Download PDF
ads:
UNIVERSIDADE ESTADUAL DO CEARÁ
ROBERTO BRUNO MOREIRA REBOUÇAS
A INFLUÊNCIA PORTUÁRIA NO MODELADO E RECONFIGURAÇÃO
DA ORLA:
O Caso do Porto do Mucuripe e da Praia do Serviluz (Fortaleza,
Ceará, Brasil)
FORTALEZA – CEARÁ
2010
ads:
Livros Grátis
http://www.livrosgratis.com.br
Milhares de livros grátis para download.
ROBERTO BRUNO MOREIRA REBOUÇAS
A INFLUÊNCIA PORTUÁRIA NO MODELADO E RECONFIGURAÇÃO DA ORLA:
O Caso do Porto do Mucuripe e Praia do Serviluz (Fortaleza, Ceará, Brasil)
Dissertação apresentada ao Curso de
Mestrado Acadêmico em Geografia do
Centro de Ciência e Tecnologia da
Universidade Estadual do Ceará, como
requisito parcial à obtenção do grau de
Mestre em Geografia.
Área de Concentração: Análise
Geoambiental e Ordenação do Território nas
Regiões Semi-Áridas e Litorâneas.
Orientador: Prof. Dr. Fábio Perdigão
Vasconcelos
FORTALEZA – CEARÁ
2010
ads:
R292i Rebouças, Roberto Bruno Moreira
A influência portuária no modelado e
reconfiguração da orla: o caso do Porto do Mucuripe
e Praia do Serviluz (Fortaleza, Ceará, Brasil) /
Roberto Bruno Moreira Rebouças. Fortaleza,
2010.
132 p.
Orientador: Prof. Dr. Fábio Perdigão
Vasconcelos.
Dissertação (Mestrado Acadêmico em
Geografia) Universidade Estadual do Ceará,
Centro de Ciência e Tecnologia.
1. Serviluz. 2. Praia Mansa. 3. Titãzinho. 4.
Porto do Mucuripe. 5. GIZC. I. Universidade
Estadual do Ceará, Centro de Ciência e Tecnologia
CDD: 330.98131
GOVERNO DO ESTADO DO CEARÁ
UNIVERSIDADE ESTADUAL DO CEARÁ
PRÓ-REITORIA DE PÓS-GRADUAÇÃO E PESQUISA
CENTRO DE CIÊNCIA E TECNOLOGIA - CCT
MESTRADO ACADÊMICO EM GEOGRAFIA
FOLHA DE APROVAÇÃO
Nome da Dissertação: “A INFLUÊNCIA PORTUÁRIA NO MODELADO E
RECONFIGURAÇÃO DA ORLA: O Caso do Porto do
Mucuripe e da Praia do Serviluz (Fortaleza, Ceará, Brasil)”
Data da Defesa: 30/08/2010
Nome do Autor: Roberto Bruno Moreira Rebouças
Nome do Orientador: Fábio Perdigão Vasconcelos
Trabalho apresentado no Curso de Mestrado
Acadêmico em Geografia CCT/UECE,
como requisito parcial à obtenção do Título
de Mestre em Geografia, Área de
Concentração: Análise Geoambiental e
Ordenação do Território nas Regiões Semi-
Áridas e Litorâneas.
BANCA:
Av. Paranjana, 1700 Campus do Itaperi – 60.740-000 – Fortaleza – CE – Fone: 3101.9792 – Fax: 3101.9885
Home Page: www.uece.br/mag - E-mail: [email protected]
Dedico este trabalho a minha Tia-Avó-Mãe
Eglantine, que sempre se preocupou comigo.
(In Memoriam)
AGRADECIMENTOS
Agradeço a Deus, por sempre me dar forças nas minhas empreitadas.
À Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior CAPES, pelo
suporte financeiro concedido por meio da bolsa de demanda social.
Ao Prof. Dr. Fábio Perdigão, orientador e amigo, a quem reservo grande admiração
e que sempre me incentivou nos caminhos da pesquisa. E aproveitando a deixa, aos
colegas de Lagizc, que sempre estiveram presentes no dia-a-dia do laboratório e,
claro, no sol dos trabalhos de campo.
Aos meus colegas de turma Mariluza – que é só paciência –, Lúcia – só “aperreio” –,
Julio Pacheco que atravessou a África para estudar conosco e que se mostrou
uma pessoa muito equilibrada e amiga, Sérgio com quem troquei muitas ideias
sobre SIG, em especial a Natacha que nunca me deixava perder os prazos quase
nunca e tantos outros, não da mesma turma, mas da UECE que estiveram
presentes nessa caminhada e que não cito no momento.
À Prof. Dra. Luzia Neide, que desde a graduação me incentivou na vida
acadêmica. A Júlia e Lúcia da coordenação do MAG, que sempre me
atenderam com muita atenção.
Ao amigo Prof. Dr. Elmo Vasconcelos – papito que na mesa de bar me convenceu
a optar pela Geografia como profissão.
Ao pessoal da Comissão do Vestibular da UECE, de onde fui colaborador e onde
sempre encontrei apoio.
Ao pessoal do Labomar, que me acolheu para minhas análises sedimentológicas,
em especial à Cida, Monica, Paulo, Luiz Gonzaga e Buda.
Ao pessoal do Museu da Imagem e do Som, que me receberam com muita atenção.
A Prof. Dra. Sandra Maia e a todo Gelda, em especial ao Magno, que foram
decisivos na aplicação e interpretação das entrevistas com os moradores e nas
correções de Português.
A minha e-avó Maria Sales, a mulher mais paciente que eu já conheci na vida. A
minha mãe Núbia, que muito batalhou para que eu tivesse sucesso. Aos meus tios
sempre presentes. A minha prima Raissa “minha aprendiz de cadista” e assessora
de assuntos aleatórios. Em especial a minha irmã Eline, sempre presente e que
muito me ajudou para materializar esse trabalho. E para não esquecer, o Roberto,
amigo da Eline, que também ajudou muito.
E por fim, agradeço aos meus amigos Emanoel, por ser o irmão que não
nasceu na mesma família, a Taís que sempre aturou as minhas marmotas, ao “mau
amigo” Christiano, sempre com algo “confortante” para dizer e
ao Paulo Emmanuel o “doido amigo”.
RESUMO
Esta pesquisa teve como objetivo estudar a influência da construção do Porto do Mucuripe
no modelado e na reconfiguração do litoral de Fortaleza, com ênfase na formação da Praia
do Serviluz e da Praia Mansa. Para atingirmos esse objetivo, procedemos à análise da
evolução histórica do local por meio da análise temporal de aerofotos e imagens orbitais, por
documentos históricos de divulgação pública e pelo relato dos moradores do Serviluz. Em
seguida analisamos a configuração atual da área em estudo com base nas imagens orbitais
atuais e na série de perfis topográficos realizados no local. Por fim, analisamos o processo
de evolução da ocupação antrópica face à progradação da praia. As análises de
documentos, de aerofotos, imagens orbitais e das coletas de campo foram feitas
concomitantemente, vez que as coletas de campo abrangeram um período de um ano, entre
outubro de 2008 e outubro de 2009. As análises gerais nos fazem concluir que o modelado
atual do Serviluz foi possível graças à construção do Porto do Mucuripe, de seus molhes
de proteção e pela ocupação antrópica das dunas da Ponta do Mucuripe; a ocupação
antrópica da Praia do Serviluz, à medida que ela foi se formando pelo processo de
progradação da linha de costa após a construção do molhe do Titãzinho, contribui para
agravar os problemas ambientais existentes na área; a população local tem conhecimento
dos problemas socioambientais do seu bairro e apresenta sugestões de soluções; o volume
de sedimentos existente na Praia do Serviluz pode ser utilizado na recomposição da praias
erodidas do litoral oeste de Fortaleza; outras possibilidades de jazidas de sedimentos estão
disponíveis num raio de 20 Km a partir das praias erodidas, sendo elas as existentes na
Plataforma Continental, no Rio Ceará e na foz do Rio Cocó; a utilização de planos de
Gestão Integrada da Zona Costeira GIZC apresenta-se como uma ferramenta eficiente
para a recuperação e a requalificação de ambientes litorâneos.
Palavras Chave: Serviluz. Praia Mansa. Titãzinho. Porto do Mucuripe. GIZC.
ABSTRACT
This research aims to study the influence of the Mucuripe Harbor construction in modeling
and reconfigurating the coast of Fortaleza, emphasizing the formation of Serviluz and Mansa
Beaches. To achieve this goal, we proceeded to the analysis of the historical evolution of
these places from the narratives of the area residents, from public historical documents, and
from aerial photographs and satellite images. Then we analyzed the current area
configuration in a study based on satellite images and on the current series of the
topographic profiles made. Finally, we analyzed the evolution process of the human
occupation in view of the progradation of the beach. The analysis of the documents, of the
aerial photographs and satellite images and of the field research data were concurrently
done, once that the field research occured within the period of one year, from October 2008
to October 2009. The general analyses made us conclude that the current model of Serviluz
is only possible due to the construction of the Mucuripe Harbor, including its protection piers,
as well as to the human occupation of the dunes of the area called Ponta do Mucuripe. The
human occupation of Serviluz/Titãzinho Beach, as it has happened by the process of
progradation of the shoreline after the construction of Titãzinho’s pier, contributes to the
environmental problems in the area. The local population knows the socio-environmental
problems in its neighborhood and suggests solutions. The sediment volume in the Serviluz
Beach can be used in the rebuilding of eroded beaches of the west coast of Fortaleza. Other
possible sediment sources are available in a radius of 20 km from the eroded beaches,
which are the ones of the Continental Shelf, in Ceará River and in the Cocó River mouth.
The use of plans for Integrated Coastal Zone Management ICZM is presented as an
efficient tool for the recovery and rehabilitation of coastal environments.
Keywords: Serviluz. Beach Mansa. Titãzinho. Mucuripe Harbor. ICZM.
LISTA DE TABELAS
Tabela 1 Frequência Percentual dos Ventos (direção e velocidade) ........................26
Tabela 2 Censos Demográficos 1940 – 2000 ...........................................................44
Tabela 3 Localização dos Perfis Topográficos em UTM ...........................................76
Tabela 4 Evolução Espaço/Tempo do Serviluz. Fonte: Rebouças, 2010 .................91
Tabela 5 Localização dos Pontos de Sondagem em UTM......................................102
Tabela 6 Classificação das Amostras (McCammon 1962)......................................103
Tabela 7 Classificação das Amostras (McCammon 1962)......................................118
LISTA DE FIGURAS
Figura 1 Identificação da Jazida da Plataforma Continental...........................................16
Figura 2 Identificação da Jazida do Rio Ceará..........................................................16
Figura 3 Identificação da Jazida da Praia do Serviluz. ...............................................17
Figura 4 Localização da Praia do Serviluz.. ..............................................................23
Figura 5 Vista da Rua Pontamar (julho de 2009). ............................................................27
Figura 6 Refração das ondas ao se aproximarem da linha de costa.........................28
Figura 7 Rosa de Ondas do Litoral do Ceará (direção e altura significativa). ...........29
Figura 8 Emissário de drenagem. .............................................................................30
Figura 9 Início da Formação da Praia Mansa............................................................31
Figura 10 Modelo reduzido do Porto do Mucuripe elaborado pelo SOGREAH.. .......32
Figura 11 Molhe de Proteção do Porto em 1958.......................................................33
Figura 12 Molhe de Proteção do Porto em 1972.......................................................34
Figura 13 Molhe de Proteção do Porto em 2008.......................................................35
Figura 14 Enseada do Mucuripe Antes da Construção do Porto...............................38
Figura 15 A) Praia do Futuro e ponta do Mucuripe 1958; B) Praia do Futuro e ponta
do Mucuripe 2008 .....................................................................................................46
Figura 16 Imagem ao fundo da Praia do Serviluz no ano 2008, sobreposta em
transparência pelo ano de 1958................................................................................48
Figura 17 Lixo na praia..............................................................................................56
Figura 18 Área demarcada pelo Decreto 4.333/2002................................................63
Figura 19 Representação esquemática do nivelamento topográfico. .......................76
Figura 20 Sondagem com pá a trado manual.. .........................................................77
Figura 21 Serviluz e Praia Mansa, década de 1950. ................................................86
Figura 22 Serviluz e Praia Mansa, década de 1970..................................................87
Figura 23 Serviluz e Praia Mansa, década de 2000..................................................88
Figura 24 Carta Imagem - Evolução da Praia do Serviluz.........................................90
Figura 25 Perfis transversais da Praia do Serviluz....................................................93
Figura 26 Foto panorâmica da mureta da Rua Ponta Mar, com retirada mecânica de
sedimentos em outubro de 2008...............................................................................94
Figura 27 Montagem de cartas 701 mostrando a formação de restinga submersa. .96
Figura 28 Localização dos Projetos de Regeneração Artificial de Praia.. .................99
Figura 29 Vista do molhe do Titãzinho e Rua Pontamar.. .......................................100
Figura 30 Distribuição espacial dos pontos de coleta. ...........................................102
Figura 31 Linha de Greide e Perfil de Corte 1.........................................................107
Figura 32 Linha de Greide e Perfil de Corte 2.........................................................107
Figura 33 Linha de Greide e Perfil de Corte 3.........................................................108
Figura 34 Linha de Greide e Perfil de Corte 4.........................................................108
Figura 35 Linha de Greide e Perfil de Corte 5.........................................................108
Figura 36 Linha de Greide e Perfil de Corte 6.........................................................109
Figura 37 Linha de Greide e Perfil de Corte 7.........................................................109
Figura 38 Linha de Greide e Perfil de Corte 8.........................................................109
Figura 39 Linha de Greide e Perfil de Corte 9.........................................................110
Figura 40 Linha de Greide e Perfil de Corte 10.......................................................110
Figura 41 Linha de Greide e Perfil de Corte 11.......................................................110
Figura 42 Linha de Greide e Perfil de Corte 12.......................................................111
Figura 43 Linha de Greide e Perfil de Corte 13.......................................................111
Figura 44 Linha de Greide e Perfil de Corte 14.......................................................111
Figura 45 Bancos de areia na Foz do Rio Cocó......................................................117
LISTA DE GRÁFICOS
Gráfico 1 Histograma Sondagem 1E.......................................................................104
Gráfico 2 Histograma Sondagem 2E.......................................................................104
Gráfico 3 Histograma Sondagem 3E.......................................................................104
Gráfico 4 Histograma Sondagem 4E.......................................................................104
Gráfico 5 Histograma Sondagem 5E.......................................................................104
Gráfico 6 Histograma Sondagem 6E.......................................................................104
Gráfico 7 Histograma Sondagem 7E.......................................................................105
Gráfico 8 Histograma Sondagem 8E.......................................................................105
Gráfico 9 Histograma Sondagem 9E.......................................................................105
Gráfico 10 Histograma Sondagem 10E e 11E ............................................................105
Gráfico 11 Frequências Acumuladas Perfil de Sondagem 1E e 2E ........................105
Gráfico 12 Frequências Acumuladas Perfil de Sondagem 3E e 4E ........................105
Gráfico 13 Frequências Acumuladas Perfil de Sondagem 5E e 6E ........................106
Gráfico 14 Frequências Acumuladas Perfil de Sondagem 9E, 10E e 11E..............106
Gráfico 15 Frequências Acumuladas Perfil de Sondagem 7E e 9E ........................106
Gráfico 16 Histograma Granulometria Banco 1.......................................................118
Gráfico 17 Histograma Granulometria Banco 2.......................................................118
LISTA DE SIGLAS E ABREVIATURAS
ACS ASSOCIAÇÃO COMERCIAL DE SANTOS
BD BANCO DE DADOS
BDM BANCO DE DADOS METEREOLÓGICOS
CAD COMPUTER-AIDED DESIGN (DESENHO ASSISTIDO
POR COMPUTADOR)
CEARAH PERIFERIA CENTRO DE ESTUDOS, ARTICULAÇÃO E REFERÊNCIA
SOBRE ASSENTAMENTOS HUMANOS,
CODESP COMPANHIA DOCAS DO ESTADO DE SÃO PAULO
COGERH COMPANHIA DE GESTÃO DE RECURSOS HÍDRICOS
CONIT CONSELHO NACIONAL DE INTEGRAÇÃO DE POLÍTICAS
DE TRANSPORTES
CPRM SERVIÇO GEOLÓGICO DO BRASIL
CPTEC CENTRO DE PREVISÃO DE TEMPO E CLIMA
DHN DIRETORIA DE HIDROGRAFIA E NAVEGAÇÃO
EC EMENDA CONSTITUCIONAL
FUNCEME FUNDAÇÃO CEARENSE DE METEOROLOGIA E
RECURSOS HÍDRICOS
GEOTIFF GEO TAGGED IMAGE FILE FORMAT
GIZC GESTÃO INTEGRADA DA ZONA COSTEIRA
IBGE INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA
INCRA INSTITUTO NACIONAL DE COLONIZAÇÃO E REFORMA
AGRÁRIA
INPH INSTITUTO NACIONAL DE PESQUISAS HIDROVIÁRIAS
INPE INSTITUTO NACIONAL DE PESQUISA ESPACIAL
LAGIZC LABORATÓRIO DE GESTÃO INTEGRADA DA ZONA
COSTEIRA
LABOMAR INSTITUTO DE CIÊNCIAS DO MAR
LANDSAT LAND REMOTE SENSING SATELLITE
MIS MUSEU DA IMAGEM E DO SOM
PDDU PLANO DIRETOR DE DESENVOLVIMENTO URBANO
PDP PLANO DIRETOR PARTICIPATIVO
PDZP PLANO DE DESENVOLVIMENTO E ZONEAMENTO
PORTUÁRIO
LPM LINHA DE PREAMAR MÉDIA
LTM LINHA DOS TERRENOS DE MARINHA
PMF PREFEITURA MUNICIPAL DE FORTALEZA – PMF/SEINF
PND’s PLANOS NACIONAIS DE DESENVOLVIMENTO
PNGC PLANO NACIONAL DE GERENCIAMENTO COSTEIRO
PNMA POLÍTICA NACIONAL DO MEIO AMBIENTE
PNRM POLÍTICA NACIONAL PARA OS RECURSOS DO MAR
PORTOBRÁS EMPRESA DE PORTOS DO BRASIL S/A
RBMC REDE BRASILEIRA DE MONITORAMENTO CONTÍNUO
SEMACE SUPERINTENDÊNCIA ESTADUAL DO MEIO AMBIENTE
SGBD SISTEMA DE GESTÃO DA BASE DE DADOS
SIAD SISTEMA DE INFORMAÇÃO PARA A AJUDA À DECISÃO
SIG SISTEMA DE INFORMAÇÃO GEOGRÁFICA
SISNAMA SISTEMA NACIONAL DO MEIO AMBIENTE
SOGREAH LABORATOIRE DAUPHINOIS D´HYDRAULIQUE
SPU SECRETARIA DO PATRIMÔNIO DA UNIÃO
UECE UNIVERSIDADE ESTADUAL DO CEARÁ
UFC UNIVERSIDADE FEDERAL DO CEARÁ
UNESCO ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS PARA A
EDUCAÇÃO, A CIÊNCIA E A CULTURA
UTM UNIVERSAL TRANSVERSA DE MERCATOR
ZC ZONA COOSTEIRA
ZCIT ZONA DE CONVERGÊNCIA INTER TROPICAL
ZEEC ZONEAMENTO ECOLÓGICO ECONÔMICO
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO.......................................................................................................15
2 O SERVILUZ: considerações sobre a área em estudo......................................22
2.1 CARACTERIZAÇÃO AMBIENTAL...................................................................22
2.2 ASPECTOS HISTÓRICOS..............................................................................37
2.2.1. A criação do Porto de Fortaleza............................................................37
2.2.2. A ocupação antrópica............................................................................40
2.2.3. A questão social da ocupação..............................................................48
3 BASE LEGAL E PROJETOS RELACIONADOS À ÁREA DE ESTUDO..............57
3.1 LEGISLAÇÃO PERTINENTE ..........................................................................57
3.1.1 Legislação Federal..................................................................................58
3.1.2 Legislação Estadual................................................................................63
3.1.3 Legislação Municipal ..............................................................................64
3.2 PROJETOS INSTITUCIONAIS E GOVERNAMENTAIS NA ÁREA DE ESTUDO
...............................................................................................................................65
4 MÉTODOS E TÉCNICAS DE PESQUISA .............................................................68
4.1 ESTUDO QUALITATIVO .................................................................................68
4.2 ESTUDO QUANTITATIVO ..............................................................................73
4.3 GESTÃO INTEGRADA DA ZONA COSTEIRA................................................81
5 RESULTADOS E DISCUSSÕES...........................................................................84
5.1 FORMAÇÃO DA PRAIA DO SERVILUZ E DA PRAIA MANSA.......................84
5.2 CONFIGURAÇÃO ATUAL DO MODELADO DA ORLA MARÍTIMA ................92
5.3 ANÁLISE DE SOLUÇÕES...............................................................................96
6 PLANO DE RETIRADA .........................................................................................99
6.1 PLANO OPERACIONAL................................................................................101
6.2 SEQUÊNCIA DE RETIRADA DOS SEDIMENTOS .......................................112
6.3 RETIRADA DE DETRITOS............................................................................113
6.4 CONSIDERAÇÕES SOBRE O PLANO.........................................................114
7 CONSIDERAÇÕES FINAIS.................................................................................120
REFERÊNCIAS.......................................................................................................123
ANDICE..............................................................................................................130
ANEXO ...................................................................................................................131
1 INTRODUÇÃO
Os ambientes costeiros são reconhecidos mundialmente como áreas de
expressiva fragilidade ambiental, cujos componentes integradores obedecem a uma
dinâmica complexa, resultante direta da interação entre agentes continentais e
litorâneos, naturais e antrópicos. Essa fragilidade supracitada pode ser observada
mesmo pelo olho mais leigo, mas, a fortiori, é evidente ao olhar técnico.
O interesse por trabalhar neste estudo a Zona Costeira e seus desafios
nasceu, a princípio, da observação diária dos fenômenos que envolvem essa
dinâmica e da necessidade de compreender as transformações por que passa esse
ambiente, e, como aluno de graduação em Geografia da Universidade Estadual do
Ceará - UECE, pela aproximação profissional e teórica que nos foi possível junto ao
Laboratório de Gestão Integrada da Zona Costeira – LAGIZC/UECE.
A participação neste laboratório de pesquisa nos levou a compor, junto ao
líder do grupo, Professor Dr. Fábio Perdigão Vasconcelos, uma equipe que
elaboraria o Projeto Básico Emergencial de Proteção/Recuperação da Praia de
Iracema, junto ao Instituto de Ciências do Mar LABOMAR/UFC e ao Escritório de
Projetos Especiais da Prefeitura Municipal de Fortaleza PMF e colaboraria na
elaboração do Projeto Executivo do mesmo programa de recuperação, encabeçado
pelo professor Dr. Luis Parente Maia do LABOMAR. Os projetos têm como objetivo
discutir e apresentar soluções para recuperação da Praia de Iracema, cartão postal
da capital cearense, que, ao longo dos anos, viu sua paisagem ser modificada pela
forte erosão decorrente do barramento do caminhamento de sedimentos resultante
da construção do Porto do Mucuripe e do molhe do Titãzinho.
Durante a elaboração dos projetos acima descritos (VASCONCELOS et al,
2008; MAIA et al., 2008), a equipe técnica apontou a existência de três jazidas de
empréstimo de sedimentos localizadas na capital cearense, dentro do perímetro
urbano, e que serviriam para recuperação das praias erodidas a jusante do Porto do
Mucuripe. A primeira, identificada como Jazida da Plataforma Continental (Figura 1),
estende-se por 7.500 metros, partindo da ponta do molhe de proteção do porto no
sentido de leste para oeste, com volume disponível de sedimento estimado em
12.600.000 m
3
; a segunda, no limite entre os municípios de Fortaleza e de Caucaia,
é a Jazida do Rio Ceará (Figura 2), onde foram identificados quatro bancos de
16
areias próprios para um procedimento de dragagem, cujo volume estima-se em
537.000 m
3
; e a terceira jazida seria a Praia do Serviluz (Figura 3), a leste do Porto
do Mucuripe, que tem abalançamento de acumulação de sedimentos na ordem de
800.000 m³/ano e que, estima-se, desde a construção do molhe da praia do Futuro,
tenha acumulado 26.400.000 m³ (PITOMBEIRA, 1995).
Figura 1 - Identificação da Jazida da Plataforma Continental. Fonte: Vasconcelos et al. 2008, p. 43.
Figura 2 - Identificação da Jazida do Rio Ceará. Fonte: Vasconcelos et al. 2008, p. 46.
17
Figura 3 - Identificação da Jazida da Praia do Serviluz. Fonte: Vasconcelos et al. 2008, p. 49.
Alguns fatores contribuíram sobremaneira para a decisão da PMF quanto à
retirada dos sedimentos na jazida correspondente à Praia do Serviluz, entre os
quais, destaca-se o custo operacional da obra, aliado à necessidade de mitigar os
transtornos sofridos pela população local com o acúmulo dos sedimentos.
Os portos e seus conflitos
“A história das nações é escrita com o trabalho de seus filhos, com a riqueza
do seu solo e com o movimento dos seus portos”. Assim se expressa o consultor
portuário Sérgio da Costa Matte, Engenheiro especializado em portos, professor
universitário e presidente da Companhia Docas do Estado de São Paulo CODESP
entre 1980 e 1985, em entrevista ao periódico Carta ACS
1
.
1
Carta ACS. Publicação trimestral da Associação Comercial de Santos - Ano XXII - Out/Dez 2004 nº
172.
18
No Brasil, assim como em todos os países do mundo, as cidades do litoral,
onde existem terminais portuários, estão fortemente relacionadas ao papel histórico
dos portos, cuja origem data do início de 1800, com a chegada da família Real ao
País e a denominada abertura dos portos às nações amigas em 28 de janeiro de
1808. Empreendidos por D. João VI para realização do comércio de madeira, ouro e
outras riquezas naturais existentes no País, e a importação de produtos
manufaturados e outras especiarias para nobreza, os portos serviam também para
facilitar o tráfego de escravos da África. Fortaleza não fugiu a essa regra. À guisa de
curiosidade, incluímos nos anexos cópia fac-símile do documento assinado pelo
então príncipe D. João de Portugal (Anexo A).
Não se tem ideia da data exata da origem dos portos no mundo, com muito
poucos registros sobre os primeiros portos. Fernandez-Armesto (2006), em sua obra
intitulada Os Desbravadores assim descreve:
“No começo do segundo milênio a.C., as cidades do Indo
2
prosperavam em virtude de contatos a longa distância. Seus postos
militares no exterior estavam claramente localizados de modo a
favorecer o comércio para atrair ou proteger navios e caravanas
que vinham de longe” (FERNANDEZ-ARMESTO, 2006, p. 39)
Pelo relato podemos concluir que a atividade portuária existe há pelo menos 4
mil anos, sendo de conhecimento comum a importância do uso desse setor. Os
portos são inegavelmente um setor que gera riquezas para o País.
No Brasil, a história portuária começa com as primeiras instalações
rudimentares, construídas logo após o descobrimento, e ainda presentes hoje em
algumas regiões, indo até as grandes estruturas dos complexos portuários e
terminais especializados hoje existentes ao longo de toda sua costa (OLIVEIRA e
RICUPERO, 2007). Essa evolução segundo Kappel (2005) teve pontos de inflexão
de grande relevância em 1808, quando das concessões para exploração dos “portos
organizados” e das ferrovias de acesso, no final do Século XIX.
No século XX, a implantação de terminais especializados, necessários e
compatíveis com a industrialização do pós-guerra, funcionou como instrumento da
prioridade exportadora dos Planos Nacionais de Desenvolvimento – PND’s, nos
governos da ditadura militar, destacando-se a atuação da Portobrás. Segundo
2
Vale do rio Indo, maior rio do Paquistão, atravessa também a Índia e a China. A toponímia de Índia
vem do nome desse rio.
19
esse autor, a partir da cada de 1990, o mesmo que ocorreu com os portos de
praticamente todos os países, também ocorreu aos portos brasileiros: passaram por
profundas reformas, com a finalidade de torná-los compatíveis com a nova ordem
econômica e política internacional. Essa compatibilização se deveu ao fato de
estarem diretamente “correlacionados ao desempenho portuário mundial, ao
acelerado incremento do comércio internacional e à demanda por ganhos contínuos
e exponenciais na eficiência produtiva” (KAPPEL, 2005; paginação irregular).
Ainda é um grande problema nas cidades portuárias a falta de entendimento
entre as administrações portuárias e as prefeituras municipais, no que diz respeito
aos seus Planos de Desenvolvimento e Zoneamento Portuário PDZP e Diretor de
Desenvolvimento Urbano PDDU. Por essa razão, o entorno dos portos é
frequentemente ligado a ocupações desordenadas e com contingente populacional
de baixa renda, o que promove um grave problema social e administrativo, haja vista
a dificuldade em proceder com um ordenamento urbano adequado dessas áreas,
principalmente nos portos mais antigos. A ocupação desordenada de regiões
sensíveis, como os entornos dos portos, tornou-se aspecto relevante nas últimas
três décadas, principalmente a partir do estabelecimento do Plano Nacional de
Gerenciamento Costeiro – PNGC, parte integrante da Política Nacional para os
Recursos do Mar – PNRM e Política Nacional do Meio Ambiente – PNMA.
De acordo com o que se tradicionalmente em cidades portuárias, a zona
portuária de Fortaleza agrega moradores em geral de baixa ou baixíssima renda e
simbolicamente constitui-se como zona de baixo meretrício. Somados a essa
realidade estão a violência e o tráfico de drogas, como aspectos da degradação
social, e os impactos ambientais causados por emissão de resíduos sólidos, líquidos
ou derrame de produtos perigosos. Segundo Oliveira e Ricúpero (2007), os portos
são tradicionalmente regiões de conflito. Os aspectos ambientais, sociais e
econômicos constituem cenários de desafio para a administração pública e
atingem de perto a sociedade, com seus múltiplos riscos.
Oliveira e Ricúpero (2007) argumentam que os conflitos formados por esses
impasses poderão ser atenuados ou resolvidos a curto, médio e longo prazos,
com a realização de estudos científicos que assinalem os problemas e os
imperativos locais e proponham planos de soluções, por meio do uso de tecnologias
20
ou inovações necessárias para a adequação dos portos e de seu entorno a uma
nova realidade.
Tendo em vista os problemas aqui apresentados, e que claramente dizem
respeito a um conflito socioambiental, formularam-se questões relativas aos
objetivos de nosso estudo:
Quais as possibilidades de atenuação dos riscos e as implicações dos
problemas do assoreamento da bacia portuária, o soterramento das residências e
equipamentos urbanos a montante do porto e a recomposição das praias erodidas a
jusante do Mucuripe com um plano de gestão do balanço sedimentar? Essa questão
levantou-nos demais vidas acerca dos procedimentos propostos pelos Guias da
Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura
UNESCO sobre a Gestão Integrada da Zona Costeira – GIZC, em que a qualificação
de uma área em estudo deve considerar seus aspectos físicos, sociais e humanos, a
fim de responder a uma abordagem ecossociosistêmica.
Partindo do reconhecimento do problema existente alteração do modelado
da costa após a construção do Porto do Mucuripe -, coube-nos questionar quais as
consequências causadas pelas alterações sofridas no modelado da orla marítima de
Fortaleza a partir da implantação do porto até os dias atuais, verificadas por meio de
aerofotos e de imagens orbitais de alta resolução? Tendo em vista a progradação a
montante do molhe de proteção do porto e a ocupação dela decorrente, buscamos
conhecer qual o papel representado pela população no uso e manejo da praia e
como essa população enfrenta os problemas do transporte eólico das areias rumo
as suas residências.
Com essas questões em tela, o interesse pelo estudo específico da área nos
levou a desenvolver a presente pesquisa de Mestrado que teve como objetivo geral
estudar a influência da construção do Porto do Mucuripe no modelado e na
reconfiguração do litoral de Fortaleza, com ênfase na formação da Praia do Serviluz.
O estudo apresenta também os seguintes objetivos específicos:
- analisar a evolução histórica do local por meio do relato dos moradores e
pela análise temporal das imagens;
- analisar a configuração atual da área em estudo com base nos perfis
realizados e nas análises das imagens atuais;
- analisar evolução da ocupação antrópica face à progradação da praia.
Alcançados os objetivos aqui propostos, este estudo pretendeu ainda:
21
- propor medidas mitigadores dos problemas enfrentados pela população
local;
- propor as bases para um plano de gestão fundamentado nos interesses e
necessidades da população do Serviluz, bem como na necessidade de
requalificação das praias a oeste do Porto.
A realização do presente estudo visa também contribuir com soluções que
possam ser aplicadas na Praia do Serviluz visando contribuir para a gestão
integrada e sustentável desse trecho da zona costeira de Fortaleza.
2 O SERVILUZ: considerações sobre a área em estudo
Nesta seção procederemos à apresentação da área de estudo,
compreendendo inicialmente sua localização geográfica, seguida de sua
caracterização ambiental, quando apresentamos de maneira integrada as condições
geológicas; oceanográficas, climáticas e biológicas da Praia do Serviluz e do seu
entorno.
Em seguida abordaremos os aspectos históricos, que permeiam a construção
do novo Porto de Fortaleza Porto do Mucuripe e a ocupação do seu entorno,
trazendo um panorama do avanço do remodelamento da linha de costa e do avanço
demográfico sofrido pela área, desencadeados com o processo de progradação
consequente à instalação do molhe do Titãzinho.
2.1 CARACTERIZAÇÃO AMBIENTAL
A área abrangida em nosso estudo, Praia do Serviluz, está localizada na
capital cearense, cidade sede de uma região metropolitana composta por 15
municípios, sendo 6 limitantes com o Atlântico perfazendo 126 km de praias, dos
quais 33,6 km são de praias fortalezenses limitadas a oeste pelo rio Ceará limite
com o município de Caucaia e a leste pelo Rio Pacoti limite com o município de
Aquiraz.
A praia do Serviluz está situada no bairro do Cais do Porto no limite
geográfico que estabelece a mudança de orientação da linha de costa, sendo a
porção a barlamar do porto de orientação SE-NE, enquanto a vertente a sotamar
orienta-se de ENE-WSW, no bairro do Cais do Porto. A pesquisa deteve-se à área
delimitada pelo molhe de contenção da Praia do Futuro molhe do Titãzinho – até a
Rua Ismael Pordeus e da Avenida Zezé Diogo até o limite como o Oceano Atlântico,
perfazendo hoje no final da primeira década do século XXI uma área aproximada de
537.000 m
2
e 1.400 metros de praia como podemos ver na Figura 4.
23
Figura 4 - Localização da Praia do Serviluz. Fonte: Imagem QB 2008 COGERH - compilação
Rebouças 2010.
Para que se possa compreender o funcionamento da dinâmica costeira, faz-
se necessário o conhecimento sistêmico prévio integrado da descrição geológica,
dos condicionantes climáticos, de direção e força dos ventos, bem como dos dados
pluviométricos, e das condicionantes oceanográficas, tais como o clima de ondas e a
direção e força das correntes de deriva, levando igualmente em consideração a ação
humana e suas intervenções. Para atingir esse objetivo, trabalhamos
convergentemente os dados coletados na literatura disponível associados aos dados
de institutos oficiais, como o Instituto Nacional de Pesquisas Hidroviárias INPH, a
Diretoria de Hidrografia e Navegação DHN, a Companhia de Gestão de Recursos
Hídricos COGERH, a Fundação Cearense de Meteorologia e Recursos Hídricos
FUNCEME e o Serviço Mineralógico do Brasil CPRM, combinados aos dados
resultantes dos trabalhos de campo.
O entendimento dos processos de deposição – que causam a progradação da
praia e o assoreamento da bacia portuária –, de erosão costeira e das
características sedimentológicas das praias depende fundamentalmente do
conhecimento da geologia local.
24
Afirma Morais que o litoral de Aracati a Fortaleza apresenta grande
uniformidade com extensos campos de dunas que recobrem os sedimentos
terciários da Formação Barreiras e afloramentos eruptivos (MORAIS, 1969, 1980), e
sobre a geologia de Fortaleza e de sua região adjacente o autor classifica ainda em
“três feições diferentes: os terrenos cristalinos, o vulcanismo [...] e a faixa sedimentar
costeira” (MORAIS, 1981, p.19). Coutinho e Morais, em seu estudo sobre a
distribuição dos sedimentos na plataforma continental do norte e nordeste do Brasil,
afirmam que, sobre o Barreiras, no litoral semi-árido na costa do Ceará se
apresentam muitas dunas móveis em função dos baixos índices pluviométricos que
não proporcionam o surgimento de vegetação capaz de fixar os depósitos
(COUTINHO e MORAIS, 1970). No entanto podemos defender que não se trata de
baixos índices pluviométricos, mas sim da irregularidade da quadra chuvosa que se
concentra prioritariamente em 4 a 5 meses por ano, somada ao balanço hídrico
negativo taxa de evaporação superior à taxa de precipitação apresentado nesta
região.
Segundo Brandão (1995) a Formação Barreiras é de idade plio-pleistocênica
e acompanha a linha de costa com largura variável. A sobreposição à Formação
Barreiras dos cordões de dunas presentes no litoral cearense é, conforme expõe
Souza (1988), produto do trabalho de deflação e de acumulação eólica. Vale
ressaltar que os estudos sobre a Formação Barreiras remontam ao inicio do século
passado, quando Branner (1902), que citamos em estudo anterior (Gurgel et al.,
2010), usou pela primeira vez a expressão para classificar sedimentos
inconsolidados, variegados, que ocorrem de forma contínua ao longo de toda a faixa
costeira, desde o Rio de Janeiro até o Amazonas. Essa formação é litologicamente
formada por sedimentos areno-argilosos de coloração variada com matrizes
amarelo-avermelhadas como abordaram Souza et al. (2009), Gurgel et al. (2010).
Entre o estirâncio e os sedimentos da Formação Barreiras localizam-se os
terraços marinhos. E segundo Morais (1980a), “Dunas bordejam paralelamente a
linha de costa em uma faixa que vai de dezenas de metros a 3 km. Concentram-se
em maior escala no litoral leste do município de Fortaleza.” (MORAIS, 1980; p. 52),
faixa que tem adensado exponencialmente a ocupação nas ultimas décadas, a
exemplo do que ocorre no Serviluz, hoje ocupado por indústrias de derivados de
petróleo e por habitações em condições precárias de infra-estrutura.
Os sedimentos praiais, encontrados na faixa costeira do Ceará, são
25
compostos por neossolos quartzarênicos, com granulometria entre média e
grosseira, sendo a área em estudo situada na planície litorânea, a qual pode ser
caracterizada nas geofácies: da faixa praial, das dunas e dos terraços marinhos
holocênicos. A granulometria do Serviluz foi classificada nos trabalhos de Morais
(1980; 1981) de média a fina, por Vasconcelos (2005) como majoritariamente
composta por sedimento de granulometria dia, e Albuquerque (2008) em estudo
na Praia do Futuro realizou análises sedimentares nas proximidades da Rua Ismael
Pordeus onde encontrou sedimentos predominantemente médios.
Souza et al. (2009) afirmam que a faixa praial de Fortaleza é composta
majoritariamente por sedimentos continentais que foram transportados pela
drenagem até o litoral onde foram retrabalhados pela abrasão marinha e foram
recobertos por neossolos quartizarênicos marinhos.
Formam-se no Serviluz lençóis de areia na superfície praial seguindo o
sentido dominante dos ventos, formando depósitos temporários como classifica
Fryberger et al. (1983). Podemos então caracterizar essa zona como by pass zone,
ou seja, uma zona de alimentação ou passagem de sedimentos. No Serviluz estes
sedimentos caminham do estirâncio para o berma e posteriormente para a formação
de dunas que, se não houvesse o barramento causado pela construção do porto,
das indústrias de derivado de petróleo ali instaladas e das casas, caminhariam rumo
às praias do Mucuripe e assim continuariam a alimentar o sistema.
O transporte eólico de sedimentos é diretamente afetado pelas condições
climáticas e é favorecido pelo período de estiagem que se estende em geral dos
meses de agosto a novembro. O estado do Ceará está integralmente inserido na
zona tropical, muito embora, por uma anomalia no mesoclima, apresentando clima
majoritariamente semiárido, com precipitações mal distribuídas no tempo e no
espaço. As precipitações concentradas na quadra chuvosa se seguem no período
compreendido entre os meses de janeiro a junho, sendo ainda o estado marcado por
anos de seca e anos com excesso de chuvas. A exemplo disso, recordamos o
volume de precipitação acumulado em Fortaleza nos anos de 1993, quando choveu
apenas 353 mm e 1994 quando choveu 2.352. Estes valores constam no Banco de
Dados Meteorológicos BDM do Centro de Previsão de Tempo e Clima CPTEC
do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais – INPE.
Vale ressaltar que o litoral cearense tem médias pluviométricas acima das
registradas no sertão, em decorrência da influência do Oceano Atlântico. Segundo
26
Ayoade (1998) as regiões próximas ao equador não têm definidas as quatro
estações do ano, sendo marcadas apenas pela presença do inverno e do verão. A
convenção popular no Ceará é a de chamar o período das chuvas de inverno, o que
na realidade qualifica-se como verão. Em contrapartida, o período de estiagem é
tradicionalmente considerado verão, independentemente da época do ano.
Em Fortaleza, a amplitude de temperatura entre as médias de temperatura
máximas e mínimas – dos períodos compreendidos como inverno e verão raramente
superam os 2º C.
Segundo a Funceme o regime de chuvas e os ventos em Fortaleza são
marcados pelo ciclo sazonal regido pela Zona de Convergência Inter Tropical
ZCIT, que se desloca para o norte ou para o sul. Essa mudança na posição da ZCIT
proporciona a mudança dos ventos que passam a predominar do quadrante NE,
enquanto na maior parte do ano a predominância é de ventos dos quadrantes SE,
ESE e E. Encontra-se disponível no trabalho de Gurgel et al. (2010) uma compilação
dos dados da estação meteorológica do Mucuripe, que demonstra a direção e a
velocidade dos ventos no período de 01/01/1997 a 31/12/1997, como observamos
na Tabela 1.
Tabela 1 - Frequência Percentual dos Ventos (direção e velocidade)
Intervalo de velocidade (m/s)
Estação
Direção
1 a 5 >5 a 7 >7 a 9 > 9
%
Velocidade
média (m/s)
Total
de
Obs.
N
-
1,3 - - 1,3 7,0
NE 6,65 2,19 - - 8,84
4,2
E 12,05 46,0 17,26
2,46 76,76
6,8
Mucuripe
SE 3,36 4,09 4,36 1,36 13,10
6,7
8760
Fonte: Funceme in Gurgel et al (2010, p. 99)
Uvo e Nobre (1989), em seus estudos sobre a relação entre a ZCIT e o ciclo
de chuvas nas regiões Norte e Nordeste do Brasil, relatam que a ZCIT é o principal
sistema gerador de chuvas no nordeste do país, e que tal fato é observado quando o
pico de chuvas sobre o nordeste ocorre concomitantemente com o período em que a
ZCIT está posicionada mais ao sul. Os autores ainda afirmam que o deslocamento
da posição da ZCIT – mais para o hemisfério norte ou mais para o hemisfério sul – é
uma resultante entre as variações da macro-circulação atmosférica e da temperatura
da superfície do mar – TSM.
Associados à TSM observamos os efeitos causados pelas suas oscilações
anormais no Pacifico equatorial, que contribuem para o aparecimento do efeito El
27
Niño aquecimento anormal das águas superficiais e sub-superficiais ou do efeito
La Niña fenômeno oposto ao El Niño. Estes fenômenos causam alterações no
padrão de precipitação da região nordeste. A atuação do El Niño é o principal fator
nas previsões de chuvas abaixo da média para a região nordeste. Segundo
informações prestadas pela Funceme, “a superfície do Oceano Pacífico equatorial
ainda está com temperatura maior que o normal, o que caracteriza o fenômeno. Em
dez anos de El Niño, oito são de poucas chuvas no Nordeste” (FUNCEME, 2010).
Estudando ainda os dados de precipitação, de velocidade dos ventos e de
taxa de insolação disponibilizados pela Funceme,
percebemos que o balanço hídrico em Fortaleza
torna-se negativo nos meses de julho a novembro.
Este período se caracteriza como crítico para a
população do Serviluz, que estas são condições
ideais para a mobilização dos sedimentos pelos
ventos, que sopram na direção das casas e, ao
encontrarem o obstáculo, tendem a edificar dunas,
causando transtornos como soterramento dos
equipamentos urbanos ruas e calçadas e das
residências, como podemos ver na Figura 5 ao
lado.
Figura 5 - Vista da Rua Pontamar (julho de
2009). Fonte: Rebouças, 2009.
Ainda para avaliarmos a formação de zonas de assoreamento e de erosão e
entendermos o transporte de sedimentos, foi necessário o estudo da hidrodinâmica
costeira, já que estes processos influenciam diretamente na modelagem da costa.
Segundo estudos de Morais (1980a; 1980b) “as cotas verticais de nível de
marés têm influência sobre o transporte litorâneo, que a posição da zona de
rebentação varia conforme o nível instantâneo (MORAIS; 1980a, p. 70; 1980b, p.
70)”. O autor, ainda nestes trabalhos, classifica as marés de Fortaleza como semi-
diurnas com amplitude média de 12,4 horas. Esta classificação também é afirmada
por Silva et al. (2000, p. 150), por Maia et al. (2002, p. 13) enquanto Vasconcelos e
Rocha (1986) afirmam que “a duração média [das marés] é de 12 horas e 24
minutos (Vasconcelos e Rocha; 1986, p. 52).
Segundo Maia et al (2008),
28
A ação das marés representam um papel relevante para os
processos morfogenéticos desenvolvidos sobre a face litorânea,
principalmente no sentido de ampliar a área de ataque das ondas,
gerando correntes em estuários, canais lagunares e em águas rasas
próximo à costa, além de apresentar importância para o transporte
de sedimentos. (MAIA et al.,2008; p. 5)
Retomando as avaliações de Maia (1998), quando analisou os registros do
marégrafo, instalado no porto do Mucuripe pelo INPH, no período de 25/04/1995 a
02/07/1996, a cota máxima do nível do mar 3,41 m ocorreu durante a sizígia de
janeiro de 1996, enquanto as mínimas -0,15 m ocorreram nos meses de maio,
julho e outubro de 1995. Vasconcelos e Rebouças (2010), quando analisaram 6.568
registros de marés coletados também pelo marégrafo do Mucuripe, relativos ao
período de 01/01/2005 à 30/06/2009, observaram que as maiores amplitudes de
maré 3,30 m ocorreram nos meses de julho, agosto, setembro e outubro. Os
autores trabalharam ainda com os registros maregráficos para calcular a Linha de
Preamar Média LPM e apontaram cartograficamente a Linha dos Terrenos de
Marinha – LTM, na Praia do Futuro – do molhe do Titãzinho ao estuário do Rio Cocó
– o que abordaremos no Capitulo Resultados e Discussões.
O clima de ondas, assim como o transporte eólico de sedimentos, sofre com a
ação dos ventos geradores da maioria das ondas que alcança a costa de Fortaleza.
Morais (1980a, p. 74) afirma que as ondas “são as principais responsáveis pelo
caminhamento da areias de leste para oeste e, por conseguinte, do assoreamento
do porto”. No litoral de Fortaleza, encontramos essencialmente dois tipos de ondas:
as do tipo sea ondas de vento, com período máximo de 10 s e com direção
definida pelo vento que a gerou – e as do tipo swell ondas com período entre 10 e
20 s e que podem deslocar-se por milhares de quilômetros desde sua origem. As
ondas ao se aproximarem da praia se refratam e se realinham ficando quase
paralelas à linha (Figura 6) de costa, deste modo promovendo o arraste dos
sedimentos.
Figura 6 - Refração das ondas ao se aproximarem da linha de costa.
29
No estudo de Maia (1998) foi analisada uma sequência de 4 anos de
medições realizadas pelo INPH com uma bóia oceanográfica Waverider – Datawell –
instalada a leste do espigão do Titãzinho. Com os dados obtidos, o autor identificou
o predomínio de ondas do tipo sea, que representaram 94,2%, em relação às de
swell, que somaram 0,28%, sendo o restante - 5,52% - não classificado por se
encontrarem situadas entre os dois limites.
Morais (1980a) constatou o predomínio das ondas oriundas do quadrante E-
SE e secundariamente de ondas do quadrante NE. Retomando as observações de
Morais (1980a), Maia (1998) acrescenta que a existência de um forte controle das
características das ondas em função da velocidade e direção do vento, determina
um domínio das ondas de E, octantes E-SE e ENE e, secundariamente de NE. O
clima de ondas observado por Maia (1998) pode ser visualizado na Figura 7.
Figura 7 - Rosa de Ondas do Litoral do Ceará (direção e altura significativa). Fonte: Maia et al. 2008.
Julho
Agosto
Outubro
Setembro
Dezembr
Novembr
Fevereiro
Janeiro
Março
Abril
Junho
Maio
30
A praia do Serviluz apresenta morfologia suave e baixa inclinação do
estirâncio, que se alonga por mais de 100 metros próximo ao molhe do Titãzinho. A
arrebentação das ondas, de acordo com a classificação proposta por Galvin (1968),
é, em geral, do tipo deslizante spilling podendo se formar valas entre a zona de
surf e o estirâncio, assim gerando arrebentação do tipo mergulhante – plunging.
Em estudo que realizamos anteriormente na
Praia do Serviluz, constatamos que a ocupação
desordenada modificou ao longo do tempo o
ambiente praial e, além disso, que se observam
ao longo da sua extensão vários emissários de
drenagem, que deságuam ainda no berma, na sua
totalidade afetados pelo lançamento de esgotos
clandestinos como podemos observar na Figura
8 ao lado e que comprometem a paisagem
natural da praia, contribuindo assim
negativamente para a balneabilidade do lugar
(GURGEL et al.; 2010).
Figura 8 - Emissário de drenagem.
Fonte: Rebouças, 2009.
De certo que o somatório de vários fatores é responsável por essas
mudanças que ocorreram e ocorrem no Serviluz, sejam elas antrópicas ou naturais.
Silva (1) (2001; p.180) chama a atenção para o fato de que “[...] a presença de
núcleos habitacionais na zona costeira tem contribuído na intensificação das
transformações paisagísticas”. Mas o maior contribuinte, na construção dessa nova
paisagem da orla de Fortaleza foi, sem vida, a instalação do Porto do Mucuripe,
situado no promontório homônimo e que aqui abordamos no estudo.
Primeiras Abordagens do Problema
A construção do Porto do Mucuripe não foi uma decisão aleatória baseada
apenas em critérios políticos. Foi, antes, uma decisão fundamentada em estudos
31
das principais autoridades nacionais em construções de portos. Segundo relato de
Espínola (2010)
“Defendiam o projeto Mucuripe não o Clube de Engenharia do
Rio de Janeiro, como pessoa jurídica, mas os engenheiros Maurício
Joppert, J.B. Belfort Vieira, Frederico Burlamaqui, Hildebrando de
Góis, Saturnino Braga, Mário Elói, João Felipe Pereira, quase todos
especialistas em construção de portos” (ESPÍNOLA, 2010; 153).
Espínola cita ainda que no parecer emitido pelo Clube de Engenharia acerca
de um projeto elaborado pelo engenheiro Hor Meyell, que defendia a construção do
porto de Fortaleza na ponta do Mucuripe, sugeriu-se que o projeto fosse submetido
a estudos em laboratório de hidráulica experimental a fim de assegura a melhor
localização e o tipo de intervenção apropriada a ser executada na orla. Essa
sugestão do Clube de Engenharia nos fornece indícios do que seria a futura
contratação do Laboratoire Dauphinois d’Hydraulique de Grenoble SOGREAH,
cujo relatório será abordado na sequência deste estudo.
Os primeiros estudos científicos realizados acerca das consequências da
construção do Porto do Mucuripe para a orla de Fortaleza apontam que ainda
durante a construção do porto, com a instalação do prolongamento rochoso na
ponta do Mucuripe, foi constatada uma mudança na dinâmica costeira por difração
das ondas incidentes (Morais, 1980). Em consequência disso, os sedimentos
transportados pela corrente de deriva litorânea passaram a se acumular na bacia
portuária, assoreando o canal do porto e
formando um banco arenoso na parte interna
do dique de proteção, soterrando o antigo
cais dos Petroleiros – que data do período da
Guerra Mundial e formando a Praia
Mansa, como podemos observar na Figura 9
ao lado.
Figura 9 Início da Formação da Praia
Mansa. Fonte: IBGE, 1959, p. 206.
Logo após o início das operações do Porto do Mucuripe, os primeiros
impactos oriundos da sua construção eram sentidos nas praias a jusante e no
próprio porto. Deu-se então início ao processo de acumulação de sedimentos na
bacia portuária, promovendo assoreamento do local. Esse problema despertou
32
interesse de cientistas, estudiosos e exigiu uma tomada de decisão política
concernente à estrutura portuária.
No ano de 1953 o laboratório francês SOGREAH foi contratado pelo governo
brasileiro para realizar um diagnóstico dos problemas e apontar soluções. O
laboratório então, por meio de estudos acerca da dinâmica litorânea da enseada do
Mucuripe, elaborou um modelo experimental reduzido da área na escala horizontal
de 1:300 e vertical de 1:100 (VINCENT, 1957), como podemos ver na Figura 10
abaixo.
Figura 10 - Modelo reduzido do Porto do Mucuripe elaborado pelo SOGREAH. Fonte: Espínola, 2010,
p. 203.
Os resultados do experimento integraram o Relatório SOGREAH, entregue ao
Governo Federal em julho de 1957. Constaram desse relatório algumas soluções
para o processo erosivo na praia de Iracema e enseada do Mucuripe: uma dessas
proposições foi a construção de um molhe perpendicular localizado na Praia do
Futuro a barlamar do porto.
Ainda na década de 1950 foi construído o molhe da Praia do Futuro ou molhe
do Titãzinho como é popularmente conhecido fazendo referência ao guindaste Titã,
como veremos no item sobre a história. Essa obra indicada no relatório do
SOGREAH sendo escolhida pelo poder público como a alternativa viável e de efeito
imediato para fazer a detenção dos sedimentos transportados da praia do Futuro
pela corrente de deriva litorânea, que tem sentido leste–oeste, causando
assoreamento da bacia portuária, o que provocou progressivamente a formação da
Praia Mansa como podemos observar na Figura 11 datada de 1958, Figura 12
datada de 1972 e Figura 13 datada de 2008.
33
Figura 11 - Molhe de Proteção do Porto em 1958. Fonte: CPRM
34
Figura 12 - Molhe de Proteção do Porto em 1972. Fonte: PMF
35
Figura 13 - Molhe de Proteção do Porto em 2008. Fonte: Cogerh
36
O molhe do Titãzinho é constituído de um enrocamento de rochas graníticas
com extensão aproximada de 900 metros perpendicular à linha de praia, no Serviluz.
Como vimos anteriormente, este molhe passou a impedir que os sedimentos fossem
transportados pelas correntes de deriva litorâneas para a bacia portuária, vez que
estavam causando assoreamento naquele local. Mas ainda estávamos longe de
uma solução. Parcialmente resolvido o problema do porto, a cidade passou a ter,
progressivamente, um novo desenho para sua linha de costa, com praias em forte
processo erosivo a jusante do porto e com forte engorda a leste do molhe do
Titãzinho.
Maia (1998) afirma que o aporte sedimentar acumulado por conta do molhe
do Titãzinho é de 860.000 m
3
por ano. Em seu estudo sobre a evolução da linha de
costa, Pitombeira (1995) encontrou que a acumulação de sedimentos a leste do
molhe do Titãzinho é na ordem de 800.000 m
3
por ano.
Vasconcelos (2005), considerando sobre o atual estado de praia em condição
progressiva, afirma que:
A praia aumentou a sua superfície em 493.000 m
2
em 37 anos. A
progradação da praia aumentou a superfície de deflação na zona
intermaré aumentando o poder de transporte de sedimentos pelo
vento em direção ao continente, para edificar dunas. Na caminhada
em direção ao continente, o sedimento encontra como obstáculo as
construções residenciais e comerciais situadas à beira mar que são
invadidas pela areia. (Vasconcelos, 2005; p. 60-1)
Diante disso, podemos afirmar que a acumulação progressiva demonstra que
o molhe cumpriu a sua função de retenção de sedimentos desde a sua construção,
mesmo em prejuízo das praias localizadas a jusante do porto.
Vale ressaltar que as intervenções institucionais e governamentais realizadas
com o intuito de resguardar o porto ou mesmo de proteger da erosão as praias
afetadas associadas ao novo padrão de ocupação do solo adotado na região,
acarretaram a rápida mudança no padrão morfodinâmico, praticamente anulando a
grande zona de baypass eólico que era a ponta do Mucuripe.
Essa mudança alterou assim o balanço sedimentar que definia os perfis de
praia por meio da ação do clima de ondas e dos ventos em ambos os lados do
complexo, com forte processo erosivo a jusante e acúmulo de sedimentos a
montante.
37
2.2 ASPECTOS HISTÓRICOS
2.2.1. A criação do Porto de Fortaleza
Os primeiros projetos de instalação de um porto em Fortaleza datam do início
do século XIX. Mas a ideia de porto no Ceará é bem mais antiga. Segundo o
historiador Raimundo Girão (1976), a costa cearense havia sido tocada pelos
descobridores nos séculos XV e XVI, pioneiramente por Vicente Pinzón. Aí, uma
pequena baía, denominada Mucuripe, palavra originada do Tupi, que significa
Caminho da Mucura espécie de roedor semelhante ao gambá -, teria recebido os
exploradores que haviam chegado inicialmente à então Ponta de Jabarana, atual
Município de Aracati, e de velejado até a ponta do Mucuripe. Um segundo local,
teria sido a Ponta de Jericoacoara, atualmente Município de Jijoca.
Assim, segundo Girão, outros exploradores teriam atracado no Mucuripe
antes da vinda de Pero Coelho de Sousa, em 1603. Segundo esse autor, citando
Rodolpho Teóphilo (1903), teria sido Mathias Beck a escolher a enseada do
Mucuripe como local ideal para ancoragem de seus navios em lugar da Barra do
Ceará, preferida por Soares Moreno. Girão acrescenta: “abrir-se-ia com isto o
interminável duelo de opiniões sobre se o cais da Capital seria em frente ao
Forte de Shoonenborch atual Forte de Nossa Senhora da Assunção ou no
promontório mucuripano (GIRÃO, 1976; p.8).
Não obstante essa discussão, o primeiro porto de Fortaleza veio instalar-se,
em 1805, sob ordem da Junta da Real Fazenda, no sítio denominado Prainha,
deixando o Mucuripe de ser o lugar de entrada dos exploradores. Em forma de um
trapiche, o novo porto, entretanto, não oferecia segurança aos navios. Segundo
Girão (ibd., p.13), o porto foi descrito por viajantes como “exposto e mau”. Em 1859,
segundo Espíndola (1978), o técnico portuário francês Pierre Berthot
Entregou ao Governo um memorial com desenho do porto de
Fortaleza [...]. Era proposta a construção de um cais; e, para impedir
o assoreamento, propunha também uma muralha, no lugar Meireles,
e a fixação de dunas (Espíndola, 1978; p.14).
38
Muitos foram os projetos de construção do porto até a sugestão do
engenheiro Zózimo Bráulio Barroso, em 1869, de que o porto fosse transferido para
o Mucuripe, com ligação com a capital por meio de estrada de ferro. As oposições
foram intensas, sobretudo do comércio. Outra importante contribuição, segundo
Espíndola (idem) e Barroso (1962) foi a do engenheiro John Hawkshaw, em 1883.
Para Hawkshaw o porto deveria ser em Fortaleza, em benefício do comércio. O
engenheiro argumentava que
O antigo molhe deve ser removido a fim de permitir a passagem às
areias e não convirá construir molhes perpendicularmente ao litoral
[...]. Recomendo um viaduto aberto no começo do quebra-mar, para
facilitar a passagem das areias; é provável, porém, que, apesar
disso, formem-se depósitos no ancoradouro; e, nesse caso,
dragagens regulares e periódicas darão ao porto a necessária
profundidade (Espíndola, 1978; p.15).
O projeto foi a termo com a construção da Ponte Metálica, inaugurada em
1906. Demais projetos foram apresentados até a década de 1920 quando tiveram
início as obras do Porto, defronte ao prédio da Alfândega, na cidade de Fortaleza,
como então era descrito. Em 1929, um projeto do engenheiro Augusto Hor Meyll
concluiu que o melhor lugar para instalação do porto seria indiscutivelmente a
enseada do Mucuripe que podemos visualizar antes da instalação do porto na Figura
14.
Figura 14 – Enseada do Mucuripe Antes da Construção do Porto. Fonte: Arquivo Nirez in Spinola
2010.
Assim, em 1933, em seguimento ao Decreto-Lei 23.606, de 20 de
dezembro de 1933, abriu-se a primeira concorrência para a construção do Porto do
Mucuripe. Grandes foram os protestos, segundo relata Espíndola (1978) e Girão
39
(1976). As discussões seguiram até 1937, quando o Presidente da República,
Getúlio Vargas, modificando o decreto anterior, lança o Decreto-Lei 544, de 7 de
julho de 1938, e o faz publicar no Diário Oficial da União e decreta em seu Artigo 1º:
Art. Fica transferida a localização do Porto de Fortaleza para a
enseada de Mucuripe a que se refere a concessão outorgada ao
Estado do Ceará, pelo decreto 23.606, de 20 de dezembro de
1933, para construção, aparelhamento e exploração do referido
porto (Espíndola, 1978; p. 32).
Em 23 de julho de 1938 as obras tiveram início no Mucuripe. Segundo
Espíndola (id. ibd., p. 36-37) foram projetados dois enrocamentos laterais e
paralelos, de 240 e 320 metros, com três metros de largura e nove de altura cada,
um enrocamento transversal levantado por 102 colunas de concreto chamadas
tubulões, cada uma com 2 metros de diâmetro por 12 metros de altura ligadas por
vigas de concreto e sobre as quais se ergueria o cais de embarque e desembarque,
espaçadas em oito metros. Um quebra-mar de 1.480 metros de comprimento à
frente dos enrocamentos com função de amortecer as ondas e guiar as correntes
para o largo. A conclusão da obra previa a realização de dragagem para alcançar
oito metros de calado, aterro do espaço entre os enrocamentos utilizando o material
dragado, um calçamento de paralelepípedos sobre o aterro e a construção de
armazéns de carga e administrativos e instalação de geradores.
A previsão de conclusão foi de 32 meses, prazo que não foi cumprido.
Segundo Ju (2000) e Espíndola (1978), o atraso e a posterior paralisação das
obras do agora Porto do Mucuripe se deveram à inadimplência, ao assoreamento e
aos fatores externos, como a crise financeira do Estado. A partir daí as idéias de
ligação do Porto à cidade foram também abortadas. Conta Jucá que a construção do
porto “incrementou o anedotário” (JUCÁ, 2000; p. 129) para muitos quando se
referiam a tempo indeterminado ou ao dia de “São Nunca”. Assim se diziam que os
play-boys da cidade se casariam no dia da inauguração do porto. Outro fator que
emperrou a construção foi o conhecido acidente do Guindaste Titã. O guindaste
vinha operando já há alguns meses em péssimas condições de uso no transporte de
pedras e na construção do quebra-mar. Segundo relata Espíndola (id. ibd.), no dia 3
de junho de 1940
[...] ao descarregar um dos carros de pedra, o Titã sofreu ruptura
numa chaveta e, em seguida, quebra de uma mensageira. Nesse
instante, a lança se encontrava desnivelada pelo carrilho,
40
resultando então no desequilíbrio e tombamento de toda a estrutura
metálica [...] (Espíndola, 1978; p. 38).
O conserto do guindaste levou dez meses, durantes os quais os trabalhos de
lançamento de pedras e construção do quebra-mar foram interrompidos. Mas o
imaginário popular ganhou espaço. A praia onde desabou o Titã acabou ganhando o
nome de Titã, e mais tarde Titãzinho.
As obras do porto se arrastaram a 1945, sendo construídos trechos
pequenos, embora o porto estivesse em funcionamento para pequenas
embarcações. Apesar de já estar operando, segundo relato de Espíndola (id. ibd., p.
47), a primeira atracação aconteceria em outubro de 1951, mas a conclusão das
obras seria bem mais tarde. Ao final de 1960, o assoreamento volta a ameaçar o
movimento do porto, o que exigiu nova dragagem.
A redinamização das obras do porto foi assim liderada, segundo Girão (1976;
p. 27) por ordem do então Governador Coronel Virgílio Távora
3
, pelo professor José
Parsifal Barroso, que se empenhou no apressamento das obras, constituindo uma
Comissão Dinamizadora, que entregou ao então Ministro da Viação e Obras
Públicas Hélio de Almeida a planta completa do porto do Mucuripe. As obras foram
assim concluídas e entregues no dia 9 de abril de 1965, quando se criou a
Companhia Docas do Ceará. O porto do Mucuripe passava assim a integrar a área
de atribuições do Governo Federal, por seu Ministério dos Transportes.
A conclusão do porto, ao mesmo tempo que trouxe, como afirmou Girão, uma
“Solução ótima para um problema difícil”, trouxe também outros problemas.
2.2.2. A ocupação antrópica
Avanço Demográfico
A inserção de Fortaleza na história dos portos no mundo teve início com o
Porto do Mucuripe. Segundo Espínola (2010), muito antes de sua construção, e
mesmo antes de Pedro Álvares Cabral chegar às terras brasileiras, o espanhol
3
Eleito em 1962 por voto direto para o Governo do Estado do Ceará.
41
Vicente Pinzón que daria bem mais tarde nome ao bairro teria desembarcado ali
naquela faixa de terra a que se deu o nome de Santa Maria de La Consolación,
nome posteriormente esquecido pelos interesses do português colonizador.
Grandes mudanças ocorreram na cidade desde então. A construção do
Trapiche do Ellery na Prainha – atualmente Praia de Iracema foi a primeiro
ancoradouro de que se tem noticia em Fortaleza. Espínola o descreve como um
“acanhado porto” de 700 palmos de extensão por 80 de largura” (ESPINOLA, 2010,
P. 119-20). Este trapiche foi desativado na década de 1860 em função de sua
precariedade operacional e do grande número de acidentes ocorridos. nessa
época os engenheiros apontavam a enseada do Mucuripe como melhor opção para
a construção do porto da cidade, mas isso ainda demoraria a acontecer.
O governo Campos Sales, descrente da viabilidade econômica da instalação
do porto no Mucuripe, decide pela construção da Ponte Metálica, em 1902. Não
obstante as notáveis melhorias operacionais, esse porto ainda não conseguiu
oferecer as condições de segurança necessárias para atender a demanda de
embarque e desembarque de passageiros nem ao calado necessário para a
atracação dos cargueiros. Os acidentes continuavam a se repetir como podemos
encontrar em relatos citados por Espíndola (1978) e Teófilo (1974). Nessa época a
cidade se reduzia ao trecho conhecido hoje como centro histórico de Fortaleza, e
sua população não passava dos 50 mil habitantes.
De certo que os efeitos da construção do Porto do Mucuripe não seriam
sentidos nem seriam motivos de crítica se não tivéssemos outra forma de ocupação
além do Porto. Mas devemos lembrar que, mesmo quando o Mucuripe ainda era
distante uma légua do núcleo urbano, já era uma vila de pescadores. A ocupação da
ponta do Mucuripe não se somente com a chegada do porto, ela remete ao
século XIX, no entorno do farol velho. Numa cidade de costas para o mar com
equipamentos urbanos apenas voltados para as populações mais abastadas, era de
se esperar, como afirma Dantas (2002), que a ocupação da zona costeira fosse
induzida por
[...] importante contingente de emigrantes pobres do sertão. Eles
estabelecem-se nos terrenos de marinha, área anteriormente
ocupada pelas comunidades de pescadores, denotando crescimento
dos efetivos demográficos, marcado por estado de saturação cujo
testemunho, após final do século XIX, são as favelas [...] (DANTAS,
2002, p.39-40).
42
Com a expansão urbana alavancada pelo porto, os pescadores moradores da
Rua da Frente hoje Av. Beira-Mar (Girão, 1959) foram removidos para o entorno
do Serviluz. Muitos desses também foram morar na Praia Mansa, recém formada
pelo assoreamento.
Segundo estudos realizados por Girão (idem), as primeiras instalações
residenciais no atual bairro Serviluz datam do período compreendido entre os anos
de 1940 e início da década de 1950. Segundo Jucá (2000), entretanto, existem
indícios de que as primeiras ocupações no Serviluz sejam até mesmo da década de
1930, vez que a área era de colônia de pescadores. É consensual, ainda, entre
historiadores e também entre moradores antigos do lugar, a informação de que as
primeiras ocupações na região do Serviluz tenham sido formadas essencialmente
por pescadores e imigrantes procedentes do interior do Estado, resultado do êxodo
rural. Dessa ocupação, houve um aumento populacional de pescadores que
residiam na Rua da Frente, que foram removidos dali em função da construção da
Avenida Presidente Kennedy, atual Avenida Beira-mar (ARAUJO, 2007).
No ano de 1974, a Companhia Docas e a Marinha do Brasil removeram os
moradores da Praia Mansa para além do molhe do Titã, sob a alegação de
problemas naturais, como a subida das marés, que poderiam afetar as populações.
Em estudo realizado acerca dos depoimentos dos moradores, coordenado por
Cabanes (CEARAH Periferia, 2002), o Centro de Estudos, Articulação e Referência
sobre Assentamentos Humanos, CEARAH Periferia, apresenta depoimentos que
retratam a situação dessas pessoas no que diz respeito à remoção:
A mudança para esse lado do Serviluz aconteceu em 1974. Muita
gente não queria sair [...] Chegou a um ponto em que o pessoal das
Docas botava obstáculos no caminho da Praia Mansa para não
deixar entrar alimentos... depois tinha que ter uma carteira para
entrar na área e virou uma praia privada. (CEARAH 2002, p. 102-3).
A instalação da Comunidade do Serviluz entre os bairros Cais do Porto e
Vicente Pinzón foi aleatória e sem planejamento institucional. Acreditamos que esse
caráter aleatório da ocupação seja preponderante no que tange à disponibilidade de
dados oficiais e específicos sobre a comunidade Serviluz. A falta de dados concretos
tornou inviável uma amostragem mais precisa sobre aspectos sócio-econômicos e
de infra-estrutura do lugar. Também a carência de imagens que revelassem a
evolução da ocupação local inviabilizou uma análise da progressão da instalação
das residências pelos moradores no período compreendido entre os anos 1972 e
43
1995, quando o local sofreu grande avanço na ocupação de sua área, como pode
ser visualizado na Figura 16, página 48 deste documento.
Segundo a contagem do censo IBGE (IBGE, 2000), a população estimada do
Serviluz é de 20.000 habitantes, distribuídos entre dois bairros Cais do Porto e
Vicente Pinzón. Vale ressaltar que apenas uma quadra do Serviluz está inserida no
bairro Vicente Pinzón de acordo com a cartografia da PMF. Não foi possível em
nosso estudo, no entanto, obter dados, sobretudo sobre a população que reside na
área, vez que os dados não tinham como ser calculados por aproximação. A
demarcação descrita pelos moradores com respeito a ruas e avenidas que delimitam
a comunidade do Serviluz, por meio da memória, foi essencialmente nosso artifício
para conhecer o local.
No que diz respeito à nova localização de moradia, os moradores contam que
[...] escolheram os terrenos aqui e nós ficaríamos com lotes de seis
metros de frente com doze de comprimento. Nós fazíamos a casa
de cinco metros para deixar meio metro de cada lado. Tivemos que
construir nossas próprias casas, todas de taipa. A rua onde fica hoje
a associação era chamada de ‘rua da merda’ porque toda imundice
do bairro era joga aqui [...] às vezes a água chegava a entrar dentro
de casa (CEARAH 2002, p. 103)
O progressivo aumento populacional do Serviluz, seja ele promovido por
populações locais removidas para ou por processos migratórios atraídos pelo
Porto do Mucuripe, construção que provocou modificação radical da paisagem local,
avança acompanhando a proporção da progradação da praia. Entrevistamos um
morador antigo, com mais de 40 anos de residência no Serviluz, que delimitou ruas
que abrangem a Comunidade, tornando possível um mapeamento do lugar. Este
morador nos conta que se mudou para o Serviluz em 1951:
“Essa rua tinha o nome que nós chamava... era a Rua da Frente...
quando foi formada a avenida Beira Mar, na década de 62-64, esse
pessoal foram todos indenizados e hoje esse pessoal que moravam
aqui, que ainda tão vivo, vivem na Serviluz, eles foram mudados
para a Serviluz e foi a mudança mais grande que teve aqui na
cidade de Fortaleza”. (E1)
A análise que nos faz esse morador, de que essa foi a maior mudança
ocorrida em Fortaleza não é irreal, sobretudo se considerarmos o aporte
socioeconômico que a valorização da orla recebeu nos últimos 50 anos, deixando
Fortaleza, de ser uma cidade de costas para o mar e passando a ser também
cenário da grande revolução das classes. Segundo Vasconcelos (2005), até a
44
Grande Guerra, a região litorânea, em especial as praias, eram locais para pessoas
de pouco privilégio socioeconômico, por ser uma área de entretenimento de
baixíssimo custo. A elite mantinha suas casas de veraneio em vales, colinas,
montanhas, e a diversão dessa classe social era notadamente em clubes fechados,
com piscinas. Ainda segundo o autor, foi por questões de tratamento de doenças
tuberculose, em especial - que as pessoas da classe mais favorecida começaram a
frequentar as regiões praiais. O mar era, assim, uma área de lazer para pessoas de
baixa renda e para os trabalhadores locais, tais como os pescadores. Além disso, a
pele escurecida de sol denotava uma diminuição na escala social. A pele branca era
sinônimo de riqueza.
Todas essas mudanças no perfil social da cidade vêm contribuir para o
nascimento de novos bairros. Com a retirada dos antigos moradores da Beira Mar,
resultante das construções ordenadas pela prefeitura da época, e a construção do
Porto do Mucuripe, um novo local de moradia começa a surgir. Vale ressaltar que a
chegada constante de novos moradores ao Serviluz somente agravou a ocupação
da área, ocupação esta a cada dia mais aleatória e desordenada, sem infraestrutura
sanitária ou de serviços, mesmo nos dias de hoje.
Se levarmos em conta o grande avanço demográfico da cidade de Fortaleza,
veremos que nos últimos 50 anos a cidade multiplicou por 5 o número de seus
habitantes, conforme podemos ver na Tabela 2:
Tabela 2 - Censos Demográficos 1940 – 2000
População (Número de habitantes) População (%)
Censo
Litoral RMF Fortaleza
Ceará
Fortaleza
x Ceará
Cresci-
mento
Fortaleza
Cresci-
mento
Ceará
1940 -
-
180.185
2.091.032
8,62
-
-
1950 728.158
-
279.809
2.733.648
10,24
55,29
30,73
1960 1.053.070
-
507.108
3.289.595
15,42
81,23
20,34
1970 -
-
1.037.279
4.361.603
23,78
104,55
32,59
1980 -
-
1.580.066
5.288.253
29,88
52,33
21,25
1991 -
2.357.100
1.768.637
6.366.647
27,78
11,93
20,39
2000 -
2.930.374
2.141.402
7.430.661
28,82
21,08
16,71
2009* -
3.665.259
2.505.552
8.547.809
29,31
17,01
15,03
* Estimativa para 1º de junho de 2009. Fonte: IBGE
Esse crescimento populacional reflete de maneira bastante evidente as
inúmeras ocupações de mesmas características observadas na periferia da cidade e
45
mesmo em seu centro urbano, num processo que acompanha o crescimento das
grandes cidades brasileiras. Diariamente surgem mais e mais locais de moradia
irregulares, onde as dificuldades de infraestrutura e serviços se repetem, inclusive
no que diz respeito à carência de escolas e de postos de saúde.
Fortaleza, com seus cerca de dois milhões e meio de habitantes e com um
crescimento demográfico constante, sofre inevitavelmente ampliação das suas áreas
urbanas. Esse fator exige, portanto, que se tenha um maior cuidado no que diz
respeito aos serviços básicos ofertados à população. O saneamento básico é um
elemento de grande relevância, uma vez que evita a proliferação de doenças e
promove saúde, conforto e bem-estar à população. portanto a necessidade de
incrementarem-se as políticas de abastecimento de água, esgotamento sanitário,
sistemas de drenagem, coleta e tratamento dos resíduos sólidos.
Além dos serviços de saneamento, também é importante dirigir atenção aos
serviços de educação e saúde. Retomando nosso estudo, segundo informações do
Ministério da educação MEC, e a Secretaria Municipal de Fortaleza SMF, o
bairro Cais do Porto possui somente uma escola municipal de ensino fundamental
4
e
um posto de saúde
5
.
Além dos evidentes problemas de ordem social, essa ocupação em direção
ao mar apresenta sérios problemas ambientais, pois o caminhamento das areias
carreadas pelos ventos invade as casas e bloqueia as vias de acesso ao local,
construídas no local onde deveria se formar o campo de dunas e compor a zona de
baypass, como se pode ver na Figura 15.
4
Escola Municipal Professor Álvaro Costa, localizada na Av. Vicente de Castro, 6074. Fonte: MEC -
Censo Escolar - 2003. Secretaria de Educação do Estado do Ceará – SEDUC e Secretaria Municipal
de Educação e Assistência Social – SEDAS, Fortaleza/Ce.
5
UBASF CÉLIO BRASIL GIRÃO - Rua Prof. Henrique Firmeza, 82 - Cais do Porto/ Serviluz – Fonte:
Secretaria Municipal de Fortaleza – SMF, 2007.
46
Figura 15 – A) Praia do Futuro e ponta do Mucuripe 1958 (Fonte: CPRM); B) Praia do Futuro e ponta
do Mucuripe 2008 (Fonte: Google Earth)
O excesso de sedimentos e sua mobilidade têm causado transtornos aos
moradores do Serviluz que lutam continuamente contra a invasão das areias em
suas casas. O avanço de sedimentos torna-se também um caso de saúde pública, já
que existem relatos de problemas de saúde dos moradores locais, em particular
problemas pulmonares, associados ao excesso de material fino transportado pelo
vento.
O produto da complexa relação de forças influentes na zona costeira se
pela interação de muitos elementos atuantes, mas, via de regra, o ambiente costeiro
apresenta uma grande fragilidade ambiental quanto ao equilíbrio dinâmico.
Segundo Vasconcelos (2005)
A zona costeira é lugar de encontro de três sistemas ambientais
diferentes: hidrosfera, litosfera e atmosfera. Essa confluência
intersistêmica gera um ambiente de dinâmica complexa, sem
domínio preponderante entre as fases terrestre, aquática ou aérea.
(VASCONCELOS, 2005; p. 15)
Observa-se mundialmente que a partir do século XX a região costeira torna-
se o lugar de preferência do homem como lugar de moradia. Hoje, início do século
XXI, segundo a UNESCO, mais de 2/3 da população humana ocupa a zona costeira,
vivendo a menos de 50 km do mar.
Até meados do século passado, a orla marítima de Fortaleza era ocupada
apenas por casas de veraneio e por vilas de pescadores. Sendo os pescadores
47
populações tradicionais e vocacionadas à região, com moradias e formas de uso
pouco impactantes à dinâmica costeira, tínhamos uma linha de costa ainda pouco
ou em nada alterada.
A partir da década de 1960, Fortaleza expandiu sua população de forma
acelerada, afirmando Vasconcelos (2005) que no período de 40 anos a população
da capital cearense foi multiplicada por 4.17, passando de 470.778 mil habitantes no
ano de 1960 para mais de dois milhões e meio em 2000. De certo que esse maior
adensamento provocou uma maior pressão sobre o ambiente, alterando cursos de
água, aterrando lagoas, lançando poluentes sólidos, líquidos e gasosos, danosos ao
meio ambiente.
O acúmulo de sedimentos e seu transporte lico em direção às casas têm
provocado danos estruturais e físicos à população do bairro do Serviluz. Esses
moradores travam luta contínua contra o soterramento de suas casas e contra os
riscos de doenças causadas ou associadas ao excesso de material fino transportado
pelo vento.
Então a paisagem, que, para Bertrand (1972), é o resultado da combinação
da dinâmica ambiental com os fatores físicos e antrópicos que interagem para
compor um único “conjunto” que permanece em constante evolução, passa a sofrer
fortes modificações.
Os sedimentos acumulados no Serviluz aumentam a área de praia, que é
paulatinamente ocupada pela construção de moradias da população de baixa renda,
como se pode ver na Figura 16. Muitos desses novos moradores são oriundos do
Mucuripe e Meireles agora ocupados, respectivamente, pelo porto e por residências
de alto padrão.
48
Figura 16 - Imagem ao fundo da Praia do Serviluz no ano 2008, sobreposta em transparência pelo
ano de 1958. Fonte: PMF - compilação Rebouças, 2010.
Essa ocupação em direção ao mar apresenta sérios problemas ambientais,
pois o caminhamento das areias carreadas pelos ventos invade as casas e bloqueia
as vias de acesso ao local, como afirma anteriormente Vasconcelos (op. cit.).
Retomando a visão teórica de Vasconcelos (2005), vale lembrar que a
população litorânea disputa um mesmo espaço geográfico para as mais diversas
atividades e finalidades, entre elas a habitação, a indústria, o comércio, o transporte,
a agricultura, a pesca, a aquicultura, o lazer e o turismo. Torna-se natural que, em
um espaço restrito pelo adensamento populacional, grupos distintos disputem uma
mesma área para atividades diferentes, muitas vezes conflitantes e até mesmo
antagônicas.
A defesa das praias é, por fim, uma atividade complexa e onerosa, que exige
interferências amplas e apoiadas por todos os atores envolvidos no processo. O
fracasso segarantido cada vez que forem tomadas medidas de proteção parciais
e inadequadas, ou em desarmonia com os interesses coletivos.
2.2.3. A questão social da ocupação
49
Análises das entrevistas
A grande dificuldade que se encontra no momento de se analisarem dados
subjetivos, em especial entrevistas e relatos abertos, é o que Minayo (2007) chama
de “ilusão de transparência”. Isso se explica pelo fato de que as falas gravadas em
campo e transcritas em laboratório são na verdade os dados brutos que ainda serão
transformados em resultados de pesquisa, por meio de procedimentos específicos a
cada categoria de análise. A ilusão de transparência por parte do pesquisador
acontece muito frequentemente em função da impressão de verdade que se
estabelece na fala espontânea dos sujeitos entrevistados. É preciso, no entanto,
buscar informações históricas e atrelá-las ao conhecimento popular a fim de
organizar um panorama dos acontecimentos.
As informações contidas na seção 1.2 são fundamentadas em estudos
históricos, por meio de documentos institucionais de valia científica. Os depoimentos
aqui apresentados são as histórias das pessoas tais como foram vivenciadas pelos
moradores locais. Tomaremos como base o depoimento de um morador que nos
conta a história do lugar:
Nossa... é uma história muito da longa. Quando vim morar aqui
estavam construindo o porto. Era uma bagunça de caminhões indo e
vindo cheio de predras pra construir aquele segundo paredão de
predras. Fumos morar lá na Praia Mansa, a gente morava ali sabia?
Era, tinha muitas casinhas. Antes do porto acabar totalmente a sua
construção. Então essa área aqui começou porque o Titã Velho
(Praia Mansa) foi invadido pelas águas, e o governo com medo, a
Capitania com medo de o pessoal anoitecerem vivo e num
amanhecerem que o mar tava crescendo muito, tomando os
paredão... pra gente atravessar nas marés grandes era um sufoco.
A gente ia enxuto e voltava molhado porque o banho era certo.
Maior perigo! Então, eles butaram o pessoal pra essa área, e foi
se localizando, aumentando e duma família trazendo outra e assim
sucessivamente... daí a Docas planeou o terreno, loteou para cada
família 12 metros de comprimento por 6 de frente. Esses 6 metros
de frente nós fazia as casas de 5 metros de casa e ficava meio
metro de cada casa, pra num ficarem conjugadas... eles doaram
vara, que não era de tijolo, barro, as madeiras e as telhas para cada
morador (E1)
O nosso cuidado em deixar o entrevistado sempre em seu espaço de convívio
e moradia, como já foi explicitado na sessão dedicada à metodologia, teve o objetivo
de promover uma situação mais natural de conversa com os moradores, vez que o
inconveniente de uma entrevista é inevitável e a presença de um entrevistador tende
50
a provocar desconforto ao informante. Tomamos o cuidado também em deixar claro
ao morador entrevistado que nosso trabalho não visava a uma mudança social ao
bairro nem a denúncias sobre as condições de moradia, mas que poderia vir a ser
um instrumento de revelação de problemas com bases científicas, com vistas a
projetos de urbanização e melhoria da área, a ser apresentado aos órgãos
competentes.
Para o tratamento das entrevistas, utilizamos a técnica da análise temática ou
categorial apresentada por Bardin (1997), técnica segundo a qual, o processo de
desmembramento do texto em unidades torna possível ao pesquisador descobrir os
diferentes núcleos de sentido que constituem a comunicação, e posteriormente,
realizar o seu reagrupamento em classes ou categorias.
As entrevistas realizadas junto aos moradores do local em estudo foram
transcritas tais como foram gravadas, sem utilização de nenhuma técnica específica,
sem considerar desvios gramaticais, privilegiando a mensagem do sujeito. Depois de
transcritas, as respostas ao questionário foram submetidas ao processo descrito
abaixo pelo diagrama da Análise de Conteúdo proposta por Bardin (1997; p. 102),
assim divididos em pré-análise, exploração de material e tratamento dos resultados
e interpretações.
Fonte: Bardin, 1997 p. 102
51
Inicialmente, após a transcrição das 10 entrevistas, e seguindo o esquema
proposto por Bardin, realizamos uma leitura flutuante das respostas apresentadas
pelos moradores, de maneira a ter uma visão geral dos discursos proferidos e
levando em conta, sobretudo, a vivência dessas pessoas no bairro em questão, suas
experiências e o conhecimento que trazem acerca da história do lugar. As respostas
foram selecionadas segundo atendessem especificamente ao assunto que concernia
diretamente ao tema desse estudo e em seguida tabulados os recortes para
categorização e codificação seguindo a metodologia proposta. Vale ressaltar que
não houve grandes divergências entre as respostas dadas às questões fechadas e a
entrevista semi-estruturada realizada a seguir.
A passagem do texto bruto ao resultado de pesquisa permite destacar
informações que ilustrem ou pelo menos ajudem a revelar os fenômenos
investigados. Não houve, entretanto, modificações de grande relevância nas
entrevistas transcritas. O material de análise foi então selecionado a partir do
comparativo entre respostas recorrentes e de respostas inéditas prestadas pelos
moradores nos dois momentos de encontro que pudemos realizar com os grupos
determinados. Organizamos para a exploração do dados advindos das entrevistas
duas linhas de categorias específicas, segundo as respostas dadas: a categoria
tempo e a categoria evento.
No panorama da categoria tempo, dispusemos os relatos segundo o tempo
de moradia dos informantes no Serviluz. No panorama da categoria evento, os
relatos forma dispostos de maneira a demonstrar a noção de responsabilidade
individual, qual seja, o sujeito morador como responsável por sua moradia e pelas
condições que envolvem segurança relativas às queixas acerca da violência
urbana –, salubridade no que tange às condições de saneamento, saúde o que
envolve ao mesmo tempo o deslocamento das areias pelos ventos e a carência de
atendimento médico que supra as demandas da comunidade e, por fim, o que os
moradores classificaram como descaso do poder público em relação à comunidade.
O tempo de moradia é pertinente, uma vez que constitui testemunho real e
atualizado sobre a evolução da ocupação da área, bem como sobre o processo de
progradação da praia, a que os moradores chamam de “crescimento da praia”. Em
complementação, a categoria evento é pertinente por fazer aparecerem nas falas
dos moradores as provas dos problemas e suas queixas relativas às condições de
52
moradia: causas e conseqüências dos problemas, assim como os responsáveis e as
possíveis soluções, segundo a população de nosso estudo.
Em consonância com nossos pressupostos apresentados no início desse
estudo, foi possível perceber, a priori, um distanciamento entre a gravidade do
problema de progradação e caminhamento das areias que apontamos e as falas dos
entrevistados. O avanço das areias se mostra como apenas “só mais um dos
problemas” existentes no local, sendo o mais grave o da violência. Vemos,
entretanto, que os problemas acarretados por esse fenômeno são sempre presentes
nas falas, embora os moradores não dêem ao fato a relevância que esperávamos.
A fim de dar relevância aos problemas que interessam ao nosso estudo,
tomamos do questionário inicial seis questões enfocando o tema. Enfocamos
também, de maneira meramente ilustrativa, haja vista que o interesse da análise de
conteúdo aqui abordada se perfaz sem o estudo estatístico das entrevistas, o
percentual de respostas recorrentes. As provas de validação foram efetuadas com
as entrevistas juntos aos líderes comunitários, vez que são eles os primeiros a
ouvirem os moradores e que têm muitas vezes as mesmas queixas, que também
são moradores.
O interesse em compreender as diversas opiniões dos moradores e em
seguida cruzá-las com as opiniões dos seus representantes se justifica pela
natureza descritiva dessa fase do trabalho, vez que é preciso ver se a voz da
comunidade está sendo representada pelos líderes. Essa confirmação sendo feita
nos permite fazer inferências sobre a iniciativa da comunidade quando de um plano
de gestão integrada. Por essa razão deixaremos de lado respostas extremas, tais
como “não tem nada de bom aqui (E9)” e “aqui é o melhor lugar do mundo (E7)”,
haja vista serem manifestações demasiadamente emotivas e frequentemente
contraditas na continuação da entrevista desses informantes.
Em relação aos questionários cujas respostas apresentaremos abaixo, é
importante levar em conta que se trata de uma amostragem validada também por
estudos comparativos com as entrevistas levantadas por outros autores (ARAÚJO,
2007; CEARAH, 2002). Vale ressaltar que os percentuais aqui mostrados não são
exatos, uma vez que as respostas muitas vezes englobaram duas classes de
queixas.
53
Veremos na sequência, as respostas dos 54 entrevistados compiladas nas
categorias previstas e classificadas acima, a partir do seguinte grupo de perguntas
extraídas das 21 questões do questionário inicial:
1- Há quanto tempo mora no local?
2- Como considera a moradia?
3- Quais os problemas enfrentados?
4- Quais as causas desses problemas?
5- Quem são os responsáveis pelos problemas?
6- Quem deve resolver os problemas?
Para a análise das informações coletadas, podemos ver no quadro abaixo a
disposição das categorias:
Quadro 1 - Informações coletadas com moradores
CATEGORIAS INFORMAÇÕES
Número de
pessoas
Tempo de moradia Chegada ao local (data
informada)
10 > 50 anos Década de 1950
14 > 30 anos Década de 1970
4 > 20 anos Década de 1980
8 > 10 anos Década de 1990
TEMPO
18 < 10 anos Década de 2000
Queixas dos Moradores
“Avanço das areias
“Esgoto e areias”
“Descaso do poder público”
“Falta de saneamento básico
“Lixo”
“Doenças que a areia pode causar
“Poluição”
“Areia, lixo, poluição da água parada”
“vento e buraco no asfalto”
“alagamento”
48%
“Brigas de gangues”
“Violência, maresia e areia”
“Violência crescente”
“Brigas de gangues e avanço de areia”
22%
“Nada de bom aqui” 2%
“Aqui é o melhor lugar do mundo 2%
Não Responderam 40%
Responsáveis pelos problemas
“Governo” 4%
Evento
“Prefeitura” 46%
54
“Governo e Prefeita” 11%
“Os membros das associações” 4%
“não é culpa de ninguém. É a natureza” 7%
“Os moradores que não denunciam” 11%
“Carro do lixo” 4%
Não sabem 4%
Não responderam 9%
Soluções previstas pelos moradores e quem deve resolver
“Prefeitura” 48%
“Governo” 4%
“Só Deus” 4%
“A sociedade mesmo” 11%
Não responderam 22%
Outro 11%
Fonte: Rebouças, 2010.
Parece indiscutível a correlação sistemática estabelecida pelos moradores
entre a não realização de obras de saneamento básico, a não retirada das areias e a
ausência de projetos de segurança local. Um morador nos conta que
uma vez e outra eles tiram um pouco das areias com uns tratores aí.
Mas eles fazem isso quando tem casas que estão bem pertinho
de serem engolidas pelas areias. É um inferno esses meses que
não chove. A areia é muito fina, entra pelas telhas e invade as
nossas casas (E10).
Podemos ver no quadro de respostas, com frequência, queixas cruzadas
entre esses três temas aliadas a uma forte descrença no poder blico, como
dissemos mais acima.
Vemos pelo quadro que apenas duas pessoas afirmaram não haver “nada de
bom aqui” em resposta à questão “Como considera a moradia?”. Esses mesmos
moradores afirmaram, entretanto, que “às vezes é boa”, e suas queixas se voltaram,
sobretudo, para as brigas das gangues e o avanço das areias. Um morador nos
confessa que
Mas aqui o que mais nos incomoda são as areias. Nessa época do
ano (de agosto a dezembro) é que ela nos tira o sono. A gente não
consegue comer direito, a comida desce com areia e tudo. Pra
comer nós temos que ir para debaixo da mesa (rindo), não é
brincadeira não. Você tem que ver isso, pode até tirar foto (E8).
Em se tratando das soluções, os moradores visualizam que a
responsabilidade é aliada à “culpa” pelos problemas. A Prefeitura foi a mais citada
quando perguntamos sobre os itens “responsabilidade e soluções”, embora a
55
descrença no poder público venha a reboque desta responsabilização e sob a égide
do descaso com a sociedade.
Araújo (2007) encontrou respostas muito aproximadas das nossas. Em seu
estudo sobre a memória dos pescadores acerca da modificação da paisagem da
Beira Mar de Fortaleza, a autora entrevistou 8 pescadores que foram remanejados
da Rua da Frente, nos anos 1960, para as obras do calçamento da atual Beira Mar,
dos quais 4 se instalaram no Serviluz. Esses moradores ratificaram as dificuldades
enfrentadas decorrentes do avanço das areias e relatadas por nossos informantes.
Permanece, porém, um aspecto divergente no que concerne à realização ou
não de obras de urbanização no local. Os moradores relataram sobre o crescimento
da praia, como vemos no relato abaixo:
A minha casa... a gente abria o quintal lá... o portão de casa e via o
mar. Depois o bairro foi aumentando, aumentando e as casas
aumentando também e hoje em dia o Serviluz tá do jeito que tá (E5).
É curioso notar que, além da precariedade das condições de habitação, a
comunidade local não dispõe de documentação referente às suas residências, haja
vista a ocupação ter sido fruto de ocupações aleatórias constantes ao longo do
tempo. Não constou nas respostas às entrevistas, em nenhum momento, a questão
fundiária. Não nos pareceu que a população tivesse esse tipo de inquietude relativa
à sua moradia, vez que, apesar de esperarem, mesmo dos céus, a solução aos
problemas gerais, esses moradores detêm suas preocupações em torno de
problemas imediatos, como a falta de segurança, devida à crescente violência, o
avanço das areias e o grave problema do lixo, conforme relata o morador E4.
Ruim daqui é a marginalidade, a galera... avacalha o lugar. Fica
fazendo confusão por besteira...tem as brigas com outras gangues
por causa de droga. Tem ai as associações que dão curso eles
podendo procurar isso não...querem mesmo é viver aí nas drogas.
Apenas dois moradores relacionaram as areias a questões de adoecimento, o
que nos leva a crer que não há, por parte da população, vislumbre da relação entre
avanço das areias e perigo. O mesmo não se pode dizer da relação entre lixo e
saúde. Os moradores estabelecem estreita relação entre “lixo”, “água parada” e
doenças diversas que possam ser causadas por esses elementos, mas, como pode
ser visto na Figura 17, o lixo continua sendo colocado em locais inadequados, como
as vias públicas e na própria praia.
56
Figura 17 - Lixo na praia. Fonte: Rebouças 2010.
Vale ressaltar ainda que 30% dos moradores desconhecem as causas dos
problemas que enfrentam no dia-a-dia, tais como o que chamam de “avanço” ou
“invasão das areias”. Um dos entrevistados (E3) relatou a experiência de ter de sair
de casa pelo telhado, quando, numa manhã, não conseguiu abrir sua porta. Esse
entrevistado, morador 50 anos, conta que viu a “praia crescer” e afirma que a
doação das areias de que trataremos na sessão sobre projetos - foi uma boa
iniciativa da Prefeitura para mitigar o problema da invasão das dunas nas casas.
Como citamos acima, a categoria tempo nos serviu para compreensão do
acompanhamento da população ao processo progradativo da Praia do Serviluz ao
longo dos últimos 50 anos, vez que o testemunho das pessoas traz acoplada a
realidade cotidiana, muito valiosa para o cumprimento de uma gestão integrada.
Assim como reza o guia GIZC, o conhecimento da base auxilia na
compreensão dos problemas a serem administrados pelo topo. O avanço das areias,
o maior vilão nas queixas dos moradores, após a violência local, é de fato o natural
caminhar das dunas, e não seria o problema que é, se não existisse a instalação da
comunidade. Há uma inversão dos acontecimentos, que não cabe aqui ser discutida,
vez que o problema está consolidado e não há, salvo com uma intervenção
drástica, formas de resolvê-lo definitivamente. O evento progradação se constitui na
realidade cotidiana dessa população e constrói com ela a história da praia e dos
moradores.
3 BASE LEGAL E PROJETOS RELACIONADOS À ÁREA DE ESTUDO
Para toda intervenção realizada na Zona Costeira de todo território nacional
é necessária uma fundamentação legal. Para tal abordagem consideramos as
competências da União e particularmente do Estado do Cea e do Município de
Fortaleza.
3.1 LEGISLAÇÃO PERTINENTE
Antes mesmo de nos tornarmos independentes da Coroa Portuguesa, a
nossa orla marítima era motivo de preocupação normativa, dada a grande
importância estratégica da zona costeira para a Coroa. Ainda em 1534, o Rei de
Portugal considerou a beira do mar e as lezírias mangues bens realengos, e
segundo Leivas (1977), em decreto de 5 de março de 1664, a Coroa proibiu a
concessão das terras lezírias.
Em 21 de outubro de 1710, é publicada uma Ordem Régia asseverando que
“que as sesmarias nunca deveriam compreender a marinha que sempre deve estar
desimpedida para qualquer incidente do meu serviço, e de defensa da terra.”
(NIEBUHR, 2004). Vasconcelos e Rebouças (2010), fazendo menção à Ordem
Régia, afirmam ser, provavelmente, a primeira citação em um documento oficial
publicado no Brasil do termo “marinha” para a faixa praial, lembrando que em
Portugal o termo “terreno de marinha” não é usado, sendo juridicamente utilizado o
"domínio público hídrico". Aqui no Brasil a expressão Terrenos de Marinha é
comumente confundida como Terrenos da Marinha fazendo alusão a que os
terrenos seriam da Marinha Brasileira.
A Ordem Régia de 18 de novembro de 1818 reservou 15 braças craveiras
6
,
medidos pela borda do mar no sentido do continente, para serviços públicos da
Coroa Portuguesa, o que segundo Obéde Lima (2005) era a largura suficiente para
permitir o livre deslocamento de um contingente militar. No entanto essa Ordem
6
Uma braça craveira equivale a 10 palmos craveiros, cada palmo igual a 22 centímetros. Deste modo
15 braças craveiras equivalem a 33 metros.
58
Régia não fazia referência a que estado do mar, em relação às suas variações de
nível, deveriam ser medidas as 15 braças.
Em 15 de novembro de 1831 a Lei Orçamentária colocou à disposição das
Câmaras Municipais os terrenos de marinha para aforar e estipular o foro sobre os
mesmos. Todavia a titularidade dos mesmos permaneceu com a Coroa (BRASIL,
1831).
Efetivamente a delimitação das 15 braças craveiras é dada com a
publicação da Instrução do Ministério da Fazenda de 14 de novembro de 1832. Essa
Instrução traz em seu artigo 4
o
que:
"hão de considerar-se terrenos de marinha todos os que, banhados
pela águas do mar, ou rios navegáveis, vão até a distância de 15
braças craveiras da parte da terra, contadas estas desde os pontos a
que chega a preamar média de 1831." (BRASIL, 1832).
Além de fazer referência ao ponto onde deve ser marcada no limite da terra
com o mar, a Instrução define também a preamar média como sendo o nível do mar
a ser considerado e estipula uma série temporal, que é o ano de 1831, para a
determinação da Linha de Preamar Média LPM. Essa Instrução segue detalhando
procedimentos para a demarcação, inclusive prevendo a participação dos
representantes de Províncias e Municípios, além de outros interessados como
posseiros e concessionários.
3.1.1 Legislação Federal
A legislação federal de interesse para o tema e para a área de estudo está
descrita abaixo com destaque para o foco de maior importância normativa.
Decreto-Lei 544 de 1938 – Construção do Porto do Mucuripe
Esse Decreto-Lei, ao qual já nos referimos na seção 1 desse estudo, modifica
o Decreto 23.606 de dezembro de 1933, transferindo para enseada do Mucuripe o
porto de Fortaleza e concede a outorga ao Estado do Ceará e revoga as disposições
em contrário.
59
Decreto-Lei 9760 de 1946 – Dispõe sobre os bens imóveis da União
O Art. dessa Lei inclui no item “a” os terrenos de marinha e seus
acrescidos como bens da União e dedica a Seção II do 2º Capitulo à demarcação
dos terrenos de marinha que, segundo o Art. 9º, é de Competência da SPU. A
discussão acerca desta demarcação será abordada neste trabalho na seção
Resultados e Discussões. No entanto é oportuno lembrar que essa lei mantém a
linha de preamar média de 1831 e os 33 metros medidos horizontalmente no sentido
do continente como demarcadores dos terrenos de marinha.
Vale ressaltar que em texto incluído pela Lei 11.481 de 2007 foi dedicada a
Seção III-A à demarcação de terrenos para regularização fundiária de interesse
social, sendo esta demarcação destinada a atender famílias com renda não superior
a 5 salários mínimos. É ainda da responsabilidade da SPU a demarcação dos
terrenos objeto desta seção.
Constituição Federal de 1988 – Constituição Cidadã
A Carta Magna da nação traz no seu Capitulo em que trata dos bens da
União Art. 20 Inc. IV que, entre outros, as praias marítimas são bens da União,
salvo os “que contenham a sede de Municípios, exceto aquelas áreas afetadas ao
serviço público” (BRASIL, 1988A), vale ressaltar que esta exclusão de propriedade
da União é dada pela Emenda Constitucional EC 46/2005. Ainda no mesmo Art.,
agora Inc. VII, ressalta que os terrenos de marinha e seus acrescidos também são
bens da União.
Os aforamentos previstos legalmente pela legislação então vigente são
mantidos no Capítulo em que se trata dos Atos das “Disposições Constitucionais
Transitórias”, mais precisamente no Art. 40, § 3º, quando assevera que “A enfiteuse
continuará sendo aplicada aos terrenos de marinha e seus acrescidos, situados na
faixa de segurança, a partir da orla marítima”, muito embora esta seja uma norma de
eficácia contida, e que veio e ser regulamentada pela lei 9636/98, que dispõe
sobre a regularização, administração, aforamento e alienação de bens imóveis de
domínio da União e outras providências, as quais veremos na sequência, no que
tange aos terrenos de marinha.
60
Lei 7661 de 1988 – Institui o Plano Nacional de Gerenciamento Costeiro (PNGC)
O PNGC define a zona costeira como o “espaço geográfico de interação do
ar, do mar e da terra, incluindo seus recursos renováveis ou não, abrangendo uma
faixa marítima e outra terrestre” (BRASIL, 1988B), sem, contudo, delimitar esses
limites de abrangência, ficando estes a serem definidos na elaboração do plano
que ficou conhecido pela sigla GERCO.
Essa legislação tem como principio a utilização racional dos recursos da Zona
Costeira ZC com o intuito de elevar a qualidade de vida da sua população e ainda
proteger o patrimônio natural, histórico, étnico e cultural. Para tanto prevê o
zoneamento de usos e atividades na ZC dando prioridade à conservação e à
proteção dos bens que integram esse patrimônio.
Em seu Art. 4º, § 2º, o PNGC, garante a transversalidade das ações do
GERCO que deverão ser aplicadas com a participação da União, dos Estados, dos
Territórios e do Municípios por meio de órgãos e entidades integrantes do Sistema
Nacional do Meio Ambiente SISNAMA. Vale ressaltar que os órgãos componentes
do SISNAMA contam não com integrantes do poder publico, mas também da
sociedade civil organizada. E institui ainda a necessidade do licenciamento
ambiental para atividades ou intervenções que alteram as características da ZC e
ressalta que essas atividades devem seguir as diretrizes dos GERCO federal,
estadual e municipal – além das demais legislações vigentes.
Decreto 5300 de 2004 – Regulamenta o Plano Nacional de Gerenciamento
Costeiro
Esse decreto além de regulamentar o PNGC Lei 7.661 de 1988 dispõe
sobre as regras de uso e ocupação da ZC e estabelece critérios de gestão da orla
marítima brasileira, ressaltando no Art. 21 que “As praias são bens públicos de uso
comum do povo, sendo assegurado, sempre, livre e franco acesso a elas e ao mar,
[...], ressalvados os trechos considerados de interesse da segurança nacional ou
incluídos em áreas protegidas por legislação específica.”
Ainda no Art. 21, em seu § 1º, torna de competência do poder público
municipal em conjunto com o órgão ambiental garantir o livre acesso às praias por
meio do planejamento urbano e, nas áreas já ocupadas por loteamentos à beira mar,
61
assegurar a implantação de servidões de passagem. O planejamento a que se
refere o Art. 21 deverá ser elaborado e executado pelo poder público municipal de
forma participativa com o colegiado municipal, órgãos e instituições e as
organizações da sociedade como ressalta o Art. 32.
Fica estabelecido o limite terrestre da orla em 50 metros em áreas
urbanizadas ou 200 metros em áreas ainda não urbanizadas a serem contados da
linha de preamar ou do limite final de ecossistemas tais como as feições de praia,
falésias, restingas (BRASIL, 2004, Art. 23. Inc. II).
O PNGC tem como instrumento de planejamento e ação o Zoneamento
Ecológico Econômico – ZEEC cujas intervenções na orla marítima, conforme aborda
o Art. 33, somente serão permitidas se em conformidade com as indicações do
ZEEC ou ainda de instrumentos similares de ordenamento e uso do território.
Visando a integração da gestão costeira, foram elaborados um “quadro
orientador para obtenção do zoneamento” – Anexo I do decreto e um “quadro
orientador para a classificação da orla marítima” – Anexo II do decreto.
Lei 9636 de 1998 - Dispõe sobre a regularização, administração, aforamento e
alienação de bens imóveis de domínio da União, altera dispositivos dos
Decretos-Leis n
os
9.760, de 5 de setembro de 1946, e 2.398, de 21 de dezembro
de 1987, regulamenta o § 2
o
do art. 49 do Ato das Disposições Constitucionais
Transitórias, e dá outras providências.
Essa Lei traz em seu Art. 18, Ins. II, § 1
o
, que a cessão de bens imóveis da
União poderá ser realizada, ainda, sob o regime de concessão de direito real de uso
resolúvel, previsto no art. 7
o
do Decreto-Lei n
o
271, de 28 de fevereiro de 1967,
aplicada, inclusive, em terrenos de marinha e acrescidos, dispensando-se o
procedimento licitatório para associações e cooperativas.
Na redação incluída pela Lei 11.481/2007 que trata da Concessão de Uso
Especial para Fins de Moradia o seu Art. 22-A indica que a concessão de uso
especial para fins de moradia aplica-se às áreas de propriedade da União, inclusive
aos terrenos de marinha e acrescidos, ressaltando que este direito não se aplica aos
imóveis funcionais, tampouco a imóveis sob a administração do Ministério da
Defesa.
Ainda fruto dessa nova redação, o Art.3-A dá a incumbência ao Poder
Executivo de organizar e manter um sistema unificado sobre os bens de que trata
esta Lei e ressalta em seu Parágrafo Único que as informações referentes aos bens
62
da União deverão ser também disponibilizadas na Internet. No entanto, em contato
com a Secretaria do Patrimônio da União SPU, órgão do Ministério do
Planejamento, encarregado de zelar pelo patrimônio do povo, não obtivemos
resposta de como ter acesso por meio eletrônico a essas informações.
Decreto 4333 de 2002 – Delimita a área do Porto Organizado de Fortaleza
O presente Decreto evoca o Art. 84 da Constituição Federal, que trata das
competências privativas do Presidente da República e faz menção à Medida
Provisória 2.217-3 de 2001, que em seu Art. cria o Conselho Nacional de
Integração de Políticas de Transportes CONIT, para então regulamentar a
delimitação das áreas dos portos de Fortaleza, Santos e Vitoria. Segundo o decreto
a área do Porto Organizado de Fortaleza é delimitada:
Art. 1
o
[...]
I - pelas instalações portuárias terrestres e marítimas, delimitadas
pela poligonal definida pelos vértices de coordenadas geográficas a
seguir indicadas: Ponto A: Latitude 43’ 15"S, Longitude: 038º 28’
37"W; Ponto B: Latitude 3º 43’ 06"S, Longitude 038º 28’ 44"W; Ponto
C: Latitude 43’ 16"S, Longitude 038º 29’ 00"W; Ponto D: Latitude
43’ 16"S, Longitude 038º 29’ 27"W; Ponto E: Latitude 42’ 40"S,
Longitude: 038º 29’ 27"W; Ponto F: Latitude 41’ 55"S, Longitude
038º 30’ 38"W; Ponto G: Latitude 41’ 00"S, Longitude 038º 30’
38"W; Ponto H: Latitude 3º 41’ 00"S, Longitude 038º 26’ 48"W; Ponto
I: Latitude42’ 38"S, Longitude: 038º 26’ 48"W; Ponto J: Latitude 3º
43’ 14"S, Longitude 038º 28’ 09"W; Ponto K: Latitude 43’ 00"S,
Longitude 038º 28’ 10"W; Ponto L: Latitude 43’ 10"S, Longitude
038º 28’ 29"W, abrangendo todos os cais, docas, pontes, piers de
atracação e de acostagem, armazéns, silos, rampas ro-ro, pátios,
edificações em geral, vias internas de circulação rodoviária e
ferroviária e ainda os terrenos ao longo dessas faixas marginais e em
suas adjacências, pertencentes à União, incorporados ou não ao
patrimônio do Porto de Fortaleza, ou sob sua guarda e
responsabilidade;
[...]
Parágrafo único. A Administração do Porto de Fortaleza fará a
demarcação em planta da área definida neste artigo. (BRASIL, 2002)
Vale ressaltar que o Decreto não elucida os critérios técnicos utilizados na
referida delimitação, que abrange uma área muito maior que a do Porto e seu
entorno imediato, deixando quase que na totalidade o Serviluz como área portuária,
como podemos ver na Figura 18.
63
Figura 18 - Área demarcada pelo Decreto 4.333/2002. Fonte: Brasil, 2002, compilação
Rebouças, 2010.
Essa demarcação demonstra que o Bairro do Cais do Porto e a Comunidade
do Serviluz foram abordados como área industrial com foco no Porto de Fortaleza
sem, no entanto, levar em conta a realidade local.
3.1.2 Legislação Estadual
Constituição do Estado do Ceará de 1989
Inspirada na Constituição Federal, a Constituição do Estado do Ceará
ressalta a competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos
Municípios em zelar, entre outros, pela proteção do patrimônio público e dos
recursos naturais.
Deste modo, com o intuído de proteger as praias, contamos com o Art. 23, o
qual trata as praias como:
[...] bens públicos de uso comum, inalienáveis e destinadas
perenemente à utilidade geral dos seus habitantes, cabendo ao
Estado e a seus Municípios costeiros compartilharem das
64
responsabilidades de promover a sua defesa e impedir, na forma
da lei estadual, toda obra humana que as possam desnaturar,
prejudicando as suas finalidades essenciais, na expressão de seu
patrimônio natural, histórico, étnico e cultural, incluindo, nas
áreas de praias [...] Parágrafo único. Entende-se por praia a área
coberta e descoberta periodicamente pelas águas marítimas, fluviais
e lacustres, acrescidas da faixa de material detrítico, tal como
areias, cascalhos, seixos e pedregulhos, até o limite onde se inicie a
vegetação natural ou outro ecossistema, ficando garantida uma
faixa livre, com largura mínima de trinta e três metros, entre a
linha da maré máxima local e o primeiro logradouro público ou
imóvel particular decorrente de loteamento aprovado pelo Poder
Executivo Municipal e registrado no Registro de Imóveis do
respectivo Município, nos termos da lei. (CEARÁ, 1989)
A constituição reza ainda que as ações de controle ambiental deverão ser
desenvolvidas de forma articulada entre a União, o Estado e os Municípios.
Plano Estadual de Gerenciamento Costeiro – GERCO Ceará
O plano de Gerenciamento Costeiro do Ceará GERCO Ceará é fruto da lei
7661/98 que instituiu o Plano Nacional de Gerenciamento Costeiro. Para efeito de
sistematização, o GERCO Ceará segmentou os 573 km de zona costeira do estado
em quatro setores, dos quais Fortaleza faz parte do II Setor – Costa Metropolitana.
Entre as atividades desenvolvidas pelo GERCO, podemos citar o
Macrozoneamento Ecológico Econômico do litoral cearense elaborado pela Semace
em Parceria com o Labomar. E atualmente está em discussão a elaboração do
Plano Estadual de Gerenciamento Costeiro e na implantação do Projeto Orla.
3.1.3 Legislação Municipal
Projeto Orla Fortaleza
O Projeto Orla Fortaleza tem como objetivo geral a identificação dos
problemas da orla marítima de Fortaleza além de estabelecer medidas de
planejamento e gestão, de uso e ocupação da ZC, sob a perspectiva da
sustentabilidade e participação da sociedade, levando em conta os aspectos sócio
65
econômicos, ambientais e patrimoniais. Propõe-se ainda promover a regularização
fundiária nas áreas da União hoje ocupadas irregularmente.
As diretrizes apontadas no Projeto Orla obedecem à orientação metodológica
proposta no Projeto Orla: Manual de Gestão (BRASIL, 2006) e Projeto Orla:
Fundamentos para Gestão Integrada (BRASIL, 2002). Vale ressaltar que o manual
intitulado Fundamentos para Gestão Integrada em muito se assemelha aos Guias
para Gestão Integrada da Zona Costeira publicados pela Unesco nos anos de 1997
e 2002. Além dos manuais aqui citados, o Projeto Orla segue o que determinam as
legislações específicas para cada área.
Lei Complementar 062 de 2009: Plano Diretor Participativo – PDP
O PDP Fortaleza obedece às exigências legais estabelecidas pela Lei
10257/2001 Estatuto das Cidades, que por sua vez regulamenta os Arts. 182 e
183 da Constituição Federal que tratam da politica de desenvolvimento urbano.
Os artigos do PDP que mais nos chamam atenção para a área de estudos,
principalmente no que se diz respeito à posse da terra, são:
“Art. [...] Inc. IX - promover a urbanização e a regularização
fundiária das áreas irregulares ocupadas por população de baixa
renda. [...] Art. 5º [...] Inc. VIII - instituir as Zonas Especiais de
Interesse Social (ZEIS) [...] Art. 72 [...] Inc. VII - promover a
regularização fundiária, em especial nas áreas de interesse social
classificadas como ZEIS.” (FORTALEZA, 2009)
A área do Serviluz está enquadrada numa ZEI, fato que choca com a
delimitação da área portuária estabelecida no Decreto 4333/2002, o que tem
promovido acirrados embates políticos entre Governo Municipal e Estadual.
3.2 PROJETOS INSTITUCIONAIS E GOVERNAMENTAIS NA ÁREA DE ESTUDO
Projeto de Guias de Corrente Eólica – SEMACE (anos de 1990)
Na década de 1990 a Superintendência Estadual do Meio Ambiente
SEMACE executou um projeto de “Guias Eólicas” de sedimentos. O objetivo do
66
projeto era instalar ao longo da faixa praial telas e palhas de coqueiro que
desviariam o transporte de sedimentos da direção das casas para o molhe de
contenção da Praia do Futuro. O projeto contou com o apoio da comunidade na
manutenção das “guias licas”, que durante a execução do projeto conseguiram
aliviar satisfatoriamente o soterramento de residências na Rua Pontamar.
Projeto de Requalificação Urbana da Área do Serviluz (PREZEIS) – PMF
O Programa PREZEIS – FORTALEZA tem o objetivo de promover incremento
sócio-econômico no local das três ZEIS prioritárias: Pirambu, Serviluz e Lagamar.
O projeto prevê a requalificação e a recuperação do aparelhamento urbano,
facilitando a mobilidade da população e melhorando os serviços de segurança
pública, da infraestrutura de saneamento ambiental, que deverá melhorar a
qualidade de vida das pessoas; e prevê ainda a regularização fundiária das
residências em condições subnormais.
Projeto Métodos Combinados para Contenção do Processo Erosivo Eólico na
Praia do ServiluzEMBRAPA
Estudos realizados pela Embrapa Agroindústria Tropical, Unidade da
Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária, apontaram a ação dos ventos na
Praia do Serviluz como erosão costeira, conforme é descrito no título do projeto
elaborado pela EMBRAPA “Métodos combinados para contenção do processo
erosivo eólico na Praia do Serviluz”, o que podemos classificar, no mínimo, como um
grave erro conceitual, haja vista que a Praia do Serviluz está em progradação,
jamais tendo sofrido com processos erosivos.
O projeto apresentou à sociedade o objetivo de “[...] instalar cercas verticais
de contenção, feitas a partir das mantas de coco verde. Essas mantas vão ajudar a
barrar a ação do vento, evitando que as partículas de areia invadam as residências
dos moradores da Praia do Serviluz” (EMBRAPA, 2008).
Projetos Aldeia da Praia e Aldeia das Dunas – PMF
O projeto Aldeia da Praia visa promover no Bairro do Serviluz a fixação da
população residente num espaço com qualidade urbana e provida dos serviços
67
indispensáveis ao desenvolvimento social. Em razão da alta densidade habitacional
atual (5.000 famílias em 15 ha), estima-se que 50% dessa população seja
reassentada no Projeto Aldeia das Dunas na área da Praia do Futuro, que atende às
mesmas características relativas à tipologia habitacional, infraestrutura e serviços
projetados para o projeto Aldeia da Praia, a uma distância de 2,5 Km.
O projeto visa em especial promover a regularização urbanística da Praia do
Futuro, integrando-a à Av. Beira Mar, favorecendo a atividade turística, criando
novas áreas de desenvolvimento socioeconômico e urbano na cidade e garantindo a
sustentabilidade da função social da cidade e da propriedade aos que lá habitam.
4 MÉTODOS E TÉCNICAS DE PESQUISA
Percurso Metodológico
Esse trabalho teve por objetivo realizar um estudo de caso tendo como
campo de investigação a Praia do Serviluz e suas modificações físicas, humanas e
sociais ao longo dos últimos 50 anos. É um estudo de natureza descritivo-analítica,
de abordagem predominantemente quantitativa, porém apresentando um recurso
qualitativo no que concerne ao contato com os atores envolvidos, ou seja, gestores,
moradores e comunidade científica. Para uma melhor sistematização das
informações inerentes ao estudo, a descrição da metodologia e dos procedimentos
foi apresentada em duas partes: a primeira concernente à abordagem qualitativa; a
segunda tratando sobre a abordagem quantitativa.
É necessário antecipar que para a coleta de dados desta pesquisa, foram
realizadas dez campanhas de campo, dentre as quais cinco se detiveram à
realização de perfis geométricos da área em estudo e as demais a entrevistas com a
comunidade. Concomitante à realização dos perfis, foram realizadas quatro séries
de coletas de sedimentos para análise laboratorial. Estes momentos procedimentais
do estudo serão descritos nos itens 3.2 e 3.3.
A metodologia empregada teve como base o levantamento de informações
referentes aos meios físicos geologia, geomorfologia, clima de ondas, dinâmica
eólica, série temporal de dados de precipitação e insolação e sócio-econômicos
identificação dos atores, renda, habitação, uso e ocupação do solo. Os
procedimentos realizados obedeceram aos passos descritos a seguir, segundo as
abordagens escolhidas.
4.1 ESTUDO QUALITATIVO
Tivemos como ferramenta de apoio a este estudo a abordagem qualitativa,
uma vez que foram entrevistados alguns dos moradores da área e tendo em vista
69
que a experiência humana, referida pelo próprio sujeito, é de grande valia para
fundamentar o conhecimento sobre seus problemas e anseios.
Para Minayo (2007) a pesquisa qualitativa procura observar o fenômeno e
compreender seu significado individual ou coletivo para a vida das pessoas, além de
permitir o entendimento sobre a complexidade de emoções, valores e atitudes. Vale
assinalar que as pesquisas de natureza qualitativa objetivam em geral a exploração,
a compreensão e a explicação de um fenômeno, a partir de informações subjetivas –
aqui chamadas dados e não de teorias e conhecimentos formalizados. Além disso,
as pesquisas qualitativas têm como propósito elucidar significados de maneira
específica e qualificar através da visão dos participantes em vez de quantificar por
meio dos olhos do observador (MOREIRA e CALEFFE, 2006).
A escolha se justifica ainda por ser esta abordagem fundamental, quando se
procura descobrir e entender o significado de eventos, práticas sociais, percepções
e ações dos indivíduos. Para obter as informações pertinentes aos objetivos deste
estudo, foram realizadas duas séries de entrevistas: a primeira, em forma de
questionário fechado, composto de 20 questões, as quais abrangiam informações
acerca do perfil socioeconômico dos usuários.
Os questionários foram aplicados em um mesmo dia, junto a 54 moradores,
dando-se prioridade àqueles que residem no local mais de 50 anos. O esquema
das questões encontra-se no Apêndice A. A segunda série de questões foi realizada
em dias diferentes, com os dez moradores mais antigos do local e que m suas
atividades ligadas à área em estudo ou em seu entorno. O critério de escolha por
antiguidade se caracterizou por serem estes dez moradores antigos moradores do
Mucuripe ou da Praia Mansa, e que foram realocados no Serviluz em 1974, pela
Capitania dos Portos, por ser a região do porto, a partir de então, de posse e
domínio institucional.
Assim sendo, no que se refere às informações prestadas pelos moradores da
área em estudo, esta pesquisa apresenta um contexto de abordagem qualitativa e
constitui-se em um estudo de caso, cujo destaque está em compreender os
acontecimentos a partir da perspectiva dos sujeitos participantes. Esse tipo de
pesquisa é preferível em situações em que questões do tipo “como” ou “por que” são
apresentadas, uma vez que evitam a manipulação de dados. É ainda favorável
quando o pesquisador, por razões práticas ou éticas, não pode realizar estudos
experimentais (YIN, 2001).
70
André (2005) assinala que o estudo de caso é proveitoso por sua capacidade
de retratar situações da vida real, sem prejuízo de sua complexidade e de sua
dinâmica natural. Isso vai demandar aceitação do pesquisador pelos participantes do
estudo nas relações de campo.
O estudo de caso é também valorizado por sua capacidade heurística, isto é,
por lançar luz sobre o fenômeno pesquisado, de modo que o observador possa
desvendar novos sentidos, ampliar suas experiências ou ratificar o que lhe era de
conhecimento prévio.
André (2005) destaca como outra qualidade do estudo de caso sua
contribuição à busca de soluções para os problemas da prática social. Isso significa
que enfatizando uma instância em particular e fazendo aparecerem suas múltiplas
dimensões, assim como suas diversas interações, o estudo de caso pode fornecer
informações valiosas para medidas de natureza prática e para decisões políticas.
Isso significa que tanto a coleta quanto a divulgação dos resultados devem estar
pautadas por princípios éticos, por respeito aos sujeitos, de modo que sejam
evitados constrangimentos aos participantes por influência de cunho ideológico do
pesquisador. É importante lembrar que obter o consentimento dos participantes é
fundamental. Este procedimento pode ser realizado por meio de instrumentos
formais ou não; o importante é que sejam explicitadas as questões e estabelecidos
os acordos.
Participantes do Estudo
Participaram do estudo na primeira fase 54 moradores locais, além de dois
representantes comunitários e a presidente de uma das associações comunitárias
locais. Na segunda fase da coleta de informações, participaram 10 moradores cujo
critério de escolha foi explicado no item anterior. Ressaltamos que os 10
moradores que participaram da segunda fase foram escolhidos a partir do primeiro
questionário aplicado, em que se perguntava, entre outras coisas, sobre o tempo de
moradia no local.
Os participantes do estudo foram, inicialmente, entrevistados individualmente.
Para complementação das informações necessárias a esta pesquisa, a segunda
etapa de questões aos moradores foi feita individualmente em suas residências,
utilizando-se de um roteiro de entrevista aberta, conforme explicitado acima.
71
Avaliamos que seria pertinente o fato de estarem esses sujeitos em áreas de
seu conhecimento e convívio. A segunda etapa da pesquisa se deu até o
pesquisador perceber a saturação dos relatos. Segundo Minayo (2007) o critério de
saturação é atingido no momento em que o pesquisador, pelos dados obtidos em
campo, consegue compreender a lógica do grupo em questão, não sendo
determinante o número de sujeitos da amostra. Portanto, 10 sujeitos com idades que
variavam de 65 a 82 anos participaram do estudo e com esses dados foi possível
obter subsídios para a compreensão do fenômeno de modificação da área em
questão.
Procedimentos para Coleta e Registro dos Dados
O princípio da Gestão Integrada da Zona Costeira GIZC, utilizado neste
estudo, consiste em fornecer aos administradores públicos elementos para que eles
compreendam melhor como funciona o complexo ecossistema costeiro, onde
coabitam o meio natural e as atividades humanas. Esse conhecimento é uma
ferramenta útil na tomada de decisão, evitando ou atenuando impactos negativos,
contribuindo para a conservação ambiental e para o desenvolvimento das atividades
humanas de modo sustentável.
A aplicação da metodologia de Gestão Integrada da Zona Costeira GIZC se
baseia no princípio de que as decisões sobre o meio ambiente devem ser tomadas
da base para o topo, e que é possível o consenso entre representantes de grupos
diferentes, com interesses também diferentes, muitas vezes contrários, sendo
fundamental a participação da comunidade científica que desempenha papel
importante de informar e fornecer elementos necessários ao conhecimento dessas
regiões.
Para a coleta dos dados, a primeira etapa deste estudo aplicou junto a 54
moradores da Praia do Serviluz um questionário fechado, cujas respostas foram
lançadas em banco de dados relacional PostgreSQL com extensão espacial
PostGIS, onde foram processadas conforme as diretrizes metodológicas propostas
pela UNESCO (1997) no Guide Méthodologique d’Aide à La Gestion Intégrée de La
Zone Côtière, 36 Etapa 3, Planilha 3 que trata da qualificação do espaço
costeiro, no que diz respeito aos modos de uso e ocupação do espaço em questão
pelo homem.
72
Na segunda etapa deste estudo, foi utilizada como instrumento de coleta de
dados a entrevista semiestruturada, gravada em meio digital para posterior
transcrição na íntegra pelo próprio pesquisador. A preferência pela entrevista
semiestruturada se justifica, pois nesta modalidade “as questões seguem uma
formulação flexível e a sequência e minuciosidade ficam por conta do discurso dos
sujeitos e da dinâmica que acontece naturalmente” (BIASOLI-ALVES, 1998, p. 145).
A opção por esta técnica se deveu ao fato de, por meio da entrevista
semiestruturada, ser possível ao pesquisador o acesso a dados descritivos na
linguagem do próprio sujeito e por possibilitar que o pesquisador desenvolva uma
opinião objetiva sobre o modo como os sujeitos interpretam as ações antrópicas
sobre o mundo. As entrevistas permitem, além disso, o mapeamento de práticas,
crenças e valores, permitindo a coleta de informações sobre o modo como os
sujeitos entendem a realidade que vivenciam e a lógica que se encontra
(DUARTE, 2004).
As entrevistas não foram agendadas previamente, tendo sido realizadas de
acordo com a disponibilidade do pesquisador, haja vista ser a fase de coleta de
material de análise laboratorial muito longa. Para as entrevistas a pesquisa contou
como o apoio de um aluno de graduação da Universidade Federal do Ceará bolsista
de um Projeto de Extensão cujo tema se liga ao Serviluz
7
. Os encontros com cada
um dos 10 moradores teve duração de 20 a 30 minutos e as transcrições posteriores
tomaram em torno de 3 a 4 horas, cada uma.
Organização e Análise dos Dados
A fim de garantir o anonimato dos participantes e entrevistados, foi utilizada a
seguinte legenda:
E – Entrevistado (sequência de 1 a 10 = E1, E2, E3...)
RC – Representantes comunitários (sequência RC1 e RC2)
Pd.- Presidente de Associação
Inicialmente foi feita a transcrição integral das entrevistas, seguida de uma
primeira exposição dos dados. A transcrição não seguiu nenhum modelo pré-
7
Magno dos Santos Gomes. Projeto: Memórias de um Espaço Criado: Narrativas de Moradores do
Serviluz. PROEX/UFC 2009-2010. Sob Coordenação da Professora. Dra. Sandra Maia Farias
Vasconcelos.
73
estabelecido, tendo sido realizada utilizando-se literalmente as falas dos
entrevistados. Na sequência procedeu-se à leitura do material empírico e, para
tornar os relatos mais compreensíveis para o leitor, foram corrigidos erros grosseiros
da língua portuguesa, sem, no entanto, alterar o significado ou particularidades dos
relatos.
Para análise desses relatos utilizamos da técnica de análise de conteúdo, que
segundo Laurence Bardin (2007, p. 37):
“é um conjunto de técnicas de análise das comunicações visando
obter, por procedimentos, sistemáticos e objetivos de descrição do
conteúdo das mensagens, indicadores (quantitativos ou não) que
permitam a inferência de conhecimentos relativos às condições de
produção/recepção [...] destas mensagens”
Escolhemos esse aporte teórico-metodológico de análise por acreditar
responder de maneira mais objetiva aos nossos propósitos. Segundo ainda a autora
“por trás do discurso aparente geralmente simbólico esconde-se um sentido que
convém desvendar” (BARDIN, 2007, p. 14). Essa afirmação nos levou a uma análise
atenta das entrevistas realizadas, por termos que trabalhar de maneira interpretativa
o conjunto de informações prestadas pelos entrevistados. O passo seguinte da
análise dos dados foi a categorização. Como passo final, iniciamos um processo de
análise das relações entre essas opiniões, a fim de compreender o fenômeno na
perspectiva humana.
4.2 ESTUDO QUANTITATIVO
Para melhor visualização no que diz respeito ao estudo quantitativo serão
descritas as etapas de forma distinta, ainda que os procedimentos tenham sido
concomitantes.
A execução desta fase do estudo seguiu três etapas: a primeira delas
consistiu no levantamento de material cartográfico existente sobre a região,
fotografias aéreas e imagens de satélite para elaboração de uma base cartográfica
diacrônica, com lapso temporal de 50 anos.
Neste momento da pesquisa, encontramos uma das maiores dificuldades
deste estudo: conseguir encontrar aerofotos e material cartográfico referentes às
74
primeiras décadas do lapso temporal abordado neste estudo, e que se
encontrassem em estado razoável de conservação, no que diz respeito a nitidez,
baixo teor de umidade e integralidade pictográfica, além de datação confiável.
Procedemos à busca deste material junto ao Exército Brasileiro, que realizou
em parceria com o Exército dos EUA o primeiro levantamento aerofotogramétrico do
Brasil em 1942 e 1943. Buscamos também junto ao Serviço Geológico do Brasil
CPRM, ao Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária INCRA, à
Prefeitura Municipal de Fortaleza PMF/SEINF, à Universidade Federal do Ceará
UFC/Dep. de Geografia, à Diretoria de Hidrografia e Navegação – DHN, à Divisão de
Geração de Imagens DGI do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais, à
Companhia de Gestão de Recursos Hidricos COGERH e ao Museu da Imagem e
do Som – MIS.
Não foi possível, entretanto, localizar junto ao Exército o destino dado às
imagens do primeiro levantamento aerofotogramétrico, cuja execução coincide com
a instalação do Porto na ponta do Mucuripe (1939 a 1945). Além disso optamos por
não trabalhar as aerofotos disponíveis na UFC e no INCRA por se tratarem de voos
coincidentes com os disponíveis na PMF e CPRM, cujos acervos estavam em
melhores condições físicas e de organização.
As aerofotos a que tivemos acesso na CPRM encontram-se na escala
aproximada de 1:25.000, e o voo consta no acervo como executado no ano de 1958,
data que podemos confirmar pela análise da imagem onde as instalações do porto
ainda não continham os armazéns 3 e 4, que foram edificados na década de
1960.
Na PMF tivemos acesso a dois jogos de aerofotos – ainda em papel –
datados de 1972 e 1978, respectivamente, ambos com escala aproximada de
1:6.000 e 1:8.000 respectivamente. No entanto só foi possível a utilização das
aerofotos do ano de 1972 haja vista que as imagens do ano de 1978 somente foram
visualizadas no seu fotoíndice, não sendo localizadas junto à sua coleção. Vale
ressaltar que ainda na PMF foram disponibilizadas, em meio digital, aerofotos da
área dos anos de 1995 e 2004, das quais também foi possível analisarmos o
primeiro conjunto de imagens referentes ao ano de 1995, que as imagens da área
em estudo estavam danificadas nos arquivos do voo de 2004.
Com a DHN foi possível obtermos valioso acervo das cartas náuticas 701
Porto de Mucuripe com a primeira datando de 27 de abril de 1945, período da
75
conclusão da edificação do porto, e ainda todas as suas atualizações até 2009. As
cartas mais antigas, que ainda se encontravam em papel, foram digitalizadas na
sede da DHN, no Rio de Janeiro, e cedidas em meio digital.
No intervalo da década de 1980, não conseguimos, em nenhum dos locais de
pesquisa a que tivemos acesso, aerofotos ou ainda imagens de satélite de alta
resolução que os satélites de resolução submétrica ainda não operavam nesse
período. No entanto a DGI/INPE disponibiliza gratuitamente em sua gina web
imagens da família Land Remote Sensing Satellite LANDSAT de todo território
nacional. Optamos então por trabalhar com as imagens do LANDSAT 5 TM que têm
resolução espacial de 30 m nas bandas de 1 a 5 e 7 e de 120 m no infravermelho
termal banda 6 e que se mostraram as de melhor qualidade disponível nesse
período para o nosso estudo.
Junto à COGERH tivemos acesso a imagens orbitais do satélite Quickbird
com resolução espacial de 0,6 m, do ano de 2008 ortoretificadas, e ainda, do ano
de 2003 standart. E por meio da web, conseguimos as imagens do Google Earth
de 2007 e 2009.
Paralelamente aos estudos de pesquisa de campo concernentes à coleta de
dados, foi realizado um levantamento do material bibliográfico, disponível ao público,
em bibliotecas universitárias e institucionais e ainda em bibliotecas digitais
disponíveis na web, sobre o tema a ser estudado, sobretudo relativo aos aspectos
físicos, ambientais e legais da área, bem como referente aos dados científicos
existentes e aos projetos governamentais (municipal, estadual ou federal) de
conservação e/ou recuperação ambiental da Praia do Serviluz. A lista do material
coletado está citada nas referências deste estudo.
A terceira etapa referiu-se às coletas de dados e amostras realizadas in situ
conforme descrito a seguir:
I. Realização de perfis topográficos da Praia do Serviluz. Esse procedimento
tem como objetivo analisar as variações da morfologia praial numa relação
espaço tempo por meio dos métodos propostos por Birkemeier (1981;
1985). Os levantamentos contaram inicialmente com doze perfis
topográficos de praia, realizados sempre na maré de sizígia, obedecendo
ao seguinte cronograma: 15 de outubro e 26 de dezembro de 2008 e 13
de março, 25 de maio e 21 de agosto de 2009. A partir da segunda
campanha de campo, os perfis P2 e P4 foram eliminados, por estarem a
76
apenas 50 metros dos perfis P1 e P3. Deste modo o arco praial foi coberto
por 10 perfis localizados nas coordenadas constantes na Tabela 3.
Tabela 3 - Localização dos Perfis Topográficos em UTM
Nome do Ponto E N Z
P 1A 559353
9590156
4,669
P 2A (ELIMINADO) 559389
9590080
4,533
P 3A 559428
9590014
4,397
P 4A (ELIMINADO) 559428
9589920
4,611
P 5A 559437
9589846
4,783
P 6A 559456
9589718
4,389
P 7A 559480
9589610
4,742
P 8A 559547
9589426
4,045
P 9A 559591
9589304
4,058
P 10A 559629
9589142
4,302
P 11A 559677
9589044
4,453
P 12A 559734
9588894
4,527
Os perfis foram executados com a utilização de nível topográfico e mira nas
primeira, terceira e quarta campanhas, estação total Topcon e prisma, na segunda
campanha, e finalizados os perfis, na quinta campanha, com a utilização de GPS
Geodésico Magelam Pro-Mark 3 em modo cinemático.
Os pontos iniciais de nivelamento foram materializados em campo por meio
de marcações em pontos fixos e de fácil localização marcados com tinta nas
calçadas e em postes. Cada ponto de nivelamento topográfico, marcado na calçada,
teve sua cota altimétrica estabelecida por GPS Geodésico, que ficou estacionado
em cada ponto por no mínimo 15 minutos e teve os dados coletados pós-
processados com base nos dados disponibilizados pelo IBGE por meio da Rede
Brasileira de Monitoramento Continuo – RBMC. O procedimento de nivelamento
topográfico consistiu em estacionar o nível topográfico ou a estação total em um
ponto estratégico do terreno e proceder a leituras equidistantes em dez metros,
partindo da calçada em direção ao oceano, e nos pontos de inflexão do terreno
antepraia, estirâncio, pós-praia – conforme modelo esquemático apresentado na
Figura 19.
Figura 19 – Representação esquemática do nivelamento topográfico. Fonte: Rebouças,
2010.
77
Vale ressaltar que foi utilizada bússola geológica Brunton durante todo
processo de coleta de dados referentes aos nivelamentos topográficos, com intuito
de garantir sempre o mesmo alinhamento para os perfis em todas as campanhas de
campo.
II. Coleta de material sedimentar e realização de análises granulométricas,
para determinar origem e tamanho médio dos grãos. As coletas foram
realizadas em quatro campanhas, concomitantemente com os
levantamentos topográficos no intervalo de um ano.
As coletas foram realizadas no alinhamento dos perfis, com pás e trado
manual, do tipo boca-de-lobo. Os pontos foram inicialmente cavados com a pá, até
uma profundidade aproximada de um metro e em seguida escavados com o trado
até atingirem dois metros de profundidade. O tamanho e o tratamento das amostras
de sedimentos colhidas em campo seguiu a sugestão metodológica proposta por
Suguio (1973; 2003).
Na primeira campanha, foi coletado material sedimentar de superfície em três
pontos do perfil 1 berma, s-praial e estirâncio. Ainda na primeira campanha,
foram coletadas mais duas amostras no berma e no estirâncio do perfil topográfico
4. Na segunda campanha foram realizadas coletas de 60 amostras divididas em 30
pontos distribuídos ao longo de todo o arco praial. As amostras coletadas variaram
em profundidade entre superfície e 50 centímetros, a razão de duas amostras para
cada ponto de coleta. Para a coleta de profundidade foi utilizado o trado do tipo
boca-de-lobo (Figura 20).
Figura 20 - Sondagem com pá a trado manual. Fonte: Rebouças, 2010.
78
Na terceira campanha foram realizadas coletas de amostras em oito pontos
ao logo dos perfis 5, 8, 9 e 10. No perfil 5, foi coletada amostra no estirâncio a um
metro de profundidade. No perfil 8, foi retirada amostra igualmente a estirâncio, a
menos um metro. No perfil 9, foi coletada amostra no estirâncio, na superfície e a um
metro de profundidade. No perfil 10 foram feitas duas coletas no final do berma, a
menos 50 centímetros e menos 1 metro, e no estirâncio de superfície e de menos 50
centímetros. Na última campanha de coletas de sedimentos, realizada após um ano
de observação em campo, foram escolhidos 10 pontos para sondagem ao longo do
arco praial. Essas sondagens constaram de coletas de superfície, de menos um
metro e de 2 metros de profundidade, exceto nos pontos S2, S5, S6, S7 uma vez
que alcançamos o nível da água, o que inviabilizou dar continuidade à sondagem.
Análise dos dados
O primeiro momento desta etapa do trabalho consistiu no tratamento das
imagens orbitais, das aerofotos e das cartas náuticas com a utilização de
ferramentas de SIG, para que fosse possível o intercâmbio de informações entre as
diversas formas de dados. Essas relações são um meio de possibilitar a análise a
que se propôs o estudo.
Optamos inicialmente por trabalhar com a imagem orbital Quickbird do ano de
2008, por tratar-se de uma imagem com resolução espacial de 60 centímetros
ortoretificada, o que a transformou em base para o georeferenciamento das demais
imagens do estudo. A necessidade de trabalhar com a imagem ortoretificada se
justifica pelo fato de as imagens originais conterem significativas distorções, que,
para Toutin (2004), não devem ser diretamente sobrepostas a dados cartográficos
em um SIG.
Dando sequência ao tratamento, as aerofotos ainda em papel, no formato 23
x 23 cm, foram digitalizadas em Scanner A3, para que não se perdesse nenhuma
parte da aerofoto, haja vista que os Scanner A4 não cobrem superfícies maiores que
30 x 22 cm. Os arquivos raster o georeferenciados, referentes à digitalização das
aerofotos, foram georeferenciados e convertidos em GeoTIFF no software gvSIG
1.9.
Para o georeferenciamento das aerofotos dos anos de 1958, 1972 e 1995
foram escolhidos pontos de controle – alinhamento de ruas e edificações com cantos
79
amolados detectáveis em toda série temporal. As imagens Google Earth dos anos
de 2007 e 2009, assim como a imagem Quickbird 2003, ambas pancromáticas,
foram ajustadas usando os mesmos pontos de controle utilizados na aerofotos dos
anos de 1958, 1972 e 1995 com base na imagem ortoretificada de 2008.
A imagem LANDSAT 5 TM de 1985 foi estruturada em duas composições de
banda, cuja baixa resolução espacial 30 m revelou-se a adequada, porque nos
possibilitou identificar a linha da costa, bem como a ocupação antrópica da área
estudada. A primeira composição foi elaborada utilizando as bandas 4
infravermelho próximo –, 5 infravermelho dio e 3 vermelho
respectivamente, em RGB, sequência que possibilitou a cil identificação da área
edificada, do limite da linha de costa bem como a visualização do transporte de
sedimentos em suspensão. A segunda composição elaborada não contou com
nenhuma das bandas dentro do espectro visível, sendo disposta em RGB na ordem
7 infravermelho médio –, 5 e 4, respectivamente. Essa composição se mostrou
boa na definição de linha de costa e nos possibilitou a confirmação do modelado da
orla obtido na primeira composição.
As cartas náuticas cedidas pela DHN foram georeferenciadas com pontos de
controle nas interseções das quadrículas indicadoras das coordenadas. As cartas
são originalmente projetadas na Projeção de Mercator, por tanto foram reprojetadas
para Universal Transversa de Mercator UTM usando o Salth American Datum
SAD 69 como elipsóide de referencia.
Todas as aerofotos e cartas náuticas digitalizadas e georeferenciadas, bem
como as imagens orbitais, foram ajustadas para o mesmo sistema de projeção. A
partir desse ajuste, demos procedimento ao trabalho de vetorização da área de
interesse para cada arquivo raster em Ambiente de Desenho Assistido por
Computador – CAD. O produto dessas vetorizações foi salvo em arquivos Esri
Shape, a fim de poder subsidiar as análises estatísticas da evolução diacrônica da
área do estudo no SIG.
No segundo momento desta etapa do trabalho, demos procedimento aos
cálculos topográficos dos perfis de praia. A cada campanha de campo, os valores
anotados nas respectivas cadernetas foram lançados no software de cálculo e
desenho topográfico Topocal 2008, programa no qual os pontos lidos tiveram
estabelecidos seus valores de cota. Depois de criada a malha de pontos cotados,
procedemos à criação de malha triangular que tem por objetivo interpolar os pontos
80
cotados para a geração das curvas de nível e a produção do Modelo Digital do
Terreno MDT. Isto justifica a necessidade de termos realizado perfis topográficos
com espaçamento mais regular, na ordem de 100 metros, o que nos aumentou a
precisão do cálculo de volume de sedimentos.
Ainda no segundo momento demos andamento ao processamento das
amostras de sedimentos colhidas em campo, que foram trabalhadas no Laboratório
de Oceanografia Abiótica do Instituto de Ciências do Mar Labomar/UFC, e
seguiram a seguinte sequência de tratamento: primeiro as amostras foram levadas a
estufa graduada em 60º C para secagem por aproximadamente 48 horas; após
secagem foi separada uma fração de 100g de cada amostra o restante foi
guardado e catalogado como testemunho. As 100 g foram então lavadas
individualmente em peneira de malha de 0,062 mm para retirada dos sais.
Após esse processo, as amostras foram novamente levadas à estufa para
nova secagem, por igual período de 48 horas; concluída a secagem, cada amostra
foi peneirada em dois conjuntos de seis peneiras cada de 2,38 mm a 0,062 mm
por 10 minutos em agitador de peneiras RO-TAP. O material retido em cada peneira
foi pesado em balança de precisão com marcação até a quarta casa decimal.
Optamos por trabalhar com a escala Wentworth (1922; apud Suguio, 1973; 2003)
largamente utilizada pelos sedimentólogos brasileiros, representada em notação Φ
(phi) proposta por Krumbein (1934, apud Suguio, 1973; 36) que é um logaritmo
negativo de base 2 da granulometria em milímetros que pode ser expressada pela
seguinte equação:
d
2
log - =
φ
; onde d = diâmetro do grão em milímetros
As vantagens em trabalhar com Φ se apresentam no momento do tratamento
estatístico das amostras, tendo em vista que os valores Φ são números inteiros
coincidentes com a escala Wentworth.
Então de posse dos dados brutos procedemos às análises cujos
detalhamentos constarão na seção Resultados e Discussões.
81
4.3 GESTÃO INTEGRADA DA ZONA COSTEIRA
Para análise conjunta com vistas aos resultados da pesquisa, os dados
referentes às abordagens quantitativas e qualitativas seguiram os passos
metodológicos propostos pelo Metodological Guide to Integrated Coastal Zone
Management publicado pela Comissão Oceanográfica Intergovernamental da
UNESCO (1997), que recomenda seis fases para a concretização do ordenamento
da zona costeira. Como podemos observar na matriz a seguir:
ELEMENTOS DE
REFERÊNCIA
ETAPAS DO PROCEDIMENTO
ELEMENTOS
LOCAIS
Características da zona
costeira
1
Análise da problemática
Características da zona
costeira estudada
|
Unidades geográficas
funcionais
2
Definição de unidades
coerentes de gestão
Escalas de trabalho
|
Grades de entrada de
dados
3
Qualificação do
espaço costeiro
Inventário e formatação de
dados
|
Normas
Classificação
Tipologia
4
Indicadores
e índices
Capacidade de carga
|
Banco de dados
5
Sistemas de
Informação
Maquetagem e simulação
|
Esquemas
Planos
Programas
6
Orientações
Proposições
Objetivos
Medidas mitigadoras
(Harmonização)
Validação
Gestão integrada das zonas costeiras
Fonte: UNESCO 1997
8
A primeira fase é a caracterização da zona costeira para a análise da
problemática da região estudada. Nessa etapa deve-se estudar o ambiente litorâneo
como um ecossistema composto e complexo, lugar de interação entre os elementos
físicos, biológicos e antrópicos. Deve-se determinar e delimitar a área de estudo
bem como definir o peso respectivo dos componentes da região. São de
8
Tradução do autor.
82
fundamental importância a definição e a identificação dos diferentes tipos de
problemas que se apresentam.
Os problemas devem ser identificados segundo três grandes categorias:
problemas gerados pelos efeitos diretos das atividades antrópicas sobre o meio
ambiente; problemas gerados pelos efeitos de fenômenos naturais sobre as
implantações ou presença humana; e problemas gerados pelas interações das
múltiplas atividades desenvolvidas na região. Esse primeiro momento sedescrito
na seção 1 deste estudo.
A segunda fase consiste em, baseado nas unidades geográficas funcionais,
definir as unidades coerentes de gestão e a escala de trabalho. A definição das
unidades de gestão depende inicialmente dos problemas apresentados. As
definições das unidades coerentes de gestão e da escala de atuação devem ser
pertinentes com a problemática, principalmente em termos de inserir os grupos de
atores interessados na formulação de soluções viáveis aos problemas existentes.
Em nosso estudo, não trabalhamos com toda a orla de Fortaleza, apenas com
um fragmento da orla, correspondente à Unidade III Trecho 4 em consonância
com a compartimentação proposta pelo Projeto Orla Fortaleza (2006), fundamentado
sobre o Projeto Orla Brasil (2002), de que trataremos no item de Discussão de
Resultados.
A terceira fase consiste na tabulação de dados para a qualificação do espaço
costeiro através da elaboração de um inventário e do ordenamento dos dados. Essa
qualificação é produto do processo de discussão e de entendimento entre as
diversas comunidades de atores e pode conduzir a uma hierarquização e a uma
classificação tipológica do espaço. Para qualificar o ambiente é necessário definir os
critérios de qualificação e seus parâmetros de caracterização. Os critérios podem
ser físicos, biológicos, das atividades humanas e do estado do meio ambiente, cada
um deles com seus respectivos parâmetros que são quantificados pelos dados
coletados em cada unidade coerente de gestão.
A quarta fase do processo de GIZC consiste, essencialmente, em definir
indicadores e índices baseados nas normas e nas classificações tipológicas,
podendo conduzir a determinação da capacidade de carga que pode suportar a
unidade de gestão ambiental. Essa fase é concretizada através da transformação
dos critérios e parâmetros em indicadores da avaliação do estado do lugar. A
hierarquização dos critérios de qualificação estabelece índices de comparação para
83
uma classificação das unidades de gestão. São definidas as pressões sobre zona
costeira e seus respectivos impactos.
A quinta fase consiste na elaboração de um sistema de informação SI,
ferramenta composta de uma base de dados BD e de um sistema de gestão da
base de dados SGBD. Essas ferramentas destinadas ao tratamento de dados
podem disponibilizar a informação em função da necessidade do pesquisador ou do
gestor.
Esse sistema deve dispor de funções especiais como o georreferenciamento
dos dados para compor um sistema de informações geográficas – SIG ou um
sistema de informação para a ajuda à decisão SIAD. Um sistema de informação
operacional conduz a um “painel de comando ambiental” que, além de organizar
coerentemente os dados da base necessários à gestão, devem poder constatar o
estado das situações ambientais encontradas na unidade de gestão.
A terceira etapa consiste na sexta e última fase do processo de GIZC, que
versa sobre orientação e proposição objetivas através da elaboração de esquemas,
planos e programas de gestão. A zona costeira deve poder ser gerida a partir de
objetivos e de prioridades definidas num quadro territorial apropriado, ou seja,
gerenciado por unidade coerente de gestão. Cada unidade é parte integrante de um
futuro plano diretor ou programa de desenvolvimento sustentável.
A organização das informações não pode se distanciar das decisões
coletivas. Nessa etapa devem se identificar os problemas a serem resolvidos em
primeiro lugar; analisar as causas dos problemas; determinar a zona geográfica do
plano de gestão; identificar os modos de gestão; identificar os procedimentos
administrativos necessários à solução dos problemas e garantir um retorno das
experiências para as comunidades de atores. Essas reflexões constam das
discussões e das considerações finais.
5 RESULTADOS E DISCUSSÕES
A pesquisa de dados bibliográficos, cartográficos, levantamentos e coletas de
campo, análises e suas respectivas análises produziram um conjunto de
informações que será apresentado e discutido nessa seção de forma sistematizada.
5.1 FORMAÇÃO DA PRAIA DO SERVILUZ E DA PRAIA MANSA
Ao longo da discussão deste trabalho, percebemos as necessidades do inicio
do século passado de um novo porto para a capital cearense. Observamos ainda
que muitos foram os projetos que surgiram com essa finalidade. A instalação do
novo Porto de Fortaleza, na Ponta do Mucuripe, foi uma decisão estudada e que
obedeceu não somente às vontades políticas, mas também a indicações do ponto
de vista da engenharia. No entanto, poucos eram os recursos no Brasil da década
de 1930 capazes de prever o desequilíbrio que essa intervenção causaria na
dinâmica costeira ao longo dos anos.
Antes mesmo do inicio oficial das operações do Porto, a bacia portuária se
encontrava assoreada, fato que levou à contratação do Laboratório Sogreah em
setembro de 1953 para um estudo de proteção do porto contra ondas e contra o
assoreamento. Vincent (1957) assinalou no relatório três soluções para o problema
do assoreamento do porto, todas elas com vantagens e desvantagens, para as
praias à montante e à jusante do porto, em especial para a Praia de Iracema que
sofria com processo erosivo causado pela instalação do novo porto.
A primeira solução consistia na edificação de um novo molhe de 275 m ao
final do molhe de contenção do porto alinhado à 90º da sua extremidade; a segunda
seria um molhe enraizado na metade do molhe existente com a extensão de 255
m e a terceira um molhe na extremidade da Praia do Futuro com extensão de 200 m.
O comprimento dos molhes levava em conta a capacidade que eles teriam de reter
1.000.000 de sedimentos ao longo de cinco anos. Deste modo a terceira solução
foi escolhida por ser a mais eficiente.
85
No entanto Vincent ainda ressaltou que qualquer uma dessas soluções
causaria problemas para as praias a oeste do porto, ao interromper a continuidade
do caminhamento natural dos sedimentos ao longo a costa e que
“A acumulação das areias para leste do porto seria infalivelmente
acompanhada de uma agravação, constatada, da situação das
praias de Iracema e das que a seguiam para oeste, estas praias não
estando suficientemente alimentadas.” (VINCENT, 1957, p. 20)
Outras duas soluções também foram apontadas a época, ambas com o intuito
de promover o transporte de sedimentos de leste para oeste do porto, sem
comprometer o canal de acesso e o calado da bacia portuária. A primeira consistia
na criação de um canal para o transporte dos sedimentos ser realizado pela corrente
de deriva litorânea; no entanto essa alternativa necessitaria de constantes
intervenções no molhe, fato que a tornou inviável. A segunda alternativa se tratava
de realizar o bombeamento hidráulico dos sedimentos que seriam retidos perto do
enraizamento do molhe de proteção do porto e que seriam lançados após o canal de
acesso ao porto, a partir de onde seriam carreados em forma de flecha pela corrente
de deriva litorânea na direção da Praia de Iracema. Essa operação propunha repor
assim o estoque sedimentar ao sistema, recuperando de tal modo as praias afetadas
pelo processo de erosivo. No entanto os modelos em escala reduzida apontaram
que esses sedimentos levariam cerca de 30 a 50 anos para alcançarem as praias.
Por conseguinte o relatório Sogreah assegura que “uma ou outra dessas
soluções torna-se mais interessante conforme o interesse dedicado à Praia de
Iracema” (VINCENT, 1957, p. 29). Vale ressaltar que dada à falta de planejamento a
médio e a longo prazos, a administração brasileira optou pela edificação do molhe
do Titãzinho, preterindo assim a opção que teria mantido a orla de Fortaleza mais
próxima da estabilidade.
A opção pelo molhe do Titãzinho transformou a Praia do Serviluz da condição
de praia estável para praia em processo de progradação. Não havendo a remoção
artificial desse material retido, a área tem avançado no sentido do mar ano após
ano. Além disso, parte do material que consegue transpor o molhe do Titãzinho tem
se acumulando no interior do molhe de proteção porto, soterrando o antigo píer
petroleiro e edificando assim a Praia Mansa, como podemos observar no overlay
feito com a Figura 21, Figura 22 e Figura 23.
86
Figura 21 - Serviluz e Praia Mansa, década de 1950. Fonte: CPRM
87
Figura 22 - Serviluz e Praia Mansa, década de 1970. Fonte: SEINF/PMF
88
Figura 23 - Serviluz e Praia Mansa, década de 2000. Fonte: COGERH
89
Isoladamente do processo de ocupação do Serviluz, a progradação da praia
não traria maiores consequências para a cidade de Fortaleza, que a série de
intervenções na orla marítima da cidade com o intuito de minimizar os efeitos da
erosão tem se mostrado eficiente, somente precisando de manutenção.
No entanto a região do porto, que nos idos dos anos de 1930 distava duas
léguas da cidade, e só apresentava uma pequena vila de pescadores, passa por um
novo ordenamento urbano aliado à instalação da colônia de pescadores Z8 no
extremo norte da Praia do Futuro, promovendo consequentemente a intensa
ocupação que se visualiza hoje. O processo de progradação da praia, causado pela
retenção dos sedimentos transportados pela corrente de deriva junto ao molhe do
Titãzinho, faz com quem a praia cresça progressivamente.
Em meados do século passado, Fortaleza deixa de ser uma cidade de costas
para o Mar, e começa a voltar a atenção da especulação imobiliária para a orla
marítima da cidade. Os antigos moradores da Rua da Frente atual Av. Beira Mar
são transferidos para o Serviluz; alguns que haviam instalado suas moradias na
recém formada Praia Mansa são removidos pela Capitania dos Portos em 1972,
como vimos nos relatos dos moradores constantes na sessão intitulada
Considerações Sobre a Área de Estudo.
A informação que não poderia ser prevista pelas modelagens em modelo
reduzido, realizadas em laboratório, era a de que o porto por si atuaria como
ponto de gravitação de pessoas em busca de emprego sobrevivência. Essa busca
deslocou centenas de famílias de todos os pontos da Capital e do Estado para o
bairro em formação, dando origem à comunidade atualmente instalada. O baixo
nível de instrução dos primeiros moradores – pescadores e até sertanejos em
procura de vida melhor na capital aliada à falta de planejamento urbano, segregou
a população do Serviluz entre o porto e as indústrias de derivados de petróleo que
se instalaram no bairro Cais do Porto e Vicente Pinzon.
A análise por classificação supervisionada das aerofotos e imagens orbitais
na série temporal que compreende da década de 1950 a 2010, permitiu a
compilação dos dados de evolução da área de estudo, tanto no tocante à
progradação da praia, quanto na mensuração da área antropizada. O resultado
dessa compilação gerou uma carta imagem mostrando todos os momentos dessa
evolução, como pode ser visto na Figura 24 a seguir.
Figura 24 - Carta Imagem - Evolução da Praia do Serviluz. Fonte: Rebouças, 2010.
91
As aerofotos de 1958 mostram a formação da Praia Mansa, nesse momento
com aproximadamente 8,0 ha de área, que ainda se deslocava da ponta do molhe
de proteção do porto rumo ao antigo píer petroleiro. No ano de 1972, quando as
famílias que habitavam foram removidas para o Serviluz, a área emersa era
calculada na ordem de 13 ha tendo alcançado nos dias de hoje uma área de
aproximadamente 17 ha. Segundo Espínola (2010) existe a ideia de dragar a área
onde está o píer petroleiro soterrado, uma das poucas obras deixadas pelos
estadunidenses que aqui passaram na época da Segunda Grande Guerra.
Não sendo mais ocupada por moradias desde a década de 1970, a Praia
Mansa tem se prestado atualmente como ponto turístico da cidade, visitada por
embarcações que fazem passeios pela orla marítima de Fortaleza.
Para mensurarmos o processo de progradação da Praia do Serviluz, assim
como para quantificarmos o crescimento da área ocupada por residências no local,
usamos os limites estabelecidos anteriormente na descrição da área de estudos
indo da Av. Zezé Diogo ao Mar e do Molhe do Titãzinho até a Rua Ismael Pordeus.
Infelizmente o quantitativo populacional se trata apenas de uma estimativa, dada a
ausência de informações oficiais, que o Serviluz não representa um setor
censitário; essa falta de informações inviabilizou ainda uma comparação mais
precisa no que tange ao aumento do número de moradores face ao aumento da
área ocupada.
Remetendo então à análise da classificação supervisionada da série temporal
de imagens, que foi graficamente representada acima na Figura 24, compilamos a
Tabela 4 que demonstra os valores de área total e área antropizada em cada época
estudada, além de mostrar numericamente o avanço da linha de costa junto ao
molhe do Titãzinho e na rua Ismael Pordeus.
Tabela 4 - Evolução Espaço/Tempo do Serviluz. Fonte: Rebouças, 2010 .
Dist. Zéze Diogo/Praia Avanço Acumulado
Ano
Área
Antropizada
(m²)
Área
Total (m²)
Molhe (m)
I. Pordeus (m)
Molhe (m)
I. Pordeus (m)
1955
-
114.633,55 131,96
64,60
-
-
1958
23.434,66 119.771,07 165,32
64,60
33,36
-
1972
61.572,24 181.574,17 250,99
94,13
119,03
29,53
1985
153.443,29 408.852,06 470,58
207,84
338,62
143,24
1995
251.822,40 503.048,60 549,42
275,17
417,46
210,57
2009
251.866,60 537.444,84 575,01
300,94
443,05
236,34
92
Segundo estimativas das associações de moradores do Serviluz, a população
atual residente entre os limites acima expostos é da ordem de cerca de 20 mil
pessoas distribuídas em aproximadamente 5 mil famílias. Como vimos na seção 1, a
violência está entre as queixas mais recorrentes da população, associada
freqüentemente ao trafico e ao consumo de drogas.
No depoimento de um morador da década de 1960, constatamos que mesmo
naquela época o Serviluz já era uma local segregado da cidade de Fortaleza,
provavelmente por se tratar de área portuária. O preconceito social já se fazia
marcante por conta da prostituição e da falta de serviços de limpeza, fato que não
mudou muito nos dias de hoje. Embora geograficamente o Serviluz seja parte
integrante da Praia do Futuro, desde as primeiras ocupações o local nunca contou
com nenhum projeto de urbanização que valorizasse a área e a integrasse de fato à
Praia do Futuro.
A mídia tem em geral contribuído para a manutenção do conceito de Serviluz
como sinônimo de violência, drogas e prostituição. Apesar dos indicadores sociais
negativas, o lugar apresenta destacada beleza nica e valorosa memória coletiva
da cidade. A exemplo citamos o Farol Velho, de construção datada da período
Imperial.
5.2 CONFIGURAÇÃO ATUAL DO MODELADO DA ORLA MARÍTIMA
Conhecer a morfodinâmica praial permite o monitoramento da feição da praia
no espaço e no tempo, ou seja, de seus ciclos de erosão e deposição (CALLIARI
et
al
., 2003). Fundamentado nesse conhecimento prévio, é importante proceder à
avaliação dos perfis transversais para o acompanhamento e análise da variabilidade
sazonal da praia. Esse acompanhamento será primordial quando de uma
intervenção, vez que conhecer essa dinâmica trará subsídios para a execução de
medidas mitigadoras capazes de manter a qualidade de vida social em níveis
satisfatórios atendendo aos planos gestores.
Como foi visto nas seções anteriores, as coletas de campo deram origem à
elaboração de perfis da zona estudada, cujas coordenadas foram citadas na
Metodologia.
93
Os perfis, após processados em laboratório por meio do software de desenho
topográfico TopCal, foram plotados como demonstra a Figura 25 a seguir:
Figura 25 - Perfis transversais da Praia do Serviluz. Fonte: Rebouças, 2010.
94
As análises da sobreposição dos gráficos dos perfis transversais realizados
nas cinco campanhas de campo descritas na Metodologia, que cobriram a quadra
chuvosa e a estação de estiagem, mostraram que no período seco a formação de
dunas bordejantes é acentuada e que a praia alcança seu maior comprimento,
sendo alcançado no perfil P01-A um comprimento acima da cota zero variando do
mínimo de 200 m e ao máximo de 250 m, e de 200 a 230 m no perfil P12-A.
As campanhas 1, 4 e 5 representadas na figura 25 pelas cores vermelho,
amarelo e cor de rosa, respectivamente comprovam que a mudança dos ventos
alísios, que no período de estiagem sopram com mais intensidade, proporciona as
condições para maior mobilização eólica de sedimentos. Neste período, as
residências localizadas à Rua Ponta Mar sofrem maior risco de soterramento por
estarem na direção do caminhamento de sedimentos
by pass
eólico. O
caminhamento destes sedimentos, se não houvesse obstrução pelas atuais
construções, edificaria dunas, que migrariam por sobre o morro de Santa Terezinha
por onde chegariam à Volta da Jurema e reabasteceriam o sistema, diminuindo a
erosão nas praias à jusante do Porto do Mucuripe.
Vale ressaltar que prioritariamente na campanha 1, realizada no mês de
outubro de 2008 traçado em vermelho os perfis apresentam-se suaves e com
pouca ou nenhuma formação de dunas bordejantes (Figura 25). A constatação se
justifica pela retirada mecânica dos sedimentos neste período. Uma iniciativa da
Prefeitura de Fortaleza, na tentativa de mitigar os problemas sofridos com o
caminhar dos sedimentos pela população, autoriza a retirada deste material por
parte de construtoras que o utilizam para aterro em obras de construção civil. Esta
medida paliativa consiste na escavação de valas com profundidade aproximada de
1,5 m, dispostas paralelamente à mureta da Rua Ponta Mar, dispostas sempre antes
das rotatórias de retorno ao longo da rua, como podemos observar na Figura 26.
Figura 26 - Foto panorâmica da mureta da Rua Ponta Mar, com retirada mecânica de
sedimentos em outubro de 2008. Fonte: Rebouças, 2008.
95
Essa alternativa nos parece uma adaptação grosseira da proposta de manejo
apontada por Vasconcelos (2005). Para o autor, as valas deveriam ser escavadas
no berma da Praia do Serviluz, como descrito a seguir:
“[...] três valas paralelas entre si e distantes em 50 m uma das outras,
com orientação de posicionamento NNE-SSO, semelhante à
orientação do trem de ondas que chegam à praia. Essas valas
deverão ter profundidade de média de 1,5 m, largura de 5 m e
comprimento de aproximadamente 100 m.” (VASCONCELOS, 2005,
p. 63)
A campanha 2 realizada no mês de dezembro de 2008 apresentou os perfis
mais suaves, demonstrando a ocorrência de menor ação do transporte eólico, que
carreia os sedimentos da zona de espraiamento para o berma. Além da menor força
do transporte eólico a quadra chuvosa ainda não se instalou nesse período,
proporcionando assim o surgimento de perfis mais suaves.
As maiores variações em volume de sedimentos foram mensuradas nos perfis
mais próximos ao molhe, em contrapartida o perfil P07-A foi o que apresentou menor
variação volumétrica ao longo do período observado.
É importante lembrar que o molhe do Titãzinho vem cumprindo com a sua
função de reter o caminhamento de sedimentos da Praia do Futuro para o Porto do
Mucuripe, o que, como vimos no item anterior, gerou um avanço na linha de costa
na ordem de aproximadamente 600 m junto ao molhe e de 300 m no alinhamento da
Rua Ismael Pordeus. Excluindo-se a área limitada pela mureta da Rua Ponta Mar e
o Oceano Atlântico – popular e genericamente chamada de praia – temos um
avanço de 290 m junto ao molhe e de 100 m na Rua Ismael Pordeus. Essa área que
antes era “praia”, veio ao longo do tempo sendo ocupada por habitações
subnormais, perfazendo aproximadamente 250.000 m² de área antropizada.
Observamos ainda que a construção dos molhes do Titãzinho e do molhe de
proteção da bacia portuária do Mucuripe não afetou a dinâmica costeira somente na
Praia do Serviluz e nas praias subjacentes ao porto. Em análise às cartas náuticas
701 – folha Fortaleza – em conjunto com as informações granulométricas constantes
nos projetos de recuperação da orla marítima de Fortaleza abordados na introdução
deste trabalho, observamos que paralelamente à orla marítima de Fortaleza e a
partir do molhe de proteção do porto, está se formando uma restinga submersa,
como podemos observar na Figura 27 abaixo, composta da compilação das cartas
náuticas da década de 1970 a 2010.
96
Figura 27 - Montagem de cartas 701 mostrando a formação de restinga submersa. Fonte:
Adaptado da DHN.
Tal restinga é composta prioritariamente pelo material de granulometria
variando de média a grossa que é transportado pela corrente de deriva litorânea e
cuja alteração no fluxo impede que haja continuidade no abastecimento às praias a
sotamar do porto, as quais, como vimos, encontram-se em déficit sedimentar,
conseguindo manter uma certa estabilidade graças a obras de contenção instaladas
com o intuito de minimizar as forças erosivas.
5.3 ANÁLISE DE SOLUÇÕES
Em respeito às diretrizes para uma Gestão Integrada da Zona Costeira, é
importante ressaltarmos aqui que a proposição de soluções advindas da
comunidade científica ou do poder público deve levar em conta, primordialmente os
anseios da população especifica local, haja vista ser ela a mais afetada pelos
problemas aqui apontados. No entanto estas soluções devem ainda levar em conta
as aspirações de toda a sociedade Fortalezense, uma vez que a orla marítima não é
exclusiva da população do Serviluz, mas, antes, bem comum de uso do povo.
97
Por assim pensarmos, optamos por não abordar neste estudo discussões
acerca do Estaleiro Promar que o Governo do Estado objetivava instalar entre o
molhe do Titãzinho e o Molhe de proteção do porto, haja vista que tal projeto não foi
apresentado para a sociedade em pormenores, mas apenas sob forma de
apresentações de cunho comercial e sem detalhamento técnico capaz de subsidiar
melhores posicionamentos científicos acerca de sua instalação naquele local. É
importante lembrar ainda que a pretendida obra gerou grandes conflitos de opinião
publica e uma acirrada disputa política entre a Prefeitura Municipal de Fortaleza e o
Governo do Estado do Ceará, amplamente divulgada nos meios de comunicação.
Duas soluções para os problemas do Serviluz nos pareceram as mais viáveis
por serem mutuamente complementares e por abordarem o problema não apenas
pontualmente, mas inserindo, enfim, o Serviluz no contexto da Metrópole Fortaleza:
o Projeto Aldeia da Praia e Aldeia das Dunas e o Plano de Retirada do Excedente
Sedimentar do Serviluz, a cujo detalhamento dedicamos a próxima seção.
O projeto Aldeia da Praia pretende efetuar a regularização fundiária do
Serviluz, além de promover intervenções urbanísticas no local, criando novas áreas
de desenvolvimento socioeconômico e integrando a Praia do Futuro à Av. Beira Mar.
O projeto considerou o contingente populacional sendo da ordem de 5 mil famílias
vivendo em habitações subnormais, em ruas apertadas sem condição de
trafegabilidade de veículos e sem saneamento adequado. A realidade do
arruamento do Serviluz dificulta o acesso de serviços como coleta de lixo, socorro
médico e de segurança pública.
Para a requalificação do Serviluz, dada a densidade populacional e o modelo
habitacional, o projeto estima que cerca de 2500 famílias deverão ser realocadas
numa área livre da Praia do Futuro a 2,5 km do Serviluz, deste modo sendo
contempladas pelo projeto Aldeia das Dunas, que seguirá os moldes urbanísticos do
Aldeia da Praia.
As principais ações desses projetos na área de estudo é a Regularização
fundiária do Serviluz, que, apesar de não ter sido apontada pelos moradores em
nossas entrevistas como problema iminente, é uma necessidade real, haja vista que
todos estão em área irregular. Destacamos aqui que o Projeto Orla Fortaleza, afirma
ter levado em conta os terrenos de marinha delimitados pela GRPU, informação de
que discordamos aqui, vez que esta demarcação está
sub judice
, por apresentar
98
graves falhas cnicas na delimitação da LPM de 1831, fato que compromete
qualquer trabalho que tenha sido feito dando fé a essa demarcação.
Especificamente na área do Serviluz, o Aldeia da Praia prevê, após a
realocação das 2500 famílias, a abertura de vias largas e arborizadas que permitam
a livre circulação de veículos e pessoas, melhorando a mobilidade urbana e o
acesso da população aos equipamentos públicos e facilitando a chegada de serviços
como os citados mais acima. Dessa forma entendemos que esses dois projetos, se
cumpridos tais quais foram apresentados, integrarão a Praia do Futuro e o Serviluz
com o restante da orla marítima de Fortaleza.
6 PLANO DE RETIRADA
A finalidade desse item é apresentar os resultados de um plano operacional
de retirada do excedente de sedimentos da Praia do Serviluz, ali acumulados
progressivamente desde a construção do molhe do Titãzinho, levando em conta as
características da área e dos sedimentos; o cálculo de volumes; a forma de
transporte do material; as áreas de retiradas; as curvas de níveis; os perfis de
cortes; a feição de praia antes e depois de uma possível execução do projeto.
A sotamar da ponta do Mucuripe, duas áreas necessitam receber sedimentos
para formação de praias artificiais conforme projetos aprovados pelo poder público e
em fase de execução. O primeiro é o Projeto Vila do Mar, na Praia do Pirambu, e o
segundo é o Projeto de Regeneração e Recuperação da Praia de Iracema, ambos
situados a jusante do Porto do Mucuripe (Figura 28).
Figura 28 - Localização dos Projetos de Regeneração Artificial de Praia. Fonte: Imagem
Google 2009, compilação Rebouças, 2010.
O Projeto Vila do Mar tem como objetivo operacional a urbanização, a
recuperação e a organização de toda orla marítima, partindo da área da Praia do
Pirambu até a Barra do Rio Ceará, assim como a recuperação e a conservação de
suas belezas naturais, levando em consideração a necessidade de revitalização de
todo o patrimônio histórico material e cultural dos bairros abrangidos pelo projeto.
100
O projeto Vila do Mar prevê a estabilização da faixa de praia por intervenção
da realização de trabalhos de manejo ambiental incluindo a retenção e/ou desvio de
areias e a recomposição da vegetação, ambos processos necessários à
reconstituição e à manutenção da zona de berma que é a faixa de pós-praia sujeita
às ressacas das marés, anteparo natural à erosão da linha de costa. Para essa
reconstituição, estão previstos sedimentos com volume total entre 450 mil e 720 mil
m³ de areia, volume variando em função da extensão da praia que se vai recompor.
O Projeto de Regeneração da Praia de Iracema, por sua vez, prevê
modificações na infra-estrutura construída na orla marítima, de forma a se obter a
proteção e a recuperação da Praia de Iracema, na área compreendida entre o
espigão localizado em frente à Rua João Cordeiro e a Ponte Metálica. Desta forma,
o projeto prevê como solução final para essa área a regeneração artificial por meio
de aterro hidráulico, com largura de 30 metros de praia seca numa extensão de
1.050 m. Para a construção desse aterro será necessário o volume de 260.000
de areias.
Dentre as possibilidades de jazidas com volume suficiente para atender a
essa demanda de sedimentos, o estoque de areias acumuladas na Praia do Serviluz
apresenta-se como a primeira opção, dependendo evidentemente da viabilidade de
retirada, de transporte e de utilização desse material, conforme descrito a seguir.
A motivação para a retirada de sedimentos dessa área, como primeira opção
de jazida, se pelos transtornos causados pelos sedimentos acumulados a
montante do espigão da Praia do Serviluz. Esses sedimentos, transportados pelos
ventos, avançam sobre a via pública e invadem as residências, causando incômodos
diários, além de problemas à saúde da população local, conforme foi relatado pelos
moradores e pode ser visualizado na Figura 29.
Figura 29 - Vista do molhe do Titãzinho e Rua Pontamar. Fonte: Rebouças, 2008.
101
A retirada dos sedimentos da Praia do Serviluz atende a múltiplos objetivos.
Em nosso estudo, os sedimentos dessa praia foram analisados em seus aspectos
granulométricos, a fim de fornecer informações referentes ao tamanho dos grãos
dos sedimentos que serão retirados dessa área, com a finalidade de executar obras
de aterros mecânicos para recomposição de praias erodidas.
6.1 PLANO OPERACIONAL
A retirada das areias da Praia do Serviluz para recomposição das praias
situadas no litoral oeste de Fortaleza, conforme projetos da Prefeitura Municipal
deve seguir as orientações e procedimentos descritos a seguir.
I. Volumes Disponíveis
A jazida da Praia do Serviluz tem as seguintes dimensões principais: um
comprimento de praia, da mureta da Rua Pontamar até a cota de 0,4 metros,
variando de um máximo de 240 metros em sua porção mais a oeste aum mínimo
de 160 metros em sua porção mais a leste, com comprimento médio de 190 metros;
largura total medida do molhe do Titãzinho até o alinhamento da Rua Ismael
Pordeus de 1.390 metros; e profundidade média de rebaixamento da praia após a
retirada dos sedimentos de 2,2 metros.
Com essas medidas, e projetando os perfis de rebaixamento conforme
especificado a seguir no Item V – Elementos de Corte –, calculamos um volume total
de sedimentos disponíveis na ordem de 600.000 m
3
.
II. Granulometria do Material
Para os estudos granulométricos e os cálculos dos parâmetros estatísticos,
realizamos uma sondagem na Praia do Serviluz em 11 pontos distintos, coletando
sedimentos em três níveis diferentes de profundidades: na superfície, no meio, a 1
metro de profundidade, e no fundo, a 2 metros. Esta nova sondagem serviu ainda
para avaliar a variação dos parâmetros sedimentológicos durante o período de
102
execução da pesquisa. A Tabela 5 exibe, em UTM fuso 24 M, a localização dos
pontes de sondagem desta campanha de campo, e a Figura 30 exibe a distribuição
dos pontos de coleta ao logo do arco praial.
Tabela 5 - Localização dos Pontos de Sondagem em UTM
Nome do Ponto E N
S 1E 559407 9590069
S 2E 559475 9590092
S 3E 559457 9589909
S 4E 559506 9589916
S 5E 559485 9589724
S 6E 559555 9589735
S 7E 559519 9589536
S 8E 559594 9589559
S 9E 559634 9589200
S 10E 559692 9589215
S 11E 559715 9589038
Figura 30 - Distribuição espacial dos pontos de coleta. Fonte: Rebouças, 2010.
Nas praias de Fortaleza, os principais agentes dinâmicos que promovem a
mudança no modelado da costa são as ondas, as correntes e os ventos. Dentre
esses agentes responsáveis pela dinâmica local, o vento é o agente motor de maior
impacto negativo para a população do Serviluz, vez que se trata de zona de
by pass
natural de sedimentos. Nas marés baixas os sedimentos expostos secam e são
carreados pelo vento em direção ao continente, onde deveriam migrar a o
103
Meireles, caso a zona fosse livre de construções. A ocupação da área inviabilizou
esse processo, o que hoje faz com que se acumulem sedimentos na frente das
casas, conforme descrito anteriormente. A corrente de deriva litorânea carreia os
sedimentos na direção E-W e, ao encontrar o molhe do Titãzinho, retém a maior
parte do material transportado, fazendo com que a Praia do Futuro entre em
processo de progradação.
Os sedimentos coletados nos pontos supracitados perfizeram 27 amostras
que foram tratadas em laboratório segundo a metodologia do peneiramento seco
proposta por Suguio (1973). Os dados foram tratados no software Sysgran 3.1 e
então classificados pelo modelo de McCammon (1962). Os resultados obtidos estão
organizados na
Tabela 6 - Classificação das Amostras (McCammon 1962)
Tabela 6:
Tabela 6 - Classificação das Amostras (McCammon 1962)
Média (D50) Grau de Seleção Assimetria
Ponto de
Coleta
mm Phi
Classificação Valor Classificação Valor Classificação
S 1E (sup.) 0,123
3,029
Areia muito
fina
0,6174
0,13
S 1E (-1,0 m)
0,148
2,753
0,5426
0,2961
S 1E (-2,0 m)
0,139
2,848
0,535
0,1871
S 2E (sup.) 0,151
2,728
0,5158
0,2238
Positiva
S 2E (-1,0 m)
0,129
2,957
0,59
-0,1165
Negativa
S 3E (sup.) 0,134
2,9
0,6232
0,2503
S 3E (-1,0 m)
0,126
2,994
0,5471
Modera-
damente
selecionado
0,2135
Positiva
S 3E (-2,0 m)
0,136
2,883
Areia fina
0,4855
Bem
selecionado
0,0097
Aprox.
simétrica
S 4E (sup.) 0,125
3,001
0,641
0,1812
Positiva
S 4E (-1,0 m)
0,117
3,097
Areia muito
fina
0,6179
-0,1052
Negativa
S 4E (-2,0 m)
0,145
2,781
0,6413
0,4929
Muito
positiva
S 5E (sup.) 0,135
2,885
0,5756
0,1741
S 5E (-1,0 m)
0,148
2,754
Areia fina
0,5513
0,2345
Positiva
S 6E (sup.) 0,114
3,136
Areia muito
fina
0,6417
0,0782
3
Aprox.
simétrica
S 6E (-1,0 m)
0,132
2,921
0,6127
0,2207
S 7E (sup.) 0,149
2,744
0,5512
0,2729
Positiva
S 7E (-1,0 m)
0,161
2,637
0,6152
0,3912
Muito
positiva
S 8E (sup.) 0,136
2,875
0,566
0,2237
S 8E (-1,0 m)
0,136
2,875
0,5423
0,1443
S 8E (-2,0 m)
0,137
2,864
0,6178
0,2146
Positiva
S 9E (sup.) 0,151
2,726
0,6192
0,5498
S 9E (-1,0 m)
0,166
2,594
0,6129
0,4639
S 9E (-2,0 m)
0,192
2,379
Areia fina
0,7938
Modera-
damente
selecionado
0,3004
Muito
positiva
104
S 10E (sup.) 0,164
2,609
0,8551
0,2158
Positiva
S 10E (-1,0 m) 0,154
2,698
0,6637
0,4927
Muito
positiva
S 10E (-2,0 m) 0,227
2,142
0,7818
0,0109
6
Aprox.
simétrica
S 11E (-1,0 m) 0,341
1,554
Areia média 0,9845
0,2158
Positiva
A análise das amostras de sedimentos coletados quando da sondagem na
Praia do Serviluz indica que na região da jazida encontramos sedimentos com
granulometria variando de areia fina a areia média. Esses resultados podem ser
melhor observados nos histogramas apresentados abaixo e nas distribuições de
frequência a seguir:
Gráfico 1 - Histograma Sondagem 1E
Gráfico 2 - Histograma Sondagem 2E
Gráfico 3 - Histograma Sondagem 3E
Gráfico 4 - Histograma Sondagem 4E
Gráfico 5 - Histograma Sondagem 5E
Gráfico 6 - Histograma Sondagem 6E
105
Gráfico 7 - Histograma Sondagem 7E
Gráfico 8 - Histograma Sondagem 8E
Gráfico 9 - Histograma Sondagem 9E
Gráfico 10 - Histograma Sondagem 10E e
11E
As frequências acumuladas estão exibidas por perfil de sondagem do
Gráfico
11
ao Gráfico 14:
Gráfico 11 - Frequências Acumuladas
Perfil de Sondagem 1E e 2E
S. 01 (supercie)
S. 01 (-1 m)
S. 01 (-2 m)
S. 02 (supercie)
S. 02 (-1 m)
Sondagem 1 e 2
Freqüências acumuladas
Phi
43210-1
%
100
90
80
70
60
50
40
30
20
10
0
Gráfico 12 - Frequências Acumuladas
Perfil de Sondagem 3E e 4E
S. 03 (supercie)
S. 03 (-1 m)
S. 03 (-2 m)
S. 04 (supercie)
S. 04 (-1 m)
S. 04 (-2 m)
Sondagem 3 e 4
Freqüências acumuladas
Phi
43210-1
%
100
90
80
70
60
50
40
30
20
10
0
106
Gráfico 13 - Frequências Acumuladas
Perfil de Sondagem 5E e 6E
S. 05 (supercie)
S. 05 (-1 m)
S. 06 (supercie)
S. 06 (-1 m)
Sondagem 5 e 6
Freqüências acumuladas
Phi
43210-1
%
100
90
80
70
60
50
40
30
20
10
0
Gráfico 14 - Frequências Acumuladas
Perfil de Sondagem 9E, 10E e 11E
S 11 (-1 m)
S. 09 (supercie)
S. 09 (-1 m)
S. 09 (-2 m)
S. 10 (supercie)
S. 10 (-1 m)
S. 10 (-2 m)
Sondagem 9, 10 e 11
Freqüências acumuladas
Phi
43210-1
%
100
90
80
70
60
50
40
30
20
10
0
Gráfico 15 - Frequências Acumuladas
Perfil de Sondagem 7E e 9E
S. 07 (supercie)
S. 07 (-1 m)
S. 08 (supercie)
S. 08 (-1 m)
S. 08 (-2 m)
Sondagem 7 e 8
Freqüências acumuladas
Phi
43210-1
%
100
90
80
70
60
50
40
30
20
10
0
Após análise sedimentar da jazida da Praia do Serviluz, concluímos que os
sedimentos poderão ser utilizados na recomposição de praias a jusante do Porto do
Mucuripe, ressalvando que, devido ao fato de sua curva granulométrica apresentar
uma distribuição contendo material de finos a médios, poderá haver a tendência de
formação de dunas bordejantes na praia que vai receber esses sedimentos.
Portanto, recomendamos a estabilização da parte alta da praia por meio de
plantação de vegetação apropriada.
III. Área de Empréstimo
A área de empréstimo de sedimentos se estende por toda a Praia do Serviluz
do molhe do Titãzinho até o alinhamento com a Rua Ismael Pordeus e dez
metros a contar da mureta da Rua Pontamar até alcançar a cota 0,40 m, limite
arbitrado para a retirada mecânica dos sedimentos
IV. Modelo Digital do Terreno
Para a elaboração do Modelo Digital do Terreno MDT realizamos um novo
nivelamento topográfico do terreno, que teve o objetivo de conhecer o modelado da
107
costa e o volume total de sedimentos no período mais próximo possível da execução
do plano de retirada. Neste período a praia estava sofrendo uma intervenção de
retirada do excedente sedimentar como descrevemos no capitulo anterior, o que nos
levou a decidir por executarmos 14 perfis de praia equidistantes em 100 metros
aproximadamente, ao invés de 10 como tinha sido realizado nas campanhas de
campo anteriores. Deste modo pudemos adensar mais a malha de pontos que foi
interpolada por triangulação para a produção do MDT, o que cobriu de forma
representativa toda a área da jazida da Praia do Serviluz.
Cada perfil foi medido a partir da mureta de proteção da Rua Pontamar,
seguindo perpendicular à linha de costa até o mar na cota de profundidade de - 0,00
metros. Depois de elaborado o MDT, foram traçadas as linhas de
greide
referentes à
secção para cada perfil, a fim de que fossem calculados os volumes por seção como
podemos ver nas Figura 31 a Figura 44.
P E R F IL H OR I Z O NT A L 01
Pe rfil Atua l do T erreno
Perfil do Te rreno após Cort e
Le ge nd a
Figura 31 - Linha de Greide e Perfil de Corte 1.
P E R FIL H O R I Z O N TA L 0 2
Pe rfil Atua l do T erre no
Pe rfil d o Ter reno após Corte
Le gen d a
Figura 32 - Linha de Greide e Perfil de Corte 2.
108
PERFIL HORIZONTAL 03
Perfil Atual do Terreno
Perfil do Terreno após Corte
Legenda
Figura 33 - Linha de Greide e Perfil de Corte 3.
PERFIL HORIZONTAL 04
Perfil Atual do Terreno
Perfil do Terreno após Corte
Legenda
Figura 34 - Linha de Greide e Perfil de Corte 4.
PERFIL HORIZONTAL 05
Perfil Atual do Terreno
Perfil do Terreno após Corte
Legenda
Figura 35 - Linha de Greide e Perfil de Corte 5.
109
PERFIL HORIZONTAL 06
Perfil Atual do Terreno
Perfil do Terreno após Corte
Legenda
Figura 36 - Linha de Greide e Perfil de Corte 6.
PERFIL HORIZONTAL 07
Perfil Atual do Terreno
Perfil do Terreno após Corte
Legenda
Figura 37 - Linha de Greide e Perfil de Corte 7.
PERFIL HORIZONTAL 08
Perfil Atual do Terreno
Perfil do Terreno após Corte
Legenda
Figura 38 - Linha de Greide e Perfil de Corte 8.
110
PERFIL HORIZONTAL 09
Perfil Atual do Terreno
Perfil do Terreno após Corte
Legenda
Figura 39 - Linha de Greide e Perfil de Corte 9.
PERFIL HORIZONTAL 10
Perfil Atual do Terreno
Perfil do Terreno após Corte
Legenda
Figura 40 - Linha de Greide e Perfil de Corte 10.
PERFIL HORIZONTAL 11
Perfil Atual do Terreno
Perfil do Terreno após Corte
Legenda
Figura 41 - Linha de Greide e Perfil de Corte 11.
111
PERFIL HORIZONTAL 12
Perfil Atual do Terreno
Perfil do Terreno após Corte
Legenda
Figura 42 - Linha de Greide e Perfil de Corte 12.
PERFIL HORIZONTAL 13
Perfil Atual do Terreno
Perfil do Terreno após Corte
Legenda
Figura 43 - Linha de Greide e Perfil de Corte 13.
PERFIL HORIZONTAL 14
Perfil Atual do Terreno
Perfil do Terreno após Corte
Legenda
Figura 44 - Linha de Greide e Perfil de Corte 14.
112
V. Elementos de Corte
A representação gráfica dos elementos de corte foram simulados da Figura 31
a Figura 44 apresentados no item IV.
Nas figuras apresentamos a secção de corte em linha de cor verde. A retirada
de material deve reduzir a cota altimétrica, a partir da mureta da Rua Pontamar, para
3,4 metros nos 10 primeiros metros da praia, mergulhando em seguida para 0,4
metros nos próximos 20 metros com declividade de 15%, perfazendo uma distância
total de 30 metros desde o batente da Rua Pontamar, e a partir desse ponto seguir
na cota de 0,4 metros até o encontro com a curva de nível também de 0,4 metros.
6.2 SEQUÊNCIA DE RETIRADA DOS SEDIMENTOS
Nesta atividade está prevista a mobilização dos equipamentos pesados, tais
como tratores de esteira equipados com lâminas do tipo
tilt-dozer
para a mobilização
dos sedimentos e pás carregadeiras e caminhões caçamba para a remoção do
material da área da jazida, para que sejam transportados os sedimentos para o local
do aterro.
A sequência da retirada foi projetada para obedecer à seguinte ordem
estratégica:
a. A retirada das areias deve ser iniciada com a movimentação do material a
partir da cota de 0,4 metros, próximo ao mar, em maré baixa inferior a 0,4
metros de altura, em direção ao continente, disponibilizando os sedimentos
na parte mais alta da praia para a sua retirada mecânica.
b. A cota de 0,4 metros deve ser mantida até 30 metros de distância antes da
mureta de proteção da Rua Pontamar. Desse ponto em diante o perfil deve
subir inclinadamente por 20 metros até a cota de 3,4 metros, com declividade
de 15%.
c. A partir dos 20 metros indo até o encontro da mureta de proteção da Rua
Pontamar, o perfil deve se manter constante por 10 metros com a cota de 3,4
metros.
d. À medida que os sedimentos forem sendo acumulados na parte alta da praia,
113
próximos à Rua Pontamar, eles devem ser retirados mecanicamente e
transportados por caminhões até a área do aterro.
e. A movimentação das areias deve ter início, obrigatoriamente, na porção oeste
da área, próximo ao molhe do Titãzinho, seguindo em direção à porção leste
até 90 metros após a Rua Ismael Pordeus, ponto extremo da área da jazida.
f. A movimentação das areias, descrita na alínea “e”, deve ser feita em seções
de área com 100 ou 200 metros de largura, ficando a escolha a critério do
executor da obra. Vale reforçar que a primeira faixa de movimentação e
retirada de sedimentos deve ser na porção mais a oeste, adjacente ao molhe
do Titãzinho.
g. À medida que a movimentação e a retirada de material forem sendo
executadas de oeste para leste, os sedimentos transportados pela corrente
de deriva litorânea e pelo transporte eólico continuarão sendo depositados
nessa praia, principalmente em sua porção mais a oeste. Esse novo estoque
sedimentar deverá ser retirado ao final da operação, ou seja, quando as obras
forem concluídas em frente à Rua Ismael Pordeus.
h. A última etapa de retirada será realizada novamente na seção contida entre o
molhe do Titãzinho e a linha do perfil transversal 3. A retirada desses
sedimentos garante a retirada total de aproximadamente 600 mil metros
cúbicos de areias disponíveis nessa jazida.
Ao final dos trabalhos de movimentação e retirada de sedimentos, estará
construído um novo perfil de praia, que terá altitude máxima de 3,4 metros numa
extensão de praia de 10 metros, com mergulho para 0,4 metros por 20 metros de
extensão. A construção desse novo perfil será necessária para dissipar a energia
das ondas que quebram nessa praia.
6.3 RETIRADA DE DETRITOS
A Praia do Serviluz é formada por sedimentos acumulados ao longo de mais
de quatro décadas, iniciando-se a partir da construção do molhe do Titãzinho, Ao
longo do tempo, a praia apresentou diversos tamanhos, profundidades e perfis
morfológicos como pudemos constatar anteriormente. Durante esse processo de
114
progradação da praia, foram estabelecendo-se residências que avançaram em
direção ao mar de acordo com o acúmulo de sedimentos.
A Prefeitura Municipal de Fortaleza visando conter, mesmo que timidamente,
o avanço dos sedimentos na direção das casas, autoriza a retirada de uma pequena
parte desse sedimento acumulado para construção civil, o que influencia no volume
total de sedimentos dessa praia.
O avanço da população de baixa e/ou baissima renda sobre a praia, a
carência de saneamento ambiental adequado e a constante alteração de volume de
sedimentos facilitam o acúmulo de lixo em todas as camadas de areia – na praia e na
pós-praia. Mesmo sendo classificada no PDDU como área industrial, a área estudada
é tipicamente residencial; e por não conter uma estrutura voltada para o turismo e pela
precariedade na segurança pública, o fluxo de pessoas é reduzido a moradores ou
poucos visitantes. Dessa forma a quantidade lixo acumulada também é reduzida.
O lixo na areia da Praia do Serviluz é composto predominantemente de
entulhos de construção civil madeira e restos de argamassa e de lixo doméstico,
esse último sendo formado prioritariamente por embalagens de produtos
industrializados, como garrafas de PET, sacos plásticos, embalagens tipo
Tetra
Brick
, latas metálicas e papelões.
Para evitar que haja o deslocamento desse lixo para as áreas que serão
aterradas, contaminando esses espaços, é necessário que se faça um criterioso
processo de separação e de retirada de entulhos e lixos da areia que será
transportada. Sugerimos então que a separação dos detritos seja feita através da
utilização de grades de ferro ou rede de nylon colocada sobre as carrocerias dos
caminhões que farão o transporte. Esse mecanismo funcionará como uma peneira,
segurando os detritos e deixando passar apenas as areias. O material detrítico
coletado deverá ser direcionado para contêineres específicos e depois destinado ao
aterro sanitário para devido processamento.
6.4 CONSIDERAÇÕES SOBRE O PLANO
Após análise minuciosa dos dois projetos – Regeneração da Praia de Iracema
e Projeto Vila do Mar , levando em conta o somatório do volume de sedimentos
115
necessário para regeneração das duas áreas, conclui-se que o volume de sedimento
da Praia do Serviluz não será suficiente para a demanda dos dois aterros. Assim,
considerando o volume individual de cada aterro, sugerimos a utilização da jazida da
Praia do Serviluz na regeneração do Projeto Vila do Mar, pois o volume necessário
para a obra é equivalente ao disponível na jazida.
Considerando volume e característica do sedimento necessário à
regeneração da Praia de Iracema, indicamos duas possibilidades de exploração de
jazidas num raio inferior a 20 km da obra do aterro hidráulico, cada uma delas com
suas características próprias que trazem vantagens e desvantagens específicas e
uma terceira opção, a Jazida do Rio Cocó, que poderá ser utilizada após estudos
de viabilidade para exploração.
I. Jazida Plataforma Continental
A construção do Porto do Mucuripe e suas obras de proteção promoveram o
desvio do material transportado pela deriva litorânea para águas profundas,
formando uma barra submarina e, em consequência, o surgimento dos processos de
erosão em todo o litoral adjacente. As análises das sequências históricas das cartas
batimétricas do porto e de suas proximidades, publicadas pela DHN, mostram que a
barra submersa de areia começou a se formar nos primeiros anos após a conclusão
das obras do porto.
Os estudos realizados por Maia
et al
(2008; a, b) mostram que esta estrutura
atualmente se estende por um comprimento total de 7.500 m e apresenta uma
largura variável entre 250 e 850 m, com média de 500 m (Figura 1, p.16) cujo volume
total estimado foi da ordem de 12.600.000 m
3
.
Esta análise confirma que muito próximo à área a ser regenerada existe uma
jazida oceânica com volume suficiente para recuperar, não só a área dos dois
projetos supracitados, mas todo o litoral de Fortaleza. Os autores demonstram ainda
que o material sedimentar é prioritariamente composto por areias médias no início
da barra D50=0,35mm e na zona próxima ao porto, e areias grossas no restante
da barra – variando de D50=0,45 a 0,60 mm. Deste modo, acreditamos que a
utilização deste material irá atribuir um elevado grau de estabilidade ao material de
regeneração.
116
II. Jazida do Rio Ceará
Segundo ainda os estudos de Maia
et al
(2008; a, b), foram identificadas 05
áreas potenciais de jazidas para utilização na engorda artificial da Praia de Iracema.
Para além disso, na batimetria realizada pelos autores, revelou-se um canal
submerso na foz do Rio Ceará com profundidades máximas em torno de 4,50
metros, com larguras que variam de 50 a 80 metros desde a foz até o estaleiro
(MAIA, 2008; a, b). Ainda neste estudo foram identificados 4 bancos arenosos, os
quais podemos identificar na Figura 2, p. 16, que se prestam à recomposição de
praias e cujo somatório volumétrico representa uma capacidade de 537.396,70 m³.
No entanto, os sedimentos desta jazida são compostos por areias quartzosas
com granulometria média, uma porção de lama oriunda da sedimentação estuarina e
uma porção de cascalho derivado de fragmentos de concha. Esses fatores nos
levam a concluir que é necessário que se façam estudos mais detalhados de sua
composição sedimentológica.
III. Jazida do Rio Cocó
Considerando o conhecimento da dinâmica costeira do litoral de Fortaleza, de
que os sedimentos são transportados de leste para oeste pela ação eólica e pela
deriva litorânea, podemos considerar que os sedimentos transportados pelo do Rio
Cocó, que está localizado na porção leste de nosso litoral, ao serem desaguados no
mar serão em grande parte os sedimentos que vão compor os estoques das praias
do litoral de Fortaleza.
Os estudos de Morais (1980; 1981) e Albuquerque (2008), apontam que os
sedimentos encontrados na foz do Cocó em direção a oeste são de natureza
prioritariamente grossa. Durante este estudo, observando as imagens orbitais atuais
da costa de Fortaleza, identificamos dois grandes bancos de areia na foz do Cocó.
Esses dois bancos perfazem uma superfície de 2,63 ha banco 1 e 2,79 ha
banco 2, como podemos observar nas poligonais traçadas em amarelo na Figura 45.
117
Figura 45 - Bancos de areia na Foz do Rio Cocó. Fonte: Google Earth 2010, adaptação
Rebouças, 2010.
Uma vez identificada essa possibilidade de jazida, foram coletadas amostras
de sedimentos, distribuídas de modo a cobrir os dois bancos de areia, identificados
na Figura 45 por meio dos pontos vermelhos seguidos de seu número de série. Em
trabalho laboratorial análogo ao realizado na praia do Serviluz, processamos as
amostras coletadas em campo quando obtivemos os seguintes resultados:
118
Tabela 7 - Classificação das Amostras (McCammon 1962)
Média (D50) Grau de Seleção Assimetria
Ponto de
Coleta
mm Phi
Classificação Valor Classificação Valor Classificação
0 0,089
3,492
Areia Muito
Fina
0,6074
Moderada-
mente
selecionado
-
0,5296
Muito
negativa
1 0,205
2,283
Areia Fina 1,008
Pobremente
selecionado
0,1138
2 0,367
1,445
Areia Média 0,786 0,1788
3 0,172
2,541
Areia Fina 0,9045
0,1082
4 0,357
1,485
Areia Média 0,9004
0,2883
Positiva
5 0,169
2,563
0,8047
0,3258
Muito
positiva
6 0,130
2,947
0,665 0,2514
7 0,165
2,603
Areia Fina
0,909
Moderada-
mente
selecionado
0,1423
Positiva
A análise das amostras de sedimentos coletados nos dois bancos de areia da
foz do Co indica que na região da jazida encontramos sedimentos com
granulometria variando de areia muito fina a areia média. Esses resultados podem
ser melhor observados nos histogramas apresentados abaixo:
Gráfico 16 - Histograma Granulometria
Banco 1
Gráfico 17 - Histograma Granulometria
Banco 2
Ressaltamos que no banco 1 está brotando vegetação típica de mangue, fato
que inviabilizaria um licenciamento ambiental para exploração dessa área em
particular. No entanto, o banco 2 se mostrou propício para retirada de sedimentos,
apresentando semelhanças com o material encontrado na jazida do Serviluz.
Caso a possibilidade de utilização de sedimentos da jazida do Rio Cocó seja
levada em consideração pelo poder público municipal para recompor as praias do
litoral oeste de Fortaleza, recomendamos que uma prospecção seja realizada ao
119
longo do estuário inferior, indo da Ponte da BR 116 até sua foz na Praia do Caça e
Pesca para identificar novos bancos de areia com seus respectivos volumes e as
respectivas características granulométricas.
7 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Este estudo teve como propósito inicial levantar questões e discussões
acerca da Praia do Serviluz, local que carrega em sua história amplos problemas de
ordem socioambiental e se transformou em foco de atenção, sobretudo nos anos de
2009 e 2010, com a discussão advinda da divergência de projetos da Prefeitura
Municipal de Fortaleza e do Governo do Estado do Ceará para a utilização dessa
área.
Ao longo dos últimos 60 anos, após a construção do Porto do Mucuripe, como
vimos de forma exaustiva neste trabalho, a praia sofreu um processo de
progradação que modificou de forma intensa seu modelado: pelo crescimento da
área de “praia” e pela ocupação desordenada que ali se instalou desde a abertura
da Av. Beira Mar, nos anos 1960. A edificação de casas no sentido do transporte
eólico de sedimentos faz o bloqueio deste caminhamento natural de sedimentos
que, por conseguinte, fez surgir o problema do soterramento das residências.
Uma vez percebidos os inúmeros problemas, surgiram as questões
apresentadas no início deste estudo, acerca das possibilidades de atenuação dos
riscos e das implicações dos problemas do assoreamento da bacia portuária, do
soterramento das residências e equipamentos urbanos a montante do porto.
Realizamos, outrossim, uma análise dos projetos para recomposição das praias
erodidas a jusante do Mucuripe, que preveem a utilização do excedente sedimentar
encontrado no Serviluz.
O problema que conduziu nosso centro de interesse foi referente à alteração
do modelado da costa após a construção do Porto do Mucuripe e suas
consequências à orla marítima de Fortaleza a partir da implantação do porto até os
dias atuais. Para tanto, realizamos estudos da área por meio de aerofotos e de
imagens orbitais de alta resolução. Também foram realizados estudos
granulométricos dos sedimentos da Praia do Serviluz assim como também o
levantamento sistemático dos perfis transversais da praia. O estudo da
granulometria teve como foco verificar a possibilidade de utilização do sedimento
acumulado no Serviluz como material de recomposição de praias erodidas a jusante
do Porto do Mucuripe.
121
Para além dos estudos físicos da área, buscamos conhecer qual o papel
representado pela população do Serviluz no uso e manejo da praia e como essa
população enfrenta os problemas do transporte eólico das areias rumo as suas
residências. Cremos pertinente conhecer a opinião da população, vez que são essas
pessoas as principais afetadas pelo processo de progradação e pela ação dos
ventos no caminhamento das areias. Essa etapa da análise necessitaria muito mais
tempo, vez que o conhecimento sobre opiniões de uma população é possível a
longo prazo. Não sendo nosso foco de pesquisa, por não se tratar de pesquisa
etnográfica, ficamos com as informações colhidas nos doze primeiros meses de
estudo, analisadas em seu sentido literal.
Retomando o interesse inicial, esta pesquisa de Mestrado teve como objetivo
geral estudar a influência da construção do Porto do Mucuripe no modelado e na
reconfiguração do litoral de Fortaleza, com ênfase na formação da Praia do Serviluz.
Para atingirmos esse objetivo, procedemos à análise da evolução histórica do local
por meio do relato dos moradores, por documentos históricos de divulgação pública
e pela análise temporal das imagens. Em seguida analisamos a configuração atual
da área em estudo com base nos perfis realizados e nas análises das imagens
atuais. Por fim, analisamos o processo de evolução da ocupação antrópica face à
progradação da praia. As análises de documentos, de imagens e das coletas de
campo foram feitas concomitantemente, vez que as coletas de campo abrangeram
um período de um ano, entre outubro de 2008 e outubro de 2009.
Partimos do pressuposto de que o descompasso das ações públicas
corrobora para a manutenção dessa realidade, pressuposto confirmado em nossas
análises. Neste estudo pretendemos mostrar que um processo adequado de gestão
desse balanço sedimentar é uma alternativa para melhorar a qualidade de vida e de
moradia dessa população e para o controle das praias que sofrem com a erosão
acarretada pela construção do molhe do Titãzinho.
Consideramos de grande relevância a criação de um plano de gestão
fundamentado nos interesses e necessidades da população do Serviluz, bem como
na necessidade de requalificação das praias a oeste do Porto.
A efetivação do presente estudo pretendeu por fim contribuir com pesquisas
futuras, que venham a trabalhar na busca soluções que possam ser aplicadas no
litoral de Fortaleza visando contribuir para a gestão integrada e sustentável.
Em conclusão podemos afirmar que:
122
1. O modelado do Serviluz foi fortemente influenciado pela construção do
Porto do Mucuripe, de seus molhes de proteção e pela ocupação
antrópica das dunas da Ponta do Mucuripe.
2. A ocupação antrópica da Praia do Serviluz, a medida que ela foi se
formando pelo processo de progradação da linha de costa após a
construção do molhe do Titãzinho, contribui para agravar os problemas
ambientais existentes na área.
3. A população local tem conhecimento dos problemas socioambientais do
seu bairro e apresenta sugestões de soluções para os mesmos.
4. O volume de sedimentos existente na Praia do Serviluz pode ser
utilizado na recomposição da praias erodidas do litoral oeste de
Fortaleza.
5. Outras possibilidades de jazidas de sedimentos estão disponíveis num
raio de 20 Km a partir das praias erodidas, sendo elas as existentes na
Plataforma Continental, no Rio Ceará e na foz do Rio Cocó.
6. A utilização de planos de gestão integrada apresenta-se como uma
ferramenta eficiente para a recuperação e a requalificação de ambientes
litorâneos.
REFERÊNCIAS
ALBUQUERQUE, Miguel da Guia.
MORFODINÂMICA DA PRAIA DO FUTURO,
FORTALEZA, CE.
Dissertação de Mestrado – Universidade Federal do Rio Grande,
Rio Grande, 2008.
ANDRÉ, Maria Eliza Dalmazo Afonso de.
Estudo de caso em pesquisa e
avaliação educacional
. Brasília: Líber Livro Editora, 2005.
ARAÚJO, Rachel Garcia Bastos de.
O turismo e a transformação da paisagem da
Beira Mar de Fortaleza
: uma descrição memória dos pescadores locais.
Dissertação de Mestrado apresentada ao Mestrado Profissional em Gestão de
Negócios Turísticos, Universidade Estadual do Ceará, 2007.
AYOADE, J. O.
Introdução a climatologia para os Trópicos.
5.ed, Rio de Janeiro:
Bertrand Brasil, 1998.
BARROSO, Gustavo.
À margem da História do Ceará
. Fortaleza: Imprensa
Universitária do Ceará, 1962.
BARDIN, Laurence.
Análise de conteúdo
. 4. ed. Lisboa: Edições 70, 1997.
BERTRAND, G. Paisagem e geografia física global: esboço metodológico. In:
Cadernos de ciências da terra.
São Paulo, v. 13, p. 1-27 (1972).
BIASOLI-ALVES, Z. M. M. A pesquisa em psicologia: análise de métodos e
estratégias na construção de um conhecimento científico. In: ROMANELLI G.;
BIASOLI-ALVES, Z. M. M. (Org.).
Diálogos metodológicos sobre a prática de
pesquisa
. Ribeirão Preto: Legis Summa, p. 135-157, 1998.
BIRKEMEIER, W.A. Fats Accurate Two-person beach survey. Coast Engineering
Technical Aid 81-11
. U. S. Army Engineer Waterways Experiment Station. Coastal
Engineering Research Center, Vicksburg, Mississippi, 1981.
__________. A User’s Guide to ISRP: The interactive Survey Reduction Program.
Instructions Report CERC 84-11
. U. S. Army Engineer Waterways Experiment
Station. Coastal Engineering Research Center, Vicksburg, Mississippi, 1985
BRANDRÃO, R. de L.
Sistemas de Informações para Gestão e Administração
Territorial da Região Metropolitana de Fortaleza:
diagnóstico geoambiental e os
principais problemas de ocupação do meio físico da Região Metropolitana de
Fortaleza – Projeto SINFOR. Fortaleza: CPRM. 1995.
BRASIL.
Lei de 15 de novembro de 1831
. Orça a receita e fixa a despesa para o
ano financeiro de 1832-1833.
Coleção das leis do Império do Brasil – Portal da
Câmara dos Deputados
. [En línea]. Rio de Janeiro: Typographia Nacional, 1831.
<http://www.camara.gov.br/Internet/InfDoc/conteudo/colecoes/Legislacao/Legimp-
14/Legimp-14_67.pdf>.
124
__________.
Instrução 348 – FAZENDA de 14 de novembro de 1832.
Instruções
para reconhecimento, medição e demarcação dos terrenos de marinhas.
Coleção
das leis do Império do Brasil – Portal da Câmara dos Deputado.
[En línea]. Rio de
Janeiro: Typographia Nacional, 1832.
<http://www.camara.gov.br/Internet/InfDoc/conteudo/colecoes/Legislacao/Legimp-
16/Legimp-16_38.pdf>
__________.
Decreto-Lei 23.606
,
de 20 de dezembro de 1933
. Disponível em:
<http://www6.senado.gov.br/legislacao/ListaPublicacoes.action?id=46821>
__________.
Decreto-Lei 544
,
de 7 de julho de 1938
. Disponível em:
<http://www6.senado.gov.br/legislacao/ListaPublicacoes.action?id=46821>
__________.
Decreto-Lei 9760
,
de 5 de setembro de 1946
. Disponível em:
<http://www6.senado.gov.br/legislacao/ListaPublicacoes.action?id=105297>
__________.
Lei 7.661, de 16 de Maio de 1988.
Disponível em:
<http://www6.senado.gov.br/legislacao/ListaPublicacoes.action?id=132089>
__________.
Lei 9.636, de 15 de Maio de 1998.
Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L9636.htm>
__________.
Decreto 4.333, de 12 de agosto de 2002
. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/2002/D4333.htm>
__________.
Decreto 5300, de 7 de dezembro de 2004
. Disponível em:
<http://www.in.gov.br/imprensa/visualiza/index.jsp?jornal=1&pagina=2&data=08/12/2
004>
__________.
Constituição da República Federativa do Brasil:
texto constitucional
promulgado em 5 de outubro de 1988. Brasília, Senado Federal, 2007.
Calliari, Lauro Júlio; Muehe, Dieter; Hoefel, Fernanda Gemael & Toldo Jr., Elirio E.
Morfodinâmica praial: uma breve revisão
. Revista Brasileira de Oceanografia
,
2003 51: 63-78.
CARTA ACS.
Publicação trimestral da Associação Comercial de Santos
- Ano
XXII - Out/Dez 2004 nº172.
CEARAH Periferia.
Vivências, lutas e memórias:
histórias de vida de lideranças
comunitárias em Fortaleza. Fortaleza: Edições Demócrito Rocha, 2002.
COUTINHO, Paulo da Nóbrega; MORAIS, Jader Onofre de. Dristribuicion de los
sedimentos en la plataforma continental norte y nordeste del Brasil.
Arq. Ciên. do
Mar
, Fortaleza, v. 10. p. 79-90. 1970.
DANTAS, Eustógio Wanderley Correia.
Mar à vista:
estudo da maritimidade em
Fortaleza. Fortaleza: Museu do Ceará / Secretaria da Cultura e Desporto do Ceará,
2002. 112 p.: il.
125
DUARTE, R.
Entrevistas em pesquisas qualitativas
. Curitiba: Educar, 2004.
ESPÍNDOLA, Itamar.
O Porto de Fortaleza
. Fortaleza, 1978.
ESPÍNOLA, Rodolfo.
Caravelas, Jangadas e Navio –
Resgates e Contrastes. 2.ed.
Rev. e ampl. Fortaleza: Expressão Gráfica Editora, 2010.
FERNANDEZ-ARMESTO, Felipe.
Os Desbravadores.
São Paulo: Editora Schwarcz
Ltda, 2006.
FRYBERGER, S. G.; ABDULKADER, AL-SARI; A. M.; CLISHAM, T .J. Eolian dune,
interdune, sand sheet, and siliciclastic sabka sediments of off shore prograding sand
sea, Dhahran Area, Saudi Arabia.
The American Association of Petroleum
Geologis Bulletin
, v.67, n.2, p. 280-312, 1983.
FUNCEME – Fundação Cearense de Meteorologia e Recursos Hídricos.
El Niño
deve reduzir chuvas no Ceará até maio de 2010
. Disponível em:
<http://www.funceme.br/noticias/el-nino-deve-reduzir-chuvas-no-ceara-ate-maio-de-
2010-1.> Acesso em 27 de fevereiro de 2010.
GALVIN, C.J. Breaker type classification on three laboratory beaches.
Journal of
Geophysical Research
, v.73, p. 3651-3659, 1968.
GIRÃO, Raimundo.
Geografia estética de Fortaleza.
Fortaleza: Imprensa
Universitária do Ceará, 1959.
__________.
Porto do Mucuripe
: solução ótima para um problema difícil. Fortaleza:
Henriqueta Galeno, 1976.
GURGEL, Gustavo Amorin Studart; VASCONCELOS, Fábio Perdigão; REBOUÇAS,
Roberto Bruno Moreira; et al.
Relatório Ambiental
– Jazida de Empréstimo para a
Recuperação da Faixa de Praia do Litoral de Fortaleza. Fortaleza: Prefeitura
Municipal de Fortaleza, 2010.
IBGE. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Recenseamento Geral do Brasil
– 1º de setembro de 1940. Série Regional, Parte VI – Ceará. Tomo 1.
Censo
Demográfico
: população e habitação. Rio de Janeiro: Serviço Gráfico do Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística, 1950.
__________. Conselho Nacional de Estatística. Serviço Nacional de
Recenseamento. Série Regional, Volume XIV, Tomo 1 –
Estado do Ceará.
Censos
Econômicos
(1950). Rio de Janeiro: Serviço Gráfico do Instituto Brasileiro de
Geografia e Estatística, 1955.
__________. Conselho Nacional de Estatística. Serviço Nacional de
Recenseamento. Série Regional, Volume XIV, Tomo 2 –
Estado do Ceará.
Censos
Econômicos
(1950). Rio de Janeiro: Serviço Gráfico do Instituto Brasileiro de
Geografia e Estatística, 1956.
126
__________.
Enciclopédia dos Municípios Brasileiros.
Rio de Janeiro: Serviço
Gráfico do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, 1959.
__________. Departamento de Estatísticas de População.
Censo Demográfico de
1960 - Ceará.
VII Recenseamento Geral do Brasil. Série Regional, Volume I –
Ceará. Tomo IV. Rio de Janeiro: Serviço Gráfico do Instituto Brasileiro de Geografia
e Estatística, s/d.
__________. Instituto Brasileiro de Estatística. Departamento de Censos.
Censo
Demográfico Ceará.
VIII Recenseamento Geral 1970. Série Regional, Volume I –
Ceará. Tomo VII. Rio de Janeiro: Serviço Gráfico do Instituto Brasileiro de Geografia
e Estatística, 1973.
__________. Secretaria de Planejamento da Presidência da República.
Censo
Demográfico: dados distritais - Ceará.
IX Recenseamento Geral do Brasil - 1980.
Volume I – Tomo 3 – Número 7. Rio de Janeiro: Serviço Gráfico do Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística, 1982.
__________. Secretaria de Planejamento, Orçamento e Coordenação.
Censo
Demográfico 1991 - Ceará.
Resultados do universo relativo às características da
população e dos domicílios. Número 11. Rio de Janeiro: Instituto Brasileiro de
Geografia e Estatística, 1991.
__________. Ministério do Planejamento, Orçamento e Coordenação.
Censo
Demográfico 2000.
Características gerais da população: resultados da amostra.
Número 11. Rio de Janeiro: Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, 2003.
JUCÁ, Gisafran Nazareno Mota.
Verso e Reverso do perfil urbano de Fortaleza
(1945-1960)
. São Paulo: Annablume; Fortaleza: Secretaria de Cultura e Desporto do
Estado do Ceará, 2000.
KAPPEL, Raimundo F. Portos brasileiros
:
novo desafio para a sociedade. In:
REUNIÃO DA SOCIEDADE BRASILEIRA PARA O PROGRESSO DA CIÊNCIA –
SBPC, 57, 2005, Fortaleza.
Anais eletrônicos
. Fortaleza: UECE, 2005. Disponível
em: <www.sbpcnet.org.br/livro/57ra/programas/CONF_SIMP/textos/
raimundokappel.html>
LEIVAS, Luís Cláudio Pereira. Terrenos de Marinha e Terrenos da Marinha: do
Patrimônio Nacional às Origens do Patrimônio Naval.
In:
Revista Marítima
Brasileira/Serviço de Documentação Geral da Marinha.
Vol. 10/12 (out./dez/97.),
p. 111- 119, Rio de Janeiro, 1977.
LIMA, Obéde Pereira de . O Instituto Jurídico dos Terrenos de Marinha e Seus
Acrescidos.
Revista Marítima Brasileira.
Rio de Janeiro, v. 125, n. 01/03, p. 228-
228, 2005.
MAIA, Luis Parente.
Procesos Costeros y Balance Sedimentário ao Largos de
Fortaleza (NE- Brasil):
Implicationes para uma gestion adecuada de la zona
litorânea. Tese de Doutorado, Universidade de Barcelona. 1998.
127
MAIA, Luis Parente; JIMENEZ, José A.; RAVENTOS, Jordi Serra. Influencia de los
Processos en las Características Granulométricas de los Sedimentos.
Arq. Ciên.
Mar
, Fortaleza, v. 35, p. 11-22, 2002.
MAIA, Luis Parente; JIMENEZ, José A.; RAVENTOS, Jordi Serra; MORAIS, Jader
Onofre de. The costline of Fortaleza city. A product of enviromental impacts caused
by the mucuripe harbor.
Arq. Ciên. Mar
, Fortaleza, v. 31, n. 1-2, p. 93-100, 1998.
MAIA, Luiz Parente; VASCONCELOS, Fábio Perdigão; MONTEIRO, Leonardo Hislei
Uchoa, REBOUÇAS, Roberto Bruno Moreira; MARTINS, Márcia Barbosa.
Projeto
executivo emergencial de proteção/recuperação da praia de Iracema.
Prefeitura
Municipal de Fortaleza. Programa de Recuperação do Litoral da Cidade. Laboratório
de Ciências do Mar, Universidade Federal do Ceará, 2008. (Documento Restrito)
MINAYO, Maria Cecília de Souza (org).
Pesquisa Social:
Teoria, método e
criatividade. Petrópolis, Vozes, 2007.
MORAIS, Jader Onofre de. Aspectos correlativos de geologia litoral e submarina no
Nordeste do Brasil.
Arq. Ciên. do Mar
, Fortaleza, v. 9. p. 127-131. 1969.
__________.
Aspectos de geologia ambiental costeira do município de
Fortaleza (Estado do Ceará).
Tese de Professor Titular, Universidade Federal do
Ceará, 1980.
__________. Aspectos do transporte de sedimentos no litoral do Município de
Fortaleza, Estado do Ceará.
Arq. Ciên. do Mar
, Fortaleza, v. 20. p. 71-100. 1980.
__________. Evolução sedimentologica da enseada do Mucuripe (Fortaleza – Cea
– Brasil).
Arq. Ciên. do Mar
, Fortaleza, v. 21. p. 19-46. 1981.
NIEBUHR, Joel de Menezes. Terrenos de Marinha: Aspectos destacados.
Revista
de doutrina da 4ª região.
Porto Alegre: Escola da Magistratura do Tribunal Regional
Federal da Região EMAGIS, 24 de agosto de 2004. <
http://www.revistadoutrina.trf4.jus.br/index.htm?http://www.revistadoutrina.trf4.gov.br/
artigos/administrativo/joel_niebuhr02.htm>
OLIVEIRA,
Luis Valente de; RICUPERO,
Rubens.
A Abertura dos Portos.
(Orgs.)
São Paulo: Editora Senac São Paulo, 2007, 352 p.; ISBN: 978-85-7359-651-9.
PASKOFF, R.
Les littoraux:
impact des aménagements sur leur évolution. Col.
Géographie. Paris: Masson, 1985, 185 p.
PITOMBEIRA, Erasmo da Silva.
Modificações na linha de costa pela construção
de quebra mar ao largo.
Universidade Federal do Ceará. Revista de Engenharia,
1995, n. 13.
SILVA, Edson Vicente da.
Desenvolvimento sustentável e meio ambiente
:
alternativas para o litoral do Estado do Ceará. In: RIGOTTO, Raquel Maria (org.).
As
128
tramas da (In)sustentabilidade
: trabalho, meio ambiente e saúde no Ceará.
Fortaleza: Inesp, 2001.
SILVA, Paulo Roberto Ferreira Gomes da; LEHUGEUR, Loreci Gislaine de Oliveira;
FONTELES, Helano Régis da Nóbrega; SILVA, José Gonzaga da. Estudo
morfodinâmico da praia do Futuro, município de Fortaleza, estado do Ceará, Brasil.
Arq. Ciên. Mar
, Fortaleza, 33:p.149-156, 2000.
SOUZA, Marcos José Nogueira de. Contribuição ao estudo das unidades
morfoestruturais do estado do Ceará.
Revista de Geologia
, Fortaleza, v.1, n.1, p.
31-40, jun/1988.
SOUZA, Marcos José Nogueira de; MENELEU NETO, José; SANTOS, Jader de
Oliveira; GONDIM, Marcelo Saraiva.
Diagnóstico Geoambiental do Município de
Fortaleza
Subsídios ao Macrozoneamento Ambiental e à Revisão do Plano Diretor
Participatico – PDPFor. Fortaleza: Prefeitura Municipal de Fortaleza, 2009.
SUGUIO, Kenitiro.
Introdução à Sedimentologia
. São Paulo: Edgar Blücher,
Edusp, 1973.
__________.
Geologia Sedimentar
. São Paulo: Blücher, 2003.
TEÓFILO, Rodolfo.
O
Paroara.
Fortaleza: Secretaria de Cultura, Desporto e
Promoção Social, 1974.
TOUTIN, T. Review article: geometric processing of remote sensing images: Models,
Algorithms and Methods.
International Journal of Remote Sensing
, v. 25, n. 10, p.
1893-1924, May 2004.
UNESCO – Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a
Cultura.
Methodological Guide to Integrated Coastal Zone Management.
Intergovernmental.
Paris: Oceanographic Commission, 1997.
__________.
Des Outils et des Hommes pour une Gestion Intégrée des Zones
Cotieres.
Guide Methodologique Volume II. Paris: Oceanographic Commission,
2001.
UVO, C. R. B. e NOBRE, C. A.
A Zona de Convergência Intertropical (ZCIT) e a
precipitação no Norte e Nordeste do Brasil. Parte I: A Posição da ZCIT no Atlântico
Equatorial
.
Climanalise
, Vol. 4, número 07, 34 – 40, 1989.
__________.
A Zona de Convergência Intertropical (ZCIT) e a precipitação no Norte
e Nordeste do Brasil. Parte II: A Influência dos Ventos e TSM do Atlântico Tropical.
Climanalise,
Vol. 4, número 10, 39 – 48, 1989.
VASCONCELOS, Fábio Perdigão.
Gestão Integrada da Zona Costeira:
Ocupação
antrópica desosdenada, erosão, assoreamento e poluição ambiental do litoral.
Editora: Premius, Fortaleza, 2005
129
VASCONCELOS, Fábio Perdigão; MAIA, Luiz Parente; MONTEIRO, Leonardo Hislei
Uchoa, REBOUÇAS, Roberto Bruno Moreira; MARTINS, Márcia Barbosa.
Projeto
básico emergencial de proteção/recuperação da praia de Iracema.
Fortaleza:
Prefeitura Municipal de Fortaleza. Programa de Recuperação do Litoral da Cidade.
Laboratório de Ciências do Mar, Universidade Federal do Ceará, 2008. (Documento
Restrito)
VASCONCELOS, Fábio Perdigão; REBOUÇAS, Roberto Bruno Moreira.
Parecer
Técnico em Resposta as Questões do Juizo no Processo N° 2005.81.00.017654-
5
(Barracas da Praia do Futuro, Fortaleza-CE). Fortaleza, 2010.
VASCONCELOS, Fábio Perdigão; ROCHA, Carlos Artur Sobreira. Análise da
Influência das Marés sobre os Parâmetros Físico-Químicos da Água de
Microambientes Formados em Rochas-de-Praias.
Arq. Ciên. do Mar
, Fortaleza, v.
25. p. 51-61, 1986.
VINCENT, G.
Port de Mucuripe (Etat de Ceara):
protection du port contre la houle
et l´ensablement, étude em modele réduit. Laboratoire Dauphinois d´Hydraulique –
SOGREAH, Rapport 4575, 1957, 44 p.
YIN, Robert K.
Estudo de Caso
: Planejamento e Métodos. 2. ed. Porto Alegre:
Bookman, 2001.
ANDICE
Esquema de entrevistas realizadas:
Perfil dos entrevistados
1- Nome da rua:
2- Número da casa:
3- Sexo do entrevistado:
4- Idade:
5- Profissão:
6- Escolaridade:
7- Tempo de moradia:
8- Nome do lugar:
Informações pessoais sobre a residência:
9- Sempre morou nessa casa?
10- Onde morava antes?
11- Quem mora com você?
12- Como considera a moradia?
13- O que tem de bom?
14- Quais os problemas?
15- Qual o período mais crítico dos problemas?
16- Quais as causas do problema?
17- Quem são os culpados?
18- Quem tem que resolver os problemas?
19- Existe associação de moradores?
20- Quais e como agem?
ANEXO
132

Livros Grátis
( http://www.livrosgratis.com.br )
Milhares de Livros para Download:
Baixar livros de Administração
Baixar livros de Agronomia
Baixar livros de Arquitetura
Baixar livros de Artes
Baixar livros de Astronomia
Baixar livros de Biologia Geral
Baixar livros de Ciência da Computação
Baixar livros de Ciência da Informação
Baixar livros de Ciência Política
Baixar livros de Ciências da Saúde
Baixar livros de Comunicação
Baixar livros do Conselho Nacional de Educação - CNE
Baixar livros de Defesa civil
Baixar livros de Direito
Baixar livros de Direitos humanos
Baixar livros de Economia
Baixar livros de Economia Doméstica
Baixar livros de Educação
Baixar livros de Educação - Trânsito
Baixar livros de Educação Física
Baixar livros de Engenharia Aeroespacial
Baixar livros de Farmácia
Baixar livros de Filosofia
Baixar livros de Física
Baixar livros de Geociências
Baixar livros de Geografia
Baixar livros de História
Baixar livros de Línguas
Baixar livros de Literatura
Baixar livros de Literatura de Cordel
Baixar livros de Literatura Infantil
Baixar livros de Matemática
Baixar livros de Medicina
Baixar livros de Medicina Veterinária
Baixar livros de Meio Ambiente
Baixar livros de Meteorologia
Baixar Monografias e TCC
Baixar livros Multidisciplinar
Baixar livros de Música
Baixar livros de Psicologia
Baixar livros de Química
Baixar livros de Saúde Coletiva
Baixar livros de Serviço Social
Baixar livros de Sociologia
Baixar livros de Teologia
Baixar livros de Trabalho
Baixar livros de Turismo