unidades de Ensino -, a exemplo da
UERJ e da UFRJ - por volta dos anos de 1985. A partir de 1989, têm-se as
primeiras turmas já com a nova proposta da ABESS/ABEPSS.
O Gráfico 3 mostra que 60% das assistentes sociais entrevistadas, tiveram
formação entre os anos de 1989 a 2002, o que sinaliza que estas podem ter sido
atingidas pelo projeto de formação da ABEPSS.
Enfatiza-se que as universidades públicas, após 1980, sempre tiveram uma
formação mais progressista em relação às universidades particulares.
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Assistentes Sociais SSA/RJ
Fonte: HORTA, G.M. No Meio da Travessia. A prática das assistentes sociais nos serviços de
saúde da Aeronáutica/RJ, 2009.
UFRN
UFRJ
UFF
UVA
UGF
0
1
2
3
4
5
militar
civil
108
Tabela 1
-
-
Assistentes Sociais dos Serviços de Saúde da Aeronáutica/RJ
Formas de Admissão
ASSISTENTES
SOCIAIS
SSA/RJ
CONCURSO
QFO
CONCURSO
QCOA
CONCURSO*
CIVIL
CIVIL**
EFETIVADA
ENTREVISTADA 1
UNIDADE DE
ENSINO
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ENTREVISTADA 2
UNIDADE DE
ENSINO
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UFRN
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ENTREVISTADA 3
UNIDADE DE
ENSINO
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UGF
ENTREVISTADA 4
UNIDADE DE
ENSINO
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UFRJ
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ENTREVISTADA 5
UNIDADE DE
ENSINO
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UGF
ENTREVISTADA 6
UNIDADE DE
ENSINO
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UVA
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ENTREVISTADA 7
UNIDADE DE
ENSINO
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UGF
ENTREVISTADA 8
UNIDADE DE
ENSINO
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UFRJ
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ENTREVISTADA 9
UNIDADE DE
ENSINO
UFRJ
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ENTREVISTADA 10
UNIDADE DE
ENSINO
----
UFF
----
----
FONTE: HORTA. GM. No meio da Travessia. A prática das assistentes sociais nos serviços de saúde da Aeronáutica/RJ, 2009.
* Concurso após Lei 8.112/90
** Contrato CLT (servidor interino) efetivação após Constituição Federal de 1988.
Com relação à unidade de formação profissional (Gráfico 4 e Tabela 1),
podemos observar que todas as assistentes sociais civis entrevistadas tiveram
formação em Instituição Privada de ensino, com destaque para a Universidade
Gama Filho, enquanto as entrevistadas militares tiveram formação em Instituição
Pública Federal de ensino.
109
Algumas questões se colocam, a saber: podemos dizer que, nos limites do
levantamento realizado, a maioria das assistentes sociais civis são provenientes do
município do Rio de Janeiro, tal fato corrobora para que estas procurem formação
em instituições de ensino de sua localidade. Alia-se a este, o fato de que após a
Reforma Universitária de 1968, acentuou-se a expansão do ensino superior,
sobretudo do ensino privado, organizado sobre a forma de estabelecimentos
isolados, sendo introduzida a lógica empresarial na condução da vida acadêmica
através dos procedimentos de burocratização e racionalização. Vejamos a análise
realizada por Netto (1996, p. 62), ao se referir à política educacional no período
ditatorial:
(...) transformou, pela primeira vez na história brasileira, o ensino superior
num setor para investimentos capitalistas privados extremamente rentáveis,
- a educação superior, sob a autocracia burguesa, transformou-se num
grande negócio.
Essa privatização, em casos muito significativos, foi operada, também, no
nível médio por grupos econômicos simultaneamente à ação no ensino superior,
como foi à típica trajetória que, no Rio de Janeiro, levou do Colégio Piedade à
Universidade Gama Filho. (NETTO, 1996, p.63).
Residem, portanto, nesse momento histórico, as bases que solidificaram o
ensino superior privado no País, de forma que se chega ao inicio da década de 80
com uma parcela significativa de estudantes matriculados nessas instituições
86
.
Assim, a inserção de assistentes sociais civis coincide com a lógica de
expansão da assistência social na Aeronáutica, marcada pela criação do Sistema de
Assistência Social da Aeronáutica/SAS em 1985, numa conjuntura de
redemocratização do país e na luta pela efetivação de direitos.
Na época, a Aeronáutica contava apenas com as assistentes sociais do
Quadro Feminino de Oficias/QFO
87
, oriundos da primeira turma de mulheres militares
nas Forças Armadas em 1982
88
.
86 Cf. Cardoso, M.F.M.L. A mediação do Estado na fronteira público-privado no processo de interiorização do
ensino superior privado na zona da Mata Mineira: O caso FAMINAS, em Muriaé-MG. Rio de Janeiro:
Universidade Federal do Rio de Janeiro, Tese de Doutorado, 2006.
87 Segundo o relato de uma capitão da reserva - assistente social militar da 3ª turma do extinto QFO em 1984,
das 64 mulheres militares admitidas pela Aeronáutica, somente 02(duas) eram assistentes sociais. As demais 62
(sessenta e duas) oficiais eram pertencentes às categorias profissionais de psicólogas, fonoaudiólogas,
nutricionistas, fisioterapeutas e enfermeiras (sendo este com o maior número de profissionais).
88 Para um aprofundamento dessa questão. Cf. MATHIAS, Suzeley Kalil. As mulheres chegam aos quartéis.
Disponível em: <http://www.resdal.org/producciones-miembros/art-kalil.html> acesso em: 17/03/2009. Mathias
propõem analisar o contexto do ingresso das mulheres no espaço viril do quartel. Conclui a autora que a
110
Entretanto, as assistentes sociais civis formadas em unidades particulares
(vide: quadro 1), foram admitidas de duas formas: através de concurso público para
servidores civis; e por CLT (Consolidação das Leis Trabalhistas) na condição de
servidor interino. Expliquemos melhor:
Com a promulgação da Constituição Federal de 1988, extinguiu-se a
ascensão funcional, então vigente no serviço público federal para os seus servidores
civis. A referida ascensão funcional estabelecia os critérios para a mudança de
categoria funcional dos servidores (por exemplo: de um servidor agente
administrativo para procurador federal, fiscal ou outro cargo de nível superior).
Assim, a partir da Constituição, qualquer alteração da categoria do servidor
somente se dará mediante concurso público.
Na verdade, eliminou com a dualidade de admissão no serviço blico, seja
pelo ingresso por concurso público, seja pelo ingresso sem concurso. Portanto, com
a consolidação da Constituição, foram agregados os funcionários celetistas (CLT)
que tinham 5 (cinco) anos de serviço público embora, admitidos interinamente
(temporariamente), estes foram efetivados. Como podemos observar nos seguintes
depoimentos:
“Não fiz concurso, na época, em 1982 fui indicada por um oficial militar esposo de
uma amiga, com a Lei (não sei qual) fui ficando, hoje sou efetivada.”
“Entrei em 1981, por indicação, na época isso existia, hoje não”.
“Fiz estágio aqui, depois por indicação (1984) entrei, sou servidora federal
estabilizada”.
Em 11 de dezembro de 1990 foi aprovada a Lei 8.112, que dispõe sobre o
Regime Jurídico dos servidores públicos civis da União, das autarquias e das
fundações federais. Esta lei institui no seu Art.10 que:
―(...) Art. 10 A nomeação para cargo de carreira ou cargo isolado de
provimento efetivo depende de prévia habilitação em concurso público de
provas e títulos, obedecidos a ordem de classificação e o prazo de sua
validade‖.
integração das mulheres foi marcada por três fatores: o primeiro está relacionado às premissas da democracia e
do estado de direito que exigem posturas mais igualitárias entre diferentes, incluindo homens e mulheres; o
segundo diz respeito às mudanças na forma de fazer a guerra, na tecnologia e na administração das instituições
militares; o último diz respeito à crise da profissão militar, com o desprestígio da profissão, levando a um
afastamento do público masculino.
111
Duas das assistentes sociais civis entrevistadas informaram terem sido
admitidas através de aprovação em concurso público para as Forças Armadas
sendo, posteriormente, designadas para a Aeronáutica. Vejamos os depoimentos:
“Prestei concurso para assistente social em 1992 para as Forças Armadas fui
designada para o Hospital da Aeronáutica”.
“Fiz concurso na década de 90 (não me recordo da data) para a Marinha, e as outras
Forças requisitaram servidores, como faltou vaga na Marinha, fui designada para a
Aeronáutica”.
No que se referem às assistentes sociais militares, estas, só podem ser
admitidas através de concurso público
89
de abrangência nacional, como
apontamos, o que sinaliza uma maior diversidade de instituições formadoras e uma
competição acirrada na busca de aprovação nestes concursos e inserção no quadro
de oficiais.
Destacamos da análise de Guerra (2007, p.08) a seguinte argumentação que
nos parece pertinente para conjeturarmos sobre esse assunto:
―No capitalismo monopolista, face ao padrão de produção atual denominado
por alguns autores como flexível
90
, acirra-se a luta de classes, mas também
a luta intraclasses, a fragmentação, a competitividade, o individualismo, a
razão instrumental que opera uma ruptura entre fins e meios, estimulando
saídas individualistas e o salve-se quem puder. Não é demasiado dizer que
essa lógica acirra a fragmentação das classes e entre segmentos
profissionais, dentre os quais dos assistentes sociais‖.
Portanto, uma questão se coloca: embora, atualmente, exista uma crescente
e expressiva demanda por assistentes sociais na instituição, esta se de forma
precarizada, haja vista o processo de substituição de um quadro efetivo de
assistentes sociais (QFO), que foi extinto na década de 90 e gradativamente
substituído (a partir de 1998) por um quadro de assistentes sociais militares
temporários.
A precarização das relações profissionais estabelecidas no âmbito do Estado
sinaliza uma tendência de apropriação, pelos assistentes sociais temporários, da
lógica dos trabalhadores terceirizados, embora sejam concursados
91
. Como se
evidencia nos seguintes depoimentos:
89 Referindo-se ao extinto concurso para Admissão de Oficiais do Quadro Feminino (QFO) e ao atual Concurso
de Admissão para Oficiais Temporários (QCOA).
90 Cf. Harvey. David. A Condição Pós - Moderna, São Paulo, Ed. Loyola, 1994.
91 Os candidatos a admissão ao Quadro Complementar de Oficias Temporários da Aeronáutica (QCOA),
realizam o mesmo concurso que os oficias efetivos de carreira, bem como passam pelas mesmas fases de
112
“(...) Apesar de tudo vivemos um retrocesso desse avanço (...) falta recursos
humanos, aqui em um hospital desse tamanho, somos apenas 03 (três) assistentes
sociais”.
“(...) Prefiro estudar para outros concursos, esse quadro não vai ser efetivado,
meu tempo está acabando”.
“(...) Você está aqui e não está ao mesmo tempo, de certa forma, afeta o nosso
cotidiano (...) quando atendo aos usuários, lógico que não fico pensando nessa
situação”.
“(...) O tempo de QCOA passa muito rápido, acho que temos que deixar nossa marca
(...) penso que tenho que me qualificar mais. Sei lá! Pode ser que efetivem o nosso
quadro. E se for uma seleção interna. Ao mesmo tempo, fico pensando que
trabalho como uma louca” para daqui a 08 (oito) anos a FAB me mandar
embora, não interessa o quanto e o que fiz”.
“(...) Eu sei que quando prestei o concurso era temporário, mas quando você está
aqui pensa diferente, quando você começa a desenvolver um trabalho legal, está
na hora de ir embora (...) o meu concurso é igualzinho ao dos médicos e dentistas, e
eles são de carreira, acho isso injusto com o assistente social e com os outros
profissionais nessa situação”.
Podemos observar através dos depoimentos que a questão da precariedade
de admissão das assistentes sociais (oficias temporários) afeta o cotidiano
profissional. A preocupação é que essa questão possa se tornar um entrave para o
desenvolvimento das atividades, influenciando as decisões das profissionais e que
estas, limitem sua prática na esfera da execução burocrática das atividades.
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até 5 anos
entre 6 e 10 anos
entre 11 e 15 anos
entre 16 e 20 anos
mais 20 anos
Fonte: HORTA, G.M. No Meio da Travessia. A prática das assistentes sociais nos serviços de
saúde da Aeronáutica/RJ, 2009.
seleção: prova de conhecimento específico, português e redação, prova de títulos, exame físico, médico e
psicológico. Motivo de descontentamento dos QCOA com a FAB.
113
O Gráfico 5 mostra que as profissionais entrevistados em sua maioria (70%)
apresenta mais de 10 anos de exercício profissional e apenas 10% possuem até 5
anos de exercício profissional. Um grupo de 40% das profissionais tem mais de 20
anos de profissão, o que indica estarem próximas da aposentadoria. Como podemos
observar nos depoimentos:
“(...) não tenho ânimo para mais nada, até pela condição que nós funcionários civis
nos encontramos, estou no fim de carreira. Eu não vou a lugar nenhum”.
“(...) já deu no que tinha que dar. Estou indo embora daqui a pouco”.
(...) Ainda tenho que esperar uns 5 anos para não ter perda salarial, se pudesse
me aposentava hoje”.
“(...) A gente vai desanimando, tenho mais de 25 anos de serviço neste hospital.
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Assistentes Sociais SSA/RJ
30%
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até 5 anos
entre 6 e 10 anos
entre 11 e 15 anos
entre 16 e 20 anos
mais 20 anos
Fonte: HORTA, G.M. No Meio da Travessia. A prática das assistentes sociais nos serviços de
Saúde da Aeronáutica/RJ, 2009.
A pesquisa buscou saber ainda, há quanto tempo as assistentes sociais
trabalham na instituição. A maioria das profissionais formados na década de 1980
tem na Aeronáutica sua primeira inserção como assistente social. Portanto, trata-se
de um grupo que não tem uma formação e atuação muito recente no Serviço Social.
Observamos através das entrevistas e da dinâmica das instituões, assim
como da relação do Serviço Social com estas, que o trabalho do Serviço Social
acabou sendo agregado às requisições da instituição de ―resolver‖ os problemas.
Percebemos que na sua maioria as atividades realizadas pelas assistentes sociais
são soltas, desconectadas de um planejamento maior do setor, sem buscar atingir
114
um objetivo predeterminado. Ou seja, não se trata de uma prática planejada e
avaliada nas suas conseqüências. Relatos a seguir exemplificam essa situação:
O Serviço Social é muito solto aqui nos hospitais da Aeronáutica”.
Trabalhamos muito com o apagar de incêndio, atendimento imediato, resolver
aquela situação momentânea que já chega ao extremo para nós”.
“Aqui não se trabalha em equipe multidisciplinar ou indisciplinar, ninguém se articula”.
“(...) Fazemos reuniões no início do ano para planejarmos as ações, mas não
conseguimos colocar em prática”.
“(...) Aqui, quando não querem “resolver” o problema dos usuários, jogam para o
Serviço Social. Muitas vezes você deixa de fazer um relatório social ou, um estudo
social para “resolver” um problema que é do setor que encaminhou o usuário;
você vai deixar um usuário idoso, com dificuldade de caminhar ficar andando sem
rumo? Vou ao setor porque por telefone, ninguém atende, e explico ao “indivíduo” o
que pode ser feito, ou seja, explico o serviço que ele deveria saber e fazer e não o
faz; eu penso é no usuário”.
Outro dado relevante é a predominância, na área da saúde, de assistentes
sociais civis mais de 20 anos de inserção. O que sinaliza que apesar da Aeronáutica
requisitar, anualmente, desde 1998, através de Concurso Público um número
expressivo de assistentes sociais temporários, um número reduzido de profissionais
tem sido alocado nas unidades de saúde
92
.
Cabe informar, que é Comando-Geral do Pessoal (COMGEP), o órgão
responsável pela política de pessoal do Comando da Aeronáutica. Este órgão tem
como principais objetivos realizar o levantamento das necessidades concretas da
Aeronáutica quanto ao efetivo, quantitativamente e qualitativamente e o
dimensionamento das necessidades de pessoal. Assim, através do subprograma
"Tabela de Lotação de Pessoal‖, estabelece o somatório das Tabelas de Lotação de
cada Organização. Tal fato, segundo o COMGEP, o possibilita planejar as
necessidades de recrutamento em prazos adequados. Esses subprogramas o, a
rigor, um Plano de Classificação de Cargos.
Entretanto, o Órgão Central do Sistema de Assistência Social/SAS do
COMAER é a diretoria de Intendência/DIRINT que, por intermédio da Subdiretoria de
Encargos Especiais/SDEE; planeja, normatiza e controla o trato dos assuntos
relacionados aos profissionais de Serviço Social do COMAER.
92 Atualmente, são 96 (noventa e seis) assistentes sociais na Aeronáutica, entre civis e militares. Desse total,
são 23 (vinte e três) assistentes sociais distribuídas nos 09 (nove) hospitais da Aeronáutica, quais sejam: HCA,
HAAF, HFAG, HFAB, HABE, HASP, HARF, HAMN, HACO. Cf. SDEE, agosto de 2009.
115
A SDEE a cada ano de concurso público informa e solicita ao COMGEP o
quantitativo de assistentes sociais
93
necessário para o desenvolvimento das ações
de Serviço Social e Assistência Social.
Destaca-se que o Plano de Assistência Social/PASIC do COMAER
94
prevê
cinco programas focados nas áreas de: promoção familiar; proteção à terceira idade;
benefícios sociais; recursos humanos e lazer e cultura. Tomando como base legal,
para o desenvolvimento dos programas, a Lei Orgânica de Assistência Social
(LOAS) e os desdobramentos legais advindos, tais como: NOB/SUAS, Estatuto do
Idoso, Estatuto da Criança e do Adolescente, entre outros dispositivos legais que
possam auxiliar na compreensão da matéria.
Em linhas gerais, é competência da SDEE: propor estudos e pesquisas para
fundamentar as estratégias de ação do Serviço Social; planejar, normatizar e
controlar as ações vinculadas às atividades de Assistência Social; articular com
os órgãos responsáveis pelas políticas de saúde, previdência social e
educação, no âmbito do COMAER, ou fora dele, visando à elevação do patamar
mínimo de atendimento das necessidades básicas da população alvo;
promover as atividades de aperfeiçoamento dos recursos humanos no campo da
Assistência Social; coordenar as ações da Assistência Social, para a
consecução de seus objetivos, no que concerne ao planejamento, à programação, à
execução e ao controle das atividades administrativas orçamentárias e financeiras,
dentre outras competências
95
.
Destaca-se, tamm, a direção dada pela Política de Assistência Social das
Forças Armadas/FFAA (Marinha, Exército e Aeronáutica), aprovada pelo Ministério
da Defesa em setembro de 2006 no I Semirio de Assistência Social das Forças
Armadas. Para elucidarmos tal afirmativa, destacamos do anexo da Portaria
Normativa nº. 1173, que aprova a Política de Assistência Social das FFAA os
seguintes objetivos:
(...) Objetivo nº. 2. Aprimorar os recursos humanos necessários à condução das
atividades de assistência social nas Forças Armadas (FFAA). Diretrizes:
a) assegurar de forma coordenada o ingresso de pessoal graduado em Serviço
Social e áreas afins, bem como o aperfeiçoamento e a especialização de recursos
93 A título de exemplo, os concursos EAOT/2007/2008/2009 e 2010, ofereceram juntos, 29 vagas para o quadro
de assistentes sociais. Entretanto, 2 (dois) hospitais do Rio de Janeiro, desde 2004, não recebem profissionais
de Serviço Social em seu quadro. Cf. SDEE, 2009.
94 ICA 163-1 de 22 de fevereiro de 2006/COMAER.
95 Instrução Reguladora das Ações da Assistência Social/ICA 163-1 de 22 de fev. de 2006, reeditada em dez. de
2008.
116
humanos necessários ao desempenho das atividades de assistência social, por
meio da participação de componentes das FFAA em cursos e estágios ministrados
em estabelecimentos de ensino militares e civis no Brasil, e no exterior;
b) estimular a permanência do pessoal qualificado em assistência social das
FFAA no exercício de atividades afins;
c) promover o contínuo aperfeiçoamento da equipe técnica responsável pela
assistência social das FFAA por meio de participação em cursos de pós-
graduação, seminários, simpósios e atividades correlatas no Brasil e no exterior;
d) incentivar o desenvolvimento de trabalhos literários (monografias,
dissertações, teses, estudos, ensaios e outros) voltados para a área de
assistência social das FFAA;
e) estimular o aproveitamento de militares e civis graduados em Serviço Social e
áreas afins, em funções de assessoria e planejamento da assistência social das
FFAA;
f) promover o estágio curricular no âmbito das FFAA, de alunos que têm a
assistência social como objeto de sua formação profissional.
De acordo com a diretriz da SDEE, a Política de Assistência Social no âmbito
do COMAER visa romper com uma prática desarticulada e conservadora e
procura adequar as ações sociais do COMAER ao enfoque da assistência social
como política pública, na busca pela garantia de direitos. No que se refere à atuação
do assistente social a ICA 163-1/2006/COMAER afirma:
(...) a atuação do assistente social se nas expressões cotidianas da
questão social, a serem atendidas pelas políticas sociais (...) o assistente
social possui uma ampla diversidade de formas de inserção sócio-
institucional, que vai desde a execução da rede de serviços sociais à
elaboração e o gerenciamento de Políticas Setoriais (pp.09-10).
Entretanto, as indicações nos levam a supor que tem sido requisitada para
atuar na área da assistência social, parcela significativa de assistentes sociais
temporários. Ou seja, uma tendência na Aeronáutica, de priorizar a Política de
Assistência Social em detrimento das demais políticas.
Deparamo-nos, portanto, com uma tendência apontada na década de 90 por
Mota (1995 e 2006), da ampliação da assistência social, transformando-a num novo
fetiche de enfrentamento à desigualdade social. Instala-se uma fase na qual a
assistência social, mais do que uma política de proteção social, se constitui num
―mito social‖. Além disso, postula-se uma intenção de reduzir a profissão à
assistência social, ou seja, uma assistencialização do Serviço Social.
117
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Assistentes Sociais SSA/RJ
60%
40%
Assistente Social
Chefe de Setor
Fonte: HORTA, G.M. No Meio da Travessia. A prática das assistentes sociais nos serviços de
saúde da Aeronáutica/RJ, 2009.
Tabela 2
-
-
Assistentes Sociais dos Serviços de Saúde da Aeronáutica/RJ
Função Exercida
ASSISTENTES SOCIAIS
SSA/RJ
CIVIL
MILITAR
ENTREVISTADA 1
ASSISTENTE
SOCIAL
----
ENTREVISTADA 2
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CHEFE
DO SS
ENTREVISTADA 3
CHEFE
DO SS
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ENTREVISTADA 4
ASSISTENTE
SOCIAL
ENTREVISTADA 5
ASSISTENTE
SOCIAL
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ENTREVISTADA 6
ASSISTENTE
SOCIAL
----
ENTREVISTADA 7
ASSISTENTE
SOCIAL
---
ENTREVISTADA 8
----
CHEFE
DO SS
ENTREVISTADA 9
----
ASSISTENTE
SOCIAL
ENTREVISTADA 10
----
CHEFE
DO SS
FONTE: HORTA. GM. No meio da Travessia. A prática das assistentes sociais nos
serviços de saúde da Aeronáutica/RJ 2009.
Quanto à função assumida, das profissionais entrevistadas 40% assumem o
cargo de chefia no Serviço Social, desempenhada, significativamente, por
profissionais militares e 60% entre militares e civis têm o cargo de assistente social.
118
No tocante a atribuição da chefia do Serviço Social compete
96
: planejar,
organizar, coordenar a controlar as atividades de Serviço Social; assessorar a
Direção do hospital em assuntos de sua especialidade; colaborar nos estudos e
projetos de reforma, adaptação e ampliação das áreas físicas do Serviço Social;
solicitar material necessário para as atividades propostas; planejar, dirigir, coordenar
programas de ensino, pesquisa, treinamento e capacitação para o pessoal de
Serviço Social subordinado à seção; apresentar estatística e relatórios das
atividades desenvolvidas; elaborar o Programa de Trabalho Anual da seção e
supervisionar a execução do mesmo; elaborar a Norma Padrão de Ação (NPA)
sobre as atividades do setor de Serviço Social ou Assistência Social; coordenar a
seleção e a supervisão de estagiários do Serviço Social; preconizar o zelo pelo
cumprimento do Código de Ética dos Assistentes Sociais. É ainda responsável pela
gestão dos recursos orçamentários do Fundo de Assistência Social (FAS) de sua
unidade, assumindo a função de gestor social
97
.
No que se referem as atribuições das demais assistentes sociais das
unidades de saúde
98
, a estas cabem: assessorar e auxiliar a chefia nos assuntos
técnicos e administrativos; realizar atendimento aos usuários e ao efetivo nos
setores de (ambulatório, internação, emergência e UTI); participar de reuniões,
seminários, grupos de estudo e pesquisas científicas; manter-se atualizado quanto
aos conhecimentos científicos e técnicos; garantir a privacidade do atendimento
realizado; participar de equipes multidisciplinares e interdisciplinares; efetuar e
atualizar registros estáticos de procedimento relativos à sua atividade; viabilizar por
intermédio de serviços e aquisição de bens para os usuários dos programas e
projetos de ações sociais, no sentido de proteção e prevenção de situações de
vulnerabilidade social.
Diante do exposto, uma questão se apresenta: a relação entre as assistentes
sociais civis e as assistentes sociais militares se de forma conflituosa frente à
questão da chefia do Serviço Social Como demonstra os depoimentos que se
seguem:
96 Instrução Reguladora do Serviço Social no SISAU/DIRSA (ICA 160-39/2008) e ICA 163-1/2006/SDEE.
97 Gestor Social é o assistente social ou agente social responsável pela elaboração, implementação e avaliação
dos programas e projetos de ações sociais, bem como pela gestão dos Recursos da Assistência Social da
Diretoria de Intendência nas Organizações Militares (OM), Cf. ICA 161-1/2008, p.07.
98 ICA 160-39/2008/DIRSA.
119
“(...) Com certeza existe um “mal estar” mesmo que velado, entre as Assistentes
Sociais civis e as Assistentes Sociais militares, e a questão da chefia e tudo mais,
não foi superado”.
“(...) Os militares temporários, é terrível. Quando entrei não existia esse quadro.
Então o militar temporário quando começa a se comprometer com a instituição “veste
a camisa” ele vai embora, são 8 a 9 anos somente. Acho prejudicial para o Serviço
Social”.
“(...) Para mim, é muito complicado, porque sempre a chefia tem que ser de uma
assistente social militar? Então a pessoa acabou de sair de uma faculdade, presta
um concurso passa e se torna um oficial tenente para chefiar obrigatoriamente,
nós com mais de 20 anos de prática profissional. Mesmo nós com toda a nossa
experiência e ela vai ser nossa chefe? Isso acontece aqui. Não tenho esmulo
para propor nada”.
“(...) Porque não uma civil com mais tempo de experiência não pode ser chefe? o
os choques, não necessariamente negativos, pois a questão não é pessoal, mais que
dificultam a prática e acarretam em uma falta de estímulo”.
“O civil sofre injustiças, o foco para tudo é sempre para o profissional militar”.
O que nos interessa questionar é de que forma essa relação explicitamente
conflituosa afeta o cotidiano da prática profissional do assistente social
99
e as
respostas profissionais ante a demanda dos usuários.
A preocupação aqui, é que as assertivas das assistentes sociais civis
sinalizam que as profissionais vinculam a realização de uma prática de qualidade e
articulada aos interesses dos que demandam seus serviços a um espaço de
trabalho ideal (Vasconcelos, 1997), a uma instituição ideal, sem problemas e sem
contradições. Apreendemos que o cotidiano profissional é permeado por conflitos e
contradições, não sendo, portanto, uma particularidade da prática profissional do
assistente social na Aeronáutica, nem somente do assistente social da Aeronáutica.
Recorremos a um exemplo: os Programas de Residência em Serviço Social
nos Hospitais Universitários /HU
100
. Nestes, os ―recém-chegados‖ assistentes sociais
residentes, são direcionados para atividades determinadas, dando cobertura a
setores-chave dos Hospitais Universitários. Ou seja, profissionais de formação
99
Ressaltamos que as demais categorias profissionais como: médicos, enfermeiros, fisioterapeutas,
psicólogos, nutricionistas; contam com pouco ou nenhum profissional civil em seu quadro funcional.
Em sua maioria, os civis são residentes ou, militares da inativa (da reserva remunerada) que
retornam como contratados.
100 Como estagiária do Serviço Social do Hospital Universitário da Universidade Federal de Juiz de Fora
HU/UFJF. Vivenciamos, em 1998, um processo de transição entre uma Supervisão de Campo permeada por
traços conservadores, para uma Supervisão de Campo emancipatória; plasmada pelo Programa de Residência
em Serviço Social do Hospital Universitário da UFJF, onde se onde se reconhecia a autonomia e a plena
expansão dos indivíduos sociais. Nesse espaço, com a criação em 1997 do referido Programa, os residentes
(denominados R1) assumiriam a responsabilidade pela supervisão de campo dos estagiários da Faculdade de
Serviço Social. O que gerou um conflito com as assistentes sociais (servidoras civis, com mais de 20 anos de
inserção) que até então, eram as responsáveis pela supervisão de estágio.
120
recente em Serviço Social assumem atividades, até então, atribuídas aos
profissionais mais antigos como
101
: a supervisão de estagiários de Serviço Social; a
responsabilidade em participar de projetos existentes nos ambulatórios dos
hospitais. O que possibilita a troca de experiências; o amadurecimento e a
construção de novas práticas e saberes da profissão.
Ainda que esse exemplo não faça parte do conflito apresentado pelas
assistentes sociais da Aeronáutica, este nos esclarece quanto à complexidade das
questões que permeiam o cotidiano da prática profissional.
Porém, o podemos desconsiderar que ao ingressar no quadro de oficiais
temporários, as assistentes sociais passam a assumir, ainda que por tempo
determinado, as prerrogativas da profissão militar. Preconiza o Art.36 do Estatuto
Militar: O oficial é preparado, ao longo da carreira, para o exercício de funções de
comando, de chefia e de direção.
Na verdade, o conflito está posto pela instituição. É fato, que uma instituição
fundamentada nos princípios da hierarquia e da disciplina com um funcionamento
que se aproxima do modelo de instituição ―fechada‖, positivista e conservadora,
diversas contradições e limites estão presentes na ação profissional imanentes à
inserção do Serviço Social nas relações sociais capitalistas inscritas na divisão
sociotécnica do trabalho. Entretanto, o assistente social o pode cair numa postura
fatalista da profissão, de que nada pode ser feito dentro das ―amarras das
instituições ‗fechadas‘ e burocráticas‖.
Reportando-nos à questão da chefia do Serviço Social, encontramos um
duplo e contraditório movimento, a saber: nas disposições gerais da ICA 163-
1/2006/COMAER/SDEE “os setores de Serviço Social ou de Assistência Social
deverão ser chefiados por Assistentes Sociais militares ou civis. Portanto,
neste documento, a chefia o é considerada exclusiva ao assistente social militar
(vide quadro 2). No entanto, contrariando esta, a ICA 160-39/2008/COMAER/DIRSA
informa que “o Serviço Social é constituído de pessoal militar e civil com graduação
em Serviço Social, sendo a chefia cargo privativo de oficial assistente social de
maior grau hierárquico do efetivo da OSA”.
Ante o exposto, faz-se necessário, o assistente social (re)pensar a forma de
organização do Serviço Social nos serviços de saúde da Aeronáutica/RJ,
101 Programa de Residência em Serviço Social da Faculdade de Serviço Social da Universidade Federal de Juiz
de Fora (MG).
121
impulsionando e tornando-se em um desafio aos assistentes sociais (civis ou
militares) comprometidos com a efetivação do Projeto Profissional do Serviço Social,
e que buscam alargar os horizontes e apreender a profissão no movimento das
classes e da própria sociedade capitalista. Como sublinha Iamamoto (2007, p. 227):
―(...) O projeto profissional é histórico e dotado de caráter ético-político, que
eleva esse projeto a uma dimensão técnico-profissional. Isto porque ele
estabelece um norte, quanto à forma de operar o trabalho cotidiano,
impregnando-o de interesses da coletividade‖.
Não podemos deixar de enfatizar que, o Código de Ética Profissional do
Assistente Social se destaca dos demais
102
na “opção por um projeto profissional
vinculado ao processo de construção de uma nova ordem societária, sem
dominação-exploração de classe, etnia e gênero.
Ora, sublinhamos que para além da discussão da chefia e o status deste
cargo, entendemos que é fundamental para o assistente social o aprimoramento
profissional
103
constante (ultrapassando os anos de formação acadêmica). Para que
este esteja munido de um referencial teórico-metodológico (Sant‘ana, 2000) que lhe
permita apreender a realidade numa perspectiva de totalidade, e construir
mediações entre o exercício profissional comprometido e os limites dados pela
realidade de atuação.
Na assertiva de Guerra (2005)
104
, no âmbito instrumental da profissão há que
se ter uma racionalidade (inclusiva, ontológica e crítica) que inspire nos profissionais
a coragem para não retroceder, e proporcione a qualificação
necessária para o enfrentamento das reformas (neoliberais social-
democratas); para isto o estabelecimento de alianças a democracia e os
direitos humanos na sua expressão mais radical e o amplo acesso aos bens
e serviços sociais, enquanto aspirações das classes trabalhadoras. Mas
deve ser tamm uma racionalidade que possibilite conhecer os
fundamentos da ordem burguesa e suas metamorfoses; as demandas
emergentes, os objetos de intervenção (para o que a atitude investigativa é
condição); estabelecer os meios mais adequados para intervir sobre eles;
avaliar a correlação de forças do momento, a fim de evitar incorrer em
falsos dilemas quanto investir em falsas alternativas. Para tanto, há que
102 Para a discussão sobre os Códigos de Ética dos profissionais de saúde, cf. Vasconcelos [et al]. Profissões
de saúde, ética profissional e seguridade social In: Bravo. Maria Inês [et al], (orgs). Saúde e Serviço Social. São
Paulo: Cortez Editora; Rio de Janeiro: UERJ, 2004.
103 O digo de Ética Profissional do Assistente Social no Título II Dos direitos e das responsabilidades gerais
do Assistente Social - Art. informa que constitui direito do assistente social o aprimoramento profissional de
forma contínua, colocando-o a serviço dos princípios estabelecidos pelo Código.
104 Para um maior aprofundamento veja GUERRA, Y.O Serviço Social frente à crise contemporânea:
demandas e perspectivas. In Revista Ágora: Políticas Públicas e Serviço Social, Ano 2, nº 3, dezembro de 2005.
Disponível em <http://www.assistentesocial.com.br> acesso em 29 de novembro de 2009.
122
se ultrapassar a racionalidade formal-abstrata das correntes
tecnocráticas, a visão tarefista-burocrática, bem como combater os
subjetivismos, dos quais as vertentes pós-modernas o legatárias,
que visam psicologizar as respostas profissionais. Ambos são produtos
do pensamento conservador burguês e dele se sustentam.(grifos nossos).
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Assistentes Sociais SSARJ
30%
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sim
não
Fonte: HORTA, G.M. No Meio da Travessia. A prática das assistentes sociais nos serviços de
saúde da Aeronáutica/RJ, 2009.
Frente a essas questões, fomos saber sobre a participação das assistentes
sociais em entidades da categoria. Das profissionais entrevistadas, 70% informam
não participar de entidades da categoria e apenas 30% declaram participar.
Destaca-se que o baixo percentual de participação política das assistentes
sociais não se apresenta como uma particularidade da Aeronáutica. Os dados
apresentados dos nos permitem traçarmos um paralelo com a pesquisa realizada
pelo CFESS em 2005
105
. A pesquisa mostra que a região Sudeste encontra-se com
um menor percentual de profissionais que participam de atividades políticas.
105 Disponível em: <http: www.cfess.org.br/pdf/perfilas_edicaovirtual2006.pdf> acesso em 29 de novembro de
2009.
123
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Assistentes Sociais SSA/RJ
10%
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Fonte: HORTA, G.M. No Meio da Travessia. A prática das assistentes sociais nos serviços de
saúde da Aeronáutica/RJ, 2009.
Quando perguntadas sobre a hipotética possibilidade de trocar de emprego
tendo o mesmo salário, 90% das assistentes sociais responderam que não trocariam
de emprego. Alegam conhecer a rotina institucional; estar acostumado com a
instituição, gostar do trabalho; ter qualidade de vida no trabalho; ambiente
profissional; local de trabalho de qualidade. E, apenas uma assistente social
respondeu que trocaria de emprego por considerar ser necessária a experiência em
outra área de atuação do Serviço Social. Vejamos alguns depoimentos:
“Sim, trocaria de emprego, não pela Aeronáutica, mas pela possibilidade de vivência
em outra área de atuação do Serviço Social, por exemplo, o judiciário”.
“Não trocaria, gosto do que faço. (...) Aqui é um hospital de grande porte, tem
tecnologia de ponta, bons profissionais, tem qualidade de vida no trabalho, e porque
eu gosto da área da saúde, na verdade, eu adoro”.
“Não, permaneceria aqui. Já conheço a rotina da instituição”.
“Não. O ambiente de trabalho é seguro, tranqüilo e organizado, não sei se em outro
local de trabalho seria assim”.
“Não tem problema nenhum em trabalhar aqui, muito pelo contrário , aqui é um
ambiente profissional de qualidade”.
É interessante observarmos que as questões mais singulares que vigoram no
cotidiano das instituições militares como: a racionalidade burocrática; a autoridade
militar; a disciplina e a hierarquia, não comparecem nos depoimentos como
elementos negativos e de estímulo a troca de emprego.
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Assistentes Sociais SSA/RJ
70%
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20 horas
30 horas
Fonte: HORTA, G.M. No Meio da Travessia. A prática das assistentes sociais nos serviços de
saúde da Aeronáutica/RJ, 2009.
No tocante à carga horária, a maioria das assistentes sociais entrevistadas
(70%) tem uma carga de 20 horas semanais e apenas 30% tem uma carga horária
de 30 horas semanais. As profissionais estão inseridas na instituição trabalhando em
média 4 horas diárias entre 4 e 5 vezes por semana
106
, em constante contato com
os usuários, o que pode contribuir para a realização de uma prática planejada e
avaliada nas suas conseqüências, comprometida com os interesses dos usuários.
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Assistentes Sociais SSA/RJ
30%
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sim
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Fonte: HORTA, G.M. No Meio da Travessia. A prática das assistentes sociais nos serviços de
saúde da Aeronáutica/RJ, 2009.
106 Para as assistentes sociais militares é obrigatório concorrer a uma escala mensal de Oficial de Dia,
atribuição aos tenentes e aspirantes a oficial de todos os quadros profissionais, conforme prevê Art.41 do
Estatuto dos Militares. Nessa atribuição de 24 horas de serviço, dentro da instituição, é proibido ausentar-se da
unidade até o final do serviço, caso ocorra à saída da unidade, configura-se como crime militar. O então Oficial
de Dia (seja o assistente social ou a psicóloga, por exemplo) é o responsável pela segurança da organização e
representante do Comandante na ausência deste e do seu substituto. É um serviço armado, de segurança e
disciplina, realizado por uma equipe de sargentos, cabos e soldados ao comando do Oficial de Dia.
125
Os dados do gráfico mostram que 70% das profissionais entrevistadas
informaram não ter e 30% informam ter outro vínculo empregatício. Esse resultado
remete a algumas questões, principalmente, se cruzarmos os dados com a questão
da carga horária, indicada linhas atrás: num primeiro aspecto, podemos sinalizar
que, apesar de serem profissionais de saúde e, poderem acumular dois cargos na
saúde, conforme Resolução CFESS nº383/1999, as profissionais não o fazem. O
que remete à questão salarial satisfatória, bem como satisfatória a cobertura do
sistema de seguridade social da Aeronáutica.
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Assistentes Sociais SSA/RJ
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30%
sim
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Fonte: HORTA, G.M. No Meio da Travessia. A prática das assistentes sociais nos serviços de
saúde da Aeronáutica/RJ, 2009.
O gráfico 12 mostra que 40% das entrevistados estão satisfeitas com a
profissão, 30% diz não estarem satisfeitas e 30% apresentam informações
contraditórias, sim e não. Observemos como as profissionais se manifestam a
respeito disso:
“(...) Hoje posso dizer que estou satisfeita como assistente social, eu faço o que eu
quero, posso atender aos usuários elucidando-os quanto as seus direitos. Enfim,
tenho tempo para isso. Antigamente eu tinha que fazer muita coisa junto, como
prestação de contas, estatísticas, ambulatório”.
“(...) Sinceramente, hoje posso dizer que sim, não tenho dificuldade de exercer minha
prática porque, tenho liberdade para atuar, tenho espaço físico satisfatório”.
“Sim. È a profissão que escolhi, nunca tive crise quanto a isso”.
“Sim. Enquanto eu puder colocar meu exercício para intervir nas questões sociais,
buscando formas e alternativas para garantir direitos, se puder estar realizando isso,
sim estou satisfeita com a profissão.
126
“Não estou satisfeita com Assistente social, o salário é baixo, não compensa se
comparado ao que a gente desempenha no meu caso, todas as formações que fiz
na psicanálise e na terapia sistêmica. É uma insatisfação muito grande”.
“A minha cota de Assistente Social terminou, isso não faz com que eu atenda mal, se
pudesse optaria por me aposentar hoje e trabalhar em outra área, mas terei perda
salarial. Já deu o que tinha que dar, são 25 anos de prática”.
“Atualmente, eu gostaria de mudar de área, estou desestimulada, até pela condição
que nós servidores civis nos encontramos, você está no final de carreira. Eu não vou
a lugar nenhum mais, há 10 anos em final de carreira. Não existe estímulo no
cotidiano”.
“Sim e não. Se eu pensar no campo profissional diria que sim, conquistei aqui no
hospital uma imagem muito positiva do Serviço Social, me sinto realizada,
principalmente no contato com os usuários. Mas se eu pensar no pessoal, diria que
não estou satisfeita. Fico esgotada, você depende de tudo, da resposta do outro setor
para dar andamento a sua requisição. Saio daqui sem querer fazer mais nada, esse
hospital suga a gente, eu tenho casa, marido e filho, acabo por não ter paciência pra
eles, financeiramente não preciso trabalhar.
“Sim e às vezes não, depende. o sei explicar muito bem, gosto do eu faço, mas a
burocracia daqui me irrita profundamente”.
As indicações nos possibilitam refletir que, as profissionais que responderam
positivamente partem de sua experiência pessoal vinculando-a de forma implícita a
questão da autonomia profissional. Essa autonomia pode ser percebida quando a
profissional relata, de forma satisfatória que, no interior das unidades de saúde,
direciona suas ações a partir das demandas que ele considera suas. As que se
expressaram tanto positiva como negativamente: o positivo é colocado na
experiência pessoal, e o negativo na racionalidade burocrática.
Cabe enfatizar, que a questão da autonomia profissional está expressa no
Código de Ética Profissional do Assistente Social no Capítulo II Das relações com
as Instituições Empregadoras, conforme sinaliza o Artigo 7º, em alguns de seus
incisos. Vejamos:
a) dispor de condições de trabalho condignas seja em entidade pública
ou privada, de forma a garantir a qualidade do exercício profissional;
b) ter livre acesso à população usuária;
c) ter acesso as informações institucionais que se relacionem aos
programas e políticas sociais , e sejam necessárias ao pleno exercício das
atribuições profissionais;
d) integrar comissões interdisciplinares de ética nos locais de trabalho
do profissional, tanto no que se refere à avaliação da conduta profissional,
como em relação às decisões quanto às políticas institucionais.
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Assistentes Sociais SSA/RJ
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satisfeita com a
profissão/ tem outro
vínculo empregatício
satisfeita com a
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outro vínculo
empregatício
insatisfeita com a
profissão/ tem outro
vínculo empregatício
insatisfeita com a
profissão/ não tem
outro vínculo
empregatício
Fonte: HORTA, G.M. No Meio da Travessia. A prática das assistentes sociais nos serviços
de saúde da Aeronáutica/RJ, 2009.
Ao cruzarmos os dados do gráfico 11 com o gráfico 12, podemos observar
que 40% das profissionais estão satisfeitas com a profissão e não possui outro
vínculo empregatício. Por vezes, durante a entrevista
107
, a maioria das as assistentes
sociais consideraram que o Serviço Social na Aeronáutica, possui uma boa e
adequada infra-estrutura para o desenvolvimento das atividades, dispondo de
recursos e materiais (computadores com acesso a rede internet; aparelhos de fax;
materiais de escritório; telefones para ligações externas; materiais diversos de
escritórios, móveis adequados), bem como um espaço físico que propicia o
atendimento sigiloso aos usuários.
Iamamoto (1998, p. 94), ao falar em prática profissional, considera que ela
não deve ser considerada isoladamente, mas em seus condicionantes sejam eles
internos os que dependem do desempenho do profissional ou externos
determinados pelas circunstancias sociais nas quais se realiza a prática do
assistente social. Os primeiros são geralmente referidos as competências do
assistente social (acionar estratégias e técnicas); capacidade de leitura da realidade
conjuntural, a habilidade no trato das relações humanas, a convivência numa equipe
interprofissional. Os segundos condicionantes abrangem um conjunto de fatores que
não dependem exclusivamente do sujeito profissional, desde as relações de poder
institucional, os recursos colocados à disposição para o trabalho pela instituição; as
107 Vide ANEXO 2, Roteiro de Observação.
128
políticas sociais específicas, a realidade social da população usuária dos serviços.
Em síntese, para a autora, a prática profissional é vista como a atividade do
assistente social na relação com o usuário, os empregadores e os demais
profissionais.
Destacamos que das (10) dez assistentes sociais entrevistadas, uma
profissional vincula sua negativa à questão do não reconhecimento por parte da
instituição quanto ao seu aprimoramento profissional dada a sua formação
especializada na abordagem clínica e na prática terapêutica, autodenominada
pelos seus executores como Serviço Social Clínico
108
. O que sinaliza, a priori, que
essa questão parte somente desta profissional. Contudo, ao falar sobre os projetos
desenvolvidos pelo Serviço Social, a profissional informa participar do Projeto de
atendimento em terapia de casal e de família.
Sobre essa questão, cabem algumas reflexões. O envolvimento de um
pequeno segmento de assistentes sociais no campo das terapias, inscritas na zona
limítrofe entre o Serviço Social e a Psicologia - que vêm se dedicando à terapia
familiar, terapia organizacional, ao psicodrama, à bioernegética, e mesmo à
psicalise -, insistem no reconhecimento do campo terapêutico enquanto ampliação
do espaço ocupacional do assistente social. Como assevera Iamamoto
109
―(...) Qualificado como Serviço Social Clínico, é anunciado como re-
significação do Serviço Social de Casos, apoiado numa ―vio holística do
ser humano‖, que possibilita adquirir novos instrumentos que permitem
compreender e atuar com grupos de famílias, considerando que essa
atuação beneficiará os indivíduos (...) Essa esteira semelhante tem-se a
‗Socioterapia‘, apresentada por parte de seus divulgadores como uma ‗nova
perspectiva para o Serviço Social (...) antiga proposta, que ressurge hoje
com uma nova maquiagem, do velho Serviço Social dos anos 1970,
derrotado e superado nas décadas de 1980 e 1990, pelo movimento de
renovação crítica do Serviço Social latino-americano, o qual se encontra na
base do projeto ético-político atual da profissão (...)o que supõe minar o
projeto profissional nas suas bases teóricas, éticas e políticas, por parte de
um movimento contra-hegemônico que hoje marca presença na categoria
profissional‖ (pp.43-44).
108 Esta proposição é decorrente de um movimento composto de um grupo de assistentes sociais com formação
especializada em diversas abordagens clínicas: holísitca, bioenergética, psicodrama, terapia familiar sistêmica,
transpessoal. É um grupo heterogêneo que reivindica das entidades da categoria e unidades de ensino, o
reconhecimento do caráter clínico ou terapêutico do exercício profissional. Cf. Parametros para a atuação de
Assistentes Sociais na Saúde (versão preliminar), Brasília, março de 2009. Disponível em http://www.cfess.org.br
Acesso em 20/06/2009.
109 A autora apresenta artigo, no qual realiza uma abordagem sobre Projeto Profissional, Espaços Ocupacionais
e Trabalho do Assistente Social na Atualidade na publicação “Atribuições Privativas do (a) Assistente Social - Em
Questão, COFI/CFESS, 2002, pp.13-46.
129
Cabe enfatizar que, em Parecer JURÍDICO N.º 16/ 08 o CFESS considera
que as Práticas Terapêuticas ou o Serviço Social Clínico, não estão situados no
objeto da profissão, sendo conseqüentemente, matérias estranhas a profissão de
Serviço Social.
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Assistentes Sociais SSA/RJ
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Fonte: HORTA, G.M. No Meio da Travessia. A prática das assistentes sociais nos serviços de
saúde da Aeronáutica/RJ, 2009.
Outro dado relevante a ser considerado é a atual inexistência de campos de
estágio de Serviço Social nas instituições pesquisadas. As profissionais argumentam
estarem assoberbados e sem tempo disponível para prestar supervisão. Frente a
essa questão, fomos saber se as assistentes sociais consideram ser necessária uma
formação específica para prestar supervisão em Serviço Social.
Os dados mostram que grande parte das profissionais entrevistadas (80%)
considera que é necessária uma preparação específica para supervisionar; outro
grupo de 20% considera o ser necessário. Vejamos como as profissionais se
expressaram:
“Tem que ter uma atualização, é muito complexo prestar supervisão”.
“Tem que estar qualificado se aprimorando”.
“(...) Acho muito positiva a troca com o estagiário, mais aconteceu de não saber o
que discutir com ele, por isso acho necessário se preparar melhor”.
“(...) Precisa de uma metodologia específica, não é tão simples assim”.
“(...) Aqui é muito complicado ter estagiário, a demanda é muito grande e ainda você
tem que ter tempo para tomar conta de estagiário, às vezes fazer tudo de novo, pois
130
eles fazem errado e você tem explicar e esmiuçar tudo. Acho que deveria ter um
assistente social que goste de supervisionar e ficar só por conta disso”.
“Acho que não. Lógico que demanda mais atenção, tempo, paciência e
disponibilidade, mas se você é assistente social o aluno é do Serviço Social, como
você não vai saber supervisionar? È inerente, não é?
“Não, não precisa de nenhuma preparação especial, talvez atualização. Acho que
você não deve se intimidar tem estagiário que gosta de te colocar na parede. Eles
estão mais fresquinhos da teoria, mas sou eu que tenho a prática”.
Destacamos que as profissionais não mencionam sobre o significativo papel
do estágio no processo de formação profissional que representa essencialmente ao
aluno uma possibilidade de aproximação da realidade cotidiana da instituição e dos
indivíduos sociais e a investigação mediada por conhecimentos teórico-
metodológicos que orientam o exercício profissional do assistente social. As
assistentes sociais entrevistadas não vislumbram a possibilidade de uma profícua
articulação entre instituição - unidade de ensino, através do estágio supervisionado.
A supervisão de estágio em Serviço Social é uma das atribuições do
profissional assistente social (Código de Ética) . Exige, portanto, profissionais cada
vez mais comprometidos com a contínua indagação da realidade, desenvolvendo
um senso crítico.
O grupo de assistentes sociais alega vivenciar entraves burocráticos e
administrativos decorrentes do processo em firmar convênio com as unidades de
ensino, devido a falta de incentivo das próprias instituições em que atuam,
inviabilizando uma proposta de política de estágio. Expliquemos melhor: as
instituições de saúde da Aeronáutica através de convênio com as Unidades de
Ensino oferecem vagas para estágio obrigatório, porém, o estágio não é
remunerado, não disponibiliza alimentação ou transporte. No entanto, observa-se
que, apesar das dificuldades apresentadas pelas instituições de saúde, outras áreas
profissionais (a exemplo da Psicologia, Nutrição, Fisioterapia, Odontologia,
Enfermagem e Medicina) possuem estagiários em atuação.
Não desconsideramos que uma tendência de identificar o estagiário como
o profissional da instituição - campo de estágio, ficando assim responsável pela
condução de atividades que nem sempre são condizentes com a sua condição de
aluno. Ou, em algumas realidades, considerar o estagiário como mão-de-obra
barata, fazendo parte do quadro funcional da instituição e, portanto, sendo
subordinado às suas exigências.
131
Porém, no Art.4 do Código de Ética dos Assistentes Sociais é vedado:
(...) permitir ou exercer a supervisão de aluno de Serviço Social em
Instituições Públicas ou Privadas que não tenham em seu quadro
assistente social que realize acompanhamento direto ao aluno estagiário.
Entendemos, portanto, que a abertura de campos de estágios em Serviço
Social, deverá considerar: a existência de um assistente social responsável no
campo; e a existência de um plano de trabalho do Serviço Social na instituição; e a
qualidade do trabalho desenvolvido.
A participação na formação profissional através da criação de campo de
estágio e a supervisão de estagiários permitem um enriquecimento profissional
através da troca de saberes entre discentes e supervisores, além de possibilitar uma
articulação com as unidades de formão acadêmica, fundamental para o
desenvolvimento destas atividades.
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Assistentes Sociais
Serviços de Saúde da Aeronáutica/RJ
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Fonte: HORTA, G.M. No Meio da Travessia. A prática das assistentes sociais nos serviços de
saúde da Aeronáutica/RJ, 2009.
Ao serem perguntados se conhecem o Código de Ética de 93, podemos
perceber (Gráfico 15), que metade das assistentes sociais possui, conhece e
manuseia, ainda que eventualmente, o Código de Ética Profissional. Há que se
considerar que a outra metade das assistentes sociais, desconhece ou não tem o
Código como referência.
132
Ora, considera-se que as atribuições e competências dos(as) assistentes
sociais, sejam aquelas realizadas na saúde na Aeronáutica ou em outro espaço
sócio-ocupacional, são orientadas e norteadas por diretos e deveres constantes no
Código de Ética Profissional e na Lei de Regulamentação da Profissão e que
requisitam do(a) profissional algumas competências gerais que são fundamentais à
compreensão do contexto sócio-histórico em que se situa sua intervenção, a saber:
Apreensão crítica dos processos sociais de produção e reprodução das
relações sociais numa perspectiva de totalidade;
Análise do movimento histórico da sociedade brasileira, apreendendo as
particularidades do desenvolvimento do capitalismo no país e as particularidades
regionais;
Compreensão do significado social da profissão e de seu desenvolvimento
cio-histórico, nos cenários internacional e nacional, desvelando as possibilidades
de ação contidas na realidade;
Identificação das demandas presentes na sociedade, visando a formular
respostas profissionais para o enfrentamento da questão social, considerando as
novas articulações entre o público e o privado (ABEPSS, 1996).
São essas competências que permitem ao profissional realizar a análise
crítica da realidade, para, a partir daí, estruturar seu trabalho e estabelecer as
competências e atribuições específicas necessárias ao enfrentamento das situações
e demandas sociais que se apresentam em seu cotidiano. (CFESS, 2009).
Ademais, duas preocupações nortearam a análise e a produção do Código de
Ética de 1993, a saber: torná-lo um instrumento efetivo no processo de
amadurecimento político da categoria, bem como um aliado na mobilização e
qualificação dos assistentes sociais diante dos enormes desafios e demandas da
sociedade brasileira, ou seja, urgia transformá-lo num mecanismo efetivo de defesa
da qualidade dos serviços prestados pelos assistentes sociais e constituí-lo como
um instrumento eficaz de defesa do exercício profissional, fornecendo respaldo
jurídico à profissão. Com atesta Barroco (2004, p.34):
(...) a ética não se esgota na afirmação do compromisso ético-profissional. É
preciso que o compromisso seja mediado por estratégias concretas,
articulando à competência teórico/técnica e à capacidade de objetivá-las
praticamente por meio dos direitos sociais.
133
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Assistentes Sociais SSA/RJ
36%
36%
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7%
7%
sigilo
profissional
democratizar
informões
não discriminar
Não sabe
responder
respeito a
dignidade
Fonte: HORTA, G.M. No Meio da Travessia. A prática das assistentes sociais nos serviços de
saúde da Aeronáutica/RJ, 2009.
Com relação às recomendações do Código de Ética de 93 que os
entrevistados atribuem maior importância na relação do assistente social com os
usuários, 36% assinalam a questão do sigilo profissional, 36% destacam a
democratização de informações, 14% pontua a não discriminação e 7% destacam o
respeito à dignidade, somente 7% não soube responder (Gráfico15).
Destaca-se que, no momento da entrevista, nenhum profissional consultou o
Código de Ética ao apontar as recomendações, apesar de algumas interpretações
confusas no tocante aos direitos e deveres profissionais. Dois assistentes sociais, ao
justificarem sua opção, apresentam um descompasso com aquelas constantes no
Código em vigor. Vejamos os depoimentos:
“(...) A questão da Ética e do sigilo, basicamente isso, estar bem consigo para atende
bem o outro”.
Procuro respeitar a dignidade da pessoa humana, defendendo seus direitos”.
“Procuro democratizar as informações junto aos usuários e seus familiares tendo em
vista o acesso aos serviços de saúde”.
“Acho que é importantíssimo democratizar as informações que tenho acesso para os
usuários, procuro estimular a participação deles nos programas da instituição, do
bairro que moram, das políticas voltadas para os idosos”.
“Indico a não discriminação; às vezes nos centramos somente na questão do sigilo, e
esquecemos-nos de não discriminar. Às vezes atendo usuários que trazem á questão
do HIV, da homossexualidade. A questão do sigilo está lá, mas tem profissional que
discrimina evita falar com aquele usuário, diz que está ocupado, ou atende rápido.
ouvi profissional dizer que „fulano‟ está infectado porque é „sem vergonha‟”.
134
“Democratizar as informações e o acesso aos programas com a devolução de
informações obtidas em pesquisa junto ao usuário.
É interessante observarmos que, apesar de 50% dos assistentes sociais
informarem desconhecer ou não manusear o Código de Ética (gráfico 16), apenas
7% das entrevistadas (gráfico 17), não soube responder sobre as recomendações
do Código na relação com os usuários. Ora, será que a prática das assistentes
sociais se objetiva em ações espontâneas e instintivas, partindo da experiência
pessoal do profissional, sem referências teórico-metodológicas?
Destaca-se que 36% das assistentes sociais (gráfico 17) assinalam a questão
do sigilo profissional como uma das recomendações do Código que julgam
importantes. No Código, o sigilo profissional é uma questão que está para além do
dever profissional, pois, é considerado um direito no sentido de proteger o usuário
de tudo aquilo que o profissional tenha conhecimento, que poderá ser quebrado
quando trouxer prejuízo aos usuários ou à coletividade.
Quanto à democratização de informação, 36% das entrevistadas (gráfico 17)
afirmam sua importância. No entanto, o Código de Ética considera como dever do
assistente social democratizar as informações e o acesso aos programas
disponíveis no espaço institucional, como um dos mecanismos indispensáveis à
participação dos usuários. A socialização da informação é determinante numa
prática que priorize as demandas da população usuária. E socializar a informação
implica uma competência teórica, política, ética e técnico operativa.
Uma importante contribuição é dada por Vasconcelos (1997) para pensarmos
sobre prática reflexiva. A autora informa que uma prática é reflexiva quando esta
envolve dois sujeitos sociais usuário/profissional -, e que contribui na politização
das demandas apresentadas ao Serviço Social, ao socializar informações
necessárias e fundamentais quando da viabilização dessas demandas, na busca da
superação da práxis cotidiana, a partir de sua análise, desvendamento, explicação,
interpretação, fortalecendo os envolvidos no processo enquanto sujeitos políticos
coletivos.
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3.3.2 Referências de conhecimento
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MARILDA IAMAMOTO
LUDMILA CAVALCANTI
JOSE PAULO NETTO
ILMA REZENDE
ANITA LIBERA NERY
MARIA DO CARMO CARVALHO
SPOSATI
YOLANDA GUERRA
ANA VASCONCELOS
ELAINE BHERING
ANA ELIZABETH MOTA
MARIA CIA BARROCO
ANDRE DARTIGUES
MARIA DO CARMO BRANT
MARIA INES BRAVO
Fonte: HORTA, G.M. No Meio da Travessia. A prática das assistentes sociais nos serviços de saúde
da Aeronáutica/RJ, 2009.
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Assistentes Sociais SSA/RJ
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MARILDA IAMAMOTO
LUDMILA CAVALCANTI
JOSE PAULO NETTO
ILMA REZENDE
ANITA LIBERA NERY
MARIA DO CARMO
SPOSATI
YOLANDA GUERRA
ANA VASCONCELOS
ELAINE BHERING
ANA ELIZABETH MOTA
MARIA CIA
ANDRE DARTIGUES
MARIA DO CARMO
MARIA INES BRAVO
Fonte: HORTA, G.M. No Meio da Travessia. A prática das assistentes sociais nos serviços
de saúde da Aeronáutica/RJ, 2009.
O estudo buscou identificar quais são os autores de referência para a prática
das assistentes sociais entrevistadas. Podemos observar que 91% dos profissionais
têm como referência autores progressistas
110
do Serviço Social, 3% tem como
110 Pautamos-nos na assertiva de Vasconcelos (2002), que considera Autores Progressistas, aqueles que
buscam uma ―ruptura com o histórico conservadorismo do Serviço Social‖. Como afirma Netto, essa ruptura não
significa como estamos vendo, superação do conservadorismo/reacionarismo no interior da categoria
profissional, mas que ―posicionamentos ideológicos e políticos de natureza crítica e/ou contestadora em face da
136
referência autor de outra área do saber e apenas 3% indica o autor André Dartigues
que propõe a discussão da fenomenologia na contemporaneidade. O interessante é
que esse autor foi citado como referência por um profissional formado no ano de
1996 em unidade de ensino pública.
Contudo, os dados indicam que a maioria dos assistentes sociais busca um
aprofundamento do debate a respeito da questão social, da prática profissional e de
uma leitura crítica da realidade social. Por vezes, durante a entrevista, alguns
profissionais mostram preocupação com o como fazer e
de forma implícita
demonstram buscar autores que apresentem a famosa “receita do bolo” da prática
profissional. Outros sinalizam buscarem autores dos quais tiveram contato na
graduação. Vejamos os depoimentos:
“Gosto de autores que são objetivos e discutem a prática, para que eu possa
realmente ter uma base”.
“Atualmente procuro autores que trazem a discussão de estudo social, laudo e
parecer social”.
“(...) No momento, não tenho nenhuma referência, já tive (...) Iamamoto.
“Tenho gostado muito de ler o André Dartigues, ele discute fenomenologia, acho que
é uma leitura de fácil compreensão, mas quando penso em referência, Marilda (...) a
faculdade tende a rotular o aluno, tem que ler esse ou aquele autor (...) tenho a
Marilda como norte”.
Destaca-se que das profissionais entrevistadas 14% tem como referência de
conhecimento Marilda Iamamoto, 11% tem como referência José Paulo Netto e 9%
Maria Inês Souza Bravo (gráfico 18 e 19).
Vasconcelos (2002, p. 36), a partir da leitura e apropriação da produção
teórica disponível, prioriza as contribuições de Iamamoto e de Netto como principais
referências teóricas, considerando estes, dentre os autores de Serviço Social, os
que desde o início de suas produções, tomaram a teoria social de Marx como
referência, sem se afastarem dos seus aspectos fundantes: a teoria valor trabalho, o
materialismo histórico e dialético e a perspectiva da revolução. Na saúde, a autora
recorre a Bravo como a única produção de peso do Serviço Social.
O que não significa, necessariamente, que as profissionais entrevistadas ao
afirmarem ter como referência autores progressistas do Serviço Social, assumem um
compromisso ético-político proposto pela direção estratégica da profissão.
ordem burguesa conquistaram legitimidade para se expressarem abertamente‖ com democratização das
relações no interior da categoria e legitimação do direito à diferença ideo-política (Netto, 1996, p.111).
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70%
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Fonte: HORTA, G.M. No Meio da Travessia. A prática das assistentes sociais nos serviços de
saúde da Aeronáutica/RJ, 2009.
A pesquisa buscou saber ainda, se os profissionais consideram a Constituição
Federal de 1988, importante para a prática do assistente social. A maioria, 70% dos
entrevistados assinala a importância da Constituição para a prática do assistente
social enquanto um instrumento legal, marco na conquistas de direitos e destaca a
adoção da assistência social como política pública. Apenas 30% não a consideram
importante ou não souberam responder. Seguem os depoimentos:
“Considero a Constituição de 88 um marco dos direitos”.
“Sim. trabalhamos com a viabilidade de direitos, a Constituição é a lei fundamental do
país”.
“Penso que sim. Consagrou o direito a ter direitos.
“Com certeza. Elevou a política de assistência social ao patamar de política pública”.
“Sim. (...) na época da aprovação da Constituição, foi um movimento de muita força
no país, trouxe muitas mudanças importantes, mais que nem sempre são respeitadas
(...) para o assistente social que trabalha com os usuários, trabalhadores, sem acesso
a determinados direitos, é fundamental.
“Sim. Junto com a saúde e a previdência social a assistência social, com a
Constituição de 88 passou a compor o tripé da seguridade social. Não é caridade é
política pública”.
“Tem sua importância sim. Garantiu uma série de direitos, embora alguns o sejam
respeitados, mais é um instrumento de defesa dos cidadãos”.
“Não me lembro de nada da constituição. Sinceramente, a resposta é não me recordo
e não sei responder”.
“Eu acho que muito pouco.
“Não sei responder sobre isso”.
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70%
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Como direito - Constituição de 1988 OrganizaçãoMundial de Saúde
Fonte: HORTA, G.M. No Meio da Travessia. A prática das assistentes sociais nos serviços de
saúde da Aeronáutica/RJ, 2009.
No que se refere à concepção de saúde, identificamos que 70% expressa à
saúde como um direito e dever do Estado, resultante da qualidade e condição de
vida e de trabalho dos cidadãos, conforme postula a Constituição de 1988, enquanto
30% assumem de forma explícita e confusa a concepção da Organização Mundial
de Saúde/OMS. Observemos como se expressam:
“Não somente a ausência de doença, mais também a condição em que o cidadão
vive”.
“Promoção da saúde”.
“Saúde é tudo, são vários fatores, um conceito ampliado, não é simplesmente
ausência de doença, é o mental, o físico, o social, o afetivo, o emocional”.
É tudo. o ter doença, ter qualidade de vida, de moradia, saneamento básico,
segurança”.
É qualidade de vida, de trabalho, de habitação”.
“Um conceito ampliado, conforme firmado na Conferência de Saúde de 86, não
centrado no conceito biológico (...) ênfase não no biológico mais nas condições
sociais em que o indivíduo vive os aspectos demográficos”.
“(...) União do bem-estar físico e mental.
“É o bem-estar físico, o estar bem em todos os sentidos”.
É o desenvolvimento do bem-estar físico e mental, não só não estar doente”.
Durante a entrevista, observamos que as assistentes sociais apresentam uma
análise e discussão muito incipiente sobre a política pública de saúde, sobre o SUS
e o movimento sanitário. As profissionais, quase na totalidade, se detêm em
139
questões de saúde referentes ao sistema de saúde da Aeronáutica, assim como as
necessidades de saúde identificadas no cotidiano da população usuária, sem uma
maior articulação com as questões mais gerais que envolvem a discussão da saúde
no Brasil.
A questão não é somente a falta de conhecimento mais substancial quanto ao
texto constitucional referente ao SUS ou ao processo histórico do movimento
sanitário, mas, sobretudo, a ausência de mediação, de debate, de reservas críticas.
A adoção da saúde como direito de cidadania e dever do Estado opera um
deslocamento teórico conceitual do tema saúde do campo biológico para o campo
político e histórico da construção dos direitos sociais. O assistente social, em sua
prática profissional, cabe facilitar o acesso da população às informações e ações
educativas para que a saúde possa ser percebida como produto das condições
gerais de vida e da dinâmica das relações sociais, econômicas e políticas do país
(CFESS, 1999).
Portanto, a atuação do assistente social na área da saúde pressupõe o
domínio da discussão no campo das políticas públicas, particularmente do SUS, e
de como o acesso a este sistema é garantido aos cidadãos. Isso implica um
conjunto de saberes que envolvem o processo saúde-doença, a trajetória da política
de saúde brasileira, a reforma sanitária e as mudanças advindas da Constituição
Federal de 1988.
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Fonte: HORTA, G.M. No Meio da Travessia. A prática das assistentes sociais nos serviços de
saúde da Aeronáutica/RJ, 2009.
140
Quando perguntadas sobre a viabilidade do Projeto Ético-Político do Serviço
Social no âmbito militar, 70% das assistentes sociais responderam positivamente,
10% de forma negativa e 20% informam desconhecer os princípios do projeto.
Do grupo que respondeu de forma positiva (70%), na justificativa se dividem
em dois grupos: metade das assistentes sociais entrevistadas apresenta, em seu
discurso, uma orientação ético-política em consonância com o projeto da categoria.
A outra metade do grupo, apesar de concordar na viabilidade do projeto, aponta
limitações para a materialidade deste.
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referência
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limitação
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referência
Fonte: HORTA, G.M. No Meio da Travessia. A prática das assistentes sociais nos
serviços de saúde da Aeronáutica/RJ, 2009.
Ao cruzarmos dos dados dos gráficos 17 e 21, podemos observar (gráfico 22)
que 40% das assistentes sociais afirmam conhecer o Código e postulam a
viabilidade do projeto ético-político do Serviço Social, porém, com limitações; 30%
das profissionais declaram não conhecer o Código, contudo, afirmam que o projeto é
referência para a prática profissional; 20% informam não conhecer o Código e afirma
limitações para a viabilidade do projeto profissional, e somente 10% das assistentes
sociais declaram conhecer o código e afirmam que o projeto ético-político do Serviço
Social é viável no âmbito militar. Ou seja, as assistentes sociais m uma postura
comprometida em nível do discurso, mas não garantem essa perspectiva na prática
realizada.
As indicações nos levam a apreender uma contradição: nos limites da
pesquisa realizada, que a hegemonia do Projeto Ético-Político do Serviço Social não
141
se expressa nos serviços de saúde da Aeronáutica, apesar do alto percentual (70%)
de profissionais sinalizarem a viabilidade do projeto ético-político do Serviço Social.
Ora, o compromisso ético-político da profissão ultrapassa os marcos
normativos do Código de Ética Profissional, pois, apresenta um projeto de profissão
e de sociedade. Isto é, além das normas, elege valores e princípios a serem
defendidos pelos profissionais na sua prática cotidiana. Ao definir-se como um
projeto que implica em meios e instrumentos para sua realização , o Código de
Ética, em vigor, está para além das funções tradicionais de um Código de Ética
profissional, pois estabelece valores e princípios que ultrapassam as normas
geralmente impostas para o exercício profissional propriamente dito.
Portanto, a efetivação dos princípios e valores postos no Código de Ética na
prática profissional dos assistentes sociais implica em assumir uma nova postura
profissional; que requer dos profissionais a capacidade de compreender e decifrar a
realidade social em sua complexidade e totalidade, ou seja, requer um profissional
que detenha
(...) o conhecimento das totalidades mais ou menos complexas nos seus
múltiplos aspectos e determinações: sua estrutura e determinantes
históricos e primordialmente seu movimento: o movimento conjuntural, na
imbricação das relações entre realidade nacional e regional e local
possibilitando, assim, estabelecer as mediações necessárias para o
desvendamento das particularidades e singularidades da realidade dos
sujeitos que demandam ou são atingidos pelas ações profissionais e,
principalmente, do cotidiano que os envolve. (Vasconcelos, 2002:124).
Observamos que uma minoria das assistentes sociais entrevistadas
evidenciou uma perspectiva mais crítica quanto à sua intervenção profissional e
quanto à realidade da instituição militar, estando mais próximos do projeto
profissional hegemônico da categoria. É o que podemos observar através dos
seguintes depoimentos:
(...) Não tem como desvincular o Projeto Ético Político da prática na Aeronáutica, ele
que direção a nossa prática profissional (...) não tem gica existir um projeto
profissional diferenciado para a área militar”.
“(...) Dificulta, pois temos Assistentes Sociais com muito potencial, mas as antigas
Assistentes Sociais do QFO não têm a mesma discussão. Na verdade, a FAB não
tem esse profissional que efetivamente articula os princípios éticos do PEP no
cotidiano profissional”.
142
Outra preocupação que se coloca é a necessidade de sujeitos históricos
individuais e coletivos não caírem no possibilismo, flexibilizando os princípios
defendidos no projeto ético - político profissional e na proposta de Reforma
Sanitária, questões que estão postas na saúde, nos movimentos sociais e têm
repercutido no Serviço Social. (CFESS, 2009).
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Assistentes Sociais dos Serviços de Saúde da Aeronáutica/RJ
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Fonte: HORTA, G.M. No Meio da Travessia. A prática das assistentes sociais nos serviços de saúde da
Aeronáutica/RJ, 2009.
NPA* - Norma Padrão de Ação
ICA ** - Instrução Reguladora das Ações
No que se referem aos aparatos legais que utilizam na prática cotidiana,
observamos que todas as entrevistadas afirmam terem como aparato o Estatuto do
Idoso. Das assistentes sociais entrevistadas, uma utiliza a Legislação Militar como
aparato legal; 04(quatro) assistentes sociais apontam a NPA e a ICA (assistência
social e a da saúde); uma profissional inclui como aparato a Política da Pessoa
Portadora de Deficiência; e 06 (seis) assistentes sociais indicam o Código de Ética
como aparato legal para o desenvolvimento das ações profissionais cotidianas.
Quanto à documentação utilizada para registro da prática das assistentes
sociais, foi observado que as profissionais utilizam no ambulatório: ficha de triagem;
folha de evolução, que e anexada ao prontuário, quando o paciente retorna ao
Serviço Social; folha de encaminhamento; relatório; livro de ocorrência, no qual um
assistente social deixa relato do seu dia de trabalho para que o outro profissional
tenha conhecimento dos atendimentos realizados e dar os encaminhamentos
necessários e livro de recursos institucionais e extra-institucionais.
Estatuto do Idoso
Código de Ética
Assitente Social
Política da pessoa
Portadora de
deficiência
Legislação Militar
NPA *
ICA **
Entrevistado 1
SIM
NÃO
NÃO
NÃO
NÃO
NÃO
Entrevistado 2
SIM
SIM
NÃO
NÃO
SIM
SIM
Entrevistado 3
SIM
SIM
NÃO
NÃO
SIM
SIM
Entrevistado 4
SIM
SIM
NÃO
NÃO
NÃO
NÃO
Entrevistado 5
SIM
NÃO
SIM
NÃO
NÃO
NÃO
Entrevistado 6
SIM
NÃO
NÃO
NÃO
NÃO
NÃO
Entrevistado 7
SIM
SIM
NÃO
NÃO
NÃO
NÃO
Entrevistado 8
SIM
SIM
NÃO
NÃO
NÃO
NÃO
Entrevistado 9
SIM
NÃO
NÃO
SIM
SIM
SIM
Entrevistado 10
SIM
SIM
NÃO
NÃO
SIM
SIM
10
6
1
1
4
4
143
No tocante aos instrumentos profissionais utilizados pelas assistentes sociais
podemos dizer que a entrevista é um dos instrumentos mais utilizados.
Segundo as profissionais é utilizada nos atendimentos aos usuários que participam
de Programas no interior da unidade, no plantão
111
e nas visitas domiciliares. Tem
como objetivo dialogar com os usuários sobre a situação apresentada e obter dele
informações que auxiliem na compreensão desta.
A visita domiciliar é a realização da entrevista na residência do usuário e tem
como objetivo conhecer a realidade deste, as condições (residência, bairro) em que
este vive e apreender aspectos do cotidiano das suas relações e do contexto familiar
não percebido nos atendimentos do plantão. De acordo com as assistentes sociais a
visita domiciliar é um instrumento comumente utilizado no atendimento ao público
idoso e aos usuários do Programa de Serviço de Atendimento Domiciliar (SAD)
112
.
Cabe ressaltarmos que o instrumento da visita domiciliar não é de emprego
exclusivo do assistente social, contudo, é um dos instrumentos relevantes e
necessário a ser utilizado pelos assistentes sociais a favor dos sujeitos, na
perspectiva da garantia de seus direitos
As reuniões em grupo são geralmente realizadas pelas assistentes sociais
que integram as equipes multidisciplinares no interior das unidades de saúde e tem
como objetivo atender aos usuários dos Programas da instituição.
Destaca-se que as assistentes sociais entrevistadas mencionaram que o
Serviço Social utiliza de forma incipiente os registros estatísticos dos atendimentos
realizados, pois, nem sempre estes, são efetuados na íntegra. O que sinaliza que as
111 Cabe informar que o plantão nas unidades de saúde da Aeronáutica/RJ se caracteriza por ser uma atividade
receptora, Vasconcelos (2002), de qualquer demanda da unidade/usuários; funciona na maioria das unidades em
local adequado (tamanho e localização) que possibilita o sigilo do atendimento. Geralmente, 01(uma) assistente
social utiliza a sala para atendimento aos usuários que procuram espontaneamente ou são encaminhados ao
Serviço Social sendo que, as assistentes sociais desenvolvem outras atividades rotineiras do Serviço Social,
portanto, as profissionais não ficam exclusivamente no plantão, aguardando serem procuradas; atendem aos
usuários conforme prioridade do setor. O trabalho com os pacientes internos e seus familiares é realizado no
quarto duplo ou nas enfermarias ao lado do leito do próprio usuário. Portanto, as atividades desenvolvidas pelo
Serviço Social nas enfermarias são as mesmas do plantão.
112 No Sistema de Saúde da Aeronáutica, a assistência domiciliar foi iniciada em 1999 com a criação do SAD-
HAAF, com objetivo de oferecer um peodo de transição entre a internação e a alta nos hospitais de
escalão(alta complexidade - HFAG e HCA), tornou-se de grande valia, segundo a DIRSA, no que diz respeito à
liberação de leitos para novas internações. Este serviço é regulamentado pela ordem técnica da DIRSA
005/DIRSA/2000 de 12 de dezembro de 2000. Atualmente, o SAD é um serviço implementado por todas as
Organizações de Saúde da Aeronáutica (OSA). É composto por uma equipe multidisciplinar (assistentes sociais,
médicos geriatras, fisioterapeutas e enfermeiros), atende aos usuários e dependentes do SISAU,
prioritariamente, ao idoso acamado e restrito ao leito e/ou pacientes com patologias estáveis, quase sempre
portadores de doenças crônicas, como doenças neurológicas degenerativas e músculo-esqueléticas. Tem como
objetivo minimizar as internações hospitalares e a exposição aos riscos infectológicos, propiciando o convívio do
acamado no contexto familiar.
144
profissionais não percebem a importância, para a prática profissional, do estudo da
demanda atendida.
Enfatiza-se que, a ausência de um registro qualificado das atividades
profissionais acarreta em uma imagem negativa da profissão de que esta não
desenvolve nenhum tipo de atividade, ficando sua ação como um trabalho perdido,
pois não existe registro, no Serviço Social, dos atendimentos realizados e atividades
implementadas.
Outros instrumentos profissionais mencionados por 03(três) assistentes
sociais (duas militares e uma civil) foram as palestras, a organização de eventos e
01(uma) relatou a pesquisa do perfil dos usuários.
Ante o exposto, ressalta-se que a utilização de instrumentais permite ao
assistente social atingir a finalidade da sua ação, possibilitando que as realidades
sejam desveladas e apreendidas adquirindo materialidade através das intervenções
profissionais.
A partir dos dados mencionados linhas acima, nos valemos da análise de
Braz (2004, p. 462) para pensarmos sobre a materialidade do projeto ético-político
do Serviço Social nos serviços de saúde da Aeronáutica. O autor ao discorrer sobre
o projeto ético-político do Serviço Social, nos esclarece que o este pode se
concretizar nas ações profissionais cotidianas dos assistentes sociais e, que
mecanismos políticos, instrumentos/documentos legais e referenciais teóricos
emprestam não legitimidade como também operacionalidade práticopolítica e
prático-normativa ao projeto.
Para o autor, os elementos constitutivos que emprestam materialidade ao
projeto podem ser observados sob três dimensões articuladas entre si, quais sejam:
a) a dimensão da produção de conhecimentos no interior do Serviço Social; b) a
dimensão político-organizativa da categoria; c) dimensão jurídico-política da
profissão. Vejamos cada uma delas.
a) Dimensão da produção de conhecimentos no interior do Serviço Social: É a esfera
de sistematização das modalidades práticas da profissão e os processos reflexivos
do fazer profissional. Esta dimensão investigativa da profissão tem como parâmetro
a afinidade com as tendências teórico-críticas do pensamento social. Dessa forma,
não cabem no projeto ético-político contemporâneo, posturas teóricas
conservadoras, presas que estão aos pressupostos filosóficos cujo horizonte é
a manutenção da ordem.
b) Dimensão político-organizativa da profissão: Aqui se assentam tanto os fóruns de
deliberação quanto as entidades representativas da profissão. O conjunto
145
CFESS/CRESS (Conselho Federal e Regionais de Serviço Social) a ABEPSS
(Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social) e as demais
associações político-profissionais, além do movimento estudantil representado pelo
conjunto de CA‘s e DA‘s (Centros e Diretórios Acadêmicos das escolas de Serviço
Social) e pela ENESSO (Executiva Nacional de Estudantes de Serviço Social). Assim,
subentende-se que o projeto ético-político (como uma projeção) pressupõe, em si
mesmo, um espaço democrático, aberto, em construção e em permanente
tensão e conflito. Esta constatação indica a coexistência de diferentes concepções
do pensamento crítico, ou seja, o pluralismo de idéias no seu interior.
c) Dimensão jurídico-política da profissão: Temos aqui o aparato jurídico-político e
institucional da profissão que envolve um conjunto de leis e resoluções,
documentos e textos políticos consagrados no seio profissional. nessa
dimensão duas esferas diferenciadas, porém articuladas, são elas: um aparato
político-jurídico de caráter estritamente profissional; e um aparato jurídico-
político de caráter mais abrangente. No primeiro caso, temos determinados
componentes construídos e legitimados pela categoria tais como: o atual Código
de Ética Profissional, a Lei de Regulamentação da Profissão (Lei 8662/93) e as
novas Diretrizes Curriculares recentemente aprovadas pelo MEC. No segundo,
temos o conjunto de leis advindas do capítulo da Ordem Social da Constituição
Federal de 1988 que, embora não exclusivo da categoria, foi fruto de lutas que
envolveram os assistentes sociais
113
e, por outro lado, faz parte do cotidiano
profissional de tal forma que pode funcionar como instrumento viabilizador de
direitos através das políticas sociais que executamos e/ou planejamos (grifos
nossos).
Braz (2004, p. 464) adverte que “neste conjunto de leis e resoluções atinentes
à profissão e ao seu projeto ético-político encontram-se realizados, direta ou
indiretamente, valores que contornam o projeto”.
Ora, sendo o profissional de serviço social, capaz de identificar a realidade
social, como determinada historicamente e, portanto, passível de transformações é
necessário que se tenha atenção para sua instrumentalidade. Para que o
profissional em sua práxis possa responder às demandas sociais advindas das
expressões da questão social, ele deve ser capacitado para identificá-las como um
processo sócio histórico, que é produzido e reproduzido socialmente. E no qual são
determinadas exigências que pressupõe ―(...) preparo cnico e intelectual e o
assistente social como aquele que vende a sua força de trabalho, e junto com ela
um conjunto de procedimentos de natureza instrumental socialmente reconhecido
(GUERRA, 2000, p. 23).
A partir dos dados apresentados pelas as assistentes sociais dos serviços de
saúde da Aeronáutica, percebemos que estas carecem de uma apropriação mais
acurada dos elementos constitutivos da prática do assistente social, onde a
113
O autor refere-se, especialmente, à construção da LOAS (Lei Orgânica da Assistência Social).
146
dimensão técnico/operativa deve ser pensada, a partir da categoria
instrumentalidade.
De acordo com Guerra (2000, p.29), instrumentalidade é a categoria reflexiva
capaz de apontar as diversas formas de inserção da profissão nos espaços
cio-ocupacionais e as competências e requisições profissionais, de modo
a demonstrar o concreto particularizado das formas de operar da profissão,
ou as ―mediações particularizadoras que conferem existência real(Lessa,
1995:119) à profissão em contextos e espaços cio-históricos
determinados.
3.3.3 Prática Profissional
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Assistentes Sociais SSA/RJ
40%
60%
sim
não
Fonte: HORTA, G.M. No Meio da Travessia. A prática das assistentes sociais nos serviços de
saúde da Aeronáutica/RJ, 2009.
O Gráfico mostra que 60% não têm projeto na instituição e somente 40%
declaram ter projeto escrito na instituição.
147
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Assistentes Sociais SSA/RJ
30%
20%
40%
10%
conhece código
de ética/ tem
projeto
conhece código
de ética/ não tem
projeto
desconhece
código de ética/
tem projeto
desconhece
código de ética/
não tem projeto
Fonte: HORTA, G.M. No Meio da Travessia. A prática das assistentes sociais nos
serviços de saúde da Aeronáutica/RJ, 2009.
Podemos observar que 40% das entrevistadas afirma desconhecer o Código
e ter projeto na instituição; 30% declara conhecer o Código e ter projeto; 20%
assinala conhecer o Código e não ter projeto e 10% das assistentes sociais declara
desconhecer o Código e não ter projeto por escrito na instituição (vide gráfico 24).
Destaca-se que das profissionais entrevistadas que declaram desconhecer o
Código de Ética profissional, 40% afirma ter projeto próprio na instituição em que
atua. Duas assistentes sociais declaram ter projeto por escrito na instituição (Grupo
de Discussão de Cuidadores Formais de Idosos); uma assistente social apresenta o
projeto (Encontro de Casais e Grupos de Vivência) e uma apresenta a proposta de
projeto a ser implementado (Educação Física para o Efetivo).
As assistentes sociais que expressaram desconhecer o Código apresentam
habilidade técnica no sentido de garantir o espaço ocupacional do Serviço Social na
instituição e uma preocupação em atender de forma qualificada os usuários no
acesso aos seus direitos, bem como em priorizar um atendimento de escuta e
acolhimento.
Entretanto, como já mencionado anteriormente, além das normas o Código de
Ética dos Assistentes Sociais elege valores e princípios a serem concretizados pelos
profissionais na sua prática cotidiana, o que implica em assumir uma nova postura
profissional que requer do assistente social a capacidade de compreender e decifrar
a realidade social em sua complexidade e totalidade.
148
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Assistentes Sociais SSA/RJ
70%
30%
sim
não
Fonte: HORTA, G.M. No Meio da Travessia. A prática das assistentes sociais nos serviços de
saúde da Aeronáutica/RJ, 2009.
Quando indagados sobre a existência de projetos do Serviço Social
desenvolvidos na Instituição, os dados mostram que 70% dos entrevistados
informam que o Serviço Social desenvolve projetos na instituição, contudo,
identificamos que as profissionais quantificam os projetos desenvolvidos pelo
Serviço Social e os Programas desenvolvidos no interior das unidades em que o
Serviço Social participa como uma questão única. Vejamos os projetos
desenvolvidos pelo Serviço Social nos 03(três) hospitais pesquisados:
Projeto de Orientação a Gestantes
Projeto de Orientação sobre Planejamento Familiar
Projeto de Convivência com os Idosos
Projeto com Cuidadores Formais de Idosos
Projeto de Orçamento Doméstico
O Serviço Social tem participação em Programas e ações desenvolvidas no
interior das 03 (três) unidades de saúde, são elas:
Programa de Assistência Domiciliar SAD
Programa de Atendimento ao Paciente Diabético
Programa de Cirurgia Bariátrica
114
Programa de Apoio ao Paciente HIV/AIDS
114 A Cirurgia Bariátrica, também chamada de Gastroplastia ou ainda de Cirurgia de redução do estomago, é
uma cirurgia indicada para pessoas com sobrepeso, os chamados obesos mórbidos.
149
Unidade de Geriatria e Gerontologia UGG
Núcleo de Geriatria e Gerontologia NUGG
Destaca-se que os objetivos dos Programas, ainda que destaquem o
diagnóstico precoce, relacionam atividades que, a partir de demandas restritas ao
interior das unidades de saúde, resume-se ao trabalho com a doença instalada.
Dentre as ações mais comuns das assistentes sociais são:
- realizar entrevistas, tendo como objetivo aprofundar as questões suscitadas nos grupos
pertinentes à situação social e de saúde apresentadas pelo usuário;
- informações relativas à rotina institucional dos programas;
- estimular, caso necessário, o comparecimento de familiares que incentivem e possibilitem a
adesão do usuário/paciente ao tratamento;
- identificar e mobilizar os recursos institucionais internos e externos, observando as
demandas dos usuários dirigidas ao Serviço social;
- organizar material (filmes, cartaz, folders, folhetos) a respeito dos direitos na atenção à
saúde do usuário, em específico do agravo em questão;
- avaliar as condições sociais e da residência dos pacientes a serem incluídos nos Programas
de atendimento domiciliar;
- realizar entrevista inicial e preencher ficha de cadastro do paciente;
- providenciar documento via fax de solicitação de dispensa, retorno e transporte reo para
usuários de outros estados (pacientes da cirurgia bariátrica);
- orientar e encaminhar usuário para pedido de ressarcimento de despesas médicas através
de relatório analítico;
- solicitar a equipe médica a elaboração de relatório analítico para ressarcimento;
- elaborar listagem de presença;
- realizar contato com usuário ausente no Programa;
- acompanhar o usuário no pré e pós - operatório (pacientes da cirurgia bariátrica);
- orientação quanto á hospitalização de gestante do pré-natal e familiar;
- realização de grupos de convivência com os usuários idosos inscritos nos programas da
UGG e NUGG;
- entrevistas com os casais e com o militar do efetivo no planejamento familiar;
- participação na discussão dos resultados dos testes do vírus HIV, sensibilização, orientação
quanto aos direitos do paciente infectado, acesso a transporte gratuito, apoio e discussão de
questões que envolvem trabalho, família, saúde e contaminação.
Ainda, que nem todos os Programas sigam a mesma rotina, grande parte das
assistentes sociais realiza entrevistas e reuniões com os usuários: entrevista de
triagem, cadastramento avaliação de inscrição nos Programas e entrevistas
150
periódicas para orientação e/ou viabilização de recursos e benefícios sociais do
COMAER. Entendemos ser essencial para as assistentes sociais a apropriação da
abordagem de Vasconcelos (1997, p. 150) sobre a prática reflexiva, nesse sentido
trabalhar a abertura de espaços, possibilidades e condições para que os usuários,
problematizem as questões de seu cotidiano procurando desvendá-las , a
partir dos conhecimentos e informações acumulados nas experiências de
vida, em articulação com novas informações/conhecimentos que possam
vir de seus iguais e/ou dos profissionais.
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Assistentes Sociais SSA/RJ
Fonte: HORTA, G.M. No Meio da Travessia. A prática das assistentes sociais nos serviços de
saúde da Aeronáutica/RJ, 2009.
A pesquisa buscou saber das assistentes sociais o que elas consideram como
especificidade do Serviço Social na Aeronáutica. Das entrevistadas, 30% qualificam
como específico da Aeronáutica a Política de Assistência Social contributiva; 20%
das profissionais consideram que o usuário e a demanda trazida por este é
característico dos serviços de saúde da Aeronáutica; um grupo de 20% das
entrevistadas atribui à dificuldade de trabalho em equipe
115
como uma peculiaridade
do Serviço Social nessa instituição; 20% não responderam a questão e na assertiva
de 10% das assistentes sociais entrevistadas não existe nenhuma especificidade do
Serviço Social na Aeronáutica que o diferencia de outro espaço sócio-ocupacional.
115 Aqui, as profissionais entrevistadas referem-se não a equipe multidisciplinar como também, a equipe
formada pelas próprias assistentes sociais da Aeronáutica.
30%
20%
20%
20%
10%
Assistência
Social
contributiva
Usuários
Dificuldade de
trabalho em
Equipe
Não sabe
responder
Nada
151
As assistentes sociais ao manifestarem sobre a especificidade da Aeronáutica
assinalam três questões centrais, a saber: o caráter contributivo da Política de
Assistência Social do COMAER; a peculiaridade do usuário e da demanda nessa
instituição; e a dificuldade de trabalho em equipe. A nosso ver, essas questões se
articulam.
Interessa-nos inferir se essas questões afetam, prejudicam ou determinam a
prática profissional realizada por elas nesse espaço sócio-ocupacional, a priori,
podemos dizer que é inconteste que o assistente social se depara com fatores
institucionais e conjunturais que provocam dificuldades para a realização de suas
atribuições e competências profissionais. O projeto ético-político-profissional do
Serviço Social, o apresenta congruência com as funções do Comando Maior da
Aeronáutica materializadas no Estatuto dos Militares, o qual possui um forte apelo
moral no trato das questões da vida concreta, perpassada por concepções
filosóficas assentadas no neotomismo, afirmando valores abstratos e metafísicos.
Verifica-se, portanto, que o áreas que não se complementam. No entanto, as
demandas que são dirigidas ao assistente social exigem uma atuação com
aprofundamento teórico-metodológico consolidando suas atribuições privativas, ou
seja, exclusivas de sua formação profissional, tanto quanto em qualquer outro
espaço profissional.
Encontramos em Guerra (2009, p.30), uma importante contribuição em que a
autora discute a questão da instrumentalidade do serviço social, ao considerar
tamm a construção histórica da profissão, na assertiva da autora
algo que precede a discussão de instrumentos e técnicas para a ação
profissional, que no nosso entendimento refere-se à instrumentalidade, ou
melhor, à dimensão que o componente instrumental ocupa na constituição
da profissão. Para além das definições operacionais (o que faz, como faz),
necessitamos compreender as conseqüências que no nível ―mediato‖ que
as nossas ações profissionais produzem. (2009, p.30).
Assim, tomamos como pressuposto de que o espaço sócio-ocupacional em
que o assistente social se insere, seja ele privado, público ou militar, trabalha com as
demandas que lhe são próprias. Ou seja, as atribuições e competências dos
profissionais de Serviço Social, sejam aquelas realizadas na saúde ou em outro
espaço sócio-ocupacional, são orientadas e norteadas por direitos e deveres
152
constantes no Código de Ética profissional e na Lei de Regulamentação da
Profissão
116
.
Embora no cotidiano profissional as complexas ações e intervenções
implementadas pelos assistentes sociais favoreçam a interesses sociais distintos e
contraditórios, os profissionais podem imprimir uma determinada direção social ao
fazer profissional, sendo este iluminado, ou não, pelo compromisso ético-
profissional e pelas referências teórico-metodológicas necessárias.
Entendemos que esse cotidiano é permeado de possibilidades e limites para
a prática profissional, bem como constantes dilemas e entraves ao compromisso
ético-político profissional. Todavia, o que não podemos perder de vista é que esse
cotidiano de limites e dilemas são impostos por uma sociedade capitalista que
perpetua a lógica da exclusão, da desigualdade social e do desrespeito aos direitos
humanos. Donde se conclui que, a questão social é constantemente perpassada por
correlações de força e confrontos de interesses opostos, os quais irão se reproduzir
nas políticas sociais correspondentes.
No tocante a Política de Assistência Social da Aeronáutica, o COMAER
informa que a assistência social é uma política contributiva e tem por atribuição
garantir o bem-estar do efetivo e de seus dependentes. Este bem-estar compreende:
a saúde, o ambiente de trabalho, a família, a alimentação e o lazer.
A preocupação aqui, é que o assistente social, na sua prática, viabilize o
acesso do usuário a um direito social. Ora, se na Aeronáutica, a assistência social e
a assistência médica são políticas contributivas, portanto, é direito do usuário o
acesso a essas.
Uma análise fragmentada e reducionista da realidade, que desconsidera as
contradições imanentes de uma sociedade capitalista, não fragmenta as ações
profissionais ante as demandas apresentadas como também, limita o exercício
profissional ao mero cumprimento burocrático de tarefas preestabelecidas.
Como mencionado anteriormente, o Plano de Assistência Social (PASIC) do
Comando da Aeronáutica tomando como base legal a Lei Orgânica de Assistência
Social (LOAS) e os desdobramos legais advindos (ECA, Estatuto do Idoso,
116
A Lei de Regulamentação da Profissão estabelece no seu artigo 4º as competências do assistente social e no
Artigo 5ª apresenta as atribuições privativas deste. Quanto às competências; são qualificações profissionais para
prestar serviços, que a Lei reconhece, independentemente de serem, também, atribuídas a profissionais de
outras categorias (Parecer Jurídico 27/98, de Sylvia Helena Terra, assessora jurídica do CFESS. No que se
refere as atribuições privativas, também são competências, porém exclusivas, decorrentes, especificamente, da
formação profissional. Cf. Parâmetros para a Atuação de Assistentes Sociais na Saúde. CFESS, 2009.
153
NOB/SUAS) viabiliza recursos financeiros para que sejam desenvolvidos programas
e projetos pelo Serviço Social das Organizações Militares direcionados aos usuários
do Sistema de Assistência Social que deverão ter um caráter eminentemente
educativo, preventivo e promocional, e prevê cinco Programas focados nas áreas
de:
Promoção familiar;
Proteção à Terceira Idade;
Benefícios Sociais;
Recursos Humanos;
Lazer e Cultura
Reportando-nos a Iamamoto (2007, p.207), a autora assevera que:
o exercício profissional é uma ação de um sujeito profissional que tem
competência para propor, para negociar com a instituição os seus
projetos, para defender o seu campo de trabalho, suas qualificações e
funções profissionais. Para a autora, uma prática mediada pelo projeto
ético-político do Serviço Social requer ir além das rotinas institucionais,
requer buscar apreender as possibilidades de ação, passíveis de serem
impulsionadas pelo assistente social.
Frente a essas questões, fomos saber se as profissionais entrevistadas
acham a prática profissional na saúde/Aeronáutica diferente da prática de
assistentes sociais que atuam em outros espaços profissionais. Destacamos que
todos as entrevistadas responderam sim para essa pergunta. É o que podemos
observar nos depoimentos:
“(...) Não diria uma diferença e sim uma peculiaridade, o usuário e a demanda”.
“Na Aeronáutica, o assistente social não trabalha somente com o viés da desgraça,
como em outros hospitais”.
“(...) Bastante diferente, a demanda e a realidade do usuário da Aeronáutica é outra,
bem ou mal, todos tem uma renda, melhor do que a de muito brasileiro, muito
diferente da realidade dos usuários do SUS”.
“(...) Existe uma diferença sobre a ótica da demanda, do usuário, somente por isso”.
“O sistema militar é terrível, de 2 em 2 anos muda tudo, todo o comando, a direção,
os profissionais vão embora, chegam outros, acaba afetando o cotidiano da nossa
prática”.
“Aqui não se trabalha em equipe multidisciplinar ou indisciplinar, ninguém se articula,
na verdade não querem prestar um bom atendimento ao usuário”. “Em outros lugares,
existem vários grupos, projetos, programas; como no Inca, no Fundão”.
154
“É diferente sim. Principalmente o usuário dos serviços sociais, ele sempre terá uma
renda.
“Com certeza, aqui a demanda é outra (dificuldade financeira momentânea, conflitos
familiares envolvendo a pensão do militar, abandono de incapaz), em hospitais do
Estado, como o Getúlio Vargas, o Serviço Social atende familiares de traficantes
feridos e mortos, trabalhador arrimo de família vitimado pela guerra do tráfico, aqui
não temos essa realidade. E se acontecer, a família terá pensão, auxílio-funeral,
enfim, é muito diferente”.
“Sim, tem uma diferença (...) o hospital não fica em área de risco é de fácil acesso é
seguro (...) a demanda do usuário é diferente, para começar todos que tem acesso ao
hospital tem soldo/renda, por maior a dificuldade financeira que estejam passando, e
têm acesso aos benefícios sociais como medicamentos com ressarcimento parcial,
ou até integral, dependendo do caso”.
“Diria que sim, tenho uma amiga que trabalha em um Hospital público em área
carente e de risco, e olha! É bem diferente. (...) o usuário é outro a demanda é outra a
carência é muito extrema. Aqui não é assim”.
Do público alvo, usuário dos serviços e que procuram por atendimento ao
Serviço Social, destacam, sobretudo, da ativa: os soldados de e classe, os
taifeiros
117
e sargentos, suboficiais, tenentes e os servidores civis. Da inativa,
destacam-se as viúvas pensionistas, as filhas solteiras dependentes de militares, os
suboficiais e sargentos reformados e da reserva e os servidores civis aposentados.
Reportando-nos, todavia, as demandas sociais e de saúde da população
usuária, as profissionais entrevistadas informam que essas giram em torno de
questões relacionadas à: hipertensão, tabagismo, alcoolismo, dependência química,
diabetes, cardiopatias, doenças oncológicas, doenças originárias do processo de
envelhecimento, doenças psiquiátricas, doenças infecto-parasitárias e agravos de
saúde decorrentes de violência urbana e acidentes de trabalho.
Não obstante, as demandas sociais encaminhadas ao Serviço Social, de uma
forma geral, referem-se a questões de: abandono de idosos; conflitos familiares
decorrentes de apoio a incapazes e pensão militar; violência contra a mulher e
idosos; dependência química; desemprego na família e aproximação de período
117 Taifeiro é um posto ou patente militar, antigo, sendo de forma geral superior ao posto ou patente de soldado
ou marinheiro "razo ou zero ou ainda grumete(esse último nas marinhas); em algumas organizações militares"; é
portanto considerado historicamente o primeiro posto ou patente após o básico ou zero ou ainda raso;
geralmente e historicamente é o soldado ou marinheiro que já entra na organização militar com alguma
profissionalição ou tem talento para tal, e como tal nas diversas organizações militares de diversas nações, são
os motoristas, cozinheiros, alfaiates, barbeiros, copeiros, mensageiros, "ordenansas(secretários ou ajudantes -
de - ordens)".
155
desligamento de militar (soldado)
118
arrimo de família; conflitos no trabalho; dívidas
financeiras e acúmulo de empréstimos e dificuldades econômicas momentâneas.
Frente a essas demandas os assistentes sociais informam privilegiar junto
aos usuários, ações sociais de caráter sócio educativo, preventivo e promocional,
através dos projetos e programas, anteriormente apresentados, e não apenas na
concessão de benefícios sociais (aquisição de medicamentos, próteses, órteses,
aparelhos auditivos, cesta básica), conforme diretriz do Sistema de Assistência
Social/SAS.
No entanto, para que possam utilizar a prerrogativa de determinar e priorizar
as demandas dos usuários e, conseqüentemente, de organizar e planejar suas
ações de forma que possam interferir nos determinantes sociais do processo
saúde/doença no resgate da saúde enquanto direito social, a prática na saúde, em
contraposição a uma prática espontânea e/ou instintiva, exige toda uma complexa
série de requisitos. Estratégias e ações que pensadas e realizadas, nas suas
relações e conexões, possam fomentar uma prática na saúde que contribua no
acesso dos usuários aos seus direitos (VASCONCELOS, 2007, p. 258).
Aliás, importa considerar que, segundo as assistentes sociais entrevistadas,
os usuários, a equipe de saúde e a direção das unidades ante as condições de
trabalho e/ou falta de conhecimento das competências do assistente social, tem
demandado e requisitado diversas ações as profissionais que o são atribuições
das mesmas. Descrevem as profissionais como: a marcação de consultas e exames;
a solicitação de ambulância para remoção e alta e o gerenciamento da equipe
responsável pela consecução da ação (motorista e auxiliar de enfermagem); a
identificação de vagas em outras unidades nas situações de necessidade de
transferência hospitalar; a convocação do responsável para informar sobre alta
hospitalar; a emissão de declaração de comparecimento na unidade quando o
atendimento for realizado por quaisquer outros profissionais que não o Assistente
Social; a confecção de documento de autorização para tratamento em rede
conveniada; o preenchimento de formulários para viabilização de medicação de alto
custo mediante autorização por parte de autoridade competente; a mediação de
conflitos entre usuários e profissionais decorrentes de extravio de documentos e
prontuário médico; a ―resolução‖ de problemas que envolvem os usuários,
118 Os soldados (reservistas) prestam serviço por um peodo de quatro anos, após esse período serão
desligados do serviço ativo, caso não consigam aprovação em concurso (extremamente concorrido) para Cabo.
156
decorrentes da falta de articulação entre as unidades de saúde que encaminham
pacientes de outros estados para internação nos hospitais do Rio de Janeiro, que
não contavam com vaga disponível para internações dos mesmos; a ―resolução‖ de
problemas entre os pacientes que dividem leitos nas enfermarias (discussão em
função de: ar condicionado, televisão com volume alto, desentendimentos diversos);
a solicitação de coleta de material de laboratório para pacientes acamados não
inscritos no Programa de Atendimento Domiciliar; e o acompanhamento junto ao
setor de Licitações na compra de medicamentos, cesta básica, vacinas para
dependentes (benefícios sociais) por Pregão Eletrônico
119
e a apreensão das
terminologias que envolvem o processo licitatório.
As indicações sinalizam que as assistentes sociais, mesmo não
reconhecendo que essas demandas não são exclusivas da intervenção profissional
do assistente social, aceitam realizar todas as atividades ―possíveis‖ para dar
atenção a todas as demandas, em detrimento de um estudo do conjunto de
demandas dirigidas ao Serviço Social nos serviços de saúde da Aeronáutica. Não
comparece nas entrevistas com as profissionais, nenhum estudo da demanda dos
usuários dos serviços, como também, o comparece indicativo por parte das
entrevistadas, em priorizar o mesmo.
Não obstante, no que se refere às demandas dos usuários, uma importante
contribuição é dada por Vasconcelos (2002). Segundo a autora, o assistente social
trabalha com as requisições institucionais (do seu contratante) e com as demandas
dos usuários (para quem desenvolve sua ação profissional), concomitantemente,
devendo entendê-las e diferenciá-las, com objetivo de desenvolver uma prática
profissional e não somente uma tarefa burocrática. Com relação a demanda
apresentada pelo usuário, pode-se dizer que se traduzem de duas formas: a
demanda explicita e a demanda implícita (VASCONCELOS, 2002, pp. 179-180).
A demanda explícita, ou aparente, diz respeito aquilo que o usuário informa;
aquilo que se traduz, de forma clara e imediata ao profissional.
A demanda implícita exige analise, para além da aparência dos fenômenos; e
aquela que implica, de um lado, em um atencioso exame por parte do profissional,
119 A modalidade licitatória chamada pregão eletrônico, utilizada pelo governo brasileiro para realizar contratos
administrativos de bens e serviços comuns, independentemente do valor estimado, foi criada através da Lei
Federal 10.520/2002. Esta lei também criou o chamado "pregão presencial", que obrigava os contendentes à
comparecerem à negociação, liderada por um pregoeiro devidamente designado pelo órgão da administração
pública licitante. O pregão eletrônico foi criado visando, basicamente, aumentar a quantidade de participantes e
baratear o processo licitatório.
157
dos motivos que fundamentam as demandas explícitas e, de outro, em uma leitura
da realidade social, de cuja dinâmica emergem demandas. Nesse ponto, mostra-se
a importância de um profissional atualizado acerca da realidade, para desvendá-la,
entendendo as múltiplas determinações que incidem sobre cada problema
apresentado pelo usuário e investigando, junto a este último todas as condicionantes
que podem ocasionar o tipo de problema que ele esta enfrentando; ou seja, o que
gera o motivo pelo qual ele procurou o Serviço Social.
De acordo com a autora, identificar e priorizar as necessidades sociais e de
saúde e demandas dos usuários requer ir pra além das demandas espontâneas,
sem negar as requisições institucionais, historicamente, fruto do mau funcionamento
da rede de saúde, aqui incluímos os serviços de saúde da Aeronáutica. Significa,
portanto,
(...) pensar profissão, não para atuar junto a indivíduos, mas junto a
grupos e segmentos da classe trabalhadora que tem interesses e
necessidades individuais que expressam interesses e necessidades
coletivas que serão de fato enfrentadas (diferente de resolvidas) se
identificadas, publicizadas e submetidas á organização dos usuários e ao
controle social. (pp.423-424
3.3.4 Aperfeiçoamento Profissional
Quando questionadas sobre o aperfeiçoamento profissional, inicialmente,
perguntamos as assistentes sociais se a instituição, de alguma forma, incentiva o
aperfeiçoamento das mesmas. A maioria do grupo estudado relata que, atualmente,
as unidades em que trabalham, viabilizam a capacitação dos profissionais, seja
mediante dispensa ou, por troca de horário. Porém, alegam dificuldades pessoais,
assim como: falta de estímulo, pouco tempo para se dedicar, cansadas, priorizam
outras atividades de caráter pessoal. Ressalta-se que duas assistentes sociais civis
e uma militar têm como planejamento imediato a realização de mestrado em Serviço
Social. Uma assistente social civil faz mestrado profissional em Avaliação de
158
Programas Sociais do Programa de Pós-Graduação da Universidade Castelo
Branco.
As indicações apontam para a uma questão de escolha das assistentes
sociais em se qualificarem ou não, haja vista o indicativo da instituição no tocante à
possibilidade de liberação do profissional para estudo e aprimoramento.
No que se refere ao aspecto financeiro, que não comparece nas respostas
das entrevistadas, encontramos na ICA 163-1/2006 a seguinte diretriz da SDEE:
formular Política de Recursos Humanos para qualificação sistemática e continuada
dos profissionais de Serviço Social. Segundo a SDEE, cabe ao profissional de
Serviço Social o envio de solicitação, devidamente fundamentada (tipo de
qualificação e objetivo da mesma, instituição de ensino, custo da qualificação), para
que esta seja apreciada pela SDEE, no intuito de viabilizar o custeamento da
mesma.
Este órgão, ainda oferece, anualmente, aos assistentes sociais do Rio de
Janeiro (RJ), o custeamento de qualificação através do Curso de Extensão de
Planejamento e Gestão de Políticas Públicas, ministrado pelo Instituto Superior de
Administração Estadual/FESP.
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Assistentes Sociais SSA/RJ
60%
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sim
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Fonte: HORTA, G.M. No Meio da Travessia. A prática das assistentes sociais nos serviços de
saúde da Aeronáutica/RJ, 2009.
A pesquisa procurou saber das profissionais se estas consideram importante
atualizar-se para o desenvolvimento de sua prática profissional. Das entrevistadas,
60% afirmaram que sim, que precisam de um suporte teórico, que as possibilite
159
conhecer a realidade em que atuam; e 40% informam que não. Todas informam
haver realizado algum tipo de curso, após a formação na graduação. Como
podemos observar no gráfico a seguir.
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Assistentes Sociais SSA/RJ
50%
50%
sim
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Fonte: HORTA, G.M. No Meio da Travessia. A prática das assistentes sociais nos serviços de
saúde da Aeronáutica/RJ, 2009.
Do grupo estudado, 50% têm algum tipo ―curso‖ e 50% informa não ter. Em
contrapartida, das dez entrevistadas, apenas uma retornou a academia, como
apontamos, para fazer mestrado.
“O nosso quadro funcional está praticamente em extinção. Não adianta para nós fazer
um mestrado, não existe uma motivação profissional a o ser a nossa própria
interna e pessoal. È complicado sabe?”
“(...) Muitas vezes seu objetivo não é compreendido pouca valorização da profissão,
qualificar pra que? Aqui não faz diferença”.
“(...) Sei que é necessário, tenho essa compreensão, mas fica muito difícil, não tenho
tempo, estímulo interno, sabe?
“(...) Prefiro me qualificar na minha área de psicanálise, como tenho feito, quando
me aposentar, é com essa formação que irei atuar. Não vou trabalhar como AS
então pra que?
As indicações permitem apreendermos uma contradição da prática das
assistentes sociais nesse espaço, qual seja: apesar de elencarem (60%) o
conhecimento da realidade como ferramenta para a realização do trabalho
160
profissional, e indicarem reconhecer que, para que conheçam a realidade, precisam
de um suporte teórico, 40% das profissionais não tem esse posicionamento.
Ou seja, ao mesmo tempo em que metade das profissionais afirma terem uma
qualificação‖, quase que na mesma proporção (40%), alega não ser importante para
a prática profissional priorizar a formação continuada, vide os depoimentos acima.
É oportuno enfatizar a presença de dois grupos de profissionais nesse espaço,
a saber: as profissionais com formação mais recente, entre os anos de 1996 a 2002,
e as profissionais que se formaram entre os anos de 1977 a 1995 (vide Gráfico 3).
Isso mostra que esse grupo de assistentes sociais não teve como referência, na
formação acadêmica, os princípios e diretrizes contidos no projeto da ABEPPSS,
como indicado. Assim, não passaram por uma formação que conforme indica a
ABEPSS busca um profissional que “(...) atue nas expressões da questão social,
formulando e implementando propostas (...) dotado de formação intelectual e cultural
generalista crítica, competente na sua área (...) comprometido com os valores e
princípios norteadores do digo de Ética do Assistente Social” (Diretrizes
curriculares para o curso de Serviço Social).
A capacidade de apreender o movimento da realidade social originário de uma
formação generalista e crítica do assistente social imprime a necessidade de um
contínuo processo de formação profissional, com garantia da capacitação dos
profissionais já formados.
Portanto, um profissional qualificado teoricamente, propositivo, comprometido
com a atualização permanente e que invista em sua formação intelectual e cultural,
atento ao movimento dos processos sociais na conjuntura contemporânea, pode
extrair potenciais propostas de trabalho, ali presentes, como possibilidades
transformando-as em alternativas profissionais. (IAMAMOTO, 1998, p. 145).
Ademais, a pesquisa está situada entre as exigências postas ao Assistente
Social na contemporaneidade, na busca de superar a dicotomia entre investigação e
intervenção. Segundo Setubal (2009), o Serviço Social não deve parar na prática
interventiva, mas buscar, na concretude dos procedimentos da pesquisa, apoio para
uma ação profissional mais dinâmica, questionadora e que caminha passo a passo
com os diferentes movimentos emergentes da sociedade.
O estudo buscou, ainda, identificar qual tipo de conhecimento o assistente
social tem que ter para atuar de forma qualificada na Aeronáutica. Observamos que
161
70% dos entrevistados assinalam a atualização profissional e somente 30% aponta
a especialização em áreas da prática médica (gerontologia e geriatria, doenças
infecto-parasitárias, oncologia e doenças cardíacas). Vejamos alguns depoimentos:
“(...) Legislação, políticas públicas, direito previdenciário etc...”.
“(...) Atualização e qualificação, aquele profissional qualificado que consegue intervir
bem, mostra diferença e conquista seu espaço”.
“(...) Uma constante atualização, o assistente social pode direcionar melhor o seu
trabalho”.
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Assistentes Sociais SSA/RJ
30%
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Áreas de
especialização da
prática médica
Atualização
Profissional
Fonte: HORTA, G.M. No Meio da Travessia. A prática das assistentes sociais nos serviços de
saúde da Aeronáutica/RJ, 2009.
O estudo buscou identificar qual tipo de conhecimento o assistente social tem
que ter para atuar de forma qualificada na Aeronáutica. Observamos que 70% dos
entrevistados assinalam a atualização profissional e somente 30% aponta a
especialização em áreas da prática médica (gerontologia e geriatria, doenças
infecto-parasitárias, oncologia e doenças cardíacas). Vejamos os depoimentos
“(...) Legislação, políticas públicas, direito previdenciário etc...”.
“(...) Atualização e qualificação, aquele profissional qualificado que consegue intervir
bem, mostra diferença e conquista seu espaço”.
“(...) Uma constante atualização, o assistente social pode direcionar melhor o seu
trabalho”.
162
De uma maneira geral, verificamos que, apesar da maioria dos entrevistados
dizer que é importante ter um conhecimento teórico para desenvolvimento do
trabalho, as leituras realizadas, na realidade são parcas e pontuais.
Os assistentes sociais colocam como elementos que dificultam a prática
cotidiana, a falta de pessoal, a falta de apoio da direção das unidades, a
desvalorização do papel do assistente social, a alta demanda, o desconhecimento
dos profissionais acerca do papel do Serviço Social. Na ótica dos assistentes
sociais,estes fatores inviabilizam o planejamento das ações e acabam por priorizar
as demandas imediatas. Observemos os depoimentos:
“Trabalhamos muito com o apagar de incêndio, atendimento imediato, resolver aquela
situação momentânea que já chega ao extremo para nós”.
“(...) Qualquer pessoa que se dirige à recepção, eles não sabem responder sobre
qualquer coisa,e encaminham direto para o Serviço Social”.
“(...) Sempre digo: não sou bombeiro, não apago incêndio”.
“(...) Os grandes problemas que o hospital enfrenta não são solucionados, quem sofre
é o usuário. Porque então a Direção não nos chama para ouvir nossas sugestões,
ouvir o que o serviço social pode fazer para o usuário. Chega tudo aqui, ou seja, s
que sabemos das grandes dificuldades dos usuários”.
Apesar da postura passiva em que se coloca uma das profissionais
entrevistadas: Porque então a Direção não nos chama para ouvir nossas
sugestões”. Percebemos que, em sua maioria, as assistentes sociais apresentam
em seu discurso, uma postura propositiva no sentido de defender o seu campo de
trabalho, suas qualificações e atribuições profissionais. Contudo, ao propor e
negociar com a instituição os seus projetos, as assistentes sociais assumem uma
postura passiva no sentido de direcionar suas ações (vide gráfico 23).
Pois bem. Será que o cotidiano institucional não deixa patente a existência de
um conjunto de demandas que revela a utilidade da profissão na dinâmica dos
processos coletivos de trabalho nos serviços de saúde (COSTA, 2007).
Será que os assistentes sociais subestimam a utilidade e o conteúdo das
suas práticas?
Os assistentes sociais não podem desconsiderar de que a atividade do
profissional do Serviço Social, como tantas outras profissões está submetida a um
conjunto de determinações sociais inerentes ao trabalho na sociedade capitalista,
quais sejam: o trabalho assalariado, o controle da força de trabalho e a
163
subordinação do conteúdo do trabalho aos objetivos e necessidades das entidades
empregadoras. De acordo com a autora o trabalho dos assistentes sociais não se
desenvolve independentemente das circunstâncias históricas e sociais que o
determinam de fato. A inserção do Serviço Social nos diversos processos de
trabalho encontra-se profunda e particularmente enraizado na forma como a
sociedade brasileira e os estabelecimentos empregadores do Serviço Social
recortam e fragmentam as próprias necessidades do ser social e a partir desse
processo como organizam seus objetivos institucionais que se voltam à intervenção
sobre essas necessidades. (COSTA, 2007, p.306).
O assistente social consegue obter sentido e significado para a sua prática
entendendo-a como participe da realidade social na qual esta inserida e situada nas
relações entre as classes sociais e nas relações destas com o Estado tendo em
vista dar respostas das demandas colocadas para o Serviço Social, de maneira a
romper
(...) com práticas que reproduzem ou manm o status quo (negação de
praticas conservadoras que utilizam conscientemente ou o e/ou
privilegiam técnicas de marginalização, atomização, controle, exclusão,
punição). (VASCONCELOS, 1998, p.117-118, grifo no original).
164
Considerações Finais
Nosso esforço neste estudo é apresentar a prática das assistentes sociais
que atuam nos serviços de saúde da Aeronáutica (RJ).
É de uma riqueza muito grande a complexidade inerente a esse espaço
profissional. Ao iniciarmos a pesquisa, não poderíamos imaginar o quanto instigante
e difícil seria estudar esse universo.
Tamm consideramos que este esforço foi arriscado, pois nos encontramos
inseridas nesse espaço e conjugamos a prática interventiva com a reflexão
sistemática sobre a mesma. Destarte, nossa inserção na Aeronáutica se deu pela
formação profissional e não por uma vinculação cívico-militar.
O interesse, portanto, em realizar um estudo junto às assistentes sociais
inseridas nos serviços de saúde da Aeronáutica (RJ) se definiu pela necessidade de
uma investigação teórica que possibilite analisar, revelar e divulgar um segmento da
categoria, muitas vezes desconhecido e estranho ao conjunto dos profissionais do
Serviço Social.
Acreditamos que a ação de pesquisar está situada entre as exigências postas
ao Assistente Social na contemporaneidade e que imprime uma necessidade de
romper com práticas espontaneístas, superando a dicotomia entre investigação e
intervenção.
Consideramos que para uma melhor compreensão desse espaço, torna-se
imprescindível captarmos, na realidade concreta, os limites e as possibilidades do
movimento do real na sua historicidade. Portanto, o referencial teórico marxista
crítico-dialético nos orientou em ir para além da aparência dos fatos.
Partimos de um resgate do período sócio-histórico do regime ditatorial (1964
a 1985), até a retomada das bases federativas do Estado brasileiro, sendo este
essencial para que possamos compreender as análises feitas sobre a significação
do golpe militar de 64 e os determinantes históricos que permitiram a implantação da
ditadura no país e as conseqüências desta na configuração do Estado brasileiro.
Em seguida, abordamos o processo de redemocratização no país com a vital
participação dos movimentos sociais, bem como a histórica interlocução do Serviço
Social brasileiro com estes, em específico, com o movimento sindical-operário.
165
Sinalizamos que a relação do Serviço Social brasileiro com o movimento sindical-
operário contribuiu, sobremaneira, para uma nova perspectiva para a categoria dos
assistentes sociais que pretendia uma ruptura com o conservadorismo profissional.
Nesse percurso, destacamos a trajetória da política de saúde no Brasil e o
processo descentralização da saúde ante ao conjunto de reformas político-
institucionais iniciadas na cada de 80, com destaque para a constituição de um
Sistema Único de Saúde ao final dos anos 80. Objetivamos refletir sobre a política
de saúde nos anos 80 e 90, culminando nos desafios atuais desta, no governo Lula.
Tendo como referência os aspectos anteriormente discutidos, apresentamos a
configuração da prática dos assistentes sociais na área da saúde, sinalizando os
desafios e as polêmicas postas na atualidade para uma prática mediada pelo projeto
profissional hegemônico do Serviço Social brasileiro.
Ao falarmos de prática profissional, nos remetemos à concepção cunhada
pela tradição marxista. Ou seja, a de que a prática profissional é uma especialização
da práxis social. Na perspectiva apontada por Vázquez (1977, p. 154), ―a práxis é o
fundamento e limite do conhecimento e do objeto humanizado que, como produto da
ação, é objeto do conhecimento‖, ou seja, a práxis é o ponto de partida e o alicerce
para aferir e validar o conhecimento, bem como estabelecer o critério de sua
verdade, necessitando, para tanto, ―plasmar-se, adquirir corpo na própria realidade,
sob a forma de atividade prática‖. Portanto, a atividade teórica em si o é práxis,
ela só adquire plenitude na prática concreta dos homens.
Nesse sentido, consideramos que tratar da prática profissional das
assistentes sociais na saúde/Aeronáutica implica em retratar especialmente o
Sistema de Saúde, assim como o Sistema de Assistência Social dessa instituição.
Isso nos permite evidenciar que o SISAU difere significativamente de um modelo
privado de saúde por não ser comercializável e ter administração pública, além de
não considerar faixas etárias no estabelecimento dos valores. Por outro lado, como
visto, difere substancialmente da proposta do SUS, pois, está apresenta propostas e
práticas concretas de controle social, transparência administrativa, gestão
participativa e democratização, além de assegurar a universalidade do acesso e a
integralidade da atenção, apesar da real distância entre o direito legal e sua
expressão no cotidiano.
166
Os serviços de saúde da Aeronáutica visam a assistência médico-hospitalar
aos militares (ativos e inativos) e aos seus dependentes. Informa, portanto,
assegurar o acesso e a humanização do atendimento na saúde.
Questionamos, porém, se existe uma aplicação privilegiada de recursos de
custeio nos níveis de maior complexidade, em detrimento da atenção primária e se
esta atende aos problemas de saúde individuais e coletivos, cuidando da qualidade
da saúde e não apenas sendo capaz de tratar das doenças e acometimentos graves
com risco à vida.
Entendemos que as ações de promoção, proteção e de recuperação formam
um todo indivisível que não podem ser fragmentadas. Assim, a integralidade não é
apenas uma diretriz do SUS definida constitucionalmente. Ela é uma “bandeira” de
luta dos sujeitos sociais. Os usuários do SISAU ao contribuírem para o Fundo de
Saúde da Aeronáutica asseguram o direito não só à complementação de suas
despesas pelo Fundo como tamm o acesso integral aos serviços de saúde por ele
oferecidos.
Ao considerarmos os pressupostos contidos no Código de Ética do Assistente
Social, na Lei de Regulamentação da Profissão e no Projeto Ético- Político,
destacamos, em especial, os princípios concernentes à ampliação e consolidação da
cidadania e à gestão democrática de serviços, programas e políticas sociais, à
defesa do aprofundamento da democracia enquanto socialização da participação
política. Ressaltamos do Código, o dever do assistente social com os usuários:
contribuir para a viabilização da participação efetiva da população usuária nas
decisões institucionais (CFESS, 1993).
Diante disso, ao entrarmos em contato com os assistentes sociais,
constatamos que na intervenção das profissionais, nos limites da pesquisa realizada,
a hegemonia do projeto ético-político do Serviço Social não se expressa.
É oportuno enfatizar a presença de dois grupos de profissionais nesse
espaço, a saber: as assistentes sociais militares temporárias, com formação mais
recente, entre os anos de 1996 a 2002; e as assistentes sociais militares do extinto
quadro feminino, juntamente, com as servidoras civis, que se formaram entre os
anos de 1977 a 1988. Identificamos que este grupo não tem uma formação e
atuação muito recente no Serviço Social, o que deveria contribuir para a existência
167
de um planejamento de suas atividades. Ou seja, uma prática planejada e avaliada
nas suas conseqüências.
O Serviço Social acabou sendo agregado às requisições da instituição de
―resolver‖ problemas. Percebemos que na sua maioria as atividades realizadas pelas
assistentes sociais o soltas, desconectadas de um planejamento maior do setor,
sem buscar atingir um objetivo predeterminado.
Desse modo, parcela significativa das profissionais entrevistadas não teve
como referência, no seu processo de formação acadêmica, os princípios e as
diretrizes contidas nas Diretrizes Curriculares da ABEPSS (1996). Importa
considerarmos que a questão da precariedade de admissão das assistentes sociais
(oficias temporários) afeta o cotidiano profissional, influenciando as decisões das
profissionais; estas acabam por limitar sua prática na esfera da execução
burocrática das atividades.
Parcela significativa de assistentes sociais temporários tem sido requisitada
para atuar na assistência social. Ou seja, uma tendência, na Aeronáutica, assim
como no executivo, nos seus diferentes níveis (Vide Mota, 2008), de priorizar a
Política de Assistência Social em detrimento das demais políticas.
Consideramos que a relação explicitamente conflituosa entre as assistentes
sociais civis e militares afeta o cotidiano da prática profissional e as respostas
profissionais ante a demanda dos usuários. Na verdade, o conflito está posto pela
instituição.
É interessante observarmos que as questões mais singulares que vigoram no
cotidiano das instituições militares - como a racionalidade burocrática; a autoridade
militar; a disciplina e a hierarquia - não comparecem nos depoimentos das
assistentes sociais como um elemento negativo e de estímulo para o egresso da
instituição.
As assistentes sociais consideram que o Serviço Social na Aeronáutica possui
uma boa e adequada infra-estrutura para o desenvolvimento das atividades,
dispondo de recursos e materiais (computadores com acesso a rede internet;
aparelhos de fax; materiais de escritório; telefones para ligações externas; materiais
diversos de escritórios, móveis adequados), bem como um espaço físico que
propicia o atendimento sigiloso aos usuários.
168
Por outro lado, as assistentes sociais entrevistadas não vislumbram a
possibilidade de uma profícua articulação entre instituição e unidades de ensino,
através do estágio supervisionado. Isso é confirmado com a atual inexistência de
campos de estágio de Serviço Social nas unidades pesquisadas.
A metade das assistentes sociais possui, conhece e manuseia, ainda que
eventualmente, o Código de Ética Profissional. que se considerar que a outra
metade das assistentes sociais desconhece ou não manuseia o Código. Ora, este
fato e a quantidade e qualidade de leituras realizadas pelas profissionais nos remete
a pensar que a prática das assistentes sociais se objetiva em ações espontâneas e
instintivas, partindo da experiência pessoal do profissional, sem referências teórico-
metodológicas.
Embora, as assistentes sociais tenham elencado com referência para pensar
a prática profissional, autores progressistas do Serviço Social, não significa,
necessariamente, que as profissionais entrevistadas, assumem um compromisso
ético-político proposto pela direção estratégica da profissão. Algumas assistentes
sociais mostram preocupação com o “como fazer e
de forma implícita demonstram
buscar autores que apresentem a famosa “receita do bolo” da prática profissional.
Podemos captar que tem repercutido nesse espaço, ainda que de forma
incipiente, a formação especializada na abordagem clínica e na prática
terapêutica, autodenominada pelos seus executores como Serviço Social Clínico.
Apesar de parte das assistentes sociais afirmarem conhecer o Código e
postularem a viabilidade do projeto ético-político do Serviço Social nos serviços de
saúde da Aeronáutica /RJ, acreditam nesta viabilidade com limitações. O que nos
levou a apreender uma contradição no alcance da pesquisa realizada: a hegemonia
do Projeto Ético-Político do Serviço Social não se expressa nos serviços de saúde
da Aeronáutica, apesar do alto percentual (70%) de profissionais sinalizarem a
viabilidade do projeto. Ou seja, as assistentes sociais têm uma postura
comprometida em nível do discurso, mas não garantem essa perspectiva na prática
realizada.
Aquelas profissionais que demonstraram uma perspectiva mais crítica quanto
à sua intervenção profissional e quanto à realidade da instituição militar, estando
mais próximas do projeto profissional hegemônico da categoria, não fazem frente ao
169
conjunto das assistentes sociais da Aeronáutica que não coadunam com a
perspectiva emancipatória do projeto ético-político do Serviço Social.
Por outro lado, constatamos que as assistentes sociais que expressaram
desconhecer o Código apresentam habilidade técnica no sentido de garantir o
espaço ocupacional do Serviço Social na instituição e uma preocupação em atender
as demandas dos usuários de forma qualificada na garantia do acesso desses aos
seus direitos, bem como em priorizar um atendimento de escuta e acolhimento.
Mesmo reconhecendo que determinadas requisições e demandas não são
exclusivas da intervenção profissional do assistente social, aceitam realizar todas as
atividades ―possíveis‖ para dar atenção ―o apagar de incêndio‖ em detrimento de um
estudo do conjunto de demandas dirigidas ao Serviço Social nos serviços de saúde
da Aeronáutica.
Sinalizamos a ausência de estudo da demanda dos usuários dos
serviços e da própria dinâmica institucional, como tamm, não comparece
indicativo por parte das entrevistadas, em priorizar o mesmo.
Entendemos como uma questão de escolha das assistentes sociais em não
se qualificarem, haja vista o indicativo da instituição no tocante à possibilidade de
liberação do profissional para estudo e aprimoramento. Identificamos a contradição
dessa escolha, pois, ao mesmo tempo em que metade das profissionais afirma ter
uma ―qualificação‖, quase que na mesma proporção (40%), alega não ser importante
para a prática profissional priorizar a formação continuada.
Assim, se pensarmos no motivo pela qual o projeto ético-político do Serviço
Social não é hegemônico na Aeronáutica, encontramos, na análise de Vasconcelos
(2002), dentre outros motivos, que, apesar do discurso progressista, boa parte dos
assistentes sociais continua atuando de uma forma conservadora, havendo um
distanciamento entre a proposta de formação profissional, o debate teórico -
critico e a prática profissional.
Entendemos que a crítica pela crítica não suscita modificação alguma. De
acordo com Marx, a crítica está a serviço de algo que não ela mesma. De igual modo,
para ele a interpretação não transforma a realidade, assim como também não é
suficiente tomar consciência.
170
No entanto, apesar da insuficiência de toda interpretação e da tomada de
consciência, estes momentos não deixam de ser necessários. Valemo-nos, portanto,
das palavras de Marx:
A crítica colheu nas cadeias as flores imaginárias, o para que o homem
suporte as cadeias sem capricho ou consolação, mas para que lance fora
as cadeias e colha a flor viva. A crítica [...] liberta o homem da ilusão, de
modo que pense, ative e configure a sua realidade como homem que
perdeu as ilusões e reconquistou a razão, a fim de que ele gire em torno de
si mesmo e, assim, à volta do seu verdadeiro sol (1989:78).
Com base na proposta do CFESS - Parâmetros para a Atuação de
Assistentes Sociais na Saúde (2009) assinalamos perspectivas e alternativas para
a prática dos assistentes sociais nos serviços de saúde, a saber:
a) Que as profissionais estabeleçam prioridades. O conjunto de demandas
emergenciais, se não for direcionado para os setores competentes por
meio do planejamento coletivo elaborado na unidade, vai
impossibilitar ao assistente social o foco no desenvolvimento de
suas competências e atribuições. A elaboração de protocolos que
definem o fluxo de encaminhamentos para os diversos serviços na
instituição é fundamental.
b) Que as assistentes sociais priorizem a avaliação socioeconômica dos
usuários com o objetivo der ser um meio que possibilite a mobilização dos
mesmos para a garantia de direitos e não um instrumento que impeça o
acesso aos serviços. Ou seja, superar a avaliação socioeconômica que
funcione somente como critério de elegibilidade e/ou seletividade
estrutural. (somente para os benefícios sociais do SAS).
c) Que as assistentes sociais não se pautem no atendimento
psicoterapêutico a indivíduos e familiares, pois, este não potencializa
a orientação social com vistas à ampliação do acesso dos indivíduos e
da coletividade aos direitos sociais.
d) Os Programas da Instituição e os trabalhos em equipe merecem ser
refletidos pelas profissionais. As atribuições do assistente social precisam
ficar especificadas e divulgadas para os diversos profissionais. O
171
assistente social, ao participar de trabalho em equipe na saúde, dispõe de
ângulos particulares de observação na interpretação das condições de
saúde do usuário e uma competência também distinta para o
encaminhamento das ações, que o diferencia do médico, do enfermeiro,
do nutricionista e dos demais trabalhadores que atuam na saúde.
Conforme assevera Iamamoto (2002, p.41) ―o trabalho coletivo não dilui as
competências e atribuições de cada profissional, mas, ao contrário, exige
maior clareza no trato das mesmas”. A atuação em equipe, desse modo,
vai requerer do assistente social a observância dos princípios ético-
políticos, explicitados nos diversos documentos legais (Código de Ética
Profissional e Lei de Regulamentação da Profissão, ambos datados de
1993 e Diretrizes Curriculares da ABEPSS).
e) que se apreender as ações socioeducativas como orientações
reflexivas e socialização de informações realizadas através de
abordagens individuais ou coletivas ao usuário, família e população de
determinada área programática.
f) Que as profissionais priorizem as ações de mobilização, participação e
controle social voltadas prioritariamente para a inserção dos usuários,
familiares e trabalhadores de saúde nos espaços democráticos de controle
social e construção de estratégias para fomentar a participação e defesa
dos direitos pelos usuários/trabalhadores.
g) Que as assistentes sociais nas ações de investigação, planejamento e
gestão, tenham como perspectiva o fortalecimento da gestão democrática
e participativa capaz de produzir, em equipe e intersetorialmente,
propostas que viabilizem e potencializem a gestão em favor dos usuários e
trabalhadores de saúde, na garantia dos direitos sociais.
h) Uma prática mediada pelo projeto ético-político profissional exige
assessoria e qualificação teórica; ou seja, formação permanente. As
atividades de qualificação profissional consistem em treinamento,
preparação e formação de recursos humanos voltados para a educação
permanente de funcionários; qualificar os trabalhadores de saúde na
172
esfera operacional da unidade, além de instrumentalizar a formação de
equipes. Estas ações devem ser realizadas com a participação de outros
profissionais e o isoladamente. A formação profissional pode ser
potencializada através da criação de campos de estágio, supervisão de
estagiários, bem como a criação e/ou participação nos programas de
residência multiprofissional. A articulação com as unidades de formação
acadêmica é fundamental para a garantia da qualidade da formação
permanente.
Reconhecemos que o trabalho em instituições militares é complexo,
contraditório e limitador. Contudo, que se considerar que não comparece nas
repostas das profissionais fatores insatisfatórios quanto as suas condições de
trabalho nesse âmbito institucional. Ainda que limitações se façam presentes, o que
merece destaque aqui é que não são as condições de trabalho que impedem
uma prática mediada pelo projeto profissional hegemônico do Serviço Social
na Aeronáutica. Dito de outro modo, o que dá materialidade a esse projeto são as
ações interventivas das assistentes sociais, ou seja, o projeto só pode se
concretizar nas ações profissionais cotidianas.
Ante o exposto, acreditarmos sim na viabilidade do projeto profissional do
Serviço Social na Aeronáutica. É necessário demonstrar nas situações singulares
em que as profissionais se defrontam na prática profissional a viabilidade do projeto
ético-político do Serviço Social, seu potencial renovador da profissão na afirmação
dos direitos sociais dos cidadãos, bem como na atenção e no respeito às suas
necessidades e interesses que, por inúmeras mediações, se transmutam em
demandas e profissionais (IAMAMOTO, 2007).
(...) Ora, são muitas conquistas da nossa profissão para nós, aqui na Aeronáutica,
recuarmos, logo agora. Para então, cruzarmos os braços e dizermos que não nos
resta nada a fazer...
(Assistente Social dos Serviços de Saúde da Aeronáutica).
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VIANNA, M.L.W. Americanizaçao (perversa) Da Seguridade Social Estratégias
De Bem-Estar E Políticas Públicas, IUPRJ/UCAM. Rio de Janeiro:Editora Revan,
1998.
YAZBEK, M ª. C. Os fundamentos do Serviço Social na contemporaneidade In:
Capacitação em Serviço Social e política social. Módulo 4: Trabalho do Assistente
Social e as políticas sociais. Brasília: CFESS/APEPSS/CEAD/UNB, 2000.
Endereços da Rede Internet
www.assistentesocial.com.br
www.abepss.ufsc.br
www.cfess.org.br
www..cgabeg.aer.mil.br
www.cress-mg.org.br
www.cress-rj.org.br
www.dirsa.intraer.br
www.fab.aer.mil.br
www.haaf.aer.mil.br
www.hca.aer.mil.br
www.hfag.aer.mil.br
www.pessoal.sercomtel.com.br/colman
www.saude.gov.br
www.wikipedia.org
www.pt.org.br
www.folha.uol.com.br/folha/brasil
www.culturabrasil.pro.br/ditadura
182
Documentos, portarias e trabalhos
ABEPSS. Diretrizes Curriculares para o Curso de Serviço Social, 2002.
ASSOCIAÇÃO NACIONAL DE ASSISTENTES SOCIAIS. Serviço Social: as
respostas da categoria aos desafios conjunturais: IV Congresso Brasileiro de
Assistentes Sociais Congresso Chico Mendes. São Paulo: Cortez.
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Da ordem social, título
VIII. Brasília: Centro Gráfico, Senado Federal, 1988.
BRASIL. Ministério da Aeronáutica. Estatuto dos Militares. RMA 35-1. Brasília
(DF), Lei 8.080 de 09 de dez. de 1980.
___________.Ministério da Aeronáutica. Portaria 614/GM3, de 16/08/92.
Reformula o Sistema de Assistência Social do COMAER. BMA 113-8 de 31/08/92.
___________. Ministério da Aeronáutica. Instrução Reguladora das Indenizações
de Assistência Médico Hospitalar do COMAER. IMA 160-28 de 10/05/1995.
___________.Ministério da Aeronáutica. Ordem Técnica do Serviço de
Atendimento Domiciliar nº005/DIRSA/COMAER de 12 de dezembro de 2000.
___________.Ministério da Aeronáutica. Instrução Reguladora das Ações Sociais
do COMAER. ICA 163-1 de 22 de fevereiro de 2006.
___________.Ministério da Aeronáutica. Instrução Reguladora das Ações do
Servo Social no SISAU do COMAER. ICA 160-139 de 19 de setembro de 2008.
___________.Ministério da Defesa. Portaria Normativa Nº. 1173/MD, de 06 de set.
de 2006. Aprova a Política de Assistência Social das Forças Armadas.
___________.Ministério da Saúde. Gestão municipal de saúde: textos básicos.
20ª ed., Rio de Janeiro, 2001.
____________.Ministério da Saúde.Sistema Único de Saúde. Lei nº. 8.080 de 19
de setembro de 1990.
____________.Secretaria de Gestão do Trabalho e da Educação na Saúde.
Departamento de Gestão da Educação na Saúde. Curso de formação de
facilitadores de educação permanente em saúde: unidade de aprendizagem-análise
do contexto da gestão e das práticas de saúde, Brasília, DF, 2005.
183
PARTIDO dos Trabalhadores. Manifesto de Fundação. Partido dos Trabalhadores.
Diretório Nacional, 2009.
Artigo de Revista
CABRAL, Otávio. Radiografia dos militares: O que pensam os militares. Revista
Veja. São Paulo: Editora Abril, Ano 40; nº. 2036 de 28 nov.2007. p.130, edição
especial.
184
ANEXOS
ANEXO I
PESQUISA NOS SERVIÇOS DE SAÚDE DA AERONÁUTICA
Serviços de Saúde: HAAF, HCA e HFAG no Rio de Janeiro (RJ).
Coordenação: Gisele Martins Horta
Formulário de Entrevistas: Assistentes Sociais
*
Entrevista nº Instituição:
Duração:
1- PERFIL PROFISSIONAL:
1.1. A - Idade:_________ B - sexo:_______ C Estado civil:__________
1.2. A - Ano de sua formação: _________ B- Instituição ____________________________________
1.3. A- Tempo de exercício da profissão? _______________________
1.4. A- Quadro funcional: A - QCOA ( ) ano ________ B - QFO ( ) ano ________ C - Civil: concursado ( )
Contr. ( ) ano de ingresso:___________________
1.5. A - Quanto tempo nesta unidade: _____________________
1.6. Carga horária: ____________
1.7. Qual sua função: Assistente Social ( ) Chefe do setor ( )
1.8. Participa de entidades da categoria: ( ) sim ( ) não
1.9. Se pudesse ter outro emprego com o mesmo salário, pediria baixa/demissão? (S) (N)
1.10. Tem outro vínculo empregatício? (S) (N) Onde? _____________________________________
1.11. Você tem estagiários atualmente? (S) (N) - Se sim de quais faculdades? _________________
1.12. Se não, porque parou? _________________________________________________________
1.13. No seu entender, quais são as recomendações mais importantes do digo de Ética sobre as
relações do Assistente Social com os usuários?___________________________________________
______________________________________________________________________________________
____________________________________________________________________________
1.14. Você está satisfeita como Assistente Social? (S) (N)
1.14.1. Por quê? ___________________________________________________________________
_________________________________________________________________________________
2. REFERÊNCIAS DE CONHECIMENTO
2.1. Quais autores são referência para a sua prática? ______________________________________
_________________________________________________________________________________
2.2. Você considera a Constituição de 1988 importante para a prática do Assistente Social? (S) (N) Por quê?
_________________________________________________________________________
_________________________________________________________________________________
2.3. O que é SUS para você?_________________________________________________________
_________________________________________________________________________________
2.4. O que é saúde para você? ________________________________________________________
_________________________________________________________________________________
2.5. Em sua opinião qual a contribuição trazida pela Reforma Sanitária? _______________________
_________________________________________________________________________________
2.6. O que você acha da Política de Seguridade Social da Aeronáutica? _______________________
_________________________________________________________________________________
2.7. Você acha ser viável articular os princípios do projeto ético-político do serviço social no âmbito militar?
(S) (N)
2.7.1. Por quê? ____________________________________________________________________
_________________________________________________________________________________
2.8. Na sua prática diária, qual (is) aparato (s) legal (is) se pauta: ( ) Código de Ética Profissional dos
Assistente Social /Lei que Regulamenta a profissão (8.662/93) ( ) Diretrizes Curriculares da ABEPSS ( )
Estatuto dos Militares ( ) RDAER ( ) NPA do Serviço Social de sua OSA ( ) ICA 161/163 ( ) ICA
Saúde no SISAU ( ) LOAS ( ) Constituição de 1988 ( ) Estatuto do Idoso ( ) ECA
( ) Política Nacional para Integração da pessoa Portadora de Deficiência
Outros:___________________________________________________________________________
2.9. Quais as necessidades sociais e de saúde você identifica no cotidiano da população usuária da
Aeronáutica?
A- Sociais_________________________________________________________________________
_________________________________________________________________________________
B- Saúde. ________________________________________________________________________
_________________________________________________________________________________
2.10. O que os usuários demandam do Serviço Social? ____________________________________
_________________________________________________________________________________
2.11. O que os usuários demandam da OSA? ____________________________________________
_________________________________________________________________________________
3. PRÁTICA PROFISSIONAL
3.1. Qual o objetivo do Serviço Social na instituição? _______________________________________
_________________________________________________________________________________
3.2. Você concorda? (S) (N) Por quê?___________________________________________________
3.3. Seu chefe imediato é assistente social (S) (N) Se não, qual é a formação dele________________
3.4. Assinale em grau de importância o que mais dificulta sua prática profissional: ( ) hierarquia e disciplina
militar ( ) Hegemonia médica ( ) caráter subalterno da profissão ante as atividades fins-instituição ( )
fragilidades ou indefinições da prática profissional ( ) falta de qualificação técnica
( ) Outros: ________________________________________________________________________
3.5. O Serviço Social tem algum projeto na instituição por escrito ? (S) (N)
3.6. Você tem projeto por escrito? (S) (N)
3.7. Você trabalha em equipe? (S) (N) Com quem? ______________________________________
_________________________________________________________________________________3.8.Vo
cê acha que sua prática profissional é diferente das AS que trabalham em hospitais públicos / privados, (S)
(N)? Em quê?___________________________________________________________
_________________________________________________________________________________
3.9. Você realiza com os usuários prioritariamente entrevistas ( ) reuniões ( )
3.10. No hospital, você participa do processo de alta hospitalar? S ( ) N ( ) Com qual objetivo?
_________________________________________________________________________________
3.11. Você comunica óbito? S ( ) N ( )
3.12. Qual (is) os princípio (s) do Código de Ética você procura concretizar no cotidiano institucional?
_________________________________________________________________________________
3.13. A seu ver, quais as atividades do Serviço Social são mais requisitadas na sua OSA: (numere em
ordem de grandeza) A ações de caráter emergencial ( ) B- educação e informação em saúde ( ) C-
planejamento e assessoria ( ).
3.14. Em sua opinião, o que é específico do Serviço Social na Aeronáutica? ____________________
_________________________________________________________________________________ 3.15.
Qual a documentação utilizada no registro de sua prática: 1.( ) ficha de cadastro 2.( ) evolução de
entrevistas 3.( ) livro de registro de plantão ou livro de ocorrências 4.( )prontuário único 5.( ) prontuário
social 6. ( ) registro de reuniões 7.( ) ficha social 8.( ) relatório social 9.( ) parecer social
outros:____________________________________________________________________________
3.16. Quais as maiores dificuldades encontradas no cotidiano de sua prática? ___________________
_________________________________________________________________________________
3.17. O que mais contribui para facilitar o cotidiano de sua prática? ___________________________
_________________________________________________________________________________
3.18. Qual a relação dos demais serviços da OSA com o Serviço Social: ignoram ( ); usam quando
precisam para desafogar seus afazeres ( ); recorrem para prestar melhor atendimento ao usuário ( );
reclamam ( ); procuram para discutir questões relacionadas aos usuários ( ); escutam ( ); trocam ( );
aceitam participar de equipes ( ); outros ( ).
3.19. Como, em ordem de grandeza, chegam os usuários ao Serviço Social? A- ( ) encaminhados pela
rotina dos programas/projetos B- ( ) que procuram espontaneamente C- ( ) encaminhados pelos demais
profissionais de saúde D- ( ) Encaminhados pelas assistentes sociais de outras unidades E ( )
encaminhados pela Direção F-( ) encaminhados pelo comandante da unidade G- ( ) encaminhados pela
recepção H- ( ) encaminhamento extra-institucional
4. APERFEIÇOAMENTO
4.1. Você é incentivado pela instituição para se aperfeiçoar profissionalmente? (S) (N)
Como?___________________________________________________________________________
4.2. Qual tipo de qualificação a instituição oferece? _______________________________________
4.3. Que tipo de conhecimento o profissional de Serviço Social tem que ter para atuar de forma qualificada
na Aeronáutica? __________________________________________________________
4.4. Você acha que para prestar supervisão a alunos o assistente social precisa ter preparação especial? S
( ) N ( ) Por quê? _________________________________________________________
4.5. Em que você sente maior necessidade A - priorizar o aperfeiçoamento profissional (pós- mestrado
doutorado) (S) (N) B - estudar para outros concursos (S) (N)
4.6. Você tem projeto de realizar algum tipo de aperfeiçoamento em breve (S) (N) Se sim qual e onde ?
___________________________________________________________________________
4.7. Gostaria de acrescentar algum outro comentário?_____________________________________
_________________________________________________________________________________
Observações:
______________________________________________________________________________________
____________________________________________________________________________
_________________________________________________________________________________
_________________________________________________________________________________
ANEXO II
ROTEIRO DE OBSERVAÇÃO
OSA: ____________________
Nº de AS: _____________________ Civis: Concursados ( ) Efetivado ( )
Militares: ( ) QCOA ( ) QFO
Efetivo de : ________________ civis/militares
1. Quem freqüenta a OSA (público predominante). De onde vem? São soldados, sargentos,
oficiais de alta patente?
2. A OSA é de fácil acesso? Transporte/área de risco/facilidade de
marcação/informação/telefone/demanda reprimida.
3. Quais programas e serviços que oferece? Em quantos e quais programas o Serviço Social
atua?
4. O setor de Serviço Social está localizado aonde? Ambulatório? Área diferenciada? No Andar?
5. E O Serviço Social encontra-se bem sinalizado (placas) para facilitar o acesso dos usuários?
Ou somente o efetivo sabe de sua localização?
6. Qual o movimento de chegada dos usuários? Rotinas de atendimento? Horário de chegada
na unidade; média de espera de atendimento; utilização do tempo de espera.
7. Quais as características do espaço profissional dos assistentes sociais (tamanho,
privacidade, sala para atendimento, sala de chefia, infra-estrutura. Se for negativa a avaliação, existe
algum movimento por parte dos A.S e chefia para alterar a qualidade no espaço.
8. Qual o horário de trabalho? Tem plantão sistematizado.
9. O Serviço Social registra a sua prática? Tem conhecimento da demanda real, aparente,
oculta? Tem dados no que se refere o número de atendimentos diários, mensais?
10. Quanto às reuniões multiprofissionais e ou de equipes. Anotar ou gravar o que e como
discutem.
Realizar as observações antes de fazer as entrevistas com os Assistentes Sociais.
UERJ/s-Graduação FSS
Pesquisa: A prática dos assistentes sociais nos serviços de saúde da Aeronáutica RJ
Pesquisadora: Gisele Martins Horta
Coordenadora: Ana Maria de Vasconcelos
TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE e ESCLARECIDO
Pesquisa: A prática dos assistentes sociais nos serviços de saúde da Aeronáutica/RJ.
Este estudo tem como objetivo conhecer o perfil profissional desses assistentes
sociais: saber quem são esses profissionais, o que eles fazem qual o trabalho desenvolvido
por eles e de que forma estão inseridos na instituição. Acreditamos, portanto, o quanto será
elucidativo para a categoria de assistentes sociais e entidades representativas da profissão,
bem como para as Faculdades de Serviço Social, o desvelar de um cotidiano profissional,
gestado no universo militar da Aeronáutica.
A participação da instituição nesta pesquisa consistirá em permitir que sejam feitas
observações, anotações, consultas a documentos, projetos e/ou gravação de entrevistas e
reuniões realizadas com usuários (entrevistas para elaboração de laudos ou pareceres, em
plantões, enfermarias, visita domiciliar, etc. ou reuniões salas de espera, grupo com
mulheres, grupos de pais, grupos de trabalhadores, grupos de jovens, etc.,) e entrevistas
com os assistentes sociais sobre a contextualização das atividades realizadas e sobre o
projeto que desenvolve. Toda atividade só poderá ser observada/gravada com o
consentimento prévio dos usuários participantes.
Os benefícios decorrentes do consentimento da instituição e assistentes sociais
estão relacionados à contribuição no estudo para nutrir o debate atual do Serviço Social,
principalmente, se levarmos em consideração que o campo militar ainda não é uma área
discutida e publicizada no interior do Serviço Social.
As informações obtidas através da pesquisa serão confidenciais estando assegurado
o sigilo quanto à identificação dos assistentes sociais, da instituição e dos usuários. Assim,
não haverá risco algum com a participação na pesquisa, pois será mantido sigilo não
sobre a Instituição, mas quanto aos nomes e dados de qualquer pessoa envolvida no
processo.A Instituição/profissional receberá uma cópia deste termo onde consta o telefone e
o endereço do pesquisador responsável pelo estudo, onde poderão ser tiradas dúvidas
sobre a pesquisa, sobre a participação na pesquisa. Os resultados da pesquisa serão
divulgados através de produção bibliográfica e eventos dos quais representantes da
Instituição ou o profissional poderão participar.
________________________________
Nome e assinatura do pesquisador
Instituição Responsável: Universidade do Estado do Rio de Janeiro/ Pós-Graduação em Serviço Social.
Programa de Mestrado em Serviço Social. Rua São Francisco Xavier, 524- andar- Bloco D do Pavilhão João
Lyra Filho Campus Maracanã.
Pesquisadora: Gisele Martins Horta
Telefone: (21) 39086000 celular: (21) 9157 - 4339 (21) 9493 - 6639
Declaro que entendi os objetivos, riscos e benefícios do consentimento para a realização da pesquisa e
concordo em participar.
________________________________________
Instituição/Assistente social, sujeito da Pesquisa
Data :___________
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