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Universidade de São Paulo
Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto
Departamento de Psicologia e Educação
Programa de Pós-Graduação em Psicobiologia
Integração de informações visuais e verbais na memória de trabalho
JULIANA PARDO MOURA CAMPOS GODOY
Dissertação apresentada à Faculdade de
Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto,
como parte das exigências para obtenção do
título de Mestre em Ciências, área de
Psicobiologia.
Ribeirão Preto
2010
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JULIANA PARDO MOURA CAMPOS GODOY
Integração de informações visuais e verbais na memória de trabalho
Dissertação apresentada à Faculdade de
Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto,
como parte das exigências para obtenção do
título de Mestre em Ciências, área de
Psicobiologia.
Orientador: Prof. Dr. César Aléxis Galera
Ribeirão Preto
2010
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2
Autorizo a reprodução e divulgação total ou parcial deste trabalho, por qualquer
meio convencional ou eletrônico, para fins de estudo e pesquisa, desde que
citada a fonte.
FICHA CATALOGRÁFICA
Godoy, J.P.M.C
Integração de informações visuais e verbais na memória de
trabalho. Ribeirão Preto, 2010.
58 p. : il. ; 30cm
Dissertação de Mestrado, apresentada à Faculdade de Filosofia,
Ciências e Letras de Ribeirão Preto/USP. Área de concentração:
Psicobiologia.
Orientador: Galera, César Aléxis.
1. Integração de Informações. 2. Memória de Trabalho.
3. Atenção. 4. Tarefas duplas.
3
FOLHA DE APROVAÇÃO
Juliana Pardo Moura Campos Godoy
“Integração de informações visuais e verbais na memória de trabalho”
Dissertação apresentada à Faculdade de Filosofia,
Ciências e Letras de Ribeirão Preto da USP, como parte
das exigências para a obtenção do título de Mestre em
Ciências. Área: Psicobiologia.
Aprovado em: _____ /_____ /_____
Banca Examinadora
Prof (a). Dr (a).__________________________________________________________
Instituição: _____________________________________________________________
Assinatura: ____________________________________________________________
Prof (a). Dr (a).__________________________________________________________
Instituição: _____________________________________________________________
Assinatura: ____________________________________________________________
Prof (a). Dr (a).__________________________________________________________
Instituição: _____________________________________________________________
Assinatura: ____________________________________________________________
4
A Deus, pelo dom da Vida.
Aos meus pais, Eulália e João por todo amor.
As minhas irmãs, Ana Leonor e Mariadélia pela
cumplicidade.
Ao Anderson pelo companheirismo.
5
Agradecimentos
Agradeço em especial ao Professor Doutorsar Aléxis Galera pela orientação,
amizade, compreensão, carinho e principalmente sabedoria.
Ao Professor Doutor José Aparecido pela supervisão do trabalho.
Aos meus pais, João Batista Godoy e Eulália Pardo Moura Campos Godoy pela
dedicação, educação e amor.
As minhas irmãs, Ana Leonor e Mariadélia, pelas quais meu amor incondicional me
faz prosseguir.
Ao meu namorado, Anderson de Aguiar Simon, pessoa a qual tenho grande respeito
e amor. Companheiro para a vida toda.
Ao José Antônio, Luzia, Gleycê, Dona Vilma, Kátia, Marcelo, Viviane e Mário
pelo carinho em família.
A grande amiga, Cátia Lira do Amaral, por fazer parte do meu dia a dia.
As eternas amigas, Daniela Waseda, Maraísa Dias, Cinthya Miura, Vanessa
Galinari, pelo carinho e apoio de todas as horas.
Aos atuais amigos e companheiros de laboratório: Mikael, Jeanny, Karla, Ricardo,
Danila, Mariana, Paola, Hugo, Ana Paula, Eduardo, Natália e Rafael pelo compartilhar
de seus conhecimentos e pelas horas de companheirismo.
Aos amigos Roberto, Marcelo, Edson, Yara e Carolina pelos momentos de
descontração e apoio.
Ao Igor e a Renata pelo suporte técnico e acadêmico.
Aos participantes dos experimentos pela dedicada cooperação, sem a qual não seria
possível a realização desse estudo.
A USP e a FFCLRP pela oportunidade de realização do curso de mestrado.
A CAPES pelo apoio financeiro para a realização desta pesquisa.
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Resumo
Godoy, J.P.M.C (2010). Integração de informações visuais e verbais na memória de trabalho.
Dissertação de Mestrado, Faculdade de Filosofia Ciências e Letras de Ribeirão Preto,
Universidade de São Paulo, Ribeirão Preto.
O paradigma de tarefas duplas foi utilizado para investigar o envolvimento da
atenção na conjunção da informação verbal e visual na memória de trabalho, e o papel
específico desses componentes quando integrados. Em dois experimentos os sujeitos (33)
memorizaram seqüências de Faces, Nomes, ou Conjunções face-nome. No experimento 1
essas condições foram realizadas, em blocos separados, isoladamente ou junto com uma
contagem regressiva de três em três (CR3). No experimento 2 essas condições foram
realizadas, em blocos separados, com uma supressão articulatória (SA) e com um ruído visual
dinâmico (RVD). A CR3 provocou um prejuízo maior na condição de conjunção do que nas
de faces e nomes (Exp 1). A SA e o RVD têm efeitos iguais e mais acentuados sobre a
conjunção; a SA tem um efeito mais pronunciado do que o RVD nas condições de face e
nome (Exp 2). O prejuízo maior da CR3 sobre a conjunção, em comparação com nomes e
faces sugere que a integração de características visuais e verbais exigiu o envolvimento da
atenção. Além disso, o efeito diferenciado da SA no armazenamento das características
visuais e verbais isoladas sugere que estas podem ser armazenadas de maneira diferente
quando integradas.
Palavras-chave: memória de trabalho, integração de informação, atenção e tarefas duplas.
7
Abstract
Godoy, J.P.M.C (2010). Integration of visual and verbal information in working memory
Dissertação de Mestrado, Faculdade de Filosofia Ciências e Letras de Ribeirão Preto,
Universidade de São Paulo, Ribeirão Preto.
The dual tasks paradigm was used to investigate the involvement of attention in the
binding of verbal and visual information in working memory, and the specific role of these
components when they are integrated. Two experiments were carried out, with 33 subjects,
who memorized sequences of faces, names, or face-name conjunctions. In the Experiment1,
these conditions were performed in separate blocks, either alone or with a backward counting
in threes (CR3). In experiment2, these conditions were performed in separate blocks, with
Articulatory Suppression (AS) and Dynamic Visual Noise (DVN). The CR3 caused greater
loss in the conjunction than in the faces and names condition (Exp.1). The SA and the DVN
have equivalent effect and they show more relevant effects in the conjunction condition. The
SA revealed more relevant effect than the DVN in the face and name conditions (Exp.2). The
greater prejudice of CR3 in binding, compared to that obtained in names and faces suggested
that the integration of visual and verbal features demanded the involvement of attention.
Moreover, the differential effect of SA towards DVN in the storage of isolated visual and
verbal features, suggests that they may be stored in different ways when integrated.
Keywords: working memory, binding of information, attention and dual task
8
Lista de Figuras
Figura 1: Modelo da memória de trabalho..............................................................................15
Figura 2: Exemplo de faces (A) e nomes (B) utilizados nos experimentos............................ 30
Figura 3: Esquema da tarefa com a condição de conjunção com contagem regressiva no
experimento 1............................................................................................................................32
Figura 4: Porcentagem de respostas corretas em função dos diferentes tipos de estímulos
(visual, verbal e conjunção) e da presença da tarefa secundária...............................................33
Figura 5: Tempo de resposta dos sujeitos nas tarefas de memória para faces, nomes, e
conjunção face-nome sob as condições de tarefa secundária com contagem e sem contagem,
no experimento 1.......................................................................................................................35
Figura 6: Ruído visual dinâmico.............................................................................................36
Figura 7: Esquemas das tarefas de memória nas condições (A) conjunção com ruído visual
dinâmico e (B) supressão articulatória......................................................................................38
Figura 8: Porcentagem de respostas corretas em função dos diferentes tipos de estímulos
(visual, verbal e conjunção) e a tarefa secundária (supressão articulatória ou ruído
visual)....................................................................................................................................... 40
Figura 9: Tempo de resposta dos sujeitos nas tarefas de memória para faces, nomes, e
conjunção face-nome sob as condições de tarefa secundária ruído visual e supressão
articulatória, no experimento 2.................................................................................................41
9
Sumário
1. Introdução............................................................................................................................10
1.1 Memória de trabalho...................................................................................................11
1.2 Fracionamento dos componentes................................................................................15
1.3 Relação dos componentes e a integração de informação............................................16
1.4 O papel da atenção na integração da informação........................................................19
1.5 Paradigma da tarefa dupla...........................................................................................23
1.6 TDAH e memória de trabalho.....................................................................................25
2. Objetivos..............................................................................................................................26
2.1 Objetivo geral..............................................................................................................27
2.2 Objetivos específicos..................................................................................................27
3. Experimentos.......................................................................................................................28
3.1 Experimento I..............................................................................................................29
3.2 Experimento II............................................................................................................35
4. Discussão Geral...................................................................................................................42
4.1 Relação entre a informação integrada e a isolada.......................................................45
4.2 Implicações práticas e relações futuras.......................................................................46
5. Conclusão.............................................................................................................................49
Referências...............................................................................................................................51
Anexo........................................................................................................................................56
1- Introdução
11
A memória é um fenômeno de extraordinária complexidade que, em seu papel na
definição do que é o indivíduo e na utilização do que fazemos com o passado para nos
definirmos no presente, pode ser considerada uma força unificadora e construtiva, impedindo
o rompimento em fragmentos da nossa consciência. Ao impedir a sensação de que se vive
apenas em segundos, a memória é a grande responsável pelo senso de continuidade, do qual
depende a história de um indivíduo (Lunardi, 2003).
Dentro deste contexto, a memória de trabalho surge como um dos mais importantes
tópicos da psicologia cognitiva atual, sendo destacada a relevância deste construto tanto para
a psicologia básica quanto para a psicologia aplicada. Segundo Baddeley (2007), ela estaria
associada ao funcionamento das atividades mentais complexas que utilizam vários recursos
cognitivos, tais como o raciocínio, aprendizagem, leitura, compreensão entre outras.
O enfoque dado por Baddeley (1986) ao estudo da memória de trabalho está centrado
no fracionamento de seus sistemas de memória em subsistemas básicos, especialmente no
armazenamento de diferentes tipos de informação. Porém, a literatura recente tem enfocado a
manutenção da informação integrada por apresentar um papel importante para o
desenvolvimento do modelo proposto por Baddeley e Hitch (1974), colocando em pauta
questões como a necessidade de um armazenador integrador, o buffer (armazenador
episódico), e a necessidade ou não de recursos extras do executivo central (Baddeley, 2000;
Repovs & Baddeley, 2006; Allen, Baddeley & Hitch, 2006).
O propósito deste trabalho foi investigar se a conjunção de informações visuais e
verbais na memória de trabalho requer recursos suplementares da atenção e se o
armazenamento da informação integrada é diferente da informação isolada. Assim, em um
primeiro momento, apresentaremos o modelo da memória de trabalho elaborado por Baddeley
e Hitch (1974). Em seguida, apontaremos os estudos referentes à dissociação dos
componentes do modelo e a integração de informações. Em uma segunda etapa,
descreveremos a estrutura do modelo experimental, os resultados obtidos e uma discussão
destes resultados. Em um terceiro e último passo apresentaremos as considerações finais
deste estudo e sua relevância para a prática aplicada.
1.1 Memória de trabalho
A memória de trabalho é um sistema de curto prazo que nos permite realizar
simultaneamente o armazenamento e a manipulação de informações enquanto uma
12
determinada tarefa cognitiva é executada. Mesmo sendo um sistema de capacidade limitada,
os processos que a envolvem abrangem uma importante gama de tarefas como leitura,
compreensão, argumentação, aprendizagem e raciocínio. Na versão original do modelo
proposto por Baddeley e Hitch (1974), a estrutura da memória de trabalho foi definida por um
executivo central, mecanismo de controle, que atua como um sistema de atenção e dois
subsistemas subsidiários de apoio, o laço fonológico, que atua como sistema de
armazenamento auditivo e fonológico, e o esboço visuo-espacial, que atua como sistema de
armazenamento visual e espacial (Baddeley, 2003, 2000, 1996, 1986; Repovs & Baddeley,
2006).
O laço fonológico é responsável por armazenar e manter um número limitado de
informações verbais e auditivas. Este componente é formado por um mecanismo de
armazenamento passivo, diretamente envolvido com a percepção da informação, que assegura
e mantêm traços de memória em forma acústica ou fonológica que enfraquecem em pouco
tempo. Além disso, compreende um processo ativo de recitação articulatória, que mantém a
informação na memória através do mecanismo de recitação interna, análogo à fala subvocal
(Baddeley, 2000).
O sistema da memória visuo-espacial de curto prazo foi proposto inicialmente para
explicar resultados experimentais que não eram facilmente explicáveis em termos da memória
verbal (Baddeley, 1986). Este sistema tem como função armazenar e manipular as
informações visuais dos objetos e suas respectivas relações espaciais. Estudos recentes deste
componente têm enfocado a compreensão de suas características (Repovs & Baddeley, 2006)
e a dissociação de seus subcomponentes (Della Salla, Gray, Baddeley, Allamano & Wilson,
1999; Logie, 1995; Smith, Jonides, Koeppe, Awh, Schumacher & Minoshima, 1995).
Assim, a informação proveniente do meio externo, se for constituída de palavras, por
exemplo, será mantida durante um curto espaço de tempo, enquanto estiver sendo processada
cognitivamente, no laço fonológico. Se a informação for constituída por imagens, será
mantida no esboço visuo-espacial (Oliveira, 2007).
Estes sistemas são gerenciados e controlados pelo executivo central, um componente
crucial para o funcionamento da memória de trabalho. Embora seja o componente mais
complexo e menos compreendido (Baddeley, 1986) atua como um elemento responsável pelo
processamento da informação e pelo controle da atenção. Sendo versátil, supervisiona e
coordena os conteúdos dentro da memória de trabalho, bem como sua posterior integração
com a memória de longo prazo (Repovs & Baddeley, 2006; Baddeley, 1996).
13
Baddeley (1986) realçou a necessidade de um detalhamento do executivo central e
para suprir esta necessidade adotou o modelo neuropsicológico de Norman e Shallice (1980).
De acordo com este modelo o controle da ação se através de um Sistema Atencional
Supervisor (Supervisory Attentional System, SAS). Ações aprendidas e automatizadas pelo
treinamento extensivo são guiadas por “esquemas” adquiridos por treinamento prévio
disparados por conjuntos de estímulos ou contextos. Conflitos eventuais entre as atividades de
diferentes esquemas seriam solucionados por um “mediador de conflitos” também treinado
previamente.
Todavia, quando atividades novas estão envolvidas ou quando um estímulo urgente é
apresentado, o SAS assume o controle da ação. Este sistema teria a função de inibir e de ativar
esquemas diretamente (Baddeley, 1986, 2007). Por exemplo, andar de bicicleta envolve
esquemas como pedalar, inclinar, virar, equilibrar e brecar. Ao se andar de bicicleta, essas
sub-rotinas tornam-se pré-ativadas; um obstáculo à frente seria um estímulo ambiental
suficiente para acionar um “esquema” para brecar ou desviar. Então, quando um estímulo
urgente ou ameaçador é apresentado o SAS assume o controle da ação. De acordo com
Repovs e Baddeley (2006), adotar o sistema SAS para explicar o executivo central oferece um
suporte para as tarefas e processos que necessitam de um controlador atentivo, pois o
executivo central parece estar envolvido principalmente como uma fonte de controle da
atenção, focalizando e dividindo-a entre tarefas simultâneas.
Ainda no que concerne à questão estrutural, o modelo da memória de trabalho passou
por mudanças. Este sistema de memória com dois armazenadores mostrava uma fraqueza
quando era necessário integrar em uma representação unitária as informações de sistemas
separados como o visual e o verbal, ou quando era necessário fazer a interface da informação
nova com a informação da memória de longo prazo. Estas dificuldades sugeriram ao autor
Baddeley a necessidade de um terceiro armazenador, um buffer (armazenador episódico), que
teria a função de integrar e armazenar temporariamente em representações complexas, as
informações armazenadas nos outros subsistemas, assim como aquela recuperada da memória
de longo prazo (Baddeley, 2000; Repovs & Baddeley, 2006).
O buffer episódico é um armazenador com capacidade limitada em termos de
números de episódios ou chuncks (agregados) (Baddeley, 2000). Miller (1956) demonstrou
que a capacidade de processamento da memória humana se estabelece em um patamar de sete
unidades ou chuncks de letras, números ou palavras, com um grau de variação de mais ou
menos dois. Allen, Baddeley e Hitch (2006) acreditam que existem diferentes formas de
14
chuncks dependendo se a união das informações envolve um ou mais subsistemas da memória
de trabalho.
É importante ressaltar que o modelo da memória de trabalho (Baddeley, 2000)
assume que o acesso dos subsistemas para o buffer ocorre através do executivo central. Então,
qualquer forma de conjunção que requeira a codificação, o armazenamento ou ambas as
funções dentro do buffer será particularmente dependente de recursos gerais da atenção
vindos do executivo central (Allen, Baddeley & Hitch, 2006).
Um exemplo tornará mais claras as funções desempenhadas pelos diferentes
componentes da memória de trabalho. Diante de um problema de aritmética escrito para um
indivíduo, este deverá ser capaz de “ler” o código visual escrito utilizando seu esboço visuo-
espacial para, antes de qualquer outra coisa, manter o enunciado do problema armazenado por
tempo suficiente para que possa processá-lo. Esta manutenção é implementada no laço
fonológico, onde a fim de estender o tempo de manutenção dessas informações, evitando sua
perda prematura, o indivíduo pode lançar mão da repetição subvocal. A compreensão do
enunciado requer o recrutamento do processador especializado em linguagem que contém o
conhecimento relativo à fonologia, sintaxe e semântica.
A seguir, será necessária a construção de algum tipo de representação do problema,
que conduzirá o indivíduo à seleção de algoritmos matemáticos apropriados, disponíveis na
memória de longo-prazo, tendo como componente atuante nesta interface o buffer.
Finalmente, o indivíduo executará os algoritmos e irá monitorar esse processo, a fim de
chegar ao objetivo que é a solução do problema. Todo esse processo é gerenciado pelo
executivo central, desde a ativação dos sistemas armazenadores para a manutenção do
enunciado, o recrutamento do processador de linguagem, a busca e seleção dos algoritmos na
memória de longo prazo, sua execução e monitoração, até o recrutamento do módulo de
linguagem para a emissão da resposta. Ou seja, todo o processo cognitivo ocorre em um lugar
“virtual” chamado memória de trabalho, tendo os múltiplos componentes seus papéis bem
definidos.
Na figura 1 pode ser visto o esquema da revisão do modelo proposto por Baddeley
(2000), incluindo partes da memória de longo prazo em cinza e o novo componente, o
armazenador episódico, com sua operação via executivo central.
15
Figura 1: Modelo da memória de trabalho edificado por Baddeley (2000).
1.2 Fracionamento dos componentes
A origem do modelo da memória de trabalho está centrada no estabelecimento da
independência dos seus sistemas. A dissociação entre memória verbal e não-verbal é bem
estabelecida em estudos comportamentais com sujeitos normais (Logie, Zucco & Baddeley,
1990) e em estudos com pacientes neuropsicológicos, no qual foram identificados dois grupos
de sujeitos em tarefas de span (capacidade) de dígitos e blocos de Corsi; um grupo que tinha o
laço fonológico preservado e o componente espacial afetado, e outro grupo de sujeitos com
padrões de resultados opostos (De Renzi & Nichelli, 1975, citado por Baddeley, 2007; ver
também Hanley, Young & Pearson, 1991).
A separação entre os componentes verbal e espacial também foi sugerida por Smith,
Jonides e Koeppe (1996) em um estudo das bases neurais humanas da memória de trabalho.
Neste estudo os sujeitos deveriam memorizar letras e suas respectivas posições sendo
monitorados pelo PET (tomografia por emissão de pósitron). Os resultados mostram que as
tarefas verbais ativam principalmente o hemisfério esquerdo (área de Broca e área pré-
motora) e as tarefas espaciais o hemisfério direito (córtex frontal ventro lateral, e o córtex
occipital e parietal).
Esboço
Visuo-Espacial
Buffer Episódico
Laço Fonológico
Executivo
Central
Semântica
Memória de Longo
Visual Prazo Episódica
Linguagem
16
Além da separação entre os sistemas, estudos da memória de trabalho enfocaram a
dissociação em subcomponentes desses sistemas como já vimos anteriormente. Baddeley
(1986) estabeleceu uma distinção entre um armazenador fonológico, baseado na fala e um
processo de controle articulatório, um recitador. Esta dissociação é apoiada por pesquisas com
pacientes com lesão cerebral, que apresentam armazenamento fonológico intacto, mas um
processo de controle articulatório prejudicado (Vallar, Betta & Silveri, 1997).
Da mesma forma que o laço fonológico pode ser dividido entre armazenador e
articulador fonológico, o esboço visuo-espacial pode ser fracionado em dois componentes
interdependentes. Um subcomponente passivo que armazena informações correlacionadas
com questões do objeto-visual (formas, objetos e cores) e outro ativo que se encarregaria de
lidar com as informações de ordem espacial (localização e movimento) (Della Sala, Gray,
Baddeley, Allamano & Wilson, 1999; Darling, Della Sala & Logie, 2007).
Evidências da dissociação do esboço visuo-espacial também em dois subsistemas
têm sido obtidas em estudos neuropsicológicos (Hecker & Mapperson, 1997; Darling, Della
Sala, Logie & Cantagallo, 2006; Logie, 1995; Pickering, Gathercole, Hall & Lloyd, 2001), em
estudos neurológicos através da tomografia por emissão de pósitron (PET) (Courtney,
Ungerleider, Keil & Haxby, 1996; Smith, Jonides & Koeppe, 1996) e estudos
comportamentais (Logie & Pearson, 1997; Darling, Della Sala & Logie, 2007). Logie (1995)
sugeriu que a memória visuo-espacial é subdividida em um armazenador passivo (visual
cache) que mantêm a informação visual estática e um armazenador ativo (inner scribe) que,
através de um mecanismo espacial de movimento, recita o padrão visual. Outros estudos
comportamentais que avaliaram o desempenho de crianças de diversas faixas etárias na
execução de tarefas de memória para padrões visuais e para seqüências de movimentos
revelaram que as taxas de desenvolvimento são diferenciadas para o armazenamento de
estímulos visuais e espaciais, sugerindo que os componentes são preservados em registros
independentes (Logie & Pearson, 1997).
1.3 Relação dos componentes e a integração de informações
Esta separação dos subcomponentes e dos sistemas vista anteriormente não pode ser
radical. Em algum momento a informação contida em cada subsistema deve ser integrada. Por
exemplo, quando você precisa ir a um lugar novo, você tem pontos visuais de referência (“ao
lado da casa azul”) e tem uma localização espacial a ser percorrida (“vire a direita no
17
semáforo”), estas duas informações devem ser integradas para que você possa corretamente
chegar ao destino desejado.
Experimentalmente, Olson e Marshuetz (2005) mostraram que o reconhecimento de
faces é afetado pela posição em que a face ocorreu, mas o reconhecimento da posição
independe da face que a ocupava. Os resultados sugerem uma interferência significativa da
mudança de localização quando a necessidade de detectar mudanças visuais e essa
interferência se especificamente nas situações de mudanças de localização relativa das
faces e não nas mudanças de localização absoluta. Os autores concluem que os subsistemas
visuais e espaciais não são totalmente independentes, mas que a memória de trabalho visual
carrega em seu processamento informações relacionada apenas à localização relativa dos seus
objetos.
Finke, Bublak, Neugebauer e Zihl (2005) também sugerem que objeto e posição são
armazenados de maneira integrada na memória de curto prazo. Eles investigaram a
informação espacial e a visual em condições de cooperação em dois tipos de tarefas de
memória. Em uma os sujeitos deveriam armazenar a forma ou a localização de um polígono, e
em outra deveria reter a forma e a localização conjuntamente. Os resultados mostram que os
sujeitos apresentam desempenho semelhante nos dois tipos de tarefas, visuais e espaciais.
Quando os sujeitos deveriam responder com base na informação integrada, houve um
decréscimo no desempenho, principalmente quando a dimensão espacial era diferente entre o
teste e o estímulo memorizado. Este dado revela que a localização espacial é uma informação
importante para a recordação de itens conjugados. É importante ressaltar que na condição de
armazenamento em paralelo da informação visual e espacial ocorreu um custo ao sistema,
indicando que a forma e localização competem pelos mesmos recursos.
Treisman e Zhang (2006) também investigaram a contribuição da posição espacial
para a combinação de forma e cor em uma tarefa de reconhecimento de objetos. O paradigma
utilizado procurou determinar a interferência de uma mudança em uma característica
irrelevante de um objeto, por exemplo, sua localização espacial, sobre o reconhecimento de
uma característica relevante, como sua forma e/ou cor. Se for possível mostrar, por exemplo,
que a mudança na posição de um objeto pode interferir em seu reconhecimento, poder-se-á
concluir que o objeto e sua posição foram memorizados em uma representação unitária que
integra o que é e onde está o objeto. Com base neste paradigma, o teste envolvia a
apresentação de três formas coloridas (teste completo) ou de apenas uma forma colorida (teste
simples). A tarefa dos participantes era a de informar se as características do teste eram iguais
às características apresentadas inicialmente. Os resultados indicaram que a integração de
18
características visuais é mediada pela conjunção entre posição e suas características visuais.
Levando em conta que a localização não é relevante para a tarefa, pode-se supor que essa
combinação é feita automaticamente.
Em um estudo preliminar em nosso laboratório, Corder e Galera (2009) aplicaram o
paradigma da detecção da mudança (change detection), utilizado por Treisman e Zhang
(2006), à tarefa de reconhecimento de sequência. O objetivo era determinar se a conjunção de
objeto e posição era codificada automaticamente quando apenas uma das dimensões, o objeto
ou sua posição era exigida para o reconhecimento. Os resultados mostraram que quando se
julga a igualdade de duas seqüências em termos das figuras geométricas, uma mudança na
posição de uma das figuras afeta o reconhecimento da seqüência. Mas, o reconhecimento das
posições espaciais não é afetado pela mudança de um dos objetos da seqüência. Ou seja,
existe uma assimetria na recordação da forma e da posição dos objetos, sugerindo talvez uma
representação hierárquica na qual os objetos podem ser referenciados pela posição que
ocupam, mas a posição não pode ser referenciada pelos objetos.
Evidências experimentais também sugerem que características visuais e verbais
podem ser armazenadas de forma integrada. Por exemplo, Chincotta, Underwood, Ghani,
Papadopoulou e Wresinski (1999) em um estudo sobre a amplitude da memória para números
arábicos e seus vocábulos, mostraram que os indivíduos usavam tanto codificações verbais
como visuais em experimentos manipulando a localização dos estímulos, com e sem tarefas
secundárias (ruído visual dinâmico e supressão articulatória). Os resultados sugerem que a
informação verbal processada no laço fonológico e as informações visuais processadas no
esboço visuo-espacial podem ser combinadas e armazenadas em um lugar comum dentro da
memória de trabalho.
Logie, Della Sala, Wynn e Baddeley (2000) também sugerem a presença de um
código visual para a retenção de seqüências verbais apresentadas visualmente em adição ao
código fonológico. Esses autores realizaram quatro experimentos no qual manipularam o grau
de similaridade, consistência visual (letras maiúsculas e minúsculas), com ou sem supressão
articulatória. Os resultados mostraram que em ambos os estímulos (palavras e letras) a
similaridade entre estímulos visuais (letras) afetou a recordação, e que a supressão
articulatória e a similaridade visual afetam independentemente o desempenho, sugerindo que
os indivíduos podem ser capazes de utilizar dois códigos diferentes na retenção de seqüências
randômicas; o fonológico e visual combinado.
Morey (2009) em um estudo com seqüências espaciais de letras testou se o objeto
isolado ou sua conjunção (espacial e verbal) podem ser armazenados da mesma forma. Em
19
seus resultados o autor verificou que a supressão articulatória prejudicou a memória para
conjunção (espacial-verbal), mas não prejudicou a memória espacial, indicando que a
informação espacial pode ser armazenada de maneira diferente quando for integrada a verbal.
Além disso, sugere que o armazenamento de duas informações de sistemas diferentes pode ser
realizado pelo buffer (Baddeley, 2000), ao invés de serem armazenadas em domínios
específicos.
1.4 O papel da atenção na integração da informação
Uma questão central investigada quando se trata da integração de características na
memória visual diz respeito se esta requer um custo extra do executivo central ou se ocorre
automaticamente. O papel dos recursos da atenção para a memória de trabalho é de particular
importância teórica por ser estipulado como chave na operação realizada pelo buffer na
integração de características (Baddeley, 2000).
No paradigma experimental utilizado por Luck e Vogel (1997) uma tela com um
número variável de estímulos era apresentada para memorização e, depois de um intervalo de
retenção, um estímulo teste igual ou diferente ao primeiro era apresentado para julgamento.
Os resultados mostram que os participantes são capazes de armazenar até quatro objetos com
cores diferentes, ou quatro objetos com orientações diferentes. E, mais interessante, os
participantes podem armazenar até quatro objetos definidos pela conjunção de cor e
orientação. Ou ainda, que objetos definidos pela conjunção de quatro características podem
ser armazenados tão bem quanto objetos definidos apenas por uma característica e que a união
das características dentro dos objetos é um processo automático, isto é não requer recursos da
atenção.
Wheeler e Triesman (2002) utilizando o paradigma da detecção da mudança sugerem
que o armazenamento é realizado tanto em termos de características isoladas como de
características integradas, e que esta integração não é um processo automático, mas necessita
de atenção. Estas autoras realizaram cinco experimentos em que uma série de formas
coloridas era apresentada aos sujeitos e depois de um intervalo de retenção, o estímulo teste,
variando em forma e/ou cor, era apresentado para o julgamento. É importante ressaltar que
nas provas em que os estímulos teste eram diferentes do apresentado inicialmente, as mesmas
características eram apresentadas, mas com conjunções diferentes. Os resultados mostram que
o desempenho foi pior nas situações em que houve diferenças nas conjunções do estímulo
20
teste, sugerindo que os objetos são armazenados em conjunções visuais e que estas se
desintegram se não houver recursos atentivos suficientes para mantê-las ativas em um
arquivo de objeto”.
Allen, Baddeley e Hitch (2006) investigaram se na integração e armazenamento das
características visuais são necessários recursos atentivos (processo ativo) ou não (processo
automático). O paradigma utilizado neste estudo foi de uma tarefa de reconhecimento com
uma tarefa dupla, a qual possibilita verificar o envolvimento dos recursos atentivos na
integração das características na memória de curto prazo. A tarefa principal consistia na
apresentação de quatro figuras geométricas com cores diferentes, com uma tarefa secundária
no intervalo de retenção, a contagem regressiva. Depois do intervalo de retenção, uma figura
teste era apresentada e o sujeito deveria julgar se a cor e/ou forma era igual à figura original.
Os resultados mostraram que a tarefa secundária afeta a precisão das respostas e que o efeito
da contagem regressiva foi semelhante tanto nas tarefas com característica integradas, como
nas características isoladas. Sugerindo assim, que a integração das características visuais (cor
e forma) foi mantida na memória sem a necessidade do envolvimento extra do executivo
central, ou seja, a integração foi um processo automático.
Johnson, Hollingworth e Luck (2008) examinaram o papel da atenção na manutenção
de características integradas na memória de trabalho visual utilizando o paradigma de
detecção da mudança. Os participantes deveriam detectar mudanças nas cores e orientações
espaciais dos objetos apresentados para a memorização. Para os autores, se a atenção é mais
importante para manter a conjunção do que a característica isolada, a tarefa que requer
atenção deve especialmente romper o desempenho da tarefa de memória para a conjunção.
Em seus resultados o oposto foi encontrado, tanto a tarefa de memória para conjunção como
para característica isolada foram prejudicadas igualmente pela tarefa de detecção da mudança,
indicando que a conjunção não requer recursos extras da atenção.
Baddeley, Hitch e Allen (2009) exploraram se a integração da informação verbal na
memória de trabalho envolve um buffer e se este requer ou não recursos extras da atenção. Os
autores utilizaram o paradigma de tarefas duplas, comparando os efeitos de diferentes tarefas
concorrentes (contagem regressiva, supressão articulatória) na recordação serial imediata de
sentenças e de listas de palavras. Os resultados mostraram que as tarefas secundárias
prejudicaram a recordação global, mas não removeram ou reduziram o efeito da superioridade
da sentença em relação à lista de palavras, sugerindo que processos executivos não são
essenciais para a conjunção das sentenças. Além disso, os autores sugerem a completa
21
separação entre o controle executivo e o armazenamento passivo episódico, tendo o buffer
acesso direto aos sistemas e a memória de longo prazo.
De maneira geral, os estudos que investigaram a relação entre atenção e memória
visual sugerem que a capacidade de armazenamento do sistema depende mais do número de
objetos do que de características isoladas e que esta integração é um processo automático. Da
mesma forma que a informação de um mesmo sistema pode ser integrada, as características de
sistemas diferentes como visuais e verbais ou verbais e espaciais também podem ser
armazenadas de maneira integrada? Por exemplo, em uma conferência, a apresentação é
composta pela voz do apresentador e por imagens visuais contidas nos slides, exigindo da
platéia que integre as duas informações para melhor compreensão. Esta integração requer
recursos da atenção?
Prabhakaran, Narayanan, Zao e Gabrieli (2000) utilizaram a imagem funcional para
identificar as regiões cerebrais envolvidas na manutenção da informação integrada e não
integrada na memória de trabalho. Nos experimentos os indivíduos realizavam quatro tarefas
com informações verbais, espaciais e a conjunção delas. Um aparelho de ressonância
magnética registrava a área mais ativada durante as tarefas. Os resultados mostraram que o
córtex frontal é mais ativado na manutenção das conjunções do que das características
isoladas, região esta potencialmente implicada com o envolvimento do executivo central.
Além disso, os sujeitos foram mais precisos e rápidos para objetos integrados do que objetos
separados, sugerindo que mais recursos neurais são necessários para manter a informação
separada.
Zhang, Zhang, Sun, Li, Wang, He & Hu (2004) investigaram as funções envolvidas
na memória de trabalho para ordem temporal com modalidade de apresentação cruzada
(dígitos auditivos e localização visual). Os sujeitos deveriam recordar gitos auditivamente e
suas localizações apresentadas visualmente em ordem misturada ou não. Através da
ressonância magnética os autores perceberam que o córtex pré-frontal direito pode ter um
papel importante para a integração de modalidades cruzadas, assim com o estudo de
Prabhakaran, et al. (2000). Estes dois estudos identificam o importante papel do córtex pré-
frontal (atenção), na integração de diferentes sistemas da memória de trabalho e demonstram
um possível correlato neural ao buffer.
Gajewski e Brockmole (2006) testaram o papel da atenção para a manutenção da
conjunção na memória utilizando uma dica espacial exógena em apresentações visuais e
recordação verbal de formas, cores ou ambas. Embora a dica tenha influenciado o
desempenho da tarefa principal indicando um papel geral da atenção na manutenção do
22
objeto, os autores observaram um padrão de “tudo ou nada” para o esquecimento. Estes
resultados sugerem que os objetos são processados como unidades únicas e que as
características são recordadas independentes mesmo quando a atenção é retirada.
Maybery et al. (2009) investigaram a conjunção verbal e a localização espacial na
retenção de seqüências de estímulos acústicos distribuídos espacialmente em diversos alto-
falantes ao redor do participante. Os resultados mostraram que a conjunção persiste na
memória de trabalho e é independe da codificação de outros sons. Além disso, que a
integração parece ser uma propriedade geral da retenção da informação auditiva e todos os
experimentos apontam para um papel central da atenção voluntária, quando os sujeitos
mantêm ambas as características e também apenas uma.
Bao, Li e Zhang (2007) investigaram a atenção seletiva dentro da memória de
trabalho verbal e espacial separadamente ou sua conjunção. Os resultados demonstraram que
a mudança de atenção entre propriedades de um item integrado (informação verbal e espacial)
na memória de trabalho foi mais rápida quando ambas as características compreendiam o
mesmo objeto do que para características isoladas, sugerindo que diferentes informações
podem ser integradas e podem requerer o foco da atenção, sendo um processo voluntário.
Elsley e Parmentier (2009) compararam o desempenho da tarefa principal de
reconhecimento de letras e suas localizações realizadas com e sem uma tarefa secundária
atencional (seqüência de tons puros). O objetivo era investigar se a conjunção de informações
verbais (apresentada visualmente) e espaciais envolvia recursos gerais da atenção. Para os
autores se o desempenho da tarefa primária com a tarefa secundária fosse menor para a
conjunção do que para as características isoladas, significaria que esta requer recursos da
atenção. Os resultados mostraram que a tarefa secundária teve um efeito prejudicial sobre a
tarefa principal afetando principalmente a memória para a conjunção verbal e espacial,
sugerindo o envolvimento do executivo central no armazenamento desse tipo de conjunção na
memória de curto prazo.
Caprio, Godoy e Galera (submetido) investigaram a integração da informação visual
e verbal utilizando uma tarefa de localização espacial na qual os sujeitos deveriam recordar as
posições dos estímulos identificáveis por informações visuais (faces), verbais (nomes de
pessoas, de objetos e pseudopalavras) e a conjunção deles. Os resultados mostraram que essa
combinação não acontece automaticamente, pelo contrário, quando ambas as modalidades
devem ser armazenadas um prejuízo para o desempenho, tanto para o visual como para o
verbal. O efeito simétrico sobre a tarefa visual e a tarefa verbal sugere que o prejuízo que
acompanha a necessidade de armazenar tanto o nome como a face, é externo aos sistemas
23
verbal e o visuo-espacial. Nesse caso, pode-se atribuir o prejuízo tanto à capacidade de
armazenamento do terceiro sistema de armazenamento, buffer, como se pode atribuir o
prejuízo a uma limitação atencional.
Mais recentemente, Allen, Hitch e Baddeley (2009) examinaram o papel da atenção
na conjunção de cores e formas através de duas modalidades de apresentação, a visual e a
verbal. Nos três experimentos foram realizadas tarefas de reconhecimento nas quais os
sujeitos desempenhavam quatro condições: cor e forma em um único objeto, cor e forma em
objetos separados, cor apresentada auditivamente e forma visualmente e vice-versa. Os
resultados demonstraram que os participantes foram capazes de integrar as características
através das duas modalidades de apresentação (visual e auditiva) e que o armazenamento da
conjunção não requer maior demanda de atenção, sugerindo ser um processo automático.
Em suma, é possível verificar que a memória de trabalho é capaz de reter
temporariamente diversas informações de forma integrada. Porém, ainda dúvidas na
literatura se a conjunção de informações de sistemas diferentes como o visual e verbal é
realizada com ou sem um custo extra do executivo central, e como os recursos dos dois
componentes são utilizados neste processo. Assim sendo, o objetivo deste trabalho foi
investigar se a integração da informação verbal (nomes) e visual (fotos de faces humanas) na
memória de trabalho requer recursos suplementares da atenção e se o armazenamento da
informação integrada era diferente da informação isolada comparadas com as mesmas tarefas
secundárias. Com esse objetivo utilizamos uma tarefa de memória de reconhecimento com o
paradigma de tarefas duplas, no qual havia tarefas secundárias que exigiam recursos da
atenção, (contar de trás para frente de 3 em 3), recursos visuais (ruído visual dinâmico), e
recursos fonológicos (supressão articulatória).
1.5 Paradigma da tarefa dupla
A idéia principal da tarefa dupla é que se a capacidade de um componente da
memória de trabalho é saturada por uma tarefa inicial, o desempenho simultâneo de uma
segunda que utilize os mesmos recursos irá prejudicar o desempenho da tarefa primária
(Baddeley, 1986; Quinn & McConnell, 1996, 1999). O fator de interesse é o decréscimo no
desempenho da tarefa primária ocasionado pela atividade concomitante da tarefa secundária,
relacionada à condição controle, quando não interferência (Klauer & Zhao, 2004, Mohr &
Linden, 2005). Este paradigma se mostrou consistente e válido tanto para pacientes saudáveis
24
quanto para pacientes com danos cerebrais, como no caso de pacientes com Alzheimer
(MacPherson, Della Sala & Logie, 2004).
A contagem regressiva é um exemplo de tarefa dupla que, de acordo com Allen, et
al. (2006), é um ótimo instrumento para avaliar a influência dos processos atentivos em
tarefas que também dependam da atenção. Lee e Kang (2002) demonstraram que a tarefa
dupla envolve diferentes subsistemas da memória de trabalho, tendo efeito diferenciado nas
tarefas de multiplicação e subtração, além disso, a contagem regressiva limita a codificação
verbal nos testes que utilizam padrões visuais, exigindo uma demanda maior de atenção.
O ruído visual dinâmico é outra técnica usada como tarefa dupla e consiste em
apresentar ao sujeito uma tela preta com quadrados brancos que mudam continuamente do
preto para o branco de maneira aleatória, criando um efeito característico do chuviscar da
televisão, capaz de causar queda no desempenho da memória de trabalho visual (Quinn &
McConnell, 1996, 1999; Darling, Della Sala & Logie, 2009). Quinn e McConnell (2006)
utilizaram o ruído visual dinâmico para interferir com palavras processadas sob instrução
visual e verbal. Os pesquisadores verificaram que o ruído afetou a codificação de palavras
apresentadas visualmente, mas não prejudicou a manutenção da informação.
Outro exemplo de tarefa dupla é a supressão articulatória que consiste na repetição
de uma sílaba (por exemplo, “blá”) simultaneamente a realização da prova principal para
prejudicar o desempenho da memória de trabalho verbal (Logie, 1995). Considerando que a
supressão articulatória impede a recitação do nome dos estímulos, Galera e Fuhs (2003)
investigaram se uma tarefa de supressão verbal, ao eliminar o acesso desses estímulos ao laço
fonológico, igualaria as taxas de reconhecimento de letras e de padrões visuais. Seus
resultados mostraram que a supressão articulatória não afeta o reconhecimento dos padrões
visuais, apenas das letras, sugerindo que os primeiros não são armazenados em termos
fonológicos.
A aplicação do paradigma de tarefas duplas na memória de trabalho já revelou na
literatura características importantes da estrutura funcional e das propriedades dos sistemas de
armazenamento. Neste trabalho pretendemos determinar se o efeito de uma tarefa secundária,
a contagem regressiva, realizada simultaneamente a uma tarefa de reconhecimento de faces ou
de nomes ou a conjunção face-nome, possibilitaria um decréscimo maior no desempenho da
recordação da conjunção, por exigir recursos do executivo central. Além disso, como os
recursos específicos de cada componente, visual e verbal, estão envolvidos na conjunção, ou
seja, se tarefas secundárias como o ruído visual dinâmico e supressão articulatória iriam
prejudicar a memória para conjunção da mesma forma que as informações isoladas.
25
1.6 TDAH e a memória de trabalho
Pode-se compreender o TDAH como um problema do funcionamento de certas áreas
do cérebro que comandam o comportamento inibitório (freio), a capacidade de executar
tarefas de planejamento, a memória de trabalho, entre outras funções, determinando que o
indivíduo apresente sintomas de desatenção, agitação (hiperatividade) e impulsividade
(Knapp; Rohde; Lyszkowski & Johannpeter, 2002).
Através de alguns estudos neuropsicológicos pode-se perceber que este transtorno
está associado a alterações do córtex pré-frontal e de suas projeções em estruturas sub-
corticais. O que caracteriza esse transtorno por frequentes níveis de desatenção,
impulsividade, hiperatividade, desorganização e inabilidade social, envolvendo um déficit do
sistema inibitório ou das funções executivas da memória de trabalho (Messina & Tiedemann,
2009).
Karatekin (2004) investigou a integridade do funcionamento da memória de trabalho
em crianças com TDAH. Crianças de 8 a 15 anos com e sem o transtorno realizaram tarefas
de memória de curto prazo verbal e espacial. Os resultados mostram que crianças com TDAH
não diferem das sem o TDAH na recordação de dígitos e nem no tempo de resposta das
tarefas realizadas isoladamente. No entanto uma queda significativa no desempenho das
tarefas primárias quando são realizadas com uma secundária, sugerindo assim um prejuízo no
executivo central, componente responsável por dividir a atenção no modelo da memória de
trabalho.
Messina e Tiedemann (2009) investigaram as habilidades cognitivas da memória de
trabalho em crianças e adolescentes com TDAH. Foi aplicado o teste TIHC – Teste Infantil de
Habilidades Cognitivas informatizado. As análises executadas indicaram a existência de
diferenças em diversos aspectos relacionados à memória nos tipos peculiares de crianças com
TDAH. Crianças com TDAH obtiveram bom desempenho nas provas de memória visual em
detrimento as provas de memória auditiva, sugerindo que as crianças com TDAH beneficiam-
se menos dos recursos verbais e mais dos visuais.
Em suma, na relação entre a memória de trabalho e o TDAH, verificou-se que as
pesquisas estão assumindo grandes proporções e que poucas contribuições que relacionem
o transtorno a estudos com a integração de informação na memória de curto prazo, decorrente
a isso tentaremos correlacionar nossos dados com esta literatura.
2- Objetivos
27
2.1 Geral
Investigar se a integração da informação verbal e visual na memória de trabalho
requer recursos suplementares da atenção e, se um armazenamento diferenciado entre a
informação integrada e a informação isolada.
2.2 Específicos
- Comparar o efeito de uma tarefa secundária atencional em tarefas de
reconhecimento visual, verbal e para a conjunção visual-verbal;
- Comparar o efeito de uma tarefa secundária visual (ruído visual dinâmico) na
memória para conjunção visual-verbal e na memória das características isoladas;
- Comparar o efeito de uma tarefa secundária verbal (supressão articulatória) na
memória para conjunção visual-verbal e na memória das características isoladas;
- Comparar o reconhecimento da conjunção visual-verbal nas condições em que a
tarefa secundária era visual (ruído visual dinâmico) e verbal (supressão articulatória).
3- Experimentos
29
3.1 Experimento I:
Neste experimento investigamos se a integração de informações visuais e verbais na
memória de trabalho é um processo automático ou se requer recursos extras da atenção vindos
do executivo central. O método utilizado foi uma tarefa principal de reconhecimento de item
que consistiu na apresentação de fotos de faces humanas, nomes e a conjunção face-nome e
uma tarefa dupla realizada durante o intervalo de retenção, a contagem regressiva de 3 em 3.
A tarefa do participante foi julgar se o estímulo teste foi apresentado na seqüência inicial ou
não. Nossa hipótese foi que, se a tarefa secundária atencional provocasse um decréscimo
maior no reconhecimento da conjunção do que das informações memorizadas isoladamente,
significaria que a integração face-nome requer recursos suplementares da atenção vindos do
executivo central.
Método
Participantes:
Os 17 participantes eram universitários do campus da USP de Ribeirão Preto-SP,
faixa etária entre 18 e 40 anos (média de 28,43), de ambos os sexos (9 homens), com visão e
audição normal ou corrigida.
Material e Estímulos:
O experimento foi montado e executado pelo pacote de programas E`Prime® 1.2
(Schneider, Eschman & Zuccoloto, 2002) processado em um Pentium III. Os estímulos foram
apresentados em um monitor Flatron 795FT Plus, com resolução de 800 x 600 pixels e taxa
de atualização vertical de 100 Hz. Os participantes permaneceram sentados em frente à tela a
uma distância de aproximadamente 60 cm, em uma sala experimental com iluminação e som
adequados.
Os estímulos visuais foram fotos de faces humanas (figura 2 A) em preto e branco,
sem expressões que denotassem sentimentos, com 274 x 350 pixels. Elas foram apresentadas
sob o fundo preto no centro da tela do monitor. As figuras foram retiradas do site:
30
http://pics.psych.stir.ac.uk/cgi-bin/PICS/New/pics.cgi e em seguidas padronizadas com o
programa photoshop.
Os estímulos sonoros (figura 2 B) gravados em uma sala específica com o editor de
áudio Gold Wave version 4.25, foram nomes com no máximo 6 letras, dissílabos apresentados
auditivamente através de um fone de ouvido.
A)
B)
Bruna André
Dora Bruno
Elza Davi
Jade Glauco
Malu Hugo
Rute Marcos
Figura 2. Exemplos de faces (A) e nomes (B) utilizados nos experimentos.
O Comitê de Ética em Pesquisa da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de
Ribeirão Preto-USP aprovou a execução desta pesquisa, sob o número de protocolo 014/2009-
11/03/2009, estando, portanto, de acordo com a Resolução CNS 196/96 (anexo 2).
Procedimento
Inicialmente foi explicado pelo experimentador ao participante o objetivo do trabalho
e a tarefa a ser realizada. Após a assinatura do Termo de Consentimento, ele foi levado à sala
experimental e novamente, na tela do computador, as instruções do experimento foram
recordadas.
A sessão tinha início com um treino da tarefa de contagem regressiva. Nessa situação
um número de dois dígitos era apresentado no centro da tela do computador por 300ms e o
31
participante iniciava a contagem regressivamente de 3 em 3 a partir desse número, de maneira
contínua, em voz alta, sob a supervisão do experimentador, durante 6 segundos. Este treino da
contagem regressiva tinha objetivo de familiarizar o participante com a tarefa e de estabelecer
uma linha de base para a contagem.
Em seguida, os participantes passaram individualmente por três condições
experimentais em ordem aleatória. Em uma condição os estímulos a serem memorizados
foram fotos de faces humanas, em outra condição foram nomes apresentados auditivamente e
em outra os estímulos foram a conjunção face-nome.
No experimento foram realizados três blocos de provas para cada condição, um
bloco inicial de treino com 2 provas, um bloco controle (sem contagem regressiva) com 24
provas de reconhecimento e um bloco experimental (com contagem regressiva) com 24
provas de reconhecimento com uma tarefa secundária realizada no intervalo de retenção. No
bloco controle, para a condição com apenas o estímulo face, cada prova, em seu início, teve a
apresentação de uma tela preta por 500 ms, em seguida foi apresentado no centro da tela uma
seqüência de quatro estímulos com 1 segundo para a memorização e com um intervalo de 500
ms entre um estímulo e o outro. Para a condição apenas com nomes, cada prova, em seu
início, teve a apresentação por 500 ms de um tela, em seguida foi apresentado auditivamente
uma seqüência de quatro estímulos sonoros com duração aproximada de 250 ms para cada
nome e um intervalo entre um estímulo e outro de 1,25 segundo. Para a condição de
conjunção face-nome foi realizada a apresentação das duas situações concomitantemente
(figura 3).
Depois da apresentação dos estímulos a serem memorizados, houve um intervalo de
retenção de 6 segundos sem nenhuma tarefa a ser executada e em seguida um estímulo teste
foi apresentado e permaneceu na tela até que o participante emitisse sua resposta. Esta foi
dada com o dedo indicador da mão direita no teclado do computador. No caso do estímulo
teste ser considerado como igual a um dos apresentados na seqüência, a resposta deveria ser 1,
caso contrário, deveria pressionar a tecla de número 2. Em metade das provas o estímulo teste
pertencia à seqüência memorizada. É importante ressaltar que na condição face-nome, as
respostas negativas foram exigidas frente a um estímulo teste definidas pela conjunção de
uma face e um nome que haviam sido apresentados na seqüência inicial, mas combinadas de
forma diferente.
No bloco experimental o procedimento foi o mesmo, com a exceção do acréscimo de
uma tarefa secundária, a contagem regressiva de 3 em 3 realizada durante intervalo de
retenção. Na contagem regressiva um número de dois dígitos apareceu no centro da tela do
32
computador por 6 segundos depois de 300ms do último estímulo memorizado e o participante
em voz alta deveria contar regressivamente de maneira contínua, sob a supervisão do
experimentador, até o aparecimento do estímulo teste.
Figura 3. Esquema da tarefa com a condição conjunção com contagem regressiva realizada
no experimento1.
Resultados e Discussão
Foram realizados dois tipos de análises, uma que levou em conta a acurácia
(porcentagem de respostas corretas) e outra o tempo de resposta. Para ambas, utilizamos
análise de variância (ANOVA). Esta análise considerou medidas repetidas em dois fatores:
tarefa secundária (contagem regressiva e sem contagem regressiva) e tipos de tarefas (apenas
face, apenas nome e a conjunção face-nome). O teste post hoc de Newman- Keuls (p<0,05)
foi para identificar diferenças mais específicas.
A análise da acurácia mostra que o tipo de tarefa secundária (com e sem contagem
regressiva) teve efeito significativo sobre o desempenho da tarefa principal (F(1,16) = 22,97;
p < 0, 001;
η
2
p
= 0,58). O desempenho é melhor nas situações sem a contagem regressiva com
33
média de acertos de 82% (epm= 3%) e pior com a contagem regressiva, com média de acertos
de 75% (epm= 5%).
A tarefa principal de reconhecimento varia em função do tipo da informação a ser
memorizada (F (2,32) = 41,91; p < 0, 001; η
2
p
= 0,72). O desempenho do sujeito é pior nas
provas com a conjunção face-nome (M= 63%, epm= 4%) e melhor nas provas com nomes
(M= 91%, epm= 2%). Nas provas com a apresentação de faces o desempenho dos sujeitos foi
de 83% (epm= 2%). Estes resultados indicam que a informação verbal tem um predomínio em
relação à informação visual e à situação na qual a conjunção é exigida.
Finalmente, houve uma interação significativa entre o tipo de tarefa principal e as
tarefas secundárias (com e sem contagem regressiva) (F(2,32) = 54,14; p < 0, 001; η
2
p
= 0,77).
Como se pode observar na figura 4, a realização da contagem regressiva provoca um prejuízo
de 16% na tarefa de reconhecimento quando os estímulos são definidos pela conjunção face-
nome (com contagem (M= 55%; epm= 4%), sem contagem (M= 71% , epm= 3%)) enquanto
que nas provas em que os estímulos são apenas as faces (com contagem (M= 85%; epm=
2%), sem contagem (M= 81% , epm= 2%)) ou apenas os nomes (com contagem (M= 87%;
epm= 2%), sem contagem (M= 96% , epm= 2%)) esse prejuízo foi de, respectivamente, 4% e
9%. Esta interação sugere que o armazenamento da conjunção face-nome e a tarefa de
contagem regressiva utilizam recursos atencionais comuns, em uma proporção maior do que a
exigida no armazenamento da informação visual e verbal, tomadas isoladamente.
Figura 4. Porcentagem de respostas corretas em função dos diferentes tipos de estímulos
(visual, verbal e conjunção) e da presença da tarefa secundária (Com contagem ou Sem
contagem). O “*” indica diferenças significativas com p<0,05.
*
34
A mesma ANOVA aplicada aos tempos de resposta revela que o tipo de tarefa
interveniente (com e sem contagem regressiva) teve efeito significativo sobre o desempenho
da tarefa principal (face, nome e conjunção) (F (1,15) = 18,14; p < 0, 001; η
2
p =
0,54) (figura
5). Os participantes são mais rápidos nas provas sem a contagem regressiva (M= 1843 ms;
epm= 157 ms) do que com a contagem regressiva (M= 2243 ms; epm= 182 ms).
O tempo de reação da tarefa principal de reconhecimento varia em função do tipo de
estímulo apresentado (F (2,30) = 42,28; p < 0, 001; η
2
p
= 0,73). O sujeito é mais lento nas
provas com a conjunção (M= 2539 ms; epm= 173 ms), do que face (M= 1908 ms; epm= 154
ms) e mais rápido para estímulos sonoros (nome) (M= 1684 ms; epm= 132 ms).
Houve uma interação significativa entre o tipo de estímulo da tarefa principal e as
tarefas secundárias (com e sem contagem regressiva) (F(2,30) = 7,53; p = 0, 002; η
2
p
= 0,33)
(figura 3). Neste caso houve um prejuízo de 116 ms no tempo de resposta da tarefa primária
causado pela contagem regressiva para conjunção (M= 2597 ms; epm= 185 ms); enquanto
que para face o prejuízo foi 586 ms (M= 2201 ms; epm= 178 ms) e para nome o prejuízo foi
de 499 ms (M= 1934 ms; epm= 153 ms) comparado com prova sem a contagem regressiva,
conjunção (M= 2481 ms, epm= 163 ms), face (M= 1615 ms, epm= 82 ms) e nome (M= 1435
ms, epm= 69 ms), ou seja, as provas primárias sem a contagem regressiva foram realizadas
mais rapidamente para todas as condições do que as provas primárias com a contagem
regressiva.
35
Figura 5. Tempo de resposta dos sujeitos nas tarefas de memória para faces, nomes, e
conjunção face-nome sob as condições de tarefa secundária com contagem e sem contagem,
no experimento 1. O “*” indica diferenças significativas com p<0,05.
3.2 Experimento II:
Neste experimento investigamos se o armazenamento da informação integrada é
diferente da informação isolada. Ou seja, quando informações de dois sistemas diferentes da
memória de trabalho são integradas (visual e verbal), uma pode ser mais relevante que a outra
na conjunção, como no caso da característica isolada verbal prevalecer em relação à visual
vista no estudo de Caprio, Godoy e Galera (submetido)? E a informação isolada é armazenada
de forma diferente da integrada?
O método foi igual ao do experimento 1 com exceção de que as tarefas secundárias
foram um ruído visual dinâmico e uma supressão articulatória. Nossa hipótese foi que se o
efeito da tarefa secundária (ruído visual ou supressão articulatória) provocasse um decréscimo
maior no reconhecimento da conjunção do que das informações memorizadas isoladamente,
significaria que a conjunção face-nome utilizaria especificamente aquele recurso (visual e/ou
fonológico) sugerindo diferenças no armazenamento da informação quando integrada.
*
*
36
Participantes:
Os 16 participantes eram universitários do campus da USP de Ribeirão Preto-SP,
faixa etária entre 18 e 40 anos (média de 26,93), de ambos os sexos (8 mulheres), com visão e
audição normal ou corrigida. Participantes diferentes do experimento 1.
Material e Estímulos:
As condições experimentais foram iguais as do experimento anterior, com exceção
de que em metade das provas, no intervalo de retenção, foi apresentado um ruído visual
dinâmico e em outra metade uma supressão articulatória.
O ruído visual dinâmico consistiu em uma tela preta com quadrados brancos com
500 x 500 pixels de tamanho com pontos de 10 x 10 pixels. Os quadrados se alternavam entre
preto e branco em uma taxa de 300 pontos por segundo, criando um efeito característico do
chuviscar da televisão (figura 6) capaz de prejudicar o desempenho da tarefa primária visual,
por dividir os recursos do mesmo sistema (esboço visuo-espacial).
A supressão articulatória consistiu na recitação em voz alta de uma laba irrelevante
(“blá”) durante o intervalo de retenção capaz de prejudicar a recordação fonológica da tarefa
primária, por impedir a recitação fonológica.
Figura 6. Ruído visual dinâmico
.
37
Procedimento:
Foi igual ao do primeiro experimento com a exceção de que em cada condição (face,
nome e a conjunção) foram realizados dois tipos de tarefas secundárias realizadas durante o
intervalo de retenção. Em metade das provas de cada condição foi realizada uma supressão
articulatória e na outra metade das provas foi apresentado um ruído visual dinâmico.
Na Supressão Articulatória o sujeito deveria repetir em voz alta e mais rapidamente
possível a palavra “blá” por 6 segundos, até aparecer o estímulo teste. Esta tarefa foi realizada
sob supervisão do experimentador (figura 7A). Já na tarefa secundária com o ruído visual o
participante deveria olhar para a tela com o ruído por 6 segundos até o aparecimento do
estímulo teste, também com a supervisão do experimentador( figura 7B).
38
A)
B)
Figura 7. Esquemas das tarefas de memória nas condições (A) conjunção com ruído visual
dinâmico e (B) conjunção com supressão articulatória
.
39
Resultados e Discussão
Foram realizados dois tipos de análises. Uma que levou em conta a acurácia
(porcentagem de respostas corretas) e outra o tempo de resposta. Para ambas, utilizamos a
análise de variância (ANOVA). Esta análise considerou medidas repetidas em dois fatores:
tarefas secundárias (ruído visual dinâmico e supressão articulatória) e tipos de tarefas (apenas
face, apenas nome e a conjunção face-nome). O teste post hoc de Newman- Keuls (p <0,05)
foi para identificar diferenças mais específicas.
A análise da acurácia mostrou que o tipo de tarefa secundária (RVD e SA) não teve
efeito sobre o desempenho da tarefa principal nas três condições (apenas face, apenas nome e
conjunção face-nome) (F (1,15) = 3,63; p = 0,08; η
2
p=
0,19). O desempenho é semelhante nas
situações com o ruído visual dinâmico com média de acertos de 81% (epm= 4%) e com a
supressão articulatória com média de acertos de 78% (epm= 3%).
O desempenho da tarefa principal de reconhecimento varia em função do tipo da
informação a ser memorizada (F (2,30) = 70,18; p < 0, 001; η
2
p
= 0,82). O desempenho do
sujeito é pior nas provas com a conjunção face-nome (M= 64%, epm= 3%) e melhor nas
provas com nomes (M= 92%, epm= 2%). Nas provas com a apresentação de faces o
desempenho dos sujeitos foi com Média de acertos de 83% (epm= 2%).
Na interação entre a tarefa primária e a secundária (figura 8) (F (2,30) = 5,74; p=
0,01; η
2
p
= 0,27) o desempenho da tarefa primária é mais prejudicado na condição com a
conjunção do que das informações isoladas. Além disso, na conjunção ele é afetado da mesma
forma pelas duas tarefas secundárias (ruído visual dinâmico M= 63%; epm= 3%; supressão
articulatória M= 66%; epm= 4%). No entanto, na condição apenas com faces a supressão
articulatória M= 80% (epm= 2%) afeta mais a tarefa principal do que o ruído visual dinâmico
M= 86% (epm= 2%). Da mesma forma, na tarefa principal com apenas nomes, a supressão
articulatória (M= 88%; epm= 2%) afeta mais a tarefa principal do que o ruído visual dinâmico
(M= 96%; epm= 1%). Deste modo, o efeito diferenciado da supressão articulatória no
armazenamento das características visuais e verbais isoladas, sugere que estas podem ser
armazenadas de maneira diferente quando integradas.
40
Figura 8. Porcentagem de respostas corretas em função dos diferentes tipos de estímulos
(visual, verbal e conjunção) e a tarefa secundária (supressão articulatória ou ruído visual). O
“*” indica diferenças significativas com p<0,05.
A mesma ANOVA foi aplicada aos tempos de resposta e revela que o tipo de prova
interveniente (ruído visual dinâmico e supressão articulatória) não teve efeito sobre o
desempenho da tarefa principal (F (1,14) = 4,07; p = 0,06; η
2
p
= 0,22)(figura 9) [ruído visual
(conjunção M= 2090 ms (epm= 127 ms); face M= 1583 ms (epm= 124 ms); nome M= 1361
ms (epm= 66 ms)] [supressão articulatória (conjunção M= 2137 ms (epm= 150 ms); face M=
1662 ms (epm= 157 ms); nome M= 1540 ms (epm= 75 ms)].
O tempo de reação da tarefa principal de reconhecimento varia em função do tipo de
estímulo apresentado (F (2,28) = 35,90 com p < 0,001; η
2
p
= 0,71) (Figura 9). O sujeito é mais
lento nas provas com a conjunção (M= 2114 ms; epm= 137 ms), do que face (M= 1622 ms;
epm= 139 ms) e mais rápido para estímulos sonoros (Nome) (M= 1451 ms; epm= 73 ms).
*
*
41
Figura 9. Tempo de resposta dos sujeitos nas tarefas de memória para faces, nomes, e
conjunção face-nome sob as condições de tarefa secundária ruído visual e supressão
articulatória, no experimento 2. O “*” indica diferenças significativas com p<0,05.
*
4- Discussão Geral
43
O objetivo do presente estudo foi examinar a integração da informação de diferentes
sistemas da memória de trabalho utilizando o paradigma de tarefas duplas. Tivemos duas
principais preocupações: (1) investigar se a integração da informação verbal (nomes) e visual
(fotos de faces humanas) na memória de trabalho requer recursos suplementares da atenção e
(2) verificar se o armazenamento da informação integrada é diferente da informação isolada
quando comparadas com as mesmas tarefas secundárias.
O envolvimento da atenção na conjunção da informação de diferentes modalidades
sensoriais tem um papel central do buffer episódico no modelo proposto por Baddeley (2000).
Um papel confirmado em alguns estudos (por exemplo, Wheeler & Treisman, 2002; Elsley &
Parmentier, 2009; Caprio, Godoy & Galera, submetido), e recusado em outros (por exemplo,
Allen et al. 2006, 2009).
Nossos resultados mostram que a memória para a conjunção da informação visual e
verbal foi afetada pela realização simultânea de uma tarefa de contagem regressiva, sugerindo
que mais recursos atentivos são necessários quando a informação foi armazenada de forma
integrada. Estes dados corroboram com o modelo de Baddeley (2000) que assumiu uma
relação entre o buffer e o executivo central, com ambos contando com uma limitada
capacidade atencional, onde a conjunção assumiria ser dependente desta capacidade. Duma
tarefa que demandasse atenção como a contagem regressiva, deveria prejudicar mais o
desempenho do processo de integração do que da característica isolada. Este achado coincide
com Elsley e Parmentier (2009) que usando uma adaptação da tarefa de reconhecimento
contendo informações isoladas e integradas, encontraram que uma tarefa secundária de
seqüências de tons puros prejudicou principalmente o desempenho da condição de conjunção.
Então, os autores sugeriram que a conjunção verbal-espacial requer atenção por dividirem os
mesmo recursos que a tarefa secundária.
Em conflito aparente com os resultados deste trabalho, Allen et al. (2006) não
encontraram diferenças no desempenho em uma tarefa de memória para conjunção de forma e
cor e para essas características memorizadas isoladamente, sugerindo que a integração é
automática. É possível que esta diferença reflita mais a uma diferença nos sistemas
envolvidos, uma vez que no estudo de Allen et al. (2006) a conjunção de forma e cor envolve
apenas o esboço visuo-espacial, enquanto a conjunção face e nome, como no experimento 1
deste trabalho, envolve o laço fonológico e o esboço visuo-espacial. Sob esta hipótese os
recursos atencionais seriam utilizados quando mais de um sistema estivesse envolvido na
integração. Além disso, Allen et al (2009), também examinaram o papel da atenção na
conjunção de características de cor e forma através de duas modalidades de apresentação a
44
verbal e a visual. Os autores sugerem que a conjunção não requer demanda da atenção e que
seriam necessárias modificações no modelo estabelecido por Baddeley (2000). Desta forma
uma possível explicação para esta diferença nos resultados pode ser devido à escolha dos
estímulos, onde podemos argumentar que mesmo sendo duas modalidades diferentes de
apresentação, os dois estímulos escolhidos pelos autores Allen et al. (2009) configuram
características visuais. Outra possível explicação na diferença dos dados entre nosso estudo e
o de Allen et al. (2009) pode ser a diferença na tarefa dupla. No estudo de Allen et al. (2009),
o sujeito contava regressivamente apenas o último número (“três cinco três, três cinco zero”),
e no nosso trabalho os sujeitos deveriam manter os números juntos (“sessenta e seis, sessenta
e três”) exigindo um grau maior de atenção.
Outro dado relevante deste experimento foi que na condição conjunção os
participantes tiveram o desempenho pior e com o tempo de resposta mais lento do que na
condição para a informação tida isoladamente, nos sugerindo que mesmo sendo complexa, os
sujeitos foram capazes de realizar a tarefa exigida, assim como no experimento 1 de Allen, et
al. (2009), em que mesmo com duas modalidades de apresentação a conjunção foi executada.
O estudo atual sugere que diferentes tipos de integração são sustentados por
diferentes processos, ou seja, quando a informação integrada é de um mesmo sistema da
memória de trabalho, como o visual e espacial, não é necessária a atenção. No entanto,
quando a integração é mais complexa como no caso nome e face, exigindo mais recursos
cognitivos esta requer recursos atencionais. Os resultados são consistentes com a idéia de que
os recursos executivos são necessários para codificar e manter representações consolidados na
mais complexa condição. Isto certamente parece ser indicativo de que em estudos vistos
anteriormente foi usada uma forma mais ativa de conjunção em que nenhum custo adicional
para a integração foi empregada como no caso de Allen et al. (2006, 2009).
Embora seja útil considerar uma distinção entre processos automáticos e voluntários
de integração, são necessários mais trabalhos para compreender os diferentes tipos de
processos. É fundamental que mais pesquisas sejam feitas para lançar luz sobre as condições
particulares em que a integração é controlada, exigindo mais atenção. É provável que sob
certas condições, sempre a integração de informações de diferentes modalidades sensoriais
estará ativa na memória, mesmo na ausência de uma tarefa dupla.
45
4.1 Relação entre a informação integrada e a isolada
No experimento 2 utilizamos duas tarefas secundárias, o ruído visual dinâmico
(RVD) e a supressão articulatória (SA) para verificar o efeito destas sobre a tarefa principal de
reconhecimento para a informação isolada e conjugada. De um modo geral, as duas tarefas
secundárias afetaram o desempenho de maneira semelhante, sugerindo que ambos os
domínios (visual e verbal) foram prejudicados na mesma proporção, e que os recursos
engajados dependem exatamente de qual informação é necessária para completar a tarefa.
Os resultados mostram que a tarefa apenas com faces é mais afetada pela SA do que
pelo RVD. Estes dados entram em conflito com alguns da literatura que mostram a tarefa
dupla com o ruído visual dinâmico afetando principalmente a tarefa com estímulos visuais
(Quinn & McConnell, 1996; Darling, Della Sala & Logie, 2009). Mas corrobora com outros
estudos que não encontraram efeito do ruído visual sobre tarefas de memória visual (Andrade,
Werniers, May, & Szmalec, 2002). Este efeito maior da SA na tarefa visual pode nos sugerir
que os participantes utilizaram uma estratégia verbal quando solicitados a memorizar os
estímulos face.
Nas provas apenas com nomes, o efeito maior da SA corrobora com dados na
literatura que apontam para um efeito verbal desta tarefa secundária. Por exemplo, Galera e
Fuhs (2003) que avaliaram a natureza da informação armazenada pelo sistema de memória
visuo-espacial de curto prazo. No primeiro experimento, uma tarefa de localização espacial
foi realizada simultaneamente com tarefas intervenientes de supressão articulatória e de
subtração aritmética. A tarefa de supressão articulatória afeta de forma negativa a recordação
das letras, mas não a dos padrões visuais, confirmando que esta tarefa dupla inibe a recitação
verbal.
Os dados mostraram ainda que as duas tarefas secundárias afetaram o desempenho
da tarefa principal de maneira semelhante para a condição com a conjunção. No entanto, para
as condições face e nome foi a supressão articulatória que causou maior prejuízo para as
tarefas principais, sugerindo um armazenamento diferenciado para a informação isolada e
integrada, corroborando com resultados encontrados por Morey (2009) que testou se o objeto
isolado ou sua conjunção (espacial e verbal) podem ser armazenados da mesma forma. O
autor verificou que a supressão articulatória prejudicou a memória para conjunção (espacial-
verbal), mas não prejudicou a memória espacial, indicando que a informação espacial pode
ser armazenada de maneira diferente quando for integrada a verbal. Estes dados supõem a
46
idéia de um domínio geral de armazenamento para a memória de trabalho que deva ser capaz
de reter o objeto incluindo características de muitos domínios sensoriais, um componente
como Baddeley (2000) propôs, o buffer.
Baddeley (2000) atualizou seu modelo da memória de trabalho supondo que: a) as
características são mantidas em locais separados, independentes; b) a informação integrada é
mantida separadamente e independente de sua característica isolada em um buffer; c) a
conjunção da informação é apenas vulnerável para uma interferência geral, enquanto a
informação isolada é vulnerável apenas para uma interferência específica. Baseada nesta
última afirmação, os resultados do segundo experimento sugerem que a conjunção é afetada
por uma interferência geral de forma diferente da informação isolada armazenada em um
componente específico, corroborando com a teoria de um terceiro armazenador, um buffer.
Outro aspecto que é preciso considerar neste estudo diz respeito ao tipo de estímulo
utilizado para memorização. Tanto no experimento 1 quanto no experimento 2 os dados
mostram que na condição conjunção, os sujeitos foram mais lentos e com o desempenho pior
do que para as condições apenas face e apenas nome, sugerindo que o estímulo utilizado para
a conjunção foi complexo. Smith, Hay, Hitch e Horton (2005) afirmam que a utilização de
faces nas tarefas de memória de curto prazo torna-se muito interessante, pois são estímulos
complexos, difíceis de nomear e fáceis de identificar após pequenos intervalos de tempo.
O estudo atual sugere que uma forma mais complexa de conjunção, ou seja, entre
modalidades, podem fornecer fortes evidências de que um buffer é necessário para armazenar
temporariamente a informação em chuncks integrados. Embora seja prematuro afirmar
qualquer localização anatômica para o buffer episódico, as conclusões do Prabhakaran et al
(2000) sugerem que o córtex pré-frontal pode ter um papel a desempenhar na integração de
diferentes tipos de informação na memória de trabalho. Além disso, quando a informação é
armazenada de forma isolada parece que ela é processada de forma diferente da integrada,
podendo ter hierarquias diferentes de codificação, por isso respondendo de maneira distinta a
supressão articulatória.
4.2 Implicações práticas e direções futuras
Para uma implicação prática deste trabalho, podemos correlacionar os dados
empíricos aqui encontrados com estudos com pessoas com TDAH (Transtorno Déficit de
Atenção e Hiperatividade). A literatura conta com dados cada vez mais substanciais
47
indicando a presença de disfunção do executivo central em patologias como o TDAH
(Karatekin, 2004). Estes dados podem corroborar com os resultados encontrados neste
experimento, pois se pessoas com TDAH tem prejuízos atencionais, isto pode ampliar as
dificuldades cotidianas de integrar as informações vindas do ambiente, acarretando em
prejuízos em diversas áreas da vida, como comprometimento acadêmico, familiar,
psicossocial e etc. Ou seja, como visto neste trabalho, para a integração de informações de
diversas modalidades é necessária a atenção, e se este recurso cognitivo neste transtorno é
mínimo isto poderá acentuar as dificuldades cognitivas destes pacientes, sendo importante
novos estudos que possibilitem tratamentos com novas estratégias a estas pessoas para
realizar a integração de informações.
Em relação às direções futuras, deve-se notar que no estudo atual a tarefa secundária
não estava presente em todo o processo de memorização; uma prática defendida para garantir
que se eliminem todas as estratégias de recitação durante a codificação e não no intervalo
de retenção (Allen, et al., 2006). Tal medida foi omitida para assegurar que a tarefa não
ficasse tão complexa e não sobrecarregasse o participante, podendo aumentar o número de
“chutes”. No entanto, isto deixa o estudo atual a tendência para a crítica de que o desempenho
das condições de integração foi inflado por estratégias apenas verbais empregadas pelos
participantes. Poderia ser interpretado que, na realidade, foi a eliminação de tais estratégias,
que possibilitaram a integração das informações por não sobrecarregar demasiadamente o
sistema cognitivo do sujeito, tendo em vista que todos os participantes ao saírem da sala
reclamavam da dificuldade da tarefa. A replicação do estudo atual, incluindo a tarefa
secundária na codificação ainda pode ser aconselhável para assegurar que a interpretação
atual do autor é válida.
Os resultados destes experimentos são favoráveis à idéia de que diversos tipos de
integração são sustentados por diferentes processos, com os recursos atencionais envolvidos
em formas mais complexas e multimodais de conjunção. Diversas combinações de recursos
ou diferentes estratégias de manutenção na memória de trabalho podem ser empregadas,
resultando em diferentes efeitos das tarefas duplas. No entanto, a literatura mostra que
integrações automáticas também são realizadas através de um mesmo sistema, com estímulos
menos complexos (Allen, et al. 2006). Nossos resultados são coerentes com o conceito de um
buffer episódico, dentro do modelo de memória de trabalho, e demonstra que este componente
continua a ser vital no fornecimento de hipóteses de investigação testáveis. No entanto, novas
pesquisas são necessárias, incidindo sobre a natureza da integração entre as modalidades
sensoriais, para elucidar a natureza dos processos. Além disso, seria prudente examinar a
48
natureza da integração na memória de longo prazo, a fim de continuar a explicar o bom
potencial do buffer como proposto por Baddeley (2000).
5- Conclusão
50
Este estudo corroborou com a proposta de Baddeley (2000) que indicou a
necessidade funcional de um sistema integrador, um buffer episódico, para seu modelo de
múltiplos componentes da memória de trabalho, pois no segundo experimento tarefas
intervenientes afetam de maneira diferente a memória para a informação integrada e para a
informação isolada. Além disso, demonstrou que este sistema integrador é dependente de
recursos da atenção quando é necessário integrar estímulos de diferentes sistemas como face e
nome, pois no primeiro experimento a tarefa secundária atencional prejudicou mais a
conjunção do que as informações isoladas. Enfim, estes dados podem dar respostas parciais
para várias questões críticas sobre o armazenamento integrado na memória de trabalho.
51
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Wheeler, M.E., & Treisman, A.M. (2002). Binding in short-term visual memory. Journal of
Experimental Psychology: General, 131, 48–64.
Zhang, D., Zhang, X., Sun, X., Li, Z., Wang, Z., He, S., & Hu, X. (2004). Cross-modal
temporal order memory for auditory digits and visual locations: An fMRI study. Human
Brain Mapping, 22, 280-289.
56
Anexos
1. Termo de Consentimento Livre e Esclarecido
2. Declaração do Comitê de Ética em Pesquisa – CEP
57
TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO
Título do estudo: “O papel da atenção na integração de características visuais e verbais na
memória de trabalho”
Pesquisadora: Juliana Pardo Moura Campos Godoy, [email protected], (16)3602-
4393. Rua Floriano Peixoto, 463, apto 31, centro. CEP 14010-200. Ribeirão Preto- SP.
Orientador: César Aléxis Galera, algalera@usp.br, (16) 3602-3760, Avenida Cândido
Pereira Lima, 155, Jardim Recreio. CEP 14040-250. Ribeirão Preto-SP.
1) Eu, pesquisadora, estou lhe convidando a participar deste estudo sobre memória de
trabalho, cujo objetivo é investigar se a integração da informação verbal e visual na
memória de trabalho requer recursos extras da atenção. O estudo não lhe fornecerá
nenhum benefício direto, mas os dados obtidos podem ser úteis para contribuir com o
conhecimento que esta pesquisa procura esclarecer.
2) O procedimento será sentar-se em frente à tela de um monitor e realizar uma tarefa de
reconhecimento de estímulos visuais e auditivos que serão apresentados na tela e por um
fone de ouvido. Caso você concorde em participar, sua tarefa será identificar em cada
prova se um estímulo teste (visual e/ou auditivo) pertence ou não a uma seqüência
inicial de estímulos. Sua resposta será dada no teclado do computador e as respostas
corretas e erradas, bem como o tempo gasto em cada prova, serão registrados para
análise.
3) O estudo não oferece quaisquer riscos a sua saúde física ou mental.
4) Informamos que sua privacidade será respeitada, ou seja, seu nome ou qualquer outro
dado ou elemento que possa, de qualquer forma, lhe identificar, será mantido em sigilo.
5)
Você também pode se recusar a participar do estudo, ou retirar seu consentimento a
qualquer momento, sem precisar justificar.
6)
Caso você concorde em participar, manifeste seu livre consentimento assinando este
termo.
Nome: ________________________________________________
Assinatura: _____________________________________________ Data:___/___/___
Endereço:
_______________________________________________________________________
Confirmo ter explicado a natureza e objetivos desse estudo ao voluntário acima.
Nome do Pesquisador:______________________________Assinatura: _________________
58
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