(...) Eu não vou mentir, o principal motivo foi o salário, na
época que eu conheci... É engraçado, eu passei de uma
situação de simples cidadão a um agente penitenciário, mas eu
acho engraçado é que na época eu não tinha conhecimento do
que era agente penitenciário, qual era a posição ou a
importância que tinha. Daí quando eu tomei conhecimento
disso eu... por intermédio de um amigo meu que trabalha na
Prisão Provisória (...). Entrevistador – Ele já era agente?
Agente Penitenciário – Já, daí eu conversando com ele, e tal,
daí ele foi me contando a situação, como é que funcionava e
tal, e eu fiquei meio curioso, eu já era meio aventureiro, daí
ele me mostrou o contracheque. Eu falei bom... ta razoável
trabalha um dia folga dois, tinha estabilidade também, aquela
coisa toda, mas eu não tinha ideia da encrenca que eu estava
me metendo (itálicos do autor). Daí prestei o concurso,
passei... e to aqui até hoje (MORAES, 2005, p. 211-212.
Itálicos nossos, quando não apontados no próprio texto).
Apesar de longa, também vale a pena transcrever a fala de
outro surveillant, recolhida em pesquisa realizada com funcionários de
instituições similares na França:
(...) O que um supervisor deve possuir é um espírito de
compaixão. Estamos cansados de ver tantos prisioneiros que,
em situação irregular, fugiram à miséria de seu país. Cruza-se
com um preto (negro) que nos sorri, e durante esse curto
tempo, aprendemos que os massacres e as mortes continuam
perpetuando-se no seu país. Faz mal restringi-lo e à seu
movimento, apenas para estar em harmonia com o
regulamento. É para isso que é necessário o destaque; não se
tem o direito de ser ele mesmo. Impossível! De qualquer modo
está-se em perigo permanente. Frequentemente esticam-me a
mão. Se digo não, faz-se uma celeuma. Os colegas acusam-me.
Digo-lhes: “Deixa estar”. Nunca falo do meu ofício. Falo o
que faço e o que fazem os prisioneiros, somente. Não se pode
falar desse ofício; aquilo não tem conteúdo. (...) Do vazio
emerge a forma, da forma emerge o vazio. É necessário ser
equilibrista, possuir o dom do ilusionismo, ser artista, que se
tenha tanto de ator de comédia como de ator dramático.
Vivemos em um jogo de falsas aparências. Por seis horas
brinca-se de ser outro. Fingindo-se ser este outro
surpreendemo-nos a enganar a nós mesmos. É verdade!
Acontece! Há ainda o dualismo, a contradição. Eu falava das
complexidades da abissal penitenciária; seria necessária uma
lâmpada para ver claramente! Permanece-se sem ver, no
escuro. É assim em todos os lugares, mas aqui isso lhe
penetra. Se permanecer (no trabalho), verá; este dualismo vai
florescer! Esse dualismo na penitenciária é como plantas de
feijão, que asfixiam as outras plantas ao redor. É necessário