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consaguineamente às famílias. As tramas históricas não se dão de forma tão
mecânica, direcionada pelas necessidades de articulações políticas.
Existe uma forte relação entre a escolha dos padrinhos e a possibilidade de
ascensão social e isso ocorre no momento da escolha do padrinho, entretanto, o
resultado esperado nem sempre é alcançado, até mesmo por que, ocorrem as
rupturas de alianças, os conflitos, divergências e distanciamentos entre os
compadres. Só o vínculo espiritual não garante que a reciprocidade de interesses
se estabeleça. Além disso, nem sempre os laços eram verticais
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, muitas vezes
eram horizontais, à medida que reforçariam os vínculos entre sujeitos do mesmo
grupo social. É o caso do apadrinhamento e compadrio entre os escravos, por
exemplo.
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Numa amostragem do ano de 1795-96, na freguesia da Sé, em Belém, de
um total de 200 registros de batismo, figuram entre os padrinhos 27 entre pretos,
cafuzos e mulatos, o que equivale a 13,5% do total de padrinhos, isso sem contar
os padrinhos de escravos que não são identificados como pretos, provavelmente
por serem livres, mas que aparecem nos assentos sem sobrenome, o que nos
indica que são do mesmo grupo social dos escravos. Neste sentido, podemos
Este dado revelou-nos que sua escolha referendava a posição social dos pais, ao mesmo tempo que, para
os padrinhos, revelava-se uma forma de fortalecimento de sua clientela”. OLIVEIRA, Mônica Ribeiro
de. Op. Cit. P. 176
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Mônica Oliveira argumenta que os pais menos ricos “escolhiam padrinhos que possuíam uma fortuna
igual ou maior que a sua, permitindo-nos aduzir que o compadrio, além de referendar alianças,
relacionava-se com a obtenção de prestígio social para aqueles menos abastados que, em retribuição,
ofereciam respeito, lealdade, além da maior probabilidade deste ato de constituir 'pontes' entre universos
sociais distintos” OLIVEIRA, Mônica Ribeiro de. Op. Cit. P. 177
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Existem vários trabalhos que demonstram a importância do compadrio na consolidação de laços sociais
entre os escravos, reforçando interesses e ampliando redes de solidariedades, dentre os quais destacamos:
GUDEMAN, S. & SCHWARTZ, S. Purgando o Pecado Original: Compadrio e Batismo de Escravos na
Bahia no século XVIII, In: REIS, João José. Escravidão e Inversão da Liberdade. Estudos sobre o Negro
no Brasil. São Paulo, Ed. Brasiliense, 1988. FERREIRA, SCHWARTZ, Stuart. Escravos, roceiros e
rebeldes. Trad. Jussara Simões. Bauru. SP: EDUSC, 2001. Roberto Guedes. Trabalho, família, aliança e
mobilidade social: estratégias de forros e seus descendentes – Vila de Porto Feliz, São Paulo, século
XIX. Caxambu (MG), 2003. (ABPHE), BRÜGGER, Silvia Maria Jardim. Compadrio de Escravos (São
João Del Rei – séculos XVIII e XIX). In: Minas Patriarcal – Família e Sociedade (São João Del Rei –
séculos XVIII e XIX). Niterói: UFF, 2002. Tese de Doutorado. HAMAISTER, Martha Daisson. Na pia
batismal: estratégias de interação, inserção e exclusão entre os migrantes açorianos e a população
estabelecida na Vila de Rio Grande, através do estudo das relações de compadrio e parentesco fictícios
(1738-1763). (ABPHE), Caxambu (MG), setembro de 2003. SILVA, Denize Aparecida da. Laços de
Compadrio: os arranjos da comunidade escrava na Freguesia de São Francisco Xavier de Joinville
(1857-1888). Escravidão e Liberdade no Brasil Meridional, Castro (PR). 2003. HARTUNG, Miriam.
Muito além do céu: Escravos e Senhores Sutis. In: A comunidade do Sutil: história e etnografia de um
grupo negro na área rural do Paraná. Rio de Janeiro: PPGAS-Museu Nacional-UFRJ, 2000. (Tese de
Doutorado).