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UNIVERSIDADE PRESBITERIANA MACKENZIE
LIDIA LACAVA
MITO DE EROS E PSIQUÊ:
UM CAMINHO POSSÍVEL PARA PENSAR A DOCÊNCIA
São Paulo
2009
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LIDIA LACAVA
MITO DE EROS E PSIQUÊ:
UM CAMINHO POSSÍVEL PARA PENSAR A DOCÊNCIA
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-
Graduação em Educação, Arte e História da
Cultura da Universidade Presbiteriana
Mackenzie, como requisito parcial à obtenção
do título de Mestre em Educação, Arte e
História da Cultura
Orientadora: Profª Dra. Regina C. F. A. Giora
São Paulo
2009
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L129m Lacava, Lídia.
Mito de Eros e Psiquê: Um caminho possível para pensar a
docência / Lídia Lacava – 2009.
156 f.: il ; 30 cm.
Dissertação (Mestrado em Educação, Arte e História da
Cultura) Universidade Presbiteriana Mackenzie, São
Paulo, 2009.
Orientadora: Profª Dra. Regina C. F. A. Giora
Bibliografia: f. 149 - 153.
1. Mito. 2. Linguagem. 3. Formação Docente.
4. Subjetividade. 5. Educação. I. Título.
CDD 370.71
LIDIA LACAVA
MITO DE EROS E PSIQUÊ:
UM CAMINHO POSSÍVEL PARA PENSAR A DOCÊNCIA
Dissertação apresentada à Universidade
Presbiteriana Mackenzie como requisito
parcial para a obtenção do título de Mestre em
Educação, Arte e História da Cultura.
Aprovado em
BANCA EXAMINADORA
Dra. Regina C. F. A. Giora
Universidade Presbiteriana Mackenzie
Dr. Norberto Stori
Universidade Presbiteriana Mackenzie
Dra. Patrícia Pinna Bernardo
Universidade de São Paulo
Ao meu pai José Armando (in memorian) por ter sempre
incentivado, em minhas andanças, a busca por novas
aprendizagens...
A minha sempre presente mãe Joaninha (in memorian) por ter
plantado em mim o amor pelas histórias...
Aos meus filhos, Carina e Paulo, estrelas-guias nesta
jornada/vida, pela presença, pelo estímulo e pela significativa
contribuição nos momentos da preparação final deste trabalho...
Ao meu marido, Oduvaldo, por nossa cumplicidade desde os
tempos da infância, meu eterno companheiro de destino...
A minha tia Julieta, por encorajar-me neste momento da
jornada...
À Thaís, minha nora predileta, pela significativa contribuição
nos muitos momentos em que me deparei com minhas
inabilidades com o computador.
As minhas companheiras de jornada as psiquês professoras
que viabilizaram esta pesquisa e que se disponibilizaram de
maneira tão inteira e íntegra...
À Instituição Escolar que abriu seu espaço para que pudéssemos
vivenciar a proposta para esta dissertação.
AGRADECIMENTOS
São tantos... pois muitos são os caminhos percorridos no caminho/vida... sempre
acompanhada por Deus, fonte de Amor e Sabedoria que a todos ilumina...
Para este momento, relembro os parceiros encontrados neste percurso...
A minha orientadora Professora Doutora Regina C. F. A. Giora, pelo respeito, conhecimento e
cumplicidade diante dos desafios que foram surgindo nesta caminhada.
Ao Professor Doutor Norberto Stori, pelas observações feitas na banca de qualificação e pelas
aulas e visitações a museus que contribuíram para a ampliação da leitura de obras artísticas.
À Professora Doutora Patrícia Pinna Bernardo, sensibilidade que se faz presença no caminho
da Arte e da Psicologia, que com seu jeito tranqüilo e grande conhecimento, a todos cativa.
Ao Professor Doutor Marcos Masetto e à Professora Doutora Maria da Graça Mizukami,
mestres no fazer docente, que muito contribuíram para que minha pesquisa tivesse um suporte
pedagógico, sem se perder por outras veredas.
Ao Professor Doutor Paulo Roberto Araújo pelas conversas filosóficas que contribuíram para
o estudo da importância da subjetividade nas questões da Educação.
Ao Professor Doutor Arnaldo Daraya Contier pelo imenso conhecimento que consegue
transmitir com tanta competência e envolvimento.
Ao Professor Doutor Marcos Rizolli pela riqueza de seus conhecimentos e pela contribuição
primorosa do como fruir uma obra de Arte.
Ao Professor Doutor Sérgio Bairon mostrando com muita autoridade e criatividade os novos
caminhos que a Arte, os Ambientes Virtuais e a Tecnologia podem enriquecer.
À Professora Doutora Ingrid Hötte Ambrogi pela disponibilidade e presença, em momentos
precisos.
À Professora Doutora Mirian Celeste Martins, que em tão poucos encontros trouxe uma
contribuição significativa e sensível para esta pesquisa.
Aos colegas de classe... Regina, João, Clara, Fabrício, Sonia, Tiago, Dirce e Bruna pelos
muitos cafés compartilhados juntos, regados por gostosas gargalhadas, algumas preocupações,
mas todos muito empenhados em dar o melhor de si em suas pesquisas.
Aos amigos com os quais, por múltiplas razões, houve um envolvimento maior, Solange,
Renato, Raphael, Angelino, Grace, José Luiz pela rica troca de experiências, sonhos e
expectativas.
À Daniella, parceira querida da jornada, que esteve sempre ao meu lado compartilhando
momentos de alegria, preocupações, surpresas que a vida nos coloca no cotidiano.
À Maria Alice do Val Barcellos amiga que me acompanha nas incursões pelos caminhos
envolventes da Arte.
À querida amiga Clara Custódio, sempre presente em momentos significativos de minha
caminhada. Clara, amiga-estrela-g
ia, que clareou momentos deste percurso.
Às professoras, sujeitos da pesquisa, Alessandra, Camila, Daniela F., Daniela M., Erica,
Erika, Gladys, Maitée, Patrícia que com muita disponibilidade e envolvimento se vincularam
à proposta. Agradecimentos extensivos à direção da escola que permitiu que o trabalho fosse
realizado, oferecendo o espaço para a efetivação do mesmo.
A querida secretária Regiane que, em tão pouco tempo, conseguiu demonstrar competência e
compromisso, orientando os alunos constantemente.
À Universidade Presbiteriana Mackenzie, através do Programa de Educação, Arte e História
da Cultura, sem o qual nosso sonho não teria condições de viabilizar-se.
O potencial criador elabora-se nos múltiplos
níveis do ser sensível-cultural-consciente do
homem, e se faz presente nos múltiplos caminhos
em que o homem procura captar-se e configurar
as realidades da vida.
Fayga Ostrower
RESUMO
A presente pesquisa tem como objetivo repensar e discutir a prática docente por meio da
análise do Mito de Eros e Psiquê, trabalhado em Oficinas de Sensibilização. O foco da
pesquisa consiste no estudo das múltiplas formas de expressão – inclusive do Mito e da Arte –
como possibilidade para uma reflexão-ação-reflexão sobre o ser e o fazer(-se) professor. A
dissertação apresenta um estudo feito em Escola Particular, situada na cidade de São Paulo,
com um grupo de nove professoras do Ensino Fundamental I. A metodologia adotada foi de
pesquisa-ação, em um estudo de caso com análise de conteúdo (Bardin, Minayo e Gaskell), na
qual se buscou priorizar a categoria subjetividade envolvida na relação ensino-aprendizagem.
Faz-se um paralelo entre as tarefas de Psiquê para resgatar o amor de Eros, com as tarefas do
professor para uma práxis pedagógica que amplie a consciência de ser-si-mesmo para poder
ser com o(s) outro(s). As Oficinas de Sensibilização são apoiadas em pesquisas feitas na
Universidade de Louisville, USA, por Kagin e Lusebrink, trazendo a contribuição da proposta
denominada ETC, onde se trabalha o fazer artístico como expressão do ser. A fundamentação
teórica adotada vem, basicamente, de Vygotsky, Jung, Ostrower, Morin e Paulo Freire que
trazem a importância das diferentes linguagens, como elemento fundamental para se aliar a
afetividade à razão, o subjetivo ao objetivo, o pensamento simbólico ao racional e lógico.
Busca-se abrir espaços para uma ação docente criativa, crítica e compromissada com o
momento sociocultural em que se vive.
Palavras-chave: Mito, Linguagem, Arte, Subjetividade, Educação, Professor e Formação
Docente.
ABSTRACT
The following research intends to rethink and discuss the teaching practice trough the analysis
of the Eros and Psyche Myth worked on Awareness Workshops. The focus of the research
consists on the study of multiple ways of expression - including the Myth and the Art- as a
possibility for a reflection-action-reflection about being and becoming a teacher. The
dissertation presents a study made at a private school, based in Sao Paulo-SP, with a group of
nine teachers from elementary school. The methodology used was the research-action, at a
study case with subject analysis (Bardin, Minayo e Gaskell), on which was sought to
prioritize the category subjectivity involved on the teaching-learning relation. A parallel is
done between Psyche’s tasks to rescue Eros´ love with the tasks of the teacher for a
pedagogical praxis that increases the awareness of being yourself to be able to be with the
other(s). The awareness workshops are supported by researches made at Louisvile University
(USA) by Kagin and Lusenbrink, bringing forward the contribution of the ETC proposal,
where the artistic doing is labored as an expression of being. The adopted theoretical support
is mainly from Vygotsky, Jung, Ostrower, Morin and Paulo Freire who brings the importance
of the different languages as a fundamental element to ally affectivity to reasonability ,
subjectivity to objectivity, symbolic thinking to rational and logical thinking. The present
project pursues to open spaces for a creative teaching action, critical and committed with the
sociocultural moment where one is living.
Keywords: Myth, Language, Art, Subjectivity, Education, Teacher, Teaching Development.
RESUMEN
Esa investigación tiene como objetivo discutir y repensar la práctica docente a través de la
análisis del Mito de Eros y Psique, trabajó en Talleres de Sensibilización. El foco de la
investigación es el estudio de las múltiples formas de expresión - entre ellos el Mito y el Arte
- como una oportunidad para la reflexión-acción-reflexión sobre el ser, el hacer y ser maestro.
La disertación presenta un estudio realizado en una escuela privada, ubicada en São Paulo,
con un grupo de nueve profesores en la escuela primaria I. La metodología es la
investigación-acción, en un estudio de caso con análisis de contenido (Bardin, Minayo,
Gaskell), que trata de dar prioridad a la categoría subjetividad enrollada a la relación
enseñanza-aprendizaje. Se trata de un paralelismo entre las tareas de Psiquê, para rescatar el
amor de Eros, con la misión de los docentes para una práctica pedagógica que se extiende a la
conciencia de ser uno mismo para estar con el otro(s). Los Talleres de Sensibilización son
apoyados por la investigación en la Universidad de Louisville, EE.UU., de Kagin y de
Lusebrink, con lo que la contribución de la propuesta denominada ETC, que trabaja para
hacer arte como una expresión del ser. La fundamentación teórica se utiliza, el estudio de
Vygotsky, Jung, Ostrower, Morin y Paulo Freire, que señale la importancia de las diferentes
lenguajes como un elemento clave para combinar el afecto y la razón, lo subjetivo con el
objetivo, el pensamiento simbólico a lo racional y gico. Trate de abrir un espacio para la
acción de enseñanza creativa, crítica y comprometida con el momento sociocultural en que
viven.
Palabras-clave: Lenguaje, Arte, Subjetividad, Educación, Profesor, Formación Docente.
LISTA DE IMAGENS
Foto 1 – Sensibilização com tules e fundo musical. ................................................................ 36
Foto 2 – Primeira tarefa. ......................................................................................................... 82
Foto 3 – Primeira tarefa. ......................................................................................................... 85
Foto 4 – Primeira tarefa. ......................................................................................................... 86
Foto 5 – Primeira tarefa. . ........................................................................................................ 88
Foto 6 – Organizando as sementes – primeira tarefa............................................................... 90
Foto 7 – Primeira tarefa concluída. ........................................................................................ 91
Foto 8 – Segunda tarefa concluída. ........................................................................................ 98
Foto 9 – Terceira tarefa. . ...................................................................................................... 106
Foto 10 – Terceira tarefa. . .................................................................................................... 107
Foto 11 – Terceira tarefa – focando imagens. . ..................................................................... 109
Foto 12 – Terceira tarefa – exercitando o olhar. ................................................................... 110
Foto 13 – Terceira tarefa. ..................................................................................................... 112
Foto 14 – Terceira tarefa – as dobraduras. ............................................................................ 113
Foto 15 – Quarta tarefa – o que será que há dentro das caixas? ............................................ 118
Foto 16 – Deixando registros artísticos nas caixas. .............................................................. 122
Foto 17 – Resultado final dos trabalhos. ............................................................................... 124
Foto 18 – Trilhas/linhas que marcaram sentimentos... pensamentos... ............................... 128
Foto 19 – Linhas/fitas que abriram trilhas e favoreceram diálogos. ..................................... 143
Autora de todas as fotos utilizadas neste estudo: Lídia Lacava
SUMÁRIO
1 CAMINHANTE... CAMINHOS... .................................................................................... 14
2 PREPARANDO A BAGAGEM... ..................................................................................... 20
2.1 VOU A BUSCA DE QUÊ?!: Proposta e objetivos ......................................................... 20
2.2 MAPEANDO O CAMINHO: Opção metodológica ....................................................... 25
2.2.1 A Trilha Encontrada - O método ............................................................................... 28
3 A HORA DA PARTIDA...REVENDO CENÁRIOS...INDO EM BUSCA DE NOVAS
PAISAGENS...NOVAS VISÕES... ....................................................................................... 38
3.1 ENLAÇANDO AS TEORIAS ........................................................................................ 38
4 PREPARANDO A AMBIÊNCIA PARA VIVENCIAR A HISTÓRIA ...................... 57
4.1 ACERTANDO O PASSO COM OS PASSOS DA HISTÓRIA: O poder da palavra.... 57
4.2 QUEM FORAM AS PERSONAGENS/CAMINHANTES DESSE CENÁRIO?: Os
sujeitos da pesquisa ............................................................................................................... 63
4.3 COLORINDO O CENÁRIO - ENTRE TINTAS E CORES... EM BUSCA DO
TESOURO: A fundamentação teórica das Oficinas de Sensibilização ................................. 66
5 SONS... CORES... IMAGINAÇÃO!... .............................................................................. 75
5.1 VEM A HISTÓRIA: Vivenciando o Mito em Oficinas de
Sensibilização........................................................................................................................... 75
5.2 PASSEANDO PELA PAISAGEM...AS RESSONÂNCIAS DA EXPERIÊNCIA:
Depoimentos e partilha depois das oficinas ........................................................................ 129
6 DEIXANDO PEGADAS... PLANTANDO SEMENTES: Considerações ................. 144
BIBLIOGRAFIA DE REFERÊNCIA .............................................................................. 149
BIBLIOGRAFIA DE CONSULTA ................................................................................. 153
APÊNDICE ........................................................................................................................ 154
14
1 CAMIHATE... CAMIHOS...
“ão tenho caminho novo. ovo é o jeito de
caminhar...”
Thiago de Mello
Num tempo que sempre me lembro, havia uma menina-caminhante embalada por sonhos
coloridos em meio a suaves melodias...
caminhante por natureza, inquieta e desejosa de tudo conhecer, entregava-se sem receios à
libertação total de seus sonhos, buscando sempre encantos na música, na dança, na poesia e
nas histórias, criando um mundo mágico à sua volta.
Em seus passeios solitários, que sempre foram os seus favoritos, costumava caminhar por
lugares tranqüilos onde pudesse ficar em contato estreito com seus pensamentos, sentimentos
e imaginação.
E o tempo... como uma implacável sombra companheira, começava fazer valer suas
artimanhas, como contribuição e estímulo ao desenvolvimento do próprio processo da vida...
Assim, essa menina-caminhante tornou-se mulher!
E eram as histórias, inventadas ou relidas, que sempre fizeram parte do cenário de sua
jornada, iluminando sua imaginação... reis, rainhas, príncipes e princesas traziam, com sua
linguagem simbólica, um jeito diferente e mágico para que a própria mulher-caminhante fosse
se conhecendo, se des-cobrindo... e vivenciando o “agora eu era o herói”, como na imagem
poética de Chico Buarque de Holanda.
Entretanto a vida não ra. É necessário continuar a jornada e, neste cenário, novas
imposições, novos papéis e desafios surgem para a menina-mulher-caminhante... vários são os
caminhos que a levaram ao encontro de uma íntima escuta de seu próprio ser... ora sentindo-
se presa em labirintos onde tinha que, aos poucos e com muita paciência e serenidade,
aprender a enfrentar seus medos e monstros, ora percebendo-se em trilhas permeadas por
alegrias e realizações... É a e-terna jornada do herói! Quanto mais vivenciada... mais a
15
coragem vai fazendo parte de seu ser... devagarinho... lentamente... vai se apossando e
fortalecendo o seu coração...
A cada percurso-vida em busca de mais conhecimentos que fossem necessários para
enriquecer sua jornada, essa menina-mulher-caminhante percebia que o essencial era invisível
aos olhos, mas que, de maneira mágica, poderia tornar-se visível através das histórias, através
da Arte!
E foi por conta desse jeito de caminhar... que eu-caminhante, deparei-me com alguns
percursos que tiveram uma importância significativa e que fizeram parte de um cenário
enriquecedor... através deles avisto novas paragens, experimento novas visões que me levam
ao encontro do outro, ao encontro comigo mesma... para o universo interno de cada um eu /
você – deixando de sermos personagens, para nos tornarmos protagonistas da própria história!
Assim... revendo algumas direções das trilhas-caminho, volto ao início de minha prática
profissional, tanto na área da docência, em cursos de formação e capacitação de professores,
como no trabalho clínico, em que muitas questões pontuavam o meu dia-a-dia. Neste caminho
percorrido em busca de novos conhecimentos e de novas aprendizagens, atalhos e veredas
foram surgindo. Questionamentos se faziam presentes no sentido de qual direção tomar.
Algumas trilhas foram repletas de sonhos, vivências e experiências positivas; outras, não
menos significativas, paralisaram-me, trouxeram dúvidas, incertezas e novos questionamentos
que acabaram impulsionando a procura por novos conhecimentos e experiências.
Revisitando rapidamente este percurso, inicio pelo trabalho como professora de Língua
Portuguesa (na rede estadual e particular de ensino), quando tive a oportunidade de exercitar a
docência no Ensino Fundamental II e, juntamente com colegas de outras disciplinas, pudemos
participar de grupos de estudo em que a troca de saberes tornava o dia-a-dia da escola mais
desafiador e envolvente.
Por conta de questionamentos a respeito do porquê certos alunos não conseguiam aprender,
do porquê tinham outro jeito de assimilarem o conhecimento, da importância do vínculo na
relação entre aluno e professor, é que fui buscar, no Instituto Sedes Sapientiae, a
Especialização em Psicopedagogia, pois esta área de pesquisa busca aprofundar o estudo
sobre os fatores neurocognitivos e afetivo/sociais que possam justificar uma dificuldade de
16
aprendizagem. A relação vincular que se constitui na dinâmica do ensinar e do aprender é
objeto de estudo, ao buscar um entendimento mais acurado de como o sujeito se relaciona
com o objeto do conhecimento e com outros sujeitos seus pares advindos da família, da
escola e do meio cultural do qual faz parte.
Terminada essa Especialização, iniciei o trabalho em consultório particular, atendendo
crianças, adolescentes e adultos que apresentavam dificuldades de aprendizagem,
concomitantemente ao trabalho de orientação familiar.
Sentindo necessidade de aprofundar-me nessas questões, fui ao encontro de mais referenciais
teóricos e práticos que pudessem tornar mais segura e prazerosa a jornada. Por conta dessa
busca, concluí a Especialização em Arteterapia, também no Instituto Sedes Sapientiae.
Estudar o lugar e o valor da Arte como recurso para o autoconhecimento, como possibilidade
de despertar a sensibilidade na educação por meio da linguagem simbólica dos contos e mitos,
veio enriquecer a caminhada, tornando o cenário mais colorido, possibilitando andanças
criativas e suscitando momentos de (re)conhecimento da importância do encontro do ser
consigo mesmo e com o outro.
Neste momento, preparando-me para mais uma etapa nessa caminhada, ao pensar no processo
de ensino e aprendizagem, em elementos facilitadores ou inibidores para uma relação positiva
que deixa marcas e significados, tanto no sujeito que ensina (professor), quanto naquele que
aprende (aluno), foco em subjetividades que se encontram, delineando experiências que tanto
podem alavancar como paralisar a aquisição de novos conhecimentos.
Devido ao caráter interdisciplinar que o programa de mestrado da Universidade Presbiteriana
Mackenzie oferece Educação, Arte e História da Cultura – encontrei, durante esta jornada, a
possibilidade de aprofundar-me ainda mais no estudo do Mito, da importância das histórias
como potencializadores para uma maior reflexão sobre o significado dos papéis assumidos
por aquele que ensina e aquele que aprende.
Com o mapa de minha viagem em mãos, ao criar pontes para unir novos caminhos, pude
encontrar-me com outros sujeitos que também buscavam novos jeitos de caminhar,
procurando novas paragens, buscando cada um descobrir onde se poderia encontrar mais
tesouros que pudessem enriquecê-los em termos de (auto)conhecimento e de novos saberes.
17
Elegi, assim, como objeto de estudo, para este momento da jornada, a análise do papel do
professor do ser e fazer(-se) do professor pois se torna concebível pensar em uma
reforma e renovação pedagógicas buscando-se abrir espaços para a reflexão e possíveis
transformações no exercício da docência.
Torna-se necessário integrar questões subjetivas e objetivas na dinâmica da aprendizagem,
viabilizar o conhecimento de novas técnicas de trabalho aliadas ao autoconhecimento,
valorizar a teoria, sim, mas imbricada conscientemente com a prática, oportunizando
momentos em que o professor se contate com seu próprio estilo de aprender, sua história de
vida, seu ambiente familiar e cultural, seu jeito particular de se contatar com o conhecimento.
São questões fundamentais que acabam interferindo de maneira significativa na trama do
cotidiano de uma sala de aula.
Busquei, então, um aprofundamento maior dessa questão através do projeto de pesquisa
exigido pelo mestrado, analisando até que ponto o trabalho de reflexão/ação/reflexão
apoiado em Oficinas de Sensibilização e usando como analogia o Mito de Eros e Psiquê
poderia atuar como elemento mediador na ampliação da consciência do papel do ser
professor, ressignificando a atuação docente – o fazer(-se) do educador.
No Mito de Eros e Psiquê, a jovem mortal, para resgatar o amor de Eros, teve que realizar
quatro tarefas que lhe foram impostas por Afrodite, deusa da beleza e mãe do jovem. Nas
Oficinas de Sensibilização, buscou-se fazer uma analogia entre as tarefas da jovem mortal e as
tarefas do professor. As tarefas de Psiquê são aqui apresentadas de maneira sucinta
1
, assim
como as possíveis relações com as tarefas do professor.
Primeira tarefa: Psiquê deveria separar de um gigantesco monte de cereais várias
sementes. Vêm em sua ajuda as formigas.
Em uma leitura simbólica, buscou-se relacionar o exercício de discriminar,
diferenciar e ordenar com o ser e fazer do professor.
1
O aprofundamento da análise das quatro tarefas será feito no capítulo V Sons... cores... imaginação... vem
a história.
18
Segunda tarefa: A jovem deveria levar para Afrodite flocos de lã de ouro que
cobriam o dorso de ovelhas ferozes. O caniço veio em seu favor e orientou que era
preciso esperar o momento certo para se aproximar dos animais.
– Em quantos momentos do fazer pedagógico deve-se esperar o momento preciso para
mediar a aprendizagem e aguardar o desenvolvimento de um aluno ou a inserção de
novos conteúdos no currículo?!
Terceira tarefa: Psiquê deveria subir até o cume de um rochedo inalcançável com
uma jarra de cristal em mãos e, lá do topo, recolher a água de uma fonte que
alimentava dois rios infernais. A águia de Zeus veio em seu auxílio para ajudá-la a
conter a essência daquilo que parecia informe e eternamente fluido.
O professor deve estar sempre atento, sem perder o foco de seus objetivos mais
significativos, para poder trabalhar com aquilo que é essencial para a aprendizagem
dos alunos.
Quarta tarefa: Afrodite propôs para a jovem uma viagem ao inferno. chegando,
Psiquê deveria pegar das mãos da deusa Perséfone a caixinha com o creme da beleza
imortal a eterna juventude. A ajuda vem através de uma torre. necessidade de
determinação e assertividade para se chegar até a última tarefa. A jovem realiza essa
etapa sozinha, pois estava fortalecida pelos desafios enfrentados, e é somente
através do autoconhecimento, do se perceber confiante que ela consegue superar o
medo e descer até o mundo dos mortos.
Quantas vezes o professor também não se depara com seus medos, limites e
inseguranças que serão amansados quando tiver a oportunidade de, a partir de seu
autoconhecimento, encará-los e com eles dialogar?
Procurei, assim, trazer um olhar (psico)pedagógico para o Mito de Eros e Psiquê trabalhado
em Oficinas de Sensibilização. Através das dinâmicas propostas durante os encontros, foram
trabalhadas a linguagem verbal e não-verbal, oferecendo às professoras envolvidas no projeto
possibilidades de despertar potenciais adormecidos, ampliando e ressignificando novas
reflexões naão. O professor, ao se reconectar com seu ser, com sua modalidade de
aprendizagem, instaura novas qualidades na dinâmica relacional entre subjetividade e
objetividade, real e ideal, razão e emoção interferindo na dinâmica do ensinar e aprender. Este
é um dos movimentos fundantes que marcam a aprendizagem humana e é um dos caminhos
que venho percorrendo algum tempo... e que agora surge como possibilidade para nele
jogar mais sementes... de onde, certamente, novos frutos surgirão...
19
Através da narração do Mito, as professoras/sujeitos participantes desta pesquisa foram
convidadas a se encontrarem como protagonistas da sua própria história, dentro da história do
Mito, com todos os riscos, incertezas e acertos que a descoberta poderia lhes trazer. As
vivências tiveram como objetivo a ampliação da consciência, pois através delas chega-se a
questões conscientes e inconscientes implícitas na prática pedagógica que se tocadas e
reordenadas podem ser transformadas em novas posturas no exercício da docência.
É a relação do homem consigo próprio e com o mundo que o torna criativo e, por isso,
humano, perpetuando pelo caminho da educação suas conquistas, seu crescimento, suas
dúvidas, seus sonhos.
Assim, retorno à epígrafe.
“ão tenho caminho novo... ovo é o jeito de caminhar...”
20
2 PREPARADO A BAGAGEM...
2.1 VOU A BUSCA DE QUÊ?!: Proposta e objetivos
“Ciência sem poética, inteligência pura sem
compreensão simbólica das finalidades humanas,
conhecimento objetivo sem expressão do sujeito
humano, felicidade sem felicidade apropriadora,
não é mais do que alienação do homem.”
Gaston Bachelard
No momento do preparo da bagagem para iniciar esta jornada, necessidade de se rever
caminhos já percorridos por outros viajantes... em outras paragens... em tempos/espaços
próximos ou distantes dos nossos.
Seguindo a trilha de May (1992, p.3), é o conhecimento do Mito que pode dar sentido a um
mundo sem sentido. É através do conhecimento de personagens míticos que se pode
transformá-los em símbolos estruturantes de uma nova identidade do ser e, neste caso, de uma
nova identidade docente. Esta idéia fará parte dessa pesquisa, pois ao nos defrontarmos com
outros caminhantes, é através do contato com personagens reais ou fictícios, com outros
professores que serviram de modelo/guia para a minha formação, que se buscará acertar o
passo para a caminhada.
Em pleno início do século XXI, vivem-se momentos de mudanças rápidas e atordoantes que
colocam em conflito questões relacionadas à Educação, ao papel do professor, às
reivindicações dos alunos gerando um clima de insegurança e contradições. Como lidar com
tudo isso? Como não sucumbir ao medo? Uma nova concepção de sujeito se faz necessária,
pois a época em que se privilegia a racionalidade técnica não basta, a visão do ser humano
cindido e fragmentado também não pode mais ser aceita. Evidencia-se uma nova
subjetividade, uma nova possibilidade de ser na qual se busque uma maior integração entre
atividades cognitivas, afetivas, sociais e políticas.
Tais posturas, certamente, quando exercitadas no próprio sujeito do ser/professor poderão
servir de guia para uma nova atuação pedagógica, uma nova relação entre ensino e
aprendizagem. Dentro desse enfoque, a razão e a emoção, a subjetividade e objetividade, o
21
pensamento simbólico e o lógico, poderão estimular a sensibilidade, a percepção ativando
novas experiências para uma autorreflexão crítica e coerente do papel do professor e da sua
relação com os alunos.
Na trilha de Morin, um de nossos interlocutores, a missão do ensino educativo é transmitir
não o mero saber, mas uma cultura que permita compreender nossa condição humana e nos
ajude a viver, e que favoreça, ao mesmo tempo, um modo de pensar aberto e livre” (2008, p.
11). Toda a proposta de Morin diz respeito ao pensamento complexo Homo complexus que
é ao mesmo tempo Homo sapiens e Homo demens, isto é, há uma junção, integração do que se
pensa estar separado, mas que na realidade fazem parte da mesma essência de ser. Assim ele
se manifesta:
relação manifesta ou subterrânea entre o psiquismo, a afetividade, a magia, o
mito, a religião. Existe ao mesmo tempo unidade e dualidade entre Homo faber,
Homo ludens, Homo sapiens, sapiens e Homo demens. E, no ser humano, o
desenvolvimento do conhecimento racional-empírico-técnico jamais anulou o
conhecimento simbólico, mítico, mágico ou poético [...]
O ser humano é um ser racional e irracional, capaz de medida e desmedida; sujeito
de afetividade intensa e instável. Sorri, ri, chora, mas sabe também conhecer com
objetividade [...] (MORIN, 2000, p. 59).
A contribuição e o lugar das ciências humanas tornam-se significativos dentro da nova
proposta de ensino para o século XXI. O Mito e a Arte podem ganhar um espaço de
significação maior, oferecendo possibilidades para, neste momento, podermos participar de
maneira mais integrada em um dos grandes saltos do espírito humano, para o conhecimento,
não da natureza exterior, mas também do nosso próprio e profundo mistério interior”
(CAMPBELL, 1990, p. XIII).
Brandão vem corroborar tal idéia quando afirma:
Na medida em que pretende explicar o mundo e o homem, isto é, a complexidade do
real, o mito não pode ser lógico: ao revés, é ilógico e irracional. Abre-se como uma
janela a todos os ventos; presta-se a todas as interpretações. Decifrar o mito é, pois,
decifrar-se. E, como afirma Roland Barthes, ‘o mito não pode, conseqüentemente,
ser um objeto, um conceito ou uma idéia; ele é um modo de significação, uma
forma’. Assim, não se de definir o mito ‘pelo objeto de sua mensagem, mas pelo
modo como a profere’ (1999, vol.1, p. 36).
O pensamento de Jung também foi trazido para fazer parte dessa pesquisa. Em seus estudos,
ele dizia que o autoconhecimento e a adaptação ao mundo são os dois pólos em torno dos
22
quais devem girar a Educação. Sugeria que educar é um processo relacional, em que não é a
ciência ou a técnica que está em jogo, mas a personalidade do educador é que se torna
fundamental para a formação da consciência e da personalidade do educando (JUNG apud
TEIXEIRA, s/d, p. 26).
Durante minha trajetória profissional, muitas reflexões e inquietações se fizeram presentes,
tais como:
Como viabilizar o encontro de singularidades (professor/aluno) valorizando os dois
campos de atuação, as múltiplas facetas do ser humano, seu contexto social e sua
historicidade?
Como tornar a aprendizagem mais significativa e despertar o desejo, o sentido e o
prazer pela busca do conhecimento tanto por parte do aprendiz como daquele que
ensina?
Como criar um vínculo afetivo e efetivo na relação ensino e aprendizagem?
Como trazer a importância e o lugar do Mito na educação?
A Arte, como recurso expressivo para a ampliação da consciência, é capaz de
contribuir para a ressignificação da atividade profissional do professor?
Quais seriam as qualidades importantes para o educador do novo milênio?
Enfim, várias questões ganharam espaço e uma que considero mais significativa e de cunho
transformador acabou tornando-se a temática/guia para esta jornada:
O Mito de Eros e Psiquê, trabalhado em Oficinas de Sensibilização, contribui para ampliar
a reflexão-ação da prática docente?
O Mito, a Arte e as histórias de vida deixaram marcas nesta trilha, na qual, através de
vivências apoiadas nas tarefas de Psiquê para resgatar o amor de Eros, procurei fazer um
paralelo com as tarefas do professor. É o exercício de um fazer pedagógico que busca ampliar
a consciência de si próprio levando o professor/educador a desvelar a essência de ser-si-
mesmo para poder ser com o(s) outro(s).
23
A atividade artística exercitada em Oficinas de Sensibilização como possibilidade de
expressão do ser, foi a oportunidade para que os viajantes-atores, sujeitos da pesquisa,
pudessem, através da analogia com o Mito de Eros e Psiquê, ampliar o cenário de reflexão de
sua práxis docente. Foram movimentos de ão/reflexão/ação que buscaram uma atualização
do “ofício de ser e fazer(-se) professor”, do seu papel na Instituição Escolar.
Como objetivo geral para ser inserido nessa bagagem, busquei analisar a importância e o
lugar que ocupa uma Pedagogia que reintegre razão e emoção, subjetividade e objetividade,
equiparando o pensamento simbólico ao racional e lógico, estimulando no ser do professor a
linguagem da sensibilidade, da fantasia e dos mitos que poderão, após serem vivenciados em
oficinas, serem compartilhados com seus pares e com seus alunos. É o exercício do
autoconhecimento como primeira possibilidade para se chegar até o conhecimento do outro. É
o caminhar para si... para poder ir ao encontro do outro... alargando fronteiras durante a
jornada.
Em relação aos objetivos específicos, tentei adentrar no universo subjetivo do professor para
que ele, de posse de seu saber e de um fazer criativo, possa atuar e despertar o saber e o ser
criativo de seu aluno; fazer uso da linguagem mítica através de Oficinas de Sensibilização
como elemento desencadeador de novas práticas docentes. É a possibilidade de, através da
narração da história do Mito, caminhar-se para um exercício de retrospecção da própria
história de vida, buscando recuperar um sentido de ser... ser pessoa... ser professor...
Nas palavras de Morin e Cyrulnik (2004, p.57), encontra-se mais uma explicação para essa
proposta, quando afirmam que “o que supõe uma reforma muito grande do ensino, a partir dos
níveis mais elementares, que ensinasse a conhecer-se a si mesmo – uma das grandes carências
atuais é que se relegou para a literatura aquilo a que se chama a introspecção.”
A intenção não é a de se abrir espaços para desencadear processos terapêuticos, mas de trazer
um sentido, um significado maior para a atuação voltada ao ser do professor e do aluno, ao
caráter subjetivo dessa dinâmica, pois a reflexão, vinda através do estudo de um Mito acaba
reverberando, com outra qualidade, no campo de aprendizagem não do professor, mas
também do aluno e, destes, para suas vidas. São ferramentas que ajudarão durante o caminho
para vislumbrar novas trilhas...
24
Novos cenários na educação rapidamente se formam e transformam, deixando marcas durante
o percurso. Observam-se, nesse momento, significativas mudanças e inovações na área da
tecnologia que trazem muitos desafios para o trabalho docente dentro das instituições
escolares e para a própria formação do mesmo. Urgem uma revisão e uma reatualização do
papel do professor nesta nova proposta, pois ele e seu aluno são sujeitos no ato da produção
de saberes, de compreender e de transformar a realidade da qual fazem parte.
Abrir espaços para educar-a-ação a fim de transformar-a-ação do professor é fundamental,
possibilitando a criação de oportunidades para que os sujeitos envolvidos (aluno e professor)
em seu objeto de estudo (a busca pelo conhecimento) possam, em uma interação dialógica,
vivenciar sua historicidade de maneira crítica, criativa e consciente, relacionando-a com sua
comunidade, suas crenças e mitos questões que se pretende pesquisar a fim de trazer cada
vez mais contribuições para o “ofício de ser e fazer(-se) professor.”
Alguns encontros aconteceram durante a caminhada... muitos conhecimentos foram
adquiridos e possibilidades de reflexão sempre foram acolhidas permeando e formando essa
trilha. Alguns companheiros de viagem tornaram-se referências/guias nesta empreitada...
25
2.2 MAPEANDO O CAMINHO: Opção metodológica
Que rota seguir? Quais trilhas aclarar? São tantas as possibilidades...
As vozes de Bardin (1977), Spink (1979), Minayo (2004), Gaskell e Bauer (2004) trouxeram
contribuições para além da análise de conteúdo, através de núcleos de pensamento expressos
em unidades de significado. Permitiram delinear novos movimentos no mapa... trilhas que se
definiram em movimentos de idas e vindas, momentos de distanciamento e volta para o
percorrido, agora com um novo olhar... novas criações que guiaram a pesquisa para uma
metodologia apoiada em uma pesquisa-ação qualitativa, de cunho descritivo, com estudo de
caso. São perspectivas metodológicas que convergem para a dimensão e pluralidade do
método de trabalho escolhido: Oficinas de Sensibilização que possibilitassem, através do Mito
de Eros e Psiquê, vivenciar/relacionar com a práxis educativa e a identidade docente.
Tornei-me a facilitadora das oficinas narrando o Mito e apresentando as dinâmicas que
mobilizavam a reflexão pessoal das professoras. Tornei-me parceira na jornada, alguém que
pôde direcionar, em alguns momentos, a ampliação da consciência através dos símbolos que
foram constelados durante as vivências!
Foram as experiências vividas nas Oficinas de Sensibilização, acrescidas de um questionário
com entrevista semidirigida, que oportunizaram a escolha das categorias que serviram de guia
para este estudo, funcionando como laços e fios que capturaram sensações, sentimentos,
lembranças, medos e sonhos que permearam a caminhada.
A opção teórico-metodológica vem dos ensinamentos de Bardin que traz outro olhar sobre as
práticas da linguagem, redimensionando o objeto de estudo. Ela aponta para a análise de
conteúdo como um conjunto de técnicas de exame das comunicações, visando obter, por
procedimentos sistemáticos e descritivos do conteúdo das mensagens, indicadores que
permitam a inferência de dados que venham confirmar ou negar a questão mobilizadora da
pesquisa. A análise de conteúdo “procura conhecer aquilo que está por trás das palavras sobre
as quais debruça [...] é uma busca de outras realidades através da mensagem” (BARDIN,
1977, p. 44).
26
No tocante às questões da subjetividade, fundamental para se chegar ao autoconhecimento, e à
importância da linguagem como elementos mediadores para a constituição do sujeito na sua
relação consigo próprio e com o outro, Vygotsky (1989, p.44), representante da psicologia
sócio-histórico, se fez presente afirmando que “o desenvolvimento do pensamento é
determinado pela linguagem, isto é, pelos instrumentos lingüísticos do pensamento e pela
experiência sociocultural do sujeito.”
A ênfase foi dada à linguagem como veículo de autoconceito e de troca, de interação entre os
sujeitos, e seguir os passos de Daniels (1994, p. 99), estudioso do pensamento vygotskyano,
possibilitou um aprofundamento nessas questões, uma vez que “fornece ao interacionismo
simbólico uma compreensão dos vínculos entre a psicologia individual e a estrutura social.”
Dessa maneira, entende-se que ao se falar em linguagem como constituinte do sujeito une-se a
essa proposta o lugar e o papel da Arte como “outro tipo de linguagem”, servindo de elemento
potencializador e enriquecedor do pensamento. Vygotsky também se aprofundou nas questões
da Arte e do papel da criatividade para a realização humana, ampliando aspectos da cognição
e da emoção.
No início de suas pesquisas, em Psicologia Pedagógica, traz a idéia de que:
Uma obra de arte vivenciada realmente pode ampliar nossa opinião sobre certo
campo de fenômenos, obrigar-nos a observá-lo com novos olhos, generalizar e
reunir fatos por vezes totalmente dispersos. Como toda vivência estética cria um
estado muito sensível para as ações posteriores e, naturalmente, nunca passa sem
deixar marcas em nosso comportamento posterior (VYGOTSKY, 2003, p. 234).
Dentro deste caminho e também servindo de guia para o aprofundamento no estudo da
condição humana, novamente Morin (2000, p.15) afirma:
O ser humano é a um tempo físico, biológico, psíquico, cultural, social, histórico.
Esta unidade complexa da natureza humana é totalmente desintegrada na educação
por meio das disciplinas, tendo-se tornado impossível aprender o que significa ser
humano. É preciso restaurá-la, de modo que cada um, onde quer que se encontre,
tome conhecimento e consciência, ao mesmo tempo, de sua identidade complexa e
de sua identidade comum a todos os outros humanos.
Paulo Freire (2007, p. 23), outro interlocutor para estes estudos, mostra a importância de uma
prática docente reflexiva, criativa e crítica, pois traz, como uma das características de sua
27
proposta, a idéia de que “quem forma se forma e re-forma ao formar e quem é formado
forma-se e forma ao ser formado.”
Portanto, são movimentos dialéticos e dialógicos que nos conduzem nessa reflexão,
exercitados por aqueles que são representantes da relação aluno-professor, seres
ontologicamente constituídos, inacabados e que, vivenciam “o ensinar (que) se dilui na
experiência realmente fundante de aprender” (FREIRE, 2007, p. 24).
Propus, assim, um estudo nas questões que tocam a subjetividade da pessoa do professor,
como sujeito mediador e facilitador de novos conhecimentos, motivador de novas
aprendizagens e modelo para uma ética voltada ao respeito por si próprio, por seu trabalho e
por seus alunos.
Furlanetto (2007, p.21) também traz sua contribuição, mostrando que os processos de
aprendizagem estão “profundamente imbricados com a ampliação da consciência e que esses
movimentos não ocorrem sem que o adulto assuma seus próprios processos de
transformação.”
Para corroborar as idéias acima elencadas, Jung (1983, p.125) analisa:
É fato notório que as crianças têm um instinto seguro para perceber as incapacidades
pessoais do educador. [...] O pedagogo precisa, por isso, dar atenção especial a seu
próprio estado psíquico, a fim de estar apto a perceber o seu erro, quando houver
qualquer fracasso com as crianças que lhe são confiadas. Ele mesmo pode ser a
causa inconsciente do mal.
Ao refletir sobre a linguagem simbólica dos mitos e seu papel na Educação, os estudos de
Byington, representante da Pedagogia Simbólica, também são importantes. Este analista
junguiano e educador mostra a importância da formação e ampliação da consciência através
do estudo do símbolo, que, sob este enfoque, surge como uma forma de se contatar com a
arqueologia da psique, de recuperar os vestígios da história do desenvolvimento da
consciência pela utilização de vivências grupais com recursos expressivos, tendo no Mito o
papel de desencadeador de um sentido mais criativo para a ação, atendendo a compromissos
da essência do ser humano. “Uma pedagogia centrada no ecossistema corpo humano-meio,
dentro do processo emocional, cognitivo e existencial do indivíduo, da cultura, do Planeta e
do Cosmos. Esta é a Pedagogia Simbólica” (BYINGTON, 1996, p. 11).
28
Um olhar psicopedagógico foi trazido para esta pesquisa, uma vez que o trabalho em Oficinas
de Sensibilização oferece a possibilidade de uma reflexão da atuação docente, exercitando a
possibilidade de criar um liame entre conhecimentos necessários que emergem tanto da área
da Pedagogia como da Psicologia: subjetividade e objetividade, afetividade e cognição, teoria
e prática, Mito e realidade tornaram-se parceiros, favorecendo uma qualificação mais
abrangente no ofício de ser professor.
2.2.1 A Trilha Encontrada - O método
“O central na formação do professor, ou de seu
retreinamento, deve consistir em tratá-los do
mesmo modo que se espera que eles tratem seus
alunos, mas treinando-os no olhar reflexivo que
lhes permite ver suas próprias emoções como o
espaço de capacitação em que se encontram em
cada momento sem perder o respeito por si
mesmos, porque podem reconhecer os seus erros,
pedir desculpas e ampliar o olhar reflexivo com
seus alunos sem desaparecer nele.”
Humberto Maturana
Preparar a ambiência para vivenciar o Mito de Eros e Psiquê foi uma tarefa difícil e
desafiadora para poder chegar a este momento da caminhada!
Presa a Chronos que sinalizava a todo o momento com sua presença a exigüidade do tempo
para efetivar a pesquisa e, paradoxalmente, vivenciando o meu envolvimento cada vez maior
a cada leitura feita para poder me aprofundar nas trilhas desse percurso, uma energia criativa
direcionou a ação diante do desafio: abrir, em nove encontros, a possibilidade de um espaço
diferenciado para a reflexão da práxis docente. Instigou-se uma provocação de, com muito
com-tato, adentrar no universo das emoções, da subjetividade de cada sujeito da pesquisa... o
encantamento da história favoreceu o trabalho, contribuindo para que se pudesse avaliar se
efetivamente, a proposta em tela poderia colaborar para desvelar e (re)conhecer outros
possíveis caminhos para estar em sala de aula!
Os passos para elaborar a trilha da metodologia e do método adotados para esse percurso
iniciou-se com Severino (2007, p. 112) ao sinalizar que:
A partir do século XIX, foram se constituindo as Ciências Humanas, com a
pretensão de se configurar de acordo com os mesmo parâmetros das ciências
29
naturais [...] Os pesquisadores se o conta de que, no caso do estudo e
conhecimento do homem, outros paradigmas podem ser utilizados (que não aqueles
baseados no positivismo de Comte), com resultados igualmente satisfatórios no que
concerne à eficácia explicativa.
Todas as interpretações feitas pelo pesquisador a partir de expressões simbólicas e dos signos
culturais de seus sujeitos podem abrir espaço para o aparecimento da análise apoiada na
Hermenêutica. Assim, elegi a abordagem qualitativa para esta dissertação, que se caracterizou
como uma pesquisa-ação, em um estudo de caso com análise de conteúdo, em que se buscou
priorizar os aspectos subjetivos da natureza humana, tendo como suporte o Mito de Eros e
Psiquê, vivenciado em Oficinas de Sensibilização. Estes dados levaram-me a adotar e
aprimorar, a cada encontro com as professoras, uma escuta atenta no que seria dito e no como
seria dito.
Não havia necessidade de uma preocupação com modelos rígidos para a pesquisa, mas, ao
contrário, deveria haver um envolvimento com a temática e atenção às informações que
chegavam através da análise das palavras, dos gestos, do contato advindo tanto do Mito, como
dos materiais de arte que foram usados nas oficinas. Esses dados foram considerados
fundamentais quando da análise efetiva dos conteúdos (corpus da pesquisa) uma vez que o
sujeito, fazendo Arte “usa seu corpo, sua percepção, seus conceitos, sua emoção, sua intuição
– tudo isso em uma atividade que não o divide em compartimentos, mas, ao contrário, integra
os vários aspectos da personalidade” (CAMARGO, 1994, p. 14).
Entretanto, esse envolvimento exigiu de mim uma postura de verdadeira pesquisadora,
garimpando entre aqueles cenários, vestígios que pudessem manifestar estados, dados e
fenômenos que viessem enriquecer os depoimentos das professoras, companheiras nessa
caminhada.
Nos passos de Bardin, há toda uma abordagem e análise de informações constantes de
documentos que podem surgir nas mais variadas linguagens: escritos, orais, imagens, gestos.
Torna-se importante compreender criticamente o sentido manifesto ou implícito nessas
comunicações. Afirma que:
A análise de conteúdo aparece como um conjunto de técnicas de análise das
comunicações, que utiliza procedimentos sistemáticos e objetivos de descrição do
conteúdo das mensagens. [...] Sua intenção é a inferência de conhecimentos relativos
30
às condições de produção (ou, eventualmente, de recepção), inferência esta que
recorre a indicadores (quantitativos ou não) (BARDIN, 1977, p. 38).
Buscando-se um detalhamento maior sobre a análise de conteúdo e apoiada em Bardin, não se
pode esquecer que o objeto de trabalho desse tipo de análise é a palavra tomada em suas
significações, na forma como se distribuem, levando em consideração aquilo que está por trás
dela, aquilo que está implícito na mensagem. É um exercício de figura/fundo, buscando tirar a
palavra de sua opacidade, deixando aflorar seu sentido mais preciso para o contexto.
Para ampliar ainda mais o tipo de postura que o pesquisador deve adotar, dentro deste estudo,
fazem-se presentes os ensinamentos de Gaskell (2004), quando coloca que posteriormente à
escolha de um referencial teórico que guiará a investigação e, em seguida, à definição do quê,
como e para quem perguntar (sujeitos da pesquisa), necessidade de se elaborar um tópico
guia como se fosse uma estrela guia para acompanhar a jornada... Este tópico funciona
como uma série de dados que não poderão ser esquecidos durante as entrevistas que serão
dirigidas aos participantes e que, não obstante, devem ser usados com alguma flexibilidade,
contribuindo para a futura análise das transcrições que farão parte da pesquisa qualitativa com
texto e imagem, produtos criados durante as oficinas.
Para o estudo de caso, Lüdke e André (1986, p. 56) afirmam que:
O caso é sempre bem delimitado, devendo ter seus contornos claramente definidos
no desenrolar do estudo. O caso pode ser similar a outros, mas é ao mesmo tempo
distinto, pois tem interesse próprio, singular, naquilo que ele tem de único, de
particular, mesmo que posteriormente venham a ficar evidentes certas semelhanças
com outros casos ou situações.
Na trilha dessas autoras, o percurso exploratório para aprofundar a análise proposta adotou o
seguinte roteiro:
Desvelar os conteúdos que poderiam influenciar o autoconhecimento das professoras e
as possíveis relações com a prática docente, durante os encontros apoiados na história
de Eros e Psiquê e trabalhados em oficinas.
Realçar, no contexto vivencial em que as tarefas do Mito foram trabalhadas, as
prováveis analogias com o ser e fazer do professor, podendo, aquilo que fora evocado
durante as vivências, ser direcionado para situações de vida.
31
Aguçar o olhar no sentido de como o uso dos materiais plásticos empregados durante
as vivências poderiam ampliar a ação-reflexão-ação do fazer expressivo das
professoras, relacionando-os com situações semelhantes em sua vivência pessoal e
profissional.
Como finalização para a coleta de dados, usei as imagens plásticas, poéticas, questionário
semidirigido
2
e depoimentos livres surgidos durante os encontros. Uma das vantagens desse
tipo de questionário é que ele permite a apreensão imediata da informação desejada, uma vez
que durante a entrevista pode-se fazer correções de rotas (sem perder a idéia do tópico guia),
no sentido de se conseguir um maior esclarecimento em relação à obtenção de informações
desejadas (LÜDKE e ANDRÉ, 1986).
Com a autorização das professoras e tendo sido garantido sigilo e anonimato, suas falas foram
gravadas para posterior aprofundamento do significado de seus depoimentos. A gravação
possibilita uma posterior releitura acurada para se perceber os núcleos de pensamentos ao se
analisar os conteúdos mais significativos (BARDIN, 1977). Além da gravação dos
depoimentos no final de cada atividade e da entrevista semidirigida, houve momentos
significativos de falas advindas durante a realização das atividades propostas nas oficinas, que
não foram gravadas, pois surgiram espontaneamente durante o “fazer artístico”, mas que
foram anotadas no diário de bordo da pesquisadora e que foram consideradas, quando da
análise mais detalhada da fala de cada professora.
Houve um envolvimento muito positivo e cooperativo tanto de minha parte, como das
participantes, em que o diálogo e as dinâmicas tiveram por escopo o favorecimento de uma
atitude flexível de descoberta, de reflexão sobre a própria ação e de uma participação não só
criativa, mas principalmente crítica em relação ao ser e fazer do professor.
As pesquisas de Minayo (2004) também foram observadas ao se pensar a ambiência para a
realização das Oficinas de Sensibilização apoiadas no Mito. Houve uma efetiva preocupação
no sentido de que o trabalho com a história e a posterior vivência artística, apoiadas nas
tarefas de Psiquê, pudessem não somente evocar questões pessoais e profisssionais, mas
também enriquecer essas reflexões, uma vez que se tinha um grupo de professoras que
2
Questionário semidirigido: seu conteúdo encontra-se, em anexo, no final do trabalho.
32
trabalhavam em um mesmo estabelecimento de ensino onde a troca de experiências,
sensações e percepções voltadas aos temas surgidos, poderia trazer uma outra qualidade para
a reflexão e para a própria relação entre elas. Foi através do movimento intrapessoal, que se
pôde vivenciar o interpessoal nas questões da prática docente!
Essas pessoas e esses grupos são sujeitos de uma determinada história a ser
investigada, sendo necessária uma construção teórica para transformá-los em objetos
de estudo [...] toma-se o campo como um palco de manifestações de
intersubjetividades e interações entre pesquisador e grupos estudados, propiciando a
criação de novos conhecimentos (MINAYO, 2004, p. 54).
Ainda quanto ao espaço preparado para a prática das oficinas, Minayo afirma que é
fundamental para o êxito da investigação, não só que o pesquisador seja aceito pelo grupo
pesquisado favorecendo a empatia entre os sujeitos envolvidos, mas também que a proposta
da pesquisa seja apresentada a todos que com ela estiveram envolvidos.
O percurso metodológico aqui empregado foi o de “pesquisa-ação” que, com a contribuição
de Spink (1979, p. 31), assim se caracteriza:
Pesquisa corrente com o duplo e explícito propósito de auxiliar a reflexão,
formulação ou implementação da ação e de desenvolver, enriquecer ou testar
quadros referenciais teóricos ou modelos relevantes ao fenômeno em estudo.
Caracteriza-se por uma relação ativa e explícita entre os pesquisadores e os
responsáveis pela ação numa área específica... Pesquisa-ação é a fusão da pesquisa e
assessoria.
A coleta de dados surgiu durante a elaboração das atividades plásticas propostas após a leitura
de cada tarefa realizada por Psiquê, em cada dia de encontro, acrescida da partilha sobre
sentimentos, sensações e percepções evocadas durante a realização e análise do material
artístico. Com o término do trabalho plástico nas oficinas, foi entregue às professoras um
questionário semidirigido para que nele ficassem registradas as impressões, reflexões e
possíveis relações do que fora vivenciado com o ofício de ser professor.
Para a análise de dados, dentro dessa proposta metodológica, partiu-se das atividades
artísticas realizadas durante as oficinas com os respectivos depoimentos das professoras; dos
registros realizados no diário de bordo da pesquisadora; dos depoimentos escritos no
questionário da entrevista semidirigida e, em seguida, comentados oralmente pelas
professoras, entrelaçando-se aos suportes teóricos que fundamentaram o estudo.
33
Para se chegar à escolha das categorias (que serão elencadas quando da análise dos dados
analisados a partir das oficinas e do questionário) e ainda tendo como suporte os estudos de
Bardin, optou-se pelo caráter semântico das mesmas, pois serão guias que auxiliarão na
questão que mobilizou essa pesquisa: em que medida o Mito de Eros e Psiquê, trabalhado em
Oficinas de Sensibilização, contribui para uma ampliação da reflexão da prática docente?
Terminadas as oficinas, o momento da análise dos dados, se concretizou, efetivamente,
através de uma leitura flutuante dos mesmos, a partir da qual, apoiando-me em Bardin (1977,
p.39), chegou-se à:
Descrição: indicação das particularidades do texto.
Inferência: dedução lógica de conhecimentos, a partir da descrição.
Interpretação: significação atribuída a essas particularidades, mas que não pode ser
desvinculada dos marcos teóricos pertinentes à investigação proposta.
As diferentes fases para a realização da análise de conteúdo organizaram-se em três
momentos:
Pré-análise: etapa que, nos dizeres de Bardin (1977, p.95), consistiu na “escolha dos
documentos a serem submetidos à análise, à formulação das hipóteses e dos objetivos
e à elaboração de indicadores que fundamentassem a interpretação final.”
Exploração do material: etapa em que busquei transformar os dados obtidos durante
as oficinas, em conteúdos que pudessem facilitar a compreensão das particularidades
da mensagem, sem deixar de lado o foco da pesquisa e seu referencial teórico.
Tratamento dos resultados e interpretação: tendo-se à disposição resultados
significativos e fiéis para a pesquisa, este foi o momento para se propor inferências e
adiantar interpretações em relação aos objetivos propostos para o estudo. Assim, a
partir dessa fase e apoiando-me nas fases anteriores, deduziram-se elementos que
pudessem ir além do que estava escrito na mensagem ou que fora falado quando do
trabalho feito nas oficinas ou nas entrevistas semidirigidas. Busquei relacionar, aqui,
dados do emissor, do receptor, da mensagem e do código usado para tornar a
mensagem um meio de comunicação.
34
Esta etapa exigiu muita reflexão, ponderação e uma dose de intuição para se estabelecer as
possíveis relações entre a fala, postura e interesse das participantes quanto à pesquisa e os
possíveis conteúdos latentes das mesmas.
Detalhando um pouco mais a parte referente aos comentários verbais feitos pelas professoras,
em relação ao questionário semidirigido, busquei suporte em Gaskell e Bauer (2004, p.73),
quando afirmam:
Toda pesquisa com entrevistas é um processo social, uma interação em que as
palavras são o meio principal de troca. [...] É uma interação, uma troca de idéias e de
significados, em que várias realidades e percepções são exploradas e desenvolvidas.
Com respeito a isso, tanto o(s) entrevistado(s) como o entrevistador estão, de
maneiras diferentes, envolvidos na produção de conhecimento.
Durante esse tipo de entrevista e com as atividades artísticas realizadas nas oficinas, chamou a
atenção o dado de que detalhes dos fatos e das lembranças evocadas durante os encontros
puderam, em alguns momentos, surpreender as próprias participantes, pois, muitas vezes, é
através do diálogo oral, da fala externa que podemos saber e entender um pouco melhor
nossos pensamentos. Vygotsky (1989) afirmava que o pensamento sem palavra era sombra!
Neste sentido, o grupo tornou-se uma entidade em si mesma e propiciou a criação de
situações em que afloraram momentos de emoção, humor, espontaneidade e intuições
criativas. Gaskell (2004) tornou-se um interlocutor valioso, nesse momento, pois foi dele que
se teve a confirmação das situações vivenciadas pela pesquisadora, durante os encontros,
momentos onde os sentimentos e sensações, acima elencados, manifestaram-se de maneira
descontraída e solta, mas não menos profunda!
Buscando fazer uma síntese das principais características da entrevista de grupo, ainda
apoiadas em Gaskell (2004, p.76), tem-se que:
Uma sinergia emerge da interação social. Em outras palavras, o grupo é mais do que a
soma das partes.
É possível observar o processo do grupo, a dinâmica da atitude e da mudança de
opinião e a liderança de opinião.
Em um grupo pode existir um nível de envolvimento emocional que raramente é visto
em uma entrevista a dois.
35
No aprofundamento da análise de conteúdo e das atividades artísticas que se tornaram o
elemento mobilizador e desencadeador de um pensar crítico e criativo para fundamentar essa
pesquisa, não pôde ser deixada de lado a possibilidade de se acessar não só os conteúdos
expressos, mas principalmente, os conteúdos latentes das mensagens, favorecendo um olhar
que vai além... buscando ideologias e tendências pessoais dos sujeitos, apoiadas no momento
cultural em que os fenômenos acontecem.
Vivenciar a possibilidade de pensar de outro jeito, onde o olhar do outro ampliou a visão de
outros olhares... foi fazer um exercício de flexibilidade, pois o pensar criativamente pode ser
compreendido como um desafio para antigas aprendizagens, que poderão, neste momento,
serem ressignificadas diante deste novo olhar que é desconhecido, mas provocador, e que
convida a um fazer diferente em Educação!
São passos... carregados de subjetividade que deixam suas marcas durante a caminhada...
Depois de ponderar sobre subjetividade, autoconhecimento, habilidades e competências,
medos e inseguranças que permeiam o cotidiano do educador, chegou-se à essência desse
estudo: Como criar atividades que pudessem sensibilizar o professor para pensar e agir dentro
de uma postura ética e criativa? Como instigar processos de autoconhecimento que toquem e
sensibilizem o professor para que suas competências sejam colocadas à mostra para uma
prática mais motivadora? As histórias míticas podem servir de guia para esse trabalho? Podem
elas fornecer pistas/guias que ajudarão o professor “a agir com ética e respeito, com aceitação
e amorosidade? Esse é o trabalho pessoal e interno que Perrenoud chama de “microrregulação
intencional” (ALESSANDRINI, in PERRENOUD, 2002, p. 169).
Assim é que detalho, agora, os passos que foram seguidos para se compor a melodia de uma
dança muito particular: a dança que guiou Psiquê (vivenciada pelas Psiquês de minha
história!) para realizar as tarefas determinadas por Afrodite e que foram apresentadas
juntamente com as vivências nas Oficinas de Sensibilização (estas serão fundamentadas
teoricamente no próximo capítulo).
Neste momento, cabe uma pergunta: Por que o nome de oficinas? Segundo o significado da
palavra (Dicionário Novo Aurélio) tem-se que oficina é o lugar onde se exerce um ofício,
uma função; em sentido figurado é o lugar onde ocorrem grandes transformações. Será que
transformações e reflexões significativas poderão ser afloradas em Oficinas de Sensibilização
com o Mito como suporte? É o que
Detalha-
se, agora, um pouco mais sobre
foram nove
encontros com duas horas de duração cada, com dois encontros a cada semana,
totalizando o período de
de ensino, onde se criou
um
de tecidos multicoloridos e músicas suaves dava
sensibilização corporal para preparar as professoras a fim
momentos com outra qualidade de presença... deixando as preocupações para longe... e se
permitindo entrar em contato, através das atividades propostas, com o que elas tinham ou
gostariam de ressignificar como outras possib
Seriam pedras encontradas durante o percurso ou sonhos embalando a jornada? o trabalho
com as oficinas poderia trazer o real sentido para a ação/reflexão!
Foto 1
transformações e reflexões significativas poderão ser afloradas em Oficinas de Sensibilização
com o Mito como suporte? É o que
busquei
como um dos focos para análise
se, agora, um pouco mais sobre
o método em que se baseou
o trabalho em oficinas:
encontros com duas horas de duração cada, com dois encontros a cada semana,
março e abril de 2009.
O lócus foi a
sala de aula
um
ambiente propício para se ouvir e vivenciar a história. Com o uso
de tecidos multicoloridos e músicas suaves dava
-
se início às oficinas com um trabalho de
sensibilização corporal para preparar as professoras a fim
de que pudessem participar desses
momentos com outra qualidade de presença... deixando as preocupações para longe... e se
permitindo entrar em contato, através das atividades propostas, com o que elas tinham ou
gostariam de ressignificar como outras possib
ilidades para suas práticas... para suas vidas...
Seriam pedras encontradas durante o percurso ou sonhos embalando a jornada? o trabalho
com as oficinas poderia trazer o real sentido para a ação/reflexão!
Foto 1
- Sensibilização com tules e fundo
musical.
36
transformações e reflexões significativas poderão ser afloradas em Oficinas de Sensibilização
como um dos focos para análise
...
o trabalho em oficinas:
encontros com duas horas de duração cada, com dois encontros a cada semana,
sala de aula
do estabelecimento
ambiente propício para se ouvir e vivenciar a história. Com o uso
se início às oficinas com um trabalho de
de que pudessem participar desses
momentos com outra qualidade de presença... deixando as preocupações para longe... e se
permitindo entrar em contato, através das atividades propostas, com o que elas tinham ou
ilidades para suas práticas... para suas vidas...
Seriam pedras encontradas durante o percurso ou sonhos embalando a jornada? o trabalho
musical.
37
Finda essa primeira sensibilização, chegava a hora da leitura do Mito e, para tal, criou-se um
ambiente de encantamento para contribuir com a magia e suspense da história... Após a
narração inicial da história, o trabalho em oficinas focou a realização de uma tarefa por
encontro em que, a cada final, as professoras deveriam escrever em fitas coloridas uma
palavra e um sentimento que fizessem a síntese do que aquela vivência evocara... e, para o
encontro seguinte, ficava a surpresa de como a história iria continuar...
Apoiando-me no conteúdo do Mito, as sensibilizações criadas para cada tarefa tiveram como
objetivo evocar situações relacionadas não com a história em si, mas também com
possíveis analogias com a vida pessoal e a prática profissional dos sujeitos da pesquisa. O
detalhamento de cada atividade será analisado no próximo capítulo.
Essa experiência representou um farejar de sinais que, nesta caminhada, ampliou e
ressignificou a importância do fazer artístico como possibilidade para o exercício de uma
reflexão mais apurada, que efetivamente tocasse no ser do professor, ressoando no fazer-se
professor!... Vivenciou-se a ampliação de olhares para outras paragens... ricas em gestos, em
detalhes, em possibilidades... tão bem expressos na canção...
... ada a temer, senão o correr da luta
ada a fazer, senão esquecer o medo
Abrir o peito à força numa procura
Fugir às armadilhas da mata escura.
Longe se vai sonhando demais,
mas onde se chega assim
Vou descobrir o que me faz sentir assim...
Eu, caçador de mim!
(Música: “Caçador de Mim”
Autores: Sérgio Magrão e Luís Carlos Sá)
38
3 A HORA DA PARTIDA... REVEDO CEÁRIOS... IDO EM BUSCA DE OVAS
PAISAGES... OVAS VISÕES
3.1 ENLAÇANDO AS TEORIAS
“É neste sentido que o exercício de uma razão
sensível se inscreve num reencantamento do
mundo como renascimento temporão... [...]
visualizando um amanhecer nem tão radiante,
talvez nem tão angustiante, mas que, sem dúvida,
nos exige uma ação e um centramento interior...
onde a compreensão de si mesmo deve ser vista
como ponto de partida, meio e fim de toda
jornada interpretativa.”
Marcos Ferreira Santos
Dúvidas surgiam durante o percurso... Por que aprofundar-me nas questões do apaixonamento
e do encantamento na relação pedagógica? Como caracterizar o Eros Pedagógico que deve
permear toda relação entre ensino e aprendizagem? É importante buscar uma união/integração
entre alma (Psiquê) e amor (Eros), entre razão (Psiquê) e emoção (Eros)? O próprio Mito
diz que o ser humano não existe sem o afeto, a emoção, o amor. Psiquê se entrega à
realização das tarefas (como possibilidade de crescimento e de autoconhecimento) depois que
conhece Eros, ela precisa reconquistá-lo para poder sentir-se mais plena, precisa do seu afeto.
Mas... o deus do amor também percebe a importância da racionalidade de Psiquê e vai ao seu
encontro, buscando uma integração maior entre ambos.
A escolha desse Mito foi intencional, pois em se falando de ensino e aprendizagem, é
fundamental que essa relação se concretize em uma relação amorosa entre o saber e o
conhecimento a ser buscado e apreendido. O Eros pedagógico se manifesta quando os alunos
vão à busca do conhecimento nas palavras e exemplos de seu professor e este, igualmente, vai
ao encontro de suas aprendizagens se mobilizando de tal maneira que consegue motivar seus
alunos, criando-se uma relação permeada, reciprocamente, pelo respeito e acolhimento ao(s)
outro(s).
A Educação tem como uma de suas tarefas favorecer o exercício do Eros nas questões de
ensino e aprendizagem, abrindo um espaço vivo e dinâmico, onde tanto o professor, quanto os
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alunos possam ser vistos e ouvidos, onde a confiança, a crença e o desejo sejam alimentados
cotidianamente.
Neste sentido, propus-me a compreender e vivenciar o sentido da história do Mito e
configurá-lo no campo da Pedagogia, pois nas palavras de Campbell (1999, p.76) “conhecer o
mecanismo do mito é conhecer a própria história do homem, que suas implicações
religiosas, culturais, psicológicas mostram uma apreciação dos valores e revelações de
padrões de comportamento do homem desde os primórdios.”
Para servir de parceiro e interlocutor no estudo da função do Mito e de sua importância para o
autoconhecimento, busquei os estudos de Brandão (1999, p.10), pesquisador da linguagem
simbólica e mítica, que assim se coloca:
Os mitos, além de gerarem padrões de comportamento humano, para vivermos
criativamente, permanecem através da história como marcos referenciais através dos
quais a Consciência pode voltar às suas raízes para se revigorar. O inconsciente
renova a Consciência.
Os mitos são depositários de mbolos tradicionais no funcionamento do Self
Cultural, cujo principal produto é a formação e a manutenção da identidade de um
povo.
Por esses caminhos... onde muitas dúvidas e algumas certezas foram vivenciadas, passaram-se
dias e noites... Sol e Lua serviam de cenário para a caminhada... ora levando-me ao encontro
do movimento solar/logos... que trazia a luz, a energia, ajudando na discriminação de
possíveis rotas, ora deixando-me guiar pelo movimento lunar... reconhecendo as dúvidas,
momentos de insegurança e incertezas que sempre acompanham o caminhante...
Segundo Jean Chevalier e Alain Gheerbrant, em Dicionário de Símbolos, esses dois astros
apresentam uma aplicação simbólica muito ampla, considerando:
O Sol representa a luz como o conhecimento racional, especulativo, carrega um
princípio masculino e ativo. A Lua simboliza o conhecimento intuitivo, imediato, a
periodicidade e renovação, princípios do feminino. Consequentemente, o Sol e a Lua
correspondem à sede do cérebro e do coração (CHEVALIER e GHEERBRANT,
2002, p. 561 e 837).
40
Vê-se assim razão e emoção, subjetividade e objetividade, percepção e intuição como
movimentos opostos e cíclicos que sempre interagem durante qualquer caminhada, deixando
suas marcas...
Como descobrir e preparar o caminho para se transitar da Psicologia Profunda, da leitura de
um Mito que marca os primórdios da existência humana, para o fazer pedagógico, sem perder
de vista seu valor, sua importância e ratificar a força de sua presença na atualidade? Ousadia?
Coragem? Pieguice?! Possibilidades... que se fazem presentes nas palavras de Campbell
(1990, p.76):
Mito é a expressão de um conhecimento primordial. É a forma mais antiga da
narrativa e é, pois, apresentado como a epopéia da humanidade, [...] revelando o
oculto e os rituais mais secretos da humanidade [...] conhecer o mito é conhecer a
própria história do homem, já que suas implicações religiosas, culturais,
psicológicas, mostram uma apreciação de valores e revelações de padrões de
comportamento do homem desde os primórdios.
O autor, ao usar a expressão “conhecimento primordial”, confirma a idéia de que o ser
humano precisa de raízes, é necessário vivenciar a idéia de pertencimento ao meio familiar,
social e humano. O conhecimento primordial, isto é, a busca da origem primeira do ser e estar
no mundo são idéias que podem trazer um sentido e significado libertadores, possibilitando
maneiras criativas para realizar o percurso/vida. Nas palavras desse pesquisador, vejo mais
uma possibilidade de que essa trilha poderá levar a caminhos de transformações...
colaborando para a construção de identidades, para a aquisição de novos saberes.
Neste com-passo de passos, procurando acertar com os outros, os meus passos, revisitei
mestres e estudiosos da Pedagogia Simbólica, da Psicologia Analítica, nos quais busquei
inspiração, através da força das histórias, do Mito e da Arte, para um pensar e fazer diferentes
na área da Pedagogia.
O estudo da relação aluno-professor, sempre se fez presente na história da Educação, pois
nele pode estar constelada a dimensão de uma relação simbólica e arquetípica
3
. Ao abordar
tais temas na dinâmica da aprendizagem, apoiei-me novamente em Jung (1964), pois na
3
Arquétipos = uma entidade hipotética irrepresentável em si mesma e evidente somente através de suas
manifestações. Os arquétipos são percebidos em comportamentos externos, especialmente aqueles que se
aglomeram em torno de experiências básicas e universais da vida, tais como nascimento, casamento,
maternidade, morte e separação (SAMUELS, 1988, p.38).
41
relação aluno professor constela-se uma situação arquetípica, no sentido de que não são
somente conteúdos pessoais que são projetados no professor e no aluno. Afloram, também,
conteúdos simbólicos que veiculam uma energia psíquica que poderá ser encontrada entre
outros seres humanos, que também vivenciaram esses papéis, desde o início dos tempos.
Para um aprofundamento maior no significado da linguagem simbólica, novamente é
apresentado o pensamento de Jung (1964) que considerava os símbolos como registros da
história do desenvolvimento da consciência cujo processo poderia ser representado através
dos mitos, contos de fadas, obras de arte de todas as épocas e lugares. Desse modo, a cultura
surge como mediadora para o entendimento da história do sujeito e os processos de
simbolização dando vez ao homo symbolicus é uma de suas grandes contribuições para a
Educação. Perceber e criar através dos símbolos são vivências significativas para que o
homem possa organizar suas experiências e ações.
É através dos processos de simbolização que o homem assume sua humanidade, tomando
consciência de sua condição de ser no mundo. Neste sentido, a linguagem simbólica ocupa
um papel significativo no desenvolvimento da consciência, pois é à medida que o ser humano
atribui sentido às coisas e ao mundo que ele se torna humano! O símbolo nunca é
precisamente definido ou de todo explicado. Ele é uma possibilidade de reflexão e de
caminho... é um jeito de dar sentido às ões humanas... faz parte de um processo que pode
tornar explícito o implícito, visível o invisível... surgindo daí toda força e reconhecimento do
estudo da linguagem simbólica, do Mito e da Arte.
Complementando as idéias acima, Jung (1964, p.20) afirma que “uma palavra ou uma
imagem é simbólica quando implica alguma coisa além do seu significado manifesto e
imediato. Esta palavra ou esta imagem tem um aspecto inconsciente mais amplo, que nunca é
precisamente definido ou de todo explicado.”
Neste momento, as palavras de Verena Kast, professora da Universidade de Zürich e do C.G.
Jung Institut, também se fazem presentes:
A palavra “símbolo” origina-se do grego symbolon, um sinal de reconhecimento.
[...] O símbolo é um sinal visível de uma realidade invisível, ideal. Portanto, no
símbolo observam-se dois níveis: em algo externo pode-se revelar algo interno, em
algo visível algo invisível, em algo corporal o espiritual, no particular o geral. Na
interpretação, procuramos a realidade invisível por trás deste algo visível e sua
42
conexão. Nesse processo, o símbolo caracteriza um excedente de significado, nunca
poderemos esgotar inteiramente seus significados (KAST, 1997, p. 19).
É importante compreender, neste sentido, as ações externas do “fazer pedagógico” quando
vindo de uma demanda do grupo, da cultura em que o sujeito está inserido (inconsciente
coletivo
4
), e também compreender o ser humano com suas determinações internas, sua
vivência e experiências em determinado grupo familiar (inconsciente pessoal). Entende-se que
o inconsciente coletivo está para além da cultura, mas a cultura enraíza-se nele e atualiza
esses mesmos conteúdos inatos, universais e os contextualiza.
Em O Desenvolvimento da Personalidade, Jung (1983, p.60) esclarece:
Como personalidade, tem, pois o professor tarefa difícil, porque se não deve exercer
a autoridade de modo que subjugue, também precisa apresentar justamente aquela
dose de autoridade que compete à pessoa adulta e entendida perante a criança. Tal
atitude não pode ser obtida artificialmente, mesmo com boa vontade, mas somente
se realiza de modo natural à medida que o professor procura simplesmente cumprir
seu dever como homem e cidadão. É preciso que ele mesmo seja uma pessoa correta
e sadia.
Também Furlanetto, em sua tese de doutorado, amplia e ressignifica o estudo da linguagem
simbólica na educação quando traz o símbolo como uma idéia e uma expressão que vão além
do seu significado convencional. Acrescenta que os símbolos “apresentam-se como enigmas,
indícios que, ao serem decifrados, nos permitem penetrar em outros veis de realidade que
não se apresentam de forma literal” (FURLANETTO, 2006, p. 51).
Byington (1996, p.11) assim se posiciona:
(Importante é...) Um referencial pedagógico baseado no próprio desenvolvimento
simbólico e arquetípico da personalidade e da cultura para tornar o estudo
naturalmente lúdico, emocional, cômico e dramático, atraente e emergente da
relação transferencial amorosa entre o aluno, a classe e o professor. Uma pedagogia
que busca interagir o aprendizado, a utilidade, o trabalho e as fontes de produção, ao
mesmo tempo em que relaciona simbolicamente os conteúdos ensinados com a
totalidade da vida e abre a educação para uma dialética psicodinâmica permanente
com a saúde e a cultura, inter-relacionando a psicopedagogia normal e patológica,
dentro da busca da Sabedoria. Uma pedagogia centrada no ecossistema corpo
4
Para Jung, inconsciente coletivo é a camada mais profunda do inconsciente, constituída de padrões não
individuais, mas universais: os instintos e arquétipos. Já inconsciente pessoal é usado tanto para descrever
conteúdos mentais que são inacessíveis ao ego, como para delimitar um lugar psíquico com seu caráter, suas leis
e funções próprias (Dicionário crítico de análise junguiana. Rio de Janeiro, Editora Imago, 1988).
43
humano-meio, dentro do processo emocional, cognitivo e existencial do indivíduo,
da cultura, do Planeta e do Cosmos. Esta é a Pedagogia Simbólica.
O autor confirma a importância da relação entre aluno e professor, sob o enfoque do
dinamismo de alteridade no ensino. Para aprofundar a busca dentro desta temática e explicitar
o significado dessa relação, Byington (1996, p.179) acrescenta:
O Arquétipo da Alteridade propicia o máximo de produtividade do processo de
elaboração simbólica. Ele assim o faz através da interação dialética quaternária do
Eu e do Outro [...]
Considerando-se que a imaginação é a função que mais bem expressa o alcance da
totalidade psíquica, esta capacidade de produzir o máximo de significados dos
símbolos torna o dinamismo de alteridade o principal arquétipo para coordenar o
objetivo e o subjetivo através da imaginação na Pedagogia Simbólica [...]
O que este dinamismo propicia é que os pólos interajam tendo a oportunidade igual
de expressar suas semelhanças e diferenças, ou seja, que o Eu e o Outro e as demais
polaridades tenham a liberdade de vivenciar toda a sua realidade. Esta pujança
diferenciadora da alteridade chega ao extremo de os dois pólos poderem até mesmo
trocar de posição para se revelarem plenamente.
Ao afirmar que o relacionamento é quaternário, Byington (1996, p.180) quer dizer que uma
pessoa pode se relacionar com outra (um aluno com um professor, por exemplo) mostrando a
sua Sombra
5
dentro da expectativa de que o outro também mostrará a sua. Afirma “ser esse o
caminho do método científico, do método criativo, do amor e da democracia.”
Para se poder efetivamente colocar em prática a Pedagogia Simbólica, necessidade de um
elemento que a mobilize: a imaginação. Somente o ser criativo, aquele que busca integrar o
imaginário à sua prática, o sensível ao seu cotidiano priorizando um fazer integrador, é que
terá condições de viver em plena totalidade essa Pedagogia.
Esse autor complementa:
Trata-se de formar educadores que tenham a vocação de ensinar com a totalidade da
sua personalidade e não somente com sua habilidade cognitiva. Esses educadores
existem, mas grande parte do seu potencial pedagógico é deixado de lado no
construtivismo exclusivamente racional.
A fantasia é a imaginação da vigília e as sensações corporais são a imaginação do
corpo. As estruturas criativas expressam a imaginação no nível normal e as
5
Sombra: arquétipo que representa o lado escuro, inferior e primitivo em todos nós, ainda não desenvolvido.
Inclui as características desagradáveis do indivíduo, o lado negativo, nossos defeitos e tudo aquilo que
desejamos esconder. Dela fazem parte também as qualidades que, por alguma razão, não puderam desenvolver-
se (GRINBERG, 2003, p. 231).
44
estruturas defensivas no nível patológico. O delírio é a imaginação dos loucos, os
mitos são a imaginação das culturas e o sonho é a imaginação do sono
(BYINGTON, 1996, p. 191).
O pensamento metafórico/simbólico/relacional ganhou lugar dentro desta pesquisa, uma vez
que se exercitou, através da história do Mito de Eros e Psiquê, a simultaneidade no pensar, a
compreensão da empatia, das projeções e identificações, o diálogo com as incertezas e o
paradoxo. Essas características vão totalmente de encontro ao pensamento mais cartesiano e
lógico que buscava a objetividade, as explicações classificatórias e a linearidade do pensar,
castrando qualquer possibilidade de criação do aprendiz.
Enriquecendo o cenário que serve de fundo para essa caminhada, trouxe na bagagem uma
proposta diferenciadora, pois ao propor um exercício de reflexão na ação, através de Oficinas
de Sensibilização, abre-se espaço para uma aprendizagem teórico-vivencial, ampliando a
reflexão da prática docente em uma dimensão mais subjetiva sem perder, entretanto, a
dimensão do coletivo.
Fazendo uso de linguagens plásticas e expressivas para ressignificar e contextualizar na ação a
reflexão sobre o oficio de ser e fazer(-se) professor, oportunizaram-se momentos de
integração do Logos com Eros, da imaginação com a razão, do símbolo com a forma,
podendo-se criar “outros jeitos” (grifo meu) de se contatar com a essência do papel de ser
educador.
Pensar a atuação do professor por meio de uma linguagem simbólica, reatualizando o
ensinamento ancestral dos mitos e inserindo-os na reflexão da prática docente, constitui novas
possibilidades para se conseguir força, coragem e determinação através do diálogo com as
incertezas, buscando uma compreensão maior da realidade atual.
Ao se analisar a formação na docência, o ofício de ser professor, também se visualiza
profissionais que se formam no próprio exercício da práxis... pois o homem se desenvolve
e se torna um ser humano pleno, quando em relação com o outro, em um processo interativo,
dinâmico e dialógico com a realidade da qual faz parte.
45
Neste sentido, a linguagem, em todas suas variáveis, constitui o pressuposto básico de
qualquer modo de interação envolvendo, nessa comunicação, todos os sujeitos de uma
sociedade, de uma cultura.
Para guiar-me neste momento da escolha de novas trilhas para essa pesquisa, acrescem-se os
ensinamentos de Vygotsky, pesquisador bielo-russo, falecido muito jovem aos 37 anos de
idade, mas que deixou uma vasta e significativa contribuição tanto na área da Psicologia,
como da Pedagogia, da Lingüística e das Artes.
Tendo como pano de fundo de suas experiências, o estudo sobre a relação entre Educação e
desenvolvimento, pensamento e linguagem e sobre o papel dessa última, não na formação
da consciência, mas também como elemento catalisador da relação eu/outro; eu/comigo
mesmo, julgo sua contribuição bastante oportuna.
Vygotsky (1989) aponta que, para se chegar à gênese do comportamento humano, é preciso se
libertar dos enquadres de uma visão meramente orgânica e buscar um maior aprofundamento
na interrelação entre os processos maturacionais aliados a funções psicológicas superiores
6
que se entrelaçam aos processos sócio-históricos do indivíduo. Acresce-se ainda, que a
relação homem/mundo é mediada por sistemas simbólicos e a linguagem, vista como
instrumento e produto social e histórico dessa relação, se articula com significados objetivos,
abstratos, metafóricos, abrindo possibilidades para uma atividade criadora e ao mesmo tempo
racional onde subjetividade e objetividade se entrelaçam. A consciência, sob este enfoque, é
formada de “fora” para “dentro”, partindo da experiência histórica e social, para a experiência
individual.
O que este pesquisador traz em sua linha de pensamento e enriquece este estudo é o fato de
que o homem se torna humano na relação com os outros que lhe são significativos e as
emoções se constituem também em outro mediador importante nessa dinâmica. Assim ele se
manifesta:
6
Funções psicológicas superiores: caracterizam o funcionamento psicológico tipicamente humano: ações
conscientemente controladas, atenção voluntária, memorização ativa, pensamento abstrato, comportamento
intencional. Essas funções se diferenciam de mecanismos mais elementares como reflexos, reações automáticas,
associações simples.
46
O pensamento propriamente dito é gerado pela motivação, isto é, por nossos desejos
e necessidades, nossos interesses e emoções. Por trás de cada pensamento uma
tendência afetivo-volitiva, que traz em si a resposta ao último “por que” de nossa
análise do pensamento. Uma compreensão plena e verdadeira do pensamento de
outrem é possível quando entendermos sua base afetivo-volitiva (VYGOTSKY,
1989, p. 129).
Através de sua contribuição, noto como as emoções se relacionam internamente com a
cognição, sendo mutuamente interdependentes, isto é, a apreciação cognitiva dos
acontecimentos (memória, atenção, percepção) é influenciada pela relação emocional do
sujeito com a situação e, inversamente, as emoções são constituídas pela apreciação cognitiva
dos mesmos acontecimentos.
Assim, os postulados trazidos por Vygotsky (1989) são condizentes com os estudos
avançados vindos das neurociências, neste novo milênio. Os exames, cada vez mais
sofisticados da anatomia cerebral, demonstram que quanto mais se expuser o sujeito a
estímulos sensoriais e comportamentais, mais se ativará a infinita plasticidade das células
neuronais. Como é importante, no desenvolvimento individual do sujeito, a exposição a novas
experiências e atividades onde os sentidos são aguçados, a criatividade liberada, criando
novas sinapses que irão influenciar a história de vida do indivíduo, do meio onde ele está
inserido e da própria sociedade.
Esta característica acaba libertando o homem do seu tempo e espaço presentes, e o autoriza a
fazer relações mentais com tudo aquilo que não está junto a ele no momento atual de sua
existência, mas que através do seu pensar, do imaginar, do criar poderá ser resgatado e
ressignificado. Tirar da opacidade das palavras a transparência de seus significados é pontuar
a importância da expressividade da mesma. Expressividade no sentido de trazer o “modo de
ser” do sujeito, como ele se apropria do “si-mesmo”, sem se colocar em uma postura
enrijecida de impessoalidade e superficialidade e mero expectador do mundo “lá fora”!
Surge, a partir dessas reflexões, o papel da linguagem como elemento simbólico básico de
todos os grupos humanos. Vygotsky (1989, p.132) contribui mais ainda para esse momento do
percurso, ao se posicionar no sentido de que:
O pensamento e a linguagem [...] são a chave para a compreensão da natureza da
consciência humana. As palavras desempenham um papel central não no
47
desenvolvimento do pensamento, mas também na evolução histórica da consciência
como um todo. Uma palavra é um micro-cosmo da consciência humana.
Sua contribuição também se torna significativa em relação ao estudo que fez do papel da Arte
como um fenômeno humano, decorrente da relação entre o mundo físico, social e cultural.
Para ele “a Arte é o social em nós” e é:
A mais importante concentração de todos os processos biológicos e sociais do
indivíduo na sociedade, que é um meio de equilibrar o homem com o mundo nos
momentos mais críticos e responsáveis da vida. [...]
não vida de que, nesse processo, a arte dirá a palavra decisiva e de maior
peso. Sem a nova arte, não haverá o novo home. (VYGOTSKY, 1999, p. 329).
Desta maneira, no aprofundamento dos conceitos de Vygotsky, configura-se parte da
fundamentação teórica para meu estudo, em que o olhar sobre a Educação, sobre os elementos
constituintes da linguagem (verbal e não-verbal), sobre a importância do papel do professor
ao trabalhar e estimular as funções psicológicas superiores, contribuem para a ampliação da
consciência, em si próprio e em seus alunos, de maneira crítica e criativa.
A subjetividade do indivíduo, numa proposta vygotskyana, é atualizada pelo caráter sócio-
histórico do contexto em que ele está inserido e, ao se situar e atuar neste mundo, acaba
deixando marcas de seu pensar, sentir e perceber a realidade da qual faz parte. Entretanto, não
é somente através da linguagem verbal que o sujeito expressa sua interioridade, também
através das expressões corporais (face, movimentos, gestos), da música, da pintura, de toda
produção artística que é capaz de fazer, e, com isso, acaba deixando aflorar sua
individualidade, presentificando uma relação entre reflexão, ação e identidade,
consubstanciando o que este autor traz no bojo de sua proposta: a importância da relação
homem/mundo mediada por sistemas simbólicos.
Vygotsky, em seus estudos, parte das Artes, da Literatura, Semiótica e Educação, para chegar
a uma visão mais ampla da Psicologia. Para ele a “consciência é um contato social consigo
mesmo” em que:
... a gênese social do pensamento institui que o pensamento e a consciência não são
uma emanação de características estruturais e funcionais internas, mas são, ao
contrário, fortemente influenciadas por atividades externas e objetivas, realizadas
num ambiente social (VYGOTSKY apud FREITAS, 1996, p. 89).
48
A essa idéia acresce-se o fato de que qualquer atividade do sujeito é resultado da integração
de dados advindos de suas relações sociais e de sua característica como indivíduo que, através
dos signos (verbais e o-verbais), marca sua colaboração e presença na sociedade. Por ser
um semioticista, Vygotsky busca conceituar e trazer a importância dos signos (verbais e não-
verbais) como meios de contato com o mundo exterior e também com o próprio sujeito e sua
consciência. Acresce-se à idéia de signo, a de “signo com significado”, ampliando o papel do
pesquisador russo quando busca mostrar, em Psicologia da Arte (1999), que o pensamento e
o sentimento é que movem a criação humana e que a base para tal é a imaginação,
manifestada em todas as situações da vida cultural, possibilitando o exercício da criação
artística, científica e técnica.
Pensando-se o papel da Educação e da formação do educador/professor, vejo quão importante
é a idéia de in-corpo-rar-a-ação ao possibilitar a abertura de espaços para a constituição de
autorias inseridas na ação de atores/autores/aprendizes criando e recriando a realidade por
meio de atividades que estimulem a imaginação, a criatividade, pois quanto mais forem
estimuladas, mais ricas e variadas serão. E a Arte, o Mito e as histórias são ferramentas
valiosas para se poder trabalhar com o ser humano em toda sua complexidade!
O conhecimento, a aprendizagem e a incorporação da ação podem se constituir
efetivamente quando o sujeito, aprendiz ativo na aquisição do conhecimento, consegue aquilo
que foi interiorizado (cognitiva e afetivamente) transformar-(em)-ação, conseguindo
significá-la em sua vida, e significá-la até mesmo no ser do professor, no ser de seus próprios
companheiros. Torna-se criador e criatura de sua ão! Reside, aqui, a importância
subjetivante da/na aprendizagem.
No momento em que, através da mediação do professor/educador, o aprendiz se percebe
inserido em um grupo (sala de aula, família, comunidade), exercita seu ser diferenciado do
próprio grupo – eu/outro. É um dos exercícios dialógicos e dialéticos da Educação, em que se
permite que, ao lado de um ensino baseado em estímulos das funções psicológicas superiores
(percepção, memória, pensamento, imaginação) se manifestem, também, a emoção e o
49
sentimento... peças fundamentais para uma aprendizagem significativa
7
capaz de movimentar
a criação humana!
Molon (2003), pesquisadora do papel da subjetividade na constituição do sujeito em uma
visão vygotskyana, acrescenta que o autor não tratou a questão da subjetividade de maneira
direta, mas a sua concepção de sujeito aflora de outros termos por ele usados, tais como:
intrapsicológico, sentido pessoal, relação eu-outro, cultura pessoal, etc.. Há várias concepções
advindas de diversas leituras de Vygotsky sobre a questão da constituição do sujeito e, neste
sentido:
(...) diferentes sujeitos são identificados em Vygotsky, quais sejam, o interativo e o
semiótico. O sujeito interativo, que não é o sujeito passivo nem o sujeito ativo, mas
construído na e pela interação com os outros e nas pautas de relação interpessoal. O
sujeito semiótico, aquele constituído na e pela linguagem, sendo que apareceu como
resultante da relação e como sujeito constituído na relação eu-outro, em uma relação
dialética (MOLON, 2003, p. 69).
As idéias de Vygotsky se atualizam quando Morin fala da necessidade de se unir ciências e
humanidades e romper com a oposição entre natureza e cultura. Em 1998, com a edição feita
pela Unesco do relatório denominado Educação: um tesouro a descobrir. Relatório da
Comissão Internacional sobre a Educação para o século XXI, coordenado por Jacques
Delors, instituíram-se os quatro pilares da educação contemporânea: o aprender a ser, a
fazer, a viver juntos e a conhecer, que constituem aprendizagens importantes e necessárias e
que devem ser perseguidas pela política educacional de todo o mundo.
Ao postular sobre a necessidade de se ensinar a condição humana, neste novo paradigma da
Educação, Morin em sua obra Os sete saberes necessários à Educação, alerta para a
complexidade das relações, para a importância do exercício da solidariedade, para o ensino da
condição humana e para a não fragmentação do conhecimento. Ele faz uma reviravolta nos
pressupostos antigos da Educação que primava por um ensino compartimentado,
fragmentado, cindindo e afastando a relação professor-aluno. Fala em unidade e diversidade
humanas; fala em unidade mental, psíquica, afetiva e intelectual do sujeito e da cultura em
que está inserido; afirma que não “há sociedade humana, arcaica ou moderna, desprovida de
7
Aprendizagem significativa: dentro da linha da teoria cognitiva, é um processo pelo qual uma nova informação
se relaciona com um aspecto relevante da estrutura de conhecimento do indivíduo [...] a aprendizagem
significativa ocorre quando a nova informação ancora-se em “conceitos relevantes” preexistentes na estrutura
cognitiva de quem aprende (MASINI, 1982, p. 7).
50
cultura, mas cada cultura é singular. Assim, sempre existe a cultura nas culturas” (MORIN,
2000, p. 56).
Dentro deste novo paradigma, é que se percebe a força e a necessidade de se analisar e
ressignificar a importância do simbólico, do Mito e da criatividade dando força ao
pensamento sistêmico e simultâneo, abolindo a linearidade e mera relação de causa e efeito
que era a base do pensamento lógico-empírico. É a abertura para um maior entendimento do
Pensamento Complexo
8
que o autor traz como uma das bases de sua pesquisa, afirmando que:
O ser humano é complexo e traz em si, de modo bipolarizado, caracteres
antagonistas: sapiens e demens (sábio e louco) / faber e ludens (trabalhador e lúdico)
/ empiricus e imaginarius (experiência e imaginário) / economicus e consumans
(econômico e consumista) / prosaicus e poeticus (prosaico e poético) (MORIN,
2000, p.58).
Este pensador traz, assim, todas as características que atuam no ser humano, pontuando
sentimentos e posturas que embora contraditórias e opostas, vivem dentro do sujeito não de
maneira excludente, mas sim, de um modo no qual convivem juntas – como exemplo, homem
sábio e louco; trabalhador e lúdico; econômico e consumista; prosaico e poético
manifestando-se no cotidiano da vida pessoal e social, nas relações com o outro, com os
grupos.
E é exatamente esta nova subjetividade que se anuncia. Somos seres em contradição... somos
seres que amamos e odiamos, adotamos posturas heróicas em alguns momentos para, logo em
seguida, ficarmos paralisados perante o outro, perante o “não saber”, a insegurança, o medo.
Quanto mais se amplia o ideário, mais possibilidades se abrem para exercitar a liberdade de
pensar, sentir, viver... de viver certezas, de viver contradições...
Ao ampliar esta análise, noto quantos movimentos diferenciados são vivenciados pelo
professor sendo ora ator, ora autor de sua prática pedagógica. Ao experienciar situações de
ensino e aprendizagem; ao lidar com amor e ódio ação e intenção na relação com seu
aprendiz; ao alavancar a importância da análise entre subjetividade e objetividade presentes
na aquisição do conhecimento; ao buscar uma tentativa de síntese entre o uno e o múltiplo, a
8
Complexo – “complexus” – do verbo latino “complectere” = aquilo que é tecido em conjunto.
51
parte e o todo na ampliação do conteúdo a ser trabalhado, ele busca aguçar o olhar de seu
aluno, trazendo-o para uma nova visão de realidade!
Dessa maneira, desperta-se para uma nova consciência de ser, inserido dentro deste novo
paradigma em que, certamente, caberá ao professor a responsabilidade de criar estratégias de
ação que instiguem e despertem, no seu aprendiz, essa postura. É o primado da subjetividade,
respeitando-se o pensar e o sentir do sujeito e dialogando-se não somente com incertezas e
inseguranças, mas abrindo possibilidades para uma análise multifacetada do pensamento,
dando espaço ao simbólico que permeia toda relação de ensino e aprendizagem.
A Pedagogia da Sensibilidade
9
sinaliza a importância do reconhecimento do homem em sua
inteireza, abrindo espaços para experiências estéticas e experiências do sensível,
reconhecendo a importância do papel da subjetividade na educação. Ela também compartilha
da idéia de que uma postura de amorosidade na relação pedagógica pode levar a um tipo de
conhecimento que se instaura entre seres inteiros e diferenciados, em que o ser amoroso do
professor se manifeste em primeiro lugar, para poder evocar o ser amoroso de seu aluno.
Ao se constituir uma energia amorosa e sensível entre aquele que ensina e aquele que
aprende, cria-se uma ponte onde os opostos poderão se aproximar, permitindo o diálogo, a
abertura ao simbólico que pode levar à transformação. Pensamento, emoção, sensação e
imaginação se colocam frente a frente resgatando o lado sensível dessa relação, sem
fragmentação.
É o ser e fazer do professor que deve ressoar no ser e fazer do aluno e deste para a
sociedade. É caminhar do micro para o macrocosmo, ao trazer a importância do papel da
identidade, da singularidade do ser, da família, da escola e da comunidade em busca de uma
efetiva solidariedade entre os homens.
Torna-se importante trazer, para ampliar essas reflexões, a figura do grande educador
brasileiro Paulo Freire (1991) que, dentro desta temática, marca sua presença quando afirma
que transformar o mundo por meio do trabalho, expressar o mundo, é expressar-se; que
9
Pedagogia da Sensibilidade: módulo inserido no curso de Mestrado da Universidade Presbiteriana Mackenzie
e coordenado pela Profa. Dra. Regina Giora.
52
ninguém educa ninguém, mas ao mesmo tempo, ninguém se educa inteiramente sozinho; que
não é possível ensinar sem aprender e que o educador deve adotar uma postura, junto ao
educando, de aproximação à realidade vivida por este. Com isso, a educação se dá verdadeira
ao estimular o desenvolvimento das necessidades dos seres humanos, de sua expressividade.
Faz-se necessário pensar na formação de um novo professor, para uma nova educação,
podendo efetivamente trabalhar o sentido dos diferentes saberes aliado à formação que deve
partir do próprio sujeito, em seu espelhamento no mundo, delimitando uma postura de
intersubjetividade.
A postura do professor diante do conhecimento e de seus próprios alunos deve ser
caracterizada por outro jeito de se colocar diante do aprendiz, não mais como detentor
absoluto do saber, mas como parceiro na construção do conhecimento, confiando em seu
papel, suas vivências e sendo valorizado por sua experiência de vida e seus estudos. Mais uma
vez, percebe-se a importância de se ressignificar o caráter dialógico que deve permear a
relação entre aluno e professor
Assim, compartilha-se o individual/pessoal (mundo do professor) com o coletivo/grupal
(mundo do aluno) e desse para o coletivo/social, ampliando-se cada vez mais a rede de
ligações, conectando-se os sujeitos envolvidos na interiorização de novos conhecimentos,
novas aprendizagens. Essa busca é constante, pois o que importa na formação docente:
[...] não é a repetição mecânica do gesto, este ou aquele, mas a compreensão do
valor dos sentimentos, das emoções, do desejo, da insegurança a ser superada pela
segurança, do medo que, ao ser “educado”, vai gerando coragem. [...] O importante
é não pararmos satisfeitos ao vel das intuições, mas submetê-las à análise
metodicamente rigorosa de nossa curiosidade epistemológica (FREIRE, 2007, p.
45).
Evidencia-se, dessa maneira, a importância do exercício da aprendizagem que liberta, que
gera autonomia para o efetivo exercício da cidadania. Paulo Freire também compartilha da
idéia da importância da linguagem, inserindo dinamicamente o sujeito na realidade, pois
através da leitura do mundo e da leitura da palavra, este mesmo sujeito é capaz de exercer
com dignidade sua consciência crítica, comprometida e aberta ao diálogo com seus pares.
Neste sentido, a assunção do sujeito como ser social e histórico, ser pensante, transformador,
questionador e esperançoso ganha significativo espaço no ensinamento de Paulo Freire.
53
Chego, agora, à idéia de “inacabamento” do ser humano, devendo-se, entretanto, fazer uma
ressalva, pois para Paulo Freire o inacabado não é o que se sabe como tal, mas aquele que
histórica e socialmente alcançou a possibilidade de saber-se inacabado. Afirma que “não foi a
educação que fez mulheres e homens educáveis, mas a consciência de sua inconclusão é que
gerou sua educabilidade” (FREIRE, 2007, p. 58).
Quando se fala em ação docente positiva, em relação dialógica, surgem algumas questões:
Como isso se manifesta no cotidiano da prática educativa? O que ocorre no espaço “entre” o
aluno e o professor que possa facilitar ou dificultar a criação de um vínculo positivo? Seriam
as palavras ditas e ouvidas? Seriam os olhares, os gestos? Seria o poder de empatia que
deveria servir como fundo para essa relação? Seria a disposição para a escuta, o envolvimento
na busca de novas aprendizagens? Seria saber lidar com a liberdade e a autoridade sem ser
libertino ou autoritário? Enfim, quais deveriam ser as qualidades que favoreceriam a criação
de um vínculo positivo, que respeitasse as singularidades de cada sujeito, mas que também
pudesse alavancar processos de crescimento, de exercício do espírito crítico, da curiosidade,
da criatividade e da competência, como ferramentas para uma real aprendizagem?
Paulo Freire, ainda presente, afirma que o ensinar exige o reconhecimento e a assunção da
identidade cultural:
Uma das tarefas mais importantes da prática educativo-crítica é propiciar as
condições em que os educandos em suas relações uns com os outros e todos com o
professor ou a professora ensaiam a experiência profunda de assumir-se. Assumir-se
como ser social e histórico, como ser pensante, comunicante, transformador, criador,
realizador de sonhos, capaz de ter raiva porque capaz de amar. Assumir-se como
sujeito porque capaz de reconhecer-se como objeto. A assunção de nós mesmos não
significa a exclusão dos outros. É a “outredade” do “não eu”, ou do tu, que me faz
assumir a radicalidade de meu eu (FREIRE, 2007, p. 41).
Ao trazer, neste momento, a “outredade”, a relação do eu com o não eu ou com o tu, busco
puxar o fio da trama que servirá como fundo para esta pesquisa/reflexão. Só posso pensar no
meu papel de professor/educador se souber “educar-a-dor” da falta, da incompletude, da
consciência de que não se sabe tudo e de que, ao se estar assumindo esse papel, trago, dentro
de mim, um universo de desejos, medos, desafios, certezas e desacertos. Desperta-se do
interior do indivíduo, um mundo de possibilidades que estavam adormecidas à espera de que
pudessem ser acordadas através do autoconhecimento, da crença e coragem para uma prática
54
docente verdadeira, guiada pela ética e estética, pela alegria e sensibilidade, pela razão e
emoção.
É um exercício constante ao se pensar o trabalho do professor como o trabalho de “um bom
equilibrista”, pois ao cuidar do conteúdo, das estratégias didáticas, da motivação do grupo, em
muitos momentos acaba desequilibrando o outro, o grupo e a si próprio. Mas, novamente,
busca “acertar a flexibilidade do fio” para que novas tramas sejam elaboradas, novos
percursos sejam seguidos, agora com o fio mais firme e forte, pois, nas palavras de Madalena
Freire (2008, p.9) os “fios sempre necessitam de laços (vínculos) entremeados para
construírem a teia do tecido do grupo”. Fios multifacetados que formam uma trama única e
ímpar...
Pensando-se no professor/educador, quão importante torna-se que, em sua prática, exercite o
ser deixando “aparecer” de dentro de si todo o envolvimento e “apaixonamento” pelo seu
fazer pedagógico e facilitando com que apareçam, de dentro de seu aluno, o interesse e a
motivação pela aprendizagem, sendo respeitado em seu jeito de ser. O bom professor como
mediador do conhecimento, deve atuar para a libertação do homem libertação entendida
como humanização e não como domesticação do outro!
O corpo, aliado ao afeto e à cognição, também pode criar e facilitar momentos de
aprendizagem, pois quando se “toca o outro”
(grifo meu)
, nos tocamos também, concreta e
metaforicamente falando. Madalena Freire (2008, p.156) traz a importância desse ato quando
afirma que:
O educador, ao mesmo tempo que sente, pensa com seu próprio corpo, dentro de
seus limites, problematiza, questiona, provoca o pensar de seus educandos, no que
seus corpos “falam” e escrevem”. Por isso, nesta concepção de educação, ele não
aula, ele constrói a aula com cada um e todos. Por isso, lança “flechas” que têm
alvo significativo para cada aluno e, ao mesmo tempo, para todos. “Flechas”, olhares
e gestos, que instigam, provocam, cutucam o pensar, o perguntar-se, o questionar-se
para assunção (“assumição”) da autoria, da própria e única, sua impressão digital,
sua consciência.
Quando se pensa em formação docente, surgem dois possíveis movimentos: um de cunho
objetivo, focado analiticamente na proposta pedagógica em questão, seu conteúdo curricular,
sua respectiva metodologia e avaliação, características que se situam no fazer pedagógico
coerente com a filosofia educacional da Instituição onde se acha inserido; outro de caráter
55
subjetivo, que busca ampliar e trazer momentos para a reflexão e para o resgate da própria
história de aprendizagem dos professores. Atores/mestres e autores/seres humanos ampliam e
ressignificam a própria identidade ao ir à busca do fio que norteou as suas próprias
aprendizagens!
As questões mais objetivas na tarefa pedagógica também são contempladas, entretanto o
vistas sob outra ótica. Novamente faz-se um jogo de figura/fundo, uma dança em que se busca
conectar sentidos e saberes ao objetivo e subjetivo, trazendo novos sabores e cores para a
elaboração de um trabalho que consiga abrir espaços para uma aprendizagem mais
significativa e um ensino mais catalisador de sentidos...
Como diz Paulo Freire (2007), “somos uma inteireza” e, ao mesmo tempo, “seres
inacabados”, incompletos e estas características servirão de impulso para o
professor/educador aprender, entrar em contato com o conhecimento e poder,
alquimicamente, transformá-lo em encanto e incentivo para o seu aluno/aprendiz. Para
corroborar tal idéia, Madalena Freire (2008, p.33 e 65) acrescenta:
O ato de ensinar, aprender, construir conhecimento é movido pelo desejo e pela
paixão. [...] Ensinar possibilitando, instigando, provocando cada aluno a assumir a
educação de seus desejos, vôo único de libertação, para a construção de sua autoria e
destino.
Assim, ambos os atores aluno e professor no exercício de seus papéis, praticam uma
postura reflexiva e democrática perante o momento de atuação, abrindo espaços para novas
autorias. Esta também é uma das características da metodologia filosófica freiriana, quando
aborda o tema da Pedagogia da Autonomia.
O trabalho com o professor/educador, neste recorte, busca aliar a subjetividade à objetividade
da prática docente, devendo ser inserido em um contexto amplo de transformações culturais e
sociais, ampliando o conceito de aprendizagem. Esta passa a ser vista, primeiramente, em uma
dinâmica intra-pessoal para, em seguida, poder chegar ao inter-pessoal. Para tal,
necessidade de que o próprio educador seja flexível em seu papel, aberto a mudanças e
desejoso de se perceber como elemento fundante desta nova possibilidade de se fazer
educação.
56
Buscando-se alinhavar o pensamento de Vygotsky ao de Paulo Freire, nas questões relativas à
linguagem, exercita-se através da leitura da palavra, a leitura do mundo, inserindo os sujeitos
professor e aluno como atores e autores responsáveis pelo seu fazer no momento
sociocultural em que se inserem.
Neste sentido, foram apresentados esses teóricos para comprovarem a importância do
professor ter plena consciência de seu papel na sociedade do conhecimento, atuando como um
pesquisador constante, comprometido com os saberes necessários para uma educação que
prime pela ética, pela liberdade e pela criatividade. Desafios para nossa formação e atuação
profissionais. Sementes que devem ser lançadas para que possam, no tempo certo,
frutificarem...
“Umas dúvidas, umas inquietações, uma certeza
de que as coisas estão sempre se fazendo e
refazendo e, em lugar de inseguro, me sentia firme
na compreensão que, em mim, crescia de que a
gente não é, de que a gente está sendo.”
Paulo Freire
57
4 PREPARADO A AMBIÊCIA PARA VIVECIAR A HISTÓRIA
4.1 ACERTANDO O PASSO COM OS PASSOS DA HISTÓRIA: O poder da palavra
“Quando Scherazade contava, quem ouvia se
esquecia de tudo, de quem era, do que era, se
sentia fome ou sono. Podia a terra tremer ou o
nariz coçar, nada importava quando Scherazade
contava. Era tão gostoso como comer uma tâmara
de olhos fechados, ouvindo as fontes do 5º. jardim
suspenso, aquele das rosas amarelas. Tudo se
encaixava, se esclarecia e se turvava, desenhos e
melodias surgiam em quem ouvia, dizendo-lhes a
diferença entre o que eram e o que acreditavam
ser, quando Scherazade contava.”
Pauline Alphen
A caminhada teve início... momentos de paradas... para descanso... para encontros...
trocas... enriquecimentos... o caminho se faz ao caminhar, já dizia a antiga canção...
Busco trazer para este momento, uma concepção de Educação e de formação de docentes com
um olhar de crença e coragem, exercitando através de um ato de criação, um novo perfil de
professor, valorizando o que ele tem de melhor, abrindo novos caminhos para se chegar a
novas paragens... é através da linguagem, do diálogo e da força que uma história mobiliza, da
força que o Mito consegue alavancar... que se busca tocar na complexidade do ser... do ser
professor!
Buber conta a experiência vivida ao se ouvir as histórias:
E todavia não era o relato de tempos e lugares distantes que a história contava, mas
sob o toque de suas palavras a melodia secreta de cada pessoa era despertada, a
melodia em ruínas era dada como morta, e cada um recebia a mensagem da sua vida
dispersa, de que ela ainda estava lá e esperava ansiosa por aquela pessoa. A narração
falava para cada um, para aquela pessoa, não havia outra; aquela pessoa era todo
o mundo, ela era a história (BUBER, in MACHADO, 2004, p. 23).
Ao se falar em histórias, no encanto e sedução que elas proporcionam, não se pode deixar de
lembrar, neste momento, Scherazade, a grande narradora, aquela que conseguiu durante as
1001 oites seduzir Schariar, o sultão de todas as Índias, que estava com sentimentos de
vingança ao descobrir, por intermédio de seu irmão, que sua mulher o traía. É significativa a
58
astúcia da jovem Scherazade, quando ao tecer narrativas intermináveis a cada noite para o
sultão, conseguia pelo poder da palavra e das histórias, prender o seu homem e vencer o
desejo que ele tinha de vingança! Onde residia a astúcia da moça? Onde estava sua força? Sua
esperteza estava na técnica do suspense e, principalmente, por conseguir lidar com o “desejo”,
pois através da sedução advinda das histórias contadas, conseguia, a cada dia, poupar a
própria vida, conseguindo que o sultão, só por mais uma noite... só por aquele dia lhe
poupasse a vida! Esta história retrata bem a força e o poder da palavra quando bem usada...
com intencionalidade... com envolvimento...
Nas palavras de Meneses (1995, p.55):
Scherazade apresenta a Schariar o nível mítico; apresenta-lhe à consciência conflitos
que o traumatizaram, bloqueando sua capacidade afetiva, de tal maneira que ele
possa lidar com eles. É por isso que ela não expurga de suas narrativas as histórias
de adultérios e traições femininas, não omite casos em que as mulheres enganam a
seus maridos. [...] Ela propicia ao sultão que reviva com ela uma experiência afetiva
continuada e para isso ela precisa de tempo (1001 noites)... pois trata-se de recuperar
a capacidade amorosa do Sultão.
Fazendo uma analogia com o papel do professor(a), em quantos momentos de seu dia-a-dia
esse mesmo professor não deve olhar para seus alunos com ar de astúcia, de esperteza
buscando apresentar uma aula dinâmica, motivadora, mobilizando-os para novas
aprendizagens... novas paisagens...
Quantas vezes o professor deve se mobilizar para trazer um saber que desperte em seus alunos
um desejo forte e envolvente que os leve em busca de outros saberes... deixando-os livres para
descobrirem outros... e mais outros... buscando saciar o desejo de inserir esses saberes em seu
cotidiano! Esta é a verdadeira aprendizagem, aquela que consegue “escapar” dos bancos
escolares e ir buscar novas paragens pelos caminhos da vida, tendo como elemento
impulsionador o Eros pedagógico.
Regina Machado, mestra do encantamento da narração que consegue seduzir com suas
palavras, seus gestos, sua voz, surge como outra interlocutora e é dela que tomo emprestada a
expressão “passear com os olhos virados”!
59
O virar o olhos é poder experimentar a flexibilidade imaginativa. [...] Quando viro o
olho, o saleiro que está sobre a mesa longilíneo, de vidro transparente, tem uma
forma elegante, feminina e a pequena tampa prateada e redonda me lembra uma
cabeça bem-delineada. Pronto, vi uma jovem princesa. A imagem dessa princesa
surgiu para mim das qualidades expressivas do objeto (que no momento apareceu
com outras possibilidades entre as quais não estava sua função cotidiana de saleiro),
das imagens internas que eu possuo do que seja uma princesa (com suas qualidades:
elegância, delicadeza, leveza, nobreza) e da disposição interna que naquele momento
eu tinha para jogar imaginativamente, da posição em que me coloquei naquele
momento. Então a conversa é sempre uma interação entre o dado que está fora de
mim, com suas qualidades expressivas, e os dados que fazem parte da minha
experiência subjetiva do mundo, minhas imagens internas (MACHADO(a), 2004, p.
89).
Percebe-se, nesta descrição, a importância de alimentarmos a imaginação, pois somente
através de experiências permeadas por ações cognitivas e afetivamente mobilizadoras em
contato com o mundo da realidade, é que se pode ampliar a riqueza do mundo da imaginação.
Somente assim, poder-se-á dar sentido, novos sentidos... a tudo aquilo que realizamos.
E é na busca constante de novas motivações e sentidos que se deve pautar o fazer do
professor... sair da rotina, da mesmice e buscar outros jeitos de trabalhar com o conteúdo,
ampliando a própria consciência e a de seus alunos, ir no “lá e então” (passado) para
relacionar com o aqui e agora” (presente) são combinações necessárias para impulsionar e
passear pelo conhecimento de uma maneira diferenciada.
Pois foi com os “olhos virados” que busquei, neste percurso, trazer o olhar (psico)pedagógico
sobre o Mito de Eros e Psiquê, sobre as tarefas realizadas pela heroína da história que foram
vivenciadas pelas “heroínas/professoras”. O Mito foi um dos fios/guias para poder percorrer
esse caminho, repleto de desafios e surpresas, buscando cenários de transformação para o ser
e fazer do professor.
Campbell (1990, p.5) não poderia deixar de se apresentar nesse momento:
Dizem que o que todos nós procuramos é um sentido para a vida. Não penso que
seja assim. Penso que o que estamos procurando é uma experiência de estar vivos,
de modo que nossas experiências de vida, no plano puramente sico, tenham
ressonância no interior de nosso ser e de nossa realidade mais íntimos, de modo que
realmente sintamos o enlevo de estar vivos.
Com o exercício de releitura, reflexão e atualização do Mito de Eros e Psiquê, busquei,
através do estudo da simbologia da história, vivida em Oficinas de Sensibilização, ampliar a
consciência da/na ação pedagógica, como um exercício de provocação... de reflexão para as
60
infinitas possibilidades que se pode ir do ser ao fazer em Educação... foi um caminho onde
procurei ampliar os canais de contato com a realidade: pensamento, sentimento, percepção e
intuição.
Exercitou-se, assim, a dialética do ensinar e do aprender, papel constantemente vivenciado na
práxis docente. Do docente sensível, curioso, que cutuca o seu pensar buscando novas
possibilidades para motivar seus alunos, buscando abrir novos espaços para neles serem
inseridos mais do que regras, normas, sistematizações advindas de um ensino apenas
mecanicista e teórico.
Durante as oficinas, abriu-se outro tipo de espaço para a reflexão... o espaço do prazer, da
descoberta, do encantamento que somente a linguagem narrativa e artística poderiam ocupar!
Um ambiente onde pudesse pesquisar a contribuição do Mito de Eros e Psiquê para a práxis
docente; onde pudesse desvendar até que ponto o trabalho em Oficinas de Sensibilização
poderiam mobilizar e quebrar resistências... abrindo outras possibilidades para uma atuação
profissional mais rica e audaciosa.
Kramer (2006, p.61) surge, neste cenário, e se posiciona no sentido de que:
Até quando as estratégias de formação de professores em serviço e as políticas
públicas de acesso à língua escrita continuarão a desconsiderar o fato de que é
preciso que os professores se tornem narradores, autores de suas práticas, leitores e
escritores de suas histórias, para que possam ajudar as crianças a também se
tornarem leitoras e escritoras reais, retirando prazer do falado, do lido e gostando de
escrever?
Reitero, neste momento, a valiosa contribuição das histórias e dos mitos para por meio deles
podermos abrir um espaço mobilizador que somente a riqueza de sua leitura e de sua
linguagem simbólica pode proporcionar. É a desafiadora tarefa de educar-se para educar,
formar-se para formar, pois ao ajudar seu aluno a encontrar possíveis caminhos para dar
sentido à sua aprendizagem, o professor não pode se descuidar de cuidar e renovar o seu
próprio caminho! Para se abrir, desbravar e contatar com novas direções/trilhas, somente
vivenciando o seu lado de herói ou heroína é que a tarefa poderá tornar-se mais concreta,
dando lugar a um forte impulso para uma ação mais precisa e assertiva.
61
Ayéres Brandão (2005, p.53), ao fazer um estudo profundo sobre a constelação do Mito do
herói no exercício do educador, assim se coloca:
Investigo como se poderia potencializar a constelação do arquétipo do herói nesses
professores, ampliando-lhes a consciência da importância do ofício que exercem,
contribuindo concreta e simbolicamente para a mudança social em nosso País. Esse
arquétipo permite falar das trajetórias desses profissionais, como um caminho de
enfrentamento, de desafios e de transformações, pelo qual alguns sujeitos vão
tornando-se cada vez mais compromissados com seu próprio desenvolvimento.
Procurou-se, neste sentido, fazer um paralelo entre as tarefas do professor com as tarefas que
Psiquê teve que vivenciar para poder encontrar-se, novamente, com Eros. É o resgate do
sentido da ação, do lugar do sentimento nas questões da educação, é a compreensão de ser
humano em uma visão global, ser que pensa, sente, percebe e intui, com consciência, a
realidade que o cerca.
Chegou o momento de se aliar, ao trabalho de formação do docente e à sua práxis, um fazer
guiado pela emoção, pelo sentimento como critérios para uma atuação mais precisa e
abrangente no fazer pedagógico. Razão e emoção unem-se, fazendo parte de uma mesma
moeda, cada qual tendo o seu espaço e o seu momento de atuação. Dessa maneira, através da
história de Eros e Psiquê, ampliou-se a reflexão sobre a importância de se integrar razão e
emoção, corpo e alma, masculino e feminino, animus e anima
10
como representações
arquetípicas na/da existência humana. São atitudes que orientam para a importância de se
situar o papel da subjetividade, do trabalho pessoal de autoconhecimento, dentro da prática
docente, a fim de que possa, também, ressoar na competência profissional do fazer(-se) do
professor. Essa proposta tem sua inserção em uma visão mais humana e construtivista de
educação, onde se busca aliar a competência criadora à coerência pedagógica.
Perrenoud diz que a meta principal da escola não é o ensino dos conteúdos disciplinares, mas,
sim, o desenvolvimento das competências pessoais. Visualiza uma figura de professor ideal
no que toca à cidadania e à construção de saberes próprios e afirma que a formação deve
integrar a teoria à prática, aperfeiçoando o caráter reflexivo, crítico e criador de identidade.
10
Animus e anima: termos introduzidos por Carl G. Jung, na Psicologia Analítica, e que representam os
arquétipos que personificam, respectivamente, a figura feminina no interior do inconsciente do homem e a figura
masculina no interior do inconsciente da mulher. Sua função é estabelecer uma ponte entre a consciência
individual e o inconsciente coletivo. Como todo arquétipo, ao serem projetados, atraem e fascinam a consciência
(GRINBERG, 2003, p. 221).
62
Sob este enfoque, o professor deve se pautar em ser um profissional que garanta a seus alunos
o sentido dos saberes, que os instigue para a expressão nas diversas linguagens, que os
mobilize para a capacidade de tomar decisões, enfim que seja um criador de situações de
aprendizagem e um regulador dos percursos de formação. Entretanto, para tal postura, o
professor – a sua pessoa mesmo – deve passar, também, pelos processos reflexivos e críticos.
O filósofo da educação explica:
A prática reflexiva é importante porque, nas sociedades em transformação, a
capacidade de inovar, negociar e regular a prática é decisiva. Ela passa por uma
reflexão sobre a experiência, favorecendo a construção de novos saberes. A prática
crítica porque as sociedades precisam que os professores envolvam-se no debate
político sobre a educação, na escala dos estabelecimentos escolares, das regiões e do
país. Esse debate não se refere apenas aos desafios corporativos ou sindicais, mas
também às finalidades e aos programas escolares, à democratização da cultura, à
gestão do sistema educacional, ao lugar dos usuários, etc. (PERRENOUD, 2002, p.
15).
63
4.2 QUEM FORAM AS PERSONAGENS/CAMINHANTES DESSE CENÁRIO?: Os
sujeitos da pesquisa
“E basta um vislumbre de novos campos para que a
imaginação da vontade acorde do conforto do repouso e
ponha em movimento o eterno criar humano.”
Gaston Bachelard
Querendo acordar a imaginação... sair do repouso e alimentar-me com a criação humana... fui
à procura das personagens/participantes dessa jornada.
Lançaram-se os fios... Quem seria enlaçado por eles? Que trama esses fios formariam?!...
Realmente, o tema motivou as professoras, e estas, sentindo-se “capturadas” pela proposta,
quiseram fazer parte do grupo que estava se constituindo. Como um dos objetivos foi uma
pesquisa de cunho social, o espaço e a dinâmica de interação entre os sujeitos deveriam
marcar presença, pois era importante que o objeto de estudo pudesse ser abordado em seu
próprio ambiente de trabalho.
Colocada a proposta para a direção da escola, a aprovação veio imediatamente. Importante
dizer que essa instituição tem uma forte preocupação com a formação continuada dos
professores, buscando sempre um trabalho diferenciado para exercitar a reflexão da práxis
docente.
A escola particular situa-se em um bairro de classe média / média-alta da cidade de São Paulo.
No total foram nove professoras que participaram do projeto, possibilitando-se uma análise da
efetiva viabilidade do trabalho em Oficinas de Sensibilização, favorecendo o processo de
escuta dos sentimentos, das emoções, dos medos e inseguranças que, possivelmente,
poderiam emergir durante os encontros.
Abaixo seguem os nomes fictícios com a respectiva identificação de cada uma das professoras
que estavam trabalhando com alunos do Ensino Fundamental I:
64
Sandra 38 anos de idade; casada. Formada em Pedagogia pela Faculdade Campos
Salles em 1992. Atua como professora há onze anos, tendo sido, anteriormente,
mantenedora de escola particular. Possui cursos de especialização em Orientação
Educacional e Vocacional e em Mathema – como ensinar Matemática.
Tereza – 32 anos; solteira. Formada em Pedagogia na Pontifícia Universidade Católica
de São Paulo em 1998. Trabalha como professora há dez anos. Tem habilitação
específica em Educação Infantil pela PUC/SP e Especialização em Psicopedagogia.
Gabriela 27 anos; solteira. Formou-se em Direito na Universidade Paulista São
Paulo em 1995 e em Pedagogia pela UNOPAR. Possui formação em Magistério. Atua
como professora há onze anos.
Karen 25 anos, solteira. Formou-se em Pedagogia na Universidade de São Paulo
(USP) em 2008. Trabalha como professora há cinco meses.
Kátia 23 anos, solteira. Graduada em Pedagogia pela Pontifícia Universidade
Católica de São Paulo em 2007. Atua em sala de aula há cinco anos.
Laís 23 anos, solteira. Formada em Pedagogia no Centro Universitário São Camilo
em 2007. Há cinco anos trabalha como professora.
Eliane 25 anos, casada. Formada em Pedagogia pela Universidade de São Paulo
(USP) em 2008. Este é o seu primeiro ano como professora regente de sala, embora
tenha substituído outros professores antes de se efetivar.
Mônica 22 anos, solteira. Com formação acadêmica em Pedagogia na Universidade
Paulista – São Paulo, concluída em 2008.
Paula 21 anos, solteira. Formou-se em Pedagogia na Universidade de São Paulo
(USP) em 2008. Trabalha como professora há dois anos.
Por parte dessas professoras/personagens houve uma expectativa e interesse muito grandes em
participar da proposta... um clima de compartilhamento e cumplicidade foi instalado
espontaneamente e o interesse por aquilo que aconteceria nos encontros foi sendo alimentado
a todo momento.
Para mim, surgiu a sensação de vivenciar o papel de Scherazade onde, a cada dia da oficina,
buscava-se levar um clima de encantamento, sedução e suspense... afinal a história do Mito
seria o elemento desencadeador de todo esse percurso, sem esquecer da mediação teórico-
65
conceitual tanto do Mito, quanto da simbologia da história aliada ao trabalho em Oficinas de
Sensibilização.
Refletir sobre a própria atuação docente, em um viés onde a subjetividade se ligasse à
objetividade, a razão à afetividade instigando um trabalho com a imaginação, a criatividade e
a percepção (de si próprio e do outro), direcionando um sentir/fazer reflexivo, sensível e
crítico foi o propósito maior que desencadeou essa pesquisa. Tarefa difícil, pois ao entrar em
contato com o novo, com o diferente, sentimentos contraditórios podem gerar medo,
insegurança, descobertas sobre nosso mundo interno, que muitas vezes intimidam e paralisam
nossas ações... Entretanto, quando se acena com outro jeito de se contatar com essas questões,
surge um novo clarão no meio do caminho que acaba motivando e acenando como uma nova
possibilidade... por que não tentar?!...
Mas... este caminhar apresenta características próprias, pois seus personagens/caminhantes
também são ímpares... é o caminho que leva para a formação e autorreflexão do ser
professor(a)... como nasce um(a) professor(a)? um momento especial em que ele/ela se
forma? Ou sua prática vem de sua vivência? Como o contexto de suas ações contribui para
refletir sua subjetividade? São questões que permeiam todo essa pesquisa e que foram
colocadas também para as professoras que fizeram parte desse percurso... desses encontros...
“ A cada encontro: o imprevisível.
A cada interrupção da rotina: algo inusitado.
A cada elemento novo: surpresas.
A cada tempo: novo parto, novo compromisso.[...]
A cada conflito: nova faceta insuspeitável.
A cada aula: descobrimento de terras ainda não
desbravejadas.[...]
Cada aula um caminho na busca de mim mesma.
Cada aula um nascimento com o outro.”
Madalena Freire
66
4.3 COLORINDO O CENÁRIO - ENTRE TINTAS E CORES... EM BUSCA DO
TESOURO: A fundamentação teórica das Oficinas de Sensibilização
“Criar é um processo existencial. ão lida apenas
com pensamentos, nem somente com emoções, mas
se origina nas profundezas do nosso ser, onde a
emoção permeia os pensamentos ao mesmo tempo
em que a inteligência estrutura, organiza as
emoções. A ação criadora forma, torna
inteligível, compreensível o mundo das emoções.”
Fayga Ostrower
Até que ponto o vivenciar uma história através da Arte pode atuar como elemento
mobilizador para expressar o universo pessoal do sujeito, servindo de ponte para contatar a
realidade da qual faz parte? O fazer artístico cria uma imagem, um símbolo, um sentido a
um significado, exterioriza uma forma que traz a singularidade de seu autor/ator. A ação de
criar, “des-criar” e tornar a criar com outra qualidade, transforma-se em um desafio,
alimentada pela emoção que essa prática deixa aflorar... Fazendo eco a essas palavras, May
(1982, p.143) afirma que “no fazer arte o sujeito sente regozijo, emoção que acompanha o
mais alto grau de consciência. Um novo estado de espírito nasce da experiência de realizar as
suas potencialidades.”
As Oficinas de Sensibilização receberam esse nome, pois buscaram facilitar, em suas
participantes, um contato/com-tato diferenciado consigo próprias e com o outro, tendo como
suporte a percepção do próprio eu e dos objetos e pessoas que as cercavam. Busquei
estimular, através da linguagem simbólica do Mito e dos canais sensoriais, uma reflexão que
viesse permeada por sentimentos, sensações e imaginação povoada pelos habitantes que a
relação intrapessoal permite despertar. É a busca, encontro e descoberta do ser-si-mesmo para
poder ser-com-o-outro!
A fundamentação teórica desse trabalho veio dos estudos de Kagin e Lusebrink,
pesquisadoras na Universidade de Louisville, USA, que realizaram, em 1978, um estudo
trazendo o valor e a contribuição do trabalho denominado ETC (Continuum das Terapias
67
Expressivas)
11
, como um modelo de pensamento para a elaboração de propostas em oficinas
de criatividade/de sensibilização, nas quais se trabalha o fazer artístico como expressão do ser.
Apoiadas em Piaget e Inhelder (1985), as autoras analisaram toda a seqüência expressiva que
o uso de materiais pode revelar, quando direcionados com a intenção de acessar o universo
interno e particular do sujeito. Importante observar que as modalidades da expressão artística,
inseridas nesse estudo, são as mais variadas: visão, toque, movimento, som e palavras. Essa
seqüência expressiva teve seu suporte teórico nas etapas do desenvolvimento dos processos
cognitivos desde a infância até a idade adulta, indo da fase sensório-motora, passando pela
pré-operatória, operatória concreta até chegar ao pensamento formal.
Assim, da Epistemologia Genética de Piaget que juntamente com Inhelder direcionaram essas
fases com o estudo da Psicologia da criança, surge um paralelo enriquecedor com o
continuum do fazer em Arte. Ao se propor analisar e aprofundar como se manifestam as
experiências do ser humano em relação ao mundo do qual faz parte, o elemento simbólico
(linguagem verbal e não-verbal) surge como manifestação da representação mental que é
desvelada através de uma ação específica em situações de Oficinas de Arte.
Kagin e Lusebrink
(1978, vol. 5, pp.171-180)
detalham mais ainda esse processo, ao mostrar que:
O indivíduo não apenas representa a experiência como também opera sobre o
ambiente interagindo através da linguagem. Na representação enativa, o indivíduo
age sobre o ambiente fazendo uso de seus esquemas de ação, organizando e
relacionando sucessivas etapas na perspectiva de seu desempenho; ela reflete
acontecimentos anteriores através de uma resposta motora apropriada. Na
representação icônica, ele percebe o ambiente através dos sentidos, selecionando e
organizando as percepções e imagens individuais, o indivíduo aprende a imaginar
que “tem um quadro diante de si ou de sua mente”, o que o lhe garante que possa
reconhecer o seu significado. Na representação simbólica, ele próprio escolhe um
código ou linguagem que lhe permite descrever o que imaginou. Faz uso de
expressões orais, seqüência, ou sentenças combinando elementos distintos a partir de
um eixo central, representativo de uma classe geral; esse é um sistema de nomeação
e de transformação da experiência naquilo que se acredita ser um abstrato e
complexo método de representação da realidade externa e interna.
Percebem-se, assim, as etapas do desenvolvimento da inteligência e das experiências,
apoiadas na Epistemologia Genética criada por Piaget, na qual cada fase da relação entre
11
Tradução disponibilizada internamente pelos professores para os alunos que faziam a s-Graduação em
Arteterapia, no Instituto Sedes Sapientiae. O original foi publicado em The Arts in Psychoterapy Pergamon
Press, USA, 1978 – vol. 5, p.171-180 (tradução livre).
68
sujeito e objeto do conhecimento se manifesta através de um fazer sensorial, cognitivo,
afetivo para, em seguida, ao ampliar os esquemas de ação, chegar ao pensamento formal do
adulto, à abstração, aos pensamentos hipotéticos dedutivos, indutivos e inferenciais. Quando
bem estimulados e mediados pelo ambiente, tornam-se elementos impulsionadores para o ato
da criação.
Depois dessa breve introdução e inserção do continuum do trabalho com a expressão
artística, chega-se à alise dos três níveis ou modalidades básicas de contato com o
material e o quarto nível pode ser experienciado nos três níveis anteriores. Importante
observar que os níveis estão assim dispostos por uma questão didática, uma vez que ao
entrar em contato com os recursos expressivos eles se misturam e integram o fazer artístico
de uma maneira transformadora, inaugurando novos esquemas de ação. Circula-se da
desorganização para uma reorganização do pensar/criar/fazer trazendo outra qualidade para
a ão/reflexão. Estas são grandes conquistas que o trabalho em Oficinas de Sensibilizão
propicia, favorecendo uma expansão do potencial afetivo, mental e criativo do sujeito que
dela participa.
Segue a descrição dos possíveis níveis experienciados no trabalho em Oficinas de
Sensibilização sob esse aporte. São eles:
Nível sensório/motor (Kinesthetic / Sensory – nível K / S)
Nível perceptual/afetivo (Perceptual / Affective – nível P / A)
Nível cognitivo/simbólico (Cognitive / Symbolic – nível C / S)
Nível criativo (Criative – nível Cr)
Dentro dessa perspectiva, aguça-se o olhar para buscar entender não só como o sujeito
representa a experiência e a expressão com a Arte (em qualquer nível e possibilidade), como
também opera sobre o ambiente interagindo através da linguagem.
Detalhando um pouco mais cada nível, tem-se:
Nível sensório/motor focaliza a liberação de uma energia veiculada pela ação e pelo
movimento. O material usado serve como facilitador da resposta motora (estimula o
69
surgimento da energia psíquica) ou permite que se descarregue ou diminua o nível de
tensão. Este nível explora as qualidades sensoriais e tácteis dos materiais. A energia no
estilo sensorial é dirigida mais para dentro, em um movimento de interiorização
embora possa haver ressonância com o movimento externo. Os aspectos formais e
estéticos não são importantes nesse momento, embora o contato direto com
determinado tipo de material, possa servir de facilitador para a expressão da
experiência.
Nível perceptual/afetivo lida com as percepções e as emoções geradas no indivíduo
através da interação com os materiais artísticos. As percepções podem chegar pelo
corpo, tato, toque, pressão e, por meio dessas sensações, envolver emocionalmente a
pessoa em níveis mais íntimos e primitivos. Reconhecer e nomear o afeto associado às
formas leva ao próximo nível do continuum.
Nível cognitivo/simbólico requer um processamento diferente de informação,
permitindo ao indivíduo lidar com aquilo que não está presente e com coisas que estão
distantes em relação ao tempo e espaço. Neste nível, o elemento cognitivo lida com o
pensamento lógico e analítico. As operações necessárias para produzir esse tipo de
pensamento estão baseadas na representação através da linguagem e podem ser
facilitadas através da representação mental da ação. Estes dados estimulam o
crescimento de habilidades intelectuais. A habilidade em manipular com sucesso
determinado material, descobrindo diferentes modos de usá-lo, ajuda a descobrir
analogias para outras situações problemáticas da vida.
Nível criativo utiliza o potencial de sintetizar e de auto atualizar-se do ego para o
self
12
. Surgem nteses entre as realidades internas e externas, entre o individual e o
social sendo caracterizado pelo diálogo ativo entre o material e o indivíduo
contribuindo para uma sensação concomitante de fechamento, término, prazer e/ou
satisfação. A experiência criativa pode ser considerada como uma experiência que
12
Self: imagem arquetípica do potencial mais pleno do homem e a unidade da personalidade como um todo. Na
Psicologia Analítica, o self não é somente o centro, mas também a circunferência total que abrange tanto o
consciente como o inconsciente; é o centro dessa totalidade, como o ego é o centro da mente consciente
(SAMUELS, 1988).
70
rompe, quebra e transforma fronteiras e formas facilitando relações mais profundas
com o meio externo e/ou com o universo interno.
Dessa maneira, a proposta das Oficinas de Sensibilização para se vivenciar o Mito de Eros e
Psiquê surgiu a partir desses estudos, uma vez que as professoras, ao serem estimuladas e
apoiadas nas tarefas da jovem, puderam refletir sobre a história de outro jeito, trazendo outra
qualidade para a reflexão/ação. As possíveis relações entre o fazer artístico e o fazer
pedagógico contribuíram para a realização de movimentos dialéticos e dialógicos quando se
buscaram subsídios para que elas se percebessem como seres humanos no ofício de ser
professor.
Todos os níveis acima descritos podem ser encontrados na vida diária, e a experiência artística
em Oficinas de Sensibilização pode ser vista como uma relação possível para situações fora
do contexto em questão. Os processos criativos vivenciados em Arte permitem (re)descobrir
significados na vida possibilitando a expansão da consciência, vislumbrando-se caminhos
mais ricos em beleza e significado para o nosso e-terno ser caminhante!
Neste momento da análise, ainda tendo como apoio as pesquisas de Kagin e Lusebrink, faz-se
uma analogia com as funções da consciência, estudo desenvolvido por Jung (1997) em A vida
simbólica
13
. Em relação a esse tema, assim se posiciona:
A consciência é como uma superfície ou película cobrindo a vasta área inconsciente
cuja extensão é desconhecida. [...] A consciência é sobretudo o produto da
percepção e orientação no mundo externo, que provavelmente se localiza no cérebro.
[...]
Uma consideração importante sobre a consciência é que nada pode ser consciente
sem ter um eu como ponto de referência. Assim o que não se relacionar com o eu
não é consciente... e ela (consciência) é dotada de um certo número de funções que a
orienta no campo dos fatos ectopsíquicos e endopsíquicos. A ectopsique é um
sistema de relacionamento dos conteúdos da consciência com os fatos e dados
originários do meio ambiente, um sistema de orientação que concerne à minha
manipulação dos fatos exteriores, com os quais entro em contato através das funções
sensoriais. A endopsique, por outro lado, é o sistema de relação entre os conteúdos
da consciência e os processos
postulados no inconsciente (JUNG, 1997, pp.27 e 29).
Apresentar as funções da consciência através de uma abordagem junguiana torna-se um
momento muito rico da jornada. É através da energia psíquica
14
do ser humano que esse
13
A vida simbólica faz parte de Obras completas de Carl Gustav Jung – XVIII / I – 1997.
14
Energia psíquica: são as possibilidades, as aptidões. Manifesta-se de várias formas, em experiências relativas
a qualquer campo (poder, fome, ódio, sexualidade, religião), em ações e atitudes específicas (querer, sentir, lutar,
trabalhar), como fenômenos dinâmicos da alma (instintos, desejos, afetos, atenção) (GRINBERG, 2003, p.92).
71
contato com a realidade se manifesta. As quatro funções ou canais por onde se contata essa
energia, tendo o eu como centro impulsionador, a força da vontade são: sensação/percepção,
intuição, pensamento e sentimento.
De uma maneira bem ampla, elencam-se as características básicas de cada uma, pois elas
surgem no Mito de Eros e Psiquê como elementos impulsionadores para ajudar a jovem
mortal a conquistar seu amado. Assim, tem-se:
Função sensação/percepção: é a função dos sentidos e diz que alguma “coisa é”.
Consiste em uma percepção que se dá através dos órgãos dos sentidos.
Função intuição: indica as possibilidades para determinado fato ou situação, mas que
fogem do caráter sensorial, pois se registra no nível do inconsciente.
Função pensamento: em sua forma mais simples, o pensamento exprime “o que uma
coisa é”. nome a essa coisa e junta-lhe um conceito, pois “pensar é perceber e
julgar” (JUNG, 1997, p.30). Esta função se manifesta por meio de julgamentos.
Função sentimento: o sentimento informa, através da carga emocional, acerca do valor
das coisas. O caráter avaliativo ao analisar fatos ou situações está sempre presente
quando se instaura essa função.
Acrescentam-se a essas quatro funções, duas atitudes que se manifestam quando o sujeito se
contata com a realidade: a extroversão e a introversão. Pela atitude extrovertida, o interesse se
direciona em primeiro lugar para o que está fora, isto é, para as coisas e pessoas que estão no
mundo, na realidade que é vista e vivida. a atitude introvertida leva a pessoa a se interessar
primeiramente para o mundo subjetivo das experiências interiores, para dentro e, depois, para
o relacionamento com os outros e com os objetos.
Para corroborar essa idéia, Von Franz e Hillmann (1995, p.11) afirmam que:
Na atitude extrovertida, a libido consciente
15
flui normalmente na direção do objeto,
mas uma reação contrária, secreta inconsciente voltada para o sujeito. No caso da
atitude introvertida ocorre o oposto; a pessoa tem a impressão de que um objeto
opressor quer constantemente afetá-la, objeto do qual ela deve afastar-se de maneira
contínua.
15
Libido: energia psíquica.
72
Necessário se faz observar que em nossa cultura e dentro de um senso comum, uma
tendência de se associar ao tipo extrovertido, alguém mais bem adaptado socialmente; ao tipo
introvertido, um sujeito mais tímido, introspectivo. No entanto, essas observações não são
verdadeiras, ao apoiarmo-nos na análise dos tipos de personalidade feitas por Jung e Von
Franz.
É importante, para uma maior ampliação da consciência, que se busque exercitar uma dança
entre as funções da consciência, embora Jung nos mostre que cada ser humano apresenta uma
função como superior e dominante e outra como auxiliar.
A importância desse conhecimento para as questões da Educação reside no fato de se poder
ampliar “nosso jeito“ de nos contatar com a realidade e com a aprendizagem. Ampliam-se
possibilidades para o autoconhecimento, para o exercício dessas funções em atividades
acadêmicas com os alunos que, ao serem estimulados a se perceberem e perceberem o mundo
à sua volta, enriquecem suas aprendizagens.
Novamente retomo Byington (1996, pp.29,30) que vem confirmar a linha de pensamento
junguiano:
A diferença proposta por Jung entre Eu (Ego) e o Self é fundamental para se
compreender esta perspectiva pedagógica. Para Jung, o Eu é o centro da consciência
e o Self é toda a personalidade, incluindo o Eu. A Pedagogia Simbólica busca ser
uma pedagogia do Self e não do Eu. Por isso, ela não é somente racional. É também
emocional e, sobretudo, existencial e cultural. [...] Tomando-se em conta as quatro
funções da consciência, descritas por Jung, quais sejam: pensamento, sentimento,
percepção e intuição, e as duas atitudes: extroversão e introversão, vemos que a
pedagogia dominantemente racional privilegiou o pensamento e a sensação
extrovertidos, em detrimento das funções do sentimento e da intuição e da atitude
introvertida. Daqui depreendemos que o ensino dominantemente racional é um
ensino sem emoção, mais especificamente, sem a função sentimento, ou seja, trata-
se de um ensino, que exclui, metodologicamente, o amor. Só isso expressa sua
aberração. “Qualquer lugar abandonado pelo amor”, comentou uma vez Jung, “é
logo ocupado sorrateiramente pelo poder”. O ensino dominado pelo poder, torna-se
exclusivamente uma obrigação e exclui a relação amorosa com o saber. Daí por
diante, professores podem ensinar e alunos aprender muitas coisas, mas o principal,
a relação amorosa com o aprendizado e a cultura, foi irreparavelmente danificada.
Tendo analisado o continuum elaborado durante as atividades artísticas realizadas nas
Oficinas de Sensibilização, arrisquei mais uma possibilidade para ampliar o exercício dessas
mesmas funções. Assim, tem-se que:
73
O nível sensório/motor pode ser relacionado à função sensorial, pois a relação com o
material artístico é vivenciada através da percepção, dos canais sensoriais (visão,
olfato, tato, paladar).
O nível perceptual/afetivo traz a dinâmica da função sentimento, em que a afetividade
e o caráter emocional podem ser manifestados em contato com o material de Arte.
O nível cognitivo/simbólico evoca a função pensamento, pois através da internalização
das ações e formas advindas dos níveis anteriores chega-se ao momento de
processar/elaborar informações cada vez mais complexas, relacionadas a temas que a
atividade pode evocar.
O vel criativo carrega, ao seu lado, as infinitas possibilidades da função intuição
que, certamente, acompanha como fundo as etapas anteriores. É o ato criador que, ao
romper fronteiras e limites, traz consigo a possível manifestação de uma energia
psíquica que produz uma sensação agradável de conquista e superação.
Buscou-se, como uma luz no meio dessa caminhada, trazer a importância do trabalho com as
histórias míticas e a possibilidade de serem vivenciadas em Oficinas de Sensibilização, pois
elas auxiliam na ampliação da consciência, na expressão dos sentimentos, na exploração dos
sentidos. É uma proposta de reflexão do trabalho docente de uma maneira mais sensível,
trazendo toda a força do pensar, sentir e criar através da Arte. Educar para a sensibilidade foi
a proposta!
Durante os encontros, as histórias de vida das professoras foram retomadas, buscando resgatar
suas subjetividades, seus jeitos de ser e vivenciar o papel de educadoras.
Através do exercício da identidade docente, vivenciada no papel de mestre, ao se contatar
com seu discípulo por meio de uma “experiência de encantamentodiante de alguma questão
que interesse a ambos, poderão surgir marcas na emoção de cada um advindas desse encontro!
Assim, abrem-se possibilidades de acolhimento nessa relação e ao professor cabe o papel de
encantar e motivar seu aluno... através de sua própria história, através de seus gestos, palavras
74
tornando-se, em um primeiro momento, modelo de identificação, para depois seu aluno
diferenciar-se dele.
Busquei direcionar o olhar para a importância do autoconhecimento do educador, da sua
constituição subjetiva, da prática de uma consciência crítica e criativa na relação com seu
aprendiz, pois ao escolher ensinar, ele escolhe aprender continuamente... movimentos opostos
que se presentificam no cotidiano da prática pedagógica.
Os momentos vividos nas oficinas promoveram um encontro de singularidades, cada uma
com suas histórias de vida onde se buscou, através de uma escuta acolhedora e sensível,
facilitar movimentos nas tramas elaboradas por elas e que pudessem (re)configurar as
experiências de seus caminhos/vida, formando um tecido ímpar e único, deixando marcas e
significativos registros pelos momentos já vividos.
Desse entrelaçamento de fios/histórias/vida emergiu outra possibilidade de reflexão apoiada
nas palavras de Josso (2004, p.29), doutora em Ciências da Educação na Universidade de
Genebra, que sugere:
São histórias de vida (as dos professores) que poderiam ser qualificadas como
referência das tomadas de posição e dos processos-projetos de formação do nosso
estar-no-mundo singular/plural por meio da exploração pluridisciplinar, ou para
alguns transdisciplinar, e da sua complexidade biográfica.
75
5 SOS... CORES... IMAGIAÇÃO!
5.1 LÁ VEM A HISTÓRIA: Vivenciando o Mito em Oficinas de Sensibilização
“Em formação (de professores), as histórias de
vida tocam as fronteiras do racional e do
imaginário [...] É precisamente esse caráter,
simultaneamente autêntico e imaginário, que surge
da articulação “poiética”
16
de um sentido
retrospectivamente construído e de uma busca, que
me parece justificar o interesse em nos
inspirarmos na experiência dos artistas para nos
ajudarem a “pensar o sensível na formação”, os
elos entre herança cultural e singularidade
criadora na pluralidade de interpretações
oferecidas por todas as vias do conhecimento.”
Marie-Christine Josso
Refletir sobre a própria atuação docente, em um viés em que a subjetividade se ligasse à
objetividade, a razão à afetividade instigando um trabalho com a imaginação, a criatividade e
a percepção (de si próprio e do outro), direcionando um sentir/fazer reflexivo, sensível e
crítico foi o propósito maior que desencadeou essa pesquisa. Tarefa difícil, pois ao entrar em
contato com o novo, com o diferente, sentimentos contraditórios podem gerar medo,
insegurança, descobertas sobre nosso mundo interno, que muitas vezes intimidam e paralisam
nossas ações... Entretanto, quando se acena com outro jeito de se contatar com essas questões,
surge um novo clarão no meio do caminho que acaba motivando e acenando como uma nova
possibilidade... por que não tentar?!...
Mas... este caminhar apresenta características próprias, pois seus personagens/caminhantes
também são ímpares... é o caminho que leva para a formação e autorreflexão do ser
professor... como nasce um professor? Há um momento especial em que ele se forma? Ou sua
prática vem de sua vivência? Como o contexto de suas ações contribui para refletir sua
subjetividade? Ele busca sentidos para sua ação? São questões que permeiam todo esse
percurso e que foram colocadas também para as professoras que fizeram parte desse estudo. O
que elas trouxeram como contribuição? Vamos aguardar, pois...
16
Poiética vem do termo autopoiésis, neologismo, vindo das biociências, principalmente de Humberto Maturana
e Francisco Varela, sendo atualmente usado em outras áreas. Do grego auto - próprio, e poiésis - fazer, produzir.
Autopoiésis: produzir a si mesmo e se refere aos sistemas cujos processos produzem seus componentes e padrões
e cujas interações e transformações regeneram o próprio sistema que o produz (JOSSO, 2004, p. 20 ).
76
... ouvem-se sinos ao longe
... um murmurar de vozes se aproxima
... uma atmosfera de encantamento se faz presente...
... uma brisa suave está solta no ar...
... a história está chegando e, ao se aproximar, leva todos
que estão à sua volta para a travessia de um portal...
... e, por ele, chega-se a outros mundos... ou para nosso
próprio mundo interno... tudo dependerá de nossas
possibilidades, de nossa sensibilidade...
77
Era uma vez
17
...
... uma história de amor que aconteceu numa época em que deuses e
homens comunicavam-se estreitamente...
E nessa época, em um lugar não muito distante daqui, havia um rei
que tinha três belas filhas. No entanto a mais jovem, Psiquê, possuía uma
beleza jamais vista. E, por causa dessa sua beleza, não conseguia casar-se. Os
homens que dela se aproximavam não ousavam pedi-la em casamento,
somente a admiravam e adoravam, como se fosse uma imortal.
Vinham pessoas de todos os lugares exclusivamente para vê-la.
Impossível uma mortal ser tão bela! Assim, tornou-se para o seu povo, a nova
deusa do amor. A deusa Afrodite fora destronada! A beleza da antiga deusa
passou a ser esquecida e seus templos foram praticamente abandonados. Mas
essa situação não foi, por muito tempo, suportada pela deusa. Enraivecida,
Afrodite chama seu filho Eros, o deus do amor, para ajudá-la. O jovem voou
rapidamente em seu auxílio, como sempre fazia quando sua mãe o chamava.
Afrodite queria se vingar... queria destruir Psiquê. Pediu ao seu filho que,
com o poder de seu arco e sua flecha, fizesse com que a jovem se apaixonasse
pelo mais horrível dos mortais.
Entretanto... Eros ao ver a linda Psiquê por ela se apaixonou e pediu
que Zéfiro (deus dos ventos) a levasse até seu palácio. E... nessa mesma noite...
sem se deixar ver, a tornou sua mulher. Mas antes do dia amanhecer,
desapareceu de forma misteriosa, restando em Psiquê uma sensação de
leveza e puro amor. E assim... durante muito tempo a história se repetiu. A
princesa acostumou-se enfim à sua nova vida: durante o dia as vozes no
palácio surgiam para servi-la adivinhando seus desejos e à noite reaparecia o
marido apaixonado que ela mesma não conhecia.
Um dia, apareceram suas irmãs, enciumadas e convenceram Psiquê a
descobrir quem era a pessoa que a desposara... pois até aquele momento ela
17
Neste momento fez-se uma síntese do mito, apoiada na versão de RANDON, Maria Augusta. Psique e Eros.
Edições Paulinas, 2005. A versão completa da história encontra-se no livro de NEUMAN, Erich. Amor e
Psiquê uma contribuição para o desenvolvimento da psique feminina. São Paulo, Editora Cultrix, 10ª. edição,
1995.
78
nunca vira o rosto de seu amado. Depois de muita insistência a jovem
acabou seguindo as recomendações de suas irmãs e começou a grande
virada de seu destino...
Eros havia lhe feito um pedido: para que o amor entre eles durasse
para todo o sempre, ela nunca poderia ver como era seu rosto... deveria amá-
lo e entregar-se a ele sem nunca conhecer sua fisionomia... entretanto, a
presença malvada e invejosa das irmãs fez que Psiquê quebrasse o juramento
e por conta disso... perdeu seu amor, pois uma vez quebrada a promessa,
dando-se conta de que seu mistério fora desvendado, não havia outra coisa
para o jovem fazer, senão ir embora. Eros partiu voando, não olhou para
trás, não disse uma única palavra e afastou-se velozmente...
Psiquê ficou desnorteada, desejou morrer e, a partir de então,
arrependida por não ter ouvido seu amor e seguido as orientações das irmãs
perversas, começou sua jornada para resgatar o amor de Eros. A deusa
Afrodite ficou com muito ciúmes quando soube da situação pela qual passou
seu filho e pelo fato de que sua nora seria Psiquê sentiu-se duplamente
traída!
Perdida... Psiquê não tinha outra saída senão ir até o palácio da deusa
e, chegando, encontrou a mãe de Eros que a humilhou, insultou e quis de
todo jeito destruir sua beleza. Para tanto... impôs a Psiquê quatro tarefas...
79
A partir desse momento do percurso, buscou-se fazer uma relação das tarefas que Psiquê teve
que enfrentar para resgatar o amor de Eros com as possíveis tarefas que o professor deve
encarar para poder resgatar sua paixão, seu entusiasmo pelo ensinar e aprender.
As tarefas estão apresentadas detalhadamente como foram trabalhadas nas oficinas, fazendo-
se intersecções com os depoimentos das professoras e possíveis analogias com educadores da
atualidade.
Assim... continuo com a história... iniciando o trabalho com as tarefas...
80
PRIMEIRA TAREFA
Terminada a tortura que Afrodite impôs para Psiquê, ordenou-lhe a
primeira tarefa: pediu para que trouxessem enorme quantidade de
cevada, milho, trigo, semente de papoula, grãos-de-bico, fava e
lentilhas. Misturou isso tudo, construindo um enorme monte. Ordenou
a Psiquê que separesse esses grãos por espécie. Ela deveria terminar a
tarefa naquela mesma noite.
Impossível! A triste esposa nem mesmo tentou.
Mas... passava por ali uma formiguinha.
Ela percebeu o desespero da princesa e a crueldade de sua sogra.
Revoltou-se com a situação e resolveu ajudá-la.
Um batalhão de formigas foi convocado. E as ágeis criaturinhas
começaram a agir, trabalhando em equipe para salvar a querida
Psiquê. Conseguiram terminar o trabalho a tempo!
Afrodite, ao acordar, foi verificar o resultado de sua perversidade.
Ficou surpresa! Sabia que seria impossível a um humano ter executado
a tarefa. Acreditou, então, que seu filho Eros ajudara a amada.
Insultou-a novamente.
81
PRIMEIRA TAREFA
Exercício: saber discriminar.
Elemento da natureza: terra.
Elemento simbólico: formiga.
Função da consciência: sensação/percepção.
Criando o cenário... preparando a oficina...
Material: círculos em EVA; sementes de grãos diferenciados; cola.
Sensibilização: música suave, trabalho com respiração ampliando a consciência corporal.
Proposta: foi entregue para cada professora um pote com as sementes misturadas, e elas
deveriam separá-las e organizá-las dispondo a organização no círculo de EVA.
Enquanto as professoras faziam a atividade de reorganizar as sementes, fui lançando questões
que pudessem servir de guia para o pensar. Seguem algumas delas:
Como você se sente ao separar essas sementes?
Quais pensamentos e sensações são evocados nesse fazer?
Como relacionar essa tarefa como o seu jeito de ser? É cil no dia-a-dia separar e
discriminar os papéis, as funções que você ocupa na sociedade?
No seu papel docente como associar essa tarefa com o ser professora? Quais são os
desafios que a tarefa exige e como associá-los ao ofício de professor?
Pensar nessa primeira tarefa de Psiquê é iniciar um caminho para se chegar ao encontro da
simbologia que ela pode representar. A pesquisa
Neumann (1993) que fe
z uma análise profunda sobre a contribuição desse
desenvolvimento da psique humana e de Angwin (1994), estudiosa dos mitos e de sua
simbologia, que ampliou
o universo das possibilidades simbólicas evocadas
Psiquê teve que separar
por espécie e classificar as sementes
grão por grão, no espaço de uma noite. Em uma leitura simbólica, teve que exercitar a
discriminação, isto é, começar a diferenciar os seus desejos, o sentido das coisas, suas
necessidad
es, o bem do mal, o prazer do desprazer. Em quantos momentos da vida
não se percebe vivendo uma situação
maneira caótica e
, repentinamente,
uma formiguinha, analisar parte por parte da situação para poder tomar uma posição,
vislumbrar uma saída
buscando chegar ao esclarecimento da situação.
do ser humano para selecionar, analisar e avaliar as situaç
caminhada pessoal e
profissional se faz necessário.
Foto 2 – Primeira tarefa
Pensar nessa primeira tarefa de Psiquê é iniciar um caminho para se chegar ao encontro da
simbologia que ela pode representar. A pesquisa
foi enriquecida
com as contribuições de
z uma análise profunda sobre a contribuição desse
desenvolvimento da psique humana e de Angwin (1994), estudiosa dos mitos e de sua
o universo das possibilidades simbólicas evocadas
por espécie e classificar as sementes
de um imenso monte de cereais
grão por grão, no espaço de uma noite. Em uma leitura simbólica, teve que exercitar a
discriminação, isto é, começar a diferenciar os seus desejos, o sentido das coisas, suas
es, o bem do mal, o prazer do desprazer. Em quantos momentos da vida
não se percebe vivendo uma situação
em que tudo está confuso,
os fatos são vivenciados de
, repentinamente,
surge a necessidade de se parar, “dar um tempo” e, co
uma formiguinha, analisar parte por parte da situação para poder tomar uma posição,
buscando chegar ao esclarecimento da situação.
Confiar na capacidade
do ser humano para selecionar, analisar e avaliar as situaç
ões/
desafios que sur
profissional se faz necessário.
82
Pensar nessa primeira tarefa de Psiquê é iniciar um caminho para se chegar ao encontro da
com as contribuições de
z uma análise profunda sobre a contribuição desse
Mito para o
desenvolvimento da psique humana e de Angwin (1994), estudiosa dos mitos e de sua
o universo das possibilidades simbólicas evocadas
pela história.
de um imenso monte de cereais
,
grão por grão, no espaço de uma noite. Em uma leitura simbólica, teve que exercitar a
discriminação, isto é, começar a diferenciar os seus desejos, o sentido das coisas, suas
es, o bem do mal, o prazer do desprazer. Em quantos momentos da vida
a pessoa
os fatos são vivenciados de
surge a necessidade de se parar, “dar um tempo” e, co
mo
uma formiguinha, analisar parte por parte da situação para poder tomar uma posição,
Confiar na capacidade
desafios que sur
gem durante a
83
Relacionando-se essa parte da história com a tarefa do professor, quantas situações surgem no
seu cotidiano que o faz sentir-se confuso, não conseguindo vislumbrar uma saída para
determinado fato, uma vez que tudo parece indiferenciado, sem lógica, causando uma
sensação de impotência. O exercício da discriminação se concretiza, por exemplo, quando se
pensa no professosr democrático, naquele professor que se coloca junto ao seu aluno servindo
de modelo, para que este possa, a partir daí, ao interiorizar maneiras de ser e estar em contato
com a aprendizagem, buscar o seu próprio caminho. A partir de um movimento dialético, de ir
e vir, de imitar e deixar-se ser imitado, de alimentar a aprendizagem do outro e ser alimentado
pela própria busca pelo conhecimento, é que se faz necessário ressaltar as diferenças de cada
papel vivenciado.
Madalena Freire (2008, p.75) para confirmar essa idéia, afirma que:
Função do educador democrático é antes de tudo assumir-se enquanto modelo, não
como o autoritário o faz, centralizando unicamente a instrumentalização, nem como
o espontaneísta, negando o “emprestar-se” ao outro, mas permitindo ao educando o
processo de imitação e de cópia, para que possa introjetar o modelo e passando a
saber o que antes não conhecia e por isso mesmo tem condições de recriá-lo. Neste
momento, temos o clímax do processo de aprendizagem.
Com esta tarefa, vê-se a necessidade de diferenciar para selecionar, excluir para incluir,
priorizar e reorganizar saberes de forma diferente, conforme a situação exija, partindo-se
sempre do autoconhecimento para o conhecimento do outro. Diferenciar os momentos em
que o professor deve ser o seu próprio mestre, indo à busca de novas aprendizagens e, outros,
em que se torna o elemento mobilizador de novas aprendizagens e desafios para seus alunos.
A Pedagogia Simbólica, estudada por Byington, amplia um pouco mais o sentido e o processo
de discriminação/indiscriminação trazido por essa tarefa. Afirma ele:
Deve-se procurar evitar o ensino de prato feito e já mastigado e o ensino
exclusivamente lógico que dificulta o engajamento emocional do aluno, mesmo
quando feito de forma construtivista. [...] O principal a resgatar é a vivência
simbólica do ensino que veicula a inteireza do Ser junto com o aprendizado. Nesse
processo simbólico, vivencia-se naturalmente a “transcendência” do material
ensinado, pois a própria vivência o insere através dos símbolos na totalidade do Self.
Saber é uma coisa. Ensinar é algo muito diferente. O importante para a transmissão
do ensino simbólico são a autenticidade e a inteireza existencial do educador, que
emanam da sua entrega intelectual e emocional à sua profissão, que inclui, além do
material ensinado, a formação da personalidade dos seus alunos e a sua própria
(BYINGTON, 1996, pp. 67- 68).
84
Neste sentido, percebe-se quão importante é essa primeira tarefa realizada por Psiquê, pois a
partir dela, do exercício de diferenciar o meu desejo do desejo do outro, de qual deve ser a
intenção para se chegar até determinada ação, discriminar os sentimentos envolvidos na
tarefa/atividade é que efetivamente se instaura um aporte maior para a ampliação da
consciência.
Na história do Mito, entretanto, Psiquê não realizou a tarefa sozinha. Vieram em sua ajuda as
formigas e dentro da análise desse elemento, assim se apresenta Angwin (1994, p.154):
As formigas são o símbolo da ordem e da estrutura; insetos que convivem com a
terra e possuem um sistema social altamente organizado. Representam o lado
instintivo de nossa natureza. Como elas não possuem nada de glamoroso, podem
também trazer a mensagem de que é possível que as facetas mais humildes e
negligenciadas de nossa natureza sejam justamente o nosso ponto de apoio quando
estamos entre a cruz e a espada.
Sendo as formigas representantes da energia psíquica que envolve o ser humano em suas
ações e observando como são pacienciosas e laboriosas, cabe aqui uma questão: Quando, no
fazer do professor, se faz necessário um trabalho paciencioso... laborioso... em que aquilo que
se apresenta como realidade confusa e assustadora deve ser analisado com muita cautela,
calma mas... com determinação?
As formigas trazem o elemento terra como cenário para essa tarefa, e nada mais frutífero do
que plantar as sementes na própria terra, local fecundo para nascerem novas forças, novos
talentos e possibilidades, pois todo trabalho de transformação parte do trabalho interno e de
“formiguinha” de cada um de nós. Para complementar essa análise, Bernardo afirma que
“cada novo símbolo com o qual entramos em contato é como uma semente que precisa ser
germinada no nosso vaso interno para que dela possamos extrair frutos que trarão energia
psíquica para o nosso crescimento” (BERNARDO, 2008, p.144).
Apresento, agora, os resultados das vivências das professoras, fazendo uma ligação entre a
proposta da tarefa em si e as possíveis reflexões/associações com a prática docente.
Após o término desse primeiro momento, quando um silêncio significativo se fez presente,
surgiu uma grande necessidade de compartilhar a experiência. Abriu-se o espaço para a
partilha
...
A esses dados, buscou-se fazer uma relação entre as categorias que serviram de
guia para a pesquisa e as unidades de registro que trouxeram uma sign
chegar aos resultados finais da análise. Assim se manifestaram as professoras:
Causou certa aflição aquele monte de sementes misturadas... mas ao mesmo tempo é
gostoso o desafio de separar, então ao mesmo tempo foi muito bom... (Môn
... para eu conseguir fazer bem cada coisa, cada semente que eu estava separando, eu
precisava dar atenção para cada uma delas e não para todas juntas! (Gabriela)
A primeira sensação foi de curiosidade... será que é isso
concentrei-
me e eu tenho um pouco assim de querer abraçar tudo, né... até em função
do meu trabalho, quero fazer tudo... (Kátia)
guia para a pesquisa e as unidades de registro que trouxeram uma sign
chegar aos resultados finais da análise. Assim se manifestaram as professoras:
Causou certa aflição aquele monte de sementes misturadas... mas ao mesmo tempo é
gostoso o desafio de separar, então ao mesmo tempo foi muito bom... (Môn
... para eu conseguir fazer bem cada coisa, cada semente que eu estava separando, eu
precisava dar atenção para cada uma delas e não para todas juntas! (Gabriela)
Foto 3 – Primeira tarefa
A primeira sensação foi de curiosidade... será que é isso
que a gente vai fazer?
me e eu tenho um pouco assim de querer abraçar tudo, né... até em função
do meu trabalho, quero fazer tudo... (Kátia)
85
guia para a pesquisa e as unidades de registro que trouxeram uma sign
ificação maior para se
chegar aos resultados finais da análise. Assim se manifestaram as professoras:
Causou certa aflição aquele monte de sementes misturadas... mas ao mesmo tempo é
gostoso o desafio de separar, então ao mesmo tempo foi muito bom... (Môn
ica)
... para eu conseguir fazer bem cada coisa, cada semente que eu estava separando, eu
precisava dar atenção para cada uma delas e não para todas juntas! (Gabriela)
que a gente vai fazer?
me e eu tenho um pouco assim de querer abraçar tudo, né... até em função
Eu também, quando a proposta começou, eu fiquei muito curiosa com os tu
demorei um tempo para cair a ficha de que nós... ah! Pensei várias coisas... ah! nós
vamos olhar as sementes... vamos ouvir mais uma parte da história, né... uma coisa
meio de ilustração, mas no momento em que vofalou que nós íamos fazer... [...]
veio um pensamento matemático de que tem que dar certo... então eu comecei a
separar... [...] eu comecei a ver que não ia caber... eu acho que para mim foi
complicado essa coisa de saber que havia me proposto a terminar e que não ia dar... no
meio do ca
minho!!!! Eu me concentrei bastante no trabalho, pois eu queria que todas
as sementes ficassem próximas umas das outras [...] Sabe, quando eu vi que tinha
aquele monte de sementes... é um aprendizado que vai para a vida inteira... eu acho
que a gente nunca
vai esquecer essa atividade... (Karen)
Tendo por base o
continuum
observar que o nível sensório
tarefa separando as sementes para r
uma ação perceptiva/sensorial/motora que facilitou a liberação de uma energia psíquica
18
Cf. Capítulo IV.
Foto 4 – Primeira tarefa
Eu também, quando a proposta começou, eu fiquei muito curiosa com os tu
demorei um tempo para cair a ficha de que nós... ah! Pensei várias coisas... ah! nós
vamos olhar as sementes... vamos ouvir mais uma parte da história, né... uma coisa
meio de ilustração, mas no momento em que vofalou que nós íamos fazer... [...]
veio um pensamento matemático de que tem que dar certo... então eu comecei a
separar... [...] eu comecei a ver que não ia caber... eu acho que para mim foi
complicado essa coisa de saber que havia me proposto a terminar e que não ia dar... no
minho!!!! Eu me concentrei bastante no trabalho, pois eu queria que todas
as sementes ficassem próximas umas das outras [...] Sabe, quando eu vi que tinha
aquele monte de sementes... é um aprendizado que vai para a vida inteira... eu acho
vai esquecer essa atividade... (Karen)
continuum
das atividades artísticas e expressivas (ETC
observar que o nível sensório
-
motor foi o ápice dessa proposta. A oportunidade de exercitar a
tarefa separando as sementes para r
eagrupá-
las, dando uma determinada configuração, foi
uma ação perceptiva/sensorial/motora que facilitou a liberação de uma energia psíquica
86
Eu também, quando a proposta começou, eu fiquei muito curiosa com os tu
les e
demorei um tempo para cair a ficha de que nós... ah! Pensei várias coisas... ah! nós
vamos olhar as sementes... vamos ouvir mais uma parte da história, né... uma coisa
meio de ilustração, mas no momento em que vofalou que nós íamos fazer... [...]
veio um pensamento matemático de que tem que dar certo... então eu comecei a
separar... [...] eu comecei a ver que não ia caber... eu acho que para mim foi
complicado essa coisa de saber que havia me proposto a terminar e que não ia dar... no
minho!!!! Eu me concentrei bastante no trabalho, pois eu queria que todas
as sementes ficassem próximas umas das outras [...] Sabe, quando eu vi que tinha
aquele monte de sementes... é um aprendizado que vai para a vida inteira... eu acho
das atividades artísticas e expressivas (ETC
18
), importante
motor foi o ápice dessa proposta. A oportunidade de exercitar a
las, dando uma determinada configuração, foi
uma ação perceptiva/sensorial/motora que facilitou a liberação de uma energia psíquica
87
contribuindo para a ampliação da reflexão, culminando com o vel cognitivo simbólico. Este
se manifestou nas falas das professoras fazendo analogias com a representação simbólica feita
com as sementes e suas atuações em sala de aula.
A partir desses depoimentos, a tarefa de discriminar buscou ampliar a reflexão para a ação
docente, e a vertente da subjetividade se fez significativamente presente nos seguintes
depoimentos:
Para fazer essa tarefa me doei muito... ao separar fui tentar formar um círculo que
acho que é a união [...] e a gente prefere assim quando está liderando, tentando
harmonizar isso tudo [...] nas sementes que ficam soltas, por mais que você as separe,
elas se entrelaçam... isso achei interessante também... a gente tem um pouco do outro e
o outro tem um pouco da gente também... por mais que a gente tente ser único,
individual, há sentimentos que partilhamos da mesma maneira. (Tereza)
Eu vou pegando do potinho e vou usando as sementes... não precisa separar semente
por semente para depois colar... foi isso que eu pensei, eu falei... não, vou ter que
separar, né? E essa coisa de organização, é uma coisa que eu estou trabalhando muito
comigo neste ano [...] separar as coisas, a hora do trabalho, a hora do lazer, a hora de
estar em casa, a hora da minha família, a hora dos meus alunos [...] que para eu
conseguir fazer bem cada coisa, cada semente que eu estava separando,eu precisava
dar atenção para cada uma delas e não para todas juntas [...] esse ano eu acho que
estou conseguindo chegar nesse equilíbrio de tranqüilidade nas coisas que eu faço,
então isso refletiu muito na minha vida. (Gabriela).
Mas eu percebi que não ia dar certo colar uma semente sobre a outra, como um
prédio... Isso começou a me angustiar, parei, respirei e falei... “NÃO VAI DAR”... não
vou usar... e escrevi a palavra RENOVAÇÃO
lidar com isso, nem sempre a gente consegue abraçar tudo e nem sempre tudo para
você arregaçar as mangas e fazer... (Karen)
Pensando nesses registros que vieram direcionar e validar as categorias, torna
fazer um exercíc
io de integração entre tais depoimentos e as necessidades
Quando se possibilita ao fazer criativo e artístico ampliações na ressignificação da própria
identidade e da prática docente, faz
com a formação pessoal buscando
ser considerada uma estratégia fundamental para que se mobilize não só conhecimentos
novos, mas também que se alimente a busca para aprendizagens significativas.
(2002, p. 154
) vem corroborar tal pensamento ao explicitar que:
A tarefa mais fundamental do professor, portanto, é semear desejos, estimular
projetos, consolidar uma arquitetura de valores que os sustentem e, sobretudo, fazer
com que os alunos sa
qual se inserem, sabendo pedir junto com os outro
Foto 5- Primeira tarefa.
Mas eu percebi que não ia dar certo colar uma semente sobre a outra, como um
prédio... Isso começou a me angustiar, parei, respirei e falei... “NÃO VAI DAR”... não
vou usar... e escrevi a palavra RENOVAÇÃO
isso para mim fo
lidar com isso, nem sempre a gente consegue abraçar tudo e nem sempre tudo para
você arregaçar as mangas e fazer... (Karen)
Pensando nesses registros que vieram direcionar e validar as categorias, torna
io de integração entre tais depoimentos e as necessidades
Quando se possibilita ao fazer criativo e artístico ampliações na ressignificação da própria
identidade e da prática docente, faz
-
se uma integração entre a organização do trabalho es
com a formação pessoal buscando
-
se uma contextualização de significados/ação. Esta pode
ser considerada uma estratégia fundamental para que se mobilize não só conhecimentos
novos, mas também que se alimente a busca para aprendizagens significativas.
) vem corroborar tal pensamento ao explicitar que:
A tarefa mais fundamental do professor, portanto, é semear desejos, estimular
projetos, consolidar uma arquitetura de valores que os sustentem e, sobretudo, fazer
com que os alunos sa
ibam articular seus projetos pessoais com os da coletividade na
qual se inserem, sabendo pedir junto com os outro
s, sendo, portanto, competentes
88
Mas eu percebi que não ia dar certo colar uma semente sobre a outra, como um
prédio... Isso começou a me angustiar, parei, respirei e falei... “NÃO VAI DAR”... não
isso para mim fo
i uma coisa nova,
lidar com isso, nem sempre a gente consegue abraçar tudo e nem sempre tudo para
Pensando nesses registros que vieram direcionar e validar as categorias, torna
-se fundamental
io de integração entre tais depoimentos e as necessidades
do professor.
Quando se possibilita ao fazer criativo e artístico ampliações na ressignificação da própria
se uma integração entre a organização do trabalho es
colar
se uma contextualização de significados/ação. Esta pode
ser considerada uma estratégia fundamental para que se mobilize não só conhecimentos
novos, mas também que se alimente a busca para aprendizagens significativas.
Machado
A tarefa mais fundamental do professor, portanto, é semear desejos, estimular
projetos, consolidar uma arquitetura de valores que os sustentem e, sobretudo, fazer
ibam articular seus projetos pessoais com os da coletividade na
s, sendo, portanto, competentes
.
89
Para estimular competências em seus alunos, o professor precisa ter consciência de quais são
as suas e de como exercitá-las para o bem da coletividade (família, escola e meio cultural).
Assim, pensando-se nos imperativos de nossa época, no mundo da globalização, é uma nova
mentalidade, baseada em uma visão sistêmica, que se deve buscar. Esta é evidenciada na ação
que busca trabalhar do intra para o interpessoal, da parte para o todo, configurando o
direcionamento para um conhecimento em rede que busca um sentido maior para a ação
facilitando a criação de novas configurações. Essas passam a ser alimentadas pelo novo
paradigma analisado por Morin (2001, p.33):
A esse novo espírito científico será preciso acrescentar a renovação do espírito da
cultura das humanidades. Não esqueçamos que a cultura das humanidades favorece
a abertura a todos os grandes problemas, para meditar sobre o saber e para integrá-lo
à própria vida, de modo a melhor explicar, correlativamente, a própria conduta e o
conhecimento de si.
Dentro dessa nova visão, é que busco trazer, nessa pesquisa, a importância do trabalho com os
mitos em Oficinas de Sensibilização, pois através dele abrem-se espaços para idéias, imagens,
conceitos e vivências adquiridas durante toda a vida e buscando ressignificá-las para o
momento existencial e profissional.
Complementando-se a proposta dessa primeira tarefa, na qual se exercita através da atividade
artística a consciência da função discriminatória, produzindo-se movimentos de separação,
distinção e organização entre o eu e o não-seu, o professor/o aluno, a afetividade e a razão são
movimentos que ao flexibilizar o pensamento, buscam um equilíbrio entre ação/reflexão/
ação. Há um percurso que vai a busca do outro, passando primeiro pela busca de si.
A idéia de um “caminhar para si” ou, em outras palavras, de um “ir ao encontro de
si”, emerge a partir do momento em que se lança a hipótese (se se tratar do
pedagogo ou pesquisador) que o nosso itinerário de vida, os nossos investimentos, e
as nossas intenções podem-se construir com base numa auto-orientação que articula
o que herdamos, as nossas experiências formadoras, as nossas pertenças, a nossas
valorizações e os nossos desejos às oportunidades que sabemos agarrar, criar e
explorar (JOSSO, 2004, p. 163).
Quando as professoras trazem em suas falas acima descritas, palavras como:
... tem um pouco do outro e o
gente tente ser único, individual, sentimentos que partilhamos da mesma maneira.
(Tereza)
... eu precisava dar atenção para cada uma delas e não para todas juntas [...] esse ano
eu acho que estou
conseguindo chegar nesse equilíbrio de tranqüilidade nas coisas que
eu faço, então isso refletiu muito na minha vida. (Gabriela)
Foto 6
... que para eu conseguir fazer bem cada coisa, cada semente que eu est
separando... não vou usar... e escrevi a palavra RENOVAÇÃO
uma coisa nova, lidar com isso, nem sempre a gente consegue abraçar tudo e nem
sempre tudo dá para você arregaçar as mangas e fazer... (Karen)
... eu acho que eu preciso
eles, ao mesmo tempo, então isso para mim é... acabou ficando assim... sementes
em pé... nossa eu fiquei super bem... até escrevi essas palavras... (Gabriela)
... tem um pouco do outro e o
outro tem um pouco da gente também... por mais que a
gente tente ser único, individual, sentimentos que partilhamos da mesma maneira.
... eu precisava dar atenção para cada uma delas e não para todas juntas [...] esse ano
conseguindo chegar nesse equilíbrio de tranqüilidade nas coisas que
eu faço, então isso refletiu muito na minha vida. (Gabriela)
Foto 6
Organizando as sementes (primeira tarefa)
... que para eu conseguir fazer bem cada coisa, cada semente que eu est
separando... não vou usar... e escrevi a palavra RENOVAÇÃO
uma coisa nova, lidar com isso, nem sempre a gente consegue abraçar tudo e nem
sempre tudo dá para você arregaçar as mangas e fazer... (Karen)
... eu acho que eu preciso
ser o foco, eu preciso ser o centro, mas eu devo estar com
eles, ao mesmo tempo, então isso para mim é... acabou ficando assim... sementes
em pé... nossa eu fiquei super bem... até escrevi essas palavras... (Gabriela)
90
outro tem um pouco da gente também... por mais que a
gente tente ser único, individual, sentimentos que partilhamos da mesma maneira.
... eu precisava dar atenção para cada uma delas e não para todas juntas [...] esse ano
conseguindo chegar nesse equilíbrio de tranqüilidade nas coisas que
Organizando as sementes (primeira tarefa)
.
... que para eu conseguir fazer bem cada coisa, cada semente que eu est
ava
separando... não vou usar... e escrevi a palavra RENOVAÇÃO
isso para mim foi
uma coisa nova, lidar com isso, nem sempre a gente consegue abraçar tudo e nem
ser o foco, eu preciso ser o centro, mas eu devo estar com
eles, ao mesmo tempo, então isso para mim é... acabou ficando assim... sementes
em pé... nossa eu fiquei super bem... até escrevi essas palavras... (Gabriela)
... eu fiquei pensando quando todo mundo apresentou o trabalho em como a gente
acaba deixando muito da gente naquilo que a gente faz, né?!... saí muito pensando...
geralmente a gente não pensa sobre nossos atos... a gente vai encarando as coisas, a
ge
nte não olha o lado do sentimento dessas características que são tão nossas... da
nossa personalidade e às vezes tem coisas que a gente consegue mudar, que é passível
de mudanças... (Karen)
Tem-
se a constatação de que maneira essa primeira tarefa de Psiqu
expressivo, permitiu a mobilização e ampliação de um fazer que ressoasse no caminhar para si
(ser do professor), para poder chegar até o outro...
Neste caminhar para si, afetividade e cognição, histórias de vida do sujeito aliadas às
experiências sociais
nas quais
histórico-
cultural. Os dois últimos depoimentos acima são um exemplo da categoria
afetividade inserida na fala e na vivência das professoras. Vygotsky
p.18) afirma:
19
Original - VYGOTSKY, L.S.
Obras Escogidas
Foto 7 – Primeira tarefa concluída
... eu fiquei pensando quando todo mundo apresentou o trabalho em como a gente
acaba deixando muito da gente naquilo que a gente faz, né?!... saí muito pensando...
geralmente a gente não pensa sobre nossos atos... a gente vai encarando as coisas, a
nte não olha o lado do sentimento dessas características que são tão nossas... da
nossa personalidade e às vezes tem coisas que a gente consegue mudar, que é passível
de mudanças... (Karen)
se a constatação de que maneira essa primeira tarefa de Psiqu
expressivo, permitiu a mobilização e ampliação de um fazer que ressoasse no caminhar para si
(ser do professor), para poder chegar até o outro...
Neste caminhar para si, afetividade e cognição, histórias de vida do sujeito aliadas às
nas quais
ele está inserido, fazem parte do mesmo percurso sócio
cultural. Os dois últimos depoimentos acima são um exemplo da categoria
afetividade inserida na fala e na vivência das professoras. Vygotsky
19
Obras Escogidas
. Madri:Visor, 1993, v.2.
91
... eu fiquei pensando quando todo mundo apresentou o trabalho em como a gente
acaba deixando muito da gente naquilo que a gente faz, né?!... saí muito pensando...
geralmente a gente não pensa sobre nossos atos... a gente vai encarando as coisas, a
nte não olha o lado do sentimento dessas características que são tão nossas... da
nossa personalidade e às vezes tem coisas que a gente consegue mudar, que é passível
se a constatação de que maneira essa primeira tarefa de Psiqu
ê, aliada a um fazer
expressivo, permitiu a mobilização e ampliação de um fazer que ressoasse no caminhar para si
Neste caminhar para si, afetividade e cognição, histórias de vida do sujeito aliadas às
ele está inserido, fazem parte do mesmo percurso sócio
-
cultural. Os dois últimos depoimentos acima são um exemplo da categoria
19
(apud Arantes, 2003,
92
Quem separa desde o começo o pensamento do afeto fecha para sempre a
possibilidade de explicar as causas do pensamento, porque uma análise determinista
pressupõe descobrir seus motivos, as necessidades e interesses, os impulsos as
tendências que regem o movimento do pensamento em um ou outro sentido. De
igual modo, quem separa o pensamento do afeto, nega de antemão a possibilidade de
estudar a influência inversa do pensamento o plano afetivo, volitivo da vida
psíquica, porque uma análise determinista desta última inclui tanto atribuir ao
pensamento um poder mágico capaz de fazer depender o comportamento humano
única e exclusivamente de um sistema interno do indivíduo, como transformar o
pensamento em um apêndice inútil do comportamento, em uma sombra sua
desnecessária e impotente.
Neste sentido, evidencia-se, de maneira muito significativa pela fala das professoras, como a
atividade da oficina acabou mobilizando-as para pensar não os aspectos concretos e
objetivos, mas também os elementos afetivos e pessoais evocados durante a vivência.
Encerrando a análise dessa primeira tarefa e servindo como uma reflexão que deverá permear
a análise de todas as outras, Ostrower (2002, p.53) enriquece esta idéia ao afirmar que:
É isso que cala tão profundamente em nós. Compreendemos que todos os processos
de criação representam, na origem, tentativas de estruturação, de experimentação e
controle, processos produtivos onde o homem se descobre, onde ele próprio se
articula à medida que passa a identificar-se com a matéria. São transferências
simbólicas do homem à materialidade das coisas e que novamente são transferidas
para si.
93
SEGUDA TAREFA
A sogra lhe ordenou a segunda tarefa.
Psiquê deveria trazer-lhe flocos de de ouro que cobriam o dorso das
ovelhas ferozes. Essas ovelhas costumavam ficar num bosque ali perto do
palácio. Tarefa perigosa e irrealizável.
Mas Psiquê, apaixonada, sabia pensar no marido e tentou tudo por
ele.
A jovem foi para o bosque. Lá chegando, o medo lhe inundara a alma, e
a esposa já tinha outra idéia em mente: matar-se!
No bosque havia um rio com redemoinhos. A pessoa que nele
mergulhasse iria diretamente para o fundo, sem retorno. Desiludida,
Psiquê nele mergulhou!
Novamente ela foi salva. Desta vez por um simples caniço verde.
Humildemente, ele lhe suplicou para que não poluísse aquelas águas
que eram sagradas. E também lhe ensinou o que fazer para conseguir os
flocos de lã de ouro.
_ Psiquê querida, você não deve se aproximar das ovelhas enquanto o sol
estiver a pino. As ovelhas ficam terrivelmente enfurecidas por causa do
calor. Elas atacam, dão testadas e ainda mordem. Suas mordidas são
venenosas e fatais. Aguarde embaixo de um plátano. Quando o calor
diminuir e o vento fresco do rio soprar, as ovelhas estarão calmas.
Então, elas irão descansar e os flocos de ficarão presos nas árvores
dos bosques. Basta sacudir as árvores, que você conseguirá colher a
quantidade que quiser.
A princesa agradeceu o caniço e partiu para mais essa tarefa.
Seguiu exatamente como lhe fora ordenado. E a jovem retornou para o
palácio repleta de flocos de lã de ouro!
94
SEGUDA TAREFA
Exercício: saber esperar.
Elemento da natureza: fogo.
Elemento simbólico: caniço.
Função da consciência: intuição.
Criando novo cenário...
Material: varetas de bambu, um CD (compact disc), giz de cera, vela.
Sensibilização:
Individualmente: exercícios corporais com a vareta, explorando-a sensorialmente. Em
seguida, fazer movimentos amplos e contidos, explorando outras possibilidades com o
corpo naquele espaço e com a vareta em mãos.
Em duplas: cada participante, com a vareta em mãos, contatar-se com o outro,
sentindo as qualidades dessa relação. Perceber o tempo de uma, o tempo da parceira;
pensar se é fácil ou difícil harmonizar esses movimentos.
Em grupos de quatro: dando continuidade à mesma proposta, ampliando a percepção
do contato com as outras parceiras... ficar atentas às sensações, sentimentos que a
dança acessa.
Proposta: com a vela acesa, as professoras deveriam, ao derreter o giz de cera, passá-lo sobre
o CD, formando configurações plásticas que pudessem representar as sensações, os
pensamentos e sentimentos que surgiram durante a atividade.
Ao mesmo tempo em que os sujeitos dessa pesquisa estavam absorvidos pela atividade, a
pesquisadora apresentava, oralmente, questões que servissem de orientação para a proposta.
Seguem algumas delas:
Como me percebo quando devo trabalhar com a espera?
Em quais momentos de minha vida eu tive que saber esperar o momento certo para
conseguir aquilo que desejava... foi fácil?
95
Quanto eu me flexiono, quando em contato com o outro ou me coloco em uma postura
mais agressiva?
Quando exercito a espera, ela vem junto com a agressividade, ou ela vem de maneira
mais tranqüila e branda? É fácil lidar com essas duas energias opostas dentro de mim,
sem cair nos extremos?
Como é lidar com a espera em minha vida profissional? E com as questões da
agressividade?
Onde situo essas questões no meu papel de professora?
A grande mensagem dessa tarefa consiste em se poder olhar para além de si próprio,
compreendendo que o universo é maior do que o nosso próprio mundo e que a solução não
consiste na luta, no confronto de forças, mas no estabelecimento de um contato fecundo entre
o masculino e o feminino.
Nesta tarefa, Psiquê teve que lidar com as forças da agressividade, da destrutividade e para
vencê-las precisou usar de sua astúcia e esperteza, para também não se tornar rígida e acuada;
teve que buscar um equilíbrio entre o lado hostil do masculino e a suavidade e acolhimento do
feminino. Somente uma espera ativa e com um sentido, atenção e determinação abrem
possibilidades para se chegar à transformação.
Como relacionar a essência dessa tarefa saber esperar” com o trabalho docente? Como
equilibrar a força do masculino, do logos, da razão, com a sensibilidade e afetividade do
feminino? Forças opostas que necessitam de um equilíbrio e que permeiam o cotidiano do
professor.
A afetividade
20
seu papel e sua função – é muito estudada nas relações do ensinar e
aprender, pois ela nasce na/da relação aluno-professor junto com outros componentes do
funcionamento psicológico de ambos. Para poder emocionar-se (e vivenciar processos
afetivos) que se ter construído indicadores ao longo da história de vida de cada indivíduo,
20
Afetividade: refere-se à capacidade, à disposição do ser humano de ser afetado pelo mundo externo e interno
por meio de sensações ligadas a tonalidades agradáveis ou desagradáveis. Tendo como apoio a teoria de Henri
Wallon, três momentos marcantes e sucessivos, na evolução da afetividade: emoção, sentimento e paixão. Os
três resultam de fatores orgânicos e sociais e correspondem a configurações diferentes e resultantes de sua
integração: nas emoções, o predomínio da ativação fisiológica; no sentimento, da ativação representacional;
na paixão, ativação do autocontrole (ALMEIDA & MAHONEY, 2007, p.17).
96
inseridos no contexto sociocultural do mesmo; “há que se ter também memória, pensamento,
imaginação, planejamento, conhecimento, linguagem, conceitos, significados, sentidos,
percepção, atenção” (OLIVEIRA e REGO, in ARANTES, 2003, p.32). Portanto, são
componentes das funções psicológicas superiores (fenômenos internos) que se aliam às
situações vivenciadas no meio cultural (fenômenos externos) e que são responsáveis pela
constituição biopsicossocial do sujeito (características da abordagem vygotskyana uma das
trilhas seguidas para esta pesquisa e explicitada anteriormente).
Assim, nesta tarefa, importante é relacionar estes sentimentos opostos, mas que convivem
dentro do sujeito e que afloram de maneira muito significativa nas questões da aprendizagem,
pois se não forem bem equilibrados trazem conseqüências negativas tanto para aquele que
ensina, como para aquele que aprende.
Ao se trabalhar com a pessoa do professor, seu ser total, busca-se desvelar toda sua
competência criadora que, através de técnicas expressivas mobilizadas nas oficinas,
convocam para a “participação do Ser inteiro nas vivências e que tornam a elaboração
simbólica na Psicologia e na Pedagogia uma atividade existencial global” (BYINGTON,
1996, p.47). É neste sentido que se percebe o valor significativo do trabalho de
(auto)formação do professor apoiado em Oficinas de Sensibilização, tendo ainda como
suporte o estudo do Mito como elemento mobilizador.
Feitas essas breves considerações sobre a importância da segunda tarefa e de seus reflexos nas
questões da Pedagogia, voltemos à nossa história e continuemos a explorá-la quanto à sua
riqueza simbólica.
Nesta tarefa, quem ajuda Psiquê é o caniço verde, planta aquática associada às águas
profundas e que traz a qualidade da flexibilidade, aconselhando-a a ter paciência e aguardar o
momento oportuno para poder tirar a das ovelhas que estão muito agressivos. Eles
representam o lado tirânico do masculino que dificulta a confrontação com o feminino e exige
a castração simbólica, significando a perda da força, da energia que o encontro pode gerar.
Somente com o conselho do caniço é que a jovem passa a confiar mais em si, conseguindo
resistir a essa tendência.
97
Quantas vezes o professor não teve que se deparar com essas forças destruidoras que
vieram ou de uma instituição eminentemente patriarcal que castrava e podava todos que
contra ela se insurgissem ou com uma classe formada por alunos que apresentavam uma
postura extremamente agressiva e ele se viu obrigado a fazer um exercício de flexibilidade,
buscando não ceder a essa força, mas se impor com outra qualidade na relação?! Quantas
ovelhas soltas não se encontram no cotidiano da escola... e para poder domá-las precisa-se
fazer uso da energia e astúcia do caniço, sabendo esperar com sabedoria a hora do
enfrentamento!
Outro elemento simbólico dessa tarefa é o fogo, que não traz necessariamente a idéia da
morte, mas da transformação, da imaginação abrindo espaço para a criatividade,
imprescindível quando se quer adotar uma postura que fuja do óbvio, do comum. O
concentrar-se nas chamas do fogo nos conduz ao mistério, ao fantástico, ao mundo das
possibilidades abrindo canais para o pensamento intuitivo. É um contato cuidadoso e paciente
que queima e transforma, sem precisar destruir!
Nesta tarefa, a proposta para a atividade artística teve como objetivo trabalhar com o
significado simbólico dessa transformação fogo da vela queimando o giz de cera derretido,
em que o exercício da transformação e criação ficava registrado no CD.
Durante a realização da segunda tarefa, pôde-se observar a concentração das professoras ao
realizar a tarefa, envolvidas cada uma em sua criação, deixando a sala de aula tomada por um
silêncio que dizia:
“Estamos criando! Estamos entrando em contato com essa energia que, ao mesmo
tempo em que intimida nos encanta e leva à transformação!”.
Entretanto, ao término da atividade e, de maneira diferente da primeira tarefa, não houve
interesse imediato pela partilha... a vivência acabou abrindo um momento em que a
introspecção, o estar voltado para si próprias, movimento alimentado pela energia do fogo
não trouxeram um compartilhar as sensações de maneira tão ampla quanto a tarefa anterior. A
profundidade da vivência tocou o íntimo de cada professora e ali ficou, como que sendo
cuidada para aflorar em outro momento... com toda a força da reflexão/transformação.
Os depoimentos que trouxeram a categoria subjetividade foram:
O masculino e o feminino devem estar junto
suave... (Gabriela)
Gostei muito de fazer a tarefa... o movimento do giz de cera me deixou tranqüila... me
fez pensar por que o forte é o masculino? E o suave o feminino? Às vezes o homem é
o laranja... em um único di
reflito muito a minha prática... por que não deu certo determinada atividade?! Teria
um outro jeito de fazer? Para mim é uma reflexão... não uma cobrança! (Eliane)
Também as categorias
afetividade e ansiedade se fizeram presentes durante a vivência:
A espera é difícil... ficamos muito entre a razão e a emoção. Sou ansiosa... o aluno tem
que dar um resultado e não ! Temos que chegar perto do nosso aluno via
portanto, não aos extremos! (Katia)
O masculino e o feminino devem estar junto
s... sem força, não conseguiremos ser
Gostei muito de fazer a tarefa... o movimento do giz de cera me deixou tranqüila... me
fez pensar por que o forte é o masculino? E o suave o feminino? Às vezes o homem é
o laranja... em um único di
a podemos passar por todas as cores!!! Trabalhar a espera...
reflito muito a minha prática... por que não deu certo determinada atividade?! Teria
um outro jeito de fazer? Para mim é uma reflexão... não uma cobrança! (Eliane)
Foto 8 – Segunda tarefa concluída.
afetividade e ansiedade se fizeram presentes durante a vivência:
A espera é difícil... ficamos muito entre a razão e a emoção. Sou ansiosa... o aluno tem
que dar um resultado e não ! Temos que chegar perto do nosso aluno via
portanto, não aos extremos! (Katia)
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s... sem força, não conseguiremos ser
Gostei muito de fazer a tarefa... o movimento do giz de cera me deixou tranqüila... me
fez pensar por que o forte é o masculino? E o suave o feminino? Às vezes o homem é
a podemos passar por todas as cores!!! Trabalhar a espera...
reflito muito a minha prática... por que não deu certo determinada atividade?! Teria
um outro jeito de fazer? Para mim é uma reflexão... não uma cobrança! (Eliane)
afetividade e ansiedade se fizeram presentes durante a vivência:
A espera é difícil... ficamos muito entre a razão e a emoção. Sou ansiosa... o aluno tem
que dar um resultado e não ! Temos que chegar perto do nosso aluno via
afeto...
99
Estou com o terceiro ano e algumas coisas me preocupam... aluno que trava. Por
exemplo, prova de matemática, e eu achei que eles tinham entendido tudo... fiquei
preocupada, me coloquei no lugar deles e tive que voltar atrás... retomei tudo
novamente... fiquei me sentindo melhor! (Eliane)
Para mim foi muito difícil essa tarefa... não deu certo e eu fiquei super aflita, fiz um
trabalho que não teve muito significado para mim naquele momento porque eu fiquei
super ansiosa e não consegui me desenvolver muito bem... associando essa tarefa com
minha vida profissional, pensar no meu dia-a-dia eu costumo me preparar, mas eu
penso nas coisas diversas que podem acontecer, né? Como agora que eu não consegui
fazer como queria... a ansiedade, trabalhar essa coisa da ansiedade que eu fico quando
tem alguma coisa nova para mim é bem complicado... eu acho que essa tarefa me fez
refletir bastante sobre isso... sobre minha ansiedade. Também é difícil eu trabalhar a
questão da espera... esperar não é fácil... é difícil! (Mônica)
Para mim essa tarefa da espera é muito difícil... algo me aflige! Como compreender?
Questão de conteúdo, procedimental, não se pode esperar tanto! (Paula)
Tendo novamente como suporte o continuum das atividades expressivas, observou-se com
essa tarefa que o nível sensório-motor foi o desencadeador para um foco maior no perceptual-
afetivo. O estilo perceptivo representado pela forma, para algumas professoras, acabou
contribuindo para a reflexão de configurações simbólicas que fugiram ao controle, não saindo
da maneira como efetivamente elas queriam que ficasse. Ao se exercitar a “distância
reflexiva”
21
o fator afetivo foi direcionado pelo envolvimento no fazer a atividade e se
manifestou na observação/percepção dos movimentos implícitos para a realização da
proposta.
Constatou-se com essa tarefa que, embora os depoimentos tivessem vindo em menor
quantidade, a atividade em si foi mobilizadora para questionamentos apoiados no meu diário
de bordo que marcaram como é difícil se lidar, no cotidiano da prática escolar, com os temas
suscitados pela história. Como é difícil lidar com as questões da agressividade, do equilíbrio
21
Distância reflexiva: no trabalho baseado no continuum das terapias expressivas, é a distância cognitiva entre a
experiência artística e a reflexão do sujeito sobre tal experiência. A distância reflexiva vai propiciar orientação
cognitiva às experiências motoras e afetivas.
100
entre razão e emoção, amor e agressão entre demandas vindas da instituição (escola e família)
e da realidade concreta da sala de aula!
Quando se efetiva uma relação de convivência baseada no amor, há um respeito e legitimação
pelo outro/parceiro que convive no mesmo espaço, mas quando surgem momentos de
agressividade, essa convivência é rompida.
O amor é a emoção central na história evolutiva humana desde o início, e toda ela se
como uma história em que a conservação de um modo de vida no qual o amor, a
aceitação do outro como legítimo outro na convivência, são uma condição
necessária para o desenvolvimento físico, comportamental, psíquico, social e
espiritual normal da criança, assim como para a conservação da saúde física,
comportamental, psíquica, social e espiritual do adulto (MATURANA, 2005, p. 25)
.
Finalizando neste momento a análise da segunda tarefa que Psiquê teve que realizar para
resgatar Eros, torna-se pertinente terminar com uma reflexão sobre a função da consciência
trabalhada intuição. Dentro da linha da Psicologia Analítica, a esta função associa-se o uso
do imaginário, na busca do que transcende o aqui e agora, possibilitando lidar com novas
possibilidades de sentir, criar e ser no mundo. Nada como a simbologia do fogo para
mobilizar esse poder de transformação quando, ao mesmo tempo em que pede cuidado, exige
o exercício da espera cuidadosa e conscienciosa impulsionada para a transformação!
Movimentos contraditórios que exigem certa dose de atenção e flexibilidade...
E... pensando-se nos elementos simbólicos apresentados nesta tarefa, insere-se, um momento
de poesia que tão bem traz o significado do caniço verde, representado pelo Salgueiro:
A árvore não sabe se esquivar,
mas se inclinar.
Tornou-se, assim,
mais numerosa que o homem.
O homem é esquivo, incerto.
O medo, mais que a coragem, o faz correr.
A árvore não sabe fugir... ela é obrigada a enfrentar
todos os ventos.
Ao enfrentá-los, torna-se ainda mais enraizada e se
vê obrigada a crescer, então, não é arrancada.
Ela, no entanto, se inclina, não afronta as intempéries
como se fosse um muro.
Maleável, sabe se adaptar,
Assim não é destroçada.
O homem, se quiser viver inúmeros e intensos anos, deve
desenvolver em si esta estabilidade tenaz
101
(desenvolver seu centro) e essa docilidade face ao
real, saber inclinar-se diante dele (desenvolver sua
inteligência).
Se alguma dessas virtudes lhe faltar, o medo o invadirá,
a vaidade o destroçará.
Jean-Yves Leloup
102
TERCEIRA TAREFA
E Afrodite ordenou a terceira tarefa, ainda mais perigosa que as outras
duas!
A sogra entregou a Psiquê um vaso de cristal e mandou que ela subisse
num rochedo totalmente íngreme. Ela deveria encher esse vaso numa
fonte, guardada, dos dois lados, por perigosos dragões, que ficavam
bem no pico do rochedo.
Quando a princesa aproximou-se do local, ficou sem ação. O rochedo
era escorregadio e, mesmo que conseguisse nele subir, os dragões a
matariam. Definitivamente, tarefa impraticável! Nem chorar Psiquê
conseguia, estava sem forças.
Entretanto...
Há algum tempo, Eros havia ajudado a águia de Zeus. Ela lhe devia um
favor.
Quando viu que o amor de Eros estava em apuros, resolveu ajudá-la.
Pegou o vaso de suas os. Abrindo suas imensas asas, passou
rapidamente por entre os dentes ferozes dos dragões, equilibrando-se de
maneira ágil. Encheu o vaso de água e o entregou a Psiquê. A esposa
não podia acreditar no que estava acontecendo!
Voltou feliz para o palácio e entregou a água à malvada sogra. Desta
vez, Afrodite pensou: “Isto não pode ser coisa de Eros. É pura magia e
bruxaria. Mas ela não escapará da quarta tarefa.”
103
TERCEIRA TAREFA
Exercício: conter a essência.
Elemento da natureza: ar.
Elemento simbólico: águia
Função da consciência: pensamento.
Preparando um novo cenário...
Material: tinta a óleo, bacia com água, palitos de sorvete e folhas sulfite.
Sensibilização: trabalho de consciência corporal apoiado em músicas com sons fortes e
fracos; tules das mais variadas cores. Movimentos individuais.
Proposta: as professoras (em duplas) deveriam sentar-se no chão e com a bacia com água
como suporte, brincar de pingar tinta na água e ficar explorando visualmente as imagens que
iriam se formando. Em um primeiro momento, foi um exercício puramente sensorial, onde a
dupla buscava capturar imagens que lhes eram significativas, sem nenhuma outra intenção.
Quanto mais imagens eram capturadas, mais rica a experiência.
Depois de um tempo em que as professoras se entregaram à proposta, sugeri algumas questões
que serviriam de fundo para a reflexão da atividade. Algumas questões seguem abaixo:
Em que momentos de sua vida pessoal se percebe tendo o olhar da águia?
E na vida profissional, quando exercita esse olhar? É fácil? Quais seriam as situações
impeditivas e, ao contrário, as facilitadoras?
viveu momentos em que, embora tendo planejado suas ações, não conseguiu chegar
até seus objetivos? É como se deixar levar, fluir pelas situações, perdendo-se do seu
foco... Como se sentiu com essas experiências e, hoje, o que faria para alterar esses
fatos?
Para o encontro seguinte, (aguardou-se a secagem das folhas) a atividade continuou com a
seguinte proposta: com as imagens que foram criadas e, nesse momento, em um trabalho
individual, cada professora deveria escolher uma das folhas que tivesse a representação mais
104
significativa para ela e, a partir daí, fazer uma dobradura, buscando exercitar o olhar de águia
para perceber, dentro daquela mistura indiferenciada de cores, linhas e movimentos o que
daria para confeccionar de maneira figurativa. É a função da consciência pensamento que
surge para buscar um sentido naquilo que está confuso e que precisa ser organizado.
Depois de Psiquê ter aprendido a discriminar suas necessidades e cooperar com as
necessidades alheias, agora o desafio consiste em adquirir a “visão” (representada pela águia)
para conseguir alcançar o que deseja. A jarra cheia e o elemento ar também dizem respeito à
discriminação, entretanto surgem mais relacionados ao atributo da concentração nos detalhes,
à possibilidade de aprender a analisar a situação em perspectiva e de maneira objetiva
(ANGWIN, 1994).
Trazer a água da fonte é uma variante da água da vida, quer dizer, daquilo que se necessita
efetivamente para uma realização maior, não importando a qualidade da água, mas sim, a
habilidade para se obter aquilo que é fundamental para viver.
Captar a água dessa fonte também simboliza, na análise de Neumann (1995), capturar o fluxo
da energia vital, representada pelo movimento eterno e pela contínua mudança. Justamente
por não poder ser contido, torna-se uma qualidade essencial desse fluxo e Psiquê, apresando a
água na jarra de cristal, exercita uma das tarefas do feminino a contenção daquilo que é
essencial, dando-lhe unidade e forma, sem ser destruída por essa energia.
Surge para auxiliá-la, nesta tarefa, a águia que representa o símbolo espiritual que pertence a
Zeus e ao âmbito do dar, a ela sendo dada as honras da rainha das aves, encarnação, substituto
ou mensageiro da mais alta divindade uraniana e do fogo celeste e sendo a ela atribuída,
também, muitos outros elementos simbólicos relacionados ao local onde ela surge
(CHEVALIER e GHEERBRANT, 2002).
Para esta história, a águia surge como a responsável pela visão detalhada do fato, aliada à
razão que vem do masculino, do logos analisando a situação com o olhar mais atento e focado
na essência para resolvê-la.
Na primeira tarefa
, colaboraram forças instintivas da natureza as formigas que ajudaram
separando e ordenando os grãos; na segunda tarefa Psiquê orientada pelo caniço soube
105
esperar o momento do entardecer para recolher os flocos de lã das ovelhas agressivas, sem ser
atacada por elas; nessa terceira tarefa – com o auxílio da águia – Psiquê consegue segurar a
jarra de cristal, podendo simbolizar que está mais amadurecida através desses desafios, uma
vez que aliou à força do princípio masculino (o olhar que sabe e compreende o porquê de
resgatar o principal para a realização da tarefa), a sabedoria do feminino, no sentido de conter
e dar forma ao fluxo vital representado pela água. Embora ela tenha sido ajudada por animais
(que representaram a força instintiva que no ser humano), ela foi ativa no sentido de resgatar,
de dentro de si, coragem suficiente para se colocar em movimento e poder realizar, através de
um ato criativo, as tarefas que lhe foram determinadas por Afrodite. Portanto, somente a ela
cabem os louros das conquistas, uma vez que não se deixou abater pelos desafios a ela
impostos.
Neumann (1995, p.86), ao se aprofundar na análise desse Mito, apresenta como um dos dados
mais surpreendentes no desenvolvimento de Psiquê o fato de que “é um desenvolvimento
para a consciência que também sempre se completa com a consciência.”
Como relacionar essa tarefa com a atividade docente? O quê no trabalho do professor poderia
se caracterizar por “conter a essência”? Seria uma atuação em sala de aula com uma didática
que motivasse os alunos e os instigassem para irem à busca de novos conhecimentos? Seria
estimular seus alunos na assunção de suas competências e, para tal, o professor deveria,
também, mostrar sua competência em relação ao domínio do conteúdo, à maneira como se
vincula com seus aprendizes, à maneira como instiga o pensamento reflexivo quando elabora
as avaliações? Seria refletir sobre a prática e torná-la uma ferramenta da consciência política e
pedagógica do educador? Enfim, teríamos várias possibilidades/alternativas para se pensar o
quê no ofício de ser professor seria “conter a essência”!
Algumas reflexões de professoras após a vivência:
Bom... como eu tinha falado, a tarefa foi bem mais fácil... foi muito gostosa... a
Eliane era a minha dupla... a gente se envolveu muito... não queríamos parar... e eu
acho que essa coisa do focar o meu olhar em algo, focar no meu objetivo deve ser uma
atitude constante do professor... (Paula)
Eu gostei muito dessa experiência... acho que o meu grupo todo... rs... a gente curtiu
mu
ito a atividade... foi muito gostoso... antes trabalhamos com os tules e, para mim,
eu consegui focar mais com o tecido do que com a água porque como estávamos em
grupo, então eu fique mais ali na brincadeira... (Mônica)
Eu gostei bastante... não queria p
nós pingávamos a tinta para ver se formava alguma coisa, mas quando a gente
colocava no papel não era o que a gente esperava que saía! (Erica)
Efetivamente, a atividade art
fluidez, de soltura e expansão, abrindo espaços para o lúdico, para a brincadeira e foi
exatamente o que aconteceu nesse momento da oficina.
muitos risos e aleg
ria, gerando um ambiente de descontração... o mesmo ambiente que o
professor, em sala de aula, em alguns momentos deve oferecer.
Significativos os registros das experiências das professoras... surge mais um:
Eu gostei muito dessa experiência... acho que o meu grupo todo... rs... a gente curtiu
ito a atividade... foi muito gostoso... antes trabalhamos com os tules e, para mim,
eu consegui focar mais com o tecido do que com a água porque como estávamos em
grupo, então eu fique mais ali na brincadeira... (Mônica)
Eu gostei bastante... não queria p
arar mais... será que tem mais folhas?... e no começo
nós pingávamos a tinta para ver se formava alguma coisa, mas quando a gente
colocava no papel não era o que a gente esperava que saía! (Erica)
Foto 9 – Terceira tarefa.
Efetivamente, a atividade art
ística quando permite trabalhar com a água, gera uma energia de
fluidez, de soltura e expansão, abrindo espaços para o lúdico, para a brincadeira e foi
exatamente o que aconteceu nesse momento da oficina.
Meu olhar
registrou momentos de
ria, gerando um ambiente de descontração... o mesmo ambiente que o
professor, em sala de aula, em alguns momentos deve oferecer.
Significativos os registros das experiências das professoras... surge mais um:
106
Eu gostei muito dessa experiência... acho que o meu grupo todo... rs... a gente curtiu
ito a atividade... foi muito gostoso... antes trabalhamos com os tules e, para mim,
eu consegui focar mais com o tecido do que com a água porque como estávamos em
arar mais... será que tem mais folhas?... e no começo
nós pingávamos a tinta para ver se formava alguma coisa, mas quando a gente
colocava no papel não era o que a gente esperava que saía! (Erica)
ística quando permite trabalhar com a água, gera uma energia de
fluidez, de soltura e expansão, abrindo espaços para o lúdico, para a brincadeira e foi
registrou momentos de
ria, gerando um ambiente de descontração... o mesmo ambiente que o
Significativos os registros das experiências das professoras... surge mais um:
A atividade da água foi uma delícia... rs...
precisava de cada vez mais folha... mais folha... e a folha do papel pardo não cabia
mais... e a gente queria mais folha... incontrolável... acabou?!... não! só mais um
pouquinho...
mais uma folha... só a
Vivenciar essas experiências em Oficinas de Sensibilização transformam
muito ricos, pois é possível se trabalhar e refletir sobre a importância do lúdico, da brincadeira
em situações de ensino e
características do ensino em uma abordagem humanista, confirma que “o processo de ensino
irá depender do caráter individual do professor, como ele se interrelaciona com o caráter
individual do aluno [..
.] relacionamento que sempre é pessoal e único
Madalena Freire
(2008, p.30)
Educador que brinca e ri enquanto ensina favorece o lidar com a tensão que todo
processo de aprendizagem contém.
ansiedade e o mal
Para rir e brincar construindo conhecimento é necessário uma boa dose de
humildade e abertura para as divergências, as diferenças. Também disponibilidade
para conviver com o estado de
A atividade da água foi uma delícia... rs...
a gente se divertiu horrores... rs... e a gente
precisava de cada vez mais folha... mais folha... e a folha do papel pardo não cabia
mais... e a gente queria mais folha... incontrolável... acabou?!... não! só mais um
mais uma folha... só a
última! (Kátia)
Foto 10 – Terceira tarefa.
Vivenciar essas experiências em Oficinas de Sensibilização transformam
muito ricos, pois é possível se trabalhar e refletir sobre a importância do lúdico, da brincadeira
em situações de ensino e
aprendizagem. Mizukami
(1986, p.52)
características do ensino em uma abordagem humanista, confirma que “o processo de ensino
irá depender do caráter individual do professor, como ele se interrelaciona com o caráter
.] relacionamento que sempre é pessoal e único
.”
(2008, p.30)
, sobre o mesmo tema, também traz sua contribuição ao afirmar:
Educador que brinca e ri enquanto ensina favorece o lidar com a tensão que todo
processo de aprendizagem contém.
O riso dosa o confronto com esta, amenizando a
ansiedade e o mal
-estar.
Para rir e brincar construindo conhecimento é necessário uma boa dose de
humildade e abertura para as divergências, as diferenças. Também disponibilidade
para conviver com o estado de
desarmonia que o conflito provoca
107
a gente se divertiu horrores... rs... e a gente
precisava de cada vez mais folha... mais folha... e a folha do papel pardo não cabia
mais... e a gente queria mais folha... incontrolável... acabou?!... não! só mais um
Vivenciar essas experiências em Oficinas de Sensibilização transformam
-se em momentos
muito ricos, pois é possível se trabalhar e refletir sobre a importância do lúdico, da brincadeira
(1986, p.52)
, quando traça as
características do ensino em uma abordagem humanista, confirma que “o processo de ensino
irá depender do caráter individual do professor, como ele se interrelaciona com o caráter
, sobre o mesmo tema, também traz sua contribuição ao afirmar:
Educador que brinca e ri enquanto ensina favorece o lidar com a tensão que todo
O riso dosa o confronto com esta, amenizando a
Para rir e brincar construindo conhecimento é necessário uma boa dose de
humildade e abertura para as divergências, as diferenças. Também disponibilidade
desarmonia que o conflito provoca
.
108
Neste momento e até por conta do exercício desse terceiro desafio imposto à Psiquê,
ampliando-se o aporte de Madalena Freire (2008, p.197), quando analisa que “no ato de
ensinar, a matéria-prima do educador não é o conhecimento, mas a pessoa humana que
conhece, que aprende, que cresce, que transforma. E essa pessoa humana não é razão, ela é
amorosidade.”
Ainda conforme as palavras dessa educadora (FREIRE(a), 2008, pp.31,32), junto com a razão
e a amorosidade, é importante acrescentar-se a reflexão crítica e criativa, uma vez que ela
possibilita:
O rompimento da anestesia do cotidiano, rotineiro, acelerado, compulsivo,
passivo e cego;
O distanciamento necessário para tomar consciência do que se sabe (e pensa
que não sabia) e do que ainda não se conhece;
Tecer um diagnóstico das hipóteses adequadas e inadequadas na prática
pedagógica;
Instrumentalizar o acompanhamento do processo de formação do educador
(apropriação de seu pensamento, sua autoria) e alicerçar o processo de
transformação, mudanças;
Resgatar sua história de educando para poder pensar melhor sua prática (atual)
de educador e que teoria vem alicerçando essa prática.
O olhar do professor é um dos seus instrumentais mais importantes... ele deve exercitar o
olhar da águia, capaz de ver efetivamente o outro e a si próprio como parceiros durante a
jornada... significa estar atento ao desejo do outro, buscando a melodia que os guiará na
realização pessoal, despertando competências, alimentando sonhos. Também através do olhar
se é capaz de comunicar ao outro dúvidas, receios, acertos e descobertas!
Fazendo mais analogias com o elemento simbólico dessa terceira tarefa a
águia que vem
em ajuda à Psiquê em relação aos depoimentos das professoras que participaram da
pesquisa e buscando o cruzamento com as categorias que vão aflorando a partir desses
registros, acrescentam-se mais alguns:
Eu acho que esse olhar (relacionando com nosso trabalho) que nós precisamos ter, nós
estamos em uma profissão muito importante e decisiva na vida de muitas pessoas e eu
acho que esse olhar tem que ficar cada vez mais aguçado, afiado é um olhar de águia
mesmo... que nem sempre é possível, pois às vezes deixamos passar algumas coisas...
somos seres humanos que outras mil coisa
difícil... até ontem aconteceu um episódio na minha classe que eu fiquei assim...
(expressão de espanto) nem dormi direito... ai... (voz embargada) acho que vou até
começar a chorar... mas na verdade não foi nem por
olhar foi muito!!! Foi demais até me aprofundei bastante e me questionei... será que
estou indo muito
fundo... o que é isso???!!!...
Foto 11
Normalmente no dia
eu gosto muito de olhar quando a pessoa está falando porque a maior expressão que a
gente tem está nos olhos... ao meu ver, né... agora o focar, realmente é ago mais difícil
que você tem que estar determinado
[...] então quando você quer observar um aluno, você está ali... focando todas as
atitudes que ele vai ter, brincando... fazendo uma atividade... distraído, mas você
realmente vem com essa tarefa praticamen
você foca do nada!...
Em todos esses depoimentos, perceb
foram aflorado
s trazendo uma reflexão sobre o fazer pedagógico que se mesclou com o ser do
somos seres humanos que outras mil coisa
s acabam acontecendo, né... mas é muito
difícil... até ontem aconteceu um episódio na minha classe que eu fiquei assim...
(expressão de espanto) nem dormi direito... ai... (voz embargada) acho que vou até
começar a chorar... mas na verdade não foi nem por
conta desse olhar, eu acho que o
olhar foi muito!!! Foi demais até me aprofundei bastante e me questionei... será que
fundo... o que é isso???!!!...
(Eliane)
Foto 11
– Terceira tarefa – focando imagens.
Normalmente no dia
-a-dia eu cost
umo olhar muito e mesmo no momento de ouvir...
eu gosto muito de olhar quando a pessoa está falando porque a maior expressão que a
gente tem está nos olhos... ao meu ver, né... agora o focar, realmente é ago mais difícil
que você tem que estar determinado
naquele momento, pra poder fazer aquela tarefa
[...] então quando você quer observar um aluno, você está ali... focando todas as
atitudes que ele vai ter, brincando... fazendo uma atividade... distraído, mas você
realmente vem com essa tarefa praticamen
te tentando fazer isso, não é
você foca do nada!...
(Sandra)
Em todos esses depoimentos, perceb
o como o foco da
subjetividade e
s trazendo uma reflexão sobre o fazer pedagógico que se mesclou com o ser do
109
s acabam acontecendo, né... mas é muito
difícil... até ontem aconteceu um episódio na minha classe que eu fiquei assim...
(expressão de espanto) nem dormi direito... ai... (voz embargada) acho que vou até
conta desse olhar, eu acho que o
olhar foi muito!!! Foi demais até me aprofundei bastante e me questionei... será que
umo olhar muito e mesmo no momento de ouvir...
eu gosto muito de olhar quando a pessoa está falando porque a maior expressão que a
gente tem está nos olhos... ao meu ver, né... agora o focar, realmente é ago mais difícil
naquele momento, pra poder fazer aquela tarefa
[...] então quando você quer observar um aluno, você está ali... focando todas as
atitudes que ele vai ter, brincando... fazendo uma atividade... distraído, mas você
te tentando fazer isso, não é
algo que
subjetividade e
do autoconhecimento
s trazendo uma reflexão sobre o fazer pedagógico que se mesclou com o ser do
profess
or... materialidade na expressão artística que traz a expressão da subjetividade.
emoção favorecendo um diálogo na busca do ser...
Essa coisa de conter a essência não é fácil mesmo... tínhamos que capturar imagens
que estavam se configurando na mi
pensa que fica de uma forma, põe o papel e ainda consegue ver que ficou do jeito que
você queria... que na hora que você puxa a folha, vai indo e vai mudando... por
mais que você seja delicada no moviment
imprescindível, né... todo momento e é super complicado porque às vezes você se
depara com umas reações que você fica “nossa”!... eu não esperava... e você retoma
esse olhar e tenta ver de um outro jeito, tenta pens
(Mônica)
Foto 12
No momento em que a proposta seria olhar as folhas de todos os elementos do grupo, agora
marmorizadas com a tinta, escolher uma e fazer uma dobradura, a reação d
que unânime! “Nossa... que difícil...
puxa agora ficou complicado...” Mas quantos desafios o professor não tem que enfrentar em
seu cotidiano? Em quantos momentos ele não deve lida
or... materialidade na expressão artística que traz a expressão da subjetividade.
emoção favorecendo um diálogo na busca do ser...
Essa coisa de conter a essência não é fácil mesmo... tínhamos que capturar imagens
que estavam se configurando na mi
stura da tinta com a água... porque você olha...
pensa que fica de uma forma, põe o papel e ainda consegue ver que ficou do jeito que
você queria... que na hora que você puxa a folha, vai indo e vai mudando... por
mais que você seja delicada no moviment
o... muda! E o nosso olhar de águia é
imprescindível, né... todo momento e é super complicado porque às vezes você se
depara com umas reações que você fica “nossa”!... eu não esperava... e você retoma
esse olhar e tenta ver de um outro jeito, tenta pens
ar em alguma outra estratégia...
Foto 12
– Terceira tarefa – exercitando o olhar.
No momento em que a proposta seria olhar as folhas de todos os elementos do grupo, agora
marmorizadas com a tinta, escolher uma e fazer uma dobradura, a reação d
que unânime! “Nossa... que difícil...
não sei se vou conseguir... não sou boa em dobraduras...
puxa agora ficou complicado...” Mas quantos desafios o professor não tem que enfrentar em
seu cotidiano? Em quantos momentos ele não deve lida
r com a transformação, com a
110
or... materialidade na expressão artística que traz a expressão da subjetividade.
Razão e
Essa coisa de conter a essência não é fácil mesmo... tínhamos que capturar imagens
stura da tinta com a água... porque você olha...
pensa que fica de uma forma, põe o papel e ainda consegue ver que ficou do jeito que
você queria... que na hora que você puxa a folha, vai indo e vai mudando... por
o... muda! E o nosso olhar de águia é
imprescindível, né... todo momento e é super complicado porque às vezes você se
depara com umas reações que você fica “nossa”!... eu não esperava... e você retoma
ar em alguma outra estratégia...
No momento em que a proposta seria olhar as folhas de todos os elementos do grupo, agora
marmorizadas com a tinta, escolher uma e fazer uma dobradura, a reação d
o grupo foi quase
não sei se vou conseguir... não sou boa em dobraduras...
puxa agora ficou complicado...” Mas quantos desafios o professor não tem que enfrentar em
r com a transformação, com a
111
criatividade, buscando significados e sentidos para situações que, a princípio, parecem
caóticas?!... Quanto de olhar de águia ele precisa ter para buscar uma parte significativa
dentro de um todo confuso, buscar a essência para sua reconfiguração?! Torna-se um desafio
que uma vez disposto a ser encarado por meio dele chega-se a novas possibilidades de ação...
o que importa é o movimento, a busca, a não paralisação...
Mais alguns depoimentos se seguem:
As imagens que eu e minha parceira capturamos ficaram muito bonitas... eu consegui
olhar no final e falei “puxa, que bacana!” e aí na hora em que você falou que tinha que
fazer uma dobradura... complicou um pouco porque isso é uma técnica que eu não
domino, que eu particularmente não gosto porque não sei fazer... não tenho essa
prática... eu fui tentando fazer e escolhi este por ser delicado, eu acho que mostra uma
delicadeza... eu achei bacana a cor essa forma delicada que ficou... E quando eu
comecei a dobrar eu pensei... eu vou dobrar... dobrar... e fui dobrando e aí no fim ficou
uma coisa abstrata... mas depois eu olhei e ficou parecendo uma pipa... e a pipa na
verdade ela é solta, ela faz movimentos soltos, ela é livre no céu, mas ao mesmo
tempo ela precisa de alguém, de alguma direção, de alguém que dê essa direção, então
eu acho que isso faz parte da minha, da nossa prática de professoras, eu acho que as
crianças... a gente um norte, assim, a gente não centralizando, mas a gente tenta
mostrar a direção correta... nem sempre a direção vai ser a correta porque eles o
seguir os próprios caminhos, mas eu fiz essa relação com o meu trabalho e com a
pipa... porque eu acho que eles precisam ser livres, mas livres para construir o próprio
conhecimento, mas eles precisam ter essa direção certa... quanto à conservar a
essência, ah! eu procurei deixar maiorzinho assim para deixar as cores.... o amarelo...
acho que eu consegui deixar a essência... (Gabriela).
A gente precisa se policiar com o
expectativas nossas e, na realidade, um desenho feito pelo aluno tem muito dele, do
crescimento e amadurecimento dele, então acho que a águia caiu bem para a gente, na
nossa profissão de professora, de focar,
crítico em relação ao aluno porque ele também tem o tempo dele e ele não está no
nosso tempo porque a gente quer que faça do jeito que a gente espera... aiaiai!!!! A
dobradura, quando você falou em dobradura eu
para dobrar?!... Mas aí comecei a dobrar de um jeito, não saía nada... eu olhava para as
colegas... eu não conseguia fazer nada... e olhando novamente eu peguei de novo a
folha e olhando pensei... “nossa! Parece um p
pelas cores... cores claras... daí caiu bem dois olhinhos aqui!... ah! Consegui fazer
alguma coisa... tem um formato de um pássaro. Mas eu me senti um pouco frustrada
com a dobradura porque ela é uma coisa que me atraí
ela estava aqui... eu olhei de novo para ela e eu pensei... vou dobrar aqui... depois
olhando para a dobradura pronta, achei que teve um resultado para mim... peguei essa
folha, as cores me chamaram a atenção... deram um
tranqüilidade [...] e novamente comecei a refletir sobre as cores, o olho do ssaro, o
conter a essência... foi muito bom!
Foto 13 – Terceira Tarefa
A gente precisa se policiar com o
nosso olhar porque muitas vezes é carregado de
expectativas nossas e, na realidade, um desenho feito pelo aluno tem muito dele, do
crescimento e amadurecimento dele, então acho que a águia caiu bem para a gente, na
nossa profissão de professora, de focar,
de ter um olhar detalhado e às vezes não tão
crítico em relação ao aluno porque ele também tem o tempo dele e ele não está no
nosso tempo porque a gente quer que faça do jeito que a gente espera... aiaiai!!!! A
dobradura, quando você falou em dobradura eu
pensei “Jesus”... o que eu vou fazer
para dobrar?!... Mas aí comecei a dobrar de um jeito, não saía nada... eu olhava para as
colegas... eu não conseguia fazer nada... e olhando novamente eu peguei de novo a
folha e olhando pensei... “nossa! Parece um p
ássaro!” para mim parece um pássaro,
pelas cores... cores claras... daí caiu bem dois olhinhos aqui!... ah! Consegui fazer
alguma coisa... tem um formato de um pássaro. Mas eu me senti um pouco frustrada
com a dobradura porque ela é uma coisa que me atraí
a, eu não sei fazer então quando
ela estava aqui... eu olhei de novo para ela e eu pensei... vou dobrar aqui... depois
olhando para a dobradura pronta, achei que teve um resultado para mim... peguei essa
folha, as cores me chamaram a atenção... deram um
a sensação de leveza, calma,
tranqüilidade [...] e novamente comecei a refletir sobre as cores, o olho do ssaro, o
conter a essência... foi muito bom!
(Laís)
112
nosso olhar porque muitas vezes é carregado de
expectativas nossas e, na realidade, um desenho feito pelo aluno tem muito dele, do
crescimento e amadurecimento dele, então acho que a águia caiu bem para a gente, na
de ter um olhar detalhado e às vezes não tão
crítico em relação ao aluno porque ele também tem o tempo dele e ele não está no
nosso tempo porque a gente quer que faça do jeito que a gente espera... aiaiai!!!! A
pensei “Jesus”... o que eu vou fazer
para dobrar?!... Mas aí comecei a dobrar de um jeito, não saía nada... eu olhava para as
colegas... eu não conseguia fazer nada... e olhando novamente eu peguei de novo a
ássaro!” para mim parece um pássaro,
pelas cores... cores claras... daí caiu bem dois olhinhos aqui!... ah! Consegui fazer
alguma coisa... tem um formato de um pássaro. Mas eu me senti um pouco frustrada
a, eu não sei fazer então quando
ela estava aqui... eu olhei de novo para ela e eu pensei... vou dobrar aqui... depois
olhando para a dobradura pronta, achei que teve um resultado para mim... peguei essa
a sensação de leveza, calma,
tranqüilidade [...] e novamente comecei a refletir sobre as cores, o olho do ssaro, o
Foto 14
Por meio dos depoimentos dessas professoras, pude
artísticas, houve uma possibilidade de ampliação da consciência, que favoreceu uma
percepção mais clara de seus movimentos e de suas atitudes quando em sala de aula.
Através desses depoimentos, observei como uma hi
elemento de reflexão aliada às expressões artísticas pode trazer uma riqueza significativa para
se pensar o fazer e o ser na Educação. Não se pode ficar preso ao simples “fazer” do
professor, numa prática linear, sem ab
fazer
é o estudo dos coordenadores cognitivos da ação, é a metacognição contribuindo para
uma intencionalidade na ação pedagógica.
O Professor Doutor Marcos Ferreira Santos, livre
e participante do CICE (Centro de Estudos do Imaginário, da Cultura e da Educação), amplia
nosso estudo sobre essa terceira tarefa e a encerra, quando apresenta as últimas andanças das
Ciências naturais e humanas, da Filosofia e da Educ
marcantes: a rapidez das informações, as explorações espaciais, o controle da genética, as
descobertas das neurociências. E assim complementa seu devaneio poético
Foto 14
– Terceira tarefa – as dobraduras.
Por meio dos depoimentos dessas professoras, pude
perceber como,
por meio
artísticas, houve uma possibilidade de ampliação da consciência, que favoreceu uma
percepção mais clara de seus movimentos e de suas atitudes quando em sala de aula.
Através desses depoimentos, observei como uma hi
stória mítica apropriada, usada como
elemento de reflexão aliada às expressões artísticas pode trazer uma riqueza significativa para
se pensar o fazer e o ser na Educação. Não se pode ficar preso ao simples “fazer” do
professor, numa prática linear, sem ab
rir espaços para pensar como o professor pensa o seu
é o estudo dos coordenadores cognitivos da ação, é a metacognição contribuindo para
uma intencionalidade na ação pedagógica.
O Professor Doutor Marcos Ferreira Santos, livre
-
docente na Faculdade
e participante do CICE (Centro de Estudos do Imaginário, da Cultura e da Educação), amplia
nosso estudo sobre essa terceira tarefa e a encerra, quando apresenta as últimas andanças das
Ciências naturais e humanas, da Filosofia e da Educ
ação trazendo como características
marcantes: a rapidez das informações, as explorações espaciais, o controle da genética, as
descobertas das neurociências. E assim complementa seu devaneio poético
113
por meio
de atividades
artísticas, houve uma possibilidade de ampliação da consciência, que favoreceu uma
percepção mais clara de seus movimentos e de suas atitudes quando em sala de aula.
stória mítica apropriada, usada como
elemento de reflexão aliada às expressões artísticas pode trazer uma riqueza significativa para
se pensar o fazer e o ser na Educação. Não se pode ficar preso ao simples “fazer” do
rir espaços para pensar como o professor pensa o seu
é o estudo dos coordenadores cognitivos da ação, é a metacognição contribuindo para
docente na Faculdade
de Educação da USP
e participante do CICE (Centro de Estudos do Imaginário, da Cultura e da Educação), amplia
nosso estudo sobre essa terceira tarefa e a encerra, quando apresenta as últimas andanças das
ação trazendo como características
marcantes: a rapidez das informações, as explorações espaciais, o controle da genética, as
descobertas das neurociências. E assim complementa seu devaneio poético
-educador:
114
As mesmas flores que soterramos com nossas granadas e fuzis, nos deram lírios de
luz franciscana, de perfume e frescor incomparáveis, nas obras da Cultura que
herdamos e que legamos para as futuras gerações. Acreditamos que educar o olho
para enxergar as flores e o céu, assim como educar a mão para cultivá-los (céu,
flores e amigos) seja a divisa mais importante no mundo da Cultura, no seu sentido
mais agrário: rasgar o solo árido, revolver a terra, plantar a semente, irrigar com um
pouco de poesia e partir para outros campos, pois para o educador que aspira a ser
uma sombra do verdadeiro mestre, não se espera a pequena planta crescer.
Terminado o plantio, segue para outros campos, pois o trabalho é imenso e sementes
existentes várias
22
.
22
Texto oferecido pela Professora Dra. Patrícia Pinna em grupo de estudos “Novas Mentalidades e Atitudes:
Diálogos com a Velha Educação de Sensibilidade autor Prof. Dr. Marcos Ferreira Santos (CICE/FEUSP).
Acesso também pelo site: www.marculus.net
115
QUARTA TAREFA
Psiquê voltou feliz para o palácio e entregou a água à malvada sogra. Desta
vez, Afrodite pensou: “Isto não pode ser coisa de Eros. É pura magia e
bruxaria. Mas ela não escapará da quarta tarefa.”
E chamou a nora:
_ Pegue esta caixinha e desça ao fundo do Hades. Quando chegar,
você deverá apresentar-se à deusa Perséfone. Solicite-lhe, em nome da mãe de
Eros, um pouquinho de beleza imortal, pois minha beleza foi quase
totalmente apagada cuidando de meu filho doente. Você terá só este dia para
cumprir a última missão.
E Afrodite foi descansar, sinistramente feliz. Sabia que a missão jamais
poderia ser realizada.
Psiquê também se deu conta de que seu fim estava próximo. Não havia
mais dúvida, estava sendo enviada para o Hades, a terra dos mortos. De
não voltaria nunca mais.
Sem nenhuma esperança, subiu à torre mais alta que encontrou.
Pularia de lá. Assim chegaria mais rápido ao fundo do Hades!
Porém...
A torre lhe falou:
_ Fiel esposa de Eros, não recue diante desta última tarefa. Conseguirei
passar-lhe ânimo e vo sairá vencedora. Sei o caminho mais rápido para
chegar ao Hades. Entre pelo cabo Tênaro. Você deverá levar na boca dois
óbolos e, em cada uma das mãos, bolo de cevada e mel. Com os óbolos você
pagará a passagem de ida e volta ao barqueiro Caronte. E os doces servirão
para acalmar o raivoso cão Cérbero, na entrada e na saída do Hades.
Durante todo o percurso, você deverá resistir a três tentações. A primeira
será com o condutor de um burriqueiro coxo, que estará conduzindo um asno
também coxo, carregado de lenha. Esse condutor pedirá a você para que
pegue algumas lascas caídas no chão. Não lhe ouvidos. Prossiga sua
viagem. A segunda tentação será na barca de Caronte. Quando você estiver
116
atravessando os rios infernais, um velho se erguerá do fundo das águas. Ele
lhe implorará para que o puxe para dentro da embarcação. Mais uma vez,
não dê ouvidos. Prossiga. Já do outro lado do rio, surgirá a terceira tentação.
Você estará se encaminhando para o Hades, palácio de Plutão e Perséfone.
Umas velhas tecedeiras vão lhe pedir ajuda. Não as atenda. Prossiga. Dentro
do palácio você será muito bem recebida por Perséfone. Vão lhe convidar
para participar de um grandioso jantar. Não aceite. Sente-se no chão e
apenas receba um pedaço de pão preto. Nesse momento, você deverá explicar
o motivo de sua viagem até o Hades. Receba a encomenda de Afrodite e faça
o caminho de volta, imediatamente. Atenção: de forma alguma abra a
caixinha que contém a beleza mortal! Agora parta, e boa sorte!
Psiquê ouviu tudo com muita atenção. Seguiu fielmente as instruições e
conseguiu passar por todas as provas.
No entanto, a curiosidade e a vaidade apoderaram-se dela quando
estava em plena luz!
A jovem princesa pensou: “Como sou tola! Trago comigo a beleza divina
e não pego nem um pouquinho para mim! Afinal, meu maior desejo é
reconquistar o verdadeiro amor de minha vida”.
Ela não resistiu: abriu a caixinha!
Para grande surpresa, a caixinha não continha a beleza imortal, e sim
o sono infernal, que se espalhou, apoderando-se da curiosa Psiquê. No mesmo
segundo, ela caiu imóvel, feito morta, no meio do caminho.
117
QUARTA TAREFA:
Exercício: saber lidar com a transformação.
Elemento da natureza: água.
Elemento simbólico: torre.
Função da consciência: sentimento.
ovo cenário para a oficina...
Material: caixa em madeira; espelho; pincel e tintas coloridas.
Sensibilização: música suave, prestando atenção na respiração, ampliar a atenção trabalhando
o sensorial por meio de tecidos. Depois de um tempo, formaram-se duplas onde uma iria
modelar a outra com o auxílio dos tecidos. Elas deveriam estar atentas às sensações,
pensamentos, sentimentos que poderiam aflorar durante a vivência.
Terminada a parte da vivência corporal, novamente sentou-se no chão formando um círculo
e... chegou-se ao final da história! Havia um clima de curiosidade, encantamento e mil
possibilidades de como seria o final para essa história entre Eros e Psiquê... novamente um
clima de suspense foi criado e... chegou-se ao final do conto... Suspiros, sentimentos de
contentamento... de desapontamento se fizeram ouvir... a partilha veio de maneira intensa e
todas as professoras querendo opinar sobre o final da história! Momento muito rico e
descontraído.
Em seguida... tiraram-se os véus que cobriam o que seria a última tarefa daquele grupo... o
que será que elas iriam fazer?
Foto 15 –
Quarta tarefa
O pedido foi para que cada uma escolhesse uma caixa e, sem abri
lugares. Novamente
uma rápida retomada dessa tarefa e quando ficaram l
abrirem a
caixa... uma surpresa... colada na tampa, na parte interna, havia um espelho... pois
ao destamparem em busca da beleza imortal... ficou a mensagem de que essa beleza está
dentro de cada uma!!! Ao se ver no espelho, dentro de sua si
possibilidades para ver o outro...
Um silêncio profundo percorreu a sala... expressões de espanto, encantamento e surpresa se
fizeram presentes... e a proposta seria para cada uma
Psiquê para r
ealizar a quarta tarefa, trariam as linhas, formas e cores que desejassem para
imprimir, na caixa,
como marca dos momentos que vivenciaram até chegar ao final da
história. Foi um fazer criativo que buscou mobilizar momentos da história do
signi
ficativos para cada professora.
Este foi um dos momentos mais desafiadores, pois tendo por base o
nível criativo ao buscar o poder de síntese e de atualização de significados que foram
evocados durante a vivência, contribui para uma
seguida de um caráter avaliativo de prazer e satisfação. É uma oportunidade de abrir um canal
Quarta tarefa
o que será que há dentro das caixas?!
O pedido foi para que cada uma escolhesse uma caixa e, sem abri
-
la, deveriam voltar aos seus
uma rápida retomada dessa tarefa e quando ficaram l
caixa... uma surpresa... colada na tampa, na parte interna, havia um espelho... pois
ao destamparem em busca da beleza imortal... ficou a mensagem de que essa beleza está
dentro de cada uma!!! Ao se ver no espelho, dentro de sua si
ngularidade, abrem
possibilidades para ver o outro...
Um silêncio profundo percorreu a sala... expressões de espanto, encantamento e surpresa se
fizeram presentes... e a proposta seria para cada uma
,
pensando nos desafios enfrentados por
ealizar a quarta tarefa, trariam as linhas, formas e cores que desejassem para
como marca dos momentos que vivenciaram até chegar ao final da
história. Foi um fazer criativo que buscou mobilizar momentos da história do
ficativos para cada professora.
Este foi um dos momentos mais desafiadores, pois tendo por base o
nível criativo ao buscar o poder de síntese e de atualização de significados que foram
evocados durante a vivência, contribui para uma
sensação concomitante de fechamento
seguida de um caráter avaliativo de prazer e satisfação. É uma oportunidade de abrir um canal
118
o que será que há dentro das caixas?!
la, deveriam voltar aos seus
uma rápida retomada dessa tarefa e quando ficaram l
iberadas para
caixa... uma surpresa... colada na tampa, na parte interna, havia um espelho... pois
ao destamparem em busca da beleza imortal... ficou a mensagem de que essa beleza está
ngularidade, abrem
-se
Um silêncio profundo percorreu a sala... expressões de espanto, encantamento e surpresa se
pensando nos desafios enfrentados por
ealizar a quarta tarefa, trariam as linhas, formas e cores que desejassem para
como marca dos momentos que vivenciaram até chegar ao final da
história. Foi um fazer criativo que buscou mobilizar momentos da história do
Mito que foram
Este foi um dos momentos mais desafiadores, pois tendo por base o
continuum do ETC, o
nível criativo ao buscar o poder de síntese e de atualização de significados que foram
sensação concomitante de fechamento
seguida de um caráter avaliativo de prazer e satisfação. É uma oportunidade de abrir um canal
119
de contato entre mundo interno e externo. Importante frisar que os outros níveis
sensório/motor, perceptivo/afetivo e cognitivo/simbólico também permearam toda a atividade,
uma vez que ao escolher as cores e as configurações para a pintura e ao fazer uso dos pincéis
para as respectivas representações, as outras etapas também se fizeram presentes.
Ostrower (2002, p. 25) também aprofunda essa idéia ao expressar:
Qualquer tipo de ordenação torna-se significativa para nós. Ao percebê-la
projetamos de imediato algum sentido ao evento [...] através da estrutura formal, a
mensagem simbólica
23
sempre articula, além das associações possíveis em cada
caso, modos de ser essenciais justamente pelos aspectos de espaço / tempo que
são entendidos como qualificações de vida. Trata-se, nessas ordenações interiores,
de processos afetivos, ou seja, de formas do íntimo sentimento de vida. São as
‘nossas formas’ psíquicas.
Durante a realização da atividade, algumas questões foram sugeridas para que pudessem
servir de guia para a realização da proposta. Importante a observação de que essa quarta tarefa
foi uma das mais significativas, pois se representa uma morte simbólica para poder recomeçar
uma nova etapa. É a possibilidade de vivenciar a transformação no sentido de mudanças
necessárias para um maior esclarecimento e autoconhecimento. Eis alguns direcionamentos:
Em quais situações de sua vida pessoal e profissional, você se deparou com momentos
de muita frustração, sentindo chegar em seu limite, experienciando extremo
sentimento de perda e depois de um contato com o problema bem de frente, conseguiu
sair-se bem, descobrindo uma solução criativa e pessoal?
Quando, em seu papel de professora, você cria situações desafiadoras para que seu
aluno possa agüentar e se fortalecer desprendendo-se do excesso de prazer, de
indiferenciação para se tornar autor/herói de sua própria aprendizagem, enfrentando
seus dragões e monstros?
Lembra-se de ter vivido alguma situação em que efetivamente achasse que teria
chegado no final do túnel”? Muito medo, insegurança, mas... depois de um tempo
você foi se contatando com seu próprio poder, conseguindo resgatar sua força?
23
Para a autora as formas simbólicas são configurações de uma matéria física ou psíquica (configurações
artísticas ou não-artísticas, científicas, técnicas, comportamentais) em que se encontram articulados aspectos
espaciais e temporais (OSTROWER, 2002, p.25).
120
Feitas essas considerações iniciais sobre possíveis significados desse desafio para Psiquê,
novamente busca-se detalhar mais profundamente a simbologia do mesmo. Angwin (1994) ao
estudar esse Mito, iguala essa tarefa à própria morte, pois a descida ao mundo subterrâneo, ao
inferno, permite que Psiquê se contate com seus próprios limites emocionais.
Erich Neumann complementa a análise afirmando que nas três primeiras tarefas a jovem teve
o auxílio de ajudantes, isto é, elementos que representaram as forças interiores do seu
inconsciente e que “pertenceram aos reinos das plantas e dos animais; dessa vez, ela será
ajudada por uma torre, como símbolo da cultura humana” (NEUMANN, 1995, p.88). Embora
surja a torre para orientá-la, ela efetivamente realizará a tarefa e enquanto a preciosa água da
vida tivera que ser recolhida do mais alto penhasco (com a ajuda da águia representada pela
função da consciência/o pensamento), agora, aquilo que Psiquê deverá buscar se situa nas
profundezas insondáveis do inferno, e se encontra nas mãos da própria Perséfone
24
.
Significativo analisar que essa quarta tarefa surge quando a jovem se sente mais fortalecida
para a empreitada, uma vez que as experiências anteriores, isto é, a ampliação da consciência
exercitada pelas funções: sensorial-perceptiva (primeira tarefa); intuitiva (segunda tarefa);
pensamento (terceira tarefa) trouxeram fortalecimento para seus atos. Para esta última tarefa é
a função sentimento que se manifesta, trazendo sempre seu caráter avaliativo quando o sujeito
se encontra em busca de alguma realização. Ela teve sucesso em conseguir obter a caixinha
com a poção da beleza dada por Perséfone, conseguiu voltar para a terra, mas movida pela
curiosidade e pelo desejo de também possuir um pouco da poção da beleza, acabou abrindo a
caixa que a deixou por um tempo em um sono profundo.
Esta tarefa é muito rica em simbologia, entretanto para o propósito dessa análise sob um
enfoque (psico)pedagógico, procurei analisar somente o elemento simbólico da torre. Ainda
dentro da simbologia apresentada por Neumann, ela representa um edifício construído por
mãos humanas, isto é, resulta de um trabalho coletivo entre os homens, sendo o símbolo da
cultura e da consciência humana e por isso é chamada de “a torre que longe” (1995, p.89).
Também surge para ajudar Psiquê a exercitar o limite, o dizer “não” quando possui uma meta
24
Perséfone = dentro do estudo das deusas realizado por Jean Shinoda Bolen, ela foi adorada de dois modos:
como a jovem / Coré (= “garota jovem”) ou como Perséfone / rainha do Inferno.Se Perséfone proporciona a
estrutura da personalidade, “ela predispõe a mulher não a agir, mas a ser conduzida pelos outros, a ser
complacente na ação e passiva na atitude” (2005, p.277). Já Perséfone / Coré, a jovem, permite à mulher parecer
eternamente jovem, que era o desejo de Afrodite.
121
objetiva a alcançar, a seguir firme em busca do que deseja, não se deixando levar por ardis
que poderão surgir para desviá-la de seu propósito.
Buscando relacionar essa tarefa com o fazer docente e enquanto facilitadora das oficinas,
importante registro em meu diário de bordo focou esse momento dos encontros. Em um clima
inicial muito sensível e reflexivo, quando ao destamparem a caixa, cada professora pode “se
ver” refletida no espelho e “se perceber” como elemento fundamental na relação ensino e
aprendizagem, novas percepções e vinculações com o ofício de professor emergiram. A
atividade artística aliada à vivência do Mito de Eros e Psiquê acabou trazendo outras
qualidades para a reflexão do fazer docente.
Abaixo algumas imagens de momentos em que, em contato com o material proposto, as
professoras pintaram a caixa trazendo marcas/cores/formas que representaram as sensações,
sentimentos e pensamentos que permearam todos os encontros...
122
123
Quando essa etapa terminou, ficou para o próximo encontro a partilha e reflexão das quatro
atividades que foram vivenciadas por meio das oficinas e, a partir desse momento, abriram-se
espaços para depoimentos e testemunhos a respeito do que fora vivenciado. Foi uma etapa
significativa da pesquisa, na qual as professoras puderam colocar-se de maneira bastante
reflexiva e crítica em relação a tudo que emergira tanto em relação às tarefas de Psiquê,
vivenciadas nas oficinas, quanto às considerações relativas à prática docente.
Depoimentos vêm confirmar essas considerações:
Um dos motivos que me fazem permanecer na profissão é poder exercitar a missão de
contribuir para formar “pessoas”!
O Mito usado nas Oficinas de Sensibilização contribuiu para a minha vida e prática
docente e eu resumiria em palavras significativas lançadas na história: foco /
curiosidade / persistência / amor incondicional. (Sandra)
As Oficinas de Sensibilização contribuíram bastante para a minha prática!!! Elas
proporcionaram momentos de descontração e, ao mesmo tempo, de reflexão. Tenho o
hábito e acho extremamente necessário a minha reflexão sobre minha prática. Isso
ajuda a melhorar minha atuação e buscar meios para superar dificuldades.
Um dos tópicos que mais me tocou foi quando falamos da importância de respeitar e
entender o “tempo do outro”. Sempre considerei esse aspecto da rotina em sala de aula
muito importante, fundamental para uma aprendizagem significativa, que o meu
tempo não é necessariamente o tempo do outro... (Eliane)
No meu ponto de vista, nossos encontros foram realmente significativos e
enriquecedores. Pude descobrir através das oficinas outros significados fundamentais
para a vida na escola (sala de aula) e fora dela também. O Mito desperta muita
curiosidade e nos permite imaginar... a cada desafio lançado e a cada tarefa cumprida,
imaginava como seria desafiar os meus alunos atuais para conhecerem um pouco
melhor sobre si mesmo. (Tereza)
124
125
Trago as palavras do Professor Moacir Gadotti (2003, p.17) titular da Faculdade de
Educação da Universidade de São Paulo e diretor do Instituto Paulo Freire que em seu livro
Boniteza de um sonho diz que ser professor hoje “é viver intensamente o seu tempo com
consciência e sensibilidade, não se podendo imaginar um futuro para a humanidade sem
educadores.”
Essa última tarefa, efetivamente, acaba fechando um ciclo de caminhadas que as Oficinas de
Sensibilização permitiram a mim e às parceiras da jornada, vivenciar não só a “consciência” e
a “sensibilidade” no ser e fazer do professor, mas buscar sentidos e encantamentos para
mobilizar uma nova identidade docente, em um mundo globalizado, regido pelas incertezas,
onde o importante é aprender a pensar, a pensar a realidade, buscando “pronunciar-se sobre
essa realidade que deve ser não apenas pensada, mas transformada” (GADOTTI, 2003, p.53).
As quatro tarefas, vivenciadas através das oficinas, puderam contribuir, efetivamente, para a
ampliação da consciência, trazendo novas possibilidades para a atuação profissional? Pelos
depoimentos, até agora registrados, percebo que novas descobertas do ser refletiram-se
também no fazer... surgiram movimentos em busca de novas aprendizagens, libertando
olhares viciados ou paralisados, permitindo o diálogo com o novo!
Parte do processo de transformação do indivíduo, exige que seja assumida a natureza
instintiva do humano e, esta, vinda por meio dos elementos simbólicos que ajudaram Psiquê a
cumprir cada uma das tarefas representaram metáforas para o trabalho interior desta jornada.
Durante este percurso, houve vários movimentos de idas, voltas, paradas e retomadas... muitas
paisagens foram (re)vistas e trouxeram novas possibilidades para os caminhantes que
desvelaram a maneira como habitam o mundo... sonhos, expectativas, desejos... tudo
acompanhando todos... E quem forma o formador?
O formador forma-se a si próprio, através de uma reflexão sobre os seus percursos
pessoais e profissionais (auto-formação); o formador forma-se na relação com os
outros, numa aprendizagem conjunta que faz apelo à consciência, aos sentimentos e
às emoções (hetero-formação); o formador forma-se através das coisas (dos
saberes, das cnicas, das culturas, das artes, das tecnologias) e da sua compreensão
crítica (eco-formação) (NÓVOA, apud JOSSO, 2004, p.17).
126
A declaração acima corrobora outros pensamentos apresentados durante esse percurso, em
que o maior objetivo foi trazer o valor do Mito e o lugar da Arte como elemento revelador de
um universo desconhecido, onde potencialidades emergem, transformando ações
automatizadas e rígidas em novos contornos e movimentos.
Cada encontro era uma conquista onde indiretamente, ou quem sabe diretamente, eu
consegui lidar melhor com algumas “dificuldades” minhas e isso foi muito importante
para mim. Participar dessa experiência foi algo muito rico e cada tarefa tinha uma
mensagem muito importante e fiel ao que vivemos diariamente. Tudo foi muito
importante e significativo. (Mônica)
Olhar para o outro, olhar para si, refletir sobre sua vida e prática são tarefas árduas e
prazerosas. Para mim, a realização desses encontros foi como a junção de Eros e
Psiquê. Entregamos nossa alma, deixamos o amor brotar, florescer e padecemos para
encontrar caminhos diante dos tortuosos desafios impostos por Afrodite, que encaro
como a vida. Levo desses momentos, a vontade de crescer, abrir-me, partilhar e
observar e refletir sobre a prática docente, uma tarefa que também é cheia de vida, e
que, como tal, leva seus altos e baixos. (Paula)
Trilhas e passos durante a caminhada que nos levaram a novas paragens permeadas pelo Mito,
pela literatura e poesias que devem ser consideradas como escolas de vida, em seus múltiplos
sentidos e que nas palavras de Morin (2001, pp.48-51), significam:
Escolas da qualidade poética da vida e, correlativamente, da emoção estética e
do deslumbramento.
Escolas da descoberta de si, em que o adolescente (será que ele?!?!) pode
reconhecer sua vida subjetiva na dos personagens de romances ou filmes. Pode
descobrir a manifestação de suas aspirações, seus problemas, suas verdades.
Escolas da complexidade humana, pois esse conhecimento faz parte do
conhecimento da condição humana.
Escolas de compreensão humana, pois através da literatura, da poesia e dos
filmes percebemos os outros em todas as suas dimensões, subjetivas e objetivas
e não somente em sua forma exterior.
Nesse momento, encerro as ambiências que foram criadas para a vivência do Mito, com a
poesia de uma professora, escrita no encerramento dos encontros... final dessa jornada!
127
RE-NASCE UM PROFESSOR
esse mundo tão maluco,
asce um professor.
De corpo, alma e coração
Razão e emoção.
essa vida tão atribulada,
Cheia de desequilíbrios e
Equilíbrios,
Vivemos nessa corda-bamba.
Tentando construir um
Futuro melhor...
Precisamos do outro
Em nossas vidas.
Essa busca constante
De reflexão e sabedoria
O que não deixa de ser
Um grande desafio,
É o que nos alimenta.
os ajuda a colocar
a “balança”
Um pouco de
Pensamento e sentimento,
Intuição e percepção.
“É preciso saber viver”,
Ou melhor,
É preciso aceitar o viver.
E ser feliz!
(Professora Tereza)
128
5.2
PASSEADO PELA PAISA
Depoimentos e partilha depois das oficinas
Palavras... sentimentos... que foram evocados e despertados durante os encontros...
sensibilidade... criatividade.
sensações nas professoras/viajantes... vivências pessoais e grupais que oportunizaram o
trabalho com as diferenças... com a complexidade!
Foto 34 – T
rilhas/linhas que marcaram sentimentos... pensam
Através do encontro da personagem mítica com as personagens internas de cada professora,
as Oficinas de Sensibilização abriram um espaço de desafio, mas também de conquista... de
pensar criativamente o ser e estar no mundo, consigo mesma e com o(
fazer como docente... do ofício de ser
velar o que poderia amarrar, prender, sufocar qualquer possibilidade de criação, de
aprendizagem, de re-nova-
ação!
PASSEADO PELA PAISA
GEM...
AS RESSOÂCIAS DA E
Depoimentos e partilha depois das oficinas
“A consciência nasce quando interpreta
objeto com o nosso sentido autobiográfico, a nossa
identidade e a nossa capacidade de anteciparmos
o que há-de-vir.”
Palavras... sentimentos... que foram evocados e despertados durante os encontros...
sensibilidade... criatividade.
.. que mobilizaram uma reflexão carregada de emoção, de
sensações nas professoras/viajantes... vivências pessoais e grupais que oportunizaram o
trabalho com as diferenças... com a complexidade!
rilhas/linhas que marcaram sentimentos... pensam
Através do encontro da personagem mítica com as personagens internas de cada professora,
as Oficinas de Sensibilização abriram um espaço de desafio, mas também de conquista... de
pensar criativamente o ser e estar no mundo, consigo mesma e com o(
fazer como docente... do ofício de ser
professor(a)! Momentos ricos em que se procurou des
velar o que poderia amarrar, prender, sufocar qualquer possibilidade de criação, de
ação!
129
AS RESSOÂCIAS DA E
XPERIÊCIA:
“A consciência nasce quando interpreta
mos um
objeto com o nosso sentido autobiográfico, a nossa
identidade e a nossa capacidade de anteciparmos
Antonio Damásio
Palavras... sentimentos... que foram evocados e despertados durante os encontros...
.. que mobilizaram uma reflexão carregada de emoção, de
sensações nas professoras/viajantes... vivências pessoais e grupais que oportunizaram o
rilhas/linhas que marcaram sentimentos... pensam
entos...
Através do encontro da personagem mítica com as personagens internas de cada professora,
as Oficinas de Sensibilização abriram um espaço de desafio, mas também de conquista... de
pensar criativamente o ser e estar no mundo, consigo mesma e com o(
s) outro(s); do ser e
professor(a)! Momentos ricos em que se procurou des
-
velar o que poderia amarrar, prender, sufocar qualquer possibilidade de criação, de
130
Foram momentos em que a partilha com o outro sobre as mesmas situações do cotidiano
escolar... sobre os mesmos sentimentos de alegria e medo / acerto e erro / expectativa e
ansiedade expressos por meio de variadas linguagens que serviram de suporte para a
linguagem verbal, tornaram-se extremamente ricos. A expressão do pensamento
propriamente dito gerado pela motivação, isto é, pelos desejos e necessidades, interesses e
emoções” (VYGOTSKY, 1989, p.129) é uma experiência que amplia o exercício sobre a
reflexão da prática docente, como elemento mediador na constituição do sujeito como ser
humano e ser professor.
Muitas coisas foram acrescentadas à minha prática com esses encontros... o que eu
estou sentindo é que desde a primeira oficina como o que a gente está sentindo em sala
de aula influencia o nosso dia... e que como essa busca pela tranqüilidade tem que
ser... digo... não tranqüilidade! Mas acho que por esse equilíbrio tem que ser diária e a
todo momento e tem que ser um objeto de atenção nosso, assim... porque quando a
gente entra com o coração um pouco agitado ou quando a gente se desequilibra em
algum momento, isso não é transmitido na fala, mas nas nossas ações, indiretamente
isso vai influenciando todo o nosso ambiente de trabalho... acho que foi isso que
mudou... acho que eu estou mais atenta a minha pessoa, ao meu eu... o que eu estou
sentindo, como eu tenho que trabalhar isso para buscar um equilíbrio... que a sala tem
que ser um ambiente de tranqüilidade para todos... (Karen)
Na fala dessa professora, percebem-se as categorias (subjetividade, afetividade) que vão se
manifestando, pensamento expresso através de palavras com uma conotação gestual de
assertividade que vai dialogando com todo o campo teórico da pesquisa, aspectos pessoais,
subjetivos que se mesclam ao profissional.
Essa última tarefa foi muito significativa para mim... ao destampar a caixa e me ver
refletida naquele espelho... nossa [suspiro]!!! Percebi e senti a importância de EU estar
bem, para poder estar em sala de aula... de eu me cuidar... eu me preparar para poder
estar com meus alunos... nossa foi muito forte a experiência... não esperava que fosse
encontrar o espelho!!! (Sandra)
Eu fiz uma relação da caixa da beleza imortal, com a beleza que deve sair de mim...
enquanto professora... como dizer... beleza que vem do gosto por aquilo que faço... do
131
prazer em estar com meus alunos...... beleza que vem... nossa! Por conta de tantas
coisas que essa profissão nos oferece... e até pelos momentos de insegurança... de
medo... de ansiedade como deu para perceber que não sou eu que fico ansiosa...
várias outras colegas expressaram os mesmos sentimentos... rs...!!! (Kátia)
... porque eu estava me cobrando demais... eu saía daqui aflita pra burro... pensava...
genteee... e eu comecei a trocar com a Gabriela... foi muito rico... ela partilhava como
era na sala dela... nossa! Isso me ajudou muito!!! (voz embargada) Eu passei a me
entender nesse sentido, que eu não posso ficar batendo muito nisso... tenho que ficar
menos ansiosa! (Mônica)
Neste sentido, trago as reflexões de Madalena Freire (2008, p.80) que tão bem dialogam com
os depoimentos acima transcritos:
A causa dessa ansiedade é o choque entre o velho e o novo dentro de nós, que existe
sempre e que nos impulsiona a crescer. Sem o velho não se constrói o novo. Jogar
fora o velho, para ficar com o novo, não é assumir o novo, é tentar resolver
falsamente essa ansiedade. É fugir do processo de construção da mudança para
apropriação do novo. Pois assumir o novo é assumir o novo significado,
construindo, estruturando, uma opção onde um dia poderei constatar porque o velho
não mais me instrumentaliza. Poderei romper, assim, com este e optar pela busca da
construção do novo.
Para educar a paciência, nas muitas situações que a prática nos coloca, é necessário
lidar com limites. Limites do outro, os nossos e os da realidade. Lidar com limites
envolve trabalhar frustrações, perdas e raiva. Significa aprender a lidar com o
desprazer, o sofrimento que o confronto com a realidade, com o outro, conosco
mesmo, nos provoca [...] Ter paciência significa buscar, permanentemente,
reconhecer, perceber, admitir esses limites para, sintonizando com eles produzir
respostas, encaminhamentos adequados às situações na nossa prática.
As ressonâncias que a vivência da história do Mito provocaram, aliadas às expressões
artísticas tornaram-se fios/guias que abriram clareiras para a caminhada por essa paisagem!
Conteúdos repletos de subjetividade foram enlaçados por outros, não menos significativos,
nos quais o caráter objetivo e pontual da observação também se fez presente.
Nas Oficinas de Sensibilização, quando se busca exercitar a Pedagogia Simbólica,
apresentada por Byington (1996, p.319), os reflexos na Educação são significativos, pois
segundo ele:
132
Trata-se de formar educadores que, durante sua atividade diária, por sua maneira de
trabalhar, sejam estudiosos da vida humana e da cultura e as elaborem criticamente
com seus alunos. Esta formação profissional requer o desenvolvimento criativo de
um professor-operário, ao mesmo tempo, sacerdote, cientista, artista e político que,
distante das cátedras e palanques e dos altares, queira simplesmente se dedicar à
curiosidade, à vitalidade e à intimidade dos seus alunos para juntos construírem,
amorosamente, através de sua convivência, o exercício maravilhoso de saber ser.
Essa construção amorosa de que fala Byington, é o que caracteriza o Eros pedagógico, quando
efetivamente se instaura uma relação entre aquele que ensina e aquele que aprende movida
pelo prazer em busca do conhecimento, pelo prazer na troca de experiências e saberes.
É o
encantamento e a sabedoria daquele que se coloca no papel de professor que deve despertar a
motivação, o encantamento e o prazer da descoberta daquele que aprende... aliança da
subjetividade com a objetividade... da emoção com a razão... de Eros com Psiquê integrados
na prática docente... um grande desafio para a Educação!
Quando estava preparando a bagagem para iniciar esta jornada e mapeava o caminho, as
trilhas foram se delineando, mas o que efetivamente poderia ser encontrado durante a
caminhada... seria arriscado determinar! Somente neste momento, depois de ter preparado
toda a ambiência para a passagem da história com seus personagens e de tê-la vivenciado
juntamente com as companheiras de jornada (“as psiquês”), seguida pela entrega de um
questionário semidirigido, é que começo a puxar fios que serviram de guia e que agora se
mostram, oferecendo possibilidades para uma análise mais profunda do conteúdo como
contribuição para a escolha da categoria subjetividade, embora outras, como afetividade,
mediação e ansiedade, também poderiam ser consideradas.
Foram fios que enlaçaram sensações, sentimentos, palavras, gestos que marcaram a jornada.
Devido à riqueza advinda dos depoimentos e das sensibilizações vividas, optou-se por focar
no aprofundamento da vertente subjetividade, mesmo porque a questão que motivou a
pesquisa situa-se na proposta de um trabalho em que se analisaria até que ponto a história do
Mito de Eros e Psiquê poderia servir de elemento mobilizador para se pensar o ser e fazer(-
se) professor. Da mesma maneira, os referenciais teóricos escolhidos direcionaram a análise
para esse caminho.
Quando se fala da análise dos depoimentos advindos das oficinas, importante a observação
(feita em meu diário de bordo), de todo envolvimento afetivo e emocional que as dinâmicas
133
mobilizaram: tom de voz, pausas, movimentos faciais, gestos, situações que enriqueceram e
demonstraram até que ponto o professor pôde ampliar sua ação-reflexão-ação por meio de um
fazer expressivo e relacioná-lo com suas experiências pessoais e profissionais (BARDIN,
1977).
Apoiada em Gaskell (2004), acresce-se a essa análise o valor dos depoimentos feitos durante a
partilha, caracterizando uma interação social muito rica e significativa, observando-se a
energia que é criada durante os depoimentos e a dinâmica que se instaura como grupo
(mudanças de opiniões, liderança, etc.).
Surgem mais alguns depoimentos:
Devemos sempre estar aberto... a gente tem que estar sempre aberto para as
oportunidades... para as novidades de nossos alunos, ouvi-los [...] fiquei muito
contente com o que vivenciei, o que conheci... o trabalho com a expressão artística foi
uma grata surpresa! Revelador!... (Kátia)
Pra mim foi muito importante a reflexão de não colocar as minhas expectativas nas
crianças... pra mim o ponto chave de todos os encontros, o que me pegou muito foi
isso... foi que eu tava vindo de um momento que eu queria que acontecesse uma coisa
e o que acontecia na realidade não era do jeito que eu esperava... então eu aprendi com
todas as vivências, todas as oficinas isso... assim... que depende de mim! (Mônica)
A maneira de cada professora se colocar perante o grupo também fez parte de minhas
observações que demonstraram como o trabalho nas Oficinas de Sensibilização, apoiado na
história do Mito escolhido, acrescentaram outra qualidade para a reflexão pessoal e sobre a
própria práxis. Josso complementa esse pensar ao afirmar que o “conhecimento de si-mesmo
inaugura a emergência de um si suficientemente consciente para orientar o futuro da sua
realização” (2004, p.163).
Corroborando esse argumento, mais depoimentos se apresentam:
Falando tudo o que a gente viveu nesses nossos encontros, eu acho que pra mim o que
marcou e foi muito importante foi essa mudança pessoal e profissional porque aqui a
134
gente teve a oportunidade de ouvir depoimentos super ricos que muitas vezes a gente
tem aquilo fechado sobre a prática, algum princípio que norteia tudo o que a gente
tem como ação pedagógica e ouvindo coisas ricas, outras maneiras, isso traz uma
reflexão, né, uma mudança! Então a cada encontro, a cada reflexão surgia assim... e
mexia muito comigo sobre o que eu estava conduzindo, tendo como prática até como
pessoa. É... até como pessoa as oficinas mexeram muito no meu intuitivo, na minha
intuição, no meu ser, na Laís. E as reflexões diante do Mito e das oficinas trouxeram
muita reflexão para o que eu trago na minha vida profissional, então foi muito
importante participar, até a Kátia trouxe uma fala que é bem como eu vim... quando
teve a primeira oficina... ah!!! fiquei inibida, mas eu vim aberta e eu acho que isso
fluiu... eu não gosto de me expor... eu sou muito assim quietinha, eu gosto assim de
observar... sabe, então eu acho que foi importante trabalhar isso, né?!... também estar
aberta para os desafios porque a nossa vida a cada dia é um desafio... a gente precisa
estar aberta para isso... para que as coisas aconteçam... [...]
Nessa última vivência... a arte tem a ver com isso, eu lembrei da minha caixa porque
no dia que eu pintei a minha caixa acho que eu na estava muito bem... rs... porque eu
colocava uma cor, colocava outra e chegou uma hora que eu pensei... “gente! Eu
não vou colocar mais nada!” eu virei para a Sandra e falei “vai ficar assim!!!” porque
se eu puder ficar até uma hora da tarde eu vou mudar essa caixa... então é bem assim...
é o ser humano... a gente está todo momento... mas a gente precisa buscar um
equilíbrio isso é muito importante a gente buscar esse equilíbrio para a gente poder
conduzir com calma e poder realizar tudo o que a gente fizer na nossa vida com
tranqüilidade para poder atingir nossos objetivos seja profissionalmente ou
pessoalmente... (Laís)
No depoimento de Laís notam-se as etapas do ETC, pois em contato com o material de arte (a
caixa, as tintas e pincéis), um contato sensório-motor (K/S), isto é, uma energia conduzida
pela ão e pelo movimento, o continuum do fazer a conduziu para outras etapas que lhe
abriram possibilidades para pensar o afetivo (P/A) e o simbólico (C/S) permeados pelo nível
da criatividade (Cr). Foram ações coordenadas pelo fazer artístico que abriram possibilidades
para mais reflexões sobre o seu modo de ser... sobre a importância de se buscar um equilíbrio
entre ação e intenção! Quantos desafios permeiam esses depoimentos!
135
Busco ressonâncias que espelham sensações... reflexões... sobre as tarefas que Psiquê teve que
enfrentar para poder se unir novamente com Eros que agora, de um outro jeito, com
plena consciência de como era seu marido, pois já poderia vê-lo em toda sua beleza e apossar-
se de seu papel como esposa! As tarefas realizadas foram os desafios que possibilitaram a
ampliação de sua consciência e, simbolicamente, representaram a integração da razão com a
emoção, da objetividade com a subjetividade. Psiquê sem Eros sente-se incompleta e daí vem
a necessidade de ir a busca do amado e este, sem Psiquê, também não se sente pleno!
Fazendo um paralelo com essas tarefas e aquelas que o professor exercita em sua prática
docente, apresento algumas configurações na trama que está sendo formada: “saber
discriminar” – “saber esperar” – “reter a essência” – “lidar com a transformação” são posturas
importantes para a prática docente, para a ampliação do ofício de ser professor.
E em quantos momentos de seu dia-a-dia o educador não se depara com situações
desafiadoras que apresentam as mesmas características dessas tarefas... a importância da
diferenciação do que cabe a ele e à instituição em termos de competências e funções. Saber
esperar o momento do outro, como quando seu aluno, que ainda não entendeu adequadamente
novos conteúdos que a ele são apresentados e, para tal, também precisa, nas palavras de
Madalena Freire (2008, p.81), “educar a paciência, nas muitas situações que a prática nos
coloca, é necessário lidar com limites. Limites do outro, os nossos e os da realidade” (2008,
p.81). Exercito a paciência também quando discrimino as cobranças, os pedidos e as respostas
para encaminhamentos adequados que o cotidiano pedagógico impõe como desafios ao
professor!
Ao buscar a essência, ela pode se manifestar de várias maneiras: essência do que é importante
em termos de aprendizagem para o aluno e de avaliação para o professor; essência quanto ao
olhar/avaliar o aluno não em termos de quantidade de conteúdo que foi apreendido, mas em
relação à qualidade, pois é ela que evidenciará uma aprendizagem com sentido; essência
significando, também, estar atento ao significado do desejo do outro, acompanhar seu ritmo e
tentar uma sintonia entre o ritmo do professor e do aluno. Como o olhar da águia, há
necessidade do professor ter um foco, um objetivo muito claro e preciso que norteaa ação
pedagógica, tornando-se, nas palavras de Gadotti (2003, p.53), um ”gestor, mediador do
conhecimento e não mero lecionador, pois importante é aprender a pensar, a pensar a
136
realidade e não pensar pensamentos pensados.” Percebem-se as qualidades desse olhar que
deverá se manifestar pela atenção e pela espera que deverão ser direcionados para o aluno!
Entretanto, muitas vezes na busca dessa essência pode-se, tal como Psiquê ao recolher a água
do alto de um rochedo, sentir medo, insegurança e, em tais situações, não se pode paralisar a
ação, mas sim exercê-la com enfrentamento de quem sabe o que quer e por onde pretende
chegar. Estamos vivendo em um mundo de incertezas e deve-se buscar “conhecimentos
pertinentes que toquem na multidimensionalidade da sociedade e do ser humano que é ao
mesmo tempo biológico, psíquico, social, afetivo e racional.” (MORIN, 2000, p.38).
Finalizando o estudo sobre as tarefas e, dentro desta linha de reflexão, ao me propor vivenciá-
las em oficinas e de acordo com os depoimentos das professoras acima apresentados, abrem-
se novas possibilidades para outro modo de pensar a Educação, pois busca-se “reformar o
pensamento para poder repensar a reforma” (MORIN, 2008) É a partir do enfrentamento de
todas as dificuldades que surgem na prática docente que poderá instigar o professor a saber
lidar com a transformação!
Cabe, nesse momento, uma pergunta: qual seria o papel de Afrodite no Mito e como
relacioná-lo com a atividade docente? Por que ela impõe de uma maneira tão malvada e
acintosa as tarefas que levariam Psiquê à morte? Quem ela estaria representando? Partindo da
idéia de seu papel no Mito, e seguindo os passos de Neumann (1995, p.90), tem-se que:
Quanto às “armadilhas de Afrodite”, devemos nos lembrar de que esta Grande
Mãe
25
possui o aspecto que vida e que a mantém; no conflito entre Afrodite e
Psiquê ela mostra apenas um dos seus lados, em contraposição às exigências do
indivíduo e, nesse sentido, pode justamente ser proibida uma atitude compassiva da
boa mãe individual [...]
Portanto, a meta secreta de Afrodite é fazer Psiquê “morrer”, fazendo-a regredir ao
estágio Core-Perséfone, no qual vivia antes de encontrar-se com Eros.
Como se percebe, ela assume o papel da Grande Mãe em seu pólo negativo, pois ela quer
eliminar Psiquê e, para tal, obriga-a a realizar as quatro tarefas, não imaginando que a jovem
25
Grande e, segundo o Dicionário Crítico de Análise Junguiana, é uma designação da IMAGEM geral,
formada pela experiência cultural COLETIVA. Como uma imagem, ela revela uma plenitude arquetípica, mas
também uma polaridade positivo-negativa. [...] O pólo positivo reúne qualidades tais como “solicitude e simpatia
maternais [...] tudo aquilo que é benigno, tudo que acaricia e sustém, que propicia o crescimento e a fertilidade”.
Em suma, a e boa. O pólo negativo sugere a mãe má: “tudo que é secreto, oculto, obscuro; o abismo, o mundo
dos mortos, tudo que devora, seduz e envenena, que é aterrador e inevitável como o destino (SAMUEL et
AL.,1988).
137
conseguiria se sair bem em todas elas! Essa personagem do Mito também chamou a atenção
de algumas professoras que assim se manifestaram:
Adorei o mito e fiquei angustiada, pois fiquei refletindo muito sobre quantas vezes na
minha vida eu fui Afrodite para outras pessoas, sabe(?!?)... acho que todo mundo já foi
e teve momentos de impor tarefas impossíveis para outras pessoas... sem conseguir
olhar para o outro verdadeiramente...porque ser Afrodite não é impor a tarefa, é
também não enxergar as questões... mas assim, quando eu comecei a participar dos
encontros eu estava com algumas questões tanto é que eu até pedira para você,
sugestões de livros relacionados à indisciplina... eu estava com muitas questões na
minha vida, na minha prática e assim... eu fiquei muito te observando (Lídia), sua
postura como pessoa, sua fala tranqüila... sua... sua... até não fala... uma comunicação
gestual em alguns momentos de muita tranqüilidade [...] eu acho que comecei a pegar
um pouco disso pra minha vida mesmo... tentar até querer ter compromisso, de querer
que tudo certo... e de todas as minhas atitudes serem um pouco mais tranqüila... e
eu acho que já estou colhendo alguns frutos!!!... (Karen)
Eu acho que poder me olhar (voz embargada), poder olhar para o outro e poder olhar
para minha prática através das reflexões da tarefa, foi algo que foi muito, muito, muito
rico... e também pensei assim... em que momentos eu deixo Eros entrar em minha
vida? Na minha prática? Na minha sala de aula? Em que momentos eu deixo Afrodite
e em que momentos eu deixo Psiquê... em relação ao mito que eu acho que está
representada na minha caixa... que é a questão da razão... e eu acho que a minha caixa
é bem isso, né... as formas geométricas... (até a Lídia comentou!) porque eu acho que
aos poucos estou pondo a Psiquê em minha vida... uau...!!! eu trouxe a Psiquê (ela
abre a caixa e mostra a flor de tecido...)... (sorrisos) ahhh!!!... E quero agradecer
porque foi muito importante... (Paula)
Por esses depoimentos percebe-se a força e riqueza que o Mito, juntamente com o trabalho em
Oficinas de Sensibilização, conseguem evocar, tornando visível o invisível, trazendo
contornos mais claros a sentimentos e sensações que habitam o mundo interno. E a presença
de Afrodite na história também traz reflexões... uma vez que representa a Grande Mãe e, no
caso a mãe má, aquela que devora, que não deixa o filho crescer e amadurecer indo em busca
de sua liberdade e realização. Traçando um paralelo com as questões da Educação, quem ela
138
poderia representar? Poderia estar vestida na pele de uma professora que não estimula seu
aluno buscando alavancar possibilidades e competências adormecidas, ou aquela outra
excessivamente exigente e enérgica para a qual nada está bom e correto, somente aquilo que
vem como resposta/repetição de suas próprias palavras, interpretações e análises! Momentos
de criatividade, de abrir possibilidades para um pensar de outra maneira jamais são
estimulados ou alimentados, uma vez que podem gerar insegurança de sua parte ao não saber
lidar com o novo, com os desafios, tornando-se uma mera repetidora das mesmas práticas que
adotara por seguidos anos, assentada em um comodismo que não condiz com a missão de ser
professora!
Mas... também poderia assumir o papel da própria instituição! Sim, uma instituição
castradora, que não permite que seus professores cresçam, impondo limites e regras de
maneira austera e sistematizada, obrigando todos os que nela trabalham (coordenadores,
professores, funcionários e alunos) a seguirem rigidamente as normas por ela instituídas, sem
poderem se posicionar de maneira crítica ou questionadora. Nessas instituições o exercício do
matriarcado negativo e castrador, acaba inibindo o desenvolvimento coeso de todos os
profissionais que nelas trabalham, não permitindo que o professor expanda sua consciência no
sentido de analisar como seu trabalho se manifesta, que direções pode tomar e em que bases
se sustenta sua profissão.
Como se percebe, são muitos os veios que a história nos permite seguir e é com toda essa
riqueza que trago mais depoimentos:
Sabe, quando era menina eu sempre dizia que seria médica!...a vida inteira eu queria
ser médica... médica e pronto! Aí quando estava no segundo ano do ensino médio você
cai naquela... “eu não vou conseguir! Não vou! Como vou passar em uma
universidade pública?! Não teria a menor condição de pagar uma universidade
particular de medicina, não teria condição nenhuma, né?! Até porque como eu iria
trabalhar para ajudar meu pai porque é período integral, então isso começou a ficar
totalmente fora de cogitação e eu entrei em conflito... o que eu vou fazer na minha
vida?!?! Depois de muitas andanças e questionamentos e do contato com algumas
amigas que estavam na Pedagogia, aí comecei a pensar: “Poxa vida! Por que eu nunca
pensei em ser professora, se foi a brincadeira que eu mais brinquei na minha vida?!... o
que eu mais fiz foi brincar de escolinha... não posso negar pois todas as minha
139
brincadeiras de boneca eram de escolinha! Era uma paixão, eu adorava brincar disso e
por que eu não pensei nisso?! Aí eu comecei a pensar e a pensar, também, que talvez a
Pedagogia tivesse uma relação com a Medicina!!!! Que seria essa questão do cuidado,
do contato com a pessoa, né? Da importância que você vai ter na vida daquela pessoa,
e aquela pessoa na sua vida! Então isso foi o que fez a diferença para mim, porque
eu falei NÃO!!! É isso... aí entrei na faculdade de Pedagogia... (Kátia)
Estamos falando de uma coisa que é muito séria... que é a situação da escola pública!
Embora possamos encontrar professores excelentes, preparadíssimos e competentes
em seus cargos efetivos, também encontramos outro que lá estão esperando
passivamente chegar o dia da aposentadoria... isso é muito grave!!!! E como ficam os
alunos que têm como professores os exemplos desses últimos?! Como fica a
motivação, o interesse pela aprendizagem se a postura do professor não os leva para
isso? E vou ainda mais... como está a organização da escola pública?... que são as
pessoas que estão entrando nessa escola? Tem a ver com a profissão, também... e os
cursos de Pedagogia? Como estão as faculdades? As pessoas têm consciência que não
é só uma profissão, que não é só ter vocação e conhecimento, mas também ter
consciência? Eu acho que os problemas aqui... ai gente... é uma coisa que me toca
mesmo!!! Depois que eu li, por exemplo, que eu li Paulo Freire pela primeira vez, li o
livro inteiro A EDUCAÇÃO COMO PRÁTICA DA LIBERDADE, eu falei: “Gente!!!
Nós temos que fazer alguma coisa... não só por mim... não só por onde tenho alcance...
mas além, sabe!... porque me preocupa muito essa reprodução da ignorância, essa
reprodução do não sei nada, da miséria... é importante ter pessoas ignorantes...!!!!
eu também penso que a questão está para além disso... acho que a questão é maior...
acho que muito maior que a minha vã individualidade alcance... mas acho que é
passível de estudo, passível de pesquisa de gente pensando e acho que se deve tentar
mudar as coisas [...] porque é uma questão de formação... ela não teve a oportunidade
de outra formação... e essa busca pela formação, pela contínua capacitação é muito
importante... trazer a reflexão da prática é fundamental!... (Erika)
Sabe, eu alfabetizei quatro faxineiros do prédio... “vou começar a chorar...” eu fiquei
tocada com isso...mas como uma pessoa não pôde ter oportunidade?! Porque eu...
realmente eu estudava em um dos melhores colégios... (voz embargada) e para mim
foi uma experiência marcante ter ensinado essas pessoas...e para eles também foi, né?
140
Tanto que meu pai falava: “Nossa! Mas que tanto você vai lá embaixo com os
faxineiros?!” eu dizia:”Pai! Você não sabeee!!! Estou ensinando todo mundo a ler e
escrever!!! E quando eles começaram eu pensei - “nossaaa!!!” Eu era uma criança
fazendo isso, não tinha todo esse estudo... Acho que essa experiência foi decisiva na
carreira que queria seguir... depois eu comecei a pensar nessa história de
professorinha, professorinha... professorinha, ta bom!!! Não quero ser uma
professorinha, quero ser uma professorona!!! Eu acho que é uma profissão muito
humana, eu me orgulho muito de ser professora e me orgulho muito mais quando meu
pai falava para um amigo: “Ah! minha filha faz Pedagogia na Usp, trabalha em um
colégio, enfim...” E o colega dizia:”Ah! mas é professorinha?!” Meu pai dizia:”Não!!!
Ela é professora e pedagoga da Usp!” Ficava todo cheio de orgulho falando... (Eliane)
Puxa! Eu estou pensando como o Mito, as oficinas, tudo isso permitiu tantas
reflexões... o olhar de águia... a sensibilidade para chegar até a essência... o papel do
professor é isso... é ser sensível ao outro!!! Em todas as tarefas a gente percebeu
algum elemento fundamental para que a Psiquê cumprisse as tarefas... a gente sem o
outro não é nada!!!... e nesse cotidiano corrido, a gente nem sempre tem esse olhar...
por conta do tempo, do conteúdo que precisa dar... a gente precisa parar um pouco
para dentro de si, né... é difícil, às vezes, mas eu acho que é de fundamental
importância... (Tereza)
Pelos depoimentos acima apresentados, percebi a riqueza que uma história, escolhida com
uma determinada intenção, como foi o caso da escolha do Mito de Eros e Psiquê, é capaz de
desencadear reflexões profundas sobre o ser e o fazer do professor! As professoras que
fizeram parte dessa jornada são extremamente compromissadas com a profissão...
questionadoras de um “fazer educação” com envolvimento e responsabilidade! Isto é
fundamental para que a docência adquira contornos mais humanos, mas não menos
competentes e desencadeadores de uma nova consciência crítica, atuante e transformadora.
“Há uma instância interna que faz parte do ser humano que somos e que não pode mais se
permitir fazer apenas parte do que precisa ser feito, mas que deseja fazer o certo, o que
preenche realmente objetivos conscientes e alinha-se com eles” (ALESSANDRINI, in
PERRENOUD, 2002, p.162), palavras que vêm corroborar o pensamento e a postura das
professoras que acompanharam todo o trabalho de pesquisa. Efetivamente, chegou o momento
141
de tentarmos desenvolver dentro de cada um de nós, no ofício de ser professor e formador,
uma nova qualidade de consciência que será a mediadora entre nossas crenças internas e a
realidade na qual se está inserida. Atualmente, exige-se muito desse papel, pois além da
formação pessoal, necessidade de se estabelecer critérios para uma prática que invista na
qualidade do trabalho, no exercício da observação crítica e construtiva, na intervenção precisa
para atingir a diversidade da sala de aula, a eterna busca por novas aprendizagens que
certamente irão enriquecer o ser do professor, refletindo em seu fazer... enfim, são
ferramentas de que o professor deverá deixar sempre afiadas para usá-las em seu cotidiano
escolar.
E... foi com os “olhos virados” que me percebi em muitos momentos dessas andanças, desde
o início da pesquisa até o momento da realização das oficinas, fazendo movimentos de idas e
vindas... ação-reflexão permeadas por palavras, sentimentos e cores... pensando na variedade
de possibilidades que esse Mito trouxe para pensar o papel do professor, da Instituição, da
família, dos alunos.
Neste momento, busco apanhar as linhas/guias que serviram de trilhas para a jornada e, entre
elas, escolho aquela que acabou sendo a referência maior para essas considerações – a
subjetividade. Dou a ela a cor amarela e trago, agora, a imagem reconfigurada e a coloco
sobreposta a todas as outras fitas/trilhas... pois seu percurso continua...
142
Linhas e fitas que, simbolicamente, serviram de guia para o término desse momento da
jornada, ligando caminhos... favorecendo diálogos... desvelando e guiando sonhos,
expectativas, desejos e alguns medos também!...
Linhas e fios... coloridos porque cada um de nós tem a sua cor... a sua individualidade...
Linhas... que levam a direções que não se sabe aonde chegarão... simplesmente se começa...
com coragem, determinação e criatividade!...
Fios... que bordam, enlaçam, enrolam e se soltam, sem sufocar, mas por onde passam, deixam
sua marca... sua cor... sua presença...
Linhas... que delineiam o eu... o outro...
Fios de vida... que se inserem no mundo!...
Foto 35 –
Linhas/fitas que favoreceram diálogos
Linhas/fitas que favoreceram diálogos
143
144
6 DEIXADO PEGADAS... PLATADO SEMETES: Considerações
“O caminho não se compõe de pensamentos,
conceitos, teorias, nem de emoções embora
resultado de tudo isso. Engloba, antes, uma série
de experimentações e de vivências onde tudo se
mistura e se integra e onde a cada decisão e a
cada passo, a cada configuração que se delineia
na mente ou no fazer, o indivíduo, ao questionar-
se, se afirma e se recolhe novamente nas
profundezas de seu ser. O caminho é um caminho
de crescimento.”
Fayga Ostrower
No momento do encerramento desta jornada, avistando o local do início da caminhada e,
olhando-o novamente... é como se o visse pela primeira vez!
Diminuo os passos para “sensar” todas essas vivências... Despeço-me das professoras que
contribuíram para este trabalho e... assumo o lugar da pesquisadora.
Retomando a proposta inicial, cujo objetivo principal foi o de contribuir para reflexões sobre a
docência por meio do Mito de Eros e Psiquê vivenciado em Oficinas de Sensibilização, busco
pelo resultado dessa pesquisa.
Para tal, recupero depoimentos dos sujeitos da pesquisa, expressos no decorrer da socialização
final da experiência, e alinhavo algumas considerações.
Quando Karen diz que as atividades das oficinas
“não mudaram nada, mas acrescentou muitas
coisas”
, penso que o fato de acrescentar algo descaracteriza a configuração inicial... Nesse
sentido, o trabalho artístico que foi direcionado através das tarefas de Psiquê, de alguma
maneira repercutiu na ão, pois
“antes, eu passava os conteúdos mecanicamente, mas depois das
oficinas eu percebi que outras coisas estão envolvidas... é olhar o outro... a importância dos meus atos,
pois acabo sendo modelo.”
Paula, em seu tom de voz embargado, questiona o
“que significa eu gostar tanto da tarefa da
semente?!... e não gostar do fogo?!... e o que isso pode significar para mim... na minha prática, dentro
da sala de aula?”
Com estes questionamentos, a professora começa a se perceber de outro jeito,
associando à atividade realizada com as sementes tarefa mais perceptiva ser mais
145
facilitadora, uma vez que ela própria traz em seu jeito de elaborar as atividades e suas
reflexões, um fazer mais perceptivo/sensorial atenta aos detalhes dos fatos e situações.
Como meu objetivo maior foi analisar até que ponto o trabalho com a Arte e o Mito, em
Oficinas de Sensibilização, poderia contribuir para uma reflexão do ser e fazer(-se) do
professor, começo a visualizar novas re-organizações e ressignificações pessoais que se
refletem também no profissional.
Entretanto, tenho claro que, embora no momento da realização das atividades artísticas eu
direcionava de certa maneira o pensar dos sujeitos, isto não me garantia que eu pudesse,
efetivamente, tocar em sentimentos e reflexões relacionadas à prática profissional. Assim se
posiciona Kátia:
“Pra mim, no começo, eu tinha um certo preconceito, vamos chamar de
preconceito... com essa questão da arte... com essa coisa que envolve dinâmicas... ai meu Deus...
porque eu estou entrando nisso... eu não gosto, não é do meu interesse, né? Genteee... foi assim... amor
à primeira vista com o negócio... (rs) eu me descobri... eu adorei muito, muito... foi uma coisa que
mexeu muito comigo... talvez eu tenha me envolvido um pouco mais com a história, né... mas acho
isso também por causa do momento em que eu estou vivendo...”
Nota-se que embora a professora
deixe claro que gostou muito das atividades nas oficinas, ainda assim acabou focando sua
atenção e reflexão tendo como suporte a história mítica. Isso sugere que, nem sempre,
conseguir-se-á atingir a todos com a proposta, uma vez que estamos sujeitos a influências
externas e de outros fatores que poderão desmotivar a prática das atividades.
a professora Mônica traz em seus depoimentos que a questão da Arte foi o que mais a
envolveu. O trabalho com as expressões artísticas deixava-a muito motivada até mais do que a
própria história com exceção da dinâmica com o fogo e o giz de cera derretido...
“mas depois
eu fiquei refletindo e percebi que foi muito rico para mim... então cada momento, cada dia era muito
importante, pois eu aprendi a tentar, ... porque é um trabalho difícil o lidar com algumas
dificuldades...”
Aqui também se percebe como a atividade plástica contribuiu para que o
sujeito pudesse se observar em situações práticas de vida.
As ponderações advindas das atividades com a Arte apoiadas nas tarefas oferecidas pela
história do Mito, contribuíram para acrescentar questionamentos e eixos para a criação de
novas possibilidades, ampliando a percepção de si próprios enquanto ser humano e ser
professor.
146
Para mim fica bem clara a riqueza em se buscar trazer para a formação do professor, outras
formas de contato com a realidade e consigo próprio. Nos depoimentos ao longo do trabalho,
nota-se que os recursos expressivos usados nas oficinas podem contribuir para a descoberta de
aspectos de sua prática que são desafiadores e que merecem atenção e compartilhamento
constantes.
Entretanto, essa pesquisa não se esgota neste momento, uma vez que o universo da Arte
aliado ao estudo dos mitos abrem várias possibilidades para um trabalho de reflexão-ação-
reflexão sobre o ser e o fazer (-se) professor.
As Oficinas de Sensibilização, tendo como suporte teórico o continuum das terapias
expressivas (ETC), contribuem para um direcionamento da reflexão/ação em propostas de
oficinas de criatividade/de sensibilização nas quais se vivencia o fazer artístico como
expressão do ser. O importante é que se realize uma proposta que permita ao sujeito viver
uma experiência significativa. Esta proposta é apenas um norte que pode ser seguido, uma
possibilidade para direcionar o olhar tanto daquele que participa da oficina, como daquele que
a coordena.
Justamente quando Paula, ao olhar sua caixa pintada e pronta afirma:
“fiquei pensando em que
momentos eu sou mais Afrodite e em que momentos sou mais Psiquê... porque eu sou muito a razão...
e eu acho que a minha caixa é bem isso, né... as formas geométricas... o jeito como eu fiz...”
Nota-se
como o fazer expressivo, o refletir sobre o fazer e ampliar essa reflexão para outras situações
de vida é algo significativo, pois se visualiza um jeito de ser que, de outra maneira (fazendo
uso somente da linguagem verbal), teria outra significação. É um re-criar-se, re-descobrir-se
de outro jeito, ampliando-se contextualizações de significados/ação!
Interessante observar que em relação às nove professoras, a pesquisadora não encontrou
resistência mais séria... no início um pouco de timidez para as sensibilizações corporais, para
a troca de experiências, mas logo um ambiente de cumplicidade se instalou o que favoreceu
imensamente a realização de toda a pesquisa.
“Na verdade, como é bom a gente poder refletir porque acho que individualmente cada uma vinha
aqui com um objetivo, com uma curiosidade, com uma intenção e de uma certa forma o pessoal
balançou muito... o olhar de cada uma mudou em relação a nossa prática e nossa vida pessoal [...]”
147
Com as palavras de Tereza, nota-se, também, a importância de um trabalho dessa
característica ser feito em grupo, uma vez que o espaço de reflexão se enriquece em função da
troca de experiências, abrindo espaços na própria instituição educacional para que seus
colaboradores (alunos, professores, coordenação e direção) possam surgir como seres inteiros,
isto é, com suas potencialidades, facilidades, mas também seus medos e incertezas.
Novamente é o viver a complexidade que faz parte da condição humana, e poder, nas palavras
de Morin, reformar o pensamento para pensar a reforma. É a visão sistêmica ganhando espaço
e religando todos os saberes, formando a teia da vida!
Justifica-se assim, dentro desta pesquisa, o porquê da escolha do Mito de Eros e Psiquê e
vivenciá-lo em oficinas, uma vez que para ressignificar o momento sociocultural no qual se
está inserido, somente o saber diferenciar, através do olhar de águia, o essencial do
secundário e saber aguardar o momento para a ação certa e precisa é que mobilizará
transformações no ser e no fazer do ser humano, no ser e fazer do professor que, certamente,
se revelarão no ser e fazer do aluno! É um exercício que parte do intrapessoal para chegar
até o interpessoal, criando-se movimentos dinâmicos que servirão de alimento para a própria
relação educacional.
A ação impulsionadora e motivadora do professor deve estar calcada em dois movimentos que
funcionam como linhas/guias conduzindo-o por duas vias... a da afetividade e a da cognição,
do sentimento e da razão de Eros e de Psiquê permeando suas ações... movimentos que se
cruzam, se distanciam, novamente se misturam, pois são eles, aliados à sensibilidade e
criatividade, a valores morais e éticos, que ajudarão na configuração de um novo educador.
Entretanto, necessidade de não se ficar com uma idéia por demais frágil e piegas de que
basta somente que se desenvolva um “apaixonamento”, uma ampliação da consciência ainda
linear e simplista para que tudo acabe dando certo... o aprender dói, como diz Madalena
Freire, pois exige o contato com a falta, com a incompletude que irá, em muitas vezes,
acompanhar os passos durante a caminhada... e o pensar sobre a prática, o resgate da memória
de nossas andanças pessoais e profissionais “é um diálogo mesmo que travamos, solitários,
com os mil outros que vivem dentro de nós (FREIRE, 2008, p.204).”
Mito de Eros e Psiquê... docência... linguagens... oficinas... sentimentos... sensações...
imaginação... buscando reunir os fios para montar essa trama... ressignificações se fazem
148
presentes... e tudo dependerá do interesse e da crença do pesquisador... daquele que cansado
da mesma paisagem busca outros cenários... busca outros caminhos...
No momento em que esta pesquisa chega nesta etapa, consciente de que o estudo não chegou
ao fim... quando desfeita a ambiência que mobilizou a vivência do Mito e conseguindo
avistar os professores/parceiros desta jornada chegando aos seus cantos...
“busco afagar a terra... conhecer os desejos da terra...
cio da terra que propicia fecundar o chão”...
E assim... espalho sementes... deixando pegadas... que ficarão no aguardo de outros
viajantes... e mais outros... na eterna busca por novas paragens... novas aprendizagens...
149
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identidade do professor universitário e suas possibilidades emancipatórias.. PUC/SP, 2004.
154
APÊDICE
155
ETREVISTA SEMIDIRIGIDA
Foi realizada após as Oficinas de Sensibilização:
IDETIFICAÇÃO DA PROFESSORA
NOME:
IDADE:
ESTADO CIVIL / TEM FILHOS (IDADE):
FORMAÇÃO ACADÊMICA E TRAJETÓRIA PROFISSIOAL
FORMAÇÃO ACADEMICA (LOCAL E DATA DO TÉRMINO DO CURSO):
POSSUI CURSO(S) DE ESPECIALIZAÇÃO (NOME E DATA DO TÉRMINO):
QUANTO TEMPO ESTÁ TRABALHANDO EFETIVAMENTE COMO
PROFESSORA?
SÉRIE EM QUE ESTÁ TRABALHANDO E QUE JÁ TRABALHOU:
VOCÊ FAZ COM FREQUENCIA CURSOS DE CAPACITAÇÃO
PROFISSIONAL?
A CADA ANO ( )
A CADA 2 ANOS ( )
A CADA 5 ANOS ( )
A CADA 10 ANOS ( )
NUNCA FEZ ( )
156
ITERESSES PROFISSIOAIS
IDENTIFIQUE OS MOTIVOS QUE A LEVARAM A ESCOLHER A PROFISSÃO
DE PROFESSORA.
IDENTIFIQUE OS MOTIVOS QUE FAZEM COM QUE VOCÊ PERMANEÇA NA
PROFISSÃO DE PROFESSORA COMO VOCÊ O FUTURO DE SUA
ATUAÇÃO?
FALE SOBRE A EXPERIÊCIA DESSAS OFICIAS DE SESIBILIZAÇÃO
SOBRE SUA PRÁXIS.
O MITO, USADO COMO METÁFORA ESSAS OFICIAS, COTRIBUIU PARA A
REFLEXÃO DE SUA PRÁTICA DOCETE? COMO?
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