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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO
Rosangela Oliveira Gonzaga de Almeida
A VIOLÊNCIA CONTRA CRIANÇAS E ADOLESCENTES
NUMA PERSPECTIVA CRÍTICA CONTEMPORÂNEA DO
SERVIÇO SOCIAL
RIO DE JANEIRO
2010
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2
ROSANGELA OLIVEIRA GONZAGA DE ALMEIDA
A VIOLÊNCIA CONTRA CRIANÇAS E ADOLESCENTES
NUMA PERSPECTIVA CRÍTICA CONTEMPORÂNEA DO
SERVIÇO SOCIAL
Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa de
Pós-Graduão em Serviço Social Escola de Serviço
Social - Universidade Federal do Rio de Janeiro, como
requisito à obtenção do título de Mestre em Serviço
Social.
Orientadora Doutora Sara Nigri Goldman
Praia Vermelha Escola de Serviço Social
2010
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Rosangela Oliveira Gonzaga de Almeida
A VIOLÊNCIA CONTRA CRIANÇAS E ADOLESCENTES
NUMA PERSPECTIVA CRÍTICA CONTEMPORÂNEA DO
SERVIÇO SOCIAL
DISSERTAÇÃO DE MESTRADO SUBMETIDA À BANCA PARA OBTENÇÃO DO
TÍTULO DE MESTRE EM SERVIÇO SOCIAL PELA ESCOLA DE SERVIÇO SOCIAL
DA UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO PROGRAMA DE PÓS-
GRADUAÇÃO EM SERVIÇO SOCIAL
Aprovada em: de de 2010.
Examinada por:
Doutora Sara Nigri Goldman Universidade Federal do Rio de Janeiro
Doutora Yolanda Demétrio Guerra - Universidade Federal do Rio de Janeiro
Doutor Maurílio Castro de Mattos Universidade Estadual do Rio de Janeiro
Doutora Janete Luzia Leite Universidade Estadual do Rio de Janeiro
Doutora Alba Tereza Barroso de Castro Universidade Estadual do Rio de Janeiro
4
A447
Almeida, Rosangela Oliveira Gonzaga
A violência contra crianças e adolescentes numa perspectiva critica contemporânea do
Serviço Social/Rosangela Oliveira Gonzaga Almeida. Rio de Janeiro: UFRJ/ESS, 2010.
xi, 161f.: il.; 31 cm.
Orientador: Doutora Sara Nigri Goldman
Dissertação (Mestrado) UFRJ/Escola de Serviço Social / Programa de Pós-Graduação
em Serviço Social, 2010.
Referências Bibliogficas: f. 146-160.
1.Crianças e violência. 2. Adolescentes e violência. 3. Serviço Social. 4. Marx, Karl,1818-
1883 Crítica e interpretação. I. Goldman, Sara Nigri. II. Universidade Federal do Rio de
Janeiro, Programa de Pós-Graduação em Serviço Social. III. Titulo.
CDD : 362.76
5
RESUMO
Discuto a violência contra crianças e adolescentes a partir
da perspectiva crítica marxiana e tradição marxista, da
gica capitalista de produção que explora e expropria a
classe trabalhadora, resgatando o arcabouço bibliográfico
que demarca o debate contemporâneo do Serviço Social.
Recorro ao método de investigação de Karl Marx para
conferir ao tema da violência contra crianças e
adolescente uma abordagem inovadora. Resgato a
dimensão política referenciando a dimensão técnica-
operativa da profissão. Apresento a relação essencial que
a aparência dissimula; descarto as formas aparentes
vinculadas ao pensamento corrente, recorro à ciência
para evidenciar o seu fundo oculto. Em oposição à
ideologia burguesa dominante expressa nos discursos
institucionais que não reconhece a transformação social e
a emancipação política e humana como solução do
problema para o qual preme.
Palavras chave: Violência Contra Crianças e
Adolescentes; Serviço Social Contemporâneo; Marxismo;
Exploração e Expropriação; Classe Trabalhadora
6
ABSTRACT
Discuss violence against children and adolescents from
the perspective of critical Marxist and Marxist tradition, the
logic of capitalist production that explores and expropriate
the working class, recovering the bibliographic framework
that marks the contemporary debate of Social Work.
Resort to the method of investigation of Karl Marx to give
the issue of violence against children and adolescents an
innovative approach. Redeem the political dimension
referencing the technical-operative dimension of the
profession. I present the essential relationship that
appearance masks; discard the apparent forms linked to
current thinking, I turn to science to enhance your bottom
hidden. In opposition to the dominant bourgeois ideology
expressed in the institutional discourses that does not
recognize the social transformation and political and
human emancipation as a solution of the problem for
which you press.
Keywords: Violence Against Children and Adolescents;
Contemporary Social Work; Marxism; Exploration and
Expropriation; Working Class
7
SUMÁRIO
APRESENTAÇÃO
INTRODUÇÃO
CAPÍTULO I: OS FUNDAMENTOS DA VIOLÊNCIA CONTRA CRIANÇAS E
ADOLESCENTES
CAPÍTULO II: A VIOLÊNCIA CONTRA CRIAAS E ADOLESCENTES NA
CONTEMPORANEIDADE: AS MEDIAÇÕES QUE DEFINEM A
PARTICULARIDADE BRASILEIRA E A SUA INTERSECÇÃO COM O SERVIÇO
SOCIAL
CAPÍTULO III: O SERVIÇO SOCIAL: UMA CONTRIBUIÇÃO AO DEBATE DA
VIOLÊNCIA CONTRA CRIANÇAS E ADOLESCENTES
1. CONSIDERAÇÕES TEÓRICAS SEGUNDO O DEBATE CONTEMPORÂNEO
DO SERVIÇO SOCIAL
2. SERVIÇO SOCIAL E PROTEÇÃO SOCIAL NUM CONTEXTO DE
VIOLÊNCIA CONTRA CRIANÇAS E ADOLESCENTES
3. O DEBATE DA TEMÁTICA DA VIOLÊNCIA CONTRA CRIANÇAS E
ADOLESCENTES PELOS PROFISISONAIS DE SERVIÇO SOCIAL
CONSIDERAÇÕES FINAIS
ANEXOS
BIBLIOGRAFIA
8
Ao meu pai,
um trabalhador que conheceu ditaduras e nunca o limiar
duma democracia.
9
AGRADECIMENTOS
A minha orientadora, Doutora Sara Nigri Goldman, que respeitou os muitos
momentos da minha prodão.
Á Coordenação do Programa de Pós-Graduação, representada pela Doutora
Yolanda Demétrio Guerra.
À banca de qualificação composta por Yolanda Demétrio Guerra e Maurílio de
Castro Matos pelas considerações que em muito contribuíram para o texto final que
agora apresento.
Aos meus professores no Programa de Pós-Graduação que sem exceção m a sua
parcela de contribuição nesta produção.
Ao Núcleo de Estudos sobre Fundamentos do Serviço Social na
Contemporaneidade NEFSSC em que as leituras e os debates ampliaram meus
horizontes quanto às inquietações de pesquisador.
A todos os profissionais que estiveram comigo no exercício profissional e que, às
vezes, mesmo dentro de contextos de controvérsias contribuíram na delimitação do
meu objeto de estudo.
10
“A Universidade tem uma importância enorme para desmascarar
a estrutura do estado de exceção e dotar a sociedade de
capacidade de decidir em que direção quer imprimir a sua
transformação. A universidade pode ajudar a usar o
conhecimento como chave libertadora.”
Francisco de Oliveira
“As coisas sonhadas só têm o lado de cá... Não se lhes pode ver o outro lado...
Não se pode andar à roda delas.. O mal das coisas da vida é que as podemos ir
olhando por todos os lados... As coisas de sonho só têm o lado que vemos... Têm
uma só face como as nossas almas.
Fernando Pessoa
“Mas essa mágica da palavra pode aplicar-se tanto à interpretação científica
como à ideologização da realidade. Esse risco está sempre à espreita, como se
fosse um surpreendente ardil da razão. A mesma razão que esclarece,
compreende e explica, recobre, mutila, obscurece. Quando permanece no nível
das aparências, das partes invertebradas, das singularidades exóticas, a
reflexão pode tornar-se prisioneira do que se observa, do que se vê, sem nunca
apreender o segredo da realidade, os nexos constitutivos das formas de
sociabilidade, dos jogos das forças sociais em suas configurações e em seus
movimentos, perdendo-se as possibilidades do devir.”
Otavio Ianni
11
APRESENTAÇÃO
Minha implicação com o tema tem relação direta com o exercício profissional
junto a crianças e adolescentes iniciado, numa segunda fase, em programas e
projetos da Prefeitura da Cidade do Rio de Janeiro na antiga Secretaria Municipal de
Desenvolvimento Social (1996-1999), na hoje denominada Secretaria Municipal de
Assistência Social (a partir de 2003) e na Secretaria Municipal de Educação (1999-
2004). Inicialmente estive uma vinculação empregatícia enquanto profissional
terceirizada e desde 1999, através de concursos públicos, minha ligação profissional
com esta prefeitura acontece na forma de servidor público. Minhas atividades
profissionais aconteceram mediante a participação do cotidiano das comunidades o
que me possibilitou acompanhar enquanto observadora a perpetração da violência
em sentido amplo e mais especialmente como e o que acontecia em relação às
crianças e adolescentes. A minha inseão numa modalidade de atendimento que
come a proteção especial¹, responsável pelo atendimento a crianças e
adolescentes em situação de rua, de “abandono” e em decorrência das mais
diversas formas da violência me propiciaram a delimitação do tema que proponho
para estudo.
O exercício profissional me possibilitou o acesso a um universo empírico
composto de uma diversidade de formas de violência contra crianças e
adolescentes. É possível ousar em encaminhar um estudo a partir de um longo
período de observação e com o referencial teórico que aqui utilizo as categorias
trabalho, mercadoria e violência contra criaas e adolescentes para estudar o trato,
o pacto e a convivência com crianças e adolescentes num contexto de violência.
As categorias simples lucro, valor de troca e oferta foram incorporadas ao
estudo aquilo que fica implícito nos discursos dos usuários que supostamente
imprimem uma violência contra crianças e adolescentes. Considerando que as
relações sociais são regidas pela ideologia que fundamenta o processo capitalista
de produção e que a partir da produção e reprodução a classe trabalhadora
incorpora e reproduz as idéias e representações “... que expressam testas relações
e as condições materiais em que se produzem, encobrindo o antagonismo que as
permeia.” (Iamamoto, 1986:30)
12
Como especifica Marilda Iamamoto “... a produção social não trata de
produção de objetos materiais, mas de relação social entre pessoas, entre classes
sociais que personificam determinadas categorias econômicas.” (Iamamoto, op. cit.)
A necessidade de reprodução da classe trabalhadora no interior das
configurações familiares é conduzida na sua mais absoluta prioridade num país em
que a redistribuição de renda é uma luta em curso. O suposto “lucro” imediato para
se refere à garantia de necessidades básicas de sobrevivência na sua urgência a
exemplo da acumulação necessária a sobrevivência do sistema capitalista. A idéia
de valor de troca incorporada às relações sociais estabelecidas a partir das mais
diversas configurações familiares envolvendo crianças e adolescentes, mesmo que
simuladas por tempo determinado, como observado nas ruas, versus a urgência
pela sobrevivência diária é outro elemento empírico que trago e que analiso a partir
da perspectiva teórica para discutir a violência. O quantitativo da população entre
crianças e adolescentes tem taxas altas de crescimento que nos remete à
categoria oferta de mercadoria e de mão-de-obra. E ainda, todo um contexto de
violações que fazem reproduzir a violência inerente ao sistema capitalista de
produção. A sociedade capitalista dita a dinâmica, a inteligibilidade e a violência que
governa a totalidade das relações sociais.
São crianças e adolescentes que expressam através de seus discursos e
histórias de vida a “barbárie capitalista”, a barbarização da vida socieria”. Minha
preocupação investigativa direciona-se a conferir ao Serviço Social a possibilidade
de aglutinação de um arcabouço teórico utilizado pela profissão, que se define
pela ruptura com a vertente conservadora, para discutir o tema da violência contra
crianças e adolescentes. Uma ruptura que expressa um pensar contemporâneo do
Serviço Social para contribuir com outra interpretação da realidade da violência
contra crianças e adolescentes brasileiros.
Como discutir um conceito de violência contra crianças e adolescentes a
partir da perspectiva crítica marxiana e da tradição marxista da lógica capitalista de
produção de exploração e expropriação da classe trabalhadora em conformidade
com o debate contemporâneo do Serviço Social? Recorri a método de Karl Marx e
busquei através de muita leitura entender como vem se processando a violência
dentro da lógica capitalista de produção e como vem sendo interpretada na
13
contemporaneidade, trazendo a discussão para a óptica teórico-metodológica do
Serviço Social. Indiscutivelmente as minhas leituras foram escolhidas com a
finalidade de embasar a minha experiência profissional, dando concretude à relação
entre teoria e prática.
O universo empírico ao qual recorri é composto por trabalhos capturados nos
Anais do 12° Congresso Brasileiro de Assistentes Sociais ocorrido em Foz do Iguaçu
entre 28 de outubro e 2 de novembro de 2007. Seu tema central versava a partir do
título A questão social na América Latina: ofensiva capitalista, resistência de classe
e Serviço Social. Trata-se de um evento que ocorre a cada três anos envolvendo
aproximadamente 2.500 assistentes sociais e estudantes. É considerado o maior
evento da categoria. Sua natureza política e científica propicia que os debates e
encaminhamentos acontecidos durante conferências, plenárias e mesas redondas,
definam a construção da agenda das entidades nacionais: conjunto
CFESS/CRESS, ABEPSS e ENESSO para o triênio seguinte. Durante o evento são
divulgadas a produção científica e técnica do Serviço Social através de
apresentação de trabalhos e comunicações pelos profissionais e pelos estudantes
de graduação e pós-graduação.
Mergulhar nesse universo de trabalhos foi uma experiência extremamente
importante, pois significou o acesso a como a categoria profissional vem
encaminhando suas reflexões; eu saí do plano dos profissionais com os quais me
relaciono profissionalmente no cotidiano para encaminhar uma intervenção e tive
acesso aqueles que se propuseram a expor suas reflexões.
Quando me deparo com muitos dos estudos que procuram desvendar o
fenômeno da violência contra crianças e adolescentes, esbarro em produções que
reproduzem o irracionalismo e o racionalismo formalista (ligados pelo agnosticismo),
que são expressões imprescindíveis do pensamento ideológico da burguesia
contemporânea, que não aceita a razão dialética, a dimensão histórica da
objetividade, a riqueza humanística da práxis. Se ficar limitada a analisar o discurso
daqueles que se propõem a debater os cenários de violência contra crianças e
adolescentes, como a mídia fica clara a evidência de manipulação de conteúdos que
propiciam a alienação dos sujeitos. Georg Lukács (1988) aponta a alienação como
um fenômeno social antigo e um problema freqüente no cotidiano a partir da sua
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utilização por parte de várias correntes teóricas. Nos epidios de violência contra
crianças e adolescentes com uso de ações barbarizantes evidencia-se o emprego
da ideologia irracionalista e subjetivista, para explicar o ato, sem, contudo buscar
aprofundar qualquer crítica, passando ao largo de uma apreciação minuciosa da
ordem dominante. São análises imbuídas de imediaticidade e espontaneismo, sem
qualquer interesse em efetuar a transformação da realidade social que perpassa as
situões sociais com as quais a sociedade vem se deparando. A minha opção é
por um estudo que na crítica ao capital, foque as relações sociais de produção que
no contexto da divisão social do trabalho são propulsoras das situações de violência
contra crianças e adolescentes.
Minha proposta visa superar a imediaticidade e a aceitação da aparência
fetichizada da realidade social que envolve as situações de violência contra crianças
e adolescentes, que se apresentam na cotidianidade dos atendimentos do Serviço
Social. Busco a relação essencial que a aparência dissimula; descarto as formas
aparentes vinculadas ao pensamento corrente, recorro à ciência para evidenciar o
seu fundo oculto.
Marilda Iamamoto afirma:
“... À medida que, no capitalismo, o modo de viver e de produzir é permeado
pela forma mercadoria, esta torna-se a mediadora, por excelência, das
relações sociais, transformando-se na aparência das relações entre coisas. É,
portanto, historicamente impossível que as representações reflitam de modo
límpido e cristalino a vida social, que a própria consciência é permeada
pela mercadoria e seu fetiche. Assim é que as representações tornam-se
expressão de um apreender parcial e mutilado da realidade, embora não
totalmente falso ou ilusório.” (Iamamoto, 1986:111)
Quero superar as análises direcionadas às situões de violência contra
crianças e adolescentes nas quais as relações humanas aparecem limitadas a “fatos
sociais isolados, que são apreendidos do ponto de vista moral. A minha intenção é
fugir daquilo que a moralização emperra: o posicionamento crítico. As relações
sociais o desvinculadas da totalidade da dinâmica social definidas pelas relações
sociais de produção que na realidade direcionam as ações dos sujeitos sociais. Não
15
é nossa intenção “encobrir” as características sociais inerentes ao produto perverso
das relações de trabalho impostas pela ordem burguesa; ocultar” os
desdobramentos sociais advindos do trabalho total e da divisão social do trabalho.
O imediatismo, o pragmatismo e o reducionismo das análises cotidianas
impedem a apresentação de propostas que expressem uma intenção de ruptura
pelo Serviço Social, em conformidade com a competência técnica, política e
investigativa imprescindível ao exercício profissional, no processo de intervenção
junto à violência contra crianças e adolescentes. A profissão é convocada a
apresentar respostas que definem vidas no âmbito da proteção social.
Paralelamente, percebo a insuficiência de fundamentos, do modo de ser e de
proceder, da lógica interna, das propriedades constitutivas e da articulação das
questões das produções intelectuais que abordam o processo de violência contra
crianças e adolescentes.
O Serviço Social vem se apropriando de produções de outras áreas do
conhecimento, como a Psicologia, a Antropologia e a Sociologia para referenciar
com base teórica a temática da violência contra crianças e adolescentes. A busca
em outras áreas do conhecimento pode estar levando o Serviço Social a conclusões
equivocadas dentro da tomada de posicionamento profissional sobre a temática e
possivelmente desconsiderando o que define o projeto ético-político da categoria. E
levando ainda, o Serviço Social a pouca ou quase nenhuma produção a partir do
referencial teórico que vem incorporando ao longo das últimas décadas, que
come o processo de ruptura com o conservadorismo e o tradicionalismo e que é
expresso no projeto ético-político da profissão. Transcrevo aqui um posicionamento
de Ricardo Cezar Rocha da Costa: “... A tarefa principal daqueles que se dedicam
à prática da pesquisa social... passa pela necessária apropriação adequada e
precisa da teoria social crítica e do método de analise histórico e dialético, tanto no
que se refere à produção marxiana, quanto às efetivas contribuições dos principais
teóricos da tradição marxista.” (Costa, 2008:106)
Não nego o pluralismo necessário no respeito à diversidade imprescindível
no exercício da democracia e à alimentação dessa diversidade. uma unidade na
diversidade. Carlos Nelson Coutinho resume a sua definição para pluralismo da
seguinte forma:
16
“Pluralismo, no terreno da ciência natural ou social, não é assim sinônimo de
ecletismo. É sinônimo de abertura para o diferente, de respeito pela posição
alheia, considerando que essa posição, ao nos advertir para os nossos erros
e limites, e ao fornecer sugestões, é necessária ao próprio desenvolvimento
da nossa posição e, de modo geral, da ciência.” (Coutinho, 1995:14)
Enfim, o meu estudo expressa a partir da perspectiva de classe, das
contradições e da historicidade que lhe são inerente, uma das possibilidades de
tornar inteligível o problema da violência contra crianças e adolescentes.
A minha proposta de estudo tem, numa abordagem teórica, a pretensão de
investigar a partir da perspectiva da totalidade que se constitui através de processos,
onde a realidade social é apreendida do ponto de vista crítico, enquanto histórica,
contraditória e dialética, numa postura de ruptura com a vertente conservadora, de
superação da imediaticidade dos atendimentos efetuados pelo Serviço Social às
situões sociais apresentadas pela população usuária no que se refere à violência
contra crianças e adolescentes. Percebo que as respostas profissionais são
imediatas e ausentes de qualquer proposta de transformação desta realidade social.
Como conclui Yolanda Guerra, “... que se superar essa perspectiva imediatista
que impregnada no Serviço Social, tanto o torna refém da razão miserável dos
procedimentos formalistas quanto abre-lhe a porta para a saída irracionalista ...”
(Guerra, 2004, p.42-43) (grifos da autora).
Sublinho a urgência definitiva do profissional de Serviço Social, em
consonância com o projeto ético-político da categoria, em participar do debate, a
partir de um enfrentamento da correlação de forças e da sociabilidade vigente, para
transformação das políticas públicas sociais direcionadas ao fenômeno da violência
contra crianças e adolescentes, pois estas são, ainda hoje, pontuais, parciais,
inconsistentes, desconexas e comem um processo de desmonte das políticas
públicas sociais brasileiras pelo que se denomina neoliberalismo. Aqui a correlação
de forças e a sociabilidade vigente são emperramentos a se superar.
Enfim, é premente ao Serviço Social a apreensão da totalidade desse
fenômeno que se evidencia como proeminente no exercício profissional. A realidade
é a síntese das múltiplas determinações” que, através da práxis, possibilita o
17
acesso a determinações parciais e a categorias universais. Não devemos nos limitar
a conhecer o singular e o parcial. Conseqüentemente, o processo de investigação
deve compor o exercício profissional do Serviço Social, enquanto fundamental
instrumento que propicia o “desvendamento da realidade” e que propõe alternativas
de ação concernentes às necessidades e interesses dos usuários (Iamamoto,
2002:41).
José Paulo Netto no seu texto Ética e crise dos projetos de transformação
social, que compõe o livro Serviço Social e ética: convite a uma nova práxis
organizado por Dilséa Adeodata Bonetti, Marlise Vinagre Silva, Mione Apolinario
Sales e Valéria M.M. Gonelli , nos remete a reflexão de que a transformação social
tem a função de uma vontade política propulsora da capacidade de edificar
estratégias com a finalidade de direcionar a ação política dos sujeitos sociais na
organização de outra ordem social. “Política não é teoria, mas supõe um
conhecimento teórico capaz de embasá-la.” (Netto, 2006:28) E é inegável que o
fenômeno da violência contra crianças e adolescentes necessita de estudos que
possibilitem outra inserção do Serviço Social que não reproduza um discurso
esvaziado de uma crítica fundamentada.
Inicio dando destaque a alguns aspectos relevantes que nos possibilitam uma
contextualização histórica do objeto de investigação: a violência contra crianças e
adolescentes.
Os séculos XVIII e XIX o demarcados no Brasil por uma ação filantrópica,
regulamentada pelo poder municipal, que legitimava o abandono de crianças que
eram deixadas nas Rodas dos Expostos. A exposição encaminhada por Renato
Pinto Venâncio no seu livro Famílias abandonadas: assistência à criança de
camadas populares no Rio de Janeiro e em Salvador séculos XVIII e XIX, da
experiência brasileira materializada na forma de Roda dos Expostos faz identificar o
abandono de crianças incorporado enquanto política pública e supor a inexistência
de lugar a ser ocupado por estas na família. De alguma forma metodologia de
assistir crianças incorpora o cultural e a moral vigente, que se esconde na pobreza -
muito embora a Roda dos Expostos fosse utilizada pela população pobre e ainda por
negros escravos que buscavam a liberdade dos filhos - justificando através dela a
entrega de crianças na roda, mas que na verdade ela atende aqueles que querem
18
dar destino aos filhos ilegítimos e fruto de relações ditas imorais segundo os
costumes das famílias daquela época.
E assim, o cultural e a moral delinearam o funcionamento das instituições
responsáveis pela operacionalização da política pública nos séculos XVIII e XIX, a
partir das atualizações que cruzam estigmatizar e higienizar, que o conduzidas
pelo Estado, prossegue no século XX até a promulgação em 1990 do Estatuto da
Criança e do Adolescente. Até aquela data não havia qualquer atenção à família ou
sua apreensão sob a perspectiva de totalidade nos moldes que se defende e se
busca consolidar ainda no século XXI.
O Decreto 5.083, de dezembro de 1926, institui o Código de Menores e o
Decreto 17.943, de 12 de outubro de 1927, consolida as leis de assistência e
proteção a menores e apresenta a redação definitiva para o referido Código. O
Código de Menores, deste período, cria a categoria abandonado e delinqüente para
apresentar as medidas de assistência e proteção legitima. A partir da delimitação
dos “infantes expostos” legitima o crescimento de crianças em espaços extra-
familiares reconhecendo os abrigos e extinguindo o sistema de rodas (“Roda dos
Expostos”) e dos “menores abandonados classificando-os enquanto abandonados,
vadios, mendigos e libertinos, institui paralelamente o estigma e uma política de
atendimento que diferencia as crianças daquelas que crescem em família. Não
garante direitos sociais fundados em princípios igualitários. Contudo, introduz uma
atenção em situação de maus-tratos e uma regulamentação do trabalho infantil.
Vicente de Paula Faleiros avalia este Código a partir da incorporação a visão
higienista, jurista repressiva e moralista (Faleiros, 2009:47)
Célia Torres, Rodrigo de Souza Filho e Rosana Morgado no texto Política da
infância e juventude: Estatuto da Criança e do Adolescente e Serviço Social (2006)
apontam que a efetivação do Código Menores (1927) acontece em decorrência da
liderança do setor jurídico, em paralelo, com um movimento internacional de
humanização da justiça e do sistema penitenciário. “Incorporando tanto a visão
higienista de proteção do meio e do indivíduo quanto à visão jurídica repressiva e
moralista, este Código considerava a família responsável pelo desvio de conduta de
seus filhos ...” (Morgado et al, 2006:102). Sinalizo que a categoria menor é instituída
e define a infância pobre. Um arcabouço de medidas é criado para atender ao
19
menor, fazendo distinção que apregoa a discriminação daqueles que são nascidos
dentro da classe trabalhadora e não correspondem ao código de condutas instituído
pela classe burguesa brasileira. naquele momento em que de alguma forma se
inicia a construção de uma intervenção junto a crianças e adolescentes, a família é
culpabilizada e de maneira indiferenciada isso permanece nos dias atuais.
Vicente de Paula Faleiros no texto Infância e processo político no Brasil
apresenta as particularidades que envolvem a relação entre Estado e sociedade na
formulação de políticas públicas voltadas para crianças e adolescentes no período
que antecede a Constituição de 1988. A inserção de crianças e adolescentes no
trabalho, que no conteúdo desta dissertação incorporei como uma forma de
violência, segundo o autor fica estabelecida a relação que articula valorização e
desvalorização da mão-de-obra nessas faixas etárias. “Os discursos e as práticas
referentes às políticas para a infância distinguem os desvalidos, dos validos tanto
econômica como sócio-politicamente.” (Faleiros, 2009:34). O trabalho era destinado
àquelas crianças e adolescentes pobres que necessitavam subsistir e preparar-se
ao futuro trabalho subalterno, ficando demarcada a distinção de a quem e a que
grupo cabia o exercício da cidadania.
Como Karl Marx constata na Inglaterra, a concepção associada a horas de
trabalho de crianças e adolescentes em proporção maior em horas para impedir a
ociosidade e o vício legando que o ambiente da fábrica é aconchegante e
moralmente puro. Houve a incorporação desse discurso moral, que atende os
interesses do capital, e as famílias brasileiras procuravam inserir precocemente no
trabalho seus filhos como parte do processo educativo.
No Brasil essa prática esteve presente de forma transversal ao longo da
evolão das políticas públicas que de alguma maneira regulamentou o trabalho
infantil até 1990. Isso se constitui numa prática legítima enquanto política pública até
a revogação do Programa Bom Menino em 1991. Este regulamentava a iniciação ao
trabalho pro quatro horas diárias entre a idade de 12 e 18 anos mediante bolsa de
meio salário mínimo, cuja cota de incorporação estava atrelada ao percentual de
funcionários da empresa.
20
“A cidadania da criança e do adolescente foi incorporada na agenda dos
atores políticos e nos discursos oficiais muito recentemente, em função da
luta dos movimentos sociais no bojo da elaboração da Constituição de 1988.
Na cultura e estratégias de poder predominantes, a questão da infância não
se tem colocado na perspectiva de uma sociedade e de um Estado de
direitos, mas na perspectiva do autoritarismo/clientelismo, combinando
benefícios com repressão, concessões limitadas, pessoais e arbitrárias, com
disciplinamento, manutenção da ordem, ao sabor das correlações de forças
sociais ao nível da sociedade do governo. As polêmicas relativas às políticas
para a infância demonstram esse conflito de visões e de estratégias, por
exemplo, a que se refere à divergência entre os que privilegiam a punição e
os que privilegiam o diálogo, a negociação, as mediadas educativas.
(Faleiros, 2009:35) (grifos meus).
Reforça Vicente de Paula Faleiros no texto que utilizo como referência a
vitória da indústria em 1932 diante da modificação do Código de Menores que
passa a autorizar o trabalho precoce antes de 14 anos, quando membros da mesma
família trabalham juntos numa empresa. “Os industriais expressam que o Código de
Menores „aplicado sem acautela, na expressão de sua letra, fatalmente lançará ao
regaço da sociedade uma nova legião de candidatos à vagabundagem, ao vício e ao
delito. O menor dos seus males será a multiplicação de rufiões e meretrizes‟”.
(Faleiros, 2009:51). Uma legislação pautada no conduto cultural e moral destinado
aos filhos da classe trabalhadora.
O Serviço Nacional de Assistência ao Menor (SAM) criado em 1941 e
redefinido em 1944, cuja finalidade era constituir-se num serviço direcionado à
infância, representava na verdade uma intenção de consolidar a ordem social.
“A política da infância, denominada „política do menor‟, articulando repressão,
assistência e defesa da raça, se torna uma questão nacional, e, nos moldes
em que se foi estruturada, vai ter uma longa duração e uma profunda
influência nas trajetórias das crianças e adolescentes pobres desse país.”
(Faleiros, 2009:57)
21
A criação da Fundação Nacional do Bem Estar do Menor (FUNABEM) em
1964, ocasião na qual se inicia a articulação de políticas públicas com entidades
privadas para intervirem no “problema do menor”. Isso implicou numa seqüência de
estudos daquilo que se passou a denominar terceiro setor, quanto a críticas
direcionadas à administração de recursos públicos. A FUNABEM surgiu num
contexto de ações repressivas voltadas para a infância e compôs o sistema
repressivo e tecnocrático da ditadura.
A Lei 6.697, de 10 de outubro de 1979, institui o Código de Menores,
definindo a assistência, proteção e vigilância, é indiscutivelmente um documento
que pune e criminaliza a pobreza. Parte da delimitação de situação irregular o menor
que estiver na condição de abandonado; na incapacidade dos pais em prover;
enquanto vítima de maus-tratos; em situação que caracterize perigo moral; em
abandono eventual; com desvio de conduta decorrente da grave inadaptação
familiar ou comunitária e os infratores. E ainda, atrela a aplicação da Lei às diretrizes
da Política Nacional do Bem-Estar do Menor fundada na institucionalização
daqueles considerados em situação irregular.
O Estatuto da Criança e do Adolescente Lei 8.069, de 13 de julho de 1990 -
substitui o Código de Menores. Ele regulamenta o que define o artigo 227 (É dever
da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com
absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à
profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência
familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência,
discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.) da Constituição Federal
de 1988, garantindo a crianças e adolescentes direitos sociais enquanto prioridade
absoluta e resguardando-os da negligência, discriminação, exploração, violência,
crueldade e opressão. A proteção integral à criança e ao adolescente representa o
reconhecimento destes enquanto sujeitos de direitos, pertencentes à família, à
comunidade e à sociedade, numa condição igualitária aos demais membros sendo
respeitadas as suas peculiaridades. Seu texto apresenta uma inovação no campo
da cidadania de crianças e adolescentes; o Estatuto da Criança e do Adolescente “...
não rompeu com a estigmatização formal da infância e adolescência pobres
anteriormente categorizadas como menoridade, como ainda buscou desjudicializar o
22
atendimento a esses segmentos da população ...” (Mendes e Matos, 2004:245)
(grifos dos autores). Independentemente dos Conselhos Tutelares constituírem uma
“inovação político-administrativa” os emperramentos na execução de suas
atribuições são de ordem conjuntural. Cabe destaque às palavras de Alessandra
Gomes Mendes e Maurílio Castro de Matos:
“A conjuntura, desde a implantação dos primeiros conselhos tutelares até o
momento presente, tem sido adversa à implementação de projetos que visem
à democracia. Vivemos consecutivos governos que buscaram fragilizar a
mobilização dos trabalhadores, não efetivaram políticas sociais públicas,
apelaram para uma ideologia da solidariedade interclasse, para uma
criminalização da questão social, tendo como ponto central a busca
incessante de desresponsabilização do Estado para com o social... Estes
dilemas se acirram quando estamos tratando de crianças e adolescentes,
uma vez que são vistos historicamente como pessoas subordinadas a
vontades alheias, portanto não são vistos como sujeitos”. (Mendes e Matos,
2004:257):
Num contexto de diversas formas de violência contra crianças e adolescentes,
a “Chacina da Candelária” ocorrida na cidade do Rio de Janeiro em 23 de julho de
1993, propiciou dentro de uma lógica perversa e equivocada pelo seu atraso e a
partir da pressão de sujeitos sociais e organizações nacionais e internacionais
comprometidas com a infância e juventude, o debate do tema violência contra
crianças e adolescentes, posto em destaque na forma de extermínio de meninos.
Uma das medidas fora o ordenamento da ação de agentes repressivos nas vias
públicas. Houve, tamm, a introdução, na cidade do Rio de Janeiro, do
ordenamento da intervenção municipal, segundo a legalidade instituída pelo Estatuto
da Criança e do Adolescente (1990) e a Lei Orgânica de Assistência Social (1993).
No processo de organicidade da Seguridade Social composta pela saúde,
previdência social e assistência social, instituída pela Constituição de 1988, toma
contornos próprios a assistência social. A Lei Orgânica de Assistência Social (1993),
no âmbito nacional, inicia o processo de descentralização político-adminstrativa e a
primazia da responsabilidade do Estado na gestão da política de assistência social,
ainda em andamento. Com algum atraso a Política Nacional de Assistência Social
23
(2004) regulamenta os artigos ( A assistência social tem por objetivos: I a
proteção à família, à maternidade, à infância, à adolescência e à velhice; II o
amparo às crianças e adolescentes carentes; III a promoção da integração ao
mercado de trabalho; IV - a habilitação e reabilitação das pessoas portadoras de
deficiência e a promoção de sua integração à vida comuniria; V a garantia de 1
(um) salário mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência e ao
idoso que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção ou de tê-la
provida por sua família; Parágrafo Único. A assistência social realiza-se de forma
integrada às políticas setoriais, visando ao enfrentamento da pobreza, à garantia dos
mínimos sociais, ao provimento de condições para atender contingências sociais e à
universalização dos direitos sociais.) e o artigo ( Consideram-se entidades e
organizações de assistência social aqueles que prestam, sem fins lucrativos,
atendimento e assessoramento aos beneficiários abrangidos por esta lei, bem como
as que atuam na defesa e garantia de seus direitos.). A Lei Orgânica de Assistência
Social apresenta o Sistema Único de Assistência Social, de uma forma implícita
aborda a temática da violência contra crianças e adolescentes na regulamentação
da proteção básica e proteção especial.
Não como criar um hiato entre a violência contra crianças e adolescentes
e a lógica econômica capitalista. Não se trata de uma analogia entre a violação de
direitos humanos e “imposição de direitos desumanos” pela política econômica na
forma das desigualdades sociais ou injustiça social. As relações sociais estão
imbricadas dentro de uma lógica que objetiva exclusivamente a maximização dos
lucros.
Elaine Rossetti Behring (2003) em seu estudo que aborda o Estado como
espaço síntese das relações sociais, sob a hegemonia do capital”, sob a prevalência
da classe dominante, cuja incorporação da demanda da classe trabalhadora se
efetiva no processo de luta de classes, cita a violência dentro de sua análise da
contra-reforma do Estado. A autora aponta que no contexto da relação capital-
trabalho que se institui na sociedade brasileira na história recente do país, diante da
impossibilidade de desconcentração de renda, da desnacionalização da economia
decorrente das privatizações, das limitações ao crescimento econômico, da
adaptação à economia mundial, da flexibilização das relações de trabalho, do
24
desemprego estrutural e da vulnerabilidade social, milhões de cidadãos passam a
ocupar espaços sociais que configuram a “violência endêmica”. As seqüelas da
contra-reforma do Estado caracterizam a deterioração das condições sociais,
aumento dos índices de violência, complexidade nas relações familiares,
inconstância na manutenção e insuficiência da renda. A flexibilização e
desregulamentação dos contratos de trabalho denotam a ausência do direito.
Desigualdade social e violência são conseqüências inerentes à contra-reforma do
Estado. O corte de recursos públicos para política pública social, apesar do aumento
da demanda por serviços sociais públicos, justifica-se na crise fiscal e na disputa
pelo fundo público. Há a flexibilização de direitos.
Não obstante, a regulamentação de direitos sociais não vem garantindo a sua
efetiva exeqüibilidade. O profissional de Serviço Social, enquanto categoria
profissional que entre suas competências tem na defesa de direitos um espaço
inquestionável de intervenção.
Notas:
1 . A partir da Lei Orgânica de Assistência Social (1993) se introduz a
assistência social enquanto política pública sob a responsabilidade do Estado. A IV
Conferência Nacional de Assistência Social (2003) deliberou a construção e
implementação do Sistema Único de Assistência Social - SUAS. O Sistema Único
de Assistência Social (SUAS) operacionalidade à assistência social enquanto
política pública. A Política Nacional de Assistência Social cujos eixos introdutórios de
gestão são a descentralização e a participação. Na configuração da rede de serviços
socioassistenciais, os desdobramentos na forma de serviços, programas, projetos e
benéficos priorizando a atenção à família, estes se distinguem em proteção social
básica e especial.
25
INTRODUÇÃO
O conhecimento da realidade nos remete a necessidade de apropriação do
método de investigação que se fundamenta na teoria social marxiana e nas
construções teóricas a posteriores que compõem a teoria social de Marx.
A teoria social marxiana é uma ontologia do ser social que objetiva apreender
a realidade enquanto uma totalidade - o ser social histórico e concretamente
concebido, sua produção e reprodução. Suas investigações, análises, afirmações
etc. ao se referirem invariavelmente a certo tipo de ser são ontológicas.
O ato de conhecer não esgota o ser. O conhecimento é inesgotável, pois o
ser é envolto de complexidade e contradições. O ser é inesgotável. O ser é sempre
mais complexo que a nossa capacidade de conhecê-lo. A consciência e a realidade
objetiva são processos históricos, por isso a relação sujeito e objeto nunca se
exaure. O recorte da realidade que proponho trata-se de uma busca de verdade que
se refere a um momento histórico determinado; representa a verdade que
corresponde a um vivido histórico determinado, o que não inviabiliza a possibilidade
de ser derrubada em outro momento e vir a se constituir outra verdade, distinta
desta. O conhecimento é possível quando correta e adequadamente acontece o ato
científico de apossear-se da concepção de história numa perspectiva de totalidade
e de incorporar a teoria social de Marx enquanto teoria crítica da sociedade
burguesa
“... resgatando daí um método para investigação e alise do ser social com
vistas à transformação, permitem à profissão avançar sobre as concepções
vigentes até o momento, estabelecendo complexas mediações entre
economia e cultura, entre ética e política. Portanto, o que diferencia as
concepções da vertente de ruptura das anteriores é a concretização histórico
social a que submete o objeto de estudo...” (Guerra, 2004:35)
26
O que define o critério de verdade é “... a prática social das classes, a qual
demanda um tipo de agente profissional determinado pelas suas necessidades reais
e concretas.” (Guerra, 2004:35).
A relação que o pesquisador estabelece com o desconhecido se efetiva pelas
necessidades objetivas, aspirações e possibilidades determinadas historicamente. O
que define a escolha que faz o pesquisador são os questionamentos, as dúvidas, a
necessidade de estabelecer a verdade.
Karl Marx em seu texto O método da economia política expõe o método
cientificamente exato” pelo qual se processa a investigação da dinâmica da
sociedade burguesa.
Não há como investigar o fenômeno da violência, da violência contra crianças
e adolescentes, sem o inserir nas relações sociais que perpassam a lógica do
capital. O processo de aproximação do real parte da “representação do todo caótico”
da realidade social que come e que se apresenta a priori por múltiplas ações que
se caracterizam enquanto atos violentos contra crianças e adolescentes, que
isolados não m qualquer significado científico, são apenas fatos isolados. A
construção do conhecimento pressupõe um processo que partindo do concreto,
representado” chega a abstrações e como desdobramento subseqüente as
determinações mais simples. E através do pensamento ao fazer o caminho de volta
vê-se que o resultado dessa construção é uma “totalidade de determinações e
relações diversas”. Karl Marx referindo-se ao método diz:
“... o concreto é concreto, porque é a síntese de muitas determinações, isto é,
unidade do diverso. Por isso, o concreto aparece no pensamento como o
processo da síntese, como resultado, não como o ponto de partida, embora
seja o verdadeiro ponto de partida e, portanto, o ponto de partida também da
intuição e da representação.” (Marx, 2008:258-259)
Reinaldo Nobre Pontes a partir da interpretação que faz desta proposição de
Karl Marx afirma:
27
“... o processo de conhecimento, de reconstrução do concreto, é um processo
de síntese que a razão teórica reproduz no plano do pensamento,
ultrapassando as mediações, que se interpõe entre o fenômeno e a essência,
ou seja, entre o nível do abstrato (imediato) ao concreto (mediato).” (Pontes,
1989:12)
Karl Marx afirma no mesmo texto que G.W. Friedrich Hegel equivocou-se
quando apreendeu o real como resultado do pensamento. E apresenta enquanto
método aquele “... que consiste em elevar-se do abstrato ao concreto não é senão a
maneira de proceder do pensamento para se apropriar do concreto, para reproduzi-
lo mentalmente como coisa concreta.” (Marx, 2008:259)
G. W. Friedrich Hegel nos apresenta no Prefácio do seu texto Fenomenologia
do Espírito a mediação, que conseqüentemente direciona as construções
subseqüentes a partir de uma leitura crítica, como principalmente os estudos de Karl
Marx:
“... a mediação nada mais é do que a igualdade consigo mesmo que a si
mesma se move, ou é a reflexão em si mesmo, o momento do Eu existente-
para-si, a pura negatividade, ou seja, a negatividade reduzida à sua simples
abstração, o simples devir.” (Hegel, 1996:304) (grifos do autor)
A mediação, como relação constituinte do sujeito que se pesquisa e o objeto
que se reconstrói, propicia a captação dialética do movimento do ser social
confirmada numa legalidade tendencial, imanente, histórica e teórica e que conduz a
investigação onde as categorias concretas no seu movimento dão sentido ao
processo histórico. A “... busca das mediações significa, no plano metodológico, a
captura das articulações e passagens vivas que se processaram entre as instâncias
envolvidas na trama histórica.” (Pontes, 2002:161)
São as categorias simples e as categorias complexas com sua “existência
antediluviana” e expressas teoricamente na categoria concreta, onde uma
relação de subordinação entre elas na medida em que o concreto mais desenvolvido
a preserva.
28
“... a categoria simples pode exprimir relações dominantes de um todo pouco
desenvolvido ainda, relações que já existiam antes que o todo tivesse se
desenvolvido na direção que é expressa em uma categoria mais completa.
Neste sentido, as leis do pensamento abstrato que se eleva do mais simples
ao complexo, correspondem ao processo histórico real.” (Marx, 2008:260-261)
Yolanda Guerra entende que “... a articulação das categorias não é
determinada pela análise, mas é resultado desta.” (Guerra, 2004:32). Acompanho a
autora citando tamm o posicionamento de Karl Marx:
“... até as categorias mais abstratas, apesar de sua validade precisamente
por causa de sua natureza abstrata para todas as épocas, são, contudo, no
que de determinado nessa abstração, do mesmo modo o produto de
condições históricas, e não possuem plena validez senão para essas
condições e dentro de limites dessas mesmas condições. (Marx, 2008:260-
264)
O método dialético de pesquisa apresentado por Karl Marx no Posfácio da 2ª.
Edição de O capital em que afirma que o real é pensado e interpretado pelo
pesquisador. A investigação tem de apoderar-se da matéria, em seus pormenores,
de analisar suas diferentes formas de desenvolvimento, e de perquirir a conexão
íntima que entre elas. depois de concluído êsse trabalho, é que se pode
descrever, adequadamente, o movimento do real.” (Marx, 1989:16)
Sergio Lessa (1999) defende que a metodologia mais apropriada ao
conhecimento de um objeto somente pode ser apresentada com exatidão post
festum, o que significa dizer, após o conhecimento do referido objeto. A função da
reflexão metodológica está em indicar as hipóteses mais prováveis que frente a um
determinado desconhecido... deverão ser primeiro investigadas...” E evidenciar “... o
caráter de aproximação de todo o movimento gnosiológico. A cada nova avanço do
conhecimento, ampliam-se tamm as experiências de investigação que poderão e
deverão, ser generalizadas em sentido metodológico.”(Lessa, 1999:145) (grifos do
autor). Distintamente o método, segundo Karl Marx, “... que consiste em elevar-se
do abstrato ao concreto não é senão a maneira de proceder do pensamento para
29
apropriar do concreto, para reproduzi-lo mentalmente como coisa concreta.” (Marx,
2008:259)
A prática profissional, enquanto práxis social conduz ao desvelamento do real.
Não quero aqui repetir o equívoco da
“... aderência pragmática aos fatos imediatamente dados exclui da concepção
de conjunto certas conexões efetivamente existentes, mas que se apresentam
com menor imediaticidade, com o freqüente resultado de se desembocar
numa falsificação objetiva dos fatos fetichisticamente divinizados.” (Lukács.
1979:23)
O conhecimento visa a superação da imediaticidade cotidiana. O
conhecimento procura entender a processualidade contraditória dos processos
presentes no cotidiano e tem como objetivo a re-configuração, no pensamento, do
seu movimento. O conhecimento parte de categorias analíticas. A verdade presente
no conhecimento diz respeito, através das categorias analíticas, deste compreender
“... o movimento, as determinações, os modos de ser dos processos analisados,
bem como a lógica do movimento de constituição dos processos. Porque incorpora o
movimento, a negatividade, o vir a ser dos processos, a razão é dialética.” (Guerra,
2006:2)
A ontologia marxiana, ontologia do ser social, cuja categoria fundante é a
práxis, sendo o processo de trabalho inerente a sociabilidade, este possibilita a
apreensão “... do modo de ser e reproduzir-se do ser social enquanto gestador de
totalidade complexas e dimicas, com legalidades e estruturas particularizadas
historicamente.” (Netto, 1994, p. 35) (grifos do autor).
José Paulo Netto (1994) na sua reflexão apresenta o processo de trabalho,
que imbuído de teleologia determina o ser social, onde cada sujeito social,
apoderando-se da herança cultural através da socialização, é simultaneamente
singularidade e universalidade e cuja existência enquanto ser social somente é
possível na medida em se constitui como ser objetivo - a objetivação ontológica
primária é especificamente o trabalho, atividade impreterivelmente coletiva que
define o homem como “ser prático e social.”
30
O referido autor conclui que:
“... a categoria de práxis permite a Marx compreender que, se cada
objetivação humana é um ato teleológico, nem por isto uma teleologia na
história: a história é um campo aberto de possibilidades entre a liberdade
concreta de cada sujeito e a necessidade e a legalidade objetivas que
decorrem da interação das suas objetivações, que, efetivadas,
desencadeiam processos que transcendem os sujeitos. A historicidade que
Marx apreende na sociedade é-lhe imanente: resulta de que a sociedade é o
processo global das objetivações sociais, sua produção e reprodução, suas
interações ...” (Netto, 1994, p. 37) (grifos do autor)
Na proposição teórico-metodológica de Karl Marx o termo crítica” não
descarta a possibilidade de utilização dos dados advindos do domínio particular do
ser social, simplesmente a defesa de que sejam submetidos à crítica marxiana.
Carlos Nelson Coutinho define crítica marxiana enquanto:
“...crivo da totalidade, através do qual se busca relacionar dialeticamente os
objetos elaborados pela ciência particular com a totalidade social,
mediatizando e desfetichizando tais objetos, fazendo com que deixem de ser
meros „fatos‟ e se convertam em processos ou momentos de processos... , a
crítica procura submeter os resultados da ciência particular ao crivo da
historicidade, já que, para o marxismo, a totalidade que se tem em vista não é
uma totalidade fechada definitiva, mas antes um processo de totalização ...”
(Coutinho:1999:99-100) (grifos do autor)
Após muitas dúvidas tiradas e leituras optei por não elencar as diferentes
expressões de violência contra crianças e adolescentes. Seria um paradoxo, posto
que, busco romper com uma visão fragmentada do fenômeno. Discorrer sobre cada
uma dessas expressões significaria negar a minha própria proposta de apresentar
um estudo de ruptura, coerente com o arcabouço bibliográfico do qual vem se
apropriando o Serviço Social, que indiscutivelmente confere fundamentação teórica
na discussão da essência do fenômeno da violência contra crianças e adolescentes.
31
Agora cito qual foi esse universo empírico de violência contra crianças e
adolescentes dentro do qual venho mergulhando profissionalmente: trabalho infantil;
trabalho escravo infanto-juvenil, exploração sexual, pedofilia, tráfico para fins
sexuais, seqüestro seguido de homicídio, violência psicológica, estupro, violência
física, negligência, abandono etc.
São meus objetivos fundamentar o debate da violência contra crianças e
adolescentes e mostrar como o Serviço Social vem considerando a dimensão
teórico-metodológica, ético-política e cnico-operativa. Como afirma Georg Lukács
“..é preciso compreender que o caminho necessário, cognoscitivamente necessário,
que vai dos „elementos‟ (obtidos pela abstração) ao conhecimento da totalidade
concreta é tão-somente o caminho do conhecimento...” Lukács, 1979:38).
Os capítulos da dissertação estão assim distribuídos: No capítulo I conduzo
uma discussão dos fundamentos da violência contra crianças e adolescentes com a
finalidade de apresentação do seu debate na contemporaneidade. Neste apresento
a análise do tema que proponho utilizando as categorias que considero centrais e
estruturantes na abordagem do objeto de estudo segundo a minha opção teórica:
trabalho, mercadoria e violência contra crianças e adolescentes. É claro que não
seria possível não envolver na composição do texto o arcabouço lingüístico utilizado
pelos autores dessa teoria marxiana e a tradição marxista para discorrer a análise
do capitalismo. Recorro à gênese da violência numa tentativa de entender porque o
homem encaminha violência contra outro homem. É um debate difícil cuja origem diz
respeito à práxis dos sujeitos sociais na medida em que somente o homem direciona
a força contra outro homem. O Estado enquanto gestor da violência aparece nesse
capítulo de forma introdutória. A família enquanto suposto “agente de violência”
requereu uma argumentação que a colocasse dentro do processo de acumulação
capitalista, que apresentasse a violência contra crianças e adolescentes a partir de
uma lógica da reprodução das relações sociais, que vai além da ação mecanicista,
mas que deflagra a desigualdade social inerente atualidade do neoliberalismo.
No capítulo II apresento uma discussão da violência contra crianças e
adolescentes destacando a particularidade brasileira. O particular, através das
mediações, propicia uma aproximação da verdade condizente com o atual momento
histórico da sociedade brasileira. Trago alguns elementos que compõem as análises
32
de autores cujo foco é outras partes territoriais do cenário mundial, mas que a
globalização traz para dentro do país. A Revolução Industrial com a constituição da
fábrica no século XIX e as guerras e revolução no século XX frente à maximização
dos lucros em prol da acumulação e as disputas pelo poder propiciam a constrão
da minha discussão na particularidade brasileira procurando entender a situão de
violências que vivencias as crianças e adolescentes brasileiros.
No capítulo III construí um entendimento para o Serviço Social da violência
contra crianças e adolescentes, apresentado uma elaboração teórica que seja um
reflexo do debate e da bibliografia acumulada pelo Serviço Social frente ao projeto
ético-político profissional. O caráter provisional do conhecimento mobilizou esforços
no sentido de recorrer a uma bibliografia de Serviço Social principalmente entre
2000 e 2009, recorri a textos da década de 80 e 90 em função da sua relevância.
Utilizei como materiais empíricos trabalhos apresentados no 12º Congresso
Brasileiro de Serviço Social e a partir destes fiz algumas considerações que avaliei
importantes dentro dos meus objetivos procurando manter uma unidade no interior
da produção. Foram selecionados trinta e cinco trabalhos que abordavam o tema da
violência contra crianças e adolescentes e incluídos na minha discussão vinte
destes. E m anexo apresento o universo dos trabalhos selecionados e incluídos na
dissertação.
O critério de elegibilidade foi o debate da violência contra crianças e
adolescentes. Os trabalhos descartados ao final tinham mais aproximação com o
debate da violência urbana ou com o debate exclusivo do sócio-jurídico, quero
ressaltar aqui a qualidade de todos os trabalhos.
33
CAPÍTULO I
OS FUNDAMENTOS DA VIOLÊNCIA CONTRA CRIANÇAS E
ADOLESCENTES
“...Na rua examinei o ente sólido, áspero com os
trabalhadores, garboso nas cavalhadas. Vi-o arrogante,
submisso, agitado, apreensivo um despotismo que às vezes
encolhia, impotente e lacrimoso. A impotência e as
lágrimas não nos comoviam. Hoje acho naturais as
violências que o cegavam. Se ele estivesse em baixo, livre de
ambições, ou em cima, na prosperidade, eu e o moleque
José teríamos vivido no sossego. Mas no meio, receando
cair, avançando a custo, perseguido pelo verão, arruinado
pela epizootia, indeciso, obediente ao chefe político, à
justiça e ao fisco, precisava desabafar, soltar a zanga
concentrada. Aperreava o devedor e afligia-se temendo
calotes. Venerava o credor e, pontual no pagamento,
economizava com avareza. não economizava pancadas
e repreensões. Éramos repreendido e batidos. “
Trecho transcrito do conto Verão do livro Infância: memórias de Graciliano Ramos
O objetivo deste capítulo é apresentar a minha análise do tema proposto a
partir das categorias centrais que entendo serem essenciais e estruturantes na
apropriação do objeto de estudo segundo o referencial teórico pelo qual optei:
violência contra crianças e adolescentes, mercadoria e trabalho. As categorias
serão reconstruídas com a finalidade de que seja possível apresentar os
fundamentos da violência contra crianças e adolescentes. Entendo que poderiam ser
inúmeros os caminhos para o alcance dos objetivos aqui propostos sem me afastar
de minhas pretensões quanto ao método, mas cabe tamm a importância de
delimitar.
Adolfo Sánchez Vázquez em seu livro Filosofia da práxis no capítulo
intitulado Práxis e violência estabelece uma vinculação entre violência e práxis. Para
34
este autor a violência acontece quando o natural ou humano apresenta resistência
ao homem. “Verifica-se justamente numa atividade humana que detém, desvia e
finalmente altera uma legalidade natural ou social.” (Vázquez, 1977:374). Assim, a
violência se restringe ao homem, “... na medida em que ele é o único ser que para
manter-se em sua legalidade propriamente humana necessita violar ou violentar
constantemente uma legalidade exterior (a da natureza).” (Vázquez, 1977:374). Não
é somente a força que determina a violência. As forças naturais estão presentes na
natureza, mas a violência não se resume à força em si, ou em ação. A violência
consiste no uso da força.
“Na natureza, as forças atuam, mas não se usam; o homem usa a força e
pode usar a si mesmo como força. Por isso dizemos que a força em si não é
violência, e sim apenas a força usada pelo homem. Daí o caráter
exclusivamente humano da violência.” (Vázquez, 1977:375)
Prossegue o referido autor na sua argumentação. Na práxis produtiva a
violência parte do sujeito (homem), pois há oposição do humano com o não humano
(a natureza). a ação de alteração e destruição do objeto. A matéria resiste e o
sujeito faz uso de atos violentos com a finalidade de dominação. Na práxis social o
homem é sujeito e objeto da ação. A práxis como ação de sujeitos sobre os
humanos (outros sujeitos) na transformação da realidade social depois da
subvenção do ordenamento social vigente. Diante da resistência humana a
transformação, o homem emprega a violência para fazer desaparecer os obstáculos
que estão impedindo a instauração da nova ordem social.
“A matéria da ação humana resiste a ser transformada e a ação do homem
assume uma forma violenta porque ela permite remover os obstáculos
para que tenha lugar uma criação... A violência está tão vinculada a toda
produção ou criação hisrica, que não faltou quem nela visse a própria força
motriz do desenvolvimento histórico.” (Vázquez, 1977:377)
A práxis social enquanto ação cuja finalidade é a transformação de uma
determinada realidade, tem que “vencer a resistência” e “esbarra no limite oferecido”
por aqueles que defendem a ordem social vigente.
35
“A violência se insere na práxis na medida em que se faz uso da força, pois
a ação violenta é exatamente a que tende a vencer ou saltar um limite
através da força... A violência visa dobrar a consciência, obter seu
reconhecimento, e a ação que se exerce sobre o corpo dirige-se, por isso, a
ela. Não interessa a alteração ou destruição do corpo como tal, mas sim
como corpo de um ser consciente, afetado em sua consciência pela ação
violenta de que é objeto. Por tanto, a violência que se exerce sobre o corpo
não se detém nele, e sim em sua consciência; seu verdadeiro objeto não é o
homem como ser natural, físico, como mero ser corpóreo, mas sim como ser
humano e consciente.” (Vázquez, 1977:379-380)
Para Adolfo Sánchez Vázquez, a instauração da violência na sociedade
acontece a partir de oposições existentes entre determinadas relações sociais, “uma
violência responde a outra”. A violência pressupõe a aplicação de distintas formas
de coerção, que abrangem, inclusive, as ações armadas, que intencionam a
conquista ou a manutenção de domínio econômico e político, ou o alcance de
privilégios. O antagonismo entre classes sociais fundamenta a violência nas
relações sociais. O surgimento e o desenvolvimento da violência nas relações
sociais relacionam-se à propriedade privada e à divisão da sociedade em classes.
“A luta de classes se desenvolve historicamente com um coeficiente maior
ou menor de violência, mas a experiência histórica demonstra que quando
está em perigo a existência da classe dominante, esta não vacila em
recorrer às formas violentas mais extremas, inclusive o terror maciço, pois
nenhuma classe social está disposta a abandonar voluntariamente o cenário
da história. (Vázquez, 1977:381)
Destaco, pois propicia a intersecção entre o pensamento do autor e o tema
que pretendo abordar, a referência que faz à exploração do homem pelo homem
presente na sociedade capitalista contemporânea em que a violência aparece
também de modo indireto, espontâneo, cujo aspecto preponderante é o seu caráter
alienante e explorador.
“Na sociedade baseada na exploração do homem pelo homem, como a
sociedade capitalista atual, a violência se mostra tanto nas formas diretas e
36
organizadas de uma violência real ou possível, quanto de modo indireto, e
aparentemente espontâneo, como violência vinculada ao caráter alienante e
explorador das relações humanas. É a violência da miséria, da fome, da
prostituição ou das enfermidades, que já o é a resposta a outra violência
potencial ou em ato, mas sim a própria violência como modo de vida porque
assim o exige a própria essência do regime social. Essa violência surda causa
muito mais vítimas do que a violência ruidosa dos organismos coercitivos do
Estado.” (Vázquez, 1977:382) (grifos do autor)
A violência perpetrada pelas instituições coercitivas do Estado não medem
esforços para defender tais interesses dominantes. Isto dito fica fácil acrescentar
que as mediações vinculadas ao desenvolvimento do modelo de instauração da
dinâmica capitalista na realidade brasileira esclarecerão como a violência veio sendo
incorporada e reproduzida. Não é meu interesse a abordagem dos processos de
institucionalização da violência e sim, a totalidade das relações sociais que na
dinâmica societária capitalista contemporânea incorporam e reproduzem a violência
recorrendo a ações barbarizantes, naturalizando-as e banalizando-as sem
precedentes. É verdade que o Estado desempenha uma função coercitiva no
âmbito da sociedade. Sem negar esta função, a ação violenta do Estado virá
vinculada às medidas de cunho ideológico que na defesa da classe dominante
brasileira e dos interesses do capital mundializado conduzirão à barbarização da
vida societária” através das expressões da violência, inclusive aquelas que
expressam a violência contra crianças e adolescentes.
A violência seja nas “formas diretas e institucionalizadas” quanto de modo
indireto” que perpassa as relações sociais é incorporada e reproduzida. A crítica, o
elenco punitivo e a repressão ocorrem no plano da culpabilização individualizada,
sem uma análise que perpasse a dinâmica societária na sua totalidade, a partir do
entendimento de que a realidade é histórica, contraditória e dialética. A realidade
que se apresenta de forma caótica na singularidade dos atos de violência contra
crianças e adolescentes se constitui num desafio cognoscente, pois as mediações
que dão significado e particularidade e as categorias que são “o verdadeiro ato de
produção” (Marx, 2008:259), precisam propiciar um pensar e conceber a realidade
de forma diferenciada a dessa lógica individualizada, criminalizadora e perversa.
37
A violência contra crianças e adolescentes é a reprodução das relações
sociais de explorão que é imposta à classe trabalhadora, não surge de um vazio,
não seria algo a se compor de julgamento moral a priori, e sim, constitui-se em
processualidade histórica e dialética.
Na configuração contemporânea do fenômeno da violência contra crianças e
adolescentes deve-se considerar que o conjunto das relações sociais que
antecederam e que, superadas dentro da processualidade histórica, deu origem a
totalidade das relações sociais pertencentes à sociedade burguesa. Tal
processualidade histórica determina a violência, a violência contra crianças e
adolescentes, presente na dinâmica social que delineia o sistema capitalista de
produção. Enfim, a violência e a violência contra crianças e adolescentes compõem
as relações sociais, a especificidade está no lugar que ela ocupa dentro do contexto
social a cada período da história ou na finalidade atribuída segundo os interesses de
uma classe em detrimento de outra.
Não apreendo o tema da violência contra crianças e adolescentes
identificando a família enquanto “agente da violência”. Para meu entendimento a
família compõe a dinâmica societária e reproduz a violência, resultante da
expropriação e da exploração sob a classe trabalhadora, engendrada pela classe
dominante no processo de acumulação.
Muito embora a violência não expresse uma idéia dominante funda uma forma
de condução do sistema em prol do seu objetivo maior que é a acumulação. A forma
de universalidade que atinge a violência é incorporada e reproduzida fomentando as
relações sociais inclusive aquelas que abrangem crianças e adolescentes; exprime a
incorporação da violência na sua naturalização e banalização, uma forma legítima
de relação entre os sujeitos sociais. A analogia e a conexão entre a violência
inerente a lógica que na contemporaneidade atingiu uma dimensão sem
precedentes e a violência contra crianças e adolescentes na particularidade é a
alienação do trabalho. Há a reprodução social dos elementos constitutivos dos
processos sociais de produção. E por isso optei por trabalhar com as categorias
mercadoria e trabalho.
38
A particularidade das sociedades se define a partir do processo pelo qual a
violência foi introduzida e legitimada no curso da própria história de introdução e
consolidação da sociedade capitalista. E posteriormente, apresentarei algumas das
mediações para apresentar isto.
No Prefácio da Edição Karl Marx afirma que na sua concepção do
desenvolvimento da formação econômico-social, a priori um processo histórico, que
exclui prioritariamente, a responsabilidade do indivíduo por relações, quando o
entende enquanto criatura. Eu aqui na exigência que me cabe de contemporização
do seu pensamento incluo a necessidade de estabelecer uma relação com o
significado de liberdade¹.
O meu entendimento de liberdade diz respeito ao fato de que a perda de
liberdade no Brasil se inicia quando no século XVI representantes portugueses
definiram que descobriram quem aqui habitava e dominaram as riquezas naturais
disponíveis. Coube na época a lógica da dominação dum povo que demandava a
diferença, com particularidades que correspondiam a uma cultura específica e a
outra concepção de civilização. O massacre inevitável demarcou a intervenção sob a
qual aquele povo (os índios) esteve.
A lógica e objetivo do sistema capitalista na contemporaneidade seguem
mediante um impulso nunca visto em outra fase do seu desenvolvimento. O objetivo
final é o aumento da produtividade através do trabalho: o emprego de coerção
na extração de mais-valia. A maximizar a produção e o lucro e mais o antagonismo
de interesses na relação entre capital e trabalho acontecem através de uma
organização hierárquica altamente disciplinada da produção, cuja intenção é o
enfraquecimento dos princípios do patriarcado. a inteão pelo capital de
superação de antigas relações de dominação masculina para que se estabeleçam
relações diretas e não sobrevivam as intermediadas por indivíduos. (Wood,
2006:229)
A reprodução da violência sob crianças e adolescentes não é algo mecânico.
Existe uma idéia que é dominante que advém da usurpação mercantilista que
naturaliza e banaliza as ações violentas, que sob as crianças e adolescentes tem
como elementos a superioridade pelo uso da força e o poder do convencimento
39
pela confiança conquistada anteriormente. Mas, invariavelmente os indivíduos
fazem escolhas e são responsáveis por estas. Conforme a assertiva de Georg
Lukács “... os homens fazem certamente sua própria história, mas os resultados do
decurso histórico são diversos e freqüentemente opostos aos objetivos visados
pelos inelimináveis atos de vontade dos homens individuais.” (Lukács, 1979:64)
Quando os indivíduos fazem as suas escolhas segundo suas vontades e no
conjunto dos seus atos se inclui a ação violenta contra crianças e adolescentes e a
relação monetária, a incorporação prévia da lógica mercantilista. O processo de
produção domina o homem e o faz transferir e reproduzir a mesma lógica. Sob os
efeitos dos ajustes que o sistema capitalista impõe sob o conjunto da população
diante das crises como o projeto neoliberal², a população não incorpora a “vontade”
do capitalista em aumentar seus lucros. A população recorre a estratégias, às vezes,
não lícitas e incorporadas de violência para burlar os efeitos do desemprego, da
flexibilização e precarização do trabalho. O que a população objetiva é sobreviver
em muitas das situões, como por exemplo, acerca da utilização do trabalho infantil
(nos períodos de crise num reordenamento da renda da família cabe tamm as
crianças a captação de valores em dinheiro), da autorização para que terceiros
executem a prática de exploração sexual e pornografia sob sua prole, do trabalho
escravo, da comercialização de crianças e adolescentes, da doação de filhos sem
fins monetários etc. (valor de uma criança e adolescente frente a qualquer intenção
mercantil refere-se à utilidade e a que classe social iservir e ao seu estado de
conservação). Algumas dessas práticas se apresentam de forma gigantesca sem
possibilidade de mensuração ainda, com uma dimensão de ordem criminal e de rede
internacional sem precedentes, perdendo apenas para o tráfico de escravos vindos
da África quando o mundo defendia tal prática.
Karl Marx (1989) apresenta a mercadoria como algo externo, como uma
coisa, que a partir das suas propriedades “satisfaz necessidades humanas” em
detrimento da sua natureza ou gênese, seja alimentar ou fantasiosa. “Não importa a
maneira como a coisa satisfaz a necessidade humana, se diretamente, como meio
de subsistência, objeto de consumo, ou indiretamente, como meio de produção.”
(Marx, 1989:41-42)
40
Uma mercadoria é uma coisa que tem sua utilidade definida pela quantidade
e qualidade, possui propriedades. São fatos históricos ... a descoberta dos
diferentes modos, as diferentes maneiras de usar as coisas e a invenção das
medidas socialmente aceitas... (Marx, 1989:42), assim como, a critica e a
intervenção junto aquelas que atingem diretamente a moral socialmente constituída.
O caráter misterioso da mercadoria se define a partir do fato de “... encobrir as
características sociais do próprio trabalho dos homens, apresentando-as como
características materiais e propriedades sociais inerentes aos produtos do trabalho;
por ocultar, portanto, a relação social entre os trabalhos individuais dos produtores e
o trabalho total, ao refleti-la como relação social existente, à margem deles, entre os
produtos do seu próprio trabalho...” O desafio científico diz respeito a
ultrapassarmos o fetiche da mercadoria. O fetichismo denomina Karl Marx enquanto
“... os produtos do cérebro humano parecem dotados de vida própria, figuras
autônomas que mantêm relações entre si e com os seres humanos. É o que ocorre
com os produtos da mão humana, no mundo das mercadorias...” (MARX, 1989: 81)
O fetichismo é conseqüência do caráter social” próprio do trabalho que
produz mercadoria. A mercadoria é entendida a partir da sua utilidade. Simplifica-se
o conjunto do trabalho social como desdobramento das relações decorrentes da
troca de produtos do trabalho e entre os produtores; simplificam relações sociais
materiais entre pessoas e relações sociais entre coisas.
As relações com crianças e adolescentes acontecem dentro dessa lógica da
utilidade e da violência, é uma relação entre coisas, facilitada pela fragilidade
inerente às características destas fases do desenvolvimento.
Na particularidade brasileira a quantidade - “oferta - está expressa na
dimensão populacional que atinge os índices etários entre crianças e adolescentes.
As relações violentas revelam a simplificação das relações com crianças e
adolescentes (relação entre coisas - fetiche da mercadoria) aos quais se atribui
valor-de-uso (modo imediato) e valor-de-troca (relação quantitativa) e a banalização
quanto às medidas de proteção. Em 2008 30,1% da população brasileira
concentravam-se entre as faixas etárias de 0 a17 anos de idade e 25,2% das
famílias tinham crianças com idade entre 0a 6 anos de idade e 46,7% das famílias
41
tinham crianças e adolescentes com idade entre 0 a 14 anos, segundo dados do
IBGE (Síntese de Indicadores Sociais Uma Análise das Condições de Vida da
População Brasileira - 2009 - IBGE).
A simplificação consubstancia-se à reprodução da ideologia burguesa que
principia as relações sociais entre classes antagônicas e deflagra a hostilidade
existente entre a classe trabalhadora e a burguesia, sendo que não podemos
descartar a alienação que subjacente em tal reprodução. a naturalização das
ações perversas cuja banalização conduz a inversão da responsabilidade de
qualquer cidadão de proteger crianças e adolescentes no âmbito da sociedade civil.
Aqui são destacadas as violações: agredir, violentar ou usar.
O caráter elementar da mercadoria inerente à produção burguesa facilita a
identificação de seus atributos fetichistas; sua aparência simplificadora de onde
advêm as ilusões.
Uma mercadoria somente assim se configura diante da possibilidade de troca.
“Um objeto útil só pode se tornar valor-de-troca, depois de existir como não-valor-de-
uso e isto ocorre quando a quantidade do objeto útil ultrapassa as necessidades
diretas do seu possuidor.” (Marx,1989:98). A própria relação com o que seria uma
mercadoria é violenta.
Em minha análise destaco o componente alienador inerente as relações que
o homem estabelece com as mercadorias. E pensando o meu objeto de estudo,
sublinho o “segredo” que possui a mercadoria: o fetichismo da mercadoria.
Nas relações sociais o componente alienante nos faz entender que se
estabelece uma relação entre coisas e que descaracterizadas das suas
características humanas não restrição, limite quanto ao como elas acontecem.
Desaparece o valor humano, prevalecem os ícones mercantis: a mercadoria, o
dinheiro, o lucro, a troca, a usurpação, a subjunção, a violência, a exploração, o
trabalho etc.
42
“As coisas são extrínsecas ao homem e, assim, por ele alienáveis. Para a
alienação ser recíproca, é mister que os homens se confrontem...” (Marx,1989:98).
Assim não há crítica, simplifica-se e banaliza-se, reproduz-se.
“Os homens procedem de maneira atomística no processo de produção
social e suas relações de produção assumem uma configuração material que não
depende de seu controle nem de sua ação consciente individual...(Marx, 1989:103-
104) e reproduzem as relações de troca nas relações sociais, tratando os mais
frágeis e fracos, como crianças e adolescentes, enquanto mercadoria. Estas
relações de troca estão impregnadas de tanta confiaa, fidelidade e ética” que as
ações violentas muitas das vezes não são reveladas.
As relações sociais permeadas de poder encontram-se na esfera social em
que uma classe social exerce a dominação sob outra classe social; o instrumento
utilizado para exercício da dominação e perpetuão do poder é a violência. A
família somente reproduz a violência que vivencia na totalidade das relações sociais.
Friedrich Engels define a família enquanto “unidade econômica da sociedade”.
(Engels, 2002:184) A transformação da família em “unidade econômica da
sociedade” acontece dentro do processo de instauração da divisão da sociedade em
duas classes antagônicas, da propriedade privada e da divisão social do trabalho. E
na seqüência, a dinâmica societária é incorporada pela família. A família reproduz as
relações sociais que perpassam na lógica mercantil.
À família coube o lugar de “centralidade” das políticas públicas de proteção a
crianças e adolescentes. Ocupar um lugar de “centralidade” lhe vem conferindo a
culpabilidade quanto aos desacordos entre cotidiano e o que define a lei, no que se
refere à proteção social e violações. o é a família que não protege socialmente ou
que viola direitos. À família, em conseqüência, das perdas acumuladas com a
contra-reforma do Estado e com toda lógica mercantil-financeira neoliberal que
conduz uma multidão a permanecer na pobreza ou em níveis classificatórios abaixo
desta, não lhe garantindo o direito de desempenhar papéis que outrora lhe foram
conferidos. Estabelecer uma relação direta entre família e política pública a partir do
entendimento de que semelhança quanto à função entre ambas, significa atribuir
um caráter individualizado aos problemas sociais, econômicos, políticos, éticos e
culturais que pertencem à dinâmica societária e não a indivíduos exclusivamente.
43
José Paulo Netto na sua intervenção que compreende o texto de Perry Anderson
(2003) aponta que limites na tolerância das massas quanto à degradação de
suas condições de sobrevivência, que as desigualdades sociais não vêm isentas de
uma “corte de seqüelas”.
Conceituo a família contemporânea brasileira a partir da complexidade que
rege a totalidade das relações sociais presentes na dinâmica da produção da
sociedade capitalista, que dentro do atual contexto histórico é denominado
neoliberalismo. A família é um recorte da organização societária no qual são
reproduzidos os aspectos sociais, econômicos, políticos, éticos e culturais. Dentre
desdobramentos na família dos aspectos que regem a contexto social, estão o
desemprego em massa e a precariedade das relações de trabalho, alargando o
contingente populacional objeto da violência da barbárie”. Simultaneamente, surge
uma organização familiar constituída segundo nculos pela sobrevivência,
afetividade, solidariedade e convivência social estreita resultando em arranjos e
combinações fora do padrão burguês de consangüinidade e matrimônio, sem,
contudo, apesar dos esforços individuais, em garantir os mínimos sociais
necessários a sua reprodução e sobrevivência. E aqui incluo uma assertiva do
Manifesto Comunista: A burguesia rasgou o véu de emoção e de sentimentalidade
das relações familiares e reduziu-as a mera relação monetária.” (Marx e Engels,
2002:28)
O processo que produz o assalariado e o capitalista tem suas raízes na
sujeição do trabalhador... na transformação da exploração feudal em exploração
capitalista.” (Marx, 1989: 831) O processo que precede o modo de produção
capitalista de produção, em que a dissolução da organização feudal e o
lançamento no mercado de trabalho de uma massa de proletários destituída de seus
direitos, o definimos enquanto permeado de violência. Surge outra forma de
sujeição que delimita a capacidade e possibilidade de inserção da classe
trabalhadora - do proletariado - mediante única e exclusivamente à disponibilização
e venda da sua força de trabalho. A força de trabalho é a única coisa que possui. A
força de trabalho do proletariado é a mercadoria que dispõem para vender e em
troca receber um salário.
44
Karl Marx afirma que o desenvolvimento burguês, em busca da soberania
absoluta, acelerou através da força a dissolução das vassalagens, que a usurpação
das terras comuns e a expulsão dos camponeses das terras pelos senhores feudais
e que o florescimento da manufatura são propulsores diretos das violências na
Inglaterra, no final do século XV e início do século XVI. O objetivo maior era
transformar as terras de lavoura em pastagens, pois ... o dinheiro era o poder dos
poderes. (Marx, 1989:833)
Karl Marx cita o processo violento de expropriação da população no século
XVI, por ocasião da Reforma e dos saques dos bens da Igreja Católica que expulsa
os habitantes de suas terras tornando mais numeroso o proletariado. A doação e
vendas dos bens da Igreja Católica desdobram-se no empobrecimento dos
lavradores. É nesse período que ocorre o reconhecimento oficial do pauperismo e é
criado o imposto de assistência aos pobres.
A especificidade da violência empregada entre o fim do século XV e o século
XVIII, segundo Karl Marx, diz respeito às formas de usurpação das terras comuns
transformando-as em propriedade particular, cuja conseqüência caracteriza-se
enquanto expropriação do povo. O objetivo da usurpação de terras, sejam terras
comuns ou as terras da Coroa, é aumentar os grandes arrendamentos que no
século XVIII, que denominados de fazendas de capital ou fazendas comerciais,
convertem a população agrícola em dispovel para a indústria. Uma multidão de
pequenos proprietários e arrendatários que antes garantiam o seu próprio sustento e
de sua família mediante o plantio e a criação de alguns animais necessitando
comprar poucas vezes algo que componha os meios de subsistência. Tornar-se-ão
pessoas que invariavelmente venderão sua força de trabalho e comprarão no
mercado tudo aquilo que precisam.
Refiro-me paralelamente às formas de violência direta, oriunda daqueles que
detêm propriedade, sob aqueles que compõem a massa empobrecida. Destaco os
desdobramentos de acontecimentos violentos que marcam a Revolução Burguesa,
em que antigas relações de propriedade deixam de existir e que no processo de
surgimento de novas relações de propriedade, a propriedade dos meios de produção
pertencentes à lógica do sistema capitalista, surge uma massa operária destituída
45
de sua capacidade de garantir o seu sustento e de sua família, enfim empobrecida,
inserida num contexto de pauperismo.
Persistiu no século XIX o uso da violência para se alcançar o acúmulo de
propriedade fundado no modo de produção capitalista de produção. O processo de
expropriação dos camponeses acontece mediante o emprego da violência direta. A
opressão era um componente em ascensão. Expulsar e dispersar pessoas de seus
lugares de moradia e produção segundo a lógica precedente em declínio era a
opção inexorável dos proprietários.
Ao recorrer ao Novo Dicionário Aurélio (2008) vê-se que a definição do termo
lucro refere-se à intenção e prática de obter ganho ou vantagem relativa a alguma
coisa ou atividade. E ainda, o termo é remetido, por extensão, ao sentido de
proveito, interesse ou utilidade. Karl Marx faz referência aos “lucros” no seu texto
“Salário, preço e lucro”: “Os lucros representam uma fração do valor total das
mercadorias e resultam do trabalho não pago contido nelas.” (Marx, 1987:8) (grifos
do autor), a mais-valia. A usurpação do capital sob a força de trabalho vendida pela
classe trabalhadora em troca de salário demarca a sua revolta, pois este não lhe
garante todas as necessidades de sua manutenção enquanto força de trabalho e
sobrevivência. A distinção entre lucro e “lucros” é que a sociedade incorpora e
atualiza o que expressa implicitamente a definição apresentada por Karl Marx , que
revela o objetivo e a vontade do capitalista
Os “valores de troca” das mercadorias exprimem suas funções sociais e
somente o trabalho as aproxima enquanto característica comum. Quando
consideramos as mercadorias como valores, encaramo-las exclusivamente sob o
único aspecto de trabalho social realizado, fixado, ou se preferirmos, cristalizado
nelas... Os valores relativos das mercadorias são portanto determinados pelas
quantidades ou somas respectivas de trabalho empregadas, realizadas, fixadas
nelas...(Marx, 1987:44) (grifos do autor). “O preço, em si, não passa da expressão
monetária do valor.” (Marx, 1987:450) (grifos do autor).
A classe trabalhadora vende ao capitalista o direito de dispor de sua força de
trabalho por um determinado tempo diariamente. O que determina o valor da força
de trabalho são a quantidade de trabalho necessária a sua conservação e
46
reprodução e a utilidade: “... o valor da força de trabalho é determinado pelo valor
dos artigos de primeira necessidade indispensáveis para produzir, desenvolver,
conservar e perpetuar a força de trabalho. (Marx, 1987:56) (grifos do autor).
Segundo Georg Lukács (1979) é nos Manuscritos econômico-filosóficos que
Karl Marx introduz as categorias econômicas enquanto categorias da produção e
reprodução da vida humana nos fornecendo uma base filosófica para entender a
ontologia do ser social segundo bases materialistas.
A relação entre classe trabalhadora³ e capitalista acontece mediante um
“confronto hostil” que se inicia com a definição de salário, em que um dos lados
acumula todos os prejuízos. As perdas acumuladas pela classe trabalhadora são
brutais e violentas através das ações do capitalista. Ela vende a sua força de
trabalho em troca de um salário ao capitalista e junto a ele continua numa relação de
subalternidade, servidão e violência. “O trabalhador tornou-se uma mercadoria e é
uma sorte para ele conseguir chegar ao homem que se interesse por ele. E a
procura, da qual a vida do trabalhador depende, depende do capricho do rico e
capitalista.” (Marx, 2008b:24).
O montante que compõe o salário diz respeito ao quanto de sacrifício em
termos tempo e em execução trabalho como escravo, descartando a sua liberdade
em prol da avareza, que não é sua e sim do capitalista, que não admite diminuir
lucros para aumentar salários.
Um aspecto problematizado por Karl Marx no texto Manuscritos econômico-
filosóficos, que se encontra presente na contemporaneidade a partir dos monopólios,
da financeirização dos mercados, da contra-reforma do Estado e da política imposta
pelo neoliberalismo para enfrentar a crise, com proporções alarmantes e relação
direta com a banalização da violência:
“... na medida em que o número de trabalhadores se elevou, a concorrência
desse entre si tornou-se maior e mais inatural e mais violenta. Por isso, uma
parte da classe trabalhadora... cai, assim necessariamente na classe dos
miseráveis ou mortos de fome... tal como uma parte dos capitalistas médios
[decai] na classe trabalhadora.” (Marx, 2008b:27).
47
O aumento da classe trabalhadora, e conseqüentemente, a formação do
exército industrial de reserva, não simplesmente o interesse único do capitalista.
Quanto mais miseráveis e inutilizados menor o número daqueles que terão tempo
livre para questionar e lutar contra os interesses da classe dominante que
direcionam as decisões de um país em benefício de uma única classe. Por esse
caminho percorre a ação invisível da violência do capital.
Na dominação do capital sobre o trabalho, as bases estão alicerçadas a
partir do interesse particular do capitalista que pertence a uma classe
preponderante economicamente, que explora a classe trabalhadora que vende a
única mercadoria que possui, a sua força de trabalho. A defesa desse interesse
particular não pode acontecer de outra forma que não mediante ações violentas
implícitas e explícitas.
São as categorias mercadoria e trabalho que conduzem pensar os
fundamentos da violência contra criaas e adolescentes. Reporto-me às palavras
de Karl Marx para complementar a minha afirmativa:
“O trabalhador se torna tanto mais pobre quanto mais riqueza produz,
quanto mais a sua prodão aumenta em poder e extensão. O trabalhador
se torna uma mercadoria tão mais barata quanto mais mercadoria cria. Com
a valorização do mundo das coisas... aumenta em proporção direta a
desvalorização do mundo dos homens... O trabalho não produz somente
mercadorias; ele produz a si mesmo e ao trabalhador como uma mercadoria,
e isto na medida em que produz, de fato, mercadorias em geral. (Marx,
2008:80b).
A vida do trabalhador retrata apenas um meio de vida”: o trabalho. O
trabalhador que é uma mercadoria que tem um preço no mercado, preço este que é
inferior ao total de itens dos quais necessita para garantir a sua existência. O
trabalhador trabalha não para si, mas para manter o capitalista.
“(O estranhamento do trabalhador em seu objeto se expressa, pelas leis
nacional-econômicas, em que quanto mais o trabalhador produz, menos tem
para consumir; que quanto mais valores cria, mais sem-valor e indigno ele
48
se torna; quanto mais bem formado o seu produto, tanto mais deformado ele
fica; quanto mais civilizado seu objeto, mais bárbaro o trabalhador; que
quanto mais poderoso o trabalho, mais impotente o trabalhador se torna;
quanto rico de espírito o trabalho, mais pobre de espírito e servo da natureza
se torna o trabalhador.) (Marx, 2008b:82)³.
“O homem faz da sua atividade vital mesma um objeto da sua vontade e da
sua consciência. (Marx, 2008b:84). Diferencia-se dos animais e é assim um ser
genérico. Mas uma inversão proporcionada pelo trabalho estranhado, sendo o
homem “... um ser consciente faz da sua atividade vital, da sua essência, apenas um
meio para sua existência. (Marx, 2008b:85) (grifos do autor). A vantagem torna-se
desvantagem: “... do ser genérico do homem... um ser estranho a ele, um meio de
existência individual. Estranha do homem o seu próprio corpo, assim como a
natureza fora dele, tal como a sua essência espiritual, a sua essência humana”, e
ainda, “... uma conseqüência imediata disto... é o estranhamento do homem pelo
[próprio] homem. Quando o homem está frente a si mesmo, defronta-se com ele o
outro homem. O que é produto da relação do homem com o seu trabalho, produto de
seu trabalho e consigo mesmo, vale como relação do homem com outro
homem...”(Marx, 2008b:85-86) (grifos do autor). É nessa relação de estranhamento
que o homem carrega consigo o peso das relações perversas e “confrontos hostis
que estabelece com o capitalista, assim como, a violência implícita e explicita na
relação entre trabalhador e capitalista ao longo de sua existência e as reproduz nos
espaços em que desenvolve a sua sociabilidade.
A existência dos seres humanos é responsável pela história humana. Na
relação homem e natureza são modificadas as bases naturais. O homem transforma
as bases naturais fazendo História. A história a que Karl Marx se refere corresponde
a processualidade histórica que consolidou a sociedade burguesa e que vem
definindo a organização social capitalista na sua formação contemporânea. E é no
caráter histórico e contraditório do ordenamento burguês que encontramos as
mediações necessárias a sua crítica. E ainda, am da crítica, a explicação
necessária a complexificação das relações sociais na contemporaneidade, ou seja,
da relação homem versus homem.
49
A concepção de história fundamenta-se no desenvolvimento do processo real
das forças produtivas, que se define na produção material da vida imediata e que
atribui caráter conceptual as relações sociais humanas vinculadas ao modo de
produção da sociedade burguesa. (Marx, 1989b). Esta concepção de história define
o Estado e explica a totalidade das diversas produções teóricas e das formas de
consciência. Nela as ideais são explicadas a partir da prática material, ou seja,
refere-se à produção material. A história vincula-se a um resultado material , a um
somatório de forças produtivas, a capitais e a formas de relações sociais. A partir da
história são definidos os seus marcos e a disseminação das idéias, desdobramentos
qualitativos das relações sociais advêm de como elas se efetivam na produção
material. Não é algo mecânico. Quando se fala em relações sociais dominantes
estas se reproduzem, tornam-se hegemônicas, e numa forma contemporânea
globais, independentemente da vontade dos sujeitos sociais, que mesmo em
desacordo, não conseguem fazer um movimento contestatório que as aniquile.
Estou falando da violência, da presença da violência nas relações sociais
contemporâneas.
A consciência distingue os homens dos demais seres vivos. A produção dos
meios de existência é um desdobramento da constatação da existência de um
patrimônio corporal e na seqüência, de sua organização. Produzindo seus meios de
vida, os homens produzem indiretamente, sua própria vida material.” (MARX,
1989b: 27) Esta mesma consciência definiu que o desenvolvimento da sociedade
burguesa devesse atingir seus objetivos que perpassam a lógica de acumulação
sem medir esforços no uso da exploração e dominação dos homens, daqueles
indivíduos que compõem a classe trabalhadora.
Como os homens produzem os seus meios de existência eso numa relação
direta com a natureza dos meios de existência prontos e apresentados para serem
reproduzidos. Além de considerarmos a reprodução da existência sica dos
indivíduos, que manifesta a sua vida, um modo de vida delimitado, devemos
apreender:
As diversas fases de desenvolvimento da divisão do trabalho representam
outras tantas formas diferentes da propriedade: ou, em outras palavras, cada
nova fase da divisão do trabalho determina igualmente as relações dos
50
indivíduos entre si, no que se refere ao material, ao instrumento e ao produto
do trabalho.” (MARX, 1989b:29)
E definem o fundamento das relões entre os homens. Sendo que a história
apresenta que a classe trabalhadora não tem escolha na definição das condições
pelas quais acontecem as condições materiais de produção e as condições pelas
quais se efetivam a sua reprodução. A luta de classes expressa a busca pelo direito
de definição das condições efetivas de sua reprodução pela classe trabalhadora. E
na particularidade brasileira a luta é por condições de vida mais igualitárias, por
justiça social.
As relações sociais (Marx,1989b:42)) se definem enquanto sociais porque se
referem à junção de ações de indivíduos independentemente das condições, modo e
finalidade - são as formas de interação sociais de produção que os homens
estabelecem para dominar a natureza e concretizarem a produção social da própria
existência. As relações sociais de produção definem o antagonismo entre duas
classes, a burguesia e a classe trabalhadora. Tal antagonismo é decorrência da
relação de exploração imposta a esta classe em benefício do acúmulo de
propriedade privada que fundamenta a lógica burguesa. Esta exploração é expressa
na subjunção da classe trabalhadora sem precedentes históricos, engendrada pela
lógica de maximização dos lucros e financeirização da economia mundial
encaminhada pelo neoliberalismo cujos desdobramentos são o desemprego e
flexibilização das relações de trabalho (Harvey, 2005); as privatizações e a Contra-
Reforma do Estado (Behring, 2003).
Partindo do pressuposto das necessidades do homem que o garantem
viver, o primeiro fato histórico é, pois a produção dos meios que viabilizem ao
atendimento de tais necessidades, a produção da própria vida material, a sua
existência.
Quanto à organização da classe dominante, Karl Marx diz o seguinte:
“... indivíduos determinados, que como produtores atuam de um modo
também determinado, estabelecem entre si relações sociais e políticas
determinadas. É preciso que, em cada caso particular, a observação empírica
51
coloque necessariamente em relevo empiricamente e sem qualquer
especulação ou mistificação a conexão entre a estrutura social e política e a
produção. A estrutura social e o Estado nascem constantemente do processo
de vida de indivíduos determinados... como realmente são, isto é, tal e como
desenvolvem suas atividades sob determinados limites, pressupostos e
condições materiais, independentemente de sua vontade.” (MARX, 1989b:35-
36)
A vida material dos homens define a produção das ideias, das representações
e da consciência. “A consciência jamais pode ser outra coisa que o ser consciente, e
o ser dos homens é o seu processo de vida real.” (MARX, 1989b:37) A consciência
é determinada pela vida, pois são os homens que ao avançar no contexto da
produção material e nas suas relações materiais transformam, a partir da realidade
inerente a sua cotidianidade, o seu pensamento e os produtos de seu pensamento.
E é na insatisfação com a sua vida, com as condições de sua reprodução que surge
a questão social; o proletariado luta em busca da conquista de melhoria de
condições, não obstante, o capital soube como liquidar ou minar suas lutas no Brasil
e estabelecer sempre um aparente consenso entre classes. O que funda a luta de
classes é a busca pela melhoria das condições de reprodução advindas do salário,
das jornadas de trabalho, das condições em que o trabalho se efetiva etc. “A
consciência, portanto, é desde o início um produto social.” (MARX, 1989b:43) e
histórico.
A divisão do trabalho acontece com a divisão de trabalho material e
intelectual. A consciência difere da consciência prática existente, não representa
algo real. A consciência se emancipa do mundo quando se torna teoria que passa a
refletir as relações sociais existentes entrando em contradição com as forças
produtivas existentes. A foa produtiva, o estado social e a consciência estão em
conflito entre si e é a divisão do trabalho que viabiliza nas atividades intelectual e
material, no gozo e no trabalho, na produção e na consumação, que estas sejam
partilhadas por indivíduos diferentes. A divisão do trabalho é simultaneamente a
repartição do trabalho e os seus produtos, marcada pela distribuição desigual na
quantidade e na qualidade. A divisão do trabalho, diz respeito à atividade e a
52
propriedade privada, ao produto da atividade; divisão do trabalho e propriedade
privada são expressões idênticas.
A ideologia da classe dominante é também a ideologia dominante à época a
que se processa. A potência material dominante da sociedade é concomitantemente
a potência espiritual dominante. A classe possui o ordenamento dos meios da
produção material delibera sob os meios de produção intelectual. A ideologia
dominante representa as expressões ideais das relações materiais dominantes.
“Os indivíduos que constituem a classe dominante possuem, entre outras
coisas, também consciência e, por isso, pensam; na medida em que dominam
como classe e determinam todo o âmbito de uma época histórica...
conseqüentemente, entre outras coisas, dominem tamm como pensadores,
como produtores de idéias; que regulem a produção e distribuição das idéias
de seu tempo e que suas idéias sejam, por isso mesmo, as iias dominantes
da época.” (MARX, 1989b:72)
Friedrich Engels a partir da sua “Teoria da violência” apresenta a
processualidade histórica inerente à instauração da sociedade capitalista. A
violência na história permeia o processo de formação das classes sociais,
desenvolveu-se na processualidade da divisão social do trabalho, nas oposições de
classes, na dinâmica de aquisição de valor da força de trabalho que desencadeou a
necessidade de forças de trabalho excedente, esta adquirida a partir de conflitos de
guerra que negociavam a preservação da vida para que houvesse força de trabalho
a ser explorada, força de trabalho escrava “divisão forçada de trabalho”
colocando-a (a violência) a serviço da dominação econômica. “Foi assim que a
violência, ao invés de dominar a situação econômica, foi posta a seu serviço.”
(Fernandes, 2003:185). A escravatura justificaria a evolução econômica, política e
intelectual da sociedade, na medida em que liberou a classe dominante para outras
áreas de produção. O crescimento das forças produtivas, a distribuição do trabalho
entre todos os membros da sociedade e a constituição do trabalho assalariado não
suprimiu a violência. Esta atravessa as relações sociais na sociedade
contemporânea.
53
Friedrich Engels no seu texto O papel da violência na história apresenta a
violência enquanto o meio utilizado pela burguesia para alcançar a sua finalidade
que é o progresso econômico. Contudo defende que a propriedade privada não
surge na história como produto do roubo e violência. Na antiga comunidade natural
dos povos civilizados a propriedade privada tem sua evolução atrelada inicialmente
à troca entre estrangeiros antes de tomar a forma de mercadoria. A dissolução da
divisão natural primitiva do trabalho acontece de forma gradativa.
“... Quanto mais os produtos da comunidade tomam forma de mercadoria,
quer dizer, quanto menos for, é produzido para uso próprio do produtor, tanto
mais são produzidos com um fim de troca, maior é a troca, mesmo no interior
da comunidade, suplanta a divisão natural primitiva do trabalho, quanto mais
o estado de fortuna dos diversos membros da comunidade da propriedade
trabalhadora está profundamente minada, e cada vez mais a comunidade se
dirige rapidamente para a sua dissolução numa aldeia de pequenos
proprietários... Não houve aqui tanta violência como no loteamento ainda em
curso, da propriedade agrária coletiva das „comunidades rurais‟ ...; são os
camponeses que julgam de seu interesse, que a propriedade privada dos
campos substitua a propriedade coletiva...”(Engels,s/d:11-12)
Friedrich Engels, no seu texto O papel da violência na história, referindo-se
ao período e transição do feudalismo à instauração da sociedade burguesa afirma
que nesse período da história a violência não tem papel algum, pois esta não é
responsável pela origem da propriedade privada. Na sucessão do desenvolvimento
da produção e troca que define a produção capitalista em seus primórdios, a
monopolização dos meios de produção e subsistência, detidos por uma única classe
minoritária em ascensão e queda de outra classe as alternâncias da produção,
apogeu e crise, têm explicações nas causas exclusivamente econômicas.
A violência para Friedrich Engels aparece quando a burguesia começa a
“encaixar lucros”... “é sem o menor disfarce de violência, duma forma puramente
econômica, que ela realizou esta desordem da sua própria posição, e a organização
de uma nova classe, o proletariado.” (Engels, s/d:17)
54
Eric Hobsbawn chama a atenção para o fato da adaptação dos indivíduos a
uma sociedade sem as instituídas regras de civilização. Segundo o autor, ainda se
fica chocado com atos violentos contra crianças e adolescentes, isto significa dizer
nas suas palavras “... ficar periodicamente chocado com alguma coisa
horrorosamente fora do comum faz parte da experiência: ajuda a ocultar o quanto
nos tornamos acostumados à normalidade ...” ( Hobsbawn, 2006:15). Eu diria que o
que corrobora o costume, a naturalização dos atos violentos ascendentemente, é a
gravidade crescente, o uso cada vez maior da força, da violência, por mais que seja
absurdo manter um posicionamento distante frente a qualquer situação de violência
contra crianças e adolescentes.
O real e o concreto que configuram a particularidade brasileira da violência
contra crianças e adolescentes m uma relação intrínseca com a violência
globalizada que Eric Hobsbawn (2006) denomina de “barbarização” . Este autor
aponta em sua cronologia para instauração da barbárie quatro estágios principais:
os períodos da Primeira Guerra e Segunda Guerra Mundiais, com agudização de
uma crise mundial que perdura entre os anos de 1917-1920 até 1944-1947; o
período que abrange a Guerra Fria, num total de quatro décadas e a partir dos anos
80, “o colapso da civilização”.
Em resposta às minhas indagações iniciais, que traduzem a minha
inquietação frente aos problemas relacionados à violência contra crianças e
adolescente, frente à particularidade brasileira ressalto possíveis mediações que
fazem entender como a violência contra crianças e adolescentes foi introduzida na
sociedade brasileira. Não serão aprofundadas nesta dissertação. Elas dizem
respeito às relações estabelecidas no período da escravatura, principalmente ao
tratamento dados às crianças e adolescentes; a violência perpetrada no período
que demarca os movimentos trabalhistas no início do século XX; a relação entre
violência e classe trabalhadora na Era Vargas e durante o Desenvolvimentismo; a
presença da violência durante as fases da ditadura militar (os períodos delimitados
entre 64-68; 68-74;74-79); o encaminhamento da contra reforma do Estado na
década de 80 e 90 independentemente da promulgação da Constituição de 1988 e o
encaminhamento do projeto neoliberal. E ainda, como o Estado se apropriou,
legitimou e institucionalizou a violência em defesa de interesses da oligarquia
55
brasileira. Numa necessidade de delimitação o meu recorte trata das mediações
que coincidem com a introdução e consolidão do projeto neoliberal.
Não desconsidero o quanto o cultural e a moral assumem a imbricação
necessária de forma a definir o posicionamento legítimo quanto àquilo que o Estado
instituiu na sua atenção à infância. O seu conteúdo violento não se revela
exclusivamente no ato violento, mas também na forma como se apropriou da
temática para instituir ações. A particularidade brasileira se delineia no quanto a
violência contra crianças e adolescentes é institucionalizada pelo Estado. Sendo que
a hisria comprova o quanto essa violência se adensou.
José Fernando Siqueira da Silva (2004) sugere em seu livro Justiceiros” e
violência urbana um caminho que se inicia no período colonial numa
interessantíssima abordagem da institucionalização da violência pelo Estado e como
a sociedade encaminha suas “soluções” reproduzido essa violência.
Para demarcar a particularidade brasileira e delimitar a minha discussão do
tema parto do período da ditadura militar. A soma das ações repressivas legitimadas
pelo Estado durante a ditadura militar transmite a lição” que a coação, a força, o
constrangimento e a violência como a causa mortis são a solução para os
“desajustamentos sociais”. Eric Hobsbaswn conclui que a mensagem do século XX
fora: “... a barbárie é mais eficaz do que a civilização ...” (Hobsbawm, 2006:28).
Resgato três assertivas de Eric Hobsbawm: “... a palavra perdeu todo o
contato com a realidade...” (Hobsbawm, 2007:13) , “...a história tem muito poucos
atalhos ...” (Hobsbawm, 2007:19) e “...Nossa era tornou-se mais violenta, inclusive
nas imagens ...” (Hobsbawm, 2007:138), para argumentar que nada que se refira à
violência e à violência contra crianças e adolescentes surge de repente. A evolução
dos mecanismos violentos enquanto instrumentos de alienação, controle e
contensão do capital sob a classe trabalhadora revelam-se ascendentes e
cumulativos ao longo da história de surgimento, consolidação e ajustes do
capitalismo. Não é o capital que materializa essa vioncia, e sim aquele que
historicamente defende seus interesses, o Estado.
56
É verdade que a América Latina e o Brasil conhecem a violência desde o
período dos Grandes Descobrimentos e colonização de suas terras e povos.
Immanuel Wallerstein no seu livro intitulado O universalismo europeu: a retórica do
poder (2007) apresenta como a “política do universalismo” foi conduzida. Coube na
época a lógica da dominação dum povo que demandava a diferença, com
particularidades que correspondiam a uma cultura específica e a outra concepção de
civilização. O massacre inevitável demarcou a intervenção sob a qual aquele povo
(os índios) esteve.
“Quem tem o direito de intervir, quando e como?” (Wallerstein, 2007:33) Os
povos civilizados e mais recentemente o poderio econômico vem definindo a quem
cabe tal direito. Primeiro Portugal assumiu esse papel de dominação, hoje os
Estados Unidos o vem exercendo não somente no Brasil, mas no mundo.Immanuel
Wallerstein nos apresenta quatro argumentos que fundamentam as intervenções”
dos ditos “civilizados” do mundo moderno em países “não civilizados” desde o
período das colonizações iniciadas no século XV aqui na América Latina e Brasil: “...
a barbárie dos outros, o fim de práticas que violam os valores universais, a defesa
de inocentes em meio aos cruéis e a possibilidade de disseminar valores universais”.
(Wallerstein, 2007:35) É inegável que o poder político, econômico e militar define
quem lidera tais intervenções. E para tanto a violência direciona as ações como
demarcação da força e da diferença pela superioridade.
Octavio Ianni (2004) reconhece no final do século XX e no início do século
XXI um “vasto cenário de violência”. O autor identifica que formas antigas” e
“recentes”, “conhecidas” e “desconhecidas de violência. “Desde o seqüestro e o
narcotráfico à violência urbana e ao terrorismo de Estado, desde aos conflitos
étnicos e religiosos à „destruição criativa‟, são muitas as formas de violência que se
manifestam nas sociedades contemporâneas ... (Ianni, 2004:167). Sugere o autor
que as pesquisas devem investigar as implicações práticas e teóricas, desvendar as
manifestações de violência no âmbito nacional e mundial, que estão “... povoando a
vida e o imaginário de indivíduos e coletividades, em todo o mundo ...” (op.cit.) .
Ainda nas palavras do autor destaco:
“... Cabe esclarecer se a trama das relações sociais e os jogos das forças
político-econômicas, conforme se desenvolvem nas sociedades
57
contemporâneas, são tamm uma fábrica de violência. Trata-se de refletir
sobre a hipótese de que algo na fábrica da sociedade moderna, do que se
poderia denominar de modernidade, que leva consigo formas, técnicas e
práticas cada vez mais brutais de violência, desde as mais prosaicas às mais
sofisticadas.” (op.cit.) .
Octavio Ianni sublinha que á notória a aceitação de que as formas” e as
“técnicas” de violência na modernidade m características “novas”, “insuspeitadas”
e “crescentemente brutais”. São formas” e “técnicas” de violência produzida e
reproduzida na fábrica da sociedade”, na “máquina do mundo”. “Não se trata de
simplificar a problemática da violência, como se ela coubesse no conceito, idéia ou
interpretação...” (Ianni,2004:168). É inegável que paralelamente às relações de
produção inerentes ao capitalismo surgem as diversidades e as desigualdades, as
formas de alienação, cnicas de dominação e lutas pela emancipação. Diante das
lutas e conquistas tensionadas pela democracia e a cidadania evoluem e se
atualizam as técnicas de repressão e as formas de tirania. Enfim, Otavio Ianni (2004)
apresenta a violência enquanto manifesta e oculta, simultaneamente na sociedade,
abrangendo indivíduos e coletividade, objetividade e subjetividade. Atribui-lhe
caráter histórico que se consolida na organização social e técnica do trabalho e da
produção, nas forças de sociabilidade e nos jogos de forças sociais. A violência
destaca o seu significado político-econômico e sociocultural, ressaltando seu
aspecto ideológico e físico.
Utilizar-me-ei de das palavras de George Lukács extraídas do texto As bases
ontológicas do pensamento e da atividade do Homem para dizer que o trabalho, o
exercício profissional do Serviço Social demanda a necessidade de darem-se
respostas. Provoca a demanda de um posicionamento concernente com os
princípios fundamentais do projeto ético-político. Sabe-se que se trata de um
processo, o importante é que as respostas vislumbrem a emancipação humana.
“Ao contrário, o homem torna-se um ser que respostas precisamente na
medida em que - paralelamente ao desenvolvimento social e em proporção
crescente - ele generaliza, transformando em perguntas seus próprios
carecimentos e suas possibilidades de satisfazê-los; e quando, em sua
resposta ao carecimento que a provoca, funda e enriquece a própria atividade
58
com tais mediações, freqüentemente bastante articuladas. De modo que não
apenas a resposta, mas tamm a pergunta é um produto imediato da
consciência que guia a atividade; todavia, isso não anula o fato de que o ato
de responder é o elemento ontologicamente primário nesse complexo
dinâmico. Tão-somente o carecimento material, enquanto motor do processo
de reprodução individual ou social põe efetivamente em movimento o
complexo do trabalho; e todas as mediações existem ontologicamente apenas
em função da sua satisfação. O que não desmente o fato de que tal
satisfação só possa ter lugar com a ajuda de uma cadeia de mediações, as
quais transformam ininterruptamente tanto a natureza que circunda a
sociedade, quanto os homens que nela atuam, as suas relações recíprocas
etc.; e isso porque elas tornam praticamente eficientes forças, relões,
qualidades etc., da natureza que, de outro modo, não poderiam exercer essa
ação, ao mesmo tempo em que o homem liberando e dominando essas
forças - põe em ser um processo de desenvolvimento das próprias
capacidades no sentido de níveis mais altos.” (Lukács, s/d:2)
Notas
1. Liberdade no Dicionário Aurélio dentre a lista de definições cabia destaque
para: “Caráter ou condição de um ser que não está impedido de expressar, ou
que efetivamente expressa, algum aspecto de sua essência ou natureza.
[Quando á liberdade humana, o problema consiste quer na determinação dos
limites que sejam garantia de desenvolvimento das potencialidades dos homens
no seu conjunto as leis, a organização política, social e econômica, a moral,
etc. - , quer na definição das potencialidades que caracterizam a humanidade na
sua essência, concebendo-se a liberdade como efetivo exercício dessas
potencialidades, as quais, concretamente, se manifestam pela capacidade que
tenham os homens de reconhecer , com amplitude sempre crescente, os
condicionamentos, implicações e conseqüências das situações concretas em
que se encontram, aumentando esse reconhecimento o poder de conservá-las
e transformá-las em seu próprio benefício.] . No Dicionário de Filosofia de
Nicola Abbagnano Liberdade é apresentada enquanto “... uma „possibilidade de
escolha‟ que se reapresenta a qualquer um que se encontre nas condições
59
oportunas ...Portanto os problemas da L. no mundo moderno não podem ser
resolvidos por fórmulas simples e totalitárias ... mas pelo estudo dos limites e
das condições que, num campo e numa situação determinada, podem tornar
efetiva e eficaz a possibilidade de escolha do homem.”
2. Estarei estabelecendo a conexão necessária entre o projeto neoliberal e o
meu objeto de estudo no capítulo II.
3. Em outras traduções do texto Manuscritos econômico-filosóficos encontramos
a palavra estranhamento traduzida enquanto alienação.
60
CAPÍTULO II
A VIOLÊNCIA CONTRA CRIANÇAS E ADOLESCENTES NA
CONTEMPORANEIDADE: AS MEDIAÇÕES QUE DEFINEM A
PARTICULARIDADE BRASILEIRA E A SUA INTERSECÇÃO COM O SERVIÇO
SOCIAL
Introduzo o capítulo prosseguindo numa apropriação do meu objeto de estudo
a violência contra crianças e adolescentes e a sua relação com a gica capitalista
e as mediações que expressam a vida global contemporânea. Diria que cada uma
das mediações que retratam a história recente mundial seriam outros grandes
temas que mereceriam atenção.
Impossível não associar ao capitalismo os rótulos da decadência,
pauperismo, intolerância, violência, tirania e barbárie. Aquela fábrica criada para
produzir mercadorias trouxe à humanidade uma incomensurável violência. A
fábrica não somente fragmentou-se, na verdade explodiu.
Serviço Social através do resgate do método de investigação marxiano
defende que sejam definidas as mediações para entendimento da realidade social.
São as mediações que possibilitam o alcance da totalidade do fenômeno. Como
Reinaldo Nobre Pontes (2002) nos apresenta:
“...estas mediações que estruturam, informam, permitem movimento, dão
textura histórico-social, permitem passagens entre as instâncias constituintes
de totalidade, e que portanto devem ser reconstruídas pela razão. Este é o
movimento da razão buscando, através do movimento do abstrato ao
concreto, capturar as mediações ontológicas na própria estrutura do objeto de
conhecimento pelo sujeito cognoscente. Este movimento vai permitir a
ultrapassagem da faticidade, com a recuperação das categorias históricas
(concretas), conduzindo o agente profissional a uma compreensão
relativamente pxima do movimento e constituição do objeto.” (Pontes,
2002:175) (grifos meus)
61
É a razão que garante o caráter inteligível dos fatos e estes são seus
fundamentos. Os fatos são “constituídos”, “constitutivos” e “constituintes” de relações
racionais, atrelados estão aos princípios de causalidade e contradições. (Guerra,
2005:43)
O capitalismo contemporâneo prosseguindo na sua lógica de acumulação e
valorização traz como conseqüência “... a (re) produção de complexos de
contradições, antagonismos e problemas ...”. (Netto, 1995b, p.47). Tais
conseqüências se desdobram em condições de sobrevivência que estão distantes
de garantir a reprodução da força de trabalho. A crise do capital, na sociedade
brasileira, se expressa em seqüelas que atingem um grande contingente
populacional. A classe trabalhadora, aquela faixa populacional em que as análises
mais recentes afirmam que não estão aptas a entrar no mercado de trabalho são
cidadãos que com baixíssima escolaridade e sem emprego procura dia após dia
angariar o mínimo necessário a manter-se na busca daquilo que sempre falta para
sobrevivência.
A dinâmica societária imposta pelo capitalismo institui diferentes, e mais
complexas expressões sócio-humanas originadas na intensificação da exploração.
José Paulo Netto apresenta, enquanto problema teórico, a determinação concreta
da “... relação entre as expressões emergentes e as de modalidades imperantes
explorações”. a necessidade, prossegue o referido autor, de considerar a
“complexa totalidade dos sistemas de mediações” no qual se concretiza a
contemporânea acumulação do capital. O desafio teórico pressupõe “... a pesquisa
das diferencialidades histórico-culturais (que entrelaçam elementos de relações de
classe, geracionais, de gênero e de etnia constituídos em formações sociais
específicas) que se cruzam e tencionam na efetividade social.” (Netto, 2008:48)
A violência encontra-se presente na processualidade histórica da humanidade
que antecede a constituição da sociedade capitalista. Contudo, hoje, a violência
apresenta suas peculiaridades de “traços barbarizantes na opção política do
neoliberalismo por um “Estado mínimo” para o alcance da democracia. O
neoliberalismo enquanto ideologia que apresenta proposições práticas cujos
conceitos e argumentos reproduzem o conservadorismo político, interferindo
periodicamente nas responsabilidades do Estado, o que lhe garante a qualidade de
62
“estratégia eficiente de predominância ideológica conferindo aparente originalidade e
força persuasiva” (Draibe, 1993:88), vem acentuando a violência sob a classe
trabalhadora. As exigências operadas sob a mão-de-obra dentro do contexto de
gestão e controle de fluxos de produção e a introdução de novas tecnologias que
exigem outra lógica de formação: o desenvolvimento de competências relacionadas
à capacidade lógico-abstrata de decodificar, calcular, programar e gerenciar
processos. Isso fez com que um contingente viesse a ser empurrado para as
atividades sem necessidade de habilidade e competências o que reduz
drasticamente os níveis de salários e que outra parte permanecesse no desemprego
engrossando o “mercado informalou que sequer tivesse a possibilidade de entrar
no mercado de trabalho. O desdobramento óbvio é o agravamento da pobreza. A
ação violenta engendrada pelo neoliberalismo no que tange ao trabalho resulta num
distanciamento entre aqueles que estão empregados e os que se encontram
desempregados ou não mais vão retornar ao mercado de trabalho. Isso não fica a
parte das demais relações, há desdobramentos, reproduções dessa violência sob as
demais relações sociais, as crianças e adolescentes são a parte sem força de todo o
contexto de relações da classe trabalhadora.
Da maximização de lucros pelo capitalista que Friedrich Engels demarca
enquanto o componente que distingue o emprego de violência na história , somada
à apresentação por Adolfo Sánchez Vázquez da violência enquanto inerente ao
homem, Otávio Ianni entende
“... o século XX, e entrando pelo culo XXI, o que se verifica é uma
revolução social permanente, subjacente às mais diversas formas de
integração e fragmentação, acomodação e contradição, sempre envolvendo
classes e facções de classes, grupos étnicos, de gênero, religiosos e
outros...” (Ianni, 2004:16-17)
A “sociedade civil mundial” (Ianni, 2004) configura-se a partir da “fábrica
global” ou máquina global”. A história se compõe de “outras e novas guerras” e
“revoluções” e sem que se possa esquecer, de mais violência.
Não obstante, os acontecimentos são apreendidos como “algo secundário”,
aparentemente sem importância, como fatos isolados, a realidade é fragmentada,
63
não havendo uma “conexão com o curso da história” (Marx, 1989); compartilha-se
a “ilusão” de cada época.
O capitalismo sintetiza classes sociais, grupos sociais nos planos locais,
nacionais, regionais e mundiais.
“Acentuam-se as diversidades e desigualdades, em termos de formas de
sociabilidade e jogos de forças sociais As dimensões transnacionais do
capital, tecnologia, força de trabalho, divisão do trabalho social, mercado,
planejamento e violência, entre outras forças produtivas, intensificam e
generalizam os processos de integração e fragmentação, em escala
mundial... É assim que se forma a sociedade civil mundial, compreendendo
classes sociais e grupos sociais, bem como estruturas sociais de poder ...
(Ianni, 2004:31)
Em continuidade às idéias do mesmo autor, é possível afirmar que estudar e
entender os ciclos de expansão do capitalismo mundial e sua intersecção com a
violência requer a apreensão das estruturas de poder, a avaliação dos mecanismos
de exploração da classe trabalhadora e extração da mais-valia, ater-se à
organização da classe trabalhadora frente à subjunção do capital, à incorporação
pela sociedade civil do aparato tecnológico (mídia eletrônica e impressa), da rede de
comunicação, informação e entretenimento. E eu acresço que tudo isto
invariavelmente está interferindo nos rumos da composição da subjetividade dos
sujeitos sociais.
Otavio Ianni (2004) nos apresenta em que condições aconteceriam o
“reencantamento do mundo”, o surgimento de outras formas de sociabilidade e
alterações na correlação de forças. Ele refere-se à substituição da alienação pela
emancipação: ... emancipar compreende a transparência nas relões entre uns e
outros; coisas, gentes e iias; modos de ser, sentir, agir, pensar, compreender,
explicar, realizar, fabular.” (Ianni, 2004:33). Essa reflexão me remete a afirmar que
que se repensar e reelaborar conceitos nos moldes que nos ensina Karl Marx de
forma que o movimento das categorias propicie o alcance da “totalidade de
determinações e relações diversas”. É imbuída desta idéias que reitero a
importância de considerar a discussão que aqui encaminho.
64
Na condução da “Reforma do Estado” e o Serviço Social incluiria tamm, da
“Contra-Reforma do Estado” no encaminhamento das diretrizes do neoliberalismo
está-se violentando a classe trabalhadora. Na mesma medida em que a economia
nacional torna-se província do capitalismo global, a violência é incorporada na
particularidade do Brasil, que corresponde a sua organização social, política,
econômica, étnica, religiosa e ética a cada período da história.
“Sob rios aspectos, a economia política da reforma do Estado revela-se
uma matriz importante de problemas sociais. Ocorre que a economia política
da reforma atinge todo o arcabouço da sociedade nacional, compreendendo o
estado e a Sociedade Civil. Essa reforma modifica ,mais ou meios
drasticamente todo o conjunto das instituições e políticas, objetivos e menos
que se havia criado em função do projeto nacional adotado em muitos
países...Trata-se de uma reforma que implica romper radicalmente o
metabolismo Sociedade Civil e Estado que se desenvolvera com o projeto
nacional. (Ianni, 2004:55)
Segundo Ianni, a introdução do projeto de capitalismo transnacional com o
abandono dos projetos de capitalismo nacional e socialismo nacional; inicia-se um
processo de dissolução entre o Estado e a Sociedade Civil (neste quadro a classe
trabalhadora oscila entre as condições de emprego e desemprego, estabilidade e
terceirização, contrato de trabalho mais estável e sazonal, desemprego conjuntural e
desemprego estrutural, migrações transnacionais e transcontinentais, pobreza e
miséria, pauperização e lumpenização) e a ascendente transformação do Estado em
aparelho administrativo das classes dominantes ou blocos de poder dominantes em
escala mundial.
A globalização do capitalismo enquanto conduz à dinâmica da produção e
comercialização dita o “processo civilizatório”, produz novas formas de sociabilidade
e “jogos de forças sociais”. Minha discussão está impregnada da concepção do
quanto à produção e a comercialização globalizada atribuem à violência o caráter de
globalização das suas expressões. O quanto à dimensão proporcional das ações
violentas em grandeza conduzem a gravidade da violência de forma global, mas
transformo em objeto de estudo, dentro das necessidades óbvias de delimitação, a
65
particularidade brasileira no que diz respeito à violência contra crianças e
adolescentes.
“No âmbito da globalização, compreendendo a formação de uma sociedade
civil mundial, as relações, os processos e as estruturas de dominação política
e apropriação econômica envolvem outros, novos e poderosos jogos de
forças sociais. Polarizados em torno de soberania e hegemonia, democracia e
tirania, guerra e revolução, alienação e emancipação.” (Ianni, 2004:57-58)
(grifos meus)
Reafirmo que estou considerando uma sinalização de Georg Lukács (1979) e
também por José Fernando Siqueira da Silva (2005) quanto aos resultados da
seqüência história são distintos e contrários aos objetivos almejados inerentes aos
“atos de vontade” dos homens.
Retornando às argumentações de Otavio Ianni ele propõe que se repense o
fazer político que expressa as mobilizações da classe trabalhadora.
“Para que a sociedade civil possa recriar-se e dinamizar-se nesse novo
patamar da história, tendo-se em conta os impasses e/ou horizontes que se
abrem, pode ser fundamental que os indivíduos e as coletividades, os grupos
e as classes que formam a maioria do povo tomem consciência das rupturas
que se acham em curso...” (Ianni, 2004:59)
Pressuponho que a violência é uma expressão da questão social e esta tem
implicações históricas, políticas, sociais e culturais que advêm dos antagonismos e
contradições erguidos sob a exploração da classe operária no processo de produção
da riqueza social. O caráter que distingue a questão social da situação social da
organização social que precedeu a ordem burguesa se refere às especificidades
que a nova forma de sociabilidade impõe.
Todo o processo histórico que as mediações podem revelar decifra como a
violência contra crianças e adolescentes permeiam as relações entre
capital/trabalho e que no capitalismo globalizado e a partir da ideologia neoliberal
apresenta configurações específicas. A produção e reprodução da questão social
66
adquirem perfis e expressões fundados na história e particularidade do cenário
contemporâneo. (Iamamoto, 2004:10)
A configuração contemporânea da acumulação capitalista, que traz a tona
novas expressões da questão social e necessita ser considerada a partir da
complexa totalidade dos sistemas de mediações que a efetiva e as particularidades
histórico-culturais e nacionais. A violência contra crianças e adolescentes a entendo
enquanto uma expressão da questão social.
Assim, a violência, esteve presente ao longo do processo de instauração da
sociedade burguesa, assumindo configurações que especificamente representam o
contexto histórico ao qual se encontra vinculado. E adquire particularidades, que
somente através das mediações se chega a apreender a sua essência na
sociedade brasileira. Na singularidade das situações sociais apresentadas ao
Serviço Social, partindo do real e concreto, dos fatos supostamente isolados e
aparentemente desconexos, um todo caótico, as mediações proporcionarão fazer o
movimento de retorno à particularidade e à universalidade da violência contra
crianças e adolescentes, e nesse desvendamento da realidade apresentar uma
leitura que vislumbre a transformação social.
A questão social advém dos desdobramentos sócio-políticos da insatisfação
da classe operária em relação às condições do trabalho. A minha leitura é que a
gênese da violência contra crianças e adolescentes, na sua configuração
contemporânea, está na ordem burguesa. Esta expressão da violência é
engendrada pelo desenvolvimento das forças produtivas materiais: exploração e
expropriação da classe trabalhadora. A “... questão social está elementarmente
determinada pelo traço próprio e peculiar da relação capital/trabalho a exploração.”
(Netto, 2004:45).
Quero explicitar que a minha defesa do pluralismo se aplica ao entendimento
dos argumentos apresentados pela Psicologia e a Psiquiatria, enquanto disciplinas
que buscam entender a subjetividade dos sujeitos sociais por outros caminhos que
não competem ao Serviço Social.
67
Octavio Ianni afirma discordar dos posicionamentos de naturalizam a questão
social, pois a delimita enquanto um problema de assistência social ou a torna um
problema de violência, caos, cujo desdobramento é a modernização das medidas
das políticas públicas sociais que tendem a “aperfeiçoar o status quo”, sem a
intenção de transformar; defendem a ordem social estabelecida e nada mais. E
prosseguindo nessa defesa da ordem social, faz-se a opção pela criminalização e
culpabilização da classe social que de alguma forma é contrária à dinâmica social
que lhe é imposta. “Há conjunturas em que amplos segmentos da sociedade civil
são criminalizados em linguagem conspícua, que se apresenta como se fora
científica.” (Ianni, 1996:101). Ao longo da história brasileira as desigualdades sociais
se repetiram ou se intensificaram e paralelamente, a questão social esteve presente,
sendo tratada enquanto problema de polícia ou problema político. A história registra
uma divergência entre desigualdades sociais e produção de riqueza. A questão
social surge dentro desse processo. uma incompatibilidade entre sociedade e
economia. “As expansões do capital beneficiam-se das condições adversas sob as
quais os a trabalhadores são obrigados a produzir no campo e na cidade.” (Ianni,
1996:112)
“É claro que uma parte fundamental das manifestações da questão social diz
respeito à condição operária no âmbito da sociedade global. São
manifestações muito reais, presentes e urgentes na sociedade nacional, mas
adquirem significados novos, reais, presentes e urgentes no âmbito da
sociedade global... Em larga proporção, podem ser vistos como
manifestações dos movimentos e configurações do capitalismo mundial,
compreendendo o jogo das forças produtivas e as polarizações das relações
de produção, compreendendo a gênese do lucro, excedente ou mais-valia.”
(Ianni, 2004:83).
Seguindo na discussão de algumas mediações possíveis e importantes
dentro do contexto das particularidades brasileiras quanto à violência contra crianças
e adolescentes vou apontar elementarmente poucos aspectos referentes à
subjetividade os quais defendo, não obstante, de haver qualquer finalização quanto
a verdades, ou seja, não se trata de uma verdade absoluta, se constitui apenas uma
68
defesa pautada nas minhas leituras e observações dentro do tema numa imersão
empírica.
É inquestionável que uma grande dificuldade em revelarmos todos os
aspectos que envolvem um episódio de violência contra crianças e adolescentes. A
motivação para atos violentos se torna possível quando o protagonista revela
aquilo que quer. Agora nunca se chegará a todos os componentes da subjetividade
dos sujeitos. Sempre haverá algo por ser revelado. Chegar-se-á a aproximações.
Poder-se-á elencar hipóteses, mas nunca às certezas.
Ao Serviço Social cabe empenhar-se na análise das singularidades das
situões sociais que são apresentadas durante os atendimentos sociais na
cotidianidade do exercício profissional. É importante que mantenha a sua
atualização profissional mediante a presença da investigação social como parte da
sua práxis.
Otavio Ianni discorre sobre o tema da violência atribuindo-lhe o caráter de
“evento heurístico de excepcional significação” (Ianni, 2004).
“Revela o visível e o invisível, o objetivo e o subjetivo, no que se refere ao
social, econômico, político e cultural, compreendendo o individual e o
coletivo, a biografia e a história. Desdobra-se perversamente pelos poros da
sociedade e do indivíduo. É um evento heurístico de excepcional
significação, porque modifica as suas formas e técnicas, razões e
convicções de conformidade com as configurações e os movimentos da
sociedade, em escala nacional e mundial. Explicita nexos insondáveis da
subjetividade de agentes e vítimas, em suas ilusões e obsessões, ao mesmo
tempo que explicita modalidades inimagináveis e verdadeiros paroxismos de
processos e estruturas de dominação e subordinação. Revela a alucinação
escondida na alienação de indivíduos e coletividades. Nasce como técnica
de poder, exercita-se também como modo de preservar, ampliar ou
conquistar a propriedade, adquire desdobramentos psicológicos
surpreendentes no que se refere aos agentes e às vítimas. Entra como
elemento importante da cultura política com a qual se ordenam, modificam
ou transformam as relações entre os donos do poder e os setores sociais
69
subalternos, os governantes e a população, as elites e as massas. Sob
vários aspectos, os atos de violência revelam aspectos recônditos,
insuspeitados e fundamentais de como se formam e transformam os jogos
das forças sociais, as tramas das formas de sociabilidade, levando
indivíduos e coletividades como em um vendaval em fúria. (Ianni,
2004:169).
A importância da investigação social na práxis profissional reside na
efetivação da análise e síntese que conduz o profissional a não cair na armadilha da
criminalização da pobreza para a qual induz o conservadorismo e o
neoconservadorismo inerentes à ideologia burguesa.
Yolanda Guerra propõe o que denomina ser imperativo ao Serviço Social:
“ousar saber para ousar transformar”.
“... a investigação social, para o assistente social, passa a ser concebida
não apenas como um instrumento necessário ou uma estratégia da
intervenção, mas como uma mediação que atravessa as dimensões
(instrumental, formativa, política, intelectual) da prática profissional, da qual
pode resultar em novos conhecimentos teórico-práticos a serem apropriados
pelo Serviço Social.” (Guerra, 2006:11)
Abro aqui um grande parêntesis para discutir o conceito de liberdade,
introduzido no capítulo anterior. Pauto-me na justificativa que, dentre as
argumentações exclusivamente acusatórias inerentes ao senso comum e que
passam ao largo da valoração de uma contextualização das ações, entendendo-as
não exclusivamente a partir do que a legislação e a moral vigente entendem
enquanto crime contra a criança e o adolescente. Diz-se que os sujeitos que
praticam atos violentos contra crianças e adolescentes fizeram as suas escolhas e
para tanto tiveram garantida a sua liberdade. Independentemente de quaisquer
punições cabíveis que o inerentes às avaliações das instâncias jurídicas e de
proteção que estão instituídas, algumas considerações há de serem feitas.
Defendo o quanto o conceito de liberdade se referencia à sociabilidade que
influi, instaurada com a dinâmica burguesa.
70
G.W. Friedrich Hegel quis afastar a liberdade do plano do intelecto e lhe
atribuir um caráter de verdade vinculado-a a vontade:
“... a liberdade da vontade é o livre arbítrio onde se reúnem os dois aspectos
seguintes: a reflexão livre, que vai se separando de tudo, e a subordinação
ao conteúdo e à matéria dados interior ou externamente. Porque, ao mesmo
tempo, este conteúdo, necessário em si e enquanto fim se define como
simples possibilidade para a reflexão, o livre-arbítrio é conseqüência da
vontade.” (Hegel, 1997:22)
Para G.W. Friedrich Hegel a “... liberdade como substância exista não
como real e necessária mas ainda como vontade subjetiva. É a idéia na sua
existência universal em si e para si, é a moralidade objetiva.” (Hegel, 1997:35).
Entendo que a apropriação do conceito hegeliano incorreria num erro frente ao
método de Karl Marx e à sua perspectiva crítica, posto que limitaria a minha
argumentação ao plano imediato dos fatos sociais e estaria desconsiderando a
perspectiva histórica e dialética na minha análise.
Como expus anteriormente, a perda de liberdade no Brasil começou com a
política expansionista européia sob o comando de Portugal e Espanha no século
XVI. Os habitantes que aqui estavam não tinham direito a escolha, a colonização era
algo imposto; a luta era disputa desigual cujo fim era perda de vida.
“Quem tem o direito de intervir, quando e como” (Wallerstein, 2007:33) Os
povos civilizados e mais recentemente o poderio econômico vem definindo a quem
cabe tal direito. Primeiro Portugal assumiu esse papel de dominação, hoje os
Estados Unidos o vem exercendo não somente no Brasil, mas no mundo. O mesmo
autor nos apresenta quatro argumentos que fundamentam as “intervenções” dos
ditos “civilizados” do mundo moderno em países “não civilizados” desde o período
das colonizações iniciadas no século XV aqui na América Latina e Brasil: “... a
barbárie dos outros, o fim de práticas que violam os valores universais, a defesa de
inocentes em meio aos cruéis e a possibilidade de disseminar valores universais”.
(Wallerstein, 2007:35) É inegável que o poder político, econômico e militar define
quem lidera tais intervenções.
71
A argumentação do autor é direcionada à solução ao problema quanto à
pretensão daqueles que detém o poder e que defendem o direito de serem os
detentores e implementadores dos valores universais e a dúvida quanto à existência
de valores universais.
A defesa do direito de intervir e da civilização justificam o uso da força e de
violência. Não somente a violência cotidiana mundial aumentou a partir do
“Orientalismo”. A violência mundial aumentou porque cresceu a avareza da classe
burguesa em encaixar lucros, para tanto, ultrapassa-se limites e barreiras.
Karl Marx menciona a liberdade em sua obra e resgatarmos algumas das
suas considerações. No capítulo IV de O capital encontramos a seguinte assertiva:
“... a compra e a venda da fôrça de trabalho é realmente um verdadeiro
paraíso dos direitos inatos do homem. reinam liberdade, igualdade,
propriedade... Liberdade, pois o comprador e o vendedor de uma mercadoria,
a fôrça de trabalho, por exemplo, são determinados apenas por sua vontade
livre. Contratam como pessoas livres, juridicamente iguais. O contrato é o
resultado final, a expressão jurídica comum de suas vontades. Igualdade, pois
estabelecem relões mútuas apenas como possuidores de mercadorias e
trocam equivalentes por equivalentes. Propriedade, pois cada um dispõe do
que é seu ...” (Marx, 1989: 196)
Aqui se entende a força de trabalho enquanto mercadoria; a apropriação, a
aquisição dessa mercadoria acontece mediante o pagamento de um salário; o
questionamento da existência de liberdade nesta transação trabalhista dá-se a partir
da mais-valia que define o lucro do capitalista e esta nunca acontece sem a
exploração e expropriação da classe trabalhadora.
Citando Karl Marx:
“... o instrumental de trabalho converte-se em meio de subjugar, explorar e
lançar à miséria o trabalhador e a combinação social dos processos de
trabalho torna-se a opressão organizada contra a vitalidade, a liberdade e a
independência do trabalhador individual.” (Marx, 1989: 578)
72
Para o capital a relação é igualitária e justa, pois esta tem a legitimidade do
mercado para subtrair e espoliar em defesa do lucro e do acúmulo de propriedade.
Para a classe trabalhadora é violenta, define a sua condição de existência na mais
absoluta pobreza.
“Compreende-se, assim, a importância decisiva da metamorfose do valor e do
preço da força de trabalho em salário ou em valor e preço do próprio
trabalho. Nessa forma aparente que torna invisível a verdadeira relação e
ostenta o oposto dela, repousam todas as noções jurídicas do assalariado e
do capitalista, todas as mistificações do modo capitalista de produção, todas
as suas ilusões de liberdade...” (Marx, 1989:623)
Domenico Losurdo apresenta uma argumentação a partir da teoria da
“liberdade em face da pobreza”, defendida por Franklin Delano Roosevelt em 1940
(dentre as liberdades essenciais e irrenunciáveis para o alcance da democracia) e
dos “direitos sociais e políticos” (Declaração Universal dos Direitos do Homem -
1948), quando vincula o seu entendimento ao texto escrito por Karl Marx e Friedrich
Engels Manifesto do Partido Comunista (Losurdo, 2004:268). Para o referido
autor, Karl Marx identifica a unidade essencial dos homens, .. os quais
desenvolvem uma consciência e um comportamento como membros do mesmo
gênero ...” (Losurdo, 2004:294).
“Assim, a série de eventos mais ampla em que se deve inserir as lutas pelo
sufrágio, pelos direitos políticos e sociais e contra a racialização da diferença
tal série é a da construção do conceito universal de homem e da
humanidade como nero, que constitui o fio condutor das revoluções do
mundo contemporâneo e essa bem longe de ter se concluído. “ (op. cit.)
Para Ellen Meiksis Wood a necessidade de conhecermos as
características do capitalismo. Para a autora a exploração pelo sistema capitalista
não considera as identidades, desigualdades e diferenças extra-econônicas
políticas ou jurídicas.
A extração da mais-valia dos trabalhadores assalariados acontece numa
relação entre indivíduos formalmente iguais e livres e não pressupõe
73
diferenças de condição política ou jurídica. Na verdade, o capitalismo tem
uma tendência positiva a solapar essas diferenças e a diluir identidades como
gênero ou raça, pois o capital luta para absorver as pessoas no mercado de
trabalho e para reduzi-las a unidades intercambiáves de trabalho, privadas de
toda identidade específica.” (Wood, 2006:229)
A condução do sistema acontece mediante as “mistificações ideológicas”. A
liberdade não é uma verdade, mas sim a maximização da produtividade e do lucro.
São os:
“... ideólogos capitalistas que nos asseguram que o capitalismo liberal é a
última palavra em liberdade e democracia ... Parece haver uma ampla gama
de relações sociais externas à estrutura de produção e exploração, que criam
uma variedade de identidades sociais sem ligação imediata com a „economia‟.
Nesse sentido, as identidades sociais parecem muito mais „abertas‟. Assim, é
possível que a separação da economia pareça dar ao mundo externo a ela
um alcance maior, uma liberdade maior ... Mas, na realidade, a economia do
capitalismo invadiu e estreitou o domínio extra-econômico ... Praticamente
não existe aspecto da vida na sociedade capitalista que não seja
profundamente determinado pela lógica do mercado. (Wood, 2006:239)
Após as duas grandes Guerras Mundiais e a partir das transformações
ocorridas na dinâmica do poder desde o início do culo XX a justificativa para as
ações militares dos Estados Unidos, que assumiu o papel de potência mundial e que
hoje possui um a liderança bélica inquestionável, são pautadas na defesa dos
direitos humanos. O poderio dos Estados Unidos, acompanhado do
desenvolvimento da indústria bélica e ampliação das práticas terroristas pelo mundo
e ainda, a perda de importância e significado das negociações para
encaminhamento das soluções diante de conflitos internacionais, vem ocasionando
o aumento da violência de ordem planetária.
“... É a consagração da guerra „infinita‟ como instrumento privilegiado de
disciplinamento e controle da ordem mundial em mutação, completada pelos
mecanismos de mercado da globalização capitalista e pelos dispositivos
74
ideológicos culturais de sujeição (entre eles, os direitos humanos e a
democracia ... “ (Gomez, 2004:83)
José Maria Gomez ressalta que o direcionamento dado pelos Estados Unidos
às estratégias de segurança constitui-se:
... por definição, o mais rio retrocesso do regime internacional dos direitos
humanos dos últimos cinqüenta anos, um ataque diretos às liberdades
democráticas e um estímulo incessante à xenofobia e à intolerância cultural
frente ao „outro‟ ou „diferente‟ que não encaixa ou simplesmente resiste aos
padrões dominantes ocidentais...” (Gomez, 2004:85)
Estou me referindo às questões de ordem macrossocial que impregnam,
alteram e influem na sociabilidade dentro de um contexto histórico definido.
“Raramente se questionam sobre a presença, importância e força das
determinações externas, remanescentes do colonialismo e do imperialismo
na dinâmica do globalismo ou neoliberalismo; precisamente na constituição,
preservação e reiteração dessas „características‟, „limitações‟ ou „distoões‟.
Abstraem traços, eventos e situações das suas reais condições histórico-
sociais, político-econômicas, nas quais mesclam e articulam-se as condições
internas e externas. Tanto abstraem, que no limite as condições adversas
em que vivem indivíduos e coletividades... o que implica na criminalização
das vítimas responsáveis por suas condições adversas...” (Ianni, 2009:203).
Abrindo outro parêntesis, quero me referir a um instrumento instituído na área
da saúde para notificar suspeitas de maus-tratos a criaas e adolescentes. Não
penso em banalizar ou fazer a crítica pela crítica. Ponho em relevância que aos
profissionais cabe a denúncia, mas não espaço para qualquer contextualização
na política que formula o instrumento desde a sua concepção.
A notificação de maus-tratos contra crianças e adolescentes atendidos nas
unidades do Sistema Único de Saúde, prevista na Política Nacional de Redução de
Morbimortalidade por Acidentes e Violências e instituída nacionalmente mediante a
Portaria 1968/GM, de 25 de outubro de 2001 - publicada no Diário Oficial da
75
União 206 de 26 de outubro de 2001 seção 1 página 86 - significa, segundo
minha avaliação, mais um instrumento legal que merece destaque neste preâmbulo
de proposta de estudo, por acumular todas as definições de violência contra
crianças e adolescentes propostas nos documentos oficiais elaborados num
passado recente e que vim apresentando ao longo da minha revisão da bibliografia
sobre o tema. A notificação induz a culpabilização e criminalização dos sujeitos se
não vier acompanhada de uma crítica criteriosa da violência, da violência perpetrada
contra crianças e adolescentes na contemporaneidade, onde a luta de classes, a
exploração e expropriação da classe trabalhadora o uma realidade concreta
dentro do contexto do neoliberalismo.
“Para que possam avaliar os potenciais e as realizações de violência em cada
século, época ou configuração histórica torna-se indispensável esclarecer
quais as formas de sociabilidade e os jogos de forças sociais que prevalecem
em cada caso... Ocorre que os jogos das forças sociais e as formas de
sociabilidade sintetizam o modo pelo qual a fábrica da sociedade, ou a
máquina do mundo, produz e reproduz o progresso e o retrocesso, a evolução
e a decadência, o florescimento e a distorção, a alienação e a mutilação... A
violência parece algo intrínseco ao modo pelo qual se organiza e desenvolve
a sociedade moderna.” (Ianni, 2004:172)
Aqui não espaço e não é minha intenção tecer argumentos para
aprofundamentos que se fazem necessários para que se mude o rumo da história,
mas enceto o meu entendimento político do tema.
Otavio Ianni ao discorrer sobre violência cita a alienação. Entende-se que
quando Karl Marx refere-se a estranhamento na verdade esteja falando em
alienação: . uma força estranha situada fora deles, cuja origem e o destino
ignoram, que não podem mais dominar e que, pelo contrário, percorre agora uma
série particular de fases e de estágios de desenvolvimento, independentemente do
querer e do agir dos homens e que, na verdade, dirigi este querer e agir.” (Marx,
1989:49)
se concebe de forma indiscutível da força inerente à imagem na difusão de
idéias, seja com a finalidade de aprendizagem ou para interferir na composição de
76
novas formas de pensar ou agir. Interfere na construção e aperfeiçoamento do
entendimento da realidade e do imaginário das individualidades, nos seus aspectos
“prosaico e revelador”, constitutivo e aterrador”. “Os signos, símbolos, emblemas e
alegorias, assim como os conceitos e as categorias, podem ser taquigrafias com as
quais se articula, compreende, explica ou inventa a realidade, o outro e o eu, o eles
e o nós, o bem e o mal. (Ianni, 2004:176)
A produção cultural é um negócio lucrativo que atrai investimentos do capital.
A inserção da produção cultural na lógica de mercado conduz a seqüência
produções e mercado (captação de leitores, espectadores e audiências) mais e mais
consumidores. Um tratamento igualitário concedido a indústria, à “indústria cultural”
“sequiosa de novas produções” e estas atravessando todos os limites na sua
expansão territorial impregnam culturas e civilizações. Nesta lógica segue a difusão
da ideologia dominante. E conseqüentemente produz a alienação dos povos.
“Esse o contexto em que nascem a imaginação, a produção a difusão e o
consumo de filmes, romances e programas de televisão sobre desastres e
catástrofes, medo e terror, tumulto e desespero, aflição e pânico, violência e
terrorismo, destruição e ruínas... Assim se alimenta o imaginário de uns e
outros, indivíduos e coletividades, em todo o mundo. Combinam-se o desastre
e o pânico, o terrorismo e o medo, a destruição e a ruína, a engenhosidade e
a produtividade, a performance e a lucratividade. Produzir o desastre, o terror
e a destruição é produzir cultura e mercadoria, informação e entretenimento,
lucro e mais-valia.”(Ianni, 2004:177-178)
Otavio Ianni (2004) destaca que a “cultura da violência” é utilizada na
intenção de “retratar” e exorcizar” a violência presente no âmbito das relações
societárias onde a sua exacerbação em nome de altos lucros. Em paralelo o
empenho em “despolitizar” multidões, não entendo que isso aconteça ao acaso.
Estar-se-á a serviço de intenções perversas da lógica do capital. Despolitizar e
alienar: assim as expressões da violência contra crianças e adolescentes ocupam
cidadãos e os afasta qualquer possibilidade de apreensão política da dinâmica de
sociabilidade que interessa a poucos de maneira vantajosa em detrimento de
interesses que abarcam a maioria. É assim que grandes decisões sempre são
definidas.
77
A cultura de massa no desenrolar do século XX e no ingresso do século XXI,
mais acentuadamente a partir da introdução da imagem televisiva no interior das
moradias da classe trabalhadora, adquire força, criatividade e
espectacularidade”.
Mione Apolinario Sales (2009) ressalta a interferência dos processos
“plásticos sociais” na formação das subjetividades contemporâneas dentro do
contexto do que apontam os séculos XX e XXI para a “multimedia” ¹.
“Trata-se, porém, de um cenário sócio-histórico ancorado na lógica da
compressão, da miniaturização, da aceleração do tempo e da invisibilização
de processos sociais, produtos de seus respectivos significados e custos
socioecomicos, com a subsequente virtualização da realidade e, para o
bem e para o mal, das relações sociais... No reino das aparências da reificada
sociedade de consumo, tudo tende a assumir, portanto, um caráter supérfluo
e descartável.” (Sales, 2009:36)
Com muita semelhança às guerras, aos ataques terroristas, à condução da
lógica capitalista para acumulação, sob a lógica de encaixe de lucros sob a classe
trabalhadora se repete com as ditaduras na América Latina e no Brasil e por fim, a
violência contra crianças e adolescentes: “... a violência adquire os refinamentos
mais sofisticados possíveis, baseados na razão instrumental, traduzindo-se em
técnicas de controle, administração, produção, alienação, brutalização.” (Ianni,
2004:192)
E no que se refere às crianças e adolescentes, a cultura da violência se
reveste na incorporação da naturalização e banalização da violência; a característica
juvenil da população brasileira se configura na importação da lógica da
“calculabilidade” numérica com que se tratam estes seres que demandam proteção,
onde a relação minoritária das ações de proteção esbarra nas várias expressões da
violência.
Otávio Ianni (2009) referindo-se a América Latina, a partir do seu
Descobrimento a denomina enquanto um fragmento da cartografia mundial” : “Um
laboratório em constante ebulição, sem nunca configurar-se nem realizar-se
78
plenamente.” (Ianni,2009:197): “...perpassa periodicamente um período pervasivo,
estranho e penoso sentido de inquietação, incerteza, ilusão.” (Ianni,2009:218). Este
território acumula na sua história “formas de sociabilidade” e “jogos de forças
sociais que expressam uma maneira peculiar de engendrar a dominação e a
apropriação que se especificam configurando fases de violência. No Brasil
encontraremos configurações para violência que representavam os interesses de
grupos presentes nos períodos que compreendem o patriarcalismo, o colonialismo,
o imperialismo, o republicano e as ditaduras, análise que nos apresenta José
Fernando Siqueira da Silva (2004).
O período de ditadura engendrado no Brasil iniciado na década de 60
denunciou o quanto grupos específicos estavam dispostos, em defesa de seus
interesses, a utilizar o quanto de violência fosse necessário. É inegável que a
ditadura emplacou outra “norma” para configurar a violência contra seus opositores e
inimigos. Ela atualizou outras formas de violência encaminhadas no período de
fundação e consolidação da sociedade brasileira. A violência se materializou pela
repressão, perseguição, tortura e morte institucionalizada sob o controle das Forças
Armadas. A ditadura diluiu no interior da sociedade o “pouco valor” da vida,
vulgarizou práticas violentas. Recorto algumas palavras de Otavio Ianni para definir
tais violências:
“Nesse labirinto, esconde-se a barbárie. Aos poucos, lenta, sub-reptícia ou de
repente, explode a violência, destruindo coisas, gentes e idéias, realidades e
ilusões. Tudo o que parecia plácido, fluindo no cotidiano de cada um e muitos,
flutua sobre o que pode ser abismo, absurdo. A destruição germina sorrateira;
ou irrompe abrupta, avassalando modos de ser. É como se a civilização fosse
simultaneamente matriz de desencantamento e reencantamento,
emancipação e alienação, esclarecimento e danação.” (Ianni, 2009:223)
O período da ditadura sendo uma das mediações que apresenta
determinações objetivas da realidade é indiscutivelmente um período que demarca
definitivamente a presença da violência do Estado segundo seus agentes
legitimados a exercê-la na defesa de outros interesses que o os da população. A
este período acresce-se o cenário internacional de guerras e terrorismo ao qual se
assiste. Tais processos sociais a partir do seu “núcleo inteligível” que com o
79
dinamismo intrínseco ao movimento do real, possibilita através da razão a sua
apreensão e reconstrução. “É a regularidade dos fenômenos, processos e práticas
sociais e sua historicidade que os tornam compreensíveis, permitindo à razão
apreendê-los nas suas manifestações dinâmicas.” (Guerra, 2005:32)
David Harvey (2005) avulta que os processos sociais definidos por Karl Marx
para discorrer sobre o liberalismo na sua versão atualizada o neoliberalismo -
apresentam o quanto esta lógica produz veis elevados de desigualdade social
através de uma acumulação predatória, fraudulenta e violenta. “Todas as
características da acumulação primitiva que Marx menciona permanecem fortemente
presentes na geografia do capitalismo até nossos dias (Harvey, 2005:121):
aprimorados se apresentam na forma do sistema de crédito e capital financeiro e
ainda, na acumulação por espoliação.
O Estado entraria nos processos de acumulação primitiva através da
monopolização da violência e das definições da legalidade, com apoio e promoção
de tais processos. Hoje, “tal como no passado, o poder do Estado é com frequência
usado para impor esses processos mesmo que contrariando a vontade popular.”
(Harvey, 2005:123)
O neoliberalismo de assim introduzir uma nova forma ideológica de
conduzir os processos sociais com uma inexorável violência, às vezes,
supostamente imperceptível e consentida, no âmbito das relações mais simples,
mas uma violência flagrante e inerente a lógica que o conduz. Nas palavras de
David Harvey:
“A mistura de coerção e consentimento no âmbito dessas atividades de
barganha varia consideravelmente, sendo contudo possível ver agora com
mais clareza como a hegemonia é construída por meio de mecanismos
financeiros de modo a beneficiar o hegemon e ao mesmo tempo deixar os
Estados subalternos na via supostamente régia do desenvolvimento
capitalista. O cordão umbilical que une acumulação por espoliação e
reprodução expandida é o que lhe dão o capital financeiro e as instituições de
crédito, como sempre com o apoio dos poderes do Estado.” (Harvey,
2005:126) (grifo do autor)
80
O neoliberalismo é uma teoria que conduz as práticas de política econômica
quanto à maximização das liberdades no mercado capitalista que se tornou
hegemônica: criou um “padrão de regulação global”. Dentre seus desdobramentos
perversos num contexto de muita destruição” para além das estruturas e poderes
institucionais, David Harvey (2006) destaca: as relações estruturais da força de
trabalho, as relações sociais, as políticas de bem-estar social (na particularidade
brasileira denomina-se a contra-reforma do Estado), os arranjos tecnológicos, os
modos de vida, o pertencimento a terra, os hábitos efetivos, os modos de pensar etc.
À avaliação de David Harvey que define a destruição criativa” do
neoliberalismo, acresço que esta se reproduz na vioncia contra criaas e
adolescentes. “Se o principal sucesso do neoliberalismo não se encontra no que
tange à geração de riquezas, mas sim à sua redistribuição, foi necessário descobrir
meios para transferir ativos e redistribuir a riqueza e renda da massa da população
em direção às classes altas, e dos países vulneráveis aos países mais ricos.”
(Harvey, 2007:17). O que resta à população sem alternativas de sobrevivência? Ela
utiliza suas supostas pertenças, crianças e adolescentes, para também gerarem
renda, das formas mais criativas possíveis, chegando ao crime em suas ações,
negando todo e qualquer aparato legal que delega à família a responsabilidade de
proteção.
Na sociedade a fábrica da violência”, em produção permanente dado ao
incremento e sofisticação ascendentes de barbárie de dimensão globalizada,
interfere e compõe idéias, subjetividades, sociabilidade, modos de vida.
O “clima de barbárie” em andamento, com disputas de forças antagônicas e
dinâmica de poder em escala mundial, fez com que no Brasil, o ano de 2007 se
inicia com a chamada de ataque ao terror” pela mídia, após várias situações de
violências em que crianças e adolescentes foram vítimas ou autores de atos de
extrema violência.
Houve uma manifestação contrária à instauração, desenvolvimento,
generalização e naturalização do clima de barbárieprotagonizado pela mídia. Esta
focou as violências contra crianças e adolescentes considerados crimes, mas
esqueceu-se de multiplicar que suas origens estão na condução histórica e legítima
81
da violência na sociedade brasileira e no mundo, na corrupção e omissão do
Estado, na gênese da situação de pobreza da populão. As expressões de
violências “são vistas em si, em sua singularidade, como atos ou situações nos
quais os agentes imediatos e as vítimas imediatas é que são considerados,
lastimados, lembrados, culpados, glorificados.” (Ianni, 2004:293)
É inegável que nessa forma de entender a violência e suas expressões houve
um rompimento com qualquer possibilidade de estabelecer um diálogo com a teoria
social de Karl Marx, de introduzir o debate dentro uma lógica critica, dialética,
histórica e de totalidade.
Os pesquisadores comprometidos em fazer uma crítica contundente recorrem
a mediações que nos fazem entender a realidade na sua faceta contemporânea e
introduzem o debate a partir das categorias que possibilitam entender o que de
perverso e é inerente à gica capitalista, que conduzem as ações violentas do
sistema: a mais-valia, o lucro, o salário, a acumulação, a crise, a mercadoria, a
exploração, a expropriação, a subjunção etc.
Generaliza-se a intolerância e o embrutecimento nas relações sociais. As
pessoas tornaram-se rigorosamente violentas com uma performance humano
civilizada, a própria barbárie: é um humano civilizado violento. A violência torna-se
demarcada na lógica burguesa, funda as relações sociais. E na base da violência se
fazem, multiplicas e perpetuam-se as relações pela força da acumulação, sem
qualquer possibilidade de crítica e transformação. Fica-se na fragmentação dos
fatos violentos. Culpa-se e criminaliza-se, a ação se finda no veredicto. Contra
crianças e adolescentes prevalecem as forças sob seres certamente indefensos
dentro dessa lógica da reprodução das relações sociais de produção.
As leituras que se vem construindo sobre algumas das formas de violência
contra crianças e adolescentes definidas enquanto crimes sexuais contra
vulneráveis são exclusivamente originados na criminologia e se utilizam do
arcabouço tecnológico. Não estou defendendo aqui que nestes crimes os indivíduos
sejam absolvidos. Critico a limitação das ações. Alguns serão penalizados pela
força da lei, outros permanecerão ocultos e outros tantos surgirão. Assim estaremos
eternamente procurando os criminosos.
82
Aqui não estou me posicionando a favor dos atos criminais, mas sim
propondo outra lógica de entendimento da imediaticidade do cotidiano. A construção
de uma política criminal como a contra a criminalidade no ciberespaço, denominada
de cibercriminalidade, expressa na Convenção sobre o Cibercrime² Convenção de
Budapeste - ainda não transforma as relações entre os sujeitos no interior da
sociedade globalizada.
Especificamente o que preconizam a Lei 11.829 (2008)³ quanto à pornografia
pedofilia infantil e a Lei 12.015 (2009) quanto aos crimes sexuais contra criaas e
adolescentes, não saem do plano do combate e da criminalização. A legislação que
objetiva a proteção não se distancia da criminalização; não propõe uma
transformação quanto ao que está atrelada a inserção histórica de crianças e
adolescentes no âmbito da sexualidade desses protagonistas de violências que a
moral vigente não consegue coibir.
A crítica aqui se faz quanto à falta de proposição de um debate irrestrito
sobre o tema a partir das diferentes mediações objetivas da realidade e subjetivas
dos sujeitos para entender-se o lugar ocupado por crianças e adolescentes na
sexualidade de homens e mulheres na particularidade brasileira. Outros tantos
atores inclusive participam de práticas internacionais que buscam crianças e
adolescentes para atender as suas fantasias, neste caso estamos especificando o
tráfico internacional de crianças e adolescentes.
Rever e romper com esse processo social e histórico: propiciar que a
pesquisa venha a possibilitar a transformação desse imaginário sexual
instrumentalizando as vítimas a libertarem-se. Tem-se que incorporar a história ao
conteúdo da razão e sair em busca de respostas.
Esgotar todas as possibilidades, ir à gênese que, em paralelo a introdução da
nova ordem em substituição ao feudalismo, principia a incorporação do uso de
crianças e adolescentes enquanto coisa que tem utilidade nas fantasias e desejos,
como as mercadorias que a burguesia apresenta no mercado para consumo. A
particularidade brasileira revela a criança e o adolescente enquanto “coisa” que tem
possibilidade de uso. Não apresenta crianças e adolescentes enquanto sujeitos
sociais participes de um processo civilizatório que nos sonhos de muitos se constrói
83
envolto de cidadania, igualdade, liberdade e justiça social, em contraposição às
violações de toda natureza.
As formas de violência contra crianças e adolescentes não se esgotam em si
mesmas. Nelas encontram-se presentes a dimensão social, econômica, política,
histórica e cultural. A dimensão social e econômica diz respeito à reprodução das
relações sociais de produção no âmbito das relações sociais mais simples. A
dimensão política implica o manejo de situações que se repetem em todo o terririo
nacional e que requerem a definição de medidas que abrangem a legalidade e o
estabelecimento de relações internacionais, como para as formas de violência que
envolve as ações de tráfico e exploração sexual internacional. As dimensões
histórica e cultural, pela presença das formas de violência no tempo e espaço, que
retratam a constituição da sociedade brasileira desde a escravatura, como descrito
na literatura, que nos faz entender o lugar ocupado por crianças e adolescentes em
distintos períodos.
Ao ser convocado o Serviço Social, para intervir nas situações sociais as
quais há a constatação de que se pratica violência contra crianças e adolescentes,
invariavelmente existe uma expectativa técnico-operativa de quem toma tal
iniciativa. Espera-se que na emissão do parecer social, constatada a situação de
violência, a culpabilização das famílias, para as situações em que são constatadas a
permanência na rua com suas crianças e adolescentes na condição de pedinte, no
trabalho infantil ou a partir de outras formas de violência que negam a proteção. A
ação violenta e a negação de proteção não têm sua origem na família. A violência e
a não proteção o conduzidas pelo Estado e pelos interesses os quais defende
dentro da ideologia neoliberal.
As famílias têm seu cotidiano “estilhaçado” pela falta de renda proveniente do
trabalho para garantir a sua reprodução e sobrevivência, seus membros, inclusive
crianças e adolescentes permanecem ininterruptamente em busca daquilo que
sempre falta para subsistirem. Culpabilizar as famílias é fragmentar a realidade, é
simplificar o caminho de acionar aqueles a quem cabe a ação de encaminhar a
redistribuição de renda.
84
A cidadania expressa na Constituição de 1988, um dos princípios
fundamentais que a regem concomitantemente aos de liberdade, igualdade,
universalidade e justiça social, representa uma normativa jurídica utópica que foca o
direito burguês no neoliberalismo.
A mídia cumpre dentro do processo de globalização dos mercados, o seu
papel de conduzir os sujeitos sociais, numa lógica de reificação, ao consumo. Todos
são induzidos a comprar indiscriminadamente. Sem trabalho para todos, aqueles
que criam e recriam formas de acessar aquilo que objetivam consumir, crianças e
adolescentes participam desse pacto familiar que os levam a situações de violência
para conseguir o imediato, o dinheiro.
À população, subtraída do trabalho, chega ao dinheiro e ao consumo. Ela não
vende a sua força de trabalho e não detém os meios de produção. Ela cria e recria a
partir da sensibilização dos que esvaídos da dimensão política inerente a condição
de cidadão e que acreditam na caridade ao partilharem o que tem. Estes cidadãos
são aqueles que acolhem o pedinte dando o dinheiro que almeja, que compram do
trabalhador infantil que vende pelas ruas, aqueles que buscam a prática de sexo
mesmo que diante de uma situação de exploração etc.
A condição de alienação na qual permanece a população, a conduz a
consumir, mesmo que lhe subtraiam o trabalho e todos os seus direitos sociais. Não
a presença da perspectiva de classe para possibilitar a crítica e a mobilização da
população a priori. Este espaço continua em aberto.
O Estatuto da Criança e do Adolescente (1990) abre uma prerrogativa
interventiva ao Serviço Social indiscutível no âmbito da questão social e das políticas
sociais, com destaque à dimensão política, não obstante, “... interditam-lhe uma
visão de totalidade as políticas sociais, exigem-lhe a adoção de procedimentos
instrumentais, de manipulação de variáveis, de previsão da ocorrência e
conseqüências de determinado efeito sobre uma causa, ações estas que, para a sua
realização, exigem que sejam acionados determinados graus e níveis de
abrangência da “razão” e resultam no controle da vida privada dos usuários dos
serviços.” (Guerra, 2005:141)
85
“Sob o domínio do capital, a emancipação política é possível. Mas é
impossível a emancipação humana. Quem a deseja deve desejar (e sobretudo, lutar)
contra o domínio do capital.” (Netto, 2009:12). Uma lógica não somente perversa;
que é oponente a maioria da população que participa ocupando o lugar da parte
explorada e expropriada, que aspira por liberdade. E somente mediante a liberdade
que há o alcance da emancipação humana.
Notas
1 Mione Apolinario Sales no seu texto Mídia e questão social: o direito à
informação como ética da resistência optou por usar o termo media que é sinônimo
de mídia.
2 A Convenção sobre o Cibercrime prevê no tulo das infrações
relacionadas a conteúdo qualifica a pornografia infantil.
3 Esta Lei altera os artigos 240 e 241 do Estatuto da Criança e do
Adolescente.
86
CAPÍTULO III
O SERVIÇO SOCIAL: UMA CONTRIBUIÇÃO AO DEBATE DA
VIOLÊNCIA CONTRA CRIANÇAS E ADOLESCENTES
1. CONSIDERAÇÕES TEÓRICAS SEGUNDO O DEBATE
CONTEMPORÂNEO DO SERVIÇO SOCIAL
Este capítulo expressa a minha intenção inicial de trazer pra o Serviço Social
uma discussão acerca da violência contra crianças e adolescentes pautada no
arcabouço bibliográfico que representa a ruptura com o conservadorismo na
profissão que usualmente denomina-se Serviço Social contemporâneo.
É uma abordagem teórica do tema que para mim vem significando uma
síntese com uma infinidade de possibilidades investigativas futuras. Os aspectos
qualitativos aqui postos dizem respeito ao meu exercício profissional que me
possibilitou o acesso a um universo empírico na condição de observador, mas
também partícipe de uma prática plausível para crítica e para construção
investigativa.
Reconheço que o meu primeiro olhar crítico, considerando as proposições
mais recentes advindas posteriormente à Lei Orgânica de Assistência Social (1993),
aconteceu sob a Política Nacional de Assistência Social (2004). A leitura que faço é
que apenas uma intenção em fazer e nada mais na medida em que a ideologia
burguesa configurada na formatação denominada neoliberalismo preconiza uma
lógica adversa a que defende eqüidade, universalidade e justiça social na órbita dos
direitos sociais e da emancipação humana. As ações planejadas são insuficientes
para encaminhar qualquer transformação social: faz-se de conta.
É impossível não explicitar abertamente que independentemente dos
posicionamentos dos profissionais de Serviço Social acerca das atribuições, das
competências e da defesa do projeto ético-político profissional, é-se convocado de
forma equivocada para, dentro de um contexto de assessoria” executar práticas
que corrompem a nossa defesa inquestionável à classe trabalhadora, para que
“mudando de lado” prevaleça o “ordenamento social” que interessa à classe
87
dominante. Isso se repete em relação ao trabalho infantil nas ruas, a explorão de
crianças e adolescentes para fins de acesso à renda etc. O equívoco é a
culpabilização e criminalização da pobreza mascarada de proteção pela violação de
direitos preconizada pelo Estatuto da Criança e do Adolescente (1990), sem
abertura para se discutir aspectos referentes à gênese das relações sociais
envolvendo crianças e adolescentes que são comandadas segundo a reprodução
das relações sociais de produção que fundam a dinâmica conflituosa entre capital e
trabalho.
Parti do pressuposto inalienável de que à razão é atribuída à possibilidade da
inteligibilidade da singularidade das situações sociais envolvendo violência contra
crianças e adolescentes que são apresentadas ao Serviço Social pelos usuários,
posto que, estas são constituídas, constitutivas e constituintes “... de relações
racionais que obedecem aos princípios de causalidade e contradições. (Guerra,
2005:43)
Este texto é introduzido com a retomada da luta de ruptura com
conservadorismo no Serviço Social a partir de elementos hisricos que a marcam.
Meu objetivo é reafirmar um posicionamento do qual compartilho que se define pela
impossibilidade de retrocesso e desconstrução a todo debate construído que
come o Serviço Social contemporâneo. Aqui incluo toda a particularidade
brasileira, nem sempre considerada pelo conservadorismo, para entendermos a
violência contra criaas e adolescentes.
“Tão-só uma ininterrupta e vigilante crítica ontológica de tudo o que é
reconhecido como fato ou conexão, como processo ou lei, é que reconstituir
no pensamento quando chegamos a esse ponto, a verdadeira inteligibilidade
dos fenômenos. (Lukács, 1979:39)
Afinada com o projeto ético-político do Serviço Social e reconhecendo o
trabalho da vanguarda da profissão que vem garantindo que o “trem não descarrile”
com firmeza teórica que enfrenta todos os confrontos ideológicos, a exemplo das
lutas encaminhadas pela a ABEPSS (Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa
em Serviço Social), do conjunto CFESS/CRESS e ENESSO (Executiva Nacional
88
dos Estudantes de Serviço Social), quis atrelar ao tema um rigor teórico que desse
continuidade à toda a luta da profissão.
Na gênese do Serviço Social no Brasil, naquele período que se denominou
de “protoformas” (Iamamoto e Carvalho, 1986:170) da profissão, encontro elementos
presentes na contemporaneidade da profissão sob a óptica e definições de outros
atores que fazem leituras equivocadas quanto às atribuições e às competências e
parecem o conhecer os seus princípios fundamentais éticos. Resgato elementos
que compõem aquilo que hoje se denomina de conservadorismo e
neoconservadorismo na profissão para conduzir neste capítulo a minha
argumentação sob o meu objeto de estudo fazendo referência ao Serviço Social.
A construção dos objetivos da profissão à época do seu surgimento com base
em “padrões mínimos”, definidos pelo pensamento conservador fundado pelo Estado
burguês no capitalismo monopolista (Netto, 1992), para operacionalização de ações
de adaptação e de apoio e estímulo aos desajustados, que corrobora o processo de
higienização e criminalização da classe trabalhadora (“educar a nossa gente”)
quando esta não conseguia cumprir os ditames burgueses. Ao Serviço Social coube
a tarefa de exercer o controle dos desequilíbrios, resultado imediato das reformas
instituídas em âmbito nacional em prol da modernidade. Não subjacentes “novas
condições morais” de fato provocaram uma exacerbação do moralismo junto à
classe trabalhadora. Houve toda uma vinculação da profissão à cura, ao
devotamento, à ternura, à engenhosidade, à caridade, à benevolência e à
solidariedade, características que hoje ressurgem remodeladas e que não podem
passar ao largo de minha crítica. Estas características ainda são utilizadas por
aqueles que querem minar as conquistas e lutas encaminhadas pelo Serviço Social
nos últimos anos.
José Paulo Netto faz sua crítica a esse período da profissão dando destaque
à intenção de psicologização dos problemas sociais:
“... a individualização dos problemas sociais, sua remissão à problemática
singular („psicológica‟) dos sujeitos por eles afetados, é... um problema
constante, embora com gravitação variável, no enfrentamento da „questão
social‟ na idade do monopólio; ela permite com todas as conseqüências que
89
daí decorrem psicologizar os problemas sociais, transferindo a sua
atenuação ou proposta de resolução para modificação e ou redefinição de
características pessoais do indivíduo então que emergem, com
rebatimentos prático-sociais de monta, as estratégias, retóricas e terapias de
ajustamento etc.).” (Netto, 1992:37) (grifos do autor)
Uma argumentação estritamente atual afirmaria que ao considerar-se
exclusivamente o indivíduo na singularidade das situações sociais distanciar-se-ia
da totalidade e impossibilitar-se-ia o alcance da particularidade e universalidade dos
problemas sociais que afligem a classe trabalhadora.
Maria Isolina Pinheiro no seu texto que na edição de 1939 recebeu o título de
Serviço Social; infância e juventude desvalidas, mas que numa edição de 1985 da
Editora Cortez, tinha como título Serviço Social; documento histórico trazia a
seguinte definição para Serviço Social elaborado na Conferência Internacional de
Serviço Social:
“O Serviço Social compreende todo e qualquer esforço que tenha por objetivo
minorar os sofrimentos oriundos da miséria e reconduzir, tanto o indivíduo
como a família, na medida do possível, às normas da existência no meio em
que habitam. Tal ação tanto póde se exercer pelos serviços prestados
isoladamente como pelos coletivos, e, ainda pela ação legislativa ou
administrativa”. (Pinheiro, 1985:17) (grifo meu)
Fazendo um recorte reporto-me agora ao processo de crítica e ruptura com o
“Serviço Social tradicional” iniciado com o Movimento de Reconceituão. José
Paulo Netto define o “Serviço Social tradicional” de uma forma objetiva:
“... a prática empirista, reiterativa, paliativa e burocratizada, orientada por uma
ética liberal-burguesa, que, de um ponto de vista claramente funcionalista,
visava enfrentar as incidências psicossociais da „questão social‟ sobre
indivíduos e grupos, sempre pressuposta a ordenação capitalista da vida
social como um dado factual ineliminável. (Netto, 2005:6).
90
O Movimento de Reconceituação compõe um momento mais amplo que
acontece entre as décadas de 60 e 70 do século XX de manifestações e
contestação mundiais frente à “crise de fundo da ordem capitalista” (Netto, 2005).
José Paulo Netto apresenta esse período cujo grande ápice se delineia em 1968:
“O tensionamento das estruturas sociais do mundo capitalista, tanto nas suas
áreas centrais quanto periféricas, ganhou um nova dinâmica e gestou-se
quadro favorável para a mobilização das classes subalternas em defesa de
seus interesses imediatos. Registraram-se, então, amplos movimentos para
direcionar os ônus da desaceleração do crescimento econômico, mediante as
lutas de segmentos trabalhadores e as ticas de reordenação dos recursos
das políticas sociais dos Estados burgueses. Em tais movimentos, o conteúdo
das demandas econômicas em função da complexidade e da diferenciação
sociais já presentes nas sociedades capitalistas mais desenvolvidas, nas
quais os impactos da revolução científica e técnica se faziam sentir
entrecruza-se e conflui com outras demandas sociais e culturais...” (Netto,
2005:7).
Dentre as suas conquistas apresentadas por JoPaulo Netto sublinho: a
articulação do Serviço Social brasileiro com a América Latina através da concepção
de unidade; o reconhecimento da dimensão política da profissão; a interlocução com
as ciências sociais abrindo para afluência com a tradição marxista e aproximando-se
novas tendências distintas do pensamento social contemporâneo naquele período; a
instauração do pluralismo profissional; a negativa para um exercício profissional
meramente executor e a possibilidade de continuar seu trabalho ainda inconcluso.
Indiscutivelmente todo o posicionamento crítico do Serviço Social se iniciou
com o Movimento de Reconceituação na década de 60. Muito embora o Serviço
Social tenha enfrentado e denunciado o conservadorismo nas décadas de 70 e 80, a
profissão representada por aqueles que defendem outro projeto profissional continua
a encaminhar essa luta: “... de recusa e crítica do conservadorismo que se
encontram as raízes de um projeto profissional novo, precisamente as bases do que
se está denominando projeto ético-político.” (Netto, 1999:1)
91
Aquela conjuntura favorecia a construção de um projeto profissional, diante da
“mobilização” em ebulição no período da ditadura no Brasil culminando com a sua
derrota, as lutas pela efetivação da democracia encaminhadas logo a seguir e a
discussão da cidadania e direitos civis, sociais e políticos da população brasileira
durante a Constituinte, cujo ápice traduz-se na promulgação da Constituição de
1988. A vanguarda da profissão dispunha de um momento extremamente favorável
à condução do debate democrático e propositivo.
José Paulo Netto defendia a sua construção com o seguinte posicionamento:
“A ação humana, seja individual, seja coletiva, tendo em sua base necessidades e
interesses, implica sempre um projeto que, em poucas palavras, é uma antecipação
ideal da finalidade que se pretende alcançar, com a invocação dos valores que a
legitimam e a escolha dos meios para lográ-la.” (Netto, 1999:2) (grifos do autor)
Dentre as características definidas e perfiladas por José Paulo Netto no texto
A construção do projeto ético-político do Serviço Social (1999), destaco as
“inelimináveis dimensões políticas”, esta dimensão que propicia que a profissão
encaminhe sua luta em defesa dos valores históricos da classe trabalhadora.
O profissional detentor das bases históricas, políticas e filosóficas acerca do
conservadorismo e do neoconservadorismo consegue fazer a escolha sem erros.
Não obstante, fica em curso a defesa do projeto eleito, que se quer hegemônico,
sabendo-se que nunca será exclusivo. O que está implicado aqui é que o
conservadorismo e neoconservadorismo presentes na profissão tornam difícil o
cotidiano do exercício profissional na condução de propostas que visam à
autonomia e emancipação da classe trabalhadora.
“Os projetos profissionais apresentam a auto-imagem de uma profissão,
elegem os valores que a legitimam socialmente, delimitam e priorizam seus
objetivos e funções, formulam os requisitos (teóricos, práticos e institucionais)
para o seu exercício, prescrevem normas para o comportamento dos
profissionais e estabelecem as bases das suas relações com os usuários de
seus serviços, com as outras profissões e com as organizações e instituições
sociais privadas e blicas (inclusive o Estado, a que cabe o reconhecimento
jurídico dos estatutos profissionais).” (Netto, 1999:4) (grifos do autor)
92
É indubitável que temos que fazer a devida crítica ao militantismo e ao
messianismo advindo do Movimento de Reconceituação (Netto, 1992 e 2005).
Considerando os posicionamentos de José Paulo Netto (1992) e Marilda
Vilela Iamamoto (2004), em minha opinião de se fazer dentro do Serviço Social
hoje a distião entre militância política, aliança política e dimensão política da
profissão. Muitas vezes essas opções estiveram imbricadas dentro da profissão e
causaram equívocos de posicionamento teórico-metodológico. A militância política
atrela o exercício profissional à vinculação política partidária do profissional. A
aliaa política representa um contexto histórico e político em que
independentemente de projetos políticos distintos o profissional busca a defesa dos
interesses da classe trabalhadora em que são reconhecidos os recuos e retrocessos
momentâneos, assim como os avanços nos processos de luta. A dimensão política
requer uma luta permanente sem compromissos políticos partidários, mas requer a
defesa do projeto ético-político profissional em que a definição ideológica aconteceu
a priori. E é esta postura profissional que defendo.
Em seguida o III Congresso Brasileiro de Assistentes Sociais ocorrido em
1979, denominado “Congresso da Virada”, marca uma proposta de ruptura com o
conservadorismo. Recorto um trecho do texto proferido na mesa de abertura desse
Congresso:
“... O problema concreto do Brasil, é de a partir das bases, a partir de todos os
protestos de mobilização social, dos movimento sociais que ocorrem no meio
urbano e no campo, o povo brasileiro diga o que ele pensa, o que ele quer, de
que forma as suas necessidades devem ser satisfeitas, e até agora o que o
Serviço Social tem se comprometido com esse povo! ... Através do
compromisso político, que nós temos que assumir com essa sociedade...
(Anais do Congresso Brasileiro de Assistentes Sociais,1980:9)
Na “intenção” de ruptura com o conservadorismo e apresentação de uma
nova proposta teórica para o Serviço Social a dimensão política esteve presente e
de forma muito clara. Era explicito o compromisso profissional com a classe
trabalhadora, de defesa de seus interesses em detrimento ao capital. O momento
político mundial era extremamente favorável àquele posicionamento quanto ao que
93
diz respeito à mobilização social. E veio o neoliberalismo que minou o campo de
lutas em andamento e arrasou projetos, como nos apresenta Perry Anderson (1995)
e José Paulo Netto (1995, ed. 2003)
Marilda Villela Iamamoto (2004) sintetiza que o Serviço Social surge
enquanto profissão inscrita na divisão social do trabalho enquanto uma “estratégia
de classe” que come um projeto de ordenamento e desenvolvimento da
sociedade capitalista, cujo tipo de ação social” de característica “essencialmente
política”, delineia uma “aparência formal que repercute aos olhos de todos,
inclusive assistentes sociais, que se trata de um fazer que todos podem executar.
“Essa aparência formal reifica a prática, não sendo capaz de dar conta do significado
sócio-político da profissão...” (Iamamoto , 2004:174)
2. SERVIÇO SOCIAL E PROTEÇÃO SOCIAL NUM CONTEXTO DE
VIOLÊNCIA CONTRA CRIANÇAS E ADOLESCENTES
O processo de luta de rios segmentos da sociedade resultou no que
come o Capítulo Da Ordem Social na Constituição Brasileira promulgada em
1988. Estão definidos direitos sociais em prol da justiça social através da seguridade
social com base na universalidade, uniformidade e equivalência de possíveis
distinções entre a população. São Saúde, Previdência e Assistência Social espaços
profissionais do Serviço Social consolidados. A Carta de Maceió (CFESS/CRESS,
2000) apresenta a Seguridade Social como
“... um campo de luta e de formação de consciências críticas em relação à
desigualdade social no Brasil, de organização dos trabalhadores. Um terreno
de embate que requer competência teórica, política e cnica. Que exige uma
rigorosa análise crítica da correlação de forças entre classes sociais e
segmentos de classe, que interferem nas decisões em cada conjuntura. Que
força a construção de proposições que se contraponham às reações das
elites político-econômicas do país, difusoras de uma responsabilização dos
pobres pela sua condição ideologia que expressa uma verdadeira
indisposição de abrir mão de suas taxas de lucro, de juros, de sua renda da
terra.”
94
A Assistência Social é uma importantes área de atuação do profissional de
Serviço Social. Equívocos conceituais tradicionais ligam a profissão exclusivamente
à assistência social. José Paulo Netto se refere ao problema enfrentado pela
profissão no que diz respeito à centralização dos seus objetivos na assistência
social. O elenco de objetivos do Serviço Social tem sido intencional e
acintosamente minimizado mediante a centralização das funções no plano
assistencial.” (Netto, 2007: 38). Conforme aponta Maria Dalva Horácio da Costa
(2000) a direciona à assistência social uma centralidade dentro da operacionalização
do Sistema Único de Saúde. Acresço a sua transversalidade nas políticas públicas e
seu caráter político na condução do processo de apreciação das demandas e
encaminhamento das lutas que definem, dentro do contexto inegável de correlação
de forças, a ampliação de direitos sociais através de novas políticas públicas sociais.
As organizações representativas da profissão se posicionam em defesa da
profissão para que esta não seja confundida como assistência social. E em 2008 o
Conselho Federal de Serviço Social definiu assim a Assistência Social:
A Assistência Social, como conjunto de ações estatais e privadas para
atender necessidades sociais, no Brasil, tamm, apresentou nas suas
últimas décadas uma trajetória de avanço que a transportou da concepção de
favor à categoria de direito, da pulverização e dispersão ao estatuto de
Política Pública e da ação focal e pontual à dimensão da universalidade.”
(CFESS, 2008)
Compartilho da certeza de que a Constituição Federal de 1988 e a Lei
Orgânica de Assistência Social (1993) aconteceram num momento distinto de
mobilização política e de conquistas democráticas concretizando a universalidade de
direitos sociais e a cidadania da população brasileira. O projeto ideológico neoliberal
incorporado no Brasil resultou no desmonte das políticas públicas sociais através da
contra-reforma do Estado (Behring, 2003). Os desdobramentos legais posteriores, a
Política Nacional de Assistência Social (2004) e a Norma Operacional Básica
(NOB/SUAS/2005) remetem a outro problema: a inviabilidade nos moldes atuais de
fortalecimento político da classe trabalhadora.
95
“... seu arcabouço conceitual, que precisam ser enunciados, sob pena do
SUAS ser apropriado por dentro e insidiosamente pelo mais arraigado
conservadorismo e transforma-se num imenso plantão de gestão da pobreza,
pan-óptico dos pobres, e gambiarra de recursos para o terceiro setor...”
(Behring, 2008:165) (grifos da autora)
O foco de ateão é o indivíduo e a família em “situação de risco” para eleger
estratégias para se alcançar a “reestruturação” e “novas referências morais”. A
“auto-organização” diz respeito ao âmbito individualizado e a autonomia refere-se a
não necessidade de assistência social futura. E mais, o encontro com indivíduos e
suas respectivas famílias acontece a partir do “ordenamento social”, higienização da
rua e instauração da civilização”. A família é apreendida a partir das suas
fragilidades, espaço de “proteção” e socialização” dos seus membros, destacando-
se a sua premência de cuidado e proteção. O reconhecimento de família prevê a
existência de consangüinidade, a afetividade e de solidariedade entre indivíduos. O
artigo 226 da Constituição Federal de 1988 e o artigo 16 da Declaração Universal
dos Direitos Humanos são utilizados como referência para conceituar família e
definir parâmetros de atuação no âmbito da política social.
José Paulo Netto sublinha a necessidade de associar-se o
... crescimento econômico com uma ampla e eficiente política de
desconcentração da propriedade para que se torne viável uma política de
redistribuição de renda ...” A história recente nos mostra que o crescimento
econômico vivenciado pelo Brasil entre 1930 a 1980 não significou alterações
na desigualdade social, pois não houve a distribuição das riquezas
produzidas. (Netto, 2004b, p.15) (grifos do autor).
E uma manifestação recente (2009) da categoria dentro do tema aconteceu
através da campanha encaminhada pelo CFESS (Conselho Federal de Serviço
Social) intitulada Socializar riqueza para romper desigualdade.
Destaco e incorporo aqui a proposição apresentada por Behring (2008)
quanto à possível e viável configuração da Política Nacional de Assistência Social
(2004) e do Sistema Único de Assistência Social (2005), por um ouro caminho:
96
“... espaço de fortalecimento e constituição dos usuários como sujeitos
políticos, com organização e autonomia política ... Bastaria incorporar
propostas de mobilização e educação popular e dar mais autonomia para as
equipes técnicas para formular, criar ... Com essa ausência na política, perde-
se a perspectiva da coletivização e politização das demandas com base no
território incorporação inovadora e interessante da lógica do SUAS , hoje
percebido como um importante lócus da resistência, à medida em que a
fábrica fragmentou-se.” (Behring, 2008:165-166)
Na verdade ao Serviço Social o impedimento de exercício da autonomia
muitas das vezes pelo medo” dentro da própria profissão dos desdobramentos
políticos partidários de uma intervenção profissional que priorize a dimensão política.
É-se cerceado na relação profissional dentro do próprio Serviço Social; um grande
equívoco. E assim persistência e reincidência do conservadorismo na profissão.
Este fato acaba corroborando para que outros projetos triunfem. Nas palavras de
Yolanda Guerra: “Há uma investida neoconservadora para, de um lado, considerar
direitos como privilégios, e, de outro, destituir os direitos dos seus conteúdos de
classe.(Guerra, 2009:32-33)
“Por isso, faz-se necessário investir numa luta política e ideológica contra o
pensamento único, contra a resignação e a tendência à naturalização dos
direitos sociais e a todo tipo de discurso que visa a ofuscar os antagonismos
de interesses próprios da sociedade de classes.” (Guerra, 2009:35)
Potyara A. P. Pereira (2008) me remete a pensar a dimensão política inerente
à questão social: “... o conceito questão social sempre expressou a relação dialética
entre estrutura e ação, na qual sujeitos estrategicamente situados assumiram papéis
políticos fundamentais na transformação de necessidades sociais em questões ...
(Pereira, 2008:51) (grifos da autora). É vexatório, mas a prática repetida e impositiva
ao profissional de Serviço Social é a de desconsiderar a formação profissional e
atender exclusivamente a outros interesses que se utilizam daquilo que está-se
priorizando enquanto política pública para atribuir valor a reconduzir indivíduos”,
que “...tem servido como forma de despolitização dos usuários dos serviços/políticas
sociais e, como tal, tem sido funcional ao ideário neoliberal.” (Guerra, 2009:36)
97
Impossível conduzir tal discussão sem considerar os pontos que compõem o
projeto ético-político do Serviço Social:
“... o reconhecimento da liberdade como valor central a liberdade concebida
historicamente, como possibilidade de escolha entre alternativas concretas;
daí um compromisso com a autonomia, a emancipação e a plena expansão
dos indivíduos sociais. Conseqüentemente, este projeto profissional se
vincula a um projeto societário que propõe a construção de uma nova ordem
social, sem exploração/dominação de classe, etnia e gênero. A partir destas
opções que o fundamentam, tal projeto afirma a defesa intransigente dos
direitos humanos e o repúdio do arbítrio e dos preconceitos, contemplando
positivamente o pluralismo, tanto na sociedade como no exercício
profissional.
A dimensão política do projeto é claramente enunciada: ele se
posiciona a favor da equidade e da justiça social, na perspectiva da
universalização do acesso a bens e a serviços relativos às políticas e
programas sociais; a ampliação e a consolidação da cidadania são
explicitamente postas como garantia dos direitos civis, políticos e sociais das
classes trabalhadoras. Correspondentemente, o projeto se declara
radicalmente democrático considerada a democratização como socialização
da participação política e socialização da riqueza socialmente produzida.
(Netto, 1999:15-16) (grifos do autor)
Mais recentemente em artigo denominado Das ameaças à crise José Paulo
Netto (2007) faz uma avaliação do projeto ético-político incluindo uma crítica ao
projeto neoliberal: “... o desenvolvimento, próprio desta conjuntura, das linhas de
força da cultura neoliberal tornou, numa escala não prevista em 1999,
profundamente problemática a conversão do „projeto ético-politico‟ em processo real
de qualificação do Serviço Social.” (Netto, 2007:40) (grifos do autor).
A dimensão política no âmbito do exercício profissional do Serviço Social
expressa através do compromisso político e do ponto de vista de classe imprime
uma direção política à prática, contudo sem a competência teórica não é possível “...
98
desvendar essa prática no jogo das relações de poder político-econômico, das
relações do Estado como o movimento das classes sociais.” (Iamamoto, 2004:179)
No cotidiano do exercício profissional além do imediatismo, do pragmatismo e
do reducionismo das análises que impregnam o fazer profissional, observa-se a
ausência do posicionamento político profissional em defesa dos interesses da classe
trabalhadora. Continua-se a reproduzir a intenção burguesa impositiva de outrora da
sua ideologia em concordância com a acumulação capitalista sem qualquer crítica.
O profissional incorpora para tanto os interesses daquela classe como se fossem
hegemônicos. Como superar a tendência de, contraditoriamente ao movimento
crítico fundado sob a égide da teoria social crítica, higienização da sociedade,
criminalização da pobreza, desmobilização política da classe trabalhadora através
de supostas políticas socais públicas inclusivas etc.?
Atrevo-me a dizer que a capacidade de síntese imprime o caminho
profissional a seguir, as possibilidades a se construir diante da realidade ctica,
que se apresenta na singularidade das situações sociais que são inerentes à
cotidianidade. Ao Serviço Social cabe elaborar no plano do pensamento uma
construção investigativa que vislumbre o alcance da verdade, que se sabe
provisória, mas que no plano do intelecto define pensar a realidade concreta. E
ainda, interpretar essa realidade diante, num primeiro momento, de material
empírico que se apresenta grotescamente sem disfarces repleto de nuanças,
sutilezas e revelações. A investigação não mais seria uma ação esporádica,
exclusivamente relacionada a compromissos acadêmicos e sim um componente do
fazer profissional de maneira a agregar um diferencial à competência técnica do
exercício profissional.
A possibilidade de síntese se revela na definição das categorias que
conduzirão a análise da realidade, o desvendamento do movimento do real. A
realidade se expressa através das múltiplas determinações. São as mediações que
propiciam a captação dialética do movimento da realidade e do ser social confirmada
numa legalidade tendencial, imanente, histórica e teórica e que conduz a
investigação onde as categorias concretas no seu movimento dão sentido ao
processo histórico. E a partir daí trilhar um caminho que se distancie das ações
99
perpetradas que querem reinventar o conservadorismo na profissão. Nas palavras
de Yolanda Guerra:
“... a presença de um projeto profissional crítico permite aproximar o
profissional das mediões que se constituem ontologicamente no modo de
ser, na legalidade tendencial dos processos sociais ali presentes, do que
decorre a apreensão das instituições como campo de mediações que
particularizam o movimento da legalidade social no cotidiano profissional,
para o que é necessário que se capte a maneira como se expressam neste
cotidiano as determinações mais amplas da vida social, a lógica
mercadológica, a alienação e a reificação das relações sociais, a exploração e
os antagonismos de interesses do capital e do trabalho. Somente a
percepção deste movimento permite que o profissional apreenda suas
demandas profissionais ...” (Guerra, 2007:18)
O resultado desse trabalho intelectivo é que conduz o profissional a
materialização de um diferencial quanto à coerência real com o projeto profissional
da categoria. E ainda, esse caminho permitiria, no meu entendimento, a concreção
da dimensão política inerente ao exercício profissional esvaziado dos equívocos do
militantismo e do messianismo, sem também ceder a alianças políticas provisórias e
perigosas, quando inevitável o fazer respaldado de embasamento teórico para
nunca se distanciar do projeto ético-político profissional e dos princípios
fundamentais éticos. Agora, encaminhar o projeto ético-político profissional requer
uma posição política coletiva dos profissionais que estão ocupados com a dimensão
técnico-operativa.
Agora, é na insatisfação com as demandas postas historicamente ao fazer
profissional que se conduz a crítica e a encaminha-se de forma política. Essa
insatisfação se constrói desde a formação profissional na medida em que a faz a
crítica real a prática conservadora e se consolida uma formação comprometida com
o que significa a ruptura no Serviço Social. A dimensão política na profissão
representa o compromisso técnico-operativo com a consolidação da emancipação
política da população na condução da luta por seus direitos negados historicamente.
Parafraseando Karl Marx: A emancipação política é simultaneamente a dissolução
dessa dinâmica societária na qual repousa um Estado defensor de interesses do
100
mercado financeiro e de pode do capital. A emancipação política encaminharia o fim
de todos os desdobramentos perversos vinculados à pobreza, restauraria a justiça
social, a igualdade entre os homens, a liberdade plena e daria novos rumos à
democracia. O desafio que se põe em pauta advém de um convocar adeptos para
essa luta, a partir do reconhecimento de sua força política na condução do processo
de transformação social. Para tal é
“... preciso conceber a modernidade também pelo ângulo da ampliação e da
universalização da cidadania, ou seja, concebê-la como uma época histórica
marcada pela promessa da plena emancipação do homem de todas as
opressões e alienações de que tem sido vítima, a maioria das quais produzidas
e reproduzidas precisamente pelo capitalismo. Nesse sentido, podemos dizer
que as possibilidades que a modernidade abriu para a humanidade as
generosas promessas de emancipação que ele criou ainda não foram
realizadas.” (Coutinho, 2000:68-69)
É através do trabalho, do processo de trabalho do Ser viço Social, na sua
inserção na divisão social e técnica do trabalho que se fará o contraponto necessário
para que se instaure um debate efetivo acerca da violência contra crianças e
adolescentes fundado no caráter inteligível propiciado pela razão.
A práxis profissional é que alavanca a intervenção descartada de
decomposições e as fragmentações do real. Assim prevalece a visão de totalidade
na apreensão das situações sociais que envolvem violência contra crianças e
adolescentes independentemente das convocações para as ações contrárias.
Diante das convocações institucionais dada à vinculação contratual do
profissional de Serviço Social, para emitir estudos sociais, pareceres sociais e
perícias sociais atrelados ao tema em questão quero incorporar uma preocupação:
“... a ausência de entendimento sobre as representações da consciência,
sobretudo da base material que as produz e as mantém, encaminha o
assistente social a tomar os fatos e fenômenos tal como eles aparecem à sua
consciência, e a buscar em modelos teóricos explicativos da sociedade seu
referencial operativo de atuação que, pela reincidência dos problemas
101
enfrentados, tende a cristalizar-se em modelos de intervenção profissional...
(Guerra, 2005:150)
No levantamento empírico feito por mim diante dos trabalhos apresentados nos
Anais do XII Congresso Brasileiro de Assistentes Sociais (2007) foram encontrados
em maior número produções que tinham como preocupação a busca de um
referencial teórico para conduzir um posicionamento crítico diante do contexto de
violência contra crianças e adolescentes ou da demanda institucional. Não obstante,
não foi encontrado em qualquer dos trabalhos a busca de uma bibliografia que
representasse uma ruptura definitiva com a ideologia conservadora. Não havia rigor
teórico na opção teórico-metodológica pelo marxismo e na busca das fontes que
subsidiasse tal opção.
Em alguns autores alguns textos se repetem na bibliografia para definição das
causas da violência contra crianças e adolescentes diante dos atendimentos a
demandas institucionais em detrimento da defesa da classe trabalhadora. pouca
ou nenhuma referência às relações sociais de produção e reprodução.
Não encontrei nenhuma crítica à finalidade das instituições de disseminação da
ideologia dominante, com a apresentação de que esta introduz tamm uma
valorização de ões em que os homens violentam-se entre si. Retomo aqui uma
contribuição de Adolfo Sanchéz Vazquéz, de que somente o homem imprime uma
ação violenta contra outro homem. Com isso não quero abrir uma defesa
indiscriminada as ações violentas, inclusive daquelas que atingem o patamar da
eliminação por morte do outro.
Fica claro que à profissão são apresentadas demandas que expressam
equívocos e que dizem respeito a uma ação autoritária, fiscalizadora e policialesca
sob os usuários.
Sublinho que dentre os trabalhos que selecionei dentro nos Anais do 12º
Congresso Brasileiro de Assistentes Sociais encontrei alguma preocupação de não
psicologização da discussão do tema. Sabemos que isso não representa a realidade
da profissão, haja vista o debate em andamento e a Resolução 569 expedida
recentemente pelo Conselho Federal de Serviço Social que veda a realização de
102
práticas terapêuticas associadas ao título e/ou ao exercício profissional do assistente
social.
3 - O DEBATE DA TEMÁTICA DA VIOLÊNCIA CONTRA CRIANÇAS E
ADOLESCENTES PELOS PROFISSIONAIS DE SERVIÇO SOCIAL
Quis incorporar aqui uma discussão que significasse uma interlocução com os
debates do tema da violência contra crianças e adolescentes encaminhados pela
categoria. Queria ouvir os profissionais; estive preocupada sempre em como fazer.
Saber como vinham entendendo e trabalhando o tema, não para fazer uma crítica
desmobilizadora e desconsiderar os acúmulos da categoria, mas sim possibilitar um
avanço no debate de um tema tão complexo. O profissional de Serviço Social é
convocado a todo o momento a posicionar-se mediante instrumentos técnicos
(estudos sociais, pareceres sociais, perícias sociais etc.) para que supostamente
sejam aplicadas medidas de proteção em conformidade com a prerrogativas legais
definidas no Estatuto da Criança e do Adolescente. E nos capítulos anteriores
explicitei todas as argumentações teóricas que defendo dentro do tema e quis expor
todos os nós indiscutivelmente presentes. A banca qualificação me sugeriu que
recorresse à produção apresentada do 12º Congresso Brasileiro de Assistentes
Sociais por este expressar invariavelmente o trabalho do Serviço Social no Brasil. E
eu acatei essa sugestão maravilhosa; foi possível ter acesso aquilo que
representava a intervenção e os estudos dentro do tema pela categoria a partir de
diferentes instituições e referenciais teóricos.
Todos os vinte trabalhos os quais utilizei tinham objeto de estudo com
alguma relação à violência contra crianças e adolescentes ou este tema era o
próprio objeto nas suas várias formas. Procurei agrupar os trabalhos com uma lógica
que facilitasse o entendimento da minha argumentação teórica e as opções que fiz
ao longo da dissertação, inclusiva aquela quanto a romper com a fragmentação do
tema.
Gostaria de reprisar a minha escolha pelo método de Karl Marx. E tamm,
que o meu exercício de reproduzir no pensamento o movimento real do meu objeto
de estudo não esgota a aproximação com a realidade, pois esta é uma “totalidade
103
inacabada, um vir-a-ser” , assim sendo, jamais conseguiria esgotar todas as
possibilidades inerentes à realidade.
Um primeiro trabalho sob o título A atuação do assistente social no Lar da
Criança no Estado de Mato Grosso trazia, a partir de dados de uma equipe de
trabalho, sua preocupação com a “negligência” enquanto a justificativa para
destituições e perda do poder familiar. (Amorim, 2007)
Outra preocupação elencada no mesmo estudo é (que entendi atrelada a
uma suposta situação de negligência) a tendência, pelos profissionais que atuam
em defesa de direitos, de “acusar única e exclusivamente a família pela
institucionalização.” (Amorim, 2007)
Muito embora a institucionalização de crianças e adolescentes não tenha
entrado na minha discussão de uma forma direta, ela é uma realidade para
interromper um processo de violência e garantir a proteção. O destaque aqui é para
o foco sugerido em direção à família para subsidiar pareceres profissionais que
definem a ação final do judiciário.
“Como profissionais de Serviço Social, atuantes na área da Infância
avaliamos que essas idéias ficam implícitas nas análises dos profissionais
que realizam o estudo psicossocial influenciando nas decisões judiciais e o
deferimento à adoção. Esse é outro aspecto que apesar de não ser nosso
objetivo tratar neste momento, me motivou a ir em busca de uma
compreensão mais aprofundada sobre as condições em que vivem as famílias
que têm suas crianças submetidas à medida protetiva de abrigamento e
entender porque esse fenômeno é crescente a cada ano, apesar de todo o
aparato legal.” (Amorim, 2007)
Outra preocupação da autora é com a “falsa concepção que se têm acerca do
abandono (Amorim, 2007) que se limita a colocar a culpa na família desde aqueles
que no processo de atendimento institucional mantém uma relação com esta e
supostamente testemunham as situações de cuidado.
104
... mães sociais e demais profissionais responsabilizam a família de origem,
principalmente as mães, pela desestruturação familiar. Constroem um quadro
da incompetência e da imoralidade dessas famílias, as caracterizando como
preguiçosas, atrasadas, acomodadas e desinteressadas. Ou seja, tais
julgamentos sobre a família que abandona, persistem na esfera moral.”
(Amorim, 2007)
Uma preocupação minha é que ao utilizar a opinião daqueles sujeitos sociais
responsáveis pela atenção direta a crianças nas instituições e que
conseqüentemente recepcionam as famílias e acompanham o cuidado direcionado
às crianças e adolescentes permanecer-se com uma avaliação concernente ao
senso comum.
O estudo não consegue contribuir quando aborda as políticas públicas e as
políticas de governo; não discute as políticas enquanto formas de controle
emplacado pelo conservadorismo e neoconservadorismo e por isso não tem a
proposta de qualificar os sujeitos sociais de maneira a intervir nos processos de
controle.
Sublinhamos a partir do mesmo estudo o destaque dado pela autora quanto
às dificuldades profissionais para a conceituação do termo “abandono”, posto que na
história brasileira de políticas de atendimento a crianças e adolescentes abandono”
era legitimado e a desconstrução deste status legítimo aconteceu diante de uma
crítica originária no senso comum direcionado à família a culpa exclusiva, sem um
viés científico.
“Por vezes, o problema conceitual acerca do “abandono” tamm é motivo de
problema na visão dos assistentes sociais e operadores de direito. Os
diferentes saberes, as correlações de força e as relações de poder permeiam
nessa relação de trabalho. Isso nos tem possibilitado um amadurecimento
profissional e nos faz lembrar de traços antigos da profissão, tais como a
velha idéia de que o assistente social é um quebra-galho” na instituição,
possui pouco valor simbólico. Dentro da divisão sócio-técnica do trabalho é
uma profissão de baixo prestígio social, sendo extensiva à idéia de
subalternidade para com os demais profissionais.” (Amorim, 2007)
105
O estudo embora cite na sua conclusão a dimensão política no Serviço Social
não apresenta detalhes quanto a sua operacionalização por aquela equipe de
trabalho e não a conceitua, o obstante, faça referência a autores que pesquisem
o tema.
Os três trechos que se seguem compõem um mesmo estudo - Violência,
saúde e negligência como andam nossas práticas? - e os aspectos nele
levantados quanto à negligência são pontuados nas minhas argumentações
anteriores e posteriores de uma forma direita e indireta.
“...Estas negligências podem ser referentes à vacinação, documentação
(registro de nascimento), situação irregular de ensino, cuidados domésticos
que inclui evasão hospitalar...”
“Sendo assim, torna-se imprescindível para os profissionais da saúde, em
especial o Serviço Social, localizar tais demandas através da escuta
qualificada, sensível e responsável. O que possibilita ao profissional,
identificação de tais casos para além da negligência estritamente familiar.
Considerando-se assim, os aspectos psicossociais que estas famílias estão
inseridas...”
“Concluímos assim, que a negligência familiar é um fenômeno que exige um
olhar atento e qualificado para um diagnóstico preciso, evitando assim que se
caia no erro da culpabilização da família possível ato negligente, percebendo
que, muitas das vezes, tais contextos são permeados por deficiências
macroestruturais.” (Freitas, 2007)
A seguir seguem alguns destaques meus para Notificação Compulsória de
Maus-Tratos e a Política Nacional de Redução na Morbidade por Acidentes e
Violências.
A Política Nacional de Redução na Morbimortalidade por Acidentes e
Violências Portaria MS/GM 737 de 16/05/2001 publicada no DOU 96
seção 1e de 18/05/2001 se constitui num “instrumento orientador” direcionada ao
setor de saúde, compreende ações de promoção da saúde e prevenção de
106
acidentes e violências, através da articulação com distintos segmentos sociais. A
Política Nacional define violência da seguinte forma:
“Os acidentes e as violências resultam de ações ou omissões humanas e de
condicionantes técnicos e sociais. Ao considerar que se trata de fenômeno de
conceituação complexa, polissêmica e controversa, este documento assume
como violência o evento representado por ações realizadas por indivíduos,
grupos, classes, nações, que ocasionam danos físicos, emocionais, morais
e/ou espirituais a si próprio ou a outros... Nesse sentido apresenta profundos
enraizamentos nas estruturas sociais, econômicas e políticas, bem como nas
consciências individuais, numa relão dinâmica entre envolvidos.
diversas formas de expressão da violência; agressões físicas, abuso sexual,
violência psicológica e violência institucional. Os diversos grupos
populacionais o atingidos por diferentes tipos de violência com
conseqüências distintas. Os homens sofrem mais violência que levam a óbito
e tornam-se visíveis os índices de mortalidade. Em outros segmentos, porém,
sobretudo o de criança, adolescente, mulher e idoso, as violências não
resultam necessariamente em óbito, mas repercutem, em sua maioria, no
perfil de morbidade, devido ao seu impacto sobre a saúde.” (Política Nacional
de Redução da Morbimortalidade por Acidentes e Violências Portaria
MS/GM 737 de 16/05/2001 publicada no DOU 96 seção1e de
18/05/2001, p.7-8)
O instrumento legal não contextualiza a violência, parte dos indivíduos
isolados para defini-la. Na expressão “apresenta profundos enraizamentos” aponta a
violência de forma naturalizada, como inerente à sociedade, simplificando a sua
conceituação. Delimita que o ambiente doméstico na infância e o espaço
extradomiciliar são potencializadores das situações violentas. Distingue a partir
dessa delimitação as violências domésticas e as violências extradomiciliares. Na
verdade reduz a gravidade e a complexidade do tema. Enquadra a violência contra
crianças e adolescentes numa moldura, sem qualquer reflexão crítica que possibilite
a apreensão de totalidade da realidade social. O entendimento dado à violência
contra crianças e adolescentes pela Política Nacional é bastante adverso daquele
que defendo. Segue ainda a Política Nacional fixando que:
107
“A violência contra a criança e o adolescente é potencializadora da violência
social, estando presente na gênese de sérios problemas, Como população de
rua, prostituição infantil e envolvimento em atos infracionais, devendo,
portanto, se alvo prioritário de atenção.” (Política Nacional de Redução da
Morbimortalidade por Acidentes e Violências Portaria MS/GM Nº 737 de
16/05/2001 publicada no DOU Nº 96 seção1e de 18/05/2001, p.20)
No texto da Política Nacional a prevenção de acidentes e violências
pressupõe a co-responsabilidade do cidadão. Nem os acidentes de trânsito são
passíveis de prevenção dentro de uma lógica cultural de associar consumo de
bebidas alcoólicas com status social, poder e virilidade. Como prevenir dentro de
uma lógica mercantil violenta?
O foco na família prevê simplesmente a culpabilização e criminalização dos
sujeitos e a notificação de maus-tratos. Não espaço para contextualização da
violência; não o considerados os aspectos sócio-históricos, econômicos, políticos,
culturais e de saúde que perpassam os atos violentos. São apreendidos
isoladamente, na singularidade dos fatos.
“Em relação à unidade familiar, as medidas estarão voltadas tanto para o
reconhecimento quanto para redução da violência doméstica, envolvendo um
conjunto de ações intersetoriais, tendo conta o caráter multifatorial para a sua
determinação, principalmente com as áreas da justiça e da segurança pública.
Assim, o desenvolvimento das ações pautar-se-á pela tipificação da violência
sofrida, considerando que os comportamentos violentos acontecem num
contexto relacional em que os sujeitos estão implicados ora como vítimas, ora
como sujeitos das agressões, e que as pessoas envolvidas nestas situões
tendem a repeti-las, perpetuando a cadeia de agressões em que estão
inseridas...” (Política Nacional de Redução da Morbimortalidade por Acidentes
e Vioncias Portaria MS/GM 737 de 16/05/2001 publicada no DOU
96 seção1e de 18/05/2001, p.27-28)
As pesquisas vinculadas à Política Nacional de Redução de Morbidade
por Acidentes e Violências são previstas nos seus aspectos sócio-antropológicos
(identificação de valores, hábitos e crenças associadas às relações interpessoais e
108
institucionais). Outra investigação prevista é o impacto socioeconômico das
violências. Assim fica esclarecido que não há qualquer intenção de buscar a gênese
da violência contra crianças e violências na sua configuração contemporânea
demarcada pela lógica mercantil e nem apresentar uma proposta de ruptura.
O único trabalho sobre perícia social Perícia social para casos de crianças e
adolescentes vítimas de violência: relato de uma experiência - faz algumas
considerações relevantes acerca da negligência e o processo de trabalho do Serviço
Social:
“... a perícia nos casos de negligência. O que podemos considerar como
negligência familiar na atualidade, quando a situação de extrema pobreza não
permite que mães fiquem em casa cuidando dos filhos ou que tenham ajuda
de outras pessoas para isto? Quando acontece algum tipo de acidente,
quando estas criaas são vítimas de violência, estas mães devem ser
condenadas, acusada de negligência, simplesmente? O perito assistente
social deve, portanto, estar preparado para investigar e analisar a situação
com competência, sem se descuidar da singularidade de cada caso no seu
contexto devido;” (Santos e Nogueira, 2007)
“A importância de dar saltos maiores na qualificação do atendimento social,
bem como na disponibilidade ético-política dos profissionais envolvidos para a
garantia de direitos de crianças e adolescentes;” (Santos e Nogueira, 2007)
O Serviço Social apesar de compor o “eixo responsabilização” (Santos e
Nogueira, 2007) dentro do contexto de trabalho daquela equipe profissional a
garantia de direitos aos cidadãos é explicitada como foco principal da perícia social.
Nós enquanto profissionais sabemos como a responsabilização é apreendida e
defendida por outros atores profissionais, não obstante o profissional acessa
dados, pesquisas e bibliografias que fundamentam os pareceres sociais de forma a
não culpabilizar e criminalizar de forma indiscriminada.
Outro estudo A garantia dos direitos da criança e do adolescente e a
resolutividade das notificações compulsórias de maus tratos - parte do processo de
“resolubilidade” (Ferrarez, 2007) das notificações compulsórias de maus-tratos para
109
definir como objeto de estudo “o direito de não sofrer violência”. Aqui sublinho que o
termo “resolubilidade” é de grande abrangência se nos reportarmos ao significado
atribuído à palavra resolver cuja definição passa por extinguir gradualmente e por
transformar.
Cabe ao Serviço Social mais que comunicar aos órgãos competentes visando
garantir a proteção de crianças e adolescentes. Se embasado nos princípios éticos
fundamentais da profissão e no projeto ético-político, e ainda dentro da sua natureza
técnico-operativa e teórico-metodológica da profissão, entendo que mais que
comunicar que tem intervir e analisar as formas de violência contra crianças e
adolescentes. Intervir e analisar considerando a dimensão política da profissão,
entendendo que as singularidades das situações sociais inerentes ao cotidiano
necessitam que se direcione um olhar crítico para que as mediações nos permitam
a aproximação da realidade com outra perspectiva de intervenção, que ultrapasse a
individualidade e a imediaticidade: proposições transformadoras. Entendendo ainda
que quaisquer proposições em termos de política pública ainda refletiriam um
recorte da realidade que efetivamente demanda uma transformação, uma ruptura
com uma lógica acumulativa eminentemente violenta.
Agora não é para se desconsiderar que as situações sociais que efetivamente
envolvem violência contra crianças e adolescentes que requerem atenção quanto ao
dimensionamento da sua gravidade e encaminhamento de providências urgentes.
Preferencialmente com o diálogo e participação de todos os envolvidos possíveis,
para o encaminhamento de providências que interrompam o processo. Mas sempre
avaliando a gravidade das situações para todos os envolvidos, inclusive para os
profissionais responsáveis pela ação delimitando as instâncias que devem participar
em cada fase da intervenção.
E não somente, ao entender que para a interrupção definitiva da violência
contra crianças e adolescentes depende da conjugação de ações transformadoras
em escala mundial dento da lógica da tolerância e mais que isso, depreender que a
violência, a sua reprodução tem relação direita com a lógica mercantil capitalista.
Alguns podem interpretar esse meu posicionamento como uma utopia ou ilusão,
mas esse objetivo se faz necessário à Humanidade tão sem limites. As ações diante
das situações singulares nunca o propiciar a prevenção, promoção e proteção,
110
segundo a fundamentação do meu estudo. Interrompe-se um processo de violência
contra crianças e adolescentes aqui, outro se inicia logo em seguida acolá. As
formas de violência contra crianças e adolescentes têm se mostrado na sua
variabilidade. Não obstante, não é minha intenção desconsiderar a compulsoriedade
do ato de notificar.
Em outro estudo Notificação de violência doméstica contra crianças e
adolescentes - faz-se importante grafar:
“... é necessário rompermos com a cultura do silêncio que envolve esta
questão. A notificação dos casos é fundamental para conhecermos a
complexidade do fenômeno e para desencadear ações de proteção para a
infância e juventude.” (Raymundo, 2007)
Mais que “quebrar o silêncio” (Raymundo, 2007) e notificar, a sociedade
precisa sair da sua condição de alienação. Somente assim a sociedade civil vai
conseguir de fato propulsionar a transformação da condução política, econômica,
ideológica e cultural da violência contra crianças e adolescentes.
Dentre os estudos sobre as Notificações Compulsórias de Maus-Tratos
sublinhamos uma abordagem que descartou a negligência por considerá-la essa
exclusivamente vinculada à condição sócio-econômica da família - Infância e
juventude violência na contramão do direito.
“É imprescindível fazermos uma tímida abordagem acerca da violência e da
negligência contra crianças e adolescentes. Sabemos que a negligência
constitui maus-tratos, mas o cuidado da não culpabilização da família é
relevante. Muitos são os casos de pouca ou nenhuma condição sócio-
econômica da família.” (Schreider, 2007)
Este estudo segue numa análise comparativa através de números para
trabalhar as formas de violência física, sexual e psicológica. E ao final defende que
muito embora o artigo 245 do Estatuto da Criança e do Adolescente que define as
responsabilidades quanto a suspeita ou confirmação de maus-tratos (“Deixar o
médico, professor ou responsável por estabelecimento de atenção à saúde e de
111
ensino fundamental, pré-escola ou creche, de comunicar á autoridade competente
os casos de que tenha conhecimento, envolvendo suspeita ou confirmação de
maus-tratos contra criança ou adolescente: Pena multa de três a vinte salários de
referência, aplicando-se o dobro em caso de reincidência. ), não citar o Serviço
Social como autor da denúncia este o faz por entender que:
“Podemos perceber que o assistente social não é mencionado, mas tendo em
vista o Código de Ética Profissional, um dos princípios fundamentais dessa
profissão é seu compromisso com a consolidação e ampliação da cidadania.
Sendo assim, através do arcabouço teórico-metodológico e técnico, a
intervenção deste profissional deve ser pautada a fim de denunciar qualquer
tipo de violação contra os direitos e ir em defesa da classe ou do grupo
atingido.” (Schreider, 2007)
Não vou repetir a minha argumentação sobre o tema das Notificações
Compulsórias de Maus tratos. A condição de defensor da cidadania dos sujeitos
sociais não se resume em exclusivamente notificar.
Quando as autoras do trabalho A atenção à criança e ao adolescente em um
hospital público de emergência do município do Rio de Janeiro: um estudo sobre
notificações afirmam que quanto à violência contra crianças e adolescentes: sua
prática não se restringe a segmentos sociais isolados, ou seja, ela pode ser
executada tanto por indivíduos de camadas sociais menos favorecidas quanto o
contrário.” (Silva, Souza, Silva e Olivar, 2007), depreende-se a partir de toda a
minha altercação até aqui, onde utilizei as categorias mercadoria e trabalho, para
percorrer o caminho da reprodução das relações sociais de produção globalizadas,
na incorporação nas relações sociais do caráter místico da mercadoria expresso
através do fetiche da mercadoria (estabelecimento de relação entre coisas), do
valor de uso, do valor de troca e do lucro. As categorias intelectivas acrescidas das
mediações trabalhadas por mim (embora haja outra gama de possibilidades não
elencadas aqui em conseqüência das limitações de uma dissertação de mestrado)
irrestrita e independentemente todas as classes sociais se incluem no debate da
violência contra criaas e adolescentes como protagonistas.
112
Continuando na pesquisa empírica, considerei relevante um trabalho a
participação do assistente social na judicialização dos conflitos - cujo objeto de
argumentação era a prática profissional no judiciário a partir da “imediaticidade das
requisições sociais, políticas e ideológicas do poder judiciário” apontando demandas
junto a crianças e adolescentes (Souza, 2007):
“O assessoramento do assistente social na administração dos conflitos
judicializados apresenta-se, a priori, numa função aparentemente imediata de
subsidiar as decisões judiciais.
No entanto, o grau de abrangência deste assessoramento determina-se pela
natureza dos conflitos, pelo nível de atuação da circunscrição judiciária ao
qual o assistente social está
subordinado, às estratégias e táticas de intervenção e produção de
conhecimento profissional, à busca da construção da identidade e do
reconhecimento profissional em nível institucional,
ao projeto ético-profissional do assistente social.” (Souza, 2007):
A construção de identidade e a busca de reconhecimento profissional o
desdobramentos naturais de uma vinculação séria com o nosso projeto ético-político
do Serviço Social, posto que ele formula referências técnicas, teóricas, éticas e
políticas, que são mediações que vão qualifica e enriquecer um fazer profissional
(Netto, 1999; Guerra, 2007) que representa um contraponto às ações do judiciário
de caráter punitivo e criminalizador impreterivelmente. Nossa responsabilidade
profissional nos direciona em defesa dos direitos sociais e civis dos usuários
independentemente das requisições institucionais de maneira clara, respeitosa e
tática. Confrontos diretos desgastam as relações, emperram processos e dilaceram
conquistas profissionais anteriores. A solicitação de subsidiar as decisões judiciais”
(Souza, 2007) o significa dizer que o profissional tem que incorporar e fazer a
defesa da ação histórica da institucional expressa na função social dessa, muitas
das vezes passíveis de todas as críticas. No meu entendimento o trabalho de
fundamentar as decisões é tamm apresentar aquilo que a instituição não quer
entender e ver em nome da defesa da ideologia que a domina e que reproduz o
conservadorismo ideológico da sociedade.
113
“... o magistrado dispõe de um corpo de profissionais de diferentes áreas e
níveis (donde se inclui o assistente social), com conhecimentos técnicos
específicos para “auxiliá-lo”, „subsidiá-lo‟ e/ou „assessorá-lo‟ e, assim, garantir
o seu monopólio na resolução dos conflitos sociais e, conseqüentemente,
legitimação do papel mediador e civilizador do estado brasileiro.” (Souza,
2007)
A profissão não pode atender às solicitações que a remeteria a voltar a
defender aquilo que se encontrava presente nas protoformas do Serviço Social.
“O assistente social, ... guarda a peculiaridade de
participar diretamente da resolução do conflito, principalmente por dispor
supostamente de uma pretensa capacidade de „extrair‟ dos seus estudos
sociais uma „verdade‟ dos fatos não
apreendida (ou apreendida superficial e equivocadamente) pelo saber
técnico-jurídico dos magistrados, ou mesmo uma certa previsibilidade sobre
comportamento dos sujeitos judicializados ...” (Souza, 2007)
“Sob o prisma de auxiliar da justiça, na relação entre o poder institucional
(jurídico-legal) e o saber profissional (técnico-profissional), o trabalho do
assistente social está condicionado, em suas maioria, à determinação judicial
...” (Souza, 2007)
Impossível fazer-se revelar essa verdade preterida. Num recorte da realidade,
com a utilização da capacidade técnica-operativa, teórico-metodológica e
investigativa do Serviço Social alcança-se uma verdade que é provisória, que revela
um determinado momento da história dos sujeitos sociais a partir da particularidade
possibilitada pelas mediações elencadas no processo de análise-síntese. Aqui o que
é competência do Serviço Social é a construção a partir da singularidade da situação
social apresentada de um estudo social que revele a sua particularidade e a
universalidade e o parecer social vai apontar os elementos a serem considerados na
tomada de decisão judicial, aqui não cabe nenhuma intervenção mágica. O como
fazer ninguém deverá dizer ao profissional de Serviço Social. Parece redundante
dizer, mas o como fazer ninguém deverá exigir ao Serviço Social:
114
“Concretamente, torna-se um desafio ao assistente social na medida
em que se defronta contraditoriamente com aspectos jurídico-legais e ético-
profissionais relacionados ao que a lei limita e proíbe e o que a ética orienta e
permite em termos de projeto profissional e societário.” (Souza, 2007)
“... à esfera do direito normativo acaba despolitizando, individualizando e
particularizando as expressões da questão social que possuem sua base na
conjuntura e estrutura sócio-histórica da sociedade
brasileira.” (Souza, 2007)
Os dispositivos legais que regem a profissão e o acúmulo bibliográfico desde
a ruptura com o conservadorismo não nos permitem ceder ao caráter impositivo,
fiscalizador e policialesco inerente a formatação positivista do judiciário.
Outra contribuição Violência na família e a garantia da população infanto-
juvenil: reflexões a partir da inserção do assistente social na Vara da Infância e da
Juventude (Silva, 2007) - aponta a população infanto-juvenil e a família enquanto
vítimas de uma violência que não aquela que é objeto das denúncias: a violência
“estrutural”. E sublinha que as “medidas judiciais” são “dissociadas das
determinações sócio-históricas” e que as posposições devem partir em “defesa e
garantia de direitos de toda a família”. A análise da autora retrocede quando não faz
nenhuma contraposição à afirmativa: “Há preocupação em compreender as causas
geradoras de violência na família... E reafirma tal retrocesso quando não se detém
em aprofundar a assertiva:
“... ao abordar a violência tendem a percebê-la como um fenômeno inscrito
não somente na dinâmica familiar, mas a partir de um determinado contexto
sócio-econômico e cultural. A violência é apreendida para além dos fatores
relacionados aos eventos, buscando articular os aspectos da ordem
macroestrutural que estariam por trás da ocorrência da violência intrafamiliar.”
(Silva, 2007)
Uma das conclusões do estudo parece introdutória, portanto pouco profunda:
115
“A pesquisa evidenciou a complexidade que encerra a violência cometida
contra crianças e adolescentes e da intervenção profissional nessa área.
Assim, a violência intrafamiliar não pode ser apreendida dissociada da
inserção da família em um dado contexto sócio-econômico e cultural. Coloca-
se mais uma vez a importância de deslocar o eixo de análise da proteção à
infância restrita às competências ou fracassos individuais ou familiares.”
(Silva, 2007)
Prosseguindo no debate da intervenção do Serviço Social junto à temática da
violência contra crianças e adolescentes destaco de outra contribuição O processo
de trabalho do Serviço Social na Vara da Infância, juventude e do Idoso de São João
de Meriti: um desafio em construção - alguns aspectos relevantes.
Aqui a explicitação de que a intervenção profissional acontece inserida na
dinâmica da sociedade na medida em que os sujeitos sociais atendidos pelo Serviço
Social compõem uma sociedade e suas demandas embora restritas ao âmbito
familiar tenham relação direta com a sociabilidade definida no âmbito das relações
sociais de produção.
“... a intervenção deste profissional não se reduz aos processos, mas requer
uma leitura permanente da dinâmica societária em que tais sujeitos estão
inseridos, visto que intervimos na esfera do campo privado dos conflitos
familiares.” (Vieira e Santos, 2007)
O trabalho infantil aqui aparece a partir do processo histórico de
desenvolvimento das forças produtivas e dos desdobramentos perversos do
neoliberalismo, sem, contudo apontar talvez o houvesse essa pretensão uma
saída transformadora para um problema social que assumiu proporções
gigantescas. As políticas públicas de transferência de renda ainda não conseguiram
retirar as crianças do trabalho, nem as ações fiscalizadoras tiveram o êxito
esperado, se considerarmos as dimensões territoriais do país e as estatísticas
oficiais. Segundo o IBGE 4,9 % das crianças e adolescentes entre 10 e 15 anos
somente trabalham (Síntese dos Indicadores Sociais- Uma Análise das Condições
de Vida da População Brasileira 2009 - IBGE).
116
“Destacamos o crescente número de processos que dizem respeito a casos
relativos ao trabalho infantil de crianças que para garantirem a sobrevivência
familiar exercem atividade laborativa, muitas vezes, comercializando diversos
artigos em via pública com o intuito de ajudarem na composição do
orçamento doméstico, deixando muitas vezes de estudar, passando a integrar
as estatísticas de evasão escolar. Ao pensarmos o trabalho infantil, não
poderíamos deixar de realizar um recuo histórico e citar a Revolução
Industrial que serve como ponto de partida para refletirmos o fenômeno em
suas múltiplas determinações históricas.” (Vieira e Santos, 2007)
Muitas das minhas indagações dizem respeito a o que fazer para proteger
crianças e adolescentes no imediatismo e urgências das situações que envolvem
violência. As respostas legitimadas pelo Estado, sociedade civil e categorias
profissionais ainda são insuficientes e não conduzem à transformação.
Na minha séria preocupação de não fragmentar o meu objeto de estudo não
apresentei durante todo o trabalho as formas de violência destacadas ou agrupadas,
seriando-as, e nisso, não apresentei em qualquer momento que no contexto da ética
e moral vigentes na sociedade brasileira e segundo as normativas legais o trabalho
infantil, em sua história passada, ocupou lugar preponderante em relação à
educação, fundamentado na argumentação teórica positivista dos Códigos de
Menores de 1927 e 1979. É assim que um dos trabalhos apresenta o trabalho
infantil. Segundo o método de investigação de Karl Marx, através das categorias e
das mediações, é o mais adequado para que ao aprofundar este interstício nos
fizesse não cometer o equívoco de condenar famílias a exporem suas crianças ao
trabalho infantil, na minha concepção uma forma de violência, cujo
desencadeamento não se encontra na família.
A seguir elenco outra maneira do Serviço Social entender o trabalho infantil
a partir do trabalho intitulado Transformações na concepção de
infância/adolescência e proibição do trabalho de crianças e adolescentes:
“Por isso, afirma-se que a proibição do trabalho de crianças e adolescentes
não é natural; é socialmente, culturalmente e historicamente datada, o que
torna possível que novas transformações socioculturais e históricas venham a
117
acontecer, com significativos impactos sobre a mesma, conferindo assim
certa vulnerabilidade à proibição do trabalho de crianças e adolescentes, bem
como à percepção e concepção do trabalho precoce.” (Feital, 2007)
Para entendermos o trabalho infantil em separado faz-se necessário que a
definição das mediações que nos fariam entender como este acontecia e como
aparecia no cotidiano dos cidadãos e a sua conexão com as forças produtivas.
Talvez assim a categoria consiga, na proposição de políticas públicas, fazer recortes
da realidade que vislumbrem transformações secundárias objetivando incorporar
mais a frente toda a população infanto-juvenil. Não era meu objetivo levantar aqui
toda a produção sobre trabalho infantil ou qualquer outra forma de violência contra
crianças e adolescentes. Sendo assim é possível que haja trabalhos que
contemplem o tema nessa perspectiva.
Destaco um trecho do texto Trabalho infanto-juvenil nas atividades rurais: o
sentido do trabalho e sua persistência - que apresenta o trabalho infantil da seguinte
forma:
“O fenômeno da persistência do trabalho infanto-juvenil no âmbito da
agricultura familiar particularmente referenciada a unidades produtivas de
precárias condições materiais revela a face contraditória de uma realidade
tensionada, de um lado, por necessidades de sobrevivência do grupo familiar;
por outro, pelas normativas legais e estatutárias que coíbem o trabalho de
crianças e adolescentes. Nos limites desses antagonismos, a inserção no
trabalho permanece, ora sendo admitida explicitamente, ora sendo negada no
sentido do não comprometimento diante das ações fiscalizatórias.” (Veras,
2007)
...o enfrentamento estatal do trabalho infanto-juvenil com a aplicação de
medidas assistenciais e de transferência de renda não vem se constituindo
em respostas capazes para transpor essa realidade de inserção de crianças e
adolescentes em atividades tanto no urbano como, particularmente, no rural.”
(Veras, 2007)
118
“Na recuperação histórica, a análise dos elementos vinculados à inserção
precoce permite-nos a compreensão de que, nos diversos períodos históricos,
suas manifestações e formas de enfrentamento foram marcadas por um
discurso ideogico fundamentado na análise do trabalho para crianças
pobres como prevenção à marginalidade e à criminalidade. Ou seja, o
trabalho é visto como redentor da infância/adolescência, entendido como
mecanismo disciplinador, “a escola da vida”. Esse discurso não sofre grandes
mudanças, nos dias atuais, quando se verificam justificativas da utilização de
crianças em atividades laborais como forma de “controle” e “disciplinamento”,
como forma de o se tornarem vagabundos” ou, ainda, como
“aprendizagem” de uma ocupação.” (Veras, 2007)
“Premidos pela condição do trabalho como natural em suas vidas, essa
naturalidade é reforçada pelas expressões „o trabalho infantil não devia
acabar‟, „se acabar vai fazer o que?‟, „no trabalho se aprende a trabalhar‟, „se
não trabalhar (quando criança) como vai saber trabalhar (quando adulto)?‟.”
(Veras, 2007) (grifo meu)
Mas ainda faz-se imprescindível a partir do destaque acima dentre os
trabalhos selecionados inserir mais um possível viés para qualquer cidadão se
contrapor ao trabalho infantil apreendendo-o como uma violência contra crianças e
adolescentes. Na naturalização encontrada dentro da família que reproduz na
verdade a banalização e a naturalização perpetrada no discurso do capitalista local
que tem interesse em que as famílias concedam autorização e cedam seus filhos
para aumentar seus lucros, em se tratando de uma mão-de-obra mais barata. Ao
falar da persistência do trabalho infantil” a autora tem que considerar que a
presença do cultural e do ideológico aos quais famílias são cooptadas dentro de
uma lógica alienadora; não aqui a presença de uma história contada de forma
linear, mas uma ideologia sendo difundida, como nos apresenta Friedrich Engels,
citado no trabalho que recebe meu destaque. A violência contra crianças e
adolescentes está no desgaste da mão-de-obra e rompimento de uma cadeia de
desenvolvimento peculiar a essas faixas etárias.
Assim o Serviço Social tem condições de atingir e derrubar a “continuidade”
da utilização e do desgaste da classe trabalhadora futura, posto que crianças e
119
adolescentes não sejam nunca trabalhadores nesses momentos da vida. E
finalmente, a mobilização da população para a transformação do sentido hoje
atribuído à assistência social e a transferência de renda nos seus valores
insignificantes frente aos lucros do capital.
A seguir o trecho do trabalho Análise sobre o trabalho infantil no setor
calçadista de Franca, que na verdade se configuraria numa denúncia da
flexibilização do trabalho infantil em que a família é a única a ser objeto de
criminalização pela prática na medida em que é retirada da indústria a presença da
criança e do adolescente:
“Atualmente o trabalho infantil não é mais desenvolvido nos chãos das
fábricas como predominava nos tempos do modelo de produção Fordista, pois
vem tomando novas configurações dentro do novo padrão de acumulação
flexível. Podemos notar tal fato ao vermos crianças auxiliando os pais na
costura de calçados dentro das casas ou mesmo nas calçadas das periferias
da cidade...
A grande proporção de crianças que trabalhavam e a intensificação da
exploração desse trabalho provinha fundamentalmente da terceirização do
processo produtivo de calçados, que se tornava cada vez mais comum e
também mais precário.” (Braga e Canoas, 2007)
Incorporo um posicionamento acerca do trabalho infantil:
“Entendemos por trabalho infantil aquele realizado abaixo da idade mínima de
dezesseis anos, que conforme a Emenda Constitucional nº. 20: prejudica a
saúde da criança, interfere na freqüência escolar e não permite tempo livre
para a continuidade dos estudos em casa, rouba-lhe a infância e o lazer”.
Entendemos ainda, que a garantia da vivência da fase da infância e da
adolescência é uma questão de direitos humanos, por isso o trabalho infantil
deve ser combatido, especialmente nas suas manifestações mais intoleráveis,
de acordo com o Estatuto da Criança e do Adolescente - ECA.” (Bonifácio,
Lopes, Jório e Gonçalves, 2007)
120
A verdade é que a nossa intolerância diante de todos os dados e estudos
acumulados em tempos de democracia o tem significado nada em termos de
transformação da realidade social. As políticas públicas continuam fragmentando e
focalizando a realidade social e não assegurando a efetiva cidadania da população.
O único trabalho que relacionava esgio e violência contra crianças e
adolescentes Crianças em situação de violência intrafamiliar e o estágio em
Serviço Social - introduz uma preocupação muito interessante ao abordar o tema a
partir das contribuições de Friedrich Engels, não obstante, é interrompida a
utilização de texto original da teoria marxista. Muito embora a minha leitura aconteça
sob um resumo, pontos sobre mídia, violência medidas sócio-educativas frente às
situões de prática de delitos não considerados no desenvolvimento do texto
aparecem na conclusão. Ainda assim, que se ressaltar outros importantes
elementos que interessam a nossa discussão.
A violência é entendida enquanto pertencente a “... diferentes classes sociais
e não vinculada diretamente à situação de pobreza” (Paro e Machado, 2007):
“Entretanto, a violência é inerente à relação de poder, dominação e
hierarquização nas relações sociais, e, na sociedade capitalista essa
hierarquia é permeada pelo poder econômico, direta ou indiretamente. São
relações que se estabelecem mediante determinadas circunstâncias,
impostas por um sistema no qual o poder econômico aparece como
instrumento de dominação.” (Paro e Machado, 2007)
É sem dúvidas um trabalho tamm preocupado com o estágio e a formação
profissional que tem a intenção de apresentar uma “alternativa de combate” à
violência contra crianças e adolescentes e com as respostas dadas pelo Serviço
Social dando uma “direção política e social” (Paro e Machado, 2007).
Elenca algumas categorias importantes na sua conclusão e sugere que
aquela equipe não chegou a construções conclusivas e que o trabalho de produção
de conhecimento encontra-se em pleno andamento. A
121
“... violência intra-familiar expressão da questão social não deve ser reduzida
à culpabilidade da família, pois trata-se de uma desigualdade estrutural
complexa onde a relação de dominação perpassa a interpessoalidade
reproduzindo as contradições das relações sociais de produção.
“A alienação inerente ao processo de produção capitalista instala uma
condição em que as pessoas não se reconhecem como tal, pertencentes a
classe trabalhadora, se individualizam, se aprisionam provocando um
estranhamento entre seus pares. (Paro e Machado, 2007)
Encontrei um trabalho Capacitação em violência doméstica contra crianças
e adolescentes - que entende a violência contra crianças e adolescentes enquanto
“fenômeno multicausal”, em que o Serviço Social procurava “uma resposta mais
eficaz ampla e comprometida com esta questão”, elencando uma proposta cujo
objetivo era “... implantar e implementar estratégias concretas de Prevenção,
Cuidados e Responsabilização para o enfrentamento da Violência. (grifos das
autoras) (Simionato e Raymundo, 2007) e reforçando que “... iremos enfrentar o
fenômeno da violência doméstica, construindo ações articuladas em rede e com
conhecimento e reflexão sobre a literatura e as experiências cotidianas.” (Simionato
e Raymundo, 2007)
Partindo de toda a argumentação que construí e considerando a minha
opção teórico-metodológicos para debater o tema entendo que as autoras
consideram o componente cultural que define posturas e opções educativas” no
bojo das relações sociais domésticas. E assim, quero contribuir dizendo que o
cultural, considerando a particularidade brasileira tem seu acúmulo em paralelo a
todo o processo que deu origem à sociedade burguesa; o período que corresponde
à escravatura e às Repúblicas rege o tom da violência perpetrada contra crianças e
adolescentes, não como violência, mas, como parte do processo educativo
imprescindível e legítimo.
Ao afirmar que a violência contra crianças e adolescentes apresenta
“múltiplas causalidades” e é um problema “endêmico” poder-se-á limitar a análise a
simples respostas institucionais imediatas. Se a discussão não se iniciar numa
122
análise da lógica societária e não elencar estratégias político-educativas como nos
propõe Marina Maciel Abreu (2008) estar-se-á caminhando num vazio.
Parte da culpa pela violência na sociedade aparece direcionada aos meios
de comunicação sem que se cite que eles na verdade veiculam uma ideologia
dominante, uma forma defendida para condução das relações sociais.
“Os meios de comunicação de massa têm contribuído para a exacerbação e
naturalização da violência, através de programas que, visando apenas à
audiência e em nome da liberdade de expressão, exem em todos os
horários cenas de violência, sexo, desestruturação dos vínculos familiares,
entre outros, invadindo os lares da população.” (Teixeira, 2007)
A mídia aparece nesse trabalho Violência contra a criança e o adolescente:
a experiência do atendimento em um serviço de saúde em Recife - junto com a
defesa de uma censura específica para “... garantir a proteção dos valores éticos de
uma sociedade sem, contudo direcionar a expressão da comunicação.” (Teixeira,
2007) E mais, “todos estes fatores estão intrinsecamente relacionados com a questão
ética.” (Teixeira, 2007) Está-se falando da ética e da moral burguesa, que estão
relacionadas à defesa do modo de produção e acumulação capitalista em detrimento
da garantia de direitos humanos à população. A família ainda é considerada por
grande parte da população como um espaço mágico dentro do qual surgem os
problemas os quais devem ser superados a partir deste próprio grupo familiar.”
(Teixeira, 2007)
Essa crítica não recebeu o devido aprofundamento estabelecendo uma
conexão com as categorias e princípios da teoria marxiana e marxista.
A autora defende que: “é preciso lutar coletivamente pelas leis que garantem
a proteção destes sujeitos, pela efetivação destes direitos adquiridos, por sua
ampliação”. (Teixeira, 2007) Ela cita a contribuição dos movimentos sociais para
melhoria das condições de vida da população. E finaliza com a argumentação que a:
“... rede funciona a partir de parcerias e intercâmbio entre as várias entidades
que trabalham com crianças e adolescentes, como os conselhos de direitos,
123
conselhos tutelares, hospitais, centros de referências, creches, delegacias
especializadas, ministério público, escolas, entre outras, proporcionando cada
uma a atenção necessária no seu âmbito de intervenção, numa perspectiva
de interação. Nesta direção, esta rede deve privilegiar a integração de
políticas, projetos e programas sociais.” (Teixeira, 2007)
E mais,
“As Instituições que trabalham com a proteção das crianças e adolescentes
precisam desenvolver práticas mais articuladas, promovendo a
intersetorialidade das ações. Desta forma a luta por um sistema de proteção
integral se cada vez mais fortalecida e se ampliará as possibilidades de
garantia de direitos para estes sujeitos.” (Teixeira, 2007)
Entendo que trabalho em rede construída com base na argumentação
elencada somente atende às demandas das crianças e adolescentes na
imediaticidade das situações de violência, assim como as suas respectivas famílias,
sem em nada alterar em direção à transformação. As leis regulamentam as medidas
de proteção, mas não transformam a inserção dos sujeitos sociais que na sua
condição de alienação, estão longe de entender a lógica violenta a qual todos estão
submetidos.
Elenco outras argumentações a partir do texto O trabalho em Redes como
forma de enfrentamento à violência contra crianças e adolescentes para justificar o
trabalho em rede. Nestas argumentações são consideradas a possibilidade de
construção de um trabalho voltado à transformação da realidade social, quando são
mencionados o caráter inovador e emancipatório em direção a construção de uma
política abrangendo todo o país. O trabalho considera a possibilidade de a rede
incorporar os temas de defesa e de segurança pública.
“A rede é uma ação integradora de órgãos envolvidos no recebimento e
direcionamento de demandas e que, além de ser um catalisador dos órgãos
de defesa dos direitos da criança e do adolescente, direcionando esses casos
os órgãos responsáveis de forma ágil e, assim, a diminuir a exposição dessas
124
vítimas aos procedimentos repetitivos e, muitas vezes, tamm violentos.”
(Moreira, Braga, Sochaczewski, Duarte e Motta, 2007)
“Tais redes podem se constituir em diversas ramificações primárias,
secundárias e intermediárias. As redes sociais contribuem e possibilitam o
exercício da solidariedade nas mais diversas e complexas situações.”
(Moreira, Braga, Sochaczewski, Duarte e Motta, 2007)
... atuação coletiva com profissionais ligados a instituições que defendem
interesses em comum através de programas, projetos, seminários, cursos de
capacitação, formação de agentes, estudo de casos, banco de dados,
estudos de viabilidade de acesso aos serviços e de seu fluxo de atendimento,
democratização de informação e fortalecimento dos sistemas sociais
inerentes às suas instituições.” (Moreira, Braga, Sochaczewsk, Duarte e
Motta, 2007)
“... uma direção democrática, articuladora, pioneira e configuradora de ações
inovadoras em prol da criança e do adolescente. (Moreira, Braga,
Sochaczewski, Duarte e Motta, 2007)
Prosseguindo, a exploração sexual de crianças e adolescentes enquanto
violência sexual foi trabalhada fazendo-se uma referência a palavra “mercadoria”
para apresentar a maneira como são entendidas as vítimas nessa forma de
violência. Não houve o estabelecimento de uma conexão com a categoria marxista
mercadoria ou qualquer outra categoria. O destaque é para a proporcionalidade
territorial publicizada com os investimentos investigativos feitos com a Comissão
Parlamentar de Inquérito da Prostituição Infantil em 1993 e desde a sua entrada na
agenda das ações do Executivo, Legislativo e Judiciário, diante da prioridade
necessária, foi-lhe atribuído o status de política pública vinculada à Assistência
Social. Sinalizo que os estudos dessa forma de violência contra crianças e
adolescentes de escala globalizada vêm recebendo contribuições em relevância
quantitativa advindas da psicologia.
Ressalto o trabalho Fatores de risco e de proteção para abuso sexual. Um
estudo nos âmbitos social, familiar e institucional:
125
“A atitude tanto da vítima, como da família, frente ao abuso sexual incestuoso
e a sua revelação, dependerá da somatória dos aspectos que constituem
suas histórias de vida e da maneira como elas interpretam, enfrentam e
superam as lembranças, bem como as dificuldades que surgem em suas
vidas...
Os fatores de risco e de proteção são indicados pela literatura como
aqueles elementos capazes de potencializar o risco para a ocorrência do
abuso e a sua reincidência, como tamm aqueles capazes de potencializar
respostas positivas por parte da vítima e de sua família como um todo, a fim
de romper com o abuso, evitar a reincidência e restabelecer as relações entre
os membros partindo de uma perspectiva protetiva.(Shchmickler, Borba e
Matos, 2007)
Aqui quero suscitar uma discussão quanto ao objeto do Serviço Social: a
questão social. Entendo a violência contra crianças e adolescentes enquanto uma
expressão da questão social. A questão social é a expressão do processo de
formação, desenvolvimento e luta da classe trabalhadora no contexto da sociedade
reivindicando o seu reconhecimento enquanto classe pelo capital e pelo Estado.
Portanto, a questão social abrange os aspectos sociais, econômicos, políticos e
culturais emergentes na sociedade capitalista. A questão social é inerente ao
processo de consolidação da industrialização/urbanização. A dinâmica societária
imposta pelo capitalismo institui da diferentes e mais complexas expressões da
questão social originárias da intensificação da exploração e dentre elas a violência
contra crianças e adolescentes dentro do complexo das demais expressões de
violência.
Isto dito ouso afirmar que o Serviço Social ao recorrer a outras disciplinas
para debater o tema aqui em questão deve ter uma preocupação quanto a que
autores escolher. Ao optar por aqueles autores que representam os fundamentos
marxistas e que estão contidos no acúmulo teórico do Serviço Social, que definem a
ruptura da profissão com o conservadorismo, que somam invariavelmente às nossas
reflexões não levam a conclusões equivocadas. Temos uma acumulação
bibliográfica que nos orienta na produção de conhecimento e na intervenção. Aqui
cabe a distinção que Carlos Montaño (2007) estabelece entre ciência e profissão.
126
“...Ciência é a dominação que se dá à atividade investigativa feita sobre
objetos reais de certa realidade e que procura reproduzi-la no plano ideal;
outra coisa é o que chamamos de profissão, sendo caracterizada por um
conjunto de atividades, dentre as quais a científica, e que envolve tanto o
nível teórico-científico quanto técnico-instrumental, político-institucional e
prático-interventivo.” (Montaño, 2007:152) (grifos do autor)
Entendo que não é possível desconsiderar o tema da violência contra
crianças e adolescentes desvinculado da questão social, objeto de intervenção do
Serviço Social, com destaque à dimensão política na intervenção.
Inclusive já sinalizei anteriormente que não podemos desconsiderar a
imediaticidade e urgência das medidas protetivas a crianças e adolescentes, mas
para tanto ao Serviço Social possui um arcabouço bibliográfico que incorpora os
aspectos técnico-operativo, teórico-metodológico e ético-político aos quais podemos
recorrer.
O trabalho Exploração sexual infanto-juvenil masculina: necessidade de
política de enfrentamento - aborda com brevidade e seriedade uma “manifestação
da questão social”, a exploração sexual , conforme denomina o próprio autor (Alves,
2007). Cabe sublinhar como ele traz o debate para o Serviço Social ao fazer a
relação com a questão social e ao descrever o trabalho dentro do neoliberalismo,
sem, contudo, fazer uso do rigor do método de Karl Marx, como preconiza a
academia pensando o Serviço Social na contemporaneidade.
“As mudanças na estrutura econômica acarretaram transformações no mundo
do trabalho... geraram um empobrecimento da classe trabalhadora, ocorrendo
uma diminuição no poder aquisitivo dos trabalhadores, os quais utilizam
muitas maneiras de complementar a renda, podendo inserir crianças e
adolescentes em atividades laborativas ...
Neste aspecto, crianças e adolescentes podem sucumbir à explorão sexual,
porque percebem esse fenômeno como trabalho ou emprego, visto que
conseguem adquirir dinheiro, pois precisam trabalhar para complementar a
127
renda familiar e/ou para satisfazer suas necessidades de consumo.” (Alves,
2007)
É possível encontrarmos aquele autor que traz o tema para o debate das
forças produtivas e das transformações no mundo do trabalho, mas em algum
momentos salienta a “desestruturação familiar” e a família estruturada”.
Muito embora haja distinção em relação a minha, para a definição da questão
social que encontra-se no trabalho A violência sexual infanto-juvenil: desvendando
vozes silenciadas é uma contribuição relevante para o debate:
“... A questão social tem sido um dos determinantes fundamentais hoje para
que milhares de crianças e adolescentes se transformem em grupos
vulneráveis à exploração sexual. Mas não os problemas sociais e
econômicos, também a cultura de consumo leva crianças e adolescentes a
buscarem acesso a roupas de grife e fetiches de marca.” (Pinheiro e Oliveira,
2007)
A inserção do sexo no mercado para consumo, associado a crianças e
adolescentes nos apresenta um grande desafio dentro do qual se aprende a
distinguir o que é objeto de intervenção do Serviço Social e o que cabe ao caráter
repressor do Estado por se constituir num crime previsto em a lei a prática de
exploração sexual de crianças e adolescentes. Não cabe aos projetos e programas
que por suas naturezas têm limites operativos, exclusivamente, atuarem na
proteção de crianças e adolescentes em situação de exploração sexual. E mais,
nada se alterará se não houver uma transformação da forma globalizada como é
cultuada a erotização da imagem da mulher brasileira”. Aqui está embutida uma
defesa das atribuições e competências profissionais do Serviço Social sem a
incorporação de demandas equivocadas.
128
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A humanidade atingiu um ápice civilizatório e tecnológico no século XXI que
quem arrisque dizer que nada temos a inventar, um paradoxo diante de tanto que
existe ainda construir em termos de relações sociais humanas. O homem
considerando a lógica atual de sociabilidade e a característica que lhe é inerente de
uso da força, esta origina a sua exclusividade de ser vivo capaz à perpetração da
violência. Essa violência num contexto de luta de classes, de dominação duma
classe sob outra se intensifica para garantir uma única legalidade.
A violência nas formas diretas e indiretas perpassa as relações sociais.
Acontece a sua incorporação e reprodução de forma a consolidar uma cultura da
naturalização e banalização, mesmo com os incrementos ascendentes que tornam
graves as ações violentas mesmo quando são imprimidas contra crianças e
adolescentes. A crítica, a punição e a repressão se fazem sem uma análise que
reconheça que na dinâmica societária está a nese da violência e assim, não
acontece uma crítica que reconheça o problema na sua totalidade incorporando o
componente ontológico de que a realidade é histórica, contraditória e dialética.
Na incorporação das categorias trabalho, mercadoria e violência contra
crianças e adolescentes, recorrendo ao método de investigação de Karl Marx,
apresentei considerando algumas das mediações possíveis uma proposição teórica
para apreender a violência contra crianças e adolescentes pelo Serviço Social
contemporâneo. Quis intencionalmente descolar a profissão de interpretações de
outras disciplinas de maneira respeitosa, entendendo que existem naturezas,
competências e atribuições distintas para as profissões, assim como
desconformidades nas tradições teóricas.
A apreensão nas dimensões técnico-operativa, teórico-metodológica e política
da violência contra crianças e adolescentes não pode acontecer pelo Serviço Social
sem que haja a sua contextualização segundo o entendimento da relação capital/
trabalho, do conflito entre classes antagônicas e da exploração e expropriação da
classe trabalhadora, sempre garantindo a proteção de crianças e adolescentes e
partindo em defesa da classe trabalhadora.
129
Uma tendência hegemônica instaurada com o advento capitalismo foi a
maximização dos lucros independentemente dos meios. A multiplicação das
violações de direitos tem atingido diretamente a classe trabalhadora com toda a
violência, inclusive com a utilização da guerra e ações repressivas de monta.
Por essa verdade mesmo que proviria, estabelecida, fica fácil entender que
a catástrofe da violência planetária revela que a riqueza é superior a tudo, inclusive
ao homem que a gerou com a venda da sua força de trabalho.
Cabe ao Serviço Social a proteção de crianças e adolescentes, é
inquestionável que esta se revela na democracia, na liberdade, no respeito e
tolerância ao diferente e na justiça social. A palavra cidadania solta ao ar não tem
sentido algum como propagam alguns. Os direitos humanos, sociais acontecem
exclusivamente na redistribuição da renda produzida na coletividade.
A família enquanto unidade econômica da sociedade não pode
exclusivamente assumir a culpa e o crime inerente a uma ideologia que não é a sua.
Não é a família que é violenta, ela reproduz no seu espaço doméstico as relações
sociais de produção coletiva comandadas pela burguesia e assume praticamente
sozinha as desgraças associadas ao seu parco salário para manutenção e
sobrevivência de todos os seus membros. Isso posto, sublinho que independente da
responsabilidade exclusiva dos sujeitos sociais sob seus atos de vontade e da perda
de controle sob suas ações e resultados, muita lhe é imputada sozinha. O que cabe
aos demais sujeitos sociais, os condutores dessa civilização.
O fazer político do Serviço Social se refere a contribuir na construção de um
contingente populacional que consolide a sua emancipação humana e política. O
primeiro passo nessa direção seria agregar outros protagonistas, não como
intelectuais orgânicos, mas como aqueles que façam a diferença para formar
trabalhadores engajados politicamente.
130
ANEXOS
131
Anexo 1
TRABALHOS SELECIONADOS DENTRO DOS ANAIS DO 12º CBAS
TIPIFICAÇÃO DO TRABALHO
QUANTIDADE
TIBUNAL DE JUSTICA -EXERCÍCIO PROFISSIONAL
5
UNIVERSIDADE - PROJETO DE PESQUISA - MAPEAMENTO DE PRÁTICAS
PROFISSIONAIS NO SÓCIO-JURÍDICO
1
SAÚDE - EXERCÍCIO PROFISSIONAL NA SUA INTERSECÇÃO COM A PROTEÇÃO
5
ESTÁGIO CURRICULAR
1
MODALIDADE DE PROTEÇÃO ABRIGO - EXERCÍCIO PROFISSIONAL
1
PROJETO DE CAPACITAÇÃO DE PROFISSIONAIS SMAS/SME/SMS
1
PROJETO DE PROTEÇÃO DE DIREITOS HUMANOS - EXERCÍCIO PROFISSIONAL
1
PROJETO DE PROTEÇÃO -CAPACITAÇÃO DE ADOLECENTES E JOVENS
UNIVERSIDADE - PROJETO DE PESQUISA DE PROGRAMA DE PÓS-DOUTORADO
DISSERTAÇÃO DE MESTRADO
IMPLANTAÇÃO DO SISTEMA DE NOTIFICAÇÃO DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA
ASSISTÊNCIA SOCIAL EXERCÍCIO PROFISSIONAL
UNIVERSIDADE PROJETO DE PESQUISA DE PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO
UNIVERSIDADE - ARTIGO
UNIVERSIDADE PROJETO DE EXTENSÃO
UNIVERSIDADE E ESTADO COMPOSIÇÃO DE REDE
UNIVERDIADE E MUNICÍPIO COMPOSIÇÃO DE REDE
CONSELHO TUTELAR EXERCÍCIO PROFISSIONAL
FAMÍLIA ACOLHEDORA
UNIVERSIDADE E MUNICÍPIO - ARTIGO
TOTAL
1
1
3
1
1
1
1
1
1
1
1
1
6
35
132
Anexo2
Ministério da Saúde
Gabinete do Ministro
PORTARIA Nº 1968, DE 25 DE OUTUBRO DE 2001
Dispõe sobre a comunicação, às
autoridades competentes, de
casos de suspeita ou de
confirmação de maus-tratos
contra crianças e adolescentes
atendidos nas entidades do
Sistema Único de Saúde.
O Ministro de Estado da Saúde, com apoio Art. 87, inciso II, da Constituição Federal,
Considerando o disposto no Capítulo I do Título II da Lei n° 8.069, de 13 de julho de 1990;
Considerando os termos da Política Nacional de Redução de Morbimortalidade por Acidentes
e Violências, publicada pela Portaria GM/MS nº 737, de 16 de maio de 2001, no Diário
Oficial da União de 18 de maio de 2001, resolve:
Art. 1º Estabelecer que os responsáveis técnicos de todas as entidades de saúde integrantes ou
participantes, a qualquer título, do Sistema Único de Saúde ? SUS deverão comunicar, aos
Conselhos Tutelares ou Juizado de Menores da localidade, todo caso de suspeita ou
confirmação de maus-tratos contra crianças e adolescentes, por elas atendidos.
Art. 2° Definir que a comunicação de que trata o Artigo deverá ser feita mediante a
utilização de formulário próprio, constante do Anexo desta Portaria, observadas as instruções
e cautelas nele indicadas para seu preenchimento.
Parágrafo único. O formulário objeto deste Artigo deverá ser preenchido em 02 (duas) vias,
sendo a primeira encaminhada ao Conselho Tutelar ou Juizado de Menores e a segunda
anexada à Ficha de Atendimento ou Prontuário do paciente atendido, para os
encaminhamentos necessários ao serviço.
Art. 3º Esta Portaria entra em vigor na data de sua publicação.
JOSÉ SERRA
133
Anexo 3
Presidência da República
Casa Civil
Subchefia para Assuntos Jurídicos
LEI Nº 11.829, DE 25 DE NOVEMBRO DE 2008.
Altera a Lei n
o
8.069, de 13 de julho de
1990 - Estatuto da Criança e do Adolescente, para
aprimorar o combate à produção, venda e
distribuição de pornografia infantil, bem como
criminalizar a aquisição e a posse de tal material e
outras condutas relacionadas à pedofilia na
internet.
O PRESIDENTE DA REPÚBLICA Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu
sanciono a seguinte Lei:
Art. 1
o
Os arts. 240 e 241 da Lei n
o
8.069, de 13 de julho de 1990, passam a vigorar com
a seguinte redação:
Art. 240. Produzir, reproduzir, dirigir, fotografar, filmar ou registrar, por qualquer meio,
cena de sexo explícito ou pornográfica, envolvendo criança ou adolescente:
Pena reclusão, de 4 (quatro) a 8 (oito) anos, e multa.
§ 1
o
Incorre nas mesmas penas quem agencia, facilita, recruta, coage, ou de qualquer
modo intermedeia a participação de criança ou adolescente nas cenas referidas no caput deste
artigo, ou ainda quem com esses contracena.
§ 2
o
Aumenta-se a pena de 1/3 (um terço) se o agente comete o crime:
I no exercício de cargo ou função pública ou a pretexto de exercê-la;
II prevalecendo-se de relações domésticas, de coabitação ou de hospitalidade; ou
134
III prevalecendo-se de relações de parentesco consangüíneo ou afim até o terceiro grau,
ou por adoção, de tutor, curador, preceptor, empregador da vítima ou de quem, a qualquer outro
título, tenha autoridade sobre ela, ou com seu consentimento.” (NR)
Art. 241. Vender ou expor à venda fotografia, vídeo ou outro registro que contenha cena
de sexo explícito ou pornográfica envolvendo criança ou adolescente:
Pena reclusão, de 4 (quatro) a 8 (oito) anos, e multa.” (NR)
Art. 2
o
A Lei n
o
8.069, de 13 de julho de 1990, passa a vigorar acrescida dos
seguintes arts. 241-A, 241-B, 241-C, 241-D e 241-E:
Art. 241-A. Oferecer, trocar, disponibilizar, transmitir, distribuir, publicar ou divulgar por
qualquer meio, inclusive por meio de sistema de informática ou telemático, fotografia, vídeo ou
outro registro que contenha cena de sexo explícito ou pornográfica envolvendo criança ou
adolescente:
Pena reclusão, de 3 (três) a 6 (seis) anos, e multa.
§ 1
o
Nas mesmas penas incorre quem:
I assegura os meios ou serviços para o armazenamento das fotografias, cenas ou
imagens de que trata o caput deste artigo;
II assegura, por qualquer meio, o acesso por rede de computadores às fotografias,
cenas ou imagens de que trata o caput deste artigo.
§ 2
o
As condutas tipificadas nos incisos I e II do § 1
o
deste artigo são puníveis quando o
responsável legal pela prestação do serviço, oficialmente notificado, deixa de desabilitar o acesso
ao conteúdo ilícito de que trata o caput deste artigo.
Art. 241-B. Adquirir, possuir ou armazenar, por qualquer meio, fotografia, vídeo ou outra
forma de registro que contenha cena de sexo explícito ou pornográfica envolvendo criança ou
adolescente:
Pena reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa.
§ 1
o
A pena é diminuída de 1 (um) a 2/3 (dois terços) se de pequena quantidade o
material a que se refere o caput deste artigo.
§ 2
o
Não crime se a posse ou o armazenamento tem a finalidade de comunicar às
autoridades competentes a ocorrência das condutas descritas nos arts. 240, 241, 241-A e 241-C
desta Lei, quando a comunicação for feita por:
135
I agente público no exercício de suas funções;
II membro de entidade, legalmente constituída, que inclua, entre suas finalidades
institucionais, o recebimento, o processamento e o encaminhamento de notícia dos crimes
referidos neste parágrafo;
III representante legal e funcionários responsáveis de provedor de acesso ou serviço
prestado por meio de rede de computadores, até o recebimento do material relativo à notícia feita
à autoridade policial, ao Ministério Público ou ao Poder Judiciário.
§ 3
o
As pessoas referidas no § 2
o
deste artigo deverão manter sob sigilo o material ilícito
referido.
Art. 241-C. Simular a participação de criança ou adolescente em cena de sexo explícito
ou pornográfica por meio de adulteração, montagem ou modificação de fotografia, vídeo ou
qualquer outra forma de representação visual:
Pena reclusão, de 1 (um) a 3 (três) anos, e multa.
Parágrafo único. Incorre nas mesmas penas quem vende, exe à venda, disponibiliza,
distribui, publica ou divulga por qualquer meio, adquire, possui ou armazena o material produzido
na forma do caput deste artigo.
Art. 241-D. Aliciar, assediar, instigar ou constranger, por qualquer meio de comunicação,
criança, com o fim de com ela praticar ato libidinoso:
Pena reclusão, de 1 (um) a 3 (três) anos, e multa.
Parágrafo único. Nas mesmas penas incorre quem:
I facilita ou induz o acesso à criança de material contendo cena de sexo explícito ou
pornográfica com o fim de com ela praticar ato libidinoso;
II pratica as condutas descritas no caput deste artigo com o fim de induzir criança a se
exibir de forma pornográfica ou sexualmente expcita.
Art. 241-E. Para efeito dos crimes previstos nesta Lei, a expressão “cena de sexo
explícito ou pornográfica” compreende qualquer situação que envolva criança ou adolescente em
atividades sexuais explícitas, reais ou simuladas, ou exibição dos órgãos genitais de uma criança
ou adolescente para fins primordialmente sexuais.”
Art. 3
o
Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.
136
Brasília, 25 de novembro de 2008; 187
o
da Independência e 120
o
da República.
LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA
Tarso Genro
Dilma Rousseff
Este texto não substitui o publicado no DOU de 26.11.2008
137
Anexo 4
Presidência da República
Casa Civil
Subchefia para Assuntos Jurídicos
LEI Nº 12.015, DE 7 DE AGOSTO DE 2009.
Mensagem de veto
Altera o Título VI da Parte Especial do
Decreto-Lei n
o
2.848, de 7 de dezembro de 1940 -
Código Penal, e o art. 1
o
da Lei n
o
8.072, de 25 de
julho de 1990, que dispõe sobre os crimes hediondos,
nos termos do inciso XLIII do art. 5
o
da Constituição
Federal e revoga a Lei n
o
2.252, de 1
o
de julho de
1954, que trata de corrupção de menores.
O PRESIDENTE DA REPÚBLICA Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a
seguinte Lei:
Art. 1
o
Esta Lei altera o Título VI da Parte Especial do Decreto-Lei n
o
2.848, de 7 de
dezembro de 1940 - Código Penal, e o art. 1
o
da Lei n
o
8.072, de 25 de julho de 1990, que dispõe
sobre os crimes hediondos, nos termos do inciso XLIII do art. 5
o
da Constituição Federal.
Art. 2
o
O Título VI da Parte Especial do Decreto-Lei n
o
2.848, de 7 de dezembro de 1940 - Código
Penal, passa a vigorar com as seguintes alterações:
TÍTULO VI
DOS CRIMES CONTRA A DIGNIDADE SEXUAL
CAPÍTULO I
DOS CRIMES CONTRA A LIBERDADE SEXUAL
Estupro
Art. 213. Constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, a ter conjunção carnal ou
a praticar ou permitir que com ele se pratique outro ato libidinoso:
138
Pena - reclusão, de 6 (seis) a 10 (dez) anos.
§ 1
o
Se da conduta resulta lesão corporal de natureza grave ou se a vítima é menor de 18
(dezoito) ou maior de 14 (catorze) anos:
Pena - reclusão, de 8 (oito) a 12 (doze) anos.
§ 2
o
Se da conduta resulta morte:
Pena - reclusão, de 12 (doze) a 30 (trinta) anos.” (NR)
Violação sexual mediante fraude
Art. 215. Ter conjunção carnal ou praticar outro ato libidinoso com alguém, mediante fraude
ou outro meio que impeça ou dificulte a livre manifestação de vontade da vítima:
Pena - reclusão, de 2 (dois) a 6 (seis) anos.
Parágrafo único. Se o crime é cometido com o fim de obter vantagem econômica, aplica-se
tamm multa.” (NR)
Assédio sexual
Art. 216-A. ....................................................................
..............................................................................................
§ 2
o
A pena é aumentada em até um terço se a vítima é menor de 18 (dezoito) anos.” (NR)
CAPÍTULO II
DOS CRIMES SEXUAIS CONTRA VULNERÁVEL
Art. 218. Induzir alguém menor de 14 (catorze) anos a satisfazer a lascívia de outrem:
Pena - reclusão, de 2 (dois) a 5 (cinco) anos.
Parágrafo único. (VETADO).” (NR)
Ação penal
Art. 225. Nos crimes definidos nos Capítulos I e II deste Título, procede-se mediante ação
penal pública condicionada à representação.
139
Parágrafo único. Procede-se, entretanto, mediante ação penal pública incondicionada se a
vítima é menor de 18 (dezoito) anos ou pessoa vulnerável.” (NR)
CAPÍTULO V
DO LENOCÍNIO E DO TRÁFICO DE PESSOA PARA FIM DE
PROSTITUIÇÃO OU OUTRA FORMA DE
EXPLORAÇÃO SEXUAL
.............................................................................................
Favorecimento da prostituição ou outra forma de exploração sexual
Art. 228. Induzir ou atrair alguém à prostituição ou outra forma de exploração sexual, facilitá-
la, impedir ou dificultar que alguém a abandone:
Pena - reclusão, de 2 (dois) a 5 (cinco) anos, e multa.
§ 1
o
Se o agente é ascendente, padrasto, madrasta, irmão, enteado, cônjuge, companheiro,
tutor ou curador, preceptor ou empregador da vítima, ou se assumiu, por lei ou outra forma, obrigação
de cuidado, proteção ou vigilância:
Pena - reclusão, de 3 (três) a 8 (oito) anos.
...................................................................................” (NR)
Art. 229. Manter, por conta própria ou de terceiro, estabelecimento em que ocorra exploração
sexual, haja, ou não, intuito de lucro ou mediação direta do proprietário ou gerente:
...................................................................................” (NR)
Rufianismo
Art. 230. ......................................................................
.............................................................................................
§ 1
o
Se a vítima é menor de 18 (dezoito) e maior de 14 (catorze) anos ou se o crime é
cometido por ascendente, padrasto, madrasta, irmão, enteado, cônjuge, companheiro, tutor ou
curador, preceptor ou empregador da vítima, ou por quem assumiu, por lei ou outra forma, obrigação
de cuidado, proteção ou vigilância:
Pena - reclusão, de 3 (três) a 6 (seis) anos, e multa.
140
§ 2
o
Se o crime é cometido mediante violência, grave ameaça, fraude ou outro meio que
impeça ou dificulte a livre manifestação da vontade da vítima:
Pena - reclusão, de 2 (dois) a 8 (oito) anos, sem prejuízo da pena correspondente à
violência.” (NR)
Tráfico internacional de pessoa para fim de exploração sexual
Art. 231. Promover ou facilitar a entrada, no território nacional, de alguém que nele venha a
exercer a prostituição ou outra forma de exploração sexual, ou a saída de alguém que exercê-la no
estrangeiro.
Pena - reclusão, de 3 (três) a 8 (oito) anos.
§ 1
o
Incorre na mesma pena aquele que agenciar, aliciar ou comprar a pessoa traficada,
assim como, tendo conhecimento dessa condição, transportá-la, transferi-la ou alojá-la.
§ 2
o
A pena é aumentada da metade se:
I - a vítima é menor de 18 (dezoito) anos;
II - a vítima, por enfermidade ou deficiência mental, o tem o necessário discernimento para
a prática do ato;
III - se o agente é ascendente, padrasto, madrasta, irmão, enteado, cônjuge, companheiro,
tutor ou curador, preceptor ou empregador da vítima, ou se assumiu, por lei ou outra forma, obrigação
de cuidado, proteção ou vigilância; ou
IV - há emprego de violência, grave ameaça ou fraude.
§ 3
o
Se o crime é cometido com o fim de obter vantagem econômica, aplica-se tamm
multa.” (NR)
Tráfico interno de pessoa para fim de exploração sexual
Art. 231-A. Promover ou facilitar o deslocamento de alguém dentro do território nacional para
o exercício da prostituição ou outra forma de exploração sexual:
Pena - reclusão, de 2 (dois) a 6 (seis) anos.
§ 1
o
Incorre na mesma pena aquele que agenciar, aliciar, vender ou comprar a pessoa
traficada, assim como, tendo conhecimento dessa condição, transportá-la, transferi-la ou alojá-la.
141
§ 2
o
A pena é aumentada da metade se:
I - a vítima é menor de 18 (dezoito) anos;
II - a vítima, por enfermidade ou deficiência mental, não tem o necessário discernimento para
a prática do ato;
III - se o agente é ascendente, padrasto, madrasta, irmão, enteado, cônjuge, companheiro,
tutor ou curador, preceptor ou empregador da vítima, ou se assumiu, por lei ou outra forma, obrigação
de cuidado, proteção ou vigilância; ou
IV - há emprego de violência, grave ameaça ou fraude.
§ 3
o
Se o crime é cometido com o fim de obter vantagem econômica, aplica-se tamm
multa.” (NR)
Art. 3
o
O Decreto-Lei n
o
2.848, de 1940, Código Penal, passa a vigorar acrescido dos
seguintes arts. 217-A, 218-A, 218-B, 234-A, 234-B e 234-C:
Estupro de vulnerável
Art. 217-A. Ter conjunção carnal ou praticar outro ato libidinoso com menor de 14 (catorze)
anos:
Pena - reclusão, de 8 (oito) a 15 (quinze) anos.
§ 1
o
Incorre na mesma pena quem pratica as ações descritas no caput com alguém que, por
enfermidade ou deficiência mental, não tem o necessário discernimento para a prática do ato, ou que,
por qualquer outra causa, não pode oferecer resistência.
§ 2
o
(VETADO)
§ 3
o
Se da conduta resulta lesão corporal de natureza grave:
Pena - reclusão, de 10 (dez) a 20 (vinte) anos.
§ 4
o
Se da conduta resulta morte:
Pena - reclusão, de 12 (doze) a 30 (trinta) anos.”
Satisfação de lascívia mediante presença de criança ou adolescente
142
Art. 218-A. Praticar, na presença de alguém menor de 14 (catorze) anos, ou induzi-lo a
presenciar, conjunção carnal ou outro ato libidinoso, a fim de satisfazer lascívia própria ou de outrem:
Pena - reclusão, de 2 (dois) a 4 (quatro) anos.
Favorecimento da prostituição ou outra forma de exploração sexual de vulnerável
Art. 218-B. Submeter, induzir ou atrair à prostituição ou outra forma de exploração sexual
alguém menor de 18 (dezoito) anos ou que, por enfermidade ou deficiência mental, o tem o
necessário discernimento para a prática do ato, facilitá-la, impedir ou dificultar que a abandone:
Pena - reclusão, de 4 (quatro) a 10 (dez) anos.
§ 1
o
Se o crime é praticado com o fim de obter vantagem econômica, aplica-se tamm
multa.
§ 2
o
Incorre nas mesmas penas:
I - quem pratica conjunção carnal ou outro ato libidinoso com alguém menor de 18 (dezoito) e
maior de 14 (catorze) anos na situação descrita no caput deste artigo;
II - o proprietário, o gerente ou o responsável pelo local em que se verifiquem as práticas
referidas no caput deste artigo.
§ 3
o
Na hipótese do inciso II do § 2
o
, constitui efeito obrigatório da condenação a cassação
da licença de localização e de funcionamento do estabelecimento.”
CAPÍTULO VII
DISPOSIÇÕES GERAIS
Aumento de pena
Art. 234-A. Nos crimes previstos neste Título a pena é aumentada:
I (VETADO);
II (VETADO);
III - de metade, se do crime resultar gravidez; e
IV - de um sexto até a metade, se o agente transmite à vitima doença sexualmente
transmissível de que sabe ou deveria saber ser portador.”
143
Art. 234-B. Os processos em que se apuram crimes definidos neste Título correrão em
segredo de justiça.”
Art. 234-C. (VETADO).”
Art. 4
o
O art. 1
o
da Lei n
o
8.072, de 25 de julho de 1990, Lei de Crimes Hediondos, passa
a vigorar com a seguinte redação:
“Art. 1
o
............................................................................
..............................................................................................
V - estupro (art. 213, caput e §§ 1
o
e 2
o
);
VI - estupro de vulnerável (art. 217-A, caput e §§ 1
o
, 2
o
, 3
o
e 4
o
);
...................................................................................................
...................................................................................” (NR)
Art. 5
o
A Lei n
o
8.069, de 13 de julho de 1990, passa a vigorar acrescida do seguinte
artigo:
Art. 244-B. Corromper ou facilitar a corrupção de menor de 18 (dezoito) anos, com ele
praticando infração penal ou induzindo-o a praticá-la:
Pena - reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos.
§ 1
o
Incorre nas penas previstas no caput deste artigo quem pratica as condutas ali
tipificadas utilizando-se de quaisquer meios eletrônicos, inclusive salas de bate-papo da internet.
§ 2
o
As penas previstas no caput deste artigo são aumentadas de um terço no caso de a
infração cometida ou induzida estar incluída no rol do art. 1
o
da Lei n
o
8.072, de 25 de julho de 1990.”
Art. 6
o
Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.
Art. 7
o
Revogam-se os arts. 214, 216, 223, 224 e 232 do Decreto-Lei n
o
2.848, de 7 de dezembro de 1940 -
Código Penal, e a Lei n
o
2.252, de 1
o
de julho de 1954.
Brasília, 7 de agosto de 2009; 188
o
da Independência e 121
o
da República.
144
LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA
Tarso Genro
Este texto não substitui o publicado no DOU de 10.8.2009
145
Anexo 5
146
Anexo 6
147
BIBLIOGRAFIA
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pedagógicos da prática profissional. 2ª Ed. São Paulo. Cortez Editora, 2008, 240p.
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graduação: noções práticas. 6ª ed. São Paulo. Editora Atlas, 2004, 165 p.
BEHRING, Eliane Rossetti. Brasil em contra-reforma; desestruturação do Estado e
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BEHRING, Eliane Rossetti. Trabalho e Seguridade Social: o neoconservadorismo
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Cortez Editora/UERJ, 2008. p.152-174.
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CARVALHO, Maria do Carmo B. de (org.). A família contemporânea em debate. 5.
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148
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