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Pontifícia Universidade Católica de São Paulo
PUC-SP
Déborah Regina Lambach Ferreira da Costa
Reparação do dano à imagem das pessoas jurídicas.
DOUTORADO EM DIREITO CIVIL COMPARADO
São Paulo
2010
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2
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo
PUC-SP
Déborah Regina Lambach Ferreira da Costa
Reparação do dano à imagem das pessoas jurídicas.
Tese apresentada à Banca Examinadora da
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, como
exigência parcial para obtenção do título de Doutor
em Direito, sob a orientação da Professora Doutora
Maria Helena Diniz.
São Paulo
2010
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3
BANCA EXAMINADORA
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4
Pour acquérir la réputation il ne faut qu’un jour, et le hasard peut donner ce jour.
Mais pour la conserver, il faut payer de sa personne presque à tous les
instants. (Montesquieu - Discours de Bordeaux).
5
RESUMO
Reparação do dano à imagem da pessoa jurídica.
Na era globalizada, o titular do direito à imagem está mais vulnerável a sofrer um
dano ressarcível. O avanço da tecnologia, a Internet, a televisão, os meios de
radiodifusão e o sistema mecanizado em geral, que propagam a informação em
tempo real, acessível a milhões e milhões de outros sujeitos, expõe as pessoas cada
vez mais ao vilipêndio.
Tanto as pessoas jurídicas de direito privado, como as de direito público, podem ser
vítimas de dano à imagem, porque titulares de direitos da personalidade compatíveis
com a sua natureza jurídica. Ademais, lhes é assegurada a reparação do dano moral
nos incisos V e X do artigo 5º da Constituição Federal.
A jurisprudência, desapegando-se do conceito de dano moral como o “dano da
alma”, editou a Súmula n. 227 do Superior Tribunal de Justiça. Passou-se a
interpretar o artigo 10 da Convenção Europeia de Direitos Humanos de modo a
coibir abusos do direito de livre expressão na proteção da reputação em toda a sua
amplitude.
De modo que o direito à imagem será analisado com profundidade, tomando-se
como ponto de partida a afirmação de que é um direito da personalidade autônomo,
recebendo proteção constitucional e infraconstitucional.
A reparação do dano à imagem aparta-se do rigor formal do positivismo,
acompanhando a mudança de paradigma trazida pela Constituição Federal de 1988,
que aflorou, inclusive no âmbito da responsabilidade civil, princípios como da
socialidade, da eticidade e da operabilidade, com vistas a dar interpretação e
subsunção às normas do Código Civil consentâneas com a equidade e a justiça, em
prol de uma sociedade mais ética e fraterna.
Palavras-chaves
: responsabilidade civil; dano à imagem; dano moral; dano moral à
pessoa jurídica; dano à imagem da pessoa jurídica; reparação.
6
RESUMEN
Reparación del daño a la imagen de la persona jurídica.
Con la globalización, el titular del derecho a la imagen está más vulnerable a sufir un
daño resarcible. El avanzo de la tecnologia, la internet, la televisión, los medios de
radiodifusión y el sistema mecanizado en general, que propagan la información en
tiempo real, disponible a millones de otros sujetos, expone las personas aun más
veces al desaparecimento.
Tanto las personas jurídicas de derecho privado como de derecho público, pueden
ser víctimas del daño a la imagen, porque son titulares de derecho de personalidad
compatibles con su naturaleza jurídica. Además, les es asegurada la reparación del
daño moral en los números V y X del articulo 5
o
de la Constitución Federal.
La jurisprudencia, separándose del concepto de daño moral como el “daño del
alma”, editó el Boletín de Jurisprudencia n. 227 del Superior Tribunal de Justicia.
Empezose a interpretar el articulo 10 de la Convención Europea de Derechos
Humanos de manera a avergonzar los abusos del derecho de libre expresión en la
protección de la reputación en toda su amplitud.
De manera que el derecho a la imagen será analizado con rigor, empezando por la
afirmación de que es un derecho de personalidad autónoma, recibiendo protección
constitucional y legal.
La reparación del daño a la imagen apartase del rigor formal del positivismo,
siguiendo el cambio del paradigma que vino con la Constitución Federal del 1988,
que ganó más espacio, incluso en el ámbito de la responsabilidad civil, principios de
sociabilidad, ética, y operabilidad, con el objetivo de interpretar y aplicar las normas
del Código Civil de acuerdo con la equidad y la justicia, buscando una sociedad más
ética y fraterna.
Palabras clave
: responsabilidad civil – daño a la imagen – daño moral – daño moral
a la persona jurídica – daño a la imagen de la persona jurídica – reparación
7
ABSTRACT
Compensation for damage to the image of a legal entity.
In a globalized world, owners of image rights are more vulnerable to damages for
which compensation may be sought. New technologies, the web, TV, broadcasting
channels and mechanical systems in general, which disseminate information in real
time making it accessible to millions of people, increase this exposure to defamation.
Both legal entities governed by private and public law that own rights of publicity
consistent with their legal status run the risk of having their images damaged. Items
V and X of article 5 of the Brazilian Constitution provide that these entities are entitle
to compensation for libel and slander, or “moral damages” in a literal translation from
Portuguese.
Detaching the concept of libel and slander from “pain and suffering”, the Brazilian
Superior Court of Justice published case law summary [“Súmula”] No. 227 which
resulted in the application of article 10 of the European Convention on Human Rights
to prevent abuse of the freedom of expression and ensure maximum protection to
reputation.
This study is an in-depth analysis of image rights based on the initial assumption that
these are autonomous rights of publicity entitled to protection both at constitutional
and infraconstitutional level.
The compensation for image damages leaves formal positivism aside to follow the
paradigm shift introduced by the Constitution of Brazil ratified in 1988 when social,
ethical and operational principles -- even within the scope of civil liability -- where
brought to light allowing the interpretation of the Civil Code to be consistent with the
concepts of equity and justice in an attempt to foster ethics and compassion in
society.
Key words
: civil liability – damage to image – libel and slander – defamation of a
legal entity – damage to image of a legal entity – compensation - moral damages
8
SUMÁRIO
CONSIDERAÇÕES INICIAIS................................................................................ 10
CAPÍTULO I – DIREITOS DA PERSONALIDADE DA PESSOA JURÍDICA....... 14
1.1. Abordagem histórica acerca do surgimento do conceito de pessoa jurídica. 14
1.1. Pessoa jurídica de direito público e pessoa jurídica de direito privado:
concepção, requisitos formais e materiais e extinção...................................
35
1.3. Os direitos da personalidade e os direitos fundamentais relativos à pessoa
jurídica de direito público e de direito privado e o direito à imagem..............
38
CAPÍTULO II - RESPONSABILIDADE CIVIL: NOÇÕES GERAIS....................... 52
2.1. A responsabilidade civil em geral.................................................................. 52
2.2. Da ação e omissão; do dano e do nexo de causalidade............................... 57
2.3. Da indenização e a questão do critério da quantificação e da prova do
dano...............................................................................................................
61
CAPÍTULO III – CONFIGURAÇÃO JURÍDICA DO DANO................................... 66
3.1. O dano como elemento da responsabilidade civil......................................... 66
3.2. O dano patrimonial: definição, elementos e conteúdo................................... 70
3.3. O dano não-patrimonial: conceituação, conteúdo e extensão....................... 71
CAPÍTULO IV – DANO NÃO-PATRIMONIAL E AS PESSOAS JURÍDICAS DE
DIREITO PÚBLICO E PRIVADO...........................................................................
95
4.1. O dano não-patrimonial e a pessoa jurídica.................................................. 95
4.2. As vertentes compreendidas na noção de dano não-patrimonial.................. 106
4.2.1. O dano à imagem........................................................................................ 112
4.2.2. O dano coletivo............................................................................................ 118
9
4.2.3. O dano institucional..................................................................................... 124
4.2.4. O dano social............................................................................................... 127
CAPÍTULO V – DANO À IMAGEM DA PESSOA JURÍDICA E A SUA TUTELA. 133
5.1. A imagem da pessoa jurídica......................................................................... 133
5.2. A natureza jurídica do dano à imagem.......................................................... 148
5.3. A tutela jurídica do dano à imagem............................................................... 155
5.3.1. A proteção constitucional ........................................................................... 162
5.3.2. A extensão da técnica do artigo 52 do CC................................................. 166
5.3.3. A Súmula 227 do STJ e seu alcance.......................................................... 179
5.4. A tutela jurisdicional...................................................................................... 181
5.4.1. A ação civil pública; a ação popular; a ação de improbidade e a ação de
indenização..................................................................................................
183
5.4.2. A tutela inibitória e projeto disciplinador do sistema único de ações
coletivas brasileiras.....................................................................................
190
CAPÍTULO VI – REPARAÇÃO DO DANO À IMAGEM DA PESSOA JURÍDICA 194
6.1. Os meios de reparação do dano à imagem da pessoa jurídica..................... 194
6.2. A efetividade da reparação........................................................................... 201
6.3. As decisões dos tribunais brasileiros. Os emblemáticos julgamentos do
recurso especial 598 281 MG relativo à possibilidade de concessão de
indenização por dano moral coletivo em caso de dano ambiental e recurso
especial 821 891 RS denegatório de indenização por dano moral à pessoa
jurídica de direito público por fraude em licitação..........................................
210
CONSIDERAÇÕES FINAIS................................................................................... 214
BIBLIOGRAFIA ..................................................................................................... 218
10
CONSIDERAÇÕES INICIAIS
Discorrer acerca da viabilidade de se indenizar a pessoa jurídica, em
especial o Poder Público, por danos morais, se é que a pessoa jurídica de direito
público pode sofrer dano moral puro, é de extrema importância, não só na qualidade
de servidores públicos, como também de cidadãos.
A propósito disso, recentemente, o jornal inglês, The Independent,
veiculou reportagem a respeito da violência e da atuação do narcotráfico no Rio de
Janeiro. A ex-capital federal, eterno símbolo do país no exterior, é chamada de a
“cidade da cocaína e da carnificina”, levando o editorial da Folha de São Paulo a
concluir pela imagem nada agradável para os brasileiros.
Outro exemplo ainda é o da entrevista dada à Rádio Jovem Pan pelo
herdeiro de Portinari que, falando a respeito de obra de seu pai, furtada de museu
paulistano, assegurou haver um dano irreparável à alma do povo brasileiro.
Muito se tem visto, lido e ouvido acerca do vilipêndio da imagem das
instituições. A globalização, a Internet, a divulgação da notícia em tempo real e para
um numero cada vez maior de pessoas, potencializa a situação de dano à pessoa,
seja ela pessoa natural, seja ela pessoa jurídica, embora pouco se tenha escrito
sobre a proteção jurídica que é outorgada a essa última pelo ordenamento pátrio.
Tímidas são as decisões judiciais que concedem a reparação dos danos morais,
embora haja na doutrina ferrenhos defensores da pessoa jurídica como sujeito de
direitos da personalidade e, por conseguinte, vítima de danos exclusivamente
morais.
A Constituição Federal assegura a reparação do dano moral nos
incisos V e X do artigo 5º, sem qualquer distinção ou limitação ao ente lesado. Já
está pacificado na doutrina e na jurisprudência que a pessoa jurídica de direito
privado tem direito a indenização por danos extrapatrimoniais, como, por exemplo,
indenização por dano à imagem. O dano moral não é mais concebido, segundo a
visão de Santo Tomás de Aquino, como o dano da alma, com o passar do tempo,
foi-se mais além.
11
Contudo, não se enfrentou ainda diretamente, e com a necessária
profundidade, a questão da aplicabilidade dos dispositivos constitucionais à pessoa
jurídica de direito público. Embora existam mecanismos jurisdicionais para tanto,
como a ação popular, a ação civil pública, a ação de improbidade e até mesmo a
ação de indenização, o Poder Judiciário reluta em reconhecer aos entes públicos a
indenização por dano moral. As sanções impostas ao causador do dano são, na
maioria das vezes, a perda do cargo público; a perda do direito de licitar ou contratar
com a Administração Pública; a multa e a recomposição do patrimônio (material)
lesado, com a destinação da verba indenizatória para um fundo criado
especificamente para tal finalidade. A legitimação ativa é, quase sempre, restrita ao
Ministério Público, sendo tímida a atuação da pessoa jurídica de direito público, o
que limita a sua incidência. As sanções são aplicadas cumulativamente, o que
permite questionar sobre a efetividade da pena. Também se deve perquirir acerca
da valoração do dano moral. Como aquilatar o prejuízo sofrido pela pessoa jurídica
de direito público quando violada a sua imagem ou sua honra objetiva? Quais os
critérios deve o magistrado utilizar para fixar a indenização?
Concebe-se, ainda, a visão de que é o político atingido em sua honra
objetiva ou sua imagem e não a pessoa jurídica de direito público, confundindo-se a
figura do representante eleito pelo povo com a figura do ente público que ele
representa. Tanto isso é verdade que, na maioria das vezes, não é possível separar
as duas “personalidades”, tal a influência da mídia e da publicidade, já que são os
chamados “marqueteiros” que “vendem a imagem do político competente”.
A Folha de São Paulo divulgou notícia em que a família de João
Goulart havia protocolado um pedido de reparação da imagem do ex-presidente
junto à Comissão de Anistia do Ministério da Justiça, enfatizando o seu desinteresse
pela reparação meramente “econômica”.
Há também que se pensar no chamado dano moral difuso ou coletivo,
sofrido pela população como um todo, ao se sentir lesada pela conduta ilegal ou
abusiva do representante do Poder Público. Aqui há que se delimitar a questão da
legitimidade ativa para pleitear eventual indenização.
Pretende-se contribuir com esta pesquisa no sentido de mostrar os
meios para a recomposição do desfalque do patrimônio público, encarado,
12
sobretudo, sob o aspecto extrapatrimonial, pois a pessoa jurídica tem, sim, um
“capital moral”. Há que se abrirem horizontes para o resgate dos princípios de direito
público, como da probidade administrativa, da moralidade, da legalidade, da
razoabilidade, enfim, da recomposição do patrimônio moral ou institucional da
pessoa jurídica de direito público.
Na verdade, o cumprimento de uma obrigação acadêmica, que impõe a
elaboração de uma tese – e uma tese de doutoramento – traz um compromisso
maior: de mudança para melhor, extraído dos questionamentos abordados durante a
colheita do material de pesquisa, não apenas para a alteração legislativa, mas quiçá,
numa discussão como a esta, para uma mudança de mentalidade, pensando-se no
patrimônio maior da pessoa jurídica que é o imaterial.
A riqueza de um país não está nos bens que produz, mas na força de
seu povo. No seu patrimônio imaterial, destinado à consecução de seus fins: o bem
comum da coletividade. São as suas instituições – que compõem esse patrimônio
imaterial - que precisam ser revitalizadas, repensadas, e, enfim, valorizadas.
Há necessidade de uma visão multidisciplinar da problemática,
inclusive buscando conceitos de filosofia do direito, ética, direito constitucional,
direito eleitoral, de direito administrativo e de direito processual civil. A ótica não
estaria circunscrita apenas ao direito civil e ao direito civil comparado.
Dessa forma, esta tese divide-se em seis capítulos, assim explicitados:
No primeiro capítulo, far-se-á uma abordagem histórica da pessoa
jurídica, sua origem, conceito e requisitos de desenvolvimento, correlacionando-a
com os direitos fundamentais e da personalidade.
No segundo capítulo, tratar-se-á da responsabilidade civil em geral, em
uma visão panorâmica dos elementos de sua etiologia: ação e omissão; dano e nexo
de causalidade, bem como da indenização.
No terceiro capítulo dedicar-se-á um estudo ao dano propriamente dito,
em uma abordagem ampla do dano patrimonial e do dano não-patrimonial (moral,
extrapatrimonial ou imaterial).
13
No quarto capítulo, o foco será o dano não-patrimonial da pessoa
jurídica e as vertentes aí compreendidas, dedicando um subtítulo para o dano à
imagem, o dano coletivo, o dano institucional e o dano social.
No quinto capítulo, o estudo será focado, no dano à imagem e sua
proteção jurídica e jurisdicional.
No sexto capítulo, cuidar-se-á dos meios de reparação do dano à
imagem à pessoa jurídica, não se descurando da apresentação das formas mais
eficazes, desenvolvendo-se a tese da reparação do dano à imagem de uma
associação de moradores de bairro; de uma sociedade empresária; de uma
fundação de proteção à criança, por exemplo, mas com enfoque particular no ente
público, que são exemplos que por si só denotam a importância do tema, que é
simplesmente apaixonante.
Far-se-á, ainda, uma pesquisa jurisprudencial, buscando na legislação
e nas decisões de dos outros países, os mecanismos de proteção desse bem
jurídico que é tão caro e que precisa ser resgatado, pois a violação ao ente de direito
público não repercute apenas patrimonialmente, mas atinge fundo cada um dos seus
cidadãos.
São Paulo, setembro de 2010.
Déborah Regina Lambach Ferreira da Costa
14
CAPÍTULO I – DIREITOS DA PERSONALIDADE DA PESSOA JURÍDICA
1.1. – Abordagem histórica acerca do surgimento do conceito de pessoa
jurídica.
Este capítulo apresentará uma breve abordagem histórica do
surgimento da pessoa jurídica, uma vez que é imprescindível, para a compreensão
das ideias que surgirão no decorrer do trabalho, conhecer como afloraram as
diversas teorias que procuraram explicá-la, na sua origem, desenvolvimento e
proteção jurídica.
O direito tem como destinatário o homem: esse ser de carne e osso, de
espírito inquieto, que busca incessantemente a satisfação de suas necessidades
materiais e imateriais, a quem a norma visa alcançar para regrar a vida em
sociedade, tendo como meta a convivência pacífica em prol da paz social.
Quando se pensa o direito, o enfoque é o homem, sendo que o
comando da norma é a ele dirigido e só ele – até aonde se sabe – pode sentir os
efeitos da sanção, como assegura Antonio Menezes Cordeiro, para quem “as
diversas normas visam, pois, a conduta das pessoas singulares: somente estas
podem acatá-las ou violá-las”.
1
Assim, nas palavras incisivas de Maria Helena Diniz, “percebe-se que o
direito só pode existir em função homem”.
2
O homem é sujeito do direito e não seu
objeto. As relações jurídicas se estabelecem entre pessoas, sejam elas naturais,
sejam elas jurídicas, mesmo quando se está diante dos chamados direitos reais, em
que o sujeito passivo só será conhecido no momento da sua violação.

1
CORDEIRO, Antonio Menezes. O levantamento da personalidade coletiva no direito civil e
comercial. Coimbra: Livraria Almedina, 2000. p. 9.
2
DINIZ, Maria Helena. Compêndio de introdução à ciência do direito. São Paulo: Saraiva, 1995. p.
220.
15
Tanto assim é que o Código Civil começa disciplinando as pessoas,
porque, como assegura José de Oliveira Ascenção,
3
a pessoa é o fim do direito, o
fundamento da personalidade jurídica e o sujeito das situações jurídicas. O diploma
civil vai além, não deixando de lado o aspecto ontológico da pessoa, tanto que
afirma a personalidade do embrião, reconhecendo-lhe direitos, pondo a salvo o
nascituro desde a concepção.
Como ser gregário que é, o homem passa a conviver, a coexistir com
os outros homens, formando agrupamentos sociais, interagindo uns com os outros
com o intuito de alcançar seus objetivos. Reúnem-se em grupos sociais, esportivos,
empresariais, em núcleos familiares, religiosos, dependendo do motivo que os move.
As pessoas precisaram – e agora mais ainda - agrupar-se e formar
uma outra realidade para atingir seus fins: a pessoa jurídica, entidade a quem a lei
empresta personalidade própria, distinta da de seus membros, para que possa atuar
na vida jurídica.
Como bem pondera Silvio de Salvo Venosa,
“A premência de conjugar esforços é tão inerente ao homem como a
própria necessidade de viver em sociedade. E é por meio da pessoa
jurídica que o homem sobrepuja suas limitações e transcende a
brevidade de sua vida. Há sempre, na vontade do homem, ao
constituir uma pessoa jurídica, um sentido de perenidade que, como
ser mortal, não pode atingir”.
4
A ideia de personalidade coletiva constitui um ponto estruturante do
pensamento jurídico moderno, uma inquietude que começou a ser resolvida como o
“problema do século XIX”, atravessou sem solução todo o século seguinte e
continua – até os dias de hoje – a fascinar os estudiosos do direito, em todos os
ramos, incitando até mesmo no direito de penal a renovação do até então
desgastado debate da possibilidade da responsabilização criminal da pessoa

3
ASCENÇÃO, José de Oliveira. Direitos humanos e direitos da personalidade. Disponível em
<http://www.fd.ul.pt/Portals/0/Docs/Institutos/ICJ/LusCommune/AscensaoJoseOliveira10.pdf>
Acesso em: 19.10.09
4
VENOSA, Silvio de Salvo. Direito civil. São Paulo: Atlas, 2003. p. 204.
16
jurídica, justificado pelos sucessivos danos causados ao meio ambiente pelas
empresas que exploram de modo irresponsável atividades econômicas. O princípio
societas delinquere non potest é questionado na sociedade moderna sob o
argumento da adoção de uma teoria da pena como prevenção geral.
Há o aspecto importante de que o direito, em qualquer de seus ramos,
deve garantir a segurança e paz sociais e, diante da gravidade das lesões
perpetradas ao meio ambiente, direito fundamental (artigo 225 da Constituição
Federal), cabe papel importante do direito penal,
5
que é o de garantir a incolumidade
do bem coletivo e difuso, impondo sanções efetivas aos que, por exemplo, são “os
maiores responsáveis por danos ao meio ambiente”.
6
Nesse sentido, a pessoa jurídica tem cumprido um papel significativo
na ordem jurídica, constituindo complexas estruturas de poder, atuando não só no
meio ambiente, mas nas relações de consumo e na ordem econômica.
A ciência do direito passa então a tratar como “pessoas” realidades de
natureza não-humana. A personalidade coletiva permite imputar condutas humanas
a entes abstratos, constituindo uma aquisição jurídico-cultural muito importante nas
sociedades modernas, ou segundo Antonio Menezes Cordeiro, “ela permite um nível
muito avançado de integração social e possibilita um desenvolvimento alargado de
sinergias humanas e das forças produtivas”, que o homem, atuando sozinho, não
poderia alcançar.
7

5
Artigo 3º, Lei 9.605 de 12.02.1998 que dispõe acerca dos crimes ambientais.
6
Conferir em DOTTI, René Ariel A incapacidade criminal de pessoa jurídica (uma perspectiva do
direito brasileiro) In Revista brasileira de ciências criminais. Revista dos Tribunais: ano 3 n. 11 julho-
setembro 1995 p. 184 a 207; ver referência jurisprudencial citada por CARVALHO, Érika Mendes de
e CARVALHO, Gisele Mendes de. Direito penal de risco e reponsabilidade penal das pessoas
jurídicas: a propósito da orientação jurisprudencial do Superior Tribunal de Justiça In
Responsabilidade penal da pessoa jurídica. Em defesa do princípio da imputação penal subjetiva.
São Paulo: Revista dos Tribunais, 2010. p. 250: STJ, Resp 564.960/SC, 5 T., j. 02.06.2005, rel. Min.
Gilson Dipp, DJ 13.06.2005, p. 331; STJ, REsp 610.114/RN, 5 T., j, 17.11.2005, rel. Min. Gilson
Dipp, DJ 19.12.2005, p. .
7
CORDEIRO, Antonio Menezes, O levantamento da personalidade coletiva no direito civil e
comercial. Coimbra: Livraria Almedina, 2000 p 10.
17
Miguel Reale confirma a dificuldade de se entender por que e como o
direito reconhece personalidade a entes que não são tangíveis fisicamente, como é
o homem.
8
Na sociedade moderna, é muito difícil e até mesmo impossível, pensar
no homem sem se voltar para a pessoa jurídica. Os agrupamentos e associações de
pessoas são cada vez mais crescentes dada à complexidade da vida que, diante da
tecnologia e dos meios de comunicação, impõe a massificação da sociedade.
Mas o que não se pode deixar de ressaltar é a nítida diferença entre os
conceitos jurídicos e o filosófico de pessoa. Para a filosofia, pessoa é o ser humano,
o indivíduo; enquanto para o direito, pessoa é o titular de direitos e de obrigações,
ou seja, o sujeito de direitos. A pessoa jurídica não é apenas o agrupamento de
indivíduos, a união de esforços tendentes à realização de um objetivo, mas é sujeito
de direitos e obrigações, que a lei reconhece como tal.
9
Dessa forma, a reunião de pessoas para a consecução de
determinadas finalidades dá ensejo à formação de um ente com personalidade
própria, materializado nas figuras da sociedade, da associação e da fundação,
mesmo que, nesta última, haja a união de patrimônios (e não propriamente de
pessoas) com um objetivo a alcançar. A personalidade jurídica, por ser distinta dos
membros que a compõem, permite, por exemplo, que se exonere de
responsabilidade os sócios se agiram de acordo com os fins estatuídos pela pessoa
jurídica; permite que o patrimônio particular dos sócios seja resguardado,
respondendo pelas dívidas apenas o patrimônio social etc.
A contrario sensu, desvirtuando-se dos fins a que se propôs, pode
ensejar a desconsideração da personalidade jurídica para alcançar-se a pessoa dos
sócios.
Esta mesma sistemática jurídica – e esse o cerne do presente estudo –
permite seja a pessoa coletiva (direito português), a pessoa moral (direito francês)

8
REALE, Miguel. Lições preliminares de direito. 27 ed. São Paulo: Saraiva, 2002. p. 233.
9
TELLES JUNIOR, Goffredo da Silva Iniciação na ciência do direito. São Paulo: Saraiva, 2006 p.
277.
18
ou a pessoa jurídica (direito alemão, italiano e espanhol) titular dos direitos da
personalidade próprios, distintos dos indivíduos que a compõem? E caso plausível,
havendo a violação do direito da personalidade pode, em última instância, a pessoa
jurídica sofrer dano moral ou esse seria inerente à pessoa humana?
As indagações partem da premissa – que se tem como verdadeira - de
que os danos morais são lesões aos direitos da personalidade.
O fato das pessoas jurídicas não terem psiquismo ou por ausência de
previsão legal, levou os juristas, durante muito tempo, a negarem a possibilidade de
ser a pessoa jurídica sujeito ativo (credora) da indenização por dano moral, por
faltar-lhe justamente o elemento anímico.
O leitor, atento à evolução, dirá que a Constituição Federal,
promulgada em 1988, colocou um ponto final à discussão nos incisos V e X do artigo
5º. Também argumentará que a questão foi pacificada na jurisprudência pátria com
a edição da Súmula n. 227 do Superior Tribunal de Justiça: “A pessoa jurídica pode
sofrer dano moral”.
10
Destarte, o presente estudo estaria fadado ao insucesso, posto que
improfícuo, no entanto, nada seria mais equivocado! Assegura-se hoje à pessoa
jurídica de direito privado, tanto na doutrina como na jurisprudência, a indenização
por dano moral, desde que provado, pois não se admite, num primeiro momento, o
dano in re ipsa. Assim, como explicar, então, as recentes decisões do Superior
Tribunal de Justiça nos Recursos Especiais 598.281 MG e 821.891 RS que negam à
coletividade, em nome dos interesses difusos e à pessoa jurídica de direito público,
o direito à indenização do dano moral? E a interpretação dada ao artigo 52 do
Código Civil
11
pelo CJF na IV Jornada de Direito Civil expresso no Enunciado 286
12
de que “os direitos da personalidade são direitos inerentes e essenciais à pessoa

10
Precedentes: RESP 161913 MG (22.09.1998 DJ 18.12.1998) RESP 177995 SP (15.09.1998 DJ
09.11.1998) RESP 161739 PB (16.06.1998 DJ 19.10.1998) RESP 129428 RJ (25.03.1998 DJ
22.06.1998) RESP 134993 MA (03.02.1998 DJ 16.03.1998)
11
Código Civil - Art. 52. Aplica-se às pessoas jurídicas, no que couber, a proteção dos direitos da
personalidade.
12
Enunciado aprovado na IV Jornada de Direito Civil - Enunciado CJF nº 286: Os direitos da
personalidade são direitos inerentes e essenciais à pessoa humana, decorrentes de sua dignidade,
não sendo as pessoas jurídicas titulares de tais direitos.
19
humana, decorrentes de sua dignidade, não sendo as pessoas jurídicas titulares de
tais direitos”?
Embora sejam estas posições minoritárias, elas refletem o
posicionamento de considerável parte da jurisprudência e seu fundamento reside no
fato de que o dano moral está indissoluvelmente atrelado à aferição da dor e do
sofrimento, que são, obviamente, sentimentos exclusivos do homem, por atingir-lhe
a alma, fenômeno biológico, ferindo-lhe a dignidade.
Alexandre Ferreira de Assunção Alves lembra que partidário dessa
corrente é Wilson Melo da Cunha para quem
“as pessoas jurídicas, em si, jamais teriam o direito à reparação por
danos morais; tal possibilidade é mesmo absurda, pois os alicerces
sobre os quais eles se firmam são puramente espirituais”. Seriam
tais entidades, na visão deste jurista, meras abstrações, cuja vida é
“emprestada” pela inteligência humana ou pelo direito; vivas estariam
apenas para os juristas que não lhes podem comunicar o calor, a
alma, sentidos e a afetividade
”.
13
Os argumentos contra a possibilidade das pessoas jurídicas sofrerem
danos morais são sintetizados por José Rubens Morato Leite
14
, uma vez que (i) o
elemento dor só é possível incidir nas pessoas físicas, e a lesão à pessoa jurídica
seria de cunho patrimonial e não moral; (ii) as pessoas jurídicas são entes de ficção
do direito e não sofrem detrimentos anímicos.
Claro está, para os conhecedores da evolução da reparação do dano
moral que tal entendimento, à primeira vista, representa um retrocesso. Basta
lembrar aqueles, qualificados de negativistas, que entendiam por imoral tal
reparação, pois imoral compensar-se a dor com dinheiro. Mas não seria também
imoral deixar sem proteção jurídica as pessoas jurídicas de direito público ao não

13
CUNHA Wilson de Mello apud ALVES, Alexandre Ferreira de Assunção A pessoa jurídica e os
direitos da personalidade Rio de Janeiro: Renovar, 1998 p. 121.
14
LEITE, José Rubens Morato. Dano ambiental: do individual ao coletivo, extrapatrimonial. São
Paulo: Revista dos Tribunais, 2003 p. 288.
20
lhes reconhecer tal direito a despeito do comando constitucional? O artigo 52 do
Código Civil não teria aplicabilidade?
Percebe-se que por mais que a doutrina e jurisprudência tenham
avançado, não se chegou a um consenso, pois é essa, justamente, a função do
pensador do direito: a de se inquietar diante das conclusões alcançadas e que, sob
sua ótica, são injustas, pois deixam irreparadas situações de menoscabo à pessoa
jurídica, em especial à pessoa jurídica de direito público.
Por um lado, ao negar direito à compensação do dano moral à pessoa
jurídica – seja ela de direito público, seja ela de direito privado – sob o argumento de
que só a pessoa natural tem sentimentos (dano ao espírito, nas palavras de Santo
Tomás de Aquino), acarreta-se-lhe um gravame, deixando-a sem proteção.
Por outro lado, a amplitude de conceitos, a equiparação sem
fundamento jurídico e até mesmo a aplicação indiscriminada de institutos pelas mais
nobres razões, acaba, muitas vezes, banalizando árduas conquistas doutrinárias e
jurisprudenciais, além de não resultar na tutela efetiva dos bens jurídicos. No caso
de se admitir indenização do dano moral em um leque maior de possibilidades,
deve-se cuidar, como alerta Sérgio Cavalieri Filho, para não se ingressar na fase de
“industrialização”.
15
E seria esta a melhor solução: a de negar à pessoa jurídica a
reparação do dano moral? E, ao deixá-la sem proteção jurídica, negar-se-ia a sua
própria condição de pessoa?
A provocação, ao que parece, induz a uma pesquisa aprofundada dos
conceitos jurídicos de pessoa jurídica, de dano moral e de reparação (abrangendo
os termos indenização e compensação), que se procurará enfrentar a seguir.
A indagação: “o que é a pessoa jurídica?”, recebeu pelo menos tantas
respostas quanto a pergunta: “o que é o homem?”. A tese sobre a essência da

15
CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de responsabilidade civil. 5. ed. rev., aum. e atual. São
Paulo: Malheiros, 2003. p. 83.
21
pessoa jurídica foi na Alemanha, de onde emanaram as ideias abraçadas pelo
direito pátrio, quase que uma profissão de fé.
16
Assim, em busca da resposta, volta-se a atenção aos romanos, em
uma brevíssima referência histórica.
O direito romano não elaborou uma teoria acerca do fenômeno da
personalidade coletiva, pois lhe era extremamente difícil à abstração, ou melhor,
pensar em um ente abstrato, o que hoje, muitas vezes, ainda é recorrente.
Procurando no direito romano figuras afins das que, atualmente,
preencham o universo das pessoas jurídicas, encontra-se como a mais antiga o
populus romanus, o que se pode considerar uma antecipação da ideia de Estado. O
populus surgiria, na verdade, como sujeito de direitos e de obrigações.
No período do Império, ele aparece como fiscus. Essa potencialidade -
de ser sujeito de direitos e deveres - estendeu-se a outras figurações de base
territorial, como os municípios e as colônias.
Avançando no tempo, passada a Idade Média, onde o conceito de
Estado era absolutista e se confundia com a própria pessoa do governante,
simbolizado na célebre frase de Luis XIV, “L’Etat, c’est moi”, ou na acepção inglesa
de que “The king can do no wrong”, surgiram doutrinas significativas no século XIX,
pós-Revolução Francesa, que, marco da ruptura do sistema absolutista, consagrou
os princípios da fraternidade, igualdade e legalidade.
Aboliu-se a prática de aplicar castigos aos cidadãos de uma cidade
quando se revoltavam contra seus governantes, rei, bispo ou papa; eram
condenados ou excomungados porque não se conseguia destacar a universalidade
da pessoa física. Concluiu-se, pois, que havia distinção entre o homem e a cidade,
bem como entre as corporações e seus membros.
17

16
SERICK, Rolf Forma e realtà della persona giuridica. Milano: Giuffrè, 1966 p. 83
17
Cf. RIZZARDO, Arnaldo. Parte geral do Código Civil. Rio de Janeiro: Forense, 2003. p. 250.
22
Pode-se resumir em poucas palavras as opiniões que se seguiram
acerca da natureza jurídica da pessoa jurídica
18
. A teoria da ficção foi atribuída à
Savigny, que defendendo a posição de que só o homem pode ser sujeito de direitos,
concluiu que a pessoa jurídica é uma ficção criada por lei com a finalidade de
permitir o exercício de direitos patrimoniais. Ele estava imbuído de idéias libero-
individualistas, pelo que, como pessoa, só podia entender o ser humano individual
(Mensch); levado por razões de ordem técnica, ele acabaria por admitir pessoas
coletivas, mas apenas a título de ficção jurídica. Savigny entendeu o conceito de
pessoa jurídica como mais um exemplo de fictio juris, pois “não existe como
entidade dotada de existência própria, mas como elemento técnico, uma
conceituação ficta, mediante a qual os juristas podem coordenar normas jurídicas
distintas, para disciplinar a responsabilidade resultante do ato associativo”.
19
Ao longo do século XIX, a construção de Savigny foi-se
descaracterizando para dar lugar a outras teses, mesmo porque, aceitar-se a teoria
da ficção, seria negar-se a própria noção de Estado; sendo o Estado, uma ficção
legal, o direito que dele emana também o seria.
Windscheid e Brinz
20
, precursores da chamada teoria da equiparação,
pensavam na pessoa jurídica como um patrimônio – um bem – com proteção jurídica
tal qual aquela dada à pessoa física. O defeito desta teoria – critica-se – seria elevar
os bens à categoria de sujeitos de direito, quando, na verdade, só as pessoas o
podem ser.
Gierke, Zitelmann e Von Tuhr
21
vislumbraram a pessoa jurídica como
organismos sociais, ou seja, tais quais as pessoas naturais – que são organismos
físicos – a pessoa jurídica teria existência e vontade próprias. É a chamada teoria da
realidade objetiva ou orgânica.
Para esta vertente, a pessoa coletiva é uma pessoa composta. A sua
unidade não se exprime numa essência humana singular, mas, antes, num

18
Para maiores esclarecimentos ver CORDEIRO, Antonio Menezes. O levantamento da
personalidade coletiva no direito civil e comercial. Coimbra: Livraria Almedina, 2000 p 45.
19
Cf. REALE, Miguel. Lições preliminares..., cit., p. 234
20
DINIZ, Maria Helena Curso de Direito Civil v. 1, cit., p. 230.
21
DINIZ, Maria Helena Curso v. 1, cit., p. 230.
23
organismo social. Segundo Gierke, seu maior defensor, “quando os homens se
reúnem para realizar qualquer objetivo, de natureza política, comercial, civil, estética
ou religiosa, forma-se efetivamente uma entidade nova”.
22
Essa concepção, a ‘da vontade real’ é levada ao extremo no direito
anglo-saxão, como relata Eugenio Raúl Zaffaroni, em passagem de J. C. Smith:
“una compañya puede asimilarse a un cuerpo humano en varios
sentidos. Tiene un cerebro y un centro nervioso que controla lo que
hace. Tambien tiene manos que manejam herramientas y actúan de
acuerdo con las directives del centro. Aigunas personas en la
compañia son meros sirvientes y agentes que no son más que
manos que hacen el trabajo y no puede considerarse que
representan la mente o la voluntad. Otros son directores y gerents
que representam la mente y la voluntad rectoras de la compañia y
controlan lo que hace. El estado de la mente de estos gerents es el
de la compañia y asi es considerado por la ley”
.
23
Contudo, Gierke conclui que as pessoas jurídicas existem e não são a
simples “soma” dos sujeitos que a compõem, sendo que “a orientação orgânica de
Von Gierke tem o mérito de recordar que a personalidade colectiva corresponde a
uma realidade histórica e sociológica, que ultrapassa o arbítrio do Direito”.
24
A teoria organicista seria, na verdade, antagônica à teoria da ficção, o
que também não é ideal, dado o seu extremismo, tanto que Miguel Reale alerta para
o exagero das convicções daquela teoria, quando dá às pessoas jurídicas uma
existência ontológica, real, efetiva.
25
A teoria que melhor sustenta a natureza jurídica da pessoa jurídica –
seja ela de direito publico, seja ela de direito privado – é a da realidade das

22
REALE, Miguel Lições preliminares, cit., p. 234.
23
ZAFFARONI, Eugenio Raúl. Parecer Nilo Batista sobre a responsabilidade das pessoas juridicas
In DOTTI, René Ariel; PRADO, Luiz Regis. Responsabilidade penal da pessoa jurídica 2 ed. São
Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2010 p. 46.
24
CORDEIRO, Antonio Menezes, O levantamento da personalidade coletiva no direito civil e
comercial. Coimbra: Livraria Almedina, 2000 p. 55.
25
REALE, Miguel Lições preliminares, cit., p. 235.
24
instituições jurídicas encabeçada por Maurice Hauriou
26
, por admitir a pessoa
coletiva como uma realidade jurídica, ou seja, uma instituição, em que as pessoas
congregam esforços para atingir os fins a que se propõem; desse modo, como
instituição, é dotada de personalidade jurídica e patrimônios próprios, distintos dos
de seus membros. Explica com clareza Maria Helena Diniz:
“Como a personalidade humana deriva do direito (tanto que este
privou seres humanos de personalidade – os escravos, p. ex.), da
mesma forma pode ele concede-la a agrupamentos de pessoas ou
de bens que tenham por escopo a realização de interesses
humanos. A personalidade jurídica é uma qualidade que a ordem
jurídica estatal outorga a entes que a merecerem”.
27
Segundo Caio Mário da Silva Pereira,
“O jurista moderno é levado, naturalmente, à aceitação da teoria da
realidade técnica, reconhecendo a existência dos entes criados pela
vontade do homem, os quais operam no mundo jurídico adquirindo
direitos, exercendo-os, contraindo obrigações, seja pela declaração
de vontade, seja por imposição da lei. Sua vontade é distinta da
vontade individual dos membros componentes; seu patrimônio,
constituído pela afetação de bens, ou pelos esforços dos criadores
ou associados, é diverso do patrimônio de uns e de outros; sua
capacidade, limitada à consecução de seus fins pelo fenômeno da
especialização, é admitido pelo direito positivo. E, diante de todos os
fatores de sua autonomização, o jurista e o ordenamento legal não
podem fugir da verdade inafastável: as pessoas jurídicas existem no
mundo do direito, e existem como seres dotados de vida própria, de
uma vida real”
.
28
Conclui Miguel Reale com exatidão que: “a pessoa jurídica é uma
existência, mas uma existência teleológica, ou seja, finalística. (…) O elemento

26
Cf. DINIZ, Maria Helena Curso v. 1, cit., p. 230.
27
DINIZ, Maria Helena. Compêndio de introdução à ciência do direito, cit., p. 468-469.
28
PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil. Vol. 1. 20 ed. Rio de Janeiro, Forense,
200. p. 310.
25
nuclear da instituição é a idéia que congrega e inspira aqueles que se dedicam à
mesma tarefa, conjugando esforços diversos visando a um fim determinado.”
29
Portanto, a idéia de pessoa – seja esta individual, seja coletiva – é
criação normativa, sendo que o direito lhe reserva e assegura a mais elevada tutela
jurídica para concretizar os objetivos para os quais ela foi criada. A construção da
ordem jurídica, ao proteger a pessoa jurídica, moral ou coletiva, e ao consagrá-la
como ente distinto dos seus membros, evita a banalização do uso indiscriminado da
mesma, proibindo abusos, haja vista o artigo 50 e seguintes do Código Civil e o
artigo 28 do Código de Defesa do Consumidor.
Ao enxergar essa realidade, e ao discipliná-la como tal, afastando
incertezas doutrinárias, permite o ordenamento jurídico emprestar-lhe existência
tranquila, havendo quem afirme que a pessoa jurídica é imortal, mesmo sendo
mortais as pessoas que a compõem.
Assim, para o direito, pessoa é “sempre, um centro de imputação de
normas jurídicas. A pessoa é singular, quando esse centro corresponda a um ser
humano; é colectiva – na terminologia portuguesa – em todos os outros casos”.
30
Já assegurava Kelsen
31
que tal como a pessoa natural (ou física), a
pessoa jurídica nada mais é do que a expressão unitária para um complexo de
normas, isto é, para uma ordem jurídica que regulará o comportamento de uma
multiplicidade de homens; ou como afirma Antonio Menezes Cordeiro:
“Na hipótese da pessoa colectiva, já se sabe que entrarão, depois,
novas normas em ação de modo a concretizar a “imputação” final
dos direitos e dos deveres. Digamos que tudo se passa, então, em
‘modo colectivo’: as regras, de resto inflectidas pela referência a uma
“pessoa”, ainda que colectiva, vão seguir canais múltiplos e

29
REALE, Miguel Lições preliminares, cit., p. 236.
30
CORDEIRO, Antonio Menezes. O levantamento da personalidade coletiva no direito civil e
comercial. Coimbra: Livraria Almedina, 2000. p. 73.
31
Cabe frisar que Kelsen, como relatado por Cordeiro, negava verdadeira existência física às
pessoas, definindo a pessoa jurídica na fórmula: “Tal como a física, também a pessoa jurídica mais
não é do que a expressão unitária para um complexo de normas, isto é, para uma ordem jurídica
que regulará o comportamento da multiplicidade de homens”. Cfe. CORDEIRO, Antonio Menezes.
O levantamento da personalidade coletiva, cit., p. 71.
26
específicos, até atingirem o ser pensante, necessariamente humano,
que as irá executar ou violar”
.
32
Na doutrina não há mais espaço para discussão: a pessoa jurídica é
uma realidade própria, distinta dos membros que a compõem, assim sublinha Luis
Gracia Martin que:
“La persona jurídica no es uma ficción, sino uma realidad própria,
distinta de las personas físicas. Si bien la atribuición de “personalid
jurídica” no es únicamente en la normativa, lo cierto es que los
modos de organozaciòn y el proceso de la actividad reales de la
persona jurídica y de modo muy especial de la empresa económica
constituyen datos que están previamente dados a la regulación
jurídica. (...)
A las personas juridicas – dice Luna Serrano y Lacruz Berdejo – les
faltam la conciencia y voluntad en sentido psicológico, y con eso la
capacidad de autodeterminación, faculdades humanas que
necessariamente han de tomar prestadas a hombres. Sólo son
semejantes a la persona natural em cuanto ‘unidade de eficácia’; en
cuanto factor activo en el acaecer social. En virtud de esa semejanza
pueden, al igual que un ser humano, constituir-se en sujeto de
derechos y deberes”. En este sentido la persona, sea física o
jurídica, no es más que un centro de imputatión normativa de
efectos jurídicos, normalmente derechos y deberes, aunque también
expectativas, cargas etc
.”
33
Discordando parcialmente da visão kelseniana, que apenas ressalta o
aspecto lógico-normativo da pessoa jurídica como “centro de imputação de normas”,
Miguel Reale
34
defende a sua teoria tridimensional do direito. O direito deve ser
interpretado como fato, valor e norma. De modo que, arremata o jurista paulista, “o

32
CORDEIRO, Antonio Menezes. O levantamento da personalidade coletiva, cit., p. 73.
33
GRACIA MARTÍN, Luis. La cuestion de la responsabilidad penal de las próprias personas
jurídicas. In DOTTI, René Ariel; PRADO, Luiz Regis. Responsabilidade penal da pessoa jurídica 2
ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2010. p. 89-90.
34
Miguel REALE. Lições preliminares, cit., p. 238
27
fato de certos homens se congregarem para a realização de um valor ou fim que os
inspira e determina”, é reconhecido pela norma, dando origem à pessoa jurídica.
Por conseguinte, firma-se a pessoa jurídica como realidade distinta dos
sujeitos que a congregam.
Mas não apenas a construção da concepção de pessoa jurídica foi
tumultuada. Após a compreensão de que a pessoa jurídica tinha existência própria,
diferente da de seus membros, surgiu novo embate: a nomenclatura.
Savigny
35
, criador da teoria da ficção, insurgiu-se contra o termo
pessoa moral, pois poderia implicar a imoralidade da pessoa singular, o que não
faria sentido. Lançou, então, o termo “pessoa jurídica”, adotado por Heise e presente
até hoje. Na verdade, a censura não tinha cabimento pois o termo – pessoa moral -
pensado por Pufendorf
36
vem de mores, no sentido clássico de comportamento
humano. A pessoa “moral” resultava, pois, do engenho humano, por oposição à
natureza.
Em contrapartida, o termo “pessoa jurídica” também poderá receber
críticas pois, em direito, todas as pessoas estão submetidas à ordem jurídica.
O termo “pessoa colectiva” – consagrado no direito português -
também não é designação perfeita, pois subjacente deve haver uma “coletividade”,
no sentido de pluralidade de pessoas. Mas nem sempre é assim, como quando se
tem uma fundação.
No direito canônico, falou-se em “universitas”, ou universalidade,
quando se tratava da questão. Foi Pufendorf
37
, então, quem atribuiu às associações
o termo “pessoa moral”. Isto porque o BGB austríaco designava apenas a
associação como pessoa moral.

35
CASTRO Y BRAVO, Frederico. La persona jurídica. Madrid: Editorial Civitas, 1991. p. 172.
36
CORDEIRO, Antonio Menezes O levantamento da personalidade coletiva no direito civil e
comercial. Coimbra: Livraria Almedina, 2000. p. 20 e 42.
37
CORDEIRO, Antonio Menezes O levantamento da personalidade coletiva..., cit., p.20 e 42
28
Na literatura jurídica francesa, a expressão só seria consagrada,
praticamente, no final do século XIX, sendo impulsionada sobretudo por publicistas.
Na esfera legislativa, tem-se o Código de Napoleão que só faz referências indiretas
às pessoas morais.
Talvez tenha sido a fraqueza estrutural do Código Civil francês, no
tocante às pessoas jurídicas que causou uma gama de construções negativistas,
como as de Planiol e Duguit
38
, que entendiam a pessoa jurídica como uma
propriedade coletiva, de todos os que a integram e distinta da propriedade individual,
sendo um conjunto de coisas de propriedade de todos os associados.
Para o presente estudo, embora o Código Civil pátrio fale em “pessoa
jurídica”, utilizar-se-á as expressões pessoas morais, coletivas ou jurídicas
indistintamente, fugindo-se do preciosismo técnico, mas sem se esquecer da
essência.
Em trabalho de referência, cuja leitura é primordial à compreensão do
tema, embora deva-se situar o pensamento no contexto histório da época – final da
Segunda Guerra Mundial – e no contexto espacial – Alemanha - Rolf Serick diz que
os americanos resolveram o problema da natureza jurídica da pessoa jurídica com
base em casos concretos com surpreendente simplicidade, pois é realmente difícil
para o americano compreender uma teoria de ente coletivo como aquela de Gierke
na sua formulação original, ironiza Serick
39
. Somente com grande dificuldade se
pode pensar nos Estados Unidos que a pessoa jurídica pudesse ser considerada na
essência com determinadas características humanas. A única coisa que pode ser
aceita para os americanos na teoria metajurídica de Gierke é que somente a pessoa
jurídica nasce através de um reconhecimento do Estado.
Informa o doutrinador alemão que os juízes americanos, diante de
determinado fato concreto e no afã de fazer justiça, ora se valiam da teoria da ficção
de Savigny, ora da superada teoria da concessão, cuja origem histórica está no fato
de que, na Inglaterra, originalmente, uma pessoa jurídica podia nascer somente
graças a uma especial concessão do poder soberano. O Estado colocava no

38
CORDEIRO, Antonio Menezes O levantamento da personalidade coletiva..., cit., p. 20 e 42.
39
SERICK, Rolf Forma e realtà della persona giuridica. Milano, Giuffrè, 1966 p. 83 e p. 84
29
organismo social o “sopro de uma vida artificial” da qual nascia um ente dotado de
vida própria. Dessa realidade histórica havia dois tipos de sujeito: a pessoa física,
criada por Deus e a pessoa criada do espírito humano “as persons incorporated into
a politic body ”. (visão de Lord Coke)
Serick mostra a clara distinção entre sociedade e o sócio no direito
norte-americano, citando um caso concreto em que um terreno, dividido em lotes,
sendo que os lotes individuais, por cláusula contratualmente expressa, não
poderiam ser de propriedade de pessoas “de cor”. Em seguida, um desses lotes foi
transferido para uma pessoa jurídica, cujos membros eram todos negros. No
momento da aquisição, a pessoa jurídica teve ciência da existência de cláusula
limitativa da transmissão da propriedade, então muito comum na América do Norte.
Em uma ação ajuizada contra a sociedade adquirente, o juiz se pronunciou em favor
da sociedade, sob fundamento de que a pessoa jurídica é um sujeito de direito
distinto dos sócios. “E le persone giuridiche non possono essere di colore in quanto
esse non sono entità dotate di una realtà corporea, ma esistono solo in
’contemplation of law’ ”.
40
Ao discorrer sobre a teoria da desconsideração da pessoa jurídica,
Serick cita Anderson
41
, que se dedica ao direito societário americano e que se
baseia no conceito de que uma pessoa jurídica não é senão uma invenção (ficção)
criada por motivo técnico-jurídico como instrumento para permitir na vida comercial o
alcance de determinados fins reconhecida pelo ordenamento jurídico e só nos limites
representativos destes mesmos fins é que a pessoa jurídica pode ter vida própria.
Ao desenvolver seu raciocínio, Rolf Serick incita a desvendar quais das
características próprias de uma pessoa física devem ser aplicadas a uma pessoa
jurídica. A resposta a essa indagação é de extrema utilidade para o desenvolvimento
do presente trabalho, pelo que a complexidade da pesquisa do jurista alemão é sem
precedentes e de referência obrigatória para os que se dedicam ao estudo da
pessoa coletiva.

40
Na tradução livre: E a pessoa jurídica não pode ser ‘de cor’ porquanto não é dotada de uma
realidade corpórea, mas existe somente na contemplação da lei. Cf. Rolf SERICK, Forma e realtà
della persona giuridica. Milano, Giuffrè, 1966, cit., p. 76.
41
Serick não faz referência à fonte.
30
Para o jurista, deve-se perquirir quais normas entre as que pressupõem
características naturais da pessoa física devem ser aplicadas também às pessoas
jurídicas. Além disso, deve-se averiguar como é possível, na aplicação dessa norma
à pessoa jurídica, determinar quais as características que conceitualmente se
baseiam na pessoa física; segundo qual critério se deve decidir se tal norma pode
ser aplicada também a uma pessoa jurídica etc.
De riqueza extraordinária, a análise do professor da Universidade de
Tübingen apontava, à época, que mesmo nos Estados Unidos não havia
entendimento adequado, talvez em referência à sociedade americana voltada às
grandes corporações.
Cita o exemplo do caso People’s Pleasure Park Co. v. Rohleder em
que a Suprema Corte de Apelação do Estado da Virgínia enfrentou a questão da
possibilidade de se atribuir a uma pessoa jurídica características naturais próprias
das pessoas físicas. Se cuidava de decidir se uma pessoa jurídica pode ser
considerada ao menos de cor (di colore). A Corte respeitou completamente o
princípio da separação jurídica entre os sócios e o ente, chegando à conclusão de
que, mesmo quando todos os membros da sociedade são negros, a pessoa jurídica,
na qualidade de sujeito jurídico autônomo, não recebe minimamente a influência
desse fato e de que, esta, como tal, não pode ser de cor.
42
Mas não faltou quem criticasse a sentença, emitindo opinião de que o
Tribunal se descuidou do seguinte fato: o único propósito da sociedade era, através
de uma pessoa jurídica constituída de negros, burlar uma proibição contratual com
base na qual um determinado fundo não poderia ser adquirido por negros. Por outro
lado, essa crítica não afronta o problema específico que consiste em determinar se
uma pessoa jurídica, a qual segundo o senso natural e corrente não pode ser de cor,
possa todavia, juridicamente, ser qualificada como “de cor”.
A resposta é negativa tendo em vista a assertiva de que ”uma
corporação formada de muitos, é invisível, imortal e existe somente por
determinação e consideração da lei. Elas não podem praticar crime, estar fora da lei,

42
SERICK, Rolf Forma e realtà della persona giuridica. Milano: Giuffrè, 1966 p. 219.
31
ou excomungadas, já que não tem alma, nem aparecem pessoalmente, mas através
de advogado”
43
.
Na Alemanha, os doutrinadores e o legislador enfrentaram, durante um
regime nacional-socialista, um problema muito semelhante ao acima exposto. Em
relação à “arianização” (arianizzazione) de empresas hebraicas, indagando se uma
pessoa jurídica poderia ser ariana ou hebraica, e em caso desta questão ser
respondida afirmativamente, com base em que elemento umaq característica desse
gênero poderia ser determinada em relação a uma pessoa jurídica.
44
Em 1935, o “Reichsjuristenführer” expediu uma norma (ordinanza)
através da qual se proibia o “NS-Rechtswahrern” de representar os hebreus diante
dos tribunais. Essa norma equiparou todos os hebreus: a sociedade de capital; a
pessoa jurídica dita individual, cuja direção ou capital não estava prevalentemente
nas mãos de arianos etc. O princípio que originou essa proibição foi depois editado
em norma legislativa, estabelecendo que uma empresa é considerada hebraica
quando hebreu é seu titular. A norma explicitou que a pessoa jurídica é hebraica
quando a) um ou mais representantes legais ou quando um ou mais de seus
membros são hebreus; b) quando o sócio hebreu tem uma participação social que,
com fundamento no capital ou no direito de voto, atribui-se-lhe uma influência
determinante.
Pfuntner-Neubert, evocados por Serick
45
, comentaram essa disposição
afirmando que hebreu é um conceito racista que, como tal, só pode ser aplicado
contra a pessoa física. Pelo que se denota que conceitos como raça, cor, religião
não podem ser ligados à ideia de pessoa moral. A pessoa jurídica, nas palavras de
Miguel Reale, “não é algo de físico e de tangível como é o homem, pessoa
natural”.
46

43
No original: “A corporation aggregate of many, is invisible, immortal, and rests only in intendment
and consideration of the law… They can’t commit treason, nor be outlawed, or excommunicated, for
they have no soul, neither can they appear in person, but by attorney”.
44
SERICK, Rolf Forma e realtà della persona giuridica. Milano, Giuffrè, 1966 p. 218.
45
SERICK, Rolf Forma e realtà della persona giuridica, cit., p. 220.
46
REALE, Miguel. Lições preliminaries de direto, cit., p. 229
32
Naquele contexto histórico se colocou questão inversa: uma pessoa
jurídica pode ter sido perseguida com base em motivos raciais? Esta questão aflorou
e foi debatida na jurisprudência que sucedeu 1945 em matéria de direito de
ressarcimento por danos de guerra e que ainda se achava, em parte, regulamentada
legislativamente. Também nesse caso é coerentemente afirmado que uma pessoa
jurídica pode ser considerada perseguida por motivos raciais, haja vista que milhares
de lojas pertencentes aos judeus foram fechadas e depredadas durante o regime
nazista.
47
Basta recordar a Kristallnacht onde em uma única noite, 7.500 lojas de
judeus foram destruídas.
Conexas ao problema acima relatado, surgem outras inquietações,
como a possibilidade de uma pessoa jurídica poder ser titular dos mesmos direitos
criados pelo ordenamento jurídico para a tutela do ser humano e de sua dignidade,
ou se uma pessoa jurídica pode ter atributos que representam uma valoração do
comportamento humano. No primeiro grupo, de natureza constitucional, podem ser
citadas como exemplo a honra, a credibilidade (confiança) e a ingratidão.
A Emenda XIV da Constituição americana estabelece que “nenhum
Estado poderá privar qualquer pessoa da vida, da liberdade e da propriedade, sem o
devido processo legal”. A jurisprudência e a doutrina dos Estados Unidos entendem
que a expressão “pessoa” compreende neste caso tanto a pessoa física como a
jurídica. E o fazem em contraste como o termo “cidadão” que seria usado
exclusivamente para a pessoa física (ou natural).
Serick assegura que a pessoa jurídica pode ser titular dos direitos
constitucionais fundamentais. Para determinar quais direitos lhe atingem, é

47
MRG americano n. 59 de 10.11.1947, publicado em Gesetzessammlung HENKEN, art. 1: “O fim
da lei é o de reintegrar na máxima medida possível a propriedade dos bens daquelas pessoas que
foram espoliadas no período de 30 de janeiro de 1933 a 8 de maio de 1945, por motivos raciais,
religiosos, ideológicos ou pela oposição política ao regime nacional-socialista (...) e o artigo 9 dessa
lei: “Se uma sociedade ou uma pessoa jurídica de direito comercial foi levada ou obrigada a
dissolver-se em razão de um dos motivos indicados no art. 1, o direito à restituição dos bens pode
ser levado a efeito, se nenhuma outra organização social lhe sucedeu, da ogni singolo sócio”.
(tradução da pesquisadora)
33
necessário examinar-se a ratio da norma e a vontade do legislador. A mesma
disposição está no artigo 19 da Constituição alemã.
48
Assevera o autor
49
que uma pessoa jurídica pode ser titular de direitos
fundamentais e ser destinatária da tutela daí decorrente, sendo incontestável que a
pessoa jurídica tem “honra”, o que é impugnado por Binding
50
, para quem honra é
um valor jurídico personalíssimo, um “valor que pertence a um ser humano como tal
e cuja base de seu comportamento está a sua integridade moral e jurídica”. Assim,
por essa concepção, não seria crível que uma pessoa jurídica ou ente coletivo fosse
titular desse direito.
Na época em que escreve, Serick faz uma pesquisa primorosa e afirma
que no Código Penal do Reich a capacidade de ser ofendido vem reconhecida a
vários entes coletivos, como a administração pública e às associações políticas,
embora no caso da administração pública se faça referência ao substrato pessoal,
ao funcionário que a representa. Não é concebível ofensa à administração pública
abstraindo-se completamente da pessoa física que a compõe, aduz o mestre
alemão.
Ver-se-á na sequência, e em capítulo próprio, que os italianos encaram
como mais grave o ato lesivo contra Administração Pública praticado pelo
funcionário público do que quando o agente é pessoa “comum”. Haveria, portanto,
uma abalo direto no princípio de confiança, quebrado pela prática do ato ilícito do
funcionário que deveria, na verdade, aigr nos estritos limites da lei pois representa a
pessoa jurídica de direito público.
Durante o Terceiro Reich, por conta do espírito nacional-socialista, deu-
se acentuada importância ao senso de coletividade. Sustentou-se, ao lado da honra

48
Art. 19 - (1) Quando, de acordo dessa lei fundamental, um direito fundamental pode estar
restringida por uma lei ou em função duma lei, a lei deve ser válida de maneira geral e não só para
o caso isolado.(…) (2) Um direito fundamental não deve ser ofendido na sua essência em caso
nenhum. (3) O direitos fundamentais são também validos para pessoas coletivas do território
do país em medida que sejam aplicáveis por sua natureza. Disponível em
<http://www.unileipzig.de/~leite/wiki/Direitos_B%C3%A1sicos_da_Constitui%C3%A7%C3%A3o_Ale
m%C3%A3_-_Art%C2%BA_1_a_19"> Acesso em 24.04.2010
49
SERICK,Rolf Forma e realtà della persona giuridica. Milano, Giuffrè, 1966, p. 232- 233.
50
Cita como referência BINDING, Lehrbuch des Gemeinen Deutschen Strafrechts, Besonderer Teil,
I (1902).
34
individual, a existência de uma honra coletiva, baseada no conceito de comunidade
supra-pessoal dotada de consciência comunitária própria. O partido socialista
alemão e organizações similares poderiam ser vítimas de ofensas à honra diante
dos valores nacional-socialistas. Contudo, a doutrina negava que as fundações e as
sociedades de capitais tivessem “honra” pois o objeto por elas perseguido era
puramente comercial. A Corte alemã, durante esse período que a humanidade quer
inclusive esquecer, dadas as atrocidades cometidas, mas que se traz à baila para a
riqueza do estudo, reconheceu ofensa à honra coletiva aos entes legalmente
constituídos e a quem o Estado outorgou algumas funções públicas.
51
A honra passa a ter um conceito sociológico, cujo conteúdo é o
respeito que o indivíduo ou a pessoa jurídica tem no âmbito da coletividade. A Corte
de Hannover atribuiu legitimidade à Ordem dos Advogados de ser ofendida em sua
honra então em 1947.
52
Foi, assim, um avanço no reconhecimento de direitos da
personalidade à pessoa jurídica análogos aos da pessoa natural.
Essa digressão histórica, em que se permitiu adentrar inclusive no
tema da presente tese, adiantando conceitos e, principalmente, as dúvidas da
doutrina e da jurisprudência, é um exemplo de que a questão não é e não será
pacífica, mesmo porque vários são os enfoques dados à pessoa jurídica.
Outrossim, é difícil até hodiernamente enxegar a pessoa jurídica sem
penetrar na sua “vida interior”, sendo comum ao intérpetre, ao aplicar a lei, confundir
a pessoa dos sócios com a pessoa jurídica. Por conseguinte, pertinente é a análise
da pessoa jurídica e sua disciplina no Código Civil.

51
Cf. SERICK, Rolf. Forma e realtà..., cit., p. 235.
52
Cf. SERICK, Rolf. Forma e realtà..., cit., p. 236.
35
1.2. - Pessoa jurídica de direito público e pessoa jurídica de direito privado:
concepção, requisitos formais e materiais e extinção.
Nem todo agrupamento de pessoas é tido como pessoa jurídica. Muitas
vezes, faltam requisitos legais para a subjetivação, embora esse ajuntamento de
pessoas tenha capacidade para estar em juízo
53
. São exemplos desses entes
despersonalizados, a família, a sociedade de fato, a massa falida, as heranças
jacente e vacante e o espólio. Ao condomínio edilício, consoante recente Enunciado
n. 90 do Conselho de Justiça Federal, deve ser reconhecida personalidade jurídica,
pois pode adquirir imóveis e outros bens em seu próprio nome, além dos
necessários à simples administração; pode movimentar contas bancárias; emitir
boletos de pagamento; contratar empregados etc.
A personalidade jurídica é, como assegura Maria Helena Diniz
54
, um
atributo que a ordem jurídica estatal outorga a entes que o merecem. O Código Civil,
nos artigos 40 e seguintes, rege os preceitos regulamentadores da matéria, uma vez
que é a Constituição Federal quem assegura entre os direitos e garantias
fundamentais da pessoa humana o de associar-se para a obtenção de fins comuns,
alcançando bens da vida que o homem, sozinho, não poderia fazê-lo. Daí a
necessidade de reunir-se a outros (artigo 5º, incisos XVII e XXI da Constituição
Federal).
As pessoas jurídicas são de direito público interno e externo e de
direito privado. São pessoas jurídicas de direito público interno: a União, os Estados,
o Distrito Federal e os Territórios, os Municípios, as autarquias, associações
públicas e as demais entidades de caráter público criadas por lei. Repetindo o
comando constitucional inserido no parágrafo sexto do artigo 37 da Constituição
Federal, o artigo 43 impõe às pessoas jurídicas de direito público interno a
responsabilidade civil objetiva pelos atos praticados por seus agentes.

53
DINIZ, Maria Helena Curso de direito civil. Volume 1 São Paulo, Saraiva, 2007 p. 293.
54
DINIZ, Maria Helena Curso... v. 1, cit., p. 229.
36
Embora faça menção às pessoas jurídicas de direito público externo, o
Código Civil deixa claro que serão regidas pelas normas de direito internacional,
enquanto o Decreto-lei 200/67 e o Decreto-lei 900/69 estruturam a pessoa jurídica
de direito público da administração direta e indireta, ressaltando as autarquias,
criadas para suprir as dificuldades de gestão, descentralizando-se a atividade
financeira e administrativa.
Elenca como pessoas jurídicas de direito privado, as associações, as
sociedades, as fundações, as organizações religiosas e os partidos políticos, sendo
que estes tem lei especial a regulamentá-los. As empresas públicas e as sociedades
de economia mista são entidades privadas, também regidas por norma de caráter
especial e subsidiariamente pelo Código Civil.
Tal qual a pessoa natural, a pessoa jurídica nasce, vive e morre.
Contudo, a sua existência se dá a partir da inscrição dos atos constitutivos
(estatutos, contratos sociais etc.) no respectivo registro. Dois são, pois, os
momentos de sua formação: o do encontro de vontades traduzido em documento
escrito e, outro, consistente no registro público. Enquanto não efetuado o registro, o
agrupamento de indivíduos é sociedade de fato.
No momento do registro, a lei reconhece à pessoa jurídica
personalidade e capacidade, podendo exercer todos os direitos subjetivos, como
direito ao nome, à marca, à imagem etc., na exata medida de sua natureza, pois lhe
falta um organismo biopsíquico. Essa personalidade é distinta dos membros que a
compõe.
Tal assertiva vale para a pessoa jurídica de direito privado, sendo a
gênese da pessoa jurídica de direito público diferente, pois o que lhe dá existência
são fatos históricos (uma revolução, por exemplo), normas constitucionais, leis
especiais e tratados e convenções internacionais (para a pessoa jurídica de direito
público externo). Dessas mesmas formas ocorre a sua extinção. O regime jurídico é
diverso tanto para uma como, para outra.
O Código Civil disciplina as pessoas jurídicas (artigo 44 do CC),
acrescentando ao rol do diploma legal de 1916 tanto as organizações religiosas,
37
prestigiando a liberdade de crença e o livre exercício dos cultos religiosos (artigo 5
o
,
inciso VI da Constituição Federal), como os partidos políticos, regidos pela Lei n.
9.096/95.
Por seu turno, as associações, pessoas jurídicas organizadas para fins
não econômicos, estão em primeiro plano. Os associados reúnem-se para fins
consecução ideais, de natureza esportiva, assistencial, educacional, política,
religiosa, profissional-liberal não visando o lucro, embora não deixem de auferir
renda, mas não há partilha dos resultados entre seus membros (artigo 53 do Código
Civil).
Ao passo que na sociedade, seja ela simples ou empresária, a
finalidade é econômica, sendo os lucros obtidos na execução de seus objetivos,
partilhados entre seus sócios.
Mas a reunião de bens, seja por destinação inter vivos ou mortis causa,
também pode tomar a forma de pessoa jurídica, quando esse patrimônio tem a
finalidade de atender ao interesse público. O instituidor, ao destinar parcela de seu
patrimônio ao exercício de finalidades religiosas, culturais, morais ou assistenciais,
constitui, com a fiscalização do Ministério Público, a fundação (artigo 66 do CC). Não
há propriamente a reunião de pessoas ou universitas personarum, mas de bens
destinados a um fim nobre, como a Fundação Ayrton Senna, para a proteção do
menor, incentivando-o ao estudo, leitura, prática esportiva etc.
Embora a personalidade jurídica da pessoa jurídica não se confunda
com a dos membros que a estruturam, a lei permite em situações excepcionais,
configurados o desvio de finalidade ou a confusão patrimonial entre os bens destes
e da sociedade (associação), em ação judicial e a requerimento da parte lesada ou
do Ministério Público quando lhe couber intervir no processo, a desconsideração da
personalidade jurídica.
A dissolução da pessoa jurídica pode se dar pelo distrato, pela lei, por
ordem judicial, pela cassação da autorização de seu funcionamento etc. Assim como
o fim da personalidade natural se dá com a morte, a pessoa jurídica tem existência
própria, diversa da de seus membros, o que lhe dá longevidade.
38
1.3. – Os direitos da personalidade e os direitos fundamentais relativos à
pessoa jurídica de direito público e de direito privado e o direito à imagem.
De posse desses elementos conceituais e estruturais, surge a
problemática: as pessoas jurídicas tem direitos da personalidade? E direitos
fundamentais? Se positivo, em que medida? Confundem-se esses direitos com os
das pessoas naturais que dela fazem parte?
A indagação, se percebe, é recorrente nesse trabalho. E a resposta,
unânime da doutrina, é a de que, no momento do registro de seus estatutos ou de
seu contrato social, a lei reconhece à pessoa jurídica personalidade e capacidade,
podendo exercer todos os direitos subjetivos. O mesmo ocorre com a pessoa
jurídica de direito público, que nasce com a edição (promulgação) da lei ou do fato
histórico do qual exurge sua constituição.
Assim, adquirindo juridicamente a personalidade (afastada as situações
de fato), as pessoas jurídicas recebem proteção normativa. O Código Civil pátrio
abre um capítulo próprio, sob a rubrica, “Direitos da Personalidade”, reconhecendo
expressamente à pessoa jurídica alguns atributos semelhantes, análogos, aos das
pessoas naturais (na expressão “no que couber”), embora não os especifique nem
os identifique, tarefa própria do intérprete.
Dispõe o artigo 52, do Código Civil: “Aplica-se às pessoas jurídicas, no
que couber, a proteção dos direitos da personalidade”, ou seja, o legislador remete o
intérprete aos artigos 11 a 21, do Capítulo II, sob o título “Dos Direitos da
Personalidade”. Entretanto, não os conceitua (tarefa que não lhe é própria, ressalte-
se), nem os elenca (para não engessá-los, dada a sua relevância). O referido
dispositivo legal traz ainda conceito vago de quais direitos da personalidade são
reconhecidos à pessoa moral (em referência à expressão no que couber).
Por sua vez, o Código Civil português editou verdadeira “cláusula de
proteção geral da personalidade” ao resguardar, no inciso I do artigo 70º, os
39
"indivíduos contra qualquer ofensa ilícita ou ameaça de ofensa à sua personalidade
física ou moral".
Falando acerca do assunto, Paulo Mota Pinto
55
aduz que essa
indeterminação conceitual do legislador é preenchida pelo elenco de direitos e
liberdades pessoais previstas na Constituição Portuguesa, nos artigos 24 a 27.
Essa cláusula geral, - arrisca-se dizer -, está implícita no direito pátrio,
uma vez que os artigos 11 e seguintes do Código Civil, com supedâneo no artigo 5º
da Constituição Federal, reconhecem os chamados direitos da personalidade,
sobretudo os emanados do princípio da dignidade da pessoa humana (artigo 1º,
inciso III da Constituição Federal). Nas palavras do doutrinador português, a
dignidade humanafoi elevada a valor fundamental atributivo de sentido e unidade
às disposições relativas aos direitos fundamentais, elemento de unidade valorativa
do sistema constitucional”.
56
Essa opinião também é compartilhada por Alexandre Ferreira de
Assunção Alves
57
, para quem a Constituição de 1988, no bojo do inciso X do artigo
5º, contém cláusula geral de tutela do direito à imagem, assegurando ao lesado
reparação por danos morais e materiais.
Claro que alguns direitos da personalidade apenas dizem respeito à
pessoa humana. “Evidentemente, não tem cabimento violação à vida, ou à
integridade física ou psíquica, ou à liberdade (privação) da pessoa jurídica. Outros
direitos da personalidade, todavia, são suficientemente exercitáveis pela pessoa
jurídica, e sua violação proporciona a indenização compensatória por danos morais”,
alerta Mota Pinto.
58
Adiantando o desfecho do presente trabalho, pode-se acompanhar o
entendimento do juiz português que vê a reputação como o direito mais atingido,

55
PINTO, Paulo Mota Direitos da personalidade no Código Civil português e no Código Civil
brasileiro. Revista Jurídica nº 313, p. 07.
56
PINTO, Paulo Mota Direitos da personalidade... cit., p. 07.
57
ALVES, Alexandre Ferreira de Assunção O levantamento da personalidade coletiva no direito civil
e comercial. Coimbra: Livraria Almedina, 2000. p 136.
58
PINTO, Paulo Mota Direitos da personalidade..., cit., p. 07.
40
pois a consideração e o respeito que passa a granjear a pessoa jurídica integra sua
personalidade própria e não as das pessoas físicas que a compõem.
O homem adquire personalidade ao nascer, atribuindo-lhe o direito a
condição de sujeito de direitos e de obrigações. A personalidade é, então, na visão
de Nelson Nery Junior, “o atributo que impede que o homem seja objeto de direito”.
59
E assegura Maria Helena Diniz, a pessoa jurídica também
“(...) tem direito à personalidade, como direito ao nome, à marca, à
liberdade, à imagem, à privacidade, à própria existência, ao segredo,
à honra objetiva ou à boa reputação, podendo pleitear, se houver
violação a esses direitos, reparação por dano moral e patrimonial,
atingindo sua credibilidade social, idoneidade empresarial,
potencialidade econômica, capacidade de produção de lucros,
qualidade do fundo de comércio, clientela etc.”.
60
Dessa forma, assim como a pessoa natural, o ente coletivo é sujeito de
direitos e tem direito à personalidade. Mas em que medida?
José Lamartine Correa de Oliveira, quem melhor se debruçou sobre o
assunto, ensina que “a pessoa humana é substancial, individual e de natureza
racional. Dessas três notas deriva a dignidade da pessoa humana, seus direitos
absolutos”.
61
A pessoa jurídica é realmente pessoa e não ficticiamente pessoa, ou
seja: a pessoa jurídica é uma realidade. “É, porém, pessoa de modo analógico”.
62
Seguindo os conceitos de Santo Tomás, o professor paranaense diz
que se pode compreender por análogo o que é semelhante. Resume Lamartine

59
NERY JUNIOR, Nelson Comentários ao Código de Processo Civil. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 2008 p. 161.
60
DINIZ, Maria Helena Curso...V. 1, cit., p. 272.
61
CORREA DE OLIVEIRA, J. Lamartine Conceito da Pessoa Jurídica. 1962. Tese. (Concurso de
Livre Docência em Direito Civil). Faculdade de Direito, Universidade Federal do Paraná. Curitiba:
1962. p. 162.
62
CORREA DE OLIVEIRA, J. Lamartine Conceito da Pessoa Jurídica. cit., p. 162.
41
Correa: um termo unívoco designa coisas iguais; um equívoco, coisas distintas; um
analógico, coisas que sendo distintas, apresentam, entretanto, pontos de contato
em suas características essenciais.
Conclui o citado autor que esse é o caso da pessoa jurídica:
“Como a pessoa humana, ela é um ser. E, mais, como a pessoa
humana ela é indivisa, individual. É permanente, pois que “sob a
mobilidade do décor, o fluxo das aparências, a identidade do sujeito
persiste”, deixando-o intacto às alterações acidentais. Possui
independência externa. Não é evidente que a sociedade possui
permanência e é a mesma, não se alterando com a entrada e a
saída de novos sócios? E não lhe assegura o Direito independência
externa? Eis os pontos de contacto, tantos e tão importantes, com a
pessoa humana.
Entretanto, ela não é substancial. Depende, para existir, dos seres
humanos, que estão sob sua existência. Entretanto, é ser, pois o
acidente é ser. É um ser acidental, - diz o mestre – pois existe para
complemento do ser humano, que, sendo ser social, deseja os
grupos associativos, e recebe utilidade das fundações.
Aí está, portanto. Pessoa jurídica: realidade análoga à pessoa
humana, porque idêntica em inúmeros aspectos e distinta no mais
importante: a substancialidade, que esta possui e aquela não. É
pessoa, portanto. Mas não no sentido pleno da palavra e sim por
analogia.”
63
Mas que tipo de analogia? Os tomistas distinguem dois tipos de
analogia: a analogia por atribuição e a analogia por proporção, o que é irrelevante
para Lamartine. A pessoa jurídica é realmente uma pessoa e sua personalidade é
analógica à da pessoa humana, quer seja uma sociedade ou associação –
universitates personarum – quer seja uma fundação – universitates rerum.

63
CORREA DE OLIVEIRA, J. Lamartine Conceito da pessoa jurídica, cit., p. 164-165
42
Nessa questão, a lei tem um papel declaratório e não constitutivo, pois
encontra uma realidade preexistente a quem dá a segurança da garantia legal. A lei
reconhece os institutos e associações cujo ser e cuja estrutura correspondam ao de
uma pessoa jurídica.
Nas palavras de Lamartine, “o reconhecimento por parte do Estado da
personalidade jurídica apenas garante com o amparo do Poder Público uma
realidade ontológica preexistente ao reconhecimento”.
64
Edgar da Mata Machado, citado para fundamentar Acórdão do Tribunal
de Justiça mineiro, assegura que a noção de pessoa é mais extensa do que a de
homem. Entretanto, pode-se estabelecer uma equiparação entre o homem e a
pessoa jurídica:
“Há, pois, na pessoa jurídica tecnicamente considerada um momento
de ação: as pessoas jurídicas são, portanto, pessoa quanto ao modo
de agir; não são pessoa entitativamente, ou na ordem da essência,
da especificação, mas dinamicamente, ou na ordem da operação, do
exercício; dizemos da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos
Municípios, das associações, das fundações, das sociedades
mercantis, que são pessoas, na mesma acepção em que apelidamos
nosso Rui de "Águia de Haia", porque há uma semelhança de
relação que têm, respectivamente, os sujeitos referidos nos artigos
14 e 16 do Código Civil, com o termo (exercício da aptidão de ser
sujeito de direitos), e o objeto significado pelo conceito personalidade
jurídica (isto é, a própria aptidão de ser sujeito de direito considerada
em si mesma, não em seu exercício) com outro termo (o homem
que, pela sua natureza, é um todo moral, titular de direitos e
obrigações)”.
65
Transportados esses conceitos para o direito português, tem-se que a
"capacidade das pessoas colectivas abrange todos os direitos e obrigações
necessários ou convenientes à prossecução dos seus fins", exceto os "direitos e

64
CORREA DE OLIVEIRA, J. Lamartine Conceito da Pessoa Jurídica, cit., p. 169.
65
Cf. MACHADO, Edgar da Mata. Apud CARREIRA MACHADO. Apelação Cível nº 228.829-7, 2ª
Câmara Cível do TAMG, Araguari, Rel. Juiz Carreira Machado. j. 11.03.97, un., DJ 11.06.97.
43
obrigações vedados por lei ou que sejam inseparáveis da personalidade singular",
como preceitua o artigo 160º do Código Civil português
66
. A exegese da norma
portuguesa é clara que a pessoa jurídica não tem direito à integridade física e
psíquica, fenômenos biológicos inerentes ao ser humano, embora tenha direito à
honra (objetiva), ao sigilo, ao nome (marca) etc.
A possibilidade de compensação por danos não-patrimoniais - também
ditos morais, isto é, não susceptíveis de avaliação pecuniária - afigura-se, aliás,
particularmente relevante na matéria dos direitos de personalidade. O direito
português a prevê no número 1 do artigo 496º
67
, desde que os prejuízos configurem
juridicamente “dano moral”, arbitrando-se o pagamento de um valor encontrado
balisando-se o grau de culpabilidade do agente, a situação econômica deste e do
lesado, bem como as demais circunstâncias que envolvem a situação fática.
O mesmo – diga-se – sucede no direito pátrio, tanto na Constituição
Federal como nos tribunais, haja visto a edição da Súmula 227 do Superior Tribunal
de Justiça.
Mas lembra Mota Pinto, citado acima, que em situações de lesão de
direitos da personalidade, - sem reflexo no patrimônio do lesado -, o que ele chama
de “genuinamente não patrimoniais”, há que se perquirir da possibilidade de
compensabilidade das pessoas coletivas (ou jurídicas, na nossa terminologia), na
medida apenas da finalidade reparatória, sem considerar as medidas punitivas ou
sancionatórias da compensação.
Ressalta o juiz do Tribunal Constitucional de Portugal,
“que a resposta a esta questão pressupõe uma análise e
reavaliação, não só das finalidades da compensação do dano não
patrimonial, como das próprias componentes deste.

66
Artigo 160º 1. “A capacidade das pessoas colectivas abrange todos os direitos e obrigações
necessarios ou convenientes à prossecução dos seus fins”. 2. “Exceptuam-se os direitos e
obrigações vedados por lei ou que sejam inseparáveis da personalidade singular”.
67
Artigo 496º (Danos não patrimoniais). 1. Na fixação da indemnização deve atender-se aos danos
não patrimoniais que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito”. 2. “Por morte da vítima, o
direito à indenização por danos não patrimoniais cabe, em conjunto, …”. 3. O montante da
indemnização sera fixado equitativamente pelo tribunal, tendo em atenção, em qualquer caso, as
circunstâncias referidas no artigo 494o; no caso de morte, (…)”.
44
Designadamente, em muitos casos, tais danos, pressuporão
necessariamente um substrato físico ou psíquico para se poderem
logo manifestar - é o caso, por exemplo, dos sofrimentos ou dores
resultantes de uma ofensa a um direito de personalidade (julgo,
assim, que poderão manifestar-se nos associados, fundadores, etc.,
mas não directamente na pessoa colectiva)”
.
68
Claro está que a pessoa jurídica não pode arvorar-se no exercício de
direito subjetivo que não possui e, via de consequência, exercer pretensão material
quando a reparação corresponder à lesão a bens da vida como integridade corporal,
integridade psciológica etc. Não pode ser vítima de lesão estética, quando de ciatriz
gerada em intervenção cirúrgica por médico imperito; dano psicológico, como o
abalo emocional com a perda de um filho etc. São limitações de sua própria
natureza por faltar-lhe organismo pisicofísico. Tais circunstâncias, obviamente,
exigem que a pessoa seja dotada de um substrato físico, espiritual. Tanto que a
doutrina italiana tem uma categoria própria que resolveu denominar de dano
biológico quando o dano for dirigido a um desses coponentes da pessoa humana.
Para as outras hipóteses, denomina de dano pessoal, pois o dano moral na
legislação itlaina está atrelado a uma contravenção penal ou a um crime.
Como assevera Maria Helena Diniz,
“A pessoa jurídica pode exercer todos os direitos subjetivos, não se
limitando à esfera patrimonial. Tem direito à identificação, sendo
dotada de uma denominação, de um domicílio e de uma
nacionalidade. Logo, tem: a) direito à personalidade, como o direito
ao nome, à marca, à liberdade, à imagem, à privacidade, à própria
existência, ao segredo, à honra objetiva (RT, 776:195) ou à boa
reputação, podendo pleitear, se houver violação a esses direitos,
reparação por dano moral e patrimonial (RT, 776:195, 716:2703,
680:85, 627:28; STF, Súmula 227), atingindo sua credibilidade social,
idoneidade empresarial, potencialidade econômica, capacidade de

68
MOTA PINTO, Paulo Direitos de personalidade no Código Civil português e no novo Código Civil
brasileiro In Revista Jurídica n 313, p. 07.
45
produção de lucros, qualidade do fundo de comércio, clientela etc.
(CC, art. 52).
Sofre, contudo, limitações decorrentes de sua natureza, pois, não
sendo dotada de um organismo biopsíquico, falta-lhe titularidade ao
direito de família, ao parentesco e a outros que são inerentes ao
homem.
Também sofre limitações de norma jurídica, mesmo no campo
patrimonial, em virtude de razões de segurança pública”.
69
Geneviève Viney, ao interpretar o caráter “pessoal” de um dano
assegura que não se pode negar a reparação das violações aos interesses
coletivos, nem aos chamados danos por ricochete. Na verdade, embora essa
orientação se dirija ao ser humano, ela procura, mais e mais, combater as lesões
que atentem aos grupos ou categorias de pessoas.
Com apoio em Patrice Jourdain, Viney
70
refere-se à sociedade de
massa, na qual se está inserido e diz que a proteção dos interesses coletivos está
na ordem do dia. Evidente, - assevera -, que em um sistema jurídico evoluído, é
indispensável permitir aos indivíduos defender suas concepções morais, filosóficas,
religiosas e, mais generalizadamente, seus valores culturais contra campanhas que
os denigram.
José Rubens Morato Leite completa a assertiva com escólio nas
palavras de Fernando Noronha, que destaca a metamorfose da pessoa jurídica:
“O fato de a nova entidade social haver sido criada por via da ordem
jurídica não é óbice à constatação de que ela efetivamente é
realidade atuante no âmbito da sociedade global. É essa nova
realidade que o direito procura caracterizar, através do processo de
sua equiparação às verdadeiras (pessoas físicas). A equiparação é
um processo simples e efetivo de realizar a disciplina jurídica da
nova entidade, assegurando-lhes meios jurídicos que vão dar-lhe a

69
DINIZ, Maria Helena Curso de Direito Civil Brasileiro São Paulo: Saraiva, 2007. V. 1 p. 271
70
VINEY, Geneviève; JOURDAIN, Patrice. Traité de Droit Civil sous la direction de Jacques
Ghestin. Les Conditions de La Responsabilité. p. 95 n. 288.
46
possibilidade de realizar aqueles interesses humanos, quereres
individuais, quereres grupais, que são seu escopo”
.
71
Encerra-se o capítulo na pena de Pierre Kayser
72
, que, debruçando-se
sobre o tema, retrata que a pessoa moral (denominação escolhida pelo direito
francês) é hoje considerada como uma realidade, que é diferente da personalidade
jurídica da pessoa natural. As pessoas morais são investidas de direitos análogos
aos direitos da personalidade. Elas somente são privadas dos direitos da
personalidade nos quais a existência tem um liame necessário com a personalidade
humana.
O nome das pessoas morais não pode ser inteiramente assemelhado
ao das pessoas físicas ou naturais, que são impostos pela filiação, embora tenham a
mesma função. O nome designa e distingue as pessoas uma das outras, quer sejam
elas naturais quer sejam elas jurídicas. Entretanto, as pessoas morais podem alterá-
lo se assim convencionarem, sendo que, em princípio, o das pessoas naturais é
imutável. Sendo uma qualidade substancial de todas as pessoas, físicas ou morais.
tem essas o direito de defende-lo de usurpações.
73
Também existe um direito análogo ao direito de respeito à vida privada.
As pessoas morais tem uma vida “interior” distinta da vida “exterior” que deve ser
respeitada. Tanto que em França a Lei de 29 de julho de 1881 atribuiu-lhes direito
de resposta.
Para Kaiser
74
, como afirmado alhures, alguns direitos da personalidade
não podem ser estendidos às pessoas morais, e elas não se beneficiam de direitos
análogos, pois alguns direitos só existem em razão da pessoa humana. Exemplifica:
como o direito ao próprio corpo e o direito à imagem (aqui se referindo à imagem-

71
LEITE, José Rubens Morato Dano ambiental: do individual ao coletivo, extrapatrimonial. São
Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2003 p 288.
72
La protection des attributs moraux de la personnalité par le jeu de l’action en responsabilité n’a
pás été réservée aux seules personnes physiques. Les groupements personnalisés ont été em effet
admis à utilisier cette voi de droit pour proteger leur droit au nom ou pour faire condammer lês
auteurs de propôs, d’écrits ou d’actes tendant à ruiner leur réputation ou à porter atteinte à leur
image de marque”. Cf. KAYSER, Pierre. Les droits de la personnalité. Aspects théoriques et
partiques. “Revue Trimestrielle de Droit Civil. Année 1971 Tome 79 Paris, Sirey, 1971. p. 490 e 491.
73
KAISER, Pierre. Les droits de la personalité aspects théoriques et pratiques In Revue trimestrielle
de droit civil – Tome Soixante-neuvième Année Paris: Sirey, 1971 Biblioteca do TJ - p. 490 n. 35
74
KAYSER, Pierre Les droits de la personalité..., cit., p. 491 n. 35
47
retrato); também é o caso do direito moral de autor fundamentado na criação
intelectual da obra.
Cabe deixar consignado, - e aqui abre-se um parênteses - que não se
está confundindo os chamados direitos da personalidade com os direitos
fundamentais, já que não são expressões que se equivalem.
Os direitos fundamentais – que tanto abarcam as pessoas físicas como
as jurídicas – são situações jurídicas travadas entre o cidadão e o Estado, estando
inseridos na Constituição. Já os chamados direitos da personalidade subordinam-se
a outro regime jurídico. Emprestam-se as conclusões de José de Oliveira
Ascenção
75
que, em evento realizado em Belo Horizonte, criticou positivamente o
então Projeto do Código Civil.
Na sua visão, o Projeto previa apenas alguns direitos da personalidade,
deixando para a Constituição, talvez, a disciplina tanto dos direitos fundamentais
como aqueles últimos. Contudo, são coisas distintas. Os direitos da personalidade
“são aqueles direitos que exigem em absoluto reconhecimento, porque exprimem
aspectos que não podem ser desconhecidos sem afectar a própria personalidade
humana. O acento dos direitos fundamentais é diferente”.
76
Não dizem apenas respeito à pessoa física, tendo como norte a
estruturação constitucional, regulando as relações jurídicas entre Estado e cidadão.
De modo que muitos dos direitos fundamentais não são direitos da personalidade e
vice-versa. Para o autor, a multiplicação do número dos direitos fundamentais
demonstra a sua banalização, assim como retrata seu enfraquecimento.Os direitos
entram em conflito entre si, limitando-se reciprocamente, de maneira que novos
direitos de justificação duvidosa, acabam por limitar alguns direitos fundamentais,
preexistentes”.
77

75
ASCENÇÃO, José de Oliveira. Direitos humanos e direitos da personalidade
<http://www.fd.ul.pt/Portals/0/Docs/Institutos/ICJ/LusCommune/AscensaoJoseOliveira10.pdf>.
Acesso em 19.10.09 p. 9
76
ASCENÇÃO, José de Oliveira. Direitos humanos..., cit., p.11.
77
ASCENÇÃO, José de Oliveira, Direitos humanos..., cit., p 14.
48
Por força do lobby de algumas categorias profissionais e políticas junto
ao Poder Legislativo nacional, acresceram-se direitos ao rol do artigo 5º da
Constituição Federal, muitos que não são, obviamente, direitos fundamentais nem
direitos da personalidade e que poderiam – deveriam – ser objeto de
regulamentação infraconstitucional. Aponta José Oliveira Ascenção
78
que “só pode
ser considerado direito da personalidade aquele direito que encontrar fundamento
ético na personalidade humana” e, assim, merecer um regime especial que o
distinga dos demais. Entretanto, quando guardam correspondência com um direito
fundamental, beneficiam-se do regime jurídico deste, usufruindo dos princípios
constitucionais como o da aplicação imediata (artigo 5º , parágrafo 1º da
Constituição Federal); da defesa penal contra qualquer discriminação atentatória dos
direitos e liberdades fundamentais (artigo 5º, inciso XLI da Constituição Federal) .
Firma-se hoje o entendimento de que os direitos fundamentais são os
direitos humanos positivados nas constituições. São os direitos imprescindíveis à
efetivação da dignidade humana, princípio que está no portico de nossa Carta Maior.
Ingo Wolfgang Sarlet deixa claro que a Constituição de 1988 tem
caráter analítico, - embora não seja taxativa -, revelando certa desconfiança do
Constituinte para com o legislador infraconstitucional, pelo que salvaguarda um
extenso número de direitos fundamentais, na sua maioria desmembramentos do
princípio da dignidade humana. São 78 incisos acoplados ao artigo 5º que, por ser
um elenco quase exaustivo, passa a conferir certo “desprestígio” desses direitos
ditos fundamentais.
Direitos fundamentais são, na sua definição,
“todas aquelas posições jurídicas concernentes às pessoas, que, do
ponto de vista do direito constitucional positivo, foram, por seu
conteúdo e importância (fundamentalidade em sentido material),
integradas as texto da Constituição e, portanto, retiradas da esfera
de disponibilidade dos poderes constituídos (fundamentalidade
formal), bem como as que, por seu conteúdo e significado, possam
lhe ser equiparados, agregando-se à Constituição material, tendo, ou

78
ASCENÇÃO, José de Oliveira, Direitos humanos..., cit., p 14.
49
não, assento na Constituição formal (aqui considerada a abertura
material do Catálogo)”.
79
Tais direitos fundamentais, como não poderia deixar de ser, estão
suscetíveis à ação do tempo, do espaço, de questões sociais, políticas etc. De modo
que como não se pode prever todos os riscos que podem atingir a pessoa, também
não é possível limitar taxativamente o elenco desses direitos.
Merece aplauso a inclusão no Código Civil de 2002 de um capítulo
versando sobre os direitos da personalidade por ser a pessoa humana o núcleo do
arcabouço jurídico. Equivale a dizer que se legitimou, na esfera privada, o que havia
sido reconhecido na esfera pública, consagrando-se os direitos do homem, -
notadamente o princípio da dignidade humana -, também no ambiente civilista.
Estabeleceu-se uma verdadeira cláusula geral da tutela da
personalidade, garantindo-se à pessoa uma vida digna em toda a sua extensão, com
respeito à integridade física, a identidade, a intimidade, a honra etc.
Em palestra proferida no Congresso Brasileiro de Direitos
Fundamentais sediado nas Alagoas em 2004, ou seja, um ano após a vigência do
novo Código Civil, Nancy Andrighi
80
dissertou, com muita técnica, acerca do
reconhecimento dos direitos fundamentais nas decisões pelo Superior Tribunal de
Justiça e sua aplicação direta nas relações jurídico-privadas, ressaltando que esse
tipo de intervenção, ainda mais na seara do Direito Civil, sempre foi repudiado em
nome do princípio da autonomia privada. A aplicação direta dos direitos
fundamentais nas relações entre particulares também, sob a ótica de alguns,
fragiliza a autonomia da vontade em favor do Estado-Leviatã.
Com propriedade, Nancy Andrighi aponta a necessidade da quebra
desse paradigma, pois na busca da solução de conflitos submetidos ao Estado-juiz,

79
SARLET, Ingo Wolfgang. A eficácia dos direitos fundamentais. Porto Alegre, Livraria do
Advogado, 2003. p. 91.
80
ANDRIGHI, Nancy. O STJ e os direitos fundamentais. Ministra do Superior Tribunal de Justiça.
Palestra proferida no Congresso Brasileiro de Direitos Fundamentais, Maceió-AL, 8 de dezembro de
2004. Disponível em <http://bdjur.stj.gov.br> Acesso em 20.09.2009.
50
a estrutura piramidal criada por Kelsen permite a aplicabilidade direta dos comandos
constitucionais, sem subverter-se a ordem jurídica.
A Alemanha foi a precursora do rompimento de fronteiras entre os
diversos ramos do direito, admitindo a eficácia imediata ou direta dos preceitos
constitucionais na seara do direito civil. É, para Nancy Andrighi, a “derrocada” do
pensamento arcaico de que os direitos fundamentais se resumem a direitos
subjetivos públicos contra o poder público.
As chamadas normas fundamentais não são mais elencadas como
princípios informadores, - normas programáticas -, mas cada vez mais são aplicadas
diretamente pelos juízes como esteio legal nas relações cidadão-cidadão.
Trilhando esse caminho, o Superior Tribunal de Justiça na missão
perfilhada no inciso III do artigo 105 da Lei Maior, aplica de forma oblíqua os
dispositivos relativos aos direitos fundamentais dando coloração mais viva à carga
de eficácia das normas infraconstitucionais para por fim aos conflitos, menciona
Andrighi.
Nesse artigo, a autora aponta os avanços do tribunal na pacificação
social sempre tendo como norte a dignidade humana. Os direitos e garantias
fundamentais tem sido sustentáculo para decisões do Superior Tribunal de Justiça
em matéria de direito de família e de responsabilidade civil, ratificando a tese de que
a pessoa jurídica também pode sofrer dano moral, desde que sua imagem possa ser
abalada no mercado, e constatada a depreciação da marca comercial pelo ato ilícito
de outrem, o dano moral ocorre ipso jure, não precisando ser provado.
A realidade social atual põe em evidência a responsabilidade civil,
alargando seus horizontes na proteção integral à pessoa, seja ela física ou jurídica.
Como afirma Caio Mário da Silva Pereira: “não importa se o fundamento é a culpa,
ou se é independente desta. Em qualquer circunstância, onde houver a
subordinação de um sujeito passivo à determinação de um dever de ressarcimento,
aí estará a responsabilidade civil”.
81

81
PEREIRA, Caio Mário da Silva. Responsabilidade civil. 8ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 1996. p.
11.
51
Fatores múltiplos decorrentes do desenvolvimento científico e
tecnológico, em particular dos meios de comunicação, promovem uma série de
interferências na vida privada das pessoas, como por exemplo, a divulgação de
dados sigilosos ou pessoais pela Internet, sem qualquer filtro.
82
Os abusos dessas situações de fato criadas pela “era da informática”
devem e precisam ser coibidas e prevenidas pelo Estado, daí a importância da
responsabilidade civil.
Flávio Tartuce, escrevendo sobre o novo Código Civil, revela a
alteração principio lógica do direito privado que busca valorizar a “eticidade”, a
“solidariedade” e a “operabilidade”. Reconhece a nova ordem os valores éticos em
todo o direito privado, abandonando o formalismo, sendo que o intérprete, ao
preencher as “janelas abertas”, terá mais amplitude não podendo deixar de lado a
proteção da boa-fé, da moral, da ética e dos bons costumes.
Nesse diapasão, o princípio da socialidade tem como meta suplantar o
caráter individualista do Código Civil de 1916 de modo que deverá prevalecer o
social sobre o individual, o coletivo sobre o particular, a pessoa sobre o patrimônio, a
vida sobre a economia. Sendo que o princípio da operabilidade tem por meta colocar
fim às sinonímias que possam dar lugar a dúvidas.
Tartuce assegura que “até mesmo a responsabilidade civil tem a sua
função social”.
83
Esse é o enfoque sob o qual será desenvolvida a problemática do
presente estudo.

82
Recentemente veiculou-se notícia de que os dados particulares de 12 milhões de candidatos ao
exame no ENEM foram disponibilizados indevidamente (sem autorização) na Internet. A
responsabilidade pela divulgação do RG, CPF e filiação dos candidatos foi imputada à “fragilidade
do sistema” que permitiu o acesso geral ao sítio da empresa organizadora do exame. Há ainda
mecanismos de divulgação de dados pessoais como facebook; twitter; youtube; orkut; blogs etc.
83
TARTUCE, Flávio. Função social dos contratos do Código de Defesa do Consumidor ao Código
Civil de 2002. (Coleção Prof. Rubens Limongi França). São Paulo: Método, 2007. p. 64.
52
CAPÍTULO II - RESPONSABILIDADE CIVIL: NOÇÕES GERAIS
2.1. – A responsabilidade civil em geral.
Louis Josserand, lecionando então na Faculdade de Direito de Lyon,
conta que ao tempo em que era estudante, o seu professor de direito civil tratava da
responsabilidade civil em uma só lição e pobres eram os repertórios de
jurisprudência.
Ao narrar o fato, lá pela década de 1940, diz que dez ou doze lições
apenas eram suficientes para o professor dar uma “ideia” do assunto, ou seja,
transpondo-se a afirmativa para atualidade, tem-se que a responsabilidade civil se
tem elevado ao primeiro plano da atualidade judiciária e doutrinária: “é a grande
sentinela do direito civil mundial; é a primeira entre todas”.
84
Arrisca-se afirmar que é o instituto jurídico que mais transformações
sofreu ao longo do tempo, tendo contribuído para essa metamorfose o fenômeno da
socialização. O dano sentido por um indivíduo acomete todo o conjunto social. É voz
corrente a força social que a responsabilidade civil angariou nesses últimos séculos,
pois nada mais injusto – aos olhos de toda a sociedade - do que deixar desamparado
aquele que foi lesado.
O papel do Estado é garantir aos seus súditos a convivência pacífica, a
vida com dignidade, sobretudo por não deixar impune os ofensores, aqueles que
cometem ilícitos sejam penais, sejam civis. Uma sociedade justa é a que torna eficaz
(eficiente) o comando contido nas normas que integram o ordenamento jurídico, não
permitindo à vítima do ato ilícito ficar indene.
Talvez resida aí a motivação para se debruçar sobre o tema que,
surrado de tanta discussão, guarda a beleza de despertar a curiosidade dos que
pensam o direito.

1. JOSSERAND, Louis Evolução da Responsabilidade Civil. Conferência pronunciada em
Faculdades de Direito e Institutos de Lisboa, Coimbra, Belgrado, Bucarest – Publicada na Revista
Forense, junho, 1941 p. 52.
53
Detecta Josserand que a primeira causa do avanço da responsabilidade
é de ordem social: quanto mais perigosamente se vive, quanto mais desprovido de
segurança material se está, mais e mais se aspira à segurança jurídica.
Há que se ter sede de justiça, isto é, de equilíbrio jurídico, ninguém se
conforma com os acidentes sem responsáveis, quando – antigamente -
desconhecido o autor do dano, logo se resolvia a situação responsabilizando-se a
divindade, imputando a responsabilidade ao act of God, damnum fatale.
Contudo, não são aceitos os golpes do destino. Procura-se sempre um
culpado, um responsável pelo infausto acontecimento. Não há como se aquietar
diante das injustiças, talvez como resultado cultural ou até da evolução da
civilização; nesse passo acelerado, em que se busca a garantia dos direitos e a
justiça das instituições, caminha a responsabilidade civil.
Hoje talvez a realidade seja, até mesmo, o inverso: a necessidade de
um semestre todo dedicado à responsabilidade civil nas aulas de direito civil e o
crescimento assustador das demandas judiciais, fazendo da chamada indústria do
dano moral a banalização da árdua conquista da doutrina e da jurisprudência. Basta
uma vista de olhos ao número de ações dessa espécie nos Estados Unidos e vários
casos emblemáticos de indenizações exacerbadas, como aquele da senhora idosa
que se queimou com o café no McDonalds recebendo uma indenização de 2.7
milhões de dólares, tal a efetividade dos chamados punitive damages.
Maria Cecília Bodin de Moraes ressalta que a “principal crítica que
sofrem os danos punitivos nos Estados Unidos é a sua completa imprevisibilidade,
para alguns um verdadeiro ‘desvario’”, havendo casos que “beiram o anedotismo e
fazem a alegria dos estudantes de responsabilidade civil”.
85
Em excelente pesquisa acerca das decisões americanas, em que os
jurados (e não o juiz) fixam o valor do dano moral, muitas vezes em valores
astronômicos – mesmo para os padrões da sociedade americana (gross damages) -
ressalta a doutrinadora que eles

85
MORAES, Maria Cecília Bodin Danos à pessoa humana. Uma leitura civil-constitucionais dos
danos morais. Rio de Janeiro: Renovar, 2003 p. 229.
54
“não discernem a função retributiva da função preventiva,
embasando o seu julgamento exclusivamente no índice de gravidade
da conduta ilícita, negligenciando o aspecto da prevenção. Se a
prevenção, e não a retribuição, é o objetivo adequado dos danos
punitivos, a função poderia ser delegada a especialistas, peritos,
experts no assunto submetido ao Judiciário, capazes de criar
critérios claros para os juízes. Para evitar abusos, muitos Estados
americanos estabeleceram tetos legais para a indenização”.
86
Não se pode esquecer aqui de fazer referência ao posicionamento da
Corte alemã, ao deixar de cumprir uma sentença americana, instada a se pronunciar
na década de 1990, trazido por Maria Cecília Bodin de Moraes:
“A função pedagógica dos danos punitivos não pode ser equiparada,
de modo nenhum, à satisfação presente na reparação do dano
moral, porque a ratio de ambos é distinta: enquanto o dano moral
tem uma função compensatória, o instituto anglo-saxão tem como
função principal a punição do responsável pelo dano e,
secundariamente, a constituição de prevenções em relação ao autor
e à sociedade como um todo. (...) A punição e a função de
prevenção são expressões de princípios da responsabilidade
penal”.
87
Concluindo que “ao se adotar o caráter punitivo, deixando-o ao arbítrio
unicamente do juiz, corre-se o risco de violar o multissecular princípio da legalidade,
segundo o qual ‘nullum crimem, nulla poena sine lege’”. Mas, não é só. As garantias
processuais, como a maior acuidade quanto ao ônus da prova, (verdade real) além
das garantias substanciais que são prestadas no juízo criminal, não estão colocadas
à disposição das partes na seara civil, ainda mais quando a demanda tem
fundamento na responsabilidade objetiva com, inclusive, a inversão do ônus da
prova.
A autora argumenta que a função punitiva não tem, na verdade, tido o
alcance que se pretendeu, inclusive no sistema anglo-saxão, um suposto caráter

86
MORAES, Maria Cecília Bodin de Danos à pessoa humana..., cit., p. 247.
87
MORAES, Maria Cecília Bodin de Danos à pessoa humana..., cit., p. 256.
55
pedagógico (ou preventivo). Representa, “não há como negar, um forte incentivo à
malícia, além de gerar a mercantilização das relações existenciais”.
88
A atuação do Estado-juiz socorre o lesado na busca do ressarcimento
dos prejuízos sofridos ante o princípio neminen laedere, recompondo-se o patrimônio
ao status quo ante como se não tivesse havido dano. Mas a história da civilização
remete ao tempo da vingança coletiva, ao tempo da justiça individual, levada a cabo
pela própria vítima e através de suas mãos, no “olho por olho” da Lei de Talião, até o
advento da Lex Aquilia de damno, ao trazer a ideia de reparação pecuniária,
impondo ao patrimônio do causador do dano, o ônus da reparação. O fundamento da
responsabilidade residia na culpa, fosse a conduta comissiva ou omissiva do agente.
Com o advento da sociedade de massa, surgiu a necessidade de
alterar-se o fundamento da responsabilidade civil que se afasta da ideia de culpa
para a responsabilidade dita “objetiva”, diante do risco da atividade. Comprovado o
nexo de causalidade entre a conduta lesiva e o prejuízo (dano), responderá o agente,
sem perquirir o elemento subjetivo: a culpa em qualquer uma de suas modalidades
(negligência, imperícia e imprudência), à exemplo do Código de Defesa do
Consumidor, do artigo 932, incisos I a V do Código Civil, do artigo 37 parágrafo 6º da
Constituição Federal e outras leis especiais.
Entretanto, a evolução mais expressiva no campo da responsabilidade
civil, conquista árdua da jurisprudência, foi a possibilidade de indenizar o dano
moral.
Afastados os argumentos contrários, desde o emblemático caso
relatado pelo Ministro do Superior Tribunal de Justiça, Raphael de Barros Monteiro
Filho, julgado em 1915 pelo Supremo Tribunal Federal, na apreciação do Agravo n.
1.723 em que se discutia a liquidação dos danos decorrentes do falecimento de
chefe de família em acidente ferroviário.
89
A pretensão da indenização foi deferida
quanto aos danos materiais, mas afastada a compensação do dano moral, sob o
argumento de extravagância do espírito humano pretender tal paga em dinheiro,
vencido o Ministro Pedro Lessa que, evocando Rui Barbosa, decidia pela

88
MORAES, Maria Cecília Bodin de Danos à pessoa humana..., cit., p. 261.
89
Acórdão publicado na Revista Forense vol. XXV, p. 73–77.
56
procedência do pedido, fundamentando seu voto de que na expressão dano (contida
na lei) estava implícito tanto o dano moral como o material.
90
Essa é a ideia defendida por José Aguiar Dias: a de que o conceito de
dano é único, e corresponde a lesão de direito. Os efeitos do dano é que podem ser
patrimoniais e não patrimoniais. Para ele, “o dano moral é o efeito não patrimonial da
lesão e não a própria lesão, abstratamente considerada”.
91
A injúria, por exemplo,
pode causar – ou não - efeitos patrimoniais e não patrimoniais. Mas o dano é uno, e
não se discrimina em patrimonial e não patrimonial em atenção à origem, mas aos
efeitos.
92
Clóvis Beviláqua buscava o fundamento no artigo 76 do Código Civil de
1916; Caio Mário da Silva Pereira assegurava, por seu turno, que a correta exegese
do artigo 159, do então diploma legal civil, já abarcava a possibilidade. Outros ainda,
como o Desembargador Yussef Said Cahali, enxergavam a reparação do dano
moral no artigo 1.537 também do mesmo Código.
93
Mas reluta a jurisprudência, mesmo frente ao disposto nos incisos V e
X do artigo 5º da Constituição Federal, nos artigos 186, 927 e artigo 52 do Código
Civil, a admitir o direito da pessoa jurídica a obter a reparação do dano moral sofrido
em determinadas situações, e, em especial, o da pessoa jurídica de direito público.
Talvez tal atitude decorra da falta de um conceito uniforme de dano moral, embora
reconhecido pelo autor do Código Civil de 1916, ilustre Clóvis Beviláqua.
Indaga-se – e essa é a tônica – se a questão não merece uma
interpretação mais condizente com o quadro social vigente e com o panorama
cultural que se descortina. Mesmo porque o conceito de responsabilidade civil
alargou-se, ganhando mais força social e mais consistência no ordenamento jurídico,

90
MONTEIRO FILHO, Raphael de Barros. Indenização por dano moral: evolução da jurisprudência.
Brasília, DF, 30 mar. 1995. Disponível em: <http://www.stj.gov.br/
webstj/ministros/discurso_internet.asp?Minis=0001089>. Acesso em: 24 nov. 2006.
91
DIAS, José de Aguiar. Da responsabilidade civil. 11 ed. Revista e atualizada de acordo com o
Código Civil de 2002, e aumentada por Rui Berford Dias. Rio de Janeiro: Renovar, 2006. p. 1.002
92
DIAS, José de Aguiar. Da responsabilidade civil, cit., p. 1.006
93
MONTEIRO FILHO, Raphael de Barros. Indenização por dano moral: evolução da jurisprudência.
Brasília, DF, 30 mar. 1995. Disponível em: <http://www.stj.gov.br/
webstj/ministros/discurso_internet.asp?Minis=0001089>. Acesso em: 24 nov. 2006.
57
até mesmo com sua previsão na Constituição Federal, com a alteração de
paradigma, resultante da própria socialização do direito civil, como acima
mencionado na doutrina de Flávio Tartuce.
Não seria um retrocesso – como ao tempo em que se deixava a vítima
do dano moral desamparada porque sentimentos de dor, sofrimento e honra eram
inestimáveis financeiramente – negar à pessoa jurídica a composição do dano
moral? A causa geradora da responsabilidade civil não é o interesse em restabelecer
o equilíbrio econômico-jurídico alterado pelo dano? Não é o de compelir o ofensor à
reparar o dano sofrido pela vítima, mesmo porque a dificuldade na avaliação
econômica não pode apagar a realidade do dano?
Não há como se contestar que toda a pessoa, quer natural quer
jurídica, é dotada de um patrimônio moral que deve e merece ser protegido. Usa-se
como forte argumento, a perplexidade do imortal, Pontes de Miranda, visionário para
sua época: “que mal-entendida justiça é essa, que dá valor ao dano imaterial ligado
ao material e não dá valor ao dano imaterial sozinho”?
94
Não é justo, exclama Pontes de Miranda, que “nada se dê, sòmente por
não se poder dar o exato”
2.2. – Da ação e omissão; do dano e do nexo de causalidade.
Pode-se afirmar que é da etiologia da responsabilidade civil a presença
de três requisitos: ação/omissão culposas (violação a um direito); dano e nexo de
causalidade.
95
Esses requisitos devem ter relevância jurídica para exsurgir o direito à
indenização, ou melhor, a conduta ou a omissão devem “interessar” para o direito a

94
Pontes de Miranda trata nesse capítulo de sua obra acerca do dano não-patrimonial e mostra-se
indignado com a recusa dos tribunais em indenizar o dano moral quando não há repercussão
patrimonial. Cf. MIRANDA, Francisco Cavalcante PONTES DE. Tratado de direito privado. Rio de
Janeiro, Borsoi, 1972. Tomo LIII, § 5.509, p 229.
95
TAVARES DA SILVA,Regina Beatriz Responsabilidade civil: responsabilidade civil na área de
saúde. São Paulo: Saraiva, 2007 (Série GVlaw) p 59.
58
fim de merecer proteção. Como, por exemplo, há condutas humanas que, embora
causem prejuízo, não dão ensejo à reparação. Da mesma forma, o dano não se
traduz em um menoscabo patrimonial ou espiritual qualquer, uma vez que o simples
incômodo não pode ser equiparado ao que a doutrina chama de dano moral. O
nexo, por sua vez, é o necessário liame de causalidade entre a conduta comissiva
ou omissiva do agente e o dano à vítima.
Ausentes esses requisitos, não há obrigação de indenizar.
Para o presente relato – e para que não se estenda em demasia – a
conceituação de dano e seu desdobramento em dano moral e patrimonial é
necessária para a fixação dos pontos controvertidos que se seguirão.
A questão principal hoje, como ressalta Sérgio Cavalieri Filho, não é
saber se o dano moral é indenizável ou não, mas justamente o que vem a ser dano
moral. Este é, na verdade, o ponto de partida para se equacionar todas as questões
relacionadas com o dano moral.
96
Assim, passa-se a apresentar o conceito de dano. Por dano material ou
patrimonial entende-se a diminuição causada no patrimônio de alguém decorrente
da ação ou omissão, culposa ou não, de outrem. Há, assim, um menoscabo nos
bens materiais que a vítima havia amealhado ao longo de sua existência, ou seja, há
uma diminuição patrimonial. O indivíduo, antes de sofrer o dano, possuía 100.
Agora, lesado seu patrimônio, passa a ter 50.
Mas muitas vezes, há perdas que não são materiais, não influindo na
higidez do patrimônio amealhado e aí se está diante do dano imaterial,
extrapatrimonial ou moral.
A doutrina costuma definir o chamado dano moral, imaterial ou
extrapatrimonial (equiparando as nomenclaturas) por exclusão: o prejuízo não
patrimonial; uma lesão ao patrimônio imaterial do sujeito; um agravo que não produz
qualquer efeito econômico, ou seja, tem existência independente do patrimonial,

96
CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de responsabilidade civil. 5. ed. rev., aum. e atual. São
Paulo: Malheiros, 2003 p. 79.
59
convencionando-se chamar de “dano moral puro”, por não ser simples reflexo ou
consequência do prejuízo patrimonial.
Mas ainda hoje não há um conceito uniforme como traçado alhures em
breve referência acerca da evolução da responsabilidade civil, sendo que para
alguns, o dano moral é a violação de um direito da personalidade e, para outros, o
dano moral é o dano que decorre dos efeitos da lesão.
O Bürgerliches Gesetzbuch (BGB) alemão cuida do dano imaterial por
exclusão, como aquele prejuízo que não é patrimonial, prevendo uma indenização
em caso de ofensa (violação) ao corpo, à saúde e à liberdade ou à preferência
sexual. Pode o prejudicado pelo dano reclamar eine billige Entschädigung¸ ou seja,
uma indenização módica, percebendo-se a preocupação em não se desvirtuar a
finalidade da reparação, que não poderá jamais ser fonte de enriquecimento sem
causa.
As definições doutrinárias, em regra, correlacionam o dano moral ao
sofrimento humano decorrente da lesão ao patrimônio ideal da pessoa. Mas não é
qualquer sofrimento que acarreta dano moral.
A jurisprudência também tem acolhido as teses desenvolvidas pelos
juristas para quem os transtornos enfrentados no cotidiano não caracterizam dano
moral, elevando o conceito a um patamar valorativo significativo sob pena de
inviabilizar-se a convivência social.
97

97
1. “Ação de indenização por danos morais – Multa de trânsito – Digitação de placa errada –
Improcedência do pedido decretada em primeiro grau – Decisório que merece subsistir – Hipótese
em que não restou demonstrada efetivamente maiores conseqüências psíquicas ou emocionais na
vida do promovente em decorrência do fato descrito na inicial – Episódio narrado, outrossim, que
carece de potencialidade para afetar direitos da personalidade, como honra e imagem, a ponto de
acarretar abalo psicológico e/ou psíquico relevante – Negado provimento ao recurso.” (v.u., TJSP,
Apelação 620.785-5/0-00, rel. Des. Rubens Rihl) e 2. “Apelação cível. Responsabilidade civil. Poder
Público. Responsabilidade objetiva. Danos morais. Não configuração. Meros aborrecimentos. (...) 4.
O único incômodo que teve o autor foi de, intimado da penhora, esclarecer, nos autos da execução,
que não se tratava do devedor. No mais, e justamente pelo fato de não ter sido o ora autor o réu da
ação de execução, não sofreu qualquer tipo de restrição típica daquela espécie de demanda. 5.
Inocorrente o dano moral. Qualificam-se as circunstâncias do caso concreto como meras
contrariedades a interesses pessoais dos autores, normais dentro do grupo social em que se
inserem. As pequenas contrariedades da vida, os dissabores, aborrecimentos, não são tidos como
causa de indenização econômica. Se assim fosse, inviabilizar-se-ia a convivência social. Não
bastam meros aborrecimentos a embasar pedido de indenização por danos morais.
Responsabilidade civil não configurada. Desprovido o apelo do autor e provido o apelo do réu.
Unânime.” (v.u., TJRS, Apelação 7001648332, Des. Helena Medeiros Nogueira).
60
Sérgio Cavalieri Filho, ao discorrer sobre a configuração do dano
moral, com a simplicidade de quem debruçou-se detidamente sobre o tema,
assegura que o dano moral é, à luz da Constituição vigente, nada mais do que
agressão à dignidade humana.
“Que consequências podem ser extraídas daí? A primeira diz
respeito à própria configuração do dano moral. Se dano moral é
agressão à dignidade humana, não basta para configurá-lo qualquer
contrariedade”.
(...)
“Nessa linha de princípio, só deve ser reputado como dano moral a
dor, vexame, sofrimento ou humilhação que, fugindo à normalidade,
interfira intensamente no comportamento psicológico do indivíduo,
causando-lhe aflições, angustia e desequilíbrio em seu bem-estar”.
(....)
“Dor, vexame, sofrimento e humilhação são conseqüência, e não
causa. Assim como a febre é o efeito de um agressão orgânica, dor,
vexame e sofrimento só poderão ser considerados dano moral
quando tiverem por causa uma agressão à dignidade de alguém”.
98
Em recente decisão monocrática, Emílio Migliano Neto
99
, sensível ao
crescente número de ações de indenização envolvendo o Poder Público e
fundamentadas na responsabilidade objetiva do artigo 37 parágrafo 6º da
Constituição Federal, ressalta, em frase de efeito, ser “inadmissível a pausteurização
dos danos morais, com iniciais cujas causas de pedir são manifestamente
deficientes”. Ressalta que pedidos sem lastro comprobatório suficiente, banalizam a
conquista fundamental da indenização por danos extrapatrimoniais e se convertem
em instrumento de voracidade de quem nada sofreu, mas antevê a possibilidade de
obter algum ganho com determinado ato ilícito.
Exsurge aí a sensibilidade do julgador em delimitar a abrangência do
conceito de dano moral ou extrapatrimonial e a real exegese do artigo 5º incisos V e
X da Constituição Federal e dos artigos 186 e 927 do Código Civil.

98
CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de responsabilidade civil. São Paulo: Atlas, 2008. p. 83-84.
99
7ª Vara da Fazenda Pública do Estado de São Paulo ação ordinária autos 053.08.113729-6
61
Mas não basta a configuração do dano e a conduta ou omissão
culposas para que o lesado faça jus à indenização. Há a necessidade de se
estabelecer um liame de causalidade entre o dano e a conduta lesiva. Se não
houver nexo causal, o suposto causador do prejuízo não poderá ser acionado a
repará-lo.
De modo que o nexo causal é elemento essencial da etiologia da
responsabilidade civil. Não se olvidando, entretanto, que em certas circunstâncias há
o rompimento da cadeia causal, quer por ato de terceiro, que interfere na trajetória
da ação; quer pela ocorrência do caso fortuito e da força maior, que por serem fatos
imprevisíveis ou inevitáveis, impedem a responsabilização do agente causador do
dano.
Há situações ainda em que o ato, embora cause dano a outrem, não
enseja responsabilização do ofensor, como nas hipóteses do artigo 188 do Código
Civil, pelo exercício regular de um direito.
100
2.3. – Da indenização e a questão do critério da quantificação e da prova do
dano.
Indenizar significa restabelecer a vítima do dano ao status quo ante
como se não tivesse sofrido mal algum. Claro está – e aqui cabe um parênteses –
que se deve evitar o enriquecimento sem causa, vedado pelo artigo 884 do Código
Civil, recompondo-se o patrimônio do lesado na exata medida em que ocorreram os
danos emergentes e os lucros cessantes, pois a indenização mede-se pela extensão
do dano, como preceitua o artigo 944 do Código Civil. A recomposição é feita se os
danos forem efetivamente comprovados no curso do processo de conhecimento em

100
O artigo 188 diz que não constituem atos ilícitos aqueles praticados em legítima defesa ou no
exercício regular de um direito reconhecido; a deterioração ou destruição da coisa alheia, ou a
lesão à pessoa, a fim de remover perigo iminente.
62
que as partes tem o ônus de provar, além do fato, do ato/omissão culposas e o liame
causal, a extensão dos seus prejuízos.
101
O Código Civil traz, em alguns dispositivos, critérios para a
quantificação da indenização, como os preceitos dos artigos 945, 946, 948, 949, 950,
951, 952 e 953, não olvidando a recomposição “in natura” (artigo 947).
A reparação do dano patrimonial não causa perplexidade, pois basta a
prova dos danos emergentes e dos lucros cessantes. Deve o lesado demonstrar,
através de notas-fiscais, as despesas que teve com o conserto da coisa; através de
perícia, o fato danoso e a extensão dos prejuízos causados como, por exemplo, as
consequências das águas que inundaram imóvel de sua propriedade; por meio de
testemunhas, em contratos cujo valor está abaixo de 10 salários mínimos etc. Se
deixou de auferir lucro, já que impedido de exercer a atividade ou trabalho de onde
provinha sua subsistência, faz jus à recomposição patrimonial e a prova dar-se-á da
mesma forma, permitindo-se, no processo judicial para apuração dos danos e sua
extensão, a liquidação por arbitramento ou por artigos.
A dificuldade reside não só na prova da existência do dano moral como
na sua extensão. Até que ponto, o abalo psicológico com o rompimento de um
noivado, causa dano moral, sem que se avalie o estado emocional da vítima, mesmo
porque cada ser humano reage de forma diversa diante dos fatos da vida.
Para uns, uma cicatriz em local não visível do corpo é motivo para
cobri-la sempre, deixando de usar trajes de banho, ir à praia etc. Para outros, mesmo
um defeito na face, que pode provocar a repulsa de muitos, em nada influi no
convívio social, não abalando sua auto estima. De forma que é difícil para o julgador,
diante de um caso concreto, avaliar a justa indenização. As máximas da experiência
muitas vezes não permitem uma correta percepção da extensão dos danos morais
por ser extremamente subjetiva. Tanto que na fixação do quantum do dano moral,
vale-se o magistrado da equidade e dos princípios gerais do direito (conjugando-se
os artigos 4o e 5o do Decreto-lei 4.657/42, Lei de Introdução ao Código Civil),
devendo pautar-se pelos critérios da razoabilidade e da proporcionalidade, pois a

101
Cf. Recurso Especial 30.583/SP – STJ.
63
finalidade reside na compensação do mal sofrido pela vítima, não podendo servir
para enriquecê-la às custas da sua própria dor.
Para o Desembargador do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul,
Paulo de Tarso Vieira Sanseverino, a equidade é um instituto bastante antigo,
mediante o qual se busca alcançar a justiça no caso concreto. Claro está, a seu ver,
que a aplicação pura e simples da equidade pode acarretar situações iníquas. O que
o magistrado pode contornar evitando o excesso de subjetivismo. O artigo 944 do
Código Civil, em especial o parágrafo primeiro, dá ao juiz a possibilidade de valorar
outras circunstâncias que permeiam o fato danoso, levando em conta o grau de
culpa do agente causador do dano, sua situação econômica, a situação econômica
da vítima, a dignidade da pessoa humana etc.
102
Ademais, o dano material e o dano moral podem ocorrer em uma
mesma situação, reconhecendo-se à vítima a possibilidade de cumular o pedido de
reparação, desde que provado o prejuízo.
Em caso de pedido de indenização deduzido por anistiado político, por
exemplo, que, na época da Ditadura, era empregado da então estatal Companhia
Siderúrgica Nacional e foi preso distribuindo folhetos de propaganda partidária da
Juventude Operária Católica do qual era militante. O SNI considerou tal atividade
como prática subversiva e o indivíduo perdeu seu emprego e seus direitos políticos,
sendo exilado. Ao julgar a pretensão material de reparação de danos morais e
materiais, o Tribunal Federal de Recursos da 2a Região, em voto do Des. Federal
Poul Erik Dyrlund, afastou o pedido quanto aos primeiros, uma vez que não foi
produzida qualquer prova nesse sentido.
103
Nesse período da história, muitos militares deserdaram, muitos civis
tiveram suas casas invadidas em nome do regime, seus empregos subtraídos, suas
famílias acharcadas, a dignidade violada de forma brutal, velada e sorrateira. Em
relatório para a Comissão de Direitos Humanos, Alfredo Martin ao examinar, como
médico, as vítimas apontou que:

102
SANSEVERINO, Paulo de Tarso Vieira. O princípio da reparação integral e os danos pessoais.
Carta Forense Janeiro 2010 p. A 16. Disponível em www.cartaforense.com.br. Acesso em
20.03.2010.
103
Apelação 1998.504577-6
64
As sequelas mais freqüentes são os problemas identitários, os
processos dissociativos graves, comportamentos regressivos, os
lutos não elaborados, a angústia crônica, a ansiedade, a depressão,
a insônia persistente, os pesadelos, a repetição, os transtornos
neuróticos ou psicóticos, alteração dos hábitos alimentares, sexuais,
etc. alta irritabilidade com crises clássicas mais ou menos graves,
sentimentos de culpabilidade e de vergonha, de perseguição e de
dano permanente, incapacidade de trabalho e perca profissional
isolamento, transtornos da memória, da percepção e da atenção
(estado de alerta permanente), dificuldades relacionais com o casal,
a família, etc. são assinaladas frequentemente as dificuldades de
inserção laboral”.
104
Para reparar o dano moral, foram editadas leis na esfera federal e no
âmbito dos Estados, como em Minas Gerais que, por meio do Conselho Estadual de
Defesa dos Direitos Humanos, criado pela Lei 9.516/87 e do Conselho Estadual de
Indenizações de Vítimas de Torturas, constituído pela Lei 13.187/99, outorgam às
vítimas de torturas a indenização “padrão e fixa” de R$ 30.000,00, mas não sem a
necessária comprovação.
Como critérios de arbitramento do valor indenizatório (ou
compensatório) estão o princípio da razoabilidade e da proporcionalidade, como já
tratado. Tais critérios podem ser revistos pelo Superior Tribunal de Justiça que, sem
o impedimento das Súmulas 7 do Superior Tribunal de Justiça e 289 do Supremo
Tribunal Federal, visa, dentro da esfera de competência que lhe é outorgada pela
Constituição Federal, coibir indenizações astronômicas ou ínfimas.
Não se considera sucumbente, a vítima de dano moral cuja pretensão
quanto ao valor indenitário é reconhecido a menor do que o veiculado na inicial.
105
Esse panorama amplo da indenização e seus desdobramentos será
esmiuçado no capítulo dedicado ao conteúdo e extensão do dano moral que, na

104
Cf. “As Violências” Indenização pelos abusos da ditadura: caso “cabo Anselmo” Grupo: S3DI1-
G1 Andréa Fernandes Assunção e outros. Professora orientadora Jacqueline Passos da Silveira.
Faculdade Novos Horizontes. Belo Horizonte (MG) 2007. Disponível em
<http://www.unihorizontes.br/pi/pi_csa_2_2007/direito/indenizacao_pelos_abusos_da_ditadura_cas
o_cabo_anselmo.pdf> Acesso em 15/4/2010
105
Súmula 326 do Superior Tribunal de Justiça.
65
verdade, é o foco da presente pesquisa, ressaltando-se que a responsabilidade civil
é o instituto que mais sofre transformações.
Não se pode deixar de frisar que, para acompanhar os avanços
tecnológicos da era globalizada, o instituto da responsabilidade civil deve moldar-se,
sempre, a favor da iniquidade e da injustiça.
66
CAPÍTULO III – CONFIGURAÇÃO JURÍDICA DO DANO
3.1. – O dano como elemento da responsabilidade civil.
“Pas de préjudice, pas de responsabilité civile” é a tônica da
responsabilidade civil.
106
Pode-se afirmar com relativa segurança de que não há
responsabilidade civil sem dano. Este é elemento essencial da configuração da
responsabilização do agente, “o seu grande vilão”. Mesmo porque, se o ato ilícito
não causar prejuízo a outrem, faltar-lhe-á interesse processual para pleitear
judicialmente a reparação, devendo o juiz declarar a carência da ação, extinguindo o
processo nos moldes do inciso VI do artigo 267 do Código de Processo Civil.
O interesse processual está configurado no binômio interesse-
necessidade, demonstrando a parte autora que a tutela por ela pretendida pode
trazer-lhe alguma utilidade prática. Verifica-se o interesse processual quando o direito
tiver sido ameaçado ou efetivamente violado.
Os artigos 186 e 927 do Código Civil enfatizam que, aquele que pratica
o ato ilícito, seja por meio de ação ou omissão, agindo com culpa (negligência,
imperícia ou imprudência) ou com dolo (com a deliberada intenção de ferir)
(responsabilidade subjetiva), seja na prática da atividade de risco (responsabilidade
objetiva), causando dano a outrem, ainda que puramente moral, tem o dever de
repará-lo.
De modo que, na definição de Carlos Alberto Bittar, dano “é a perda, ou
a diminuição, total ou parcial, de elementos, ou de expressão componente de sua
estrutura de bens psíquicos, físicos, morais ou materiais”.
107

106
LALOU, Henri. Traité pratique de responsabilité civile n. 135 Apud PEREIRA, Caio Mário da
Silva. Responsabilidade civil, Rio de Janeiro: Forense, 1996. p. 38. Na tradução livre: “Sem
prejuízo, não há responsabilidade civil”, mostrando a importância do dano ou prejuízo na etiologia
da responsabilidade civil, devendo o dano, ainda, ser certo e atual.
67
Nessa esfera conceitual, assegura-se ao lesado a reparação contra o
dano sofrido. Mas apenas quando o dano é injusto, contrário ao ordenamento
jurídico. Comete ato ilícito aquele que, no exercício regular de um direito, excede os
limites impostos pelas regras de convivência pacífica (artigo 187 do Código Civil).
Portanto, exclui-se da obrigação de ressarcir o prejuízo decorrente do exercício
regular de um direito, da legítima defesa, da remoção de perigo iminente, e todas
aquelas situações previstas nas hipóteses do artigo 188 do Código Civil.
Exemplo clássico é o desforço imediato da posse, quando o possuidor,
no exercício de seu direito, repele injusta agressão consubstanciada na invasão de
suas terras. Resquício da justiça privada, a autotutela da posse tem expressa
autorização legal, como reza o parágrafo segundo do artigo 1.210 do Código Civil.
Contudo, o possuidor ofendido na sua posse, pode repelir o agressor
desde que o faça de forma imediata e proporcional ao gravame. Isto porque o
próprio dispositivo legal, em consonância com o comando contido no artigo 188 do
Código Civil, coíbe o abuso do direito. Não é crível que o legislador tenha permitido,
sob o manto da legalidade, que se cometam atrocidades e abusos.
Tome-se como ilustrativa a situação em que garimpeiros invadem as
terras de empresa mineradora de renome internacional e exploram,
clandestinamente, a atividade de garimpo. No entanto, são surpreendidos em ação
não permitida e identificados pela vigilância contratada.
No afã de retirá-los do local, os seguranças da referida empresa,
armados, perseguem os invasores pelas ruas próximas da sede, empunhando
revolveres e atirando para o alto. Ao conseguir interceptá-los, colocam-lhes
algemas, tal como se fossem bandidos, mesmo diante do não oferecimento de
resistência.
Reconheceu o Tribunal de Minas Gerais que a reação dos vigilantes foi
desproporcional com a situação fática ocorrida, extrapolando os limites da
autodefesa da posse, condenando a empresa mineradora a pagar aos garimpeiros

107
BITTAR, Carlos Alberto. Responsabilidade civil. Teoria e prática. Rio de Janeiro: Forense, 2005.
p. 9.
68
R$ 10.000,00 a título de danos morais. Afastou, porém, a pretensão de indenização
dos danos materiais, já que não provados.
108
De modo que só o dano injusto é indenizável. Além de injusto, deve o
dano ser atual para justificar a reparação, não se afastando, é claro, a possibilidade
de indenização do dano futuro ou da chamada perda de uma chance, desde que
comprovado. Também deve o dano ser certo, não se dando guarida ao prejuízo
meramente eventual.
Caio Mário da Silva Pereira traz da experiência enfrentada no início de
sua carreira uma situação deveras caricata e na qual obteve sucesso, com o
reconhecimento de sua tese pelo Tribunal de Minas Gerais que afastou a pretensão
material do autor com argumento do dano hipotético (em contraposição à necessária
certeza do dano): “um jovem que argumentava com sua inclinação pela carreira das
armas e que, em razão do dano sofrido, tornara-se inabilitado. Raciocinava que, em
razão de sua idade e de sua vida provável, poderia dentro na previsão desta, atingir
o generalato”.
109
Portanto, presentes esses elementos, vislumbra-se a potencialidade do
dano gerar reparação.
Várias são as vertentes doutrinárias que se apresentam ao intérprete
na classificação do dano, o que conduz a decisões aparentemente contraditórias
quando, na verdade, estas devem ser encaradas sob a ótica do aplicador da norma.
Alguns juristas, como o citado Carlos Alberto Bittar, preferem mais de uma.
Classificam-se os danos, consoante o saudoso professor da
Universidade do Largo São Francisco, em “(i) pessoais, quando violam direitos da
personalidade do indivíduo ou de seu corpo (lesão ao corpo, partes do corpo,
psiquismo, liberdade, imagem, intimidade); (ii) morais, aqueles que atingem o
complexo de valores do indivíduo e sua expressão social (honra, reputação) e (iii)

108
Apelação 1.0317.03.026807-0/001 – Relator Des. Duarte de Paula. Data do julgamento:
14/11/2007. TJ/MG. Apelante: Cia Vale do Rio Doce. Apelados: Nilton Mendes e outros.
109
PEREIRA, Caio Mário da Silva, Responsabilidade..., cit., p. 41.
69
patrimoniais, ligados aos elementos materiais (bens e direitos), pecuniários (de
cunho econômico)”.
110
Bittar ainda ordena os danos de uma forma mais ampla, agora em
função de seus reflexos em: (i) patrimoniais, como aqueles que repercutem na esfera
pecuniária da vítima e (ii) extrapatrimoniais, também denominados imateriais ou
morais, que são aqueles sem cunho econômico, pois afetam a personalidade do
ofendido.
111
Mas a ofensa ao direito da personalidade deve ser real e efetiva,
afastadas lesões de somenos importância a demandar a tutela jurídica.
O Ministro Carlos Veloso teve a oportunidade de destacar o
entendimento do Supremo Tribunal Federal de que o dano moral indenizável é
aquele que atinge a esfera legítima de afeição da vítima, que agride valores, que
humilha, que causa dor, afastando a pretensão de uma passageira de avião cuja
companhia aérea perdeu frasqueira contendo objetos pessoais, a maquiagem que
levava consigo.
112
Fatos desagradáveis do cotidiano, traduzíveis em meros
aborrecimentos inerentes ao prejuízo material, não caracterizam dano moral.
113
É a
agressão aos bens que compõem o patrimônio imaterial do indivíduo que
desencadeia o dano moral. De modo que primeiro se deve reconhecer se o gravame
feriu direitos ou interesses da esfera extrapatrimonial da vítima para, - respondendo-
se afirmativamente -, fazer emergir a carga valorativa (de relevância ou não para o
ordenamento jurídico) e determinar a sua extensão. Só então, arrisca-se dizer,
poder-se-á falar em dano moral.
Há ainda os que como Aguiar Dias
114
, citado no capítulo anterior,
encaram que o dano é um só, é uno. Os efeitos por ele produzidos é que serão
patrimoniais ou não patrimoniais. Assim não há, em um primeiro momento, que se

110
BITTAR, Carlos Alberto. Responsabilidade civil. Teoria e prática. Rio de Janeiro: Forense, 2005.
p. 22.
111
BITTAR, Carlos Alberto, Responsabilidade civil ..., cit., p.23.
112
Agravo Regimental no Recurso Extraoirdinário n. 387014-SP, Supremo Tribunal Federal.
113
Enunciado n. 159, III Jornada de Direito Civil, Superior Tribunal de Justiça.
114
DIAS, Aguiar. Da responsabilidade civil. 11ª ed. Revista, atualizada de acordo com o Código
Civil de 2002, e aumentada por Rui Berford Dias – Rio de Janeiro: Renovar, 2006. p. 1006.
70
falar em categorias diferentes de dano. Releva notar que esse posicionamento
vislumbra o dano estético como dano moral.
Mas a questão assim colocada, precisa necessariamente ser melhor
explicitada sob pena de falhar na técnica, pelo que os conceitos de dano patrimonial
e de dano moral, imaterial ou extrapatrimonial
115
serão a seguir apresentados com
mais vagar.
3.2. – O dano patrimonial: definição, elementos e conteúdo.
O dano patrimonial pode ser entendido como aquele que reflete um
menoscabo, uma diminuição do acervo de bens de propriedade do lesado. Ou seja,
o indivíduo lesado em sua esfera patrimonial experimenta uma diminuição dos bens
que possuía e passa, então, a possuir.
Agostinho Alvim refere o conceito de Polacco para quem “o dano é a
efetiva diminuição do patrimônio e consiste na diferença entre o valor atual do
patrimônio do credor e aquele que teria se a obrigação fora exatamente cumprida”.
116
Com a ressalva, é claro, de que o patrimônio relacionava-se com dinheiro. Essa
era a visão do jurisconsulto romano Paulo e que, durante longo tempo, serviu de
entrave para a reparação do prejuízo moral.
A configuração do dano patrimonial ou material não acarreta maiores
reflexões e a forma de reparação é, de fato, a recomposição do patrimônio da
pessoa lesada ao “status quo ante”. Esse ressarcimento deve ser o mais amplo
possível para que se coadune ao princípio da reparação integral, consagrado
constitucionalmente e expresso no artigo 402 do Código Civil.
Como dito, o taxista transporta um passageiro em seu veículo pelas
ruas da cidade quando é interceptado por outro veículo que, cortando a trajetória do

115
Os termos são aqui tomados como sinônimos, pois a classificação de Bittar em danos pessoais
e morais não foi adotada na legislação pátria que “generalizou” os conceitos, como exemplo o
inciso VI do artigo 6º do Código de Defesa do Consumidor e artigo 1º da Lei n. 7.347/85.
116
ALVIM, Agostinho. Inexecução das obrigações e suas conseqüências, cit, p. 170.
71
automóvel de aluguel, acaba por abalroar a sua traseira. Para consertar os
prejuízos, o taxista precisa desembolsar R$ 2.000,00, além de deixar o veículo na
oficina por dez dias. Neste período, fica impedido de trabalhar. Para que o
patrimônio seja reparado e volte ao “staus quo ante”, deve o motorista causador do
acidente, pagar o conserto do veículo, considerados danos emergentes, além do
valor correspondente à renda que o taxista deixou de auferir nos dias em que ficou
parado, denominados lucros cessantes.
3.3. – O dano não-patrimonial: conceituação, conteúdo e extensão.
Por exclusão, os demais prejuízos sofridos pela pessoa, seja ela
natural ou jurídica, que não afetem de modo direto os bens materiais que possuem,
são danos imateriais, extrapatrimoniais, não-patrimoniais ou morais. As
nomenclaturas se equivalem, sendo indiferente o “nomen juris”, ao menos para a
presente dissertação, mesmo porque a legislação pátria – ao que parece – adotou
um conceito amplo de dano moral.
Afinal, a pessoa jurídica, como sujeito de direitos e obrigações;
realidade jurídica e não mera ficção; reconhecida no ordenamento jurídico como
ente abstrato, que, analogicamente à pessoa natural tem direitos fundamentais e
direitos da personalidade, tem patrimônio distinto dos membros que a compõem,
responde civilmente pelos atos omissivos e comissivos de seus representantes.
Verificado o ilícito, a pessoa jurídica será sujeito passivo da obrigação de indenizar
aquele que foi lesado.
A “contrario sensu”, vítima de ação ou omissão culposas (ou dolosas) e
nas circunstâncias em que há obrigação legal de reparar o dano decorrente de
atividade de risco (responsabilidade objetiva), passa a pessoa jurídica a ser sujeito
ativo, credor da reparação.
Pode sofrer dano moral, pois atingido o patrimônio imaterial (que se
compõe de valores sociais e de direitos). Dano moral encarado como a violação, o
menoscabo, a agressão a um direito da personalidade conjugado com a
72
circunstância dessa violação causar uma reação na vítima passível de ser
reconhecida pelo ordenamento jurídico e valorada a ponto de merecer reparação
pelo lesado, a reação a uma violação e não propriamente a causa do dano.
A assertiva pode ser explicada por meio dos fenômenos da medicina.
O paciente que sofre um mal, como à agressão ao organismo por uma doença
qualquer como a gripe, pode ou não apresentar febre. A febre é uma reação do
organismo, seja por uma infecção ou não.
Muitos doutrinadores caracterizam o dano moral – e acabam por defini-
lo - pelos sentimentos experimentados pela vítima, como a dor moral, a dor física,
constrangimento, vergonha e humilhação. Sendo tais sentimentos, de ordem
iminentemente subjetiva, surge a dificuldade na identificação e apuração do dano
moral, causando uma situação de insegurança jurídica.
117
Talvez em razão dessa visão “unilateral” de dano moral é que os
doutrinadores fazem a distinção em dano moral reflexo e dano moral puro. O dano
moral puro é, para de Araken de Assis, aquele que se esgota na lesão à
personalidade, exemplificando com o uso da imagem de alguém, expondo-a ao
ridículo; e dano reflexo, resultante da “interpolação do ilícito no patrimônio”, em que
o atentado à imagem acarreta dano patrimonial frente a perda da clientela, caso em
que o dano é patrimonial e não moral propriamente dito.
118
Nada impede que haja dano moral sem reflexos de ordem patrimonial,
havendo independência entre as duas categorias de danos, caso se afaste o
intérprete do conceito de Aguiar Dias como mencionado anteriormente.
Cabe registrar o voto do Ministro Ari Pargendler que deixa claro que a
prova do fato que maculou a reputação da pessoa jurídica é suficiente para
indenização do dano moral, nada importando que daí tenha resultado, ou não,

117
TAVARES DA SILVA, Regina Beatriz. Responsabilidade civil: responsabilidade civil na área de
saúde. São Paulo: Saraiva, 2007 (Série GVlaw) p. 60
118
Palestra proferida em 11.04.97, no Simpósio "Direito Civil: Responsabilidade Civil e Família",
realizado em Canela - RS, pela Editora Síntese Indenização do dano moral Araken de Assis
Desembargador do TJRS e Professor no Curso de Mestrado em Direito da PUC/RS publicado na
Revista Jurídica nº 236, p. 5.
73
prejuízo patrimonial. É o dano moral puro recebendo o reconhecimento da
jurisprudência.
119
Regina Beatriz Tavares da Silva, em abalizada opinião, cinge os danos
morais em duas categorias: 1) os que afetam os aspectos extrínsecos da
personalidade; e 2) os que atingem os aspectos intrínsecos da personalidade. De
modo que tanto as pessoas naturais como as jurídicas podem ser vítimas de danos
morais que violam aspectos extrínsecos da personalidade. Apenas as pessoas
naturais se enquadrariam no segundo.
120
O Código Civil italiano, nos artigos 2.043 e 2.059
121
, diz que qualquer
fato doloso ou culposo, que causa a outrem um dano injusto, obriga aquele que o
cometeu a ressarci-lo, sendo que o dano não patrimonial deve ser reparado somente
nos casos determinados em lei, ou seja, a liberdade ao julgador é limitada pelo
legislador, restringida a reparação do dano não patrimonial (é essa a denominação
usada) aos casos determinados por lei. Não havendo reconhecimento pelo
legislador, em princípio, não há como reparar o mal sofrido.
Talvez tenha sido essa a dificuldade encontrada – como se verá mais
adiante – pelos juízes italianos e até nas decisões administrativas, para conceder-se
à Administração Pública a reparação moral causada pelos atos da “Cosa Nostra”
que, infiltrando-se no serviço público e até mesmo junto ao Poder Judiciário, cooptou
pessoas influentes para servir às suas finalidades escusas e ilícitas.
122
Isto porque a concepção italiana de dano moral está ligada ao fato
delituoso: ao crime ou à contravenção, tanto que desenvolveu outras facetas de
danos imateriais como os danos biológicos e os danos existenciais.
O Bürgerliches Gesetzbuch (BGB) alemão, como já dito, não se utiliza
da expressão “dano não-patrimonial” como o italiano, mas entende como “dano

119
Agravo Regimental no Agravo de Instrumento n. 970.204/SC (Superior Tribunal de Justiça, j.
2/9/2008).
120
TAVARES DA SILVA, Regina Beatriz Responsabilidade civil: responsabilidade civil na area de
saúde. São Paulo: Saraiva, 2007 (Série GVlaw) p. 61.
121
Art. 2043 Risarcimento per fatto illecito Qualunque fatto doloso o colposo, che cagiona ad altri un
danno ingiusto, obbliga colui che ha commesso il fatto a risarcire il danno (Cod. Pen. 185). Art.
2059 Danni non patrimoniali Il danno non patrimoniale deve essere risarcito solo nei casi determinati
dalla legge (Cod. Proc. Civ. 89; Cod. Pen. 185, 598).
122
Relembrando que o dano moral está ligado ao ilícito penal.
74
imaterial” – também por exclusão - o prejuízo que não é patrimonial e que pode dar
ensejo a uma “módica” indenização quando há violação ao corpo, à saúde, à
liberdade ou à preferência sexual.
123
Na Espanha, o fenômeno do crescimento da responsabilidade civil
também sofreu incremento com a possibilidade de se indenizar o dano moral
resultante de inadimplemento contratual e o dano moral da pessoa jurídica.
Alma María Rodriguez Guitián
124
, preocupada com a possível
contradição entre as Turmas do Tribunal Supremo da Espanha, alerta que é posição
minoritária aquela que define o dano moral como o sofrimento físico ou psíquico
resultante da lesão aos direitos da personalidade. Na realidade, é difícil identificar
todos os bens dignos de proteção cuja lesão pode e deve ser reparada, uma vez
que o conceito de direito da personalidade não está bem definido e, sem dúvida, se
confunde com os direitos fundamentais consagrados na Constituição espanhola.
Em segundo lugar, se só devem ser reparados os danos morais que
decorrem da lesão a direitos da personalidade, sendo que ficariam sem proteção
outros bens que não podem ser incluídos em tal categoria, mas que são dignos de
tutela jurídica na sociedade espanhola, como, por exemplo, o tempo de ócio (el
tempo de ocio). Em terceiro plano, não há no ordenamento jurídico espanhol, um
sistema fundado na lesão de direitos subjetivos.
Bem se percebe que a posição majoritária da doutrina enxerga o dano
moral do ponto de vista da consequência da lesão e não do interesse lesado. Assim,
o dano moral se identifica com aquele prejuízo de natureza não-patrimonial que
resulta da lesão a qualquer interesse jurídico, mesmo quando o interesse primário
lesionado é patrimonial.
Alma Maria Rodriguez Guitián alerta que esse novo crescimento da
responsabilidade civil pela adoção de uma visão ampla de dano moral, conduz a

123
Observa-se que se destacou a expressão “módico” em itálico uma vez que o adjetivo billig
significa barato, correspondendo seu conceito jurídico ao termo módico.
124
Conforme artigo da Professora da Universidade de Madri com o título “Dano moral e pessoa
jurídica”.<http://216.239.51.104/search?q=cache:6CVT0uibzpwJ:www.indret.com/code/getPdf.php%
3Fid%3D849%26pdf%3D334_es.pdf+da%C3%B1o+moral+y+la+persona+juridica&hl=pt-
BR&gl=br&ct=clnk&cd=2>Acesso em 08/06/06.
.
75
uma degradação desse conceito inclusive para abracar as pessoas jurídicas,
firmando a posição de que, embora seja ela favorável à extensão da proteção
jurídica aos entes morais, devem os tribunais ser sumariamente rigorosos na prova,
em função das circunstâncias dos casos de se relamente existe o dano moral.
125
No Brasil, a questão sofre inúmeras soluções na doutrina e na
legislação infraconstitucional, até porque a Constituição Federal traz no inciso V do
artigo 5º o direito à indenização do dano material, moral e à imagem, provocando o
entendimento – quiçá equivocado – de que o dano moral não abarca o conceito de
imagem; ou de que o direito à imagem está numa categoria privilegiada em relação a
outros direitos como a honra, a liberdade, o sossego que seriam abrangidos no
conceito de “dano moral.” Claro está que a interpretação literal ou gramatical levaria
o intérprete a raciocinar de maneira simplista, com consequências deveras
desastrosas.
Antes mesmo da promulgação da Carta Cidadã, a doutrina vislumbrava
a existência do dano moral em inúmeros dispositivos tanto do Código Civil de 1916
como em leis esparsas.
Araken de Assis diz que poderá surgir dano extrapatrimonial ou moral
quando afetados direitos à personalidade, o que já era reconhecido no artigo 1.547
do anterior Código Civil que, como se sabe, não dedicava um capítulo aos chamados
direitos da personalidade, não deixando, obviamente, de protegê-los.
126
Interessante notar que antes da promulgação da Carta de 1988, os
tribunais relutavam em reconhecer o dano moral justamente porque a ordem
infraconstitucional era canhestra, sendo poucos os dispositivos legais que
regulamentavam a questão. Cite-se o caso ocorrido em São Paulo quando da
explosão de uma casa de fogos de artifício que funcionava na garagem de uma
residência no Jardim Bonfiglioli em 1985. A explosão atingiu as casas vizinhas (pois
situadas em um bairro estritamente residencial), danificando além dos imóveis, os

125
Disponível<http://216.239.51.104/search?q=cache:6CVT0uibzpwJ:www.indret.com/code/getPdf.p
hp%3Fid%3D849%26pdf%3D334_es.pdf+da%C3%B1o+moral+y+la+persona+juridica&hl=pt-
BR&gl=br&ct=clnk&cd=2>Acesso em 08/06/06.
126
ASSIS, Araken de. Indenização do dano moral. Revista jurídica nº 236, p. 5.
76
veículos ali estacionados, objetos pessoais dos proprietários etc. O sinistro resultou
na morte dos membros de uma família inteira, - mãe e dois filhos -, ingressando o
pai com ação de indenização buscando a reparação dos prejuízos materiais e
imateriais que resultaram a perda dos entes queridos. Os outros vizinhos, que na
época tiveram apenas desfalque patrimonial, deduziram pretensão material para
recomposição deste, tendo sido procedentes os pedidos.
Mas outro rumo tomou a ação daquele marido e pai, cuja pretensão
material quanto ao dano moral restou improcedente, não apenas por falta de amparo
legal, mas em razão de que, como a mulher e os filhos não trabalhavam, não houve
prejuízo patrimonial e, por conseguinte, dano moral.
127
Mais uma vez traz-se à baila as lições de Sérgio Cavalieri Filho, que
interpreta o conceito de dano moral com fundamento nos preceitos constitucionais
esculpidos nos incisos V e X do artigo 5º, da Constituição Federal, argumentando
que o dano moral nada mais é do que a agressão à dignidade humana, não estando
necessariamente atrelado a uma reação psíquica do lesado. “Dor, vexame,
sofrimento e humilhação podem ser conseqüências, e não causas”.
128
Para o Desembargador do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, à luz
da carta constitucional, pode-se conceituar o dano moral sob dois aspectos distintos:
em sentido estrito, como a violação do direito à dignidade e em sentido amplo,
abrangendo outros direitos da personalidade que não estão necessariamente
vinculados à dignidade, como a imagem, bom nome, reputação, hábitos, convicções
políticas etc., ou seja, o dano moral, nessa visão de Cavalieri, abarca todas as
ofensas à pessoa considerada em sua vertente individual e social (como grupo de
pessoas).
Percebe-se, pois, que o dano moral hoje – após a promulgação da
Constituição Federal de 1988 – não mais se restringe à dor, tristeza, sofrimento,

127
Apelação Cível n. 108.665.1/5-00, pendente de julgamento Agravo Interno junto ao Supremo
Tribunal Federal.
128
CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de responsabilidade civil. 5. ed. rev., aum. e atual. São
Paulo: Malheiros, 2003 p. 80.
77
estendendo a proteção jurídica a todos os direitos da personalidade, razão pela qual
Cavalieri prefere denominá-lo de dano imaterial ou não patrimonial.
129
Claro está o que a Constituição Federal protege tanto o patrimônio
material como imaterial do sujeito de direitos, quer seja ele pessoa natural (ou física)
ou pessoa jurídica, podendo aquele que foi vítima de uma fato/ato ilícito deduzir
judicialmente pedido de indenização abarcando as duas esferas jurídicas
cumulativamente: a material e a imaterial. Pacífica a cumulação de pedidos, como
inserto na Súmula 37 do Superior Tribunal de Justiça.
O direito à indenização pela violação do dano moral foi alçado à
categoria de garantia fundamental (incisos V e X do artigo 5º da CF), integrando-o
definitivamente no sistema jurídico como cláusula pétrea, nos moldes do disposto no
art. 60, § 4º, inc. IV, da Constituição Federal.
Há situações, portanto, em que o mesmo fato, em regra ilícito, gera
para o lesado tanto um dano de ordem moral como um dano de ordem material e
vice-versa, não sendo necessário que haja repercussão no patrimônio econômico do
sujeito prejudicado para que tenha legitimidade ativa e interesse processual (ou de
agir) para pleitear dano moral. Verificada essa circunstância, estar-se-á na presença
do chamado dano moral puro.
Corrobora esse posicionamento Maria Helena Diniz, que assim se
expressa:
Deveras, o caráter patrimonial ou moral do dano não advém da
natureza do direito subjetivo danificado, mas dos efeitos da lesão
jurídica, pois do prejuízo causado a um bem jurídico econômico pode
resultar perda de ordem moral, e da ofensa a um bem jurídico
extrapatrimonial pode originar dano material. Realmente, poderá até
mesmo suceder que, da violação de determinado direito, resultem ao
mesmo tempo lesões de natureza moral e patrimonial
”.
130

129
CAVALIERI FILHO, Sérgio Programa de responsabilidade civil, cit., p 81.
130
DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro. Vol. 7, São Paulo: Saraiva, 2009. p. 92.
78
Caso os danos materiais e imateriais coexistam, a reparação, por ser
integral, cobrirá tanto um como o outro, o que foi objeto da já mencionada Súmula
37 do Superior Tribunal de Justiça.
Outrossim, indaga-se se no conceito de extrapatrimonialidade –
considerado como um grande círculo imaginário – estariam compreendidos os
chamados danos morais. Seriam, ainda, os danos à honra, à intimidade, à
privacidade, à imagem, ao direito autoral etc também abarcados pelo conceito de
“dano moral”? Qual seria a abrangência então da definição de “dano moral”?
A discussão, que parece por demais acadêmica, é essencial para que
se desenvolva, ao longo do tema, uma coerência lógica e jurídica, ainda mais se se
pretende promover um avanço nas idéias hoje sedimentadas pelos nossos Tribunais
que, a exemplo do Superior Tribunal de Justiça, no emblemático recurso especial
interposto pelo Ministério Público de Minas Gerais
131
, enterraram qualquer
possibilidade de compensação ao poder público ou à coletividade pelo infortúnio
sofrido ao meio ambiente.
Ao enfrentar pedidos de reparação do dano moral oriundos de
infrações ao Código do Consumidor, os julgadores não tem se comportado de forma
uniforme, entendendo a corrente contrária ao deferimento da pretensão à reparação
de que não é possível falar em “danos morais coletivos” pois não se pode identificar
os sentimentos de cada um dos lesados (seja nos interesses individuais
homogêneos ou difusos).
Proliferam em nossos tribunais, em progressão crescente, ações civis
públicas ajuizadas pelos Ministério Público Federal e Estaduais, pelos órgãos de
classe e pelas entidades de defesa do consumidor – os PROCON – com pedidos de
indenização de danos patrimoniais e morais coletivos. Muitas ações ainda tramitam
sem decisão. Tímida é a atuação das pessoas jurídicas de direito público na busca
da reparação do dano moral, imaterial, extrapatrimonial ou não patrimonial, talvez
em razão das incertezas doutrinárias quanto à sua definição.
Há ainda que se considerar que no dano moral o caráter reparatório
tem duas faces: uma punitiva ou pedagógica, servindo a condenação como “castigo”

131
Recurso Especial n. 598.281-MG
79
ao ofensor e desestímulo para a reincidência e uma compensatória para a vítima,
que receberá uma soma em dinheiro visando a compensar o mal sofrido, trazendo-
lhe conforto.
Corrente hoje minoritária na jurisprudência e na doutrina entende que o
dano moral é um sofrimento físico ou psíquico (uma reação do organismo humano)
resultante de violação a direitos da personalidade, o que por certo deve ser
respeitado. Não há impropriedade na interpretação, mas a limitação da visão do
exegeta resulta da conceituação de dano moral como sendo “o preço da dor”, não
alargando o conceito para situações outras que não as que atingem o espírito
humano.
O precursor da teoria no direito pátrio, como mencionado alhures,
Wilson de Melo e Silva, dizia que o dano moral – tal qual Santo Tomás de Aquino –
é o dano da alma; o sofrimento alcançado pela violação a um direito fundamental,
talvez inspirado em Savatier para quem o dano moral é todo sofrimento humano que
não é causado por uma perda pecuniária, ou “pretium doloris”, traduzido como
“preço da dor”.
132
Na oportunidade dos estudos daquele consagrado jurista, antes
mesmo da promulgação Constituição Federal de 1988, importou-se do direito anglo-
saxão a ideia de que o dano moral seria a violação aos direitos fundamentais do
homem, hoje transportados para a proteção na seara civilista com o advento do
Código Civil de 2002 no capítulo dedicado aos direitos da personalidade.
Tal afirmação se dá pela análise dos conceitos intuídos por civilistas de
ponta, como Orlando Gomes para quem o dano moral é “o constrangimento que
alguém experimenta em conseqüência de lesão a direito personalíssimo, ilicitamente
produzido por outrem”.
133
A visão mais abrangente de Carlos Alberto Bittar, já
destacada, para quem os prejuízos “morais são lesões sofridas pelas pessoas,
físicas e jurídicas, em certos aspectos de sua personalidade, em razão de investidas

132
Cf. SILVA, Wilson Melo da. Dano moral. In Enciclopédia Saraiva de Direito. p. 266-279.
133
GOMES, Orlando Obrigações. Rio de Janeiro: Forense, 2002. p.332.
80
injustas de alguém, causando-lhe constrangimentos, vexames, dores, enfim,
sentimentos e sensações negativas”.
134
Assim, para que se possa equacionar a problemática veiculada no
presente estudo, há que se avançar nos conceitos de responsabilidade civil e de
dano moral, inclusive quanto à sua identificação (prova) e valoração (reparação).
É inquestionável que toda a interpretação e aplicação das normas
infraconstitucionais tem balizamento na Constituição Federal e, ao colocar o homem
no vértice do ordenamento jurídico, a Carta Magna estabeleceu como norte a
proteção à dignidade, em toda a sua extensão, sendo esta o “fio condutor de todos
os direitos”.
135
Ao garantir que o homem una-se a outro homem, associe-se, agrupe-
se a outrem para a consecução de determinados fins que, sozinho, não poderia
realizar e o faz através da pessoa jurídica, nada mais coerente que estenda a essa
nova entidade, criada pelo esforço do grupo, sua proteção, de modo a atender a
alteração de princípios trazidos à nova ordem legal: eticidade, solidariedade e
operabilidade.
A interpretação do direito positivo passa a ter maior abrangência,
superando o caráter individualista, privilegiando-se o social, o coletivo.
Esse novo paradigma, inaugurado pela Constituição Federal, deve ser
sentido em todas as instituições jurídicas, pois até mesmo a responsabilidade civil
tem a sua função social. De modo que a nova ordem impõe um repensar de
conceitos, mas não sem antes conhecer os dogmas já assentados.
Socorre-se da doutrina estrangeira que, com supedâneo nas lições de
Ramón Daniel Pizarro, alude a três correntes para a conceituação de dano moral.
A primeira delas acentua a índole dos direitos lesionados, sendo dano
moral aquele que se infere quando há violação a direitos personalíssimos ou da
personalidade, tais como a paz, a vida íntima, a liberdade individual, a integridade

134
BITTAR, Carlos Alberto. Reparação civil por danos morais. Revista do Advogado 44/24, apud
REMÉDIO, José Antônio, Dano moral: doutrina, jurisprudência e legislação, p. 21.
135
Cf. CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de responsabilidade civil. 5. ed. rev., aum. e atual. São
Paulo: Malheiros, 2003. p. 83
81
física etc. Duas são as diretivas para reconhecê-lo como indenizável: lesão a direitos
personalíssimos e ausência de repercussão patrimonial, de sorte que o dano moral é
definido pelo caráter negativo: o de não ser patrimonial.
136
Outra vertente, também criticada por Pizarro, e defendida por
Fernández Sessarego, é aquela que vislumbra o dano moral como um dano atual e
transitório, destinado a mitigar-se ou a desaparecer com o tempo. O dano moral
produz pena, dor, sofrimento etc., ou seja, assimila-se com algumas de suas
manifestações de espírito.
Há codificações que só admitem a reparação do dano moral nos casos
previstos em lei, como a da Polônia, da Alemanha, Áustria, Itália, motivando uma
série de erupções de novas categorias de danos ressarcíveis: dano a pessoa, dano
biológico, dano à saúde etc.
Outros ainda, como Moisset des Espanés, citado por Pizarro, que
identificam o dano moral com a lesão a um direito extrapatrimonial, com abstração
ao seu resultado (efeitos) sendo possível para essa vertente aceitar o dano moral da
pessoa jurídica.
Pizarro conceitua o dano moral como aquele derivado de uma lesão a
um interesse não patrimonial. Esse detrimento ocorre mesmo que falte compreensão
à vítima: em ausência de lágrimas, ou até mesmo de uma pessoa sem condições
físicas ou psíquicas (como uma pessoa acéfala). Esse dissabor subjetivo existe,
inclusive, quando a vítima tenha amadurecido essa dor, e, talvez, deixado de senti-
la.
137
Nessa esteira também se posiciona Maria Helena Diniz esclarecendo
que dano moral é a lesão de interesses não patrimoniais de pessoa física ou
jurídica. Isto porque, qualquer lesão que a pessoa sofra no objeto de seu direito
reflete no seu interesse jurídico; “por isso, quando se distingue o dano patrimonial do
moral, o critério da distinção não poderá ater-se á natureza ou índole do direito

136
PIZARRO, Ramón Daniel. Daño moral. Prevención. Reparación. Punición. El daño moral en las
diversas ramas del Derecho. Buenos Aires, Hammurabi (Depalma), 2ª ed. p. 36.
137
PIZARRO, Ramón Daniel. Daño moral. Prevención, cit., p. 153.
82
subjetivo atingido, mas ao interesse, que é pressuposto desse direito, ou ao efeito
da lesão”.
138
Regina Beatriz Tavares da Silva
139
propõe a conjunção (junção) de dois
critérios na apuração segura do dano moral: (i) a verificação da natureza do bem
violado e (ii) a constatação do dano. Sendo que os danos morais dividem-se em
duas categorias: os que afetam os aspectos extrínsecos da personalidade e os que
atingem seus aspectos intrínsecos.
Desse modo, enfatiza essa jurista, “o dano moral é identificado por sua
origem na ofensa a um direito da personalidade e em seus efeitos refere-se aos
aspectos intrínsecos/extrínsecos da personalidade do lesado”.
140
Para que haja coerência no presente trabalho e na evolução da
responsabilidade civil pari passu com os direitos da personalidade, arrisca-se emitir
um conceito próprio de dano moral, imaterial, extrapatrimonial ou não-patrimonial
como sendo o menoscabo a um direito da personalidade, compreendido este em
toda a sua extensão (aspectos extrínsecos e intrínsecos, objetivos e subjetivos do
sujeito) para a salvaguarda da dignidade da pessoa, natural ou jurídica, por ato ou
omissão de outrem que, em contrariedade ao ordenamento jurídico, cause uma
reação na vítima de modo a merecer reparação, por repercutir na sua esfera
extrapatrimonial e, em algumas circunstâncias, até mesmo patrimonial.
Assim, não estariam compreendidos no conceito de dano moral, as
contrariedades do cotidiano; as vicissitudes; os simples contratempos; as
suscetibilidades; as sensibilidades exacerbadas etc. Mas o termo seria de modo
abrangente a abarcar o dano estético; o dano à honra; à imagem; à vida; ao corpo;
às partes do corpo; à intimidade e o dano psicológico.
Ressaltando-se, por oportuno, que a esfera dos direitos da
personalidade é por demais ampla e assim deve ser encarada pelo exegeta, com

138
DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro, volume 7: responsabilidade civil. São
Paulo: Saraiva, 2009. p. 90 – 91.
139
TAVARES DA SILVA, Regina Beatriz. Responsabilidade civil: responsabilidade civil na area de
saúde. São Paulo: Saraiva, 2007 (Série GVlaw) p 60-61.
140
TAVARES DA SILVA, Regina Beatriz. Responsabilidade civil..., cit., p. 65-66.
83
vistas à assegurar o princípio da dignidade humana, podendo compreender direitos
não elencados no Código Civil ou em lei especial.
Poder-se-ia arrematar com as lições do ilustre Antônio Chaves, em
observação trazida por Aparecida Amarante, que pondera:
“Mas propugnar pela mais ampla ressarcibilidade do dano moral não
implica no reconhecimento de todo e qualquer melindre, toda
suscetibilidade exacerbada, toda aviltação do amor próprio,
pretensamente ferido, a mais suave sombra, o mais ligeiro roçar de
asas de uma borboleta, mimos, escrúpulos, delicadezas excessivas,
ilusões insignificantes desfeitas, possibilitem sejam extraídas da
caixa de Pandora do Direito, centenas de milhares de cruzeiros
”.
141
Maria Helena Diniz também é incisiva ao expor a sua balizada opinião
de que “o direito não repara qualquer padecimento, dor ou aflição, mas aqueles que
forem decorrentes da privação de um bem jurídico sobre o qual a vítima teria
interesse reconhecido juridicamente”.
142
Não fosse assim, todo e qualquer sofrimento humano interessaria ao
direito. As pretensões materiais abarrotariam o Poder Judiciário que, editando o
Enunciado 159, da IV Jornada de Direito Civil, colocou um ponto final na chamadas
“aventuras jurídicas”: “O dano moral, assim compreendido todo o dano
extrapatrimonial, não se caracteriza quando há mero aborrecimento inerente a
prejuízo material”.
O entendimento exposto tem o apoio da jurisprudência, sufragada nas
decisões que não tutelam os efeitos desastrosos do cotidiano. Interessante frisar
que mesmo no caso de violação ao direito da personalidade, como à intimidade ou
privacidade, o intérprete é levado a perquirir os efeitos do ato tido como ilícito.
Servidores municipais ingressaram com ação de indenização por
danos exclusivamente morais em face do poder público que teria, na ótica dos
autores, exposto a intimidade dos mesmos ao divulgar seus vencimentos em sítio da
Internet. O prejuízo moral estaria configurado, ainda consoante os argumentos da

141
CHAVES, Antônio Tratado de direito civil, p. 637 apud Aparecida AMARANTE, Responsabilidade
Civil por Dano à Honra. Belo Horizonte: Del Rey, 2001. p. 359.
142
DINIZ, Maria Helena Curso de direito civil brasileiro v. 7, cit., p. 93.
84
petição inicial, no medo, na insegurança que o ato do Poder Executivo causou, pois
temem que pessoas inescrupulosas usem dos dados para prática de atos ilícitos, até
mesmo atentando contra a integridade física dos servidores, que poderiam ser
vítimas de roubo e até mesmo sequestro. Mas mesmo entendendo ilegal o ato do
Executivo, alguns juízos das varas da Fazenda Pública não vislumbraram a
existência do dano moral.
143
Isso quer dizer que há entendimento de que não basta a lesão ao
direito da personalidade, como no exemplo acima, à intimidade ou à privacidade,
mas é necessário que essa tenha repercutido na esfera moral ou patrimonial da
vítima.
Ademais, só os bens imateriais de significativo reconhecimento na
ordem jurídica seriam reparados e, na falta de um tabelamento, valorados pela
equidade, tendo o juiz como norte os princípios da razoabilidade e da
proporcionalidade, evitando o enriquecimento sem causa. Ao arbitrar o valor
compensatório, dizem doutrina e jurisprudência, deve o magistrado atentar para a
tríplice função da reparação do dano moral, trazendo conforto para a vítima;
dissuadindo o ofensor a reincidir na sua prática e servindo de exemplo de conduta
para a sociedade pela proteção devida à dignidade.
Quando se trata de pessoa jurídica, - pacificado o entendimento de que
a pessoa jurídica de direito privado faz jus à indenização do dano moral -, deve o
magistrado redobrar a cautela, verificando a repercussão do dano tanto na esfera
imaterial (valores significativos que não de cunho material) como na patrimonial,
separando as duas ordens de coisas. O que se torna por certo tarefa hercúlea, dada
a capacidade de abstração que deve ter o julgador uma vez que a tendência é
confundir-se a personalidade da pessoa jurídica com a dos membros que a
compõem.
Difícil ainda alcançar-se a segurança jurídica proferindo-se
indenizações justas, não pecando em excessos ou valores ínfimos, que em nada

143
“O dano alegado não é presumível, uma vez que o fato em questão, por si só, não gera os
prejuízos relatados na inicial, pois a influência no ânimo, no sentimento daquele que pleiteia a
reparação não pode ser considerada automática. E o autor, por sua vez, não apresentou provas
hábeis a demonstrar qualquer abalo emocional ocorrido. Como se vê, de rigor a improcedência da
ação”. (Processo n. 053.09.027229-6 – 6ª VFP)
85
contribuirão para os fins pretendidos pelo ordenamento jurídico. Não há uma tabela
ou termômetro para se aferir o grau de lesão – ou a sua extensão - o que dificulta
atribuir-se um correspondente valor monetário à vítima da agressão a um bem
imaterial. Tanto é assim que o Superior Tribunal de Justiça firmou o entendimento,
expresso na Súmula 281, de que a indenização por dano moral não está sujeita a
tarifação da Lei de Imprensa.
144
Por falta de critérios legais e justamente para evitar a subjetividade, os
juízes, na árdua tarefa jurisdicional, passaram a aplicar os parâmetros fixados em
leis especiais para arbitrar as indenizações.
São inquestionáveis as palavras do Ministro Raphael Monteiro de
Barros para quem, com escólio em Athos Gusmão Carneiro (RESP 3.003-MA), é
impossível eliminar uma certa dose de subjetivismo na liquidação do dano moral:
Em verdade, não há um parâmetro próprio para estimar-se o valor a
ser ressarcido. Há o Juiz de recorrer aos princípios de eqüidade, ao
bom senso, ao arbitrium boni viri. A soma, como ressalta o Prof. Caio
Mário, não deve ser tão grande que se converta em fonte de
enriquecimento, nem tão pequena que se torne inexpressiva (ob.
citada, pág. 60). Segundo Maria Helena Diniz, "na reparação do dano
moral o juiz deverá apelar para o que lhe parecer eqüitativo e justo,
mas ele agirá sempre com um prudente arbítrio, ouvindo as razões
da parte, verificando os elementos probatórios, fixando
moderadamente uma indenização. Portanto, ao fixar o quantum da
indenização, o juiz não procederá a seu bel-prazer, mas como um
homem de responsabilidade, examinando as circunstâncias de cada
caso, decidindo com fundamento e moderação" ("Curso de direito
civil brasileiro", 7º vol., 4ª ed. pág. 77). Claro está que qualquer
excesso ou radicalização importará no enfraquecimento e
desmoralização do instituto”.
145

144
Súmula 281 A indenização por dano moral não está sujeita à tarifação prevista na Lei de
Imprensa. DJ 13/05/2004 p. 200 RSTJ vol. 177 p. 21 RT vol. 824 p. 150
145
MONTEIRO FILHO, Raphael de Barros. Indenização por dano moral: evolução da
jurisprudência. Brasília, DF, 30 mar. 1995. Disponível em: <http://www.stj.gov.br/
webstj/ministros/discurso_internet.asp?Minis=0001089>. Acesso em: 24 nov. 2006.
86
O Código Brasileiro de Telecomunicações (Lei 4.117, de 27.08.1962)
limitava a 100 salários mínimos a indenização pelo dano moral. A Lei de Imprensa
(Lei 5.250 de 09.02.1967), retirada do sistema por força da ADPF n. 130 julgada pelo
Supremo Tribunal Federal, trazia no artigo 53 parâmetros úteis ao juiz para arbitrar a
indenização por dano moral.
Mas a difícil tarefa não está apenas restrita ao Poder Judiciário. Na
esfera administrativa, reconhecidos fatos históricos que causaram dano moral,
passaram a ser objeto de decisões extrajudiciais por expressa previsão legal.
Comissões constituídas pelo poder público e compostas por membros da sociedade,
advogados, promotores, sociólogos, foram instadas a enfrentar situações análogas
às submetidas aos magistrados.
Essas comissões, atuando na esfera administrativa, tem a missão de
arbitrar o valor da reparação do dano moral, como nos casos das vítimas do regime
ditatorial experimentado após o golpe de 1964. A Lei Federal 10.559/02, ressalte-se,
garante aos anistiados políticos e suas famílias uma reparação econômica que não
poderá exceder à R$ 100.000,00, estabelecendo, portanto, um teto indenizatório.
Reconhece-se o dano moral, tarifando o valor da reparação a um “teto” máximo.
Alguns juristas defendem o caráter punitivo ou pedagógico da
indenização do dano moral, que deve ser tal a desestimular o agente a reincidir no
fato lesivo. Mas tem ela ainda a finalidade de trazer o necessário conforto à vítima,
diminuindo a sua perda (já que não há como se restabelecer a situação ao status
quo ante como na violação do dano patrimonial). Assim, haveria que se conjugar
ambos os critérios.
O valor fixado a título de danos morais pelo Tribunal a quo é passível
de revisão pelo Superior Tribunal de Justiça quando o quantum se mostrar irrisório
ou exorbitante, não implicando em reexame da matéria de fato. O órgão julgador
deve pautar-se pelos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade no
arbitramento da indenização. E quando a vítima é pessoa jurídica? Quais os
elementos de que dispõem o magistrado para quantificar o prejuízo moral ou
extrapatrimonial?
87
Magistral a decisão da Ministra Fátima Nancy Andrighi que, ao apreciar
o Recurso Especial 883.630/RS (2006/0192157-7), em que as partes, ambas
sociedades civis fabricantes de tintas e disputando o mesmo mercado, litigavam
objetivando o ressarcimento dos prejuízos exclusivamente morais sofridos pela
divulgação de informação fiscal, reconhecidas pelo Superior Tribunal de Justiça,
como muito mais graves e incisivas que as consequências eventualmente
desabonadoras causadas a uma empresa comum, sem qualquer relação de
concorrência.
Para a julgadora, esse fato [de serem concorrentes]
Deve, necessariamente, ser levado em consideração no momento
de se estabelecer a indenização. Como é cediço, na fixação do valor
da condenação por dano moral deve o julgador atender a certos
critérios, tais como nível cultural do causador do dano; condição
sócio-econômica do ofensor e do ofendido; intensidade do dolo ou
grau da culpa do autor da ofensa; efeitos do dano no psiquismo,
inclusive no que diz respeito às repercussões do fato. No processo
sub judice, a circunstância de a notícia ter sido divulgada por
empresas que atuam no mesmo ramo de atividade incrementa
significativamente o grau de culpa do ofensor, que pode se beneficiar
diretamente com a derrocada comercial da ofendida em decorrência
do dano de imagem que lhe foi causado. Assim, ganha relevo o
caráter pedagógico da indenização, de deve ser fixada em em
patamar suficiente para desencorajar, no futuro, a prática de
condutas semelhantes
”.
O Superior Tribunal de Justiça, valendo-se da prerrogativa
constitucional, manteve, assim, o montante de R$ 400.000,00 fixado pelo Tribunal a
quo.
Mas não basta a ação ou omissão culposas a causar o dano que deve
ser comprovado materialmente; ou melhor, a prova do dano deve ser feita pelo
lesado, que demonstrará ainda, além da existência efetiva do dano, a extensão dos
prejuízos etc. Claro está que respeitado o entendimento de que os danos morais são
in re ipsa.
88
Tome-se o caso de uma criança que, vítima de acidente em escola, tem
o dedo do pé amputado quando do fechamento de uma porta. Além de provar o fato
– a lesão à parte do corpo – deve demonstrar, em regra por meio de perícia médica,
a extensão da lesão, se incapacitante ou não para as atividades normais, como
vestir-se, tomar banho, deambular etc. Mas também incapacitante para o trabalho e,
se positivo, em que grau. Talvez a lesão a impeça de exercer atividade que exija ficar
muito tempo em pé, por exemplo.
Na hipótese do dano material, a comprovação cinge-se a diminuição do
patrimônio, ou seja, deve a vítima comprovar a perda patrimonial e o quantum, em
determinadas situações, deixou de auferir de lucro. Assim, a prova dos danos
emergentes e dos lucros cessantes se faz por meio de testemunhas, de documentos
ou de perícia. Tudo a permitir a verificação da diminuição patrimonial.
Quando há violação aos direitos extrapatrimoniais, não se fala
propriamente em indenização, mas sim em reparação, compensação do dano, uma
vez que o pagamento em dinheiro não visa a recomposição do patrimônio da vítima,
mas objetiva trazer-lhe algum conforto.
No exemplo acima, além dos danos emergentes (despesas médico-
hospitalares, fisioterapia etc) e lucros cessantes (lesões incapacitantes para o
trabalho remunerado), que configuram danos patrimoniais, pode a criança sentir-se
lesada na sua esfera moral, tendo sofrido dano estético e psicológico, diminuída sua
auto-estima.
Não haverá a recomposição do patrimônio ao status quo ante uma vez
que as violações na esfera imaterial da personalidade dificilmente podem ser
efetivamente recompostas.
O direito à intimidade, por exemplo, depois de escancarado com uma
publicidade abusiva, dificilmente será compensado com uma soma em dinheiro ou
um pedido de desculpas. Muitas são as decisões judiciais que determinam que as
revistas ou jornais que divulgaram falsa notícia, maculando a imagem de alguém,
publiquem, no mesmo espaço e veículo de informação, a sentença proferida. Claro
está que, além da paga em dinheiro, compensa-se o dano moral com a divulgação
89
de que o órgão de imprensa que cometeu a infração, recebeu uma sanção, uma
reprimenda do Judiciário.
O advogado que é ofendido pelo juiz que lhe desfere impropérios nos
bancos de um tribunal, será desagravado em sua honra em audiência pública
promovida pelo órgão de classe, podendo até receber uma indenização. Mas, por
certo, jamais esquecerá a vergonha, o vexame de ter sido humilhado, ainda que
tenha recebido a solidariedade de seus pares. Haverá, portanto, uma compensação
pela dor sofrida, pois o dinheiro não pode comprar nem recompor o bem maior: a
honra.
Não se deve esquecer, é claro, que o sistema anglo-saxão, importado
pelos magistrados ao decidir, tem forte carga pedagógica, no sentido de que a
reparação do dano deve ser educativa para o ofensor que, punido, sentir-se-á
desestimulado a reincidir; contudo, os Estados Unidos tem sido exemplo negativo, ao
exagerar nesse critério sancionador, até mesmo coercitivo, concedendo
indenizações astronômicas quando o causador do dano é empresa de grande vulto.
Para a maioria dos doutrinadores, o chamado dano moral não precisa
ser provado, pois “in re ipsa”, porém é fácil sustentar a assertiva quando se está
diante do dano a um dos direitos da personalidade da pessoa natural, como a
violação à intimidade; à honra; à integridade de parte do corpo etc., mesmo porque
próximos ou, melhor, integrantes da experiência pessoal do aplicador da norma. Mas
quando o paciente é a pessoa jurídica, dispensar-se-ia a prova?
A exegese do artigo 927 do Código Civil motivou, pelos integrantes da
III Jornada de Direito Civil promovida pelo Superior Tribunal de Justiça, a edição do
Enunciado 189: “Na responsabilidade civil por dano moral causado à pessoa jurídica,
o fato lesivo, como dano eventual, deve ser devidamente demonstrado.
Com o devido respeito daqueles que entendem de modo diverso, nem
toda a violação de um direito da personalidade acarreta dano moral. Essa deve ser
tal monta ou intensidade a repercutir no patrimônio imaterial do lesado a ponto de
causar-lhe dano efetivo; a ponto de vislumbrar a necessidade de prová-lo quando
não evidente, dispensada a prova de circunstâncias com forte carga de
90
“objetividade”, determinada pela experiência comum – do homem médio - como a dor
com a morte de um filho; o sentimento de repulsa diante do aleijão etc.
Mas nas hipóteses trazidas ao Judiciário e que hoje acumulam-se nas
prateleiras dos Fóruns em razão de um sem número de ações que buscam a
reparação pela divulgação do nome junto aos serviços de proteção ao crédito por
falta de prévia notificação, em que a vítima muitas vezes é devedor contumaz mas,
aproveitando-se de falha do sistema ou desídia de funcionário, acaba por auferir
paga a que não faz jus pois não provou que efetivamente sentiu-se ferida em sua
honra; ou do cidadão que tem a placa do veículo clonada e, ao ser intimado
administrativamente da aplicação de multa de trânsito que efetivamente não
cometeu, bate às portas do Judiciário buscando a reparação do “dano moral” sofrido
sem mesmo apresentar recurso administrativo para anular a infração. Também o
caso da pessoa jurídica que busca a reparação judicial de dano moral decorrente de
fechamento administrativo de bar em bairro nobre da capital por infrações constantes
à lei do silêncio resultantes de inúmeras reclamações da vizinhança e que foi
anulado pela própria Administração Pública por erro “formal” na emissão das multas.
Calmon de Passos é categórico ao afirmar a necessidade de se provar
o dano moral assim como nas indenizações por danos materiais, “repelindo-se, tanto
como critério para certificação de sua existência quanto para sua estimativa, o juízo
de valor que a vítima faz de si mesma, cingindo-nos rigorosamente a padrões
socialmente institucionalizados, o que assegura o mínimo de objetividade exigido de
toda e qualquer aplicação do direito ao caso concreto”. Em uma das passagens do
texto, Calmon de Passos lembra que se contratavam “carpideiras” para chorar nos
velórios, pois as pessoas relacionadas ao morto não conseguiam externar a dor,
simplesmente porque não podiam senti-la.
146
Realmente, deve o Estado-juiz, na busca da paz social, encontrar
critérios objetivos para a fixação do valor do dano moral. Não é o sentimento de
apreço que o indivíduo faz de si próprio que servirá de norte para o arbitramento,
como ressalta o referido mestre, cujas palavras merecem ser enaltecidas:

146
Cf. PASSOS, J.J. CALMON DE. O Imoral nas indenizações por dano moral. In LEITE, Eduardo
de Oliveira (coord.) Grandes temas da atualidade: dano moral. Rio de Janeiro: Forense, 2002. p.
259
91
Não são os meus valores os tuteláveis juridicamente, sim os
socialmente institucionalizados, porque é da essência mesma do
direito seu caráter de regulação social da vida humana. (...) Nada
mais suscetível de subjetivizar-se que a dor, nem nada mais fácil de
ser objeto de mistificação. Assim como já existiram carpideiras que
choravam a dor dos que eram incapazes de chorá-la, porque não a
experimentavam, também nos tornamos extremamente hábeis em
nos fazermos carpideiras de nós mesmos, chorando, para o
espetáculo diante dos outros, a dor que em verdade não
experimentamos. A possibilidade, inclusive, de retiramos proveitos
financeiros dessa nossa dor oculta, fez-nos atores excepcionais e
meliantes extremamente hábeis, quer como vitimas, quer como
advogados ou magistrados. Para se ressarcir esses danos,
deveríamos ter ao menos a decência ou a cautela de exigir a prova
da efetiva dor do beneficiário, desocultando-a. Hipocritamente
descartamos essa exigência, precisamente porque, quando real a
dor, repugna ao que sofre pelo que é insubstituível substituí-lo pelo
encorpamento de sua conta bancária”
.
147
Para ele, tal como os danos materiais devem ser rigorosamente
comprovados para que seja procedente o pedido de indenização, também os danos
morais, “essa misteriosa ‘dor que se oculta no íntimo das pessoas, deve vir à luz
com um mínimo de força de convencimento para que mereça a tutela judicial.
A prova do dano moral é realmente difícil de ser feita e poderá levar o
Estado-juiz a decidir pela improcedência da pretensão material à reparação moral,
mas jamais fazer letra morta da viabilidade de tutelar-se o dano moral pela simples
razão da dificuldade de demonstrá-lo.
Mas se a pessoa natural não precisa fazer prova dos danos morais –
em si mesmos considerados – pois “in re ipsa”, uma vez que o dano moral é aquele
que se compreende em sua própria causa, como no exemplo evocado, a dor sentida
pela morte de um filho, o mesmo não se poderá dizer quanto à pessoa jurídica.
Mister, sim, provar o fato caracterizador do dano moral e, a partir daí, quantificar o

147
Cf. PASSOS, J.J. CALMON DE. O Imoral nas indenizações por dano moral..., cit, p. 259.
92
valor da reparação tendo em vista a extensão e gravidade do dano, sua repercussão
na esfera íntima do lesado tendo em vista os parâmetros do “homem médio”.
O dano moral, naquelas circunstâncias, é in re ipsa. Obviamente,
situação diversa é a da pessoa jurídica uma vez que a expressão “dano moral” é
usada com outra carga valorativa, com outra conotação, pois o ato ilícito atinge
direitos da personalidade da pessoa jurídica de forma analógica, assemelhada,
equiparada aos da pessoa natural que não são de natureza biopsíquica.
De sorte que, como doutrinam Teresa Arruda Alvim Wambier e Luiz
Rodrigues Wambier
148
, a prova do dano moral não pode ser dispensada, embora
possa ser feita através de presunções como ocorre com a pessoa natural vítima de
dano moral. Ao fixar-se o valor da indenização pela morte de um filho em um conflito
armado, ponderam os autores que não se leva em conta a sensibilidade do
ofendido, havendo uma “padronização” independente da classe social, religião,
sexo, etnia do lesado. Tanto que em uma guerra, a dor sentida pelo pai diante da
morte do filho é a mesma, independente do lado pelo qual se luta, seja para o
americano quanto para o iraniano. O sofrimento, exemplificam os processualistas, é
o mesmo.
Contudo, tal não acontece com as pessoas jurídicas que, por não ter
um organismo biopsíquico, são diferentes entre si. Inclusive quanto as suas
finalidades, podem vestir roupagens diferentes: associações são agrupamentos de
pessoas com finalidades distintas das pessoas que se reúnem em uma sociedade,
voltada para o lucro. Dizem os processualistas retrocitados que é impossível,
portanto, conseguir estabelecer essa “padronização”. Basta analisar cada grupo de
indivíduos para perceber que a finalidade que os une também permite diferenciar
cada espécie de pessoa jurídica por eles criada.
Pinçam da atualidade casos emblemáticos para apontar a diferença
entre as duas situações como a da Escola de Base ocorrida em São Paulo. Algumas
das mães dos alunos desta escola infantil procuraram a polícia e a imprensa para

148
WAMBIER, Luiz Rodrigues; WANBIER, Teresa Arruda Alvim. Prova do dano moral da pessoa
jurídica Revista Jurídica nº 317, p. 7.
93
divulgar o fato de que os sócios-diretores teriam abusado sexualmente de seus
filhos. A escola foi obrigada a fechar as portas diante da pressão popular, com
ameaças inclusive de linchamento dos seus representantes legais. Provada a
inocência destes, a escola não foi reaberta, dada a pecha que maculou seu nome.
Mas a repercussão teria sido outra se o abuso sexual ocorresse no interior de uma
fábrica de motores? Provavelmente, não. As pessoas continuariam a adquirir os
produtos desta última, sem que a atividade negocial restasse inviabilizada,
argumentam os processualistas referidos.
Recentemente um ex-pároco da igreja católica foi acusado de pedofilia
na cidade de Arapiraca. Uma das mais tradicionais instituições particulares de
ensino da cidade, a escola de ensino fundamental Monsenhor Luiz Marques decidiu
trocar de nome após a divulgação na comunidade local das imagens do padre
molestando sexualmente um ex-coroinha.
A questão do “reconhecimento” do dano moral da pessoa jurídica tem
trazido situações esdrúxulas aos tribunais pátrios. A amplitude do conceito e a
valoração inadequada do dano extrapatrimonial, com todo o respeito, é sentida na
decisão do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul ao majorar a condenação de
empresa de telefonia celular, fixando-a em R$ 5.000,00 por ter compelido o
Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Campos Borges a pagar por serviço (short
message) que não contratou na fatura do mês de março de 2007, pelo qual
desembolso R$ 721,50. Obteve a tutela antecipada para suspender a cobrança e
evitar que seu nome fosse inscrito nos cadastros de inadimplentes.
A fundamentação da decisão, com base em indícios e presunções
(pois a prova do fato – se houve a contratação ou não, não ficou esclarecida) ao
incrementar o valor da compensação de R$ 1.500,00 para R$ 5.000,00, se deu com
supedâneo na imposição de pena à empresa de telefonia, pessoa jurídica de grande
porte. Já a parte autora, emenda a Desembargadora Relatora, “é um Sindicato que
representa dezenas de pessoas, pois conforme os documentos acostados aos
autos, são, no mínimo, 26 (vinte e seis) os usuários do sistema de comodato
oferecido, ou seja, os atingidos pela cobrança indevida”, concluindo que o
94
deferimento da indenização em valor reduzido “não alcançará aos quais se propõe a
responsabilização, ou seja, não terá caráter repressivo-pedagógico.”
149
A decisão reflete a forte carga de subjetivismo com a impropriedade de
“enxergar” por detrás da pessoa jurídica os membros que a compõem, de modo,
inclusive, desnecessário. O que importa, para o arbitramento da indenização, é a
gravidade da lesão e não – neste exemplo – o número de pessoas alcançadas.
A Ministra Fátima Nancy Andrighi, em sede de Recurso Especial
interposto pela Companhia Ultragás s/a, reconhece que em casos de protesto
indevido de título, com negativação do nome, não há que se distinguir os critérios de
apuração (prova) do dano moral quer seja a vítima pessoa jurídica ou física. Embora
diga não desconhecer a regra geral de que as pessoas jurídicas devem provar a
ofensa à sua honra objetiva para fazer jus à reparação moral, in casu de inscrição
indevida do nome de empresa em cadastros de inadimplentes ou protestos de título
já quitado, os danos morais prescindem de prova, posto que presumidos,
caracterizam-se in re ipsa.
150
Ao julgar o Recurso Especial 331.517-GO, o Superior Tribunal de
Justiça decidiu que a pessoa jurídica pode sofrer dano moral, dizendo que
“prevalece a orientação de que a responsabilização do agente se opera por força do
simples fato da violação, de modo a tornar-se desnecessária a prova do prejuízo em
concreto”.
De tudo o que foi dito, fica evidente que a questão é tormentosa e será
analisada com vagar em capítulo próprio, uma vez que, - arrisca-se afirmar -,
reconhecida como verdadeira a afirmação de que a pessoa jurídica pode ser lesada
em seu “capital moral”, entende-se que os fatos devem ser rigorosamente provados,
pois o dano moral não é, nessa circunstância, “in re ipsa”.

149
Apelação Cível n. 70024859811, TJ/RS, J. 15/10/2008, Des. Marilene Bonzanini Bernardi.
150
Recurso Especial 1.059.663-RS, Superior Tribunal de Justiça.
95
CAPÍTULO IV – DANO NÃO-PATRIMONIAL E AS PESSOAS JURÍDICAS DE
DIREITO PÚBLICO E DE DIREITO PRIVADO
4.1. – O dano não-patrimonial e a pessoa jurídica.
No decorrer da narrativa, deixou-se claro que a pessoa jurídica tem
personalidade jurídica e patrimônio próprios, distintos dos membros que a compõem,
seja ela uma associação, uma sociedade, uma fundação ou, até mesmo, pessoa
jurídica de direito público, quer da administração direta, quer da indireta.
A pessoa jurídica é uma realidade (e não uma ficção), a quem o
ordenamento jurídico confere personalidade jurídica, da qual emanam uma série de
direitos e sobre a qual impõe outras tantas obrigações. Equipara-a à pessoa natural,
com os recursos da analogia, não apenas pelo entendimento firmado pela doutrina,
mas por força do permissivo constante no artigo 52 do Código Civil.
Ao empregar o conceito vago – no que couber – abriu o diploma civil
verdadeiro leque de possibilidades para a tutela da pessoa jurídica. Isto porque
pessoa – seja natural ou jurídica – é um centro de imputação de normas jurídicas
a quem o Estado outorga proteção para alcançar as necessárias segurança jurídica
e paz social na consecução de suas finalidades. Assim não fosse, o homem não
congregaria esforços para, em grupo, realizar atividades mais complexas que
sozinho não poderia fazer.
151
Mas nem todos os doutrinadores compartilham do mesmo
entendimento. Renan Lotufo, debruçando-se detidamente sobre a análise do artigo
52 do Código Civil, firma posição restritiva à sua aplicação, o que será objeto de
desenvolvimento no próximo capítulo.
152

151
CORDEIRO, Antonio Menezes. O levantamento da personalidade coletiva no direito civil e
comercial. Coimbra: Livraria Almedina, janeiro/2000 p. 73.
152
LOTUFO, Renan. Código civil comentado. V. 1 São Paulo: Saraiva, 2004. p. 149.
96
Respeitada essa colocação, ousa-se dela divergir para ressaltar que a
concepção de dano moral deve ser ampla de modo a compreender, no seu âmbito
de alcance, os chamados danos extrapatrimoniais, imateriais ou não-patrimoniais,
que violam direitos da personalidade como a intimidade, a honra, a privacidade, a
imagem etc.; direitos integrantes do patrimônio imaterial da pessoa (seja ela natural;
seja ela jurídica).
Assim como a pessoa jurídica responde pelos danos causados a
terceiros pela conduta (omissão) de seus representantes e prepostos, com a
consequente escussão dos bens que compõem seu patrimônio quando do
pagamento da indenização (só excepcionalmente atingindo os bens dos sócios em
caso de desconsideração da pessoa jurídica), também é sujeito ativo para pleitear a
reparação de prejuízos sofridos nas suas esferas patrimonial e não-patrimonial.
Deixando-se de lado a indenização do dano patrimonial, foca-se o
assunto na compensação dos prejuízos imateriais, lembrando que a despeito dos
artigos 76 e 159 do Código Civil de 1916, relutava-se em reconhecer o direito do
lesado a recompor os chamados danos morais, no que a Constituição de 1988
colocou uma pá de cal (incisos V e X do artigo 5º da Constituição Federal). Mas a
legislação extravagante anterior à promulgação da novel ordem constitucional, já
estendia à pessoa jurídica tal proteção (Lei de Imprensa (Lei 5.250/67, art. 49,I c/c
art. 16, II e IV), ou no Código Brasileiro de Telecomunicações (Lei 4.117/62, art. 99).
A questão, tormentosa na jurisprudência, foi uniformizada em outubro
de 1999 pelo Superior Tribunal de Justiça na Súmula n. 227, embora os julgados
paradigmas tivessem como foco a pessoa jurídica de direito privado, em especial a
sociedade empresária, quase todas situações de abalo ao crédito:
Súmula STJ nº 227 - A pessoa jurídica pode sofrer dano moral.
Reconheceu-se na jurisprudência o que a doutrina afirmava,
asseguram Silmara Chinellato e Regina Sahm: “a pessoa jurídica é titular de honra
objetiva, a projetada externamente, no âmbito da sociedade”.
153

153
CHINELLATO, Silmara; SAHM, Regina. Código civil interpretado. 3ª ed. Barueri, São Paulo:
Manole, 2010. p. 75.
97
Passados mais de dez anos, estranhamente esse mesmo Tribunal, que
congrega os mais altos representantes do Judiciário, refuta à pessoa jurídica de
direito público e aos órgãos legitimados na defesa dos interesses coletivos e difusos
os direitos que vem concedendo às de direito privado, o que provocou a reação dos
estudiosos do direito.
Em um primeiro momento, teve-se a impressão de que a alta Corte
retrocedeu nos avanços alcançados até então e que havia sedimentado o
entendimento de que a pessoa jurídica, embora não possua um organismo
biopsíquico, pode “sentir” os efeitos da norma que lhe atribui direitos e deveres. No
campo dos direitos, estão compreendidos os direitos subjetivos que emanam da
personalidade e também os chamados direitos fundamentais.
O extinto Tribunal de Alçada de Minas Gerais reconheceu a
possibilidade de uma empresa sofrer os efeitos do dano moral embora não os
sentisse.
“Basta o reconhecimento dessas semelhanças essenciais e da
possibilidade jurídica de direitos e obrigações às pessoas jurídicas
para se concluir que, sem a necessidade de sentir o sofrimento
moral, a pessoa jurídica pode sofrer o dano moral e, pela existência
deste, tem direito à reparação. Afinal, a indenização não se pede
pela dor ou pelo sentimento moral, mas, pelo dano moral objetivo
que pode ser sem dor. O dano moral pode ser um fato objetivo de
infâmia, sem corresponder ao ato subjetivo do sentimento”
.
154
Em similitude com a pessoa natural, tem a pessoa jurídica um nome a
ser presevado; um domicílio que não pode ser violado; prestígio na esfera social que
não pode ser maculado. Todos esses atributos são reconhecidos pela ordem jurídica
constitucional e infraconstitucional e estão inseridos no conceito do artigo 52 do
Código Civil, que permite a extensão da técnica da analogia aos entes morais.
Esse complexo de valores dá forma e estrutura à pessoa jurídica que
recebe reconhecimento e proteção do ordenamento jurídico e, em caso de conflito, a

154
Apelação Cível nº 228.829-7, 2ª Câmara Cível do TAMG, Araguari, Rel. Juiz Carreira Machado.
j. 11.03.97, un., DJ 11.06.97.
98
tutela jurisdicional do Poder Judiciário, coibindo-se a violação dos direitos que
emamam desse complexo normativo. A Constituição de 1988, no artigo 5º, inciso X,
contém cláusula geral de tutela do direito à imagem, assegurando ao lesado
reparação por danos materiais ou morais.
Assim, a pessoa jurídica – seja ela privada ou pública – pode ser vítima
de dano moral, compreendido em uma conceituação ampla. De modo que em caso
de violação, faz jus à reparação. As máculas à credibilidade e ao prestígio de uma
pessoa jurídica – pense-se aqui uma associação filantrópica - são equiparáveis ao
menoscabo à honra das pessoas naturais. O dano moral não implica
necessariamente em subjetivação, pois pode e deve ser, nessas hipóteses,
objetivado.
Referiu-se anteriormente que várias são as classificações da dano
moral e que muitas delas foram formuladas com foco na proteção do homem,
subestimando-se – ousa-se assim dizer – a própria carga valorativa do instituto,
chegando até mesmo a desprestigiá-lo em determinadas situações como se fez
outrora, ao negar-se a indenização por dano moral, sob os mais variados
argumentos.
Muitas dessas formulações coincidem com a Declaração Universal dos
Direitos do Homem e com o pós-guerra. O direito moderno avançou, mas não
impediu que aflorassem as divergências doutrinárias e jurisprudenciais,
permanecendo sem resposta a indagação: pode a pessoa jurídica sofrer dano
moral?
A raiz dessas divergências está, sem sombra de dúvidas, na própria
divergência do conceito de dano moral, sobretudo em razão daqueles que adotam
uma posição subjetivista e daqueles que vislumbram um patrimônio moral, imaterial
em todas as pessoas, sejam elas físicas (naturais) ou jurídicas, independentemente
de “sentir ou querer” e que esses direitos também são suscetíveis de violação.
A chamada posição negativista parte de uma concepção subjetivista do
dano moral cuja violação atinge a pessoa em suas paixões próprias de ser humano,
de sentir, querer e compreender.
99
Todavia, o patrimônio moral de um sujeito não se esgota em seus
sentimentos, havendo um número significativo de direitos sem conteúdo econômico
que tem caráter nitidamente “objetivo”, como o nome, a honra, a intimidade, que são
dignos de proteção e cuja violação muitas vezes acarreta prejuízos exclusivamente
imateriais.
Se assim não fosse, estar-se-ia negando vigência às ordens
constitucional e infraconstitucional em especial aos incisos V e X do artigo 5º da
Constituição Federal, aos artigos 52, 186 e 927 do Código Civil, incisos VI e VII do
artigo 6º do Código de Defesa do Consumidor.
Havendo desrespeito a um bem que compõe o patrimônio imaterial da
pessoa jurídica, ter-se-á caracterizado o dano moral (na amplitude conceitual
adotada no presente estudo), que atingir-lhe-á na sua honra (objetiva), na sua
imagem, na sua reputação e, por evidente, dessa agressão não decorrerá dor,
aflição, abalo psicológico, justamente por faltar-lhe organismo biopsíquico. Mas os
efeitos do dano serão sentidos na esfera moral, por abalar seu patrimônio imaterial,
amealhado ao longo de sua existência, muitas vezes, por inviabilizar a consecução
dos fins para os quais foi criada (e que seriam sua própria essência).
Insista-se: a pessoa jurídica, como sujeito de direitos e obrigações;
realidade jurídica e não mera ficção; reconhecida no ordenamento jurídico como
ente abstrato, que, analogicamente à pessoa natural, tem direitos fundamentais e
direitos da personalidade, tem patrimônio distinto dos membros que a compõem;
responde civilmente pelos atos omissivos e comissivos de seus representantes. Ao
revés, verificado o ilícito cometido contra ela, desfalcando injustamente seu
patrimônio (material ou imaterial), será a pessoa jurídica sujeito credor da
indenização.
Na atual legislação equatoriana, por exemplo, a pessoa jurídica é
sujeito passivo de dano moral posto que pode possuir bens extrapatrimoniais, como
o bom nome; a confiança do público etc.
100
Como expõe José C. Garcia Falconi, os ataques ao crédito e ao
prestígio de uma empresa se equiparam a honra dos humanos, podendo-se concluir
que uma pessoa jurídica pode sofrer dano moral.
155
O artigo 1.902 do Código Civil espanhol, por seu turno, fala de “dano”
sem especificar se moral ou material, reconhecendo o artigo 38 do mesmo diploma
legal, o direito da pessoa jurídica defender sua reputação.
156
Entretanto, a jurisprudência majoritária na Espanha segue dizendo que
as pessoas jurídicas (em geral) tem fama, crédito ou reputação como dano material
e não como dano moral. Interessante notar que o artigo 18.1 da Constituição
espanhola garante a defesa da honra à pessoa jurídica de direito privado (aqui
entendida como reputação). Embora esta não seja estritamente necessária para o
cumprimento de seus fins, há razão para sua proteção, pois permite ao ente moral

155
Es procedente el daño moral a las personas jurídicas? Esta es una de las interrogantes que me
han planteado algunos colegas abogados...Se dice que es procedente el daño moral a una persona
ideal, cuando haya sido perjudicada directamente a consecuencia de un hecho y esto es obvio, ya
que todo acto o hecho contrario a la ley no deja de dañar gravemente a toda entidad al margen de
la faz económica, ora en el buen nombre o en la confianza del público ora en el crédito que goza.
Recordemos que la persona jurídica es sujeto pasivo del daño moral en la actual Legislación del
país, puesto que si bien ella no puede alimentarse de sentimientos de bienestar o dicha puede
poseer otros bienes extra patrimoniales. Así se dice que los ataques al crédito y prestigio de una
empresa, se equipara al honor de los humanos”. Cf. GARCIA FALCONI, José C. Artigo escrito pelo
profesor da Faculdade de Jurisprudencia da Universidade do Equador, José García Falcón, para o
diário “La Hora” Disponível em
<http://www.dlh.lahora.com.ec/paginas/judicial/PAGINAS/D.Civil.10.htm> Acesso em: 08/06/06.
O Código Civil do Equador
. Ley Reg Of n. 46 de 24 de Junio de 2005 dispõe que: Art. 2231.- Las
imputaciones injuriosas contra la honra o el crédito de una persona dan derecho para demandar
indemnización pecuniaria, no sólo si se prueba daño emergente o lucro cesante, sino también
perjuicio moral;.
Art. 2.233
- La acción por daño moral corresponde exclusivamente a la víctima o a su representante
legal. Mas, en caso de imposibilidad física de aquella, podrán ejercitarla su representante legal,
cónyuge o parientes hasta el segundo grado de consanguinidad. De haber producido el hecho ilícito
la muerte de la víctima, podrán intentarla sus derecho habientes, conforme a las normas de este
Código.
Cuando el daño moral afecte a las instituciones o personas jurídicas, la citada acción corresponderá
a sus representantes.
<http://www.derechoecuador.com/index.php?option=com_content&task=view&id=4112&Itemid=415
> Acesso em 20.09.2009.
156
: Código Civil espanhol: Artículo 1902. El que por acción u omisión causa daño a otro,
interviniendo culpa o negligencia, está obligado a reparar el daño causado
Artículo 38
. Las personas jurídicas pueden adquirir y poseer bienes de todas clases, así como
contraer obligaciones y ejercitar acciones civiles o criminales, conforme a las leyes y reglas de su
constitución. La Iglesia se regirá en este punto por lo concordado entre ambas potestades; y los
establecimientos de instrucción y beneficencia por lo que dispongan las leyes especiales.
Constituição espanhola: Artículo 18
. 1. Se garantiza el derecho al honor, a la intimidad personal y
familiar y a la propia imagen.
101
usufruir uma existência tranquila e manter íntegra a sua identidade. Por exemplo, se
uma fundação perder sua reputação, acabará sem receber doações. Mas os
prejuízos, no entendimento majoritário da jurisprud6encia espanhola, são sempre
patrimoniais, pois o critério dos fins deve subordinar-se aos da natureza.
Clayton Maranhão, depois de discorrer acerca da possibilidade de
danos morais causados à honra (difamação) de pessoa jurídica, defende a tese de
que inclusive o órgão integrante de pessoa jurídica de direito público, como o
Ministério Público, poderia pleitear a reparação dos danos causados contra a
instituição.
As hipóteses são restritas, por certo, mas a pretensão de que “órgãos
públicos destituídos de personalidade jurídica venham reclamar em juízo os
chamados ‘direitos-funções’, ou seja, a preservação de competências
constitucionalmente asseguradas a interesses institucionais” é cabível.
157
A jurisprudência argentina rechaçou a pretensão de reparação de
danos morais a uma sociedade mercantil no emblemático caso Kasdorf ocorrido na
Província de Juyjuy e que acarretou a diminuição das vendas de “Bonalac”. O leite
em pó comercializado pela Kasdorf s/a sofreu contaminação por pesticida durante o
transporte feito pela empresa Mil Millas, casuando a morte de vários bebês no
hospital público Pablo Soria que também, em atitude negligente, ministrou aos
lactentes leite proveniente de embalagens manchadas de amarelo e com forte odor
de produto químico.

157
MARANHÃO, Clayton. A tutela jurisdictional da honra objetiva do Ministério Público na hipótese
de abuso (ou de não-incidência) da imunidade material parlamentar: uma contribuição ao estudo
das tutelas de prevenção do ilícito e de repressão do dano In: MARINONI, Luiz Guilherme (Coord).
Estudos de direito processual civiI em homenagem ao Prof. Egas Dirceu Moniz de Aragão. São
Paulo: Revista dos Tribunais, 2005. p. 673.
102
Apesar da decisão da Corte Judiciária não ter sido unânime
158
, não se
concedeu indenização por dano moral, sob a forte justificativa de que uma
sociedade comercial tem capacidade jurídica limitada pelo princípio da especialidade
e que a sua finalidade própria é a obtenção de lucro. Tudo aquilo que pode afetar o
prestígio ou bom nome da sociedade ocorre por duas ordens: ou bem redunda em
uma diminuição de seus benefícios ou bem carece de transcendência para justificar
uma indenização. Isto porque, conclui a alta Corte argentina, os entes morais não
são suscetíveis de sofrer padecimentos espirituais.
A doutrina chilena não diverge mais acerca da legitimidade ativa das
pessoas jurídicas para pleitear a reparação por dano moral quando houver violação
a algum atributo de sua personalidade, questão sedimentada pelos tribunais locais.
Tal assertiva foi veiculada pela mídia, acompanhada da íntegra do pedido formulado
pelo Colegio de Periodistas de Chile em demanda judicial na qual pleiteava
reparação de danos exclusivamente morais pelas mazelas do regime do General
Pinochet e que haviam ocasionado a morte de jornalista, além de ter impingido a
censura e o medo na sociedade chilena.
Também nesse país, havia os que resumiam o dano moral somente à
pretium doloris, negando a titularidade das pessoas jurídicas à reparação do dano
moral por não ter “sentimentos” e, portanto, não poder “sofrer dor”. Mas a notícia

158
Cf. voto divergente de Bacqué que concedia indenização por danos morais em razão da enorme
repercussão pública dos fatos e por causar o desprestígio comercial da Kasdorf. Ademais, os
depoimentos dos profissionais do hospital deixaram claro que as mães passaram a solicitar que os
médicos receitassem outro leite para seus filhos. Bacqué fundamenta o voto nas seguintes
palavras:
- Que si bien es cierto que el concepto de daño moral, en tanto se relaciona con la lesión a bienes
jurídicos extrapatrimoniales, propios de las personas físicas como son sus afecciones legítimas, no
resulta en tales términos, apropiado en el caso de las personas jurídicas, no lo es menos que éstas,
provistas de subjetividad jurídica, poseen atributos de igual naturaleza extrapatrimonial que, si bien
de manera indirecta, le son reconocidos para el logro de sus fines específicos. Estos atributos,
como el prestigio, crédito comercial, o el derecho al nombre, son valorizados por la comunidad en
que se desenvuelven y su menoscabo genera un daño de características similares a la lesión de los
bienes extrapatrimoniales característicos de las personas de existencia visible y que deben ser
objeto de tutela aún al margen de la existencia de un perjuicio patrimonial actual y cierto. Por lo
demás constituye prueba elocuente del amparo legal que aquellos atributivos merecen lo dispuesto
--bien que el ámbito del derecho penal--por el art. 112 del Código respectivo.
- Que es evidente que el lamentable episodio suscitado produjo a más de las consecuencias
materiales que ya fueron objeto de estudio, efectos que obraron en detrimento de la consideración
empresaria de la actora, cimentada por una prolongada actuación en los ramos comerciales donde
participaba activamente y que se ve lesionada ante los consumidores de sus productos y el público
en general. En tales condiciones, corresponde reconocerle la existencia de un daño moral que se
justiprecia en la suma de 389.000.000. (Kasdorf, S. A. c. Provincia de Jujuy y otro s/ Daños y
Perjuicios. Buenos Aires, marzo 22 de 1990).
103
ressalta, em referência à doutrinadora Carmen Dominguez Hidalgo, que há os que
consideram que as pessoas jurídicas tem alguns atributos semelhantes ao das
pessoas naturais, que se violados devem dar lugar a uma reparação
extrapatrimonial, como a honra, o prestígo, o bom nome, o segredo ou privacidade
de seus negócios etc. O Colégio de Periodistas, como organização que assumiu a
representação e defesa dos interesses coletivos de uma profissão (objeto social),
teria assim legitimidade ativa para ajuizar ação de reparação de danos morais
quando há lesão a esses interesses e também quando afeta
“el sustento básico y esencial para el buen ejercicio del periodismo,
esto es, la libertad de expresión, de información y de emitir opinión.
Con mayor razón cuando el daño ha sido ocasionado por agentes del
mismo Estado que tiene, a su vez, la obligación de resguardar dichos
intereses y garantizar el ejercicio de tales libertades reconocidas
como garantías constitucionales. Por eso, en estas circunstancias, la
reparación del daño procede, tanto por la acción de los agentes del
Estado como por la omisión de sus órganos, responsables de cuidar
aquellos derechos y libertades”
.
159
Com o assassinato do líder nacional e jornalista, José Humberto
Carrasco Tapia, a entidade jurídica que traz nos seus estatutos o objetivo de defesa
da liberdade de expressão, se viu lesada nos atributos essenciais de sua
personalidade que motivaram a sua criação: la defensa del ejercicio de la profesión
de periodista, la protección de tal ejercicio, la de los propios periodistas y la defensa
de las libertades de expresión, de emitir opinión y de informar sin censura previa.
160
Parte considerável da doutrina pátria ainda sustenta que a pessoa
jurídica só pode sofrer prejuízos patrimoniais, afirmando que o nome comercial
ostenta caráter estritamente patrimonial e não moral.
Instalado o dissídio jurisprudencial quando da edição da Súmula 227
do Superior Tribunal de Justiça, o voto prolatado pelo Ministro Eduardo Ribeiro,

159
DOMINGUEZ HIDALGO, Carmen. El daño moral. Editorial Jurídica de Chile. Tomo II, p. 720
160
Disponível em <http://www.radio.uchile.cl/interno.asp?id=29966> Acesso em 08/06/06.
104
então acompanhado pelo Ministro Carlos Alberto Menezes Direito, indagava: qual o
suporte jurídico para admitir o dano moral da pessoa jurídica?
Asseverou o Relator do Recurso Especial 147.702 MA, que:
“O conceito de honra objetiva, opondo-se ao conceito de honra
subjetiva, é apenas um artificio para o fim colimado.
Tudo o que se passa na esfera da atividade empresarial repercute no
patrimônio. Se por exemplo, contra uma instituição financeira é
assacada afirmação mentirosa sobre a sua capacidade de cumprir os
compromissos com seus clientes é evidente que não há falar em
dano moral, mas sim, em dano à credibilidade da empresa com
repercussão patrimonial, assim a fuga de clientes ou o encerramento
das contas. O que não pode existir é a empresa sentir-se ofendida
na sua dignidade, na sua honra. Se fosse diferente, estar-se-ia no
reino do absurdo.
É claro que a construção interpretativa pode sempre preencher as
lacunas, para compatibilizar a lei com a realidade. Todavia, essa
interpretação construtiva tem cabimento quando não há caminho
legal para amparar a prestação jurisdiccional. Ora, no caso da
pessoa jurídica, o direito brasileiro tem outras avenidas que podem
ser percorridas para esse efeito”.
Claro está que o eminente voto foi prolatado antes do advento do
Código Civil, não havendo o permissivo do artigo 52. Também é óbvio que o
desprestígio da pessoa jurídica – diga-se a sociedade empresária – arrebata suas
perspectivas de lucro, diminuindo suas capacidade econômica. Mas tudo a depender
de prova, que, ao que parece, difícil de ser feita, diante dos entraves na
demonstração do nexo causal, tendo em vista que o Código Civil adotou a teoria da
causalidade imediata.
Assim, a amplitude do conceito de dano moral permite abarcar efeitos
que atinjam inúmeros valores imateriais, sem, contudo, pecar-se na técnica, pela
interpretação teleológica do artigo 52 do Código Civil.
Matilde Zavala de Gonzalez diz que muitos dos danos se sentem de
forma coletiva, dada a complexidade do mundo moderno. A titularidade se fragmenta
105
entre uma quantidade de sujeitos particulares indefinidos, permitindo-se falar em
danos coletivos ou comunitários.
Em consequência, se assiste a uma acentuação do coletivo na
construção da responsabilidade civil sendo que a concepção de dano se
redimensiona para abarcar interesses sociais:
“el daño trasborda el buque del individuo e ingresa en el que
desplaza a toda una cierta comunidad”. (…) “Es que la ’persona’
mira esencial del derecho civil – no es igual que ‘individuo’, pues
deviene inseparable de la existencia plena del hombre – quien no
vive como un Robison Crusoe – la faceta comunitaria. Y la sociedad
no queda en la vereda de enfrente, sino que penetra en el ser
humano, “haciéndolo’, y éste se vuelca hacia aquélla,
‘rehaciéndola’.
161
Também cabe complementar a asertiva, ressaltando que não há uma
separação tangente entre o individual e o social. Pelo contrário, no mundo atual o
papel da pessoa se desenvolve e se oculta sob a roupagem da integração de
múltiplas comunidades e pelos mais diversos interesses: familiares, laborais,
profissionais, políticos, religiosos e até simplesmenete por pertencer ao gênero
humano. Tal a importância desse agregamento para o desenvolvimento da pessoa
que, isoladamente, não atingiria muitos dos propósitos para os quais se dedica. Por
tal motivo, há uma particular complexidade na propagação dos danos, que se passa
a sofrer em grande medida coletivamente.
Ademais, o patrimônio público deve ser efetivamente protegido que
quaisquer lesões ou de ameaça de lesão, sendo que o “conceito de ‘patrimônio
público’, para esse efeito, é o mais amplo possível, abarcando, inclusive, aquele
empregado na forma do parágrafo único do artigo 1º” da chamada Lei de
Improbidade, ou seja, o dano moral, garante Marcelo Figueiredo.
162

161
ZAVALA DE GONZALEZ, Matilde. Resarcimento de daños. Daños a las personas (integridad
sicofisica). Buenos Aires, Editorial Hammurabi s.r.l., 1996. p. 32
162
FIGUEIREDO, Marcelo. Probidade administrativa: comentários à lei 8.429/92 e legislação
complementar. São Paulo: Malheiros Editores, 1995. p. 31.
106
4.2. – As vertentes compreendidas na noção de dano não-patrimonial.
De tudo o que foi dito até o presente momento, extrai-se a conclusão
de que as incertezas jurídicas existentes na doutrina e na jurisprudência acerca da
reparação do dano moral são fruto da ausência de um conceito uniforme do referido
instituto. Talvez até mesmo pela visão equivocada de que as normas destinam-se
apenas para a proteção da pessoa natural, cuja dignidade se quer preservar sem se
atentar para a existência de outros fenômenos jurídicos.
Não se acordou, ainda, para a socialização das relações jurídicas e
que a proteção do dano moral não tem como destinatário tão-somente o indivíduo,
mas toda a coletividade. Até mesmo, - ousa-se dizer -, não se cuidou de fazer uma
opção legislativa que, apurando os conceitos, evitaria celeumas quase sempre
desastrosas.
Será que a falha conceitual levou até mesmo a Constituição Federal à
reconhecer juridicamente indenizáveis três espécies de danos: patrimonial, moral e à
imagem. O dano à imagem não estaria compreendido no âmbito do dano moral?
Seria, então, um terceiro gênero?
A Assembléia Constituinte de 1988 recebeu inúmeras sugestões, tendo
consultado não apenas especialistas, mas a opinião popular.
Pela leitura dos debates da época, aflorava a preocupação popular e
das comissões constituídas na Câmara dos Deputados e no Senado, de se livrar dos
ranços da ditadura, da censura à imprensa, da opressão às liberdades individuais
etc.
O viés da nova Carta Magna era o da garantia dos direitos
fundamentais, sobretudo o direito à dignidade da pessoa humana, em toda a sua
plenitude. Lutava-se pela auto-aplicabilidade dos direitos fundamentais,
reconhecidos dentro da mais vasta gama, pois, como bradou Cândido Mendes, a
intromissão dos meios eletrônicos e de informática trazia “o problema fundamental
107
de que hoje não temos apenas a defender o corpo: estamos diante do rapto da
alma”.
163
Seu discurso inflamado alertava para a necessidade de se dotar a
pessoa de um mecanismo que neutralizasse as ações abusivas da mídia,
convalidando-se constitucionalmente o direito de resposta, na proporcionalidade e
instantaneidade entre a agressão sofrida e a sua correção; pois não era mais
possível admitir-se que o direito de resposta viesse estampado em uma pobre nota,
uma errata, uma vez que, da forma como estava disciplinado, vulnerava a pessoa
num câncer irremissível.
164
De que adiantam todas as indenizações do mundo se a honra é
irrecuperável?!, bradou Cândido Mendes no Plenário da Câmara dos Deputados.
Assim, o direito de resposta passa a granjear outros terrenos, para ser mecanismo
de defesa não apenas da honra, mas também da imagem. Talvez, por força até
mesmo da persuação de Cândido Mendes, que preparou o texto do pronunciamento
do Papa João Paulo VI às Nações Unidas em 1976.
Confidenciou-lhe o Pontífice que “bocejou nas Nações Unidas”! Ora,
nada mais humano! Mas se um fotógrafo retratasse o momento: o Papa bocejando
diante do Plenário Munidial? O fato redundaria em um vilipêndio à imagem e não há
honra de Sua Santidade. O incidente, diante da implacabilidade da mídia, denigreria
a imagem do Papa perante as nações que exibiam o evento, pois era uma imagem
em dissonância com o normal dessa figura. De maneira que Cândido Mendes
ressaltou a importância do estabelecimento, dentro da Constituição Federal, “dessa
equivalência entre afirmação como direito da imagem e como garantia do direito de
resposta”.
165

163
BRASIL. Assembléia Nacional Constituinte (1987-1988). Anais da Assembléia Nacional
Constituinte. Brasília: Senado Federal, 1994. Câmara dos Deputados. Centro de Documentação e
Informação. Coordenação de Relacionamento, Pesquisa e Informação – CORPI – CF 1988 – art 5,
V Discussões na ANC 87/88. Brasilia, 12/03/2010
164
BRASIL. Assembléia Nacional Constituinte (1987-1988). Anais da Assembléia Nacional
Constituinte. Brasília: Senado Federal, 1994. Câmara dos Deputados. Centro de Documentação e
Informação. Coordenação de Relacionamento (cit).
165
BRASIL. Assembléia Nacional Constituinte (1987-1988). Anais da Assembléia Nacional
Constituinte. Brasília: Senado Federal, 1994. Câmara dos Deputados. Centro de Documentação e
Informação. Coordenação de Relacionamento (cit).
108
Ao que tudo indica, o contexto histórico – fim da ditadura militar, Diretas
Já, Constituinte, a preocupação em garantir os direitos fundamentais, em
regulamentar a liberdade de imprensa e a liberdade de expressão - tenha permitido
a inserção, ao lado dos danos patrimoniais e morais, da reparação dos danos à
imagem, como afirmação de um direito subjetivo até então não inserido nas
constituições anteriores. De modo que o dano à imagem ganha espaço na
Constituição como modo de reconhecimento e proteção, como fluem as palavras do
representante da Comissão de Justiça e Paz, pois às vezes, os novos direitos são o
convalescimento de atentados antigos, que possivelmente pela sua terrível
contemporaneidade, precisariam de um outro tratamento constitucional.
Valeu-se então de um momento histórico para se prestigiar institutos -
o direito de resposta e a reparação de imagem – contrabalançando os direitos
fundamentais do homem, os de liberdade de pensamento, de intimidade, de
privacidade e o direito/dever da mídia de informar, a chamada liberdade de
imprensa.
Não se esqueceu, é claro, de que os meios tecnológicos à disposição
dos órgãos de comunicação permitem a difusão da notícia e da informação de modo
extremamente abrangente e em tempo real. A resposta daquele que se sentiu
ofendido pode até vir “a galope”, como diz o ditado popular, mas obviamente não
terá o mesmo impacto da mensagem divulgada pela mídia, “por isso recrudesce e
assume indiscutível realce a incolumidade moral da pessoa física e jurídica”.
166
Mas a oportunidade de se debruçar sobre o tema foi usada no capítulo
anterior, com a apresentação de inúmeras definições e critérios de classificação do
dano. Mas quais seriam as vertentes compreendidas na noção de dano não-
patrimonial? Se o dano é único, como asegura Aguiar Dias, e seus efeitos são
patrimoniais ou não-patrimoniais, como arremata Maria Helena Diniz, onde se
enquadraria o dano à imagem? Como categoria autônoma?
Outrossim, a Constituição Federal ao utilizar-se do termo “dano moral”
em contraposição ao dano patrimonial, usa-o como sinônimo de dano não-

166
Cf. JABUR, Gilberto Haddad. Liberdade de pensamento e direito à vida privada. Conflitos entre
direitos da personalidade, cit., p.21.
109
patrimonial? Ou seria uma das espécies deste último? Seria ainda correto equiparar-
se o nomem iuris “dano moral” ao de “dano imaterial” ou “dano extrapatrimonial”?
Tantas impropriedades, inclusive terminológicas, permitiram a
formulação de um conceito próprio de dano moral ou não-patrimonial, como já dito,
com uma carga valorativa a impedir sejam aquilatadas monetariamente celeumas de
menor importância, como as contrariedades do cotidiano. Só mereceriam ser
reparadas as condutas reprováveis pelo ordenamento jurídico que causassem uma
grave reação na vítima por repercutir na sua esfera imaterial e, em algumas
circunstâncias, até mesmo patrimonial.
Também foi dito que o termo “moral” seria de modo abrangente a
abarcar o dano estético; o dano à honra; o dano à imagem; o dano à vida; o dano ao
corpo; o dano às partes do corpo; o dano à intimidade; o dano à privacidade e o
dano psicológico. Ressaltou-se que a esfera dos direitos da personalidade é por
demais ampla e assim deve ser encarada pelo exegeta, com vistas à assegurar o
princípio da dignidade, podendo compreender direitos não elencados no Código Civil
ou em lei especial.
Por conseguinte, seria indiferente chamar-se o dano de moral,
imaterial, não-patrimonial ou extrapatrimonial. O dano é um só. Os seus efeitos
serão sentidos (inclusive objetivamente) no conjunto de bens imateriais (direitos) da
pessoa, seja ela natural ou jurídica. Isso porque o ordenamento jurídico lhes outorga
a mais ampla proteção para a consecução de suas finalidades.
De modo que nada impede que a lesão a um direito da personalidade
repercuta na imagem, na honra, na credibilidade e ainda cause um dano psicológico
na vítima (pessoa física). Como se o feixe de luz atravessasse o prisma, com
variadas matizes de cores.
Não se desvirtuando do motivo que a criou e da finalidade perseguida
por aqueles indivíduos que a compõem, tendo sido constituída tal qual disposto na
lei, a pessoa jurídica amealha ao longo de sua existência, até a sua extinção, não só
um patrimônio material, mas direitos, valores etc, que lhe dão reconhecimento na
sociedade.
110
Em entrevista para o diário equatriano “La Hora”, José García Falcóni
deixa claro que a questão é também tormentosa para os estrangeiros. Ressalta que
a atual legislação do seu país admite a indenização por dano moral às chamadas
“pessoas ideais”, pois embora essas não tenham sentimentos de bem-estar, podem
se apoderar de outros bens extrapatrimoniais. Assim, se diz que as afrontas à
credibilidade e ao prestígio de uma empresa, se equiparam à honra das pessoas
humanas.
O dano moral é aquela espécie de gravame correspondente a alguns
dos direitos personalísimos, aqueles direitos subjetivos que protegem como bem
jurídico as “faculdades” ou “pressupostos” da personalidade, a paz, a tranquilidade
de espírito, a vida íntima ou direito a privacidade, a liberdade individual, a
integridade física, a honra da pessoa, refere o professor equatoriano.
167
Nancy Andrighi enfrentou caso em que houve a divulgação de textos
que feriram a honra objetiva da WWF Brasil – Fundo Mundial para a Natureza,
maculando sua reputação perante a sociedade, da qual a organização, que tem
como mote a defesa do meio ambiente, depende diretamente para a obtenção dos
fundos necessários à sua manutenção (por tratar-se de associação).
168
A demanda foi originalmente analisada sob a ótica da infração à
intimidade da pessoa jurídica, tendo o voto corrigido a impropriedade, permitindo-se
a Ministra do Superior Tribunal de Justiça dissertar acerca da interpretação do artigo
52 do Código Civil e do direito à intimidade da pessoa jurídica.
Ressalta, com referência à doutrina de Elimar Szaniawski, que o direito
à intimidade não deve ser negado à pessoa jurídica, mas apenas adaptado às
peculiaridades destas. A intimidade da pessoa jurídica decorre de que esta só pode
desenvolver e cumprir suas finalidades estatutárias e contratuais se existir para as
mesmas uma esfera secreta, que impossibilite a aproximação indesejada dos olhos
e ouvidos alheios ou qualquer outra forma de indiscrição, o que é imprescindível
para sua existência. Não só necessita a pessoa coletiva de sigilo em relação à sua

167
Disponível em <http://www.dlh.lahora.com.ec/paginas/judicial/PAGINAS/D.Civil.10.htm> Acesso
em 08/06/06
168
RESP 744.537 – RJ. Recorrente: WWF Brasil – Fundo Mundial para a natureza – Recorrido:
Movimento de Solidariedade Ibero-Americana MSIA e outros
111
escrita comercial, às suas operações bancárias, mas toda a atividade empresarial
necessita de certo grau de segredo.
Valendo-se dos ensinamentos de Adalberto Simão Filho, argumentou
que:
“A vida privada da pessoa jurídica, portanto, poderia ser violada,
exemplificativamente, nos casos de violação ao sigilo de
correspondência (art. 5º, XII da CF), divulgação de segredo comum
(art. 153 do CP), violação de segredo profissional (art. 154 do CP), e
concorrência desleal (art. 195 da Lei nº 9.279/96)”.
169
Aguiar Dias, numa das primeiras edições de seu verdadeiro tratado
sobre a responsabilidade civil, mostrava a timidez da jurisprudência pátria quando o
tema era dano moral, mas afirmava que:
“A pessoa jurídica pública ou privada, os sindicatos, as autarquias
podem propor ação de responsabilidade, tanto fundada no dano
material como no prejuízo moral. Este ponto de vista, esposado pela
generalidade dos autores, é sufragado hoje pacificamente pela
jurisprudência estrangeira. A nossa carece de exemplos, ao menos
de nós conhecidos. Não há razão para supor que não adote, ocorrida
a hipótese, igual orientação”
.
170
Sempre à frente de seu tempo, Pontes de Miranda admitia como
indenizável o dano não-patrimonial às pessoas jurídicas,
“Desde que, com dinheiro, se possa restabelecer o estado anterior
que o dano não patrimonial desfez, há indenizabilidade do dano não
patrimonial. Se houve calúnia ou difamação da pessoa jurídica e o
efeito não patrimonial pode ser pós-eliminado ou diminuído por
algum ato ou atos que custam dinheiro, há indenizabilidade”
.
171
O dano à imagem está ligado ao dano moral, assegura Alexandre
Ferreira de Assumpção Alves, sendo que a sua violação repercute na reputação da

169
Recurso Especial n. 744.537/RJ. Recorrente: WWF Brasil – Fundo Mundial para a natureza
Recorrido: Movimento de Solidariedade Ibero-Americana MSIA e outros
170
AGUIAR DIAS, José de. Da responsabilidade civil. Forense: Rio de Janeiro, 1983 p 897.
171
MIRANDA, Francisco C. Pontes de Tratado de direito privado. Rio de Janeiro: Borsoi, 1971.
XXVI, § 3.108, p 32.
112
pessoa jurídica, dimunindo não apenas o seu sucesso comercial, mas afetando sua
credibilidade, como será esclarecido a seguir.
172
4.2.1 – O dano à imagem.
Estabeleceu-se, pois, como premissa verdadeira, que a pessoa jurídica
tem um patrimônio imaterial, ideal ou moral em contraponto ao patrimônio material.
Podendo-se também afirmar que os direitos da personalidade compõem os valores
extrapatrimoniais da pessoa jurídica tal como os da pessoa natural.
Entretanto, a extensão desses direitos às pessoas jurídicas só adquire
sentido enquanto alicerçados nos direitos da personalidade reconhecidos e análogos
aos das pessoas que as integram e fieis às finalidades propostas, “objetivando-se”
os seus efeitos, ou seja, a extensão se torna inviável em alguns direitos cujo
conetúdo é atribuído exclusivamente à pessoa natural como o caso da imagem-
retrato ou direito à própria imagem, entendida como representação gráfica da figura
humana, pois este direito só pode se adaptar à pessoa natural.
Embora o Código Civil não traga um rol discriminando os direitos da
personalidade, a doutrina encarregou-se de fazê-lo. De sorte que dentre os direitos
da personalidade há que se pinçar quais podem ser dirigidos à pessoa coletiva,
perquirindo-se sobre o dano à imagem que vem regulamentado no artigo 20 do
Código Civil.
O dispositivo legal em comento faculta à pessoa proibir que sejam
veiculados, sem sua autorização, escritos, palavras, publicações, sua imagem, se
forem destinadas a fins comerciais ou, ainda, se atingirem a sua honra, boa fama ou
prestígio.
Por certo, a imagem-retrato é a representação física da pessoa por
meio de fotografia, pintura, desenho escultura etc (artigo 5º, inciso X da Constituição

172
ALVES, Alexandre Ferreira de Assumpção. A pessoa jurídica e os direitos da personalidade, cit.,
p. 100.
113
Federal) enquanto a imagem-atributo é entendida como conceito que a pessoa goza
perante a sociedade (artigo 5º, inciso V, da Constituição Federal). Obviamente, só
esta última interessa ao presente estudo. De modo que, em ambas as situações, a
pessoa poderá impedir a divulgação.
Maria Helena Marques Braceiro Daneluzzi e Maria Lígia Coelho
Mathias alertam que a avaliação social que a pessoa recebe no meio em que se
insere é indevidamente chamada como imagem, denominação usada na linguagem
coloquial, pois na verdade é “honra”. “Esta – honra – se biparte em: honra subjetiva,
quando o prestígio social é avaliado pela própria pessoa e honra objetiva, caso o
juízo valorativo seja o do grupo social”.
173
Para Maria Lígia Coelho Mathias,
“A questão de se reconhecer às pessoas jurídicas direitos da
personalidade é polêmica e a doutrina não converge, para uma
posição uniforme. Quanto ao direito à imagem, entendemos que ele
só existe dentro da esfera dos direitos da personalidade da pessoa
natural. As pessoas jurídicas não podem arguir em sua defesa esse
direito, porque, como ente moral, são desprovidas de imagem e sua
representação se faz através de símbolos ou de um sinal
figurativo”
.
174
Tal entendimento, ao que parece, é referente e restrito à imagem-
retrato (honra subjetiva) e não à imagem-atributo (honra objetiva). A representação
da pessoa jurídica se faz através de símbolos que, muitas vezes ganham
significativo relevo e podem ser objeto de ilícito penal, portanto, indenizáveis
civilmente os danos daí decorrentes.
Outros doutrinadores se debruçaram sobre a questão, afirmando que a
Constituição Federal fez uma opção de tratar o dano à imagem de forma autônoma.
Claro está que esta foi a mens legislatoris, - asseguram Oduvaldo e Rogério Donini -

173
DANELUZZI, Maria Helena Marques Braceiro; MATHIAS, Maria Lígia Coelho. Aspectos da
responsabilidade civil sob a perspectiva do direito à imagem In NERY, Rosa Maria de Andrade;
DONINI, Rogério (coord) Responsabilidade Civil: estudos em homenagem ao professor Rui Geraldo
Camargo Viana. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2009 p. 369.
174
MATHIAS, Maria Ligia Coelho Direito à própria imagem. 1994. Dissertação (Mestrado em Direito
Civil sob orientação da Profa. Maria Helena Diniz) Faculdade de Direito – Pontifícia Universidade
Católica de São Paulo (1994). p. 55
114
, pois se o dano moral for encarado como a violação do direito da personalidade, o
dano à imagem integraria esse rol e, por conseguinte, estaria compreendido na
noção de dano moral. Mas o legislador inovou fazendo um discrímen entre dano
moral e dano à imagem.
Isso porque, dizem os citados mestres, em uma dada situação podem
estar “configurados danos materiais, morais e à imagem, que devem ser analisados
de forma autônoma e quantificados da mesma forma, vale dizer, uma determinada
soma, a título de indenização, para cada um desses danos”.
Essa autonomia é tão evidente - na ótica dos autores - que afirmam
que “nada impede, também, que de um certo fato decorra apenas a violação ao
dano à imagem, sem que se cogite dequalquer dano material ou moral”.
175
O Superior Tribunal de Justiça teve a oportunidade de julgar ação de
indenização em que a vítima, atriz de renome nacional e conhecida por sua beleza
singular, pleiteava a reparação do dano à imagem cumulada com dano moral. O fato
lesivo consistia na divulgação de foto com os seios nus feita para a Revista Playboy
e que foi estampada em jornal de grande circulação sem sua autorização. Entendeu
o Tribunal a quo que se configurou a violação à imagem, mas o uso não autorizado
desta não trouxe à vítima dor, vexame, humilhação a justificar a indenização por
dano moral, no que foi acompanhado pelo Ministro Carlos Alberto Menezes Direito
(voto vencido). Admitindo a possibilidade de cumular-se a indenização pelo uso
indevido da imagem e a indenização pelo dano moral, dependendo das
circunstâncias concretas de cada caso, concluiu o saudoso julgador que, na
hipótese “o uso indevido é suficiente para justificar a indenização por violação ao
direito à imagem; quanto ao dano moral, contudo, a lesão à honra, à dignidade,
provocando sentimento íntimo de dor e de sofrimento, de humilhação e de vexame,
neste feito, diante da situação concreta antes desenhada, não está presente”.
176
O voto vencedor, de lavra da Ministra Nancy Andrighi, concedeu à atriz
ampla indenização, tanto pelo dano à imagem como pelo dano moral, mesmo
porque o decoro, o sentimento de auto-estima, tem um “termômetro próprio inerente

175
DONINI, Oduvaldo. Imprensa livre, dano moral, dano à imagem, e sua qualificação à luz do novo
código civil/ DONINI, Oduvaldo; DONINI, Rogério Ferraz. São Paulo: Método Editora, 2002. p. 62.
176
Recurso Especial nº 270.730/RJ – Superior Tribunal de Justiça.
115
a cada indivíduo”. Daí ter a doutrina feito uma divisão no conceito de honorabilidade:
“honra objetiva, a opinião social, moral, profissional, religiosa que os outros tem
sobre aquele indivíduo, e, honra subjetiva, a opinião que o indivíduo tem de si
próprio”.
A visão que se procura desenvolver no presente estudo, com todo o
respeito que merecem as posições contrárias, circunscreve-se à tutela dos valores
imateriais da pessoa jurídica. A imagem, quando violada, produz efeitos na esfera
extrapatrimonial do lesado, seja ele pessoa jurídica ou natural, causando-lhe dano
moral, na ampla conceituação que foi dada.
O conceito de dano não-patrimonial, para De Cupis, não poderá limitar-
se ao campo do sofrimento físico ou moral, mas abranger “tutti i danni che non
rientrano nell’altro gruppo, quello dei danni patrimoniali: vale a dire che la loro
nozione non può essere che negativa”. Dessa maneira, as pessoas jurídicas, tanto
uma sociedade comercial como uma benemérita, podem ser sujeitos de dano não-
patrimonial diante de uma campanha difamatória, de violação de correspondência,
divulgação de um segredo etc,, mesmo não possuindo os sentimentos próprios da
dignidade.
177
Tudo se passa como em um grande círculo. O ato lesivo pode causar
uma violação à intimidade, à imagem, e a outros atributos da personalidade,
resultando (ou não) em danos à esfera moral da vítima (seja seu espírito, sejam
seus valores finalísticos). Mas todos esses direitos da personalidade podem ser,
depois de identificados, mensurados para fins de reparação e agrupados como se
tivessem produzido um só efeito, recompondo-se o patrimônio moral da pessoa.
Hoje, não há um único dano moral, mas vários “tipos” de danos morais,
cada qual com um tratamento autônomo, como assegura o inciso V do artigo 5º da
Constituição Federal. Teresa Ancona Lopes
178
, defendendo o posicionamento de
que o dano estético é dano moral, indaga então como seria possível também afirmar

177
DE CUPIS, Adriano. Il danno. Teoria generale della responsabilità civile. Milano: Giuffrè editore,
1966. V. 1 p. 52 e 53.
178
LOPES, Teresa Ancona. O dano estético: (responsabilidade civil) São Paulo: Revista dos
Tribunais, 1980 p. 164-165.
116
que pode haver cumulação entre dano estético e dano moral? Tal questionamento é
referido, pois o mesmo raciocínio vale para o dano à imagem.
A pessoa jurídica não sente, não sofre com a ofensa que lhe é
desferida, não podendo ser injuriada; mas nada impede que seja sujeito passivo de
difamação. Isso ocorre quando a pessoa jurídica tem maculada a reputação que
desfruta no meio social.
Não tem capacidade de sentir emoção e dor, estando desprovida de
“honra subjetiva”. Mas pode padecer de ataque à honra objetiva, pois “goza de
reputação junto a terceiros, podendo sofrer abalo no seu nome na esfera social e
comercial em que atua”, assegura Arnaldo Rizzardo.
179
Caso interessante foi submetido ao Tribunal Supremo da Espanha que
em 2003 decidiu a pretensão de um partido político, Esquerra Republicana, em
receber indenização alegando que sofreu danos em sua imagem perante os
eleitores, decorrente do cumprimento defeituoso de contrato de mailing que havia
estabelecido com uma empresa para envio de propaganda eleitoral.
A Corte espanhola afastou a alegação de desprestígio, pois o
descumprimento defeituoso do contrato não acarreta nenhuma lesão à honra (o fato
de não chegar a propaganda à casa do eleitor ou, quando chega, está incompleta).
Como também não houve a divulgação de dados erroneos do referido Partido que
pudesse provocar um desmerecimento na consideração alheia. Entendeu o Tribunal
que não houve dano à imagem eleitoral do partido porque o dano não restou
provado. Ademais, a existência de um dano moral depende, entre outros fatores, da
gravidade da lesão.
O Tribunal da Península Ibérica não reconheceu o dano à imagem pela
ausência de provas, mas admitiu a possibilidade da lesão, por eventual

179
RIZZARDO, Arnaldo. Parte geral do código civil, cit., p. 271.
117
descumprimento contratual (responsabilidade contratual e não aquiliana), caso esse
tivesse o condão de lesar a honra objetiva da pessoa jurídica.
180
A legislação italiana reconhece e garante os direitos invioláveis do
homem, tanto na sua individualidade como na sua formação social (ou agrupamento
social), em que se desenvolve a personalidade, sendo que o direito à imagem está
previsto no artigo 10 do Código Civil italiano. Carlo Buonauro, interpretando ação
judicial objetivando o dano decorrente da perda de prestígio e do grave detrimento à
imagem do Estado italiano, infere que há proteção legal e constitucional, pois não se
tem limitá-la à pretium dolor.
181
Como referência normativa para o dano à imagem da Administração
Pública cita os seguintes: Constituição art 2º e 97 e artigos 6º, 7º, 10, 1.223, 2.043,
2059 do Código Civil.
182
Assegura o doutrinador italiano ainda que não se deve confundir o
dano à honra, tutelado constitucionalmente, com o dano à imagem. A honra, de fato,
não é outra coisa senão o respeito que o sujeito merece enquanto ente físico e
psíquico digno de consideração. Emerge, portanto, uma primeira diferença entre
imagem e honra: a imagem é resultante de dois elementos diversos, um individulista
e outro tipicamente coletivo. Por isso, pode-se dizer que para ofender a honra do
indivíduo é suficiente assacar-se contra a sua reputação (honra-objetiva), enquanto
para lesar a imagem é necessário algo a mais (quid pluris) simbolizado pela
projeção da lesão ao meio exterior.
“In altri termini, può dirsi che per offendere l’onore dell’individuo è
sufficiente uma mera azione che ne danneggi la consistenza, mentre
per ledere l’immagine è necessario um quid pluris, simboleggiato
dalla proiezione della lesione all’esterno”
.
183

180
<http://216.239.51.104/search?q=cache:6CVT0uibzpwJ:www.indret.com/code/getPdf.php%3Fid%3
D849%26pdf%3D334_es.pdf+da%C3%B1o+moral+y+la+persona+juridica&hl=pt-
BR&gl=br&ct=clnk&cd=2> Acesso em 08/06/06.
181
BUONAURO, Carlo. Il danno all’immagine della Pubblica Amministrazione in Temi e Percorsi
Diritto Amministrativo IV Edizione p. 5.
182
Tais artigos são transcritos no capítulo V ao se tratar especificamente do dano à imagem e
podem ser consultados.
183
BUONAURO, Carlo, Il danno all’immagine della Pubblica Amministrazione in Temi…,cit., p. 5.
118
Assim, a Constituição italiana, embora não discipline a tutela da
imagem em um artigo específico, traz no bojo do artigo 2º a inviolabilidade (e a
consequente defesa) do direito da solidariedade social. De modo que o dano à
imagem, embora traduzível em dinheiro, é um dano não-patrimonial, que estende os
efeitos relativos a uma esfera (superior) intelectual, social e espiritual do sujeito
passivo, o qual, em seguida ao prejuízo se encontra a ser posto em discussão na
esfera social como pessoa não mais merecedora de estima e de tutela individual.
184
O dano à imagem envolve não apenas um lado monetário, mas
sobretudo um lado não patrimonial, atinente ao vilipêndio da própria individualidade.
“In conclusione, il danno all’immagine è um danno non patrimoniale,
che estende i relativi effeti alla sfera (superiore) intellettuale, sociale e
spirituale del soggetto passivo, il quale, a seguito del pregiudizio, si
ritrova ad essere messo in discussione nell’ottica societaria come
persona non più meritevole di stima e di tutela individuale”
.
185
Mas muito ainda se tem a discorrer. Por ser o protagonista deste
trabalho, dedicar-se-á um capítulo excusivo para o tratamento do dano à imagem,
porém sem deixar de confrontá-lo com seus “pares”, o que se fará a seguir.
4.2.2. – O dano coletivo.
A sociedade de hoje é industrializada, consumerista, amplamente
informatizada, a ponto de falar-se em sociedade de massa. Surgem grandes
corporações, e conglomerados se fortalecem nas áreas de prestação de serviços
(saúde, educação), de venda de produtos de primeira necessidade, de turismo
(lazer), etc. Assim, a responsabilidade civil, acompanhando a evolução, passa a
proteger a pessoa não só como indivíduo, mas como coletividade.

184
BUONAURO, Carlo Il danno all’immagine della Pubblica Amministrazione in Temi…, cit. p. 8
185
CASTRO, Sandro. Il danno all’immagine.Torino: G. Giappichelli Editore, 2000.p. 215.
119
Com a promulgação da Constituição-cidadã, houve acentuada
valorização dos princípios da função social da propriedade, da função social do
contrato, da boa-fé objetiva, com inovação significativa na área dos direitos de
família, tudo a garantir a dignidade da pessoa humana em toda a sua extensão.
Essa reviravolta permitiu a chamada socialização, ou seja, a
prevalência do coletivo sobre o individual. Assim, como ressalta Carlos Alberto Bittar
Filho, “os reflexos desse panorama de mudança estão fazendo-se sentir na teoria do
dano moral, dando origem à novel figura do dano moral coletivo”.
186
Para esse autor, a coletividade – em maior ou menor grupo – é titular
de valores a serem protegidos, como os relativos ao meio ambiente; ao consumidor;
ao patrimônio artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico etc., enfatizando
que um valor caracterizado precisamente como coletivo é a honra. Com esteio na
visão de De Cupis, afirma que “a ‘honra’ significa tanto o valor moral íntimo do
homem, como a estima dos outros, ou a consideração social, o bom nome ou a boa
fama, como, enfim, o sentimento, ou consciência, da própria dignidade pessoal”.
187
De modo que a honra biparte-se em honra objetiva, encarada como a
reputação, o respeito que se desfruta no seio da sociedade e honra subjetiva, como
a estima que cada qual tem de si próprio.
Bittar Filho informa que sob o prisma coletivo, as duas faces da honra –
objetiva e subjetiva – se fazem sentir, uma vez que a coletividade também apresenta
sua auto-estima. Trazendo em perspectiva que outro valor coletivo é a dignidade
social, representada pelos símbolos nacionais (emblemas, hinos, bandeiras,
escudos, brasões, insígnias etc). O Estado, promovendo o bem comum, a
convivência pacífica de seus cidadãos, permitindo desfrutarem de uma vida digna,
materializa tais valores através dos símbolos. O autor afirma ainda que quando se
fala em dano moral coletivo, está-se fazendo menção ao fato de que o patrimônio
valorativo de certa comunidade (maior ou menor), idealmente considerado, foi
agredido de maneira absolutamente injustificável do ponto de vista jurídico; quer isso

186
Cf. BITTAR FILHO, Carlos Alberto. Estudos do dano moral coletivo. Entrevistado por Eunice
Nunes especial para Tribuna do Direito ano 14, n. 158, junho 2008.
187
Cf. BITTAR FILHO, Carlos Alberto. Estudos do dano moral coletivo. Entrevistado por Eunice
Nunes especial para Tribuna do Direito, cit.,
120
dizer, em última instância, que se feriu a própria cultura, em seu aspecto imaterial. A
coletividade, sentindo-se lesada em seus valores institucionais, teria legitimidade
para pleitear a reparação, como o dano ambiental; a violação à honra de
determinada comunidade como a negra ou a judaica através de publicidade abusiva;
o abuso à bandeira brasileira etc.
188
O caráter indivisível dos valores coletivos que, obviamente, não se
confundem com os de cada elemento, cada indivíduo da coletividade, fazem
resgatar as incisivas palavras de José Carlos Barbosa Moreira que diz que
“Em muitos casos, o interesse em jogo, comum a uma pluralidade
indeterminada (e praticamente indeterminável) de pessoas, não
comporta decomposição num feixe de interesses individuais que se
justapusessem como entidades singulares, embora análogas. Há,
por assim dizer, uma comunhão indivisível de que participam todos
os possíveis interessados, sem que se possa discernir, sequer
idealmente, onde acaba a "quota" de um e onde começa a de outro.
Por isso mesmo, instaura-se entre os destinos dos interessados tão
firme união, que a satisfação de um só implica de modo necessário a
satisfação de todas; e, reciprocamente, a lesão de um só constitui,
ipso facto, lesão da inteira coletividade. Por exemplo: teme-se que a
realização de obra pública venha a causar danos graves à flora e à
fauna da região, ou acarrete a destruição de monumento histórico ou
artístico. A possibilidade de tutela do "interesse coletivo" na
preservação dos bens em perigo, caso exista, necessariamente se
fará sentir de modo uniforme com relação à totalidade dos
interessados. Com efeito, não se concebe que o resultado seja
favorável a alguns e desfavorável a outros. Ou se preserva o bem, e
todos os interessados são vitoriosos; ou não se preserva, e todos
saem vencidos”
.
189
Interessante exemplo de avanço nesse campo é a decisão do Superior
Tribunal do Trabalho que, conhecendo de ação civil pública para a defesa do meio

188
Disponível em <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=6183>. Acesso em 05/06/06 Do
dano moral coletivo no atual contexto jurídico brasileiro. Carlos Alberto Bittar Filho Procurador do
Estado de São Paulo, Doutor em Direito pela USP.
189
Cf. BITTAR FILHO, Carlos Alberto. Estudos do dano moral coletivo. Entrevistado por Eunice
Nunes especial para Tribuna do Direito ano 14, n. 158, junho 2008.
121
ambiente do trabalho, deferiu a indenização do dano moral coletivo, pois o meio
ambiente, que deve ser adequado à saúde e à segurança dos trabalhadores, é
encarado como complexo social inserido em seus valores íntimos, em especial a
própria dignidade humana.
190
A aceitação de que a tutela dos valores morais não está restrita apenas
aos valores morais individuais da pessoa natural, inaugura-se a possibilidade da
reparação do dano moral coletivo em face da coletividade. O ente coletivo possui um
patrimônio ideal que deve ser protegido.
Pense-se ainda no dano ecológico uma vez que a lesão ao meio
ambiente afeta outros valores da coletividade, como a saúde, a qualidade de vida.
Todos esses valores estão interligados. Luis Henrique Paccagnella refere que
“O dano ao patrimônio ambiental, ou dano ecológico, é qualquer
alteração adversa no equilíbrio ecológico do meio ambiente (...) Por
sua vez, o dano moral ambiental não tem repercussão no mundo
físico, em contraposição ao dano ao patrimônio ambiental. Esse
dano moral ambiental é de cunho subjetivo, à semelhança do dano
moral individual. Só que o dano moral ambiental é o sofrimento de
diversas pessoas dispersas em uma certa coletividade ou grupo
social (dor difusa ou coletiva), em vista de um certo dano ao
patrimônio ambiental (...)
Exemplificando, se o dano a uma certa paisagem causar impacto no
sentimento da comunidade daquela região, haverá dano moral
ambiental. Também vislumbramos dano moral ambiental na
exploração predatória de uma jazida mineral que venha a deixar
indelével marca em paisagem significativa de uma cidade, na
contaminação da Baía de Guanabara, quando toda a coletividade
sofreu abalo na sua auto-estima e imagem, ao presenciar os
gravíssimos danos materiais impostos ao ecossistema, na
contaminação desencadeada em Rio Grande pelo Navio Bahamas,
nas hipóteses de poluição sonora e atmosférica em que ocorre
perturbação do sossego e diminuição da qualidade de vida da
coletividade, dentre outros exemplos.

190
Acórdão TRT/ 1ª T. - RO 5309/2002 – Tribunal Regional do Trabalho da 8ª Região.
122
Nesses casos, então, será perfeitamente possível cumular
obrigações de fazer com indenização por dano extrapatrimonial”
.
191
Liliane Garça Ferreira, trata do tema com acuidade, ressaltando que o
Código de Defesa do Consumidor, em seu art. 6º, incisos VI e VII, de maneira
expressa, prevê o dano extrapatrimonial tanto na hipótese de violação de direitos
individuais, quanto coletivos e difusos. Mesmo porque, a coletividade, apesar de ser
ente despersonalizado, possui um patrimônio ideal, nele considerado o meio
ambiente ecologicamente equilibrado.
192
Justamente o alargamento do conceito de dano moral permitiu
incorporar o chamado dano moral coletivo e que pode e deve ser tutelado,
legitimando-se os órgãos de classe, o Ministério Público, os órgãos de defesa dos
chamados interesses coletivos e difusos a defendê-lo.
Se à coletividade, lesada por situações que violam o meio-ambiente,
as relações de consumo, o ambiente cultural, histórico, artístico etc, tem-se negado
a indenização por danos morais, mesmo diante da ferrenha insistência do Ministério
Público e dos órgãos de defesa do consumidor, com supedâneo nos permissivos
das leis especiais (Código do Consumidor, Lei do Meio Ambiente), como ficará a
legitimidade da pessoa juridica de direito público para pleiteá-la? O Ministério
Público de Minas Gerais ingressou com ação por danos materiais e morais por
danos ambientais sob o argumento de que a Constituição Federal de 1988 no que
concerne à proteção do dano moral possibilitou ultrapassar a barreira do indivíduo
para abranger o dano extrapatrimonial à pessoa jurídica e à coletividade, mas
saiu-se vencido, apesar do magnífico voto do Ministro Luiz Fux.
193
Mas a proteção do dano moral coletivo não exclui, nem suplanta a
legitimidade da pessoa jurídica de direito público.
Consuelo Yatsuda Moromizato Yoshida, traz uma visão poliédrica do
patrimônio público como bem público (estatal) e como bem difuso (da coletividade).
Assegura que

191
<http://www.mp.rs.gov.br/ambiente/doutrina/id378.htm> Acesso em 06/06/06
192
<http://www5.mp.sp.gov.br:8080/caouma/doutrina/Amb/Teses/Liliane%20Garcia%20Ferreira.htm
> Acesso em 05/06/06.
193
Recurso Especial n. 598 281 MG – Superior Tribunal de Justiça.
123
“Um mesmo bem jurídico pode ser simultaneamente objeto de direito
ou interesse difuso, coletivo ou individual, dependendo do ponto de
vista que o mesmo é analisado. O patrimônio público pode ser
interpretado como um bem da entidade estatal respectiva (bem
coletivo), e como bem de interesse da coletividade em geral,
contribuinte dos tributos que o alimentam (bem difuso)”
.
194
Diante da lesão, e até mesmo de ameaça de lesão ao patrimônio
público, são atingidos os interesses da coletividade, extrapolando-se a esfera de
interesses da pessoa jurídica titular desses bens. Consuelo Yoshida sublinha que o
critério da lesividade, ou da simples ameaça de lesão, é que torna o patrimônio
público objeto de interesse difuso, provocando a atuação dos legitimados para
propor as ações coletivas, com a necessária e obrigatória intervenção do Ministério
Público. Para a professora
“O patrimônio público, quando lesado ou ameaçado de lesão, deixa
de ser interesse meramente estatal, da pessoa jurídica de direito
público correspondente (União Federal, Estados, Municípios e
respectivas autarquias) e passa a ser interesse de toda a
coletividade, tutelável por todos aqueles legitimados pelo art. 5º da
Lei nº 7.357/85 e art. 82 da Lei nº 8.078/90, ensejando, ainda, a
intervenção obrigatória do Ministério Público com fulcro no art. 82, III,
do Código de Processo Civil, na qualidade de custos legis. (...) A
partir da Constituição de 1988 está superado aquele entendimento
que preconiza que o interesse público não se confunde com o
interesse meramente patrimonial da Fazenda Pública. Havendo
lesão ou ameaça de lesão ao patrimônio público deixa de haver
interesse meramente estatal, o chamado interesse público
secundário, e concomitantemente surge o interesse público primário
ou interesse social ou, ainda, interesse difuso, de toda a coletividade,
cuja defesa é função institucional do Ministério Público, entre outros
legitimados”. (grifos da pesquisadora)

194
YOSHIDA, Consuelo Yatsuda – O Ministério Público e sua função institucional de defesa do
patrimônio público lesado ou ameaçado de lesão. Boletim dos procuradores da República 18 de
outubro de 1999. Disponível em <www.anpr.org.br/boletim/boletim
>. Acesso em 20/03/2009.
124
“O patrimônio público lesado ou ameaçado de lesão é
simultâneamente bem público (estatal) e bem difuso (da
coletividade). O interesse na tutela do patrimônio público, nestas
situações, deixa de ser exclusivo das entidades estatais e passa a
ser de toda a coletividade, contribuinte dos tributos que o
alimentam”
.
195
Rafael Viola, criticando a terminologia “dano moral coletivo” (pois o
dano moral tem caráter subjetivo e individual), assume que não se pode negar que a
violação dos interesses difusos e coletivos, acarreta um dano extrapatrimonial. Mas
indaga acerca da possibilidade de enquadrar o dano ambiental e o dano de massa
na categoria de danos morais: “existe dor, sofrimento ou humilhação? Existe lesão
ao direito da personalidade ou da dignidade da pessoa humana, que são exclusivos
da pessoa humana? A resposta a todas essas indagações, diz, é negativa, pois não
é possível conceituar o dano ambiental ou o dano de massa como um dano moral.
Para Viola, o dano extrapatrimonial não se confunde com o dano moral em que pese
a positivação do termo dano moral coletivo no artigo 6º, incisos VI e VII do Código
de Defesa Consumidor e do caput do artigo 1º da Lei 7.347/85.
196
4.2.3. – O dano institucional.
A questão é por demais controvertida na doutrina, pois há quem se
refira ainda ao chamado dano institucional em contraponto ao dano moral.
Desenvolve-se a tese de que a pessoa jurídica, em especial a de direito público, por
não ter um organismo biopsíquico, não tem direitos da personalidade, que são
próprios da pessoa natural. De modo que, não podendo sentir os efeitos da lesão,

195
YOSHIDA, Consuelo Yatsuda – O Ministério Público e sua função institucional de defesa do
patrimônio público lesado ou ameaçado de lesão. Boletim dos procuradores da República 18 de
outubro de 1999. <www.anpr.org.br/boletim/boletim> Acesso em 20/3/2009
196
VIOLA, Rafael O papel da responsabilidade civil na tutela coletiva TEPEDINO, Gustavo;
FACHIN, LUIZ EDSON (organizadores). Diálogos sobre Direito Civil vol 2 3 ed. Rio de Janeiro:
Renovar, 2008 p. 395.
125
não sofre danos morais. A lesão ao patrimônio imaterial da pessoa jurídica acarretar-
lhe-ia dano institucional.
Gustavo Tepedino critica a visão daqueles que querem ampliar os
confins da responsabilidade civil ao não fazer distinção entre a pessoa natural e a
jurídica como titulares dos direitos da personalidade, mesmo diante da opção
constitucional em valorar diferentemente o dano patrimonial e o extrapatrimonial.
Deixa claro que a lesão à reputação de uma empresa comercial atinge de modo
direto ou indireto os seus resultados econômicos, em nada se assemelhando a
chamada honra objetiva com os direitos da personalidade da pessoa humana. Isto
porque há duas ordens valorativas no ordenamento jurídico: a das empresas, que
visam o lucro e a da pessoa natural, cuja dignidade está no vértice da proteção
constitucional.
Desse modo, a tutela da imagem assim como da honra objetiva da
pessoa jurídica é valorada de modo diferente da pessoa natural, sendo que para
esta, a imagem é atributo de fundamental importância até mesmo para a sua
integridade psicofísica, pois atinge a sua dignidade, ferindo-a moralmente, arremata
Gustavo Tepedino.
197
Mas a preocupação para com a pessoa jurídica – aquela de fins
lucrativos – refere-se aos aspectos pecuniários desta, pois a lesão repercutirá na
capacidade de auferir lucros, sendo pois espécie de dano material (e não moral).
Tepedino não descuida, contudo, da análise da questão quando o
gravame atinge a pessoa jurídica sem fins lucrativos, a associações e as fundações.
Aventa, então, a possibilidade da configuração de danos institucionais, que
conceituou como “aqueles que, diferentemente dos danos patrimoniais ou morais,
atingem a pessoa jurídica em sua credibilidade ou reputação, sendo
extrapatrimoniais, posto informados pelos princípios norteadores da iniciativa
econômica privada”.
198

197
TEPEDINO, Gustavo. Tutela da personalidade no ordenamento civil-constitucional brasileiro.
Temas de Direito Civil. 3 ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2004. p. 55-56.
198
TEPEDINO, Gustavo. Tutela da personalidade no ordenamento civil-constitucional brasileiro.
Temas de Direito Civil, cit., p. 57.
126
Alerta que o intérprete deve estar atento, não podendo imaginar os
direitos da personalidade e a reparação dos danos morais como categorias neutras.
Há duas esferas axiológicas, sendo diversos os princípios e valores que inspiram a
tutela da pessoa natural e a da pessoa jurídica.
De modo que se poderia acrescentar ao elenco de danos patrimoniais,
morais e à imagem, mais uma categoria de dano: o dano institucional.
Durante protestos contra a intolerância sexual e racial ocorrida em
2003, no Parque Farroupilha, em Porto Alegre, os manifestantes – um grupo de
punks – pintou uma suástica (símbolo nazista) em uma Bandeira do Brasil e ateou
fogo, provocando a revolta dos freqüentadores do parque que partiram em defesa do
símbolo brasileiro. Ouviram-se frases de indignação, como a de Eloir:
“Quando vi a bandeira queimando, senti como se eu mesmo
estivesse sendo queimado. Fiquei muito indignado. Aquele é o
símbolo do país. Aquilo foi um insulto à nação brasileira. É como se
queimassem o povo. (...)
Eu me orgulho ao ver os jogadores brasileiros enrolados na bandeira
depois de uma vitória. Hoje, tive de me enrolar em uma bandeira
queimada para mostrar o que estavam fazendo. Por isso, me
emocionei tanto. Depois de tudo calmo, veio um rapaz punk e disse
que era só um símbolo. Mas que queimem qualquer símbolo, menos
a Bandeira Nacional. Sempre me indignei com estas coisas, como
quando atacaram o relógio dos 500 anos. Sempre vou reagir. Sou
uma pessoa preocupada com o país, com o povo. Participei das
campanhas do agasalho e contra a fome. Sou patriota e ensinei isso
a meu filho, que está estudando Direito para tentar fazer algo pelo
país”
.
199
Por certo, a reação de cada indivíduo será diferente quando aviltado
um bem que compõe a esfera extrapatrimonial ou imaterial da pessoa jurídica. Como
no exemplo acima, a Bandeira Nacional materializa a pátria, com toda a carga
valorativa que o símbolo representa e, mesmo que não provoque na maioria dos

199
Cf. <http://www.sjs.rs.gov.br/portal/principal.php?action=imp_noticias&cod_noticia=2920>
Acesso em 07/07/06.
127
súditos brasileiros as mesmas “sensações”, a destruição do símbolo constitui crime.
E o dano ao símbolo (bandeira, escudo, brasão, emblema, hino) – que agrega em si
os valores imateriais da pessoa jurídica, em particular a pessoa jurídica de direito
público - produz efeitos morais que podem ser objetivados, não havendo que se
perquirir o que cada cidadão experimentou ao ver a queima da bandeira para se
reconhecer os danos morais.
Os entes públicos, como por exemplo, os municípios, células
importantíssimas da organização política, devem cultuar suas tradições. “O espírito
cívico deve ser desenvolvido nos munícipes, fazendo-lhes presentes as glórias do
passado, a indicar-lhes o caminho do futuro”.
200
Por isso, acompanha-se a conclusão de Carlos Alberto Bittar Filho, já
que “o dano moral coletivo é a injusta lesão da esfera moral de uma dada
comunidade, ou seja, é a violação antijurídica de um determinado círculo de valores
coletivos”.
201
Alicerçando-se no exemplo da história, extrai-se da lição de Sólon o
grande significado do dano perpetrado à sociedade: “Sólon, segundo refere
Plutarco, já dizia que a cidade realmente civilizada é aquela em que todos os
cidadãos sentem a injúria feita a um só e em que todos exigem sua reparação
tão vivamente como aquele que a recebeu”.
202
4.2.4. – O dano social.
Foi talvez essa a inspiração de Antonio Junqueira de Azevedo na
defesa do que denominou de dano social. Alertando para a atualidade da
problemática, o jurista encontra o caminho para que a reparação de danos possa ser

200
MEIRELLES, Hely Lpoes. Direito municipal brasileiro. São Paulo, Malheiros, 1994 p. 127
201
Cf. BITTAR FILHO, Carlos Alberto. Estudos do dano moral coletivo.
202
Cf. REIS, Clayton. Dano moral. Rio de Janeiro: Forense, 1998 p. 101. Os grifos são da
pesquisadora, justamente para ressaltar a frase de Sólon, que resume a improtância da
argumentação. Não foi encontrada a frase no original.
128
um desestímulo, uma dissuasão à prática do ilícito vislumbrando uma nova categoria
de dano: o dano social. Segundo suas palavras, o dano social não é uma alteração
sobre o tema: dano moral, mas a criação de um novo caso de dano advindo do
rebaixamento da qualidade de vida de uma população.
O dano social, sob a ótica de Junqueira, não é o dano coletivo ou
relativo aos interesses coletivos (difusos) da esfera do Ministério Público. Segundo
aduz, ele defende “o óbvio”, aquilo que até agora ninguém ousou dizer:
“determinados danos individuais, patrimoniais ou morais, causam também dano à
coletividade. A lesão, o dano-evento, é a uma pessoa, mas o ato repercute por
ricochete em prejuízo de uma comunidade”.
203
Para ilustrar, cita o caso Isabela
Nardoni, ocorrido em São Paulo e que comoveu uma verdadeira multidão de
pessoas.
204
Para o doutrinador, o dano social é o dano por ricochete coletivo, que
não recebeu ainda o necessário reconhecimento da doutrina.
No fundo, como Junqueira mesmo diz, está defendendo uma espécie
de punitive damages à brasileira para recomposição do dano social, da qualidade de
vida social que foi rebaixada com a lesão individual.
Conclama os juristas a procurar soluções para os problemas atuais de
insegurança não apenas quanto à incolumidade física, mas também quanto à
psíquica, diante da ineficiência do direito penal para impedir crimes e contravenções.
O autor propõe que seja repensada a tradicional separação entre direito civil
(reparação) e direito penal (repressão). Ilustra, com várias passagens do Código
Civil, a correção do seu pensamento, vislumbrando em inúmeros dispositivos a
assertiva de que o direito civil também pune o ofensor (artigo 1.992 que comina a
perda do direito (pena) ao herdeiro que sonega bens da herança; artigos 939, 940 e
941; 1.336; 1.814; 1962; 1220 e 667).
O raciocínio desenvolvido por Junqueira deixa claro que o
agravamento da indenização não residiria apenas no aspecto “punitivo”, mas serviria
ainda como “desestímulo”, que tem características e finalidades diversas da punição

203
AZEVEDO, Antonio Junqueira de. Por uma nova categoria de dano na responsabilidade civil: o
dano social. In Novos estudos e pareceres de direito privado. São Paulo: Saraiva, 2010 p. 602.
204
O pai de Isabela, Alexandre Nardoni e a madastra, Ana Carolina Jatobá, foram condenados por
homicídio da filha de cinco anos de idade, atirando-a pela janela do apartamento.
129
(penal). A pena é para o ofensor; o desestímulo é tanto para este como para “os
outros” que se sentirem tentados a praticar os mesmos atos lesivos, tendo a sanção
natureza dissuasória, didática, pedagógica, projeta-se para o futuro como todo o
ensinamento. Esse caráter pedagógico, na visão do jurista, seria útil quando
aplicado às pessoas jurídicas que tem por finalidade atividades dirigidas ao público,
aos consumidores, ou seja: “A pena tem em vista um fato passado enquanto que o
valor de desestímulo tem em vista o comportamento futuro; há punição versus
prevenção”.
Também quanto às pessoas haveria essa dicotomia, pois falar-se-ia
em “punição” à pessoa física e “dissuasão” à pessoa jurídica (embora esta possa ser
apenada). A primeira objeção ao agravamento da indenização reside em que não
poderia ser aplicada aos casos de responsabilidade objetiva, limitada estaria à
responsabilidade subjetiva, pois só nesta espécie é que o juiz examina o dolo e a
culpa do agente (para, então, puni-lo). Entretanto, o desestímulo é cabível ainda que
se fique exclusivamente no campo da responsabilidade objetiva.
A segunda questão a ser analisada é o ponto central do pensamento
de Junqueira: “um ato, doloso ou praticado com culpa grave, ou ainda se
negativamente exemplar, não é lesivo somente ao patrimônio material ou moral da
vítima, mas sim, atinge a toda a sociedade, num rebaixamento imediato do nível de
vida da população. Causa dano social”.
Mosset Iturraspe também compartilha dessa opinião, postulando na
sanção jurídica duas funções: a prevenção e a compensação. Ao apresentar suas
ideias cita Soler, para quem “el derecho no es um sistema de convivência que se
satisfaga com la aplicación de las sanciones; aspira a no tener que aplicarlas; a que
se cumplan los preceptos primários. La sancion no es el precio de la violación”.
205
Desse modo, o artigo 944 do Código Civil não impede que o juiz fixe,
além da indenização pelo dano material e moral, uma indenização pelo dano social,
como quer Junqueira de Azevedo. A “pena” – agora, entre aspas, porque no fundo, é

205
ITURRASPE, Mosset p. 231
130
reposição à sociedade -, visa restaurar o nível social de tranqüilidade diminuída pelo
ato ilícito, incutindo no espírito da comunidade as segurança jurídica e paz social.
Outras situações que causam rebaixamento do nível coletivo de vida
(de qualidade de vida) são os negativamente exemplares. Ilustra com o atraso
sistemático dos voos por uma empresa aérea, em que a indenização a um
consumidor individual não basta para dissuadi-la na prática do ato lesivo. Mesmo
porque, ela pensará na equação custo-benefício: poucas serão as demandas
judiciais, sendo mais vantajoso economicamente manter a situação tal como está! O
passageiro sairá de casa angustiado, sem saber se honrará seus compromissos
chegando a tempo no destino. Muito diferente quando o passageiro sai confiante
quanto à observância dos horários. “As sociedades têm um nível de qualidade de
vida que é até mesmo mensurado estatisticamente, por exemplo, com os índices de
desenvolvimento humano (IDH)”.
206
Para Junqueira, “a tolerância para com o dolo e para com o
descumprimento da palavra (seria alterum laedere e suum cuique non tribuere, tudo
ao contrário do que deveria ser) são os piores males para uma sociedade. Em
resumo, é preciso repor, quer num caso, por punição, quer noutro, por dissuasão, o
que foi tirado da sociedade”.
207
Sugere que esse plus da indenização, que é a reparação do dano
social, poderia ir para um fundo como ocorre nos danos ambientais, desde que
houvesse uma política legislativa nesse sentido. Mas defende que o autor da ação
individual faça jus a esse plus, pois agiu como defensor da sociedade, agiu como
“um promotor público privado” (ou para os americanos: private attorney general),
agiu em benefício da sociedade, como um incentivo para um aperfeiçoamento geral
da sociedade.
A ideia de Junqueira é inovadora e relevante do ponto de vista da
cidadania. A sensibilidade desse jurista e a sua experiência de vida, permitiu-lhe

206
AZEVEDO, Antonio Junqueira de. Por uma nova categoria de dano na responsabilidade civil: o
dano social. In Novos estudos e pareceres de direito privado. São Paulo: Saraiva, 2010 p. 382.
207
AZEVEDO, Antonio Junqueira de, Por uma nova categoria de dano na responsabilidade civil: o
dano social. In Novos estudos..., cit., p. 382.
131
ousar, alertando para o óbvio: a sociedade está perdendo seus valores intrínsecos,
morais.
Vivencia-se o desrespeito descarado às instituições. Os casos de
corrupção e concussão alastram-se, sem que se experimente o gosto da punição
aos agentes faltosos.
Talvez a descrença tenha raízes até mesmo na falta de reação das
pessoas ofendidas, entre elas as pessoas jurídicas, por não exercitarem, na sua
plenitude, a defesa dos seus direitos da personalidade, pleiteando a reparação dos
danos morais, extrapatrimoniais, coletivos, institucionais, sociais, qualquer que seja
o nomen iuris. Não importa a denominação que se dê. Importa que esses direitos
deveriam estar arraigados em nossa sociedade e a sua proteção e defesa facilitadas
quer pela doutrina quer pela jurisprudência.
A grande vedete desse trabalho é a imagem da pessoa jurídica, bem
imaterial que dá suporte (sustentação) à própria finalidade para a qual a pessoa
jurídica foi criada: de agregação, de congregação de esforços comuns e que exige –
dessa maneira – que se estabeleça um vínculo de confiança quer nas relações
internas (entre sócios, entre associados), quer nas relações externas (entre sócios e
destinatários dos serviços (objeto social)).
E esse vínculo de confiança é que repercute externamente, resultando
na reputação que a pessoa jurídica adquire no meio social.
A tese defendida por Antonio Junqueira de Azevedo é clara: a
responsabilidade civil deve ter por norte a imposição de indenização por danos
individuais e por danos sociais. Esses chamados “danos sociais” seriam as lesões
causadas à sociedade que rebaixam não apenas seu nível de vida (qualidade de
vida), mas também seu patrimônio moral (segurança jurídica).
Sandro Castro traz inúmeros julgados dos tribunais italianos que
vislumbram, no dano à imagem da Administração Pública, natureza plúrima: ora um
dano moral, ora um dano existencial; ora como dano-evento, ora como dano-
consequência. Há, na jurisprudência citada por Castro, opinião de que o dano à
imagem é um dano social, pois a noção de dano público não compreende apenas a
lesão de bem público patrimonial em sentido próprio, mas se estende a qualquer
132
interesse que caracteriza bem em sentido jurídico, consistente no prejuízo da
imagem de um ente público, que se traduz em verdadeiro dano social, pelo
descrédito derivado do comportamento ilícito do funcionário público, mediante uma
conduta dolosa ou culposa em relação ao descumprimento do serviço público; já por
“dano moral”, vale dizer “dano não-patrimonial”, se refere ao dano derivado da grave
perda de prestígio.
208
Ressalta-se que a imagem deve ser “preservada” para que a pessoa
jurídica atinja as suas finalidades. Como, então, elaborar uma teoria de reparação da
imagem? O que se deve entender por “imagem da pessoa jurídica” e qual a
extensão da proteção jurídica a esse instituto? Por certo, há que se escrever um
capítulo em apartado, enfrentando-se a seguir a problemática ora aguçada.

208
Nesse teor é a lição de Castro: “La nozione di danno pubblico non comprende soltanto la lesione
dei beni pubblici patrimoniali in senso proprio, ma si estende anche alla lesione di quegli interessi
che sono da ritenere beni in senso giuridico, consistenti nel pregiudizio recato all’immagine dello
stato di un ente pubblico, che si traduce in vero danno sociale, per effeto del discredito derivato dai
comportamenti illeciti di pubblici dipendenti, mediante una condotta dolosa o colposa in relazione ad
inadempimenti do obblighi di servizio; per cui per “danno morale”, vale a dire “dano non
patrimoniale”, si fa riferimento al danno derivante dalla garve perdita di prestigio”.Cf. CASTRO,
Sandro. Il danno all’immagine”. (Corte Conti Lazaio, Sez giurisdiz., 29 ottobre 1998, n. 2246, in Foro
amm., 1999, 1125) Torino: G. Giappivhelli Editore, 2008. p. 241.
133
CAPÍTULO V – DANO À IMAGEM DA PESSOA JURÍDICA E A SUA TUTELA
5.1. – A imagem da pessoa jurídica
Imagem é a representação de um objeto ao espírito. “Símbolo pelo qual
e no qual a consciência atinge um objeto sensível ausente”, define Maria Helena
Diniz com supedâneo em Goffredo da Silva Telles Junior, esboçando a visão
filosófica da palavra.
209
Cláudio Luiz Bueno de Godoy, valendo-se da feliz expressão de Walter
Moraes, diz que a imagem é “toda sorte de representação de uma pessoa”.
210
O termo, na linguagem jurídica, tem duplo significado. De um lado, a
imagem-retrato, entendida como o conjunto de caracteres físicos da pessoa. De
outro, a imagem-atributo, o conceito que a pessoa goza no meio social em que vive,
seja essa pessoa natural, seja jurídica.
De modo que este aspecto é o que importa ao presente estudo, pois a
reprodução gráfica (imagem-rerato) da pessoa jurídica se faz por meio de símbolos.
Como os símbolos carregam valores intrínsecos, eles integram a imagem-atributo e
não a imagem-retrato. Ademais, a usurpação do símbolo pode ser considerada
crime.
Por exemplo, o abuso da marca – que identifica determinado produto,
mas não necessariamente corresponde à identidade (nome) da empresa (pessoa
jurídica) que o produz – resulta em danos patrimoniais, pela perda da clientela, pela
perda de credibilidade no mercado etc.; mas não é apenas na diminuição dos lucros
que a sociedade empresária se vê lesada, visto que há registro de decisões judiciais
que concedem indenização por violação ao patrimônio moral. Basta pensar em uma

209
DINIZ, Maria Helena. Dicionário jurídico. 2 ed. São Paulo, Saraiva, 2005. v. 2 p. 887
210
GODOY, Cláudio Luiz Bueno de A liberdade de imprensa e os direitos da personalidade.
Dissertação. (Mestrado em Direito Civil). Faculdade de Direito, Pontifícia Universidade Católica de
São Paulo, São Paulo, 2000. p. 46.
134
pessoa jurídica que não vise o lucro, como a Cruz Vermelha, a UNICEF, a Fundação
Ayrton Senna etc.
211
Outrossim, o direito de marca não integra a personalidade do titular,
pois apenas designa um produto, sendo que sua violação traz danos materiais e não
morais. Entretanto, a contrafação da marca pode eventualmente causar dano moral
na hipótese de manchar a própria reputação comercial do seu titular. As associações
não são amparadas pelos dispositivos legais que tutelam o nome empresarial, mas
nem por isso ficam à margem da lei, pois a imagem não se confunde com o signo
figurativo.
Não se pode ainda esquecer da pessoa jurídica de direito público, pois
o descrédito da instituição, como o de uma prefeitura de um pequeno município que
se vê abalada por um caso grave de corrupção, poderia acarretar danos patrimoniais
pela sensível diminuição na arrecadação, caso os munícipes resolvessem deixar de
recolher aos cofres públicos os impostos devidos. Mas, provoca-se ao raciocínio:
não haverá também dano extrapatrimonial?
O vilipêndio à imagem de um produto, de uma marca, de um nome
comercial pode trazer consequências nefastas à pessoa jurídica, não apenas de
ordem patrimonial, mas também imaterial, decorrentes da perda de confiança, de
credibilidade, inviabilizando, muitas vezes, a própria finalidade para qual foi criada.
Em França, a publicação de uma entrevista com um renomado enólogo
na revista “Lyon Mag” rendeu ao Sindicato dos Viticultores da região de Villefranche-
sur-Saône a soma de 100.000 euros. O Tribunal de Lyon entendeu que o
entrevistador, assim como o entrevistado, exerceram abusivamente a liberdade de

211
Nesse sentido, as lições de Santos Cifuentes. Entende o jurista que há pessoas de existência
ideal que, por terem fama, podem sofrer lesão ao bom nome com repercussão não-patrimonial,
tendo legitimidade para pleitear a reparação do dano moral. Ao contrário, as sociedades comerciais,
por terem sido criadas com o fim específico de obtenção de lucros (princípio da especialidade),
carecem de bens extrapatrimoniais. Portanto, essas últimas não podem sofrer dano moral.
CIFUENTES, Santos. Derechos personalíssimos. Buenos Aires: Astrea, 1995. p. 493 e 494
135
expressão e de informação como dispõe a lei 29 de julho de 1881 ao criticar o vinho
“Beaujolais”, comparando o produto a um excremento, denegrindo a sua imagem.
212
Caso interessante foi submetido a Segunda Câmara de Direito Público
do Tribunal de Justiça de São Paulo que, em voto relatado pelo Desembargador
Nelson Calandra, aplacou a pretensão do CEL Centro Educacional da Lagoa, do Rio
de Janeiro, de proibir à Cidade de São Paulo de usar a expressão “CEU” e outras
combinações em quaisquer produtos, encartes, folders, folhetos ou serviços
relacionados às atividades de ensino.
O chamado CEU designa o Centro Educacional Unificado, projeto da
então Prefeita Marta Suplicy que pretendia unificar, nos estabelecimentos de ensino,
atividades comunitárias, abertas ao público da região onde instaladas, propiciando
maior convivência social. As similitudes dos nomes, embora fonéticas, em nada
induziam o público em erro.
Concluiu o Acórdão, citando trecho da sentença, ser “muita pretensão
da autora entender-se copiada pelo fonema”, ressaltando que o Poder Público
municipal não explora comercialmente a atividade nos mesmos moldes que a
autora. A ré, pessoa jurídica de direito público, tem natureza jurídica diferenciada,
não buscando a captação de clientela tal como a autora, “mas sim, melhores
condições de educação a população, o que afasta, assim, qualquer possibilidade de

212
Conforme reportagens veiculadas na Internet (referência aos sites abaixo), a atitude ultrapassou
os limites da lei de 29 de julho de 1881 (crítica abusiva). A revista “Lyon Mag” publicou a opinião de
renomado enólogo de que: «les viticulteurs du Beaujolais étaient conscients de commercialiser un
vin de merde». Por força do artigo 1.382 do Código Civil francês, a ação culposa denegriu a
imagem do produto, cabendo indenização, originalmente fixada pela Corte de Villefranche-sur-
Saône em 350.000 euros.
Responsabilite pour faute: Dénigrement du Beaujolais. En dénaturant le vin dit "Beaujolais", jusqu'à
la scatologie et en l'assimilant finalement à un excrément, un interviewé et son intervieweur
dépassent l'exercice admissible de leurs fonctions sociales respectives de critiques - même sévères
- et d'information en abusant gravement de la liberté d'expression et d'impression qui leur est
reconnue par la loi du 29 juillet 1881, attitudes constitutives d'une faute, au sens de l'article 1382 du
Code Civil, seul applicable en l'espèce, dont les syndicats professionnels peuvent solliciter
réparation. (T.G.I. Villefranche-sur-Saône, 20 janvier 2003; Dalloz 2003, 1645, note E.Agostini).
Notícia transmitida nos sites: <http://www.jurisques.com/jfc0203.htm#denigrement>
<http://denidejustice.wordpress.com/2009/06/>; <http://www.lexinter.net/JP/presse.htm>
136
confusão entre a marca “CEL” com o nome dado pelo Município de São Paulo ao
“CEU” – Centro Educacional Unificado”.
213
Mesmo diante da corrente minoritária que nega à pessoa jurídica direito
à imagem por negar-lhe direitos da personalidade, certo está que a Constituição
Federal, como repisado inúmeras vezes, assegura aos entes coletivos o direito à
reparação dos danos materiais, morais e à imagem (artigo 5º, incisos V e X).
Como dito alhures, a pessoa jurídica é portadora de direitos
fundamentais e da personalidade, compatíveis com a sua natureza, como
reconhecem os dispositivos constitucionais ora invocados, o Código Civil e a
jurisprudência, na expressão da Súmula 227 do Superior Tribunal de Justiça.
O mesmo se repete nas doutrinas estrangeiras. Lecionam Geneviève
Viney e Patrice Jourdain, com propriedade, que o caráter pessoal do dano aos
direitos da personalidade não pode afastar a proteção das pessoas morais (na
terminologia francesa).
214
Parece evidente que em um sistema jurídico evoluído, é
indispensável permitir aos indivíduos defender suas concepções morais, filosóficas,
religiosas e mais generalizadamente seus valores culturais contra campanhas que
as visam denegrir.
215
A afirmação, trazida para a realidade pátria, se sustenta não só pelo
disposto no artigo 52 do Código Civil, que será melhor analisado a seguir, mas
também pelos princípios e normas importados de outros ramos do direito, como do
direito penal, por exemplo.

213
Apelação Cível n. 675.971.5/7 – 2a Câmara Direito Público. Relator: Des. Nelson Calandra.
Julgamento em 27.03.2009. Publicado no DJE em 07.05.2009.
214
La protection des atributs moraux de la personnalité par le jeu de l’action en responsabilité n’a
pás été réservée aux seules personnes physiques. Les groupements personnalisés ont été en effet
admis à utilisier cette voi de droit pour proteger leur droit au nom ou pour faire condammer les
auteurs de propos, d’écrits ou d’actes tendant à ruiner leur réputation ou à porter atteinte à leur
image de marque. Cf. VINEY, Geneviève; JOURDAIN, Patrice. Les conditions de la
responsabilité.Traité de Droit Civil sous la direction de Jacques Ghestin. Paris, Librarie Générale de
Droit et de Jurisprudence, EJA, 1998. 2 Ed. p. 35 n 260.
215
Enfin il apparait de plus em plus évident que, dans um système juridique évolué, il est
indispensable de permettre aux individus de défendre leurs conceptions morales, philosophiques,
religieuses et plus généralement leus valeurs culturelles contre les campagnes de dénigrement.
(Geneviève VINEY; Patrice, JOURDAIN. Les Conditions de La Responsabilité. Traité de Droit Civil
sous la direction de Jacques Ghestin.. Paris, Librarie Générale de Droit et de Jurisprudence, EJA,
1998. 2 Ed. p. 35 n 260.
137
Esta interdisciplinaridade dos diversos ramos do direito, - sem olvidar
os diferentes fundamentos e princípios de cada um -, se faz necessária para que se
possa compreender o instituto (imagem) na sua realidade jurídica, no contexto do
seu desenvolvimento; mesmo porque a visão atual do jurista não pode ser
segmentada, uma vez que, nas palavras de Melina Girardi Fachin, “não há mais
fronteira aguda que aparte os ramos, até então tão autônomos e destacados, do
direito constitucional e do direito privado – este tradicional império dos indivíduos,
àquele do Estado”.
216
Pacificado na doutrina penal que a pessoa jurídica pode ser sujeito
passivo dos crimes contra a honra, em particular do crime de difamação (afastados o
de calúnia e injúria), tal se sustenta porque a pessoa jurídica, embora não dotada de
um substrato físico, tem honra-objetiva.
Qual, então, seriam os reflexos da responsabilidade penal na seara da
responsabilidade civil?
Mirna Cianci e Rita de Cássia Rocha Conte Quartieri, ao discorrerem
acerca da evolução jurisprudencial que culminou na edição da Súmula 227 do STJ,
dizem que os julgados enfrentaram essa necessária dicotomia entre honra-subjetiva
e honra-objetiva, uma vez que, desprovida de organismo físico e psíquico, a pessoa
jurídica pode padecer do ataque à honra-objetiva, como vítima de difamação:
A jurisprudência orientou a abrangência desse entendimento, em
célebre julgado (9), onde destacou que “quando se trata de pessoa
jurídica, o tema de ofensa à honra propõe uma distinção inicial: a
honra subjetiva, inerente à pessoa física, que está no psiquismo de
cada um e pode ser ofendida com atos que atinjam a sua dignidade,
respeito próprio, auto-estima etc., causadores de dor, humilhação,
vexame; a honra objetiva, externa ao sujeito, que consiste no
respeito admiração, apreço, consideração que os outros dispensam
à pessoa. Por isso se diz ser a injúria um ataque à honra subjetiva, à

216
FACHIN, Melina Girardi e PAULINI, Umberto. Problematizando a eficácia dos direitos
fundamentais nas relações entre particulares: ainda e sempre sobre a constitucionalização do
Direito Civil in TEPEDINO, Gustavo e FACHIN, Luiz Edson (organizadores). Diálogos sobre Direito
Civil vol 2. 3a ed. Rio de Janeiro, Renovar, 2008. p. 196.
138
dignidade da pessoa, enquanto à difamação é ofensa à reputação
que o ofendido goza no âmbito social onde vive. A pessoa jurídica,
criação de ordem legal, não tem capacidade de sentir emoção e dor,
estando por isso desprovida de honra subjetiva e imune à injúria.
Pode padecer, porém, de ataque à honra objetiva, pois goza de uma
reputação junto à terceiros, passível de ficar abalada por atos que
afetem o seu bom nome no mundo civil ou comercial onde atua”. (9)
STJ 4 T. Ruy Rosado de Aguiar RT 727/123
Entenda-se, portanto, por honra objetiva aquela que, externa ao
sujeito, tenha por objeto de preservação a admiração, o apreço, a
consideração que terceiros dispensam à pessoa, “refletida na
reputação, no bom nome e na imagem perante a sociedade, comum
à pessoa natural e à jurídica”, como afirma Cavalieri (p. 80)”.
217
Quando há violação à honra-objetiva da pessoa jurídica por meio dos
meios de comunicação, pela televisão, rádio, imprensa escrita, Internet etc.,
exteriorizando-se a ação danosa, haverá dano à imagem.
De modo que o dano à imagem representa um plus do dano à honra,
como será melhor abordado em capítulo à frente.
Embora reconheça e proteja o direito (ou o interesse jurídico), a
jurisprudência ainda resiste em admitir que a violação da imagem da pessoa jurídica
resulte em dano moral (extrapatrimonial). Sempre focada nos efeitos que esse
produz, como sendo aqueles que atingem a alma do lesado, provocando-lhe
sentimento de dor, perda, sofrimento etc., as decisões judiciais negam à pessoa
jurídica a reparação do dano moral.
Na visão dessa corrente - hoje minoritária -, o que se indeniza a titulo
de danos morais é o pretium doloris e por faltar substrato físico e espiritual à pessoa
jurídica, só há como recompor-se o seu patrimônio material.
Na Argentina, Brebbia relata que a problemática envolvendo o
reconhecimento do direito à imagem como direito da personalidade autônomo é

217
CIANCI, Mirna e QUARTIERI, Rita e Cássia Rocha Conte. Dano Moral à Pessoa Jurídica de
Direito Público e Respectiva Tutela Inibitória in Ensaios sobre responsabilidade civil nas pós-
modernidade/ (Coordenado por) HIRONAKA, Giselda Maria Fernandes Novaes e FALAVIGNA,
Maria Clara Osuna Diaz. Porto Alegre: Magister, 2007. p. 297
139
ainda tormentosa. Durante muito tempo, duvidou-se de sua existência, posto que
colocado à margem da honra e da intimidade, com as quais mantém conexão
evidente. Contudo, ressalta o jurista, a defesa da singularidade e da autonomia
desse direito tem cada vez mais aceitação na doutrina, havendo os que interpretam
como retrocesso admitir o direito à imagem como faceta do direito à honra.
218
Isto porque o conteúdo desses direitos é diferente: o direito à própria
imagem na tutela da privacidade tem tutela jurídica autônoma por ser a proteção
exterior e concreta da pessoa.
Antonio Chaves, criticando aquela visão obsoleta apontada alhures,
traz ao conhecimento Acórdão da 6ª Câmara Civil do Tribunal de Justiça do Rio
Grande do Sul, proferido na AC 593.028.962, ADV 65.232, relatado pelo
Desembargador Adroaldo Fabrício que enxerga a pessoa jurídica apenas como
titular de direitos patrimoniais, pois, por não ter substrato físico e espiritual, não pode
sentir os efeitos da lesão:
Nada disso se passa com a pessoa jurídica. Tudo o que se possa
imaginar como conseqüência de uma ofensa, injúria ou insulto
tomará a forma de menosvalia econômica, na medida em que o
conceito e a credibilidade no mundo dos negócios, a oportunidade de
ganhos futuros, a redução dos lucros atuais e a cessação dos
esperados, as restrições ao crédito são sempre valores econômicos
e não morais. As pessoas jurídicas só podem ser prejudicadas em
suas finalidades, não em sua essência de pessoa: o dano que assim
se traduza será sempre dano econômico, inclusive quando se trate
do bom-nome, de credibilidade pública e da decorrente redução de
oportunidades de ganho. O dano à auto-estima, ao amor-próprio,
pode eventualmente alcançar, por via reflexa, os membros de uma
sociedade, mas nesse caso por estes e em seu favor tem de ser
postulada a correspondente indenização”.
219

218
BREBBIA, Roberto H. El daño moral. Buenos Aires: Editorial Bibliográfica Argentina. Exemplar
da Biblioteca do Tribunal de Justiça de São Paulo E – 47 18-2 32.391 p. 36 e 37
219
CHAVES, Antônio. Responsabilidade civil - atualização em matéria de responsabilidade por
danos morais. Revista Jurídica nº 231, p. 11
140
Entretanto, o voto vencido do Desembargador Sérgio Gischkow foi
incisivo:
“Considero que os valores relacionados com a honra estão entre os
mais sérios e relevantes protegidos pelo sistema jurídico, situando-se
logo depois do valor vida, do valor integridade corporal e do valor
liberdade. Assim, devem ser aprimorados e aperfeiçoados os meios
jurídicos visando à prevenir e reprimir o dano moral. Mais ainda em
época na qual a honra das pessoas é posta em dúvida pelas formas
as mais levianas e quando se tem um sistema jurídico que,
equivocadamente, defende mais o patrimônio do que a honra,
bastando ver o que acontece com nosso CP. Ensina JOSÉ DE
AGUIAR DIAS (Da Responsabilidade Civil, 5ª ed., 1973, vol. II, nº
250, pág 448) que "a pessoa jurídica pública ou privada, os
sindicatos, as autarquias podem propor ação de responsabilidade,
tanto fundada no dano material como no prejuízo moral. Este ponto
de vista, esposado pela generalidade dos autores, é sufragado hoje
pacificamente pela jurisprudência estrangeira. A nossa carece de
exemplos, ao menos de nós conhecidos. Não há razão para supor
que não adote, ocorrida a hipótese, igual orientação”.
220
Não se pode, obviamente, partir de uma premissa equivocada,
tomando-se como paradigma as sociedades civis, como a empresária, cuja
finalidade é puramente econômica. As associações sem fins lucrativos e, até mesmo
a fundação, cujas finalidades são nobres, merecem tratamento diferenciado;
também a conclusão do voto vencedor não se dirige à pessoa jurídica de direito
público, que tem finalidade institucional: o bem comum.
221
Tome-se como exemplo a jurisprudência italiana que define o dano à
imagem contra a pessoa jurídica de direito público como uma

220
CHAVES, Antônio Direitos da personalidade. Justitia. São Paulo, v. 39, n. 98, p. 63-104, jul/set.
1977. p. 11.
221
Há opinião contrária de Gilberto JABUR para quem as pessoas jurídicas não experimentam
dano imaterial, pois a violação de direito imaterial ou de qualquer “expressão personalíssima” da
pessoa jurídica é sempre econômica, mesmo no tocante às pessoas jurídicas sem fins lucrativos
como associações e fundações. Isto porque embora não persigam o lucro, dependem do dinheiro
das contribuições dos associados para se manter. Cf. JABUR, Gilberto Efeitos jurídicos da ameaça
ou lesão a direitos personalíssimos por fato de comunicação social. 2005. Tese (Doutorado sob
orientação da Profa. Maria Helena Diniz – Faculdade de Direito – Pontifícia Universidade Católica
de São Paulo) 2005 p. 695-696.
141
“menomazione della funzionalità dell ‘Amministrazione stessa che, in
base agli artt. 97 e 98 Cost., deve agire in modo efficace, efficiente,
economico ed imparziale. É, dunque, un danno pubblico, in quanto
lesione del buon andamento della P.A. che perde, per la condotta
illecita dei suoi dipendenti, credibilità ed affidabilità all ‘esterno’”
.
222
Assim, ocorrerá dano à imagem quando houver um menoscabo às
funções da administração pública, que deve agir de modo eficaz, eficiente,
econômico e imparcial, levando-a em razão da conduta ilícita a perder a
credibilidade e confiança da sociedade que representa. A assertiva também se
aplica à pessoa jurídica de direito privado que, ferida em seu prestígio, conceito
criado pela confiança daqueles que com ela se relacionam, tem sua imagem
diminuida, restando desacreditada.
Na Itália, além da jurisdição ordinária, há uma jurisdição administrativa,
de atribuição do Tribunal de Contas que não está restrito ao desempenho das
tarefas clássicas de controle em matéria financeira e de contabilidade pública, tendo
certas funções jurisdicionais, em especial a relativa a juízos sobre responsabilidade
dos funcionários públicos. Tem, pois, uma jurisdição administrativa que é dirigida à
Administração Pública e não ao particular, sendo que a Administração Pública, salvo
os casos previstos em lei por razões de interesse público, atua com base nas
normas de direito privado.
223
De modo que já está consolidado na Corte dei Conti (Tribunal de
Contas) que as pessoas jurídicas, em particular a Administração Pública, são
portadoras de alguns direitos da personalidade que são compatíveis com ausência
de um organismo físico, como o direito ao nome, à reputação e à imagem.
224

222
Cf. Elementi di diritto amministrativo. 21. ed. Napoli: Edizioni Giuridiche Simone, 2007. p. 310.
223
SALMERÓN, Manuel Fernández. Nuevas tendencies de la justicia Administrativa en Italia: hacia
algunas quiebras de la distinction entre intereses legítimos y derechos subjetivos In Revista de
administración pública n. 154 enero-abril 2001 p. 505.
224
In materia, la Corte dei Conti ha riaffermato il consolidato principio in base al quale le persone
giuridiche e, in particolare, la P.A., sono portatrici di quei diritti della personalità che sono compatibili
com l’assenza di fisicità (es. diritto al nome, alla reputazione, all’immagine) (...) Il danno
all’immagine, conseguente alla condotta illecita del pubblico funzionario che scredita la P.A., pur se
non comporta una diminuzione patrimoniale, à suscetibile di una valutazione patrimoniale. Cf.
Elementi di diritto amministrativo. 21 ed. Napoli: Edizioni Giuridiche Simone, 2007. p. 310.
142
Tanto que os servidores envolvidos nas operações da Cosa Nostra,
como já mencionado em capítulo anterior, sofreram pesadas sanções, tanto de
ordem penal como de ordem patrimonial. Dentre as inúmeras decisões de interesse,
cita-se a da Corte dei Conti da região siciliana proferida na sentença n. 3227 de 9 de
novembro de 2006 que condenou o então Diretor do Centro Interprovincial da Polícia
Criminal (Criminalpol) da Sicília, a 10 anos de reclusão pelo crime de associação
mafiosa e ao ressarcimento do dano à imagem arbitrado em 150.000 euros,
concluindo que o ilícito penal praticado pelo funcionário público mesmo por não
acarretar uma lesão ao erário é suscetível de valoração patrimonial.
Durante o período que ocupou o cargo de Diretor do Centro
Interprovincial Criminalpol da Sicília, o acusado praticou condutas tais que
facilitaram a associação criminosa “Cosa Nostra”. Ao arbitrar a reparação, a Corte
considerou em primeiro lugar, a conduta contraditória atribuída ao Delegado e ao
grande número de episódios criminosos cometidos. Em segundo lugar, da específica
importância do cargo que ocupava, dentro da polícia estruturada para combater o
crime organizado; isto porque o delegado deu aos participantes da associação
criminosa, notícias reservadas a respeito das investigações e operações da polícia;
dificultou operações iniciadas por outros funcionários da polícia com o fim de
prender os mafiosos que estavam foragidos. Enfim, durante período relevante de
tempo, o então delegado de polícia teve um papel colaborador com a organização
mafiosa, agindo de forma contrária aos princípios da integridade e aos deveres
básicos da honestidade e fidelidade próprios de cada membro do Corpo de Polícia
do Estado.
Concluiu o Ministério Público, com muita propriedade, que a conduta
ilícita do acusado, confirmada na sede penal, teria provocado dano à imagem e ao
prestígio da administração, economicamente passível de avaliação (citando como
fundamento a “Cassazione” sentença 98 de 04/04/2000).
A notícia dos graves fatos cometidos pelo delegado encontrou ampla
difusão na imprensa com a inevitável repercussão sobre a imagem da Corporação
da Polícia, considerada pela coletividade dos cidadãos; representante dos valores
da legalidade e da integridade moral. Dessa forma, a indenização foi fixada por
equidade (artigo 1.226 do CC italiano), tendo em vista o cargo ocupado pelo ofensor
143
dentro da corporação (Diretor do Centro Interprovincial da Polícia Criminal da
Sicília), cargo de ponta da organização da Polícia do Estado e que lhe permitia obter
notícias reservadas a respeito das investigações e das ações criminosas que agiam
no território da região.
A decisão frisou que “é claramente evidente que o dano à imagem
precisa ser sempre provado, não podendo ser consequência automática do
reconhecimento da ilicitude do comportamento e assim para ressarcimentos ou
reparações a potencialidade danosa da conduta deve ser avaliada caso a caso.
Figuram de importância, relativamente ao “an debeatur” e ao “quantum debeatur” do
dano à imagem, os seguintes elementos: a atividade do ente, do órgão do autor do
dano; a posição funcional do autor da ilegalidade, que assume maior gravidade no
caso de posição de chefia; a continuidade, a frequência ou a reiteração dos
comportamentos ilícitos; a impressão negativa na opinião pública que provoca falta
de confiança na entidade.
225
O valor de 150.000 euros levou em conta a cricunstância de que a
conduta criminosa prolongou-se desde 1982 e durante toda a permanência no cargo
do delegado até 1989. Tanto que a sentença foi implacável, afirmando que o então
delegado teve dois empregadores: o Estado, com o qual ele foi infiel, e a Máfia,
cujas finalidades ele dobrou, instrumentalizando a organização criminosa, que, ao
contrário, deveria ter perseguido e reprimido.
Ainda especificamente na questão da tutela à imagem da
Administração Pública, Carlo Buonauro
226
assevera, como dito no capítulo anterior,
que o direito italiano a assegura tanto na Constituição, nos artigos 2 e 97,
227
como
na legislação infraconstitucional, como nos artigos 1.223 e 2.043 do Código Civil

225
Cf. Sentença do Tribunal de Contas, Seção jurisd. de 2º grau para a região Siciliana, n. 61 de
18/01/2005, publicada em 09 de março de 2005
226
BUONAURO, Carlo. Il danno all’immagine della Pubblica Amministrazione in Temi e Percorsi
Diritto Amministrativo – IV Edizione
227
Cf. Art. 2 La Repubblica riconosce e garantisce I diritti inviolabili dell’uomo, sia nelle formazioni
sociali ove si svolge la sua personalità, e richiede l’adempimento dei doveri inderogabili di
solidarietà política, econômica e social; e Art. 97
I pubblici uffici sono organizzati secondo
disposizioni di legge, in modo che siano assicurati il buon andamento e l’imparzialità
dell’amministrazione. Nell’ordinamento degli uffici sono determinate lê sfere di competenza, le
attribuzioni e lê responsabilità poprie dei funzionari. Agli impieghi nelle pubbliche amministrazioni si
accedere mediante concorso, salvo i casi stabiliti dalla legge.
144
italiano.
228
A República italiana reconhece e garante os direitos invioláveis do
homem, sejam individuais, seja na formação social, onde se desenvolve a sua
personalidade. Ressalta o doutrinador da península que o direito à imagem está
positivamente previsto no artigo 10 do Código Civil italiano.
229
Esse dispositivo legal é integrado pelos artigos 96 e 97 da legislação
italiana sobre o direito do autor.
230
A Itália, em exemplar apuração dos crimes praticados pela Máfia,
infiltrada em todos os ramos da sociedade peninsular, deu um largo passo na tutela
da imagem da pessoa jurídica de direito público, punindo criminal e civilmente os
servidores e representantes da Administração Pública (PA) que se desviaram da
conduta correta. Como sanção aos danos à imagem do ente público, foram
aplicadas indenizações significativas, com a finalidade pedagógica para que não
houvesse reincidência da conduta ilícita.
Sandro Castro
231
identifica decisões dos Tribunais de Contas que
classificam o dano não-patrimonial (na terminologia italiana) à imagem da
Administração Pública como dano-evento (em contraponto ao dano-consequência,
no qual se perquire os efeitos da lesão). O dano à imagem decorrente da conduta
ilícita do funcionário público que causa descrédito, se não comporta uma diminuição
patrimonial direta, é todavia suscetível de uma avaliação patrimonial.

228
Art. 1223 Risarcimento del danno Il risarcimento del danno per l'inadempimento o per il ritardo
deve comprendere così la perdita subita dal creditore come il mancato guadagno, in quanto ne
siano conseguenza immediata e diretta (1382, 1479, 2056 e seguenti).
Art. 2043
Risarcimento per fatto illecito Qualunque fatto doloso o colposo, che cagiona ad altri un
danno ingiusto, obbliga colui che ha commesso il fatto a risarcire il danno (Cod. Pen. 185).
229
Art. 10 Abuso dell'immagine altrui Qualora l'immagine di una persona o dei genitori, del coniuge
o dei figli sia stata esposta o pubblicata Fiori dei casi in cui l'esposizione o la pubblicazione e dalla
legge consentita, ovvero con pregiudizio al decoro o alla reputazione della persona stessa o dei detti
congiunti, l'autorità giudiziaria, su richiesta dell'interessato, può disporre che cessi l'abuso, salvo il
risarcimento dei danni.
230
SEZIONE II Diritti relativi al ritratto. Art. 96 - Il ritratto di una persona non può essere esposto,
riprodotto o messo in commercio senza il consenso di questa, salve le disposizioni dell'articolo
seguente. Dopo la morte della persona ritrattata si applicano le disposizioni del 2/a, 3/a e 4/a
comma dell'art. 93.
Art. 97 Non occorre il consenso della persona ritrattata quando la riproduzione dell'immagine è
giustificata dalla notorietà o dall'ufficio pubblico coperto, da necessità di giustizia o di polizia, da
scopi scientifici, didattici o colturali, o quando la riproduzione è collegata a fatti, avvenimenti,
cerimonie di interesse pubblico o svoltisi in pubblico.
Il ritratto non può tuttavia essere esposto o messo in commercio, quando l'esposizione o messa in
commercio rechi pregiudizio all'onore, alla reputazione od anche al decoro della persona ritrattata.
<http://www.newlaw.it/musicatestiimmagini_diritto_autore_foto_online.htm>
231
CASTRO, SANDRO Il danno all’immagine. Torino, G. Giappivhelli Editore 2008. p. 234 a 237.
145
O doutrinador italiano compila dentre outras, a decisão da Corte de
Conti Lazaio que enfrenta bem a questão ainda sob outra ótica por concluir que a
corrupção passiva ou a concussão, trazem um descrétido ao ente público como
regulador da vida em sociedade e econômica, seja como sujeito impositori, sai come
erogatori di spesa, pois a perda da credibilidade se traduz em um dano patrimonial
certo porque induz à evasão fiscal, afasta o contratante honesto e comporta
dispendioso problema de reorganização interna.
Outro julgado colecionado por Sandro Castro, em que um ministro da
República italiana recebeu, através de seu secretário, larga soma de dinheiro para
acelerar um processo de licitação, constituiu, indubitavelmente, um fato gerador de
descrétido da opinião pública, comportando, consequentemente, um grave
detrimento da imagem e da personalidade pública do Estado.
232
O dano a imagem consiste – para a Administração Pública – no
prejuízo decorrente da perda de prestígio que, embora não comportando uma perda
patrimonial direta, é todavia suscetível de uma valoração patrimonial para a
recomposição do bem jurídico lesado.
Outras decisões, entretanto, enfrentam o dano à imagem como uma
“espécie” de dano moral. Subsiste o dano moral, mais propriamente qualificado de
“dano à imagem”, no caso da corrupção do funcionário do fisco pela violação da
consideração social e da integridade da personalidade pública do Estado; tal dano
comporta uma atividade patrimonialmente custosa de recuperação dos valores da
imagem da administração financeira, valorada equitativamente.
233
Fábio Medina Osório identifica o mesmo problema no Brasil, em que as
instituições públicas são constantemente vilipendiadas por alguns setores da mídia,
por políticos e governantes quase sempre comprometidos com interesses escusos,
que não correspondem aos interesses da sociedade:

232
Corte Conti Lazio, Sez. Giurisdiz., 24 luglio 2001, n. 2905, in Riv. Corte Conti, 2001, fasc. 4, 157.
233
Corte Conti Lombardia, Sez. Giurisdiz., 3 dicembre 1998, n. 1679, in Foro amm., 1999, 2291; in
Riv. Corte Conti, 1999, fasc n. 1, 76.
146
É curiosamente nesse livre e desimpedido mercado que prolifera a
corrupção administrativa. A iniciativa privada, onde se encontram
ferozes críticos do Estado, participou, historicamente, da
consolidação de uma cultura do desrespeito às leis e às exigências
de honestidade, lealdade, probidade e moralidade no trato da coisa
pública. Ao corrompido sempre corresponde o corruptor. As fraudes,
em todos os setores públicos, tiveram a conivência e participação de
funcionários públicos, agentes políticos e também de
empresários”.
234
Ao concluir sua exposição, Osório, ferrenho representante do Ministério
Público, convoca para a necessidade da defesa do patrimônio público lato sensu, de
modo a abranger tanto os bens materiais (o erário propriamente dito) e os bens
imateriais (os institucionais).
O Ministro Paulo Brossard indeferiu habeas corpus em que o paciente,
então delegado de polícia de cidade do interior paulista, em concurso com policial
militar, praticou o crime de falsidade ideológica, emitindo 452 Carteiras Nacionais de
Habilitação falsas. Ponderou o ministro que a conduta do agente repercutiu
negativamente na sociedade local, além de representar um prejuízo ao trânsito e
consequente conspurcação da imagem dos órgãos públicos no seio social.
235
Ressaltou o voto de que o paciente integrava os chamados órgãos de
segurança da cidade paulista de Paulo de Faria; que “recebia vencimentos dos
cofres públicos para dar segurança e traia o seu compromisso perante a sociedade
que o pagava negando a segurança a que tinha direito. Aliás, causava ele ainda
mais insegurança com a sua conduta delituosa”.
Por conseguinte, a imagem, embora conexa à honra, dela se diferencia
por ser um plus em decorrência da divulgação de fatos ou atributos lesivos à
reputação da pessoa jurídica. Ademais, é direito da personalidade autônomo, assim
reconhecido pela Constituição Federal, com ampla proteção, pois vulnerável ao
vilipêndio não só pelos meios de comunicação como rádio, televisão e imprensa,
mas ainda pela Internet.

234
OSÓRIO, Fábio Medina. Improbidade administrativa decorrente de despesas públicas ilegais e
imorais: aspectos práticos da lei nº 8.429-92 Osório Revista Jurídica n. 235, p. 134.
235
Habeas Corpus n. 70668-1 – Supremo Tribunal Federal – 2a Turma.
147
Para ilustrar a afirmação, busca-se na jurisprudência pátria o Acórdão
relatado pela Desembargadora Sílvia Meirelles, do Tribunal de Justiça de São Paulo
que, decidindo com fundamento nas lições de Carlos Alberto Bittar, reconhece o
dano imaterial da pessoa jurídica de direito público e o direito, em tese, de
reparação. Contudo, a ausência de provas no sentido da divulgação dos atos
lesivos, afim de comprovar o impacto que o ato de improbidade causou na
população do Município de Osasco,
“Com efeito, a reparação aos danos morais de pessoa jurídica já são
reconhecidos pela doutrina, tal como se observa da lição de
CARLOS ALBERTO B1TTAR:
"Frise-se, ao revés, que pessoas jurídicas e entes não
personalizados podem figurar no pólo ativo da relação reparatória,
em fatos provocados por pessoas físicas ou entidades outras,
especialmente em razão de ilícitos praticados, tanto no plano da
contratualidade como no da extracontratualidade assim como
ataques injustos à reputação de empresa ou de dirigente, de produto
ou de ser\>iço; divulgação de notícias tendenciosas sobre a empresa
ou seus produtos, ou serviços; uso abusivo ou indevido de direitos
autorais, de nome, de marca, ou outro elemento identificador;
violação de segredo, ou de know-how por desafeto e outras
situações." (in "Reparação Civil por Danos Morais, Ed. RT, 3a.
edição, 1997, pp. 175/176).
Portanto, ao menos em tese, a municipalidade de Osasco, na
qualidade de pessoa jurídica de direito público interno que é, teria o
direito à reparação dos danos morais sofridos em razão da
contratação da empresa ré.
Contudo, tais danos não podem ser presumidos, incumbindo à
apelante comprovar que da contratação efetivada, de fato, houve
repercussão pública entre os munícipes, o que teria vindo a manchar
a boa imagem da Administração Municipal.
No mínimo, haveria que ser demonstrado que o julgamento feito pelo
Tribunal de Contas veio a conhecimento da população em geral,
através de sua divulgação pelos meios de comunicação (imprensa
148
escrita e falada), e que esta publicação teria maculado a sua imagem
pública.
Todavia, nenhuma dessas circunstâncias foi comprovada nos autos,
tal como lhe incumbia, na forma do art. 333, inciso I, do Código de
Processo Civil, motivo pelo qual improcede esta parte da pretensão,
merecendo prevalecer a r. sentença apelada neste aspecto.
(Apelação n. 994.05.030458-3 - TJSP - 8a Câm., j. 3/3/10).
5.2. - A natureza jurídica do dano à imagem.
No Brasil, a imagem é, ao mesmo tempo, direito fundamental e direito
da personalidade e sua proteção é sentida em todos os ramos do direito, tanto na
esfera constitucional, pois decorre do princípio da dignidade humana, quanto na
esfera infraconstitucional, em que a lei ordinária assegura-lhe mecanismos de
defesa, inclusive no âmbito penal, pois a difamação é um dos crimes contra a honra.
Conforme observa Márcia Haydée Porto de Carvalho
236
, o direito à
honra é de ser encarado como o direito à reputação, à honorabilidade, à boa fama,
que redunda no respeito dos concidadãos, na consideração social. É o direito de não
ser ofendido na sua dignidade ou no seu apreço social.
A autora reproduz as lições de Luiz Alberto David Araújo e Vidal
Serrano que defendem que o direito à honra abrange a proteção da honra-subjetiva,
ou o sentimento de auto-estima que o sujeito tem de si próprio e da honra-objetiva,
ou o conceito social que o sujeito possui.
237
Assim, e recapitulando, tem-se que a imagem pode ser entendida sob
dois prismas: como imagem-retrato e como imagem-atributo. A imagem-retrato
compreende a expressão da fotografia, da radiodifusão, e os gestos, expressões

236
CARVALHO, Márcia Haydée Porto de. A relação tensional entre direito à informação e direito à
honra, 2001, Dissertação (Mestrado em Direito Constitucional) Faculdade de Direito da Pontifícia
Universidade Católica de São Paulo (Orientadora GARCIA Maria). p. 128
237
CARVALHO, Márcia Haydée Porto de. A relação tensional entre direito à informação e direito à
honra, cit., p. 128.
149
dinâmicas da personalidade. A imagem-atributo é aquela que se forma nas relações
sociais, como chefe de família, como profissional, como amigo”.
238
Nada impede que o sujeito disponha do direito à imagem, autorizando
a sua reprodução ou proibindo a sua captação e difusão nos meios de comunicação,
no ambiente exterior.
Na justa observação de Cláudio Luiz Bueno de Godoy, a elasticidade
do conceito de direito à imagem permite confundi-lo com a honra, “a ponto, inclusive
de sustentar, tal como lembra Pontes de Miranda, que a imagem de alguém é
protegida como decorrência de simultânea ofensa à sua honra e, portanto, não
chega mesmo a constituir um autônomo direito da personalidade”.
239
Mas honra e imagem são direitos autônomos e independentes, e assim
sua proteção como direitos da personalidade se realiza da mesma forma, sem
dependência um do outro. Cláudio Luiz Bueno de Godoy afirma, nas palavras de
Santos Cifuentes que “el derecho a la imagem debe protegerse en si mismo y com
independência de que su utilización lesione algún outro bien jurídico como el honor,
la intimidad o el trabajo”.
240
Por conseguinte, imagem e honra não se confundem. “Imagem, vale
ressaltar, possui um conteudo próprio, de identificação da pessoa. (...) É a
representação exterior e pública da pessoa, que a diferencia na comunidade”.
241
Pode-se dizer, com suporte nas lições de Sandro Castro, que a
imagem é um valor primário de um indivíduo enquanto tal, que se dirige à tutela da
credibilidade da pessoa na sociedade.
242

238
CARVALHO, Márcia Haydée Porto de. A relação tensional entre direito à informação e direito à
honra, cit., p. 139.
239
GODOY, Cláudio Luiz Bueno de. A liberdade de imprensa e os direitos da personalidade, 2000.
Dissertação (Mestrado em Direito Civil) Faculdade de Direito da Pontifícia Universidade Católica de
São Paulo.p. 47.
240
GODOY, Cláudio Luiz Bueno de A liberdade de imprensa ..., cit. p. 49
241
GODOY, Cláudio Luiz Bueno de A liberdade de imprensa ..., cit. p. 48.
242
CASTRO, SANDRO Il danno all’immagine. Torino, G. Giappivhelli Editore 2008. p. 4
“proiezione ab externo della personalità del soggetto, personalità che trae linfa vitale dallo sviluppo
dei rapporti sociali e umanitari che la persona scambia com altri esseri umani, nella comune
direzione del miglioramento di se stessa e di persistenza della civile convivenza com l’ambiente che
la circonda”.
150
Tércio Sampaio Ferraz Junior assegura que o direito à imagem,
embora componha o direito da privacidade, estando ao lado do nome e da
reputação, é direito autônomo. “A imagem, a reputação, o nome, à diferença da
intimidade, são exclusivos (próprios), mas perante os outros. Como direito à
privacidade, demarcam a individualidade em face dos outros. Ninguém tem um
nome, uma imagem, uma reputação para si mesmo, mas como condição de
comunicação”.
243
“Não há um conceito absoluto de intimidade. Mas é possível
exemplifica-lo: o diário íntimo; o segredo sob juramento; as próprias
convicções. (p. 79). Já a honra e a imagem têm ostensivamente um
sentido comunicacional, que inevitavelmente envolve terceiros.
Ambos, especialmente a imagem, são situações personalíssimas
perante os outros. Direito à honra é, assim, direito de sustentar o
modo pelo qual cada um supõe e deseja ser bem visto pela
sociedade. É uma combinação entre autorespeito e respeito aos
outros. A honra se projeta na imagem que, embora de alguém, é
sempre como alguém julga e quer aparecer para os outros. O direito
à imagem é o direito de não vê-la mercantilizada, usada, sem o seu
exclusivo consentimento, em proveito de outros interesses que não
os próprios”
.
244
Assim, honra e imagem são conceitos conexos, que não se
confundem.
Fala-se de honra desde os tempos da Idade Média. O cavaleiro
medieval atribuía à honra um significado social altamente relevante, que, se lesado,
comportava o dever de investir na batalha para restabelecer a ordem violada, ou
seja, para restabelecer a honra perdida.
O conceito de honra fazia parte da própria essência da pessoa que, ao
perdê-la, era constrangida, pela vergonha sofrida, a retirar-se à vida privada.

243
FERRAZ JUNIOR, Tércio Sampaio. Sigilo de dados: o direito à privacidade e os limites à função
fiscalizadora do estado. In Revista dos Trbunais. Cadernos de direito constitucional e ciência
política. Ano 1, out/dez 1992. p. 78.
244
FERRAZ JUNIOR, Tércio Sampaio Sigilo de dados: o direito à privacidade e os limites à função
fiscalizadora do estado, cit., p. 79.
151
Por esse motivo, o Código Penal de Rocco de 1930 previa atenuantes
para o delito de honra, pois não era apenas a injúria e a ofensa que eram muitas
vezes resolvidas em duelos, mas como reação ao filho bastardo ou ao homicídio
resultante da traição da mulher, tal era a importância social da honra.
Com o passar do tempo, registrou-se uma atenuação desse
sentimento, desse “senso dell’onore”.
De modo que enquanto a lesão à honra não depende da divulgação do
fato nocivo, a violação da imagem, ao inverso, é uma lesão complexa, que só se
configura quando na presença de outros sujeitos. Ela vive de luz própria e se
cristaliza no instante em que o fato lesivo passa a ser de conhecimento público,
independente do número de pessoas que tomam ciência da divulgação.
A imagem também se distingue da reputação, embora guardem
identidade. A reputação, que vem do verbo “reputar”, “pensar”, é uma somatória de
princípios éticos do indivíduo, mas que, diferentemente da imagem, assume
características abstratas e teóricas.
Acompanham esse raciocínio as conclusões extraídas por Alexandre
Ferreira de Assumpção Alves: o dano moral atinge a pessoa jurídica em sua imagem
ou “honra externa”, mas não nos sentimentos de auto-estima, que só as pessoas
físicas possuem.
245
O direito à imagem é um direito fundamental de “negação” como diz
Pontes de Miranda: o bem protegido, o objeto do direito é a liberdade de “negação”
de exposição. O conteúdo do direito é a faculdade de resistir à comunicação.
Partindo dessas considerações, Teresa Ancona Lopes
246
sintetiza: a
pessoa “tanto pode ser lesada no que ela é quanto pode ser lesada no que tem”.
Com referência em Miguel Reale, afirma que o mentor do Código Civil de 2002
distingue os aspectos subjetivo e objetivo do dano moral, porquanto a Constituição
Federal no seu artigo 5º inciso V faz diferença entre dano moral e dano à imagem.

245
ALVES, Alexandre Ferreira de Assumpção A Pessoa Jurídica e os Direitos da Personalidade Rio
de Janeiro: Renovar, 1998 p 123.
246
LOPES, Teresa Ancona. O dano estético: responsabilidade civil. 3 ed. São Paulo: Editora
Revista dos Tribunais, 2004. p. 24-26
152
De forma que se teria um tertium genus, ou seja, um dano pessoal ou dano à
imagem social, situado entre o dano patrimonial e o moral.
Manoel Gonçalves Ferreira Filho assegura que o dano à imagem, tal
qual tutelado na Constituição Federal, é uma espécie de dano moral, talvez a
principal de todas. Imagem, para ele, nada mais é do que a perda da estima pública.
O direito da inviolabilidade da honra (que nada mais é do que o respeito devido a
cada um pela comunidade) impede a divulgação ou a expressão de qualquer
manifestação no sentido de privar o seu titular desse direito. Nas palavras do autor:
“A honra veste a imagem de um indivíduo determinado”.
247
Sem descartar essa possibilidade tripartida do dano (dano material,
moral e à imagem), Miguel Reale distingue com demasiada técnica jurídica o dano
moral em objetivo e subjetivo. O dano moral objetivo é o que tem como alvo direto a
dimensão social ou imagem de uma pessoa e o dano moral subjetivo é o sofrimento
interior. Assim, fácil denotar que há uma autonomia de tratamento jurídico na esfera
do dano moral, vislumbrando-se várias espécies de dano moral, cada uma dizendo
respeito a um aspecto diferente da pessoa, alerta Teresa Ancona Lopes.
248
De modo que a Constituição Federal coloca no inciso V do artigo 5º,
três espécies de dano, não incluindo o dano à imagem dentro do dano moral.
249
Essa assertiva é corroborada por Nelson Nery Júnior, para quem o
dano moral tutelado na Constituição Federal e reconhecido pela jursprudência do
Superior Tribunal de Justiça não é propriamente o do maltrato a determinados
sentimentos, mas um dano moral que se relaciona à imagem da pessoa, como uma
terceira categoria de danos indenizáveis, não fazendo distinção quanto ao
destinatário, sendo que é possível, assim, admitir-se dano moral à pessoa jurídica.
250

247
FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Comentários à Constituição brasileira de 1988. São
Paulo: Saraiva, 1990. V. 1, p. 33.
248
BAPTISTA, Denise Cristina Lima. Crimes contra a honra e liberdade de imprensa. 2003.
Dissertação.(Mestrado em Direito Penal) Faculdade de Direito – Pontifícia Universidade de São
Paulo. (Orientador Dirceu de Mello). p. 27.
249
BAPTISTA, Denise Cristina Lima Crimes contra a honra e liberdade de imprensa, cit., p. 29.
250
Diferentemente de NERY, Márcio CAMAROSSANO não consegue vislumbrar tal afirmação, pois
para ele os reflexos da lesão à Administração Pública são sempre patrimoniais, mesmo que
considerado o patrimônio público no sentido mais amplo, como havia discorrido em artigo anterior.
153
Denise Cristina Lima Baptista, enxergando a possibilidade de a pessoa
jurídica ser vítima do crime de difamação, pois nela se reconhece um conceito de
respeitabilidade, afirma que o direito à honra é, ao mesmo tempo no Brasil, um
direito fundamental e um direito da personalidade e, como a expressiva maioria dos
autores, considera autônomos os três direitos: honra, imagem e vida privada.
251
Com apoio nas palavras de Miguel Reale, Denise Cristina Lima
Baptista diz que a Constituição Federal ao tratar da imagem “não se refere ao
aspecto físico da pessoa, mas à sua dimensão ética perante a coletividade,
implicando necessariamente em um dano moral”.
252
Como se percebe, a interpretação dos conceitos jurídicos merece uma
incursão em todos os ramos do direito; mesmo porque os próprios conceitos de
honra e imagem se embaralham. Não é possível o olhar pontual do intérprete,
devendo buscar no ordenamento jurídico qual a correta exegese da norma,
valorando-a, razão pela qual se incursiona na seara do direito penal.
O Código Penal abre um capítulo dedicado aos “crimes contra a
honra”: calúnia, difamação e injúria. A seguir, trata dos delitos contra a liberdade
individual (ameaça; sequestro ou cárcere privado; redução análoga à de escravo;
violação de domicílio; contra a inviolabilidade de correspondência; sonegação ou
destruição de correspondência; violação da comunicação telegráfica, radioelétrica ou
telefônica; impedimento de correspondência e de comunicação comercial;
divulgação de segredo; violação de segredo profissional).
Damásio de Jesus
253
define como honra, o “conjunto de atributos
morais, físicos, intelectuais e demais dotes do cidadão, que o fazem merecedor de
apreço no convívio social”. Segundo sua doutrina, a honra pode ser subjetiva,
quando referir-se ao sentimento de cada um a respeito de suas qualidades físicas,
morais, intelectuais, ou seja, o que cada um pensa de si mesmo. Pode ainda ser

O embate travou-se quando ambos foram questionados de “Como se caracteriza o dano moral da
Fazenda Pública?”. Cf. NERY, Nelson; CAMAROSSANO, Márcio. Defesa do patrimônio em juízo. In
SUNDFELD, Carlos Ari; BUENO, Cássio Scarpinella (coord) Direito processual público: a Fazenda
em juízo. São Paulo, Malheiros, 2000. p. 279-278.
251
BAPTISTA, Denise Cristina Lima. Crimes contra a honra e liberdade de imprensa, cit., p. 29.
252
BAPTISTA, Denise Cristina Lima. Crimes contra a honra e liberdade de imprensa, cit., p. 30
253
JESUS, Damásio F. de Direito Penal. 2 vol.: parte especial: Dos crimes contra a pessoa e dos
crimes contra o patrimônio. 29 ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p 205
154
objetiva, quando disser respeito à reputação, ou seja, ao conceito que os outros
fazem de nós: “é o sentimento alheio incidindo sobre nossos atributos”.
Daí se extrai a posição da corrente doutrinária majoritária na defesa da
pessoa jurídica: por faltar-lhe honra subjetiva (não tem sentimentos próprios), pode
ser apenas sujeito passivo de difamação, já que não se pode negar que possui
honra objetiva, uma vez que goza de reputação, fama, credibilidade no seio da
sociedade. Difamar alguém é ato ofensivo à reputação do ofendido (artigo 139,
caput do Código Penal)
254
Tanto que caluniar ou difamar o Presidente da República
ou um Senador por motivo político (e não pessoal) constitui delito contra a
Segurança Nacional (Lei 7.170/83).
Permite-se ainda correlacionar a questão com a da titularidade do
direito a ser pleiteado em juízo, ou melhor, com a questão no âmbito do processo
civil referente à legitimidade ativa (condição da ação) para deduzir pretensão
material indenizatória.
O Judiciário enfrentou recentemente questão deveras interessante
envolvendo delegados da Polícia Federal que, se achando ofendidos por reportagem
jornalística, ajuizaram inúmeras ações de indenização por danos morais por ofensa
à imagem.
Em reportagem veiculada pela Rádio Excelsior Ltda., o jornalista Carlos
Heitor Cony, comentando acerca do episódio do assassinato da missionária
americana, Dorothy Stang, afirmou que Polícia Federal "é ineficiente em todo o
Brasil", que "é um cancro na vida nacional", que "a gente sabe da Polícia Federal é
que quando não é ineficiente, ela é corrupta. Então, realmente, não dá nenhuma
garantia." De modo que a Polícia Federal foi “desqualificada” como incompetente,
desidiosa e corrupta, tendo alguns integrantes da corporação, todos delegados

254
Art. 139 - Difamar alguém, imputando-lhe fato ofensivo à sua reputação: Pena - detenção, de 3
(três) meses a 1 (um) ano, e multa.
Exceção da verdade. Parágrafo único. A exceção da verdade somente se admite se o ofendido é
funcionário público e a ofensa é relativa ao exercício de suas funções.
155
federais, ingressado com ações de indenização por se sentirem ofendidos em sua
honra.
255
Pleitearam, além da indenização por dano morais, que a Radio
Excelsior Ltda. fosse condenada a publicar o teor da sentença em veículo de
comunicação por eles escolhido, sob pena da imposição de astreintes.
O Tribunal de Justiça de São Paulo decretou a extinção dos processos
sem exame de mérito por ilegitimidade ativa, sob o fundamento de que a matéria
jornalística veiculada por meio do rádio foi dirigida à corporação à qual pertencem
os autores, não à pessoa física dos mesmos. De modo que a legitimidade para a
propositura da ação seria da pessoa jurídica, não da pessoa física de seu membro.
Isto porque o comentário feito por Carlos Heitor Cony atacou a instituição como um
todo, não individualizando quais membros seriam corruptos ou ineficientes, o que
provocou a revolta dos policiais que se mantiveram íntegros, mas nem por isso tem
eles legitimidade para, individualmente, propor ação em face do responsável
objetivando a reparação do dano moral causado à instituição Polícia Federal.
Pois bem, imagem e honra não se confundem, embora sejam conceitos
próximos. Ambos estão atrelados à reputação que a pessoa, seja natural ou jurídica,
angaria no meio social. A diferença entre os dois conceitos está em que haverá dano
à imagem quando a ofensa à reputação for exteriorizada, tornando-se de domínio
público.
A proteção jurídica, como já mencionado, deve ser ampla e irrestrita,
assegurando-se a reparação dos danos materiais e morais decorrentes de eventual
difamação.
5.3. – A tutela jurídica do dano à imagem.
Os romanos traçaram os primeiros interditos para a proteção da
pessoa, sendo a actio injuriarum de importância para a defesa da honra. Esse

255
Apelação Cível n° 994.05.084625-4 - São Paulo - Voto n° 5.837
156
interdito objetivava a defesa do indivíduo contra toda ofensa a sua pessoa, como
nome, liberdade, honra etc. Vieram a seguir as primeiras leis para a proteção da
privacidade do indivíduo: a Lex Cornelia, coibindo a violação do domicílio; a Lex
Aquilia, protegendo a integridade física e a Lex Fabia, na tutela da liberdade
individual.
256
Também os gregos dispunham de ações tendentes à punição da
hybris, tida esta como idéia de injustiça. De modo que a origem remota dos direitos
da personalidade pode estar tanto a hybris como a actio injuriarum.
Mas como já mencionado em capítulo anterior, o conceito de pessoa
coletiva ganha contornos com Savigny, já no final do Século XIX. De modo, pois,
que a tutela jurídica do direito à imagem é recente e, no direito pátrio, inaugura um
momento histórico com o advento da Constituição Federal de 1988.
Por certo, o Código Civil de 1916 trazia no bojo dos artigos 75, 76 e
159 a possibilidade de reparação à vítima do dano, embora a jurisprudência
relutasse em reconhecer a compensação do dano moral. Perceba-se que era
pacífico, na doutrina penal, que a pessoa jurídica pudesse ser vítima de difamação,
mas a correspondente responsabilidade civil era incipiente tendo em vista a timidez
da jurisprudência de então.
Dispunha o Código Civil de Beviláqua:
Art. 75 - A todo o direito corresponde uma ação, que o assegura.
Art. 76. Para propor, ou contestar uma ação, é necessário ter
legítimo interesse econômico, ou moral.
Parágrafo único. O interesse moral só autoriza a ação quando toque
diretamente ao autor, ou à sua família.
Art. 159. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência, ou
imprudência, violar direito, ou causar prejuízo a outrem, fica obrigado
a reparar o dano.A verificação da culpa e a avaliação da
responsabilidade regulam-se pelo disposto neste Código, artigos
1518 a 1532 e 1537 a 1553.

256
GODOY, Cláudio Luiz Bueno de A liberdade de imprensa e os direitos da personalidade, cit., p.
14.
157
De sorte que os pedidos de indenização só eram procedentes quando
havia prejuízo patrimonial, afastando-se a viabilidade da pretensão quanto ao dano
moral puro.
A Lei n. 5.250/67, chamada Lei de Impensa, regulava a liberdade de
manifestação do pensamento e de informação, e regrava que:
Art. 49. Aquele que no exercício da liberdade de manifestação de
pensamento e de informação, com dolo ou culpa, viola direito, ou
causa prejuízo a outrem, fica obrigado a reparar:
I - os danos morais e materiais, nos casos previstos no art. 16,
números II e IV, no art. 18 e de calúnia, difamação ou injúrias;
§ 1º Nos casos de calúnia e difamação, a prova da verdade, desde
que admissível na forma dos arts. 20 e 21, excepcionada no prazo
da contestação, excluirá a responsabilidade civil, salvo se o fato
imputado, embora verdadeiro, diz respeito à vida privada do ofendido
e a divulgação não foi motivada em razão de interesse público.
Art. 51. A responsabilidade civil do jornalista profissional que
concorre para o dano por negligência, imperícia ou imprudência, é
limitada, em cada escrito, transmissão ou notícia:
I - a 2 salários-mínimos da região, no caso de publicação ou
transmissão de notícia falsa, ou divulgação de fato verdadeiro
truncado ou deturpado (art. 16, ns. II e IV).
II - a cinco salários-mínimos da região, nos casos de publicação ou
transmissão que ofenda a dignidade ou decoro de alguém;
III - a 10 salários-mínimos da região, nos casos de imputação de fato
ofensivo à reputação de alguém;
IV - a 20 salários-mínimos da região, nos casos de falsa imputação
de crime a alguém, ou de imputação de crime verdadeiro, nos casos
em que a lei não admite a exceção da verdade (art. 49, § 1º).
Art. 52. A responsabilidade civil da empresa que explora o meio de
informação ou divulgação é limitada a dez vezes as importâncias
referidas no artigo anterior, se resulta de ato culposo de algumas das
pessoas referidas no art. 50.
Art. 53. No arbitramento da indenização em reparação do dano
moral, o juiz terá em conta, notadamente:
158
I - a intensidade do sofrimento do ofendido, a gravidade, a natureza e
repercussão da ofensa e a posição social e política do ofendido;
II - A intensidade do dolo ou o grau da culpa do responsável, sua
situação econômica e sua condenação anterior em ação criminal ou
cível fundada em abuso no exercício da liberdade de manifestação
do pensamento e informação;
III - a retratação espontânea e cabal, antes da propositura da ação
penal ou cível, a publicação ou transmissão da resposta ou pedido
de retificação, nos prazos previstos na lei e independentemente de
intervenção judicial, e a extensão da reparação por esse meio obtida
pelo ofendido.
Embora não mais em vigor, a chamada Lei de Imprensa foi um avanço
na reparação civil quando a pessoa – e aí não fazia distinção se natural ou jurídica –
era difamada pela ação culposa ou dolosa do profissional no exercício da liberdade
de manifestação de pensamento e de informação.
Traçou parâmetros para o arbitramento da indenização, bem como
implantou um sistema de tarifamento, que caiu por terra com o advento da
Constituição Federal, motivando a Arguição de Preceito Fundamental ADPF n. 130
no Superior Tribunal Federal, que, por ser fórmula processual subsidiária de controle
concentrado de constitucionalidade, julgou de todo imprestáveis as tentativas de
conciliação da Lei n. 5.250/67 com a Constituição Federal, expurgando-a do
sistema, aplicando-se as normas da legislação comum, notadamente do Código
Civil, o Código de Processo Civil, o Código Penal e de Processo Penal às causas
decorrentes das relações de imprensa.
O então Código Brasileiro de Telecomunicações (Lei n. 4.117/62), na
mesma esteira, regulamentava a responsabilidade civil, abarcando a possibilidade
de reparação do dano moral, também estabelecendo um teto para a indenização
(artigos 81 a 88).
Consoante Maria Cristina da Silva Carmignani, o artigo 244 do Código
Eleitoral de 1965 (Lei 7.737) previa a possibilidade de reparação do dano moral em
caso de calúnia ou difamação contra membro ou partido político. Editou-se em 1973
159
a Lei de Direitos Autorais que dispôs acerca da reparação dos danos
extrapatrimoniais pela ofensa aos direitos do autor (artigo 122).
257
Mas foi a promulgação da Constituição Federal verdadeiro divisor de
águas:
TÍTULO II - Dos Direitos e Garantias Fundamentais
CAPÍTULO I
DOS DIREITOS E DEVERES INDIVIDUAIS E COLETIVOS
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer
natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes
no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à
segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
V - é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além
da indenização por dano material, moral ou à imagem;
X - são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem
das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material
ou moral decorrente de sua violação;
Milena Donato Oliva aponta que a Constituição Federal operou
significativa transformação no Direito Civil, alterando a base axiológica sobre a qual
se fundam institutos, colocando a pessoa humana no ápice do sistema.
258
Entretanto, entende que, quando se trata de interpretar as normas
infraconstitucionais com relação às pessoas jurídicas, o fundamento é outro:
“Os direitos da personalidade e o ressarcimento por danos morais
não podem ser imaginados como ‘categorias neutras’, que pudessem
ter sua aplicação estendida às pessoas jurídicas. Tanto que os

257
CARMIGNANI, Maria Cristina da Silva. A evolução histórica do dano moral. In Revista do
advogado p. 41.
258
OLIVA, Milena Donato Condomínio edilício e subjetividade. In TEPEDINO, Gustavo e FACHIN;
LUIZ EDSON (organizadores). Diálogos sobre Direito Civil vol 2. 3 ed. Rio de Janeiro: Renovar,
2008. p. 64
160
princípios e valores que inspiram a proteção da pessoa física são
diferentes dos que sustentam as pessoas jurídicas”
.
259
Crítica que não passou despercebida no presente trabalho, cuja
referência se fez a Gustavo Tepedino (dano institucional) e será objeto de discussão
em ponto destacado, quando se falar do artigo 52 do Código Civil.
Na sequência, as normas infraconstitucionais que se seguem firmam
posição, como o Código de Defesa do Consumidor, estendendo-se a proteção a
grupos de pessoas, mesmo despersonalizados:
Art. 6º São direitos básicos do consumidor:
VI - a efetiva prevenção e reparação de danos patrimoniais e morais,
individuais, coletivos e difusos;
O Código Civil de 2002 inaugurou novo paradigma, disciplinando as
relações jurídicas entre particulares não mais de modo individualista, mas
socializado. O Novo Código Civil tem na sua base axiológica os princípios da
socialidade, da eticidade e da operabilidade, que devem ser sopesados quando da
interpretação das normas.
Sobreveio então o artigo 52 do Código Civil (sem correspondência no
Código Civil/1916), dispondo que se aplica às pessoas jurídicas, no que couber, a
proteção aos direitos da personalidade, “sendo omisso quanto aos tipos de direitos
da personalidade que, previstos para a pessoa física, possam ser aplicados à
pessoa jurídica”, lembra Fábio Maria De-Mattia
260
.

259
OLIVA, Milena Donato, Condomínio edilício e subjetividade, cit., p. 65.
260
DE-MATTIA, Fábio Maria. Das pessoas jurídicas In O novo Código Civil: Estudos em
homenagem ao professor Miguel Reale/Ives Gandra da Silva Martins Filho, Gilmar Ferreira Mendes,
Domingos Franciulli Neto, coordenadores. São Paulo: LTr, 2003. p. 75
161
O intérprete tem o dever de aplicar as normas de forma integradora,
com atenção ao ordenamento jurídico, adequando-as à realidade social, não seria
crível que o legislador editasse norma sem conteúdo, para que não produzisse
efeitos. Antecipa-se a crítica, mas guarda-se para o momento adequado o seu
desenrolar.
Com relação às pessoas jurídicas de direito público, o sistema legal
criou a ação popular, a ação civil pública, a ação de improbidade (Lei n° 8.429/92) e
a Lei 8.666/93. Nessa cronologia, passa a trazer mecanismos cada vez mais
eficazes de tutela do ente público e dos interesses da coletividade; contudo, embora
vislumbrem a possibilidade de reparação do dano moral, não há, em particular, um
artigo sequer mencionando a imagem, ou seja, permite-se inferir que a indenização
do dano moral abrange o dano aos diversos direitos da personalidade.
O que implica, em algumas circunstâncias, rechaçar-se a reparação do
dano moral, dada a diversidade de entendimentos quanto ao seu conceito. Para
ilustrar, tome-se como exemplo a doutrina de Carlos Ari Sundfeld, em que renderia
ao ente público a recomposição de dano moral por contratação sem licitação (em
violação ao princípio da moralidade pública)
261
e a decisão proferida pelo
Desembargador Gonzaga Franceschini na Apelação 61.273.5/0 5 do Egrégio
Tribunal de Justiça de São Paulo.
Na hipótese dos autos, basta a recomposição do erário municipal
pelo ressarcimento do numerário dispendido com a publicidade
indevida, ou seja, a restituição do valor de R$ 72.820,28, corrigidos
até março de 1997, consoante o apurado pelo perito judicial (fls. 975)
e não impugnado pelo réu.
Isso porque boa parte da publicidade questionada, embora feita com
violação dos deveres da legalidade, da impessoalidade e da
moralidade, teve caráter educativo, informativo ou de orientação
social.

261
SUNDFELD, Carlos Ari Ação civil pública e ação popular. Boletim de Direito Administrativo. n. 7
Ano XII junho 1996.
162
Ademais, inexistiu proveito patrimonial auferido diretamente pelo réu
e não se identificou o propósito de causar lesão.
A publicidade nos "outdoors" em que figurava a CUT, como os
artistas que participaram do show em protesto contra as reformas da
Previdência foram pagos pela Central Única dos Trabalhadores,
segundo a perícia contábil. A campanha publicitária foi regida por
contrato, após processo de licitação. E corretamente foram
excluídas, na sentença, as verbas derivadas do uso dos espaços
pertencentes à municipalidade, dada a inocorrência de prejuízo.
Nos fatos imputados ao apelado não se encontra a tipificação legal
dos incisos I e II do artigo 10 da Lei n° 8.429/92 e não há como
impor-lhe condenação por danos morais, eis que impossível
confundir violação do princípio constitucional da moralidade
administrativa com ofensa à moral de pessoa jurídica, no caso, o
Município.
Daí porque incabíveis outras sanções”.
5.3.1. – A proteção constitucional
A Constituição Federal trata da imagem como direito fundamental nos
incisos V e X do artigo 5º. Além disso, disciplina a imagem como direito autômono,
tal qual assentado anteriormente.
262
A Constituição portuguesa o faz no artigo 26, reconhecendo a todos os
direitos à identidade pessoal, ao desenvolvimento da personalidade, à capacidade
civil, à cidadania, ao bom nome e reputação, à imagem, à palavra, à reserva de
intimidade da vida privada e familiar e à proteção legal contra quaisquer formas de
discriminação. Esse dispositivo, interpretado em consonância com o artigo 12/2 da
Constituição portuguesa permite, inferir que se “as pessoas colectivas gozam dos

262
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos
brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à
igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: V - é assegurado o direito de
resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou à imagem; X -
são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito
a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação;
163
direitos e estão sujeitas aos deveres compatíveis com a sua natureza” superou-se
uma “concepção de direitos fundamentais exclusivamente centrada sobre os
indivíduos.
263
Este mesmo dispositivo também alcança outros grupos sociais (como
comissões de trabalhadores (art. 45); comissão de moradores (art. 265) que não
apenas as pessoas jurídicas regularmente constituídas, pois há um alargamento
teleológico do artigo 12/2. Essa norma não encontra correspondência na
Constituição brasileira de 1988.
De modo que no direito luso são assegurados às pessoas jurídicas
(coletivas, na terminologia peninsular), direitos fundamentais compatíveis com a sua
natureza, como arremata Canotilho:
A extensão dos direitos e deveres fundamentais às pessoas
colectivas (pessoas jurídicas) significa que alguns direitos não são
‘direitos do homem’, podendo haver titularidade de direitos
fundamentais e capacidade de exercício por parte de pessoas não
identificadas com cidadãos de ‘carne e osso’.
Determinar quais os direitos e deveres ‘compatíveis com a natureza’
das pessoas colectivas depende do conceito e do âmbito normativo
específico do direito fundamental. Os direitos postuladores de uma
referência humana afastam a titularidade de pessoas colectivas:
direito à vida (artigo 24º), direito de constituir família e de celebrar
casamento (artigo 36º), liberdade de consciência (artigo 41º). Em
fórmula sintética e aproximada: as pessoas colectivas gozam de
direitos fundamentais que não pressuponham características
intrínsecas ou naturais do homem como sejam o corpo ou bens
espirituais (cfr., também, artigo 160º do Código Civil).
As pessoas colectivas gozam de direitos fundamentais como a
liberdade de imprensa, a liberdade de reunião a liberdade de
profissão,...”.
“Claro está que se deve verificar, caso a caso, se o domínio da
norma é aplicável às pessoas jurídicas e exemplifica: as igrejas

263
CANOTILHO, J. J. Gomes. Constituição da República portuguesa anoada. São Paulo, Revista
dos Tribuanis; Coimbra, PT: Coimbra Editora, 2007.
164
podem reivindicar a liberdade de religião e de culto (artigo 41º), mas
não podem pleitear a liberdade de consciência (artigo 41º)”.
264
J J. Gomes Canotilho refere que a possibilidade das pessoas jurídicas
de direito público serem titulares de direitos fundamentais é muito debatida na
doutrina. Embora a constituição portuguesa não faça distinção entre pessoas
jurídicas de direito privado e de direito público, tudo gira em torno da interpretação
da “natureza” dos direitos fundamentais que, a seu ver, não é puramente
individualista.
Tanto que da mesma forma que certos direitos fundamentais
pressupõem uma referência humana há outros cuja titularidade pertence às pessoas
coletivas não aos seus membros individualmente considerados, exemplificando com
o exercício do controle de gestão pertencente às comissões de trabalhadores (artigo
54º /5/b).
265
Esse mesmo raciocínio pode ser estendido a outras culturas jurídicas.
A Constituição Espanhola de 1978 em vigor, protege o direito à
imagem nos artigos 15 e 18, garantindo-se o direito à honra, à intimidade pessoal e
familiar e à própria imagem, sendo também inviolável o domicílio e o sigilo de
correspondência.
266
A Constituição Brasileira de 1988 disciplina o direito à imagem nos
incisos V e X do artigo 5º. Ao comentar os dispositivos legais, Luiz Alberto David de
Araújo adverte que existem, no texto constitucional, imagens e não apenas uma
ideia de imagem. Isso porque a Constituição atendeu a um novo conceito de
imagem decorrente do desenvolvimento das relações sociais, - a imagem-atributo -,

264
CANOTILHO, J.J. Gomes. Direito constitucional. Coimbra, Almedina, 1995. p. 559
265
CANOTILHO, J.J. Gomes. Direito constitucional , cit.,p. 561
266
Artículo 15. Todos tienen derecho a la vida y a la integridad física y moral, sin que, en ningún
caso, puedan ser sometidos a tortura ni a penas o tratos iñumanos o degradantes. Queda abolida la
pena de muerte, salvo lo que puedan disponer las Leyes penales militares para tiempos de guerra.
Artículo 18
. 1. Se garantiza el derecho al honor, a la intimidad personal y familiar y a la propia
imagen. 2. El domicilio es inviolable. Ninguna entrada o registro podrá hacerse en el sin
consentimiento del titular o resolución judicial, salvo en caso de flagrante delito. 3. Se garantiza el
secreto de las comunicaciones y, en especial, de las postales, telegráficas y telefónicas, salvo
resolución judicial. 4. La Ley limitara el uso de la informática para garantizar el honor y la intimidad
personal y familiar de los ciudadanos y el pleno ejercicio de sus derechos
165
consequência da vida em sociedade, “como o conjunto de característicos
apresentados socialmente por determinado indivíduo”. “Trata-se de concepção
moderna do termo. A imagem do Poder Judiciário, a imagem do Presidente da
República, a imagem do líder religioso, a imagem do político. São expressões novas,
correntes e incorporadas ao vocabulário nacional, de forma a determinar uma
proteção certa e individualizada”.
267
Para Luiz Alberto David de Araújo, imagem é um direito autônomo, não
havendo mais espaço para as teses que defendiam a imagem como contida dentro
da honra como duas faces da moeda: ou seja, ao ferir-se a imagem, estar-se-ia
ferindo a honra. Exalta o jurista que a imagem pode ser lesada sem gravame à
honra, como no caso, por exemplo, da usurpação da fotografia em que pode haver a
reprodução não consentida da imagem (dano à imagem), sem que a honra seja
maculada.
O autor alerta ainda que o avanço da tecnologia contribuiu
sobremaneira para o incremento do número de situações potencializadoras do dano
à imagem – em especial à imagem-atributo -, pois a divulgação poderá ter
repercussão global em segundos. De forma que “o bem imagem recebe dupla
proteção inovadora: como imagem-retrato, sendo colocado ao lado da honra, vida
privada e intimidade, e como imagem-atributo, sendo lançado junto ao direito de
resposta, como um dos bens feridos pelos meios de comunicação”.
268
Mas o texto constitucional não criou um novo tipo de dano, pois o
vilipêndio à imagem tem repercussões tanto na esfera moral (extrapatrimonial) como
na patrimonial. Para o professor da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, o
constituinte pretendeu apenas a facilitação da comprovação do dano. Dá o exemplo
de uma escola no Morumbi que pediu que o jornal divulgasse o arquivamento de
inquérito policial instaurado por aluno que foi obrigado a retirar o brinco que usava,
sob o argumento de que “tem de ficar claro que ganhamos a causa, senão ficamos

267
ARAUJO, Luiz Alberto David de A proteção constitucional da própria imagem. Belo Horizonte:
Del Rey, 1996. p. 32.
268
ARAUJO, Luiz Alberto David de, A proteção constitucional da própria imagem, cit., p. 74.
166
com a imagem de escola retrograda e conservadora” (Jornal da Tarde de 19 de maio
de 1996 p. 5 –C – “O outro lado – Morumbi fala sobre o brinco”).
269
Paulo Luiz Netto Lôbo assegura que o direito à reputação é o mais
atingido e, portanto, mais vulnerável. A consideração e o respeito que a pessoa
jurídica adquire ao longo do exercício de suas finalidades merece proteção, pois a
difamação pode acarretar prejuízos materiais e morais. A tutela legal, para ele,
também alcança os entes não personificados, como o condomínio, o espólio, a
herança jacente.
270
Some-se aos argumentos acima, o fato do legislador ter incluído no
Código Civil de 2002 a proteção aos entes morais.
5.3.2. – A extensão da técnica do artigo 52 do CC
A proteção constitucional se estende, assim, para a esfera
infraconstitucional, abarcando os chamados direitos da personalidade, de modo a
dar proteção à pessoa. Tanto que a dignidade da pessoa é valor fundamental
colocado no vértice da Constituição Federal.
O Código Civil de 2002, atento às alterações principiológicas trazidas
pela nova ordem constitucional, passa a valorizar a solidariedade, procurando
superar o caráter individualista do diploma civil de 1916, transmudando a
responsabilidade civil, que assume também uma função social, inclusive de caráter
pedagógico, não restrita à faceta do ressarcimento, como quando se está na esfera
dos bens patrimoniais.
A evolução social permite um prestígio ao princípio neminen laedere,
reparando-se o dano em toda a sua extensão, uma vez que o conceito formulado

269
ARAUJO, Luiz Alberto David de. A proteção constitucional da própria imagem, cit., p. 124
270
LÔBO, Paulo Luiz Netto. Danos morais e direitos da personalidade. in Grandes temas da
atuaidade – Dano moral. Coordenador: Eduardo de Oliveira Leite. Rio de Janeiro: Forense, 2002. p.
364.
167
pelo jurisconsulto Paulo, de efetiva diminuição patrimonial deve ser alargada. Para
Paulo, o conceito de patrimônio relacionava-se com seu valor em dinheiro, o que
está ultrapassado.
Alerta Agostinho Alvim que o termo dano deve ser enfocado em sentido
amplo, como a lesão de qualquer bem jurídico.
271
A legislação infraconstitucional, em particular o Código Civil, passa a
reger os chamados direitos da personalidade nos artigos 11 a 21, enxertados no
Livro I – Das Pessoas, Título I – Das Pessoas Naturais e no Título II – Das Pessoas
Jurídicas, dispõe, no artigo 52 que:
Art. 52. Aplica-se às pessoas jurídicas, no que couber, a proteção
dos direitos da personalidade.
Desse modo, o Código Civil vale-se de conceito aberto: “no que
couber”, para possibilitar ao intérprete da norma aplicar a analogia a fim de estender
às pessoas jurídicas a proteção dos direitos da personalidade que, por óbvio, não
tenham como requisito o substrato pessoal (biopsíquico).
Conforme afirmado, o Código Civil não enumerou os direitos da
personalidade, evitando engessá-los, omitindo-se em identificar quais os direitos da
personalidade previstos para a pessoa física poderiam ser aplicados à pessoa
jurídica, “visando à sua salvaguarda, sob múltiplos aspectos, desde a proteção
dispensada ao nome e à imagem até o direito de dispor do próprio corpo para fins
científicos ou altruísticos”.
272
Miguel Reale, idealizador do novo diploma civil, faz críticas severas ao
código anterior, que pecava por excessivo rigorismo formal, num verdadeiro espírito

271
ALVIM, Agostinho. Da inexecução das obrigações. São Paulo. Saraiva, 1980. p. 241.
272
Câmara dos Deputados – Projeto de Lei n. 634, de 1975 (Do Poder Executivo) – Mensagem n.
160/75 publicado no Diário do Congresso Nacional, Suplemento (B) n. 061, 13 de junho de 1975:
Art. 50. Aplica-se às pessoas jurídicas, no que couber, a proteção dos direitos da personalidade.
EXPOSIÇÃO DE MOTIVOS - item c: Todo um capítulo novo foi dedicado aos Direitos da
personalidade, visando à sua salvaguarda, sob múltiplos aspectos, desde a proteção dispensada ao
nome e à imagem até o direito de se dispor do próprio corpo para fins científicos ou altruísticos.
Tratando-se de matéria de per si complexa e de significação ética essencial, foi preferido o
enunciado de poucas normas dotadas de rigor e clareza, cujos objetivos permitirão os naturais
desenvolvimentos da doutrina e da jurisprudência. Observa-se que o artigo 50 foi introduzido no
Código Civil de 2002 como artigo 52.
168
dogmático-formalista, por pretender prever tudo de forma detalhada. Descrente na
“geral plenitude da norma jurídico positiva”, Reale propõe ao intérprete e aplicador
da norma o uso de critérios ético-jurídicos para chegar a uma solução mais justa,
mais equitativa, sem o rigorismo normativo de outrora.
O doutrinador ressalta que “o que importa numa codificação é o seu
espírito; é um conjunto de idéias fundamentais em torno das quais as normas se
entrelaçam, se ordenam e se sistematizam”.
273
Tanto isso é fato que a Exposição de
Motivos do Projeto 634, de 1975, que introduziu o artigo 52 foi explícita: “Tratando-
se de matéria de per si complexa e de significação ética essencial, foi preferido o
enunciado de poucas normas dotadas de rigor e clareza, cujos objetivos permitirão
os naturais desenvolvimentos da doutrina e da jurisprudência.”
274
Reale deixa claro que “o Código é um sistema, um conjunto harmônico
de preceitos que exige a todo instante recurso à analogia e a princípios gerais”, de
modo que cabe ao intérprete valer-se das regras de hermeneutica, como
estabelecem os artigos 4º e 5º da Lei de Introdução ao Código Civil (Decreto-lei nº
4.657, de 04 de setembro de 1942):
Art. 4º Quando a lei for omissa, o juiz decidirá o caso de acordo com
a analogia, os costumes e os princípios gerais de direito.
Art. 5º Na aplicação da lei, o juiz atenderá aos fins sociais a que ela
se dirige e às exigências do bem comum.
Ao preencher os conceitos abertos, deve o intérprete buscar a
harmonia do significado no próprio ordenamento jurídico. O que fará, primeiro, pela
analogia.
Mas como as comparações são sempre perigosas, deve o exegeta, ao
equiparar a pessoa natural à pessoa jurídica, ficar atento às diversidades de sua
natureza; do fundamento de sua proteção e de suas finalidades. A finalidade que
move cada uma das pessoas jurídicas também é diversa, não só em comparação

273
REALE, Miguel. Visão geral do projeto do código civil. Revista dos Tribunais. Ano 87, v. 752.
junho de 1998 p. 29.
274
Câmara dos Deputados – Projeto de Lei n. 634, de 1975 (Do Poder Executivo) – Mensagem n.
160/75; publicado no Diário do Congresso Nacional, Suplemento (B) n. 061, 13 de junho de 1975.
169
com a pessoa natural, tendo a associação fins “nobres”, enquanto as sociedades,
em regra, visam exclusivamente o lucro.
A analogia, como ensina Carlos Maximiliano, é essencialmente
contingente, sendo que o mesmo princípio contido numa regra legal é logicamente
estendido a outras hipóteses não previstas. Mas com o alerta de que não se aplica
uma norma jurídica senão à ordem de coisas para a qual foi estabelecida.
“O manejo acertado da analogia exige, da parte de quem a emprega,
inteligência, discernimento, rigor de lógica; não comporta uma ação
passiva, mecânica. O processo não é simples, destituído de perigos;
facilmente conduz a erros deploráveis o aplicador descuidado”.
275
Interessante ilustrar com o exemplo tirado por Érika Mendes de
Carvalho e Gisele Mendes de Carvalho da doutrina penal (com a observação de que
não se está afirmando a analogia no direito penal, posto que não aplicável como
meio de integração, mas exemplificando-se uma situação surreal). Criticando a
comparação que fazem alguns doutrinadores entre aquisição da personalidade da
pessoa jurídica com a possibilidade de delinquir, as autoras citam Günther Jakobs:
“o próprio v. Liszt ficaria boquiaberto se seu argumento fosse levado adiante, no
sentido de que à pessoa jurídica também seria reconhecido o direito político ao voto,
dado que é pessoa”, o que permite concluir que “só porque é pessoa, a pessoa
jurídica não tem porque ser pessoa para todos os efeitos”.
276
Por outro lado, o extremo rigor hermeneutico esvaziaria o conteúdo do
próprio artigo 52 do Código Civil.
Ao julgar o Recurso Especial n. 58.660-7, o Ministro Relator Waldemar
Zveiter deixa claro que o artigo 52 (então ainda Projeto) representa um avanço nas
questões de responsabilidade civil, acompanhando o pensamento doutrinário
estrangeiro, em particular na França.

275
MAXIMILIANO, Carlos. Hermenêutica e aplicação do direito. Rio de Janeiro: Forense, 1979. p.
213.
276
CARVALHO, Érika Mendes de; CARVALHO, Gisele Mendes de Direito penal de risco e
responsabilidade penal das pessoas jurídicas: a propósito da orientação jurisprudencial do superior
tribunal de justice. In DOTTI, René Ariel; PRADO, Luiz Regis. Responsabilidade penal da pessoa
juridica. 2 ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2010. p. 257
170
O Acórdão faz referência à Pierre Kaiser para quem as pessoas morais
são investidas de direitos análogos aos direitos da personalidade, sendo somente
privadas dos cuja existência está ligada necessariamente ao da personalidade
humana.
Cabe destacar, por oportuno, o entendimento restritivo de Gustavo
Tepedino para quem o artigo 52 não é um passe livre às equiparações, sendo que
autoriza a extensão da técnica às pessoas jurídicas, uma vez que:
Andou bem o legislador em não conferir à pessoa jurídica direitos
informados por valores inerentes à pessoa humana. Limitou-se o
dispositivo a permitir a aplicação, por empréstimo, da técnica da
tutela da personalidade, e apenas no que couber, à proteção da
pessoa jurídica. Esta, embora dotada de capacidade para o exercício
de direitos, não contém os elementos justificadores (fundamento
axiológico) da proteção à personalidade, concebida como bem
jurídico, objeto de situações existenciais. (...)
A tutela da imagem da pessoa jurídica – atributo mencionado, assim
como a honra, pelo art. 20 – tem sentido diferente da tutela da
pessoa humana. Nesta, a imagem é atributo de fundamental
importância, de inspiração constitucional inclusive para a
manutenção de sua integridade psicofísica. Já para a pessoa jurídica
com fins lucrativos, a preocupação resume-se aos aspectos
pecuniários derivados de um eventual ataque à sua atuação no
mercado. O ataque da pessoa humana atinge a sua dignidade,
ferindo-a psicológica e moralmente, no caso da pessoa jurídica
repercute em sua capacidade de produzir riqueza, no âmbito da
atividade econômica por ela legitimamente desenvolvida.
Há que se resguardar, todavia, a necessária diferenciação entre as
pessoas jurídicas que aspiram lucros e aquelas que se orientam por
outras finalidades. (....) Particularmente neste último caso não se
pode considerar (como ocorre na hipótese de empresas com
finalidade lucrativa) que os ataques sofridos pela pessoa jurídica
acabam por se exprimir na redução de seus lucros, sendo espécie de
dano genuinamente material. Cogitando-se, então, de pessoas
jurídicas sem fins lucrativos, poder-se-ia admitir a configuração de
171
danos institucionais, aqui conceituados como aqueles que,
diferentemente dos danos patrimoniais ou morais, atingem a pessoa
jurídica em sua credibilidade ou reputação, sendo extrapatrimoniais,
posto informados pelos princípios norteadores da iniciativa
econômica privada.
Com base em tais premissas metodológicas, percebe-se o equívoco
de se imaginar os direitos da personalidade e o ressarcimento por
danos morais como categorias neutras, adotadas artificialmente pela
pessoa jurídica para a sua tutela (a maximização de seu
desempenho econômico e de seus lucros). Ao revés, o intérprete
deve estar atento para a diversidade de princípios e valores que
inspiram a pessoa física e a pessoa jurídica, e para que esta, como
comunidade intermediária constitucionalmente privilegiada, seja
merecedora de tutela jurídica apenas e tão-somente como um
instrumento (privilegiado) para a realização das pessoas que, em seu
âmbito de ação, é capaz de congregar.”
277
Como sucede com a pessoa física, a pessoa jurídica tem direito de
fazer valer a própria imagem em confronto com a sociedade civil. A pessoa jurídica,
se não pode por sua natureza sofrer dor ou angústia, é portadora de direitos da
personalidade compatíveis com a ausência de físico (corpo), e por isso do direito à
existência, ao nome, à imagem e à reputação.
278
É fundamental ressaltar que a pessoa jurídica, igualmente à pessoa
natural, detém certos direitos de personalidade, em conformidade com a doutrina de
Silmara Juny Chinellato.
279
Entretanto, não foi esta a interpretação dada pelo Conselho de Justiça
Federal ao aprovar na IV Jornada de Direito Civil o Enunciado CJF que dispõe:

277
TEPEDINO, Gustavo. Tutela da personalidade no ordenamento civil-constitucional brasileiro
Temas de Direito Civil. 3 ed. Rio de Janeiro, Renovar, 2004. p. 57.
278
CASTRO, Sandro. Il danno allímmagine. Torino, G. Giappichelli Editore, 2000.p. 258.
279
CHINELLATO, Silmara Juny. Da responsabilidade Civil no Código de 2002 – Aspectos
fundamentais. Tendências do Direito Contemporâneo. O Direito e o Tempo: Embates Jurídicos e
Utopias Contemporâneas. (Coord.) Gustavo Tepedino e Luiz Edson Fachin. Rio de Janeiro:
Renovar, 2008. p. 939-968.
172
Enunciado CJF nº 286: Os direitos da personalidade são direitos
inerentes e essenciais à pessoa humana, decorrentes de sua
dignidade, não sendo as pessoas jurídicas titulares de tais direitos.
Renan Lotufo, ao comentar o artigo 52 do Código Civil, ressalta a
atualidade da norma, conforme a jurisprudência do STJ, expressa na Súmula 227,
desconhecendo na legislação estrangeira dispositivo semelhante.
A importância do tema vem da necessidade da extensão da proteção à
pessoa jurídica, o que, segundo ele, não passou ao largo das lições de Rubens
Limongi França que reformulou o conceito de dano moral para nele incluir toda e
qualquer pessoa (dano moral é aquele que direta ou indiretamente a pessoa física
ou jurídica, bem assim a coletividade, sofre no aspecto não econômico dos seus
bens jurídicos).
280
Cita Massimo Franzoni para quem não se pode negar que muitas
hipóteses de dano moral só atingem a pessoa física como a violação da liberdade
individual ou sexual. Mas, como o espectro do dano moral é muito mais abrangente,
entes abstratos e inclusive entidades de fato podem ser vítimas da lesão à honra, à
reputação, à imagem, ao nome e à privacidade.
281
Mas Renan Lotufo é contundente ao criticar a aplicação analógica dos
direitos da personalidade à pessoa jurídica, sobretudo porque os fundamentos para
a reparação são diferentes, pois o dano moral tem o seu fundamento em função da
dignidade humana:
Não nos parece que para resguardar, por exemplo, a “boa fama”, a
“reputação” da maioria das empresas, devamos utilizar daquilo que
levou milênios e milênios para ser alcançado pelo ser humano.
Precisamos preservar os direitos humanos como sendo
absolutamente intocáveis e que não podem ser submetidos a uma
analogia tão simplista na invocação de uma “honra objetiva”.
Sabemos que a dignidade do ser humano é algo que transcende a
qualquer violação, como não é qualquer violação que faz permitir a
falência de uma empresa. São conceitos diferentes. São belezas

280
LOTUFO, Renan. Código civil comentado. V. 1 São Paulo: Saraiva, 2004 p. 149
281
Cf. LOTUFO, Renan Código civil comentado, cit., p. 150
173
diferentes que foram.construídas no desenvolvimento da atividade
humana. Por isso, entendemos que o âmbito da honra objetiva da
empresa é algo que é inerente ao desenvolvimento de suas
atividades, ao seu dia-a-dia, e que por isso mesmo passa a integrar
o seu patrimônio. Portanto, mais perto da proteção que o direito
contemporâneo denomina “propriedade imaterial”
282
Tem razão Lotufo ao criticar a visão simplista atual em querer “estender
conceitos”, em “dar denominação unívoca” a institutos cuja essência é diversa. Mas
chega também a ser é inflexível por querer colocar a “respeitabilidade” da pessoa
jurídica distante dos direitos da personalidade.
O doutrinador faz a seguinte colocação: o que leva à construção da
pessoa jurídica é o fruto do exercício da cidadania, do trabalho e da associação dos
esforços. Esse é um valor criado, não um valor natural, é um valor, portanto, que
merece proteção específica, que deve ser dado à pessoa jurídica. A boa fama, a
reputação, a honra objetiva são atributos necessários para o desenvolvimento das
finalidades da pessoa jurídica e que não estão atrelados ao dano moral, mas a uma
reparação extrapatrimonial, pois em seu sentir, “a moral não é um bem
extrapatrimonial; a moral é algo integrante da personalidade humana e, portanto,
algo que transcende, que não pode ser levado à objetividade de um bem, no sentido
específico de compor patrimônio”.
283
Evidente que para Lotufo, a pessoa jurídica pode sofrer dano
extrapatrimonial, mas não dano moral, por serem – em sua opinião - institutos
essencialmente diferentes. Lembra da obra de Suzanne Carval que prevê a
possibilidade da reparação nesses casos como modo a servir como exemplo (pena
privada), revertendo a indenização em favor da própria sociedade, como anteviu
Antonio de Azevedo Junqueira.
284

282
LOTUFO, Renan Código civil comentado, cit.,p. 152
283
LOTUFO, Renan Código civil comentado, cit., p. 151
284
LOTUFO Renan Código civil comentado, cit.,p. 154. Sobre Álvaro Junqueira de Azevedo, conferir
o que foi dito no capítulo IV acerca do dano social.
174
Já para J. J. Canotilho, a Constituição portuguesa reconhece
expressamente a capacidade de gozo de direitos às pessoas coletivas, superando
assim uma concepção de direitos fundamentais exclusivamente centrada sobre os
indivíduos.
285
De modo que as pessoas jurídicas, embora possam ser titulares de
direitos e deveres fundamentais, serão apenas (e não de todos) daqueles que sejam
compatíveis com a sua natureza. O problema de se saber quais são compatíveis e
quais não o são, só se resolveria casuisticamente (claro está que não teriam direito
à vida, à integridade pessoal e à constituir família). O que dependeria, ainda, da
própria natureza de cada um dos direitos fundamentais.
286
Canotilho faz mais uma ponderação: dependeria da natureza das
pessoas coletivas em causa. Há as associações que reúnem pessoas físicas e que
são como uma extensão da personalidade individual, e há as fundações e outras
instituições sem base associativa. Ainda haverá que ter em conta a distinção entre
as pessoas coletivas privadas e as públicas, sendo particularmente problemático o
caso destas, adverte o constitucionalista português.
Mas faz um alerta digno de nota: a intensidade de proteção desses
direitos não é a mesma que a das pessoas físicas ou humanas.
287
Para ilustrar a dificuldade do tema, traz-se à baila as lições de Esther
Muñiz Espada, que defende com galhardia a capacidade das pessoas jurídicas de
direito privado de serem tutoras e o faz com fundamento no artigo 38 do Código Civil
espanhol
288
. Esse dispositivo legal permite concluir que a capacidade das pessoas
jurídicas não se limita ao âmbito das relações jurídicas de caráter patrimonial.
289
É entendimento de Esther Muñiz Espada que as pessoas jurídicas tem
direito ao nome e que podem defendê-lo judicialmente contra a usurpação de
terceiros, pois se reconhece que o nome constitui tanto para as pessoas naturais

285
CANOTILHO Comentários..., cit., p. 329.
286
CANOTILHO Comentários..., cit., p. 330 e 331.
287
CANOTILHO, Comentários..., cit., p. 474
288
Artículo 38 Las personas jurídicas pueden adquirir y poseer bienes de todas clases, así como
contraer obligaciones y ejercitar acciones civiles o criminales, conforme a las leyes y reglas de su
constitución.
La Iglesia se regirá en este punto por lo concordado entre ambas potestades; y los establecimientos
de instrucción y beneficencia por lo que dispongan las leyes especiales.
289
MUÑIZ ESPADA, Esther. Las personas jurídico-privadas tutoras. Barcelona: Bosch, 1994. p.43
175
como para as pessoas um autêntico patrimônio moral, de caráter irrenunciável e
imprescritível. Da mesma forma que se lhes reconhece uma nacionalidade, direitos
corporativos etc. Gozam de sinais distintivos, inclusive de caráter honorífico.
Justifica seu posicionamento, com a jurisprudência firmada com a
sentença de 31 de março de 1930, que reconheceu o direito de indenização por
danos morais à pessoa jurídica decorrentes de ações difamatórias e divulgadoras de
segredos de atividades econômicas e industriais, ou por violação do direito de
correspondência.
290
Deixa entrever, contudo, que o tratamento dispensado às pessoas
jurídicas só não é tão extenso quanto ao às pessoas naturais dada a falta de um
substrato físico. Mas a reforma do Código Civil espanhol de 1983 permitiu, no artigo
242, que as pessoas jurídicas, - sempre que não tenham finalidade lucrativa e entre
seus fins figure a proteção aos menores e incapacitados -, acedam a um campo que
anteriormente lhes era estranho.
291
Discorrendo acerca do tema, Francisco de Assis Alves, permite inferir
que o artigo 52 do Código Civil garante às pessoas jurídicas alguns direitos da
personalidade como o nome, a marca, o símbolo, o direito à liberdade, à própria
existência, à boa reputação, à honra, à própria imagem. E conclui: “portanto, a
pessoa jurídica pode sofrer, inclusive, danos morais”.
292
Na mesma linha segue Silvio Luis Ferreira da Rocha ao reconhecer às
pessoas jurídicas o direito à imagem, entendida esta como imagem-atributo.
293
O artigo 52 do Código Civil deve ser compreendido de modo a
desestimular a irresponsabilidade e a impunidade, uma vez que o fundamento do
dano moral não é apenas a ideia de compensação, mas carrega forte carga punitiva
e pedagógica. Ou como quer Sérgio Cavalieri Filho: a pessoa jurídica pode sofrer
dano moral em sentido amplo (violação a algum direito da personalidade) porque é

290
Cf. MUÑIZ ESPADA, Esther Las personas..., cit., p. 47
Artículo 242 Podrán ser también tutores las personas jurídicas que no tengan finalidad lucrativa y
entre cuyos fines figure la protección de menores e incapacitados.
291
MUÑIZ ESPADA, Esther Las personas..., cit., p. 48
292
ALVES, Francisco Assis Direito constitucional civil. O perfil dos direitos das pessoas naturais e
das pessoas jurídicas no Código Civil de 2002. in MARTINS, Ives Gandra.Lições de direito
constitucional em homenagem ao jurista Celso Bastos. São Paulo: Saraiva, 2005 p. 888.
293
ROCHA, Sílvio Luis Ferreira da Direito civil I. Parte geral. São Paulo: Malheiros, 2010. p. 52
176
titular de honra objetiva, “fazendo jus a indenização sempre que seu bom nome,
credibilidade ou imagem forem atingidos por algum ato ilícito”.
294
Sente-se que as lições de Canotilho podem ser utilizadas como critério
de interpretação do artigo 52 do Código Civil, sendo que o termo “no que couber”
deve assentar-se em duas ordens conjuntas: a) na natureza dos direitos da
personalidade (excluídos os que exigiriam substrato psicofísico) e b) na natureza
jurídica da pessoa coletiva (excluídas as constituídas com finalidade exclusivamente
de lucro).
Busca-se na jurisprudência decisão que tenha enfrentado essa
tormentosa questão, trazendo à baila o Acórdão proferido na Apelação
2004.023730-8, do Tribunal de Santa Catarina, Comarca de Lages, em que o
Município de Lages e a Secretaria Municipal de Águas e Saneamento – SEMASA
reclamam 100 salários mínimos de indenização por dano moral. Teria o Sindicato
dos Trabalhadores nas Indústrias de Purificação Distribuição de Água e Serviços de
Esgoto de Santa Catarina – SINTAE veiculado na imprensa fatos que feriram a
honra objetiva do Município de Lages e da Autarquia que poderiam influenciar
negativamente a opinião dos munícipes acerca do governo local.
Para o SINTAE, não se aplica o artigo 52 do Código Civil às pessoas
jurídicas de direito público, pois tem apenas os direitos positivados nas normas de
direito público, oriundas de seu poder soberano, não tendo direito subjetivo à
imagem e à honra objetiva.
Contrapondo-se ao argumento do sindicato, o Procurador Geral de
Justiça, Anselmo Jerônimo de Oliveira ressalta que hoje existe um consenso quanto
à possibilidade de indenização pelo dano moral à pessoa jurídica de direito privado.
Sendo que se a ofensa atingir a reputação do ente público, notadamente no que diz
respeito à excelência ou não de seus serviços, e isso transcende à simples crítica ou
reclamo do cidadão, tal pode e deve ser objeto de reparação.
Ressaltou que após a edição do Código Civil de 2002 não resta mais
dúvidas acerca da possibilidade de a pessoa jurídica ser indenizada em razão de

294
CAVALIERI FILHO, Sérgio Programa de responsabilidade civil. 5. ed. rev., aum. e atual. São
Paulo: Malheiros, 2003. p. 98.
177
abalo moral. É que o artigo 52 assegura a extensão da proteção dos direitos da
personalidade às pessoas jurídicas, direitos esses que incluem a imagem e a honra.
Rabindranath Capelo de Sousa afirma que por força do artigo 160º, n.
1, do Código Civil português, há que se reconhecer às pessoas jurídicas a exsitência
de direitos da personalidade, porquanto titulares de valores e motivações pessoais.
Claro está que o reconhecimento desses direitos cinge-se às especiais
características da pessoa jurídica, bem como às suas particularidades, pois tem
analogicamente à pessoa natural direito à identidade pessoal, aí incluído o direito ao
nome; o direito à honra, ao decoro; um direito a uma esfera de sigilo, como por
exemplo, o sigilo de correspondência, de funcionamento e de know-how, afirmando
que, quando violados esses direitos, nasce para a pessoa colectiva direito à
indenização civil por danos não-patrimoniais.
295
O autor protuguês traz notícia do que se passa na Alemanha, onde a
questão também não é tranquila no que diz respeito à existência de um direito geral
de personalidade das pessoas jurídicas, destacando três posições doutrinárias: os
que negam veementemente direitos da personalidade aos entes morais, por
reconhecer apenas às pessoas singulares tais direitos; os que reconhecem alguns
direitos da personalidade, não por analogia à pessoa física, mas por força do artigo
2º, n. 1 da Constituição alemã que estende à pessoa jurídica alguns direitos
fundamentais e, por fim, a corrente minoritária, que parte da chamada “teoria da real
personalidade associativa”, ou Theorie der realen Verbandspersönlichkeit. Para esta
última, as pessoas jurídicas tem uma “verdadeira personalidade”, análoga às das
pessoas naturais e equiparada “com individualidade, valor próprio, dignidade e
particularidades e, por conseguinte, um amplo direito geral de personalidade”.
296
Da mesma forma, a doutrina pátria, mesmo frente ao disposto no artigo
52 do Código Civil, ainda reluta em admitir à pessoa jurídica a titularidade dos
direitos da personalidade.

295
CAPELO DE SOUSA, Radindranath. O direito geral da personalidade. Coimbra, Coimbra
Editora, 1995. p. 596-597.
296
CAPELO DE SOUSA, Radindranath. O direito geral da personalidade, cit., p. 600.
178
A problemática, como já se fez referência, não é nova para o Superior
Tribunal de Justiça que ainda não tem uma posição uniforme acerca da
interpretação do artigo 52 do Código Civil de 2002.
A Ministra Nancy Andrighi reconhece que a pessoa jurídica detém
certos direitos da personalidade em conformidade com o tão invocado artigo 52.
Também vislumbra o dano moral no sistema moderno como lesão a direito da
personalidade. De modo que, ao julgar o Recurso Especial 1.032.014/RS, deu
provimento ao inconformismo da empresa SOUZA CRUZ S/A.
Pleiteou a fabricante de cigarros indenização por danos materiais e
morais em face de uma empresa gráfica pela prática de contrafação, pois produzia
embalagens de cigarros de marcas “semelhantes” sem sua autorização, afetando a
sua imagem junto aos consumidores das marcas Trevo e Colomy.
Pondera Nancy Andrighi que o direito de marca não integra a
personalidade do titular, pois apenas designa um produto, sendo que sua violação
traz danos materiais e não morais. Entretanto, a contrafação da marca pode causar
dano moral quando macular a própria reputação comercial de seu titular. A prática
de falsidade, em razão dos efeitos que irradia, por enganar o consumidor, fere o
direito à imagem do titular da marca e o autoriza a pleitear a reparação dos danos
morais.
A usurpação da marca alheia, diz Nancy Andrighi, pode ser vista como
violação ao direito de identidade, este sim direito da personalidade.
Em caso análogo, também de contrafação, a Ministra fixou a
indenização em R$ 50.000,00 em favor da empresa LOUIS VUITTON por ter seus
produtos falsificados e comercializados pela Caliente Comércio de Modas Ltda em
Shopping Center do Rio de Janeiro.
A decisão judicial reconheceu os danos morais, com a justificativa de
que a “vulgarização do produto e a depreciação da reputação comercial do titular da
marca, efeitos da prática de falsificação, constituem elementos suficientes a “lesar o
direito à imagem” do titular da marca”.
179
Nessa linha de pensamento doutrina Alexandre Ferreira de Assumpção
Alves, defendendo a imagem como um dos fatores de sucesso do mundo
empresarial. A decicação e o esforço dos sócios ao longo dos anos constroem uma
imagem abstrata, não visual que angaria prestígio no mundo dos negócios e junto
aos consumidores. Essa imagem pode muito bem ser destruída por uma notícia
inverídica, por meio de envolvimento dos sócios com atividades ilícitas etc., uma vez
que, ao divulgar a informação, a imprensa não faz referência a este ou aquele sócio,
expondo o nome da sociedade. A imagem da pessoa jurídica e não do sócio que é
colocada em risco.
297
5.3.3. – A Súmula 227 do STJ e seu alcance
Hoje a questão parece tranquila na jurisprudência brasileira desde a
edição da Súmula 227 do Superior Tribunal de Justiça que reza: “A pessoa jurídica
pode sofrer dano moral” (DJU 08.10.1999).
Os Acórdãos que serviram de paradigma para a uniformização
enfrentaram a problemática tendo como sujeitos ativos (credores da pretensão
material deduzida em juízo), pessoas jurídicas de direito privado (sociedade
empresária) e, todas as decisões, decorreram de ações de indenização por protesto
indevido de título de crédito.
O Recurso Especial n. 61913-MG (22.09.1998 DJ 18.12.1998), em que
foi relator o Ministro Carlos Alberto Menezes Direito, decidiu questão referente a
protesto de notas-fiscais fraudulentas. O Banco Bradesco s/a, banco endossatário,
protestou duplicatas da Construtora Verde Grande, sem lastro algum, sabendo que
eram fraudulentas, o que rendeu a esta a reparação de danos morais.
O Recurso Especial n. 177995-SP (15.09.1998 DJ 09.11.1998), de
relatoria do Ministro Barros Monteiro e o RESP161739-PB (16.06.1998 DJ

297
ALVES, Alexandre de Assumpção. A pessoa jurídica e os direitos da personalidade. cit, p. 99.
180
19.10.1998), cujo relator foi o Ministro Waldemar Zweiter, cuidaram de protesto
indevido de cambial.
No Recurso Especial n. 129428-RJ (25.03.1998 DJ 22.06.1998), o
Ministro Ruy Rosado de Aguiar foi conclusivo: “a pessoa jurídica pode padecer,
porém, de ataque à honra-objetiva, pois goza de reputação junto a terceiros,
passível de ficar abalada por atos que afetam o seu bom nome no mundo civil ou
comercial onde atua”.
Extrai-se do voto do Ministro Rosado de Aguiar que esta ofensa pode
ter efeito limitado à diminuição do conceito público de que goza no seio da
comunidade, sem repercussão direta e imediata sobre o seu patrimônio.
“Assim, embora a lição em sentido contrário de ilustres doutores
(Horacio Roitman e Ramon Daniel Pizarro, El daño moral y la
persona jurídica, RDPC, p. 215) trata-se de verdadeiro dano
extrapatrimonial, que existe e pode ser mensurado através de
arbitramento.
É certo, que, além disso, o dano à reputação da pessoa jurídica pode
causar-lhe dano patrimonial, através de abalo de crédito, perda
efetiva de chances de negócios e de celebração de contrato,
diminuição de clientela etc., donde concluo que as duas espécies de
danos podem ser cumulativas, não excludentes”.
Para o Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira, no Recurso Especial n.
134993-MA (03.02.1998 DJ 16.03.1998)(STJ), são preciosas as lições de Mazeaud
e Mazeaud, em Traité Théorique et Pratique de la Responsabilité Civile Délictuelle et
Contractuelle uma vez que o prejuízo material é o único em jogo. Um grupo de
pessoas, tal qual uma pessoa física, tem um patrimônio extrapatrimonial, que pode
ser lesado. Se a pessoa moral (na terminologia francesa) não tem um coração, ela
tem honra e reputação, arremata o voto.
De sorte que a jurisprudência pátria interpreta, de forma uniforme, e
antes mesmo do advento do artigo 52 do Código Civil de 2002, o conceito de dano
moral tal como “posto” e “pensado” pela Constituição Federal, no seu viés
181
sociológico, para abarcar agrupamentos de indivíduos, interesses difusos e
coletivos, “objetivando-se” seus efeitos, reconhecendo à pessoa jurídica um “capital
moral”.
5.4. – A tutela jurisdicional
Firmada a posição de que a pessoa jurídica tem direitos da
personalidade que lhe são próprios, como consagrado pela atual jurisprudência,
inseridos no permissivo do artigo 52 do Código Civil, nos incisos V e X do artigo 5º
da Constituição Federal e em outros dispositivos legais, quando violados ou
ameaçados de violação tem a sua disposição mecanismos de defesa tanto no
âmbito administrativo como jurisdicional.
Dispõe a alínea “a” do inciso XXXIV do artigo 5º da Constituição
Federal:
XXXIV - são a todos assegurados, independentemente do
pagamento de taxas:
a) o direito de petição aos Poderes Públicos em defesa de direitos ou
contra ilegalidade ou abuso de poder;
Completa com o inciso XXXV, a saber:
XXXV - a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou
ameaça a direito;
De maneira que a todos, inclusive aos entes públicos, confere-se
constitucionalmente legitimidade ativa para a proteção de seus direitos,
estabelecendo a legislação infraconstitucional inúmeros mecanismos de proteção,
como a ação de indenização, a ação popular, a ação civil pública e a ação de
improbidade.
182
Claro está que o ideal seria que os direitos não fossem violados e,
quando lesados, a reparação se fizesse espontaneamente, sem a necessidade de
intervenção do Poder Judiciário. Mas a segurança jurídica e a paz social devem
permanecer inabaladas, sendo primordial evitar-se dentro do que se denomina
princípio do razoável, que o causador do dano fique “impune” ou persista na prática
da lesão do direito subjetivo de outrem.
Para tanto estão previstas as chamadas tutela inibitória e tutela de
remoção do ilícito, previstas nos artigos 273 e 461 do Código de Processo Civil.
Geneviève Viney e Patrice Jourdain afirmam que há uma evolução
favorável ao reconhecimento da legitimidade ativa aos entes públicos na defesa de
um interesse altruísta ou de um prejuízo moral, sejam esses interesses públicos ou
privados, notadamente com o fito de assegurar uma maior efetividade do direito
francês, mesmo sendo a jurisprudência dominante restritiva quanto à questão.
Ressaltam, ainda, casos em que o legislador ampliou a legitimidade para a defesa
dos interesses imateriais ou não-patrimoniais às agência ao meio-ambiente, aos
órgãos que cuidam de assuntos urbanísticos; de conservaçrazão de ão do
patrimônio histórico etc.
298
O mesmo entendimento é compartilhado por Henri Mazeaud para
quem não há razão na limitação da legitimidade da pessoa jurídica de direito público
para pleitear tão somente o ressarcimento de danos materiais. Arremata o jurista:
Une personne morale publique peut fort bien être lésée dans ses intérêts moraux”.
Traz a situação, reconhecida pela jurisprudência francesa, da condenação em danos
morais de um professor de escola pública que, abusando da confiança, feriu a
reputação do colégio em que trabalhava.
299
René Demogue, nessa mesma linha, já advogava que “l’action pour
dommage moral n’est pás réservée aux seules personnes physiques. Elle peut être
exercée par une personne morale dont les droits ont été leses pour ceux-ci ne

298
VINEY, Geneviève; JOURDAIN, Patrice. Les conditions de la responsabilité.Traité de Droit Civil
sous la direction de Jacques Ghestin. Paris, Librarie Générale de Droit et de Jurisprudence, EJA,
1998. 2 Ed. P. 127 n 260.
299
MAZEAUD, Henri. Traité théorique et pratique de la responsabilité civile délictuelle et
contractuelle. vol 2. Paris: Librairie du Recueil Sirey, 1949 p. 737.
183
restent pás sans sanction”; O autor completava a frase exemplificando justamente
com a usurpação do nome ou a difamação de uma associação.
300
5.4.1 – A ação civil pública; a ação popular; a ação de improbidade e a ação de
indenização.
Vários, então, os mecanismos de defesa do patrimônio imaterial da
pessoa jurídica, em particular os endereçados à proteção da pessoa jurídica de
direito público e dos interesses difusos e coletivos que são a ação popular, a ação
civil pública, a ação de improbidade e a ação de indenização, esta tida como
remédio “genérico”.
Obedecendo à cronologia da edição das leis especiais, tem-se a ação
popular (Lei 4.717/65) como o primeiro mecanismo jurisdicional ao alcance do
cidadão para pleitear a anulação ou a declaração de nulidade de atos lesivos ao
patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados e dos Municípios, de
entidades autárquicas, de sociedades de economia mista (Constituição Federal, art.
141, § 38).
Para fins dessa lei:
Art. 1º Qualquer cidadão será parte legítima para pleitear a anulação
ou a declaração de nulidade de atos lesivos ao patrimônio da União,
do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios, de entidades
autárquicas, de sociedades de economia mista, de sociedades
mútuas de seguro nas quais a União represente os segurados
ausentes, de empresas públicas, de serviços sociais autônomos, de
instituições ou fundações para cuja criação ou custeio o tesouro
público haja concorrido ou concorra com mais de cinqüenta por cento
do patrimônio ou da receita ânua, de empresas incorporadas ao

300
DEMOGUE, René. Traité des obligations em général. Tome IV. Librarie Arthur Rousseau, 1924.
p. 55.
184
patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados e dos
Municípios, e de quaisquer pessoas jurídicas ou entidades
subvencionadas pelos cofres públicos.
§ 1º Consideram-se patrimônio público para os fins referidos neste
artigo, os bens e direitos de valor econômico, artístico, estético,
histórico ou turístico. (Redação dada ao parágrafo pela Lei nº 6.513,
de 20.12.1977)
A sentença que, julgando procedente a ação popular, decretar a
invalidade do ato impugnado, condenará ao pagamento de perdas e danos os
responsáveis pela sua prática e os beneficiários dele, ressalvada a ação regressiva
contra os funcionários causadores de dano, quando incorrerem em culpa.
301
Embora a lei não mencione expressamente os danos morais, a sua
interpretação permite admitir-se a reparação do prejuízo imaterial.
A ação civil pública, regida pela Lei 7.347 de 24 de julho de 1985, tem
por objetivo a reparação, indenização e a prevenção de danos, bem como a
remoção e a inibição de condutas violadoras de direitos e interesses difusos e
coletivos, como preceitua Fernando A. N. Galvão da Rocha, focado na discussão do
patrimônio cultural, para quem “o manejo da ação civil pública pode materializar
tutelas efetivamente protetivas do patrimônio cultural imaterial”.
302
Art. 1º Regem-se pelas disposições desta Lei, sem prejuízo da ação
popular, as ações de responsabilidade por danos morais e
patrimoniais causados:
I - ao meio ambiente
II - ao consumidor;
III - à ordem urbanística; (Inciso acrescentado pela Lei nº 10.257, de
10.07.2001)

301
Art. 11. A sentença que, julgando procedente a ação popular, decretar a invalidade do ato
impugnado, condenará ao pagamento de perdas e danos os responsáveis pela sua prática e os
beneficiários dele, ressalvada a ação regressiva contra os funcionários causadores de dano,
quando incorrerem em culpa.
302
Cf. ROCHA, Fernando A. N. Galvão da. Atuação do Ministério Público na proteção do patrimônio
cultural imaterial. In Revista Jurídica do Ministério Público do Mato Grosso. V. 1, n. 1, julho/dez
2006. Cuiabá, Entrelinhas, 2006. p. 72.
185
IV - a bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e
paisagístico; (Antigo inciso III, renumerado pela Lei nº 10.247, de
10.07.2001)
V - por infração da ordem econômica e da economia popular. (Inciso
alterado. Redação atual dada pela MP nº 2.180-35, de 24.08.2001)
VI - à ordem urbanística. (Inciso alterado. Redação atual dada pela
MP nº 2.180-35, de 24.08.2001)
Art. 3º A ação civil poderá ter por objeto a condenação em dinheiro
ou o cumprimento de obrigação de fazer ou não fazer.
Art. 5º Têm legitimidade para propor a ação principal e a ação
cautelar: (Redação dada pela Lei nº 11.448, de 2007).
I - o Ministério Público; (Redação dada pela Lei nº 11.448, de 2007).
II - a Defensoria Pública; (Redação dada pela Lei nº 11.448, de
2007).
III - a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios; (Incluído
pela Lei nº 11.448, de 2007).
IV - a autarquia, empresa pública, fundação ou sociedade de
economia mista; (Incluído pela Lei nº 11.448, de 2007).
V - a associação que, concomitantemente: (Incluído pela Lei nº
11.448, de 2007).
a) esteja constituída há pelo menos 1 (um) ano nos termos da lei
civil; (Incluído pela Lei nº 11.448, de 2007).
b) inclua, entre suas finalidades institucionais, a proteção ao meio
ambiente, ao consumidor, à ordem econômica, à livre concorrência
ou ao patrimônio artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico.
(Incluído pela Lei nº 11.448, de 2007).
§ 1º O Ministério Público, se não intervier no processo como parte,
atuará obrigatoriamente como fiscal da lei.
§ 2º Fica facultado ao Poder Público e a outras associações
legitimadas nos termos deste artigo habilitar-se como litisconsortes
de qualquer das partes.
§ 3° Em caso de desistência infundada ou abandono da ação por
associação legitimada, o Ministério Público ou outro legitimado
assumirá a titularidade ativa. (Redação dada pela Lei nº 8.078, de
1990)
§ 4.° O requisito da pré-constituição poderá ser dispensado pelo juiz,
quando haja manifesto interesse social evidenciado pela dimensão
186
ou característica do dano, ou pela relevância do bem jurídico a ser
protegido. (Incluído pela Lei nª 8.078, de 11.9.1990)
§ 5.° Admitir-se-á o litisconsórcio facultativo entre os Ministérios
Públicos da União, do Distrito Federal e dos Estados na defesa dos
interesses e direitos de que cuida esta lei. (Incluído pela Lei nª 8.078,
de 11.9.1990)
§ 6° Os órgãos públicos legitimados poderão tomar dos interessados
compromisso de ajustamento de sua conduta às exigências legais,
mediante cominações, que terá eficácia de título executivo
extrajudicial. (Incluído pela Lei nª 8.078, de 11.9.1990)
Art. 6º Qualquer pessoa poderá e o servidor público deverá provocar
a iniciativa do Ministério Público, ministrando-lhe informações sobre
fatos que constituam objeto da ação civil e indicando-lhe os
elementos de convicção.
Art. 7º Se, no exercício de suas funções, os juízes e tribunais tiverem
conhecimento de fatos que possam ensejar a propositura da ação
civil, remeterão peças ao Ministério Público para as providências
cabíveis.
A tutela inibitória é obtida, na maioria das vezes, por meio de Termo de
Ajustamento de Conduta previsto no parágrafo 6º do artigo 5º da Lei n. 7.347/85.
Outrossim, percebe-se que a legislação especial ampliou o rol dos legitimados para
ajuizar a ação civil pública.
303
Elton Venturi entende que a pessoa jurídica de direito público é a maior
interessada no manejo da tutela coletiva, uma vez que é dever seu zelar pelo

303
Cf. Recurso Especial 222.582 – MG do Superior Tribunal de Justiça assim ementado: Processo
Civil. Ação Civil Pública. Compromisso de acertamento de conduta. Vigência do § 6º, do artigo 5º,
da Lei 7.374/85, com a redação dada pelo artigo 113, do CDC. 1. A referência ao veto ao artigo
113, quando vetados os artigos 82, § 3º, e 92, parágrafo único, do CDC, não teve o condão de
afetar a vigência do § 6º, do artigo 5º, da Lei 7.374/85, com a redação dada pelo artigo 113, do
CDC, pois inviável a existência de veto implícito. 2. Recurso provido.
187
patrimônio da coletividade; mas, paradoxalmente, é perceptível uma notória
desmotivação de tais entidades.
304
O Código de Defesa do Consumidor (Lei 8.078/90) também assegura a
reparação dos danos morais sem distinguir entre consumidor pessoa jurídica ou
pessoa física, dispondo que:
Art. 6º São direitos básicos do consumidor:
VI - a efetiva prevenção e reparação de danos patrimoniais e
morais, individuais, coletivos e difusos;
A Lei 8.429 de 2 de junho de 1992 prevê, nas hipóteses de
improbidade administrativa, que o dano ao patrimônio público seja ressarcido
conforme preceitua o artigo 5º, assim escrito:
Art. 5º Ocorrendo lesão ao patrimônio público por ação ou omissão,
dolosa ou culposa, do agente ou de terceiro, dar-se-á o integral
ressarcimento do dano.
Maria Regina Ferro Queiroz defende a possibilidade de fixação de
indenização por danos morais pelo juiz, trazendo, como exemplo, a seguinte
situação: o servidor omite a existência do crime de peculato que tem conhecimento,
praticando ato omissivo que, por si só, caracteriza violação a dever funcional, pois
falta com o dever de lealdade e honestidade para com a Administração Pública.
Nesta hipótese, ressalta, há inegável prejuízo moral à administração.
305
A autora conclui seu posicionamento dizendo que alguns atos de
improbidade podem, sim, contribuir para o descrédito do Estado junto à sociedade

304
VENTURI, Elton. Tutela jurisdicional coletiva brasileira: elementos críticos, efetividade e
afirmação. 2005. Tese (Doutorado em Direito – Faculdade de Direito – Pontifícia Universidade
Católica de São Paulo) Orientador: Nelson Nery Junior. p. 178.
305
QUEIROZ, Maria Regina Ferro Perfil processual da lei de improbidade administrativa. 2004.
Dissertação (Mestrado em Direito Processual Civil – USP) Orientador: Cândido Rangel Dinamarco
p. 111
188
civil, com repercussão extremamente negativa no meio social, caracterizando-se o
dano moral.
306
Expressivas são algumas decisões proferidas pelos tribunais nacionais,
no mesmo diapasão, que assim estão fundamentadas:
“É importante frisar que não se exige, para a configuração do ato de
improbidade, a existência de dano ou prejuízo material. Aliás, desde
a época em que surgiu no direito brasileiro a ação popular, tenta-se
ligar a idéia de prejuízo ou dano à perda do erário, deixando à
margem o imenso prejuízo que pode ser causado ao meio ambiente,
às artes, à moralidade ou até mesmo ao patrimônio histórico e
cultural da nação, nem sempre mensurável em dinheiro. O
equivocado raciocínio está hoje inteiramente superado porque na
ação civil pública, acertadamente, a expressão ATOS LESIVOS,
constante do art. 1º da Lei 4.717/65, (ação popular), foi substituída
pela expressão DANOS MORAIS E PATRIMONIAIS, o que deixa
clara a intenção político-legislativa de sancionar não somente os atos
danosos aos cofres públicos, mas também as improbidades
geradoras de danos imateriais, eis que tais atos atingem a
moralidade, requisito que hoje está explicitado na Constituição
Federal como princípio da administração pública. Assim, é possível
haver lesão presumida, na medida em que a moralidade passou a
ser, por princípio, dever do administrador e direito público subjetivo.
(...)
Diante das Leis de Improbidade e de Responsabilidade Fiscal,
inexiste espaço para o administrador "desorganizado", "desleixado",
"despreparado" e "despido de senso de direção". Não se pode
conceber, principalmente na atual conjuntura política, que um
Prefeito, legitimamente eleito, assuma a administração de um
Município e deixe de observar as mais comezinhas regras de direito
público e, o que é pior, tentar colocar tais fatos no patamar de ‘meras
irregularidades’”.
307

306
QUEIROZ, Maria Regina Ferro Perfil processual da lei de improbidade administrativa, cit., p.
197
307
Recurso Especial n. 708.170 MG, j. 19/12/2005, Relatora Eliana Calmon
189
“Porém, existe outro dano consequente a todos os atos de
improbidade administrativa, que é exatamente aquele decorrente da
própria imoralidade, apta a diminuir perante a população o valor e
seriedade que deveriam guardar as administrações e seus
funcionários, fazendo desmerecer mais e mais o poder público, como
um todo e a cada escândalo, frente à população. Este dano é
imaterial e urge seja igualmente recomposto, na forma determinada
na sentença hostilizada”.
308
A multa civil prevista para os casos de improbidade administrativa (art.
12, I, II e III, da Lei 8.429), por ter natureza de penalidade, não impede a
condenação por danos morais, quando o ato ilícito caracterizar ferimento à
moralidade administrativa. Isto porque a reparação destes danos tem natureza
jurídica de compensação e não propriamente de punição na aplicação da lei especial
em comento.
Mas é a ação de indenização o remédio genérico para a recomposição
do patrimônio lesado, por força do disposto nos artigos 186 e 927 do Código Civil
brasileiro que dispõem:
Art. 186 Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou
imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que
exclusivamente moral, comete ato ilícito.
Art. 927 Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187) causar dano a
outrem, fica obrigado a repará-lo.
Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano,
independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou
quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano
implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem.

308
Apelação Cível 994.05.066061-2, TJ-SP, j. 2.3.2010, Relatora Regina Capistrano.
190
O interesse de agir reside na violação da imagem e a legitimidade ativa
é da pessoa vítima da lesão, não importando se pessoa natural ou jurídica. A
configuração do dano, mesmo que sem efeitos patrimoniais, deve ser comprovada
por qualquer dos meios de prova, de indícios ou presunções, pois, como dito, o dano
moral da pessoa jurídica não é in re ipsa.
Os demais elementos da etiologia da responsabilidade civil também
devem estar presentes, em especial o nexo de causalidade. A fixação da
indenização deve atender ao disposto no parágrafo único do artigo 953 do Código
Civil.
Vários, então, os mecanismos jurisdicionais que propiciam o amplo
acesso ao Poder Judiciário na reparação do dano moral da pessoa jurídica, bem
como os que impedem, preventivamente, que ele se configure ou se intensifique.
5.4.2 – A tutela inibitória e o projeto que disciplina o sistema único de ações
coletivas brasileiras.
O direito à imagem tem natureza jurídica de um direito subjetivo
excludendi alios, podendo o seu titular exigir dos sujeitos com os quais se relaciona
um comportamento negativo, de respeito à sua reputação. Mesmo porque o
interesse é que a imagem não seja maculada, produzindo efeitos nefastos na esfera
subjetiva da vítima, não podendo ser recomposta.
Regina Beatriz Tavares da Silva ensina que a tutela inibitória surge da
proposta de “combate ao ilícito; ela age antes que o dano se concretize ou progrida
com os efeitos nocivos”.
309
Claro está que o dano deve ser evitado, repita-se. À guisa de ilustração
traz-se à baila petição inicial de ação civil pública ajuizada pelo Estado de São Paulo

309
TAVARES DA SILVA, Regina Beatriz. Responsabilidade civil: responsabilidade civil na area de
saúde. São Paulo: Saraiva, 2007 (Série GVlaw) p 351
191
contra empresa de propaganda subscrita pelas Procuradoras do Estado de São
Paulo, Flávia Piovesan e Maria Regina Fava Focaccia.
310
Pleiteava-se então a imediata paralisação de propaganda nociva aos
direitos difusos, requerendo-se a concessão de tutela antecipada com vistas à
imediata paralisação da campanha publicitária, além da condenação em obrigação
de fazer consubstanciada na efetivação de contrapropaganda, bem como no
pagamento do danos morais difusos (devidos à toda a sociedade em especial à
comunidade negra).
A campanha estampava em Outdoors pela cidade de São Paulo o
seguinte slogan: “Você é da paz, eles não: vamos desarmar os bandidos, não os
cidadãos de bem”. A ilustração mostrava a foto de um jovem usando um gorro com
uma venda nos olhos e portando uma arma, caracterizando o tipo físico igual a
milhares de jovens negros que circulam no centro de São Paulo.
Tanto a imprensa, em reportagem da Folha de São Paulo, como a
Comissão Extraordinária permanente de Direitos Humanos e Cidadania da Câmara
Municipal de São Paulo decidiu que a tal publicidade representava flagrante estímulo
à discriminação racial e ao preconceito e incitamento do armamento de pessoas
“ditas do bem”; reforça o preconceito racial ao equiparar e identificar o “bandido” ao
jovem negro e pobre.
Há ainda que mencionar o Projeto que disciplina o sistema único de
ações coletivas, tendo como princípios a tutela coletiva adequada, com efetiva
precaução, prevenção e reparação dos danos materiais e morais, individuais e
coletivos, bem como punição pelo enriquecimento ilícito.
O Projeto ressalta a importância da tutela preventiva e de remoção do
ilícito, trilhando o caminho da melhor doutrina que enxerga a reparação “in natura
como preferível à indenização pecuniária, tal como disciplinam os artigos abaixo
transcritos:
Art. 24. Na ação que tenha por objeto a imposição de conduta de
fazer, não fazer, pagar ou entregar coisa, o juiz determinará a

310
TRABALHOS FORENSES Revista de direitos difusos Ano II vol. 9 Direitos de Grupos
Vulneráveis. Out/ 01 ADCOAS Ed. Esplanada p. 1.193
192
prestação ou a abstenção devida, bem como a cessação da
atividade nociva, em prazo razoável, sob pena de cominação de
multa e de outras medidas indutivas, coercitivas e subrogatórias,
independentemente de requerimento do autor.
§1º. A conversão em perdas e danos somente será admissível se
inviável a tutela específica ou a obtenção do resultado prático
correspondente e, no caso de interesses ou direitos coletivos ou
individuais homogêneos, se houver interesse do grupo titular do
direito.
§2º. A indenização por perdas e danos far-se-á sem prejuízo da
multa, quando cabível.
Art. 25. Na ação reparatória dos danos provocados ao bem
indivisivelmente considerado, sempre que possível e
independentemente de pedido do autor, a condenação consistirá na
prestação de obrigações específicas, destinadas à reconstituição do
bem, mitigação e compensação do dano sofrido.
Parágrafo único. Dependendo das características dos bens jurídicos
afetados, da extensão territorial abrangida e de outras
circunstâncias, o juiz poderá determinar, em decisão fundamentada e
independentemente do pedido do autor, as providências a serem
tomadas para a reconstituição dos bens lesados, podendo indicar,
dentre outras, a realização de atividades tendentes a minimizar a
lesão ou a evitar que se repita.
O interesse na recomposição dos danos “in natura” é primário, sendo
que, caso a indenização se faça em dinheiro, este deverá ser depositado em juízo e
reverterá à comunidade lesada, e não a um fundo, como o criado na ação civil
pública.
Art. 48. Havendo condenação em pecúnia, inclusive decorrente de
dano moral coletivo, originária de ação relacionada com interesses
ou direitos difusos e coletivos, a quantia será depositada em juízo,
devendo ser aplicada na recuperação específica dos bens lesados
ou em favor da comunidade afetada.
Parágrafo único. Na definição da aplicação da verba referida no
193
caput, serão ouvidos o autor coletivo, o Ministério Público e, sempre
que possível, em audiência pública, os membros da comunidade
afetada.
Em boa hora, institui de modo salutar um Programa Extrajudicial de
Prevenção ou Reparação de Danos, privilegiando acordos para a resolução
consensual das controvérsias (artigo 60 e seguintes).
O Projeto avaliza a criação do Cadastro Nacional de Processos
Coletivos, que está sendo desenvolvido pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ),
evitando-se, na prática, a multiplicação indiscriminada de processos sobre o mesmo
tema, muitas vezes com dispêndio desnecessário de dinheiro e esforços.
Essa brevíssima referência à proposta de alteração legislativa, tem por
escopo referendar alguns dos posicionamentos defendidos no presente trabalho
acerca da amplitude conceitual de dano moral. Na sequência, reconhecido à pessoa
jurídica o direito à reparação pelos danos exclusivamente morais decorrentes da
violação à imagem, adentrar-se-á nos meios de reparação do dano, apontando quais
os mais efetivos.
194
CAPÍTULO VI – A REPARAÇÃO À IMAGEM DA PESSOA JURÍDICA
6.1. – Os meios de reparação do dano à imagem da pessoa jurídica.
Os danos morais, imateriais, extrapatrimoniais ou não-patrimoniais,
por sua ligação umbilical com os direitos da personalidade, não podem ser
efetivamente reparados. Quando houver lesão ao patrimônio imaterial da pessoa
jurídica, assim como quando há violação aos direitos da personalidade da pessoa
natural, a indenização terá caráter compensatório e não indenizatório.
O inciso V do artigo 5º da Constituição Federal regula que a reparação
do dano moral deve ser proporcional ao agravo. Ao assim dispor, o constituinte
pretendeu que a compensação fosse efetiva (eficaz), não devendo ser ínfima, a
ponto de não surtir impacto no ofensor (no seu patrimônio), nem exacerbada, a
ponto de permitir enriquecimento sem causa ao lesado (o que é vedado no artigo
884 do Código Civil).
Clayton Reis pondera que:
“A valoração envolve sensibilidade para os atos da vida. Somente os
espíritos sensíveis são aptos a captar as expressivas manifestações
do universo e da pessoa humana. O homem é o centro de um
imenso complexo de relações jurídicas. Não se trata, todavia, de
questionarmos os direitos e obrigações existentes no plano desse
universo – é preciso observar o que conduziu as pessoas à prática
de atos ilícitos, bem como valorar as conseqüências produzidas na
intimidade das pessoas em virtude das ações contrárias ao
direito”
.
311

311
REIS, Clayton. O verdadeiro sentido da indenização dos danos morais. Grandes temas da
atualidade – Dano moral Coordenador: Eduardo de Oliveira Leite. Rio de Janeiro: Forense, 2002 p.
89.
195
Mas não só por meio da sanção econômica poder-se-á reparar o dano
moral. Outros instrumentos são tão efetivos quanto a condenação pecuniária, como
o desagravo, o pedido púbico de desculpas, a publicação de uma sentença judicial,
a divulgação de nota de retratação em espaço publicitário equivalente àquele em
que foi veiculada a notícia lesiva etc.
Verificado o dano, urge estabelecer um equilíbrio entre o gravame e a
reparação, mesmo porque há o perigo de que o instituto do dano moral seja
descaracterizado em sua essência se usado para que a vítima aufira incremento
patrimonial ao qual não faz jus, afastando-se assim de sua finalidade originária.
Criar-se-ia uma sociedade injusta, menos fraterna, menos solidária,
desvirtuando-se o comando constitucional, em nome do caráter absoluto dos direitos
fundamentais e dos direitos da personalidade.
Outras formas de reparação, que não o dinheiro, são mais éticas.
Também esse, pelo que se infere, é o entendimento de Flávio Luiz Yarshell, que
conclui pela viabilidade da imposição, pelo juiz, ao ofensor a ampla divulgação da
sentença de procedência de pedido indenizatório:
“Sempre que dessa divulgação puder resultar alívio para o dano
moral experimentado pelo autor (vítima); ou que o juiz imponha ao
fornecedor, nos casos de publicidade enganosa ou deficiente
identificação do produto, o dever de promover também a divulgação,
no respectivo mercado consumidor, das informações corretas ou
sonegadas sobre o produto (não apenas fazer cessar a conduta
violadora)”
.
312

312
YARSHELL, Flávio Luiz. Dano moral: tutela preventiva (ou inibitória), sancionatória e específica
In Revista do advogado. n. 49. dez/96 p. 66.
196
Há ainda outros meios como as notificações judicial e extrajudicial, a
interpelação etc., mesmo que seja para o exercício do direito de resposta. Na esfera
criminal, por exemplo, há registro de que o Banco Nacional de Desenvolvimento
Econômico Social – BNDS, empresa pública federal (Lei n. 5.662/71) promoveu
notificação judicial nos termos do artigo 25 da então Lei de Imprensa, com o intuito
de obter explicações acerca das declarações veiculadas em jornais de grande
circulação (“O Estado de São Paulo”, “Folha da Tarde” e “Jornal do Comércio”) tidas
como pejorativas, por insinuar desvio de conduta (caracterizadora de verdadeira
“perseguição política”), causando “sério comprometimento da imagem” da empresa
perante a sociedade.
313
É o chamado direito de resposta consagrado
constitucionalmente, com o fito de que a verdade venha à tona, de que se conheça
“as duas versões” dos fatos e, até mesmo, para se buscar um equilíbrio entre os que
detém o poder da mídia e daqueles que estão sujeitos a sua atuação.
O Ministro do Supremo Tribunal Federal, Celso de Mello, ao proferir
seu voto na ADPF n. 130, que declarou como não recepcionada pela Constituição
Federal a Lei de Imprensa de 1967, aduziu que o direito de resposta deve ser visto
como um instrumento de mídia colaborativa (“collaborative media”) em que o público
é convidado a colaborar com as suas próprias versões dos fatos.
Assim sendo, a primeira grande utilidade do direito de resposta é o
exercício da defesa da pessoa ofendida, de maneira pronta e eficaz, evitando que a
vítima bata às portas do Poder Judiciário, apazigando-se os ânimos e evitando-se
disputas forenses.
A segunda utilidade desse instrumento é a preservação da verdade,
com a oportunidade de apresentar as duas versões dos fatos noticiados.
Gilmar Mendes, ao prolatar a sua decisão na mesma ADPF n. 130, cita
trecho do livro do jornalista Alex Ribeiro que, escrevendo sobre o caso Escola Base
ocorrido em São Paulo e já tratado anteriormente, prova que a simples retratação
não corrige os danos morais causados pela publicação de informações incorretas,
num caso típico de abuso do poder da imprensa.

313
Processo n. 2005.61.81.002393-2, da 8a Vara Federal Criminal de São Paulo.
197
Acrescenta aos argumentos que é fácil perceber que entre o indivíduo
e os meios de comunicação há uma patente “desigualdade de armas”, sendo o
direito de resposta uma garantia fundamental como meio de contrabalançar o
desequilíbrio natural que se impõe entre o cidadão e os donos dos veículos de
comunicação.
A importância do direito de resposta para a garantia dos direitos da
personalidade é reconhecida ainda pelo artigo 14 do Pacto de San José da Costa
Rica.
314
Pierre Kayser
315
reforça o posicionamento acima já que o direito de
resposta, consagrado no artigo 13 da lei de 29 de julho de 1881, revela o poder que
tem toda pessoa envolvida em uma publicação ou divulgação por meio da imprensa
de fazer inserir nesse contexto a sua réplica. O direito de resposta tem a finalidade
de assegurar a proteção moral e material de uma pessoa contra a influência que a
imprensa tem na formação de opinião, pois toda pessoa tem o direito de dar
conhecimento de sua versão dos fatos, sendo o direito de resposta instrumento para
restabelecer a igualdade (ou equilíbrio) entre a imprensa e o particular. O direito de
resposta guarda o mesmo fundamento daquele consagrado no direito alemão
Gegenaustellung, considerado “mode de protection de la personne, au sens du vieux
dicton Audiatur et altera pars, et de rétablissement de l’égalité des armes entre les
particuliers et la presse”.

314
Pacto de San José da Costa Rica - Artigo 14 – Direito de retificação ou resposta 1. Toda
pessoa, atingida por informações inexatas ou ofensivas emitidas em seu prejuízo, por meios de
difusão legalmente regulamentados e que se dirijam ao público em geral, tem direito a fazer, pelo
mesmo órgão de difusão, sua retificação ou resposta, nas condições que estabeleça a lei. 2. Em
nenhum caso a retificação ou a resposta eximirão das outras responsabilidades legais em que se
houver incorrido. 3. Para a efetiva proteção da honra e da reputação, toda publicação ou empresa
jornalística, cinematográfica, de rádio ou televisão, deve ter uma pessoa responsável, que não seja
protegida por imunidades, nem goze de foro especial.
315
KAYSER, Pierre. Les droits de la personnalité. Aspects théoriques et pratiques..., cit., p.469 e
470. KAYSER também faz a distinção entre o direito de resposta e o direito de retificação,
consagarado no artigo 12 da lei de 29 de julho de 1881 que prevê sejam corrigidos os fatos que não
foram reproduzidos pela imprensa de maneira exata.
198
No Chile, o direito de resposta é garantido a qualquer pessoa, natural
ou jurídica, que tiver sido ofendida injustamente por algum meio de comunicação
como disciplina o artigo 16 da Lei 19.733 de 18 de maio de 2001.
316
Cifuentes revela o direito de resposta ou derecho de réplica como um
dos modos de recomposição do dano moral; ferramenta útil para preservar os
direitos da personalidade e apaziguar os espíritos dos ataques dos meios de
comunicação. A resposta é a mais rápida reação para remediar a reputação violada,
tanto que la víctima encuentra satisfacción al ponerse em evidencia públicamente la
falsedad de la noticia que la hiere.
317
No Brasil, os artigos 186 e 927 do Código Civil estabelecem o
ressarcimento do dano como obrigação legal. Violado o direito, nasce para a vítima
o direito de exigir a sua reparação. A lei dá ao credor, diante do descumprimento de
uma obrigação, os meios legais para exigir o cumprimento da obrigação e, diante da
impossibilidade do cumprimento específico ou “in natura” da prestação, tem o credor
direito ao ressarcimento do prejuízo, que se concretiza quase sempre em uma
obrigação pecuniária.
O ato ilícito obriga a um ressarcimento de danos que consiste, em
primeiro lugar, na reposição das coisas ao seu status quo e, na impossibilidade, se
traduz em uma indenização pecuniária. O vocábulo “ressarcimento” é empregado
como expressão genérica, compreensiva dos modos que pode assumir a reparação,
quer “in natura” quer em dinheiro.
Para ilustrar a assertiva, narra-se uma situação em que o Poder
Judiciário foi acionado para decidir ação de indenização em que a Municipalidade de
São Paulo objetivava reparação dos danos materiais e morais sofridos em razão de
divulgação de nota na imprensa escrita por Georges Gazale, então proprietário de
uma loja situada nas esquinas das Ruas Nove de Julho e João Cachoeira, que se

316
Ley num. 19.733 sobre libertades de opinion e informacion y ejercicio del periodismo Del
derecho de aclaración y de rectificación Artículo 16.- Toda persona natural o jurídica ofendida o
injustamente aludida por algún medio de comunicación social, tiene derecho a que su aclaración o
rectificación sea gratuitamente difundida, en las condiciones que se establecen en los artículos
siguientes, por el medio de comunicación social en que esa información hubiera sido emitida.
317
CIFUENTES, Santos. Derechos personalíssimos. Buenos Aires: Astrea, 1995 p. 633.
199
dizia traído pelos ex-amigos, Paulo Maluf (então Prefeito da Capital) e Edvaldo Alves
da Silva (no cargo de Secretário de Governo). Entendeu a Prefeitura, ao defender
sua honra objetiva, que a matéria difamou o seu nome, prejudicando a sua imagem
de forma injusta e infundada, uma vez que ingressou com as ações de reintegração
de posse e demolitórias do imóvel, motivadas pelas irregularidades cometidas pelo
proprietário e comerciante e não a mando dos dirigentes políticos.
318
O Tribunal de Justiça de São Paulo negou provimento à apelação da
Municipalidade de São Paulo, mantendo a sentença, por reconhecer a ilegitimidade
ativa do ente público uma vez que “a publicação supostamente difamatória atingiu
diretamente as pessoas físicas nela referidas, ex-amigos do réu, não tendo sido a
matéria considerada ofensiva, dirigida à pessoa jurídica de direito público interno, de
cujo órgão público não se cogitou”.
319
A questão da legitimidade ativa para pleitear a reparação por danos à
imagem é intrincada, pois muitas vezes confundem-se os interesses da pessoa
jurídica com os interesses dos particulares.
Exemplos são as Representações n. 598 e 605, Classe 30a do Rio
Grande do Sul, decididas através dos Acórdãos 598 e 605 (21.10.2002) do Tribunal
Superior Eleitoral, em que foram Presidente, o Ministro Nelson Jobim e Relator, o
Ministro Caputo Bastos, formuladas pelo Estado do Rio Grande do Sul, por seu
procurador-geral, que afirmou a divulgação de dados inverídicos acerca da
segurança pública no estado gaúcho por programa partidário (Coligação Grande
Aliança (PMDB/PSDB), sustentando que:

318
O Estado de São Paulo”, matéria publicada em 9.10.94, intitulada “Quanto duram certas
amizades???”, com o seguinte teor: “Duram o tempo suficiente para tirar todo o proveito do “amigo”.
Duram o tempo suficiente entre o uso do “Amigo”e a traição a ele. Duram enquanto se crê que o
“Amigo” é Homem de Prestígio. PAULO MALUF E EDVALDO ALVES DA SILVA, quais são seus
“Amigos”?? Eu tenho muitos e leais. Com as promessas de ambos repetidas por várias vezes,
durante um ano prometeram regularizar o que a própria Prefeitura criou em torno da loja Mais Linda
da Nove de Julho a Sweet Sweet Way, apelidada pelos clientes “a Bibelô da Cidade”. Vocês dois
demoliram esta loja, mas jamais conseguirão demolir minha Pessoa, meus Princípios e minha
Moral. Sou muito Forte porque tenho as Bençõas de Minha MÃE, que está no Céu e “alguém”foi
proibido de ver a sua antes de falecer. A diferença é muito grande. Aprendam vocês Dois, a Única
Dívida que não Prescreve é a da Gratidão. E vocês me devem e muito. Georges Gazales”.
319
Apelação Cível n. 23.114-5/7-00 TJ/SP
200
“(…) Não se trata de beneficiar um candidato em detrimento de
outro, mas tão-somente da recomposição da verdade, para o
resguardo à honra e à imagem agredidos, direitos inalienáveis e
indisponíveis que cabe ao Estado-requerente pugnar, seja em favor
de sua população, seja em favor de seus agentes públicos, mas
essencial e primordialmente em favor da população local, razão pela
qual o pedido é formulado em único e exclusivo benefício do Estado
do Rio Grande do Sul na condição de pessoa jurídica de direito
público (…)”.
Embora o Tribunal Superior Eleitoral tenha julgado improcedente a
representação, deixou anotado que a pessoa jurídica de direito público, ou seja, o
Estado do Rio Grande do Sul tem legitimidade ativa para pleitear o direito de
resposta para restabelecer a verdade, pois “ainda que não se confundam os
interesses da unidade federativa e os interesses programáticos e partidários da
administração do Estado, está em jogo, ao menos indireta e aparentemente, a
imagem da pessoa jurídica de direito público interno”.
320
O Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro nos autos da
Apelação Cível 160/97, em que é apelante, Roseana Macieira Sarney e apelados,
Jornal do Brasil s/a e Danuza Leão, foi incisivo: “conquanto seja intuitivo que a
pessoa atuante no cenário político nacional, tem a sua vida pública muito conhecida,
e por isso mesmo bastante exposta, bem mais do que os integrantes de outras
categorias profissionais, igualmente intuitivo é que o político há de ter a sua honra
objetiva e a sua honra subjetiva devidamente respeitadas. O bom nome, a
reputação, a imagem, o decoro, a auto-estima e a dignidade, de qualquer pessoa
física, e a honra objetiva de qualquer pessoa jurídica, merecem a proteção da lei e
da Carta Magna, com os princípios dos princípios éticos”.
321
Recentemente, o Tribunal de Justiça de São Paulo concedeu
indenização por danos materiais e morais por dano à imagem diante de propaganda
tida como enganosa, com fundamento no parágrafo 1º do artigo 37 do Código de
Defesa do Consumidor. A empresa EDESP – Editora de Guias do Estado de São

320
Artigo 240, do Código Eleitoral.
321
Processo 1997.001.00160 do Superior Tribunal Eleitoral.
201
Paulo estampou a mesma fotografia – inclusive com o logotipo errôneo – nos
anúncios veiculados para duas empresas comerciantes de toldos (concorrentes),
possibilitando a indução do consumidor em erro.
Como medida adequada a restaurar a verdade dos fatos e a “falsa
imagem”, determinou o Tribunal de Justiça que se fizesse contrapropaganda em
edição futura.
322
De maneira que muitos são os meios de reparação do dano à imagem,
quer pela contrapropaganda, pela publicação de errata, quer pela divulgação da
sentença condenatória. Entretanto, a eficácia desses meios muitas vezes não é
sentida pelo ofensor que, sendo profissional de mídia, trabalhando em grandes
jornais e cadeias de televisão, até mesmo no anonimato da Internet, é condenado a
pagar uma indenização módica à vítima. Talvez a falta de critérios legais propicie
uma enxurrada de recursos ao Superior Tribunal de Justiça para a revisão dos
valores arbitrados a título de indenização.
6.2. – A efetividade da reparação.
Caetano José da Fonseca Costa advertia que a dificuldade na
avaliação da extensão do pretium doloris, pela ausência de critério legal "não pode
servir de base para sua negação" e quando da lesão ao direito da personalidade não
resultar dor, vexame, humilhação, sentimentos de perda, como no caso das pessoas
jurídicas, parece que a assertiva tem um significado ainda maior.

322
Apelação Cível n. 994.07.099.802-5 – 7a Câmara de Direito Privado – Comarca de Sumaré –
Relator Des. Elcio Trujillo – j. 19/5/2010.
202
Como não há a possibilidade da reparação específica do dano, ganha
terreno o caráter pedagógico da indenização, devendo ser ressaltado pelo
magistrado ao arbitrá-la, mesmo porque, indenizações de valores exacerbados
levam ao descrédito do próprio instituto.
O essencial é que a reparação seja eficaz. Por conseguinte, Sandro
Castro sugere a intensificação de propagandas publicitárias quando verificado o
dano à imagem, trazendo como exemplo a colocação da Corte Conti Sardegna que,
em caso de dano não patrimonial ao ente público, com a perda de credibilidade,
sugere o ressarcimento da imagem lesada através da intensificação de campanhas
publicitárias (Corte Conti Sardegna, Sez giurisdiz., 11 luglio, 2000, n. 699, in Riv.
Corte Conti, 2000, fasc n. 6, 15).
323
Fernando Moreira e Atalá Correia trazem à baila a opinião de Sérgio
Pinheiro Marçal para quem hoje há uma brusca mudança de um sistema de quase
irresponsabilidade para “um sistema que perigosamente vem procurando se
aproximar dos padrões norte-americanos dos punitive damages” provenientes não
de uma alteração legislativa nem constitucional, mas de alguns julgados em louvor à
“teoria do valor do desestímulo”.
324
Em prol do argumento de que a compensação do dano moral não pode
ter como fim causar mal (punição) e tampouco prevenir outros ilícitos (pedagógico),
pois sua finalidade exclusiva deve ser a de atenuar o sofrimento experimentado pelo
lesado (compensação), ressaltam os doutrinadores que “punir pelo arbitramento
judicial é conferir poderes ao Judiciário sem autorização legal. É ferir direito e
garantias individuais; é a própria negação do Estado de Direito”.
O inciso X do artigo 5º da Constituição Federal assegura a
compensação do dano moral, não falando em punição ao causador do dano.
Segundo as regras da hermenêutica não se pode dar aplicação extensiva em

323
CASTRO, Sandro. Il danno all’ímmagine. Tornio, G. Giappivhelli Editore, 2000 p.
324
MOREIRA, Fernando; CORREIA, Atalá. A fixação do dano moral e a pena. Revista Forense. Rio
de Janeiro, vol. 365, jan./fev. 2003, p. 369.
203
matéria de pena, pois a regra geral é de que não há pena sem lei anterior que a
defina, nem pena sem prévia cominação legal. Essa é a máxima.
325
Judith Martins-Costa e Mariana Pargendler ensinam que a figura dos
punitive damages (ou exemplary damages, vindictive damages ou smart money)
a idéia de indenização punitiva (e não “dano punitivo”) e consiste na “soma em
dinheiro conferida ao autor de uma ação indenizatória em valor expressivamente
superior ao necessário à compensação do dano, tendo em vista a dupla finalidade
de punição (punishment) e prevenção pela exemplaridade da punição (deterrence)
opondo-se – nesse aspecto funcional – aos compensatory damages, que consistem
no momento da indenização compatível ou equivalente ao dano causado, atribuído
com o objetivo de ressarcir o prejuízo.
326
Os exemplary damages tem duplo papel: de punir o culpado e de servir
de dissuasão da prática de certo comportamento social, introduzindo na
responsabilidade civil a idéia de “pena privada”. Sua “popularidade” decorreu,
talvez, da visível ineficácia do caráter meramente ressarcitório da indenização
quando aplicada aos danos extrapatrimoniais.
Tanto que a multa prevista na Lei 7.347/85 é um exemplo saudável de
meio termo entre “o intento de tornar exemplar a indenização e a necessidade de
serem observados parâmetros mínimos de segurança jurídica”, pois a multa é
recolhida a um fundo público (e não para o bolso do lesado), beneficiando o universo
dos lesados, servindo para efetivar o princípio da prevenção.
327
Claro está que não se pode confundir a expressão punitive damages
(designativa de um determinado instituto jurídico) com o caráter punitivo associado à
indenização do dano extrapatrimonial.
Brebbia diz que no regime da lei civil germânica, os conceitos de
reparação e de indenização são distintos. O primeiro dever do obrigado é reparar o

325
MOREIRA, Fernando; CORREIA, Atalá. A fixação do dano moral e a pena, cit.,p. 371 e 279
326
MARTINS-COSTA, Judith; PARGENDLER, Mariana Souza. Usos e abusos da função punitiva.
(punitive damages e o Direito brasileiro) Revista do CEJ. Brasília, n. 28 p. 15-32, jan./mar. 2005. p.
16.
327
MARTINS-COSTA, Judith; PARGENDLER, Mariana Souza Usos e abusos, cit., p. 24.
204
dano causado, restabelecendo as coisas ao status quo ante
328
e somente quando
esta espécie de reparação é impossível, é que se indeniza a vítima, ou seja, se
determina a entrega de dinheiro como reparação.
329
Na maioria dos casos de dano moral, a reparação efetiva ou natural é
impossível, não cabendo outro remédio que o pagamento de uma indenização para
ressarcir ou compensar o dano extrapatrimonial sofrido
330
De modo que a legislação alemã estabelece como regra de caráter
geral a reparação natural dos danos morais e como regra de exceção à indenização
dos mesmos (Schmerzengeld), princípio salutar à orientação de conduta social.
Mas há outros meios de reparação que não o Schmerzengeld. Nos
casos de delitos de lesões físicas e injúria, o juiz criminal pode impor uma multa em
benefício da vítima, sempre que esta o solicitar. O pagamento da multa ou Busse
(castigo, pena) Bussgeld (multa) exclui a procedência do Schmerzengeld, como está
no artigo 188 e 231 do Código Penal alemão.
Brebbia diz que a Busse é pena privada, sendo aplicada pelo direito
penal e que o Schmerzenged cumpre uma finalidade reparatória.
Na Inglaterra e nos Estados Unidos da América, são os jurados (e não
juízes togados), pessoas do povo, que fixam os exemplary damages. Não basta
assim a violação pura e simples de um dano, mas que esta tenha sido feita com
caráter ultrajante (grave). Muitas vezes são arbitradas reparações simbólicas de um

328
BGB § 249 Art und Umfang des Schadensersatzes
(1) Wer zum Schadensersatz verpflichtet ist, hat den Zustand herzustellen, der bestehen würde,
wenn der zum Ersatz verpflichtende Umstand nicht eingetreten wäre. (2) Ist wegen Verletzung einer
Person oder wegen Beschädigung einer Sache Schadensersatz zu leisten, so kann der Gläubiger
statt der Herstellung den dazu erforderlichen Geldbetrag verlangen. Bei der Beschädigung einer
Sache schließt der nach Satz 1 erforderliche Geldbetrag die Umsatzsteuer nur mit ein, wenn und
soweit sie tatsächlich angefallen ist.
329
BGB § 251 Schadensersatz in Geld ohne Fristsetzung
(1) Soweit die Herstellung nicht möglich oder zur Entschädigung des Gläubigers nicht genügend ist,
hat der Ersatzpflichtige den Gläubiger in Geld zu entschädigen. (2) Der Ersatzpflichtige kann den
Gläubiger in Geld entschädigen, wenn die Herstellung nur mit unverhältnismäßigen Aufwendungen
möglich ist. Die aus der Heilbehandlung eines verletzten Tieres entstandenen Aufwendungen sind
nicht bereits dann unverhältnismäßig, wenn sie dessen Wert erheblich übersteigen.
330
BREBBIA, Roberto H. El daño moral. Buenos Aires: Editorial Bibliográfica Argentina. Exemplar
da Biblioteca do Tribunal de Justiça de São Paulo E p. 138-139
205
shiling denominadas nominal damages. Percebe-se aí um caráter misto, tanto de
cunho punitivo como indenizatório.
Brebbia admite que as pessoas de existência ideal são suscetíveis de
sofrer agravo moral, sempre que o ataque que originou o dano seja dirigido contra
os bens ou os pressupostos pessoais que as mesmas possuem de acordo com a
sua particular natureza. Assim, por exemplo, possuindo as pessoas ideais, dentre
seus atributos de ordem pessoal, um nome e uma consideração, o fato que violá-los
engendrará verdadeiro dano moral.
331
A reputação e a honra da pessoa jurídica não
são formadas pela soma das honras individuais dos membros que a compõem, mas
constituem um produto distinto de cada um e da soma (totalidade) das reputações
individuais. Quando esse patrimônio moral da pessoa coletiva é lesado, origina um
dano moral de idênticas características ao que se produz quando é atacado o
patrimônio moral de um indivíduo de existência visível.
O jurista argentino aventa como única maneira de captar a infinita
multiplicidade de matizes que integram as diversas espécies de danos morais é
fazer uma classificação de tais gravames. De modo que daños morales, derechos
inherentes a la personalidad y bienes personales formam uma trilogia indissolúvel e
que constitui o núcleo da teoria dos danos extrapatrimoniais. Efetuar uma
classificação de qualquer desses três, implica agrupar automaticamente em classes
similares aos restantes.
332
Ademais, o patrimônio moral de uma pessoa, quer física quer ideal,
apresenta uma faceta objetiva e uma subjetiva. O lado subjetivo é formado pelos
bens pessoais que os sujeitos possuem em razão de suas características individuais
biológicas e psíquicas como a integridade física, afeições legítimas, intimidade,
direito moral do autor etc. Só se pode assegurar que uma pessoa sofreu com a
morte de seu pai (ou ente querido) porque a experiência, vivida por toda e qualquer
pessoa, indica de maneira imperiosa que, em idêntica situação, tem-se o mesmo
sentimento. Em contrapartida, a lesão sofrida em alguns dos bens que compõem o
aspecto objetivo da personalidade moral admite uma comprovação mais direta por

331
BREBBIA, Roberto H. El daño moral. Buenos Aires: Editorial Bibliográfica Argentina. Exemplar
da Biblioteca do Tribunal de Justiça de São Paulo E p. 217.
332
BREBBIA, Roberto H El daño moral, cit., p. 223-224.
206
parte das demais pessoas, uma vez que esses bens não se originam da natureza
bio-psíquica dos seres humanos, mas nas relações sociais e, portanto, deixam de
constituir um valor puramente individual. Tal é o caso da honra, da honestidade, do
nome etc., cuja lesão ou menoscabo podem ser apreciados de uma maneira objetiva
e externa, sem necessidade de realizar uma “introspecção” por parte do observador.
333
Portanto, a reparação do dano extrapatrimonial, imaterial ou moral da
pessoa jurídica deve ser preferencialmente através de um pedido público de
desculpas, de um desagravo, da divulgação de errata (quando necessária a
retificação posto que incorreta a publicação), da publicação da sentença
condenatória, em que a verdade dos fatos ofensivos viria à tona. Dar-se-ia
efetividade ao direito de resposta, constitucionalmente assegurado, anulando-se a
malfadada divulgação lesiva à imagem.
Entretanto, diante da impossibilidade da reparação in natura ou pelo
equivalente, o ressarcimento seria em dinheiro de modo a compensar o gravame
sofrido pela pessoa jurídica através do prudente arbítrio do juiz, evitando-se
indenizações de valor ínfimo ou exacerbado.
Maria Helena Diniz propõe as seguintes regras a serem seguidas pelos
magistrados na fixação da indenização: a) evitar indenização simbólica (valor ínfimo)
e enriquecimento injustificado da vítima (valor superior ao dano); b) não recorrer a
tarifação nem a porcentagem do dano patrimonial (porque haveria
“desumanização”); c) considerar a gravidade, a natureza e a extensão do dano; d)
avaliar a repercussão pública da lesão; e) ponderar as peculiaridades de cada caso,
atentando para o caráter anti-social da conduta do agente; f) verificar a situação
econômica do lesante e quais os benefícios angariados com a conduta lesiva; g) o
prejuízo real da vítima, usando o juízo de probabilidade, para verificar se houve
“perda de chance” ou oportunidade futura; h) o contexto econômico do país; i) a
intensidade do dolo ou o grau de culpa do lesante; j) fundamentar-se em prova
segura do dano; k) apurar os efeitos psicológicos do dano, avaliando a pessoa do
lesado, considerando seus princípios religiosos, sua profissão, sua posição social ou

333
BREBBIA, Roberto H El daño moral, cit., p. 229.
207
política; l) harmonizar as reparações em casos semelhantes (para manter um
“padrão”); m) com cautela e prudência, buscar a justiça e a equidade.
334
A ausência de critérios objetivos para fins de arbitramento da
indenização pode acarretar enormes discrepâncias dos valores obtidos nas ações
que buscam a reparação dos danos morais. Mesmo porque, poder-se-á desvirtuar a
essência do instituto, atribuindo-se vultosas somas de dinheiro a propiciar o
enriquecimento sem causa. Júlia Caiuby de Azevedo Antunes identifica como três as
funções da indenização por danos morais: a compensatória; a punitiva e a
preventiva. A primeira delas tem característica de recompensa pela dor sofrida, uma
vez impossível voltar à situação de normalidade; a segunda, serve como reprimenda
ao ofensor e a terceira, como desestímulo, prevenindo ofensas futuras.
335
Arrisca-se admitir que, ao lado desta última, a finalidade da reparação
dos danos morais é a de compensar a perda sofrida e não a de punir o ofensor,
sendo a prudência e o bom-senso os elementos imprescindíveis na fixação do valor
indenizatório.
Nas lições de Sérgio Cavalieri Filho, o magistrado deve agir dentro dos
critérios da proporcionalidade e da razoabilidade:
Razoável é aquilo que é sensato, comedido, moderado; que guarda
certa proporcionalidade. A razoabilidade é o critério que permite
cotejar meios e fins, causas e conseqüências, de modo a aferir a
lógica da decisão. Para que a decisão seja razoável é necessário
que a conclusão nela estabelecida seja adequada aos motivos que
a determinaram; que os meios escolhidos sejam compatíveis com
os fins visados; que a sanção seja proporcional ao dano. Importa
dizer que o juiz, ao valorar o dano moral, deve arbitrar uma quantia
que, de acordo com o seu prudente arbítrio, seja compatível com a
reprovabilidade da conduta ilícita, a intensidade e duração do
sofrimento experimentado pela vítima, a capacidade econômica do

334
Maria Helena Diniz, Curso de direito civil brasileiro. V. 7 2009, p. 104/105
335
ANTUNES, Júlia Caiuby de Azevedo Antunes. A previsibilidade nas condenações por danos
morais: uma reflexão a partir das decisões do STJ sobre relações de consumo bancárias. In Revista
Direito GV 09. V. 5, n. 1, jan/jun 2009. p. 179.
208
causador do dano, as condições sociais do ofendido, e outras
circunstâncias mais que se fizerem presentes
.
336
Verifica-se o papel de relevância da conduta do magistrado que deve
se pautar em critérios objetivos a sustentar a fundamentação da sentença para que
a reparação seja eficaz, pois indenizações substanciosas apenas engordam os
fundos das pessoas jurídicas sem que isso traga qualquer reflexo social, o que seria
por demais desastroso, abrindo portas para a indústria do dano moral.
Sandro Castro traz decisão dos julgados dos tribunais italianos
prevendo que o dano à imagem do ente público deve ser ressarcido com
fundamento na equidade, com referência a gravidade do fato e ao comprometimento
da imagem.
337
Afigura-se interessante a colocação da Corte Conti Sardegna que, em
caso de dano não patrimonial ao ente público, com a perda de credibilidade, sugere
o ressarcimento da imagem lesada através da intensificação de campanhas
publicitárias.
338
Recente a aprovação pela Comissão de Constituição e Justiça do
Projeto de Lei do Deputado Federal Marcus Vicente n. 1.914/2003 (apensado ao PL
7.124/2002)
e que propõe alteração do artigo 953 do Código Civil.
339
Em parecer
parcialmente favorável, o Deputado Régis de Oliveira ressaltou a
inconstitucionalidade dos preceitos constantes dos demais projetos de lei reunidos

336
CAVALIERI FILHO, Sérgio, Programa de Responsabilidade Civil, cit., p. 108.
337
Cf. App. Roma, 1 luglio 2002, cit, in Danno e resp., 2003, fasc n. 7, 763, nota di PLEBANI
Referido por CASTRO, Sandro Il danno all’ímmagine. Tornio, G. Giappivhelli Editore, 2000 p. 238.
338
Corte Conti Sardegna, Sez giurisdiz., 11 luglio, 2000, n. 699, in Riv. Corte Conti, 2000, fasc n. 6,
15.
339
Art. 1º Esta lei fixa parâmetros para a fixação da indenização por danos morais, prevista no art.
953 da Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002 - Código Civil.
Art. 2
º O art. 953 da Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002, passa a vigorar com a seguinte
redação: “Art. 953
. ..................
§ 1º Se o ofendido não puder provar prejuízo material, caberá ao juiz fixar, equitativamente, o valor
da indenização, na conformidade das circunstâncias do caso e de acordo com o disposto no
parágrafo seguinte.
§ 2º Na fixação da indenização dos danos morais, o juiz, a fim de evitar o enriquecimento indevido
do demandante, levará em consideração a situação econômica do ofensor, a intensidade do ânimo
de ofender, a gravidade e repercussão da ofensa, a posição social ou política do ofendido, bem
como o sofrimento por ele experimentado (NR).”
Art. 3º Esta lei entra em vigor na data de sua publicação.
209
para apreciação conjunta e que, sob a justificativa de preencher lacuna legislativa,
conceituavam o dano moral e enumeravam os bens juridicamente tutelados.
Qualquer que seja a proposta legislativa estabelecendo critérios de
reparação dos danos morais, em particular do dano à imagem, não podem ser
admitidas as que tolham o direito da pessoa à manifestação do pensamento,
constitucionalmente assegurado nos incisos IV e IX, do art. 5º, da Constituição
Federal. Outrossim, não se pode limitar o exercício dos meios de comunicação,
ainda que de forma velada, sob pena de infração ao artigo 220 da Carta Maior.
Percebe-se pois a crescente preocupação na disciplina legal do dano
moral, inclusive de conceituá-lo, com a finalidade precípua de conter os abusos,
enquanto as decisões dos Tribunais pátrios são tímidas quando se está diante da
pessoa jurídica. Como será debatido a seguir, chegam a fragilizar o posicionamento
que firmaram ao editar a Súmula 227 do Superior Tribunal de Justiça.
340

340
Cf. Parecer da Galeno Lacerda criticando a postura tímida do Poder Judiciário. Os fundamentos
legais são ainda os do Código Civil de 1916. “Nesse ponto, ousamos ponderar que, ao contrário do
sustentado acima, a jurisprudência brasileira tem se revelado muito tímida e acanhada, em regra,
no ressarcimento do dano moral, em radical contraste com as decisões das Cortes norte-
americanas. Essa diferença de conduta e de comportamento nasce da profunda diversidade da
formação política e cultural que distingue o Brasil dos Estados Unidos. Enquanto nestes a
federação é regime político natural, com ampla autonomia dos Estados para legislar, inclusive,
sobre direito material, esgotando-se o duplo grau de jurisdição no âmbito dos Estados, com
Judiciários em regra eletivos, - no Brasil, a federação é artificial, com centralização absurda de
poderes da União, com Judiciário de carreira, preso a horizontes estreitos. Some-se a isso o modo
diverso de realização do direito: o norte-americano, common law, casuísta, aberto ao precedente e
à equidade; o brasileiro, vinculado à teoria e ao Código. Daí, a timidez com que aos poucos a
jurisprudência brasileira vem se tomando menos avara no ressarcimento do dano moral. Disponível
em <http://www.buscalegis.ufsc.br/revistas/index.php/buscalegis/article/viewFile/6938/6505>.
Acesso em 20/09/2009.
210
6.3. – As decisões dos tribunais brasileiros. Os emblemáticos julgamentos do
recurso especial 598 281 MG relativo à possibilidade de concessão de
indenização por dano moral coletivo em caso de dano ambiental e recurso
especial 821 891 RS denegatório de indenização por dano moral à pessoa
jurídica de direito público por fraude em licitação.
Nas páginas que antecederam esse capítulo, muito se disse sobre o
dano moral da pessoa jurídica, enfrentando-se a questão da necessidade de uma
interpretação abrangente e “objetivizada” do conceito de dano moral, em sintonia
com a Constituição Federal de 1988. Tanto isso é verdade que a doutrina tem
admitido a reparação do dano moral à pessoa jurídica, encontrando pouca
resistência na jurisprudência, com a edição da Súmula 227 do Superior Tribunal de
Justiça.
O legislador infraconstitucional, acolhendo as sugestões do Projeto do
Código Civil n. 634 de 1975, inseriu o artigo 52 no capítulo das pessoas jurídicas,
estendendo-lhes a proteção dos direitos da personalidade no que for compatível
com a sua natureza de ente abstrato.
341
Contudo, o próprio Superior Tribunal de Justiça, na pena da Ministra
Eliana Calmon, em recente julgamento de uma ação civil pública ajuizada pelo
Ministério Público do Estado do Rio Grande do Sul em que objetivava alijar os
entraves criados por companhia de transporte coletivo (Empresa Bento Gonçalves
de Transportes s/a) que, ferindo o princípio da dignidade, passou a exigir dos idosos
o cadastramento prévio e a confecção de carteirinhas para que obtivessem

341
Câmara dos Deputados – Projeto de Lei n. 634, de 1975 (Do Poder Executivo) – Mensagem n.
160/75 publicado no Diário do Congresso Nacional, Suplemento (B) n. 061, 13 de junho de 1975: Art.
50. Aplica-se às pessoas jurídicas, no que couber, a proteção dos direitos da personalidade.
EXPOSIÇÃO DE MOTIVOS - item c: Todo um capítulo novo foi dedicado aos Direitos da
personalidade, visando à sua salvaguarda, sob múltiplos aspectos, desde a proteção dispensada ao
nome e à imagem até o direito de se dispor do próprio corpo para fins científicos ou altruísticos.
Tratando-se de matéria de per si complexa e de significação ética essencial, foi preferido o enunciado
de poucas normas dotadas de rigor e clareza, cujos objetivos permitirão os naturais
desenvolvimentos da doutrina e da jurisprudência. Observa-se que o artigo 50, do Projeto, foi
introduzido no Código Civil de 2002, como correspondendo ao artigo 52.
211
transporte gratuito, invocou como precedentes, os Recursos 598 281 MG e 821 891
RS, para negar a indenização do dano moral coletivo.
342
Estes dois Acórdãos, que serviram de paradigma para a decisão da
ação civil pública da empresa transportadora, são motivadores de alerta para a
alteração dos ventos que sopravam a favor da reparação ampla do dano moral, em
particular da pessoa jurídica. Também acusam a mudança de opinião de um dos
seus Ministros depois de redigir judicioso voto no Recurso Especial n. 598 281 de
Minas Gerais favorável à compensação do dano moral coletivo, como será
explicitado a seguir.
Nega-se a proteção jurídica à imagem da pessoa jurídica pelo
argumento simplista e ultrapassado de que, por não possuir substrado físico e
psíquico, a pessoa jurídica não pode sentir dor, angústia, frustração, ou seja, não
pode sentir os “efeitos” do dano moral.
O Recurso Especial n. 821 891 interposto pelo Ministério Público do
Estado do Rio Grande do Sul, sendo interessado o Município de Uruguaiana, foi
dirigido contra Acórdão da 2ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do
Sul por violação aos artigos 1º inciso IV da Lei 7.347/85 e artigos 186 e 927 do
Código Civil. Na oportunidade, o tribunal a quo afastou a pretensão indenizatória
pois, sob sua ótica, não houve prova do abalo moral que a fraude a licitação causou
à comunidade uruguaiana.
Debate-se o Ministério Público do Rio Grande do Sul na tese de que o
Tribunal de Justiça falhou em indeferir a indenização por dano moral, mesmo tendo
decretado as demais penas da lei de improbidade, proibindo a empresa Eletrojan, ré
na ação, de contratar com o poder público por dois anos, constatada a apresentação
de certidão falsa durante a fase de habilitação em licitação pública.
Para o parquet, a condenação ao pagamento de dano moral é corolário
lógico do acolhimento da pretensão, uma vez que o ato ilícito praticado pela

342
Recurso Especial n. 1.057.274/RS (2008/0104498-1), Superior Tribunal de Justiça, j. 1º/12/2009.
212
empresa, ao apresentar certidão negativa de débito (CND) falsificada, denota grave
ofensa à moralidade pública, gerando agressão moral à comunidade local.
Acompanhando a fundamentação da sentença monocrática no sentido
de que não se pode presumir o dano moral, foi negado provimento à apelação. A
juíza de primeiro grau entendeu que “seria necessário a prova no sentido de que a
Municipalidade, de alguma forma, tenha perdido a consideração e a respeitabilidade
e que a sociedade uruguaiana tenha se sentido lesada e abalada moralmente, em
decorrência do ilícito praticado”.
Embora opinando pelo não conhecimento do recurso especial, por
ausência de prequestionamento, o Ministro Luiz Fux não vislumbrou a possibilidade
de se indenizar dano moral coletivo, salvo se efetivamente comprovado, dada a
“incompatibilidade entre o dano moral qualificado pela dor e sofrimento psíquico, e a
transindividualidade, evidenciada pela indeterminabilidade do sujeito passivo e
indivisibilidade da ofensa objeto de reparação”.
Apoia seu voto nos argumentos do Ministro Teori Zavascki, exarado no
Recurso Especial 598.281 MG, para quem a vítima do dano moral é,
necessariamente, uma pessoa, sobre o fundamento de que este envolve dor,
sentimento, lesão psíquica, afetando “a parte sensitiva do ser humano”. “A ofensa
moral sempre se dirige à pessoa enquanto portadora de individualidade própria; de
um ‘vultus’ singular e único”.
O voto do Ministro Teori Zavascki caminha no sentido de que “o dano
ambiental ou ecológico pode, em tese, acarretar também dano moral – como, por
exemplo, na hipótese de destruição de árvore plantada por antepassado de
determinado indivíduo, para quem a planta teria, por essa razão, grande valor
afetivo”. Mas a vítima do dano moral é, necessariamente, uma pessoa (e não uma
pluralidade de sujeitos), assegurou o Superior Tribunal de Justiça.
Ressalta ainda o voto que “não parece ser compatível com o dano
moral a ideia de ‘transindividualidade’ (igualmente da indeterminabilidade do sujeito
passivo e da indivisibilidade da ofensa e da reparação) da lesão. E o dano moral
envolve, necessariamente, dor, sentimento, lesão psíquica, afetando ‘a parte
213
sensitiva’ do ser humano, como a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem
das pessoas”.
343
O Ministro Francisco Falcão, participando do julgamento, descarta a
responsabilidade por dano moral quando lesado o meio ambiente, “porquanto para a
condenação em dano moral, faz-se impositiva a comprovação de que o estrago
alcançou a órbita subjetiva de terceiros, atingindo “uti singuli” a pessoa, de forma a
lhe causar desconforto de caráter individual”.
Como dito acima, o Ministro Luiz Fux havia proferido voto divergente ao
decidir a questão posta pelo Ministério Público do Estado de Minas Gerais em face
do Município de Uberlândia e da empresa de empreendimentos imobiliários que
causou danos ao meio ambiente quando da implantação irregular de loteamento.
344
Naquela oportunidade, Luiz Fux lançou importantes argumentos
favoráveis à indenização do dano moral que podem ser resumidos: “o advento da
novel ordem constitucional – no que concerne à proteção do dano moral –
possibilitou passar a barreira do indivíduo para abranger o dano extrapatrimonial à
pessoa jurídica e à coletividade”. O Ministro reconhece o dano moral ambiental e o
relaciona à transgressão do sentimento coletivo de insatisfação, consubstanciado no
sofrimento da comunidade, ou grupo social, diante de determinada lesão ambiental.
De modo que – por tudo o que aqui foi dito – deve este posicionamento
vingar no âmbito dos tribunais, que não apenas decidirão aplicando adequadamente
o direito positivo, mas fazendo justiça, trazendo aos jurisdicionados, pessoa jurídica,
bem estar e paz social.

343
Recurso Especial n. 598 281/MG.
344
Recurso Especial n. 598 281/MG.
214
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Na era globalizada, o titular do direito à imagem está mais vulnerável a
sofrer um dano ressarcível pelas facilidades de acesso aos meios de comunicação e
consequente abuso do direito à livre manifestação do pensamento encartado no
inciso IV do artigo 5º da Constituição Federal. Graças à Internet, à televisão, aos
meios de radiodifusão e ao sistema mecanizado em geral, que propagam a
informação em tempo real, acessível a milhões e milhões de outros sujeitos, as
pessoas estão expostas ao vilipêndio. A liberdade é a regra, mas devem ser
respeitados os direitos e garantias dos interesses das pessoas naturais e jurídicas
em não ser ofendidas ou sofrer ameaça de lesão em sua honra ou reputação.
As pessoas jurídicas, tanto de direito privado como de direito público,
podem ser vítimas de dano à imagem. Isto porque são titulares de direitos da
personalidade compatíveis com a sua natureza jurídica, ou seja, a reputação de que
gozam no meio social em que desenvolvem suas atividades. No caso, a lesão à sua
reputação, por ato ou omissão, quer seja o sujeito funcionário público que não,
difundido pelos meios de comunicação com ampla divulgação na mídia, acarreta-
lhes gravame extrapatrimonial, moral ou imaterial. Isso porque não haverá
necessariamente uma perda de lucratividade, ou uma diminuição patrimonial, mas,
na maioria das vezes, de confiança, quando se tem em mente entes associativos ou
fundações cuja finalidade é nobre.
A violação à imagem da pessoa jurídica pode, até mesmo, inviabilizar a
realização de seus objetivos.
A afirmação se sustenta, uma vez que a pessoa jurídica é uma
realidade presente no ordenamento jurídico (e não uma ficção), recebendo o
reconhecimento da lei que lhe outorga personalidade jurídica e capacidade próprias,
bem como um patrimônio distinto dos membros que a compõem; sendo que esse
patrimônio não é apenas traduzido ou traduzível em dinheiro, consubstanciado não
só nos lucros e nas vantagens econômicas que aufere, mas também em um
215
patrimônio imaterial que, uma vez violado, pode inviabilizar a consecução das
finalidades para as quais a pessoa jurídica foi criada.
A pessoa jurídica é sujeito de direitos e obrigações, sendo titular de
direitos fundamentais e da personalidade análogos aos das pessoas naturais.
Violados tais direitos, nasce para a pessoa jurídica, quer de direito privado, quer de
direito público, a pretensão de reparação patrimonial ou exclusivamente imaterial.
A Constituição Federal não faz discrimen entre pessoa física ou
jurídica, sendo que protege tanto uma quanto a outra contra os danos à imagem nos
incisos V e X do artigo 5º. O Código Civil, no artigo 52, também recepciona os
comandos da Lei Maior. A jurisprudência, seguindo a mesma linha de raciocínio,
editou a Súmula n. 227 do Superior Tribunal de Justiça. Nessa linha, passou-se a
interpretar o artigo 10 da Convenção Europeia de Direitos Humanos, coibindo-se
abusos do direito de livre expressão, na proteção da reputação ou dos direitos dos
outros, compreendida esta expressão em toda a sua amplitude.
De modo que, sendo o direito à imagem, um direito da personalidade
autônomo, recebe proteção constitucional e infraconstitucional, abarcando tanto a
pessoa natural, como a pessoa jurídica.
Assim, quando violado esse direito da personalidade, com repercussão
tal de modo a inviabilizar ou até mesmo dificultar a consecução das finalidades para
as quais foi criada, tem em mãos o seu titular – ente físico ou jurídico – direito à
reparação. Reparação esta que é integral, de modo a recompor o patrimônio lesado,
seja por meio da reparação in natura, de um pedido de desculpas, um desagravo, a
publicação de errata, o exercício do direito de resposta ou até mesmo a divulgação
da sentença condenatória em periódico de grande circulação, seja por meio do
pagamento de uma indenização em dinheiro.
Esse patrimônio, na esteira da evolução constitucional, deve
necessariamente ser encarado sob o seu duplo aspecto: material e imaterial; ou
seja, a pessoa jurídica tem, em seu espectro existencial, um patrimônio moral ou
imaterial, que se revela em suas finalidades sociais, para as quais ela foi criada,
sendo essa a sua essência. Se houver uma violação que dificulte e até mesmo
impeça a consecução de seus fins, tem-se que a pessoa jurídica será ferida em sua
216
“essência”, nos seus elementos “finalísticos” ou “morais”, merecendo a mais ampla
reparação.
Tal pensamento se coaduna com a mudança de paradigma trazida pela
Constituição Federal que aflorou, inclusive no âmbito da responsabilidade civil,
princípios como da socialidade, da eticidade e da operabilidade, sendo que os
operadores do direito se desapegam do rigor formal para uma interpretação e
subsunção do texto legal consentânea com a equidade e a justiça.
O dano moral, vedete da responsabilidade civil, não deve ser encarado
apenas com relação aos efeitos que produz, interferindo na esfera psíquica da
vítima, acarretando-lhe dor, sofrimento, tristeza. Também não está atrelado
exclusivamente à dignidade da pessoa humana no seu aspecto individual. O dano
moral, - ousa-se afirmar -, pode ser objetivizado, de modo a assimilar as
consequências do desrespeito aos direitos da personalidade próprios das pessoas
jurídicas, pois dotadas de um nome, de uma honra objetiva, de uma reputação, de
uma imagem.
Claro está que o princípio axiológico é diferente quando se pretende
amparar os direitos da pessoa natural, uma vez que a dignidade humana está no
topo da Constituição Federal, da qual irradiam os demais direitos, sociais, políticos
etc. Quando se está diante dos direitos da personalidade da pessoa jurídica, deve
haver um critério restrito no reconhecimento desses mesmos direitos (limitando-se o
espectro de incidência) e uma mitigação na valoração do dano moral (preferindo-se
a reparação in natura). O aplicador do direito, embora tenha hoje uma maior
amplitude de interpretação da norma, tanto que o artigo 52 vale-se de conceitos
vagos, indeterminados, deverá atuar com maior rigor, exigindo a prova efetiva do
dano, uma vez que, nessas hipóteses, - permite-se assegurar - o dano moral não é
in re ipsa.
Diz-se que quando a vítima da lesão à imagem (imagem-atributo) é a
pessoa jurídica, o dano moral é um dano atenuado, que merece a proteção tanto da
Constituição Federal (artigo 5º, incisos V e X) como do artigo 52 do Código Civil.
Assim, essas afirmações são feitas de modo a não deixar sem
reparação as agressões à imagem das pessoas, pois a reparação do dano, mesmo
217
quando não há reflexos no patrimônio econômico do lesado, tem uma função
pedagógica, educativa, de dissuasão da prática lesiva, servindo de exemplo, de
paradigma de conduta, para uma sociedade melhor, mais ética, mais fraterna, mais
solidária e mais justa.
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