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UNIVERSIDADE
FEDERAL DE SANTA MARIA
CENTRO
DE CIÊNCIAS SOCIAIS E HUMANAS
PROGRAMA
DE PÓS-GRADUAÇÃO STRICTU SENSO EM CIÊNCIAS
SOCIAIS
REPRESENTAÇÕES DO MUNDO DO TRABALHO: O
LUGAR DO SINE NO IMAGINÁRIO DOS
DESEMPREGADOS DE SANTA MARIA-RS
DISSERTAÇÃO
DE MESTRADO
Ana Paula de Lima Rodrigues
Santa Maria, RS, Brasil
2010
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11
REPRESENTAÇÕES DO MUNDO DO TRABALHO: O
LUGAR DO SINE NO IMAGINÁRIO DOS DESEMPREGADOS
DE SANTA MARIA-RS
por
Ana Paula de Lima Rodrigues
Dissertação apresentada ao Curso de Pós-graduação em Ciências
Sociais, Área de Concentração em Ciências Sociais, da Universidade
Federal de Santa Maria (UFSM, RS), como requisito parcial para
obtenção do grau de
mestre em Ciências Sociais.
Orientador: Prof. João Vicente R. B. da Costa Lima
Santa Maria, RS, Brasil
2010
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12
Universidade Federal de Santa Maria
Centro de Ciências Sociais e Humanas
Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais
A Comissão Examinadora, abaixo assinada,
aprova a Dissertação
REPRESENTAÇÕES DO MUNDO DO TRABALHO: O LUGAR
DO SINE NO IMAGINÁRIO DOS DESEMPREGADOS DE
SANTA MARIA-RS
elaborada por
Ana Paula de Lima Rodrigues
como requisito parcial para obtenção do grau de
Mestre em Ciências Sociais
COMISSÃO EXAMINADORA:
João Vicente R. B. da Costa Lima, Dr.
(Presidente/Orientador)
Francis Moraes de Almeida, Dr.
(Examinador)
Holgonsi Soares Gonçalves Siqueira, Dr.
(Examinador)
Santa Maria, 09 de julho de 2010.
13
PASSA UMA BORBOLETA
Àqueles que torceram. Àqueles que desejaram sorte e
que pediram paciência & tenacidade. À todos dedico
este trabalho e agradeço pela confiança.
14
AGRADECIMENTOS
Agradeço à minha família (Iglae, Renan e Márcio) pela confiança depositada,
pelo carinho e zelo sem os quais, seguramente, não conquistaria esta etapa que,
muitas vezes, pareceu tão longa e difícil.
Um agradecimento especial à amiga, Eliziane Silva, presente em todas as
horas, nos momentos bons e ruins, pela ajuda, pela paciência e pela amizade
verdadeira. Às amigas, Dalcimara Martins e Isabel Padoin, que em razão da
distância ou excesso de compromissos estiveram mais afastadas, mas, certamente,
também torceram pela efetivação deste trabalho.
Ao professor Clóvis Schmitt por estar sempre disposto a ajudar, dar opiniões,
emprestar livros e à professora Mari Cleise Sandalowski, sempre solícita,
empenhada, dedicada.
À Nilson Amaury Siqueira, diretor do núcleo de informática do CCSH, do qual
fui bolsista durante oito meses e pelo qual tenho grande estima e respeito.
À professora Drª. Selva López Chirico, primeira orientadora do trabalho, pelo
auxílio intelectual e pela amizade, que mesmo longe, seguramente, torceu pelo êxito
deste trabalho que, afinal, começamos e imaginamos juntas.
Ao presente orientador, professor Dr. João Vicente, por assumir uma
dissertação em andamento, apesar do excesso de compromissos. Acredite, essa
atitude é de poucos e demonstra não somente qualidades intelectuais,
reconhecidas, mas, sobretudo, pessoais.
À profª.dr.ª Cinara Rosenfield, professora da UFRGS, e Prof. Dr. Holgonsi
Soares, da UFSM, pelos profícuos comentários e questionamentos na qualificação
de minha dissertação.
À secretaria Jane, pela paciência e eficiência em dirimir todas as dúvidas.
Ao delegado regional da Secretaria da Justiça e Desenvolvimento Social,
Leandro Carvalho Sanson, ao coordenador da Agência Sine de Santa Maria, Carlos
Dal Moro, pela cordialidade e, sobremaneira, aos entrevistados que dedicaram
momentos de seu tempo tão valioso para participar e contribuir para a minha
pesquisa.
15
Aos colegas da graduação, Vinícius Bevilaqua, Valesca Ames e Tássia Walau
que ajudaram na coleta dos dados.
Aos colegas do mestrado.
Ao Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais da UFSM.
16
RESUMO
Dissertação de mestrado
Programa de Pós-graduação em Ciências Sociais
Universidade Federal de Santa Maria
REPRESENTAÇÕES DO MUNDO DO TRABALHO: O LUGAR DO
SINE NO IMAGINÁRIO DOS DESEMPREGADOS DE SANTA MARIA-
RS
AUTOR: ANA PAULA DE LIMA RODRIGUES
ORIENTADOR: JOÃO VICENTE RIBEIRO BARROSO DA COSTA LIMA
Data e local da defesa: Santa Maria, 09 de Julho de 2010.
A presente dissertação de mestrado tem como finalidade identificar as
representações sociais construídas acerca da instituição SINE em Santa Maria
utilizando como principal fonte interpretativa os relatos dos atores sociais que
circulam neste local à procura de trabalho. Aspira-se, fundamentalmente, entender
como o imaginário social apropria-se desta instituição enquanto um dos principais
interlocutores com o mundo do trabalho em Santa Maria e enquanto agência que
administra e executa ações de inserção no mercado. Com isso, o estudo procura
aprender a forma como os atores vivem essa relação e o sentido que atribuem as
suas ações tendo como referência as políticas e práticas institucionais espelhadas
pelo SINE. Pretende-se recuperar os universos de significados dos indivíduos
excluídos do mercado de trabalho formal sobre o mundo do trabalho e da relação
que se verifica com suas biografias e suas inserções mais diversas nos contextos
sociais em que estão inseridos. Deste universo de significados capturado
depreende-se que os indivíduos estabelecem planos de ação no cotidiano
relativamente ao mundo do trabalho e de suas inserções nele. Enfatiza-se que esta
primeira leitura dos indivíduos sobre o mundo do trabalho e do lugar e função do
SINE nessa conjuntura é importante porque se trata de um diagnóstico não somente
do mundo estrito do trabalho, como do mundo da política e da estrutura de status e
de classes em que estão inseridos. Os conteúdos interligam-se: motivos básicos,
como os da sobrevivência econômica, com visões sobre o funcionamento do mundo
político. A própria instituição SINE constitui-se em uma entidade que conserva na
sua natureza e rotinas estas duas dimensões, a de ser um organismo de gestão de
mão de obra (econômico), ao tempo em que mantém profunda conexão com o
mundo da política. As conclusões do estudo emanam da análise qualitativa das
entrevistas semi-estruturadas aplicadas no mês de novembro de 2009.
Palavras-chave: Trabalho; representações sociais; SINE; práticas institucionais
17
RESUMO
Dissertação de mestrado
Programa de Pós-graduação em Ciências Sociais
Universidade Federal de Santa Maria
TYPES OF WORK OF THE WORLD: THE PLACE OF THE SINE OF
THE UNEMPLOYED IN IMAGINARY OF SANTA MARIA, RS
AUTHOR: ANA PAULA DE LIMA RODRIGUES
ADVISOR: JOÃO VICENTE RIBEIRO BARROSO DA COSTA LIMA
Date and place of the defense: Santa Maria, July 09th, 2010.
The aim of this master’s dissertation is to identify the social representations
constructed around the institution SINE in Santa Maria, having as the main source
reports from social actors who frequent this place in search for jobs. It basically
intends to understand how the social imaginary takes this institution as one of the
main interlocutors with labor world in Santa Maria and as an agency that manages
and performs actions of market insertion. Then, this study aims to learn how actors
experience this relationship and the meaning they attribute to their actions, having as
reference political and institutional practices mirrored by SINE. It intends to rescue
the several meanings that people excluded from formal market place have about
labor world and the relation with their biographies and their different insertions in the
social contexts they are. From this universe of meanings it infers that people
establish action plans in their daily routine in relation to labor world and their
insertions in it. It highlights that this first view of people about labor world and the
place and role of SINE in this context is important because it is a diagnosis not only
of the restrict labor world but also of the political world as well as of the status and
classes structures in which they are inserted. The contents are linked: basic reasons,
such as economic survival with visions about the functioning of the political world.
SINE itself constitutes an entity which conserves in its nature and routine these two
dimensions to be an organism of (economical) labor managing while it maintains
deep connections to the world of politics. The conclusions of the study come from
qualitative analysis of semi-structured interviews applied in November, 2009.
Keywords: work; social representations; SINE; institutional practices
18
LISTA DE QUADROS
Quadro 1. Comparativo 1991-2000, nível de escolaridade em Santa Maria e
Rio Grande do Sul (Fonte: IBGE, 2000) .................................................................49
Quadro 2. Diferenças de remuneração entre homens e mulheres e vel de
instrução, Santa Maria, 2000 (IBGE, 2000).............................................................51
19
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO...........................................................................................................11
1. TRABALHO E SOCIEDADE: construção do problema de pesquisa................20
2. AS AÇÕES E POLÍTICAS DE ASSISTÊNCIA AO TRABALHADOR
DESEMPREGADO NO BRASIL: O LUGAR DA INTERMEDIAÇÃO DE MÃO-DE-
OBRA ........................................................................................................................33
3. TRAJETÓRIAS DE (RE) INSERÇÃO NO MUNDO DO TRABALHO EM SANTA
MARIA........................................................................................................................45
3.1. A escolha pela abordagem qualitativa ...........................................................45
3.2. Narrativas sobre o trabalho: contradições, tensões e conflitos na produção
de significados.........................................................................................................48
3.3. Que mudanças objetivas podem ser atribuídas ao SINE nas trajetórias dos
desempregados?......................................................................................................69
3.4. Representações sobre o SINE: a instituição sob o “olhar” do trabalhador
desempregado..........................................................................................................74
4. CONSIDERAÇÕES FINAIS...................................................................................80
5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS......................................................................83
6.ANEXOS.................................................................................................................88
6.1 Anexo A. Termo de consentimento informado (SINE) ...................................89
6.2 Anexo B. Roteiro de entrevista.........................................................................90
6.3 Anexo C. Descrição dos entrevistados ...........................................................92
6.4 Anexo D. quadro 3. Sinopse: características sócio-ocupacionais dos
entrevistados e ocupações adquiridas via SINE...................................................94
6.5 Anexo E. Termo de Consentimento Informado (Desempregados) ...............95
6.6 Anexo F. Decreto-lei nº. 76.403 de 08/10/1975 de criação do SINE Sistema
Nacional de Emprego ..............................................................................................96
6.7Anexo G. DECRETO . 34.322, DE 12 DE MAIO DE 1992. Estatuto da
Fundação Gaúcha de Trabalho e Ação Social. Disponível no endereço
eletrônico:http://www.fgtas.rs.gov.br/portal/index.php?menu=biblioteca_viz&c
od_biblioteca=15......................................................................................................98
20
INTRODUÇÃO
A presente dissertação tem como objetivo a realização de um estudo
sociológico sobre o SINE (Sistema nacional de emprego) de Santa Maria-RS,
entendido como uma “agência gestora de ações de inserção no mundo do trabalho”,
tendo por base os relatos dos usuários desse sistema de alocação de mão-de-obra.
Dessa maneira, o estudo versa sobre um duplo aspecto: entender se houveram
mudanças nas trajetórias ocupacionais dos sujeitos em razão da sua passagem pelo
SINE e de que forma os próprios sujeitos constroem, a partir de seus relatos, a
significação dessa instituição.
Com isso, busca-se compreender se esses sujeitos definem ou atribuem sua
inserção no mundo do trabalho à relação estabelecida com o SINE e às ações
promovidas por essa instituição. Para dar conta desses objetivos, optou-se pela
realização de um levantamento qualitativo com os trabalhadores desempregados
(em desemprego aberto ou oculto, segundo classificação da Fundação Seade e
DIEESE Departamento Intersindical de Estatística e Estudos socioeconômicos), o
qual se realizou durante o mês de novembro de 2009.
A pesquisa foi realizada no SINE-FGTAS de Santa Maria-RS. Nesse local,
concentra-se um conjunto de serviços como a intermediação de mão-de-obra, a
concessão do seguro-desemprego, a confecção da carteira de trabalho e a oferta de
cursos de qualificação profissional. É um local bastante procurado pelos
trabalhadores do município e região, salientando que o serviço de intermediação de
mão-de-obra é o que mais se destaca.
Conforme Cacciamali et alli (1998), o SINE faz parte de um programa criado
pelo Ministério do Trabalho e Emprego, na década de 1970, o qual se utiliza de
recursos provenientes do Fundo de Amparo ao Trabalhador - FAT
1
. Disponibiliza
variados serviços de assistência ao trabalhador desempregado ou no subemprego.
1
O Fundo de amparo trabalhador é o fundo que se destina ao custeio do programa do seguro-
desemprego, do abono salarial e ao financiamento de programas de desenvolvimento econômico. Ele
foi instituído pela lei nº. 7.998, de 11 de janeiro de 1990, juntamente, com a criação de um conselho
tripartite, responsável, entre outras coisas, pela administração desse fundo e pela avaliação do
impacto social dos programas financiados por ele. Vale salientar que as ações do programa do
21
É importante destacar que, na visão da autora, esse programa surgiu em um
momento em que o objetivo do governo federal consistia em mobilizar mão-de-obra
a fim de dar continuidade ao processo de industrialização. Diferente do que ocorre,
hoje, quando o desemprego atinge também o setor industrial.
No passado recente, a execução dos serviços de intermediação de mão-de-
obra sofreu um processo de descentralização conferindo aos Estados e municípios
autonomia para administrar os postos de atendimento dos SINE’s. Para Cardoso et
alli (2006), esse processo de descentralização e focalização das políticas sociais no
campo do trabalho representa, por um lado, uma retração do papel do Estado e da
sua responsabilidade pelo enfrentamento dos problemas sociais e, por outro, uma
necessidade devido à natureza do desemprego que, no decurso da década de 1980,
atingia grupos específicos da força de trabalho, como as mulheres, os negros e os
jovens sem experiência profissional.
A maioria das análises sobre as políticas de emprego dirige-se a
compreensão dos objetivos que fundamentam a sua atuação, assim como sobre os
impactos que causam no público-alvo para qual se destinam. O SINE, por exemplo,
é tratado em grande parte da literatura como peça integrante da política de emprego
que incide sobre a oferta e a demanda de mão-de-obra.
Em virtude dos problemas com o financiamento de novas ações ou políticas
voltadas a reincorporação do trabalhador desempregado, a atuação do sistema de
intermediação de mão-de-obra custeado por recursos públicos teve limitado seu
escopo a intermediação passiva
2
.
Além disso, as muitas definições, inclusive, a do próprio Ministério do
Trabalho, salientam a relevância de ações voltadas ao trabalhador e aumento da
sua capacidade para ocupar posições favoráveis no mercado de trabalho, seja
seguro-desemprego são executadas de forma descentralizada através do Sistema Nacional de
Emprego, entidades que são contratadas pelos estados, municípios e consórcios de municípios, além
de outras entidades que são conveniadas diretamente com o Ministério do Trabalho e que contam,
ainda, com a participação das Comissões de Emprego locais. A proposta desse arranjo institucional
criado em torno do Fundo de Amparo ao Trabalhador consiste, segundo o Ministério do Trabalho e
Emprego, em garantir a formulação e execução de políticas de emprego e renda de forma
descentralizada e participativa. De acordo com tal premissa, é possível aproximar o executor das
ações e o cidadão que delas se beneficia. Informações disponibilizadas no endereço eletrônico:
http://www.mte.gov.br/fat/historico.asp
2
O termo “passivo” não está ligado a nenhum juízo de valor acerca das ações do SINE, somente,
procura classificar um tipo de intermediação no qual as empresas demandantes da força de trabalho
contatam o sistema quando necessitam contratar funcionários, e não o contrário, ou seja, o SINE,
raramente, faz esse primeiro contato. Pochmann (2002) propõe essa expressão para qualificar os
sistemas de intermediação que atuam dessa forma.
22
através do aumento do salário ou melhoria das condições laborais. Esse tem sido o
discurso hegemônico que perpassa a formulação e planejamento das políticas no
campo do trabalho, incentivando a busca periódica por qualificação.
Todavia, a presença de trabalhadores com perfil de baixa qualificação – como
a falta de escolaridade, o histórico percorrido na informalidade, a ocupação de
postos de trabalho desqualificados – acaba contribuindo para a “estigmatização” dos
postos de atendimento do SINE e a captação de vagas também desqualificadas.
O estudo dos mecanismos de intermediação de mão-de-obra parte de uma
discussão prévia concernente ao movimento de saída do desemprego
3
. Portanto,
desejo apontar que este tema traz uma série de pesquisas que remontam à
realidade de grandes metrópoles como São Paulo, onde a preocupação colocava-se
em elucidar a estrutura dessa densa rede de atores envolvidos no mercado de
intermediação.
Dessa forma, tomo como base teórica os vários estudos desenvolvidos por
Nadya Araújo Guimarães (2007), em São Paulo, para definir e construir a
especificidade do meu objeto de pesquisa, sedimentado em uma outra realidade
histórico-espacial, Santa Maria-RS, procurando avançar na análise uma vez que
estende a investigação para além da situação estrita da procura por trabalho para
incorporar outras dimensões do fenômeno tais como: o êxito do trabalhador na
inserção ou (re) inserção em atividades produtivas, a importância atribuída a esses
empregos na narrativa dos entrevistados e a relação do trabalhador com as práticas
desencadeadas no/ou pelo SINE.
Em decorrência, procura-se investigar as significações que surgem sobre a
referida instituição, bem como as experiências concretas de trabalho relacionadas
direta ou indiretamente à procura de emprego por meio dessa via. O SINE constitui
uma entidade primordial de acesso ao emprego para a maioria da mão-de-obra do
município e região, gerindo o processo de intermediação e/ou disponibilizando o
espaço físico ou divulgando outras ações de assistência ao trabalhador
desempregado.
A fim de sustentar teoricamente a importância da temática valho-me da
discussão levantada por Offe (1989), que estabelece uma crítica a respeito da
3
Tal movimento é caracterizado pela presença de mecanismos que podem ser classificados como
públicos ou privados. Porém, existem também outros mecanismos que atuam fora do mercado,
menos formais, que têm sua substância contida nas redes sociais (Nadya Araújo Guimarães, 2007).
23
sociedade do trabalho, entendida como uma associação humana que vive do e para
o trabalho, onde vê essa moralidade desvanecer paulatinamente.
De acordo com o autor, o trabalho deixou de assumir a posição de
centralidade que ora ocupava na vida das pessoas e, por esta razão, não pode ser
considerado como referência para essas na organização de suas biografias. Nessa
perspectiva, o trabalho que serviu como um referencial em suas vidas, organizando
seu tempo, sua visão de mundo, sua sociabilidade perde todo seu significado social;
não as aproxima e nem as afasta, tornando-se, simplesmente, uma forma de
subsistência.
Pretende-se, assim, recuperar os universos de significados dos indivíduos
excluídos do mercado de trabalho formal sobre o mundo do trabalho e da relação
que se verifica com suas biografias e suas inserções mais diversas nos contextos
sociais em que estão inseridos. Desse universo de significados capturado
depreende-se que os indivíduos estabelecem planos de ação no cotidiano
relativamente ao mundo do trabalho e de suas inserções nele. Enfatiza-se que essa
primeira leitura dos indivíduos sobre o mundo do trabalho e do lugar e função do
SINE nessa conjuntura é importante porque se trata de uma visão não somente do
mundo estrito do trabalho, como do mundo da política e da estrutura de status e de
classes em que estão inseridos. Os conteúdos interligam-se: motivos básicos, como
os da sobrevivência econômica, com visões sobre o funcionamento do mundo
político. A própria instituição SINE constitui-se em uma entidade que conserva na
sua natureza e rotinas essas duas dimensões, a de ser um organismo de gestão de
mão-de-obra (econômico), ao tempo em que mantém profunda conexão com o
mundo da política.
Assim, tomando como base as discussões precedentes, a presente
dissertação objetiva realizar uma análise das trajetórias dos desempregados visando
entender a diversidade de suas experiências de trabalho e sua relação com o SINE.
Com isso, o estudo procura aprender a forma como os atores vivem essa relação e
o sentido que atribuem as suas ações tendo por base as políticas e práticas
institucionais espelhadas pelo SINE.
Quando falo em trajetória, procuro tratar de um percurso que o grupo constrói
e reconstrói resgatando fatos e experiências que ele considera importante para
identificar-se e pensar a si próprio. Essa noção de trajetória subjetiva permite, do
ponto de vista do agente ou do grupo social, identificar como esses se inserem no
24
espaço social, que recursos utilizam e as expectativas daí decorrentes e, importante,
como interpretam sua inserção e práticas no mundo do trabalho. É por meio dessa
narrativa que se faz possível encontrar as singularidades que caracterizam as
experiências dos sujeitos, mas, ao mesmo tempo, elementos relativos ao meio em
que estão inseridos.
De acordo com Bourdieu (2007), os sujeitos estão a todo o momento sofrendo
as pressões exercidas pela estrutura social, que acabam os sujeitando as mesmas
condições objetivas. Tal discussão envolvendo a relação entre indivíduo e sociedade
persiste nas teorias sociológicas, embora, novos dados tenham surgido
demonstrando que os indivíduos criam no seu cotidiano novas estratégias nas
interações com o contexto em que vivem.
De sorte que a discussão estabelecida ajudou a compor as questões de
pesquisa, bem como as hipóteses basilares do estudo, que procura entender a
diversidade dos discursos e apropriações sobre o SINE. Supunha-se que tal como
nas interações cotidianas as experiências com o trabalho e, conjuntamente, as
significações sobre todas as relações correlatas estabelecidas nesse universo
social, político e econômico encontrar-se-iam assentadas sobre falas e práticas
diversas, contraditórias e conflituosas.
Igualmente, ao questionar-se sobre a efetividade e natureza da relação entre
os trabalhadores e o SINE acreditou-se tratar de uma instituição desgastada
“simbolicamente” que fora perdendo, paulatinamente, seu apelo junto à população
para tornar-se exclusividade daquele desempregado que não possui alternativa.
Atrelado ao objetivo central, o estudo, ainda, procura descrever quem são os
trabalhadores de que fala a pesquisa, que tipo de passagem tiveram pelo mercado
de trabalho, de que forma descrevem essa passagem. Apesar de na grande maioria
das cidades brasileiras o setor informal manter sua relevância como um dos
principais criadores de postos de trabalho, partiu-se da hipótese de que o grupo
apresentaria diferenciações quanto ao tipo de desemprego e sua duração, quanto à
trajetória sócio-ocupacional e às percepções.
Vale ponderar que o conceito de informalidade passou por uma revisão
devido aos resultados de estudos sociológicos e econômicos. O conceito de
informalidade ora associado ao empobrecimento e marginalidade dos trabalhadores
pode constituir uma opção de vida e ocupar o ápice no conjunto de alternativas do
indivíduo.
25
Portanto, ao partir para a análise da realidade social é mister desprender-se
de pressupostos como esses, de que a informalidade pode ser vista apenas sob o
prisma da exclusão social. A esse respeito, o estudo de Rivero (2000) demonstra
que o perfil ocupacional desse setor tem mudado tanto em relação à renda quanto
às condições de trabalho. As vertentes que analisam o fenômeno da informalidade
utilizam-se de duas perspectivas: uma de base econômica que entende a
informalidade apenas do ponto de vista da sobrevivência dos mais pobres e outra
que compreende a procura pelo setor informal como uma alternativa consciente dos
atores, como uma opção decorrente de vantagens, como uma renda maior, como a
possibilidade de gerenciar seu próprio tempo, de se dedicar também a outras
atividades e projetos de vida, pode-se dizer um “desprendimento” da racionalidade
do trabalho.
Nessa perspectiva, uma das preocupações que perpassou a dissertação foi
perceber a diversidade de percepções associadas à informalidade sem categorizar,
previamente, os informantes como “excluídos” ou “marginalizados” procurando
compreender como os pesquisados construíam tal racionalidade.
Para atender tais objetivos, optou-se por um levantamento qualitativo,
baseado em entrevistas semi-estruturadas com os desempregados que procuram o
SINE. As entrevistas foram gravadas e no trabalho foram usados nomes fictícios
para manter em sigilo a identidade dos entrevistados.
A fundamentação teórica do trabalho parte das contribuições dos estudos
realizados sobre os mecanismos de intermediação de mão-de-obra e uma discussão
mais ampla a respeito da centralidade do trabalho, tendo como referência os
estudos de Offe (1989), Sennett (2006) e Castel (2004).
Ao imergir na literatura sobre o tema do desemprego e do mercado de
trabalho percebeu-se que os espaços destinados à assistência ao trabalhador
desempregado são extremamente ricos, tanto do ponto de vista estrutural quanto
simbólico.
Todavia, são poucos os trabalhos acadêmicos que procuraram analisar esses
espaços bem como o público que participa, interage e se beneficia das ações
desencadeadas por eles. Os trabalhos encontrados datam dos anos de 1970 e
1980, auge dos mecanismos de intermediação custeados por recursos públicos. Na
década atual, ocorre uma sistematização dos estudos sobre os intermediadores
privados, os quais possuem uma estrutura distinta e um público com demandas e
26
perfis também diversos. Esses trabalhos foram muito importantes na medida em que
problematizaram não somente a estrutura organizacional dos espaços de
intermediação de mão-de-obra, mas, sobretudo os atores e as relações sociais aí
construídas.
Entretanto, constatou-se uma ausência de trabalhos que tratassem da
realidade das pessoas após a passagem por essas instituições de intermediação de
mão-de-obra. Por conta disso, a dissertação privilegia o universo representacional
dos atores imersos na procura por emprego antes e após o acionamento da
instituição do SINE Sistema Nacional de Emprego de Santa Maria, Rio Grande do
Sul.
Para tanto, utilizo o conceito de representação social na tentativa em
entender como se posicionam os trabalhadores em relação ao tipo de inserção no
mercado de trabalho e como se insere o SINE nessa procura.
Entende-se por representações sociais o conjunto de significados, motivos,
aspirações, atitudes, crenças e valores que se manifestam nas relações cotidianas
(MOSCOVICI, 2003). Essas significações presentes no imaginário social são de
extrema relevância para orientar a ação dos sujeitos na sociedade, pois através
delas o sujeito interpreta e explica o que acontece no meio social no qual está
inserido.
Como instrumento de coleta de dados, o estudo utiliza a entrevista semi-
estruturada, composta por um roteiro de perguntas pré-estabelecidas, mas que no
transcorrer da situação de entrevista sofreram adaptações. Segundo Goldenberg
(2007), essa técnica possibilita o enriquecimento do trabalho científico, haja vista
que amplia a descrição, a explicação e a compreensão do objeto problematizado.
Na presente dissertação, as entrevistas foram realizadas com pessoas
desempregadas, de diferentes idades, entre 16 e 65 anos, 13 homens e 12
mulheres. Foram realizadas 25 entrevistas obedecendo ao critério de saturação
4
.
Optou-se por dividir o roteiro em blocos distintos abarcando questões relacionadas
às características sociais da população estudada, questionamentos sobre o grupo
familiar, essenciais porque essa instituição constitui um espaço fundamental de
constituição social do indivíduo e de apoio material.
4
A saturação consiste em um critério para a finalização da pesquisa qualitativa. Nesse sentido, diz-se
que um “corpus” de informações encontra-se saturado quando o acréscimo de mais estratos não traz
novas informações ou dados (POUPART et alli, 2008).
27
Além disso, foram propostas questões sobre as condições de trabalho dos
atores, buscando identificar sinais de precariedade, exclusão e fragmentação dos
vínculos sociais com o trabalho e a importância do trabalho assalariado na vida
desses sujeitos. O quarto bloco, por sua vez, procurou investigar a relação dos
desempregados com o SINE procurando responder a pergunta central do estudo.
Na abordagem explicaram-se os objetivos da pesquisa e perguntou-se sobre
o interesse em contribuir para o estudo. Na maioria dos casos, as pessoas
mostraram-se solícitas, demonstrando interesse ou, ao menos, curiosidade pela
pesquisa, aderindo voluntariamente, a partir da assinatura de um termo de
consentimento informado (Ver em anexo).
Para Brandão (1984), o primeiro contato com o entrevistado constitui um
momento delicado, pois depende da criação de uma situação de “empatia” favorável
ao diálogo entre investigador e investigado. Por se tratar de um espaço que envolve
um constante fluxo de pessoas, a negociação entre investigador e investigado
tornou-se, ainda mais, delicada, apesar de não prejudicar a obtenção dos dados,
exceto em alguns casos em que a impaciência dos entrevistados gerou relatos muito
breves, não dando espaço para maiores questionamentos.
Além disso, é necessário comentar sobre a importância de selecionar os
dados de forma objetiva e precisa. A esse respeito, Fernandes (1980) assinala que:
Quando o sociólogo observa uma situação social dada, ou quando a
interpreta: ele pratica uma seleção inapelável nos dados de fato, que
chegam a sua consciência pela percepção sensorial. Ele não se interessa
por tudo que se desenrola diante de si, pela simples razão de que não é
sua missão gravar todos os fatos brutos que se passam em derredor. Na
verdade, alcança uma performance notável quando consegue registrar
todos os fatos que o essenciais na descrição sociológica dos fenômenos
que observa (FERNANDES, 1980, p.49).
Nessa perspectiva, a abordagem sociológica depende de um método que
possa situar os fatos, os quais variam em importância, significado e pertinência em
razão do recorte adotado na pesquisa. Assim, Weber (1992) elucida que a sociologia
deve estar preocupada com a compreensão de fatos que são construídos, dado que
partem de certa visão da realidade apreendida pelo cientista interessado em
encontrar respostas para problemas sociais, através da “invenção” de um objeto
sociológico analisado por meio de conceitos, categorias e uma teoria social base.
28
Logo, a pesquisa caracteriza-se como um estudo de caso, o qual consiste no
tipo de abordagem metodológica onde se procura coletar e examinar o máximo de
dados possíveis sobre o tema, buscando estabelecer relações entre as experiências
individuais e o contexto mais amplo, com o objetivo de descrever e explicar uma
determinada situação social (BABBIE, 2005).
Para tanto, a estrutura da dissertação é formada por três capítulos. O primeiro
deles trata da construção do problema de pesquisa acionando autores tomados
como referência tanto na discussão teórico-metodológica quanto na fase de
interpretação dos dados e definindo o que constitui o objeto central da dissertação,
qual seja o estudo das representações sociais que justificam certas formas de
conduta e de comportamento entre os desempregados que utilizam o serviço de
intermediação de mão-de-obra prestado pelo SINE. O segundo capítulo estabelece
uma discussão sobre as ações e políticas de assistência ao trabalhador
desempregado e o lugar do SINE e sua política de intermediação de mão-de-obra,
no Brasil – a partir da literatura existente sobre o tema O último capítulo destina-se a
apresentação dos dados oriundos da análise das entrevistas, buscando, quando
possível e pertinente, retomar hipóteses, objetivos e propor conclusões.
29
CAPÍTULO 1
TRABALHO E SOCIEDADE: CONSTRUÇÃO DO PROBLEMA DE
PESQUISA
Os estudos sociológicos valendo-se da contribuição de áreas como a
antropologia e a economia procuram, hoje, apreender a diversidade de experiências
concretas com o trabalho, entendido enquanto atividade social e econômica,
principalmente, a partir do momento em que se passou a questionar a importância
do trabalho nas esferas moral, social, econômica e política de reprodução societária.
De acordo com Nadya Araújo Guimarães (2007), o desenvolvimento desses
estudos, no Brasil, remonta a década de 1970 e 1980, onde, em um primeiro
momento, a preocupação central se dirigia ao movimento de saída do emprego e,
posteriormente, a experiência com o desemprego.
Nesse contexto, os teóricos interessaram-se em identificar quais grupos da
força de trabalho foram mais atingidos pela perda da ocupação formal, destacando-
se, fundamentalmente, os estudos sobre desigualdade e análises referentes à
trajetória dos desempregados e suas representações a respeito da experiência
social causada pelo desemprego.
Para a autora supracitada, foram os processos de reestruturação econômica
os responsáveis por gerar importantes mudanças no mercado de trabalho, como o
aumento do volume e da duração do desemprego, das modalidades de ocupação e
do tipo de relação de trabalho.
Após os estudos sobre o desemprego, seguiram-se outros sobre os
mecanismos de intermediação de empregos. A construção teórica desse objeto de
pesquisa, segundo a autora, originou-se da tentativa em compreender as formas e
experiências associadas ao desemprego.
Ao contrário dos estudos anteriores, interessados em entender esse
movimento que vai do trabalho ao desemprego, os estudos sobre os
30
intermediadores de empregos visam compreender de que forma os sujeitos saem do
desemprego, como eles fazem para conseguir uma ocupação.
Portanto, na sua visão, o que caracteriza o mercado de trabalho
contemporâneo é a existência da figura do “intermediador”, de origem pública ou
privada, que estabelece essa troca entre trabalho e capital. Considerar a sua
presença e também a de mecanismos que operam fora do mercado é condição
fundamental para entender o funcionamento dos mercados de trabalho.
A pesquisa da autora baseou-se na análise dos intermediadores privados,
onde procurou apreender a complexidade dos agentes e das condutas que
envolvem a situação de procura avaliando, principalmente, como se deu a
construção social e simbólica do demandante de emprego e as novas ocupações e
relações de trabalho que surgiram em um contexto de precariedade.
Nadya Araújo Guimarães (2007) trouxe uma importante contribuição, tanto
teórica quanto metodológica, de abordagem desse fenômeno tão caro em épocas
atuais. Ela compreende que o fenômeno da procura de trabalho apresenta um
complemento ao tema do desemprego, pois estar desempregado implica o
reconhecimento de um determinado estatuto social de demandante de trabalho, isto
é, de um indivíduo ou grupo que estabelece relações para sair dessa condição.
Conseqüentemente, o estudo dos espaços de intermediação, privados e
públicos, procuraram caracterizar esse demandante visto não apenas como um
desempregado, mas também como um ator social envolvido em um ambiente
dinâmico de negociações.
Ao realizar o survey “Mobilidade Ocupacional”
5
, em São Paulo, Guimarães
(2003) evidenciou que dois mecanismos de procura por ocupação se destacaram,
por um lado, as redes de contatos pessoais e, por outro, a procura direta junto às
empresas. Dessa maneira, constatou que as redes sociais vêm ocupando um papel
cada vez maior no mercado de trabalho, seja provendo a assistência ao trabalhador
desempregado, seja facilitando seu acesso a uma ocupação.
As agências de intermediação privadas também se destacaram como um
mecanismo relevante entre as escolhas dos indivíduos. A particularidade do
contexto histórico da década de 1970 e 1980, onde o governo esforçava-se em criar
e organizar um sistema público de intermediação de empregos, chamou a atenção
5
Realizado em 2001, na região metropolitana de São Paulo, na forma de um questionário
suplementar a PED – Pesquisa de Emprego e Desemprego (GUIMARÃES, 2003).
31
de Guimarães (2003) em compreender as motivações de quem recorria ao sistema
privado de intermediação, bem como as características deste demandante.
De acordo com a autora, havia nesse período uma literatura internacional
preocupada em entender o papel dos intermediários na (re) inserção ocupacional,
seja nos Estados Unidos, na Europa e na América Latina. Neste conjunto de países,
os intermediadores surgiram em um momento de importantes mudanças no mercado
de trabalho, relacionadas à necessidade de se eliminar postos de trabalho e também
a busca pelos trabalhadores de novas ocupações diante da ausência de vagas.
No Brasil, os mecanismos de intermediação tiveram bom desempenho, na
década de 1970, porque contavam com um contexto favorável a criação de
empregos. Porém, logo o sistema precisou adaptar-se a nova realidade adversa à
expansão de postos de trabalho.
Durante as décadas de 1980 e 1990, com a criação do seguro-desemprego e
a instituição do Fundo de Amparo ao Trabalhador mudaram as formas de
financiamento e também as atividades de planejamento, de decisão e de execução
das políticas de emprego. A ação do governo, a partir daí, concentrou-se em reduzir
o desemprego de curta duração (CARDOSO et alli, 2006).
Outro estudo realizado por Guimarães (2007), também em São Paulo,
auxiliou na compreensão das características dos mercados de intermediação de
mão-de-obra e de seus usuários. Por meio de um estudo quantitativo, comprovou
que o mecanismo de intermediação financiado por recursos públicos não foi
apontado como a principal alternativa do demandante de emprego, naquela cidade.
Segundo o survey “À procura de trabalho”, realizado em 2005, a grande maioria dos
desempregados recorreu aos intermediadores privados.
As características desses demandantes apresentaram-se também
diferenciadas daquelas dos desempregados cadastrados em agências financiadas
por recursos públicos. Nas agências privadas, destacou-se a presença de um
público mais jovem e mais escolarizado, que devido à transição tardia para a vida
adulta viam-se assistidos pela família durante o tempo de desemprego. A partir
deste levantamento, percebeu-se, igualmente, que, ao contrário dos pais, os
desempregados apresentavam uma maior qualificação, investindo também em
cursos profissionalizantes.
32
Em contrapartida, nos locais destinados a intermediação custeada por
recursos públicos a família não tinha condições de auxiliar o desempregado, uma
vez que se encontrara ela própria em situação de desemprego ou subemprego.
Na presente dissertação, o problema de pesquisa posto é identificar até que
ponto o SINE cria e contribui para a construção de sentidos de identidade entre os
desempregados. Procura-se, então, interrogar se existem uma identidade e
experiências de mundo partilhadas entre os atores sociais submetidos às relações
que aí se estabelecem.
Para tanto, o estudo apropria-se do conceito de representação social de
Moscovici (2003). Nas ciências sociais, a utilização desse conceito tem como
objetivo estabelecer uma relação entre idéia e realidade, partindo do pressuposto de
que, ao mesmo tempo em que os grupos pensam a si mesmos e aos outros, eles
também orientam o seu agir social.
As representações sociais constituem uma forma de produção de
conhecimento que é partilhado pelos indivíduos nas suas interações cotidianas e
são expressas por meio de condutas e formas de comportamento. Essas formas de
pensar e interpretar a realidade são difíceis de compreender devido sua natureza
subjetiva.
Em vista disso, Bourdieu (2007) assinala que é preciso compreender que as
práticas e as representações sociais se dão em um contexto cio-histórico
determinado, mas nem sempre possuem uma explícita correspondência com a
realidade objetiva desse contexto. O fato é que por meio das representações, que
podem traduzir ou não a realidade, os indivíduos e coletividades se movem pelo
tecido social.
A estrutura social do mercado de trabalho, por exemplo, é caracterizada pela
complexidade de agentes e de condutas sociais. É constituída por relações de troca
entre trabalho e desempenho, que colocam em contato ofertantes e demandantes
de trabalho (OFFE, 1989).
Para Offe & Hinrich (1989), a característica predominante desse mercado é a
desigualdade de poder existente entre a oferta e a demanda. Essa desigualdade
manifesta-se devido à urgência dos indivíduos em conseguir um trabalho e é
acentuada no próprio grupo de trabalhadores visto que o capital econômico, social e
cultural que carregam e herdam constitui um fator importante que pode viabilizar ou
não sua entrada no mercado de trabalho.
33
Nesse sentido, as intervenções provenientes da esfera política são adotadas
para equilibrar essa contenda. O caso dos mecanismos de intermediação de mão-
de-obra como parte constituinte de um sistema público de emprego, trabalho e renda
é oportuno para demonstrar que existe não somente um objetivo econômico por trás
do serviço de intermediação de mão-de-obra, mas um objetivo político que é diminuir
os níveis de desemprego e impedir a proliferação de outros problemas sociais.
Deve-se destacar que as políticas de geração de emprego e renda, bem
como as políticas de intermediação e capacitação da mão-de-obra refletem as
opções governamentais frente ao problema social gerado pelo desemprego e,
sobretudo, a importância simbólica que a questão ganha em meio ao coletivo.
A discussão sobre a eficácia desses mecanismos de intermediação de mão-
de-obra somente ganharam importância entre as esferas do governo e da
sociedade, a partir dos anos de 1990, em função do aumento da dificuldade de
acesso ao emprego assalariado para vários grupos da sociedade. Antes, o mercado
de trabalho apresentava mudanças quanto ao nível e à estrutura do emprego,
mas o modo como o governo encarava a questão não a colocava como um
problema.
Somente quando se passou a dar crédito à natureza estrutural do
desemprego é que se voltou os olhos para a necessidade de encontrar meios para
criar mais postos de trabalho e facilitar o acesso ao emprego.
Por isso, é importante ressaltar que, a partir da década de 1970, os processos
econômicos, políticos e tecnológicos que tiveram lugar nas economias avançadas e
que assumiram características e conseqüências diversas nas economias do terceiro
mundo motivaram o surgimento de fenômenos macro e microssociais de extrema
relevância. Primeiramente, a reestruturação econômica, que buscou responder as
limitações do modelo fordista, causou o enxugamento dos postos de trabalho, a
externalização das atividades de serviços como forma de reduzir os custos de
produção e provocou o aparecimento de desigualdades regionais devido à forma
como eram distribuídas a oferta de trabalho, os recursos e os investimentos entre os
países em virtude da Nova Divisão Internacional do Trabalho (CASTELLS, 1999).
As políticas econômicas neoliberais levaram a uma redefinição do papel
interventor do Estado na área econômica e social, o que teve influência direta sobre
o formato das políticas sociais no campo do trabalho. Dos anos 80 em diante, as
políticas sociais no campo do trabalho passaram por um movimento de
34
descentralização, terceirização e focalização de suas ações, resultando, por
exemplo, na delegação de responsabilidades para os estados, municípios e outras
entidades da sociedade civil (CARDOSO et alli, 2006). O SINE também sofreu
mudanças, como a grande maioria das políticas sociais nas diferentes áreas.
A justificativa para essa transformação baseou-se, principalmente, nas
dificuldades financeiras e na necessidade em se fazer escolhas, adaptações. O
mercado de trabalho, nesse período, também explicava a natureza dessas escolhas,
haja vista que o desemprego atingia não diferentes grupos, mas apresentava
desigualdades entre as regiões.
Ressalta-se que a década de 1980, no Brasil, foi denominada de “década
perdida” em razão da crise e da estagnação econômicas. As políticas públicas, em
geral, e aquelas referentes ao mercado de trabalho, em particular, tinham um caráter
minimalista, isto é, com o Estado falido, as ações ora denotavam fazer mais com o
pouco, ora, definitivamente, transformaram a variável trabalho em um veículo de
negociação política, diluída nos três níveis de representação nacional, estadual e
municipal.
No interior do processo produtivo; e em outros setores como os serviços, o
processo em curso caracterizado pelo avanço tecnológico além de gerar uma maior
independência em relação ao fator trabalho passou a exigir maior qualificação da
força de trabalho, autonomia e interatividade, transformando-se em um elemento de
distinção, segmentação e seleção de trabalhadores (CASTELLS, 1999).
Paralelamente, no Brasil, apenas um pequeno círculo de grupos profissionais, de
trabalhadores e de empresas estava organizado nos termos sofistificados
demandados pela revolução tecnológica vivenciada nos último trinta anos. A grande
maioria excluída, em razão das deficiências de um sistema educacional e de
políticas públicas, em geral, excludentes, porque ineficientes, não podia e nem sabia
sobre o novo mundo do trabalho em estruturação. Quanto ao mercado de trabalho
real que lhe restava, a estagnação econômica criou a oportunidade de uma eficiente
barganha conduzida pelo mercado (empresas) sobre uma multidão de
desempregados sem maiores oportunidades e escolhas.
Em conseqüência desses processos, a experiência com o trabalho aparece,
hoje, revestida de outras características. Para Sennett (2006), a precariedade das
relações de trabalho é responsável pela crise identitária dos sujeitos, isto é, a
mudança constante de emprego, os longos períodos de desemprego levaram a falta
35
de identificação com o trabalho, prejudicando também as relações de sociabilidade
nesses espaços e fora deles.
Dessa maneira, tanto do ponto de vista objetivo quanto simbólico,
reproduziram-se, para o autor, as trajetórias despadronizadas e precárias. O
paralelo brasileiro é ambíguo porque, de um lado, aprofundou-se o pior do trabalho
precário e do trabalhador vulnerável apostando um jogo no mundo do trabalho em
que tinha poucas margens de manobra. De outra forma, o mundo do trabalho
informal, no Brasil, apresentou e, ainda, apresenta situações ricas de criatividade e
recuperação de identidades. Muitas vezes, o trabalho informal é sinônimo de renda
maior que a do trabalho formal, a despeito da perda de status e reconhecimento. A
vida prosseguiu e os indivíduos foram fazendo o melhor por si próprios, sustentados
por redes de solidariedade que se pode incluir desde a família, passando pela
comunidade e outras entidades associativas que cimentaram bases de cooperação
significativas.
É importante salientar que a experiência social dos indivíduos com o trabalho,
ou seja, a importância que esta atividade ocupa nas suas vidas tem sido interpretada
de diferentes formas pela sociologia. Existe entre os autores posições antagônicas
no que diz respeito à centralidade do trabalho na sociedade.
Para elucidar como o trabalho se tornou uma dimensão explicativa
privilegiada para pensar a sociabilidade e as relações sociais, os teóricos ou
aproximam-se das análises clássicas da sociologia que colocam o trabalho como
fato principal da experiência social ou de abordagens mais contemporâneas que,
simplesmente, não vêem o trabalho como uma dimensão importante para os sujeitos
pensarem a si próprios e o mundo que os cerca. Conforme elucida Offe (1989), a
sociologia preocupou-se, ao longo do seu desenvolvimento teórico-metodológico,
com a inter-relação entre as dimensões política, social, cultural e econômica
atribuindo ao trabalho o ponto-chave de ligação entre tais dimensões.
Entretanto, a heterogeneidade das vivências e das experiências dos sujeitos
inseridos nas relações de trabalho encontrava-se encoberta pelas lutas entre
trabalho e capital. Neste período, digam-se séculos XIX e XX, a sociologia procurou
compreender os mecanismos de estratificação e dominação social intrínsecos às
relações entre os dois atores históricos.
Conseqüentemente, como ponto chave de entendimento da vida social, o
trabalho, a meados do século XX, aparece ora como mecanismo de integração
36
social, ora como mecanismo de dominação e exploração social, justificando as
condutas e modos de vida dos povos e estruturando a sociedade (CASTEL, 2004).
Durkheim (1987) teoriza sobre os “elementos não contratuais do contrato” ou
do “econômico como socialmente constituído”, contraponto ao materialismo que
subordinava os fenômenos diversos da vida social e cultural às determinações
econômicas de natureza conflituosa uma teoria que concebia o consenso porque
predominariam, eficientemente, os mecanismos de solidariedade. O mundo do
trabalho é, portanto, para Durkheim, não parte estrita do mundo econômico, senão
que parte constitutiva do social, considerando-se uma base moral subjacente. O
trabalho aparece como mecanismo rico de construção da identidade, conferindo aos
indivíduos um sentimento de pertencimento. Nessa medida, a partir das experiências
do trabalho os sujeitos construíam representações sobre si mesmos e sobre os
outros tecendo suas relações de sociabilidade.
Offe (1989), por outro lado, defende um enfoque centrado no mundo vivido
postulando que o trabalho tornou-se menos importante tanto para os indivíduos
quanto para a coletividade. Nessa medida, segundo o autor, esta atividade perdeu
sua capacidade de determinar a estrutura e o desenvolvimento da sociedade mais
ampla, levando a busca por novas identidades sociais e pessoais.
De acordo com Sennett (2006), os trabalhadores inseridos em relações
informais pertencem a um segmento onde as conseqüências sociais geradas pela
falta de emprego regular são mais danosas. O novo capitalismo, na sua ótica,
continua sendo um sistema de poder, apesar de ilegível, difícil de entender e de
reagir contra suas regras. A flexibilidade ao invés de permitir maior liberdade à ação
dos indivíduos impõe novos controles, exige mais daqueles que querem manter as
mesmas formas de vida, os mesmos compromissos.
Por isso, o autor enfatiza, principalmente, as influências das novas relações
de trabalho sobre a experiência emocional das pessoas. A lealdade, o compromisso
mútuo, a possibilidade de planejar, de criar expectativas “alcançáveis” a longo prazo
é uma característica do capitalismo da segunda metade do século XX.
Distintamente, o capitalismo pós-1970 tem outras características, exige mais
dos indivíduos para manter o que resta dos seus caracteres, isto é, traços pessoais
que valorizam em si mesmos e buscam que as outras pessoas também os
valorizem. A maior dificuldade consiste em acumular conquistas, perseguir ganhos
ao longo do tempo, de natureza material ou de outra natureza.
37
Atualmente, essa experiência é difícil de concretizar, pois são muitos os
retrocessos, as perdas pela via do trabalho, principalmente, de natureza econômica.
Com isso, a possibilidade de integração por meio do trabalho se torna mais fugidia
porque exige tempo; os laços sociais levam tempo para surgir.
No seu ponto de vista, entre os trabalhadores formais também se instaura
uma lógica da insegurança que afeta duramente as bases emocionais em razão da
desregulamentação das atividades do trabalho. O mercado formal é instável e
instável se torna a condição emocional do trabalhador formal. A desregulamentação
cria o melhor dos mundos no sentido de exigir do trabalhador a entrega da sua vida
tempo e energia - e dar em troca a incerteza de sua permanência no mercado de
trabalho.
Para Castel (2004), estamos diante de uma nova questão social, onde o
trabalho deixa de ser fonte de status, proteção e identidade para adquirir uma
natureza precária que deteriora o tecido social. Trata-se da emergência de um
fenômeno social que se tornou objeto de estudo, principalmente, a partir da década
de 1980, caracterizado pela dissociação entre trabalho e proteção.
Todavia, os autores que defendem a centralidade do trabalho na sociedade
entendem que essa atividade continua mobilizando e integrando os indivíduos,
constituindo-se na dimensão societária que eles mais valorizam (ANTUNES, 2000).
Indiscutivelmente, a sociedade contemporânea passou, ao longo do século
XX, por transformações importantes nas relações sociais e formas de integração,
exigindo da sociologia novo ímpeto na redefinição do seu objeto, uma vez que os
indivíduos e grupos sociais envolvidos em múltiplas relações sociais ora tomam o
trabalho como elemento central de sua experiência social e ora como esfera
marginalizada de expressão e identificação social.
Em virtude dessas mudanças objetivas, os estudos do trabalho encontram-se
diante do desafio de construir metodológica e teoricamente seus objetos de
pesquisa e de retirar da realidade novos elementos e interpretações sociais. A
tentativa de revitalizar esse campo de estudo deu-se através de abordagens de
diversas áreas como a economia, a psicologia social, a antropologia e a sociologia.
No campo da sociologia, a análise do mercado de trabalho e de seus agentes
é objeto de abordagens estruturalistas e individualistas, que procuram compreender
o modo como se estabelece a relação entre indivíduo e sociedade. Tais abordagens
38
tratam dos aspectos econômicos, políticos e sociais relacionados à esfera do
trabalho e às conseqüências sobre o agir social.
Nesta dissertação, procura-se trabalhar com a idéia segundo a qual o
indivíduo não se encontra totalmente condicionado a estrutura, isto é, ele é capaz de
construir estratégias criativas para viver em sociedade, assumindo a condição de
agente. Essa é uma dimensão que a sociologia tem procurado destacar em suas
análises empíricas. A diversidade do setor informal, das trajetórias sócio-
ocupacionais e dos mecanismos e recursos utilizados pelos sujeitos em suas
experiências sociais são exemplos disso.
Partindo desse entendimento, a sociologia, nas últimas décadas, tem
procurado repensar seu objeto de pesquisa na tentativa de incorporar no campo de
investigação novas formas pensar a realidade.
Sorj (1991) se reporta, por exemplo, a expansão do setor de serviços e da
necessidade em olhar esse segmento sob uma outra perspectiva. Segundo a autora,
é necessário compreender que outros arranjos organizacionais estão surgindo e,
com isso, um novo modelo de trabalhador e de empregabilidade.
Primeiramente, o trabalho nas indústrias está diminuindo, tanto em função do
uso de novas tecnologias, quanto em função da reestruturação e extinção de postos
de trabalho. Além disso, outras mudanças relacionadas a estas também são
evidentes como o aumento do trabalho autônomo, das formas atípicas de emprego
como, por exemplo, o trabalho temporário, em tempo parcial e a domicílio, a
expansão das pequenas empresas, o surgimento de novos arranjos produtivos,
como a subcontratação.
Enfim, a adequação dos trabalhadores a esse conjunto de mudanças é o que
a autora se propõe a teorizar. Para ela, o setor de serviços é cada vez mais
caracterizado pelo contato direto entre trabalhador e consumidor, portanto, o
primeiro acaba se tornando parte do produto que está sendo consumido.
Nesse sentido, as características pessoais dos empregados são cada vez
mais demandadas e traços como aparência, idade, educação, gênero e raça se
transformaram em potencial produtivo (SORJ, 1991). Frente a isso, produz-se uma
forte estratificação do mercado de trabalho, em que os níveis inferiores de emprego,
em tempo parcial ou temporário, são preenchidos por minorias, mulheres e jovens
com baixa escolaridade e, consequentemente, com poucas chances de mobilidade.
39
Com isso, uma das formas de assegurar a empregabilidade, na visão da
autora, consiste em recorrer às redes de sociabilidade como a família, grupos de
vizinhança, igrejas, partidos políticos. Essas redes atuam como fontes de informação
e de oportunidades no mercado de trabalho e o acesso a elas costumam
aprofundar-se em contextos marcados pela incerteza.
A participação nas atividades sociais organizadas por essas redes tornou-se
uma condição fundamental de empregabilidade. De acordo com Sorj (1991), estudos
internacionais têm demonstrado que uma proporção satisfatória de pessoas aciona
as redes de familiares, amigos, vizinhança e contatos pessoais como forma de obter
um emprego
6
.
A fim de sintetizar sua explanação, Sorj (1991) considera que:
Estas são apenas algumas das questões que o atual mundo do trabalho
coloca para a Sociologia em geral e para a Sociologia do Trabalho em
particular. À medida que for capaz de interpretar as mutações em curso
sem reduzi-las, por um lado, a uma visão saudosista de um passado agora
idealizado e, por outro, a uma sociedade de consumidores ávidos de
imagens e símbolos da qual se exorcizou a luta pela sobrevivência
material, creio que a Sociologia do Trabalho poderá ocupar um lugar
central na renovação da teoria social nos tempos vindouros (SORJ, 1991,
p.11).
Nesse sentido, a importância do trabalho na sociedade deve ser observada
como resultado da emergência de um contexto de incessantes mudanças sócio-
históricas, que possibilitaram o surgimento de novas idéias e comportamentos na
sociedade. O cenário de precarização do trabalho fez surgir uma massa de
trabalhadores desprotegidos ou desempregados, que tecem relações através de
uma vasta rede de recursos e de instituições com vistas a aumentar sua participação
na esfera econômica.
A relação existente entre as esferas política, econômica e social também
motiva os indivíduos a buscarem ou acionarem alternativas dos mais distintos meios,
mobilizando seus contatos sociais, a herança cultural, o capital econômico
acumulado para melhorar o seu desempenho no mercado de trabalho (PICANÇO,
2007). Por conseguinte, a trajetória do indivíduo recebe a influência de todos os
6
Esse fenômeno pôde ser observado a partir dos anos de 1980 e 1990, em países como a
Inglaterra e o Japão, que já sofriam os impactos da reestruturação econômica (GRANOVETTER,
1995 apud Sorj, 1991).
40
meios sociais e a realização de êxito no mercado depende da capacidade de fazer o
melhor uso desses recursos.
A trajetória objetiva da qual está se tratando diz respeito às posições
ocupadas pelos indivíduos durante toda a sua vida, seja ela ascendente,
descendente ou estacionária. A análise desse tipo de trajetória é importante para
apreender os ganhos materiais, sociais, culturais que o indivíduo conseguiu obter,
além de propiciar resultados objetivos, que podem ser codificados e mensurados.
Todavia, tal análise perde em qualidade porque perde a riqueza do discurso,
das palavras, das situações que o indivíduo se apropria para falar de si mesmo, dos
outros, do contexto. Esse processo de organização do discurso, de omitir esta ou
aquela experiência, pode ser apreendido por meio de um recurso analítico que
privilegia a trajetória subjetiva.
Diante disso, Dubar (1998), afirma que o conceito de trajetória social
encontra-se relacionado a dois aspectos do processo biográfico e refere-se tanto à
trajetória objetiva dos sujeitos, procurando definir as posições sociais ocupadas por
eles durante a vida quanto à trajetória subjetiva, onde a importância é dada aos
relatos biográficos dos próprios agentes, na tentativa de compreender como eles
pensam a si mesmos e ao mundo que os cerca.
Quando se analisa uma trajetória subjetiva, é preciso concentrar-se, portanto,
na análise das categorias de linguagem, que podem ser alcançadas a partir da
fala do sujeito no momento da entrevista. Nesse processo de narração sobre si
mesmo, o indivíduo pontua aspectos de sua experiência que considera importante
para caracterizar sua trajetória, constituindo-se em um conhecimento de grande
valia para a sociologia. Assim, quando me refiro à trajetória social a preocupação
que perpassa o trabalho é identificar como os indivíduos dão conta dessas
trajetórias, justificando as posições que ocupam e também suas expectativas
futuras, tendo como principal referência a relação estabelecida com o SINE.
Por conseguinte, a trajetória subjetiva tem por base os processos identitários
individuais, isto é, metodologicamente, parte dos relatos produzidos pelos próprios
atores em uma situação de entrevista. Nas palavras de Dubar (1998, p. 7):
A hipótese central norteando a análise é a de que a colocação deste
percurso em palavras, numa situação de entrevista considerada como um
diálogo focando o sujeito, permite a construção lingüística de uma ordem
41
categorial que organiza o discurso biográfico e lhe confere um significado
social.
Ao sociólogo cabe, portanto, segundo o autor citado acima, concentrar-se
sobre a estrutura dessas narrações, bem como as categorias que estão presentes
nos relatos, que podem estar relacionadas a níveis distintos como função, ação e
narração. Ao atentar para esses níveis, é necessário apreender a lógica usada pelo
sujeito para caracterizar, descrever e fundamentar os acontecimentos considerados
importantes no decorrer do seu percurso. Lógica esta permeada de elementos
cognitivos, afetivos, pessoais e sociais.
Em vista disso, é importante destacar que essas formas discursivas que
compõem o imaginário social e tecem determinadas representações sociais sobre a
realidade, constituem um todo integrado, que articula elementos econômicos e
sociais. Na visão de Moscovici (2003), é em função dessas representações, que
podem ou não expressar a realidade, que os indivíduos e coletividades se
movimentam pelo tecido social.
Vale ressaltar que o discurso do sujeito é orientado por uma temporalidade
que ele considera importante para pensar seu ciclo de vida. Através desse discurso,
ele articula suas argumentações, justificando opiniões, atitudes e disposições.
Nas sociedades contemporâneas, segundo Dubar (1998), a relação entre
formação, emprego e trabalho constitui uma das dimensões mais importantes na
estruturação dos “espaços-tempos” individuais, ou seja, da forma como as pessoas
costumam se situar diante do mundo. É a partir dessa relação que elas “narram suas
biografias” e, assim, categorizam o sistema de posições que ocupam durante suas
vidas. E, nesse sentido, também é possível pensar como o SINE insere-se nessa
argumentação.
42
CAPÍTULO 2
AS AÇÕES E POLÍTICAS DE ASSISTÊNCIA AO TRABALHADOR
DESEMPREGADO NO BRASIL: O LUGAR DA INTERMEDIAÇÃO DE
MÃO-DE-OBRA
As leituras realizadas sobre o desenvolvimento das políticas de emprego, no
Brasil, contribuíram para, em um primeiro momento, constatar que a criação dos
mecanismos de intermediação de mão-de-obra implicou o reconhecimento da
natureza coletiva do desemprego, ou seja, no fato de que o indivíduo necessita de
auxílio para superar a condição de desempregado. De acordo com Cardoso et alli
(2006), os sistemas de intermediação de mão-de-obra, no Brasil, constituem um
desdobramento das políticas sociais introduzidas, a partir da cada de 1960, que
possuíam como finalidade a recuperação da capacidade produtiva do trabalhador
sem emprego.
Nesse sentido, a partir daquele momento, a preocupação em criar meios para
reincorporar o trabalhador novamente ao mercado de trabalho formal passou a ser
um diferencial das ações de assistência nessa área.
Além disso, outra medida que corroborou para demonstrar a preocupação
com o problema social do desemprego foi a criação do Fundo de Amparo ao
Trabalhador, isto é, uma fonte específica de financiamento para os programas de
intermediação, geração de emprego e renda.
Entretanto, conforme Cardoso et alli (2006), a dificuldade em criar ou
estender os programas vinculados ao mercado de trabalho encontra-se relacionada
às carências de ordem financeira que o sistema público de emprego, trabalho e
renda enfrenta. Mesmo com a criação do FAT elas se mantiveram, impondo
barreiras ao desenvolvimento de iniciativas nessa área social.
Para o autor, apesar de 20 anos de existência, as políticas sociais relativas ao
emprego, no Brasil, são muito recentes em comparação a experiência dos países
desenvolvidos em relação a esse formato de política.
43
O SINE, criado na década de 1970, colocou entre suas finalidades a
reincorporação do trabalhador em atividades produtivas fazendo a ponte entre o
desempregado e o empresariado industrial. Reitera-se, porém, a existência de um
cenário propício à criação de empregos, a década do milagre econômico em 1980,
que possibilitou o êxito desse tipo de política (Ver legislação, em anexo).
Entre os principais serviços executados por esse programa pode-se citar: a
intermediação de mão-de-obra para o mercado formal de trabalho, a intermediação
de trabalhadores autônomos, a carteira de trabalho e previdência social, o seguro-
desemprego e cursos de qualificação profissional
7
.
A intermediação de mão-de-obra é realizada de forma gratuita, onde é gerado
um cadastro eletrônico dos trabalhadores e também das vagas ofertadas pelo
empregador. Este último descreve o perfil da vaga através de critérios como a
experiência em carteira de trabalho, escolaridade e sexo – este último critério,
abolido, recentemente, por determinação judicial.
A intermediação de trabalhadores autônomos - que compreende pessoas
físicas, associações, sindicatos, profissionais liberais, empresas ou condomínios é
realizada por meio de um cadastro no Centro do Trabalhador Autônomo, onde os
profissionais que atuam por conta própria dispõem de um registro na prefeitura,
contribuem para o Instituto Nacional de Seguridade Social e participam de
programas permanentes de qualificação e avaliação de seu trabalho
8
.
A carteira de trabalho é o documento que habilita o trabalhador a ingressar
no mercado de trabalho e também ao recebimento de outros benefícios sociais
como a obtenção da aposentadoria, a garantia do seguro-desemprego e outros. É
fornecida ao trabalhador pelo SINE, através de um convênio com a
Superintendência Regional do Trabalho e Emprego.
O seguro-desemprego, por sua vez, consiste em um auxílio financeiro
concedido ao trabalhador desempregado demitido sem justa causa. O benefício é de
caráter provisório e também habilita o trabalhador para se cadastrar no serviço de
intermediação ou realizar cursos de qualificação profissional.
7
Fundação Gaúcha de Trabalho e Ação Social, 2010. Disponível em:
http://www.mte.gov.br.br/fat/historico.asp
8
No Rio Grande do Sul, esses centros são encontrados em Porto Alegre, Cachoeirinha, Canoas,
Pelotas, Rio Grande, Santa Cruz e São Leopoldo (Fundação Gaúcha de Trabalho e Ação Social,
2010. Disponível em: http://www.mte.gov.br.br/fat/historico.asp).
44
Os cursos de qualificação profissional são ofertados a pessoas com 16 anos
ou mais, inscritas na FGTAS/SINE em situação de desemprego ou empregadas. A
maioria dos recursos para a realização dos cursos emana do FAT e do governo do
Estado.
Na visão de Cardoso et alli (2006), a justificativa para a maioria dos
programas criados pelo governo federal era de que o crescimento econômico
resultava, basicamente, na criação de empregos e o desemprego, por sua vez, era
visto como conseqüência de um ciclo recessivo da economia. Contudo, atualmente,
aponta-se para a natureza estrutural do desemprego o que inviabilizaria as ações
relacionadas ao mercado de trabalho formal.
Outra mudança vivenciada pelo sistema público de emprego, trabalho e renda
foi a descentralização de papéis e funções para outros membros da sociedade. A
questão colocada por Cardoso et alli (2006) parece concorrer para a relação entre a
descentralização e o desapego à questão do trabalhador, delegando à sociedade a
resolução de seus próprios problemas.
Conforme se destacou, anteriormente, o poder público manifesta-se através
de programas como o FAT, que tem como objetivo combater o desemprego através
do estímulo à qualificação dos trabalhadores, que se manifestam por meio do
Seguro-Desemprego, o Abono Salarial e o financiamento de Programas de
Desenvolvimento Econômico.
No entanto, as políticas de estabilização monetária, a incorporação de meios
tecnológicos e a flexibilização das leis trabalhistas promoveram um aumento de
produtividade em diversos setores, o que se reverteu em uma ampliação dos postos
dos trabalhos. Em contrapartida, esse mesmo processo acabou restringindo o papel
das empresas nacionais e aumentando os fatores negativos do modelo adotado pelo
Brasil.
Dias
9
em seu artigo, Geração de emprego, renda e política de qualificação
nacional: elementos para uma análise no Estado do Pará, estabelece que o novo
modelo de abertura econômica propiciou o aumento da desigualdade social,
intensificando os problemas sociais como a pobreza, a falta de trabalho, moradia,
alimentação, entre outros. Essa situação corroborou para a reprodução de outras
9
Maria do Carmo da Silva Dias. Doutoranda, Faculdade de Educação/ UFMG. Professora de
Sociologia Núcleo Pedagógico Integrado, pesquisadora do GESTRADO/FaE/UFMG.
45
questões sociais como a ampliação da violência, da insegurança e da
marginalidade.
Destacam-se, nesse processo, a reestruturação produtiva, a flexibilização da
produção e os novos padrões de gestão, que aliam escolaridade e melhores
salários. Os programas como o PNQ (Plano Nacional de Qualificação) passam a
propor a busca por qualificação técnica e social aos novos candidatos aos postos de
trabalho, tornando a questão do trabalho cada vez mais individual.
O modelo neoliberal emprega a formulação de que o desemprego está
relacionado a falta de domínio de elementos técnicos, habilidade e competência,
apegada a vontade individual. Dias estabelece que políticas, como o PNQ 2003-
2007, visam a promover conhecimentos técnicos que possibilitem às pessoas dispor
de seu capital social, econômico e cultural, com vistas a melhorar sua condição de
vida.
A qualificação profissional era indicada como elemento de
inclusão social do trabalhador orientando para a promoção de
um outro contrato social com base na democratização das
relações de trabalho, sendo a economia solidária, o
cooperativismo e o crédito facilitado os elementos dessa
política. A proposta tinha como eixo à integração e qualificação
social e profissional com uma estratégia de integração de
política de emprego, trabalho e renda, educação e
desenvolvimento.
Para Furtado, várias políticas públicas vêm sendo implementadas com o
objetivo de qualificar a mão-de-obra nacional, visando o enfrentamento do
desemprego. A reestruturação produtiva e a necessidade por bases de inovação
impõe novas dinâmicas às empresas nacionais, diante as novas tendências
tecnológicas e de organização social do trabalho. A competição por mercados
converge à necessidade de se intensificar a capacitação dos trabalhadores, a partir
da educação profissional. Sanar a baixa qualificação torna-se o objetivo das políticas
públicas diante de um mercado de trabalho em constante mutação nas palavras da
autora.
A atuação estatal não fica restrita a educação profissional, mas também
envolve as linhas de crédito como o PROGER, que visa promover ações de
incentivo as pequenas e microempresas, cooperativas e formas associativas de
produção, além de ramos da economia informal.
46
Voltando a questão da descentralização das políticas sociais no campo do
trabalho, acredito que essa medida também pode ser pensada como uma ação que
oportuniza aos atores locais a promoção de alternativas mais adequadas ao seu
contexto. A divisão de responsabilidades pode trazer à cena política novas
demandas, tornando o sistema mais participativo e mais dinâmico.
Cabe destacar que a descentralização não é exclusividade das políticas de
emprego, pois é visualizada em outras áreas das políticas sociais. Esse caráter
híbrido do Sistema Público de Emprego, Trabalho e Renda leva a questionamentos
sobre a razão que determinou essas mudanças, isto é, se respondem a necessidade
de se gerenciar melhor os recursos, de focalizar melhor as ações ou, tão somente,
se denota um retraimento da ação do Estado.
No Rio Grande do Sul, foi feito um convênio com o Ministério do Trabalho
cabendo ao estado oferecer os serviços de intermediação de mão-de-obra, de
concessão do seguro-desemprego, projetos de geração de emprego, renda e
qualificação profissional, além da operacionalização do sistema. No conjunto dos
municípios, são encontradas as agências da Fundação Gaúcha de Trabalho e Ação
Social (FGTAS), entidade que foi regulamentada pelo decreto lei nº. 34.155, de
30.12.1991 (Ver legislação, em anexo). Estão entre suas atribuições a administração
do sistema blico de emprego e a promoção de ações de formação profissional
(FUNDAÇÃO GAÚCHA DE TRABALHO E AÇÃO SOCIAL, 2010. Disponível em:
http://www.mte.gov.br.br/fat/historico.asp).
Essa fundação é uma entidade de direito privado e está vinculada a
Secretaria da Justiça, do Trabalho e da Cidadania. Segundo a legislação referente à
sua criação é garantida a sua autonomia administrativa e a possibilidade de contar
com o apoio de outras entidades, de origem pública ou privada, para promover os
seus programas.
As suas ações também são focalizadas em grupos específicos do mercado
de trabalho, principalmente, desempregados, jovens sem experiência profissional,
portadores de deficiência, artesãos, trabalhadores autônomos.
Assim como a União conta com uma gestão administrativa hierarquizada
formada por um Conselho Tripartite e paritário, as unidades federativas também
possuem uma Comissão com o mesmo molde, de caráter deliberativo, formada por
18 membros que representam as demandas de trabalhadores, empregadores e
governo. Essas comissões estaduais, criadas em 1994, possuíam como objetivo
47
receber os recursos da União e decidir sobre a melhor forma de aplicação e
investimento dos mesmos. À comissão estadual cabia também a avaliação das
políticas de emprego financiadas pelo FAT e a elaboração de outras políticas.
No Rio Grande do Sul, é por meio da Fundação Gaúcha de Trabalho e Ação
Social que são disponibilizados programas, ações e serviços com a finalidade de
gerar emprego e renda. Esta fundação encontra-se organizada por 134 agências,
localizadas em 131 municípios do Estado (FUNDAÇÃO GAÚCHA DE TRABALHO E
AÇÃO SOCIAL, 2010. Disponível em: http://www.mte.gov.br.br/fat/historico.asp).
Além disso, cabe destacar que os fatores externos como as transformações
no tipo de desemprego, na sua duração e as mudanças nas características da
população desocupada influenciaram os resultados das políticas de intermediação
de mão-de-obra porque, segundo Cardoso et alli (2006), existe uma estreita ligação
dessas políticas com o setor formal da economia, o qual tem crescido menos que o
mercado informal de trabalho. Atrelado a isso, ainda, visualiza-se a carência de
recursos para dar continuidade às políticas existentes ou criar novas políticas.
Contudo, é importante salientar que o autor, quando fala da carência de
recursos, não está tratando da dificuldade em captar recursos para o Fundo de
Amparo ao Trabalhador, mas na realocação de parte desses recursos para atender
outras áreas da política social, o que obrigou a seleção e estabelecimento de
prioridades.
Dessa maneira, observa-se que as mudanças políticas, econômicas, morais e
sociais relativas ao mundo do emprego refletiram nos resultados do sistema público
de emprego, trabalho e renda, bem como no tipo humano que transita e depende
dessa via para conseguir uma ocupação.
Vale salientar que a análise dos mercados de trabalho, dos mercados de
intermediação de mão-de-obra também passa pela abordagem desse tipo humano
com experiências concretas diversas com o trabalho e com esses mecanismos de
intermediação.
A relação do indivíduo com o trabalho entendido enquanto atividade social e
econômica alterou-se como conseqüência dos processos de reestruturação
econômica. Paralelamente, a sociologia procura entender a posição que o trabalho
assume na constituição do tecido social e sua importância como um elemento de
integração entre as pessoas.
48
Cabe elucidar que a relação entre o trabalho e a sociedade abordada pela
sociologia clássica tem sido criticada por muitos autores contemporâneos, dos quais
se destaca Offe (1989), o qual compreende que o trabalho deixou de assumir a
posição de centralidade no tecido social. Entretanto, conforme proposto,
anteriormente, também são vários os autores interessados em revitalizar os estudos
no campo do trabalho, através da proposição de novos conceitos e categorias
analíticas.
Alguns desses estudos encontram-se ligados à sociologia econômica que, a
partir da década de 1970 e 1980, passaram a se dedicar à compreensão das formas
de inserção dos sujeitos no mercado de trabalho, a circulação de informações nesse
mercado, bem como as relações e redes construídas pelos indivíduos nesses
espaços de sociabilidade e participação.
Porém, o muitas as contradições teóricas e metodológicas que perpassam
os estudos sobre o mercado de trabalho. Sob um contexto social em constante
transformação, parece haver um movimento no sentido de encontrar uma atividade
ou domínio de expressão social que tal como o trabalho provoque abalos e
agitações na sociedade, promovendo sua transformação e desenvolvimento.
Contemporaneamente, as teorias sociológicas apontam para a perda da
importância do trabalho na vida social, como resultado das transformações
econômicas ocorridas, a partir da década de 1970, nas principais economias
capitalistas. De acordo com tais teorias, os conceitos e categorias que ajudaram a
explicar os fenômenos que caracterizaram a vida moderna encontram-se
desgastados e não dão conta de explicar o comportamento dos atores no tempo
presente.
Conforme Sorj (1991), a Sociologia do trabalho ou Sociologia industrial não
possui mais a importância adquirida entre os anos de 1940 e 1960, como uma
subárea central da Sociologia. Nesse sentido, tem ocorrido uma revisão tanto dos
seus conceitos teóricos quanto das suas categorias analíticas.
Para essa autora, a Sociologia industrial conceituava o trabalho como aquele
que determinava não apenas direitos e deveres, existentes nas relações de trabalho,
mas, sobretudo, padrões de identidade e sociabilidade, interesses e comportamento
político, modelos de família e estilos de vida. Essa visão tem sido amplamente
revista e questionada, sob o pressuposto de que o trabalho e a produção perderam
sua capacidade de estruturar as posições sociais, os interesses, os conflitos e os
49
padrões de mudança social. De acordo com sua perspectiva, os desdobramentos
dessas concepções para a Sociologia do trabalho são de extrema relevância e,
portanto, não podem ser desprezados.
Entretanto, diante dessas contradições teórico-metodológicas, a Sociologia do
trabalho ficou dividida entre dois movimentos contraditórios onde, por um lado,
insistiu-se na validade das teorias sociais tradicionais e, por outro, adotou-se de
forma determinante a tese sobre o “fim do trabalho” e a necessidade de se dedicar
ao estudo de outros objetos de pesquisa, a partir de novos conceitos e categorias
explicativas.
Frente a isso Sorj (1991) compreende que o trabalho tem assumido, no tempo
presente, uma pluralidade de formas e continua a ser um dos mais importantes
determinantes sobre as condições de vida das pessoas. Portanto, ainda, é
responsável pelo sustento da maioria dos indivíduos, que dependem da venda do
seu tempo e das suas habilidades no mercado.
Além disso, assiste-se a um alargamento do trabalho a diferentes esferas da
vida, tornando-se mais difícil classificar que atividades constituem ou não trabalho.
Por conta disso, hoje, em virtude das mudanças nas relações contratuais, torna-se
mais difícil entender em que domínios o trabalho não se faz presente.
Ao colocar como a finalidade da sociologia a análise dos princípios que
moldam a estrutura da sociedade, que garantem a sua integração e, ao mesmo
tempo, promovem seus conflitos, Offe (1989) salienta que, ao longo dos séculos
XVIII, XIX e XX, o trabalho era concebido como a fonte de explicação para a
associação, a organização e a desintegração da vida social. Por conta disso, as
análises teóricas dos autores clássicos da sociologia encontravam-se preocupadas
com a influência do trabalho sobre o conjunto das relações sociais.
Na perspectiva sociológica clássica, o trabalho encontrava-se associado a
outro conjunto de fenômenos como a pobreza ou pauperização, a alienação e a
sujeição dos trabalhadores ao capital, a racionalização técnico-científica e também a
formas de resistência social, cultural e política (OFFE, 1989). Dessa maneira, as
relações sociais emergentes no interior do processo de produção eram estendidas e
reproduzidas no conjunto da vida social, cultural e política, exercendo uma influência
determinante sobre as formas de sociabilidade existentes.
50
Cabe ressaltar que desde a sua constituição, a Sociologia do trabalho adotou
a interpretação predominante entre os autores clássicos das ciências sociais de que
a economia formava uma esfera central do conjunto da vida social.
A peculiaridade da sociedade moderna é, portanto, decorrente dessa
diferenciação entre os subsistemas, o econômico, o cultural, o político. Para os
autores clássicos, à exceção de Weber, onde a dimensão cultural assume grande
relevância na explicação dos fenômenos sociais, a economia é concebida como uma
esfera determinante do sistema social (SORJ, 1991).
Durkheim, em “Da divisão do trabalho social (1995)”, define o trabalho como o
princípio organizador da sociedade, pois é a partir dele que os indivíduos se
relacionam, representam a si mesmos e aos outros. Portanto, atribui ao trabalho um
elemento de distinção e de identificação social, uma vez que seus conteúdos morais
têm um substrato não-econômico e que consistem no sentido de pré-dispor as ações
de indivíduos e grupos.
Entretanto, nas pesquisas sociológicas contemporâneas, o poder explicativo
do trabalho sobre a experiência e a ação social dos indivíduos tem sido questionado,
sob o pressuposto de que na vida cotidiana há uma diferenciação cada vez maior de
interesses, de estilos de vida e de demandas sociais entre os trabalhadores. A
própria organização do trabalho incentiva essa diferenciação, visto que as tarefas
encontram-se cada vez mais segmentadas, a maioria delas tampouco necessita do
mesmo espaço físico para ser realizada.
De acordo com essa perspectiva, o trabalho perdeu a capacidade de criar
entre os indivíduos uma identidade homogênea e estável, pois a diferenciação de
ocupações, das relações de trabalho e das condições de vida implica o maior ou
menor reconhecimento simbólico do trabalho.
No entanto, Manuel Castells (1999) contemporâneo a Offe, apesar de tratar
do nexo existente entre as esferas cultural, econômica e política para compreender o
contexto extremamente mutável em que vivemos, através do conceito de exclusão
social, acaba alocando em uma mesma categoria de excluídos aqueles que não
participam das trocas econômicas da sociedade em rede. Para ele, a privação
econômica é responsável por conferir um sentido de homogeneidade às
experiências de vida dos indivíduos. Logo, a dependência da força de trabalho em
relação ao salário, além da sua submissão aos riscos sociais gerados pela falta de
51
emprego, contribui para a aproximação entre as experiências de vida dos indivíduos
e certa unidade nas suas formas de ser e estar no mundo.
A análise de Robert Castel (2004) converge para outro aspecto importante
que diz respeito ao afrouxamento da proteção social ligada ao trabalho assalariado.
Essa ruptura entre o trabalho e a proteção social mais do que contribuir para a piora
das condições de vida durante o desemprego sinaliza para emergência de um
contexto de incerteza social, de descrédito e inseguridade em relação às instituições
de caráter coletivo. Assim, o trabalho antes considerado símbolo de reconhecimento
social e de emponderamento, uma vez que agregava a massa de trabalhadores em
torno de demandas comuns e que possuíam legitimidade, aparece destituído da sua
função social de integrar e criar laços de interdependência entre as pessoas.
Por conta disso, convém elucidar que uma das características das relações
sociais no tempo presente é a instabilidade e a incerteza diante da experiência
concreta dos indivíduos. Para Giddens (2004), a falta de um lugar seguro na
sociedade, decorrente da inserção precária ou da não-inserção em relações de
trabalho regulamentadas, é acompanhada por um comportamento distinto em
relação à questão social. Tal comportamento consiste na transferência de
responsabilidades de ordem coletiva para a competência dos próprios sujeitos. Por
essa razão, a procura por emprego e o sustento da família ou o próprio sustento
transformou-se em um “empreendimento” solitário e incerto criando novas práticas e,
consequentemente, novas representações e percepções acerca de tais
experiências.
Giddens analisa essas mudanças a partir do conceito de individualização dos
riscos sociais, utilizado para descrever e caracterizar contextos onde se visualiza um
processo contínuo de desestruturação social que fragiliza a coesão interna das
sociedades e, ao mesmo tempo, aumenta o risco de marginalização e exclusão de
determinados grupos da população. Esse processo pode ser exemplificado pelo
aumento da autonomia dos indivíduos em relação às estruturas de caráter coletivo,
como é o caso do Estado.
Nesse sentido, o que motiva a ação dos sujeitos acaba se tornando a busca
por uma vida própria, isto é, construir modos de realização pessoal. Todavia,
conforme demonstrou Sennett (2006), existe um descontrole cada vez maior dos
indivíduos sobre seus próprios destinos, consolidado pelo afastamento entre as
experiências narradas e as experiências, efetivamente, vividas.
52
As sociedades modernas incentivadas pelo modelo de “Estado mínimo”
acabaram deixando os indivíduos desassistidos em muitas esferas de reprodução
social. Assim, a falta de controle institucional acabou gerando muita insegurança,
mas, por outro lado, forçou os indivíduos a criarem formas de agir contra os riscos
sociais, passando, a assumir a condição de agentes.
Entretanto, ao transferir para o indivíduo a responsabilidade por gerir seu
cotidiano tornou este último, totalmente, responsável, também, pelas conseqüências
negativas de seus atos. De todo modo, tomar iniciativa em um mundo instável e
dinâmico, hoje, tornou, ainda, mais incerto os diagnósticos a respeito dos resultados
das escolhas tomadas. Logo, cabe teorizar que a dificuldade em prever as
conseqüências resultantes da ação social também implica na dificuldade em criar
medidas de proteção contra os resultados negativos destas.
Dupas (1999) acredita que todas essas transformações contribuíram para
intensificar estados de pobreza e de exclusão social, que a maioria da população,
ainda, depende da inserção em relações de trabalho assalariadas para manter
níveis satisfatórios de bem-estar, apesar das chances de mobilidade social pela via
do trabalho encontrarem-se, amplamente, prejudicadas.
De acordo com Tavares (2006), as conseqüências sociais do processo de
reestruturação produtiva, atrelado às políticas neoliberais, são as mais perversas do
ponto de vista das condições objetivas dos indivíduos. Na medida em que a
liberalização e a desregulamentação dos mercados intensificaram a competição
entre os países, exigindo a adoção de novos modelos de organização da produção,
distribuição e prestação de serviços, assim como de uso da força de trabalho, a
criação de postos de trabalho de qualidade tornou-se um desafio a ser alcançado.
Para a autora, a inserção dos países na economia globalizada depende,
primeiramente, da criação de condições adequadas para resolver os problemas
sociais. Trata-se, sumariamente, de um problema de natureza distributiva que
consiste em criar condições minimamente satisfatórias para superar estados de
pobreza e exclusão e possibilitar a participação efetiva da grande maioria da
população nas diferentes esferas de expressão social, política, cultural e econômica.
Em regiões e países que convivem com intensos níveis de desigualdade a
geração de empregos constitui a primeira garantia de exercício da cidadania.
Entretanto, na economia de mercado criar tais condições é extremamente complexo,
53
haja vista a voracidade em reduzir a dependência em relação ao homem enquanto
fator de produção.
54
CAPÍTULO 3
TRAJETÓRIAS DE (RE) INSERÇÃO NO MUNDO DO TRABALHO EM
SANTA MARIA
3.1 A escolha pela abordagem qualitativa
A utilização da metodologia qualitativa na ciência social contemporânea é
fruto de um debate em torno da validade do conhecimento calcado na interpretação
da realidade social. Nesse sentido, explorar o mundo social através de um enfoque
que prima pela interpretação e não pela produção de verdades absolutas e
incontestáveis tem sido o desafio de muitos pesquisadores na tentativa de dar
sentido a suas práticas e, ao mesmo tempo, questionar, refletir e entender seu
exercício como um conhecimento, em larga medida, compartilhado e produzido em
conjunto com os sujeitos da pesquisa.
Por conta disso, é de suma importância destacar que falar sobre método
qualitativo é sustentar a idéia segundo a qual a produção do conhecimento é válida
para uma realidade histórica e culturalmente situada, buscando as sutilezas e as
peculiaridades da ação humana naquele contexto. Nesse sentido, é oportuno o
seguinte fragmento:
A inteligibilidade de nossos relatos sobre o mundo provém não do mundo
em si mesmo, mas de nossa imersão dentro de uma tradição de práticas
culturais que herdamos de gerações anteriores. chegamos a
compreensão quando nossos relatos aproximam-se de tais convenções.
Logo, é a partir das nossas relações dentro das comunidades
interpretativas que surgem nossas construções do mundo
(GERGEN&GERGEN, 2006, p. 368).
Desse modo, a pesquisa social encontra-se permeada de interpretações,
onde o pesquisador observa e confere significado às práticas provenientes da
experiência concreta. Nessa medida, o ato de escrever e interpretar além de ser
uma tarefa que exige responsabilidade e comprometimento com o trabalho também
55
deve prezar pelo reconhecimento da riqueza e da multiplicidade de perspectivas e
vozes que surgem do contexto pesquisado.
Por conseguinte, a validade do conhecimento produzido pelos métodos
qualitativos baseia-se na premissa segundo a qual o estudo consiste em uma
contribuição para a compreensão de maneiras de ser e estar no mundo em uma
determinada época e lugar. Conforme, postula Haraway (1988 apud
GERGEN&GERGEN, 2006) trata-se do reconhecimento de “verdades situadas”, isto
é, verdades que se encontram localizadas no interior de certas comunidades para
representar a condição dessas.
Porém, embora o conhecimento situado traga questionamentos acerca da sua
validade, na medida em que trata especificamente da realidade de um determinado
grupo, Gergen&Gergen (2006) apontam para a possibilidade de, a partir de tal
conhecimento, conhecer e problematizar outras realidades sociais.
Quanto à exposição dos resultados e o compromisso com a divulgação
desses é oportuno assinalar que ao atuar o pesquisador mesmo contra sua vontade
interfere e altera o campo de investigação. Com isso, vale salientar que:
[...] à medida que embarcamos em nossa pesquisa, alteramos a
composição do campo. Agir como pesquisador é perturbar inerentemente o
sistema de relações e, tal como o bater das asas de uma borboleta na
China, os efeitos da própria pesquisa podem dar origem a múltiplos
eventos imprevistos à distância (GERGEN&GERGEN, 2006).
Por isso, a pesquisa assenta-se em um recursivo pensar e repensar como
falar “dos” e para os “outros”, sobre as conseqüências e repercussões do fazer
investigativo (FINE, M. et al, 2006). Tendo em vista essa perspectiva, é necessário
ponderar sobre a presença do pesquisador no espaço de pesquisa, uma presença
anunciada tácita ou explicitamente que influencia maneiras de agir, de se expressar
e de ocultar determinadas percepções e comportamentos.
[...] o trabalho social geralmente representa uma intrusão e uma
intervenção dentro de um sistema de relações, um sistema de relações que
o pesquisador tem muito mais liberdade de abandonar do que o
pesquisado. Não como escapar da desigualdade e da perfídia potencial
dessa relação (FINE, M. et alli, 2006, In: Denzin&Lincoln, 2006).
56
A esse respeito, Fine (2006) destaca que o objeto/sujeito de pesquisa não é
um todo coerente ou um “conjunto de outros unificado” e que o contexto sobre o qual
escrevemos muda constantemente e, da mesma forma, as leituras e apropriações
sobre o texto que produzimos também se diversificam. Outro ponto apreciado pela
autora é a relação existente entre as histórias que contam os indivíduos e o conjunto
de relações históricas, estruturais e econômicas em que elas se situam. Nenhuma
análise social deve menosprezar o nexo explicativo e interpretativo entre as pessoas
e as estruturas e as ideologias que as circundam, que, muitas vezes, o são
narradas pelos pesquisados.
Portanto, a “ética da responsabilidade” deve perpassar todos os estágios da
pesquisa, desde a escolha dos métodos, das formas de abordagem e relação com
os pesquisados, da interpretação a a divulgação dos resultados. Passa também
pelo comprometimento com a produção de um conhecimento válido e consciente de
que não ambiciona apresentar verdades absolutas e incontestes, mas propor idéias,
questionamentos, reflexões e uma maneira de ver e pensar a realidade a partir de
um método.
O uso do consentimento informado tanto para adentrar a instituição quanto
para entrevistar os informantes também parte de uma maneira de conceber o
processo de pesquisa como aquele que exige um determinado controle e depende
da confiança sobre os usos do mesmo. Participar de uma pesquisa significa
comprometer-se ou posicionar-se sobre algo que, algumas vezes, o se discute a
priori, ser “pego” de surpresa gera um sentimento de insegurança, não por parte
dos informantes, mas também pela própria instituição que questiona-se sobre os
usos e desusos da pesquisa.
Colocar tais questões é de suma relevância antes de introduzir os resultados
empíricos da investigação sobre as quais me debruçarei nas páginas seguintes,
onde todas as questões, de certo modo, surgiram em circunstâncias variadas
demandando muitas reflexões e, algumas vezes, insegurança.
57
3.2 Narrativas sobre o trabalho: contradições, tensões e conflitos na produção
de significados.
Vislumbrou-se, neste subtítulo, interpretar os discursos construídos sobre o
trabalho, apresentando a diversidade da dimensão representacional que perpassa a
experiência concreta dos sujeitos investigados
10
. Como ponto de partida,
convencionou-se realizar uma breve análise do histórico familiar dos
desempregados e suas condições de trabalho e se essas condições e
características se repetem na trajetória dos sujeitos da pesquisa.
Além disso, foi analisada a trajetória dos entrevistados abarcando elementos
sobre sua formação educacional, profissional e experiências ocupacionais onde se
constatou que o tipo de passagem dos indivíduos pelo mercado foi determinante
quanto à relação que tinham com o trabalho enquanto atividade social e econômica.
Ao analisar as entrevistas, foi possível identificar que apenas duas das
entrevistadas alcançaram o nível médio de escolaridade, Gabriela e Dona Lurdes,
esta última com pós-graduação, e Luíza que, apesar de fazer magistério,
ambicionava fazer especialização nessa área, portanto, apresentava ao menos um
desejo de mobilidade, ausente nos demais discursos. Todavia, como será visto, a
seguir, a escolaridade não apareceu como um dado significativo em termos
interpretativos, que demonstrou, somente, a obtenção de ganhos concretos de
escolaridade entre as gerações, mas não ajudou a explicar a relação dos
informantes com o trabalho.
Embora não se tenham, ainda, os dados referentes ao Censo 2010, se
pode perceber que, entre os anos de 1990 e 2000, ocorreu um crescimento no nível
de instrução importante entre a população com 10 anos ou mais de idade no
município.
10
O estudo baseou-se na análise de 25 casos, compreendendo um público de 12 mulheres e 13
homens.
58
Veja no quadro, a seguir:
Tabela 146
-
Pessoas de 10 anos ou mais de idade por grupos de anos de estudo
Unidade da Federação
e Município
Grupos de anos de estudo
Ano
1991
2000
Rio Grande do
Sul
Total
100,00
100,00
Curso de alfabetização de adultos concluído
0,20
-
Sem instrução e menos de 1 ano de estudo,
exclusive Curso de alfabetização de adultos
8,84
-
Sem instrução e menos de 1 ano
-
5,56
1 a 3 anos
18,38
13,72
4 a 7 anos
45,06
41,53
8 a 10 anos
12,64
17,41
11 a 14 anos
10,65
15,93
15 anos ou mais
4,14
5,17
Não determinados
0,08
0,67
Santa Maria
-
RS
Total
100,00
100,00
Curso de alfabetização de adultos concluído
0,23
-
Sem instrução e menos de 1 ano de estudo,
exclusive Curso de alfabetização de adultos
7,36
-
Sem instrução e menos de 1 ano
-
4,38
1 a 3 anos
14,89
10,25
4 a 7 anos
38,82
33,95
8 a 10 anos
16,33
20,30
11 a 14 anos
14,33
21,24
15 anos ou mais
7,95
9,29
Não determinados
0,10
0,61
Nota: Para 1991: 1 - Dados da Amostra 1 Fonte: IBGE - Censo Demográfico Para 2000
Quadro 1 – COMPARATIVO 1991-2000, Nível de escolaridade da população em
Santa Maria e Rio Grande do Sul
Portanto, em relação ao Estado, Santa Maria apresentou um considerável
aumento na porcentagem de pessoas com 11 anos ou mais de instrução. Entre as
pessoas com 11 anos de instrução a 14 anos de instrução, no período
compreendido entre 1991 e 2000, ocorreu em Santa Maria um acréscimo de 6,91%
enquanto no Rio Grande do Sul o aumento foi de 5,28%. Em todas as séries foi
apresentado um comportamento positivo, representado pela redução do número de
pessoas com menos de 7 anos de instrução e aumento daquelas com 8 anos ou
mais de instrução. Possivelmente, esse resultado se repetirá nos dados referentes
aos próximos anos.
Entre as entrevistadas, agora, considerando-se os dados obtidos na pesquisa
de campo, em 2010, houve ganhos de escolaridade em relação aos pais, apenas em
três casos (Dona Isaura, Dona Lurdes e Luíza). No caso de dona Isaura, os pais não
haviam freqüentado a escola, no caso de Dona Lurdes os pais completaram o nível
59
fundamental e médio, no caso de Luíza os pais possuíam ensino fundamental
incompleto, no caso do pai, e completo no da mãe.
Em Santa Maria, segundo o último Censo, 29,47% da população feminina
possuía entre 4 e 7 anos de estudo, seguida daquela com 11 a 14 anos de estudo,
19,66%, ao passo que 5,35%, abarcava mulheres sem instrução ou com menos de
um ano de estudo. Entre as mulheres ocupadas, de acordo com a mesma fonte, a
maioria, 12,18%, possuía entre 11 e 14 anos de estudo, apenas 0,82% não possuía
instrução ou possuía menos de 1 ano de instrução
11
.
Contudo, percebeu-se uma mudança em relação à geração anterior que é a
entrada das mulheres no mercado, haja vista que as mães das entrevistadas eram
donas de casa, restringindo, portanto, sua sociabilidade ao espaço doméstico ao
passo que as primeiras mesmo que em ocupações de baixo prestígio ou isentas de
direitos sociais demonstraram uma tentativa de emancipação da dependência
financeira em relação aos maridos ou aos familiares, Nos demais registros
referentes à força de trabalho feminina houve uma prevalência do ensino
fundamental incompleto e as ocupações que mais se destacaram foram as de
doméstica, cozinheira e babá.
Entre os homens, percebeu-se em 3 dos 13 casos, que também ocorreu um
aumento da escolaridade em relação aos pais. No caso de Fabiano, 24 anos, ensino
médio incompleto, filho de pais que não freqüentaram a escola; Eduardo, 47 anos,
com ensino fundamental incompleto, filho de pais que também nunca freqüentaram
os bancos escolares e Jackson, 25 anos, o qual conseguiu completar o ensino
médio, ao contrário dos pais que possuíam apenas o ensino fundamental, porém,
incompleto. Entretanto, considerando-se o total dos entrevistados as mudanças
entre as gerações em termos de escolaridade foram pouco expressivos.
A força de trabalho masculina ocupada, em Santa Maria, é constituída por
pessoas que possuem entre 4 e 7 anos de estudo, concentradas, no comércio de
mercadorias, seguido da construção civil. As mulheres, por sua vez, estão inseridas
no setor da prestação de serviços, acompanhado pelo setor social (IBGE, 2000).
11
Os dados são de 2000, ano da realização do último censo demográfico, onde podem ser
encontrados dados relacionados ao perfil dos municípios, trazendo questões como educação,
rendimento, trabalho, entre outros temas. Porém, esses dados não deixam de representar a realidade
do município de Santa Maria, pois são tendências que costumam manter-se no tempo. Além disso, se
utilizarmos como parâmetro os dados mais recentes limitados às regiões metropolitanas, como os
divulgados pelo DIEESE, são comportamentos que obtiveram ganhos positivos em relação ao ano de
2000.
60
A seguir, será apresentado um quadro que compara as diferenças de
remuneração entre homens e mulheres e seu respectivo nível de instrução, de modo
a comprovar que, apesar dos ganhos educacionais da população do sexo feminino,
em Santa Maria, o número de mulheres sem rendimento é expressivo, ainda, no ano
2000. Consideradas as proporções, espera-se que esse comportamento tenha se
alterado, em 2010, mas conforme visto a partir das características dos informantes
que freqüentam o SINE mesmo auferindo algum rendimento são mulheres que
continuam inseridas em condições de trabalho precárias.
Anos de
instrução
Homens Mulheres
Rendimento (%)
Mais
de ½ a
1
salário
mínimo
Mais de
1 a 2
salários
mínimos
Mais de
2 a 3
salários
mínimos
De 3 a 5
salários
mínimos
Mais
de ½ a
1
salário
mínimo
Mais de
1 a 2
salários
mínimos
Mais de
2 a 3
salários
mínimos
De 3 a 5
salários
mínimos
Menos de
1 ano de
instrução
ou sem
instrução
0,66 0,31 0,11 0,16 1,02 0,32 0,13 0,09
Quadro 2. - Diferenças de remuneração entre homens e mulheres e nível de
instrução.
Nota:
1 - Dados da Amostra
2 - Salário mínimo utilizado: R$ 151,00.
3 - A categoria Sem rendimento inclui as pessoas que receberam somente em benefícios.
Fonte: IBGE - Censo Demográfico
É necessário ressaltar que entre a força de trabalho masculina ocupada com
11 a 14 anos de instrução, 2,37% ganhava mais de 5 a 10 salários mínimos, ao
passo que 1,70% não possuía nenhum rendimento. O total de mulheres ocupadas,
em 2000, compreendia 52,95%. A categoria sem rendimento compreendia 23,31%;
7,41% recebia mais de ½ a 1 salário mínimo. As mulheres que recebiam mais de 5
De 1 a 3
anos
0,78% 0,70 0,51 0,48 1,19 0,66 0,27 0,21
De 4 a 7
anos
1,61 2,98 1,84 1,95 3,02 2,27 0,92 0,71
De 8 a 10
anos
0,78 1,61 1,06 1,42 1,19 1,63 0,56 0,56
De 11 a 14 0,33 1,17 0,79 1,69 0,81 1,89 1,08 1,31
De 15 anos
ou mais
0,03 0,07 0,10 0,29 0,09 0,28 0,46 0,91
61
salários a 10 salários mínimos eram aquelas que possuíam 15 anos ou mais de
instrução. Do total de 52,95%, 5,58% estavam nessa situação.
Todavia, a grande maioria insere-se na categoria sem rendimento, 46,60%,
comparado a população masculina que possui somente 12,68% inserido na mesma
categoria. A força de trabalho masculina que recebia de 5 a 10 salários mínimos
somava 13,61%.
Do total de 57,92% da força de trabalho masculina ocupada, em 2000,
18,02% possuía entre 4 e 7 de instrução. Desse total, 1,44% com menos de um ano
de instrução ou não tinha nenhuma instrução; 6,28% possuía 15 anos ou mais de
estudo.
Da população ocupada em Santa Maria com 10 anos ou mais de idade, em
2000, 2,26% possuía menos de um ano de instrução ou era considerada sem
instrução; 6,78% possuía entre 1 e 3 anos de instrução; 28,71% possuía entre 4 e 7
anos de estudo; 20,40% entre 8 e 10 anos de estudo; 26,86% entre 11 e 14 anos de
estudo e 6,28%, 15 anos de estudo ou mais.
Ao tratar da origem da renda das informantes, em 2010, foi possível constatar
que entre as mulheres, ela apresentou-se bastante paritária, pois Luciana, Gabriela,
Maria e Rita, além de suas famílias, mantinham o sustento a partir de recursos
provenientes da inserção no setor informal. Luciana relatou que sua família
constituída por quatro pessoas era mantida pela renda do pai, trabalhador
autônomo, visto que sua mãe, doméstica, estava desempregada. Gabriela, que
mora com cinco irmãos, informou que todos trabalhavam, porém, informalmente,
eles eram basalteiros e a irmã cuidava de doentes no hospital. Maria dependia da
renda do marido, que fazia trabalhos como pintor sem carteira assinada e dos filhos,
um deles é camelô e o outro telemoto. Rita, por sua vez, também dependia da renda
do marido ocupado como pedreiro, visto que os filhos, um de 18 anos e o outro de
15 anos, eram estudantes e não trabalhavam.
Por outro lado, Carla, Lurdes, Dona Isaura, Cláudia, Jaqueline, Dona Cléia,
Luíza e Juliana mantinham seu sustento a partir da renda garantida pela inserção na
formalidade de seus cônjuges, de seus familiares ou mesmo da sua inserção prévia
no mercado de trabalho formal. O marido de Carla, por exemplo, trabalhava como
gari e a sustentava, bem como seus quatro filhos, menores de idade e estudantes.
Dona Lurdes, professora aposentada, e de todos os entrevistados, seguramente, a
que detinha a maior renda, em média, 10 salários mínimos com a qual sustentava
62
também sua filha, menor de idade. Isaura, aposentada e morando sozinha, pagava
suas despesas com o salário mínimo. Cláudia e seu filho, menor de idade,
encontravam-se assistidos pelo marido; militar. Jaqueline que tem três filhos, onde
dois deles trabalhavam como servente de obras, sem carteira assinada, e a filha era
estudante, além de receber o seguro-desemprego, contava com o benefício do
Bolsa-escola recebido pela filha. Dona Cléia, que morava com o neto, estudante de
15 anos, recebia uma ajuda do filho, que não morava com ela e tem outra família,
em troca dos cuidados com o neto. O pai de Luíza trabalhava realizando serviços
gerais, com carteira assinada, sua mãe era dona de casa e seu irmão, menor de
idade era estudante. Juliana e seus irmãos encontravam-se assistidos pela mãe,
doméstica com carteira assinada e o padrasto que recebia, em dia, 3 salários
mínimos. Com em média 4 pessoas por domicílio, essas famílias possuíam uma
renda per capita média de R$ 475,00.
A população masculina, em Santa Maria, encontrava-se protegida pelo
trabalho assalariado, conforme os dados do IBGE (2000), do total de 57,92 % de
ocupados, 36,91% eram empregados; 22,26% com carteira de trabalho assinada.
Militares e funcionários públicos estatutários somavam 7,61%; trabalhadores sem
carteira assinada, 7,03%, empregadores 3,01% e trabalhadores por conta própria
16,98%.
Entre as mulheres, 31,05% trabalhava com carteira assinada, ao passo que
4,43% era empregado sem carteira assinada, seguido de 8% que trabalhava por
conta própria. O grupo constituído por militares e funcionários públicos estatutários
somava 18,49%.
Vislumbra-se, dessa forma, que a formalidade é um traço característico das
relações de trabalho em Santa Maria, tanto entre os homens quanto entre as
mulheres, apesar das atividades encontrarem-se bem definidas entre os sexos, isto
é, o que é “trabalho de mulher” e o que é “trabalho de homem”.
Porém, existe uma insatisfação com os rendimentos auferidos pelo trabalho
considerados insuficientes pelos entrevistados para manter níveis mínimos de bem-
estar. A insatisfação com a renda apareceu de forma mais acentuada entre os
homens não somente pela responsabilidade por manter a casa, mas, sobretudo,
como modo de diferenciar-se do universo feminino, que auxilia nas despesas
quando consegue trabalho, portanto, para a mulher o trabalho é temporário, opcional
e acessório em relação ao trabalho masculino.
63
Além disso, constatou-se com maior clareza na fala das mulheres que a não-
inserção em atividades produtivas e assalariadas contribuiu para reproduzir uma
visão instrumental do trabalho.
As entrevistas elucidaram que os anos dedicados ao trabalho criaram
vínculos sociais no caso de dona Lurdes, ao passo que desorganizaram e
desestruturaram a vida de Luíza e Gabriela. Vale ressaltar que suas falas se
distanciaram em função da passagem mais duradoura ou mais imediata pelo
mercado, mesmo constituindo o estrato mais escolarizado. Lurdes, por exemplo, diz
o seguinte:
É que eu to pensando que eu tenho que fazer alguma coisa, embora eu
saiba fazer algumas coisas, assim, porque eu sou da área das artes, né, e
sempre to fazendo algo, porque parada total eu não to, mas dentro de casa
trancada, por mais que tu saia final de semana e coisa, mas é muito,
assim, eu acho que o contato com as pessoas, isso também é muito
importante pra gente.
Ai, agora, muito ruim, porque de início, tu te aposenta, tu põe toda a tua
vida que tu não tinha tempo de organizar tu organiza e depois chega uma
hora que o tem mais o que fazer, daí tem que trabalhar mesmo. Porque
em casa não é negócio. A gente fica, assim, muito chateada de ficar
dentro de casa (LURDES, 63 ANOS, PÓS-GRADUAÇÃO).
Dessa forma, percebeu-se que foi no trabalho que dona Lurdes criou vínculos
sociais, a falta de trabalho torna-se, portanto, fonte de isolamento e de rotina. Por
isso, que ela decidiu voltar ao mercado, mesmo em atividades de baixo prestígio,
para resgatar o sentido de pertencimento social que somente o trabalho lhe
proporcionou.
Ah, eu imagino, assim, ou dando aula ou com alguma ocupação, assim, pra
eu o ficar parada, eu me sinto assim meio inútil, assim, parada, eu não
gosto. Eu quero ter uma ocupação que seja dentro do que eu possa
corresponder, né, que esteja dentro daquilo que eu aprendi e que eu sei
[pausa], mas a função, assim, eu nem escolheria nenhuma. Eu queria
trabalhar (DONA LURDES, 63 ANOS, PÓS-GRADUAÇÃO).
As outras falas também convergem nesse sentido, pois as atividades restritas
ao espaço da casa, doméstico, não tinham como finalidade criar nenhum tipo de
associação ou de sociabilidade, independente do caráter mercantil ou não mercantil
64
da atividade, pois eram atividades artesanais, como fazer crochê, costurar, ou
mesmo cultivar uma horta.
Luíza, por sua vez, teve um único trabalho de doméstica com carteira
assinada e auferindo um salário. Suas razões e ações encontravam-se motivadas
pela formação educacional. Desse modo, assinalou que:
[...] foi por opção minha mesmo, porque eu assim ó, não era o ruim o
emprego que eu tinha, porque a mulher era uma mãe pra mim sabe.
que eu optei por estudar e a conseqüência disso foi eu perder o meu
emprego.
Agora, eu quero trabalhar e estudar. Parei de trabalhar porque o horário do
serviço não dava certo, não conciliava com meus estudos.
Agora, eu quero arrumar um serviço que seja no turno da noite, porque daí
tem o dia pra estudar.
Eu pretendo, final do ano que vem, eu me formo, o curso leva quatro anos,
mas eu tinha cursado dois anos do curso e eu tive que parar porque eu
não tinha situação financeira pra continuar porque quando eu trabalhava eu
fiz uma ‘poupancinha’ pra tentar o que me mantendo e assegurando [...]
Daí, depois que eu me formar, me aperfeiçoar numa creche, alguma coisa
(LUÍZA, 23 ANOS, MAGISTÉRIO).
Ao mesmo tempo, ao analisar a fala das mulheres acima dos cinqüenta anos
visualizaram-se elementos característicos do trabalho como aquele que desorganiza
e debilita a identidade dos indivíduos. Especialmente nesse tipo humano constatou-
se um desgaste social onde elas relataram que foram objeto de preconceito - a
falta de planejamento em relação à experiência futura e a tendência a justificar a
busca ou permanência em determinadas ocupações a traços de caráter pessoal ou
social.
Dona Maria enfatiza em sua fala a falta de oportunidades de trabalho para as
pessoas com mais de 40 anos, apesar da inserção desse grupo etário em muitos
espaços sociais e produtivos, na atualidade. Segundo ela:
Olha, por enquanto, eu to no seguro-desemprego, mas daqui pra frente não
trabalho é difícil porque a idade da gente [...] eu tive aqui antes e me
disseram que depois dos 40 anos, dos 50 anos é muito difícil e eu fui bem
mal educada com ele [um rapaz que também estava a procura de trabalho]
e falei, então, os velhos tem que se “mata” porque não querem mais as
pessoas de idade? [...] como é que o pessoal de idade vai sobreviver?
(DONA MARIA, 55 ANOS, ENSINO FUNDAMENTAL INCOMPLETO)
65
Além disso, ressaltou que: “Daqui a cinco anos, eu quero estar aposentada,
se deus quiser. Já trabalhei bastante”.
Outro aspecto pertinente pode ser exemplificado através do relato de dona
Rita, de 66 anos. Tal informante possuía ensino fundamental incompleto e seu
último trabalho foi como doméstica, sem carteira assinada, onde ficou um ano.
Paralelamente ao último emprego, decidiu vender “lingeries” para aumentar a renda,
mas assumiu que não se adaptou a esse tipo de trabalho.
[...] eu sou mais da área da limpeza, porque eu não tenho muita prática, por
isso, que eu não vendo muito. Isso aí, é pra quem tem bastante prática,
que conversa mais com as pessoas, . Eu sou mais quieta, eu prefiro a
área da limpeza, eu me identifico melhor.
Eu acho que é o grau de escolaridade, o curso de informática que eu não
tenho, né, por isso, que eu procuro mais na área da limpeza, (DONA
RITA, 66 ANOS, ENSINO FUNDAMENTAL INCOMPLETO).
Seu primeiro trabalho foi em uma casa de família, de doméstica, sem carteira
assinada, com ganhos de um salário mínimo, onde ficou um ano e foi demitida,
porque a senhora para a qual trabalhava vivia de renda e faltaram recursos para
pagar a empregada. Após isso, conseguiu um emprego com carteira assinada em
uma loja, meio turno, onde ficou seis meses, mas pediu para sair em função de
desentendimentos com a chefe.
Todos os empregos aos quais se referiu foram narrados em termos de
sacrifícios, muita carga de serviço e que “não valiam à pena”. Para ela, o serviço de
doméstica era o que mais correspondia às suas características pessoais, afinal, se
considera mais introspectiva, mais quieta; falta de simpatia e espontaneidade que
justificavam os maus negócios na venda de “lingeries”.
O serviço que eu sei fazer, de doméstica, de limpar, de camareira, o que
vir, eu to pegando. Eu trabalho o dia inteiro. Se for de manhã, é só de
manhã, se for de tarde é só de tarde. Pra mim não tem horário.
[...] na mesma área de doméstica, acho que é isso que eu me identifico
melhor, é o que eu dou mais certo (DONA RITA, 66 ANOS, ENSINO
FUNDAMENTAL INCOMPLETO)
66
Em Santa Maria, em 2000, segundo dados do último censo demográfico,
existiam 4.664 pessoas com 60 anos ou mais de idade. Desse total, 1.579
encontravam-se desempregados e 843 empregados com carteira assinada.
Entre a população com 60 anos ou mais de idade, no município, naquele
período, 552 pessoas eram empregados sem carteira de trabalho assinada, 384,
empregadores, 2.119 trabalhadores por conta própria, 111 trabalhadores não
remunerados em ajuda a membro do domicílio e 461 trabalhadores na produção
para o próprio consumo.
Destaca-se, também, que do grupo de idade compreendido por pessoas com
60 anos ou mais, em 2000, 8,67%, encontrava-se ocupado. As pessoas
aposentadas, naquele período, somavam, 26.126 do total de 177.186 (IBGE, 2000).
Nesse sentido, percebeu-se que o mercado de trabalho formal constituiu uma
alternativa possível apenas para uma reduzida parcela dessa população que
encontrou como “refúgio” o desempenho de atividades autônomas.
O ponto comum a todas essas trajetórias que retratam, objetivamente, a
situação de pessoas com uma formação precária e que não conseguem sua
inserção no mercado de trabalho (e tem parcialmente consciência disso), consiste
no fato de que conservaram o sentimento de um mundo que não tem lugar para
elas. Para isso, na continuidade de suas vidas procuraram construir certos
elementos de estabilidade nas rotinas de sobrevivência bem sustentadas pelo
improviso. A atitude de improvização denotou a combinação de criatividade e
resignação frente ao mundo indeterminado e, ainda, mais inseguro, relativamente ao
seu lugar no mundo do trabalho.
As questões moral e política ressurgiram na atitude das pessoas assumirem
para si a responsabilidade pelas condições precárias que apresentam para
concorrer a um lugar no mercado de trabalho. Entretanto, para esses indivíduos
excluídos por fatores estruturais, a experiência subjetiva do trabalho demonstrou-se
uma experiência de passagem, de transição, porque era, antes de tudo, um mundo
ordenado que os tratou na forma correspondente para que se sentissem assim.
No entanto, a narrativa de dona Lurdes, a qual foi citada em linhas
anteriores, encontrou-se dotada da experiência concreta mais sólida com o trabalho,
pois seus 34 anos de vida profissional foram dedicados, integralmente, a profissão
de professora da rede estadual e particular. Agora, aos 63 anos, encontra-se
67
aposentada, mas busca sua reinserção em uma atividade produtiva. Filha de pai
militar e mãe dona de casa, dona Lurdes ressaltou em sua narrativa a formação
educacional como condição fundamental para ocupar as melhores posições no
mercado de trabalho; posições sólidas, estáveis, que permitissem pensar e planejar
o futuro.
Olha, os meus pais eram de uma época em que estuda não era tão
importante, que era mais a prática, assim, de alguma profissão, do que tu
entra em uma universidade e se formar em alguma coisa, bem o contrário
de, hoje, , que se tu não se preparar tu o tem uma oportunidade,
mesmo.
Algumas pessoas não estão preparadas naquilo que querem desempenhar
[...] claro, que é lógico, que quando tu vai procura, tu não tem nenhuma
formação, não consegue mesmo. Eu acho que as pessoas têm que
estudar, se preparar, profissionalmente, para quando procurar um serviço
estar, ali, à altura (DONA LURDES, 63 ANOS, PÓS-GRADUAÇÃO)
Por essa razão, o trabalho apresentou para ela a mesma solidez e
durabilidade que os laços que a uniam a família. Ambas as instituições são
imprescindíveis, segundo ela, para o desenvolvimento do ser humano, que
compreendem uma relação de ajuda e compromisso mútuo, onde se desempenha
uma tarefa que está sendo útil para alguém “[...] porque se tu tem trabalho, tu sai pra
trabalhar tem um retorno, a parte lucrativa, mas eu acho que, assim, o mais
importante, é tu ter uma ocupação, tu saber que está fazendo uma tarefa que está
sendo útil pra alguém” (DONA LURDES, 63 ANOS, PÓS-GRADUAÇÃO).
Outro aspecto ressaltado pela informante referiu-se à possibilidade de
convivência interpessoal por meio do ambiente do trabalho, enfatizando aspectos
como a dimensão informacional, “[...] não ficar desligada das coisas” e a dimensão
temporal “[...] eu gosto de trabalhar com gente jovem porque tu fica meio renovada
vivendo neste meio [...]”.
Eu procuro serviço porque eu gostaria muito de ter uma atividade,
novamente, mas a minha situação é vista de outra maneira, com outro
olhar, porque eu já tenho o meu ordenado, eu já tenho o que eu conquistei.
Então, agora, é mais uma situação de não ficar desligada das coisas,
porque tu trabalhando tu convive com as pessoas, tu aprende no dia a dia,
tu fica sabendo o que está acontecendo [pausa] eu sempre gostei de estar
envolvida com as pessoas (DONA LURDES, 63 ANOS, PÓS-
GRADUAÇÃO).
68
Na sua narrativa, as conquistas financeiras que adquiriu depois de uma vida
inteira dedicada ao trabalho a permitiram pensar a vida de aposentada de outra
forma, “com outro olhar”, elegendo outras experiências significativas como a
possibilidade de reorganizar seu tempo, encontrar um trabalho de meio turno e sair
da rotina.
Então, manter-se em contato com as pessoas e sentir-se útil estava entre a
perspectiva de alguém que visualizava a sua trajetória com um sentido de “dever
cumprido”. Cabe destacar que Dona Lurdes priorizou em toda a sua fala o fato de
suas conquistas terem sido fruto de muito estudo e empenho, começou cedo dando
aulas na educação de jovens e adultos, enquanto freqüentava a faculdade e passou
em um concurso, pois não acreditava “nessas coisas de indicação”.
A narrativa de Dona Lurdes constituiu o achado mais relevante do estudo. A
sua fala e a análise da sua situação objetiva no mercado de trabalho permitiu, em
primeiro lugar, constatar que a dimensão instrumental não é a única forma possível
de experiência com o trabalho. Ora, dona Lurdes possui uma situação financeira
estável, recebia um salário que garantia não seu sustento como de sua filha e,
mesmo diante desse fato, quis retornar ao mercado de trabalho. Conforme vimos, o
motivo de seu retorno foi outro, distinto dos motivos elencados pelos demais
informantes. A dimensão social do trabalho assumiu na sua fala um valor
inestimável.
O caso de Gabriela, 47 anos, apresentou-se distinto com relação à
experiência da dona Lurdes, mas, igualmente, importante porque apesar da
trajetória precária que detinha, as ocupações que teve, embora informais, foram
descritas pela informante com a mesma relevância que o trabalho assalariado
assumiu na fala anterior. Com ensino médio completo, Gabriela, no momento da
entrevista, trabalhava cuidando de doentes no hospital, no turno da noite e fazendo
lanche em um posto de gasolina no turno da manhã. Fazia dois meses que ela
dedicava-se a esse último trabalho. Descreve sua trajetória da seguinte forma,
[...] me criei trabalhando em loja de turco, trabalhava meio período, porque
estudava de manhã e trabalhava de tarde. Não era com carteira assinada,
mas já era um conhecimento a mais e um ganho a mais. Que daí, eu fiz um
cursinho no SENAC de vendedor lojista e o cursinho te encaminhava para
o emprego [...]. Aí, então foi assim, trabalhei muito no comércio, daí
69
fiquei um tempo fora, saí daqui fui pra Porto Alegre, também, trabalhei em
comércio, trabalhei em residência, trabalhei de babá, assim. Aí, depois,
voltei pra Santa Maria, trabalhei em residência, cuidei de idoso, cuidei de
dois idosos até que acabou a história, né, e, depois, fiquei um tempo
trabalhando em residência, depois, saí de e fui pra outra residência, e é
assim, é tudo versátil, faz uma coisa, faz outra sabe (GABRIELA, 47
ANOS, ENSINO MÉDIO COMPLETO).
Quando interrogada sobre a importância do trabalho em sua vida ela referiu-
se a essas ocupações precárias que teve, como responsáveis pelo sentido de
dignidade e realização cotidiana Tudo, trabalho é tudo, é realização, é tudo, tudo, é
realização, porque se tu não tem trabalho os dias são todos iguais, pra mim o
trabalho é tudo, dignifica a gente, entende?” (GABRIELA, 47 ANOS, ENSINO
MÉDIO COMPLETO).
Esse senso de dignidade também apareceu na fala de dona Isaura, 65 anos,
ensino fundamental incompleto. Aposentada quatro anos, procurava
incessantemente uma ocupação, visto que seu sustento dependia disso. Filha de pai
agricultor e mãe dona de casa, que não freqüentaram a escola, ela também não teve
a oportunidades de concluir os estudos.
Ao construir sua narrativa, entretanto, a idade constituiu o fator determinante
a solapar suas chances de reinserção ocupacional.
Agora, as pessoas já não querem, acham que eu não faço nada. Não tenho
medo de nenhuma guria nova, eu conheço tudo que é serviço e faço bem
feito. Sou caprichosa. Sempre continuei trabalhando. [...] eu não tenho
medo de trabalhar. Me criei fora fazendo tudo que é serviço. Sempre
trabalhei (DONA ISAURA, 65 ANOS, ENSINO FUNDAMENTAL
INCOMPLETO).
Após a sua aposentadoria, dona Isaura continuou trabalhando em casas de
família e, nos momentos de desemprego, refugiava-se em sua casa fazendo crochê,
corte e costura, tudo que podia para auxiliar nas despesas da casa. Durante a
entrevista, percebeu-se, em alguns momentos, que a instabilidade e as mudanças
de emprego constituíam quase que uma promoção de si, “[...] tudo que é serviço eu
faço. Faço tudo que é serviço, não tenho medo. Sempre cozinhei. Trabalhei pra
diversos, pra médico, pra doutor, pra tudo. Nunca reclamaram da comida, também”.
Essa característica merece destaque uma vez que surgiu em apenas um
discurso de forma explícita, mas trouxe um aspecto presente em todas as falas, de
70
uma forma ou de outra, que corresponde à importância do saber-fazer, da
experiência acumulada no decorrer da vida, nos muitos e diferentes trabalhos
precários e que adquiriu uma relevância simbólica extremamente significativa na
vivência desses indivíduos, apesar de desvalorizado socialmente e não acrescentar
ou valorizar em nada a estrutura de oportunidades desses sujeitos. Esse saber-fazer
criou uma espécie de emponderamento entre eles, explícito na fala de um dos
informantes “[...] eu não me considero um desempregado porque eu tenho os meios”
(referindo-se a experiência adquirida com os anos de dedicação a atividade de
pintor).
Voltando a fala de Dona Isaura, num ponto adiante da entrevista ela
completou “A importância é ser honesta e tudo. Honesta, eu sempre fui. O trabalho é
bom porque tu se distrai e fazendo o que tu gosta, eu gosto de trabalhar. Gosto de
cozinhar, gosto de fazer faxina.
Porém, também concluiu “É o trabalho que consegui, não tive estudo. Hoje
em dia, quando não tem estudo pra lavar chão mesmo, me arrependo porque eu
não estudei”. O retorno ao mercado de trabalho representaria, por conseguinte, uma
possibilidade de aumentar sua renda, mas não faz nenhum plano a longo prazo
“Não sei, não sei. Não posso fazer nenhum plano.”
Nas falas das entrevistadas mais jovens foi possível perceber que faziam
projeções em relação às experiências que tiveram. Luíza, que faz magistério, pensa
em se formar e trabalhar em uma creche, Carla, pretendia trabalhar de vigilante, pois
fez o curso com o que conseguiu poupar em seus trabalhos e Luciana, 18 anos,
também procurava outro tipo de emprego porque “não adianta trabalhar muito para
ganhar pouco, né”, à medida que fez cursos de empacotadora de caixa e curso de
informática porque gostava de trabalhar com o público, de estar envolvida com as
pessoas.
Carla, 26 anos, ensino fundamental incompleto, desempregada um ano é
marcada por uma trajetória de trabalhos com baixos salários e que demandavam
pouca qualificação, onde o tempo de permanência nessas ocupações não
ultrapassou 4 anos. Seu último emprego foi como doméstica, com carteira assinada,
em uma empresa privada de Santa Maria. Durante sua vida profissional, trabalhou
como servente em uma firma de limpeza, em Porto Alegre, e como doméstica,
diarista, sem carteira assinada, no trabalho anterior a esse. Os ganhos auferidos
nesses trabalhos nunca ultrapassaram o salário mínimo. O curso de vigilante que fez
71
com os recursos poupados com grande esforço, segundo ela, representava a
esperança de progredir na vida, em uma ocupação com maior status” e,
principalmente, com maior renda.
Eu trabalhei em Porto Alegre como servente de uma firma de limpeza, daí
eu trabalhava no mercado, nessas lojas de vender carro, essas ‘firma’,
escritórios, assim, para fazer limpeza. Trabalhei como doméstica, como
diarista e, daí, fiz o curso de vigilante pra ver se eu pegava como vigilante,
mas daí pedem experiência É difícil, geralmente, nunca tem, (CARLA,
26 ANOS, ENSINO FUNDAMENTAL INCOMPLETO).
No entanto, fazer o curso não significou a conquista imediata de emprego.
Daí se seguiu um ano à procura de emprego, onde o auxílio da mãe foi fundamental
para a aquisição de serviços esporádicos como diarista.
Ao referenciar um dos empregos que teve, Carla salientou o que mais lhe
incomodava nesses trabalhos; a falta de rotina.
Da firma eu saí porque me mudei pra Santa Maria, eu vim pra cá, daí eu
saí, e de doméstica eles eram muito relaxados e eles não queriam uma
empregada, eles queriam uma escrava, não tinha hora pra entrar e nem
pra sair e daí como eu tenho filho, né, [pausa] o tem como e na firma tu
cumpre o horário ali, fez teu horário e vai embora.
Pra mim, que tenho filho é muito importante, né, se eu não trabalhar fico
estressada, acostumada a sair [...] acostumada àquela rotina, né, acostuma
a levantar cedo pra trabalhar, pra mim é muito importante, até pelo
sustento da família, (CARLA, 26 ANOS, ENSINO FUNDAMENTAL
INCOMPLETO).
A entrevistada relatou que os compromissos com a família consistiam o
principal incentivo para buscar sua colocação no mercado de trabalho, as despesas
eram muitas, manter o filho no colégio e dar-lhe a assistência necessária era o que
lhe movia em busca de “qualquer trabalho”, mas, enquanto isso, como não gostava
de ficar “parada”, fazia bolo, fazia pão a fim de aumentar sua renda.
A formalidade aparece em seu discurso como sinônimo de seguridade, de
garantias sociais, sentir-se amparada frente a uma demissão.
Na firma, eu gosto de trabalhar porque uma, tu tem direitos, se um dia eles
te colocarem pra rua ou tu sair, tem direitos e de doméstica tu não tem
direito nenhum, né, tu sai com uma mão na frente e a outra atrás (CARLA,
26 ANOS, ENSINO FUNDAMENTAL INCOMPLETO)
72
Luciana, com 18 anos, revelou em seu discurso as conseqüências da
precariedade da sua experiência concreta com o trabalho no imaginário que
construiu acerca desse como atividade e referência para pensar e estruturar sua
vida. Com ensino fundamental incompleto e tempo de desemprego de um ano,
trabalhava desde os treze anos como babá, com a jornada de meio turno e auferindo
uma renda de meio salário.
Agora, aos 18 anos, conseguiu um trabalho, também em meio período na
lancheria de uma escola, onde ficou durante três meses. Por isso, Luciana, ainda,
não gozou da experiência proporcionada pela formalidade.
Quando interrogada sobre o que estava fazendo no momento da entrevista e
durante o tempo em que estava desempregada Luciana respondeu que divide a sua
rotina entre procurar serviços e realizar as tarefas domésticas.
Eu tenho ficado em casa, agora. Eu saio, assim, se eu tenho que ir em tal
lugar que tenha um serviço eu vou lá, mas nem sempre certo por causa
que a gente trabalhar em bairro, geralmente, porque as pessoas são de
perto de casa e eles pagam menos, porque não adianta trabalhar para
receber pouco, né [...] (LUCIANA, 18 ANOS, ENSINO FUNDAMENTAL
INCOMPLETO).
De todo modo, Luciana aparentou na sua fala certo cansaço de tanta
instabilidade. Esses trabalhos “não lhe renderam nada, representaram apenas a
possibilidade de auxiliar nas despesas da casa. Luciana morava com os pais e um
irmão, menor de idade, com 11 anos, estudante. O pai, 43 anos, trabalhava como
autônomo em negócio de chapeamento enquanto a mãe era doméstica, embora
desempregada; ambos com ensino fundamental incompleto. No momento, a renda
da família se resumia a do pai, em média 800,00 reais, pois a irmã mais velha de
Luciana, que trabalhava em uma empresa de telefonia, com carteira assinada, não
morava com eles.
Agora, pensava em concluir os estudos e, com isso, encontrar um trabalho
que, realmente, valorizasse.
Eu fiz trabalho de doméstica, mas eu procuro outras coisas, eu tenho
curso de operadora e empacotadora de caixa, eu fiz no ano de 2008, e
curso de informática, este ano.
73
Eu não tenho muitas exigências, eu, geralmente, o que eu mais gosto é
lidar com o público, com pessoas, eu tenho que mexer com pessoas, essas
coisas, com comércio, ou mercado, é o que eu gosto, mas como a gente
tem pouca chance por causa do estudo, porque eu tenho o primeiro
grau, que incompleto (LUCIANA, 18 ANOS, ENSINO
FUNDAMENTAL INCOMPLETO).
Consequentemente, percebeu-se que para essa gente excluída e jogando a
sorte no mundo do subemprego (e é emblemático o trabalho de doméstica), o
trabalho é um meio para um fim efetivamente, mas, em boa medida, elas têm um
diagnóstico das suas limitações no contexto: “... essas coisas de comércio eu
gosto..., mas como a gente tem pouca chance por causa do estudo, porque eu
tenho o primeiro grau...”. Nesse sentido, elas sentiram e contaram de como a
instabilidade do mercado de trabalho as atingiu. Contudo, eram visíveis os
questionamentos morais produzidos: “Eu gosto de trabalhar porque tu tem direitos”.
Dito de outra forma, o trabalho era, para essas mulheres, meio para um fim, ao
mesmo tempo em que, excluídas, situam-se na realidade instável do trabalho com
base em pressupostos morais básicos, porque mínimos, que auxiliaram no seu
entendimento e ação no contexto do mercado de trabalho.
Em relação aos homens, as mulheres entrevistadas eram menos
escolarizadas, 9 dos 12 casos possuíam ensino fundamental incompleto, ao passo
que, entre os homens, 7 dos 13 entrevistados possuíam ensino médio completo ou
incompleto e um, ensino superior completo.
Todavia, isso não resultou na piora das condições de trabalho dessas, uma
vez que 9 das 12 entrevistadas tiveram experiência de trabalho anterior no setor
formal.
No caso dos homens, o setor informal também ocupou uma posição relevante
na origem da renda no período do desemprego. Jackson vivia da renda que recebe
dos trabalhos esporádicos como pintor que realiza com o pai. Rafael contava com o
auxílio do afilhado, de 15 anos, que trabalhava informal na construção civil; João
dependia da renda da mulher que trabalhava como manicure; Pedro, da renda
proveniente da construção civil e da modalidade de trabalho “por tarefas” e Fabiano
do auxílio do pai carpinteiro e da mãe doméstica.
Nos relatos dos entrevistados, o trabalho adquiriu uma importância
estritamente instrumental e, além disso, percebeu-se um retorno a instituição
familiar, pois foi nesse âmbito que eles construíram suas relações de sociabilidade e
74
reproduziram seus papéis como provedores. Em quase a totalidade das falas, a
dimensão econômica do trabalho prevaleceu e apenas em duas delas o trabalho
aparece ora como mecanismo de reconhecimento social e ora como potencializador
de ascensão social.
Isso pode ser constatado na fala de Jackson, por exemplo, que disse: “[...]
hoje em dia, não dá pra escolher uma profissão, né. A primeira chance que aparecer
tem que pegar” e também na de Marcos “Ah, agora, a prioridade é comprar as
coisas pro meu filho. Com o dinheiro do seguro e tal que eu tava recebendo; Agora,
no momento acabou e daí [...] Bah [o trabalho] é tudo, né, porque desde os dezoito
eu venho trabalhando, desde a maioridade, assim né, sempre trabalhei, é difícil ficar
desempregado, assim, né”; e, por fim, no relato de Fabiano “O [trabalho] de porteiro
até que eu gostava, assim, o que me deixava chateado com o emprego era o
salário, o funcionário quando não é bem remunerado não trabalha bem. Digamos,
trabalha por obrigação daquele dinheirinho no final do mês, agora, quando tu é bem
remunerado sai com ânimo pra trabalha, eu gostava, até pra economizar eu ia de
bicicleta pra trabalhar no posto”.
Fabiano explicitou de forma muito objetiva o indivíduo que tem o trabalho
como uma experiência estritamente instrumental, na forma do ganho financeiro que
o trabalho proporciona para a realização de um outro fim. No quadro mental que
apresentou, visualizou-se uma hierarquia de interesses: a satisfação do trabalho em
si tornou-se secundária relativamente à remuneração. Essa pré-disposição de
Fabiano para interpretar o trabalho nessas bases mostrou-se inseparável de sua
trajetória em uma ordem econômica precária em que sempre esteve em situações
desfavoráveis de escolha. Nesse caso, o trabalho informal guardou o pior dos
significados para o sujeito, a ponto de favorecer uma hierarquia de motivos, com
ênfase em uma visão instrumental.
As razões que os entrevistados acionaram para justificar a procura por
trabalho relacionaram-se a necessidade, quase que urgente, de manter os
compromissos com a família. Isso pode ser identificado em diversos relatos como o
de João, de Mário e de Daniel:
Pra mim, significa tudo, tudo que eu o posso ter, né, a minha
preocupação maior é a estabilidade familiar, que a esposa, ela tem uma
renda variável, o é carteira assinada, eu me preocupo com isso,
75
justamente, pra estabilidade da minha família. Então, estar desempregado
pra mim é sinônimo de preocupação, preocupação familiar (JOÃO, 45
ANOS, ENSINO MÉDIO COMPLETO).
Olha, a importância que tem é que trabalho pra manter os filhos, né, é essa
que é a importância, que o futuro o cara trabalhando mesmo pra fica rico,
não fica. Então, é só a família (MÁRIO, 47 ANOS, ENSINO
FUNDAMENTAL INCOMPLETO).
Eu acho que quem empregado, assim com a base feita pra ti constitui
uma família e pra ti adquirir teus bens [...] tem pessoas que se “intorvém
na vida da gente, diz bah! O fulano passa sentado, não faz nada, é um
vagabundo, depende do pai e da mãe [...] (DANIEL, 31 ANOS, ENSINO
FUNDAMENTAL INCOMPLETO)
É importante ressaltar que na fala de Daniel apareceu também a preocupação
diante do olhar do “outro” de reprovação social por ainda morar com o pai e a irmã e
depender da assistência financeira desses. Veja, portanto, que constituir família e ter
a condição de mantê-la constituiu a real realização de êxito para os entrevistados e
não a mobilidade vinculada ao “status” da ocupação ou o melhor retorno financeiro
da mesma.
Daniel ponderou, ainda, sobre como a vida social depende,
fundamentalmente, do trabalho “A gente quer ter uma vida boa, uma vida melhor [...]
todas as pessoas adquirindo bens, saindo, se divertindo e a gente fica em casa
sem dinheiro. Eu tenho vergonha de pedir pro meu pai e para a minha irmã, fico
constrangido, sabe de pedir dinheiro emprestado pra eles, daí fica aquela coisa, né”.
Por conta disso, a dependência apresentou se como um mal, ou seja, sinalizava,
duplamente, o fracasso pessoal e social.
Agora, tomemos como exemplo o caso de Alberto e Pedro. Alberto, 47 anos,
formado em direito e atuando como advogado, e Pedro com a mesma idade de
Alberto, porém, com menor escolaridade, ensino fundamental incompleto.
Alberto relatou que estava desempregado um ano, pois foi demitido, e,
nesse tempo, passou a exercer a advocacia atendendo em média de dois a três
clientes durante o mês. Começou trabalhando no comércio de Santa Maria, mas a
baixa remuneração o forçou a buscar uma alternativa que, no seu caso, foi cursar a
faculdade de direito. Antes disso, porém, vinculou-se a variadas ocupações, em uma
oficina mecânica, no comércio como vendedor lojista, em hotel como recepcionista,
tendo, por isso, que mobilizar ou adquirir novas qualificações na mudança de um
emprego para outro.
76
A sua preocupação, no momento da entrevista, baseava-se mais em ocupar o
tempo, pois ele mesmo havia reclamado dos baixos salários ganhos no comércio
e deixa claro isso:
Eu trabalho na minha área como advogado e eu to buscando um emprego
diferente, porque eu o tenho uma ocupação efetiva, todos os dias, certa.
Tenho um, dois, três clientes ao mês, me ocupa pouca carga horária e me
torno ocioso durante o resto do tempo (ALBERTO, 47 ANOS,
GRADUADO).
Pedro encontrava-se desempregado seis meses e seu último emprego foi
como carpinteiro, onde trabalhou durante quatro meses. Seu primeiro emprego foi
como servente de obra em uma firma de esgoto de São Paulo, com carteira
assinada, onde permaneceu durante um ano e sete meses, até terminar as obras.
Nessa oportunidade, foi convidado para trabalhar com a firma em São Paulo, mas
não quis abandonar a família, referindo-se a seus pais.
Depois, foi trabalhar em uma firma de construção, com carteira assinada,
onde ficou quatro anos trabalhando de carpinteiro e, posteriormente, foi colocado
como mestre de obra recebendo um acréscimo de 200 reais a mais no seu salário.
Contudo, saiu do emprego porque considerou o salário era insuficiente.
Agora, decidiu trabalhar por tarefa
12
, modalidade de trabalho que na sua visão
apresenta mais vantagens, do ponto de vista financeiro.
Eu to vendo se consigo pegar por tarefa. Eles assinam a carteira, fundo de
garantia eles dão por fora, mas eu não tenho direito a férias, décimo, essas
coisas, mas todas as empresas estão fazendo, assim. Não te dão salário
fixo, entendeu. Que nem no outro emprego, eles pagavam R$ 680,00. Tu
vai sustenta uma família com 680 pila? Não. E esse pessoal que paga luz e
aluguel?. o tem condições (PEDRO, 47 ANOS, ENSINO
FUNDAMENTAL INCOMPLETO).
Pedro encontrava-se confiante em conseguir uma ocupação e o fato de não
ter encontrado, ainda, encontrava-se sustentado apenas pela razão de que queria
uma “coisa melhor”.
12
Trabalhar por tarefa é uma modalidade de trabalho onde aquele que assume o serviço em uma
obra, na construção civil, por exemplo, se responsabiliza por desenvolver o serviço em um prazo
determinado, porém, quem demanda o serviço não assume todos os compromissos de uma relação
de trabalho assalariada. É mais vantajoso porque se reduzem os encargos e, ao mesmo tempo,
aumenta-se a renda de quem realiza o trabalho.
77
O emprego em Santa Maria a partir do negócio de obra muito bom. Em
83, enquanto tinha três “vaga” lá, tinha trezentas, aqui, no SINE. Agora,
qualquer esquina tem obra e eles te colocam, entendeu. Eu to
desempregado por causa que eu quero uma coisa melhor, por isso, que eu
to. Senão, eu tinha saído lá da outra, tinha ido para Júlio de Castilhos, tinha
carpintaria lá. o salário é pouco R$ 630,00. Por esse valor, não tem.
Nem 25% eles pagavam a mais, todas as empresas pagam 25% para se
deslocar de uma cidade para outra e eles não queriam pagar, (PEDRO,
47 ANOS, ENSINO FUNDAMENTAL INCOMPLETO).
A reprovação da família, o desgaste da sua figura como pai provedor, a
imagem diante dos filhos era o que mais lhe apavorava ao narrar sua experiência
Bah! É um ‘troço’ meio complicado, levanta cedo, é que eu tenho vergonha de
pegar meus filhos, tenho vergonha de pegar, ultimamente, e senta na frente,
entendeu?”.
Nesse sentido, aproveitava o tempo de desemprego para se dedicar a outras
atividades como a venda de roupas e calçados, desde 1997. Sempre que sai dos
empregos ele reservava um capital para investir nesse negócio. Nessa perspectiva,
o período de desemprego era utilizado sempre de forma produtiva, através de
atividades autônomas, apesar de pouco lucrativas.
Planejar e pensar na experiência a longo prazo somente apareceu nas falas
de entrevistados mais jovens como Anderson, por exemplo, que disse “Esse ano
[final de 2009] eu vou pra Santa Catarina, é bem mais fácil, tem mais emprego, a
renda é maior. As empresas pagam até 65% da faculdade. Profissionalmente, eu
pretendo ter um bom salário em um lugar que eu goste de trabalhar. Eu quero cursar
a faculdade de direito.”
Em contrapartida, João com 45 anos e desempregado 4 meses resumiu
seus planos a próxima entrevista Não me imagino, porque eu o sei o que vai
acontecer comigo, então, eu to pensando só no dia de hoje, vim buscar uma vaga de
emprego, me encaminharam, vou fazer uma entrevista”.
De tal modo, as distintas narrativas ao mesmo tempo em que demonstraram
um desgaste das relações sociais regidas pela racionalidade do trabalho assalariado
também assinalaram que os sujeitos realizaram um diagnóstico das suas limitações
no contexto.
Entretanto, a narrativa assumiu funções distintas entre os diferentes
entrevistados. Ora o discurso acionado tomou a função de resignação, isto é, gerou
78
entre os sujeitos um sentido de conformidade diante de suas limitações e ora tomou
a função de emponderamento, ou seja, a capacidade de realizar diversas ocupações
e tarefas foi ressaltada como uma qualidade ou característica necessária nos
tempos de hoje, onde encontrar um trabalho deixou de ser um meio de realização da
satisfação pessoal e de distinção social.
Na maioria das entrevistas, à exceção dos casos de Dona Lurdes, Gabriela e
Dona Rita, as trajetórias denotaram transição, tentativas, abandonos e reinícios na
vida dos desempregados. A experiência do trabalho faz parte de suas trajetórias
amplas de vida, mas como uma experiência significativa. Difícil dizer se
determinante de todas as escolhas outras da vida, mas foi um dado que tem uma
implicação para além do significado econômico estrito. Individualmente
responsáveis, parcialmente responsáveis, as avaliações dos fatores que geraram
suas situações diluíram-se e agregaram mais elementos, mas tudo isso enquadrou-
se em uma dinâmica que racionalizavam: o tempo não pode parar e eles precisam
continuar a responder aos desafios da subsistência.
3.3 Que mudanças objetivas podem ser atribuídas ao Sine nas trajetórias dos
desempregados?
Conforme visualizou-se nos capítulos anteriores, a precarização dos postos
de trabalho ou a inserção dos indivíduos no mercado informal contribuiu para
criar uma fraca identificação com o trabalho. Essa situação confirmou-se em Santa
Maria entre as pessoas que participaram da pesquisa, pois os anos dedicados às
atividades informais e a instabilidade dos empregos formais foram determinantes
para tornar a busca por emprego uma ação necessária à sobrevivência, mas
destituída de recompensas a longo prazo.
Por conseguinte, neste momento do texto, procurou-se analisar as mudanças
concretas nas experiências de trabalho dos indivíduos que procuraram o serviço de
intermediação do SINE. Destacando características como a idade, a trajetória pelo
mercado de trabalho e o grau de instrução, buscou-se apreender se os
trabalhadores desempregados conseguiram ou não empregos e se essas
ocupações foram importantes para sua construção identitária e inserção social.
79
Do total de 25 entrevistados, 9 conseguiram emprego pelo SINE. Em
contrapartida, somente Jackson realizou um curso de pintura através do Sine, mas
não conseguiu emprego assalariado nessa função.
Embora constatada a presença crescente de mulheres a procura de emprego,
emancipando-se, apesar de parcialmente, do ambiente doméstico, a inserção
permaneceu precária e em ocupações socialmente aceitas como femininas,
geralmente, domésticas. Do mesmo modo, os homens aparecem em funções
distintamente masculinas, na construção civil ou realizando serviços gerais.
Freqüentar o SINE a mais ou menos tempo não implicou o melhor
desempenho na procura por emprego ou ganhos em termos de empregabilidade,
pois conforme assinalado, anteriormente, somente um conseguiu emprego por essa
via, conquanto conhecesse o SINE bastante tempo. Paralelamente, a realização
de cursos não representou o êxito imediato na inserção em atividades produtivas e
assalariadas.
É necessário ressaltar, contudo, que a inserção de homens e mulheres deu-
se em função das experiências prévias que tiveram pelo mercado de trabalho.
Portanto, eles conseguiram tais vagas de emprego porque possuíam a qualificação
necessária para isso e o SINE preencheu a função de estabelecer esse contato
entre empregador e potencial empregado, haja vista que a efetivação do contrato e a
permanência no emprego foge a qualquer responsabilidade por parte do SINE.
O que se está teorizando, porém, é que qualquer aspiração de ascensão ou
mudanças ocupacionais elas, sim, não encontram respaldo em qualquer instituição
de natureza pública no município. A trajetória de Carla, 26 anos, ensino fundamental
incompleto e desempregada um ano, por exemplo, tal como descrita em
momentos anteriores desse texto, foi colocada em termos de precariedade, gozando
de instabilidade nos empregos e baixos salários. Ao descrever como conheceu o
SINE, a entrevistada salienta que há, aproximadamente, sete anos conhece o local,
mas durante esse período, ainda, não conseguiu emprego por essa via. Nesse
espaço de tempo, conseguiu outros empregos por intermédio da e e fez cursos
recursos próprios. Realizou um curso de vigilante e, por isso, procurava um emprego
nessa área.
Dona Cléia, 58 anos, ensino fundamental incompleto, também não conseguiu
vaga pelo SINE e não fez cursos por essa via. Os encaminhamentos a entrevistas
80
de emprego foram sempre para trabalhos esporádicos, de faxina, por exemplo, que
a informante, na primeira parte da sua narrativa, declarou que não é o que buscava.
Agora, mesmo, eu vim aqui no SINE to com um aqui, eu sempre consigo
de faxina, mas eu gosto mesmo é de trabalhar com a carteira assinada
porque é uma segurança pra mim e pro meu patrão, a carteira assinada
(DONA CLÉIA, 58 ANOS, ENSINO FUNDAMENTAL INCOMPLETO)
Todavia, a entrevistada assumiu que esse foi o único trabalho que pode
conseguir, afinal, não sabe ler, portanto, nesse momento da sua vida a formalidade
e a mobilidade social a partir do trabalho não faziam parte do seu discurso.
Olha, eu to procurando de empregada doméstica porque é a única coisa
que eu [pausa] como eu não sei ler, eu acho que a única coisa que pode
me dar, por enquanto, é de empregada doméstica, ou de faxineira, porque
nessas alturas da minha vida qualquer coisa me serve, sabe (DONA
CLÉIA, 58 ANOS, ENSINO FUNDAMENTAL INCOMPLETO).
Cláudia, 32 anos, ensino fundamental incompleto e desempregada oito
meses, passou a freqüentar o SINE, recentemente, cerca de quatro meses, segundo
ela. Nesse período, passava pelo local, de duas a três vezes por semana,
aproveitando os dias em que se dirigia aos cultos de sua Igreja. Conseguiu somente
um trabalho de diarista, onde trabalhou três dias, recebendo, por isso, 15 reais.
Declarou que não gostou do trabalho, principalmente, com os ganhos que auferiu,
entendidos como uma forma de explorar.
Jaqueline, 45 anos, revelou, por outro lado, que a maioria dos empregos, com
carteira assinada, que conseguiu foi através do SINE, tais como o de passadeira em
uma lavanderia. Agora, encontra-se desempregada quatro meses e procura
qualquer tipo de emprego. Segundo ela, a freqüência ao SINE é quase diária, uma
forma de conseguir as melhores vagas.
Rita, 66 anos, ensino fundamental incompleto, desempregada seis meses,
freqüenta o SINE dois anos. Seu último trabalho foi conseguido através do SINE,
de doméstica, sem carteira assinada, onde permaneceu por um ano, sendo demitida
logo após: Quando eu consegui foi de doméstica, era meio turno, ganhava 200
reais. Daí foi bom, a gente pega um pouquinho de experiência. Daí, não deu certo. E
tu ganha pouco e muita carga de serviço, daí não vale a pena.”
81
Entre os homens, Alberto o mais escolarizado, freqüenta o SINE há três
meses e, ainda, não conseguiu ocupação ou encaminhamento. Daniel, 31 anos, com
ensino fundamental incompleto, desempregado três anos e freqüentando o SINE
dois anos, também não conseguiu ocupação ou encaminhamento até o momento
da entrevista.
Portanto, pode-se dizer que o SINE favoreceu a alguns pesquisados na sua
reinserção no mercado mesmo em atividades esporádicas e sem proteção social,
atuando como “intermediador” e propiciando a incorporação desses indivíduos em
atividades produtivas, apesar dos reduzidos ganhos em termos de mobilidade no
tocante a salário ou status ocupacional. Nesse sentido, também é válido destacar
que o desempregado que vai à agência FGTAS/SINE não gera nenhuma
expectativa de encontrar um emprego que corresponda a um ganho em termos de
status, renda ou reconhecimento social. uma quase inexistência de discursos
que ambicionam mobilidade social para si, apenas entre os mais jovens existe um
modesto desejo de crescimento, dependente para eles da continuidade dos estudos.
Entretanto, raros foram os relatos de qualificação ou requalificação
profissional por meio dessa via. Nos relatos em que a questão da qualificação
apareceu, o indivíduo beneficiado se questionava o que fazer depois de qualificado,
afinal, é experiência que o mercado demanda.
Ao analisar o quadro 2, em anexo, foi possível perceber que três situações se
destacam, primeiro caso é o de Luciana, 18 anos, que conseguiu pelo SINE a
ocupação de babá, sem carteira assinada, onde permaneceu durante um ano, a de
Dona Rita, de 66 anos, que conseguiu a ocupação de doméstica, sem carteira
assinada, meio turno e a de Cláudia que conseguiu de diarista, onde ficou somente
três dias. O ponto comum a esses casos é o fato de Luciana ser uma das mais
jovens, de dona Rita ser a de mais idade e Cláudia ter permanecido o maior período
de tempo afastada do mercado de trabalho para se dedicar aos compromissos com
a família, demonstrando que o fator etário e a perda de empregabilidade podem ser
apontados como a explicação mais pertinente para justificar a precariedade de suas
ocupações mais recentes ou a dificuldade de conseguir um novo emprego.
Tratando, especificamente, do caso de Luciana pode-se realçar o fato de que
seus pais também não completaram o ensino fundamental. Sua mãe é doméstica,
porém, encontrava-se desempregada quando da realização da entrevista. Seu pai
82
trabalhava como autônomo auferindo uma renda de 800 reais. Essa renda garantia o
sustento da família constituída por quatro pessoas.
Luciana narrou uma trajetória de abandonos e recomeços nos estudos,
quando via que não alcançar a média necessária para passar de ano desistia e
voltava a procurar trabalho. A maioria dos seus trabalhos foram sem carteira
assinada e nas mesmas ocupações de doméstica e babá.
Os motivos para a saída dos trabalhos são recorrentes em todas as falas e
partiram, na maioria dos casos, dos próprios desempregados. Esse é um dado
relevante porque acreditava-se que encontrar-se-ia uma outra realidade na qual as
demissões emanassem, prioritariamente, dos empregadores.
A informante, por exemplo, relatou o seguinte:
Eu sai mais pelo motivo de assim [pausa] um pouco de abuso deles,
porque eu dava muita atenção pra eles e eu não tinha tempo pra mim, às
vezes, eu tinha que sair pra pagar uma conta e não podia porque eu
tinha folga aos domingos [...] às vezes, tava muito cansada, porque fazer
as duas coisas ao mesmo tempo [trabalhar como babá e empregada
doméstica] cansa bastante, então, acabou de se provalecendo de modo de
eu não ter tempo pra mim [...] eu passava 24 horas trabalhando e muitos
amigos meus, assim, “Ah, mas tu muito sumida, minha mãe, meu pai
[pausa] (LUCIANA, 18 ANOS, ENSINO FUNDAMENTAL INCOMPLETO)
Agora, que está desempregada, Luciana optou por ficar mais em casa, para
ajudar sua mãe nas tarefas domésticas e cuidar do seu irmão. Portanto, sua
sociabilidade limita-se ao universo familiar, na medida em que reitera as
conseqüências negativas do excesso de trabalho para manter o contato com os
amigos.
O início da sua vida produtiva deu-se aos 13 anos, onde começou
trabalhando como babá, próximo a sua casa e, a seguir, reproduziu a mesma
trajetória dos pais galgando ocupações pouco remuneradas, sem carteira assinada e
com excessiva carga de trabalho. A impossibilidade de continuar os estudos foi
atribuída, justamente, a falta de tempo para freqüentar os bancos escolares.
Nesse sentido, sua opção foi a educação à distância, duas vezes por
semana, isso quando era liberada pelos patrões. Nas suas palavras:
83
Por causa que sem estudo, hoje, a gente não anda pra frente, porque,
geralmente, dão mais privilégio pra quem tem mais estudo, tu pode ter
todos os cursos, mas quando tu chega lá sempre falta alguma coisa.
[...] tem muita gente que não terminou os estudos, não adianta ficar
procurando porque não conseguimos por causa disso [...] (LUCIANA, 18
ANOS, ENSINO FUNDAMENTAL INCOMPLETO)
O estudo é importante em sua vida, mas a necessidade de trabalhar minou
suas expectativas e planos com relação a essa esfera. Desse modo, percebe-se a
dificuldade que essas pessoas possuem em mobilizar recursos culturais,
econômicos e sociais que permitam introduzir mudanças qualitativas em suas
relações de trabalho.
Cláudia, por exemplo, consiste em um exemplo que, ainda, hoje, visualiza-se
com freqüência relativo ao abandono do trabalho para cuidar da casa e dos filhos e
o difícil retorno, quase que impraticável.
3.4 Representações sobre o SINE: a instituição sob o “olhar” dos
desempregados
A primeira questão que norteou este tópico consistiu em evidenciar se os
sujeitos atribuem a sua inserção no mercado à relação estabelecida com o SINE e
se, nesse sentido, visualizam tal instituição como responsável por assegurar sua
assistência no tempo de desemprego e através de que modo. Assim, vários
aspectos foram analisados como a experiência temporal com o SINE, a iniciativa dos
entrevistados em procurá-lo como recurso e as representações construídas a
respeito dessa instituição.
Nos vários estudos que realizou na região metropolitana de São Paulo,
Guimarães (2004) constatou que as redes sociais constituídas por instituições
basilares na formação dos indivíduos, como a família, passando pela vizinhança até
chegar aos espaços impessoais como as agências privadas de intermediação são
as mais acionadas como a forma de obter um emprego.
Dessa forma, indagou-se se, em Santa Maria-RS, os indivíduos representam
ou percebem o SINE como uma instituição “protetora” e acionadora de mecanismos
84
que podem atuar como facilitadores na sua inserção ou reinserção em atividades
produtivas, haja vista a grande circulação de pessoas no local.
Como vimos na discussão anterior, poucos pesquisados realizaram cursos de
qualificação através do SINE e quando o fizeram não sabiam o que fazer com a
requerida qualificação, pois a experiência em carteira é o que, na sua visão,
determina, em primeira instância, a inserção no mercado.
Muitos pesquisados alegaram conhecer o SINE mais de vinte anos,
embora a freqüência mais efetiva tenha se limitado aos últimos seis, sete anos.
Quando interrogados sobre como definiriam o SINE, a maioria dos entrevistados
pontuou aspectos como a procura de emprego, um lugar que tem várias
oportunidades, um lugar que conhece onde estão localizadas as vagas, um lugar
que encaminha trabalhadores.
O que mais chamou a atenção em tais relatos foi justamente a ausência,
principalmente, entre aqueles que conhecem a instituição a mais tempo de sequer
citar a presença de cursos de qualificação no local. Cabe lembrar que, a partir da
década de 1980, o formato das políticas de emprego mudou, assim como suas
formas de financiamento, suas atividades de planejamento e suas metas calcadas
em extinguir o desemprego de curta duração. A meta a ser atingida, desse modo,
ultrapassava a intermediação e incorporava a assistência contínua do
desempregado, garantindo recursos financeiros e ativos indispensáveis para sua
reinserção, mantendo-o, sempre, “empregável”.
Entretanto, os informantes também não acionaram um discurso de
culpabilização do SINE por sua condição de desemprego, ao contrário, todos os
discursos encontravam-se atrelados a causas individuais e a procura por ocupações
mesmo que precárias sempre se resolveram no âmbito privado. Portanto, acredita-
se que o fenômeno que Giddens denomina como “individualização dos riscos
sociais” é oportuno para descrever a situação atual daqueles que demandam por
ocupações através do SINE, pois se trata de sujeitos que assumiram a procura por
emprego como dependente de estratégias que não passam pela entidade, em
primeira instância. Inicialmente, o SINE é apenas o intermediário, aquele que
oportuniza esse encontro/contato com o empregador, mas, via de regra, não assume
nenhuma outra responsabilidade na ótica dos entrevistados. A busca por
empregabilidade, entendida como a realização de cursos de qualificação ou
85
requalificação profissional ou o exercício de ocupações efetivas ou com maior
“status” são buscadas por outros meios, amigos, vizinhos, antigos patrões.
Porém, o fato de agregar variados serviços de assistência ao desempregado
foi uma questão bastante ressaltada de forma positiva pelos sujeitos da pesquisa
permitindo otimizar seu tempo e gerando um sentido de acolhimento no momento do
desemprego.
Por conseguinte, o conhecimento partilhado e expresso por meio das
condutas e formas de comportamento que seria assumir para si a responsabilidade
por descobrir ou mobilizar ativos que possibilitem essa reentrada no mercado de
trabalho formal harmoniza-se com o discurso hegemônico que perpassa as
instituições do mercado de trabalho e os principais atores envolvidos no debate
público acerca das causas do desemprego atual, o qual demanda uma atitude pró-
ativa do desempregado.
Em Santa Maria-RS, por exemplo, entre 2009 e 2010, as reportagens sobre
emprego no município realizadas com representantes da FGTAS/SINE apontaram a
falta de qualificação dos trabalhadores como a principal justificativa do desemprego.
De acordo com a reportagem de Rosauro (2010), no primeiro semestre de
2010, foram ofertadas 1.380 vagas de trabalho pelo sistema de intermediação, no
município. No entanto, somente foram preenchidos 439 postos de trabalho. Segundo
as funcionárias responsáveis pelo setor de captação de vagas a dificuldade para
preencher tais vagas é decorrente da falta de compromisso e interesse dos
desempregados, que a quantidade de retorno, isto é, do número de pessoas que
voltam a agência do SINE após terem sido encaminhados chega a 2.616
atendimentos. Conforme tais funcionárias, aqueles que conseguem uma vaga
permanecem por poucos dias ou até completar seis meses com o objetivo de
receberem o seguro-desemprego.
Além disso, salientam que a maior dificuldade consiste em preencher as
vagas que demandam maior qualificação, ao contrário das ocupações de servente,
doméstica e auxiliar de serviços gerais, por exemplo, para as quais existe uma
ampla oferta e também uma ampla demanda de mão-de-obra. No primeiro semestre
de 2010, foram preenchidas apenas 439 vagas de emprego para um total de 7.822
pessoas que procuraram o local nesse período.
Em 2009, constatou-se um aumento no número de pessoas a procura do
seguro-desemprego no município. Segundo Rosauro (2009), foram registrados
86
1.454 pedidos nos dois primeiros meses do ano, representando um acréscimo de
28,3% em relação ao mesmo período de 2008. Entre janeiro de 2009 e janeiro de
2010, o crescimento dos pedidos de seguro-desemprego chegou a 47%.
Já em uma reportagem de fevereiro de 2009
13
, a redução de postos de
trabalho na construção civil e no comércio foi apontada pelo SINE como a principal
causa do desemprego no período. Em entrevista ao jornal “A Razão”, o presidente
do Sindicato dos Trabalhadores da Construção Civil, Cirlon Moreira, afirmou que
faltam trabalhadores nesta área, em função do desgaste da mão-de-obra devido,
principalmente, a idade e a falta de investimento em qualificação. Para tanto, os
empresários do setor estão investindo em cursos ofertados pela própria empresa.
Em entrevista ao mesmo jornal, o presidente do Sindicato dos Lojistas de Santa
Maria (Sindilojas) destacou que os clientes estão mais exigentes o que demanda
profissionais bem preparados para lidar com o público.
Em 2010, podemos citar projetos, no Rio Grande do Sul, envolvendo
parcerias entre o MTE - Ministério do Trabalho e Emprego e os governos estaduais
na promoção de planos de capacitação profissional. O setor privilegiado é a
construção civil, onde jovens terão a oportunidade de aprender profissões por meio
do Programa Projovem Trabalhador um programa que visa preparar jovens de 18
a 29 anos provenientes de famílias que ganham a um salário mínimo para o
mercado de trabalho ou para o exercício de ocupações que geram renda. Portanto,
são dois programas de capacitação profissional, o Planseq Construção Civil e o
Projovem.
Através desses convênios para a execução dos Planseqs deverão ser
beneficiados mais de 19 mil trabalhadores em segmentos da Construção Civil,
Economia Solidária, Naval e Microcrédito Produtivo Orientado. Seu objetivo principal
será proporcionar a mão-de-obra local formação profissional para facilitar sua
entrada no mercado de trabalho. São planos setoriais de qualificação que foram
estabelecidos em novembro de 2004 como parte das ações do Plano Nacional de
Qualificação, do Ministério do Trabalho e Emprego.
Dessa forma, é possível notar que as parcerias mediante a descentralização
das ações de emprego continuam sendo operacionalizadas, por meio de planos de
qualificação e parcerias com empresas, onde o foco central são os setores de menor
13
ROSAURO, M. In: Jornal A Razão.
87
qualificação e, principalmente, visando o público mais jovem. Em reportagem do
Ministério do Trabalho e Emprego, o próprio enunciado reafirma a importância
dessas parcerias “Parceria com prefeituras garante operacionalidade”. Nesta
reportagem, divulgou-se a transferência da operação do Programa Nacional de
Estímulo ao Primeiro Emprego, em 2005, para a Delegacia Regional do Trabalho do
Rio Grande do Sul
14
.
Tal proposta de descentralização foi justificada pela possibilidade de ampliar
a participação de comunidades de municípios, nas quais não existem agências do
SINE ou subdelegacias, nesses programas.
De acordo com a coordenadora do Plano Nacional de estímulo ao Primeiro
Emprego, Denise González, essa estrutura permite potencializar os contatos e a
intermediação de vagas entre os empresários e jovens, que as prefeituras
conhecem a natureza, o porte e a vocação social de cada empresa. Divulgou, ainda,
que tal parceria foi firmada com 85 prefeituras.
Além disso, cabe destacar que todo discurso com referência à instituição
(SINE) foi realizado de forma impessoal, uma vez que a tratavam como aquela que
faz o cruzamento de dados acerca do perfil das vagas e do perfil dos
desempregados e encaminha de acordo com tais elementos “É o local onde te
oferecem várias oportunidades, tu tem que se encaixar no perfil deles e eles buscam
a tua vaga (Gabriela, 47 anos)”; “[...] Um meio de arrumar emprego, mas eu não
entendo, porque tenho tentado umas quantas vezes e não dá [...] eles é que
escolhem, talvez seja isso que não certo (Cláudia, 32 anos)”. Salientam que o
perfil do desempregado deve “se encaixar” no perfil deles (vagas/SINE), e não o
contrário. Isso depreende que a iniciativa de criar “mecanismos de encaixe” parte
dos trabalhadores que devem buscar isso, previamente, e através de outras vias.
Além disso, as ações desencadeadas no/ou pelo SINE não são concebidas
como reflexos de políticas governamentais, seja na esfera federal, estadual ou
municipal. Apesar da instituição conservar na sua natureza e rotinas essas duas
14
O Plano Nacional de estímulo ao Primeiro Emprego faz parte de um conjunto de políticas
promovidas pelo Governo Federal voltadas ao público mais jovem. O programa incentiva as
empresas a contratarem jovens entre 16 e 24 anos, faixa que concentra um número maior de
desempregados. Ver mais informações no sítio eletrônico:
http://www.mte.gov.br/sgcnoticia.asp?IdConteudoNoticia=7188&PalavraChave=infantil
88
dimensões, a de ser um organismo de gestão de mão-de-obra (econômico), ao
mesmo tempo em que mantém uma profunda conexão com o mundo da política, a
primeira dimensão prevaleceu no discurso dos entrevistados.
89
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A presente dissertação procurou avaliar a instituição SINE e o sistema
nacional de emprego por meio das representações do indivíduo desempregado que
busca os serviços da instituição. Parcialmente, foi possível observar e analisar o
sistema de emprego do país sob a ótica do indivíduo desempregado. O SINE
consolidou-se ao longo dos anos como entidade focada nos objetivos de inserção do
trabalhador com baixa instrumentalização para participar do mercado de trabalho,
aquele tipo humano que tem transitado entre o mundo informal do trabalho com
suas experiências sempre ambíguas, ora o benefício de uma renda maior
relativamente ao mundo do trabalho formal, ainda que com um status menor; ora, o
contrário, em que o mundo informal é pleno de negatividades, seja no quesito
“renda”, seja no quesito “status” — e o mundo formal e precário. Elementos e
conteúdos sistêmicos escapam às percepções dos indivíduos que vivem suas
trajetórias tomando a si próprios como os únicos responsáveis pelos resultados que
obtém.
A realidade, porém, como o conjunto de relações sociais também revelou
tensões, conflitos e contradições na produção de sentidos. Conforme visto, a
experiência com o trabalho produziu narrativas de resignação, mas também
narrativas de emponderamento, que justificaram a tendência de esperar ou acionar
ocupações informais que permitissem aumentar as chances de inserção ou
reinserção correspondentes à demanda do mercado.
Em outros termos, percebeu-se a relevância de dois tipos de discurso. Um
deles justificava a situação de desemprego através de argumentos individuais, isto
é, a falta de trabalho como o efeito de escolhas erradas feitas durante a vida. O
outro tipo de discurso privilegiava a importância da experiência acumulada nos
muitos e diferentes trabalhos precários. Esse saber-fazer criou entre os indivíduos
uma espécie de identidade social partilhada, de pessoas que na ausência do auxílio
institucional não se limitaram ao conformismo. Ao contrário, criaram alternativas
frente à ausência do emprego assalariado.
90
Nas representações dos pesquisados, poucas vezes, ganhou forma os
extremos do trabalho como “meio para um fim” e o trabalho como “um fim em si
mesmo, como um valor”. Esses conteúdos encontraram-se imersos e diluídos em
uma totalidade/unidade que constitui a visão de suas vidas numa trajetória que
compreende outros elementos significativos, além do mundo do trabalho.
Contudo, o trabalho em si ganha a forma dos extremos e, também, a forma
da síntese. Os indivíduos eram jovens e velhos, no início da vida produtiva e no fim
de uma jornada econômica produtiva, que vão ao SINE, como a outras instâncias,
em um processo de busca de soluções para seus desafios adaptativos ao mundo do
trabalho. Verificou-se a recorrência de uma trajetória da esfera impessoal baseada
nas escolhas pelas instituições públicas até o retorno às formas pessoais de solução
dos dilemas do desemprego (família, comunidade).
Os governos e o Estado não aparecem como variáveis da equação do
emprego feita pelos entrevistados. Por isso, resta um julgo muito pesado sobre os
seus ombros, pois toda a boa e sorte nas tentativas de (re) inserção no mundo
do trabalho tornou-se de responsabilidade individual, obrigando seu retorno ao
mundo mais cooperativo da família. Por conta disso, a dimensão de uma estrutura
de oportunidades que, objetivamente, nunca lhes alcançou não teve lugar em sua
equação subjetiva.
Em contrapartida, foi possível perceber que o SINE constitui para os
indivíduos uma instituição importante de assistência ao trabalhador desempregado,
pois o visualizam como a única alternativa que possuem para facilitar o acesso a
uma ocupação. Tal instituição, contudo, não foi acionada ou representada pelos
entrevistados como pertencente a uma das esferas governamentais federal,
estadual ou municipal - ou como uma entidade que tem como objetivo capacitar o
trabalhador desempregado para seu retorno ao mercado.
Desse modo, percebeu-se na experiência desses trabalhadores, objeto da
presente pesquisa, que a descentralização na operacionalização das atividades do
SINE teve o efeito oposto, uma vez que ao invés de torná-los mais participativos e
simbolicamente mais protegidos perante a dimensão institucional, levou a
disseminação de condutas individualistas, onde a preocupação central constituiu-se
em cuidar da própria vida e isolar-se no âmbito doméstico, galgando atividades
suficientes à sobrevivência.
91
Objetivamente, a mobilidade social pela via do trabalho não alcançou os
trabalhadores desempregados, alvo da pesquisa. Ao mesmo tempo, a participação
em cursos de qualificação pelo SINE ou através de outras vias não facilitou a
inserção desses indivíduos no mercado de trabalho formal, obrigando-os a
permanecer na informalidade.
A opção pelo SINE deu-se, prioritariamente, pela natureza pública da
entidade. Apesar da instituição conservar na sua natureza e rotinas essas duas
dimensões, a de ser um organismo de gestão da mão-de-obra (econômico), ao
mesmo tempo em que mantém uma profunda conexão com o mundo da política, a
primeira dimensão prevaleceu no discurso dos desempregados.
Ir até o SINE pressupôs, via de regra, o reconhecimento de uma determinada
situação social de exclusão, na qual o indivíduo reconhece a si mesmo e a outros
que acionam o mesmo local como pertencentes a um mesmo estrato da sociedade e
como portadores de um determinado estatuto sócio-econômico – de excluídos.
O fato de compartilharem a mesma trajetória de precariedade os aproximou
do ponto de vista objetivo. A negação do trabalho e de sua dimensão social foi uma
constante no discurso dos entrevistados. Consequentemente, a realização de êxito
para estes desempregados depende do trabalho, mas não se encontra,
estritamente, relacionada a essa esfera. A dimensão social que mais valorizam é a
família e seus planos materiais estão ligados à necessidade de manutenção e
reprodução dessa unidade nuclear.
Portanto, a dissertação trouxe dados importantes para problematizar as
questões sociológicas sobre o trabalho, uma vez que incluiu relatos em que a
dimensão social do trabalho reapareceu, estruturando e dando sentido a muitas
experiências de vida, mas também experiências concretas em que o trabalho
assumiu apenas uma função estritamente econômica. Dessa maneira, ambas as
percepções foram reproduzidas pelos indivíduos excluídos do mercado de trabalho
formal, demonstrando a diversidade simbólica do trabalhador desempregado em
Santa Maria.
92
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96
TAVARES, M. C. Problemas de médio e longo prazos do desenvolvimento
brasileiro. In: Cadernos do desenvolvimento. Rio de Janeiro, n. 2-1, dez. 2006.
97
ANEXO
98
Anexo A. Termo de Consentimento Informado.
UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA MARIA
CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS E HUMANAS
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIAS SOCIAIS
Santa Maria, ___ de__________ de 2009.
TERMO DE CONSENTIMENTO INFORMADO
Prezado (s),
Eu, Ana Paula de Lima Rodrigues, mestranda em Ciências Sociais pela Universidade Federal de
Santa Maria, matrícula 2860766, venho através deste documento solicitar consentimento para a
realização de processo investigativo relativo à dissertação de mestrado. Essa pesquisa tem como
objetivo apreender as dinâmicas sociais dos sujeitos na busca pela integração no mundo do trabalho
e as mudanças objetivas e subjetivas ou simbólicas em suas trajetórias sócio-ocupacionais que
podem ser atribuídas à ão do SINE. Pretende-se, dessa maneira, estabelecer uma discussão
acerca do processo de legitimação ou adesão dos pesquisados, público-alvo das ações do sistema
de intermediação de mão-de-obra em Santa Maria, haja vista as transformações sociais, econômicas
e políticas que perpassam a esfera do trabalho, que tem refletido na configuração do Sistema Público
de Emprego, Trabalho e Renda, levando, entre outras coisas, a descentralização das políticas sociais
no campo do trabalho e a participação de outros agentes sociais, representados por Estados,
Municípios e outras entidades da sociedade civil. Para tanto, necessito de informações a respeito de
pessoas que conseguiram uma ocupação por meio deste sistema de intermediação de mão-de-obra e
de desempregados que freqüentam o local, para a aplicação de entrevistas.
Desde já agradeço.
____________________________ _________________________________
Ana Paula de Lima Rodrigues (Mestranda) João Vicente R. B da Costa Lima
Coordenador do curso e orientador
_________________________________
SINE/FGTAS
99
Anexo B. Roteiro de entrevista.
UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA MARIA
CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS E HUMANAS
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIAS SOCIAIS
ROTEIRO DE ENTREVISTA
BLOCO 1. CARACTERÍSTICAS SOCIAIS DOS ENTREVISTADOS
Q1. Idade
Q2. Escolaridade
Q3. Ocupação
Q4. Estado civil
Q5. Bairro onde mora
BLOCO 2. CARACTERÍSTICAS DA FAMÍLIA
Q6. Agora, fale sobre as pessoas que moram na casa, tratando de questões sobre
parentesco, idade e escolaridade.
Q7. Quantas pessoas trabalham e em que ocupação. Fale sobre as características
desta ocupação.
Q8. Qual a renda da família ou, em caso de morar sozinho, qual a renda do
entrevistado
BLOCO 3. TRAJETÓRIA SÓCIO-OCUPACIONAL DOS ENTREVISTADOS
Pessoas que fazem “bicos”
Q9. Primeiramente, gostaria que você falasse sobre o trabalho que realiza atualmente
(NÃO LER PARA O ENTREVISTADO --- onde é (centro/periferia, ganha quanto,
que tipo de atividade, como está organizada a rotina de trabalho,... )
Q10. De que forma os ganhos obtidos pelo seu trabalho contribuem para o seu
sustento e/ou de sua família?
Q11. Há quanto tempo realiza essa atividade?
Q12. Como conseguiu esse trabalho?
100
Anexo C. De
Q13.
Você se identifica com o trabalho que realiza?
Q14. Por quê?
Q15. Preciso que você explique como eram os empregos e/ou trabalhos que teve ao
longo da vida e como chegou a esta ocupação que tens agora (NÃO LER PARA O
ENTREVISTADO --- qualificações exigidas, ganhos destes trabalhos, tipo de
atividade)
Q16. Destaque as vantagens e desvantagens dos trabalhos e/ou empregos que você
já teve
BLOCO 4. EXPERIÊNCIAS COM O DESEMPREGO (NÃO LER PARA O
ENTREVISTADO --- pessoas que realizam bicos)
Q17. Durante sua vida profissional, qual foi o maior período de tempo que ficou
desempregado?
Q18. O que costuma fazer nestas situações de desemprego?
Q19. Fale de que maneira está organizada sua rotina? O que você tem feito?
Q20. O que se imagina fazendo daqui a cinco anos? Por quê?
Q21. Qual a importância que o trabalho tem na sua vida?
BLOCO 3. TRAJETÓRIA SÓCIO-OCUPACIONAL DOS ENTREVISTADOS E
EXPERIÊNCIAS COM O DESEMPREGO
Desempregados
Q22. Fale sobre sua última ocupação? Descreva como era esse trabalho, quanto
tempo ficou com ou sem carteira assinada.
Q23. Fale sobre os motivos pelos quais saiu dessa ocupação?
Q24. O que você tem feito agora que está desempregado (a)?
Q25. O que significa para você estar desempregado (a)?
Q26. Preciso que você explique como eram os empregos que teve ao longo da vida e
como conseguiu esses empregos.
Q27. Durante sua vida profissional qual foi o maior período de tempo que ficou
desempregado?
Q28. O que costuma fazer nestas situações de desemprego?
Q29. O que se imagina fazendo daqui a cinco anos? Por quê?
Q30. Qual a importância que o trabalho tem na sua vida?
BLOCO 4 - A RELAÇÃO DO DESEMPREGADO COM O SINE
Agora, as perguntas procurarão compreender a relação dos entrevistados com
o SINE, visando saber sua opinião e experiências com ele.
Q31. De que forma você conheceu o SINE?
Q32. A partir de que momento você procurou o SINE e por quê?
Q33. Quando você fez o cadastro?
Q34. Para você, o que é o SINE?
Q35. Conseguiu alguma ocupação por meio do SINE? Fale sobre ela.
Q36. Descreva qual a sua freqüência de visitas e se participa ou participou de alguma
atividade nesse local.
Q37. Fale sobre as iniciativas que teve para conseguir uma ocupação?
Q38. Costuma usar os serviços de outras agências de intermediação de mão-de-
obra?
Q39. Como foi essa experiência?
101
Descrição dos entrevistados
Maria, 55 anos, casada, ensino fundamental incompleto, última ocupação: cozinheira
com carteira assinada, tempo de desemprego: 6 meses.
Luciana, 18 anos, solteira, ensino fundamental incompleto, última ocupação: babá
sem carteira assinada, tempo de desemprego: 9 meses.
Rita, 66 anos, casada, ensino fundamental incompleto, última ocupação: doméstica
sem carteira assinada, tempo de desemprego: 6 meses.
Gabriela, 47 anos, solteira, ensino médio completo, última ocupação: doméstica com
carteira assinada, tempo de desemprego: 2 meses.
Dona Isaura, 65 anos, solteira, ensino fundamental incompleto, última ocupação:
doméstica com carteira assinada, aposentada.
Cláudia, 32 anos, casada, ensino fundamental incompleto, última ocupação: diarista,
sem carteira assinada, tempo de desemprego: 8 meses.
Jaqueline, 45 anos, separada, ensino fundamental incompleto, última ocupação:
cozinheira de uma firma terceirizada com carteira assinada, tempo de desemprego:
4 meses.
Carla, 26 anos, casada, ensino fundamental incompleto, última ocupação: doméstica
com carteira assinada, tempo de desemprego: 1 ano.
Dona Lurdes, 63 anos, separada, pós-graduação, última ocupação: professora da
rede pública e particular, aposentada há dois anos.
Dona Cléia, 58 anos, separada, ensino fundamental incompleto, última ocupação:
acompanhante de idosos sem carteira assinada. Tempo de desemprego: uma
semana.
Luíza, 23 anos, solteira, faz magistério, última ocupação: doméstica com carteira
assinada, tempo de desemprego: 8 meses.
Juliana, 16 anos, solteira, ensino fundamental incompleto, última ocupação: babá
sem carteira assinada, tempo de desemprego: 1 ano.
Saulo, 20 anos, ensino fundamental incompleto, última ocupação: entregador de
jornal, com carteira assinada, tempo de desemprego: 6 meses.
Anderson, 20 anos, solteiro, ensino médio incompleto, nunca trabalhou.
Daniel, 31 anos, solteiro, ensino fundamental incompleto, última ocupação:
manobrista em um estacionamento, tempo de desemprego: 3 anos.
Paulo, 23 anos, solteiro, ensino médio completo, última ocupação: entregador de
jornal, com carteira assinada, tempo de desemprego: 4 meses.
102
Alberto, 47 anos, casado, terceiro grau completo, advogado.
Fabiano, 24 anos, solteiro, ensino médio incompleto, última ocupação: porteiro, com
carteira assinada, tempo de desemprego: 1 mês.
Eduardo, 47 anos, casado, ensino fundamental incompleto, última ocupação:
serviços gerais, sem carteira assinada, tempo de desemprego: 7 meses.
Pedro, 47 anos, casado, ensino fundamental incompleto, última ocupação:
carpinteiro, tempo de desemprego: 6 meses.
Jackson, 45 anos, solteiro, ensino médio completo, última ocupação: ajudante de
gráfica, com carteira assinada, tempo de desemprego: 2 anos.
João, 45 anos, casado, ensino médio completo, última ocupação: segurança, com
carteira assinada, tempo de desemprego: 4 meses.
Marcos, 26 anos, solteiro, ensino médio completo, última ocupação: controlador de
produção, com carteira assinada, tempo de desemprego: 15 dias.
Mário, 47 anos, casado, ensino fundamental incompleto, última ocupação: pintor
com carteira assinada, tempo de desemprego: um mês.
Rafael, 40 anos, solteiro, ensino médio completo, última ocupação: auxiliar de
eletricista com carteira assinada, tempo de desemprego: 1 ano.
103
Anexo D. QUADRO 3. SINOPSE: CARACTERÍSTICAS SÓCIO-OCUPACIONAIS
DOS ENTREVISTADOS E OCUPAÇÕES ADQUIRIDAS VIA SINE.
Cursos
NÃO
NÃO
PINTURA
NÃO
NÃO
NÃO
NÃO
NÃO
NÃO
Tempo de
permanên
cia
1 MÊS
8 MESES
3 MESES
11 MESES
12 MESES
12 MESES
12 MESES
12 MESES
TRÊS
DIAS
edSalário
UM
SLÁRIO
UM
SALÁRIO
UM
SALÁRIO
UM
SALÁRIO
UM
SALÁRIO
UM
SALÁRIO
MEIO
SALÁRIO
UM
SALÁRIO
15 REAIS
POR
LIMPEZA
Ocupação
via SINE
PEDREIR
O C.A
ELETRECI
STA
C.A
SERVENT
E DE
OBRAS
C.A
SERVIÇO
S GERAIS
C.A
DOMÉSTI
CA
S.C.A
ACOMPAN
HANTE DE
IDOSOS
C.A
DOMÉSTI
CA S.C.A
LAVANDE
RIA
C.A
DIARISTA
S.C.A
Salários
Um salário
Um salário
Um salário
Um salário
Meio salário
Um salário
Um salário
Um salário
15 REAIS
Última
Ocupação
Entregador
de jornal
C.A
Auxiliar de
eletricista
C.A
Ajudante
de gráfica
S.C.A
Serviços
gerais
S.C.A
Babá
S.C.A
Doméstica
C.A
Doméstica
S.C.A
Cozinheira
C.A
Diarista
S.C.A
Escolaridade
E.F.I
E.M.C
E.M.C
E.F.I
E.F.I
E.F.I
E.F.I
E.F.I
E.F.I
Idade
20 anos
40 anos
25 anos
47 anos
18 anos
65 anos
66 anos
45 anos
32 anos
Nome
do
entrevi
stado
Saulo
Rafael
Jackson
Eduard
o
Luciana
Dona
Isaura
Rita
Jaqueli
ne
Cláudia
Legenda: E.F.I = Ensino fundamental incompleto; E.M.C = Ensino médio completo; C.A =
CARTEIRA ASSINADA; S.C.A= SEM CARTEIRA DE TRABALHO ASSINADA.
104
Anexo E. Termo de consentimento informado (desempregados)
UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA MARIA
CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS E HUMANAS
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIAS SOCIAIS
Eu _____________________________ autorizo, Ana Paula de Lima Rodrigues, a
utilizar as informações prestadas por mim em sua dissertação de mestrado
desde que minha identidade seja mantida em sigilo.
Santa Maria, ___ de _______ de 2010.
105
Anexo F. Decreto-lei nº. 76.403 de 08/10/1975 de criação do SINE Sistema
Nacional de Emprego
Art. Fica instituído o Sistema Nacional de Emprego - SINE sob a coordenação e
supervisão do Ministério do Trabalho, através da Secretaria de Emprego e Salário.
Art. Integram o SINE: a Secretaria de Emprego e Salário, os serviços e agências
federais de emprego, os sistemas regionais de emprego e as agências, núcleos,
postos ou balcões de emprego, públicos ou particulares, em todo o território
nacional.
§ A Secretaria de Emprego e Salário funcionará como órgão central e os serviços
e agências federais de emprego como órgãos setoriais do SINE.
§ 2º O Ministério do Trabalho baixará instruções para o registro, o funcionamento e a
articulação dos órgãos integrantes do Sistema.
Art. 3º Constituem objetivos do SINE:
I - organizar um sistema de informações e pesquisas sobre o mercado de trabalho,
capaz de subsidiar a operacionalização da política de emprego, em nível local,
regional e nacional;
II - implantar serviços e agências de colocação em todo o País, necessários à
organização do mercado de trabalho;
III - identificar o trabalhador, por meio de Carteira de Trabalho e Previdência Social,
como participante da comunidade brasileira de trabalho;
IV - propiciar informação e orientação ao trabalhador quanto à escolha de emprego;
V - prestar informações ao mercado consumidor de mão-de-obra sobre a
disponibilidade de recursos humanos;
VI - fornecer subsídios ao sistema educacional e ao sistema de formação de mão-
de-obra para a elaboração de suas programações;
106
VII - estabelecer condições para a adequação entre a demanda do mercado do
mercado de trabalho e a força de trabalho em todos os níveis de capacitação.
Art. 4º Na organização e progressiva implantação do SINE terão prioridade:
a) as alternativas mais favoráveis à absorção da força de trabalho disponível ou
potencial, especialmente para o caso de projetos prioritários de desenvolvimento;
b) o desenvolvimento de experiências que favorecem à utilização intensiva da força
de trabalho potencial.
Art. Compete ao Ministério do Trabalho definir as prioridades das áreas a serem
gradativamente abrangidas pelo SINE, estabelecer os programas necessários à sua
implantação e as normas administrativas e técnicas para seu funcionamento.
Art. Para a organização, implantação e manutenção do SINE, o Ministério do
Trabalho poderá dispor de recursos ordinários e vinculados, programados em seu
orçamento anual, além de recursos de outras fontes.
Art. O Ministério do Trabalho dará apoio técnico, financeiro e administrativo à
implantação e funcionamento do SINE, inclusive através de auxílios e subvenções.
Art. Este Decreto entrará em vigor na data de sua publicação, revogadas as
disposições em contrário.
107
Anexo G. DECRETO Nº.
34.322, DE 12 DE MAIO DE 1992. Estatuto da
Fundação Gaúcha de Trabalho e Ação Social. Dis
ponível no endereço
eletrônico:http://www.fgtas.rs.gov.br/portal/index.php?menu=biblioteca_
viz&cod_biblioteca=15
Aprova o Estatuto da Fundação Gaúcha do Trabalho e Ação Social.
O GOVERNADOR DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL, no uso de
atribuição que lhe con
fere o art. 82, inciso V, da Constituição do Estado e nos
termos da LEI 9.434
, de 27 de novembro de 1991, regulamentada pelo
DECRETO Nº 34.155, de 30 de dezembro de 1991,
DECRETA:
Art. -
Fica aprovado o Estatuto da Fundação Gaúcha do Trabalho e Ação
Social, que é publicado em anexo a este Decreto.
Art. 2º - Este Decreto entra em vigor na data de sua publicação.
Art. 3º - Revogam-se as disposições em contrário.
PALÁCIO PIRATINI, em Porto Alegre, 12 de maio de 1992.
ESTATUTO DA FUNDAÇÃO GAÚCHA DO TRABALHO E AÇÃO SOCIAL
CAPÍTULO I
Da Natureza e Competência
Art. 1º -
A Fundação Gaúcha do Trabalho e Ação Social, instituída pelo
Estado do Rio Grande do Sul nos termos da LEI 9.434
, de 27.11.1991,
regulamentada pelo DECRETO 34.155, de 30.12.1991, caracteriza-
se
como entidade de personalidade jurídica de direito privado com
autonomia
administrativa, financeira e quanto à gestão de seus bens, e será regida por
este Estatuto.
Art. -
A Fundação terá sua sede e foro na cidade de Porto Alegre, com
abrangência de atuação em todo o território estadual, e seu prazo de duração
será por tempo indeterminado.
108
Parágrafo único -
A Fundação será vinculada à Secretaria da Justiça, do
Trabalho e da Cidadania.
Art. -
A Fundação terá a finalidade de implementar e desenvolver, no
âmbito do Estado, as políticas de relações de trabalho e de
promoção e
assistência social.
Art. 4º - Compete à Fundação:
I -
planejar ações e executar projetos de assistência e promoção social,
objetivando prevenir a marginalização de segmentos populacionais ou
incorporar, no processo de desenvolvimento econômico-
social, as populações
marginalizadas;
II - assessorar técnica e/ou financeiramente entidades e grupos sócio-
assistenciais, comunitários ou sindicais e Prefeituras Municipais, visando a
ampliação dos níveis de renda, a criação de novas ocupações, o estímu
lo às
formas associativas de produção ou prestação de serviços, a melhoria das
condições de vida do trabalhador urbano e rural e o reforço da organização
comunitária;
III -
apoiar e estimular a iniciativa de entidades sindicais, no sentido da
capacitação para a negociação e o aprimoramento das relações de trabalho;
IV -
apoiar as organizações dos trabalhadores nas áreas de formação e
administração sindical, saúde e segurança do trabalhador, bem como
produzir e divulgar informações relativas à questão do trabalho;
V -
articular e celebrar convênios e outros ajustes, visando a cooperação
técnica e/ou financeira com órgãos públicos e privados, para a promoção de
melhorias sociais nas comunidades carentes do Estado;
VI - realizar estudos sistematizados da re
alidade social para subsidiar a
elaboração da política social do Poder Público através da manutenção de um
109
Banco de Dados, bem como prestar informações aos segmentos
interessados;
VII -
apoiar e administrar o sistema público de emprego, que envolve
ativid
ades permanentes de informações sobre mercado de trabalho e
intermediação de mão-de-obra;
VIII -
estimular o desenvolvimento do artesanato mediante o apoio à
organização dos artesões, o aprimoramento das técnicas de produção, a
comercialização, bem como o resgate cultural de atividade artesanal;
IX -
promover ações de formação profissional, para os mercados formal e
informal de trabalho;
X -
estender e diversificar programas voltados ao idoso, num processo de
integração de gerações;
XI - administrar os Centros Sociais Urbanos do Estado;
XII - articular-
se com entidades públicas e privadas, nacionais e estrangeiras,
visando a execução de seus programas;
XIII - executar outras atividades compatíveis com suas finalidades.
Parágrafo único - A Fundação pode
rá, para a consecução de seus objetivos,
realizar a contratação de serviços de terceiros inclusive com fito de renda
para amortizar as despesas administrativas e de serviços prestados.
CAPÍTULO II
Do Patrimônio e dos Recursos Financeiros
SEÇÃO I
Do Patrimônio
Art. 5º - Constituirão o patrimônio da Fundação:
110
a) os bens veis e imóveis, veículos, aparelhos, máquinas, equipamentos e
material técnico que pertenciam ao patrimônio da Fundação Gaúcha do
Trabalho e Fundação Sul-Riograndense de Assistência "Senad
or Tarso
Dutra";
b) os bens móveis e imóveis, assim como os direitos a ela transferidos, em
caráter definitivo, a qualquer título, por quaisquer pessoas ou organismos,
nacionais e internacionais.
§ 1º - Os bens e direitos da Fundação Gaúcha do Trabalho e A
ção Social
deverão ser utilizados, exclusivamente, para a consecução de seus objetivos
sendo, porém, permitida a sub-
rogação de uns e de outros para obtenção de
rendas destinadas ao mesmo fim.
§ - Poderão ser alienados os bens móveis ou imóveis desneces
sários,
inservíveis ou em desuso, para sua própria substituição, no caso de imóveis,
ou para constituição de receita eventual, nos demais casos, observada a
legislação pertinente.
SEÇÃO II
Dos Recursos Financeiros
Art. 6º - Os recursos financeiros da Fundação compreenderão:
a) no primeiro exercício, as dotações específicas consignadas no Orçamento
Geral do Estado para as Fundações Gaúchas do Trabalho e Sul-
Riograndense de Assistência "Senador Tarso Dutra";
b) as dotações específicas para a Fundação, consig
nadas no Orçamento
Geral do Estado;
c) as contribuições, subvenções, auxílios e qualquer recurso da União, do
Estado e dos Municípios, bem como de suas respectivas autarquias,
empresas públicas e sociedades de economia mista;
d) as rendas decorrentes da ex
ploração de seus bens, da prestação de
serviços e das medidas previstas no parágrafo 2º do artigo 5º, deste Estatuto;
e) as contribuições, auxílios ou subvenções a ela destinadas por quaisquer
pessoas ou organismos nacionais ou internacionais;
f) os recursos decorrentes da comercialização de produtos artesanais;
g) quaisquer outros recursos que lhe forem destinados.
111
§ -
A Fundação Gaúcha do Trabalho e Ação Social poderá, mediante
autorização do Governador do Estado e com a interveniência do Secretário
de
Estado da Justiça, do Trabalho e da Cidadania, contrair empréstimo no
País e no exterior para o financiamento de suas atividades, obedecida a
legislação em vigor.
§ -
A receita da Fundação Gaúcha do Trabalho e Ação Social deverá ser
aplicada integralme
nte na manutenção e no desenvolvimento de suas
finalidades, obedecidas as normas e procedimentos constantes da legislação
pertinente.
CAPÍTULO III
Da Organização e Administração
SEÇÃO I
Da Estrutura
Art. 7º - A Fundação terá a seguinte estrutura básica:
I - Diretoria;
II - Conselho Deliberativo;
III - Conselho Curador;
IV - Órgãos Executivo.
Art. -
A organização e o funcionamento da Fundação e de seus órgãos,
bem como as respectivas atribuições e competências, serão estabelecidas
em seu Regimento Interno, a ser expedido na forma do artigo 14, da
LEI
9.434, de 27.11.92.
SEÇÃO II
Da Diretoria
Art. - A Diretoria será composta por um Diretor-
Presidente, um Diretor
Técnico e um Diretor Administrativo.
Parágrafo único -
Além das demais vantagens pecuniárias inerentes ao
cargo, a Diretoria da Fundação fará jus à percepção do 13º salário, nos
termos da lei que instituiu esse benefício aos servidores do Estado. (incluído
112
p/D. 34.574/92).
Art. 10 - O Diretor-
Presidente será indicado pelo Secretário de Estado da
Justiça, do Trabalho e da Cidadania, e nomeado pelo Governador do Estado,
que igualmente nomeará os Diretores Técnico e Administrativo, que serão
indicados conjuntamente pelo Diretor-
Presidente e Titular da Pasta da
Justiça, do Trabalho e da Cidadania.
Art. 11 - Compete à Diretoria:
I -
responder pela administração da Fundação e pela consecução de suas
finalidades;
II - administrar os recursos financeiros da Fu
ndação, zelar pelo seu
patrimônio e ter sob sua guarda os seus bens;
III -
submeter à aprovação do Conselho Deliberativo a criação, alteração ou
extinção de órgãos, serviços, cargos ou funções da Fundação;
IV - submeter à aprovação do Conselho Deliberativo
o Regimento Interno da
Fundação;
V - aprovar os regulamentos gerais de âmbito interno da Fundação;
VI - autorizar a celebração de convênios e outros ajustes;
VII -
submeter ao Conselho Fiscal, para apreciação, o balanço anual, as
prestações de contas e o
relatório circunstanciado das atividades do exercício
anterior;
VIII - submeter à aprovação do Conselho Deliberativo:
a) até o dia 30 de junho de cada ano, o Plano Anual de Trabalho e a previsão
da receita e da despesa, ambos para o exercício seguinte;
b) as prestações de contas;
c) as doações de bens patrimoniais;
d) previamente, as aquisições e alienações de imóveis;
e) até 31 de março de cada ano, o balanço anual, as contas do exercício
findo e o relatório circunstanciado do exercício anterior com o pare
cer do
Conselho Fiscal.
IX -
examinar e decidir sobre assuntos relevantes ou de interesse geral da
Fundação;
113
X -
aprovar programas e projetos, estabelecer metas e prioridades, fixar
princípios e objetivos dentro da política de atuação da Fundação.
Art. 12 - Compete ao Diretor-Presidente:
I -
representar a Fundação, ativa e passivamente, judicial e
extrajudicialmente;
II - prover as funções de chefia e demais funções de confiança;
III - delegar atribuições e constituir mandatários;
IV - praticar todos os atos inerentes ao cargo;
V - superintender todas as atividades da Fundação;
VI -
cumprir e fazer cumprir as normas estatutárias, regimentais e
regulamentares, assim como as decisões do Conselho Deliberativo;
VII - convocar, extraordinariamente, a Diretoria,
o Conselho Deliberativo e o
Conselho Fiscal;
VIII - presidir as reuniões de Diretoria;
IX -
assinar os convênios e outros ajustes previstos pelo artigo 11, VI, deste
Estatuto;
X -
encaminhar ao Conselho Deliberativo e ao Conselho Fiscal os assuntos
de suas respectivas competências;
XI -
autorizar as despesas e os pagamentos em geral, bem como assinar
cheques e outros títulos de créditos juntamente com o Diretor Administrativo
e/ou Diretor Técnico;
XII - autorizar a execução de projetos, programas e planos;
XIII -
expedir Resoluções, Portarias e Ordens de Serviço, bem como proferir
despachos de caráter decisório.
Art. 13 - Compete ao Diretor Técnico:
I - administrar, dirigir, coordenar e superintender a área técnica da Fundação;
II - definir as linhas técnicas de atendimento à clientela da Fundação;
III - fixar normas e princípios técnicos de atendimento;
IV -
propor à Diretoria o Plano Anual de Trabalho da respectiva área e
responsabilizar-se pela sua execução;
V - submeter à Diretoria projetos e programas e encarregar-
se de sua
114
execução e acompanhamento;
VI - oportunizar a especialização de pessoal técnico da Fundação;
VII - colaborar na elaboração e/ou co-
participar na coordenação, execução e
fiscalização de projetos e programas dos governos federal, estadu
al e
municipais;
VIII -
executar outras tarefas inerentes ao cargo, ou que lhe forem atribuídas
pelo Diretor-Presidente.
Art. 14 - Compete ao Diretor Administrativo:
I -
administrar, dirigir, coordenar e superintender a área administrativa e
financeira da Fundação;
II -
elaborar, em consonância com a Diretoria Executiva, a programação
orçamentária da Fundação, bem como proceder o acompanhamento, o
controle e a avaliação de sua execução;
III - organizar e manter atualizados os balancetes de toda a movimenta
ção
financeira da Fundação, assim como o balanço anual;
IV -
propor e executar a política financeira no que tange à receita e à despesa
da Fundação;
V - manter cadastro dos bens móveis e imóveis da Fundação;
VI - proceder a aquisição e o fornecimento do ma
terial permanente e de
consumo necessários aos serviços da Fundação, bem como executar o
controle quantitativo e de custo;
VII -
acompanhar a tramitação dos atos, documentos e demais expedientes
de interesse da Fundação junto aos órgãos da administração pública;
VIII - encarregar-
se da execução das atividades de vigilância e conservação
da área física da Fundação.
SEÇÃO III
Do Conselho Deliberativo
Art. 15 - O Conselho Deliberativo será presidido pelo Diretor-
Presidente da
Fundação e, no seu impedimento, por substituto devidamente designado.
115
Art. 16 -
O Conselho Deliberativo se composto por membros titulares e
suplentes, como segue:
a) Presidente da Fundação Gaúcha do Trabalho e Ação Social;
b) dois representantes nomeados pelo Governador do Estado, med
iante
indicação de entidades assistenciais e sindicais que atuam em área análoga
à da Fundação;
c) um representante da Secretaria da Justiça, do Trabalho e da Cidadania;
d) um representante dos servidores da Fundação, que será escolhido pelo
Presidente den
tre os nomes constantes da lista tríplice, em assembléia geral
dos servidores.
§ -
Os membros do Conselho Deliberativo terão mandato de quatro anos,
permitida a recondução por igual período.
§ - Cabe ao Secretário de Estado da Justiça, do Trabalho e
da Cidadania,
a nomeação dos membros integrantes do Conselho Deliberativo, excetuados
aqueles de que trata a alínea "b" deste artigo.
Art. 17 - Compete ao Conselho Deliberativo:
I -
aprovar o Plano Anual de Trabalho e a previsão da receita e da despesa
para o exercício seguinte;
II - responder às consultas formuladas pela Diretoria;
III -
aprovar os atos da Diretoria referidos no artigo 11, inciso VIII, deste
Estatuto;
IV - reunir-se extraordinariamente quando convocado pelo Diretor-Presidente;
V - conferir ao Diretor-
Presidente, no interesse dos objetivos da Fundação,
outras atribuições não especificadas neste Estatuto, desde que não colidam
com as normas gerais nele contidas;
VI - aprovar o Regimento Interno da Fundação;
VII - aprovar a criação, alteração
ou extinção de órgãos, serviços, cargos ou
funções da Fundação, por proposição da Diretoria;
VIII -
aprova anualmente o relatório circunstanciado das atividades da
Fundação, submetido pela Diretoria;
IX - aprovar alterações do Plano de Classificação de Ca
rgos e Salários da
Fundação, propostas pela Diretoria;
116
X - autorizar previamente a aquisição, alienação ou sub-
rogação de bens
imóveis e direitos, nas hipóteses previstas nos §§ e 2º, do art. , deste
Estatuto;
XI - aprovar convênios, contratos ou acor
dos que forem celebrados pela
Instituição, para obtenção de empréstimos para financiamento das atividades
da Fundação;
XII -
aprovar as diretrizes gerais para a elaboração do Plano Anual de
Trabalho bem como normas e critérios gerais para a execução de pla
nos,
programas e projetos a cargo da Fundação ou cuja prestação seja ajustada
através de acordos e contratos.
Parágrafo único -
As resoluções a que se referem os incisos I, II e V
dependem de aprovação da maioria dos membros presentes.
Art. 18 - O Conselho Deliberativo reunir-se-
á a cada três meses,
ordinariamente, e extraordinariamente, mediante convocação de seu
Presidente ou quando convocado por dois terços (2/3) de seus membros.
§ 1º - O Conselho Deliberativo poderá reunir-
se extraordinariamente, por
i
niciativa de um terço de seus membros, mediante ofício protocolizado com
antecedência mínima de dez dias.
§ 2º -
O Conselho Deliberativo funcionará com a presença da maioria de seus
membros e deliberará:
a) por maioria absoluta, no caso de reforma dos Estatutos;
b) por maioria de votos dos Conselheiros presentes, nos demais casos,
cabendo ao Presidente o voto de qualidade em caso de empate.
SEÇÃO IV
Do Conselho Curador
Art. 19 -
O Conselho Curador, com mandato de dois anos, será composto por
três membros
titulares e respectivos suplentes, de livre escolha do
Governador do Estado, a quem caberá a indicação do Presidente.
Parágrafo único - O Conselho Curador reunir-se-
á ordinariamente uma vez
por mês, e extraordinariamente, quando convocado por seu President
e ou
117
pelo Diretor-Presidente da Fundação.
Art. 20 - Compete ao Conselho Curador:
I - opinar sobre a aquisição e alienação de bens imóveis;
II -
apreciar os balanços anuais e as prestações de contas apresentadas pela
Presidência, emitindo parecer a respeito;
III -
acompanhar e fiscalizar a execução orçamentária e a aplicação das
despesas extraordinárias autorizadas pelo Conselho Deliberativo;
IV -
examinar documentos, livros e papéis que digam respeito à
administração financeira da Fundação, bem como verifi
car a situação do
Caixa e quaisquer valores em depósito;
V -
atender a consultas sobre matéria de sua competência, formalizadas pelo
Presidente e pelo Conselho Deliberativo.
Parágrafo único -
O Conselho Curador poderá recorrer, em caso de
necessidade, a pe
ssoas físicas ou jurídicas de reconhecida capacidade
técnica e idoneidade, para assessorá-
lo no desempenho das atribuições
fiscalizadoras a seu encargo.
CAPÍTULO IV
Do Regime Financeiro e da Fiscalização
Art. 21 - O exercício financeiro da Fundação coincidirá com o ano civil.
Art. 22 -
A prestação de contas anual da Fundação será encaminhada ao
Conselho Fiscal até o dia 15 de março de cada ano e constará, no mínimo,
dos seguintes elementos:
a) balanço patrimonial;
b) balanço financeiro;
c) demonstrativo de dívidas e compromissos a pagar;
d) quadros comparativos entre a receita prevista e a receita realizada, bem
como entre a despesa prevista e a realizada;
e) quadros comparativos de metas e receitas previstas e realizadas
referentes aos contratos de gestão em que a Fundação for executora.
118
Art. 23 -
A prestação de contas da Fundação, com parecer do Conselho
Curador e aprovação do Conselho Deliberativo, deverá ser publicada no
Diário Oficial do Estado e encaminhada aos Órgãos de Controle Interno do
Poder Ex
ecutivo Estadual e ao Tribunal de Contas do Estado para
apreciação.
CAPÍTULO V
Do Regime de Pessoal
Art. 24 -
A Fundação terá Quadro de Pessoal próprio, regido pela
Consolidação das Leis do Trabalho, além do Quadro de Funções de
Gratificação e Cargos em Comissão.
§ 1º -
Poderão ter exercício na Fundação servidores da Administração Pública
Direta ou Indireta do Estado, da União e dos Municípios, postos à sua
disposição, nos termos da legislação vigente.
§ - A Fundação poderá colocar servidores à disposi
ção da administração
Pública Estadual, Direta ou Indireta, por autorização do Diretor-
Presidente,
observada a legislação que rege a matéria.
§ -
No prazo de noventa dias, a contar da aprovação deste Estatuto, será
implantado o Plano de Classificação de Cargos e Salários da Fundação.
CAPÍTULO VI
Das Disposições Gerais e Transitórias
Art. 25 -
Os empregados das Fundações extintas pelo Decreto 34.154, de
30.12.91, passarão a integrar o Quadro de Pessoal da Fundação Gaúcha do
Trabalho e Ação Social, sendo-
lhes assegurados todos os direitos e
vantagens já adquiridos, previstos na Consolidação das Leis do Trabalho e no
respectivo Plano de Classificação de Cargos vigente à época.
Parágrafo único -
Os empregados da Fundação que venham a assumir cargo
de dire
ção e que optarem pela percepção das vantagens funcionais, terão
direito à gratificação natalina.
119
Art. 26 - O presente Estatuto poderá ser alterado no todo ou em parte.
§ -
A alteração a que se refere o "caput" deste artigo deverá ser feita por
propost
a da Diretoria ou, no mínimo, por dois membros do Conselho
Deliberativo.
§ -
Aceita a alteração pela maioria absoluta dos membros do Conselho
Deliberativo, será a mesma submetida à aprovação do Governador do
Estado.
Art. 27 - Os membros dos órgãos de a
dministração da Fundação não serão
pessoalmente responsabilizados pelas obrigações contraídas pela instituição
em virtude de ato regular de gestão, mas responderão, civil e penalmente,
pelos prejuízos que causarem por violação à Lei ou a este Estatuto.
Art. 28 -
Para compras, obras e serviços contratados, a Fundação deverá
observar, obrigatoriamente, os princípios de licitação estabelecidos na
legislação federal e estadual.
Art. 29 - A Fundação sujeitar-se-
á também ao controle da Contadoria e
Auditoria-Ge
ral do Estado e do Tribunal de Contas, de conformidade com o
DECRETO Nº 23.974, de 8.8.75.
Art. 30 -
O Presidente da Fundação editará os Regimentos Internos dos
Conselhos Deliberativo e Curador, após aprovação
do Secretário de Estado
da Justiça, do Trabalho e da Cidadania.
Art. 31 -
Em caso de extinção, todos os bens da Fundação reverterão ao
patrimônio do Estado, devendo ser observadas e seguidas as destinações a
que se dispunham enquanto integrantes da instituição.
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