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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL
FACULDADE DE CIÊNCIAS ECONÔMICAS
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ECONOMIA
Guilherme Cezere Celi
RENDA DA TERRA E DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO:
UMA CRÍTICA SMITHIANA À TEORIA DOS RENDIMENTOS DECRESCENTES
RICARDIANA
PORTO ALEGRE
2010
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1
GUILHERME CEZERE CELI
RENDA DA TERRA E DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO:
UMA CRÍTICA SMITHIANA À TEORIA DOS RENDIMENTOS DECRESCENTES
RICARDIANA
Dissertação submetida ao Programa de Pós-
Graduação em Desenvolvimento Econômico, da
Faculdade de Ciências Econômicas, da
Universidade Federal do Rio Grande do Sul,
como requisito parcial para obtenção do título de
Mestre em Economia, com ênfase em Economia
do Desenvolvimento.
Orientador: Prof. Dr. Ronaldo Herrlein Jr.
PORTO ALEGRE
2010
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DADOS INTERNACIONAIS DE CATALOGAÇÃO NA PUBLICAÇÃO (CIP)
Responsável: Biblioteca Gládis W. do Amaral, Faculdade de Ciências Econômicas da UFRGS
S587i Celi, Guilherme Cezere
Renda da terra e desenvolvimento econômico : uma crítica smithiana à
teoria dos rendimentos decrescentes ricardiana / Guilherme Cezere Celi. –
Porto Alegre, 2010.
61 f.
Orientador: Ronaldo Herrlein Jr.
Ênfase em Economia do Desenvolvimento.
Dissertação (Mestrado em Economia) - Universidade Federal do Rio
Grande do Sul, Faculdade de Ciências Econômicas, Programa de Pós-
Graduação em Economia, Porto Alegre, 2010.
1. Teoria econômica : Renda da terra 2. Desenvolvimento econômico
I. Herrlein Júnior, Ronaldo. II. Universidade Federal do Rio Grande do Sul.
Faculdade de Ciências Econômicas. Programa de Pós-Graduação em
Economia. III. Título.
CDU 330.82
3
GUILHERME CEZERE CELI
RENDA DA TERRA E DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO:
UMA CRÍTICA SMITHIANA À TEORIA DOS RENDIMENTOS DECRESCENTES
RICARDIANA
Dissertação submetida ao Programa de Pós-
Graduação em Desenvolvimento Econômico, da
Faculdade de Ciências Econômicas, da
Universidade Federal do Rio Grande do Sul,
como requisito parcial para obtenção do título de
Mestre em Economia, com ênfase em Economia
do Desenvolvimento.
Aprovado em: Porto Alegre, 16 de julho de 2010.
Banca Examinadora:
______________________________________________________________________
Prof. Dr. Ronaldo Herrlein Jr. = Orientador.
Universidade Federal do Rio Grande do Sul - UFRGS
______________________________________________________________________
Profa. Dra. Maria Heloisa Lenz
Universidade Federal do Rio Grande do Sul - UFRGS
______________________________________________________________________
Prof. Dr. Augusto Mussi Alvim
Pontifícia Universidade Católica - PUCRS
______________________________________________________________________
Prof. Dr. Hermógenes Saviani Filho
Universidade Federal do Rio Grande do Sul - UFRGS
4
RESUMO
Este trabalho tem por objetivo confrontar a teoria da renda da terra de David Ricardo com a
análise de Adam Smith sobre este mesmo assunto. Isto significa que este trabalho irá
encontrar na obra “A Riqueza das Nações” uma suposta teoria da renda da terra e mostrar que
Adam Smith possui uma teoria tão rica quanto à análise de David Ricardo sobre a renda da
terra. Será abordada a análise da renda da terra sob o enfoque do desenvolvimento econômico,
ou seja, será verificada qual das teorias têm melhores condições de explicar a temática do
desenvolvimento econômico sob a ótica da fertilidade da terra e seus rendimentos. Os
objetivos específicos serão comprovar a importância do progresso técnico e dos rendimentos
crescentes da terra como enfoque de confrontação da teoria da renda da terra de David
Ricardo e também verificar a importância da produtividade da terra, inserida na análise de
ambos os autores, para o progresso contínuo do desenvolvimento econômico. Para tanto,
foram buscadas referências nas próprias obras de Adam Smith e David Ricardo, textos que
abordassem o pensamento destes autores e trabalhos que relacionassem o tema progresso
técnico e fertilidade da terra.
Palavras Chaves: Desenvolvimento Econômico. Rendimentos Crescentes. Fertilidade
Relativa. Fertilidade Absoluta. Renda da Terra. Progresso Técnico.
5
ABSTRACT
The aim of this dissertation is to confront the theory of land rent of David Ricardo with the
theory of Adam Smith. It means that this dissertation will try to find in the “Wealth of
Nation” a theory of land rent and show that Adam Smith have a theory as better as the analyze
of land rent by David Ricardo. The dissertation will analyze the land rent by the conception of
economic development. It means verify what theory has more condition to explain the
economic development by optic of the land fertility. The specific aim will be prove that
technical progress and increase fertility, inside analyze of Smith, can confront Ricardo’ theory
and verify that land productive, inside analyze of both authors, is important to keep economic
development and progress of nations. To build this work, it will be find references own by
Adam Smith and David Ricardo, papers by others authors that study the theory of this two
authors and books that make connection between technical progress and land fertility.
Keywords: Economic Development. Crescent Revenue. Relative Fertility. Absolute Fertility.
Land Rent. Technical Progress.
6
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO........................................................................................................... 07
2 RICARDO E A RENDA DA TERRA....................................................................... 14
2.1 A renda da terra e o desenvolvimento econômico....................................................... 14
2.2 Taxa de lucro e renda da terra ..................................................................................... 20
3 SMITH E A RENDA DA TERRA ........................................................................... 21
3.1 A divisão do trabalho................................................................................................... 21
3.2 O campo e a cidade...................................................................................................... 23
3.3 A renda da terra............................................................................................................ 25
3.4 Smith e os rendimentos econômicos crescentes.......................................................... 32
3.5 As supostas quatro teorias da renda da terra................................................................ 35
4 RENDIMENTOS CRESCENTES, PROGRESSO CNICO E
DESENVOLVIMENTO: ELEMENTOS PARA UM CONFRONTO ENTRE AS
TEORIAS DA RENDA DA TERRA DE DAVID RICARDO E DE ADAM
SMITH ....................................................................................................................... 37
4.1 Rendimentos crescentes, avanço produtivo, divisão do trabalho e expansão dos
mercados...................................................................................................................... 37
4.2 Progresso técnico na agricultura.................................................................................. 40
4.3 O confronto da análise de Adam Smith e David Ricardo............................................ 45
5 CONCLUSÃO ........................................................................................................... 53
REFERÊNCIAS ........................................................................................................ 59
7
1 INTRODUÇÃO
Passados mais de 230 anos da publicação de “A Riqueza das Nações”, ocorre um
ressurgimento do interesse pelas idéias de Adam Smith sobre o comportamento do sistema
econômico de mercado. Mesmo depois de tanto tempo de seus escritos, as idéias de Smith
parecem ser bastante úteis para entendermos a economia nos dias atuais. O enfoque de Smith
como economista político - mesclando a ciência econômica, o conhecimento sociológico e a
filosofia moral - faz deste autor um dos grandes teóricos a serem estudados pelos atuais e
futuros economistas. Entender a economia como parte de um sistema complexo e
compreender os mecanismos do mercado, junto com uma análise do comportamento da
sociedade, é o principal mérito que Smith trouxe para a ciência econômica. Querer saber onde
a sociedade está e para onde a mesma vai leva os atuais estudiosos a reler não “A Riqueza
das Nações” como o mais amplo número de escritos sobre o pensamento de Adam Smith,
além da análise de sua obra intitulada “Teoria dos Sentimentos Morais”.
A reinterpretação da análise smithiana na atualidade tenta perceber que Smith não é
apenas um simples partidário de que o melhor para o indivíduo significa o melhor para a
sociedade. A análise completa deste autor revela que existe, sim, ética nas relações humanas,
e que as pessoas não necessariamente devem guiar-se apenas por objetivos individuais. Isto
significa defender que Smith percebia a importância dos valores morais nas relações humanas
em sociedade como forma de limitar um possível comportamento egoísta do ser humano. Nas
palavras de Smith (1999, p. 170):
Deveríamos nos ver, não sob a luz em que nossas próprias paixões egoístas tendem a
nos colocar, mas sob a luz em que qualquer outro cidadão do mundo nos veria.
Deveríamos considerar o que nos acomete como acomete nosso vizinho, ou, o que
dá no mesmo, como nosso vizinho considera o que nos acomete.
Smith percebe que o comportamento humano deve ser orientado como se nos
colocássemos no lugar de nosso “vizinho” para podermos medir o real impacto de nossas
atitudes e ações e assim perceber o quão certos ou errados estamos. Medir os próprios
sentimentos significa melhorar a relação com o próximo e, desta forma, propagar, mesmo que
indiretamente, benefícios para toda a sociedade. O homem, quando respeita as regras de
8
conduta de seu comportamento, tende a trazer benefícios para a sociedade. Um indivíduo que
costuma extravasar seus sentimentos sem considerar o impacto do mesmo para o coletivo
tende a perturbar o comportamento da sociedade. Para Smith (1999, p. 180):
A pessoa sob influência de qualquer uma dessas paixões extravagantes não é apenas
desgraçada em sua situação atual, mas muitas vezes inclina-se a perturbar a paz da
sociedade, para alcançar o que tão totalmente admira.
A virtude e o vício são como um fator de manutenção da harmonia da sociedade
(virtude) e da desordem da mesma (vício). O comportamento do ser humano deve ser baseado
na virtude para que sua ação individual traga o melhor para a sociedade. Orientar o
comportamento humano sob a ótica da harmonia das pessoas a nossa volta é um dos méritos
da análise smithiana, segundo a passagem a seguir.
A virtude é o que mais conserva a sociedade humana, e o vício, o que mais perturba.
A primeira, pois, é agradável e o segundo, ofensivo a todo o homem, uma vez que
uma lhe permite prever prosperidade e o outro, a ruína e desordem do que é tão
necessário para o confronto e segurança de sua existência (SMITH, 1999, p. 392).
Segundo o livro “A Riqueza das Nações”, o indivíduo é guiado por motivações
econômicas e morais. Nesta obra, a teoria econômica de Adam Smith é construída a partir da
análise da divisão do trabalho dentro do processo econômico. Segundo Smith, a divisão do
trabalho tem como vantagens a aquisição de maior habilidade na execução da tarefa, a
economia de tempo entre a execução de um serviço e outro e a melhor propensão ao
desenvolvimento de maquinários e ferramentas em virtude da simplificação das tarefas.
Outro ponto de extrema importância na análise do autor é a defesa da competitividade e da
concorrência na economia. Para Smith, a livre concorrência leva os recursos a serem alocados
nas aplicações mais vantajosas e nas mais lucrativas possíveis. O mecanismo de livre
mercado faz com que os capitais migrem das atividades menos rentáveis para as atividades
mais rentáveis. Desta forma, a queda dos preços em função do aumento da concorrência traz
um maior nível de bem- estar para a sociedade.
O papel do estado na economia é de manter um ambiente econômico de defesa dos
direitos de propriedade e de estabilização social e econômica. Na opinião do autor, a ênfase
recai na criação de um ambiente estável para a melhor aplicação dos recursos econômicos, e
não cabe ao estado controlar ganhos privados, pois tal medida irá contra a geração da riqueza
de uma nação. Segundo o autor, a busca individual do lucro leva ao aumento da riqueza de
9
uma nação e, com isto, o progresso econômico é alcançado. Sendo assim, a economia, desde
que liberta das “amarras” do estado, tende a elevar a riqueza via progresso dos indivíduos.
O pensamento de Smith acabou subsidiando muitos trabalhos posteriores a sua
publicação tanto no prosseguimento de seu pensamento, quanto na crítica de muitos autores
que não concordaram com as principais idéias deste pensador. Seja no aspecto positivo, seja
no aspecto negativo, a verdade é que Smith é o ponto inicial do pensamento econômico para o
posterior avanço da economia até o estágio atual de sua evolução como ciência.
A análise amplamente conhecida de Smith é a de que o interesse individual leva ao
bem-estar coletivo quando os agentes econômicos encontram-se inseridos no mercado.
Todavia, esta visão egoísta do ser humano fazendo o melhor para si e não se importando com
os demais membros da sociedade é criticada por autores que estão redescobrindo a amplitude
do pensamento de Smith. Assim:
Que esta visão equivocada tenha prevalecido por tanto tempo entre os economistas
e historiadores do pensamento econômico é algo que não deveria causar surpresa,
pois é um resultado previsível do enfoque anti-histórico que orienta sua maneira de
ler e abordar as obras do passado (CERQUEIRA, 2003, p. 19).
Na verdade, a simples visão de que o interesse individual leva ao bem-estar coletivo
não passa de uma leitura parcial e seletiva da obra de Smith. Entender a obra de Adam Smith
é um exercício de paciência e atenção, em que a cada parágrafo pode estar escondido” um
universo de informação que possui um encadeamento com todo o seu pensamento. Não basta
ler duas ou três frases e tomar tal argumento como regra sem tentar entender a obra e o
pensamento de Smith como um todo.
O ressurgimento da importância da análise de Adam Smith está relacionado à melhor
compreensão do autor como economista e como filósofo. A leitura completa e integral das
obras de Smith e a análise conjunta de suas idéias fazem com que os novos autores
interessados em suas obras interpretem suas idéias como parte do contexto de seus estudos e
não como mera passagem sem relação com sua obra completa.
Em função deste ressurgimento do interesse pela teoria econômica de Adam Smith,
este trabalho irá abordar um tema que não tem relação com a atual tendência de analisar a
teoria de Adam Smith aliando ética e economia, mas que tenta apresentar um novo enfoque à
obra de Adam Smith em relação ao processo de desenvolvimento econômico. Esta dissertação
irá estudar a importância que Smith dava a terra, seus rendimentos crescentes, sua relação
10
com o processo de desenvolvimento econômico e confrontar esta suposta teoria da renda da
terra de Smith com a teoria ricardiana dos rendimentos decrescentes. Dentro de todo este
contexto de ressurgimento da importância do pensamento smithiano, este trabalho irá analisar
uma possível “teoria da renda da terra” de Adam Smith. Em virtude do renascimento da
análise das idéias de Smith, esta dissertação tenta dar continuidade a trajetória de recuperação
e reinterpretação das idéias de Smith, ao mesmo tempo em que aborda um assunto que passou
despercebido por muitos economistas: o enfoque de Smith sobre a renda da terra. Neste caso,
faz-se importante analisar o pensamento de Adam Smith em relação aos rendimentos da terra
como forma de melhor compreender o enfoque do autor sobre este assunto e sua relação com
o processo de desenvolvimento de uma nação.
A importância da produtividade da terra na economia foi dada em um primeiro
momento pelos fisiocratas. A fisiocracia surgiu na França no final do mercantilismo como
uma resposta contra a excessiva interferência do estado na economia via regulações, leis,
normas, entre outros. Segundo esta corrente, o excesso de interferência do estado na economia
acabava por inibir o investimento e a riqueza privada. O início de tal corrente foi dado por
Quesnay
1
em 1756. A fisiocracia, como corrente econômica, destacava-se por ver a economia
como um sistema dirigido por leis naturais
2
. Dentro desta corrente, destacou-se Turgot por
analisar os rendimentos decrescentes na economia, antes mesmo de autores como Malthus e
Ricardo. Em seu Observation sur un mémoire de M. Saint Péravy, provavelmente escrito
em 1767, o mesmo autor analisava uma suposta teoria de redução de retornos.
Posteriormente, tal idéia acabou sendo usada por Ricardo em sua teoria da renda da terra.
Contudo, Smith, ao enfatizar os retornos crescentes, não a aplicou em sua teoria econômica.
A idéia de rendimentos decrescentes na agricultura também tinha sido proposta por
Steuart em seu Principles (1767). Antes mesmo de Ricardo, outro autor que abordava a
associação entre produtividade e agricultura era Anderson. Segundo Schumpeter (1964, p.
333), “[...] a associação de renda com rendimentos decrescentes, que haveria de ser uma das
mais características realizações do sistema ricardiano, foi estabelecida por Anderson”. Logo,
Ricardo não foi o único economista a abordar o tema renda da terra. Todavia, Ricardo teve a
1
O início da fisiocracia é datado de 1756. Nesse ano, Quesnay publicou seu primeiro artigo sobre economia na
Grande Encyclopédie. O término desta escola deu-se quando Turgot perdeu seu alto posto no governo Francês e,
também, com a publicação em 1776 da “Riqueza das Nações”.
2
A fisiocracia via a economia, assim como a física, “governada” por leis naturais que pudessem explicar o
sistema econômico. Também enfatizava o liberalismo econômico, a análise da agricultura como sendo única
atividade geradora de excedente econômico e minimizava a importância das trocas comerciais. Considerava as
atividades comerciais estéreis.
11
habilidade de criar uma teoria que acabaria sendo um marco na história do pensamento
econômico.
David Ricardo e Adam Smith são economistas que se enquadram na Economia
Política. A Economia Política é caracterizada por ser uma corrente que se preocupa em
estudar a contraposição dos interesses econômicos das diferentes classes sociais. A teoria de
Ricardo (além da teoria de Adam Smith) é “parada obrigatória” para economistas que desejam
entender os mecanismos e as “leis” que regem um sistema econômico. A análise ricardiana é
caracterizada por estudar a realidade econômica através de uma teoria que usa a abstração
como método para melhor compreensão da realidade. Sendo assim, é indiscutível que Ricardo
possui uma capacidade teórica e uma grande elegância na formulação de suas teorias. A
publicação da obra de Ricardo está inserida em um contexto que se caracteriza pelos efeitos
da revolução industrial e também pelas conseqüências das “enclousures”
3
.
Ricardo, assim como Adam Smith, rechaçava a intervenção do estado na economia e
defendia que os mecanismos de mercado são superiores à intervenção estatal na economia.
Por isso, era contra a chamada “Corn Laws”
4
aplicada na Inglaterra. O autor defendia que o
lucro era fonte de acumulação de capital. A teoria da renda de Ricardo foi elaborada como um
mecanismo teórico de explicação de como seria possível retardar o estreitamento da margem
de lucro dos capitalistas pelo pagamento da renda e dos salários. Sua famosa teoria da renda
da terra faz uma interligação entre o aumento da população, o crescimento econômico e o
pagamento da renda diferencial em função da diferença de fertilidade das terras.
A teoria da renda da terra de David Ricardo consagrou-se no meio intelectual e
acadêmico como a teoria dos rendimentos decrescentes da terra. Todavia, Adam Smith
também havia formulado uma teoria dos rendimentos da terra. A abordagem de Smith
contrasta com a amplamente conhecida teoria dos rendimentos decrescentes de Ricardo.
Enquanto Ricardo defende a abordagem dos rendimentos decrescentes da terra, Smith permite
3
Milhões de terras coletivas foram repartidas e cercadas para o uso econômico de proprietários particulares. Os
“encloseres” praticamente extinguiram a agricultura camponesa, expulsaram a mão-de-obra do campo para as
cidades e deram “infraestrutura” à agricultura capitalista. A agricultura capitalista intensificou o uso da terra,
introduziu métodos de drenagem, de fertilização e aplicou métodos de rotação de cultura. Por mais que tenha
sido responsável pela miséria de muitos camponeses, o sistema de cercamento das terras serviu de suporte ao
avanço da produtividade agrícola da época.
4
Famosa lei dos cereais que proibiam a importação de trigo se o preço ficasse abaixo de 80 xelins por quarter.
Tal lei acabava beneficiando os proprietários das terras e ocasionava a queda da taxa de lucro dos capitalistas por
barrar a importação de cereais e, desta forma, incentivar a produção agrícola de cereais rumo às terras de menor
fertilidade.
12
sustentar que a terra possui rendimentos crescentes de sua produção com o crescimento e o
progresso da riqueza.
Ricardo aponta que o nível da renda da terra é determinado pela terra menos produtiva,
ou seja, a última terra utilizada. Contrapondo tal análise, Smith defende que a renda da terra é
determinada pela terra mais produtiva, ou seja, a primeira terra utilizada. Smith enxerga uma
relação positiva entre o desenvolvimento econômico e o aumento da renda da terra. Todavia,
Ricardo enxerga que a expansão da produção agrícola em direção às terras menos férteis
tende a diminuir a margem de lucro dos capitalistas e, conseqüentemente, afetar
negativamente o processo de desenvolvimento da economia. Conforme a visão de Ricardo, o
aumento da demanda de produção de cereais (em virtude, por exemplo, do aumento da
população) impõe a necessidade de cultivo de terras menos férteis e mais afastadas do
mercado. A exploração das terras menos férteis levaria ao aumento da renda da terra e à
redução da taxa de lucro dos capitalistas.
Portanto, a pergunta que este trabalho quer responder é se a teoria da renda da terra de
Adam Smith tem potencial de se contrapor à teoria da renda da terra de David Ricardo. O
objetivo principal do trabalho será tentar confrontar a teoria de Ricardo com a ótica smithiana
dos rendimentos da terra. Ou seja, contestar uma teoria bastante conhecida nos meios
acadêmicos a partir de uma abordagem escrita antes das idéias de David Ricardo. Partindo da
análise dos rendimentos crescentes da terra feita por Adam Smith, esta dissertação irá
contrapor à idéia de Ricardo em relação aos rendimentos decrescentes da terra.
Os objetivos específicos desta dissertação serão buscar e comprovar a importância do
progresso técnico e dos rendimentos crescentes da terra na análise de Smith e também
verificar a importância da produtividade da terra, inserida na análise de ambos os autores,
para o progresso contínuo do desenvolvimento econômico.
Será feita uma análise da teoria de ambos os autores a partir de suas principais obras e
também de trabalhos que discutam a teoria de ambos os autores. Além disso, será feita uma
pesquisa sobre a importância do progresso técnico na agricultura como forma de mostrar que
a teoria de Smith pode contrapor-se à teoria dos rendimentos decrescentes da terra de David
Ricardo. Portanto, este trabalho irá discutir a posição dos dois autores dentro de uma
discussão relacionada à teoria econômica.
Neste trabalho, fez-se a opção de abordar, primeiramente, a teoria bastante conhecida
dos rendimentos decrescentes da terra, portanto o capítulo dois desta dissertação irá tratar de
“Ricardo e a renda da terra”. Neste capítulo será feita uma análise da teoria dos rendimentos
13
da terra do autor e seu enfoque sobre o desenvolvimento econômico. O capítulo três irá
discutir “Smith e a renda da terra”. Neste capítulo será feita uma análise, principalmente,
sobre o capítulo onze do livro primeiro de “A Riqueza das Nações”. O capítulo de Smith irá
abordar a renda da terra na visão deste autor e, também, o enfoque que este assunto tem em
relação ao desenvolvimento econômico. O capítulo quatro possui o título “Rendimentos
crescentes, progresso técnico e desenvolvimento: elementos para um confronto entre as
teorias da renda da terra de David Ricardo e de Adam Smith”. O objetivo desta parte da
dissertação é buscar argumentos que mostrem que a teoria de Smith pode contrapor-se à teoria
amplamente conhecida de Ricardo sobre os rendimentos decrescentes da terra. Por fim, o
capítulo cinco traz a conclusão e a síntese dos argumentos elaborados ao longo do texto.
14
2 RICARDO E A RENDA DA TERRA
Em uma situação hipotética de superabundância de terras férteis, dificilmente existiria
o pagamento da renda da terra. Claro que esta é apenas uma situação irreal e não condiz com a
história econômica. A expansão da produção em direção às terras de menor fertilidade tende a
baixar a taxa de lucro dos capitalistas e a aumentar a renda da terra. Segundo Ricardo, renda e
lucros são duas variáveis econômicas que caminham em direções opostas. Quando uma sobe,
a outra desce, e vice-versa. Segundo Ricardo (1978, p. 200):
Assim, ao passar a cultivar terras de pior qualidade, a renda subiria na terra
previamente cultivada, e precisamente na mesma extensão declinariam os lucros; e
se o baixo nível dos lucros não detivesse sua acumulação, dificilmente haveria limite
para a elevação da renda e a queda do lucro.
2.1 A renda da terra e o desenvolvimento econômico
Segundo Ricardo, caso não houvesse incompatibilidade entre o aumento da renda e o
dos lucros, o pagamento da renda da terra em função da diferença de fertilidade entre as terras
mais e menos produtivas não seria uma restrição ao desenvolvimento de uma nação e,
conseqüentemente, à acumulação de capital. O preço dos cereais tende a aumentar quando
uma nação se vê obrigada a recorrer a terras mais pobres para a produção de alimentos. O
surgimento e o aumento da renda, aliado à tendência declinante da taxa de lucro, aparece em
virtude do próprio processo de desenvolvimento econômico que requer a expansão da
produção em direção a terras de menor fertilidade. Na passagem abaixo, o autor defende sua
abordagem em relação a manutenção da tendência de queda da taxa de lucros.
[...] contudo, num período posterior, cada acumulação de capital será acompanhada
de uma redução tanto absoluta como proporcional dos lucros, se bem que as rendas
aumentarão uniformemente (RICARDO, 1978, p. 201).
15
O aumento da população e o próprio processo de desenvolvimento da economia levam
uma nação a expandir sua produção em direção às terras menos férteis. Isto significa
defender, dentro da abordagem de Ricardo, que o próprio desenvolvimento de uma nação
pode ocasionar a elevação dos preços dos cereais, o aparecimento da renda da terra e a queda
da taxa de lucro. Ou seja, o processo de desenvolvimento pode levar à interrupção de seu
próprio curso. Sendo assim:
O único efeito, pois, do desenvolvimento da riqueza sobre os preços, independente
de todas as melhorias, tanto na agricultura como nas manufaturas, parece ser a
elevação do preço das matérias-primas e do trabalho, deixando todas as demais
mercadorias com seus preços originais, e a redução dos lucros gerais em razão da
alta dos salários (RICARDO, 1978, p. 205).
A tendência à queda da taxa de lucro pode ser combatida em virtude de uma queda
dos salários reais, de melhorias na agricultura ou pela importação de cereais. Existe um
argumento econômico que defende que um país deve intensificar sua produção de alimentos,
mesmo que em terras de menor fertilidade, com o objetivo de evitar o risco de um possível
desabastecimento alimentar em tempos de guerra. Segundo esta linha, a intensificação da
produção alimentar seria importante para a segurança alimentar de uma nação mesmo que tal
fato afetasse negativamente a taxa de lucro dos capitalistas. Em relação à intensificação da
produção agrícola de um país em função de uma possível guerra que poderia bloquear a
importação de alimentos necessária a determinada nação, escreve Ricardo (1978, p. 214):
Portanto, seria prudente legislar para evitar um mal que pode vir a não suceder,
sacrificando uma renda anual de alguns milhões para afastar um perigo sumamente
improvável?
Ricardo observa que a queda do preço do cereal tende a baixar os salários dos
trabalhadores e aumentar a taxa de lucro, beneficiando, desta forma, a acumulação de capital.
Ou seja, a queda dos preços dos cereais não é vista como maléfica para a economia de um
país. O fato de os preços caírem não está relacionado a uma queda geral dos preços da
economia e, neste caso, a um desincentivo à acumulação de capital por parte dos capitalistas.
A queda dos preços que Ricardo defende é uma queda dos preços dos cereais, e não a uma
queda geral de todos os preços de uma economia. O preço do cereal é visto como custo. Com
sua queda, os salários e o pagamento da renda da terra tendem a cair, e, conseqüentemente, os
16
lucros interrompem a tendência declinante de sua taxa. Ou seja, os baixos preços dos cereais
tendem a afetar positivamente a taxa de lucro, conforme citações a seguir.
Devo observar uma vez mais que a elevação do valor do dinheiro faz baixar todas as
coisas, ao passo que a queda do preço do cereal somente faz baixar os salários do
trabalhador, elevando conseqüentemente os lucros (RICARDO, 1978, p. 221).
[...] a prosperidade das classes comerciais conduz com toda certeza à acumulação de
capital e ao estímulo da atividade produtiva; e isto não se pode conseguir de forma
tão segura como através da queda no preço do cereal (RICARDO, 1978, p. 221).
As primeiras terras a serem exploradas na atividade agrícola são as terras de melhor
qualidade. Enquanto terras de menor qualidade não são exploradas, é o próprio proprietário da
terra que explora as primeiras. Todavia, com o aumento populacional e a necessidade de
expansão da fronteira agrícola em direção a terras menos férteis, a exploração dessas leva à
criação da renda nas terras de melhor qualidade. O custo de produção de determinado produto
agrícola é determinado pela fertilidade desta segunda terra de menor qualidade. O preço do
cereal é dado em função dos custos de produção nas terras de qualidade inferior. Como nesta
situação existe um excedente, além do custo de produção na terra de melhor qualidade, surge
então desta diferença a renda da terra. Este processo de expansão da produção em direção a
terras de menor fertilidade ocasiona o surgimento da renda nas terras anteriores. Sendo assim,
sempre a última terra, ou seja, a de menor qualidade será a terra que ditará o preço do produto
agrícola em função de seus custos. Sucessivamente, as demais terras proporcionarão uma
renda para os seus proprietários, regulada de acordo com qualidade produtiva da última terra a
ser explorada.
Dessa análise é que surge o conceito de renda diferencial de David Ricardo. Para
Ricardo, a renda é cobrada pela diferença de fertilidade entre as terras exploradas. A
passagem de Hugon elucida bem o surgimento da renda da terra na análise de Ricardo.
E assim por diante: a população ao aumentar o seu volume, reclama uma quantidade
suplementar de gêneros alimentícios e, implicando isso a exploração de terras cada
vez menos férteis, vai provocar o aparecimento de novas rendas e o aumento das
taxas das rendas antigas (HUGON, 1995, p. 123).
Para Ricardo, a economia encontrava dificuldades em função da produtividade
decrescente da agricultura. Uma baixa na taxa de lucro significa que a economia não poderá
prosseguir desenvolvendo-se e gerando bem-estar para a sociedade. Em função de tal situação
é que Ricardo elaborou sua famosa teoria da renda da terra. O resultado de uma queda da taxa
17
de lucro na economia significaria a interrupção do progresso econômico. Ricardo entendia
que o interesse dos capitalistas estava de acordo com o interesse da sociedade.
Ricardo enxerga a renda como o pagamento pela capacidade produtiva da terra. Ou
seja, a renda da terra não pode ser confundida com a simples análise da extração de bens
naturais (carvão, ouro entre outros). Uma crítica de Ricardo em relação à teoria de Adam
Smith refere-se ao fato de Smith analisar a renda da terra como também vinda da exploração
de florestas (madeira) e do carvão. Para Ricardo, existe uma confusão na análise de Smith ao
relacionar renda da terra com a simples extração de bens naturais da mesma. Segundo Ricardo
(1996, p. 65), “[...] no caso descrito por Adam Smith, pagava-se pelo direito de extrair e
vender a madeira, e não pelo direito de cultivá-la”. O surgimento da renda relaciona-se com a
limitação das terras cultiváveis e também com a não-uniformidade da fertilidade da terra,
conforme passagem a seguir.
Portanto, somente porque a terra não é ilimitada em quantidade nem uniforme na
qualidade, e porque, com o crescimento da população, terras de qualidade inferior ou
desvantajosamente situadas são postas em cultivo, a renda é paga por seu uso
(RICARDO, 1996, p. 66).
Conforme Ricardo (1996, p. 272), “[...] as terras de qualidade inferior passam a ser
utilizadas para alimentar uma população crescente, aumentam progressivamente tanto a parte
da produção total da terra como o valor que ela recebe”. Em outra passagem, Ricardo
defende a distinção entre fertilidade absoluta e fertilidade relativa. A renda da terra “[...],
devemos considerar, não é proporcional à fertilidade absoluta da terra, mas sim a sua
fertilidade relativa” (RICARDO, 1996, p. 272).
Outro ponto importante de Ricardo refere-se ao aumento do preço e ao aumento da
renda da terra. Existe uma relação entre aumento dos preços e, posteriormente, aumento da
renda, e não o contrário. Na análise de Ricardo, a renda da terra é conseqüência do aumento
dos preços agrícolas e não a sua causa. Segundo Ricardo (1996, p. 69), “Portanto, a razão pela
qual aumento no valor comparativo dos produtos agrícolas é o emprego de mais trabalho
para produzir a última porção obtida e não o pagamento de renda da terra ao proprietário”.
Desta forma, “O aumento da renda da terra decorre sempre do aumento da riqueza de um país
e da dificuldade de produzir alimentos para a população crescente” (RICARDO, 1996, p. 70).
Uma nação pode estar tendo sua riqueza em ascensão, todavia a maior necessidade de
alimentos para a população tenderá a aumentar a exploração de terras menos férteis e, desta
forma, a renda da terra começará a ser regulada pela diferença de fertilidade da terra. Ricardo
18
faz uma crítica à análise de Smith relacionada à formação de preço. Para Smith, a renda da
terra é parte componente do preço das mercadorias. Contudo, Ricardo defende que o preço
dos produtos agrícolas é regulado pela quantidade de trabalho. Logo, renda da terra não é
parte do preço. O que determina o preço é a quantidade de trabalho utilizada na produção de
determinado produto agrícola.
O aumento da renda, dos salários e a diminuição dos lucros são “[...] geralmente
efeitos inevitáveis da mesma causa: a demanda crescente de alimentos, a maior quantidade de
trabalho necessário para produzi-los e, em conseqüência, seu preço elevado” (RICARDO,
1996, p. 277). O preço de uma mercadoria pode aumentar de maneira permanente “[...] ou
porque uma maior quantidade de capital e trabalho deve ser empregada para produzí-lo, ou
porque o valor do dinheiro diminuiu”
(RICARDO, 1996, p. 279). Logo o nível da renda da
terra maior ou menor o tem impacto sobre o nível dos preços dos produtos agrícolas. O que
determina o nível dos preços ou é o trabalho empregado para a sua produção, ou a
desvalorização da moeda de um país. Ricardo faz uma análise da relação entre o aumento da
riqueza de uma nação e a renda da terra. O autor defende que a riqueza aumenta em uma
velocidade maior onde:
[...] a terra disponível é mais fértil, onde as importações sofrem menos restrições,
onde, graças aos aperfeiçoamentos na agricultura, a produção pode ser multiplicada
sem qualquer aumento na quantidade proporcional de trabalho; onde,
conseqüentemente, o progresso da renda é mais lento (RICARDO, 1996, p. 70)
5
.
Para Ricardo, melhorias na fertilidade e rotação de culturas tendem a melhorar a
qualidade da terra e, conseqüentemente, aumentar a produção em uma mesma porção de
terras. Desta forma, a produção de trigo pagará uma renda menor aos proprietários da terra e,
com o uso de terras de maior qualidade, o preço do trigo não será tão alto. Com isto, o nível
dos lucros não será prejudicado da mesma forma que seria caso terras de menor fertilidade
tivessem que ser usadas na produção do trigo.
Um dos capítulos da obra de Ricardo é intitulado de “Impostos sobre a Renda da
Terra”. Neste capítulo, Ricardo defende que impostos sobre a renda da terra recaiam apenas
sobre o proprietário, pois o proprietário da terra não teria condições de “[...] alterar a diferença
entre o produto obtido na terra de pior qualidade, e o obtido nas outras terras” (RICARDO,
5
Isto significa que Ricardo considerava que em países onde o progresso do pagamento da renda da terra é mais
lento existe uma possibilidade muito maior de desenvolver e de gerar uma maior riqueza para a sociedade do que
naqueles países cujas terras férteis estão totalmente ocupadas e dispõem para o uso terras de menor
fertilidade.
19
1996, p. 127). Isto significa que um imposto sobre a renda da terra seria pago apenas pelo
proprietário da mesma sem recair sobre o nível dos salários e dos lucros. Todavia, um imposto
sobre a terra (e não sobre a renda) poderia afetar o nível dos preços agrícolas de um país.
Neste caso, um imposto sobre a terra “[...], por mais leve que seja, sena realidade um
imposto sobre o produto, e fará aumentar conseqüentemente o preço deste” (RICARDO,
1996, p. 133). Em outra passagem, Ricardo aborda que um imposto lançado sobre as terras
“[...], sem distinção, da sua qualidade, fará o preço do trigo aumentar proporcionalmente ao
imposto pago pelo agricultor que cultiva a terra de pior qualidade” (RICARDO, 1996, p. 134).
Para auxiliar a melhor compreensão da renda da terra de Ricardo, é necessário também
entender a importância que o autor dá para o comércio exterior. Segundo o autor, o comércio
exterior de uma nação é importante para “[...] ampliar o volume de mercadorias, e, portanto, a
soma de satisfações” (RICARDO, 1996, p. 101). O comércio exterior “[...], não tem nenhuma
tendência para elevar os lucros do capital, a menos que as mercadorias importadas
correspondam àquelas nas quais os salários são pagos” (Ricardo, 1996, p. 103). A importação
de produtos agrícolas utilizados na cesta de consumo dos trabalhadores pode ocasionar a
menor necessidade de utilizar terras menos férteis para a produção agrícola. Como o nível dos
preços é determinado pela quantidade de trabalho despendida sobre a produção de bens
agrícolas, a não utilização de terras menos férteis ocasionará a utilização de uma menor
quantidade de trabalho despendida na produção agrícola das terras mais férteis.
Conseqüentemente, o nível dos preços não será tão alto, e o pagamento de salários não será
também tão alto (já que os salários devem acompanhar os preços dos produtos agrícolas para
a satisfação das necessidades do trabalhador). Com um menor preço de bens agrícolas e um
menor nível dos salários pagos, o nível dos lucros tenderá a aumentar. A satisfação das
necessidades da sociedade por bens agrícolas poderá, neste caso, ser satisfeita pela livre
importação de bens agrícolas que possam ser produzidos por outro país que possua terras mais
férteis e, conseqüentemente, possa vender seus bens agrícolas a um nível de preços mais
baixo. Ou seja, a importação de produtos agrícolas leva uma nação a deixar de explorar terras
menos férteis e, desta forma, a evitar um aumento dos níveis dos preços e da renda aliado a
uma redução dos níveis dos lucros.
20
2.2 Taxa de lucro e renda da terra
A abordagem de Ricardo sobre a renda da terra traz implícita uma teoria sobre os
lucros e a tendência de sua queda ao longo do processo de desenvolvimento econômico. A
análise da renda da terra tem uma maior preocupação “[...] com o comportamento da taxa de
lucro, sobretudo com as relações com o salário” (LENZ, 1985, p. 92). A análise dos lucros no
pensamento de Ricardo estava articulada na abordagem da renda da terra, conformando uma
visão completa da economia capitalista em desenvolvimento. Assim:
Ricardo traz, assim, uma nova abordagem da teoria da renda da terra, na medida em
que a apresenta juntamente com uma teoria sobre os lucros, bem como a tendência à
queda da taxa de lucro no decorrer do processo de desenvolvimento do capitalismo
(LENZ, 1985, p. 92).
A renda da terra é um efeito do aumento da riqueza e não é a sua causa. Para Ricardo,
o proprietário da terra é beneficiado pela maior dificuldade na produção de trigo. A queda de
fertilidade em função da expansão econômica em direção às terras de menor fertilidade
beneficia os proprietários das terras, pois os mesmo apropriam-se de uma parcela da
remuneração que poderia ser destinada aos capitalistas. Dentro deste cenário, a queda da taxa
de lucro é inevitável. A renda é a subtração de uma riqueza já existente, sob a forma de lucros.
Ricardo considera a renda “[...] uma dedução dos lucros obtidos e nunca uma porção do
acréscimo da riqueza” (LENZ, 1985, p. 100). Ricardo não contesta os direitos de propriedade
dos detentores da terra, mas verifica o progresso técnico nas terras já existentes e/ou a
importação de cereais como solução para a tendência queda da taxa de lucro. Conforme Lenz
(1985, p. 103):
Ricardo, por outro lado, defende avidamente os interesses dos capitalistas. Ele na
renda da terra um obstáculo ao progresso de acumulação de capital, mas não
questiona os direitos dos proprietários de se apropriarem da renda da terra. Para ele,
o proprietário de terras é um personagem passivo que se beneficia do progresso da
sociedade apenas por razões técnicas. Os únicos meios pelos quais os capitalistas
poderiam sobrepujar esse obstáculo seria através do progresso técnico e/ou da
importação de trigo mais barato.
21
3 SMITH E A RENDA DA TERRA
Antes da análise da renda da terra de Adam Smith, faz-se necessário abordar alguns
aspectos relacionados ao processo de desenvolvimento econômico de um país. Dentro do
contexto abordado neste trabalho, o processo de divisão do trabalho e a relação de
retroalimentação econômica do campo e da cidade merecem uma análise preliminar para
situar a renda da terra dentro da abordagem teórica de Adam Smith.
3.1 A divisão do trabalho
A divisão do trabalho para Adam Smith não se resume apenas à divisão dentro de uma
fábrica de alfinetes ou qualquer outra manufatura sendo produzida. Toda a sociedade entra em
um processo de divisão do trabalho com o progresso da nação e a expansão dos mercados
consumidores. Segundo Smith (1996, p. 42), “Em toda sociedade desenvolvida, o agricultor
geralmente é apenas o agricultor, e o operário de indústria somente isso”. Neste caso, a
agricultura também acaba inserindo-se no processo de divisão do trabalho. Vale ressaltar que
este processo subentende o aumento da produtividade do trabalho, ou seja, a produção de um
excedente que esteja além das necessidades daquele que produz. Desta forma, este excedente
acaba sendo levado ao mercado em forma de produtos, para que o mesmo possa ser comprado
por outras pessoas. O processo de desenvolvimento econômico (aliado ao crescimento da
população e à expansão dos mercados) acaba propagando a divisão do trabalho sobre o
restante da economia. Isto significa que aquele que antes produzia bens para a manutenção de
sua subsistência irá dedicar-se a um produto rentável e vendê-lo no mercado para a obtenção
de um ganho. Com este dinheiro, o mesmo busca os demais produtos feitos por outros
trabalhadores para a sua subsistência.
O processo de divisão e especialização do trabalho resulta da necessidade que cada ser
humano tem do trabalho alheio. Para Smith (1996, p. 51), “[...] entre os homens, os caracteres
e habilidades mais diferentes são úteis uns aos outros [...]”. O homem para progredir
22
economicamente e socialmente precisa encontrar no mercado produtos feitos por outros
trabalhadores. Encontrando no mercado produtos de que precisa, o mesmo pode dedicar-se à
produção de um bem específico que lhe traga maior bem-estar e maior remuneração do que
dedicar-se simplesmente à produção de produtos voltados para a sua subsistência. Esse
processo de especialização do trabalho em todos os setores da economia encontra certo limite
na agricultura. Smith não descarta a importância da divisão do trabalho na agricultura, porém
“A natureza da agricultura não comporta tantas subdivisões do trabalho, nem uma
diferenciação tão grande de uma atividade para outra, quanto ocorre nas manufaturas”
(SMITH, 1996, p. 42). Seguindo nesta mesma linha, Smith verifica a seguinte situação:
Essa impossibilidade de fazer uma diferenciação tão completa e plena de todos os
diversos setores de trabalho empregados na agricultura constitui talvez a razão por
que o aprimoramento das forças produtivas do trabalho nesse setor nem sempre
acompanha os aprimoramentos alcançados nas manufaturas (SMITH, 1996, p. 43).
Na manufatura, o país mais desenvolvido possui uma maior produtividade do que o
país menos desenvolvido. Contudo, a agricultura nunca é tão mais produtiva nos países
desenvolvidos do que nos países menos avançados A diferença de produtividade entre a nação
mais rica e a menos rica no setor manufatureiro é muito maior do que a diferença da
produtividade agrícola da nação de maior e de menor desenvolvimento. Conforme Smith
(1996, p. 43) “Na agricultura, o trabalho do país rico nem sempre é muito mais produtivo do
que o dos países pobres, ou, pelo menos nunca é mais produtivo na mesma proporção em que
o é, geralmente, nas manufaturas”.
Antes do processo de desenvolvimento econômico, o trabalhador do campo é obrigado
a executar todas as tarefas de que necessita para a manutenção de sua subsistência. Os
produtos não são encontrados no mercado para a comercialização. Ou seja, o trabalho dos
demais membros da sociedade não é encontrado na forma de produtos em mercados
organizados. O crescimento populacional, a divisão do trabalho e o avanço do
desenvolvimento econômico ampliam os mercados e fazem com que as pessoas encontrem
produtos de que precisam em mercados organizados.
Segundo Thirwall, uma das maiores contribuições de Smith para as ciências
econômicas foi introduzir a idéia de rendimentos crescentes na economia. Segundo esta
análise, o aumento do mercado consumidor leva a divisão do trabalho e, desta forma, ao
aumento da produtividade do trabalho. Nas palavras de Thirwall (2005, p. 17):
23
E foi a idéia de rendimentos crescentes, baseados na divisão do trabalho, que esteve
no cerne da visão otimista de Smith sobre progresso econômico como processo
autogerador, em contraste com os economistas clássicos posteriores, como Ricardo e
Mill, que acreditavam que as economias acabariam numa situação estacionária [...].
A divisão do trabalho acaba sendo causa da ampliação do mercado em virtude de
aumentar a produtividade da economia e o poder de compra da população. Todavia, mesmo
assim existe uma relação de retroalimentação entre divisão do trabalho e expansão do
mercado. Segundo Thirwall (2005, p. 18), “A divisão do trabalho depende do tamanho do
mercado, mas o tamanho do mercado depende da divisão do trabalho”. O processo de divisão
do trabalho desencadeia o aumento da produtividade tanto no setor manufatureiro, quanto no
setor agrícola de uma nação. Mesmo que possa aumentar a produtividade em menor grau que
no setor industrial, a agricultura também acaba inserindo-se no processo de divisão do
trabalho. Tal aumento de produtividade ocorre também em virtude do progresso das técnicas
de produção. Ricardo e Malthus enxergavam a terra como um limite natural ao processo de
desenvolvimento econômico. Para o autor, o erro de Malthus e Ricardo, por exemplo,
relaciona-se ao fato de que ambos os autores subestimaram “[...] a força do progresso
tecnológico na agricultura como um modo de contrabalançar os rendimentos decrescentes”
(
THIRWALL
, 2005, p. 22). Segundo Thirwall (2005, p. 22):
O pessimismo de Ricardo também foi desbaratado pelo progresso tecnológico e o
estado de estagnação nunca despontou no horizonte, exceto, na África dos últimos
tempos mas ali, as causas são diferentes e complexas, relacionadas com o fracasso
político.
3.2 O campo e a cidade
A cidade e o campo mantêm uma relação econômica na qual um necessita do
excedente do outro para sua evolução. O campo libera alimentos e mão-de-obra para a cidade,
e a cidade fornece manufaturas para o campo. Também neste caso, o campo funciona como
mercado consumidor para os produtos da cidade, e a cidade, como mercado consumidor para
os produtos do campo. A cidade e o campo mantêm uma relação de complementação em que
o mercado de um sustenta o mercado da outra. A cidade não tem condições de produzir os
alimentos de que necessita, e o campo não tem condições de produzir as manufaturas de que
24
precisa. Além disso, existe o fato da importância que o aumento da produtividade na atividade
do campo tem quando libera mão-de-obra para as atividades manufatureiras e comerciais da
cidade. Ou seja, o sucesso econômico das cidades sustenta-se somente em função do
progresso técnico do campo. Sem produtividade agrícola no campo não existiriam as cidades
e as demais atividades econômicas no entorno de suas imediações. Para Smith (1996, p. 322):
[...] o aprimoramento e o cultivo da terra, pelo fato de assegurar o necessário para a
subsistência, deve forçosamente ter prioridade sobre o crescimento da cidade que
fornece apenas comodidades e artigos de luxo. É somente o excedente da produção
do campo, isto é, o que vai além do necessário para a manutenção do pessoal do
campo, que constitui a subsistência da cidade, a qual, pois, só pode crescer na
medida em que aumentar o excedente de produção do campo.
Um ponto que Smith aborda sobre a importância da relação do campo com a cidade é
o fato de que o capitalista da cidade muitas vezes canaliza o seu excedente econômico, na
compra ou aluguel da terra, para usar a mesma como meio de produção visando o lucro. Ou
seja, o capitalista difere do aristocrata, pois este último apenas possui a propriedade da terra e
não possui o espírito capitalista de buscar mais lucro via alocação de terra, de capital e de
trabalho da forma mais eficiente possível. Para Smith, o comerciante possui uma natureza
diferente da natureza econômica do aristocrata proprietário da terra. Conforme Smith (1996,
p. 346):
Além disso, os hábitos de ordem, economia e cuidado, para os quais a profissão do
comércio naturalmente molda o comerciante, o tornam muito mais apto a executar,
com lucro e sucesso, qualquer projeto de desenvolvimento.
A cidade também contribui para o progresso do campo quando o próprio comércio
introduz a ordem e a boa administração na atividade do campo. O estímulo à intensificação do
comércio traz ganhos de produtividade para o campo. O livre comércio traz liberdade de
comercialização para a população do campo, ao contrário da época feudal, em que os
camponeses mantinham sua produção restrita ao entorno do feudo e forneciam uma parte de
seu pequeno excedente para o senhor feudal. Para Smith, o capital adquirido através do
comércio e da manufatura constitui “[...] uma posse muito precária e incerta, enquanto parte
dele não tiver sido assegurada e não for aplicado no cultivo e na melhoria de suas terras”
(SMITH, 1996, p. 353). A posição que Smith defende na passagem anterior é que o excedente
econômico deve ser canalizado, entre outros setores econômicos, na atividade agrícola para
25
que esta mesma atividade possa aumentar sua produtividade e contribuir para o
desenvolvimento das cidades e de suas atividades econômicas.
3.3 A renda da terra
A renda da terra para Smith tem relação com a existência da propriedade privada sobre
a terra. Conforme Lenz (2008, p. 9), “Fica claro desde logo que, para Adam Smith, a renda da
terra representa um preço pago pela existência da propriedade privada da terra”. A renda, para
o autor de “A Riqueza das Nações”, é o preço pago por um monopólio.
Para Smith, a renda da terra comporta-se como conseqüência do aumento dos preços,
ao contrário do nível dos salários e dos lucros que são causas do aumento do nível dos preços.
Na abordagem de Smith, a renda da terra nada mais é que o “[...] efeito dos preços altos ou
baixos das mercadorias” (SMITH, 1996, p. 152), ao passo que salários e lucros são “[...] a
causa do preço alto ou baixo das mercadorias” (SMITH, 1996, p. 152). O objetivo do
proprietário da terra é auferir o máximo que puder cobrar do capitalista que está produzindo
em sua propriedade, mediante o pagamento de uma renda, ou seja, o aluguel da terra usada no
processo agrícola. O preço gera a renda quando existe um excedente que paga uma
remuneração além do pagamento normal do salário e do lucro. Este excedente constitui a
renda paga ao proprietário da terra.
Segundo o autor, o investimento em canais, estradas e rios navegáveis tende a
estimular e encorajar a produção interiorana de produtos agrícolas. O aumento da produção
agrícola em direção às terras mais afastadas e menos férteis tende a fazer com que tais terras
sejam exploradas por um capitalista, criando o pagamento da renda em terras antes não
exploradas ou exploradas pelo próprio proprietário.
A renda da terra, segundo Smith (1996, p. 154) “[...] varia não somente conforme a
fertilidade qualquer que seja seu produto mas também de acordo com a sua localização,
qualquer que seja a fertilidade”. O desenvolvimento de transportes que permitam que a
produção de terras distantes concorra com a produção das terras mais próximas da cidade traz
“[...] vantagem à cidade, por quebrarem o monopólio do campo em suas proximidades”
(SMITH, 1996, pg 154). O aumento da concorrência dos produtos cultivados em terras
distantes eleva a concorrência na cidade e, desta forma, acaba beneficiando os moradores
26
urbanos por disporem de produtos agrícolas ofertados por um maior número de produtores.
Neste caso, a própria concorrência tende a baixar os preços agrícolas
6
.
A renda da terra aumenta com a sua fertilidade e com as melhorias feitas pelo
proprietário da terra. Isto significa dizer que a fertilidade natural da terra ou melhorias feitas
na mesma pelo próprio proprietário tendem a elevar o nível da renda pago pelo capitalista ao
proprietário. Terras mais produtivas e mais férteis tendem a pagar um maior nível da renda
para seu proprietário.
Uma diferença da teoria de Smith da renda da terra em relação à teoria de David
Ricardo é que a abordagem de Smith defende a idéia que a renda é determinada pela terra
mais produtiva e mais eficiente. Segundo Smith (1996, p. 155), “[...] a renda e o lucro das
pastagens não melhoradas vêm a ser reguladas [...] pela renda e pelo lucro daquelas que
tiveram melhoria [...]”. Ou seja, o determinante da renda da terra é a terra mais produtiva e
não a menos produtiva. Conforme o autor, a renda e o lucro das principais terras cultivadas
determinam a renda e o lucro das demais terras de uma nação. Assim:
Em todos os grandes países, a maior parte das terras cultivadas é empregada para
produzir alimento humano ou alimento para o gado. A renda e o lucro dessas terras
determinam a renda e o lucro de todas as outras terras cultivadas (SMITH, 1996, p.
158).
Se uma nação possui o trigo como alimento básico, o cultivo do trigo determinará o
nível do lucro e da renda sobre a produção dos demais bens cultivados em uma nação.
Segundo a análise de Smith sobre esta questão, os capitais tendem a migrar das atividades
menos rentáveis para as atividades mais rentáveis. Neste caso, se existe uma produção menos
lucrativa que a produção do trigo, estes capitais tenderão a migrar para a atividade voltada ao
cultivo do trigo e, desta forma, esta última atividade (que é a mais rentável de uma nação)
tenderá a regular o nível da renda e dos lucros das demais atividades
7
. Conforme citação a
seguir:
É dessa maneira que a renda da terra cultivada, na qual se produz alimentos para o
homem, regula a renda da maior parte das outras terras cultivadas. Nenhum produto
6
Nota-se que o efeito final do uso das terras mais distantes, na argumentação de Smith, é aumentar a
concorrência de modo a reduzir os preços agrícolas. Segundo a teoria de Ricardo, o efeito final desse uso é
precisamente o inverso: aumento dos preços agrícolas.
7
Um ponto interessante da análise de Smith refere-se à peculiaridade do arroz em não ter poder de determinar o
nível da renda das demais atividades agrícolas de uma nação. Segundo o autor, “Um bom arrozal é um pantanal
em todas as estações do ano, e em uma das estações é um pantanal coberto de água” (SMITH, 1996, p. 163).
Neste caso, terras utilizadas para o cultivo de arroz não podem ser utilizadas para o cultivo de outros bens
agrícolas.
27
específico pode proporcionar uma renda inferior a essa, pois se tal acontecer a terra
seria imediatamente empregada para outro tipo de cultura; e se algum tipo de cultura
produzir uma renda superior à do cultivo de alimentos humanos, é por que a
quantidade de terra que pode ser preparada para esse fim será muito pequena para
atender a demanda efetiva desse produto (SMITH, 1996, p. 162).
Outro ponto abordado pelo autor refere-se ao fato de que a atividade agrícola mais
importante para o sustento e a alimentação da população de uma nação funciona como um
mercado consumidor para as demais atividades agrícolas. Segundo Smith (1996, p. 159), “A
numerosa mão-de-obra empregada em uma cultura necessariamente estimula a outra,
garantindo um mercado pronto para seus produtos”. Os trabalhadores envolvidos na principal
atividade agrícola de uma nação (por exemplo, o trigo) possuem necessidades de vestuário e
de outros tipos de alimentos que o produzidos por estas terras secundárias. A atividade
econômica envolvida na produção do trigo, neste caso, possui poder, através de sua demanda,
de estimular a produção das terras secundárias e, conseqüentemente, o nível da renda de seus
proprietários.
A expansão da produção das terras de maior fertilidade tende a aumentar o valor das
terras de menor qualidade. O aprimoramento das técnicas de produção sobre a terra e o
aumento de sua fertilidade constituem fatores que elevam o valor das terras em que se
implantam o aprimoramento e, conseqüentemente, elevam o valor de muitas outras terras
criando nova demanda de sua produção
8
.
Para Smith a renda da terra não está relacionada apenas à dádiva da natureza em
relação à fertilidade natural da terra. A renda também está relacionada ao aprimoramento do
trabalho sobre a terra cultivada. A fertilidade pode ser trabalhada e aperfeiçoada para o
aumento da produção e da renda da terra. Assim:
Dessa forma, o alimento não é somente a fonte original da renda, mas qualquer outra
parte do produto da terra que depois proporciona renda, deriva essa parcela de seu
valor do aperfeiçoamento das forças de trabalho na produção de alimentos através
do aprimoramento e do cultivo da terra (SMITH, 1996, p. 167).
Tudo aquilo que aumenta a fertilidade da terra na produção de alimentos aumenta
não somente o valor das terras nas quais se implantam aprimoramentos, mas
contribui igualmente para aumentar o valor de muitas outras terras, criando demanda
para a sua produção (SMITH, 1996, p. 174).
8
Smith, em sua análise, verifica a importância da triticultura para a economia européia. Segundo o autor, na
Europa, o trigo “[...] é o produto principal da terra que serve imediatamente como alimento humano. Excetuadas
certas situações específicas, é a renda da triticultura na Europa que regula a renda de todas as outras terras
cultivadas” (SMITH, 1996, p. 162).
28
Existem produtos que às vezes podem proporcionar o pagamento da renda e às vezes
não podem proporcionar renda. Após a alimentação, as duas necessidades do homem são o
vestuário e a moradia. Estes dois últimos é que tem esta peculiaridade de gerarem ou não o
pagamento da renda da terra
9
.
Smith elaborou uma análise do pagamento da renda da terra e o nível dos preços nas
minas de uma nação. Segundo o autor, as minas mais produtivas regulam o preço das minas
de menor produtividade. O motivo para tal situação é que tanto o proprietário da terra quanto
o capitalista que irá explorar as minas mais produtivas podem obter um nível de renda e de
lucro maior vendendo mais barato que seus concorrentes, que serão obrigados a vender a um
preço mais baixo. Segundo Smith (1996, p. 169):
Tanto o proprietário como o empreiteiro da mina consideram, o primeiro, que pode
obter uma renda maior, e o segundo, que pode auferir um lucro maior, vendendo um
pouco mais barato que todos os seus vizinhos que logo serão obrigados a vender
pelo mesmo preço, embora não possam facilmente fazê-lo e embora isso sempre
diminua sua renda e seu lucro, às vezes até eliminando-as totalmente.
O valor de uma mina de carvão relaciona-se com a localização desta mina e com o
nível de sua riqueza (quantidade e qualidade do carvão). as minas de metais preciosos
dependem muito mais da riqueza de seu solo do que de sua localização. O motivo que
diferencia as minas de carvão e de metais preciosos, em relação a sua localização, é que os
metais precisos possuem um preço mais alto que o preço do carvão. Neste caso, podem
suportar custos de transporte maiores em função de sua longa distância dos centros
consumidores, diferentemente do que ocorre com o carvão que possui preço menor e não tem
condições de suportar preços elevados de transporte. Smith defende que a renda da terra nas
minas de metais preciosos e dos metais menos preciosos representa uma pequena parcela do
preço desses metais. Neste caso, o nível dos salários e dos lucros representa a maior fatia do
preço
10
.
A renda nas minas está relacionada à sua riqueza relativa, ou seja, à superioridade da
mina mais rica em relação às demais minas. As minas mais ricas regulam a produção das
9
Um exemplo dado por Smith é as nações que possuem atividades relacionadas à caça. Neste caso, quando um
animal é abatido, o caçador retira a sua pele e a utiliza para vestuário. O excesso de pele que não tem serventia
para o caçador é jogado fora, conseqüentemente, sem o pagamento da renda. Estes produtos relacionados à
moradia e vestuário quando “[...] superabundam no país que os produz, acontece com freqüência, mesmo no
atual estágio do comércio mundial, que não tenham valor algum para o dono da terra” (SMITH, 1996, p. 166).
10
Smith defende que “[...] o preço máximo dos metais preciosos não parece ser necessariamente determinado
por outro fator a não ser a escassez ou abundância dos próprios metais” (SMITH, 1996, p. 172).
29
minas mais pobres. Desta forma, as minas mais produtivas têm poder de regular o nível da
renda das minas menos produtivas. Neste caso, escreve Smith (1996, p. 173):
que o preço tanto dos metais preciosos como das pedras preciosas é regulado em
todo o mundo pelo preço que têm a mina mais rica, a renda que uma mina de metais
preciosos ou de pedras preciosas pode oferecer ao proprietário é proporcional, não a
sua riqueza absoluta, mas ao que se pode chamar sua riqueza relativa, ou seja, à sua
superioridade em relação a outras minas da mesma espécie.
Smith defende que, em se tratando de produtos advindos acima do solo, ou seja,
produtos agrícolas produzidos e cultivados - ao invés de simplesmente extraídos como o
carvão, o ouro e a prata -, a renda da terra está relacionada à fertilidade absoluta e não à
fertilidade relativa como ocorre nas minas. Segundo Smith (1996, p. 173-74):
A situação é outra em se tratando de propriedades acima do solo. O valor de sua
produção e da renda da terra é proporcional à sua fertilidade absoluta e não à sua
fertilidade relativa.
Propriedades acima do solo podem ter sua fertilidade melhorada em virtude de novas
técnicas aplicadas ao cultivo do solo. Contudo, os metais preciosos possuem sua fertilidade
dada pela natureza. Neste caso, o homem não tem como aumentar a quantidade ofertada de
carvão ou de metais preciosos, por exemplo, pois a quantidade destes é determinada pela
disponibilidade oferecida pela natureza. Ao contrário, produtos acima do solo podem ter suas
quantidades aumentadas em virtude do progresso técnico. Tal fato explica porque a renda da
terra é determinada pela fertilidade absoluta em produtos acima do solo e não pela fertilidade
relativa, como os produtos advindos abaixo do solo.
A abordagem de Smith observa com muita clareza a importância da terra como fator
de desenvolvimento econômico de uma nação. Melhorias nas terras mais produtivas e mais
exploradas tendem a gerar um efeito multiplicador sobre o restante da economia. Tal fato
aumenta a utilização de novas terras para a produção de bens que servirão de suporte para o
desenvolvimento das principais terras de uma nação.
Em seu capítulo onze do livro primeiro de “A Riqueza das Nações” Adam Smith
define a existência de três tipos de produtos. O primeiro tipo caracteriza-se por ser aqueles
que dificilmente o trabalho humano pode multiplicar. O segundo tipo de produto são aqueles
que o trabalho humano pode multiplicar em proporção à demanda gerada pelo processo de
desenvolvimento econômico. O terceiro tipo caracteriza-se por ser de eficácia limitada e/ou
30
incerta a sua multiplicação, em compatibilidade com a demanda existente e em processo de
crescimento.
O primeiro tipo de produto (trabalho humano dificilmente pode multiplicar) tem como
característica o aumento dos preços com o processo de desenvolvimento econômico de uma
nação. O exemplo citado por Smith é o dos peixes raros, aves selvagens e aves migratórias.
Neste caso, não trabalho que possa aumentar sua produção. Isto significa que seus preços
sobem em uma escala de acordo com o avanço e o desenvolvimento de uma economia. O
segundo tipo de produto (trabalho humano é capaz de multiplicar a oferta de acordo com a
demanda) é exemplificado por Smith em relação à criação de gado. Segundo Smith (1996, p.
207), “O aumento da quantidade de gado e o aprimoramento da terra são duas coisas que
devem andar de mãos dadas, sendo que uma nunca pode avançar mais que a outra”. Neste
segundo tipo de produto o aumento da demanda leva a um aumento do vel dos preços em
um primeiro momento; todavia, como o trabalho humano é capaz de aumentar a oferta de
acordo com a demanda existente, a perspectiva de lucro por parte dos capitalistas leva à
intensificação das forças produtivas de uma nação (terra, capital e trabalho), ao aumento da
oferta e, neste caso, à criação de um “teto” para o nível dos preços destes tipos de produtos.
Este “teto” está relacionado com a compatibilização do nível da oferta com o nível da
demanda. Seguindo nessa linha, “[...] o gado é, talvez, aquele cujo preço primeiro atinge esse
teto, com o avanço do desenvolvimento” (SMITH, 1996, p. 206). Fica claro neste tipo de
produto a importância da fertilidade da terra para equalização da oferta com a demanda e,
conseqüentemente, o equilíbrio do nível dos preços. Para Smith, a criação de porcos, por
exemplo, muitas vezes pode estar restrita apenas ao nível de subsistência em um primeiro
estágio de desenvolvimento econômico. Todavia, com o avanço do desenvolvimento de uma
nação e o aumento de sua demanda o preço torna-se rentável para o aumento de sua escala de
produção e criação voltada para o mercado. Ou seja, o desenvolvimento econômico leva ao
aumento das necessidades da população, tornando produtos antes não rentáveis em
mercadorias altamente lucrativas. Neste caso, a intensificação das forças produtivas da terra,
do capital e do trabalho eleva a oferta destes bens para suprir a demanda existente e em
constante crescimento. O aprimoramento das forças produtivas da terra é intensificado se
“[...] o preço de cada produto nelas cultivado seja tão compensador que pague a despesa de
todo o melhoramento e o cultivo” (SMITH, 1996, p. 212).
O terceiro tipo de produto caracteriza-se por ser “[...] limitada ou incerta a eficácia do
trabalho humano para aumentar a quantidade dos mesmos” (SMITH, 1996, p. 212). Neste
31
caso o preço do produto sobe com o avanço do desenvolvimento econômico. Um exemplo
dado por Smith é a produção de peixes. Segundo o autor, a oferta de determinados tipos de
peixes é dada de acordo com o número de lagos e rios, a proximidade ou distância dos centros
consumidores e pela “fertilidade” dos rios e lagos em ofertar um nível de peixes compatível
com a demanda existente. O aumento da população leva ao aumento do mercado consumidor.
Como neste caso é incerto ou limitado o aumento da oferta de determinados tipos de peixes,
pode ocorrer a desproporção entre o nível da oferta e o da demanda, com conseqüências para
o aumento do nível dos preços.
A eficácia em ampliar a produção de peixes pode ser, além de limitada, totalmente
incerta em função dos riscos que o investimento em uma atividade como esta pode ocasionar.
Outro exemplo usado por Smith, em se tratando de produtos de terceiro tipo, refere-se ao
incentivo das importações por parte de um país. Tal incentivo pode limitar a eficácia da
produção interna de um país. Neste caso, pelo fato de independerem totalmente “[...] do
trabalho e dos esforços internos, necessariamente faz com que a eficácia dos esforços feitos
no país seja mais ou menos incerta (SMITH, 1996, p. 217).
A afirmação de Smith em relação à renda da terra e a própria atividade agrícola é clara
sobre os benefícios para a sociedade do aumento da produção da terra, que vem associado à
elevação da renda da terra. Segundo Smith (1996, p. 222), “A terra constitui de longe a parte
maior, a mais importante e a mais durável da riqueza de todo um país”. Para o
desenvolvimento econômico é necessário que a produção da terra seja incentivada e
aprimorada. As técnicas de aperfeiçoamento do trabalho na terra em função do aumento da
demanda urbana devem ser incentivadas para o aumento da produtividade da terra e,
conseqüentemente, para o aumento do bem-estar da sociedade. Smith defende, segundo
passagem a seguir, que todo o aumento da riqueza da sociedade tende a aumentar a renda real
da terra.
[...] toda melhoria da situação da sociedade tende, direta ou indiretamente, a elevar a
renda real da terra, a aumentar a riqueza real do proprietário da terra, seu poder de
compra de trabalho, ou a produção do trabalho das outras pessoas (SMITH, 1996, p.
226).
Seguindo nessa linha, o autor conclui queA parcela do proprietário da terra na
produção necessariamente aumenta com o crescimento da produção” (SMITH, 1996, p. 227).
O proprietário da terra na visão de Smith tem sua importância, dentro do desenvolvimento
econômico, não necessariamente em sua posição de proprietário, mas pelo fato de possuir em
sua mão a propriedade da terra. A questão que Smith leva em consideração é a terra e não
32
apenas a figura do proprietário da terra. Para Smith (1996, p. 227), “Todo aumento na riqueza
real da sociedade, todo o aumento na quantidade de mão-de-obra útil nela empregada,
indiretamente tende a aumentar a renda real da terra”. O termo “indiretamente” mostra que o
proprietário, por ter a propriedade das forças produtivas da terra, tende a beneficiar-se da
fertilidade da terra. Para Smith o interesse do proprietário e do trabalhador está intimamente
ligado ao interesse da sociedade. A passagem a seguir resume bem a posição de Smith sobre
os efeitos do menosprezo do aprimoramento da terra sobre os proprietários. Neste caso, o não
aprimoramento da fertilidade da terra afeta a parcela do proprietário relacionada à renda da
terra.
Por outro lado, a situação contrária, o menosprezo do cultivo e do aprimoramento da
terra, a queda do preço real de qualquer parcela da produção natural da terra, o
aumento do preço real dos produtos manufaturados, devido ao declínio da arte
manufatora, o declínio da riqueza real da sociedade, todos esses fatores tendem a
baixar a renda real da terra, a reduzir a riqueza real do proprietário da terra, a
diminuir seu poder de comprar trabalho ou o produto do trabalho de outras pessoas
(SMITH, 1996, p. 227).
O desenvolvimento de uma nação tende a elevar a produção agrícola e,
conseqüentemente, aumentar a renda da terra. Smith defende que a riqueza da terra é
fundamental para o progresso de uma nação. Neste caso, o aumento da parcela da renda do
proprietário da terra reflete a evolução e o progresso de uma nação, pois “Tudo que fomenta
ou obstrua o interesse do proprietário da terra necessariamente fomenta ou obstrui o interesse
da sociedade” (SMITH, 1996, p. 227). Como defende Smith, o interesse dos proprietários da
terra está inseparavelmente ligado ao interesse da sociedade.
3.4 Smith e os rendimentos econômicos crescentes
Segundo a visão de Adam Smith, o rendimento crescente é uma característica da
organização econômica e social de uma sociedade que estrutura sua formação na divisão do
trabalho. Tal fato é o que permite que uma economia desenvolva-se a taxas crescentes. A
argumentação de Adam Smith em relação ao efeito multiplicador da produção das terras de
melhor fertilidade em relação a terras de menor fertilidade é uma posição que defende
explicitamente os rendimentos crescentes da terra. Segundo Smith (1996, p. 159), “A
33
numerosa mão-de-obra empregada em uma cultura necessariamente estimula a outra,
garantindo um mercado pronto para seus produtos”. Ou seja, o efeito multiplicador que a
atividade agrícola das terras mais férteis ocasiona nas terras de menor fertilidade só se
concretiza em função da fertilidade, mesmo que em grau menor, das novas terras a serem
exploradas. Mesmo que existam diferenças de fertilidade entre as terras de maior e de menor
fertilidade, as terras de menor fertilidade ainda têm uma função econômica importantíssima
para a sustentação do desenvolvimento econômico de um país. São elas que proporcionam,
na análise smithiana, bens relacionados à moradia e vestuário. São os seus rendimentos
crescentes, mesmo que em grau menor que as terras de maior fertilidade, que proporcionam
os demais bens necessários a uma população que cresce sem cessar.
Segundo Adam Smith, é a fertilidade crescente da terra que proporciona segurança e
“estrutura” necessária para o aumento da produção agrícola nas terras de menor qualidade de
uma nação. Na passagem a seguir, o autor mantém sua defesa em relação à importância da
fertilidade crescente da terra e seu efeito benéfico para a economia de uma nação.
O aumento da quantidade de gado e o aprimoramento da terra são duas coisas que
devem andar de mãos dadas, sendo que uma nunca pode avançar mais que a outra.
Sem algum aumento da quantidade de gado, dificilmente poderá haver qualquer
melhoria na terra, mas pode haver um aumento considerável da quantidade de
gado apenas em conseqüência de um melhoramento considerável da terra; porque,
de outra maneira, a terra não poderia mantê-lo (SMITH, 1996, p. 207).
Existe uma relação positiva entre o aprimoramento da atividade agrícola e o
crescimento da população. Para o autor, a maior fertilidade da terra e, conseqüentemente, a
maior produção de alimentos permite que a população possa crescer a taxas compatíveis com
a oferta de alimentos. Ou seja, o risco de desabastecimento alimentar para uma população que
cresce sem parar é nulo em função dos rendimentos crescentes da produtividade da terra.
Conforme citação a seguir:
O número de trabalhadores cresce proporcionalmente ao aumento da quantidade de
alimento, ou seja, ao crescente aprimoramento e cultivo das terras; e que a
natureza de suas ocupações permite a máxima subdivisão de trabalho, a quantidade
de matérias que podem elaborar aumenta em proporção muito maior do que seu
número (SMITH, 1996, p. 167).
A riqueza e o progresso de uma nação proporcionam o aumento da remuneração
salarial e da renda da terra, visto que os rendimentos crescentes da economia atuam para
aumentar a riqueza de uma nação e, conseqüentemente, aumentar os rendimentos dos
34
trabalhadores e dos proprietários das terras. Ou seja, o nível dos rendimentos dos
trabalhadores, por exemplo, está relacionado ao progresso ou declínio de uma nação,
conforme passagens a seguir:
A proporção entre a remuneração real do trabalho em países diferentes importa
relembrar é naturalmente regulada, não pela riqueza ou pobreza efetiva, mas pelo
seu estado de progresso, de declínio, ou pela sua situação estacionária (SMITH,
1996, p. 185).
A diferença entre o preço da mão-de-obra em dinheiro na China e na Europa é ainda
maior do que a diferença entre o preço dos mantimentos em dinheiro, nas duas
regiões, pois a remuneração real do trabalho é mais elevada na Europa do que na
China, já que a maior parte da Europa está desenvolvida, ao passo que a China ainda
parece estacionária (SMITH, 1996, p. 185).
Neste caso, a remuneração dos trabalhadores na óptica smithiana acompanha o
progresso e o desenvolvimento econômico, visto que a maior demanda por mão-de-obra
proporciona uma melhor posição da classe trabalhadora para exigir melhores níveis salariais,
pois:
[...] Com efeito, o preço da mão-de-obra em dinheiro aumentou na Grã-Bretanha
durante o curso do século atual. Isso, porém, parece ter sido o efeito, não tanto de
alguma diminuição no valor da prata no mercado europeu, mas antes do aumento da
demanda de mão-de-obra na Grã-Bretanha, devido ao grande e mais ou menos geral
aumento da prosperidade do país (SMITH, 1996, p. 192).
Smith aborda que a possibilidade de aumento da taxa de lucro dos capitalistas é o
motivo que leva os mesmos a aprimorarem as técnicas de produção, assim como a
expandirem a produção em direção a terras ainda não exploradas. O ponto em que os agentes
econômicos desencadeiam suas técnicas de produção com intuito de auferir uma maior taxa
de lucro com base nos rendimentos crescentes inerente das terras de uma nação, por exemplo,
é mostrado na citação a seguir:
O aumento do preço paga maior quantidade de trabalho, de cuidado e de limpeza. O
negócio se torna mais convidativo para o agricultor, melhorando gradualmente a
qualidade do produto. Ao final, o preço sobe tanto que vale a pena empregar uma
parte das terras mais férteis e melhor cultivadas para criar gado somente para
comercializar laticínios; quando o preço chega a essa altura, dificilmente poderá
aumentar. E se aumentasse logo se destacaria mais terras para este fim (SMITH,
1996, p. 211).
35
A expansão da produção em direção a novas terras pode levar à redução do nível dos
preços dos produtos a serem cultivados. O aprimoramento da produtividade da terra tende a
baixar o nível dos preços visto que os avanços das técnicas de produção introduzem [...]
muitos tipos de alimentos vegetais, os quais, exigindo menos terra e não exigindo mais mão-
de-obra do que os cereais são vendidos mais baratos” (SMITH, 1996, p. 222).
O avanço das técnicas de produção no campo, como dito no decorrer deste trabalho,
libera a mão-de-obra do campo para a atividade industrial e, desta forma, o processo de
divisão do trabalho, em que toda a economia de uma nação está inserida, acaba requerendo
esta mão-de-obra excedente do campo para as atividades industriais e urbanas de uma nação.
Ou seja, todo o processo de divisão e especialização do trabalho começa na fertilidade natural
e artificial (aquela proporcionada pelo avanço das técnicas de produção) da terra. Para Smith
(1996, p. 166):
Entretanto, quando, em razão do aprimoramento e do cultivo da terra, o trabalho de
uma família é capaz de produzir alimentos para duas, basta o trabalho da metade da
sociedade para prover de alimentos o país inteiro.
3.5 Os enfoques da renda da terra na óptica de Smith
A teoria da renda da terra de Adam Smith mostra a possibilidade da existência de
quatro enfoques da renda da terra. A renda de monopólio é caracterizada por ser representada
como o pagamento do capitalista ao proprietário pelo direito de propriedade da terra, ou seja,
é a renda relacionada ao fato das terras férteis não estarem disponíveis na natureza em
quantidade ilimitada e, também, terem sua propriedade privada pertencente à figura do
proprietário das terras.
O segundo tipo de explicação para a renda da terra é a idéia da renda absoluta. A renda
absoluta relaciona-se ao fato de que produtos cultivados acima do solo possuem o pagamento
da renda relacionada positivamente com a fertilidade da terra. Nesse caso, a renda está
relacionada diretamente com a aplicação do progresso técnico e de acordo com a fertilidade
natural da terra. Quanto maior for a fertilidade natural ou provocada da terra, maior será o
pagamento da renda ao proprietário da terra.
36
A renda relativa é a terceira visão de renda da terra para Adam Smith. Este tipo de
renda relaciona-se com os produtos extraídos abaixo do solo (cobre, ouro, prata, diamante e
etc.). A renda relativa relaciona-se com o fato de que produtos obtidos abaixo do solo
possuem sua fertilidade dada como uma dádiva da natureza. Como neste caso o trabalho do
homem não pode alterar as quantidades disponíveis na natureza, o pagamento da renda da
terra acaba sendo uma função da diferença de fertilidade entre terras mais e menos férteis.
O quarto tipo de explicação para a renda da terra na visão smithiana é caracterizado
pela renda do tipo concorrencial e também é a explicação e complementação da existência da
renda do tipo relativa. A renda concorrencial é dada em uma situação como a anteriormente
citada, ou seja, em casos relacionados a produtos fornecidos em quantidades limitadas pela
natureza como cobre, ferro, prata, ouro, diamante entre outros. Contudo, a explicação
concorrencial pode se aplicar à renda da terra obtida no cultivo dos produtos agrícolas. Isso
ocorre quando esses o obtidos em terras com diferença de produtividade e custos e os
produtores/proprietários de maior produtividade praticam e induzem baixos preços para
expandir suas vendas e o montante absoluto de seus lucros e rendas totais.
A diferença de produtividade entre as terras mais e menos férteis permite que as
rendas pagas nas terras de maior fertilidade possam ser rebaixadas (em conjunto com a
margem de lucro) e, desta forma, seja evitada a extração de minérios em terras de menor
fertilidade ou deslocada do mercado a produção agrícola de maior custo. Esses casos
exemplificam bem o poder de mercado que os proprietários e os capitalistas das terras de
maior fertilidade têm em usar a queda de suas remunerações por unidade de produto para
tornar inviável a extração de matérias-primas e a produção agrícola em terras de menor
produtividade, em virtude dos maiores custos de produção em terras menos produtivas.
Estas supostas quatro teorias da renda da terra são, na verdade, uma forma de analisar
a relação entre a terra (e sua fertilidade) e o progresso econômico de uma nação. São quatro
abordagens (ou diferentes enfoques) de uma teoria econômica que contempla aspectos
relacionados à hierarquia das necessidades, fertilidade absoluta, fertilidade relativa,
rendimentos crescente, concorrência econômica, progresso cnico, crescimento populacional
entre outros. O dinamismo da análise da teoria da renda da terra de Adam Smith permite que
possamos explorar a riqueza das suas idéias e encontrar uma teoria que possua um amplo
encadeamento com diversas variáveis econômicas. Ou seja, a teoria da renda da terra
smithiana possui uma profundidade e uma interligação com diversos aspectos econômicos
fundamentais ao estudo do desenvolvimento econômico das nações.
37
4 RENDIMENTOS CRESCENTES, PROGRESSO TÉCNICO E
DESENVOLVIMENTO: ELEMENTOS PARA UM CONFONTO ENTRE AS
TEORIAS DA RENDA DA TERRA DE DAVID RICARDO E DE ADAM SMITH
Os rendimentos decrescentes em uma economia são concretizados, entre outros
fatores, quando o capital, a terra e o trabalho não aumentam suas quantidades incorporadas no
processo produtivo de uma forma integrada e homogênea. Isto significa defender que, por
exemplo, aumentos nas quantidades aplicadas de capital e de trabalho que não tenham uma
contrapartida na expansão da fronteira agrícola e/ou da produtividade da terra podem fazer
com que o desajuste na ampliação dos fatores de produção leve ao aparecimento de
rendimentos decrescentes no setor agrícola. Todavia, o aperfeiçoamento das técnicas de
produção pode tornar a terra mais produtiva e evitar o retorno decrescente da produção
agrícola. Conforme Blaug (1989, p. 125):
[...] a extensão do cultivo é um processo temporal, e as técnicas evoluem sempre
com o decorrer do tempo; neste caso, mesmo quando a fertilidade de todas as terras
que estão ainda por cultivar é conhecida e está corretamente avaliada, um
aperfeiçoamento da tecnologia pode fazer com que uma terra que até então era
considerada inútil passe a ser rendível.
4.1 Rendimentos crescentes, avanço produtivo, divisão do trabalho e expansão dos
mercados
O processo de desenvolvimento econômico está ligado à expansão dos mercados
consumidores de uma nação. O crescimento populacional, a inserção desta no mercado de
trabalho e a expansão da renda dos cidadãos tendem a elevar o poder de compra dos mercados
consumidores e, conseqüentemente, os setores econômicos são impulsionados pela divisão do
trabalho e pela especialização das tarefas. Este processo de divisão do trabalho não se
exclusivamente no setor industrial de uma nação. Toda a economia entra em um processo
contínuo de divisão e especialização do trabalho. Dessa forma, a agricultura também é
38
beneficiada com a ampliação dos mercados e, conseqüentemente, com a divisão do trabalho.
Os rendimentos crescentes do processo de produção de determinado setor significam que a
ampliação das quantidades da terra, do capital e do trabalho aplicados na economia tenderá a
trazer retornos mais do que proporcionais na produção. Isto significa dizer, por exemplo, que
a duplicação das quantidades de terra, do capital e do trabalho em um determinado setor terá
que trazer retornos na produção acima do dobro. A formulação abaixo explica melhor o
significado dos retornos crescentes:
Função de Produção:
F(x,y) = (x*y)*ß
Duplicação dos fatores de produção: (2*x*2*y)*ß.
Rendimentos Crescentes:
(2*x*2*y)*ß
<
F(2x,2y).
A representação matemática anterior mostra que a duplicação das quantidades de X e
Y no processo produtivo tenderá a resultar em um F(2x,2y) maior que (2*x*2*y)*ß. A análise
dessa situação mostra que existem ganhos na aplicabilidade conjunta de capital e trabalho que
proporcionam um rendimento (ou resultado) superior à simples multiplicação das variáveis X
e Y. Tal fato pode estar relacionado à inovação tecnológica, ao uso de insumo mais produtivo
que o anteriormente usado, a uma melhor organização da estrutura produtiva, entre outros
motivos. A elevação da produtividade de apenas um dos fatores de produção pode trazer no
curto-prazo ganhos crescentes na produção, todavia no médio e no longo-prazo existirá um
limite para continuação dos rendimentos. Tal limite poderá impor uma nova situação de
rendimentos constantes e, até mesmo, rendimentos decrescentes no processo produtivo e
agrícola de um país.
Schumpeter defende que os rendimentos não podem ser analisados como estáticos. Os
rendimentos tendem a evoluir e progredir com o avanço da produtividade dentro do processo
histórico de desenvolvimento econômico, pois:
[...] rendimentos históricos crescentes não podem, como os autênticos, ser
representados por qualquer curva ou lei”, menos ainda por uma curva sobre a qual
se pode ir para frente e para trás. Novos níveis de técnica são alcançados no decorrer
do processo histórico irreversível e não se revelam até serem realmente atingidos
(SCHUMPETER, 1964, p. 331).
39
O avanço das técnicas de produção e a maior destreza dos trabalhadores tendem a
trazer ganhos irreversíveis para o processo econômico e estes tendem a afetar a produtividade
econômica da agricultura, da indústria e dos serviços. Esse aumento de produtividade é o que
proporciona os rendimentos crescentes na economia. Em outra passagem de sua “História da
Análise Econômica”, Schumpeter aponta que sem a aplicação das técnicas que aumentem a
produtividade da terra, essa proporcionará retornos progressivamente menores. Assim:
[...] como a população cresce, solos cada vez mais pobres serão oferecidos ao
cultivo, aplicados a esses solos progressivamente tornados mais pobres quantidades
iguais de esforço produtivo, darão como resultado colheitas progressivamente
menores (SCHUMPETER, 1964, p. 328).
Analisar a renda da terra e sua relação com o desenvolvimento econômico e social de
uma nação requer que outros aspectos da realidade econômica sejam estudados com
profundidade. A análise de Ricardo peca em não abordar a inovação das técnicas de produção
com a devida profundidade dentro do setor agrícola de uma nação. Não parece adequado
estudar o desenvolvimento econômico e não dar a importância devida ao progresso técnico do
setor agrícola. O progresso técnico deve ser estudado dentro de uma economia como um todo.
Ou seja, as inovações nas técnicas de produção e trabalho não são exclusivas do setor
industrial de um país. O estudo da agricultura e da renda da terra deve ser analisado em
conjunto com o progresso técnico e com o desenvolvimento de uma nação. Abstrair os
avanços das técnicas de produção no estudo da renda da terra é o mesmo que “desligar-se” do
mundo real e analisar a economia como uma modelação teórica incompatível com a economia
real.
Além do progresso técnico, é importante analisar, concomitantemente com a renda da
terra, o crescimento da população, a expansão dos mercados e a divisão do trabalho no
contexto histórico de uma nação. Isto significa compreender a relação dessas variáveis com a
análise da produtividade da terra. O fato de uma economia aumentar a sua população a taxas
significativas de um ano ao outro necessariamente requer a expansão da produção agrícola
para servir de suporte ao aumento populacional de uma nação. Na análise ricardiana, as forças
produtivas da agricultura como propulsora do progresso da nação e da sociedade acabam não
sendo analisadas com a ênfase e a importância necessárias em uma abordagem do
desenvolvimento econômico.
O ponto em questão é que a agricultura é fundamental para o progresso de uma nação,
pois as forças produtivas envolvidas nesta atividade são como uma “infraestrutura” necessária
40
ao desenvolvimento, a expansão dos mercados e a divisão do trabalho em toda a economia.
Para que a divisão do trabalho ocorra é necessário que a economia esteja em processo de
desenvolvimento. A divisão do trabalho é concretizada se ocorre à expansão dos mercados,
pois a expansão do mercado e o aumento da demanda de uma nação é que levam os
capitalistas a aumentarem a produção e a produtividade de suas fábricas, via especialização
das tarefas dentro do processo produtivo e agrícola de um país. Ou seja, a análise da renda da
terra deve ser realizada em conjunto com a análise da divisão do trabalho e da expansão dos
mercados dentro do processo de desenvolvimento econômico.
4.2 Progresso Técnico na Agricultura
O progresso técnico na agricultura foi o que proporcionou à economia mercantil
desenvolver-se, ao liberar a mão-de-obra do campo para o setor industrial e, posteriormente,
para o setor de serviços. Outro ponto importante do progresso técnico da agricultura refere-se
ao fornecimento de matérias-primas e alimentos para os demais setores da economia e,
respectivamente, para uma população em crescimento. Dentro desta análise é importante
verificar com uma maior precisão o conceito de progresso técnico no setor primário da
economia.
O progresso técnico na agricultura serve como um instrumento pelo qual o capital
acaba rompendo as barreiras que a natureza impõe ao desenvolvimento de uma economia. Ou
seja, o progresso das técnicas de produção permite que o homem possa “domar” a natureza
em prol de seus interesses e faz com que a mesma aumente sua capacidade produtiva e desta
forma sirva de suporte para o desenvolvimento econômico. Para Silva, as inovações
biológicas são fundamentais para tal processo. Assim:
Daí a relevância que assumem as inovações biológicas, as quais constituem a base
do processo que levam o capital a superar as barreiras naturais que encontra para seu
desenvolvimento no campo (SILVA, 1981, p. 3).
Para Silva a propriedade privada da terra nada mais é que um monopólio sobre um
meio de produção. A renda diferencial de uma terra é “[...] obtida pelos capitais que operam
em condições mais favoráveis de produção” (SILVA, 1981, p. 9). O autor defende, conforme
41
citação, que o trabalho aplicado nas terras mais produtivas permite a geração de um excedente
adicional além do nível dos salários e dos lucros, contrapondo a idéia de que a fertilidade
relativa por si só determina a renda da terra.
É importante ressaltar que não é a terra em si mesma, pelas suas diferenças de
qualidade, a causa da renda diferencial, mas sim o fato de que o trabalho aplicado às
terras melhores tende a ser mais produtivo, permitindo com isso a geração de um
lucro adicional (SILVA, 1981, p. 9).
A renda diferencial pode ser caracterizada como uma fração natural em virtude das
diferenças de localização e de fertilidade do solo, ou pode estar caracterizada por uma fração
“fabricada” em virtude dos capitais aplicados a terra resultarem em um aumento de sua
produtividade. A fração “fabricada” entende-se como resultado das inovações biológicas,
química, físicas e mecânicas aplicadas à agricultura. Ou seja, tais inovações tendem a
aumentar a fertilidade das terras férteis e também a melhorar a fertilidade em terras de
menor qualidade. Isto significa que a renda diferencial pode estar relacionada tanto à
fertilidade natural da terra, quanto à fertilidade associada à aplicação do progresso técnico na
agricultura.
O progresso técnico aplicado pelos capitalistas na agricultura tende a ser como um
mecanismo de aumento da fatia do lucro em virtude das restrições naturais da terra. O
progresso técnico nada mais é que a forma que o capitalismo encontrou em prol de sua
evolução como sistema econômico. Sem progresso técnico na agricultura não existiriam pré-
condições para o avanço e o progresso do desenvolvimento econômico. Silva acredita que o
progresso técnico é uma forma do capital contrapor-se à tendência declinante da taxa de lucro.
Assim:
O progresso técnico, portanto, da mesma maneira que se expressa pelo crescimento
da composição orgânica e pelo aumento da produtividade social do trabalho, atua
como um meio do capital contrapor-se à tendência declinante da taxa de lucro.
(SILVA,1981, p. 26).
O crescimento da população exige um aumento da produção agrícola para que a
mesma possa ter à sua disposição uma oferta de alimentos no nível da demanda existente em
virtude do crescimento demográfico. O aumento da produção pode-se dar tanto de uma forma
extensiva, como de uma forma intensiva nas terras disponíveis para a atividade agrícola. A
forma extensiva constitui-se em estender a produção agrícola rumo às terras antes não
42
exploradas. A forma intensiva constitui-se em aumentar a produção agrícola nas terras
existentes sem a necessidade de ampliar a produção rumo a novas terras. Partindo da análise
de que as terras disponíveis para uma nação são limitadas em sua extensão, o crescimento da
população de uma nação tende a exigir a intensidade da produção agrícola nas terras
existentes. Claro que o capitalismo pode expandir-se em direção às novas terras; todavia,
dependendo da taxa de crescimento da população, faz-se necessária a busca e a implantação
do progresso técnico na agricultura, para que a atividade agrícola forneça a quantidade
necessária de alimentos e matérias-primas com o crescimento da população.
O crescimento da população também tem relação com os avanços nas técnicas de
produção agrícola e, conseqüentemente, com os rendimentos crescentes da agricultura em
virtude de tal aumento da população gerar elevação da demanda por alimentos. Desta forma,
melhores técnicas de produção no campo são buscadas pelos capitalistas para que os mesmos
possam ampliar a produção agrícola e, conseqüentemente, sua margem de lucro. Ou seja, o
aumento da população desencadeia um aumento da demanda e, desta forma, a existência de
um mercado a ser explorado pelos capitalistas. Esse mercado em potencial, associado às
restrições naturais da fertilidade da terra, desencadeia o avanço e o progresso técnico na
agricultura. Terras antes com uma menor fertilidade podem, através do avanço e da aplicação
de técnicas modernas de cultivo, tornar-se solos de maior e de melhor fertilidade. Conforme
Boserup (1987, p. 21):
Populações em crescimento podem ter, no passado, destruído mais do que
aperfeiçoado as terras que cultivaram. Mas não razão para extrapolar tendências
do passado, porque cada dia sabemos mais a respeito de métodos de preservação do
solo e podemos, portanto, usando as técnicas modernas, recuperar para o cultivo
muito da terra que nosso antepassados tornaram estéril.
A aplicação da tecnologia e do progresso da ciência na agricultura tende a aliviar as
restrições sobre a produção. O avanço da ciência e sua aplicabilidade sobre os métodos de
produção agrícola tendem a subordinar a agricultura ao avanço da economia. Neste caso, a
agricultura torna-se agente passivo dentro do processo de desenvolvimento econômico. A
importância da produtividade agrícola foi fundamental para, por exemplo, o aumento do
excedente dos consumidores e para a industrialização japonesa. Segundo Hayami e Ruttan
(1985, p. 263-64):
43
O crescimento da produtividade na agricultura, o setor dominante na economia, foi
exigido, não para contribuir para o bem-estar social, aumentando o excedente dos
consumidores, mas também como elemento essencial para financiar a
industrialização e várias medidas de modernização.
Em outra passagem, Hayami e Ruttan apontam que, no período Meiji, o Japão aliou o
avanço da tecnologia e o desenvolvimento da agricultura para que o crescimento da
produtividade agrícola servisse como suporte para o processo de desenvolvimento econômico
do Japão. Assim:
O sucesso de crescimento da produtividade agrícola, no período Meiji, foi alcançado
através de uma reorientação da política de desenvolvimento agrícola, na direção do
desenvolvimento de uma tecnologia apropriada à disponibilidade de recursos no
Japão. A interação efetiva entre agricultores e cientistas foi encorajada
deliberadamente, como parte do processo de seleção, adaptação e difusão da melhor
tecnologia nativa (HAYAMI e RUTTAN, 1985, p. 269).
O processo de desenvolvimento do capitalismo requer, antes do avanço do processo de
industrialização, o desenvolvimento das forças produtivas na agricultura e, conseqüentemente,
o avanço das técnicas de produtividade no setor primário da economia. O progresso técnico na
agricultura é essencial para que o setor agrícola cumpra com suas funções primordiais de base
para o desenvolvimento do sistema capitalista.
Assim, as inovações tecnológicas na agricultura, que permitiram essa transferência
de recursos formam a base principal da industrialização e do desenvolvimento
econômico global, especialmente na sua fase inicial (HAYAMI e RUTTAN, 1985,
p. 284).
O desenvolvimento econômico é possível quando a agricultura insere-se dentro do
mercado. A expansão da população, o aumento da demanda, a intensificação da produção
capitalista e o processo de divisão do trabalho tendem a levar os capitalistas a organizar a
produção em um vel de maior eficiência e a modernizar suas técnicas de produção com o
intuito de aumentar sua taxa de lucro. A inserção da atividade agrícola no sistema capitalista e
a subordinação da agricultura às regras de mercado são essenciais para o progresso de um
país. Segundo Hayami e Ruttan, Ricardo, ao não abordar com a ênfase necessária a evolução
agrícola, torna-se “[...] demasiado pessimista a respeito do potencial do progresso tecnológico
na agricultura” (HAYAMI
e
RUTTAN, 1985, p. 13). O desenvolvimento requer a alocação
eficiente dos fatores de produção com o intuito de aumentar a produtividade do trabalho.
44
Logo, nada mais sensato que entender o progresso técnico da agricultura como o aumento da
produtividade do trabalho com vista à elevação da produção agrícola.
O desenvolvimento econômico e a ampliação do bem-estar da sociedade são
relacionados por muitos economistas com o processo de industrialização de uma economia. O
desenvolvimento do capitalismo requer a industrialização de uma nação. Este conceito é bem
forte entre os economistas. Qualquer nação que queira avançar em termos de desenvolvimento
econômico deveria iniciar um processo de industrialização de seu sistema econômico.
Todavia, antes deste processo é de fundamental importância que o avanço das técnicas de
produção penetre no setor agrícola, para que o mesmo sirva de “infraestrutura básica” para o
processo de industrialização de uma nação. Sem o progresso sincronizado do setor agrícola
com a industrialização, dificilmente uma nação conseguirá desenvolver sua economia e
intensificar suas forças produtivas. A estagnação das técnicas agrícolas gera um ponto de
estrangulamento na economia, com conseqüências sérias para o desenvolvimento econômico
e a distribuição de renda.
Quando o sistema capitalista inseriu o agricultor na lógica do mercado, o mesmo,
como agente econômico, tende a ser movido pelo lucro. Em um cenário de razoável
concorrência, nada mais natural que o mesmo tenha o objetivo de aumentar a sua produção e
reduzir os seus custos (com vista a uma maior taxa de lucro) com a busca de técnicas mais
modernas de produção na utilização da terra, do capital e do trabalho. O agricultor, quando
entra na lógica do mercado, tende a ter um comportamento natural de busca do lucro via
inovação das técnicas da produção de sua propriedade.
Com o desenvolvimento das técnicas de produção, a evolução do sistema econômico
mostra que o homem conseguiu exercer o domínio sobre a terra e seus recursos naturais e,
desta forma, utilizá-los como ferramenta para o desenvolvimento da economia e da sociedade.
Ou seja, a evolução do homem, antes mesmo do aparecimento da escrita até os dias atuais,
mostra o grau de controle da natureza em prol do benefício da humanidade. Essa evolução
teve como ponto de partida o controle dos recursos naturais proporcionados pelo planeta. Sem
este domínio, o mundo e o homem em sociedade não teriam chegado ao estágio atual de
desenvolvimento. A apropriação do solo e o surgimento de um excedente econômico são as
bases materiais e sociais das primeiras civilizações agrícolas. Segundo Corazza e Martinelli
(2002, p. 9):
45
Com o desenvolvimento da agricultura, o homem fixou-se ao solo e apropriou-se da
terra. Com isso, surgiu à divisão social do trabalho e a divisão da sociedade em
classes, os conflitos de interesses e o poder político do Estado. Criaram-se, assim, as
bases materiais, sociais e políticas das primeiras civilizações agrícolas.
A busca deste excedente agrícola na forma de lucro é resultado do processo de
inserção da atividade agrícola na lógica do mercado. Conforme Corazza e Martinelli (2002, p.
10), “Em resumo, se, no início da história econômica, a agricultura tinha por finalidade
produzir alimentos, no final, seu objetivo passou a ser produzir dinheiro através da produção
de alimento”. A passagem da agricultura familiar e de subsistência para a agricultura
capitalista nada mais é que a acumulação do capital, a aplicação do progresso técnico e a
busca do lucro na atividade agrícola.
4.3 O confronto das análises de Adam Smith e de David Ricardo
Ricardo avaliou que o fato de existirem terras livres que não pagassem renda não
afetaria a sua teoria, pois a escassez de terras férteis seria a justificativa para a existência da
renda. Ou seja, o diferencial de fertilidade das terras mais e menos produtivas é o
determinante do surgimento da renda da terra na análise ricardiana.
A teoria ricardiana da renda da terra deixa o crescimento econômico condenado, pois
sua teoria sustenta que a escassez de terras férteis fatalmente limitará o processo de
desenvolvimento econômico. Conforme Blaug (1989, p. 137), “No cerne do sistema de
Ricardo, encontra-se a noção de que o crescimento econômico está condenado a acabar, mais
cedo ou mais tarde, devido à escassez de recursos naturais”. A renda da terra não
desapareceria com a limitação da terra, pois a mesma é determinada pela diferença de
fertilidade entre a terra de maior e de menor fertilidade. Todavia, com o aumento
populacional, com certeza, a ausência do progresso técnico na atividade agrícola seria um
limite para a expansão da população e para o processo de desenvolvimento econômico.
Caso se considere os rendimentos decrescentes como algum ponto a ser alcançado no
sistema econômico, dados os fatores de produção disponíveis, pode-se considerar que
realmente os rendimentos tornar-se-ão decrescentes ao longo de seu processo e um ponto de
“steady state” pode ser alcançado com o crescimento da economia, sem a alavanca do
46
progresso técnico como fator de condução da multiplicação da produtividade do capital, do
trabalho e da terra. Todavia, o progresso técnico pode ter, como conseqüência, o
deslocamento de uma função de produção para um ponto mais alto, impedindo, desta forma, o
alcance do nível de estado estável na economia em um certo período de tempo.
Mesmo que uma função de produção tenda a iniciar sua curva com retornos
crescentes, alcançando um ponto de inflexão e, logo após, iniciando uma trajetória de retornos
decrescentes, o progresso técnico tende a deslocar a curva de produção para pontos cada vez
mais altos. Nesta situação, mesmo que, em uma análise estática, realmente existam os
chamados retornos decrescentes, a analise dinâmica e histórica da economia mostra que o
progresso técnico desloca a função de produção para cima, evitando desta forma que a
economia caminhe rapidamente para o nível de retornos decrescentes. Se os níveis de
produção deslocam-se para cima, “[...] não razão por que as diferenças entre estes
sucessíveis níveis cresçam menos [...]” (SCHUMPETER, 1964, p. 331). Para Schumpeter
(1964, p. 331) “[...] não lei de rendimentos decrescentes para o progresso tecnológico”. A
análise do progresso técnico é dinâmica. A análise estática do sistema econômico não permite
que o progresso das técnicas de produção seja analisado de acordo com o seu grau de
importância no processo produtivo.
A expansão econômica requer o aumento da produção, o progresso tecnológico e a
realização de rendimentos crescentes na economia de uma nação. A incorporação dos
rendimentos crescentes acaba alavancando um círculo virtuoso na economia visto que
rendimentos crescentes e progresso técnico ocasionam aumento da produtividade, da
produção e dos rendimentos dos capitalistas, dos proprietários e dos trabalhadores. Taxas
crescentes de rendimentos estão associadas às economias dinâmicas, pois, ao contrário das
economias estáticas, as economias dinâmicas relacionam-se a deslocamentos da função de
produção para pontos cada vez mais altos. Neste caso, rendimentos decrescentes ao longo de
uma função estática acabam transformando-se em rendimentos crescentes ao longo de uma
função dinâmica de produção. A análise das economias estáticas e dinâmicas tem relação com
o enfoque de curto e de longo prazo. Economia estática refere-se ao curto prazo, e economia
dinâmica refere-se ao longo prazo.
Na teoria da renda da terra de Ricardo, a parte que cabe ao lucro dos capitalistas teria
sua fatia relativa reduzida da produção total de uma nação concomitante com o processo de
acumulação de capital. A taxa de lucro decresceria ao longo do processo de expansão da
produção em direção às novas terras e, conseqüentemente, a parte relativa dos salários e da
47
renda da terra teria sua ampliação como proporção da renda nacional. Em sua análise da teoria
ricardiana, Blaug indica que Ricardo sustentava que a “[...] taxa de lucro cairia numa
economia em crescimento, mas também que a parte relativa dos lucros no rendimento total
decresceria, e que quer a parte do trabalho quer a parte da terra cresceriam” (BLAUG, 1989,
p. 154). A melhora na produtividade técnica para Ricardo poderia vir de uma inovação
poupadora de terras, como a melhor rotação das culturas, ou uma melhora na aplicação de
adubos, além de uma inovação poupadora de capital e trabalho, como a aplicação de
modernas máquinas e equipamentos na atividade agrícola. Por mais que Ricardo tenha
abordado que o progresso técnico pode aumentar a fertilidade da terra e evitar a queda da taxa
de lucro, a ênfase e a importância do progresso técnico na agricultura não é o centro da
atenção de Ricardo. Preocupado muito mais com sua modelação teórica dos rendimentos
decrescentes, Ricardo não levou em consideração que o progresso técnico é fator fundamental
de análise quando se estuda os rendimentos e a fertilidade da terra ao longo do processo
histórico de desenvolvimento.
Segundo Blaug, a inovação poupadora de terras e a inovação poupadora de capital e
trabalho trazem uma melhora econômica para a nação em virtude da manutenção das taxas de
lucros a níveis satisfatórios. Nas palavras de Blaug (1989, p. 159), “O primeiro, conclui
Ricardo, faz diminuir as rendas por hectare, bem como a parte da renda, enquanto o segundo
faz diminuir as rendas nominais totais, mas não necessariamente as rendas totais expressas em
termos de trigo”.
O modelo de Ricardo “[...] pretendia demonstrar a ineficiência das leis dos cereais, que
protegiam os agricultores britânicos através da proibição da importação de trigo, excepto em
anos de penúria e preços elevados” (BLAUG, 1989, p. 160). A análise crítica do autor
considera que “Certamente, Ricardo mostra muito pouco interesse nas mudanças estruturais
de uma economia no longo prazo, tema para qual Adam Smith contribuiu com algumas das
suas melhores análises” (BLAUG, 1989, p. 160). A análise crítica sobre Ricardo é que o
sistema econômico tende encaminhar-se “[...] suavemente para o estado estacionário, sem
qualquer obstáculo por parte de uma carência da procura efectiva” (BLAUG, 1989, p. 184).
A análise de Ricardo sobre a renda da terra não aborda com a ênfase necessária o
progresso técnico e sua importância para o desenvolvimento da agricultura. A análise
ricardiana parece supor que o desenvolvimento econômico possui um limite à sua evolução
que não condiz com a realidade econômica e social. Supor que o homem não possa alterar a
fertilidade das terras férteis e criar fertilidade nas terras menos e não férteis traz a noção de
48
que a humanidade teria aqui um obstáculo natural ao seu progresso econômico e social. Neste
quesito, a análise de Smith supera a de Ricardo em função da incorporação da fertilidade da
terra como algo a ser controlado e superado pelo progresso técnico aplicado à agricultura,
como parte do processo de desenvolvimento econômico.
Ricardo defende que a solução para o problema da compressão da taxa de lucro em
virtude do aumento da renda e do nível dos salários seria a importação de alimentos de outra
nação. Mas se a produção agrícola desta outra nação começasse a expandir-se em direção a
terras de menor fertilidade e, conseqüentemente, a taxa de lucro iniciasse uma trajetória de
declínio, qual seria a solução ricardiana para este problema? A solução de Ricardo poderia ser
a busca de uma terceira nação que produzisse trigo e exportasse tal produção, todavia outro
processo de declínio da taxa de lucro teria início. Em função disso é que Ricardo “amarraa
economia a uma tendência estacionária de sua produção. Ou seja, a economia ricardiana da
renda da terra é a própria economia da estagnação. Neste caso, chegaria um ponto em que
todas as terras teriam sua fertilidade limitada e não haveria terras disponíveis que pudessem
produzir alimentos para uma população em crescimento e desta forma haveria uma
compressão generalizada das taxas de lucro e, conseqüentemente, a economia entraria em
uma trajetória de estacionaridade.
Um ponto de destaque da teoria de Smith, e que desta forma supera a teoria ricardiana,
é a idéia de que as terras mais férteis têm o poder de gerar um efeito multiplicador nas terras
de menor fertilidade. Segundo esta posição de Smith, terras destinadas à produção de trigo ou
alimento para gado tendem a gerar demanda para a produção de terras secundárias. Estas
terras secundárias teriam a função de produzir produtos relacionados a vestuário e a moradia,
com o intuito de suprir a necessidade dos trabalhadores das terras mais férteis. Ou seja, o
progresso das terras mais férteis acaba levando ao aumento da produção das terras de menor
fertilidade em função do efeito multiplicador (apesar de Smith não utilizar este termo) sobre
as mesmas. A análise ricardiana acaba não visualizando a função das principais terras de uma
nação em alavancar a produção de outras terras. Para Ricardo, o principal produto agrícola de
uma nação pode ter o poder de comprimir a taxa de lucro dos capitalistas. Na análise de
Smith, a principal atividade agrícola de um país, ao invés de comprimir a taxa de lucro, irá
alavancar a atividade agrícola de outras terras e, desta forma, alavancar o desenvolvimento
econômico via efeito multiplicador.
Uma questão abordada por Smith relaciona-se à existência de três tipos de produtos. O
ponto mais importante é que os bens de segundo tipo são aqueles em que o homem, através do
49
avanço das técnicas de produção sobre a terra, consegue aumentar a oferta dos mesmos bens
para suprir a demanda que cresce em função do desenvolvimento econômico. Smith, além
deste bem de segundo tipo, aborda o bem de primeiro tipo (trabalho humano não consegue
aumentar a oferta no decorrer do progresso de uma nação) e do terceiro tipo (bem este que
possui limitada ou incerta capacidade de aumento de produção). Ao dividir e caracterizar os
produtos em três tipos, Smith consegue fazer uma divisão dos produtos agrícolas em que o
progresso cnico é possível de ser aplicado pelo homem e em que o mesmo não é possível.
Essas três caracterizações permitem a Smith ter uma “válvula de escape” em relação a
produtos que tenham restrições à aplicação do progresso técnico. Ricardo, neste caso,
generalizou todos os produtos como se fossem apenas um (trigo ou cereal), cuja produção
seria limitada pela suposta fertilidade decrescente da terra.
Segundo a análise de Smith, produtos cultivados acima do solo (trigo, milho, alimento
para gado, etc.) possuem sua renda baseada na fertilidade absoluta da terra e não em sua
fertilidade relativa. Segundo o enfoque smithiano, a renda da terra como função da fertilidade
absoluta em se tratando de produtos acima do solo tem relação com o fato do progresso
técnico proporcionar, através da combinação da terra, do capital e do trabalho, o aumento da
produção e a quebra” da restrição natural da terra em proporcionar alimentos e matérias-
primas para o ser humano. Esta “quebra” da restrição da terra tem relação com o aumento da
fertilidade em terras férteis e com o aprimoramento da fertilidade em terras pouco férteis.
Essa inovação das técnicas de produção é que proporciona esta situação em que produtos
acima do solo têm a renda relacionada à fertilidade absoluta e produtos abaixo do solo
possuem a renda da terra relacionada à fertilidade relativa. A extração de minerais da terra
possui uma fertilidade dada pela própria natureza. O trabalho do homem não consegue
aumentar a quantidade de ouro, de prata e de cobre, por exemplo, pois tais quantidades são
fornecidas pela própria natureza em quantidades limitadas. Ao contrário disso, trigo, arroz,
gado e alimento para o gado podem ter sua oferta aumentada em função da inovação do
progresso cnico aplicado a tais atividades. Ou seja, o avanço técnico agrícola nada mais é
que a superação do homem sobre a restrição natural da terra em relação a sua fertilidade. Ou
seja, a fertilidade absoluta tem relação direta com o progresso técnico aplicado a terra.
Portanto, parece clara e certa a idéia de Smith de que o progresso técnico melhora a
fertilidade e a produtividade da terra e, dessa forma, o proprietário da terra pode obter uma
maior renda a que tem direito por possuir a propriedade da terra. O proprietário aumenta sua
renda em virtude do avanço e do progresso técnico agrícola. A fertilidade absoluta em
50
produtos cultivados acima da terra determina a renda paga ao proprietário da terra, pois o
progresso técnico tem condições de alterar a produtividade das terras de maior e de menor
fertilidade. Neste caso, o proprietário tem sua renda determinada em função da fertilidade
absoluta por poder usufruir uma renda excedente em função dos ganhos de produtividade da
terra.
Ricardo considera que é a diferença de fertilidade das terras que determina a renda
paga ao proprietário. Para o autor, o progresso cnico teria o poder de impedir e/ou adiar a
elevação do pagamento da renda da terra. O enfoque de Ricardo neste caso foi em analisar
que o progresso técnico não pode ser usufruído pelo proprietário. O progresso das técnicas de
produção significa que toda a economia entra em um processo de desenvolvimento e aumento
dos rendimentos das diferentes classes. A questão é que o progresso cnico permite que a
terra, o capital e o trabalho tenham rendimentos crescentes. Desta forma, o proprietário, o
capitalista e o trabalhador podem usufruir do aumento de seus rendimentos, visto que o
desenvolvimento econômico acarreta o aumento dos rendimentos das classes econômicas em
função das taxas crescentes da produtividade do capital, da terra e do trabalho. Ou seja, as três
classes podem aumentar seus rendimentos visto que o desenvolvimento econômico gera
crescimento da produção e o aumento das remunerações.
Outro ponto importante da análise de Smith em seu capítulo sobre a renda da terra é o
fato que, com o avanço do desenvolvimento econômico, produtos antes explorados apenas
para a subsistência dos agricultores e seus familiares (porco, aves, ração para aves, produtos
alimentícios feitos com resíduos de plantação e etc) passam a ser produzidos para a
alimentação de uma população em crescimento. Desta forma, tais produtos acabam tendo sua
produção voltada para o mercado. Esta análise de Smith tem relação com a formação de uma
hierarquia de necessidades com o avanço do processo de desenvolvimento econômico. Com o
aumento da renda, a população aumenta sua necessidade de consumo para produtos além dos
consumidos nos estágios iniciais de desenvolvimento. Este aumento das necessidades de
novos produtos leva os produtores a produzirem para o mercado produtos antes direcionados
para a sua subsistência, atendendo a alimentação de uma população em crescimento. Desta
forma, surge um novo produto a ser consumido, uma nova taxa de lucro, uma nova renda e
um novo salário a ser pago.
Novamente, nesse ponto destaca-se o mérito que Smith teve em incorporar uma
análise relacionada à interação da produção e da produtividade entre as terras de maior e de
menor fertilidade. Contudo, Ricardo, ao enfatizar a importância do principal produto agrícola
51
de uma nação e sua relação com a taxa de lucro, acaba não levando em consideração os
efeitos multiplicadores da produção das terras de um produto agrícola com as terras usadas no
cultivo de outros produtos agrícolas, mesmo que de menor importância, quando comparados
ao principal produto de uma nação.
A grande questão que diferencia a análise de Smith com a de Ricardo é que Ricardo
considera que as três classes não podem aumentar suas rendas em conjunto e, ao mesmo
tempo, com o processo de desenvolvimento econômico. Smith verifica que os rendimentos
crescentes da terra, do capital e do trabalho permitem o aumento do produto de um país e,
desta forma, as três classes podem aumentar suas remunerações em virtude da inserção do
progresso técnico na atividade econômica. O fato de Ricardo limitar a análise econômica a um
suposto rendimento decrescente da terra leva a supor que a economia é um jogo de subtração
dos rendimentos de uma classe pela outra e não um processo de crescimento contínuo e
integrado dos rendimentos das três principais classes de um país em virtude do aumento de
suas respectivas produtividades.
Para Smith, toda a economia, com o avanço do desenvolvimento econômico, entra em
um processo de divisão e especialização do trabalho. Nesta situação, a agricultura também
entra em processo de divisão do trabalho em função do avanço do progresso técnico sobre as
terras de uma nação. A análise ricardiana restringe o avanço das cnicas de produção em
relação à agricultura. Todavia, supor que exista o progresso técnico e eliminar a importância
da análise do mesmo na atividade agrícola parece uma posição um pouco estranha. Qual seria
o motivo que levaria ao não avanço do progresso técnico sobre a agricultura de uma nação?
Smith, ao aplicar o conceito do avanço das técnicas de produção também sobre a agricultura,
elabora uma teoria da renda da terra muito mais real e concreta do que a abstração feita por
Ricardo em sua teoria da renda da terra.
O grande ponto de discórdia da análise de Smith e da análise de Ricardo é que o
primeiro visualiza toda sua análise em torno dos rendimentos crescentes e o segundo “amarra”
a economia real a uma modelação teórica na qual os rendimentos decrescentes são a regra
dentro da análise da fertilidade da terra. A economia de Adam Smith é a economia do
progresso técnico, dos rendimentos crescentes, da divisão do trabalho, do aumento da
produção e, conseqüentemente, do desenvolvimento econômico. A economia de Ricardo é a
economia da estagnação. É a economia em que o homem encontra um limite à sua evolução
econômica e social. A análise ricardiana talvez seja válida como estudo de caso, ou seja, a
análise única e exclusiva de um caso específico, a Inglaterra da primeira metade do século
52
XIX. Contudo, ao analisar a economia como um todo e “amarrarmos” o conceito de
fertilidade decrescente das terras a todos os países, a produtividade decrescente das terras com
certeza limitaria o avanço do desenvolvimento econômico. Neste caso, pode-se entender que a
economia de Adam Smith é geral, é real, é concreta, enquanto a economia de David Ricardo é
abstrata ou é o estudo de um caso específico.
53
5 CONCLUSÃO
Conforme a análise discutida neste trabalho, fica claro que a teoria da renda da terra de
Adam Smith tem condições suficientes de contrapor-se à amplamente conhecida teoria da
renda da terra de David Ricardo. Pelo estudo em questão, Smith faz uma análise da renda da
terra que engloba assuntos como o progresso técnico, fertilidade crescente da terra, divisão do
trabalho, desencadeamento da produção de terras “secundárias”, desenvolvimento econômico
entre outros. A teoria smithiana mostra-se inserida em um contexto que contempla diversos
aspectos relacionados ao estudo do desenvolvimento econômico. Contrariando Ricardo, Smith
mostra que o progresso técnico, aliado aos rendimentos crescentes da terra, tem condições de
aumentar a fertilidade das terras e, dessa forma, servir de base para o desenvolvimento e a
geração da riqueza das nações.
A grande questão que diferencia a análise de Ricardo e de Smith é o enfoque que cada
um dos autores dá a terra e à sua relação com o desenvolvimento econômico. Ricardo enxerga
a produtividade decrescente da terra e sua fertilidade relativa como a causa do pagamento da
renda da terra. Contudo, Adam Smith, ao contrário da análise ricardiana, defende que a terra
possui rendimentos crescentes e que o aumento do pagamento da renda da terra é um dos
efeitos do desenvolvimento econômico de uma nação. Ricardo coloca o pagamento da renda
da terra como um obstáculo ao processo de desenvolvimento econômico. Sua teoria diz que o
cultivo de terras de menor fertilidade leva ao pagamento da renda em função da fertilidade
relativa existente entre as terras. Neste caso, o pagamento da renda, aliado ao aumento do
nível dos salários, leva à redução da margem de lucro dos capitalistas.
Ricardo defende que a riqueza aumenta nos países em que a terra é mais fértil, em que
as importações sofrem menos restrições e em que os aperfeiçoamentos na agricultura
multiplicam a produção sem qualquer aumento na quantidade proporcional do trabalho. Ou
seja, países que possuem o progresso do pagamento da renda da terra mais lento têm maiores
chances de desenvolver sua economia. Conforme Ricardo (1996, p. 71):
Não dúvida de que a redução nos preços relativos dos produtos agrícolas em
conseqüência de melhoramentos na agricultura, ou como resultado de menor
54
utilização de trabalho na sua produção, conduziria, naturalmente, a um aumento na
acumulação, pois os lucros do capital cresceriam consideravelmente.
Ricardo não deixa de abordar o progresso cnico, porém sem a profundidade e a
importância necessária. Todavia, como a renda é determinada pela fertilidade relativa, o
progresso técnico não teria condições (na análise ricardiana) de impedir, no longo prazo, a
queda da taxa de lucro, pois o avanço das técnicas de produção não teria condições de alterar
a diferença da fertilidade entre a terra de maior e a de menor fertilidade. Mesmo que se
aumentasse a fertilidade das terras, suas condições relativas de fertilidade seriam as mesmas,
ou seja, ainda haveria terras de maior e de menor fertilidade. Segundo Ricardo (1996, p. 276-
77):
Melhorias na agricultura e na divisão do trabalho são comuns a todas as terras:
aumentam a quantidade absoluta de produtos agrícolas obtida em cada uma, mas
provavelmente não modificam significativamente as proporções relativas que antes
existiam entre elas.
A grande crítica da teoria ricardiana é que a economia encontra-se limitada ao avanço
do processo de desenvolvimento econômico. Isto significa que Ricardo desconsidera a análise
dos rendimentos crescentes na atividade econômica. A verdade é que a economia, por possuir,
através do progresso técnico, retornos crescentes da produtividade da terra, do trabalho e do
capital, não encontra limitação ao desenvolvimento e ao progresso da riqueza. É neste ponto
que a teoria da renda da terra de Adam Smith mostra-se superior a de David Ricardo. A
questão-chave é que Ricardo desconsiderou a importância dos retornos crescentes na
economia, enfatizando a análise dos rendimentos decrescentes em sua teoria. O problema da
análise ricardiana é que o autor “amarrou” a economia a um estado de limitação de seu
processo de desenvolvimento ao não dar a ênfase necessária aos rendimentos crescentes da
terra e seus benefícios para o progresso econômico. O fato de uma nação ter que importar
alimentos para manter os preços dos cereais baixos mostra que o autor não acreditava que o
ser humano pudesse, através da ciência e do progresso técnico, afetar a fertilidade da terra em
prol do desenvolvimento econômico e baratear os preços dos cereais.
Caso a demanda por cereais se estendesse por todas as terras de todas as nações e não
houvesse mais terras disponíveis para o cultivo de cereais, qual seria a solução ricardiana para
o crescimento da produção de alimentos e matérias-primas para o suprimento das
necessidades da humanidade? Como se percebe, Ricardo deixa o desenvolvimento econômico
55
limitado a um ponto em que a humanidade não teria mais condições de progredir
economicamente. Porém, ao enfocar os rendimentos crescentes na economia, incluindo neste
caso a terra, Smith fornece uma resposta clara para o desenvolvimento econômico, ou seja,
em função do progresso técnico e dos rendimentos crescentes, não existe limitações ao
processo de desenvolvimento econômico da humanidade.
A contraposição de Smith é que a terra, por possuir retornos crescentes, pode aumentar
a oferta de alimentos, de matérias-primas e permitir que o processo de desenvolvimento
econômico prossiga a taxas crescentes. Os retornos crescentes da produtividade da terra
servem de “infraestrutura” para todo o processo de desenvolvimento econômico. Para Smith,
o progresso técnico aplicado a terra tende a aumentar a produtividade do trabalho a taxas
crescentes. Ou seja, não existe limite natural que impeça o homem de aumentar a fertilidade
da terra em prol do progresso econômico. Caso inexistisse o avanço técnico aplicado a
agricultura, o setor primário de uma nação não teria condições de liberar mão-de-obra do
campo para a cidade, fornecer alimentos e matérias-primas para as indústrias e servir de
mercado para as manufaturas produzidas na cidade. Desta forma, o desenvolvimento
econômico teria um limite para a sua própria evolução.
A análise estática de Ricardo sobre os rendimentos decrescentes da terra traz implícita
a falta de importância do progresso técnico na agricultura. Ricardo, ao contrário de Smith,
acaba não levando em consideração que a atividade agrícola deve ser analisada em um
enfoque dinâmico, e que, desta forma, a maior produtividade da terra, do capital e do trabalho
permitem que a terra deixe de ser um fator de limitação ao desenvolvimento econômico.
Ricardo deixa ausente em sua análise que a economia possui mudanças estruturais de longo
prazo que aumentam a produtividade agrícola em relação ao fornecimento de alimentos e
matérias-primas para o restante da sociedade.
O progresso técnico deve ser estudado como um todo. Ou seja, a análise do avanço das
técnicas de produção deve ser estendida aos setores primário, secundário e terciário da
economia. Não é apenas o setor industrial que possui o progresso técnico como motor de sua
evolução. O avanço produtivo do setor industrial requer uma agricultura que possua retornos
crescentes de produtividade quando capital e trabalho o aplicados a terra. O avanço das
técnicas de produção na terra significa que o homem está conseguindo romper as barreiras
naturais da terra. Neste caso, a terra deixa de ser um agente ativo e passa a ter um papel
passivo, sujeito aos interesses econômicos do homem. O aparecimento do excedente
56
econômico transforma a terra, de simples meio de subsistência, em um meio de produção
utilizado pelo homem na sua busca incessante pelo aumento de seus lucros.
O fato de Smith inserir em sua análise a expansão dos mercados e a divisão do
trabalho como fundamental para o desenvolvimento econômico mostra que o autor estava
ciente da importância dos rendimentos crescentes para o desenvolvimento econômico. Smith,
ao contrário de Ricardo, não o desenvolvimento como um processo que possua um limite
intransponível e enxerga a importância dos rendimentos crescentes no setor agrícola e
manufatureiro para a evolução contínua das riquezas das nações. Ricardo não analisa a renda
da terra e os rendimentos da mesma inseridos em uma abordagem ampla e dinâmica.
A preocupação de Ricardo é de como formular uma política econômica que possa
retardar a redução da margem de lucro pelo aumento da renda e do nível dos salários. Fica
claro que a preocupação do autor é muita mais em afastar o possível ponto de estado estável
econômico na qual uma economia possa chegar do que em teorizar uma abordagem que
explique como a economia pode intensificar os retornos crescentes do capital, da terra e do
trabalho via progresso cnico. A teoria da renda da terra de Ricardo mostra uma análise onde
a redução da taxa de lucro leva a uma queda da acumulação de capital em função da exaustão
dos recursos naturais e também em função da impossibilidade do homem em afetar a
produtividade da terra através da aplicação do progresso técnico na exploração da terra.
Todavia, “Se o problema da ciência econômica é o crescimento e o desenvolvimento,
como se diz muitas vezes, os contributos de Smith são também superiores ao de Ricardo
(BLAUG, 1989, p. 192). Ou seja, dentro de uma análise abstrata, a teoria de Ricardo,
realmente, mostra uma superioridade pela sua refinada modelação teórica do comportamento
da renda da terra com o processo de desenvolvimento econômico; porém, a análise de Smith
mostra sua superioridade por deixar de lado à análise abstrata da economia e focar sua
abordagem no lado real e concreto do sistema econômico.
Outro ponto positivo da análise de Adam Smith é que o autor verifica que a terra e
seus rendimentos crescentes são tão importantes para o progresso econômico, quanto o
processo de industrializações das nações. Já no século XVIII, Smith antevia que a economia
precisaria de uma atividade agrícola (também incluída a pecuária e a mineração) altamente
produtiva para servir de suporte ao processo de industrialização e urbanização das nações. Ou
seja, a industrialização de uma nação poderia encontrar “gargalos”, relacionados à produção
de alimentos e matérias-primas, que afetassem a trajetória de desenvolvimento econômico,
caso sua atividade agrícola não fosse altamente eficiente. Para Smith, os rendimentos
57
crescentes na atividade primária de uma nação são fundamentais para os rendimentos
crescentes na atividade industrial.
A figura do proprietário da terra na análise de Adam Smith é vista como uma classe
que se beneficia do progresso econômico de uma nação. Smith defende que o pagamento da
renda é aumentado em função do progresso técnico de uma nação. Ricardo também defende,
neste caso, que o desenvolvimento econômico leva ao aumento da renda da terra. Todavia, a
diferença da teoria de Adam Smith é que o aumento do pagamento da renda da terra está
inserido em um estágio de desenvolvimento econômico, apoiado nos rendimentos crescentes
da terra, do capital e do trabalho. O fato do aumento do pagamento da renda não afetar a taxa
de lucro a ponto de bloquear o desenvolvimento econômico mostra que tal situação está
inserida em um contexto de desenvolvimento contínuo da riqueza de uma nação. Ricardo,
porém, aborda sua teoria da renda da terra em um contexto de compressão da taxa de lucro,
visto que o aumento do pagamento da renda e do nível dos salários está inserido em uma
análise de rendimentos decrescentes da terra.
Smith defende que os interesses dos proprietários das terras estão alinhados com o
interesse da sociedade. Diferentemente deste ponto de vista, Ricardo aborda que o interesse
dos proprietários é contra o interesse da sociedade. Smith tem um ponto de vista diferente de
Ricardo em função de defender a importância da terra e de seus rendimentos irreversíveis
crescentes como fundamentais para o avanço econômico. Neste caso, o aumento do
pagamento da renda estaria relacionado tanto à renda de monopólio do proprietário como
também à renda absoluta. Não é o interesse do proprietário por si só que vai de encontro ao
interesse da sociedade, mas é a importância da fertilidade crescente da terra para o
desenvolvimento econômico que proporciona a renda absoluta para os proprietários e,
conseqüentemente, tal situação vai ao encontro do interesse da sociedade.
Segundo a análise de Adam Smith, a produção nas terras mais férteis de uma nação
tende a aumentar a demanda de moradia e de vestuário da sociedade e, desta forma, a
produção agrícola nas demais terras é incentivada, com o intuito de produzir bens que sirvam
para suprir essas novas necessidades da sociedade. Neste ponto fica claro que Smith deixa
implícita a idéia de efeito multiplicador e hierarquia das necessidades. O primeiro refere-se à
importância que a atividade econômica das terras mais férteis tem em desencadear a produção
de terras não próprias para a produção de alimentos, mas que possuem fertilidade suficiente
para bens de moradia e de vestuário. Tais bens só possuem a vantagem econômica de serem
produzidos a partir de um determinado estágio de desenvolvimento econômico. O segundo
58
refere-se ao aumento das necessidades inerentes do ser humano em uma economia que avança
e desenvolve-se. O progresso econômico permite que as pessoas aumentem suas
remunerações e demandem novos bens a serem produzidos pelo trabalho de outras pessoas.
Ou seja, uma economia em desenvolvimento na análise smithiana está inserida em um
contexto contínuo e ininterrupto de divisão do trabalho e de progresso da riqueza. Tal análise,
porém, não é enfatizada na teoria da renda da terra de David Ricardo.
A economia smithiana progride e desenvolve-se via progresso técnico e via
rendimentos crescentes. a teoria ricardiana “amarra” a economia a um ponto em que o
desenvolvimento econômico é freado, visto que o progresso técnico não consegue alterar os
rendimentos da terra ao longo do processo de desenvolvimento. Mesmo que o progresso
técnico modifique a fertilidade da terra, o enfoque de Ricardo mostra que o mesmo prioriza a
análise estática da economia ao invés de fazer a análise sob o ponto de vista dinâmico. O
desenvolvimento para Ricardo é visto como algo temporário e sujeito a um fim, ou seja, a um
ponto em que economia irá estagnar e interromper seu processo de desenvolvimento.
59
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