Cynthia S. de Gusmão
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O filósofo Aristóxeno de Tarento, do século IV a.C, é um
autêntico representante da escola peripatética, tendo sido aluno
direto de Aristóteles. Sua obra Elementos de Harmônica é o mais
completo dos antigos tratados musicais gregos que chegaram até
nós. No primeiro parágrafo, ele define o campo de investigação da
Harmônica: “A ciência do mélos é multifacetada e divide-se em
muitos ramos; um deles é preciso tomar como base: o estudo da
chamada Harmônica, primeira na ordem e com função elementar. De
fato, sendo a primeira das matérias teóricas, ela abarca tudo que diz
respeito ao estudo dos tons e das escalas. Sendo esta a finalidade do
seu estudo, convém, pois, não considerá-la para além disso”
(Meibom, 1, 11-25).
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Rosetta da Rios aponta em nota a sua tradução
italiana do tratado: “Assim como, de fato, a qualidade dos sons é o
elemento específico da música, pois o ritmo está presente na poesia e
no canto, assim, no uso técnico de Aristóxeno e de seus seguidores,
mélos passa a ser usado para significar exclusivamente a parte tonal
da música ou a melodia no sentido comum, considerada como uma
sucessão de notas de alturas diferentes, em contraposição ao ritmo.
De fato, mais tarde quando se quiser designar melodia no sentido
antigo, será acrescentada a palavra téleion à mélos para indicar a
melodia acabada, com a presença do ritmo” (Rios, 1954, p.3, nota 2).
Portanto, Aristóxeno dá à palavra grega mélos um sentido
especificamente tonal, modificando a concepção anterior que a referia
a uma combinação de palavra, ritmo e melodia. Ela é distinta desse
mélos composto ao qual poderíamos incluir elementos de coreografia,
e que Platão e Aristóteles mencionaram ao atribuir efeitos da música
ao comportamento humano, falando do ponto de vista do ethos
musical. A música grega antiga, e especialmente a defendida por
Platão, era eminentemente vocal – portanto, ligada a um texto
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Neste estudo, utilizamos a mesma numeração que Rios como referência para a
obra de Aristóxeno. Ela advém da compilação de Marcus Meibom, Antiquae Musicae
Auctores, Amsterdam, 1652.