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UNIVERSIDADE ESTADUAL DO OESTE DO PARANÁ
CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS APLICADAS
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM DESENVOLVIMENTO REGIONAL E
AGRONEGÓCIO
PAULO DEJAIR TOMAZELLA
AGRICULTURA E MEIO AMBIENTE: AGRICULTURA FAMILIAR E RESERVA
FLORESTAL LEGAL EM PALOTINA, PARANÁ
TOLEDO
2010
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PAULO DEJAIR TOMAZELLA
AGRICULTURA E MEIO AMBIENTE: AGRICULTURA FAMILIAR E RESERVA
FLORESTAL LEGAL EM PALOTINA, PARANÁ
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-
Graduação em Desenvolvimento Regional e
Agronegócio, do Centro de Ciências Sociais
Aplicadas da Universidade Estadual do Oeste do
Paraná – Campus Toledo, como requisito parcial à
obtenção do título de Mestre em Desenvolvimento
Regional e Agronegócio.
Orientador: Prof. Dr. Erneldo Schallenberger
TOLEDO
2010
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PAULO DEJAIR TOMAZELLA
AGRICULTURA E MEIO AMBIENTE: AGRICULTURA FAMILIAR E RESERVA
FLORESTAL LEGAL EM PALOTINA, PARANÁ
Dissertação aprovada como requisito parcial à obtenção ao Grau de Mestre em
Desenvolvimento Regional e Agronegócio pelo Programa de Pós-Graduação em
Desenvolvimento Regional e Agronegócio, do Centro de Ciências Sociais Aplicadas da
Universidade Estadual do Oeste do Paraná – Campus Toledo, pela seguinte banca
examinadora:
Orientador: Prof. Dr. Erneldo Schallenberger
UNIOESTE – Campus Toledo
Prof. Dr. Jefferson Andronio Ramundo Staduto
UNIOESTE – Campus Toledo
Prof. Dr. Sérgio Schneider
Universidade Federal do Rio Grande do Sul UFRGS – Porto Alegre
Toledo, 27 de maio de 2010.
À minha mãe e minha irmã Dirce por suas histórias de vida.
AGRADECIMENTOS
Para aqueles cujas caminhadas se misturaram as minhas e se transformaram em
personagens dessa trajetória.
Uma lembrança especial para o Professor Orientador Erneldo Schallenberger por seu
apoio e amadurecimento dos meus conhecimentos e conceitos.
Ao Professor Pery Shikida pela aposta na formação diversa dos alunos para o
Mestrado.
Ao Professor Jandir Ferrera pela objetividade.
Aos Professores Silvio Colognese e Tarcísio Vanderlinde por apontarem novos
caminhos possíveis.
À secretária Clarice T. Stahl pela atenção e simpatia com todos os alunos.
À amiga Eliana Reis pelo auxilio direto na construção deste trabalho.
A nossa turma de mestrado, em especial ao Paulo Wilian sempre na busca da melhor
tese, e ao Ariel Letti pela amigável solidariedade.
A minha mãe e aos meus irmãos pelo laço familiar que nos une.
À minha mulher Gilca por seu carinho e fundamental apoio na construção do
pensamento, e que compartilhou comigo, incansavelmente, deste projeto que agora se realiza.
TOMAZELLA, Paulo Dejair. Agricultura e meio ambiente: agricultura familiar e reserva
florestal legal em Palotina, Paraná. 2010. Dissertação (Mestrado em Desenvolvimento
Regional e Agronegócio) – Universidade Estadual do Oeste do Paraná – Campus/Toledo
RESUMO
O presente trabalho tem por objetivo analisar as formas de reprodução da agricultura familiar
do município de Palotina, localizado no Oeste do Estado do Paraná, e avaliar a relação
existente entre o desempenho da legislação ambiental desenvolvida para o setor agropecuário,
mais especificamente para esta categoria, com as práticas de utilização do espaço produtivo
dos agricultores familiares. Para tanto, foi realizada uma discussão a cerca da gênese da
agricultura familiar no Brasil que encontra no campesinato a base de sua formação. Tal
discussão conduzirá a questão da pluriatividade desenvolvida por esta categoria. Ainda na
caracterização da agricultura familiar, a proposta de modernização da agricultura nacional,
que teve seu marco inicial na década de 1960, aparece como importante elemento deflagrador
das mudanças ocorridas na unidade agrícola e agrária, levando esta categoria a buscar sua
lógica própria de reprodução, processo este desencadeado na década de 1980. Desta forma, a
transição da agricultura camponesa para agricultura familiar é conduzida de modo a
demonstrar as transformações ocorridas frente à conjuntura da agropecuária nacional. A
caracterização do recorte espacial escolhido para a pesquisa, no que se refere aos critérios
sócio-econômicos, culturais e ambientais, constitui importante ferramenta no auxílio à
compreensão da forma de reprodução da agricultura familiar em Palotina. Assim, a categoria
denominada de agricultura familiar moderna foi identificada e dimensionada neste contexto,
bem como a importância que assume diante do cenário nacional agropecuário e sua expressão
na economia de mercado bem como no desenvolvimento sustentável. Paralelo a esta análise,
procedeu-se uma pesquisa de campo focada nas implicações da legislação ambiental vigente,
que regula os processos de exploração no espaço rural de Palotina, mais especificamente no
que tange a reserva legal e a função social da propriedade rural. A partir daí, são examinadas
as possibilidades do desenvolvimento de modelos de produção agropecuária adequados ao
ambiente e associados a uma proposta educacional ecológica como estratégias para
preservação ambiental, conciliando, desenvolvimento e sustentabilidade ambiental.
Palavras-chaves: Agricultura familiar. Reserva legal. Legislação ambiental.
Desenvolvimento sustentável.
TOMAZELLA, Paulo Dejair. Agriculture and environment: family agriculture and legal
forest reserve in Palotina, Paraná. 2010. Thesis. (Master in Agribusiness and Regional
Development) – of West of Paraná State University. – Campus/Toledo.
ABSTRACT
The main purpose of this paper is to analyze how family agriculture has reproduced itself in
the town of Palotina, located on the west of Parana state, and evaluate the existing relation
between the environmental legislation performance developed for the agriculture and cattle
raising sectors, more specifically to this category, and the performed use of their productive
farming space. In order to do that, a debate about the genesis of family agriculture in Brazil,
which finds on peasantry the basis of its origin, was brought up. Such debate will lead
towards the plural activities developed by this category. Still characterizing family
agriculture, the proposal for national agriculture modernization, which had its launching on
the 1960’s, appears as a striking element of the changes occurred on agricultural and agrarian
units, leading this category to search its own reproduction logic, process started on the 1980’s.
This way, the transition from peasant agriculture to family agriculture is conducted in such
way to display the transformations occurred facing the national agriculture and cattle raising
conjuncture. The description of the spatial cutout chosen for the research, which refers to
social, economic, cultural and environmental criteria, makes it a striking tool for
acknowledging the way familiar agriculture has reproduced in Palotina. Therefore, the
category denominated as modern familiar agriculture was identified and dimensioned on this
context, as well as the importance it assumes on the national agricultural and cattle raising
scenery and its expression on the market economy as well as on sustainable development.
Parallel to this analysis, a field research was made focusing on the implications of the actual
environmental legislation that regulates the rural setting exploration in Palotina, more
specifically concerning legal reserve and the social function of the rural property. From that
point, the possibilities of developing models of agriculture and cattle raising production
appropriated to the environment and paired up with an ecologic educational proposal such as
strategies for environment protection, harmonizing environment development and
sustainability.
Key words: Family agriculture. Legal reserve. Environmental legislation. Sustainable
development.
LISTA DE TABELAS E ILUSTRAÇÕES (FIGURAS E GRÁFICOS)
Figura 1 – Localização do município de Palotina ................................................................... 35
Figura 2 – Mapa das principais rodovias de acesso à Palotina................................................ 37
Tabela 1 – Número de tratores agrícola de pneu e colheitadeiras........................................... 45
Figura 3 – Mapa da cobertura florestal original no ano de 1890............................................. 50
Figura 4 – Mapas da cobertura florestal do Paraná (1930-2000)............................................ 50
Gráfico 1 – Procedência do agricultor familiar de Palotina .................................................... 80
Gráfico 2 – Condição de posse da terra................................................................................... 81
Tabela 2 – Local de residência por condição de posse............................................................ 82
Gráfico 3 – Proveniência da receita......................................................................................... 82
Tabela 3 – Percentual de agricultores por grupo de idade....................................................... 83
Tabela 4 – Percentual da população por grau de escolaridade................................................ 84
Tabela 5 – Estrutura fundiária................................................................................................. 87
Gráfico 4 – Ocupação da área e uso do solo............................................................................ 89
Gráfico 5 – Produção agrícola................................................................................................. 90
Tabela 6 – Produção pecuária.................................................................................................. 91
Gráfico 6 – Fonte de informação sobre a legislação ambiental............................................... 92
Gráfico 7 – Por que não considera importante fazer a reposição florestal.............................. 93
Gráfico 8 – Público beneficiado com a reposição da reserva legal......................................... 95
Gráfico 9 – Principais fóruns de discussão sobre as leis ambientais no município de Palotina
................................................................................................................................................. 95
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO ...................................................................................................................10
2 A AGRICULTURA FAMILIAR: ELEMENTOS CONCEITUAIS E
CARACTERIZAÇÃO ...........................................................................................................19
2.1 A Gênese e o Conceito da Agricultura Familiar............................................................20
2.2 As Atividades Desenvolvidas Pelos Agricultores Familiares........................................23
2.3 A Mecanização Agrícola como Transformadora do Espaço Rural.............................27
3 CARACTERIZAÇÃO DO MUNICÍPIO DE PALOTINA.............................................33
3.1 Localização Geográfica e Caracterização do Município de Palotina..........................35
3.2 Principais Rodovias de Acesso ........................................................................................37
3.3 Aspectos Físicos do Município de Palotina ....................................................................38
3.3.1 Geologia ..................................................................................................................38
3.3.2 Solos ........................................................................................................................38
3.3.3 Relevo......................................................................................................................39
3.3.4 Hidrografia ..............................................................................................................40
3.3.5 Clima .......................................................................................................................40
3.3.6 Vegetação ................................................................................................................40
3.4 Aspectos Históricos da Construção da Territorialidade de Palotina ..........................41
3.5 O contexto da Agricultura Familiar de Palotina...........................................................42
3.5.1 Ocupação e Uso do Solo..........................................................................................42
3.5.2 A Motomecanização da Agricultura Familiar.........................................................45
4 O CENÁRIO AMBIENTAL E PRODUTIVO EM QUE PALOTINA ESTÁ
INSERIDA...............................................................................................................................48
4.1 A Expressão Econômica da Produção Agropecuária do Estado..................................48
4.2 A Fragmentação Ambiental.............................................................................................49
4.3 A Postura Mundial Frente às Questões Ambientais .....................................................51
4.4 Medidas de Proteção ao Meio Ambiente........................................................................52
4.5 A Expressão Econômica Desencadeada em Palotina e a Sustentabilidade Ambiental
..................................................................................................................................................52
5 A LEGISLAÇÃO PARA PRESERVAÇÃO AMBIENTAL ...........................................56
5.1 Das Implicações Legais da Reserva Florestal Legal......................................................56
5.2 As Proposições Acerca da Reserva Florestal Legal.......................................................69
5.3 Usando a Reserva Florestal Legal...................................................................................73
6 AGRICULTURA FAMILIAR E RESERVA LEGAL: UM ESTUDO DE CASO .......77
6.1 Procedimentos Metodológicos.........................................................................................77
9
6.2 Análise da Pesquisa de Campo........................................................................................79
6.2.1 Identificação do Agricultor Familiar e Demais Membros da Família......................80
6.2.2 Caracterização da Propriedade....................................................................................86
6.2.3 Produção Agropecuária: produtos transformados e consumo familiar ...................89
6.3 Caracterização Ambiental...............................................................................................91
7 CONSIDERAÇÕES FINAIS..............................................................................................98
BIBLIOGRAFIA..................................................................................................................105
APÊNDICE 1 – Questionário aplicado na pesquisa de campo ........................................111
10
1 INTRODUÇÃO
A discussão acerca da agricultura familiar tem conquistado espaço cada vez mais
expressivo em diferentes ramos da ciência, entre os especialistas em políticas públicas e nos
setores governamentais ligados direta ou indiretamente ao espaço rural. Essas discussões
assumem maior relevância ainda quando relacionadas a propostas de desenvolvimento
sustentável, geração de emprego e renda e segurança alimentar.
Segundo estudos realizados pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma
Agrária e a Organização das Nações Unidas para a Agricultura e Alimentação (INCRA/FAO)
(2000), a agricultura familiar diversa de acordo com o meio ambiente, a aptidão dos solos, a
disponibilidade de infra-estrutura, as situações econômica, cultural e social dos produtores,
entre outros fatores, sendo que esta variação não se restringe apenas no âmbito inter-regional,
mas verifica-se, também, intra-regionalmente
1
.
Conforme dados do Censo Agropecuário do Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatística (IBGE) (2006), a agricultura familiar representa 84,4% do total de
estabelecimentos agrícolas do país, ocupa 24,3% da área agricultável total e é responsável por
38% do Valor Bruto da Produção anual agrícola (VBP). Na região sul, a agricultura familiar
tem expressão ainda maior, uma vez que representa 90,5% de todos os estabelecimentos
agrícolas da região, 43,8% da área total e é responsável por 57,1% do VBP agrícola regional
(INCRA/FA0, 2000). Essas informações permitem dimensionar a posição desse segmento na
economia do setor primário, tanto na produção de produtos destinados ao mercado interno,
como dos que fazem parte da pauta de exportação agrícola.
Regressando mais ainda cronologicamente a análise, em que pese à importância
econômica e social desse grupo, o modelo de modernização da agricultura iniciado no Brasil,
nas décadas de 1960 e 1970, e que foi representada pelo “pacote tecnológico” da Revolução
Verde, deu início a uma reestruturação da unidade agrícola e agrária que privilegiou os
produtores mais capitalizados com direcionamento para o cultivo de grãos com respostas
produtivas mais propícias à utilização desse modelo tecnológico. A economia de exportação
foi fortemente incentivada, fato esse que pode ser verificado pelos crescentes níveis da
produção brasileira de grãos, que só nos últimos 12 anos cresceu de 78 para 137 milhões de
1
Para a dimensão de região serão consideradas as Grandes Regiões em que está dividido o território brasileiro -
Sul, Sudeste, Centro-Oeste, Norte, Nordeste. Assim, ao se referir aos âmbitos inter e intra-regionais, estar-se-á
fazendo menção às relações e correlações estabelecidas entre estas regiões e em seus interiores.
11
toneladas por ano. Também aumentos na produção e exportação de bens agrícolas e pecuários
são identificados nesse mesmo período (LACKI
2
, 2007, p. 01).
Tais mudanças tiveram reflexos sobre a agricultura desenvolvida pela unidade
familiar, que, para se manter no processo produtivo, teve de forjar novas formas de
reprodução
3
. O agricultor familiar, no ímpeto de se adequar ao modelo de modernização,
passou a utilizar um “pacote tecnológico” de maior impacto (nem sempre compatível com sua
realidade) e também a desenvolver atividades de exportação de produto, porém sem estrutura
de uma política agrícola adequada para atender a essa nova lógica. Na tentativa de adaptação
à nova realidade, pode-se falar de uma agricultura familiar que obteve relativo sucesso e
também daquela que foi conduzida à desestruturação econômica, social e ambiental.
A verticalização da produção decorrente do uso intensivo de tecnologia exógena à
propriedade rural teve reflexo no aumento de produtividade e renda, mas não se estendeu a
todos os agricultores familiares, o que contribuiu para a desestruturação de muitas unidades
familiares de produção. A principal conseqüência disso foi o significativo êxodo rural
ocorrido, principalmente, nas décadas de 1960 e 1970.
O processo de aumento de produção e produtividade, focado no mercado externo,
baseou-se no uso do pacote tecnológico aliado à mecanização intensiva do solo agrícola. Este
novo modelo de exploração agrícola passou a exercer forte pressão na demanda por recursos
naturais para a produção, causando, de forma acelerada, a degradação ambiental. O
imediatismo do modelo de desenvolvimento econômico propagado nos anos 1960 e 70,
voltado às expensas do Produto Interno Bruto (PIB), sem considerar a preservação dos
recursos naturais, não levou em conta o significado de qualidade de vida ou o
desenvolvimento como fator de inclusão social e ambiental. A partir de então, as atividades
desenvolvidas no meio rural visavam, essencialmente, à produção para o mercado, sendo esta
forma de produção, pautada na excessiva demanda por recursos naturais.
Segundo Sorrenson (1989, p. 25), pesquisador do Instituto Agronômico do Paraná:
[...] a exploração agrícola, de forma geral, tem sido uma atividade predatória
em termos de conservação de solo. As áreas agrícolas vêm sofrendo um
processo acelerado de degradação em sua capacidade produtiva,
2
Polan Lacki é engenheiro agrônomo formado pela Universidade Federal do Rio de Janeiro, tendo trabalhado
com a extensão rural no Paraná nos primeiros anos de sua carreira e posteriormente como membro integrante
da FAO-ONU desde 1980.
3
Essa dinâmica pode ser verificada no município de Palotina – PR, onde as principais atividades agropecuárias
(produção de grãos – soja e milho –, avicultura de corte, suinocultura e bovinocultura de leite) se apresentam
como importantes fontes de renda, com aumentos expressivos de produção e de produtividade nos últimos
anos.
12
comprometendo os rendimentos das culturas, os quais, com o estreitamento
das fronteiras agrícolas, estão fadados a crescer via produtividade,
implicando na tomada de consciência de que os métodos de exploração do
solo não poderão ser os mesmos.
Ainda para Sorrenson (1989, p. 25), a conservação do solo não se limita apenas ao
controle da erosão, mas também ao uso de um conjunto de práticas que permitam a sua
exploração racional, proporcionando alta produtividade ao longo do tempo. As
recomendações para a conservação do solo abrangem tanto as práticas de mecanização como
as de caráter edáfico e vegetativo, visando à melhoria ou a conservação de suas características
físicas, químicas e biológicas. Neste sentido, o reflorestamento conservacionista auxilia no
controle da degradação ambiental, complementando as demais práticas de manejo e
conservação de solos.
Assim, torna-se necessário manter as florestas nos topos de morro, nas áreas de solos
rasos, à beira de rios e nascentes, pois melhora o clima local, protege a fauna, previne a
erosão, regula o ciclo das águas e mantém a qualidade da mesma.
Conforme sinalado, a chamada modernização da agricultura mundial, e não menos a
local, levou ao aumento da produção e da produtividade. Entretanto, o uso inadequado dos
recursos naturais como solo e a água, associado ao desmatamento, desprovido de critérios
sustentáveis de exploração, levaram a um rápido processo de degradação ambiental. Este
processo refere-se especialmente às áreas de mata ciliar e áreas de reserva florestal legal.
No município de Palotina, segundo o censo agropecuário do IBGE/2006, o
percentual de área de remanescente florestal é de 11,57%. O atual Código Florestal Brasileiro
preceitua que, a área mínima de cobertura florestal para o sul do Brasil, deve ser no mínimo
20% da área de cada propriedade rural. Este déficit florestal existente contribui para a
degradação ambiental, impedindo ao cidadão o uso e o desfrute do direito fundamental
constitucionalizado do ambiente sadio e ecologicamente equilibrado.
Deste modo, faz-se necessário conhecer melhor a proposta de implantação da reserva
florestal legal, pois a mesma está em discussão nos meios legislativo, jurídico e ambiental que
engloba a alteração do Código Florestal, cujo projeto de lei se encontra em discussão no
Congresso Nacional. A questão é muito polêmica e vem causando grandes divergências entre
ambientalistas e proprietários de terras, uma vez que trata da estipulação do percentual ideal
de preservação das áreas naturais, mediante a chamada reserva florestal legal.
Em vista da crescente conscientização ambiental, encontram-se na sistemática legal
ambiental brasileira dispositivos que limitam o direito de propriedade em prol do meio
13
ambiente. Entre eles estão positivados os que impõem, no caso do proprietário rural, a
conservação de um percentual do imóvel como reserva florestal, chamada reserva florestal
legal.
Portanto, a reserva florestal legal é um instituto de preservação que, pelo seu
percentual e destinação, mostra-se de grande importância na política do meio ambiente.
Como evidenciado, as práticas agrícolas implicam a seleção de espécies vegetais e
animais, simplificando e transformando o ecossistema com o objetivo de produzir
determinados alimentos, tendo por referência a produção para a subsistência ou a demanda do
mercado. Contudo, é na agricultura voltada às demandas de mercado que a simplificação
ecossistêmica atinge seus níveis mais elevados.
A conseqüência maior dessa simplificação, ditado pelo uso do pacote tecnológico
aplicada à exploração agropecuária, interfere na capacidade de auto-regulação natural que
depende da complexidade. O equilíbrio e a estabilidade de um novo sistema simplificado pelo
homem passam, portanto, a depender de uma permanente interferência no sistema produtivo,
deste último (ROMEIRO, 1998, p. 249).
A simplificação do meio adotada pelo atual modelo produtivo agrícola, possibilita
um maior controle do trabalho, limitando o poder de argumentação e decisão do agricultor,
representa uma intensa dependência exógena de energia e insumos. O desafio atual de superar
a dicotomia entre agricultura e meio ambiente é o de recuperar práticas conservacionistas e
preservacionistas como diretrizes de desenvolvimento agrícola (CAMPOS, 1999, p. 231).
De acordo com Veiga (1994, p. 22), a sustentabilidade na produção agrícola depende
da superação do paradigma cartesiano/newtoniano. Para o autor, torna-se necessário superar a
postura disciplinar do conhecimento científico. Abramovay (1992, p.157-182) complementa
esta proposição ao argumentar que a crise ambiental é um problema que têm repercussões
sociais, econômicas e políticas.
Trigo et al. (1994, p. 09-31), ao discutir os recursos naturais, afirma que os
ecossistemas não são estáticos, por isso a sustentabilidade dos recursos naturais implica
posturas que devem ser dinâmicas visando assegurar as condições necessárias para a sua
evolução (TRIGO et al., 1994, p. 26). Conway (apud VEIGA, 1994, p. 21) menciona que um
agroecossistema sustentável deve ser estável em termos de produtividade, ser capaz de fazer
frente a momentos de adversidades naturais e deve conter equidade social no trabalho e na
distribuição de resultados. Nijikamp (apud VEIGA, 1994, p. 21) diz que a sustentabilidade
envolve dimensões ecológicas, econômicas e sociais associados ao respeito dos valores
sociais e culturais envolvidos.
14
A sustentabilidade ambiental envolve também uma agricultura sustentável, sendo que
esta deve incorporar, à lógica do sistema de produção, os ciclos ecológicos, a redução do uso
de insumos externos, justiça social na distribuição do trabalho e dos seus resultados, o
aumento da diversidade genética e biológica, o conhecimento e os valores da comunidade
local, a racionalização da produção, buscando eliminar os desperdícios e o uso inadequado
dos recursos de forma a tornar o mais constante possível às taxas de produtividade. Assim,
podem-se listar três condições para uma agricultura mais sustentável. A primeira diz respeito
ao emprego de tecnologias de conservação dos recursos adaptadas às especificidades locais. A
segunda se refere à participação da comunidade local na gestão dos recursos. E a terceira
condição está atrelada à disponibilidade de recursos profissionais e econômicos externos à
comunidade, quer governamentais, quer não, mas que a auxiliem na gestão dos recursos
(PRETTY, 1995, p. 07).
Carmo (1998, p. 11), ao discutir a sustentabilidade da agricultura sob seus aspectos
tecnológicos, menciona uma agricultura que se adapta às diferentes condições ambientais,
com um agrossistema holístico e práticas de manejo que estimulam a atividade do solo. Com
relação ao aspecto ecológico, a agricultura sustentável , para a autora, apresenta um sistema
de produção diversificado que integra, sustenta e intensifica as interações biológicas, que
apresenta ainda uma combinação da produção vegetal com animal, bem como agrossistemas
constituídos por indivíduos de potencial produtivo alto ou médio, e com relativa resistência às
variações das condições ambientais. E, por fim, ao discutir os aspectos sócio-econômicos,
relaciona como principais características desta agricultura o retorno econômico a médio e
longo prazo, a baixa relação capital/homem, a alta eficiência energética e a produção de
alimentos de alto valor biológico. Neste sentido, espera-se que a estrutura de produção
familiar sustentável seja capaz de se adaptar mais facilmente às práticas econômicas cujos
benefícios são obtidos em longo prazo, rompendo com o imediatismo econômico do mercado
contemporâneo.
Em face do exposto, a proposta do trabalho orienta-se no sentido de desenvolver um
estudo de caso do município de Palotina, Paraná, conjugando agricultura familiar e
sustentabilidade ambiental, mais especificamente, no que se refere à
composição/recomposição da reserva florestal legal.
O interesse do referido estudo está centrado na análise da existência de reserva
florestal legal nos estabelecimentos rurais dos agricultores familiares de Palotina. Parte do
pressuposto de que os percentuais de reserva florestal legal estão aquém dos preconizados
15
pela legislação ambiental vigente.
4
Procura estabelecer relações entre os limites e os avanços
do processo de composição/recomposição do percentual de mata registrado nos últimos anos
por parte dos detentores da terra da agricultura familiar em Palotina, nos termos preconizados
na legislação, e a conexão da lógica de reprodução da agricultura familiar com a parcial
adesão à proposta de regularização deste passivo ambiental.
Esta situação está relacionada ao fato do agricultor familiar estar inserido em uma
dinâmica de produção para o mercado, onde os resultados são expressos e mensurados pela
produção em larga escala, do que decorre e expansão física da área explorada
economicamente. Deste modo, a proposta da lei não consegue se sobrepor aos interesses
econômicos, permanecendo, neste caso, o cenário de fict florestal frente ao positivado nas
leis ambientais brasileiras.
Abramovay (1998, p. 97) dá conta da existência no Brasil de uma agricultura familiar
integrada a um processo mercantil para sobreviver e se reproduzir, onde “[…] a
mercantilização materializa-se por meio do processo de externalização, de cientifização da
produção e da dependência estrutural em relação aos mercados pelos agricultores.”
A discutível eficiência da aplicação da legislação contribuiu para este cenário de
déficit da cobertura florestal mínima. Corrobora ainda com esse fato a cultura da
administração pública ao longo do período ditatorial do país, que constituiu uma estrutura
jurídico-institucional verticalizada e com tendência à centralização. Por outro lado, o período
pós-constituição (Constituição Federal de 1988) passou a ser marcado pela fragmentação das
ações entre as esferas do governo (criou-se um emaranhado de leis, órgãos fiscalizadores,
planos de manejo ambiental, fundos municipais de meio ambiente, área de proteção ambiental
etc.), obstruindo a necessária intercomunicação e interação entre elas. O resultado foi a
freqüente sobreposição de projetos entre as esferas de governo e/ou entre órgãos de uma
mesma esfera para tratar de um mesmo problema. Por outro lado, a forte resistência por parte
de alguns setores da sociedade para recuperar o ambiente utilizado indevidamente aponta para
a premência de mudança de paradigma e estratégia de conservação da biodiversidade.
O histórico de ocupação do município de Palotina conduz a uma economia baseada
na produção primária, sendo que o agricultor foi motivado e legitimado pelos órgãos públicos,
estadual e federal, para a necessidade da abertura das áreas de cultivo por meio da derrubada
das matas. Ainda hoje, dado a juventude da colonização do município, pode-se encontrar o
mesmo agricultor familiar explorando a mesma área de terra que foi incentivado, pelos
4
O Código Florestal Brasileiro que trata da obrigação de recompor os 20% da cobertura florestal em cada
imóvel rural foi promulgado em 1965.
16
organismos públicos, a fazer a derrubada das matas. Do incentivo oficial à situação vigente,
paradoxalmente a legislação ambiental passou a considerar o agricultor como transgressor da
norma jurídica, e, portanto, podendo ser penalizado pela mesma.
Este processo estabeleceu um significativo passivo ambiental apresentado nas
propriedades rurais como um todo, que, atualmente, representa uma contrariedade ao
consignado nas leis ambientais vigentes.
Com o propósito de alterar/reverter esta situação, o Ministério do Meio Ambiente
criou diversos decretos
5
que regulamentaram a Lei de Crimes Ambientais com inferências à
reserva florestal legal, estabelecendo sanções administrativas ao seu não cumprimento.
A publicação destes decretos impulsionou o setor produtivo da agropecuária e seus
representantes para uma mobilização contrária à proposição estabelecida nos mesmos,
desencadeando no Congresso Nacional a proposta para mudança do Código Florestal.
No município de Palotina, os agricultores e suas lideranças tiveram adesão maciça a
este movimento, solicitando, junto aos seus representantes políticos, o compromisso à
alteração da Legislação que trata do Código Florestal. Cabe destacar que o Ministério da
Agricultura representa, neste processo, o principal articulador das propostas feitas pelo setor
produtivo agropecuário.
Diante da problemática apontada, o objetivo deste trabalho é identificar e discutir
quais os fatores que contribuem para o comportamento de resistência do agricultor familiar de
Palotina à observância do positivado nas leis sobre a composição/recomposição da reserva
florestal legal.
Desta questão posta deriva a hipótese de que este comportamento de resistência tem
relação com a ocupação do espaço construído a partir das referências socioculturais dos seus
pioneiros e o modelo de produção adotado nos estabelecimentos rurais dos agricultores
familiares, cuja infra-estrutura, mão-de-obra existente e economia convergem para a produção
de commodities como principal produto.
Para tanto, o desenvolvimento do trabalho obedece a uma construção teórico-
metodológica que se fundamenta na contextualização histórico-espacial para incidir sobre um
estudo de caso como instrumento de investigação. Vale-se da pesquisa de fontes
bibliográficas e documentais legais (legislação ambiental) e de uma pesquisa de campo
qualitativa indutiva. Visto de uma forma sintética, o trabalho está estruturado em sete
5
Conforme Decreto Federal de número 7.029 de 11 de dezembro de 2009, o prazo final para averbação da
reserva florestal legal é 11 de junho de 2011.
17
unidades temáticas, que compõem as etapas da pesquisa, sendo a primeira composta por esta
introdução.
A segunda unidade temática discute a caracterização da agricultura familiar e sua
lógica de reprodução;
A terceira unidade analisa o recorte geográfico definido - município de Palotina – PR
– sob os aspectos geográficos, econômico e social com o propósito de compreender a
formação do espaço agrícola e a relação entre trabalho, meio ambiente e produção até o
estágio atual;
A quarta unidade propõe uma abordagem da questão ambiental no mundo e seus
reflexos positivos no comportamento ambiental brasileiro;
A quinta unidade discorre através de uma abordagem comparativa entre o estatuído
legalmente pelas leis ambientais no que tange à reserva florestal legal e as práticas culturais
desenvolvidas pelos Agricultores Familiares em relação à questão da reserva florestal legal,
bem como, as implicações legais contidas nestas leis quando da permanência do passivo
ambiental e da possibilidade de uso desta área para fins econômicos;
A sexta unidade apresenta a metodologia e procedimento da pesquisa para obtenção
dos dados por meio de questionário (Apêndice 1) em forma de entrevista orientada junto a
uma amostra de agricultores familiares do município de Palotina. Conforme consta do
cadastro do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Palotina (órgão credenciado junto ao
Ministério de Desenvolvimento Agrário (MDA) para efetuar o enquadramento da categoria
agricultor familiar), de um total de 623 agricultores familiares existentes no município, 33
agricultores familiares foram entrevistados. Estes agricultores familiares entrevistados fazem
parte àqueles que acessaram a linha de crédito investimento através do Programa Nacional de
Fortalecimento da Agricultura Familiar (PRONAF) no primeiro semestre de 2009, sendo os
projetos técnicos elaborados pelo Instituto Paranaense de Assistência Técnica e Extensão
Rural (EMATER) unidade local de Palotina. Salienta-se que a amostragem limitada do
número de agricultores familiares, se deve, sobretudo, a natureza qualitativa da pesquisa, que
optou pelo aprofundamento das questões, sem desconsiderar o leque de possibilidades de
informações.
O segundo momento desta unidade temática trata da análise dos resultados obtidos
por meio da pesquisa de campo, quando então é possível identificar os fatores as causas da
resistência do agricultor familiar à proposta de composição/recomposição da reserva florestal
legal.
18
Na sétima unidade, são apresentadas as reflexões finais sobre as tendências/desafios
que envolvem o crescimento econômico concomitante com a conservação do meio ambiente,
a tranqüilidade social e a ordem pública.
19
2 A AGRICULTURA FAMILIAR: ELEMENTOS CONCEITUAIS E
CARACTERIZAÇÃO
A Lei Federal de número 11.326 de 24 de julho de 2006, além de determinar que a
agricultura familiar passe a ser considerada categoria produtiva, estabelece critérios para
identificação da mesma. Tais critérios têm a sua definição associada ao tamanho de área
máxima do estabelecimento rural, à mão-de-obra utilizada neste estabelecimento para
desenvolver as atividades produtivas, à renda máxima e à origem desta renda obtida
6
.
Ainda, por meio desta lei, a agricultura familiar passa a ser reconhecida como um
segmento produtivo e se encerram as dúvidas sobre a sua conceituação legal. Passa a garantir
também, participação de agricultores e agricultoras familiares na formulação e implementação
das políticas públicas e as relações de trabalho e organizacionais nesse segmento se
fortalecem com a aplicação de diversas políticas fundamentais para os agricultores familiares,
como o da previdência social. Já os órgãos governamentais, poderão adotar este conceito para
aplicar outras medidas em benefício ao segmento, além do Programa Nacional de
Fortalecimento da Agricultura Familiar (PRONAF) do Ministério do Desenvolvimento
Agrário (2009).
Todavia, a caracterização do segmento sócio-produtivo dos agricultores familiares
deve ir para além do estabelecimento de critérios. As discussões sobre a gênese e a forma de
reprodução dessa categoria devem ser abordadas para conduzir ao entendimento não só do
espaço que ocupa, mas também de suas dinâmicas sociais, culturais e econômicas.
Neste sentido, frente à dinâmica de formação e transformação da agricultura,
Carneiro (1997, p. 147-185) propõe, para análise da categoria da agricultura familiar, a
relevância da “decomposição e recomposição de sistemas sociais” diante das diferentes
relações que cada um estabelece com outros sistemas. Seguindo a mesma lógica, Tavares
(2002, p. 20) sugere que, para a caracterização da população do espaço rural, sejam
considerados também “[…] os elementos históricos, sociológicos e geográficos […]”.
Questões relativas à ocupação de determinado espaço e sua vocação, constituem aspectos que
ajudam a explicar e caracterizar a população desse meio.
6
Os critérios estabelecidos na Lei Federal estão assim especificados: a) não deter área maior do que quatro
módulos fiscais; b) utilizar, predominantemente, mão-de-obra da própria família nas atividades econômicas do
seu empreendimento; c) ter renda familiar, predominantemente, originada de atividades econômicas
vinculadas ao próprio estabelecimento ou empreendimento; e, d) dirigir o estabelecimento ou empreendimento
com o auxílio de pessoas da família (MINISTÉRIO DO DESENVOLVIMENTO AGRÁRIO, 2009, p. 05).
20
Assim, a discussão sobre a agricultura familiar passa pelo contexto que se formou em
seu entorno, envolvendo a importância dos centros urbanos e sua cultura, também a questão
do mercado e da globalização econômica, e de como essa categoria se transformou para
adaptar sua própria lógica a esta realidade (WANDERLEY, 1996, p. 6).
2.1 A Gênese e o Conceito da Agricultura Familiar
A agricultura familiar vem, ao longo do tempo, buscando formas de adaptação para
se desenvolver e possibilitar sua inserção nas dinâmicas que a cercam. Porém, para entender
essa trajetória, é necessário o encontro com a origem dessa categoria, que empresta de alguns
modelos de agricultura características que constituem a base de sua formação.
Ao falar da origem da agricultura familiar, Tchayanov (1972 apud LAMARCHE,
1997, p. 17) constitui um modelo que apresenta:
Inter-relação entre a organização da produção e as necessidades de
consumo; o trabalho é familiar e não pode ser avaliado em termos de lucro,
pois o custo objetivo do trabalho familiar não é quantificável e o objetivo da
produção é o de produzir valores de usos e não valores de troca.
Assim, a forte relação estabelecida entre a família, a propriedade e o trabalho
representam o foco de preocupação do camponês com relação à garantia de sobrevivência no
presente e também com o que Wanderley (1996, p. 3) chama de “horizonte das gerações”, a
garantia das gerações futuras. Desse modo, a transmissão do conhecimento a essas gerações
constitui um dos eixos da forma de reprodução do campesinato, bem como o sistema de
policultura desenvolvido por este público como forma de assegurar a subsistência familiar.
Lamarche (1997, p. 15) confirma essa idéia ao deixar explícito que esse modelo de agricultura
requer as noções de “transmissão do patrimônio e a reprodução da exploração”.
Nessa mesma linha, Tavares (2002, p. 46) define o camponês como sendo:
[…] um produtor rural, proprietário ou não, que trabalha direta e
pessoalmente a terra, com a produção baseada fundamentalmente no
trabalho familiar e que ocasionalmente pode utilizar outros poucos
elementos (mão-de-obra temporária, principalmente para colheita e troca de
dia entre a vizinhança), remunerando-os de maneira variada; o trabalho não
pode ser avaliado em termos de lucro, pois seu custo objetivo não é
quantificável; geralmente praticam a policultura, cuja pequena produção,
obtida em áreas não extensas e
por meio de técnicas rudimentares (na
maioria das vezes), destina-se ao consumo familiar (elevado valor de uso),
sendo apenas o
excedente destinado para o mercado (pequeno valor de
21
troca). Dito de outra forma há forte inter-relação entre a organização da
produção e as necessidades de consumo; possuem relativa independência
com relação à sociedade envolvente, devido à auto-suficiência, porém
estabelecem alguma relação com esta e apresentam-se em posição de
subordinação econômica, social e política a outras categorias, tanto rurais
quanto urbanas.
Wanderley (1996, p. 5), por sua vez, enfatiza que o caráter de subsistência não
encerra a definição da agricultura camponesa. Com base em Lamarche (1997, p. 2), essa
autora afirma que a agricultura camponesa se define, sobretudo por um forte desejo de
conservação e de ampliação do patrimônio familiar. Por fim, cabe mencionar a forte relação
com a terra explorada pela mão-de-obra familiar como outro traço definidor dessa categoria
social. Lamarche (1997, p. 15) confirma tal proposição ao afirmar que a produção camponesa
“[…] corresponde a uma unidade de produção agrícola onde propriedade e trabalho estão
intimamente ligados à família.”
Esse modelo constitui o que Lamarche (1997, p. 58) convencionou chamar de
“Modelo Original”, ou seja, aquele em que os diversos modelos encontram suas raízes, mas
não o reproduzem em sua plenitude
7
. Assim, as variações em relação ao “Modelo Original”
refletem as diferentes lógicas desenvolvidas historicamente para a reprodução da agricultura,
constituindo o que o autor denomina de “Modelo Ideal”. Esse modelo abriga assim a
diversidade das formas de agricultura desenvolvidas.
Dentro dessa diversidade, encontram-se, como exemplos: a agricultura de
subsistência, cujo objetivo é a sobrevivência familiar; os empreendedores agrícolas que, com
o uso de mão-de-obra assalariada, objetivam ganhos máximos; e a agricultura familiar, que
visa a reprodução familiar, sendo esta última a categoria de interesse deste trabalho
(LAMARCHE, 1997, p. 18).
Muito embora a agricultura familiar brasileira, na atualidade, busque novas formas
de adaptação e reprodução, encontra no Modelo Original do campesinato a origem de sua
formação e reprodução. Algumas características, tais como, a forte relação estabelecida entre
a família, a propriedade e o trabalho no campesinato, são extremamente relevantes como
identificadores dessa categoria, e também hoje são encontradas na agricultura familiar
moderna.
A modernização agrícola intensificou a valorização da unidade agrária, resultando
em uma maior concentração fundiária, bem como na dificuldade de acesso à terra por parte do
7
Ainda no “Modelo Original”, Lamarche (1997, p. 17), além da agricultura camponesa, também destaca a
colonial. Conforme o autor essa agricultura trata-se de “[...] um modelo fundado na produção mercantil e na
utilização de uma mão-de-obra exterior à família.”, não constituindo assim objeto de discussão desta pesquisa.
22
pequeno produtor rural (DAVID, 1996, p. 207). A modernização agrícola aprofundou assim
as diferenças entre as categorias de agricultores rurais e conduziu a agricultura camponesa à
busca de adaptação para sua reprodução, assumindo novos contornos e dando lugar à
chamada agricultura familiar. Esse agricultor familiar não carrega mais consigo a integridade
das características da agricultura camponesa, mas se apresenta fortemente ligado à
propriedade, constituindo uma forma de agricultura que busca sua inserção na economia de
mercado por meio do trabalho desenvolvido pela mão-de-obra familiar.
Nesse processo, a agricultura familiar apresenta uma gama de variações da forma de
reprodução em razão não só de suas inter-relações com a economia de mercado, que se
apresenta como um processo capitalista, mas também em razão de sua comunicação com
outros campos, tais como o social e o cultural.
A agricultura familiar foi assumindo o seu caráter diverso, apropriando-se dos meios
de produção e desenvolvendo-os na busca de uma lógica de reprodução satisfatória. Vale
dizer, “[…] a agricultura familiar não é um elemento da diversidade, mas contém, nela
mesma, toda a diversidade.” (LAMARCHE, 1997, p. 18). Desse modo, o caráter de
homogeneidade, presente na agricultura camponesa, não integra a agricultura familiar.
A agricultura familiar, que encontra suas raízes no campesinato, desenvolveu outras
formas de reprodução buscando sua adaptação ao mundo moderno, considerando sua
“comunicação” com o espaço urbano e a questão da inserção em um sistema produtivo e uma
economia capitalista, muito embora essa inserção seja representada por uma produção em
pequena escala. Santos (2001, p. 62), refere-se às adaptações da agricultura familiar e ao
capitalismo presente, esclarecendo que “A penetração do capitalismo no campo […] não tem
significado historicamente a destruição da pequena produção, mas a redefinição de seu papel
no movimento mais geral da acumulação.”
Gazola (2006, p. 88), por meio de seus trabalhos de pesquisa realizados na Região do
Alto Uruguai, Rio Grande do Sul, destaca que o crescente processo da mercantilização
8
faz
com que a produção de alguns itens esteja voltada:
[…] quase que exclusivamente para a venda, assumindo, portanto, apenas
valor nos circuitos de mercado. Já os produtos de autoconsumo possuem
apenas valorização na esfera interna da unidade familiar, servindo para
manutenção dos membros do grupo doméstico e importância na sua
segurança alimentar e na sua reprodução social.
8
“A mercantilização materializa-se por meio do processo de externalização, da cientifização da produção e da
dependência estrutural em relação aos mercados pelos agricultores.” (GAZOLA, 2006, p. 84).
23
O autor ainda menciona que há diferentes graus de mercantilização do consumo entre
os agricultores familiares. Mas que um maior grau de mercantilização do consumo
necessariamente não se reflita em uma maior vulnerabilização do agricultor familiar no
interior da unidade de produção (GAZOLA, 2006, p. 90).
Assim, na busca de uma caracterização geral da agricultura familiar, adequada ao
mundo contemporâneo, Tavares (2002, p. 58) sustenta que o produtor integrante dessa
categoria se caracteriza como sendo “[…] um produtor familiar-trabalhador que não é
camponês e nem assalariado, mas um agricultor familiar, o qual não tem autonomia completa
de seus meios de produção, embora tenha sua propriedade.”
Ainda na construção de uma definição para a agricultura familiar, Souza (2002, p.
38) afirma:
A agricultura familiar pode ser definida como aquela em que a família, além
de deter uma relação de propriedade sobre a terra (meio de produção),
assume a responsabilidade pela execução do trabalho necessário ao processo
produtivo. Podemos entendê-la como uma categoria genérica, pois a
associação entre o trabalho familiar e a propriedade assume diferentes
formas quanto à organização e aos objetivos da produção ao longo do tempo
e do espaço.
Assim, o modelo de agricultura familiar atual, que apresenta na sua base
características da agricultura camponesa tais como o uso da mão-de-obra familiar e o valor
atribuído a terra, mistura-se com a sua realidade e se reconstrói com o propósito de se adaptar
e conseqüentemente se reproduzir.
Para aprofundar a discussão sobre estas características da agricultura familiar, é
importante proceder a análise sobre as atividades desenvolvidas por esta categoria e a forma
como ela se apropria de novos conceitos e se transforma.
2.2 As Atividades Desenvolvidas Pelos Agricultores Familiares
A forte correlação do espaço rural com as atividades agropecuárias faz com que, na
sua caracterização tradicional, algumas concepções apontem para a extinção desse espaço tal
como se apresenta, visto a sua inserção no processo de industrialização e urbanização, que
promovem mudanças nos meios de produção econômica e também nos aspectos sócio-
culturais. Essa concepção é ainda fortalecida pelo processo de globalização, que levaria o
espaço rural a se urbanizar. Essas lógicas são também corroboradas pela redução da densidade
24
demográfica da População Economicamente Ativa (PEA) rural ocorrida anteriormente no
espaço rural.
Para Silva e Del Grossi (2003b, p. 3), a queda da taxa de emprego nas atividades
agropecuárias, similarmente ao ocorrido na indústria, no final do século passado,
caracterizado como período pós fordisda ou pós-moderno, culminou nas transformações do
espaço rural na atualidade somadas à modernização da agricultura e à urbanização do meio
agrícola.
Estas transformações são resultado de três elementos correlacionados à dinâmica
social e econômica do espaço rural: o primeiro elemento está intimamente relacionado à
chamada agropecuária moderna, à produção de commodities e estreitamente vinculado à
agroindústria (como exemplo, pode-se citar a produção de soja no oeste paranaense); o
segundo constitui-se das chamadas atividades não-agropecuárias que são desenvolvidas
combinadas ou não com as atividades agrícolas ligadas à moradia, ao lazer e a várias
atividades industriais e de prestação de serviços; e o terceiro trata-se das atividades
agropecuárias desenvolvidas em nichos específicos de mercado (SILVA; DEL GROSSI,
2003b, p. 1).
Klein (1999) e Weller (1997) (apud SILVA; DEL GROSSI, 2002, p. 14) identificam
ainda cinco dinâmicas existentes no espaço rural para explicar as atividades desenvolvidas, a
saber:
1. as atividades econômicas derivadas da produção direta de bens e serviços
agropecuários ou indiretamente da sua comercialização, processamento e
transporte, bem como o consumo intermediário de insumos não-agrícolas
utilizados nesses processos;
2. atividades derivadas do consumo final da população rural que incluem a
produção de bens e serviços não agropecuários, tanto de origem rural, como
também urbanos;
3. atividades derivadas da grande mão-de-obra excedente do setor camponês
(“emprego de refúgio”), englobando aí tanto o trabalho a domicílio, como o
trabalho complementar daqueles que exercem outra atividade fora de suas
fazendas, seja ela agrícola (por ex., trabalho assalariado estacional) ou não.
4. o consumo pela população urbana de bens não-agrícolas produzidos em
áreas rurais, como o artesanato, turismo rural etc;
5. os serviços públicos nas zonas rurais.
Estas classificações podem explicar a dinâmica de espaços onde o trabalho
assalariado é bastante utilizado por unidades agrícolas maiores e onde haja a presença de
muitas unidades de base familiar. Mas devem-se mencionar as dinâmicas que interagem com
25
o setor urbano e este se apresenta como determinador dos produtos a serem desenvolvidos e
oferecidos.
De acordo com esta constatação, Silva e Del Grossi (2002, p. 7) identificam outras
três dinâmicas que satisfazem a relação existente entre a população urbana residente próxima
à área rural e à população rural:
a. demanda da população urbana de altas rendas por áreas de lazer e/ou
segunda residência (casas de campo e de veraneio, chácaras de recreio) bem
como a prestação de serviços pessoais a elas relacionados (caseiro,
jardineiro, empregados domésticos, etc.);
b. demanda da população de baixa renda por terrenos para autoconstrução de
suas moradias em áreas rurais;
c. demanda por terras não-agrícolas por parte de indústrias e empresas
prestadoras de serviços que buscam meio rural como uma alternativa
favorável de localização para fugir das externalidades negativas dos grandes
centros urbanos (condições de tráfego, poluição, etc.).
Ferreira (1999, p. 147) relaciona outra lógica, indicando uma reorganização do
espaço rural e, adaptando-se às dinâmicas atuais, menciona o exemplo da Espanha e de outros
países da Europa em que há uma revalorização do rural, sendo indicada inclusive pelo
aumento da densidade demográfica nesse espaço.
Souza (2002, p. 36) ressalta, também, sobre o mesmo aspecto que:
A nova realidade do espaço rural não deve ser interpretada apenas como o
resultado da subordinação do campo ao capital e aos valores urbanos
industriais, pois, ao contrário, muitos dos símbolos e tradições próprios da
cultura rural são buscados como objeto de consumo pela sociedade urbana.
Assim, Entrena Durán, (1998, p. 143) salienta que “[…] o rural se constrói
socialmente e, como social, está sujeito a mudanças.”. Desse modo, fortalece-se a idéia de
uma agricultura familiar buscando sua inserção nas dinâmicas produtivas atuais,
reorganizando-se social, cultural e economicamente, bem como mantendo um intercâmbio
com o espaço urbano para dar fluxo às estas dinâmicas, mas especialmente caracterizada pela
diversidade. No dinâmico processo de organização e reorganização do espaço rural, a
diversidade das atividades desenvolvidas não se restringe mais às atividades agropecuárias.
Desse modo, torna-se inconsistente utilizar unicamente estas atividades como parâmetros para
caracterizar o espaço rural.
Do ponto de vista da agricultura familiar, a heterogeneidade das atividades
desenvolvidas no espaço rural se expressa na forma da pluriatividade, fenômeno que tem
26
suscitado a produção de várias pesquisas e, conseqüentemente, o surgimento de novos
parâmetros para explicar a ocupação da mão-de-obra existente no espaço rural e a forma de
reprodução. Assim, Silva e Del Grossi (2002, p. 11) discutem, no projeto (RURBANO), a
pluriatividade presente nas atividades desenvolvidas no espaço rural e concluem:
[…] já não se pode mais caracterizar a dinâmica do meio rural brasileiro
como determinada exclusivamente pelas atividades agropecuárias. Assim,
por exemplo, o comportamento do emprego rural e principalmente dos
movimentos da população residente nas zonas rurais, não pode mais ser
explicado apenas a partir do calendário agrícola e da expansão/retração das
áreas e/ou produção agropecuárias. Há um conjunto de “novas” atividades
agrícolas e não-agrícolas – tais como a prestação de serviços (pessoais, de
lazer
ou auxiliares das atividades econômicas), o comércio e mesmo
atividades industriais – que respondem cada vez mais por outras dinâmicas
populacionais no meio rural brasileiro.
A crescente tendência da pluriatividade, no espaço rural, transcende a análise de
transformação do agricultor em proletário ou mesmo a decomposição da agricultura familiar,
mas representa sim a busca da complementaridade da receita exercida por ele e pelos
membros da família.
A agricultura familiar encontra, na história do campesinato, as explicações para este
caráter pluriativo, haja vista que, no caso do Brasil, diferentemente da Europa, o modelo de
agricultura fortalecido foi o da grande propriedade, relegando o campesinato a planos
inferiores, delineando um perfil de agricultura desestruturada e precária, conforme Wanderley
(1996, p. 9) salienta:
Porém, mesmo considerando que todas as formas da precariedade são
diferenciadas, os camponeses tiveram, de uma maneira ou de outra, que abrir
caminho entre as dificuldades alternativas que encontravam: submeter-se à
grande propriedade ou isolar-se em áreas mais distantes; depender
exclusivamente dos insuficientes resultados do trabalho no sítio ou
completar a renda, trabalhando no eito de propriedades alheias; migrar
temporária ou definitivamente.
Também o emprego de mão-de-obra de terceiros constitui um recurso temporário e
variável utilizado para desenvolver a lógica de reprodução, estando intimamente relacionado à
estrutura familiar e ao sistema produtivo. Assim, estes agricultores buscam, por meio da
complementação de renda oferecida pelo trabalho pluriativo, a melhoria das condições de vida
familiar:
27
[…] a pluriatividade e o trabalho externo de membros da família não
representam necessariamente a desagregação da agricultura camponesa, mas
constituem, freqüentemente, elementos positivos, com o qual a própria
família pode contar para viabilizar suas estratégias de reprodução presentes
e futuras. (WANDERLEY, 1996, p. 5).
Assim, a ocupação da mão-de-obra familiar e sua relação econômica na renda
familiar, constituindo uma lógica de reprodução que se concentra estritamente no
desenvolvimento de atividades agropecuárias, não é suficiente para explicar esta categoria.
A diversidade da agricultura familiar tem como pano de fundo alguns processos
transformadores. O processo de mecanização agrícola pode ser considerado impulsionador de
uma profunda transformação no campo e conseqüentemente na categoria da agricultura
familiar. Deste modo, torna-se necessário a compreensão da dimensão deste processo.
2.3 A Mecanização Agrícola como Transformadora do Espaço Rural
O custo da modernização ocorrida no campo a partir dos anos 1960 representou um
alto investimento em recursos financeiros aplicados direto na produção primária. Tal período
foi caracterizado como uma nova era, haja vista que a proposta tecnológica apresentada
carregava a promessa de uma profunda mudança no modelo de produção, com maior
velocidade e precisão na realização das operações agrícolas com o uso de maquinários e
conseqüente elevação dos níveis de produtividade pelo alto uso de insumos agrícolas. Porém,
alguns autores observam que o modelo de modernização da agricultura ocorrido no país não
foi uniforme, pois não atingiu todos os produtos e todas as regiões agrícolas.
Segundo Elias (1996, p. 3) “[…] a difusão de inovações, assim como a distribuição
de crédito rural, deu-se de maneira não uniforme, constituindo um setor baseado em uma
estrutura dual, promovendo um desenvolvimento cada vez mais desigual e combinado do
setor no país.”
Essa transformação, quando então o investimento na mecanização e na aplicação de
insumos e corretivos químicos deu-se de modo intenso, pelo incentivo à produção de produtos
para a exportação, representou um corte em um modelo de produção, provocando à
remodelação da unidade agrícola e agrária.
Deste modo, a modernização agrícola associada ao sistema de crédito constituiu um
processo excludente para a agricultura familiar em razão das barreiras encontradas por esta
categoria para acessá-lo. Fleischfresser (1988, p. 24), destaca que este desenvolvimento
tecnológico deu-se de modo mais intenso e difundido nas tecnologias de produto que o autor
28
exemplifica com a cultura da soja, tendo havido uma concentração tecnológica para este
produto e ficando a produção agrícola familiar a margem desse processo implementado pelas
políticas públicas, ou seja, fica evidente o investimento em um modelo tecnológico,
desconsiderando as características intrínsecas às categorias da agricultura.
Nessa mesma linha, Elias (1996, p. 2) ainda menciona:
Antes do processo maciço de difusão de inovações na agricultura, a
produção destinada ao autoconsumo ainda ocupava grande parte da força de
trabalho a ela dedicada, especialmente no Terceiro Mundo. Mas, hoje, a
produção agrícola tem seu funcionamento cada vez mais regulado pela
economia de mercado, objetivando a troca, através do comércio, em função
das demandas urbanas e industriais, ficando restrita a poucas áreas a
produção de subsistência.
Por sua vez, David (1996, p. 210) afirma que o nível tecnológico alcançado, a
produção voltada essencialmente para o mercado e a vinculação ao sistema financeiro
acentuaram os problemas da organização da produção, diminuindo a relação entre os custos e
a renda obtida. Esse fato torna-se ainda mais grave em virtude da deficiência nos sistemas de
armazenagem, conservação e distribuição da produção, que não possibilitam ao agricultor
alcançar mercados e preços mais favoráveis, configurado, muitas vezes, pela venda imediata
da produção após a colheita quando então os preços dos produtos não são os mais favoráveis
ao produtor em razão da grande oferta, bem como a dificuldade da busca de mercados mais
vantajosos. Para fomentar a modernização do campo, foram ofertados grandes volumes de
crédito agrícola, os quais ficaram concentrados nos produtores que satisfaziam a proposta de
desenvolvimento de produção para exportação. Esses produtores, chamados empreendedores
agrícolas ou agricultores patronais, são caracterizados por apresentarem extensões de área
apropriadas para o desenvolvimento da agricultura em larga escala, bem como possuíam
condições para adoção de tecnologia compatível com esta proposta pela implementação de
novos níveis tecnológicos com intenso uso de maquinários e insumos (adubos e defensivos
químicos).
Apesar do quadro favorável à agricultura patronal para produção de commodities, a
agricultura familiar não se excluiu totalmente dessa lógica, porém com variações no sistema
de produção, especialmente no nível tecnológico e no tamanho da escala. Destaca-se que, em
alguns casos, a agricultura familiar adotou o modelo de produção da agricultura patronal na
tentativa de obtenção de amplas margens de lucros, tendo, para alguns, conduzido ainda mais
à descapitalização destas unidades familiares, visto o desenvolvimento de atividades não
29
adequadas à sua realidade. Pode-se citar, como exemplo, a atividade de produção de grãos
desenvolvida em Palotina por todas as categorias de produtores, cuja lucratividade está
intimamente associada à sua escala de produção.
O acesso ao crédito era para poucos. Segundo David (1996, p. 202), “Os recursos
financeiros proporcionados pelo governo deram um impulso à compra de máquinas, sementes
e insumos. Por conseguinte, essas medidas tiveram grande efeito na modificação da base
produtiva agrícola, particularmente na região Centro-Sul”.
Conforme Elias (1996, p. 4), este quadro permanece na atualidade, sendo as regiões
Sudeste, Sul e partes da Região Centro-Oeste as que mais produzem para exportação, bem
como produtos para atender à demanda interna que exigem alto capital e tecnologia, apesar da
proximidade com o mercado consumidor. “A modernização foi viabilizada via políticas
públicas (crédito subsidiado) para atender a demanda de produção além do fornecimento de
alimentos e matérias-primas à população urbana.” (DAVID, 1996, p. 200).
David (1996, p. 202) menciona alguns fatores propulsores da mecanização, como a
implantação, na primeira metade da década de 60, da indústria de tratores e implementos
agrícolas; os incentivos oferecidos pelos mercados interno e externo, as políticas
governamentais de apoio às lavouras capitalistas – baseadas na redução das taxas de juros e
do aumento dos prazos de financiamento para aquisição de máquinas e implementos agrícolas
– e, por fim, o uso de insumos modernos.
David (1996, p. 205) também discute, à questão da pluriatividade ao mencionar a
dinâmica do processo de modernização da agricultura, a exemplo do ocorrido no Rio Grande
do Sul, onde a expansão da pluriatividade resultou na retração da força de trabalho familiar,
provocando a expropriação dos pequenos produtores, que foram obrigados, para sua
sobrevivência, a complementar sua renda, vendendo sua força de trabalho nas épocas de
maior demanda por mão-de-obra.
Schneider (1999, p. 111) analisa as novas formas de reprodução da agricultura
familiar a partir do processo de industrialização difusa do setor coureiro-calçadista da região
do Vale dos Sinos ocorrido no Rio Grande do Sul. Para ele, “o emprego dos colonos,
especialmente os mais jovens, em atividades fabris não se caracteriza por um processo de
proletarização stricto sensu”. Segundo o autor, os efeitos da industrialização sobre a
agricultura familiar não provocam, de fato, o êxodo destas populações rurais para as cidades.
A proximidade da moradia dos agricultores familiares com as empresas calçadistas, no caso
da região do Vale do Rio dos Sinos, no Rio Grande do Sul, o fácil acesso ao transporte aliado
ao amplo mercado de trabalho oferecido por estas empresas, permitiram a combinação dos
30
trabalhos agrícolas com o acesso aos empregos não agrícolas por parte de alguns membros da
família dos pequenos agricultores (SCHNEIDER, 1999, p. 111).
Conforme Schneider (1999, p. 113), na literatura internacional sobre este tema, a
expressão part-time farming é frequentemente utilizada quando se refere à diversidade de
tarefas (agrícolas e não agrícolas) desempenhadas pelos membros de uma mesma unidade
familiar. “No sentido aqui empregado, pluriativos são os agricultores ou os componentes da
família rural que além de estarem ligados às atividades agrícolas em suas propriedades,
desempenham outro tipo de trabalho remunerado fora da propriedade”. Assim, a expressão
part-time farming refere-se às características que o trabalho assume na propriedade familiar,
que pode funcionar em tempo integral ou em tempo parcial, conforme o grau o de
envolvimento dos membros da família nas atividades ali desenvolvidas. Neste sentido,
quando a agricultura familiar assume as características de uma part-time farming, a força de
trabalho de origem rural passa a ter na pluriatividade um dos seus principais atributos com
reflexos significativos nas transformações dos processos produtivos agrícolas, bem como, a
do próprio espaço rural.
A venda da força de trabalho realizada pelos agricultores familiares configura a
pluriatividade exercida por este público. Silva e Del Grossi (2002, p. 03) destacam que o
aumento da pluriatividade entre os agricultores familiares coincide com a redução da
População Economicamente Ativa agrícola após os anos 1980 e também com a forte
mecanização da agricultura, mais particularmente nas regiões de expansão da fronteira
agrícola.
Porém, a agricultura familiar tem buscado sua adaptação à nova dinâmica existente
no espaço rural para se inserir no processo produtivo. Assim, Leite, (1989, p. 53), observa que
“Modernização da agricultura não significa forçosamente, extinção do pequeno, significa
mais seu fortalecimento, caso ele não fique alheio ao processo de inovação […]”
Alentejano (1998, p. 35) ainda destaca a pluriatividade presente nessa lógica: “A
subordinação cada vez maior do agro ao industrial e financeiro, mas também na expansão da
infra-estrutura urbana para o espaço rural - tendem a empurrar os trabalhadores do campo
cada vez mais em direção à pluriatividade.”
Para aprofundar ainda mais as diferenças entre os modelos de agricultura familiar e
empresarial, David (1996, p. 207) ao discorrer sobre a estrutura fundiária, observa que o
modelo agrícola brasileiro, pelo intenso uso de capital e tecnologia e as vantagens oferecidas
pelo crédito subsidiado, provocou a reversão da tendência de “minifundização”. De modo
31
análogo, a valorização da terra, provocada pela implementação da modernização agrícola,
aumentou o grau de concentração da propriedade fundiária.
Ainda para David (1996, p. 208), as políticas agrícolas brasileiras beneficiaram as
culturas denominadas dinâmicas, ou seja, aqueles produtos mais diretamente ligados à
indústria e à exportação, em detrimento dos produtos de subsistência.
As diferenças entre áreas no que se refere à capacidade de responder aos estímulos
técnicos para aumento da produtividade resultaram em uma “transformação de funções
historicamente exercidas por determinados produtos agrícolas” provocando uma “profunda
divisão social e territorial do trabalho agrícola no Brasil.” Destacam-se “as áreas que passam a
produzir produtos agropecuários industrializados ou semi-industrializados”, produtos estes de
exportação, “gerando um privilégio econômico a uma nova classe de empresários agrícolas ou
agroindustriais, com grande concentração de terras e de renda” (ELIAS, 1996, p. 4).
A agricultura deixa de ser um sistema isolado para estar diretamente vinculada à
indústria, ao comércio e ao setor financeiro. Torna-se dependente dos centros urbanos onde
são adquiridos os bens e serviços necessários à produção nesse setor. Por sua vez, a cidade
centraliza a comercialização, a industrialização de insumos e a agroindustrialização da
produção.
Chega-se então à noção de uma agricultura familiar moderna que envolve não só a
expansão do capitalismo como também a redefinição de antigas relações sociais agrárias.
Abarca não só a temática da subordinação ao capital, mas também relações não capitalistas
que permanecem e são recriadas pelo próprio capitalismo (COSTA NETO, 1998, p. 120).
A estrutura e a evolução do setor rural na década de 70 refletem de forma clara uma
nova dinâmica do período recente: uma dinâmica que não pode mais ser apreendida a partir
dos mecanismos internos da própria atividade agrícola (como a propriedade da terra, a base
técnica de produção, a fronteira) e nem a partir da segmentação do mercado interno versus
externo. Trata-se, agora, de uma dinâmica conjunta do tripé “indústria para a agricultura –
agroindústria”, que remete ao domínio do capital industrial e financeiro e ao processo global
de acumulação. É a fase de constituição dos complexos agroindustriais (CAIs). O conceito
chave por trás desse novo quadro de desenvolvimento da agricultura é o da integração de
capitais, isto é o processo de centralização de capitais industriais, bancários, agrários etc. que,
por sua vez, fundir-se-iam em sociedades anônimas, condomínios, cooperativas rurais e,
ainda, empresas de responsabilidade limitada, integradas verticalmente agroindústrias ou
agro-comerciais (SILVA, 2003, p. 90).
32
Deste modo, é nesta nova estrutura ditada pelo complexo de integração agroindustrial
que se encontra a maioria dos agricultores familiares de Palotina.
Uma vez caracterizada a agricultura familiar e os desafios de sua reprodução, no
capítulo seguinte, discorrer-se-á, sinteticamente, como esta agricultura familiar ocupou este
espaço partindo da Marcha para o Oeste sobre a ocupação do extremo oeste paranaense. O
resgate dos subsídios desse processo histórico permitirá a análise da política de ocupação e de
colonização do Estado Novo. Para tanto, reportar-se-á às raízes históricas da ocupação desta
fronteira internacional do ponto de vista da segurança nacional, da economia e da cultura.
Será abordado ainda, o processo de ocupação e exploração deste recorte geográfico ora em
estudo como reflexo desta política aliada ao favorecimento de implantação das atividades
agrícolas, haja vista os aspectos físicos e geográficos favoráveis deste território do qual
passaremos analisar.
33
3 CARACTERIZAÇÃO DO MUNICÍPIO DE PALOTINA
Anteriormente à caracterização do município de Palotina, necessária se faz uma
breve abordagem sobre o processo de ocupação do extremo oeste paranaense que se reproduz
na ocupação de Palotina.
Este processo de ocupação teve seu alicerce construído a partir da proposta política
de teor nacionalista delineada no período em que Getúlio Vargas esteve à frente do Executivo
Nacional, 1930-54 (FREITAG, 2001, p. 27). Salienta, que não foi somente durante a era
Vargas que ocorreram preocupações em relação à segurança do território brasileiro, mas, foi
durante o seu governo, principalmente, no período denominado Estado Novo, no período que
compreende do ano de 1937 a 1945, que esta ação política foi mais contundente.
As proposições das políticas imprimidas por Vargas, aliadas à função social da
intelectualidade brasileira comprometida com a legitimação dos objetivos nacionalistas do
regime político em pauta, desencadeou a articulação para o movimento das migrações
internas, ligado ao aspecto étnico. O desdobramento desta política territorial do Estado Novo
materializa-se na Marcha para o Oeste, entendida, como estratégica para o controle do espaço
geográfico da nação brasileira em seus limites nacionais e internacionais para esta região.
Assim, esta política migratória conecta-se ao processo de ocupação territorial do extremo
oeste paranaense.
A projeção nacionalista para os territórios do oeste do Brasil a povoar, e não menos
do Paraná, bem como para os territórios de fronteiras internacionais, nasceram, portanto, da
necessidade da defesa contra os perigos visualizados pelo Estado Novo, representados pelos
vazios demográficos e pela marcante presença estrangeira nesses espaços.
Em suma, mesmo que os mecanismos de atuação jurídico-política com o intuito de
interiorizar e ocupar determinados territórios já se fizessem presentes antes do período
Imperial, foi com o advento da República, em especial nos anos pós-1930, que questões
relacionadas à ocupação dos chamados vazios demográfico fossem eleitos como uma das
prioridades do Governo Federal (FREITAG, 2001, p. 39).
A política de governo, ao combinar as idéias de fragmentação da unidade territorial,
aliado aos perigos por ela representados para a soberania nacional, lançou mão de uma
estratégia de dominação sobre o corpo social, que se alicerçou na proposta nacionalista de
ocupação e desenvolvimento territorial, denominada Marcha para Oeste.
O slogan Marcha para Oeste foi elaborado no final do ano de 1937 e teve seus
objetivos insistentemente retrabalhados nos anos seguintes. Por meio das mais variadas
34
técnicas de propaganda, construiu a imagem da população marchando em direção da grande
obra de construção da unidade nacional. Por meio da ideologia nela contida, o movimento
migratório seria responsável pelo resgate da tradição histórica do país, integrando o homem a
terra (FREITAG, 2001, p. 41).
Assim, a Macha para Oeste apresentou um teor de estímulo ao sentimento de que
todos, indiscriminadamente, estariam participando do processo político de construção
nacional. Portanto, o alargamento das fronteiras territoriais seria, além de tudo, obra dos
trabalhadores nacionais. Diante disso, a utilização de imagens como dispositivos de
propagandas, além de construção de imaginários sociais, entendia claramente, as finalidades
políticas que os intelectuais do Estado difundiam.
Portanto, a multiplicidade de significados atribuídos a essa política migratória
derivava da estratégia geo-econômica do governo de Vargas, com o objetivo de articular
economicamente as diversas regiões do país (FREITAG, 2001, p. 44).
O processo de ocupação humana do território paranaense, segundo o modelo
explicativo de Pinheiro Machado, é produto de deslocamento de três frentes pioneiras básicas.
Destas, a mais antiga é a do “Paraná tradicional” que avançou do litoral para o planalto de
Curitiba, e após, para as zonas dos campos gerais; a segunda “frente” é da região norte,
impulsionada pela cafeicultura após a 1ª Grande Guerra; por último, a mais recente é a
“frente” sudoeste verificada em meados do século XX, tendo como base os migrantes
procedentes do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina. A migração do Rio Grande do Sul
para Santa Catarina e Paraná começou durante a Primeira Guerra Mundial, intensificando-se
gradativamente. Nos anos de 1954-555, o elemento gaúcho já era majoritário nessa sociedade
(GREGORY, 1993, p. 297).
No entanto, esta corrente migratória procedente do sul do país não ficou restrita ao
sudoeste do Paraná; foi além do Rio Iguaçu e colonizou o território do extremo oeste
paranaense, e nesse caso, por conseguinte, Palotina lócus de nossa pesquisa. A configuração
deste espaço teve como principal característica a apropriação e organização a partir dos
interesses de cunho capitalista das companhias colonizadoras de capital privado, que se
localizaram na região, principalmente, a partir do período estadonovista (FREITAG, 2001, p.
82).
Esses projetos de colonização possibilitaram condições objetivas para a inserção da
área na economia nacional, como produtos extrativos, a erva mate e a madeira. Assim, o
conceito de colonização aplicado para esta área significa o estabelecimento de descendentes
de ítalos e teuto-brasileiros em pequenos lotes de terras destinados à agricultura.
35
Dado este contexto, a ocupação e colonização do município de Palotina pode ser
entendida como derivada de todo este processo desencadeado para o extremo oeste
paranaense.
3.1 Localização Geográfica e Caracterização do Município de Palotina
O Município de Palotina, localiza-se no Oeste do Estado do Paraná, micro-região de
Toledo, Região Sul do Brasil. O Centro Político-administrativo de Palotina, é a cidade
homônima, localizada 24º 12’ de latitude sul e 53º 50’30” de longitude oeste de Greenwich e
a 289 metros acima do nível do mar (altitude). Possui uma área de 65.100 hectares, conforme
dados da Prefeitura Municipal de Palotina (1998).
Limita-se: ao norte com os municípios de Iporã e Francisco Alves; ao sul com
Maripá e Nova Santa Rosa; a leste com Assis Chateaubriand; e a oeste com Terra Roxa, como
demonstra o mapa abaixo:
Figura 1 – Localização do município de Palotina
Fonte: (INSTITUTO PARANAENSE DE DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO E SOCIAL (IPARDES),
2004, p. 03).
A proprietária dos lotes onde se situa cidade de Palotina foi da Empresa
Colonizadora “Pinho e Terra” Ltda. Esta colonizadora foi mais uma das empresas de
colonização do extremo oeste paranaense. Foi fundada em 1946, com sua sede instalada no
36
município de Céu Azul Paraná. O seu objetivo principal era a compra e venda de terra,
extração e exportação e o beneficiamento de madeiras.
Rui Castro, um dos acionistas da colonizadora Maripá
9
e também da Pinho e Terra,
no ano de 1953, adquiriu da Companhia Brasileira de Viação e Comércio (BRAVIACO), uma
extensão de terras denominada gleba Piquiri. Um ano após, a Pinho e Terras recebeu o direito
de colonizar esta área. Com uma extensão de 65.100 hectares de terras, deu origem ao espaço
que compreende hoje o município de Palotina.
O nome dado ao município resulta de uma homenagem dos diretores da Empresa
para a Congregação dos Padres Palotinos, “[…] que desde as primeiras casas que ali foram
construídas, destacaram um sacerdote para que, morando junto com eles, melhor pudesse
assisti-los e acompanhar de perto o rápido e surpreendente desenvolvimento nela verificado.”
(REGINATO, 1979, p. 37).
A homenagem proposta fez parte da estratégia montada pela Colonizadora Pinho e
Terra à estrutura disponibilizada para possibilitar a colonização. Freitag (2001, p. 112),
menciona que a colonizadora, entre outros corretores selecionados para a venda dos imóveis
recém demarcados, valeu-se dos serviços dos religiosos da Congregação Palotinos para
divulgar aos possíveis interessados a compra das novas áreas de terra. “Os convites aos
possíveis candidatos à colonização eram feitos, geralmente, após a missa (missas estas
rezadas no interior do Estado do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina) e os interessados se
reuniam no salão paroquial, fora ou dentro da igreja.” (FREITAG, 2001, p. 112).
Estabeleceu-se aí uma perfeita sintonia entre os interesses econômicos do grupo
empresarial ligado à colonização, à proposta política de nacionalização das fronteiras imposta
pelo Estado e aos objetivos dos Palotinos. Assim, os Palotinos foram os principais
incentivadores da colonização das terras que abrangem o atual município de Palotina
(FREITAG, 2001, p. 116).
9
A Industrial Colonizadora Rio Paraná S/A (MARIPÁ), foi fundada por um grupo de empresários gaúchos em
1946, com a sede na cidade de Porto Alegre. Esses empresários adquiriram a Fazenda Britânia, localizado no
Extremo Oeste Paranaense, com uma grande área de terra (aproximadamente 274.846 há) que pertencia a uma
antiga obrage. Salienta-se aqui, a forma de colonização adotado por esta colonizadora. A estrutura fundiária
teve como modelo o já implantado em São Miguel do Oeste, que por sua vez seguiu os padrões determinados
em Guaporé, no Rio Grande do Sul. Assim, a Fazenda Britânia foi dividida em 10.000 lotes rurais cercados
por chácaras. Este critério impediu a criação de latifúndios na área colonizada (FREITAG, 2001, p. 86-87).
Outro fator utilizado como referência por outras colonizadoras, foi em relação aos critérios para as vendas dos
lotes de terra. Valeu-se da ordem étnica, sendo selecionados para a ocupação das terras, aqueles trabalhadores
rurais provenientes das antigas zonas coloniais de Santa Catarina e do Rio Grande do Sul, com pequenas
propriedades, preferencialmente, descentes de alemães e italianos, acostumados com a policultura, e com a
agricultura de subsistência (FREITAG, 2001, p. 87).
37
Salienta-se que a política colonizadora levado a feito em Palotina denota a realização
de um “duplo desejo”: fundar um núcleo colonial católico por parte dos trabalhos
empreendidos pelos Palotinos e maximizar o lucro por parte da colonizadora por meio da
venda de imóveis rurais para colonos com apego a terra, de bons antecedentes e da religião
católica (FREITAG, 2001, p. 117). Ademais, os reflexos desta colonização desencadeada pela
Congregação Palotinos constata-se ainda hoje a hegemonia católica entre os habitantes. A
nossa pesquisa de campo aponta que 96,97% dos entrevistados se declararam católicos (ver
análise da pesquisa no capítulo 5).
A fundação do Município de Palotina ocorreu em 03 de setembro de 1953 e possui
uma população, recenseada em 2000 (IBGE, 2009), de 28.966 habitantes, com densidade
demográfica de 44,49 habitantes por quilômetro quadrado. Após a sua fundação, teve rápido
crescimento, que pode ser associado à dinâmica da nova frente de ocupação agrícola, bem
como com a sua localização estratégica entre dois importantes pólos de colonização da região
oeste do Paraná: Toledo e Guaíra (REGINATO, 1979, p. 67).
3.2 Principais Rodovias de Acesso
A rodovia estadual PR-182 corta o Município no sentido norte-sul, enquanto que a
rodovia estadual PR-364, no sentido noroeste-sudeste. A cidade de Palotina está à oeste de
Curitiba e dista da Capital paranaense 666 km; 70 km de Guaíra; e 105 km de Cascavel.
Figura 2 – Mapa das principais rodovias de acesso à Palotina
Fonte: (ASSOCIAÇÃO DOS MUNICÍPIOS DO OESTE DO PARANÁ (AMOP), 2003, p. 04).
38
3.3 Aspectos Físicos do Município de Palotina
10
3.3.1 Geologia
O Município de Palotina está inserido na unidade estratigráfica
11
do Mesozóico
Jurássico Cretáceo Grupo São Bento, compostas de basalto e arenitos. Esta unidade faz parte
da Bacia do Paraná Eflisivas Básicas. Os arenitos são rochas clásticas coerentes de textura
média, e os basaltos são rochas ígneas eflisivas básicas.
O vulcanismo fissural da Bacia do Paraná representa urna das maiores manifestações
de vulcanismo continental do Globo. No Município, esse vulcanismo está representado por
espessos derrames de lavas, bem como por diques e soleiras. A seqüência básica compreende
derrames de basalto, andresito e brechas vulcânicas e sedimentares. Essa seqüência originou-
se de um magma básico gerado no Manto Superior.
3.3.2 Solos
As áreas do Município, situadas sobre os lençóis de rochas eruptivas básicas (80% da
área), apresentam solos proflindos, com horizontes
12
A, B e C, cor arroxeada, alta fertilidade,
boa drenagem e com relevo ondulado plano.
No município de Palotina existem quatro grupos de solos que são: a)
Hidromórfico Gleyzado Indiscriminado, textura argilosa; b) Latossolo Roxo,
textura argilosa; c) Terra Roxa Estruturada Eutrófica, textura argilosa; d) Latossolo
Vermelho-Escuro Eutrófico, textura argilosa.
10
Os dados apresentados a seguir sobre o levantamento ambiental do Município de Palotina foram elaborados
pelo geógrafo, com especialização em Análise Ambiental e Mestrado em Engenharia Florestal, Giampiero
Falvo, na Obra intitulada “Inventário Ambiental do Município de Palotina, 1996 - trabalho realizado neste
Município nos quais fundamentam-se os aspectos físicos”.
11
“Estudo na seqüência, no tempo e no espaço das rochas da biosfera, assim como de suas relações genéticas,
suas condições pretéritas de formação e sua paleogeografia.” (HENKLAIN; MEDEIROS; FARIAS, 1986, p.
08).
12
“Latossolo roxo desenvolvido a partir de rochas eruptivas básicas. Profundo (33 cm), com seqüência de
horizontes: A, B, (latossódico) e C, ocorre em relevo predominantemente suave ondulado. A classe textural
tanto no horizonte A como no B é muito argilosa. Sua porosidade natural é muito alta, ocasionando drenagem
acentuada. A cor varia de vermelho–escuro–acinzentado a bruno-avermelhado-escuro no horizonte superficial
e entra bruno-avermelhado-escuro nos horizontes superficiais. Possui capacidade de Troca de Cátions (CTC)
baixa e pode ser entrófico, distrófico e álico. A densidade global no perfil varia entre 0,7 a 1,0 g/cm
3
. Ocorre
principalmente nas regiões Nordeste, Oeste e Sudeste do Estado do Paraná.” (HENKLAIN; MEDEIROS;
FARIAS, 1986, p. 09).
39
Os solos hidromórficos, que se caracterizam pela presença de um horizonte gley
13
que é formado em condições de excesso de umidade resultando coloração acinzentada, são
solos mal-drenados e com riscos de inundação, pois o lençol freático se mantém próximo a
superfície. Localizam-se próximos ao Rio Piquiri.
Os Latossolos Roxos possuem altos teores de óxido de ferro, apresentam coloração
tipicamente avermelhadas, textura argilosa e excelentes propriedades físicas com boa
estrutura e porosidade total elevado.
Para a manutenção de altos níveis de produtividade são necessárias calagem e
adubação com fósforo e potássio. São muito profundos e ocorrem em áreas mecanizáveis.
Ocupam a maior área no Município.
A Terra Roxa representa solos com horizontes B textural, são proflindas, textura
argilosa e coloração avermelhada com estrutura em blocos subangulares com cerosidade forte
abundante e argila de atividade baixa. Em Palotina possuem boa fertilidade natural e ocupam
grandes áreas no Município.
Os Latossolos Vermelho-Escuros estão a nordeste do Município. São solos com
horizontes B latossólicos, com baixa capacidade de permuta de cátions, baixa relação textural
B/A, baixos conteúdos de silte e alto grau de intemperismo. Apresentam coloração
avermelhada e alta fertilidade natural.
3.3.3 Relevo
O Município situa-se no Terceiro Planalto Paranaense, na unidade de relevo Planalto
Central da Bacia do Paraná, segundo o (IBGE) Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística.
As formas de relevo apresentam-se esculpidas sobre rochas efusivas da formação
Serra Geral, ocorrendo afloramentos esparsos de arenitos eólicos que se apresentam
inclinados em direção ao vale do Rio Paraná com ângulo de mergulho baixo. A formações
superficiais de textura mais argilosa, sobre as quais se desenvolvem os solos como o
Latossolo Roxo, coincidem com a rocha de substrato constituída por basalto.
O relevo apresenta uma aparente homogeneidade com superfícies aplainadas, pouco
dissecadas, compreendendo planícies e terraços fluviais com altitudes inferiores a 300 metros
ao sul e superiores a 300 metros ao norte.
13
“São solos desenvolvidos a partir de sedimentos aluviais de natureza variável. Compreendem os solos mal
drenados de características físicas e químicas variáveis condições estas imposta pelo relevo e natureza do
material originário. Sua textura é variável, embora existe quase sempre predomínio das frações argila e silte
sobre a fração de areia.” (HENKLAIN; MEDEIROS; FARIAS, 1986, p. 29).
40
3.3.4 Hidrografia
A bacia hidrográfica que drena o Município é a do Rio Piquiri, que faz parte da
grande bacia hidrográfica do Rio Paraná. Os principais rios do Município são o Rio Piquiri
situado ao norte de Palotina e o Rio Azul a leste.
O Rio Piquiri é um rio cataclinal de reverso. O seu talvegue é simples e está
encaixado num vale por encostas ao longo do vale. Forma terraços e várzeas.
3.3.5 Clima
O clima em Palotina é sub-quente, superúmido com subseca, Cfa
14
, conforme
Köppen.
A temperatura média anual varia de 21
0
C (vinte e um graus centígrados) a 22
0
C
(vinte de dois graus centígrados) no norte, e 20
0
C (vinte graus centígrados) a 21
0
C (vinte e um
graus centígrados) no sul. A temperatura média do mês mais quente, janeiro, encontra-se ente
24
0
C (vinte e quatro graus centígrados) e 26
0
C (vinte e seis graus centígrados). A média do
mês mais frio, julho, está em 15
0
C (quinze graus centígrados). A expectativa de ocorrência de
geadas é de dez a vinte dias no ano.
Chove em média entre 1.500 mm (milímetros) a 1.600 mm (milímetros) de
precipitações anuais no sul e de 1.400 mm (milímetros) a 1.500 mm (milímetros) ao norte
com até 40% (quarenta por cento) da precipitação total anual nos meses de setembro, outubro
e novembro. Segundo o Instituto Agronômico do Paraná (IAPAR), em 1995 a precipitação
pluviométrica alcançou 1.648 mm (milímetros).
3.3.6 Vegetação
No Município, a tipologia da vegetação atual, segundo o Instituto Brasileiro de
Geografia e Estatística (IBGE), é floresta estacional semidecidual secundária ou aluvial.
14
O sistema de classificação de Köppen (TREWANTHA; HORN, 1980, p. 55) baseado na temperatura e
pluviosidade, “[…] apresenta um código de letras que designa grandes grupos e subgrupos climáticos, além
de subdivisões para distinguir características estacionais de temperatura e pluviosidade. Utilizando a série de
dados metereológicos disponível, foi possível identificarem-se três tipos climáticos: Af, Cfa e Cfb. Cfa: Clima
subtropical: temperatura média no mês mais frio inferior a 18 ºC (mesotérmico) e temperatura média no mês
mais quente acima de 22 ºC, com verões quentes, geadas pouco freqüentes e tendência de concentração das
chuvas nos meses de verão, contudo sem estação seca definitiva.” (IAPAR, 1994, p. 06)
41
Na floresta estacional semidecidual, a flora está condicionada a um período de baixa
precipitação pluviométrica, além da ocorrência eventual de geadas, quando 20% (vinte por
cento) a 50% (cinqüenta por cento) das árvores do dossel perdem suas folhas, modificando a
fisionomia da vegetação. O Município subdivide-se em Floresta estacional semidecidual
aluvial (planícies ao longo dos rios), e Floresta estacional semidecidual submontana (abaixo
de 500 metros de altitude). Dentre as espécies que se encontram nesta formação vegetal da
região consta: fumo-bravo, grandiúva, pata-de-vaca, embaúva, canela-guaicá, entre outras.
O sistema de vegetação secundária é aquele que surge com o abandono da terra após
o seu uso e que normalmente passa por diferentes fases de desenvolvimento ao longo dos
anos, que se define como “sucessão vegetal”.
3.4 Aspectos Históricos da Construção da Territorialidade de Palotina
Em 1953, iniciou-se a colonização de Palotina, encravada no território do Município
de Guaíra. A situação topográfica da área e extraordinária fertilidade natural de suas terras
foram os fatores atrativos que aceleraram o processo da ocupação e exploração do solo,
transformando o território apropriado rapidamente em distrito do Município de Guaíra,
condição esta na qual permaneceu até meados de 1957. Com a Lei Estadual n.º 3.212, de 24
de junho de 1957, a cidade de Palotina passou à categoria de Distrito Administrativo e
Judiciário de Guaíra, município que teve como prefeito eleito Celino Rocha de Araújo,
responsável pela criação e administração do novo Distrito.
Pela Lei Estadual n.º 4.245, de 25 de julho de 1960, foi criado o Município
de Palotina, já desmembrado do Município de Guaíra e do Município de
Toledo e, com base na Constituição da época, foi nomeado para exercer o
cargo de prefeito de Palotina, Waldemar Gregório Empinotti, por ato do
Decreto n.º 31.335, de 05 de agosto de 1960, do então Governador do
Estado do Paraná, Moysés Lupion. (REGINATO, 1979, p. 140).
A primeira eleição de prefeito e vereadores aconteceu no ano de 1961, sendo eleito
como Chefe do Executivo Municipal, Marcelino Afonso Neis, com os seguintes vereadores à
Câmara Municipal: Antônio Bordin, Albino Schwengberg, Bruno Rohslig, Bonifácio
Laurindo Cancelli, João Bortolozzo, João Pelanda, Oscar Belmiro Klein Ibing, Waldemar
Schneider e Willy Koellen.
Assim, Palotina com suas autoridades constituídas, foi oficialmente criada, como
municipalidade, em 03 de dezembro de 1961.
42
A gestão administrativa do primeiro Prefeito estribou-se na organização dos serviços
municipais, criando os instrumentos necessários às suas atividades, agora como unidade
autônoma. No período, foram criados dois distritos administrativos: o de Maripá, pela lei
número 54, de 03 de março de 1964, e o de São Camilo, pela lei número 61, de 06 de março
de 1964. Posteriormente, estas leis foram ratificadas por lei Estadual, elevando-os, também, a
condição de Distritos Judiciários do município sede.
No sentido de solidificar o município, as ações do governo municipal, foram
principalmente pautadas na consecução e ampliação da malha rodoviária. Tal prioridade foi
dada por se tratar de um período de devastação das matas para cederem lugar às plantações.
Nesse sentido, as estradas municipais constituíam-se na única forma de acesso à área de terra
recém adquirida pelos pioneiros possibilitando a chegada dos animais de tração para a ajuda
nos trabalhos com o terreno e demais utensílios necessários para a construção da moradia e as
sementes para o plantio da área pós o desmatamento.
Para a gestão do segundo mandato a prefeito foi eleito Domingos Francisco Zardo,
um dos pioneiros de Palotina, empossado ao cargo no dia 01 de fevereiro de 1966. O
desenvolvimento acelerado do município passou a exigir a criação de mais dois distritos
administrativos que foram: o de Alto Santa Fé, pela lei número 131, de 22 de julho de 1966, e
o de Pérola Independente, pela lei número 165, de 29 de maio de 1967, os quais,
posteriormente, foram ratificados por lei Estadual. Hoje, o distrito de Pérola Independente
pertence ao município de Maripá e o de Alto Santa Fé pertence ao município de Nova Santa
Rosa.
Dentre todos os trabalhos exigidos do recém formado município, o que se destaca
desta segunda gestão do governo municipal, foi sua preocupação em dotar os espaços rurais
que se abriam com novas unidades escolares (REGINATO, 1979, p. 142).
3.5 O contexto da Agricultura Familiar de Palotina
3.5.1 Ocupação e Uso do Solo
O território palotinense, originalmente coberto por uma densa mata tropical
perenifólia com grande variedade de espécies vegetais e solos de alta fertilidade, teve, em
1954, o início da divisão de terras em propriedades que eram adquiridas por agricultores, em
sua maioria, agricultores familiares, e, em seguida começaram as grandes derrubadas das
matas nativas.
43
Essa abertura de áreas deu-se através das derrubadas que, geralmente desprovidas de
critérios, iniciaram-se de forma errônea, desmatando-se as margens dos arroios e cabeceiras
das águas. As derrubadas fizeram-se acompanhar das queimadas, a fim de liberar as áreas
para o plantio. Com isso, muita madeira industrializável foi destruída.
Assim, em Palotina, a devastação da mata abriu espaço para a agricultura rotineira
trazida pelos agricultores originários do Sul do Brasil. Praticavam-se culturas anuais de milho,
feijão, trigo e soja e a criação de suínos.
Simultaneamente a este processo, houve um acelerado aumento da população e com
o incremento demográfico, aumentaram também as áreas plantadas. O alto rendimento
observado nas lavouras justificava o entusiasmo dos primeiros moradores criando um clima
de pioneirismo característico da nova fronteira agrícola.
Com a devastação desordenada das matas e o aproveitamento da alta fertilidade
natural dos solos, não houve a preocupação, por parte do agricultor, em restituir os nutrientes
exportados pelas plantas durante seu ciclo. A carência de preservação das estruturas de solo
desencadeou os processos erosivos somado ao intenso desmatamento desprovido de critérios
para a sustentabilidade ambiental.
Muitos foram os fatores que influíram no uso incorreto da terra, dos quais dois
podem ser destacados: 1) a falta de orientação quanto à área a ser derrubada; 2) a insegurança
na posse da terra que obrigava o agricultor a arrasar grande parte da mata de sua propriedade,
para não correr o risco de perdê-la, devido à intromissão dos posseiros profissionais.
De acordo com a origem dos povoadores, a agropecuária passava a se desenvolver
conforme a tradição do povo, sendo a maioria vinda da região sul do país, onde a suinocultura
e o manuseio do gado leiteiro tinham significativa importância na vida econômica dos
colonos.
As culturas exploradas no município eram totalmente voltadas para a alimentação
animal e de subsistência familiar. Nesta primeira fase, a agricultura era toda manual, dadas as
condições iniciais da ocupação da área. Assim, as principais culturas exploradas foram: a)
milho: após a derrubada das matas, era uma das culturas mais plantadas, visando a
alimentação dos suínos, que se constituía na principal fonte de renda do município. Voltada a
este objetivo, a cultura do milho foi a mais importante da década dos anos sessenta; b) soja:
trazida pelos agricultores vindos do Rio Grande do Sul, foi a segunda cultura de importância
econômica. Por utilizarem variedades de baixo potencial produtivo e por ser explorada
manualmente, a produção era pouco expressiva. A exemplo do milho, a soja tinha como
finalidade principal a alimentação dos suínos, sendo fornecida aos animais na forma de
44
forragem verde (cortada na fase de desenvolvimento vegetativo da cultura), e utilização do
próprio grão; c) mandioca: constituía-se na terceira cultura de importância econômica. A
produção era utilizada para o consumo humano, na criação de suínos e bovinos; d) as culturas
de feijão, fumo, café e trigo, apresentaram pouca importância econômica no desenvolvimento
inicial do município, sendo exceção o trigo, que juntamente com a soja na fase posterior, a da
motomecanização, foi o grande propulsor do crescimento municipal; e, e) hortelã (menta): a
cultura de hortelã foi uma das opções que acompanharam o desbravamento municipal e
regional, pois, exigia grande demanda de mão-de-obra. Nessa fase, o município alcançou a
sua maior densidade demográfica. Foi o mais intenso movimento comercial e,
consequentemente, registrou-se, o maior crescimento do município. A cultura da menta
acelerou o desbravamento da mata, impulsionada pela instalação de empresas compradoras do
óleo de menta que, em muitos casos, mantinham a produção sob contrato de financiamento
monetário e de produtos fitossanitários com os agricultores, apresentando aspectos positivos
de garantia de comercialização e orientação de cultivo. Por outro lado, o produtor se tornava
essencialmente dependente dos compradores, donos dos alambiques para a extração do óleo
da menta que fazia os preços a seu talante, sendo mais vulneráveis os pequenos arrendatários
e os agricultores familiares donos de terras (REGINATO, 1979, p. 177).
O óleo de menta provou o seu auge no início dos anos 1970 (setenta), mas logo
entrou em declínio, para desaparecer em cinco anos. Este ciclo acompanhou a suinocultura e
foi paralelo à corrida da mecanização agrícola.
O segundo período, bastante diferente do primeiro, provocou uma autêntica
revolução verde, e que levou o nome de Palotina para além das fronteiras, denominado como
ciclo da soja e trigo.
Como preparativo, surgiram patrulhas de tratores pesados (de esteira), destinados a
efetuar a destoca rápida das terras. Empresas revendedoras de máquinas agrícolas instalaram
na cidade oferecendo seus produtos e assistência aos agricultores. Neste diapasão, merece
destaque o surgimento de uma empresa genuinamente de origem palotinense, a “Giombelli &
Companhia Ltda.”, que estendeu seus préstimos também a municípios vizinhos. Cabe
salientar que a Giombelli & Companhia Ltda foi a mais importante revenda de tratores da
marca Valmet do Brasil nas décadas de 1980 e início da década de 1990.
Este ciclo caracteriza-se pelo forte ingresso da mecanização nas áreas de produção
agrícola do município.
45
3.5.2 A Motomecanização da Agricultura Familiar
Nos anos de 1968 e 1969, embora houvesse cerca de setenta por cento das áreas já
ocupadas por lavouras e pastagens, eram todas terras não mecanizadas, onde a agricultura era
executada manualmente, com ajuda da força animal na tração de arados e carroças, e outras
ferramentas de trabalho (REGINATO, 1979, p. 177).
A partir dos anos 1970 (setenta) a mecanização teve um grande desenvolvimento. As
destocas eram intensas, ininterruptas, sendo sempre maior o número de tratores de esteira em
serviço, nos mais variados pontos do município. Este processo foi impulsionado com a
facilidade de acesso ao crédito para os agricultores através do Banco Regional de
Desenvolvimento Econômico (BRDE), sendo os projetos elaborados pela Associação de
Crédito e Assistência Rural do Paraná local (ACARPA), injetando recursos necessários para a
aquisição de máquinas agrícolas e para custeio das destocas (REGINATO, 1979, p.178).
O quadro abaixo mostra a evolução de entrada de máquinas durante a década de 70
no município de Palotina:
Tabela 1 – Número de tratores agrícola de pneu e colheitadeiras
Ano Tratores Agrícolas de Pneu Colheitadeiras Automotrizes
1971 175 43
1972 314 157
1973 685 321
1974 938 518
1975 1263 749
1976 1613 814
1977 1906 905
Fonte: Reginato, 1979.
O terreno, livre dos obstáculos, facultou ao meio rural palotinense à adoção da
mecanização total da lavoura, contribuindo para facilitar o trabalho do agricultor.
A arrancada da produção da soja e de trigo em Palotina, teve suas origens nas
condições excepcionais de clima, topografia e fertilidade natural do solo, que aliado à
disponibilidade e facilidade de acesso ao crédito, quer seja na linha de investimento para
aquisição de máquinas e implementos agrícolas ou na linha de custeio financiando as
lavouras, propiciaram um incremento extraordinário destas duas culturas. O binômio trigo e
46
soja, além da perfeita adaptação entre as explorações, possibilitavam o aproveitamento do
maquinário agrícola em épocas distintas.
Essa nova fonte de riqueza, despertou interesse dos pequenos, médios e grandes
produtores agrícolas. Cabe salientar que no biênio 1970 a 1972 o saldo dos empréstimos
aplicados pelo Banco Regional de Desenvolvimento Econômico (BRDE), constituiu-se na
maior soma de recursos destinados por uma entidade creditícia a uma determinada região
agrícola isoladamente via Agência do Banco do Brasil de Palotina (REGINATO, 1979, p.
178).
A soja era um produto de exportação influenciado pela política brasileira para o
setor, passou a carrear consideráveis somas de divisas para o País. Já o trigo, de sua parte,
produto carente no mercado interno, passou a movimentar os moinhos de trigo nacionais,
disponibilizando o produto para o consumo interno, o que reduziu significantemente a sua
importação.
A intensificação da exploração destas culturas possibilitou o impulso da Cooperativa
Mista Agrícola de Palotina, hoje C-Vale. Por outro lado, a Cooperativa passou a ser uma
intermediária das políticas agrícolas de incentivo à produção agropecuária por meio da
viabilização e acesso do pacote tecnológico aos seus associados, bem como, no suporte do
armazenamento da produção e intermediando, diretamente, na exportação dos grãos.
Ademais, atuou ainda como mediadora de acesso ao crédito rural, de custeio e/ou
investimento para seus associados.
Dado esta condição, intensificou-se também a pesquisa oficial, onde a Estação
Experimental do Instituto Agronômico do Paraná (IAPAR), instalada no Município em 1966,
contribuiu, decisivamente, para melhoramento técnico das cultivares de soja, trigo e milho.
A exploração da cultura da soja aumentava a cada ano, sendo que em 1980, o
Município foi denominado “A Capital Nacional da Soja”, devido à sua área de plantio e à
grande produtividade dessa oleaginosa (PREFEITURA MUNICIPAL DE PALOTINA, 1998,
p. 13).
Esta rápida expansão da fronteira agrícola municipal, desencadeada principalmente,
pela alta fertilidade natural dos solos, trouxe inúmeros benefícios, como o fortalecimento do
comércio local, melhoria da condição sócio-econômica dos agricultores, aumento de
produção, geração de emprego e renda, dentre outros. Por outro lado, esta exploração agrícola
constituiu, de forma geral, uma atividade predatória em termos de preservação do meio
ambiente. As áreas agrícolas sofreram um processo acelerado de degradação em sua
capacidade produtiva, comprometendo os rendimentos das culturas, os quais, com o
47
estreitamento da fronteira agrícola, estão fadados a crescer via produtividade, implicando na
tomada de consciência de que os métodos de exploração da propriedade rural não poderão
mais ser os mesmos.
O aumento da área agrícola ocupada com culturas anuais – especialmente soja, trigo
e milho – decorrentes da prática de agricultura mais intensiva e mecanizada, associado ao
sistema de monocultura contínuas sem métodos adequados à sustentabilidade ambiental,
resultou na formação de erosão do solo e na rápida degradação da fertilidade do mesmo.
Assim, o modelo de crescimento e desenvolvimento proposto inicialmente não foi
capaz de difundir a prosperidade generalizada conforme pregava.
Na busca do salto para o desenvolvimento, o Brasil, a exemplo de outros países,
acelerou a urbanização, modernizou setores de infra-estrutura, deflagrou o processo de
industrialização e, também, tomou empréstimos externos. Deste modo, a desigualdade entre
países ricos e pobres foi aprofundada, houve a intensificação da miséria e, especialmente, a
destruição do meio ambiente.
Devido à forte demanda do setor primário por recursos naturais, faz-se necessária a
análise sobre o modo de inserção econômica em que o município de Palotina se encontra, bem
como, os desafios desta forte expressão econômica para com o meio ambiente. Também a
importância da política de incentivo para a mecanização e da exportação agrícola
representando um dos principais fatores responsáveis pelo rápido desenvolvimento e
crescimento experimentado por esta região,e, por outro lado, a conseqüente demanda por
recursos naturais e seus impactos sobre os mesmos.
Serão ainda identificados os principais interesses de ordem econômica responsável
por este desenvolvimento, os estrangulamentos desencadeado por esta política para a
sustentabilidade ambiental e o surgimento dos movimentos sociais com o objetivo de
equilibrar, produção agrícola e meio ambiente.
48
4 O CENÁRIO AMBIENTAL E PRODUTIVO EM QUE PALOTINA ESTÁ
INSERIDA
4.1 A Expressão Econômica da Produção Agropecuária do Estado
A imagem construída do Paraná contemporâneo é um retrato do próspero e do
moderno. Contido num território modesto para os padrões continentais do Brasil – cerca de
200 mil quilômetros quadrados, 2,3% da superfície do país – o Estado alcançou,
particularmente nos últimos 50 anos, expressão de dimensão nacional e internacional na
produção agrícola. Marcas que o destacam como quinto maior Produto Interno Bruto (PIB) do
país, primeiro colocado na produção de milho, feijão, trigo, carne e frango, segundo na de
soja e segundo maior exportador brasileiro de produtos agrícolas sinalizam para a capacidade
empreendedora e para a inserção no mercado globalizado. O Valor Bruto (VB) da produção
real e nominal – sempre crescente – alcançou R$ 28,8 bilhões na safra 2006/07, mais que 12%
do Valor Bruto nacional. Situa-se assim entre os grandes pólos econômicos do país. Reunindo
produção agrícola, agroindústria e parcela de serviços orientados para a agricultura, o
agronegócio
15
representa hoje 32% na composição do PIB estadual (PRODUZINDO COM A
NATUREZA, 2009, p. 21).
Mas, ao mesmo tempo, apresenta uma outra face: o custo ambiental cobrado pela
exuberância econômica. De fato, a ocupação do território paranaense e a decorrente expansão
das atividades produtivas avançaram sobre um dos mais importantes biomas do mundo: a
Mata Atlântica. Esta mata cobria, originalmente, 83,41% do território do Estado. Reunindo a
Floresta Ombrófila Densa, a Floresta Ombrófila Mista (Floresta de Araucária), a Floresta
Estacional e campos de altitude, a Mata Atlântica é bioma tão rico e tão vital a ponto de ser
considerado pelo Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA) patrimônio
da humanidade.
15
O agronegócio é um sistema constituído de cadeias produtivas compostas de fornecedores de insumos e
serviços, produção agropecuária, indústria de processamento e transformação, agentes de distribuição e
comercialização, tendo como objetivo comum suprir o consumidor de produtos de origem agropecuária e
florestal.
49
4.2 A Fragmentação Ambiental
Como decorrência deste avanço produtivo, a fatura ambiental foi elevada. O
extrativismo e a agropecuária “abocanharam” matas a perder de vista. Resultado: a matriz
florestal que existia até os anos 1950 foi sendo transformada em matriz agrícola com
fragmentos florestais, o que provocou empobrecimento da flora e fauna, erosão e fragilização
do solo e poluição dos recursos hídricos. Tal realidade é demonstrada pela quantidade de
espécies presentes nas listas de fauna e flora ameaçadas de extinção no Paraná.
As primeiras serrarias, instaladas no final do século XIX, inauguraram a derrubada
das florestas, fenômeno acelerado a partir de 1930, com a colonização do norte paranaense e a
conseqüente introdução e expansão da cafeicultura. A partir do final dos anos 1940 do século
XX, a ocupação intensiva da vasta região do oeste e sudoeste deu-se sobretudo com base na
exploração de madeira. As serrarias proliferaram, nômades: esgotada a mata, mudavam-se de
lugar, de olho na fabulosa riqueza das araucárias, mais de 6 milhões somente no sudoeste. A
floresta, obviamente, não resistiu: já em 1950, a cobertura florestal do Estado caiu para
39,6%, e, em 1965, para 24% (PRODUZINDO COM A NATUREZA, 2009, p. 23).
A partir dos anos 1970, a agricultura tecnologicamente mais desenvolvida espalhou-
se pelo Estado, criando gado e produzindo grãos. Soma-se a isso a grande ocorrência de
incêndios florestais, a extração de espécies vegetais de importância econômica, a implantação
de projetos agropecuários em áreas frágeis, a expansão urbana, entre outros fatores, e se
entenderá porque o Estado sofreu drástica redução em sua cobertura vegetal, em índices que
variam segundo diferentes parâmetros de interpretação.
A redução drástica da cobertura vegetal desencadeado no Estado pode ser visualizada
nestes mapas da Secretaria do Meio Ambiente do Paraná SEMA:
50
Figura 3 – Mapa da cobertura florestal original no ano de 1890
Fonte: (SEMA, 2004, p. 12).
Redução da cobertura florestal em 1930
Redução da cobertura florestal em 1965
Redução da cobertura florestal em 1990
Redução da cobertura florestal em 2000
Figura 4 – Mapas da cobertura florestal do Paraná (1930-2000)
Fonte: (SEMA, 2004, p.12).
51
Nos últimos 200 anos, mas sobretudo a partir de meados do século XIX, verifica-se
um expressivo crescimento mundial, mas com fortes reflexos sobre seus recursos naturais. Em
muitos casos, o avanço produtivo tem ocorrido sobre ecossistemas frágeis, que não suportam
a exploração agrícola intensiva, como as áreas de cerrados, savanas e de vegetação semiárida.
Essas regiões correspondem a quase 40% da superfície do planeta, ou cerca de 190 milhões de
quilômetros quadrados, e respondem por 22% da produção mundial de alimentos. Como
resultado da exploração inadequada, tem-se o empobrecimento do solo, o denominado
processo de desertificação, que segundo estimativa da FAO, o órgão da ONU para a
agricultura, já afeta cerca de 250 milhões de pessoas em mais de 100 países (PRODUZINDO
COM A NATUREZA, 2009, p. 22).
Também o Brasil sofreu com as pressões sobre o meio ambiente. Exemplo evidente é
a dramática redução da Floresta Atlântica em 93% de sua área original de 100 milhões de
hectares, consumida pela população do país, pelo desenvolvimento da agricultura e da
indústria, pela crescente urbanização e, no geral, pelo desconhecimento generalizado da
importância dos recursos naturais (PRODUZINDO COM A NATUREZA, 2009, p. 23).
4.3 A Postura Mundial Frente às Questões Ambientais
Frente a este cenário, o mundo, no entanto, expressa algumas reações. As quatro
últimas décadas marcaram atitudes das populações diante do que se convencionou chamar de
crise ambiental. Nos anos 1960, as iniciativas pioneiras limitavam-se quase sempre à
obsessiva e extravagante atenção à preservação das baleias, dos graciosos ursinhos panda da
China ou ainda do, cada vez mais raro, mico-leão-dourado do Brasil, recortados dos seus
respectivos contextos históricos, sociais, políticos e culturais. A década seguinte inaugurou
uma espécie de marco de luta ambientalista, inserindo-a em cenários mais realistas, a começar
pela Conferência de Estocolmo, em 1972. Sob seu influxo, criou-se no Brasil, em 1974, a
Secretaria Especial do Meio Ambiente, embrião do atual Ministério do Meio Ambiente
(PRODUZINDO COM A NATUREZA, 2009, p. 24).
Nos 20 anos seguintes, as formas de mobilização tiveram grande expressividade,
culminando com a “Rio-92”. Neste sentido, numerosas reuniões, acordos, tratados e estudos
conferiram maior consistência à preocupação conservacionista. Além da Organização das
Nações Unidas para a Agricultura e Alimentação (FAO), importantes instituições, tais como o
Banco Mundial, passaram a se envolver no financiamento de programas de proteção
ambiental, em particular nos chamados países em desenvolvimento.
52
No Brasil, ainda que a legislação ambiental tenha engatinhado já nos anos 30 do
século passado, com os Códigos setoriais (Florestal e de Minas, todos de 1934), todavia, foi
com a promulgação da Constituição Federal de 1988 que, pela primeira vez, o trato dos
recursos naturais e a proteção da biodiversidade no país ganharam foro constitucional. Todo o
capítulo VI da nova Carta é dedicado ao meio ambiente, incluindo sua defesa entre os
princípios da ordem econômica, de modo a compatibilizar a promoção do crescimento
econômico-social com a necessária proteção e conservação ambiental.
4.4 Medidas de Proteção ao Meio Ambiente
Do novo status provém, entre outras obrigações legais, a exigência de prévio estudo
de impacto ambiental para a instalação de obras e atividades potencialmente impactantes do
meio ambiente. Tal estudo indica medidas para preservação da diversidade e da integridade
do patrimônio genético do país, com a proteção da fauna e da flora, o controle da produção, a
comercialização e o emprego de técnicas, métodos e substâncias que possam colocar em risco
a qualidade de vida e o meio ambiente e a promoção da educação ambiental.
Na década de 1990, novas leis surgiram para regulamentar e dar seqüência ao texto
constitucional, com destaque para a lei que instituiu a Política Nacional dos Recursos
Hídricos, em 1997. Seguiram a Lei de Crimes Ambientais, o Sistema Nacional das Unidades
de Conservação, o Protocolo Verde (exigindo que os bancos e as agências de empréstimo
levem em consideração os critérios ambientais no financiamento dos projetos), a preparação
de uma Agenda 21 para o Brasil e a descentralização do gerenciamento ambiental para os
estados e municípios (PRODUZINDO COM A NATUREZA, 2009, p. 25).
Neste contexto de ampla ação ambiental, a conservação da biodiversidade encontra
na legislação o suporte legal para regular as ações do cidadão e conciliar a sustentabilidade do
ambiente e a produção.
4.5 A Expressão Econômica Desencadeada em Palotina e a Sustentabilidade Ambiental
O Município de Palotina, desde o início da colonização, a partir de 1953, apresenta
nas atividades agropecuárias o principal pilar para o desenvolvimento econômico, gerando
grande número de empregos e riquezas.
No ano de 1954, os agricultores começaram a ocupar e dividir esta extensa e rica área
de terras em propriedades e deram início às derrubadas da mata. Essas derrubadas eram
53
executadas sem critérios e limites, desmatando as margens dos arroios e cabeceiras das águas.
Conseqüentemente às árvores caídas surgia a necessidade das queimadas a fim de liberar as
áreas para o plantio. Com isso, um grande volume de madeira industrializável foi destruído
(REGINATO, 1979, p. 228).
A cobertura vegetal original foi totalmente devastada, sendo substituída por extensas
áreas cultivadas por uma agricultura rotineira trazida por agricultores originários do Sul
brasileiro. “Derrubaram-se as florestas, queimou-se até o último graveto das destocas, não se
fez logo contenção de erosão. Procurou-se o desfrute imediato, sem cuidar do futuro […]”
(REGINATO, 1979, p. 229).
Após a derrubada da mata, o agricultor começou a desenvolver suas atividades
impulsionando a economia do município. Assim, o município tem suas origens nas
transformações operadas na estrutura produtiva da economia municipal, desenvolvendo os
ciclos: 1º ciclo milho, 2º ciclo da hortelã e o 3º ciclo da soja (PALOTINA, 2000, p. 67).
O 1º ciclo agrícola, representado pela cultura do milho e implantado após a derrubada
das matas, visava alimento básico para a atividade agropecuária, especialmente a
suinocultura, e também representou a principal fonte de renda a partir de 1955 (PALOTINA,
2000; REGINATO, 1979).
Em meados da década de 1960, surge o 2º ciclo, caracterizado pela cultura da hortelã,
acompanhando o desbravamento regional. Devido à necessidade da mão-de-obra, atraiu para a
região um grande contingente de imigrantes vindos do norte do Brasil. Estes imigrantes
atuaram, em sua maioria, como parceiro do detentor do imóvel rural ou como pequenos
arrendatários na exploração da cultura a menta. Caracterizaram-se, sobretudo, como uma
frente de trabalho e não como uma frente colonizadora. Estima-se que em 1975, a população
de Palotina tenha chegado a 70.000 habitantes (PALOTINA, 2000, p. 07).
Segundo Reginato (1979, p.176), a cultura da menta acelerou o desmatamento, o que
impulsionou a instalação de empresas compradoras do produto e possibilitou aos agricultores
garantia de comercialização e orientações sobre o cultivo. Com o fim da exploração da cultura
de menta, em 1975, com a legalização das terras e a mecanização agrícola, surge o 3º ciclo; o
ciclo da soja e trigo, influenciado pela política brasileira de exportação (revolução verde).
Assim, surge a mecanização agrícola que por meio de patrulhas de tratores de esteira
possibilitou a destoca rápida das terras.
Para a realização da destoca, várias empresas revendedoras de máquinas agrícolas
instalaram-se no município, oferecendo seus produtos e assistência aos agricultores, que aos
poucos incorporaram a proposta de mecanização nas áreas agrícolas. Nos anos de 1968 a
54
1969, cerca de 70% das áreas já eram ocupadas por lavouras e pastagens. Onde não havia
mecanização, a agricultura era executada manualmente, com ajuda da força animal na tração
de arados e carroças (REGINATO, 1979, p. 178).
A partir dos anos 1970, a mecanização teve um grande desenvolvimento em Palotina.
As destocas eram financiadas por meio do Banco Regional de Desenvolvimento Econômico
(BRDE), cujos projetos eram elaborados pela Associação de Crédito e Assistência Rural do
Paraná (ACARPA), custeava-se a aquisição de máquinas agrícolas para a destoca, com o
objetivo de conseguir-se um solo limpo e produtivo (REGINATO, 1979, p. 178).
Dessa forma, a destoca permitiu a adoção da mecanização total das lavouras,
facilitando o trabalho do agricultor. As condições excepcionais de clima, topografia e
fertilidade natural do solo de Palotina, aliadas ao crédito, propiciaram um incremento
extraordinário das culturas de soja e trigo, que além da perfeita adaptação ao clima e solo,
aproveitavam à maquinaria em épocas diferentes, alternando entre as culturas.
A soja passou a ser um produto de exportação, influenciada pela política agrícola
brasileira, conduzindo consideráveis somas de divisas para o País. Enquanto o trigo passou a
movimentar moinhos nacionais, disponibilizando o produto para consumo interno, e
reduzindo assim, significativamente, sua importação.
A transformação no meio rural, com o maior emprego de máquinas, técnicas
modernas associadas à alta fertilidade natural dos solos e ao sistema de monocultura aliado ao
“pacote tecnológico” propiciaram a elevação da produtividade, induziram a industrialização
agrícola e fortaleceram do comércio local. Este potencial de crescimento estava
intrinsecamente relacionado à exploração do setor primário, denominado agronegócio.
Conforme dados da SEAB/DERAL 2008, o percentual das principais culturas de grãos e
produção pecuária em relação ao Valor Bruto de Produção, o do município deu-se da seguinte
forma: soja
16
27,26%; milho safrinha 12%; milho safra verão 1%; trigo 1,9%; frango de corte
35%; leite 2,6% e suínos 5%. Ademais, segundo dados da SEAB/DERAL, 2008, dos
64.728,00 hectares que é a área total do município de Palotina, 47.100 hectares são destinados
à exploração de culturas temporárias de grãos, sendo 6.737,33 hectares ocupados com
pastagem. Assim, apenas estas duas atividades demandam 83,17% do território municipal.
16
Salienta-se que a safra de grãos ano 2007/2008, houve ocorrência de estiagem com redução na produtividade
da cultura da soja sendo 8,5% menor quando comparado com a melhor safra obtida. Isto se refletiu
diretamente na receita obtida. Tal fator climático ocorreu também na safra 2008 com redução na
produtividade de 31% menor quando comparado com a melhor safra obtida no município, com a cultura de
inverno, ou seja, com o milho safrinha.
55
De posse desta informação, a expressão econômica exercida pelo agronegócio frente
à demanda sistemática por recursos naturais refletiram-se no remanescente florestal existente,
com interferência significativa na flora, fauna e no uso e manejo do solo e água. Segundo
dados do Censo Agropecuário (IBGE, 2006), no município de Palotina, a cobertura florestal
corresponde apenas 11,57% do total da sua superfície. Cabe salientar que este remanescente
florestal existente não cumpre ao positivado no Código Florestal Brasileiro e demais Leis
derivadas, sendo para a Região Sul do Brasil, a cobertura necessária para cumprir o
dispositivo legal é de no mínimo 20% da área total do município.
No que tange ao aspecto social, a persistência deste cenário de déficit florestal
acarreta prejuízo para o cidadão sobre o uso e o desfrute do direito fundamental
constitucionalizado do ambiente sadio e ecologicamente equilibrado. Neste sentido, o enfoque
imediatista de crescimento econômico, voltado apenas às expensas do Produto Interno Bruto
(PIB), sem considerar a preservação dos recursos naturais, não leva em conta o significado de
qualidade de vida e a prosperidade.
Devido à necessidade de equilibrar a produção agrícola primária e a sustentabilidade
ambiental, o capítulo seguinte, abordará as principais normativas legais com restrições de
cunho administrativos a interferir no direito de propriedade em prol do meio ambiente e dos
direitos difusos dos cidadãos, ditado, principalmente, pela Constituição Federal de 1988.
56
5 A LEGISLAÇÃO PARA PRESERVAÇÃO AMBIENTAL
5.1 Das Implicações Legais da Reserva Florestal Legal
Antigamente, em algumas regiões do Brasil, os agricultores costumavam manter a
cobertura florestal numa parte da propriedade. Faziam isso por razões diversas: a) proteger as
encostas e evitar erosão; b) proteger as margens dos rios; c) manter abrigos para animais e
aves; d) manter uma reserva de sementes e mudas; e) manter uma “poupança” para tempos de
“vacas magras”; f) ter um estoque de lenha; g) proteger uma nascente de água;
h) ter uma área de lazer; i) preservar a paisagem; ou, j) simplesmente, porque gostavam de ter
um pedacinho de mata na propriedade. (SOCIEDADE DE PESQUISA EM VIDA
SELVAGEM E EDUCAÇÃO AMBIENTAL, 1996, p. 09).
Com o tempo, foi possível observar que a manutenção da floresta trazia outros
benefícios para a propriedade, como a garantia de fornecimento permanente de água, o
aumento dos níveis de umidade do solo e o controle de insetos e pragas. Por isso, os
proprietários chegavam a definir, muitas vezes, em conjunto, áreas lindeiras para manter suas
reservas, formando uma floresta de propriedade coletiva, que favorecia a todos.
A idéia de “reservar” uma parte da floresta, antes de iniciar a derrubada para o
plantio, apresentava tantas vantagens para o equilíbrio físico e biológico da propriedade e do
ambiente geral que ganhou força de lei, estabelecida anteriormente, pelo Decreto n.º 23.793
de 23 de janeiro de 1934, “[…] contemplando limitação administrativa a propriedade rural
imobiliária consistente na obrigação de manutenção na propriedade de um mínimo percentual
de cobertura florestal.” (CORREA, 1993, p. 03).
Assim, dispunha o Código Florestal instituído pelo Decreto nº 23.793 de 23 de
janeiro de 1934 em seu Art. 23: “Art. 23 – Nenhum proprietário de terras cobertas de matas
poderá abater mais de três quartas partes da vegetação existente, salvo o disposto nos artigos
24
17
e 51
18
”. Neste sentido, pode-se observar que a preocupação do legislador com a
manutenção de percentual mínimo da vegetação arbórea nas propriedades.
17
Art. 24. As proibições dos arts. 22 e 23 só se referem á vegetação espontânea, ou resultante do trabalho feito
por conta da administração publica, ou de associações protetoras da natureza. Das resultantes de sua própria
iniciativa, sem a compensação conferida pelos poderes públicos, poderá dispor o proprietário das terras,
ressalvados os demais dispositivos deste código, e a desapropriação na forma da lei.
18
Art. 51. É permitido aos proprietários de florestas heterogêneas, que desejarem transformá-las em
homogêneas, para maior facilidade de sua exploração industrial, executar trabalhos de derrubada, ao mesmo
tempo, de toda a vegetação que não houver de subsistir, sem a restrição do art. 23, contanto que, durante o
inicio dos trabalhos, assinem, perante a autoridade florestal, termo de obrigação de replantio e trato cultural
por prazo determinado, com as garantias necessárias.
57
Já o Código Florestal atual, (Lei n.º 4.771 de 15 de setembro de 1965), tornou
obrigatória para as propriedades rurais localizadas nas regiões Leste Meridional, Sul e na
parte Sul da região Centro Oeste do Brasil, a manutenção do “[...] limite mínimo de 20%
(vinte por cento) da área da propriedade com cobertura arbórea localizada.” (SOCIEDADE
DE PESQUISA EM VIDA SELVAGEM E EDUCAÇÃO AMBIENTAL, 1996, p. 09). A
partir daí, a reserva ganhou nome oficial e sigla: Reserva Florestal Legal (RFL), mais
conhecida como Reserva Legal.
Vinte e cinco anos depois, considerando as dificuldades encontradas pelos
agricultores para cumprir a exigência de manutenção da cobertura original em 20% (vinte por
cento) da propriedade, a Lei de Política Agrícola estabeleceu a possibilidade de uma
recomposição gradual (1/30 avos por ano de implantação) da Reserva Florestal Legal. O
vigente Código Florestal ora citado, estabeleceu exigências bem diferenciadas para a
cobertura destinada a proteger margens de rios e de encostas e para a Reserva Florestal Legal.
O Art. 2º considera como preservação permanente, isto é, reservas ecológicas que
não podem sofrer qualquer alteração, as florestas e demais formas de vegetação natural, nas
seguintes situações: a) ao longo de rios ou de qualquer curso d’água, desde o seu nível mais
alto, variando de largura conforme o tamanho do rio; b) de 30 metros para os curso d’água
com menos de 10 (dez) metros de largura; c) de 50 (cinqüenta) metros para os curso d’água
que tenham de 10 (dez) a 50 (cinqüenta) metros de largura; d) de 100 (cem) metros para os
cursos d’água que tenham de 50 (cinqüenta) a 200 (duzentos) metros de largura; e) ao redor
de lagos, lagoas, reservatórios naturais ou artificiais e nascentes; f) em topos de morro,
montes, montanhas e serras e nas encostas com declive superior a 45% (quarenta e cinco por
cento); e, g) em altitude superior a 1800 (hum mil e oitocentos) metros.
O Código Florestal também define que a Reserva Florestal Legal, no Art. 16
19
e seus
parágrafos, estabelecem critérios específicos quanto à fixação de percentuais mínimos de
Reserva Florestal Legal, tendo como parâmetro a peculiaridade regional, sendo definido para
19
“Art. 16, Lei 4771/65, de 15/09/1965, já alterada pela Lei 7.803/89, de 18/07/1989; Art. 16: As florestas de
domínio privado, não sujeitas ao regime de utilização limitada e ressalvadas as de preservação permanente
previstas no Art. 2º e 3º desta Lei, são suscetíveis de exploração, obedecidas as seguintes restrições: a) nas
Regiões Leste Meridional, Sul e Centro-Oeste, esta na parte Sul, as derrubadas de florestas nativas, primitivas
ou regeneradas, só serão permitidas desde que seja, em qualquer caso, respeitado o limite mínimo de 20% da
área de cada propriedade com cobertura arbórea localizada, a critério da autoridade competente; §Único: Nas
propriedades rurais, compreendidas na alínea ‘a’ deste artigo, com área entre 20 e 50 hectares, computar-se-
ão, para efeito de fixação de limite percentual além da cobertura florestal de qualquer natureza, os maciços de
porte arbóreo, sejam frutíferas, ornamentais ou industriais; §2º; A reserva legal, assim atendida a área de no
mínimo 20% de cada propriedade, onde não é permitido o corte raso, deverá ser averbada à margem da
inscrição da matrícula do imóvel, no registro de imóvel competente, sendo vedada a alteração de sua
destinação nos casos de transmissão, a qualquer título, ou de desmembramento da área.”
58
a região Sul, no qual se situa o Município de Palotina, pelo menos 20% (vinte por cento) da
área de cada propriedade, “a critério da autoridade competente”.
A área reservada tem relação com “cada propriedade” imóvel e assim, se uma mesma
pessoa, física ou jurídica, for proprietária de propriedades diferentes, ainda que contíguas, a
área a ser objeto da Reserva Florestal Legal será medida em “cada propriedade” (arts. 16, “a”,
e 44, caput, ambos da Lei 4.771/65).
Há diferença de redação entre a Reserva Florestal Legal da região Norte e do resto do
país no que se refere ao processo de escolha da área a ser reservada. O Art. 44 silencia sobre
quem pode escolher a mesma, sendo que o Art. 16, “a”, diz, “[...] da área de cada propriedade
com cobertura arbórea localizada, a critério da autoridade competente.”. Assim, o Art. 44
possibilita ao proprietário localizar a área a ser reservada, sendo que no caso do Art. 16, será a
autoridade competente que indicará a mesma com base em motivos de gestão ecologicamente
racional. Não pode haver arbítrio por parte da autoridade, mas decisão motivada. A área de
reserva destina-se a ter “cobertura arbórea” como se vê nos Artigos. 16 e 44, mencionados. O
legislador brasileiro sentiu a necessidade de manter e/ou de reintroduzir árvores no País
independentemente do valor botânico e/ou ecológico das mesmas. As espécies nativas têm
preferência, mas não foram abolidas as espécies exóticas do manejo florestal. Nas
propriedades rurais das regiões da Reserva Florestal Legal do Art. 16, com área entre 20 e 50
ha, no cômputo do percentual dos 20% (vinte por cento) da reserva, podem entrar os maciços
de porte arbóreo frutíferos, ornamentais ou industriais (Art. 16, parágrafo único, da Lei
4.771/65).
Neste sentido, não se desprezou o ecossistema, mas se optou por uma política
ambiental em que não haveria necessidade de investimento de dinheiro público para
expropriar. Se, contudo, em determinada região do País, um ecossistema for ameaçado ou
estiver em perigo, não se descartou a utilização do zoneamento ecológico, que muitas vezes
ainda não foi sequer formulado.
O fato de inexistir cobertura arbórea na propriedade não elimina o dever do
proprietário de instaurar a Reserva Florestal Legal. A Lei de Política Agrícola, Lei 8.171, de
17/01/1991, previu:
[...] a partir do ano seguinte ao de promulgação desta Lei, obriga-se o
proprietário rural, quando for o caso, a recompor em sua propriedade a
Reserva Florestal Legal, prevista na Lei 4.771/65, com a nova redação dada
pela Lei 7.803/89, mediante o plantio, em cada ano, de pelo menos 1/30
(hum trinta avos) da área total para complementar a referida Reserva
Florestal Legal.
59
Esta norma legal torna clara a obrigação de recomposição florestal da área da
reserva, ainda que, de outro lado, seja criticável a morosidade da recomposição (essa lei
entrou em vigor no dia 18/01/1991 e, assim a reserva só será integralmente recomposta aos 18
dias de janeiro de 2021).
Pondere-se que, ao se dar prazo para a recomposição, não está se retirando à
obrigação do proprietário de, desde já, manter a área reservada na proporção estabelecida de
20% (vinte por cento) ou 50% (cinqüenta por cento), conforme o caso. Se nessa área inexistir
floresta, nem por isso poderá o proprietário exercer atividade agropecuária ou de exploração
mineral. A área da Reserva Florestal Legal, desmatada anteriormente ou não, terá cobertura
arbórea pela regeneração natural ou pela ação humana.
Na recomposição florestal deverão ser utilizadas, preferencialmente, espécies nativas,
conforme estabelece o Art. 19, parágrafo único, da Lei 4.771/65, com a redação dada pelo
Art. 19 da Lei 7.803/89.
Para evitar o não cumprimento à norma imperativa do referido dispositivo, o
legislador em 1989, através da Lei n.º 7.803, de 18 de julho de 1989, introduziu algumas
modificações no Código Florestal, e o Art. 16 passou a definir que, nas propriedades entre 20
(vinte) e 50 (cinqüenta) hectares, para formar a reserva legal, pode-se somar, além da
cobertura florestal existente, os maciços formados por árvores frutíferas, ornamentais ou
industriais.
Em termos da conceituação legal de poluição, tem-se que a atividade de supressão da
Reserva Florestal Legal e a omissão em recompô-la, importam em degradação da qualidade
do meio ambiente que prejudica a saúde, a segurança e o bem estar da população (influem no
clima, regime das chuvas, fixação do solo, habitat animais etc.); criam condições adversas às
atividades sociais e econômicas (a atividade florestal é essencial em nossa sociedade
contemporânea); afetam desfavoravelmente a biota (os elementos ambientais são necessários
ao equilíbrio ecológico); e tem repercussões sobre as condições estéticas e sanitárias do meio
ambiente (a flora é o elemento estético fundamental na paisagem rural e na composição do
equilíbrio ecológico).
A não recomposição da floresta integrante da área de Reserva Florestal Legal
constitui dano ao meio ambiente. Trata-se do dano decorrente do uso nocivo da propriedade,
estabelecido no Art. 1º, parágrafo único da Lei n.º 4.771/65, in verbis.
60
Art. 1º: As florestas existentes no território nacional e as demais formas de
vegetação, reconhecidas de utilidade às terras que revestem, são bens de
interesse comum a todos os habitantes do País, exercendo-se os direitos de
propriedade com as limitações que a legislação em geral e especialmente
esta Lei estabelecem.
Parágrafo Único - As ações ou omissões contrárias às disposições deste
Código na utilização e exploração das florestas são consideradas uso nocivo
da propriedade.
Portanto, em condições de anormalidade, (fora dos parâmetros legais) e gravidade (o
mínimo percentual de floresta é indispensável ao equilíbrio ecológico) que o Direito repele.
Dessa forma, não há de cogitar-se de eventual prescrição, eis que se trata aqui de
direito fundamental da personalidade humana, e, portanto, revestido do caráter de extra-
patrimonialidade e imprescritibilidade, sendo certo que o ato nocivo, e pois danoso, renova-se
a cada instante em que há falha do dever geral de conservar o bem, sendo ato de natureza
permanente.
A sucessividade na propriedade importa em que o “novo” proprietário assuma todos
os direitos de usar, gozar e fruir e o dever respeito às limitações administrativas e o uso
cumprindo a função social inerentes a esta propriedade. Esta sucessividade importa na
assunção, pelo adquirente, do ônus inerente ao domínio e posse do bem, mesmo porque nas
obrigações de fazer, o atual proprietário haverá de suportar as ações ou omissões que serão
impostas para que a situação se estabeleça à normalidade legal e ambiental. Por tal razão, é
que se torna indispensável em compor a lide no pólo passivo o atual proprietário que haverá
de suportar o conteúdo condenatório de obrigação de fazer ou de omitir-se para que a sua
propriedade respeite as limitações legais e cumpra a função social.
Além disso, foram estabelecidos os procedimentos para a averbação da Reserva
Florestal Legal, que deve ser feita à margem da inscrição da matrícula da propriedade no
registro de imóveis. Averbação esta que não poderá ser alterada em caso de venda, herança ou
desmembramento da área.
Em 1991, a Lei de Política Agrícola (Lei nº 8.171 de 17 janeiro de 1991),
estabeleceu, no Art. 99
20
, a possibilidade de uma reposição gradual da Reserva Florestal
Legal, nos casos em que foi destruída ou já não existia quando da compra da propriedade.
A partir do ano seguinte ao da promulgação desta Lei, obriga-se ao proprietário rural,
quando for o caso, a recompor em sua propriedade a Reserva Florestal Legal, prevista na Lei
20
“Art. 99: A partir do ano seguinte ao da promulgação desta Lei, obriga-se o proprietário rural, quando for o
caso, a recompor em sua propriedade a reserva legal prescrita na Lei nº 4771, de 1965, de 15/09/1965, com a
nova redação dada pela Lei nº 7803, de 18/07/1989, mediante a planta em cada ano, de pelo menos um trinta
avos da área total para complementar a referida Reserva Florestal Legal.”
61
nº 4.771, de 1965, com nova redação dada pela Lei n.º 7.803, de 18 de julho de 1989,
mediante o plantio, em cada ano, de pelo menos 1/30 (um trinta avos) da área total para
complementar a referida Reserva Florestal Legal. No parágrafo único, fica estabelecido que
“[...] o reflorestamento de que trata o caput deste artigo será efetuado mediante normas que
serão aprovadas pelo órgão gestor da matéria.” (SOCIEDADE DE PESQUISA EM VIDA
SELVAGEM E EDUCAÇÃO AMBIENTAL, 1996, p. 10)
No âmbito paranaense, além de referência às florestas e ambiente na
Constituição Estadual, temos a Lei Florestal do Estado (Lei n.º 11.054, de 14
janeiro de 1995). De acordo com esta Lei, as florestas são classificadas em
quatro categorias: a) preservação permanente; b) reserva legal; c) produtivas;
e, d) unidades de conservação. (IAPAR, 1999, p. 225).
Excetuando-se a categoria “unidades de conservação”, que é prevista e definida na
legislação federal e no Sistema Federal de Unidades de Conservação, os demais tipos são do
interesse direto de todos os proprietários rurais. As florestas classificadas na categoria
“Produtivas” são as não abrangidas pelas demais formas de classificação e visam o
suprimento de matérias primas de origem florestal. A categoria “Reserva Florestal Legal” é
definida no Art. 7º, devendo apresentar um mínimo de 20% (vinte por cento) da área da
propriedade, sendo seu uso permitido somente através de técnicas de manejo que garantam a
sua perpetuidade. Por fim, se tem a categoria “Preservação Permanente”, que é definida no
Código Florestal como as florestas e demais formas de vegetação natural.
Com a criação da Lei Florestal Paranaense, Lei n.º 11.054, de 14 de janeiro de 1995,
estabelecida em consonância com a Lei Federal n.º 4.771, de 15 de setembro de 1965 que
instituiu o Código Florestal Brasileiro, passou a assegurar, além de seus objetivos sócio-
econômicos para o Estado, também a manutenção da qualidade de vida e o equilíbrio
ecológico.
A Lei Florestal Paranaense n.º 11.054, de 14 de janeiro de 1995, determinou em seu
Artigo 7º que:
[...] as florestas e demais formas nativas de vegetação consideradas reserva
legal devem representar, em uma ou várias parcelas, um mínimo de 20%
(vinte por cento) da propriedade rural visando a manutenção de tecido
florestal em nível de propriedade e ficando seu uso permitido somente
através de técnicas de manejo que garantam a sua perpetuidade.
A partir desta Lei (Lei n.º 11.054, de 14 de janeiro1995, Lei Florestal Paranaense), o
governo do Paraná instituiu, através do Decreto n.º 387, publicado no Diário Oficial em 03 de
62
Março de 1999, o Sistema de Manutenção, Recuperação e Proteção da Reserva Florestal
Legal e Áreas de Preservação Permanente no Estado do Paraná.
O Art. 2º do referido Decreto afirma que:
[...] é propósito do Sistema de Manutenção, Recuperação e Proteção da
Reserva Florestal Legal e Áreas de Preservação Permanente levar o Estado
do Paraná a ter um índice de no mínimo 20% (vinte porcento) de cobertura
florestal, através da conjugação de esforços do Poder Público e da Iniciativa
Privada.
O Sistema de Manutenção, Recuperação e Proteção da Reserva Florestal Legal
(SISLEG) tem como diretrizes básicas a manutenção dos remanescentes florestais nativos, a
ampliação da cobertura florestal mínima visando a preservação, conservação da
biodiversidade e o uso dos recursos florestais e o estabelecimento de zonas prioritárias para a
conservação e recuperação de áreas florestais através de corredores da biodiversidade.
O Art. 7º do Decreto Lei n.º 11.054, de 14 de janeiro de 1995, estabelece que:
[...] o prazo máximo para a recuperação das áreas de reserva florestal legal
fixado por este Decreto é de 20 (vinte) anos, a ser cumprido pelo proprietário
de forma escalonada. A proporção estabelecida no referido artigo é de um
vinte avos por ano, a partir de 31 de dezembro de 1999.
A Lei Orgânica do Município de Palotina, promulgada em 04 de abril de 1990, em
seu capítulo VI, trata do meio ambiente, e em seu Art. 139
21
, prevê o direito dos cidadãos ao
meio ambiente equilibrado, essencial à qualidade de vida, sendo de competência do Poder
Público e da comunidade o dever de protegê-lo para as presentes e futuras gerações.
Assim, é importante salientar que, os direitos de propriedade das florestas são
limitados pela Lei Federal, Estadual e Municipal e que a não observância do Código Florestal
pode gerar implicações graves para o proprietário rural, especificado nas referidas Leis.
A permanência da situação do dano faz o proprietário de imóvel rural incorrer em
falha de dever jurídico que o torna suscetível à responsabilização administrativa (imposição
de sanções administrativas previstas na legislação ambiental); à responsabilização penal (o
fato é tipo contravenção na forma do Código Florestal); e ainda, e principalmente, à
responsabilização civil (recomposição da área ao status quo ante, por falha do dever primário
de conservar o mínimo de floresta na propriedade). Isto tudo por força da legislação ambiental
21
“Art. 139 – Todos tem direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e
essencial à sadia qualidade de vida, e impondo-se ao Poder Público e à comunidade o dever de protege-la para
as presentes e futuras gerações.”
63
corroborada no princípio constitucional da independência da responsabilidade nos planos
administrativos, civil e penal (Constituição Federal de 1988, Art. 225
22
, §3º).
Além do que consta na legislação pertinente ao meio ambiente, outras questões são
importantes para assegurar a recuperação da Reserva Florestal Legal: a) a definição de
padrões para a recuperação da reserva na propriedade, com a inclusão de critérios ambientais
mínimos, no que se refere por exemplo, ao plantio de espécies nativas adequadas a cada
região; e, b) a definição de planos microregionais de recuperação, segundo necessidades
ambientais previamente definidas.
Quanto à propriedade, o planejamento da recuperação da Reserva Florestal Legal
poderá ser feito sem muita dificuldade. No plano microrregional, dependerá, em grande parte,
do entendimento e da articulação dos proprietários das áreas vizinhas, associações de
produtores, cooperativas e as autoridades responsáveis pelo planejamento ambiental, na esfera
municipal, estadual e federal.
Com o surgimento da consciência social sobre a importância das riquezas naturais
para o desenvolvimento da humanidade, a sustentabilidade ecológica passou a ocupar um
importante espaço, evoluindo para o que se denomina como agricultura sustentável, onde o
termo sustentável carrega consigo as proposta de um correto manejo ecológico, do
desenvolvimento de atividades economicamente viáveis e ainda o exercício da justiça social.
As necessidades atuais e futuras da sociedade são definidas considerando-se as
diversidades cultural, étnica e econômica da organização. Porém, esta definição não responde
às diferenças relativas ao sistema político, às relações de produção e poder e, especialmente,
como e quem arbitra e qualifica as necessidades.
Deste modo, a proposta de desenvolvimento sustentável requer um profundo
questionamento destas relações de dominação existentes na sociedade e entre os países, visto
que a sustentabilidade do planeta não se encerra apenas na defesa da natureza, mas também
requer uma mudança das relações de dominação entre os homens.
[...] inicialmente formados num Estado de concepção liberal, já não
encontram mais guarida na sociedade moderna. Hoje, não é mais contrário à
noção de desenvolvimento o papel ativo do Estado no socorro dos valores
ambientais. Ao contrário, justamente porque houve uma mutação no referido
conceito, a proteção do meio ambiente e o fenômeno desenvolvimentista,
22
“Art. 225 – Todos tem direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e
essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e
preservá-lo para as presentes e futuras gerações. §3º; As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio
ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas,
independentemente da obrigação de reparar os danos causados.”
64
onde poderíamos encaixar a livre iniciativa, fazem parte de um objetivo
comum, dado que são interesses convergentes entre si. (FIORILLO, 1997, p.
23)
Deste modo, “[…] o equilíbrio entre o desenvolvimento social, o crescimento
econômico e a utilização dos recursos naturais demanda um planejamento que considere os
limites de sustentabilidade.” (FIORILLO, 1997, p. 25). Assim, a Constituição Federal dispõe,
em seu Art. 225, sobre o desenvolvimento sustentado definido pela Comissão Mundial como:
“[...] o desenvolvimento que atende às necessidades do presente, sem comprometer a
capacidade das futuras gerações atenderem as suas próprias necessidades”.
Também no Art. 170
23
da Constituição Federal de 1988, é estabelecido que “[...] a
ordem econômica fundada na livre iniciativa e valorização do trabalho humano, deverá
nortear-se pelos ditames da justiça social, dentre os quais, o do inciso VI que trata da defesa
do meio ambiente.” (FIORILLO, 1997, p. 27).
Além do princípio do desenvolvimento sustentável, Celso Antônio Pacheco Fiorillo
menciona outros princípios que garantem o Direito Ambiental, sendo: a) o princípio do
“poluidor-pagador” que apresenta caráter preventivo, pois busca, em primeira instância, evitar
a ocorrência de danos ambientais, visto que atua como inibidor do potencial poluidor do meio
ambiente; e caráter repressivo, prevendo a reparação dos danos causados ao meio ambiente,
bem como a responsabilidade sobre estes danos, independentemente do resultado obtido com
a poluição ou degradação ambiental, ficando a pessoa física ou jurídica sujeita às sanções
penais e administrativas, independente da obrigação de reparar os danos causados (Art. 225 da
Constituição Federal de 1988); b) o princípio da prevenção parte da premissa que os danos
ambientais são irreversíveis e irreparáveis. Assim, frente à impotência jurídica de reverter
uma situação de degradação ambiental fortaleceu a necessidade da prevenção associada à
consciência ecológica. O Art. 225 da Constituição Federal de 1988 estabelece que: “[...] fica a
encargo do Poder Público e à coletividade o dever de proteger e preservar o meio ambiente
para as presentes e futuras gerações.” (FIORILLO, 1997, p. 26); c) O princípio da
participação está intimamente correlacionado com o da prevenção, onde a atuação na defesa e
proteção do meio ambiente configuram um dever da coletividade, visto que a omissão da
mesma, resultará em prejuízos próprios. Ainda, se correlaciona com os princípios de educação
23
“Art. 170 – A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim
assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios:
Inciso I [...]; Inciso II [...]; Inciso VI: Defesa do meio ambiente.”
65
e da informação ambiental, onde o princípio da educação ambiental dispõe sobre a
necessidade da consciência ecológica pela coletividade aliada ao princípio da participação.
Para Celso Antônio Pacheco Fiorillo, educar ambientalmente significa:
[...] efetivar o princípio da prevenção é fixar a idéia de consciência ecológica
que buscará sempre a utilização de tecnologias limpas; incentivo à realização
do princípio da solidariedade, no exato sentido que perceberá que o meio
ambiente é único, indivisível e de titulares indetermináveis, devendo ser
justa e distributivamente acessível a todos; efetivação do princípio da
participação etc. (FIORILLO, 1997, p. 30).
E, finalmente, o princípio da ubiqüidade que discorre que tudo que se pretenda fazer,
criar ou desenvolver deve antes passar pelo crivo de uma consulta ambiental, visto que
considera a vida e a qualidade desta o epicentro de todo esse processo preservacionista.
Para Benjamin (1993, p. 148): “O direito de propriedade vem paulatinamente
sofrendo uma crescente desprivatização”. O termo desprivatização é aplicado no sentido não
de estatização, mas sim de publicização. Ainda de acordo com Benjamin (1993, p. 148): “[...]
a delimitação da extensão desse direito, condicionamento do seu exercício, sem
comprometimento ou supressão do seu conteúdo.”
Nesse viés, a Constituição Federal de 1988, consagra que: “[...] o direito de
propriedade junto aos direitos e garantias fundamentais do indivíduo e condiciona esse direito
ao exercício da função social da propriedade.” (BENJAMIN, 1993, p. 151).
Essas limitações possuem origem na ordem pública e de ordem privada, onde as
primeiras atendem aos interesses da coletividade, dispondo sobre as águas, energia, flora,
fauna, florestas, cavidades naturais subterrâneas, ou seja, de todos os bens ambientais que,
segundo a Constituição Federal de 1988, estão sob a guarda do Estado. Os instrumentos
administrativos (zoneamento industrial, estudo de impacto ambiental, licenciamento de
atividades, regramento do parcelamento do solo urbano, restrições urbanísticas etc.), são
utilizados para manejar e coordenar esses bens. Já as limitações de natureza privada estão
descritas no Código Civil (Art. 524) e asseguram ao proprietário que: “[...] o direito de usar,
gozar e dispor dos bens e de reavê-los de quem quer que injustamente os possua.”
(BENJAMIN, 1993, p. 152).
Assim, os objetivos teleológicos deste instituto, no que trata das limitações da
propriedade, estão ligados à função ecológica que representa a floresta, como proteção física
dos solos, dos mananciais, garantia da vida animal, a conservação do chamado conforto
66
climático, e à função social, dada à utilidade dos produtos e subprodutos ao consumo do bem
estar humano, além do seu aspecto econômico (CORREA, 1993, p. 03).
Hodiernamente, já não se concebe a visão do conteúdo do direito de propriedade
destacado de sua função social preconizado na Constituição Federal de 1988. A propriedade, a
floresta que a integra, deixou de ser um mero instrumento de gozo e satisfação pessoal para
suprir as exigências da coletividade e propiciar o bem estar geral. Neste sentido, sobreleva
ressaltar que a propriedade rural além de ser um bem de produção, do ponto de vista
econômico é um bem de vocação ecológica, ou seja, é um bem que propicia o equilíbrio
ambiental para a convivência humana com o meio.
Por força de princípios constitucionais ficou a cargo do proprietário rural o
cumprimento da função social de sua propriedade, entre outras providências através da
preservação do meio ambiente. Também ficou imposto a todos (ao proprietário rural
inclusive) o dever de preservar o meio ambiente não só para as presentes, mas para as futuras
gerações.
Há que se destacar que o eventual fato da aquisição do domínio e posse do imóvel
rural, quando já não mais havia parte da cobertura vegetal na propriedade, não afasta a
responsabilidade do adquirente.
Além de tal responsabilidade ser objetiva e solidária, ela consubstancia uma
obrigação real propter rem, ou seja, uma obrigação que se prende ao titular do direito real,
seja ele quem for.
Assim, a preservação da qualidade ambiental na propriedade rural, é, conforme a
Constituição, o pressuposto da existência do direito de propriedade, conferido pelo
constituinte. Logo, a definição de espaços territoriais protegidos, impostos em caráter geral a
todos os proprietários, não constitui restrição ou intervenção no direito de propriedade, mas
sim condição para o reconhecimento jurídico deste último.
Para Benjamin (1993, p. 152) a Reserva Florestal Legal e Área de Preservação
Permanente “[…] são, sempre, limites internos ao direito de propriedade e, por isso, em
nenhuma hipótese são indenizáveis. Integram a essência do domínio, sendo com o título
transmitidas.”
Nesse viés, não importa o esvaziamento do conteúdo econômico do direito de
propriedade. A desapropriação, sabe-se, priva o particular do bem que é proprietário; ora, não
é isso que se dá com a Reserva Florestal Legal e Área de Preservação Permanente, pois, o
senhor dessas áreas não deixa de ser o proprietário original, o particular.
Com relação ao tema, SILVA (1995, p. 273) esclarece:
67
[...] a função social da propriedade não se confunde com os sistemas de
limitação da propriedade. Estes dizem respeito ao exercício do direito ao
proprietário; aquela à estrutura do direito do mesmo, à propriedade... Com
essa concepção é que o intérprete tem que compreender as normas
constitucionais, que fundamentam o regime jurídico da propriedade; sua
garantia enquanto atende sua função social, implicando uma transformação
destinada a incidir, seja sobre o fundamento mesmo da atribuição dos
poderes ao proprietário, seja, mais concretamente, sobre o modo em que o
conteúdo do direito vem positivamente determinado; assim é que a função
social mesma acaba por posicionar-se como elemento qualificante da
situação jurídica considerada, manifestando-se conforme as hipóteses, seja
como condição de exercício de faculdades atribuídas, seja como obrigação
de exercitar determinadas faculdades de acordo com modalidades
preestabelecidas. Enfim, a função social se manifesta na própria
configuração estrutural do direito de propriedade, pondo-se concretamente
como elemento qualificante na predeterminação dos modos de aquisição,
gozo e utilização dos bens.
No plano jurídico, a admissão do princípio da função social e ambiental da
propriedade tem como conseqüência básica fazer com que a propriedade seja efetivamente
exercida para beneficiar a coletividade e o meio ambiente (aspecto positivo), não bastando
apenas que não seja exercida em prejuízo de terceiros ou da qualidade ambiental (aspecto
negativo). Por outras palavras, a função social ambiental não constitui um simples limite ao
exercício de direito de propriedade, como aquela restrição tradicional, por meio do qual se
permite ao proprietário, no exercício do seu direito, fazer com que não prejudique a
coletividade e o meio ambiente. Diversamente, a função social e ambiental vai mais longe e
autoriza até que se imponha ao proprietário comportamentos positivos, no exercício do seu
direito, para que a sua propriedade concretamente se adeque à preservação do meio ambiente.
Aliás, já decidiu o egrégio Tribunal de Justiça de São Paulo:
Sem o embargo do direito à propriedade, seu uso ficou constitucionalmente
condicionado à sua função social. Há, portanto, disposição específica na
Constituição estabelecendo condições limitantes ao seu uso. Na medida em
que o proprietário queira fazer dela uso anti-social, encontrará vedação na
ordem constitucional.
O civilista Carvalho Santos, citado por Elizeu de Moraes Correia ao comentar a
evolução do Direito Civil, afirma que:
Se bem que o direito de propriedade compreenda o jus utendi et abutendi,
não pode ser objeto de dúvida que esse direito não é absoluto, não pode ser
exercido sem restrições, porque, de acordo com as conquistas do Direito
68
Moderno, não há direitos absolutos na comunhão social, só podendo o
direito de um, como já fizemos sentir, se estender até onde começa o direito
do outro. É que o direito, antes de tudo, é essencialmente social,
preponderando o interesse geral, ou quando não, os princípios de
solidariedade social. (BASTOS, 1981, p.138).
Neste sentido, verifica-se sintonia do legislador constituinte de 1988, com a
atualização conceptual do direito de propriedade, pois, ao prever a garantia do direito de
propriedade no (Art. 5º, XXII), ao seu lado estabeleceu que esta atenderá a função social.
(Art. 5º, XXIII)
Art. 5º da Constituição Federal de 1988: todos são iguais perante a lei, sem
distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos
estrangeiros residentes no País a inviolabilidade à vida, à liberdade, à
igualdade, à segurança, e à propriedade, nos termos seguintes: [...] XXII: é
garantido o direito de propriedade; XXIII: a propriedade atenderá a sua
função social.
Mais do que isto, erigiu como princípio basilar da ordem econômica a função social
da propriedade e a defesa do meio ambiente (Art. 170
24
, inciso III e IV) e, ao tratar dos
requisitos ao cumprimento da função social, estabeleceu a utilização adequada dos recursos
naturais disponíveis e a preservação do meio ambiente (Art. 186
25
, inciso II, Constituição
Federal de 1988).
Assim, a função meramente distributiva da propriedade rural, conforme Art. 5º,
XXII, passa a atender questões de caráter ambiental (Art. 186, II da Constituição Federal de
1988) e conseqüentemente de interesse da sociedade, apresentando parâmetros objetivos e
definidos no que se refere à utilização adequada dos recursos naturais disponíveis e
preservação do meio ambiente (BENJAMIM, 1993, p. 28).
A propriedade, então, só existe enquanto direito, se respeitada a função social.
Desatendida esta, não existe o direito de propriedade amparado pela Constituição Federal de
1988. O cumprimento da função social é condição sine qua non para o reconhecimento do
direito de propriedade (PACCAGNELLA, 1998, p. 29).
Para Goss (2001, p. 09), os desequilíbrios ecológicos são problemas que ameaçam a
sobrevivência humana. Considera-os como: “[...] problemas sociais porque são causados
24
“Art. 170 – A ordem econômica, fundada na valorização econômica do trabalho humano e na livre iniciativa,
tem por fim assegurar a todos a assistência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os
seguintes princípios: Art. 170, III: Função social da propriedade.”
25
“Art. 186 – A função social é cumprida quando a propriedade rural atende, simultaneamente, segundo critérios
e graus de exigências estabelecidos em Lei, aos seguintes requisitos: Art. 186, II: Utilização adequada dos
recursos naturais disponíveis e preservação do meio ambiente.”
69
pelos padrões institucionalizados da atividade humana, padrões do pensamento humano e dos
valores humanos.”
Menciona assim quatro alternativas pelas quais estes problemas podem ser atacados:
a) por meio de movimentos sociais; b) intervenção política; c) inovação tecnológica; e, d)
autocorreção institucional.
A intervenção política vem associada à legislação. A inovação tecnológica e
autocorreção institucional trabalham na perspectiva de minimizar os problemas de
desequilíbrio ambiental acarretados pelo homem em consonância com tarefas orientadas.
Já os movimentos sociais, para Goss (2001, p. 10), atingem exatamente o cerne do
problema, visto a sua origem social. Assim, a discussão doutrinária e a previsão legal ora
mencionados, deverão harmonizar com o estabelecimento de uma política ambiental séria e
previdente. Requer, não apenas uma ação voltada para o controle de fontes de poluição ou de
degradação ambiental e correção de situação críticas já existentes ou exigências de reparação
de danos causados, mas, de uma ação preventiva integrando a conservação e o
desenvolvimento de um adequado ordenamento territorial e do aproveitamento racional dos
recursos naturais.
Dessa forma, espera-se que se possa comemorar uma política ambiental-florestal
adequada e eficiente e que, voltada para o desenvolvimento sustentável, possa garantir a
utilização, proteção e perenidade das florestas e demais formas de vegetação, proporcionando
o equilíbrio almejado e conciliando segurança jurídica, desenvolvimento e meio ambiente.
5.2 As Proposições Acerca da Reserva Florestal Legal
No intuito de corrigir o passivo ambiental, como forma de preservar e reabilitar a
biodiversidade originária, o Ministério do Meio Ambiente instituiu o Decreto Federal número
6.514, de 22/07/2008, que regulamentou a Lei de Crimes Ambientais, Lei 9.605 de
30/03/1998. O decreto ora mencionado trata das infrações e sanções administrativas ao meio
ambiente e estabelece o processo administrativo federal para apuração dessas infrações e dá
outras providências.
Com a expiração do prazo do decreto anterior, no mês de dezembro de 2009, por
meio do Decreto Federal número 7.029 de 11 de dezembro de 2009, houve nova prorrogação
da data da averbação para a reserva florestal legal. O prazo final passou a ser 11 de junho de
2011. Este Decreto criou também o Programa Mais Ambiente que prevê recursos na ordem de
100 a 500 milhões de reais para oferecer apoio técnico, educação ambiental e pagamento de
70
serviços ambientais para os agricultores familiares como incentivo para se legalizarem.
Salienta-se que as negociações prosseguem para ajustamento das propostas com Ministério da
Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA) e com Ministério do Meio Ambiente
(MMA), com a edição de futuras instruções normativas e resoluções do Conselho Nacional do
Meio Ambiente (CONAMA). As mudanças mais polêmicas dependem de decretos
presidenciais ou medidas provisórias. Esta conduta verticalizada do Ministério do Meio
Ambiente, aliado ao prazo para a sua execução, bem como, a penalidade pelo não
cumprimento ao proposto, motivou, o Ministério da Agricultura, discutir, no Congresso
Nacional Brasileiro, a mudança do atual Código Florestal Brasileiro que é de 1965. Um dos
temas que está sendo fortemente debatido é a referida composição/recomposição da reserva
florestal legal.
Para o Ministério da Agricultura, atualmente, 67% do território brasileiro estão
indisponíveis para a agricultura e outras atividades econômicas. Dentro de alguns anos, serão
77%. Neste momento, são 280 milhões de hectares disponíveis para o plantio e outras
finalidades, ou seja, 33% do País. Entretanto, há extensões consideradas prioritárias para a
conservação da biodiversidade que vão sofrer algum tipo de restrição de uso (FRENTE
PARLAMENTAR DA AGROPECUÁRIA (FPA)
26
, 2009, p. 4).
Se as áreas prioritárias à conservação da biodiversidade fossem implementadas hoje,
não existiriam hectares disponíveis para as atividades agrícolas, tampouco para apoiar o
desenvolvimento urbano e econômico, como a ampliação de cidades, construção de
hidrelétricas e estradas, por exemplo. Ao contrário, faltaria área para o plantio de alimentos e
para o crescimento da população. Isso ocorre porque já ultrapassamos, em muito, o limite de
utilização das áreas disponíveis (MINISTÉRIO DA AGRICULTURA, PECUÁRIA E
ABASTECIMENTO, 2009, p. 5).
A Frente Parlamentar da Agropecuária, no Congresso Nacional, por meio do seu
Presidente, Deputado Federal por Santa Catarina, o Engenheiro Agrônomo Sr. Valdir Colatto,
argumenta, que a:
[…] legislação ambiental vigente está em desacordo com a realidade, as
necessidades e os interesses do País tanto para a efetiva proteção do meio
ambiente quanto para o desenvolvimento. A má qualidade das águas, do ar
e os índices de desmatamento demonstram a necessidade de uma mudança
urgente nos conceitos e paradigmas até hoje adotados” (FRENTE
PARLAMENTAR DA AGROPECUÁRIA, 2009, p. 2).
26
A Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA) é uma entidade associativa que defende interesses comuns,
constituída por representantes de todas as correntes de opinião política do Congresso Nacional e têm como
objetivo estimular a ampliação de políticas públicas para o desenvolvimento do agronegócio nacional.
71
Segundo o mesmo Deputado, o estabelecimento de parâmetros, porcentagens e
metragens de forma generalizada em um país de proporções continentais foi o início de uma
antipolítica ambiental. Os diplomas foram se multiplicando vertiginosa e desordenadamente
com regras cada vez mais rígidas e o que se conseguiu foi punir aqueles que protegeram o
meio ambiente com o engessamento econômico. Porém, onde há miséria, não há condição de
proteção dos recursos naturais.
Além disso, prossegue o Deputado, após duas décadas de sua promulgação, as
normas vigentes ainda não contemplam mandamentos constitucionais, pois os principais
diplomas da legislação ambiental, que são a Lei da Política Nacional de Meio Ambiente, Lei
nº 6.938/81 e o Código Florestal, Lei nº 4.771/65, são anteriores à Constituição Federal de
1988. Ao contrário das Constituições anteriores em que cabia apenas à União legislar sobre
florestas, caça e pesca, nossa “Constituição Cidadã” prestigiou e consolidou o sistema
federativo e estabeleceu no Art. 24 que seria de competência da União editar apenas e tão
somente normas gerais a respeito do meio ambiente e que os Estados caberia legislar sobre
suas peculiaridades.
No entanto, até hoje os Estados não conseguem regrar adequadamente o uso e
proteção de seus recursos dada à especificidade inadequada da legislação federal que engessa
sua competência. Sem respeito à realidade e às peculiaridades regionais a legislação torna-se
inaplicável (FRENTE PARLAMENTAR DA AGROPECUÁRIA, 2009, p. 3).
Ainda no Congresso Nacional, foi criada a comissão especial do Código Ambiental
Brasileiro sendo o seu Presidente, o Deputado Federal pelo Estado do Paraná, o Engenheiro
Agrônomo Sr. Moacir Micheletto. Para o Deputado paranaense, a comissão especial do
Código Ambiental vai mostrar para toda a sociedade que o produtor rural não deve ser
considerado o “vilão” dessa questão ambiental.
Todos temos a consciência que é preciso fazer as mudanças no Código
Florestal vigente para atualizá-lo e para que tenhamos uma lei maior. Por
isso, vamos buscar o consenso e o bom senso para que a nova legislação
ambiental seja fruto do entendimento porque na verdade o relatório será
votado pelo Plenário do Congresso Nacional que representa toda a
sociedade brasileira. (BOLETIM DE DIVULGAÇÃO DE ATIVIDADE
PARLAMENTAR, 2009, p. 1).
Para o Deputado, é preciso acabar com essa dicotomia entre ruralistas e
ambientalistas.
72
Na audiência pública realizada no dia 21 de agosto de 2008, junto a Comissão de
Agricultura da Câmara Federal com o Ministro do Meio Ambiente, Sr. Carlos Minc,
representantes do agronegócio solicitaram ao Ministro rever alguns itens do Decreto Federal
nº 6.514/2008, que regulamentou a Lei de Crimes Ambientais, que tanto pânico causou ao
agronegócio brasileiro. Para o Deputado presidente da comissão especial do Código
Ambiental, Moacir Micheletto entende que “[…] não podemos criminalizar a produção rural.
Sem votar o novo Código Ambiental Brasileiro, tudo que o governo fizer será “remendo” na
legislação ambiental.” (Câmara dos Deputados; 53ª Legislatura – 2ª Sessão Legislativa; Série
Separatas de Discursos, Pareceres e Projetos nº 203/2008).
Para o relator da referida comissão do novo Código Ambiental, Deputado Federal por
São Paulo, Aldo Rebelo, a questão é polêmica. Segundo ele, sua posição como relator é ter
equilíbrio e tentar compatibilizar a agricultura e meio ambiente. Assim, “[…] nem
ambientalistas devem temer um código que despreze o meio ambiente, nem os ruralistas
devem temer um código financiado pelas ONGs estrangeiras.” Ademais, “[…] não se pode
admitir que a pretexto da defesa do meio ambiente se transforme a agricultura e agricultor em
criminosos”. A agricultura é um patrimônio importante para o país como é o meio ambiente.
O Brasil não pode renunciar nem um nem outro segmento. “Justiça só faremos se formos
capazes de combinar os dois em perfeito equilíbrio”. Não é uma tarefa fácil e simples, se
fosse alguém já teria feito (BOLETIM DE DIVULGAÇÃO DE ATIVIDADE
PARLAMENTAR, 2009, p. 2).
No caso do município de Palotina, representantes do Sindicato Patronal, do
Sindicato dos Trabalhadores Rurais e líderes da Cooperativa local desencadearam movimento
junto aos seus sócios, solicitando aos Deputados e Senadores, por meio de lista de baixo
assinado, envio de cartas e e-mail para a derrubada do atual Código Florestal no que tange,
principalmente, à obrigatoriedade na composição/recomposição dos 20% da reserva florestal
legal. O slogan do movimento é “mata ciliar sim, reserva legal não”.
Para o presidente da Cooperativa Local, C-Vale, Engenheiro Agrônomo Alfredo
Lang, um dos líderes do movimento local, a proposta da Cooperativa para o novo Código
Ambiental se dá por meio da manutenção das matas ciliares, sem a imposição de novas
exigências para áreas já em produção.
Não se mexe em áreas consolidadas, isto é, que já estão produzindo e que
têm vocação para a produção de alimentos. Árvores devem ser plantadas em
regiões sem vocação para a produção de alimentos. Os agricultores fazem
73
sua parte para a preservação ambiental ao recompor as matas ciliares, usar o
plantio direto e recolher as embalagens de agrotóxicos. (JORNAL FOLHA
DE PALOTINA, 2009, p. 7).
Para ele, a preservação ambiental é responsabilidade de toda a sociedade já que todos
precisam de água pra viver. Exigir mais do que isso comprometeria a renda e a permanência
do produtor no campo e ainda afetaria outros seguimentos sociais. “A exigência da reserva
florestal legal vai prejudicar não só o produtor, mas toda a sociedade porque significará 20% a
menos riquezas circulando, ou seja, vai prejudicar as vendas e os empregos.” (JORNAL
FOLHA DE PALOTINA, 2009, p. 7).
A comissão especial do novo Código Ambiental está promovendo audiências
públicas na maioria dos Estados Brasileiros. Na região Oeste do Estado do Paraná, a mesma
ocorreu no dia 04 de dezembro de 2009, na cidade de Assis Chateaubriand. Segundo a
organização do evento, aproximadamente, cinco mil agricultores participaram do referido
evento para ratificar a necessidade de mudança no vigente Código Florestal Brasileiro.
Embora que se mostra nítida a divergência entre o setor produtivo o e setor que
defende a aplicação da lei para se estabelecer, de fato, a implantação da reserva florestal legal
nas propriedades rurais, salienta-se que não há vacância legislativa sobre a obrigatoriedade
imediata no que tange a composição/recomposição da referida reserva.
Assim, até que o trâmite legal do novo Código Ambiental ora proposto não cumpra
seus prazos e procedimentos, salienta-se que o agricultor, detentor de imóvel rural, está
sujeito ao Código Florestal Brasileiro vigente, Lei 4.771/65, e demais leis derivadas, quer na
esfera Federal, Estadual ou Municipal, bem como, está abrangido também pelos Decretos
Federais números, 6.514/6.686/2008, 6.686/2009 e 7.029/2009, sendo que este último
instituiu o Programa Federal de Apoio à Regularização Ambiental de Imóveis Rurais e
estabeleceu o termo final para averbação da reserva florestal legal nestes referidos imóveis
rurais para o dia 11 de junho de 2011.
5.3 Usando a Reserva Florestal Legal
O legislador pátrio, ao criar o atual Código Florestal em 1965, estabeleceu que a
reserva florestal legal tem, na propriedade, as funções de uso sustentável dos recursos naturais
e a conservação ambiental. No parágrafo 2º, do Artigo 44, permitiu que, na recomposição da
reserva florestal legal, sejam utilizadas espécies exóticas como pioneiras, em caráter
74
temporário, e que essa utilização das espécies exóticas
27
visa estabelecer condições favoráveis
à restauração do ecossistema original e, ao mesmo tempo, geração suplementar de renda para
o produtor rural, com ênfase no agricultor familiar. A utilização de espécies exóticas na
recuperação da reserva legal, pode ser consorciada com as espécies nativas num sistema
denominado multiestrata. O sistema multiestrata se dará por meio do plantio de no mínimo de
duzentas plantas de árvores nativas pioneiras por hectare e de, no mínimo, cinco espécies
florestal diferentes da região, sendo o plantio das exóticas feito nas entre linhas das árvores
nativas (art. 3º da Resolução nº 045, de 31/07/2008, SEMA PR).
As espécies exóticas deverão ser erradicadas após a conclusão de um ciclo
econômico da espécie, mas, no caso do agricultor familiar, os mesmos poderão perpetuar em
suas propriedades o sistema de exploração multiestrata, se tornando, neste caso, uma fonte de
renda na propriedade rural (Art. 3º da Resolução nº 045, de 31/07/2008, SEMA PR).
Outra forma de exploração econômica permitida pela legislação ambiental na reserva
florestal legal é o reflorestamento para o seqüestro de carbono. O reflorestamento para
seqüestro de carbono é feito nas áreas de reserva florestal legal (20% de cada propriedade),
mantendo-as e, ao mesmo tempo, conferindo-lhes um sentido produtivo. As áreas de reserva,
até então ocupadas por pastagens e atividades agrícolas expostas pelo tempo de exploração e
ao uso constantes de agrotóxicos, passam, a partir desse sistema de exploração, a produzir
madeira. Com a realização de fotossíntese da floresta em crescimento, que seqüestra carbono
da atmosfera na proporção de 260 toneladas por hectare, gera créditos de carbono que podem
ser comercializados por meio do Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL), na
modalidade de projetos de pequena escala (PRODUZINDO COM A NATUREZA, 2009, p.
90).
Estes modelos ora propostos, já foram trabalhados no Estado do Paraná por meio do
Programa Paraná Biodiversidade e as informações dos resultados econômicos e técnicos se
encontra a disposição dos produtores rurais, cooperativas e empresas que queiram
implementar estas formas de exploração na reserva florestal legal, transformando-as, em
geração de renda e emprego para o agricultor familiar. O modelo é inovador, pois concilia
adequação à legislação ambiental, conservação da biodiversidade, produção econômica e
inclusão social.
27
Espécies exóticas são aquelas que ocorrem numa área fora de seu limite natural historicamente conhecido,
como resultado de dispersão acidental ou intencional por atividades humanas. Por exemplo: eucalipto,
grevílea, pinus, pupunha etc.
75
Salienta-se que todo este arcabouço jurídico que regula as questões ambientais tem
sido tratado como um diferencial no comércio nacional e internacional aquele
produtor/fornecedor/empresa que se propõe a cumprir tais preposições exigidas. Com uma
legislação ambiental cada vez mais exigente e uma crescente conscientização das partes
interessadas em relação ao desenvolvimento sustentável, as organizações estão cada vez mais
preocupadas em atingir e demonstrar um correto desempenho ambiental. Neste sentido, tem-
se buscado cada vez mais as certificações ambientais. Dentre elas, destaca-se o Sistema de
Gestão Ambiental denominada ISO 14001.
De âmbito internacional, a NBR ISO 14001 é uma norma relativa ao Sistema de
Gestão Ambiental (SGA), apresentando especificações e diretrizes para uso. É uma norma
voluntária podendo ser aplicada a qualquer organização pública ou privada independente do
porte.
Criada pela International Organization for Standardizatio (ISO), é baseada na
prevenção da poluição e no melhoramento contínuo e seu foco é o aperfeiçoamento constante.
Não estabelece requisitos absolutos para o desempenho ambiental. Exige da organização estar
em conformidade com os requisitos legais, e do cumprimento da política ambiental
estabelecida pela própria propriedade e/ou empresa.
A busca permanente da qualidade ambiental é, portanto, um processo de
aprimoramento constante do SGA de acordo com a política ambiental estabelecida. Os
objetivos e as finalidades inerentes a um gerenciamento ambiental devem estar em
consonância com o conjunto das atividades empresariais. Todavia, eles não podem e nem
devem ser vistos como elementos isolados, mas como um trinômio de: responsabilidade
ambiental, econômica e social.
Cada vez mais compradores, principalmente importadores, estão exigindo a
certificação ambiental, no molde ISO 14000, ou mesmo certificados ambientais específicos
como, por exemplo, para produtos têxteis, madeiras, cereais, carnes, frutas etc. Tais
exigências são voltadas à concessão do “Selo Verde”, mediante a rotulagem ambiental.
Acordos internacionais, tratados de comércio e mesmo tarifas alfandegárias incluem questões
ambientais na pauta de negociações culminando com exigências não tarifárias que, em geral,
afetam produtores de países exportadores. Este conjunto de fundamentos não é conclusivo,
pois os quesitos apontados continuam em discussão e tendem a se ampliar. Esta é uma
questão indiscutível, até pelo fato de que apenas as normas ambientais da família ISO 14000,
que tratam do Sistema de Gestão e de Auditoria Ambiental encontram-se em vigor.
76
Assim, este sistema de certificação deriva dos avanços trazido pelas leis ambientais,
principalmente, para as atividades desenvolvidas pelo setor primário que, em sua maioria, são
grandes demandadores por recursos naturais.
Neste contexto, com objetivo de aprofundar o conhecimento a respeito da
aplicabilidade das normativas legais ambientais por parte do agricultor familiar de Palotina no
que se refere à reserva florestal legal, o próximo capítulo infere-se, especificamente, sobre o
locus da pesquisa onde a fonte de informação compõe-se por meio de levantamento de dados
primários através da pesquisa de campo.
77
6 AGRICULTURA FAMILIAR E RESERVA LEGAL: UM ESTUDO DE CASO
6.1 Procedimentos Metodológicos
A metodologia seguida para o estudo de caso da presente dissertação está fundada
num referencial teórico que buscou conceituar e qualificar as categorias: agricultor e
agricultura familiar. Recorreu, para tal fim, a fontes bibliográficas, documentais legais e
pesquisa de campo, valendo-se, sobretudo, dos procedimentos da história oral.
Para pesquisar o universo dos agricultores familiares do município de Palotina e suas
relações com o meio ambiente, com o objetivo de obter dados qualitativos
28
dessa categoria,
foi aplicado um questionário (Apêndice 1) junto a uma amostra destes produtores
enquadrados como agricultores familiares conforme critérios estabelecidos na Lei Federal nº
11.326 de 24 de julho de 2006 (denominada lei da agricultura familiar). Estes agricultores já
foram identificados por meio do uso do Programa Nacional da Agricultura Familiar
(PRONAF), feito pelo Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Palotina (órgão credenciado
junto ao Ministério de Desenvolvimento Agrário para efetuar o enquadramento conforme os
critérios estabelecidos na lei).
Para a realização da pesquisa de campo, após identificação do público alvo, foi
realizado o dimensionamento da amostra em 33 agricultores familiares de um universo total
de 623 residentes no município de Palotina, segundo cadastro do Sindicato dos Trabalhadores
Rurais de Palotina. Salienta-se, que a amostragem de 33 agricultores familiares emana do total
de agricultores familiares que acessaram a linha de crédito PRONAF, na modalidade de
investimento, no primeiro semestre de 2009, e tiveram seus projetos técnicos elaborados pelo
Instituto Paranaense de Assistência Técnica e Extensão Rural (EMATER) da unidade local de
Palotina.
Para a pesquisa de campo, a aplicação do questionário (Apêndice 1) deu-se em cada
unidade familiar de produção delineado pela amostragem, cujo foco principal está nas
proposições legais para preservação do meio ambiente.
28
Enquanto estudos quantitativos geralmente procuram seguir com rigor um plano previamente estabelecido
(baseada em hipóteses claramente indicadas e variáveis que são objetos de definição operacional), a pesquisa
qualitativa costuma ser direcionada ao longo de seu desenvolvimento; além disso, não busca enumerar ou
medir eventos e, geralmente, não emprega instrumental estatístico para análise dos dados; seu foco de
interesse é amplo e parte de uma perspectiva diferenciada da adotada pelos métodos quantitativos. Dela faz
parte a obtenção de dados descritivos mediante contato direto e interativo do pesquisador com a situação
objeto do estudo. Nas pesquisas qualitativas, é freqüente que o pesquisador procure entender os fenômenos,
segundo a perspectiva dos participantes da situação estudada e, a partir daí, situe sua interpretação dos
fenômenos estudados.
78
Neste sentido, a primeira parte do questionário trata da caracterização do agricultor
familiar e seus familiares quanto à origem, etnia, religião, estado civil, tipo de posse da área e
local de moradia, percentual da receita bruta das atividades desenvolvidas na propriedade e,
fora desta.
Assim, foram identificadas seis possíveis origens de renda para auxiliar na
caracterização da agricultura familiar, a saber:
a) Rendas provenientes de Atividades agropecuárias intrapropriedade;
b) Rendas provenientes de Atividades agropecuárias extrapropriedade (refere-se a
todas as atividades de exploração primária, bem como transformação artesanal de produtos
agrícolas e pecuários);
c) Rendas provenientes de Atividades rurais não-agropecuárias na propriedade
(referem-se ao desenvolvimento de atividades de características rurais, mas não
correlacionadas à exploração de produtos primários. Exemplo: artesanato, turismo rural, entre
outras);
d) Rendas provenientes de Atividades rurais não-agropecuárias extrapropriedade
(referem-se ao desenvolvimento de atividades de venda de mão de obra para realização de
serviços ligados à agropecuária. Exemplo: serviços de plantio, aplicação de defensivos
agrícolas, colheita, limpeza de aviários, entre outras);
e) Rendas provenientes de Atividades não-agropecuárias extrapropriedade (referem-
se à venda de mão-de-obra em atividades diversas fora da propriedade, mas que não estão
relacionadas à agropecuária. Exemplo: professores, vendedores, operários de
fábricas/agroindústria);
f) Rendas provenientes de Proventos de benefícios previdenciários de atividades
rurais e de outros benefícios sociais (referem-se às rendas obtidas por aposentadoria e pensões
rurais e outros benefícios concedidos via projetos de auxílio à família de cunho educacional e
também de auxílio à manutenção especialmente de deficientes físicos e mentais).
Ainda no item identificação, a estrutura familiar
29
foi detalhada no que se refere ao
nível de escolaridade, mão-de-obra ocupada em atividades intra e extrapropriedade e suas
relações com as instituições de representação da categoria e comercial;
29
Para determinação da estrutura familiar, foram identificadas todas as pessoas que vivem na propriedade, sendo
pertencentes ao núcleo familiar (parentes do titular) ou não (empregados).
79
Na segunda parte do questionário, foi trabalhada a caracterização da unidade
produtiva com relação ao tipo de solo, tamanho da propriedade, data de aquisição/posse,
existência de cursos d’água, e uso do solo.
Na terceira parte, foi identificada a produção agropecuária (dimensão, composição e
nível tecnológico de produção por meio dos níveis de produtividade). Também foram
identificadas atividades que demonstrem diversificação na atividade agropecuária, a
agregação de valor ao produto primário por meio da transformação primária, bem como
produção para consumo familiar.
A quarta e última parte do questionário trata da “Caracterização Ambiental”,
identificando o ambiente com relação à preservação dos remanescentes florestal existentes e
as motivações para a derrubada destas matas. Também trata do conhecimento sobre a
legislação ambiental por parte do agricultor familiar, mais especificamente sobre a reserva
florestal legal, as fontes de informação e fóruns de discussão sobre este tema; a proposta
destes agricultores familiares para recomposição da reserva florestal legal e seus
questionamentos com relação às proposições da legislação ambiental, suas relações com a
unidade produtiva e em relação à Constituição Federal de 1988, bem como suas ações, por
meio de suas atividades produtivas, e os reflexos destas atividades em relação à
sustentabilidade do meio ambiente.
Os dados obtidos foram armazenados no aplicativo Microsoft EXCEL 2007
30
e,
após, tabulados no mesmo ambiente gráfico, para finalmente haver a extração de dados e
obtenção de índices e indicativos.
6.2 Análise da Pesquisa de Campo
A análise que segue refere-se à amostra de agricultores familiares do município de
Palotina - Paraná classificados nesta categoria de acordo com as normas estabelecidas na Lei
Federal nº 11.326 de 24 de julho de 2006, denominada lei da agricultura familiar. O órgão
credenciado junto ao Ministério de Desenvolvimento Agrário (MDA) responsável pelo
enquadramento dos agricultores familiares do município de Palotina, conforme a lei ora
mencionada, é o Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Palotina. Os agricultores familiares
pesquisados estão regularmente enquadrados pelo Sindicato conforme a exigência legal.
30
A tabulação de dados, bem como a formatação de tabelas e gráficos foram realizados pela Engenheira
Agrônoma Eliana Aparecida dos Reis, Instituto Paranaense de Assistência Técnica e Extensão Rural
(EMATER), município de Maripá, Paraná.
80
6.2.1 Identificação do Agricultor Familiar e Demais Membros da Família
De acordo com o Gráfico 1, pode-se identificar que a procedência do agricultor
familiar de Palotina é predominantemente oriunda dos três estados que compõem a região sul
do país (96,97%), especialmente das regiões serranas.
Gráfico 1 – Procedência do agricultor familiar de Palotina
A formação étnica cultural dos agricultores responsáveis pelas unidades produtivas
indica a predominância da origem italiana (84,85%), seguida pela germânica (12,12%), e
outras (3,03%). Estes agricultores que, em sua maioria, migraram do sul do país, junto com
seus pais e avós, trouxeram o “saber-fazer” destas civilizações. A prática de produzir para o
abastecimento próprio familiar é uma característica, como será demonstrado pela pesquisa de
campo. Também a diversidade da produção agropecuária trazida para este espaço rural, e hoje
profissionalizada por meio da tecnologia e dos canais de comercialização (ex: produção de
grãos, suínos e aves) caracteriza-se como um forte traço destes povos.
Em termos de formação religiosa, o credo dominante é quase na sua totalidade o
católico, com um percentual de 96,97%, sendo, 3,03% de evangélicos. Da amostragem dos
entrevistados responsáveis pelas unidades familiares de produção, 96,97% são casados e
3,03%, viúvos. Em relação ao tempo de casamento, o maior percentual está representado pelo
grupo com tempo de casamento acima de 30 anos, seguido pelo intervalo de 21 a 25 anos de
casamento com 27,27% e pelo intervalo de 25 a 30 com 12,12%. Esta condição revela uma
maior estabilidade na organização do núcleo familiar, com reflexos também na estabilidade
nas relações de posse da unidade produtiva, haja vista que, conforme será demonstrado
54,55%
21,21%
21,21%
3,03%
PR SC RS SP
81
adiante, a principal fonte de renda destes agricultores se encontra nas atividades agropecuárias
intrapropriedade. (Pesquisa de campo, 2009)
Já, em relação à condição de posse da área agrícola, predominam três categorias,
conforme o Gráfico 2: proprietário (90,91%), parceiro
31
(6,06%) e arrendatário
32
(3,03%).
Gráfico 2 – Condição de posse da terra
Os dados de relação de posse da unidade produtiva vão ao encontro da análise sobre
a distribuição desta população nos espaços urbano e rural. Assim sendo, conforme aponta a
Tabela 1, a população amostrada apresenta seu maior percentual residindo na área explorada
(média 84,85%), seguida por 12,02% dos entrevistados que residem na área urbana e somente
3,03% deste universo residem próximo à área explorada
33
. Esta situação pode ser explicada
pela condição de posse predominante (proprietário) que favorece a permanência da família na
unidade rural, visto que é o seu principal e, muitas vezes, único imóvel. É favorecida,
também, pelo fato da reprodução nestas unidades envolver fortemente a mão-de-obra familiar
para o desenvolvimento das atividades agropecuárias, principalmente aquelas que possuem
31
“Parceria rural é o contrato agrário pelo qual uma pessoa se obriga a ceder à outra, por tempo determinado ou
não, o uso específico de imóvel rural, de partes do mesmo, incluído ou não benfeitorias, outros bens e/ou
facilidades, com o objetivo de nele ser exercida atividade de exploração agrícola, pecuária, agro-industrial,
extrativa vegetal ou mista; e/ou lhe entrega animais para cria, recria, invernagem, engorda ou extração de
matérias primas de origem animal, mediante partilha de riscos de caso fortuito e da força maior do
empreendimento rural, e dos frutos, produtos ou lucros”. (art. 4º do Decreto n.º 59.566/66, in verbis).
32
Arrendamento rural é o contrato agrário pelo qual uma pessoa se obriga a ceder à outra, por tempo
determinado ou não, o uso e gozo de imóvel rural, parte ou partes do mesmo, incluindo, ou não, outros Bens,
benfeitorias e/ou facilidades, com o objetivo de nele ser exercida atividade de exploração agrícola, pecuária,
agroindustrial, extrativa ou mista, mediante certa retribuição ou aluguel, observados os limites percentuais da
lei. (Estatuto da Terra -Lei 4504/64).
33
Considere-se como “local próximo à área explorada” as sedes de comunidade rurais com agrupamentos
residenciais que apresentam infra-estrutura mínima para a comunidade local, tal como energia elétrica e água.
3,03%
6,06%
90,91%
Proprietário Parceiro Arrendario
82
atividades pecuárias que demandam manejo diário do rebanho, e, portanto, uso intenso desta
mão-de-obra na área de exploração.
Tabela 2 – Local de residência por condição de posse
Local Residência (%)
Condição
Área explorada Próxima à área explorada Área urbana
Proprietário 78,79 0,00 12,12
Arrendatário 0,00 3,03 0,00
Parceiro 6,06 0,00 0,00
Sobre as receitas obtidas, 78,79% da renda bruta provém das atividades
agropecuárias desenvolvidas na unidade produtiva, conforme o Gráfico 3. As atividades
extrapropriedade, caracterizadas como pluriatividade, compõem 12,12% do total das
atividades desenvolvidas, cabendo salientar que são paralelas às atividades agropecuárias
tradicionais. Este dado vem confirmar uma tendência do espaço rural: o de incorporar outras
atividades não agropecuárias para compor a receita familiar. Este cenário já foi apontado nas
pesquisas sobre a pluriatividade no espaço rural no Brasil desenvolvida, principalmente, pelos
professores José Graziano da Silva e Sérgio Schneider. Cabe evidenciar que, para o caso em
estudo, as atividades agropecuárias desenvolvidas na propriedade ainda representam a
principal fonte de renda.
Os proventos advindos de benefícios previdenciários aparecem com relativa
expressão entre os entrevistados, perfazendo um percentual de 9,09% da receita. Analisando
um pouco mais esta informação, denota-se que parte dos responsáveis pela unidade produtiva
e seus cônjuges estão com faixa etária acima 60 anos. Frente estes percentuais de proventos
previdenciários, os mesmos revelam relativa importância na composição global da receita.
21,21%
3,03%
9,09%
9,09%
100,00%
Atividades
agropecuárias
Atividades
agropecuárias
extrapropriedade
Avidades não
agropecuárias
extrapropriedade
Proventos de
beneficios
previdenciários
Gráfico 3 – Proveniência de receita
83
Com relação à composição da estrutura familiar, tem-se do total da população
residente na área rural: 34,38% de agricultores (este grupo é formado pelos titulares
responsáveis pelas unidades agrícolas independentemente do seu tipo de relação de posse com
a unidade agrícola), 33,33% de cônjuges (do total de entrevistados, 96,97% são casados e
3,03% viúvos), e 32,29% de filhos.
Todavia a identificação da mão de obra existente remete à necessidade de analisar a
população amostrada sob vários aspectos. Neste sentido, a análise da faixa etária do grupo dos
agricultores familiares responsáveis pela unidade produtiva, detectada na pesquisa, se dá a
partir dos 20 anos que é a idade próxima a maioridade, e assim, permite que estes agricultores
assumam a unidade agrícola de modo oficial (concessão do pai de parte da área, herança ou
aquisição de outra unidade agrícola), bem como, aproximarem-se, formalmente, de
instituições afins ao seu negócio (cooperativa, sindicato, agentes financeiros).
Esta análise é bastante relevante, haja vista que demonstra a experiência do grupo,
mas também revela o baixo nível de renovação deste mesmo grupo. Somente 3,03 % do grupo
amostrado têm idade inferior a 30 anos, conforme a Tabela 2, demonstrando um desequilíbrio
deste intervalo em relação aos intervalos que compõem as maiores faixas de idade (de 30 até
79 anos) do que se conclui que este baixo índice de pessoas jovens à frente da exploração de
atividades agropecuárias está diretamente relacionado à redução da população rural mais
jovem, cuja idade propicia o interesse pelo trabalho e em assumir funções. Esta camada da
população rural tem deixado o espaço rural em favor do urbano, conforme será demonstrado
mais adiante por meio dos resultados obtidos. Este fato dá conta de um espaço rural mais
maduro e mais estável, todavia com força física limitada. Esta condição se reflete na
diversificação de atividades, e em especial, aquelas que dependem diretamente deste fator,
bem como deixa questionamentos sobre a prospecção da continuidade do setor produtivo pela
agricultura familiar.
Tabela 3 – Percentual de agricultores por grupo de idade
Faixa etária dos agricultores responsáveis pela unidade produtiva % Agricultores por grupo de idade
20 a 29 anos 3,03
30 a 39 anos 21,22
40 a 49 anos 33,33
50 a 59 anos 18,18
60 a 69 anos 15,15
70 a 79 anos 9,09
Já sobre a questão da escolaridade, a população amostrada apresenta níveis
diferenciados. Do total do público amostrado, 71,89% concentram seu nível de escolaridade
84
entre as faixas de 1ª à 4ª série do ensino fundamental incompleto ao 2º grau incompleto.
Todavia, analisando por categoria amostrada (agricultores, cônjuges e filhos), tem-se que
66,66% dos agricultores possuem nível de escolaridade entre as faixas de 1ª à 4ª série do
Ensino fundamental incompleto à 5ª à 8ª série do Ensino Fundamental incompleto. Índice
similar ocorre para os cônjuges (65,63%) na mesma faixa de escolaridade. Já 64,52% dos
filhos aparecem estudando entre as faixas de 1ª à 4ª série do Ensino fundamental ao 2º Grau.
Em análise à categoria dos filhos de modo mais aprofundado, encontram-se ainda aqueles que
não possuem ainda idade escolar (9,68%) e aqueles que estão em escolas de Ensino Especial
(3,23%), que somados aos filhos em idade escolar (64,52%) totalizam 77,43% da categoria,
indicando um bom potencial educacional futuro para este grupo, conforme a Tabela 3.
Estes dados demonstram a preocupação para que os filhos alcancem níveis
educacionais superiores aos dos pais para que tenham a possibilidade de, por meio da
qualificação formal, buscar a sua inserção no mercado do trabalho e da produção através de
outras profissões e atividades que a não de agricultor, como pode se verificar pelo depoimento
do entrevistado número 5. “O serviço na roça é árduo. Com estudo na cidade, a vida é mais
fácil. O trabalho é mais leve. Melhor arrumar emprego e se formar em alguma coisa.”
(Entrevista 5, 2009, C. B., agricultor familiar, morador da Linha Medianeira, Palotina).
Tabela 4 – Percentual da população por grau de escolaridade
% pessoas da população total % pessoas por categoria
Grau escolaridade
Agricultor Cônjuge Filho Agricultor Cônjuge Filho
Analfabeto 1,04 0,00 0,00 3,03 0,00 0,00
Sem idade escolar 0,00 0,00 3,13 0,00 0,00 9,68
1ª a 4ª série ensino fund. Incomp. 7,29 5,21 0,00 21,21 15,63 3,23
1ª- 4ª série E.fund. Incomp.cursando 0,00 0,00 12,50 0,00 0,00 38,71
1ª a 4ª série ensino fund. Comp. 9,38 10,42 0,00 27,27 31,25 0,00
5ª a 8ª série ensino fund. Incompl. 6,25 2,08 1,04 18,18 6,25 3,23
5ª-8ª S. Ens. fund. Incomp. cursando 0,00 0,00 3,13 0,00 0,00 9,68
5° a 8ª série ensino fund.compl. 0,00 4,17 1,04 0,00 12,50 3,23
2° grau incompleto 2,08 3,13 4,17 6,06 9,38 12,90
2° grau incompleto - cursando 0,00 0,00 5,21 0,00 0,00 16,13
2° grau completo 3,13 4,17 0,00 9,09 12,50 0,00
3° grau incompleto 1,04 1,04 0,00 3,03 3,13 0,00
grau completo 4,17 3,13 1,04 12,12 9,38 3,23
Já a análise sobre os locais de concentração de mão de obra
34
levou aos seguintes
resultados: do total dos agricultores responsáveis pela unidade produtiva, que representam
34,37% do total da população amostrada, 100% desenvolvem atividades agropecuárias na
unidade produtiva, e somente 3,03% destes desenvolvem atividades rurais não agropecuárias
34
Os dados foram trabalhados sobre a População Economicamente Ativa que na pesquisa corresponde a 72,91%
do total da população amostrada.
85
extra-propriedade, sendo estas atividades caracterizadas por trabalhos com maquinários em
outras unidades agrícolas (serviços de tratorista) envolvendo, em média, 41% do tempo destes
agricultores.
Do total dos cônjuges, que representam 33,33% da população amostrada, 84,38%
desenvolvem unicamente atividades agropecuárias nas unidades produtivas, paralelamente aos
serviços domésticos, demonstrando que esta categoria representa a principal aliada nos
afazeres diários das atividades agropecuárias para os agricultores titulares. Já 12,5% dos
cônjuges desenvolvem atividades não-agropecuárias extra-propriedade, sendo caracterizados
pelos serviços de secretária, professora, técnica em laboratório e costureira (estas atividades
são desenvolvidas no horário comercial em tempo integral). E somente 3,12% envolvem-se
unicamente com os serviços domésticos de suas residências.
Os filhos com idade superior a 16 anos residentes nas unidades produtivas
representam 12,5% do total da população amostrada, sendo que 50% desenvolvem
unicamente atividades agropecuárias juntamente com os pais; 25% estudam e/ou trabalham e
auxiliam os pais nas atividades agropecuárias ocupando, em média, 28,22% do seu tempo
com estas atividades na propriedade. O grupo daqueles que somente estudam perfaz o total de
25%, indicando um relativo distanciamento desta categoria com relação às atividades
desenvolvidas na unidade produtiva, e uma provável qualificação formal para o
desenvolvimento de atividades não afeitas às agropecuárias.
Importante destacar que do total dos filhos sem idade para o desenvolvimento do
trabalho formal que representam 19,80% do total da população amostrada, 26,31% do total
deste público, apresentando idades entre 13 a 14 anos, foram envolvidos em atividades
agropecuárias na unidade produtiva ocupando, em média, 22,46% do seu tempo. Este dado
torna-se interessante na medida em que, ao se envolverem com os afazeres da unidade
produtiva, aumentam a possibilidade de familiarização com este ambiente rural e de se
“apropriação” deste espaço.
Ainda com relação à mão de obra jovem existente na unidade produtiva, verificou-se
que do total dos entrevistados, 60,70% dos agricultores responsáveis pelas unidades
produtivas assistiram a saída de seus filhos por motivos diversos: casamento (39,13%), estudo
(26,09%) e para desenvolver atividades não-agropecuárias (34,78%). Cabe ainda mencionar
que do total das unidades produtivas analisadas, 30,30% possuem como formadores do núcleo
familiar somente o casal. E, concentrando a análise sobre este último grupo, 20% possuem
média de idade inferior a 40 anos. Os demais (80%) variam de 43 a 76 anos de idade,
86
apontando para o envelhecimento dos núcleos familiares e o conseqüente déficit da mão-de-
obra jovem tão necessária para muitos dos afazeres diários na unidade produtiva.
Estes dados revelam que há, não só uma redução já definida pela saída dos filhos da
unidade produtiva, mas um potencial de saída de mais 8,33%, considerando aqueles que
residem nas unidades produtivas, mas estão inseridos em atividades produtivas não-
agropecuárias extra-propriedade. Este fato, em muitos casos, é preponderante para a definição
de quais atividades serão desenvolvidas ou terão continuidade na unidade produtiva.
Este cenário vai ao encontro da preocupação dos agricultores em reter os filhos na
unidade produtiva, conforme manifestado por este agricultor pesquisado: “Vai chegar uma
hora que não vai ter mais agricultor. Se todos forem para a cidade, terá emprego para todos?
A gente deve incentivar os filhos a cuidar do que já foi construído.” (Entrevista 4, 2009, N.
C., agricultor familiar, morador da Linha Alvorada, Palotina).
As formas de organização e inserção produtiva dos agricultores familiares indicam
que 78,79% estão filiados à cooperativa local e 87,88% ao seu sindicato de classe, o que
demonstra que predomina o entendimento da importância em estabelecer suas referências por
meio de instituições do sistema cooperativo e sindical. De outro lado, a cooperativa, além de
propiciar a reunião das diversas categorias do espaço rural, também representa o principal
canal para aquisição de insumos e maquinários e comercialização da produção agropecuária.
6.2.2 Caracterização da Propriedade
A caracterização da propriedade revela a estrutura existente para reprodução da
agricultura familiar. Deste modo, conforme classificação do INCRA (2010, p. 5), os imóveis
rurais se classificam quanto ao tamanho em:
Minifúndio: trata-se do imóvel rural com área inferior a 1 (um) módulo fiscal
35
.
35
O módulo fiscal, segundo documento do Ministério do Desenvolvimento Agrário, consiste em: “Unidade de
medida expressa em hectares, fixada para cada município, considerando os seguintes fatores: tipo de
exploração predominante no município; renda obtida com a exploração predominante; outras explorações
existentes no município que, embora não predominantes, sejam significativas em função da renda da área
utilizada; e o conceito de propriedade familiar. O Módulo Fiscal serve de parâmetro para classificação do
imóvel rural quanto ao tamanho, na forma da Lei nº 8.629/93. O Módulo Fiscal vigente de cada município, foi
fixado pelos seguintes atos normativos: Instruções Especiais/INCRA Nº 19/80, 20/80, 23/82, 27/83, 29/84,
33/86 e 37/87; Portaria/MIRAD nº 665/88, 33/89 e MA nº 167/89; Instrução Especial/INCRA nº 32/90,
Portaria Interministerial MF/MA nº 308/91, MF nº 404/93 e Instrução Especial INCRA nº 51/97.” (Ministério
do Desenvolvimento Agrário – Instituto de Colonização e Reforma Agrária). – INCRA. Estatísticas cadastrais
– municipais – recadastramento 1992, v. 1. Disponível em:
<www.desenvolvimentoagrario.gov.r/incra/estrut/snda/cad/indic.htm
> Acesso em: 15/09/2009)
87
Pequena propriedade: é aquele imóvel rural de área compreendida entre 1 (um) e 4
(quatro) módulos fiscais.
Média propriedade: está representada pelo imóvel rural de área superior a 4 (quatro)
e até 15 (quinze) módulos fiscais.
Grande propriedade: trata-se do imóvel rural de área superior a 15 (quinze) módulos
fiscais.
Assim, conclui-se que a maior concentração de imóveis rurais da categoria da
agricultura familiar, em Palotina encontra-se classificada como minifúndio e pequena
propriedade.
O intervalo destas duas categorias, para Palotina, compreende de 0,10 a 72,0 há, haja
vista que o módulo fiscal, no município, é de 18 ha. Assim, quatro módulos fiscais perfazem o
total de 72 ha, sendo este o limite de área admitido para enquadrar-se como Pequena
Propriedade conforme classificação do INCRA. Todavia, a maior concentração de
produtores/famílias está no estrato compreendido entre 10,1 e 20 ha (42,42%) conforme
demonstrado pela Tabela 4.
Tabela 5 – Estrutura fundiária
Estrato de área % Propriedades % da Área Média (ha) / Produtor
0 - 10,00 há 9,09 2,07 5,70
10,01 a 20,00 há 42,42 23,77 14,03
20,01 a 30,00 ha 18,18 18,46 25,41
30,01 a 40,00 ha 12,12 17,25 35,62
40,01 a 50,00 ha 12,12 22,85 47,19
50,01 a 60,00 ha 3,03 6,88 56,87
60,01 a 72,00 ha 3,03 8,72 72,00
Fica demonstrada a tendência do universo de famílias da agricultura familiar
explorar, em média, unidades com área abaixo de um módulo fiscal (média de 14,03
ha/agricultor). Para aqueles casos em que a média é trazida para o patamar inferior (média de
5,70 ha/agricultor), muito possivelmente poderá haver um comprometimento da viabilidade
econômica da área explorada quando relacionada com as atividades desenvolvidas. Conforme
os critérios estabelecidos para conceituar o módulo fiscal, ater-se unicamente ao tamanho da
unidade rural pode-se depreender uma análise parcial da forma de reprodução da agricultura
familiar e suas relações com o meio ambiente.
Assim, a análise avançará também sobre alguns aspectos geográficos da unidade
produtiva e o modo de uso deste espaço.
Neste sentido, o tempo de aquisição das unidades produtivas é uma informação que
revela a experiência do agricultor na atividade, bem como sua relação de conservação e uso
88
dos recursos naturais. Deste modo, tem-se que do total dos proprietários, 69,69% adquiriram
suas áreas até o inicio da década de 1990, o que demonstra relativa estabilidade da condição
de posse. Com relação à estrutura da unidade produtiva: 87,88% apresentam cursos d’água,
revelando a possibilidade da diversificação da propriedade com atividades pecuárias.
Este mesmo percentual é verificado para o tipo de solo argiloso, ou seja, a maior
parte dos agricultores familiares de Palotina ocupa áreas com fertilidade natural elevada e
com boa estruturação de solo, permitindo a exploração da área de mais de 74% com culturas
temporárias, mais especificamente, produção de grãos (soja, milho, e trigo), de acordo com o
Gráfico 4.
A área explorada para a produção pecuária é de 10,79%, configurando-se, em
muitos casos, como a segunda fonte de renda da unidade produtiva. Este fato pode ser
relacionado à disponibilidade de mão de obra existente na propriedade que obrigou muitos
agricultores a reduzir, senão eliminar esta atividade, conforme demonstra o Gráfico 4.
Os trabalhos realizados pelas assistências técnicas aliado aos incentivos
governamentais na década de 1980, para manejo correto e conservação dos solos e águas
surtiram seus efeitos também nas áreas destinadas à mata ciliar, que somam 85,85% das
propriedades, dado este que se correlacionado com as propriedades que apresentam recursos
hídricos (87,88%), indica que 97,69% preservam as margens dos rios e córregos,
representando 10,62% da área total. Ainda com relação à preservação, as áreas de
remanescentes de florestas nativas e reflorestamento estão presentes em 39,09% das
propriedades, perfazendo um total de 2,93% das áreas. Assim, mesmo com a soma de todas as
áreas de preservação e de reflorestamento para o mesmo fim, não é obtido o valor de 20%
conforme legislação vigente, como demonstra o Gráfico 4, a seguir.
89
Gráfico 4 – Ocupação da área e uso do solo
6.2.3 Produção Agropecuária: produtos transformados e consumo familiar
As principais culturas desenvolvidas são os grãos, especialmente as commodities,
representadas pela soja (90,91%) e milho safrinha
36
(87,88%), seguidas pelo trigo (3,03%) e
aveia (15,15%), sendo esta última com o propósito de pastoreio de inverno e/ou rotação de
cultura/cobertura do solo. As culturas voltadas para produção de grãos apresentam assistência
técnica em 100%, como demonstra o Gráfico 5.
As produtividades médias das culturas denominadas temporárias (soja – 3.336,43
kg/ha; Milho safrinha – 4.975,55 kg/ha; Trigo – 2.727,0 kg/ha) denotam um bom nível
tecnológico, se comparadas às médias obtidas pelo município, a saber: soja – 3.100 kg/ha,
milho safrinha – 5.000 kg/ha, trigo – 2.900 kg/há). Esse alto percentual de produtores
explorando a cultura da soja e milho deve-se à conjuntura mercadológica destes produtos.
Todavia, importante destacar que, na atividade de produção de grãos, os melhores
rendimentos por unidade de área não são aqueles que encontram a maior lucratividade, haja
vista que estas atividades têm sua maior expressão econômica em produções em larga escala.
Assim, a atividade de produção de grãos, que apareceu entre 96,97% das unidades agrícolas
amostradas, deve ser analisada com critério para a agricultura familiar que dispõe de áreas
classificadas como minifúndios e pequenas propriedades. O Gráfico 5, abaixo, demonstra a
produção agrícola.
36
Na região Oeste do Estado do Paraná, estabeleceu-se uma safra intermediária às de verão e inverno,
caracterizada pelo plantio do milho imediatamente após a colheita da soja de verão, oportunizando um período
ainda considerado tecnicamente favorável para o desenvolvimento desta cultura.
0,00% 20,00% 40,00% 60,00% 80,00% 100,00%
Culturas temporárias
Mata ciliar
Culturas perenes / Pastagem
Remanescente florestas nativas
Reflorestamento
Outras
Eucalipto
% propriedades % área
90
Gráfico 5 – Produção agrícola
Já a produção pecuária apareceu, entre as unidades amostradas, sendo desenvolvida
por parte da categoria da agricultura familiar em Palotina, conforme a Tabela 6. As atividades
identificadas foram: a bovinocultura de leite e corte, a suinocultura, a avicultura de corte e a
piscicultura. O menor índice de agricultores envolvidos em atividades pecuárias, em relação à
produção agrícola, está diretamente relacionado com as oscilações mercadológicas que estes
produtos têm apresentado, assim como uma elevação rápida e significativa do custo de
produção, sem acompanhamento dos preços pagos ao produto, especialmente na atividade de
bovinocultura de leite. Ainda aparece como causa da redução das atividades pecuárias a
redução da mão-de-obra disponível na unidade produtiva, especialmente a mão-de-obra mais
jovem responsável pela execução dos serviços diários considerados com maior exigência de
força física. Além destes fatores, faz-se importante mencionar o volume de recursos para
investir na infra-estrutura necessária para as mesmas, e as exigências de adequação das
unidades produtivas à legislação ambiental, mais especificamente para as atividades de
avicultura de corte, suinocultura e piscicultura.
Embora a existência do fomento à atividade de suinocultura integrada por parte da
cooperativa local, no grupo amostrado, somente a atividade de avicultura de corte apresentou
integração e assistência técnica em 100%. A suinocultura ainda está sendo desenvolvida no
sistema independente e com menor índice assistência técnica (40%).
A atividade de bovinocultura de leite é a atividade pecuária com maior expressão
entre os agricultores amostrados, sendo desenvolvida por 66,67% dos entrevistados. Este fato
pode ser explicado porque esta atividade, além de ser tradicional, apresenta retorno imediato e
investimentos em infra-estrutura de menor vulto, bem como não apresenta as mesmas
exigibilidades legais como as atividades de suinocultura, avicultura de corte e piscicultura. A
0,00%
10,00%
20,00%
30,00%
40,00%
50,00%
60,00%
70,00%
80,00%
90,00%
100,00%
Soja Milho Safrinha Aveia Trigo
Kg / ha
% Propriedades
0,00
1.000,00
2.000,00
3.000,00
4.000,00
5.000,00
6.000,00
% propriedades % área de culturas temporárias
% propriedades com ASTEC Produtividade Média (Kg/ha)
91
bovinocultura de corte aparece com baixos índices (3,03%) dentre o grupo amostrado. Esta
atividade é decorrente, em muitos casos, de animais descartados da atividade de bovinocultura
de leite. As atividades de avicultura de corte, piscicultura e suinocultura seguem o ritmo de
produção e produtividade determinado pela empresa integradora. A tabela 5 demonstra a
produção pecuária.
Tabela 6 – Produção pecuária
Atividade % propriedades Produtividade média Unidade
Avicultura de corte 6,06 2,70 Kg / cab.
Bovino de corte 3,03 100,00 Kg / cab.
Bovino de leite 66,67 12,80 L / cab. / dia
Piscicultura 9,09 0,50 Kg / cab.
Suinocultura 15,15 68,20 Kg / cab.
Sobre a transformação de produtos primários para comercialização é desenvolvida
por somente 6,06% do grupo amostrado, sendo que o total deste percentual está representado
pela transformação do leite para produção de queijo.
A produção para consumo familiar é feita por todos os entrevistados que
apresentaram algum tipo de produção e/ou transformação de produtos primários para tal fim.
Os produtos mencionados foram: olerículas, frutíferas, grãos, raízes, cárneos, derivados de
cana-de-açúcar, embutidos, ovos, farináceos, geléias, doces, sucos e vinhos. Destaca-se ainda
que em análise deste dado juntamente com a informação sobre o local de moradia, indica,
além da questão da herança do saber fazer mencionada por Gazola (2006, p. 91), a
preocupação com a redução de custos das despesas familiares. Toda esta situação se reflete
ainda sobre a segurança alimentar, haja vista que existe uma parcela dos produtores
entrevistados e seus familiares que residem no espaço urbano (12,02%), e que, mesmo diante
desta condição, opta pelo consumo de produtos com origem própria.
6.3 Caracterização Ambiental
Esta análise visa caracterizar o ambiente de produção da agricultura familiar em sua
origem e os reflexos da sua interferência no processo de ocupação e reprodução, bem como
delinear o perfil deste agricultor com relação ao meio ambiente, legislação vigente e as
perspectivas para a proposta para a recomposição da reserva florestal legal.
Os dados sobre a existência de mata ao adquirir a propriedade, demonstraram que
42,42% das áreas possuíam mata nativa intocada, sendo que este percentual correlacionado
92
com a atual detenção da posse da propriedade das unidades produtivas representa, em média,
32,88%. Ou seja, mais de 30% das áreas foram desmatadas pelos agricultores entrevistados
para dar início ao processo produtivo agropecuário (53,13%), bem como o desmatamento
promovido por meio dos incentivos de crédito governamentais (46,81%) nos anos de 1970.
Verifica-se também que estas áreas, em muitos casos, são administradas, atualmente, pelo
mesmo produtor que realizou a abertura da área por meio do derrubada da mata. Daí pode-se
dizer que o processo de desmatamento neste recorte geográfico é bastante recente.
Assim, os agricultores de Palotina, mais especificamente, os familiares foram criando
suas formas de organização por meio das suas instituições de representação formal
(sindicatos) e seus canais de obtenção de insumos e comercialização (cooperativa). E,
juntamente com estas organizações, realizando suas tomadas de decisões. Não só para as
questões afeitas à produção, mas toda e qualquer discussão referente ao espaço rural.
Neste sentido, a cooperativa local aparece como a principal fonte de informação
sobre as questões agropecuárias (57,58%) dos agricultores familiares, seguido pelo sindicato
da categoria (18,18%), conforme demonstra o Gráfico 8. Por outro lado, verifica-se um
agricultor familiar preocupado em reunir mais informações para além das fontes citadas, pois
quando perguntado sobre a suficiência destas instituições como informadoras, 51,52%
manifestaram-se negativamente, havendo então a necessidade de buscar outros canais de
informação. A seguir, no Gráfico 6, é demonstrada as principais fontes de informação sobre a
legislação ambiental.
57,58%
18,18%
15,15%
6,06% 3,03%
Cooperativa Sindicato Outros Órgãosblicos Assistência técnica privada
Gráfico 6 – Fonte de informação sobre a legislação ambiental
93
Estes mesmos agricultores, em sua maioria, demonstraram conhecimento sobre a
legislação vigente que trata sobre a reposição da reserva florestal legal (96,97%). Em
contrapartida, 78,79% dos entrevistados não consideram importante fazer a recomposição da
reserva florestal legal, pois, segundo estes agricultores, para 80,77% resultará em redução da
área de produção, 15,38% já possuem reserva em acordo com legislação vigente, e 3,85% não
entendem com sendo sua responsabilidade, como demonstra o Gráfico 7.
A questão do entendimento da maior parte dos agricultores é facilitada pelo razoável
nível de escolaridade verificado anteriormente, não só dos agricultores responsáveis pela
unidade produtiva, mas também pelos cônjuges e filhos, que com certeza mantém um canal de
comunicação e questionamento com o chefe da família.
Depreende-se destes dados, quando correlacionados com o Gráfico 4, relativo
ocupação da área e uso do solo, a importância que as áreas destinadas à produção de grãos
representam para a composição da renda destas famílias, bem como o entendimento de que, se
outrora foram incentivados e até mesmo condicionados ao desmatamento pelo governo para
obtenção de recursos (crédito agrícola) para exploração da área, este mesmo governo também
tem suas responsabilidades para com o meio ambiente e sociedade, devendo assumi-las. Daí
deduz-se o relativo distanciamento demonstrado na pesquisa de campo sobre a importância da
recomposição da reserva florestal legal, como demonstra o Gráfico 7.
Gráfico 7 – Por que não considera importante fazer a reposição florestal
De outro lado, os 21,21% consideram importante fazer a reposição florestal em sua
propriedade. Entendem que isto resultará em benefícios ao meio ambiente (85,71%), e que
suas atividades devem se adequar para cumprir as exigências para mercado
96,15%
3,85%
0,00%
0,00%
0,00%
0,00%
25,00%
50,00%
75,00%
100,00%
% propriedades
Porque resultará em redução
de área para produção
Não endente como sua
responsdabilidade
Custo elevado para execução
da reposição/legalização
Não tem certeza sobre os
benefícios futuros p/ meio
ambiente
Já possui reserva em acordo
com legislação vigente
94
externo/exportação (14,29%). Estes últimos são representados especialmente por: parte do
grupo de agricultores que desenvolvem atividades de avicultura de corte no sistema
integração (6,06%) e que estão em fase de conclusão das adequações estabelecidas pela
legislação; os piscicultores (9,09%) pela cobrança da legislação e dos órgãos responsáveis; e
os suinocultores (15,15%) que, embora ainda estejam no sistema de produção independente,
vislumbram o sistema de integração como uma possibilidade para assegurar margens de lucro,
e, portanto, irão se encontrar com a necessidade de adequação da unidade produtiva.
Já com relação ao planejamento para recomposição da reserva florestal legal, 45,45%
manifestaram-se contrários, 12,12% já realizaram a recomposição de acordo com a legislação,
e 42,42% mencionou estar planejando, sendo que o motivo deste planejamento está
intimamente relacionado com as exigências do sistema de integração e/ou com regularização
de registro de imóvel (72,41%). Acrescentaram, ainda, que esta adequação refletirá em
redução da renda agropecuária (87,88%
37
). Acredita-se que aqueles que não tem o mesmo
entendimento (12,12%) constituem parte do grupo que não apresenta na produção de grãos a
sua principal fonte de renda, não sendo a área fator preponderante para sua atividade
(avicultura de corte, suinocultura, bovinocultura de leite e piscicultura).
Já quando questionados sobre a possibilidade de serem indenizados para compor a
reserva florestal legal com base na produtividade obtida por área nas suas propriedades, 100%
manifestaram sua concordância. Todavia, somente 54,55% dos entrevistados concordariam
em arcar com parte dos custos. Este dado remete à questão sobre o entendimento de quem é a
responsabilidade sobre o desmatamento realizado, onde 100% daqueles que responderam
negativamente entendem que já houve/haverá contribuição ao ceder a área para o
reflorestamento.
Os agricultores também foram questionados sobre a quem eles atribuem o(s)
beneficio(s) com a reposição da reserva florestal legal. O grupo de maior expressão é aquele
que entende que todos irão se beneficiar conjuntamente, seguido do meio ambiente
isoladamente, a sociedade, o governo, e outros (sem identificação) conforme o Gráfico 8.
Todavia, 6,06% acreditam que ninguém terá benefício algum.
37
Esta questão foi respondida pela totalidade dos agricultores entrevistados.
95
0,00%
42,42%
24,24%
12,12%
9,09%
6,06%
6,06%
Todos
Meio ambiente
Sociedade
Governo
Niguém
Outros
Produtor
Gráfico 8 – Público beneficiado com a reposição da reserva legal
Os agricultores ainda se manifestaram sobre a possibilidade de alteração nas leis
ambientais. Do total dos entrevistados, 84,85% se pronunciaram favoráveis à desobrigação da
recomposição da reserva florestal legal e que estas discussões tem sido abordadas
principalmente pela cooperativa local, sindicatos, representantes políticos, seguidos por outros
fóruns não especificados e, finalmente, as cerealistas, conforme o Gráfico 9.
0,00% 20,00% 40,00% 60,00% 80,00%
% propriedades
Ag en tes
fina nc eir os
Cerealistas
Outros
Representantes
políticos
Sindicato
Cooperativa
Gráfico 9 – Principais fóruns de discussão sobre as leis ambientais no município de Palotina
De outro lado, estes mesmos agricultores, em sua maioria (72,73%), entendem que,
embora tenham legalmente a posse da propriedade, não podem dispor da mesma como
desejarem, ignorando as leis que determinam sobre seu uso. Mas somente 6,06% afirmaram
conhecer sobre a “função social da propriedade” contida na Constituição Federal de 1988.
96
Estes dados revelam uma categoria que tem no cumprimento da lei um dever, mas
não exatamente a compreensão desta lei. Pode decorrer do fato de que as discussões sobre a
origem da mesma não tem sido socializadas e abordadas nos seus fóruns pertinentes.
Para além do conhecimento legal, 75,76% do grupo tem a percepção dos impactos
que especialmente à exploração agrícola com uso de insumos químicos tem sobre o ambiente.
E finaliza sua percepção sobre o ambiente com 90,91% dos entrevistados, onde mencionam a
importância dos remanescentes de mata como mecanismos auxiliares na limpeza do ar
poluído pelo uso de agrotóxicos. Tem-se, assim, uma categoria preocupada com a qualidade
de vida e conhecedora de como o uso intensivo de tecnologia com alto volume de insumos
químicos pode ser maléfico ao ambiente e que, para tanto, a água e o ar, fontes da vida,
devem ser protegidos.
Finalmente, este mesmo grupo foi questionado sobre a herança da sua atividade para
os filhos e 69,70% manifestaram seus desejos em ver a continuidade de suas atividades sendo
desenvolvidas por eles, como sendo esta uma forma de creditar e valorizar o segmento da
produção primária realizado por esta categoria, bem como ter o que consideram uma
qualidade de vida melhor em relação ao espaço urbano.
Veja alguns depoimentos dado pelos entrevistados: “Se o filho tocar a terra levará
uma vida tranqüila. Terá mais renda do que na cidade. Na roça, nunca passei fome. Gosto de
fazer o que faço, e gostaria que meu filho continuasse a atividade.” (Entrevista 1, 2009, J. G.,
agricultor familiar, morador da Linha São Roque, Palotina).
“Gosto de trabalhar na lavoura. A gente vive num ambiente melhor, sem acúmulo de
pessoas e tem liberdade do tempo. Gostaria que meu filho seguisse o legado herdado.”
(Entrevista 27, 2009, H. M., agricultor familiar, morador da Linha Madrugada, Palotina).
“Se todos forem para a cidade como vai ficar a produção de alimentos? Tem que ter
um substituto para produzir. Vai ter emprego prá todos na cidade? A cidade depende da
agricultura. Palotina, se não tiver agricultura, pára.” (Entrevista 16, 2009, A. D., agricultor
familiar, morador da Linha São Luiz, Palotina).
Deste modo, também há que se considerar a importância econômica da agricultura
familiar para os pequenos e médios municípios na geração de empregos e renda, bem como a
própria segurança alimentar do país, como fica claro no depoimento deste agricultor:
Se continuar a saída do pequeno agricultor para a cidade, vai chegar um
momento de ter que se alimentar com pílulas. A pequena propriedade é que
põe alimento na mesa do brasileiro. Se ficar na mão do grande produtor, o
nível de utilização de veneno será maior e com isto vai piorar a qualidade
97
dos alimentos. O governo tá refém do sistema multinacional. O dinheiro
destinado ao custeio e investimento agrícola só tem seguro se o produtor
adquirir o pacote tecnológico. (Entrevista 9, 2009, A. P., agricultor familiar,
morador da Linha Santana, Palotina).
Os depoimentos acima ratificam as características da agricultura familiar e sua forte
relação estabelecida entre a família, à propriedade e o trabalho. Estabelecem ainda, na visão
dos entrevistados, a importância desta categoria para o país. Também o desejo, em sua
maioria, de que seus filhos dêem continuidade às atividades desenvolvidas na unidade
produtiva.
98
7 CONSIDERAÇÕES FINAIS
A pesquisa possibilitou a realização da análise e reflexão acerca da legislação
ambiental brasileira e de sua aplicabilidade a uma realidade concreta como a da reserva
florestal legal no universo da agricultura familiar de Palotina.
Com este propósito, contextualizou a agricultura familiar de Palotina originária do
processo da migração para nova fronteira agrícola que deslocou unidades familiares de
produção do espaço agrícola do sul do Brasil. Buscou a relação entre este segmento da
economia agrícola com outros setores da produção agroindustrial, com vistas a entender a sua
postura frente ao modelo de modernização da agricultura proposto a partir dos anos 1960.
Também compreender sua relação com os demais setores, sendo o principal objeto deste
trabalho, o setor ambiental. Diante deste quadro foi possível utilizar a lei da agricultura
familiar, lei nº 11.326 de 24 de julho de 2006, como parâmetro básico para discutir suas
formas de produção e reprodução e o nível de intervenção das políticas públicas, neste caso, a
política ambiental, sobre essa categoria.
Ao realizar a pesquisa junto aos agricultores do município de Palotina,
depreenderam-se alguns resultados que chamam a atenção sobre a reorganização da estrutura
familiar e produtiva especialmente quando relacionadas às atividades desenvolvidas na
unidade agrária e a preservação do meio ambiente. Este mesmo agricultor assistiu o poder
público, em curto período de tempo, redirecionar a política agrícola do incentivo ao
desmatamento à recomposição da cobertura florestal sob pena de multa.
Assim, a agricultura familiar de Palotina, constituída predominantemente pelo
agricultor proprietário residente nessa unidade produtiva, corroborando sua forte relação com
a terra, possui, em média, unidades agrárias com tamanho inferior a um módulo fiscal (18 ha
para Palotina). A pesquisa buscou entender também a inserção da agricultura familiar na
dinâmica atual da produção para o mercado. Da mesma forma buscou entender as alternativas
de geração de trabalho e renda na combinação de atividades agropecuárias com outras
ocupações combinadas ou diferenciadas da agropecuária.
Nas atividades internas da organização produtiva, as pecuárias representam uma
expressão menor em termos de valor arrecadado em relação à agricultura. Estas atividades
fazem parte do conjunto de diversificação da unidade familiar, mas em contrapartida
demandam mão-de-obra mais intensa e freqüente. Diante deste cenário, as atividades
agrícolas mais mecanizadas e cíclicas, representadas pela produção de grãos, especialmente a
99
cultura da soja, aparecem como sendo as principais, estando a produção destas culturas
intimamente relacionada com a conjuntura de mercado nacional e internacional.
Deste modo, a agricultura familiar que se assentava, antes deste período, na
diversidade dos processos produtivos, hoje, se reproduz fortemente com base no mercado de
fatores de produção, na especialização produtiva, nos cultivos voltados ao mercado e com
intensa diferenciação sócio-produtiva entre as suas unidades (GAZOLA, 2006, p. 100). Neste
contexto, a proposta de preservação ambiental, mais especificamente, a reserva florestal legal,
entra em conflito com a o modelo de exploração econômico da unidade produtiva pelo
agricultor familiar que tem suas principais atividades voltadas para o mercado de produção
em escala.
As atividades combinadas vêm a caracterizar a presença da pluriatividade no setor
rural. E, conforme ficou demonstrado no trabalho de campo, a pluriatividade, já presente no
modelo de agricultura camponesa, reconstruiu-se na agricultura familiar e se apresenta como
importante elemento na forma de reprodução dessa categoria. Representa cerca de 10% das
receitas obtidas pelos membros dos núcleos familiares, especialmente cônjuges e filhos, o que
conduz à percepção da necessidade de complementação da renda obtida na agropecuária.
Mas o setor rural é ambiente de mais um movimento sócio-econômico: a evasão do
público mais jovem, especialmente aqueles que apresentam nível de escolaridade mais
elevado. Encontra-se então um espaço rural representado por 65% dos titulares das unidades
produtivas com idades acima de 30 anos, demonstrando que os jovens, candidatos a
sucessores destes titulares, estão se afastando do espaço rural em troca da execução de
atividades não-agropecuárias no espaço urbano.
Pode-se então falar de uma agricultura familiar definida pelo modo de ocupação do
espaço rural, pelo tamanho das unidades agrárias somado ao modelo de produção
desenvolvido influenciado por uma política agrícola.
Neste contexto, a combinação de atividades na propriedade e extrapropriedade não
tem sido suficiente para o universo dos descendentes dos núcleos da agricultura familiar.
Configura-se, assim, o processo de esvaziamento do campo pela parcela da população mais
jovem que não tem encontrado condições suficientes para se inserir na lógica de reprodução
familiar de modo a lhe oferecer sustentabilidade econômica.
Este processo denominado de mercantilização social e econômica que muitas destas
unidades estão expostas nos últimos anos, conforme Gazola (2006) menciona em seus
trabalhos, reflete-se na reprodução da agricultura familiar de Palotina.
100
Dentro deste padrão de desenvolvimento agrícola setorial, as principais atividades
produtivas que são as responsáveis, em grande medida, pela vulnerabilidade e pelo
deslocamento espacial e temporal da produção para o autoconsumo, são a produção de grãos e
commodities agrícolas e a integração agroindustrial com marcante presença dos complexos
agroindustriais da avicultura e da suinocultura em um processo verticalizado. Estas atividades
fazem com que o produtor adote uma proposta de especialização produtiva e de inserção
mercantil, de modo que os mesmos voltem às estratégias de reprodução econômica a poucas
atividades produtivas rentáveis e que possuem mercado garantido e seguro. São estas as
principais expressões máximas do padrão de desenvolvimento agropecuário da região,
produzido desde a década de 1970.
A estrutura e a evolução do setor rural refletem de forma clara uma nova dinâmica do
período recente: uma dinâmica que não pode mais ser apreendida somente a partir dos
mecanismos internos da própria atividade agrícola, como a propriedade da terra, a base
técnica da produção e nem a partir da segmentação do mercado interno.
Neste sentido, cabe ressaltar a interferência do Estado junto ao setor agrícola com
objetivo de regular as distorções de mercado, “[…] através da garantia de preços e rendas para
os agricultores, e estimular a produção doméstica, de modo que o abastecimento alimentar,
especialmente urbano, não seja comprometido pela escassez de produtos e por preços internos
muito elevados.” (LEITE, 2001, p. 16). Porém, o que tem sido percebido é o forte
esvaziamento dessa tendência, quando então a polêmica sobre as falhas do mercado perdeu
importância frente às falhas do Estado. Assim, o setor agrícola reduziu seu status de
dependência do Estado e trilhou para sua inserção no mercado por meio da adoção de padrões
tecnológicos próprios estreitamente relacionados à agroindústria e ao mercado de produtos
agrícolas.
Deste modo, pode-se concluir que a atual política agrícola, isoladamente, não deu
conta de interferir em um quadro que envolve uma política setorial integrada. A mudança de
atividade ainda está estreitamente vinculada às relações produto-mercado.
Neste caso, conforme Graziano (2003, p. 174), o Estado não pode continuar a ser
apenas o árbitro de uma luta que segue regras impostas pelos mercados capitalistas, numa
pretensa neutralidade que se traduz, na maioria das vezes, simplesmente pela omissão. É
preciso que o Estado participe efetivamente das decisões, impondo regras aos setores
oligopolizados da comercialização agrícola, tanto no mercado de insumos como no de
produtos (SILVA, 2003, p. 174).
101
Neste mesmo viés, Lamarche (1998, p. 272) deixa bastante clara a importância da
interferência do Estado ao mencionar que:
Das diversas teorias que tentam explicar a sobrevivência, a permanência, o
desenvolvimento ou o fim próximo, periodicamente reiterado, a unidade de
produção familiar, várias concedem ao Estado um papel decisivo na
perpetuação da unidade de produção agrícola familiar, seja através das
políticas fundiárias de acesso à terra, das políticas de crédito para a
modernização ou de diversas disposições jurídicas ou regulamentares.
Também como componente deste cenário, as proposições da legislação ambiental
levam a comunidade a reflexões acerca da sua viabilidade diante do atual quadro de produção
rural e, deste modo, aprofundam ainda mais as diferenças de postura diante da proposta da
recomposição da reserva florestal legal. Fortalecendo ainda mais esta postura, os fóruns de
discussão e, também, referências técnicas e ideológicas do agricultor familiar refletem um
senso/consenso conjunto com os agricultores familiares de Palotina e as lideranças locais: de
que a legislação ambiental vigente está para interferir supressivamente na viabilidade
econômica da agricultura familiar, uma vez que exige a composição/recomposição florestal
em 20% de sua área produtiva.
Percebe-se assim, a dificuldade que o agricultor familiar de Palotina, bem como seus
representes sindicalistas e cooperativistas, tem em vislumbrar para além da proposta do
grande comércio outra forma de estruturar ou reestruturar a unidade produtiva a partir de
novos conceitos de produção. Assim, os conceitos tradicionais do mercado capitalista, nos
quais o agricultor familiar se encontra inserido, obstam a formação de uma consciência
ecológica e sustentável de produção.
De outro lado, tem-se o mesmo agricultor familiar resistente à legislação ambiental,
demonstrando relativa consciência dos reflexos de suas ações sobre o ambiente, bem como
disposto a abrir mão do que entende como sendo sua a exclusividade de exploração e engajar-
se em ações conjuntas ao Estado, à sociedade e à pesquisa para preservação do ambiente.
Todavia com a observância de ser ressarcido pelo que deixará de explorar.
Assim, pode-se mencionar uma resistência à lei que tem sua derivação de um
complexo contexto: das questões socioculturais, do incentivo dado pelo Estado na promoção
da derrubada da mata para possibilitar o desenvolvimento da região por ocasião da sua
ocupação, da forma da estruturação da propriedade, do sistema de produção adotado, e da
dificuldade do agricultor familiar em repensar e reestruturar um novo sistema de produção
econômico juntamente auxiliado por suas representações institucionais.
102
Da análise acima, pode-se depreender ainda que as bases da problemática ambiental
resultam de uma visão social distorcida sobre o tema associada a um modelo de produção
adotado pelo agricultor familiar mais adequado à agricultura empresarial. Nesta lacuna, pode-
se dizer que as propostas tecnológicas desenvolvidas pelos órgãos de pesquisa para
exploração econômica das áreas de reserva legal, já prevista na legislação ambiental,
constituem ferramentas importantes para a solução do problema com menores impactos
supressores sobre a renda da agricultura familiar.
Estas proposições alternativas de exploração econômica, contudo, ainda são
estranhas aos representantes do comércio para o mercado de comodities e agroindústria e este
distanciamento se reflete no nível de adoção e execução destas novas formas de exploração
pela agricultura familiar. Faz-se oportuna, neste caso, a presença de um Estado com ações
convergentes para o cumprimento da legislação ambiental, fortalecendo a pesquisa oficial,
possibilitando por meio do crédito agrícola, a adoção destas propostas pela agricultura
familiar, desenvolvendo propostas de subsídio e incentivo a preservação do meio ambiente e,
principalmente, formando uma sociedade consciente de suas ações e responsabilidades por
meio da educação.
Depreende-se assim que as transformações sociais e culturais são fatores
determinantes nas questões relacionadas ao meio ambiente. Assim, soluções para problemas
de degradação dos recursos naturais estão intrinsecamente ligadas à necessidade de mudanças
nos conceitos da sociedade que devem ser patrocinados pela educação.
O entendimento de que a crise ambiental também tem suas raízes na questão social,
entendimento este já contemplado nos princípios basilares das leis ambientais, é fundamental
para que se busquem propostas adequadas, que envolvam a compreensão e o
comprometimento da sociedade, visto que o problema abrange pessoas, recursos naturais
limitados, ecossistemas desequilibrados e sistemas mantenedores da vida.
Fica evidente que a evolução da recuperação de áreas degradadas, a preservação dos
recursos naturais só obterá êxito quando a questão do meio ambiente ultrapassar os níveis da
discussão e se constituir em proposta de educação ambiental. Todas as práticas, tais como
legislação, políticas públicas e princípios, somados à conscientização da sociedade a cerca das
questões ambientais, constituirão a proposta ideal para solucionar as questões do meio
ambiente.
Assim, formar-se-á um cenário em que o agricultor familiar possa se situar de forma
consciente diante do problema e, com isto, promover a organização do espaço da sua
103
propriedade agrícola, na perspectiva de uma produção que se desenvolva de forma harmônica
e equilibrada, visando a sustentabilidade ambiental.
De outro lado, o Estado deve transcender suas ações de legislador e, como
participante de um pacto social, transformar-se em um instrumento que subsidie e estimule a
formulação de políticas públicas eficientes, voltadas para a questão ambiental e para o
desenvolvimento sustentável pela utilização racional do solo e da água e pela proteção e
perenidade das florestas e demais formas de vegetação, proporcionando o equilíbrio almejado
entre as diferentes formas de vida, para conciliar o desenvolvimento econômico com
sustentabilidade ambiental.
Esta proposta atuará como agente conciliador entre as preocupações e ações
correlatas ao meio ambiente com participação direta da sociedade, visto que esta sociedade,
conforme os princípios embasadores das leis ambientais, constituem a principal interessada,
pois todo e qualquer prejuízo que venha a ocorrer no nível ambiental reverterá para ela.
Já com relação ao futuro do rural, cabe destacar que este espaço se reconstrói e
assume novos contornos na busca de sua integração às dinâmicas modernas e à sociedade.
Deste modo, torna-se evidente a necessidade da agricultura familiar conectar-se ao seu tempo
e espaço, onde o peso das políticas públicas assuma o papel articulador desse processo.
Torna-se perceptível que a proposição para preservação ambiental deve estar ligada a
uma proposta que apresente a integração entre crescimento e desenvolvimento, apoiada na
viabilidade econômica e social da categoria da agricultura familiar. Neste sentido, destaca-se
o pensamento de Lamarche (1997, p. 22, grifos do autor) sobre a agricultura familiar e sua
trajetória “A exploração familiar é ao mesmo tempo uma memória, uma situação, uma
ambição e um desafio. Do valor atribuído a cada um desses elementos dependerão suas
características, suas exigências e seu futuro.”
Assim, finalizaremos com o entendimento sobre o desafio de discutir um cenário em
que a lógica da agricultura familiar, usufruindo da sua diversidade, construa um modelo de
reprodução para além meramente da instituição legal e do crescimento tecnológico, mas sim
de uma proposta de maior amplitude que é a do desenvolvimento sustentável. Neste mesmo
propósito, faz-se importante mencionar Brandenburg (1999, p. 23) que remete a necessidade
de um repensar sobre o espaço rural e sua função em que as propostas para este espaço
estejam apoiadas no tripé formado pela: “[…] eficiência econômica, valorização social e
sustentabilidade agro-ecológica.”. Por sua vez, a categoria da agricultura familiar deve voltar
o seu olhar para si própria e redescobrir todo o potencial que possui para se desenvolver seja
nos recursos humanos disponíveis, no “saber-fazer” que herdou, nos aspectos geográficos
104
favoráveis que este recorte oferece, bem como, também, considerar os apoios externos como
os provenientes dos avanços tecnológicos e das políticas públicas.
Nossa reflexão, talvez, longe de constituir um consenso, procura trazer a público um
“novo olhar” sobre a agricultura familiar de Palotina, seu desafio no saneamento do passivo
ambiental existente frente ao positivado nas leis ambientais vigentes e, por conseguinte, a
adequação às mesmas. E, com isso, espera contribuir para ampliação do debate em torno da
composição da reserva florestal legal nas unidades produtivas rurais da agricultura familiar.
105
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111
APÊNDICE 1 – QUESTIONÁRIO APLICADO NA PESQUISA DE CAMPO
1. Identificação:
1. Nome__________________________
2. Origem/naturalidade:_________________
3. Etnia _________________
4. Religião: __________________
5. Estado civil:
( ) 1. Solteiro
2. Casado - ( ) até 5 anos ( ) de 6 a 10 ( ) de 11 a 15 ( ) de 16 a 20
( ) de 21 a 25 anos ( ) de 26 a 30 anos ( ) mais de 30 anos
6. Tipo de posse predominante
( ) 1. Proprietário
2. Arrendatário
3.Parceiro
4.Outros
7. Local da residência
( ) 1. Área explorada
2. Próximo à área explorada
3.Área urbana
8. Receita bruta anual (%):
6.1) Atividades agropecuárias:_______________________
6.2) Atividades agropecuárias extrapropriedade: ___________________
6.3) Atividades nãoagropecuárias na propriedade: ____________________
6.4) Atividades rurais nãoagropecuárias extrapropriedade: _________________
6.5) Atividades nãoagropecuárias extrapropriedade: _________________
6.6) Proventos de benefícios previdenciários de atividades rurais e de outros
benefícios sociais _________________
9. Estrutura da mão-de-obra existente no estabelecimento rural:
Grau de
parentesco c/
o produtor(a)
Idade
Grau de
escolaridade
Estuda
(S/N)
Trabalha na
propriedade
(S/N)
dias/ano
Atividades
extra-
propriedade
(identificar
dias/ano
Produtor (a)
10. Teve algum filho(a) que saiu do estabelecimento rural?
( ) 1. Sim Quantos? ___________________
2. Não – segue para questão 11
112
11. Qual o principal motivo daquele(s) que não reside(m) mais no estabelecimento
rural terem saído?
( ) 1. Casou
2. Foi estudar
3. Foi trabalhar em atividades não-agropecuárias
4. Foi trabalhar em atividades agropecuárias extrapropriedade
5. Outros (identificar) __________________________
12. É filiado à cooperativa?
( ) 1. Sim
2. Não
13. É filiado ao Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Palotina?
( ) 1. Sim
2. Não
2. Caracterização da propriedade
1. Tipo de solo predominante ______________________
2. Tamanho da Propriedade (hectares):_______________
3. Data da aquisição/posse: _________________
4. Existência de curso d’água
( ) 1. Sim
2. Não
5. Caracterização da propriedade por áreas de ocupação (hectares):
5.1) Florestas nativas:___________
5.2) Reflorestamento:___________
5.3) Culturas perenes:___________
5.4) Culturas cíclicas:___________
3. Produção agropecuária, produtos transformados e consumo familiar
1. Produção agrícola
Cultura Área explorada
(ha)
Produtividade média
(kg/ha)
ASTEC (S/N)
2. Produção pecuária
Atividade Tamanho do
rebanho produtivo
(cab)
Produtividade média
(kg/cab ou lt/cab)
ASTEC
(S/N)
Integrado
(S/N)
113
3. Produtos transformados
Produto Produção
média anual
(kg, lt, uni)
Mão de obra
familiar envolvida
(número pessoas)
Selo de
Inspeção
Muncipal
(S/N)
% da renda
total do
estabelec.
rural
4. Produtos para consumo familiar
Produto
4. Caracterização ambiental
1. Quando a propriedade foi adquirida a área para produção estava coberta
por mata nativa?
( ) 1. Sim
2. Não
Quantos hectares aproximadamente: ______________
2. O que mais motivou a derrubada da floresta?
( ) 1. As necessidades de abertura de área para plantio
2. Os incentivos de crédito governamentais
3. Legislação vigente na época
4. Outros ___________
3. Qual sua principal fonte de informação sobre a legislação ambiental?
( ) 1. Cooperativa
2. Sindicato
3. Órgãos públicos
4. Assistência técnica privada
5. Outros
4. Considera esta fonte de informação suficiente?
( ) 1. Sim
2. Não
5. Conhece a legislação que trata sobre a recomposição da reserva florestal
legal?
( ) 1. Sim
2. Não
114
6. Considera importante fazer a reposição florestal em sua propriedade?
( ) 1. Sim - vai para questão 7
2. Não - vai para questão 8
7. Por que sim?
( ) 1. Por causa dos benefícios ao meio-ambiente
2. Porque não quer sofrer as punições da lei
3. Porque sua atividade deve se adequar para cumprir exigências para mercado
externo/exportação
4. ______________________________
Segue para questão 9
8. Por que não?
( ) 1. Porque resultará em redução da área de produção
2. Porque possui custo elevado para execução da reposição/legalização
3. Não entende como sendo sua responsabilidade
4. Não tem certeza sobre os benefícios futuros para o meio-ambiente
5. Já possui reserva em acordo com legislação vigente
6. ________________________________
9. Está planejando compor a reserva florestal legal?
( ) 1. Sim – segue para questão 10
2. Já compôs – segue para questão 10
3. Não – segue para questão 11
10. A composição da reserva legal está relacionada com as exigências do
sistema de integração e ou com regularização de registro do imóvel?
( ) 1. Sim
2. Não
11. Considera que a composição da reserva legal trará redução na renda
agropecuária?
( ) 1. Sim
2. Não
12. Se houvesse indenização anual, considerando a produtividade obtida por
área nas propriedades, considera que a motivação para compor a reserva
florestal legal aumentaria?
( ) 1. Sim – segue para questão 13
2. Não – segue para questão 14
13. Acredita que haveria concordância dos agricultores em arcar com parte
dos custos?
( ) 1. Sim – segue questão 15
2. Não – segue questão 14
14. Por que não?
( ) 1. Considera que já houve/haverá contribuição ao ceder a área para o
reflorestamento
2. Não trará benefício algum para o negócio
115
3. Outra ______________________
15. Quem o senhor acredita que vai ganhar com a reposição da reserva
florestal legal
( )1. O produtor
2. O meio-ambiente
3. A sociedade
4. O Governo
5. Todos
6. Ninguém
7. Outros _____________
16. Considera que a lei que trata sobre a reserva legal deveria ser alterada
para a desobrigação de sua composição?
( ) 1. Sim – segue para questão 17
2. Não – segue para questão 18
17. Em que fórum(ns) de discussão e/ou com que representantes/instituições
tem sido abordada a possibilidade sobre a não implantação da reserva legal?
( )1. Sindicatos
2. Cooperativa
3. Cerealistas
4. Representantes políticos
5. Agentes financeiros
6. Outros _____________
18. Considera que a propriedade rural, em sendo sua, poderá dispor da forma
como quiser, independente das leis que limitam o seu uso?
( ) 1. Sim
2. Não
19. Tem conhecimento sobre a “função social” da propriedade rural contida
na Constituição Federal de 1988?
( ) 1. Sim
2. Não
20. Acredita que, na execução do trabalho com a terra, a atividade agrícola
pode poluir o meio ambiente com a utilização de adubos químicos e agrotóxicos
recomendados para obtenção de produtividade?
( ) 1. Sim
2. Não
21. Acredita que a existência de remanescentes de mata podem auxiliar na
limpeza do ar poluído pelo uso de agrotóxicos?
( ) 1. Sim
2. Não
22. Gostaria que seu filho prosseguisse na sua atividade de agricultor?
( ) 1.Sim (Explicitar o por quê)______________________________________
2.Não (Explicitar o por quê)______________________________________
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