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O caráter desarrazoado de uma interpretação que vê em uma palavra contida em um
artigo isolado a destruição de outras partes desse mesmo artigo, e ainda dos demais
dispositivos que distribuem competências e limitam o poder de tributar, dispensa
maiores explicitações.
Advoga-se, portanto, no sentido da não admissão de contribuições sociais gerais no
ordenamento jurídico brasileiro. Tal posicionamento é defendido, principalmente, com base e
em defesa do princípio federativo, bem como do princípio da razoabilidade, visto que, se a
União pode, sem base constitucional, instituir contribuições sociais, restaria configurada uma
violação à Federação, pois a autonomia dos entes federados estaria prejudicada, visto que toda
a arrecadação tributária estaria centralizada na União, tornando sem efeito a divisão de
competências tributárias feita pela Constituição de 1988. Estaria, portanto, desprovido de
razoabilidade, tal pensamento (MACHADO SEGUNDO, 2002, p. 171):
A demolição do Sistema Tributário causada pela admissão de contribuições sociais
gerais, referida no item anterior, não traria malefícios apenas aos contribuintes, que
seriam submetidos a uma tributação ainda mais imprevisível, incompreensível e
irracional. Os maiores prejudicados seriam os Estados e os Municípios, com sérios
abalos na forma federativa de Estado, alçada ao patamar pétreo da CF/88.
É sabido que a autonomia de qualquer ente, desde a do jovem que pretende sair da
casa dos pais, até a do Estado que não deseja submeter-se às determinações da
União Federal, está diretamente relacionada com auto-suficiência financeira.
Dependentes financeiramente do poder central, Estados e Municípios teriam – como
às vezes têm – a liberação de verbas para suas necessidades locais condicionada ao
atendimento das exigências feitas pelo poder central. A autonomia seria meramente
ornamental. [...]
Foi por essa razão que a CF/88 cuidou de dividir a competência tributária entre
União, Estados e Municípios, redobrando seus cuidados no trato da chamada
competência residual, cujos impostos com base nela criados hão de ter o produto de
sua arrecadação partilhado entre Estados e Distrito Federal (CF/88, art. 157, II). Dito
isto, nem precisamos entrar na questão de saber se as contribuições podem incidir
sobre fatos pertencentes à competência impositiva de Estados e Municípios para
termos por contrária à federação a existência de contribuições sociais gerais. De
fato, o desequilíbrio gerado por essa espécie tributária, verdadeira brecha que se abre
na competência residual da União, que se torna assim ilimitada e não partilhada,
tornaria sem efeito a divisão de competências feita pela Constituição Federal.
E, destaque-se, não são poucas as vozes que admitem a incidência de contribuições
sobre fatos submetidos à tributação de Estados e Municípios, ou mesmo sobre fatos
praticados por Estados e Municípios. Diante da possibilidade de criar contribuições
gerais, a União teria formidável instrumento para subjugar todos os demais entes. A
finalidade poderia ser determinada por lei, dentre as centenas ou mesmo milhares de
possibilidades ofertadas pela Constituição, e as imunidades e demais restrições ao
poder de tributar não lhe seriam aplicáveis. Seria mesmo o fim da federação.
Desta forma, estariam as contribuições sociais, ditas gerais, ferindo o princípio
federativo, violando os artigos 154, I, 157, II, e 195, § 4.º, da CF/88, que tratam da repartição
das competências tributárias e, por conseqüência, ferindo a autonomia dos entes federados.
Bem como a razoabilidade, prevista no artigo 5.º, LIV, da CF/88, visto que tornaria inócuos
vários outros dispositivos constitucionais tributários, pois as contribuições gerais poderiam