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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO
PUC-SP
Fernando Moreno Castilho
Concepções evolutivas de Charles Darwin na Origem das espécies
(1859) e na Expressão das emoções no homem e nos animais (1872):
um estudo comparativo
MESTRADO EM HISTÓRIA DA CIÊNCIA
SÃO PAULO
2010
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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO
PUC-SP
Fernando Moreno Castilho
Concepções evolutivas de Charles Darwin na Origem das espécies
(1859) e na Expressão das emoções no homem e nos animais (1872):
um estudo comparativo
MESTRADO EM HISTÓRIA DA CIÊNCIA
Dissertação apresentada à banca
examinadora da Pontifícia
Universidade Católica de São
Paulo, como exigência parcial
para obtenção do título de
MESTRE em História da Ciência,
sob a orientação da Profa. Dra.
Lilian Al-Chueyr Pereira Martins.
SÃO PAULO
2010
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Castilho, Fernando Moreno
“Concepções evolutivas de Charles Darwin na Origem das espécies (1859) e na
Expressão das emoções no homem e nos animais (1872): um estudo
comparativo”
São Paulo, 2010
xiii, 71, [5] p.
Dissertação (Mestrado) – PUC – SP
Programa: História da Ciência
Orientadora: Profa. Dra. Lilian Al-Chueyr Pereira Martins
Banca Examinadora
_________________________________
_________________________________
_________________________________
Autorizo, exclusivamente para fins acadêmicos e científicos, a reprodução total ou
parcial desta dissertação por processos fotocopiadores ou eletrônicos.
Ass.: __________________________________________________________
Local e data: ____________________________________________________
Fernando Moreno Castilho
“A observação tem outra função além de oferecer apoio à nossa busca intelectual
da compreensão das leis da natureza: é o veículo pelo qual alcançamos a
satisfação estética de conhecer a natureza. Alguns biólogos tem motivações
puramente intelectuais para estudarem orquídeas, borboletas ou bactérias, alguns
também descobrem beleza na polinização de orquídeas ou na estrutura de uma
célula. Descrever a história e a diversidade dos seres vivos, fornecer o
conhecimento pelo conhecimento, é enriquecer a humanidade”.
(Douglas J. Futuyma, Biologia evolutiva, 15)
DEDICATÓRIA
À minha amada esposa, Thaiane Moreira Michellão Castilho, que sempre me
estimulou a dar este grande passo, e pelo carinho, paciência e compreensão
durante minha ausência nos momentos em que me dedicava a esse trabalho.
Aos meus queridos pais, Natalino Moreno Castilho e Ivanize Caputo Castilho,
meus exemplos de vida, pelo amor incondicional e por me apoiarem em todos os
momentos de minha vida, mesmo aqueles mais tortuosos e difíceis, além de me
ensinarem, acima de tudo, o respeito, a dignidade e a amizade em toda e qualquer
relação humana, demonstrando o real sentido de uma família.
Aos meus queridos irmãos, Luciano Moreno Castilho e Adriana Moreno Castilho,
por nossa união, pela nossa amizade e por sempre me incentivarem na busca do
crescimento, sendo para mim exemplos de competência e determinação.
À minha orientadora Profa. Lilian Al-Chueyr Pereira Martins por todo respeito, pela
sua sabedoria, gentileza, paciência, bom senso, compreensão e, acima de tudo,
exigência, competência, participação, correções, revisões, sugestões que fizeram
com que concluíssemos este nosso trabalho.
À professora Maria Elice Brzezinski Prestes pelas primeiras orientações que foram
essenciais para a realização deste estudo e pela confiança em mim depositada.
Além dos conhecimentos transmitidos durante nossas aulas com muita eficiência,
elegância e sabedoria e pelas valiosas contribuições na banca de qualificação.
AGRADECIMENTOS
À Sociedade pelo financiamento deste trabalho com verba pública sob forma de
bolsa de estudo concedida através da Secretaria de Educação do Estado de São
Paulo que custeou a sua realização e viabilizou esta pesquisa.
A todos os professores do Programa de Estudos Pós-Graduados em História da
Ciência, especialmente à Vera Cecília Machline pelos conhecimentos transmitidos
e pelo relacionamento amigo e ao Ubiratan D’Ambrósio pela sua generosidade e
pela honra da sua presença na banca de qualificação com sugestões tão valiosas.
À professora Ana Maria Haddad Baptista pela cordialidade, amizade, paciência e
respeito dedicados a mim e à minha esposa Thaiane, em todos os momentos,
desde o primeiro contato, até a recepção no Programa e durante o período que
tive o prazer e o privilégio do convívio agradável e enriquecedor em sala de aula.
Aos meus colegas de Mestrado pelo apoio, incentivo, amizade e companheirismo,
e pelos momentos agradáveis que compartilhamos durante a realização do Curso.
À professora Solange F. Azevedo Dias por suas contribuições, pelo respeito e pelo
seu profissionalismo no atendimento aos bolsistas da Secretaria da Educação.
Aos meus professores da Graduação em Ciências Biológicas pela Faculdade de
Ciências de Letras de Assis, especialmente à professora de Zoologia Vera Cristina
Silva por sempre ter acreditado e me incentivado para que eu prosseguisse com
meus estudos acadêmicos.
Aos meus familiares e amigos que sempre estiveram ao meu lado me apoiando,
incentivando e confortando com palavras amigas, abraços fortes, sorrisos sinceros
ou pela sua simples companhia.
RESUMO
Dentre os livros escritos por Charles Robert Darwin (1809-1882), o Origem das
espécies (1859) é o mais conhecido. Entretanto, nesta obra ele não lidou com o homem.
Ele tratou deste assunto em duas obras que publicou posteriormente: na Expressão das
emoções no homem e nos animais (1872) e na Origem do homem (1871). O objetivo
desta dissertação é elucidar se Darwin apresentou os mesmos meios de modificação das
espécies nessas duas obras. Serão também consideradas as concepções apresentadas
na Origem do homem.
Esta dissertação contém uma introdução e três capítulos. O capítulo 1 trata de
algumas contribuições de Darwin oferecendo uma visão geral dos principais meios de
modificação das espécies encontrados no Origem das espécies. O capítulo 2 analisa os
meios de modificação das espécies encontrados no livro Expressão das emoções no
homem e nos animais. O capítulo 3 apresenta uma comparação das concepções
encontradas nos dois livros bem como algumas considerações finais sobre o assunto.
Este estudo levou à conclusão de que os meios de modificação das espécies
apresentados nas duas obras consideradas são os mesmos: seleção natural, seleção
sexual, herança de caracteres adquiridos pelo uso e desuso. Entretanto, na Expressão
das emoções no homem e nos animais, Darwin enfatizou o papel da herança de
caracteres adquiridos para explicar alguns padrões de comportamento no homem e em
outros animais.
Pode ser também apontado que diversas concepções encontradas no livro
Expressão das emoções no homem e nos animais serviram de inspiração para trabalhos
mais recentes contribuindo para a construção da disciplina Etologia, na década de 1960.
Palavras-chave: História da evolução; Darwin, Charles; modos de modificação das
espécies.
ABSTRACT
Among the books written by Charles Robert Darwin (1809-1882) the Origin of
species (1859) is the best known. However, in such book he did not deal with man. He had
dealt with this subject in two books which were published later: The expression of
emotions in man and animals (1872) and The descent of man (1871). This dissertation
aims to elucidate if Darwin had presented the same ways of modification of the species in
The origin of species and The expression of emotions in man and animals. It will be also
taken into account some conceptions presented by him in The descent of man.
This study contains an introduction and three chapters. Chapter 1 deals with some
of Darwin’s contributions offering an overview of the main ways of modification found in the
Origin of species. Chapter 2 analyses the ways of modification of species found in The
expression of emotions in man and animals. Chapter 3 offers a comparison between the
conceptions found in both books as well as providing some final remarks on the subject.
This study led to the conclusion that the ways of modification of species proposed
in both books are the same: natural selection, sexual selection, inheritance of acquired
characteristics. Besides that, it may be found an analogy between natural and artificial
selection in both of them. However, in The expression of emotions in man and animals
Darwin stressed the role of the inheritance of acquired characteristics in order to explain
some patterns of behaviour in man and other animals.
It can also be pointed out that several conceptions found in The Expression had
inspired some more recent works contributing for the building of the discipline Ethology, in
the 1960’s.
Key-words: History of evolution; Darwin, Charles; ways of modification of species.
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO…………….…………………………………......…..….........…....….…1
CAPÍTULO 1 – MECANISMOS EVOLUTIVOS PROPOSTOS POR CHARLES
DARWIN NO LIVRO ORIGEM DAS ESPÉCIES....................................................12
1.1 CARREIRA E INTERESSES PROFISSIONAIS................................................12
1.2 ALGUNS MECANISMOS EVOLUTIVOS PROPOSTOS POR DARWIN NA
ORIGEM DAS ESPÉCIES....................................................................................30
CAPÍTULO 2 MECANISMOS EVOLUTIVOS PARA A FORMAÇÃO DE
PADRÕES DE COMPORTAMENTO E A EXPRESSÃO DAS EMOÇÕES NO
HOMEM E NOS ANIMAIS......................................................................................36
CAPÍTULO 3 – CONSIDERAÇÕES FINAIS..........................................................62
BIBLIOGRAFIA......................................................................................................68
1
INTRODUÇÃO
Inicialmente pretendia investigar sobre o impacto causado na Inglaterra e
em alguns países europeus pela publicação do livro A origem das espécies por
meio da seleção natural, ou a preservação das raças favorecidas na luta pela vida
(1859), de Charles Darwin (1809-1882). Num segundo momento, após algumas
conversas com a Professora Dra. Maria Elice Brzezinski Prestes, que foi minha
orientadora inicialmente, pesquisamos e constatamos que esse tema havia sido
explorado por outros autores além de ser excessivamente amplo e abrangente
para ser abordado em uma dissertação de Mestrado. Decidimos, com isso, pela
manutenção do autor, porém mudamos o tema e a obra a ser analisada.
Escolhemos A expressão das emoções no homem e nos animais que foi publicada
anos depois (1872).
Embora a obra mais conhecida de Darwin seja a Origem das espécies,
Ernst Mayr (1904-2005) considera A expressão das emoções no homem e nos
animais bastante relevante. Ele comenta a respeito:
Suas últimas publicações, particularmente The Expression of the
Emotions in Man and Animals (1872) e The Effects of Cross and Self-
Fertilization in the Vegetable Kingdon (1876), foram tão pioneiras e
eminentes que juntamente com sua teoria dos recifes de corais e da
2
monografia sobre as cracas,
1
teriam tornado Darwin um homem
famoso, mesmo se ele não tivesse proposto a evolução por seleção
natural.
2
Tomando como ponto de partida esta afirmação de Mayr, decidimos ter
uma idéia do impacto desta obra considerando suas edições. Nesse sentido,
fizemos um levantamento das diferentes edições, bem como das traduções deste
livro. Verificamos que o livro passou por pelo menos 40 impressões em inglês, por
diferentes editoras, tanto da Inglaterra como dos Estados Unidos. Na Inglaterra
foram 13 impressões, todas em Londres. Nos Estados Unidos, encontramos 21
impressões em Nova Iorque, e seis impressões em Chicago. As traduções
compreendem diversos idiomas, como oito impressões em russo, duas
impressões em polonês, duas impressões em francês, quatro impressões em
italiano, quatro impressões em espanhol, quatro impressões em japonês, seis
impressões em chinês e uma impreso em alemão, húngaro, tcheco, romeno,
belga e português.
3
Dentre as traduções disponíveis, destacamos a tradução feita para o idioma
russo, por Vladimir Kovalevsky, no mesmo ano em que o livro foi publicado na
1
Somente a monografia que Darwin desenvolvera sobre a subclasse cirripedia havia se estendido
para dois grandes volumes (A Monograph On The Sub-class Cirripedia, 1851), que lhe valeram a
medalha Copley da Royal Society em 1853.
2
Ernst Mayr, The Growth of Biological Thought: Diversity, Evolution, and Inheritance
(Cambridge: Belknap Press: Harvard University Press, 1982), 424; Ernst Mayr, O Desenvolvimento
do Pensamento Biológico: Diversidade, Evolução e Herança (Brasília, DF: Editora Universidade de
Brasília, 1998), 474.
3
Wyhe, John van, dir. The complete works of Charles Darwin online. Disponível em http://darwin-
online. org.uk/. Acesso em março 2008.
3
Inglaterra. Como a publicação da primeira edição em Londres data do dia 26 de
novembro, o tradutor russo teve pouco mais de um mês para publicação da
tradução russa de São Petersburgo, antes do final do ano de 1872. As traduções
feitas na Espanha, Japão e China datam do início do século XX, no máximo
traduzidas até o final da década de 1930. Na década de 1960 foram feitas as
traduções na Hungria, na República Tcheca, na Romênia e na Bélgica. As
traduções para o português foram feitas posteriormente e consideras por nós
tardias, principalmente, quando comparadas às traduções russa, polonesa,
francesa e italiana, além das impressões em Nova Iorque, todas feitas ainda no
século XIX. A tradução portuguesa feita em Lisboa data da primeira metade da
década de 1970 e a tradução brasileira para o português, feita em São Paulo, foi
publicada somente no final do século XX, no ano de 2000.
4
Decidimos, então, desenvolver uma pesquisa com o objetivo de averiguar
as eventuais nuances, de alguns dentre os conceitos centrais da teoria evolutiva
apresentada por Darwin, no livro, que a partir de agora passaremos a chamar de
Origem das espécies,
5
publicado em 1859, ao compará-lo com o livro A expressão
das emoções no homem e nos animais, publicado no ano de 1872. Partimos da
hipótese de que em um livro que trataria, aparentemente, de aspectos
comportamentais, Darwin poderia ter utilizado argumentos que reforçariam sua
teoria evolutiva apresentada em 1859, onde defendeu a descendência com
modificação a partir de um ancestral comum, e a ação da seleção natural como
4
Wyhe, John van, dir. The complete works of Charles Darwin online. Disponível em http://darwin-
online. org.uk/. Acesso em março 2008.
5
Charles Darwin, The origin of species by means of natural selection, or the preservation of
favoured races in the struggle for life. 6th ed. (London: John Murray, 1872).
4
principal agente de modificação sobre a variação individual. Entretanto, no
desenvolvimento da pesquisa decidimos averiguar se no livro A expressão das
emoções no homem e nos animais aparecem os mesmos mecanismos de
transformação das espécies que foram sugeridos por Darwin na Origem das
espécies e, em caso positivo, qual deles recebe uma ênfase maior.
Nesta pesquisa utilizamos como fontes secundárias publicações de
historiadores e filósofos da ciência como Adrian Desmond, James Moore, Ernst
Mayr, James Lennox, Janet Browne, Konrad Lorenz, Nikolaas Tinbergen e Peter
Bowler, tratando direta ou indiretamente do assunto, bem como de seu contexto.
Consultamos também a dissertação de Mestrado que apresenta um estudo
comparativo entre as concepções evolutivas de Charles Darwin no Origem das
espécies e as concepções evolutivas de Alfred Russel Wallace em seu livro
Darwinism (Darwinismo), de autoria de Viviane Arruda do Carmo. Essas e as
outras obras que foram consultadas durante a elaboração desta dissertação estão
relacionadas na bibliografia final.
Como fonte primária, utilizamos a tradução brasileira da primeira edição do
livro A expressão das emoções no homem e nos animais,
6
tradução feita a partir
da versão da primeira impressão norte-americana feita em Chicago,
7
no ano de
1965, com introdução de Konrad Lorenz (vigésima impressão nos Estados
Unidos); assim como, utilizamos a versão do original em inglês da segunda edição
6
Charles Darwin, A expressão das emoções no homem e nos animais. Tradução de Leon de
Souza Lobo Garcia (São Paulo: Cia das Letras, 2000).
7
Charles Darwin, The expression of the emotions in man and animals. Introduction by Konrad
Lorenz (Chicago: University of Chicago Press, 1965).
5
da Expressão das emoções no homem e nos animais,
8
publicada em Londres, no
ano de 1890. A segunda edição em inglês teve publicação póstuma com prefácio
e notas escritas por seu filho Francis Darwin (1848-1925), além daquelas deixadas
pelo seu pai.
9
Ainda como fonte primária utilizamos a tradução brasileira do livro A
origem do homem e a seleção sexual
10
e a sua versão do original em inglês,
11
publicada em dois volumes no ano de 1871, em Londres, por Darwin.
O livro A expressão das emoções no homem e nos animais é composto de
13 capítulos. Neles Darwin tratou dos princípios gerais da expressão, os meios de
expressão nos animais, as expressões especiais de animais, expressões
especiais do homem: sofrimento e choro; desânimo, ansiedade, tristeza,
abatimento e desespero; alegria, bom humor, amor, sentimentos de ternura e
devoção; reflexão, meditação, mau humor, amuo e determinação; ódio e raiva;
desdém, desprezo, nojo, culpa, orgulho, desamparo, paciência, afirmação e
negação; surpresa, espanto, medo e horror; preocupação consigo mesmo,
8
Charles Darwin, The expression of the emotions in man and animals. 2d edition. Edited by Francis
Darwin (London: John Murray, 1890).
9
Pela primeira edição não ter se esgotado durante o período de vida do meu pai, ele o teve a
oportunidade de publicar o material recolhido com vista a uma segunda edição. Este material
consiste de um volume de cartas, a partir de extratos e referências a livros, panfletos e artigos. Que
tenho tentado utilizar, no presente volume. Também tenho utilizado o que foi escrito desde a
publicação da primeira edição, mas a minha leitura tem sido muito longe de ser completa. Algumas
correções do texto foram feitas, na qual eu tenho seguido a lápis as observações do exemplar do
livro do meu pai. Os outros são complementos das notas e são distinguidos por estarem entre
parênteses (Francis Darwin, Preface to the second edition.” In: Darwin, Charles. The expression of
the emotions in man and animals. (London: John Murray, 1890).
10
Charles Darwin, A origem do homem e a seleção sexual. Tradução de Eugênio Amado (Belo
Horizonte: Itatiaia, 2004).
11
Charles Darwin, The descent of man, and selection in relation to sex. In two volumes. Vol. I e Vol.
II (London: John Murray, 1871).
6
vergonha, timidez e modéstia. Ele apresentou descrições detalhadas de
expressões manifestadas mediante situações comportamentais por ele
observadas, ou relatadas por seus correspondentes, acompanhadas de figuras,
gravuras e fotografias, utilizadas como exemplos para reforçar seus argumentos.
12
Na resenha crítica de A expressão das emoções no homem e nos animais,
no ano que se seguiu à sua publicação, o naturalista Alfred Russel Wallace
13
comentou:
12
Para Steven Mithen, este foi um livro verdadeiramente notável, o primeiro que fez o uso da
fotografia como um auxílio para a argumentação científica e que começou o estudo sistemático da
emoção. (Steven J. Mithen, The singing neanderthals: the origins of music, language, mind and
body (London: Weidenfeld & Nicolson, 2005), 85).
13
Alfred Russel Wallace (1823-1913), nascido em Monmouthshire, País de Gales, foi um
naturalista, geógrafo e antropólogo britânico, que durante o período de extensa exploração, na
longa expedição que fizera, entre 1854 e 1862, para o Arquipélago Malaio (atualmente Indonésia e
Malásia), formulou de forma independente o princípio da seleção natural, o que teria levado
Charles Darwin a publicar sua própria teoria. O estímulo imediato para publicação de Darwin teria
sido um artigo escrito por Wallace intitulado On the tendency of varieties to depart indefinitely from
the original type (Sobre a tendência das variedades divergirem indefinidamente do tipo original)
enviado em 9 de março de 1858 e recebido por Darwin, segundo as evidências atuais, no terceiro
(ou quarto) dia de junho de 1858. O artigo de Wallace foi apresentado perante a Sociedade
Lineana de Londres juntamente com um excerto de um ensaio de Darwin sobre a seleção natural
em de julho de 1858. Antes da expedição ao Arqui pélago Malaio, Wallace já havia explorado de
1848 a 1852 a bacia amazônica, numa jornada que culminou na publicação de Palm trees of the
Amazon and their uses (Palmeiras da Amazônia e seus usos) e A narrative of travels on the
Amazon and Rio Negro, with an account of the native tribes, and observations on the climate,
geology, and natural history of the Amazon valley (Uma narrativa das viagens no Amazonas e no
Rio Negro, com um relato sobre as tribos indígenas, e observações sobre o clima, geologia e
história natural do vale do Amazonas), ambos em 1853. Entretanto, em 1845, depois de ler
Vestiges of the natural history of creation (Vestígios da historia natural da criação), de Chambers,
publicado no ano anterior, Wallace já havia se convertido à crença de que as espécies surgiam por
causa de leis naturais e não por ordem divina (Henry Lewis McKinney, “Wallace, Alfred Russel”.
Tradução de Carlos Almeida Pereira (Rio de Janeiro: Contraponto, 2007), 2579-2587).
7
O livro é admiravelmente ilustrado, tanto por xilogravuras como por
uma série de fotografias que representam as mais características
expressões. Está escrito com toda a clareza e precisão habitual do
autor, e embora algumas partes sejam um pouco maçantes, a partir
da quantidade de diminutos detalhes exigidos, no todo um tanto
de aguda observação e engraçada anedota, para talvez torná-lo mais
atraente para os leitores em geral, mais do que qualquer um dos
trabalhos anteriores do Sr. Darwin.
14
Para Wallace, nesta obra Darwin apresentou de modo sistematizado o
resultado de suas investigações sobre as causas dos fenômenos mais variados e
complexos apresentados pelos seres vivos, por meio do reconhecimento de todos
os fatores fisiológicos e psicológicos, da imensa variedade de movimentos
complexos e de diminutas contrações musculares, através da observação das
mais variadas paixões e emoções nos homens e nos animais. Ainda, segundo
Wallace, nada seria tão insignificante, para Darwin, que pudesse escapar à sua
inquieta curiosidade de criança de tudo notificar, ou tão comum, que não fizesse
com que buscasse incessantemente por uma explicação.
15
A intenção inicial de Darwin era publicar um ensaio sobre a expressão das
diversas emoções no homem e nos animais inferiores como o terceiro volume da
obra A origem do homem e a seleção sexual, publicada em 1871. Porém esta obra
acabou sendo publicada em apenas dois volumes. No primeiro volume deste livro
14
Alfred Russel Wallace, Review of The expression of the emotions in man and animals,
Quarterly Journal of Science 3 (1873), 118.
15
Ibid., 113.
8
defendeu a ascendência ou origem do homem, e no segundo volume discutiu os
princípios da seleção sexual, as características sexuais secundárias nas classes
inferiores do reino animal e as características sexuais secundárias de insetos,
peixes, anfíbios, répteis, aves, mamíferos e do homem. Darwin teria se
interessado pela expressão das emoções a partir da leitura que fizera anos antes
de uma obra do anatomista Charles Bell.
16
Nesta obra Bell afirmava que
determinados músculos no homem existiam somente para a expressão de suas
emoções. Como para Darwin essas idéias se opunham à hipótese de que o
homem fosse descendente de alguma outra forma inferior, como ele acreditava,
decidiu levá-las em consideração e proceder à sua análise.
17
Darwin comentou:
Meu livro Expression of the Emotions in Man and Animals foi
publicado no outono de 1872. Eu havia pretendido redigir apenas um
capítulo sobre esse assunto na Origem do homem mas assim que
comecei a organizar as anotações, percebi que ele exigiria um
tratado separado. (...) Meu primeiro filho nasceu em 27 de dezembro
de 1839. Comecei imediatamente a tomar nota do primeiro despontar
das diversas expressões que ele exibia, pois estava convencido,
nessa fase precoce, de que todas as formas mais complexas e
delicadas de expressão deviam ter uma origem gradativa e natural.
16
Sir Charles Bell (1774-1842), nascido em Edimburgo, foi um anatomista, cirurgião, fisiologista e
teólogo natural escocês. Prolífico autor e pesquisador, fez sua primeira publicação de estudos
detalhados do sistema nervoso e do cérebro, em 1811, em seu livro An idea of a new anatomy of
the brain (Uma idéia de uma nova anatomia do cérebro), onde descreveu suas experiências com
animais e distinguiu a diferença entre nervo sensorial e nervo motor. (From Wikipedia, the free
encyclopedia) Disponível em http://en.wikipedia.org/wiki/ Charles_Bell. Acesso em setembro de
2008.
17
Charles Darwin, The descent of man, and selection in relation to sex –Vol. I, 5; Charles Darwin, A
origem do homem e a seleção sexual, 11.
9
No verão do ano seguinte, 1840, li o admirável trabalho de Sir C. Bell
sobre a expressão, o que aumentou meu interesse pelo assunto,
embora eu não pudesse de maneira alguma concordar com sua
crença de que vários músculos teriam sido especialmente criados
para favorecer a expressão.
18
Com receio de ser acusado de invadir os domínios de outros autores,
19
Darwin fez questão de se defender lembrando que anunciara no livro A origem
do homem e a seleção sexual ter escrito parte deste outro livro e que suas
primeiras anotações sobre as observações das expressões datavam do ano de
1838. Nessa época ele aceitava a evolução orgânica, ou da origem das
espécies a partir de outras formas inferiores. Desde então passara a se dedicar ao
assunto.
20
18
Charles Darwin, Autobiography (London: Collins, 1958), 131-132; Charles Darwin, Autobiografia
(Contraponto: Rio de Janeiro, 2000), 114-115.
19
Os trabalhos mais antigos que consultou e que, segundo o próprio autor, não tiveram muita
validade, foram Conférences do pintor Le Brun, publicado em 1667, e Discours, publicado em
1774-1782 pelo anatomista holandês Camper. Os trabalhos Anatomy and Philosophy of Expression
(Anatomia e Filosofia da Expressão), 1806-1844, de Sir Charles Bell; Mécanisme de la
physionomie humaine (Mecanismo da fisionomia humana), do Dr. Duchenne, de 1862; as notas do
anatomista francês, Pierre Gratiolet, publicadas em 1865, após sua morte, com o título De la
physionomie et des mouvements d’expression (Sobre a fisionomia e os movimentos de expressão);
e, os princípios de psicologia (Principles of Psychology) de Herbert Spencer, que tratava dos
sentimentos em 1855, diferente dos antigos trabalhos que consultara, foram muito interessantes
para Charles Darwin e continham observações que lhe foram muito valiosas (Charles Darwin, The
expression of the emotions in man and animals, 1-9; Charles Darwin, A expressão das emoções no
homem e nos animais, 13-20).
20
Charles Darwin, The expression of the emotions in man and animals, 19-20; Charles Darwin, A
expressão das emoções no homem e nos animais, 28.
10
Darwin comentou sobre a dificuldade encontrada para detectar a origem
dos hábitos de expressão dos nossos sentimentos e a maneira pela qual eles
teriam sido adquiridos gradualmente através de certos movimentos musculares.
Ele sugeriu uma nova abordagem para este problema e uma explicação racional
para o estudo de cada expressão.
21
Mais tarde Darwin defendeu que somente avançaríamos na investigação
das possíveis causas da expressão a partir do momento em que deixássemos de
considerar o homem e todos os outros animais como criações independentes.
Para o naturalista inglês, somente aqueles que admitissem, a partir de uma nova
perspectiva, a evolução gradual da estrutura e dos hábitos de todos os animais e
que no passado remoto o homem tivesse existido sob uma forma mais inferior e
animalesca, poderiam compreender algumas das expressões nos humanos.
22
Ele
comentou:
Desejava igualmente investigar até que ponto as emoções seriam
expressas de maneira idêntica pelas diversas raças humanas.
Contudo, dada a extensão da presente obra, julguei mais prudente
reservar esse ensaio para uma publicação posterior em separado.
23
21
Charles Darwin, The expression of the emotions in man and animals, 19-20; Charles Darwin, A
expressão das emoções no homem e nos animais, 28.
22
Charles Darwin, The expression of the emotions in man and animals, 12-13; Charles Darwin, A
expressão das emoções no homem e nos animais, 21-22.
23
Charles Darwin, The descent of man, and selection in relation to sex –Vol. I, 5; Charles Darwin, A
origem do homem e a seleção sexual, 11.
11
Embora o Origem das espécies tenha sido objeto de muitos estudos, o
mesmo não se aplica ao Expressão das emoções no homem e nos animais. Um
levantamento bibliográfico na Isis Current Bibliography of the History of Science
indicou que poucos trabalhos publicados sobre este livro de Darwin. Mostrou
ainda que a maioria dos estudos que se referem ao conteúdo deste livro,
desenvolvidos até agora, estão mais voltados para a área da Psicologia do que
para a Biologia Evolutiva. Como não encontramos na ocasião deste levantamento
nenhum trabalho que fizesse a comparação a qual nos propusemos nesta
dissertação decidimos pela escolha da Expressão das emoções no homem e nos
animais. Além disso, esta obra é reconhecida como tendo contribuído para o
desenvolvimento do campo da Etologia no século XX. Esperamos que a presente
pesquisa possa contribuir para a historiografia da Evolução.
Esta dissertação é composta por esta introdução e por mais três capítulos.
O primeiro capítulo discutirá alguns dos mecanismos evolutivos propostos por
Darwin no livro Origem das espécies. No segundo capítulo, procuraremos
averiguar se no livro A expressão das emoções no homem e nos animais Darwin
utilizou os mesmos mecanismos que havia sugerido no livro Origem das espécies,
para justificar certos padrões de comportamento e a expressão das emoções no
homem e nos animais. O terceiro capítulo apresentará uma comparação entre os
mecanismos evolutivos propostos por Darwin nos livros Origem das espécies e A
expressão das emoções no homem e nos animais procurando averiguar suas
eventuais nuances e apontar suas principais semelhanças, além da apresentação
de algumas considerações finais que serão feitas sobre o assunto.
12
CAPÍTULO 1
MECANISMOS EVOLUTIVOS PROPOSTOS POR
CHARLES DARWIN NO LIVRO ORIGEM DAS ESPÉCIES
Neste capítulo comentaremos de forma breve sobre a formação e carreira
de Darwin, de seu contexto e daremos algumas informações sobre sua obra mais
conhecida: a Origem das espécies. Trataremos também dos principais meios
naturais de modificação das espécies conforme aparecem na sexta edição de sua
obra Origem das espécies.
1.1 CARREIRA E INTERESSES PROFISSIONAIS
Charles Robert Darwin, quinto dos seis filhos do médico Robert Waring
Darwin e de Susannah Wedgwood Darwin, que faleceu quando ele tinha apenas
oito anos de idade, nasceu na cidade de Shrewsbury, situada no oeste da
Inglaterra, em 12 de fevereiro de 1809. A família Charles se caracterizou pelas
boas condições intelectuais de seus membros, situação financeira privilegiada e
interesses culturais, o que serviu de estímulo para seus estudos científicos.
Darwin foi incentivado a trilhar a mesma carreira do pai e de seu avô, Erasmus
13
Darwin,
24
quando ainda adolescente, foi retirado da escola de Shrewsbury e
enviado, em 1825, à Universidade de Edimburgo para estudar medicina.
25
Em sua
autobiografia Darwin comentou:
Como eu não andava me saindo bem na escola, meu pai teve a
sensatez de me tirar de lá bem antes da idade costumeira, enviando-
me com meu irmão, em outubro de 1825, para a Universidade de
Edimburgo, onde permaneci dois anos, ou dois períodos. Meu irmão
estava terminando os estudos de medicina, embora eu não creia que
jamais tenha pretendido exercê-la.
26
Darwin permaneceu em Edimburgo até 1827, onde após experiência mal
sucedida e demonstração de falta de interesse pela medicina, abandonou os
estudos e retornou à Inglaterra. As pretensões de seu pai agora haviam se
modificado, e diante da necessidade de oferecer novas perspectivas ao filho,
matriculou o jovem Darwin, em janeiro de 1828, na Universidade de Cambridge,
com o intuito de prepará-lo para ingressar na Igreja Anglicana como pastor. Na
época, essa era uma posição social de destaque, tão valorizada quanto a
24
Erasmus Darwin (1731-1802) botânico e médico inglês deixou diversas publicações. Dentre elas,
Zoonomia or The Laws of Organic Life (Zoonomia ou Leis da Vida Orgânica), publicada em dois
volumes (1794 e 1796), resultado de um trabalho de vinte anos sobre medicina e ciências naturais.
Esta é considerada sua obra mais significativa. Nela o autor defendeu que a variação do ambiente
provoca uma resposta do organismo. (Cohen de Birkenhead. “Darwin, Erasmus. In: Charles
Coulston Gillispie (ed.), Dictionary of scientific biography (New York: Charles Scribner’s Sons,
1981), 577-581).
25
Gavin de Beer. “Darwin, Charles Robert”. In: Charles Coulston Gillispie (ed.), Dictionary of
scientific biography (New York : Charles Scribner’s Sons, 1981), 565-566.
26
Charles Darwin, Autobiography, 46; Charles Darwin, Autobiografia, 39-40.
14
profissão de médico, que possibilitaria a geração de rendimentos que permitiriam
uma vida confortável.
27
Darwin dedicou parte do seu tempo livre, em Edimburgo, para leituras em
Zoologia e História Natural. Foram possivelmente esses assuntos que fizeram com
que ele se aproximasse, em Cambridge, do reverendo e professor de Botânica,
John Stevens Henslow (1796-1861), de quem se tornou amigo muito próximo.
Para Nelio Bizzo, Henslow foi um grande incentivador que suscitou em Darwin, o
interesse pela história natural, e incentivou o desenvolvimento da observação
científica, ao mesmo tempo em que transmitia suas orientações para a ordenação
eclesiástica do jovem.
28
Mayr, ao comentar sobre o assunto, considerou que essa
teria se tornado, para Darwin, a mais importante, fecunda e significativa amizade
que fizera em sua passagem por Cambridge:
O acontecimento mais importante de sua vida em Cambridge foi a
amizade com o professor de botânica, o reverendo John Stevens
Henslow. Henslow, além de ser profundamente religioso, e
totalmente ortodoxo, era um naturalista ardente. Dele Darwin,
absorveu grande volume de conhecimentos sobre botânica,
entomologia, química, mineralogia e geologia.
29
27
Gavin de Beer. “Darwin, Charles Robert”. In: Charles Coulston Gillispie (ed.), Dictionary of
scientific biography, 565.
28
Nelio Bizzo, Darwin do telhado das Américas à teoria da evolução (São Paulo: Odysseus,
2002), 25.
29
Ernst Mayr, The Growth of Biological Thought: Diversity, Evolution, and Inheritance, 396; Ernst
Mayr, O Desenvolvimento do Pensamento Biológico: Diversidade, Evolução e Herança, 443.
15
Após concluir seus estudos em Cambridge, em abril de 1831, Darwin
recebeu um convite para ocupar uma vaga na qualidade de naturalista não
remunerado a bordo do navio inglês H.M.S. Beagle. Sua função era ser
acompanhante do jovem capitão da Marinha Britânica, Robert Fitzroy (1805-1865),
para que pudesse, com essa viagem, se aprofundar na sua carreira de naturalista.
A viagem a bordo do Beagle tinha como destino a América do Sul e nela seria feito
um levantamento cartográfico das costas da Patagônia, Terra do Fogo, Chile e
Peru; e visitaria algumas ilhas do Pacifico.
30
A viagem do Beagle foi sem dúvida um evento marcante na vida de
Darwin que teve importantes desdobramentos. Em uma das passagens em sua
autobiografia ele assim se expressou:
As glórias da vegetação dos trópicos erguem-se hoje em minha
lembrança de maneira mais vivida do que qualquer outra coisa. A
sublime sensação que senti vendo os grandes desertos da Patagônia
e as montanhas cobertas de florestas da Terra do Fogo deixaram
uma impressão indelével em minha lembrança. A visão de um
selvagem nu, em sua terra natal, é um acontecimento que nunca se
pode esquecer. Muitas de minhas excursões a cavalo ou de barco a
regiões agrestes, algumas das quais duraram várias semanas, foram
extremamente interessantes. Também não posso deixar de lado a
descoberta das relações singulares entre animais e plantas que
habitavam as várias ilhas do arquipélago de Galápagos e, entre
todos eles, os habitantes da América do Sul.
31
30
Gavin de Beer. “Darwin, Charles Robert”. In: Charles Coulston Gillispie, (ed.), Dictionary of
scientific biography, 565-566.
31
Charles Darwin, Autobiography, 80; Charles Darwin, Autobiografia, 69-70.
16
Atualmente, quando se fala sobre a viagem de Darwin ao redor do mundo
a bordo do Beagle, logo ela é associada à sua passagem pelo arquipélago de
Galápagos. Porém, Darwin, permaneceu apenas 35 dias nessas ilhas, numa
viagem que havia sido prevista, inicialmente, para dois anos, e que se estendeu
para quase cinco (1831-1836). Não devemos desconsiderar o valor das
observações que Darwin tenha feito no arquipélago das Ilhas de Galápagos, mas
tão, ou até mesmo, mais significativo do que essa sua passagem, foram suas
expedições terrestres em solo argentino e, principalmente, suas excursões Andes
adentro, em solo chileno. De acordo com Bizzo, foram essas excursões que
fizeram com que a teoria da formação geológica do planeta tivesse de ser
repensada.
32
Nas próprias palavras de Darwin:
Nessa viagem, tive a primeira formação ou educação verdadeira de
minha mente. Fui levado a prestar uma atenção rigorosa em vários
ramos da história natural e, com isso, aprimorei minha capacidade de
observação, embora ela já estivesse bastante desenvolvida. A
investigação de geologia de todos os lugares visitados foi muito mais
importante, pois nela entrou em jogo o raciocínio.
33
Durante o período da viagem de Darwin no Beagle a idade da Terra, de
acordo com o relato bíblico, era estimada em, aproximadamente, cinco mil anos.
Mas diante de uma floresta petrificada, mais de dois mil metros de altitude,
Darwin percebeu que esse cálculo teria de ser refeito. O tempo geológico
32
Nelio Bizzo, Darwin – do telhado das Américas à teoria da evolução, 137.
33
Charles Darwin, Autobiography, 76-77; Charles Darwin, Autobiografia, 66.
17
precisaria de muito mais que cinco mil anos para ter elevado os Andes e
fossilizado todo aquele bosque. Foi com o que Darwin se deparou nos Andes, em
março de 1835, após quilômetros de caminhadas pelas trilhas andinas, na região
de Uspallata, lado chileno da cordilheira, aproximadamente seis meses antes do
desembarque em Galápagos:
Uma floresta fossilizada de árvores in situ (isto é, que não veio
carregada de algum outro lugar) porque seus troncos se projetavam
mais de um metro perpendicularmente ao estrato no qual estavam
engastados. O próprio estrato estava recoberto por cerca de mil
metros de depósitos sedimentares que se alternavam com lavas
vulcânicas. Isto mostrou que as árvores tinham sido enterradas cerca
de mil metros abaixo do nível do mar à medida que os depósitos se
acumularam e tinham sido, desde então, erguidas até sua altura
atual. Esta era uma prova de extensa deposição, bem como de
elevação.
34
A teoria mais aceita na geologia, durante a primeira metade do século XIX,
era a do catastrofismo.
35
A teoria do catastrofismo defendia que as forças que
34
Gavin de Beer, “Darwin, Charles Robert”. In: Charles Coulston Gillispie (ed.), Dictionary of
scientific biography, 568.
35
Do ponto de vista dos catastrofistas, houve na historia da Terra uma sucessão de criações de
vida animal e vegetal. Cada criação sobrevivera durante um período de relativa tranqüilidade da
superfície da Terra, mas tinha sido depois destruída num catastrófico distúrbio e convulsão. A
história da Terra, portanto, incluiu períodos de tranqüilidade interrompidos por catástrofes, e cada
catástrofe foi seguida por uma nova criação. A teoria catastrófica da historia geológica foi
considerada compatível com a narrativa da criação na Bíblia: a catástrofe mais recente teria sido o
dilúvio de Noé. Muitos animais fósseis foram caracterizados como antediluvianos, ou anteriores ao
dilúvio. Os geólogos também supuseram que as sucessivas criações foram cada vez mais
Fig. 1 – Fotografia de Charles Darwin aos 33 anos de idade com seu filho mais velho, William
Erasmus Darwin que recebeu o nome em homenagem ao seu avô. Daguerreótipo original de
1842.
Obs.: Esta imagem é uma fiel reprodução fotográfica de domínio público porque seu direito autoral expirou.
18
produziram alterações no passado geológico da Terra agiram numa escala muito
maior que quaisquer outras que estivessem ativas hoje. Desta forma, para explicar
a elevação dos estratos sedimentares marinhos na formação das montanhas e
colinas e o seu deslocamento da posição horizontal para as posições inclinadas,
ou mesmo verticais, os geólogos defendiam duas explicações possíveis.
Considerando a sua origem como leitos de sedimentos depositados no fundo do
mar, uma das explicações defendia que o mar, que num determinado momento se
encontrava em um nível mais alto, teria se estendido por toda a superfície da
Terra, enquanto que a outra explicação possível considerava a elevação dos
estratos como responsável pela formação das colinas ou cordilheira de
montanhas. Porém, o custo dessas elevações seriam as grandes alterações na
superfície da Terra que determinariam mudanças na vida animal. Muitas espécies
não suportariam as convulsões geradas por tais mudanças e não teriam resistido.
Desta forma novas espécies seriam criadas para substituir as que se tornaram
extintas.
36
O ponto de vista catastrofista foi contestado em 1830 por Charles Lyell
(1797-1875) com a publicação dos seus Principles of Geology (Princípios de
geologia). Lyell defendia que os estratos teriam se elevado gradualmente do fundo
do mar, ao longo de um imenso período de tempo, por ações repetidas de
terremotos que persistiram por longos períodos, ao invés de terem se elevado a
partir de uma única convulsão. Quando zarpou a bordo do Beagle, Darwin, que
complexas e finalmente culminaram na criação do homem (Gavin de Beer, “Darwin, Charles
Robert”. In: Charles Coulston Gillispie (ed.), Dictionary of scientific biography, 567).
36
Gavin de Beer, “Darwin, Charles Robert”. In: Charles Coulston Gillispie, (ed.), Dictionary of
scientific biography, 566-567.
19
aparentemente não tinha nenhum motivo para colocar em dúvida o ponto de vista
aceito de que as espécies de plantas e animais vivos na Terra eram fixas, levou
com ele o primeiro volume dos Princípios de geologia, de Lyell.
37
Eu levara comigo o primeiro volume dos Princípios de geologia, de
Lyell, que estudei atentamente; esse livro prestou-me serviços
inestimáveis sob muitos aspectos. O primeiro lugar que examinei
mostrou-me com clareza a superioridade da maneira como Lyell
tratava a geologia, comparada à de qualquer outro autor cujos textos
eu tivesse comigo ou tenha lido deste então.
38
Segundo Janet Browne, essa leitura teria convencido Darwin de que as
idéias de Lyell estavam de acordo com os fatos que ele havia observado durante a
viagem:
Sem Lyell, pode-se dizer, não seria possível haver Darwin: nem a
intuição intelectual, nem a viagem do Beagle tal como é conhecida.
Os pensamentos de Darwin começaram a girar em torno da noção
de que pequenas mudanças conduzem a grandes efeitos. Com isso,
ele deu um dos mais importantes passos conceituais de sua jornada
pessoal. Para o resto da vida acreditou no poder de mudanças
pequenas e graduais. Mais tarde, ao trabalhar com a evolução, usou
37
Gavin de Beer. “Darwin, Charles Robert”. In: Charles Coulston Gillispie (ed.), Dictionary of
scientific biography, 567.
38
Charles Darwin, Autobiography, 77; Charles Darwin, Autobiografia, 67.
20
o mesmo conceito de pequenas mudanças cumulativas como chave
da origem das espécies.
39
O Beagle chegou a Falmouth, Inglaterra, em outubro de 1836, depois de
quase cinco anos no mar, numa das maiores viagens de exploração já realizadas:
Após meu retorno à Inglaterra, pareceu-me que, seguindo o exemplo
de Lyell na geologia e colecionando todos os dados que se
relacionassem de algum modo com a variação dos animais e plantas
domésticos encontrados na natureza, talvez fosse possível
esclarecer um pouco esse assunto.
40
Depois de seu retorno à Inglaterra, Darwin tornou-se amigo íntimo de Lyell.
Em 16 de abril de 1856, Darwin relatou sua teoria da seleção natural a Lyell que
insistiu em que ele escrevesse um livro expondo suas idéias de maneira completa
sobre o assunto. Porém, de acordo com o próprio Darwin, no início do verão de
1858, seus planos sofreram uma reviravolta após o recebimento de uma carta,
juntamente com um artigo, por parte de Wallace. Este também apresentava a
seleção natural como mecanismo de diversificação das espécies.
41
Darwin,
impressionado com a similaridade entre o conteúdo deste artigo de Wallace e
suas própria idéias, o enviou a Lyell juntamente com uma carta dizendo:
39
Janet Browne, A origem das espécies de Darwin: uma biografia. Tradução de Maria Luiza X. de
A. Borges (Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2007), 39-40.
40
Charles Darwin, Autobiography, 119; Charles Darwin, Autobiografia, 103.
41
Charles Darwin, Autobiography, 121; Charles Darwin, Autobiografia, 104-105.
21
Nunca vi coincidência tão marcante; se Wallace tivesse em mãos o
meu esboço manuscrito, assentado em 1842, não poderia ter feito
dele um melhor resumo!... assim, toda a minha originalidade, em
qualquer nível que for, será liquidada.
42
Gostaríamos de acrescentar que, neste intervalo com duração de mais de
vinte anos, entre sua chegada da viagem a bordo do Beagle (1836) e a publicação
do Origem das espécies (1859), Darwin escreveu vários livros onde tratou de
diversos assuntos. Entre fevereiro de 1838 e outubro de 1842, ele publicou um
extenso relato dos resultados zoológicos da viagem do Beagle, intitulado The
zoology of the voyage of H.M.S. Beagle, under the command of Captain FitzRoy,
R.N., during the years 1832 to 1836 (A zoologia da viagem do H.M.S. Beagle, sob
o comando do Capitão FitzRoy, durante os anos de 1832 a 1836). Esta obra está
dividida em cinco volumes bastante extensos. No primeiro, ele tratou de aspectos
geológicos a partir do estudo fóssil de mamíferos; no segundo discutiu sobre os
aspectos geográficos ao descrever os mamíferos observados; no terceiro dedicou
os seus estudos às aves; no quarto volume ele tratou dos peixes e no quinto
analisou a classe dos répteis.
43
No livro que publicou a seguir, Journal of researches into the geology and
natural history of the various countries visited by H.M.S. Beagle round the world,
under the Command of Capt. FitzRoy, R.N. (Diário de pesquisas sobre a geologia
42
Charles Darwin apud Ernst Mayr, The Growth of Biological Thought: Diversity, Evolution, and
Inheritance, 423; Charles Darwin apud Ernst Mayr, O Desenvolvimento do Pensamento Biológico:
Diversidade, Evolução e Herança, 473.
43
Charles Darwin, The zoology of the voyage of H.M.S. Beagle, under the command of Captain
FitzRoy, R.N., during the years 1832 to 1836 (London: Smith Elder & Co., 1838).
22
e a história natural dos vários países visitados pelo H.M.S. Beagle ao redor do
mundo, sob o Comando do Capitão FitzRoy), Darwin tratou de geologia e história
natural dos países visitados durante a viagem feita a bordo do Beagle.
44
Ainda dentro deste período que antecedeu a publicação do Origem das
espécies, Darwin passou a maior parte de seu tempo, de 1846 à 1852, num total
de oito anos, escrevendo os dois volumes da sua extensa monografia sobre os
cirrípedes.
45
Finalmente, pouco mais de 23 anos do seu retorno da viagem do Beagle,
no dia 24 de novembro de 1859, com tiragem inicial de 1.250 exemplares, Darwin
publicou o livro Origem das Espécies
46
onde defendia que o principal, mas não
exclusivo mecanismo de diversificação das espécies era a seleção natural:
É a essa preservação das variações favoráveis e à eliminação das
variações nocivas que denomino de Seleção Natural ou
Sobrevivência do Mais Apto. Quanto às variações que não são
vantajosas nem nocivas, essas não serão afetadas pela Seleção
Natural, permanecendo como uma característica oscilante, tais como
as que talvez se possam verificar nas espécies denominadas
polimorfas. (...) Mas se as variações úteis para um ser vivo qualquer
se apresentam algumas vezes, certamente os indivíduos que disso
44
Charles Darwin, Journal of researches into the geology and natural history of the various
countries visited by H.M.S. Beagle round the world, under the Command of Capt. FitzRoy, R.N.
(London: Henry Colburn, 1839).
45
Charles Darwin, A monograph of the sub-class Cirripedia, with figures of all the species. The
Lepadidae; or, pedunculated cirripedes. Vol. 1 (London: The Ray Society, 1851); Charles Darwin, A
monograph of the sub-class Cirripedia, with figures of all the species. The Balanidae, (or sessile
cirripedes); the Verrucidae. Vol. 2 (London: The Ray Society, 1854).
46
Charles Darwin, On the origin of species by means of natural selection, or the preservation of
favoured races in the struggle for life. 1st ed. (London: John Murray, 1859).
23
são objeto têm mais chances de vencer na luta pela sobrevivência
em função do princípio da hereditariedade. Por esse princípio os
indivíduos transmitem aos seus descendentes a mesma variação. A
isso denominei de Seleção Natural, ou seja, princípio de conservação
ou de persistência do mais capaz Esse princípio conduz ao
aperfeiçoamento de cada ser vivo em relação às condições
orgânicas e inorgânicas da sua existência.
47
A segunda edição do livro Origem das espécies, publicada em 7 de janeiro
de 1860, com tiragem de três mil exemplares, foi considerada a edição com o
maior número de exemplares impressos, maior do qualquer outra edição ou
publicação deste livro que tenha ocorrido durante a vida de Darwin. John Murray,
que foi o principal editor de Darwin, na Inglaterra, geralmente imprimia apenas
alguns milhares de cópias de cada vez, na maioria das vezes duas mil cópias. A
terceira edição surgiu em abril de 1861 com duas mil cópias impressas. A quarta
edição de 1866 foi de 1.500 exemplares. Nesta edição foi feita a correção da data
de publicação da primeira edição, de de outubro para 24 de novembro. Na
quinta edição de 1869, com 2.000 exemplares, Darwin utilizou pela primeira vez o
termo “sobrevivência do mais apto”, que aparece alterando o tulo do capítulo
IV, de Natural Selection (Seleção Natural) para Natural Selection; or the Survival of
the Fittest (Seleção Natural; ou a Sobrevivência do mais Apto).
48
47
Charles Darwin, The origin of species, 62-105; Charles Darwin, A origem das espécies (São
Paulo: Martin Claret, 2005), 143-196.
48
Charles Darwin, On the origin of species by means of natural selection, or the preservation of
favoured races in the struggle for life. 5th ed. (London: John Murray, 1869), 91.
Fig. 2 – Fotografia de Charles Darwin aos 59 anos de idade reproduzida da cópia negativa,
original tamanho 27,5 x 20,6 cm, de 1868, da inglesa Julia Margaret Cameron (1815-1879).
Obs.: Esta imagem é uma fiel reprodução fotográfica de domínio público porque seu direito autoral expirou.
24
A sexta edição do livro, que geralmente é considerada como sendo a
última, publicada em fevereiro de 1872, foi destinada a um público mais vasto e
impressa em um modelo menor dando a impressão geral de uma edição mais
barata. Nesta edição o título do livro foi alterado de Origin of species (Origem das
espécies) para The origin of species (A origem das espécies) e nele foi incluído
um novo capítulo (VII), Miscellaneous objections to the theory of natural selection
(Oposições diversas para a teoria da seleção natural). Este novo capítulo foi
incluído por Darwin para responder às críticas do biólogo católico George Mivart.
49
Outra novidade nesta edição é a ocorrência da palavra evolução. Palavra que na
realidade havia sido utilizada no ano anterior, em 1871, na introdução do livro
Origem do homem, antes dessa sua aparição, de 1872, na sexta edição do
Origem das espécies:
49
St George Jackson Mivart (1827-1900), nascido em Londres, foi um biólogo do Reino Unido que
recebeu o grau de Doutor em Filosofia pela Pope Pius IX em 1876, e de Doutor em Medicina pela
Universidade de Louvain, em 1884. Membro da Sociedade Lineana de 1862 e membro da
Sociedade Zoológica de Londres de 1869, foi eleito em 1867 membro da Sociedade Real de
Londres pelo seu trabalho On the Appendicular skeleton of the Primates (Sobre o esqueleto
apendicular dos primatas). Em 1871 publica Genesis of Species (Gênese das espécies), onde
expõe diversas objeções à teoria evolutiva proposta por Charles Darwin. Ele é famoso por começar
como um fervoroso adepto da seleção natural, que mais tarde se tornou um dos seus mais ferozes
críticos. Tentando conciliar a teoria da evolução de Darwin com as crenças da Igreja Católica, ele
acabou sendo condenado por ambas as partes. (From Wikipedia, the free encyclopedia) Disponível
em
http://en.wikipedia.org/wiki/St._George_Jackson_Mivart. Acesso em outubro de 2009. Sobre as
críticas de Mivart e as respostas de Darwin ver, por exemplo, Anna Carolina Krebs Pereira Regner,
“A polêmica Mivart versus Darwin: uma lição em refutar objeções”. In: Maria Elice B. Prestes, Lilian
A.-C. P. Martins e Waldir Stefano, Filosofia e História da Biologia 1 (São Paulo: Mack Pesquisa,
2006), 55-89.
25
Um grande número aceita o mecanismo da seleção natural; embora
alguns defendam que eu tenha exagerado a sua importância, mas
com justiça o futuro haverá de mostrar quem está com a razão.
Infelizmente, muitos naturalistas veteranos, e honrados, ainda se
opõem à evolução, sob qualquer forma que seja exposta.
50
O termo evolução, possivelmente, foi omitido nas edições anteriores para
evitar confusões com o uso da palavra, uma vez que na época o seu significado
era mais, particularmente, utilizado no sentido de descrever o desenvolvimento
ontogenético, ou seja, descrever a origem e o desenvolvimento de um organismo
desde o ovo fertilizado até sua forma adulta.
Somente durante o período de vida de Darwin o livro Origem das espécies
foi traduzido para um total de dez idiomas diferentes. As primeiras traduções, para
os idiomas neerlandês, russo e italiano, datam do ano de 1864. Na década de
1870 o livro foi traduzido para os idiomas alemão, sueco, polonês, húngaro,
francês, espanhol e sérvio. Na Inglaterra, Darwin pode ver seu o livro passar por
14 impressões, e re-impressões, sendo todas elas feitas em Londres. Ainda
durante o seu período de vida e ainda para o idioma inglês, foram feitas mais 22
impressões em Nova Iorque e uma impressão, em 1872, na Filadélfia. Sendo que
a primeira impressão fora da Inglaterra foi a de 1860, na cidade de Nova Iorque,
para um total de mais de 250 impressões em inglês até o final da década de 1970.
Encontramos ainda, neste levantamento, duas edições em braile de 1935
publicadas pelo Instituto Nacional para Cegos de Londres.
50
Charles Darwin, The descent of man, and selection in relation to sex –Vol. I, 2; Charles Darwin, A
origem do homem e a seleção sexual, 9. Ênfase nossa.
26
O pensamento predominante na época da publicação do livro Origem das
espécies, inclusive por parte dos teólogos naturais, era a crença geral de que as
espécies eram fixas e que haviam sido criadas por Deus adaptadas a seu
ambiente.
51
Entretanto, elas poderiam estar sujeitas à extinção. Caso isso
ocorresse, novas espécies seriam criadas. Porém, segundo Mayr, esse pacífico
cenário seria sacudido com a publicação, em 1844, de Vestiges of the natural
history of creation (Vestígios da história natural da criação), que devido ao seu
conteúdo, considerado herético para os padrões da época, foi publicado, como
precaução por parte do autor, no anonimato. O assunto foi colocado em questão e
as discussões foram intensas, sendo inclusive, especulado o nome de Darwin
como possível autor. O mistério permaneceu e somente em 1871, após a sua
morte, a identidade do autor foi revelada, como sendo de autoria do conhecido
editor escocês da Chambers' Encyclopedia (Enciclopédia Chambers), Robert
Chambers (1802-1871).
52
Mas, para Mayr:
O clima de opinião na Inglaterra era tão fortemente oposto à
evolução que nenhum naturalista levou Chambers realmente a rio.
Fazia-se necessário um esforço substancial para mudar o clima da
51
Ernst Mayr, The Growth of Biological Thought: Diversity, Evolution, and Inheritance, 403; Ernst
Mayr, O Desenvolvimento do Pensamento Biológico: Diversidade, Evolução e Herança, 451.
52
Ernst Mayr, The Growth of Biological Thought: Diversity, Evolution, and Inheritance, 381-383;
Ernst Mayr, O Desenvolvimento do Pensamento Biológico: Diversidade, Evolução e Herança, 427.
Sobre a visão evolucionista de Chambers ver, por exemplo, Marcelo Akira Hueda, As concepções
evolutivas no Vestiges of the natural history of creation (1844) de Robert Chambers e a proposta de
Lamarck: um estudo comparativo. [Dissertação de Mestrado]. São Paulo: PUC, 2009.
27
opinião, não os salpicos de um diletante como Chambers. E esse
esforço não se apresentou antes de 1859.
53
A década de 1870 seria marcada, na carreira do naturalista, por ter trazido
o homem para o seu plano principal de estudo, o que ele havia evitado por doze
anos desde a publicação do Origem das espécies. É sobre duas dessas obras,
publicadas nessa década, que iremos tratar nos próximos capítulos desta
dissertação: A Origem do homem (1871), e a Expressão das emoções no homem
e nos animais (1872). Porém, anteriormente, Thomas H. Huxley (1825-1895)
54
havia publicado em 1863 o livro Evidence as to Man's Place in Nature (Evidências
53
Ernst Mayr, The Growth of Biological Thought: Diversity, Evolution, and Inheritance, 385; Ernst
Mayr, O Desenvolvimento do Pensamento Biológico: Diversidade, Evolução e Herança, 431.
54
Thomas Henry Huxley (1825-1895), nascido na vila de Ealing, em Londres, foi um biólogo e
anatomista britânico que ficou conhecido como o “Bulldog de Darwin” pela defesa da sua teoria da
evolução. Huxley fez uso do termo "agnóstico" para descrever a sua própria opinião sobre a
teologia, um termo cujo uso se mantém até os dias atuais. Por quase uma década, seu trabalho foi
direcionado, principalmente, para a relação do homem com os macacos. Suas idéias sobre este
tema foram resumidas, em janeiro de 1861, na primeira edição de seu próprio jornal, a Natural
History Review (Revisão da História Natural), que foi reeditado, em 1863, como o argumento
central do segundo capítulo do seu livro Evidence as to Man's Place in Nature (Evidências quanto
ao lugar do homem na natureza). Porém, a maior parte do conteúdo do seu livro havia sido
apresentado ao público sob a forma de discursos orais e na forma de ensaios que foram
publicados em periódicos. Suas publicações em periódicos incluem: On the zoological relations of
man with the lower animals (Sobre as relações zoológica do homem com os animais inferiores) e
Man and the apes (Homem e os macacos), em 1861, e, The brain of man and apes (O cérebro do
homem e dos macacos) e On some fossil remains of man (Sobre alguns restos fósseis do homem),
de 1862. (From Wikipedia, the free encyclopedia) Disponível em
http://en.wikipedia.org/wiki/
Thomas_Henry_Huxley. Acesso em dezembro de 2009.
28
quanto ao lugar do homem na natureza),
55
onde apresentou evidências
anatômicas da origem do homem e dos macacos a partir de um ancestral comum:
Agora me proponho a apresentar os argumentos, e expor, de forma
inteligível, para aqueles que não possuem nenhum conhecimento
específico sobre a anatomia, os principais fatos sobre todas as
conclusões que, respeitando a natureza e a extensão do nculo que
liga o homem com o mundo bruto, devem ser baseadas: apontarei
uma conclusão imediata que, no meu julgamento, justifica-se por
esses fatos, e, finalmente, discutirei o rumo das conclusões sobre as
hipóteses que tenho considerado a respeito da origem do homem.
56
Nos seus últimos dez anos de vida, mesmo com a saúde debilitada, o que
restringia seu trabalho a quatro horas diárias, Darwin ainda encontrou motivação
para se dedicar a novas produções. Em 1875 estudou as plantas insetívoras.
57
No
ano seguinte lançou outro livro sobre plantas, abordando de forma geral os efeitos
da fecundação cruzada e da auto-fecundação no reino vegetal.
58
Em julho de 1877
Darwin publicou um trabalho técnico composto de vários artigos sobre as
diferentes formas de flores nas plantas da mesma espécie.
59
A seguir, publicou
uma versão ampliada de seu trabalho (1865) sobre trepadeiras.
60
O último livro de
55
Thomas Huxley, Evidence as to Man's Place in Nature (London: Williams & Norgate, 1863).
56
Thomas Huxley, Evidence as to Man's Place in Nature (New York: D. Appleton, 1863), 74.
57
Charles Darwin, Insectivorous plants (London: John Murray, 1875).
58
Charles Darwin, The effects of cross and self fertilisation in the vegetable kingdom (London: John
Murray, 1876).
59
Charles Darwin, The different forms of flowers on plants of the same species (London: John
Murray, 1877).
60
Charles Darwin, The power of movement in plants (London: John Murray, 1880).
29
Darwin foi publicado em outubro de 1881, seis meses antes de sua morte. O tema
dizia respeito às relações entre plantas e animais e formação dos solos.
61
Sobre
esse livro, Stephen Jay Gould (1945-2002), comentou:
Habitualmente, esperamos que na velhice, pouco antes de morrer,
um grande cientista escrever um tratado filosófico pontificando
sobre a natureza da realidade. Darwin não fez isso, escreveu sobre
minhocas. Darwin as usou como metáfora da importância de coisas
aparentemente minúsculas quando você as examina ao longo de
grandes períodos de tempo, e é isso que é evolução: a extensão de
pequenas mudanças ao longo de vastos períodos de tempo. Então
as minhocas se tornam uma metáfora da evolução e de todo o
processo de modificação temporal.
62
É importante diferenciar a proposta de Darwin sobre a qual trataremos
nesta dissertação do que se chama “Darwinismo”,
63
que não será objeto de estudo
desta dissertação.
61
Charles Darwin, The formation of vegetable mould, through the action of worms (London: John
Murray, 1881).
62
Stephen Jay Gould. “Perguntas irrespondíveis”. In: Kayzer, Wim. Maravilhosa obra do acaso:
para tentar entender nosso lugar no quebra-cabeça cósmico. Tradução de Marta de Senna (Rio de
Janeiro: Nova Fronteira, 1998), 93.
63
Para Martins, “um conceito adequado de “Darwinismo” deve considerar o trabalho de Darwin
como sendo ‘darwiniano’ de outro modo, dever-se-ia escolher um outro nome. Não deve excluir
todos os outros indivíduos do ‘Darwinismo – de outro modo, o nome não caracterizaria uma
tradição de pesquisa, mas a pesquisa de uma única pessoa. Não deve incluir todos os
evolucionistas e deveria ser visto como um tipo especial de visão evolutiva”. (Lilian Al-Chueyr
Pereira Martins, Materials for the study of variation de William Bateson: um ataque ao
darwinismo?”. In: Lilian A.-C. P. Martins, Anna Carolina K. P. Regner e Pablo Lorenzano (eds.).
Ciências da vida: estudos históricos e filosóficos (Campinas: AFHIC, 2006), 262).
Fig. 3 – Fotografia de Charles Darwin poucos meses antes de sua morte, tirada por Joseph
John Elliott e Edmund Clarence Fry (Elliott & Fry), em 29 de novembro de 1881.
Obs.: Esta imagem é uma fiel reprodução fotográfica de domínio público porque seu direito autoral expirou.
30
1.2 ALGUNS MECANISMOS EVOLUTIVOS PROPOSTOS
POR DARWIN NA ORIGEM DAS ESPÉCIES
Segundo Darwin, as espécies vivas (animais, incluindo o homem e
plantas) não foram criadas como se apresentam atualmente, mas são
descendentes de espécies extintas e de ancestrais comuns que foram modificados
por causas naturais. A principal dessas causas é a seleção natural que consiste
em um processo semelhante ao da seleção artificial que é feita pelos criadores de
animais ou aqueles que se dedicam a produzir variações nas plantas ornamentais
com intuito de produzir novas variedades e raças. A seleção natural, segundo
Darwin, preserva as variações que são úteis e adaptativas, agindo sobre variações
leves que ocorrem ao acaso. Como nem todo o indivíduo que nasce é capaz de
sobreviver e deixar descendentes, pois existem restrições de espaço e alimento,
ocorre uma luta pela existência. Nessa luta sobrevivem aqueles que apresentam
vantagens leves sobre seus companheiros. São eles que podem deixar
descendentes. Como os aspectos úteis são hereditários,
64
eles são transmitidos
aos descendentes, o que conduz a uma modificação gradual da população.
65
Além da seleção natural, Darwin propôs outras causas naturais para a
modificação das espécies, como a seleção sexual, por exemplo. Esta poderia
64
Para explicar a hereditariedade Darwin propôs a hipótese da pangênese. Ver a respeito em
Luzia Aurélia Castañeda, As idéias pré mendelianas da herança e sua influência na teoria da
evolução de Darwin. [Tese de doutorado]. Campinas: UNICAMP, 1992; Andreza Polizello, Modelos
microscópicos de herança no século XIX: a teoria das estirpes de Francis Galton. [Dissertação de
Mestrado]. São Paulo: PUC, 2009, capítulo 2.
65
Lilian Al-Chueyr Pereira Martins, Materials for the study of variation de William Bateson: um
ataque ao darwinismo?”, 263-264.
31
explicar a beleza e as características sexuais secundárias do macho, através da
escolha da fêmea. Ou seja, a fêmea escolheria os machos mais atraentes para se
acasalar, deixando descendentes, como no caso do pavão, por exemplo. Outra
possibilidade seria a luta entre os machos pela posse da fêmea em que o macho
mais bem equipado venceria deixando descentes. Nas palavras de Darwin:
Espécie de seleção que não depende da luta pela sobrevivência,
mas sim da luta travada pelos machos pela posse das fêmeas. Essa
luta não termina com a morte do derrotado, mas sim pela redução
parcial ou total de seus descendentes. Concluímos, portanto, que a
Seleção Sexual é menos rigorosa que a Seleção Natural. Os machos
mais vigorosos e melhor adaptados ao lugar que ocupam na
natureza deixam maior número de descendentes. (...) A seleção
sexual desenvolve também nos machos alguns caracteres que lhes
são úteis em suas rivalidades ou nas lutas com outros machos.
Esses caracteres podem ser transmitidos somente a um sexo ou aos
dois de acordo com a forma da hereditariedade predominante na
espécie.
66
Como exemplo de seleção sexual, Darwin falou sobre um par de chifres
que pudesse ser utilizado por um veado para ferir o oponente durante um combate
que envolvesse confronto direto na disputa pela posse da fêmea. Outro exemplo
utilizado por Darwin, foi a exibição das esplêndidas plumagens dos machos dos
tordos-da-guiana e das aves-do-paraíso, para a contemplação por parte das
fêmeas, que no final escolhem para si o parceiro mais atraente.
67
66
Charles Darwin, The origin of species, 103; Charles Darwin, A origem das espécies, 194.
67
Charles Darwin, The origin of species, 69-70; Charles Darwin, A origem das espécies, 151.
32
Além disso, Darwin considerava a herança de caracteres adquiridos pelo
uso e desuso, inclusive herança direta de mutilações não necessitando que elas
ocorressem em ambos os progenitores. No caso dos animais subterrâneos ele
utilizou como exemplo o tamanho reduzido dos olhos das toupeiras para discutir
os efeitos o uso e do desuso quando atribuiu essa perda totalmente ao desuso.
68
A mudança de hábito também teria influência decisiva na produção dos efeitos
hereditários como, por exemplo, nas observações que fizera das modificações que
sofrera o pato doméstico em comparação ao pato selvagem. Acreditava que em
razão do uso e do desuso; pelo fato do pato doméstico voar menos e andar muito
mais que seu antepassado selvagem; os ossos das suas asas teriam ficado mais
leves e os ossos das suas pernas mais pesados, em relação ao peso total de seus
esqueletos.
69
Dessa forma, o uso e o desuso, a seleção sexual, ou ainda outras
suposições auxiliares, foram buscadas como explicações, para justificar as
características conhecidas dos seres vivos, sempre que alguns casos especiais
resistissem inicialmente às explicações através da seleção natural, a principal
causa da transformação, uma causa importante como fator na evolução, mas não
como a sua causa exclusiva.
70
68
Ernst Mayr, One Long Argument: Charles Darwin and the Genesis of Modern Evolutionary
Thought (Cambridge, MA: Harvard University Press, 1991), 109; Ernst Mayr, Uma Ampla
Discussão: Charles Darwin e a Gênese do Moderno Pensamento Evolucionário (Ribeirão Preto,
SP: FUNPEC, 2006),109.
69
Charles Darwin, The origin of species, 8; Charles Darwin, A origem das espécies, 74.
70
Lilian Al-Chueyr Pereira Martins, Materials for the study of variation, de William Bateson: um
ataque ao darwinismo?”, 266.
33
Atualmente se aceita que durante milhões de anos a América do Sul foi um
continente isolado cercado por oceanos. Não havia surgido o Istmo do Panamá e
a América do Sul e América do Norte eram terras isoladas. O soerguimento da
América Central e o Istmo do Panamá, causado pelo movimento de aproximação
da América do Sul da América do Norte, na continuidade da Deriva Continental, há
aproximadamente dois milhões de anos, fez surgir uma ponte terrestre unindo os
dois continentes e permitindo a migração em ambos os sentidos. Este evento
favoreceu as modificações nas faunas originais através deste intercâmbio
faunístico e, ao mesmo tempo, contribuiu para a manutenção do caráter endêmico
da fauna marinha do Arquipélago das Ilhas Galápagos ao isolar suas espécies das
encontradas no Caribe e ao impedir a livre migração das espécies encontradas no
lado ocidental das América do Sul e Central.
71
O próprio Darwin já havia observado a importância das barreiras geológicas
como obstáculos que, ao se oporem à livre migração, estabeleceriam uma relação
íntima direta com as diferenças entre as produções das diversas regiões. Neste
caso, o Istmo do Panamá funcionaria como um obstáculo intransponível que ao
separar essas duas grandes faunas marinhas as teria modificado de forma
significativa fazendo com que dificilmente nos deparássemos com peixes,
moluscos ou crustáceos comuns aos dois litorais.
72
71
Departamento da Diversidade Socioambiental da Biblioteca da Floresta Marina Silva. Governo
do Estado do Acre. A deriva continental. Texto adaptado por Alceu Ranzi tendo por base o livro
“Quando o Rio Amazonas corria para o Pacífico”, autoria de Evaristo Eduardo de Miranda, Editora
Vozes. Disponível em:
http://www.bibliotecadafloresta.ac.gov.br/biblioteca/docs_expo/Deriva4.pdf.
Acesso em: dezembro de 2007.
72
Charles Darwin, The origin of species, 317-318; Charles Darwin, A origem das espécies, 447.
34
Porém, ultrapassar barreiras durante o processo de migração na conquista
de novos territórios ou encontrá-las como obstáculos intransponíveis que impeçam
a emigração e determinem o isolamento não seriam suficientes para modificar
uma espécie uma vez que:
Caso algumas espécies que tenham estado em luta pela existência,
concorrendo diretamente entre si, migrem em conjunto para alguma
região isolada, isto não as tornará passiveis de modificação, uma vez
que nem a migração nem o isolamento podem fazer a este respeito.
Esses princípios entram em ação apenas quando os organismos são
levados a estabelecer novas relações entre si, e em menor grau com
as condições físicas do ambiente.
73
De acordo com Darwin, a modificação e a difusão de uma nova espécie não
ocorreriam, simplesmente, pela ultrapassagem de uma barreira, mas,
predominantemente, pelas vitórias que pudesse obter nesses novos e distantes
territórios na luta pela sobrevivência que seria travada contra os rivais que
fossem encontrados, ou seja, com a ão da seleção natural.
74
A luta pela
sobrevivência que poderia ocorrer tanto entre os indivíduos da mesma espécie,
como entre os indivíduos da mesma espécie e os indivíduos de espécies distintas,
ou ainda uma luta dos indivíduos com as condições adversas de vida existentes
em seu meio.
75
73
Charles Darwin, The origin of species, 319; Charles Darwin, A origem das espécies, 449.
74
Charles Darwin, The origin of species, 358; Charles Darwin, A origem das espécies, 493.
75
Charles Darwin, The origin of species, 50; Charles Darwin, A origem das espécies, 126.
35
Recapitulando, o principal mecanismo de modificação das espécies seria a
seleção natural que atuaria sobre as leves variações contínuas que aconteciam ao
acaso e fossem úteis para o indivíduo. Essas variações eram transmitidas aos
descendentes. Como nem todo o indivíduo que havia nascido podia sobreviver
devido às restrições de alimento e espaço, na luta pela existência eram
preservados os indivíduos que apresentassem vantagens leves sobre seus
companheiros. Eles teriam uma maior probabilidade de sobrevivência e de se
reproduzir. Como esses aspectos eram hereditários, seriam transmitidos aos
descendentes, o que conduziria a uma modificação gradual da população. Além
da seleção natural, Darwin admitia outras causas naturais para modificação
espécies, tais como, a herança das características obtidas pelo uso e desuso; a
seleção sexual para dar conta das características sexuais secundárias; a seleção
artificial utilizada por criadores de animais domésticos, e plantas cultivadas, na
produção de novas variedades e raças. Esses seriam os principais meios de
modificação das espécies que aparecem no Origem das espécies.
76
Serão esses
mecanismos que iremos considerar em nossa pesquisa, procurando analisar como
eles comparecem no livro A expressão das emoções no homem e nos animais.
76
Lilian Al-Chueyr Pereira Martins, “Materials for the study of variation, de William Bateson: um
ataque ao darwinismo?”, 264.
36
CAPÍTULO 2
MECANISMOS EVOLUTIVOS PARA A FORMAÇÃO DE
PADRÕES DE COMPORTAMENTO E A EXPRESSÃO DAS
EMOÇÕES NO HOMEM E NOS ANIMAIS
Neste capítulo analisaremos as duas obras onde Darwin tratou de questões
relacionadas ao ser humano: A expressão das emoções no homem e nos animais
(1872) e A origem do homem (1871). Nesta última, ele lidou com a ascendência
ou origem do homem.
Darwin estava ciente das dificuldades envolvidas no estudo da expressão
no homem, que os movimentos eram, muitas vezes, bastante sutis e de curta
duração. Outro problema que ele apontou consistia em determinar até que ponto
as mudanças de traços ou gestos expressavam realmente determinados estados
de espírito. Nesse sentido, ele propôs que seria possível obter esclarecimentos
sobre o assunto através da observação de crianças, que mostravam diferentes
emoções; dos loucos, que mostravam suas paixões de forma descontrolada; da
consulta a pessoas cultas de ambos os sexos e de diferentes idades, pois isso
diminuiria a possibilidade de cometer enganos no reconhecimento de alguns tipos
de expressões; de fotografias e gravuras de grandes mestres da pintura e
escultura; de gestos e expressões de raças humanas que tinham tido pouco
37
contato com os europeus; das diversas expressões nos animais mais comuns.
Darwin acreditava que a adoção desses procedimentos evitaria que o observador
fosse levado pela imaginação e, ao mesmo tempo, proporcionaria uma base mais
segura para se fazer uma generalização das causas dos movimentos de
expressão.
77
Para o estudo das expressões e gestos nas raças humanas de nativos ao
redor do mundo, em 1867, Darwin divulgou um folheto impresso intitulado Queries
about expression (Questões sobre a expressão). Neste ele apresentou uma série
de questões que havia elaborado e o enviou para pessoas que estavam em
contato com povos primitivos em diferentes regiões do mundo, tais como,
missionários ou protetores de aborígines. Recebeu desses últimos um total de 36
respostas, que considerou valiosas devido às circunstâncias em que foram
obtidas. As respostas ao seu questionário sobre a expressão foram essenciais
para a elaboração da Expressão das emoções no homem e nos animais, onde
elas foram reproduzidas. Eram elas:
1. Exprime-se a surpresa pelo arregalar dos olhos e da boca e pela
elevação das sobrancelhas?
2. A vergonha produz enrubescimento, quando a cor da pele nos
permite percebê-lo? Se sim, até onde desce pelo corpo?
3. Quando um homem está indignado ou desafiador, ele franze o
cenho, mantém cabeça e corpo erguidos, apruma os ombros e cerra
os punhos?
77
Charles Darwin, The expression of the emotions in man and animals, 14-18; Charles Darwin, A
expressão das emoções no homem e nos animais, 22-27.
38
4. Quando se concentra ou tenta resolver algum problema, ele franze
o cenho ou enruga a pele abaixo das pálpebras inferiores?
5. Quando abatido, desce os cantos da boca e eleva a extremidade
interna das sobrancelhas pela ação desse músculo que os franceses
apelidaram de “músculos de sofrimento”? Nesse estado as
sobrancelhas fazem-se levemente oblíquas, com um pequeno
inchaço em sua extremidade medial; e o meio da testa fica enrugado,
não toda a sua extensão, como quando se elevam as sobrancelhas
exprimindo surpresa?
6. Quando satisfeito, brilham seus olhos, enruga-se a pele em volta
destes e retraem-se os cantos da boca?
7. Quando um homem olha para outro com desprezo ou ironia,
ergue-se o canto do lábio superior por sobre o canino do lado pelo
qual ele o está encarando?
8. Pode uma expressão de obstinação e tenacidade ser reconhecida
principalmente pela boca firmemente fechada, pelo cenho baixo e
pelas sobrancelhas levemente franzidas?
9. O desdém é exprimido por uma leve protrusão dos lábios e
discreta expiração com o nariz empinado?
10. Manifesta-se o nojo virando-se o lábio inferior para baixo e
elevando-se levemente o lábio superior com uma bita expiração,
como um vomitar incipiente ou cuspir?
11. O medo extremo é expresso aproximadamente da mesma
maneira que o fazem os europeus?
12. O riso pode chegar ao extremo de fazer com que lacrimejem os
olhos?
13. Quando um homem quer demonstrar que não pode impedir algo
ou que ele mesmo não consegue fazer alguma coisa, ele encolhe os
ombros, vira para dentro os cotovelos e estende as mãos para fora
com as palmas abertas; e as sobrancelhas são erguidas?
39
14. As crianças, quando emburradas, fazem bico ou protraem
fortemente os lábios?
15. Expressões de culpa, malícia ou ciúme podem ser reconhecidas,
ainda que eu não consiga defini-las?
16. Balança-se a cabeça verticalmente na afirmação e
horizontalmente na negação?
78
Darwin esclareceu quais seriam as observações mais valiosas para ele:
A observação de nativos que tiveram pouco contato com os
europeus seria, é claro, a mais preciosa, embora a observação de
qualquer nativo seja de grande interesse para mim. Informações
genéricas sobre as expressões são comparativamente de pouca
valia; e a memória é tão enganosa que eu sinceramente peço que
não se confie nela. Uma descrição precisa do semblante relacionado
a uma dada emoção ou estado de espírito, determinando as
circunstancias em que este apareceu, seria de grande valia.
79
Outra versão das Questões sobre a expressão foi publicada em Notas e
questões para a China e o Japão, em uma nota intitulada Sinais de emoção entre
os chineses, com data de julho de 1867, e assinada pelo conhecido naturalista e
ornitólogo britânico, Robert Swinhoe (1836-1877). Este era vice-cônsul em
Formosa. Essa versão é consideravelmente diferente da versão do folheto inglês,
impressa no livro Expressão das emoções no homem e nos animais, e citada logo
78
Charles Darwin, The expression of the emotions in man and animals, 16-17; Charles Darwin, A
expressão das emoções no homem e nos animais, 24-26.
79
Charles Darwin, The expression of the emotions in man and animals, 16-17; Charles Darwin, A
expressão das emoções no homem e nos animais, 24-26.
40
acima. A diferença consiste no fato de conter uma questão a mais, dezessete em
vez de dezesseis, e por cinco perguntas (2, 5, 7, 10 e 13) estarem mais curtas,
além de pequenas diferenças de letra e arranjo. A questão ausente no folheto
inglês é a questão de número 16, que trata sobre vocalização em vez de
expressão: “Como um sinal para ficar calado é um suave assobio proferido?”. O
nome de Darwin não aparece explicitamente nesta publicação. Ele é descrito para
os leitores como "um amigo na Inglaterra” que deseja que as informações do
questionário sejam aplicadas às expressões exibidas em várias emoções pelos
chineses ou por qualquer outra raça estranha.
80
Como fazia habitualmente em suas obras anteriores, Darwin deu crédito a
seus colaboradores, expressando sua gratidão pelas informações recebidas. De
um desses colaboradores, o Sr. Wilson, ele recebeu treze conjuntos de respostas
sobre os aborígines australianos, principalmente, de observações que foram feitas
nas regiões mais afastadas, ao sul da colônia de Victoria. Darwin elogiou as
observações que foram feitas pelo reverendo J. W. Stack
81
sobre os maoris da
Nova Zelândia pela sua clareza, complexidade e precisão. O naturalista inglês
mencionou ainda as observações dos daiaques de Bornéu que haviam sido feitas
80
Charles Darwin, Queries about Expression. In: Swinhoe, Robert. Signs of emotion amongst the
Chinese. Notes and Queries on China and Japan 1 (31 August): 105. 1867.
81
James West Stack (1835-1919), nascido em uma vila Maori, no distrito de Thames, na Nova
Zelândia, foi um missionário, pastor, escritor e intérprete que publicou uma série de artigos sobre
os maoris, com destaque para South Island Maoris: a sketch of their history and legendary lore
(Ilhas Maoris do Sul: um esboço da sua história e tradição lendária), de 1898. Disponível em
http://www.dnzb.govt.nz/DNZB/alt_essayBody.asp?essayID=1S21. Acesso em dezembro de 2009.
41
pelo rajá James Brooke.
82
Através de contato com Frederick Geach,
83
intermediado por Wallace, Darwin obteve informações esclarecedoras sobre os
nativos malaios que nunca haviam feito contato com homens brancos.
84
Por outro
lado, o mesmo não aconteceu em relação às informações recebidas a partir das
observações feitas pelo senhor H. Erskine, no distrito de Ahmednugur, em
Bombaim, na Índia. Isso se deveu ao fato, dos indianos não expressarem suas
emoções diante de europeus. Erskine comentou:
Habitualmente os nativos se comportam muito bem na presença de
europeus de modo que não temos oportunidades favoráveis para a
sua observação. O fato é que os nativos raramente são naturais
diante dos europeus (salvo uma exceção, que pode ser feita no caso
dos nativos europeizados), eles estão sempre tentando agradar ou
decidem ser mal-humorados! Em todas as situações eles são sempre
reservados.
85
82
Sir James Brooke (1803-1868), nascido em Secrore, um subúrbio de Benares, na Índia, foi o
primeiro Rajá Branco do Reino de Sarawak. O Reino de Sarawak foi um estado-nação em Bornéu
estabelecido por Brooke, em 1842, recebendo o status de reino independente do Sultanato de
Brunei, como recompensa por ajudar a combater a pirataria e a insurgência. (From Wikipedia, the
free encyclopedia) Disponível em
http://en.wikipedia.org/wiki/James_Brooke. Acesso em dezembro
de 2009.
83
Frederick F. Geach, foi um engenheiro de minas, que encontrou Alfred Russel Wallace, em
Timor-Leste, em 1861, e desde então, tornou-se um dos seus amigos mais próximos. Disponível
em
http://piclib.nhm.ac.uk/piclib/www/image.php?img=73948. Acesso em dezembro de 2009.
84
Charles Darwin, The expression of the emotions in man and animals, 20-22; Charles Darwin, A
expressão das emoções no homem e nos animais, 28-30.
85
Carta 5663, de Erskine, H.N.B. para Wedgwood, F.J., em 01 de novembro de 1867. Disponível
em
http://www.darwinproject.ac.uk/entry-5663. Acesso em dezembro de 2009.
42
A observação precisa feita curador do Jardim Botânico de Calcutá, J. Scott,
foi elogiada por Darwin. No que se refere aos negros africanos, Darwin considerou
que as informações que recebera de Winwood Reade
86
não foram de grande valia,
apesar de reconhecer o esforço deste colaborador.
87
Do continente americano Darwin recebeu algumas respostas sobre as
expressões dos fueguinos enviadas pelo catequizador Bridges. Na metade norte
do continente americano Rothrock observou as expressões das tribos selvagens
dos atnah e espyox, do Noroeste americano. Outro colaborador, cujas respostas
foram valiosas para Darwin, foi o médico assistente do Exército dos Estados
Unidos, Washington Matthews,
88
que fizera observações em algumas tribos
86
William Winwood Reade (1838-1875) foi um historiador escocês, explorador e filósofo. Nascido
em Perthshire, na Escócia, aos 23 anos de idade partiu para a África, chegando em Gabão de
barco a vapor, em 1862. Após vários meses de observação de gorilas e uma passagem por
Angola, voltou para casa e publicou seu primeiro relato de viagem, Savage África (África
Selvagem). Retornou à África Ocidental em 1868, e na sua volta publicou African Sketch-Book
(Caderno de Esboços da África), em 1873. No ano anterior (1872) havia publicado The Martyrdom
of Man (O Martírio do Homem) onde tentou traçar o desenvolvimento da civilização ocidental em
termos análogos aos utilizados nas ciências naturais. Reade era um ateu que atacava a religião
tradicional e a moralidade, e um darwinista social que acreditava na sobrevivência do mais apto e
queria criar uma nova civilização. (From Wikipedia, the free encyclopedia) Disponível em
http://en.wikipedia.org/wiki/William_Winwood_ Reade. Acesso em dezembro de 2009.
87
Charles Darwin, The expression of the emotions in man and animals, 22-23; Charles Darwin, A
expressão das emoções no homem e nos animais, 30-31.
88
Washington Matthews nascido em Killiney, perto de Dublin, Irlanda em 1843, foi um cirurgião,
etnógrafo, lingüista e conhecido pelos seus estudos dos povos nativos americanos, especialmente
os Navajo. Estudos que resultaram nas publicações de The Mountain Chant: A Navajo Ceremony
(O Canto da Montanha: Uma Cerimônia Navajo), em 1887; Navajo legends (Lendas Navajo), no
ano de 1897; e Navajo Myths, Prayers, and Songs (Mitos, Orações e Canções Navajo), 1907.
Como cirurgião integrou o Exército dos Estados Unidos, onde atuou como voluntário na Guerra
Civil Americana (1861-1865). (From Wikipedia, the free encyclopedia) Disponível em
http://en.wikipedia.org/wiki/Washington_Matthews. Acesso em dezembro de 2009.
43
selvagens do Oeste americano. Além das ter utilizado as respostas de todos
esses colaboradores, Darwin explicou que havia procurado responder o
questionário tomando como base informações contidas em livros de viagens de
outros exploradores.
89
No primeiro volume do livro A origem do homem e a seleção sexual, que foi
publicado antes da Expressão das emoções no homem e nos animais, ao
apresentar argumentos que eram favoráveis à descendência do homem a partir de
formas inferiores, Darwin chamou a atenção para o fato de que certas expressões
de felicidade demonstradas por filhotes de cães, de gatos e de carneiros, eram
idênticas às expressões exibidas pelas nossas próprias crianças ao brincarem
juntas.
90
Neste mesmo volume considerou o terror como responsável pelas
manifestações fisiológicas que provocam tremor nos músculos, palpitações do
coração e arrepio no cabelo, tanto no homem, como na maioria dos animais
selvagens. No ano seguinte dedicou um capítulo de A expressão das emoções no
homem e nos animais para tratar do terror e medo como emoções sentidas pelo
homem e pelos animais inferiores.
91
Darwin comentou sobre a expressão de uma série de emoções que podiam
ser detectadas tanto em diferentes animais como no homem. Ele deu vários
89
Charles Darwin, The expression of the emotions in man and animals, 23; Charles Darwin, A
expressão das emoções no homem e nos animais, 31.
90
Charles Darwin, The descent of man, and selection in relation to sex –Vol. I, 39; Charles Darwin,
A origem do homem e a seleção sexual, 32.
91
Charles Darwin, The descent of man, and selection in relation to sex –Vol. I, 39-40; Charles
Darwin, A origem do homem e a seleção sexual, 33.
44
exemplos tais como: o mal-humor e a boa disposição de cães e cavalos; a
tendência a manifestar fúria por parte de certos animais; a vingança arquitetada
por diversos animais; o amor e o carinho de um cão para com o seu dono na
agonia da morte; a afeição materna das fêmeas de todas as espécies; a dor
intensa das macacas pela perda dos filhotes; a adoção de macacos órfãos por
outros do bando; a generosidade de certas fêmeas de babuínos ao adotarem
macacos de outras espécies, além de roubarem cãezinhos e gatinhos para criar. A
partir desses exemplos que aparecem em A origem do homem e a seleção sexual,
Darwin argumentou que o princípio da sua ação seria o mesmo tanto no homem
como nos animais. Outras expressões de emoções como terror e medo seriam
abordadas mais tarde em capítulos do seu livro dedicado ao estudo da expressão
das emoções.
92
Na mesma obra, Darwin comparou as feições humanas com aquelas dos
macacos antropóides, percebendo que havia várias semelhanças em relação aos
movimentos dos músculos da face ao expressar as emoções. Ele explicou:
As diversas emoções são manifestadas por movimentos quase
similares dos músculos e da pele, especialmente acima das
sobrancelhas e ao redor da boca; algumas dessas expressões
chegam a ser praticamente as mesmas, como o choro de certos tipos
de macacos e a risada de outros, durante a qual os cantos da boca
são repuxados para trás e as pálpebras franzidas.
93
92
Charles Darwin, The descent of man, and selection in relation to sex –Vol. I, 40-41; Charles
Darwin, A origem do homem e a seleção sexual, 33.
93
Charles Darwin, The descent of man, and selection in relation to sex –Vol. I, 191; Charles
Darwin, A origem do homem e a seleção sexual, 129.
45
Darwin comentou que esperava mostrar em sua próxima obra (Expressão
das emoções no homem e nos animais), que devido à grande semelhança entre
as expressões faciais e os gritos inarticulados emitidos pelo homem e animais
quando expostos às mesmas condições, essas características teriam sido
provavelmente adquiridas como herança de alguma forma silvestre de parentesco
próximo. Este fato estava de acordo com sua tese da descendência de um
ancestral comum.
94
O naturalista destacou a importância da música na manifestação das mais
variadas emoções, com exceção do terror e da raiva. A seu ver, de um modo
geral, ela despertaria nos seres humanos sentimentos de ternura, amor, ou
mesmo devoção. Esse sentimento seria comparável ao efeito provocado pelo
canto de algumas aves machos em suas fêmeas. O aumento da intensidade
desse canto consistiria em uma tentativa de cativar uma fêmea que estivesse
sendo disputada com um outro macho.
95
Para Darwin, a manifestação do susto nos adultos, após escutarem um
barulho repentino, viria acompanhada pelo piscar dos olhos quando este estímulo
fosse transmitido pelos nervos auditivos. No entanto, ao observar seus filhos com
menos de quinze dias notou que apesar de se assustarem com barulhos
inesperados quase nunca piscavam, mesmo quando ele balançou diante dos
olhos de um dos seus filhos uma caixa de papelão. Porém, quando colocou alguns
doces na caixa e repetiu o gesto na mesma posição chocalhando-a diante do bebê
94
Charles Darwin, The descent of man, and selection in relation to sex –Vol. I, 232-233; Charles
Darwin, A origem do homem e a seleção sexual, 155-56.
95
Charles Darwin, The descent of man, and selection in relation to sex, –Vol. II, 335-336; Charles
Darwin, A origem do homem e a seleção sexual, 503.
46
o mesmo assustou-se e piscou violentamente. Isso levou Darwin a pensar que
este aprendizado não podia ter sido adquirido pela experiência já que o bebê se
encontrava protegido e que esse tipo de ruído não representava nenhum perigo
para ele. Pensou então que teria sido adquirido lentamente numa idade mais
avançada durante uma longa série de sucessivas gerações e transmitido
hereditariamente para os descendentes em uma idade mais precoce do que
aquela idade em que este hábito tivesse sido adquirido anteriormente pelos pais.
96
Aqui podemos perceber que Darwin ofereceu explicações semelhantes àquelas
encontradas na Origem das espécies. O hábito de piscar teria se formado de
forma lenta e gradual e teria sido transmitido para os seus descendentes. Aqui
podemos encontrar dois elementos que fazem parte da teoria evolutiva de Darwin
na Origem das espécies: evolução como um processo lento e gradual e herança
de caracteres adquiridos.
Darwin aventou a possibilidade de que algumas ões humanas que,
inicialmente, eram executadas de forma consciente terem sido convertidas pela
força do hábito e da associação em ações reflexas. Estas seriam herdadas e
fixadas firmemente, sendo executadas quando houvesse um estímulo para isso,
ou quando as mesmas causas que originalmente as provocaram reaparecessem,
mesmo quando não tivessem a menor utilidade. Seriam executadas de forma
inconsciente pela ação das células nervosas sensitivas que excitariam nossas
células motoras. Como exemplo, comentou que o espirro e tosse poderiam ter
sido adquiridos num período muito remoto através do hábito de expelir
96
Charles Darwin, The expression of the emotions in man and animals, 40-41; Charles Darwin, A
expressão das emoções no homem e nos animais, 44-45.
Fig. 4 – Fotografia de Duchenne (1806-1875) estimulando eletricamente o rosto de um
paciente na exibição de uma expressão em 1862. O livro de Darwin sobre a expressão das
emoções contém muitas ilustrações elaboradas a partir de fotografias copiadas de Duchenne.
Obs.: Esta imagem é uma fiel reprodução fotográfica de domínio público porque seu direito autoral expirou.
47
violentamente partículas irritantes das vias aéreas. Com o tempo, teriam se
tornado inatos e teriam sido convertidos em ações reflexas para quase todos os
quadrúpedes superiores.
97
Mais uma vez estamos diante de um exemplo de
herança de caracteres adquiridos.
Darwin havia observado que cães e gatos escavavam o chão, mesmo se
ele fosse de pedra, após defecarem como se quisessem cobrir seus excrementos.
Por outro lado tratadores de animais que viviam nos zoológicos haviam relatado
que lobos, chacais e raposas procediam da mesma forma. Porém, foi observado
que os animais em ambos os casos, mesmo tendo a possibilidade de cobrirem
completamente seus excrementos, não o faziam por completo. Nesse caso, os
animais procediam de modo diferente daquele que adotavam para com as sobras
de alimento que eram enterradas por completo. De acordo com Darwin esses
hábitos comportamentais teriam sido adquiridos, muito provavelmente, de algum
ancestral remoto do gênero dos cães, que originalmente executaria esses
movimentos com alguma finalidade precisa. Estes teriam sido preservados e
transmitidos às gerações seguintes como remanescentes inúteis de um
movimento habitual que perdera sua eficiência, mas que um dia tivera uma
finalidade específica.
98
Sobre cães e gatos Darwin ainda afirmou que:
97
Charles Darwin, The expression of the emotions in man and animals, 41-42; Charles Darwin, A
expressão das emoções no homem e nos animais, 45-46.
98
Charles Darwin, The expression of the emotions in man and animals, 46; Charles Darwin, A
expressão das emoções no homem e nos animais, 49.
48
No caso tanto do cachorro como do gato, temos todos os motivos
para acreditar que seus gestos de hostilidade e afeição são inatos ou
herdados, pois eles são praticamente idênticos nas diferentes raças
da espécie, e em todos os indivíduos da mesma raça, jovens ou
velhos.
99
A partir das observações feitas pelos seus diversos colaboradores, por ele
próprio e de casos descritos na literatura especializada, Darwin pensou que se
uma sensação produzisse um movimento voluntário cada vez que ela fosse
sentida durante várias gerações, tenderia a produzir o mesmo movimento nas
gerações subseqüentes, mesmo que o movimento executado não tivesse a
mesma utilidade que tinha nas gerações anteriores, ou fosse inútil. Esses
movimentos habituais seriam muito semelhantes aos atos reflexos e seriam
transmitidos aos descendentes.
100
Para Darwin, a prática constante de gestos ao
longo das sucessivas gerações teria sido responsável pela sua transmissão para
as gerações seguintes.
101
Ou seja, nesse caso, ocorreria a herança de caracteres
adquiridos pelo uso.
No terceiro capítulo do livro A expressão das emoções no homem e nos
animais, onde apresentou as conclusões sobre os princípios gerais da expressão,
Darwin comentou que, por mais forte que fosse uma emoção, ela somente
99
Charles Darwin, The expression of the emotions in man and animals, 59; Charles Darwin, A
expressão das emoções no homem e nos animais, 62.
100
Charles Darwin, The expression of the emotions in man and animals, 51; Charles Darwin, A
expressão das emoções no homem e nos animais, 53-54.
101
Charles Darwin, The expression of the emotions in man and animals, 63; Charles Darwin, A
expressão das emoções no homem e nos animais, 65-66.
49
provocaria algum movimento se fosse acompanhada de algum tipo de ação
voluntária para o seu alívio ou satisfação. Ele explicou:
Uma dor intensa desencadeia nos animais os mais violentos e
diversificados esforços para que escapem da sua causa, e assim tem
sido por gerações e gerações. Mesmo quando um membro ou outra
parte do corpo são machucados, muitas vezes temos uma tendência
a sacudi-los, como para livrar-se da causa, ainda que isso seja
obviamente impossível. Assim, estabeleceu-se um hábito de contrair
com força todos os músculos sempre que se experimenta um
sofrimento intenso. Como os músculos do rax e dos órgãos vocais
são habitualmente usados, sempre uma tendência para que
sejam acionados produzindo gritos e soluços fortes e cortantes.
102
Os gritos seriam benéficos e estariam relacionados a um pedido de auxilio a
seus progenitores, por parte dos animais jovens que estavam em situação de
sofrimento. Os gritos de alguns indivíduos que pertencessem a uma comunidade
serviriam para alertar os demais sobre uma possível situação de perigo. Isso faria
seus integrantes se ajudarem.
103
Os movimentos violentos difundidos sem direção pelas primeiras células
nervosas afetadas, como os dos órgãos vocais responsáveis pela fala que
produzem o grito, teriam sido para Darwin, adquiridos através do antigo hábito
102
Charles Darwin, The expression of the emotions in man and animals, 75-76; Charles Darwin, A
expressão das emoções no homem e nos animais, 75.
103
Charles Darwin, The expression of the emotions in man and animals, 75-76; Charles Darwin, A
expressão das emoções no homem e nos animais, 75.
50
consciente de que o uso do esforço muscular expressivo aliviaria a dor na
tentativa de escapar de sofrimento.
104
Darwin chamou a atenção para o fato de que seria bem provável que:
As ações reflexas estivessem sujeitas a pequenas variações, como
todas as estruturas corpóreas e instintos; e toda variação que fosse
benéfica e suficientemente importante tenderia a ser preservada e
herdada. Portanto, ações reflexas, uma vez adquiridas para uma
finalidade, poderiam depois ser modificadas independentemente da
vontade e do hábito, para servir a outra finalidade. Tais casos fariam
paralelo com aqueles que, teríamos todas as razões para acreditar,
ocorreram com muitos instintos; pois, se alguns instintos foram
desenvolvidos simplesmente por um longo e hereditário hábito,
outros, altamente complexos, o foram por meio da preservação de
variações de instintos preexistentes ou seja, por meio da seleção
natural.
105
Nesta passagem, Darwin está procurando explicar o desenvolvimento dos
instintos através de dois mecanismos: o uso e desuso e a seleção natural.
Darwin havia observado o comportamento das serpentes do gênero
Trigonocephalus,
106
ao produzirem sons, durante sua passagem pela América do
104
Charles Darwin, The expression of the emotions in man and animals, 76-77; Charles Darwin, A
expressão das emoções no homem e nos animais, 76.
105
Charles Darwin, The expression of the emotions in man and animals, 43-44; Charles Darwin, A
expressão das emoções no homem e nos animais, 47.
106
Serpente peçonhenta de hábitos terrícola e noturno de no máximo 2,5 metros de comprimento.
No Brasil temos uma espécie com duas subespécies, Lachesis muta muta na Amazônia e Lachesis
muta rhombeata na Mata Atlântica. Também é encontrada na América Central. É a maior serpente
peçonhenta das Américas. Vive exclusivamente em áreas florestadas de solo úmido, abrigando-se
durante o dia no oco de troncos, entre as raízes salientes das árvores e em tocas abandonadas.
51
Sul. Ele comparou esse comportamento ao da serpente Echis carinata,
107
encontrada na Índia, e ao da cascavel. Ele percebeu que quando uma
Trigonocephalus era perturbada vibrava a ponta do seu rabo com rapidez, que ao
bater contra gravetos e contra a grama seca produzia um barulho semelhante ao
som produzido por um guizo que poderia ser claramente ouvido a uma distância
de dois metros. Esse barulho seria bem diferente daquele produzido pela Echis
carinata da Índia que, à medida que se enrolava, esfregando as escamas laterais
dos lados das dobras do seu corpo, umas contra as outras, produzia um som
curioso e prolongado, quase um silvo. Por fim, destacou o som produzido pela
cascavel quando sacode o seu guizo.
108
As observações que havia feito em relação a essas três serpentes fizeram
com que Darwin chegasse a algumas conclusões. Para ele, independentemente
da finalidade da produção dos sons por parte das diversas espécies de serpentes;
o guizo da cauda da Trigonocephalus e da cascavel, o esfregar das escamas da
Echis, ou ainda, a dilatação do pescoço da naja; pelos seus movimentos
Conhecida popularmente como surucucu. Disponível em: http://www.butantan.gov.br/museu/.
Acesso em: dezembro de 2008.
107
Víbora de pequeno porte, e agressiva quando se sente ameaçada, responsável pelo maior
índice de acidentes fatais, mais do que qualquer outra serpente do mundo, mesmo não sendo
considerada a que tem a peçonha mais tóxica. Considerando a produção e a toxidade da peçonha,
o tamanho das presas, o temperamento e a freqüência da mordida é a detentora do título de
serpente terrestre mais perigosa. Serpente com vasta distribuição geográfica encontrada na África
Oriental, através do Oriente Médio até a Índia (Mark Carwardine. Natureza radical (Rio de Janeiro:
Ediouro, 2007), 47).
108
Charles Darwin, The expression of the emotions in man and animals, 112-113; Charles Darwin,
A expressão das emoções no homem e nos animais, 105-106.
52
ameaçadores, todos teriam a mesma função e objetivo. Ou seja, servir de alerta
para possíveis predadores.
Darwin discordava da visão de que os sons produzidos pelo guizo das
cobras tivessem a função de atrair suas presas, como pássaros, por exemplo,
uma vez que para ele, o uso do guizo somente seria feito numa situação em que o
animal se sentisse incomodado ou com raiva.
109
De acordo com o naturalista inglês, a seleção natural preservaria as
variações que fossem benéficas para as serpentes que estivessem mais aptas a
espantar os seus predadores, escapando, assim, de serem devoradas. Em
contrapartida, a seleção natural favoreceria, também, os predadores que se
adaptassem na prática da captura das serpentes venenosas.
110
109
Charles Darwin, The expression of the emotions in man and animals, 113; Charles Darwin, A
expressão das emoções no homem e nos animais, 350.
110
Charles Darwin, The expression of the emotions in man and animals, 116; Charles Darwin, A
expressão das emoções no homem e nos animais, 108.
53
Konrad Lorenz,
111
no prefácio do livro A expressão das emoções no homem
e nos animais, comenta que um dos mecanismos propostos por Darwin no livro
Origem das espécies como possível causa responsável pela determinação de
padrões de comportamento específicos nos animais é a seleção natural. Lorenz
concorda com Darwin em que as formas de estrutura e de comportamento podem,
em princípio, terem sido adquiridas como resultado de uma pressão seletiva
exercida pela luta pela sobrevivência.
112
111
Konrad Zacharias Lorenz (1903-1989), nascido em Viena, foi um zoólogo, psicólogo animal e
ornitólogo austríaco, ganhador do Prêmio Nobel de Fisiologia / Medicina de 1973. Formado pela
Universidade de Viena, em 1928, como doutor em medicina, tornou-se professor assistente no
Instituto de Anatomia até 1935, onde terminou seus estudos zoológicos em 1933, e recebeu seu
segundo doutorado (PhD). Em 1936, em um simpósio internacional científico sobre o instinto,
Lorenz encontrou quem se tornaria seu grande amigo e colega Nikolaas Tinbergen. Juntos, eles
estudaram os gansos silvestres, domésticos e híbridos. Konrad Lorenz é considerado um dos
fundadores da etologia moderna, a partir do desenvolvimento de uma abordagem que começou
com uma geração anterior, incluindo seu professor Oskar Heinroth (1871-1945). Konrad Lorenz
estudou o comportamento instintivo dos animais, especialmente em gansos cinzentos e gralhas.
Escreveu vários livros, como Evolution and modification of behavior (Evolução e modificação do
comportamento), em 1965, e On Aggression (Agressão), em 1966, que tornaram sua leitura
popular. Em seu ensaio autobiográfico, publicado em 1973 no Les Prix Nobel, Lorenz creditou sua
carreira para seus pais, por serem, segundo o próprio Lorenz, extremamente tolerantes com seu
amor desmedido para os animais, e para o seu encontro na infância com Wonderful adventures of
Nils (A maravilhosa viagem de Nils), da escritora sueca Selma Lagerlöf' (1858-1940), livro esse que
o encheu com um grande entusiasmo sobre os gansos selvagens. (From Wikipedia, the free
encyclopedia). Disponível em
http://en.wikipedia.org/wiki/Konrad_Lorenz. Acesso em setembro de
2008.
112
Konrad Lorenz, “Preface” In: Charles Darwin, The expression of the emotions in man and
animals, x-xi; Konrad Lorenz, “Prefácio” In: Charles Darwin, A expressão das emoções no homem
e nos animais, 8-9.
54
Para explicar a contração involuntária da musculatura lisa dos arrectores
pili,
113
Darwin defendeu que originalmente ao longo das gerações esses músculos
eram acionados toda vez que o sistema nervoso fosse estimulado sob a influência
da fúria e do terror:
Os animais têm sido repetidamente estimulados pela fúria e pelo
terror ao longo das gerações. Conseqüentemente, os efeitos diretos
do sistema nervoso perturbado sobre os apêndices dérmicos foram,
quase com certeza, incrementados pelo hábito e pela tendência da
força nervosa a passar mais facilmente por canais já utilizados.
114
Para Darwin, esse comportamento poderia ter sido adquirido quando os
próprios animais tivessem percebido que o eriçamento dos pelos nos machos
rivais fazia com que seus corpos ficassem maiores, procedendo da mesma forma
para amedrontar seus inimigos. Desta forma, uma ação que de início era
desempenhada pela contração voluntária de um músculo, teria a mesma
113
Arrectores pilorum (singular arrector pili) o minúsculas fibras musculares associadas a cada
folículo piloso, que se contraem para fazer com que os cabelos fiquem de pé, causando arrepios.
Eles existem, na maioria dos mamíferos, incluindo os seres humanos. São músculos lisos, e não
músculos esqueléticos, o que explica porque os seres humanos não podem, voluntariamente, se
arrepiarem. Em outros animais com mais pêlos do que os seres humanos, eles adquirem uma
importante função - levantam os pêlos para que o ar fique preso entre eles, fornecendo uma
camada de isolamento para manter o animal aquecido. Alguns animais também contraem os
arrectores pilorum quando estão encurralados, a fim de parecerem maiores e mais ameaçadores.
Um exemplo de animal que assume essa postura é o porco-espinho, que utiliza os arrectores
pilorum para levantar seus espinhos quando ameaçado. (From Wikipedia, the free encyclopedia)
Disponível em: http://en.wikipedia.org/wiki/ Arrectores_pilorum. Acesso em: fevereiro de 2009.
114
Charles Darwin, The expression of the emotions in man and animals, 108-110; Charles Darwin,
A expressão das emoções no homem e nos animais, 102-103.
55
finalidade de uma mesma ação que fosse efetuada por um músculo involuntário.
Ele ainda afirmou que essa ação poderia ser controlada por esforços repetidos e
pela vontade própria do animal, assim que tomasse consciência de que algum tipo
de mudança se iniciasse em seus pêlos, toda vez que o mesmo fosse provocado:
Temos razões para acreditar que a vontade pode influenciar, de
forma pouco clara, a ação de alguns músculos lisos, ou involuntários,
como no período dos movimentos peristálticos dos intestinos, e na
contração da bexiga.
115
Ao parecerem maiores e mais temíveis para os seus rivais, ou para os seus
inimigos, mesmo que na realidade não o fossem assim tão fortes deixariam um
número maior de descendentes que herdariam as suas qualidades características
ainda que a princípio adquiridas.
116
Darwin comparou o comportamento dos mamíferos com aquele exibido
pelos pássaros que eriçam suas penas sempre que assustados ou enraivecidos.
certos anfíbios e répteis, para parecerem maiores inalavam o ar para
amedrontar o inimigo ou para impossibilitar que seus inimigos os engolissem. Ele
observou esse tipo de comportamento, principalmente, em sapos e rãs.
117
115
Charles Darwin, The expression of the emotions in man and animals, 108-110; Charles Darwin,
A expressão das emoções no homem e nos animais, 102-103.
116
Charles Darwin, The expression of the emotions in man and animals, 108-110; Charles Darwin,
A expressão das emoções no homem e nos animais, 102-103.
117
Charles Darwin, The expression of the emotions in man and animals, 110-111; Charles Darwin,
A expressão das emoções no homem e nos animais, 103-104.
56
No caso dos répteis, Darwin deu como exemplo o comportamento
apresentado por algumas espécies de lagartos machos que eriçavam suas cristas
dorsais, ou inflavam suas bolsas ou coleiras de escamas de sua garganta, quando
disputavam uma fêmea durante o processo de corte. Ele fez referência, também,
aos camaleões e alguns outros lagartos que para compensar os seus movimentos
lentos, assumiriam um aspecto feroz quando irritados, inflando seus corpos. Esse
tipo de comportamento foi observado, por Darwin, em inúmeras espécies de
serpentes, como as najas, por exemplo.
118
No caso dos animais domésticos, Darwin citou como exemplo, o caso dos
galos de briga que eriçam a penugem do seu pescoço arrepiando suas penas e
estufando seu colarinho, quando se preparam para lutar. Porém, admitiu que
neste caso esse eriçamento não poderia ser considerado uma vantagem, uma vez
que os criadores de galos de briga preferiam aparar essa penugem. Relatou o
caso das galinhas que, para protegerem seus pintos, abrem as suas asas,
levantam sua cauda e arrepiam todas as suas penas, para parecerem ferozes
para o invasor. Comportamento análogo foi observado em cisnes toda vez que um
invasor se aproximava da beira da água; em corujas, papagaios, pintassilgos e
jovens cucos, quando alguém se aproximava dos seus ninhos.
119
A partir desses fatos ficou evidente para Darwin que o eriçamento dos
apêndices dérmicos observado em um grande número de animais pertencentes a
classes bastante diferentes era quase sempre acompanhado por diversos
118
Charles Darwin, The expression of the emotions in man and animals, 111-112; Charles Darwin,
A expressão das emoções no homem e nos animais, 103-106.
119
Charles Darwin, The expression of the emotions in man and animals, 111-112; Charles Darwin,
A expressão das emoções no homem e nos animais, 97-100.
57
movimentos voluntários que tinham como objetivo específico oferecer alguma
vantagem. Darwin, explicou:
Pareceria difícil acreditar que o eriçamento coordenado dos
apêndices dérmicos, que faz o animal parecer maior e mais temível
para seus inimigos e rivais, poderia ser um resultado acidental e
involuntário da perturbação do sensório. Isso parece tão inacreditável
quanto imaginar que o eriçamento das espinhas do ouriço, ou do
porco-espinho, ou das plumas ornamentais de muitos pássaros
durante a corte seriam ações sem finalidade.
120
No seu livro sobre a Origem do homem, quando se propôs a analisar as
diferenças entre o homem e os macacos, com o intuito de desvendar a sua
descendência, Darwin afirmou que em momento algum durante nosso processo
evolutivo tivemos como ancestral comum um símio com quaisquer semelhanças
com os macacos existentes, inclusive com os atuais macacos antropomorfos.
121
Mas propôs a existência de um ancestral comum aos homens e macacos,
chegando até mesmo sugerir como seria a forma desse antepassado primitivo, e
atualmente extinto:
Considerando-se a estrutura embriológica do homem, podemos
visualizar mais ou menos as condições existentes na época de
nossos ancestrais, caracterizando melhor sua posição na rie
zoológica. Chegaremos assim à conclusão de que o homem
120
Charles Darwin, The expression of the emotions in man and animals, 107-108; Charles Darwin,
A expressão das emoções no homem e nos animais, 101-102.
121
Charles Darwin, The descent of man, and selection in relation to sex –Vol. I, 198-199; Charles
Darwin, A origem do homem e a seleção sexual, 133-134.
58
descende de um quadrúpede peludo, dotado de cauda e orelhas
pontudas, provavelmente de hábitos arbóreos, habitante do Velho
Mundo. Essa criatura teria sido classificada entre os quadrúmanos,
122
tão seguramente quanto o seria também o mais antigo ancestral
comum dos macacos do Velho e do Novo Mundo.
123
Portanto, a ascendência do homem de formas inferiores, e sua origem a
partir de um ancestral primitivo, constituíram um assunto que havia sido
abordado, discutido e ilustrado com vários exemplos comparativos, por Darwin, na
Origem do homem. Entretanto, na Expressão das emoções no homem e nos
animais, ele aprofundou o assunto defendendo a descendência do homem e
alguns grupos de macacos de um ancestral comum. Nesse sentido, ele foi guiado
pela semelhança encontrada entre algumas de suas formas de expressão.
124
Para ilustrar essa semelhança, Darwin deu alguns exemplos. Um deles foi a
forma como os chimpanzés jovens repuxam os cantos da boca e enrugam as
pálpebras inferiores, quando são submetidos a cócegas em suas axilas.
122
Quadrumana e Bimana formam uma obsoleta divisão dos primatas: os quadrúmanos são
primatas com quatro mãos (duas ligadas aos braços e duas ligadas às pernas), e os bimanos são
aqueles com duas mãos e dois pés. A divisão foi proposta pelo médico, fisiologista e antropólogo
alemão Johann Friedrich Blumenbach (1752–1840) na primeira edição do seu Manual of Natural
History (Manual de História Natural), 1779, e retomada por outros naturalistas. Alguns elevaram a
distinção ao nível de Ordem. No entanto, as muitas afinidades entre os humanos e outros primatas,
especialmente os grandes macacos, deixaram claro que a distinção não fazia sentido científico. Em
1863, entretanto, Thomas Henry Huxley em seu Evidence as to Man's Place in Nature demonstrou
que os macacos poderiam ser incluídos no Bimana. (From Wikipedia, the free encyclopedia)
Disponível em
http://en.wikipedia.org/wiki/Quadrumana. Acesso em dezembro de 2009.
123
Charles Darwin, The descent of man, and selection in relation to sex –Vol. II, 389-390; Charles
Darwin, A origem do homem e a seleção sexual, 537-538.
124
Charles Darwin, The expression of the emotions in man and animals, 13; Charles Darwin, A
expressão das emoções no homem e nos animais, 21-22.
Fig. 5 – Caricatura de Charles Darwin retratado como um macaco, publicada em 1871 na
revista Hornet como resposta ao Origem do homem que afirmava que humanos e macacos
tiveram um ancestral comum.
Obs.: Esta imagem é uma fiel reprodução fotográfica de domínio público porque seu direito autoral expirou.
59
Comparou este procedimento com a expressão exibida pelas crianças quando
submetidas à mesma condição. Ele atribuiu a semelhança encontrada entre os
dois casos à origem dos chimpanzés e humanos a partir de um ancestral primitivo
comum.
125
Um acidente com um dos seus filhos, à época com poucos meses de vida,
teria feito com que Darwin notasse algo que lhe chamou a atenção. Ao bater com
a manga de seu casaco em um dos olhos de seu filho, observou que apenas um
deles lacrimejou abundantemente, enquanto o outro olho permaneceu seco,
apesar do bebê gritar sem parar. Como é sabido que nessa fase as glândulas
lacrimais ainda não são capazes de produzir lágrimas, Darwin passou a observar
essa reação em seu filho em determinados períodos de tempo. De acordo com
suas observações somente com quase cinco meses de vida (139 dias) que
durante uma crise de choro surgiram as primeiras lágrimas. Para ele o
funcionamento das glândulas lacrimais precisaria ser primeiro praticado para
depois ser fixado e aperfeiçoado, assim como, vários outros movimentos e
reflexos dependeriam deste exercício. Desta forma, Darwin comentou a respeito:
Seria muito provável que esse fosse o caso com o lacrimejar, que
deveria ter sido adquirido desde o tempo em que o homem se
separou, a partir do ancestral comum do gênero Homo, dos macacos
antropomórficos que não lacrimejam.
126
125
Charles Darwin, The expression of the emotions in man and animals, 139-140; Charles Darwin,
A expressão das emoções no homem e nos animais, 127-128.
126
Charles Darwin, The expression of the emotions in man and animals, 160-161; Charles Darwin,
A expressão das emoções no homem e nos animais, 145-146.
60
As informações oferecidas por tratadores de zoológicos em relação ao
carinho e amor de macacas para com suas crias, levaram Darwin a comparar com
o que acontecia nos humanos, entre as mães e seus filhos bebês. As descrições
do comportamento no reencontro de dois chimpanzés, que depois de ficarem
frente a frente, colocaram as mãos um sobre os ombros do outro e se abraçaram
carinhosamente, seria comparável ao comportamento apresentado por humanos
que procuram expressar o amor pela pessoa amada através do toque. Para
Darwin, esse comportamento, de gostar de acariciar e receber carinho, teria sido
adquirido como herança.
127
No décimo capítulo do livro Expressão das emoções no homem e nos
animais Darwin abordou a manifestação da emoção da fúria em humanos, em
comparação aos macacos. Ele considerou que a fúria era responsável pela
alteração no funcionamento, principalmente, do coração e do sistema respiratório,
preparando o corpo para o ataque. O sistema muscular seria afetado causando o
tremor, os dentes seriam mostrados, os lábios paralisados, por vezes ficariam
protraídos, e a boca espumante. A sua explicação para a contração dos lábios,
durante a manifestação da fúria, estaria condicionada a nossa descendência de
um animal semelhante ao macaco.
128
Darwin ainda considerou instintivo o hábito
que algumas crianças têm em morder ao compará-lo ao hábito adquirido pelos
filhotes de crocodilos, que mal saem do ovo começam a fazer uso das suas
pequenas mandíbulas. Sobre as reações manifestadas na expressão da fúria,
127
Charles Darwin, The expression of the emotions in man and animals, 224-225; Charles Darwin,
A expressão das emoções no homem e nos animais, 200-201.
128
Charles Darwin, The expression of the emotions in man and animals, 250-254; Charles Darwin,
A expressão das emoções no homem e nos animais, 223-226.
61
como o ato de mostrar os dentes caninos, Darwin comentou que esse ato “era o
remanescente de um hábito adquirido em tempos primitivos, quando nossos
ancestrais semi-humanos combatiam entre si com seus dentes, como os gorilas e
os orangotangos hoje”.
129
O termo semi-humano foi utilizado por Darwin ao comparar as reações
voluntárias de descobrir um dos caninos na expressão das emoções de ódio e
raiva demonstrados pelo homem, com as mesmas reações de mostrar os dentes,
em babuínos e outros macacos antropomorfos. Ele comentou:
A expressão de que falamos revela no homem a sua ascendência
animal. Podemos facilmente acreditar, pela nossa afinidade com os
macacos antropomorfos, que nossos ancestrais semi-humanos do
sexo masculino possuíam grandes caninos, e os homens de hoje por
vezes nascem com caninos excepcionalmente grandes, com
espaços no maxilar oposto para sua recepção. Podemos também
suspeitar que, apesar de não haver nenhum caso análogo em que
possamos nos basear, nossos ancestrais semi-humanos mostravam
seus caninos quando prontos para lutar, como ainda hoje fazemos
quando furiosos, ou quando estamos apenas sendo irônicos ou
desafiando alguém, sem nenhuma intenção de realmente atacar com
os dentes.
130
129
Charles Darwin, The expression of the emotions in man and animals, 250-251; Charles Darwin,
A expressão das emoções no homem e nos animais, 359. Darwin fez essa referência em nota de
rodapé numa crítica ao anatomista e zoólogo francês Louis Pierre Gratiolet (1815-1865) que,
segundo ele, numa passagem no seu livro De la Physiognomie et des Mouvements d'Expression
(Fisionomia e os Movimentos de Expressão), de 1865, havia usado o termo vago symboliquement
(simbolicamente) quando se referiu ao hábito de mostrar os dentes no ato de morder e rasgar.
130
Charles Darwin, The expression of the emotions in man and animals, 264; Charles Darwin, A
expressão das emoções no homem e nos animais, 236.
62
CAPÍTULO 3
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Neste capítulo procuraremos atingir o objetivo proposto na introdução, que
consistia em averiguar se na Expressão das emoções no homem e nos animais
Darwin apresentou os mesmos mecanismos de transformação das espécies que
estão presentes na Origem das espécies. No final, apresentaremos algumas
considerações sobre o assunto tratado nesta dissertação.
Como vimos no Capítulo 1 desta dissertação, na Origem das espécies,
Darwin sugeriu alguns meios de modificação das espécies. O principal deles é a
seleção natural. Esta agiria sobre pequenas variações, conservando aquelas que
fossem úteis para o indivíduo. Haveria uma luta pela existência e os indivíduos
mais aptos deixariam descendentes. Além desse mecanismo de transformação,
havia outros tais como: a seleção sexual e a herança de caracteres adquiridos
pelo uso e desuso. A seleção sexual daria conta da ornamentação, bem como das
armas de defesa encontradas nos machos de algumas espécies, que seriam
explicados pela escolha da fêmea. Outra possibilidade foi que as modificações
que ocorressem nos indivíduos durante sua vida, através do uso e desuso, ou
mesmo mutilações, poderiam ser herdadas pelos seus descendentes (herança de
caracteres adquiridos). No entanto, na Origem das espécies, Darwin mencionou
que poderia haver outros meios de modificação das espécies, além desses, e
63
sugeriu vários tipos de estudos que poderiam trazer esclarecimentos sobre a
origem das espécies.
Nossa análise mostrou que na obra A expressão das emoções no homem e
nos animais aparecem todos os mecanismos que mencionamos no início deste
capítulo e que estão presentes na Origem das espécies. Foi possível perceber,
também, que em ambas as obras Darwin enfatizou que o processo evolutivo é
lento e gradual. Os mecanismos apresentados por Darwin, nesse caso, são:
seleção natural, herança de caracteres adquiridos pelo uso e desuso e seleção
sexual. Além disso, de modo análogo ao que aparece na Origem das espécies,
Darwin fez uma analogia entre o que a seleção natural faz na Natureza e o
trabalho do criador de animais e plantas (seleção artificial). Um exemplo disso é a
mudança de comportamento dos chacais em relação ao hábito de emitir sons.
Segundo Darwin, os chacais após estarem sujeitos à domesticação e serem
mantidos em cativeiro teriam aprendido, através da imitação, a latir como os cães,
passando, assim, a emitir sons que não lhes eram naturais. De modo análogo, as
pombas domesticadas passaram a arrulhar de modo diferente de seus ancestrais,
a pomba de rocha (Columba lívia).
131
Porém, percebemos que o mecanismo de modificação das espécies mais
utilizado por Darwin na Expressão das emoções no homem e nos animais, para
justificar padrões de comportamento, é a herança dos caracteres adquiridos pelo
uso e desuso, que além de se aplicar aos dois exemplos acima, se aplica também
a vários outros casos, como vimos no Capítulo 2. A seleção natural também foi
131
Charles Darwin, The expression of the emotions in man and animals, 91; Charles Darwin, A
expressão das emoções no homem e nos animais, 87-88.
64
bastante utilizada, o que está de acordo com o defendido por Darwin na Origem
das espécies, onde ele a considerava o principal meio de modificação das
espécies.
Para Darwin, o aprendizado desenvolvido pela experiência seria adquirido
pelos indivíduos adultos, lentamente, durante uma longa e sucessiva série de
gerações, e seria transmitido para os seus descendentes em uma idade mais
precoce do que aquela em que este hábito teria sido, anteriormente, adquirido
pelos pais.
132
Aqui notamos que ele utilizou a herança dos caracteres adquiridos
pelo uso e desuso para explicar a preservação de um comportamento que teria
sido adquirido, inicialmente, pelo aprendizado e que em um determinado
momento, pela força do hábito, se manifestaria nas gerações seguintes sempre
que solicitado e independentemente da vontade do indivíduo. Como exemplo para
esta situação ele mencionou as reações das observações que fizera dos seus
filhos ao piscarem, violentamente, após o susto de um barulho repentino quando
ele balançou diante dos seus olhos, uma caixa de papelão com alguns doces
dentro, chocalhando o seu conteúdo, conforme aparece no Capítulo 2 desta
dissertação.
De acordo com o naturalista britânico, a força do hábito seria responsável
pela conversão de algumas ações reflexas, que em um determinado momento
teriam sido executadas de forma consciente, em ações que, depois de fixadas,
seriam transmitidas como herança e executadas automaticamente sempre que
provocadas, mesmo se não tivessem mais utilidade para o indivíduo. Por exemplo,
132
Charles Darwin, The expression of the emotions in man and animals, 40-41; Charles Darwin, A
expressão das emoções no homem e nos animais, 44-45.
65
o hábito adquirido de expelir, através da tosse e do espirro, toda e qualquer
partícula que irritasse as vias aéreas. Ou seja, com o tempo esses hábitos se
tornaram inatos e, independentemente da vontade, seriam convertidos em ações
reflexas por quase todas as espécies de quadrúpedes superiores.
133
Através dos exemplos acima apresentados, é possível perceber que na
Expressão das emoções no homem e nos animais Darwin utilizou, principalmente,
a transmissão das características adquiridas pelo uso e desuso, que propusera
alguns anos antes, na Origem das espécies. É interessante mencionar que outros
autores da época, como Alfred Russel Wallace, por exemplo, na fase madura de
sua obra considerava que a herança de caracteres adquiridos pelo uso e desuso
era irrelevante para o processo evolutivo.
134
A seleção natural e a seleção sexual também estão presentes na maioria
dos casos. Na luta pela existência, os indivíduos mais adaptados deixariam
descendentes ou, então, alguns machos que exibissem determinados tipos de
comportamento seriam escolhidos pelas fêmeas.
Um outro aspecto da Expressão das emoções no homem e nos animais
que merece ser destacado foi o modo insistente com que Darwin chamou a
atenção para as semelhanças entre o comportamento de macacos e dos
humanos, sugerindo sua descendência a partir de um ancestral comum, como
aparece no Capítulo 2 desta dissertação. Essas semelhanças são também
133
Charles Darwin, The expression of the emotions in man and animals, 41-42; Charles Darwin, A
expressão das emoções no homem e nos animais, 45-46.
134
Ver a respeito em Viviane Arruda do Carmo, Concepções evolutivas de Charles Darwin no
Origin of species e de Alfred Russel Wallace em Darwinism: um estudo comparativo, 95.
66
mencionadas de uma outra forma no primeiro volume do livro Origem do homem,
onde ele não tratou das emoções sentidas pelo homem.
É interessante mencionar que autores recentes como Konrad Lorenz
defendem que a evolução do comportamento animal foi guiada pela seleção
natural. No livro Evolução e modificação do comportamento,
135
publicado na
década de 1960, Lorenz defendeu que os mecanismos de aprendizagem
desenvolvidos através da experiência individual, ou filogeneticamente,
determinariam tanto comportamentos úteis para a preservação da espécie, como
prejudiciais que poderiam causar sua extinção. Para ele, a aprendizagem,
essencial para a sobrevivência do individuo, teria sido desenvolvida através de um
mecanismo do sistema orgânico dos indivíduos ao longo do processo evolutivo. A
seu ver, a aprendizagem é certamente “uma modificação adaptativa do
comportamento”.
136
Nessa sua obra, Lorenz considerou a seleção natural como mecanismo de
adaptação e peça fundamental na determinação da evolução do comportamento
animal. Esta seria um provável fator de influência na manutenção de um
comportamento adaptativo característico. Ou seja, que pudesse trazer benefícios
ao organismo na sua interação com o meio ambiente, além da sua transmissão
aos descendentes. Em sua argumentação em defesa da formação de certos
padrões comportamentais Lorenz se apóia nas concepções evolutivas presentes
na Origem das espécies, de Darwin.
135
Konrad Lorenz, Evolução e modificação do comportamento. Tradução de Mônica Beatriz
Salgado do Nascimento (Rio de Janeiro: Interciência, 1986).
136
Konrad Lorenz, Evolução e modificação do comportamento, 20.
67
Pode se dizer que várias idéias que aparecem na Expressão das emoções
do homem e nos animais, de Darwin, serviram de inspiração para os estudos
feitos por Lorenz e Niko Tinbergen, dando origem à disciplina Etologia, voltada ao
estudo do comportamento animal, na década de 1960.
68
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