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UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE - UFF
CENTRO DE ESTUDOS GERAIS
INSTITUTO DE CIÊNCIAS HUMANAS E FILOSOFIA
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO INTERINSTITUCIONAL EM HISTÓRIA
UFF - UNICENTRO
LUCIA TERESINHA MACENA GREGORY
RETRATOS, INSTANTÂNEOS E LEMBRANÇAS:
a trajetória e o acervo da fotógrafa Írica Kaefer, Marechal Cândido Rondon
(1954-1990)
NITERÓI/RJ
2010
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LUCIA TERESINHA MACENA GREGORY
RETRATOS, INSTANTÂNEOS E LEMBRANÇAS:
a trajetória e o acervo da fotógrafa Írica Kaefer, Marechal Rondon (1954-1990)
Tese apresentada ao Programa de Pós-Graduação
Interinstitucional em História UFF – Universidade Federal
Fluminense / UNICENTRO – Universidade Estadual do
Centro-Oeste do Paraná para a obtenção do Grau de Doutora.
Área de Concentração: História Social.
Orientador: Profª. Drª. Ana Maria Mauad
Niterói
2010
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Dados Internacionais de Catalogação-na-Publicação (CIP)
(Biblioteca da UNIOESTE – Campus de Marechal Cândido Rondon – PR., Brasil)
Gregory, Lucia Teresinha Macena
G822r Retratos, instantâneos e lembranças: a trajetória e o
acervo da fotógrafa Írica Kaefer, Marechal Cândido Rondon
(1954-1990) / Lucia Teresinha Macena Gregory. – Niterói,
2010.
380 p.
Orientador: Profª. Drª. Ana Maria Mauad
Tese (Doutorado em História Social) - Universidade
Federal Fluminense e Universidade Estadual do Centro-Oeste
do Paraná, 2010.
1. Fotografias. 2. Memória. 3. Foto Kaefer. 4. Kaefer,
Írica. 5. Marechal Cândido Rondon (PR) – História. I.
Universidade Federal Fluminense. II. Universidade Estadual
do Centro-Oeste do Paraná. III. Título.
CDD 21.ed. 302
770
981.62
CIP-NBR 12899
Ficha catalográfica elaborada por Marcia Elisa Sbaraini Leitzke CRB-9/539
LUCIA TERESINHA MACENA GREGORY
RETRATOS, INSTANTÂNEOS E LEMBRANÇAS:
a trajetória e o acervo da fotógrafa Írica Kaefer, Marechal Rondon (1954-1990)
Tese apresentada ao Programa de Pós-Graduação
Interinstitucional em História UFF– Universidade Federal
Fluminense / UNICENTRO – Universidade Estadual do
Centro-Oeste do Paraná para a obtenção do Grau de Doutora.
Área de Concentração: História Social.
Aprovada em
BANCA EXAMINADORA
________________________________________________________
Profª. Drª. Ana Maria Mauad – Orientadora
UFF-Niterói-RJ
___________________________________________________________
Prof. Dr. Charles Monteiro
PUC-RS
____________________________________________________________
Profª. Drª. Mariana Aguiar Ferreira Muaze
UNIRIO-RJ
____________________________________________________________
Profª. Drª. Ismênia de Lima Martins
UFF-Niterói-RJ
_____________________________________________________________
Prof. Dr. Paulo Knauss
UFF-Niterói-RJ
Niterói
2010
DEDICAÇÃO
À minha família:
Aos meus filhos,
Brummer, Valkíria, Bárbara e Oliver, que, nos diferentes caminhos que traçam, são o
nosso orgulho.
– E, por acompanharem a pesquisa, conferindo dados, medindo e contando fotos,
mostrando surpresa diante das vestes, espaços ou objetos percebidos nas fotos, como por
exemplo, “nossa, já usavam all star...”; ao Oliver, pelas digitalizações e digitações, pelos
questionamentos diante de alguns fatos e por mostrar-se indignado por “toda aquela
parafernalha feita para o carinha (Presidente Geisel) ficar apenas um dia no município”...; ao
Brummer, pelas digitalizações das fotografias e outros documentos incluídos na pesquisa e
por me socorrer naqueles probleminhas básicos de informática dando alertas: “mãe, é só ler as
mensagens...” e, também, pela preocupação diante da quantidade de imagens a digitalizar,
após o retorno de cada “saidinha” e que me tranqüilizava quando dizia, “mãe, já tem mais
fotos para digitalizar?”
Ao meu marido Valdir,
pela paciência (quem o conhece sabe), pelo carinho e pelo amor com que tem tratado
das nossas questões familiares e pelo incentivo para as coisas da vida.
- Também pela dedicação, pelas leituras, correções e sugestões feitas, pelas
reclamações sobre minha teimosia em não encerrar há mais tempo a pesquisa, o que só me
fazia concentrar ainda mais...e, principalmente pela segurança sobre..., sobre (quase) tudo.
Como dizem nossos amigos, “você é o cara!”
Aos demais familiares, especialmente à
Miloca e
Ao sogro, Egídio, aos cunhados Osmar e Clair, in memoriam,
pois, na lembrança, são exemplos de trabalho e de alegria.
Aos meus pais,
Lucia, mulher exemplo extremo de compreensão;
João, homem exemplo de lutas.
AGRADECIMENTOS
– À Profª. Dra. Ana Maria Mauad – orientadora: Preciso dizer que tenho, na pessoa da
minha orientadora, a imagem de uma guerreira, que me impulsionou, que me deu as
coordenadas e que me encaminhou para o fazer. Acompanhando-a nos diferentes eventos, não
foi difícil perceber a correria que a acompanhava, ora dando cursos, ora ministrando palestras,
ora coordenando e participando de mesas-redondas, ora coordenando simpósios. Ainda assim,
enquadramo-nos nos encontros. Portanto, agradeço à professora Ana pela orientação e pelos
encaminhamentos seguros que vieram acompanhados pela luz do seu exemplo.
– À Fundação Araucária, pelo apoio financeiro.
– Ao Programa de Pós-Graduação Interinstitucional UFF-Niterói/RJ e UNICENTRO-
Guarapuava/PR, instituição promotora e receptora.
– À UNIOESTE, pelo apoio institucional através do Programa de Incentivo à
Qualificação e Capacitação de Servidores.
- Ao professor Dr. Marcos Nestor Stein, coordenador do CEPEDAL, pelo apoio
durante as pesquisas naquele centro e pelas observações pertinentes; aos demais colegas de
trabalho desse centro de pesquisa, André Ubenisk, Rosana Déa, Jael, Boris, Daniele, Schainy
e a todos aqueles que se preocuparam e torceram pelo trabalho e pela compreensão
demonstrada.
– Aos colegas do curso, pela receptividade e pelo acolhimento na Unicentro e nas
demais atividades.
– À Bárbara Nagae, pelo incentivo e pelo apoio, pelas gargalhadas e pelos espantos
durante a classificação, a contagem e a medição de fotos.
- À Marta Piloto, Daniel Vilha e Luana Schmitt pela serenidade com que tem
acompanhado nosso dia-a-dia e pelos sorrisos que aliviam quaisquer problemas e deixam tudo
mais alegre.
– A todos os demais que mostraram interesse, incentivando e apoiando.
– Aos professores, especialmente aos coordenadores do Programa de Pós-Graduação
Interinstitucional, Dra. Márcia Menendes Motta e Dra. Marta Abreu, (UFF) e Dra. Beatriz
Olinto, (Unicentro) e, também aos professores dos cursos ministrados, Dra. Ismênia de Lima
Martins, Dr. Paulo Knaus, Dr. Carlos Gabriel Guimarães, Dra. Gislene Neder e Dr. Gisálio
Cerqueira Filho que perceberam especificidades, estimulando e indicando caminhos para a
pesquisa.
– À Dra. Ismênia de Lima Martins pelo incentivo constante.
– Às amigas professoras Drª Lia Dorotéa Pfluck, pelo auxílio na identificação dos
espaços físicos das fotografias; Dra. Marli Schlosser pelo incentivo constante;
-À professora Ms. Neiva Kern Macari pelas sugestões feitas;
– A equipe do Instituto Cultural Casa Gasa: Wilson Hubner, Valdir Gregory, Dorotéia
Koco Gaza, Lia D. Pflück que segurou as pontas principalmente no decorrer de 2009.
- Às colaboradoras da Casa Gasa, Karyn Pflück e Claudiane Prass pelo interesse e
dedicação voluntária às coisas da cultura;
– Ao fotógrafo Levino Boeck, pelas fotografias e pelos depoimentos cedidos.
- A todos aqueles que cederam entrevistas Almiro e Selmira Bauermann, Arlindo
Alberto e Norma Lamb; Irma Hartleben Vorpagel, Veleda Liessen, Helga Port,
A todas as pessoas que auxiliaram nas informações dando dicas, sugerindo, indicando
nomes que poderiam auxiliar na identificação das fotos e pelo esforço em tentar lembrar de
nomes e espaços nas fotografias Gláucia Weirich, Dulce, Rudi Router, Célia Liessem
Schaiane e sua família, seus avós Elly e Nelson Alois Hack,
- Ao João Macena, pela entrevista e conversas mantidas sobre as tantas mudanças que
transportou de uma localidade à outra, na região Sul do país e pelos transportes de
mercadorias tais como produtos agrícolas, fertilizantes, suínos, etc.
– Aos colegas de curso e de viagem, Antonio Myskiw e Fábio André Hahn.
- Para Liris Brigger, Vanusa Ferreira e demais colaboradoras pelo apoio nas lidas do
cotidiano de nossa família;
– À Marcia Elisa Sbaraini Leitzke, pelas correções e pela diagramação.
– Ao professor Célio Escher, pela revisão do texto.
- Especialmente à fotógrafa Írica Kaefer, pela liberação e abertura das “Caixas do
Depósito” de fotografias, pela disponibilização dos equipamentos, pelas entrevistas cedidas e
recepção na residência por incontáveis vezes.
RESUMO
Este é um estudo sobre fotografias e memórias feito a partir do acervo particular de Írica
Kaefer, constituído pela Foto Kaefer, uma das primeiras casas fotográficas da então Vila
General Rondon, com funcionamento desde meados de 1950 até 1990, período que define o
nosso recorte temporal. Na perspectiva teórico-metodológica adotada, a fotografia é
identificada como uma prática social de produção de sentido. A pesquisa, portanto, relaciona
fotografia e memória a fim de discutir o processo de construção social e a relação dos sujeitos
com a história local. As unidades culturais foram organizadas nas categorias espaço
fotográfico, espaço geográfico, espaço do objeto, espaço da figuração e espaço da vivência,
que serviram de base para a análise. Em síntese, após definidas as séries e as quantidades
fotográficas analisadas, então entrevistas, textos, jornais e revistas fundamentaram a relação
percebida entre a cultura fotográfica e a construção de memórias em Marechal Cândido
Rondon/PR, no período 1954 a 1990.
Palavras-chave: Fotografia; Memória; Identidade; Foto Kaefer.
ABSTRACT
This is a study of photographs and memories made from the private collection of Írica Kaefer,
consisting of Photo Kaefer, one of the first houses photographs of the then Village General
Rondon, operating since mid-1950 until 1990, a period that defines our time line. In the
theoretical-methodological approach adopted, the photograph is identified as a social practice
of meaning production. The research, therefore, related photography and memory in order to
discuss the process of social construction and the relation of subjects with local history. The
cultural units were arranged in categories photographic space, geographic space, object space,
figuration space and experience space, having served as a basis for analysis. In synthese, after
defined the photographics series and quantities analyzeds, then interviews, texts, newspapers
and magazines of the perceived relationship between culture and the construction of
photographic memories in Marechal Cândido Rondon, PR, in the period 1954 to 1990.
Keywords: Photography; Memory; Identity; Photo Kaefer
ZUSAMMENFASSUNG
Dies ist eine Studie von Fotos und Erinnerungen aus der privaten Sammlung von Írica Kaefer,
bestehend aus Foto Kaefer, eines der ersten Häuser Fotografien der damaligen Village
General Rondon, der seit Mitte 1950 vorgenommen, bis 1990, eine Zeit, die unsere Zeit Zeile
definiert. In den theoretisch-methodischen Ansatz ist die Fotografie als eine soziale Praxis der
Bedeutung der Produktion identifiziert. Die Forschung, also im Zusammenhang Fotografie
und Erinnerung, um den Prozess der sozialen Konstruktion zu diskutieren und das Verhältnis
der Patienten mit lokalen Geschichte. Die kulturelle Einheiten wurden in Kategorien geordnet
fotografischen Raum, geographischen Raum, Objekt-Raum, Raum und Figuration Raum der
Erfahrung, da sie als Grundlage für die Analyse dienten. Kurz, nachdem die Serie-Kameras
setzen und die Mengen analysiert, dann Interviews, Texte, Zeitungen und Zeitschriften der
wahrgenommenen Beziehung zwischen Kultur und den Bau von fotografischen Erinnerungen
in Marechal Cândido Rondon, PR, im Zeitraum 1954 bis 1990.
Schlüsselwörter: Fotografie; Erinnerung; Identität;. Foto Kaefer.
LISTA DE ILUSTRAÇÕES
Figura 1 - Mapa Oeste do Paraná. ............................................................................................43
Figura 2 – Localização da Região Oeste no Paraná. ................................................................57
Figura 3 - Mapa Divisão e Limites do Município Marechal Cândido Rondon........................
58
Figura 4 - Plano urbano piloto da cidade de Marechal Cândido Rondon, chácaras, colônias e
rede hidrográfica, 1950..............................................................................................
59
Foto 1 - A Serraria....................................................................................................................47
Foto 2 - Área de apoio..............................................................................................................55
Foto 3 - Produção de mandioca................................................................................................69
Foto 4 – A COPAGRIL............................................................................................................72
Foto 5 – Álbum de Bolso - Tamanho Original 6x9 cm............................................................75
Foto 6 - Residência Kaefer e Estúdio Antigo I.........................................................................84
Foto 7 – Residência Kaefer e Estúdio Antigo II.......................................................................85
Foto 8 – Residência Kaefer e Estúdio Antigo III .....................................................................
86
Foto 9 – A nova residência Kaefer I.........................................................................................
88
Foto 10 – Depósito Bicicletaria Kaefer ...................................................................................
89
Foto 11 – Estúdio Fotográfico Kaefer em fins de 1961 ...........................................................
90
Foto 12 – Írica Kaefer e seus equipamentos fotográficos ........................................................95
Foto 13 – Câmara Linhof .......................................................................................................100
Foto 14 – Câmara Exakta .........................................................................................................96
Foto 15 – Bordas Serrilhadas .................................................................................................101
Foto 16 – Bordas Eleitorais ......................................................................................................97
Foto 17 – Câmara Rolleicord .................................................................................................102
Foto 18 – Câmara Rolleiflex ....................................................................................................
97
Foto 19 – Balança e Pesos para Laboratório Fotográfico.........................................................
98
Foto 20 - A Pasta Preta.............................................................................................................99
Foto 21 - A modelo internacional...........................................................................................107
Foto 22 - A modelo local........................................................................................................102
Foto 23 – O olho fechado .......................................................................................................108
Foto 24 – O olho aberto..........................................................................................................103
Foto 25 -A amostra – Retrato de Família ...............................................................................104
Foto 26 - A amostra - Retrato de Casamento .........................................................................105
Foto 27 - O rosto.....................................................................................................................107
Foto 28 - O avô.......................................................................................................................108
Foto 29 – O bilhete.................................................................................................................109
Foto 30 – Envelopes de Papel Laboratório Fotográfico Colorama ........................................110
Foto 31 – Envelope de Papel Laboratório Paranacolor..........................................................110
Foto 32 – Envelopes de Papel Pardo ......................................................................................
111
Foto 33 – O Timbre ................................................................................................................
112
Foto 34 – O paspatour............................................................................................................118
Foto 35 - O retrato ..................................................................................................................113
Foto 36 - As propagandas.......................................................................................................114
Foto 37 - O envelope ..............................................................................................................120
Foto 38 - A formanda .............................................................................................................115
Foto 39 – As finanças.............................................................................................................116
Foto 40 – A gravatinha...........................................................................................................117
Foto 41 – A moça pintada ......................................................................................................119
Foto 42 – O álbum I................................................................................................................125
Foto 43 - O álbum II...............................................................................................................120
Foto 44 – O álbum cor-de-rosa...............................................................................................120
Foto 45 – Time de Futebol Pintado ........................................................................................
121
Foto 46 – No verso da foto.....................................................................................................127
Foto 47 - O ajuste da cor ........................................................................................................
122
Foto 48 – Do “Casamento Preto e Branco”............................................................................129
Foto 49 – Para o “Casamento Colorido” ................................................................................123
Foto 50 – Os aparadores de copos..........................................................................................
129
Foto 51 – As bolsas ................................................................................................................
130
Foto 52 - O Cristo...................................................................................................................131
Foto 53 – A estrada.................................................................................................................138
Foto 54 – O rio .......................................................................................................................132
Foto 55 – A Guardiã no “depóstio de fotos” ..........................................................................133
Foto 56 - Amostras de fotografias de autoria dos Kaefer.......................................................138
Foto 57 - Jovem senhor ..........................................................................................................179
Foto 58 - Jovem senhora.........................................................................................................172
Foto 59 – A dúvida.................................................................................................................180
Foto 60 – A brabeza ...............................................................................................................173
Foto 61 – O sorriso.................................................................................................................174
Foto 62 - As cinco irmãs Vorpagel.........................................................................................175
Foto 63 - Retrato de Casamento .............................................................................................177
Foto 64 – Os familiares no Casamento - I..............................................................................178
Foto 65 – Familiares no Casamento - II .................................................................................
179
Foto 66 - Família Ulhein ........................................................................................................
180
Foto 67 - Retrato de família....................................................................................................181
Foto 68 – O casal de noivos e a mata .....................................................................................182
Foto 69 – O casal de noivos e a residência dos Kaefer. .........................................................183
Foto 70 - Casamento – o grupo familiar.................................................................................184
Foto 71 - Vista aérea. A vila General Rondon .......................................................................185
Foto 72 - Peixes......................................................................................................................186
Foto 73 - Desfile ao lado de parte de uma mata.....................................................................187
Foto 74 – Aula dominical.......................................................................................................188
Foto 75 – O galho fatal...........................................................................................................
189
Foto 76 – Desespero? .............................................................................................................
190
Foto 77 - Ponte pêncil em Guaíra...........................................................................................191
Foto 78 - Jovem no estúdio antigo..........................................................................................
192
Foto 79 - O noivado................................................................................................................
193
Foto 80 - O encontro das irmãs Lemke ..................................................................................194
Foto 81 - O rapaz e a farda .....................................................................................................195
Foto 82 - Noivos no estúdio antigo ........................................................................................196
Foto 83 - A menina e as flores................................................................................................206
Foto 84 - O menino e o cavalinho ..........................................................................................197
Foto 85 – A menina e o cavalinho..........................................................................................198
Foto 86 - Noivos.....................................................................................................................199
Foto 87 - O casal e a casa .......................................................................................................201
Foto 88 - Uma família e a parede ...........................................................................................202
Foto 89-A - Família de Erno Vorpagel...................................................................................212
Foto 89-B – Família de Erno Volpagel ..................................................................................203
Foto 90 - Ruas, construções e o traçado da Praça Willy Barth ..............................................204
Foto 91 - O capotamento do ônibus 287 ................................................................................205
Foto 92 - A mecânica do ônibus 287......................................................................................205
Foto 93 - Campo de futebol....................................................................................................207
Foto 94 - Time de Futebol......................................................................................................207
Foto 95 - Evento religioso ......................................................................................................209
Foto 96 - Caminhão com tora.................................................................................................210
Foto 97 - Retrato de família....................................................................................................
211
Foto 98 - Crianças na varanda................................................................................................
212
Foto 99 – Crianças nas cadeiras .............................................................................................213
Foto 100 – Os peixes ..............................................................................................................214
Foto 101 – A onça ..................................................................................................................214
Foto 102 - Um porco com seu dono .......................................................................................216
Foto 103 – O menino e o suíno. .............................................................................................217
Foto 104 – A carga de suínos e a Família Wiedeck. ..............................................................218
Foto 105 - Uma colheita de soja.............................................................................................219
Foto 106 - Crianças no estúdio...............................................................................................222
Foto 107 – Vista parcial da vila..............................................................................................
223
Foto 108 – Animais na vila. ...................................................................................................
224
Foto 109 - Escola Luterana Concórdia...................................................................................225
Foto 110 – O certificado.........................................................................................................
226
Foto 111 – A faixa..................................................................................................................
228
Foto 112 - As senhoras do esporte .........................................................................................229
Foto 113 – A relojoaria Esmeralda.........................................................................................230
Foto 114 - Vista urbana e uma serraria...................................................................................231
Foto 115 - Moradia em espaço rural.......................................................................................
232
Foto 116 - Jovem e um porco gordo.......................................................................................
233
Foto 117 - Noivos no estúdio antigo ......................................................................................236
Foto 118 - Crianças no estúdio antigo....................................................................................237
Foto 119 - Bebê sentado em mesa sem toalha........................................................................247
Foto 120 - Bebê sentado em mesa com toalha .......................................................................238
Foto 121 - Jovem no sofá .......................................................................................................239
Foto 122 - O casal de fotógrafos testemunham um casamento..............................................241
Foto 123 - O véu da noiva ......................................................................................................251
Foto 124 - O véu e a amiga.....................................................................................................242
Foto 125 - Casamento na igreja..............................................................................................244
Foto 126 - Menina na igreja católica......................................................................................255
Foto 127 - Menino na igreja ...................................................................................................246
Foto 128 - Batizado ................................................................................................................247
Foto 129 - Velório de um bebê...............................................................................................248
Foto 130 - Salão de Festas e Bailes........................................................................................
250
Foto 131 - A boneca do baile .................................................................................................261
Foto 132 - A surpresa do lance?.............................................................................................
251
Foto 133 - A Rainha da Soja. .................................................................................................253
Foto 134 - A bicicleta no estúdio fotográfico.........................................................................255
Foto 135 - Casamento em espaço externo..............................................................................257
Foto 136 - Desfile...................................................................................................................258
Foto 137 – As damas do futebol.............................................................................................259
Foto 138 – Time de futebol Flamengo ...................................................................................260
Foto 139 - Enforcamento de uma senhora..............................................................................261
Foto 140 - Acidente de trânsito ..............................................................................................
262
Foto 141 - Acidente não identificado .....................................................................................
263
Foto 142 - Carnaval................................................................................................................265
Foto 143 - O esforço do goleiro..............................................................................................
266
Foto 144 - Parada cívica.........................................................................................................
268
Foto 145 - Olaria Honke.........................................................................................................269
Foto 146 - Batata-doce no estúdio fotográfico.......................................................................270
Foto 147 - Vista aérea urbana de Marechal Cândido Rondon – PR.......................................271
Foto 148 - Vista rural .............................................................................................................
273
Foto 149 – Paisagem das Cataratas do Iguaçu .......................................................................
274
Foto 150 – Os noivos Vorpagel..............................................................................................287
Foto 151 - Os noivos Router .................................................................................................277
Foto 152 - Sorriso “de ouro” ..................................................................................................278
Foto 153 - Homem com ferimento na cabeça I. .....................................................................279
Foto 154 - Homem atingido na cabeça II ...............................................................................280
Foto 155 - O grupo masculino................................................................................................283
Foto 156 – A procissão...........................................................................................................284
Foto 157 - Homens no bar......................................................................................................285
Foto 158 - Oficina Mecânica..................................................................................................286
Foto 159 - Acidente de trânsito ..............................................................................................287
Foto 160 - Acidente com um fusca.........................................................................................287
Foto 161 – Time de futebol Oeste Paranaense .......................................................................288
Foto 162 – As Professoras e os alunos ...................................................................................289
Foto 163 – A comemoração ...................................................................................................290
Foto 164 – Ademar de Barros em Toledo - PR......................................................................
291
Foto 165 – O dia do Presidente Ernesto Geisel......................................................................
292
Foto 166 - A população do Oeste do Paraná acolhe o presidente Ernesto Geisel..................298
Foto 167 - Professor caipira?..................................................................................................310
Foto 168 - O paletó para o dia do Presidente. ........................................................................300
Foto 169 - A freira..................................................................................................................303
Foto 170 – Campanha política para Jânio Quadros I..............................................................304
Foto 171 – Campanha política para Jânio Quadros II ............................................................315
Foto 172 – Campanha política para Jânio Quadros III...........................................................305
Foto 173 - Meninos no bar .....................................................................................................307
Foto 174 - Um versinho para o Governador do Estado..........................................................
308
Foto 175 - Um registro das crianças.......................................................................................
309
Foto 176 – A carga de pasto...................................................................................................311
Foto 177 – O brinquedo e o bebê ...........................................................................................323
Foto 178 – Dividindo o brinquedo .........................................................................................312
Foto 179 – O homem e seu cavalo .........................................................................................314
Foto 180 - Acidente com patrola............................................................................................315
Foto 181 - Acidente entre um Jeep Rural e um caminhão......................................................316
Foto 182 - O peixe..................................................................................................................
317
Foto 183 - Os tucanos.............................................................................................................
318
Foto 184 - Menina no estúdio novo........................................................................................334
Foto 185 – Desfile cívico. ......................................................................................................336
Foto 186 – Batizado................................................................................................................337
Foto 187 – Casal de noivos ....................................................................................................339
Foto 188 – A dona da casa .....................................................................................................340
Foto 189 – Menina com Rainha do Carnaval 1987................................................................353
Foto 190 - Mulheres e crianças no Carnaval 1987 .................................................................341
Foto 191 – O Bloco carnavalesco “Colô no Samba”..............................................................343
Foto 192 - Crianças em momento da confirmação.................................................................345
Foto 193 - Moça no estúdio....................................................................................................357
Foto 194 - Rapaz no estúdio...................................................................................................346
Foto 195 - A menina e a professora Mirian............................................................................347
Foto 196 – Vista aérea parcial da cidade de Marechal Cândido Rondon...............................348
LISTA DE QUADROS
Quadro 1 - Fotos preto e branco guardadas em caixas pequenas. Tamanho das caixas: 10x15
cm ............................................................................................................................136
Quadro 2 – Fotos preto e branco guardadas em caixa grande. Tamanho da caixa 30x40 cm 139
Quadro 3 - Fotos coloridas guardadas em caixa grande. Tamanho da caixa: 30x50 cm........141
Quadro 4 - Total geral das fotos.............................................................................................143
Quadro 5 - Total de Imagens..................................................................................................144
Quadro 6 - Total Geral de Fotografias e Totais Analisados...................................................153
Quadro 7 – Tema “Vistas, Locais e Paisagens” .....................................................................155
Quadro 8 – Tema “Retratos” ..................................................................................................156
Quadro 9 – Tema “Religião”..................................................................................................156
Quadro 10 – Tema “Produção” ..............................................................................................
157
Quadro 11 – Tema “Tragédias”..............................................................................................
157
Quadro 12 – Tema “Esportes”................................................................................................157
Quadro 13 – Tema “Festividades”..........................................................................................
158
Quadro 14 – Tema “Educação”..............................................................................................
158
Quadro 15 – Tema “Civismo”................................................................................................158
Quadro 16 – Tipo da Foto ......................................................................................................159
Quadro 17 – Enquadramento I e II – sentido e direção..........................................................161
Quadro 18 – Enquadramento III – distribuição dos planos....................................................163
Quadro 19 – Enquadramento IV – objetivo central................................................................164
Quadro 20 – Enquadramento V – arranjo e equilíbrio ...........................................................165
Quadro 21 – Enquadramento VI – arranjo e equilíbrio (linhas).............................................165
Quadro 22 – Nitidez I – Foco.................................................................................................167
Quadro 23 – Nitidez – II – Impressão visual (textual) ...........................................................
167
Quadro 24 – Nitidez – III – Iluminação .................................................................................168
Quadro 25 – Tipos de lugares fotografados ...........................................................................200
Quadro 26 – Distribuição dos temas por grupos x indivíduos e horizontal x vertical ...........276
Quadro 27 – Figuração ...........................................................................................................282
Quadro 28 – Figuração feminina e masculina........................................................................301
Quadro 29 - Variação da ocupação do espaço infantil...........................................................306
LISTA DE ANEXOS
Anexo 1 – Marcha do Povoamento do Estado do Paraná.......................................................
374
Anexo 2 – Localização da Fazenda Britânia ..........................................................................
375
Anexo 3 – Modelo da ficha ....................................................................................................376
Anexo 4 - Modelo da ficha.....................................................................................................377
Anexo 5 – Jornais Editados em Mcrondon – uma síntese......................................................378
Anexo 6 - Elementos da Forma da Expressão........................................................................380
LISTA DE ABREVIATURAS
AACC Associação Atlética Cultural Copagril
ACARPA Associação de Crédito e Assistência Rural do Paraná
ARENA Aliança Renovadora Nacional
ASSUMAR Associação dos Servidores da Unioeste Campus de Marechal Cândido
Rondon
CEPEDAL Núcleo de Documentação e Pesquisa sobre o Oeste do Paraná
CEPRES Comissão de Estudos de Previsão de Safras
COPAGRIL Cooperativa Agroindustrial Copagril
COPEL Companhia Paranaense de Energia
DER Departamento de Estradas e Rodagem
EMATER Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural
INCRA Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária
IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
MCRONDON Marechal Cândido Rondon
MOBRAL Movimento Brasileiro de Alfabetização
PLANEPAR Organização de Planejamento Técnico Econômico
PDE Partido Democrático Cristão
PFL Partido da Frente Liberal
PR Paraná
PRP Partido Republicano Progressista
PTB Partido Trabalhista Brasileiro
RS Rio Grande do Sul
SAAE Serviço Autônomo de Água e Esgoto
UDN União Democrática Nacional
UNIOESTE Universidade Estadual do Oeste do Paraná
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO ...................................................................................................................23
2 FAZENDO PARTE DE UM TERRITÓRIO....................................................................39
2.1 UMA REGIÃO A SER OCUPADA – O OESTE DO PARANÁ......................................39
2.2 A MARIPÁ – UMA COLONIZADORA EM AÇÃO .......................................................49
2.3 MIGRAÇÃO PARA O PARANÁ .....................................................................................56
2.3.1 FOCANDO O OESTE ...........................................................................................................56
2.3.2 INFRAESTRUTURA – VIABILIZANDO A ECONOMIA ............................................................67
2.3.3 1ª EXPOSIÇÃO AGROPECUÁRIA E INDUSTRIAL ÁLBUM DE BOLSO .................................72
3 A PRÁTICA DE FOTOGRAFAR - TRAJETÓRIAS DA FOTO KAEFER ................81
3.1 OS FOTÓGRAFOS............................................................................................................81
3.2 A PLANTAÇÃO DE CAFÉ E A “COLHEITA” DE FOTOGRAFIAS............................82
3.3 CÂMARAS, LUZES, COMERCIALIZAÇÃO.................................................................94
3.4 TRAMITAÇÕES COMERCIAIS DE UMA PRODUTORA FOTOGRÁFICA.............102
3.5 A TRANSIÇÃO DAS CORES ........................................................................................118
3.6 O APAGAR DE UMA LUZ E O ASCENDER DE OUTRAS LUZES. .........................124
4 A COLEÇÃO DE FOTOGRAFIAS DE ÍRICA.............................................................128
4.1 O DEPÓSITO E O SÓTÃO .............................................................................................128
4.1.1 UM B, MUITAS IMAGENS ...........................................................................................134
4.2 LUGARES DE MEMÓRIA: FOTOGRAFIAS E FALAS DE UMA FOTÓGRAFA.....144
5 A ORGANIZAÇÃO DA DOCUMENTAÇÃO EM TEMAS FOTOGRÁFICOS.......151
5.1 A CONSTRUÇÃO DOS TEMAS....................................................................................151
5.2 DESENVOLVIMENTO DA ANÁLISE..........................................................................153
5.2.1 O ESPAÇO FOTOGRÁFICO ................................................................................................154
5.2.1.1 A Agência Produtora e o Período de Produção..........................................................154
5.2.1.2 Tamanho e formato.....................................................................................................155
5.2.1.3 Tipo da foto ................................................................................................................159
5.2.1.4 Enquadramento...........................................................................................................161
5.2.1.5 Nitidez ........................................................................................................................166
5.2.2 O ESPAÇO GEOGRÁFICO ..................................................................................................169
5.2.2.1 A oposição natural x artificial ....................................................................................170
5.2.2.2 A oposição externo x interno......................................................................................208
5.2.2.3 A oposição urbano x rural ..........................................................................................220
5.2.3 O ESPAÇO DO OBJETO ......................................................................................................234
5.2.4 O ESPAÇO DA FIGURAÇÃO ..............................................................................................276
5.2.4.1 A relação entre grupo e indivíduo ..............................................................................276
5.2.4.2 Relação entre espaço feminino e espaço masculino...................................................281
5.2.4.3 “Hoje, o tão esperado dia”..........................................................................................292
5.2.4.4 Relação entre espaço infantil e adulto........................................................................306
5.2.4.5 Os animais acompanham as vivências........................................................................313
5.2.5 DA ARTE DE FOTOGRAFAR AS VIVÊNCIAS .......................................................................319
5.2.5.1 Tempos de fotografar vivências .................................................................................320
5.2.5.2 Realizando passeios e participando de esportes .........................................................322
5.2.5.3 Os retratos e seus espaços...........................................................................................323
5.2.5.4 Celebrando a fé...........................................................................................................325
5.2.5.5 Produzir e crescer .......................................................................................................327
5.2.5.6 Momentos inesperados – as tragédias ........................................................................328
5.2.5.7 Festividades ................................................................................................................330
5.2.5.8 Participando da educação e do civismo......................................................................330
5.2.5.9 Espaço da figuração....................................................................................................332
5.2.6 COLORINDO REGISTROS E VIVÊNCIAS .............................................................................333
5.2.6.1 A expressão fotográfica na produção de fotos coloridas............................................334
5.2.6.2 Investindo no retrato colorido.....................................................................................334
5.2.6.3 Manifestações cívicas e religiosas..............................................................................335
5.2.6.4 Nos casamentos, as cores exibem novas poses e novos objetos.................................338
5.2.6.5 Novos elementos culturais nos espaços da figuração.................................................341
5.2.6.6 Relação entre espaço feminino e espaço masculino...................................................344
5.2.6.7 A vista da cidade ........................................................................................................348
6 CONCLUSÃO....................................................................................................................350
REFERÊNCIAS ...................................................................................................................360
FONTES PRIMÁRIAS ..........................................................................................................360
OBRAS CITADAS ................................................................................................................363
OBRAS CONSULTADAS ....................................................................................................370
ANEXOS ...............................................................................................................................373
1 INTRODUÇÃO
A pesquisa que se apresenta tem por objetivo analisar a experiência de constituição
fotográfica e a sua relação com o processo de construção de memórias em Marechal Cândido
Rondon, no oeste do estado do Paraná. Írica Kaefer foi proprietária, juntamente com o seu
esposo, Oscar Kaefer, da loja fotográfica Foto Kaefer, uma das primeiras casas do ramo na
então Vila General Rondon. Ela constituiu e mantém um acervo documental a partir de sua
atividade. A Foto Kaefer foi constituída em 1954, com a vinda do casal para o Paraná, e
permaneceu funcionando até 1990, quando foram encerradas as atividades com a produção
fotográfica, período que define o nosso recorte temporal. Assim, a análise de fontes visuais,
textuais, orais, jornalísticas
1
, equipamentos e objetos procurou estudar a relação das
fotografias do acervo de Írica Kaefer com a memória e a construção de identidades locais.
Com relação à colonização do Oeste paranaense, mais especificamente da
microrregião de Toledo, a Fazenda Britânia, adquirida em 1946 pela Industrial Madeireira e
Colonizadora Rio Paraná S/A, empresa mais tarde conhecida como Maripá, instalou escritório
em Toledo e, a partir daquele ano, passou a se preocupar com os trabalhos da implantação e
do desenvolvimento da colonização. Para tanto, um plano de ação foi elaborado pela
colonizadora, estabelecendo os principais objetivos da empresa e a infraestrutura básica a ser
montada para atrair e atender aos migrantes que viessem a se instalar na região.
A nossa pesquisa volta-se à construção de memórias na então Vila General Rondon,
distrito de Toledo, vila elevada à categoria de município em 1961, passando a designar-se
Marechal Cândido Rondon. Enfatizamos que o nosso recorte espacial envolve a região
construída pelos migrantes ao se deslocarem para o Paraná, em meados do século XX, até o
ano de 1990, período relacionado com o encerramento das atividades da loja Foto Kaefer,
1
Para obter uma visão sobre os jornais editados em MCRondon verificar o quadro (Anexo 5) elaborado pela
autora.
24
responsável pela produção de fotografias do período, fotografias que se tornaram objeto e
fonte da nossa pesquisa.
Kalervo e Jabine
2
, em pesquisa publicada no ano de 1960, escreveram sobre as
atividades desenvolvidas pela colonizadora e sobre os recursos financeiros empregados pela
Maripá, que teve sede em Toledo. Evidenciam a existência de muita mata na região,
destacando que “As extensas florestas de pinheiros e de madeiras de lei foram, desde o
começo, uma fonte de rendas e a exploração de serrarias foi uma importante atividade da
companhia através de sua existência”. Os migrantes que se deslocaram para esse espaço
oestino-paranaense vieram de locais mais desenvolvidos e com características socioculturais
diversas.
Busca-se entender a trajetória desses migrantes, também considerados colonos, os
quais, ao se depararem com o espaço escolhido para desenvolverem o seu novo projeto de
vida, encontraram diante de si uma floresta de mata fechada, e busca-se perceber como
ocorreu a organização e o desenvolvimento dessa comunidade, cujos integrantes procuraram
transportar, para a região, as suas crenças, os seus valores e os seus hábitos culturais, mas, ao
mesmo tempo, desenvolveram outras características no seu modo de vida. Para tanto, procura-
se analisar como se deu o processo de construção de registros sobre o cotidiano local, análise
feita pelo diálogo com o conjunto de fotografias produzidas pela Foto Kaefer, uma das
principais referências na produção cultural fotográfica local e responsável pela constituição de
parte da documentação fotográfica durante as transformações histórico-sociais ocorridas no
período em estudo.
Salienta-se que, durante a nossa pesquisa de mestrado, no decorrer de 2002,
deparamo-nos com um valioso acervo privado relacionado com a produção da Foto Kaefer --
acervo guardado e preservado por Írica Kaefer. Írica, atualmente com 78 anos de vida, falou,
naquela oportunidade, das suas experiências como fotógrafa, ocasião em que nos foi relatado
que ainda mantêm preservadas, na sua residência, caixas de fotografias, diferentes câmaras
fotográficas e outros equipamentos utilizados na trajetória profissional. Esse acervo de
fotografias e equipamentos integra esta pesquisa.
O casal de fotógrafos, Írica e Oscar Kaefer, com os filhos pequenos, migrou de
Piratuba, Santa Catarina, em fevereiro de 1954, para General Rondon, atraídos pelas notícias
da boa produção do café, no Paraná, pois “era muito famoso, falavam do café, que ia dar
2
OBERG, Kalervo; JABINE, Thomas. Toledo: um município da fronteira oeste do Paraná. Rio de Janeiro: Ed.
SSR, 1960. p. 34. Os autores são antropólogos e produziram um estudo a partir de documentação e
informações oficiais da Maripá e de levantamentos feitos em meados da década de 1950 na área desta
colonizadora. É um estudo usado como referência em diversos trabalhos acadêmicos.
25
muito bem o café”
3
. Ocorre, porém, que a região foi afetada por fortes geadas, que destruíram
os cafezais. O casal, mesmo assim, permaneceu na região e passou a investir no ramo
fotográfico, arte que já desenvolviam em Santa Catarina.
Essa produção de fotografias preservada e tomada como objeto de estudo pode ser
entendida como uma documentação importante e original para trabalhar a cultura fotográfica
desenvolvida em Marechal Cândido Rondon e relacioná-la com a construção de memórias
locais. O uso e o domínio minucioso dos produtos químicos, do revelador, do fixador e da
balança utilizada na época continuam sendo rememorados junto ao acervo preservado.
Fotografias foram encomendadas e retiradas por pessoas da época, porém uma parte delas
continua sendo guardada pela fotógrafa. Írica Kaefer as mantém num local que denomina de
“depósito”, quarto que fica nos fundos da sua residência. Trata-se de fotografias antigas, não
retiradas por quem as encomendou e que registraram aspectos históricos, sociais e culturais da
sociedade local.
Parte das fotos não retiradas foi jogada no lixo, porque Írica não sabia o que fazer com
elas. Além de materiais e equipamentos, a quantidade de fotos guardadas dentro das “caixas
do depósito” apontou para algumas interrogações, considerando-se que alguns registros foram
feitos há quase meio século. A interrogação principal é: – Por que essas fotos não retiradas
permanecem ali, guardadas em envelopes, dentro de pequenas caixas, reunidas em caixas
maiores, de papelão, decorrido tanto tempo?
Pomian
4
, ao referir-se à vida material dos homens e à sua relação com os objetos,
entende que:
A actividade produtiva revela-se, portanto, orientada em dois sentidos diferentes:
para o visível, por um lado; para o invisível, por outro lado; para a maximização da
utilidade ou para a do significado. As duas orientações, embora possam coexistir em
certos casos privilegiados, sã
o todavia opostas na maior parte das vezes... mas
existem objectos que parecem ser ao mesmo tempo coisas e semióforos... e os que
são privados de valor; de facto, já não são objectos, são desperdícios
5
.
O material preservado no acervo refere-se à utilidade e a significados. Ao se observar
a trajetória das fotografias produzidas pela Foto Kaefer, percebe-se que, num primeiro
momento, podem ser consideradas como “objectos” úteis, pois, servindo para o consumo,
eram vendidas para diferentes receptores, satisfazendo diferentes necessidades. Algumas, no
3
KAEFFER, Írica. Entrevista concedida para Lucia Teresinha Macena Gregory. Marechal Cândido Rondon, 5
jul. 2002.
4
POMIAN, Krzysztof. Colecção. In: ENCICLOPÉDIA Einaudi. Porto: Imprensa Nacional - Casa da Moeda,
1997. v. 1 – Memória-História.
5
Idem, p. 71.
26
entanto, passam, posteriormente, pelo descarte e são jogadas no lixo, pois, sem valor, podem
ser considerados “desperdícios”. O que dizer, no entanto, das fotografias que Írica Kaefer
guarda no seu depósito, “mantidas sob proteção especial?”. Quem sabe, aguardam uma
oportunidade para serem “expostas ao olhar” de curiosos, de pesquisadores, de admiradores
de arte, de colecionadores, da população, de quem as registrou, de quem as encomendou, de
quem foi flagrado até sem saber... Para o momento, os equipamentos e as fotografias
preservadas por Írica Kaefer servirão como fonte da nossa pesquisa.
As reflexões sobre as questões técnicas, as situações socioeconômicas, familiares e
sobre o conteúdo das fotografias reunidas no “depósito” particular, a relação da casa
fotográfica com o mercado da fotografia, com a produção de imagens locais, mereceram
atenção especial na elaboração do conhecimento sobre a dinâmica da cultura fotográfica,
sobre a memória e sobre a história representadas na documentação pesquisada.
Segundo Chartier
6
,
a história cultural, tal como a entendemos, tem por principal objecto identificador o
modo como em diferentes lugares e momentos uma determinada realidade social é
construída, pensada, dada a ler. ... As lutas de representações têm tanta importância
como as lutas econômicas para compreender os mecanismos pelos quais um grupo
impõe, ou tenta impor, a sua concepção do mundo social, os valores que são os seus,
e o seu domínio.
Pode-se entender a representação sobre as vivências registradas nas fotografias, como
a vontade de tornar presente o momento vivido que, uma vez realizado, é passado. O ato de
fotografar parte da história do espaço e das pessoas da região estudada é uma opção que nasce
“de uma determinada realidade social” que quer se tornar visível, através de imagem fixada
no documento fotográfico. Nos diferentes objetos, pessoas, animais e espaços físicos
registrados estão representados valores sociais, religiosos e econômicos que se misturam,
elaboram e re-elaboram na tentativa de realizar o interesse de um determinado grupo social,
quer seja ele produtor/emissor, receptor, expositor, divulgador ou colecionador do bem
material produzido.
Entende-se relevante a produção fotográfica e os equipamentos que continuam sendo
preservados, até a atualidade, por considerá-los uma demonstração da busca pela construção
de memórias e de identidade(s) locais, por parte de Írica Kaefer, que participou da elaboração
dessas imagens, descartou algumas e selecionou outras, revelando-se uma guardiã desses
documentos.
6
CHARTIER, Roger. A História cultural: entre práticas e representações. Lisboa : Difel, 1990. p. 16 e 17.
27
As fotografias dos Kaefer, ao deixarem de circular, passaram a integrar uma coleção,
recebendo “proteção especial” de uma instituição privada. As fotografias deixaram de
pertencer ao circuito econômico para “participar no intercâmbio que une o mundo visível e o
invisível”
7
. As fotografias feitas por esses primeiros fotógrafos de Marechal Cândido Rondon
são imagens de vida, imagens que ora mostram aspectos do cotidiano, outras vezes momentos
festivos e que, no seu conjunto, mostram a trajetória de migrantes, na maioria colonos, e o
desenvolvimento que os acompanhou ao se deslocaram para o Oeste paranaense.
Conceituar a categoria coleção remete-nos ao estudo de Krzysztof Pomian
8
. Ao definir
coleção, lembra que é preciso evidenciar um paradoxo relacionado a esse conceito, paradoxo
que assim é resumido: “Numa palavra, e é este o paradoxo, [as coleções] têm um valor de
troca sem ter um valor de uso”. Quanto ao conceito de coleção, este é explicitado como
“qualquer conjunto de objectos naturais ou artificiais, mantidos temporária ou definitivamente
fora do circuito das actividades económicas”, no caso sendo fotos especialmente guardadas e
protegidas e atualmente “expostas ao olhar”.
A pesquisa, portanto, pretende relacionar fotografia e memória a fim de discutir o
processo de construção cultural e a relação dos sujeitos na história local. Buscou-se reunir e
analisar documentos textuais sobre a história da região, com o objetivo de contextualizar a
realidade local com as situações econômicas e políticas que envolvem o Estado do Paraná e a
nação brasileira.
Também, se faz uso da metodologia da História Oral. Através de entrevistas, de
depoimentos e de conversações, foram levantadas informações para identificar a relação dos
integrantes da Foto Kaefer com a produção fotográfica local e a construção de lembranças de
migrantes, que, dos seus locais de origem sulina, partiram para uma região que estava por se
desenvolver e se constituir como sociedade no flanco oeste do território paranaense.
Ao analisar as teorias explicativas sobre identidades no Brasil -- teorias escritas em
fins do século XIX e início do século XX --, Renato Ortiz percebe que várias interpretações
são elaboradas por intelectuais brasileiros na busca da construção de uma identidade nacional.
Segundo esse autor, as teorias científicas europeias têm influenciado intelectuais brasileiros
na sua compreensão e na elaboração de uma nação. As definições iniciais sobre meio e raça
vão se modificando e novos elementos irão definir a interpretação da realidade do país
9
.
Participam das análises membros de órgãos normativos, intelectuais, estudantes e políticos.
7
POMIAN, op. cit., p. 66.
8
Idem, p. 51-86.
9
ORTIZ, Renato. Cultura brasileira e identidade nacional. São Paulo: Brasiliense, 1985. p. 13-35.
28
Intelectuais ligados aos órgãos do governo insistem na preservação das manifestações
voltadas ao passado brasileiro, cultivando nomes, datas, tradições folclóricas, etc. Essas
manifestações culturais são vistas como patrimônio brasileiro e precisariam ser preservadas. É
ainda Renato Ortiz que esclarece o conceito de patrimônio, percebendo que o seu significado
compreende duas dimensões: uma voltada ao ser brasileiro e outra ao acervo material criado
pela história. Membros dos órgãos oficiais culturais, numa valorização da temática
patrimonial, foram orientados por essa política que levou à preservação e à defesa dos bens
culturais, representados através dos museus, dos arquivos, do folclore.
Lilia M. Schwarcz
10
, no texto “Nem preto nem branco, muito pelo contrário: cor e
raça na intimidade”, também aponta como cientistas e pesquisadores brasileiros
manifestavam a sua expectativa em relação ao branqueamento do país e mostra que, aos
poucos, a miscigenação passou a ser exaltada, valorizando-se a mistura racial vinculada ao
tema da identidade. Novos elementos integraram o debate intelectual e passaram a fazer parte
de noções de nacionalidade, elementos como a feijoada, a capoeira, o samba, o candomblé, o
futebol, etc.
A ideologia apresentada por intelectuais durante o Estado Novo procurou adequar a
população ao processo de desenvolvimento econômico-social do país e novos conceitos foram
adotados na definição da identidade brasileira, quando o conceito de raça foi substituído por
cultura. Sobre aspectos relacionados à educação e à cultura desse período, na obra “Tempos
de Capanema”
11
temos um estudo enfocando a atuação desse ministro da Educação,
mostrando que “a constituição da nacionalidade deveria ser a culminação de toda a ação
pedagógica do ministério...”. Desse modo, a educação transmitida nas escolas deveria ter um
conteúdo nacional quando símbolos como a Bandeira e o Hino Nacional e personalidades
históricas passaram a integrar os currículos escolares, enquanto que a universidade teria que
representar “ao mesmo tempo, o núcleo da cultura brasileira”
12
, ou seja, a universidade
deveria estar preocupada com uma política de nacionalização e participando da construção da
identidade brasileira.
Uma visão sobre a preocupação com a nacionalidade brasileira é apresentada por
Paulo Knauss em seu texto “O Homem Brasileiro Possível – monumento da juventude
10
SCHWARCZ, Lilia Moritz. Nem preto nem branco, muito pelo contrário: cor e raça na intimidade. In:
NOVAIS, Fernando A. (Org.). História da vida privada no Brasil. São Paulo: Cia. das Letras, 1998. v. 4. p.
174-243.
11
SCHWARTZMAN, Simon; BOMENY, Helena Maria Bousquet; COSTA, Vanda Maria Ribeiro. Tempos de
Capanema. São Paulo: Paz e Terra: Fundação Getúlio Vargas, 2000.
12
Idem, ibidem.
29
brasileira”
13
. Knauss apresenta uma noção da disputa e do debate gerado em torno da
construção e do local a ser destinado a uma estátua, na década de 1930. A referida estátua
deveria “representar o Homem Brasileiro”. Paulo Knauss afirma que “o poder instituído
costuma se representar”, através de comemorações, a exemplo dos monumentos e através das
manifestações sociais.
Em termos de legislação governamental temos, no caso do Paraná, no ano de 1935, a
criação da Lei Estadual nº 1.211/1935, que dispõe sobre o “patrimônio histórico, artístico e
natural do estado do Paraná”, lei que definiu o conjunto patrimonial de interesse do Estado. A
criação dessa e de outras leis, em nível do poder público municipal, estadual ou nacional,
demonstra a atuação de governos, os quais, através da área cultural, passam a implementar
ações voltadas à proteção de bens de valor histórico-cultural nas diferentes regiões do país e
com grande ênfase concedida “a fatos históricos memoráveis”
14
.
Transformações políticas e econômicas, o crescimento da classe média e a
concentração da população em grandes centros urbanos são fatores que elevaram a criação de
espaços culturais onde os “bens simbólicos”, usando expressão de Ortiz, tiveram um consumo
mais significativo. Os membros dos órgãos oficiais de cultura, valorizando a temática
patrimonial, foram orientados por essa política que levou à preservação e à defesa de bens
culturais, representados através dos museus, dos arquivos e através do folclore.
Segundo observações de Helenice da Silva
15
, as temáticas culturais continuam
chamando a atenção de intelectuais, os quais tomam a cultura como objeto de pesquisa, pois
“conceito pertinente na abordagem dos fenômenos políticos e históricos atuais, a cultura,
entendida como valores, representações, símbolos e patrimônio, assimilados e compartilhados
por uma comunidade”, integra as discussões das ciências humanas.
Questões como as que foram apresentadas podem ser verificadas na mesma época,
embora em proporções distintas, na região Oeste do Paraná. Entendemos que a discussão da
identidade pode passar por diferentes aspectos e as manifestações culturais locais representam
parte dessa problemática.
Fazendo uso dos recursos apresentados pela metodologia da História Oral
16
,
analisaram-se entrevistas realizadas com a fotógrafa com o intuito de buscar informações
sobre a sua participação no ramo fotográfico e o desenvolvimento desse empreendimento.
13
KNAUSS, Paulo. O homem brasileiro possível: monumento da juventude brasileira. In: KNAUSS, Paulo
(Coord.). Cidade vaidosa: imagens urbanas do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro: Sette Letras, 1999. p. 29-44.
14
Site: <www.pr.gov.br> -- Secretaria de Estado da Cultura: < www.iphan.gov.br>.
15
SILVA, Heleni Rodrigues da. Cultura, Culturalismo e identidades: reinvindicações legítimas no final do
século XX? Tempo, Niterói, v. 9, n. 17, jul. 2004.
16
ALBERTI, Verena. História oral: a experiência do CPDOC. Rio de Janeiro: Ed. FGV, 1990.
30
Uma infinidade de objetos e diversas situações do passado dessa região foram esquecidas,
desfeitas ou transformadas, a exemplo de algumas fotografias que foram descartadas. Por que
certas fotografias e equipamentos permanecem no “depósito”? Acredita-se que a coleção
particular de fotografias de Írica Kaefer tem participação na afirmação de valores e
lembranças relacionadas à memória, à dinâmica do desenvolvimento local.
Entende-se, a exemplo de Mauad, que a fotografia “é resultado de um trabalho social
de produção de sentido, pautado sobre códigos convencionalizados culturalmente”
17
. Sua
produção se dá através de relações sociais que ocorrem num determinado tempo e espaço.
Ao analisar o uso da fotografia pelas Ciências Humanas, Miriam L. M. Leite
18
afirma
que a fotografia é o registro carregado de uma dualidade, ou seja, a fotografia como objeto e o
conteúdo dela. Considera que ambos devem ser levados em conta e que os trabalhos com
fotografias requerem uma linguagem verbal que identifique os personagens e os lugares dos
acontecimentos, pois, sem uma legenda mínima, “a fotografia pode ser um elemento mudo,
além de propiciar decodificações ambíguas”.
Na introdução de obra dedicada à fotografia, Mauad
19
destaca que: “Há mais de 100
anos a fotografia vem registrando a história numa linguagem de imagens. No entanto, só
recentemente a historiografia passou a tratá-la como objeto de investigação e de interesse para
além de um inventário de técnicas e aparatos”. O historiador, principalmente a partir da
“Escola dos Annales”, vê-se diante do recurso de novas linguagens, ou seja, novas formas de
registros históricos, visto que, a partir da década de 1970, passou a ter outras concepções de
história. A renovação historiográfica, no entanto, ao possibilitar novos campos de estudos na
área de história, também trouxe dificuldades, gerou controvérsias e debates em torno dos
“novos paradigmas” apresentados ao pesquisador.
Cardoso e Mauad
20
reconhecem os “múltiplos enfoques” atribuídos às imagens por
pesquisadores e especialistas que vêm reconhecendo os “apelos” dos fundadores dos Annales.
“Materialização da experiência vivida, doce lembrança do passado, memória de uma trajetória
de vida, flagrantes sensacionais, ou ainda, mensagens codificadas em signos. Tudo isso, ou
nada disso, a fotografia pode ser”. Concebem-se, portanto, as fotografias como a elaboração
17
MAUAD, Ana Maria. Através da imagem: fotografia e história – interfaces. Tempo, Rio de Janeiro, v. 1, n. 2,
p. 73-98, 1996.
18
LEITE, Miriam Moreira. O retrato de casamento. In: _____. Retrato de família: leitura da fotografia
histórica. São Paulo: EDUSP, 1993. p. 86
19
MAUAD, Ana Maria. Apresentação. Anais do Museu Histórico Nacional, Rio de Janeiro, v. 32, p. 11, 2000.
20
CARDOSO, Ciro Flamarion; MAUAD, Ana Maria. História e imagem: os exemplos da fotografia e do
cinema. In: CARDOSO, Ciro Flamarion; VAINFAS, Ronaldo (Org.) Domínios da história: ensaios. 5. ed.
Rio de Janeiro: Campus, 1999. p. 405.
31
de discursos produzidos através de códigos e de signos que se procura interpretar neste
trabalho.
Entende-se também, a exemplo de Le Goff
21
, que a fotografia pode ser considerada
como um documento que possibilita o estudo do passado, pois é um testemunho visual que
acompanha a memória da sociedade. A fotografia “revoluciona a memória: multiplica-a, dá-
lhe uma precisão e uma verdade visual nunca antes atingida, permitindo assim guardar a
memória do tempo e da evolução cronológica”. Nesse sentido, consideram-se as fotografias
do acervo de Írica como um registro carregado de vivências ocorridas num determinado
contexto histórico. Ainda fazendo referência a Le Goff, cabe dizer que todo documento é
monumento, porém “Só a análise do documento enquanto monumento permite à memória
coletiva recuperá-lo e ao historiador usá-lo cientificamente, isto é, com pleno conhecimento
de causa”. Írica, ao preservar os documentos, ela, à sua maneira, está fazendo a sua parte.
Considera-se a coleção como um documento/monumento. É um monumento, porque é
representado pela herança produzida através de registros visuais; e como um documento, pela
vida ali registrada e pela possibilidade de uma reconstituição histórica que as fotografias
possibilitam. Aqui está o papel da historiografia.
Para desenvolver a nossa pesquisa, analisam-se fotografias organizadas por séries
temáticas a partir de categorias espaciais, adotando metodologia indicada por Mauad
22
.
Segundo a autora, “a fotografia comunica através de mensagens não verbais, cujo signo
constitutivo é a mensagem” e, para compreendê-la, o pesquisador precisa perceber as
“funções sígnicas” da imagem, ou seja, ainda segundo a autora, compreender que a mensagem
é estruturada “a partir de uma escolha efetuada em um conjunto de escolhas então possíveis”.
Para tanto, Mauad
23
organizou duas fichas de análise “no intuito de decompor a imagem
fotográfica em unidades culturais”, as quais levam à distinção entre “elementos da forma da
expressão e elementos da forma do conteúdo” que remetem ao levantamento de itens que
compõem a fotografia, itens “concebidos como unidades culturais”. Ao se observarem
elementos da forma do conteúdo, será levada em consideração “a relação dos elementos da
fotografia com o contexto no qual se insere remetendo-se ao corte temático e temporal” e
21
LE GOFF, Jaques. História e memória. 2. ed. Campinas, SP: Editora Unicamp, 1992. p. 544-545.
22
MAUAD, Apresentação, 1996, op. cit. p. 92. Ver também esta tese para maior compreensão sobre iconografia.
23
MAUAD, Ana Maria. Sob o signo da imagem: a produção de fotografias e o controle dos códigos de
representação social da classe dominante, no Rio de Janeiro, na primeira metade do século XX. Niterói, 1990.
Tese (Doutorado em História) – UFF. p. 23.
32
serão observados elementos da forma da expressão, o que levará em consideração “a
compreensão das opções técnicas e estéticas
24
da produção fotográfica.
As unidades culturais organizadas em categorias espaciais servirão de base para a
nossa análise. As categorias se distinguem em: espaço fotográfico, espaço geográfico, espaço
do objeto, espaço da figuração e espaço da vivência. O espaço fotográfico “compreende o
recorte espacial processado pela fotografia”, onde se procura analisar como ele se organiza
considerando-se os itens apresentados no plano da expressão fotográfica
25
.
O espaço geográfico volta-se ao espaço físico representado na fotografia. Através
desse item, se procurou caracterizar os lugares fotografados, oposições que apresentam entre
cidade e campo, entre fundo artificial e fundo natural, entre espaço interno e externo, assim
como locais, datas e atributos da paisagem, os quais estão voltados ao plano do conteúdo
26
.
Com a categoria espaço do objeto, se observam e se analisam os objetos fotografados
e incluídos na imagem fotográfica
27
. A partir dessa categoria são analisados os objetos, as
experiências vividas e o espaço construído. Itens como o tema da foto, as pessoas e a
paisagem são analisados nessa categoria, contidos no plano do conteúdo. Procura-se, assim,
perceber a relação existente entre os diferentes tipos de objetos, objetos de interiores, de
exteriores, pessoais, as atividades desenvolvidas no novo espaço e sua relação com os objetos.
A categoria do espaço da figuração analisa as pessoas retratadas, a natureza desse
espaço, a hierarquia das figuras e os seus atributos. Essa categoria é composta pelos itens,
pelas pessoas retratadas e pelos atributos das pessoas, também voltados ao plano do conteúdo.
Integram essa categoria os itens de distribuição dos planos e o objetivo central, referentes ao
plano da expressão
28
. Ao abordar-se o espaço da figuração, faz-se referência também aos
animais retratados.
O espaço da vivência “é concebido como uma categoria sintética, por incluir todos os
espaços anteriores e por ser estruturada a partir de todas as unidades culturais. É a própria
síntese do ato fotográfico”
29
. São analisadas as atividades, eventos e momentos eleitos para o
registro fotográfico. Os índices a serem observados nessa categoria são o tema da foto, locais
retratados, figuração, produtor e opções técnicas.
24
MAUAD, Ana Maria. Na mira do olhar: um exercício de análise da fotografia nas revistas ilustradas cariocas,
na primeira metade do século XX. Anais do Museu Paulista, São Paulo, v. 1, n. 13, p. 145, 2005.
25
MAUAD, Sob o signo da imagem, 1990, p. 24.
26
Idem, p. 24.
27
Idem, p. 24.
28
Idem, p. 24.
29
Idem, p. 24.
33
Nesse sentido, no primeiro momento da pesquisa, procura-se situar a região Oeste do
Paraná, (re)ocupada e colonizada a partir da década de 1950, mostrando a atuação da
Industrial Madeireira e Colonizadora Rio Paraná S/A (Maripá) e a sua relação com os
migrantes, vindos principalmente do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina. Mostra-se que,
no final do século XIX e no início do século XX, havia muito interesse pelas terras na região
da fronteira oeste do Paraná devido à diversidade de espécies de madeiras encontradas na
região e devido à erva-mate, o que proporcionava bons negócios aos especuladores.
Destacam-se medidas governamentais adotadas em âmbito do Estado do Paraná e
demonstra-se que havia uma relação entre as medidas de caráter regional e o conjunto de atos
nacionais que versavam sobre a integração territorial. Entende-se que as relações políticas e
culturais nacionais tiveram envolvimento e repercussões nas relações espaciais locais. Nesse
sentido, procura-se mostrar a infraestrutura básica apresentada pela empresa colonizadora
através da adoção de um plano de colonização.
Contextualiza-se o pioneiro, também considerado como colono e migrante, e a sua
relação com a dinâmica e o desenvolvimento da nova região colonizada. O conceito desse
pioneiro, para Leo Waibel
30
, está vinculado ao de agricultor, homem apto a transformar a
mata numa nova paisagem e explorar pequena propriedade rural com o auxílio dos familiares,
que não estivessem interessados nem no trabalho escravo, nem na criação extensiva de gado:
“O novo tipo de colono deveria ser tanto soldado quanto agricultor, para poder ao mesmo
tempo defender sua terra e cultivá-la”
31
. Ele se constitui, portanto, no contexto da substituição
da escravidão pelo trabalho livre. No caso desta região, o pioneiro era entendido como aquele
que desbravou uma área de fronteira e ocupou terras onde viviam indígenas e caboclos. O
pioneiro não é o primeiro, mas o que domina. Isso se dá numa situação de conflito.
32
Procura-se perceber a relação dos migrantes com a colonização da região Oeste do
Paraná, a qual teve a participação preponderante de descendentes de imigrantes alemães,
italianos e poloneses, vindos do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina – sul do país. A estes
migrantes somaram-se migrantes vindos de outras áreas e de outras origens e os homens e
30
WAIBEL, Leo. Capítulos de geografia tropical e do Brasil. 2. ed. Rio de Janeiro: Ed. IBGE, 1979. O autor é
alemão e fez estudos sobre imigração e colonização no Brasil, sendo esta obra considerada um clássico sobre
este tema publicado na década de 1950.
31
Idem, p. 231.
32
Ver MARTINS, José de Souza. Fronteira: a degradação do outro nos confins do humano. São Paulo:
Hucitec, 1997.
34
mulheres já estabelecidos anteriormente na região, ou seja, os considerados índios, caboclos,
paraguaios e outros. Segundo Pflück
33
[...] Marechal Cândido Rondon denota a presença de diferentes grupos culturais e ou
étnicos no local e região. Enquanto Fazenda Britânia ou Obrage, aqui conviveram
espanhóis (argentinos e paraguaios), ingleses; com a colonização a partir de
1949/1950, vieram descendentes de alemães, de italianos, de poloneses, além de
grupos menores do próprio Estado, do sul do país e de outros.
Acredita-se que as memórias locais, trabalhadas através da documentação e dos
registros produzidos e preservados, ou descartados, participam dos diferentes “lugares de
memória” que, para Pierre Nora
34
, se constituem “nos três sentidos da palavra, material,
simbólico e funcional, simultaneamente”. Entende-se, portanto, que, quanto ao acervo de Írica
Kaefer, identidades locais poderão estar se evidenciando e se (re)constituindo através das
lembranças e das rememorações dos acontecimentos e das experiências que a história
representada nas fotografias procurou mostrar e valorizar. Esta memória implica em seleção,
descarte, opção. As fontes trabalhadas, principalmente a coleção de fotografias, são resultado
de seleção.
No segundo momento da pesquisa se faz a historicização da Foto Kaefer. Mostra-se a
casa fotográfica através do levantamento de informações e entrevistas, onde se evidenciam os
seus proprietários e auxiliares e o interesse do casal Kaefer em migrar de Santa Catarina para
o Paraná, a tentativa de investimentos na agricultura, a frustração com a plantação de café e a
decisão de reorientar os negócios e optar pelo ofício de fotografar. Informa-se sobre as
condições de infraestrutura encontradas pelo casal quando se instalou na região, os materiais e
os equipamentos utilizados para desenvolverem o trabalho com a fotografia e as dificuldades
enfrentadas por esses profissionais.
O casal Kaefer procurou uma nova região para se estabelecer. Sabe-se que a noção de
região tem se ampliado, e o seu sentido pode ser operacionalizado sob diferentes perspectivas,
quando se aborda a questão espacial do Oeste paranaense, evidenciando-se os meandros do
processo de instituição da sociedade local. Nesse sentido, como já mencionado, General
Rondon, hoje Marechal Cândido Rondon, foi distrito de Toledo, emancipando-se em 1961.
No efervescer das demandas no sentido de se ocupar a fronteira, o casal tomou rumo ao
chamado Oeste paranaense, tentando a sorte e procurando se estabelecer, atuando com a
33
PFLÜCK, Lia. Riscos ambientais: enxurradas e desabamentos na cidade de Marechal Cândido Rondon-PR.
Florianópolis, 2009. Tese (Doutorado em Geografia) – Universidade Federal de Santa Caratina, p. 48.
34
NORA, Pierre. Entre memória e história: a problemática dos lugares. Projeto História, São Paulo, n. 10, p. 21,
dez. 1993.
35
colonizadora e com os migrantes que, da mesma forma, buscaram realizar sonhos e melhorar
de vida. Para tanto, precisaram fazer bons negócios.
A fotógrafa Írica Kaefer apontou, nas entrevistas, dificuldades econômicas pelas quais
passou e ressaltou a sua experiência como fotógrafa, oportunidade em que revelou a
existência de “caixas do depósito” onde eram guardadas fotografias não retiradas, após a sua
encomenda, desde o início das suas atividades no Paraná até o encerramento da casa
fotográfica em 1990. Mostram-se, assim, através de texto, de falas e de imagens, opções
fotográficas e os interesses manifestados em torno da prática de fotografar no período da
colonização recente do Oeste paranaense.
No terceiro momento da pesquisa, se percorre a dinâmica da constituição da coleção
particular de fotografias preservadas por Írica Kaefer. Percebendo a fotografia como objeto de
coleção, as pesquisadoras Vânia Carneiro de Carvalho e Solange Ferraz de Lima
35
apontam
que a prática de colecionar objetos está vinculada a colecionadores particulares e a
colecionadores de instituições. Estudos sobre a arte de colecionar mostram as funções, as
regras de organização e outros aspectos relacionados ao colecionador e aos objetos de
coleção. As pesquisas apontam que coleções particulares estão muito voltadas a “efeitos
estéticos” e a formas de lazer e que as estratégias do colecionismo particular se relacionam
com as institucionais. “Se a produção e o gerenciamento de coleções aproximam as duas
experiências, os objetivos diversos (lazer/trabalho) deveriam fazer divergir o processo
institucional daquele particular, o que por vezes não acontece”. As autoras mencionadas
chamam a atenção no sentido de que o pesquisador precisa perceber que cada forma de
coleção possui uma “dinâmica própria”, o que ocorre com a Foto Kaefer.
Paulo Knauss
36
, referindo-se à arte e à prática de colecionar, entende a arte como “fato
da história política, confunde história da imagem artística com a história do poder simbólico”,
sendo que “as práticas contemporâneas de colecionar são dependentes da constituição de um
mercado livre de circulação de mercadorias”. Dessa forma, pode-se entender que, no caso da
coleção particular de Írica Kaefer, a constituição do acervo deve ser relacionada com a
dinâmica social do lugar e do tempo em que ocorreu, ou seja, “na confluência e
entrelaçamento” dos agentes, da vinculação com a realidade em que vivem e com as
instituições a que servem. No nosso caso, mostram-se os cuidados demonstrados para com a
coleção de fotografias, vista como uma coleção particular.
35
LIMA, Solange Ferraz de; CARVALHO, Vânia Carneiro de. Fotografias como objeto de coleção e de
conhecimento. Anais do Museu Histórico Nacional, Rio de Janeiro, v. 32, p. 17, 2000. p. 17.
36
KNAUSS, Paulo. O cavalete e a paleta: arte e prática de colecionar no Brasil. Anais do Museu Histórico
Nacional, Rio de Janeiro, v. 33, p. 40, 2001.
36
Fica, nesse sentido, contextualizada a formação do acervo, a sua localização e a
dinâmica das atividades em torno da seleção e do descarte das fotografias de Írica.
Quanto ao trabalho específico de acesso à coleção, iniciou-se o trabalho abrindo as
caixas, atividade que fez aparecer a sensação de se estar abrindo um velho baú. Realizar um
diagnóstico sobre o conjunto documental fotográfico, objeto da nossa pesquisa, foi tarefa
significativamente difícil por se tratar de um número elevado de documentos. Ou seja, eram
7.027 documentos, considerando-se a reprodução ou as cópias de muitas poses, às vezes 6 ou
até 12 cópias, ou, para usar expressão escrita em alguns envelopes ainda guardados, “1/6
dúzia, 1 dúzia de fotos”, indicando tratar-se da mesma pose, reproduzida várias vezes.
Algumas fotografias foram descartadas no decorrer da constituição do acervo no
decorrer dos anos, como visto anteriormente, e as questões em torno da seleção e do descarte
mereceram atenção. Uma infinidade de objetos e de situações do passado dessa região oestina
foi assim esquecida, desfeita ou transformada. Por que certas fotografias e equipamentos
permanecem no “depósito” de Írica?
Através da realização do estudo sobre o acervo, procuramos saber qual o significado
da coleção para a fotógrafa. Para que lado da balança pende hoje aquele olhar atento de
outrora -- olhar exigido para pesar os produtos químicos e chegar à melhor composição
fotográfica? Para o circuito econômico ou para o valor simbólico das imagens? Entende-se
que aspectos do valor simbólico dos objetos estão relacionados com memórias. Michael
Pollak
37
destaca elementos constitutivos da memória como sendo “os acontecimentos vividos
pessoalmente” e os “vividos pelo grupo”, entendendo-se que há uma relação marcante entre
memória e fotografia.
No quarto momento da pesquisa, seguindo as indicações de Mauad, inicia-se a
caracterização da coleção a partir de elementos culturais relacionados com os planos da
expressão e os planos do conteúdo. Mostram-se, portanto, nessa etapa, as diferentes temáticas
enfocadas nas imagens. Os assuntos levantados a partir da coleção foram agrupados em
grandes temas, separados por séries. Após essa seleção, identificaram-se e apartaram-se das
séries as fotografias com reprodução ou as cópias de fotos originais e que elevaram, muitas
vezes, para seis ou para até doze vezes as reproduções de um mesmo registro, permanecendo,
para a análise do acervo, somente uma unidade, ou seja, uma cópia de cada foto original.
Essas fotos foram contadas e classificadas, resultando, para fotografias em preto e
branco, os seguintes temas e fotos: vistas locais: 121 fotos; retratos: 679 fotos; religião: 955
37
POLLAK, Michael. Memória, esquecimento, silêncio. Estudos Históricos, Rio de Janeiro, v. 2, n. 3, p. 3-15,
1989.
37
fotos; produção: 117 fotos; tragédias: 103 fotos; esporte: 74 fotos; festividades: 284 fotos;
educação: 133 fotos; civismo: 93 fotos. A totalidade resultou em 2.559 imagens sobre as quais
foram eleitas, por amostragem, 224 fotografias p&b para análise.
As fotografias coloridas foram assim distribuídas: vistas locais: 23 fotos; retratos: 79
fotos; religião: 40 fotos; produção: 2 fotos; festividades: 73 fotos; educação: 143 fotos, e
civismo: 57 fotos. A totalidade das fotos coloridas resultou em 405 imagens sobre as quais
foram eleitas, por amostragem, 49 fotografias coloridas para análise.
Analisar a coleção a partir de categorias espaciais leva a perceber, além da natureza da
expressão fotográfica, lugares, objetos, pessoas e animais, bem como as vivências retratadas e
outros aspectos que proporcionaram o ato fotográfico, considerando-se que “a mesma unidade
cultural pode estar presente em diferentes campos espaciais e que tais campos não são
estanques”. Na verdade, os campos espaciais nos auxiliam a levantar, a trazer para a análise,
“o restabelecimento dos códigos de representação social de comportamento no seu marco
histórico”
38
.
Considera-se que a organização das temáticas emergidas das fotografias foi uma
atividade fundamental para o desencadeamento e a realização da análise sobre a coleção de
fotografias visando perceber a relação da cultura fotográfica com memória local através dos
quadros de representação da mensagem fotográfica.
Assim, diante do conjunto de documentos e dos dados levantados, e a partir dos temas
especificados, adotou-se a metodologia segundo a qual uma parte das fotografias foi eleita,
por amostragem, para formar o conjunto de fotografias a ser pesquisado. As quantidades de
fotografias de cada tema foram definidas segundo o seguinte critério: até 3 fotos para as séries
que contêm até 50 fotografias e 5 fotos para as séries com mais de 50 fotografias, abrangendo-
se todos os temas e, dentro de cada tema, cada série levantada. Alguns temas apresentam um
maior número de documentos, porém o motivo do registro e o espaço retratado são, muitas
vezes, o mesmo, como, por exemplo, as fotos de casamento nos estúdios ou os alunos ao
receberem certificados de conclusão de curso. Identificada essa característica na coleção de
fotos e diante da grande quantidade de imagens, optou-se por trabalhar a coleção de
fotografias de Írica Kaefer pelo critério da amostragem.
Em síntese, após definidas as séries e as quantidades fotográficas analisadas, então
entrevistas, textos e jornais fundamentaram a relação percebida entre a cultura fotografia e a
construção de memórias em Marechal Cândido Rondon/PR, no período 1954 a 1990. Foi um
38
MAUAD, Através da imagem, 1996, op. cit., p. 96.
38
trabalho de oficina ampliada. O uso de computador, de calculadora, de lupas e de outras
ferramentas em diversos ambientes fez parte do cotidiano de pesquisadora. Alguns detalhes,
por exemplo, só puderam ser percebidos com a ampliação de imagens na tela do computador
ou com o auxílio de lupas. Estas realidades e outras tantas poderão ser percebidas no decorrer
do texto que segue.
2 FAZENDO PARTE DE UM TERRITÓRIO
2.1 UMA REGIÃO A SER OCUPADA – O OESTE DO PARANÁ
Apresenta-se, neste capítulo inicial, a (re)ocupação do Oeste paranaense, a atuação da
Colonizadora MARIPÁ, a vinda e o estabelecimento de migrantes para o espaço colonial que
é hoje Marechal Cândido Rondon, a partir de 1950.
No final do século XIX e início do século XX, havia muito interesse pelas terras na
região da fronteira oeste do Paraná, que estava passando por vários conflitos. Segundo
Foweraker
39
, “os especuladores, em geral pertencentes a consórcios econômicos”, integravam
os grupos interessados nestas terras. Ondy Niederauer
40
, contador da MARIPÁ, faz
referências à diversidade de espécies de madeiras encontradas na Região Oeste do Paraná:
“não encontradas nos citados países cisplatinos, os madeireiros argentinos, desde o século
anterior, tiveram sua atenção despertada para a nossa região”, de onde também extraíam a
erva-mate, o que lhes proporcionava “negócio altamente lucrativo”. Colodel
41
comenta que as
autoridades governamentais brasileiras ainda não tinham conhecimento da “extensão e
quantidade das reservas de ervais que haviam se espalhado por todo o Oeste paranaense e as
companhias paraguaias e argentinas as exploravam”, adotando condições específicas de
controle e de utilização de mão de obra acessível.
Após o término da Guerra do Paraguai (1865-1870), segmentos da oficialidade
brasileira passaram a pressionar as autoridades no sentido de que fosse providenciada a
39
FOWERAKER, Joe. A luta pela terra: a economia política da fronteira pioneira no Brasil de 1930 aos dias
atuais. Rio de Janeiro : Zahar, 1982.
40
NIEDERAUER, Ondy. Toledo no Paraná: a história de um latifúndio improdutivo, sua reforma agrária, sua
colonização, seu progresso. Toledo: Manz Etiquetas Adesivas, 1992. p. 92. Acrescenta-se que o Uruguai, o
Paraguai, o Brasil, a Argentina e parte da Bolívia são países pertencentes à bacia platina.
41
COLODEL, José A. Obrages & companhias colonizadoras: Santa Helena na história do Oeste Paranaense até
1960. Santa Helena: Prefeitura Municipal, 1988. p. 45.
40
“instalação de uma Colônia Militar na região Oeste do território do Império”
42
, pois a
consideravam “de valor estratégico” e essa área não poderia ficar sem fiscalização. Sendo
assim, foi criada, em 1889, uma Colônia Militar na foz do Rio Iguaçu, “com a finalidade de
ser um centro agrícola e pastoril”, o que não evitou, no entanto, a exploração intensiva e
predatória da madeira e da erva-mate, riquezas naturais da região. Sabe-se que, além dos
estrangeiros, ocorreram situações de atividades de exploração nacional. Em 1892, quando a
colônia militar “apresentava um quadro organizativo adequado”, o Ministério da Guerra,
através de portaria, desmembrou a mesma do seu ministério.
Diversas companhias estrangeiras continuaram a atuar na região, entre as quais a
Companhia de Maderas del Alto Paraná, fundada em Buenos Aires, Argentina, em agosto de
1906
43
. Essa companhia, de capital e ramificação da companhia inglesa The Alto Paraná
Development Company Ltda., sociedade anônima formada por ingleses e argentinos,
residentes em Buenos Aires, adquiriu extensa área de terras, denominada Fazenda Britânia,
“objetivando explorar a madeira, a erva-mate e os minerais, desenvolver a colonização, o
arrendamento e a partilha das terras”
44
. Niederauer informa que, segundo o seu estatuto, essa
companhia estava disposta a “extrair e explorar, a construir estradas de ferro, a pedir
concessões ao Governo Brasileiro e a colonizar”
45
. Por terem se defrontado com uma mata
fechada e praticamente impenetrável “para pessoas de procedência inglesa”, a intenção de
colonização não se efetivou e as atividades fixaram-se na extração da madeira e da erva-mate.
Várias dificuldades foram se apresentando, levando à decadência dessas atividades
extrativas. Podem-se destacar as medidas decretadas no período de 1889-1891 pelo Governo
Provisório
46
, proibindo a existência de empresas estrangeiras na região de fronteiras, o
aumento da produção de erva-mate na Argentina, as dificuldades de exportação de madeiras
em toras, a falta de estradas regulares para o escoamento e o intercâmbio comercial, a
instabilidade econômica do país e as revoltas militares, que “foram certamente os motivos que
levaram os ingleses a desfazerem-se de sua propriedade”, afetando economicamente a região.
42
Idem, p. 49.
43
NIEDERAUER, op. cit., p. 19.
44
GÜTHS, Lia Dorotéa. Mapeamento geo-ambiental e planejamento urbano: Marechal Cândido Rondon (Pr)
(1950/97). Cascavel : Edunioeste, 2002 p. 30.
45
NIEDERAUER, op. cit., p. 21. Deste autor, temos as informações dos seguintes dados oficiais: “Em
29.9.1933, sob nº 461, fls. 93 do livro nº 1, foi registrada a compra, pela Cia. de Maderas Del Alto Paraná, e a
venda feita pelo Governo deste Estado”; a área total da compra é de 274.752 ha.
46
GERKE, 1992 apud GÜTHS, op. cit., p. 39 e NIEDERAUER, op. cit., p. 26.
41
Em síntese, ao abordar a política imigratória paranaense, Altiva Pilatti Balhana
47
entende que esta teve o caráter de povoar “vazios demográficos”, de suprir mão de obra
escrava, de criar agricultura de abastecimento e de fornecer trabalhadores às grandes obras
públicas, através de ações e de programas de colonização desenvolvidos desde o governo
provincial até a “colonização moderna do Paraná”, que atingiu regiões do Norte, do Sudoeste
e do Oeste, proporcionada basicamente pela migração interna do país.
Medidas governamentais continuaram a ser implementadas pelo governo federal
brasileiro, como a de 1943, que criou o Território Federal do Iguaçu visando à ocupação
destas fronteiras nacionais. Dentre as medidas destacam-se o levantamento de dados sobre os
níveis de vida, a vistoria de glebas “para apontar os lotes efetivamente ocupados” e a criação
de órgãos específicos, a exemplo da Fundação Paranaense de Imigração e Colonização em
1947, que desenvolvia toda uma política de integração e de “saneamento [...] para os
desajustados”, com o propósito de atrair imigrantes, atender a população e possibilitar o
escoamento da produção. Ainda no que tange ao Estado do Paraná
48
, nos governos de Bento
Munhoz da Rocha Netto (1951-56) e de Moisés Luppion (1946-50 e 1956-60), é dado
incentivo à ocupação efetiva do Estado através de um conjunto de atos que versam sobre a
questão da integração territorial.
A importância da ocupação do território paranaense passa a ser vista como a “união
definitiva de tôdas estas correntes”, sendo destacada, com orgulho político, expresso pelo
governador Paulo Pimentel, em 1968, em discurso no Palácio Iguaçu, reportando-se a décadas
anteriores “quando este Estado só tinha um terço de seu território efetivamente ocupado”,
mencionando “os gaúchos e catarinenses” que conquistaram o Sudoeste e o Oeste
paranaense
49
.
Nesse sentido, diversas companhias colonizadoras se instalaram na região,
promovendo a vinda de colonos do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina para o Oeste
paranaense. O objetivo dessas empresas junto com os governos era o de evitar exploração
desses territórios de forma assistemática e fora dos controles administrativos dos governos
federal e estadual. Cabe salientar que, até 1940, o Paraná apresentava um crescimento
populacional pouco acentuado. O processo de expansão da fronteira agrícola e a criação de
novos núcleos urbanos estabeleceu um maior contingente populacional no Estado,
47
BALHANA, Altiva Pilatti. Política imigratória do Paraná. Revista Paranaense de Desenvolvimento, Curitiba,
n. 12, p. 65-80, maio/jun. 1969.
48
IPARDES. O Paraná reinventado: política e governo. Curitiba, PR: IPARDES, 1989. p. 25-55.
49
PIMENTEL, Paulo. Discurso proferido pelo governador Paulo Pimentel. Revista Paranaense de
Desenvolvimento, Curitiba, n. 9, p. 19, nov./dez. 1968.
42
acentuadamente no Norte, na década de 1950, acelerando-se o surto de crescimento. “À
medida que o avanço colonizador se expande”
50
, a imigração sulina se apresenta mais forte,
intensificando-se o número de habitantes durante a década de 1960 (Anexo 1).
A região Oeste do Paraná, área de fronteira entre o Brasil, o Paraguai e a Argentina,
teve ocupação e colonização após a terceira década do século XX, dentro do contexto da
Marcha para o Oeste e da política de colonização com objetivos de ocupar “vazios
demográficos”, alargar as fronteiras agrícolas do Brasil após 1930, e, assim, garantir o
domínio do território nacional.
Otávio Guilherme Velho, referindo-se a esse contexto, menciona discurso proferido
por Getúlio Vargas, em 1940, sobre o programa do Estado Novo, discurso onde se enfatiza
que:
[...] o verdadeiro sentido da brasilidade é o rumo ao Oeste. Para bem esclarecer a
idéia, devo dizer-vos que o Brasil, politicamente, é uma unidade. Todos falam a
mesma língua, todos têm a mesma tradição histórica e todos seriam capazes de se
sacrificar pela defesa de seu território. Considerando-a uma unidade indivisível,
nenhum brasileiro admitiria a hipótese de ser cedido um palmo desta terra, que é o
sangue e a carne do seu corpo [...].
51
Podem-se destacar aspectos importantes a partir do fragmento do discurso
apresentado, sendo um dos primeiros aspectos a preocupação do governo federal com a
ocupação de espaços vazios do interior do país, momento em que à região Oeste é repassado o
atributo de “verdadeira brasilidade”, tornando-se a região um elemento significativo da
identidade nacional. Outro aspecto que pode ser percebido através do fragmento do discurso
está relacionado a questões culturais como o destaque à língua unificada e à bravura do povo,
que é visto como defensor de um espaço considerado “seu território”, sendo que o colono teve
que adquirir o seu pedaço de terra e, depois, adaptar-se ao novo espaço. Várias famílias
passaram por dificuldades e por problemas de enfrentamentos por disputas de terras
52
vivendo
situações de conflitos que surgiram entre colonos, companhias de terras e jagunços em
localidades da região Oeste (Assis Chateaubriand, Tupãssi) e Sudoeste (Francisco Beltrão) do
Paraná.
50
COMNINOS, Constantino. Alguns aspectos populacionais. Revista Paranaense de Desenvolvimento, Curitiba,
n. 3, p. 48, nov./dez. 1967.
51
VELHO, Otávio Guilherme. Marcha para oeste. In: _____. Capitalismo autoritário e campesinato: um estudo
comparativo a partir da fronteira em movimento. São Paulo: Difel, 1976. p. 147.
52
Trabalham sobre estes assuntos: PEGORARO, Éverly. Dizeres em confrotno: a Revolta dos Posseiros de
1957 na Imprensa Paranaense. Guarapuava: Unicentro, 2008. SOUTO MAIOR, Laércio. História do
município de Assis Chateaubriand: o encontro das correntes migratórias na última fronteira agrícola do
Estado do Paraná. Maringá: Clicheter, 1996. MYSKIW, Antonio Marcos. Colonos, posseiros e grileiros:
conflitos de terra no Oeste Paranaense (1961/66). Niterói, 2002. 201 p. Dissertação (Mestrado em História) –
UFF.
43
Cabe aqui lembrar também que a região Oeste do Paraná constitui-se de uma forte
presença de descendentes de europeus. Destacam-se os alemães, cuja língua de origem foi
proibida durante o Estado Novo em decorrência dos desencadeamentos oriundos da Segunda
Guerra Mundial. Podemos considerar também a presença de imigrantes descendentes de
italianos, os quais apresentam uma cultura própria e uma “tradição histórica” diferente, já a
partir da própria língua. Como dizer então que “todos têm a mesma tradição histórica”? O
discurso da autoridade é uma tentativa de amenizar problemas sociais, pois as falas passam a
ser validadas por órgãos de imprensa e por outros meios de comunicação que se
comprometem com a ocupação de novos espaços e a divulgação de terras
53
.
Segundo Manuel Correa de Andrade, na questão da ocupação e da integração do
território brasileiro com vistas ao Oeste, Getúlio Vargas teve “grande preocupação com a
expansão do Brasil econômico na área do Brasil legal, levando a colonização para o Oeste”.
Assim sendo, com a política de marcha para o Oeste, foram criados “núcleos coloniais onde
fossem instalados colonos que desbravassem áreas virgens para o mercado nacional [...]”
54
Figura 1 - Mapa Oeste do Paraná.
Este mapa, além de destacar a Fazenda Britânia, na qual estão inseridos os atuais municípios de Toledo e de
Marechal Cândido Rondon, dentre outros, demarca, também, através de linha pontilhada, a área do Oeste e do
Sudoeste do Estado do Paraná incluída na faixa de fronteira (150 km de largura).
Fonte: FOWERAKER, 1982, p. 180.
53
Para conhecer a forma de venda de áreas de terras da Maripá, ver: SCHMIDT, Robi Jair. Cenas da
constituição de um mito político: memórias de Willy Barth. Cascavel: Edunioeste, 2001.
54
ANDRADE, Manuel Correia de. Formação territorial do Brasil. In: BECKER, Berta K. (Org.). Geografia e
meio ambiente no Brasil. São Paulo: Hucitec, 1995. p. 172.
44
Normalmente, o Oeste do Paraná é descrito como uma região de muitas
potencialidades naturais, de formação sociocultural recente e de significativo
desenvolvimento econômico. Alguns marcos importantes nesse sentido são as Cataratas do
Iguaçu, o Parque Nacional do Iguaçu, a Usina Hidrelétrica Itaipu Binacional e as “praias
artificiais” formadas junto aos municípios lindeiros ao lago formado pela hidrelétrica. Eles
também são chamados de municípios da Costa Oeste e serviram para a realização dos Jogos
Mundiais da Natureza (1997). A sua localização está em área de fronteiras internacionais
(Brasil, Argentina e Paraguai). São mencionados também o desenvolvimento da agroindústria
e as diversidades culturais e gastronômicas.
Essas caracterizações e referências se tornam complexas quando se considera que o
conceito de região passa por controvérsias e por debates constantes. Mais recentemente,
através do estudo da chamada geografia crítica
55
, o seu sentido tem se ampliado nas diversas
áreas do saber. A noção de região pode ser operacionalizada sob diferentes perspectivas,
quando se aborda a questão espacial do Oeste paranaense, evidenciando-se os meandros do
processo de instituição da sociedade local. Entendemos que esses aspectos interferem na “[...]
configuração, transformação, representação social, etc., do espaço estudado”
56
.
Mudanças percebidas através dessa nova linha de pensamento são colocadas por
Roberto Lobato Correa
57
, que enfatiza que “a geografia crítica descobre o Estado e os demais
agentes da organização espacial: os proprietários fundiários, os industriais, os incorporadores
imobiliários, etc.”. As relações políticas e culturais nacionais tiveram envolvimento e
repercussões nas relações espaciais locais. A história da exploração, da ocupação e da
colonização do Oeste do Paraná tem origens políticas e econômicas específicas, sendo
apresentadas por diversos autores, que necessariamente fazem referências ao Rio Grande do
Sul e à Santa Catarina, uma vez que a população regional é constituída majoritariamente por
descendentes de imigrantes alemães e italianos, vindos desses Estados
58
.
55
Com relação à introdução da chamada geografia crítica, esta nasce, no Brasil, no final da década de 1970. O
principal acontecimento, considerado como marco desta discussão, é o 3º Encontro Nacional de Geógrafos,
realizado em julho de 1978, em Fortaleza, sob a coordenação da Associação dos Geógrafos Brasileiros.
56
AMADO, Janaina. História e região: reconhecendo e construindo espaços. In: _____. República em
migalhas: história regional e local. Porto Alegre: Marco Zero, 1990.
57
CORRÊA, Roberto Lobato. Região e organização espacial. 6. ed. São Paulo: Ática, 1998. p. 21.
58
Neste sentido, ver: GREGORY, Valdir. Os eurobrasileiros e o espaço colonial: migrações no Oeste do
Paraná (1940-70). 2. reimp. Cascavel: Edunioeste, 2008; WACHOWICZ, Rui. História do Paraná. 4.ed.
Curitiba: Vicentina, 1977; WESTPHALEN, Cecília Maria. Historia documental do Paraná: primórdios da
colonização moderna na região de Itaipu. Curitiba: UFPR, 1987.
45
Valdir Gregory
59
no estudo sobre a colonização eurobrasileira, tematiza o espaço
colonial do Sul do Brasil e entende que “região é uma construção intelectual cujas interações
com a realidade mais ampla e com a totalidade evidenciam a precariedade de suas
delimitações”. Afirma que “não há limites geográficos rígidos para o fenômeno regional... O
que faz o regional ser são relações e não a delimitação de espaços”. Assim, entende que o
espaço é constituído a partir das relações sociais e da interação do homem com uma estrutura
mais ampla, onde aspectos do regional se apresentam não necessariamente enquadrados pela
configuração do espaço físico.
A divisão atual do Brasil, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
(IBGE
60
), é apresentada a partir de “meso” e de “microrregiões” geográficas. A mesorregião é
entendida como “uma área individualizada, em uma unidade da Federação”. As formas de
organização do espaço são definidas pelas dimensões “do processo social, como
determinantes, do quadro natural, como condicionante e, da rede de comunicação e de
lugares, como elemento de articulação espacial”. Já as “microrregiões” são definidas como
“partes das mesorregiões que apresentam especificidades com relação ao espaço”. As
especificidades são percebidas a partir das “estruturas de produção agropecuária, industrial,
extrativismo mineral, ou pesca”. Nesses termos, temos que a mesorregião do Oeste
paranaense é integrada pela microrregião de Foz do Iguaçu, a de Cascavel e a de Toledo.
Milton Santos
61
, ao escrever sobre o espaço, apresenta um conjunto de elementos que
devem ser a ele relacionados, associando-o ao estudo da paisagem, à configuração territorial,
à economia, às inovações tecnológicas, à globalização, ao tempo, ao mundo e a outros
aspectos. Assim, percebendo o espaço num contexto amplo, ele escreve que “a paisagem é o
conjunto das coisas que se dão diretamente aos nossos sentidos; a configuração territorial, [...]
é a natureza em seu aspecto superficial e visível; o espaço é a totalidade verdadeira”. Sendo
assim, o autor conclui que o espaço está relacionado com a sociedade, com o território e com
a paisagem onde se estabelece uma dinâmica que, “no transcurso histórico”, reelabora
espaços.
Os principais produtos da economia paranaense, da segunda metade do século XIX até
a década de 1930, foram a madeira e a erva-mate. A exploração da madeira, especialmente a
exploração de pinheiros, trouxe consideráveis transformações ao Paraná (a construção da
59
GREGORY, Valdir. História: reflexões metodológicas. In: LOPES. Marcos Antônio; GREGORY, Valdir.
(Orgs.). O ensino e a pesquisa em história na UNIOESTE: realizações e tendências. Cascavel, PR:
Edunioeste, 1998. p. 36.
60
INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA. Boletim de Serviços. Rio de Janeiro, 1989.
61
SANTOS, Milton. Metamorfoses do espaço habitado: fundamentos teóricos e metodológicos da geografia. 4.
ed. São Paulo: Hucitec, 1996. p. 77.
46
Estrada da Graciosa e da Ferrovia Curitiba-Paranaguá, por exemplo), porém, em
contrapartida, o dinamismo dessas economias levou à inevitável perda de reservas florestais,
uma vez que não havia nem a consciência e nem a obrigatoriedade de repor as árvores
derrubadas
62
. Essa situação mostra uma interferência de segmentos da sociedade na paisagem
local, gerando uma mudança nesse espaço, afetando e praticamente eliminando a mata que
existia.
Em fontes escritas e em imagens fotográficas que enfocam a região Oeste do Paraná é
destacado que, durante o período da ocupação e da colonização recente, ela apresentava, em
sua paisagem, uma mata intensa, constituindo-se numa das últimas reservas floesrtais do
estado do Paraná. Como uma das atividades das companhias colonizadoras da região era a
exploração da madeira para o mercado interno e para a exportação, essa paisagem
rapidamente foi modificada. A mudança foi proporcionada pela exploração econômica da
madeira e pela derrubada da mata para a construção das moradias, dos galpões, dos chiqueiros
e dos galinheiros; para a construção das próprias carroças, para o preparo da lavoura e, enfim,
para a implantação de uma infraestrutura necessária para o desenvolvimento da colônia.
Kalervo e Jabine
63
, em pesquisa publicada no ano de 1960, escreveram sobre as
atividades desenvolvidas pelas companhias colonizadoras da região Oeste do Estado, em
especial pela Maripá e sobre os recursos financeiros empregados por ela em Toledo, sede do
escritório dessa colonizadora, que abarcava as áreas de vários municípios atuais, entre os
quais Marechal Cândido Rondon. Tais atividades evidenciam a existência de muita mata na
região nos anos iniciais do desenvolvimento industrial local, época em que as maiores
serrarias eram da propriedade da MARIPÁ, da Agro-Industrial do Prata e da Guaçu Agrícola
Industrial. Para os citados autores, “as extensas florestas de pinheiros e de madeiras de lei
foram, desde o começo, uma fonte de rendas e a exploração de serrarias foi uma importante
atividade da companhia através de sua existência”.
A atuação das companhias colonizadoras
64
e dos industriais ligados às serrarias e as
atividades ligadas à organização do novo espaço a ser preparado pelos colonos interferiram na
“forma” da paisagem ali encontrada, o que se tornou “visível aos sentidos” do colono, no
decorrer da sua vivência na região. Irmgart e Artur Lohmann
65
, casal de colonos vindos do
sul, ela de Concórdia/SC, em 1952 e ele vindo de Crissiumal/RS, em 1954, revelam que havia
62
FEDALTO, Bernardo. Revista Paranaense de Desenvolvimento, Curitiba, n. 3, p. 5, nov./dez. 1967.
63
OBERG e JABINE, op. cit., p. 34.
64
Sobre a história da atuação das companhias colonizadoras do Oeste do Paraná e, mais especificamente, da
região da Fazenda Britânia, ver GREGORY, Valdir. Os eurobrasileiros... op. cit.
65
LOHMANN, Arthur; LOHMANN, Irmgart. Entrevista concedida a Lucia Teresinha Macena Gregory.
Marechal Cândido Rondon, 16 nov. 1996.
47
muita madeira na região, mas que a madeira boa, como o cedro, a MARIPÁ já havia retirado
antes da vida deles ao Paraná. Irmgart faz comentários quanto à dimensão das árvores
encontradas, lembrando que, da madeira de uma só árvore, foi construída a casa do casal.
Artur comenta que “foi muito rápida a destruição de tudo”
66
. Outras entrevistas
67
e fontes
costumam enfatizar falas relacionadas com as dimensões e as variedades das árvores que
foram derrubadas.
Foto 1 - A Serraria
Foto Kaefer. Acervo particular de Írica Kaefer. General Rondon, PR. Década de 1950/60.
Na imagem da foto 1 tem-se uma demonstração do trabalho realizado em torno da
derrubada da mata, do transporte e do beneficiamento da madeira ocorrido nas décadas de
1950/60. A serraria, localizada no meio da mata, está com os trabalhos comprometidos pelo
que indicam as toras e troncos de madeira espalhados ao redor do empreendimento e a fumaça
do chaminé. Contador da MARIPA, Niederauer escreve: “Em menos de vinte anos, a madeira
de pinho, não só de Toledo, mas de todo o oeste do Paraná, foi transferida para Argentina e
um pouco para o Uruguai. Da madeira de cedro e de outras madeiras duras, pouca foi vendida
ou aproveitada. A sua quase totalidade foi queimada para dar lugar à agricultura mecanizada”
68
.
Acompanhando entrevista realizada com o senhor Lohmann e na tentativa de
identificar fotografias, Alberto Lettnin, dono de serraria na vila General Rondon, comenta que
66
GREGORY, Lucia Teresinha Macena. Arquivo fotográfico: a necessidade e importância de sua implantação.
Marechal Cândido Rondon, 1996. Trabalho de Conclusão de Curso (Curso de História) – UNIOESTE. p. 67.
67
Projeto História Oral. Entrevistas com pioneiros. Acervo CEPEDAL. MCRondon. 1994. MACARI, Neiva
Salete Kern. Migrações e memórias: a colonização do oeste paranaense. Curitiba, 1999. Dissertação
(Mestrado em História) - UFPR.
68
NIEDERAUER, op. cit., p. 114-115.
48
as máquinas da serraria eram movidas através da água do Lajeado Guavirá, na sua chácara,
localizada nos fundos do atual Hospital Rondon. Comenta ainda Lettnin que, durante 14 anos,
trabalhou na sua serraria, comprada, em dezembro de 1954, do Sr.Wibling. Lettnin afirmou
que foi procurado para fazer contratos de exportação, mas que preferiu trabalhar atendendo
aos moradores locais
69
.
As inovações tecnológicas implantadas na agricultura do Oeste do Paraná, a partir da
década de 1970, foram adotadas pelos colonos, que substituíram, gradativamente, técnicas
tradicionais por técnicas modernas de cultivo. Substituíram adubos vegetais e animais por
fertilizantes químicos e substituíram a força humana e a tração animal por tratores, por
ceifadeiras e por veículos motorizados. Essas ações marcaram a economia regional e
municipal, a qual derivou para um status de agricultura especializada, caracterizada pelo
binômio trigo-soja, refletindo-se sobre a demografia local e provocando uma inversão do
percentual da população, que passou a ser significativamente maior na cidade, especialmente
na década de 1990. Em 1991, a população no Oeste do Paraná
70
era de 1.015.929 habitantes,
sendo que, desse contingente, 28% eram da zona rural e 72% da zona urbana, o que
demonstra uma inversão populacional no período de 1970 a 1990, “trazendo implicações
importantes na redefinição do perfil das cidades da Região”. O município rondonense passou
a desenvolver uma pecuária intensiva, voltada principalmente à bovinocultura, à avicultura e à
suinocultura, “passando a ser uma fonte econômica alternativa ao lado das culturas de
exportação”. A região Oeste sentiu os reflexos das mudanças econômicas ocorridas no país, o
que provocou a “descapitalização dos agricultores”, sendo que muitos despertaram para a
“policultura e a horticultura”, entre outras atividades agrícolas, “como acontecia no início da
colonização”
71
.
69
LETTNIN, Alberto. Entrevista concedida para Lucia Teresinha Macena Gregory. Marechal Cândido
Rondon, 16 nov 1996.
70
COLOGNESE, Sílvio Antônio; GREGORY, Valdir; SCHALLENBERGER, Erneldo. Tupãssi: do mito à
história. Cascavel, PR: Edunioeste, 1999. p. 118.
71
GÜTHS, op. cit., p. 11.
49
2.2 A MARIPÁ – UMA COLONIZADORA EM AÇÃO
Com relação à colonização do Oeste paranaense, mais especificamente da
microrregião de Toledo, a antiga obrage
72
denominada Fazenda Britânia (Anexo 2), com uma
área de 274.752 hectares, equivalentes a 113 mil alqueires, explorada pela Companhia de
Madeiras del Alto Paraná, filial da companhia inglesa The Alto Paraná Developement
Company Ltda., anteriormente mencionada, foi adquirida, em 1946, pela Industrial Madeireira
e Colonizadora Rio Paraná S/A, mais tarde conhecida pela sigla MARIPÁ.
Constituída a sociedade Industrial Madeireira e Colonizadora Rio Paraná S/A
(MARIPÁ), a mesma foi registrada em cartório de Porto Alegre, em 1946, sede da empresa, e,
como as terras foram pagas ainda em setembro daquele ano, a escritura de compra e venda foi
lavrada no Registro de Imóveis de Foz do Iguaçu (município ao qual pertencia todo o Oeste
do Paraná). A MARIPÁ instalou o seu principal escritório em Toledo e, a partir daquele ano,
diante de toda aquela área de terras, a companhia passou a se preocupar com os trabalhos “da
implantação e do desenvolvimento da colonização, devendo, no seu entender, recorrer até às
influências políticas” para viabilizar a comunicação com a região e “acelerar a criação do
Município e da Comarca”. A MARIPÁ era formada por acionistas comerciantes, industriais e
banqueiros que pretendiam realizar um “reinvestimento” financeiro, aplicando os lucros na
agropecuária, na indústria e no comércio
73
.
No seu artigo 2º, o estatuto apresenta como objetivos da empresa: “a) aquisição por
compra e exploração das terras, campos e matos da ‘Fazenda Britânia’, com os respectivos
72
Obrages, nas colocações de Colodel, é “termo retirado do castelhano, passou a designar as propriedades e/ou
explorações instaladas em regiões onde predominava a existência de uma flora tipicamente adequada ao clima
subtropical nos Estados vizinhos da Argentina e do Paraguai”. Dessa forma, através da exploração intensiva,
os investimentos econômicos dessas empresas voltavam-se à exploração “dos produtos que compunham o
binômio mate/madeira”, matéria-prima da reserva nativa abundante em toda a região Oeste e também no
Estado do Mato Grosso. Os obrageiros, proprietários dessas unidades de exploração, contratavam a mão de
obra dos mensus. Mensus:etimologicamente, a expressão vem do espanhol: mensual, ou seja, mensalista”.
Era a designação dada aos trabalhadores paraguaios, “os chamados guaranis modernos”, que eram
empregados como “peões” numa obrage. COLODEL, op. cit., p. 53-60. As obrages são também definidas por
Gregory como “empreendimentos de exploração das propriedades do Oeste e Sudoeste do Paraná antes da
colonização moderna da região. Mensus eram os trabalhadores das obrages”. GREGORY, Os
eurobrasileiros..., op. cit., p. 89.
73
NIEDERAUER, op. cit., p. 34-36. A constituição da empresa foi realizada em cartório de Porto Alegre em 16
de abril de1946 e o registro de compra e venda se deu em 10 de setembro de 1946, no cartório de Registro de
Imóveis de Foz do Iguaçu. “É importante observar que, no seu estatuto, a empresa não indicou o uso de sigla.
Em virtude da dificuldade de comunicação por telefone à longa distância, o meio mais usado na época era o
telegrama. Entretanto, o nome da empresa era muito comprido para ser escrito no telegrama. Então o diretor
Egon Brecht, que também era contador, bolou uma composição com as três primeiras sílabas de Madeireira
Rio Paraná, resultando em MARIPÁ. Registrou essa sigla no Departamento de Correios e Telégrafos. Assim,
todos os telegramas expedidos com endereçamento de MARIPÁ – Porto Alegre eram recebidos na empresa.
Por ser mais curto, foi mais usado e a empresa passou a ser conhecida por MARIPÁ”.
50
prédios, instalações e benfeitorias”. Ela visava, num primeiro momento, à “exploração,
industrialização, beneficiamento e exportação” de madeira e erva-mate e “mais tarde vem o
interesse na colonização, seguido pela agricultura, pastagens, pelo comércio em geral e no fim
a participação da firma em outras empresas industriais e comerciais que forem criadas na
região”. Uma vez adquirida e já paga a fazenda, os acionistas da empresa tomaram posse das
terras e a construção da primeira vila (também sede administrativa da colonizadora) ocorreu
“nas proximidades do arroio Toledo, entre os frondosos pinheiros que já tinham visto”
anteriormente os acionistas Alberto Dalcanale e Alfredo Ruaro
74
.
O Plano de Ação
75
“teórico e prático” elaborado pela MARIPÁ estabelecia diversos
objetivos, entre os quais a medição e a venda de terras, a construção de sedes, a abertura de
estradas e o “amparo ao agricultor” através de uma ampla assistência social. A colonizadora
também planejava a industrialização e o desenvolvimento comercial da colônia. Ao analisar-
se essas informações sobre o Plano de Ação da Companhia, deparamo-nos com uma nítida
preocupação desta para com o elemento humano. Nesse plano, o tamanho das propriedades, a
produção, a industrialização, o transporte e a educação integram medidas básicas a serem
tomadas no sentido de viabilizar o êxito dos novos moradores das colônias e de assegurar as
suas necessidades básicas. Assim, após um intenso trabalho em torno da extração e da
exportação de madeiras, começaram a aparecer, no ano de 1950, os primeiros compradores de
terras da MARIPÁ e esta, nos registros de Niederauer
76
, “começou a tomar corpo”.
O Plano de Colonização previa a constituição de mais de 11 mil lotes divididos em
colônias, chácaras ou lotes urbanos e a construção de pequenos povoados, que passaram e ser
chamados de vilas e que “deveriam ser construídas com intervalos de 10, 15 ou 20
quilômetros entre si”. As vilas serviriam de centros de subsistência aos moradores da região e
a sua localização seria preferencialmente junto às estradas tronco ou às estradas secundárias,
para facilitar a comunicação com a sede da colonizadora, em Toledo. As vilas se constituíram
de diversas quadras “de cem por cem metros, contendo 8 a 10 lotes urbanos”. O planejamento
das ruas obedecia a um traçado norte-sul, leste-oeste e, a exemplo da sede, Toledo e nos
centros eram reservadas “quadras para futuras praças”. Ao redor do conjunto de quadras das
vilas foram traçados “anéis de chácaras”, que mediam cerca de dois e meio hectares (25.000
m
2
). Essas chácaras eram destinadas “a pessoas de menor poder aquisitivo ou àqueles que
desejassem dedicar-se à horticultura”.
74
Idem, p. 38-39.
75
SILVA, Oscar. Toledo e sua história: projeto histórico. Toledo: Prefeitura Municipal, 1988. p. 88.
76
NIEDERAUER, op. cit., p. 120-133.
51
Posto em prática o plano, foram muitas as vilas construídas na Fazenda Britânia, que
providenciava o desmatamento do local central da vila, afastando tocos e galhos de árvores,
aplainando a área e, em seguida, demarcando as ruas e os lotes urbanos. A colonizadora
também construía “casas de imigrantes” e acompanhava a construção de escolas e de igrejas.
“Ao todo, a MARIPÁ fundou, na Fazenda Britânia, 28 vilas”. Depois de fundada uma vila, a
colonizadora se empenhava na venda dos lotes e das chácaras
77
.
A colonizadora construía hotéis, que passavam a ser explorados por interessados,
sendo isentos de pagamento de aluguel. Mais tarde, eles passavam a ser adquiridos por
interessados, que compravam as instalações pertencentes à colonizadora. Um Hotel-Bar, que
teve seu início com a colonizadora, foi administrado, em fins da década de 1950, por
Guilherme Anschau
78
. Guilherme veio do RS para plantar café, um propósito de muitos
colonos, quando migraram para o Oeste paranaense. Passados os 3 ou 4 anos da plantação do
café, a região foi, porém, atingida por uma forte geada, que matou os pés que estavam com os
frutos praticamente no ponto de serem colhidos. Frustrada a safra, Guilherme passou a
investir no ramo hoteleiro, sendo que, “na década de 1950, Toledo chegou a ter oito hotéis”
79
.
Guilherme Anschau é, portanto, mais um exemplo da opção de migrantes por outros
investimentos que não a agricultura pois ele também re-ordenou os seus trabalhos. O
propósito que objetivara inicialmente o café passou a ser o Hotel-Bar, conforme nos foi
indicado pelo seu neto Valdir Rekziegel.
Com a vinda dos colonos, vinha o ferreiro “para fabricar os aros e os eixos das rodas,
ferrar os cascos dos cavalos, fazer o cano da chaminé”. Muitas outras especialidades tiveram
que ser atendidas e a companhia providenciava também a vinda de marceneiros e de
carpinteiros para fabricarem carroças, móveis e cangas de bois. Houve preocupação também
em atender os aspectos religiosos e de saúde e, nesse sentido, a companhia providenciou a
construção das primeiras igrejas e dos primeiros hospitais
80
.
A colonizadora pretendia, após a divisão da área da Fazenda Britânia em lotes e depois
de povoada a área, “estabelecer um forte comércio de fornecimento de bens aos moradores e
de compra da sua produção”, de tal modo que, ao começar as vendas das terras, Willy Barth,
um dos acionistas da colonizadora e administrador local, “estipulou que a venda seria feita de
77
Idem, p. 134.
78
RECKZIEGEL, Valdir. Docente da UNIOESTE. Valdir Reckzeigel nos auxiliou na identificação de algumas
fotografias. Segundo este docente, Guilherme Anshau administrava o Hotel-Bar com a sua família. Uma das
filhas de Guilherme, Maria Lucia, que teria chegado com 7 anos à Toledo, mais tarde veio a se casar. Trata-se
da mãe de Valdir Reckziegel, senhora de quem Valdir obtém informações e histórias sobre a sua família.
79
NIEDERAUER, op. cit., p. 136.
80
Idem, ibidem.
52
apenas uma colônia a cada comprador”, sendo que, para as chácaras e os lotes urbanos, não
houve tais restrições. O comprador que tivesse filhos poderia, contudo, adquirir também uma
colônia para cada um dos filhos. Willy Barth entendia que, dessa forma, estaria evitando a
formação de pequenos latifúndios ou a migração dos filhos dos colonos “por falta de terras
para eles cultivarem, em vizinhança dos seus pais”
81
.
Para a venda das colônias, a empresa contou com os trabalhos de corretores de terras,
“geralmente comerciante estabelecido no interior gaúcho ou catarinense”. Alguns acionistas
da MARIPÁ trabalhavam como atacadistas na venda de tecidos, ferragens, miudezas e outros
artigos e percorriam o Rio Grande do Sul e parte de Santa Catarina. Os seus clientes eram
negociantes do interior. Eles aproveitavam para fazer propaganda “junto aos seus amigos e
fregueses”, sendo-lhes proposta a venda de terras “em troca de boa comissão, com a
recomendação de darem preferência aos melhores agricultores e com condições financeiras
estáveis”
82
.
Uma lista de interessados começava a circular e, marcada a viagem, esta era feita em
micro-ônibus ou em caminhão do corretor ou alugado. Dependendo das condições climáticas
e das estradas, a viagem durava até quatro dias. Ao chegarem a Toledo, já havia todo um
aparato organizado pela MARIPÁ para receber e acompanhar as caravanas de colonos
interessados em conhecer e/ou comprar colônias. Havia, assim, os “corretores de mato”, como
se denominavam, os quais, além de desempenharem outras funções, acompanhavam os
colonos até a fazenda, para conhecerem as terras. “À tardinha, voltando do mato, eram os
compradores levados ao gabinete do diretor”, onde manifestavam o interesse em comprar as
suas terras, “no mesmo local onde poderiam continuar com os seus amigos e vizinhos lá do
Rio Grande”
83
.
Embora, às vezes, viessem turmas de duas ou três caravanas por dia e algumas
colônias já tivessem sido vendidas em anos anteriores, foi somente em 1950 que se iniciaram
as “vendas planejadas” e, em 1951, “quase três mil colônias foram vendidas”, diminuindo as
vendas a cada ano. Em 1958 foi feita a distribuição de colônias restantes aos acionistas: “O
produto dessas vendas era todo reaplicado na infraestrutura necessária à colonização”
84
.
A definição pela escolha do elemento humano foi rigorosa e mereceu atenção especial
por parte dos diretores na divulgação da venda de terras. O colono gaúcho e catarinense
descendente de imigrantes italianos e alemães era visado para ocupar a nova área colonizada.
81
Idem, p. 136-137.
82
Idem, p. 131.
83
Idem, p. 137-138.
84
Idem, p. 140.
53
O excedente populacional de algumas regiões do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina seria
atraído para a Fazenda Britânia, onde o seu modo de vida viria a ser marcante na cultura do
Oeste paranaense. Essas intenções e preferências constam de documentos e de textos sobre a
região e vão embasar a constituição de fontes e de memórias. Esses “descendentes de
imigrantes italianos e alemães” do sul do país foram considerados como uma população
“provada e testada para a experiência de uma vida pioneira da nova área”, uma vez que já
estariam acostumados às condições de vida do Brasil e, como proprietários rurais voltados à
produção familiar, estariam habituados ao “trabalho árduo na agricultura”
85
.
Pode-se considerar a ênfase dada à vinda de colonos alemães, e também italianos, já
que o colono é mais conhecido com a denominação de sulista, ao passo que o elemento
humano que constituía a frente de expansão cafeeira, que se deslocava de São Paulo e de
Minas Gerais para o Norte do Paraná era conhecido como nortista. Este ficava praticamente
excluído dos interesses da MARIPÁ na ocupação do oeste. Cabe, porém, perguntar como a
questão da germanidade e da italianidade (sulinidade) é apresentada pelas instituições oficiais,
pela comunidade e pela constituição de acervos na região, uma vez que outras identidades
étnicas integram a população da região Oeste do Paraná, tais como os poloneses ou os
trabalhadores vindos do norte do Estado, e de outras regiões, apresentando especificidades
próprias; há ainda os indígenas e caboclos. Há uma clara preocupação de se ressaltar e de se
evidenciar a preponderância e o predomínio de grupos específicos, principalmente dos
descendentes de alemães e de italianos do sul do Brasil.
O que chama a atenção no processo de colonização do Oeste paranaense é também a
política cultural e religiosa implantada pelos diretores da empresa, que dedicou à colonização
peculiaridades especiais. Uma das características principais é o predomínio de núcleos de
italianos católicos, poloneses católicos, alemães luteranos, alemães católicos, mais ou menos
concentrados em determinados locais. Além da infraestrutura básica, a empresa colonizadora
teve a preocupação de preservar e de (re)construir, nesse espaço físico, aspectos socioculturais
dos colonos migrantes. Mesmo que essas comunidades tenham se constituído em um espaço
de vivência familiar e social com forte herança cultural dos núcleos de origem, elas não
deixaram de passar por dificuldades na nova organização.
Por outro lado, a ênfase dada à produção familiar carrega consigo uma forte ética do
trabalho e desenvolve um discurso que opõe o trabalho à preguiça, considerando-o como
85
WACHOWICZ. Rui. Obrageros, mensus e colonos: história do oeste paranaense. Curitiba, PR: Vicentina,
1982. p. 173.
54
fonte de progresso e de prosperidade. Assim, Pawelke
86
, em 1970, descreveu o Oeste do
Paraná como um lugar de prosperidade, onde “só aquele que cultiva a preguiça não participa
destas riquezas”, destacando assim as pessoas do oeste com a qualidade de um povo
trabalhador. Nesse aspecto, Davi Schreiner
87
afirma que o discurso do poder público e
empresarial sobre o trabalho no Oeste paranaense “exalta o trabalho e o desenvolvimento
econômico e cultural, a honra e a ordem”, surgindo a “noção de trabalho” na região. A
situação aconteceu, entre outros fatores apontados, em função da presença dos descendentes
dos imigrantes teutos e italianos. Apresentar o homem brasileiro como um indivíduo com
qualidades próprias é também percebido na ação cultural de governos, no que se refere à
música popular, por exemplo, onde o tema malandragem é substituído pelo trabalho
88
. É o
trabalho que passa a ser valorizado na sociedade brasileira para a construção da nação.
Entenda-se, no entanto, que, além das mudanças de espaço (do Rio Grande do Sul e de
Santa Catarina para o Oeste do Paraná), ocorrem também (a partir da década de 1970)
importantes mudanças econômicas. Schallenberger
89
, ao escrever sobre as comunidades
cristãs no Oeste do Paraná, demonstra como essas comunidades precisavam reorganizar-se e
afirma que, “além de enfrentarem o desafio da adaptação ao novo hábitat, foram
acompanhadas pelo processo envolvente da modernização agrícola”. O autor afirma, ainda,
que a modernização “globalizou elementos culturais” e “desestruturou” a maneira como
viviam esses migrantes.
A MARIPÁ, portanto, para alcançar os seus objetivos, planejou a divisão da Fazenda e
providenciou uma infraestrutura auxiliar no atendimento das necessidades dos colonos. Nesse
sentido, constituiu “um grande número de Áreas de Apoio à colonização”, os núcleos urbanos,
dividindo a sua área em pequenas propriedades – os lotes urbanos.
86
PAWELKE, J. Ficando rico no Oeste do Paraná: uma pequena história do Oeste do Paraná especialmente do
Município de Marechal Cândido Rondon. Marechal Cândido Rondon: s. ed., 1970. Prefácio.
87
SCHREINER, Davi Félix. Cotidiano, trabalho e poder: a formação da cultura do trabalho no Extremo Oeste
do Paraná. Cascavel, PR: Edunioeste, 1996. p. 46.
88
No quadro da sociedade nacional, a partir dos anos de 1930, com o governo Vargas, o trabalho é promovido
como elemento importante da ordem social.
89
SCHALLENBERGER, Erneldo; COLOGNESE, Sílvio. Migrações e comunidades cristãs: o modo-de-ser
evangélico-luterano no Oeste do Paraná. Toledo, PR: EdT, 1994. p. 23.
55
Foto 2 - Área de apoio
Autoria Foto Kaefer. Acervo particular de Írica Kaefer. Fins da década de 1950.
Ao redor desses lotes urbanos, foi reservado o espaço para as chácaras. Na Foto 2 a
parte central, no sentido horizontal, focaliza as primeiras residências da Vila General Rondon
e, próximo da mata, a construção da igreja católica. No primeiro plano despontam plantações.
Trata-se de carreiras de mudas de café que crescem entre carreiras de milho. A plantação
mista, no caso café e milho, se fazia possível enquanto os pés de café ainda eram pequenos e
permitiam o crescimento do milho que seria colhido em poucos meses. No entanto, esses pés
de café, devido às geadas, não vigoraram frustrando as famílias que optaram por plantar café.
As colônias, estabelecimentos rurais típicos de áreas de colonização, foram
organizadas ao redor das chácaras. Essas colônias foram organizadas no sistema de lotes
rurais longos, sistema denominado “espinha de peixe”. Predominaram colônias com áreas em
torno de 25 hectares, respeitando os limites fluviais, beneficiando cada uma (sempre que
possível), com pelo menos um curso d’água, através de fontes, sangas, lajeados, arroios ou
rios, e uma estrada ou estradão, no alto da divisa. Em termos de infraestrutura básica, em cada
grupo de colônias, centralizada pelo núcleo urbano, foram providenciadas as construções de
casa comercial, igreja, escola e de hospital
90
.
Dentre essas várias “Áreas de Apoio” formadas, uma delas foi General Rondon, vila
que foi marcada por uma presença maior e mais evidenciada de descendentes de imigrantes
alemães no início da década de 1950
91
.
90
GÜTHS, op. cit., p. 41; NIEDERAUER, op. cit., p. 125; GREGORY, Os eurobrasileiro..., op. cit., p. 111-117.
91
Para inteirar-se mais sobre a ocupação de MCRondon, ver STEIN, Marcos Nestor. A construção do discurso
da germanidade em Marechal Cândido Rondon (1946-1966). Florianópolis, 2000. Dissertação (Mestrado em
História) - UFSC e GREGORY, Os eurobrasileiros..., op. cit.
56
Atualmente essa presença majoritária de descendentes de imigrantes alemães tem sido
muito evidenciada em jornais locais, em folders e na imprensa falada e escrita. Essa mídia
apresenta a cidade e o município de Marechal Cândido Rondon com materiais de divulgação
fornecendo discursos que procuram caracterizar raízes calcadas em origens étnicas. A
apresentação da cidade como “a mais germânica do Paraná”, a característica hospitaleira da
cidade e “o orgulho do povo rondonense em relação às suas origens” são exemplos
significativos dessa vivência
92
. Marcos Stein
93
escreve que em 1986 passa-se a elaborar um
“Projeto de Caracterização Germânica da cidade” documento que prevê a criação de festas
típicas, a exemplo da Oktoberfest, incentivo de arquiteturas em estilo Enxaimel. Para o autor a
iniciativa se apresenta também “como uma tentativa discursiva de se criar uma ‘memória
coletiva’ como indica Michel Pollak
94
...”. Entende-se que, documentos, arquiteturas em estilo
próprio e a elaboração de slogans são realmente artifícios relacionados com a construção de
memórias coletivas e sociais.
2.3 MIGRAÇÃO PARA O PARANÁ
2.3.1 FOCANDO O OESTE
Marechal Cândido Rondon, em termos de classificação adotada pelo IBGE, assunto ao
qual já nos referimos, integra, juntamente com outros municípios, a Microrregião Geográfica
de Toledo. O município de Marechal Cândido Rondon, apresentando uma área de 747,116
km
2
, situa-se no Extremo Oeste do Terceiro Planalto Paranaense, também denominado
Planalto de Guarapuava, ficando ao Norte da barragem da Hidrelétrica de Itaipu, à margem
esquerda do lago formado pelo Rio Paraná. Já em termos de rede fluvial, o município
delimita-se, “ao Norte e Nordeste pelo arroio Guaçu, ao Sul pelo rio São Francisco
Verdadeiro e a Oeste pelo Rio Paraná”. Afluentes do rio Paraná, esses cursos d’água foram as
principais vias de acesso ao seu interior, “através da Região Platina, além de algumas estradas
de rodagem”. Fazem limite com o município rondonense, “ao Norte-Noroeste, Mercedes;
Nordeste, Nova Santa Rosa; Leste, Quatro Pontes e Toledo; Sudeste, Ouro Verde do Oeste;
92
Essas colocações podem ser verificadas, por exemplo, no jornal O Presente, jornal importante de circulação
local, criado em 04 jan 1991, em prospectos e fôlders sobre o município, a exemplo dos expedidos pela
Secretaria Municipal da Indústria, Comércio e Turismo.
93
STEIN, A construção..., 2000, op. cit., p. 5.
94
POLLAK, op. cit., p. 5-10.
57
Sul, São José das Palmeiras; Sudoeste, Entre Rios do Oeste e Pato Bragado; Oeste, República
do Paraguai, através do rio Paraná”
95
.
Paraná
PARANÁ:
Marechal Cândido Rondon
Figura 2 – Localização da Região Oeste no Paraná.
Na Figura 2 pode-se observar a localização, no Paraná, da região oeste e de
MCRondon, a configuração do seu território e os municípios que lhe fazem limite. O ponto
sinalizando a Sede é o sinal que identifica onde se iniciou o núcleo urbano da antiga Vila
General Rondon o que se mostra com mais detalhes, nas próximas figuras.
95
PFLUCK, Lia Dorotéa. Mapeamento geo-ambiental e planejamento urbano: Marechal Cândido Rondon-
PR/1950-1997. Cascavel: Edunioeste, 2002.
Mal. Cdo Rondon
Mercedes
Nova Sta Rosa
Quatro Pontes
Tol ed o
Ouro Verde
do Oeste
o Jo
das Palmeiras
Entre Rios
do Oeste
Pato
Bragado
PARAGUAY
Sede
58
Figura 3 - Mapa Divisão e Limites do Município Marechal Cândido Rondon.
A área tracejada na legenda e com a indicação de “área de estudo” refere-se, no nosso caso, ao espaço onde se
iniciou o núcleo urbano. Ver a área tracejada, em destaque, na próxima Figura 4.
Fonte: Mapa do Município, 1997 (PFLUCK, 2002, p. 89)
No mapa do Município de Marechal Cândido Rondon estão sinalizados -- com uma
marca quadriculada -- os distritos do município, que teve a sua organização espacial ligada à
MARIPÁ. Atualmente, ele está subdividido em sete distritos, entre os quais o distrito sede e
os distritos de Novo Três Passos, de Novo Horizonte, de Iguiporã, de Margarida, de São
Roque e de Porto Mendes. As localidades de Mercedes, de Pato Bragado, de Entre Rios do
Oeste e de Quatro Pontes eram áreas da MARIPÁ, pertenciam ao município de Marechal
Cândido Rondon e emanciparam-se em 1991. A área pontilhada indica partes do Rio Paraná
represado, o lago da Itaipu Binacional e que faz divisa com parte do território do Paraguai.
O próximo mapa é uma demonstração de como a parte central da vila General Rondon
foi projetada e elaborada. Nestes traços, ruas são demarcadas, quadras com a numeração dos
lotes são identificadas. As marcas coloridas são adaptações feitas para auxiliar na localização
das principais ruas e dos principais estabelecimentos que foram sendo criados a partir de
meados da década de 1950 na Vila General Rondon. Através da linguagem dos mapas pode-se
visualizar com mais “nitidez” a “cidade planejada” pela MARIPÁ.
59
Figura 4 - Plano urbano piloto da cidade de Marechal Cândido Rondon, chácaras, colônias e rede hidrográfica,
1950
Traços amarelos, limite do plano urbano, em 1950 (2.384.100 m
2
); círculo branco, local onde foram construídas
as 1
as
casas; esfera verde, praças; setas: azul, Av. Rio Grande do Sul; rosa, Av. Maripá; elipses: azul claro,
empório; verde, hotéis; vermelha, Hospital e Maternidade Filadélfia (1954); azul, rodoviária e correio;
triângulos: verde, igrejas; laranja, escolas; losango: lavanda, frigorífico de suínos (1963); verde, fábrica de óleo
(1967); preto, Copagril (1970). Fonte: Acervo da Maripá, 1953. Obs.: As sinalizações foram feitas pela autora
96
.
O quadro do plano urbano piloto de Marechal Cândido Rondon foi traçado pela
colonização quando passou a vender a área. A divisão do núcleo rondonense em lotes rurais e
urbanos ocorreu em 1949 e, já no ano seguinte, recebeu seus primeiros moradores, migrantes
sulistas descendentes de alemães vindos do sul do país, para a vila General Rondon. Em
1952
97
, General Rondon passou à categoria de distrito administrativo de Toledo. Durante a
década de 1950, caracterizava-se economicamente pela exploração da madeira e pela
policultura mercantil e de subsistência voltada à suinocultura, à produção de milho, mandioca,
feijão, de batata, dentre outros. Durante a década de 1960 ocorreu um rápido desmatamento
96
PLFÜCK, 2009, op. cit., p. 106.
97
PAWELKE, op. cit., p. 28.
L.Guavi
r
L.Bonito
L.Matilde
Cuê
L.Borboleta
L.A
p
e
p
L. Guará
60
nas propriedades rurais do distrito, resultando em aumento das áreas de cultivo agrícola,
“sendo que a prosperidade econômica e o crescente fluxo populacional elevou General
Rondon à categoria de município de Marechal Cândido Rondon em 25 de julho de 1960”
98
.
Ao se emancipar, contava com 12.848 habitantes.
Para os colonos, efetuada a compra da colônia, era hora de pensar em fazer a mudança
e dirigir o olhar para o Paraná. Durante as viagens, as dificuldades a enfrentar eram o longo
tempo para o deslocamento em razão da distância entre a origem e o destino da migração, as
chuvas, que, muitas vezes, dificultavam ainda mais o percurso pelas estradas estreitas e cheias
de valetas, além dos meios de transporte precários (normalmente caminhões adaptados).
Niederauer
99
comenta que, nos dias chuvosos, quando o terreno era plano, ainda podiam
arriscar a andar, “mas, quando chegava uma descida com valetas laterais provocadas por
erosão, então o jeito era parar e esperar até a estrada estar suficientemente seca”, para que os
caminhões de mudança pudessem prosseguir. Na área da fazenda, os riachos e as pontes
também constituíam dificuldades e, muitas vezes, essas pontes eram reforçadas “por alguns
barrotes e tábuas grossas” para garantirem a passagem e a viagem até o local da vila onde, nas
proximidades, se localizava a colônia comprada.
Às vezes, porém, durante o transporte da mudança, os caminhões ficavam atolados e
todos precisavam ajudar a empurrá-los e puxá-los com cordas. A abertura de estradas
principais era providenciada pela companhia, com a ajuda de trabalhadores paraguaios,
alargando estradas, “as picadas”, que já haviam sido abertas anteriormente, pelas companhias
exploradoras. As estradas eram roçadas, as árvores derrubadas e afastadas para os lados,
liberando os caminhos. O local da moradia era preparado com instrumentos manuais, como
machado, foice, serra manual e “não tinha tratores e serra motorizada só apareceu em fins da
década de 50”
100
.
Motorista de mudanças realizadas do Rio Grande do Sul para Santa Catarina e Paraná,
desde a década de 1950, João Macena
101
, em entrevista, fala da sua experiência, da
experiência de quem transportou mudanças, carregou e descarregou objetos, auxiliou e
transportou adultos e crianças, “famílias inteiras, ihc, quatro cinco filhos, mais...”.
98
SAATKAMP, Venilda. Desafios, lutas e conquistas: história de Marechal Cândido Rondon. Cascavel.
Assoeste, 1985. p. 74. Conforme a autora, a categoria de distrito foi oficializada pela Lei Municipal nº
17/1953, de 6/7/1953 e o ato da categoria de município foi oficializado pela Lei Estadual nº 4.245, de
25/7/1960.
99
NIEDERAUER, op. cit., p. 43.
100
Idem, p. 58.
101
MACENA, João. Entrevista concedida a Lucia Teresinha Macena Gregory. São Martinho, RS, 24 mar.
2009.
61
João Macena, atualmente com 82 anos e residente em São Martinho, no RGS, foi um
dos motoristas que trouxe para o oeste paranaense várias mudanças. Ele é motorista desde os
tempos em que prestou Serviço Militar, no Quartel de Cruz Alta, naquele Estado, no ano de
1948. Aprendeu a dirigir em um Jeep Aéro Willys e em outros carros do quartel, sendo que lá
permaneceu um ano.
Ao falar sobre sua vinda para a localidade de São Martinho, comentou que logo ao
retornar do quartel ouviu falar, em sua vila, Quinze de Novembro, município de Ibirubá, RS,
que o comprador de suínos “lá do matadouro, o Oto Kleinar, meu conhecido, tava procurando
um motorista e também um comerciante de São Martinho estava precisando de motorista”.
João desejava muito dirigir caminhão. “Eu queria caminhão grande” comenta dizendo que se
sentia seguro e, com o aval dos pais, mudou-se para essa localidade. Em São Martinho foi
trabalhar com a família Reimann, comerciante de produtos agrícolas. O comerciante teria
comprado um caminhão Ford-Fargo, F-8, da agência Ford de Encantado, RS. João começou a
dirigir o caminhão. Sobre o que transportava lembra: “fumo, porco para Santo Ângelo, feijão
e olha trabalhei 11 anos com o Arnoldo Reimann”. Na verdade, trabalhou com outros
comerciantes também, dos quais lembra “os Konzen, os Rodrigues, os Lotermann”. Neste
período João também foi chamado por muitas pessoas para ensiná-los a dirigir veículos
automotores e lembra que ensinou o Dr. Arnaldo Tonelotto, o primeiro médico na cidade,
padres, vizinhos, e algumas pessoas do interior.
O motorista João, ao lhe ser perguntado sobre as primeiras mudanças feitas, comentou:
“As primeiras mudança que eu levei, fora do Estado, foram para Santa Catarina, isto foi mais
ou menos em 1951”. Na ocasião viajou para a cidade de Itapiranga, local limítrofe à região de
onde estava, e “o Silo Cará foi guia” pois o mesmo era motorista há tempos e amigo de João
Macena que estaria conhecendo as estradas. No retorno, sempre aproveitava levar
mercadorias, tais como madeira (que carregava em Palmassola, SC) ou milho (do Paraná).
Entre as mudanças transportadas por João para Santa Catarina são lembradas as viagens para
Mundo Novo (para a mudança de Willi Helcher), para Volta Redonda (João Nicolau Schons,
Otto Huppes, Alécio Huppes, Klerin, Otto Geller, Engster), entre outras. As viagens para um
Estado e outro eram feitas intercaladas, dependendo para onde era enviado.
Para o Paraná, no entanto, o transporte das mudanças iniciou somente em 1955. A
viagem para o Paraná era feita por Itapiranga e, entre os dois Estados, Rio Grande do Sul e
Santa Catarina, a travessia é feita por balsa, sobre o Rio Uruguai, um dos maiores rios que
banha esses Estados. No momento da travessia, já tendo atravessado o rio, ou seja, já em
outro Estado, o motorista acompanhava as famílias no Posto de Fiscalização. Era um
62
momento de formalização e legalização da mudança e dos passageiros. O motorista
“precisava carimbar a nota, o papel da mudança”. O motorista lembra que, numa determinada
ocasião, uma das mulheres da mudança teria acompanhado o momento da fiscalização e,
quando estariam prestando as informações, o agente da fiscalização teria perguntado para
onde seria a mudança: “ --- Para o Prasil”, respondeu a mulher, o que teria provocado risos e
gargalhadas, pois seria o óbvio que mudar para o Paraná ainda permaneceriam no Brasil.
Seria óbvio, porém não o era para aquela nova migrante. Associado à mudança está o
novo espaço, o diferente, o desconhecido, a dúvida e a expectativa que faz aumentar a
distância. Mudar para o Paraná envolvia a separação da terra natal e dos familiares que
ficavam para trás, do outro lado do grande rio, e do Rio Grande do Sul, pois era hora de
cruzarem a balsa de Itapiranga, cruzarem o Estado de Santa Catarina e, ainda, quando já
estariam no Paraná, passarem por todos aqueles municípios e localidades menores, recordadas
e citadas pelo motorista João. O caminho ainda estava praticamente fechado pela mata, ao
menos na década de 1950, e, só depois de terem percorrido esse trajeto, chegariam a Toledo,
município sede da MARIPÁ, empresa da qual deveriam ter comprado as terras. Em Toledo e
já tão pertos (em torno de 50 quilômetros) de General Rondon, depois de terem viajado quatro
ou cinco dias e percorrido em torno de 600 km. (certas famílias demoravam até mais de dez
dias), muitas vezes era preciso fazer ali mais uma parada e pernoitar, antes de chegarem às
suas novas localidades. Ao saírem daquele Rio Grande, as pessoas já estavam informadas
sobre a longa viagem e a distância de um local para outro, pois certamente se informavam e
tinham ideia do que iriam enfrentar, mas fazer a mudança, sentar-se na cabine do caminhão,
acompanhar e ver a estrada de frente pode ter gerado, naquela senhora, a sensação de estar
viajando para bem longe, “lá para o Brasil”, no Paraná. Pioneiros de MCRondon comentam
que não era raro ouvirem falar de expressões a exemplo do que escreve Pflück
102
: “quando tu
atravessares o Rio Uruguai, podes dizer ‘Adeus, Brasil’”, numa referência aos moradores das
antigas colônias gaúchas “porque os emigrantes de 1920/40 atravessavam o Rio Uruguai e
formavam colônias na Argentina e Paraguai (Sudeste) e, quando, mais tarde, outros
atravessavam o mesmo rio para ocupar o Sudoeste de Santa Catarina e Sudoeste e Oeste do
Paraná, imaginavam que também deixavam o país.” Acredita-se que a expressão “Adeus,
Brasil” também estava associada às emoções do momento da partida, à distância que os
separaria e as dificuldades que impediriam visitas constantes à terra natal.
102
PFLUCK, 2002, op. cit., p. 29 e 54.
63
João, o motorista, ainda rememorou mais detalhes da sua atividade como motorista e
das inúmeras mudanças que transportou para diversos lugares nos Estados do Rio Grande do
Sul, de Santa Catarina e do Paraná. Para o Estado do Paraná, lembra, que começou a viajar
com mudanças em 1955. Perguntado sobre as localidades por onde passava quando trazia
mudanças para a região de Toledo, lembra que: “Quando viajava para o Paraná passava por
novo Planalto, Capanema, ali cruzando pelo Parque Nacional, hoje é a estrada do colono,
né?”
103
Passava também por São José do Cedro, Dionísio Cerqueira, Santo Antônio do
Sudoeste. Falar sobre o trajeto feito pelo parque fez lembrá-lo de que, numa ocasião, na
década de 1950, durante a vinda com uma mudança, teriam perguntado para onde iria a
família da mudança que estava transportando, pois os motoristas estariam alertas e
conversando entre si sobre o problema de terras que estaria ocorrendo na região de Pranchita,
próximo de Santo Antônio do Sudoeste, no Paraná, e esclarece: “Olha, comentaram, eu não
sei, mas disseram que mataram vários homens que estavam viajando prá lá, fizeram uma
tocaia e mataram todos, era uns quantos, mas isto faz tempo... eram os vendedores de terra
contra os jagunço, olha, teve uma grande matança. Os jagunços colocaram árvores, de peroba,
pra fechar a estrada”. A menção às mortes pode estar associada aos conflitos de terra
104
ocorridos no Sudoeste paranaense em meados da década de 1950, considerando-se tratar de
área limítrofe à região Oeste paranaense, para onde vinham com mudanças.
Sobre as mudanças, João Macena lembra que as pessoas viajavam sentadas em bancos,
muitas vezes sem encosto e se acomodavam em espaço reservado na carroceria do caminhão,
para tal. Na frente, junto à cabine, com o motorista, viajavam a mulher, os bebês que eram
amamentados e as crianças menores. “As outras crianças e os homens iam atrás, junto com a
mudança”. Quando havia a necessidade de dar uma parada, já havia uma combinação entre o
motorista e aquele que viaja em cima do caminhão. Uma ripa longa, de madeira, era usada por
uma pessoa que estava viajando em cima do caminhão, para bater na cabine. A ripa de
madeira era usada porque, devido ao barulho provocado pelo ronco do caminhão, o motorista
acabava não ouvindo quando era chamado. Ao falar sobre a duração da viagem, o motorista
fala que, durante a viagem, encontravam outras mudanças. Numa ocasião, “eu não me lembro
bem quando, mas quando nós paramos prá pernoitar, tava o comentário que morreu uma
criança de uma mudança, na estrada, de frio. O pessoal só notou quando o caminhão fez uma
103
A Estrada do Colono cortava o Parque Nacional do Iguaçu, havendo uma balsa para a travessia do rio Iguaçu.
Atualmente, por questões ambientais, esta estrada está interditada, gerando protestos e polêmicas, envolvendo
moradores das redondezas, autoridades, ambientalistas e instituições.
104
O conflito de terra ocorrido na região Oeste e Sudoeste do Paraná pode ser acompanhado pelas obras
mencionadas em nota anteriormente. Sobre a área da região de Santo Antônio do Sudoeste indica-se a leitura
de PEGORARO, op. cit.
64
parada”. A lembrança dessa situação mostra que são inúmeros e, até inimagináveis,
determinados problemas vivenciados pelos migrantes e que podem ser recuperados através
dos depoimentos.
Sobre os animais que as famílias traziam junto com a mudança, o motorista lembra
que normalmente traziam vaca, cavalo, cachorros, galinhas, porquinho... Quando a viagem se
estendia, os animais eram descidos do caminhão para serem alimentados, dormirem fora do
caminhão e descansar durante à noite. Aproveitavam para tirar o leite das vacas. “Olha,
tiravam o leite e de noite a gente já bebia, mas primeiro dava pras crianças”. O motorista
conta com detalhes que, “em Toledo, tinha uma rodoviária, um hotel e tinha espaço pro
gado”. O gado era descido do caminhão para descansar. O motorista lembra que, em Rondon,
fazia essa parada no local onde hoje está a rodoviária, pois o declive, que ainda pode ser visto
naquele espaço, servia para o caminhão estacionar e facilitava a retirada dos animais.
Naquelas proximidades também funcionava um estabelecimento que oferecia pernoite.
Comentar sobre o local onde desciam os animais e descansavam fez o motorista lembrar-se de
um detalhe sobre as mudanças e, sobre o episódio, lembra: “Então, a mulher veio com uma
tachada de sabão e na hora de tirar o tacho, ele caiu no pé de um homem... tive que ir atrás e
levar numa farmácia”.
Outro detalhe de mudança que ele transportou refere-se à família Haan: “Levei eles
prá Pato Bragado, tinha seis guri, é, só guri... ah, e a estrada, não é por aonde é hoje, viu, a
gente entrava lá por Margarida...”. Para o Paraná teria feito a mudança “do Rifel, que foi pra
Nova Santa Rosa... Lembra de ter transportado as mudanças de Schefer e de Luft, que teriam
ido para Novo Três Passos. Também teria feito a mudança do Flech (ferreiro), de Valter
Keffer (para Pato Bragado), de Paulo Hensel (que teria saído de Linha Mineiro, interior de
São Martinho, para Quatro Pontes, vilarejo de General Rondon, por onde as mudanças que
vinham para General Rondon cruzavam). Levou a de Lothar Berch e lembra ainda das
mudanças do Benz, do Kiesel. Outras famílias de que lembra ter trazido mudanças são as dos
irmãos Alberto Rodrigues e Almiro Rodrigues, que teriam vindo para o vilarejo de Margarida,
em 1957. Teve também as mudanças do Vogel, do Ritter, do Aldino Scheid, do Hergezel, do
Hard (que “tinha um probleminha na orelha”), do Afonso e do Ernesto Gauer. Sobre a
mudança dos Gauer, lembra que passou pelo Serro da Lola, próximo a Dez de Maio. A lista
de mudanças não para. Enquanto a entrevista segue, o motorista continua “viajando” por sua
memória e lembranças: “Ah, tem a do Aldino Scheid, do Weber, o, o peeeito de aço”, lembra
e sorri.
65
Considerando ter feito várias viagens, perguntou-se também sobre a alimentação de
quem estava viajando. Sobre essa necessidade lembra: “Olha, levavam bata-doce, já assada,
salame, mortadela, cuca, queijo, pão”. Acenou que “ih, levavam de tudo”. O motorista, além
de cuidar da mudança que transportava e da estrada, orientava as famílias para que cuidassem
com o que comiam e com a água e recorda: “Não podia faltar água, eles levavam muito
salame, salgado, né, então dava aquela sede... e eu lembro que eu falei, olha, não dá tanta
mortadela pros guri... e numa dessas tavam desesperados pedindo prá parar porque um deles
tava dando dor de barriga... olha, mas isto era assim mesmo”, acrescentou, como que
conformado e satisfeito com o trabalho que prestou pois a situação, ao ser rememorada,
provocou gargalhadas no motorista.
Com o passar dos anos, novas famílias se acrescentavam à lista de mudanças
transportadas por João. Sobre as famílias que trouxe também recebia notícias quando
retornava para o Paraná ou quando encontrava familiares dos migrantes que ficaram no sul.
Entre as informações recebidas por parte de famílias, comenta que Otto Gergen, de
Margarida, teria sido mordido por uma cobra; o Haas, ficara sabendo quando faleceu; o
Gergen também teria recebido uma mordida de cobra urutu; o Hupes teria tido tétano; o Luft,
de Margarida, teria morrido na derrubada de uma árvore... E, sobre outras famílias que
migraram para o oeste paranaense, falam Írica Kaefer e suas fotografias no decorrer deste
trabalho.
Na década de 1950, a companhia adquiriu alguns tratores e motoniveladoras para
facilitar o trabalho da construção das estradas e da movimentação de toras no mato. Um
desses tratores se encontra atualmente exposto na praça Willy Barth, a principal e central
praça da cidade. Embora de forma precária, as colônias eram providas de estradas que as
ligavam a outros povoados ou a “estradas tronco”. Como, porém, não havia meios de
transporte suficientes e os povoados vizinhos ficavam distantes, os primeiros anos de vivência
na localidade tornaram-se muito difíceis. Antes de se instalarem nas suas colônias, muitas
famílias eram recebidas nas “Casas de Imigrantes”, onde passavam algum tempo até poderem
instalar-se nas terras adquiridas da companhia colonizadora.
Eram casas feitas de madeira de pinho, “compridas e repartidas com quartos para três
a quatro famílias se acomodarem”. Junto às casas eram feitos poços para a captação de água
potável e, na devida distância, fossas para instalações sanitárias: “Isto tudo numa clareira de
mato recém-derrubado, na beira da estrada”, comenta Niederauer
105
. Desse mesmo autor
105
NIEDERAUER, op. cit., p. 120.
66
temos também a informação de que, a uns 10 quilômetros além de Quatro Pontes, foram
construídas umas três casas e que, numa dessas casas, é que morava a família de Benno
Weirich, um dos primeiros moradores da vila General Rondon.
Pawelke
106
menciona a chegada, em 7 de março de 1950, dos primeiros moradores de
Rondon, como sendo “Erich Ritscher, Antonio Rockenbach, Osvald Heinrich” e, em 14 de
abril de 1950, a vinda de “mais um imigrante: Benno Weirich, mas sem família”. Também,
nos seus 13 anos de idade, chegou Irmgard Lohmann. O que veio fazer a moça? Ela veio
“para cuidar dos filhos do irmão Benno”. A pesquisa de Güths
107
, ao mencionar as primeiras
famílias que vieram morar em General Rondon em 1950, refere-se aos casais Erwin Schafller,
Arlindo Kribler, Alice e Benno Weirich “e aos seus três filhos”, o que denota a vinda da
esposa de Benno, ainda em 1950. Ocorre que, muitas vezes, vinham primeiro os homens para
prepararem a moradia e a terra para o plantio e só mais tarde buscavam a família para
morarem na nova colônia. O casal Benno Weirich teve os primeiros gêmeos nascidos na vila
General Rondon em outubro de 1950. A menina chamou-se Gláucia e o menino faleceu no
mesmo ano.
Em 1951 chegaram os casais Heidrich: Edwin e Hilda, Balduino e Helga, Erni e
Catarina, com seus filhos pequenos. Edwin e Hilda tiveram mais 2 filhos rondonenses.
Consta, nos dados da ficha catalográfica
108
, do acervo fotográfico, que os três casais não
tinham terras no sul e moravam com os pais, em terras arrendadas em Guaíba (RS). Quando o
proprietário da terra faleceu, os herdeiros mantiveram só o casal de idosos e às famílias,
jovens, cujos homens eram irmãos, restou a alternativa de se mudarem para uma nova
fronteira agrícola, para General Rondon. Os três casais vieram de Sertão Santana, município
de Guaíba (RS), com mudança e filhos, sem antes terem conhecido o local onde passariam a
residir.
Junto à estrada de Toledo a Porto Britânia, a MARIPÁ fundou o núcleo de Vila
Margarida, hoje distrito de Marechal Cândido Rondon. Um dos motoristas de caminhão que
trabalhava para a empresa, Wenceslau Pietrowsky (descendente de poloneses), interessou-se
pela venda de terras da região de Vila Margarida e convidou “amigos agricultores que
moravam pelos lados de Irati, neste Estado” para conhecerem o Oeste do Paraná. Esses
amigos compraram algumas colônias, passaram a propagar a mudança para a região e, por
106
PAWELKE, op.cit., p. 27.
107
GÜTHS, op.cit., p. 52.
108
CEPEDAL. Ficha do acervo de fotografias “Grupo Família”. Pasta 12.
67
isso, na vila Margarida, hoje se concentra uma “população de agricultores de origem
polonesa”
109
vindos de área de colonização mais antiga do Paraná.
Enquanto algumas famílias eram acomodadas nas “Casas de Imigrantes”, outras
providenciavam acampamentos como moradias provisórias até “levantarem” uma casa para
moradia. Esse trabalho era, muitas vezes, feito em mutirão, entre alguns vizinhos próximos,
que auxiliavam no transporte de toras para as serrarias ou emprestavam algumas tábuas
serradas que já possuíam.
2.3.2 INFRAESTRUTURA – VIABILIZANDO A ECONOMIA
A Fazenda MARIPÁ ficava distante dos centros de consumo maiores. Para atender às
suas “áreas de apoio”, a companhia enviava caminhões para Guarapuava ou para Ponta
Grossa, providenciando ferramentas e alimentos para os sócios, empregados e moradores.
Inicialmente, as mercadorias eram depositadas e comercializadas no próprio escritório da
empresa, que, às vezes, “enchia de mercadorias, feijão, arroz, batatas, cebolas, charque,
calçados, talheres, louças, bolachas, tecidos, roupas, salames, erva, café, queijos e muitos
outros gêneros”, que acabavam em pouco tempo
110
. A MARIPÁ fundou, então, uma firma
denominada “Empório Toledo Ltda.”, com várias filiais, dentre as quais uma no núcleo
General Rondon. No início da formação das vilas, a produção agrícola e de suínos era
consumida nos próprios locais. Quando começaram a aparecer excedentes, o empório passou
a atuar na compra deles. Eram comprados feijão preto, milho e suínos, que eram
comercializados principalmente em Ponta Grossa. Havia também produção de fumo, que era
“enfardada e revendida aos fabricantes de cigarros”. Muitas vezes, as famílias realizavam a
troca de produtos da colônia com outros oferecidos pelo Empório.
A MARIPÁ, além de comercializar madeira em toras, vendia madeira serrada para
exportação. Para incrementar a produção e a exportação regular, providenciou a vinda de
madeireiros provenientes de Sarandi, de Nova Prata e outros lugares do sul. Com os
madeireiros, constituiu sociedades, a exemplo da Agro Industrial do Prata Ltda., com
diversos sócios. De outras serrarias, a MARIPÁ contratou apenas a serragem, isto é, ela
“fornecia os pinheiros e ficava com a metade das tábuas”. A madeira de terceira era vendida
pela serraria para consumo local”. Alberto Lettnin, dono de serraria e já mencionado
109
NIEDERAUER, op. cit., p. 87.
110
Idem, p. 82.
68
anteriormente, trabalhou durante 14 anos nesse negócio, mas, em fins da década de 1960, a
disponibilidade de madeiras diminuiu e a serraria foi vendida, tendo sido desmontada e levada
para o Paraguai
111
. Enquanto a MARIPÁ aplicava a receita advinda da comercialização da
madeira no aumento da produção de tábuas ou de toras exportáveis, transportadas com a sua
frota de caminhões até o Rio Paraná, os colonos se valiam de carroças, suas ou do dono da
serraria, para transportarem toras que, beneficiadas, transformar-se-iam em tábuas para a
construção das suas casas.
A necessidade de descascar o arroz e de transformar o milho e a mandioca em farinha
levou à construção de moinhos na vila e nos povoados.
Assim que passou a haver produção agrícola própria dos colonos, tal como
verduras
112
, raízes de batata-doce e de mandioca
113
, pés de mamão e animais eram logo
fotografados. Portanto, passa-se a demonstração de exibição de qualidade da produção, da
terra boa. Na análise sobre o Plano de colonização da MARIPÁ, realizada por Solange
Portz
114
e, numa referência à boa produção, está indicado que: “Por outro lado, o Plano de
Colonização, por onde quer que circulasse, iria propagar todo o sucesso da colonização, com
ares de propaganda: mostrar toda a grandiosidade dos feitos no Oeste e todas as vantagens de
fazer parte desse espaço.”
111
LETTNIN, op. cit.
112
Fotografia de uma cabeça de repolho, com a indicação “peso 12 quilos”, está entre as fotos doadas por João e
Ida Risse. Acervo do CEPEDAL. Pasta Coleção Col. Foto 0053. Fotógrafo não identificado. Fotógrafo da
reprodução Rogelio Lang. Foto Avenida. MCRondon.
113
Fotografia de um pé de mandioca, com a indicação “106 Kg.”, está entre as fotos doadas por Maria Raspe.
Acervo do CEPEDAL. Pasta Coleção Col. Foto 0082. Fotógrafo Foto Kaefer. Fotógrafo da reprodução
Rogelio Lang. Foto Avenida. MCRondon.
114
PORTZ, Solange da Silva. As paisagens da memória: um estudo sobre as fotografias do Plano de
colonização da empresa MARIPÁ (1946/55). Niterói, 2002. Dissertação (Mestrado em História) - UFF. p. 23-24
e 27
69
Foto 3 - Produção de mandioca
Acervo CEPEDAL. Autoria Foto Ondy Hélio Niederauer. Plano de Colonização. Mimeografado. Toledo. 1955.
p. 14.
Ainda, através das imagens inseridas no Plano de Colonização, o que se pode ver na
Foto 3, são mostrados o ânimo e a satisfação dos colonos com a produção considerada
satisfatória. Pai e filho são enquadrados e posicionados em cima do pé de mandioca e
colocam vestes boas para o registro fotográfico. Em outras imagens, tanto do plano de
colonização como do acervo de Írica Kaefer, são colocadas crianças em cima da plantação ou
ao lado desta indicando parâmetros de tamanho entre a planta/fruta/animal e a criança.
Crianças também sentam em cima e de outras ramas de mandioca
115
, que, de tão altas e fortes,
suportam o peso das pessoas.
Os colonos levantavam de manhã cedo todos os dias, colocavam o produto nas costas
e andavam a pé, a cavalo ou de bicicleta até os moinhos a quilômetros de distância. Alguns
produtos, quando moídos, permaneciam ainda rústicos, assim, quando a família queria uma
farinha mais fina, enviava para o moinho de Cascavel
116
. Também foram surgindo olarias,
115
PLANO de Colonização da Madeireira Maripá. Toledo, 1955. mimeo.
116
VORPAGEL, Irma Hartleben. Entrevista concedida para Lucia Teresinha Macena Gregory. Marechal
Cândido Rondon, 09 ago. 2009.
70
ferrarias e marcenarias, dentre outros empreendimentos, fornecendo tijolos, cabos, pás,
enxadas e martelos, bem como foram sendo manufaturados aros, rodas e eixos (de madeira e
de metal) para as carroças, viabilizando os trabalhos do cotidiano rural.
Fotografias mostram vários momentos da relação entre famílias de colonos e a criação
de suínos. As atividades nas pequenas propriedades rurais eram exercidas pelos membros das
familias, ocorrendo distribuição e divisão de algumas tarefas. Pais, acompanhados dos filhos
maiores e, muitas vezes, até de crianças pequenas, executavam os trabalhos da lavoura, em
conjunto, preparando a terra, plantando e colhendo. No espaço doméstico, enquanto os
homens preparavam o pasto e tratava dos animais, as mulheres, tiveram papel marcante “pois
trabalhavam juntamente com os homens e, ao chegarem em casa, realizavam, ainda, serviços
domésticos”
117
. Geralmente tiravam leite das vacas e se ocupavam das lidas da casa.
Cozinhavam, amassavam e assavam o pão, lavavam, costuravam, limpavam a casa e
cuidavam dos filhos. Registros de pessoas trabalhando, tratando de vacas, de galinhas ou
mesmo de suínos praticamente não existem nas fotografias, porém, o resultado do trabalho, o
porco já criado e gordo ou o pé de mandioca já crescido, o fruto gerado do trabalho, este sim
recebeu destaque em fotos.
A prática da produção familiar baseava-se principalmente na produção para
subsistência e para o mercado.
118
Assim, através da produção agropecuária, a suinocultura
veio a se integrar à agricultura, tornando-se uma das principais atividades econômicas do
município. A própria colonizadora, através do Empório Toledo Ltda., após 1954, passou a
comercializar a produção “sempre crescente... que era transportada por precária estrada à
Ponta Grossa, Curitiba e até São Paulo”
119
, escoada também para centros de abate do Estado
do Rio de Janeiro e Minas Gerais
120
e para frigoríficos de Santa Catarina
121
. Em 1958 esses
117
GREGORY, Valdir; VANDERLINDE, Tarcísio; MYSKIW, Antônio Marcos. Mercedes: uma história de
encontros. Marechal Cândido Rondon: Editora Germânica, 2004. p. 56.
118
ELFES, Alberto. Estudos agro-economico e social: Guaira, Toledo, Palotina, Nova Aurora, Santa Helena,
Assis Chateaubriand, Terra Roxa do Oeste, Marechal Candido Rondon e Formosa do Oeste. Curitiba: INDA,
1970. p. 20-24. Na obra de Elfes, pesquisador alemão, constam algumas “preliminares” que consideramos
interessante transcrever: “Para executarmos o presente estudo realizamos três viagens; Entramos em contato
com: 9 prefeituras, 3 escritórios da ACARPA, 3 sindicatos de proprietários rurais, 1 sindicato de trabalhadores
rurais, 1 agência do Banco do Brasil. Visitamos: 23 estabelecimentos. Independente dos mencionados contatos,
entrevistamos cerca de trinta habitantes da região, trabalhadores rurais e industriais, colonos, comerciantes,
soldados, professores de escola primária, motoristas e compradores de suínos ... Em Curitiba procuramos contato
com o: IBGE, DEE, DER, PLANEPAR, CEPRES. Os dados estatísticos apresentados no presente estudo
baseiam-se em dados oficiais, fornecidos pelas autoridades, prefeituras, informações fornecidas pelos
agricultores, em observações pessoais”.
119
NIEDERAUER, op. cit., p. 149-150.
120
SAATKAMP, op. cit., p. 137-140.
121
SPECK, Lori. A dinâmica do espaço agrário do município de Marechal Cândido Rondon. O Portal da
Informação, Marechal Cândido Rondon, ano 1, n. 27, p. 12, 28 jul. 2002.
71
animais integraram a grande exposição agropecuária e industrial, sendo os porcos destacados
na reportagem apresentada pela Revista Municipalista
122
editada em Curitiba, que incluiu
cinco fotografias desses animais nas 18 páginas de sua revista. Exposições podem ser
consideradas como oportunidades para “exibição” de produtos pessoais ou comuns a um
determinado espaço, a exemplo dos produtos colhidos pelos colonos e expostos ao olhar de
admiradores, de curiosos ou de interessados em negócios relacionados, no caso, com a
agricultura e, os quais, além de estarem expostos também passam por leilões e são
comercializados
123
. Devido ao rápido crescimento da suinocultura
124
, foi criado, no
município, em 1963, o Frigorífico Rondon S/A. Nesse sentido, posar ao lado de um suíno
gordo pode representar uma ativa participação na vida econômica do Oeste paranaense, que
passou a mostrar a sua produção local e a se projetar nacionalmente
125
.
Os jornais locais que passaram a circular desde 1968, fazem da agricultura e da
pecuária notícia constante e, em 1970, MCRondon foi considerado como o município de
maior produção suína do Estado do Paraná. Instruções sobre melhores tratos para animais,
preparo da terra, locais e formas de comercialização e a construção dos empreendimentos tais
como frigoríficos e cooperativas são informes que chegam aos leitores a cada edição de jornal
publicada semanalmente ou mensalmente
126
. Além dessas informações sobre a
suinocultura
127
, pode-se mencionar que, em Toledo, já é tradicional a Festa Nacional do Porco
no Rolete
128
, cuja 36ª edição ocorreu em 2009 e, na oportunidade, foram preparados mais de
cem leitões recheados para um domingo de festa, com grande comparecimento de pessoas de
todas as partes.
122
REVISTA MUNICIPALISTA. Curitiba, ano 2, n. 7, p. 7-8, set. 1958.
123
SCHNEIDER, Claércio I. Vitrine de Aparências: exposição como palco para a exibição de uma comunidade
(Oeste do Paraná, 1958). In: DIEHL, Astor. (org). Fascínios da história. Passo Fundo: UFP, 2003. p. 114-
137.
124
Em Toledo, a suinocultura “foi desenvolvendo-se na década de 50, levando à fundação do Frigorífico
Pioneiro S/A”, hoje um dos maiores bairros daquele município. O frigorífico “teve seu controle acionário
adquirido pela empresa Sadia no ano de 1964, hoje a maior indústria instalada no município, que destina sua
produção para o mercado doméstico e exterior”. TOLEDO (Paraná). Disponível em:
<http://pt.wikipedia.org/wiki/ Toledo_(Paran%C3%A1)>. Acesso em: 30 jun. 2008.
125
“Importante centro de suinocultura, Toledo começou a ganhar destaque no cenário nacional com a sua Festa
Nacional do Porco Assado no Rolete, hoje com mais de 33 anos de existência e conhecida
internacionalmente”. TOLEDO é conhecida como a "Cidade do Porco no Rolete". ParanáOnline, 05 nov.
2008. Disponível em: <http://www.parana-online.com.br/canal/viagem-e-turismo/news/332963/?noticia=
TOLEDO+E+CONHECIDA+COMO+A+CIDADE+DO+PORCO+NO+ROLETE>. Acesso em: 12 set.
2009.
126
Ver anexo 5
127
Para maiores informações sobre a produção agropecuária em MCRondon ver: SCHREINER, op. cit. e
SCHNEIDER, Claídes R. Do cru ao assado: a Festa do Boi no Rolete de Marechal Cândido Rondon.
Curitiba, 2002. Dissertação (Mestrado em História) – Universidade Federal do Paraná.
128
“Porco no rolete é uma comida típica regional da cidade brasileira de Toledo, no Estado do Paraná”. No mês
de agosto, anualmente, a cidade realiza uma festa e assa vários porcos. PORCO no rolete. Disponível em:
<http://pt.wikipedia.org/wiki/Porco_no_rolete>. Acesso em: 20 jul. 2008.
72
Foto 4 – A COPAGRIL
Autoria: Foto Kaefer. Acervo particular de Írica Kaefer. Década de 1970.
A projeção da produção dos suínos e de outros produtos agrícolas já na década de
1960 e o desenvolvimento da agroindústria levaram a fundação da COPAGRIL, em 1970
(sinalizada na figura 4). A fotografia aérea (Foto 4) destaca o complexo cooperativo já com
vários armazéns. Ao redor, áreas de terras plantadas ou preparadas para plantio, cujas linhas
mostram o uso de plantação mecanizada.
Acompanhando as atividades agrícolas, algumas indústrias
129
foram instaladas no
município, tais como o Comércio e Indústria Rondonense de Óleos Vegetais S/A Exportação
e Importação (em 1966), as Organizações Rainha (balas e café), a Indústria de Fécula Lorenz,
Rima Implementos e Máquinas Agrícolas Ltda., dentre outras.
Festas, bailes, atividades escolares e cívicas também aconteciam no vilarejo. Uma
demonstração dessas atividades pode ser resumida, em parte, através de um conjunto de
fotografias constituídas em um miniálbum que se vê como um “álbum de bolso”.
2.3.3 1ª EXPOSIÇÃO AGROPECUÁRIA E INDUSTRIAL ÁLBUM DE BOLSO
O contato inicial com Írica Kaefer ocorreu durante a realização da nossa pesquisa de
mestrado
130
, quando utilizamos como corpus documental uma coleção de fotografias do
129
SAATKAMP, op. cit., p. 161.
130
GREGORY, Lucia Teresinha Macena. Imagens do pioneiro: a colonização do Oeste do Paraná na fotografia.
Rio de Janeiro, 2002. Dissertação (Mestrado em História) – UFF/Niterói.
73
CEPEDAL
131
, uma coleção de constituição pública. Naquela oportunidade procuramos Írica
Kaefer, reconhecida por muitas pessoas, principalmente pelos moradores mais antigos da
localidade, como sendo proprietária, juntamente com seu marido Oscar, da Foto Kaefer, uma
das primeiras casas do ramo fotográfico na região.
Durante aquela pesquisa chamou a atenção um conjunto de 12 fotografias, coladas em
cartolina dura, em estilo sanfona, dobradas uma sobre a outra, formando um pequeno
álbum
132
. Tratando-se de fotografias, é sempre um álbum de recordações. Considerando que
foi através daquele estudo que se conheceu a fotógrafa Írica, elege-se agora o miniálbum do
acervo de Írica para, através dessas imagens, apresentar aspectos temporais e espaciais nos
quais está situada a presente pesquisa.
A agência produtora das fotografias desse miniálbum de 6x9 cm é a Foto Kaefer. Com
sua habilidade, o casal Kaefer produz um material especial sobre a vila que, embora já levasse
o nome de um eminente personagem do país, General Rondon, ainda não havia sido
emancipada e era distrito do município de Toledo. Formando um conjunto de 12 fotografias
(Foto 4), o álbum traz imagens feitas no ano de 1958, por ocasião das comemorações da 1ª
Exposição Agropecuária e Industrial do distrito. Conforme escreve Saatkamp
133
, um dos
objetivos da festa foi a divulgação da região a nível nacional, sendo que diversas autoridades
se fizeram presentes, tais como o governador do Estado, Moisés Lupion, o ex-governador
Bento Munhoz da Rocha Neto, o Ministro da Agricultura e o Secretário da Agricultura do
Paraná, senadores e deputados, além de visitantes de outras regiões. Nesse sentido, o álbum
131
O Centro de Estudos, Pesquisas e Documentação da América Latina – CEPEDAL, vinculado à Unioeste,
Campus de MCRondon, foi criado em 1988. O CEPEDAL é órgão suplementar, vinculado ao Campus de
Marechal Cândido Rondon, da Universidade Estadual do Oeste do Paraná – UNIOESTE e objetiva a pesquisa
e preservação de acervos documentais sobre a Região Oeste do Paraná e as populações de fronteira próximas
à esta região. Ao ser criado, teve por finalidade o estudo e a pesquisa sobre temas regionais e latino-
americanos voltando-se à identificação, ao registro de fontes e arquivos e a sua preservação. Ao se
oficializarem as primeiras reuniões do CEPEDAL ficaram evidenciados contatos mantidos com vários órgãos
nacionais e estrangeiros. Linhas de pesquisa foram sendo traçadas ocorrendo a participação em eventos
científicos locais, estaduais, nacionais e internacionais. Nesse sentido, podem ser mencionadas a participação
e a atuação nos Simpósios de História, nas Jornadas Internacionales sobre as Missiones Jesuíticas, nos
encontros da Associação Brasileira de História Oral – ABHO, desde sua fundação, dentre outros, o que
possibilitou importantes intercâmbios e a divulgação dos trabalhos desenvolvidos pelo CEPEDAL. Através do
centro, pesquisas foram desencadeadas, bolsistas foram agregados formando-se posteriormente, pesquisadores
mestres e doutores que atuam na Unioeste e em outras instituições de ensino. Recentemente as atividades do
centro foram re-orientadas e este passou a se designar Núcleo de Pesquisa e Documentação sobre o Oeste do
Paraná. Maiores informações sobre o CEPEDAL poderão ser obtidas na dissertação de GREGORY, Imagens
do Pioneiro, op. cit., cap. II.
132
O miniálbum era de propriedade de Gerda Mette, que o havia emprestado para o CEPEDAL durante o projeto
“História Viva”, em 1994, para fazer cópias para a coleção sobre pioneiros de MCRondon. As fotografias
daquele álbum foram reproduzidas e ampliadas, no tamanho 20 cm x 30 cm e também digitalizadas. Acervo
do CEPEDAL. Pasta Fotografias Colonização. Col. Fotos 0037 à 0048. Os originais foram devolvidos à
doadora depois de 15 anos do empréstimo, conforme Termo de Doação assinado em 15.9.2009. Arquivo
Cepedal. Pasta Termos de Doação. MCRondon, 2009.
133
SAATKAMP, op. cit., p. 148.
74
foi produzido para ser comercializado e para integrar-se à própria programação da festa, que
ocorreu na atual Praça Dealmo Selmiro Poersch (10.000 m
2
), no centro da vila, integrar-se à
divulgação deste espaço e das pessoas que estão residindo ali e mostrar a infra-estrutura que o
distrito já apresenta.
5-A
5-B 5-C
5-D 5-E
75
5-F 5-G
5-H 5-I
5-J 5-L
5-M 5-N
Foto 5 – Álbum de Bolso - Tamanho Original 6x9 cm
Autoria: Foto Kaefer. Acervo Írica Kaefer. General Rondon. 1958.
76
Na capa do álbum de fotos pode-se ler, em grifos acentuados: Lembrança de
General Rondon e da 1ª Exposição Agro-Pec. e Ind. dos dias 1º a 7 Setembro, 1958”. O
álbum foi planejado com antecedência. Fotografias foram feitas e selecionadas para serem
incluídas no trabalho e “a capinha desse álbum foi feita lá na Clivatti
134
, comenta Írica,
referindo-se à agência fotográfica de Toledo. A elaboração do álbum ainda está presente na
memória dessa mulher, que auxiliou na organização do álbum e que lembra: “a gente era novo
aqui e a gente queria mostrar nosso trabalho e também a MARIPÁ ela viu que a gente era
sério e tal, e sempre apoiou a gente”. A referência à empresa colonizadora é uma indicação de
que a produção e a venda de imagens sobre o espaço que estava sendo ocupado e que tinha
ainda muitos lotes urbanos e áreas rurais a serem vendidos viria em benefício não só da
MARIPÁ mas também da agência produtora de fotos. Organizar uma festa de tamanha
abrangência e poder oferecer aos visitantes, não somente como propaganda, mas também
como “lembrança de General Rondon” um álbum de bolso com 12 imagens ilustrando a vila e
tendo incluído momentos da própria festa foi algo extraordinário. “Nós vendemos muito este
álbum. Nós fazia de noite e de dia até o Renato ajudou a vender”
135
, acrescenta Írica,
referindo-se ao filho pequeno, que circulava por entre os visitantes, oferecendo o álbum das
lembranças da festa e da vila.
Aspecto a considerar é o fato de que o conjunto de fotografias, além de mostrar
imagens gerais sobre a vila, agrega ao álbum imagens de momentos sociais e cívicos da
própria exposição: os pavilhões construídos especialmente para o evento (foto 5-A), a
solenidade de abertura dos festejos (foto 5-F), a rainha e princesas da festa.
A construção dos pavilhões é uma referência para várias pessoas quando comentam
sobre o evento. A própria fotografia (foto 5-B)
136
faz parte do acervo de várias famílias
visitadas. Veleda Liessen comenta que possui um exemplar e ainda diz: “Lembro tão bem, a
gente morava aqui pertinho, né, então a gente ia todo o dia ver a festa”
137
. Veleda lembra que
teve dias de chuva, muito barro, mas, mesmo assim, “as autoridades de fora vieram”. Quanto
aos pavilhões, explica que eles foram construídos em terreno da igreja católica, ou seja, “a
igreja atual está bem onde foi a exposição”, mas na época a igreja ficava em uma quadra ao
lado. Parte da igreja pode ser vista no alto da foto, à esquerda, acima dos pavilhões. Os jornais
134
A Foto Clivatti, na cidade de Toledo, é considerada uma das primeiras casas no ramo fotográfico na região
Oeste paranaense.
135
KAEFER, Írica. Entrevista concedida a Lucia Teresinha Macena Gregory. Camburiu, SC, 03 maio 2009.
136
Na obra de WEIRICH, Udilma Lins. História e atualidades: perfil de Marechal Cândido Rondon. Marechal
Cândido Rondon: Germânica, 2004. p. 123. consta a foto 5-B, acervo Prefeitural Municipal de MCRondon.
137
LIESSEM, Veleda. Entrevista concedida a Lucia Teresinha Macena Gregory. Marechal Cândido Rondon,
24 maio 2009.
77
de MCRondon, quando começaram a circular, na década de 1970, passaram a fazer
referências ao desenvolvimento da cidade, mencionando o evento e ilustrando a reportagem
com a fotografia (5-B) dos pavilhões
138
.
A vila estava sendo constituída. Havia já alguns moradores, como mostram as
residências. Nas fotos 5-C-E-G, o traçado das ruas indica aspectos de uma “cidade planejada”
em torno da qual a movimentação se fazia perceptível. Postes para a instalação de energia
elétrica estão colocados. Havia, já nessa época, as construções do Empório Toledo, do Hotel
Avenida e uma estação rodoviária. Assim, portanto, apresentados através de diversas partes,
os recortes produzidos pelos fotógrafos formam um todo que, no conjunto do álbum, formam
o conjunto comercial e residencial da vila. A foto 5-E
139
nos apresenta uma vista parcial da
vila General Rondon, em 1958. Ao centro, a construção mais alta mostra o Moinho Fronteira
de Henke & Filhos, construído de três andares e de madeira, na esquina da Rua Santa Catarina
com a Rua Colombo, ruas centrais da vila. A foto 5-D mostra parte da vila e aspectos do
cotidiano. A foto está analisada no capítulo IV, como foto -----
Na foto 5-L, a construção do Empório Toledo à esquerda e, no centro, o Hotel
Avenida. Na Avenida Rio Grande do Sul, a principal avenida daquele momento, em destaque
nas fotos 5-C-G-J, algumas edificações podem ser avistadas, como o Posto Esso, foto 5-C,
atualmente conhecido como Posto Centrão e a Casa Rieger
140
, acima, à esquerda, de dois
pisos, a qual expandiu seu empreendimento com o comércio de produtos para lavoura.
Indica-se que ainda podem ser vistas, por entre construções e ruas, as quadras que
demarcaram os lotes, pequenas hortas, arbustos e terrenos vazios (fotos 5-H-J-M-N). Enfim,
um conjunto de edificações construídas pelos migrantes com o apoio e a administração da
colonizadora, em meio a um espaço que ainda apresentava alguns traços de floresta. Pouca
movimentação? Talvez não, pois essas pessoas e as instituições às quais estavam vinculadas
foram o suficiente para que se realizasse, na jovem vila do Oeste, ainda distrito de Toledo,
distante 596 km de Curitiba, capital do Estado, uma grande feira de negócios. Em fins da
138
No acervo de Írica Kaefer permanece um exemplar da foto 5-B (pasta Produção Econômica foto 3), 4-F
(pasta Civismo foto 05), 4-J (pasta Vistas da Localidade foto 14) da foto da rainha e princesas, em pose
semelhante a da foto 4-I (pasta Festividades, foto 45), incluídas na análise.
139
Um exemplar da fotografia 4-E também está no acervo do CEPEDAL, doada por Germano Buss, data da foto
1958. Pasta Coleção COL-0048. Fotógrafo Foto Kaefer. Fotógrafo da reprodução Rogelio da Foto Avenida.
140
No CEPEDAL, o acervo digital de fotografias doadas pela família Rieger integra uma foto (Col. 0013) do
estabelecimento onde as palavras escritas nas paredes divulgam os produtos ali comercializados: “Casa Rieger
– Importadora Pindorama. São Paulo, Maringá, Paranavaí, Campo Mourão. Caça e pesca, ferragens para
indústrias, material de construção, material elétrico, máquinas agrícolas e acessórios. O Lago Municipal
Rodolfo Rieger, de MCRondon, leva o nome do proprietário da Casa Rieger, um dos pioneiro locais.
78
década de 1950 e na década de 1960, a movimentação em torno de novos migrantes era
significativa, assim como a de novos compradores de terras.
No conjunto das imagens selecionadas para o álbum estão registradas fases em que um
espaço estava recebendo rápidas transformações na paisagem através da derrubada intensa da
mata, a exemplo do que foi feito no espaço destinado para ser a sede da vila onde já havia
sido derrubada toda a mata e a área já estava sendo substituída por pequenas lavouras e hortas
e por edificações. Esse espaço recebia modificações também das primeiras construções, da
demarcação das principais ruas, das instituições religiosas, dos estabelecimentos comerciais
que, inicialmente, tinham a sua administração acompanhada pela MARIPÁ.
A companhia colonizadora também acompanhou a programação dessa primeira
exposição agropecuária e industrial
141
. As autoridades vindas de fora foram recebidas na
cidade sede da colonizadora, em Toledo, onde funcionava um aeroporto. Para recebê-las, o
município construiu um palanque oficial junto aos pavilhões. Bandeiras do Brasil e do Estado
do Paraná foram hasteadas. As escolas se fizeram presentes e grupos de alunos uniformizados,
enfileirados formam filas bem alinhadas, numa demonstração de que na vila é dada à
instrução “da ordem e do progresso”, valorizada pelo público que se faz presente. Os
discursos são acompanhados por curiosos e interessados, pois quer se escutar o que será
proferido pelas autoridades políticas e quais as promessas que farão para a nova vila de
General Rondon e que tem na pessoa do governador o poder da nomeação do prefeito
provisório, o qual passa a representar a autoridade nacional, considerando constituir-se esse
um espaço situado em área de “faixa de fronteira”, como mostra a Figura 1.
As fotos do álbum são uma demonstração da vista da Vila General Rondon e de parte
do local preparado para os festejos da exposição. Acompanhando a programação festiva,
outro local preparado foi o Clube Aliança
142
, que recebeu ornamentações. O ambiente interno
recebeu enfeites naturais com ramos de folhagens e flores. A escolha da rainha e das princesas
(foto 5-I) foi um dos pontos altos da programação, que durou uma semana, encerrando-se no
dia 7 de setembro, coincidindo a data com as comemorações nacionais em torno do dia da
Independência do Brasil. Nesse sentido, as imagens são representações de contextos locais em
meio aos quais a identidade brasileira vai se firmando, quer seja através da Bandeira Nacional
que tremula acima dos troncos e tocos de árvores queimadas, ainda posicionados nos lotes
vazios, no centro da vila, quer seja recebendo seus visitantes com grupo de alunos
uniformizados e em ordem.
141
KAEFER, 05 jul 2002, op. cit.
142
PAWELKE, op. cit. A Sociedade de Cantores Aliança foi fundada em 1954, com 63 sócios. p. 32.
79
Registradas para divulgar a vila durante a 1ª Exposição Agropecuária e Industrial de
General Rondon, as imagens serviram para divulgar o empreendimento da empresa
colonizadora, bem como para os visitantes, os quais poderiam divulgar o empreendimento e
os lotes de terras ainda à venda, aos moradores que, quando retornassem à sua terra natal,
poderem mostrar a parentes e a amigos o que estava acontecendo nessa região da nova
colônia. São imagens de vistas aéreas da vila, tomadas a partir de edificações mais altas, de
árvores, de uma igreja ou de moradias em posições estratégicas para as tomadas fotográficas.
Nesse sentido, o pequeno distrito de Toledo, General Rondon, pôde mostrar a sua
participação na ocupação desse espaço de fronteira, aspecto que estava causando
preocupações às autoridades governamentais estaduais e nacionais. As preocupações públicas
em torno da existência de empresas estrangeiras, da exploração ilegal da área, dos conflitos,
da necessidade de tomar medidas de saneamento e que vinham ocupando as autoridades, não
se encerraram, no entanto, com a ocupação deste espaço. Os problemas passam a ser
compartilhados, através da colonização da área, pelas companhias colonizadoras, que
necessitam vender as terras e auxiliar na infraestrutra das vilas fundadas e, através da
migração, por aqueles que já se faziam ocupantes desse espaço e, ainda, pelos novos
ocupantes da fronteira oeste paranaense. Famílias, casais jovens vinham tentar a sorte,
adquirir mais terras para os filhos, aumentar os próprios bens, acompanhando os pais, os
vizinhos, algum parente. As dificuldades se apresentavam ainda no caminho da vinda.
Relatos
143
sobre as mudanças indicam o tempo da viagem, que podia durar uma semana e até
mais dias. Dependia muito do tempo, das condições da estrada e do meio de transporte.
As imagens do álbum evidenciam, em parte, aspectos sociais e econômicos que
levaram ao desenvolvimento da vila, que se emancipou dois anos após a grande festa,
passando a chamar-se Marechal Cândido Rondon. Preservadas
144
, as imagens deixam de
pertencer ao circuito econômico para “participar no intercâmbio que une o mundo visível e o
invisível”
145
, adquirindo um valor simbólico. Representam também a busca pela construção
de uma identidade local de pessoas trabalhadoras e progressistas e, de uma memória por parte
dos diferentes empreendedores e da sociedade que se estabeleceu na vila General Rondon,
entre os quais, a própria Foto Kaefer.
143
Entrevistas com pioneiros. Projeto História Oral. Acervo Cepedal. 1994.
144
No acervo do CEPEDAL, em pasta de fotografias doadas por Rodolfo Rieger, está digitalizado um conjunto
de fotos (duas a duas) também na forma de miniálbum porém esse composto de oito fotos. As fotografias são
iguais às fotografias do miniálbum do acervo de Írica Kaefer (fotos 5-B-C-D-E-F-G-L-M), porém são
distribuídas em ordem diferente da do álbum de Írica. Acervo Cepedal. Pasta de fotografias Colonização. Col.
0062 a 0065.
145
POMIAN, op. cit., p. 66.
80
As considerações esboçadas nesta parte do trabalho procuram mostrar a (re)ocupação
do oeste do Paraná no que se refere à atuação da colonizadora MARIPÁ na região de
Marechal Cândido Rondon. Através do “álbum-de-bolso”, mostrou-se a integração da agência
Foto Kaefer nesse contexto de colonização. Essas questões também têm relação com as
discussões desenvolvidas nos próximos capítulos da pesquisa, a partir do acervo fotográfico
de Írica Kaefer. No próximo capítulo passa-se, portanto, a mostrar a história da Foto Kaefer.
3 A PRÁTICA DE FOTOGRAFAR - TRAJETÓRIAS DA FOTO KAEFER
3.1 OS FOTÓGRAFOS
Após apresentar-se, no presente estudo, a formação e a constituição da região Oeste do
Paraná, mais especificamente do município de Marechal Cândido Rondon, passa-se, neste
capítulo, a mostrar aspectos relacionados com fotógrafos que atuaram na região, seus
equipamentos, sua produção e o interesse manifestado em torno da prática de fotografar no
período da colonização recente do Oeste paranaense, tomando como referência a Foto Kaefer.
Objetiva-se analisar as relações econômico-sociais percebidas a partir das fotografias da
coleção particular de Írica Kaefer, dos equipamentos e das entrevistas orais para mostrar a
constituição e a participação da Foto Kaefer na ocupação e colonização de Marechal Cândido
Rondon e a sua relação com a economia e a sociedade rondonense.
Conforme se colocou anteriormente, o nosso contato com a fotógrafa Írica vem
acontecendo desde o período de nossa dissertação de mestrado oportunidade em que a mesma
foi procurada pelo CEPEDAL para auxiliar na identificação de fotografias arquivadas naquele
centro. A coleção de fotografias denominada como “Colonização” integra fotografias sobre as
famílias pioneiras vindas para MCRondon e, como havia pouca referências sobre as fotos
procurou a ajuda de Írica até porque, como ocorre em outros centro de documentação ou
arquivos particulares, as fotografias não têm identificadas a sua autoria. Assim, com o apoio
de Írica, complementou-se as referências sobre as fotografias inclusive, confirmando ela, a
autoria de fotografias feitas pela Foto Kaefer.
A fotógrafa Írica apontou dificuldades pelas quais passou e ressaltou sua experiência
como fotógrafa e, naquela oportunidade, revelou a existência de “caixas do depósito” onde
eram guardadas as fotografias não retiradas, conforme afirmado anteriormente, após a sua
82
encomenda, desde o início das suas atividades no Paraná até o encerramento da casa
fotográfica em torno de 1990.
As fotografias das “caixas do depósito” passam a ser as principais fontes de nossa
pesquisa. Nesse sentido, pretende-se perceber, através da análise dessa documentação
fotográfica, das entrevistas, das câmeras, dos equipamentos e acessórios e de outros papéis
localizados, a relação da Foto Kaefer com a construção da cultura fotográfica, percebendo o
processo de construção de identidade(s) local.
3.2 A PLANTAÇÃO DE CAFÉ E A “COLHEITA” DE FOTOGRAFIAS
A vinda da família de Írica e Oscar Kaefer para a região Oeste do Paraná, em 1954,
está associada às notícias veiculadas na região sul do país sobre a boa produção do café no
Paraná, pois “era muito famoso, falavam do café, que ia dar muito bem o café”
146
.
Assim, atraídos pela novidade econômica em torno do café, os Kaefer migraram de
Piratuba, Santa Catarina, para General Rondon. O casal Írica e Oscar chegou com dois filhos
pequenos, encontrando-se ela grávida de uma filha que nasceu em setembro. Em 1963, o casal
teve o quarto filho. A região Oeste, ainda passando pelas experiências do plantio do café
iniciadas em 1954 e que “motivaram a vinda de muitos colonos”
147
, no final da década foi
afetada por geadas que destruíram os cafezais.
Segundo Írica
148
, de uma hora para outra desfez-se um “sonho, porque a Maripá fez
tanta propaganda que a terra aqui era própria para o café”, que o casal avaliou a possibilidade
de trocarem de atividade, pois, em Santa Catarina, trabalharam “só com foto... mas via que
não dava futuro”, porém admitiu que o ramo da fotografia fosse bom negócio. Com o dinheiro
que estavam juntando, mais “um pouquinho dos pais para iniciar e atender a família e, o que
era o importante, o trabalho certinho”, compraram uma colônia de terras, mais uma chácara e
uma casa em General Rondon. Estas informações dão conta de que o casal teve um bom
capital inicial.
Foi, portanto, a expectativa em torno da produção do café que trouxe os Kaefer para
General Rondon, uma vez que já conheciam a fama do café “do norte, né?”, porque lá
moravam pessoas conhecidas. Írica lamenta situações enfrentadas, pois, quando se deram
146
KAEFFER, 5 jul. 2002, op. cit.
147
SAATKAMP, op. cit., p. 116.
148
KAEFFER, Írica. Entrevista concedida a Lucia Teresinha Macena Gregory. Marechal Cândido Rondon, 21
nov. 2006.
83
conta, viram que “não era isso, que não dava”
149
para insistirem na plantação de café. Várias
famílias também passaram por essa frustração, pois “a geada de 1958, matou tudo, as plantas
eram bonitas, o café estava na flor, e o clima não deu certo para o café, aqui”
150
.
Írica e Oscar, como já eram profissionais fotógrafos em Santa Catarina, e tinham boa
experiência, “sabia que dava bem”, reorientaram os negócios e passaram a trabalhar
novamente com fotografia em General Rondon. Do empreendimento frustrado com a
agricultura nasceu, portanto, um novo investimento, agora num ramo de negócios cuja
especialidade dominavam – a fotografia. Assim, através dessa opção e da necessidade
profissional, em meio às casas comerciais integradas ao conjunto econômico da Vila General
Rondon, surgiu, em 1958, uma casa fotográfica – a Foto Kaefer.
Ao mesmo tempo, diante da situação desastrosa e negativa advinda do café, o casal
vendeu as terras em que havia plantado café e, diz Írica, “trocamos terras por gado”
151
, em
São Francisco/Margarida, interior de General Rondon e, nesta terra, investiram na pecuária,
com criação de gado de raça, comprado em exposições e feiras de Londrina e Maringá.
Entendendo se tratar de um bom negócio, Oscar Kaefer foi comprando terras dos vizinhos,
fazendo piquetes para pasto e registrou a fazenda como empresa.
Fica, porém, claro que a intenção da vinda era a plantação de café, tanto que foram
plantados “3 mil pés de café” e “em nenhum momento, nenhum momento” a família pensou
em trabalhar em outro negócio. Com a frustração e a zebra do café, recomeçaram os trabalhos
com a produção fotográfica.
149
KAEFFER, Írica. Entrevista concedida a Lucia Teresinha Macena Gregory. Marechal Cândido Rondon, 27
jun. 2002.
150
KAEFFER, 21 nov. 2006, op. cit.
151
Idem, ibidem.
84
Foto 6 - Residência Kaefer e Estúdio Antigo I
Autoria: Foto Kaefer. Acervo particular de Írica Kaefer. 1954.
Para desenvolver as atividades do ramo fotográfico, o casal reservou “a sala da frente”
da casa (Foto 5), que ficava na Av. Rio Grande do Sul, próxima ao Hotel Avenida. A família
dividia o espaço residencial com o espaço profissional, confundindo-se, muitas vezes, o
espaço público com o espaço privado. Dependências externas à casa serviam, em certas
ocasiões, como cenário, época em que havia necessidade da luz natural, considerada recurso
fotográfico importante. Nas fotos de casamento, por exemplo, vasos de porcelana com flores
de plástico serviram para adornar os enquadramentos de espaços. As barras dos vestidos de
casamento eram lavadas pela fotógrafa e secadas a ferro, quando “chegavam sujos de lama”.
Na parte dos fundos da casa, ficava “o quartinho escuro”, espaço reservado para fazer
as revelações. Um furo foi feito em uma das paredes deste quarto, permitindo a passagem de
luz natural, aproveitada para fazer revelações em dias de sol.
85
Foto 7 – Residência Kaefer e Estúdio Antigo II.
Autoria: Foto Kaefer. Acervo particular de Írica Kaefer. 1954.
Através da imagem da Foto 5 e Foto 6 tem-se uma visão ampla da residência dos
Kaefer e dos seus arredores. Ao lado da porta da frente da casa e que dava entrava para o
estúdio, na varanda, de telhado caído e semi-abrupta, alguém está parado, próximo de
folhagens colocadas na sacadinha da mesma. Uma cerca vazada, feita com ripas de madeira,
faz um contorno uniforme ao redor da casa, isolando-a do espaço da rua e do chão de terra. A
cerca é um ponto de referência, um marco de delimitação entre o que pertence ao espaço
público e o que pode ser usufruído livremente como espaço privado. A extensão da casa, a
quantidade de janelas, mais a parte destinada ao estúdio indicam que se trata de casa grande,
bem construída, o suficiente para a realização dos negócios e a vida do casal com quatro
filhos pequenos. A chaminé do telhado na parte dos fundos indica o uso do fogão à lenha e a
localização da cozinha. Alguns arbustos crescem ao redor da casa e, ao fundo, uma bananeira.
Assim foi registrada a foto e residência Kaefer, dando uma mostra do espaço fotográfico que
foi enquadrado nas fotos no período de 1954 até 1961.
Iniciar um novo negócio, na memória dessa profissional, “foi difícil [...] muito difícil,
era muito pequeno Rondon”. Essa passagem indica que não havia muita demanda para a
fotografia, assim como, quanto aos recursos técnicos e produtos da área fotográfica. Estes
eram comprados em centros maiores, como Curitiba, Guarapuava, Ponta Grossa e, mais tarde,
Cascavel. Írica lembra: “No início, os compadres, do Posto Von Borstel levavam pedido, e o
dono do Hotel em Curitiba levava adiante o pedido, para a empresa. Às vezes parte do
material já vinha junto com o motorista, mas, na maioria das vezes, a gente esperava o
86
material chegar pelo correio”. Nessa rápida fala da entrevistada, que ainda recorda que
também faziam compras na Rua XV de Novembro, Praça Tiradentes, na Casa Schneider, em
Curitiba, nota-se a movimentação em torno da aquisição de materiais. Os motoristas da
Maripá também levavam pedidos dos Kaefer para essas localidades. O proprietário do Hotel
comprometeu-se com os motoristas, além da hospedagem. Assim, quando o motorista, que se
havia deslocado com a finalidade de comprar combustível para o posto Esso (foto 5-C), não
conseguia entregar o pedido dos Kaefer na empresa fotográfica, não havia problemas, pois
alguém do Hotel se encarregava de fazê-lo e a encomenda chegada até o interior, via correio.
Pedidos de material fotográfico também eram feitos diretamente nos correios.
As observações em torno das encomendas fazem parte do conjunto de outros
desdobramentos nos quais a fotógrafa se envolveu. Percebendo nas fotografias que muitas
casas não eram pintadas, perguntou-se sobre a casa de Írica, se esta era pintada, ou não.
Quanto a isso ela lamentou: “Sim, uma tinta meio marrom e misturada com óleo, uma cor
escura e feia”. Percebe-se que a cor da casa não agradou à fotógrafa. Considerando as
inúmeras fotografias feitas em espaço externo e o fato de que “gostava muito de flores”
152
,
Írica se empenhou em arborizar os arredores da residência plantando ciprestes, pés de
folhagens e flores.
Foto 8 – Residência Kaefer e Estúdio Antigo III
Autoria: Foto Kaefer. Acervo particular de Írica Kaefer. 1954.
A Foto 7 é um registro fotográfico feito em ambiente externo ao estúdio, nos fundos
da residência dos Kaefer e em meio às roseiras plantadas por Írica e o pé de bananeira que, em
152
KAEFER, 03 maio 2009, op. cit.
87
relação às folhas da Foto 7, já se renovou. As jovens fazem gestos insinuando segurar as
flores. As moças posicionadas nas laterais aparentam serem irmãs pela semelhança do rosto e
dos vestidos que usam. O enquadramento das jovens junto às folhagens indica o diálogo entre
a fotógrafa e as fotografadas e destas para com o ambiente natural que as envolve. A situação
mostra que ocorrem escolhas e seleções de objetos e de espaços na determinação dos
enquadramentos.
Ao observar e analisar fotografias da coleção percebeu-se que alguns espaços externos
se repetiam nas imagens, como os que se faziam acompanhar de ciprestes, de arbustos e de
figurantes ao lado de uma casa e bananeiras. Certificou-se com Írica sobre as repetições dos
ambientes, ao que ela confirmou tratar-se dos arredores da casa, pois “dependia muito de
como estava o sol. Aí a gente escolhia onde ficava mais claro e tal, mas sempre
acompanhando o sol”. Nesse sentido, o estúdio fotográfico se estendia para a parte externa e
se deslocava por toda parte ao redor da residência, ora na frente, ora nas laterais, outras nos
fundos da casa, o que mostram imagens incluídas no capítulo IV deste trabalho.
A fotógrafa tem uma relação singular com as flores e explica: “eu gosto, sempre gostei
muito de flores. Então eu plantei e assim podia também fazer uns buquês, porque muitas
noivas tinham o seu buquê, mas outras não tinham. Assim, Írica não deixava as noivas sem
flores pois preparou “vários buquês com flores naturais... Plantei flores para poder colocar e
enfeitar o estúdio e fazer os buquês”. A ambientação fotográfica em espaço externo à casa, os
diferentes tipos de objetos, as poses, a forma de comercialização dos produtos, são
representações da cultura fotográfica do período do início da colonização na região.
Quando o casal Kaefer chegou à Vila General Rondon, outra pessoa começou a atuar
nesse ramo, em General Rondon. Vindo também de Piratuba-SC, Alfredo Krauser, fotógrafo
profissional e colega de infância do casal, “tirava muito e pegava esses bichos”, os animais
caçados. Alfredo também empalhava animais, deixando-os no seu estúdio para proporcionar
poses com crianças, que, em primeiro lugar, provavelmente, queriam ver os bichos e, depois,
posar para serem fotografadas ou, quem sabe, as duas coisas. Somadas à vontade dos
fotógrafos, temos imagens, em diferentes acervos locais, a exemplo da coleção da Prefeitura
Municipal da cidade, que marcam um estilo artístico que optou por introduzir no espaço da
figuração diferentes espécies de animais
153
.
Informações dão conta de que as obras de Alfredo Krauser são fotos de animais
caçados, de onças, de pacas e de outros animais fotografados por interesse do fotógrafo,
153
Ver PAWELKE, op. cit., p. 47; SAATKAMP, op. cit., p. 72-73;
88
porque nessa época algumas pessoas não conheciam esses animais. Por detrás desses registros
havia, certamente, interesses de caçadores, orgulhosos de proezas e da valentia no
enfrentamento com os animais ferozes. Faziam-se fotos com animais caçados, como também
com toras de madeira e com produtos agrícolas, para mostrá-los a parentes e a amigos da terra
natal ou a novos vizinhos. Passados alguns anos, Alfredo Krauser foi para Pato Bragado,
então interior do distrito de General Rondon, ocupando seu tempo também com atividades
agrícolas.
Acentuando que a vila começou a ser construída “lá embaixo bem no Hotel Avenida”,
a entrevistada explicou que morava na casa de madeira, Foto 6 e 7, por sete anos, quando, em
novembro de 1961, a família mudou-se para uma casa de alvenaria, de dois pisos.
Foto 9 – A nova residência Kaefer I
Autoria: Foto Kaefer. Acervo particular de Írica Kaefer. 1960.
Localizada junto aos álbuns de família, a fotografia 9 registrou o novo
empreendimento dos Kaefer, em fase de construção. No térreo, da esquerda para a direita da
foto, a primeira abertura foi feita para ser usada como uma vitrine e, ao lado, era a entrada
para a bicicletaria e para o estúdio fotográfico, mas “funcionava tudo separado, só a entrada
era a mesma”
154
. A terceira abertura, a do centro, serviu para vitrine de fotos. Na parte das
demais aberturas, as da parte térrea do lado direito da foto foi reservado espaço para ser
alugado. Este espaço foi alugado para um compadre, casal Romeu Guido e Helga Port, que
estabeleceu uma alfaiataria no local. As gravatas eram compradas na alfaiataria do casal Port,
que eram conterrâneos e amigo dos Kaefer, e a alfaiataria funcionava ao lado da foto. Írica
154
KAEFER, 03 maio 2009, op. cit.
89
aproveitava para comprar gravatas ou camisas, que ficavam ali estocadas para diversificar os
acessórios que colocava nos seus figurantes.
Nos fundos da construção, duas escadarias levam para o primeiro andar, reservado
para dois apartamentos da família sendo que, no do lado direito, instalou-se a família de Írica.
Ainda, nos fundos, na parte do lado direito da construção, foi construído uma espaço para
depósito e oficina de bicicletas.
Foto 10 – Depósito Bicicletaria Kaefer
Autoria: Foto Kaefer. Acervo Particular de Írica Kaefer. MCRondon. 1965(±)
A parte da construção onde foi feito o depósito para as bicicletas é de um andar só,
mas é bem alta, o que permitiu a construção de um sótão a que se tem acesso por uma escada
interna, de madeira. As paredes estão com prateleiras e divisórias que guardam peças da
bicicletaria. No alto, próximo ao forro, aros e outros objetos estão pendurados. Em frente às
prateleiras, um balcão para atendimento expõe outros objetos. Em frente ao balcão, foram
posicionadas bicicletas e até um fogão à lenha foi enquadrado, ocupando o cantinho inferior
direito da foto. E na parede, ao fundo da foto? Apetrechos de dona Írica? É o espaço para a
guarda de vasos de flores vazios e de regadores, indicando o cuidado da proprietária para com
plantas.
Atualmente, o que guarda dona Írica nesse espaço? Quais os segredos escondidos no
sótão? Características sobre o depósito serão vistas no capítulo 3.
O novo estúdio fotográfico foi instalado no andar térreo da nova construção.
90
Foto 11 – Estúdio Fotográfico Kaefer em fins de 1961
Autoria: Foto Kaefer. Acervo Particular de Írica Kaefer.
A fotografia 11, do estúdio novo, aqui sem figurantes, foi localizada em uma das
“caixas do depósito”, praticamente no final do levantamento que se realizou sobre o conteúdo
das caixas, causando surpresa e satisfação à pesquisadora. Os detalhes do estúdio estavam
sendo percebidos nas fotos, constantemente, durante o trabalho, chamando a atenção o piso
ladrilhado de cerâmica, o detalhe artístico na parte superior da parede do fundo, a escadaria
enquadrada, o pequeno corrimão, as colunas laterais, os quadros na parede do fundo, entre
outros detalhes físicos, objetos e adereços incluídos no espaço fotográfico. O estúdio novo,
pois teve sua inauguração integrada ao ano de festividades da vila General Rondon, que se
emancipou de Toledo, em 1961.
Levando em consideração que o levantamento da organização das fotografias recaía
também sobre as diferentes temáticas e poses, quando classificávamos as imagens feitas nesse
estúdio, esse espaço ficava em grande parte ocupado e encoberto, ora pelas crianças
acompanhadas de familiares, ora pela pose de noivos e de outros retratados, outras vezes, por
algum objeto enquadrado, impedindo, até então, uma visão mais ampla desse espaço. Entre as
linhas e os traços do estúdio, hoje quase frios e estáticos nessa figura, foram articuladas luzes,
poses e enquadramentos criados através da arte dos fotógrafos e da vida dos figurantes.
91
Aumentada a demanda pela fotografia, o casal investiu em recursos humanos.
Trabalhava com o casal Írica e Oscar Kaefer um senhor conhecido por “Charuto”, cujo nome
não é lembrado pela fotógrafa. Não permaneceu muito tempo na vila. Na opinião de Írica,
porque não sabia falar muito bem a língua alemã, retornou para Chapecó-SC. Cabe observar a
incidência de migrantes de descendentes germânicos, que acabaram se destacando e
predominando nas relações socioculturais, causando, na percepção de alguns,
constrangimentos e discriminações a demais habitantes em minoria.
Ainda quanto à produção fotográfica, a demanda por fotografias levou os proprietários
do estúdio a procurar outra pessoa para ajudar nos trabalhos. Depois de fazer alguns contatos,
chegou, em 1965, de Três Passos/RS, o migrante, de origem alemã, Levino Boeck, com a
esposa Selga e dois filhos. Inicialmente, Levino veio como auxiliar da casa fotográfica da
família Kaefer. Segundo Írica, para ele foi muito difícil, pois também veio com as crianças
pequenas, mas “ele começou a enfrentar”. Ao chegar, tudo era novidade. As árvores, “dentro
da cidade”, a estrada de chão sem asfalto, muita poeira e “tudo era estranho”
155
. Na fala de
Levino, sobressai seu espanto com a quantidade de mato ainda encontrado, porém o destaque
para as árvores plantadas na cidade é uma decorrência do refloresramento do espaço ocorrido
depois do desmatamento geral que o local designado para a sede da vila havia sofrido. Nas
ruas, planejadas e traçadas, foram plantadas árvores, tanto nos canteiros centrais das avenidas
quanto nas laterais das ruas, aspecto que chamou a atenção do novo fotógrafo e continua a
chamar a atenção da população e de visitantes, até a atualidade.
A vinda de Levino Boeck estava sendo aguardada com muita ansiedade pelo seu
irmão, que já morava em Rondon e que afirmava que “ali teria futuro”, justifica Levino. Na
oportunidade, porém, além de perceber diferenças na natureza, sentiu que as estradas eram
precárias e não davam passagem para carros maiores. O jovem fotógrafo também lembrou das
palavras de seu pai, que teria dito: “Olha, Livino, tu vai para lá para fazer um futuro. Tu vai
vê como é Rondon. É novo, não tem asfalto, não tem nada, más não importa”
156
. Vinculando
a expectativa do irmão e a exortação do pai, Levino resolveu mudar de vida e morar em outra
cidade. Nas entrelinhas, o pai alertava o filho sobre oportunidades de trabalho, de enriquecer e
garantir o seu futuro, deixando transparecer, no discurso, os valores do trabalho.
Além do mais, ele estava sendo aguardado também pelo casal Kaefer, que perguntava
seguidamente para Valdino: “Teu irmão não veio ainda? Porque eu não sei se vou esperar por
155
BOECK, Levino. Entrevista concedida a Lucia Teresinha Macena Gregory. Marechal Cândido Rondon, 11
jun. 2002.
156
Idem, ibidem.
92
ele”. Essa parte do relato demonstra que, no entender do entrevistado, era significativa a
procura pela fotografia e que a produção estava aumentando. Na época, devido à presença
significativa de falantes do alemão, era preciso falar e entender essa língua para se
encaminhar um bom entendimento no relacionamento e, consequentemente, nos negócios, no
que Levino, que enfim chegou, logrou vantagens.
Dona Írica lembra que trabalhavam muito fotografando casamentos e fazendo fotos
para documentos, principalmente para títulos eleitorais. Assim como vinham pessoas de
localidades próximas para o estúdio, os fotógrafos também se deslocavam para localidades do
interior. Com a ajuda de Levino, a sobrecarga do trabalho foi um pouco aliviada, porque,
enquanto uma pessoa tirava as fotos, a outra já fazia as revelações, até durante a noite,
enquanto o motor ainda gerava energia elétrica, permitindo o recorte das fotos, que eram
entregues já no dia seguinte. O trabalho em torno da fotografia era intenso, pois havia um
número reduzido de fotógrafos e o trabalho manual tornava morosas as tarefas, que
precisavam ser aceleradas durante o dia e intensificadas à noite.
Com o casal trabalhava sempre um fotógrafo, pois havia muito trabalho no estúdio,
além das procuras de pessoas que passavam pela região: Írica
157
enfatiza que “Vinham
caravanas, caravanas de fora, era fora de sério... eles vinham com caminhão, um toldo em
cima e com banco, sabe? Só umas tábuas postas e sentavam lá dentro e vinham em dez,
vinte”. Procuravam fotos, pois queriam levar fotos de Rondon para o sul. Tratava-se de
compradores de terra.
A ênfase dada à possibilidade de progredir na nova colônia, agora já emancipada, o
“plantar e cuidar”, é uma demonstração do discurso do trabalho, que, na família do seu
Levino, estava muito presente, como ressalta no seu depoimento. Levino Boeck considera-se
filho de família pobre. Veio do sul, em 1965, “sem nenhum capital”
158
. A situação foi
amenizada porque encontraram uma família conhecida que lhes ofereceu uma moradia
provisória: “Era metade paiol. Daí tiraram as coisas fora e metade era estrebaria de vaca, e lá
nós morava 27 dias”, enquanto aguardavam o término da construção de uma casinha para
alugar, pois havia poucas casas disponíveis. Outro problema a enfrentar foi a negociação do
aluguel da casa, feita com muitas dificuldades. Ela só foi superada quando o novo morador
informou que trabalharia na Foto Kaefer. A referência à Foto Kaefer resolveu o problema do
migrante e mostra que a Foto Kaefer já era uma empresa consolidada e reconhecida na cidade.
157
KAEFFER, Írica. Entrevista concedida a Lucia Teresinha Macena Gregory. Marechal Cândido Rondon, 5
jun. 2002.
158
BOECK , op. cit..
93
A menção provavelmente vinha acompanhada da posição social e econômica do casal de
fotógrafos, projetada também pela pecuária, apicultura e pelo comércio de bicicletas (Foto
- placa indica o comércio de bicicletas e, ao lado, a Foto Kaefer).
Levino afirma ter feito tudo com muito capricho na Foto Kaefer, lembrando que “nós
éramos os fotógrafos mais procurados. Era a Foto Kaefer”. Pode-se deduzir, desse fragmento
de relato, que a procura por serviços fotográficos aumentou na década de 1960. O fotógrafo
procurou passar os segredos do ofício para os filhos, que, desde pequenos, o acompanhavam,
tanto nos trabalhos de laboratório como nas saídas para o interior, mostrando, inicialmente,
detalhes sobre a revelação em preto e branco, quando “sempre tem que controlar a borda
branca, na margem do papel para ver” a intensidade da fixação da cor e, mais tarde, em
meados da década de 1970, passou às técnicas do ofício de revelação de filme colorido.
As fotos aéreas eram feitas de cima de algumas casas ou de cima de torres de igrejas –
como foi o caso das fotos da praça. Quando a praça foi traçada, fez-se “aquela emenda de
pegar aquela praça toda [...] parei, outra aqui, outra aqui, aí cortei depois”, ajustando todas,
uma ao lado da outra, formando uma fotografia única da imagem completa da praça. As
pessoas pediam fotos da praça Willy Barth. Levino lembra, com detalhes, que fazia as fotos
preto e branco das igrejas que estavam “ali, dentro das árvores, aquelas igrejas que já
pareciam velhas, feitas de madeira”. Ao comentar sobre as fotos em preto e branco, Levino
lembrou-se de como reaproveitava as chapas de vidro, dizendo que pintava as bordas das
chapas, colocava uma foto no centro, fixava-a com um papelão ou cartolina, criando “um
porta-retrato”, que era vendido nos fins de semana, em festas ou quando saía para os
povoados. Denota-se aí uma forma de reciclar produtos e de aumentar a renda, num período
em que o profissional estava se firmando financeiramente.
Levino, gostando muito de fotografar, a cada foto que fazia, pensava: “Eu quero ver o
erro que eu fiz e corrijo, e coisa assim”. Passou a fazer sociedade com a Foto Kaefer,
ganhando 45% dos lucros. Enquanto Levino auxiliava Írica nos trabalhos da casa fotográfica,
Oscar Kaefer acompanhava os serviços na fazenda de gado. Ocorre, porém, que o gado foi
atingido por inseticidas aplicados no combate a pragas em plantações, em terras de vizinhos,
sendo que, em razão disso, parte do gado teria morrido. Oscar diminuiu a área do gado e
investiu na agricultura. Também comprou terras no Mato Grosso, pois “lá eram muito mais
baratas [...] e, em Cochim, foi comprado umas 500 colônias”
159
. Percebe-se que, para Oscar, o
trabalho como fotógrafo estava ficando em segundo plano, pois, embora tenham investido no
159
KAEFFER, 21 nov. 2006, op. cit.
94
ramo fotográfico após a frustração com a plantação de café, Oscar passou a aumentar os
investimentos na pecuária.
O pessoal que trabalhava no estúdio fotográfico precisava trabalhar à noite, pois,
quando o dia clareava, a energia era desligada em determinados horários. Dessa forma, as
revelações eram feitas durante a noite, “até clarear o dia”, para atender a pedidos de
fotografias de casamentos e 3x4 cm para documentação. Os pedidos eram tantos que “ficava
bobo [...] identidade, naquele tempo, era título de eleitor e era 3x4 cm. Olha, eu fiz num dia,
eu contei, 110 cabeças num dia”. O fotógrafo considera-se vitorioso. Fotografava e revelava
no quarto escuro e as fotos davam certo: “a Frau Kaefer tirava as fotos. Nós tinha uma
máquina, ela só tirava porque tinha uma [...] no lado você puxava, cortava o filme dentro da
máquina”, explica Levino. Não era preciso tirar o filme, ou seja, esperar completar as poses
para tirar o filme da máquina. A situação relatada indica, novamente, a demanda crescente
pela fotografia, no caso, por fotos para títulos de eleitor.
3.3 CÂMARAS, LUZES, COMERCIALIZAÇÃO
Os equipamentos utilizados para a produção fotográfica em General Rondon eram
considerados de boa qualidade. Alguns eram fabricados na Alemanha. As câmaras
fotográficas utilizadas no início dos trabalhos com fotografia na vila General Rondon foram a
“Lambe-Lambe”, a Linhof, a Exakta, a Rolleiflex, a Rolleicord, a Capsa, a Nikon e a Fujica
3S FS.
Írica, “até hoje, tem guardadas” câmaras fotográficas, uma pasta preta, um tripé,
chapas de alumínio, um pano vermelho, fotômetro e lentes, clips, um pote, carretel, balança,
colher, pesos, cabos, estojos, etc.
A máquina conhecida como “Lambe-Lambe” foi doada para o Museu Pe. José
Gaertner, do distrito de Porto Mendes. A câmara Exakta era destinada para uso no estúdio.
Muitas vezes, as pessoas vinham com pressa para fazer fotos ou até “xerocar” alguns
documentos e a casa fotográfica estava preparada. As câmaras Nikon e Capsa acompanharam
os trabalhos externos. Nessas máquinas eram usados filmes 120 mm e 127 mm. O tamanho
das fotos era determinado através do uso de peças chamadas chassis. Essas peças
acompanhavam materiais fotográficos, sendo colocadas no ampliador para estabelecer os
tamanhos das fotos. Assim, as peças possuíam diferentes tamanhos, indicando a possibilidade
da produção de diferentes tamanhos de fotografias.
95
Foto 12 – Írica Kaefer e seus equipamentos fotográficos
Fotógrafo Ilário Boeck, em 28 jun. 2002. Acervo particular da autora.
Veem-se, na Foto 12, a fotógrafa Írica e os equipamentos fotográficos utilizados nas
décadas de 1950/60 pela Foto Kaefer e que fazem parte dos primeiros instrumentos de
trabalho utilizados para registrar os espaços e as pessoas que participaram da colonização da
vila General Rondon. Boa parte dos primeiros instrumentos utilizados, a exemplo do material
que pode ser visto na fotografia, ainda é guardado com muito interesse pela fotógrafa, no
chamado depósito, cuja entrada se faz pela porta que pode ser vista à esquerda da foto. Os
negativos de vidro, as chapas, tendo atendido à sua finalidade, eram jogados fora, no entanto
um detalhe curioso sobre essas chapas foi o seu reaproveitamento por alguns moradores, que,
ao reformarem ou construírem suas moradias, procuravam a Foto Kaefer para comprarem
alguns daqueles vidros, “pelo menos para a janela da frente” da casa, comenta Írica. A atitude
não deixa de ser uma forma de reaproveitar materiais.
As primeiras máquinas, a “Lambe-Lambe” e a Linhof, foram compradas de outros
fotógrafos. Usavam-se negativos de vidro, também conhecido como chapa de vidro. A
“Lambe-Lambe” proporcionava fotos no tamanho 9x12 cm.
96
Foto 13 – Câmara Linhof Foto 14 – Câmara Exakta
Fotógrafo Ilário Boeck, em 28 jun. 2002. Acervo particular da autora.
A câmara fotográfica Linhof, à esquerda (Foto 12), uma máquina com fole, tipo
sanfona, também era usada com negativo de vidro colocado na máquina, individualmente. Na
própria máquina havia uma espécie de estojo que acompanhava o negativo de vidro, usado na
hora de tirá-lo da máquina para proteger a imagem. O enquadramento de conteúdo estava
vinculado ao regulador do fole e proporcionava maior ou menor abertura para o campo
fotográfico. Essas informações foram obtidas através do manuseio das máquinas e das
instruções de Írica. Foi um pesquisar fazendo, experimentando, rememorando e presenciando.
Os aparelhos de flash eram comprados em separado. Além de serem usados junto com
a câmara, alguns aparelhos de flash eram segurados por um colaborador, em separado ou em
tripés. Para a Foto Kaefer foi feito um tripé por um ferreiro que teve que fabricar a peça
seguindo instruções de Írica, com alumínio, para aumentar a luminosidade, porque a luz de
ambientes internos costumava ser insuficiente. Os aparelhos de flash eram substituídos
seguidamente por causa da sua pouca durabilidade, embora pudessem ser recarregados através
de baterias. Há casos em que eram usados faróis de carros para aumentar a luz para fazer fotos
à noite. Esses detalhes mostram como os fotógrafos procuravam soluções, criavam,
inventavam, ajustavam e adaptavam-se às condições materiais de que dispunham.
A câmara fotográfica Exakta (Foto 13), fabricada em Jhagee, Dresden, na Alemanha,
foi utilizada pela Foto Kaefer na década de 1950/60. Na Exakta era colocado chassis para
fazer fotos 3x4 cm com filme 135 mm. Também podiam ser feitas fotos de outros tamanhos
nessa máquina, no entanto, devido à grande procura de fotos 3x4 cm, essa máquina ficava
reservada especificamente para esse fim. Um detalhe interessante dessa máquina é uma peça,
um pequeno cabinho, com um minúsculo estilete na ponta, em forma de tesoura. Essa peça
podia ser acionada para cortar pedaços do filme (fotos) à medida que ia sendo usado. Tal
recurso proporcionava economia e praticidade ao fotógrafo, uma vez que a procura por fotos
97
3x4 cm era intensa e as pessoas tinham urgência, a exemplo das fotografias para título de
eleitor.
Foto 15 – Bordas Serrilhadas Foto 16 – Bordas Eleitorais
Fotógrafo Ilário Boeck, em 28 jun. 2002. Acervo particular da autora.
Os tamanhos das fotos de filme 120 mm e 127 mm eram principalmente 6x6 cm e 6x9
cm. Os filmes proporcionavam 8 poses, mais tarde 12 poses e depois 24 poses. As guilhotinas
das Fotos 14 e 15 fazem parte dos instrumentos fotográficos ainda guardados no depósito da
fotógrafa Írica, que as denomina de “cortadeiras”. Eram utilizadas para recortar as fotografias.
Através do fio da navalha serrilhada (Foto 14) era feito o recorte que dava o detalhe da borda
nas fotografias. A guilhotina da Foto 15 proporcionava um corte reto e era usada
especificamente para as fotos 3x4 cm, encaminhadas com a documentação para títulos de
eleitores e outros documentos.
Foto 17 – Câmara Rolleicord Foto 18 – Câmara Rolleiflex
Fotógrafo Ilário Boeck, em 28 jun. 2002. Acervo particular da autora.
98
A câmara Rolleicord (Foto 16) foi utilizada pela Foto Kaefer quando iniciou o
trabalho com fotografias na Vila General Rondon. Fabricada na Alemanha, era um pouco
mais simples que a máquina Rolleiflex, porém a qualidade dessa máquina é, ainda hoje,
enfatizada por Írica, que fez fotos com boa coloração e nitidez, qualidades comentadas, a cada
foto que analisava ou a que fazia referência durante entrevistas.
A câmara Rolleiflex (Foto 17) foi utilizada pelos Kaefer quando já haviam feito alguns
trabalhos fotográficos em General Rondon. Foi adquirida depois da Rolleicord, sendo
considerada uma ótima máquina, mas de preço muito elevado. As primeiras câmaras eram
acionadas, para dar o clic, através de um cabo pequeno, de metal, chamado disparador. O
flash era ajustado às câmaras, na parte externa destas, pois, nas primeiras máquinas, o flash
não era compactado à câmara como nas atuais.
Foto 19 – Balança e Pesos para Laboratório Fotográfico
Fotógrafo Ilário, em 28 jun. 2002. Acervo particular da autora.
Na época, o material fotográfico, tal como filmes, produtos químicos, papel e outros
era adquirido, normalmente, em Curitiba. Às vezes, as compras eram feitas em Cascavel,
cidade mais próxima, sempre com dificuldades, pois, seguidamente, a estrada não permitia o
tráfego devido à sua precariedade agravada em dias de chuva, que deixava o percurso
intransitável. Foram, porém, auxiliados pela MARIPÁ, que “ajudou nós conseguir ônibus pra
ir a Curitiba. Era dois, três dias”. Nessas idas aproveitavam para fazer compras de material em
quantidades maiores a fim de fazer estoque. O material químico necessário era comprado
99
nessas ocasiões. Eram feitas também encomendas. O uso dos produtos químicos, do revelador
e do fixador era muito complicado no início dos trabalhos com fotografia. As dosagens de
reguladores e de fixadores teriam que ser exatas e pesadas cuidadosamente, com uma
balancinha apropriada, o que mostra a Foto 18.
Foto 20 - A Pasta Preta
Fotógrafo Ilário Boeck, em 19 jul. 2002. Acervo particular da autora.
A Foto 20 representa um conjunto de materiais fotográficos utilizados na década de
1950-60 pela Foto Kaefer. Vê-se, além da balança, uma pasta profissional. A pasta preta,
como era conhecida, servia para carregar máquinas, filmes e lentes de reserva, cabos e
extensões de luz. Tudo era cuidadosamente enrolado no pano vermelho para o transporte, que
poderia ser feito a pé, de bicicleta, de motocicleta ou de carro, no dizer saudosista de Írica, “o
nosso 29”, ou seja, o carro Ford 1929.
O filme, colocado num carretel, era mergulhado num pote preto contendo o regulador.
O pote preto era considerado prático, pois “podia caminhar pela casa e fazer outros serviços e
sacudindo o pote”, pois não ocorria interferência da luz. Já para passar o filme na água era
preciso ficar no quarto escuro, trabalhar com uma pequena luz vermelha e, com uma pinça,
colocá-lo no fixador. O outro processo era pendurá-lo para secar preso a um clips. Esse o
processo era trabalhoso e exigia atenção na dosagem dos químicos e na determinação do
tempo que o filme e a foto deveriam permanecer nos líquidos.
Um retorno ao passado, na companhia de Írica e dos instrumentos e materiais reunidos
especialmente para uma ocasião ímpar de pesquisa, possibilitou a (re)vivência do espaço
fotográfico. Possibilitou, também, associá-lo ao espaço geográfico do início da colonização.
Ocorreu uma espécie de confusão sadia entre fonte, depoente e investigadora. Houve uma
espécie de reconstituição de espaço de época. Írica, no entanto, ressalta as diferenças daquilo
100
que vê hoje. Segundo ela, as estradas eram muito ruins, cheias de poeira e havia poucas casas.
Quando a poeira, enfrentada nos primeiros anos de trabalho como fotógrafa em General
Rondon, era rememorada, a fotógrafa lembrava da necessidade de limpezas constantes e do
uso de um produto que era fundamental na atividade da revelação fotográfica – a água.
As fotos recém-reveladas e passadas nas emulsões químicas próprias para a revelação
de imagens eram, em momento posterior, mergulhadas numa vasilha com água. Essa água
precisava ser bem limpa. Como não havia ainda água encanada, que foi instalada somente em
1966/67, poços de 20 até 30 metros de profundidade eram feitos. A água era puxada em
baldes pendurados em cordas, com o auxílio de manivelas, fixadas em cima dos poços, usadas
para enrolar e desenrolar tais cordas. Mais tarde, esses equipamentos foram sendo
substituídos, em algumas residências, por bombas movidas a motor elétrico. Então, como
chegava água até o laboratório fotográfico? Muitas dificuldades enfrentadas para prover água
boa e suficiente estão presentes na rememoração de detalhes do dia a dia do ofício de
fotógrafo de Írica. Ela se lembrou das vezes em que, ao tirar a água do poço, o balde
balançava ao ser manivelado para fora, batendo nas laterais, derrubando terra e sujando a
água. Diz ela: “encostava o balde, quando tirava com manivela, encostava do lado, entrava
terra, um pouco no balde e já não dava para fazer as fotos [...] nosso problema era água
limpa”. As fotos eram passadas “duas, três, até quatro vezes na água limpa” para eliminar os
químicos e trabalhar bem a fixação das imagens
160
. Írica lembra também, em entrevista, que
panos brancos eram usados como coadores, para limpar bem a água a ser utilizada no
laboratório fotográfico
161
.
Lembrando também das muitas fotos que ainda possui, a fotógrafa fala que, quando
começou a tirar fotos em General Rondon, estas eram “tudo fotos preto e branco, não existia
colorido, nada disso”. Além de fotografar, Írica também acompanhou os trabalhos de
revelação. Ajudou “muito no quarto escuro”, onde tudo era feito manualmente. As
complicações envolviam, também, a falta de energia elétrica em certas horas do dia e da noite:
“nós sofremos demais nessa parte de luz, né?”
162
. Na época, a luz era fornecida pela
MARIPÁ. A situação melhorou com o passar dos anos, pois a cidade estava crescendo e
melhores geradores de energia a motor foram instalados. A casa fotográfica, localizada ao
lado do prédio do cinema, foi beneficiada, pois pôde estender uma rede de luz até o estúdio
novo.
160
KAEFFER, 5 jun. 2002, op. cit.
161
KAEFFER, Írica. Depoimento concedido ao documentário Especial Pioneiros. Marechal Cândido Rondon:
TELEVIGO Canal 10, 25 jul. 2005. DVD.
162
KAEFER, 5 jun. 2002, op. cit.
101
As fotos não retiradas eram outro problema enfrentado pela Foto Kaefer. Inúmeras
fotos não retiradas foram jogadas no lixo, porque não sabiam o que fazer com elas. Outras
fotos estavam guardadas. A quantidade de fotos dentro das caixas apontou para várias
interrogações: – Que imagens contêm esses registros fotográficos, feitos desde meio século
atrás? – Por que permanecem ali, guardadas em envelopes, dentro de pequenas caixas,
decorrido esse tempo? Entende-se que estas questões estão relacionadas com a história e com
a memória da sociedade local.
Ao se observar a trajetória das fotografias produzidas pela Foto Kaefer, remetendo a
Pomian
163
, percebe-se que, num primeiro momento, podem ser consideradas como objetos
úteis, pois, servindo para o consumo, eram vendidas para diferentes receptores, satisfazendo
diferentes necessidades. Algumas, no entanto, posteriormente passam pelo descarte e são
jogadas no lixo, pois, sem valor, podem ser consideradas “desperdícios”. O que dizer, no
entanto, das fotografias que dona Írica mantém guardadas no seu depósito?
A não retirada das fotografias na Foto Kaefer deve-se a várias situações. Informa-se
que um dos motivos está relacionado à localização dos moradores da colônia, que ficava
distante da vila, e ao fato de as pessoas interessadas frequentarem a vila em raras ocasiões.
Fregueses alegavam que não tinham condições econômicas de pagarem as fotos no momento
em que as faziam, solicitando que aguardassem “até que vendessem os porcos”. Outra razão
da não retirada de fotografias foi a longa espera no aguardo das devoluções, uma vez que, no
início, quando esse trabalho era feito em Curitiba, demorava “em torno de um mês”, até que
as fotografias estivessem disponíveis na casa fotográfica.
As revelações, portanto, eram feitas em preto e branco. As fotos coloridas entraram em
circulação na região em 1970/71. Essas revelações chegaram a ser feitas, inicialmente, na
Alemanha, por intermédio da Paranacolor, firma de Curitiba, com a qual a Foto Kaefer
negociava, “e depois, de lá, vinham as fotos, né? Mas depois, se queria pedido, tinha que
mandar de novo prá Curitiba”
164
. Assim, portanto, Alemanha, Curitiba, São Paulo,
Guarapuava e, mais tarde, também Cascavel foram locais que receberam filmes e revelaram
imagens sobre o Oeste paranaense.
163
POMIAN, op. cit., p. 71
164
KAEFFER, 5 jul. 2002, op. cit.
102
3.4 TRAMITAÇÕES COMERCIAIS DE UMA PRODUTORA FOTOGRÁFICA
Cópias, moldes, copiões, amostras são designações para os exemplares de fotografias
reveladas, guardadas, misturadas junto às fotos definitivas. Para uma boa orientação no
trabalho fotográfico, as lojas fotográficas recebiam manuais, folders e moldes dos
revendedores de material fotográfico.
Foto 21 - A modelo internacional Foto 22 - A modelo local
Acervo Particular de Írica Kaefer. Foto 20. Papel e pose propaganda da empresa alemã LEONAR. Foto 21.
Fotógrafa Írica Kaefer. General Rondon. Entre 1954-1961.
A imagem da Foto 21 é um exemplo de propaganda de papel fotográfico. Segundo
inscrições feitas no mesmo exemplo pode-se ler: “LEONAR Renarto weiβ Matt rauh Rt 114”,
o que indica que se trata de papel branco, fosco, áspero da empresa alemã Renarto LEONAR,
na Rota 114. Entende-se que, nesse conjunto de informações, tanto o texto, quanto o tipo de
papel, quanto a imagem que o papel suporta são referências e indicações para serem usadas
pelos fotógrafos. Írica explica como aceitavam o material: “Nós observávamos, sempre vinha
alguma coisa junto com os vendedores e quando a gente ia para fora também observava o que
tinha de novidade... Mas a gente se esforçava muito. Sempre tentava melhorar. Olha, quando
não ficava bem uma coisa, já tentava melhorar”
165
. A pose da moça da Foto 22 é uma
indicação de influências ou propagandas adotadas. Aquela rigidez estampada em várias
165
KAEFER, 03 maio 2009, op. cit.
103
fotografias mais antigas, aquele olhar e aquele corpo que tantas vezes se mostrou estático para
a câmara, aos poucos vai se ajustando e posicionando de outras formas, criando uma nova
linguagem entre o figurante e o fotógrafo.
A circunstância da percepção de problemas por parte dos fotógrafos e que poderiam
estar interferindo na qualidade da fotografia pode ser evidenciada nas fotos feitas pela família
de Rinaldo e Zulmira.
Foto 23 – O olho fechado Foto 24 – O olho aberto
Acervo particular e fotógrafa: Írica Kaefer. Foto da família de Rinaldo e Zulmira. Posicionado entre os pais, o
menino Hilário. Atrás dos pais, da esquerda para a direita, Irineu, Otávio, Mário e Alcida. General Rondon.
Entre 1954-1961.
Ao se examinarem fotos da coleção, Írica se deparou com a fotografia da família de
Rinaldo e Zilmira, foto 23 e 24, não lembrando do sobrenome da mesma família. “Olha aqui a
comadre Alcida, ela é madrinha da Irene” e, dando continuidade, nomeou os filhos do casal,
admirando-se e lembrando de um e de outro e de como as crianças brincavam juntas.
Continuando a olhar comentou ainda: “Por isso eu digo, uma coisinha tão pequena...
(referindo-se à amostra fotográfica) e ele já é bisavô”, referindo-se ao casal. Através dessa
fotografia ainda fez as observações sobre problemas percebidos no ato do clic fotográfico.
Exemplificou a circunstância com “o olho do nenê, às vezes na hora a gente vê que não deu,
esse caso me alembro..., olha a gente tinha experiência... e daí eu logo fiz mais uma, vie sach
ma noch? (como se diz ainda),amostras”.
104
Foto 25 -A amostra – Retrato de Família
Acervo particular e fotógrafa: Írica Kaefer. Foto de família. General Rondon. Entre 1954-1961.
A amostra de fotografias (conjunto fotos 25) é preservada junto ao material fotográfico
particular de Írica, em sua residência. Guarda-a “para ver como a gente fazia antigamente”.
Diante das alterações e mudanças ocorridas desde meados do século XX até nossos dias, no
campo da imagem, a amostra é, na verdade, um sinal interessante do trabalho cotidiano
relacionado com a arte fotográfica de um período de uso de técnicas manuais. Um trabalho
que exigia o conhecimento e domínio de máquinas analógicas, reguláveis, de químicos a
serem medidos e pesados, tempo de luz, tempo de água a serem controlados manualmente e
significativamente diferente dos equipamentos fotográficos digitais atuais. Após a fotografia
ser tirada, os copiões, ou amostras eram colados em pedaços de papel cartolina, para que
assim, posicionadas lado a lado, as pessoas pudessem observá-las e escolher aquela que se
tornaria a fotografia que levariam para casa. Pequenas variações nas poses e “duas a cinco
amostras” eram feitas e, eventualmente, dependendo do evento, este número poderia
aumentar. Detalhes explicados pela fotógrafa esclarecem o procedimento da encomenda: “A
gente tinha que controlar o papel porque não sabia quando o viajante passava de novo. E daí,
não podia faltar papel. A gente sempre tinha controle e tinha estoque... e foto para amostra,
era papel bem simples, não de cartão”
166
.
Neste sentido, a referência ao papel cartão, é o papel definitivo, o papel usado como
suporte da imagem e as fotografias do acervo são exemplos da variação de tipos de papel
existentes. O papel podia ser de material brilhante, esse é de uma gramatura mais fina, o papel
fosco, liso, um pouco mais grosso que o brilhante, e há ainda, um papel fosco, de superfície
com uma aparência áspera e que parece formar um leve quadriculado sobre a imagem, um
papel forte e resistente. Esses papéis, os definitivos, são denominados pela fotógrafa como
sendo os papéis cartão. Já para as amostras, era usado um papel de gramatura fina.
166
Idem, ibidem.
105
Sobre as amostras, a fotógrafa fala que, mesmo que a pessoa quisesse fazer uma foto e
já a encomendasse, os fotógrafos não aceitavam. Era preciso aguardar e fazer o pedido a partir
das amostras, pois não era feita uma encomenda sem antes a pessoa vê-las, fazer a sua escolha
e definir a quantidade desejada. “Primeiro era feito uma prova”, referindo-se às amostras.
Foto 26 - A amostra - Retrato de Casamento
Acervo particular Írica Kaefer. Fotógrafo: Foto Kaefer. Amostra de fotografia de retrato de casamento. General
Rondon. Década de 1960/70.
A amostra de fotografia 26 sinaliza a variação da pose e dos familiares que integram
as fotos de casamento. O casal de noivos, em molde maior que as demais amostras, os noivos,
testemunhas e familiares. As anotações na cartolina, feitas abaixo das amostras, são de um
momento posterior ao do registro da foto. É o momento de outra forma/fórmula de revelação.
É o momento de outro olhar. É o momento em que aquele que fez a pose e olhou para a
câmara agora se vê. É um novo momento. É o momento de festejar o registro realizado. É o
momento do documento. Como amostra, um pequeno monumento? Uma das amostras, ao que
indicam os números, passará a reproduzir-se para “10 pos” ou poses, sendo uma para o casal e
as outras para os demais nove figurantes. As fotografias, muito significativas, passarão a
tornar-se monumento, pelo momento especial registrado. Momento especial para os noivos e
para a coletividade.
Com relação à comercialização das fotografias de casamentos, também procediam da
mesma forma que as demais encomendas. Feitas as amostras, os noivos escolhiam as fotos a
serem reproduzidas, tanto as do casal como as de grupos. As encomendas das fotografias de
106
grupos, ou seja, com a presença dos convidados, essas, sim, eram definidas já no dia do
casamento. Neste caso, portanto, as pessoas encomendavam uma foto sem terem visto um
modelo antes. Era, porém, responsabilidade das famílias dos noivos controlar a lista dos
pedidos de cópias dessas fotos. A entrega das fotos era feita somente para os noivos mediante
o pagamento da encomenda ou parte dela. Não ocorria a entrega de fotos para outras pessoas
que integrassem a foto do grande grupo. “Os noivos recolhiam o dinheiro do grupo e, as
fotos?...”, refere Írica, numa interrogação cuja resposta aponta pessoalmente: “só para os
noivos, porque eles que entregavam as fotos para as pessoas”. A passagem sobre o processo
de comercialização mostra que se precaviam de encomendas que poderiam ser feitas e não
retiradas e os noivos tornavam-se corresponsáveis pelos pedidos. Írica reforça esta forma de
trabalho dizendo também que muitas vezes não conheciam os convidados ou ainda poderiam
ser de outras localidades e “então ficava mais fácil para a família dos noivos e eles eram
encarregados de entregar as fotos”
167
.
Assim, entregavam as fotos mediante o pagamento, que teria que ser “ou tudo ou
nada”, pois algumas pessoas “tinha gente que saía daqui, mudava para outro lugar, outras se
separavam”. Poderiam levar as fotos e não retornar para pagá-las. Certas vezes, decorrido um
tempo, as pessoas davam uma entrada e podiam retirar as fotos.
Outro aspecto enfatizado por Írica é sobre pedidos de fotografias expostas no balcão
ou vitrine. Sobre essa situação, explica que “nunca, nunca a gente vendia fotos de freguês
para outras pessoas”, alertando-as de que só poderiam obter uma cópia com a própria pessoa
da foto, “porque às vezes tinham fotos bonitas, tinha foto de jovens e moças bonitas e, pra
que, pra que queriam, o que iam fazer, né? a gente nunca sabia”. Fala ainda com espanto.
Aqui há a explicitação de uma certa ética profissional.
Írica e Oscar, quando possível, trabalhavam juntos, no momento de festividades e
quando eram chamados para fotografar no interior, sendo que cada um tinha a sua máquina e
considera ainda hoje que: “Era preciso para ajudar a arrumar as pessoas, ajeitar as roupas e a
pose. Comenta ainda sobre a posição das pernas das pessoas e que depois os próprios
integrantes das fotos ou amigos poderiam fazer comentários tais como: “mas como você está
parada assim de pernas abertas?”. E sobre a fisionomia, “o sorriso feio, a gente tinha que
ajeitar as pessoas até nisso”, acrescentou. Entendia que aquele que fotografa precisa perceber
esses detalhes, que são também ações de interferência no quadro fotográfico
168
.
167
KAEFFER, Írica. Entrevista concedida a Lucia Teresinha Macena Gregory. Marechal Cândido Rondon, 19
ago. 2009.
168
Idem, ibidem.
107
Assim, portanto, com relação às encomendas e às fotografias que permanecem no
acervo de Írica, muitas fotografias que não foram retiradas são fotos que, em alguns casos, as
pessoas podem ter visto, mas não têm consigo nenhum exemplar. Quando ficou uma dúzia,
meia dúzia no estúdio, significa que as pessoas não retiraram nenhum exemplar.
Foto 27 - O rosto
Acervo particular e fotógrafa: Írica Kaefer. Amostra de fotografia com variações do rosto de uma criança.
Marechal Cândido Rondon. Década de 1970.
O conjunto de fotografias coladas em um envelope são outra demonstração da prática
fotográfica tradicional, se assim já pode ser denominada. Cinco poses diferentes, cinco
expressões diferentes, cinco amostras diferentes. Antecedendo, porém o resultado desse
ensaio fotográfico, cinco ou mais comandos diferentes. Lá está a menina, atendendo
chamados, indicações, recomendações, virando o rosto ora para um lado, ora para outro, ora
para frente. Às vezes sorrindo e outras, menos alegre. A realização desse tipo de ensaio
fotográfico também era acompanhada de algumas práticas ou, como expressa Helga Port
169
,
mostrando um retrato na parede de sua casa, com fotografias feitas, nesse estilo, dos seus
filhos: “Não, não, olha a Ieda, ela tava alegre e só ria e quando era para chorar ela não
conseguia chorar e aí nós demos uns beliscões nela, tão querida...”. Helga é esposa de Romeu
Guido, o qual tinha alugado um espaço na nova construção dos Kaefer, para o funcionamento
da sua alfaiataria. Eram vizinhos, em Santa Catarina e, novamente, em General Rondon.
Auxiliou na identificação de algumas fotografias do acervo de Írica, confirmando dados e
169
PORT, Helga. Entrevista concedida a Lucia Teresinha Macena Gregory. Marechal Cândido Rondon, 17
maio 2009.
108
revelando esse truque fotográfico de beliscar para fazer chorar. Vê-se, neste caso, que
relações anteriores à migração para MCRondon interferiam nas relações econômicas e sociais.
Foto 28 - O avô
Acervo particular e fotógrafa: Írica Kaefer. Amostra de fotografia de família na visita do avô, que veio do Rio
Grande do Sul. General Rondon. Entre 1954-1961.
Na amostra de fotografia (Foto 28), está reunida uma família, com seus sete filho. O
momento, especial pela reunião da família, tornou-se ainda mais significativo para a família
pela presença do avô paterno, vindo do Rio Grande do Sul, para visitar o casal e ver os netos.
Assim, ao registrar o encontro, o avô “podia levar uma lembrança para o Rio Grande”
170
e
mostrar para os familiares e amigos como está a família do filho. Fazer uma fotografia com
familiares era uma forma de comunicação, até que as pessoas não pudessem retornar a passeio
para a terra natal. Registrar para mostrar aos conterrâneos reporta também a registros que, não
raras vezes, foram feitos para serem mostrados àqueles que ainda poderiam migrar ou àqueles
nos seus locais de origem. Observa-se que, no momento, no estúdio antigo, já estão sendo
usados os móveis de vime, comprados para substituírem as cadeiras estofadas que vinham
sendo usados nesse estúdio.
Um bilhete localizado junto às fotos indica que os fotógrafos também eram auxiliados
por algumas pessoas externas ao estúdio e que levavam modelos de fotografias e tentavam
vendê-las no interior do município. Essa é uma constatação percebida, no caso, de Quatro
Pontes, então distrito de Marechal Candido Rondon, localizado a 8 quilômetros da sede.
170
KAEFER, 19 ago. 2009, op. cit.
109
Foto 29 – O bilhete
Acervo Particular de Írica Kaefer. Quatro Pontes. 2.12.1973
Na Foto 29 temos um bilhete escrito à mão em 2 de dezembro de 1973, por uma
senhora chamada Marli, endereçada ao “prezado fotógrafo”, informando que vendeu
fotografias e aguarda o recado de retorno sobre quando a encomenda estará pronta. Comenta
como realizou a transação com relação ao pagamento das fotos e informa ao fotógrafo que
“tem mais duas que eu poderia ter entregado, mas sem dinheiro há, a”. Nesse recado ao
“prezado fotógrafo”, escrito há 36 anos, tem-se uma indicação das relações entre os
fotógrafos, seus auxiliares e clientes e, ainda, a indicação de valor, possivelmente dado como
entrada, um sinal, para o pagamento da encomenda.
Junto ao levantamento das fotografias da coleção de Írica encontram-se alguns
envelopes. Os envelopes e os dados gravados sobre eles também indicam relações comerciais.
110
Foto 30 – Envelopes de Papel Laboratório Fotográfico Colorama
Acervo particular de Írica Kaefer.
Os envelopes de papel das fotos A e B indicam a relação profissional da foto Kaefer
com o Laboratório Cinefotográfico Colorama Ltda., que atuava nas localidades de Curitiba,
de Ponta Grossa e de Londrina, no Paraná, e que tiveram, nos seus laboratórios, os serviços de
revelação de filmes feitos por profissionais situados na região oeste do Estado. Nesses
envelopes, valores, indicação do nome de Arlindo José da Silva, quem fez o pedido das
cópias, a indicação de “papel brilhante”, definindo o tipo de papel escolhido, a agente
autorizada Irene Dalla Vechia, filha de Írica, que acompanhou a mãe nos trabalhos da
fotografia, entre outras informações, são possíveis de serem levantadas.
Foto 31 – Envelope de Papel Laboratório Paranacolor
Acervo particular de Írica Kaefer.
30A
30B
111
Na Foto 31, destaque para o envelope da Paranacolor. Através desse envelope
importantes dados podem ser observados e que indicam a data de “14 AGO 1974”, uma data
de tramitação das atividades com fotografia que se desenrolaram entre a Foto Kaefer e o
laboratório. No envelope se identifica a agente autorizada Irene. Ocorre uma relação
comercial entre um profissional de Marechal Candido Rondon, interior do Estado, e o
trabalho executado pelo laboratório da Paranacolor, localizado na capital do Estado.
Nas idas para os centros urbanos maiores, como visto anteriormente, aproveitavam-se
as ocasiões para fazer compras de material em quantidades maiores a fim de fazer estoque. O
material químico necessário era comprado nessas ocasiões. Outra dificuldade enfrentada
estava relacionada aos pagamentos, feitos à vista, pois o primeiro banco instalado em Rondon,
o Bamerindus, veio com a emancipação do município, em 1960. Mais tarde, as casas
fotográficas começaram a ser visitadas e atendidas por revendedores, oportunidades em que
eram feitas encomendas.
Dentro de algumas caixinhas de fotografias há alguns envelopes que guardam algumas
anotações feitas na época, a lápis ou à caneta.
Foto 32 – Envelopes de Papel Pardo
Acervo particular de Írica Kaefer.
Nos envelopes em destaque (Foto 32), algumas anotações persistem, tais como o nome
da pessoa que as havia encomendado (“Armindo Prass”), quantidade de fotos, valores e forma
112
de pagamento, “6p 14,00 pago 5.00”, ou, a que tipo de evento as fotos do envelope se referem
(no caso, “I comunhão”). As informações, marcadas à mão, com lápis ou caneta, os dados
“meia dúzia”, “uma dúzia” são representações da forma como as encomendas eram
comercializadas e do controle interno da casa fotográfica.
Dois títulos de eleitor foram encontrados junto aos documentos das “caixas do
depósito”. Embora sejam apenas dois documentos reproduzidos, são uma mostra de uma
atividade desenvolvida em determinado período, quando a máquina xerocadora ainda não
existia na região, assunto sobre o qual a fotógrafa faz referência nas entrevistas citadas. Como
não existiam, na localidade, máquinas para reprodução de documentos, esta era feita através
de fotografia. Assim, títulos eleitorais, declarações, certidões de nascimento, de casamento, de
óbito, são exemplos de papéis fotografados, e serviam geralmente para acompanhar processos
judiciais, inquéritos policiais, inventários, etc.
Entre as fotografias da coleção em estudo, além dos envelopes de papel usados quando
foram efetuados pedidos de fotos junto aos laboratórios da capital, encontram-se alguns
envelopes timbrados do estúdio Kaefer.
Foto 33 – O Timbre
Acervo particular de Írica Kaefer. Envelopes de papel com timbre e endereço da Foto Kaefer.
Nesses envelopes encontramos a designação “FOTO KAEFER”, o número do telefone
e o endereço impressos. Ali também se encontram escritos, à caneta e à mão, nomes de
clientes, números que indicam quantidades e valores. São informações que dão certa
identidade à casa fotográfica, pois Kaefer é uma marca e se reporta a fotógrafos, locais dos
estúdios, tamanhos e quantidades de fotografias encomendadas, nomes de clientes, valores.
No verso de algumas fotos é percebido o carimbo Foto Kaefer. Esse carimbo já vinha
sendo usado em Piratuba-SC. Sobre o uso do carimbo, Írica relata: “A gente usava, colocava
atrás das fotos e também naquele papel, onde colava a foto mas, às vezes, uns fregueses
reclamavam..... diziam, a gente já pagou isto. Não precisa fazer propaganda”. Mostra, assim, a
profissional, que passavam por dificuldades nesse sentido, pois “alguns fregueses, eles eram
113
exigentes”. Com o passar do tempo, com a substituição dos envelopes em branco por
envelopes timbrados, a prática do carimbo não foi mais utilizada.
O papel ao qual a fotógrafa faz referência e em cima do qual era carimbado Foto
Kaefer é o paspatour, onde eram acondicionadas fotografias comercializadas.
Foto 34 – O paspatour Foto 35 - O retrato
Acervo particular de Írica Kaefer. Paspatour em cartolina com retrato de casamento feito pela Foto Kaefer.
Piratuba, SC. 1952. Fotógrafo dos documentos Hilário Boech. MCrondon. 25.9.2009.
O paspatour, objeto usado para acondicionar fotografias, foi usado nos trabalhos ainda
em Piratuba (SC), e apenas algumas sobras desse material foram usadas em General Rondon.
Usavam vários tipos de paspatour. O da Foto 34 é a capa do paspatour da foto 35. “Era como
um pequeno álbum. A gente dava de brinde nos casamentos.”
171
Informa Írica fazendo
referência à foto do casamento Vorpagel (foto 64), que, no caso, “era mais simples, sem a
capinha”. Esse material foi usado até esgotar o estoque trazido de Santa Catarina e não foi
comprado outro até porque “aí já entraram os álbuns e as pessoas já tinham mais condição de
comprar”
172
.
171
Idem, ibidem.
172
Idem, idibem.
114
Mas a divulgação da agência fotográfica, em 1979, é ampliada pelos Kaefer através de
anúncios no jornal “O Alento”
173
.
Foto 36 - As propagandas
Montagem: Brummer Macena Gregory. Anúncios de jornais que propagaram a Foto Kaefer . Acervo particular
da autora. MCRondon, 8 out. 2009
A partir da segunda edição do jornal “O Alento”, a “Foto Kaefer” passou a divulgar
seu empreendimento naquele jornal local. Na imagem 36 foi montado um quadro com
diversas propagandas que divulgaram a Foto Kaefer. Nos anúncios há uma variação na
apresentação da mensagem textual e a ilustração de câmara fotográfica em posições diferentes
e acompanham os anúncios feitos em torno dos serviços oferecidos. “Fotos para documentos -
Fotocópias - Reportagens - Revelações - preto e branco e a cores - Casamentos, Festas em
Geral”. Abaixo da imagem, o anúncio traz o endereço e o telefone da agência fotográfica.
Além de brindes, descontos eram oferecidos. As divulgações seguem até fins de 1982, quando
esse jornal encerra suas atividades. Conforme levantamento realizado nos jornais locais e que
173
O ALENTO. Marechal Cândido Rondon, Ano I, nº 2, 10 ago. a 16 ago. 1979, p. 9. Também se verificou
outras edições do jornal O Alento, no acervo do CEPEDAL, e constam propagandas publicadas nesse jornal
durante o ano de 1980 e algumas edições de 1982.
115
circularam antes de agosto de 1979 e, depois de 1982, não se verificou propaganda dessa
agência fotográfica nos jornais locais.
Foto 37 - O envelope Foto 38 - A formanda
Acervo particular de Írica Kaefer. Envelope de plástico com logomarca e endereço da Foto Kaefer contendo a
fotografia de uma formanda.
Ajustado ao tamanho de fotografias feitas pelos Kaefer, o envelope de plástico (Foto
38), tamanho 6x10 cm, acompanhado de seis fotografias de uma formanda, mostra um tipo de
embalagem utilizada para acondicionar as fotos encomendadas. O envelope tem um dos lados
colorido, tom vermelho/vinho, onde está indicada uma logomarca, em formato que lembra o
sol e que leva, no centro, o nome da agência fotográfica “Foto Kaefer”. Abaixo da logomarca
consta o endereço e telefone. Essa logomarca foi vista apenas neste documento, sendo que
esse envelope confeccionado em material plástico é um produto de uso posterior e mais
recente em relação aos envelopes de papel usados pelos Kaefer. Simples, pequena, porém
criativa, a logomarca representa o elemento máximo da fotografia, a luz. A luz de que todo
profissional da área precisa, procura, vai atrás, se desloca e se ajusta, de um canto a outro, a
exemplo dos Kaefer, que fizeram do espaço externo da residência e de outros espaços, o
espaço ideal, guiados pela luz do sol.
Na veste especial da formanda, um toque especial da fotógrafa. “Mas olha só, esta
parte aqui, olha eu vi as fotos do seu Gasa e ele fazia bem as fotos. Então eu já tinha umas
roupas parecidas, mas eu não tinha esta parte da capa e deste babado, como é que se diz.
Então eu fiz à mão esta parte branca, bem no capricho. Eu comprei em metro e fui
pregando...
174
”. Írica faz referências às vestes de formatura. Já possuindo algumas peças de
roupas características para o momento da formatura, passa a orientar-se e verificar o modelo
174
KAEFER, 19 ago. 2009, op. cit.
116
de peças usadas por Heribert Hans Joachin Gasa
175
. Nascido na Alemanha, Gasa que veio
para MCRondon em 1961 e, entre outros afazeres, como os de ótico, ele também passou a
fotografar.
Assim, Írica copiou o molde da “capa preta”- a beca e do peitilho branco, das peças
usadas pelo seu Gasa para melhorar as vestes nas fotos de formatura em seu estúdio. Procurar
disponibilizar vestes para os seus figurantes, costurar, confeccionar, ajustar, criar, são uma
demonstração do olhar atenta da fotógrafa sobre tendências e estilos de roupas ou uniformes
que estavam sendo usados. Essas atividades são também uma representação das atividades
cotidianas relacionadas com o ofício de fotografar. São atividades que provavelmente não
estão registradas nas fotografias, porque as antecedem. No entanto, participam da memória
desta profissional. Ainda, quanto ao número de cópias feitas do mesmo registro fotográfico,
essas são, na verdade, indícios que apontam, para além da foto em si, do seu conteúdo, mas
para outros elementos relacionados com a cultura fotográfica praticada na época, o que se
observa no conjunto da coleção, com registros feitos de outros eventos e que tem suas fotos
reproduzidas em até doze vezes.
Foto 39 – As finanças
Acervo particular de Írica Kaefer. Carteira contendo documentos financeiros. Décadas de 1970/80.
Fotografia: acervo particular da autora. Fotógrafo: Fotógrafo Hilário Boech. MCrondon. 25.9.2009.
Documentos financeiros, cheques e notas promissórias permanecem guardados com
Írica. Quando alguém não pagava as dívidas, guardava os documentos assinados na carteira
preta, pequena, com borda em metal. Sobre essas transações comenta: “Tinha freguês que não
conseguia pagar a conta. Então vinha, falava, fazer o quê. Mas eu sempre guardava os
comprovantes. E tinha freguês que negava a conta. Então eu guardava porque se um dia a
175
Para obter mais informações sobre Heribert Hans Joachin Gasa, ver: STEIN, A construção..., 2000, op. cit. e
HACK, Schaiana. Casa Gasa: uma história visual de Marechal Cândido Rondon. Marechal Cândido
Rondon, 2009. Trabalho de Conclusão de Curso (Curso de História) – Unioeste.
117
pessoa quer negar a dívida, a gente pode dizer: olha, tá aqui”
176
. Perguntada se ainda pensa
em receber essas dívidas, fez menção, com a cabeça, que não, mas os guarda porque entende
que “faz parte, né?” da trama fotográfica. Não mostra resignação e pode, inclusive, que os
nomes dos devedores sejam preservados.
Foto 40 – A gravatinha
Acervo particular de Írica Kaefer. Gravata de uso infantil. MCRondon. Década de 1970.
Fotografia: acervo particular da autora.Fotógrafo Hilário Boech. MCrondon. 25.9.2009.
A gravatinha na cor vermelho/vinho foi adquirida por Írica, entre muitas outras
gravatas que a mesma comprou. Assim como as comprou do alfaiate Port, comprou acessórios
para uso no estúdio quando conseguia viajar para outras cidades, mencionando viagens a
Curitiba. A gravatinha da Foto 40, ela não lembra onde foi adquirida, mas a guarda com zelo,
em um armário localizado num quarto do seu apartamento – quarto reservado para fazer
pinturas. Uma estante acolhe os vasos para flores, vasos usados desde o estúdio em Santa
Catarina, dos quais lembra com carinho: “este ganhei quando fiz 15 anos, das amigas... pode
ver, aparece nas fotos”. O vaso de vidro, rosa fosco, formato ovalado, está enquadrado em
várias fotografias, tanto feitas no estúdio antigo quanto no estúdio novo e em espaços externos
o que mostra a foto 69.
Camisas, havia várias e eram de tamanhos diferentes para atender aos diferentes
físicos. “Mas a cor da camisa era branca, só usava branca porque prá documento... sempre
camisa com gola e gravata”. Írica ajeitava e penteava os cabelos que tinham que ser alinhados
“para trás” e arrumava as roupas. A fotógrafa enaltece a percepção da mulher para esses
detalhes e acredita que “a mulher no estúdio, percebe”, fazendo referência ao fato de que os
homens não eram tão detalhistas e de que era bom que ela, mulher, estivesse presente no
176
KAEFER, 19 ago. 2009, op. cit.
118
desenvolvimento das atividades do dia a dia da fotografia. Ainda referente à indumentária,
esclarece que “sapatos não, não tinha... e, para os casamentos, cada um tinha o seu terno”.
Ao verificar fotografias do seu álbum, um álbum com um predomínio de retratos de
casamentos, Írica lembrou de um detalhe preparado para o casal Zimermann: “Ele era um
senhor alto e ela bastante baixa. Quando vieram fazer a reserva para o dia da foto pediram
para arranjar uns tijolos para parar em cima”. Dois tijolos foram posicionados onde a noiva
deveria ficar parada, em cima, para equilibrar um pouco a altura entre os dois. No dia
marcado, segundo Írica, a noiva teria explicado que fez o vestido um pouco mais longo para
poder “cobrir os tijolos e você precisa ver como ficou bonita a foto”, pois não teria aparecido
nada dos tijolos e o pessoal teria gostado muito da foto
177
.
Observar, acrescentar detalhes, lembrar, localizar objetos, disponibilizar-se, são
demonstrações de vivências e de experiências da fotógrafa. São atributos que mostram sua
integração a uma categoria social e, como profissional, ela, sim, estava de olho aberto e alerta.
Tendo-se encerrado as atividades da Foto Kaefer, as fotografias, os equipamentos, os
documentos, mais as entrevistas possibilitam recuperar a história da cultura fotográfica
praticada e vivenciada por essa agência de fotos e parte da história da sociedade local. Por
terem sido fotografadas pessoas e situações, muita história ficou registrada. Vários espaços,
determinados objetos e inúmeras pessoas já não mais vivas, tudo permanece visível na sua
representação, ali, nesses mesmos documentos.
3.5 A TRANSIÇÃO DAS CORES
As primeiras fotografias coloridas feitas através da Foto Kaefer são de 1967
178
, ao
menos, é o que revela a faixa de rainha usada por uma moça, fotografada no estúdio. Mas o
auge da revelação a cores acontece no início da década de 1970. O período ficou marcado
para a fotógrafa Írica, que comenta: “Quando o filme colorido foi introduzido, era uma
reportagem em cima da outra, daí já entrou mais fotógrafos, mais concorrentes”
179
. A
fotógrafa lembra que precisou de muita dedicação para aprender a revelar esses filmes para
dar boa qualidade às fotos, até porque estava bem acostumada a dar cores às fotos preto e
branco, que “recebiam uns toques de colorido que a gente fazia”. Neste sentido, faz-se
referência, também, à técnica da pintura de fotografias realizada por Írica.
177
Idem, ibidem
178
Pasta “Mulher estúdio” foto não incluída na análise. Uma moça usa uma faixa que indica Rainha 1967.
179
KAEFER, 03 maio 2009, op. cit.
119
Algumas fotografias mostram que há uma interferência nas imagens feitas em preto e
branco, pois as imagens receberam um toque colorido na foto. Partes da foto, como um
broche, o rosto ou um brinco e, em alguns casos, a foto toda foi pintada. Quando o pano de
fundo era com estampas, este recebia um tom de uma cor só, porém com partes mais leves e
outras um pouco mais escuras, deixando o fundo com uma cor suave. Outras vezes, partes do
corpo dos figurantes foram pintadas.
Foto 41 – A moça pintada
Acervo e autoria: Foto Kaefer. Marechal Cândido Rondon. Década de 1960. Fotógrafo da reprodução: Hilário
Boech. MCrondon. 8.10.2009.
O retrato da moça (Foto 41) foi pintado, assim se produzindo um colorido na cor da
pele e um destaque foi dado para as bochechas e os lábios. As sobrancelhas foram reforçadas
e o cabelo recebeu um tom amarelado. A cor verde dada à blusa suaviza o fundo azulado
escuro. Os braços da moça estão levemente manchados, mostrando a dificuldade na
distribuição da tinta sobre o papel. Todavia, a arte da pintura manual não interferiu no
trabalho final da fotografia a tal ponto de manter a marca do sorriso da moça.
Na residência de Írica, na sala de televisão, uma estante fixa, de madeira, é o espaço
do apartamento onde são guardados os álbuns de família. Ao pegá-los para mostrar fotos
pintadas que preserva nos álbuns, exclama sorridente: “Olha aqui, aqui tem história”. Na
expressão da fotógrafa, estão representadas histórias suas, como migrante que carrega
artefatos que lembram parte da sua vida, histórias do Estado de origem.
120
Foto 42 – O álbum I Foto 43 - O álbum II
Álbuns: Acervo de Írica Kaefer. MCRondon. Fotografia: acervo particular da autora. Fotografia dos álbuns:
Fotógrafo Hilário Boech. MCrondon. 25.9.2009.
Os álbuns das Fotos 42 e 43 são os mais antigos de Írica Kaefer, e guardam fotografias
da família. Confeccionados com capas grossas, têm as folhas presas por cordão. As estampas
das capas, uma com animais e a outra com paisagem, são coloridas. As fotos desses álbuns
datam de período em que moravam em Santa Catarina e feitas nas décadas de 1940 a 1950.
A foto pintada do time Oeste Futebol Clube permanece até a atualidade, em outro
álbum de fotos da família.
Foto 44 – O álbum cor-de-rosa
Álbum: Acervo de Írica Kaefer. MCRondon. Década de 1960. Fotógrafo: Hilário Boech. MCrondon. 25.9.2009.
121
Foto 45 – Time de Futebol Pintado
Álbum: Acervo e autoria de Írica Kaefer. MCRondon. Década de 1960. Fotografia: acervo particular da
autora.Fotógrafo: Hilário Boech. MCrondon. 25.9.2009.
Ao abrir-se o álbum cor-de-rosa com um detalhe em flores, os olhos deparam-se com a
foto colorida de um time de futebol que permanece colada no verso da capa. A distribuição
das cores (tanto do fundo azul cinza e do verde da grama, quanto as cores da vestimenta dos
atletas) é um sinal de paciência da fotógrafa, que passa a ser artista e que pode dizer hoje: “A
gente tinha golpe de vista... e eu fazia porque eu gostava, como hoje ainda faço nos panos,
toalhas. Eu pinto tudo”
180
. Segundo Írica, o trabalho de pintar fotografias exigia atenção para
que as partes pintadas não recebessem interferência de traços com cores diferentes. As tintas
eram especiais e eram encomendadas dos representantes. Ela usava pincéis de tamanhos
diferentes, mas pequenos. Para sinalizar algum ponto na foto, “um botão, ou algum objeto
menor, usava palito de madeira, já existia próprio para isso”, comenta com naturalidade,
juntando os dedos polegar e indicador numa menção ao gesto que a mão faz ao pintar.
180
KAEFER, 19 ago. 2009, op. cit.
122
Foto 46 – No verso da foto Foto 47 - O ajuste da cor
Acervo e autoria: Foto Kaefer. Marechal Cândido Rondon. Década de 1960.
A técnica da pintura girava em torno da calma, da precisão e do gosto pela arte de
esparramar “um pingo, o mínimo” de tinta em um objeto ou, às vezes, até mesmo o verso de
uma foto podia ser usado para que, aos poucos a tinta fosse misturada e as cores ajustadas,
passadas para as fotografias.
O plano de fundo usado em várias fotografias em preto e branco é pintado e este
adereço recebe um colorido em tom azulado, quase dando movimento às nuvens. Essa
intervenção pode ser percebida em poucas fotos, porém é uma pequena mostra de que havia
um desejo de introduzir e de ver diferentes cores nas imagens registradas. Essa ação se faz
presente no decorrer da técnica da fotografia preto e branco. A história cultural, analisando
questões sobre a modernidade, apresenta diferentes reações da sociedade, diante das
invenções. Segundo a fotógrafa, a atitude exercida na Foto Kaefer foi tomada para testar a
técnica da pintura sobre a fotografia preto e branco. Mais tarde, aguardavam os recursos
técnicos inovadores do filme colorido. Enquanto esses recursos não chegavam, ao pintar,
estavam dando toques e retoques de cores nas imagens, articulando tons, tentando a cor certa,
aguardando e apreciando os resultados da própria arte. Quanto ao filme colorido, algumas
novidades podem demorar para chegar em localidades interioranas, o que não impediu que
elas se atualizassem, conforme mostram as fotos coloridas da coleção da fotógrafa Írica.
Fotografias coloridas serão analisadas em item do capítulo IV.
123
A introdução do colorido na fotografia gerou uma expectativa na sociedade. A arte de
fotografar ainda estava restrita a profissionais e a algumas pessoas com condições econômicas
para tal. Porém, as inovações tecnológicas em torno do ofício fotográfico se apresentavam.
No início, os custos relacionados com a produção fotográfica colorida se elevaram, levando as
pessoas a agirem com cautela quanto à opção pela foto colorida ou em preto e branco. Há que
se considerar a credibilidade e a segurança em torno da novidade do colorido, a diferença no
preço do novo produto em relação à foto preto e branco e, ainda, o fato de as revelações não
serem feitas no estúdio local. As primeiras revelações, no caso das fotos coloridas, foram
feitas através de laboratórios de Curitiba, os quais enviavam os filmes para a Alemanha.
Considerando a demora do retorno das fotos e os custos, alguns clientes optavam por fazer
fotos em preto e branco e apenas um exemplar colorido.
Foto 48 – Do “Casamento Preto e Branco” Foto 49 – Para o “Casamento Colorido”
Foto Kaefer. Acervo particular de Írica Kaefer. Marechal Cândido Rondon. 1970.
As fotografias do casamento registrado em uma residência, com um exemplar feito nas
cores preto e branco e outro exemplar feito no colorido, são uma demonstração da opção
oferecida aos clientes da casa fotográfica e a escolha feita pelos clientes, porém a questão do
preço foi uma das razões que levou a maioria dos clientes, inicialmente, a optarem pelo
124
registro maior de reproduções em “preto e branco” e menor no colorido, do mesmo evento.
Há sinais dessa situação no acervo, o que pode ser percebido em registros de casamentos.
3.6 O APAGAR DE UMA LUZ E O ASCENDER DE OUTRAS LUZES.
A narrativa mostrada em páginas anteriores evidenciou que a família Kaefer migrou
com capital para Marechal Cândido Rondon, podendo adquirir uma chácara e uma colônia de
terras. Outra parte “guardava em casa porque ainda não tinha banco”. Emprestou parte dessas
reservas para os donos do posto de gasolina Esso. Investiu na apicultura, no comércio e na
oficina de bicicletas e, anos mais tarde, investiu também na pecuária. Passou a criar gado e
adquiriu uma fazenda em Margarida, no interior do município. Em meados da década de
1970, os negócios da pecuária foram direcionados para o Mato Grosso.
Nessa época, em 1982
181
, desfez-se o casamento entre Írica e Oscar, cuidando este dos
negócios da fazenda, no Mato Grosso. Silfredo Schranck, irmão de Írica, acompanhou a
fazenda de gado em Margarida, administrada pelo filho Valdir. Írica, acompanhada da filha
Irene, assumiu as atividades fotográficas. Trabalhou 30 anos em Rondon e em torno de 1985 a
filha Irine juntou-se às atividades, sempre acompanhada pela mãe. A filha, no entanto, dizia
que “tirar fotografia não é para mim”, lembra Írica. A casa fechou em torno de 1995, depois
de ter ficado mais ou menos 10 anos na direção da filha. Desse período, Írica preserva, além
de equipamentos e câmaras, parte das fotos coloridas
182
.
Levino Boeck, depois de trabalhar 13 anos com o casal, passa a assumir negócio
próprio, dando início à Foto Rondon. Trabalha até hoje e o faz na companhia dos filhos Ilário,
Jandir e Mauri, que, ainda crianças, aprenderam a arte de fotografar com o pai. Essa família
também tem guardadas as primeiras máquinas usadas nesse ofício, como a Rolleiflex, a
Bessmatic, a Matz Fleck, a Yashica-12, a Minoleta, a Zenit 122K, que acabaram se
estragando e/ou sendo substituídas por câmaras mais modernas.
Das informações de Írica e de Levino, relacionadas aos equipamentos e aos materiais,
depreende-se que as inovações tecnológicas na área da fotografia foram sendo incorporadas
nas atividades desses fotógrafos, principalmente no que se refere às indústrias da Alemanha e,
posteriormente, do Japão.
181
KAEFER, 21 nov. 2006, op. cit.
182
KAEFER, 03 maio 2009, op. cit.
125
Nesse sentido, durante os encontros, Írica realçava muito o estilo de fotos que faziam:
“as fotos, como é que se diz? A gente se envolveu aqui só, só com reportagens”, indicando
tratar-se de “fotos feitas fora do estúdio”
183
, mostrando que foi um tipo de foto muito
procurada e que resultou em ganhos financeiros, pois souberam enfrentar as dificuldades. As
fotos-reportagens envolviam a paisagem da região e também aspectos da produção, que já se
fazia mostrar, como plantações de milho, hortaliças, mandioca (plantas com raízes grandes),
repolhos, batatas, etc. Dessa atuação, pode ser percebida a interferência do ato fotográfico na
própria propagação da colonização, pois as pessoas “traziam repolho de dois, de dez, doze
quilos”. Eram feitas identificações com dizeres dos pesos dos produtos e colocados nas fotos.
Assim, estas imagens estariam indicando: “Olhe, a terra é boa”, “Olhe, vale a pena vir prá cá”.
Ao mesmo tempo em que os compradores de imagens e vendedores de terras se interessavam
por fotos que mostravam possibilidades de boas safras e de progresso na região, o casal
investia na foto-reportagem, que rendeu um bom lucro.
184
Cabe ressaltar que as fotografias com imagens de acidentes causaram impressões
diferentes aos entrevistados. Írica fez comentários sobre esse tipo de imagens, dizendo que
eram terríveis, trágicas e preferiu rasgá-las e jogá-las fora. Levino, por sua vez, ainda tem
guardados exemplares delas. Com o seu filho Ilário pôde-se ver uma pequena caixa contendo
80 fotografias feitas pela Foto Kaefer, consideradas trágicas. São imagens cuidadosamente
tratadas, reservadas a poucos olhares, por serem “terríveis”. Guardam registros de
enforcamentos, de acidentes de trânsito, por motosserra, resultando em vítimas fatais. No
meio delas encontram-se algumas fotos de pessoas hospitalizadas.
Levino fazia fotos para a delegacia de polícia, quando era chamado para registrar
acidentes ou “sinistros”, como de “uma casa que aqui no centro pegou fogo”, ou coisas de
mato e de motosserra. Isso acontecia muito, “quando dava um toque no bico da moto-serra,
ela pula, o cara caiu por cima dela, cortou ele todo”. Estas são circunstâncias que remontam a
um período em que o sistema de produção familiar passou por mudanças, ocorrendo a
introdução da modernização agrícola, passando os colonos a adotar novas técnicas e novos
instrumentos de trabalho. Mortes ocorriam também pelas dificuldades de deslocamento até os
hospitais e consequente demora no atendimento. No caso das fotografias que tratam de
dificuldades enfrentadas e de aspectos trágicos, Írica não quis deixar na coleção que
preservou. Levino, porém, selecionou várias e as preservou na sua coleção particular.
183
KAEFER, Írica. Entrevista concedida a Lucia Teresinha Macena Gregory. Marechal Cândido Rondon, 27
jun. 2002.
184
Idem, ibidem.
126
Imagens apresentando esse tipo de conteúdo estão incluídas no estudo, inclusive as
fotos encontradas com o filho de Livino, uma vez que foram registradas através da Foto
Kaefer e fazem parte da memória dessa casa fotográfica.
O fotógrafo Levino encerrou suas atividades em 2006 e na família desses fotógrafos
existem hoje aparelhos próprios para revelação em uma hora, revelações digitalizadas, o que
demonstra a recepção e a adaptação ao moderno, às mudanças tecnológicas e às inovações no
ofício de fotografar.
As imagens produzidas pela casa fotográfica, preservadas nas “caixas do depósito”,
decorrido meio século do seu registro (em alguns casos), participam da construção da cultura
fotográfica, são uma demonstração da busca pela construção de memórias e de identidades
locais.
Atualmente, Írica
185
continua residindo em MCRondon onde acompanha a vida dos
familiares. Informa que passaram para os filhos parte dos investimentos para auxiliá-los nos
empreendimentos. Renato é representante da empresa Motos Honda na região, tendo lojas em
MCRondon, Cascavel e Foz do Iguaçu, desde a década de 1980. Também foi vice-prefeito de
MCRondon na gestão de Ariston Limberger (1997 a 2000). Nelson trabalha na agricultura em
Sinop/MT e Valdir, nas terras de MCRondon. A filha Irene faleceu em meados de 2006. Írica
ainda acompanha os netos e a bisneta. Dedica-se, há mais de 20 anos, como voluntária, ao
Grupo de Terceira Idade “Amizade”, ensinando pintura, crochê e costura para as colegas,
intercalando as atividades com longas temporadas e passeios pelo litoral catarinense, a uns
800 de MCRondon, nos seus mais de 70 anos de idade.
Entende-se que muitas imagens desse acervo de fotografias não entraram no circuito
de exposições ou de álbuns de figurantes que estão enquadrados nas imagens, especialmente
as fotos dos noivos que deixaram as 6 ou 12 cópias intactas em envelopes que ainda
permanecem na Foto Kaefer. Nestes casos de fotografias de noivos guardadas em envelopes,
“nenhuma fotografia foi retirada”
186
. Ainda assim, alguns exemplares participaram do circuito
da circulação de fotografias produzidas pelos Kaefer, sendo localizadas cópias/originais em
gavetas de armários de pioneiros (foto nº 64), no acervo do Cepedal, no Plano de Colonização
da MARIPÁ
187
, no “álbum de bolso”, na obra de Saatkamp, (foto 105 já mencionada) ou,
185
Idem, ibidem.
186
KAEFER, 19 ago. 2009, op. cit.
187
A segunda foto da página 19 do Plano de Colonização da MARIPÁ é a mesma foto (foto 2 do presente
trabalho) que se encontra no acervo de Írica Kaefer. Segundo o trabalho de PORTZ, op. cit., é considerado
que as fotografias desse Plano seriam de autoria de Ondy Niederauer o que gera uma dúvida quanto ao
fotógrafo da foto uma vez que a mesma também se encontra no acervo de Írica informa que faziam fotos para
a MARIPÁ.
127
ainda, distribuídos em páginas de jornal.
As imagens desse acervo ainda pertencem a uma “instituição particular”, formando e
integrando uma coleção que passou a receber “proteção especial” da artista que participou da
sua produção e continua a preservá-las. O ato de preservar as fotografias reporta-se à memória
da fotógrafa, que atribui aos registros fotográficos e aos equipamentos as suas atividades
profissionais e parte da sua vida.
4 A COLEÇÃO DE FOTOGRAFIAS DE ÍRICA
4.1 O DEPÓSITO E O SÓTÃO
Após mantidos contatos com Írica, através de entrevistas, outros encontros foram
realizados com o objetivo de esclarecer dúvidas, observar outros pertences relacionados com a
história da casa fotográfica e com a trajetória de vida dessa profissional. O espaço destinado
para a arte de fotografar hoje não existe mais (para a finalidade que originou o espaço) e parte
dos materiais utilizados ainda são guardados pela fotógrafa Írica nas dependências de sua
residência, encontrando-se câmaras fotográficas expostas em uma prateleira, na sala de estar,
logo na entrada do apartamento de Írica, assim como outros equipamentos fotográficos.
Apresenta-se, agora, uma abordagem geral do nosso debruçar sobre o acervo,
constituído de 6.849 fotografias pertencentes à fotógrafa Írica Kaefer. Conforme quadros
apresentados no capítulo II deste trabalho, um diagnóstico inicial e geral sobre o conjunto
documental foi realizado para caracterizar-se o acervo a partir da sua produção e constituição
e, assim, poder entender aspectos da cultura fotográfica desenvolvida em MCRondon.
Neste sentido, entende-se, a exemplo de Mauad
188
, que a fotografia “pode ser vista
como produto cultural, fruto de trabalho social de produção sígnica”. Relações entre o plano
do conteúdo e o plano da expressão são opções feitas observando-se o corte temático e
temporal feitos e as opções técnicas que envolveram a fotografia local. Assim, feito o
levantamento de aspectos relacionados com “o plano da expressão”, apresenta-se a produção
fotográfica da casa Kaefer identificando a coleção, os fotógrafos da coleção, os seus
equipamentos, as suas opções fotográficas e os interesses manifestados em torno da prática de
fotografar no período da colonização recente do Oeste paranaense. O trabalho é acompanhado
de quadros, organizados pela autora, e de fotografias, que dão uma mostra do que se
188
MAUAD, 1996, op. cit., p. 84.
129
encontrou, “abrindo o baú” das “caixas do depósito” ao qual a fotógrafa Írica faz referências
quando menciona o acervo de fotos preservadas.
A fotógrafa mantém preservados vários objetos relacionados com o trabalho
fotogrático. Perguntando-se o que há no antigo depósito da oficina de bicicletas (foto ----),
pode-se dizer que lá se encontra de tudo um pouco. Berço antigo de madeira, para bebê, o
qual foi enviado para ser usado por uma netinha nascida em Toledo início de 2009. A mesinha
de madeira, pequena, baixinha, da filha Irene, quando criança e agora repassada para as netas.
Cestas de vime da floricultura que tem um das salas da frente alugadas e algum material da
relojoaria que funciona em outra sala alugada, entre outros objetos.
Os materiais estão relacionados com a própria forma de Írica ver e valorizar as coisas,
como, por exemplo, a de guarda de objetos. Numa caixa de papelão estão guardados suportes
de papelão (Foto 49), usados para proteger copos com bebidas.
Foto 50 – Os aparadores de copos
Acervo particular da autora.
Fotografia: Acervo particular da autora. Fotógrafo Ilário Boeck, em 28 jun. 2009.
A variedade de peças de aparadores de copos (Foto 50) faz parte da coleção de
artefatos aos quais Írica, sempre que pode, acrescenta mais uma unidade. Ao esclarecer sobre
o motivo dessa coleção, Írica sorri: “Olha, quando eu viajava para Alemanha, visitar minha
irmã e meu cunhado, .... e nós saíamos para tomar chope, eu sempre falava com os garçons e
dizia, olha o chope tá muito bom, mas isto aqui é tão bonito...”
189
. Assim, foi reunindo esse
material por considerá-lo bem feito, interessante pelas gravuras coloridas e algumas
189
KAEFER, 19 ago. 2009, op. cit.
130
localidades ali estampadas. Acrescentou, em sua fala, que as mantêm guardadas pela “história
que tem ali, olha ali tem história, cada lugar, cada chope que a gente tomou, a gente se
lembra...”. O ato de guardar, de colecionar e de lembrar desses momentos é uma forma de
revivê-los, tendo-os sempre próximos, representados nessas peças.
Outra coleção que Írica mantêm no depósito suas inúmeras bolsas de mão antigas.
Foto 51 – As bolsas
Acervo das bolsas: Írica Kaefer. Fotografia: Acervo particular da autora.
Fotógrafo Ilário Boeck, em 28 jun. 2009.
Conservadas em uma grande caixa de papelão, as bolsas de mão são de diferentes
tipos, desde material em vime, napa, couro, sendo algumas mais elaboradas e outras menos.
Sobre as bolsas, faz a observação de que “acho bonitas, e era moda, usavam muito a bolsa de
vime”
190
. A bolsa mais clara, na parte superior da foto, feita em tiras finas de madeira e
costurada à mão com cordão de linha, era uma das preferidas porque “nela eu podia levar a
máquina. Ela cabia bem direitinho ali e era prático para levar”
191
. As bolsas permanecem no
depósito, conservadas em caixa “bem fechada”, protegidas para evitar que a poeira e outra
sujidade penetre na caixa e prejudique as bolsas.
190
Idem, ibidem.
191
Idem, ibidem.
131
Foto 52 - O Cristo
Arte de autoria não identificada. Quadro pintado a óleo, sobre lâmina de madeira. s/d. Acervo da obra de arte e
do banco enquadrado: Írica Kaefer. Foto acervo da autora. Fotógrafo Ilário Boeck. MCRondon, em 28 jun. 2009.
A figura de Cristo, moldada em madeira e enquadrada na Foto 52, é um adereço usado
pelo casal Kaefer para fotografar crianças em dia de comunhão. O banco de madeira
acompanhava o espaço fotográfico. A criança comungante era posicionada, de joelhos, na
frente da moldura do Cristo que, representado através da imagem, estaria dando a comunhão
para a criança, através do gesto de estender a mão que segura a hóstia. Írica comenta que
usava os objetos em Piratuba e aqui em General Rondon teria usado poucas vezes essa figura.
Pessoas da comunidade que tiveram acesso a fotografia do Cristo, lembraram e comentaram
que fizeram fotografia de sua comunhão com o enquadramento destes objetos.
132
Foto 53 – A estrada Foto 54 – O rio
Arte de autoria de Kurt Hass. Quadros pintados a óleo sobre lâmina de madeira. 1961. Acervo de Írica Kaefer.
Foto acervo da autora. Fotógrafo Ilário Boeck, em 28 jun. 2009. MCRondon.
Os quadros pintados sobre lâminas de madeira, medindo 90 cm x 1:30 cm foram
encomendados por Írica para serem pendurados na parede do estúdio novo. O artista dos
quadros de paisagens é “Kurt Hass, M.C.Rondon”, o qual deixou seu nome e o nome da
cidade escritos no quadro conforme se vê (Foto 53) na parte inferior esquerda do quadro.
Segundo a fotógrafa, esse senhor era morador da Linha Guarani, interior do município. Sobre
a finalidade dos quadros, Írica informa: “as pessoas gostavam de quadros e precisava de uma
coisa para a parede, era bonito”
192
. Ao fechar o estúdio fotográfico, os quadros foram
guardados no sótão da oficina de bicicletas, onde permanecem, um com as ripas de madeira
que formam o contorno da moldura e outro sem as ripas. Tripés, as cortadeiras de fotos e
outros materiais fotográficos permanecem guardados no sótão juntamente com outros objetos
da família. As “caixas do depósito” contendo as fotografias do acervo de Írica estavam
guardadas na antiga oficina de bicicletas.
192
Idem, ibidem.
133
Foto 55 – A Guardiã no “depóstio de fotos”
Fotógrafo Ilário Boeck, em 28 jun. 2002. A fotógrafa Írica, no acervo particular da autora.
Írica (Foto 55) está examinando antigas fotografias e amostras de fotografias, no seu
depósito particular, onde se encontram as “caixas do depósito” entre as quais, algumas fotos
nunca procuradas. Atenciosa e demonstrando interesse no sentido de esclarecer o desenrolar
das atividades fotográficas, Írica, a guardião, abre seu depósito, naquele momento,
acompanhada pela autora desta pesquisa, em 2002. Existiam ali duas caixas de papelão,
contendo inúmeras caixas menores, onde mantém guardadas inúmeras “fotos não retiradas”.
As fotos não retiradas foi outro problema enfrentado pelo casal. Grande quantidade de fotos
permaneceu guardada. Uma parte das fotos não retiradas foi jogada no lixo, porque não
sabiam o que fazer com elas. A quantidade de fotos dentro das caixas apontou para algumas
interrogações: – Que imagens contêm esses registros fotográficos, muitos dos quais feitos há
quase meio século? – Por que permanecem ali, guardadas em envelopes, dentro de pequenas
caixas, todas reunidas numa caixa maior, decorrido tanto tempo? E as fotos da segunda caixa,
todas amontoadas e misturadas, sobre o que tratam? Estes questionamentos foram analisados
na pesquisa, que está acompanhada de tabelas e imagens que mostram elementos culturais
registrados nas fotografias relacionadas aos usos e às funções da fotografia e à permanência
dessa coleção “nas caixas de depósito”.
Passa-se, assim, a mostrar a coleção de fotografias no seu conjunto, ressaltando-se a
maneira como a coleção foi preservada, alguns aspectos relacionados com “as formas da
expressão”, as opções fotográficas, os fotógrafos da coleção, os seus equipamentos, e os
134
interesses manifestados em torno da prática de fotografar no período da colonização recente
do Oeste paranaense. O trabalho é acompanhado de quadros, organizados pela autora, e de
fotografias que dão uma mostra do que se encontrou ao abrir o baú das “caixas do depósito”
ao qual a fotógrafa Írica faz referências quando menciona o acervo de fotos.
4.1.1 UM B, MUITAS IMAGENS
No decorrer da realização de trabalhos
193
para os cursos do doutoramento realizou-se
um minucioso diagnóstico sobre “as fotografias do depósito” (na expressão de Írica) e
constatou-se que a coleção está constituída de 5.042 fotografias (excluídas as fotos repetidas),
entre outros documentos textuais e equipamentos. Deste total de fotografias, 932 fotos são
coloridas, representando 18,5% do total das fotos, e 4.110 fotos são em preto e branco,
representando 81,5%.
Levando em consideração a quantidade de fotografias e o espaço necessário para
realizar um diagnóstico detalhado da coleção, as “caixas do depósito” com as fotografias
estão, atualmente e com o consentimento da fotógrafa Írica, sob a guarda e à disposição da
pesquisadora.
Iniciamos o trabalho abrindo as caixas com a sensação de estar abrindo um velho baú.
Realizar um diagnóstico sobre o conjunto documental fotográfico, objeto de nossa pesquisa, é
tarefa significativamente difícil, por se tratar de um número elevado de documentos, ou seja,
6.849 fotografias, além das demais fontes.
Uma metodologia teria que ser adotada para fazer o levantamento inicial das fotos.
Nesse sentido, adotou-se metodologia indicada por Mauad, onde se procurou trabalhar a
“relação entre o plano do conteúdo e o plano da expressão”. Nosso trabalho voltou-se, nesse
momento, a aspectos relacionados com “o plano da expressão” da produção fotográfica da
casa Kaefer, identificando o tamanho, a coloração e a quantidade das fotos nas diferentes
dimensões, a coleção, os fotógrafos da coleção, seus equipamentos, suas opções fotográficas e
os interesses manifestados em torno da prática de fotografar no período da colonização
recente do Oeste paranaense.
Outros aspectos ainda voltados a questões da expressão, tais como a direção, o sentido,
os planos, nitidez, iluminação, arranjo e equilíbrio, a impressão visual e a composição dos
193
GREGORY, Lucia Teresinha Macena. Abrindo o baú: memória fotográfica de Írica Kaeffer (1954-1985).
Niterói, mar. 2006. (Monografia final do Curso História da Cultura, Debates e Propostas).
135
objetos foram levantados para definir as temáticas, selecionar as fotos e quantidades para
análise, dentro da coleção Kaefer. Os aspectos que revelam “formas do conteúdo”, formas
voltadas a perceber datas, locais retratados, espaço da figuração, atributos das pessoas e os
tipos de objetos, são categorias espaciais analisadas no decorrer da pesquisa. Essa situação se
justifica devido ao grande número de documentos a manusear e à estruturação da pesquisa.
Optou-se, nesse momento, por adaptar uma forma de trabalho que atenda ao levantamento a
partir da realidade encontrada no nosso corpus documental. Nesse sentido procurou-se apurar
inicialmente um levantamento da quantidade de fotos, a sua dimensão e a sua cor.
As fotografias foram encontradas em três grandes caixas de papelão, medindo 30x42
cm cada uma delas. Dentro delas, algumas fotografias estavam reunidas em 33 caixinhas
menores medindo 10x15 cm cada uma, também de papelão e que acondicionavam material
fotográfico (algumas fotos ali dentro ainda estão separadas por pequenos envelopes de papel).
As demais fotos se encontram, porém, soltas e amontoadas, sem invólucro, dentro das caixas
grandes. São inúmeras fotos avulsas.
Para viabilizar os trabalhos, as fotos avulsas foram agrupadas por temas e cores. As
temáticas foram sendo atribuídas à medida que as embalagens, nas quais as fotografias
estavam acondicionadas, foram abertas, revelando, através de um cuidadoso manuseio, um
leque de curiosidades, expectativas, dúvidas e muito trabalho, mas a principal definição de
temas foi sendo construída a partir da história que o conjunto de imagens traduz. Logo no
início dos trabalhos de desvendamento da coleção foram atribuídas várias temáticas, quais
sejam: aniversário, balé, carnaval, casamento, crianças, diversos temas, família, jovens,
edificações, escola, festas, esporte, formatura, homens, mulheres, religião, transporte e
paisagem. Ressalta-se que as fotos foram agrupadas, numa primeira tentativa de organização
do material, para saber-se o que guarda a coleção.
Decidiu-se fazer um diagnóstico geral das fotografias e levantar agora a quantidade de
documentos, o seu tamanho, a cor e os temas mais recorrentes destas “fotografias do
depósito”, procurando, através das informações, identificar melhor esta fonte de estudo para
entender por que determinadas fotografias, muitas vezes encomendadas, permaneceram na
casa fotográfica e não foram retiradas. Pretende-se também reconhecer os aspectos sociais que
as fotografias guardam. O trabalho de levantamento desses dados exigiu paciência e
determinação, pois foi demorado e cansativo. Por outro lado, enquanto se realizava a tarefa,
expectativas em torno da coleção foram surgindo, anunciando e revelando, através de um
atento exercício do olhar, diferentes aspectos da sociedade local. Essa parte de levantamento
dos dados proporcionou uma melhor compreensão dos elementos da “forma da expressão”,
136
pois nos dando indicações sobre as possibilidades técnicas da fotografia no período em
estudo, nessa região.
Apresenta-se, a seguir, um quadro que mostra a quantidade das caixas menores, o
tamanho das fotografias, a coloração e a quantidade de fotos em cada caixa. Levando-se em
consideração que a forma de armazenamento poderia trazer informações importantes com
relação a determinados períodos ou temas das fotografias. Optou-se, no momento do
diagnóstico, em preservar a originalidade das formas de guarda adotadas pela fotógrafa.
Quadro 1 - Fotos preto e branco guardadas em caixas pequenas. Tamanho das caixas: 10x15 cm
TAMANHOS
CAIXA
5x5 6x9 8x8 8x10 9x12 10x15 12x17 10X10 NEG
COR
QUANT.
DE
FOTOS
QUANT.
DE
POSES
01 - 03 - - - 72 - - - - p&b 75 24
02 - - - - - 34 - - - - p&b 34 14
03 - 10 - - 31 58 - - 6x9 13 p&b 99 32
04 - 02 - - - 66 - - - - p&b 68 68
05 - 03 - - - 43 - - - - p&b 46 46
06 - - - - - 51 - - - - p&b 51 10
07 - - - - - 68 - - - - p&b 68 20
08 - - - - - 02 - 03 - - p&b 05 05
09 - 85 - - - 01 - - 3x3 20 p&b 86 16
10 - 01 - - - 46 - - - - p&b 47 10
11 - 01 - - - 70 - - - - p&b 71 24
12 - 52 - - - 20 - - 6x9 14 p&b 72 23
13 02 05 - - - 68 - - 6x9 26 p&b 75 39
14 - 24 - - - 23 - - 3,5x2,5 40 p&b 47 07
15 - - - - - 51 - - - - p&b 51 22
16 - 13 - - - 32 - - - - p&b 45 09
17 - - - - - 101 - - - - p&b 101 101
18 - 08 - - - 59 - - 6x9 09 p&b 67 29
19 - 48 - - - - - - 6x9 20 p&b 48 23
20 - 18 - - - 65 - - 6x9 06 p&b 83 63
21 - - - - - 44 - - 6x9 03 p&b 44 10
22 - - - - - 41 - - - - p&b 41 15
23 - 12 - - - 40 - 18 - - p&b 70 63
24 01 10 - - - 111 - - - - p&b 122 108
25 - 19 - - - 61 - - - - p&b 80 20
26 10 12 - - - 95 - - - - p&b 117 117
27 17 12 - - 08 86 02 - - - p&b 125 125
28 - 11 - - 56 28 97 - - - p&b 192 182
29 - 41 - - 13 42 01 - - - p&b 97 92
30 - - - - - 193 - - - - p&b 193 164
31 - 237 - - - - - - - - p&b 237 237
32 - - - - - 50 - - - - p&b 50 11
33 - 12 - - 50 - - - - - p&b 62 25
TOTAL 30 639 - - 158 1721 100 21 - 151 p&b 2.669 1.754
O levantamento feito a partir das caixas menores trouxe-nos a informação de que
nessas caixas as fotografias são todas em preto e branco, totalizando 2.669 fotografias nas 33
caixinhas. Dessas fotos, temos algumas poses repetidas, levantamento também já realizado e
137
que mostrou que, de muitas fotografias, foram reproduzidas 3, 6 ou mais cópias, ocorrendo
situações de 12 cópias da mesma pose. Nesse sentido, chegou-se, no conjunto das fotografias
guardadas em caixas menores, num total de 1.754 poses. Essa situação de muitas cópias já
não se percebe tanto nas fotografias coloridas. O fato de ter ocorrido uma repetição nas poses
de fotografias em preto e branco, em maior número, reporta-nos ao período em que eram
feitos os registros fotográficos de uma pose e essas fotografias eram reproduzidas originando
mais cópias, de acordo com os pedidos dos clientes. As fotografias de casamento encontradas
nos envelopes de papel e acondicionadas nas caixas de papelão pequenas mostram, em parte,
essa situação.
Com relação à dimensão das fotos, essa é variada e encontram-se, no conjunto da
coleção, as dimensões 5x5 cm, 6x9 cm, 8x8 cm, 8x10 cm, 9x9 cm, 9x12 cm, 10x15 cm,
12x17 cm e 18x24 cm. Algumas fotografias pequenas não apresentam tamanho que se
enquadre nos tamanhos já mencionados e foram acrescentadas às fotografias com dimensões
mais próximas, situando-se estas nas dimensões 5x5 cm e 6x9 cm. Destaca-se, quanto ao
maior número de fotos, a dimensão 10x15 cm, representando 64,50% do total dessas fotos e
as fotos na dimensão 6x9 cm apresentam 24% das fotos em preto e branco. As demais fotos
representam 11,50% das fotos. Essas dimensões estão relacionadas às formas de produção,
aos tipos de instrumentos e às condições socioeconômicas de um determinado período
fotográfico.
Com relação à temática, diversos temas foram levantados numa mesma caixinha e
estão relacionados principalmente a eventos religiosos, tais como crianças em primeira
comunhão, crisma, casamentos, velórios, além de esporte, desfiles cívicos escolares e
municipais. O espaço retratado enquadra o estúdio e aspectos de ambientes urbanos e rurais.
138
Foto 55 - Amostras de fotografias de autoria dos Kaefer
Caixa de Írica Kaefer contendo amostras de fotos. Fotógrafo da foto 56, Brummer Macena Gregory. Acervo
particular da autora. 12/2005.
Na Foto 56 temos uma visão dos registros encontrados na caixa nº 31 e que contém
237 fotos as quais contemplam vários temas. São fotos de diferentes tamanhos, inclusive
pequenos, e muitas serviram como modelo, copião, cópia de contato, ou amostra para, a partir
dela, serem feitas as fotografias e as cópias encomendadas.
O conjunto dessas fotos pequenas, assim como a coleção toda, é fruto de um trabalho
minucioso dos fotógrafos que reuniram, através de cada pedacinho de papel fotográfico,
durante vários anos, partes de uma história. Trata-se de história da fotografia, dos fotógrafos,
de diferentes figurantes, espaços e objetos. Nessas fotografias, guardadas em caixinhas feitas
pequenos baús, a história da região e dos seus personagens se revela e se renova.
No conjunto das fotografias das caixinhas menores, com as fotos em preto e branco,
não localizamos referências com relação à data da realização das fotos. Entende-se que se
trata de fotografias feitas desde meados da década de 1950, quando a família Kaefer veio ao
Paraná, até o início da década de 1970, período em que a fotografia colorida surgiu na região,
conforme mencionado pela fotógrafa. As revelações feitas em preto e branco aconteceram em
quantidades significativas até 1972, aproximadamente.
Quadro 2 – Fotos preto e branco guardadas em caixa grande. Tamanho da caixa 30x40 cm
CAIXA COM
FOTOS AVULSAS
TAMANHOS COR
QUANT
DE FOTOS
QUANT
DE
POSES
5x5 6x9 8x10 9x12 10x15 12X17 18x24 NEGATIVOS
CASAMENTO 54 33 227 498 36 88 34 - - - p&b 970 844
CRIANÇAS 23 81 36 122 06 06 3 - - - p&b 277 187
FAMÍLIA 27 30 05 51 07 47 - - - - p&b 167 153
JOVENS 22 - - 23 - - - - - - p&b 45 27
EDIFICAÇÕES 16 15 04 230 - 12 - - - - p&b 277 94
FESTAS 18 02 38 214 - 17 - - - - p&b 289 289
ESPORTE 03 - - 58 - - - - - - p&b 61 61
FORMATURA - 39 117 - - - 04 - - - p&b 160 95
HOMENS 45 09 - 88 - 05 01 - - - p&b 148 148
MULHERES 34 66 23 114 - 04 - - - - p&b 241 241
RELIGIÃO 07 - - 179 - 64 01 - - - p&b 251 141
TRANSPORTE - - - 76 - - - - - - p&b 76 76
TOTAL 249 275 450 1653 49 243 43 - - - p&b 2.962 2.356
140
As fotografias encontradas em uma das caixas maiores, de papelão, encontravam-se
todas misturadas, sem nenhuma identificação ou referência. São fotos também em preto e
branco. Dessas fotos também fizemos agrupamentos determinando temáticas de acordo com
os temas mais recorrentes nelas encontrados. Esta classificação prévia serviu de diagnóstico
que, no decorrer da pesquisa, e, com o acompanhamento da fotógrafa Írica, resultou nos temas
que definiram a análise conforme se demonstra no capítulo 4.
Nesse conjunto, a maior concentração de imagens recaiu sobre as fotografias de
casamento, que totalizaram 970 unidades, representando 33% do total das fotografias
encontradas na caixa, ressaltando-se o tamanho 9x12 cm. Os conjuntos de fotografias de
crianças (9,40%), de edificações (9,40%), de festas (10%), de mulheres (8,10%) e de religião
(8,5%) somam mais de 200 fotografias para cada tema e representam 45% das fotografias da
caixa. Os demais temas (família, jovens, esporte, formatura e transporte), contando com o
número de fotografias inferior a 200 fotos por tema, representam 22% das fotos da caixa.
Quanto às dimensões das fotos na caixa, ressalta-se o tamanho 9x12 cm em todos os temas,
podendo ser feita uma exceção às fotos de formatura, fotos que, na sua maioria, apresentam a
dimensão 8x10 cm. As fotografias avulsas encontradas na caixa (fotos p&b) somam 2.962
fotos, reduzidas a 2.356 poses ou cópias e representam 43% do total de todas as fotos. Esse é
um dado significativo no sentido de se poder avaliar que a quantidade de fotos em preto &
branco quase se iguala ao percentual dos registros coloridos. Essa situação também pode nos
reportar ao período de realização dos registros, lembrando que a foto colorida só começou a
ser produzida comercialmente em torno do ano de 1972.
Quadro 3 - Fotos coloridas guardadas em caixa grande. Tamanho da caixa: 30x50 cm
CAIXA FOTOS
AVULSAS
TAMANHOS COR
QUANT
FOTOS
QUANT
POSES
5x5 6x9 8x8 8x10 9x12 10x10 10x15 12X17 NEGATIVOS
ANIVERSÁRIOS - - - 01 10 - 33 - - - Col 44 13
BALÉ - - - - - - 33 - - - Col 33 22
CARNAVAL - 03 - 01 02 - 122 - - - Col 128 122
CASAMENTOS - 03 - - 02 - 16 - - - Col 21 15
CRIANÇAS 06 39 - 75 10 6X8 08 Col 130 98
DIVERSAS - - 51 130 74 - - - 2,3X3 09 Col 255 122
EDIFICAÇÕES - - - - - - 08 - - - Col 08 08
ESCOLA - - - - 18 - 45 - - Col 63 34
ESPORTE - - - - - - 10 - - - Col 10 04
FESTAS - - - 02 01 - 43 - - - Col 46 40
FAMÍLIA - - - - 64 149 59 - - - Col 272 272
FORMATURA - - - - - - 67 - - - Col 67 57
MULHER - - - 03 01 - 75 01 - - Col 80 80
PAISAGEM - - - - - - 05 - - - Col 05 05
RELIGIÃO - - - - - - 39 - - - Col 39 23
TRANSPORTE 06 - - - - - 10 01 - - Col 17 17
TOTAL 06 06 51 143 211 149 640 12 - 27 1218 932
142
No Quadro 3 estão agrupadas as fotografias encontradas na outra caixa de papelão
maior e se trata das fotografias avulsas coloridas. O percentual maior de fotografias recaiu
sobre fotos de família e representa 22% das fotos coloridas, onde sobressai o tamanho 10x10
cm. Na temática “diversos” agruparam-se assuntos variados, como apresentações escolares,
formaturas, família, entre outras, nas dimensões 8x10 cm e 9x12 cm. Trata-se de revelações
em quantidade um pouco menor que as fotos 10x15 cm, que passou a ser o tamanho usual,
atualmente, também chamada foto postal. As fotografias da temática “diversos” são coloridas
e algumas dessas fotos registram datas nas bordas laterais e se referem ao período que vai de
1972 a 1977. Esses dados se cruzam com informações prestadas pela fotógrafa quando se
referiu ao desenvolvimento da foto colorida na região, ou seja, após 1970.
As imagens agrupadas em “diversos”, pela sua forma, enquadramento apresentando
cortes, luminosidade prejudicada, indicam tratar-se de fotografias feitas por fotógrafos
amadores. Existem outras fotos na coleção que indicam a reprodução de filmes feitos por
amadores, o que se percebe pelo assunto e pela figuração da foto, retratando familiares em
momentos diversos de um mesmo passeio, por exemplo.
Quadro 4 - Total geral das fotos
TAMANHOS COR
QUANT
FOTOS
QUANT
POSES
FOTOS
5x5 6x9 8x8 8x10 9x12 10x10 10x15 12X17 18x24 NEG
Quadro 1 - CAIXAS
PEQUENAS
30 639 - 21 158 - 1.721 100 - 151 P&b 2.669 1754
Quadro 2 - CAIXA
GRANDE - P&b
249 275 - 450 1.653 - 49 243 43 - p&b 2.962 2356
TOTAL P&B 279 914 - 471 1.811 - 1.770 343 43 151 p&b 5.631 4.110
Quadro – CAIXA
GRANDE COL
06 06 51 143 211 149 640 12 - 27 col 1.218 932
TOTAL GERAL 275 900 51 594 2.012 170 2.400 355 43 178 - 6.849 5.042
Com relação à dimensão das fotos, o Quadro 4, sobre o total geral das fotos, mostra
que o tamanho 10x15 cm é o que apresenta um maior número de registros, com 35% do total
das fotos. Em seguida, temos os tamanhos 9x12 cm, que representa 29,40%, o tamanho
6x9cm, que representa 13,20% e os demais tamanhos, juntos, representam 22,40% do total
das fotos. As fotos nas dimensões extremas, as menores e as maiores, são as de menor
reprodução, nessa coleção. Enfim, com relação ao uso de cores, cabe ressaltar que as fotos
preto e branco, num total de 82%, são a maioria das fotos da coleção, enquanto que as
restantes, apenas 18%, são coloridas. Conforme salientado anteriormente, as dimensões das
fotografias, assim como as cores e as temáticas, estão relacionadas às condições de produção
fotográfica de uma determinada época. Essas condições se referem, em grande parte, ao tipo
de câmera, aos produtos químicos, às condições de uso da luz, enfim, às condições técnicas
encontradas pelos fotógrafos.
Quadro 5 - Total de Imagens
NEGATIVOS 178
FOTOGRAFIAS 6.849
TOTAL GERAL 7.027
Ao fazermos o levantamento das fotografias, organizamos diversas listas até
chegarmos aos quadros apresentados no decorrer deste trabalho. Assim, ao final, chega-se ao
total geral de imagens da coleção que soma 7.027 documentos. Nessa situação certas fotos
estão reproduzidas várias vezes. Os negativos foram examinados e confrontados com algumas
fotografias e, considerando-se que esses negativos verificados estavam revelados e, ainda, que
se tratava de filmes amadores, esses documentos não mereceram maior análise.
Assim, apresentam-se aqui informações gerais sobre a nossa fonte de pesquisa
acondicionada no baú, tendo presente um quadro geral da cor, da quantidade, da dimensão das
fotos para demonstrar como o conjunto de documentos foi encontrado.
4.2 LUGARES DE MEMÓRIA: FOTOGRAFIAS E FALAS DE UMA FOTÓGRAFA
O nosso trabalho apresentou, até aqui, a coleção de fotografias e de equipamentos
fotográficos do acervo particular preservado por Írica Kaefer, que se constitui do resultado do
trabalho dela e, possivelmente, do trabalho conjunto dos profissionais que atuaram na casa
Kaefer.
145
Embora se reconheça a atuação e a colaboração de vários profissionais no ato de
fotografar, de manusear os produtos químicos, de revelar, de operar as câmaras e de
reproduzir as fotografias, durante o desenrolar das atividades comerciais da Foto Kaefer, cabe
salientar, a opção pelo ato de preservar as imagens produzidas, mas não retiradas, coube à
fotógrafa Írica.
Com relação à fotógrafa, como fragmentos do cotidiano, ela salienta aspectos
relacionados com a arte de fotografar, tais como o pote preto que, contendo o filme e o
regulador, lhe permitia andar para além do estúdio, pois o material colocado no pote preto era
protegido da luz, facilitando o trabalho que, não raras vezes, era complicado, complicação
devida aos cuidados com as dosagens exatas e a outros detalhes exigidos para um bom
trabalho fotográfico.
Ao observar as entrevistas, notamos que a memória da fotógrafa perpassa por muitos
caminhos que mostram lembranças do início da colonização, tais como as estradas de chão e a
sujeira causada pelo pó, a necessidade da “água limpa”, necessidade que levava a fotógrafa a
recorrer aos coadores de pano para obter a água em condições de uso para o laboratório
fotográfico. Cabe mencionar, ainda, a referência feita à coloração das fotos e a relação
comercial da Foto Kaefer com outros centros urbanos. O casal de fotógrafos apresentou
estabilidade econômica, o que foi mostrado pela fotógrafa, conforme mencionamos
anteriormente, pois realizou vários investimentos, além da fotografia. Cabe refletirmos sobre
a preservação de fotografias e de equipamentos pela fotógrafa.
Anateresa Fabris
194
, quanto aos objetos de coleção, fala da relação afetiva entre o
homem e o objeto que é “[...] abstraído de sua função”, tornando-se a coleção “uma tentativa
de reconstituição de um mundo” no qual ele se insere. Entende-se que essas fotografias,
mesmo não tendo sido retiradas após a sua encomenda e ainda pertencendo a uma pessoa
física, formam e integram uma coleção que passou a receber proteção especial da artista que
as produziu e continua a preservá-las. O ato de preservar as fotografias reporta-se à memória
da fotógrafa, que vê, nos registros fotográficos e nos equipamentos preservados, as suas
atividades profissionais e parte da sua vida. Cabe, porém, a pergunta: -- Por que Írica não
preservou aquelas fotos consideradas horríveis, por exemplo? A fotógrafa preferiu jogá-las
fora porque estavam relacionadas com dificuldades e com problemas encontrados no decorrer
das atividades na região e essa realidade ela provavelmente preferiu esquecer e afastar do
mundo em que vive e no qual se insere.
194
FABRIS, Anateresa. A fotografia como objeto de coleção. Anais da Biblioteca Nacional, Rio de Janeiro, v.
117, p. 61, 1997.
146
Apresentaram-se, portanto, em capítulos anteriores, aspectos das fotografias e dos
equipamentos fotográficos do acervo particular de Írica Kaefer que se constituem como
resultado do trabalho dos profissionais que atuaram na Foto Kaefer, destacando-se a atuação
da fotógrafa Írica, no ato de selecionar e de preservar a coleção fotográfica que registrou a
história local, tornando-se a coleção objeto de memória e de patrimônio dessa sociedade
rondonense.
Diante dessas constatações, reportamo-nos a Pierre Nora
195
para dizer que as imagens
dessa coleção não são como objetos “condenados ao esquecimento”, mas fontes possíveis de
análise, pois, “desde que haja rastro, distância, mediação, não estamos mais dentro da
verdadeira memória, mas dentro da história”. Írica registrou, descartou, selecionou e
preservou um significativo conjunto documental referente à história regional que revela, em
imagens, uma relação com a construção social da região e o seu projeto de desenvolvimento e
inovações tecnológicas.
Pierre Nora também entende que “a memória é a vida, sempre carregada por grupos
vivos e, nesse sentido, ela está em permanente evolução, aberta à dialética da lembrança e do
esquecimento, inconsciente de suas deformações sucessivas, vulnerável a todos os usos e
manipulações, susceptível de longas latências e de repentinas revitalizações”. Diante dessas
situações, pode-se entender a criação fotográfica de Írica como suporte de memória. À medida
que essa criação se constituiu, nessa medida gerou uma evolução da memória sobre a Foto
Kaefer e, nas “caixas do depósito”, a memória se fez latente e revitalizadora, marcada por
uma distância porque recolheu “rastros”, marcas de um tempo.
Em torno da dinâmica da constituição da coleção, a fotógrafa registrou, reuniu e
preservou um acervo que se constituiu de 7.027 imagens, entre outros documentos textuais e
equipamentos fotográficos. Quanto à gestão desses documentos, percebe-se que há uma
preocupação em guardar os objetos, embora não tenham os registros visuais recebido trato
arquivístico adequado. Quanto às câmaras, estas estão higienizadas e expostas em uma sala de
visitas, na casa da fotógrafa. O fato de ser redirecionado o foco da função das fotografias da
coleção, isso nos leva a mencionar estudo de Krzysztof Pomian
196
que, ao definir o conceito,
lembra que é preciso evidenciar um paradoxo relacionado a esse conceito, que assim é
resumido: “Numa palavra, e é este o paradoxo, têm um valor de troca sem ter um valor de
uso...”, pois saíram do circuito econômico para permanecerem guardadas, protegidas e
“expostas ao olhar” de familiares e de alguns admiradores.
195
NORA, op. cit., p. 9.
196
POMIAN, op. cit, p. 51-86.
147
Percebendo a fotografia como objeto de coleção, as pesquisadoras Vânia Carneiro de
Carvalho e Solange Ferraz de Lima
197
apontam que a prática de colecionar objetos está
vinculada a colecionadores particulares e a instituições. As pesquisas apontam que coleções
particulares estão muito voltadas a “efeitos estéticos” e a formas de lazer e que as estratégias
do colecionismo particular se relacionam com as institucionais. “Se a produção e o
gerenciamento de coleções aproximam as duas experiências, os objetivos diversos
(lazer/trabalho) deveriam fazer divergir o processo institucional daquele particular, o que por
vezes não acontece”. As autoras mencionadas chamam a atenção no sentido de que o
pesquisador precisa perceber que cada forma de coleção possui uma “dinâmica própria”. No
nosso caso, mostram-se os cuidados demonstrados para com a coleção de fotografias, vista
como uma coleção particular.
Paulo Knauss
198
, referindo-se à arte e à prática de colecionar, entende a arte como
“fato da história política, confunde história da imagem artística com a história do poder
simbólico”, sendo que “as práticas contemporâneas de colecionar são dependentes da
constituição de um mercado livre de circulação e de mercadorias”. Dessa forma, pode-se
entender que, no caso da coleção de Írica Kaefer, a constituição do acervo deve ser
relacionada com a dinâmica social do lugar e do tempo em que ocorre: ou seja, “na
confluência e entrelaçamento” dos agentes, da vinculação com a realidade em que vivem e
com as instituições a que servem.
Neste sentido, entende-se que as “caixas do depósito” de Írica Kaefer se constituem,
segundo indica Pierre Nora
199
, como lugares de memória “nos três sentidos da palavra,
material, simbólico e funcional, simultaneamente, somente em graus diversos”. A seguir,
mostram-se, portanto, aspectos da análise feita a partir das observações realizadas.
No que se refere ao aspecto material, “por seu conteúdo demográfico”, a
documentação selecionada e preservada, investida de informações, e que passou a fazer parte
do acervo de Írica, constitui-se em suporte da memória coletiva que reforça elementos
formadores de identidade, visto que “só é lugar de memória se a imaginação o investe de uma
áurea simbólica”, como quer ser o gesto da fotógrafa. É no acervo documental de Írica Kaefer
que uma identidade local poderá estar se evidenciando e se (re)constituindo através das
lembranças e das rememorações dos acontecimentos e experiências que a fotografia poderá
mostrar e valorizar. Sob o aspecto do seu conteúdo, essas fotos são lugares de memória
197
LIMA; CARVALHO, op. cit., p. 17.
198
KNAUSS, 2001, op. cit., p. 40.
199
NORA, op. cit., p. 21.
148
também, por representam o trabalho realizado por um grupo de profissionais, profissionais da
fotografia.
Michael Pollak
200
destaca elementos constitutivos da memória como sendo “os
acontecimentos vividos pessoalmente” e os “vividos pelo grupo”, razão por que se percebe
que há uma relação marcante entre memória e a coleção de objetos guardados e sempre
lembrados por Írica. Nesse sentido, entende-se, ainda, a exemplo de Ulpiano de Menezes
201
,
que a participação e a atuação de agentes familiares, numa “atuação do presente”, levaram à
“rememoração” de acontecimentos que se efetivaram e passaram a participar da memória da
fotógrafa Írica, que, através de ações do presente, tais como seleção e descarte, vai
(re)constituindo memórias, mostrando os “agentes e suas práticas”.
No que se refere ao aspecto funcional, isto é, “só entra na categoria se for objeto de
um ritual”
202
, entende-se que as disputas em torno da definição do que deverá ser preservado
ou descartado numa sociedade e o sentido em torno da seleção e preservação que levou à
acumulação de fotografias sobre o Oeste do Paraná, por parte de Írica, são frutos de um ritual
que se cristaliza “na lembrança e sua transmissão”
203
, do que decorre que o conjunto
selecionado se torna um lugar de memória, pois é fruto de práticas realizadas por um
profissional da fotografia, profissional que pode ser visto como indivíduo pertencente a um
grupo – grupo que considera importante lembrar e rememorar. Verifica-se que o ato de reunir
e preservar documentos produzidos por ação da fotógrafa e o fato de destinar-lhes um espaço
específico tornam-se uma dominante funcional de lugar de memória, o que se justifica pela
participação dessa pessoa nas atividades desenvolvidas em General Rondon em torno da
prática de fotografar.
Finalmente, como destaque ao aspecto simbólico dos lugares de memória, a
documentação fotográfica preservada por Írica Kaefer pode ser ressaltada. Ela se efetua
“simbólica por definição, visto que caracteriza, por um acontecimento ou uma experiência
vividos por um pequeno número, uma maioria que deles não participou”
204
. A rememoração
do passado através da valorização dos fotógrafos que auxiliaram nos trabalhos, percorrendo o
interior da região para atender aos pedidos, a intenção de guardar vestígios dos recursos
técnicos utilizados, lembrar-se das dificuldades encontradas para a aquisição de materiais e
dos retornos econômicos proporcionados pelos investimentos na área e, principalmente, a
200
POLLAK, op. cit. p.
201
MENEZES, Ulpiano T. Bezerra de. A história, cativa da memória? Para um mapeamento no campo das
Ciências Sociais. Revista do Instituto de Estudos Brasileiros, São Paulo, v. 34, 1992.
202
NORA, op. cit., p. 21.
203
Idem, p. 22.
204
Idem, ibidem.
149
intenção de manter viva parte das imagens registradas através da Foto Kaefer, são lugares
simbólicos a considerar.
Como indica Pomian, os objetos de coleção “participam no intercâmbio que une o
mundo visível e o invisível”
205
. Considerada suporte da memória, a fotografia está “aberta à
dialética da lembrança e do esquecimento”
206
, porque existe sempre uma atividade dinâmica
em torno da coleção, através da reunião gradativa, e talvez silenciosa, de fotos por parte de
Írica, que a mesma guardava nas “caixas do depósito”, também lugares de memória, mesmo
que misturados junto a outros objetos pessoais da família. Ali, armazenadas em caixas de
papelão, não exigiam maiores recursos financeiros, técnicos e de material de preservação
destinado à constituição de Arquivos Especiais
207
, como são designados os arquivos
fotográficos. Diante da dificuldade quanto aos investimentos em recursos humanos, Írica se
encarregava de tratar da coleção com atenção e cuidado.
A coleção possui uma dinamicidade própria, porém não está diretamente disponível
para a sociedade, mas tem uma função a ser percebida pelos pesquisadores, uma vez que “o
historiador é aquele que impede a história de ser somente história” e deve se colocar “diante
da mesma oficina, mas para uma outra obra”
208
, uma história reconstruída, descontínua como
se entende o nosso desafio.
Le Goff
209
escreve que todo documento é monumento, porém “Só a análise do
documento enquanto monumento permite à memória coletiva recuperá-lo e ao historiador usá-
lo cientificamente, isto é, com pleno conhecimento de causa”. Írica, ao preservar os
documentos, à sua maneira está fazendo a sua parte. As principais dificuldades talvez estejam,
portanto, relacionadas com os historiadores, dificuldades no sentido de perceber a relação do
ato de preservar uma coleção particular com o sentido dessa fonte para a história.
As fotografias integram o patrimônio histórico relacionado a um espaço de ocupação e
de colonização recente, à organização social e à cultura fotográfica realizada nessa região. A
preservação é uma demonstração da atuação da fotógrafa Írica que, através da sua atitude, faz
das fotografias instrumentos de acesso ao mundo invisível através da linguagem do olhar e da
interpretação. Essa atitude pode ser associada ao lugar simbólico relacionado ao ato de
205
POMIAN, op. cit., p. 66.
206
NORA, op. cit., p. 9.
207
Sobre arquivos especiais, situação onde se enquadram os documentos visuais e se enquadram as fotografias,
ver: BELLOTTO, Heloisa Liberalli. Arquivos permanentes: tratamento documental. São Paulo: T. A.
Queiroz, 1991; BURGI, Sergio. Introdução à preservação e conservação de acervos fotográficos: técnicas,
métodos e materiais. Rio de Janeiro: FUNARTE, 1988; PAES, Marilena Leite. Arquivo: teoria e prática. 2.
ed. Rio de Janeiro: Ed. da FGV, 1991.
208
NORA, op. cit., p. 21.
209
LE GOFF, op. cit., p. 545
150
reavivar a memória e de evidenciar aspectos de uma comunidade que, através de ato de se
fotografar, elegeu a sua participação na construção social. Muitos integrantes do grupo e da
comunidade não tiveram, porém, a oportunidade de ver as suas poses e de levar os seus
registros para junto de si. Não podendo estar expostas em porta-retratos na casa dos
figurantes, talvez minorias sociais, naquele contexto, continuam como que aprisionadas nas
“caixas do depósito” de Írica. Coleções podem ser entendidas como “lugares de memória” à
medida que são “[...] Sinais de reconhecimento e pertencimento de grupo numa sociedade”
210
.
A elaboração de uma narrativa sobre as fotografias de Írica Kaefer e os aspectos que
acompanham essa trajetória se renovam e se complementam a cada exercício de olhar, de
rememorar falas e imagens sobre as “caixas do depósito”.
A função dos objetos de coleção, conforme Pomian
211
, necessariamente se efetua ao
“passar pela linguagem” que se concretiza “sobretudo ao olhar”. Diante dessa constatação, a
sociedade se organiza e proporciona um tempo específico para que alguém possa até “mesmo
produzir objetos que representem o invisível”, como se pode entender as fotografias. As ações
de preservar e, algumas vezes, de retornar às “caixas do depósito” para atender alunos em
pesquisa, podem levar a rememorações e à “referência ao invisível”. As fotografias integram
o patrimônio histórico relacionado a um espaço de ocupação e de colonização recente, à
organização social e à cultura fotográfica realizada nessa região. A preservação é uma
demonstração da atuação da fotógrafa Írica, que, através da sua atitude, faz das fotografias
instrumentos de acesso ao “mundo invisível” através da linguagem do olhar e da
interpretação.
Essa atitude pode ser associada ao lugar simbólico relacionado ao ato de reavivar a
memória e de evidenciar aspectos de uma comunidade que, através de ato de se fotografar,
elegeu a sua participação na construção social
Aspectos demonstrados neste item do trabalho estabelecem uma experiência que se
constitui como prática de produção social de sentido. Enfim, a análise sobre as fotografias do
acervo de Írica Kaefer e os aspectos que acompanham esta trajetória integram o próximo
capítulo.
210
NORA, op. cit., p. 13.
211
POMIAN, op. cit., p. 69-71
5 A ORGANIZAÇÃO DA DOCUMENTAÇÃO EM TEMAS FOTOGRÁFICOS
5.1 A CONSTRUÇÃO DOS TEMAS
No quarto momento da pesquisa, apresenta-se a construção dos temas e as respectivas
séries e subséries fotográficas analisadas, utilizando-se a produção guardada e preservada pela
Foto Kaefer. Empregando, portanto, metodologia indicada por Ana Mauad, caracterizam-se as
séries fotográficas a partir dos elementos culturais que estas séries compõem para
compreender as escolhas e as opções feitas pelos fotógrafos diante dos diferentes assuntos
registrados e a mensagem fotográfica sobre o espaço oestino registrada nas imagens.
Compreende-se que essas escolhas se efetivaram na definição dos equipamentos e das
técnicas, dos temas, dos sujeitos, dos lugares e dos outros elementos que levaram ao resultado
obtido pela composição fotográfica.
Conforme apresentamos no capítulo anterior (Quadro 5), o diagnóstico sobre a coleção
das “fotografias do depósito” mostrou que a coleção está constituída de 178 negativos em
preto e branco e de 6.849 fotografias, totalizando 7.027 documentos, entre outros documentos
textuais, equipamentos e objetos. Os negativos foram examinados e confrontados com
algumas fotografias e, considerando-se que esses negativos verificados estavam revelados e,
ainda, que se tratava de filmes amadores, esses documentos não merecem maior análise. Após
esse diagnóstico foram definidos os temas analisados. Os temas estabelecidos nos quadros
iniciais foram estruturados seguindo-se orientações da arquivística no que diz respeito ao
“princípio de origem” dos documentos. Apontou-se o que se encontrava dentro de cada caixa,
procurando não perder a ordenação original feita pela instituição de origem, ou seja, uma
instituição privada, no caso, a Foto Kaefer. A forma como vinham sendo guardados os
documentos, em diferentes caixas de papel e caixinhas de fotos, estava relacionada a alguns
aspectos em torno da guarda adotada pela mesma, aspectos como datas ou períodos
152
específicos, fotos de um mesmo evento, etc. Assim as fotos das três caixas de papelão foram
colocadas em pastas suspensas enumeradas e as fotos retiradas para análise foram enumeradas
no verso, recebendo o número da caixa ou do envelope de origem.
Em momento posterior da organização do material reexaminamos também a coleção
para apurar possíveis fotos ainda com exemplares repetidos ou com fotos de amadores, o que
recebeu também o olhar e a confirmação de Írica, a qual indicava o motivo por que a foto era
profissional ou era de autoria de amador. Detalhes como o enquadramento, a iluminação,
figurantes, a borda das fotografias, dentre outros aspectos, auxiliaram na definição dessa
organização. Foi dessa maneira que se conseguiu definir o corpus documental desta pesquisa
com relação à coleção de fotografias preservadas pela fotógrafa Írica Kaefer.
A partir dessa ordenação, estabeleceu-se e reuniu-se, para a pesquisa, uma unidade
fotográfica de cada registro efetuado, evitando-se trabalhar com uma quantidade de
documentos repetidos e/ou assemelhados que, em termos de elementos culturais, não
acrescentaria novidades e só duplicaria informações desnecessariamente. Após esse
ordenamento, foram definidos os temas e as quantidades de fotografias a serem trabalhados na
pesquisa.
Nesse sentido, a partir das temáticas levantadas, foram definidas as séries e as
subséries a seguir especificadas e foi atribuída uma quantidade de fotografias a serem
analisadas da seguinte forma: Para cada série ou subsérie de até 50 fotografias foi
estabelecido trabalhar com um conjunto de até três fotografias e, para a série ou subsérie com
mais de 50 fotografias, foi estabelecido trabalhar com cinco fotografias. Justifica-se esta
metodologia por entender que as temáticas percebidas estão contempladas para análise através
das diferentes séries e subséries fotográficas definidas e através das quantidades atribuídas
para estudo.
A definição da quantidade de documentos para análise a partir de amostragens serviu
para aprofundar melhor a análise dos conteúdos das imagens, considerando-se o elevado
número de fotografias encontradas na coleção. De todo modo, interseções ocorreram entre as
fotografias eleitas para análise com demais exemplares da coleção, situações em que se sentiu
a necessidade de ampliar ou de especificar as discussões.
Os assuntos levantados foram agrupados em temas e as fotos foram contadas, dentro
de cada tema, resultando na classificação que se demonstra no quadro que segue:
153
Quadro 6 - Total Geral de Fotografias e Totais Analisados
TEMAS
FOTOS
P&B
FOTOS
ANALISADAS
P&B
FOTOS
COLOR
FOTOS
ANALISADAS
COLOR
Vistas locais e paisagens 121 11 23 3
Retratos 679 69 79 5
Religião 955 57 40 3
Produção 117 17 2 2
Tragédias 103 16 - -
Esporte 74 11 - -
Festividades 284 21 73 5
Educação 133 11 143 5
Civismo 93 11 57 5
Total Geral 2.559 224 417 28
O Quadro 6 é uma síntese dos temas organizados e apresenta quantidade de fotos
distribuídas para cada tema e a totalidade de fotos consideradas para a análise, ou seja, das
2.559 fotografias originais da coleção foram definidas, por amostragem, 224 fotografias preto
e branco para a análise. A totalidade das fotos coloridas resultou em 417 imagens e desse
grupo foram eleitas, por amostragem, 28 fotografias para a análise.
A definição das temáticas não significa que as fotografias eleitas para determinado
tema tenham única e exclusivamente a ver com tal tema. As fotos definidas para determinado
tema não têm um limite, uma linha ou um indicador específico que as defina, de forma
fechada, para um tema ou outro, pois os assuntos retratados nas fotografias são inter-
relacionados.
5.2 DESENVOLVIMENTO DA ANÁLISE
A partir desta parte do trabalho passa-se a apresentar a análise do material de pesquisa.
Para auxiliar a compreensão e dar uma maior visibilidade aos elementos culturais apurados,
algumas informações serão demonstradas através de quadros, incluídas ao texto ou, anexas ao
final do trabalho (Anexo 6). O anexo 6 é uma síntese, em forma de quadro, dos elementos
levantados em torno da forma da expressão. Os elementos da forma do conteúdo são
apresentados no decorrer do texto.
154
5.2.1 O ESPAÇO FOTOGRÁFICO
5.2.1.1 A Agência Produtora e o Período de Produção
Considerando tratar-se aqui da coleção de fotografias preservadas de Írica Kaefer, a
agência produtora dessas fotografias é a própria casa fotográfica Foto Kaefer, que foi de
propriedade do casal Oscar e Írica Kaefer, conforme se expôs no Capítulo 2 deste trabalho. Há
que se ressaltar, no entanto, que a autoria das imagens não é necessariamente de um ou de
outro proprietário, pois com eles trabalhavam outros fotógrafos, os empregados auxiliares.
Assim, nem todas as fotografias tiveram sua autoria identificada no conjunto da coleção,
porém, sempre que isso se fez possível, com o auxílio de Írica e quando a segurança nesse
sentido era demonstrada, atribuiu-se a autoria das fotos selecionadas para a pesquisa. As
fotografias se referem ao período estabelecido para a pesquisa, que gira entre o ano de 1954
até o ano de 1990, quando a casa efetivamente encerrou suas atividades.
Com relação à habilitação dos fotógrafos, eles foram profissionais, pois tanto o casal
quanto os seus auxiliares eram pessoas com experiência na área. Eventualmente, uma ou outra
fotografia do conjunto em análise pode ser de um fotógrafo amador visto que a casa também
revelava fotografias a partir de filmes clicados pelos próprios clientes. Faz-se esta observação
com liberdade e respeito, para que nenhuma injustiça seja cometida quanto à autoria das
fotografias apresentadas neste trabalho.
A questão relacionada à segurança quanto à autoria das fotografias remete também aos
aspectos do campo do conteúdo fotográfico -- a identificação e a descrição dos elementos que
contêm as fotografias. Assim como algumas pessoas ou espaços foram identificados com
tranquilidade por Írica ou por parte de outras pessoas entrevistadas, uma quantidade
significativa de fotos preservadas não pôde ser identificada. Lamentavelmente locais, pessoas,
eventos, atividades registradas não puderam mais ser reconhecidos... Espaços foram
modificados, pessoas não são mais vistas, alguns eventos registrados já se passaram
décadas. Aquelas pessoas que jogavam, dançavam, desfilavam, os professores ou alunos, os
trabalhadores, os noivos e seus familiares, os fiéis, enfim, todos cresceram e aqueles
retratados tiveram suas fisionomias alteradas e nem tudo a memória da depoente reconhece.
Írica, nossa principal “informante”, certamente guardou o que pôde dos registros feitos
e não retirados, das amostras, dos copiões e, mesmo não sendo possível identificar os
documentos na totalidade, esforçou-se e lamentou quando lembrava vagamente de algumas
155
pessoas, “mas o nome, olha, não consigo chegar lá”
212
, dizia. São registros, contudo. Na
representação desses documentos, ações, momentos, locais, a vida permanecem. A
dificuldade na identificação das pessoas, por exemplo, pode estar relacionada ao fato de que,
na fotografia, ninguém envelhece. Fixada ali no papel, através da ação do fotógrafo, a idade
da pessoa é a mesma que ela apresentou no momento do clic. Ao olhar-se, hoje, uma
fotografia, a fisionomia da pessoa permanece a mesma da época passada. Ocorre que, no vai e
vem das lembranças, no decorrer do próprio tempo, aspectos da vida real se modificam e, no
presente, nem tudo é acompanhado pela memória. Apesar desses lapsos, reconhece-se o valor
dos registros e da sua guarda. Assim, dá-se continuidade aos demais itens da análise em torno
dos elementos da forma da expressão.
5.2.1.2 Tamanho e formato
Quadro 7 – Tema “Vistas, Locais e Paisagens”
Série Tamanhos
P M G
Formato
3x4 6x9 8x10 9x13,5 10x15 12x17
Vistas urbanas 04 01
Vistas rurais 01 01 01
Espaço externo
Paisagens 01 01 01
Total 02=18% 07=64% 02=18%
O tamanho e o formato para o tema “Vistas, Locais e Paisagens”, num total de 11
fotos, apresentou 64% das fotos no tamanho médio e 18% para os tamanhos pequeno e
também grande. Nesse sentido, para esse tema há um predomínio para o tamanho médio das
fotos, nas dimensões 9x13,5 cm. No tamanho pequeno, 6x9 cm, e no tamanho maior, 12x17
cm, temos apenas dois registros, para ambos os casos.
Guardando as suas diferentes dimensões, as fotos estudadas apresentam formato
retangular.
212
KAEFER, 03 maio 2009, op. cit.
156
Quadro 8 – Tema “Retratos”
Série Tamanhos
P M G
3x4 6x9 8x10 9x12,5 9x13,5 10x15 12x17
Quant.
de fotos
Formato
P&B P&B P&B P&B P&B P&B P&B P&B
Retrato mulher 07 07 09 23
Retrato homem 02 01 09 12
Retrato família 08 06 14
Retrato crianças 02 03 14 01 20
Total 02 10 10 40 07 69
Total geral 12=18% 50=72% 7=10% 100%
O tema retratos é constituído de 69 fotografias e um total de 72% dessas fotos foram
feitas no tamanho médio, sendo que 10 fotos medem 8x10 cm e 40 medem 9x13,5 cm. Para o
tamanho pequeno temos 18% das fotos e para o tamanho grande (12x17 cm) 7% das fotos.
No tamanho pequeno temos apenas duas fotos 3x4 cm. Este tamanho de foto, além de
ser produzido para fazer o título de eleitor, muitas vezes era usado para presentear amigos ou
namorados. No conjunto da coleção, essas fotografias quase não aparecem, pois se tratava de
fotos para documentos, sendo retiradas pelos clientes quase totalmente.
Quadro 9 – Tema “Religião”
Série TAMANHOS
P M G
3x4 6x9 8x10 9x9 9x12,5 9x13,5 10x15 12x17 20x25
Quant.
Fotos
Formato
P&B P&B P&B P&B P&B P&B P&B P&B P&B P&B
Casamento 02 21 09 32
Comunhão 01 15 03 19
Batismo 03 03
Morte 03 03
03 42 57
Total
45=79% p&b 12=21% p&b 100%
O tema “Religião” é constituído de 57 fotografias. Desse total, 79% estão no tamanho
médio, sendo que apenas 3 fotos medem 8x10 cm e 42 medem 9x13,5 cm. Para o tamanho
pequeno não temos registro nesse tema e para o tamanho grande (12x17 cm) temos 12 fotos.
As fotos com tamanho grande são fotografias de casamento e de comunhão. Os registros são
do grupo familiar convidado para os casamentos e, no caso da comunhão, das crianças que
participaram desta celebração e receberam o sacramento. Tratando-se de eventos especiais,
algumas fotos foram ampliadas, no entanto todas as séries do tema “Religião” são de
momentos especiais, mas predomina o tamanho 9x13,5 cm.
Cabe ressaltar-se, aqui, que, no conjunto das fotos de casamentos (não incluídas na
análise) encontram-se 87 fotos pequenas, tratando-se de algumas cópias produzidas como
modelo e usadas para as pessoas poderem fazer as escolhas e definir a encomenda. Considera-
157
se interessante esta última observação, pois mostra que, na coleção das fotos de Írica,
inclusive copiões foram guardados.
Quadro 10 – Tema “Produção”
Tamanhos
P M G
Formato
6x9 9x9 8x10 9x13,5 9x12,5 12x17
Série P&B P&B P&B P&B P&B P&B
Caça e Pesca 01 02
Agricultura 03
Indústria 01 01 01
Comércio 01 02
Espaço
externo
Transportes 05
Total 02=12% 01=6% 13=76% 01=6%
O tema “Produção” constitui-se de 17 fotografias. Destas, 76% estão no tamanho
médio, sendo que apenas 1 foto mede 8x10 cm e 13 medem 9x13,5 cm. Para o tamanho
pequeno temos 12% dos registros e, para o tamanho grande, apenas 1 foto, que representa 6%
do tema.
Quadro 11 – Tema “Tragédias”
Tamanhos
P M G
Formato
3x4 6x9 8x10 9x13,5 10x15 12x17
Série P&B P&B P&B P&B P&B P&B
Espaço interno Enforcamentos 02
Acidentes de trânsito 05
Enforcamentos 01
Acidentes motosserras 02
Temporais 03
Espaço externo
Acidentes diversos 03
Total 16=100%
Para o tema “Tragédias”, constituído de 16 fotografias, um único tamanho é
apresentado, pois todas as fotos foram feitas no tamanho médio, na dimensão 9x13,5 cm,
totalizando as séries deste tema 100% na mesma dimensão.
Quadro 12 – Tema “Esportes”
Tamanhos
P M G
Formato
3x4 6x9 8x10 9x13,5 10x15 12x17
Série P&B P&B P&B P&B P&B P&B
Espaço externo Jogadores e
times futebol
05
Espaço externo
e interno
Futebol
Damas do
futebol
01 02
Total 01 05 02
Espaço externo Ciclismo 03
Total 09=82% 02=18%
158
O tema “Esportes” é constituído de 11 fotografias. Destas, 82% estão no tamanho
médio, sendo uma foto 8x10 cm e 8 fotos no tamanho 9x13,5 cm. Duas fotos estão no
tamanho grande (12x17 cm), o que representa 18% da série “Esportes”.
Quadro 13 – Tema “Festividades”
Tamanhos
P M G
Formato
3x4 6x9 8x10 9x12,5 9x13,5 10x15 12x17
Série P&B P&B P&B P&B P&B P&B P&B
Carnaval 02 01
São João 01 02
Festas 01 04
Espaço interno
Bailes 05
Total 01 03 12
Espaço externo Festas 01 01 02 01
Total 01 01 02 01
Total geral 02=10% 18=85% 01=5%
O tema “Festividades” é constituído de 21 fotografias. Destas, 85% estão no tamanho
médio, sendo quatro fotos 8x10 cm e 18 fotos no tamanho 9x13,5 cm. Duas fotos estão no
tamanho pequeno e uma foto no tamanho grande (12x17 cm).
Quadro 14 – Tema “Educação”
Tamanhos
P M
Formatos
3x4 6x9 8x10 9x12,5 9x13,5 10x15
Série P&B P&B P&B P&B P&B P&B
Educação infantil 03
Educação de adultos 01 04
Cursos de qualificação 03
Total 01 10
Total geral 11=100%
Nas fotografias do tema educação encontra-se uma foto na dimensão 8x10 cm e 10
fotos na dimensão 9x13,5 cm, definindo-se para o tamanho médio 100% das fotos do tema
educação.
Quadro 15 – Tema “Civismo”
Tamanhos
P M
Formato
3x4 6x9 8x10 9x12,5 9x13,5 10x15
Série P&B P&B P&B P&B P&B P&B
Espaço externo e
interno
Evento político 01 04
Total 01 04
Sete de Setembro 03
Espaço externo
Aniversário do município 03
Total 06
Total geral 11=91%
159
O tema “Civismo” é constituído de 11 fotografias e a dimensão delas se concentra
100% no tamanho médio, ou seja, uma foto tamanho 8x10 cm e 10 fotos no tamanho 9x13,5
cm.
5.2.1.3 Tipo da foto
O item tipo da foto está distribuído entre foto posada e foto espontânea. No quadro que
segue, apresenta-se uma síntese dessas variáveis.
Quadro 16 – Tipo da Foto
TEMAS Posada p&b Instantânea p&b
Vistas Locais e Paisagens 03=27% 8 s/f=73%
Retratos 69=100%
Religião 57=100%
Produção 15=88% 02 s/f=12%
Tragédia 16=100%
Esporte 07= 64% 04=36%
Festividades 20=95% 1=5%
Educação 11=100%
Civismo 10=91% 01=9%
Total - 224 fotos 192=86% 32=14%
No item tipo da foto, para o tema “Vistas Locais e Paisagens”, em três fotos encontra-
se o tipo posada, que soma 27% das fotos. Assim, uma foto das vistas rurais e uma sobre
paisagem trazem pessoas e as demais fotos deste tema (73%, ou seja, 8 fotos) são registros
sem figuração (s/f). Nesse caso, trata-se de vistas gerais feitas sobre a cidade e podem ser
aéreas ou não.
As fotografias do tema retratos foram todas feitas posadas. Ocorre, para esse tipo de
foto, uma intencionalidade específica, desde a decisão tomada no sentido de se fotografar
como no momento do retrato em si, tanto para as fotografias feitas em estúdio como para
aquelas feitas em espaços externos.
O tema “Religião” apresenta o tipo de foto posada, nas 57 fotos, alcançando esse tipo
de registro também 100% das fotos. São fotos de casamentos, de comunhão, de batismo e
sobre morte. Independente do local, nessas fotos, seja no grande grupo ou individual, há
preparação para a pose.
A situação mostra que as fotos sobre o religioso são fotos ensaiadas, estáticas, e que,
nessa rigidez, buscam a qualidade técnica. No caso, havendo o arranjo e o enquadramento
bem definidos, isso auxilia na finalização do registro. O registro do casamento, por exemplo,
160
desde o seu ensaio até a finalização da foto, procura a qualidade máxima, a exatidão,
passando a ter um valor documental.
No tema produção econômica temos 15 fotografias, que representam 88% das fotos
deste tema, para o tipo foto posada. Junto com as pessoas, a atividade, o fruto do trabalho é
exibido e registrado. Apenas duas fotos, 12 % desse tema, são instantâneos e sem figuração,
mostrando estrutura física de atividades com serraria e olaria.
O item tipo da foto nas 16 fotos para o tema tragédias recaiu 100% no tipo
instantâneo. Trata-se de pessoas mortas por enforcamento, por acidente de trânsito ou por
motos-serra e fotos de temporais. Essas situações levaram ao registro dessas fotos.
No tema “Esporte”, 7 fotos situam-se como posadas (64% da série) e 4 fotos (36%)
são fotos instantâneas. A pose dos jogadores dos times de futebol pode ser considerada uma
questão intrínseca ao jogo. Sejam perdedores ou ganhadores no jogo, a foto dos jogadores,
com seu técnico, é imprescindível. Momento interessante é a fotografia das senhoras e jovens
que acompanham o movimento em torno dos campeonatos. Para elas também há momento de
pose. As fotografias instantâneas referem-se a algumas tomadas mais amplas, envolvendo
jogadores, público, espaço esportivo, durante eventos esportivos.
No tema festividades, 20 fotos (95% delas), são registros em que a pose, às vezes
indiscreta, é captada. São jovens sentados ao redor de alguma mesa, são casais dançando, mas
que sabem que ali, naquele lado do salão, o fotógrafo está posicionado, e cruzam, dançando,
num disfarce de pose que se torna registro. Apenas uma foto deste tema é um instantâneo, na
nossa percepção.
Para o tema “Educação” não há fotografia com tomada espontânea. O tema, nas 11
fotos, é caracterizado, em 100% dos registros, pelo tipo de foto posada.
Para “Civismo”, 10 fotos (91%) são posadas. Apenas uma foto se refere a um
instantâneo. Entende-se que o desfile, em si, é uma exibição. É o colégio que se faz presente e
quer ser notado e são os professores, administradores e alunos que, através dos desfiles,
querem mostrar seu patriotismo e cumprir com o dever à pátria. Nesse ato de mostrar-se, a
pose se faz através da marcha, da rigidez no alinhamento das filas, da descontração em algum
momento de parada, onde a posição de sentido ou a de descansar é captada pelo fotógrafo. De
um modo geral, nos desfiles, não referindo-se somente aos cívicos e, onde a intenção
primeira não tenha sido a programação de uma pose, acredita-se que, por se tratar de um
momento festivo, já é presumido a presença de um fotógrafo no local o que faz com que
figurantes criem um disfarce de instantâneos que se entende como poses.
161
5.2.1.4 Enquadramento
Quanto ao enquadramento, esse item foi dividido nas seguintes partes: enquadramento
I e II, referente a sentido e direção; enquadramento III, referente à distribuição dos planos e
enquadramento IV, referente ao arranjo e equilíbrio. As informações levantadas podem ser
apresentadas, dentro de cada tema, de acordo com as diferentes variáveis, conforme indica o
quadro:
Quadro 17 – Enquadramento I e II – sentido e direção
DIREÇÃO
ESQUERDO CENTRO DIREITO
Temas Sentido
P&B P&B P&B P&B P&B
Horizontal 11 04 01
Vistas locais e paisagens
Vertical
Horizontal 23
Retratos
Vertical 46
Horizontal 02 18 04
Religião
Vertical 01 32
Horizontal 14 01 01
Produção
Vertical 03
Horizontal 03 10 01 06
Tragédia
Vertical 02
Horizontal 10 01
Esporte
Vertical
Horizontal 01 12 02 02 01
Festividades
Vertical 06
Horizontal 06 05
Educação
Vertical
Horizontal 11 04
Civismo
Vertical
TOTAL = 224
H=134=60%
V=90=40%
07 204 13 13 07
Observando-se os dados levantados sobre as características em relação ao sentido e
direção, obtêm-se diferentes significados nas suas representações. Segundo Mauad
213
,
“representar é relacionar um significado explícito a uma cadeia de significados subjacentes” e,
para a atribuição de significados às variáveis levantadas, este trabalho guia-se nas indicações,
ou “seqüências-chave” apresentadas por essa autora, a qual, para tanto, se baseia em estudos
sobre composição fotográfica
214
, onde indica o que segue:
213
MAUAD, Sob o signo, 1990, op. cit. (ver cap. III, p. 8).
214
Segundo Mauad, 1990, op. cit, p. 8 Cap. III. “Inter-relações semelhantes aparecem em revistas de fotografia
que desenvolvem estudos sobre composição fotográfica”. REVISTA Photocamera, São Paulo, Ano I, n. 8,
1980. Ver também: OSTROWER, Fayga. A construção do olhar. In: O OLHAR: vários fatores. São Paulo:
Companhia das Letras, 1989. p. 175-177. ECO, Umberto. Tratado geral de semiótica. São Paulo:
Perspectiva, 1980. p. 185
162
Horizontal: chato, uniforme, nivelado, igual, monótono ligado às idéias de
estabilidade, manutenção e permanência.
Vertical: ereto, tenso, esticado, a pique, ligado às idéias de movimento, ascensão e
hierarquização.
Direita: justa, reta, correta, ligada às idéias de ordenação e aceitação.
Esquerda: impreciso, incorreto, desajustado e torto, ligado às idéias de desordem,
desarmonia e desagregação.
Centro: meio, foco, alma, núcleo, eixo ligado às idéias de concentração, união,
harmonia e confluência.
Considerando-se o enquadramento no que se refere ao sentido da foto, percebe-se um
predomínio para o sentido horizontal que soma 134 fotos, representando essa parte 60% das
fotos. No sentido horizontal temos todas as fotos sobre as vistas da localidade e paisagens,
esporte, educação e civismo e quase a totalidade das fotos sobre produção econômica e
tragédias. O que representa essa opção fotográfica? O sentido horizontal mostra uma busca de
estabilidade e de permanência do evento representado. Esses percentuais indicam que, ao se
representar a cidade, nas vistas aéreas, por exemplo, procura-se mostrar que, na medida em
que o espaço onde muitas famílias se estabeleceram se amplia, uma infraestrutura vai se
formando e acompanhando o planejamento inicial apresentado pela colonizadora. As ruas
receberam iluminação elétrica, calçadas, asfaltos, arborização. A foto no sentido horizontal
amplia esse horizonte. Assim, para além da beleza avistada, certa segurança é mostrada pela
organização e pelo planejamento do espaço urbano. No âmbito do rural, o trabalho
desenvolvido levou à construção de moradias novas e à ampliação de instalações rurais, tanto
de madeira como de alvenaria, gerando estabilidade para as famílias.
Nas fotos sobre esporte, educação e civismo temos o grande grupo reunido. A
fotografia no sentido horizontal, mais uma vez, abrange um enquadramento maior. Os alunos
enfileirados, durante os desfiles, são acompanhados por familiares e por professores, que se
posicionam ao longo das avenidas, lado a lado dos seus filhos, percorrendo com os olhos
atentos, um a um daqueles que são parte do seu círculo de vivência. Os jogadores de futebol,
durante as partidas, se espalham pelos campos, mas procuram se reunir, antes ou ao final das
partidas, para aquela foto “família futebolística” do time ao redor do qual se reúnem.
No tema sobre o religioso ocorre a opção pela fotografia no sentido horizontal, quando
o grande grupo se reúne. Procura mostrar tanto o momento festivo como a importância da
estabilidade do evento, especialmente do casamento. Os noivos estão ali, acompanhados pelos
familiares, amigos, vizinhos. O sentido horizontal mostra, também, além da busca pela
estabilidade, a permanência do evento representado, bem como a união e a harmonia,
esperadas da família que se forma. O casal de noivos, ali no centro da foto, representa o novo
núcleo social.
163
Para as fotografias no sentido vertical encontram-se 90 fotos, o que equivale a 40%
das fotos dessa análise. A partir das fotos posadas, percebe-se o ereto, o esticado,
representando uma ideia de ascensão e de hierarquização, o que se acentua em 46 fotos do
tema retratos e 33 fotos do tema religioso, onde está presente a figuração.
Na vertical ainda se situam duas fotos do tema tragédias, que mostram
enforcamentos... Ali, o ereto, o literalmente esticado, pode estar representando a busca por um
fim que pode levar à “ascensão” para outro plano de vida...
Quadro 18 – Enquadramento III – distribuição dos planos
1º 2º 3º 4º 5º
Planos/Temas
P&B P&B P&B P&B P&B
Vistas locais e
paisagens
05 05 01
Retratos 04 57 08
Religião 14 24 18 01
Produção 05 10 02
Tragédias 03 06 07
Esporte 05 06
Festividades 03 09 08 01
Educação 06 02 03
Civismo 02 05 04
Total = 224 04=2% 79=35% 73=32% 60=27% 08=4%
No item relacionado ao enquadramento III, item referente à distribuição dos planos,
temos um predomínio e uma média quanto ao uso dos planos, que apresenta 35% para
fotografias com dois planos, 32% para fotografias com três planos e 27% de fotografias com
quatro planos distintos. Apenas 2% das fotografias apresentam um plano e 4% das fotografias
apresentam 5 planos. A situação mostra uma opção por uma profundidade de campo,
projetada nas vistas amplas, inclusão de objetos, enquadramento de pessoas em grupos.
O uso de três ou quatro planos, quando em ambientes internos, por exemplo, está
relacionado ao enquadramento de mesas com bebidas, num primeiro plano, e, ao redor destas,
alguns casais sentados e, ainda enquadradas, ao fundo, outros casais ora em pé, ora sentados,
mas visíveis nas imagens. No ambiente externo, temos o uso de três planos, por exemplo, nas
fotografias sobre “Civismo”, onde objetos, tais como faixas e bandeiras são destacadas,
acompanhadas por grupos de pessoas, que seguem em desfile, tendo por fundo parte do
público ou construções. Objeto e figurante são a preocupação do fotógrafo no uso de três e
quatro planos.
O uso de um 5º plano está relacionado ao enquadramento de vistas amplas, uma
vastidão que leva a um fundo com mata e o céu, em certas fotos. A situação pode ser
observada em foto sobre “Educação”, onde temos o grupo de jovens fazendo ginástica, num
164
primeiro plano, atrás destes, a professora, num terceiro plano, o estabelecimento de ensino,
conhecido como “o internato”, ao fundo mata e, ainda, o céu.
Realizar um registro fotográfico com um maior número de planos está associado a
uma maior inclusão de elementos físico-naturais e de objetos no documento que está sendo
elaborado. É uma forma de deixar escrito, “através da luz e da sombra”, aspectos ambientais e
sociais sobre os quais o fotógrafo já tem um entendimento e uma previsão de mudanças, até
porque, na década de 1950, migrantes estavam chegando e se instalando na região,
derrubando a mata, fazendo lavouras, erguendo suas casas. A infraestrutura urbana estava
planejada e, em breve, aquele fio de linha, traçado para servir de caminho, se tornaria uma
estrada ladeada de estabelecimentos e de moradias. Assim, tem-se a sensação até de que a
imensidão do espaço leva ao uso de mais planos no registro fotográfico, considerando-se,
também, a possibilidade de uma maior inclusão de objetos.
Quadro 19 – Enquadramento IV – objetivo central
TEMAS/OBJETOS
CENTRAIS
Vivos Moveis Fixos
Vivos e
móveis
Vivos e
fixos
Vivos
móveis e
fixos
Móveis e
fixos
Vistas locais e
paisagens
08 01 02
Retratos 55 14
Religião 01 22 01 03
Produção 01 01 03 01 11
Tragédias 10 04 02
Esporte 01 08
Festividades 08 11 02
Educação 04 02 05
Civismo 02 02 07
Total 74 01 11 60 08 38
Através do Quadro 19, referente aos aspectos do enquadramento no que se refere ao
objeto central, constata-se, para as fotografias p&b, um predomínio para o enquadramento de
componentes vivos, com 74 fotos, onde se destacam os retratos. Os componentes vivos
também se associam, porém, na composição, junto aos componentes móveis, onde temos 60
fotos, aos fixos, em 8 fotos, e aos vivos, móveis e fixos, em 38 fotos. Considera-se, nessas
composições da figuração com a inclusão de objetos, objetos como o cavalinho ou um vaso de
flores nas fotos em estúdio, com crianças; no caso das fotos de casamento, o buquê de flores
das noivas; nas comunhões, a vela, o livro ou o certificado, objetos relacionados com eventos
significativos e importantes na vida das pessoas. Ocorre também uma inclusão de objetos no
tema da produção, onde a figuração se posiciona junto aos elementos de trabalho, com sacas
de soja e ceifadeira (Foto 105).
165
As 11 fotos com componentes fixos estão relacionadas principalmente com o tema
“Vistas Locais e Paisagens”, onde as edificações sobressaem. No item referente à composição
de elementos móveis, temos apenas uma fotografia em que o objeto central é destacado.
Trata-se de batata doce (Foto 146), mais um resultado do trabalho e da mostra da boa
qualidade da terra encontrada nesta região do Paraná. Três batatas grandes são enquadradas
ocupando praticamente todo o espaço da fotografia.
Quadro 20 – Enquadramento V – arranjo e equilíbrio
D/E C/S C/I
P&B P&B P&B
Vistas locais e paisagens 10 01
Retratos 69
Religião 57
Produção econômica 16 01
Tragédias 13 03
Esporte 11
Festividades 18 02 01
Educação 11
Civismo 10 01
Total=224 215=96% 07=3% 02=1%
Legenda: D/E = distribuição equilibrada na foto.
C/S = concentração na parte superior da foto.
C/I = concentração na parte inferior da foto.
O aspecto relacionado ao arranjo mostra um espaço fotográfico em equilíbrio entre os
planos superiores e inferiores, pois a posição dos elementos se concentra, quase na sua
totalidade (em 96% das fotos), distribuídas equilibradamente na foto correspondendo essa
posição à parte central dos registros, com a posição dos componentes no segundo, terceiro e
quarto planos. A coleção apresenta uma característica peculiar marcada pela presença de
pessoas acompanhadas de objetos, conforme demonstrado no item referente à distribuição dos
planos e do objeto central.
Apenas em 7 fotos a concentração se faz na parte superior e em duas fotos na parte
inferior.
Quadro 21 – Enquadramento VI – arranjo e equilíbrio (linhas)
Horizontal % Vertical % D/E C/S C/I
P&B P&B P&B P&B P&B
Linhas retas 50 77 122 03 02
Círculo 04 01 05
Semicírculo 10 01 09 02
Linhas duplas ou mais 45 06 49 02
Agrupadas 10 01 11
Espalhadas 08 04 12
Sem figuração 07 07
Total=224 134 90 215 07 02
166
O aspecto relacionado ao arranjo e equilíbrio também está demonstrado na
composição da figuração em linhas retas, tanto nas fotografias feitas no sentido horizontal
quando há um destaque para fotos em grupo, quanto no tipo vertical, quando se destacam as
fotografias de retrato e do aspecto religioso, a exemplo das fotos da série sobre casamento,
onde a figuração é o objeto central. A opção pelas linhas retas está registrada em 127 fotos
que, somadas às fotos na opção em linhas duplas ou mais, em 51 fotos, representa 79,5%
(Quadro 21) das fotos. Esse percentual reforça a representação de uniformidade, de
estabilidade, de manutenção e de permanência.
As fotos em círculo (5), semicírculo (9) e agrupadas (11) equivalem a apenas 11% do
total das fotos da série e indicam a pequena variação no arranjo do espaço fotográfico, mas
que também priorizou a parte central da foto, guardando-se o equilíbrio entre os planos e o
sentido de união, de núcleo relacionados, tanto na vida familiar quanto na vida social, como
nos momentos de educação ou nos momentos festivos.
Percebe-se, ainda, uma pequena incidência (de 12 fotos), que apresentam as pessoas
espalhadas, mostrando que os significados de desordem, de afastamentos, de desunião não
eram desejados. A situação é percebida nos temas relacionados à diversão, como esporte,
festividades e civismo, o que pode representar uma busca de prazer, de alegria e de
descontração. O esporte, porém, leva também à disputa e os ânimos podem se alterar; o
civismo é acompanhado do discurso e sabe-se que existem diferentes tendências políticas
numa sociedade; as festas, além da alegria e da descontração, podem vir acompanhadas de
exageros na bebida, de acertos de contas, etc. São circunstâncias que, talvez, por se tratar de
espaço público, amplo, podem representar falta de domínio e insegurança. Há que se
considerar, ainda, três fotos sobre acidentes, que levaram as pessoas a se posicionarem, ou
curiosas, ou tentando auxiliar na “desordem” com a qual se depararam.
5.2.1.5 Nitidez
O item nitidez, na composição do espaço fotográfico, constitui-se aqui dos subitens
foco, impressão visual (textual) e iluminação.
167
Quadro 22 – Nitidez I – Foco
Nº de Fotos
Tudo no foco Plano central no foco Foco desigual
Descrição
P&B P&B P&B
Vista locais e paisagens 08 03
Retratos 66 03
Religião 51 03 03
Produção 12 05
Tragédias 12 04
Esporte 10 01
Festividades 15 06
Educação 11
Civismo 10 01
Total = 224 195=87% 20=9% 09=4%
No subitem foco destacaram-se três variáveis. Considerando-se que 87% das fotos
priorizaram colocar os planos no foco, isso indica, nessa coleção, um foco objetivo, direto,
com destaque para a figuração, que só não se faz presente em 7 fotografias. Há que se
mencionar, além das fotografias dos retratos, voltadas essencialmente para a figuração, as
fotos sobre o tema religioso, onde noivos, crianças da comunhão, os familiares e, também a
morte, são focados. A intenção de colocar todos os planos no foco, acrescentando-se, aqui,
9% de fotos em que o plano central é destacado. Segundo Mauad, “indica a preocupação com
a clareza e com a inclusão de um maior número de elementos no foco”
215
. Deve-se considerar,
também, tratar-se essa coleção de fotografias feitas por profissionais habilitados e
preocupados com a arte fotográfica, visto que apenas 4% das fotos não apresentam bom foco.
Quadro 23 – Nitidez – II – Impressão visual (textual)
Linhas bem definidas Linhas definidas Linhas mal definidas
P&B P&B P&B
Vistas locais e paisagens 05 04 02
Retratos 58 08 03
Religião 44 13
Produção 10 05 02
Tragédias 10 06
Esporte 09 01 01
Festividades 13 08
Educação 05 06
Civismo 06 04 01
Total = 224 160=71,5% 55=24,5% 09=4%
A impressão visual apresenta bom contraste, o que levou a linhas bem definidas em
71,5% das fotos e a linhas definidas em 24,5% das fotos. A preocupação com a direção dos
planos e com o foco reforçou essas linhas. Apenas 4% apresentam linhas mal definidas. A
215
MAUAD, Sob o signo, 1990, op. cit., cap III, p. 11
168
situação foi percebida em 9 registros, onde a iluminação foi prejudicada, escurecendo o
segundo ou terceiro planos, devido à profundidade de campo e ao pouco alcance da luz.
Quadro 24 – Nitidez – III – Iluminação
Sem sombra Com sombra Com contraste Pouco contraste
P&B P&B P&B P&B
Vistas locais e paisagens 05 06 06 05
Retratos 46 23 56 13
Religião 46 11 47 10
Produção econômica 06 11 11 06
Tragédia 09 07 13 03
Esporte 07 04
Festividades 20 01 17 04
Educação 06 05 07 04
Civismo 04 07 07 04
Total/% 149=66,5% 75=33,5% 164=64% 49=36%
O espaço fotográfico relacionado à iluminação mostra uma clareza de tons em 66,5%
das fotos. Tratando-se das fotografias em preto e branco, a textura da cor se faz bem visível,
mostrando a diferença entre o claro e o escuro da foto, o que proporcionou um bom contraste
que se faz em 64% das fotos. A incidência de sombra em 33,5% das fotos não chega a
prejudicar a imagem no que se refere ao contraste, pois a sombra se faz levemente, sendo, em
algumas vezes, percebida na altura dos olhos, quando ocorre uma maior profundidade de
campo e o figurante está mais distante do fotógrafo, outras vezes, redesenhando a silueta de
alguns figurantes ou a cabeça e, em alguns casos, as orelhas. A fotógrafa Írica se lembra de
algumas reclamações feitas por clientes que se queixavam da sombra na fotografia dizendo
que “os fregueses eram enjoados, eles vinham e mostravam na foto, olha aqui, Ich bin hier
zweimal und einmal so gar Schwarz
216
, comenta ela hoje, sorrindo. A expressão em alemão
significa “eu estou duas vezes aqui e uma vez inclusive preto(a)”. Alguns clientes não
aceitavam muito bem aquela sombra, pois poderia significar não apenas um problema de
técnica fotográfica, de descuido, mas de “sujicidade”, de algo relacionado ao escuro, uma
sombra não identificada.
Reforça, novamente, a fotógrafa que a questão da luz era muito problemática e os flash
tinham pouca durabilidade, sendo que alguns “só duravam seis horas”. Nos dias em que
tinham muito trabalho, “muita reportagem” e tinham que sair do estúdio, faziam uma parte
dos registros e “pofti”, queimava um flash e a foto da pessoa seguinte já era prejudicada,
mesmo quando usavam mais de um flash. Cabe, no entanto, ressaltar a boa qualidade das
fotos, considerando-se a nitidez dos tons e o bom contraste.
216
KAEFER, 03 maio 2009, op. cit.
169
Em síntese, os atributos do espaço fotográfico representado nas fotos podem ser assim
apresentados: predomínio no tamanho médio, formato retangular, posada, sentido horizontal,
central/figurado, com 2 a 4 planos distintos, equilibrados, tudo no foco, linhas bem definidas,
sem sombra e com contraste. Esse padrão é o que sobressai e representa o espaço fotográfico
(embora ocorram variações em alguns itens). Os significados produzidos traçam um espaço
equilibrado e bem definido, o que possibilita boa identificação dos planos, também
proporcionada pela nitidez na composição do espaço. A opção pela direção central ressalta o
núcleo da foto, que elegeu a figuração como destaque onde o evento fotografado é o de
momentos especiais.
Avaliando-se o espaço fotográfico, que tem como material de pesquisa diferentes
temas, entende-se que as opções técnicas levantadas a partir dos itens que correspondem às
formas de expressão estão relacionadas a produtos e a técnicas disponíveis no mercado. As
ações dos fotógrafos, aliadas aos recursos técnicos, captaram partes de realidades, de
vivências, dessa forma transformando o momento do registro em documento, sabendo-se que,
nesse documento, há uma intenção de representar a verdade. Segundo Mauad
217
, “a busca da
verdade codifica a representação, que, mesmo assim, continua sendo representação”.
Entende-se, pois, que os esforços emitidos pelos fotógrafos, esforços unidos aos itens
relacionados ao espaço fotográfico, codificam ações, pessoas e ideias que pretendem traduzir
práticas sociais em fato documentado, real e verdadeiro. O objetivo dos registros se concretiza
naquilo que continua sendo representação, a fotografia e seus diferentes elementos culturais.
Cabe ressaltar-se a boa qualidade das fotos. Trata-se de registros feitos por
profissionais que buscavam, no ato de registrar, a perfeição, até porque, para além do gosto
pela arte da fotografia, bons resultados significavam bons retornos econômicos.
Apresentados os elementos da forma da expressão, ou seja, aspectos técnicos, dados,
informações, passa-se a apresentar os elementos da forma do conteúdo.
5.2.2 O ESPAÇO GEOGRÁFICO
O espaço geográfico compreende o espaço físico representado na fotografia. É
caracterizado pelos lugares fotografados e pelas mudanças registradas no decorrer do período
que envolve a coleção.
217
MAUAD, Sob o signo, 1990, op. cit., cap. III, p. 12.
170
Segundo Mauad, “a representação do espaço geográfico, através da mensagem
fotográfica, possibilita a recomposição do espaço vivido pela família...”
218
. No presente caso,
refere-se às famílias migrantes que ocuparam o espaço do Oeste paranaense e foram
registradas pelo Estúdio Kaefer ao longo dos anos de 1954 até 1990.
Considera-se que, ao realizar a análise, percorrem-se os diferentes espaços que
“assumem funções sígnicas à medida que se associa a determinados objetos e vivências”
219
, a
exemplo de transformações físicas provocadas tanto pela ocupação realizada pelos migrantes
como pela efetivação de infraestrutura realizada pela colonizadora e pela administração
pública e, ainda, pelo sentido que os diferentes eventos proporcionam às pessoas. A relação
do espaço geográfico com os objetos e aspectos da vivência serão trabalhados nos itens
seguintes.
Assim, apresenta-se a reestruturação do espaço geográfico apontando as oposições:
natural x artificial; externo x interno; urbano x rural.
A identificação das fotos no que se refere aos locais, às pessoas, aos eventos e à época
dos registros não foi possível na sua totalidade. Mas, através de alguns parâmetros, pode-se
aproximar alguns dados considerando-se os componentes das fotos, tais como datas, a partir
de 1954, considerado o ano da vinda dos Kaefer para a Vila General Rondon, o espaço do
estúdio antigo, que se refere a registros feitos até 1960 e que tem um tapete com estampa
diferente do piso do estúdio novo, inaugurado em 1961, o advento da foto colorida no início
da década de 1970, assim como igrejas ou outros elementos de infraestrutura que, incluídos
nas fotos, auxiliaram na identificação de determinadas imagens. Também se usou do recurso
de jornais da época, onde algumas fotos foram divulgadas.
5.2.2.1 A oposição natural x artificial
No caso de nosso trabalho, o espaço natural se refere a lugares externos, porém
envolve indivíduos que têm ou não a intenção de se fotografarem. Ao espaço natural também
são acrescidos elementos que já sofreram alguma mudança pela ação natural ou humana. Já a
relação com o aspecto artificial integra espaços onde há a intenção dos indivíduos de se
fotografarem, o que ocorre normalmente dentro de estúdios e/ou em ambientes preparados.
Na coleção, porém, existem situações em que fotos posadas foram feitas fora do estúdio,
218
Idem, p. 15.
219
Idem, ibidem.
171
provocando, em algumas circunstâncias, espaços mistos entre o natural, ligado a aspectos da
natureza, e o artificial, o que veremos através dos cenários, das poses e enquadramentos
realizados nos diferentes temas.
No conjunto das fotografias em preto e branco encontram-se 29% das fotografias
localizadas em ambiente natural. Estas são fotos espontâneas, considerando-se que 10 fotos
não apresentam figuração. As fotografias sem figuração estão relacionadas principalmente
com as fotografias do tema “Vistas Locais e Paisagens”, onde aspectos do urbano e do rural
são registrados para mostrar o crescimento da infraestrutura urbana ou a natureza que envolve
moradias com traços rurais.
Ainda, no espaço natural situam-se 88 fotografias do tipo posada, representando 39%
do total das fotos em preto e branco. Acentua-se, portanto, a situação para as fotos do tema
“Retratos”, que são em maior número, ou seja, 32 fotos, seguindo com 15 para o tema
“Religioso”, 10 para o tema “Produção”, 10 para o “Civismo” -- e algumas fotos para os
demais temas, temos um significativo número de fotos posadas, feitas em espaço externo.
Dentro desse conjunto de 88 fotos, 84% apresentam fundo natural, que vai desde
arbustos menores e ralos até um fundo com árvores e matas mais densas e fechadas, cobrindo
todo o fundo de fotos. Já os 16% das fotos restantes estão associados ao espaço natural
externo, próximo ao estúdio, que também preservam um fundo natural e algumas feitas com
fundo artificial.
Nesse sentido, apresentam-se as diferenças de localização registradas na coleção, o
que “permite que se reconstrua o universo geográfico experimentado pelo grupo
220
” nas
diferentes circunstâncias.
A opção por fotografias posadas em espaço natural, para o tema retratos, está
vinculada, em parte, a questões técnicas da época, principalmente no período que vai desde
1954 até 1960, quando o estúdio ainda funcionava na antiga casa dos Kaefer e a energia
elétrica era distribuída apenas em determinados períodos do dia. Assim, os fotógrafos
recorreram à luz natural, o que foi constatado em várias imagens e sobre as quais destacamos
algumas conforme se expõe na sequência:
220
Idem, p. 21
172
Foto 56 - Jovem senhor Foto 57 - Jovem senhora
Acervo e autoria Foto Kaefer. Jovens fazem pose nos fundos da Casa Kaefer.
Foto período entre 1954-1961.
Nas Fotos 57 e 58, bem vestidos, ele sério e ela com um suave sorriso, ambos
elegantes, os figurantes foram encaminhados para a parte externa do estúdio e posicionados
em frente a um cipreste, que, entre outros arbustos, forma o fundo natural. Entre os arbustos,
dependendo do enquadramento, aponta uma parte do telhado da residência dos fotógrafos. O
enquadramento dessa paisagem se faz em 14 fotografias com homens, mulheres, crianças e
em grupo.
173
Foto 58 – A dúvida Foto 59 – A brabeza
Acervo e autoria: Foto Kaefer. Foto feita entre 1954-1961.
Meninos (Foto 59 e 60) fazem pose na parte externa da Foto Kaefer. Ao fundo, a
paisagem natural mostra novamente o cipreste, mas nota-se uma pequena mudança na direção
do enquadramento. Nessas fotos, são enquadrados, ora o cipreste, ora as folhas viçosas do pé
conhecido como banana de bugre. A fisionomia séria dos meninos, a expressão da boca
cerrada do menino da Foto 60 sugerem que estes não estavam muito dispostos de serem
fotografados. Quem sabe o jeito da pose, uma perna dobrada sobre a outra, ou a gravatinha
ajustada ao pescoço os incomodava, levando-os à dúvida e à brabeza demonstradas nos rostos.
174
Foto 60 – O sorriso
Acervo e autoria: Írica Kaefer. Margarete Kiepagsque. 1959.
Na disposição da criança inocente, a alegria do privilégio de ser fotografada pela
madrinha... A menina Margarete deve ter sentido o envolvimento e a dedicação da fotógrafa
Írica nos preparativos dos equipamentos, do enrolar os cabelos “tipo Chuquinha”, do ajeitar a
gargantilha e do estender delicado do vestido. Esses ajustes são suavizados pelo semblante
tranquilo da garotinha. Ah!, e o enquadramento... A menina é posicionada em frente ao pano
que serve como fundo em ambientes internos. A imagem criada dá uma leve impressão de que
a menina integra a própria paisagem, que existe um só plano e de que o registro foi feito em
ambiente interno não fossem as ripas da cerca exposta no lado direito da foto e que seguram o
pano estampado. A fotógrafa informa
221
que, além de apoiarem o pano nas cercas, na parede
dos fundos da casa já estavam afixados pregos que eram usados para pendurarem o pano que
serviria de fundo para as fotos feitas em espaço externo. São arranjos que a fotógrafa criou
por inúmeras vezes, buscando a luz ideal dentro do seu espaço fotográfico, dos recursos
técnicos e da infraestrutura disponível e que puderam captar aquele sorriso.
221
KAEFER, 19 ago. 2009, op. cit.
175
Foto 61 - As cinco irmãs Vorpagel
Acervo e autoria Foto Kaefer. Da esquerda para a direita: em pé - Ruth, Nicolina e Cimilda; sentadas – Hilda e
Herta Vorpagel. Aproveitaram a festa de casamento do irmão Beno para fazerem uma foto só delas. Arroio
Fundo no distrito de General Rondon. 17.7.1954.
Algumas fotografias posadas, em espaço natural, trazem, como fundo, parte de
paredes de casas, a exemplo da Foto 62 (canto superior direito destruído) das irmãs Vorpagel,
feita no dia do casamento do irmão Beno
222
. As irmãs aproveitaram a presença do fotógrafo
que fez os registros do casamento do irmão Beno para fazer uma foto juntas. Na ocasião
também se encontravam bem vestidas para a festa do casamento. Neste sentido, na foto estão
Ruth (atualmente casada com Zastrow), Nicolina (casada com Gaier), Cimilda (que era casada
com Bruno Zastrow mas já é falecida), Hilda (também já falecida e que era casada com
Smegel) e Herta (que casou com Guido). Objetos como latinhas com flores, folhas de
coqueiro, um canto de mesa de madeira sobre a qual aparecem uma xícara e um bule
enquadrados. As latinhas de mantimentos ou embalagens de plástico vazias eram
reaproveitadas para usos diversos, tanto pelos homens, nos galpões, como pelas mulheres, que
as aproveitavam para plantar flores e as posicionavam próximas das casas, dentro de casa ou
as penduravam em varandas e paredes externas das casas. O bule e a xícara enquadrados na
mesa à direita da foto sinalizam o café da tarde servido aos convidados, com a ajuda das cinco
irmãs.
222
Idem, ibidem; VORPAGEL, op. cit.
176
Pergunta-se, porém: E a foto dos noivos? Se as irmãs do noivo foram fotografadas
seria possível encontrar, na coleção, a foto dos noivos? Bom, no decorrer da organização e da
definição das fotografias a integrar a pesquisa, após a localização da fotografia das irmãs
Vorpagel, quando esta foto ainda não havia sido identificada, deparou-se com uma fotografia
de casamento, cujo fundo chamou atenção. As folhas de palmeiras posicionadas junto à
parede da casa, as latinhas penduradas e a própria parede da casa, ou seja, os objetos que
formam o fundo da foto, apresentam um casal de noivos. Estar-se-ia diante do mesmo espaço?
Recorreu-se novamente à Claudiane Prass, pessoa entrevistada anteriormente em função da
Foto 75 considerando o sobrenome Vorpagel daquela pessoa acidentada. Além do mais, com
Írica teve-se a informação de que a foto das cinco irmãs se tratava das filhas de família
Vorpagel. Com uma cópia digitalizada das duas fotos, a das irmãs e a do casamento,
Claudiane atravessou a Rua Costa e Silva, onde reside, para interrogar sua vizinha, que, por
ser “pioneira”, poderia conhecer melhor as pessoas da localidade. “De onde você tirou isso?
Da onde você me vem com isto?”
223
, teria a vizinha perguntado para Claudiane. Após
algumas explicações, a vizinha, ainda espantada, exclamaria: “mas é a foto do meu
casamento... e estas são as irmãs do Beno”.
Diante dessas circunstâncias, realizou-se entrevista com Irma Hartleben Vorpagel, no
sentido de identificar os personagens das imagens das foto 62 e foto 63 em foco.
223
VORPAGEL, op. cit.
177
Foto 62 - Retrato de Casamento
Acervo e autoria Foto Kaefer. Casamento de Irma Hartleben com Beno Vorpagel. Linha Arroio Fundo, distrito
de General Rondon. 17.7.1954.
A entrevista realizada com Irma, a esposa de Beno, revela alguns detalhes do enlace.
Os noivos são filhos de pioneiros vindos de São Paulo das Missões, RS, no início da década
de 1950. O casamento no religioso ocorreu na sede da vila General Rondon e celebrado na
Igreja Cristo, na parte da manhã, e a festa, com almoço e café da tarde, foi realizada na casa
dos pais do noivo, na Linha Arroio Fundo, interior de General Rondon. Os preparativos para
as refeições foram organizados com antecedência, tais como a carneação de gado para o
churrasco. Irma lembra que durante a semana fizeram bolachas e exclama: “as bolachas, ixi,
era lata e mais lata cheias de bolachas”. Já as cucas foram feitas no dia anterior, “era uma
mesa grande cheia, cheia, nossa”, relembra Irma
224
, ao rever o seu retrato de casamento.
Os preparativos do casamento envolveram também a necessidade de “avisar o
fotógrafo” e, no sábado, dia do casamento, quando ele chegou, “a família e todo mundo fez
uma foto”. O casal tem a foto original do casamento, mas, quando lhe foi perguntado sobre a
foto das irmãs de Beno, ela não se lembrava do momento daquela foto.
Após a entrevista, enquanto ainda se conversava, foram mostradas fotos da família de
Irma, guardadas em uma gaveta grande, de balcão, que media mais ou menos 40x60 cm, e que
224
Idem, ibidem.
178
a senhora apoiou sobre suas pernas. Entre várias fotos, algumas eram estendidas para que
fossem olhadas, ao que fazia observações. Enquanto algumas eram mostradas, outras eram
empurradas para um outro lado da gaveta, a exemplo de uma foto já rasgada. A foto está
colada em um suporte de papelão bege, tipo paspatour, contornada com dois traços na cor
marrom, já amarelado, apresentando um pouco de sujicidade e rasgada, em três pedaços e
chamou-nos a atenção por apresentar uma semelhança com uma foto da coleção de Írica.
Foto 63 – Os familiares no Casamento - I
Acervo Casal Irma e Beno Vorpagel. Autoria Foto Kaefer. Familiares e convidados no casamento de Irma
Hartleben com Beno Vorpagel. Linha Arroio Fundo, distrito de General Rondon. 17.7.1954.
A Foto 64, ambientada na natureza, foi feita nas proximidades da casa dos pais dos
noivos e é uma reprodução igual a uma imagem da coleção da fotógrafa. Assim, pôde-se
identificar mais uma foto da coleção.
179
Foto 64 – Familiares no Casamento - II
Acervo e autoria Foto Kaefer. Familiares e convidados no casamento de Irma Hartleben com Beno Vorpagel.
Linha Arroio Fundo, distrito de General Rondon. 17.7.1954.
O caminhão que foi enquadrado mostra que uma boa parte dos convidados se deslocou
para o casamento através desse meio de transporte, diante do qual fazem uma pose. A
fotografia do grupo reunido nessa festividade e posando em frente ao caminhão é uma
representação do contexto social que envolve casamentos do período. Para a festa de
casamento foram convidadas várias famílias e elas se fizeram presentes com vários filhos,
desde crianças maiores até bebês de colo. Trinta crianças podem ser contadas nesse registro.
Faz-se menção ao número de crianças para se pensar um pouco nos antecedentes à festa e que
tipo de envolvimento o evento provocou. Se a família dos noivos teve preocupações em
preparar a festa para receber esses convidados, também aqueles que foram à festa e levaram
seus filhos passaram pelo preparo das crianças, das sacolas com roupas, das fraldas de pano,
etc. e da confirmação de um meio de transporte até o local do casamento. A reunião de tantas
crianças no mesmo espaço, acompanhadas dos adultos que se envolveram na preparação e na
comemoração da festa são representações de momentos de reunião familiar festiva. Enquanto
as pessoas fazem pose e, na tentativa de enquadrar a todos, o espaço externo e amplo, nas
proximidades da casa, foi o escolhido. Até o cachorro ficou registrado. Atrás do caminhão
uma plantação já seca e, aos fundos, uma mata densa ainda pode ser vista. Assim, nessas duas
fotos iguais está representada não apenas a sua produção, o evento registrado, mas também
aspectos da circulação fotográfica, pois, ao menos, em dois espaços diferentes está a mesma
imagem e, quem sabe, não estará outro exemplar da foto, com familiares que estiveram no
casamento?
180
O registro de uma outra família e, em outra circunstância, também se passou em
espaço externo e natural, onde as “bonitas” folhas de bananeira servem como fundo para a
foto de família.
Foto 65 - Família Ulhein
Acervo e autoria Foto Kaefer: Foto feita entre 1954-1961.
A senhora Ulhein é a primeira à esquerda, com bebê no colo, casada com o senhor
Ulhein, ao seu lado, também com bebê no colo. Ele foi um dos pracinhas na 2ª Guerra
Mundial. Teria falecido de enfarte
225
. Ao centro, os pais de Ulhein e, à direita, mais um casal
com o homem segurando outro bebê. No primeiro plano, as crianças maiores, descalças,
posicionadas próximas, cada qual, dos seus pais. Assim, no espaço externo e amplo, o foco se
fez especialmente sobre o grupo, que tem aos pés algumas folhas secas e pequenos arbustos.
225
PRASS, Claudiane. Entrevista concedida a Lucia Teresinha Macena Gregory. Marechal Cândido Rondon,
18 abr. 2009.
181
Foto 66 - Retrato de família
Acervo e autoria: Foto Kaefer. Foto de uma família com seus dez filhos. Feita entre 1954-1961.
Um momento especial, o retrato de família, reserva grandes expectativas. A pose firme
e ereta de alguns, as mãos espalmadas sobre os joelhos, a delicadeza no segurar as flores e o
olhar, dirigido para a câmera, ou não, como no caso das meninas menores, revelam certa
ansiedade. Pode-se imaginar o envolvimento das pessoas, dos pais, da criançada e do
fotógrafo na preparação desse evento. Vestir e deslocar-se com dez filhos para uma foto de
família -- haja espaço. Como organizar o fundo da foto? Uma mescla entre o natural e o
artificial resolveu o problema. Ao fundo e no centro, um pano artificial, mas com estampa que
imita a natureza, é pendurado e esticado, ladeado por folhagens naturais. Cadeiras de madeira
são levadas para o espaço externo onde sentam o casal e dois meninos. Os quatro filhos
maiores posicionam-se em pé, atrás deles. As crianças menores ficam em pé, entre as pessoas
sentadas. As meninas seguram um ramalhete de flores naturais, provavelmente pela falta de
brinquedos artificiais. Assim, integrados e enquadrados entre elementos naturais e artificiais,
posicionam-se os figurantes e forma-se o espaço geográfico de várias fotografias da coleção.
As fotografias referentes ao espaço natural, relacionadas com o tema religioso, seguem
uma linha semelhante às fotos de retrato e podem ser também consideradas como retratos de
casamento ou de comunhão.
182
Foto 67 – O casal de noivos e a mata
Acervo e autoria Foto Kaefer: Foto feita entre 1954-1961.
A foto de um casal de noivos, ela segurando um buquê natural e que mostra ao fundo a
natureza da mata, está relacionada com o espaço e objetos encontrados pelas famílias no
início da migração para a região. O casal, ou o fotógrafo, ou ambos, preferiram o fundo
natural ao espaço interno. Talvez a moradia e a infraestrutura familiar ainda não estivessem
bem estruturadas ou não o suficiente que agradasse tê-las como fundo da foto. A opção da
mata também pode estar associada ao uso da luz natural e à distribuição das folhas formando
um fundo uniforme, que é “arrastado” e distribuído para frente, envolvendo os pés dos noivos.
Um galho quebrado, deitado na parte inferior direita da foto, “quebra”, porém, essa
uniformidade.
183
Foto 68 – O casal de noivos e a residência dos Kaefer.
Acervo e autoria Foto Kaefer: Foto feita entre 1954-1961.
Situação diferente é a do casal da Foto 69. A noiva segura um buquê de flores brancas
e naturais e que tem ao fundo a parede de uma casa de madeira bem construída, com janelas
de vidro, varanda e um jardim estreito ao longo da casa que enfeita o acabamento desta. Um
vaso de flores artificiais é posicionado entre os pés dos noivos e uma parte dos degraus de
uma escada de madeira. Nesse sentido, há uma inclusão maior de objetos na imagem que
forma um espaço natural com alguns elementos artificiais e mantendo-se as fotos posadas. Ao
realizar-se a análise das fotografias notou-se a repetição de poses ao lado de parede de
madeira, algumas muito semelhantes e perguntou-se para Írica sobre a localização destes
enquadramentos. A fotógrafa sorriu e comentou que faziam várias fotos nesse espaço, ao
redor da casa, pois “era a nossa casa, a casa velha”
226
explicou, ou seja, a extensão do estúdio
antigo que se deslocava de forma a acompanhar o sol e ter a luminosidade suficiente para
fazer as fotos. O vaso é o mesmo que está enquadrado em fotos feitas dentro do estúdio.
Na localidade de Marechal Cândido Rondon, os espaços eleitos para a realização das
fotos do tema religioso foram o ambiente interno, o estúdio antigo, o estúdio novo e interiores
226
KAEFFER, 19 ago. 2009, op. cit.
184
de igrejas ou de residências. O espaço externo abrange aspectos da natureza. A partir do
enquadramento da natureza, o foco se dirige às residências, mostrando a mata ao fundo, típica
ambientação rural. Tem-se, ainda, como fundo de foto, parte das paredes das residências, em
meio a jardins, cercas de hortas, varandas e folhagens.
Cabe ressaltar que, do total das fotografias do acervo de Írica (considerando-se o
conjunto não computado para a análise), 745 fotos estão relacionadas a casamentos, feitas em
preto e branco. Dessas fotografias, as feitas em ambiente interno somam 615 fotos, o que
significa 82,5% do total das fotos de casamento; as fotos em ambiente externo somam 130
fotos, 17,5% das imagens feitas sobre casamento
227
.
No espaço natural, o grande grupo também tem o seu registro próximo às residências,
porém são enquadramentos maiores em relação ao espaço artificial, incluindo, às vezes,
terreno da propriedade, tendo a mata ao fundo.
Foto 69 - Casamento – o grupo familiar
Acervo e autoria: Foto Kaefer. Casamento ambiente externo. O grupo familiar se organiza rigorosamente para a
foto, em festa realizada em Marechal Cândido Rondon. Década 1950/60.
Observa-se que o espaço externo enquadrado pela fotografia mostra um ambiente
rústico, chão de terra, arbustos, gramíneas que faziam parte da natureza são colocadas
próximas dos pés dos noivos. Ao fundo, parte da mata que estava sendo dominada através da
derrubada da mata e da organização das lavouras para plantio e da organização das
propriedades. Optar pelo registro em ambiente externo está relacionado às possibilidades ou
às escolhas feitas. Registrar o casamento ao ar livre possibilitou um maior enquadramento,
juntando-se, aos noivos, alguns familiares. O espaço de negociação se amplia para os
fotografados, mas as fotos seguem um rigor de poses e jeitos rígidos semelhantes aos dos
227
GREGORY, Lucia Teresinha Macena. Fotografias de casamento: entre o clic fotográfico e o sim religioso.
Niterói, 2006. (Monografia de curso apresentada para a disciplina Instituições e Poder: Pensando com a
História).
185
estúdios fotográficos. Todos estão bem vestidos e rigorosamente posicionados. O registro em
espaço externo também possibilitou incluir aspectos do espaço físico da região, espaço no
qual as relações de convivência se efetuaram no período do casamento. Parte de um caminhão
e de um telhado, ou um puchado podem ser vistos em segundo plano, atrás dos figurantes.
O que se pode observar, a partir do número total dos registros de casamentos, é a
opção pela fotografia feita em ambiente interno, com fotos que se realizam
predominantemente nos estúdios. Embora no período inicial das atividades dos Kaefer
houvesse o problema da falta de iluminação interna, posteriormente, no estúdio novo, havia a
iluminação adequada, o flash, os tripés, os panos de fundo. Mais tarde, o estúdio novo se
tornou um espaço preparado e equipado especificamente para a pose fotográfica. Considera-se
também que alguns elementos deixaram de ser enquadrados, o que significa a mudança de
espaço da própria foto Kaefer, que opta pela construção de uma casa nova, de dois pisos, com
espaço específico para um estúdio. Aquela paisagem dos fundos da casa anterior não é mais
enquadrada, acentuando-se o ambiente dos registros artificiais.
Ainda, com relação ao uso do espaço, no que concerne ao tema religioso, cabe
mencionar a variação no uso das igrejas, as quais serviram para as manifestações de fé,
acompanhadas de festividades. As principais igrejas identificadas foram a Igreja Católica, a
Igreja Luterana Cristo, a Igreja “Martin Luther”.
Foto 70 - Vista aérea. A vila General Rondon
Acervo e autoria Foto Kaefer: Núcleo urbano da Vila General Rondon. Meados da década de 1950.
Nessa imagem (Foto 71) pode-se ver, na parte central da foto, o núcleo urbano da Vila
General Rondon, com casas construídas ao longo da Avenida Rio Grande do Sul, que corta a
186
foto na diagonal sentido esquerdo/direito da foto. Uma divisão dos lotes é sinalizada, embora
as demais ruas ainda não apareçam bem demarcadas a exemplo da Av. Maripá que passou a
ser uma das principais avenidas (ver Foto ).
Demarcados estão, no entanto, os espaços de manifestações religiosas, o que
demonstra as construções das igrejas, então designadas de capelas. As comunidades religiosas
reuniam-se inicialmente na casa de um dos seus membros e, nas festividades, faziam-se
presentes fiéis de outras igrejas. Já em 1951 foram fundadas quatro comunidades religiosas na
vila. Na igreja católica Sagrado Coração de Jesus atuaram, inicialmente, cinco famílias, que,
em 1951, tiveram sua primeira missa com celebração de crisma, feita na escola e “com a
presença de 150 pessoas de outros credos”. A capela foi construída em madeira, em 1956, e
esta pode ser vista na parte superior esquerda da foto.
No espaço natural, as fotografias do tema produção e civismo apresentam fundo
natural semelhante aos demais temas, ocorrendo uma variação quanto ao fundo que se faz no
quarto ou quinto planos, ocorrendo uma maior inclusão de objetos nas imagens,
principalmente no tema civismo.
Foto 71 - Peixes
Acervo e autoria Foto Kaefer: Foto feita entre 1954-1961.
187
Ao espaço natural de várias fotos são agregados elementos da produção, como caças
de aves, de animais maiores (como antas) ou como peixes, a exemplo da Foto 72. Aqui, os
pés do pescador são envoltos pela gramínea e é enquadrada uma parte do chão de terra.
Percebe-se nesta foto que a pose do pescador é secundária uma vez que o objetivo do registro
fotográfico são os peixes. É possível que tenham sido feitas outras fotografias desse momento
e, com poses diferentes, tendo sobrado a presente foto.
Nas fotos sobre o tema civismo, além da natureza, elementos como a estrutura física
das construções, objetos de desfiles (tais como carros alegóricos, faixas e bandeiras)
preenchem o espaço geográfico.
Foto 72 - Desfile ao lado de parte de uma mata
Acervo e autoria Foto Kaefer: Foto feita entre 1954-1961.
A Foto 73 é o registro de um desfile cívico que mostra uma professora à frente dos
alunos, acompanhada de uma criança que carrega balões, provavelmente coloridos, a
enfeitarem o desfile dos alunos, que, no rigor de trajes uniformizados, são acompanhados de
uma pequena banda. Ao som desta e da marcha, em meio à natureza, a população é envolvida
e, estupefata, de braços cruzados, as mulheres esquecem-se de aplaudir. Nesse conjunto
temos, num primeiro plano, o chão de “terra fresca” e, no terceiro plano, as folhas de
palmeiras, que auxiliam na cobertura das barracas preparadas para o momento cívico. As
árvores solitárias e os arbustos menores sobraram de derrubada feita anteriormente.
O aspecto geográfico natural em espaço externo e que apresenta o tipo de foto posada
relacionado aos demais temas e em menor número está vinculado aos temas das vistas e
paisagens, esporte, festividades e educação.
188
Foto 73 – Aula dominical
Acervo e autoria Foto Kaefer: Foto feita entre 1954-1961.
A Foto 74 mostra uma professora que levou as crianças da “aula dominical”
228
para
um espaço externo, aberto e mais amplo que a sala de aula. Posicionadas em círculo, fazem
atividades sobre o gramado. No terceiro e quarto planos, podem ser avistados, ainda, tocos
secos de árvores derrubadas e já sem galhos e folhas. Ao fundo se veem plantações e mata. As
crianças fazem pose, acompanhando as coordenadas repassadas pela professora, na tentativa
de transparecer espontaneidade. Algumas, no entanto, se distraem e direcionam olhares para o
fotógrafo, o que “denuncia” o menino à esquerda e dois meninos à direita da imagem. Uma
pequena distração na atividade.
Com relação à oposição natural x artificial, para as fotos com pose espontânea no
espaço externo, temos 29 fotos, o que representa 13% do total das fotos preto e branco,
concentrando-se essa situação para o tema tragédias, com 14 fotos, e, ainda, as fotos sobre
vistas da localidade e paisagens.
228
ALBRECHT, Alice. Entrevista concedida a Lucia Teresinha Macena Gregory. Marechal Cândido Rondon,
12 ago. 2009
189
Foto 74 – O galho fatal
Acervo e autoria: Foto Kaefer. Corpo de Arno Vorpagel. Linha Guará.
Marechal Cândido Rondon. 26.10.1968.
As informações obtidas de Claudiane Prass
229
esclarecem essa fotografia, que se refere
à “morte trágica de Arno Vorpagel, que é o avô do Djone, e a menininha da foto (aparece
apenas a perna e o pezinho com chinelo de dedo) é a mãe dele, Loreni Stumm, que tinha três
anos”, explica. Djone é marido de Claudiane, portanto, decorridos 40 anos, a nora daquela
criança, que tem um pezinho enquadrado no registro, comenta sobre o acidente, lembrando
que “o Arno era jovem, tinha apenas 24 anos”. O fato teria ocorrido quatro anos após o seu
casamento, deixando enlutada a esposa Marta e a filha pequena.
Entende-se que, no enfrentamento da natureza, na busca da organização do espaço,
auxiliados por equipamentos técnicos, a exemplo da motos-serra, as dificuldades e as
fatalidades estiveram presentes. Em outra foto
230
desse acidente, pode-se observar que a
árvore não foi totalmente cortada. Antes de ela tombar, um galho fatal teria caído sobre o
trabalhador. Acidentes com motosserra aconteciam, muitas vezes, causados pelo uso incorreto
do equipamento, cortando braços, o rosto e outros órgãos das pessoas, mas, embora essa
ferramenta tenha sido usada naquele momento, o que realmente ocasionou a morte desse
senhor foi um galho de árvore, que, ao se chocar com outra árvore, teria caído antes daquela
que estava sendo derrubada.
229
PRASS, Claudiane. Entrevista concedida a Lucia Teresinha Macena Gregory. Marechal Cândido Rondon,
19 abr. 2009
230
Acervo do CEPEDAL. As fotos são doação de Ido Kungs. Pasta Coleção Colido. Foto 002. Fotógrafo: Foto
Kaefer. Fotógrafo da reprodução não identificado. A mesma pasta contém outras fotos, entre as quais, uma
cópia (foto 001) igual à foto 75 desta pesquisa e, ainda, uma foto do velório de Arno Vorpagel, onde mãe e
filha se despedem, colocando a mão no rosto do falecido (Foto 008).
190
Foto 75 – Desespero?
Acervo e autoria: Foto Kaefer. Enforcamento. Década de 1960-70.
O espaço natural foi escolhido por um senhor, que usando de uma corda, pendurou-se
numa árvore para se enforcar. A ação trágica praticada por essa pessoa e o motivo que o levou
ao ato fatal não puderam ser levantados. Seria despero? As dificuldades, o sofrimento, a
angústia certamente pairaram sobre alguns migrantes naqueles tempos, levando pessoas à
praticarem atos extremos ao ponto de tirarem a sua própria vida. Ao ser observada a veste, a
calça aparece amarrotada e desalinhada. Usava chinelos e um pé do chinelo ficou caído na
grama, próximo dos pés. Esse senhor usava um paletó o que indica que na data do ocorrido
deveria estar fazendo frio. A manga longa porém, não encobre o terço que essa pessoa deixou
enrrolado na altura do seu punho direito. A veste, o terço assim como o uso do espaço externo
utilizado para a realização desse ato de enforcar-se são objetos relacionados com a forma que
este senhor escolheu ser visto e lembrado.
O espaço natural referente ao tema das vistas locais e paisagens apresenta-se quase
sem figuração, porém, segundo o conjunto das imagens da coleção, ocorreu uma opção maior
por fotografar com a presença de pessoas.
191
Foto 76 - Ponte pêncil em Guaíra
Acervo e autoria: Foto Kaefer. Passeio sobre o Rio Paraná. Década 1960.
Dois casais fazem pose ao visitarem as “Sete Quedas”, em Guaíra, e realizarem um
passeio sobre uma ponte pênsil, apreciando o Rio Paraná. Para uma maior visão e
aproveitamento da natureza e das quedas nessa região de Guaíra, município que faz divisa
com o município de Salto del Guairá, no Paraguai, algumas pontes foram construídas. Nesse
período de 1950 até a inundação da área pelo Lago da Itaipu Binacional, em 1982, a região
era um grande ponto turístico e alguns moradores aproveitavam para conhecê-la. Fotografar-
se em cima de uma ponte pênsil mostra a inclusão de um elemento importante na imagem,
considerando-se que as Sete Quedas ou “Saltos Del Guairá” eram conhecidas e famosas.
Provavelmente, na época, esses casais não imaginavam que a ponte poderia vir a se romper e
causar, em janeiro de 1982, uma das maiores tragédias na região das quedas. Tampouco, que
o espaço das Sete Quedas (os sete conjuntos de saltos com mais de 20 quedas) viria a ser
inundado pela represa da Itaipu Binacional, meses mais tarde e que as pontes pênseis
desapareceriam debaixo do lago que se formou em outubro de 1982.
231
No item espaço geográfico vinculado à oposição natural x artificial situam-se também
as fotografias do tipo posada, num total de 107 fotos, ou seja, 48% do total das fotos em preto
e branco, realizadas em espaço interno, aqui considerado o espaço artificial. Novamente as
fotografias dos temas retrato e religião sobressaem, seguidas de um número menor de fotos
sobre festividades e outros temas.
231
Maiores informações sobre as Sete Quedas poderão ser obtidas nas obras: LIMA, Ivone Carleto. Itaipu: as
faces de um mega projeto de desenvolvimento. Marechal Cândido Rondon: Ed Germânica, 2006;
GREGORY, Valdir. Guaíra: um mundo de águas e histórias. Marechal Cândido Rondon: Ed. Germânica,
2008. Cap. 8.
192
As fotografias do tema retratos somam 37 fotos e representam 37,5 % das fotos em
ambiente interno. No tema retratos, temos as fotografias realizadas no estúdio antigo e no
estúdio novo.
As fotografias realizadas no estúdio antigo apresentam um fundo artificial com
estampa sobre a natureza, e se repete em várias fotos feitas naquele espaço com exceção de
duas onde o fundo é liso. As fotos apresentam arranjos com objetos interiores, tais como
cadeiras de vime, mesa redonda pequena de madeira, toalha de mesa bordada e com renda,
vaso de flores naturais ou artificiais, sofá, um tapete, cadeira de balanço para bebê. A inclusão
de objetos para a composição dos quadros de representação cria uma maior artificialidade no
campo fotográfico e esses podem representar, “muito mais que um modo de vida, representam
uma vontade de ser”
232
, pois as pessoas podem não possuir determinados objetos, mas os
“adquirem” através da representação fotográfica. A própria opção pela fotografia, por poder
se fotografar num estúdio, pode representar essa possibilidade, representada também pela
variedade e pela quantidade de objetos enquadrados.
Foto 77 - Jovem no estúdio antigo
Acervo e autoria: Foto Kaefer. Jovem não identificada. Década entre 1954-61.
232
MAUAD, Sob o signo, 1990, op. cit., cap. III, p. 17.
193
A jovem da Foto 78 é posicionada levemente de lado para fazer um retrato de meio
corpo e seu olhar firme é direcionado para a câmara como que enfrentando-a. Exibindo roupa
xadrez que se destaca pelos botões e gola clara, apresenta-se bem vestida. Feito com pinchaus
e manga bufante, a blusa/vestido está bem ajeitada no seu corpo. Os cabelos penteados e
colocados atrás das orelhas deixam os brincos à mostra e a tornam elegante. Ao fundo, o pano
com estampa imitando a natureza mostra aspectos artificiais característicos do espaço
geográfico relacionado com o estúdio antigo sendo que esse pano já era usado em Santa
Catarina. A fotografia passou por uma montagem onde foi feito um contorno oval sobre a foto
pois a fotógrafa Írica “recortava uma cartolina ou outro papel e deitava em cima da foto” para
obter esse tipo de efeito. Algumas fotografias no acervo têm esta característica e, no depósito
de Írica, fotos de várias crianças, entre as quais seus netos, permanecem emolduras mostrando
o uso dessa técnica de montagem de retratos.
Foto 78 - O noivado
Noivado de Edila Lemke com Armindo Ruppenthal. General Rondon, PR. 07.09.1960.
Autoria: Foto Kaefer. Acervo particular de Írica Kaefer
No acervo de Írica encontram-se várias fotografias de casais a exemplo da Foto 79.
Segundo a fotógrafa, trata-se de fotografias feitas por ocasião de noivados. Os espaços
escolhidos para o momento podem ser o espaço interno, no estúdio fotográfico, a exemplo da
fotografia do casal de noivos, Edila Lemke e Armindo Ruppenthal, assim como o espaço
externo ao estúdio, em ambientação natural. Dados fornecidos por Idette Arantes
233
, através
233
ALTMANN, Idette Arantes. Foto casal Edila. [mensagem pessoal]. Mensagem recebida por:
<teregregory@gmail.com> em 04 nov. 2009. A professora Idette Arantes Altmann é esposa de Haraldo
Altmann.
194
de comunicaçaão eletrônica onde fotografias (Foto 79 e 80) foram enviadas por e-mail para a
mesma, dão conta do motivo desse registro fotográfico indicando que foi o noivado do casal
“ocorrido em 7 de setembro de 1960, na casa velha” dos Kaefer. A referência à data do
noivado deste casal e à casa velha onde o registro teria ocorrido são indicações sobre a
localização do estúdio fotográfico e de que esse funcionava junto à moradia dos fotógrafos,
cujo espaço, para os “fregueses”, utilizando expressão de Írica, era um só, a casa velha. O ano
do registro, em 1960, indica que o estúdio ainda funcionava naquela casa considerando-se
que, posteriormente, no novo estabelecimento, a agência fotográfica passou a ter espaço
específico. Os noivos casaram em 1961.
Foto 79 - O encontro das irmãs Lemke
Da esquerda para a direita: Em pé, apoiadas no sofá, Olívia Lemke e Edila Lemke. Sentadas, da esquerda para a
direita, Celita Lemke Altmann e Elzira Lemke Lohmann.
Autoria Foto Kaefer. Acervo particular de Írica Kaefer. General Rondon. 1957.
Através dos contatos eletrônico
234
, também mantido com Idette Altmann, perguntou-se
sobre a fotografia identificada por Írica como sendo “as irmãs Lemke”. Idette procurou uma
das irmãs, que é sua cunha e escreveu: “Ontem olhamos fotos e vieram as recordações por
parte da Edila.” Com Idette obteve-se significativa informação a qual se transcreve aqui: “A
Celita, que morava em Concórdia, SC., veio em Rondon, visitar as outras irmãs, em 1957”.
Aproveitando o momento de estarem todas reunidas, as quatro mulheres teriam planejado
fazer uma fotografia. Contudo, a razão principal do registro fotográfico foi a seguinte:
“Tiraram a foto pensando que seria muito difícil se encontrarem novamente. A Olívia e Edila
ainda eram solteiras e Elzira já casada”. Portanto, entende-se que existe uma justificativa para
234
ALTMANN, Idette Arantes. Foto – ordem dos nomes. [mensagem pessoal]. Mensagem recebida por:
<teregregory@gmail.com> em 23 out. 2009.
195
o registro de cada fotografia. Ainda, durante comunicação com Idette Altmann obteve-se a
identificação das mulheres fotografadas, que segue a seguinte ordem:
Em pé, apoiada no sofá, a esquerda de quem olha a foto: Olívia Lemke (falecida). A
1ª sentada, do lado da Olívia: Celita Lemke Altmann (mãe do Haraldo, mora em
Rondon). A 2ª Sentada, do lado da Celita: Elzira Lemke Lohmann (mora em
Curitiba). A última, à direita de quem olha a foto, em pé apoiada no sofá: Edila
Lemke Ruppenthal (mora em Rondon).
235
Para a época, quando as fotografias ainda eram feitas em menor número e, diante da
perspectiva de as irmãs eventualmente não mais se verem, deixar gravado em papel a imagem
de cada uma delas fez, do ato fotográfico, a forma de perenizarem o encontro. Assim,
poderiam permanecer sempre juntas, através da representação fotográfica até porque,
atualmente, quem não está mais entre elas é Olívia Lemke. Na família das cinco irmãs havia
mais cinco irmãos homens.
A figuração masculina também foi registrada no estúdio antigo dos Kaefer.
Foto 80 - O rapaz e a farda
Acervo e autoria: Foto Kaefer. Estúdio antigo, rapaz com farda militar. Década entre 1954-61.
Nesse retrato pequeno, Foto 81, o enquadramento tem como objeto principal o rosto
do jovem -- enquadramento que cria, através da sua indumentária (a farda), uma mensagem
fotográfica com espaço e objetos reduzidos. Na coleção de fotos de Írica localizaram-se
poucas fotos com rapaz fardado, mas a fotógrafa comentou que muitos jovens gostavam de
235
ALTMANN, Idette Arantes. Foto – foto casal Edila. [mensagem pessoal]. Mensagem recebida por:
<teregregory@gmail.com> em 04 nov. 2009.
196
fazer fotos com essa vestimenta, para darem como lembrança para as namoradas. Há que se
considerar que os rapazes da região normalmente prestavam seu compromisso militar nos
Quartéis de Foz do Iguaçu, de Cascavel ou de Guaíra. A proximidade geográfica pode ter
proporcionado um maior vínculo entre os namorados, especialmente quando a relação era
acompanhada de uma fotografia do namorado fardado pelo “5 CF” conforme indicação no
emblema do boné do soldado.
Foto 81 - Noivos no estúdio antigo
Acervo e autoria: Foto Kaefer. Estúdio antigo. Noivos. Década 1954-61.
As fotografias que têm como espaço os estúdios, também considerado de espaço
artificial, referem-se, principalmente, a fotos feitas de crianças e de casamentos. Nesse caso,
na maioria das vezes, do casal de noivos e, em menor proporção, deles com familiares. Os
objetos que integram esse espaço são vasos de flores, que podem ser de porcelana, vime ou
vidro, com flores naturais ou artificiais, cadeiras de vime. No chão, um tapete com estampa
em forma de losango, é característico do estúdio antigo. Como fundo foi enquadrado o pano
197
estampado, floral ou o liso, estes usados no estúdio antigo, “porque o estúdio novo ainda não
estava bem acabado”
236
.
A mudança para o estúdio novo foi feita quando este ainda não estava bem concluído
e, assim, o fundo do espaço fotografado recebeu ainda panos usados anteriormente, no estúdio
antigo. Eventualmente, alguma pessoa também pedia, escolhia determinada estampa, sendo
que, no estúdio novo, aos poucos se mostra uma tendência ao uso de fundo liso.
Foto 82 - A menina e as flores Foto 83 - O menino e o cavalinho
Acervo e autoria: Írica Kaefer. Crianças no estúdio novo. Década entre 1961-1971.
236
KAEFER,03 maio 2009, op. cit.
198
Foto 84 – A menina e o cavalinho
Acervo e autoria: Foto Kaefer. Estúdio novo. Menina posa sentada sobre o cavalinho de brinquedo. Décadas
1970.
As Fotos 83, 84 e 85 foram realizadas no estúdio novo, que apresenta um fundo liso,
diferente dos panos florais usados no estúdio antigo. A esse fundo artificial são agregados o
vaso de vime com flores de plástico e um cavalinho de madeira. A menina da primeira foto
desse conjunto ainda segura na mão uma fotografia entregue a ela para, num primeiro
momento, distraí-la e, num segundo momento, chamar-lhe a atenção para alguém que diz
“olha o passarinho”... Ela chega a esforçar seu olhar, mas o passarinho não aparece. O menino
posando ao lado do cavalinho de brinquedo faz um gesto com uma das pernas ameaçando
subir no cavalinho, mas a posição das pernas está trocada, o que não causa nenhum
constrangimento, pois é apenas uma insinuação, e seu olhar está atento ao fotógrafo. Na Foto
85, uma menina, montada no cavalinho, ergue o queixo e mostra-se valente frente ao animal,
segurando-se apenas com uma mão. O animal está direcionado para o lado esquerdo da foto e
a menina dirige o olhar para frente, na direção do fotógrafo, como quem diz, “estou pronta”,
pode clicar.
199
No espaço artificial do estúdio, o cavalinho de brinquedo e seus acessórios, tais como
o apoio para colocar os pés, o cordão para segurar o cavalinho ou segurar-se, o pelo do
cavalinho na parte da crina, a cabeça do cavalinho em si, com o nariz e olhos estampados,
formam um quadro de representação que introduz na imaginação da criança a sensação de
possuir tal brinquedo, mesmo que por alguns instantes.
Foto 85 - Noivos
Acervo e autoria: Foto Kaefer. Estúdio novo. Casal de noivos. Década 1960/70.
Inúmeras fotos foram feitas com esse enquadramento como mostram as fotos 82, 83,
84 e a foto 86. Tendo por objeto principal a figuração, os noivos, meninos, meninas, raras
vezes mulheres com crianças e alguns homens ocuparam esse espaço geográfico. Em relação
aos objetos enquadrados, ou se renovava o tipo do vaso e das flores, ou se trocava o vaso de
flores pelo cavalinho, sofás estofados, alguns brinquedos. Quando familiares dos noivos eram
enquadrados, eles ficavam em pé, ocupando todo o espaço do estúdio. Os objetos artificiais
eram afastados focando-se o grande grupo. O fundo liso, sem estampas, dá um maior destaque
aos outros objetos, os vasos de vime com as flores artificiais colocados no chão, as folhagens
penduradas na parede e os ramos enrolados na coluna à esquerda e que deixa visível uma
parte de um quadro na parede.
200
No conjunto da coleção, foram fotografados diferentes tipos de lugares, conforme
indica o quadro 25.
Quadro 25 – Tipos de lugares fotografados
Locais P&B Percentuais
Escola 05 2,5%
Campo/lavoura 06 3%
Rio 04 2%
Casa 31 14%
Ponte 03 1,5%
Estúdio antigo 28 12,5%
Estúdio novo 26 11,5%
Mata 17 7,5%
Igreja 15 7%
Clube/salão 17 7,5%
Rua 27 12%
Varanda 02 1%
Comércio 04 2%
Indústria 02 1%
Oficina mecânica 01 0,5%
Campo de futebol 06 3%
Arbusto 04 2%
Palanque 02 1%
Na coleção de fotografias, os lugares fotografados referem-se a espaços localizados
em áreas de Marechal Cândido Rondon com exceção das duas fotos de Guaíra (Foto 77) e
uma referente à Foz do Iguaçu (Foto l49). De acordo com o quadro de lugares fotografados e
os percentuais considerados sobre as 224 fotos da coleção p&b, os espaços em maior
evidência são: a casa, com 14%; o estúdio antigo, com 12,5%; a rua, com 12%; o estúdio
novo, com 11,5%; o clube / salão, com 7,5%; e a igreja, com 7,5% de frequência. Os lugares
que aparecem com uma frequência menor são a escola, a lavoura, rio e ponte, entre outros
elencados no quadro.
A casa é um dos elementos que mereceram a atenção dos registros fotográficos, o que
se deu em 31 fotografias, representando 14% do total da coleção, mas, na maioria das vezes,
não é a casa o objeto central da fotografia, como no caso da Foto 87, e, sim, os figurantes que
enquadram uma parte dela, como fundo da foto.
No início da ocupação da região pelos migrantes pode-se perceber um predomínio da
inclusão da mata e de pequenos arbustos como fundo das fotos e, aos poucos, a esses
elementos naturais, são integrados outros elementos naturais, mas já apresentando a
interferência e a transformação do homem no espaço.
201
Foto 86 - O casal e a casa
Acervo e autoria: Foto Kaefer. Um casal com seus seis filhos fazem pose tendo por fundo uma parede de
madeira. Década 1950/60.
Fotografar-se ao lado da casa é uma demonstração de que o casal tem uma área, um
terreno onde pode construir uma morada para si e a família. Mostrar a parte da frente da casa
possibilitou mostrar a varanda com o acabamento em ripinhas de madeira e algumas latinhas
de flores a enfeitar a casa. Também deixa visíveis as venezianas de madeira, as janelas com
vidraças que deixam a cortina à vista. Ao fundo, no alto da casa, a chaminé anuncia o fogão a
lenha e a localização da cozinha. A madeira com bom acabamento e as telhas bem ordenadas
são a mostra de que o casal construiu uma casa boa. Na frente da casa, dando um enfeite ainda
maior à moradia, um jardim com flores. Uma parte do galpão ou, quem sabe, da moradia
anterior, aparece do lado esquerdo e, ao fundo, alguns arbustos. É uma demonstração de
poder, mas, certamente, também de trabalho.
202
Foto 87 - Uma família e a parede
Acervo e autoria: Foto Kaefer. Um casal com seus seis filhos fazem pose tendo por fundo uma parede de
madeira. Década 1950/60.
O que se percebe, em várias fotos, é a inclusão de parte das casas nas imagens. Na
Foto 88 um casal jovem faz um registro com seus filhos. As crianças são posicionadas entre o
pai e a mãe, segurando eles as crianças menores. Além das cadeiras e do chão de tábuas de
madeira, talvez tratando-se de uma varanda externa, vê-se ao lado esquerdo da foto, pequenos
troncos quebrados de um arbusto plantado próximo da casa. Quanto à indumentária, as vestes
são boas e limpas. Os meninos menores usam suspensórios que se cruzam na altura do peito.
O vestido das meninas é feito do mesmo tecido. O menino mais velho usa um casaquinho e
pode ser que suas camisas, já pequenas para ele, tenham sido repassadas para os irmãos
menores. O pai usa uma calça social e camisa de manga curta. A mãe, um vestido estampado
que cobre os joelhos. As crianças, posicionadas de pé, no centro da foto, estão descalças e
deixam os pés sujos à vista. Já os pais, posicionados nas extremidades da fila e sentados em
cadeiras, estão com calçados nos pés. A parede de madeira e aparentemente sem pintura, cria
o fundo da foto.
Uma variação na posição do grupo é percebida em outras fotografias. Casais são
posicionados no centro e os filhos nas laterais, na frente, atrás ou entre os pais. Nas
fotografias de famílias feitas na região durante as décadas de 1950/60 nota-se ainda que além
do número elevado de filhos que se posiciona em pé, alguma criança ainda é segurada no colo
dos pais.
203
Foto 88-A - Família de Erno Vorpagel Foto 89-B – Família de Erno Volpagel
Foto 89-A: Acervo e autoria: Foto Kaefer. Casal Vorpagel com seus três filhos. MCRondon. Década 1960/70.
Foto 89-B: Acervo e autoria: Foto Kaefer. Casal Vorpagel com seus quatro filhos. MCRondon. Década 1960/70.
Na imagem da Foto 89-A, temos outro casal Vorpagel, jovem e fazendo pose
acompanhado de três filhos que são posicionados assim: a menina ao lado da mãe, que segura
a menor e a nenê fofa no colo e, ao lado do pai, o filho intermediário, um menino. Este parece
estar tranquilo e seguro, entrelaçado ao braço do pai. Já a menina mostra preocupação. A
definição do lugar das mãos, numa pose, é, para algumas pessoas, um problema. A menina,
inclinando a cabeça para frente e olhando para baixo, deixa o laço do cabelo bem visível. Já as
mãos, as coloca atrás do corpo e, na tentativa de fazer uma boa foto, torna-se rígida e sequer
dialoga com o fotógrafo.
As fotografias 89-A e B foram identificada com Irma Vorpagel, já referida, e que
possui em sua casa a foto da família desse seu cunhado Erno, (foto 89-B), feita em momento
posterior à foto 89-A. Nessa foto, as crianças estão um pouco mais crescidas e já está incluído
mais um filho na foto de família. A apresentação dessa família assegura condições de vida
melhor, considerando-se as vestes e a estrutura da casa. A varanda, aos fundos, mostra um
local e aspecto característico das casas nesse período, com diferentes tipos de acabamento,
com ripas ora em diagonal ora em vertical e simples, às vezes trabalhadas e com detalhes,
como o que se vê na imagem. A altura da casa a partir do chão, a construção desta apoiada em
cima de caibros e o suporte da mesma em cima de troncos de madeira fixados na terra são
alguns elementos que integram o espaço da casa.
O espaço da rua, marcado em 12% das imagens é, na mensagem fotográfica, um
espaço com registros frequentes. Na rua ocorrem os eventos oficiais, programados e
divulgados, tais como os desfiles nas festas do município ou no dia Sete de Setembro, a
preparação dos ciclistas para uma corrida, a procissão religiosa. É na rua que um grupo de
homens recebe certificado de treinamento e posa em frente a uma casa de tratores. O conjunto
das ruas da cidade planejada aparece alinhado nas fotos das vistas aéreas.
204
Foto 89 - Ruas, construções e o traçado da Praça Willy Barth
Acervo e autoria: Foto Kaefer. Vista aérea parcial da cidade de Marechal Cândido Rondon. Década 1960.
Na Foto 90, mostra-se uma parte da cidade de Marechal Cândido Rondon. Pode-se
observar que já existem várias casas e construções. Em meio a essa estrutura aparecem as
árvores e os lotes vazios são ocupados com plantações. Na parte superior direita da foto
aparece a atual Praça Willy Barth, marcada por traços e por contornos que receberam calçadas
e árvores. Ainda na parte superior direita da foto, atrás da praça, pode ser vista, com um
pequeno esforço, a antiga Igreja Evangélica “Martin Luther” e, ao lado, o início da construção
de uma igreja nova. Olhando-se para a praça, na parte inferior desta, podem ser vistos dois
terrenos vazios, reservados para a construção da prefeitura nova e do fórum. Atualmente esse
espaço, por onde cruzam a Rua Sete de Setembro, saliente à esquerda, e a Avenida Maripá,
saliente na parte superior direita da foto, faz parte do centro da cidade.
Através do registro de determinados espaços, alguns objetos puderam ser enquadrados,
como as pontes, as estradas, os meios de transporte e alguns carros envolvidos em acidentes.
205
Foto 90 - O capotamento do ônibus 287
Acervo e autoria: Foto Kaefer. Ônibus nº 287 – Linha Cascavel. Observado por autoridade policial, motoristas e
por curiosos. Década 1950/60.
Foto 91 - A mecânica do ônibus 287
Acervo e autoria: Foto Kaefer. Ônibus nº 287 que capotou e deixou a estrada interditada. MCRondon. Década de
1950/60.
Na estrada de chão, um pouco estreita para o tráfego simultâneo, o ônibus, através do
desvio da direção (não sabemos as causas), pelo que indicam os rastros deixados no chão de
terra pelos pneus, alcança o barranco e acaba por tombar, ocupando a estrada de forma
horizontal, de um lado ao outro. Virado de lado, uma parte da mecânica desse veículo de
transporte coletivo fica bem à vista. É difícil, para as pessoas que não trabalham com
mecânica, poderem observar esses veículos sob esse ângulo. Assim, algumas pessoas
observam o ocorrido e aproveitam para dar uma “examinada” no ônibus. Os motoristas e a
206
autoridade policial analisam o acidente de cima do ônibus. Portanto, ali, na estrada, por entre
a lavoura, ainda com mata ao fundo, os barrancos, pessoas, espaço e objeto são envolvidos.
O Jornal Hoje
237
, em 1977, faz comentários sobre acidentes de trânsito indicando que
estes “estão ficando cada vez mais freqüentes”. Na mesma página, faz um alerta, lembrando
aos leitores para que verifiquem a documentação dos carros e se o veículo recebeu alguma
multa, indicando que as multas são por causa de “diversas infrações”, tais como o uso de
contramão, o estacionamento irregular, velocidade superior à permitida ou, ainda, o
estacionamento em ponto de ônibus. Esse tipo de notícia indica que são várias as causas que
podem estar associadas aos acidentes, notando-se que descuidos, velocidade e inesperiência
causaram vários acidentes.
A construção do espaço geográfico está relacionada com a forma como esses lugares
são aproveitados e eleitos para serem vistos, apreciados e marcados pelo clic, tanto no que se
refere ao espaço natural quanto ao artificial.
Nesse sentido, fotografar-se envolto por elementos naturais tais como a mata, arbustos
menores, paredes sem pintura, latinhas penduradas, vasos de flores e plantas, o jardim dos
fundos e os arredores da casa dos fotógrafos são uma forma de representação do meio em que
viviam as pessoas e daquilo que priorizaram mostrar, o que foi possibilitado pelo
enquadramento direcionado para um tipo de fundo, e não outro, definindo o campo
fotográfico.
O espaço do jogo de futebol em lugares livres e abertos indica opções e condições de
lazer da época. Vários times de futebol foram criados no município, mas, desde os primeiros
anos da vinda dos migrantes, esses se reuniam nas praças para jogarem bola. Na oportunidade
da derrubada das árvores na sede da Vila General Rondon, a comunidade se reuniu em
mutirão para tirar os tocos e limpar a terra no espaço que estava sendo reservado para a
construção da atual Praça Wily Barth, para ali organizarem o campo de futebol. Na obra
escrita por Pawelke
238
estão relacionados o Esporte Clube Botafogo, Esporte Clube Flamengo
e o Esporte Clube Oeste, com inauguração do estádio em 1966, 1967 e 1970, respectivamente.
Constituídos de diretorias, os clubes possuíam mais de cem sócios, destacando-se o Botafogo,
que, em 1970, contava com 49 clubes associados e, segundo mencionado pelo autor, o
“número de atletas registrados na Federação: 950”. Ainda, a ênfase à prática do futebol deve
estar associada às “conquistas de três Copas do Mundo pelo Brasil de 1958 a 1970.”
239
237
JORNAL HOJE. Marechal Cândido Rondon, n. 6, p. 12, 02 a 07 set. 1977.
238
PAWELKE, op. cit., p. 60.
239
GREGORY; VANDERLINDE; MYSKIW, op. cit., p 112.
207
Foto 92 - Campo de futebol
Acervo e autoria: Foto Kaefer. Campo de futebol. Meados de 1950.
Na Foto 93, podem-se perceber atributos espaciais tais como a qualidade do campo,
com pouca grama e demarcado com pó de cal; sem arquibancadas, as pessoas posicionadas e
espalhas ao redor deste; as poucas casas e, ao fundo, uma mata fechada. Os torcedores e
outras pessoas da comunidade se deslocavam, em caminhão aberto
240
, para acompanharem as
partidas, inclusive as jovens e as senhoras. As imagens são uma representação das aspirações
sociais, da busca por disputas que se realizaram entre os diferentes times locais; das inúmeras
partidas para realizarem os campeonatos locais e regionais. Nesse vai e vem do jogo, do
exercício físico, dos deslocamentos para a realização das partidas, atletas, técnicos e pessoas
das comunidades se envolveram, percorrendo espaços que os levaram para muito além do que
os olhos puderam ver ao acompanhar o rolar da bola.
Foto 93 - Time de Futebol
Acervo e autoria: Foto Kaefer. Um dos primeiros times de futebol da Vila General Rondon. Meados de 1950.
240
Foto 03, pasta Esporte, acervo de Írica Kaefer, foto não incluída na análise.
208
Um time de futebol deixa registrados os seus atletas uniformizados, posicionados por
entre duas árvores pequenas. Camisetas e calções de algodão brancos, calção na altura da
metade das coxas, tênis e meia e, na cabeça, o que é isto? Uma espécie de boné usado para
protegerem a cabeça do sol. Deve ter caído algumas vezes durante os jogos. Algumas pessoas
e jogadores preparavam seu “boné” com um lenço de bolso, amarrando os quatro cantinhos do
lenço e formando um pano ovalado, adaptando-o à cabeça. No lado direito da foto, o técnico
do grupo e, num terceiro plano, posicionados na porta da moradia ou do comércio, um senhor
e uma criança, bem vestidos. Ainda, do lado esquerdo da foto, o enquadramento de um banco
de madeira e de uma cesta apoiada na varanda da casa. A cortina branca que aparece por
detrás da vidraça quadriculada acompanha os tons do uniforme, contrastando com a sombra
na porta.
Diante da variedade dos espaços, nota-se tratar-se de um espaço heterogêneo, com
alterações no que se refere à presença de pessoas, de objetos e de enquadramentos, indicando
a variedade de opções eleitas para a representação social.
A oposição natural x artificial mostra que o espaço natural é gradualmente alterado e
que diferentes objetos são acrescidos ao espaço geográfico, ampliando-se o enquadramento.
Outro aspecto que se observa é que, na medida em que ocorre uma maior ocupação do espaço,
os eventos passam a ter uma maior abrangência, envolvendo um maior número de objetos, de
lugares e de pessoas. Assim, a ideia do natural associada tanto à espontaneidade quanto à
pose, nos diferentes cenários que a coleção mostra, está associada às representações sociais e
esses espaços “entram na fotografia via uma escolha feita dentre um conjunto de escolhas
possíveis”
241
.
5.2.2.2 A oposição externo x interno
O espaço considerado natural subdivide-se em dois níveis: externo e interno. Neste
trabalho observa-se a diferença entre o espaço externo, considerado o espaço público, e o
espaço interno, considerado o espaço privado. Observam-se, pois, os registros relacionados
com o espaço exterior à casa e o espaço familiar e próximo à casa.
241
MAUAD, Sob o signo, 1990, op. cit., cap. III, p. 18.
209
Constata-se uma superioridade em relação ao registro de espaços exteriores sobre os
espaços interiores. De acordo com o quadro 25, dos 18 lugares que foram fotografados, 13
lugares estão ambientados em exteriores e 5 lugares em espaço interior.
Os espaços exteriores, assinalados por ambientações públicas, exibem lugares
próximos ao espaço externo do estúdio antigo, lugares relacionados com manifestações de
religiosidade, com esportes, com educação, com espaços comerciais e industriais, com
espaços cívicos e com a rua. Exemplificam-se espaços públicos com duas imagens -- uma
referente a um evento religioso e outra referente ao trabalho. Outros espaços públicos serão
integrados ao texto em momentos posteriores, quando se fará a análise dos espaços dos
objetos, das vivências e da figuração.
Foto 94 - Evento religioso
Acervo e autoria: Foto Kaefer. Inauguração do salão de festas da Igreja Evangélica “Martin Luther”. 1960.
Durante a festividade, uma parada para o registro da comemoração de inauguração do
salão comunitário. Entre a igreja e o salão estão aglomerados os fiéis. Um conjunto musical
anima ainda mais o grupo reunido, que acolhe a população em geral. A igreja está situada na
sede da vila, mas ainda existe uma parte da mata próxima dali. É a igreja próxima à praça
Willy Barth, mencionada na foto aérea (Foto 90).
A manifestação da religiosidade é uma das características da comunidade. Em General
Rondon foram fundadas várias igrejas na sede e nos distritos. A religião foi um aspecto
considerado inclusive pela colonizadora ao fundar os povoados.
Considerando-se as razões do seu enquadramento, o espaço público da rua, traçado em
27 imagens, é, na mensagem fotográfica da coleção, um espaço muito significativo.
210
Foto 95 - Caminhão com tora
Acervo e autoria: Foto Kaefer. Caminhão com tora de madeira. Década de 1960.
Na Foto 96, um caminhão carregado com uma tora de madeira foi estacionado na
frente do Estúdio Kaefer. O motorista e mais dois colegas de trabalho fazem uma fotografia
para registrar o tamanho da tora. Ao tamanho da tora estão associadas outras representações,
que se referem ao esforço desprendido para a derrubada da árvore, os equipamentos
utilizados, a técnica de carregamento desse pesado tronco, o tipo do caminhão, o motorista e
os homens que se envolveram nesse trabalho. Enfim, a imagem é uma representação de uma
atividade desenvolvida no período de desbravamento do espaço natural, que, através desses
objetos e do local enquadrado, ou seja, espaço urbano, na rua, em frente à Foto Kaefer e à
Casa das Bicicletas, demarca um espaço público.
A rua serviu, portanto, para reunir pessoas em momentos de acidentes de trânsito
(como já vimos), serviu como espaço para desfiles, para manifestações políticas, para
registros relacionados com atividades econômicas e para outras funções mais.
Na subdivisão do espaço natural ao nível interno, situado nas proximidades da
residência, a coleção guarda imagens que incluíram a mata, as casas ou parte delas, varandas,
arbustos, aspectos campestres e de lavoura.
211
Foto 96 - Retrato de família
Acervo e autoria: Foto Kaefer. Momento festivo. Década de 1960.
Registros fotográficos realizados em espaço próximo da residência, conforme pode ser
visto na Foto 97, eram muito comuns. Um grupo se reúne para uma foto de família. Trata-se
de um momento de comemoração. Um casal mais velho está posicionado ao centro, o que
pode indicar uma festa de bodas de ouro. A vestimenta também é de festa, pois todos estão
bem vestidos e, com exceção de um senhor que usa terno claro e camisa xadrez, os demais
homens usam traje escuro, as mulheres e meninas usam saia ou vestidos e os meninos, calça
curta escura com camisa clara, tratando-se de roupa boas. Dois meninos de colo usam boinas
e duas meninas, agachadas ao centro, em frente ao casal idoso, usam vestidos bem rodados,
cobrindo as pernas e os pés. Apenas dois meninos, sentados à direita da foto, aparecem
descalços, o que não significa necessariamente a falta de calçados, mas a liberdade de correr e
de brincar descalços num espaço livre, por entre as casas e nas proximidades da mata.
A fotografia 97 mostra um aspecto interessante. Segunda Írica
242
, nas fotos de família,
os filhos se posicionavam sentados ao lado dos pais. Nesse caso, as mulheres se encontram do
lado esquerdo e os homens do outro lado, tendo, atrás de si, seus parceiros(as). Por isso,
apresentam-se de um lado, o lado da mãe, as filhas mulheres sentadas e seus maridos, os
genros, permanecem em pé e atrás delas. Do outro lado, o lado do pai, sentam-se os filhos
homens enquanto as mulheres, as noras, ficam em pé. Ao centro da foto, atrás do casal mais
velho, em pé, posiciona-se um jovem. Esse poderia ser um filho mais novo e, ainda solteiro
ou, um neto mais velho? Ou ainda, poderia tratar-se de um filho que estivesse estudando em
seminário religioso podendo este ser um motivo por não estar acompanhado de parceira?
242
KAEFER, 19 ago. 2009, op. cit.
212
Estas observações, bem como outras, podem ser sugeridas pelos diversos componentes
fotográficos quando não se tem os mesmos formalmente identificados.
Foto 97 - Crianças na varanda
Acervo e autoria: Foto Kaefer. Crianças em espaço privado. Década de 1950/60.
A varanda da casa da Foto 98 recebe um enfeite especial: 11 crianças são posicionadas
nela, que é fechada com ripas de madeira encostadas uma ao lado da outra, diferente de outras
varandas, que têm as ripas separadas, mais abertas, recortadas ou quadriculadas. Paradas em
cima de algum objeto e, dependendo da altura, algumas aparecem mais e outras menos. As
meninas e os meninos estão posicionados próximos à parede da varanda, ocupando toda a
frente desta e a menina, aparentemente mais velha, segura um nenê nos braços. A luz intensa
parece refletir nas telhas, nas folhas da árvore da direita da foto e na parede da casa,
interferindo no contraste e prejudicando a percepção dos detalhes. A vantagem da claridade se
faz para o interior da varanda que fica bem iluminada para o enquadramento das crianças,
embora a profundidade de campo reduza os traços principalmente do rosto. Duas crianças têm
sua atenção voltada para algo que acontece no lado esquerdo da foto, mas não está
enquadrado.
213
Foto 98 – Crianças nas cadeiras
Acervo e autoria: Foto Kaefer. Crianças em frente a uma casa. Década de 1950/60.
As crianças da Foto 99, também, são posicionadas na parte externa da varanda,
próximas à residência. No primeiro e segundo planos, a luz se faz mais intensa, não definindo
bem os traços dos rostos das crianças. Já no terceiro plano, o tom da cor da parede da varanda
e os galhos de árvores introduzidos para o registro amenizam o fundo. Nessa imagem, um
objeto é colocado junto às crianças para distribuí-las e ajeitá-las melhor no enquadramento
fotográfico. Ou seja, aqui a cadeira é visível
243
e, na falta de uma cadeira, uma das crianças
fica de pé no chão perto das demais sentadas. As crianças estão voltadas para o fotógrafo, mas
a cabeça de um dos menino menores sentado na parte esquerda da foto volta-se para a criança
que está ao seu lado e, ao invés de colocar as mãos sobre os joelhos como aquela, ergue a mão
e mexe em uma de suas orelhas.
No espaço privado também são feitos registros, porém em número menor, de algumas
pescarias, caçadas e atividades agrícolas. Cabem algumas exceções, a exemplo da batata-doce
(Foto 146), que foi levada para ser fotografada no estúdio o que também ocorreu com outros
produtos agrícolas, tais como cabeças de repolho, e que podem ser vistos no acervo de fotos
do CEPEDAL. Próximo da residência, ficava o chiqueiro dos porcos e o galpão que armazena
produtos colhidos. Animais caçados eram expostos e fotografados, a exemplo de alguma
onça, porco-do-mato, capivara, peixes, aves, etc.
Apresentamos alguns desses animais.
243
Idem, ibidem. Percebeu-se o uso de cadeiras para acomodar crianças em várias fotografias do acervo de Írica.
A fotógrafa informou que as cadeiras eram usadas para auxiliar no nivelamento da altura das crianças
ajustando-as com a altura do tripé quando este era usado.
214
Foto 99 – Os peixes
Acervo e autoria: Foto Kaefer. Homens exibem a pesca em frente a uma casa. Década de 1950/60.
A pescaria era uma atividade de lazer, mas também era feita para fornecer alimentos.
Quando os homens iam pescar em rios maiores, como no Rio Paraná, conseguiam peixes
muito grandes e que dava trabalho para serem retirados das águas e puxados até o caminhão,
de onde eram transportados para casa. Chegou-se a pescar animais que pesaram quase cem
quilos. A carne era repartida entre as famílias dos pescadores e também vendida. Um peixe
dava para alimentar mais de uma família.
Foto 100 – A onça
Acervo e autoria: Foto Kaefer. Homens exibem o resultado de uma caçada - uma onça pintada. Cachorros
caçadores entram na cena fotográfica. Década de 1950/60
A Foto 101 refere-se a um registro de uma caça singular – uma onça pintada. Onças
eram temidas nas décadas de 1950/60, pois elas perambulavam pela mata ainda existente e, às
vezes, as pessoas ouviam seus gemidos ou viam sinais de suas patas. Quando se colocavam a
persegui-las, armavam-se de espingardas, de cartucheiras e de cachorros preparados para as
215
caçadas. Os cachorros que foram enquadrados no registro, magros e altos, são de uma raça
específica para caça.
O suporte usado para expor a onça é semelhante a cavaletes fabricados manualmente
para formar uma mesa e lembra também o suporte onde eram colocados troncos e galhos de
árvores para serem serradas e usadas para fazer fogo. Serrava-se a lenha em pedaços menores,
pedaços que eram depois cortados com machado e usados como lenha de fogão ou para outras
finalidades.
Fazer um registro de uma caça, especialmente de animais ferozes, ou da captura de
peixes grandes de até 70 quilos, significa a possibilidade de contar e poder mostrar aos
amigos, vizinhos, familiares e aos novos moradores que chegavam a conquista e o domínio do
espaço. Além do que, essa era uma tarefa para grupos de pessoas com habilidades e coragem
o suficiente para enfrentar a fera e dominá-la, enfrentar o rio e ter forças para puxar os peixes
até a embarcação e, ainda, até o caminhão. Dominado o animal, era preciso carregar e
transportar o mesmo para casa, onde, então, era preparada a cena e aguardado o fotógrafo para
fazer o registro. Em certas ocasiões, dependendo do trajeto da estrada, principalmente os
pescadores, chegavam em frente à Foto Kaefer e davam uma paradinha na viagem justamente
para o registro da caça ou da pesca.
A situação de registros em espaço interno é verificada também com relação à
produção, chamando a atenção a quantidade de registros feitos com a criação de suínos.
Nosso primeiro contato com uma fotografia com imagem de um suíno ocorreu no CEPEDAL
e a imagem chamou nossa atenção. Por que estaria um casal fazendo pose dentro de um
chiqueiro e junto de um suíno? O tipo de registro chamou nossa atenção e a questão do
interesse sobre fotos com suínos por parte dos agricultores ficou esclarecida durante nossa
dissertação. Das atividades domésticas praticamente não era feito registro. Ressalta-se, porém,
neste aspecto da fotografia feita junto a um suíno, que “a prática da produção familiar
baseava-se principalmente na produção para subsistência e que, através da produção
agropecuária, a suinocultura veio a se integrar à agricultura, tornando-se uma das principais
atividades econômicas do município”
244
.
Na coleção de Írica novamente nos deparamos com fotografias de agricultores que
fazem fotos com suínos.
244
GREGORY, Imagens..., 2002, op. cit., p. 54
216
Foto 101 - Um porco com seu dono
Acervo e autoria: Foto Kaefer. Um porco no chiqueiro sendo acariciado pelo seu dono. Década de 1950/60.
A Foto 102 mostra um momento de atenção e de afabilidade que ocorre entre um
criador e o seu porco. As roupas desalinhadas são vestes boas, sem rasgos e não estão muito
sujas. Como acessórios, um chapéu e um cinto. A bota de couro é o calçado normalmente
usado nas lidas da roça e nos serviços próximos à casa, como nos chiqueiros e nos galpões.
Segurando o cigarro em uma das mãos e apoiando a outra sobre o porco, o homem quer
mostrar e registrar a boa produção, pois criar porcos era uma das atividades nas pequenas
propriedades rurais. Poder mostrar um suíno gordo e forte era um sinal de que a família tinha
trato para os animais, era sinal de trabalho e também orgulho para os agricultores. O olhar do
homem que posa ao lado do suíno é direcionado para o espaço de criação dos animais, o
chiqueiro. É no chiqueiro que a economia está sendo gerada. Assim, tem-se a impressão de
que o valor econômico falou mais alto e está acima do valor do equipamento e daquele que o
está registrando. Naquele momento deveria estar seguro do valor simbólico produzido através
do registro, agora visível, na representação fotográfica.
217
Durante entrevistas com pessoas da comunidade, elas procuravam mostrar suas “fotos
antigas” e verificou-se que, quando possível, o agricultor procurava fazer um registro do suíno
gordo, no momento da sua venda. Mostram-se duas imagens sobre essa atividade agrícola e a
transação comercial envolvendo a venda de suínos, com fotos que não pertencem ao acervo
pesquisado.
Foto 102 – O menino e o suíno.
Acervo Irma e Beno Vorpagel. Autoria: Foto Kaefer. O pai Vorpagel e filhos acompanham a venda de um suíno.
Marechal Cândido Rondon. Início da década de 1960.
Uma das circunstâncias foi verificada na residência da família Vorpagel, que, na
ocasião da venda de um suíno, aproveitou para fazer várias poses com o animal. Segundo
comentário de Irma: “A gente sentava as crianças em cima do porco para fazer uma foto, olha
aqui”
245
. Informa a mesma senhora que o agregado que trabalhava com o casal também fez
foto com o suíno, já carregado na carroceria do caminhão para ser transportado e
comercializado.
A outra circunstância foi levantada em momento de entrevista com a Elsa Wiedeck.
Trata-se da venda de uma carga de suínos. Procurada para auxiliar na identificação de
algumas fotografias por ser moradora da localidade de Pato Bragado, antigo distrito de
Marechal Cândido Rondon, essa pioneira levou para a entrevista a foto da venda de suínos,
considerada “a primeira carga de porco que a família vendeu, depois de chegar do Rio
Grande”
246
, fazendo alusão à localidade de Montenegro, no Rio Grande do Sul.
245
VORPAGEL, op. cit.
246
VIEDECK, Elsa Elma. Entrevista concedida a Lucia Teresinha Macena Gregory. Marechal Cândido
Rondon, 22 jul. 2009.
218
Foto 103 – A carga de suínos e a Família Wiedeck.
Acervo de Elsa E. Wiedeck. Autoria: Fotógrafo de Pato Bragado, nome não identificado. 1967.
Sentado na frente do caminhão, o motorista e “bodegueiro” comprador dos suínos, Lotário Stelda. Em pé, da
esquerda para a direita, Arlindo Wiedeck. Ao lado, a esposa, Elsa, de avental e chapéu. Ao lado da mãe,
Teresinha, a segunda filha mais velha. A avó, mãe de Arlindo, está de avental e bengala. Depois, do seu lado,
Lucia, a filha mais velha, Erno, o único filho homem, posicionado no meio do grupo, e as meninas menores
Dulce, Verena, Iara, Lurdes e Vera, no final da “escadinha”. Depois, nasceu mais uma filha, a Rosecler. Em
cima do caminhão, Bucks e outro senhor que auxiliaram no carregamento dos animais.
A Foto 104 mostra a situação depois de feito o carregamento dos suínos. Trata-se da
“primeira carga de porco” vendida pela família Wiedeck. O casal chegou a Pato Bragado
depois de oito dias de viagem de mudança, vindos de Montenegro, RS, em 1965. O
comprador da carga, que faz pose sentado na frente e em cima da cabine do caminhão, teria
dito “sim, agora nós vamos fazer uma fotografia com toda a família” comenta Elsa. Assim,
teriam se posicionado ali, na frente do caminhão, com os porcos já carregados. As pessoas, de
fisionomia alegre, estão com vestes de uso doméstico e a dos homens está mais suja por terem
trabalhado no chiqueiro, acompanhado o peso dos suínos e feito o carregamento desses
animais. Elsa comenta que poderia fazer algumas compras com o dinheiro do faturamento dos
porcos, porém “demorava às vezes dois meses até que a gente recebia o dinheiro, porque os
porcos eram levado prá longe porque no início não tinha frigorífico aqui... Mas a gente já
podia comprar alguma coisinha”.
Tendo perguntado sobre a compra dos tecidos, a senhora explicou, dando risada:
“Olha ali, tá tudo com a mesma roupa, as pequena. A gente aproveitava mais o pano” –
detalhou, referindo-se ao fato de que, ao comprar vários metros do mesmo tecido, as laterais
do pano permitiam a confecção da parte superior ou das mangas para mais um vestido.
Continuando a rir, a mesma senhora ainda observou, “e olha aqui, o meu avental é igual à
camisa do Erno”, apontou para a foto, observando que essas duas vestes foram
confeccionadas do mesmo tecido.
219
Sobre as transações com os suínos, a senhora lembrou que, ao comprarem sacos de
ração para tratar os animais, essa ração vinha armazenada em bolsas de algodão. A família
aproveitava as bolsas para fazer toalhas, panos de prato ou lençóis. “As filhas ficavam de olho
na linha dos sacos”, comenta a senhora, referindo-se ao fio de linha que era retirado da
costura da bolsa à medida que os sacos eram esvaziados. Ao retirarem a ração das bolsas, o
fio de linha com o qual a bolsa tinha sido costurada era disputado entre as moças, que
enrolavam os fios em sabugos de milho e o aproveitavam para fazer crochê ao redor dos
panos de prato e das toalhas. Aspectos mostrados em torno de fotografias feitas com suínos
são representações relacionadas com atividades que se passaram em espaço interno e indicam
a abrangência que a criação de suínos teve em uma família de agricultores. A fotografia em
frente ao caminhão carregado de suínos mostra que o momento é tão importante que toda a
família é reunida, além dos trabalhadores que auxiliaram na transação comercial. Até mesmo
os cachorros, o Piloto e o Totó, estão enquadrados. Só faltou Soeli, a filha que já havia saído
de casa para trabalhar em Mercedes, uma localidade a uns 40 quilômetros de Pato Bragado.
Elfes, após pesquisa realizada em nove municípios da região, escreveu, em 1970, que
embora decorrido “um curto período de povoamento, o volume da produção ali realizada é
simplesmente impressionante”, indicando que os principais produtos são o porco, a soja e o
trigo. Ao indicar um dado relativo à suinocultura no município de Marechal Cândido Rondon,
informa que, “somente no ano passado, exportou 314.000 cabeças vivas, além do que foi
morto e industrializado internamente”
247
.
Foto 104 - Uma colheita de soja.
Acervo e autoria: Foto Kaefer. Trabalho mútuo na colheita da soja. Fins da década de 1960.
247
ELFES, op. cit., Apresentação.
220
A plantação de soja na região do Oeste do Paraná foi incrementada na década de 1960,
tendo ampliada a sua produção nas décadas seguintes. Durante os primeiros anos, os
migrantes colhiam a soja com trilhadeiras. Na foto 105, um grupo de produtores se reuniu
para a colheita e aproveita para mostrar o funcionamento da ceifadeira
248
, que é maior e mais
potente que as trilhadeiras. Depois de cruzar por toda a lavoura e colher a soja, a ceifadeira
faz o ensacamento. Enquanto alguns trabalhadores acomodam as sacas cheias, outros ajustam
as sacas e as seguram abertas para recolher a soja que cai do graneleiro. Na lavoura
localizada, às vezes próxima, outras vezes mais distante da casa, se reúnem as pessoas para
darem conta da colheita. A lavoura preparada, a semente plantada, a planta cresceu e
amadureceu são símbolos que representam o trabalho familiar. A colheita é um sinal de
fartura e de prosperidade. Através da negociação da safra, dívidas podiam ser pagas e novas
compras podiam ser feitas. Para que tudo funcionasse bem, até as crianças eram levadas para
a roça e acompanhavam o trabalho das mães, que, com chapéus na cabeça, de avental,
acompanham os maridos nessa tarefa.
Percebe-se que o espaço natural ao nível da oposição público x privado também é um
espaço heterogêneo e as variáveis acentuam a ambientação pública em detrimento do privado.
O espaço público, o movimento social, os eventos, as atividades registradas no espaço da rua
mostram onde o grupo se reunia e como ocupava seu tempo de lazer, de religiosidade, de
educação, de trabalho, de relações econômicas -- “o espaço da fruição e do consumo” entre
outras atividades que as fotografias representam. No espaço interior, privado, são registradas
as crianças, os casamentos dos filhos que crescem e formam um novo lar, dos elementos
relacionados com a produção -- “o espaço do trabalho, onde a riqueza é gerada” e que se torna
espaço de referência para o grupo.
5.2.2.3 A oposição urbano x rural
A oposição urbano x rural integra a caminhada de grande parte dos migrantes.
Procuradas por vendedores de terras da Maripá, as famílias, passando por dificuldades por
causa do solo enfraquecido das lavouras do sul, optam pela compra de uma área de terras no
Paraná. Mais baratas, as famílias compraram áreas maiores, pensando no futuro dos filhos,
que, em certos casos, passou de oito ou mais filhos.
248
A mesma fotografia da ceifadeira, foto 105, está inserida no livro Desafios, Lutas e conquistas de
SAATKAMP, 1985, p. 118.
221
Através da colonizadora Maripá, criada a Vila General Rondon, esta foi dividida em
distritos, conforme visto no capítulo I. Além da sede da vila General Rondon, os distritos
também possuíam a sua sede. Nesses espaços, foram construídas igrejas, escolas, salões de
festas, casas comerciais. Algumas atividades eram desenvolvidas nos distritos, porém
questões relacionadas com a saúde, com o comércio mais amplo, com bancos, com
cooperativas, com atividades públicas envolvendo a prefeitura, questões policiais ou judiciais,
todas essas questões teriam que ser resolvidas na sede da vila General Rondon ou no
município de Toledo, o que levou as pessoas a transitarem do espaço rural para o urbano.
No conjunto da coleção identificaram-se 76% das fotos relacionadas ao universo
urbano e 20% das fotografias ao universo rural. Nove fotografias, o que corresponde a 4% do
total das fotos, não puderam ter identificada essa característica de espaço. São fotos
relacionadas com acidentes de trânsito, esporte e festividades. Cabe relacionar esses dados ao
fato de que a população era numericamente maior que a população no Paraná até o censo de
1980 do IBGE, quando os índices populacionais urbanos superaram os do meio rural.
Na coleção das fotos de Írica, os espaços urbanos que foram registrados estão
relacionados aos estúdios fotográficos, às igrejas, aos clubes e aos salões de festas, à escola, à
rua e a seus momentos cívicos, às vistas da cidade, às fachadas comerciais e ao lazer.
O estúdio fotográfico pode ser considerado como um lugar de ambientação urbana.
Aos domingos, após as cerimônias religiosas, muitas famílias levavam seus filhos para serem
fotografados, aproveitando o dia de folga e também o momento, “pois as crianças estavam
arrumadas”
249
, ou seja, limpas, bem vestidas e acompanhadas dos pais.
249
BOECH, op. cit.
222
Foto 105 - Crianças no estúdio
Acervo e autoria: Foto Kaefer. Quatro irmãs e um irmão são fotografados no estúdio novo que mantém ao fundo,
estampa do estúdio antigo. Década de 1960.
Na Foto 106, veem-se cinco crianças posicionadas para uma foto. Ao centro, no
primeiro plano, sentada no sofá, a menor delas e, apoiadas no encosto do sofá e sentadas no
braço deste, uma das meninas e o único menino são ajeitadas, e, em pé, atrás do sofá, usando
seus vestidos poá, estão paradas as irmãs maiores. Essa foto não significa necessariamente
que tenha sido feita em um domingo, porém as crianças apresentam-se bem vestidas, usam
sapatos e duas delas usam sapatos com meias, ou seja, houve uma preparação, uma intenção
fotográfica.
A imagem registra as quatro filhas e o único filho, criando uma representação da prole
que, nesse caso, se faz mais feminina do que masculina e significa que os pais estão dando
continuidade à família.
Para o estúdio foram, além das crianças, noivos e seus familiares, mulheres, mulheres
com crianças, e, em menor número, os homens.
Durante a década de 1970 ocorre a mecanização agrícola na região. A opção pela
cultura do binômio trigo e soja provoca êxodo rural, alterações nos movimentos populacionais
e várias famílias ou seus filhos mudaram para a cidade, gerando maior urbanização. Nesse
contexto, assim como a maioria das famílias se estabeleceu em espaço rural, existem
exceções, pois também vieram famílias para atuarem no comércio, na indústria, na saúde ou
na administração pública, estabelecendo-se, desde o início, em espaço urbano, a exemplo dos
223
fotógrafos Kaefer, que, ainda assim, também atuaram em espaço rural, por causa das
atividades com a cultura do café e, posteriormente, com a agropecuária.
Várias famílias que se estabeleceram em lotes urbanos também desenvolveram
atividades de características rurais, limpando a terra, determinando áreas para plantar café,
milho, mandioca, bananas, árvores frutíferas, em áreas do perímetro urbano e destinando um
espaço para a horta, que ficava próxima da residência, cercada, para evitar que os animais,
principalmente as galinhas, fossem picar e comer as verduras. Plantava-se de tudo um pouco.
Foto 106 – Vista parcial da vila
Acervo e autoria: Foto Kaefer. Lotes em área urbana. Vila General Rondon, 1955. Diversas moradias e na parte
inferior da foto, as hortaliças.
A Foto 107 é uma representação do espaço urbano, com poucas ruas abertas, mas os
postes de luz já estão colocados, as casas são bem construídas, as aberturas com janelas
venezianas e vidraças, cobertas com telhas, numa dimensão significativa, com alguma
infraestrutura construída separada que servia para guardar alimentos, ferramentas, bicicletas
ou o carro. Na parte superior à esquerda, vê-se uma casa em construção e à mostra o
alinhamento das cunheiras, uma estrutura montada em madeira, onde são colocadas as telhas
da casa. Era preciso saber fazer bem essa parte da casa, ajustando-a ao tamanho da construção
e às divisões e repartições que a mesma possuía, o que pode ser observado na residência
localizada na parte superior direita da foto.
Animais também foram criados no espaço da vila, em pequena quantidade, tais como
vacas, cachorros, galinhas, porcos para a subsistência da família e vizinhos próximos, que
compravam leite, galinhas, ovos, uma parte da carne e banha de porco. As famílias também
faziam trocas de alimentos, pois, no início da colonização, não havia como guardar carnes por
muito tempo e estas eram repartidas entre os vizinhos e, assim, quando um outro morador
224
carneava um animal, devolvia a carne. Gregory
250
escreve que “A produção agrícola colonial
exigia a diversificação de atividades produtivas, principalmente no setor urbano. As principais
indústrias da colônia, em 1956, eram de processamento agrícola, atendendo necessidades
locais, além das indústrias madeireiras e de alguma oficina.”
Foto 107 – Animais na vila.
Acervo e autoria: Foto Kaefer. Aspecto urbano da Vila General Rondon, 1954. Diversas moradias e na parte
central inferior da foto, animais no pasto.
A imagem da foto 108 aponta para uma vista parcial da vila e, abaixo do centro da
imagem, um animal amarrado num toco que fica atrás dele (pode ser visto com a imagem
ampliada), que se alimenta e caminha de acordo com os limites estabelecidos pela corda,
pisoteando e marcando seu espaço, alimentando-se da vegetação circundante até os limites
permitidos pela corda, conforme mostra a área esbranquiçada ao seu redor. A prática de
amarrar os animais servia para alimentá-los, para que pastassem na vegetação e gramas e era
uma segurança para que não saíssem da propriedade, até porque poderiam causar transtornos
no espaço urbano.
Registros relacionados à educação mostram a ambientação da escola em espaço
urbano, porém, até a década de 1960, “foram criadas na região de Rondon 31 escolas”,
mantidas pelo município de Toledo. As escolas, salas de aulas e os recursos humanos que
envolveram o aspecto educacional podem estar representados nessas imagens do acervo.
250
GREGORY, Os eurobrasileiros..., op. cit., p. 197.
225
Foto 108 - Escola Luterana Concórdia
Acervo e autoria: Foto Kaefer. Professor e alunos da Escola Luterana Concórdia. Rua Paraná, Marechal Cândido
Rondon. Década de 1960.
A Foto 109 é um registro das crianças do ensino primário da Escola Luterana Cristo,
mantida pela Comunidade Evangélica Luterana Cristo e foi fundada em 1955
251
. No início da
década de 1970, a escola tinha 217 alunos
252
. Na imagem, as meninas estão posicionadas à
esquerda e os meninos, ao fundo e no lado direito da foto. O professor posicionou-se no
centro da foto e da entrada para o educandário, atrás dos alunos. Uniformizadas, ordenadas e
posicionadas em linha reta, em vários planos, colocaram-se uma ao lado da outra de modo a
permitir a visualização melhor das crianças. O grande grupo posando, assim alinhado,
uniformizado, é uma representação da boa educação, de como os alunos recebem as ordens
repassadas, o que demonstra também a posição das mãos, que todos colocaram para trás do
corpo. Eis uma imagem da ordem e da disciplina.
Ao se mencionarem atividades relacionadas à educação, pode ser feita uma referência
aos cursos de qualificação, voltados à alfabetização, a exemplo do curso MOBRAL, e outros
que também eram destinados à preparação das pessoas que lidavam no campo, considerando-
se a aquisição de equipamentos, de implementos e de maquinários modernos, para os quais o
colono necessitava preparar-se.
251
BAUERMANN, Almiro. Entrevista concedida a Lucia Teresinha Macena Gregory. Marechal Cândido
Rondon, 21 jul 2008.
252
PAWELKE, op. cit., p. 61
226
Foto 109 – O certificado
Acervo e autoria: Foto Kaefer. Recebimento de certificados de um curso para tratoristas. Marechal Cândido
Rondon. Início da década de 1970.
A Foto 110 é o registro do momento em que os agricultores receberam certificado de
curso de preparação para tratoristas. No primeiro plano percebe-se um chão de terra. No
segundo plano, um grupo de alunos/agricultores, posicionados para a foto, segura seus
certificados usando bonés de firma vendedora de produtos agrícolas. Nas extremidades, do
lado esquerdo, um trator foi enquadrado e alguém do grupo usa o acento do motorista, dando
maior ênfase à máquina. Na outra extremidade, sem certificado e com as mães cruzadas nas
costas, posicionaram-se, aparentemente, vendedores e instrutores. Atrás do grupo, entre este e
o estabelecimento de venda de produtos agrícolas, ficaram estacionados os automóveis, entre
os quais Fuscas Volkswagen e Jeep, indicando tratar-se de carros usados da época. Ao fundo,
a empresa representante de máquinas agrícolas. No alto da fachada, no sentido horizontal, a
propaganda indica tratar-se da empresa Carelli Ltda, representante de “tratores CBT” e das
Colhedeiras Case. Na fachada do empreendimento, as janelas e portas com vidro auxiliam na
visibilidade dos produtos que devem estar expostos no interior da loja. Ainda, entre as janelas
e portas, usando a parte que restou da parede de alvenaria, outra propaganda, escrita na
vertical, especifica que ali podem ser adquiridos “acessórios, arados, pé de pato, carretas,
pulverizadores, grades”, numa divulgação dos produtos que ali podem ser encontrados. O
agricultor está, assim, cercado, por todos os lados, de mensagens que o espaço urbano oferece
para seduzi-lo. Integrado às mensagens está o nome do formado que, como participante do
curso, recebe seu certificado.
227
Quando os jornais locais começaram a circular em MCRondon, mais expressivamente
a partir de 1974
253
, vários cursos nesse âmbito do interesse foram oferecidos e divulgados por
esse meio de comunicação, mostrando a preocupação das empresas vendedoras, dos seus
representantes, da Secretaria Municipal de Educação, etc., em qualificar as pessoas do setor
agrícola. Através do programa “MOBRAL, em conjunto com a Massey-Fergunson”, teria sido
oferecido um curso de tratorista, “para alunos e ex-alunos da educação integrada do
município”
254
. As inscrições poderiam ser obtidas com o Departamento de Educação. Nota-
se, nessa forma de educação e qualificação, a integração de diferentes órgãos a se envolverem
na preparação de pessoas da comunidade e em qualificá-las para que pudessem praticar e
obter domínio sobre os equipamentos que estavam chegando das fábricas. A indústria também
tinha esse interesse, pois, para que houvesse vendas, era preciso que o comprador estivesse
preparado e soubesse manusear os equipamentos. Nesse sentido, ao espaço urbano estava
reservada a venda de equipamentos e a preparação dos agricultores para o manuseio correto
das máquinas. O meio rural era o lugar onde as técnicas recebidas eram colocadas em prática
e as máquinas eram acionadas para preparar a terra e fazer a colheita. A
modernização/modernidade era articulada entre o urbano e o rural.
Vinculada ao espaço urbano da escola está a atividade cívica. Na escola, as crianças
são preparadas, fazem os ensaios para a marcha, acompanham os professores no enfeite dos
carros alegóricos, cantam hinos cívicos e, no dia determinando, especialmente no dia do
aniversário do município e/ou no dia da independência do Brasil, vão às ruas para realizarem
os desfiles e participarem do ato público que envolve também a comunidade.
253
WILMSEN, Ana Paula; KUNZLER, Maria Cristina. Mídia e Memória: estória dos veículos de comunicação
do município de Marechal Cândido Rondon contada por seus protagonistas. Marechal Cândido Rondon:
Editora Germânica, 2006. p. 53. Segundo a obra, o “Jornal Rondon Comunicação passou a circular, em
15.03.1974”, com uma tiragem de 3 mil exemplares.
254
CURSO de tratorista. Rondon Comunicação, Marechal Cândido Rondon, Ano, 3, n. 108, p. 15, 10 maio
1976. O ALENTO. Marechal Cândido Rondon, Ano 1, n. 40, p. 11, 16 a 22 maio 1980. Anuncia curso de
mecanização agrícola, no distrito de Pato Bragado, com a presença de engenheiros e técnicos agrícolas da
Acarpa/Emater, com aulas teóricas e práticas. Um grupo de jovens cooperativistas posa em foto ao lado de
vários tratores.
228
Foto 110 – A faixa
Acervo e autoria: Foto Kaefer. Alunas carregam uma faixa em dia de desfile. Marechal Cândido Rondon. Início
da década de 1970.
O espaço urbano apresenta a rua asfaltada. Uma multidão acorre ao evento e, ao
prestigiar o desfile, integra-se à atividade cívica. Através da fotografia 111 percebe-se que um
dia de desfile é um dia especial. A comemoração da independência do país é lembrada na
escola e a comunidade acompanha os comentários através de rádios e dos jornais que
normalmente aproveitam a oportunidade para elogiar as autoridades políticas e propagar os
seus feitos. A escola segue uma linha político-educacional semelhante, enaltecendo o país e
seu povo, o que bem demonstra a frase “Formamos Povo Brasileiro”, escrito na faixa. A
escola é a instituição que recebe das instâncias superiores determinações no sentido de que os
cidadãos precisam valorizar seu país e respeitar as autoridades para que estas possam manter a
ordem e o progresso. Nesse sentido, através da escola, a população se reúne, comemora,
festeja, ocupando ruas e praças num espaço que se faz eminentemente urbano. Nos primeiros
anos da fundação de General Rondon, as escolas dos distritos desfilavam na sede e, anos mais
tarde, cada distrito organizava seus desfiles, que eram acompanhados de um representante da
administração pública municipal. O ambiente escolar é representado enquanto espaço em que
circula o civismo e a moralidade.
O ato de participar das manifestações cívicas é uma oportunidade para a escola
mostrar seu potencial, em termos da quantidade de alunos, dos uniformes, da organização que,
em parte, pode ser interpretada pelo alinhamento das filas durante a marcha, enfim, um sinal
de cumprimento do dever. Já para os familiares é uma oportunidade de verem seus filhos, os
filhos da vizinhança, os alunos de outras escolas, etc. A festividade é, para eles, além de um
momento cívico, um momento de lazer, porque deixaram de lado o trabalho e afazeres
cotidianos para poderem se divertir.
229
Uma outra atividade de lazer realizada em espaço urbano está relacionada ao esporte,
mais especificamente ao futebol. Nessa coleção, as imagens relacionadas ao futebol, no que se
refere aos jogadores e aos campos, não puderam ser identificadas quanto a se tratarem de
espaço rural ou urbano. Ilustra-se, porém, a atividade por considerar a realização em espaço
urbano de um baile realizado com a escolha de rainha e princesas de um clube esportivo. A
atividade esportiva está relacionada com os dois espaços de oposição, urbano x rural, pois, a
exemplo do que se mencionou anteriormente sobre as escolas, times foram organizados na
sede do distrito, onde campos de futebol ficavam em espaço urbano. Em localidades do
interior rondonense também foram feitos campos de futebol.
Foto 111 - As senhoras do esporte
Acervo e autoria: Foto Kaefer. Rainha, princesas e Prefeito Dealmo Selmiro Poersch e esposa em momento
festivo do Esporte Clube. Marechal Cândido Rondon, Final década de 1960.
A fotografia 112 mostra um momento festivo, com a coroação de uma jovem eleita
como rainha de um clube esportivo. A rainha está ladeada de um casal e da primeira e
segunda princesas. As jovens receberam faixas e a rainha recebeu uma coroa e um cetro.
Todos estão em pé e, atrás do grupo, num segundo plano, foram colocados sofás, que servem
para as moças eleitas sentarem e fazerem outras poses no decorrer da festividade -- o que
pode ser visto em outras fotos da coleção, referente a outros bailes de rainhas de futebol, não
incluídas na análise. Várias festividades registradas e que envolvem o espaço urbano se
desenvolveram em clubes e salões. Nesses espaços ocorreram, além dos bailes esportivos, os
bailes de formaturas e as festas de carnaval e juninas.
No espaço urbano também estão localizados o comércio e a indústria, com registros
em menor número.
230
Foto 112 – A relojoaria Esmeralda
Acervo e autoria: Foto Kaefer. Interior da Relojoaria Esmeralda. Marechal Cândido Rondon, Década de 1960.
Na Foto 113, podem ser vistas mercadorias da Relojoaria Esmeralda, localizada na
Rua Sete de Setembro, ao lado da Prefeitura Municipal. Além de joias, vasos para flores e
cuia para chimarrão podem ser vistas na vitrine. Como pano de fundo, na parte central
superior da foto, vários relógios estão expostos na parede. Ao lado dos objetos, atrás do
balcão e em segundo plano, à direita da foto, o proprietário Rudi Reuter faz pose sobre o
balcão, de braços cruzados e olhar voltado para a lateral, olhando para fora da vitrine. Na
outra ponta do balcão, um funcionário que, através do olhar, dialoga com a câmera. Na
margem escura, parte inferior da foto, números “7 – 4A” e a palavra “Perutz” são indicações
referentes ao filme utilizado no momento.
No espaço urbano de General Rondon foram instaladas várias indústrias, sendo uma
de café, um frigorífico de suínos, laticínios, mas, num primeiro momento, foram as serrarias e
as marcenarias que se fizeram necessárias. É sobre as serrarias que a coleção guarda algumas
imagens.
231
Foto 113 - Vista urbana e uma serraria.
Acervo e autoria: Foto Kaefer. Vista geral de Marechal Cândido Rondon. Início da década de 1970.
A imagem da Foto 114 mostra que a cidade cresceu, os lotes bem divididos estão
ocupados com residências e com construções comerciais, igrejas e escolas. A avenida central,
mais na parte esquerda da foto, já está duplicada e arborizada, o que se observa na parte
superior da foto e se refere à Avenida Maripá, sentido centro-bairro. Seguindo-se a mesma
avenida, porém para a parte inferior da foto, a Avenida Maripá atravessa a Avenida Rio
Grande do Sul e, a partir desse cruzamento, a Avenida Maripá passa a ser Avenida Castelo
Branco. Uma característica a mais pode ser percebida nesse espaço urbano: a implantação do
asfalto. O asfalto vem pela Avenida Castelo Branco e está a três quadras de uma serraria que
se avista na parte inferior esquerda da foto. As serrarias tiveram importância significativa no
início da colonização e várias estavam localizadas em perímetro urbano
255
. Duas delas ainda
funcionaram, com pequenas atividades, até o ano de 2005.
Percebe-se que as imagens do espaço urbano estão relacionadas às manifestações
festivas, de lazer e de civismo. Estão relacionadas às poses e às artificialidades dos estúdios e
sua técnica, às fachadas comerciais, à educação, ao asfalto, à iluminação, etc. e, em menor
proporção, ao trabalho. Nesse sentido, o espaço urbano está associado ao movimento, ao vai e
vem nas ruas, à tecnologia, ao ensino e à aprendizagem, às comemorações e às vibrações.
Através das atividades urbanas, as pessoas estão vinculadas aos códigos de modernidade, de
velocidade, de luz. Também vinculadas às diferentes opções de compras, ao consumo. As
imagens são registros dos diferentes momentos de uso do espaço urbano e das opções das
famílias pela representação social desses espaços através da mensagem fotográfica.
255
Fotos da coleção, nºs 08, 99, 101.
232
No espaço rural encontram-se as imagens relacionadas a aspectos da natureza, como
rios, pontes, mata e campo, casas ou parte destas, bem como relacionadas à produção e a
alguns registros festivos, num total de 20% das fotografias da coleção.
Foto 114 - Moradia em espaço rural
Acervo e autoria: Foto Kaefer. Espaço rural no interior de Marechal Cândido Rondon.
Na Foto 115, foram enquadradas uma residência e parte da infraestrutra. Ao fundo,
arbustos e, atrás da casa, na parte superior direita da foto, uma parte da roça e ainda uma parte
de mata. Posicionados à frente da casa estão um casal de idade, uma senhora e uma filha
pequena. Os figurantes são o objeto central da foto, estão em pé e voltados para a câmera.
Chama a atenção a pose da senhora, que, com a cabeça baixa, volta seu olhar para o chão,
demonstrando um ar pensativo. O senhor faz um gesto com o chapéu, como o estivesse
tirando da cabeça enquanto o registro da foto estava acontecendo. A senhora, de mãos
cruzadas, está usando um vestido preto. Seria uma demonstração de luto? Afinal, a senhora
mais jovem não está acompanhada do marido e parece triste. A menina está parada
naturalmente entre as duas senhoras. Entre o casal idoso, posicionou-se, tranquilamente, o
cachorro. Ao fundo pode ser visto um cavalo branco, amarrado em um poste que fica em
frente a um galpãozinho. Na parte esquerda da foto, fica uma parte de um chiqueiro para
porcos ou estrebaria para gado. Atrás desta estrutura, um pouco distante dali, avista-se uma
outra moradia. O pátio ao redor da casa é de chão batido e está limpo e varrido até a
proximidade da roça que está com alguns arbustos e sobras secas de alguma planta que foi
colhida. A casa é simples, em madeira e sem pintura, com janelas também de madeira, sem
vidraças e com cortinas amarradas por um nó.
A imagem da foto 115, com uma moradia em ambientação simples, mostra que o
próprio caminho para chegar até a residência não é bem traçado, contraste com outras
233
imagens de espaço rural, onde a estrutura, as aberturas, os complementos da casa são
melhores e o próprio aspecto externo apresenta um investimento em varandas, jardins, cercas.
As imagens sobre o espaço rural apresentam um mundo mais calmo, livre da movimentação
urbana, também mais simples, porém, muitas vezes, são uma demonstração das carências ou
das limitações de quem mora distante dos recursos que o espaço central do distrito oferece e,
mais ainda, o espaço urbano.
Foto 115 - Jovem e um porco gordo
Acervo e autoria: Foto Kaefer. A filha de um colono ganhou um porco para ser engordado. O objetivo era faturar
o animal e poder investir nos preparativos do enxoval do seu casamento. Década de 1960.
As circunstâncias do registro da imagem 116 são lembradas pela fotógrafa Írica
256
. A
jovem que faz pose junto ao porco, apoiando uma das mãos sobre o animal já gordo, recebeu
o porquinho da família para engordar. O motivo de oferecerem o animal para a filha engordar
está relacionado com os preparativos do enxoval, pois a filha estava programando se casar. O
porco, bem tratado e bem cuidado, era o dote dos pais para que a filha, ao venderem o porco,
pudesse investir nos preparativos da sua própria casa. Nos fundos da imagem, empilhado
próximo de um galpão, pode ser visto material para construção, ou sobras de material, como
telhas ou lajotas. Na parte esquerda da foto, um pequeno pedaço da carroceria do caminhão
que veio carregar e “comprar” o porco.
A venda dos animais era combinada com antecedência com algum comerciante e,
sabendo qual o dia em que este iria para o interior pegar o porco, algumas famílias já
acertavam com o fotógrafo para o registro da transação. Nesse caso, o espaço rural associado
à venda dos porcos é uma representação vinculada à produtividade, ao lucro, ao dinheiro de
que toda família necessita.
256
KAEFER, 03 maio 2009, op. cit.
234
Através das fotografias da coleção, a oposição urbano x rural mostra diferenças na
ambientação desses espaços, identificando-se o espaço urbano como o espaço de uma maior
manifestação das relações sociais e o espaço rural um espaço do trabalho e da casa. Segundo
Mauad, as famílias criam espaços em que elas vivem e experimentam, portanto “é o espaço
retratado que é reconhecido como seu”
257
.
5.2.3 O ESPAÇO DO OBJETO
A análise sobre as formas do conteúdo voltadas ao espaço do objeto relaciona-se aos
objetos enquadrados, “tomados como atributos da imagem fotográfica”. Mostra-se, neste
item, “a lógica existente na representação dos objetos, sua relação com a experiência vivida e
com o espaço construído”
258
. Na composição do espaço do objeto são observados os objetos,
seus tipos e formas, atributos das pessoas e da paisagem. O espaço do objeto representado nas
fotografias da coleção compreende a seguinte tipologia: objetos interiores, objetos exteriores e
objetos pessoais. Os principais objetos levantados a partir das imagens da coleção foram
divididos a partir das diferentes formas que assumem.
Objetos interiores: balcão para cozinha, bandeja, batata-doce, bibelô, bicicleta,
carteira, bolsa, boneca, buquê, cadeira de fórmica, caixão, crucifico, carrinho para bebê,
cartaz, cavalinho de brinquedo, certificado, chaleira, chassis, copos, corda, coroa, cristaleira
de fórmica, cuia e bomba para chimarrão, dinheiro, faixas com frases, fogão a gás, fogão a
lenha, garrafas, jarro, livro, mesa de fórmica, guardanapo com crochê, pia batismal, relógio,
cerveja, sofá, sorvete, tapete, velas, almofada para joelhos, banco de vime, cadeira de madeira
com assento de palha, cadeira de madeira com assento estofado, cadeira de madeira infantil,
sofá individual com encosto lateral, coluna de alvenaria, escada de alvenaria, mesa pequena
redonda de vime, toalha de mesa bordada, mesa pequena redonda de vime sem toalha, pano
de fundo liso, pano de fundo estampado, vaso de cerâmica, flores naturais, flores artificiais,
vasos de porcelana, vaso de vime.
Objetos pessoais: indumentária - aliança, broche, buquê, grinalda, bolsa, carteira,
luva, terço, vestido de noiva, flor no terno, gravata-borboleta, gravata longa, lenço no terno,
terno do noivo, brinco, colar, gargantilha, chapéu, óculos , relógio de pulso, calçado, vestidos,
saia, blusa, casaco, calça, boné, cintos, coroa, relógio, túnica, etc.
257
MAUAD, Sob o signo, 1990, op. cit., cap. III, p. 37.
258
Idem, p. 38.
235
Objetos exteriores: Alto-falante, bandeira, bicicleta, bola, caminhão, carrinho para
bebê, automóveis, carroça, cartaz, boi, cavalo, certificado, chaleira, cuia e bomba para
chimarrão, bancos de madeira, cadeira de madeira, cerca de madeira, calçadas, rua asfaltada,
chão de terra, folhagem natural e artificial, espeto para churrasco, mesa de madeira, toalha,
residências de madeira, pistão, gaita, cobertura com lona, casa de madeira, casa de alvenaria,
cerca de madeira, espingarda, faixa com frase, garrafa, microfone, motosserra, ônibus, salão
de festa, tábua de madeira, talher, vaso, rio, ponte, peixe, porco, prédio, serrote, cerveja, sofá,
soja, tambor, toldo, tora, trator, tucano, vassoura.
Os objetos estão integrados às imagens e, como diz Mauad, eles fazem parte das
fotografias, “assumindo formas e tipos diferentes e fornecendo à imagem fotográfica a
dimensão do espaço-tempo no qual elas se inserem”. Nesse sentido, após a classificação dos
objetos nas formas exterior, interior e indumentária, relacionam-se os objetos aos diferentes
significados que eles assumem, os quais foram percebidos e estabelecidos segundo a
integração e presença de determinado objeto em ambientes e eventos diversos.
Com o intuito de perceber a relação entre as diferentes formas dos objetos e o tipo de
fotografia ao qual o mesmo está inserido, estabeleceu-se a análise a partir de três séries:
fotografias posadas, fotografias espontâneas e fotografias sem figuração, abrangendo todos os
temas da coleção.
De acordo com o Quadro 16, as fotografias posadas, em maior número, representam
86% da coleção, as instantâneas, 10% e as fotografias sem figuração representam 4% da
coleção.
Nas fotografias posadas estão situadas 100% das fotografias do tema “Retratos” e do
tema “Religião”, as quais somam 126 fotos. Ou seja, quase dois terços das fotos posadas estão
concentrados nesses dois temas, ficando as restantes 66 fotos posadas distribuídas entre os
demais sete temas da análise, num total de 192 fotos posadas.
No conjunto das fotos posadas, em ambientação interna, tais como nos estúdios, nas
igrejas e nos salões ou clubes, estão situados objetos de interiores, principalmente objetos
artificiais.
As fotografias do estúdio antigo, dos temas “Retratos” e “Religião”, tanto as fotos
individuais quanto as dos casais de noivos ou de grupos apresentam a figuração no primeiro e
segundo planos, o que mostra também o Quadro 18, referente à distribuição dos planos.
Nessas imagens, o fundo presente em todas as fotografias feitas no estúdio antigo às vezes é
liso, outras é floral, certas vezes em estampa discreta, porém, na maioria das vezes, mostra um
motivo natural. Nesse pano, nas laterais da estampa estão desenhados alguns arbustos e, entre
236
eles, no centro e parte superior da estampa, alguns arbustos que também lembram nuvens,
criando uma imagem quase celestial ao ambiente fotográfico.
Foto 116 - Noivos no estúdio antigo
Autoria Foto Kaefer. Acervo particular de Írica Kaefer. Casamento. General Rondon. Entre 1954-1961.
A estampa celestial, como pode ser visto na fotografia da imagem 117, é a que
predominou como fundo de fotos de casamento. Na preparação do estúdio, pela agência
produtora, o ambiente oferece arranjos que propiciam uma ambientação orientada para o
divino e a harmonia. Criou-se uma sensação de paz celestial na terra. Percebe-se, nesse fundo
artificial, uma representação do sagrado, como quer ser o casamento.
Ainda no estúdio antigo, para as fotografias de retratos de família, também ocorreu o
enquadramento com este fundo.
237
Foto 117 - Crianças no estúdio antigo
Autoria Írica Kaefer. Acervo particular de Írica Kaefer. Duas irmãs. General Rondon. Entre 1954-1961.
Na tranquilidade da pose das meninas da Foto 118 e na aproximação das personagens,
estão representadas a harmonia e a união fraternal. Os tons escuros da estampa natural, ao
fundo, dão uma sensação um pouco pesada para a ambientação, o que é suavizado pela
expressão de ingenuidade da menina menor e pelo sorriso da menina à direita da foto. As
meninas são o motivo principal da imagem e percebe-se, pela direção do olhar, uma energia
cativante entre elas e a fotógrafa.
A menina maior usa uma gargantilha, a menor parece que segura algo na mão,
provavelmente para prender sua atenção e para que permanecesse nesse espaço. Ambas usam
pulseiras, seus vestidos franzidos são enfeitados com pregas e, para completar os adereços,
receberam um laço de fita no cabelo.
Nas fotografias do estúdio antigo estão incluídos objetos tais como mesa com toalha
de algodão bordada à mão, com acabamento em crochê. Em cima da mesa é colocado um
vaso de porcelana com flores naturais ou artificiais. No chão é colocado um vaso de cerâmica,
com planta natural ou vasos de vime com flores artificiais. Eventualmente é incluída uma
almofada no chão. Os objetos e os fotografados são posicionados em cima de um tapete com
estampa quadriculada num tamanho médio e uniforme. Esse tapete e a estampa
natural/celestial são uma das características principais da ambientação do estúdio antigo a
exemplo da foto 121. As fotografias posadas no estúdio caracterizam-se pela figuração como
objeto central, onde esta se apresenta com vestes especiais, objetos e adereços pessoais além
dos objetos móveis mencionados.
238
Foto 118 - Bebê sentado em mesa sem toalha Foto 119 - Bebê sentado em mesa com toalha
Autoria Írica Kaefer. Acervo particular de Írica Kaefer. Crianças no estúdio antigo. General Rondon. Entre 1954-
1961.
As imagens de crianças sentadas sobre uma mesa, Foto 119 e 120, mostram o
enquadramento dessa mesa em inúmeras imagens feitas no estúdio antigo. Uma pequena mesa
redonda, sem toalha. Um lapso? Possivelmente não, embora esta esteja com toalha, na maioria
das fotografias, que varia entre toalha branca, bordada, com ou sem crochê, e outra toalha,
também bordada, numa tonalidade mais escura com bordados claros. Trata-se de toalhas
pequenas, que cobrem as mesas, ou maiores, que caem um pouco além da base. Imagens, com
a mesa descoberta, revelam tratar-se de uma delicada mesa de vime. Talvez tenham existido
mesas de outro formato, porém, a mesinha redonda, exposta normalmente no canto esquerdo
das fotos, é um ornamento, uma marca, na coleção de Írica.
No estúdio antigo são enquadrados, também, o banco de vime, o banco de madeira, o
sofá estofado individual e, para mais pessoas, com apoio de madeira nas laterais, cadeiras de
madeira, cadeira de madeira infantil. No banco de vime ou estofado sentaram-se, geralmente,
os noivos quando eles eram acompanhados do grande grupo, destacando-se o casal que ficava
sentado no centro do sofá. Fotos da coleção (que não entraram na análise) mostram, também,
em outras circunstâncias, pais com filhos, o casal de noivos, fotos individuais, onde as
pessoas, sentadas ou apoiadas nos braços do sofá, fazem pose envolvendo-se com esse objeto.
239
Foto 120 - Jovem no sofá
Acervo particular de Írica Kaefer. A jovem Edila faz pose sentada no braço do sofá, no estúdio antigo dos
Kaefer. General Rondon. Entre 1954-1961.
A jovem da imagem 121 faz uma pose especial usando um vestido rodado, sentada
sobre um sofá individual. O decote do vestido estilo canoa deixa parte do ombro à vista e os
pinchaus marcam a cintura da jovem. A parte da saia do vestido mostra que ele é
confeccionado com vários panos: por baixo, um pequeno sinal do forro num pano branco; no
meio, o tecido do vestido, num pano liso que recebe, por cima deste tecido, um tecido
transparente, tipo tule, com detalhes na lateral. A indumentária é acompanhada por sapatos
pretos, de salto. Os cabelos bem penteados deixam visíveis os brincos. Sentada sobre um dos
braços do sofá, apoia-se com uma das mãos sobre o outro braço do sofá. Sobre as pernas
estende a mão esquerda, em que usa o relógio e o anel. A imagem é um registro de um
momento de exibição pessoal.
Nas fotos posadas, vestes, pose e espaço são escolhidos para transmitir uma
mensagem. No estúdio, diz Mauad, “o espaço é programado para ser uma representação” e,
nessas fotos, os objetos são expressos pelo seu “valor simbólico de pura representação” bem
mais do que pelo seu valor de uso.
A almofada para joelhos que aparece em algumas fotos é, também, um exemplo de
espaço programado onde um pequeno objeto, deitado no chão, próximo aos pés da noiva e
que parece ter servido para enfeite apenas. É, também, um ornamento, um algo a mais, que
serve para enriquecer o quadro, o que chegou a ser feito também em espaço externo, quando a
240
almofada ficou estendida sobre o gramado. Independente de participarem ou não diretamente
da vida das pessoas e, mesmo que elas não possuam certos adereços, os objetos se associam
aos fotografados e fazem parte deles através da representação fotográfica.
E no estúdio novo? Os objetos do estúdio antigo vão aos poucos desaparecendo e
novos elementos são introduzidos no enquadramento fotográfico. Então cabe perguntar: – O
que há no estúdio novo? Pode-se observar novamente a fotografia do estúdio novo (Foto 11).
Na imagem não ocorreu registro de um evento específico ou a inclusão de figuração. Estão
enquadrados, como objetos móveis, apenas dois quadros na parede do fundo. Nota-se que o
assunto principal é o estúdio novo em si. Alguns detalhes podem ser percebidos, tais como
enfeites artísticos na parte superior da parede do fundo (que se fazem notar em muitas fotos),
a escada e o corrimão (enquadrados em tantas poses), as colunas laterais (aqui ainda sem
adernos de folhagens como aparece nas fotos mais tarde). Ao fundo, quadros com paisagens
lembram ainda a natureza que se fazia presente nas fotos feitas nos espaços externos. A
parede (que se apresenta descoberta) mostra os quadriculados e outros traços de enfeites que,
em parte, estão imitando uma porta e formando um painel de fundo. Nota-se outro detalhe no
estúdio novo que está relacionado ao piso e este está, agora, com ladrilhos de cerâmica.
No estúdio novo não há estampa natural como pano de fundo. Nas fotografias pode ser
visto raras vezes um fundo estampado. E este vai sendo substituído pelo fundo liso ou, então,
a estrutura do próprio estúdio forma o plano de fundo. Algumas vezes são introduzidos vasos
de vime, que ficam no chão, no formato de um tripé. Vaso de cerâmica, com flor natural,
permanece, mas ele, assim como o vaso de mesa, eventualmente ganha um espaço. Alguns
objetos artificiais acompanham o espaço do estúdio novo. Serão artifícios da modernidade?
Provavelmente o são, assim como as colunas e a escada de alvenaria, que começam a integrar
o enquadramento das fotos no estúdio novo.
No estúdio novo, as fotos são feitas com as pessoas em pé, principalmente as crianças,
enquadrando-as integralmente. Ou são feitas fotos de perfil, destacando-se o rosto do
retratado. Assim, o enquadramento, quanto ao sentido e direção, é o central. Ainda,
associando-se a pose aos objetos fixos (tais como as colunas ou a escada), temos, quanto ao
sentido da foto, a predominância de fotos na vertical (Quadro 17, enquadramento I e II),
alguns objetos móveis e os objetos pessoais.
241
Foto 121 - O casal de fotógrafos testemunham um casamento
Autoria: Foto Kaefer. Acervo Particular de Írica Kaefer. À direita, o casal Írica e Oscar Kaefer fazem pose como
testemunhas de casamento. Marechal Cândido Rondon, Década de 1960.
A imagem de um casamento registrado no estúdio novo mostra os noivos. Nessa
imagem, ela, sentada, é a figura especial no momento, pois é a afilhada da fotógrafa. Os
noivos estão acompanhados por dois casais, as testemunhas do casamento. É interessante
perceber a inversão de posição na ação do registro desse documento. Írica e Oscar, que
normalmente estão do outro lado, o lado invisível do fotógrafo quando este faz o clic, aqui
estão enquadrados num momento especial também para o estúdio.
O estúdio está especialmente preparado nessa Foto 122. No fundo se vê um pano liso
estendido e, nas laterais, dois panos com leves estampas. Na parte esquerda da foto pode ser
vista uma meia cortina. Pequenas folhagens estão penduradas por toda a parte: no alto da
parede, nas colunas, no chão. As flores acompanham os enfeites.
A noiva usa um vestido de renda branca e longo, acompanhado de um véu e de um
buquê de flores. As mulheres usam vestes claras, bem alinhadas e discretas, e os homens
usam terno preto com enfeite na gola. Apenas o noivo usa gravata.
Na organização do espaço do estúdio, no enquadramento dos objetos, na distribuição
dos fotografados que elegeu a noiva em primeiro plano, no aspecto sério e compenetrado dos
fotografados, estão representados valores que vão muito além do que os olhos podem ver.
Nesse contexto está comprometida a relação noivos e testemunhas, afilhada e madrinha,
fotografados e fotógrafo, os noivos e a religiosidade e também a relação de amizade entre o
casal Kaefer com os noivos. Nesse sentido, com o estúdio organizado e preparado, os
figurantes transmitem a seriedade do compromisso mútuo e familiar.
A coleção de fotografias de Írica, no que se refere à categoria casamento, enquadra
objetos que enfatizam a celebração desse evento especial, considerado pelo aspecto religioso
242
como um sacramento, ambientado em igrejas e em situações de manifestação de fé,
associados a objetos vinculados ao espaço de registro formal, como nos estúdios ou, ainda,
relacionados ao espaço privado, em algumas residências. Circunstanciados a esse evento,
associam-se, pois, objetos pessoais, objetos de interiores e de exteriores.
Os objetos de uso pessoal estão associados ao momento do evento – o casamento. Os
vestidos longos usados pelas noivas predominam nas fotografias (No conjunto total das 728
fotografias de casamento, 98% da série). Os vestidos são brancos e representam “a pureza, a
castidade, a dignidade e a submissão da jovem”
259
. Os buquês, as grinaldas e os véus, curtos
ou longos, acompanham as noivas. O véu tem uma simbologia forte para a jovem cristã, “pois
é o símbolo da virgindade”
260
. Há uma predominância do uso de véu curto nessas fotografias.
A opção pelo uso do véu curto pode estar relacionada à opção estética ou econômica e
acredita-se que o fundamental é a noiva mostrar que está preservando bons princípios.
Foto 122 - O véu da noiva Foto 123 - O véu e a amiga
Autoria: Foto Kaefer. Acervo particular de Írica Kaefer. À esquerda uma noiva exibe o véu e, na foto da direita,
o véu é segurado por uma amiga. Estúdio novo. Marechal Cândido Rondon. Década de 1961.
Nas Foto 123 e 124, o enfoque são os véus das noivas, o que se deu em outras
fotografias da coleção (não incluídas na análise). A noiva da Foto123, à esquerda, segura na
mão direita uma rosa, apoiando-se na pequena escada do estúdio e, com a mão esquerda,
estende o véu para o alto, sorrindo orgulhosa por poder usá-lo. A noiva da Foto 124
posiciona-se voltada para o noivo, que conduz o olhar sobre ela. Embora esbocem um leve
259
LEITE, op. cit., p. 112.
260
Idem, ibidem.
243
sorriso, a direção do olhar da noiva não se encontra com o olhar do parceiro, o que pode se
justificar pela rigidez da pose e pela estatura menor da noiva. A posição dos noivos deixa uma
terceira figurante quase isolada, não fosse o gesto dela de segurar o véu da noiva. Entre as
moças está o véu, que as une num quadro que simboliza a amizade entre a convidada e os
noivos e, quem sabe, o pensamento e desejo da amiga de casar um dia e poder exibir o seu
próprio véu. Entende-se que pode ser esta a mensagem triste daquela que, sim, se comunica
com o fotógrafo.
Enfim, os véus são destacados, estendidos ao redor das noivas ou erguidos pelas mãos
das noivas, que os exibem para deixá-los bem à vista no ensaio fotográfico. Os vestidos das
noivas são geralmente simples, mesmo que acompanhados de rendas ou de alguns apliques,
mas a sua textura, o comprimento, o branco dão o ar festivo à vestimenta. Eventualmente, a
vestimenta de alguma noiva se destaca pelo uso de luvas e de vestidos mais rodados e mais
franzidos, indicando o acompanhamento de saias engomadas por baixo do vestido. As vestes
dos convidados, em geral, são simples, mas festivas e bem apresentadas. Também, quanto aos
brincos, colares ou broches, esses adereços são pouco usados, seja pelas noivas, seja pelas
convidadas. Na verdade, são mais usadas finas gargantilhas.
O terço quase não tem espaço no registro de casamento, pelo menos na presente
coleção. A aliança, símbolo de união, “indica a indissolubilidade do casamento... é colocada
no quarto dedo da mão esquerda como símbolo de submissão, ligando-se a uma veia que leva
diretamente ao coração, e reflete a união sexual e emocional”
261
. São símbolos que tanto
encantam como comprometem, mas, no espaço de registro aqui tratados, não receberam
destaque. A situação se fez em duas circunstâncias quando o registro ocorreu em igreja. As
alianças certamente já vinham sendo usadas anteriormente, por ocasião do noivado, e era de
fundamental importância que o casamento se realizasse.
Entende-se, portanto, que o objetivo maior não foi o registro das alianças em si, porém
o registro da fotografia de casamento, registro que representa a integração entre o casal e seus
familiares e destes com os amigos e a sociedade. Os retratos feitos com o grande grupo
apresentam as pessoas posicionadas em pé e em linha reta e, quanto ao sentido da foto, a
predominância se faz na horizontal. Nessas manifestações estão representadas a uniformidade
em torno da ideia do sacramento do casamento. O sentido horizontal e as linhas retas são uma
tentativa de igualar os noivos aos convidados, pois todos são importantes na celebração do
261
Idem, p. 113.
244
casamento e, nesse conjunto de relações, estão representadas ideias de estabilidade, de
manutenção e de permanência.
As imagens no sentido horizontal, feitas em maior número, tanto do tema “Retratos”
como do tema “Religião”, indicam ideia de movimento, de ascensão. Os noivos estão abrindo
um caminho de sucessos, de novidades, e esse novo pode estar acompanhado do moderno, das
construções de concreto que substituem as moradias de madeira, do asfalto que irá substituir a
estrada de chão batido. Referências que podem ser feitas neste sentido são os próprios espaços
dos estúdios, antes situados em espaço privado e vinculado à residência de madeira da agência
fotográfica. Pode-se mencionar também a circunstância do casamento dos noivos Vorpagel
(Foto 63), realizado em 1954. Deslocando-se do interior para a vila, casando em uma
igrejinha de madeira e retornando para o interior, pegando estrada de chão. É um período de
exploração e de uso intenso da madeira e do chão de terra provocando bastante pó.
As fotografias posadas e feitas em interiores de igrejas são em menor número. As
cinco fotografias sobre casamento e cinco fotografias sobre comunhão de crianças incluídas
na análise dão um toque religioso ao conjunto das fotos: cálice, crucifixos, velas, estátuas de
santo, livro de reza, quadros de parede, altar, toalha de mesa com motivos sagrados, vasos de
flores sobre o altar ou cesto de vime com flores no chão. Os objetos estão enquadrados em
segundo plano. Não há grandes enfeites, tapetes ou arranjos especiais, o que denota situações
de simplicidade. Algumas cadeiras ou bancos de madeira servem para acomodar os fiéis.
Foto 124 - Casamento na igreja
Autoria: Foto Kaefer. Acervo particular de Írica Kaefer. Noivos recebem a bênção de casamento no interior de
uma igreja. General Rondon. Década de 1954-60.
245
A Foto 125 mostra um casal de noivos recebendo a bênção de casamento celebrado
por um pastor, ocorrido no interior de uma igreja. Os noivos estão ajoelhados e de cabeça
baixa, em sinal de respeito pela bênção nupcial. Diante deles e em pé está o celebrante. Trata-
se de um pastor, pois está vestido de preto conforme costume dessa Igreja
262
. Atrás dos
noivos, e em pé, está posicionado um casal de testemunhas e, ao fundo e sentados, avistam-se
alguns convidados. Na parte direita da foto aparece uma parte da toalha branca que cobre o
altar.
Aspecto interessante da imagem é a luminosidade da capela. Provavelmente não havia
luz artificial no momento da celebração, o que fez com que a janela permanecesse aberta com
a cortina levantada e estendida sobre uma das venezianas. A contraluz que veio das janelas
interferiu na coloração do ambiente, criando um tom cinzento na parede, no vestido da noiva e
no rosto das pessoas. Por outro lado, a janela, no formato de arco e a luz forte que veio da
parte externa contrapondo-se ao tom cinzento da foto, apesar das vestes pretas dos homens,
criam um tom nostálgico, porém sublime ao ambiente. A contraluz que bate no braço
esquerdo do noivo forma um leve fio que desce até encontrar-se com o buquê da noiva, buquê
junto ao qual cria a sensação de formar-se um leve ramo integrado ao buquê.
Fotografias posadas no estúdio e nas igrejas também estão relacionadas com o tema
“Religião”, especificamente com fotografias de primeira comunhão ou de crisma, quando, na
Igreja Católica, ou de Primeira Eucaristia, nas Igrejas Evangélicas.
262
O celebrante com vestes pretas normalmente se refere a um pastor de Igreja Batista ou Evangélica, pois, na
Igreja Católica, o celebrante é um padre e este usa batina de cores variadas e uma estola.
246
Foto 125 - Menina na igreja católica Foto 126 - Menino na igreja
Autoria: Foto Kaefer. Acervo particular de Írica Kaefer. Crianças recebem a primeira comunhão e fazem fotos
em frente ao altar. Marechal Cândido Rondon. Década de 1954-1970.
As fotografias de crianças quando recebem a primeira eucaristia é feita na igreja e em
frente ao altar. As meninas usam vestes brancas, véu e grinalda e os meninos, terno preto com
camisa branca. O uso do véu não ocorre em todas as fotos, mas o tipo do altar indica tratar-se
de fotos mais antigas, sendo que, nas décadas de 1950 até 1970, havia o costume e a
orientação, por parte da Igreja, para que as meninas se vestissem de branco. O branco, mais
uma vez simbolizando a pureza, acompanha as atividades religiosas e, para justificar essa
necessidade, algumas meninas eram, inclusive, vestidas de anjo, representando a proteção
divina sobre as crianças comungantes.
As crianças de comunhão são posicionadas na parte central e no primeiro plano e o
altar e parte da parede fazem o fundo da foto. Atrás das crianças e em cima do altar ficam
vários objetos sacros, tais como velas, crucifixo, toalhas de mesa e flores. Em duas fotos uma
menina e um menino seguram as velas, em outra, um certificado. Ocorrem circunstâncias
onde um menino e uma menina seguram um livro de reza nas mãos. A vela e o certificado são
objetos integrados às celebrações da Igreja Católica. Já o livro de rezas é um material litúrgico
mais usado segundo as Igrejas Evangélicas. A vela é um símbolo de luz e o certificado é um
compromisso da criança pela opção de uma caminhada voltada para a fé em Deus. O livro de
rezas é um sinal de compromisso assumido na comunhão no sentido de seguir a palavra de
Deus.
247
No tema “Religião” também estão incluídas três fotografias sobre batizados e três
sobre morte. As fotografias sobre batizados foram feitas em espaço externo.
Foto 127 - Batizado
Autoria: Foto Kaefer. Copião. Acervo particular de Írica Kaefer. Criança com bata branca no dia do batizado.
Marechal Cândido Rondon. Década de 1954-1970.
O registro da Foto 128 é um modelo, ou copião, de uma criança batizada. Tanto essas
fotografias como outras fotografias da coleção e não incluídas na análise têm como o objeto
principal a criança batizada, que é enquadrada em primeiro plano. Duas crianças estão
posicionadas em cima de cadeiras de madeira, sendo uma dessas cadeiras mais alta. A outra
criança está posicionada em cima de um sofá que foi levado para o espaço externo da casa.
Ao fundo, além de algumas folhagens, está a parte da parede das residências. Os objetos
pessoais são semelhantes, pois as três crianças usam veste branca e longa, que cobre quase
toda a altura das cadeiras nas quais estão sentadas. As vestes (batas brancas com rendas,
franzidos e laços) são representações de um momento especial. As três crianças aparentam
idades diferentes em termos de meses e a maior delas, a que segura uma chupeta na boca, já
permanece sentada sozinha. Nos registros dos batizados acompanhados das vestes brancas
está agregada a pureza das crianças, a opção da família em seguir as tradições de fé e o
compromisso cristão. A pouca quantidade de objetos e a ausência de adereços de igreja não
conta tanto, e sim o motivo da comemoração e a ação de registrar para ter uma lembrança do
momento do batismo.
248
Foto 128 - Velório de um bebê
Autoria: Foto Kaefer. Acervo particular de Írica Kaefer. Família presta a última homenagem à criança falecida.
Marechal Cândido Rondon. Década de 1954-1970.
Na Foto 129, temos uma criança vestida de forma semelhante à criança da foto sobre
batizado, porém contrapondo com a altivez daquela. Com uma túnica branca que cobre todo o
seu corpinho, uma criança (Foto 129), ainda um bebê, é velada pelos pais e o único irmão, que
se aconchega no colo do pai. Desolada, toda vestida de preto, a mãe pende a cabeça para um
lado e guarda na mão o lenço que recolheu suas lágrimas... No momento da fotografia, certa
reserva emocional não controla a tristeza estampada nos rostos. O menino, pequeno,
provavelmente sem entender o que está se passando, capta a dor do momento, olhando
interrogativo para a câmera. A dor certamente se fez maior, pela ausência dos familiares.
Como parte de um consolo, a fotografia passa a ter a função de reproduzir a pequena
cerimônia fúnebre, que é registrada para mostrar, oportunamente, aos familiares ausentes, a
criança que eles não puderam conhecer em vida
263
. O caixão, bonito e delicado, com tampa na
cor clara, com uma cruz no centro e outros detalhes leves, é enfeitado e ornamentado com
várias folhagens e algumas flores, que são colocadas ao redor do pequeno caixão (caixinha!) e
em cima de cadeiras, no espaço externo da casa. Cadeiras de madeira são o apoio para os pais,
que estão sentados, e para o caixão, que está posicionado entre o pai e a mãe. Ao fundo, parte
de uma parede de madeira pintada numa cor clara, os tons da veste da criança e o cinza claro
da tampa do caixão e da cruz, suavizam o escuro das vestes dos pais e da faixa escura da
parede. Assim, ao tema da morte são acrescentados símbolos de religiosidade, numa
representação que atribui, a essa celebração, uma última homenagem, com a esperança de
salvação da alma da pequena falecida.
263
KAEFER, 19 ago. 2009, op. cit.
249
O número menor de objetos de interiores de igreja está associado à dificuldade na
iluminação do ambiente interno nos primeiros anos da colonização -- o que levou à prática de
fotografar no estúdio. No estúdio há mais condições de iluminação e os equipamentos são
melhores, as linhas e planos são organizados e distribuídos, possibilitando um melhor foco
para o objeto principal. Já na igreja o espaço é público, mais amplo e falta aquele cantinho
preparado para a pose e, além do mais, há um espaço limitado para a circulação dos
fotógrafos e fiéis, pois eles, numa determinada época, não podiam ultrapassar a linha do altar.
Dona Írica, por exemplo, passou por uma situação constrangedora, pois, nos primeiros anos
na região, a vestimenta usada pelas mulheres era o vestido. Isso remete à especificidade de
uma época em que o uso da calça comprida era uma forma de vestir restrita ao masculino. A
introdução do uso de calças compridas trouxe opções para as mulheres. Essa opção teve
agregadas algumas facilidades ao seu dia a dia, como indica a fotógrafa Írica: “para subir e
descer dos caminhões e das carroças”
264
ou de outros lugares mais elevados, quando fosse
preciso, para fazer os registros fotográficos. A inovação, porém, não deixou de trazer alguns
constrangimentos para essa profissional.
Ocorre que, em certa oportunidade, Írica usou seu “traje marrom”, feito especialmente
para essas saídas, quando foi fotografar um casamento no distrito de Quatro Pontes. O traje
era composto de casaco e calça, ou “eslaque”
265
, como ela denominou a peça de roupa. Írica
recebeu críticas das “velhinhas” e comentários diretos do padre, que já a conhecia muito bem
pelo fato de ela se posicionar na parte posterior do altar para enquadrar os noivos do
casamento realizado na igreja. Esse aspecto mostra, por outro lado, situações atípicas pelas
quais passam os emissores de imagens e que não são acompanhadas pela maioria dos
receptores, que pensam basicamente no resultado da encomenda.
A opção fotográfica nesse espaço busca o conjunto da figuração, predominando, no
caso do casamento nas igrejas, as fotografias com o grande grupo. A integração de objetos
está associada ao momento: além dos objetos sacros, os adereços dos noivos, convidados e
celebrante. O armário de madeira enquadrado em algumas imagens e próximo do altar indica
que não há espaço especial para a secretaria ou a sacristia, onde normalmente são feitas as
atividades administrativas. Um armário com livros em uma fotografia de velório
266
indica
também que esses espaços, igreja e escola, se interpenetravam, considerando que as atividades
de oração e de educação se realizavam no mesmo espaço.
264
KAEFFER, 5 jul. 2002, op. cit.
265
Idem, ibidem.
266
Foto 2. Pasta Religioso (morte), foto não incluída na análise.
250
Alguns laços e fitas de papel produzem uma pequena ornamentação no interior de
algumas igrejas, o que pôde ser visto em fotografias não computadas para a análise, assim
como uma cadeira de fórmica, um microfone (verificado em apenas uma das fotografias).
Aqueles objetos são, no entanto, o anúncio do uso de novas tecnologias pela igreja.
Ainda em relação ao enquadramento dos objetos e às fotos do tipo posadas de outros
temas, tais como festividades, algumas fotografias foram feitas dentro de salões de festas.
Foto 129 - Salão de Festas e Bailes
Autoria: Foto Kaefer. Acervo particular de Írica Kaefer. Casais em momento festivo. À esquerda, Acácio Strey.
Marechal Cândido Rondon. Década de 1960.
Aqui se vê parte interna de um salão de festas. Na Foto 130, dois casais acompanham
um momento de festas em pose aparentemente espontânea. Mostrando-se distraído, o rapaz da
direita nem olha para o fotógrafo, mas o grupo fica imóvel e sem conversar diante do registro
fotográfico. A construção do salão é de madeira, assim como a mesinha e as cadeiras. Sobre a
mesa, uma toalha pequena, que deixa parte da mesa exposta. Uma garrafa de refrigerante e
várias de cerveja. A quantidade de garrafas que ficam sobre a mesa mostra certa exibição,
pois as pessoas gostavam de mostrar o quanto consumiam. Quando um grupo se reunia, a
mesa ficava cheia de garrafas vazias. As garrafas e copos de vidros sobre a mesa e ao fundo
indicam material característico da época, quando ainda não estava no mercado o material
reciclável (como garrafas e copos de plástico). A carteira de cigarros e a caixa de fósforos,
também deixados sobre a mesa, são indícios de que havia algum fumante no grupo. As vestes
(ternos e vestidos floridos e bem assentados) mostram que se trata de uma ocasião especial.
Na intenção de conseguir dados de identificação de algumas imagens da coleção,
contatou-se o velho Strey, um senhor de 93 anos, que se encontrava praticamente todos os
dias, antes do almoço, no Bar do João. O Bar do João funcionou 15 anos nas esquinas da Rua
Espírito Santo com a Rua XV de Novembro, quase no centro da cidade. Strey já era nosso
251
conhecido e, no próprio bar, algumas fotografias foram mostradas ao velinho. Primeiramente
ele sorriu e, como que se justificando, disse: “Ich trinke Jurubeba”
267
(“Eu bebo jurubeba”).
Strey olhou várias fotos e, como estava próximo do meio dia, aos poucos os fregueses do
trago iam chegando e alguns se aproximando da mesa com fotos. Strey olhava e comentava:
“Ich glaube, ich kenne niemand die hier oben ist ...” (“Eu penso que eu não conheço ninguém
que está aqui em cima”) e foi olhando, quando, de repente, olhou mais atentamente para uma
foto e exclamou: “Aber das ist doch mein Jung, ja, ist sehr ähnlich, is mein Jung” (“mas este é
meu filho, é, é bem parecido, é meu filho”). Egon, uma pessoa ao seu redor, também
reconheceu que se tratava do amigo Acácio Strey, pois conhecia a família de Strey.
A realização de uma entrevista em um bar pareceria ser um momento e um local
inadequado para o tipo de estudo histórico que estava sendo realizado. Estava previsto um
contato inicial no sentido de marcar-se a entrevista, porém, como algumas fotos foram sendo
mostradas para deixar Strey inteirado do que as fotos tratavam, este já foi fazendo alguns
comentários. Ainda, como esse senhor apresentou dificuldades em reconhecer as pessoas e os
ambientes retratados, optou-se por não realizar entrevista em momento e locais apropriados.
O reconhecimento de um personagem em meio a tantas fotos da coleção é, no entanto, por
outro lado, uma conquista para memórias de grupos, pois, durante a presente pesquisa, sentiu-
se a grande dificuldade dos entrevistados em identificar os nomes das pessoas, os locais ou os
eventos registrados.
A festividade em torno do chamado Baile de Kerb é um aspecto interessante em
relação ao enquadramento de objetos nas fotos do tipo posadas, feitas em ambiente interno.
Foto 130 - A boneca do baile. Foto 131 - A surpresa do lance?
Autoria: Foto Kaefer. Acervo particular de Írica Kaefer. Na foto 131 casais na expectativa do resultado do lance,
ao redor da “Boneca do Baile de Kerb”. Na foto 132 aparentemente uma surpresa quanto ao resultado do maior
lance, pois um novo casal, o segundo da direita para a esquerda e ela sorrindo, se posiciona entre o grupo.
Marechal Cândido Rondon. Dezembro de 1973.
267
STREY, Senhor. Entrevista concedida a Lucia Teresinha Macena Gregory. Marechal Cândido Rondon, 29
maio 2009. Jurubeba é uma bebida consumida principalmente por pessoas mais idosos, por seu baixo teor
alcoólico, por ser produzida com ervas e por ser considerada bebida rejuvenecedora.
252
Nas Fotos 131 e 132, referentes ao Baile de Kerb, vários casais posam em semicírculo
ao redor de uma boneca colocada no chão, na frente deles, na primeira foto e colocada sobre
as mesinhas entre garrafas e copos vazios na foto colorida. O baile se realizava para
comemorar o dia da colheita nas comunidades alemãs. Maccari
268
fez estudo sobre memórias
em MCRondon, constatando, através de depoimentos, que a “kerbfest” está “entre as festas
mais lembradas”. Sobre esse evento já nos referimos na ocasião da dissertação de mestrado
269
.
A festa iniciava pela manhã com a celebração religiosa. Era animada pela banda musical, do
amanhecer ao entardecer, encerrando-se com o tradicional Baile de Kerb. Na dissertação de
mestrado afirmamos que a boneca era leiloada durante o baile e proporcionava a quem
oferecesse o maior lance em dinheiro escolher uma dama para dançar e fazer a abertura do
baile. Uma boneca era enfeitada e colocada sobre uma garrafa de cerveja. O leilão era
realizado pelos homens. Ao participarem do leilão, as pessoas mostravam sua disponibilidade
em fazer uma oferta para a comunidade. A intenção inicial da festa de Kerb era a
comemoração e o agradecimento da “sobrevivência dos colonos a uma difícil viagem
marítima”
270
, viagem em que sentiram a falta de alimentos e a ocorrência de problemas com a
embarcação, o que colocava em risco a vida dos imigrantes. A ideia nasceu de um grupo de
alemães vindos da Europa e que se instalou no Rio Grande do Sul, com a promessa de realizar
anualmente uma confraternização “caso todos sobrevivessem à longa viagem”.
Atualmente, além de se representar um tributo à boa colheita, é um momento de
exibição, de superioridade financeira e de poder masculino. Já para a mulher é uma
oportunidade para servir o café, com cucas, bolos e bolachas, que eram preparados na véspera
como parte dos festejos. A situação não deixa de ser um instante de idealização da mulher,
que, embora participe da preparação do evento, passa, de certa forma, à submissão social e
econômica, pois, enquanto o homem faz o lance e tem o direito de escolher a mulher com
quem vai iniciar o baile, esta, sem poder econômico, fica no aguardo e na expectativa de ver
aquela que vai ter o privilégio de dar a abertura ao baile e dançar a primeira música. As faces
risonhas dos jovens e os gestos dos rapazes (foto 132 - os da direita e os da esquerda parecem
ser irmãos) indicam que ocorreu uma surpresa em relação ao resultado do lance oferecido por
alguém desse grupo e que, ao que os ânimos indicam. O casal que não estava na primeira foto
e se integra ao grupo, conforme mostra a segunda foto (a colorida) deve ter dado o lance
maior para a festa do Kerb. A alegria e a “gargalhadas” da jovem, a segunda da direita para a
268
MACCARI, op. cit., p. 142.
269
GREGORY, Imagens, 2002, op. cit., Cap. IV.
270
TROVO, Silvia. Kerbs brindam a sobrevivência no mar. Jornal Vale do Sinos, São Leopoldo, 16-17 jul.
1994. Suplemento Especial – Imigração Alemã.
253
esquerda, aponta para isso. Nesse momento festivo, as vestes boas, as calças com cintos, os
calçados, a ornamentação das mesinhas com toalhas, esses detalhes todos mostram que se
trata de uma confraternização onde estão representados costumes que o grupo quer preservar.
A realização da Festa da Soja pode ser, de certa forma, comparada à realização do
Baile de Kerb. Tendo outra origem, a celebração da colheita da soja envolve a realização de
um baile com a escolha da rainha e princesas.
Foto 132 - A Rainha da Soja.
Autoria: Foto Kaefer. Acervo particular de Írica Kaefer. Jovem já com a coroa e a faixa do título de Rainha da
Soja. Marechal Cândido Rondon. Década de 1970/80.
Através da fotografia da jovem eleita como a “Rainha da Soja”, novos elementos são
introduzidos no campo dos objetos. A coroa e a faixa indicam a realização de festividade em
torno da produção da soja na região. O vestido longo e o colar também representam tratar-se
de um momento especial. A soja passou a ser considerada uma cultura importante na região e,
dando bons resultados, passou a ter significativo valor econômico. Uma demonstração da
representação da soja para a região é a realização dos bailes e foi também a presença do
presidente Ernesto Geisel na abertura oficial da colheita da soja no Paraná, em 1976. Mais
detalhes sobre a visita do presidente a MCRondon serão trazidos mais adiante. A importância
254
da soja também passou para a culinária, por ser considerado um grão nutritivo em termos de
alimentação humana. Jornais
271
da cidade, em páginas como a “Coluna Rural” e sobre
culinária, passam informações sobre o valor nutritivo da soja e divulgam receitas à base de
soja, tais como croquetes e cajuzinhos.
Nos espaços festivos, mesas longas, de madeira, ou algumas mesinhas pequenas,
bancos e cadeiras de madeira, alguns laços e fitas de papel e folhagens de palmeira serviram
para enfeitar a cena nestes espaços públicos. Sobre as mesas, toalhas de papel, pratos, talheres
e alimentos indicam que alguns festejos eram acompanhados de refeição. O salão, em
madeira, janelas às vezes sem vidraças, portas de madeiras, são sinal do ambiente muitas
vezes rústico e simples desses salões, a exemplo do então conhecido “Salão do Weiss”. Já o
ambiente do Clube Aliança, também construído em madeira, mostra-se mais sofisticado. No
teto, lâmpadas penduradas e um detalhe no centro. A pista rebaixada como espaço para
danças permitia uma visão melhor das pessoas que permaneciam sentadas. Ao fundo do salão
e bem centralizado há um palco elevado e fechado por cortinas lisas.
Os músicos são os responsáveis pela inclusão de objetos tais como gaitas, violões,
bateria e instrumentos de sopro que animam as festividades, quer sejam elas realizadas em
ambiente interno ou externo.
Assim, portanto, as vestes boas, os acontecimentos em salões ou clubes, a música e a
bebida são aspectos das representações festivas e descontraídas, porém, com intenções de
pose quando o fotógrafo estava por perto o que se percebe em fotos de casais dançando ou de
foliões durante o carnaval ou ainda em momentos cívicos, durante desfiles.
Ainda, quanto às fotografias posadas, ocorreram alguns registros especiais, diferentes
daqueles programados em função de um momento festivo específico.
271
RONDON COMUNICAÇÃO. Marechal Cândido Rondon, Ano 1, n. 6, p. 12, 27 abr. 1974. RONDON
HOJE. Marechal Cândido Rondon, n. 10, p. 10, 11 a 16 ago. 1977.
255
Foto 133 - A bicicleta no estúdio fotográfico
Autoria: Foto Kaefer. Acervo particular de Írica Kaefer. Um senhor de terno e sua bicicleta enfeitada fazem pose
no estúdio. General Rondon. Década de 1954-60.
É possível imaginar a cena que antecede o registro da Foto 134. A possibilidade de
comprar uma bicicleta pode ser comparada à compra de um automóvel para algumas pessoas.
A bicicleta foi e continua sendo um meio de transporte muito utilizado em Marechal Cândido
Rondon, tanto para passeio e prática de esporte como para o trabalho. A satisfação desse
jovem com a sua bicicleta levou-o a se fotografar ao lado desse seu valioso veículo. Ocorre
que o local do registro não foi o espaço externo, a rua, onde seria normal o uso dela
272
. Por ser
muito valiosa mercadoria, ela teria que ser fotografada em um lugar especial. O espaço ideal
para a pose do dono da bicicleta e seu objeto foi, então, o estúdio fotográfico. Assim, definir o
local, dirigir-se até a casa dos fotógrafos, apresentar a ideia e poder entrar no estúdio, que, na
verdade, era uma sala da casa dos Kaefer e ajustar o melhor enquadramento para os dois, o
homem e a bicicleta, certamente, demandou um bom diálogo entre fotógrafo e fotografado(s).
Enfim, ajustado o fundo liso, a bicicleta foi posicionada em cima do tapete e a parte da
frente ficou em primeiro plano, enquanto outra parte é posicionada ao lado do seu dono, que a
segura pelo guidão, com as duas mãos. A bicicleta está toda equipada. Na frente, no meio do
272
Fotos incluídas na análise nºs 152, 179, 180.
256
guidão foi colocada uma lâmpada, no varão está pendurada uma espécie de carteira para
ferramentas, o assento recebeu uma capa com franjas, uma garupeira e um suporte, o pé (que
permite deixá-la parada em pé -- o que significa que o condutor da bicicleta não precisaria
segurá-la com as duas mãos na hora da foto). Mas o significado daquele momento e o de
possuir um bem levam à necessidade de deixar bem visível a quem o bem pertence, o que se
concretiza no ato do aproximar-se, do encostar, do apalpar, do tocar os objetos (a exemplo da
atitude com os suínos gordos vista em fotos anteriores).
Fotografias posadas também são feitas com objetos ou com animais cuja temática está
vinculada à produção, tais como batata-doce (foto 146), suíno (fotos 4, 102, 104), caminhão
(foto 96), pasto (foto 176), bicicleta (foto 134), cavalo (179) etc. As fotografias mostram que
o objeto tem uma relação com a experiência de vida das pessoas e, “... mesmo incorporando
funções sígnicas, mesmo sendo produto de investimento de sentido, não perde a sua dimensão
material e, que, na mensagem fotográfica, estas duas instâncias não são incompatíveis”
273
.
Bom, também já escreveu Vanderlinde
274
, “com a minha bicicleta eu posso ir aonde ela me
levar”. A bicicleta do então menino, já veio junto com a mudança de Santa Catarina para
Mercedes, então distrito de MCRondon, em 1961. Servia para fazer comprinhas, caçar
borboletas, deslocar-se e passear.
A tendência apresentada na série das fotografias posadas indica que os objetos estão
relacionados com ocasiões especiais, especialmente casamentos, celebrações eucarísticas,
com retratos, com momentos sociais e com trabalho. Essas imagens, mesmo na sua
simplicidade, criam um quadro de representação festivo, onde a sociedade pode mostrar frutos
do trabalho, as possibilidades de preparar festejos, de comprar bens e de comemorar.
As fotografias posadas e em espaço externo são em menor número (10% da coleção
analisada). São imagens associados a objetos exteriores, também vinculados a fotos de
casamentos e de retratos e algumas referentes a atividades cívicas, de educação, de esporte e
de produção.
273
MAUAD, Sob o signo, 1990, op. cit., cap. III, p. 38.
274
VANDERLINDE, Tarcisio. Viagens. Capítulo 8. A curva do Lobisomem. In: _____. Fragmentos de
Inconformidade: sociedade, territórios e espaços. Cascavel: Ed. Edunioeste, 2009. p. 140-141.
257
Foto 134 - Casamento em espaço externo
Autoria: Foto Kaefer. Acervo particular de Írica Kaefer. Casamento realizado em espaço externo com os noivos
sentados à esquerda da foto. General Rondon. Década de 1954-60.
A fotografia de casamento, foto 135, realizada em espaço externo, apresenta uma
variedade de objetos exteriores agregados aos eventos festivos. Os noivos quase não são
percebidos, pois, mesmo que haja uma tentativa de deixar tudo no foco, o objeto principal é
uma das mesas ao redor das quais o grupo se reúne. Sobre a mesa, provavelmente uma longa
tira de papel faz as vezes da toalha e, sobre esta, são colocados os pratos, que, pelo tamanho,
representam ser descartáveis, copos e garrafas aparentando champanhe. A mesa está posta, só
faltam os talheres, e o grupo aguarda para que o almoço seja servido. Antes, aguarda o clic. A
mesa parece ter sido “fabricada” para o momento, tendo como pés troncos finos de árvore não
beneficiada e uma tábua longa. Os bancos são de madeira e uma perna da mesa é usada para
pregar um pedaço de tábua para ajudar a sustentar o banco em que adultos e crianças se
acomodam. Uma cadeira de palha acompanha os móveis. Uma lona escura é esticada por
cima do espaço preparado para a comemoração do casamento. A lona também é sustentada
por ripas de troncos finos de árvore. No sentido vertical, uma quarta parte à esquerda da foto
um prédio de madeira, denotando ser uma casa, ou um galpão.
A formalidade da pose é assegurada pelos convidados, principalmente as mulheres
posicionadas em pé, no terceiro plano. As pessoas estão sorridentes e uma das crianças,
sentada à direita da foto, quebra a formalidade do momento, virando-se para trás como que
fazendo algum comentário. As vestes são simples, podendo ser visto um senhor com as
mangas da camisa arregaçadas, e outro senhor com camisa xadrez e usando botas. A
predominância dos objetos de madeira mostra, novamente, as condições da época, conforme
já se salientou. Ao fundo podem ser vistos uma faixa com alguma plantação seguida de
arbustos e ainda há sinal de mata nativa. Nesse sentido, esses aspectos rústicos do uso de
258
objetos em madeira e da ambientação do evento na natureza são representações do princípio
da ocupação local e formas de aproveitamento dos recursos à disposição dos colonos.
Ainda, com relação às fotos posadas, alguns objetos são introduzidos aos registros
fotográficos com a intenção de reforçar as vivências, o que pode ser verificado nos momentos
de comemoração do aniversário do município ou desfiles cívicos. Os artefatos são montados,
caminhões são ornamentados e os tratores enfeitados são incluídos aos desfiles.
Foto 135 - Desfile
Autoria: Foto Kaefer. Acervo particular de Írica Kaefer. Homens em momento de desfile nas comemorações do
dia do município. Entre década de 1954-1961.
Os caminhões eram ornamentados e as faixas indicavam a participação dos distritos no
desfile. Na imagem da Foto 136, o grupo colocou vários objetos em cima do caminhão, sendo
objetos representam o cotidiano dessas pessoas. Da esquerda para a direita, um senhor segura
uma cuia de chimarrão. A cuia e a chaleira são elementos que fazem parte dos hábitos das
pessoas vindas do sul. Ao chimarrão estão associados os momentos de descanso, de lazer e de
conversa sobre as tarefas do dia a dia e o planejamento de atividades. Um tronco de madeira é
exposto bem no alto do caminhão, onde dois senhores do grupo se posicionam como se
estivessem serrando a madeira com uma serra traçador, ressaltando uma atividade associada
ao universo rural. Várias faixas com dizeres diversos são carregadas por alunos das escolas ou
por pessoas da comunidade ou fixadas nos meios de transporte. As faixas se encontram em
várias fotografias
275
. Nelas, o colono e o motorista são saudados. Ou são esses, as casas
comerciais ou o seu distrito que saúdam o município. As expressões nas faixas são uma forma
de mostrar a relação ora da população do interior com o espaço urbano, ora a integração local
275
Foto nº 7, 11 e 23, Pasta
259
com a nação. Nos momentos políticos, algumas faixas saúdam os visitantes e outras
apresentam dizeres que reafirmam a posição do colono como “esteio da nação”.
Finalizando a série das fotos posadas em espaço externo, podem ser analisadas as fotos
sobre o tema do “Esporte”.
Foto 136 – As damas do futebol
Autoria: Foto Kaefer. Acervo particular de Írica Kaefer. Mulheres em momento de encontro futebolístico.
Marechal Cândido Rondon.
A fotografia 137 mostra o envolvimento das mulheres nas atividades de laser. A
bandeira estendida atrás do grupo de mulheres, é presa por alguns galhos e, para deixá-la bem
estendida, tem uma das pontas esticadas por uma corda que é amarrada no tronco de outra
árvore. Assim aberta, expõe o emblema do “Esporte Clube Botafogo - fundado em 5-5-66 –
Sociedade das Damas”. Na imagem estão reunidas jovens, senhoras e mulheres mais idosas.
A bandeira, assim como o uniforme das mulheres, que tem um emblema na própria blusa, são
uma representação da participação das damas no espaço esportivo. A fotografia, inclusive, é
feita no próprio campo, em meio a grama e tendo ao fundo parte da parede de madeira que
deve cercar o campo de futebol.
A indumentária característica masculina associa-se ao uniforme dos times, dentre os
quais estão identificados o Esporte Clube Flamengo e o Oeste Marechal Futebol Clube. Para
essas atividades, os registros destacam os jogadores, as bolas, uma trave, rede e as bicicletas,
no caso do ciclismo. A fachada de uma casa comercial e a parede de madeira formam o fundo
260
em duas fotos. Em outras quatro fotos, alguns arbustos podem ser vistos e o céu na parte
superior de quatro fotos.
Foto 137 – Time de futebol Flamengo
Autoria: Foto Kaefer. Acervo particular de Írica Kaefer. Jogadores do Esporte Clube Flamengo de General
Rondon. Década de 1960.
Os jogos de futebol eram uma atração especial nas atividades de lazer desde o início
da colonização na região. Em torno dos times de futebol organizavam-se as torcidas e grande
parte da comunidade, especialmente em períodos de campeonatos. Na Foto 138, os jogadores
mostram o uniforme, composto de calção branco e camiseta com listras em dois tons, no
sentido horizontal. Algumas camisetas expõem o distintivo no lado esquerdo e, na camiseta
do goleiro, esse distintivo foi fixado bem no centro. Cabe também ao goleiro segurar a bola
no momento desse registro formal e característico dos times de futebol.
As fotografias da série fotos espontâneas e que correspondem a 10% da coleção estão
relacionadas principalmente com objetos exteriores e envolvem os temas “Tragédias”,
“Civismo”, “Esporte” e “Festividades”.
Ao tema “Tragédias” estão associados objetos de interiores e de exteriores. Nos dois
registros em espaços interiores uma corda e um fio estão relacionados com enforcamentos.
261
Foto 138 - Enforcamento de uma senhora
Autoria: Foto Kaefer. Acervo particular de Írica Kaefer repassado para acervo de Livino Boech. Enforcamento
de uma senhora ocorrido em espaço interno. Marechal Cândido Rondon. Década entre 1954-60.
Um dos enforcamentos ocorridos em parte interna aparenta ter sido em um galpão. Na
parede da parte esquerda da foto, ali uma estante feita com duas tábuas rústicas mostra dois
garrafões de vidro com a palha ao redor, um caixote de madeira e uns objetos esbranquiçados,
que parecem ser pedaços de sabão caseiro. Aos pés da senhora falecida aparece um banco ou
caixote de madeira, que, provavelmente, tenha sido utilizado para auxiliar no ajuste da corda
usada para o enforcamento. A corda continua suspensa, o que indica ter sido presa na parte
superior do galpão. O galpão parece pequeno, as paredes de madeira estão sem pintura e o
chão é rústico. A senhora morta está enquadrada no centro da imagem e, como pertences
pessoais, apenas um lenço estampado na cabeça e o vestido xadrez miúdo no preto e no cinza,
completam os objetos da cena. Os pés sujos e descalços, a simplicidade das vestes e do
ambiente são uma representação das dificuldades e da vida precária que acompanha algumas
pessoas e das interferências no estado emocional e psíquico que pode ter levado à
conseqüências fatais conforme retratam algumas cenas À outra foto de enforcamento em
espaço interno está associado o espaço de moradia com um senhor enforcado em primeiro
plano e de costas para a câmera. Aos pés descalços, um pedaço de pano não identificado e, em
segundo plano, encostada numa parede de madeira e sem pintura, uma bolsa de mão
confeccionada com palha, apoiada em cima de outro objeto não identificado. Ao lado da bolsa
ficaram parados os sapatos masculinos. Ainda na mesma parede pode ser vista uma máquina
de costura à mão e uma cadeira de madeira com a palha rasgada. Casas e chão de madeira sem
pintura, objetos em madeira e palha, vestes simples... é tudo o que pode ser enquadrado nessas
imagens.
262
As imagens do tema “Tragédias” feitas em espaço externo estão ambientadas na rua,
envolvendo objetos exteriores relacionados com meios de transporte, tais como carroça,
automóvel, ônibus, patrola e caminhão... todos envolvidos em acidentes, sendo três fotos em
acidente não identificados, uma foto com acidente de derrubada de uma árvore (Foto 75) e
três fotos relacionadas com temporais.
Foto 139 - Acidente de trânsito
Autoria: Foto Kaefer. Acervo particular de Írica Kaefer e repassado para o acervo de Livino Boech. Acidente de
trânsito envolvendo um automóvel e uma carroça puxada por cavalo. Marechal Cândido Rondon. Década entre
1954-70.
As fotografias sobre acidentes de trânsito indicam os principais fatores que induziram
a acidentes, como nevoeiros e a precariedade das estradas que, em dias de chuva, dificultava o
trânsito em função da lama e, em dias de sol, pela quantidade de poeira que se formava. O
aspecto de algumas colisões (“batidas”, na linguagem local) indica que a velocidade também
deve ter provocado alguns acidentes. Vários caminhões estão tombados e outros acidentes
mostram os veículos com danos significativos, ou seja, com capô, portas e laterais muito
amassadas. Os meios de transporte com tração animal também são envolvidos em acidentes e
algumas imagens indicam que ocorreram em curvas de estradas. Eventualmente algum
motorista desgovernado ou um problema mecânico podem ter provocado acidentes,
considerando-se colisões em postes ou no canto de uma moradia.
Considerando que várias pessoas foram envolvidas nesses acidentes, não raras vezes
fatais, e que outras pessoas acompanharam o ocorrido, os objetos exteriores relacionados a
essa temática também se relacionam com objetos pessoais, principalmente a indumentária, em
que se veem homens às vezes com os pés descalços, vestindo calças simples, camisas de pano
xadrez ou liso, casacos e chapéus. O espaço de estrada de chão vem acompanhado de
pequenos arbustos, que podem ser vistos na beira das estradas. As imagens sobre acidentes de
263
trânsito são feitas no sentido horizontal, permitindo o enquadramento de veículos ou dos
animais envolvidos no acidente. Fotografias não incluídas na análise também incluem
tomadas com enquadramentos específicos, mostrando consequências do acidente, como
corpos das pessoas estendidas no chão e animais mortos. Írica ressaltou que parte dos
registros sobre acidentes de trânsito ou outras fatalidades eram feitas com um foco direto
sobre algum detalhe, isso para a foto depois acompanhar documentação policial e pericial.
As fotografias trágicas em circunstâncias não identificadas mostram pessoas mortas
caídas no chão em meio ao gramado ou a arbustos rasteiros.
Foto 140 - Acidente não identificado
Autoria: Foto Kaefer. Acervo particular de Írica Kaefer e repassado para o acervo de Livino Boech. Acidente
não identificado. Marechal Cândido Rondon. 1968.
A Foto 141 se refere a uma morte ocorrida em 1968. Na coleção, permaneceram as
fotos de número um e número dois, números que se referem aos registros e controles dos
fotógrafos. Na foto identificada pelo número 2 (não incluída na análise) ocorreu o
enquadramento de todo o corpo dessa mesma pessoa da foto número 141. Algum objeto
apareceu na frente da câmara. As marcas de ferimentos estão por toda a parte superior do
corpo. No enquadramento da foto, são dados destaques para o abdômen, o peito, os braços e o
pescoço do corpo. A pessoa falecida usava uma camisa xadrez e uma calça com cinto. As
vestes da pessoa morta são simples, aparentando serem roupas usadas no trabalho. Na outra
imagem, o chapéu ficou caído próximo aos pés e estes ficaram encobertos por um tronco de
árvore. Com esses detalhes, as formas e os tipos de objetos enquadrados indicam tratar-se de
264
mais um acidente com derrubada de árvore. Ainda, esclarece-se que a outra fotografia não
está aqui incluída, procurando preservar-se o nome da pessoa falecida que consta na foto
276
.
Nas outras fotografias de acidentes não identificados, as imagens de pessoas mortas
também destacam partes do corpo atingidas, principalmente a parte da cabeça, que aparece
ensanguentada. Uma imagem mostra um machado ao lado da pessoa caída e morta e em outra
foto há uma mareta. São imagens terríveis e podem estar associadas a causas indesejadas, pois
nas caçadas aconteceram acidentes
277
com armas de fogo, mas podem também estar
relacionadas com brigas e desentendimentos.
Em duas fotos sobre acidentes consta uma identificação na parte da frente com escrita
à caneta indicando o local do acidente. Trata-se de Entre Rios do Oeste e de Quatro Pontes.
Essas referências mostram que os fotógrafos se deslocavam para o interior do município para
registrar esse tipo de ocorrências também nos distritos. As pessoas envolvidas nesses
acidentes são homens com vestes simples. O registro dessas imagens relacionadas com
acidentes de trânsito e outras fatalidades são um sinal visível de problemas enfrentados pela
população.
Jornais
278
também mostram e comentam problemas, mas somente em momentos em
que tais fatos ocorriam. Quando os jornais comemoram o aniversário do município, por
exemplo, as dificuldades são mencionadas, mas enaltecidas como momentos de bravura e
heroísmo. A passagem comemorativa é enfatizada e ilustrada com imagens que mostram o
progresso, o desenvolvimento, o crescimento da cidade. Com fotos antigas mostram-se os
diferentes espaços geográficos e os objetos que eram utilizados e pertencentes àquele período,
relacionados às moradias, aos estabelecimentos públicos, aos automóveis, às estradas, aos
eventos cívicos e sociais, enfim. Mostra o antes e depois e, nesse vai e vem, do presente ao
passado, na tentativa de recordar, hoje, o ontem, passa-se à noção de uma sociedade que
passou, sim, por problemas, mas os superou. Assim, os espaços retratados nas comemorações
não estampam as imagens de tragédias, dos acidentes, dos problemas psíquico-sociais que as
fotos da coleção registram. As imagens da coleção proporcionam o tom da gravidade dos
problemas enfrentados e do sofrimento que também acompanhou a sociedade.
Para finalizar as análises sobre o espaço do objeto com relação às fotos espontâneas,
mencionam-se as fotos sobre os temas “Festividades”, “Esporte” e “Civismo”, que totalizam
seis fotos. A foto sobre carnaval é em espaço interno e as demais em espaço externo.
276
Foto nº 28 pasta tragédias, acervo de Írica Kaefer.
277
KAEFER, 27 jun. 2002, op. cit.
278
Fatos noticiados sobre acidentes, roubos, brigas e desentendimentos poderão ser verificados nos diferentes
jornais publicados em MCRondon conforme quadro (anexo 5).
265
A fotografia do carnaval mostra o instantâneo da cena.
Foto 141 - Carnaval
Autoria: Foto Kaefer. Acervo particular de Írica Kaefer. Flagrante de um carnaval. Marechal Cândido Rondon.
Década de 1960-70.
Cadeiras esparramadas, uma inclusive na parte da pista de dança, pessoas de mãos
dadas em forma de “cordão” uma puxando a outra, casais dançando, crianças observando e
acompanhando a folia. A fotografia mostra um momento de distração, de festejos, de
comemoração carnavalesca. O flash sobre o grupo permite a visão dos integrantes do primeiro
plano. No segundo plano e mais ao fundo da foto não há luminosidade suficiente para o
campo fotográfico, o que indica também tratar-se, além de espaço interno, de evento ocorrido
à noite.
Os objetos integrados a esse espaço são, além da cadeira de madeira com assento de
palha, os objetos pessoais. As roupas são de festa e de folia, o que é demonstrado pelo casal
que dança. Ele, de costas para a câmera, inclusive de terno, ela com vestido florido e sapato
fechado. As crianças usam camisetas de manga curta, calças compridas e seguram algum
objeto não identificado nas mãos. Bem à direita da foto, uma parte da silhueta de um rapaz é
enquadrada e ele segura um copo na mão. Pode-se ver que usa uma cinta como parte da
fantasia. Os foliões do cordão usam roupas mais fantasiadas, como camisas com franjas, mas
a calça é comum. Uma mulher usa vestido estampado. Na cabeça, usam chapéus enfeitados.
Como calçado, usam sapatinhos de pano. Os objetos diferenciados desse carnaval são
principalmente a camisa do folião e dois chapéus enfeitados, o que significa que a associação
ao carnaval é o objeto pessoal, representado na fantasia dos chapéus e nos gestos dos foliões.
266
As fotografias espontâneas sobre esporte estão relacionadas com jogos de futebol e de
prática de ciclismo.
Ao espaço do futebol cabem objetos exteriores relacionados com esse evento,
conforme mostra uma das fotos.
Foto 142 - O esforço do goleiro
Autoria: Foto Kaefer. Acervo particular de Írica Kaefer. Flagrante de um jogo de futebol. Marechal Cândido
Rondon. Década entre 1954-1970.
Na Foto 143, uma síntese de objetos exteriores relacionados com esse esporte, tais
como o apito do árbitro (“juiz”, na linguagem da maioria local), que se encontra no primeiro
plano, agachado ao lado da trave de madeira. No segundo plano, encontra-se o goleiro, em
movimento, tentando defender a bola. Considerando que o goleiro joga o corpo para o seu
lado direito (o pé esquerdo não encosta o chão) e, pela direção da bola, esta deve ter entrado
no gol. O fotógrafo, atento, vai fazendo fotos e “gravando” lances. Na parte da altura da trave,
o chão, de terra ou grama, estão encobertos por algo esbranquiçado que deve ser serragem ou
maravalha. Segundo informações de Klein
279
, “para cobrir a terra e proteger os jogadores da
sujeira e chão duro os times de futebol buscavam sacos de serragem ou maravalha nas
serrarias, tinha bastante, e espalhavam pelo campo de futebol”. Acredita-se que essa prática
deve ter sido feita no dia do jogo registrado na Foto 143 considerando-se o espaço do chão
claro na altura da trave.
No terceiro plano, e contornando a campo, o público aglomerado contorna o campo e
aprecia o jogo que ocorre próximo de residências (que podem ser identificadas pelos telhados,
279
KLEIN, Valmor Ermindo (Baio). Entrevista concedida a Lucia Teresinha Macena Gregory. Marechal
Cândido Rondon, 31 jun. 2009.
267
que estão à vista), assim como a parte superior de um caminhão, que, provavelmente serviu,
na ocasião, para transportar os jogadores e o público, ida e volta. Os espectadores dão um
jeito para melhor acompanhar o jogo e algumas pessoas olham do alto do caminhão. Outras
sobem em algum apoio que está atrás de uma parte do público, que pode se posicionar mais
próximo. Uns estão em pé, outros agachados e outros ainda se apoiam na cerca de madeira
que fica atrás da rede. No meio do público, duas pessoas também estão com meias compridas,
de futebol, o que indica tratar-se de atletas reservas ou de outro time que já jogou ou deverá
jogar ainda na mesma oportunidade. Em termos de paisagem, árvores e moradias se
encontram nas proximidades do evento. No chão, parte do gramado, uma listra branca
delimita o campo e, nas proximidades da trave, foi esparramado algo que deixou
esbranquiçado o chão.
Como objetos pessoais, parte do público usa chapéus, camisas e calças e os meninos
calções. A indumentária esportiva é realçada através do goleiro, que está com chuteiras, meias
longas e listradas, calção curto e camisa de manga longa. Nesse contexto esportivo, a atenção
se volta muito mais para o jogo do que para o fotógrafo, indicando que os poucos objetos
associados ao esporte são uma representação suficiente para indicar o quanto o futebol
envolve a comunidade, mesmo que, no caso da Foto 143, o público seja predominantemente
masculino.
As outras duas fotos espontâneas sobre esporte mostram momentos de corrida
ciclística. Os principais objetos enquadrados são as bicicletas, uma bandeirola e uma faixa.
Em uma das fotos estão, em segundo plano, inúmeros atletas participantes de uma corrida,
parados com as respectivas bicicletas mas olhando para trás como que aguardando algum
atleta integrante da equipe. Em outra foto apenas duas bicicletas foram enquadradas, numa
estreita pista de corrida ladeada pelo público. É o momento do flagrante em que um ciclista
está pedalando, de costas para a câmera, talvez sendo um dos primeiros a passar pela linha de
“CHEGADA”, como indica a faixa. A bandeirola quadriculada que está nas mãos de um
senhor posicionado na beira da pista, junto ao público, já está abaixada enquanto o segundo
ciclista entra para o enquadramento da foto. Para Mauad, “... a medida do tempo no
instantâneo fotográfico possibilita o surgimento de uma linguagem visual mais ágil,
comprometida com ‘o que realmente aconteceu’ ou com o que ‘ninguém estava esperando’”
280
e, no presente caso, o próprio fotógrafo pode ter se perguntado: -- Será que deu tempo de
enquadrar o participante da corrida?
280
MAUAD, Sob o signo, 1990, op. cit., Cap III, p. 58
268
Na faixa, além da expressão “CHEGADA”, em letras destacadas, pode ser percebida a
divulgação de bicicletas através da marca Monark, com dizeres que ressaltam a sua utilidade,
tais como: “Monark – a moderna condução do povo brasileiro!” (isso estampado em uma
extremidade da faixa) e “Monark – a bicicleta da família brasileira!” (estampado na outra
extremidade da faixa). Uma faixa, como se sabe, é um simples pano, mas com símbolos e
expressões que ultrapassam o espaço do objeto em si e procuram mexer com a imaginação,
provocando o desejo de possuir tal bicicleta, com frases que colocam o usuário num nível
econômico ascendente, caso possua uma condução, tal qual o povo e as famílias brasileiras. O
contexto nos remete a uma pequena parte de uma bicicleta, um guidão, que pode ser vista na
parte superior direita da foto e às fotografias em que as pessoas orgulhosamente expõem sua
“condução”. Não por acaso o momento também é um momento especial, o que mostram as
vestes, os chapéus de palha limpos e não amassados, o chapéu de feltro, os calções e as
camisetas dos meninos, que usam sapatos com meias e, alegres, fazem a maior torcida. A
exceção se faz a dois meninos de camisetas listradas, posicionados à direita da foto e que
voltam seu olhar para a câmera, deixando de aplaudir o atleta.
A fotografia espontânea do tema “Civismo” mostra o momento de uma parada cívica
que vai da posição de “sentido” para a de “descansar”, onde foram enquadrados vários
meninos.
Foto 143 - Parada cívica
Alguns alunos na Foto 144 ainda se encontram com as mãos estendidas na lateral do
corpo, o que proporciona uma impressão de pose programada, porém a forma de se posicionar
do menino ao centro e em terceiro plano e que está de costas para a câmera e com as mãos
269
entrelaçadas na cabeça e, ainda, a pose descontraída do menino à direita da foto, com as duas
mãos no bolso da calça, cabeça inclinada acompanhada de um leve enrugar sorridente no
rosto, indicam uma cena envolta em movimentos. O momento cívico de desfile normalmente
envolve poses, como já foi mencionado, porém, além da pose e do programado, ocorrem
tomadas instantâneas que podem captar diferentes gestos e olhares como, inclusive, a direção
de alguns desses meninos, para o próprio fotógrafo.
A esse espaço associa-se um elemento significativa do momento cívico, espaço que é
objeto pessoal, a indumentária dos alunos, ou seja, o uniforme na calça social escura e presa
por um cinto, as camisas brancas por dentro da calça, o distintivo da escola, os sapatos pretos
e as meias escuras. Se a posição cívica não é mais a de “sentido”, nas vestes e na disposição
em fila estão representadas a ordem, a obediência e o amor à pátria.
Ainda, no aspecto referente ao espaço do objeto, há o conjunto de 4% de fotografias
sem figuração, num total de 10 fotos, sendo oito do tema “Vistas Locais e Paisagens” e duas
fotografias do tema “Produção”.
Os objetos exteriores vinculados à produção são a vista de uma olaria.
Foto 144 - Olaria Honke
Autoria: Foto Kaefer. Acervo particular de Írica Kaefer. Olaria Henke. Proximidades da Avenida Írio Welp.
General Rondon. Década entre 1954-1961.
Nessa imagem da olaria (Foto 145), a chaminé é uma característica da série
“indústria”. O telhado longo dá a dimensão da infraestrutura, que aponta uma capacidade
significativa de fabricação de tijolos. Ao redor, alguns telhados menores são avistados,
mostrando residências e, à direita da foto, há um galpão. Ao fundo ainda existe uma mata
densa. Resumem-se, pois, às construções e a seus telhados, à chaminé e aos arbustos que
crescem ao redor dessas construções, os objetos exteriores dessa imagem sem figuração. A
270
atividade está ambientada em espaço natural em que houve interferência humana percebida na
vegetação rarefeita e nos tocos de árvores derrubadas. A olaria localizava-se numa área ainda
não urbanizada, nas proximidades da Avenida Írio Welp, em General Rondon onde,
atualmente funciona a UNIOESTE. Na imagem está registrada parte da infraestrutura de
produção existente, necessária para atender à demanda da população que chegava à
localidade.
No tema produção, a série “agricultura”mostra o registro da batata-doce, registro feito
no estúdio fotográfico.
Foto 145 - Batata-doce no estúdio fotográfico
Autoria: Foto Kaefer. Acervo particular de Írica Kaefer. Batata-doce. Estúdio novo dos Kaefer, na Avenida Rio
Grande do Sul. Marechal Cândido Rondon. Década de 1960.
Batatas-doces, normalmente, só aparecem como objetos interiores quando
fotografadas ao serem descascadas para o preparo de uma refeição. Não é o caso dessas três
batatas expostas e ajeitadas sobre uma mesa com toalha estampada no interior do estúdio dos
Kaefer. Enquadradas, em primeiro plano, as batatas são fotografadas de forma a deixarem
salientes, na imagem, a textura com marcas onduladas das batatas, manchas e uma
ramificação que ainda une as três batatas. Em segundo plano, aparece a parte quadriculada,
com foco desajustado, da parte do piso do estúdio e ao fundo uma pequena parte da escada,
indicando tratar-se de foto feita no estúdio novo. A grandiosidade do ato de fotografar
produtos agrícolas no estúdio fotográfico está na dimensão que a boa produção representa
para os produtores. No registro de alguns produtos (como batata-doce, repolho, mandioca),
alguns até identificados com os seus pesos nos registros, inclusive no registro dos suínos, está
representada a boa produção da terra adquirida. Havia também a intenção da própria
271
colonizadora, que aproveitava os momentos de boas colheitas para registrá-las e,
posteriormente, divulgá-las nas propagandas de terras. Registrar momentos de uma boa
produção associa-se a uma representação do possuir alimento, do resultado obtido através do
trabalho, o que possibilita o sustento da família.
As oito fotografias sem figuração estão relacionadas com o tema “Vistas Locais e
Paisagens”, da coleção analisada, e mostram espaços e objetos exteriores enquadrados nos
registros da coleção.
Foto 146 - Vista aérea urbana de Marechal Cândido Rondon – PR.
Autoria: Foto Kaefer. Acervo particular de Írica Kaefer. Início da década de 1970.
Nas vistas urbanas ocorreram tomadas aéreas que destacam objetos fixos, tais como
prédios, casas, estradas de chão, estradas asfaltadas, ruas, calçadas, postes de iluminação,
árvores, mata, etc. Na fotografia 147, esses objetos exteriores estão relacionados ao espaço
urbano e mostram como a vila cresceu, tanto no sentido horizontal (ampliando suas ruas)
como na vertical (com prédios de altura pequena, estabelecimentos públicos, comerciais e
residenciais). Objetos do espaço urbano indicam o crescimento da cidade, o aumento das
construções e do movimento urbano.
A imagem mostra, à esquerda, a Avenida Rio Grande do Sul e, na altura da parte
central da foto, a Avenida Maripá, as duas principais avenidas da cidade. Como objetos fixos,
na esquina dessas ruas, pode ser visto o Posto Esso, um dos primeiros postos de gasolina,
então de propriedade da família Von Borstel. Através dos motoristas desse empreendimento
seguiram várias vezes pedidos de material fotográfico para os Kaefer, quando os motoristas
buscavam combustíveis em Curitiba. À direita do posto de gasolina, já na outra esquina, na
Rua Santa Catarina, está a rodoviária, com três andares, podendo ser visto um ônibus ali
272
estacionado. Na parte inferior da foto, “descendo a rua”, do lado esquerdo, está o Hotel
Flamingo, hoje Hotel Bender, com seu pátio de estacionamento bem na esquina. À frente
deste hotel, em meio a árvores, o prédio da atual Casa Gasa pode ser avistado. Na parte
superior da foto pode ser vista a igreja católica e, para quem conhece um pouco melhor o
espaço, pode ainda identificar o Hospital Fumagali à direita da foto e a caixa de água do
SAAE (Serviço Autônomo de Água e Esgoto, no alto da foto, ofuscada pelo prédio que está
atrás dela. Na parte inferior da foto, na Rua Independência, ainda pode ser destacado outro
posto de gasolina, atualmente conhecido como Posto Camilo e, entre esse posto e o Hotel
Bender, alguns ônibus estacionados.
Ainda, com relação a objetos fixos, podem ser vistas várias árvores de tamanho médio
que já proporcionam sombra. A situação de poder usufruir da sombra remete ao período em
que a vila estava sem sombra, praticamente em meio à floresta, pois havia sido feita a
derrubada de todas as árvores e aplainada a área para a construção da “cidade planejada”, o
que está indicado no traçado das ruas.
Nesse sentido, a leitura que pode ser feita, a partir do enquadramento desses objetos, é
a de que, em meio a prédios residenciais e públicos, as ruas e as avenidas, já asfaltadas e
tendo demarcados o espaço de calçadas e o canteiro central da Avenida Rio Grande do Sul,
junto às árvores e aos automóveis, no propósito do fotógrafo havia a intenção de enquadrar
parte do espaço onde funciona a vida urbana. Assim, nesse espaço urbano, ao mesmo tempo
em que a população tem ali seu espaço do viver cotidiano, de lazer e de religiosidade, tem,
nas proximidades, instituídos outros aspectos da infraestrutura necessária para o
desenvolvimento da cidade. Ao fundo, a parte superior da foto já é um sinal de área rural, área
para onde vai se direcionando parte do crescimento urbano.
273
Foto 147 - Vista rural
Autoria: Foto Kaefer. Acervo particular de Írica Kaefer. Marechal Cândido Rondon. Década de 1960.
As fotografias sobre espaço rural sem figuração são tomadas feitas nas proximidades
de residências. Os objetos são a casa, o galpão, o galinheiro, tocos de árvores que foram
derrubadas, troncos caídos sobre um chão com um pouco de gramínea. Trata-se de objetos
simples, relacionados com uma vida com menos recursos disponíveis e possibilidades de
aquisição de objetos reduzida.
A casa construída em cima de palanques de madeira pode associar-se a alguns objetos,
embora não enquadrados nessa imagem, mas que são vinculados ao espaço rural. Debaixo da
casa, dependendo da sua altura em relação ao chão, vários objetos eram guardados,
principalmente sobras de madeira (Foto 148). Ali debaixo da casa, gatos, cachorros e galinhas
aproveitavam o chão de terra para descansar ou até mesmo para fazerem suas moradas e seus
ninhos. Nesse espaço, às vezes pouco visível, cachorros e gatos davam luz às suas crias,
galinhas botavam ovos e, quando não recolhidos, podiam ser comidos pelos cachorros. Ou,
então, as galinhas aproveitavam o ninho cheio para chocar. Quando a família menos esperava,
aparecia uma choca com pintinhos caminhando pelo pátio. São, portanto, objetos associados
ao meio ambiente em que as pessoas vivem e constroem suas vidas.
274
Foto 148 – Paisagem das Cataratas do Iguaçu
Autoria: Foto Kaefer. Acervo particular de Írica Kaefer. Cataratas de Foz do Iguaçu. Década entre 1960-70.
A fotografia das Cataratas do Iguaçu Foto 149 e a de Sete Quedas são registros de
espaços percorridos pela família Kaefer
281
em passeios e em visita aos pontos turísticos mais
importantes da região. Segundo Írica, eventualmente algumas famílias se reuniam para
conhecer a região e “dar um passeio”. As duas únicas fotografias sobre esses espaços
turísticos proporcionam, por um lado, o enquadramento de objetos exteriores relacionados
com a natureza, a beleza, as águas, a mata e a vegetação existentes na região naquele
momento. Por ouro lado, mostram que sair de meio em que as pessoas viviam e visitar esses
lugares turísticos era um privilégio para poucas pessoas. Neste caso, trata se da área de
preservação, o Parque Nacional do Iguaçu, anexo às cataratas.
Enfim, ao se concluir a análise sobre o espaço do objeto que a coleção mostra e
enquadra, acredita-se, como Mauad, que “os objetos associam-se ao espaço-tempo da ação
fornecendo o significado do grupo social àquele evento.” A região de General Rondon, no
início da década de 1950, estava recebendo as primeiras famílias, que eram acomodadas nas
poucas casas simples já construídas. Seguindo-se poucos anos, quando o casal Kaefer já se
encontrava na região, em 1953, praticamente tudo ainda estava por ser feito em meio à mata,
que ainda era abundante. Assim, no enquadramento dos diferentes objetos, a mata está lá, no
terceiro ou quarto planos, formando o fundo dos registros.
281
KAEFER, 03 maio 2009, op. cit.
275
O espaço da mata densa aos poucos vai desaparecendo, dando lugar aos arbustos, à
vegetação menor, às plantações, às hortaliças, às flores e às folhagens naturais, que, aos
poucos, vão assumindo o espaço. Junto a essas mudanças são enquadradas as residências, as
construções públicas, a infraestrutura que a população necessita -- tudo acompanhado dos
eventos e dos objetos a eles agregados, alterando as cenas do pequeno “álbum-de-bolso”.
O crescente espaço-do-objeto está relacionado e vem acompanhando o conjunto das
mudanças, mostrando o novo, a movimentação e as alterações desse espaço de interiores e de
exteriores, o que o casal Kaefer registrou e documentou, no decorrer de 30 anos. Nessas
fotografias, os objetos, na sua diferente posição, forma, espaço, são um representação da
intenção de reafirmar e de confirmar valores, eventos e vivências.
Uma análise sobre a variedade e a quantidade de objetos, tanto de interiores, como de
exteriores, destaca, na sua simplicidade, aspectos e condições econômicas, detalhes da
natureza, mas, acima de tudo, aspectos sociais que envolveram as famílias no período
enquadrado.
No conjunto das imagens, ressalta-se uma variedade de objetos, que são elaborados e
criados muitas vezes para atender àquele momento, mostrando aspectos específicos e a
variedade de objetos muitas vezes fabricados pelas próprias famílias. Entende-se, assim, que
os objetos estão associados também às condições econômicas. No caso das imagens
analisadas, na maioria das vezes a escassez e as dificuldades eram evidentes, pois no
transporte do local de origem até o Oeste paranaense, na mudança vinha o essencial, ou seja,
só o que cabia no caminhão de mudanças e que, no início da ocupação, tudo estava por ser
feito.
Os momentos festivos e solenes mostram, aos poucos, hierarquias sociais que se
evidenciam pelo consumo incorporado à condição social das pessoas retratadas. Os objetos
organizados no arranjo fotográfico criam a representação da comemoração de um momento
especial. Segundo Moreira Leite, “todos esses rituais simbolizam uma reciprocidade de
serviços e de propriedade de bens de produção e de consumo”
282
que mostram a transferência
de bens materiais para o espaço fotográfico.
282
LEITE, op. cit., p. 113.
276
5.2.4 O ESPAÇO DA FIGURAÇÃO
Neste item, também relacionado aos elementos da forma do conteúdo, observa-se a
figuração representada nos registros, percebendo as pessoas e animais retratados. Acompanha
a análise o espaço enquadrado, a distribuição dos figurantes, seus atributos e gestos.
Compõem, portanto, o espaço da figuração homens, mulheres, crianças e animais.
Analisa-se o espaço da figuração através da relação dicotômica percebida na coleção:
grupo e indivíduo, feminino e masculino, adulto e infantil.
5.2.4.1 A relação entre grupo e indivíduo
No conjunto da coleção, 64% das fotografias são de grupos (143 fotos) e 28,5% são
individuais (64 fotos).
Quadro 26 – Distribuição dos temas por grupos x indivíduos e horizontal x vertical
Grupos Indivíduo
Temas
Horizontal Vertical Horizontal Vertical
Vistas locais 3
Retratos 15 14 38 2
Religião 24 19 14
Produção econômica 7 2 3
Tragédia 5 6 2
Esporte 11
Festividade 7 14
Educação 11
Civismo 11
TOTAL 94 49 61 4
O Quadro 26 também indica que as fotografias de grupos possuem um enquadramento
no sentido horizontal em 94 fotos para 49 no sentido vertical. Considerando tratar-se de
fotografias em grupo, chama atenção o número significativo, embora num percentual menor,
das fotos na vertical. Ocorre que, no sentido vertical, em algumas fotos, o grupo se posiciona
em dois planos, formando linhas duplas, o que deixou as pessoas mais reunidas,
proporcionando o enquadramento vertical. São exemplos desse enquadramento grupos
pequenos, de senhoras com crianças e de família onde o casal posa sentado e os filhos, atrás
deles. A situação ocorre também quando há o enquadramento de casais de noivos ou de
namorados, o que se verificou principalmente nas fotos posadas referentes aos temas
“Retratos”, “Religião” e “Festividades”, onde são enquadrados casais dançando.
277
Foto 149 – Os noivos Vorpagel Foto 150 - Os noivos Router
As fotografias 150 e 151 são exemplos de momentos especiais – trata-se do dia do
noivado desses casais. O casal Zastrow escolheu o espaço natural e faz pose em frente a
alguns arbustos, deixando registrado em documento o dia do noivado, assim como o casal
Romilda e Rudi Reuter. Já este último casal optou pela fotografia no estúdio. Os casais usam
veste especial. Os rapazes usam terno e camisa clara. O noivo da Foto 150 deixa a gola da
camisa por cima do terno e o rapaz da Foto 151 usa uma gravata. A noiva de Zastrow usa um
vestido escuro enfeitado com fitas brancas nas extremidades do vestido, na altura das pernas e
do pescoço. Os acessórios estão representados no cinto, lenço no bolso do paletó, colares e o
par de meias que a noiva de Zastrow usa. Todos podem mostrar seus sapatos. Romilda, em
seu vestido claro, posa cruzando as pernas e deixando os sapatos brancos bem à vista. Sentada
de forma alinhada e protegida pelo noivo Rudi que, sentado num dos braços da cadeira de
vime, estende a mão sobre os ombros da noiva. Essa foto mostra como fundo, dois panos, um
liso com estampa mais leve (onde bate uma sombra dos noivos) e o outro ainda o mesmo do
estúdio antigo. A fotografia do noivado capta um momento único para os jovens, pois aí vêm
278
representadas, nessas imagens, a união e a responsabilidade do novo casal e da família que
está por ser formada.
As fotografias de grupo no sentido horizontal, direção central, são fotografias de
famílias. Nessas fotografias, as famílias são posicionadas formando várias linhas, com as
crianças sentadas na frente do grupo e o grupo, normalmente, tem uma parte das pessoas
sentadas em cadeiras ou em bancos e os demais ficam posicionados em pé, atrás, na tentativa
de enquadrar a todos.
As fotografias individuais somam 65 fotos e são, na sua maioria (61 registros) no
sentido horizontal e 4 no vertical. As fotografias individuais mostram o contexto das opções
pelo momento do particular, do só, do único.
Foto 151 - Sorriso “de ouro”
Autoria Foto Kaefer. Acervo particular de Írica Kaefer. O jovem senhor exibe parte dos bens, o seu terno e um
par de dentes de ouro. Marechal Cândido Rondon. Década de 1954-60.
Um jovem senhor esboça um leve sorriso de forma a deixar a boca entreaberta,
permitindo que seus dentes de ouro se tornem perceptíveis. O brilho dos olhos não chega a
ofuscar o brilho leve que se faz notar nos dentes do rapaz, embora essa seja uma
demonstração de poder, de posição superior, que é completada pelo traje especial que veste.
279
Nesses momentos, o indivíduo é o objeto central e os momentos são de retratos, como
também nas comunhões, três fotografias do tema produção e duas do tema tragédia.
Na circunstância de tragédias, com relação à foto individual, ocorreu um índice maior
de fotografias no sentido horizontal. É o registro em espaço público e amplo, que pode ser na
rua com o enquadramento da pessoa acidentada ou o registro de sua morte provocada por
queda de árvore, na mata, ou o seu envolvimento com outro acidente fatal, cujo motivo não
pode ser identificado ou, ainda, em registro de temporal e chuva forte.
Foto 152 - Homem com ferimento na cabeça I.
Autoria Foto Kaefer. Acervo particular de Livino Boech. Acidente fatal. Marechal Cândido Rondon. Década de
1950/60. Relaciona-se com a Foto 154.
A situação ocorrida em acidente não identificado em situação individual, a exemplo da
Foto 153, mostra a pessoa como assunto principal e em primeiro plano. Há outra situação de
registro do mesmo acidente (foto não computada na análise), com enquadramento maior,
mostrando todo o corpo da pessoa morta e objetos envolvidos no acidente.
280
Foto 153 - Homem atingido na cabeça II
Autoria Foto Kaefer. Acervo particular de Livino Boech. Acidente fatal. Marechal Cândido Rondon. Década de
1954-70. Relaciona-se com a Foto 153.
As fotografias 153 e 154 referem-se ao mesmo acidente e, embora não haja referências
sobre o motivo que tenha causado o acidente, a morte desse senhor deve ter sido provocada
por uma martelada que na cabeça. Como indícios dessa hipótese vê-se parte da cabeça partida,
o sangue ao redor da cabeça e o martelo deixado ao lado do corpo. Do outro lado do corpo, no
barranco de terra, ficou caído um par de óculos escuro. Seriam arma e sinais deixados pelo
criminoso? As vestes estão sujas e desalinhadas, mas o homem caído continua com sapatos e
meias nos pés. O pescoço está coberto por um pano branco indicando que esta parte do corpo
também pode ter sido atingida por um golpe. A roupa desalinhada e a camisa desabotoada,
assim como os objetos que se encontram ao lado do corpo e, ainda, o sinal de terra levemente
mais escura no chão beirando o corpo da pessoa morta são indícios de que o mesmo deve ter
se debatido e defendido para fugir do local e tentado escapar desse momento fatal.
As fotografias de grupo são as tradicionais fotografias de família, onde os integrantes
formam uma hierarquia de presenças que pode ser formada pelo grupo maior, que reúne desde
os avós até os netos, incluindo-se noras e genros ou somente pelos pais, casais mais jovens,
com seus filhos. A mesma constatação é feita nas fotografias sobre o religioso, que reúne o
grupo familiar nas ocasiões de casamento, oportunidade em que ao grupo familiar são
enquadrados amigos, parentes, vizinhos. A reunião de adultos e de crianças, de familiares e de
convidados são variações em torno desse espaço coletivo.
Nesses momentos especiais, o grupo se veste de forma festiva, o que mostram os
ternos e os sapatos lustrados dos homens e os vestidos franzidos e bem acinturados das
281
mulheres, os cabelos bem alinhados, mais o uso de adereços, que se faz de gargantilhas,
colares, broches para as mulheres, e de lenço ou flor no terno dos homens -- tudo, porém, sem
luxúria. As fotografias coletivas desse período visam criar representações do momento do
evento, da disponibilidade dos grupos de se reunirem e de programarem festividades, mesmo
diante das precariedades de infraestrutura apresentadas nos primeiros anos de vivência dos
grupos na região. Nesse sentido, a indumentária, mesmo sendo importante, passa a ter um
valor secundário, pois aquele que não possuía terno, calçado ou adereços, fazia parte do
registro da mesma forma.
Ainda, ambientadas nos estúdios ou nos interiores de igrejas, nos salões ou nos clubes,
associadas ao espaço artificial ou vinculadas ao espaço natural, nas proximidades das casas, as
fotografias coletivas são opções que concedem às representações significados de estabilidade,
de união e de harmonia. Ao grupo e à casa estão vinculados pontos de referência e de
segurança.
As fotografias individuais ambientadas nos estúdios são demonstração de poder e de
condições favoráveis que permitem documentar um evento ou um momento específico da
opção pelo registro fotográfico pessoal.
O momento pode até ter sido de dificuldades, mas, ainda assim, foi feito o esforço para
deixarem registrados no papel fases das suas vidas, os filhos, os afilhados. As pessoas em
situações ainda mais críticas, felizes por se fotografarem e por terem feito o registro do
evento, tiveram que se conformar em deixar as fotografias na agência fotográfica, nas mãos
do seu produtor e, provavelmente, pensam que esses registros foram descartados e apagados
da história. Provavelmente também não esperam que, decorrido até meio século, em alguns
casos, aquele momento tão especial permaneça guardado, com um valor ainda mais especial,
“nas caixas do depósito...”.
283
5.2.4.2 Relação entre espaço feminino e espaço masculino
A presença da figura feminina e masculina na coleção pode ser acompanhada através
do Quadro 27.
283
Pode-se exemplificar, sobre fotografias não retiradas, as fotografias de casamento, não computadas para a
análise. Na coleção de Írica Kaefer, encontram-se, ainda envelopadas, guardadas em caixas 10x15 de material
fotográfico, mais de 700 envelopes com fotografias de casais de noivos que fizeram a encomenda de “uma
dúzia” de cópias ou de “meia dúzia” de cópias não retiradas.
282
Quadro 27 – Figuração
FIGURAÇÃO/
TEMA
FEMININO MASCULINO
Vistas 02 03
Retratos 43 32
Religião 41 36
Produção 03 12
Tragédia 03 11
Esporte 5 9
Festividade 19 19
Educação 11 9
Civismo 07 11
TOTAL 134 141
Percebe-se uma presença equivalente entre a figuração, sendo que a feminina aparece
134 vezes e a masculina 141 vezes no conjunto da coleção. Essa presença difere, no entanto,
nos eventos registrados. A presença feminina se faz um pouco maior apenas por ocasião dos
retratos e das fotos sobre religião e educação. O feminino e o masculino estão no mesmo nível
de presença nas ocasiões das festividades. Para os demais temas apresenta-se uma
superioridade da presença masculina. Ou seja, o homem tem uma presença numericamente
maior nas fotos sobre vistas e paisagens, produção, tragédias, esporte e civismo.
Nas vistas sobre paisagens, por exemplo, dois senhores podem ser vistos em meio às
pedras e águas no registro das Sete Quedas. Distantes do foco, fazem pose e mostram a
bravura e a aventura que acompanha o grupo, pois alguém ficou à espreita para fazer o
registro do passeio. As vestes para essa ocasião são os trajes especiais em que os homens
usam camisas brancas de manga longa e abotoadas acompanhadas de calças sociais. Parece
estarem calçando botas, o que destoa um pouco do conjunto das vestes, sendo, porém,
calçados usados como prevenção contra animais peçonhentos, até porque estão em meio a
uma floresta.
Nas ocasiões dos retratos, há uma diferença para menos (de 11 fotos) para os homens.
Os mesmos posam sozinhos no estúdio e usam veste especial, como terno e gravata e, como
adereço, lenço no bolso do paletó. Também há ocasiões especiais onde há terno sem gravata e
outras com vestes mais simples, como camisas com estampa xadrez miúdo.
Uma das poucas fotografias de homens em espaço externo, reunidos num grupo, o
mesmo se apresenta com veste especial.
283
Foto 154 - O grupo masculino
Autoria: Foto Kaefer. Acervo particular de Írica Kaefer. Um grupo de jovens senhores faz pose em espaço
externo. Marechal Cândido Rondon. Década de 1954-70.
Imagens que mostram o grupo masculino não são comuns na coleção, principalmente
no tema “Retratos”, podendo ser a Foto 155 um particular exemplar dessa situação. Nesse
sentido, uma atenção especial foi dada às vestes. As camisas são brancas, exceto a de um
senhor que usa uma camisa preta, as mangas são curtas ou estão arregaçadas e todos estão
com as mãos cruzadas para trás do corpo. As calças sociais são de uma cor só por calça, sendo
uma branca, duas nos tons cinza e as demais na cor preta. Posicionados em fila, um ao lado do
outro, o acessório que os acompanha é uma cinta que está praticamente na mesma altura, em
todos os homens, que usam a camisa por dentro de forma a deixar a cinta e suas fivelas, com
feitios diferentes, bem à mostra. Os sapatos lustrados são, mais uma vez, um elemento
importante no enquadramento, aparentando tratar-se de sapatos de couro. O grupo, nesse
espaço natural, representa, através da pose e das vestes, uma uniformidade e mesmo nível
social.
Quanto ao masculino, há ainda o enquadramento das crianças, que se faz individual e
acompanhado de meninas ou de outros meninos, os irmãos. O espaço infantil será analisado
no próximo item.
O homem também faz registros na companhia da família ou acompanhado da
namorada. Essas fotos podem ser em espaço interno, nos estúdios ou em espaço externo. A
veste é o traje especial com terno, gravata e lenço opcional no bolso do paletó. Um dos
namorados, bem vestido, não está de terno, mas, em compensação, deixa bem à vista o braço
do lado esquerdo, onde usa o seu relógio de pulso.
284
No aspecto do religioso, a diferença da presença masculina se faz em seis fotos a
menos em relação à presença feminina. Nessas ocasiões, os homens estão acompanhados das
noivas ou do grupo familiar, tanto nos estúdios como nos salões ou igrejas. O momento
masculino infantil e em grupo é o da comunhão dos meninos. Praticamente em todas as
fotografias, no espaço do religioso, os homens usam o terno. A gravata, a flor e o lenço
afixados no terno são acessórios que acompanham a maioria dos homens.
No espaço do religioso, outra indumentária especial é a vestidura sacerdotal, as túnicas
pretas usadas por pastores e, ainda, o uso conjunto de túnicas pretas e brancas mais curtas, a
estola e as vestes do bispo.
Foto 155 – A procissão
Autoria: Foto Kaefer. Acervo particular de Írica Kaefer. Momento de celebração solene com a presença de
autoridades religiosas e do bispo. Marechal Cândido Rondon. Década de 1954-60.
Nessa imagem estão, em primeiro plano, representantes da igreja católica, que
acompanham a visita do bispo para General Rondon. As vestes desses homens são as túnicas
pretas e longas, acompanhadas de estolas, que aparecem por debaixo das batas brancas de
mangas longas. Ainda, por cima dessas vestes, usam túnicas escuras. No segundo plano, vem
o bispo, que pode ser identificado pelas vestes especiais que usa: túnica escura longa, bata
branca menor sobre a túnica e, ainda, uma capa que cobre todo o seu corpo. Na cabeça usa a
mitra. O bispo é ladeado por quatro fiéis que o protegem com uma cobertura de pano com
detalhes em gregas e franjas, que formam uma espécie de guarda-sol com quatro cabos, os
quais são segurados por esses senhores. A comunidade assiste, atenta, à passagem das
autoridades eclesiais e suas vestes, que simbolizam, além da beleza, a pureza, a divindade e a
autoridade divina.
285
As fotografias sobre o tema “Produção” destacam os homens que vão caçar, pescar,
fazer reparos em automóveis, contar o dinheiro no bar.
Foto 156 - Homens no bar
Autoria: Foto Kaefer. Acervo particular de Írica Kaefer. Garrafas vazias e dinheiro na mão significa que é hora
de pagar a conta. Marechal Cândido Rondon. Década de 1954-60.
O traje a passeio indica que os senhores da Foto 157 estão usufruindo de um momento
de lazer. As camisas são de cor clara, sendo uma de listras assim como uma das calças que
pode ser vista. Um dos senhores tem apenas uma parte do corpo enquadrada, podendo ser
notada, no entanto, parte dos acessórios que usa, tais como um chapéu de feltro e uma cinta e,
como se apoia de costas para o balcão do bar, percebe-se que o mesmo nota a presença do
fotógrafo. Outro senhor, que está de frente para o balcão, deixa de contar o dinheiro, mas não
de fumar, e vira seu rosto também fitando o fotógrafo. Já os outros dois senhores,
responsáveis pelo negócio, continuam atentos às contas, olhando para baixo, na direção das
mãos. Um dos senhores que está atrás do balcão tem uma toalha pendurada sobre o braço, que
era usada para secar o balcão e as garrafas molhadas pelo gelo. Ao fundo, no lado direito da
foto, uma estante guarda alguns objetos, que podem ser pacotes de cigarro. Portanto, o bar e
seus objetos, o dinheiro, a bebida, a distração são símbolos que representam uma ambientação
masculina.
Na mecânica, trajes simples acompanhados de macacão e a sujeira nas roupas ficam à
vista.
286
Foto 157 - Oficina Mecânica
Autoria: Foto Kaefer. Acervo particular de Írica Kaefer. A construção de madeira abriga a oficina mecânica,
num raro registro de atividade cotidiana. Marechal Cândido Rondon. Década de 1954-60.
A veste suja, o uso do macacão, os automóveis parados ao fundo e o caminhão
desmontado indicam o tipo de trabalho da oficina mecânica registrada na Foto 158. As
atividades, no entanto, não impediram que um dos garotos cruzasse os braços e acompanhasse
o colega a olhar na direção da câmara fotográfica. Os outros dois homens continuam a lidar
nos chassis de um caminhão e, enquanto um dos mecânicos usa um soldador, provocando
claridade e faíscas, o outro senhor, ao lado, tenta proteger seu rosto descoberto. Novamente, o
espaço se faz masculino. Cabe mencionar que registros de atividade cotidiana não são comuns
nas fotografias da coleção, sendo esse fragmento um interessante registro de trabalho
executado pelos homens.
As vestes nas atividades de produção têm uma relação maior com o trabalho
masculino, embora a caça e a pesca também estejam relacionadas a momentos de lazer. Nessa
divisão de tarefas, trata-se de um tipo de lazer talvez considerado um tanto perigoso para as
mulheres, isso em função de envolver o perigo pelo uso de armas, o contato com rios e a
quantidade maior de águas, o peso do transporte da caçada e, quem sabe, para a época, o peso
do preconceito de ver a mulher envolvida neste tipo de ambiente. Assim, cabia ao homem o
envolvimento com atividades no espaço externo e afastado da casa. A mulher ficava, de certa
forma, protegida ao não participar dessas atividades, voltando-se ao espaço interno, privado.
Porém, competia-lhe, enquanto isso, a guarda dos filhos e os cuidados da casa.
Nos momentos de acidentes também é o homem que vai para a rua, olha, verifica,
acompanha, examina e se inteira do ocorrido.
287
Foto 158 - Acidente de trânsito
Autoria: Foto Kaefer. Acervo particular de Írica Kaefer. Momento de um grave acidente de trânsito. Marechal
Cândido Rondon. Década de 1954-60.
O momento de um acidente de trânsito ocorrido durante a noite mostra o aglomerado
de pessoas que se reuniram ao redor do veículo tombado, aparentemente um caminhão. Com
o acidente, o veículo ficou com o rodado virado para cima e está todo amassado. Apenas em
duas imagens a mulher aparece nesse tipo de enquadramento e ali ela está para observar, no
meio do grande grupo, que se faz predominantemente de homens.
Foto 159 - Acidente com um fusca
Autoria: Foto Kaefer. Acervo particular de Írica Kaefer. Acidente com automóvel, onde foi envolvido um fusca.
Marechal Cândido Rondon. Década de 1954-60.
Nessa imagem da Foto 160 pode ser vista apenas a presença masculina, mesmo se
tratando de espaço próximo à residência. O fusca amassado, o objeto central, está em segundo
288
plano. No primeiro plano está a autoridade policial responsável pelo registro do acidente.
Assim, percebe-se, mais uma vez, que o espaço relacionado com acidentes de trânsito é mais
ocupado pelo masculino. Nesse momento imprevisto, as pessoas vestem roupas mais simples,
relacionadas com o espaço doméstico, com as atividades do dia a dia.
As fotografias do tema “Esporte” que privilegiam o masculino são fotografias com o
enquadramento de atletas. Os atletas enquadrados no período que a coleção cobre são
essencialmente masculinos, quer seja jogando bola, quer seja pedalando as bicicletas. É ao
homem que cabe competir.
Foto 160 – Time de futebol Oeste Paranaense
Autoria: Foto Kaefer. Acervo particular de Írica Kaefer. Atletas do Oeste Paranaense Futebol Clube. Marechal
Cândido Rondon. Década de 1960-70.
Reunidos, em espaço separado e afastado do time adversário, os atletas deixam
registrado mais um dia de competição. Uma parte dos jogadores fica agachada,
acompanhados de um menino, que está sentado na frente deles, e a outra parte dos jogadores
faz pose em pé. A veste, nessas ocasiões, é esportiva. O calção e camiseta sem manga usados
nos primeiros jogos ocorridos em General Rondon (Foto 161) foram substituídos por
uniformes coloridos, acompanhados de distintivos dos times. No lado direito da foto, pode ser
visto o treinador, técnico ou alguém da diretoria que dirige e acompanha o grupo. Este veste
roupa de passeio e está com calça social.
Nas festividades, a presença masculina se faz integrada à feminina e os trajes são
especiais e estão associados aos momentos de casamentos ou de bailes. Os homens vestem
289
ternos e gravatas. Os sapatos pretos e bem lustrados dão um brilho especial ao conjunto da
vestimenta.
A presença masculina nas atividades relacionadas com a educação se faz como aluno,
formando, professor, ouvinte e como membro de diretoria de escola. Os trajes são especiais e,
por ocasião de formaturas, é incluída a gravata nas vestes.
Foto 161 – As Professoras e os alunos
Autoria: Foto Kaefer. Acervo particular de Írica Kaefer. Alunos da Escola ----- acompanhados das professoras.
Marechal Cândido Rondon. Década de 1954-70.
A fotografia 162 é um registro do público masculino da escola, pois as moças
284
fizeram pose em foto separada dos rapazes, no mesmo local e com as mesmas professoras. As
professoras acompanham, portanto, o registro fotográfico dos dois momentos. O grupo está
bem centralizado. Os alunos se posicionaram nos diferentes degraus da escada e as
professoras, no primeiro plano, colocaram-se duas de cada lado do grupo, posicionadas no
chão, com exceção de uma delas, que está no primeiro degrau da escada e, entre elas, está um
aluno. Os alunos usam camisa branca de manga longa com uma gravata preta e uma calça
social também preta. Como acessórios, os homens e as mulheres usam cintos, e elas, relógio
de pulso. As professoras usam vestidos lisos ou estampados num comprimento que vai abaixo
dos joelhos. Aparentemente todos estão com sapatos. A veste indica tratar-se de um momento
especial.
284
Foto 36, pasta Educação, não computada na análise.
290
Em outro momento, os homens da diretoria de uma escola usam ternos, mas eles estão
sem gravatas.
Foto 162 – A comemoração
Autoria: Foto Kaefer. Acervo particular de Írica Kaefer. Alunos da Escola acompanhados da professora e pais.
Marechal Cândido Rondon. Década de 1954-70.
O ambiente dessa fotografia está relacionado a uma formatura de final de ano com a
presença do Papai Noel (em fotografias não enquadradas para a análise), que fez a entrega de
presentes para as crianças. Os sete homens que estão posicionados atrás de sete crianças,
sendo dois meninos, podem ser os pais das crianças, mas entende-se tratar de membros da
diretoria, pois seria bem provável que as mães também seriam chamadas para a foto, não
fosse o encargo e o compromisso ao qual estão imbuídos esses senhores.
Nos momentos de civismo ou nos momentos políticos, o traje masculino varia.
Associadas aos homens no meio do grande público estão as vestes de passeio, uso de chapéus
de palha ou de terno sem gravata e, associadas aos políticos, as calças sociais normalmente
acompanhadas de ternos e gravatas.
291
Foto 163 – Ademar de Barros em Toledo - PR.
Autoria: Foto Kaefer. Acervo particular de Írica Kaefer. Visita de Ademar de Barros a Toledo/PR. Data
provável, década de 1950.
O momento do registro da Foto 164 foi feito na cidade de Toledo, por ocasião da
vinda de Ademar de Barros
285
, em período de campanha política. Írica comenta que o político
teria vindo de avião até Toledo e “foi muita gente prá lá”
286
para vê-lo. O motivo da vinda,
segundo Írica, teria sido sua candidatura para algum cargo político que a mesma não
lembrava, assim como não sabia dizer o ano de sua vinda. Considerando a candidatura de
Ademar de Barros para a presidência da república, entende-se que o político possa ter vindo
para Toledo em campanhas políticas na década de 1950. Na imagem, ao fundo, embora sem
condições de serem identificadas, podem ser vistas frases escritas em faixas penduras na
parede de um estabelecimento. Ao redor da autoridade, várias pessoas acompanham o
discurso que está sendo transmitido pelo microfone que ele segura na mão esquerda. Já sua
mão direita faz um gesto mostrando estar se dirigindo ao público. Na parede, o som do alto-
falante deve propagar a fala da autoridade, que está em cima de um palanque preparado para o
momento.
285
Adhemar Pereira de Barros nasceu em São Paulo em 1901 e morreu em 1969. Atuou na política brasileira
entre as décadas de 1930 e 1960, quando exerceu, entre outras funções políticas, o cargo de governador de
São Paulo (1947-1951 e 1963-1966). Concorreu à presidência da República do Brasil em 1955 e em 1960,
ficando em terceiro lugar nas duas eleições. Foi filiado à UDN (1945), depois ao PRP, entre outros partidos/
coligações. ADEMAR Pereira de Barros. Disponível em: <http://pt.wikipedia.org/wiki/Ademar_Pereira_de_
Barros#Primeiros_passos>. Acesso em: 19 jul. 2009.
286
KAEFER, o5 jul. 2002, op. cit.
292
Foto 164 – O dia do Presidente Ernesto Geisel.
Autoria: Foto Kaefer. Acervo particular de Írica Kaefer. Momento do discurso proferido pelo Excelentíssimo
Senhor Presidente da República Ernesto Geisel. Marechal Cândido Rondon. 1976.
A vinda da maior autoridade da Nação a Marechal Cândido Rondon está registrada em
momento de discurso proferido pelo Excelentíssimo Senhor Presidente da República, General
Ernesto Geisel, para o público que se fez presente na praça Willy Barth, onde foi preparado o
palanque oficial para aquele momento. Na oportunidade, a veste militar se faz presente,
acompanhando a autoridade militar que veio para a cidade. Nesse sentido, o enquadramento
do Senhor Presidente Geisel em momento de discurso se faz rodeado por políticos nas vestes
especiais e do uniforme dos militares que, na veste típica, usam distintivos e cordões no
casaco e o tradicional quepe armado com emblema pátrio.
5.2.4.3 “Hoje, o tão esperado dia”
Ao aspecto cívico está associado um momento único na história de Marechal Cândido
Rondon. Foi a visita que a cidade recebeu, em 1976, da maior autoridade política do país, o
Excelentíssimo Senhor Presidente da República, General Ernesto Geisel. A vinda do
presidente para o interior do país foi divulgada e anunciada pela imprensa local, o que levou
muitas pessoas a duvidarem da informação e outras a fazerem questionamentos sobre quem
teria sido “o batalhador e vencedor de tão admirável tarefa”.
287
287
LOHMANN, Elói. Ponto por ponto. Rondon Comunicação, Marechal Cândido Rondon, Ano 3, n. 101, p. 4,
19 mar. 1976.
293
Em um estudo
288
feito sobre os veículos de comunicação de Marechal Cândido
Rondon ficou ressaltado que a vinda do Presidente General Ernesto Geisel teria marcado a
vida de um dos fundadores da Rádio Educadora, de propriedade de Werner Wanderer
289
e
sua esposa, pois a visita presidencial ao município teria se dado “a partir de um convite de
Werner e Elisabeth, que eram amigos pessoais de Ernesto e Luci Geisel”. Segundo consta em
parte de depoimento prestado às autoras, “O presidente não viajava. Ele era militar e não tinha
o costume de participar dos eventos... Todo mundo perguntava o que havia acontecido para o
presidente viajar para Rondon...”, teria falado Werner Wanderer
290
, o qual, em 1976, data da
vinda do presidente ao município, era deputado estadual, pela ARENA, o mesmo partido do
Presidente.
O Jornal Rondon Comunicação
291
lançou edição especial sobre o evento. Através da
frase da capa “Hoje, o tão esperado dia”, a edição, com 24 páginas, foi dedicada
especialmente “à visita de Geisel e ao desenvolvimento de MCR”.
Segundo informações do discurso do deputado Werner Wanderer, publicado em
edição posterior à edição especial e pelo mesmo Jornal Rondon Comunicação, além do
governador do Estado do Paraná, Jayme Canet Júnior, o presidente da República estaria
“trazendo em sua comitiva quatro ministros: Ney Braga, da Educação; Shigeaki Ueky, das
Minas e Energia; Alysson Paulinelli, da agricultura; e o ministro Chefe da Casa Militar,
General Hugo Abreu”. Para a população e políticos locais e regionais, bem como para o
Estado do Paraná, conforme noticiado através dos jornais, o evento representou, além da
projeção da região em nível nacional, um certo vínculo dessas pessoas para com as
autoridades, momento em que devem ter se sentido membros integrantes da Nação Brasileira.
O Jornal Rondon Comunicação, edição especial, iniciou a página 2 lembrando os
leitores da Revolução de 1964, indicando que a mesma teria sido “cuidadosamente tecida pelo
patriotismo e pela coragem de grandes brasileiros...”, os quais teriam atendido a um desejo
geral da Nação. Esse veículo de comunicação, como se percebe, enaltece os feitos dos
288
WILMSEN; KUNZLER, op. cit.
289
Werner Wanderer iniciou sua carreira política em Marechal Cândido Rondon onde foi prefeito, no período de
1965-1970, pelo PTB; deputado estadual, pelo Paraná, através da ARENA, de 1975-1979/1979-1983 e pelo
PDS, de 1983-1987; deputado estadual constituinte pelo PFL, de 1987-1991; deputado federal (Congresso
Revisor), de 1991-1995, pelo PFL/PR; deputado federal, de 1995-1999, também pelo PFL/PR, e foi reeleito
deputado federal em 199-2002 pelo PFL/PR. Disponível em: <http://www.wernerwanderer.com.br/index
principal.htm>. Acesso em: 13 jun. 2008.
290
WANDERER (apud WILMSEN; KUNZLER op. cit, p. 43).
291
RONDON COMUNICAÇÃO. Marechal Cândido Rondon, Ano 3, n. 101, p. 2, 19 mar. 1976. Equipe
responsável pelo jornal. “Diretor responsável: Ivete Knappmann, Diretor Administrativo - Ivo Knappmann,
Redator-chefe - Harto Viteck, Secretaria - Agrit Winter. Colaborador - Elói Lohmann, Elói Mendonça
(Guaíra). R.T.D. nº 1.475 – DOU 5.837”.
294
governos militares. O termo Revolução é usado no sentido de considerar que setores
conservadores da política brasileira teriam realizado um movimento revolucionário, o que não
é corroborado por grande parte da historiografia brasileira
292
. Ainda, conforme editorial, desta
edição especial, foi dado destaque à região, considerando-a “possuidora das mais férteis terras
do mundo”, numa referência ao solo de terra roxa da região. O jornal mostrou ações que
foram feitas “nesta parte do território” com o objetivo de divulgar “toda a pujança de sua
potencialidade”
293
.
Dividido em tópicos, o jornal, ainda nessa edição, enfatizou diversos aspectos
relacionados com Marechal Cândido Rondon, entre os quais menciona-se: Primeiramente foi
mostrado “O Programa de Geisel em Mal. Cdo. Rondon”, informando que a autoridade
chegaria de Foz do Iguaçu e, com “o avião presidencial”, pousaria no aeroporto local.
Recebido pelo prefeito municipal Almiro Bauermann, entre outras autoridades locais e
estaduais, o mesmo estaria se deslocando para a propriedade rural de Waldemar Kroth. A ida
até uma localidade do interior serviu como ato solene no município, quando teria sido
acionado um interruptor inaugurando a segunda etapa do Programa da Cooperativa de
Eletrificação Rural de Marechal Cândido Rondon, o que teria elevado para mil o número de
beneficiados com esse sistema.
Na edição seguinte à edição especial, percebe-se que o jornal mostra ações
desenvolvidas pelas autoridades políticas, que aproveitaram o fato da vinda da maior
autoridade nacional para destacarem o Estado do Paraná, oportunidade em que teriam
realizado atos oficiais em conjunto com autoridades municipais (assinatura de vários atos,
reunião com presidentes de cooperativas e com políticos do partido Arena), estaduais
(Secretaria de Agricultura, assinatura de convênios) e nacionais. Nesse sentido, o jornal
informa que, entre outros atos, foi realizada a abertura oficial da colheita da safra de soja de
1976, no Paraná. Essa parte da programação teria ocorrido na propriedade agrícola de Arlindo
Sousa Batista, possuidor de 40 hectares de terra. “Cinco colheitadeiras foram autorizadas pelo
Chefe da Nação a iniciar a colheita”, destaca o noticiário, o que, segundo expressões do
governador ao Presidente, representaria “a maior safra na história do Paraná’’
294
.
Ao se apresentar no palanque oficial, o Presidente Geisel teria entregado “o primeiro
dos 3.248 títulos definitivos de propriedade de terras” a produtores da região oeste e sudoeste
292
Para mais informações ver também STEIN, Marcos Nestor. O Oitavo Dia: produção de sentidos identitários
na Colônia Entre Rios-PR (segunda metade do século XX). Florianópolis, 2008. Tese (Doutorado em
História) – Universidade Federal de Santa Catarina.
293
RONDON COMUNICAÇÃO. Marechal Cândido Rondon, Ano 3, n. 101, p. 2, 19 mar. 1976.
294
RONDON COMUNICAÇÃO. Marechal Cândido Rondon, Ano 3, n. 102, p. 5-7, 27 mar. 1976.
295
do Paraná, honraria passada ao agricultor Dirceu Berticelli, o qual estaria agora com sua terra
legalizada. Simbolizando a entrega dos demais títulos, outros nove agricultores teriam sido
chamados para receberem o título de terras das mãos de funcionários do INCRA
295
.
A situação da titulação de terras foi um problema nessa faixa de fronteira com
documentação sobreposta, oriunda de conflitos jurídicos entre as concessões federais e do
estado do Paraná nessa área limítrofe do Brasil com o Paraguai e com a Argentina.
296
O
Ministro da Agricultura teria feito pronunciamento indicando que o que estava sendo entregue
“é uma parcela do Brasil, que forma o conjunto do território nacional”
297
.
Na oportunidade de sua vinda ao oeste, o presidente passaria ainda por Salto Osório,
também no Paraná, para inaugurar uma usina hidrelétrica e retornaria, no mesmo dia, para
Brasília.
Entende-se que o desencadear da agenda presidencial no interior do país interferiu na
pauta dos meios de comunicação, que transmitiram impressões aos leitores, levando-os a se
manifestarem e a reforçarem a ideia de que eles são realmente parte integrante do povo
brasileiro (Foto 111) e que essa parte do território “semente da civilização” é um local de
pessoas que, com o seu trabalho e o seu envolvimento nas atividades do município, fazem
parte do desenvolvimento e do crescimento do próprio país. Os problemas causados pela
ditadura, no mesmo período em que esse grupo estava se deslocando para a região e que
desencadearam na revolução, foram sublimados por ideias tais como força militar, repressão e
segurança, as quais representariam a preocupação das autoridades no sentido de que pudessem
realizar o desenvolvimento do país.
Nesse sentido, a edição especial, nas páginas seguintes, tratou de assuntos diversos, os
quais receberam sinais gráficos para reforçar os temas sublinhando-os, negritando-os, ou
ainda, escrevendo-os com letras maiúsculas. Um dos principais assuntos destacados foi
“Agricultura maior fonte de renda” -- era uma parte do jornal em que foram lembrados os
agricultores que iniciaram o desmatamento e fizeram as primeiras lavouras, as construções
nas propriedades agrícolas e nos centros urbanos. Na parte do texto “As primeiras lavouras” –
aí foram mencionados o milho e a mandioca usados “na maior atividade de então: a
suinocultura”. A suinocultura “representou ao município o maior surto de desenvolvimento
econômico” do passado, enfatiza o jornal. “A soja” - “... há pouco mais de 5 anos” já estaria
dando bons resultados no Rio Grande do Sul. Logo após a soja, teria surgido a cultura do
295
Idem, p. 6.
296
Para obter mais informações sobre conflitos ocorridos nessa área de fronteira ver MYSKIW, 2002, op cit.
297
RONDON COMUNICAÇÃO. Marechal Cândido Rondon, Ano 3, n. 102, p. 7, 27 mar. 1976
296
trigo. Desde a colonização, o trigo foi cultivado em escala insignificante, servindo apenas
para o consumo dos agricultores, que o levariam para os moinhos coloniais, recebendo em
troca “a farinha”. Ainda, com destaque para o “Novo Panorama Agrícola”, foram
mencionados os “mais de três dezenas de tratores de esteira, mais de 500 colheitadeiras
automotrizes e mais de 1500 tratores agrícolas” adquiridos pelos agricultores. Com a
introdução dessas máquinas no município ter-se-ia estabelecido “toda uma estrutura de
mecanização agrícola”, assistência técnica, empresas de revenda de máquinas e implementos,
o que teria gerado “investimentos paralelos” ao cultivo do solo e às colheitas, considerando
que “75% são completamente mecanizáveis”. Nesse sentido, também é mencionada a
Copagril, a qual seria a maior cooperativa de armazenamento do Paraná. Outras indústrias
também foram destacadas, tais como a Industria e Comércio Laticínios Rainha Ltda, o
Frigorífico Rondon S/A e a Cereser S/A, extratora de Óleos Vegetais
298
.
Outro destaque, com o título “1976 – Ano das grandes realizações em Marechal
Cândido Rondon”, falou do número dos habitantes do município. Teria aumentado “de 43.696
habitantes para mais de 75.000 habitantes”, o que teria refletido na mão de obra, “ascensão da
produção global”, pois teriam aumentado bens e serviços. Percebendo essas mudanças, a
administração pública teria estabelecido critérios no sentido de “facilitar e estimular a fixação
do homem à terra”. Uma das estratégias teriam sido as rodovias, as quais melhorariam o
escoamento e a incorporação do sistema de ensino.
Aspecto a considerar foi a ênfase nas ações públicas, reconhecidas pelo jornal como
“as grandes obras”, referindo-se às construções públicas de diversas áreas de nível municipal,
estadual e federal, as quais deveriam ser inauguradas com a presença de autoridades locais e
representantes das entidades, que estariam se instalando no município. Isso teria levado a
administração pública a “adotar o lema: 1976 – o ano das grandes realizações em Marechal
Cândido Rondon”. Nas demais páginas do jornal, edição especial, várias empresas privadas
prestaram homenagens, desejando as boas-vindas ao Presidente Geisel, que seria motivo de
alegria para os rondonenses. Exemplo dessa expressão de acolhida foram “Os 4.300
associados da Copagril, que estariam expressando acreditar no trabalho do governo de
Geisel
299
, que teria mostrado seu interesse também pelo interior do país.
298
RONDON COMUNICAÇÃO. Marechal Cândido Rondon, Ano 3, n. 101, p. 3-11, 19 mar. 1976.
299
RONDON COMUNICAÇÃO. Marechal Cândido Rondon, Ano 3, n. 101, p. 14-15, 19 mar. 1976.
297
Depois de divulgadas as mensagens das empresas comerciais, ainda foi noticiada parte
da biografia do Presidente Geisel
300
. Nasceu em Bento Gonçalves, RS, em 1907, e iniciou
seus estudos no Colégio Militar de Porto Alegre, sendo, mais tarde, transferido para o 4°
Grupo de Artilharia a Cavalo, em Santo Ângelo, interior do Estado gaúcho, e participado nas
operações militares da Revolução de 30. Teve outras funções até 1973, “ano em que foi
lançada a sua candidatura à Presidente da República em Convenção Nacional do partido
majoritário brasileiro, a ARENA” e tendo sido eleito, em 1974, Presidente da República.
Essas informações têm uma relação com uma grande parte da população rondonense, que se
originou do Rio Grande do Sul e de localidades próximas ou mesmo por onde o Presidente
transitou. Assim, a imagem do Presidente está próxima das vivências dessas pessoas, o que
teria interferido nas eleições de 1974, dando à ARENA (Aliança Renovadora Nacional) uma
votação significativa, o que bem demonstrou o resultado das urnas em Marechal Cândido
Rondon
301
. Dados dão conta de que “o município de Marechal Candido Rondon foi conhecido
como ‘o município mais arenista do Brasil’”
302
. Esta votação significativa teria sido um
motivo forte para a presença do chefe da nação em MCRondon
303
.
Outra informação noticiada e que pode ser observada nessa edição especial, com letras
maiúsculas, foi a divulgação, na contracapa, trata do “crédito especial para o trigo liberado no
Paraná”, numa referência à liberação de “Cr$ 200,00 por hectare de trigo plantado” e cuja
safra teria sido danificada pelas geadas
304
. Assim, em meio à satisfação demonstrada pela
visita do presidente do país ao município e às matérias enfáticas sobre o aumento da
população, o trabalho e o resultado obtido com boas colheitas, aquisição de maquinários,
surgimento de cooperativas e empresas no município, nota-se, em espaço nobre do jornal,
uma matéria talvez controversa, pois, a menção à geada é um sinal de problema enfrentado e,
receber crédito, pode amenizar a situação, porém significa também assumir dívidas.
A população acorreu, no entanto, ao encontro das autoridades e, nesse momento, tanto
o público masculino quanto o feminino, acompanhado das crianças, se integraram à
programação.
300
Sobre a biografia do Presidente Ernesto Geisel (e de outros presidentes brasileiros) pode ser consultado:
ARQUIVO NACIONAL. Os presidentes e a república: Deodoro da Fonseca a Luiz Inacio Lula da Silva. 2.
Ed. ver. e ampl. Rio de Janeiro: O Arquivo, 2009.
301
RONDON COMUNICAÇÃO. Marechal Cândido Rondon, Ano 3, n. 101, p. 21, 19 mar. 1976.
302
URNAU, Iraci Maria Wenzel. Autoritarismo, rádio e a idéia de nação: 1985-1992. Niterói, 2003.
Dissertação (Mestrado em História) – UFF-RJ. p. 80.
303
Para outras informações sobre a vinda do Presidente Ernesto Geisel para MCRondon ver também SPECK,
Lori Spitzer. A cidade e a praça: memória e política em Marechal Cândido Rondon – 1960-2000. Niterói.
2002. Dissertação (Mestrado em História) – UFF.
304
RONDON COMUNICAÇÃO. Marechal Cândido Rondon, Ano 3, n. 101, p. 24, 19 mar. 1976.
298
Foto 165 - A população do Oeste do Paraná acolhe o presidente Ernesto Geisel
Autoria: Foto Kaefer. Acervo particular de Írica Kaefer. Pessoas de toda a região Oeste do PR chegam a
Marechal Cândido Rondon para ver o presidente Geisel. 19.3.1976.
Marechal Cândido Rondon mostra, através dessa imagem da Foto 166, a
movimentação que se fez em torno de suas residências, ruas e praças no dia em que a
localidade recebeu o Presidente da Nação, Ernesto Geisel. No alto das ruas, amarradas nos
postes de luz, faixas foram estendidas saudando a comitiva presidencial. Na primeira faixa da
imagem pode ser lido: “Aos Ministros Ney, Paulineli e Ueki as boas-vindas”. Numa indicação
de que as autoridades administrativas municipais estavam aguardando a presença desses
ministros, conforme também divulgado na programação do jornal especial já referendado.
Com vestes de sair, as pessoas caminham acompanhadas para a direção do local do evento.
Alguns homens, sem largar o chapéu, outro carregando criança no colo e outros ainda
carregando um rádio, acompanham, de perto e desde cedo, passo a passo, todas as
informações e novidades em torno desse dia. Os jovens acenam alegres e, nesse programa
especial, as mulheres também se fazem presentes.
Na segunda faixa estendida sobre as pessoas, a frase “Itaipu fará do Paraná um
gigante” é um sinal das transações políticas e diplomáticas que estavam ocorrendo, em torno
da construção da Usina Hidrelétrica Itaipu Binacional (Brasil e Paraguai), em Foz do Iguaçu.
A construção da usina teve início em 1974 e deveria interferir na vida das pessoas, nas terras
dos moradores e na área física de vários municípios da região Oeste do Paraná, a qual, nessa
hora, estava sendo visitada por autoridades máximas do país. Para as autoridades locais que
precisavam intermediar os projetos nacionais com o interior do país, esta foi uma forma de
divulgar o empreendimento, que não estava sendo aceito por uma boa parte da população,
299
principalmente por agricultores e moradores lindeiros ao lago que veio a se formar na região,
o Lago de Itaipu. A formação do lago ocorreu em outubro de 1982.
Sobre a vinda de Ernesto Geisel para Marechal Cândido Rondon, há que se considerar
também que o Jornal Rondon Comunicação
305
, em seu primeiro número, ainda em 1974, em
manchete de capa acompanhada de uma fotografia, anunciava “Geisel: posse”, referindo-se
ao General Ernesto Geisel que teria assumido “ontem em Brasília, a presidência da
República”. Mostrando sua posição política, o jornal enfatizou que ele seria “o 4º presidente
da revolução de março de 64”, transcrevendo partes do discurso do presidente, o qual teria
elogiado os dez anos de governo militar. Considerando-se a abrangência do jornal e a
expectativa em torno desta edição inicial, o destaque ao presidente do país faz-nos refletir
sobre o sentido dessa notícia para os eleitores do município, considerando-se, ainda, que, na
contracapa do mesmo jornal, uma mensagem do prefeito, Almiro Bauermann, pronuncia
“palavras de fé” para o presidente, por esse estar à frente do “novo comando da Nação”. Em
edições posteriores, o jornal continua mencionando a Revolução de 64, indicando que os
brasileiros estariam mostrando confiança aos líderes revolucionários
306
. No mês de junho de
1974, através da manchete “O Gabinete do Presidente Geisel”
307
, o jornal divulga, em página
inteira, o nome de 20 chefes de governo, acompanhados cada um de uma pequena foto. Além
da foto, são mencionados o ministério, os nomes e alguns dados biográficos dos políticos que
integrariam a equipe ministerial. Através desses dados a população pode ter uma noção prévia
sobre os governantes e sentir-se, talvez, um pouco próxima até dos políticos, considerando-se
que seus rostos poderiam se tornar ícones a serem reconhecidos em momentos de campanhas
políticas e eleições.
A visita de outras autoridades políticas de renome nacional para a região ou o Estado
são notícias divulgadas pelos jornais locais. O jornal “O Alento”
308
, em 1982, por exemplo,
anuncia visitas das autoridades ao Estado, entre as quais, a “quarta visita de Figueiredo ao
Paraná”, indicando que foi “proveitosa”. A matéria está acompanhada de uma foto que mostra
um grande público reunido na capital do Estado e muitas faixas.
Informações sobre a vinda de Geisel ao município de Marechal Cândido Rondon
também puderam ser obtidas, ainda que em momento inusitado, junto ao professor de
educação física e recém-aposentado, Haraldo Altman. Ao participar-se de uma festa junina
encontrou-se o professor trajado à caipira, usando um casaco xadrez.
305
RONDON COMUNICAÇÃO. Marechal Cândido Rondon, Ano 1, n. 1, p. 1, 16 mar. 1974. Capa.
306
RONDON COMUNICAÇÃO. Marechal Cândido Rondon, Ano 1, n. 2, p. 2 e 16, 24 mar. 1974.
307
RONDON COMUNICAÇÃO. Marechal Cândido Rondon, Ano 1, n. 13, p. 17, 22 jun. 1974..
308
O ALENTO. Marechal Cândido Rondon, Ano 3, n. 124, p, 1, 26 mar. a 01 abr. 1982. Capa.
300
Foto 166 - Professor caipira? Foto 167 - O paletó para o dia do Presidente.
Autoria: Lucia T. M. Gregory. Acervo particular da autora. O professor Haraldo Altmann e seu paletó
“presidencial”. Na Associação dos Professores Rondonenses - Apron. Marechal Cândido Rondon. Festa Junina.
28.6.2009.
O que chama a atenção é o detalhe afixado no casaco. Haraldo, na época da vinda do
presidente, era diretor do Departamento de Esportes da Prefeitura Municipal local, tendo sido
convocado “para fazer parte do Palanque Oficial” e acompanhar a comitiva presidencial.
Honrado, “precisaria comprar um terno novo, pois era um momento muito especial”, comenta
o professor, ressaltando que “o xadrezinho” era do momento. Nesse sentido, para rememorar
aquela data, Haraldo pede ao filho, profissional em marketing, que prepare um adesivo para
colocar no terno, agora usado como objeto de folclore. Haraldo lembra de vários detalhes que
foram apontados com entusiasmo, dizendo que “o que mais me marcou foi o almoço. O prato
principal era paca ao molho...”. Das falas dos discursos, lembrou apenas de uma frase
proferida pelo então governador Paulo Pimentel: “Se estas pacas pudessem falar, seria em
guarani”, comenta o professor. As pacas teriam sido compradas no país vizinho, Paraguai e
“toda a prataria, talheres, panelas, produtos usados na cozinha” teriam vindo da capital do
Estado para aquele evento. Haraldo considerou que eram muitos talheres na mesa e, quando
chegou a hora de servir, “era aquele silêncio, um olhando para o outro... com qual talher iria
começar?” Para Haraldo, essa teria sido uma das maiores festas realizadas no município,
tendo-se recebido pessoas da região toda
309
. Assim, vestir, novamente, o paletó “xadrezinho”
mereceu um trabalho artístico com o detalhe da frase: “Este palito já esteve com o Presidente
Geisel”, fazendo o cidadão reviver e rememorar a sua participação na recepção à comitiva do
309
Segundo o jornal Fronteira do Iguaçu, as cerca de 40 mil pessoas que visitariam a cidade seriam alimentadas
gratuitamente, com o apoio da municipalidade e a organização da Associação Comercial (SPECK, 2002, p.
32). JORNAL FRONTEIRA DO IGUAÇU. Cascavel, Ano 6, n. 841, p. 3, 09 mar. 1976. ALTMANN,
Haraldo. Depoimento. [mensagem pessoal]. Mensagem recebida por: <teregregory@gmail.com> em 23 nov.
2009.
301
presidente do país que veio para o interior do seu Estado, mencionando detalhes vivenciados
pela sociedade naquele dia ímpar elaborando ainda o trocadilho “palito e paletó”.
No aspecto relacionado à presença da figuração no espaço fotográfico percebe-se,
quanto à presença feminina o masculina, os dados que seguem:
Quadro 28 – Figuração feminina e masculina
Vistas Feminino Masculino
Retratos 43 32
Religião 41 36
Produção 03 12
Tragédia 03 11
Esporte 5 9
Festividade 19 19
Educação 11 9
Civismo 07 11
TOTAL 134 141
A presença feminina é um pouco maior nas fotografias sobre retratos, religião e
educação e sua presença é menor nas fotografias que enfocam atividades relacionadas com
produção, tragédias, esporte e civismo. Nas festividades ocorre uma presença de igual para
igual, sendo que o feminino e o masculino estão presentes nas 11 fotografias sobre
festividades.
As fotografias de retratos com a presença da mulher foram feitas em poses individuais
ou acompanhadas de irmãs ou de crianças. Nas fotografias de família, um atributo seu é o de
segurar a criança menor no colo e, nessas fotografias, as meninas e os meninos são
posicionados entre os pais ou na sua frente, ou, se forem maiores, atrás do pais, quando estes
estão sentados. As fotografias de noivado são bem expressivas na coleção, pois os casais
procuraram os fotógrafos, os quais registraram o momento, tanto na parte interna, quanto na
parte externa do estúdio. As vestes são especiais. Os vestidos podem ser estampados ou lisos,
com ou sem gola, decotes tipo canoa ou em forma de V. As mangas podem ser justas ou
franzidas. Os vestidos, normalmente, são cortados e franzidos na cintura e o comprimento
abaixo do joelho ou até a metade das pernas. As mulheres também usam blusas com saias. As
blusas podem ser nos tons claro ou escuro, estampa lisa ou floral, com mangas curtas, com
gola e abotoadas e as saias são em tons escuros e lisos.
Para as meninas ocorre uma variação entre vestidos bem franzidos, com detalhes em
fitas e gregas, mangas bufantes. Nos pés, sapatos fechados, com meias. Outras meninas usam
vestidos mais simples, num corte reto, ou babados ao redor do vestido tipo jardineira, ou
vestidos estampados. Nos pés, usam tênis ou sandálias com meias. As meninas são
acompanhadas de mães, das tias ou das madrinhas.
302
Nos estúdios também foram feitas fotos de formatura. Além de participarem das
solenidades de colação de grau, a turma de formandos passava no estúdio fotográfico para
fazer a sua foto oficial e individual. Nesta foto de formatura estão agregados valores de
aprendizado e preparação para a vida. Formar-se é uma conquista pessoal e merece uma veste
especial que, no caso, acompanha o capelo, a beca na cor preta e o peitilho. A figuração
masculina também teve desses momentos.
Nas fotografias do espaço religioso, o feminino faz par com o masculino nos estúdios
e na parte externa ao estúdio, momento em que a veste nupcial envolve as noivas, assim como
elas se deixam envolver por essa veste. Seus vestidos brancos e longos (no conjunto da
coleção não incluída na análise noivas também usam vestido curto), bem acinturados e
franzidos, são acompanhados de véu, às vezes curto, outras longo, e de grinalda, conforme já
observado. O vestido tubinho também fez parte da veste de algumas noivas. Nas mãos, com
ou sem luvas, elas seguram delicados buquês, que, em certas circunstâncias, são naturais e,
em outras, artificiais. Os sapatos são cobertos pelo vestido especialmente quando estas se
encontram nos estúdios e sentadas, rodeadas por amigas ou irmãs e familiares. O vestido das
noivas, nessas ocasiões, é todo armado para os lados, cobrindo os braços do sofá. Apenas em
três momentos os noivos são fotografados na igreja. Uma particularidade é o enquadramento
de duas meninas junto aos noivos, as aias, que também estão de branco e exibem seus
vestidos, segurando-os por uma das mãos e abrindo-os para o lado, chamando forçosamente a
atenção para a veste, que também era especial para elas.
A presença menor da figuração feminina nos momentos de produção, de tragédias ou
de civismo é demonstração de uma prática social que atribui prioridade ao homem em
determinadas atividades, tais como o de estar na direção dos negócios comerciais, ser
motorista e dirigir caminhões e automóveis, ser uma pessoa com cargos políticos e públicos.
Ao feminino cabem funções privadas, ao nível do doméstico. Exceção cabe à área da
educação, onde, desde o início da colonização, elas, as professoras, juntamente com os
professores, são incumbidas da educação, da catequese das crianças, dos jovens e dos adultos.
Nesse sentido, ao feminino estão associados os livros de reza e os livros de ensino escolar.
303
Foto 168 - A freira
Autoria: Foto Kaefer. Acervo particular de Írica Kaefer. Primeira Eucaristia. Registro enquadrou o lado da igreja
onde foram posicionados os meninos. A soberania feminina se faz pela freira em meio ao universo masculino.
Marechal Cândido Rondon. Década 1954-60.
A fotografia 169 mostra um momento solene de primeira eucaristia. A presença
masculina é soberana, ao menos nesse lado da igreja onde se encontram, no primeiro plano, os
meninos comungantes, com suas vestes especiais e, ao fundo e em pé, os homens adultos.
Usam ternos e gravatas pretas. A camisa é branca e combina com os tons dos laços de fita
brancos e as flores de margarida branca colocados na lateral central dos bancos. Ao fundo da
igreja, e em pé, permanecem os adultos masculinos. Em meio a esse espaço de presença
masculina, uma única mulher: a freira, a catequista, a educadora. Ela se faz presente, de forma
soberana, em meio a esse espaço masculino, na sua veste religiosa, que se faz de um hábito
preto, véu preto com uma borda branca na parte interna e uma pala branca sobre os ombros.
Nesse enquadramento, com destaque para o masculino, está representado o costume da época,
de separar o público masculino do feminino. Estas situação e práticas ocorriam nas igrejas,
assim como nas escolas, onde se sentavam os homens de um lado e as mulheres do outro lado,
no mesmo ambiente. Há situações fotográficas, relacionadas aos ambientes escolar e
religioso, em que essa divisão se faz bem nítida.
A participação feminina em momentos cívicos normalmente se faz através da
participação de programações onde o grande grupo é envolvido, especialmente desfiles
cívicos. Há poucos registros em que a mulher participa de forma mais ativa nas programações
políticas. Uma das imagens da coleção é, todavia, significativa para mostrar em que
circunstância a mulher também se envolveu nas manifestações políticas.
304
Foto 169 – Campanha política para Jânio Quadros I.
Autoria Foto Kaefer. Acervo particular de Írica Kaefer. Mulheres exibem vassouras em momento de campanha
política para Jânio Quadros. Clube Aliança. Marechal Cândido Rondon. 1960.
A Foto 170 mostra que a mulher foi para as ruas e fez manifestações, inclusive em
período noturno. O momento é um flagrante de uma campanha política envolvendo adeptos
do então candidato Jânio da Silva Quadros
310
à Presidência da República, cargo que o mesmo
veio a assumir em 31.1.1961. Jânio Quadros prometeu ao eleitorado “varrer a corrupção” da
administração pública e seu símbolo de campanha era uma vassoura.
O evento referente à Foto 170 ocorreu no Clube Aliança, então localizado na Rua São
Paulo, no centro de Marechal Cândido Rondon. Algumas mulheres erguem vassouras,
enquanto outras acenam com as mãos para um registro, que, além de enquadrar alguns
homens, procura centralizar as mulheres na fotografia. A criança, à direita da foto, mostra que
também elas, mesmo não entendendo muito bem o que se passava, participavam do evento.
Alice Albrecht
311
fez o seguinte comentário ao auxiliar nas identificações de fotografias. “Nós
íamos junto nos comícios e a gente gostava de pegar aquelas vassourinhas e depois a gente
levava para casa. Nós colocávamos nas roupas... Era chique aquilo, aquele broche, tinha um
cabinho e a vassourinha, parecia dourada, eu nunca entendi muito bem porque eles
distribuíram aquilo”. Alice explica que usava porque achava bonito o “enfeite” e não tinha
maiores preocupações em saber o significado daquele objeto -- “a gente era criança”,
310
Jânio Quadros era natural de Campo Grande, Estado do Mato Grosso do Sul. Seus pais foram paranaenses e
ele viveu e estudou em Curitiba até a década de 1930, de onde se mudou para São Paulo. Foi eleito presidente
da República em 1960 com o apoio da União Democrática Nacional (UDN), tendo tomado posse em Brasília,
em 31.1.1961. Renunciou, porém, ao cargo sete meses depois. Sobre Jânio Quadros, ver também ARQUIVO
NACIONAL, op. cit., p. 111-116.
311
ALBRECHT, op. cit.
305
comenta. A Foto 170 também foi reconhecida, em momento de identificação de fotografias
312
,
como momento de campanha política por Arlindo Lamb.
Também Helga Port
313
, por ocasião de identificação de fotografias em sua residência,
ao ver a fotografia 170, ficou exaltada por lembrar de momentos políticos em que sua família
teria participado, sentindo-se impulsionada a mostrar fotos pessoais.
Foto 170 – Campanha política para Jânio Quadros II. Foto 171 – Campanha política para Jânio Quadros III.
Autoria: Foto Kaefer. Acervo particular de Helga Port. Homens e mulheres exibem vassouras durante campanha
política. Marechal Cândido Rondon. Na Foto 172 alguns óculos são encaixados na palha das vassouras em
momento de campanha política para Jânio Quadros. Marechal Cândido Rondon. 1960.
As fotografias 171e 172 são lembranças do momento político que teve a participação
dos pais de Helga Port, em evento realizado na parte interna do Clube Aliança, o que indica a
placa afixada na parede e entre as janelas, conforme a Foto 171. Helga comenta: “A gente não
se envolvia muito. Mas, quando era época de campanha, a gente ia junto com os pais, que
acompanhavam os discursos. E era bacana”. Assim falando, levantou-se e foi buscar a sua
“caixinha de fotos velhas”, uma caixa de sapatos, pois precisava mostrar que também tem
guardadas fotos sobre o dia do comício para a as eleições de Jânio Quadros.
As fotografias sobre realização de campanhas políticas para candidatos estaduais ou
nacionais mostra que havia um relacionamento da população local, principalmente dos
integrantes de partidos com as autoridades políticas no âmbito estadual e nacional. Através da
imagem da Foto 170 pode-se perceber uma relação entre o candidato Jânio Quadros e o
candidato a governador do Estado do Paraná, Ney Braga, conforme indica a faixa na parte
superior esquerda da foto, visto que, através desta campanha, também se elegeu governador
do Paraná pelo PDC (Partido Democrata Cristão).
Cabe observar que, já em 1958, os dois nomes desses políticos devem ter sido
propagados por ocasião de campanha para deputado federal, apoiados pelo Paraná, momento
312
LAMB, Arlindo Alberto. Entrevista concedida a Lucia Teresinha Macena Gregory. Marechal Cândido
Rondon, 06 jul. 2008.
313
PORT, Helga. Entrevista concedida a Lucia Teresinha Macena Gregory. Marechal Cândido Rondon, 17
maio 2009.
306
em que Ney Braga, pelo PDC, e Jânio Quadros, pelo PTB (Partido Trabalhista Brasileiro), se
elegeram deputados federais pelo Estado do Paraná, tendo Ney Braga sido o segundo mais
votado e Jânio Quadros “se elegeu deputado federal pelo estado do Paraná, com o maior
número de votos, mas não assumiu o mandato”
314
. Nota-se, pois, que, através dos seus
representantes, a população mantinha contatos, recebia material de divulgação, participava de
encontros, fazia divulgações sobre eventos dos partidos.
5.2.4.4 Relação entre espaço infantil e adulto
Observando-se a presença infantil nas fotografias, chegou-se ao levantamento que
mostra as meninas em 71 fotografias e os meninos em 61 fotografias no conjunto da coleção.
Ou seja, meninos e meninas aparecem nos mesmos enquadramentos. Ocorre uma diferença de
10 fotos a mais para as meninas, no entanto as crianças de ambos os sexos estão presentes
praticamente nos mesmos eventos.
As fotografias da coleção mostram que há uma variação dos lugares ocupados pelas
crianças.
Quadro 29 - Variação da ocupação do espaço infantil
Tema/Objeto
Criança com
criança
Criança
individual
Grupo misto
Mulher com
criança
Total
Vistas locais 03 03
Retratos 07 14 07 04 32
Religião 06 10 20 36
Produção econômica 03 03
Tragédia 01 01
Esporte 04 04
Festividade 01 06 07
Educação 05 05
Civismo 07 07
314
Ney Aminthas de Barros Braga foi militar e político tendo iniciado vida pública no Estado do Paraná, onde
nasceu. Tendo assumido, no ano de 1952, “a antiga chefatura de polícia do estado do Paraná, cargo
equivalente ao de Secretaria de Estado da Segurança Pública oportunidade em que toma contato com o
problema de posse de terras no sudoeste e oeste do Paraná, tornando-se conhecido em todo o Estado e, além
da vida militar “começa a construir sua longa trajetória de liderança na política”. Ney Braga foi eleito prefeito
de Curitiba (1954-1958 sem filiação partidária. “Antes dele, os prefeitos eram nomeados pelo Governador”.
Foi deputado federal pelo PDC (1958), senador, governador do Paraná pelo PDC (1961-1965), Ministro da
Agricultura do Brasil (1965-1986), Ministro da Educação (1974-1978), Governador do Paraná (1979-1982).
Presidente da Itaipu Binacional. NEI Braga. Disponível em: <http://pt.wikipedia.org/wiki/Nei_Braga>.
Acesso em: 10 ago. 2009. Ver também JÂNIO Quadros. Disponível em:
<http://pt.wikipedia.org/wiki/J%C3%A2nio_Quadros>. Acesso em: 11 ago. 2009. Ver também ARQUIVO
NACIONAL, op. cit.
307
As crianças estão representadas individualmente ou acompanhadas de outras crianças
em 37 fotografias. Nessas situações são as fotos dos retratos ou a comunhão na igreja o
motivo do registro. Para os demais temas correspondem: vistas (3 fotos), produção (3),
tragédia (1), esporte (4), festividades (6), educação (5) e civismo (7) fotos. Nesses espaços
diversificados, portanto, a presença de crianças se faz em 25 fotos e com o grupo misto.
Assim as crianças estão normalmente acompanhadas, quer seja de outras crianças ou de
adultos.
O sinal de presença infantil em foto do tema tragédias é, na verdade, marcada pelos
pés da menina que foi verificada na Foto 75. No tema esporte ocorre a presença de meninos
em quatro registros acompanhados de homens.
O registro de uma foto de crianças acompanhadas de outras crianças no tema
festividades é um momento especial para os meninos.
Foto 172 - Meninos no bar
Autoria: Foto Kaefer. Acervo particular de Írica Kaefer. Meninos exibem garrafas já vazias em um momento de
autonomia no bar. Marechal Cândido Rondon. Década 1954-60.
A fotografia dos meninos da Foto 173 é um raro momento em que crianças estão
sozinhas e sem a companhia de adultos. Sentados ao redor de uma mezinha de bar ou de
salão, exibem as garrafas de vidro já vazias. As crianças estão bem vestidas, de camisa branca
e de calça social, com exceção de um dos meninos, que está com veste mais simples, usando
uma camiseta, calça curta e está com os pés descalços, enquanto os outros meninos estão com
sapatos. Os meninos estão bem à vontade e sorridentes. É a alegria da autonomia e da
liberdade. Ocupando as cadeiras de qualquer jeito, simulam encher novamente os copos. A
308
bebida de um dos copos parece ser branca e não foi identificado o líquido que bebiam. Um
dos meninos chupa um picolé do qual já caiu um pingo no seu calção. No fundo do salão
estão expostas duas taças esportivas. Determinados bares ou salões são locais de guarda
desses objetos, que ficam expostos ao público e simbolizam conquistas de desportistas.
Outro aspecto que as fotografias revelam é uma diferença percebida no sentido das
ações desenvolvidas pelas meninas, o que se percebe em diferentes eventos, a saber: em
fotografia de noivos, meninas são aias; nas de comunhão, são os anjinhos; nos batizados, a
veste longa é feminina (o que não significa tratar-se sempre de uma criança menina); no
momento cívico é a menina que declama um versinho para o governador do Estado e é ela
também que carrega faixas; nas fotos de família, quando são enquadradas somente as
crianças, é uma menina que segura o bebê (Fotos 98, 175, 177). São as meninas (ou as moças)
que oferecem algo da região para visitantes considerados ilustres.
Foto 173 - Um versinho para o Governador do Estado
Autoria Foto Kaefer. Acervo particular de Írica Kaefer. Gláucia Weirich, considerada a primeira criança nascida
em General Rondon, declama um verso para o governador do Estado do Paraná Lupion. Marechal Cândido
Rondon. Década 1954-60.
Entre os preparativos para a recepção do governador do Estado em Marechal Cândido
Rondon estava a preparação da menina Gláucia Weirich, que deveria recitar um verso para a
autoridade. O momento da vinda de autoridades para o município foi lembrado por Lamb
315
,
que recitou, pois sabia “de cabeça” o que a menina declamou: “Eu sou a primeira criança,
nascida em Marechal Cândido Rondon, e saúdo a Vossa Excelência, Governador Moisés
315
LAMB, op. cit.
309
Lupion”. O momento político ficou gravado na memória do então prefeito municipal, assim
como a singeleza da menina, que declamou o verso relembrado e exclamado por Arlindo
Lamb, ao rever a foto durante entrevista realizada em sua residência. A escolha da menina
Glaucia Weirich para presentear o governador é também um tributo às primeiras familiar que
vieram morar em General Rondon, consideradas pioneiras.
Foto 174 - Um registro das crianças.
Autoria Foto Kaefer. Acervo particular de Írica Kaefer. Crianças fazem pose em registro de família,
oportunidade em que, normalmente, cabe à menina maior segurar o bebê. Marechal Cândido Rondon. Década
1954-60.
A fotografia 175 é um registro das crianças de uma família com oito filhos, onde há o
predomínio dos meninos sobre as meninas. As crianças são o objeto central e estão
posicionados em duas linhas, formando dois planos. No terceiro plano, o fundo artificial
formado por folhas de palmeiras, cobre parte da parede de madeira da casa. Essa casa tem
uma parte de tijolos abaixo da altura da madeira até o chão, fazendo um acabamento ao redor
dela. O limpador de calçados que pode ser visto do lado direito da foto causa um pequeno
desequilíbrio no enquadramento. No entanto, é um objeto significativo do período, pois está
relacionado com um artefato usado para limpar o acúmulo de barro que grudava nos calçados
e ao chão de terra que circundava as casas e a rua. A ripa na horizontal servia para o apoio da
mão na hora de passar o calçado sobre o limpador, que era feito de uma lâmina estreita de
ferro.
As crianças dessa Foto 175, estão bem vestidas, podendo ser percebido um costume
com relação às vestes, onde os vestidos das meninas são feitos do mesmo tecido estampado,
assim como o tecido xadrez das camisas de dois dos meninos. Os outros meninos usam
310
camisas brancas. As crianças estão com calçados e meias nos pés. A menina maior e um dos
meninos menores estão sentados em cadeiras de madeira. Uma das cadeiras recebe um apoio
de um objeto (um pedaço de madeira ou de pedra) em um dos pés para deixar a cadeira no
nível e a criança mais segura. A irmã, que está de pé do seu lado, também estende o braço
atrás da criança, tentando proteger o irmão menor. Na outra cadeira, a menina maior, mas que
não é a criança mais velha, está encarregada de segurar o nenê do grupo no colo. Para melhor
equilibrar-se afirma os pés no apoio da cadeira, com as pernas meio desajeitadas para a foto,
porém ajustadas para melhor acomodar a criança. Essa menina espalma uma das mãos contra
a barriga do nenê, o que torna a sua mão desproporcional às mãos dos demais. O menino que
está em pé, do seu lado, também se protege nessa menina e apoia um dos braços sobre a perna
da irmã. A outra mão está colocada bem direitinho no bolso do seu calção.
A fisionomia das crianças é séria e apreensiva e os olhares seguem várias direções.
Enquanto a maioria das crianças olha para o lado direito da foto, onde alguém deve estar
dando algum comando, o que pode estar interferindo na ansiedade e no ânimo destas, o
menino mais velho olha para a câmara, enquanto outro, em posição de sentido e rígido, olha
para baixo. A menina que segura o nenê mostra o rosto interrogativo e de alguém que tem
dúvidas quanto à pose tomada para a foto. Enfim, como já mencionado anteriormente,
preparar tantos filhos e organizá-los da melhor maneira no espaço fotográfico não foi tarefa
fácil diante do rigor dos gestos para a época e da intenção do registro. Entende-se que, na
fisionomia das crianças, está representada a rigidez com que alguns registros fotográficos com
crianças foram elaborados e a indicação de que há, frequentemente, adulto acompanhando e
determinando poses e gestos das crianças. Situação diferente é a percebida no flagrante da
Foto 173, onde as crianças estão bem mais à vontade.
Nesse sentido, fotos incluídas na análise são exemplos de atribuições desempenhadas
por meninas e registradas em imagens. Essas características estão presentes em fotografias do
grupo misto e pondera-se que tanto os meninos como as meninas estão nas imagens. Porém, é
a menina que recebe atribuições e desempenha uma função que lhe confere responsabilidades
diferentes, pois, enquanto todos fazem pose, por exemplo, ela, além de posar, segura alguém
no colo, declama, carrega cestinhos e, ao desfilar, também carrega faixas. As atribuições dos
meninos são em menor número e eles também assumem algumas funções, como é o caso do
momento cívico, onde eles desfilam e também executam a banda colegial. Raramente
seguram nenês no colo.
311
Foto 175 – A carga de pasto
Autoria Foto Kaefer. Acervo particular de Írica Kaefer. Crianças transportam pasto. General Rondon. Década
1954-60.
Conforme mostra a imagem 176, ocorrem momentos em que as crianças executam
tarefas em conjunto. Nessa foto, as crianças conduzem uma carreta pequena, puxada por um
boizinho que parece ainda bezerro, considerando que sua altura está abaixo das crianças que
estão sentadas na carreta. O comando é do menino. As crianças estão bem vestidas e podem
não ter ajudado no carregamento do pasto na carreta. Auxiliam, porém, na tarefa de puxar o
pasto para o trato dos animais.
Na relação do espaço infantil e adulto desta coleção, percebe-se, portanto, que as
crianças ocupam espaços individualmente apenas nos momentos de fotos posadas dentro ou
fora dos estúdios e nos demais espaços estão acompanhadas dos adultos, principalmente no
grande grupo. As crianças são enquadradas com a função de fazer poses. Praticamente, não há
registro instantâneo com as crianças (exceto Foto 173), prevalecendo a pose, que se faz séria,
pela importância dos eventos e pela formalidade com que os adultos tratam o espaço
fotográfico. O semblante se suaviza quando ao retrato é enquadrado algum brinquedo que
normalmente não pertence à criança, e, sim, ao estúdio. Não raras vezes, o brinquedo era
disputado, mas apenas uma das crianças podia usufruir dele na pose.
312
Foto 176 – O brinquedo e o bebê Foto 177 – Dividindo o brinquedo
Autoria Foto Kaefer. Acervo particular de Írica Kaefer. Nas imagens das crianças, o semblante apreensivo diante
da necessidade de compartilharem a bicicleta. Marechal Cândido Rondon. Década 1954-60.
Para a criança, o brinquedo é muito mais interessante do que uma pose fotográfica. A
possibilidade de poder sentar na bicicleta (Foto 177) não alivia o semblante do menino, que
precisa equilibrar-se em cima dela, e da menina, que precisa consolar-se em segurar o bebê.
Para melhor equilibrar-se, estica as perninhas para frente provavelmente por não alcançarem o
apoio da cadeira. As crianças usam vestes boas e são posicionadas em frente a uma parte da
varanda da casa, que está sem pintura. Um balde velho colocado em cima da parede de tábuas
vazadas da varanda foi enquadrado no canto superior direito da foto, provocando um
desequilíbrio no enquadramento. Porém, mostra a simplicidade do espaço, que tem como chão
alguns tijolos ou lajotas onde são posicionadas as crianças.
Vestidas de branco e preto (ou outra cor escura), com calçados nos pés, a foto das
outras duas crianças (178) é, mais uma vez, a demonstração do uso do pano do estúdio como
fundo de foto em espaço externo. Posicionados em cima de um pedaço de madeira, bem
menor que a extensão do pano de fundo, as crianças estão aflitas, tanto a menina que pode
sentar na bicicleta, quanto o menino, que precisou se conformar segurando uma parte da
direção da mesma. A falta de brinquedos ou a necessidade de compartilhar a oportunidade do
contato com um brinquedo deixou as crianças com rosto aflito, rancoroso e triste. As
situações com enquadramento das crianças são representações de espaços e de momentos
313
programados e acompanhados por adultos e que se tornam controlados e reservados ao espaço
do estúdio-igreja-educação/civismo.
5.2.4.5 Os animais acompanham as vivências
No presente item, mostra-se a presença de animais no enquadramento da coleção
analisada, indicando-se as diferentes espécies com as quais as pessoas conviveram,
complementando as circunstâncias desses contatos já sinalizadas, em alguns casos, em itens
anteriores.
Os tipos de animais que foram fotografados são o cavalo, o cachorro, o peixe, o
tucano, o porco, o boi ou a vaca e a onça. Pode-se considerar, pois, que há, nesse contexto
fotográfico que a coleção cobre, animais domésticos e animais selvagens. Na lista dos
domésticos entram bois, vacas, porcos, cavalos, cachorros e, na lista dos selvagens, animais
relacionados com a caça e a pesca como aves, onças e peixes.
A presença do cavalo se fez em dois espaços: no espaço rural e no espaço urbano.
Uma vez aparece em fotografia relacionada com o espaço privado e rural amarrado e próximo
das dependências de uma residência simples, sem pintura, sem vidraças, sem varanda, sem
calçada (Foto 115). O animal não está em destaque. Mas o enquadramento amplo mostra-o
em meio a um galpãozinho e uma estrebaria para vacas, algo anexa a um chiqueiro para
porcos. O cavalo é todo branco e apresenta bom estado físico. Encilhado e amarrado, está com
um pelego sobre as costas, preparado para montaria. O animal não está integrado ao grupo
familiar e, como não está solto em algum potreiro ou cercado, aparenta não pertencer à
família, tanto que permanece com os apetrechos nas costas e encilhado. Seria de um visitante?
Já junto ao grupo, no mesmo plano e na mesma linha da figuração, está o cachorrinho preto e
branco. Considerado como um animal doméstico, mostra-se, também, um bicho de estimação
e faz parte do espaço da casa. O cachorro, ainda, é enquadrado em foto sobre caçadas (Foto
101) considerando a habilidade de determinada espécie para essa atividade ou até em fotos
festivas (Foto 64) ou ainda em outros momentos familiares quando ali ele se posicionava No
espaço urbano, o cavalo recebeu destaque e, com seu dono, integra o mesmo espaço, o espaço
da rua.
314
Foto 178 – O homem e seu cavalo
Autoria Foto Kaefer. Acervo particular de Írica Kaefer. Um senhor faz pose ao lado de seu cavalo. Marechal
Cândido Rondon. Década 1954-60.
O homem, no primeiro plano, e o animal, no segundo plano, são o objeto central do
enquadramento da Foto 179. Como fundo, foi enquadrada uma parte da parede de um imóvel.
A construção de alvenaria apresenta, ao centro, uma porta fechada com partes em vidro e, de
cada lado da porta, janelas com a parte das venezianas abertas, porém suas vidraças estão
fechadas. Na frente do imóvel, há uma faixa de calçada e a estrada onde o homem e seu
cavalo estão posicionados é de chão de terra. Esse cavalo é de cor escura e tem uma parte
branca acima das patas. As cerdas do pescoço estão cortadas e alinhadas. O cavalo, encilhado
e com um pelego sobre as costas, está posicionado de lado, com a cabeça voltada para a
direção esquerda da foto. O homem faz uma pose bem programada, apoiando-se com um
braço sobre as costas do cavalo e uma das mãos na cintura, voltando seu corpo também na
mesma direção do cavalo. Para dar um maior envolvimento à pose, estende a perna direita,
que está ao lado do cavalo, para a frente e seu pé alcança a mesma linha das patas dianteiras
do seu cavalo companheiro. O homem está com vestes simples, de trabalho, usa sapatos,
camisa xadrez e calça lisa. Como acessórios, usa um chapéu de feltro e tem enlaçado, no
braço direito, um pequeno relho. Assim posicionados, não ocorre comunicação através do
olhar entre o animal e seu dono e nem deles para com quem está fotografando. Há, contudo,
um sorriso no rosto do homem, proporcionando-lhe um semblante alegre, que, associado aos
gestos, aproxima o homem do seu cavalo. É esse diálogo que une os fotografados à câmera,
dando vida à imagem.
Outra cena com a presença de um cavalo é a de um acidente de trânsito, como pode ser
visto na Foto 140. O acidente envolveu um automóvel e uma carroça puxada por cavalo(s). O
animal ficou caído na frente do carro e a carroça, atrás do carro, ficou desmontada. A imagem
315
não mostra pessoas feridas. No entanto, além da morte do cavalo, a imagem mostra tratar-se
de um acidente com danos graves.
O enquadramento fotográfico de uma junta de bois também se deu por conta de um
acidente de trânsito. Esse acidente ocorreu à noite e em estrada de chão, onde se envolveram,
no caminho, uma patrola e uma carroça ou charrete puxada por bois. A cena é chocante e de
desolação.
Foto 179 - Acidente com patrola
Autoria: Foto Kaefer. Acervo particular de Írica Kaefer. Acidente de trânsito noturno envolvendo uma patrola e
uma junta de bois. Marechal Cândido Rondon. Década 1954-60.
A parte de uma das rodas da carroça/charrete está no lado esquerdo da foto e um dos
bois está caído e preso entre as duas rodas traseiras da patrola. O outro boi continua em pé,
mas preso por uma canga e uma corda, que, presa aos bois, é usada para auxiliar na condução
da carroça. À direita e ao fundo, estão algumas pessoas, paradas em círculo e conversando.
Em outra foto desse mesmo acidente
316
, o foco central é a cabeça do boi atropelado, já
desprendida das cordas e da canga, mas com o corpo ainda preso entre as rodas da patrola. O
envolvimento desses meios de transporte em acidentes, inclusive à noite, são representações
que podem ser associadas às atividades desempenhadas por um grupo social, em que, de uma
parte, está presente o poder público, desenvolvendo serviços de infraestrutura e preparando
estradas e, de outro, o agricultor comprometido com suas tarefas.
Uma cena doméstica com vínculo entre a figuração e vaca/boi é o exemplo do animal
amarrado no quintal, em espaço urbano (foto 108) já analisada no item espaço.
Outros animais domésticos envolvidos em acidentes foram os suínos.
316
Foto 12 Pasta Tragédias. Acervo de Írica Kaefer, foto não computada na análise.
316
Foto 180 - Acidente entre um Jeep Rural e um caminhão
Autoria Foto Kaefer. Acervo particular de Livino Boech. Acidente onde foram envolvidos um Jeep Rural Willys
e um caminhão com uma carga de suínos. Marechal Cândido Rondon. Década 1960.
Um acidente envolvendo um Jeep Rural e um caminhão chamou a atenção de vários
homens (Foto 181), que acorreram ao local com suas vestes de trabalho, alguns descalços e de
chapéus. O posicionamento dos veículos envolvidos não mostra a intensidade do acidente.
Mas a natureza da carga transportada pelo caminhão, os suínos, é uma interessante
demonstração das atividades desenvolvidas por essas estradas do interior e do tipo de
mercadoria em que certos motoristas e comerciantes se envolveram. Os suínos eram
carregados no caminhão e, quando a carga era maior, havia uma divisão na carroceria do
caminhão, formando dois pisos, onde os animais eram acomodados, a exemplo do que pode
ser visto nesse caminhão. Outra foto com o enquadramento de suínos é o da moça da Foto 116
entre outras já mencionadas anteriormente, uma foto de uma enchente onde os suínos
acabaram saindo do chiqueiro, caminhando pelas águas, que subiram o nível do rio e
chegaram próximas da residência.
Foram enquadradas ainda algumas cenas com peixes numa relação individual (Foto
72) e de grupo (Foto 100 e 182).
317
Foto 181 - O peixe
Autoria Foto Kaefer. Acervo particular de Írica Kaefer. Grupo de senhores exibe um peixe em cima da cabine de
um caminhão. Marechal Cândido Rondon. Década 1954-60.
Um peixe com um tamanho que se estende por quase toda a cabine do caminhão Fargo
(Foto 182), é exibido para um foto. Dois senhores estão posicionados nas laterais da cabine e
um deles estica o braço para alcançar o rabo do peixe e dois senhores em cima do caminhão
seguram suas barbatanas. O menino, no alto do caminhão, fica com parte do corpo coberta
pelo peixe. Considerando-se a escrita “Willy Barth” no para-choque do caminhão, pensa-se
que alguns membros da foto têm relação com a companhia colonizadora Maripá, pois Barth
317
era um dos seus sócios e administrador geral na região. Barth também foi candidato a senador
e a escrita no para-choque, além de identificar a companhia, poderia estar vinculada a uma
propaganda política. A pesca era uma atividade desenvolvida tanto para subsistência como
também esporte e lazer, estando representada na sua exibição também a técnica que envolve
uma boa pescaria e o domínio da natureza, principalmente quando a pesca se fazia no Rio
Paraná, mais conhecido como “o Paranazão”.
Finalizando a relação entre o espaço da figuração e os animais, cabe uma referência à
caça aos tucanos.
317
Para obter mais informações sobre a pessoa de Willy Barth ver a obra SCHMIDT, op. cit.
318
Foto 182 - Os tucanos
Autoria Foto Kaefer. Acervo particular de Írica Kaefer. Um rapaz faz pose com uma espingarda na mão diante
dos tucanos caçados. Marechal Cândido Rondon. Década 1954-60.
O vínculo com as aves, segundo a coleção, é menor do que com outros animais.
Considera-se impressionante, porém, a quantidade de tucanos abatidos em apenas uma caçada
e que são expostos na Foto 183. A quantidade da caça registrada nessa oportunidade é uma
demonstração do número elevado de aves que viviam nessa região e, das quais, o tucano é
representativo
318
. Por outro lado, porém, a grande quantidade de aves ainda existentes nas
décadas de 1950/60 e a pouca visão sobre a preservação da natureza e do meio ambiente no
período permitiam maior liberdade e facilidades aos adeptos das caçadas. Uma imagem nos
termos da Foto 183, no momento atual, não poderia mais ser exibida com naturalidade e
tampouco causaria satisfação, como o mostra o rapaz caçador da época. De forma semelhante
à caça aos tucanos, pode-se fazer a referência à onça caçada e fotografada com toda ênfase, o
que foi mostrado no item sobre o espaço geográfico (Foto 101).
Enfim, a relação espaço da figuração e animais nas fotografias da coleção demonstra
uma integração entre eles, de forma espontânea e desproposital às vezes ou posada em outras,
em circunstâncias onde os animais considerados domésticos auxiliaram em diversas
atividades, servindo como tração de carroças, como meio de transporte, nos trabalhos
agrícolas, para passeios, etc. ou como alimento (carne, leite) e, ainda, como satisfação e lazer
em momentos de pescarias e de caçadas. Além da sua utilidade, estão presentes o cuidado e o
afeto para com os animais domésticos, assim como, em momentos de adversidades, a dor
318
Divulgações sobre a região, a exemplo de folders e imagens sobre a Itaipu, na Internet, ainda destacam o
tucano como uma ave da região.
319
provocada pelos acidentes ocorridos e, ainda, o temor diante da possibilidade da presença de
animais ferozes nas proximidades ou refugiados na mata densa que as primeiras famílias
ainda encontraram. São, também, registros de proezas e de troféus de caçadores e de
pescadores. Nesses enquadramentos de animais também estão representados o trabalho das
pessoas da comunidade, o trabalho e o preparo de infraestrutura realizado por parte do poder
público e a diversidade de espécies de animais com os quais as famílias mantiveram
diferentes contatos.
Há que se observar que a presença de animais nas fotografias aponta para o registro de
animais domésticos, normalmente, de conotação econômica, e de animais selvagens e de
peixes, para lazer ou alimentação. Dentre os animais domésticos, aparecem os animais
diretamente relacionados à economia, como os suínos criados para serem vendidos, os bois e
as vacas, e os cavalos usados no trabalho no meio rural, servindo para tração de arados e de
carroças e meios de transporte. Os cachorros eram animais de estimação e também para
vigiar, caçar e proteger. De alguns animais as famílias também obtinham alimentos, como
carnes, banhas e leite.
A presença dos animais nesta coleção não se fez muito significativa em termos de
quantidade, mas, através de seus registros, está documentada a variedade de espécies
relacionadas com as famílias e as inúmeras funções que desempenharam juntos especialmente
com o grupo masculino.
No próximo subitem analisa-se aspectos voltados ao espaço da vivência percebendo
como as fotografias mostram as atividades que apresentam essas vivências que identificam o
grupo social e suas memórias.
5.2.5 DA ARTE DE FOTOGRAFAR AS VIVÊNCIAS
Percebe-se, através desta pesquisa, que um conjunto de ações estão presentes na vida
das pessoas que se estabeleceram desde a década de 1950 no espaço atualmente conhecido
como Marechal Cândido Rondon. Tendo realizado análise do material fotográfico a partir das
imagens, entrevistas, equipamentos fotográficos e jornais, enfocam-se, neste item do trabalho,
aspectos vivenciais que são trazidos ao texto como percepções gerais da análise. Recuperam-
se os cortes temáticos e as vivências associadas a esses temas e mostra-se como essas
vivências conformam memórias.
320
5.2.5.1 Tempos de fotografar vivências
Percorrendo por entre espaços considerados naturais e artificiais, de exteriores e de
interiores, ambientações urbanas e rurais, a câmara, carregada a pé, de bicicleta, no carro Ford
29, na Kombi Volkswagen ou por outros meios (como caminhões ou carroças), gravou, no
papel, tipos e poses que, enquadradas e recortadas, demarcam tempos e espaços específicos.
Nesses locais, no início da colonização, marcadamente no período do dia e, mais tarde,
também à noite, nos estúdios, nas residências, nas igrejas, nos salões ou nos clubes, foram
geradas imagens que, passando pelo corte e pelo recorte, fixaram ações dos fotógrafos e
também dos figurantes. Ação, espaço e tempo integram vivências que se efetivaram num
determinado momento e local que, com o decorrer dos dias, passaram por interferências
provocadas pela natureza e/ou pela ação humana. A câmara mostra mudanças.
Fotografias foram feitas pensando-se no momento programado, a exemplo dos
registros de eventos festivos. Outras fotografias foram feitas pensando-se na oportunidade que
a ocasião sugeria, a exemplo da fotografia das irmãs Lemke, que pensaram em registrar para o
futuro. Fotografias, também, foram feitas de acontecimentos inesperados, tais como as
tragédias. Entende-se, contudo, que fotografias são feitas pensando-se em deixar registrados
instantes da vida para serem lembrados, (re)memorados. Tratava-se de deixar registrado para
poder rever fatos vividos em grupo ou individualmente ou, simplesmente, para presentear a
outros ou relembrar a si mesmo, como no caso dos retratos.
A fotógrafa Írica selecionou e preservou inúmeros registros fotográficos, documentos
textuais e equipamentos, assim como descartou outros. Na verdade, foram descartadas
fotografias porque estariam repetidas, porque não conhecia algumas pessoas que estavam nas
fotos ou, no caso das fotografias consideradas trágicas, deu-lhes um destino diferente,
“descartando-as” para o fotógrafo auxiliar, Livino que, com outro olhar as preservou.
Na verdade mesmo, Írica desabafa: “A Irene não gostava de fazer fotos e também
queria sempre jogar fora. Por quê? coisa velha, ela dizia”
319
. Assim, as fotos preservadas
mostram a persistência e a resistência da fotógrafa guardiã que, ao cuidar desse material por
tanto tempo, talvez tenha esperado por um momento de maior valorização desse acervo.
Porém, pode não ter se dado conta da validade desse cuidar e guardar para a pesquisa
histórica. Ocorre que, preservando esse material, preservou não apenas documentos, mas
registros, memórias que falam de experiências de vida – falam especialmente da vida sua,
319
KAEFFER, 19 ago. 2009, op. cit.
321
como profissional, como mulher que desempenhou um papel que ultrapassou os limites da
vida doméstica e de mãe. Atuando na vida pública, torna-se um exemplo ímpar de
profissional feminina na área da fotografia nessa região, em um período em que as atividades
desempenhadas fora de casa eram ainda restritas e limitadas aos homens.
As fotografias preservadas são também sinais de experiências de famílias, de grupos
sociais que deixaram marcados lugares que se tornaram vivências. Os lugares enquadrados
nos registros fotográficos “criam uma rede de significações que permite reconhecê-los como
espaços cotidianos...”
320
. Também, aos objetos são associados usos e formas de vivências,
conforme análise do espaço do objeto. Assim, portanto, nesta parte do trabalho recompõem-se
os registros fotográficos associados às vivências e aos espaços nos diferentes temas do
período estudado, os quais indicam tempos e eventos construídos.
O registro é sempre realizado por alguém, que, também, está acompanhado do seu
objeto. Esse objeto é um objeto específico – a câmara fotográfica e seus acessórios. O
fotógrafo, através da sua câmara, diagnosticou, avaliou, sintonizou, focou e fez escolhas.
Diante das possibilidades, definiu seu assunto principal, centralizou e enquadrou. Procurou a
melhor luz, elegeu a melhor pose e as linhas. E, nesse seu ofício de marcar e de demarcar,
registrou diferentes espaços, momentos festivos e especiais, que são passíveis de serem
reconhecidos como memórias gravadas nas fotografias e, ao mesmo tempo, de despertar
lembranças.
Aspecto interessante em relação à ambientação no estúdio são os objetos particulares
dos fotógrafos, a exemplo das toalhas de mesa e dos vasos de flores, os quais, inclusive,
vieram do enxoval de casamento da fotógrafa. Nesse sentido, auxiliaram na composição dos
objetos do espaço, onde registros mostram a inclusão da mesa redonda, que chegou a ser
aproveitada para sentar as crianças em determinadas poses. O próprio espaço de uma das salas
da casa que, reservada para estúdio tornado “objeto principal”, serviu como um meio para a
concretização dos objetivos dos fotógrafos. E as toalhas de mesa bordadas com crochê, que
cobrem aquela mesinha redonda e colocada normalmente no canto esquerdo das fotos, são
objetos ornamentais que se tornaram uma marca na coleção de fotos dos Kaefer.
São objetos marcantes da coleção também os figurantes e suas vestes especiais, seus
acessórios, suas poses e fisionomias, alguns com menos e outros com mais ênfase nos gestos
e expressões. Mais ênfase? Pode-se rever a foto daquele senhor com a bicicleta no estúdio, a
foto da afilhada, a foto das irmãs Vorpagel e Lemke, só para mencionar alguns exemplos. As
320
MAUAD, Sob o signo, 1990, Cap. III. p. 73.
322
fotos marcam épocas e estilos, portanto muitas imagens são registros de momentos de
exibição pessoal, onde o espaço, quer seja interno, quer seja externo, participa da
representação que a intenção do registro proporcionou.
Ao questionar-se sobre o que há no estúdio novo e como são feitas as fotografias no
novo espaço fotográfico, nota-se, novamente, o enquadramento na direção central da foto e a
predominância de fotos no sentido vertical. O estúdio se encontra organizado e sempre
preparado para a realização de registros que se fizeram, em grande parte, ainda, com rigidez e
seriedade nas décadas de 1950 e 1960. Assim, a relação dos figurantes com a fotografia, nas
décadas iniciais da migração para o oeste paranaense, revela-se numa representação onde a
naturalidade dos sentimentos era valorizada. O natural era entendido como o normal onde
principalmente o rosto não mostra expressões de riso.
5.2.5.2 Realizando passeios e participando de esportes
Para esse tipo de fotos podem ser identificadas as seguintes características:
— espaço fotográfico: foto média, posada para o esporte e instantânea para momentos
de passeio, sentido horizontal e central, tudo no foco, três e quatro planos,
equilíbrio;
espaço do objeto: fixo para espaços de lazer com vistas e paisagens, construções;
para o esporte, objetos vivos, móveis e fixos;
— espaço geográfico: externo, natural, composto pela paisagem, rios, campos de
futebol;
espaço da figuração: superioridade da presença masculina, porém, acompanhada
da presença feminina.
As vistas de paisagens mostram momentos com figuração mista e trajes a passeio. São
fotos onde visitas foram feitas a espaços turísticos conhecidos pela beleza das quedas e
quantidade das águas, em espaço externo e alguns registros mostram passeios em espaço
natural urbano. São fotos em menor número, o que indica que não eram realizados muitos
passeios para lugares turísticos e que esses provavelmente não eram considerados de primeira
necessidade. Assim as fotografias dessa temática mereceram investimentos reduzidos do
grupo migrante.
323
As atividades ocorridas em torno do futebol, mesmo que apresentando registros em
menor proporção, demonstram que a parte das vivências motivadas pelo esporte é intensa.
Times e campeonatos, jogadores e torcedores, homens e mulheres, campos de futebol e salões
de bailes, são marcos de vivências realizadas em torno desse tipo de lazer.
A importância dada ao futebol também é mostrada através dos jornais, lançados a
partir de 1968. O Oeste Paraná Clube organizava campeonatos no dia 1º de maio, em
comemoração ao dia do trabalhador. No ano de 1976, por exemplo, para esse dia estava sendo
aguardado o time União, da localidade de Bandeirantes (PR), com o qual o Oeste teria feito
contratação com cláusula específica “para que Flávio Antônio da Rocha, o ‘nosso Pelé’, que
saiu daqui para o União, jogue nesta partida”
321
. Mostra-se, através desses informes, que
ocorre uma relação de cumplicidade entre jogadores e torcedores e que, às vivências em torno
do futebol, no interior do país, estão agregados certos nomes de times, de atletas ou seus
apelidos, os quais foram buscados no futebol nacional.
5.2.5.3 Os retratos e seus espaços
Para esse tipo de fotos podem ser identificadas as características seguintes:
espaço fotográfico: foto média, posada, sentido horizontal e central, dois planos,
tudo no foco e em equilíbrio, linhas bem definidas, contraste marcado e sem
sombra;
— espaço do objeto: natural e de interiores, relacionados aos objetos de estúdio;
espaço geográfico: externo, natural, composto pela paisagem, mata, paredes de
casas; interno, nos estúdios, antigo e novo;
espaço da figuração: apresenta-se tanto coletivo quanto individual de forma
proporcional.
O espaço externo, também considerado o espaço público, em ambientação exterior à
casa, foi o mais procurado para o registro dos retratos. Essa padronização confirma a
necessidade de procurar um profissional para a realização do retrato. Imagens feitas do corpo
inteiro em espaço natural, ou do rosto e do corpo inteiro em espaço interno, tanto adultos,
quanto crianças foram fotografados, em diferentes épocas, o que mostra a ambientação e os
objetos do espaço fotográfico.
321
RONDON COMUNICAÇÃO. Marechal Cândido Rondon, Ano 3, n. 102, p. 15, 27 mar. 1976.
324
Os retratos feitos no estúdio antigo são marcados pela figuração no primeiro ou
segundo planos, diante de um plano de fundo artificial, porém, com um motivo natural, onde
a estampa, feita com árvores e arbustos, leva traços naturais ao espaço de ambientação
artificial. Ainda, quanto à figuração, ocorre uma incidência maior da presença feminina nos
retratos.
Aspecto interessante em relação aos objetos ambientados no estúdio antigo são os
objetos particulares da fotógrafa, a exemplo das toalhas de mesa e dos vasos de flores. A
situação mostra que, ao mesmo tempo em que ocorre um desprendimento de objetos pessoais
por parte da fotógrafa, a casa fotográfica atende a uma necessidade comercial de organização
do espaço do estúdio. Ainda, conjuga-se essa organização aos interesses de fregueses, que
podiam optar por um determinado tipo de fundo, de vaso, de brinquedo ou, ainda, de um
espaço externo em meio ao jardim, também cultivado por essa profissional. Alguns objetos,
inclusive, eram transportados da parte interna para a externa, proporcionando acomodação
para crianças, que podiam ser posicionadas em cima da mesa, cadeira ou cadeirinha e, ainda,
na bicicleta dos seus filhos. Assim, cedidos, os diferentes objetos, incluindo-se o próprio
espaço dos estúdios, tornam-se objetos fundamentais para a comercialização fotográfica.
Os figurantes e suas vestes especiais, seus acessórios, suas poses e fisionomias, alguns
com menos e outros com mais ênfase nos gestos e expressões, são o “objeto vivo” a integrar a
ambientação nos estúdios. As fotos marcam épocas e estilos.
Ao questionar-se sobre o que há no estúdio novo e como são feitas as fotografias no
novo espaço fotográfico, nota-se novamente o enquadramento na direção central da foto e a
predominância de fotos no sentido horizontal.
As fotografias de retratos, quando individuais, são feitas no sentido vertical tendo por
objeto principal a própria figuração e seus objetos pessoais.
No conjunto dos objetos de interiores, a presença dos objetos relacionados ao espaço
do estúdio são marcas fortes da mensagem fotográfica. Assim, pode-se mencionar novamente
a presença do cavalinho de brinquedo, dos vasos de flores, móveis de vime, o tapete do
estúdio antigo, o piso do estúdio novo, os quadros de paisagens, a cadeira de madeira com
assento estofado, a coluna de alvenaria, a escada de alvenaria e o pequeno corrimão que
acompanha a escada. Ainda, o encanto produzido no espaço dos enquadramentos. Estes são
feitos com a mesa pequena redonda, acompanhada de toalhas bordadas e de panos de fundo,
que são objetos que podem ser apreciados, constantemente nas fotos. Ao serem vistas e
revistas fotos feitas nos estúdios, o que indica a quantidade significativa de exemplares,
325
mesmo que ocorra a variação dos personagens e do motivo do registro, o espaço da foto e dos
objetos acaba se repetindo e, assim, recompondo vivências.
5.2.5.4 Celebrando a fé
As ocasiões especiais de casamento e de comunhão são os eventos mais registrados
pelas famílias. São momentos festivos, que podem ser considerados como compromissos
religiosos realizados e que merecem ser fotografados para ficarem bem marcados. As
fotografias do tema religioso seguem o seguinte padrão:
espaço fotográfico: foto média, posada, sentido vertical, central, diversos planos,
tudo no foco, arranjo e equilíbrio, linhas bem definidas, contraste marcado e sem
sombra;
— espaço geográfico: espaço natural e artificial;
espaço do objeto: no espaço natural, estão representados cadeiras, bancos e mesas
que revelam a utilização predominante de artefatos de madeira, desde a década de
1950 até 1970. Alguns talheres, pratos, copos e garrafas, em um pequeno número
de fotografias, mostram momentos de enquadramento de alguma refeição. Os
objetos de interiores, relacionados aos objetos de estúdio destacam os noivos e seus
adereços;
espaço da figuração: individual, seguida do grupo misto, notadamente dos casais
de noivos.
Nas fotografias, tanto as de noivos com o grande grupo, quanto as de casais, pode-se
entender que há a intenção da confirmação do casamento. E o fato de fotografar-se, ali, no
espaço doméstico, junto às residências e à natureza, assim como nos salões de festa, são
representações da abrangência do ato de casar e de comprometimentos com a família e com a
sociedade. Acima de tudo, é uma prova da confirmação de um evento festivo, evento que
culmina com o momento do registro fotográfico. A fotografia passa a ser mais uma
testemunha, uma prova daquele acontecimento.
Uma análise sobre a variedade e a quantidade de objetos, tanto de interiores, como de
exteriores, destaca, na sua simplicidade, aspectos e condições econômicas, detalhes da
natureza., mas, acima de tudo, aspectos do convívio social -- na sua maioria enquadra, como
objeto principal, o casal de noivos ou os comungantes. Os objetos relacionados com batizados
326
e mortes, momentos que são marcos do princípio e do fim da vida, são enquadrados em menor
número. A celebração do batismo envolve grupos menores em relação aos casamentos, por
exemplo, e mostra-se, pelo número reduzido dessas fotos, que, nos primeiros anos de vida na
nova colônia, esses sacramentos não recebiam tanta ênfase fotográfica.
Os objetos e ações relacionadas ao casamento e à comunhão lembram a base espiritual
repassada pelos antepassados e transmitida aos filhos através da educação com base em
princípios religiosos, materializados na vela, na certidão da comunhão, no livro de rezas.
Ainda, na elaboração da construção da vida a dois, representada pelos objetos pessoais,
especialmente a indumentária, pelos acessórios e também pelos gestos. A representação da fé
se faz, ainda, pela opção e inclusão nas vivências de cerimônias religiosas, na atitude de quem
ministra as celebrações, na disposição de quem recebe sacramentos e na vibração de quem
delas participa e comemora. Festejar essas etapas significa o sucesso da família, que vê seus
filhos crescidos e se firmando num novo lar através do sacramento do matrimônio ou
formalizando o sacramento da comunhão. Os objetos integrados ao espaço fotográfico
reforçam essas vivências, tornando-se esses momentos, momentos especiais.
Quanto à figuração, as fotografias de grupos, no sentido vertical, são os momentos
especiais, como dia do noivado ou do casamento, acompanhados das vestes especiais, que
fazem parte dos registros. Noivar e casar são momentos únicos e especiais na representação
das vivências, em que a participação da mulher tem uma presença mais significativa.
Ao serem feitas as fotografias de casamento, os objetos enquadrados enfatizam a
ambientação religiosa e, quando nos estúdios ou residências, é através dos objetos pessoais
circunstanciados a esse evento que a representação da fé é exteriorizada. Para tanto, os
vestidos brancos, os buquês, as grinaldas e os véus das noivas, assim como os ternos dos
noivos, com seus acessórios, e os sapatos brilhosos interagem com o momento religioso.
Tornam-se, assim, símbolos da própria fé, manifestada através desses objetos e do próprio
sacramento do casamento, muito embora um dos símbolos maiores, as alianças, não tenham
sido enquadradas na quase totalidade dos registros sobre esse tema. Nessas manifestações,
está representado o compromisso familiar e social em torno da ideia do casamento e da ideia
de estabilidade, de manutenção e de permanência, reforçadas pelo sentido horizontal das
fotos, indicando, ainda, ideia de movimento e de ascensão.
Ao sagrado, também, estão vinculados objetos incluídos ao espaço da celebração da
primeira eucaristia católica. São marcados, quando realizados em igrejas, por um plano de
fundo característico, os altares, e acompanhados de objetos, tais como as vestes, os
certificados, os manuais de rezas.
327
5.2.5.5 Produzir e crescer
As fotografias do tema produção seguem o seguinte padrão:
espaço fotográfico: foto média, posada, sentido horizontal, central, três e quatro
planos, arranjo e equilíbrio, tudo no foco, linhas bem definidas, contraste marcado
e com sombra;
espaço geográfico: espaço natural e rural com ambientação próxima de matas e
arbustos;
— espaço do objeto: relaciona-se à produção, objetos de interiores, os poucos móveis,
os utensílios domésticos, alguns produtos agrícolas, os animais, os meios de
transporte de tração animal e as bicicletas;
espaço da figuração: individual, seguida do grupo misto, notadamente dos casais
de noivos.
O espaço rural, em relação ao espaço urbano, é um espaço mais lento. A situação se
faz sentir pela falta da energia elétrica, que limita a atividade para o período do dia,
considerando-se como indica Elfes
322
, que em 1970 “o abastecimento com energia elétrica
quase não existe ainda no meio rural, a não ser em alguns pontos do município de Toledo”.
Há que se considerar também o uso de equipamentos manuais que exige um período maior
para a execução de tarefas
323
.
O alicerce das construções era feita em cima de pedaços de troncos de árvores. Isso
lembra uma época em que o cotidiano dos seus moradores ocorria, em boa parte, dentro
dessas residências. Às vezes até, debaixo das casas, quando a altura ou o espaço aberto
deixado entre o assoalho da casa e o chão de terra o permitia, outra espécie de vida se
desenvolvia. Sabe-se que debaixo de casas, dependendo da sua altura em relação ao chão,
vários objetos eram guardados, tais como latas vazias, ferramentas e sobras de madeira. Ali,
debaixo da casa, gatos, cachorros e galinhas, também aproveitavam o chão de terra para
322
ELFES, op. cit., p. 19.
323
Especificações sobre os instrumentos de trabalho e o espaço colonial do Oeste do Paraná podem ser
verificadas na obra de GREGORY, Os eurobrasileiros, op. cit., capítulo IV. Já objetos desta natureza são
preservados e expostos no Museu Municipal de Pato Bragado e elencados no capítulo IV – Museu: da coleção
de idéias à coleção de objetos na obra GREGORY, Valdir; MYSKIW, Antonio Marcos; GREGORY, Lucia
Teresinha Macena. Porto Britânia a Pato Bragado: memórias e histórias. Marechal Cândido Rondon: Ed.
Germânica, 2004. p. 139-194.
328
descansar ou até mesmo para fazerem suas moradas e seus ninhos. Neiva Macari
324
, em
entrevista, comenta que seu marido Mauro, quando criança, tinha o compromisso de vigiar as
galinhas após o almoço. A atribuição teria sido repassada pelo seu pai pois esse não queria ter
seu horário de descanso do meio dia, atrapalhada pelo cacarejar das galinhas que, naquele
hora, também gostavam de procurar seus ninhos debaixo da casa. Portanto, nesse espaço
pouco visível, cachorros e gatos instalavam seus ninhos, ganhavam crias, galinhas botavam
ovos e, quando não recolhidos, podiam ser comidos pelos cachorros ou por outros animais.
Ou, ainda, eram protegidos pelas galinhas, que os aproveitavam para chocar. Quando a
família menos esperava, daquele ninho cheio de ovos saía uma galinha-choca a caminhar
lentamente pelo pátio, rodeada de pintinhos amarelos, pretos ou de cores variadas.
Dificilmente seriam pintinhos brancos, como os “frangos atuais”. Cresciam devagar e
somente depois de 12 a 15 meses eram carneados para servirem de refeição. No dia a dia
essas aves eram tratadas manualmente, assim como os demais animais, marcando vivências
do homem com os animais e, de ambos, com a natureza. Os frangos atuais, nascem da mesma
cor, são criados “em série” e tratados mecanicamente. Esses frangos, perderam o colorido das
penas e da vida, carneados que são logo após terem nascido, ou seja, são abatidos em torno de
40 dias de vida
325
.
O espaço rural vai, porém, se modernizando e mostra mudanças. Um aspecto das
mudanças a mencionar pode ser percebido na fotografia da ceifadeira, que acelera os
trabalhos no campo, associados às vivências que indicam a presença familiar e a busca pela
manutenção da existência.
5.2.5.6 Momentos inesperados – as tragédias
As fotografias desse tema seguem o seguinte padrão:
324
MACCARI, Neiva Salete Kern. Entrevista concedisa a Lucia Teresinha Macena Gregory. Marechal
Cândido Rondon, 30 jun. 2009.
325
LORENÇON, Letícia. Avaliação de promotores de crescimento para frangos de corte de 1 a 42 dias de idade
utilizando rações fareladas e peletizadas. Marechal Cândido Rondon, 2005. Trabalho de Conclusão de Curso
(Curso de Zootecnia) – Unioeste. P. 5-6. Na introdução do trabalho é posto que: “Atualmente os promotores
de crescimento são os principais aditivos de uso na alimentação animal, em particular na dieta de aves. São
responsáveis pela melhoria na produtividade animal, principalmente nas fases iniciais de criação. A maioria é
constituída por antibacterianos utilizados em doses subterapêuticas por quase toda a vida do animal,
respeitando apenas o período de retirada antes do abate”. Quanto à metodologia utilizada na pesquisa, a autora
indica que “Foram utilizados 576 pintos de corte [...], provenientes de matrizes com 55 semanas de idade”.
Segue o trabalho: “As rações experimentais foram formuladas [...] para as fases de 1 a 21 (inicial); 22 a 35
(crescimento) e 36 a 42 (terminação) dias de idade”. As fases de dias de idade das aves indicam, portanto, a
precocidade da vida dos frangos criadas atualmente.
329
espaço fotográfico: foto média, instantânea, sentido horizontal, central, três e
quatro planos, tudo no foco, arranjo e equilíbrio, linhas bem definidas, com
contraste e sem sombra;
espaço geográfico: espaço natural e artificial;
espaço do objeto: natural e, de interiores, relacionados aos objetos de estúdio;
espaço da figuração: individual, seguida do grupo misto, notadamente dos casais de
noivos.
No tema tragédias, os momentos de acidentes apresentam uma superioridade da
presença masculina. Isso mostra um envolvimento maior dos homens nesse tipo de
compromisso, passando ele a assumir a direção do automóvel, da carroça, da bicicleta, a fazer
atividades no espaço externo à casa. Interessante observação pode ser feita sobre a presença
da figuração feminina, que se faz maior em espaços mais reservados e privados, em relação à
presença da figuração masculina. Esta se faz presente, além do espaço privado, com maior
visibilidade, nos espaços públicos, tendo em vista as funções inerentes ao masculino,
principalmente no início da colonização, o que fez com que ele estivesse à frente dos
negócios, dirigisse os meios de transporte, assumisse os cargos políticos.
Além de festas, celebrações ou trabalhos, há registros de tragédias. Na vida simples, a
necessidade da convivência com uma realidade cruel e fatal foram momentos que marcaram
as fotografias de acidentes e de mortes, motivadas, entre outras causas, por imprudência ou
por inexperiência para com determinadas circunstâncias, a exemplo do trânsito ou da
derrubada da mata, acidentes com espingardas mal carregadas, como, ainda, por outros
problemas não “identificados”. Írica comenta que, para enfrentar animais grandes e fortes, a
exemplo de uma onça, as pessoas colocavam muita munição no cano da espingarda e esta, ao
ser acionada, “espalhava chumbo pelo rosto, horrível isto, olha num ano, nós registramos três
casos de mortes deste tipo”
326
. A fotógrafa mostrou indignação e comentou que já não
gostava nem de acompanhar os chamados para registrar acidentes.
Conforme já se colocou anteriormente, jornais também mostram e comentam
problemas desse tipo, fazendo menção, às dificuldades, mas logo passa a enaltecer o pioneiro,
o migrante, o agricultor, dando-lhe o mérito de participar do desenvolvimento da cidade e do
interior.
326
KAEFER, 19 ago. 2009, op. cit.
330
5.2.5.7 Festividades
As fotografias desse tema seguem o seguinte padrão:
espaço fotográfico: foto média, posada, sentido horizontal, central, três e quatro
planos, tudo no foco, arranjo e equilíbrio, linhas bem definidas, contraste marcado
e sem sombra;
espaço geográfico: espaço natural e artificial;
espaço do objeto: natural e de interiores relacionados aos objetos de estúdio.
espaço da figuração: individual, seguida do grupo misto, notadamente dos casais de
noivos.
As fotografias de grupo falam de família e de festas principalmente, onde também os
amigos e vizinhos são enquadrados, com suas vestes festivas, mesmo que simples, às vezes. A
ambientação se fez variada, mostrando os figurantes tanto em ambientes de interiores e
artificiais até em os espaços externos e naturais, que, em algumas circunstâncias, foram
mesclados com objetos artificiais. Nas festividades está representada a presença e a
participação de homens e de mulheres de forma equilibrada.
5.2.5.8 Participando da educação e do civismo
As fotografias desse tema seguem o seguinte padrão:
espaço fotográfico: foto média, posada, sentido horizontal, central, três e quatro
planos, tudo no foco, arranjo e equilíbrio, linhas bem definidas, número igual entre
fotos com sombra e sem sombra, com contraste;
espaço geográfico: espaço natural e artificial
espaço do objeto: natural e de interiores, relacionados aos objetos de estúdio;
espaço da figuração: individual, seguida do grupo misto, notadamente dos casais de
noivos.
Quanto aos objetos incluídos nas fotografias, há também aqueles relacionados com as
manifestações de cidadania e de patriotismo, feitas nos momentos de desfiles cívicos e
políticos. Cabe lembrar que a presença do feminino e do masculino se faz de forma
equivalente em ternos de percentuais nesses espaços de vivências, porém varia quanto aos
331
locais onde essas presenças se fazem, podendo-se destacar a presença feminina no espaço da
educação e desfiles. É ela a professora ou a menina que está encarregada de alguma função
nesses momentos. A presença masculina é, contudo, maior nos momentos cívicos, quando se
trata de manifestações políticas.
Nas fotografias sobre formaturas, que enquadram individualmente o masculino ou o
feminino, estão representados valores associados ao conhecimento e à qualificação das
pessoas. Na veste especial, um toque especial da fotógrafa. “Mas olha só, esta parte aqui.
Olha, eu vi as fotos do seu Gasa e ele fazia bem as fotos. Então, eu já tinha umas roupas
parecidas, mas eu não tinha esta parte da capa e deste babado. Como é que se diz: então, eu
fiz à mão esta parte branca, bem no capricho. Eu comprei em metro e fui pregando...”. Írica
faz referências às vestes de formatura. Já possuindo algumas peças de roupas características
para o momento da formatura, passa a orientar-se e verificar o modelo de peças usadas por
Heribert Hans Joachin Gasa. Gasa, nascido na Alemanha, veio para Rondon em 1961. Entre
outros afazeres, como os de ótico, ele também passou a fotografar. Assim, Írica copiou o
molde da capa preta e do peitilho branco das peças usadas pelo seu Gasa, para melhorar as
vestes usadas nas fotos de formatura em seu estúdio.
O momento cívico relacionado à foto 165, referente à vinda do presidente Geisel a
Marechal Cândido Rondon, é um exemplo característico dessa situação, uma vez que se pode
ver que o palanque oficial da cerimônia está ocupado pela presença masculina. O jornal que
cobre a vinda da autoridade máxima da Nação menciona a presença de autoridades civis,
políticas, empresariais, proprietários rurais, em que são enaltecidos nomes do público
masculino. A presença feminina foi até destaque em foto com o presidente, quando a
autoridade foi presenteada com um pé de soja por jovens recepcionistas da Copagril. Usando
chapéu e com o rosto bem à vista, certamente, puderam ser reconhecidas pelos leitores, porém
nenhuma alusão ao nome das moças foi feita por esse meio de comunicação
327
.
Entende-se que as comemorações cívicas reforçam vivências. Assim, além das
festividades religiosas, os momentos de comemoração do aniversário do município e de datas
cívicas são exemplos de registros fotográficos a considerar, pois ocorre todo um envolvimento
e ornamentação para essas ocasiões. As pessoas vivem e revivem vivências através da
montagem do espetáculo e da observação dos desfiles alegóricos. Assim, também, procuram
mostrar, através das vivências locais, relações com eventos e autoridades políticas estaduais e
nacionais. São marcos significativos e de repercussão, primeiro, a 1ª Exposição Agropecuária
327
RONDON COMUNICAÇÃO. Marechal Cândido Rondon, Ano 3, n. 102, p. 9, 27 mar. 1976.
332
e Industrial de General Rondon, em 1958, depois as vindas de deputados, de governadores e
de ministros, por diversas vezes, e, por fim, a presença do presidente General Ernesto Geisel,
em 1976, em Marechal Cândido Rondon.
Nas mensagens transmitidas através das faixas carregadas e expostas nos desfiles e nas
falas dos discursos pronunciados pelas autoridades políticas afloram as vivências patrióticas
locais, tais como “viva o Brasil”, “Integração Nacional”. Assim, as manifestações privadas
juntam-se às manifestações públicas e gera-se uma integração do grupo com a própria nação.
As pessoas, assim organizadas, passam a se verem, efetivamente, como parte do povo
brasileiro.
5.2.5.9 Espaço da figuração
Na relação entre fotos de grupos e de indivíduos, constata-se um registro maior de
fotografias de grupos, num enquadramento no sentido horizontal, direção central, formando
linhas simples ou duplas.
Nota-se nas fotografias, quanto a relação entre espaço feminino e masculino, a
presença de crianças a desenvolver atividades. A situação é constatada também em páginas de
jornais. O Departamento de Educação e Cultura divulga uma nota no jornal
328
da cidade onde
solicita aos professores, pais e responsáveis pelos alunos, para que “façam com que os
mesmos participem das aulas, não faltando pelo motivo da colheita da soja”, pois a falta às
aulas poderia vir em prejuízo mais tarde.
Matéria desse teor é indício de que havia um envolvimento significativo das crianças
nas tarefas da lavoura, interferindo na presença delas nas aulas
329
, visto que ocorre, nesse
anúncio, um apelo do departamento de educação municipal para que os pais façam um esforço
e mandem seus filhos para a escola. Os responsáveis do departamento procuram mostrar a sua
preocupação para com esse fato, alertando, através da nota da imprensa, inclusive os
professores das escolas, procurando, também, atingir a própria comunidade.
328
RONDON COMUNICAÇÃO. Marechal Cândido Rondon, Ano 1, n. 6, p. 3, 27 abr. 1974.
329
ELFES, op. cit., p. 18. No item correspondente ao “ensino” informa sobre a educação dos jovens em
Marechal Cândido Rondon. Considerada quanto à alfabetização, “quase completa... mas o número de alunos
vai diminuindo de série em série, de forma que a quarta série é freqüentada por apenas 32% dos alunos que
participaram do início do curso [...]. Na medida em que crescem os filhos dos lavradores, êles têm que
começar a trabalhar na roça... Os cursos secundários são freqüentados atualmente por cêrca de 10% dos
jovens em idade correspondente”.
333
Por fim, entende-se que os temas analisados mostram, através das diferentes
manifestações, ou seja, através das vistas de paisagens, da estrutura urbana e rural, dos
registros feitos em diferentes ambientes, quer internos, quer externos, naturais ou artificiais,
aspectos de conformações diversas que foram captadas e se revelaram de uma forma e que, no
decorrer da construção do acervo, indicam as transformações ocorridas nesse contexto
espacial. Ainda, a análise dos objetos mostra a relação da figuração associada a diferentes
bens, ou seja, aos objetos e às pessoas que se relacionam no campo fotográfico e às vivências
a elas associadas. Nesse sentido, as fotografias tornam-se suporte de memória de Írica Kaefer,
que, ao abrir “as caixas do depósito”, tornou visível a composição fotográfica produzida e
preservada pela Foto Kaefer. Através das entrevistas, a fotógrafa, juntamente com outras
pessoas entrevistadas e que rememoraram parte da suas vivências através das observações
sobre as fotografias, ampliaram a visibilidade dos documentos fotográficos, conferindo-lhes
um lugar de memória. Na história de cada fotografia estão registrados elementos culturais
vivenciados e que constroem identidades.
5.2.6 COLORINDO REGISTROS E VIVÊNCIAS
Apresenta-se, neste item do espaço das vivências, a análise feita sobre as fotografias
coloridas. Considerando-se que o acervo está constituído de 405 fotos coloridas,
selecionaram-se, por amostragem, 49 fotografias para a análise. No caso dessas fotos
coloridas, apresentam-se os dados levantados no decorrer do texto. Considera-se que há um
número menor de fotos analisadas nessa série, contudo valoriza-se a presença dos exemplares
de fotografias coloridas no acervo de Írica Kaefer. Conforme se mostrou no Quadro 6, os
temas estão assim constituídos, entrando na análise, por amostragem, da mesma forma que se
procedeu com as fotografias preto e branco, na seguinte proporção: “Vistas Locais e
Paisagens”, 23 fotos e analisadas, três; “Retratos”, 79 fotos e analisadas, cinco; “Religião”, 40
fotos e analisadas, três; “Produção”, 2 fotos e analisadas, duas; “Festividades”, 73 fotos e
analisadas, cinco; “Educação”, 143 fotos e analisadas, cinco; e “Civismo”, 57 fotos e
analisadas, cinco fotos num total de 247 fotos sendo analisadas 28 fotos. Não ocorreu
atribuição de fotografias para os temas “Tragédias” e “Esporte” nas fotografias coloridas.
334
5.2.6.1 A expressão fotográfica na produção de fotos coloridas
As fotografias coloridas, quanto à forma da expressão, mostram o predomínio de fotos
para o tamanho médio, feitas no tamanho 9x12,5 cm e no tamanho 10x15 cm, sendo
considerada a foto 10x15 cm do tipo postal. As fotos coloridas também se apresentam com
contraste no foco, com linhas bem definidas, equilíbrio de sombras, central, sentido
horizontal, quando foto de grupo, ou na vertical, para foto individual. Cabe, no entanto,
lembrar as referências que Írica fez, mostradas no capítulo 3, sobre as dificuldades que
passaram para obterem bons resultados com essa nova técnica e que as primeiras revelações
das fotografias coloridas, enviadas para Curitiba, eram feitas na Alemanha.
5.2.6.2 Investindo no retrato colorido
Observações sobre a oposição natural x artificial, nas fotografias coloridas, apresentam
um predomínio de fotos posadas e em ambiente artificial. São as fotografias relacionadas com
retratos, feitos no estúdio novo e outras, em menor número, feitas em cerimônia religiosa de
comunhão e em bailes de carnaval.
Foto 183 - Menina no estúdio novo
Acervo e autoria: Foto Kaefer. Década 1970/80.
335
A fotografia feita no estúdio novo (Foto 184) é uma demonstração da qualidade da
foto colorida. As cores diferentes nas listras da blusa reforçam a nitidez da foto. O fundo liso
harmoniza o enquadramento. A direção do olhar da menina, para a câmara, a cor dos olhos
com contornos, bem demarcados e sem sombra, dão vida à personagem. Observar a fotografia
é como sentir o inverso da ação, pois não é difícil perceber-se do outro lado e sendo
contemplado pelo olhar sereno da menina. É o momento do resultado final. O fotógrafo sai de
cena e, para um novo diálogo com a personagem, entra o observador/pesquisador.
Com o advento da fotografia colorida, no início da década de 1970, as fotografias de
retrato no estúdio continuam sendo procuradas pelas famílias. As fotos que predominam são
os retratos de crianças e de adultos, que fazem pose individualmente. A foto do personagem
passa a ser colorida, nos diferentes tons que objetos e vestes trazem. Também a cor da pele,
dos olhos e dos cabelos, antes identificadas principalmente pelos tons preto, branco e cinza,
agora recebem coloração em tons levemente amarelados, castanhos, azul, vermelho,
dependendo do objeto e dos personagens captados pela câmara. O cavalinho passa a ter mais
vida com o vermelho do nariz e da boca. As flores dos vasos mostram seu colorido, assim
como os planos de fundo, o que depende da estampa ou do liso da cortina. Os quadros
pendurados nas paredes, hoje guardados e desbotados no depósito, quando enquadrados nas
fotos, mostram o colorido de uma paisagem natural. Quando surgiu, a fotografia colorida se
tornou mais cara em relação à fotografia preto e branco. A situação fez com que, no mesmo
evento, fossem divididos os filmes a serem usados, sendo feito uma parte das fotos em preto e
branco e outra, no colorido. Mesmo assim, as fotografias coloridas tiveram a sua retirada
garantida e, embora alguns exemplares tenham sido eliminados e descartados, permanecem os
405 exemplares nas caixas do acervo.
5.2.6.3 Manifestações cívicas e religiosas
A oposição externo versus interno em relação aos registros coloridos mostra um
predomínio de registros no espaço público, com o grande grupo, considerando-se fotos feitas
em torno de momentos festivos, especialmente de formaturas ou de carnaval, em ambiente
interno. Predomina, porém, o registro feito no estúdio. Algumas imagens mostram momentos
de batizados, em igrejas.
A fotografia colorida, no que se refere à oposição entre espaço urbano versus espaço
rural, apresenta fotografias feitas em espaço urbano, repetindo, em termos de temáticas,
336
situações de registro feitas em preto e branco. Assim, seguidos dos retratos, os momentos
sobre educação e civismo são os mais registrados.
Foto 184 – Desfile cívico.
Acervo e autoria: Foto Kaefer. Marechal Cândido Rondon. 1973.
O desfile (Foto 185) mostra um momento de integração entre vivências com sinais
rurais e urbanos. A rua onde o desfile acontece já está asfaltada e, atrás do público, que está
posicionado no centro da foto, a calçada se faz saliente. No lado esquerdo da foto, uma parte
do poste de concreto mostra que os primeiros suportes de fios, feitos de troncos de madeira, já
foram substituídos. Ao fundo, na parte superior da foto, a casa de madeira permanece,
enquanto o sobrado de alvenaria se ergue, ao lado dela. Ambos os imóveis têm relação com
atividades comerciais, o que indicam as placas nas fachadas, o tamanho das portas e a vitrine
da casa de alvenaria. Um aspecto referente às duas construções pode ser observado em relação
à altura, pois o telhado da de madeira alcança boa parte do andar de cima da construção de
alvenaria. Entre uma e outra, nada mais restou, nem arbustos, nem espaço para calçada e
sequer um trilho de chão de terra foi deixado.
Nessa imagem de desfile, o objeto central enquadrado foi o veículo enfeitado, que
carrega mensagens e pessoas envolvidas no evento e encarregadas de mostrar alguns aspectos
da cultura brasileira. O “carro-chefe” desse quadro é um trator. O trator, de uso em espaço
rural, deixa a roça, para agregar-se às atividades, no momento, desenvolvidas em espaço
urbano. O tratorista, talvez, tenha sido preparado por algum dos cursos realizados através da
Secretaria da Educação. Afinal, ali está ele dirigindo trator em pista de asfalto, com pessoas
em cima de um carroção, mais conhecido como gaiotão, adaptado para o desfile. Para o
337
momento, deixou a veste de trabalho no ambiente rural e usa vestes de sair. Ainda, entre o
trator e a parte do gaiotão, está posicionada, em pé, uma garota, talvez aluna, usando botas,
minissaia, blusa de mangas fofas e chapéu, que faz desse espaço a sua participação no desfile.
E, dos dois lados da rua por onde cruza o trator, está o público, que acompanha o evento.
As pessoas, que estão ali, podem observar, além do mapa do Brasil, a representação de
diferentes tipos de brasileiros. Deles, um usa chapéu, outros usam tiara com penas, indicando
representarem índios, e outra pessoa está sem nada na cabeça. Associada ao fato do evento
cívico, eis uma oportunidade de transitar com um trator em espaço urbano, numa
demonstração de que o campo está se modernizando. O espaço rural, adotando novos
equipamentos, mostra sua opção pela adoção de novas tecnologias apresentados para o
desenvolvimento das atividades no meio rural. A imagem da ceifadeira (Foto 105), por
exemplo, da lavoura limpa, a preparação dos agricultores para manusear as máquinas torna-se
um espaço preparado e que acelera as atividades também no espaço rural.
Ao tema religião estão associadas 40 fotografias coloridas realizadas em ambiente
interno e externo de igrejas. Os eventos estão associados à celebração de comunhão, com
registros feitos principalmente do grande grupo, em frente de igrejas, e de batizados, sendo
estes realizados dentro de igrejas.
Foto 185 – Batizado
Acervo e autoria: Foto Kaefer. Década 1970/80.
A fotografia de batizado (Foto 186) mostra aspectos da vivência religiosa. A
manifestação do batizado mostra, também, relações de compadrio e de amizade. Indica
também a integração entre pessoas de cor escura com pessoas de cor branca, uma situação que
338
não raras vezes trouxe dificuldades para moradores da região, especialmente para os
considerados negros, num espaço predominantemente habitado por descendentes de alemães e
italianos. A madrinha segura o nenê quando este recebe as águas do batismo através do padre,
considerado o representante divino. As vestes são boas, de sair. O padre realiza o ritual em
suas vestes sacerdotais. Embora a coleção de fotos antigas de Írica apresente um sinal desse
tipo de registro, o que se percebe em número reduzido, a imagem desse batizado indica que
um novo assunto e novas formas de enquadramento passam a se integrar aos registros. Na
fotografia preto e branco apenas a criança batizada e a mãe ou madrinha eram registradas. Já
mais tarde, o ritual do batismo passa a ser objeto de fotografia produzindo-se outras imagens e
outros significados. A pia batismal, a água sobre a cabeça do batismando, a presença dos pais,
padrinhos e sacerdote são elementos que passam a compor o quadro religioso.
5.2.6.4 Nos casamentos, as cores exibem novas poses e novos objetos
Nas fotografias coloridas, o espaço dos objetos enfatiza os objetos do estúdio novo, o
sofá estofado, o cavalinho, as flores, eventualmente parte dos quadros sobre paisagem fixados
na parede, pois, como se trata de fotos, na maioria, individuais, o enquadramento se faz direto
para a pessoa. Algumas fotografias mostram alterações nos objetos e atributos das pessoas nos
registros feitos em ambiente interno, o que mostra a Foto 186 relacionado com batizado.
Também em relação aos objetos, no enquadramento de fotos coloridas, ocorre a superioridade
de objetos artificiais e de interiores em relação aos naturais e de exteriores.
O jogo de latas para mantimentos, o jogo para café, assim como a cama e o criado
mudo são uma exceção no espaço do objeto. Os noivos, nesse caso, fazem pose junto aos
presentes que receberam e que estão expostos pela cama, junto ao jogo de quarto. A opção por
escolher um novo ambiente fotográfico, o quarto, mostra um espaço diferenciado na
fotografia de casamentos. Mostra certa liberdade, um diferencial, por parte dos noivos, para o
ato fotográfico. A escolha de um ambiente diferenciado mostra maior liberdade na definição
dos espaços fotográficos e, em momentos posteriores ao dos registros em preto e branco,
noivos e fotógrafos enquadram poses, por exemplo, em jardins e praças. No ambiente interno,
como salões de festa, a alteração se faz com o enquadramento de novos figurantes, pois não
são feitas, somente, fotos dos noivos, pais ou padrinhos. Passa-se a enquadrar os convidados
em geral, junto às mesas ou em grupos e com menos formalidade.
339
Foto 186 – Casal de noivos
Acervo e autoria: Foto Kaefer. Marechal Cândido Rondon. Década de 1970.
O que pode ser percebido na Foto 187, feita em espaço externo, são os novos atributos
das pessoas e da própria paisagem. O casal de noivos faz uma pose ao lado do carro Ford
Corcel, que os leva para o local da cerimônia e da festa de casamento. A posição do sol gera a
sombra do carro, escurecendo a parte inferior das vestes dos figurantes, nesse registro, feito
em espaço natural. O noivo veste um terno claro, usa gravata e camisa. Sapatos? Certamente
os usa, porém o comprimento da calça provoca um leve amontoado de tecido sobre a altura
dos pés, prejudicando a percepção sobre os calçados do noivo em meio ao gramado. O vestido
branco e longo da noiva também alcança o gramado, onde estão posicionados. Esta, usando
véu e grinalda, segura uma rosa vermelha na mão esquerda e faz um gesto de apoiar-se com a
outra mão na porta do carro amarelo, que está com a porta aberta, do lado dos noivos. Uma
faixa preta, em forma de listra, percorre o carro na altura logo abaixo dos vidros. A noiva
mostra um rosto alegre, enquanto ele, de bigode, parece “incomodar-se” um pouco com o sol.
Ao fundo, ainda, podem ser vistas algumas construções e árvores. Mesmo que os figurantes
estejam fazendo pose, o enquadramento é diferente daquelas fotos estáticas feitas no estúdio.
Percebe-se, através desse tipo de foto, que a forma de fazer fotografia está mudando,
340
permitindo maior liberdade nos gestos dos figurantes, percebendo-se, por parte da noiva, a
simulação de um movimento de estar entrando no carro.
Foto 187 – A dona da casa
Acervo e autoria: Foto Kaefer. Marechal Cândido Rondon. Abril de 1977.
Decorridos três anos da data do registro fotográfico, feito da parte externa da
residência
330
, a dona da casa (Foto 188), uma senhora de meia idade, faz um registro da sua
cozinha, ou seja, da parte interna. Os objetos de interiores são vários. No canto inferior, à
direita, um guardanapo feito de crochê, semelhante ao que está sobre a mesa. Os guardanapos,
feitos à mão, são um símbolo de capricho e de poder das mulheres, que, com esses adereços,
enfeitavam os móveis da casa. Sobras de tecidos eram alinhavadas e costuradas e recebiam
pinturas e crochês em sua volta, para servirem como guardanapos. Eram feitos joginhos, com
três ou cinco guardanapos do mesmo desenho ou tipo de ponto/crochê, com um detalhe
quanto ao tamanho. Cada guardanapo aumentava um pouco de tamanho, o que formava o
jogo de guardanapos. O jogo de três peças era destinado para uso no quarto, um para cada
“criado mudo” ou bidê e outro para a penteadeira. O outro jogo era usado na sala ou na
cozinha, em cristaleiras, armários com portas de vidro, geladeiras, mesas, etc.
A senhora usa veste boa, em tons avermelhados, semelhante à cor do conjunto de
mesa. A mesa, agora, é de fórmica. As cadeiras de fórmica são estofadas. O suporte das
cadeiras e as pernas da mesa são de aço e pintadas. Acompanha o jogo a cristaleira vermelha
colocada na parede à direita da foto. Ao fundo, uma janela de vidro e uma veneziana servem
para deixar a casa duplamente fechada. Abaixo da janela, um balcão com pia para lavar a
louça, com duas portas e com quatro gavetas, aparentando ser, também, de fórmica. Atrás do
balcão, protegendo a parede da água e da sujeira, foi afixado um pedaço de pano ou de
plástico. Na parte esquerda da foto estão colocados o fogão a lenha, branco, e, atrás dele, já
330
Acervo Írica Kaefer. Fotografia nº 17, caixa 34, não incluída da análise.
341
está o fogão a gás, azul. Vários objetos de cozinha ainda estão enquadrados, a exemplo do
suporte afixado na parede, logo acima do fogão a gás. A cozinha está rigorosamente
organizada, combinando com a ordem transmitida pelas listras do assoalho. A parede, toda
pintada e limpa, produz reflexos, assim como a chaleira e a chaminé do fogão a lenha. O
fotógrafo procurou, portanto, enquadrar tudo, do teto ao assoalho, de uma parede à outra. E a
dona da casa? Ali está posicionada, segurando uma cuia de chimarrão, objeto de significativo
valor nas tradições do sul do Brasil. Através desses objetos estão representados não apenas o
avanço das técnicas da fotografia, mas, também, o surgimento de objetos e de utensílios com
novos tipos de materiais e novos coloridos na década de 1970. Através do colorido das
imagens, percebem-se, aos poucos, mudanças nas poses, nos gestos mais livres e, em alguns
casos, uma liberdade maior na expressão facial.
5.2.6.5 Novos elementos culturais nos espaços da figuração
Nas fotografias coloridas predominam as fotografias individuais, feitas no sentido
vertical, no estúdio. Nas fotografias em grupo, o registro se faz no sentido horizontal, sobre
carnaval e em momentos de desfiles cívicos.
Foto 188 – Menina com Rainha do Carnaval 1987 Foto 189 - Mulheres e crianças no Carnaval 1987
Acervo e autoria: Foto Kaefer. Marechal Cândido Rondon. Carnaval de 1987.
A fotografia 189 é um momento de desfile de Carnaval, dando destaca à Rainha. O
evento movimenta o Clube Concórdia, um dos principais clubes da cidade. A programação
342
em torno do carnaval (Fotos 189 e 190) envolve grupos mistos, com adultos e crianças.
Famílias participam da folia, além de fazerem torcida para os diferentes blocos que desfilam.
Eventos em torno do carnaval já aconteciam nos fins da década de 1960 e se intensificaram
nas décadas de 1970 e 1980.
Com relação aos objetos, as vestes de carnaval, agora, são mais sofisticadas. As
mulheres desfilam com sapatos de salto alto, são enfeitadas com plumas e outros adereços
com brilho. As crianças também usam vestes coloridas, babados com detalhes e flores no
cabelo. Confetes são jogados pelo salão. Várias fotos da coleção
331
mostram o desfile dos
blocos, que fazem encenações referentes ao tema escolhido pelos grupos. Desfilam com
bandeiras do município, bandeirinhas com as cores da Alemanha, num sinal de tributo às
questões germânicas locais, além de bandeiras características confeccionadas pelos blocos
332
.
Os temas apresentados pelos blocos reportam-se a aspectos culturais ou econômicos de
âmbito local e nacional
333
. Uma referência à ambientação local é a criação do bloco “Colô no
Samba”
334
, numa alusão ao colono, um personagem real que integra o espaço local.
Após a realização do evento carnavalesco, o jornal O Alento
335
passa a anunciar
resultados do carnaval, indicando blocos vencedores e outras categorias premiadas. O bloco
“Colô no Samba”, também nomeado por “Academia de Samba de Colono”, é o destaque do
carnaval de 1980, levando o título de campeão. O sucesso desse bloco, com seus integrantes
usando chapéu na cabeça e carregando sacos nas costas, representando a lida no meio rural,
sugere que novos elementos passam a integrar manifestações culturais. O carnaval motivou os
foliões a caracterizar o colono, denominação dada ao camponês, proprietário de uma área de
331
Fotos coloridas e em envelopes. Pasta “Festividades - Carnaval’.
332
O ALENTO. Marechal Cândido Rondon, Ano 1, n. 25, p. 9, 01 a 07 fev. 1980.
333
O ALENTO. Marechal Cândido Rondon, Ano 1, n. 27, p. 1, 15 a 21 fev. 1980. A manchete anuncia:
“Carnaval no Concórdia inicia amanhã”. Uma foto é acompanhada de legenda: Sandra R. Hoffmann,
escolhida como “Rainha do Carnaval/80” -- numa referência ao baile ocorrido no Clube Concórdia. No centro
do jornal, ocupando as duas páginas, o espaço da “agenda social” anuncia “especial de carnaval”. O texto
jornalístico é eliminado, apenas legendas e um destaque para 18 fotos sobre carnaval, divididas entre fotos do
ano anterior, dão destaque para a Rainha e o Rei Mono 79, para a mesa de jurados e o baile de escolha da
rainha do carnaval 80, para o público e músicos que acompanharam os foliões. Os diferentes blocos, “Os
Madrugas, Bloco 3.001” representam diferentes entidades sociais tais como AACC, as rádios Educadora e
Difusora, a Assemar.
334
O ALENTO. Marechal Cândido Rondon, Ano 3, n. 127, p. 12, 16 a 22 abr. 1980.
335
O ALENTO. Marechal Cândido Rondon, Ano 1, n. 28, p. 1, 22 a 28 fev. 1980. Os jornais nº 27 e 28 dividem
as notícias de capa, anunciando e divulgando foto de uma carnavalesca. A página central do jornal novamente
destaca, com 19 fotos, o carnaval/80. As legendas e fotos indicam a realização de desfiles de rua com a
presença de “os palhaços”; do “Bloco os Petrodólares”, Bloco “Os Madrugas”, campeã de rua, bloco “Unidos
Tropical”, bloco “3 Fazendas”, foto com o discurso do prefeito, entre outros carnavalescos fantasiados que
não integravam oficialmente algum bloco. As “matines infantis”, blocos e desfile de rua mostravam moças
sentadas em cima dos carros. Uma das legendas ao lado de uma foto indica: “Aqui, representantes do bloco
campeão (Academia de Samba de Colono) interpretam a música e a letra que lhes auxiliou a conquistar o
troféu giratório”. As manchetes e fotos mostram a organização e preparação em torno do carnaval que
procurava dar premiação ao melhor bloco, melhor fantasia e ainda, ao “casal mais animado”.
343
terra, que, com a mão de obra familiar, produzia para a subsistência e para o mercado. Na
década de 1980, participava da modernização agrícola. Essa realidade motivou assunto para o
samba do carnaval.
As notícias dos jornais, porém, conforme indica a mesma capa que anuncia os festejos
carnavalescos, mostram, além de informes econômicos, que, em meio aos eventos festivos, a
sociedade vivencia momentos problemáticos envolvendo brigas e mortes, conforme mostra a
capa. São situações que não deixam de coexistir na vida das pessoas.
Foto 190 – O Bloco carnavalesco “Colô no Samba”
Acervo Cepedal. Foto na parte inferior da capa do jornal O Alento
336
. MCRondon. Abril de 1982.
A movimentação em torno do carnaval parece ser atraente, pois o jornal seguinte ao da
data da realização da festa, em manchete de capa e ao lado de foto, destaca: “Aqui,
representantes do bloco campeão (Academia de Samba de Colono) interpretam a música e a
letra que lhes auxiliou a conquistar o troféu giratório”. Ocorrem circunstâncias em que os
foliões identificam o bloco através das vestes, de faixas e de cartazes. Conforme já se
mencionou, fotos não incluídas na análise mostram blocos e foliões identificados com dizeres,
tais como: “Malandro Moderno”, “Bloco 3001”, bloco “Coroa Brastel”, “Os Petrodólares”.
336
O ALENTO. Marechal Cândido Rondon, Ano 3, n. 127, p. 1, 16 a 22 abr. 1980. Capa.
344
Este último, com integrantes vestidos no estilo árabe, lembram a crise proporcionada pela
elevação dos preços do petróleo que influenciava na balança comercial brasileira da época.
As fotografias da coleção, assim como as notícias de jornais em torno do carnaval, são
indicações de vivências que envolveram autoridades, a comunidade, entidades locais,
representadas através de blocos e de porta-estandartes. A imprensa, ainda no mês de março
337
,
divulga mais 18 fotografias sobre o carnaval. Na mesma página central, em um anúncio,
oferece: “Fotografias do carnaval? Procure a Foto Kaefer, ao lado da Casa das Bicicletas, e
faça a sua encomenda.” A propaganda é uma indicação do empreendimento Kaefer e dos
registros que a mesma fez sobre o evento. Assim, portanto, nas fotografias sobre o carnaval,
na especificidade dos objetos e dos adereços a ele agregados estão representadas vivências
dos grupos a eles vinculados, numa manifestação de integração com a comemoração que o
país realiza nessa época de início de cada ano. As fotografias fazem parte das atividades
desenvolvidas pelos Kaefer, que captaram diferentes formas, gestos, expressões e mensagens,
num propósito de registrar cada bloco, cada personagem, cada momento desse evento.
5.2.6.6 Relação entre espaço feminino e espaço masculino
Nas fotografias coloridas, observando-se a relação entre o feminino e masculino, a
situação da divisão do grupo ainda é percebida em algumas ocasiões, como nas fotos sobre
comunhão. Já temas que apresentam aspectos sobre educação mostram registros onde as
meninas e os meninos se posicionam de forma alternada e sem separação por critério de
gênero.
337
O ALENTO. Marechal Cândido Rondon, Ano 1, n. 28, p. 1, 22 a 28 fev. 1980. A legenda abaixo de uma das
fotos esclarece o episódio - “Uma cena de grande significação: após ter sido “assassinado” pelo seu filho
Brutus, o imperador César ainda é pisoteado. O espetáculo foi muito bem representado pelo Bloco 3
Fazendas”.
345
Foto 191 - Crianças em momento da confirmação.
Acervo e autoria: Foto Kaefer. Igreja Evangélica “Cristo”- MCRondon. Década de 1970/80.
Considerando-se o registro de fotografias coloridas a partir da década de 1970, nota-se
que, nesse período, ainda se preserva, nas vivências religiosas, a separação entre os fiéis,
posicionando-se os meninos de um lado e as meninas de outro na preparação do
enquadramento fotográfico. A veste também é uma representação dos costumes religiosos da
época, considerando-se, no exemplo dessa foto, que à túnica branca estão associados sentidos
que reportam à pureza das crianças e o vínculo divino que se firma através da opção pelo
Sacramento da Comunhão ministrado pelo pastor, figura importante e que também se faz
presente na fotografia.
A presença quanto à ocupação dos espaços nas fotografias coloridas mostra equilíbrio
entre o feminino e o masculino, pois, conforme já indicamos, homens e mulheres são
registrados ou individualmente nos estúdios, sentido vertical, ou em grupo, quando participam
de eventos religiosos ou de desfiles cívicos, sentido horizontal, indicando o registro da
presença feminina e masculina em espaços públicos. A fotografia de uma dona de casa é um
exemplo raro de foto em espaço privado.
346
Foto 192 - Moça no estúdio. Foto 193 - Rapaz no estúdio
Acervo e autoria: Foto Kaefer. Marechal Cândido Rondon. Década de 1970/80.
A moça da fotografia 193, num enquadramento central, faz pose por entre folhagem
pintada artificialmente, sinal de que estão ocorrendo inovações no espaço fotográfico. Através
das mãos, a modelo se envolve com os longos fios da folhagem e cobre a parte superior do
corpo, que está sem blusa e deixa o sutiã à vista. Mostrando tranquilidade, o olhar
compenetrado não procura a câmara fotográfica, mas dirige-se para o lado direito da foto,
como que fitando o vazio.
O rapaz da Foto 194 senta-se na escada do estúdio e, num gesto de descontração, apoia
um dos cotovelos na parte da “varandinha” que acompanha a escada. Na veste tipo esporte, a
camisa estampada, o tênis azul da marca All Star e a pulseira vermelha do relógio de pulso
são representações de objetos da moda que chegam ao interior. O olhar do jovem que se
fotografa solitário é, agora, ainda mais triste daquele da foto que fez em pé, em outro
momento
338
, ao lado da coluna desse mesmo estúdio. Assim, portanto, tons variados, objetos,
poses e gestos diferenciados são representações da nova fotografia e indícios de novas
vivências.
338
Acervo Írica Kaefer. Fotos coloridas. Foto 17 da pasta “Masculino - estúdio novo”.
347
A oposição entre o espaço infantil e adulto, quanto às fotografias coloridas, mostra que
as crianças continuam a ser registradas em grupo, em momentos de comunhão, na escola, em
desfiles cívicos ou, ainda, individualmente, no estúdio.
Foto 194 - A menina e a professora Mirian.
Acervo e autoria: Foto Kaefer. Marechal Cândido Rondon. Década de 1980.
A professora Mirian (Foto 195) agacha-se até o chão para acolher a menina em
momento de formatura. O vestido branco, com bolinhas vermelhas, usado pela menina, faz
uma combinação com o sapato branco, com o pacote de presente vermelho e com o
certificado branco enrolado em forma de canudo. A professora usa uma saia ou short em
tecido jeans, blusa com meia manga e uma sapatilha. Ambas direcionam o olhar para a
câmara e mostram sorriso de satisfação pelo evento que estão a comemorar. Através do rosto
que sorri percebe-se certa facilidade em exteriorizar sentimentos. A pose descontraída indica
uma maior liberdade nos gestos e nos movimentos diante da câmara. Outro aspecto a
considerar é o motivo do evento. As crianças que, antigamente, iam para a escola a partir dos
sete anos de idade, agora vão para a escola mais cedo, participando do jardim ou do pré-
escolar. São novos elementos que entram na área da educação e alteram vivências. A criança
pequena, ao ir para a escola, passa a conviver com coleguinhas. Deixa mais cedo parte do
convívio familiar e passa a participar de eventos formais, a exemplo das formaturas da pré-
348
escola. São partes de vivências programadas e realizadas pelos adultos e acompanhadas pelas
crianças.
5.2.6.7 A vista da cidade
O acervo de fotografias, no que se refere às vistas locais e paisagens, apresenta um
número reduzido desse tipo de foto. Os poucos exemplares são, no entanto, mostras de como
a cidade cresceu e renovou aspectos da infraestrutura pública.
Foto 195 – Vista aérea parcial da cidade de Marechal Cândido Rondon
Acervo e autoria: Foto Kaefer. Marechal Cândido Rondon. Década de 1980.
A fotografia 196 é uma vista aérea de Marechal Cândido Rondon feita na década de
1980. Partindo exatamente do canto inferior esquerdo da foto, a Avenida Maripá mostra-se
arborizada e segue até alcançar as chácaras, vendo-se, já na parte superior da foto, o início da
área rural do município. Na parte inferior da foto estão centralizadas a construção do antigo
fórum (foi destruído por um incêndio) em forma de círculo, à sua direita uma parte do prédio
da Prefeitura Municipal e, à sua esquerda, instalações da TELEPAR. Informa-se que a Praça
Willy Barth, a mais antiga e mais conhecida da cidade, limita-se a esses estabelecimentos
públicos, tendo apenas parte de pontas de árvores incluídas na parte inferior da foto. No
centro e mais ao alto da foto, a construção alongada e na cor verde indica o Hospital
Fumagali. Avistam-se, em meio a esses estabelecimentos públicos, as ruas planejadas,
arborizadas e residências de moradores da cidade.
349
Enfim, através do trabalho com o acervo de fotografias de Írica Kaefer mostram-se
aspectos das vivências que identificam o grupo social que integra e interage no espaço de
Marechal Cândido Rondon e tem, nas fotografias, possibilidades de rever momentos e de
reavivar memórias.
6 CONCLUSÃO
O espaço sobre o qual nos debruçamos nesta pesquisa mostrou elementos da forma da
expressão e da forma do conteúdo registrados e preservados pela fotógrafa Írica Kaefer. Nesse
sentido, nas imagens, aspectos de interiores e exteriores, públicos e privados, naturais e
artificiais, mostram elementos culturais vivenciados pela sociedade que através de suas ações
no sentido de elaborarem a sua vida, modificaram e transformaram esse espaço. A presença
humana também se modificou, pois ocorreram investimentos político-administrativos para
que a região fosse ocupada. Os migrantes que vieram para o oeste do Paraná vieram
acompanhados de uma gama de objetos e aqui adquiriram outros os quais auxiliaram na
adaptação dos mesmos ao novo espaço e participaram das transformações locais.
Figurantes masculinos e femininos, adultos e infantis, individualmente ou
acompanhados foram sendo registrados mostrando características locais, a exemplo da divisão
entre a presença do masculino e do feminino, onde se posicionam homens/meninos de um
lado e as mulheres/meninas do outro lado, permanecendo separados para acompanhar as
atividades, no mesmo ambiente, ou seja, principalmente, escolar e religioso.
Os lugares mais representados foram, em primeiro lugar, o estúdio e, em segundo
lugar, os de vivências religiosas. Junto a esses migrantes, encontram-se o casal Kaefer. Assim
como tantas outras famílias que se mudaram para o oeste paranaense, os Kaefer também
vieram com filhos pequenos e tiveram uma filha e um filho nascidos em MCRondon. Com o
decorrer do tempo, com a ocupação mais intensa e já sentindo as transformações e,
procurando novos espaços para investir, alguns integrantes da família partiram em busca de
novos desafios enquanto outros permanecem na localidade.
Enquanto as luzes das câmaras da Foto Kaefer funcionavam, a vitrine era re-
organizada, as fotografias não retiradas, os copiões, amostras, moldes eram guardados em
caixas de papelão. Envelopes permaneciam misturados a essas fotos, com outras marcadas por
borrões de tinta ou com cálculos de contas a receber no verso dessas. Até que um dia, a casa
fechou as portas. As câmaras fotográficas, saindo das mãos dos profissionais da fotografia,
foram recolhidas e colocadas em uma estante. Perdendo sua função econômica, ficam
expostas em uma sala da residência. O estúdio novo tornou-se antigo. O espaço da antiga foto
Kaefer passou a servir para outros fins comerciais, como a de agência de turismo da Flay`s
Tur, que, também, fechou as portas, quando a filha, Irene, faleceu. Hoje, nenhum sinal visível
351
do estúdio fotográfico permanece naquele local, além da fachada que pode lembrar os Kaefer
e lá funciona a floricultura Paraíso das Flores.
No entanto, as mãos que souberam posicionar e enquadrar figurantes, objetos, fazer
reportagens, pesar e misturar os químicos e fazer boas revelações souberam, também,
valorizar o que foi reunido ao longo do tempo, um longo tempo que cobre quase 50 anos de
produção fotográfica. Mas o tempo passou e outro tempo chegou, pois o tempo não para. O
que parou, foram as impressões deixadas nas fotografias e hoje podem ser vistas, com outros
olhos, com outras finalidades, com outra luz. As imagens não perderam seu brilho visto que,
são iluminadas pela luz do documento/monumento nas quais se tornaram “as caixas do
depósito”, pela lembrança e pelo brilho dos olhos de quem as preservou, pela história que
trazem e pelas pessoas que vêem nestas imagens a construção da própria identidade. Enfim,
permanecem acesas, as luzes das vivências. Das vivências de quem fotografou e das vivências
dos espaços e dos objetos que acompanharam os figurantes, individualmente, ou
acompanhados, alegres ou tristes, felizes ou infelizes, com adultos ou com crianças.
Permanecem iluminadas as fotografias pela luz de quem já se foi mas pode deixar um sinal da
sua vivência em uma fotografia. Permanecem iluminadas, pela dor que quem se foi
tragicamente e na lembrança dos familiares. Permanecem iluminadas porque podem ser
reconhecidas como lugares de memória. Neste sentido, podem auxiliar na compreensão da
história, mostrando parte do seu passado, sugerindo e auxiliando a compreensão sobre o
presente, fundamentado planejamentos futuros para a sociedade. Assim, iluminando o futuro,
sua luz não se apagará.
A fotógrafa Írica mostrou no decorrer da pesquisa, especialmente das entrevistas, que
passou por inúmeras dificuldades. Migrantes, conforme testemunham as fotografias, também
passaram por desafios, trabalho intenso, diversões também, é claro. Porém, para algumas
famílias, acompanhadas de problemas, acidentes e mortes. Há que se considerar, em alguns
casos, desafios imprudentes, a exemplo de caças e pescarias feitas não apenas para a
subsistência, e sim, por diversão e exibição, desmatamentos exagerados, atitudes
inconseqüentes no trânsito. No caso de Írica, familiares que permanecem em MCRondon
continuam a desenvolver atividades na sociedade local enquanto que, uma das filhas já não
vive mais. Neste sentido, as fotografias preservadas no acervo de Írica Kaefer são uma
representação das vivências que acompanharam o grupo social que participou da construção
desse espaço.
Entende-se, enfim, que as fotografias podem servir para que as pessoas mais jovens e
os moradores atuais deste espaço, assim como pesquisadores e outros interessados nesses
352
registrados possam ter uma compreensão melhor sobre o trabalho e o envolvimento da
geração passada com este local. Aqui viveram antepassados e ainda vivem familiares de
grande parte da atual população.
Neste sentido, podem auxiliar na compreensão da história, mostrando parte do seu
passado, sugerindo e auxiliando a compreensão sobre o presente, fundamentando
planejamentos e projetos. Entende-se, ainda, que a sociedade local poderá viver, a cada
rememorar de registros fotográficos e outros documentos preservados por Írica Kaefer, com
mais intensidade visto que, diante de uma maior percepção sobre o seu passado, poderá
valorizar melhor o seu futuro o qual poderá, enfim, ser iluminado pela luz do entendimento
que sentirá cada pessoa ao rememorar, pessoalmente, a sua participação na construção social.
Aspectos relacionados com a “infraestrutra” dos estúdios, quer internos quer externos,
foram se alterando e a fotógrafa buscou renovar e inovar. Coube à fotógrafa, por exemplo,
preparar acessórios para noivas, tais como os buquês, as roupas masculinas para as fotos
oficiais para documentos, gravatinhas para os meninos da comunhão, a beca e a lapela para os
formandos. Estas ações fazem parte do negócio da fotografia e mostram diferentes situações
que antecedem o próprio ato fotográfico, mas que fazem parte do resultado a ser alcançado
pelos fotógrafos.
As situações rudimentares enfrentadas pelas famílias que chegaram nas décadas de
1950 e 1960 também foram flagradas, o que indicam as coberturas feitas com folhas de
coqueiro ou lonas, as mesas e bancos feitos de troncos de madeira e tábuas rústicas onde as
famílias se reuniam. Em meio a estes objetos e espaços é que algumas vivências ocorreram.
Ali, nas proximidades da mata, em meio a um ambiente natural e rústico, nas primeiras
capelas, igrejinhas e salões comunitários é que as pessoas se reuniam, preparavam os festejos,
conversavam, bebiam, planejavam, recordavam. Nestas circunstâncias, viam as crianças
correr, brincar, estudar e crescer. Pois é, cresceram tanto que, na atualidade, muitas pessoas
não são mais reconhecidas nas fotografias pelos conterrâneos ou por amigos de infância.
Mas, o rústico foi aos poucos sendo substituído por construções mais elaboradas, tanto
de madeira como de alvenaria, com uso de janelas e vidraças, telhados bem feitos, as
residências recebendo pinturas e construções públicas surgindo e atendendo a população na
área dos transportes, das comunicações, do abastecimento de água, etc.
Afinal, aos poucos, a infraestrutura, ligada ao meio em que as vivências vão
acontecendo, recebe mudanças que vão sendo absorvidas pela população tais como a energia
elétrica, as construções de concreto, o espaço do estúdio que, localizado junto à residência, se
tornou o “Estúdio Fotográfico” ou, a casa velha dos Kaefer.
353
Nas observações feitas sobre a ocupação do espaço, no que se refere à presença
infantil e adulta, percebe-se que meninos e meninas participam dos mesmos eventos e em
espaços variados e se fazem presentes praticamente na mesma proporção. Porém, as
atribuições desempenhadas pelas crianças no decorrer do registro fotográfico é que diferem
dos meninos para as meninas, aos quais está associada a representação de funções de adultos
que assumem no seu cotidiano. Se uma das meninas precisou equilibrar-se numa cadeira para
melhor segurar um bebê da família, estas crianças também aprenderam, nas vivências, a
equilibrar o tempo entre brincadeiras e compromissos. Independentemente das atribuições
recebidas no dia-a-dia, havia, ainda, no campo fotográfico, a cobrança para com a boa pose,
tanto para os meninos como para as meninas. Neste sentido, percebe-se que os comandos
repassados, mesmo que de fora do espaço enquadrado, são percebidos na fisionomia de
algumas crianças, o que as deixou mais sérias e apreensivas que outras, indicando o
compromisso que sentem ao receberem certas “advertências” dos adultos como a da popular
expressão, “olha o passarinho”, aos gestos e poses esperadas das mesmas para finalizarem um
bom trabalho fotográfico.
As fotografias da coleção de Írica Kaefer são registros de experiências de vida. Nestas
experiências e espaços diversos estão entrelaçadas pessoas com diferentes objetivos e
intenções aos quais foram agregados objetos variados. A este conjunto associa-se uma rede de
significações identificadas através da percepção dos diferentes espaços.
Esta constatação é outra circunstância que mostra dificuldades pelas quais as famílias
passaram, pois, em termos de fotos de casamentos, conforme já se mencionou, quase mil
casais ficaram sem poder levar para casa uma prova de um momento de vivência tão especial
como o é o de poder ter sido fotografado no dia do casamento, considerando-se as
circunstâncias da época onde apenas o casal ou este com as testemunhas se fotografavam.
Conforme já mencionamos, passados tantos anos, até meio século, em alguns casos, o
conjunto de fotos não retiradas e que permanecem “nas caixas do depósito” preservam não
somente a memória daqueles que estão ali fotografados e registrados, ou o trabalho dos
fotógrafos, mas circunstâncias adversas que possivelmente permanecem em certas famílias,
pois, do contrário, filhos ou outros familiares poderiam ter feito, em momentos posteriores, a
retirada destes registros históricos. Acredita-se que a própria existência do registro de várias
destas fotografias sequer tenha chegado ao conhecimento de familiares dos fotografados.
As fotografias preservadas por Írica Kaefer mostram diferentes fases da ocupação do
espaço que se tornou a atual cidade e a paisagem rural de MCRondon. Através de Írica,
aspectos socioculturais e atividades de produção são rememorados revelando-se em
354
representações identitárias locais firmadas em determinado tempo e espaço dando sentido às
vivências. Ao mesmo tempo em que a fotógrafa revive momentos do seu passado, sua bisneta
Luiza, com 11 anos, manifesta, no presente, curiosidade sobre as vivências da bisavó ao
assistir com a mesma, reportagem televisiva que falava sobre os festejos que estavam
ocorrendo no município. Tratava-se de um documentário sobre o 49º aniversário de
emancipação de MCRondon, ocorrido em julho de 2009, oportunidade em que a partir das
informações prestadas por Írica, a menina teria perguntado: “Vó, mas onde tem estas coisas,
porque a vó nunca me mostrou?...”. Naquelas circunstâncias, Írica novamente reviveu seu
passado, num misto de vida familiar e profissional e a bisneta é levada a passear pela casa
para olharem juntas vestígios do trabalho da anciã.
Tentar ver as coisas sobre as quais se ouve falar ou sobre aquilo que se lê muitas vezes
suscita curiosidade e ansiedade. Ocorrem momentos no texto que remetem o leitor à
imaginação de espaços fotográficos em que cenários são descritos sem a inserção de fotos.
Estas circunstâncias se fazem numa referência a outras fotos do acervo considerando-se que
esta situação foi prevista na própria metodologia.
Cabe neste momento de tentar concluir pensar-se na perspectiva vivenciada pelas
famílias no período da mudança, do deslocar-se e partir para um novo espaço na busca de
uma nova vida. Na ocupação do novo espaço ocorre a organização das pessoas nesta nova
vida. No desenrolar do arrumar as coisas, do instalar-se e da preparação das lavouras, das
moradias e demais dependências, da implantação das pequenas indústrias, da participação nas
atividades administrativas, nos diferentes níveis da infraestrutura que a sociedade necessita,
homens, mulheres e crianças, acompanhadas por diferentes objetos e também de animais,
foram, constantemente, assumindo diferentes afazeres. A cidade e o meio rural não se
organizaram sozinhos e, tão pouco de uma hora para outra. O desejo de conquistas certamente
acompanhou cada família de migrante e suas ações marcam o espaço e o tempo registrados.
Os objetivos, na medida em que foram sendo alcançados, foram comemorados. A tentativa de
ajustar-se, de participar da construção da nova localidade também foi acompanhada de
preocupações e até dissabores. São os acidentes de trânsito nas estradas ou outros acidentes
que acompanham o percurso da vida...
Entende-se, portanto, que as fotografias preservadas por Írica Kaefer são
representações deste deslocar-se e instalar-se em novas terras. São uma demonstração de
como o grupo familiar encontrou este espaço, as transformações que o espaço recebeu e
sofreu, a organização da vida almejada por homens, mulheres e crianças que acompanharam
esse período histórico de General/Marechal Cândido Rondon. Percebendo assim as
355
fotografias, entende-se que estas participam das explicações sobre o passado e poderão servir
de referência para outros estudos numa busca e compreensão cada vez mais próxima da
realidade que constitui esta região do oeste paranaense.
Um maior conhecimento histórico sobre a região, acompanhado de fotografias, poderá
levar a uma melhor percepção dos aspectos que envolvem o desenvolvimento e a
modernização de uma sociedade, sejam estes positivos ou negativos, e levar esta a conhecer-
se melhor, proporcionar um futuro com um maior intercâmbio “entre o mundo visível e o
mundo invisível”, entre o econômico e o simlico e colaborar na construção de uma
sociedade, que possa contar para além dos aspectos econômicos do capitalismo, movida a
construir um futuro voltado ao bem-estar social, apoiado pela memória fotográfica registrada.
Entende-se que o plano de colonização da região Oeste do Paraná está inserido num
projeto de desenvolvimento nacional que incluiu, nas suas medidas, reformas administrativas
e fiscais com o propósito de uma reforma agrária do país, com incentivo para o
desenvolvimento da agricultura e para a adaptação do uso da propriedade às características
agroindustriais nacionais. Mesmo que em menor escala, em relação aos grandes centros,
ocorre na região uma industrialização e crescimento urbano. O campo se moderniza,
adquirindo novas tecnologias, novos equipamentos agrícolas e novos insumos. A presença do
capital estrangeiro se faz notar e leva colonos à procura do agente financeiro, do aumento da
área de plantio, pois a agricultura precisa produzir para fornecer alimentos.
As inovações tecnológicas implantadas na agricultura, no oeste paranaense, a partir da
década de 1970, foram adotadas pelos colonos, que substituíram, gradativamente, técnicas
tradicionais por técnicas modernas de cultivo. Mesmo que a intenção inicial das pessoas tenha
sido o desenvolvimento, há que se admitir que alguém se excedeu nas atividades, com isso
provocando um desequilíbrio no meio ambiente e, em certos casos, no próprio ser humano.
Os registros feitos pela Foto Kaefer sobre fatalidades e que Livino ainda tem guardados, aos
quais tivemos acesso, são realmente terríveis.
A Foto Kaefer participou do desenvolvimento da cultura fotográfica deste espaço
ainda quando era distrito de Toledo, registrando as mudanças e a modernização que se
fizeram presentes nos diferentes setores da economia, inclusive no ofício de fotografar.
Embora se reconheça a presença, a atuação e a colaboração de vários profissionais no ramo da
fotografia, durante o desenrolar das atividades comerciais da Foto Kaefer, cabe salientar que a
opção pelo ato de preservar as imagens produzidas, mas não retiradas, coube à fotógrafa Írica.
A abertura da casa fotográfica Kaefer ocorreu no contexto da implantação do plano de
colonização da região Oeste do Paraná, incorporada ao surgimento de diferentes instituições
356
públicas e privadas. Através da atuação dos fotógrafos profissionais da produtora Kaefer se
desenvolveu a ação de registrar o espaço encontrado nos anos pós-1954, quando a família
veio para o Paraná, as mudanças que ocorreram e o desenvolvimento que se efetivou até
início da década de 1990.
Já em relação à atuação da Foto Kaefer, os seus proprietários vieram com capital para
investir em General Rondon. Apesar da frustração agrícola relacionada com a plantação de
café, o casal teve condições de investir na pecuária, na apicultura, atuou no comércio de
bicicletas e com fotografias. Com tantos investimentos, é difícil dizer que o ramo da
fotografia tenha sido o “braço forte” dos Kaefer, no sentido de renda e de produção de capital
no Paraná. No entanto, foi uma atividade econômica importante na economia familiar.
Por fim, percebeu-se, através das fontes analisadas, aspectos que vão muito além da
fotografia como arte, aspectos que vão além da imagem que encanta e emociona. A cada
olhar, somos despertados para uma série de elementos que a fotografia valorizou, explorou
num contexto amplo enquadrado pela fotografia. As fotos indicam movimento, ascensão.
Mostram também transformações, novidades e, este novo, pode estar acompanhado do
moderno, do concreto que substitui a madeira, do asfalto que substitui a estrada de chão
batido, das linhas e cabos de energia elétrica que substituem a luz das velas e dos motores, do
registro fotográfico em p&b para o colorido, o colorido da imagem.
Finalizando, apresenta-se algumas indicações/lições que surgiram no decorrer da
pesquisa:
1. O restauro de fotografias – As Ciências Humanas deverão comprometer-se com a
cultura material e imaterial, o patrimônio e a diversidade cultural da região. A atividade
relacionada com a identificação de fotografias e o contato com arquivos de famílias, por
exemplo, mostrou a necessidade da instituição de um setor de restauro de fotografias na
região. A necessidade se faz também em virtude das inovações tecnológicas no campo da
fotografia uma vez que com o recurso da digitalização nas agencias fotográficas sugerem a
“restauração de fotografias antigas” realizando porém, apenas a digitalização das fotos. Esta
prática poderá levar ao descarte da foto original. Ainda, as fotografias antigas e estragadas
que passam por algum conserto, não recebem a atenção recomendada pela arquivística. A
situação pode ser vista, por exemplo, na fotografia 64 – Familiares casamento Vorpagel.
Observando-se o conserto dos rasgos da fotografia, percebe-se o excesso de cola que
provocou um esbranquecimento no centro e à direita da foto, provocando interferência na
imagem. Bom, entende-se a necessidade de uma gestão documental nesta área re(ocupação)
recente, o que poderá levar ao maior reconhecimento e a mais pesquisas sobre esta região
357
brasileira a qual, como bem mostram as fotografias pesquisadas, tem grande vínculo com as
questões nacionais. Algumas fotografias (fotos 99, 123) por exemplo, já puderam ser
incluídas em exposição realizada no Rio de Janeiro, no decorrer de 2009, a qual teve como
tema a família brasileira.
2. A identificação de fotografias – Faz-se necessário e urgente uma melhor e mais
ampla identificação das fotografias preservadas pela Foto Kaefer assim como, aquelas que se
encontram em arquivos públicos e particulares. Mesmo que alguém entenda que “as
fotografias falam mais que mil palavras” ou, ainda que para muitos, “as fotografias falam por
si”, entende-se que também, pelo reconhecimento e indicação do uso da fotografia como
recurso didático ou fonte de pesquisa, aqueles que forem fazer uso do recurso fotográfico,
necessitam de referências sobre os elementos culturais e técnicos destas fotografias. Devido à
data de grande parte das fotografias produzidas na região, cujos municípios estão neste ano de
2010 comemorando seu 50º aniversário de emancipação, é preciso atentar para as pessoas
representadas nas imagens as quais ainda poderão auxiliar na identificação de muitos
documentos. Além do que, percebeu-se também a dificuldade de muitos figurantes não serem
mais reconhecidos pela fotógrafa Kaefer.
A situação do não reconhecimento de determinados espaços, objetos, pessoas e
eventos enquadrados nas fotografias remete a um problema da própria área da história, dos
arquivos e do patrimônio cultural da sociedade. Constata-se que há uma necessidade do
envolvimento dos agentes sociais, vinculados a estas áreas, para a elaboração de projetos que
venham a preservar estas memórias. Para que servirá a fotografia sem indicações,
identificações e sem referências? Para ilustrações, generalizações?
3. As fotografias e as lembranças – Olhando e tentando identificar fotografias, as
pessoas contatadas realizaram cálculos, compararam datas com a data do nascimento dos
filhos, com a data da vinda para o Paraná, etc, na tentativa de identificar espaços e tempos. E,
através dessas fotos, lembraram de muitos outros fatos. Com algumas fotografias as pessoas
conversaram, realizaram exclamações, mataram saudades... e, com outras, ficaram na
expectativa e pediram cópias das mesmas. Considerando-se fotografias não retiradas e
preservadas no acervo, caberia a realização de projetos no sentido de realizar-se atividades
que viessem expor as fotografias e possibilitassem o contato com a população e se efetivasse
o intercâmbio entre o mundo visível e invisível que se efetua através do olhar os objetos
expostos.
4. A criação de arquivos fotográficos – Na mesma linha da preservação mostra-se a
necessidade da criação e organização de Arquivos Fotográficos na região. Juntamente com a
358
criação de arquivos, deverão ser pensados os recursos técnicos e humanos necessários para a
boa gestão documental bem como a efetivação formal, através de termo de doação e uso, dos
documentos. Durante a pesquisa, esboçou-se uma organização e documentos fotográficos
foram sendo consultados. Um exemplo é o uso da fotografia feita pelo então funcionário da
Foto Kaefer, Livino Boech, em viagem ao Paraguai. Uma das fotografias foi identificada,
durante a pesquisa, por sua esposa Selga e a foto passou a integrar o livro (página 235) que
estava sendo escrito sobre a história da Igreja Evangélica Congregacional, editado por ocasião
da celebração do cinqüentenário de sua atuação em MCRondon. De forma semelhante, o
acervo foi consultado por alunos do ensino fundamental e médio e por professores e
pesquisadores que tiveram projetos aprovados pelo Governo do Paraná e deverão trabalhar
com fotografias desta coleção em sala de aula. O acervo de Írica Kaefer também foi
consultado por órgãos de impressa local, o jornal O Presente e a emissora de televisão TV
Canal 10, os quais divulgaram imagens e realizaram entrevista com a fotógrafa Írica Kaefer.
Gostaria-se de acrescentar ao texto que o entrevistado, motorista aposentado, João
Macena, é pai da autora desta pesquisa. Durante a entrevista realizada em sua casa, lembrou e
comentou das várias mudanças que transportou. Andando pelos caminhos da sua memória, foi
revendo estradas, localidades, objetos e pessoas. Já ao final da entrevista, com um sorriso no
rosto e insinuando ares de dúvida perguntou à entrevistanda: “E você, Teresinha, não vai me
perguntar quem levou a tua mudança?...”. É pai, nessa você me pegou... Realmente, naquele
momento, foi surpresa o fato de fazer referência à mudança de minha família para o Paraná
até porque, parecia-nos ser de uma época bem mais recente... Mas, naquele momento,
passaram a se apresentar algumas coincidências na conversa que se passou a fazer sobre a
mudança da própria filha para o Paraná, quais são: A Foto Kaefer, ou a família, veio para o
Paraná em 1954. As primeiras mudanças feitas por João Macena, para o Paraná, foram
realizadas no ano de 1955. Trata-se do ano em que esta sua filha nasceu. No decorrer do ano
de 1990, a Foto Kaefer encerrou suas atividades em MCRondon. Naquele ano, o motorista
João transportou a mudança da filha para esta localidade. Em 2005, exatamente meio século
depois da vinda dos Kaefer para o Paraná, a UFF/RJ, através do Programa de Pós-Graduação
Interisntitucional em História, juntamente com a Unicentro/PR, anuncia, através do edital
03/2005, a seleção de uma candidata que viria a realizar a pesquisa sobre o desenvolvimento
da cultura fotográfica em MCRondon através do acervo preservado por Írica Kaefer. Contudo,
a variedade e preciosidade do material e das fotografias preservadas, não podem se fechar
para a conclusão desta pesquisa. Assim, decorridos o período de contatos e perspectivas,
apresenta-se a confirmação da família de Írica Kaefer no sentido de realizar a doação das
359
fotografias e outros materiais para o CEPEDAL, uma instituição pública, ato a se efetivar
oportunamente.
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ANEXOS
Anexo 1 – Marcha do Povoamento do Estado do Paraná
NIEDERAUER, op.cit. contra-capa, anexos.
375
Anexo 2 – Localização da Fazenda Britânia
NIEDERAUER, op.cit. contra-capa, anexos.
376
Anexo 3 – Modelo da ficha
Ficha de elementos da forma do conteúdo
Agência produtora Ano
Local retratado
Tema retratado
Pessoas retratadas
Objetos retratados
Atributo das pessoas
Atributo da paisagem
Tempo retratado
(dia/noite)
N° da foto
MAUAD, Ana Maria. op. cit. p. 145, 2005.
377
Anexo 4 - Modelo da ficha
Ficha de elementos da forma da expressão
Agencia produtora Ano
Tamanho da foto
Formato da foto e suporte (relação com o texto escrito)
Tipo de foto
Enquadramento I: sentido da foto (horizontal ou vertical)
Enquadramento II: direção da foto (esquerda, direita
centro)
Enquadramento III: distribuição de planos
Enquadramento IV: objeto central, arranjo e equilíbrio)
Nitidez I: foco
Nitidez II: Impressão visual (definição de linhas)
Nitidez III: iluminação
Produtor: amador ou profissional
N° da foto
MAUAD, Ana Maria. op. cit. p. 146, 2005.
378
Anexo 5 – Jornais Editados em Mcrondon – uma síntese
Data Jornal Desenvolvimento Public Término
1968 O
desbravador
31.07.68 – Fundador: Élio Winter. ARES. Associação
Rondonense de Estudantes do 1º e 2ºGraus.
Mensal 25.03.70
1970 Impulso 25.03.70. – Foi reformulado.
Direção: Elio winteher e Suzana Kaefer. Fecha o jornal
quando encerra o mandato de Elio Winter na ARES.
mensal 22.10.70
1971
a
1974
Não tem
jornal
Sem jornal
Venilda e Obras/ Mídia colocam 1970 a 1974 s/jornal
editado.
1974 Rondon
Comunicação
15.03.1974 – Impressão: Grafo-Set
IMPRENSA OFICIAL DE MCR
Tiragem: 3.000 exemplares
1976 a Grafo Ed. Oeste Imprime
Fundador: Sérgio Luiz Moy.
Direção: Ivo Knappmann e Ivete Knappmann (esposa)
Participação: Eloi Lohmann e Agritt Winter
1979 - A Editora Independente de Cascavel compra o jornal
Rondon Comunicação que passou a ser o Rondon Hoje. O
Rondon Hoje é uma sub-seção do Cascavel/Hoje, Foz/Hoje.
semanal 1979
1979 Rondon Hoje A Editora Independente de Cascavel compra o jornal
Rondon Comunicação que passou a ser o Rondon Hoje. O
Rondon Hoje é uma sub-seção do Cascavel/Hoje, Foz/Hoje.
(Já a apartir de 04/08/79 conta a concorrência do Jornal
Alento.
O Rondon Hoje – Direção. Quando começou a circular em
MCRondon foi dirigido por Eduardo Lima e adotou linha
próxima da “imprensa marron”, é da imprensa nanica.
Circulou até meados de 1979. p 172.
O Rondon Hoje – jornal mais crítico (caso Verno Scherer e
Almiro Bauerman (Copagril)
Crítica x ira aos políticos do Paço. 1979 caso Werner
Wanderer.
Rondon Hoje recebe censuras comerciais
Rondon Hoje só tem apoio da oposição e deixa de circular.
Eduardo Lima Fundou a Revista Oeste
O jornal Rondon Hoje encerra logo depois de vir o
ALENTO
Semanal
(?)
1979/80
1979 O Alento 04.08.1979 até meados de 1982
A partir de 1979 o Alento passa a ser concorrente do Jornal
Hoje (cujo editorial desagrada a rondonenses. ). O Jornal
Rondon Hoje encerra. “Um jornal – linha agressiva,
destruidora e dado a um pasquim. O outro jornal – mais
consciente e mais sério. Foi esta a razão da sobrevivência de
“O Alento”. O Alento passou a órgão oficial do município
.
Surge um jornal mais progressista.
Direção: Frederico Von Borstel
Ralf Alex Konicieczniak
Ivo Welp
Haari StrensKe. Administração: Hugo Ewalt Balko e o irmão
Richardt Kurt Balko.
semanal 1982
1982 A Semana 30.07.1982 – é uma remodelação do Alento. Hugo Balko
Richard Balko saem do jornal. Entra: Idealizador: Airton
Kraemer (trabalhou no Rondon Comunicação) e
Fredy Schbnir. Proprietário: Frederico Von borstel
E Ralf Konieczniak. Tiragem: 1000 exemplares
Semanal
1985
379
1989 A Tribuna De 1986 a 1988
Prefeito Priesnitz e Ademir Bier – PMDB
Editorial de situação ao PMDB.
A Tribuna – em 1989 De Tablóide para Standar - era o único
jornal da mídia. (Dos comerciantes dos políticos)
A Tribuna – linha de esquerda. 1989 - retoma como
oposição ao governo Dieter s/Verno Scherer.
1990
1991 O Presente 04.10.1991. Hugo Balco – não é jornalista mas agora com
registro adquirido por tempo de serviço.
Arno Knzler – registro definitivo por tempo de serviço.
Lorena, Carlos Adamezky. Tiragem: 2.500
“Linha Editorial Independente”. 1997 – 1ª edição colorida
06.03.2001 – diário
Semanal
Em
2001
diário
Em
andamento
1994 A Notícia Freddy Sclosser. Mais tarde mais a esposa Claudete
Tiragem: 6.000
mensal
1995 O Pasquin
do Oeste
Ana Maria 16.01.1995. Anélcio Kuehl. (Imitação à linha do
O Pasquin - um jornal da década de 1970, de nível Nacional,
feito por intelectuais de esquerda).
Semanal
em
1999
Em 2009
semestral
1997 O Jornal Hugo Balko Atual
1997 Jornal
Fronteira
Rural
Airton Kraemer. Tiragem: 6.000. Circulação em 14
municípios. 1º jornal do segmento.
1998
1999 Editora
Germânica
Luis Carlos Diesel. Jadir Zimermann. Em 200 Neri Wagner Em
andamento
1999 Região em
Revista
20.12.1999. Produção da Ed. Germânica. Luiz C. Diesel,
Jadir Zimermann. Néri Wagner é sócio resp. Comercial
2001 muda para Revista Região.
2001
2001 Revista
Região
Néri Wagner, em 2000 é sócio. Inicio linha mais
política./Marlise Ostjen. Depois informativa e investigativa.
Cristiano Viteck – jornalaista responsável.
Em
andamento
LIVRE
EXPRESSÃO
Jornal Fechou
Canal 10 Iniciou com Jadir Zimermann. Em 2009, assumido pela
Família de Lair Berch.
Em
andamento
2000 Jornal Nossa
Terra
Suplemento com o Presente. Projeto Airton kraemer
A Wilhems, Daniel Calvi, Eliberto Fell vaip/ Guairá
Circulação nacional acompanhando feiras. Jornalista
Rogério Thomas (1º jornalista Rondonense formado)
Ivanildo Cardoso, Jadir Zimermann e Cristiano Viteck
2003
2006 O Olho no
Lance
Alsenir Wilhelmns, Anderson Picolo (da Rádio Difusora) mensal Em
andamento
Editora Nossa
Terra
agropecuária
A partir de O Presente.
2001 Amigos da
Natureza
A partir de O Presente surge a Revista Amigos da Naturea. Em
andamento
Quadro elaborado pela autora a partir dos jornais arquivados no CEPEDAL e a partir de informações nas obras:
Saatkamp (1985); Wilhemns e Kunzler (2002).
Anexo 6 - Elementos da Forma da Expressão
ENQUADRAMENTOS NITIDEZ
IV –
Forma de
expressão
Tamanho /
Formato
Tipo
I – Sentido II – Direção III – Planos
Objeto central Arranjo e equilíbrio
I – Foco
II – Impressão
visual
III - Iluminação
Temas P M G Pose Inst. Hor. Vert.. E C D
1 2 3 4 5 1 2 3 4 5 6 7 D/E C/S C/I 1 2 3 1 2 3 1 2 3 4
Religioso 57 45 12 57 21 36 02 35 02 14 24 18 01 01 22 01 03 05 51 03 03 44 13 46 11 47 10
Educação 11 11 11 11 06 05 06 02 03 04 02 05 11 11 05 06 06 05 07 04
Esporte 11 09 02 07 04 11 10 01 05 06 02 02 07 11 10 01 09 01 01 07 04 08 03
Civismo 11 11 10 01 11 07 04 02 05 04 02 02 07 10 01 10 01 07 04 04 07 07 04
Produção 17 02 14 01 15 02 14 03 04 10 01 01 01 05 10 02 01 01 03 01 11 16 01 12 05 10 05 02 06 11 11 06
Vista 11 02 07 02 02 09 11 11 01 05 05 01 08 01 02 10 01 08 03 05 04 02 05 06 06 05
Festividades 21 02 18 01 20 01 15 06 01 18 02 03 09 08 01 08 11 02 18 2* 1* 18 03 13 08 20 01 17 04
Retratos 69 12 50 07 69 23 46 69 04 57 08 55 14 69 66 03 58 08 03 46 23 56 13
Tragédias 16 16 16 14 02 03 06 01 06 03 06 07 10 04 02 13 03 12 04 10 06 09 07 13 03
Totais 224 18 181 25 191 33 131 93 10 172 11 08 06 04 79 73 60 08 74 03 11 60 16 30 05 158 07 02 198 14 12 161 55 08 149 75 172 52
Direção - E = Esquerda; C = Central; D = Direita; = De cima para baixo; = De baixo para cima
Objetos Centrais – 1 = Componentes vivos; 2 = Componentes móveis; 3 = Componentes fixos; 4 = Componentes vivos e móveis; 5 = Componentes vivos e fixos; 6 =
Componentes vivos, móveis e fixos; 7 = Componentes móveis e fixos.
Arranjo e equilíbrio – D/E = Distribuição equilibrada; C/S = Concentração na parte superior; C/I = Concentração na parte inferior; * = Contração na parte direita ou na parte
esquerda.
Nitidez I – 1 = Tudo no foco; 2 = Plano central no foco; 3 = Foco desigual.
Nitidez II – 1 = Linhas bem definidas; 2 = Linhas definidas; 3 = Linhas pouco definidas.
Nitidez III – 1 = Sem sombra; 2 = Com sombra; 3 = Sem contraste; 4 = Com contraste.
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