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diversos estilos, experiência que o fez adentrar o mundo do samba, gênero em que
mais compôs. Através do samba expressou o amor pelas mulheres, pela boemia,
por seu bairro, descreveu os tipos humanos do Rio de Janeiro, o cotidiano e os
problemas de um Brasil que adentrava o conturbado período da crise capitalista
internacional e a nova realidade imposta pela Revolução de 1930.
E é sobre esse “Brasil de tanga”, segundo sua própria explicação, o primeiro
samba de Noel Rosa: Com que roupa?. Um samba composto nos moldes das
transformações rítmicas e melódicas surgidas no bairro do Estácio de Sá em
contraposição ao antigo samba da Cidade Nova
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. Recebendo logo a aceitação e o
entusiasmo dos tangarás, decide-se que o novo samba de Noel será lançado ainda
em 1929 no outro lado do disco em que está Não quero amor nem carinho, de João
de Barro e Canuto. Mas não é isso o que acontece
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, pois no lugar dela acaba
sendo lançada a canção Na pavuna, de Almirante e Candoca da Anunciação
(pseudônimo de Homero Dornellas
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). O lançamento do samba de Noel é transferido
para o próximo carnaval. Pode-se perceber, no entanto, que estava traçado o
caminho do compositor, do músico. A faculdade de medicina ficaria relegada ao
esquecimento diante dos encantos do samba. Após o lançamento do disco com o
seu Com que roupa? – que tinha no outro lado Malandro medroso, também de Noel
– vários artistas, além de Noel Rosa, passaram a gravar suas composições
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.
Mesmo depois de sua morte, várias canções inéditas foram gravadas pelos mais
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Para os diferentes tipos de samba ver o capítulo 2 desse trabalho. Grosso modo, o samba feito no
Estácio de Sá tem a melodia, o ritmo e a poesia diferentes do antigo samba da Cidade Nova.
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Em 30 de setembro de 1930, somente, é que Noel consegue finalmente entrar no estúdio da
Odeon para gravar Com que roupa?. A gravação é feita sem a presença dos outros tangarás, com
Noel sendo acompanhado pelo bandolim de Luperce Miranda e mais dois violões.
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Homero Dornellas foi o maestro responsável por colocar na partitura Com que roupa?. No mesmo
dia em que o fez, no entanto, mostrou aos tangarás que o procuraram em sua casa (João de Barro,
Noel e Almirante), um samba de sua autoria, pedindo a Almirante que fizesse a letra da segunda
parte. Assim nascia Na pavuna, sucesso do carnaval de 1930.
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Entre os principais intérpretes de Noel Rosa, alguns merecem destaque: Aracy de Almeida (1914-
1988) era, para Noel Rosa, quem com mais exatidão interpretava suas canções. Gravou algumas das
mais importantes composições do poeta da Vila, entre as quais estão Palpite infeliz, O “x” do
problema e Último desejo. No final de sua vida ficou conhecida, infelizmente, apenas como jurada do
programa de calouros do programa de Sílvio Santos. Como ela mesma dizia, havia virado “palhaça
de auditório”. Marília Batista (1918-1990) dedicou-se especialmente à divulgação da obra de Noel
Rosa. Gravou, entre outras, Provei, Cem mil réis e Silêncio de um minuto. Francisco Alves (1898-
1952) ficou conhecido como o Rei da Voz e teve papel fundamental na divulgação de diversos
compositores do início do século. Depois do próprio Noel Rosa, foi o mais freqüente intérprete do
compositor: 27 gravações. Mário Reis (1907-1981) inaugurou um estilo diferente de cantar samba.
Não possuía a potência vocal de Francisco Alves, por exemplo, mas cantava de uma forma coloquial
e com uma divisão rítmica mais ágil. De Noel Rosa gravou, além de Filosofia e outras importantes
canções, É preciso discutir, em dueto com Francisco Alves.