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UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA MARIA
CENTRO DE CIÊNCIAS RURAIS
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EXTENSÃO RURAL
RELAÇÕES ENTRE ESTAÇÃO ECOLÓGICA DO
TAIM E COMUNIDADE LOCAL: CONFLITOS E
COOPERAÇÃO
DISSERTAÇÃO DE MESTRADO
Lucas Rogério Sete
Santa Maria, RS, Brasil
2010
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2
RELAÇÕES ENTRE ESTAÇÃO ECOLÓGICA DO TAIM E
COMUNIDADE LOCAL: CONFLITOS E COOPERAÇÃO
por
Lucas Rogério Sete
Dissertação apresentada ao Curso de Mestrado do Programa de Pós Graduação em
Extensão Rural da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM, RS), como
requisito parcial para obtenção do grau de Mestre em Extensão Rural.
Orientadora: Prof. Dr. Vivien Diesel
Santa Maria, RS, Brasil
2010
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3
Universidade Federal de Santa Maria
Centro de Ciências Rurais
Programa de Pós-Graduação em Extensão Rural
A Comissão Examinadora, abaixo assinada, aprova a Dissertação de
Mestrado
RELAÇÕES ENTRE ESTAÇÃO ECOLÓGICA DO TAIM E
COMUNIDADE LOCAL: CONFLITOS E COOPERAÇÃO
elaborada por
Lucas Rogério Sete
como requisito parcial para obtenção do grau de
Mestre em Extensão Rural
Comissão Examinadora
Vivien Diesel, Dr.
(Presidente/Orientador)
Pedro Neumann, Dr. (UFSM)
Carmen Rejane Flores Wizniewsky, Dr. (UFSM)
Santa Maria, 7 de Abril de 2010
4
AGRADECIMENTOS
À minha mãe e toda minha família, que sempre me apoiaram no meu
percurso acadêmico,
A minha orientadora, pela orientação, pelos incentivos, pela paciência, pela
amizade. O meu muito obrigado.
Ao corpo docente e Funcionários do Programa de Pós-Graduação em
Extensão Rural. Foi uma honra conviver com pessoas tão profissionais quanto
competentes, desfrutar de um ambiente acadêmico tão saudável e responsável.
Ao CNPq do Brasil e ao Ministério da Ciência e Tecnologia de Moçambique
pela bolsa de estudos que me possibilitou atingir este nível acadêmico.
Agradeço carinhosamente também aos colegas de mestrado e doutorado,
pelo convívio, pelas confraternizações, pelas amizades construídas, muitos
churrascos. A minha estadia em Santa Maria se tornou categoricamente mais feliz e
mais proveitosa.
O meu agradecimento para a gestão da Estação Ecológica do Taim, pelo
alojamento e acompanhamento proporcionados para a realização da pesquisa de
campo.
Ciente da impossibilidade de citar todos que contribuíram para tornar este
sonho real. O meu ultimo agradecimento vai especialmente a todos os meus
professores do ensino primário, secundário e licenciatura. Sem a participação de
todos, certamente este sonho não seria possível.
5
RESUMO
Dissertação de Mestrado
Programa de Pós-Graduação em Extensão Rural
Universidade Federal de Santa Maria
RELAÇÕES ENTRE ESTAÇÃO ECOLÓGICA DO TAIM E
COMUNIDADE LOCAL: CONFLITOS E COOPERAÇÃO
AUTOR: LUCAS ROGÉRIO SETE
ORIENTADORA: Prof. Dr. VIVIEN DIESEL
Data e Local da Defesa: Santa Maria, Abril de 2010
A criação de áreas protegidas é uma das principais reivindicações históricas de
movimentos preocupados com a conservação da natureza e também uma das
principais estratégias adotadas pelos governos e entidades ambientais para a
conservação do meio ambiente e de seus recursos naturais. Os órgãos responsáveis
pela criação e gestão das unidades de conservação como as estações ecológicas,
têm empregado políticas autoritárias e tecnocráticas que resultam em conflitos com
as comunidades locais, com destaque para a desapropriação das terras; disputa
pelas águas; restrições à caça e pesca; entre outras, com prejuízo tanto aos fins de
conservação quanto de desenvolvimento das populações do entorno (especialmente
grupos tradicionais). Frente a este quadro têm sido buscadas formas de
compatibilização entre os objetivos de conservação e desenvolvimento mediante
estratégias diversas, com ênfase na valorização da visão e participação das
populações locais nas ações e decisões da gestão. As pesquisas sobre a percepção
da comunidade local do entorno das unidades de conservação oferecem
instrumentos para a compreensão de comportamentos e auxiliam na melhoria do
processo de gestão ambiental. Este trabalho aborda a problemática da
harmonização entre objetivos de conservação e desenvolvimento no caso da
Estação Ecológica do Taim, RS, que se constitui em uma área de proteção integral
que, na sua implantação, implicou a remoção de algumas famílias e introdução de
normas restritivas para as populações que residem no seu entorno. Nesse contexto
se pretendem identificar os conflitos existentes e as iniciativas de conciliação entre
os propósitos de conservação e desenvolvimento que vem sendo realizadas na
região. Os dados desta pesquisa qualitativa foram obtidos no período de janeiro de
2009 a janeiro de 2010, pela técnica da entrevista semi-estruturada, combinada com
consulta a dados secundários, consultas bibliográficas e observações no local. Os
dados levantados indicam que a população percebe a existência de diversas
contradições no discurso conservacionista e divergências entre os propósitos da
unidade de conservação e da população residente no entorno. As iniciativas de
harmonização dos propósitos de conservação e desenvolvimento são diversas, mas
ainda incipientes e dependentes de recursos externos, o que restringe seus
impactos.
Palavras-chave: Áreas protegidas; Unidades de Conservação; Estação Ecológica
do Taim; gestão social de UC, participação.
6
ABSTRACT
Dissertation of Master Degree
Post Graduation Program in Rural Extension
Federal University of Santa Maria
RELATIONSHIPS BETWEEN ECOLOGICAL STATION OF TAIM AND
LOCAL COMMUNITY: CONFLICTS AND COOPERATION
AUTHOR: LUCAS ROGÉRIO SETE
SUPERVISOR: Prof. Dr. VIVIEN DIESEL
Date and Place of receiving Master’s Degree: Santa Maria, April, 2010
The creation of protected areas is one of the main historical claims of conservation of
the nature movements and also one of the main strategies adopted by the
governments and environmental entities for the conservation of the environment and
of their natural resources. The responsible organs for the creation and administration
of the units of conservation as the ecological stations, have employed authoritarian
and technocratic political, that result in conflicts with the local communities, with
prominence for the expropriation of the lands; dispute of waters; restrictions to the
hunt and fishing; among other, with so much damage to the conservation ends as of
development of the populations of the spill (especially traditional groups). Front to this
scenery compatible forms have been looked between the conservation objectives
and development by diverse strategies, with emphasis in the valorization of the vision
and participation of the local populations in the actions and decisions of the
administration. The researches about perception of local community offer instruments
for the understanding of behaviors and they aid in the improvement of the process of
environmental administration. This work approaches the problem of the
harmonization between conservation objectives and development in the case of the
Ecological Station of Taim that is constituted in an area of integral protection that, in
his implantation, it implicated the removal of some families and introduction of new
restrictive norms for the populations that live in yours spill. In that context intends to
observe the conflicts that appeared with the new scenery, and the conciliation
initiatives among the conservation purposes and development that it has been
accomplished in the area. The data of this qualitative research were obtained in the
period of January from 2009 to January of 2010, with the technique of the semi-
structured interview, combined with secondary data, bibliographical consultations and
observations in the place. The lifted up data indicate that the population notices the
existence of several embarrassments in the conservationist speech and divergences
among the purposes of the unit of conservation and of the resident population in the
spill. The initiatives of harmonization of the conservation purposes and development
are several, but still incipient and dependent of external resources, what restricts their
impacts.
Word-key: Protected areas; Units of Conservation; Ecological station of Taim; social
administration of UC, participation.
7
LISTA DE TABELAS
Tabela 1 - Percentual de área coberta por UC`s nos continentes, década de
1980...................................................................................................
32
Tabela 2 - Áreas Naturais Protegidas no Brasil e no mundo.............................. 33
Tabela 3 - Total de áreas protegidas no Brasil por
tipologia..............................................................................................
38
Tabela 4 - Detalhamento do SNUC por grupo de manejo, jurisdição e
condição geográfica...........................................................................
41
Tabela 5 - Extensão e percentual de unidades de conservação por bioma e
grupo de manejo no Brasil.................................................................
42
Tabela 6 - Número e área de unidades de conservação por categoria da IUCN
e sua equivalência segundo o SNUC................................................
43
Tabela 7 - Síntese dos parâmetros de análise de atividades que impactam
negativamente nas Estações Ecológicas e Reservas Biológicas
federais no Brasil...............................................................................
47
8
LISTA DE FIGURAS
Figura 1 - Crescimento cumulativo das áreas protegidas a cada 5 anos no
período 1872-2003.........................................................................
31
Figura 2 - Tendências da superfície terrestre sob proteção por categoria da
UICN...............................................................................................
35
Figura 3 - Número e extensão de áreas protegidas na America do Sul e
Brasil...............................................................................................
36
Figura 4 - Mapa da localização da região do Taim, RS.................................. 66
Figura 5- Vista da Lagoa Mirim, RS............................................................... 71
Figura 6 - Banhado do Taim, RS.....................................................................
72
Figura 7 - Mata nativa na região do Taim, RS.................................................
74
Figura 8 - Indicação dos limites da estação ecológica do Taim...................... 75
Figura 9 - Vista aérea do Banhado do Taim, RS.............................................
76
Figura 10- Mapa de unidades ambientais da Capilha...................................... 100
9
LISTA DE QUADROS
Quadro 1 -
Categorias de Unidades de Conservação e respectivos objetivos
de manejo conforme SNUC..............................................................
40
Quadro 2 -
Lista dos entrevistados.....................................................................
67
Quadro 3 -
Atividades do Nema no entorno da ESEC Taim no período 2003-
2008..................................................................................................
97
Quadro 4 -
Composição do Conselho Consultivo da Estação Ecológica do
Taim..................................................................................................
107
10
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO........................................................................
13
2 ORIGENS E EVOLUÇÃO DAS DEMANDAS SOCIAIS
PELA CRIAÇÃO DE ÁREAS PROTEGIDAS............................
18
2.1 Iniciativas de defesa da “natureza selvagem” e o
conservacionismo.....................................................................................
19
2.2 O Ecologismo e a defesa dos ecossistemas................................ 21
2.3 O Ambientalismo e a defesa do meio ambiente........................... 24
2.4 O Socioambientalismo e a etnoconservação................................... 25
2.5 Convergências e divergências de diferentes movimentos em
defesa da criação de áreas protegidas...................................................
27
3 OS PROCESSOS DE IMPLANTAÇÃO DE ÁREAS DE
PROTEÇÃO INTEGRAL: CARACTERÍSTICAS E IMPACTOS
SOCIAIS.....................................................................................
30
3.1 Criação e implantação de áreas protegidas: uma preocupação
mundial.......................................................................................................
30
3.2 Criação e implantação de áreas protegidas no Brasil..................... 38
3.3 Impactos sociais relacionados à implantação de áreas de
proteção integral no Brasil.......................................................................
43
3.4 Os conflitos sociais e suas repercussões sobre os propósitos
de conservação.........................................................................................
45
4 “PROMESSAS” E “AVANÇOS” DOS NOVOS MODELOS
DE GESTÃO DE ÁREAS DE PROTEÇÃO INTEGRAL
..............
49
4.1 O modelo tradicional de gestão das áreas protegidas e seus
limites.........................................................................................................
50
4.2 Os “novos modelos” de gestão......................................................... 51
4.2.1 O co-manejo como modelo de referência para a participação na
gestão..........................................................................................................
54
4.3 Mudanças nos modelos de gestão das UC no Brasil...................... 56
4.3.1 Mecanismos para participação na gestão das UCs no Brasil......
58
11
4.3.2 Primeiras avaliações dos “avanços” possibilitados pelos
“novos modelos”......................................................................................
60
5 CONFLITOS E COOPERAÇÃO ENTRE A ESTAÇÃO
ECOLÓGICA E COMUNIDADE LOCAL NO TAIM...................
64
5.1 Metodologia......................................................................................... 65
5.1.1 Localização geográfica da área de estudo........................................ 65
5.1.2 Percurso metodológico.......................................................................
65
5.1.2.1 Técnicas escolhidas para realização da pesquisa.......................... 68
5.2 As características naturais da região costeira do Rio Grande do
Sul e as motivações para criação da Estação Ecológica do Taim.......
69
5.2.1 Lagoas costeiras: Complexo Mirim-Mangueira.................................. 70
5.2.2. Banhados.......................................................................................... 71
5.2.3 Campos nativos..................................................................................
73
5.2.4 Matas nativas..................................................................................... 73
5.2.5 Importância ecológica da área da E. E. do Taim............................... 74
5.3 Histórico de ocupação da região do Taim, categorias sociais e
avaliações prévias de impactos sociais da criação da ESEC...............
77
5.3.1 Avaliações prévias sobre impactos sociais da criação e
implantação da EE do Taim........................................................................
80
5.4 Estudo da percepção atual da comunidade local sobre sua
relação com a Estação Ecológica do Taim.............................................
81
5.4.1 Processos sociais e organização social atual na região do Taim...... 81
5.4.1.1 Comunidade da Capilha.................................................................. 82
5.4.1.2 Comunidade da Serraria................................................................ 83
5.4.1.3 Comunidade da Vila Anselmi.......................................................... 84
5.4.2 A persistente problemática de delimitação e implantação da área
da Estação Ecológica do Taim e a percepção da população local sobre
este processo..............................................................................................
84
5.4.3 Percepções sobre a influência da ESEC Taim na atividade
econômica dos pescadores........................................................................
88
5.4.4 Percepções sobre a influência da ESEC Taim na atividade
econômica dos arrozeiros...........................................................................
90
5.4.5 Percepções sobre a influência da ESEC Taim na atividade
12
econômica dos produtores florestais...........................................................
91
5.4.6 A relação dos moradores das vilas do entorno com a ESEC do
Taim.............................................................................................................
92
5.5 Descrição e percepção da comunidade sobre as iniciativas de
conciliação dos objetivos de conservação e desenvolvimento...........
94
5.5.1 Iniciativas protagonizadas pelo NEMA............................................... 95
5.5.1.1 Projeto comunidades Taim..............................................................
96
5.5.1.2 Visitação orientada no entorno da ESEC Taim............................... 97
5.5.1.3 Estabelecimento de diretrizes para o ordenamento territorial para
as localidades da Capilha e da Serraria......................................................
99
5.5.1.4 Participação das comunidades na gestão da pesca artesanal da
região...........................................................................................................
101
5.5.1.5 Promoção de iniciativas de produção agropecuária “ecológica”..... 103
5.5.1.6 Estabelecimento de mecanismos de gestão participativa e de
educação ambiental....................................................................................
104
5.5.2 Iniciativas dos gestores da ESEC: Promoção da participação na
gestão da ESEC do Taim............................................................................
106
5.6 Contrapondo conflitos sociais e cooperação no Taim....................
110
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS....................................................
116
7 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS....................................... 120
ANEXO:
Roteiro de pesquisa
....................................................... 126
13
1 INTRODUÇÃO
No mundo, a preservação da natureza tem sido feita através da criação de
áreas protegidas, por meio da identificação, demarcação e restrição de uso de
algumas áreas consideradas importantes de ponto de vista ecológico ou social. Por
outro lado, esse propósito resulta em conflitos no processo da gestão e manutenção
dessas áreas, devido a incompatibilidades no convívio com as comunidades locais,
pois as áreas protegidas, muitas vezes, originam restrições às populações que
habitavam essas regiões e que vivem no entorno, levando a desintegração de
comunidades realocadas, perdas culturais e implicações negativas para a
biodiversidade (FLEURY; BORBA, 2007).
Nos países do sul a criação de áreas protegidas tem sido importante para
identificação de problemas mais amplos de conservação, que contribuíram para o
reconhecimento da necessidade de se criar modelos de proteção da natureza
viáveis, fundamentados nas especificidades ambientais e culturais de suas
sociedades.
Geralmente as comunidades que residem no interior ou no entorno das áreas
protegidas não participam do processo de tomada de decisões sobre estas áreas: o
Estado define o território e os modos de proteção, simplesmente formula e executa
os respectivos planos de manejo. Pior ainda, as decisões normalmente são mantidas
em segredo até sua transformação em lei, de modo a evitar movimentações sociais
que possam comprometer os seus planos. Quando não cumprem as normas, as
populações são criminalizadas pelas suas ações que visam assegurar sua
sobrevivência através da exploração dos recursos naturais (ARRUDA, 1997). Assim,
as populações envolvidas no processo de conservação da biodiversidade,
geralmente são ignoradas e afastadas de qualquer contribuição que possam
oferecer à elaboração das políticas públicas, por outro lado são as primeiras a serem
atingidas pela destruição do ambiente e as últimas a se beneficiarem das políticas
de conservação ambiental (ARRUDA, 1997).
As populações vivendo em áreas protegidas ou no seu entorno vivenciam um
conflito entre o paradigma de conservação da biodiversidade e da sustentabilidade
ambiental e o seu direito ao uso dos recursos naturais, ao desenvolvimento e ao
14
crescimento econômico, com decorrente confronto permanente com as autoridades
reguladoras.
A criação de áreas de conservação representa um indispensável instrumento
de proteção do meio ambiente ecologicamente equilibrado, um dever do poder
público e de todos, sendo a sua preservação crucial para a presente e para as
futuras gerações. Mas, a prática tem evidenciado o conflito entre os objetivos da
criação dessas áreas protegidas e a busca do desenvolvimento através do
incremento da produção agropecuária.
Este conflito ocorre na região do Taim, situada numa região costeira no
extremo sul do Rio Grande do Sul. Nas colocações de Sosinski (2009) fica evidente
a importância ambiental da região do Taim, que é destacada como uma das regiões
mais ricas em aves aquáticas da América do Sul. Sosinski (2009) realça o seu
enorme valor como patrimônio genético e paisagístico, por causa da sua imensa
diversidade biológica e ecossistêmica. A região do Taim é considerada núcleo da
Reserva da Biosfera e Área Prioritária para preservação da Biodiversidade.
Segundo Quesada et al. (1987) no processo de criação da Estação Ecológica
(ESEC) do Taim, a partir de 1978, passou-se inevitavelmente por uma fase de
discriminação da área, que foi marcada pela desapropriação de algumas terras. A
implantação da Estação Ecológica do Taim causou vários impactos na vida
socioeconômica e cultural das populações locais, a desapropriação de terras
durante a implantação não respeitou as normas locais (tradição da região), alguns
envolvidos consideraram as políticas de compensações injustas, esses conflitos
associaram-se à exclusão dos beneficiários nos momentos de tomada de decisão ao
longo de todo processo que, inevitavelmente, afetou as suas vidas. No
entendimento dos autores a atuação do Estado nesse ato acabou sendo mais um
momento em que se beneficiou o estabelecimento das relações capitalistas de
produção e o afugentamento ou reformulação das relações tradicionais com a
provável inviabilização das comunidades que ali sobreviviam. Deste modo, coloca-
se que durante a ação da implantação da ESEC a ordem legal do estado ignorou a
ordem local, não se levando em conta as questões sócio-culturais e a participação
da comunidade em todo processo (QUESADA et al, 1987).
Segundo NEMA (2002) a ESEC do Taim sofre impactos relacionados
fundamentalmente das ações feitas no entorno, por causa dos problemas ligados a
conflitos de uso. Destes, sobressai a utilização das águas para o cultivo do arroz, a
15
pecuária, a pesca, a caça, a mortalidade de animais por atropelamentos na BR 471
(MULLER, 1993 apud NEMA, 2002), o florestamento com espécies exóticas e as
queimadas. Outro potencial conflito que vem surgindo é o aumento da atividade do
turismo na região.
A preocupação com os conflitos entre propósitos de conservação e
desenvolvimento envolvendo áreas protegidas levou a que se propusessem
mudanças nos modelos de criação e gestão destas áreas, com maior participação
popular. Como política recente (no Brasil estas mudanças foram formalizadas a
partir de 2000) ainda há muito para se avaliar sobre sua eficácia. O presente estudo
visa conhecer a percepção da comunidade local sobre a influência da área de
proteção em suas vidas e sobre as iniciativas de conciliação dos propósitos de
conservação e desenvolvimento no entorno e na gestão da ESEC Taim.
Deste modo, o presente trabalho tem os seguintes objetivos:
Objetivo geral
- Avaliar o conflito e cooperação entre os objetivos conservacionistas na Estação
Ecologica do Taim e a vida das comunidades locais.
Objetivos específicos
- Identificar a percepção sobre o impacto das normas de conservação relacionadas a
Estação Ecologica do Taim na vida da comunidade local
- Caracterizar o cenário dos trabalhos participativos desenvolvidos de modo a avaliar
seu potencial na conciliação dos objetivos de conservação e desenvolvimento:
a) descrever a iniciativa e investigar percepção dos atores sociais locais sobre
potencial dos conselhos gestores de UC
b) descrever a iniciativa e investigar percepção dos atores sociais locais sobre
planos de ordenamento territorial
c) descrever a iniciativa e investigar percepção dos atores sociais locais sobre
projetos demonstrativos
d) descrever a iniciativa e investigar percepção dos atores sociais locais sobre
educação ambiental
Importa referir neste espaço, que o projeto inicial de pesquisa tinha como
região de estudo a reserva terrestre e marinha da ilha de Inhaca, em Moçambique.
Mas, questões conjunturais ligadas a bolsa de estudos e acesso a auxílio pesquisa
inviabilizaram a viagem à Moçambique para coleta de dados. Assim se optou por
16
continuar na mesma linha de pesquisa alterando a região de estudo, com esperança
de aplicar os resultados desta aprendizagem neste país. A escolha da região do
Taim se deveu a sua similaridade com a região de Inhaca, onde foi implantada uma
estação de biologia maritima, com reserva florestal e maritima. Por outro lado, este
local fornecia facilidades de deslocamento para a coleta de dados e iniciativas de
conciliação entre objetivos de conservação e desenvolvimento passíveis de estudo.
Na realização do estudo considerou-se que a avaliação das relações entre as
áreas protegidas e as comunidades locais deve partir da elaboração de uma base de
dados documentais e de uma revisão bibliográfica que devem fornecer elementos,
para, de um lado, entender a evolução das preocupações, tanto dos governantes
quanto da população; mas necessita, também, de levantamentos de campo para
poder avaliar as especificidades locais e gerar contribuições para análise de outras
áreas de proteção.
Para contemplar os objetivos propostos, a presente dissertação segue a
seguinte estrutura: o primeiro capítulo aborda as origens e a evolução das
demandas sociais pela criação de áreas protegidas, analisando as convergências e
divergências de diferentes movimentos em defesa da criação de áreas protegidas.
O capítulo seguinte se dedica ao estudo dos processos de implantação de
áreas de proteção integral, suas características e impactos sociais, identificando as
áreas de proteção integral como áreas de conflito entre propósitos de conservação e
desenvolvimento.
O próximo capítulo se debruça sobre as “promessas” e “avanços” dos novos
modelos de gestão de áreas de proteção integral, aborda os limites dos modelos
tradicionais de gestão das áreas protegidas, analisa as mudanças e mecanismos
para viabilizar a participação na gestão das áreas protegidas no Brasil e termina com
as primeiras avaliações dos avanços possibilitados pelos novos modelos.
Parte-se, então, para o estudo dos conflitos e cooperação entre a ESEC e
comunidade local no Taim. Inicialmente expõe-se a metodologia utilizada para a
realização da presente pesquisa, são apresentadas as características naturais da
região costeira do Rio Grande do Sul e as motivações para criação da Estação
Ecológica do Taim. A secção seguinte se desbruça sobre a caracterização da
comunidade local e descrição de suas percepções sobre influência da área de
proteção em suas vidas e sobre as iniciativas de conciliação dos propósitos de
17
conservação e desenvolvimento no entorno e na gestão da ESEC Taim. Finalmente,
são apresentadas algumas considerações merecedoras de reflexão sobre conflitos e
cooperação nas relações entre áreas de proteção e comunidades locais.
18
2 ORIGENS E EVOLUÇÃO DAS DEMANDAS SOCIAIS PELA
CRIAÇÃO DE ÁREAS PROTEGIDAS
Todas as sociedades humanas dependem da natureza para seu
desenvolvimento, mas a maneira como se relacionam com ela é influenciada por sua
cultura e forma de organização econômica.
Em diversas situações históricas sociedades se confrontaram com previsões
de escassez de recursos naturais socialmente valorizados discutindo sobre medidas
com vistas a sua “proteção”. Tais situações estariam, por exemplo, na origem da
instituição de normas em defesa das florestas naturais (para sustentação do acesso
à recursos madeireiros, assegurar a disponibilidade de água e diminuir a erosão dos
solos) ou na criação de “reservas de caça” para proteção de certas espécies
animais. Assim, conforme Ramade (1979, p.453): “A necessidade e o desejo de
preservar certas reservas naturais manifestaram-se em diversas sociedades
humanas, de nível cultural muito variado, muito mais cedo do que geralmente se
acredita.”
As sociedades ocidentais nos últimos séculos vinham se orientando por um
“ímpeto expansionista” a busca pelo crescimento - que se refletia em sua cultura
(valorizadora do “progresso”) e organização econômica (capitalista), o que resultou
numa crescente artificialização da natureza. Segundo diversos autores a velocidade
e magnitude dos processos de artificialização da natureza (e degradação)
provocados pelas sociedades ocidentais constituíram ameaça à oferta de recursos e
serviços ambientais socialmente valorizados, intensificando reações de “proteção da
natureza”. Embora existam diversas estratégias para assegurar a oferta de recursos
e serviços ambientais socialmente valorizados, entendeu-se que certos casos
requerem estabelecimento de áreas com restrição da intervenção humana na
natureza áreas protegidas. Segundo Scherl et al. (2006, p.7) as áreas protegidas
são definidas pela União Internacional para Conservação da Natureza (UICN) como:
[...] uma superfície de terra ou mar especialmente consagrada à proteção e
preservação da diversidade biológica, assim como dos recursos naturais e
culturais associados, e gerenciada através de meios legais ou outros meios
eficazes.
19
Os argumentos em defesa da criação de áreas protegidas variaram ao longo
da história. O presente capítulo visa uma contextualização da questão da criação de
áreas protegidas com a identificação da trajetória dos movimentos sociais
relacionados à questão ambiental e sua visão sobre as áreas protegidas. Seguindo
tendências observadas na literatura brasileira sobre o tema e, considerando os
objetivos do presente trabalho, distinguem-se as perspectivas do movimento
conservacionista, ecologista, ambientalista e socioambientalista.
1
2.1 Iniciativas de “defesa da natureza selvagem” e o conservacionismo
Conforme Ramade (1979, p.454, grifo nosso) “[...] a primeira reserva natural
dos tempos modernos foi criada não por biólogos, mas por um grupo de pintores
franceses que, em 1853, conseguiram colocar sob a proteção de uma lei uma parte
de uma floresta de Fontainebleau, a fim de conservar sua beleza.”
Para entender tais circunstâncias, convém reconhecer, com Simmonet (1981,
p.115), que a defesa da natureza foi associada a alguns filósofos, dos quais o mais
ouvido foi sem dúvida Jean Jacques Rousseau que protestava contra os espíritos
excessivamente quadrados dos tecnocratas do século XVIII, este alegava que
pretendiam “colocar as árvores em sentido” nos jardins à francesa, o autor
questionava se a natureza empregaria sempre o esquadro e a régua.
Tais aportes levam a reconhecer a importância do movimento romântico na
constituição de uma visão valorizadora da “natureza” que, contestando a visão
mecanicista e utilitarista da natureza que então se afirmava com o advento da
ciência ocidental, a vê como objeto de admiração e contemplação estética.
2
1
Embora estas categorias não sejam consolidadas na literatura entende-se que sua distinção é
conveniente para o presente trabalho tendo em vista que a cada visão pode corresponder uma
proposta de manejo das áreas protegidas que têm conseqüências significativas na determinação do
impacto social de sua operação.
2
Diversos autores reconhecem a existência de reivindicações que, partindo de uma crítica ao
progresso e seus valores, vêem o ser humano como parte da natureza e na criação de “áreas
protegidas” a possibilidade de resguardar a natureza selvagem das forças degradantes do progresso.
Este movimento caracteriza-se por uma defesa da “natureza selvagem” e a percepção de que esta
estaria ameaçada pelo avanço do progresso.
20
Cabe reconhecer que este movimento não se restringiu ao espaço cultural
europeu. Nos Estados Unidos, consideram-se Henry Thoreau e Gary Snyder como
expoentes na luta pela sensibilidade ecológica, estes eram considerados os poetas
do poder verde, que viam na água e nas árvores classes tão exploradas como o
proletariado (SIMMONET, 1981, p.111-2).
3
Neste contexto, áreas e paisagens de particular beleza tenderam a ser
socialmente valorizadas a ponto de serem consideradas “riquezas naturais”.
Conforme Ramade (1979, p. 454) a primeira decisão destinada a proteger as
riquezas naturais na América foi tomada pelo presidente Lincoln em 1864, quando
fez com que o Congresso dos EUA votasse por unanimidade, uma lei que confiava
ao Estado a incumbência de manter em estado natural a área que veio a constituir o
parque nacional de Yosemite e o bosque de Mariposa, com a finalidade de
salvaguardar as excelentes sequóias gigantes que estavam sendo exageradamente
exploradas.
Conforme relata Vallejo (2003) uma das motivações para a criação destas
áreas era a tentativa de “salvar pedaços de natureza de grande beleza”, reservar
grandes áreas naturais para colocá-las a disposição das populações urbanas para
fins de recreação. Embora diversos autores (como Vallejo) partam do
reconhecimento de que a criação destas áreas usa de uma noção de antagonismo
entre intervenção humana e a finalidade de conservação, possivelmente acreditava-
se que a beleza destas áreas haveria de ser desfrutada pela população em geral
razão pela qual se preconizava o seu uso para fins recreativos (turístico
possivelmente desde que controlado) o que não era percebido como uma ameaça à
preservação da “vida selvagem”. Assim em torno destas áreas favoreceu-se o
turismo e, deste modo, motivações econômicas podem estar na base da criação de
muitas destas áreas.
Outras preocupações, aos poucos, emergiram à esfera política em defesa da
criação de áreas protegidas. Conforme Vallejo (2003, p.3) “Com a virada do século
XX, parques e reservas similares [ao Yelowstone] foram sendo criados em vários
3
A contraposição a visão mecanicista da natureza também se revela em John Muir (século XIX).
Diegues (2001) aponta que John Muir segue um pressuposto que se baseia no respeito pela
natureza, o reconhecimento da constituição de uma comunidade onde os seres humanos também
fazem parte. Nas colocações desse mesmo autor, não somente os animais, mas os vegetais, e até as
rochas e a água eram fagulhas da Alma Divina. Essas idéias, que defendiam que o homem não
poderia ter direitos superiores aos animais, receberam um suporte científico da História Natural, em
particular da teoria da evolução de Charles Darwin (1809-1882).
21
países. Além da proteção de belezas cênicas admiráveis, a criação de novos
parques agregou outras motivações como a preservação da biodiversidade florística
e faunística e dos bancos genéticos.[...]
4
.” Cabe reconhecer que estas
reivindicações tendem a agrupar-se em torno de um movimento social mais
abrangente, que se configura nesta época, muitas vezes denominado movimento
“conservacionista”. Segundo Santos e Oliveira (2007) o conservacionismo foi
iniciado pelo engenheiro florestal, Gifford Pinchot, no século XIX, como um protótipo
do atual modelo de desenvolvimento sustentável. Esta visão se caracteriza por
reivindicar o uso racional dos recursos; o uso dos recursos pelas gerações presentes
e futuras; que se evitem os desperdícios; o uso dos recursos a favor do benefício da
maioria da população; a diminuição dos dejetos e da ineficiência da utilização dos
recursos naturais não renováveis.
5
Diegues (2001) acrescenta que se a visão
preservacionista [inspirada no romantismo] pode ser exposta como a reverência à
natureza no âmbito da apreciação estética e espiritual da vida selvagem
(wilderness), almejando proteger a natureza, se precavendo do desenvolvimento
moderno, industrial e urbano; o ponto chave da "conservação dos recursos" é a
exploração apropriada e criteriosa dos recursos naturais.
No que se refere à criação de áreas protegidas nas reivindicações
conservacionistas da época ela aparece, sobretudo, como forma de proteger um
patrimônio natural e uma necessidade para assegurar a sobrevivência de espécies
vegetais e animais ameaçadas de extinção através da utilização racional dos
recursos levando em conta as gerações atuais e futuras.
2.2 O Ecologismo e a defesa dos “ecossistemas”
4
A perspectiva científica de criação de parques acabou reforçando a idéia de que a presença
humana nessas áreas deveria ser permitida em situações muito particulares e restritas (ou tira
aspas ou indica fonte)
5
Lima (1999) destaca o relatório publicado em 1980 pela IUCN (International Union for Conservation
of Nature), intitulado "World Conservation Strategy", que confirma prioridades conservacionistas e
conclama cada país a constituir suas diretrizes de atuação, fundamentalmente baseado em 3
princípios: uso sustentável dos recursos, manutenção dos processos ecológicos e preservação da
diversidade genética (IUCN, 1993).
22
Segundo Viola (1988) a Conferência das Nações Unidas sobre Meio
Ambiente de Estocolmo em 1972, marcou o despertar da consciência ecológica no
mundo. O mesmo autor cita o relatório Meadows (1972) que aborda os limites do
crescimento
6
; como relacionado ao aparecimento do paradigma teórico da ecologia
política e propagação de movimentos sociais ecologistas no mundo não ocidental
como fatores determinantes nesta nova abordagem. Pela primeira vez as
conseqüências da degradação dos recursos naturais provocadas pelo crescimento
econômico são percebidas como um problema de todo o mundo, que vai além das
diversas questões pontuais que eram apontadas nas cadas de 50 e 60 pelas
instituições estatais de meio ambiente dos países do Primeiro Mundo.
Viola (1988) coloca que os movimentos ecológicos se desenvolveram na
década de 1970 no clima de crise do marxismo, e apresenta três fatores
fundamentais na base desta crise: o estilo totalitário do socialismo real, a
complexidade sócio-política do capitalismo contemporâneo e a crise ecológica. Esta
crise questiona no seu cerne o marxismo: o conceito do valor-trabalho, a infinitude
dos recursos naturais e concepção de natureza como uma peça passiva sem valor.
O ecologismo se apresenta como uma critica ao utilitarismo não somente nas
relações dentro da sociedade (como acontece no marxismo), mas também, e
principalmente, nas relações sociedade-natureza. Nesta ótica os movimentos
ecológicos e pacifistas se apresentam como um ponto de destaque na história da
mobilização social e da ação coletiva: trata-se de movimentos possuidores de
valores e interesses universais acima das fronteiras de classe, sexo, raça e idade
(VIOLA, 1988).
Segundo Viola (1988) a expectativa do movimento ecológico para os países
do Primeiro Mundo era de promover uma ação de educação ambiental generalizada
(que implicaria uma enorme reconfiguração da distribuição do poder na sociedade),
o que tornaria possível e provável a incorporação, pela grande maioria da
população, de valores pós-materialistas, tendo como conseqüência o autocontrole
na satisfação das necessidades materiais. Enquanto que no terceiro mundo a
6
Publicado em 1972, foi o resultado do trabalho de investigação realizado por uma equipe do
Massachusetts Institute of Technology (MIT) coordenada por Donella Meadows, a pedido do Clube de
Roma, uma associação informal de empresários, estadistas e cientistas. O Relatório, conhecido por
Relatório de Roma, trata essencialmente de problemas cruciais para o futuro desenvolvimento da
humanidade tais como: energia, poluição, saneamento, saúde, ambiente, tecnologia, crescimento
populacional, entre outros.
23
expectativa era de uma ação que visava o desenvolvimento ecológico auto-
sustentado e socialmente justo resultando na elevação do nível de consumo material
das grandes massas da sociedade, no mesmo sentido se estagnaria e racionalizaria
o consumo das classes médias, e promoveria a redução do consumo das classes
altas.
Devido a este estilo reestruturador cultural e político tão marcante do
movimento ecológico ele se transforma no eixo do surgimento de uma nova vaga de
partidos políticos, os partidos verdes ou ecopacifistas (BUSKLIN, 1985 apud VIOLA,
1988). Estes novos partidos com valores que não ambicionavam se tornar
majoritários, enquanto partidos, e governar ou tomar revolucionariamente o poder,
procuravam atuar como transformadores da cultura política inserindo valores pós-
materialistas.
7
Viola (1988) argumenta que os ecologistas realistas apostavam na
probabilidade de mudança da sociedade, começando pela construção e
desenvolvimento de um movimento ecologista rigoroso nos princípios e flexível na
relação com a sociedade. Viola (1986) acrescenta que o referencial normativo do
ecologismo é um sistema sócio-econômico totalmente distante do capitalismo e do
socialismo, fundamentado na pequena propriedade privada e na propriedade
cooperativa (majoritariamente média, e poucas grandes) com autogestão do sistema
produtivo e maior destaque no Estado de nível local (município, região) como
provedor de recursos. Entretanto o meio para se chegar até esse ponto passa por
uma extensa transição, incutindo princípios ecológicos continuamente ao capitalismo
e socialismo estabelecidos.
Embora o foco do ecologismo fossem os processos macro-sociais entende-se
que, no que se refere às áreas protegidas, o advento da consciência ecológica veio
associado à introdução de nova visão (sistêmica) e novos conceitos que repercutem
na política de criação de áreas protegidas. Em geral passa-se a adotar novos
critérios para seleção, demarcação, justificação e manejo das áreas.
Surgem preocupações com identificação de “ecossistemas representativos”,
reconhecimento da importância das noções de entorno, valorização da pesquisa
7
Pode se tomar como exemplo o primeiro partido verde criado na Nova Zelândia em 1969, este
conseguiu em pouco tempo afetar fortemente a cultura política, incorporando valores ecológicos nos
dois partidos tradicionais no poder (Trabalhista e Nacional) Viola (1988).
24
sobre estrutura e dinâmica de “sistemas naturais” e mantém-se o ideal de
estabelecer restrições ao uso humano nas áreas protegidas.
2.3 O Ambientalismo e a defesa do “meio ambiente”
Lima (1999), ao comentar a obra de Leis (1999) de caracterização do
ambientalismo, coloca que, para o autor, a linha que conduz à complexa rede do
ambientalismo parece ser seu potencial inovador e base de sua habilidade de
integrar as múltiplas dimensões da realidade, muitas vezes avaliadas de maneira
fragmentária e reducionista. Nesse âmbito, o ambientalismo tem originado novas
reflexões e sínteses entre a economia e a ecologia, a cultura e a natureza, a ética e
a política, a ciência e a religião, as artes e a filosofia. O mesmo autor acrescenta que
essa característica do ambientalismo determina sua natureza de movimento
histórico-vital, que se baseia numa articulação plural de atores, valores e interesses
sociais que, mesmo diferenciados, se complementam na composição de um
panorama de enorme riqueza cultural.
Conforme Lima (1999), no caso da visão dos ambientalistas, “as evidências
de insustentabilidade das sociedades atuais se exprimem no conteúdo
antropocêntrico da cultura ocidental, considerando-se que esses fatos geram e
perpetuam o afastamento entre a sociedade e a natureza”. Por outro lado
contribuem para a miséria espiritual visível na “autofagia consumista e no império do
mercado”, para a instrumentalidade da razão e do conhecimento hegemônicos e
para o individualismo quase autista das sociedades modernas.
Essa análise crítica da sociedade e civilização contemporâneas, da visão
ambientalista, confirma, por várias perspectivas, a insustentabilidade de modos de
vida individual, social e das relações com os recursos naturais contemporâneos.
8
As preocupações mais comuns dos ambientalistas na década de 1980,
arroladas por Viola (1988), eram as seguintes: poluição ostensiva da atmosfera ou
do sistema de águas pela indústria; projetos de instalação industrial com suspeitas
8
E, por outro lado, é nesse diagnóstico menos encorajador que surge a esperança para enxergar a
possibilidade de outra sociedade global, motivada por novos princípios éticos espirituais. (LIMA,
1999).
25
de grande impacto ambiental; preservação de uma área verde em risco de
deterioração por um uso particular semi-clandestino ou uso destrutivo pelo poder
público; degradação de áreas de preservação ecológica definidas legalmente por
falta de fiscalização das entidades estatais (parques nacionais e estaduais,
manguezais, etc.)ou ameaça de destruição de uma área urbana com valor histórico-
arquitetônico pela especulação imobiliária.
9
Além de lutarem por avanços na regulação ambiental exercida pelo Estado,
concretizados em políticas ambientais mais sistêmicas e inclusivas, nesta mesma
época ganha força a noção de criação de áreas protegidas para assegurar
serviços ambientais como as APAs (área de proteção ambiental) que constitui
um tipo especial de área protegida, valorizada especialmente por sua importância
para as sociedades (como as áreas de nascentes de bacias hidrográficas que
abastecem centros urbanos).
2.4 O Socioambientalismo e a etnoconservação
O socioambientalismo passou a ser uma alternativa ao
conservacionismo/preservacionismo ou movimento ambientalista tradicional, mais
afastados dos movimentos sociais e das lutas políticas por justiça social, e cético
quanto à probabilidade de envolvimento das populações tradicionais na conservação
da biodiversidade (SANTILLI, 2005).
Segundo Santilli (2005) o socioambientalismo foi arquitetado a partir da
premissa de que as políticas públicas ambientais devem incluir e envolver as
comunidades locais, possuidoras de conhecimentos e de práticas de manejo
ambiental. Mais do que isso, desenvolveu-se a partir da visão de que, em um país
9
Um marco importante apresentado por Viola (1988) é a fundação da Associação Gaúcha de
Proteção ao Ambiente Natural (AGAPAN), a primeira associação ecologista criada no Brasil e na
América Latina. Este fato ocorreu em junho de 1971, graças a um grupo encabeçado pelo engenheiro
agrônomo José Lutzenberger. As diretrizes principais do programa fundacional da AGAPAN eram os
seguintes: proteção da fauna e da vegetação; luta contra o uso indiscriminado de inseticidas,
fungicidas e herbicidas; combate à poluição industrial e domiciliar dos resíduos não tratados; combate
a deterioração dispensável de belezas paisagísticas; redução do uso dos meios mecânicos contra o
solo e à poluição provocada pelas indústrias e veículos; promoção da ecologia como ciência da
sobrevivência e difusão de uma nova moral ecológica.
26
pobre e com tantas desigualdades sociais, um novo paradigma de desenvolvimento
deve promover não a sustentabilidade estritamente ambiental (a sustentabilidade
de espécies, ecossistemas e processos ecológicos), como também a
sustentabilidade social, deve contribuir também para a diminuição da pobreza e das
desigualdades sociais e originar valores como justiça social e eqüidade.
10
Por outro
lado, o novo paradigma de desenvolvimento recomendado pelo socioambientalismo
deve estimular e valorizar a diversidade cultural e a consolidação do processo
democrático no país, com ampla participação social na gestão ambiental. Santilli
(2005) salienta que a articulação entre meio ambiente e democracia é estimulada
pelo socioambientalismo, e a participação social na gestão ambiental é, atualmente,
um dos princípios principais e norteadores da legislação constitucional e
infraconstitucional e de toda a política ambiental.
11
Entende-se que as contribuições do socioambientalismo no que tange às
áreas protegidas, abarcam tanto a questão da participação na gestão ambiental
quanto o desenvolvimento de uma proposta de Etnoconservação.
Segundo Faria (2002) o etnoconservacionismo enfatiza a necessidade de se
estabelecer uma aliança entre o homem e a natureza, fundamentada na importância
das comunidades tradicionais indígenas e não-indígenas nesse tipo de conservação
das matas e outros ecossistemas presentes nos territórios em que habitam.
12
Apresenta-se como a valorização do conhecimento e das práticas de manejo dessas
populações. Nessa ótica, uma das prioridades é envolver as populações tradicionais
na pesquisa para a conservação como co-pesquisadores e treinar uma nova
geração de pessoas de várias culturas para iniciar estudos junto de seus próprios
povos (DIEGUES, 2000).
Diegues (2000) coloca que a diversidade cultural, apontada como condição
para manutenção da diversidade biológica, somente prosseguirá se as comunidades
10
O socioambientalismo surgiu fundamentado na premissa de que as políticas públicas ambientais
teriam eficácia social e sustentabilidade política se abarcassem as comunidades locais e
promovessem uma repartição socialmente justa e eqüitativa dos benefícios decorrentes da
exploração dos recursos naturais.
11
Para seus defensores este enfoque deverá ser abordado na superação das divergências que hoje
separam os ecologistas sociais e os preservacionistas, tanto que uma das principais ameaças está
vindo das instituições neoliberais que acham que a conservação poderá ser atingida por mecanismos
de mercado.
12
Segundo Farias (2002, p.60) Esse contexto tem levado ainda a análise antropológica sobre as
comunidades tradicionais a rever o sentido de conservacionismo ambiental ou ecoconservacionismo.
Dentro dessa nova ótica, a postulação mais recente para entender o comportamento político, social,
econômico e cultural dos “comunitários” tem sido o termo etnoconservacionismo.”
27
tradicionais continuarem a ter acesso aos recursos naturais de seu território e não
forem expulsas, seja pela especulação imobiliária, ou pela implementação de áreas
protegidas. O autor acrescenta que a criação de áreas protegidas, em vez de ser
baseada na idéia importada de natureza selvagem intocada, deveria fundamentar-se
na compreensão da paisagem como mosaico de ecossistemas e habitats, um
contínuo que abrange desde porções de matas nativas até áreas de agricultura
tradicional e que, em muitos casos, constitui território de comunidades tradicionais.
2.5 Convergências e divergências de diferentes movimentos em defesa da
criação de áreas protegidas
Pela exposição apresentada neste capítulo, diversos movimentos
reivindicaram, ao longo da história, a criação de “áreas protegidas” como áreas de
intervenção humana restrita. As motivações para a criação destas áreas foram tanto
de ordem estética, como econômica (valor para turismo), ou de preservação de
espécies ameaçadas de extinção, de ecossistemas representativos, da
biodiversidade, dos serviços ambientais e, ultimamente, como requisitos da
diversidade cultural.
Neste processo é importante reconhecer a convergência de um conjunto de
interesses em torno da criação de áreas protegidas sujeitas a restrição absoluta da
intervenção humana “intocadas”. Conforme Diegues (2000) conservacionistas,
preservacionistas, defensores da ecologia profunda
13
e biólogos da conservação
14
se uniram em defesa de uma política de criação de áreas protegidas que prevê que
“A natureza, para ser conservada, deve estar separada das sociedades humanas”.
Segundo Diegues (2001) os grupos que defendem esta visão são formados,
normalmente, por profissionais provenientes da área das ciências naturais que
tendem a considerar que toda influência humana na natureza é negativa.
13
Ecologia profunda constitui linha de pensamento que defendia que a vida humana e não humana
tem valores intrínsecos independentes do utilitarismo; considera que os humanos não têm o direito de
reduzir a biodiversidade; exceto para satisfazer suas necessidades vitais. (DIEGUES, 2000)
14
Biólogia da conservação é uma disciplina científica que nasceu no final dos anos 60 com o
objetivo de associar ciência e gestão ambiental. Esta disciplina tende a embasar a ação
conservacionista utilizando os conhecimentos adquiridos das teorias ecológicas e da biologia das
populações, com influência da teoria da biogeografia insular e das pesquisas relativas à probabilidade
de extinção das espécies (DIEGUES, 2000)
28
Ideologicamente, resultam da visão preservacionista americana, assumem desse
modo que a natureza selvagem é intocada e intocável e entendem que não é
possível que uma área protegida proteja, além da diversidade biológica, a
diversidade cultural.
Este modelo de área protegida contrapõe-se àquele preconizado por aqueles
que a buscam como forma de assegurar a diversidade cultural (especialmente de
populações extrativistas) ou buscam a biodiversidade através dos princípios da
etnoconservação, por exemplo, e que colocam que a diversidade biológica almejada
pode ser produto da intervenção humana. Diegues (2001) como exemplo o caso
da agricultura de corte e queima que estimula o desenvolvimento da biodiversidade,
tendo em conta que pode ser considerada uma forma de manejo das plantas
daninhas.
Como produto da contraposição destes movimentos, entre outros fatores,
distinguem-se, atualmente, dois modelos gerais de áreas protegidas (GONÇALVES,
2007):
- áreas de proteção integral (ou de uso indireto) - cujo objetivo básico é preservar a
natureza, sendo admitido apenas o uso indireto dos recursos naturais.
- áreas de uso sustentável (de uso direto) que objetivam compatibilizar a
conservação da natureza com o uso sustentável de parcela dos recursos naturais
existentes em seu interior.
Dentro de cada uma destas categorias gerais distinguem-se tipos específicos
de áreas protegidas conforme a motivação dominante para criação das áreas, que
podem ser
15
:
- áreas com ecossistemas, atributos físicos, geológicos e/ou espécies
representativos e/ou excepcionais;
- grandes áreas pouco ou o modificadas que mantêm suas características
naturais, sem significativa habitação humana que são administradas para
preservação da sua condição natural;
15
Os diferentes objetivos das áreas protegidas, aqui apresentados, são derivados da classificação de
áreas protegidas da UICN.
29
- áreas destinadas à proteção da integridade ecológica de um ou mais ecossistemas
para as gerações presentes e futuras, excluindo exploração ou ocupação
inadequada aos objetivos; provê visitação, recreação e usos científicos e culturais;
- áreas com uma ou mais características naturais/ culturais específicas excelentes
ou únicas por causa de sua raridade, representatividade ou qualidades estéticas;
- áreas sujeitas a manejo ativo para fins específicos a fim de manter habitats ou
satisfação de necessidades de espécies específicas;
- áreas de terra, com costa e mar, geralmente com alta biodiversidade, onde a
interação com pessoas ao longo do tempo produziu características estéticas,
ecológicas e/ou culturais significativas; e
- áreas contendo predominantemente ecossistemas não modificados, manejados
para manter a proteção da biodiversidade em longo prazo, mas também prover
produtos de forma sustentável às comunidades.
No presente capítulo fica evidente a importância do cenário ambiental e
político vigente no mundo e no Brasil, tanto que os movimentos sociais ligados a
criação de áreas protegidas vão se adaptando e criando novas possibilidades, que a
legislação por fim passa a reconhecer.
Nas primeiras fases dos movimentos sociais de defesa da natureza a
participação social na formulação da legislação e das políticas governamentais era
limitada. Mas as mudanças nas políticas ambientais acompanharam as mudanças
no panorama político dos Estados de modo que, atualmente, a democracia
predominante na maioria dos países do mundo possibilita o fortalecimento do
socioambientalismo, pois a participação é a base da democracia.
30
3 OS PROCESSOS DE IMPLANTAÇÃO DE ÁREAS DE PROTEÇÃO
INTEGRAL: CARACTERÍSTICAS E IMPACTOS SOCIAIS
As preocupações com as questões relativas ao esgotamento dos recursos
naturais, degradação ambiental, desequilíbrio dos ecossistemas e biodiversidade
levantadas pelos movimentos sociais descritos no capítulo anterior tiveram eco em
todos os países.
A internalização das preocupações com questões de ordem ambiental veio
associada à adoção de um conjunto de políticas, dentre as quais se inclui a criação
de áreas protegidas.
Após uma primeira fase em que o modelo de conservacionismo norte-
americano baseado em parques nacionais (a exemplo de Yelowstone) expandiu-se
com muita rapidez pelo mundo gerando iniciativas isoladas de cada país, houve um
esforço internacional de articulação das estratégias de conservação da natureza dos
diferentes países. Assim, atualmente, as iniciativas de criação de áreas protegidas
geralmente resultam de convergências de interesses internos e externos à
população de determinada Nação. Como resultado destes processos observa-se
um significativo aumento das áreas protegidas no mundo e criação de sistema
internacional de referência para sua classificação e gestão.
O presente capítulo visa apresentar os avanços em termos de superfície
protegida, as características dos processos de implantação e aproximar aos
impactos sociais da criação de áreas de proteção integral. Apresenta uma breve
contextualização inicial da estrutura de apoio à conservação da natureza em nível
internacional para, então, discorrer sobre a experiência brasileira.
3.1 Criação e implantação de áreas protegidas: uma preocupação mundial
Kervran (2005) ao analisar as políticas de conservação da natureza na
América Latina argumenta que para compreendê-las é necessário levar em conta o
papel exercido pelos “atores” internacionais.
31
Conforme Ramade (1979) no que se refere à conservação da natureza, um
fato marcante foi a criação da UICN (União Internacional para a Conservação da
Natureza) em 1948. A UICN, na qualidade de união, procura influenciar, encorajar e
auxiliar sociedades em todo o mundo a conservar a integridade e diversidade da
natureza, além de buscar que toda utilização de recursos naturais seja praticada de
maneira eqüitativa e ecologicamente sustentável. A UICN recorre à força de seus
membros, redes e parceiros para incrementar sua capacidade e apoiar alianças
globais com a finalidade de proteger os recursos naturais a nível nacional, regional e
global (SCHERL et al, 2006).
Além da maior organização das entidades que atuam em defesa da
conservação da natureza, a intensificação da preocupação em torno à problemática
ambiental repercutiu no aumento das áreas protegidas a partir da década de 1960,
como ilustra a figura 1.
Figura 1 -
Crescimento cumulativo das áreas protegidas a cada 5 anos no
período 1872-2003
Fonte: Chape et. al. (2003, p.26).
32
Esta evolução das áreas protegidas foi acompanhada pelo crescimento muito
rápido do número de áreas de proteção integral entre 1960 e 1980. Esse fato é
justificado pelo início do turismo e reação à deterioração dos ecossistemas devido à
reforma agrária combinada com a revolução verde, quando a agricultura industrial
transformou completamente o meio rural (KERVAN, 2005).
As tabelas 1 e 2 apresentam a percentagem de área territorial coberta por
áreas protegidas por continente.
Tabela 1 - Percentual de área coberta por UC`s nos continentes, década de
1980
Fonte: Cardoso (2007, p.59)
33
Tabela 2 - Áreas Naturais Protegidas no Brasil e no Mundo
Fonte: World Resources Institute (2000-01 apud VALLEJO, 2003).
Os dados das tabelas mostram que a superfície coberta por áreas protegidas
no mundo vêm crescendo nas últimas décadas, isso fica evidente também quando
se faz a comparação por continentes. A tabela 2 expõe a grande influência dos
acordos internacionais na criação das áreas protegidas, tanto que quase metade da
área ocupada pelas áreas protegidas em todo mundo resultou de acordos
internacionais. Nos países em desenvolvimento a influência dos acordos
internacionais esta bastante evidente, pois o número das áreas protegidas criadas
nesses países através de acordos internacionais é aproximadamente metade em
relação aos países desenvolvidos, mas o número total de áreas protegidas nos
países em desenvolvimento é cinco vezes menor que o dos desenvolvidos.
Kervan (2005) o aumento das áreas protegidas nas cadas de 1980 e
1990 como fruto da ação combinada de instituições financeiras internacionais,
organizações de cooperação internacional e grandes ONGs ambientalistas.
34
Segundo este autor essas entidades criaram políticas que possibilitaram fontes de
financiamento internacional para a multiplicação dos projetos de conservação
executados pela maioria dessas entidades.
Nas colocações de Kervan (2005) fica evidente a forte influência do norte,
concretamente dos atores americanos, nas políticas de conservação em todo
mundo. O autor explica que as políticas de conservação foram fortemente
aceleradas pela ação das três maiores ONG`s internacionais com origem americana,
o WWF (Fundo Mundial Para Natureza), o TNC (
The Nature Conservancy) e
Conservação Internacional. O papel destas três ONG`s internacionais cresceu muito
durante os anos 90 chegando a constituir uma espécie de oligopólio da
conservação, apoiado por uma logística complexa com os seus assentos em
Washington e os escritórios a nível nacional. As três entidades têm um papel
essencial de fiador na administração financeira, na produção de informação
especializada, na divulgação das normas internacionais e na formação do pessoal
nacional que atua com as áreas protegidas (KERVAN, 2005). Estas entidades
encontraram na América Latina um espaço de ação privilegiado. Apesar de
possuírem histórias diferentes e da competição entre elas, atualmente possuem
escritórios na maioria dos países do continente signatários das convenções
internacionais e têm uma relação privilegiada com a USAID (Agência Americana
para o Desenvolvimento).
O autor entende que os “atores internacionais” tanto influenciam no sentido de
colocar a criação de áreas protegidas na agenda e incentivá-las, quanto
desenvolveram modelos de referência para isto. Os modelos de referência
passaram a ser discutidos internacionalmente, e apresentaram certa “evolução” ao
longo do tempo encontrando-se hoje um mosaico de “tipos de unidades de
conservação” para contemplar a diversidade de propósitos para os quais são
criadas. O sistema de referência desenvolvido pela IUCN distingue os seguintes
tipos de categorias de áreas protegidas:
Categoria Ia: Reserva natural rígida - área destinada principalmente a pesquisas
científicas e/ou monitoramento ambiental;
Categoria Ib: Área de selva - área destinada principalmente para a proteção de
selva;
Categoria II: Parque nacional - área destinada principalmente para proteção de
ecossistemas e recreação;
35
Categoria III: Monumento natural - área destinada para a conservação de
características naturais específicas;
Categoria IV: Área de gestão de habitats ou espécies - Área destinada à
conservação através de intervenção de manejo;
Categoria V: Paisagem terrestre e marítima protegida - área destinada para a
conservação de paisagens e recreação; e
Categoria VI: Áreas protegidas para gestão de recursos - área manejada
principalmente para o uso sustentável dos recursos naturais.
Figura 2 - Tendências da superfície terrestre sob proteção por categoria da
UICN
Fonte: UNEP, Centro de Monitoramento da Conservação Mundial
A Figura 2 evidencia que algumas categorias têm maior representatividade
(em termos de área total) destacando-se os parques nacionais, tipo II, que
constituem áreas de proteção integral e áreas de uso sustentável (tipo VI) onde as
36
restrições a intervenção humana são menos severas. È importante observar que a
superfície das áreas de proteção integral (com restrições absolutas a intervenção
humana) no mundo (abrangendo tipo Ia, Ib, II e III) continua se ampliando.
As avaliações da participação das áreas de proteção integral no total de áreas
protegidas na América Latina a partir da base de dados da UICN são prejudicadas
pelo grande número de áreas sem classificação, mesmo assim constata-se que
constituem cerca de 50% das áreas protegidas com categoria identificada.
Figura 3 - Número e extensão de áreas protegidas na America do sul e Brasil
Fonte: Chape et al (2003, p. 42).
Muitos autores, analisando pelo lado econômico da questão, percebem a vida
selvagem como um grande negócio, pois estes ambientes, neste caso, se
apresentam para o turista como uma janela para o passado. O crescimento do
mercado turístico, baseado no ecoturismo, leva os países de todo mundo a buscar
37
programas com a finalidade de demarcarem áreas prioritárias para a conservação
(SANTOS; OLIVEIRA, 2007).
Segundo Ramashandra Guha (1997 apud SANTOS; OLIVEIRA, 2007),
existem cinco grandes grupos que se beneficiam financeiramente da conservação da
vida selvagem:
I) Populações das cidades e turistas: prazer e recreação;
II) Membros de governos: veneração de um símbolo de prestígio nacional;
III) Organizações ambientalistas internacionais: educar as pessoas nos conceitos da
biologia da conservação;
IV) Funcionários dos serviços dos parques: benefícios provenientes da decorrência
do “amor à natureza”;
V) Biólogos: defendem a importância da vida selvagem e a preservação das
espécies a favor da ciência.
Nessa argumentação de Ramashandra Guha os cinco grupos se juntam na
hostilidade em relação aos camponeses, pastores e caçadores que moravam no
território antes da formação das áreas protegidas. Este grupo percebe as
comunidades humanas como sendo responsáveis pelas conseqüências negativas
sobre o meio ambiente, e interpretam suas formas de vida como promotoras da
extinção das espécies, erosão do solo, simplificação de habitats e outros processos
mais sérios. O autor destaca uma crítica importante às grandes entidades
conservacionistas do mundo, que é o fato de prestarem mais atenção às questões
biológicas (fauna e flora) e deixarem de lado as questões humanas (SANTOS;
OLIVEIRA, 2007).
Entretanto, hoje um maior reconhecimento de que o modelo Yellowstone
não se adapta à realidade dos países do sul, porque gera uma espécie de crise
socioambiental. As populações retiradas dos parques precisam de toda uma
estrutura pré-estabelecida de modo que os prejuízos provocados ao seu modo de
vida sejam os menores possíveis e isto geralmente não acontece. Deste modo,
avalia-se que este modelo de área de proteção proveniente de países
industrializados não responde as expectativas e as percepções em torno da relação
homem/natureza dos países do sul. Na explanação de Santos e Oliveira (2007)
ficam evidentes as críticas ao modelo preservacionista norte-americano, onde se
destacam as seguintes características:
38
a) separatista: promove a dicotomia entre pessoas e parques. Segrega, desse modo,
as populações tradicionais que moravam no lugar, provocando danos irreversíveis à
essas comunidades;
b) mitológico: “busca recriar o mito da natureza intocada, do paraíso perdido”;
c) antropocêntrico: privilegia as comunidades urbanas e valoriza os seus valores
estéticos religiosos e culturais; e
d) discriminador: elege áreas de valor estético em prejuízo de outras que, com
menor valor estético, são fundamentais para a manutenção dos ecossistemas.
3.2 Criação e implantação de áreas protegidas no Brasil
Segundo Medeiros (2006) existe um consenso entre vários autores em
apontar o Parque Nacional de Itatiaia como a primeira área protegida do Brasil,
implantada em 1937 no Rio de Janeiro. O Parque Itatiaia resultou de longos anos
de debates e mobilizações iniciados no período colonial e imperial
Desde este período houve grande evolução na política de criação de áreas
protegidas que, além das unidades de conservação, englobam outros tipos de áreas,
como mostra Medeiros (Tabela 3)
Tabela 3 - Total de áreas protegidas no Brasil por tipologia
Fonte: Medeiros (2006)
39
Cabe destacar a ampliação da área sob proteção com objetivos
conservacionistas no período de 1997/ 2007 como evidencia o texto:
[...]Até 1997, haviam sido criadas 345 unidades de diferentes categorias, que
protegiam aproximadamente 47,5 milhões de hectares dos ecossistemas brasileiros. Em
março de 2007, o país contabilizava 596 unidades de conservação, ou 99,7 milhões de
hectares protegidos um incremento de mais de 100%. Quando somados a essa área
os 575 mil hectares de reservas privadas existentes, a superfície do território brasileiro
protegida por unidades de conservação ultrapassa 100 milhões de hectares. Além disso,
o governo federal, com a aprovação, em 2006, do Plano Estratégico Nacional de Áreas
Protegidas, passou a reconhecer a importância das terras indígenas - que somam mais
105 milhões de hectares -, para a conservação da biodiversidade e vem trabalhando
para fortalecer a integração dessas terras ao planejamento e à gestão da conservação
no Brasil.(GONÇALVES, 2007, p.13)
A política para as áreas protegidas no Brasil passou por uma reformulação
em julho de 2000, com a introdução da Lei 9.985 que marcou a política atual
relacionada à criação e gestão de unidades de conservação. Nesta data foi instituído
o Sistema Nacional de Unidades de Conservação (SNUC); sendo criadas 12
categorias de manejo divididas em dois grupos: o grupo das unidades de
conservação de proteção integral, composto por cinco categorias, e o grupo de
unidades de conservação de uso sustentável, com sete categorias (GONÇALVES,
2007), conforme Quadro 2.
40
Quadro 1 - Categorias de Unidades de Conservação e respectivos objetivos de
manejo conforme SNUC.
Fonte: Lei no 9.985/2000 - Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza (2000 apud
GONÇALVES, 2007).
Entre as unidades de conservação verificam-se diferenças cruciais nos seus
modelos de gestão. No caso das Reservas Extrativistas, que constituem uma
41
modalidade de unidade de conservação de uso sustentável, existem espaços
territoriais destinados à exploração auto-sustentável e conservação dos recursos
naturais renováveis pela população local, a propriedade continua nas mãos do
Estado e se estabelecem contratos de concessão de uso (decreto-lei n. 271, de
28/02/87), enquanto que na Estação Ecológica, que constitui uma unidade de
conservação de proteção integral, a legislação é mais rígida, não prevê a
presença humana dentro dos limites desse tipo de Unidade de Conservação, assim
não permite o auto-desenvolvimento e a liberdade de trabalho (PANZUTTI, 2003).
Segundo Panzutti (2003) a Estação Ecológica é uma das categorias das unidades
de conservação mais restritivas, tendo em conta que serve para conservar áreas
representativas de ecossistemas naturais onde somente serão realizadas pesquisas
básicas e aplicadas de Ecologia, visando a preservação do meio ambiente natural e
a melhoria da educação conservacionista.
A tabela 4 permite conhecer a representatividade de cada grupo de manejo
no total da área protegida.
Tabela 4 - Detalhamento do SNUC por grupo de manejo, jurisdição e condição
geográfica
Fontes: Atlas de Conservação da Natureza Brasileira Unidades Federais, IBAMA, 2004; Cadastro
Nacional de Unidades de Conservação/ MMA, Março 2007; CNRPPN.
A tabela 4 demonstra certo equilíbrio entre o número de unidades de proteção
integral e uso sustentável, com certa supremacia da área ocupada pelas unidades
42
sob jurisdição federal nos dois grupos de manejo. As UCs marinhas ainda são muito
reduzidas, provavelmente por se tratar de modelo mais recente.
Analisando-se os dados da tabela 5 que fornece o detalhamento do SNUC
por grupo de manejo, jurisdição e condição geográfica, quanto à representatividade
dos diversos biomas no grupo das unidades de conservação existentes, federais e
estaduais, é possível verificar que existe disparidade entre a área da Amazônia
submetida à proteção e a área dos demais biomas, com fraca expansão do bioma
pantanal e zona costeira e marinha.
Tabela 5 - Extensão e percentual de unidades de conservação por bioma e
grupo de manejo no Brasil
*
Não inclui as Reservas Particulares do Patrimônio Natural.
Fonte: Cadastro Nacional de Unidades de Conservação, março de 2007.
A tabela 6 apresenta a representatividade de cada categoria de manejo, onde
se evidencia a importância das áreas de proteção integral, com significativo número
de UC`s do tipo Estações Ecológicas e parques nacionais. Na ótica de Barbosa e
Santos (2008) as unidades de conservação de uso restrito vêm ganhando espaço
nas políticas públicas.
Tabela 6 - Número e área de unidades de conservação por categoria da IUCN e
sua equivalência segundo o SNUC.
43
Fontes: Atlas de Conservação da Natureza Brasileira Unidades Federais, Ibama 2004; Cadastro
Nacional de Unidades de Conservação/ MMA, março 2007; CNRPPN.
3.3 Impactos sociais relacionados à implantação de áreas de proteção integral
no Brasil
A questão das populações humanas tornou-se um tema central na discussão
das áreas protegidas em todo mundo. No cenário das UCs brasileiras, sobressai o
conflito das populações humanas com órgãos da administração blica em áreas
naturais protegidas integralmente.
Na ótica de Barbosa e Santos (2008) as unidades de conservação de uso
restrito tem aumentado a pressão sobre populações locais nessas áreas, por não
apresentarem mecanismos efetivos de gestão sustentável, forçando essas
populações a abandonarem suas propriedades ao restringirem o uso dos recursos
naturais existentes nestas áreas e no entorno. Nessa ótica as unidades de
conservação acabam se tornando parte de um processo de invisibilidade e
encurralamento das populações locais.
Fleury e Borba (2007) entendem que a legislação brasileira sobre as unidades
de conservação, em muitos casos é muito rígida, mesmo quando a população
comprovadamente não causa impactos, como nos casos de reduzida densidade
populacional, ela é retirada pelas obrigações da legislação. Esse propósito gera
conflitos no processo da implantação, gestão e manutenção dessas áreas. Devido a
44
incompatibilidades no convívio com as comunidades locais, as áreas protegidas
muitas vezes representam restrições às populações que antes moravam nas regiões
onde são implementadas, levando a desintegração de comunidades realocadas,
perdas culturais e implicações negativas para a biodiversidade.
Simon (2003) estudando o caso do Parque Estadual da Serra da Tiririca
avalia que a razão que credencia os atores para o conflito é o fato de estarem
submetidos às novas regras de uso e apropriação dos recursos, normas voltadas
para o “não uso”. Assim, as novas regras de uso e de apropriação e o eventual
desenho do espaço enquanto espaço público estão na base dos conflitos sócio-
ambientais nas unidades de conservação. O mesmo autor acrescenta que a perda
do direito de usar, usufruir e abusar da propriedade resulta da nova dinâmica
estabelecida para o ambiente.
Arruda (1997) estudando as relações entre as comunidades tradicionais e as
unidades de conservação aponta que, historicamente, as populações envolvidas nas
áreas de conservação parecem invisíveis para o poder público, que se prende às
concepções ambientais tecnicistas e inadequadas, ignorando outra saída além do
padrão vigente. As populações são convidadas a proteger e respeitar o meio
ambiente, mas suas principais atividades para a subsistência como a caça, a pesca,
agricultura são transformadas em crime. Mesmo que não residam na área elas são
impedidas de tirar a lenha para cozinhar, para a construção de suas residências,
etc.. Não se leva em consideração que as populações locais são as principais
responsáveis pela preservação da área em questão. Em certos casos, as
comunidades passam a enxergar os recursos naturais da região como se
estivessem perdidos para elas, levando-os a praticar formas de manejo dos recursos
que causam a deterioração ambiental. (ARRUDA, 1997) Nas colocações de Arruda
(1997) fica evidente que não é reconhecida a identidade sócio-cultural das
populações tradicionais, elas ficam desprovidas do seu modo de sobrevivência
habitual e desse modo passam a enveredar por práticas destrutivas para o meio
ambiente como estratégia para garantir sua subsistência e evitar a miséria. Desse
modo, aumentam situações em que os objetivos de conservação não são atingidos e
as populações locais são criminalizadas e, ao mesmo tempo, privadas de usufruir
dos recursos naturais de forma sustentável e garantir sua sobrevivência. Nesse
âmbito, são privilegiados os grupos que comercializam irregularmente os bens de
45
extração clandestina, deixando-se de lado a conservação da bio e sócio-diversidade,
a credibilidade e anuência dos ideais da preservação dos recursos naturais.
Arruda (1997) indica que os impactos não se limitam ao nível local de modo
que as restrições resultantes da criação de áreas de proteção integral têm
contribuído para o descontentamento crescente. A aplicação de modelos de gestão
de áreas protegidas que não respeitam a participação comunitária em países do
terceiro mundo, traz um conjunto de conseqüências desagradáveis tais como,
agravamento das condições de vida das comunidades locais; aumento das
multidões em situação de miséria e a proliferação de favelas, crescimento da
degradação ambiental e destruição florestal, pois quando populações são expulsas
passam a ocupar e derrubar novas áreas para residência ou sobrecarregam as
áreas ainda acessíveis (ARRUDA, 1997). Conforme o autor, na situação do Brasil,
país com sérios problemas de desemprego urbano, estrutura fundiária
superconcentrada, distribuição de renda desigual, esse modelo tem acelerado o
agravamento do conflito rural (ARRUDA, 1997).
Uma vez que o modelo de áreas protegidas ”intocáveis” se espalhou
principalmente nos países do Terceiro Mundo, suas conseqüências foram
desastrosas para as "populações tradicionais" de extrativistas, pescadores, índios,
mesmo que a relação com a natureza destes povos não seja tão perversa quanto a
pressuposta pelos primeiros "ideólogos" preservacionistas.(DIEGUES, 2001).
3.4 Os conflitos sociais e suas repercussões sobre os propósitos de
conservação
As dificuldades na implantação e gestão de áreas de proteção integral vêm
sendo apontadas por diversos autores há algumas décadas. Arruda, em 1997,
avaliava que a legislação ambiental não é cumprida totalmente como resultado das
pressões de grupos econômicos, da organização das populações locais, dificuldades
operacionais, financeiras e políticas que afetam a fiscalização e manejo destas
áreas.
Benatti, em 1998, apontava que nas Unidades de Conservação de uso
indireto no Brasil não se estava conservando nem 1,8% dos biomas brasileiros.
46
Acrescentava que boa parte das áreas protegidas criadas não foram efetivamente
implantadas, não passavam de “unidades de conservação no papel”, pois a maioria
das unidades de proteção integral apresentava problemas (53,4%). Benatti (1998)
apontava como os problemas principais: a existência de terras ainda não totalmente
regularizadas, demarcadas, falta de equipamentos e de funcionários suficientes para
fiscalizar e administrar a área; existência de planos de manejo e de gerenciamento
em apenas poucas unidades e presença de populações humanas dentro das áreas
protegidas.
Estudos mais recentes reforçam a noção de incompletude dos processos de
implantação de unidades de conservação de proteção integral. Destacam o impacto
negativo de variáveis como a caça, a pesca, espécies exóticas invasoras, influência
externa, incêndios, expansão urbana, presença de populações humanas, pastagens,
construção de infra-estruturas, conforme resume a tabela 7 para o caso das
Estações Ecológicas e Reservas Biológicas federais.
47
Tabela 7 -
Síntese dos parâmetros de análise de atividades que impactam
negativamente nas Estações Ecológicas e Reservas Biológicas federais no
Brasil.
Fonte: IBAMA; WWF-Brasil ( 2007, p.30-31)
* O sinal “+” é indicado quando o parâmetro analisado apresenta valor maior que a média alcançada
em cada atividade impactante, tanto para as pressões (atividades ocorridas nos últimos cinco anos)
quanto para as ameaças (atividades que poderão ocorrer nos próximos cinco anos).
Segundo Vivacqua e Vieira (2005) o crescimento dos conflitos nas unidades
de conservação pode gerar perdas irreparáveis em médio e longo prazo, por outro
lado, eles são fundamentais para promover oportunidades de colocar em cena
atores sociais locais historicamente marginalizados dos processos de tomada de
decisão. As pesquisas realizadas têm evidenciado que os custos sociais e
ecológicos da criação de áreas de proteção integral levam muitas comunidades
locais a burlar as leis e desrespeitar as regras estabelecidas pelos sistemas de
gestão.
48
Segundo vários autores o aumento significativo das áreas protegias no Brasil
têm sido acompanhado pelo crescimento dos conflitos nessas áreas.
Os estudos realizados mostram que processo de implantação das áreas
protegidas não está consolidado, procurando-se continuamente alternativas para
que os processos sejam menos conflituosos, assegurando a preservação com
poucos danos à comunidade local. As áreas de proteção integral o
potencialmente mais conflituosas, pelas restrições absolutas ao uso dos recursos na
área preservada e restrições de uso no entorno. Isto se agrava em países como o
Brasil, pois grande parte da população rural depende da exploração dos recursos
naturais para o seu desenvolvimento e a criação destas áreas ao mesmo tempo que
estabelece restrições, o resulta automaticamente na disponibilização de outras
formas de sobrevivência aos afetados.
49
4 “PROMESSAS” E “AVANÇOS” DOS NOVOS MODELOS DE
GESTÃO DE ÁREAS DE PROTEÇÃO INTEGRAL
Para Buckles e Rusnak (2000, p.1) os conflitos por recursos naturais tais como a
terra, a água e os bosques estão presentes em todas as partes e, embora possam
ser considerados desejáveis (na medida em que são motor da mudança social),
podem também desencadear situações sociais indesejáveis como a violência, a
marginalização de grupos sociais ou mesmo a aceleração da degradação de áreas
que se desejava proteger.
Um conjunto de autores argumenta que o Estado, em sua intervenção
orientada à implementação da política ambiental, tem promovido ou acentuado
conflitos pré-existentes e indesejáveis. Isso seria particularmente evidente no caso
da política de implantação de áreas protegidas, especialmente unidades de proteção
integral, como foi abordado no capítulo anterior. Para Vivacqua e Viera (2005) o
crescimento dos conflitos em unidades de conservação é associado ao
estabelecimento de normas carentes de legitimidade, que colocam em risco a
sobrevivência das comunidades locais e a sustentabilidade dos recursos.
Frente a este contexto têm sido discutidas algumas alternativas que implicam
maior atenção às relações com as comunidades locais e revisão do modelo de
criação e gestão de áreas protegidas. Vivacqua e Viera (2005), por exemplo,
colocam que a incapacidade de resolução de conflitos socioambientais em áreas
protegidas tem mostrado a necessidade de se rever o modelo de gestão das
unidades de conservação vigente no Brasil.
O presente capítulo tem por objetivo expor as alternativas que vem sendo
apresentadas para a harmonização dos interesses de conservação e
desenvolvimento na criação e gestão de áreas protegidas. Expõe-se, inicialmente, o
diagnóstico apresentado por autores quanto ao modelo tradicional de gestão de
áreas protegidas para, posteriormente, apresentar as alternativas e medidas
adotadas no Brasil.
50
4.1 O modelo tradicional de gestão das áreas protegidas e seus limites
Para Marangon e Agudelo (2004) a legislação ambiental é criticada no Brasil
por desconsiderar o saber tradicional. Os autores colocam que muitas vezes a
política ambiental relativa as unidades de conservacão tem se revelado autoritária e
presa às informações contidas nas ciências naturais, deixando de lado outros
componentes da realidade, como os processos sociais e culturais predominantes.
Pimbert e Pretty (2000 apud VIVACQUA; VIEIRA, 2005) tomando por base
experiências internacionais colocam que as práticas de gestão de UC continuam
sendo dominadas pelos especialistas em Biologia da Conservação. Esclarecem que
nos trabalhos de consultoria, os biólogos tendem a ignorar a importância dos
conhecimentos locais e, por implicação, da participação autêntica das comunidades
locais nos processos de tomadas de decisão no planejamento, na implementação e
no monitoramento das áreas protegidas.
Marangon e Agudelo
(
2006) colocam que a legislação ambiental
frequentemente remete a um universo doutrinário jurídico nem sempre sensível às
questões socioambientais, por outro lado, estes dispositivos e normas encontram
várias barreiras no momento da sua implementação. Benatti (1998) aponta a
política autoritária na criação de unidades de conservação como sendo
responsável pela colisão de dois direitos fundamentais garantidos
constitucionalmente: o direito cultural e o natural (art. 215 e 225, respectivamente).
Segundo este autor esse fenômeno ocorre quando “o exercício de um direito
fundamental por parte do seu titular colide com o exercício do direito fundamental
por parte de outro titular. O autor ressalta que não se trata de um cruzamento ou
acumulação de direitos (como na concorrência de direitos), mas de um ‘choque’, um
autêntico conflito de direitos”. Realça que se trata de um conflito dos direitos
fundamentais e bens jurídicos das populações tradicionais (patrimônio cultural e
natural). Estes conflitos entre normas legais estão presentes na legislação
ambiental. Para Marangon e Agudelo
(
2006) a legislação ambiental brasileira
mesmo que configure como uma das mais avançadas do mundo, na prática trabalha
com dispositivos e normas virtualmente conflituosos. Nestas circunstâncias,
historicamente a legislação ambiental procura se viabilizar por uma postura
autoritária toda dependente de fiscalização repressiva, o dispondo de suporte
51
técnico-científico nem de legitimidade social entre a população local, como aponta
Arruda (1997).
Marangon e Agudelo (2004) também identificam que a Lei Ambiental
caracteriza-se por ser implementada sem um adequado processo de educação
ambiental e sem disponibilizar alternativas de produção que permitam uma
agricultura de subsistência sustentável (exemplos: melhoria do solo com adubos
orgânicos, demarcação de áreas possíveis ao cultivo, rotatividade de culturas e
fomento a outras fontes de renda, como o turismo). Assim, em alguns casos
estudados a implementação da Lei Ambiental forçou restrições que resultaram em
impactos negativos sobre a população, estendendo-se sobre o próprio ambiente que
se pretendia conservar (MARANGON; AGUDELO, 2004). Avalia-se que as normas
que causam restrições de uso dos recursos naturais e à manutenção dos modos de
vida tradicionais, na ausência de uma política orientada de desenvolvimento
sustentável, aceleraram a desagregação da economia e cultura autóctones levando
a perda dos conhecimentos ecológicos originais da população e a um
comportamento contrário aos objetivos conservacionistas (MARANGON; AGUDELO,
2004).
A procura por novos modelos que buscam rever as relações entre as várias
culturas e comunidades com os recursos naturais, favorecendo o alcance dos
propósitos de conservação em áreas protegidas é contínua e, cada vez mais, cresce
o reconhecimento da importância das comunidades na conservação da
biodiversidade que caracteriza os locais onde residem.
4.2 Os “novos modelos” de gestão
Ao tratar-se da questão dos “novos modelos” convém considerar, com
Kervran (2005, p.72) que : “Le secteur de la conservation, qui es fortment domine par
la gestion des reserves naturelles, est particulierement marque par le phenomene
de convergence des politiques dans lês differents pays.” Tendo em vista que as
deficiências abordadas na seção anterior para o caso brasileiro são observadas
também em outros países, a questão da conciliação entre propósitos de
conservação e desenvolvimento passou a ser discutida em fóruns internacionais.
52
Neste sentido as preocupações com populações tradicionais são alvo de
atenção também em fóruns internacionais. No V. Congresso Mundial de Parques,
por exemplo, os participantes insistiram na necessidade de se obter maior clareza
relativamente à posse da terra e dos recursos naturais, o que consideram
imprescindível para manutenção da biodiversidade assim como a distribuição justa e
eqüitativa dos benefícios da conservação (SCHERL et al., 2006). Agindo assim, se
estaria de acordo com as sugestões do Relatório de Desenvolvimento Mundial de
2000/2001 que chamam atenção para ações de redução efetiva da pobreza,
apontando a necessidade de se potenciar a resistência da população pobre, através
da criação de mais postos de trabalho e incremento da renda; abrindo mais
possibilidades para a participação no processo de tomada de decisão em todos os
níveis das instituições envolvidas nas suas vidas; diminuindo sua vulnerabilidade às
intempéries da natureza, epidemias e crises financeiras, desse modo lhes garantindo
maior segurança (SCHERL et al., 2006).
Diversos autores têm defendido a maior participação da população na gestão
das unidades de conservação.
Scherl et al. (2006), em texto para UICN, recomendam que os grupos de
gestão trabalhem para fortalecer a capacidade de incorporar as questões sociais na
conservação, no sentido de promover políticas e condições que promovam a plena
participação dos diversos atores sociais na conservação ambiental. Consideram que
esta é uma abordagem com grande potencial para a consecução da almejada
utilização sustentável e equilibrada dos recursos naturais.
No Brasil, a questão da participação da população era reivindicada
tempos. Arruda (1997) colocava que a legislação ambiental, vinha ignorando um
dos caminhos possivelmente mais indicados para atingir os objetivos
conservacionistas preconizados ao desprezar o potencial da diversidade cultural
que, historicamente, favoreceu a riqueza dos ecossistemas habitados. Nessa ótica a
inclusão da visão das populações rurais no modelo de conservação, teria que ter em
conta o reconhecimento da sua identidade sócio-cultural, a valorização de seus
conhecimentos, a melhoria das suas condições de vida e a garantia de sua
participação na construção de uma política de conservação ambiental mais
abrangente e sustentável. Na ótica de Arruda (1997) a participação comunitária deve
se estender à definição da área protegida e à gestão, considerando-se, assim, o
interesse de todos intervenientes. Isto implicaria preconizar a adoção de uma
53
participação mais ativa, avançar de uma participação consultiva para mais interativa
e com repartição de poder. Neste contexto, no entendimento do autor, os
profissionais da preservação e outras pessoas externas deveriam assumir novos
papéis, de modo a garantir a participação genuína das comunidades na concepção,
desenho, manejo e avaliação de áreas de conservação. Esta nova visão requereria
uma nova postura dos profissionais perante as novas teorias, valores,
comportamentos e métodos. Isso levaria os governos a adotarem modelos que
repartem o poder com as comunidades.
Marangon e Agudelo (2003) refletindo sobre a situação de áreas de proteção
ambiental também destacam a importância da participação das comunidades locais
na estão de unidades de conservação, pois para os autores não se pode exigir que
populações inseridas nessas áreas não beneficiem das suas possibilidades de
desenvolvimento, uma vez que todos almejam uma vida melhor, pretendem
melhores serviços públicos básicos (como saúde, educação) e querem acesso a
recursos comercializáveis. Para que tal aconteça é imprescindível a compatibilização
do uso dos recursos naturais com o saber da população local de modo que ambos
sejam respeitados na busca da sustentabilidade das UCs.
Soares et al (2002, p.92) refletindo sobre experiências de unidades de
conservação integral colocam:
É necessário lidar com a complexidade das situações que
envolvem conservação da biodiversidade e populações humanas; o que
acontece fora da unidade de conservação influencia o que se quer
conservar em seu interior; quanto mais participação, organização e
informação, menos conflituosa e mais eficiente é a gestão da unidade; e
quanto mais alternativas para a geração de renda das comunidades locais,
maior sucesso na conservação da biodiversidade tem sido obtido.
Outros autores ressaltam a necessidade de indicar alternativas econômicas
para a comunidade local. Para Diegues (1996) para se alcançar um modelo gestão
mais harmonioso para todas as partes envolvidas, é preciso não priorizar apenas a
repressão, necessitando-se de exemplos de convívios bem sucedidos entre as
pessoas e a natureza. Para o autor, para tornar as unidades de conservação mais
adaptadas à novas situações emergentes é importante criar mecanismos para que
os métodos tradicionais de manejo dos recursos naturais sejam valorizados,
renovados e até reinterpretados.
54
4.2.1 O co-manejo como modelo de referência para a participação na gestão
O co-manejo apresenta-se como o novo modelo de gestão de áreas
protegidas com a participação de profissionais e populações, esperando-se que
resulte em uma preservação ambiental mais apropriada. Scherl et al (2006)
entendem que este modelo pode proporcionar meios eficazes para lidar com os
interesses e as relações complexas e que pode promover a participação de grupos e
comunidades que são freqüentemente marginalizadas nos modelos convencionais
de gestão de recursos e processos de desenvolvimento. Segundo Pimbert e Pretty
(2000 apud VIVACQUA; VIEIRA, 2005) no novo paradigma da pesquisa
transdisciplinar a palavra-chave é co-gestão ou co-manejo: uma configuração de
parceria onde o governo, as comunidades envolvidas localmente, os atores externos
(organizações o-governamentais, universidades e institutos de pesquisa) e outros
atores sociais compartilham responsabilidades e autoridade para tomadas de
decisão na procura de gestão integrada dos recursos. As autoras acrescentam que
se o manejo das UCs apresenta como finalidade garantir a conservação em longo
prazo, sem omitir a preocupação pela redução das desigualdades sociais, seria
necessário abrir gradativamente espaços para uma participação capaz de permitir o
exercício da cidadania completa.
Para Pimbert e Pretty (1997) os dados disponíveis mostram que quando
existe uma mudança do comportamento dos atores externos e se aposta em
métodos participativos, as comunidades rurais exibem grande capacidade de
apresentar e analisar informação e uma criatividade surpreendente de fazer
diagnósticos, planejar, manejar e avaliar. Podem ser consideradas especialistas de
suas realidades imediatas, tanto que conhecem o seu meio ambiente, a
complexidade e diversidade do seu estilo de sobrevivência.
O novo modelo conservacionista pressupõe participação e assim novas
habilidades para os profissionais envolvidos e comunidades locais na gestão das
áreas protegidas. Esse fato condiciona maior ênfase de treinamento em
comunicação em relação às habilidades técnicas, é necessário que se formem
equipes de trabalho multi e pluridisciplinares, que incluam as comunidades locais
tendo em conta as questões de gênero e de geração. O treinamento deve levar ao
55
desenvolvimento das capacidades de julgamento e habilidades interpessoais através
do uso de métodos participativos. Esse treinamento deve ser ele próprio participativo
e baseado na ação; reconhecendo-se que essas mudanças certamente afetariam as
técnicas usadas nos treinamentos convencionais (CHAMBERS, 1992 apud
PIMBERT; PRETTY, 1997).
Este novo conceito exigirá enormes mudanças nos profissionais, populações,
políticas e instituições. A gestão em colaboração entre todos os atores envolvidos
(caso das comunidades locais, técnicos profissionais, entidades do governo, ONGs
ou empresas particulares) tendem a garantir que as comunidades locais consigam
maior participação na tomada de decisão e recebam maiores benefícios das áreas
de conservação. Mas, para que tal aconteça é necessário que as iniciativas de
preservação comunitária funcionem ancoradas em uma política e legislação de meio
ambiente que preconize a passagem, para a comunidade local, de uma parte
considerável de autoridade e responsabilidade em relação aos recursos naturais
(SCHERL et al. , 2006)
Segundo Galvin e Haller (2008) embora alguns projetos de participação
tenham tido sucesso, pelo menos no papel, o fracasso de muitos desses projetos
com uma abordagem baseada em participação conduziu a uma constelação
problemática na administração das unidades de conservação. O maior entrave neste
assunto se relaciona ao acesso legal aos recursos, direitos de propriedade,
segurança para usufruir do recurso, autorização e participação verdadeira na tomada
de decisão, de modo que estes são considerados fatores chaves para existência ou
mitigação dos conflitos socioambientais em unidades de conservação.
Vivacqua e Vieira (2005) recomendam o desenvolvimento de pesquisas com
foco na gestão de conflitos, que possam oferecer subsídios importantes para a
construção de um sistema de gestão baseado na procura de soluções negociadas,
mediadas por um ideal regulativo que privilegia a transmissão intergeracional dos
recursos comuns a todos os atores sociais envolvidos.
Buckles e Rusnak (2000), trabalhando com questão dos conflitos no manejo
de recursos naturais, colocam que os conflitos são resolvidos completamente
quando são eliminadas as fontes subjacentes de tensão entre as partes. Por outro
lado acrescentam que para os que vêm o conflito como uma característica normal e
positiva das sociedades humanas, o conflito não deveria ser eliminado totalmente
por meio de "solução" mas, administrado de tal modo que não conduza à violência,
56
mas seja suficiente para provocar uma mudança. Assim, a gestão do conflito requer
uma intervenção para reduzi-lo quando é excessivo, ou uma intervenção para
promove-lo quando é muito pequeno.
Buckles e Rusnak (2000) apontam que os mecanismos locais podem
constituir meios eficientes de controlar conflitos mas nem sempre o são,
especialmente quando os conflitos tem múltiplas dimensões e intensidade crescente.
Os autores reconhecem que alguns mecanismos locais podem bloquear o
desenvolvimento equilibrado e sustentável na medida em que colocam o poder de
decisão na mão de elites locais e também que as decisões podem ser refutada
legalmente, por outro lado julgam que o conhecimento e o respeito a estes
mecanismos é importante porque reflete respeito à cultura local. Para os autores é
importante dedicar atenção às estratégias locais porque a diversidade que ostentam
propicia debates metodológicos abertos a outras vozes e experiências (BUCKLES;
RUSNAK, 2000).
4.3 Mudanças nos modelos de gestão das UC no Brasil
No Brasil apenas a partir das duas ultimas décadas do século XX, debates
importantes foram desenvolvidos com a preocupação de rever a estrutura de
regulação à implantação e gestão das unidades de conservação. Tais debates
assumiram maior expressividade durante a ECO/92, realizada em 1992 na cidade do
Rio de Janeiro, evento em que os debates acerca da temática ambiental como
política pública envolveram governos e entidades da sociedade civil (BARBOSA;
SANTOS, 2008).
Estes debates refletiram-se em mudanças significativas da política para
unidades de conservação, que ocorreram no ano 2000 quando criaram-se diversos
mecanismos para assegurar maior participação da população na criação e gestão
das unidades de conservação
57
4.3.1 Mecanismos para participação na gestão das UCs no Brasil
Em 18 de Julho de 2000 foi sancionada a lei Nº 9.985
16
que instituía o
Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza (SNUC) e estabelecia
critérios e normas para criação, implantação e gestão das unidades de conservação.
A participação das populações locais está salvaguardada em preceitos expressos
nos capítulos II e IV. No artigo 5 do capítulo II com respeito a participação coloca-se
que devem ser seguidas diretrizes que:
II - assegurem os mecanismos e procedimentos necessários ao
envolvimento da sociedade no estabelecimento e na revisão da política
nacional de unidades de conservação;
III - assegurem a participação efetiva das populações locais na criação,
implantação e gestão das unidades de conservação;
V - incentivem as populações locais e as organizações privadas a
estabelecerem e administrarem unidades de conservação dentro do sistema
nacional;
VIII - assegurem que o processo de criação e a gestão das unidades de
conservação sejam feitos de forma integrada com as políticas de
administração das terras e águas circundantes, considerando as condições
e necessidades sociais e econômicas locais;
IX - considerem as condições e necessidades das populações locais no
desenvolvimento e adaptação de métodos e técnicas de uso sustentável
dos recursos naturais;
X - garantam às populações tradicionais cuja subsistência dependa da
utilização de recursos naturais existentes no interior das unidades de
conservação meios de subsistência alternativos ou a justa indenização
pelos recursos perdidos
Assim, a política prevê a participação da população em diversas instâncias e
formas: na elaboração da política nacional, na criação, implantação e gestão das
unidades de conservação e no estabelecimento e administração de unidades de
conservação. Revela-se, ainda, especial preocupação com as populações locais,
especialmente as populações tradicionais prevendo-se a integração e
16
Presidência da República. Brasília. Jul. 2000 disponível em:
http://legislacao.planalto.gov.br/legisla/legislacao.nsf. acesso em 20 Jun.2009.
58
compatibilização das políticas públicas regionais e com a justa indenização e
viabilização de alternativas econômicas para os grupos sociais afetados pela criação
das unidades de conservação.
O capítulo IV apresenta artigos com regulamentação relativa à criação de
unidades de conservação, preconizando-se:
2
o
A criação de uma unidade de conservação deve ser precedida de
estudos técnicos e de consulta pública que permitam identificar a
localização, a dimensão e os limites mais adequados para a unidade,
conforme se dispuser em regulamento.
3
o
No processo de consulta de que trata o 2
o
, o Poder Público é
obrigado a fornecer informações adequadas e inteligíveis à população local
e a outras partes interessadas.
4
o
Na criação de Estação Ecológica ou Reserva Biológica não é
obrigatória a consulta de que trata o 2
o
deste artigo.
Deste modo a lei assegura a participação das comunidades locais durante as
fases de diagnóstico e formulacão do projeto, mas na prática, como indicam estudos,
nem sempre as entidades respeitam estes direitos adquiridos pelas comunidades,
faltam esforços para que a legislação seja cumprida na íntegra.
No que se refere a gestão, ressalta-se a importância da elaboração dePlano
de Manejo e do estabelecimento de Conselhos de Gestão. No que se refere ao
Plano de Manejo coloca-se:
Art. 27. As unidades de conservação devem dispor de um Plano de
Manejo.
§ 1
o
O Plano de Manejo deve abranger a área da unidade de
conservação, sua zona de amortecimento e os corredores ecológicos,
incluindo medidas com o fim de promover sua integração à vida econômica
e social das comunidades vizinhas.
§ 2
o
Na elaboração, atualização e implementação do Plano de
Manejo das Reservas Extrativistas, das Reservas de Desenvolvimento
Sustentável, das Áreas de Proteção Ambiental e, quando couber, das
Florestas Nacionais e das Áreas de Relevante Interesse Ecológico, será
assegurada a ampla participação da população residente.
Estes dois instrumentos são fundamnetais para a integração das
comunidades na gestão da UC´s, pois criam uma base legal para a integração das
59
conunidades nessas áreas. Por outro lado, diversos autores reconhecem que na
prática estas normas ainda não estão sendo seguidas por todas as UC`s, mas existe
o mérito em se legitimar legalmente a participação no processo de gestão, o que
pode vir a reduzir os conflitos nessas áreas.
No que se refere ao Conselho, coloca-se:
Art. 29. Cada unidade de conservação do grupo de Proteção Integral
disporá de um Conselho Consultivo, presidido pelo órgão responsável por
sua administração e constituído por representantes de órgãos públicos, de
organizações da sociedade civil, por proprietários de terras localizadas em
Refúgio de Vida Silvestre ou Monumento Natural, quando for o caso, e, na
hipótese prevista no § 2
o
do art. 42, das populações tradicionais residentes,
conforme se dispuser em regulamento e no ato de criação da unidade.
A composição e atuação do Conselho de Gestão é regulamentada por
normativa posterior, de 2002, onde é detalhado o papel do Conselho. No artigo 20
do capítulo V coloca-se:
.
Art. 20. Compete ao conselho de unidade de conservação:
I - elaborar o seu regimento interno, no prazo de noventa dias,
contados da sua instalação;
II - acompanhar a elaboração, implementação e revisão do Plano de
Manejo da unidade de conservação, quando couber, garantindo o seu
caráter participativo;
III - buscar a integração da unidade de conservação com as demais
unidades e espaços territoriais especialmente protegidos e com o seu
entorno;
IV - esforçar-se para compatibilizar os interesses dos diversos
segmentos sociais relacionados com a unidade;
V - avaliar o orçamento da unidade e o relatório financeiro anual
elaborado pelo órgão executor em relação aos objetivos da unidade de
conservação;
VI - opinar, no caso de conselho consultivo, ou ratificar, no caso de
conselho deliberativo, a contratação e os dispositivos do termo de parceria
com OSCIP, na hipótese de gestão compartilhada da unidade;
VII - acompanhar a gestão por OSCIP e recomendar a rescisão do
termo de parceria, quando constatada irregularidade;
VIII - manifestar-se sobre obra ou atividade potencialmente causadora
de impacto na unidade de conservação, em sua zona de amortecimento,
mosaicos ou corredores ecológicos; e
60
IX - propor diretrizes e ões para compatibilizar, integrar e otimizar a
relação com a população do entorno ou do interior da unidade, conforme o
caso.
A Lei 9.985/2000, que criou o SNUC, permite, então, a participação da
sociedade civil e de populações locais - inclusive indígenas, nos casos que habitam
a zona de amortecimento das unidades de proteção integral -, na gestão de
unidades de conservação de proteção integral por meio dos Conselhos. Para os
casos das categorias Reserva Extrativista e Reserva de Desenvolvimento
Sustentável, a participação das comunidades locais ocorre através dos conselhos
deliberativos. No sentido complementar, o Decreto 4.340/2002, que regulamentou
o SNUC, assegura a participação de representantes de associações indígenas na
gestão unificada de mosaicos de unidades de conservação, através de um Conselho
de Mosaico, de caráter consultivo (GONÇALVES, 2007).
4.3.2 Primeiras avaliações dos “avanços” possibilitados pelos “novos
modelos”
Ao instituir o SNUC, o imperativo de planejamento, de investimentos em
capacitação e infra-estrutura, de controle e gestão corretos, de participação da
comunidade local e regional nos benefícios econômicos desse mercado passam a
ser vistos como questões essenciais para o setor. Na linha das diretrizes do SNUC,
devem ser formados os conselhos, ser elaborado um zoneamento e um plano de
manejo das áreas preservadas, com a participação efetiva das comunidades locais.
A partir deste novo marco legal, vem sendo criados conselhos e definidos planos de
manejo, entretanto, segundo relatos de diversos autores, ainda não se alcançou
uma situação desejável de formação de conselhos ativos e definição de planos de
manejo em todas as UCs. Assim, a diversidade cultural vêm sendo incorporada, mas
de forma ainda incipiente, nas políticas de conservação da biodiversidade
(VIVACQUA; VIEIRA, 2005).
Outro aspecto que merece destaque são as recentes mudanças institucionais.
Desde 1989, quando foi criado, o IBAMA-
Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos
Recursos Naturais Renováveis (uma entidade autárquica de regime especial dotada
61
de personalidade jurídica de direito público e vinculada ao Ministério do Meio
Ambiente)
17
passou a ser o gerenciador da questão ambiental, responsável por
formular, coordenar, executar e fazer executar a Política Nacional do Meio Ambiente
e da preservação, conservação e uso racional, fiscalização, controle e fomento dos
recursos naturais renováveis (IBAMA; WWF-BRASIL 2007).
18
De acordo com novas
orientações do SNUC, a partir de abril de 2007, com o advento da Medida Provisória
366, a gestão das unidades de conservação federais de proteção integral e de
uso sustentável passou a ser de responsabilidade do Instituto Chico Mendes de
Conservação da Biodiversidade que tem como finalidade:
a) executar ações da política nacional de unidades de conservação da
natureza, referentes às atribuições federais relativas à proposição, implantação,
gestão, proteção, fiscalização e monitoramento das unidades de conservação
instituídas pela União;
b) executar as políticas relativas ao uso sustentável dos recursos naturais
renováveis e ao apoio ao extrativismo e às populações tradicionais nas unidades de
conservação de uso sustentável instituídas pela União;
c) fomentar e executar programas de pesquisa, proteção, preservação e
conservação da biodiversidade e de educação ambiental;
d) exercer o poder de polícia ambiental para a proteção das unidades de
conservação instituídas pela União;
e) promover e executar, em articulação com os demais órgãos e entidades
envolvidos, programas recreativos, de uso público e de ecoturismo nas unidades de
conservação, onde estas atividades sejam permitidas.
19
17
Este órgão resultou da fusão entre quatro entidades que trabalhavam na área ambiental: Secretaria
do Meio Ambiente - Sema, Superintendência da Borracha - Sudhevea, Superintendência da Pesca -
Sudepe e Instituto Brasileiro de Desenvolvimento Florestal - IBDF.
18
Segundo Gonçalves (2007), em 1997 o IBAMA publicou o “Marco Conceitual das Unidades de
Conservação Federais do Brasil”, onde cada categoria de manejo integrava diversos tipos de uso
público. A publicação afirma o objetivo de promover a participação das comunidades locais nas
atividades de ecoturismo, visando melhorar a qualidade de vida através da criação de mecanismos
que resultem no uso da mão-de-obra local, ao desenvolvimento das potencialidades das
comunidades, o apoio à criação de pequenas empresas de serviços ligados ao ecoturismo e estimulo
à produção de artesanato.
19
Segundo o IBAMA e WWF-BRASIL (2007) o Instituto Chico Mendes de Conservação da
Biodiversidade é responsável pela gestão de 290 unidades de conservação distribuídas em todo o
Brasil, compreendendo cerca de 8% do território nacional, onde 126 unidades de conservação são de
proteção integral e 164 de uso sustentável. No primeiro grupo perfazem 4% da extensão do território,
62 parques nacionais, 29 reservas biológicas, 32 estações ecológicas, 3 refúgios de vida silvestre. O
grupo de unidades de conservação de uso sustentável, que também abrange aproximadamente 4%
do território nacional, é composto de 31 áreas de proteção ambiental, 17 áreas de relevante interesse
62
Doralice Pereira (2007) apud Barbosa e Santos (2008) abordando a
concepção e gestão das UC’s brasileiras assinala que este processo
tradicionalmente ocorre de forma centralizada com decisões “de cima para baixo”,
limitando a participação pública. O número excessivo de categorias de unidades de
conservação não garante a proteção desses espaços, talvez por muitos se
encontrarem sem um plano de manejo. Na avaliação de Barbosa e Santos (2008) o
órgão executor da Política Nacional de Meio Ambiente no Brasil, criado em 1989-
IBAMA, responsável pela gestão das UCs federais até 2007, não vinha se revelando
à altura dos desafios envolvidos na gestão de áreas protegidas, assumindo uma
postura autoritária, com viés preservacionista e avessa à participação das
populações locais no processo de gestão (BARBOSA; SANTOS, 2008).
Com o decorrer do tempo a ação cotidiana das instituições públicas ligadas as
UCs tem colocado seus agentes em uma situação social de conflito com os
moradores dessas áreas sob proteção legal. Os processos de consulta para criação
de UC são especialmente ilustrativos destes conflitos. Projetos de preservação
elaborados em gabinetes fechados, debatidos e referendados muitas vezes em
fóruns internacionais, no momento de serem implantados, foram severamente
politizados, movimentado vários atores; alguns preservacionistas acabaram revendo
suas posições e conceitos e, essencialmente os moradores, em sua maioria sem
uma prévia experiência importante de participação política, transformaram-se
bruscamente em intervenientes ativos do processo (CARDOSO, 2006).
Segundo Barbosa e Santos (2008) freqüentemente a participação das
populações locais abrangidas por unidades de conservação ocorre de maneira
passiva, limitando-se a uma simples transferência de informações ou participação
apenas por consulta, de modo que não se verifica uma participação efetiva da
população com a incorporação dos valores preservacionistas em sua cultura, o que
facilitaria um manejo participativo e democrático dos recursos ambientais. Entende-
se que em muitos casos a participação da população parece ser ainda menor pois
as populações locais ficam sabendo que sua propriedade está inserida dentro de
uma unidade de conservação depois de sua criação.
Outros conflitos referem-se a questão das medidas compensatórias. Em muitos
casos em que há geração de recursos (pela visitação, etc) resultantes da criação
ecológico, 64 florestas nacionais, 51 reservas extrativistas e uma reserva de desenvolvimento
sustentável.
63
das unidades de conservação, estes são aplicados em regiões bem distantes; de
modo que esse fator cria uma revolta e não aceitação dessas unidades pelas
populações afetadas. Ainda, identifica-se uma recusa por parte dos grupos locais de
aceitar o processo de implantação de algumas UC`s apoiando-se no fato de que são
criadas unidades de uso indireto somente para cumprimento da legislação que
obriga adoção de medidas compensatórias (Condicionantes Ambientais, previstas no
Artigo 36 do SNUC) para os investimentos governamentais ou privados que venham
impactar/degradar, de algum modo, o meio ambiente e a população afetada por este
fato não é compensada justamente (BARBOSA; SANTOS 2008).
Analisando as constantes mudanças na legislação brasileira visando harmonizar
o processo de criação e gestão das UC`s, percebe-se que existe um esforço enorme
em reduzir as tensões que se verificavam nos modelos usados anteriormente,
colocando em risco os objetivos da criação destas áreas. Do exposto pode-se
deduzir que as criticas que eram feitas pelos analistas tem surtido algum efeito
positivo, mas na pratica os novos modelos precisariam de mais tempo para provar a
sua aplicabilidade e benefícios.
64
5 CONFLITOS E COOPERAÇÃO ENTRE A ESTAÇÃO ECOLÓGICA
E COMUNIDADE LOCAL NO TAIM
A criação da Estação Ecológica (ESEC) do Taim, definida como uma unidade
de proteção integral, implica que o acesso aos recursos naturais dentro da superfície
da unidade não é permitido, e que no seu entorno respeitem-se restrições legais.
Certamente, isto afeta as estratégias econômicas dos atores sociais que utilizavam
recursos na área da UC e/ou residem no seu entorno e à vida das comunidades
locais.
Conforme estudos anteriores a implantação da Estação na região do Taim
afetou a vida dos membros das comunidades locais em várias dimensões. Nesse
processo surgiram conflitos de ordem econômica, ambiental, política e sociocultural.
O surgimento dos conflitos e a dificuldade em resolvê-los acabaram tendo
implicações negativas para os objetivos da conservação da biodiversidade que
nortearam a criação da estação.
Por outro lado, as novas orientações das políticas de conservação têm
favorecido a realização de programas de desenvolvimento e conservação da
biodiversidade que envolvem as comunidades locais que é envolvida, também, na
gestão dessas áreas. Em tese, a opinião das comunidades locais se torna
fundamental na avaliação da gestão das áreas protegidas, tanto que a legislação
tem estabelecido procedimentos que garantem a participação da população local e a
utilização de metodologias que levam à incorporação dos conhecimentos locais.
Este capítulo procura avaliar o conflito entre os objetivos conservacionistas na
ESEC do Taim e as atividades econômicas das comunidades locais, assim como
caracterizar os trabalhos participativos desenvolvidos na região. Para tal, se
recorrerá aos dados qualitativos levantados na região em estudo, com entrevista aos
principais atores implicados no processo.
65
5.1 Metodologia
5.1.1 Localização geográfica da área de estudo
A área de estudo abrange a Estação Ecológica do Taim e seu entorno (esse
definido como a área de 10 km que circunda o perímetro da Unidade de
Conservação).
A Estação Ecológica do Taim está localizada na região costeira do extremo
sul do estado do Rio Grande do Sul.
Figura 4 - Mapa da localização da região do Taim, RS
Fonte: Disponível em: <http//:www.Google.com.br/mapas>. Acesso em 20 Jun. 2009.
66
5.1.2 Percurso metodológico
No presente trabalho de pesquisa, pelo fato do objeto abordado ser de cunho
eminentemente social, optou-se pela utilização de ferramentas primordialmente
qualitativas, onde o tratamento dos dados foi direcionado para uma análise que
resultasse na compreensão das ações, opiniões, atitudes dos atores sociais
envolvidos na questão em estudo.
Chizzoti (1998 apud ALBUQUERQUE; LEITE, 2008) argumenta que a
abordagem qualitativa se apóia no pressuposto de que existe uma relação dinâmica
entre o mundo real e o sujeito, cria-se uma interdependência viva entre o sujeito e o
objeto, uma ligação finita entre o mundo objetivo e a subjetividade do sujeito.
O estudo contou de três fases: uma fase preparatória (de exploração de
dados secundários, documentos e revisão bibliográfica sobre o tema), uma fase de
levantamento de campo e uma fase de análise e interpretação de dados.
Na fase preparatória realizou-se uma revisão com vistas à caracterização do
ambiente natural, do histórico e organização social da região, histórico da criação,
levantamento de conflitos da ESEC do Taim e comunidades locais e iniciativas de
conciliação dos propósitos de conservação e desenvolvimento realizadas no local.
Na fase de levantamento de dados, o pesquisador realizou duas viagens para
o Taim, a primeira eminentemente exploratória ocorreu na última semana de agosto
de 2009 com objetivo de conhecer o local, reunir as primeiras impressões, conversar
com alguns informantes chaves e programar melhor a realização da coleta dos
dados. A segunda viagem de campo ocorreu no final de outubro de 2009 com a
duração de duas semanas, quando, com as técnicas escolhidas, foi feita a coleta
dos dados junto ao grupo alvo pré-definido. Para realização da pesquisa optou-se
por uma amostra intencional, procurando ouvir representantes de todos os atores da
comunidade local e envolvidos nas ações conservacionistas da Estação Ecológica
do Taim. Nessa ótica, foram selecionados os representantes que participam na
gestão da estação, entidades com projetos participativos na comunidade (Núcleo de
Estudos e Monitoramento Ambiental - NEMA) e membros das diferentes categorias
sociais da comunidade local. A repetição das respostas entre os entrevistados se
tornou um meio de validação dos dados.
No total foram entrevistadas 27 pessoas, discriminadas no quadro a seguir:
67
Entrevistado Classe social Viagem
1 Representante da gestão da ESEC do Taim,
que tamm desempenha a função de
fiscalizador
1
2 Representante do NEMA 1
3 Representante da associação dos pescadores
da vila Capilha
2
4 Representante da associação dos pescadores
da vila Anselmi
2
5 Técnico da Trevo Florestal 2
6 Ativista responsável pelas visitas orientadas 2
7
8
9
10
11
12
Pescador da vila Anselmi-1
pescador da vila Anselmi-2
Pescador da vila Anselmi-3
pescador da vila Anselmi-4
Pescador da vila Anselmi-5
Pescador da vila Anselmi-6
1
1
2
2
2
2
13
14
15
16
pescador da vila Capilha-1
pescador da vila Capilha-2
pescador da vila Capilha-3
pescador da vila Capilha-4
1
2
2
2
17
18
19
granjeiro do entorno da-1
granjeiro do entorno da-2
granjeiro do entorno da-3
1
2
2
20
21
22
23
morador do entorno da ESEC-1
morador do entorno da ESEC-2
morador do entorno da ESEC-3
morador do entorno da ESEC-4
1
2
2
2
24
25
26
27
Comerciante do entorno da ESEC-1
Comerciante do entorno da ESEC-2
Comerciante do entorno da ESEC-3
Comerciante do entorno da ESEC-4
2
2
2
2
Quadro 2 – Lista dos entrevistados
A terceira fase de análise e interpretação de dados consistiu na análise das
entrevistas e dos documentos de forma descritiva, procurando identificar as
percepções, relações e argumentos dos principais atores relacionados a ESEC do
Taim.
68
5.1.2.1 Técnicas escolhidas para realização da pesquisa
a) Utilizadas na fase preparatória de contextualização da problemática local
- Consulta bibliográfica: foram pesquisados estudos acadêmicos e publicações
relacionadas ao tema. Com essa pesquisa procurou-se compreender melhor os
conceitos relacionados ao tema em estudo, maior familiarização com o assunto em
análise para orientar o trabalho de coleta de dados de campo.
- Dados secundários e documentos: procurou-se estudar documentos que
fornecessem subsídios importantes para a compreensão da dinâmica (impacto) da
criação da ESEC do Taim, como: mapas, fotografias, atas de reuniões, imagens de
satélite, etc.
b) Utilizadas na fase de levantamento de campo
- Entrevista semi-estruturada: O pesquisador procurou combinar perguntas abertas e
fechadas, onde o informante tinha a possibilidade de discorrer sobre o tema
proposto, fazendo perguntas adicionais para elucidar questões não esclarecidas ou
ajudar a refazer o contexto da entrevista, em situações que o entrevistado tenha se
desviado do tema.
Para o registro da informação se optou pela gravação do som por meio de um
MP3 com objetivo de evitar interrupções ao entrevistado para anotações, assim se
conseguia melhor fluidez na entrevista. O pesquisador ficou com maior possibilidade
de explorar o ambiente, verificar emoções, observar todos os detalhes do contexto e
se beneficiava de maior concentração na entrevista.
A entrevista semi-estrutura foi a principal ferramenta de coleta de dados
usada nesta pesquisa, de modo que as outras cnicas de coleta descritas a seguir
serviram para reforçar os dados obtidos através desta técnica. Nas colocações de
Boni e Quaresma (2005) ficam evidentes as vantagens desta técnica, pois as
entrevistas semi estruturadas possibilitam a correção de enganos dos informantes,
falhas que em muitos casos não poderão ser emendados num questionário escrito;
69
permitem a elasticidade do tempo, possibilitando o aprofundamento dos assuntos;
promovem uma maior abertura e proximidade entre entrevistador e entrevistado,
colaborando para a investigação dos aspectos pessoais que influenciam as atitudes
e comportamentos dos pesquisados.
- Observação direta: através das conversas informais com o grupo alvo procurou-se
explorar ao ximo todas as informações, o pesquisador procurou apenas conduzir
as conversas para temas ligados a pesquisa. Esta técnica permitiu ao pesquisador
uma maior compreensão do cenário local, porque o observador faz parte do
processo de conhecimento e permite a interpretação dos fenômenos, atribuindo-lhes
um significado.
Segundo Chizzoti (1998 apud ALBUQUERQUE; LEITE, 2008) a observação
direta resulta do contato direto do pesquisador com o fenômeno observado,
permitindo a observação das ações dos atores no seu contexto natural, partindo de
sua perspectiva e suas opiniões. Acrescenta que a observação direta pode ter em
vista uma descrição “fina” dos elementos de uma situação.
5.2 As características naturais da região costeira do Rio Grande do Sul e as
motivações para criação da Estação Ecológica do Taim
Segundo Paixão et al. (1984) o clima da região do Taim pode ser definido,
como “subtropical”, caracterizado por precipitações médias anuais bastante
uniformes, mesmo que os valores mensais causem uma acentuada dispersão acima
da média. O mesmo estudo aponta como precipitação média anual 1.100m e
temperatura média do ar de 18ºC.
Conforme relatório do Nema (2002) a região caracteriza-se pela presença de
ecossistemas límnicos e transicionais.
Os ecossistemas transicionais são aqueles que interagem entre o sistema
terra/água/ar – os banhados, as lagoas e as áreas alagáveis. Os ecossistemas
límnicos são representados pelos banhados e lagoas de água doce Lagoa Mirim,
Lagoa Mangueira, Lagoa do Jacaré, Lagoas Nicola, Caiubá e das Flores. Existe uma
70
enorme variedade de espécies da fauna e flora nesses ecossistemas porque existe
muita disponibilidade de alimento, condições climáticas adequadas, aliada a
características físicoquímicas (NEMA, 2002).
Na região são identificados os seguintes ecossistemas específicos: lagoas
costeiras- complexo Mirim- Mangueira; banhados, campos nativos e matas nativas.
5.2.1 Lagoas costeiras: Complexo Mirim-Mangueira
Considera-se que os avanços e recuos do mar, juntamente aos processos
erosivos do vento e da água, criam um sistema costeiro que forma em seu interior
um rosário de lagoas costeiras. Metade da superfície da Planície Costeira do Rio
Grande do Sul é coberta pelas lagoas costeiras, onde sobressaem três lagoas que
se estendem paralelas ao oceano: a Laguna dos Patos, a Lagoa Mirim e a
Mangueira (NEMA, 2002).
A enorme dimensão das lagoas Mangueira e Mirim contribui para a existência
de vários habitats aquáticos e transicionais, que desempenham um papel
fundamental na manutenção dos sistemas palustres, além de constituírem
ecossistemas aquáticos importantíssimos. O sistema hidrológico formado na área
onde se situam as lagoas Mangueira e Mirim oferece elevada biodiversidade, agindo
como corredores ecológicos na fauna aquática e terrestre, além de ser uma fonte
essencial de sobrevivência das comunidades do entorno (NEMA, 2002).
A Lagoa Mirim (Figura 5) apresenta cerca de 380.000 ha de espelho d’água,
com um volume de aproximadamente dezessete bilhões de metros bicos de água
doce. A lagoa possui 350.000 anos de idade, durante vários momentos esteve ligada
ao oceano. Atualmente está completamente isolada das águas marinhas e se
beneficia de alguns aportes fluviais Rio Piratini (via Canal São Gonçalo), Rio
Jaguarão, Rio Tacuary, Arroio del`Rey, Arroio São Miguel e outros de menor
significância, as suas águas são turvas, com profundidade média de 2,5 a 3,5 metros
(NEMA, 2002).
71
Figura 5 - Vista da Lagoa Mirim, RS
Fonte: NEMA (2002, p.27)
A Lagoa Mangueira é considerada uma lagoa costeira bastante jovem, possui
cerca de 150.000 anos de idade, que antigamente ligava-se à Lagoa Mirim. A lagoa
possui cerca de 80.000 ha de espelho d’água e volume aproximado de dois bilhões
de metros cúbicos de água doce, o que representa 1/6 da Lagoa Mirim (NEMA,
2002).
A Lagoa Mangueira proporciona uma capacidade hídrica limitada, como
resultado do seu afastamento na restinga, entre a lagoa Mirim e o Oceano Atlântico,
formando o sistema hidrológico do Taim, despojada de aportes fluviais significativos,
com exceção do Arroio Pastoreio, esta lagoa é abastecida apenas por drenagens
pluviais e águas freáticas sub-superficiais, desse modo, fica muito vulnerável a
situações de déficit hídrico. As dunas costeiras são determinantes na sustentação do
nível e da qualidade de água dessa lagoa. As águas são límpidas com até dois
metros de transparência, caracterizadas por uma dureza elevada água alcalina.
Apresenta uma profundidade média de 2,0 metros (NEMA, 2002).
72
5.2.2. Banhados
Os banhados correspondem a zona de transição entre a terra firme e a água.
Trata-se de um ecótono que trabalha como sistema tampão, ou seja, um regulador
do ambiente. Consideram se banhados as áreas inundadas ou saturadas através da
água superficial ou do solo, com uma freqüência e duração suficiente para suportar,
em situações normais, a prevalecente vegetação caracteristicamente adaptada à
vida em condições de solo saturado (AZEVEDO, 1995 apud NEMA, 2002).
Os banhados, como o do Taim (Figura 6), proporcionam características
peculiares, que tornam muito importantes a sua preservação, estes se compõem de
áreas planas e alagadiças de extensão variável ao longo do ano. O modelo oscilante
das águas, caracterizado pelos ciclos anuais de enchentes e secas, representa uma
enorme importância para a vida que se desenvolve no sistema, onde é influenciada
por fatores climáticos (evaporação e precipitação). Este fluxo hídrico depende do
regime de precipitação da região, onde a estação chuvosa corresponde ao período
das cheias (inverno) e o verão, o período das secas. A quantidade de água que
entra e sai do sistema condiciona a entrada de sedimentos, matéria orgânica e
nutrientes, para além da saída de detritos, sedimentos, nutrientes, zooplâncton e
matéria vegetal (NEMA, 2002).
Figura 6 - Banhado do Taim, RS
Fonte: NEMA (2002, p.28)
73
5. 2.3 Campos nativos
Um denso estrato herbáceo caracteriza os campos da região, comumente
usado no pastoreio intensivo. A vegetação herbácea e por vezes arbustiva acolhe
uma enorme diversidade de espécies animais e vegetais que usam estratégias de
adaptação aos imprevistos que surgem num ambiente aberto. Os campos arenosos
proporcionam alta taxa de solo destapado, com baixa variedade de cobertura que
fornecem espécies forrageiras nativas casos do Paspalum notatum, Axonopus
compressus, Briza minor, Stenotaphrum secundatum. É possível encontrar também
densas manchas de Androtrichum trigynum, Senecio crassiflorus, Tamarix gallica e
Bacharis spicata. (NEMA, 2002).
A proximidade do lençol freático à superfície caracteriza os campos úmidos,
encontram-se assim os alagadiços sazonais. Existe um domínio das espécies de
estoloníferas como Axonopus paroddi e Ischaemum urvilleanum. Também é muito
freqüente nos campos naturais a ocorrência de Drosera ssp., normalmente
significando uma alta acidez edáfica (NEMA, 2002).
5.2.4 Matas nativas
As matas de restinga são habitats de diversas espécies vegetais e animais,
uma parte em risco de extinção, que oferecem grande biodiversidade, agindo como
corredores ecológicos para a fauna terrestre. As matas nativas servem de proteção
para os solos contra o processo da erosão e são fixadoras das dunas fósseis, onde
são diferenciadas de acordo com as condições edafo-hidrológicas, estabelecendo
formações arbóreas de solos arenosos drenados e turfosos mal-drenados. Nos solos
drenados, ocorre o incremento de espécies de maior porte, sobressaindo a
pitangueira (Eugenia uruguaiensis), a quaresmeira (Scoutia buxifolia), o araçazeiro
(Psidium catleianum) e as capororocas (Rappanea lorentziana) (NEMA, 2002).
As espécies de solo mal-drenado se constituem especialmente de corticeiras
(Erhythrina crista-galli), chá-de-bugre (Casearia silvestris), pau-de-leite (Sapium
74
gladatum) e sarandi (Sebastiana sp.), todas de pequeno e médio porte, com
exceção das figueiras (Ficus organensis e F. enormis) muito adequadas à saturação
hídrica, que possuem um adensamento muito expressivo e um elevadíssimo nível de
epifitismo (Figura 7). Entre as efitas, sobressai a barba-de-pau (Tillandsia
usneoides), as bromélias (Aechnea recurvata e Vhriesia gigantea), a orquídea
(Cattleya intermedia), o cravo-do-mato (T. aerhantus), e o rabo-de-rato (Licopodium
sp.) (NEMA, 2002).
Figura 7 - Mata nativa na região do Taim, RS
Fonte: NEMA (2002, p.29)
5.2.5 Importância ecológica da área da E. E. do Taim
A Estação Ecológica do Taim encontra-se situada na região dos banhados do
Taim, nos municípios de Rio Grande e Santa Vitória do Palmar, entre os 332` e
32º 50`S de latitude e 52º 23` e 52º 32`W de longitude. Os seus limites são definidos
na parte norte pelas terras de particulares pertencentes ao município do Rio Grande,
75
a oeste com a Lagoa Mirim, a leste com o Oceano Atlântico, e a sul com a Lagoa
Mangueira. (IBAMA, 2003).
Figura 8 - Indicação dos limites da estação ecológica do Taim.
(1) sede da ESEC Taim; (2) comportas da saída do banhado; (3) lagoa Nicola; (4) lagoa jacaré; (5)
canal de jacaré (6) canal da Sarita;
Fonte: Paz ( 2003, p.13)
A ESEC Taim proporciona variedade de ecossistemas, onde se encontram os
banhados que correspondem 51% de sua área total (Figura 8); as lagoas ocupam
20%; as dunas com 10%; os campos com 10%; as dunas obliteradas com 8%; e as
matas representam 1% (AZEVEDO, 1995 apud NEMA, 2002). Nestes ecossistemas
76
se encontram varias espécies de vegetais e animais, entre eles a capivara
(Hidrochaeris hidrochaeris) e o colhereiro (Platalea ajaja), uma parte delas em risco
de extinção, como o cisne-do-pescoço-preto (Cygnus melancoryphus), a lontra
(Lutra longicaudis) e o jacaré-de-papo-amarelo (Caiman latirostris) (NEMA, 2002).
Figura 9 - Vista aérea do Banhado do Taim, RS
Fonte: Nema (2002, p.7)
Conforme salientado na introdução deste trabalho nas colocações da Sosinski
(2009) fica evidente a importância ambiental da região do Taim, que é destacada
como uma das regiões mais ricas em aves aquáticas da América do Sul. A Embrapa
realça o seu enorme valor como patrimônio genético e paisagístico, por causa da
sua imensa diversidade biológica e ecossistêmica. A Zona do Taim é considerada
núcleo da Reserva da Biosfera e Área Prioritária para preservação da
Biodiversidade.
77
5.3 Histórico de ocupação da região do Taim, categorias sociais e avaliações
prévias de impactos sociais da criação da ESEC
Segundo Quesada et al (1987) durante o século XVII a região do Taim
passou por disputas (guerras) entre Portugal e Espanha, que faziam com que o
território pertencesse as vezes a Portugal, outras vezes a Espanha sendo que, em
alguns anos (30-40 anos), chegou a permanecer como território neutro (sem dono).
Rudiger (1965) apud Quesada et al (1987) destaca a migração dos proprietários
originais em novas frentes de colonização (buscando terras mais férteis); a
formação de grandes latifúndios com áreas abandonadas; as limitações técnicas,
ecológicas ou outras para delimitação das propriedades e cenários de sucessão “mal
resolvidas” como responsáveis pelo processo de ocupação de certas áreas por
outras vias sem ser pelos contratos legais firmados em cartório. A situação irregular
de ocupação da área (caracterizada pela ausência de acordos formais legais do
domínio privado) não podia ser interpretada como uma anomalia, tanto que os
fatores históricos explicavam esse cenário, o contrato verbal predominava na região.
(QUESADA et al, 1987). Levantamento de dados realizados por Quesada et al
(1987) evidenciaram que, tradicionalmente, grande parte dos contratos de trabalho
eram acertados verbalmente, as relações entre os moradores antigos ainda se
processavam por meio de contrato verbal, mas nas empresas (agropecuárias ou
florestais) as relações tinham a tendência a ser regulamentada por preceitos legais.
Um aspecto de destaque era a existência no local de propriedades de
exploração coletiva, onde todo mundo criava junto, uma situação que se manteve
até a época da instalação da ESEC do Taim. Além destas áreas de criação coletiva,
existiam áreas de caça ou de pesca de exploração coletiva. Estes grupos sociais,
mesmo explorando permanentemente a área não tinham como solicitar
reconhecimento de propriedade. Assim, com a instalação da ESEC do Taim foram
submetidos a mercê de novas condições concretas de existência (QUESADA et al,
1987).
Paixão et al registram, em 1984, que a população do município de Rio Grande
era majoritariamente urbana (93,8%), com apenas 6,2% de população rural. O
município de Santa Vitória do Palmar tinha uma distribuição populacional mais
78
equilibrada, com uma pequena vantagem da população urbana em relação à rural,
58,5% e 41,5%, respectivamente. A densidade demográfica do município de Rio
Grande era de 56,03 hab/Km
2
, uma situação que refletia o grau de urbanização
deste município. O município de Santa Vitória de palmar apresentava 5,86
Hab/Km
2
, portanto uma população bem mais dispersa, com densidade quase dez
vezes inferior a Rio Grande (PAIXÃO et al, 1984).
Segundo Paixão et al (1984) nos dois municipios a maioria dos adultos ainda
não tinham completado 35 anos. A população não economicamente ativa nesses
municipios representava 50,8% em Rio Grande e 49,3% para Santa Vitoria de
Palmar. Estes pesquisadores acrescentam que grande parcela da população desses
municipios estava sem rendimento, desempregada, procurando trabalho ou em
condições inativas.
20
Levantamentos de dados realizados por Quesada et al. (1987) de
caracterização das categorias sociais encontradas no entorno da ESEC Taim
resultaram na identificação das seguintes categorias sociais:
- Empresa rural: eram empresas que se dedicavam a produção de arroz e pecuária.
O arroz era cultivado em grande escala, em propriedades com superfície acima de
3.000 hectares próprios. Maior parte de suas áreas eram destinadas a pecuária,
onde se praticava a criação extensiva. O cultivo do arroz era sincronizado com a
criação bovina.
- Arrendatários capitalistas: este grupo alugava as terras para a produção de arroz,
em alguns casos para a pecuária. O arrendatário capitalista organizava e
comandava o processo produtivo, estes arrendavam a terra, através de
financiamentos bancários, assalariavam os trabalhadores e comercializavam a
produção.
- Grandes proprietários: estes possuíam grandes extensões de terra destinadas a
pecuária extensiva e ao reflorestamento, as suas propriedades chegavam a atingir
mais de 500 hectares.
20
A população do município de Rio Grande se dedicava as atividades econômicas dos setores
secundário e terciário na sua grande maioria (86,0%). Apesar de possuir 6,2% de sua população
alocada na zona rural, 11,6 da população total exercia atividades economicas no setor primario, o que
pressupunha que a população alocada na zona urbana podia tambem estar exercendo atividades
basicamente rurais. O município de Santa Vitória de Palmar apresentava um quadro diverso, onde
42,9% da população se dedicava a atividades economicas no setor primario enquanto que 53,5%
estava ligada a atividades economicas dos setores secundario e terceiario (PAIXÃO et al, 1984).
79
- Médios proprietários: Eram estabelecimentos que ocupavam uma área que variava
de 100 a 300 hectares. A principal atividade era a pecuária, com uma certa
diversidade na produção, combinando pecuária-agricultura, onde predominava o
milho, feijão e batata-inglesa, com a criação de ovelhas, bovinos e suínos.
- Médios arrendatários: eram produtores que arrendavam terras de terceiros para a
produção de arroz, a suas propriedades (arrendadas) tinham de 100 a 200 hectares.
Na época de plantio e colheita aumentava significativamente o número de
trabalhadores assalariados.
- Pequena produção: nesta classe se incluía os posseiros, os pequenos
arrendatários e os pequenos proprietários. Faziam parte todos que tinham acesso a
terra para cultivo e criação de pequeno número de animais, com propriedades que
iam até 50 hectares.
- Assalariados: faziam parte desta classe todos que prestavam serviço as duas
atividades principais da região, a arrozeira e a pecuária. Estas atividades produziram
alguns tipos de especialização, como os aguadores, posteiros, capatazes,
domadores. Este grupo era totalmente desprovido da assistência social e seguro
trabalhista.
- Firma empreiteira: Trata-se de firmas que contratavam trabalhadores para
execução de serviços ligados ao reflorestamento. Geralmente grupos (trabalho
coletivo) para plantio, tratos culturais e corte de madeira, etc.
- Pequeno comércio: eram pequenas vendas ao longo da rodovia Rio Grande- Chuí,
onde se encontrava uma variedade de mercadorias, de um modo geral pertenciam a
pessoas que tinham terrenos com casa ao longo da rodovia.
- A pequena produção pesqueira: distinguiam-se dois grupos: os pescadores
lavradores e pequenos pescadores artesanais. No primeiro caso a pesca era feita
ocasionalmente pelo pequeno agricultor ou pecuarista. No segundo tratava-se de
uma reduzida produção pesqueira artesanal, que representava a principal fonte para
renda.
- A intermediação no setor pesqueiro do Taim: o intermediário residia na vila junto
dos pescadores, tinha um forte relacionamento com estes, pois se afirmava como
funcionário da firma compradora da produção dos pescadores e por outro lado,
pagava as mensalidades e era filiado a colônia dos pescadores.
80
5.3.1 Avaliações prévias sobre impactos sociais da criação e implantação da EE do
Taim
Conforme relatos de Quesada et al (1987) durante o processo da criação da
ESEC do Taim as comunidades locais foram afetadas pela desapropriação das
terras, as pessoas sentiram a necessidade de recorrer aos tribunais para reivindicar
os seus direitos.
Quesada et al (1987) detalham que a criação da estação ecológica do Taim
em 1979 causou vários impactos na vida socioeconômica e cultural das populações
locais, a desapropriação de terras durante a implantação o respeitou as normas
locais (tradição da região), alguns envolvidos consideraram as políticas de
compensações injustas. Com a criação da Estação Ecológica do Taim houve
desapropriação das terras que pertenciam às populações locais dentro das normas
tradicionais da região, isso gerou conflitos diferenciados conforme o posicionamento
que as pessoas tomaram frente à legislação estatal. Essa diferença de atitudes
afetou o impacto da desapropriação, surgiu um grupo que se conformou com a
subtração de seus recursos e migrou, outro foi buscar amparo na justiça e continua
em conflito, um terceiro que procurou apoio político e o ultimo grupo que teve
sucesso na justiça sendo mais compensado (QUESADA et al, 1987). Passados oito
anos depois do processo de desapropriação na estação do Taim podia se considerar
que este foi incompleto, parecendo por vezes para a população como injusto (onde
alguns foram beneficiados e outros prejudicados). Os grupos sociais apontavam uma
implantação incompleta, caracterizada por incoerências concretas facilmente
notadas por estes grupos. Logicamente podia se questionar se a justificativa para
este aspecto surge como uma opção ou por pressão política de alguns grupos ou
situa-se na burocracia estatal e limitações técnicas - cientificas (QUESADA et al,
1987).
As comunidades ficaram privadas da exploração dos recursos naturais na
região que passou a ser reserva. Com a introdução das normas restritivas o modo
de sobrevivência da população local, majoritariamente pescadores, foi severamente
afetado, a proibição a pesca; caça; desmatamento; etc., logicamente representou um
novo ordenamento na busca pelo desenvolvimento das populações locais. As
81
comunidades locais tiveram que se adaptar a nova realidade, se enquadrar no novo
modelo implantado na relação com os recursos naturais da região.
Quesada et al (1987) apontam que o aparelho estatal foi sendo usado para
beneficiar os propósitos de uma determinada classe, esse fato é notório para o
restante da população afetada, que é menos influenciada pela “bruma ideológica”
que escondia estes interesses. Acrescentam que o Taim podia ser considerado,
como um palco de uma clara luta de classes e, assim, evidentemente surgiram os
conflitos. Os autores avaliam que esse ato acabou sendo mais um momento em que
se beneficiou o estabelecimento das relações capitalistas de produção e o abandono
ou reformulação das relações sociais tradicionais com a provável expulsão das
comunidades que nela sobreviviam.
5.4 Estudo da percepção atual da comunidade local sobre sua relação com a
Estação Ecológica do Taim
Nesta seção apresenta-se, inicialmente uma caracterização das comunidades
locais do entorno da ESEC Taim, a investigação sobre a influência da ESEC na vida
da comunidade abordando a questão da desapropriação, influência na atividade
econômica dos pescadores, dos arrozeiros, dos produtores florestais e, depois, a
percepção dos moradores do entorno.
5.4.1 Processos sociais e organização social atual na região do Taim
Segundo Paz (2003) citando Villanueva (2000) atualmente, a orizicultura
representa a principal atividade econômica na região, esta requer a manutenção de
laminas de água sobre os cultivos, ao longo do processo de seu crescimento,
tornando-se praticamente a única fonte de emprego e sobrevivência da população
82
regional.
21
Cabe assinalar, entretanto, a importância no local das atividades
econômicas relacionadas a exploração madeireira, do extrativismo (pesca) e do
turismo no entorno do Taim.
O Nema apresentou, em 2002, uma descrição do perfil das comunidades do
entorno da ESEC Taim, a qual será utilizada como base para a caracterização da
realidade atual das comunidades locais. Os dados foram obtidos pelo Nema através
de consultas bilbiográficas, entrevistas e conversas informais, reuniões, oficinas,
saídas de campo e contatos institucionais.
22
Para entender a descrição apresentada pelo Nema convém lembrar que a
Estação Ecológica do Taim insere-se no espaço territorial do distrito de Taim,
município de Rio Grande e do distrito de Curral Alto, município de Santa Vitória do
Palmar. O 4º distrito do município do Rio Grande, conhecido como Taim, distribui-
se ao longo de 120 Km da BR 471, com população agrupada em comunidades como
a Vila da Capilha e Terras do Albardão Serraria e nas propriedades denominadas
de granjas. (NEMA, 2002). no distrito de Curral Alto, município de Santa Vitória
do Palmar, o principal agrupamento encontra-se na Vila Anselmi. A seguir serão
descritas as características dos principais agrupamentos sociais encontrados no
entorno da Estação Ecológica do Taim.
5.4.1.1 Comunidade da Capilha
A Capilha é uma comunidade muito antiga que testemunhou todo o processo
de criação da Estação Ecológica do Taim, os espanhóis chamavam de Saco da
Capilla, por causa da capela do Taim, de 1832. Encontra-se no Distrito da cidade
do Rio Grande, à cerca de 80 km desta pela BR 471. A Capilha está localizada às
margens da Lagoa Mirim. Atualmente, ainda se encontram algumas casas no estilo
colonial português, mas a sua maioria são de alvenaria e chalés de Pinus. Na
comunidade vivem cerca de 300 pessoas, sendo formada principalmente de
21
Acrescenta ainda que os estudos iniciais da região basearam se na avaliação da possibilidade de
drenagem do Taim, com a finalidade de utilizá-lo para o cultivo de arroz.
22
O trabalho do Nema se enquadrava no contexto da geração do Plano de Desenvolvimento
Sustentável da ESEC do Taim, que contou com a participação das comunidades dos municípios do
Rio Grande – Capilha e Serraria e de Santa Vitória do Palmar – Vila Anselmi.
83
pequenas e médias propriedades. Grande parte da comunidade tem a pesca como
atividade econômica principal, outros dependem do trabalho campeiro. (NEMA,
2002).
A comunidade da Capilha é constituída majoritariamente por pessoas adultas,
seguidas das crianças e dos jovens. Os poucos jovens que concluem o grau se
retiram a procura de melhores oportunidades de trabalho em Rio Grande e Pelotas.
O nível de escolaridade da maioria das pessoas é baixo. Os homens dedicam-se
nas atividades de pesca, trabalham como caminhoneiros, realizam serviços gerais,
são marceneiros, no pequeno comércio, na pecuária, e como trabalhadores nas
granjas e nas serrarias (NEMA, 2002).
5.4.1.2 Comunidade da Serraria
A comunidade da Serraria se encontra situada nas Terras do Albardão, que
pertence ao 4º Distrito do Taim como o caso da Capilha, de modo que a serraria
esta próxima à Sede Administrativa da ESEC, na BR 471. O acesso a comunidade
ocorre através de uma estrada municipal sem pavimentação, edificada sobre um
aterro que atravessa os campos e banhados
23
(NEMA, 2002).
A Companhia Trevo Florestal, proprietária de cerca de 7.500 hectares de
floresta de Pinus e Eucalyptus, no entorno do Taim é responsável pelo surgimento
desta vila, pois com a formação do cleo inicial, os seus funcionários trouxeram
suas famílias para a pequena vila construída pela empresa. Durante anos, a Trevo
Florestal fazia o corte e o beneficiamento da sua madeira, mas depois de um
incêndio que destruiu sua serraria, passou então a dedicar-se apenas ao corte da
floresta. Desse modo surgiram diversas serrarias particulares que trouxeram com
elas pessoas de várias localidades do Rio Grande do Sul (NEMA, 2002).
Segundo a fonte da Trevo Florestal atualmente vivem mais de 600 pessoas
no local, sem incluir os trabalhadores diários que não residem na comunidade e
voltam para as suas localidades no final do dia. Segundo o Nema (2002) a vila da
23
Infelizmente, durante o inverno as vezes fica intransitável por causa das chuvas e do tráfego
pesado de caminhões que transportam a madeira, ficando a comunidade algumas vezes com
dificuldades de locomoção
84
Trevo apresenta melhor organização espacial, isso porque as outras vilas possuem
residências das famílias no próprio pátio de produção, local que é freqüentado por
caminhões, máquinas e serve de deposito de resíduos gerados do beneficiamento
da madeira, pilhas de serragem e restos de madeira picada.
5.4.1.3 Comunidade da Vila Anselmi
A Vila Anselmi está localizada no distrito de Curral Alto, distrito de Santa
Vitória do Palmar. A vila se encontra nas margens da BR 471, onde dista a cerca de
80 km de Santa Vitória do Palmar e 35 km da sede da ESEC Taim. A Vila Anselmi
se encontra situada entre as Lagoas Mirim e Mangueira, no limite sul da Estação
Ecológica do Taim, nesse espaço vivem cerca de 300 pessoas sem muita infra-
estrutura. (NEMA, 2002)
O nome Anselmi deriva da Casa Anselmi, a segunda firma que surgiu em
Santa Vitória do Palmar no final do século XIX. Esta firma foi criada por Raphael
Anselmi, um italiano imigrante, este acabou se radicando definitivamente na cidade
marítima do Rio Grande. A Anselmi & Cia. possuía sua matriz na cidade do Rio
Grande e uma filial em Santa Vitória do Palmar que mais tarde foi ampliada para
Curral Alto, local que conservou um grande estabelecimento comercial e pastoril.
(NEMA, 2002).
A comunidade apresenta uma ligação muito forte com a pesca, em virtude da
sua localização entre as duas lagoas, mas possui muitos problemas em função do
declínio dos recursos sobrepesca, devido a falta de regulamentação da pesca na
lagoa Mangueira, onde a porção norte pertence a ESEC. Por outro lado, a
deterioração dos banhados adjacentes pelas plantações de arroz contribui para a
diminuição das áreas pesqueiras e de criação. (NEMA, 2002).
85
5.4.2 A persistente problemática de delimitação e implantação da área da
Estação Ecológica do Taim e a percepção da população local sobre este
processo
O Ministério do Interior encaminhou, em outubro de 1976, o projeto de
estruturação e implantação da ESEC Taim. O Instituto Nacional da Colonização e
Reforma Agrária - INCRA e o Serviço de Patrimônio da União começaram em março
de 1978 o tombamento e o enquadramento de áreas devolutas. Finalmente, em 26
de abril 1978, a área de 33.815 ha entre a Lagoa Mirim e o Oceano Atlântico,
passou, por decreto do Presidente da República, para área de utilidade pública para
ser implantada a Estação Ecológica do Taim.
No intuito de legalizar a criação desta unidade de conservação, em 27 de abril
de 1981, foi decretada a Lei 9.902, que normatizou a criação da Estação
Ecológica. Por fim, em julho de 1983, o INCRA submeteu à Secretaria de Meio
Ambiente - SEMA o balanço das desapropriações e áreas de domínio da União, que
totalizavam 25.247,57 ha (equivalente a 74% da área da ESEC Taim) (NEMA, 2002).
No decreto de 1986 (n 92.963), que cria a Estação Ecológica do Taim, a área
total da Estação soma 10.764,64 ha. Notícia publicada em 2008 contribui para
esclarecer os impasses criados em torno da implantação e divergências quanto a
área total na delimitação da Estação Ecológica:
A reserva acabou sendo criada em 21/07/1986, pelo Decreto 92.963, em
cima de áreas devolutas da União que totalizam 11 mil hectares. Mas, na
prática, o Ministério e o Ibama sempre trabalharam em cima da área
prevista desde 1978, explica José Paulo Fitarelli, responsável pelas
Unidades de Conservação no Rio Grande do Sul até a recente criação do
Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade. (EcoAgencia
Solidaria, 2008, grifo nosso)
Em 2003 a questão da definição dos limites da Estação Ecológica foi revisada
com o decreto presidencial de 05 de junho de 2003 que, em seu artigo primeiro
previa a ampliação desta UC.
24
Segundo o decreto do Presidente da República, a
Estação Ecológica do Taim devia ampliar-se em 77.540 ha, e parte dos custos
referentes à implantação e regularização fundiária do projeto seriam arcados pelo
24
(“Art. 1º Ficam incorporadas aos limites da Estação Ecológica do Taim, criada pelo Decreto nº
92.963, de 21 de julho de 1986, as áreas com superfície aproximada de setenta e sete mil,
quinhentos e quarenta hectares”)
86
IBAMA com recursos oriundos do empreendimento referente a futura usina
hidrelétrica-UHE foz do Chapecó, a titulo de compensação ambiental. Na mesma
deliberação constava que parte da área ampliada é de propriedade ou é arrendada
por Selva Floral e Ourives Florestal.
Este decreto foi revogado em 2004 pelo Supremo Tribunal Federal, como
esclarece a notícia:
um certo alarme na região, pois em junho de 2003 o Governo Federal
decretou a ampliação da estação para 111 mil hectares. Mas em dezembro
de 2004 o Supremo Tribunal Federal (STF) revogou o decreto. Proprietários
descontentes alegaram judicialmente que não teriam ocorrido as audiências
públicas obrigatórias. (EcoAgencia Solidaria, 2008)
Segundo o mandado de segurança
25
a medida acauteladora foi indeferida em
decisão liminar que argumentava que não se comprovou a exigência de efetiva
participação popular e de estudos quanto à necessidade de manter-se preservada a
área. Os estudos técnicos mostraram-se precários, não havendo demonstrado base
suficiente para a edição do decreto. Nessa medida salientava-se que a ampliação
resultaria de um estudo realizado por um único biólogo, que se limitou a examinar as
questões ambientais, sendo desprezados os aspectos socioeconômicos.
Asseverava-se a ausência de alusão as populações locais e aos efeitos que a
medida ocasionaria para a economia comprometiam o trabalho. Na mesma liminar
apontava-se que os estudos ficaram restritos quase que de maneira total à fauna
existente. Ressalta-se a falta de recursos para a efetivação da Estação Ecológica na
extensão prevista. Os projetos de reflorestamento seriam interrompidos com
prejuízos para os cofres públicos e com interrupção dos projetos de reflorestamento
ocorreria uma diminuição de aproximadamente 11 000 empregos diretos, indiretos e
a serem criados.
A imprensa revela, também, a intenção governamental atual de consolidar o
projeto original da Estação Ecológica, que previa a preservação de 33.000 e não
apenas 11.000 atualmente considerados como área da ESEC Taim:
A consolidação foi autorizada pelo Ministério do Meio Ambiente (MMA) e
prevê a ampliação, este ano [2008], dos atuais 11 mil hectares da reserva
para 33.815 hectares, conforme está previsto no Decreto 81.603 de 26/04
de 1978. Ele designou a área como de utilidade pública para a
desapropriação de áreas visando a criação da Estação Ecológica, com base
25
Publicado em 5 de outubro de 2003, assinado pelo Ministro Marco Aurélio. Brasília. 4p.
87
num estudo da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Ufrgs).
(EcoAgencia Solidaria, 2008)
Não um levantamento sistemático do conjunto dos conflitos gerados no
apossamento das áreas pela União para fins da implantação da Estação Ecológica
entretanto existem diversas evidências em dados secundários de contestação
judicial dos processos de desapropriação.
As referências aos conflitos em torno da desapropriação da área para criação
da ESEC Taim são recorrentes nas entrevistas realizadas no trabalho de campo
desta pesquisa, como evidenciam os depoimentos abaixo:
A metade que morava ali onde é reserva não existe mais, morávamos ali
onde tem os canais do dique. Sai dali com treze anos, fomos tirados dali de
80 para 81... correu o processo e morreu. Ninguém sabe mais nada, as
pessoas que podiam dizer tudo certinho morreram, o meu pai entrou na
justiça não deu em nada e o caso morreu, tem algumas pessoas que
conseguiram recuperar suas terras (entrevistado 13)
O processo da passagem para estação ecológica criou muitos problemas,
eles tomaram conta das terras e não pagaram, nós tínhamos terra ali dentro
120 ha de terra lá, até hoje não pagaram. Esta na justiça, só chegaram
tomaram conta e desapropriaram, a causa foi vencida mas ate agora não
pagaram, (entrevistado 25).
Eu estou nesta propriedade desde 1985, o processo de criação da estação
não foi pacifico, no nosso caso eles pagaram uma indenização, mas o valor
foi baixo. Nós entramos na justiça para corrigir o valor, q levou 23 anos
para conseguir a compensação. O valor foi recebido, foram 70ha da nossa
propriedade desapropriados ((entrevistado 23).
O processo da desapropriação da ESEC do Taim afetou os moradores de
formas distintas, em alguns casos a situação foi regularizada, as pessoas receberam
os seus valores e se conformaram. Noutros casos, os moradores perderam suas
terras e ainda estão brigando na justiça pela indenização e alguns deles já perderam
a vida antes de se conseguir uma solução. Os dados de entrevistas indicam,
também, que existe um grupo que conseguiram recuperar as suas terras na justiça,
mas se queixa de não ter sido compensado pelo tempo que ficou sem explorar as
suas propriedades.
A tentativa de ampliação da área da ESEC Taim (em 2003) também aparece
e é avaliada na fala dos entrevistados:
O projeto deles era para não existirem mais moradores aqui perto, mas o
Lula mandou um helicóptero e provou-se que existiam moradores: veja o
88
caso da serraria que movimenta muitas famílias, muito dinheiro. Aqui as
decisões são tomadas sem conversas com as pessoas, chegam com
papel já esta na rua, (entrevistado 14)
[...] naquela época [da criação da ESEC] não tinha consulta popular, mesmo
o caso da ampliação para 100 mil ha não deu certo porque não houve
consulta popular e perderam na justiça. (entrevistado 25)
Conforme entrevistado, no caso da ESEC do Taim o problema da
desapropriação continua se registrando:
O conflito da desapropriação continua 10.000 ha estão sendo
desapropriados ainda, alguns agricultores ganharam na justiça para
poderem produzir ainda enquanto não ocorrer a desapropriação
(entrevistado 1)
Atualmente 10.000 ha estão sendo desapropriados, alguns agricultores
conseguiram na justiça o direito de produzir enquanto o processo não se conclui.
Segundo representante da gestão da estação entrevistado, a unidade de
conservação será redefinida e criado o decreto, a partir daí será estabelecido um
plano de desapropriação. Este processo de desapropriação levará em conta as
necessidades dos afetados, os direitos de cada um, as benfeitorias existentes no
espaço, etc. O entrevistado esclarece que nas reuniões do conselho será
estabelecida uma linha estratégica a seguir que orientará a alocação de recursos,
entretanto isso possivelmente não eliminará a possibilidade de resultar numa ação
judicial movida pelos afetados por causa da diferença de expectativa em torno dos
valores a receber.
5.4.3 Percepções sobre a influência da ESEC Taim na atividade econômica dos
pescadores
A pesca artesanal é a principal atividade socioeconômica na região do Taim,
sendo que esta atividade condiciona a vida de várias famílias no entorno da reserva.
No entorno da ESEC do Taim, existem pescadores na Vila Capilha, Vila Anselmi e
reunidos em grupos pequenos em localidades ao redor das lagoas Mangueira e
Mirim. Os pescadores estão organizados em associações, que se tornaram
oficialmente reconhecidas graças ao apoio do Nema, mas atualmente passam por
crises de organização.
89
Quanto à relação com a Estação Ecológica, propriamente dita, encontram-se
diferenças na percepção dos pescadores próximos á Lagoa Mirim e da Mangueira.
Os pescadores da lagoa Mirim destacam o impacto negativo que a criação da
estação representa nas suas vidas. Estes responsabilizam as normas de
conservação pelos seus problemas, alegando que não conseguem muito pescado
por causa das restrições do tamanho de rede e que antes de existirem essas normas
restritivas conseguiam mais peixe. Relatam que, com as normas, o pescador ficou
com poucas opções, as normas diminuem a diversidade e a defesa da própria
natureza, como declara um entrevistado:
No meu ponto de vista a reserva traz beneficio para a natureza, mas
prejudica por causa das normas, não se pode usar malha fina, as multas
são muito caras, a fiscalização é muito rígida, mesmo estando perto, fora
da reserva, eles fiscalizam muito, todos usam mesmo tipo de rede e o
peixe não cresce. Antes de existirem essas normas tinha mais peixe, elas
prejudicam a pescaria porque não muita opção ao pescador. Sem as
normas um pesca com rede miúda outro com rede graúda, e a própria
natureza se defende da própria pesca. (entrevistado 9)
Os pescadores da vila Capilha criticam, também, a ação dos turistas que
freqüentam a praia no entorno da reserva. Argumentam que os turistas não
respeitam o interregno entre os meses de outubro à janeiro. Enquanto eles param
com toda a atividade de pesca, os turistas não respeitam as normas estabelecidas,
tanto que enchem os seus barcos de peixe, prejudicando os pescadores no seu
regresso.
Por outro lado, nas colocações de alguns pescadores majoritariamente da
Lagoa Mangueira fica evidente o conflito com os arrozeiros e o reconhecimento da
influência positiva da área de reserva.
O conflito entre os pescadores e os granjeiros é evidente nas reclamações
dos pescadores. Os pescadores consideram que os arrozeiros cometem crimes
ambientais e que são prejudicados pela atividade exercida pelos arrozeiros, porque
lhes é limitado o acesso a alguns locais, o peixe é puxado pelas bombas de água e
a água é devolvida para lagoa contaminada com agrotóxicos- prejudicando o
desenvolvimento dos peixes. Um entrevistado coloca:
A lavoura nos prejudica porque trancam os canais de acesso e a
lagoa fica encerrada, não entra peixe nenhum, zero, acaba morrendo
porque eles aplicam herbicidas de trator, a água não é escoada para a
lagoa mãe e fica lá dentro, eles colocam sucatas de carros, troncos para o
pescador não entrar nos canais de acesso, mas como é grande, o IBAMA
90
não faz nada, quando somos nós a cometer crime ambiental recebemos
multas pesadas. (entrevistado 7).
Esta categoria social não encontra soluções para as suas reivindicações a
respeito do assunto, alega que se cansou de encaminhar as suas preocupações
para os diversos fóruns, como o caso das associações de pescadores, conselho de
gestão da ESEC, associações de arrozeiros, sempre sem solução a vista.
Os pescadores da Mangueira, por outro lado, alegam que a área protegida
traz benefícios à pesca porque o peixe desenvolve melhor aa fase adulta e pode
passar depois para área não proibida. Acrescentam que se não existisse a restrição
na reserva os pescadores acabariam com todo pescado, como está acontecendo em
outras partes onde se usa redes finas que não possibilitam o desenvolvimento do
peixe. Mesmo assim, denunciam que alguns pescadores pescam apenas na área de
reserva, entram clandestinamente de madrugada e exercem a atividade ilegalmente.
5.4.4 Percepções sobre a influência da ESEC Taim na atividade econômica dos
arrozeiros
Segundo estimativa do Instituto Rio-Grandense do Arroz IRGA, constante
em estudo do NEMA, de 2002, no município do Rio Grande se encontram 65
estabelecimentos rurais que se dedicam ao cultivo do arroz irrigado; deste total 48
propriedades se localizam no distrito do Taim, o que demonstra a importância desta
cultura para a região. No município de Santa Vitória do Palmar a cultura do arroz
representa dois terços da área cultivada, constituindo o elemento mais
representativo da paisagem e, sem duvida, a principal vocação econômica do
município (NEMA, 2002).
O arroz irrigado depende da água das lagoas para a sua irrigação que é
obtida através de bombas de sucção ou através de canais próprios. Esta
necessidade acaba influenciando o balanço hídrico, principalmente em épocas de
secas, por outro lado acaba levando agrotóxicos e fertilizantes em direção à ESEC.
Os arrozeiros são acusados pelos pescadores de prejudicar o seu trabalho.
Como já relatado, afirmam que estes trancam os canais de acesso e os peixes ficam
91
presos, colocam sucatas de carros, troncos para o pescador o entrar nos canais
de acesso. Os pescadores se queixam também das bombas de água usadas pelos
arrozeiros, que puxam o peixe por falta de telas nos tubos causando a sua morte.
Estas reclamações atingem os fiscais do IBAMA que são acusados de nada fazer
contra os mais poderosos economicamente, apenas fiscalizam os desfavorecidos
aplicando multas pesadas. Um entrevistado coloca:
Não existe uma força organizada contra os arrozeiros que usam
agrotóxicos, porque é o grande produtor que usa água depois devolve com
agrotóxico, eles tem força econômica muito maior, o pescador esta numa
situação mais frágil, uma fazenda tem dinheiro de todas essas pessoas, é
difícil controlar os produtores de arroz, por exemplo nós pedimos para não
fazerem mais sobrevôo para deitar veneno para não voar para dentro da
água, para o banhado, também na beira da lagoa tem uma faixa que a
gente não deixa usar, existe algumas estratégias como recomendar que
faça o arroz ecológico mas não se obriga (entrevistado 1).
Os granjeiros rebatem todas as criticas afirmando que a sua atividade em
nada prejudica os pescadores, uma vez que eles respeitam todas as normas
estabelecidas.
Os arrozeiros entrevistados responsabilizam as normas estabelecidas pela
extinção de algumas espécies animais na região, e exemplificam mencionando que
antes da criação da ESEC os granjeiros colocavam caçadores para abater os
pássaros que se alimentavam da sua produção, estes contam que havia muito
pássaro para caça, mas com a proibição os granjeiros começaram a colocar veneno
nas lavouras, terminando com tudo que pousava na lavoura.
Assim, existem percepções de que a atividade produtiva dos arrozeiros
prejudica tanto a atividade dos pescadores quanto afeta negativamente a
preservação dos recursos da ESEC entretanto entende-se que os arrozeiros gozam
de alguns privilégios comparativamente as outras classes sociais e, por causa do
seu poder econômico, acabam ignorando algumas normas estabelecidas na região,
perseguindo prioritariamente maior produtividade e rentabilidade nas suas
atividades. Os arrozeiros, por sua vez, não se vêem como transgressores e se
sentem prejudicados pela ESEC principalmente pelas restrições que impõe ao
controle de pragas.
92
5.4.5 Percepções sobre a influência da ESEC Taim na atividade econômica dos
produtores florestais
A empresa Trevo Florestal criada em 1971 antes da ESEC Taim, atualmente
desempenha um papel importante na dinâmica socioambiental da região
(entrevistado 5). Esta empresa é proprietária de uma floresta plantada de cerca de
7.500 ha de eucaliptos no entorno da ESEC, que vende matéria-prima para as
serrarias instaladas na região. Segundo técnico da empresa entrevistado, esta
atividade atraiu, nos últimos anos, cerca de 600 famílias para a região, tudo por
causa da floresta que está estabelecida nesta região. O entrevistado também relata
que o último plantio da floresta foi em 1984, depois nunca mais se plantou, porque
atualmente é proibida essa atividade sem autorização legal das autoridades, e que
vem buscando nova autorização para plantio. Avalia que foi “graças a empresa” que
surgiram benfeitorias na região como a estrada de areia batida, ônibus, energia,
sinal de celular, etc.
O entrevistado coloca que devido à crescente instalação das serrarias na vila,
a Trevo Florestal vem estabelecendo normas de conduta e ordenamento, como
limpeza do local, assentamento das famílias fora da área de produção, além de um
trabalho de divulgação de normas de segurança no trabalho. Também afirma que a
empresa Trevo Florestal promove atividades de educação ambiental através da
organização de palestras para os trabalhadores e que neste momento a empresa se
encontra no processo de obtenção da certificação florestal internacional que significa
o bom manejo. Cabe acrescentar que a empresa estava integrada em iniciativas
comunitárias promovidas pelo NEMA uma vez que havia trilhas de visitação pública
em áreas da empresa.
5.4.6 A relação dos moradores das vilas do entorno com a ESEC do Taim
A categoria social classificada neste capitulo como moradores inclui os
pequenos comerciantes, pequenos granjeiros, pequenos pecuaristas, simples
93
moradores e outros atores sociais com pouca expressão, mas com algum impacto
socioambiental.
A maioria dos trabalhadores (moradores) da vila da serraria, por exemplo,
reconhece que a ESEC do Taim é um local de proteção e conservação ambiental,
que serve para pesquisa e que pode incentivar o crescimento do turismo,
proporcionando uma imagem bonita. Mas, alguns trabalhadores se queixam do
excesso da população de jacarés e cobras venenosas na região, não se conformam
por não poder desfrutar das possibilidades que a natureza fornece, como a carne de
caça, pesca e madeira
...aqui é proibido pescar, caçar, não pode fazer nada. Eu acho isso
errado, não existe nenhuma estação, porque tu o tens nem segurança,
às vezes tu sais podes atropelar um bicho perigando a sua vida, teve
vários acidentes nessa faixa aqui mesmo de cair com o carro dentro do
banhado porque teve que desviar um capicho. Então para nós não tem
beneficio nenhum, aqui tem bastante cobra venenosa, não se pode matar
jacaré, tem cobras de mais de 7 metros. (entrevistado 24).
Os moradores da vila Capilha acusam veemente o jacaré pela extinção da
maioria dos animais, e explicam que com a proibição ao abate este se multiplicou
com mais facilidade nesta região de modo que atualmente o jacaré domina as águas
da Lagoa Mirim na região próxima aos diques, e que nessa área não se
encontram as várias espécies de animais que existiam antes da reserva, como o
caso do ratão do banhado e variedades de peixes. Pelo excesso de jacarés alguns
moradores apelidaram o local de “reserva dos jacarés”. Um entrevistado desabafa:
Ouvir falar da reserva do Taim pensa numa coisa, mas na realidade
é a uma coisa totalmente diferente, isto aqui a 30 anos atrás era uma
reserva mesmo, era banhado, tinha tudo que era bicho hoje não tem mais
nada, capivara e jacaré não tem mais nada, terminaram com tudo, ali
onde é campo era banhado, trancaram as águas, terminaram com tudo, por
enquanto tem capivara e jacaré daqui a nada terá jacaré apenas,
porque tomou conta de tudo, esta terminando com os outros bichos, antes
se abatia o jacaré (entrevistado 25)
Esta visão é contraposta, de certo modo, pelas colocações de alguns
pescadores especialmente na região próxima à Lagoa Mangueira onde fica evidente
o reconhecimento da importância da área de reserva. Esses alegam que essa área
protegida traz benefícios porque o peixe desenvolve melhor até a fase adulta e pode
passar depois para área não proibida. Acrescentam que se não existisse a restrição
na reserva os pescadores acabariam com todo pescado, como esta acontecer em
94
outras partes onde se usa redes finas que não possibilitam o desenvolvimento do
peixe.
Um entrevistado, partindo de outra perspectiva, destaca a projeção social que
a ESEC traz para a região:
O beneficio existe porque a gente é conhecida no mundo todo,
mesmo na Europa as pessoas conhecem, ouviram falar do Taim,
algumas espécies animais [que] estavam desaparecendo existem, eu
concordo que tem se proibir algumas coisas porque se for liberar mesmo
os bichos podem desaparecer, em minha opinião se for liberar talvez 2
anos com caça e 4 ou 5 sem caça para manter o equilíbrio. A estação
trouxe estrada, telefone, luz, posto medico, lixeira, ônibus, isso tudo é por
causa da estação, a estação não me proíbe de produzir, o principal
problema é o turista toda hora correndo pescar, não tem cultura de turismo,
nem querem pagar nada (entrevistado 23)
Na ótica de representante da entidade gestora, a criação da estação trouxe
benefícios para a região, porque manteve a água para o consumo, além de
proporcionar uma melhor qualidade de vida. Avalia que alguns empreendimentos
não vieram para a região por causa do impacto ambiental que causariam e assim as
normas instituídas no entorno proporcionam uma vegetação diferente. Acrescenta
que as grandes indústrias, se viessem, teriam expulsado as comunidades para muito
longe, mas beneficiou-se de investimentos menores como a serrarias e fábrica de
gelo que resultaram em benefícios para a região.
5.5 Descrição e percepção da comunidade sobre as iniciativas de conciliação
dos objetivos de conservação e desenvolvimento
A Estação Ecológica do Taim está localizada próxima a grandes centros
urbanos (como Rio Grande e Pelotas) e, portanto, situa-se na área de atuação de
diversas instituições públicas de ensino e pesquisa como Fundação Universidade de
Rio Grande (FURG), Universidade Federal de Pelotas (UFPEL),Centro de Pesquisa
da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (EMBRAPA), entre outros.
Entende-se que estes fatores favorecem a presença e atuação de agentes externos
na ESEC Taim. Também o fato de ser área prioritária de conservação leva,
potencialmente, ao desenvolvimento de projetos diversos na região.
95
Conforme levantamentos realizados no caso do Taim, na busca da
conciliação dos objetivos de conservação e desenvolvimento destaca-se a atuação
do Núcleo de Educação e Monitoramento Ambiental (NEMA).
Apresentam-se, inicialmente, iniciativas do NEMA e, depois, os avanços na
gestão participativa da ESEC Taim.
5.5.1 Iniciativas protagonizadas pelo NEMA
Uma ONG que foi recorrentemente citada nas entrevistas por sua atuação no
local é o NEMA (
Núcleo de Educação e Monitoramento Ambiental).
O NEMA é uma associação privada sem fins lucrativos de utilidade publica
municipal. Esta associação surgiu em
1985 por iniciativa de estudantes da Fundação
Universidade Federal do Rio Grande (FURG), preocupados com a situação
ambiental no município. A finalidade do NEMA é a promoção da harmonia no
relacionamento entre o ser humano e a natureza, procurando melhorar a qualidade
de vida do ser humano e do ambiente que o rodeia. Tem como objetivos
desenvolver uma consciência conservacionista nas comunidades da zona costeira,
por meio de programas de educação ambiental; procura planejar e executar
trabalhos que levem ao conhecimento e a utilização apropriada dos ambientes
costeiros e marinhos; prover informações para o grupo alvo por meio de diversas
maneiras de comunicação; promover o intercâmbio com instituições nacionais e
internacionais e criar parcerias e acordos para alcançar os seus objetivos (NEMA,
2009).
O NEMA é formado por um Conselho Geral consultivo e deliberativo,
constituído por representantes da sociedade, com a finalidade de instituir a política
de atuação da instituição. A implementação dessa política está sob a
responsabilidade de uma Superintendência formada por um superintendente, um
superintendente adjunto, um tesoureiro e um secretário. Coordenadores, técnicos e
estagiários de diversas áreas do conhecimento são os executores dos projetos que
colocam em prática as diretrizes filosóficas definidas pelo Conselho Geral (NEMA,
2009).
96
O NEMA desenvolve grande parte de seus trabalhos via projetos em parceria
com financiadores e comunidade local para sua execução. Suas ações no entorno
do Taim se fizeram via projeto (Projeto Comunidades Taim).
5.5.1.1 Projeto comunidades Taim
O projeto comunidades Taim surgiu em 2002 quando o MMA lançou o edital
03/2001 - FNMA/PROBIO - MMA: Proposta de projeto de utilização sustentável de
recursos da biodiversidade no entorno de Unidades de Conservação de Proteção
Integral localizadas em ecossistemas abertos. O projeto do NEMA foi aprovado, e
posteriormente foi elaborado o plano de atividades.
O NEMA, através da sua intervenção, buscou definir um Plano de
Desenvolvimento Sustentável para as comunidades do entorno da Estação
Ecológica do Taim. O objetivo deste Plano era de projetar ações demonstrativas
para a preservação da diversidade biológica, pelo uso sustentável de seus
componentes e repartição justa e eqüitativa dos benefícios resultantes. Segundo o
Nema (2002) com este plano pretendia-se chegar à definição de metodologias,
instrumentos e processos; a capacitação de recursos humanos; o incentivo à
cooperação interinstitucional; a promoção de investigação e estudos; a produção e
dispersão de informações; o aperfeiçoamento institucional e a criação de políticas
públicas de conservação e uso responsável da biodiversidade no Brasil e, em
particular, na região do Taim, facilitando desse modo o uso dos recursos naturais,
observando os critérios de resiliência do ambiente. (NEMA, 2002).
A implementação do Plano tinha como finalidade servir de referência e
subsídio técnico-participativo à gestão e co-gestão do espaço de amortecimento do
Taim, procurando reduzir o déficit que se verifica na relação comunidade ESEC, e
promovendo estratégias e práticas sustentáveis à criação de renda, à conservação
da diversidade biológica e à melhoria da qualidade de vida. Conforme representante
do NEMA entrevistado foram priorizadas as comunidades mais próximas da Estação
Ecológica, trabalhando-se com as comunidades da Capilha, da serraria e da vila
Anselmi.
97
Para problematizar a realidade local e definir as ações prioritárias o Nema
reuniu as comunidades e fez uma oficina onde as pessoas diziam o que tinha de
bom e ruim na região, as causa e as conseqüências do problema, o que podia se
melhorar, os meios necessários, depois elegeram o pior problema.
26
Usou-se uma
metodologia participativa de trabalho com a comunidade, que se baseava na
construção da arvore de conflito e arvore de solução. Foram, então, definidas as
atividades a serem desenvolvidas com as comunidades.
O trabalho do NEMA no entorno do Taim desenvolveu-se no período de 2003
a 2008 entretanto deu-se em duas fases (de 2003 a 2006 e de 2006 a 2008) tendo
em vista os requisitos de financiamento dos projetos. A Tabela 10 mostra as
iniciativas desenvolvidas pelo NEMA ao longo do período 2003-2008, salientando a
duração de cada iniciativa.
Iniciativa 2003 2004 2005 2006 2007 2008
Visitação orientada no entorno da
ESEC Taim
x x x x x x
Diretrizes para o ordenamento
territorial para as localidades da
Capilha e da Serraria.
x x x
Plano de ordenamento territorial Vila
Capilha
X X X
Participação das comunidades na
gestão da pesca artesanal da região.
x x x
Iniciativas ecológicas de produção
agropecuária
x x x
Produção de arroz ecológico x x x
Gestão participativa e de educação
ambiental.
X X X
Programa de educação ambiental
para o Taim
X X X
Quadro 3 - Atividades do Nema no entorno da ESEC Taim no período 2003-
2008
A seguir são descritas as atividades desenvolvidas e a percepção da
comunidade local sobre elas.
26
Paralelamente a esta metodologia foram realizadas diversas ações como: levantamentos
bibliográficos, saídas de campo, entrevistas com os moradores locais, reuniões técnicas e contatos
institucionais, que culminaram na elaboração do Plano e a formação do Conselho Gestor. (NEMA,
2009).
98
5.5.1.2 Visitação orientada no entorno da ESEC Taim
O programa de visitação orientada pretendia explorar os benefícios oriundos
da organização e normatização do turismo, que era uma atividade já existente e com
potencial de risco, e servir de instrumento sensibilizador da sociedade para a
conservação do local.
O programa enfatizou o estabelecimento de trilhas interpretativas para
visitação orientada, a capacitação da comunidade local - com a formação de
monitores locais para visitação - e formação de grupos para a produção de
artesanato local. Procurou também ordenar, normatizar, promover a visitação e
monitorar a atividade com o estabelecimento de condutas e procedimentos a serem
adotados no desenvolvimento do sistema de visitação as bases socioambientais
(NEMA, 2009)
Durante o período de 2003 a 2006 foram estabelecidas 4 trilhas (Tigre,
Flores, Capilha e Figueiras), formados de 16 monitores locais (que passaram por um
curso com duração de 100 horas, incluindo saídas de campo) e reunidas 20 artesãs
que foram envolvidas em cursos sobre biscuits, fauna local, papel reciclado.
Segundo o Nema (2009) no final do período de 2003 a 2006 ficaram
estabelecidas as bases socioambientais com definição da capacidade de suporte,
normas e protocolo de monitoramento.
No período de 2006 à 2008 se procurou consolidar os grupos de monitores
locais organizado, trabalhou-se com as mulheres artesãs, aumentou-se a
divulgação da visitação e as atividades passaram por monitoramento e avaliação.
Este programa sofre, atualmente, o problema da falta de sustentabilidade,
pois iniciou a sua atividade com 16 e chegou a ter 32 jovens voluntários, atualmente
conta com apenas 2 orientadores da visitação, encontrando-se em risco extinção
(entrevistado 6).
A falta de sustentabilidade do programa das visitas orientadas criado pelo
NEMA é justificada pelos ativistas com referência à motivações sociais: estes
alegam que os jovens vão migrando para as cidades a procura de formação e
99
emprego, uma vez que com este tipo de trabalho não é possível sobreviver. Por
outro lado os ativistas reconhecem que essa atividade ajuda a aumentar o
movimento de turistas na região, tanto que as pessoas que participam geralmente
retornam com outras pessoas. Segundo um ativista entrevistado:
Tem pessoas que ficam deslumbradas com as visitas, outros não,
alguns pensam que chegarão e encontrarão os animais esperando por
eles, o pessoal tem que fazer silêncio para ver melhor os animais, o que é
difícil. Eles cobram algumas coisas que não estão ao nosso alcance... Esse
trabalho aumenta o movimento de turistas para cá, geralmente o pessoal
que vem retorna, muitas vezes com outras pessoas, os alunos voltam com
os pais... (entrevistado 6).
Entende-se que o programa de visitação orientada traz benefícios
provenientes da organização e regulamentação da atividade, com enorme potencial
turístico a ser explorado, por outro lado serve de ferramenta de sensibilização da
sociedade para a conservação do local, mas está fragilizado com o problema da
insustentabilidade financeira.
5.5.1.3 Estabelecimento de diretrizes para o ordenamento territorial para as
localidades da Capilha e da Serraria.
Segundo Nema (2002) o ordenamento do espaço pretendia resolver os
problemas que começaram a surgir com o crescimento dos aglomerados humanos e
com a utilização da Capilha como local de balneário, pois o turismo vinha crescendo
no entorno da ESEC sem nenhum ordenamento. Com o crescimento da atividade
das serrarias, também, era necessário estabelecer normas de conduta e
ordenamento como o assentamento das famílias fora da área de produção. Assim
as atividades realizadas no ordenamento territorial se basearam na análise territorial,
planificação e gestão para ocupação e uso do solo da Capilha e requalificação
espacial do assentamento na Vila da Serraria. Na avaliação do Nema (2009) esse
processo resultou na elaboração de mapas das unidades ambientais e antrópicas,
estabelecimento de diretrizes de uso e zoneamento (texto e mapas ), elaboração de
plano de requalificação do uso do espaço (planejamento das plantas industriais e
indicações comunitárias) e proposta para melhoria da estrada. Na figura 10 pode se
ver o mapa elaborado pelo NEMA para o processo de ordenamento.
100
Figura 10: Mapa de unidades ambientais da Vila da Capilha.
Fonte: Nema, 2002.
Segundo o Nema (2009) com as ações desenvolvidas se almejava que
fossem criadas as bases técnicas para orientar o processo de gestão municipal,
estadual e territorial, assim como fossem estabelecidas regras de convivência
compatíveis com as atividades e a conservação no entorno da ESEC do Taim.
No período de 2006 a 2008 houve a implantação do Plano de Ordenamento
Territorial para a Vila da Capilha, recuperação de áreas degradadas e produção de
espécies nativas. Na avaliação do Nema (2009) o programa de ordenamento
territorial trouxe grandes melhorias para a região da serraria, as residências dos
trabalhadores se encontram melhor organizadas no espaço comparativamente ao
cenário inicial de vilas da serraria, quando se depositava lixo no mesmo lugar, o
acesso dos caminhões e maquinas está mais bem estruturado. Os moradores
101
entrevistados manifestam reconhecimento de que houve mudanças no uso do
espaço com afirmações do tipo “agora está melhor organizado” entretanto não
reconhecem esta mudança como fruto de ação planejada de alguma instituição.
Para o Nema (2009) o ordenamento na vila da Capilha beneficiou em grande
medida o turismo, porque com o crescimento dos aglomerados as vias de acesso
aos balneários acabariam se encerrando, dado que as tentativas de usurpar esses
espaços são freqüentes, com intenções de habitação ou de desenvolver algumas
atividades turísticas nesses locais.
5.5.1.4 Participação das comunidades na gestão da pesca artesanal da região
A pesca artesanal é uma atividade socioeconômica importante na região, da
qual muitas famílias das comunidades do entorno dependem diretamente. Conforme
Nema (2002) a pesca no início do projeto vinha atravessando uma crise,
principalmente por causa da utilização de artes de pesca predatória e da
descaracterização de áreas adjacentes a ESEC, antes produtivas.
Para contornar os constrangimentos da atividade pesqueira se procurou
agrupar os pescadores da Vila Anselmi e consolidar sua organização
estabelecendo medidas de manejo participativo na pesca, buscou-se assegurar a
representatividade do grupo no processo de gestão da pesca local em fóruns como
o SEAP, IBAMA e MPPA e fomentar outras ações de apoio a esta atividade. As
outras ações desenvolvidas estavam relacionadas ao aumento do tamanho da
malha, fiscalização, comercialização, criação da colônia modelo, pesquisa de
balanço trófico de biomassa, experimento de marca e recaptura (NEMA, 2009)
No final do período de 2003 a 2006, a organização de pescadores foi
legalmente reconhecida (como associação com estatutos e CNPJ), alcançou-se
atendimento a reivindicações diversas, foi realizado o trabalho de regulamentação
sobre o tamanho de malha com COOMIRIM, IBAMA e Ministério Público entre outros
avanços. Como metas para a fase seguinte do projeto enfatizou-se o
acompanhamento e consolidação do grupo, a necessidade de levantamento de
102
dados para formatação de uma proposta de manejo e maior atuação na
comercialização (NEMA, 2009).
No período 2006 a 2008 enfatizou-se o fortalecimento das Associações de
Pescadores da Vila Anselmi e da Lagoa Mangueira, maior articulação e
representatividade dos pescadores artesanais na gestão da pesca e aprimoramento
da participação dos pescadores na cadeia produtiva da pesca.
Na época do levantamento de campo as atividades da associação relativas a
fabrica de gelo (criada com apoio do NEMA) estavam paralisadas, porque não havia
condições para processar e embalar o peixe no local, os outros membros pararam
de entregar o seu peixe na associação de modo a agregar valor, apenas dois
membros continuavam entregando (entrevistado 4). A participação e
sustentabilidade na Associação dos pescadores da vila Anselmi - criada com apoio
do NEMA também são críticas. Os dados colhidos em entrevista revelam que nos
últimos anos os membros não tem se reunido, o ambiente na associação é descrito
como desagradável, o numero de membros reduziu-se drasticamente restando
apenas os que possuem ligações familiares e até agora realizou-se uma eleição,
desde que se criou a associação em 2004. A declaração de um entrevistado ilustra
o contexto:
A associação é formada por poucos membros para os associados
e de porta fechada, quando se criou a associação dos pescadores da vila
Anselmi eram mais de 30 membros, mas agora ficou uma minoria e
essa associação esta ser dirigida por uma família apenas, por causa de
desacordos, disputa por dinheiro, os outros acabaram abandonando, a
mulher do presidente, o cunhado o primo por ai adiante, uma panela
familiar, ao invés de trazer benefícios para nós não esta criando nada
aquilo ai, foi um dinheiro do governo jogado fora, se viesse alguém do
governo para gerir aquilo podia gerar lucro (entrevistado 8).
No caso da associação dos pescadores da vila Capilha a situação é
semelhante. Segundo entrevista, seu representante considera que está praticamente
inativa, tem alguns projetos elaborados, mas alega que ainda não conseguiram o
apoio desejado: o principal seria da construção de uma fabrica de gelo para agregar
valor ao peixe. Esta associação realizou eleições recentemente, mas existia um
candidato por falta de interesse dos outros membros.
Avalia-se que a criação destas associações certamente, em alguns
momentos, trouxe benefícios sociais, uma vez que implicou discussão em grupo e
103
procura coletiva de estratégias para implementar várias reivindicações que
melhorariam a qualidade de vida e promoveriam a sustentabilidade da sociedade,
trazendo também novos conhecimentos incorporados de forma individual e coletiva.
Segundo o Nema (2009) as ações vinculadas à pesca acabam requerendo a
necessidade de uso sustentável e conservação da região, fazendo com que os
interesses de conservação sejam partilhados entre os diversos atores sociais para
assegurar conservação da biodiversidade e, assim, a manutenção desta atividade
econômica.
5.5.1.5 Promoção de iniciativas de produção agropecuária “ecológica”
O objetivo deste tipo de iniciativas promovidas pelo Nema era a conciliação
entre conservação e desenvolvimento pelo aproveitamento das vantagens da
produção agropecuária baseada em princípios orgânicos/ecológicos (sem o uso de
fertilizantes e defensivos, resguardando o solo e a água) conciliada a reconstrução
da paisagem na propriedade (se buscaria recompor os ambientes “naturais”
essenciais à manutenção da fauna e flora local).
As ações implicaram um levantamento da flora arbórea local para recompor a
paisagem natural, produção de mudas arbóreas em viveiro, plantio de mudas e,
além disto, experimentos de uso de técnicas agroecológicas no cultivo de arroz,
criação da espaços de discussão e troca de experiências com proprietários rurais.
Para incentivar o uso de novas cnicas na produção realizaram-se reuniões de
discussão, demonstrações, visitas a campo, seminários visando o surgimento de
novos produtores interessados.
No período de 2003 a 2006 a produção de arroz ecológico passou de 7 ha em
2003 para cerca de 140 ha em 2006. No período 2006 a 2008 apostou-se na
capacitação de produtores rurais ecológicos, promoção do cultivo, beneficiamento,
comercialização e certificação do arroz ecológico. Na comercialização do arroz
ecológico buscou-se diferenciá-lo através de marca própria (“Amigo do Taim”),
embalagem à vácuo e certificação.
104
Segundo dados de entrevista à representante do Nema, a produção do arroz
ecológico continua acontecendo, mas em áreas reduzidas de modo que ainda não
constitui uma aposta da maioria dos produtores. O entrevistado esclarece que em
2008 foram trabalhados apenas 180 ha. Enquanto o entrevistado do Nema coloca
que a lucratividade é maior pela redução do investimento em insumos, arrozeiro
entrevistado contextualiza que, a lucratividade do arroz ecológico é inferior e, na
ótica dos arrozeiros da região, a questão do retorno econômico acaba se
sobrepondo às vantagens ambientais, mesmo que reconheçam a importância da
preservação ambiental que o arroz ecológico propicia.
5.5.1.6 Estabelecimento de mecanismos de gestão participativa e de educação
ambiental
O Nema (2002) constatou que existia na região a cultura da não-participação,
a falta de hábito em discutir problemas e soluções em caráter comunitário, bem
como o distanciamento das pessoas do local em relação à ESEC Taim. Para
contornar essas deficiências se apostou na promoção da gestão participativa,
esperando que resultasse em benefícios para a conservação da natureza, melhoria
da qualidade de vida e para a realização de pequenos investimentos que
contribuiriam para que, localmente, fossem alcançadas as condições de
sustentabilidade.
As atividades foram desenvolvidas nas escolas do banhado, onde criaram
grupo de professores das escolas, elaboraram as visões do banhado. Noutra
vertente trabalharam com os visitantes do Taim, elaborando palestras, realizando as
trilhas interpretativas. Para os moradores do Taim apostaram nos cursos de
educação ambiental e palestras. Outro foco das atividades se concentrou na gestão
comunitário-participativa, através de cursos de capacitação para lideranças
comunitárias e gestores governamentais, redes de solidariedade entre as
comunidades. Com vista a realizar a educação ambiental foram feitas exposições,
produziram material informativo/educativo documentos e divulgação (NEMA, 2009).
No balanço periódico das ações realizadas entre 2003 e 2006, o Nema
constatou que foram realizados cursos com participantes de todas as comunidades,
105
saídas de campo; curso de educação ambiental para a ATLA e artesãs; impressão
de material educativo; procedimentos administrativos foram executados; programa
de Rádio Minuto do Taim transmitido; ações passaram por avaliação (avaliador-
facilitador); e outras ações educativas foram executadas concomitantemente.
(NEMA, 2009)
Como metas para o futuro se previa a implementação do Programa de
Educação Ambiental e consolidação dos Projetos demonstrativos através do Projeto
Comunidades do Taim: Educação Ambiental e Sustentabilidade – NEMA/FNMA
(NEMA, 2009).
No período 2006 a 2008 nas escolas do banhado houve criação do grupo de
professores das escolas e elaboração das visões do banhado.
Os visitantes do banhado participaram das palestras de educação ambiental e
das atividades previstas nas trilhas interpretativas.
Os moradores do Taim participaram dos cursos de educação ambiental, das
palestras, do curso de capacitação para lideranças comunitárias e gestores
governamentais e se criou redes de solidariedade entre as comunidades.
Na ótica de alguns moradores entrevistados os projetos de educação
ambiental registram pouca participação na região. Um entrevistado coloca:
Os projetos de educação ambiental têm pouca participação, o
pessoal não é unido, as reuniões são pouco divulgadas, para os
proprietários das serrarias e lavouras, o resto não acompanha o que
acontece na região, aqui é cada um por si. (entrevistado 6).
Entende-se que, mesmo com pouca participação, certamente a educação
ambiental permite aproximação das comunidades às questões da conservação do
meio ambiente local e favorece a compatibilização entre os objetivos da ESEC e
necessidade de sustento dos moradores.
106
5.5.2 Iniciativas dos gestores da ESEC: Promoção da participação na gestão da
ESEC do Taim
Segundo o modelo institucional vigente o gestor (chefe) da estação do Taim
se limita as questões relacionadas ao cumprimento das normas conservacionistas. A
direção técnica e financeira da ESEC é feita por duas diretorias em Brasília, que
trabalham com todas as unidades. O representante da ESEC entrevistado esclarece
que recursos como combustíveis, energia, pagamento do guarda e outros serviços
estão na responsabilidade da central em Brasília e coloca que existe a associação
regional, com um coordenador em Santa Catarina representando a estação, mas
esta ainda não está organizada por isso, atualmente, estão subordinados a
organização de São Paulo.
O IBAMA criou o Conselho Consultivo da Estação Ecológica do Taim/RS em
decreto publicado em 17 de abril de 2003, portaria IBAMA 20 baseado no artigo
29 da lei nº 9.985, de julho de 2000, que instituiu o Sistema Nacional de Unidades de
Conservação da Natureza, bem como nos artigos 17 a 20 do decreto nº4340, de 22
de agosto de 2002. Os conselhos têm como finalidade contribuir para com a
implantação e implementação de ações voltadas para a consecução dos objetivos
de criação desta unidade de conservação.
Segundo o decreto da criação do Conselho da Estação Ecológica do Taim,
este tem a composição apresentada no Quadro 4.
107
Organizações de
ensino e pesquisa
Um representante da Universidade Federal do Rio Grande do Sul;
Um representante da Universidade Federal de Pelotas/RS;
Um representante da Universidade Católica de Pelotas/RS
UCPEL;
Um representante da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária
– EMBRAPA;
Um representante da Fundação Universidade de Rio Grande –
FURG/RS;
Organizações
ambientais
Um representante do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos
Recursos Naturais Renováveis- IBAMA/MMA;
Um representante da secretaria Estadual de Meio Ambiente do
Estado do Rio Grande do sul – SEMA/RS;
Um representante do Batalhão de Policiamento Ambiental do Rio
Grande do Sul;
Outras
organizações
públicas
Um representante do departamento Nacional de Infraestrutura de
Transporte – DNIT;
Um representante da polícia Rodoviária Federal;
Um representante da Associação Riograndense de
Empreendimentos de Assistência Técnica Rural – EMATER/RS;
Um representante do Instituto Rio Grandense do Arroz – IRGA.
Um representante da Prefeitura Municipal de Santa Vitória do
Palmar/RS
Organizações
públicas
Representantes
do poder público
local
Um representante da Prefeitura Municipal de Rio Grande/RS;
Ongs
ambientalistas
Um representante da Associação Brasileira para a Preservação
Ambiental – ABRAPA;
Um representante do Instituto de Preservação Ambiental e Cultural;
Um representante do Núcleo de Estudos e Monitoramento
Ambiental – NEMA
Entidades
representativas de
classe
Um representante do Sindicato Rural de Rio Grande/RS;
Um representante da Federação dos Pescadores do Estado do Rio
Grande do Sul;
Um representante do Sindicato Rural de Santa Vitória do
Palmar/RS;
Um representante do Sindicato dos Empregados no Comércio de
rio Grande/RS;
Empresas Um representante da Refinaria de Petróleo Ipiranga S/A;
Um representante da Trevo Florestal Ltda;
Organizações da
sociedade civil
Comunidade local Um representante da Comunidade de Capilha, do Município de Rio
Grande/RS;
Um representante da comunidade da Serraria e Albardão, do
Município de Rio Grande/RS;
Um representante da Comunidade de Curral Alto, do Município de
Santa Vitória do palmar/RS;
Quadro 4- Composição do Conselho Consultivo da Estação Ecológica do Taim
108
Os dados do Quadro 4 mostram certo equilíbrio da composição em relação a
participação do poder público (15) e da sociedade civil (12). Se for comparada a
participação da comunidade local (3) em relação a de outros atores da sociedade
civil (9) registra-se pouca representatividade da comunidade local. Mesmo
confrontando-se a participação da comunidade local em relação as organizações de
ensino e pesquisa (5) se constata a mesma representatividade reduzida,
possivelmente tais fatos confirmem que o objetivo principal da criação estação é a
pesquisa.
No mesmo decreto ficou estabelecido que o chefe da Estação Ecológica do
Taim representaria o IBAMA/MMA no conselho consultivo e a este presidiria. As
atribuições dos membros, a organização e o funcionamento do Conselho Consultivo
da Estação Ecológica do Taim seriam fixados em regime interno.
Com relação a atividade recente do Conselho Consultivo da Estação
Ecológica do Taim o representante da gestão da ESEC entrevistado colocou que o
Conselho não realizou reuniões ao longo do ano de 2008, apenas retomou os
encontros no início de 2009 quando tomou posse o novo gestor da ESEC do Taim.
Entende-se que a não realização de reuniões do Conselho para debate durante
2008 indica prazo muito longo entre uma reunião e outra para uma região com
características peculiares, como esta área de proteção integral, que está ainda em
implantação, com vários conflitos por resolver.
Segundo dados de entrevista existe o reconhecimento dos integrantes de que
nem todos com assento no conselho participavam das reuniões no passado, sempre
se registrou maior presença dos atores sociais com maiores interesses econômicos
na região.
Os levantamentos de campo indicam que a classe social dos arrozeiros
desempenha um papel importante na dinâmica da região do Taim, preocupa-se em
participar das reuniões do conselho de gestão e consideram que são consultados
nas diversas decisões. Esta classe procura sempre defender os seus interesses nos
debates que participa, como se evidencia na fala de um entrevistado:
O IBAMA (gestão) nos consulta quando quer tomar alguma decisão,
nós damos a nossa opinião, tentamos sempre negociar para não sermos
prejudicados, o pessoal do IBAMA é muito aberto, trabalhamos a vontade
com eles... (entrevistado 19).
109
O técnico da Trevo Florestal entrevistado indica que esta participa das
reuniões do conselho de gestão, considera que a gestão da estação é democrática,
que as questões são discutidas e opinadas por todos, estabelecendo uma boa
relação com os vários atores com impacto na estação. Segundo o entrevistado:
O gerente participa das reuniões do conselho de gestão, aqui é tudo
bem democrático, as questões são discutidas, todos têm direito a opinião.
Essa estrada de areia batida surgiu ha 8 anos, agora o ônibus chega até a
comunidade. Em minha opinião a estação não trás benefícios nem
atrapalha, temos uma boa relação com a gestão, nós organizamos
palestras com os trabalhadores explicando sobre as normas, estamos
buscando a certificação florestal que significa o bom manejo o que é
importante para empresa (entrevistado 5).
No caso dos pescadores (Vila Anselmi cuja associação participa nas reuniões
do conselho) fica evidente alguma insatisfação na fala de alguns entrevistados em
relação ao trabalho que é realizado pelo conselho de gestão. Estes consideram que
não se vislumbram benefícios da participação em fóruns como associações ou
conselho de gestão, porque não se consegue resolver os problemas por esta via e
questiona-se a representatividade da associação. Expressões como “O conselho de
gestão não resolve nada”, recolhida de um pescador entrevistado, são
representativas desta posição.
Segundo explica o representante da gestão da ESEC em entrevista, em geral
o gestor da ESEC preside o conselho, mas qualquer um dos membros tem liberdade
para solicitar as reuniões, e as deliberações devem ser cumpridas obrigatoriamente
pela presidência. Detalha que o conselho se apresenta como uma instituição de
apoio a gestão da Estação do Taim, mas que as decisões do Conselho são
inalteráveis, mesmo que o presidente não concorde com elas, este deve dar
encaminhamento delas ao órgão gestor [Instituto Chico Mendes].
O entrevistado acrescenta que todos participantes do conselho expõem a sua
opinião sem reservas durante as reuniões, lamentando apenas o fato de ficar a
impressão da falta de retorno para as bases. Segundo representante da gestão da
Estação Ecológica do Taim existe o problema de representatividade, porque os
integrantes do Conselho Consultivo não levam as discussões para as bases, de
modo a estabelecer uma construção coletiva. Esclarece que o representante expõe
a sua própria opinião e não leva de volta aos beneficiários as decisões, de modo que
este detém o poder da informação.
110
5.6 Contrapondo conflitos sociais e cooperação no Taim
Cabe reconhecer pré-existência de conflitos sociais na região (como entre
pescadores e arrozeiros) de modo que a ESEC insere-se num contexto já conflituoso
(referências de Quesada et al. indicam que antes da criação da ESEC haviam
problemas com caçadores (de capivara) e pescadores que afetavam o patrimônio de
moradores (pecuaristas) e traziam insegurança à região).
O caso da criação da ESEC do Taim revela os problemas históricos das
unidades de conservação. Benatti (1998) aborda o cenário das Unidades de
Conservação de uso indireto, realça que boa parte das áreas protegidas criadas não
foram efetivamente implantadas, na verdade são “unidades de conservação no
papel”, porque segundo ele a maioria dessas unidades de proteção integral
apresentam problemas. O autor enumera alguns problemas como: as terras ainda
não totalmente regularizadas, demarcadas, insuficiência de equipamentos e de
funcionários para fiscalizar e administrar a área; planos de manejo e de
gerenciamento em apenas poucas unidades, presença de populações humanas no
interior das áreas protegidas.
A questão da delimitação da área a ser preservada constituiu e ainda constitui
fonte de conflito na região. A área inicialmente destinada a preservação abrangia
33.000 entretanto até o período atual, apenas cerca de 11.000 ha estão
regularizados embora ainda com pendências judiciais. O descontentamento de
entrevistados com a forma de implantação da ESEC Taim (processo de
desapropriação) é evidente. Por outro lado, existem muitas indicações de que este
tipo de conflito ressurge periodicamente devido a intenção de ampliação da área a
ser preservada. Mesmo com as novas orientações do SNUC os processos de
criação de áreas de proteção integral não prometem ser menos conflituosos. O
decreto presidencial que previa a ampliação da ESEC do Taim de 2003 é a prova
mais flagrante da falta de participação das populações tradicionais em todas as
fases do processo de criação de UC`s no Brasil, desde a fase de diagnóstico,
desenho, execução, implantação, monitoramento e avaliação. Esse decreto acaba
colocando em causa os pressupostos da nova legislação ambiental que defende
111
maior integração das comunidades locais no processo de criação e gestão das
UC`s. Nesse processo ficou também evidente a falta de multidisciplinaridade das
equipes cnicas que assessoram os órgãos do estado, fato que acabou
enfraquecendo a tomada de decisão presidencial, sustentada em argumentos
incompletos que em certa medida não correspondiam a verdade. Este processo
evidenciou também a disposição à organização de grupos locais que se sentem
afetados negativamente pelas medidas preservacionistas.
De um modo geral, persistem diversas ameaças à preservação dos recursos.
Os moradores do entorno da ESEC do Taim quando abordam a questão dos
conflitos na região destacam a pesca ilegal na unidade, a caça no interior e entorno,
a morte dos animais por atropelamento na BR 471, o uso da água para o arroz que
acaba drenando a água do banhado em grandes quantidades e o representante da
gestão acrescenta como ameaças o gado em grandes quantidades que fica
pisoteando os ambientes, a proximidade da silvicultura, com o cultivo de Pinnus sp
que é agressivo e vai tomando áreas de pastagem e banhado.
A persistência destas ameaças está relacionada diretamente a forma como o
conflito se manifesta e a possibilidade de interferir nele.
Entende-se que, em parte, algumas infrações estão relacionadas a
necessidades de populações tradicionais. Arruda (1999) alertava para o risco do
não reconhecimento da identidade sócio-cultural das comunidades tradicionais, que
com a criação de áreas de proteção ficariam desprovidas do seu modo de
sobrevivência comum, motivado pelo modelo de conservação ambiental vigorante.
Assim iriam desenvolver uma postura anticonservacionista e passariam a assumir
práticas destrutivas para o meio ambiente como estratégia para assegurar sua
subsistência e fugir da miséria. Nessa óptica, aumentariam situações em que os
objetivos de conservação não são alcançados e as populações locais são
criminalizadas e, ao mesmo tempo, excluídas de desfrutar dos recursos naturais de
maneira sustentável e garantir sua sobrevivência. Nesse âmbito, seriam privilegiados
os grupos que comercializam irregularmente os bens de extração clandestina,
ignorando-se a conservação da bio e sócio diversidade, a credibilidade e anuência
dos pressupostos da preservação dos recursos naturais.
Segundo Vivacqua e Vieira (2005) as pesquisas realizadas têm demonstrado
que os custos sociais e ecológicos da criação de Unidades de Conservação de uso
112
indireto induzem muitas populações locais a burlar as leis e desrespeitar as regras
estabelecidas pelos sistemas de gestão.
Muitas vezes as infrações o justificadas com referência ao estabelecimento
de normas desprovidas de legitimidade, que acabam deixando em risco a
sobrevivência das comunidades locais e a sustentabilidade dos recursos. Referem-
se as contradições das ações preservacionistas (que proíbem a pesca, o
aproveitamento da carne dos animais atropelados e não o uso de agrotóxicos nas
lavouras de arroz) e os limitados efeitos percebidos em termos de biodiversidade do
“fechamento” da área (“agora é reserva do jacaré”). Analisando se o discurso da
comunidade local pode se concluir que eles consideram o modelo de unidade de
conservação desajustado para as suas necessidades de sobrevivência, tanto que a
manutenção dos ecossistemas e biodiversidade estão a ser questionados pelas
populações. Exemplos mais flagrantes são os casos da extinção dos ssaros por
causa da proibição a caça tradicional e liberalização do uso dos produtos químicos,
a extinção de espécies como o rato do banhado, causada pelo crescimento
excessivo da população de jacarés. Defendem que a legislação é ignorada por
causa do poder econômico de alguns atores sociais na região e da falta de
organização das populações locais.
Em parte a literatura aponta que as dificuldades vivenciadas pelas populações
tradicionais estão relacionadas a falta de medidas adicionais de criação de novas
alternativas de subsistência e desenvolvimento. Barbosa e Santos (2008) comentam
que a medida que as unidades de uso restrito vêm ganhando espaço nas políticas
públicas, aumenta a pressão sobre populações locais nessas áreas, por não
proporcionar-se mecanismos eficazes de gestão sustentável, obrigando essas
populações a abandonarem suas propriedades. Nessa ótica as unidades de
conservação se tornam parte de um processo de invisibilidade e encurralamento das
populações locais. Marangoni e Agudelo (2004, p.15, grifo nosso) colocam:
O choque causado pela restrição de uso dos recursos naturais e a
manutenção dos modos de vida tradicionais das populações nativas, sem
uma política orientada de desenvolvimento sustentável, aprofundou o
distanciamento da economia e cultura autóctones ocasionando a perda dos
conhecimentos ecológicos originais da população e provocando um
comportamento contrário às ações preservacionistas.
Outro conflito estabelece-se entre os objetivos conservacionistas e a principal
atividade de maior impacto econômico da região: o cultivo do arroz. Os relatos, os
113
produtores de arroz vivem uma realidade um pouco distinta do caso dos pescadores:
usam água e devolvem com agrotóxicos e não se consegue mudar a situação
porque estes investem muito dinheiro, não existe uma força organizada contra essa
prática, o pescador se encontra numa situação mais frágil. Segundo dados de
entrevista um reconhecimento de que se pode, apenas, motivar para uma
mudança de comportamento dos arrozeiros mas não obrigá-los. È neste sentido que
se inclui o projeto demonstrativo na ESEC do Taim com maior impacto, que é o da
produção do arroz ecológico. Esta iniciativa vem ganhando mais espaço na região,
conquistando o mercado no comércio da região. Analisando o seu crescimento pelo
tempo de existência, prevalece a impressão positiva quanto aos objetivos da sua
criação, mesmo que total de área cultivada ainda seja pequeno e seu incremento
anual, restrito.
Os moradores das comunidades do entorno mesmo que não tenham suas
atividades produtivas diretamente influenciadas pelas normas preservacionistas se
vêem afetados pela ESEC. Reclamam dos riscos associados ao crescimento da
fauna na região (cobras, jacarés) e ameaça representada pelos animais nas
estradas, entre outros e não vêem sentido nas restrições ao aproveitamento de
recursos existentes.
O trabalho realizado pela ESEC nesta comunidade se limita apenas a
fiscalização, o que torna a relação com o Taim somente proibitiva, apresentando
grande déficit de sentimento emancipação sobre o local.
O discurso de alguns moradores do entorno evidencia a emancipação em
relação ao local, a necessidade de proteção ambiental é ressaltada por todos. Mas
por outro lado, reconhecem que a partir do momento que a pessoa é afetada pelas
normas, a mesma muda de postura, criticando a fiscalização, propondo que a sua
área deveria ficar fora da desapropriação, desse modo se colocam contra os
objetivos da ESEC do Taim.
Entende-se que o Plano de ordenamento territorial promovido pelo Nema no
período de 2003 a 2008 trouxe benefícios para os moradores da região do Taim,
assim como para os objetivos conservacionistas da criação da ESEC do Taim. A
execução deste plano defendeu de certo modo atividades com maior impacto
econômico como o turismo e a instalação das serrarias, prestando-se menor atenção
114
para as preocupações dos pescadores que reclamam por melhores acessos para os
seus locais de trabalho.
A educação ambiental promovida pelo Nema no período de 2003 a 2008 na
região do Taim pode se considerar que atingiu boa parte da comunidade local, mas
os seus resultados só poderão ser avaliados ao longo do tempo, uma vez que nesse
tipo de ações de sensibilização nem sempre que o ter conhecimento significa
automaticamente a aceitação do fato.
Constata-se que existe a preocupação em termos de representatividade no
processo de gestão, garantida em certo modo pela criação do conselho consultivo,
mas por outro a participação de todos não esta garantida pela diversidade de
interesses dos envolvidos. O poder de decisão dos mais fortes financeiramente é
maior, o que não garante a defesa dos interesses dos mais fracos, assim como da
grande maioria que não participa dos debates do conselho consultivo. O fluxo de
informação se limita aos representantes da comunidade local, não existe a
circulação da informação por todas as classes sociais no momento oportuno, o que
põe em causa a participação de todos envolvidos.
Estas constatações nos remetem as reflexões de Bernard (2009) no jornal
Rede Pró-UC, este analista questiona o tamanho dos conselhos consultivos em
função da presença dos seus integrantes nas reuniões, partindo do princípio de que
nas UC`s deviam ser representativos, democráticos, atuantes e eficientes. Nessa
linha argumenta que a participação depende muito mais da motivação e do
engajamento dos conselheiros e de quem gerencia o conselho, mesmo
reconhecendo que as chances de ausência, desinteresse e desistência em um
conselho com muitos assentos é maior que em conselho com menos membros.
A participação das comunidades no entorno da ESEC do Taim pode ser
comparada ao cenário colocado por Barbosa e Santos (2008), onde a participação
das populações locais nas UC`s ocorre de maneira passiva, limita-se a uma simples
transferência de informações, participação somente por consulta, não ocorre uma
participação efetiva da população desde a congregação dos valores fundamentais à
incorporação dos valores preservacionistas, que promoveria um manejo participativo
e democrático dos recursos ambientais.
115
Os projetos participativos têm algum impacto nas comunidades do entorno da
estação, contribuem para a emancipação das comunidades do entorno e melhoria
dos modos de sobrevivência das populações. Mas, existe o problema da falta de
sustentabilidade dos projetos, dificilmente conseguem se livrar da dependência do
financiador externo, em alguns casos tudo termina com o fim do financiamento,
apenas dá-se continuidade quando se consegue outro financiador.
116
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS
A ESEC do Taim continua enfrentando conflitos com a desapropriação de
terras, pesca e caça nas áreas de reserva, atropelamento dos animais, uso da água,
pecuária e silvicultura. Provavelmente estes conflitos resultam de divergências entre
os objetivos conservacionistas e a necessidade de desenvolvimento das
comunidades locais, que apostam no extrativismo, em modelos de produção de alto
rendimento e maior abertura da região para o turismo.
Constata-se que a atividade dos arrozeiros causa maior conflito na região do
Taim, e é mais impactante nos objetivos conservacionistas da ESEC, por ser
praticada com uso de água e de produtos químicos prejudiciais ao meio ambiente,
especialmente aos produtos pesqueiros. Nesta atividade a água é absorvida pelas
bombas de irrigação juntamente com os peixes por falta de telas de proteção e é
devolvida para as lagoas de modo bastante tóxico para os animais do local. Estes
constrangimentos são reconhecidos pela maioria dos atores sociais, mas dificilmente
se conseguirá mudar o comportamento desta classe social, por causa do seu poder
econômico e político que faz com que dominem os principais fóruns de decisão.
O aumento significativo do número de áreas protegidas nas ultimas décadas
evidencia que se trata de um sistema em crescimento, embora persistam problemas
e contradições nessas áreas. Percebe-se que as entidades ligadas ao setor das
áreas protegidas vêm buscando mudanças nos modelos de criação e gestão destas
áreas, procurando diminuir os impactos negativos e potenciando os aspectos
positivos.
Historicamente a política de áreas protegidas teve como referência as áreas
de proteção integral (caso dos parques nacionais), esse fato pode estar associado
ao interesse econômico que existe na criação destas áreas, que leva ao
favorecimento de projetos ligados ao turismo. Nas ultimas décadas, o aumento da
área ocupada pelas áreas protegidas no mundo tem sido fortemente acompanhado
pelo aumento dos acordos internacionais na sua criação, chegando a alcançar
quase metade da área criada em todo mundo. Este fato evidencia a existência de
uma articulação política mundial, que influencia todo o processo de criação e gestão
117
destas áreas, principalmente nos países em desenvolvimento, onde o número das
áreas criadas através de acordos é quase metade em relação aos países
desenvolvidos, mesmo sendo aproximadamente cinco vezes menor em termos
totais. Nesta ótica não se pode pensar na questão da criação das áreas protegidas
isoladamente do cenário político mundial, tanto que o seu crescimento em países
como o Brasil é acompanhado pelo crescimento a nível mundial da influência dos
acordos internacionais.
A falta de participação comunitária na definição das áreas protegidas, como o
caso das Estações Ecológicas, contribui para o aumento dos conflitos e resistência
das comunidades na incorporação dos objetivos conservacionistas propostos. Na
pratica comunidades abrangidas ficam sabendo que sua propriedade está inserida
dentro de uma unidade de conservação depois de sua criação, como no exemplo
recente (2003) do esforço de ampliação da área do Taim:
O projeto deles era para não existirem mais moradores aqui perto,
mas o lula mandou um helicóptero e provou-se que existiam moradores,
veja o caso da serraria que movimenta muitas famílias, muito dinheiro,
disseram que ninguém morava lá, mas tem centenas de famílias naquele
bairro, aqui as decisões são tomadas sem conversas com as pessoas,
só chega com papel já esta na rua... (entrevistado 20).
Arruda (1997) responsabilizava a legislação ambiental pela marginalização
das comunidades nos processos de tomada de decisão, sustentando que a
legislação vinha ignorando possivelmente um dos caminhos indicados para atingir os
objetivos conservacionistas ao ignorar o potencial da diversidade cultural. Assim, a
inserção da visão das populações rurais na política de conservação, consideraria o
reconhecimento da identidade sócio-cultural, a valorização de seus conhecimentos,
a melhoria das condições de vida, asseguraria sua participação na construção de
uma política de conservação ambiental mais abrangente e sustentável. Atualmente,
mesmo que a legislação preveja avanços na participação, os conflitos com as
comunidades locais persistem.
A noção dos benefícios provenientes da criação da ESEC do Taim é muito
relativa, depende dos critérios de análise usados pelos afetados, do ponto de vista
dos objetivos conservacionistas praticamente existe unanimidade na importância da
118
estação, mas por outro lado, os afetados negativamente não se sentem beneficiados
pela criação da ESEC, como os casos dos moradores que passaram pela
desapropriação que consideraram injusta e financeiramente desajustada, atores
sociais que são fiscalizados contra a sua vontade e as vitimas dos conflitos ligados
ao uso dos recursos.
Os trabalhos participativos desenvolvidos pelo NEMA na região do Taim,
evidentemente na sua concepção contribuem para estimular o desenvolvimento na
região e ajudam a incorporar os objetivos da criação da ESEC nas comunidades do
entorno. Os resultados mostram que a população reconhece a importância das
iniciativas promovidas e que, em algum momento, estas contribuíram para a
melhoria da vida socioeconômica das comunidades locais.
O trabalho de investigação realizado por Silva (2005) reforça a idéia do
impacto positivo na criação da associação da vila Anselmi, onde fica evidente o
surgimento do espírito de união, o crescimento do sentimento de emancipação no
seio da comunidade ao buscar objetivos comuns para o desenvolvimento.
Este
autor
apresenta o seguinte relato:
...depois de uma infinidade de encontros, de palestras, e de
reuniões, eles acreditaram na transformação, quando muitos desistiram de
sonhar, viram as possibilidades de mudança e queriam ir além (SILVA,
2005).
De um modo geral, as populações do entorno da ESEC Taim reconhecem
tambem os benefícios que o ordenamento territorial acarretou para as suas vidas e
sua contribuição para conservação dos recursos da região. Aparentemente a
execução do plano de ordenamento priorizou ações que afetam atividades com
impacto econômico, casos do turismo e exploração madeireira, onde se procurou a
melhoria dos acessos a praia na Capilha e organização das vilas da Serraria. Os
pescadores continuam reclamando por melhores acessos aos seus locais de
trabalho.
A educação ambiental esteve incorporada em todas as iniciativas
desenvolvidas pelo NEMA, pode se cogitar que alcançou boa parte das
comunidades da região. Os entrevistados na sua maioria reconhecem o potencial de
119
impacto desses programas, mas ressaltam as restrições no interesse indicando que
a incorporação dos seus pressupostos só poderá ser percebida ao longo tempo.
O projeto demonstrativo na ESEC do Taim com maior visibilidade é o da
produção do arroz ecológico. A percepção dos atores sociais locais sobre este
projeto é positiva, e verifica-se que se trata de uma iniciativa que tem crescido ao
longo tempo, mesmo se reconhecendo a lentidão da sua expansão. Este projeto é
condicionado pela questão ecomica, uma vez que os arrozeiros priorizam a
viabilidade econômica em detrimento da questão ambiental, de modo que enquanto
não estiverem convencidos da sua lucratividade resistem em adotar.
Por outro lado, existe o problema da falta de sustentabilidade dos projetos em
longo prazo, como se nota em programas como o das visitas orientadas atualmente
com apenas dois (2) monitores e associações de pescadores atravessando crises de
organização e liderança.
Aparentemente os projetos desenvolvidos pelo NEMA não
apresentam perspectivas promissoras para o futuro, tanto que sem o
acompanhamento permanente desta entidade as iniciativas têm a tendência de
desaparecer. Na fase inicial se verifica a emancipação das pessoas, a mobilização
comunitária para o objetivo comum, mas o mesmo não se vislumbra quando as
comunidades caminham sem acompanhamento. Constata-se que existe falta de
união espontânea entre as pessoas moradoras do entorno do Taim, desse modo
não se pode prever um futuro promissor para os projetos desenvolvidos pelo NEMA.
Aproveito este espaço para realçar como esta experiência foi enriquecedora e
bastante oportuna, para a minha expectativa de aplicar os resultados desta pesquisa
em Moçambique, na reserva de biologia marítima da Ilha de Inhaca. Certamente se
tiver oportunidade de intervir neste local procurarei agir me lembrando dos aspectos
negativos e positivos vivenciados nesta experiência do Taim, tornando a convivência
entre as comunidades no entorno e a reserva de Inhaca muito mais harmoniosa.
120
7 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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126
ANEXO 1
ROTEIRO DE PESQUISA
Roteiro para as principais Classes sociais: Pescadores, arrozeiros,
madeireiros, comerciantes, simples moradores.
1- Tempo de residência no entorno da ESEC do Taim?
2- Como foi o processo de passagem para estação ecológica?
3- A criação da estação trouxe benefícios?
4- acha que as normas conservacionistas são compridas?
5- Quais são os principais conflitos entre os principais atores da região? Os
problemas da desapropriação foram resolvidos? Uso da água?
6- A comunidade participa de todas as fases para identificação das soluções?
7- quais o os programas de educação ambiental que existem na comunidade?
Como é a aceitação na comunidade?
8- A comunidade participa da gestão da estação ecológica?
9- Como é a relação entre a gestão, conselho de gestão, NEMA e moradores?
10- O que acha que devia ser melhorado no funcionamento da estação?
Roteiro para NEMA - Núcleo de Educação e Monitoramento Ambiental
Projeto comunidades Taim: Educação ambiental e desenvolvimento sustentável
1- Como surgiu o projeto comunidades Taim? Quais foram os atores envolvidos?
2- A comunidade beneficiaria participou da fase de diagnostico e elaboração do
projeto.
3- Como foi à aceitação e inserção do projeto na comunidade?
4- Como avalia a participação comunitária no projeto? Existe a emancipação da
população? Percebem a necessidade da preservação ambiental?
5- De que modo pretendiam alcançar os objetivos como as praticas sustentáveis à
geração de renda, à melhoria da qualidade de vida e à conservação da diversidade
biológica.
6- Como avalia os resultados do projeto? Os objetivos foram alcançados?
7- Qual é o impacto do programa visitas orientadas? Ligação com outros agentes
como transporte?
8- Quais são os principais conflitos que existem entre os principais atores da
estação? Ainda notam se os efeitos da desapropriação?
9- Como é a relação entre a gestão, conselho de gestão, NEMA e moradores?
10- Como avalia o impacto da criação da estação ecológica na vida dos usuários?
Será que trouxe benefícios?
127
Roteiro para Gestor da estação ecológica do Taim
1- Como é nomeado o gestor da estação?
2- Qual é a estrutura deste órgão e principais tarefas?
3- Quais são os principais conflitos que existem entre os principais atores da
estação?
4- O problema da desapropriação de terras que afetou mais os pequenos em
relação aos grandes foi ultrapassado?
5- Como participa a comunidade na procura de soluções?
6- Como avalia a participação comunitária no projeto? Existe a emancipação da
população? Percebem a necessidade da preservação ambiental?
7- Quais são as classes sociais que existem no entorno do banhado? Como é a
convivência entre ambos?
8- Como é a relação entre a gestão, conselho de gestão, NEMA e moradores?
9- Os resultados da fiscalização são satisfatórios?
10- Como avalia o impacto da criação da estação ecológica na vida dos usuários?
Será que trouxe benefícios?
Roteiro para membros do conselho de gestão
1- como surgiu o conselho de gestão?
2- Quais são as tarefas do conselho de gestão?
3- Qual é a composição do conselho de gestão? Participação comunitária
4- Como avalia a participação comunitária no projeto? Existe a emancipação da
população? Percebem a necessidade da preservação ambiental?
5- Quais o os principais conflitos que existem na estação ecológica? E como são
resolvidos? Convivência entre produtores de arroz e pescadores?
6- Como avalia os resultados do trabalho realizado pelo conselho?
7- Como é a relação entre a gestão, conselho de gestão, NEMA e moradores?
8- Os resultados da fiscalização são satisfatórios?
9- Como avalia o impacto da criação da estação ecológica na vida dos usuários?
Será que trouxe benefícios?
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