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CLAYSON MORIMOTO
A INTERDISCIPLINARIDADE DO MEIO AMBIENTE:
DA GEOGRAFIA AO DIREITO AMBIENTAL
LONDRINA
2010
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CLAYSON MORIMOTO
A INTERDISCIPLINARIDADE DO MEIO AMBIENTE:
DA GEOGRAFIA AO DIREITO AMBIENTAL
Dissertação apresentada ao Programa
de s-Graduação Strictu Sensu em
Geografia, Dinâmica, Espaço
Ambiental do Departamento de
Geociências da Universidade Estadual
de Londrina, como requisito parcial à
obtenção do título de Mestre.
Orientadora: Profª Drª Rosana
Figueiredo Salvi.
LONDRINA
2010
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CLAYSON MORIMOTO
A INTERDISCIPLINARIDADE DO MEIO AMBIENTE:
DA GEOGRAFIA AO DIREITO AMBIENTAL
Dissertação apresentada ao Programa
de s-Graduação Strictu Sensu em
Geografia, Dinâmica, Espaço
Ambiental do Departamento de
Geociências da Universidade Estadual
de Londrina, como requisito parcial à
obtenção do título de Mestre.
COMISSÃO EXAMINADORA
Profª Drª Rosana Figueiredo Salvi
Universidade Estadual de Londrina
Profª Drª Eloiza Cristiane Torres
Universidade Estadual de Londrina
Profº Drº Cezar Bueno de Lima
Pontifícia Universidade Católica
Londrina, 19 de fevereiro de 2010.
Catalogação elaborada pela Divisão de Processos Técnicos da Biblioteca Central da
Universidade Estadual de Londrina.
Dados Internacionais de Catalogação-na-Publicação (CIP)
M857i Morimoto, Clayson.
A interdisciplinaridade do meio ambiente : da geografia ao direito
ambiental / Clayson Morimoto. Londrina, 2010.
161 f. : il.
Orientador: Rosana Figueiredo Salvi.
Dissertação (Mestrado em Geografia, Dinâmica Espaço-Ambiental) Universidade Estadual de Londrina,
Centro de Ciências Exatas, Programa de Pós-Graduação em Geografia, Dinâmica Espaço-Ambiental, 2010.
Inclui bibliografia.
1. Meio ambiente Abordagem interdisciplinar do
conhecimento Teses. 2. Geografia Meio ambiente
Teses. 3. Direito ambiental Teses. I. Salvi, Rosana
Figueiredo. II. Universidade Estadual de Londrina. Centro de
Ciências Exatas. Programa de Pó-Graduação em Geografia,
Dinâmica Espo-Ambiental. III.tulo.
CDU 911.3:577.4
Dedico este trabalho aos meus pais, Mario e
Zuzu, por terem permanecido ao meu lado,
me apoiando e incentivando a percorrer este
caminho, por compartilhar as angustias e
vidas, estendendo suas mãos fraternas,
nos árduos momentos.
A minhas queridas irmãs, Danielle e
Verediana pelo afeto, dedicação e pela
fraterna convivência.
A minha adorável avó Carolina por todas as
razões do coração.
AGRADECIMENTOS
Agradeço, primeiramente a DEUS, pelo dom da vida e por tantas
graças recebidas.
A minha querida família em especial, pela confiança, motivação e
pelo apoio imprescindíveis para o meu sucesso.
A Professora Doutora Rosana Figueiredo Salvi, pela orientação,
incentivo, disposição e pacncia na concretização deste trabalho. O galgar nos
degraus do conhecimento não seria o mesmo sem as suas contribuições.
Aos docentes do Programa do Mestrado em Geografia, Dinâmica,
Espaço Ambiental, que no decorrer do curso com suas discussões auxiliaram para o
enriquecimento de meus estudos.
Aos colegas de classe, que por tantas vezes transformaram os dias
de estudos em momentos agradáveis. Vocês jamais serão apagados de minha
memória.
A Fundação Araucária pela bolsa de estudos concedida, que
financiou parcialmente esse trabalho, contribuindo para o devido aprimoramento
profissional.
Ao professor Doutor Cezar Bueno de Lima e a professora Doutora
Eloiza Cristiane Torres, por integrarem a Comissão Examinadora e pelas brilhantes
contribuições visando o aprimoramento deste trabalho.
Um agradecimento especial a professora Doutora Yoshiya
Nakagawara Ferreira, por compartilhar sua sabedoria e seu acervo bibliográfico
particular.
Ao professor Doutor Marcos Antônio Striquer Soares, por integrar a
comissão examinadora.
A todos que, de alguma forma, contribuíram direta ou indiretamente
para a realização e conclusão desse trabalho, os meus sinceros agradecimentos.
Todos nós desejamos ajudar uns aos outros.
Os seres humanos são assim. Desejamos viver
para a felicidade do próximo não para o seu
infortúnio. Por que havemos de odiar e
desprezar uns aos outros? Neste mundo há
espaço para todos. A terra, que é boa e rica,
pode prover a todas as nossas necessidades.
O caminho da vida pode ser o da liberdade e
da beleza, porém nos extraviamos. A cobiça
envenenou a alma dos homens, levantou no
mundo as muralhas do ódio, e tem-nos feito
marchar a passo de ganso para a miséria e os
morticínios. Criamos a época da velocidade,
mas nos sentimos enclausurados dentro dela.
A máquina, que produz abundância, tem-nos
deixado em penúria. Nossos conhecimentos
fizeram-nos céticos; nossa inteligência,
empedernidos e cruéis. Pensamos em demasia
e sentimos bem pouco. Mais do que de
quinas, precisamos de humanidade. Mais do
que de inteligência, precisamos de afeição e
doçura. Sem essas virtudes, a vida será de
violência e tudo será perdido.
Charles Chaplin, em O Grande Ditador (1940)
MORIMOTO, Clayson. A interdisciplinaridade do meio ambiente: da geografia ao
direito ambiental. 2010. 160 f. Dissertação (Mestrado em Geografia, Dinâmica,
Espaço Ambiental) Universidade Estadual de Londrina, Londrina. 2010.
RESUMO
O presente trabalho promove uma discussão sobre a interdisciplinaridade do meio
ambiente, perpassando pela ótica da ciência geográfica até a sua proteção no
arcabouço jurídico. Para auferir seus objetivos contextualiza-se no decorrer dos
tempos a intrínseca relação dicotômica do homem e da natureza, buscando
explicitar as transformações socioeconômicas, culturais, políticas e jurídicas que se
delineam nesse amplo processo interconectado. Desde a mais primitiva das
sociedades, homem e natureza mantêm intrínsecas relações. No limiar do século
XXI as ciências humanas e sociais enfrentam novos desafios, frente a produção
fragmentada do conhecimento. O processo interdisciplinar é uma medida
integradora, capaz de favorecer a dimensão social que a ciência fragmentada não
possibilita. Sabe-se que a Geografia detém um conhecimento acumulado no
decorrer dos séculos, por sua vez o Direito Ambiental, é um fenômeno recente na
história da humanidade. Muito embora sejam ciências com características próprias e
distintas, e de utilizarem nomenclaturas distintas, é possível afirmar que ambos m
o mesmo objeto de estudo, resguardadas algumas considerações. Em razão do
caráter teórico deste trabalho, utiliza-se a pesquisa bibliográfica e documental,
crivadas a um processo analítico e sistemático. No que tange às contribuições
esperadas, busca-se um estudo sistematizado da relação homem-natureza, de
modo a contribuir para uma reflexão sobre o desenvolvimento humano e da ciência
geográfica e jurídica ambiental. Assim, no âmbito teórico, coteja-se demonstrar aos
profissionais envolvidos na temática exposta, que da interação homem-natureza
existem aspectos econômicos, sociais e jurídicos que se interrelacionam numa
matriz multiescalar e multitemporal. Com isso, aspira-se que as conclusões do
estudo possam subsidiar novos projetos e fundamentar uma concepção em que
homem e natureza são concebidos como parte de um mesmo processo constituído
de diferenças.
Palavras-chave: Meio ambiente. Geografia. Direito ambiental. Interdisciplinaridade.
MORIMOTO, Clayson. The interdisciplinarity of the environment: from the
geography to the environmental law. 2010. 160 f. Dissertation. (Master´s degree in
Geography, Dinamic, Environmental Space) State University of Londrina, Londrina.
2010.
ABSTRACT
The present work promotes an discussion on the interdisciplinarity of the
environment, traversing for the optics of geographic science until its protection in
framework legal. To gain its objectives contextualizes in elapsing of the times the
intrinsic dichotomy relation of the man and the nature, being searched to explicit the
socioeconomic, cultural transformations, legal politics and that if delineate in this
ample interconnected process. Since most primitive of the societies, man and nature
keep intrinsic relations. In the threshold of century XXI sciences social human beings
and face new challenges, front the fragmented production of the knowledge. The
process to interdisciplinary is a measure integrator, capable to favor the dimension
social that fragmented science does not make possible. Know that Geography
withholds a knowledge accumulated in elapsing of the centuries, in turn the
Environmental Law, is a recent phenomenon in the history of the humanity. Much
even so is sciences with proper and distinct characteristics, and to use distinct
nomenclatures, is possible to affirm that both have study object the same, protected
some regard. In reason of the theoretical character of this work, it is used
documentary bibliographical research and, riddled to an analytical and systematic
process. In what it refers to the waited contributions, one searchs a study systemize
of the relation man-nature, in order to contribute for a reflection on the human
development and of ambient geographic and legal science. Thus, in the theoretical
scope, seek to demonstrate to the professionals involved in the thematic one
displayed, who of the interaction man-nature exist economic aspects, social and legal
that if interrelated in a matrix to multiscale and multiweather. With this, aspirated that
the conclusions of the study can subsidize new projects and base a conception
where man and nature are conceived as part of one same consisting process of
differences.
Key Words: Environment. Geography. Environmental Law. Interdisciplinarity.
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO .................................................................................................... 11
2 NATUREZA, HOMEM E SOCIEDADE ............................................................... 16
2.1 INTRÓITO ............................................................................................................ 16
2.2 O HOMEM E A NATUREZA NAS SOCIEDADES PRIMITIVAS ......................................... 20
2.3 NATUREZA NA GRÉCIA ANTIGA ............................................................................. 24
2.4 SOCIEDADE E NATUREZA NA IDADE MÉDIA ............................................................ 29
2.5 NATUREZA E SOCIEDADE MODERNA ..................................................................... 33
3 A INTERDISCIPLINARIDADE E O MEIO AMBIENTE ....................................... 43
3.1 CONSIDERAÇÕES TEÓRICO-METODOLÓGICAS ........................................................ 43
3.2 A INTERDISCIPLINARIDADE NA(S) CIÊNCIAS(S) ....................................................... 55
3.3 DA IDEIA DE NATUREZA A EXPRESSÃO MEIO AMBIENTE .......................................... 60
3.4 O CONCEITO JURÍDICO DE MEIO AMBIENTE ........................................................... 72
4 A EPISTEME DA GEOGRAFIA .......................................................................... 81
4.1 DA GEOGRAFIA ANTIGA OU MEDIEVAL .................................................................. 81
4.2 A GEOGRAFIA CLÁSSICA OU TRADICIONAL ............................................................ 88
4.3 A GEOGRAFIA MODERNA ..................................................................................... 96
5 A PROPEDÊUTICA DO DIREITO AMBIENTAL ................................................. 107
5.1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS .................................................................................... 107
5.2 O DIREITO AMBIENTAL SISTEMATIZADO ................................................................. 111
5.3 OS PRINCÍPIOS DO DIREITO AMBIENTAL ................................................................ 119
5.3.1 Noções Preliminares ..................................................................................... 119
5.3.2 Princípio do Ambiente Ecologicamente Equilibrado como Direito
Fundamental da Pessoa Humana .......................................................................... 122
5.3.3 Princípio da Natureza Pública da Proteção Ambiental .................................. 123
5.3.4 Princípio da Participação ............................................................................... 124
5.3.5 Princípio da Reparação ................................................................................. 125
5.3.6 Princípio do Poluidor-Pagador ....................................................................... 126
5.3.7 Princípio da Prevenção ................................................................................. 127
5.3.8 Princípio do Desenvolvimento Sustentável ................................................... 128
6 AS INTERFACES DA GEOGRAFIA E DO DIREITO AMBIENTAL ..................... 131
CONCLUSÃO ........................................................................................................ 143
REFERÊNCIAS ...................................................................................................... 147
INTRODUÇÃO
A introdução de um trabalho normalmente começa por direcionar de
forma impessoal a temática a ser desenvolvida, de modo que o leitor seja informado
de forma clara e precisa o que se pretende com a pesquisa proposta, esta não será
diferente, entretanto em algumas linhas despindo-se de fórmulas e conceitos
agregar-se-á algumas informações sobre a formação do autor deste trabalho, que de
certo modo contribuiu para que a temática envolvida fosse pesquisada propiciando
uma nova visão.
Durante os primeiros anos de graduação no curso de Bacharel em
direito do Centro Universitário Filadélfia UNIFIL, a intensa atividade da vida
acadêmica e trabalho de estagiário junto ao Setor de Triagem do Juizado Especial
Cível de Londrina, não me permitia com uma certa clareza, ter uma visão objetiva e
prática para onde meus passos deveriam caminhar. No último ano do curso de
Direito, alguns colegas declinavam a área de atuação, por vezes, esbocei alguns
pensamentos, mas nada se definia, pois as afinidades, o eram suficientes para
engajar uma especialização no ano seguinte. Ao começar a pesquisa sobre o
trabalho de conclusão de curso, os anseios e a busca de uma área de atuação,
pareciam estar chegando ao fim.
Notoriamente, com o trabalho de conclusão de curso aconteceu uma
aproximação com uma nova área do direito, até então desconhecida, o direito
ambiental. A dificuldade em encontrar referencial bibliográfico para a redação do
trabalho era um obstáculo a mais a ser vencido, por ser uma área nova não havia
tantos autores, muito menos uma variedade de obras para pesquisa. Entretanto
com muita leitura e pesquisa, os resultados foram aparecendo. O fato é que a
identificação com a área ambiental crescia a cada momento, a leitura das obras era
algo fascinante. Um dado curioso era que ao escolher a área ambiental, pensava
que não haveria muito mais contato com outras áreas do direito, assim, os
conhecimentos e estudos sobre Direito Constitucional, Direito Administrativo, Direito
Penal, Direito Civil, Direito Tributário, dentre outros, não seriam utilizados, mas os
estudos demonstraram o oposto, pois o Direito Ambiental não é uma ciência
estanque, muito pelo contrário, exige um conhecimento complementar das cncias
jurídicas supracitadas e muitas outras o jurídicas, verbi gratia (v.g.) a Geografia, a
Ecologia, a Física, a Sociologia, a Filosofia e a História dentre outras.
Assim, após a graduação ingressei no Curso de Pós-Graduação
Latu Sensu do Instituto de Ensino Pesquisa e Educação IEPE, na busca de novos
conhecimentos sobre a questão ambiental. As disciplinas cursadas tinham uma
significância marcante, enquanto na graduação se faziam alusões aos direitos
consagrados e a instrumentalização desse direito, nas aulas ministradas na
especialização era possível verificar a dinâmica da questão ambiental e necessidade
de maiores estudos. A obtenção do título de especialista em meio ambiente e
desenvolvimento sustentável era mais uma conquista de um ano virtuoso.
A luz de preceitos e valores particulares, para se desenvolver uma
advocacia ambiental, não basta apenas conhecer o mundo da ciência e da técnica
jurídica, é preciso ir além, que se conhecer a tabulação territorial da natureza e o
conjunto de fenômenos e pertences a ela entrelaçados. A natureza é una. Visando
agregar uma maior qualificação profissional, e aprofundar em novos conhecimentos
o Curso de Pós-Graduação Strictu Sensu em Geografia, Dinâmica, Espaço
Ambiental da Universidade Estadual de Londrina era o caminho que se aportava. O
Mestrado em Geografia da Universidade Estadual de Londrina, dentre seus
objetivos, visa a capacitação e formação de profissionais para atuarem nos diversos
níveis de ensino, pesquisa e atividade profissional. A oportunidade de coadunar as
expectativas intelectuais e profissionais foram decisivas para iniciar uma nova
caminhada.
Nesse momento de discussão acadêmica discortina-se um ambiente
favorável à pesquisa, à reflexão, à criação e ao amadurecimento científico. As
condições básicas ofertadas pelo programa para a construção de uma visão
integradora, articulada pela ambiência geográfica, possibilitaram a incorporação de
valores inerentes a uma escala temporal-evolutiva, identificando que existem
relações entre os diversos campos da Geografia e do Direito. Com trajetórias e
experiências distintas, o conhecimento secular de duas ciências corroboram para a
formação cultural do homem.
A presente dissertação consagra o Programa de Pós-Graduação em
Geografia da UEL, em nível de mestrado enfatizando a perspectiva geográfica na
abordagem do espaço. A área de concentração do curso tem como proposta a
“Geografia, Dinâmica, Espaço Ambiental” com a inserção de duas linhas de
pesquisa: “Dinâmica Sócio-espacial” e “Dinâmica Geo-ambiental”. A base triangular
que alicerça as linhas de pesquisa baseia-se no conjunto natureza, sociedade e
cultura, que de modo articulado configuram toda a essência do curso.
A complexidade para se fazer uma abordagem sistêmica e dualista,
aguçou o interesse pelo presente trabalho e manteve-se como principal elemento da
motivação ao longo de todo o seu desenvolvimento, refletindo o entusiasmo
perpassado no texto produzido. Buscando compreender a questão conceitual de
meio ambiente entre duas ciências (Geografia e Direito Ambiental) é preciso estudar
a relação do homem com a natureza, para averiguar a carga axiológica precursora e
delimitadora de conceito embasadores de uma ciência.
Por essas razões o objetivo da presente dissertação, no decorrer de
seus capítulos, é discutir a interdisciplinaridade do meio ambiente, demonstrando
que existem inúmeras interfaces entre a Geografia e o Direito Ambiental. Em tempos
de pensamento sistêmico, onde se comprovam as interligações dos processos
físicos, a ligação estreita entre as atividades do ser humano, é preciso haver diálogo
entre as ciências, como resposta à complexa realidade social. Em razão do caráter
teórico deste trabalho, a metodologia utilizada teve como base a pesquisa
bibliográfica cujas leituras iniciais estiveram atentas à evolução do pensamento
geográfico e às principais tendências e categorias da análise geográfica, seguindo a
linha da epistemologia ambiental, para finalmente ater-se ao campo do Direito
Ambiental. Teve-se como meta poder estabelecer uma síntese dos pressupostos de
ambas as disciplinas, no tocante a problemática e alternativas para as queses do
meio ambiente. Por meio de um processo analítico e sistemático foram, assim,
coletadas e analisadas as informações referentes ao tema.
Para atingir seu objetivo, a presente dissertação, no capítulo
introdutório ”Natureza, homem e sociedade” promover-se-á a discussão sobre o
homem e a natureza no decorrer dos séculos, iniciando-se com algumas
constatações no intróito, para em seguida proceder a descrição do homem e da
natureza nas sociedades primitivas. Também perpassará pela concepção originária
de natureza no período grego, além da mudança de concepção sobre natureza
durante a idade média. Para finalizar a primeira parte abordar-sesobre as novas
compreensões do relacionamento do homem com a natureza na sociedade
moderna.
No segundo capítulo nominado a “Interdisciplinaridade e meio
ambiente analisar-se o fenômeno interdisciplinar, com seus marcos teóricos e
definições. Não obstante simplista, mas profícua será a abordagem sobre a
interdisciplinaridade na ciência. Logo sem seguida, iniciar-se-á uma abordagem
sobre a migração da terminologia natureza para a expressão meio ambiente, no
contexto das ciências. Como rmino da segunda parte discorrer-se-á como o
conceito de meio ambiente incorporou-se e sistematizou-se passando a ser
amplamente utilizado pelo direito ambiental.
Não obstante no terceiro capítulo, explicitar-se-á sobre a “Episteme
da Geografia”, demonstrando as características marcantes do processo evolutivo do
pensamento geográfico. As considerações iniciar-se-ão pela Geografia Clássica,
fase embrionária de todo os estudos da ciência geográfica. Logo em seguida
abordar-se-á a Geografia Tradicional, demonstrando às dimensões do pensamento
geográfico com o desenvolvimento econômico e cultural, a possibilidade de novos
campos de estudo, a expressividade de alguns autores no cenário internacional e a
consagração das escolas geográficas. Ato contínuo articular-se-á a Geografia
Moderna com seu pensamento crítico e o debate sobre a questão metodológica
articulando-se uma análise epistemológica.
Quanto ao capítulo “A propedêutica do direito ambiental” nas
considerações iniciais buscar-se-á sistematizar a gênese do Direito Ambiental no
sistema jurídico brasileiro. Analisar-se-á o Direito ambiental como um direito
fundamental caracterizado pela tutela jurídica do meio ambiente, a extensão e os
limites de seu campo de incidência. No que tange os princípios do direito ambiental
abordar-se-á os postulados principiológicos, ensejadores dos ensinamentos básicos
e gerais, que traçam as orientações, as diretrizes básicas para que uma ciência
possa ser considerada autônoma e desenvolvida no contexto científico que se
apresenta.
Por fim, no capítulo A interface da Geografia e do Direito ambiental”
demonstrar-se-á que o meio ambiente pode ser analisado sob o ângulo de duas
ciências: a geográfica e a jurídica ambiental. É fato que as relações sociais se
estabelecem no substrato geográfico, fazendo-se necessário a constatação das
interfaces dessas ciências, uma vez que compartilham e cooperação na produção
de diversos conhecimentos para a sociedade.
O resultado almejado com este trabalho tende a ser pretensioso, de
forma a buscar uma singularidade impar no campo das ciências humanas e sociais.
A disposição dos conteúdos reflete a carência de trabalhos interdisciplinares entre a
Geografia e o Direito Ambiental. Assim, coteja-se elucidar certos argumentos sobre a
definição de natureza e meio ambiente demonstrando o seu significado em cada
ciência e que não existem indefinições terminológicas. O trabalho interdisciplinar
entre a Geografia e o Direito ambiental é uma realidade que adquire novos
contornos, afasta os abismos e constrói novas pontes adequando e readequando os
saberes. Por óbvio espinhoso, mas brilhante será o caminho a ser trilhado.
2 NATUREZA, HOMEM E SOCIEDADE
À primeira vista a noção de natureza não coloca maiores
problemas, entretanto por meio de um estudo mais detalhado, é possível lhe atribuir
novos significados a depender do contexto da pesquisa em que se insere. Nesse
sentido utilizar-se-ão expressões sinônimas para natureza neste capítulo
introdutório, tais como: meio, meio ambiente, ambiente, ambiente material;
resguardadas a complexidade terminológica e suas implicações, passam a
dimensionar a representação do meio físico num contexto geográfico geral. Nesse
substrato material, o homem vive em sociedade desde os primórdios da
humanidade; por sua vez a sociedade se manm pela convivência dos homens.
Nessa relação homem/sociedade existem inúmeros processos dicotômicos que se
refletem na própria sociedade humana. Estas serão as bases introdutórias de
discussão.
2.1 INTRÓITO
Desde que o homem surgiu no planeta, aos processos normais de
transformação da própria natureza foram somados outros resultantes das atividades
humanas. Assim, ao construir sua história, ao longo dos tempos, três momentos
significativos marcaram a relação das suas atitudes para com o meio natural. O
primeiro momento é a descoberta, momento este em que a natureza, dotada de
poder divino e sobrenatural, é temida pelo homem. O segundo momento é o meio de
existência, momento em que os condicionantes da natureza passaram a ser aceitos
como fatores limitantes e reguladores da vida levando o homem a desenvolver o
aprendizado de convivência com eles. Por fim, no terceiro momento ocorre, a
transformação, em que os condicionantes da natureza passaram a ser modificados,
minimizados ou superados, em virtude dos avanços culturais e tecnológicos da
sociedade humana (EMÍDIO, 2006, p. 25-26).
Nesse sentido a natureza constitui o conjunto de todos os seres que
formam o universo. Considerando-se como fruto da elaboração e inteligência
humana, o conceito de natureza não é estático, mas diferencia-se dependendo do
pensamento dos homens que o estudaram e elaboraram, naturalmente diferentes a
depender de cada etapa da história da humanidade. Desse modo, tem-se que as
relações do homem com a natureza são social e culturalmente condicionadas,
somente podendo ser compreendidas a partir dessa perspectiva (ANTUNES, 2000,
p. 13). Ainda que sejam muitos os sentidos e definições adquiridos pela natureza
através dos tempos e dos espaços sociais, certo é que, sendo um conceito
humanamente determinado, ela não pode ser compreendida de forma apartada do
ser humano. Isso quer dizer que, ao se falar em natureza necessariamente está
sendo relacionado o elemento humano, ainda que historicamente se possa constatar
uma maior ou menor aproximação entre esses dois pólos da relação (DUARTE,
2003, p. 22-23).
É preciso mencionar que natureza e sociedade não se excluem
mutuamente. A primeira nos abrange, como resultado das intervenções humanas.
Por sua vez a segunda existe em toda parte. O homem situa-se na confluência da
estrutura e do movimento de ambas: biológico, por ser social, social por ser
biológico, não sendo produto específico de nenhum desses movimentos. Separando
o problema de sua origem, e a oposição entre estas suas duas ordens de realidade,
é possível deslocar a questão do plano horizontal para o vertical. Sendo assim a
transição da primeira para a segunda revela-se, com efeito, uma transição paralela,
solidária, de um estado natural comum para um estado natural do próprio homem,
um estado social comum para um estado que lhe é peculiar. Impõe-se o
reconhecimento de um vínculo sequencial, estático, unindo os processos sociais e
os processos bionaturais (MOSCOVICI, 1975, p. 27-28).
Muito embora possa induzir a uma certa polêmica e por vezes
parecer complexa as considerações de Moscovici, suas afirmativas passam a ser
simples quando se compreende que o reconhecimento do vínculo sequencial dos
processos sociais e bionaturais representam os acontecimentos, fatos e fenômenos
históricos que são dispostos de maneira diferente na sociedade e na natureza, ou
seja, os processos naturais e sociais se entrelaçam sobre a mesma base territorial
formando um único processo, uma vez que são consequências das mudanças
introduzidas pelo próprio homem.
Coadunando com as ideias de Moscovici, em sua obra O Enigma
do Homem, Morin (1975, p. 22-23) salienta que a dualidade antitética
homem/animal, cultura/natureza choca-se com a evidência de que o homem não é
um ser constituído por duas fatias sobrepostas, uma bionatural e outra psicossocial;
é evidente que ele não é atravessado por uma muralha da China separando sua
parte humana de sua parte animal; é evidente que cada homem é uma totalidade
biopsicossociológica. Diante de tais evidências a antropologia suscita paradoxos que
ela mesma não consegue decifrar. Hodiernamente a antropologia evita tais questões
e por muitas vezes rejeita o inexplicável como sendo insignificante, até que o
problema se esvaia no campo da percepção. Mas, é preciso mencionar ainda que,
para a Biologia na primeira metade do século XX, a relação homem/natureza era
inexplicável e a incapacidade da Biologia possibilita a compreensão da anestesia da
Antropologia em face do problema.
Para Cruz (1967, p. 15) o homem como ser biológico e em sua
radical ontologia de ser, está instalado em um ambiente que se encontra em
constante interação adaptativa e modificadora, de acordo com suas conveniências
biológicas e com seu espírito projetivo. Como indivíduo é uma estrutura dinâmica
que se materializa num processo substancial no tempo por meio das características
de sua herança genética latente. É uma estrutura que experimenta modificações
pela ação que o ambiente realiza sobre ele. Todavia, Dorst (1973, p. 09-10) ressalta
que as atividades humanas, levadas ao seu paroxismo, desenvolvidas a o
absurdo, parecem conter em si os mesmos germes da destruição da espécie
humana. O homem evoluiu de tal forma, permitindo-lhe atingir um alto nível de vida,
cujo excesso pode ser-lhe fatal.
Fazendo-se alusão ao mencionado por Cruz e por Dorst, a
possibilidade no mundo contemporâneo do próprio homem ser destruído em face do
desenvolvimento alcançado é perfeitamente factível. No mundo globalizado a
mobilidade provinda das rotas comerciais da aviação civil, proporcionam uma
interligação entres os mais diversos locais, favorecendo uma maior circulação de
pessoas. Nesse sentido, os vírus e as bactérias podem se espalharem em todos os
continentes por meio daqueles que se encontrarem em trânsito. Em março e abril de
2009, o vírus influenza h1n1, descrito inicialmente no México, país da América
Central, espalhou pelos países vizinhos, cruzou oceanos e contaminou milhões de
pessoas em todos os continentes.
O homem é um produto da hereditariedade e do ambiente em que
vive e cresce, assim como viveram e cresceram seus ancestrais. Nesse sentido a
hereditariedade reflete os ambientes em que homem viveu em outros tempos. Sabe-
se que os genes, e os genótipos, que conferiram boas adaptações aos ancestrais do
homem, para que sobrevivessem num ambiente hostil existente no passado, lhe
foram transmitidos ao longo das gerações, ao passo que aquelas que produziram
imperfeições foram eliminadas. A seleção natural é uma função da adaptação dos
fenótipos aos ambientes em que vivem e os fenótipos são produtos dos genótipos e
do ambiente. Em outras palavras o ambiente selecionou no passado e ainda
seleciona no presente. A seleção natural é uma interação entre o genótipo, por meio
do fenótipo que determina, e do ambiente.
As interrelações complexas entre as sociedades e as naturezas
produzem rebatimentos espaciais. De maneira mais precisa, as dinâmicas
socioambientais se dão no espaço, através do espaço, tornando-o um terreno
profícuo de estudos. Por isso, Lipietz (1994, p. 10), afirma que o grande problema da
humanidade hoje, assim como do seu futuro parece ser o espaço. Seu espaço: o
meio ambiente. Como ela o cria, como vive nele, e como se arrisca a sucumbir com
ele. O lugar, a região e a espacialidade são a natureza da sociedade e da história, e
não apenas o palco imóvel onde a vida acontece (MARTINS, 2007, p. 40). Pierre
Gourou (1971), brilhante geógrafo francês, apud Deleáge (1993, p. 283) enfatiza que
não existe crise no uso da natureza, que não seja na forma de vida dos homens.
Não obstante as novas formas de ver a realidade considerarem que
a rigidez da ciência moderna dominante pode representar sério obstáculo a um
conhecimento profundo e verdadeiro do mundo social e natural. Nesse sentido, a
emergência da questão ambiental em anos recentes, com variadas conotações
políticas e normativas e aparentemente dissociada da prática científica contribuiu
para aumentar a visibilidade de limitações do conhecimento estabelecido. Diante das
questões suscitadas pelo discurso ambiental da atualidade, a temática sociedade-
natureza, embora objeto de debates no âmbito interno da Geografia, sem dúvida
contribui para situar esse campo de conhecimento no foco das atenções (CIDADE,
2001, p. 100).
Registre-se ainda que a natureza sempre foi o objeto de reflexão de
diferentes campos do conhecimento. Desde a filosofia moderna ocidental, dos idos
de Francis Bacon até hodiernamente, na medida em que se confronta a natureza
como domínios das ciências naturais, verifica-se um distanciamento das ciências
humanas em relação à natureza. Existe, claramente uma crescente separação no
tratamento das questões ambientais em relação às questões sociais, em que a
natureza sucumbe como algo externo ou por vezes estranho a questão social
(LIMONAD, 2007, p. 15).
A intrínseca relação tricotômica existente sobre a natureza, o
homem e a sociedade ocupa um lugar de destaque, quando se busca uma melhor
compreensão dos fenômenos naturais e sociais. É sabido que o homem por meio da
cooperação e organização do trabalho, implementando suas relações de produção,
apropria-se da natureza buscando o desenvolvimento socioeconômico. Às custas
desse desenvolvimento econômico incomensurável, perfilam comportamentos
culturais distintos a depender do nível de exploração vivenciada em cada natureza, e
em cada sociedade. Diante de tais argumentos é preciso fazer uma releitura da
sociedade, do homem, e do que ainda resta da natureza.
2.2 O HOMEM E A NATUREZA NAS SOCIEDADES PRIMITIVAS
É evidente que a definição ou a conceituação do que seja natureza,
depende da percepção que se tem dela, e inclusive do próprio homem, assim sua
finalidade subordina-se as formas e objetivos da convivência social, que foram
múltiplos nas várias sociedades que ao longo da história os homens constituíram.
Em cada uma dessas sociedades, em cada um desses tempos, a natureza possuía
um significado diferente segundo os valores e objetivos de cada agrupamento social.
Nas chamadas sociedades primitivas a natureza sequer era reconhecida enquanto
algo distinto do agrupamento humano, uma vez que se confundia com o próprio
espaço de vida desse agrupamento (CARVALHO, 1991, p. 13). Dubos (1968, p.
234) perlustrando as ideias da sociedade primitiva salienta que o homem primitivo se
considerava parte do meio. Ademais as pedras, as nascentes, as árvores e os
animais não eram conceitos abstratos, mas uma expressão que haviam sido
geradas por uma ordem cósmica.
Segundo Dorst (1973, p. 19) o homem nos primórdios da civilização
ainda podia ser considerado como um elemento natural, ao mesmo tulo que
qualquer outra espécie animal; entretanto não permaneceu muito tempo nessa
situação de igualdade: a evolução que conduz aos tempos modernos já tinha
iniciado. Ressalta ainda que em uma análise profunda a história da humanidade
pode ser encarada como a luta da nossa espécie contra o meio em que se insere e
sua emancipação progressiva relativamente à natureza e a algumas de suas leis,
como o domínio progressivo do homem sobre o mundo com seu solo, suas plantas,
e seus animais, submetidas às invenções do nio humano. O homem primitivo não
dispunha evidentemente de uma quantidade de energia mecânica para que o seu
impacto sobre a natureza pudesse ultrapassar certos limites estreitamente
circunscritos.
Cumpre observar que, segundo Delge (1993, p. 283), desde a
pré-história, as atividades de depredação e de produção humana supõem a redução
geral e a transformação contínua dos ecossistemas naturais ou seminaturais, de
acordo com determinado número de tendências seculares e mesmo plurimilenares.
Não obstante o modus vivendi das sociedades primitivas, Moscovici (1975, p. 135)
salienta que a gênese da caça contribuiu para uma série de acréscimos e
transformações sobre os fatores orgânicos e físicos preexistentes. De certo modo,
pode-se dizer que a evolução do homem subordina-se a um combate direto contra
as adversidades climáticas e geográficas do ambiente material, escandido por
invenções que, em cada etapa decisiva, resolvem um problema, geram novos
recursos e aperfeiçoam a tecnologia.
Quando a natureza ainda era inteiramente natural, intocável pelo
homem, ter-se-ia, a rigor uma diversificação da natureza em estado puro. O
movimento das partes, causa e conseqüência de suas metamorfoses, deriva de um
processo devido unicamente as energias naturais desencadeadas. A primeira
presença do homem é um fator novo na diversificação da natureza, pois ela atribui
às coisas um valor, acrescentando ao processo de mudança um dado social. Num
primeiro momento, ainda não dotado de tecnologias que aumentassem o seu poder
transformador e sua mobilidade o homem é criador, mas subordinado (SANTOS,
2004, p. 131). Para Lebon (1976, p. 46) é importante mencionar que, o
conhecimento geográfico das sociedades primitivas, sobre o território que
ocupavam, muitas vezes, decorria da própria necessidade, passando a ser cada vez
mais detalhado e especializado o conhecimento , por meio da percepção do
espaço.
De igual forma sabe-se que os povos primitivos se relacionavam
com a natureza de forma intensa, uma vez que, para garantia de sua subsistência, o
homem pré-histórico coletava frutos e raízes, caçava e pescava, além de se utilizar
de abrigos naturais, como cavernas, copas de árvores ou choças feitas de galhos
para se proteger do frio e das intempéries naturais. As muitas pinturas rupestres
encontradas nas paredes das cavernas, onde são retratadas cenas do cotidiano
daqueles povos, demonstram ora, o domínio dos mesmos sobre bens da natureza,
principalmente sobre os animais que lhes serviam de caça, ora o tratamento de
reverência a certos elementos e fenômenos da natureza, traduzindo uma (primeira)
cosmovisão mágica desses povos (DUARTE, 2003, p. 23).
Segundo Morin (1975, p. 66 a 70) cumpre assinalar que
a caça é o grande continuum numa evolução que viu as espécies
sucederem umas às outras descontinuamente, desde o homínida de
cabeça pequena até o sapiens de grande cérebro. A caça deve ser
considerada um fenômeno humano total; não atualizou e exaltou
aptidões pouco utilizadas e suscitou novas aptidões, não
transformou a relação para com o meio ambiente; mas também
transformou a relação de homem para homem, de homem para
mulher, de adulto para jovem. Mais ainda: seus próprios
desenvolvimentos, correlativamente às transformações operadas,
transformaram o indivíduo, a sociedade e a espécie. [...] A caça
estimula aptidões estratégicas: a atenção, a tenacidade, a
combatividade, a audácia, o ardil, o engodo, a armadilha, a espreita.
[...] A caça intensifica e complexifica a dialética pé-mão-cérebro-
instrumento, a qual, em compensação, intensifica e complexifica a
caça. Esta dialética traz consigo o desenvolvimento técnico que afina
e diversifica a arma e o instrumento melhorando a construção de
abrigos. [...] É, enfim, no plano social que o desenvolvimento da caça
e suas consequências representam um papel transformador.
Acompanham uma sociogênese que dissocia o modelo social
hominídeo do modelo das sociedades primatas mais avançadas e
constitui um novo tipo de sociedade.
É importante elencar ainda, que as tentativas de explicações dessa
realidade primitiva referenciadas pela analogia do comportamento da natureza com
as características do comportamento humano, deflagram a ideia de que a primeira
constitui uma fonte inesgotável de mistérios e que os atributos humanos conferidos à
ela retornam aos homem, configurando-se como elementos de uma super-natureza
e atribuindo poderes sobrenaturais aos homens destinados a revelar os seus
mistérios, ou seja, os sacerdotes, minoria dominante que se distância das atividades
produtivas e passa a se apropriar da terra e do trabalho daqueles que dedicam-se
diretamente à produção. O monopólio das informações sagradas por uma
determinada classe social privava os demais componentes dessa sociedade do
contato direto com os poderes sobrenaturais e promovia a distinção entre os
homens e a natureza, uma vez que essa se torna inatingível para aqueles que não
pertencem ao grupo dominante (ELY, 2006, p. 136).
Nesse universo, Morais (1999, p. 77) revela que o mundo natural e o
mundo social não apresentam diferenças significativas para os seres, que ensejasse
um rompimento. Atributos humanos como os sentimentos (paixões, gratidão, ira,
fome, carência, etc.) tamm são comportamentos naturais, igualmente como os
percebidos na chuva, na morte de um animal, na enchente ou na erupção de um
vulcão. Outro dado importante dessa concepção mágica de natureza refere-se nos
traços da mentalidade religiosa demonstrada por uma heterogeneidade do sagrado
(formas e conteúdos), onde a sexualidade, nascimento, morte, vegetação e animais
são considerados tabus, feitiços, ocasionando ambivalências de adoração e medo,
como se tivessem poderes supremos.
Corroborando o assunto Carvalho (1991, p. 31) enfatiza que quando
o domínio do natural e da natureza se torna um atributo monopolizado por uma
classe, o restante da sociedade não só fica privado dos poderes sobrenaturais,
como tamm começa a perceber distinções importantes entre os homens, a maioria
pelo menos, e a natureza, que esta se torna algo inalcançável para o comum dos
mortais. Assim, estabeleceu-se uma distinção de classes sociais e a adoção de
outra hierarquia de valores rompendo sem vida o esquema comunitário do mundo
selvagem. Para Gonçalves (1990, p. 24) é de fundamental importância que se faça
uma análise e uma reflexão de como foi e como é concebida a natureza nas
sociedades.
Nas sociedades antigas e as dos povos do Oriente (babilônios,
assírios, hebreus, persas, etc.) os mitos ainda continuaram povoando as explicações
do natural e da natureza por um bom tempo. Sem dúvida, no início, numa fase de
subordinação, o homem sofreu os imperativos do seu habitat natural. Todavia este
período foi relativamente curto (DORST, 1973, p. 28). Para Gomes (1991, p. 34) as
sociedades primitivas possuíam os embriões do conhecimento científico, sendo que
a prática cotidiana e o senso comum é que definiam a dimensão dessa verdade
científica. Por tais razões Carvalho (1991, p. 30) salienta que o rompimento com o
chamado universo primitivo não ocorreu de forma abrupta e nem da mesma forma
em todos os lugares ou ao mesmo tempo.
2.3 NATUREZA NA GRÉCIA ANTIGA
O século VI a.C. na Grécia é normalmente caracterizado como o
período do nascimento de uma nova forma de reflexão sobre a natureza, os homens
e seu universo. O fato é que para o dinamismo do mundo grego, as velhas
linguagens e as velhas concepções sobre o natural e a natureza teriam que ser
substituídas (CARVALHO, 1991, p. 32-33). Duarte (1985) apud Morais (1999, p. 78)
salienta que as condições históricas de afirmação territorial grega criaram as
condições necessárias para uma nova mentalidade, cujas observações são
inspiradas nas contradições sociais. Assim, com uma sociedade mais dinâmica,
baseada no comércio, a natureza aguarda uma nova linguagem para sua
explicação.
Assim, os primeiros filósofos de que se tem notícia na Grécia antiga
foram denominados físicos da natureza, pelo fato de terem se importado com o
estudo da natureza e dos processos naturais. Embora discordando quanto aos
elementos e princípios que constituem e regem o universo, os filósofos pré-
socráticos do mundo helênico (século IV a V a.C.) compartilhavam a visão de que
tudo integra a natureza: o ser humano, a sociedade por ele construída, o mundo
exterior e até os deuses. A diferença desta cosmovisão para a das sociedades
simples e a dos sistemas filosóficos orientais consiste no fato de que tais físicos não
se postarem numa atitude de adoração e de contemplação diante da natureza, mas
de a interrogarem em busca do seu segredo (SOFFIATI, 2000, p. 160).
Partindo da realidade que os cercava e da experiência prática de
cada homem, os (denominados) físicos procuraram, por diversos caminhos, criar
uma teoria capaz de sintetizar os fenômenos e enquadrá-los em categorias
estruturadas (ANTUNES, 2000, p. 13). Na chamada época pré-socrática os filósofos
Tales, Anaximandro, Anaxímenes (todos de Mileto); Xenófanes (de Cólofon);
Heráclito (de Éfeso); Pitágoras (de Samos); Parmênides e Zenão (de Eléia); Melisso
(de Lamos); Empédocles (de Agrigrento); Filolau (de Cróton); Arquitas (de Torento);
Anaxágoras (de Clazomena); Diógenes (de Apolônia) e Leucipo e Demócrito (de
Abdera) desenvolveram um conceito de natureza diferente (GONÇALVES, 1990, p.
29).
Neste sentido a filosofia pré-socrática busca uma explicação racional
e sistemática sobre a origem, ordem e transformação da natureza, da qual os seres
humanos fazem parte, de modo que, ao explicar a natureza, a filosofia tamm
explica a origem e as mudanças dos seres humanos. Em outras palavras, a
cosmologia não admite a criação do mundo a partir do nada, mas afirma a geração
de todas as coisas por um princípio natural de onde tudo vem e para onde tudo
retorna. Esse princípio é uma natureza primordial denominada physis (palavra
oriunda de um verbo que significa “fazer surgir, fazer brotar, fazer nascer, produzir),
sendo a causa natural contínua e imperecível da existência de todos os seres e de
suas transformações (CHAUI, 2006, p. 39).
Ilustrando a assertiva Gerd Bornheim apud Gonçalves (1990, p. 29)
descreve a dimensão do significado da physis para os filósofos gregos:
A physis pode ser melhor compreendida a partir de sua gênese
mitológica [...] Os deuses gregos não são entidades sobrenaturais,
pois são compreendidos como parte integrante da natureza [...] Esta
presença (dos deuses) transparece ainda na frase que é atribuída a
Tales: “Tudo está cheio de deuses!” [...] Segundo Haeger, Tales
emprega a palavra de Deus “em um sentido um tanto distinto
daquele em que a empregariam a maioria dos homens.Os deuses
de Tales não vivem em uma região longínqua, separada, pois tudo,
todo o mundo que rodeia o homem e que se oferece ao seu
pensamento está cheio de deuses e dos efeitos de seu poder. “Tudo
está cheio de misteriosas forças vivas; a distinção entre a natureza
animada e inanimada não tem fundamento algum; tudo tem alma.
Esta ideia da alma, de forças misteriosas que habitam a physis,
transforma-a em algo inteligente, empresta-lhe certa espiritualidade,
afastando-a do sem-sentido anárquico e caótico. Veja-se, como
exemplo, o fragmento 67 de Heráclito. “Deus é dia e noite, inverno e
verão, guerra e paz, abundância e fome. Mas toma formas variadas,
assim como o fogo, quando misturado com essências, toma o nome
segundo o perfume de cada uma delas.Ou ainda o fragmento 64:
“O relâmpago (que é a arma de Zeus) governa o universo.” Esta ideia
de que Deus pertence em algum sentido à physis é característica de
todo o pensamento pré-socrático e continua viva mesmo em
Demócrito (...) à physis pertence, portanto, um princípio inteligente,
que é reconhecido através de suas manifestações e ao qual se
emprestam os mais variados nomes: espírito, pensamento,
inteligência, logos, etc. [...] A palavra physis indica aquilo que por si
brota, se abre, emerge, o desabrochar que surge de si próprio e se
manifesta neste desdobramento, pondo-se no manifesto. Trata-se,
pois de um conceito que nada tem de estático, que se caracteriza por
uma dinamicidade profunda, genética. “Dizer que o oceano é a
gênese de todas as coisas”, afirma Werner Jaeger referindo-se a
Homero. Neste sentido, a physis encontra em si mesma a sua
gênese, ela é arké, princípio de tudo aquilo que vem a ser. O “pôr-se
no manifesto” encontra na physis a força que leva a ser manifesto.
Por isto pode Heidegger dizer “a physis é o próprio ser, graças ao
qual o ente se torna e permanece observável.
Em outras palavras a ideia de physis significa que o universo físico
deve ser concebido como o próprio lugar da criação e da organização. Entretanto a
physis o é nem uma base, nem um estrato, nem um suporte. A physis é comum
ao universo físico, à vida, ao homem. A ideia de sermos seres físicos deve ser
transformada em ideia significante (MORIN, 2003, p. 43). Segundo Gerd Bornheim
apud Gonçalves (1990, p. 31-32), existe ainda um terceiro aspecto que caracteriza a
physis para os gregos:
A physis é a totalidade de tudo o que é. Ela pode ser apreendida em
tudo o que acontece: na aurora, no crescimento das plantas, no
nascimento de animais e homens. E aqui convém chamar a atenção
para um desvio em que facilmente incorre o homem contemporâneo.
Posto que a nossa compreensão do conceito de natureza é muito
mais estreita e pobre que a grega, o perigo consiste em julgar a
physis como se os pré-socráticos a compreendessem a partir daquilo
que nós hoje entendemos por natureza; neste sentido comprometeria
o primeiro pensamento grego com uma espécie de naturalismo. Em
verdade a physis não designa principalmente aquilo que nós, hoje,
compreendemos por natureza, estendendo-se, secundariamente ao
extranatural. Para os pré-socráticos, já de saída, o conceito de physis
é o mais radical e amplo possível, compreendendo em si tudo que
existe. Não se compreende psíquico, por exemplo, a partir do modo
de ser da natureza em seu sentido atual, como não se entendem os
deuses a partir do nosso conceito mais parco de natureza. À physis
pertencem o céu e a terra, a pedra, a planta, o animal e o homem, o
acontecer humano como obra do homem e dos deuses e, sobretudo,
pertencem à physis os próprios deuses. Devido a esta amplidão e
radicalidade, a palavra physis designa outra coisa que o nosso
conceito de natureza. Vale dizer que na base do conceito de physis
não está nossa experiência de natureza, pois a physis possibilita ao
homem uma experiência totalmente outra que não a que temos face
à natureza. Assim, a physis compreende a totalidade daquilo que é;
além dela nada que possa merecer a investigação humana. Por
isto, pensar o todo do real a partir da physis não implica naturalizar
todos os entes ou restringir-se a este ou aquele ente natural. Pensar
o todo do real a partir da physis é pensar a partir daquilo que
determina a realidade e a totalidade do ente.
Posta assim a conceituação, para o filósofo pré-socrático a partir da
physis pode-se chegar a uma compreensão da totalidade do real: do cosmos, dos
deuses e das coisas particulares, do homem e da verdade, do movimento e da
mudança, do animado e do inanimado, do comportamento humano e da sabedoria,
da política e da justiça (GONÇALVES, 1990, p. 31). Segundo Pelizzoli (1999, p. 55)
o termo physis (natureza) apresenta um conceito dinâmico, da totalidade das coisas
existentes. Remete também a um princípio intrínseco do ser e devir de tudo, sendo
fundamental lembrar a sua raiz, phyomai: crescer, germinar, brotar, nascer. Aqui o
termo physis designa o caráter de geração vital, de algo absolutamente vivo.
Remetendo-se a uma força e dinâmica que a tudo perpassa. Tal noção de natureza
como algo dinâmico e vivo, orgânico e regenerador é notável, e começou a ser
sufocada apenas na Revolução Científica.
Embora todos os pré-socráticos afirmassem que o princípio
fundamental do mundo obedecia às leis determinadas pela physis, nem por isso
concordavam ao determinar o que era physis, e cada filósofo encontrou motivos e
razões para determinar qual era o princípio eterno e imutável que está na origem da
natureza e de suas transformações (CHAUI, 2006, p. 40). É bem verdade que Tales
e outros integrantes da primeira escola filosófica escola de Mileto , como
Anaxímenes e Anaximandro, foram os pioneiros no estabelecimento de princípios
explicativos para a natureza, a partir de elementos dela própria, isto é, livres dos
mitos ou compromissos religiosos. Para Tales, o princípio de tudo estaria na água;
para Anaxímenes, no ar; já para Anaximandro, esta origem não deveria ser
acreditada a nenhuma substância em particular, uma vez que a Terra seria de
princípio indeterminado e ilimitado (CARVALHO, 1991, p. 34).
Segundo Ferreira (1999, p. 43) Anaximandro (560 a.C.), autor do
“Tratado da Natureza”, entendeu que a substância essencial encontrava-se fora de
todas as outras (água, terra, ar e fogo). Para esse filósofo, o mundo era apenas um
dos mundos que surge de algo” que para ele considera como infinito; destacando
que esse algo não poderia ser apenas a água (FERREIRA, 1999, p. 43). Nesse
sentido é preciso mencionar que Tales de Mileto (625-558 a.C.) foi o primeiro
estudioso sistemático da natureza, atribuindo à água a uma importância fundamental
para a vida. Observando os seres vivos, esse filósofo procurou compreender-lhes a
essência, para daí explicar os fatos observáveis a partir das regras gerais. Tales de
Mileto e Demócrito foram tidos como os responsáveis pelo desenvolvimento das
noções de natureza (physis), ordem natural (cosmos) e da lei tural (nomos)
(ANTUNES, 2000, p. 13).
Cumpre observar, todavia que Aristóteles é considerado o principal
historiador e organizador do saber desenvolvido pelos filósofos, sistematizando este
“mundo da natureza” descortinado pelos gregos. Inicialmente, propõe definições
para o termo natureza (physis) admitindo seu uso tanto para fazer referência a tudo
aquilo que não for produto do homem, como ao substrato ou à matéria-prima de que
as coisas são feitas. Baseando-se no princípio de que no mundo da natureza todas
as coisas têm o seu lugar, todos os lugares a sua coisa e o conjunto permanente
movido pelas mesmas causas e orientado sempre para os mesmos fins, concluiu
que no mundo vivo, a reprodução e o desenvolvimento das plantas e animais
obedeciam a uma finalidade interna, imutável e eterna, inerente a forma destes
organismos (CARVALHO, 1991, p. 35). Segundo Morais (1999, p. 79) Aristóteles
acreditava que as coisas tinham uma causa em si mesma, ou seja, um princípio de
nascimento, organização e movimento. Assim a natureza se manifesta como
processo, crescimento e mudança. Com Aristóteles, sistematiza-se a compreensão
de natureza.
Assim, com base nestes princípios Aristóteles formulou o seu
modelo geostático terra imóvel para os cosmos: a Terra, admitida como esférica,
estaria depositada no lugar mais baixo, pois era o corpo mais pesado do cosmos;
em torno dela, sucessivos estratos esféricos de água, ar e fogo a circundariam, e, ao
redor deste conjunto, a lua, o sol, o céu das estrelas fixas e demais astros
realizariam movimentos circulares, compondo outras 55 esferas sólidas e
constituídas por uma quinta essência desconhecida e evidentemente diferente das
outras quatros terra, água, ar e fogo (CARVALHO, 1991, p. 36). Para Pelizzoli
(1999, p. 55) a noção do cosmos é fundamental. O homem se debruça de fato para
conhecer e integrar-se no processo da natureza, em suas oposições. O homem é
parte do cosmo; é o ser no mundo, na casa, e deve associar-se aos processos
naturais, ao mesmo tempo em que busca desvendá-los.
Tenha-se presente que com o desenvolvimento das cidades, do
comércio, do artesanato, e das artes militares, Atenas tornou-se o centro da vida
social, política e cultural da Grécia. O filósofo Sócrates, considerado o patrono da
filosofia, propunha que antes de querer conhecer a natureza e antes de querer
persuadir os outros, cada um deveria primeiro e antes de tudo, conhecer-se a si
mesmo (CHAUI, 2006, p. 40-41). O escopo desse filósofo, que exemplificava por
meio de parábolas, era buscar na investigação filosófica por meio do conhecimento
profundo do homem, o homem como homem e a comunidade em que vivia. Essa
busca da descoberta do homem pelo próprio homem conduziu Sócrates a sua
clássica afirmação: “conhece-te a ti mesmo”, entendendo que o homem, além de
seu sentido e de suas sensações subjetivas, é tamm razão, por isso capaz de
construir conceitos universais e imutáveis (OLIVEIRA, 2006, p. 51).
A máxima de Sócrates é tida como um marco de uma cosmovisão
antropocêntrica (COELHO, 1977, p. 58). Ao mesmo tempo que a alteridade da
natureza começa a ser percebida, por meio da objetividade -se o esboço do
domínio da natureza via materialização, racionalização, lógica linear e conceituação.
Isto pode ser vista a partir desse filósofo e de forma bem mais acentuada com
Aristóteles. Deste modo a partir de Sócrates desloca-se a ênfase do olhar
investigativo conjugado aos processos da natureza, para uma esfera lógico-
conceitual determinada pela razão em expansão (PELIZZOLI, 1999, p. 58-59).
A poderosa força, tanto da personalidade como dos pensamentos de
Sócrates, influenciou aquela época de esplendor da Grécia antiga e tamm das
gerações posteriores. A doutrina socrática inicialmente teve continuidade por meio
de seu discípulo Platão e depois também com o seguidor deste filósofo Aristóteles
(OLIVEIRA, 2006, p. 53). Enfim, da amplitude do pensamento grego, enfatiza-se
uma dupla orientação: a) uma forma de abordagem da natureza de caráter
integrador, que considera os processos da mesma; e b) um modelo de apreensão do
real que enceta para a autonomia da razão e lógica humana, e modo de relação com
a alteridade via dominação (PELIZZOLI, 1999, p. 59).
Cumpre assinalar que os princípios aristotélicos e a sistematização
de Ptolomeu compuseram uma concepção de natureza que não sobreviveu ao
Império Romano, como se manteve tamm praticamente incólume durante todo o
período em que se desenvolveu a chamada Idade Média Cristã. A igreja fez algumas
adaptações, mas manteve a essência de uma natureza orgânica, imutável, movida
eternamente a partir das causas e fins predeterminados, num mundo situado no
centro do cosmos, já que tais ideias serviriam para as suas pretensões. De modo
que o livro da natureza criado pelos gregos se torna o livro das escrituras,
explicando o surgimento do homem, considerado um fruto divino e descreve a
criação da terra como um ato divino (CARVALHO, 1991, p. 36-37).
2.4 SOCIEDADE E NATUREZA NA IDADE MÉDIA
Inicialmente cumpre esclarecer que as ditaduras de semideuses, das
antigas e primeiras sociedades desempenharam um papel de transição entre a não-
natureza dos primitivos e a natureza oficialmente reconhecida dos gregos. O período
medieval também pode ser considerado como uma nova espécie de transição entre
as diferentes visões de mundo, promovendo uma revolução nas concepções sobre o
natural e a natureza tão importante quanto aquela promovida pelos gregos e suas
cosmologias (CARVALHO, 1991, p. 38-39). A natureza existe e inclui o ser humano,
que dela emergiu depois de um longo e complexo processo de transformação
ecossistêmica e biológica. Todavia, a natureza lhe é inacessível na sua objetividade,
porquanto entre o ser humano e ela necessariamente interpõe-se um sistema de
representações que conduz a visões diferenciadas do mesmo objeto (SOFFIATI,
2000, p. 159).
A visão medieval do universo fundava-se numa cosmografia
geocêntrica, com a Terra no centro de um universo esférico e dividido em duas
zonas, a celeste e a terrestre. Na zona celeste, a zona da perfeição, o movimento
dos objetos é previsível movem-se em órbitas circulares em torno da terra. Na
zona terrestre, porém, o movimento é irregular e imprevisível e as coisas nascem e
morrem, ou seja, modificam-se. É a zona da imperfeição. Tratava-se de uma
cosmografia orientada por uma ideia teleológica os acontecimentos imperfeitos
deste Cosmos, os seus movimentos de mudança, tendiam para o preenchimento de
uma causa final, o cumprimento dos desejos de Deus. Desta percepção decorre que
a natureza poderia ser vista a partir de duas metáforas principais: a do livro e a do
organismo (CASTRO, 2002, p. 136).
Segundo Castro (2002, p. 136) a natureza era vista como livro
porque nela estavam inscritos para quem os soubesse ler, esses mesmos desejos
de Deus; a outra metáfora medieval a da natureza como organismo fazia
equivaler a Terra a um grande animal habitado pelas pessoas. A ideia central que
anima esta metáfora é a de que todas as partes do Cosmos seriam
interdependentes e permeadas pelo princípio vital. Esta doutrina do vitalismo
inscreve-se na ideia de que o universo tem como causa final o cumprimento dos
desejos de Deus. Plenitude e continuidade são os dois conceitos centrais desta
visão de mundo.
Duarte (2003, p. 26), ressalta que a partir da influência judaico-cristã
é que a oposição homem-natureza e espíritomatéria adquiriram maior dimensão,
dando início a um processo de dessacralização da natureza. O desenvolvimento do
monoteísmo contribuiu para deslocar vários valores místicos dos bens naturais para
uma unidade única, onipotente, onipresente e onisciente denominada Iaveh (Jeova
ou Deus). Em que pese o universo ser tomado como criação divina, Deus e natureza
se tornam realidades distintas, separadas, e o homem passa a ocupar posição
intermediária entre ambas; o que vem lançar as raízes do teocentrismo-
antropocentrismo e da história. Para Soffiati (2000, p. 160) a fragmentação da visão
sacralizada de natureza inicia-se com a domesticação dos animais e das plantas,
constituindo o primeiro passo na construção de uma sociedade humana complexa.É
importante mencionar que a assimilação aristotélico-platônica que o cristianismo fez
em toda a Idade Média levou a cristalização da separação espírito-matéria. Se
Platão apregoava que a ideia era perfeita, em oposição à realidade mundana,
operando sua própria leitura, o cristianismo opunha a perfeição divina à imperfeição
do mundo material. Entretanto, apesar da acusação de obscurantismo que seria
lançado aos tempos medievais, pelos pensadores modernos, a separação corpo e
alma ocorrida na Idade Média teria sido de grande importância para a Ciência e
Filosofia moderna (GONÇALVES, 1990, p. 32). Segundo Soffiati (2000, p. 159), para
os povos simples, em que natureza ainda constituía uma unidade sagrada e mágica,
a visão sacral não admitia os questionamentos de ordem filosófica, mas tão somente
o culto.
Helfrich Jr. (1974, p. 133) salienta que a ênfase dada na dicotomia
de dois mundos: o mundo do homem e o mundo da natureza encorajou o estudo do
homem somente dentro da estrutura das instituições humanas, de sua luta contra a
natureza e de seu domínio sobre ela, como atividades realizadas dentro do âmbito
dessas instituições humanas com tendências a desencorajar uma visão orgânica; a
beleza, a variedade, a plenitude podiam ser celebradas na arte, na música na
literatura. Encorajava, por outro lado, uma visão utilitarista da natureza, não uma
visão que recomendasse preservar ou conservar a natureza; a primeira visão era
progressista, a segunda romântica, uma incurável fidelidade para com o passado.
Todavia, seu aspecto mais enganador, especialmente quando era um elemento
indistinguível da ideia de progresso, era o elevado plano em que colocava o homem
e suas instituições. O homem, na verdade, dominava a natureza por meio da
racionalidade e do propósito.
O fato do homem criar conceitos permitiu-lhe o poder de ter a si
como referência única homem como medida única de todas as coisas. Esta
consequência da razão iluminista que permite que o homem se coloque como o
centro do universo, numa direta substituição a Deus, por este próprio ter lhe
permitido, ao ter lhe concedido diferencialmente a razão (anima rationales para
Bacon), permitiu-lhe desenvolver uma ética com a qual todo seu meio pode e deve
ser subjugado, para a finalidade de desenvolvimento da sociedade. A natureza,
neste contexto, recurso natural, entrega sua substância para a apropriação e
compreensão humana (DERANI, 2001, p. 76).
Segundo Dorst (1973, p. 91-92) o histórico do conceito de proteção
da natureza revela uma ideia muito antiga, existente na antiguidade. Autores
clássicos já haviam suscitado o interesse pelas devastações cometidas na região
mediterrânea. Essa tomada de consciência amplificou-se durante a Idade Média, de
modo que inúmeros textos legislativos foram promulgados por príncipes, visando à
proteção da grande fauna da Europa e à conservação das florestas que, em outras
zonas estavam sendo abatidas de forma generalizada. No entanto, a maior parte
dessas medidas tinha como objetivo principal a monopolização da grande fauna e a
preservação de terrenos de caça para o exclusivo benefício dos poderosos” da
época. Colocadas no seu contexto social, protegeram, a fauna de um modo bastante
eficaz, moderando o processo de degradação da natureza.
É preciso mencionar que o saber científico conservado como
propriedade privada da hierarquia feudal (igreja e senhores palacianos) é rompido
pelo contínuo crescimento das forças produtivas emergentes do novo regime
político, econômico e social, o capitalismo. Desse modo impõe-se a necessidade da
substituição do saber inventariante pelo saber científico, a fim de legalizar nos
séculos vindouros, perante a opinião blica os atos de rapina (colonialismo)
praticados contra povos e nações considerados como inferiores ou incapazes de
promoverem o seu próprio desenvolvimento, assim com o advento das ciências
naturais e experimentais e posterior desenvolvimento das ciências sociais, políticas
e filosóficas (as chamadas ciências humanas), a ciência entra em uma nova fase da
História (GOMES, 1991, p. 34).
Note-se ainda que sobre este substrato é que vai desenvolver, na
Europa Ocidental, entre os anos 1550 e 1700, a chamada Revolução Científica,
construída sobre uma concepção racionalista, utilitarista e mecanicista do mundo,
onde a natureza é despojada de qualquer vestígio de sacralidade, seja de
concepção teológica, filosófica ou ideológica. René Descartes é considerado como o
maior expoente da ruptura entre o ser humano e o mundo, eis que deposita na razão
humana a possibilidade de dar significado ao mundo. O homem passa a ser
colocado no centro do Universo. A razão, compreendida como a capacidade do
homem de pensar, questionar, buscar e conhecer, desprovida de mitos e de
significações pré-concebidas, seria a única condição de existência de fundamentos
certos à compreensão do mundo. Com base nessa visão, os objetos naturais
perdem a capacidade de significar para o homem algo que transcendesse sua mera
instrumentalização. As teorias de pensadores como Galileu, Copérnico e Newton
revelam o Universo, a natureza, como objeto do conhecimento sujeito a observação
e comprovação empírica, totalmente desprovido de essências. O ser humano e o
ambiente em que vive perdem sua identificação com o Cosmos, com o mundo, que
passa a ser mediatizado pela ciência. Na modernidade, a ciência dedicou-se
predominantemente a conhecer as leis da natureza como objeto a ser conhecido,
dominado e colocado a serviço dos seres humanos (SOFFIATI, 2000, p. 161).
2.5 NATUREZA E SOCIEDADE MODERNA
A palavra “modernusderivado de modo (recentemente, há pouco) é
uma palavra de formação tardia na língua latina, seguindo o modelo de hodiernus
(derivada de hodie, hoje). Usada inicialmente em fins do culo V d.C., como
antônimo de antiquus. Posteriormente, termos como modernitas (tempos modernos)
e moderni (homens de nosso tempo) tornaram-se comuns, sobretudo após o século
X. A modernidade, por conseguinte é uma invenção da Idade Média Cristã, esse fato
deveria, em princípio, ter estabelecido um contraste tão nítido quanto fosse
impossível imaginar com o mundo antigo. O mundo antigo era pagão, o moderno,
cristão. O cristianismo deu novo alento a ideia de tempo e História (KUMAR, 1997,
p. 79-80).
A força mais profunda que movimenta o homem e faz com que
invente novas formas de sociedade é sua capacidade de mudar suas relações com
a natureza, ao transformá-la. No entanto, nenhuma ação intencional do homem
sobre a natureza pode começar sem a existência de representações, de ideias que,
de algum modo, são o reflexo das condições materiais de produção. Em síntese, no
âmago das relações do homem com a natureza aparece uma parte ideal, não
material, onde se exercem e se entrelaçam as três funções do conhecimento:
representar, organizar e legitimar as relações dos homens entre si e deles com a
natureza. Deste modo, é preciso analisar o sistema de representações que
indivíduos e grupos fazem de seu ambiente, pois é com base nelas que eles agem
sobre o meio ambiente (DIEGUES, 1998, p. 63).
É preciso salientar que toda sociedade moderna parte de um ponto
comum na qual a natureza é recurso natural (matéria a ser apropriada), e o homem,
sujeito apartado do objeto a ser apropriado, o é mais integrante da natureza.
Sujeito e objeto vivem em dois mundos: mundo social e mundo natural. Meio
ambiente, seria toda a entouragedeste solitário sujeito. Não somente a natureza
bruta em sua forma primitiva é meio ambiente, porém todo o movimento de
transformação do recurso natural, ou seja, todo movimento deste objeto que
circunda o homem, que sobre ele age com seu poder, querer e saber, construindo o
meio ambiente (MORIN, 1997, p. 21).
Ainda segundo Morin (1997, p. 21), pode se dizer que dois aspectos
do pensamento cartesiano vão marcar a modernidade. O primeiro é o caráter
pragmático adquirido pelo conhecimento, onde a natureza é vista como um recurso
e o segundo é o antropocentrismo, que coloca o homem como o centro do mundo,
como sujeito em oposição ao objeto (a natureza). Instrumentalizado pelo método
científico, o homem começa a adentrar nos mistérios da natureza e, assim, torna-se
seu senhor e possuidor de forma a domi-la. A esses dois aspectos se alia o
mercantilismo que se afirmava e o colonialismo que tornava alguns homens, de fato,
senhores e possuidores do mundo. Se, no início da Idade Média, essa visão é
assumida pelos ricos senhores feudais, pelo clero e pela nobreza, com o
desenvolvimento do mercantilismo e a Revolução Comercial e o surgimento da
burguesia, a pragmática filosofia cartesiana encontra um fértil terreno para germinar,
vindo a se consolidar o paradigma dominante da antropocentrização do mundo.
Saliente-se ainda que o antropocentrismo e o sentido pragmático-
utilitarista do pensamento cartesiano não podem ser vistos desvinculados do
mercantilismo que se afirmava e se tornava, com o colonialismo senhor e possuidor
de todo o mundo. Afinal, na Idade Média a riqueza dos senhores feudais e da Igreja
advinha da propriedade da terra, e da exploração dos servos. Com o
desenvolvimento mercantil e, com ele, da burguesia a riqueza passa cada vez mais
a depender da técnica. Deste modo o antropocentrismo consagrará a capacidade
humana de dominar a natureza (GONÇALVES, 1990, p. 34). Sem embargos, a
expressão “civilização humana é sinônima de conquista da natureza (THOMAS,
1989, p. 31).
Segundo Duarte (2003, p. 30) foi com a consolidação do capitalismo
que a tendência cartesiana foi levada às ultimas consequências sendo, no século
XIX, o triunfo desse mundo pragmático onde se consagra a ideia de uma natureza
objetiva e exterior ao homem, pressupondo um homem não natural e alheio a
natureza, eis que a ciência e a técnica adquirem um lugar central. As ciências da
natureza se separam das ciências do homem, criando-se entre elas um grande
abismo. A natureza, objeto possuído e dominado passa a ser subdividida em Física,
Química, Biologia, Geografia, e o homem em Economia, Sociologia, História,
Antropologia, etc., tornando-se mais difícil qualquer tentativa de pensar o homem e a
natureza de forma mais integrada. Até porque a divisão não se somente ao nível
de pensamento, mas tamm na realidade objetiva construída pelo homem, onde se
inicia uma intensa divisão social e técnica do trabalho.
Para Santos (2004, p. 235-236) na medida em que tudo era meio
natural, o homem escolhia da natureza aquelas suas partes ou aspectos
considerados fundamentais ao exercício da vida, valorizando, diferentemente,
segundo os lugares e as culturas, essas condições naturais que constituíam a base
material da existência do grupo. Esse meio natural generalizado era utilizado pelo
homem sem grandes transformações. As cnicas de trabalho se casavam com as
dádivas da natureza, com a qual se relacionavam sem outra mediação. As
transformações impostas às coisas naturais já eram técnicas, entre as quais a
domesticação de plantas e animais aparece como um momento marcante: o homem
mudando a natureza, impondo-lhe leis. Assim, a sociedade local era ao mesmo
tempo criadora das técnicas utilizadas, comandante dos tempos sociais e dos limites
de sua utilização. A harmonia socioespacial assim estabelecida era desse modo,
respeitosa da natureza herdada, no processo de criação de uma nova natureza.
Produzindo a sociedade territorial produzia tamm, uma série de comportamentos,
cuja razão é a preservação e a continuidade do meio de vida. Tais sistemas técnicos
sem objetos técnicos não eram, pois, agressivos, pelo fato de serem indissolúveis
em relação à natureza que, em sua operação, ajudavam a reconstruir.
No mundo moderno, com Descartes, o método ganha maior
destaque. O homem dispondo do domínio do método científico poderá ter acesso
aos mistérios da natureza tornando-se senhor e possuidor desta, utilizando-a para
os fins que desejar (GONÇALVES, 1990, p. 42). Assim, a moderna investigação da
natureza é a única que conseguiu um desenvolvimento científico, sistemático e
múltiplo, em contraste com as geniais intuições filosófico-naturalistas dos antigos e
com as descobertas, muito importantes, mas esporádicas e em sua maior parte
carente de resultados (ENGELS, 1976, p. 15). Em virtude dessas considerações o
estudo da realidade social pressupõe a compreensão da inafastável unidade
dialética entre natureza e cultura. Toda formação cultural é inseparável da natureza,
com base na qual se desenvolve. Natureza conforma e é conformada pela cultura.
De onde se conclui que tantas naturezas ter-se-á quão diversificadas forem as
culturas e, naturalmente, pelo raciocínio inverso, as culturas terão matizes diversas
posto que imersas em naturezas diferentes (DERANI, 2001, p. 72).
A questão ambiental parece exigir um novo paradigma onde
natureza e cultura não fiquem uma fora da outra. A socialidade está inscrita no reino
animal muito mais profundamente do que até bem pouco se podia imaginar. Logo a
cultura humana não sai da natureza, ao contrário é uma das suas qualidades. O
homem, por natureza, produz cultura. E o faz desenvolvendo-se a partir de um
patamar alcançado pelos primatas, pelos homínidas até chegar ao homo sapiens.
Há, portanto continuidade e descontinuidade no processo de constituição do
homem. Enfim a tradicional dicotomia homem-natureza que conformou o saber na
sociedade ocidental volta a ser questionada (GONÇALVES, 1990, p. 82-83).
No final do século XX, mais precisamente na década de 1980, surge
a cosmovisão contemporânea da natureza, que segundo Pelizzoli (1999, p. 65)
nessa nova compreensão o universo passa a ser visto como uma rede de relações
vivas, que incluem o homem como próprio observador, assim como ator e não
apenas como mero espectador passivo e neutro. Compreendendo-se que toda
pesquisa e experiência humana envolvem uma ação e reação entre o sujeito e
objeto, percebem-se as limitações do método científico, notadamente na abordagem
lógico-analítica e causal-linear dos sistemas dinâmicos como os ecossistemas e
passa a ser considerada a necessidade de uma abordagem cíclica, integrada e
complexa, que os sistemas (visualizados como redes dinâmicas e auto-
organizativas, imprevisíveis) são compreendidos em sua realidade dinâmica, e
dialética em um movimento contínuo, onde a alteração faz desembocar uma nova
estabilidade, mas a qual não se pode apreender completamente ou fixar. Ao inverso
do cartesianismo, é incluída a incerteza e indeterminação como princípio
fundamental a ser considerado, vez que pelo caráter próprio da natureza não se
permite chegar à certeza absoluta.
Nesse sentido pode-se dizer ainda que a questão da natureza, surge
num contexto absolutamente problemático, crucial e urgente do avançar inesperado
e assustador do século XX. Ou seja, o questões que tomam vigor
inescapavelmente, após todas as grandes e repetidas reavaliações das causas e
das conseqüências do progresso contraditório do capitalismo. Críticas internas a
própria ideia de civilização da Europa, pós-revolução científica e revolução industrial,
dos colonialismos e dos renovados imperialismos. Críticas como a do marxismo, o
cristianismo social e engajado, a psicanálise, as peripécias da arte contemporânea,
e mesmo de alguns filósofos na tentativa de recuperação da humanidade do homem
em perigo; críticas que não conseguiram os resultados esperados, mas antes foram
até abarcadas pelo status quo in crescendum, pelo sistema ou mecanismo. As vozes
proféticas e as filosofias deste século ainda não foram suficientes, mas a voz do
calor, da acidez, da seca, da fome e da morte química dos seres vivos, via
degradação da natureza, começa a ser sentida de toda forma (PELIZZOLI, 1999, p.
83).
A ideia de desenvolvimento sintetiza o melhor projeto civilizatório
que a Europa Ocidental acreditou poder universalizar, tanto pela via liberal e
capitalista como pela via social democrata e socialista. O desenvolvimento é o
nome síntese da ideia de dominação da natureza, desde as mais remotas
contradições do mundo colonial-moderno. Afinal, ser desenvolvido é ser
industrializado, urbano, enfim, é ser tudo aquilo que afasta o homem da ideia
primitiva de natureza, colocando o homem diante dos mais diferentes constructos
realizados (cidades, indústrias, estradas, etc.). A ideia de progresso é parte de uma
hegemonia cultural tecida a partir do iluminismo, ou seja, da vertente burguesa da
modernidade isto é do capitalismo. Nos anos de 1950-60 surge a ambiguidade e o
questionamento dos efeitos do desenvolvimento, logo, aparecem as diferenças
diante dos paradoxos constitutivos moderno-colonial. A superação da desigualdade
se transforma numa busca da igualdade para todos, destruindo talvez o maior
patrimônio da humanidade, as diferenças. Eis uma problemática e um risco para
todos, pois na medida em que tenta submeter o planeta e a humanidade a uma
mesma lógica, de caráter mercantil, induz se a novos riscos e maiores consumos de
matéria prima e energia (GONÇALVES, 2004, p. 27 a 30).
Considerando-se o alargamento do Cosmos ao infinito, a Terra
passa a ser vista, não como um simples planeta dentre outros, mas como Gaia, ou
seja, como um organismo vivo onde todos os elementos, inclusive os não-vivos se
encontram em intrínseca interdependência e interação. Inaugura-se uma época
holística onde se isola o elemento particular e parte-se para as interligações uma
época de rede, da comunicação e aldeia global, da internet, onde passa a ser
permitido cada vez mais partilhar acontecimentos, trocar experncias, em um
mundo que pode ser cosmopolita sem sufocar os indivíduos. Nesse contexto, a
relação do homem e a natureza parecem ganhar um novo sentido na busca de
formas alternativas de sabedoria para além da cientificidade, como as terapias do
transcendental, a recuperação da espiritualidade como intimidade fundamental, o
naturalismo, o pensamento oriental, o pós-modernismo, o pensamento da diferença
e, principalmente, a busca de uma nova ética que permita o surgimento do novo
resgate da sabedoria e da solidariedade humana, o que se resume na procura,
antes de tudo, da humanidade do homem e sua vocação a existência (PELIZZOLI,
1999, p. 66-67).
Nessa linha de raciocínio vale citar o filósofo francês Michel Serres,
defensor da ideia de que é chegada a hora de substituirmos a teoria do contrato
social pela teoria do contrato natural. Preconizando uma revisão conceitual do direito
natural de Locke, pelo qual o homem é o único sujeito de direitos, Serres considera
que o homem deve renunciar ao mito do contrato social primitivo para firmar um
novo pacto com o mundo: o contrato natural. Para Serres, o direito de propriedade
tem uma origem excremental. Isso porque, assim como os outros animais que
urinam e defecam para marcar o seu território, o homem, com a criação do direito de
propriedade, fez do planeta uma lata de lixo, estando, com sua sujeira, a ameaçar as
outras espécies. O desafio da sociedade moderna seria, assim, a superação desse
estado de coisas por meio da celebração de um contrato natural (DUARTE, 2003, p.
33).
A visão de Serres em acabar com o contrato social e implementar o
contrato natural, origina-se por meio de análises sobre o modelo de civilização
construída historicamente no Ocidente, pautado pelos ideais de uma racionalidade
dominadora. Assim, ao analisar o Contrato Social, o Direito Natural e a Declaração
Universal do Homem e do Cidadão, Serres constata que todos ignoram a natureza,
ao passo que visam impedir a guerra de todos contra todos, mas não impedia a
guerra de todos contra tudo. Em sua visão deve-se ser rediscutido a importância da
natureza, entretanto atribuir respeito a natureza, impondo novas noções de
responsabilidade para com ela, por meio do contrato natural, é abstrato demais para
prosperar. No mundo atual a não existência de normas positivadas levaria ao caos.
Segundo Serres (1991, p. 46-47) a cultura moderna ainda entende a
natureza como algo externo ao homem. Muito embora dominante no passado a
Terra é hoje vítima dos sistemas econômicos desenvolvidos a partir da Revolução
Industrial. Mesmo diante dos resultados desastrosos produzidos por uma tecnologia
contra-natural, a história continua cega à natureza. Referindo-se a cultura ocidental
nas suas vertentes liberal e socialista, Serres salienta que a natureza se reduz a
natureza humana, que se reduz seja à história, seja à razão. O mundo desapareceu.
O Direito Natural moderno se distingue do Clássico por esta anulação. Compete aos
homens vaidosos sua história e sua razão.
Entretanto na visão de Rousseau (1975, p. 150), um dos tradutores
da visão contemplativa da natureza, o contrato social representaria o primeiro passo
para a degradação da natureza humana e não-humana, sendo a sociedade para os
seres humanos e a domesticação para os animais a tradução da degenerescência
da natureza; razão pelas quais os males frutos da obra humana seriam aqueles
quase todos evitados se conservasse a maneira simples, uniforme e solitária de
viver, que nos foi prescrita pela natureza. Em contrapartida para Locke e Hobbes, o
contrato social, derivado da necessidade de aperfeiçoar o estado de natureza,
significaria não somente a superação das condições de guerra e o aprimoramento
das instituições, respectivamente, mas principalmente a instauração de uma ordem
que ultrapassava a natureza (humana e não-humana), permitindo a sua dominação
(SOFFIATI, 2000, p. 167).
Assim, é que Leis (1998, p. 100-101) propõe a superação da luta
maniqueísta que marcou a questão ambiental nos anos 60 e 70, polarizada nas
posições biocêntricas, utilitaristas (de conquista da natureza). Pensando assim, é
que traçou um quadro de tendências do ethos e praxis do ambientalismo, dividindo-o
em dois eixos: antropocêntrico e biocêntrico; que foram subdivididos nas vertentes
alfa, beta, gama e delta. As duas primeiras, pertencentes ao eixo antropocêntrico,
defendem valores e atitudes que privilegiam a espécie humana, estabelecendo uma
forte distância valorativa entre o homem e a natureza. Nas vertentes gama e delta se
encontra o eixo comunitário ou coletivista, orientado para uma maior integração do
homem com a natureza. Para Leis, a complexidade e a riqueza do ethos e da praxis
do ambientalismo obrigam a pensar um princípio superior que possa dar um sentido
comum e permitir a sinergização recíproca entre as quatro vertentes colocadas, o
que se resumiria em Omega entendido como o estado de consciência que ilumina o
múltiplo e único caminho evolutivo (material-espiritual e social-natural) da
humanidade.
O crescimento e amadurecimento dessas ideias introduzidas pela
nova compreensão do relacionamento do homem com a natureza que vem trazer
os caminhos para novos anseios e formas de organização social, numa perspectiva
ética e de solidariedade planetária não parecem se coadunar com o pensamento e
estilo de vida hegemônico das sociedades, com a essência do modelo econômico
vigente, com as indústrias, com o comércio, com a mídia, com as instituições, enfim,
com o modo de produção e de vida que domina a sociedade atual, ainda presa à
visão utilitarista do modelo liberal. Aí se encontra a raiz da crise ambiental da
atualidade que, como se constata, não pode ser compreendida apenas como
escassez de recursos e bens ambientais, mas como herança de ideias, valores e
conhecimentos que constituem as bases da ação social, confirmando o seu caráter
civilizatório e, conseqUentemente, cultural (R. ECKERSLEY apud LEIS, 1999, p.
182). Nos dizeres de Dubos (1974, p. 49) “enquanto a natureza do homem exibe tão
notável unidade e perpetuidade, suas instituições sociais e modo de vida são
extremamente diversos e mutáveis.”
É preciso entender que o desafio ambiental é o único que se coloca
para além das fragmentações em debate, na medida em que implica uma verdadeira
revolução cultural. Como se depreende, o desafio ambiental é muito mais complexo
do que vem sendo posto em debates midiáticos e, até mesmo científico. Posta assim
a questão, passa a requerer uma profunda reflexão de caráter filosófico para
entender o sentido do tempo, da vida. O desafio ambiental se resume a ideia de que
existem limites para a relação da humanidade, por meio de cada sociedade. De fato
todas as evidencias estimulam o homem a buscar uma outra relação da sociedade
com a natureza, em que a justiça social e a sustentabilidade ecológica se façam
presentes, por meio da liberdade, garantindo a todos o direitos iguais para afirmarem
a sua diferença. Que a diversidade biológica e cultural, na igualdade na diferença,
possa ser vislumbrada como o maior patrimônio da humanidade (GONÇALVES,
2004, p. 170-171).
Cumpre observar que a descoberta de que existe uma questão
ambiental oriunda das formas pelas quais a sociedade se relaciona com a natureza,
traz em seu bojo a crise política da razão (RODRIGUES, 1994, p. 67). Eda Tassara
(1992, p. 35) ilustrando a assertiva menciona que:
A crise ambiental é, portanto, uma crise política da razão, que não
encontra significações dentro do esquema de representações
científicas existentes para o reconhecimento social do mundo, que foi
histórica, técnica e civilizatoriamente produzida. O Ocidente está
diante do dilema o universo, o mundo, isto é, o representável em
sua última instância, mudou de significação. Tornou-se contexto de
ambiente.
Neste sentido pode-se dizer que a descoberta de uma crise política
da razão requer uma mudança de paradigma, devendo ser compreendida como uma
questão fundamental para as ciências da natureza e da sociedade. Ademais toda
crise oferece riscos e oportunidades. Riscos de permanecer como outrora e
oportunidade de alterar as formas como as crises ocorrem. Na atual crise política da
razão o risco de permanecer a metáfora temporal dominante e a oportunidade de
que a metáfora espaço-temporal demonstre a imbricação da sociedade com a
natureza. Assim, evidencia-se que a crise paradigmática da ciência moderna está
ligada com a questão ambiental, com a compreensão de que está se destruindo tudo
de modo irreversível. Nesse sentido para que a sociedade se construa, faz-se
necessária a destruição de sua base territorial essencial para a vida. Assim coloca-
se a necessidade de uma releitura para compreender a complexidade ecossistema e
as suas interrelações que se estabelecem ao longo do tempo das organizações
societárias com a natureza (RODRIGUES, 1994, p. 67).
A nova reestruturação social que se coloca como desafio, origina-se
basicamente da unificação e homogeneização de um mesmo estilo de vida. Nesse
sentido a homogeneização é contrária e maléfica a vida, em todos seus aspectos,
principalmente no ecológico e no cultural. Durante séculos o homem construiu
diferentes sentidos culturais para suas práticas, a partir de diferentes convivências
com diferentes ecossistemas e as variadas trocas entre culturas que ao longo da
história pode experimentar. Evidencia-se assim uma mudança de escala na crise
atual de escassez dos recursos naturais (ar, água, minerais, solos, etc.). Assim, é
preciso resgatar a política em seu sentido grego mais profundo, ou seja, a arte de
definir os limites, que somente podem ser plenos na democracia. É preciso impor
limites imperativos à relação das sociedades com a natureza. Tais limites deverão
ser construídos entre os homens por meio do diálogo dos saberes, entre as
modalidades distintas de produção do conhecimento, seja no interior de uma mesma
cultura, seja entre culturas distintas (GONÇALVES, 2004, p. 32 a 36).
3 A INTERDISCIPLINARIDADE E O MEIO AMBIENTE
Na busca de uma melhor compreensão sobre a interdisciplinaridade
e o meio ambiente, o presente capítulo reúne quatro características poucas vezes
encontradas em uma única obra: coerência histórica com os dados, qualidade e
densidade acadêmica de análises nos parágrafos transcritos e exposição didática de
forma coerente e adequada ao conteúdo exposto. Inicialmente tem-se uma reflexão
sobre os marcos teóricos e definições da interdisciplinaridade; em seguida uma
discussão da interdisciplinaridade nas ciências. Na terceira e quarta parte
respectivamente retratar-se-á a ideia de natureza a expressão meio ambiente e
apontamentos jurídicos sobre meio ambiente.
Enfim, a leitura desse capítulo passa a ser elemento importante para
todos aqueles que vivenciam o processo interdisciplinar e a questão ambiental, visto
que, permite resgatar um sentido a partir de um sólido substrato acadêmico.
3.1 CONSIDERAÇÕES TEÓRICO-METODOLÓGICAS
O saber humano cresce a cada minuto, mas ao mesmo tempo esse
saber experimenta um forte processo de fragmentação. O esfacelamento do saber
científico, tanto quanto seu ensino, exigem a urgência de um diálogo entre as várias
disciplinas científicas e sua interligação com a realidade. A prática da
interdisciplinaridade é uma resposta concreta ao ensino e à pesquisa, especialmente
em determinados ramos do saber, que tem demonstrado fraqueza em tal
empreendimento e, ainda mais, num mundo globalizado (WACHOWICZ, 1998, p.
85).
Nesse sentido a interdisciplinaridade decorre da forma do homem
produzir-se enquanto ser social e enquanto objeto do conhecimento social. Na busca
incessante de satisfazer suas múltiplas e históricas necessidades de natureza
biológica, intelectual, cultural, afetiva e estética o homem estabelece as mais
diversas relações sociais. Assim, na medida em que o conjunto das ciências, mais
especificadamente as sociais e humanas, tem como objeto de conhecimento a
compreensão e explicitação da produção da existência social dos homens, não
razões de ordem ontológica e epistemológica para cindir esta prática social
(FRIGOTTO, 1995, p. 26-27).
Em consonância com o exposto a interdisciplinaridade é uma
exigência natural, e de certo modo, interna das ciências. Desse modo impõe-se uma
adequação na formação do homem e uma necessidade de agir, no sentido de uma
melhor compreensão da realidade que se apresenta. Essa compreensão da
realidade numa busca de interdisciplinaridade pressupõe, de certa forma, um
comprometimento com a totalidade, isto é, quando se pensar em projeto
interdisciplinar, necessariamente pensar-se-á na possibilidade de traçar uma linha
de demarcação entre as pretensões ideológicas e a realidade de que é sintoma
(FAZENDA, 1994, p. 91).
Para Leff (2000, p. 19) a interdisciplinaridade juntamente com a
questão ambiental e a sua complexidade emergem no último terço do século XX,
mais precisamente nos finais dos anos 60 e começo da década seguinte, como
problemáticas contemporâneas, compartilhando o sintoma de uma crise de
civilização, que se manifesta pelo fracionamento do conhecimento e pela
degradação do ambiente, marcados pelo logocentrismo da ciência moderna e pelo
transbordamento da economização do mundo guiado pela racionalidade tecnológica.
Interessante notar ainda que no fim dos anos 70 constitui-se uma mudança na forma
de apropriação da natureza pelas ciências sociais, haja vista a emergência do
paradigma ambiental (SILVA; HAINARD, 2005, p. 20).
O fracionamento do conhecimento exposto por Leff, reforça as
afirmativas de Japiassu (2006, p. 28-29) quanto a situação patológica do saber. A
especialização sem limite resultou numa crescente fragmentação do conhecimento.
Chegouse a um ponto em que o especialista, se reduz a um indivíduo que, visando
saber muito mais sobre cada vez menos, termina por saber tudo ou quase tudo
sobre o nada, em contrapartida tem-se o generalista, que sabe quase nada sobre
tudo. Neste ponto de esmigalhamento do saber, o interdisciplinar manifesta um
estado de carência. O desenvolvimento sem medidas da especialização, com todos
seus inegáveis méritos, repartiu ao infinito o território do saber. Entretanto os efeitos
dessa especialização revelam-se contraditórios. Se por um lado, é inegável o
aprofundamento do conhecimento, construído em cima de uma disciplina
estruturada. Por outro, torna-se difícil a elaboração de síntese de uma visão de
conjunto.
Para Santomé (1998, p. 44) a ruptura das fronteiras entre as
disciplinas induz a consideração de modelos de análise muito mais potentes dos que
caracterizavam apenas uma especialização disciplinar. A complexidade do mundo e
da cultura atual leva a desentranhar novos problemas com múltiplas lentes, tantas
como as áreas do conhecimento existente; do contrário, facilmente os resultados
seriam afetados pelas deformações impostas pela seletividade das perspectivas de
análise às quais se recorre. Outrossim, são diversas, portanto as razões que
confluem para um novo impulso aos discursos sobre a interdisciplinaridade. Diante
das novas tendências culturais, ressurge com maior força um discurso justificador da
necessidade de reorganizar e reagrupar os âmbitos do saber para não perder a
relevância a significação dos problemas a detectar pesquisar, intervir e solucionar.
Uma das críticas mais taxativas contra a especialização do saber é a
de José Ortega y Gasset, quando em sua obra La rebelión de lãs masas rotula
esta tendência como ato de “barbárie”. Em suas palavras:
[...] cada especialista seria um primitivo, um bárbaro moderno. [...] a
entrada na era da industrialização e o fortalecimento do capitalismo
foram realizados junto com fortes tendências à fragmentação do
trabalho, e portanto, também do trabalho intelectual e científico, em
claro contraste com o saber de caráter “enciclopédico” de momentos
históricos anteriores. O ser humano culto da nossa época é aquele
que sabe tudo o que é preciso saber para ser um personagem
discreto, conhece apenas uma ciência determinada, e mesmo desta
ciência conhece apenas a pequena parcela que pesquisa
ativamente. Chega a proclamar como virtude o fato de não saber
nada que fique fora da estreita paisagem que cultiva especialmente,
e chama de diletantismo a curiosidade pelo conjunto do saber
(ORTEGA Y GASSET, 1972, p. 171-172).
Oportuno mencionar nas palavras de Follari (1995, p. 129-130) que
o surgimento da interdisciplinaridade foi uma reação do capitalismo diante de seus
próprios problemas de legitimação. Tenha-se presente que os universitários
europeus, com suas posições anticapitalistas haviam se tornado um grave problema,
estendendo-se depois para a América Latina. Assim, diante da problemática do
funcionamento das universidades e o papel do saber no capitalismo, discutia-se a
falta de relevância social dos conteúdos curriculares. Como meio de superação
desses impasses a interdisciplinaridade surgiu como opção que poderia superar a
excessiva especialização do saber e fornecer os meios para vincular o
conhecimento à prática.
De forma sintética para Fourez (1995, p. 134 a 137) a
interdisciplinaridade nasce da constatação de que apenas uma disciplina não
poderia fazer uma abordagem completa do mundo, ou seja, seria parcial e em geral
muito estreita. Diante da complexidade dos problemas é preciso ter outros enfoques.
É a isto que se refere a interdisciplinaridade que na prática ocorre de duas formas
distintas. Na primeira enquanto se reunem diversas abordagens, esperando-se a
formação de uma superciência, o que não ocorre, constrói-se apenas um novo
paradigma; por sua vez na segunda, limita-se a produzir um discurso e uma
representação prática diante dos problemas, estabelecendo negociações com
diversos pontos de vista, enquanto a primeira é neutra a segunda é densamente
mais política, para enfim decidir sobre a representação considerada e racional.
Segundo Japiassu (1976, p. 42) o fenômeno interdisciplinar tem
dupla origem:
uma interna, tendo por característica essencial o remanejamento
geral do sistema das ciências, que acompanha seu progresso e sua
organização; outra externa, caracterizando-se pela mobilização cada
vez mais extensa dos saberes convergindo em vista da ão. [...] a
questão da interdisciplinaridade está subjacente às dificuldades com
que atualmente se debatem as instituições de ensino, com seus
procedimentos pedagógicos, bem como aos problemas com que se
defrontam os empreendimentos visando ao controle do futuro da
sociedade, com seus empreendimentos de planificação.
Para De Luca Garate (2000, p. 24) não obstante a década de 70
corresponder ao período da construção epistemológica da interdisciplinaridade como
um novo paradigma mundial, tendo por base a concepção de Thomas Kuhn. De
acordo com Kuhn, a revolução científica significa uma mudança da forma de pensar
e ver o mundo. Nesse período consagra-se o resultado da deterioração das
condições ambientais nos países desenvolvidos expressado pelo Relatório do Clube
de Roma, primeiramente na Conferência Mundial sobre o Meio Ambiente Humano,
em Estocolmo, em 1972, e posteriormente na Conferência das Nações Unidas sobre
Ambiente e Desenvolvimento Sustentável, no Rio de Janeiro, em 1992. Por tais
razões a concepção de interdisciplinaridade, oriunda da crise da fragmentação do
saber, se constituiu num procedimento que visa a superação dessa crise, através da
busca da unidade de uma área do conhecimento, da unidade do homem, e da
unidade do universo.
Cumpre observar que a mudança revolucionária científica divulgada,
define-se em parte, por sua diferença com respeito à mudança normal, ou seja,
aquele que resulta em crescimento, acréscimo, adição cumulativa ao que era antes
conhecido. A maioria dos avanços do conhecimento científico é cumulativo. Por sua
vez as mudanças revolucionárias são diferentes e bem mais problemáticas, elas
envolvem descobertas que não podem ser acomodadas nos limites dos conceitos
que estavam em uso antes delas terem sido feitas. Assim, ao fazer ou assimilar um
novo conhecimento (ou uma tal descoberta), deve-se alterar o modo como se pensa
e se descreve. Muito embora as revoluções científicas deixem muita coisa para ser
gradualmente completada, a mudança central não pode ser fragmentada. Ao
contrário, ela envolve uma transformação relativamente bita e não estruturada no
qual alguma parte do fluxo da experiência se rearranja de maneira diferente e exibe
padrões que antes não eram visíveis (KUHN, 2006, p. 25 a 28).
É bem verdade que, com a divulgação da Conferência de
Estocolmo, em 1972 e a publicação de inúmeras obras, são indicadores da eclosão
de uma nova consciência ecológica. Embasados nesses antecedentes lança-se uma
cruzada em favor do meio ambiente, reconhecendo-se que a solução da
problemática ambiental implica mudanças na organização do conhecimento. Dessa
forma surge a proposta do desenvolvimento de uma educação ambiental fundada
numa visão holística da realidade e nos métodos de interdisciplinaridade. Entretanto,
somente em Tbilisi, em 1977, na Conferência Intergovernamental sobre Educação
Ambiental, estabeleceram-se os parâmetros da educação ambiental, fundada nos
princípios da interdisciplinaridade para compreender e restabelecer as relações
entre a sociedade e a natureza (LEFF, 2000, p. 19-20).
Do ponto de vista evolucionário Fazenda (1994, p. 18) salienta que
no período inicial das pesquisas sobre o tema interdisciplinaridade. A preocupação
incidia fundamentalmente na explicitação terminológica. A necessidade de
conceituar e de explicitar fazia-se presente por vários motivos. Um destes motivos
era que a interdisciplinaridade constituía uma palavra difícil de ser pronunciada e,
mais ainda, de ser decifrada. Certamente que antes de ser decifrada precisava ser
traduzida e não se chegava a um consenso sobre sua forma correta de escrita,
menor acordo havia sobre seu significado e a repercussão dessa palavra que ao
surgir anunciava a necessidade de construção de um novo paradigma de ciência e
de conhecimento.
Na medida em que as proposições teóricas avançam, mais explícitas
vão se tornando as hipóteses da interdisciplinaridade. Em uma visão histórica
evolutiva com fins meramente didáticos é possível fracionar o movimento da
interdisciplinaridade, subdividindo-o em três grandes décadas: 1970, 1980 e 1990.
Caso opte-se por fazer um recorte epistemológico, dizer-se-á de forma reduzida e
simplificadamente que na primeira década, ou seja, em 1970 parte-se para uma
construção epistemológica da interdisciplinaridade. Na segunda, em 1980, parte-se
para a explicitação das contradições epistemológicas decorrentes dessa construção
e na terceira, a partir de 1990, busca-se construir uma nova epistemologia, a própria
da interdisciplinaridade (FAZENDA, 1995, p. 17). Atualmente, a interdisciplinaridade
se revela tão importante para fazer as disciplinas dialogarem, convergirem e se
concertarem, que talvez seja o momento de dar novos passos e postular novos
sonhos (JAPIASSU, 2006, p. 65).
Nogueira (1998, p. 21) coadunando com o pensamento exposto,
salienta que:
[...] na década de 70, procurou-se uma definição do termo
interdisciplinaridade. Na década de 80, ocorrem tentativas de
explicitar um método. Entretanto na cada de 90, busca-se nortear
uma teoria da interdisciplinaridade. Destas três fases, a tentativa de
pontuar um método é uma das mais problemáticas. Por fim, desde o
final da cada de 90, existe uma grande dicotomia teórica, com
indagações a serem respondidas pela comunidade científica.
Embora seja evidente que os paradigmas científicos modelam as
sociedades e o seu pensamento. O inverso, tamm é verdadeiro, formando um
mecanismo de retroalimentação, em constante aceleração. Não dúvidas que o
alto grau de especialização no conhecimento teórico e na vida prática decorre de um
paradigma, identificado com esta ou aquela corrente filosófica ou científica
(COIMBRA, 2000, p. 52-53). Nesse sentido segundo Folari (1995, p. 137) o
processo interdisciplinar deve saciar-se em seu próprio espaço, compreender seus
limites, encarar os novos desafios, e assumir-se enquanto problema parcial e
situado na contemporaneidade. Embora alguns equívocos teóricos permaneçam,
parcialmente serão clarificados pela evolução das teorias (FAZENDA, 1995, p. 17).
O significado de uma palavra não é algo que o homem descobre,
muito pelo contrário, o significado associa-se a uma palavra por acordo entre os
usuários de uma linguagem. Esse acordo, naturalmente se solidifica no decorrer de
períodos de tempos variáveis, inclusive, podendo alterar-se na medida em que a
linguagem se desenvolve e se transforma. Nesse sentido a palavra possui um
significado de acordo com as convenções que se estabelecem no meio social. A
convenção, por sua vez, pode ser apresentada de modo formal, ou resultante do
uso. Quando uma convenção que governa o domínio do emprego de certa palavra,
atinge o patamar de desenvolvimento, pode fixar uma definição. A definição não é
verdadeira nem falsa, é apropriada ou o, conforme as convenções estabelecidas.
Em muitos casos, a definição assemelha-se a um enunciado de fato. As regras,
assim como as propostas, podem ou não serem aceitas, observadas ou violadas,
desde que resultem meios para decidir se uma palavra foi ou deixou de ser
apropriadamente utilizada. Enfim, existem muitos modos de especificar o significado
de uma palavra e, consequentemente, muitos modos de definir um termo
(HEGENBERG, 1974, p. 20-21).
Antes de aprofundar a discussão sobre interdisciplinaridade, convém
tentar esclarecer o sentido do conceito disciplina. Para que um corpo de
conhecimentos possa ser rotulado legitimamente como disciplina, é preciso
preencher uma série de requisitos. No entanto tampouco existe uma total
unanimidade na hora de concretizá-los (SANTOMÉ, 1998, p. 55). Para Coimbra
(2000, p. 55) o que importa no momento é observar que disciplina traduz em
conhecimento vivenciado, independentemente dos agentes ou processos de
transmissão desse mesmo conhecimento. Mas, no escopo destas considerações em
seu sentido predominante, destaca que “disciplina é o conjunto de conhecimentos
científicos, artísticos, linguísticos etc., que se professam em cada cadeira de um
instituto escolar.”
A tendência à diferenciação do conhecimento em uma multiplicidade
de disciplinas autônomas é algo que vem se concretizando desde o início do culo
XIX, vinculado ao processo de transformação social que ocorria nos países
europeus mais desenvolvidos e que necessitava de uma especialização de acordo
com a divisão material do processo de produção favorecido pela industrialização. As
técnicas e saberes foram se diferenciando progressivamente; por sua vez, as
linguagens que os caracterizavam foram se especializando e circunscrevendo a
âmbitos específicos (SANTOMÉ, 1998, p. 55-56). Para Marcel Boisot apud Santomé
(1998, p. 56) uma disciplina caracteriza-se por três elementos:
1) Objetivos observáveis e/ou formalizados, ambos manipulados por meio
de métodos e procedimentos;
2) Fenômenos que são a materialização da interação entre estes objetos;
3) Leis (cujos termos e/ou formulações dependam de um conjunto de
axiomas) que dêem conta dos fenômenos e permitam prever sua operação.
Os elementos desse conjunto, dotado de relações internas e/ou
externas revelam-se através de fenômenos que, a posteriori,
confirmam ou anulam os axiomas e as leis.
Outra importante hierarquização de níveis de colaboração e
integração entre disciplinas é a proposta por Jean Piaget (1979) apud Santomé
(1998, p. 70), que distingue multiplidisciplinariedade, interdisciplinariedade e
transdisciplinariedade, ao passo que:
Multidisciplinariedade. O nível inferior de integração. Ocorre quando,
para solucionar um problema, busca-se informação e ajuda em
várias disciplinas, sem que tal interação contribua para modificá-las
ou enriquecê-las. Esta costuma ser a primeira fase da constituição de
equipes de trabalho interdisciplinar, porem não implica em que
necessariamente seja preciso passar a níveis de maior cooperação.
Interdisciplinariedade. Segundo nível de associação entre disciplinas,
em que a cooperação entre várias disciplinas provoca intercâmbios
reais; isto é, existe verdadeira reciprocidade nos intercâmbios e,
consequentemente, enriquecimentos mútuos.
Transdisciplinariedade. É a etapa superiora da integração. Trata-se
da construção de um sistema total, sem fronteiras sólidas entre as
disciplinas, ou seja, de “uma teoria geral de sistemas ou de
estruturas de regulamentação e sistemas probabilísticos, e que una
estas diversas possibilidades por meio de transformações reguladas
e definidas.
Nunca é demais lembrar o peso e o significado das palavras, uma
vez que para Japiassu (1976, p. 39), as definições expressam o vernáculo e, por
conseguinte, não situam-se no âmbito do verdadeiro ou falso, mas do conveniente.
Entretanto é preciso ao mesmo tempo um jzo de valor, ao uso do que parece ser
mais difundido e o que se afigura mais adequado. Da confluência de tais fatores
resulta-se a delimitação do domínio. Nesse sentido a conceitualização da
interdisciplinaridade é uma questão típica do século XX, embora deva-se reconhecer
que desde a época dos gregos houve algumas tentativas com os primeiros
intelectuais (SANTOMÉ, 1998, p. 46).
Segundo Ohira (2006, p. 10) as primeiras definições de
interdisciplinaridade na ciência apresentam como preocupação central uma
excessiva especialização do conhecimento em disciplinas isoladas umas das outras.
Paralelamente, surgiam posicionamentos epistemológicos que propiciavam de certa
forma beneficiar concepções que retratavam a ciência como uma construção social,
embasados em argumentos presentes na discussão em torno das concepções e das
finalidades da Ciência. Tais discussões sobre as definições da interdisciplinaridade,
de certo modo, colaboraram para uma sistematização mais específica e uma visão
mais abrangente da realidade.
Para Assumpção (1996, p. 23) é preciso compreender a
interdisciplinaridade em seus fundamentos e a partir de sua existência, partindo-se
do significado dos seus elementos constitutivos, ou seja, como esse termo pode ser
compreendido do seu significado original. O termo interdisciplinaridade compõe-se
de um prefixo latino inter que significa posição ou ação intermediária,
reciprocidade, interação. O sufixo latino dade guarda a propriedade de
substantivar alguns adjetivos, conferindo-lhes o sentido de ação ou de resultado de
ação, qualidade, estado ou ainda o modo de ser. Por sua vez a palavra disciplina,
núcleo do termo, significa a epistemé (o saber, o conhecimento), caracterizando uma
ordem ao funcionamento organizacional ou um regime de ordem imposta ou
livremente consentida.
Ainda segundo Assumpção (1996, p. 24) a interdisciplinaridade
nomeia um encontro que pode ocorrer entre os seres a partir de uma direcionalidade
da consciência, buscando a compreensão do objeto. Desse modo, interpretada,
pressupõe um momento antecedente, ensejando a disposição da subjetividade de
perceber-se e presentificar-se, ocorrendo um encontro com o outro, a
intersubjetividade. Fundamentada nessa intersubjetividade verifica-se uma ligação
de identidade e de diferença. Identidade no sentido de interação, do próprio ser
humano enquanto ser social. Diferença, porque como disciplina exige do sujeito a
consciência direcionada para algo específico, o que constitui a própria dialética
homem-mundo.
Conceituar interdisciplinaridade é uma árdua e complexa tarefa, uma
vez que esta palavra envolve uma acumulação de equívocos e possibilidades. Os
equívocos referem a sua definição, que ao ser interpretada por muitos autores, corre
o risco de perder uma de suas características, que é a concepção única do
conhecimento. Existem ainda os que confundem e empobrecem a noção de
interdisciplinaridade, estreitando o seu campo de atuação, comparando-a com as
definições de integração, interação ou interrelação. Em relação às possibilidades,
esta se restringe na apreensão do termo, que ao ser interpretado como atitude,
servirá como instrumento para as reais transformações emancipatórias
(FERREIRA,1996, p. 33).
Os dicionários pátrios de língua portuguesa conceituam a
nomenclatura interdisciplinar nos seguintes termos:
Interdisciplinar. (de inter + interdisciplinar). Adj. 2 g. Comum a duas
ou mais disciplinas ou ramos de conhecimento (FERREIRA, 2004, p.
1118).
Interdisciplinar. Adj m + f (inter + disciplina + ar). Comum a diversas
disciplinas (MICHAELIS, 1998, p.1167).
Santomé (1998, p. 66) caracteriza a interdisciplinaridade como:
um objetivo nunca completamente alcançado e por isso de ver ser
permanentemente buscado. Não é apenas uma proposta teórica,
mas sobretudo uma prática. Sua perfectibilidade é realizada na
prática; na medida em que são feitas experiências reais de trabalho
em equipe, exercitam-se suas possibilidades, problemas e
limitações. É uma condição necessária para a pesquisa e a criação
de modelos mais explicativos desta realidade tão complexa e difícil
de abranger.
Para Japiassu (1976, p. 32) a característica central da
interdisciplinaridade “consiste no fato de que ela incorpora os resultados de várias
disciplinas, tomando-lhes de empréstimo esquemas conceituais de análise a fim de
fazê-los integrar, depois de havê-los comparado e julgado. Por outro lado Etges
(1993, p. 18) ao expor seu conceito salienta a impossibilidade da redução a um
denominador comum:
A interdisciplinaridade, enquanto princípio mediador entre as
diferentes disciplinas, não poderá jamais ser elemento de redução a
um denominador comum, mas elemento teórico-metodológico da
diferença e da criatividade. A interdisciplinaridade é o princípio da
máxima exploração das potencialidades de cada ciência, da
compreensão dos seus limites, mas, acima de tudo, é o princípio da
diversidade e da criatividade.
Em consonância com o exposto, para On (1998, p. 156) a
interdisciplinaridade não deve ser tratada como um método de investigação, uma
técnica didática, um instrumento utilitário, um princípio de homogeneização ou um
modelo metodológico capaz de produzir ideias generalizadoras ou universalizantes,
mas sim como postura profissional que permite se pôr a transitar o espaço da
diferença com sentido de busca. Desse modo a interdisciplinaridade caracteriza-se
pelo desvelamento da pluralidade de ângulos que um determinado objeto é capaz de
proporcionar, que uma determinada realidade é capaz de gerar, ou ainda nas
diferentes formas que a abordagem sobre o real podem trazer. Em consonância com
o exposto Floriani (2004, p. 34) ressalta que as tentativas de formulação do caráter
da interdisciplinaridade e de sua pertinência de aplicação dependem do
entendimento teórico sobre o estatuto das ciências, assim como das aplicabilidades
metodológicas interdisciplinares decorrentes da aproximação que a ciência faz sobre
o mesmo tema.
Mayville (1978) define a interdisciplinaridade pela interação entre
duas ou mais diferentes disciplinas, com a integração de seus conceitos, com a
incorporação de metodologias e procedimentos. Como se observa, esta definição
não propõe a criação de uma nova ciência com a integração das duas anteriores,
mas uma interação entre disciplinas. De fato Kelly (1996), aconselha uma
interdisciplinaridade ampla, compartilhadora de suposições epistemológicas entre as
disciplinas, argumentando que as ciências se beneficiariam ao eliminarem valores
ou suposições arraigadas.
Para Siebeneichler (1989, p. 156) o conceito de interdisciplinaridade
se traduz, da seguinte forma:
A interdisciplinaridade é antes de tudo uma perspectiva e uma
exigência que se coloca no âmbito de um determinado tipo de
processo. Ela tem basicamente a ver com a procura de um equilíbrio
entre a análise fragmentada e a ntese simplificadora. Entre
especialização e saber geral, entre o saber especializado do
cientista, do expert e o saber do filósofo.
Para Coimbra (2000, p. 58), é importante retomar os conceitos sob a
ótica do conhecimento, nesse sentido o interdisciplinar:
Consiste num tema, objeto ou abordagem em que duas ou mais
disciplinas intencionalmente estabelecem nexos e vínculos entre si
para alcançar um conhecimento mais abrangente, ao mesmo tempo
diversificado e unificado. Verifica-se, nesses casos, a busca de um
entendimento comum e o envolvimento direto dos interlocutores.
Cada disciplina, ciência ou cnica mantém a sua própria identidade,
conserva sua metodologia e observa os limites dos seus respectivos
campos. É essencial na interdisciplinaridade que a ciência e o
cientista continuem, a ser o que são, porém intercambiando
hipóteses, elaborações e conclusões.
Acrescenta-se a tudo isso a distinção conceitual de Lenoir & Hasni
(2004) apud Leis (2005, p. 06) sobre interdisciplinaridade, oriundos dos movimentos
interdisciplinares, que partem de diversas premissas, aparentemente divergentes
entre si, mas que constituem verdadeiros movimentos impulsionadores da mesma. O
primeiro associa-se à cultura científica francesa, com bases nas dimensões
epistemológicas dos saberes disciplinares e na racionalidade científica, centrado na
busca de um significado (portanto, abstrato). Um segundo, associado à cultura
norte-americana, remetendo-se a uma preocupação lógica instrumental, visando
uma funcionalidade social (portanto, profissionalizante). Por fim, o terceiro associado
à cultura científica brasileira, que privilegia as dimensões humanas e afetivas,
expressando, uma lógica subjetiva dirigida a procura do próprio ser.
Lavaqui (2004, p. 22), pondera que:
As formas de entendimento da interdisciplinaridade são variáveis e
que as definições anteriormente citadas não são definitivas, percebe-
se que estas oferecem várias opções epistemológicas que propiciam
a implementação da interdisciplinaridade, derivadas das muitas
possibilidades de contatos e interações entre as disciplinas
científicas.
É indubitável que a discussão sobre o saber interdisciplinar exige
que se considere uma outra base ontológica, onde o ser seja considerado em seu
dinamismo, bem como em sua totalidade. Nesse caso considerando a concepção de
Heráclito sobre o ser e depois a moderna concepção da dialética. Nesse contexto a
dialética permite o real como totalidade dinâmica, sem excluir a identidade do ser.
Isso porque o princípio da contradição pressupõe a identidade, quando do contrário,
a identidade excluiria a contradição (lógica formal). Daí a ideia de que o saber
interdisciplinar exige uma abordagem dialética, contudo sem excluir os conteúdos
das ciências especializadas (ANGELIS, 1998, p. 26).
Para Santomé (1998, p. 65) é preciso saber que “a busca de novos
níveis de maior interdisciplinaridade nunca pode derivar em formas totalitárias de
integração, na imposição de marcos teóricos, conceituais e metodológicos com os
quais obrigatoriamente todos devam comungar”; nesse sentido Gusdorf (1983, p. 52)
complementa que a pluralidade dos espaços e das épocas e a multiplicidade das
formas do humano imem uma espécie de politeísmo epistemológico, respeitoso
das discordâncias e das descontinuidades, assim como dos intervalos.”
Ademais, que se entender que o conhecimento no horizonte do
saber não significa segregá-lo do rigor, da ética nas ideias articuladas, da retidão de
procedimentos, sem o qual, inviabiliza superar com competência, o estabelecido e a
questionar certas posturas dogmáticas como verdades absolutas. Esta perspectiva
contribui para desmistificar o conhecimento, desgarrando-o de uma tendência à
univocidade, a permanecer o mesmo, projetando-o no mundo da aventura,
comprometendo-o com uma oportunidade de sair de si para inovar (ON, 1998, p.
153).
3.2 A INTERDISCIPLINARIDADE NA(S) CIÊNCIA(S)
A ciência para Morin (2003a, p. 09) é intrínseca, histórica,
sociológica e eticamente complexa, porque é inseparável do seu contexto histórico e
social. De igual forma para Fourez (1995, p. 253) é inegável que a ciência
representa a estrutura do conhecimento que se desenvolveu em determinado
contexto histórico. Dentro dessa perspectiva a ciência evolui por caminhos tortuosos,
num processo contemplativo de separação das disciplinas em diferentes áreas do
conhecimento, confinando o conhecimento produzido em cada pólo desmistificado.
Ainda que esse padrão tenha sido essencial para que se acumulasse todo o
conhecimento produzido, perpassa-se agora por um período de transição, onde se
faz necessário o compartilhamento dos conhecimentos adquiridos entre as diversas
áreas do saber. Entretanto a forma de transmissão desse saber acumulado encontra
dificuldades na sua disseminação (SILVA; HAINARD, 2005, p. 09).
Gomes (1991, p. 34) traz a seguinte contribuição ao mencionar que:
Nos séculos XIX e XX o desenvolvimento da ciência impôs
modificação de sua função social. O crescente aceleramento do
progresso técnico/científico e a correlação intrínseca cada vez maior
entre ciência e prática social passam a ser mais determinantes em
termos de interação dialética: o desenvolvimento teórico
experimental da ciência passa a revolucionar a prática, criando de
forma crescente novos ramos de produção. No caso, a prática-
critério superior da verdade autêntica, mais e mais a validade
teórica da estrutura conceitual científica, fazendo-a avançar como
fundamentação teórica necessária e verdadeira. Finalmente, a
função social da ciência como pressuposto fundamental para o
desenvolvimento da sociedade, imprime uma dinâmica maior,
definida por procedimentos científicos, à nível de formação
profissional e política de cada cientista/pesquisador. A função social
do saber cienfico estará sempre na dependência do avanço da
consciência social e este pressupõe, inexoravelmente, o avanço de
nossa consciência política. Quanto maior for o desenvolvimento
desta última, mais a sociedade, sujeito histórico da transformação
social exercerá de maneira crítica o seu papel de “cobradora” dos
valores sociais contidos nos diferentes campos do saber humano: o
filosófico, o científico, o artístico e o social.
Para Fourez (1995, p. 141), a ciência pode ser assim explicitada:
[...] A ciência é também uma produção cultural. Por meio dela, os
seres humanos desenvolvem uma obra poética: exprimem o que é o
mundo no qual se inserem, descobrem a sua própria produção,
partilham uma representação do mundo. tamm a possibilidade
de prazer estético, essa atividade em que o ser humano reencontra o
seu espírito no mundo por ele estruturado.
Convém sublinhar que para Frigotto (1995, p. 30) o processo de
construção do conhecimento social na sociedade capitalista é prisioneiro de uma
materialidade social. Assim, pode-se constatar que o conhecimento não é produzido
de forma neutra. É justamente nesse ponto que a interdisciplinaridade na produção
do conhecimento e no progresso das ciências, torna-se uma necessidade
imperativa, mas também um problema na intrínseca relação capitalista de produção
científica. Para Fourez (1995, p. 140-41) pode-se considerar vários tipos de
produção científica, v.g. as representações do mundo (por meio de relatórios,
sínteses, publicações que possibilitem a realização e interpretação de experiências
precisas), e as produções simbólicas (discursos legitimadores da prática), causando
a integração dos cientistas, constituindo uma legitimação e motivação de novas
ações. Entretanto não se pode reduzir a ciência a esses dois aspectos, uma vez que
a ciência reflete uma produção cultural, partilhando uma representação do mundo.
Em consonância com o atacado, se por um lado a
interdisciplinaridade é uma exigência imanente das ciências postas, por outro lado
constitui nova forma de organização do mundo elaborada pelo homem, que se
concretizam na linguagem. Por meio da linguagem o homem consegue expor aos
demais homens suas formas de organização e demais objetos criados. A exigência
desta comunicação impulsiona o homem a transpor as barreiras das
representações. Nesse sentido a interdisciplinaridade também consiste na
transposição, no deslocamento de um sistema construído para outro, tendo como
fundamento a sua própria gênese e a produção do saber (ETGES, 1995, p. 64).
O processo de cooperação entre as ciências, não é
necessariamente um processo recente, visa essencialmente à superação dos
obstáculos científicos, quando se confrontam objetos abrangentes que requerem a
superação da compartimentação tradicional das ciências para sua abordagem
(ASSIS, 2000, p. 171). Frente a complexidade do meio ambiente, se faz necessária
a contribuição das diversas áreas das ciências, no sentido de que cada uma, dentro
de suas especificidades, possa contribuir para uma visão mais abrangente e
integrada (CST, 2004, p. 162). Assim, para Fourez (1995, p. 135) cada vez mais
admite-se, que para estudar a complexidade dos problemas, é necessário uma
multiplicidade de enfoques.
Raynalt (2004, p. 24) ao tratar da perspectiva interdisciplinar,
demonstra claramente que o desafio fundamental ao se adotar um enfoque
interdisciplinar, é tentar restituir, ainda que de forma parcial, o caráter totalitário e da
complexidade do mundo real onde se pretende atuar. A totalidade e a complexidade
são palavras que surgem todas as vezes que se discute sobre a
interdisciplinaridade. A totalidade e a complexidade são elementos constituintes dos
primeiros modelos de construção da consciência do universo e da concepção do
homem. A novidade introduzida pelo pensamento científico, quando comparado a
outras formas de pensamento é a de aceitar e dividir o mundo em facetas e tentar
por meio de alguns instrumentos conceitos, definições e métodos explicar os
fenômenos delimitados.
De igual forma Frigotto (1995, p. 27-28) menciona que:
a necessidade da interdisciplinaridade na produção do conhecimento
funda-se no caráter dialético da realidade social que é, ao mesmo
tempo, una e diversa e na natureza intersubjetiva de sua apreensão.
O caráter uno e diverso da realidade social nos impõe distinguir os
limites reais dos sujeitos que investigam os limites do objeto
investigado. Delimitar um objeto para investigação não é fragmentá-
lo, ou limitá-lo arbitrariamente. Ou seja, se o processo de
conhecimento nos impõe a delimitação de determinado problema,
isto não significa que tenhamos que abandonar as múltiplas
determinações que o constituem. [...] A compreensão da categoria
totalidade concreta em contraposição à totalidade caótica vazia, é
imprescindível para entendermos a interdisciplinaridade como
necessidade imperativa para construção do conhecimento social.
kendal e Mackintosh (1979) apud Assis (2000, p. 171) identificam o
processo de cooperação para a produção interdisciplinar do conhecimento como
sendo a cooperação organizada a partir da elaboração de um pressuposto comum a
um conjunto de disciplinas conexas, onde a hipótese formulada serve de
coordenação dos esforços realizados em todos os níveis. Sendo assim,
resguardadas as características disciplinares, que são importantes na geração dos
aportes científicos ao entendimento global do problema, os pesquisadores
necessitam de redobrados esforços no estabelecimento de pontes entre domínios
conexos, uma vez que é nessa cooperação que se atinge a sinergia para promover
o avanço do conhecimento sobre os fenômenos complexos.
Para Frigotto (1995, p. 29-30) os contornos da questão
interdisciplinar da produção de conhecimento não é apenas das ciências sociais.
Entretanto nelas, sem embargos é mais cruel, porque o alcance de uma maior
objetividade somente será atingida por meio do intercâmbio crítico intersubjetivo dos
sujeitos que investigam um determinado objeto ou problemática. A busca da
objetividade reafirma a especificidade do método científico nas ciências sociais
colidindo com a concepção positivista de conhecimentos em diferentes históricos e
matizes como explicita a materialidade adversa no plano histórico empírico.
Nessa perspectiva reconhece-se que os problemas ambientais são
sistemas complexos, nos quais intervêm processos de diferentes racionalidades,
ordens de materialidade e escalas espaço-temporais. A problemática ambiental é o
campo privilegiado das interrelações sociedade-natureza, razão pelo qual seu
conhecimento demanda uma abordagem holística e um método interdisciplinar que
permitam a integração das ciências da natureza e da sociedade; das esferas do
ideal e do material, da Economia, da tecnologia e da cultura (UNESCO,1986 apud
LEFF, 2000, p. 20).
Moraes (1990, p. 33) apud Oliveira (2000, p. 93) salienta que:
a interdisciplinaridade não dilui as abordagens específicas e as
perspectivas próprias de cada ciência. Ao contrário, o trabalho
interdisciplinar torna sentido como a associação de análises
peculiares, como uma conjunção que afirma individualidades. O
resultado desse trabalho aparece como um somatório dos enfoques
individuais de cada disciplina, que nesse cruzamento adquire
qualidades novas. O interdisciplinar é constituído sobre a partir das
análises empreendidas pelas várias ciências. Desta forma, não
prescinde dos conhecimentos particulares (e parciais frente a
temática da questão), mas alimenta-se deles (do resultado de sua
aplicação ao tema em foco). O recorte temático que funda o ponto
de convergência do trabalho interdisciplinar não anula a diversidade
dos objetivos científicos e suas apreensões ímpares. Na verdade,
tais recortes criam novos objetos, ao inaugurarem novas formas de
abordar a realidade.
Desse modo a interdisciplinaridade implica assim uma interrelação
de processos, conhecimentos e práticas que transbordam e transcendem o campo
da pesquisa e do ensino no que se refere estritamente às disciplinas científicas e a
suas possíveis articulações. Dessa maneira, o termo interdisciplinaridade está sendo
utilizado como sinônimo e metáfora de toda a interconexão entre os diversos
campos do conhecimento envolvendo tanto as disciplinas acadêmicas quanto as
práticas não científicas (v.g. instituições e atores sociais diversos). Nesse contexto
aplica-se a noção de interdisciplinaridade em uma prática multidisciplinar. Desse
modo é preciso refletir sobre os marcos conceituais e as bases epistemológicas que
podem impulsionar a prática de uma interdisciplinaridade mais aprofundada e mais
bem fundamentada em seus princípios teóricos e metodológicos, orientada ao
manejo, gestão e apropriação dos recursos ambientais (LEFF, 2000, p. 20).
Nesse sentido vale ressaltar que a interdisciplinaridade pressupõe
três condições elementares: a) trabalhar com um mesmo objeto de pesquisa; b)
combinar as linhas metodológicas, definindo uma problemática comum; e c) recorrer
a conceitos teóricos transversais, a saber, retomar aqueles que alimentam as
estratégias científicas, corroborando para a compreensão dos problemas analisados.
Logo é indiscutível o papel da linguagem nesse processo, principalmente na forma
escrita, que necessita de formas não-verbais. Partindo dessa premissa, é evidente a
dificuldade de atingir essa comunicação quando se discute conceitos que portam
diferentes concepções, em virtude das possíveis interpretações, o que é bastante
comum em trabalhos interdisciplinares (SILVA; HAINARD, 2005, p. 27).
Finalizando a temática envolvendo a interdisciplinaridade e as
ciências, é preciso esclarecer que o processo de transformação do mundo impõe ao
conhecimento uma constante renovação, ou seja, a cada dia novas propostas
reformulam o arcabouço teórico, produzindo novos conceitos na cadeia infinita do
conhecimento, onde somente com uma reflexão crítica possibilita o caminhar. Nesse
processo dinâmico do conhecimento, a Geografia e o Direito Ambiental como saber
e parte desse processo de conhecimento, é, em cada momento histórico, um modo
de pensar a época, movendo-se no contexto da produção do conhecimento, que é
dinâmico e ininterrupto (CARLOS, 1999, p. 07).
3.3 DA IDEIA DE NATUREZA A EXPRESSÃO MEIO AMBIENTE
O homem não é apenas um ser social que coopera, mas um ser que
por meio de suas ações provoca modificações duradouras. Quando o homem toma
posse da realidade passa a compreendê-la na medida em que a transforma. Assim,
por meio da manipulação das coisas adquire os conceitos sobre ela, e ao mesmo
tempo em que se desenvolve, transforma o seu meio. Nesse sentido todo o
processo de formação conceitual, pode ser compreendido materialisticamente como
resultado das relações de influência com a natureza. De início, tem-se um aspecto
meramente subjetivo dos fenômenos, mas na medida em que o conhecimento se
eleva, supera-se as referências meramente pragmáticas e técno-antropomórficas,
concretizando uma representação da realidade onde se reflete a essência das
coisas. É surpreendente como o conhecimento progride da aparência para a
essência, da essência mais simples para uma essência cada vez mais profunda
(HAVEMANN, 1967, p. 48 a 51).
A visão cartesiana dominante de grande parte do pensamento
científico coloca o homem como observador da natureza, ensejando o conceito de
ambiente natural, como algo externo ao homem, no qual se encontra total e
umbilicalmente imerso, todavia não faz parte da natureza humana dicotomia clara
(LUTZENBERGER, 1990, p. 87). Descola (1996) apud Labour (2004, p. 96), não
nada mais instável de que a noção de natureza, uma vez que a palavra, segundo o
naturalismo uma forma de identificação dentre outras próprias aos ocidentais
designa três elementos diferentes:
a) uma parte do mundo submissa à estrita causalidade e somente ao
reino da necessidade; neste sentido, a natureza opõe-se ao reino da
sociedade humana, de sua subjetividade, marcada, ao contrário, pelo
reino e pela suspensão da estrita causalidade; b) mas a palavra
natureza, e é ai que as coisas se tornam instáveis, designa também
o conjunto formado pela reunião da natureza não social e da
natureza social. Dito de outra forma, a palavra natureza designa ao
mesmo tempo uma parte e o conjunto, pois a sociedade humana em
sua evolução não é concebida fora do quadro da causalidade; c) mas
que se torna, então, a distinção entre a natureza (não-social) e a
(natureza) social.
De forma suscinta, a ideia de natureza na história ocidental
contempla uma interpretação a cada momento histórico (MARCONDES, 1999, p.
39). Partindo dessa perspectiva o conceito de natureza no decorrer da história
humana adquire novos significados e novas estratificações (ANGELI, 2001, p. 33).
Na perspectiva de introduzir uma visão do homem como elemento e transformador
da natureza, no final do século XVIII, propaga o mito da dominação da natureza.
Entretanto, a ideia era que a natureza deveria ser domesticada, mas não destruída.
Por sua vez, no século XIX, surgem diversas observações sobre a relação do
homem com a natureza, partindo desde o enfoque evolucionista de Darwin ao de
Marx e Engels, pautando as relações na dinâmica social de produção
(MARCONDES, 1999, p. 41-42).
Em breves linhas para Darwin o enfoque evolucionista parte do
pressuposto que o homem se origina da evolução natural, portanto do próprio
desenvolvimento histórico natural. Darwin retira o homem da zona celestial e
colocando-o no mundo terrestre, inaugura uma nova forma de entender a natureza e
o homem (MOREIRA, 2006, p. 67). Para Marx ao longo de sua obra O Capital,
processa-se alterações na relação do homem com a natureza a partir da produção
de mercadorias, e na própria relação entre os homens. Essa alteração está presente
no fato de que a natureza passa a ser objeto de uso e consumo, ao mesmo tempo
em que o conhecimento de suas leis e de sua potencialidade fornece subsídios a
intensificação da produção (BARREIRA, 1991, p. 31).
Nos dizeres de Angeli (2001, p. 35) para Engels, a questão da
natureza somente deveria ser entendida como ambiente, mas para Casseti (1991, p.
12) a natureza separada da sociedade não possui significado, logo a natureza é
vista em relação ao homem.” Todavia, para Angeli (2001, p. 35) “a referência de
Engels permite entender como a natureza se manifesta nas suas formas mais
concretas e como se o processo destrutivo e construtivo dela mesma.” Segundo
Vitte (2007, p. 37) na obra Naturphilosophie de Humboldt sua visão de natureza é
“a de um organismo vivo, em constante movimento e interação contínua, que se
define a partir da dialética de forças da natureza.” Nesse sentido Humboldt
considerava a natureza racionalmente, isto é:
Submetida ao processo de pensamento, e uma unidade na
diversidade dos fenômenos; uma harmonia, combinando todas as
coisas criadas, por mais diferentes em forma e atributos; um grande
todo animado no sopro da vida. O resultado mais importante da
pesquisa racional da natureza é, portanto, estabelecer a unidade e a
harmonia dessa massa estupenda de força e matéria, determinar
com justiça imparcial o que é devido às descobertas do passado e às
do presente e analisar as partes individuais dos fenômenos naturais
sem sucumbir sob o peso do todo.
Para explicar a concepção ontológica de natureza, segundo Casseti
(2004, p. 160) é preciso:
superar as implicações dicotômicas da relação metafísica natureza-
sociedade, resgatar a dialeticidade das relações processuais,
reforçando o argumento de que é o sistema de produção e as foas
produtivas que dão a natureza sua existência social. Torna-se
necessário, então, superar a ideologização das “leis da natureza”
como forma de legitimação das diferenças sociais, em que a
propriedade e a vida são colocadas supostamente como mera
acidentalidade, sem desconsiderar o homem como resultado do
processo evolutivo da natureza. Assim, sem qualquer pretensão de
sugerir um novo referencial epistemológico para a Geografia
entende-se o conceito ontológico de natureza como algo que se
aproxima do conceito categorial de espaço”, partindo do princípio de
que buscam a compreensão totalizante da “unidade do real”.
Para Suertegaray (2004, p. 114), a Geografia, no decorrer de sua
história, trabalha com o conceito de natureza, todavia enquanto construção cultural,
o conceito pode ser compreendido de diversas maneiras. A primeira subordina o
conceito de natureza à concepção de Geografia desde sua autonomia, perpassando
pelo culo XX, como algo externo ao homem. Numa segunda concepção cogita-se
a dimensão do humano, ou seja, aquilo que escapa da intervenção do natural.
Destas concepções resultam caminhos analíticos diferenciados: de um lado uma
natureza externa ao homem, logo algo distinto ao homem, pois formam um conjunto
de todas as coisas produzidas sem a intensionalidade humana. De outro lado, um
caminho analítico que entende a construção humana como natureza.
Na perspectiva de estabelecer uma compreensão da dialética
natureza (natureza-sociedade, sociedade-natureza), Casseti (1994, p. 111) salienta
que a Geografia, deve assumir uma nova postura epistemológica, visando superar
todos os determinismos e consequentes relações duais. Dessa forma, resgataria
não apenas o valor científico fundamentado nos postulados históricos-materialistas,
como tamm a participação política, negada a Geografia por sua neutralidade
científica. Ao levar o homem a compreender que é um ser natural, permitir-lhe-á
entender que a natureza lhe pertence, não apenas como substrato material, mas
como fonte de vida. Isso implicará numa rediscussão dos conceitos de propriedade
dos meios de produção e antagonismo de classes, favorecendo a compreensão da
essência ambiental.
Segundo Moreira (2008, p. 47) o que se chama de natureza é um
conjunto de corpos ordenados pelas leis da matemática. Não se distingue natureza e
fenômenos naturais. Visualiza-se a natureza por meio do seu relevo, das rochas, do
clima, da vegetação, dos rios, etc.. Todo conhecimento adquirido da natureza
provém medindo as proporções matemáticas e descrições dos movimentos
mecânicos de seus corpos. A natureza concebida é proveniente da experiência
sensível, cujo conhecimento produzido, é organizado numa linguagem geométrico-
matemática. Quando se fala em organização geográfica da natureza, parte-se para o
agrupamento, a enumeração e a classificação dos dados da percepção numa ordem
taxonômica corológica. Para entender o processo de formação do todo é preciso
somar os femenos individuais, somando do primeiro ao último para se ter uma
integração do sistema da natureza.
A concepção de Moreira se prende a uma visão clássica, porque
fundamenta na matemática e na evolução da natureza por ciclos mecânicos e
fechados, nesse sentido Santos (1991) apud Camargo (2008, p. 92) salienta que a
partir de uma ideia fragmentada da natureza, percebe-se a totalidade do meio
ambiente como um conjunto matematicamente ordenado de corpos, que somados
refletem a totalidade ambiental. Ademais “a natureza, como um conjunto inerte,
inorgânico e, consequentemente, mecânico, nos reforça a ideia de domínio e de que
a sua instrumentalização utilitária é a resposta inexorável às demandas do
progresso humano.
Derani (1997, p. 73-74) salienta que a natureza apresenta duplo
sentido na percepção humana:
Seja como fonte da sua produção e reprodução econômica, seja
como fator de bem-estar o homem encontra sua expansão física e
psíquica no todo. Nas duas manifestações, a relação homem-
natureza é uma relação parte e todo, em que não se pode apartar o
homem da natureza, seja pela impossibilidade de sua existência
material, seja para seu equilíbrio psíquico.
[...] esse duplo relacionamento que hoje em dia foi colocado em
atrito, excluindo-se mutuamente, [...] não é em sua origem
conflitante, apenas dois aspectos de uma única relação homem-
natureza. Ao torná-los espacialmente excludentes uns ao outro,
forma-se uma necessidade de escolha e de disposição temporal das
atividades designadas como de trabalho e lazer.
Em outras palavras, reforça-se o fato que a espécie humana possui
um espaço limitado para a expansão de suas atividades, ou seja, a vontade
incomensurável humana tem como barreira os limites da Terra; em contrapartida, a
delimitação do que seria matéria (natureza) para o trabalho e matéria (natureza)
para o lazer é definida dentro de um universo finito. Não obstante a imanente
necessidade de expansão produtiva da atividade econômica implicar na
subordinação de toda relação homem-natureza. Com uma única ação apropriativa a
natureza passa a ser exclusivamente recurso, elemento da produção (DERANI,
1997, p. 74).
Milton Santos em sua obra Por uma nova Geografia (1986, p. 158),
define a natureza “como o conjunto de todas as coisas existentes, ou, em outras
palavras, a realidade em sua totalidade. A natureza é parte de um processo em
constante movimento, e cada um desses momentos é fugaz, tornando sempre difícil
no presente a sua definição. Esboça ainda, que uma profunda mudança tecnológica,
organizacional e social transforma substancialmente os modelos de percepção da
realidade. Para Suertegaray (2004, p. 115-116) isto exige uma reflexão efetiva sobre
o que é natureza e algumas proposições encaminham essa discussão. Assim, a
natureza possuída pelo homem transfigura adquirindo outra dimensão. Capel (2005,
p. 115) apud Limonad (2007, p. 12) “propõe que se comece a aceitar que hoje a
natureza não é mais uma natureza natural, considerando que toda a superfície da
Terra está afetada pelas atividades humanas.” Lipietz (1995, p. 10) coaduna o
pensamento de Capel ao dizer que ”tudo que existe na Terra é atualmente
influenciado pela atividade humana.
Morais (1999, p. 91-92) reforça a discussão salientando que a
natureza deve ser entendida como um processo dialético cuja forma não visa
apenas o acréscimo do novo, mas parte do pressuposto em que a história da
natureza e da sociedade devem ser vista como um único processo, modelado na
constituição do vir-a-ser de cada situação histórica. Essa integração da sociedade e
natureza como unidade materializa nas últimas décadas, a partir de estudos
dialéticos, retratados pela Geografia Crítica. Para Grossi (1993, p. 127) a abordagem
da natureza como unicidade tem sido objeto de reflexões de geógrafos pautados no
materialismo histórico e dialético. Nessa perspectiva, o conceito de natureza pauta-
se nas seguintes observações pontuais:
1) O mundo perceptível é produto das forças espontâneas da
natureza e do desenvolvimento social;
2) Entre o homem vivendo em sociedade e a natureza há uma
contradição que se resolve mediante o trabalho social. Sem trabalho
é impossível a troca entre o homem a natureza;
3) A diferença de consumo animal e consumo humano é ativa no
sentido de que, antes de consumir, o homem deve produzir. Sem
produção é inconcebível a existência humana.
Segundo Morais (1999, p. 92) dada a simbiose perfeita entre
natureza e a sociedade torna difícil conceber uma natureza sem o homem, pois
quem atribui significado à natureza é a existência humana. Segundo Souza e
Suertegaray (2007, p. 06) o conceito de natureza passa a ser repensando na década
de 60. Tradicionalmente a natureza era entendida como algo externo ao homem.
Nota-se a partir desse momento que se torna cada vez mais difícil estabelecer o que
é puramente natural do que é social, sendo comum a interpenetração desses
elementos. A evolução para o conceito de ambiente é resultante não de uma
interface entre os processos naturais e a sociedade, mas tamm, e principalmente
da transfiguração proporcionada pelo desenvolvimento das técnicas de intervenção
nas formas e processos naturais. Segundo Limonad (2007, p. 15) apud Harvey
(1996, p. 148) é de suma importância situar o conceito de natureza e de ambiente,
uma vez que se encontra em pauta a preservação de uma ordem social particular e
de um status quo hegemônico, mais do que a preservação da natureza em si.
Para Marcondes (1999, p. 42) “a relação homem-natureza, pauta
presente no pensamento do século XIX, emergiu com a denominação meio
ambiente, tratada nos aspectos concernentes à problemática do desenvolvimento.
Verifica-se assim que a terminologia meio ambiente designa uma pluralidade de
questões ambientais. Pierre George (1973, p. 07) em sua obra O Meio Ambiente
traz o questionamento sobre o que é meio ambiente? É evidente que na atual
realidade científica, é um tema para controvérsias, o ambiente seria um objeto de
imenso receio, uma diversão, ou quiça uma especulação? Para P. George “o meio
ambiente é, a um só tempo, um meio e um sistema de relações. Ademais a
existência e a conservação de uma espécie encontram-se subordinadas aos
equilíbrios dos processos destruidores e regeneradores do meio. Logo, se define o
meio ambiente como:
Um conjunto de dados fixos e de equilíbrios de forças concorrentes
que condicionam a vida de um grupo biológico, o qual comporta por
sua vez simbioses e parasitoses, e entra na composição dos
equilíbrios. Sob este aspecto, o meio ambiente é da alçada das
ciências da natureza e, mais especialmente, da Biologia. O meio
ambiente dos grupos ou sociedades humanas não passa de um caso
particular aliás, excepcionalmente complexo devido à multiplicidade
das ações voluntárias ou involuntárias do homem da abordagem
ecológica em geral.
Antonio Leyva apud Cerrada (1972, p. 55) assinala que uma das
primeiras dificuldades que todo investigador sobre meio ambiente encontra é a sua
delimitação conceitual da terminologia. Sem embargos, a delimitação é necessária
para determinar o campo de atuação da matéria. Ademais, para Cerrada (1972, p.
56) nenhuma definição sobre meio ambiente pode ser estranha a ideia de um
sistema global e extraordinariamente complexo em constante evolução, face aos
elementos que o constituem e pelo fato do homem estar utilizando, transformando e
desenvolvendo o meio em que vive. De certa maneira pode-se dizer resumidamente
que o meio ambiente, é o homem e o seu entorno, ou seja, compreende todos
elementos mutáveis, todas as condições e circunstâncias de ordem física e orgânica
em que se desenvolve a vida. Nada, portanto é estranho ao conceito de meio
ambiente.
Para Dubos (1968, p 241) um conceito ideal de meio ambiente é
irreal porque implica uma visão estática da natureza biológica e social do homem. O
planejamento futuro exige uma atitude ecológica admitindo uma mudança evolutiva
e uma atividade criativa contínua por parte do ser humano. Paradoxalmente Giddens
(1997, p. 97) assinala que o verdadeiro conceito de meio ambiente em
comparação com a natureza, aponta para uma transição. Logo, o meio ambiente
que parece não ser mais que um parâmetro independente da existência humana,
reflete uma natureza transfigurada pela intervenção humana, em outras palavras, a
ação humana socializou a natureza renomeando-a para meio ambiente.
Para Mota (2001, p. 83) “a base para a atribuição de valor ao meio
ambiente tem dimensão filosófica,” porque pela análise filosófica compreende-se a
processo valorativo e sua conexão entre a razão e ação. Ainda segundo Mota apud
Maclean (1996, p. 181 a 187) esse problema pode ser enfocado pelo aspecto ético,
sob três ângulos distintos, o antropocentrismo, o biocentrismo e o ecocentrismo, a
saber:
a) O antropocentrismo: considera o homem como o centro do
universo, e que a ele são destinadas todas as coisas. Assim, o
processo de escolha fundamenta o valor intrínseco e é interpretado
em termos de preferências a serem satisfeitas, que são as
necessidades do homem, e são medidas pelo seu bem estar. Trata-
se de um enfoque que é puramente econômico e se baseia no
raciocínio simplista de que os recursos naturais são apenas um
apêndice dos mercados convencionais. Os homens não percebem o
problema de suas satisfações somente pelo aspecto econômico, mas
antes de tudo pela percepção da escolha e dos recursos naturais.
b) O biocentrismo: relaciona-se com a justiça biótica que atribui
importância a todos os seres vivos, não considerando o aspecto
puramente utilitarista do antropocentrismo estreito como gerador de
bem-estar humano, ou seja, o biocentrismo está centrado no
raciocínio moral. A justiça biótica considera a questão do risco do
recurso natural como elemento importante de avaliação e, por isso,
questiona vários paradigmas clássicos de valor.
c) O ecocentrismo: baseia-se na “ética da Terra e assume um
enfoque sistêmico que ajuda a entender como o sistema biótico
sobrevive e se modifica, sinalizando que o valor é guiado por essa
perspectiva. Todos os elementos da biota estão interligados entre si,
entre as espécies e seus meios ambientes. Por essa perspectiva, a
ótica da Terra adquire um forte apelo biológico e sugere uma forma
de antídoto para as metodologias individualistas, baseadas no
utilitarismo antropocêntrico, principalmente na filosofia econômica
predominante do passado. O valor, por esse enfoque, alcança uma
dimensão que não é somente econômica, mas também de senso
filosófico. A ética ecocêntrica considera que os seres humanos
devem usar o meio ambiente de tal maneira que respeitem a
integridade, a estabilidade e a beleza da comunidade biótica.
Atendo-se, ao sentido de um conceito de meio ambiente, pode-se
dizer tamm que todo conceito contém uma história e um elo de identificação com
seu autor, eis que sua elaboração tem bases científicas ou filosóficas, que
juntamente com seus elementos internos e devidamente articulados definem sua
consistência, a partir de sua própria constituição, remetendo a outros conceitos para
efeitos de comparação ou de superação. Em virtude das mudanças na forma de
pensar da sociedade, os conceitos podem ser superados ou modificados, dentre as
várias razões, é significativo o desenvolvimento tecnológico, aculturações, conflitos
de interesses, novos conhecimentos elaborados, etc (SPOSITO, 2004, p. 60). Para
Martins (1989, p. 51) a Geografia, fundamenta a sua elaboração científica,
principalmente em conceitos.
Segundo Suertegaray (2004, p. 116) na origem da discussão sobre o
homem versus o meio, a Geografia compreendia o meio ambiente como sinônimo de
natural, ou seja, nesta visão o homem era parte externa ao meio, ou externo a
natureza. No transpassar dos tempos, a Geografia vai transformando sua
compreensão, passando a pensar o meio ambiente como homem e sociedade
juntamente com seu entorno. Nesse sentido o homem não somente está envolvido
pelos objetos e ações, mas interage de forma conflitiva com o meio. Para Limonad
(2007, p. 08) é preciso ter muita clareza para não confundir o conceito de ambiente
com o de natureza, já que a ideia de ambiente pode ser adjetivada e referir-se não
somente ao ambiente considerado “natural”, mas também ao ambiente construído,
ao ambiente rural, ao ambiente social, e mais atualmente um ambiente virtual. Em
suma, a definição do conceito de natureza e meio ambiente possui um importância
vital para a reflexão do espaço social e dos discursos contemporâneos.
Para Roberto Lobato Corrêa (1997, p. 155) segundo a visão da
Geografia Humana, entende-se por meio ambiente um conjunto de três aspectos
interligados. Num primeiro momento o meio é o resultado material da ação humana,
ou seja, a natureza transformada pelo trabalho social. Nota-se que a materialidade
constituída é resultante de um lado, dos conflitos sociais e, de outro, das forças
produtivas, que gera novas tecnologias e novos meios de produção de ambientes.
Num segundo aspecto o ambiente não se faz apenas de objetos materiais fixos,
englobam-se também os diferentes objetos criados pela ação humana. O meio
agrega fixos e fluxos (carros, pedestres, barulhos). Por fim, o homem, mas não um
homem qualquer, um homem qualificado pelas suas relações sociais, culto,
idealizador, com mitos e mbolos, utopias e conflitos. Ademais a conceituação de
meio que exclua o homem em sua complexa plenitude é falha, incompleta, pois alija
o produtor e usuário do meio ambiente. Logo, tem-se que o conceito de meio
ambiente, da forma explicitada, confunde-se com o meio geográfico, estando muito
além dos limites das ciências da natureza.
Para Emídio (2006, p. 127) inicialmente considerava-se meio
ambiente como as condições físicas e químicas, juntamente com os ecossistemas
do mundo natural, e que constitui o bitat do homem, também é, por outro, lado
uma realidade com dimensão de tempo e espaço.” Essa realidade pode ser tanto
histórica como social. Histórica do ponto de vista da transformação dos aspectos
naturais e estruturais pelas atividades transformadoras do homem no seu meio, e
social na medida em que o homem vive e se organiza para a produção de bens e
serviços visando suas necessidades e a sobrevivência da espécie. Tuan (1980, p.
04-05) em seu estudo sobre topofilia elo afetivo entre a pessoa e o lugar ou
ambiente físico , afirma que as ligações entre os seres humanos e o meio
ambiente, que diferem em sensibilidade, intensidade e expressão, são estabelecidas
por meio das palavras-chave: percepção, valor e visão de mundo.
De acordo com Branco e Rocha (1987, p. 43) muito embora “o meio
ambiente pode se definido com um conjunto de fatores indispensáveis a vida,” a
questão não é pacífica. Nesse sentido meio e ambiente encerram uma conotação de
espaço físico. Entretanto a noção de meio ambiente é mais estática que de
ecossistema, embora sutil e às vezes arbitrária. Embora um meio possa ter
elementos e condições necessárias à existência da vida, estes não podem ser
suficientes para sustentar o fluxo trófico de energia de um sistema dimico. Logo,
um determinado meio ambiente pode não abrigar vida, enquanto que o ecossistema
pressupõe a existência desta. que se mencionar ainda que meio ambiente difere
de hábitat, uma vez que este encerra uma conotação geográfica ou a mesmo
espacial. Nunca é demais mencionar que a dependência dos seres vivos em relação
ao meio ambiente varia muito de uma espécie para outra, v.g. os animais e os
vegetais.
Na visão de Morin (1997, p. 21) o meio ambiente é um conceito que
deriva do homem e a ele está ligado, porém o homem não o integra. O fato de o
homem não constituir o conceito de meio ambiente não significa que este conceito
seja menos antropocêntrico, muito pelo contrário, ele mostra exatamente o poder de
subordinação e dominação do mundo exterior objeto de ação do eu ativo. Isto
significa que o tratamento legal destinado ao meio ambiente permanece
necessariamente numa visão antropocêntrica porque essa visão está no cerne do
conceito de meio ambiente.
Para Derani (1997, p. 71) tendo em vista que o conceito de natureza
apresenta duplo sentido, o conceito de meio ambiente também apresenta essa
peculiaridade dentro da sociedade moderna, uma vez que é recurso-elemento e
recurso-local. Sintetizando:
Este conceito extremamente novo, tem sua base na contemporânea
relação social com a natureza, justamente por refletir uma dentro
das inúmeras possíveis relação com a natureza, seu conteúdo
torna-se tão pantanoso e turvo, na proporção que as sociedades
tornam-se mais complexas e diferenciadas. A possível
universalização do conceito de meio ambiente deve se ao fato de
que as sociedades contemporâneas estão, de certo modo, unificadas
culturalmente, sobretudo motivadas pela unificação da produção
(produção internacionalizada), o que nivela a cultura e logicamente
o modo de relacionar-se com a natureza das sociedades que
integram o mercado mundial.
Faz-se necessário explicitar que a questão do meio ambiente está
diretamente ligada com o aparecimento do meio cnico-científico, momento pelo
qual a sociedade industrializada se renova alcançando novos patamares
(SANTANA, 1996, p. 53). O desenvolvimento da ciência das técnicas, ou seja, da
tecnologia, favorece o processo produtivo. Nota-se nesse período que toda
natureza, torna-se passível de utilização direta ou indireta, ativa ou passiva,
econômica ou política. Outra característica marcante desse período é a expansão do
trabalho intelectual e uma maior circulação do capital numa escala mundial,
favorecendo maior movimentação das coisas, valores e ideias (SANTOS, 1985, p.
37-38). Para Gomes (1982, p. 104) “a ciência e a técnica se atualizam
continuadamente e, pelo fato da natureza manter intrínsecos laços com diversas
modalidades de desenvolvimento social, faz com que os liames com a natureza
também se atualizem. Segundo Mendonça (2004, p. 124) na evolução do conceito
de meio ambiente:
Observa-se o envolvimento crescente das atividades humanas,
sobretudo nas quatro últimas décadas, mas ele continua fortemente
ligado a uma concepção naturalista, sendo que o homem
socialmente organizado parece se constituir mais num fator que num
elemento do ambiente. De maneira geral, e observando-se tanto o
senso comum como o debate intra e extra academia, a impressão
geral que se tem é de que a abordagem do meio ambiente es
diretamente, traduzido numa hierarquização dos elementos
componentes do real, onde aqueles atinentes ao quadro natural
estão hierarquicamente em posição mais importante e sem os quais
não haveria a possibilidade da compreensão ambiental da realidade.
Muito embora tenha sido intensa a produção acadêmica no campo
ambiental nas últimas décadas, não existem paradigmas determinados, uma vez
que a questão ambiental emerge fora do campo acadêmico, exigindo-se esforços
para sua compreensão, sobretudo no campo das ciências sociais. Assim, a busca
para conceituar meio ambiente é um árduo trabalho, uma vez que coaduna
conhecimentos originários da Ecologia, da problemática social e de outros ramos do
saber (MARCONDES, 1999, p. 44). No entanto as tendências atuais tendem a
pensar o ambiente sem negar as tensões sob as suas diferentes dimensões. Assim,
pela perspectiva geográfica, retoma-se um pensamento conjuntivo, onde o meio
ambiente é pensado por inteiro, na medida em que sua análise requer uma
compreensão das práticas sociais, das ideologias e das culturas envolvidas
(SUERTEGARAY, 2004, p. 117).
3.4 O CONCEITO JURÍDICO DE MEIO AMBIENTE
Inicialmente é preciso ressaltar que os conceitos são fundamentais
para o mundo das ciências. Especialmente para a Ciência do Direito é de extrema
importância a correta fixação de conceitos jurídicos, de forma a assegurar à
sociedade e aos cidadãos a adequada segurança jurídica (ANTUNES, 2005, p. 228).
Para Rodrigues (2002, p. 51) em qualquer definição não preocupa-se apenas com
as palavras que irão ser utilizadas, mas sim, e especialmente com o objeto definível,
qual seja, com a realidade que é percebida sensorialmente e que se pretende
conceituar. Ressalta ainda que qualquer falha na percepção ou na sua cristalização
pelas palavras pode ser fatal à coincidência entre a definição de algo e sua
essência.
De forma sintética costuma-se dizer que a palavra „ambiente‟ indica
a esfera, o círculo, o âmbito que nos cerca, em que vivemos. Em certo sentido,
portanto, nele já se contém a palavra „meio‟ (SILVA, 2004, p. 19). Embora sinônimos
quando tratados isoladamente, os vocábulos meio e ambiente, quando unidos,
traduzem uma ideia bem diferente, porque refletem em sentido autônomo aquele
que possuíam quando analisados em separado. O alcance da expressão é mais
largo e mais extenso do que o de simples ambiente (RODRIGUES, 2002, p. 51).
Segundo Freitas (2005, p. 17) a expressão meio ambiente, adotada no Brasil, é
criticada pelos estudiosos, porque meio e ambiente, no sentido enfocado, significam
a mesma coisa. Logo, tal emprego importaria em redundância. Em Portugal e na
Itália emprega-se tão somente o vocábulo ambiente. O termo francês equivalente é
milieu; no alemão é unwelt; e no inglês environment. Na Espanha e países da
chamada América espanhola usa-se a expreso entorno.
Reigota (1998, p. 11 a 15) assevera que o meio ambiente nem
mesmo pode ser considerado conceito científico, mas consiste numa representação
social. Isto porque, os conceitos científicos são entendidos e universalmente
utilizados como tais, caracterizando-se como consenso na comunidade científica
internacional, como ocorre com os conceitos de habitat, nicho ecológico,
ecossistema, etc.. As representações sociais pelo contrário, se relacionam
principalmente com as pessoas que atuam fora da comunidade científica, podendo
nelas serem encontrados conceitos científicos que foram internalizados socialmente.
Analisando as diversas concepções sobre meio ambiente, onde apenas em uma
delas referência expressa ao homem como componente do mesmo, conclui-se
que, por inexistir na comunidade científica um consenso sobre o meio ambiente, que
assume um caráter difuso e variado, a noção de meio ambiente se caracteriza
apenas como uma representação social.
Para Rovere (1990, p. 13) a declaração da pioneira Conferência das
Nações Unidas sobre o Meio Ambiente Humano, realizada em Estocolmo, em 1972,
define meio ambiente “como o sistema físico e biológico global em que vivem o
homem e outros organismos um todo complexo com muitos componentes
interagindo em seu interior. É importante frisar que a definição estabelecida nesta
Conferência, inclui o homem como parte do meio ambiente, uma vez que os efeitos
da atividade humana sobre a natureza originam impactos socioambientais. Para
Liberato (2007, p. 14) a preocupação direta não era com o meio ambiente
propriamente dito, e muito menos com o homem, mas com o nível de
desenvolvimento dos países integrantes da Conferência.
Segundo Fiorillo (2005, p. 20) cumpre frisar, primeiramente, que o
conceito de meio ambiente, é unitário, porquanto todo este é regido por inúmeros
princípios, diretrizes e objetivos que compõem a Política Nacional do Meio Ambiente,
esclarecendo que não se busca estabelecer divisões estanques, até mesmo porque
isso seria um empecilho à aplicação de sua tutela. No Direito brasileiro, o conceito
de meio ambiente inicialmente foi estabelecido pela promulgação da Lei 6.938, de
31 de agosto de 1981, que o define
1
nos seguintes termos:
Art. 3º. Para os fins previstos nesta Lei, entende-se por:
I Meio ambiente, o conjunto de condições, leis, influências e
interações de ordem física, química e biológica, que permite, abriga e
rege a vida em todas as suas formas.
Sem dúvida alguma, o grande passo no arcabouço teórico jurídico
ambiental, consolida-se com a promulgação da Constituição Federal de 1988,
referindo-se ao meio ambiente e sua proteção jurídica, trazendo uma gama de
inovações em relação às legislações antecedentes. De fato, as cartas magnas
anteriores jamais se dedicaram a temática ambiental de forma tão abrangente e
completa, eis que as disposições anteriores aos recursos ambientais eram feitas de
forma assistemática, sendo considerados exclusivamente como recursos
econômicos. Além de atribuir um capítulo próprio para as questões ambientais, ao
longo de outros artigos dispõe sobre as obrigações da sociedade e do Estado
brasileiro para com o meio ambiente (ANTUNES, 2005, p. 59 a 62).
Fazendo um estudo comparativo com as Constituições brasileiras
anteriores à de 1988, pode-se constatar que nada acrescentaram ao meio ambiente
natural. As mais recentes, desde 1946, basicamente se referiam à proteção da
saúde, sobre a água, florestas, caça e pesca que ensejariam leis protetoras dos
respectivos códigos, mas sem qualquer enfoque holístico do meio ambiente, como
direito pluri-individual, ou que transportassem limites internacionais. A Constituição
brasileira de 1988, inovou, significativamente ao inserir no titulo da Ordem Social,
um capítulo dedicado ao meio ambiente (GRASSI, 1995, p. 66).
As Leis fundamentais anteriores a Constituição de 1988 não se
dedicaram ao tema de forma abrangente e completa, não haviam uma preocupação
com a conservação dos recursos naturais e com sua utilização racional, Antunes
(2005, p. 47 a 51) ensina que:
1
A Lei 6.938, de 31 de agosto de 1981 dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente, seus fins
e mecanismos de formulação e aplicação, e da outras providências.
A Constituição imperial de 1824 não fez qualquer referência a
matéria ambiental [...] a concepção predominante, no entanto, era a
de que o Estado não deveria se imiscuir nas atividades econômicas,
ou melhor, fazia-o por abstenção, e logicamente não cabia à
Constituição traçar qualquer perfil de ordem econômica
constitucional. [...] no Período Republicano as antigas províncias
foram transformadas em Estados, [...] A Constituição Federal de
1981, em seu artigo 34, nº 29, atribuía competência legislativa à
União para legislar sobre as suas minas e terras. [...] em 1934 como
fruto da Revolução de 30 e da Revolução Constitucionalista de 1932
elaborou-se uma nova Constituição com características
intervencionistas na ordem econômica e social. [...] de algum modo a
Constituição de 34 estimulou o desenvolvimento de uma legislação
infraconstitucional que se preocupou com a proteção do meio
ambiente, dentro de uma abordagem de conservação dos recursos
econômicos (Código das Águas, Código Florestal) [...] a Carta de 37
e de 46 praticamente manteve o mesmo padrão da Constituição de
1934. [...] 64 e 67 durante o regime militar mantinham-se as
características anteriores. [...] por fim a Carta de 69 houve pequenas
mudanças quanto as competências legislativas em relação a energia,
que foi subdividida em elétrica, térmica, nuclear ou de qualquer
natureza.
De igual forma, Ana Paula Liberato (2007, p. 78) ressalta em sua
obra, que as Constituições brasileiras dispensaram diferentes formas de tratamento
ao meio ambiente, conforme aduz o seguinte quadro síntese:
Quadro 1: As Constituições brasileiras e o meio ambiente
Proteção conferida ou relacionada com o meio
ambiente
Visão ambiental utilitarista, sem qualquer menção ao
meio ambiente.
Proteção da natureza econômica em detrimento da
preservação do meio ambiente.
Objetivo exploratório em relação aos recursos
naturais (subsolo, mineração, flora, fauna, águas,
energia hidrelétrica e florestas).
Noção exploratória dos recursos naturais, com
previsão de competência legislativa sobre os
recursos naturais.
Manteve previsão de Constituição de 1937.
Apresenta texto similar ao da Constituição de 1937 a
1946.
Equiparou o posicionamento internacional definido
na Declaração de Estocolmo de 1972, reconhecendo
a todos o direito-dever ao meio ambiente
ecologicamente equilibrado para as presentes e
futuras gerações.
Fonte: Liberato (2007, p.78)
O capítulo dedicado ao meio ambiente na Carta Magna em 1988 é
um marco no contexto histórico das Constituições brasileiras (SANTILLI, 2005, p.
58). O art. 225 da Constituição Federal do Brasil de 1988, assim determina:
Art. 225 Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente
equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia
qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o
dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras
gerações.
§ Para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao Poder
Público:
I preservar e restaurar os processos ecológicos essenciais e prover
o manejo ecológico das espécies e ecossistemas;
II preservar a diversidade e a integridade do patrimônio genético do
País e fiscalizar as entidades dedicadas à pesquisa e manipulação
de material genético;
III definir, em todas as unidades da Federação, espaços territoriais
e seus componentes a serem especialmente protegidos, sendo a
alteração e a supressão permitidas somente através de lei, vedada
qualquer utilização que comprometa a integridade dos atributos que
justifiquem sua proteção;
IV exigir, na forma da lei, para instalação de obra ou atividade
potencialmente causadora de significativa degradação do meio
ambiente, estudo prévio de impacto ambiental, a que se dará
publicidade;
V controlar a produção, a comercialização e o emprego de
técnicas, métodos e substâncias que comportem risco para a vida, a
qualidade de vida e o meio ambiente;
VI promover a educação ambiental em todos os níveis de ensino e
a conscientização pública para a preservação do meio ambiente;
VII proteger a fauna e a flora, vedadas, na forma da lei, as práticas
que coloquem em risco sua função ecológica, provoquem a extinção
de espécies ou submetam os animais a crueldade.
§ Aquele que explorar recursos minerais fica obrigado a
recuperar o meio ambiente degradado, de acordo com solução
técnica exigida pelo órgão público competente, na forma da lei.
§ As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio
ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a
sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação
de reparar os danos causados.
§ A Floresta Amazônica brasileira, a Mata Atlântica, a Serra do
Mar, o Pantanal Mato-Grossense e a Zona Costeira o patrimônio
nacional, e sua utilização far-se-á, na forma da lei, dentro de
condições que assegurem a preservação do meio ambiente, inclusive
quanto ao uso dos recursos naturais.
§ São indisponíveis as terras devolutas ou arrecadadas pelos
Estados, por ações discriminatórias, necessárias à proteção dos
ecossistemas naturais.
§ As usinas que operem com reator nuclear deverão ter sua
localização definida em lei federal, sem o que não poderão ser
instaladas.
Na medida em que a fruição de um ambiente saudável e
ecologicamente equilibrado foi erigida num direito fundamental pela ordem vigente,
revela-se um campo para a construção de garantias da qualidade de vida dos
cidadãos. É preciso mencionar que uma adequada compreensão do capítulo sobre
meio ambiente e dos dispositivos constitucionais voltados ao meio ambiente, exige
uma atenção especial para as disciplinas que não são jurídicas. Assim, uma série de
conceitos pertencentes a Geografia, a Ecologia, a Mineralogia, dentre outras o
importantes para se compreender a verdadeira dimensão da norma inserida na
Constituição (ANTUNES, 2005, p. 62).
Para Santilli (2005, p. 58) o meio ambiente ecologicamente
equilibrado, essencial à sadia qualidade de vida, é um direito humano fundamental,
consagrado e reconhecido em convenções internacionais. E mais, considerado
como um direito humano de terceira geração, face a sua natureza coletiva, de forma
a ser tratado de forma diferenciada dos direitos humanos de primeira geração, que
são os chamados direitos civis e políticos, de natureza individual e vinculados a
liberdade, à igualdade e à propriedade e dos direitos humanos de segunda geração,
que são os direitos sociais, econômicos e culturais. Recentemente a teoria das
“gerações de direito” criticada pela doutrina substituiu o termo gerações” por
“dimensões” uma vez que os direitos humanos resultam de um processo de fazer-se
e de complementaridade permanente.
De relevante efeito prático, a caracterização do meio ambiente
ecologicamente equilibrado como um direito fundamental, nos dizeres de Benjamin
(2002, p. 94), traz consigo três qualidades inerentes a sua tipologia: a
irrenunciabilidade, a inalienabilidade e a imprescritibilidade. A irrenunciabilidade
consiste em jamais se aceitar sua renúncia, enfim, conquanto o direito conviva com
a omissão do exercício, ele persistirá; a inalienabilidade, na medida em que sua
titularidade é personalíssima e de exercício próprio, é intransferível, inegociável; por
fim a imprescritibilidade caracterizada pelo perfil intertemporal, garante aos
beneficiários, inclusive os incapazes, o exercício de seus direitos.
Ao considerar como “bem de uso comum do povo” a Carta Magna
materializa o meio ambiente, reduzindo-o em suas entrelinhas aos seus
componentes físicos essenciais para uma sadia qualidade de vida. No capítulo
dedicado ao meio ambiente na Constituição brasileira de 1988 percebe-se que, a
maioria (quase a totalidade) dos incisos explicativos referem-se aos elementos
bióticos (fauna e flora) e abióticos (ar, água, solo), que constituem os suportes físico-
químicos do meio ambiente (COIMBRA, 2002, p. 36). Para Antunes (2005, p. 63) a
lei fundamental reconhece que a questão ambiental é importante para toda a
sociedade, seja porque se faz necessário preservar os valores, seja porque o meio
ambiente é o princípio que fundamenta a atividade econômica.
Para Santilli (2005, p. 70) a Constituição adota uma “concepção
unitária do meio ambiente que compreende tanto os bens naturais quanto os bens
culturais. Isso pode ser deduzido por meio de um interpretação sistemática e
integrada dos dispositivos de proteção ao meio ambiente e a cultura, sendo este o
entendimento de grande parte dos doutrinadores. Nesta perspectiva, as palavras de
José Afonso da Silva (2004, p. 20):
O conjunto de meio ambiente de ser, pois, globalizante,
abrangente de toda natureza original e artificial, bem como os bens
culturais correlatos, compreendendo, portanto, o solo, a água, o ar, a
flora, as belezas naturais, o patrimônio histórico, artístico,
paisagístico e arquitetônico. O meio ambiente, é assim, a interação
do conjunto de elementos naturais, artificiais e culturais, que
propiciem o desenvolvimento equilibrado da vida em todas as suas
formas.
No mesmo sentido, é o entendimento de Marés de Souza Filho
(1997, p. 09) quando discorre da relação entre meio ambiente, cultura e Direito:
O meio ambiente, entendido em toda a sua plenitude e de um ponto
de vista humanista, compreende a natureza e as modificações que
nela vem introduzindo o homem. Assim, o meio ambiente é composto
pela terra, a água, o ar, a flora e a fauna, as edificações, as obras de
arte e os elementos subjetivos evocativos, como a beleza da
paisagem ou a lembrança do passado, inscrições, marcos ou sinais
de fato naturais ou da passagem de seres humanos. Desta forma,
para compreender o meio ambiente é importante a montanha, como
a evocação stica que dela faço o povo. Alguns destes elementos
existem independentes da ação do homem: os chamamos de meio
ambiente natural; outros são frutos da sua intervenção e os
chamamos de meio ambiente cultural.
Da simples leitura do dispositivo constitucional, verifica-se que o
legislador brasileiro optou por uma conceituação que realça a interação e a
interdependência entre o homem e a natureza. É neste aspecto que se denota a
proteção jurídica do meio ambiente como um bem unitário (LEITE, 2003, p. 78). Nas
palavras de Machado (2000, p. 123), vai atingir tudo aquilo que permite a vida, que
a abriga e a rege. Diante da amplitude do conceito legal algumas vozes se
insurgiram, afirmando existir falta de clareza terminológica ao significado jurídico de
meio ambiente. No entanto a posição que prevalece na doutrina pátria firma-se por
uma postura ampla e disjuntiva a tal conceito (VIANNA, 2006, p. 20).
Segundo Coimbra (2002, p. 36) seria uma leviandade crer que o
meio ambiente não é uma realidade natural e social, tangível ou não, constituído de
seres concretos, mas com a somatória de fatores externos, como condições, leis,
influências e interações de ordem física, química e biológica. E se o fosse dessa
forma, como todos esses tipos de interações o meio ambiente seria apenas uma
normatização científica e técnica; não seria uma realidade subsistente constituída de
seres reais, tanto os vivos como os não-vivos.
Por seu turno, Antunes (2005, p. 229) observa que o conceito de
meio ambiente es mais voltado para os aspectos biológicos, físicos e químicos. O
conceito estabelecido na Constituição da República Federativa do Brasil é o mais
sensato, pois conjuga conceitos técnicos com conceitos sociais. Salienta ainda que,
embora o conceito jurídico de meio ambiente seja amplo, aduz que, o meio ambiente
possui uma amplitude extraordinária. Esta, talvez seja a grande dificuldade posta
para a análise sobre este candente problema jurídico.
Segundo Milaré (2000, p. 52-53) embora não haja acordo entre os
especialistas sobre o que seja meio ambiente, quanto ao seu conceito jurídico pode-
se distinguir duas perspectivas principais: uma estrita e outra ampla. Numa visão
estrita, o meio ambiente nada mais é do que a expressão do patrimônio natural e
suas relações com e entre os seres vivos. Tal noção, é evidente, despreza tudo
aquilo que não seja relacionado com os recursos naturais. Numa concepção ampla,
que vai além dos limites estreitos fixados pela Ecologia tradicional, o meio ambiente
abrange toda a natureza original (natural) e artificial, assim como os bens culturais
correlatos. Nesta perspectiva mais ampla, o meio ambiente seria a interação do
conjunto de elementos naturais, artificiais e culturais que propiciem o
desenvolvimento equilibrado da vida em todas as suas formas.
Cumpre observar que a adoção de um amplo e abrangente conceito
de meio ambiente, não lhe é benéfico, mas muito pelo contrário, faz com que não se
tenha um conjunto de normas homogêneas, concentrado e efetivo ao seu alcance. E
a causa disso não é outra senão porque o meio ambiente seria esparçamente
tutelado por todas as ciências específicas. Em outras palavras, a inexistência de
uma definição precisa, que identifique concreta e juridicamente qual o bem
ambiental, não permite que ele seja tratado com um Direito autônomo, justamente
porque a sua proteção seria fracionada nos diversos direitos que garantem o bem-
estar e a qualidade de vida (RODRIGUES, 2002, p. 57).
Atento à conceituação de meio ambiente, em sua concepção
antropocêntrica alargada, pode-se constatar que, no que tange à natureza jurídica, o
bem ambiental tem sua maior intensidade na proteção de um Direito difuso e
qualificado, isto é, a qualidade de vida. Assim, quando se protege juridicamente o
bem ambiental, busca-se a proteção de um Direito difuso. Desta forma, este não se
encontra vinculado com o tradicional Direito Público e Privado, mas, sim, visa à
conservação de um bem que pertence à coletividade como um todo e cujo controle é
feito de forma solidária pelo Estado e pelos cidadãos. Nos termos dos ditames
constitucionais a preservação ambiental é necessária tendo em vista as gerações
presentes e futuras. Trata-se de uma equidade intergeracional completamente
diferenciada da regra tradicional do Direito, pois protege todos os seres vivos futuros
(humanos ou não) alcançando-se ainda proteção de um Direito difuso de caráter
futuro (WOLKMER; LEITE, 2003, p. 218-219).
4 A EPISTEME DA GEOGRAFIA
Para discorrer sobre a episteme da Geografia, é preciso estudar a
história do pensamento geográfico, sendo assim, faz-se necessário certo rigor ao
proceder um aprofundamento bibliográfico, para que possa favorecer uma análise
crítico-reflexiva, eivada de vícios, em relação aos postulados desta ciência, que
desde outrora corrobora para o desenvolvimento das sociedades. Examinar-se-á
neste catulo os caminhos para a formação de uma racionalidade científica
geográfica (observação, construção, levantamento de hipóteses, adoção e rejeição
de teorias); em seguida demonstrar-se-á sua evolução e estruturação como ciência,
contribuindo para desvelar a complexidade do cotidiano, por meio da pesquisa
geográfica. Trata-se, por conseguinte de um capítulo de reflexão epistemológica.
4.1 DA GEOGRAFIA ANTIGA OU MEDIEVAL
O conhecimento geográfico é um saber tão antigo quanto a própria
história do homem (MOREIRA, 1985, p. 15). Inicialmente o conhecimento empírico
da Geografia desenvolveu-se com os povos orientais. Ao realizarem observações e
estabelecerem estudos matemáticos colaboraram de forma significativa para a
sistematização do conhecimento na antiguidade oriental. Assim, as ideias
geográficas em coexistência com as de outras ciências desenvolveram-se a partir da
exploração da Terra e das análises dos viajantes. As civilizações agrícolas da
Mesopotâmia e do Egito eram dependentes da irrigação para a produção de
alimentos. Os primeiros estudos sobre o rio Nilo, Tigre e Eufrates, colaboraram para
o desenvolvimento de estudos hidrográficos e de Geometria, uma vez que as cheias
destruíam as áreas demarcadas entre as famílias, forçando uma nova divisão
territorial (ANDRADE, 1987, p. 22).
Segundo Broek (1976, p. 20) os conhecimentos produzidos pelos
povos do Oriente Médio, foram utilizados pelos gregos para construírem novos
conceitos sobre o universo. Para Andrade (1987, p. 23) a contribuição dos gregos é
de suma importância, tanto do ponto de vista qualitativo, quanto quantitativo, para o
desenvolvimento dos conhecimentos básicos originários da ciência moderna. Os
gregos na visão de Sodré (1989, p. 14) foram os primeiros a registrar de forma
sistemática os conhecimentos geográficos. Ademais, Moraes (2002, p. 32) ressalta
que a denominação Geografia, tem como origem a antiguidade clássica do
pensamento grego.
Para Sodré (1989, p. 14) a evolução do pensamento geográfico
grego, tem como característica a sua posição privilegiada da Grécia no centro da
Europa, ao lado da Ásia, de frente com a África, entre o Mediterrâneo e o Mar
Negro; outro fator era o comércio que favorecia uma troca intensa de contatos; deste
modo restava aos gregos coletar, organizar, sistematizar, como que compendiar
os conhecimentos de natureza geográfica. Ainda num primeiro momento cabia-lhes
teorizar a base desses conhecimentos. Exercendo um domínio sobre o
Mediterrâneo, os gregos conheciam o litoral sul da Europa, o litoral norte da África, o
estreito litoral da Ásia, o Mar Vermelho, o Mar Negro, a Mesopotâmia, o Golfo
Pérsico e as terras que se estendem até à Índia.
Para Moreira (1985, p. 15-16) a Geografia nasce juntamente com as
lutas democráticas que se desenrolavam nas cidades gregas. Atendo-se ao
pensamento grego é preciso mencionar que delineavam-se algumas perspectivas
distintas de Geografia:
Uma, com Tales e Anaximandro, privilegia a mediação do espaço e a
discussão da forma da Terra, englobando um conteúdo hoje definido
como da Geodésia; outra, com Heródoto, se preocupa com a
descrição dos lugares, numa perspectiva regional. Isto para não falar
daquelas discussões, hoje tidas como geográficas, mas que não
apareciam como a da relação entre o homem e o meio, presente em
Hipócrates, cuja obra principal se intitula Dos ares, dos mares e dos
lugares. [...] Aristóteles discute a concepção de lugar, na sua Física,
sem articulá-la com a discussão da relação homem-natureza
apresentada em sua Política, e sem vincular esses estudos com sua
meteorologia e com suas descrições regionais, como a efetuada no
Egito (MORAES, 2002, p. 32).
Na gênese da Geografia, todo seu conhecimento é diluído na
filosofia, proporcionando a reflexão da prática da vida. Lebon (1976, p. 12) salienta
que nessas linhas iniciais, constata-se que a Geografia é um estudo filosófico,
exigindo vasta cultura dos cidadãos e estadistas. Nesse sentido Moreira (1985, p.
17) aduz que a “Geografia concebida como uma práxis democrática e
transformadora ficará sufocada nos interstícios da forma oficializada, assim, como na
vida real dos homens ficaram os gregos e a democracia sob o império romano.
Para Moraes (2002, p. 33) nesse período o pensamento geográfico ainda
encontrava-se disperso. Se por um lado, as matérias apresentadas eram muito
diversas, sem conteúdo unitário. De outro, muito do que se entende atualmente por
Geografia, não era apresentado com esse título.
Para Figueira (1977, p. 14) merece ser ressaltada a contribuição de
Aristóteles ao desenvolvimento do conhecimento geográfico. Para comprovar sua
teoria da esfericidade da Terra, apresenta três argumentos: a) a matéria se
concentra em torno de um eixo comum; b) a sombra projetada pela Terra na
superfície lunar, durante os eclipses, é circular; e c) somente se explica as
mudanças ocorridas no horizonte e o aparecimento de constelações devido ao fato
da Terra ser uma esfera. Todavia, sua preocupação não limitava a este problema.
Dentre seus estudos tamm abordava temas como a erosão, a formação dos
deltas, a relação entre as plantas, os animais e o meio físico, as variações do clima
com a latitude e as estações do ano, a vinculação das águas dos rios e dos
oceanos, as relações entre as raças humanas, o clima e as formas políticas.
Heródoto (484-425 a.C.) é considerado como o pai da história, mas
também pode ser considerado o pai da Geografia, “porque sempre a colocou os
acontecimentos históricos dentro de seu contexto geográfico.” muito se deve a
dois grandes expoentes da Geografia Antiga: Estrabão e Ptomoleu. Estrabão (64
a.C. ~ 20 A.D.) cuja Geografia era essencialmente uma descrição enciclopédica do
mundo ecumene conhecido e habitado. Ptolomeu, que viveu aproximadamente
em 150 da era cristã, tinha muito apreço pelos aspectos matemáticos do preparo de
mapas e levantamento de plantas. Contribuiu com o aperfeiçoamento dos métodos
de projeção de mapas e introduziu palavras como “paralelo” e “meridiano” para as
linhas de latitude e longitude (BROEK, 1976, p. 20-21).
Estrabão, um dos maiores geógrafos do mundo antigo, sustentava
alguns pontos de vista sobre a ciência geográfica:
A ciência da Geografia [...] é [...] da mesma forma que qualquer outra
ciência, uma preocupação do filósofo, sendo o acerto do meu ponto
de vista evidente por muitos motivos. Em primeiro lugar, os que nos
tempos primitivos aventuraram-se a tratar do assunto eram, a seu
modo, filósofos [...] em segundo lugar, o amplo conhecimento, que
somente torna possível empreender um trabalho sobre Geografia,
pertence unicamente ao homem que investigou tanto as coisas
humanas como divinas cujo conhecimento, dizem, constitui a
filosofia. E assim também a utilidade da Geografia a sua utilidade é
multifária, não apenas no tocante às atividades dos estadistas e
comandantes como também no que diz respeito ao conhecimento
tanto dos céus como das coisas na terra e no mar, animais, plantas,
frutos e tudo o mais que se pode ver em varias regiões [...] (LEBON,
1976, p. 12).
Para Sodré (1989, p. 18-19) o como negar que Estrabão e
Ptolomeu sistematizaram os conhecimentos geográficos da antiguidade. O primeiro
por ser mais viajante e historiador que geógrafo sintetizou em longa obra tais
conhecimentos. Por sua vez o segundo, voltava-se mais para a matemática. De fato
são valiosos os conhecimentos sobre a Geografia na antiguidade. Se por vezes
caminhava a passos lentos, ou com informações errôneas sobre a superfície
terrestre (e seus fenômenos) seja no sentido do dimensionamento, ou da
quantificação, resguardadas as restrições históricas, a compilação e acumulação
desses conhecimentos (saberes) definiram as etapas preliminares das ciências.
Importante destacar que os elementos geográficos, apareciam misturados, quando
não subordinados a outros. A Geografia ainda não era algo tão importante, era
preciso desvencilhar-se dos mitos, das lendas e deformações que escondiam em
seus rudimentos, o que havia de verdadeiro e duradouro.
Nos culos a seguir o aceleramento no ritmo do processo histórico,
a expansão dos descobrimentos, o aprofundamento da dialética entre os
descobrimentos e as invenções (SODRÉ, 1989, p. 21), a doutrina da igreja em
confronto com o pensamento grego, a ascensão das explorações portuguesas e
espanholas nas viagens a Índia e a América, trazem juntamente com o
Renascimento, uma retomada do pensamento geográfico (BROEK, 1976, p. 22-23).
O desenvolvimento de instrumentos náuticos (astrolábio e bússola) e o surgimento
de novos tipos de embarcações favoreceram significativamente a sociedade naquele
momento (ANDRADE, 1987, p. 35). Assim, era preciso reorganizar todo esse
conhecimento científico produzido, nesse sentido Bernardo Varênio, publica em
Amsterdã, em 1650, a obra Geographia Generalis (BROEK, 1976, p. 24).
Outra obra importante no contexto histórico geográfico é Introdução
à Geografia Universal, de Cluverius, publicada em 1626. Esta obra era dividida em
duas partes. Na primeira parte Cluverius resume os conhecimentos da Geografia
Matemática; por sua vez na segunda, efetua a descrição regional de diversos países
(SODRÉ, 1989, p. 23). Cumpre observar que a obra de Varênio não foi concluída,
mas é de significativa importância, ao ponto de Max Sorre considerá-lo um gênio.
Andrade (1987, p. 45) faz a seguinte observação sobre o autor e a obra Geographia
Generalis:
Varênio adotou de forma sintética a chamada Geografia Matemática
em que estuda a Terra como astro e procura explicar as relações
existentes entre este planeta e os outros astros, enveredando em
seguida pelos temas de Geografia Física, procurando explicar as
formas de relevo, a rede fluvial e as condições climáticas se
interinfluenciando, para chegar ao papel sociedade, do homem na
elaboração do espaço. Esta terceira parte foi a que sofreu uma
abordagem mais geral, menos aprofundada em face do seu
falecimento prematuro. Varênio o se limitou a descrever a
superfície da Terra, baseado na observação e informações
disponíveis, ele procurou explicar a origem dos fenômenos e das
formas que modelaram sua superfície. Da afirmativa de Sorre de
que ele tinha uma concepção genial, e o interesse de Isaac Newton
pela sua obra, a ponto de reimprimi-la em 1762. O grande valor de
Varênio resulta do fato de haver ele unido a Geografia Geral,
Matemática, à Geografia Descritiva, Humanista, Literária em uma
totalidade e de haver feito tanto a descrição como a interpretação
das formas e fenômenos descritos, indicando relações de causa e
efeito. Foi um precursor de Kant, que durante mais de vinte anos
ensinaria Geografia Física na Universidade de kroeninsberg, e do
próprio Humboldt, considerado o pai da ciência geográfica. A obra de
Varênio necessita ser mais divulgada e discutida pelos que fazem a
Geografia nos dias de hoje.
No século XVII o conhecimento geográfico ainda esparso e
interligado a outras ciências, já era numeroso e detinha uma certa profundidade.
Na astronomia Copérnico reformulou o sistema planetário, inovando com o sistema
heliocêntrico, colocando o sol como o centro do universo e admitindo que os
planetas giravam em torno dele, assim como os satélites giravam em torno dos
planetas, contestando a antiga visão de Ptolomeu de que a Terra era o centro do
universo (apoiado pela igreja). Os geólogos passaram a preocupar-se com a
estrutura da Terra e a formação de rochas. Montesquieu admite que o clima tinha
influência no modo de agir e pensar (ANDRADE, 1987, p. 44). Stené e John Ray
iniciam as tentativas para lançarem as primeiras bases, respectivamente, da
Geologia e Biologia (SODRÉ, 1989, p. 23). Para Moreira (1985, p. 18) “a Geografia
apresenta-se como uma ciência de síntese, participando de seu discurso os
processos produtivos como a administração da natureza e dos homens.”
A expansão do capitalismo nos séculos XVIII e XIX favoreceu o
desenvolvimento das ciências em geral e a Geografia em particular. Não dúvidas
que o capitalismo comercial a partir do século XV provocou à expansão da
navegação, tendo como consequência a descoberta de novos continentes e ilhas,
intensificando o comércio entre os povos. A Europa possuía os cleos civilizados
mais dinâmicos, e tinha maior controle tecnológico, estendendo seus domínios pelas
superfícies terrestres de fácil acesso as embarcações. O enriquecimento da
burguesia e sua influência crescente no governo, estimularam o desenvolver de
técnicas e pesquisas, visando racionalizar e maximizar a exploração dos recursos
naturais (ANDRADE, 1987, p. 46). Para Moraes e Costa (1984, p. 82-83) o
desenvolvimento do comércio intraeuropeu a partir de meados do século XV,
impulsionou a desintegração da antiga ordem feudal, eis que, uma transformação na
estrutura produtiva, implica mudanças futuras na estrutura social.
Não obstante a ascensão capitalista culminar na Revolução
Industrial. É preciso esclarecer que ao mesmo tempo em que a burguesia cria as
técnicas de que necessita, tamm arma-se ideologicamente. Sob esses auspícios,
a Geografia nasce como uma disciplina autônoma. Nesse sentido passa a esboçar,
suas linhas de pensamento e ao mesmo tempo afirmar-se e definir-se, compondo
contribuições de diversas origens. Uma dessas formas consiste nos estudos
marítimos, uma vez que antes as meras expedições e viagens de caráter botânico e
etnográfico passam a revestir um caráter científico. As expedições ao continente
Africano são sistemáticas, seja por mar ou por terra (SODRÉ, 1989, p. 24-25).
Ainda segundo Sodré (1989, p. 25) a extraordinária acumulação de
conhecimentos empíricos ou não, não eram frutos apenas das expedições científicas
ou mesmo das viagens desprovidas de interesse, mas do trabalho acadêmico,
organizado, produzido pelas academias. Na segunda metade do século XVIII as
ciências naturais, como a Física, a Química, a Biologia, a Botânica, a Zoologia, e a
Astronomia desenvolveram-se significativamente, causando repercussões na
Geografia. Começam os embates entre a ciência e a religião, as ideias e princípios
teleológicos começam a perder terreno (ANDRADE, 1987, p. 47). Para Moraes
(2002, p. 33) até o final do século XVIII o conhecimento geográfico não é
padronizado, não existe uma unidade e temática e muito menos uma continuidade
nas formulações. Segundo Lebon (1976, p. 20) a Cartografia entre os séculos XVI e
XIX fez mais progresso que a própria Geografia.
A sistematização do conhecimento geográfico somente ocorre no
início século XIX. A Geografia como um saber autônomo, passa a demandar de
certar condições históricas, que somente neste culo estarão suficientemente
maturadas. Tais pressupostos históricos da sistematização geográfica objetivam-se
no próprio processo de avanço e domínio das relações capitalistas. Além do
desenvolvimento das forças produtivas existem os pressupostos referindo-se a
evolução do pensamento. Assim, a correspondência no plano filosófico e científico
opera transformações ao nível econômico e político, implicando na valorização de
temas geográficos para reflexão (MORAES, 2002, p. 35).
Segundo Sodré (1989, p. 29-30) a Geografia no final do culo XVIII
reunia as condições necessárias para emancipar-se. Poderia sistematizar todo o seu
conhecimento por meio da composição de seus elementos, que estavam espalhados
nos mais diversos campos do conhecimento, embora esses conhecimentos, por
vezes pertenciam a outros domínios. O esclarecimento da natureza dos fenômenos
físicos observados em quase todas as partes da Terra, a catalogação de espécies,
proporcionava condições para uma descrição científica da superfície terrestre.
Entretanto dois pontos ainda dificultavam a Geografia alçar novos patamares, um
era a sua ligação com a História, e outro era a relação entre o homem e natureza.
Modernamente este último ponto se apresenta pela dicotomia entre a Geografia
Física e a Geografia Humana. É preciso mencionar que o fato da Geografia ser ao
mesmo tempo uma ciência da natureza e uma ciência da sociedade, isso a torna
complexa por demais.
Posteriormente, Kant trouxe significativas mudanças na Geografia
ao assegurar-lhe bases na estrutura filosófica da ciência contemporânea. Para Kant
o conhecimento pode ser organizado sob três aspectos: a) disposição dos fatos em
grupos, segundo o tipo de objeto; b) visualização das relações que se estabelecem
no decorrer dos tempos; c) o estudo dos elementos com suas associações no
espaço. Por esta formulação filosófica a Geografia ganhou estatus entre as ciências
e a opinião de Kant tem sido formulada e reformulada como justificação fundamental
da Geografia. Nos Estados Unidos, Richard Hartshorne é um expositor do sistema
Kantiano, inclusive com grande aceitação pelos geógrafos (BROEK, 1976, p. 25).
Segundo Moreira (1985, p. 23 a 25) “para Kant o conhecimento é
dado pelos sentidos, é portanto um conhecimento empírico.” De modo que este
conhecimento empírico oriundo da percepção pelos sentidos, revela o homem
(antropologia pragmática) num “sentido interno”, e revela a natureza (Geografia
Física) num “sentido externo.” A percepção orienta a experiência, e esta precisa ser
sistematizada. A Geografia no plano do espaço cabe esta sistematização. Para se
entender Kant na Geografia Física, é preciso relembrar que em sua época a
natureza “era concebida como uma massa de matéria e força, como uma natureza
dotada de vida e movimento.”
Para Broek (1976, p. 26) não resta dúvida que Kant proporcionou a
justificação filosófica da Geografia. Suas aulas deram origem a livros, embasadores
do desenvolvimento epistemológico da Geografia com Humboldt e Ritter, e, a partir
de Ritter, com Ratzel. Embora um pouco distante do sistema Kantiano, já que
Humboldt, apoiava na filosofia de Schelling (1775-1854) e Ritter na Filosofia da
história de Hegel (1770-1831). Tais precursores da Geografia Cssica não
romperam com a epistemologia geográfica de Kant, como consolidarão a noção
geográfica Kantiana do conhecimento empírico, de síntese espacial, bem como a de
espaço e tempo (MORAES, 1985, p. 25).
4.2 A GEOGRAFIA CLÁSSICA OU TRADICIONAL
No início do século XIX, também chamado o século das luzes, as
condições culturais, econômicas e políticas propiciaram as diretrizes intelectuais e
científicas que mudariam o pensamento do século XIX. É nesse momento da história
do homem que se consolida o domínio da burguesia e do modo de produção
capitalista. De igual forma o emprego de uma superestrutura ideológico-cultural,
consagrava a racionalidade humana sobre a natureza. “O homem empregando os
meios de que dispunha, procuraria dominar a natureza, e fazê-la produzir, de acordo
com suas metas e com os seus interesses.” O pensamento iluminista, de certo modo
levaria ao positivismo, estruturado por Augusto Conte. A preocupação com o
controle da natureza provocou uma expansão das ciências da observação e da
experimentação, do domínio da razão prática, nos dizeres de Kant (ANDRADE,
1987, p. 49).
De acordo com Moraes e Costa (1984, p. 49 a 51) o positivismo:
Preconizava uma compartimentação rígida das ciências, concebendo
domínios autonomizados no conhecimento científico (a ligação entre
eles sendo dada pelo “Filosofia Positiva” os fundamentos do
“método científico.” Tal visão se opõe a alguns dos princípios mais
elementares do materialismo histórico e dialético. [...] O materialismo
histórico dialético propõe, assim de forma clara, que os estudos
sobre segmentos específicos da realidade devem operar um corte
ontológico. Isto é, serão possíveis estudos específicos de objetos,
que possuam uma identidade própria (o que não implica
autonomização absoluta) e que se manifestem no real como
específicos.
Em meados do século XIX, as primeiras concepções de uma
Geografia sistematizada, aparecem na Alemanha nas obras de dois autores, ligados
a aristocracia. Alexandre Von Humboldt (1769-1859), conselheiro do rei da Prússia,
e Karl Ritter (1779-1859) tutor de uma família de banqueiros (MORAES, 2002, p.
47). De acordo com Moreira (1985, p. 27) Humboldt e Ritter, integram “uma geração
de cientistas e intelectuais que viveram o ambiente histórico de ascensão do
capitalismo alemão.” Muito embora tiveram vidas bem diversas, suas ideias
convergiam para os mesmos princípios (ANDRADE, 1987, P. 51). Para Broek (1976,
p. 26) “Humboldt e Ritter modelaram a substância da Geografia, dando-lhe uma
forma científica.” Assim, nasce a Geografia acadêmica, isto é, produzida nos centros
universitários e ensinada nas escolas (MOREIRA, 1985, p. 26).
Alexandre Von Humboldt foi um grande estudioso das ciências
naturais, sobretudo da botânica (ANDRADE, 1987, p. 52). Inspirado pelo desejo de
compreender a totalidade do universo (BROEK, 1976, p. 26) defendia o conceito de
unidade da natureza, e que a pesquisa científica tinha como objetivo desvendar a
conexão causal dos fenômenos (SODRÉ, 1989, p. 33). Em sua obra O Kosmos
procurou demonstrar o lugar da Terra no Universo e a sua natureza física (LEBON,
1976, p. 38). Humboldt não estava preocupado em formular princípios para uma
nova disciplina, de modo que, seus trabalhos não tinham conteúdo normativo, desta
forma entendia que a Geografia era a parte terrestre da ciência do Cosmos, ou seja,
como uma superfície de síntese de todos os conhecimentos relativos a Terra
(MORAES, 2002, p. 47).
Para Andrade (1987, p.52) as ideias centrais de Humboldt era
resultado da influência do racionalismo Francês do século XVIII, do idealismo
alemão e do projeto positivista. Por isso havia uma grande preocupação em formular
uma lei geral para explicação do mundo, dos povos, das categorias sociais e do
meio ambiente. Visando estabelecer leis sociais aceitava e defendia os
ensinamentos de Isaac Newton. Como naturalista procurava conhecer a natureza
física, para chegar a explicação da evolução da sociedade, não se preocupando
com as relações sociais. Para Humboldt a Geografia era uma disciplina sintética,
preocupada com a conexão dos elementos, e buscando por meio dessas conexões,
a causalidade existente na natureza. Em termos de métodos propõe o empirismo
raciocinado (MORAES, 2002, p. 47).
Carl Ritter, não era um explorador, mas sim um grande leitor e
excelente expositor. Baseando-se no idealismo de Shelling e no formalismo
neoplatônico, admitia que o todo era formado pela soma das partes, e que da soma
das partículas locais poderia formular leis gerais, válidas por toda superfície da terra.
Nesse sentido surge a formulação do Princípio da Geografia Geral ou da Analogia,
utilizado em sua vasta obra. Com relação as leis gerais teve dificuldades uma vez
que as leis sociais não se adequavam com as leis físico-naturais (ANDRADE, 1987,
p. 53). Os trabalhos de Ritter complementaram o de Humboldt, enfatizando a
experiência humana no contexto regional. Para Ritter a Terra seria a casa do
homem, todavia, julgava que a vontade divina teria criado a Terra como uma escola,
para que o homem pudesse sair da barbárie e evoluir para uma grandeza espiritual.
Ao misturar a Filosofia religiosa com investigação objetiva foi duramente criticado,
muito embora esse procedimento ainda fosse comum em sua época (BROEK, 1976,
p. 27).
Segundo Moraes (2002, p. 48-49) a obra de Ritter é explicitamente
metodológica. Em seu principal trabalho, nominado Geografia Comparada, nota-se
a proposição de uma nova Geografia. A formação de Ritter é bem distinta de
Humboldt, enquanto este é geógrafo e botânico, aquele tem como base a Filosofia e
a História. Ao definir um conceito sobre sistemas naturais, como uma área
delimitada de uma individualidade, Ritter ressalta que a Geografia deveria estudar
tais arranjos individuais, e inclusive compa-los. Isso porque cada arranjo abarca
um conjunto de elementos, representando uma totalidade, onde o homem seria
sempre o principal elemento. Nota-se que a Geografia de Ritter é um estudo dos
lugares e uma busca dessa individualidade. Em termos metodológicos Ritter reforça
a análise empírica.
Discute-se muito acerca das diferenças de formação, temperamento,
métodos e filosofias desses dois homens. Wooldridge e East (1967, p. 20) salienta
que:
As relações que mantiveram entre si, [...] viveram durante longos
anos na mesma cidade, vieram a ser submetidas a exame crítico.
Basta uma simples referência a isso, porquanto, na escala temporal,
as convergências de seus modos de pensar prevalecem sobre aquilo
em que divergiram. Ambos deixaram absorver-se pelas relações de
coerência entre os fenômenos biológicos e físicos da superfície da
Terra, como um e outro tiveram nítida consciência de que os
fenômenos humanos eram correlatos às condições físicas e
constituíam parte integrante e harmoniosa do quadro completo, que
no âmbito menor do mundo visto como um todo, quer na escala
maior dos continentes e suas regiões. [...] O propósito dos dois
consistiu em ver os fenômenos naturais (incluídos os humanos) em
seus agrupamentos ou contextos naturais, no propósito de perceber
as relações de causalidade entre eles existentes. Nessa posição
assenta, indubitavelmente, o princípio fundamental da Geografia,
como hoje a conhecemos.
Segundo Moraes (2002, p. 49-50) as obras destes dois autores
constituem a base da Geografia Clássica ou Tradicional. A maioria dos trabalhos
posteriores remetem as formulações de Humboldt e Ritter sejam para aceitá-las ou
refutá-las. É preciso esclarecer que apesar das diferenças entre a Geografia de
Ritter que é regional e antropocêntrica, e a de Humboldt que visa a Terra como um
todo, sem privilegiar o homem, alguns pontos coincidem para os geógrafos
posteriores, como fundamento de uma Geografia unitária. Assim, as contribuições
desempenhadas por ambos merecem ser ressaltadas.
No final do século XIX a Geografia ainda se revigora no seu
processo de sistematização, com as formulações de Friedrich Ratzel. As
formulações de Ratzel somente o compreensíveis por meio de uma análise da
época e da sociedade. Lembrando que enquanto Humboldt e Ritter vivenciaram o
ideal da unificação alemã, Ratzel vivencia a constituição real desse processo e suas
primeiras décadas (MORAES, 2002, p. 52). Segundo Lebon (1976, p. 39), Ratzel
tinha um raciocínio amplo, de modo que procurava compreender uma única ciência
da humanidade, de modo que abrangia a Filosofia da História, a Etnologia e a
Geografia. Para Moreira (1985, p. 31) “a Geografia ratzeliana é a ideologia do
império alemão, mas seu fundo é a ideologia comum a todo imperalismo. Assim
Ratzel retira de Spencer a noção de sociedade como organismo e a concepção
naturalista do desenvolvimento da sociedade humana. Dessa maneira, passa a
incorporá-las nos discursos geográficos de seus predecessores, assimilando estas
interconexões com os interesses do capitalismo alemão. Nesse sentido formulará
um discurso geográfico expondo a teoria do determinismo geográfico e a teoria do
espaço vital.
De forma sintética a concepção determinista parte dos postulados de
Darwin, pelo qual a evolução se processa pelas lutas entre as espécies, vencendo
as mais capazes de se adaptar ao meio natural. Tal concepção levou os geógrafos
ingleses e americanos ao determinismo declarado, uma vez que o homem era um
produto do meio. Em relação ao espaço vital, origina-se no fato que o progresso ou
decadência de um Estado, depende da sua capacidade de expansão ou redução do
território dominado (ANDRADE, 1987, p. 55). Para Ratzel (MOREIRA, 1985, p. 32) é
o homem em todos seus planos de existência que determina seu meio natural (teoria
do determinismo geográfico); como na luta das espécies pelo espaço, o homem se
organiza em Estados para os quais o espaço se torna uma fonte de vida (teoria do
espaço vital).
O livro denominado Antropogeografia fundamentos da aplicação
da Geografia à Historia, publicado em 1882 é a principal obra de Ratzel.
Considerada a obra que funda a Geografia Humana, defini como objeto geográfico o
estudo da influência que as condições naturais exercem sobre a humanidade. A
análise da relação entre o Estado e espaço é a característica principal de sua obra.
Para Ratzel o território é a base das condições de trabalho e existência de uma
sociedade. Em termos metodológicos sua obra não oferece muita significância.
Entretanto, mantém a Geografia como uma ciência empírica, cujos procedimentos
de análise seriam a observação e a descrição. A grande importância dessa obra
reside no fato que incorporou ao debate geográfico, os temas políticos e
econômicos, tendo o homem como foco de análise (MORAES, 2002, p. 55 a 60).
Em oposição às colocações de Ratzel, nasce a Escola Francesa de
Geografia, tendo como maior expoente Paul Vidal de La Blache (MORAES, 2002, p.
61). Coube a La Blache definir com clareza uma nova etapa da Geografia, e de
início ressalta que a terra não determina o comportamento do homem, apenas lhe
oferece oportunidades; a escolha pertence ao homem, eis uma citação de seu
trabalho:
Devemos partir da noção de que a terra é um reservatório que
contém energias adormecidas, cujas sementes foram plantadas pela
natureza, mas cujo uso depende do homem. É ele quem,
modelando-as à sua feição, demonstra sua individualidade. O
homem estabelece a ligação entre elementos díspares, colocando
uma organização significativa das forças em lugar dos efeitos
incoerentes da circunstância local. Desse modo, a região adquire
identidade e se distingue de outras, tornando-se no curso do tempo,
como uma medalha fundida à imagem de um povo (BROEK, 1976, p.
38).
Segundo Moreira (1985, p. 35) “La Blache personificará a escola
francesa, por espelhar em suas ideias melhor que qualquer de seus companheiros
as aspirações do Estado francês.Em toda a França, como que num processo de
expurgo, somente o pensamento geográfico lablachiano, seria utilizado. Eliseé
Reclus, naquele momento, era um dos expurgados sob a alegação que
personificava a Geografia Descritiva e Utilitária, algo que para a academia francesa
estava sendo superada com La Blache. Na Geografia francesa se mantém o
empirismo da Geografia alemã. Todavia, enquanto a escola alemã apoiava-se no
idealismo Kantiano com Humboldt e Ritter, redefinido a luz de Schelling e Hegel, e
no materialismo de Ratzel, a escola francesa apóia-se no funcionalismo, que se
absorve do positivismo. Durkheim (1858-1917), grande interlocutor de La Blache,
com quem sustentava produtivos debates acadêmicos, em sua obra todo de
Investigação Sociológica ressalta que os processos sociais são relações entre
coisas, compreendendo cada parte de um todo orgânico e harmônico. A sociedade é
um todo composto de partes, quando cada parte desempenha sua função, confere a
sociedade uma unidade solidária, estável e harmônica.
A corrente fundada por La Blache, nominada de possibilismo, trouxe
para a França o eixo da discussão temática, durante o primeiro quartel do século
XX. Para La Blache a Geografia deveria estudar os gêneros da vida, os motivos de
sua manutenção ou transformação, e sua difusão, com a formação dos domínios de
civilização. Em termos metodológicos sua proposta não rompeu com as
formulações de Ratzel, entretanto Vidal era mais relativista, negando a ideia de
causalidade e determinação, tinha um enfoque menos generalizador. O pensamento
positivista aproxima os dois autores, vinculando uma aceitação de metodologias de
pesquisa das ciências naturais. Entretanto Vidal hostilizando o pensamento abstrato
e o raciocínio especulativo, propõe o método empírico-indutivo, pelos quais se
formulam os juízos de valor, por meio da observação direta, considerando a
realidade como o mundo dos sentidos, limita-se a explicação aos elementos e
processos visíveis (MORAES, 2002, p. 68 a 72).
É preciso ressaltar que escola geográfica francesa, apesar das
divergências entre seus integrantes, tem como característica principal uma
preocupação regionalista, uma orientação ideográfica, uma posição política
conservadora, encoberta por uma neutralidade científica, e por considerar a
descrição algo importante, muito embora o menosprezasse a explicação
(ANDRADE, 1987, p. 74). A região para La Blache era a denominação de uma
unidade de análise geográfica, que poderia exprimir a forma que o homem se
organiza no espaço. A ideia de região propiciou a majoritária perspectiva de análise
do pensamento geográfico: a Geografia Regional considerada por muitos como o
principal desdobramento da proposta de La Blache (MORAES, 2002, p. 75-76).
Deixando de lado o continente europeu e cruzando o oceano, nos
Estados Unidos desenvolveu-se a Escola Geográfica Americana. Inicialmente com
dois geógrafos suíços que migraram para os Estados Unidos, Arnold Guyot e Louis
Agassiz, que desenvolveram estudos geomorfológicos e da Geografia Regional, de
acordo como os modelos germânicos. Com os estudos destes mestres a Geografia
americana conquistou um avanço em seu aspecto físico. Quanto a Geografia
Humana destacam-se duas escolas, a de Chicago, com Elen Semple e E.
Huntington, e a de Berkeley ou da Califórnia, com Carl Sauer. Entretanto o
teorizador da escola clássica norte-americana foi Richard Hartshorne, que
influenciado pelo pensamento de Hettner, procurou desenvolver reflexões sobre a
epistemologia, e sobre a natureza da Geografia como ciência (ANDRADE, 1987, p.
77-78).
A Geografia Racionalista proposta por Hartshorne embasada em
Hettner, traz consigo uma menor carga empirista, privilegiando o raciocínio dedutivo.
Isto ocorreu porque fundamentava-se no neokantismo de Rickert e Windelband. A
Geografia de Hettner é a ciência que estuda a diferenciação de áreas, isto é, a que
visa explicar o “por quê‟” e “em que” diferem a superfície terrestre, em outras
palavras, a Geografia seria o estudo das formas de interação dos elementos no
espaço terrestre. Dentre outros fatores as ideias de Hettner não floresceram em
virtude da fase áurea do possibilismo, todavia com o resgate de seus estudos por
Hartshorne, suas propostas passaram a ser discutidas (MORAES, 2002, p. 84-85).
Para Gomes (2003, p. 238 a 242) é preciso notar que Hartshorne em
sua obra The Nature of Geography, procura uma justificativa para a Geografia, na
origem desta disciplina. Isto significa dizer que o melhor caminho para a Geografia é
ditado pelo reconhecimento crítico de sua evolução. A natureza da Geografia se
exprime a partir de sua história. A sistematicidade e a objetividade do trabalho
geográfico para Hartshorne são elementos que possibilitam ultrapassar o nível
descritivo e alcançar novos patamares científicos. Em sua visão a Geografia deve
proceder a análise racional da realidade organizando as categorias gerais e as
tipologias funcionais explicativas. O conhecimento produzido por Hartshorne
representa a transição entre um saber clássico e uma Geografia Moderna.
Na medida em que a Geografia se afirmava como ciência no final do
século XIX, começaram a produzir no Brasil os primeiros textos geográficos com
uma abordagem científica, entretanto impressos no vernáculo francês. A França e a
Alemanha dominavam a produção geográfica, contudo os textos alemães não
encontraram respaldo no Brasil. Isso pode ser facilmente explicado pelo fato da
cultura francesa exercer naquele período uma certa influência junto às elites
brasileiras. Por sua vez a literatura americana, ainda em formação não era
exportada. O único autor americano que teve uma divulgação no meio geográfico,
até os fins da década de 30 no Brasil, foi William Morris Davis, com sua obra Ciclo
da Erosão” (PAZERA JR, 1988, p. 33).
De forma breve, no Brasil o ensino e a pesquisa de Geografia
institucionalizaram-se somente após a Revolução de 30, quando a burguesia e a
classe média exerciam maior influência sobre o governo. Faz se necessário
mencionar que nos grandes projetos da Geografia universal francesa, nos fins do
século XIX e início do século XX, o Brasil se fazia presente, como objeto de estudo,
dada sua importância e sua dimensão territorial (ANDRADE, 1987, p. 81-82). Em
1934 é fundada a Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras, na Universidade de São
Paulo, marco decisivo da influência da escola geográfica francesa. Pierre
Deffontaines e Pierre Monbeig foram convidados para ministrarem seus
ensinamentos na área das humanidades (PAZERA JR, 1988, p. 33). A criação do
Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), na década de 30 era a primeira
instituição a admitir a existência de profissionais de Geografia, não dedicados ao
ensino, mas à pesquisa, muito embora fornecesse diversos professores a
numerosas universidades. Tamm em 1934 surge a Associação dos Geógrafos
Brasileiros (AGB), organizada por Deffontaines (ANDRADE, 1987, p. 83).
No contexto histórico da Geografia como ciência, durante o período
entre guerras as correntes geográficas desenvolveram-se de forma segmentada
geograficamente. Esta segmentação é devida em grande parte as tensões nacionais
da época, as crises econômicas e as fraturas ideológicas. A dificuldade de
comunicação e diálogo o aparentemente as causas da dispersão geográfica das
escolas e círculos desta época. Os círculos de Viena, de Praga, a escola de
Frankfurt, de Cambridge, marcaram sua identidade científica desses anos.
Paradoxalmente, estas mesmas dificuldades e as perseguições que precederam a
Segunda Guerra, plantaram a semente de um novo cosmopolitismo (GOMES, 2003,
p. 249).
4.3 A GEOGRAFIA MODERNA
É sabido que as guerras de grandes proporções provocam grandes
transformações territoriais nos Estados partes envolvidos. A guerra de 1939/45
provocou a destruição de grandes cidades da Europa, dando ensejo à necessidade
de reconstrução. A política do tow and country planning, iniciada na Inglaterra,
juntamente com o desenvolvimento da política de aménagement du territoire, na
França e na Bélgica, procuravam dar ao mesmo tempo um planejamento com
dimensão histórica e geográfica. Histórica no sentido de projetar a direção natural de
um futuro crescimento, indicando as possibilidades existentes, assim como fazendo-
se um trabalho de prospectiva; quanto ao aspecto geográfico buscava-se indicar
como as atividades econômicas e o crescimento populacional se comportariam
pelos países, e as possibilidades de se estimular uma melhor distribuição, por meio
da realocação de instrias e da utilização agrícola do território (ANDRADE, 1987, p.
94).
Diante dessas novas perspectivas a Geografia não poderia ausentar
das transformações que estavam acontecendo naquele momento histórico em todos
os domínios do conhecimento científico (SANTOS, 1986, p. 39). Para Andrade
(1987, p. 96) a constatação desses fatos e a necessidade de participar da
reformulação científica e política da sociedade incitou os geógrafos a percorrem
novos caminhos visando atualizar os princípios gerais da Geografia Clássica e
Tradicional, visando o rompimento com ela, iniciando uma Nova Geografia. Santos
(1986, p. 40) ressalta que a utilização freqüente da terminologia Nova Geografia”,
queria caracterizar-se por não ser apenas diferente, mas tamm uma oposição, e
até mesmo uma contradição a Geografia Tradicional, que desse modo, sua
denominação não era tão inocente, seus idealizadores buscavam deixar claramente
seu distanciamento de uma Geografia ultrapassada, que não poderia ser
considerada uma Geografia.
A guisa de exemplo é preciso citar as palavras do professor Andrade
(1994, p. 23), em sua obra Uma Geografia para o Século XXI:
[...] o Pós-guerra deu margem a que se procurasse ultrapassar e, até
para alguns, eliminar aquela Geografia Descritiva e preocupada com
um relacionamento mais íntimo do homem com a natureza,
altamente influenciada pela antropologia e ligada à discussão do
determinismo e do ambientalismo, por uma Geografia com maior
impacto filosófico e ligada a posições conservadoras de um lado ou
revolucionárias de outro. Naturalmente que as conotações eram as
mais diversas e o radicalismo era maior ou menor, conforme as
posições e interesses de cada grupo; grupos neopositivas
procuraram destruir e renegar toda a experiência geográfica,
admitindo que geravam uma Geografia nova sem qualquer ligação
como passado e esqueciam os problemas mais delicados e difíceis
de serem solucionados, em nome de um desenvolvimento
completamente alienado. Por isso, trocaram as observações de
campo, a parte empírica e experimental da Geografia, por modelos
matemáticos-estatísticos com variáveis uniformes para todo o mundo
e para todos os tempos. Como afastavam da reflexão as
considerações sobre o meio ambiente e os impactos sociais do
desenvolvimento, eram agradáveis aos governos ditatoriais e
autoritários, e dispuseram de verbas e de apoio para os seus
estudos.
Segundo Gomes (2003, p. 254) “a visão sistêmica, a utilização de
modelos e a submissão à lógica matemática penetraram fortemente nas ciências
naturais e sociais a partir dos anos cinqüenta.” Salienta ainda que nesse contexto se
faz a passagem da Geografia Clássica para a Geografia dita Moderna. O artigo de
Schaefer de 1953 é a primeira manifestação de se conceber a ruptura da Geografia.
A sua crítica elaborada desenvolveu-se culminando com o que atualmente se
denomina revolução quantitativa. Todavia a revolução metodológica na Geografia
tinha iniciado muito mais cedo, com Christaller, nos anos trinta, no entanto passou
despercebida, devido ao contexto da época.
Nada obsta que se diga tamm que para a Geografia Moderna
viesse a ser formulada havia a necessidade de outras condições, diretamente
ligadas à evolução das ideias, ou seja, a discussão autônoma e unitária do
pensamento geográfico deveria ter o respaldo do pensamento filosófico e científico.
Assim, para a Geografia Moderna eclodir seria necessário uma rie de
pressupostos intelectuais. A existência dos pressupostos materiais não fornece
subsídios para uma explanação geográfica, sendo necessário um arcabouço lógico
filosófico, que propiciasse a formulação das postulações. Neste caso, para realizar
tais postulados, não basta apenas o desenvolvimento histórico, mas um postulado
intelectual, entretanto a relação dialética (base material + base intelectual)
manifesta-se de forma mediatizada, diferenciada, dada as particularidades do
desenvolvimento de cada país (MORAES, 1989, p. 20).
Aos olhos de Moraes e Costa (1984, p. 18) a Geografia Moderna se
desenvolve dentro de paradigmas positivistas. Muito embora não tendo uma
orientação metodológica por berço e apesar dos apelos intuicionistas no passar da
História, é o positivismo que domina a evolução da pesquisa geográfica no século
XX. O ponto de inflexão da Geografia é a crítica do positivismo. Nesse sentido, essa
ciência acompanha o movimento da realidade e do conhecimento, que vem abalar a
dominância desse método no trabalho científico. A Geografia é uma ciência
retardatária nesse processo vivenciado por outras ciências como a Física e a
Sociologia. A renovação da Geografia aparece como um rompimento com o
positivismo, ensejando a crise do pensamento geográfico (possibilismo-
determinismo). A partir da década de 50 começam a surgir críticas mais cerradas às
postulações tradicionais, fazendo-se necessário uma dissecação minuciosa das
propostas tradicionais, tanto ao nível epistemológico quanto aos seus fundamentos
sociais.
Segundo Camargo (2008, p. 99) o novo estilo capitalismo pós-guerra
apresenta novas formas geográficas que retratam a difusão de novas culturas,
industrialização, urbanização, entre outras relações espaciais, como ferrovias,
rodovias, modernização no campo e novos espaços urbanos. Oportuno mencionar
ainda que, na década de 50 o movimento geral do capitalismo impôs teorias aos
geógrafos dos países da periferia, como por exemplo, a visão espacial imposta pelos
norte-americanos aos brasileiros, descartando-se a visão de organização de espaço
da escola francesa (GONÇALVES, 1982, p. 109). Corrêa (2002) apud Camargo
(2008, p. 99) salienta que essa nova dinâmica do capitalismo, inviabilizou antigos
paradigmas da Geografia (possibilismo, determinismo e método regional), de modo
que a Nova Geografia, que surgiu nacada de 50, é ideologicamente necessária à
expansão do capitalismo, escamoteando as antigas transformações da Geografia
fixada e trazendo a ideia de desenvolvimento a curto e médio prazo.
Por volta da cada de 50, entre alguns geógrafos franceses, de
formação marxista, vislumbrava-se uma ligeira reorientação do pensamento
geográfico; dentre eles Pierre George, que romperá com o marxismo em pleno
processo de renovação da Geografia. Em linhas gerais o processo de reorientação
do pensamento geográfico caminha para um maior ecletismo, misturando-se
elementos. Pierre George introduz uma nova organização geográfica do espaço
mundial, pela primeira vez a divisão natural em continentes, base do conhecimento
geográfico durante séculos é substituída por um novo alicerce, os sistemas
econômicos. Por esse novo sistema o mundo se divide em: sistema capitalista e
sistema socialista. Nessa nova sistemática a Geografia de cada país, organizar-se-á
de acordo com seu sistema econômico. Nesse ponto, a história determina o modo
das relações estabelecidas entre o homem e o seu meio natural. Com Yves Lacoste,
discípulo de P. George a ruptura caminha mais um passo, não se distingue mais o
homem pelo seu ambiente e sim pela sua condição econômica e social de existência
(MOREIRA, 1985, p. 50 a 52).
Gomes (2003, p. 274) pondera que o progresso inicial dos anos 60
perdia seu impacto e as numerosas promessas contidas no discurso da Nova
Geografia começavam a mostrar seus limites. Entretanto para Santos (1986, p. 42).
o debate não se interrompeu, algumas vozes já discutiam sobre o destino da
Geografia mesmo antes dos últimos anos da década de 60. Assim, diante dos
debates e a existência da Nova Geografia era preciso conhecer as suas finalidades,
sua ótica e seus métodos, o seu objeto, ou melhor, dizendo, os seus objetivos, para
depois apreciar as suas debilidades. A Nova Geografia manifestava-se, sobretudo
por meio da quantificação, muito embora tenha utilizado como instrumento, os
modelos, as teorias dos sistemas (ecossistemas incluídos), a tese da difusão das
inovações, as noções de percepção e de comportamento e, da mesma maneira, as
múltiplas formas de valorização do empírico e do ideológico.
Para Moraes (2002, p. 93) na década de sessenta encontra-se as
incertezas e os questionamentos difundidos por vários pontos. Entretanto a partir de
1970, instala-se uma nova fase no contexto disciplinar, buscando novas discussões
e caminhos metodológicos até então não trilhados, implicando numa dispersão de
perspectivas e na perda da unidade contida na Geografia Tradicional, induzindo um
pensamento crítico frente ao passado da disciplina e seus horizontes futuros. É a
possibilidade do novo, de uma Geografia mais generosa. É preciso ter em mente
que as divergências no movimento de renovação advêm das inúmeras metodologias
de interpretação e de posicionamento dos autores que a compõem. A busca do novo
gerou propostas antagônicas e perspectivas excludentes. A Geografia renovada
abrange uma variedade de concepções. Por mais difícil que seja, é possível agrupá-
las, em função dos seus propósitos, e de seus posicionamentos políticos.
Para fazer uma análise da evolução da Geografia e do pensamento
geográfico, nos últimos trinta anos, é preciso fazer uma classificação, de certo modo
um tanto arbitrária, como toda classificação (ANDRADE, 1987, p. 106). De acordo
com Moraes (2002, p. 99) pode se dividir o movimento da renovação geográfica em
duas vertentes, a Crítica e a Pragmática, ambas com polaridades ideológicas em
suas propostas. Para Andrade (1987, p. 106) é possível dividir em quatro correntes
teórico-metodológicas: a corrente Teórico-quantitativista, a corrente da Geografia do
Comportamento e da Percepção, a corrente Ecologista e a Corrente Radical.
É sabido que a base da concepção de mundo do autor é decorrente
de posicionamentos sociais e/ou engajamento político. As correntes e/ou vertentes
são embasadas nas perspectivas ideológicas que alimentam e pelos interesses
concretos que a servem. Dentro do fundamento ético de cada uma, encontram-se
propostas e procedimentos ímpares. Em todas as vertentes aparecem posturas
filosóficas, logo, tão diversificados serão os fundamentos metodológicos. Muito
embora a unidade ético-política não implica diretamente com os métodos (MORAES,
2002, p. 99). Na presente dissertação abordar-se-á em breves linhas de forma clara
e suscinta o posicionamento do professor Carlos Robert de Moraes, por ser mais
didática a abordagem.
Para o professor Moraes (2002, p. 100 a 106) a Geografia
Pragmática ataca o caráter não prático da Geografia Tradicional, seus autores
propõem uma ótica prospectiva, um conhecimento voltado para o futuro, que
instrumentalize uma Geografia aplicada, visando basicamente uma renovação
metodológica. A nomenclatura pragmática visa ser planejada, utilitária. O
planejamento é uma nova função imposta as ciências humanas pelas classes
dominantes; A Geografia Pragmática, busca contemporaneizar esse novo campo do
conhecimento (as ciências humanas), sem romper com os conteúdos de classe,
substanciando-se por algumas propostas diferenciadas, dentre as quais: a Geografia
Quantitativa, a Geografia Sistêmica ou Modelística e a Geografia da Percepção ou
Comportamental.
A corrente Teórico-quantitativista inicialmente apresentou-se como
uma revolucionária, negando as origens da Geografia. Desenvolvida inicialmente na
Suécia, nos Estados Unidos e na Grã-Bretanha, com forte repercussão na extinta
União Soviética e na Polônia. Na Alemanha e na França tiveram forte resistência.
Seus grandes expoentes são Torsten Hargestrand na Suécia; Edward Ulmann nos
Estados Unidos; Peter Haggert, Michael Chisholm e Richard Chorley na Inglaterra;
na Alemanha e na França embasados em estudos de Hettner da escola
Lablachiana, destaca-se Pinchemel. Destaca-se na Geografia Quantitativista a
utilização em larga escala dos modelos matemáticos-estatísticos (ANDRADE, 1987,
p. 107 a 109).
Para Ian Burton, a revolução quantitativista tornou a Geografia uma
ciência respeitável. Os métodos matemáticos eram considerados os mais precisos,
datados de um valor preciso. A combinação de análises sistêmicas, os modelos e o
uso da estatística seria uma peça fundamental. A utilização da análise multifatorial,
deveria resolver, de uma vez por todas as questões complexas pela multiplicidade
de variáveis e a fragilidade do trabalho interdisciplinar. Desse modo, o trabalho
quantitativo favoreceria apreender as diferenciações e contabilizá-las, capacitando
para se construir modelos não apenas descritivos, mas tamm prospectivos, de
modo que, a previsão obtida, não seria apenas intuitiva ou sentimental, mas
sistemática (SANTOS, 1986, p. 45-46). Segundo Moraes (2002, p. 103) para os
afiliados dessa corrente o avanço da estatística e da computação propiciam uma
explicação geográfica.
Segundo Gomes (2003, p. 261) a revolução quantitativa para Burton
é um momento impar na história da Geografia, significando a construção de um
verdadeiro campo teórico de investigação. A partir da Lógica e da Matemática, a
Geografia pode desenvolver métodos de verificação e de previsão, causando
imensas mudanças na natureza da Geografia. A obra de Harvey, The Explanation in
Geography é um referencial fundamental para o desenvolvimento da teoria analítica
na Geografia. Tendo a revolução ocorrida, Harvey, tinha como objetivo apreciar as
tendências gerais das ciências e suas aplicações na Geografia.
Outra forma da subjetivação da Geografia Pragmática é oriunda da
teoria dos sistemas, também denominada Geografia Sistêmica ou Modelística.
Expressa nas considerações de Brian Berri propõe o uso de modelos de
representação e explicação, no trato dos temas geográficos. Esta proposta articula-
se com a anterior, mas ultrapassa-a, ao conceber um nível mais genérico de análise.
Os modelos seriam representados das estruturas fundamentais da organização do
espaço, assim as articulações tidas como constantes em todos os casos singulares.
Tais modelos atuariam na pesquisa como hipóteses lógicas dadas aprioristicamente,
sendo constituídos de dados constantes ou fatores e de elementos agregados ou
variáveis (MORAES, 2002, p. 103-104).
Segundo Santos (1986, p. 55 a 57) esta teoria também é utilizada
pelas ciências humanas, pelo menos vinte anos, sendo a Geografia a última a
utilizar-se desse método. Considerando o espaço como um sistema, independente
de sua dimensão, haveria entre os diferentes espaços e os sistemas correlatos uma
espécie de hierarquização, contribuindo para explicar as localizações e polarizações.
Por este esquema será possível apreender as articulações do espaço e reconhecer
a sua própria natureza. Para Moraes (2002, p. 105) os modelos tentam expressar
uma grande quantidade de situações, sendo aplicáveis em qualquer ponto da
superfície. O modelo apóia-se na ideia que os fenômenos se manifestam como
sistemas, ou seja, relações de partes articuladas por fluxos. O modelo visa
expressar a estrutura sistêmica, em Geografia o geossistema, ou o ecossistema, os
sistemas de cidades, ou a organização regional como subsistema do sistema.
Um dos maiores equívocos sugeridos pela aplicação da modelística
na Geografia vem das práticas mecânicas, pelas quais transformam um conceito em
categoria metafísica. Não há dúvidas que um modelo representa uma realidade, cuja
aplicação se justifica para conhecê-la, ou seja, como uma hipótese de trabalho
sujeita a verificação. Entretanto é preciso esclarecer que conceito e modelo devem
permanentemente ser revistos e refeitos, isso pode ser feito levando-se em conta
que a teoria e a realidade estão em permanente processo de evolução. Quando se
esquece deste detalhe e aplica um modelo congelado, para tentar explicar uma
realidade em movimento, tem-se uma violência metodológica pura e simples, cuja
aplicação não se traduz na realidade científica, mas sim ao erro (SANTOS, 1986, p.
65-66).
Quanto a Geografia da Percepção ou Comportamental, caberia
mencionar que dentro das objetivações da Geografia Pragmática, é a que mais se
aproxima da Psicologia, buscando entender o homem e o espaço por ele vivenciado,
a sua consciência em relação ao meio, as suas reações frente aos elementos da
natureza, e como esse processo reflete na ação sobre o espaço. Os seguidores
desta corrente tentam explicar a valorização subjetiva do território, a consciência do
espaço vivenciado, o comportamento em relação ao meio. Estes estudos fazem uso
do instrumental desenvolvido pela Psicologia, particularmente as teorias
behavioristas. Suas pesquisas abordam temáticas, tais como: o comportamento do
homem urbano, em relação ao espaço de lazer; a influência das formas na produção
do trabalho; a relação sociedade-natureza, expressa nas organizações dos parques,
as atitudes do homem frente as novas técnicas de plantio, as concepções e formas
de representação do espaço numa sociedade, dentre outros. Frisa-se que esta é
uma perspectiva muito recente (MORAES, 2002, p. 106).
Para Santos (1986, p. 67-68) a Geografia da Percepção ou do
Comportamento é uma das tendências da Geografia. Fundamenta-se no fato de que
cada indivíduo tem uma maneira de apreender e de avaliar o espaço. O espaço
social passa a ser definido pelas peculiaridades que lhe são familiares. Por esse
sentido a Geografia da Percepção ela é mais profunda, uma vez que apóia-se no
princípio de uma escala espacial própria de cada indivíduo e também de uma
significação do espaço muito particular para cada homem. De certo modo isto tem
implicações nas interpretações de funcionamento e de organização do próprio
espaço. Esta tendência de certa forma representa uma ruptura com os
economicismo e na forma de restituição dos valores individuais.
Para Andrade (1987, p. 113) faz se necessário mencionar que:
As ideias centrais, defendidas por numerosos geógrafos do mundo
anglo-saxão, como David Lowenthal, Yi-Fi-Tuan e Anne Buttimer,
entre outros, tiveram repercussões no Brasil, onde a professora Livia
de Oliveira, traduzindo a obra de Yu-Fi-Tuan, tornou-se a maior
defensora dos princípios da Geografia da Percepção. A discussão
suscitada no mundo dos geógrafos tomou grande impulso, havendo
críticas que condenavam as ligações estabelecidas entre o
behavioralismo e o behaviorismo admitindo-se que o primeiro
“indica um movimento nas ciências sociais que procura tomar o lugar
das teorias tradicionais sobre as relações homem/ambiente, com
novas versões que reconhecem explicitamente as verdadeiras
complexidades do comportamento humano,” enquanto o
behaviorismo foi uma escola reducionista e de Psicologia que
constitui precisamente o tipo de teoria que o behavioralismo visa
substituir.” Os radicais, sobretudo os neomarxistas, combatem a
Geografia da Percepção alegando que ela foge a análise da
realidade e conduz à reflexão a teorias alienadas e comprometidas
com o psicologismo. Assim, sendo profundamente subjetivista, eles
levam a uma balcanização, à atomização que dificulta qualquer ação
social. Chegam a admitir que, sendo neodarwinianos, facilitam a
ascensão das ditaduras de direita e das filosofias mais agressivas.
Livia de Oliveira (1977) apud Santos (1986, p. 69) afirma que o se
deve confundir percepção e sensação. Alias, é preciso acrescentar que não se deve
confundir uma ou outra com a realidade própria do objeto experimentado ou
percebido. Em suma para Oliveira (1977) o conhecimento do mundo físico é tanto
perceptivo quanto representativo. Para Santos (1986, p. 70-71) as bases essenciais
da Geografia do Comportamento são basicamente duas: a) os comportamentos
individuais são o resultado de volições e decisões pessoais, individuais; e b) são os
comportamentos pessoais que contribuem para modelar o espaço. Existem praxis
individuais e práxis sociais. Ora, o espaço por suas características e por seu
funcionamento, pelo que oferece a alguns e recusa a outros é o resultado da práxis
coletiva que reproduz as relações sociais.
A segunda vertente do movimento de renovação do pensamento
geográfico agrupa-se num conjunto de propostas a que pode denominar Geografia
Crítica. Tal denominação advém de uma postura crítica, frente a Geografia existente,
seja ela a Tradicional ou a Pragmática, em que num certo momento se dará o
rompimento com o pensamento anterior, frente à ordem existente. Os autores da
Geografia Crítica se posicionam por uma transformação da realidade social,
instrumentalizando o seu saber como uma arma desse processo, na busca de uma
Geografia mais militante e com uma sociedade mais justa. Em uma avaliação
profunda das razões da crise, vão além de um questionamento acadêmico,
buscando as raízes sociais (MORAES, 2002, p. 112-113).
A Geografia Crítica ou Radical não apresenta uma uniformidade de
pensamento, e muito menos forma propriamente uma escola. O fato de se
denominarem radicais é devido ao fato de aprofundarem nas investigações para
descobrirem as causas dos problemas, e o fato de serem críticos justificam-se pelos
compromissos ideológicos, sem procurarem esconder-se sob falsa neutralidade.
Nessa corrente tem grandes subdivisões, como a corrente formada por geógrafos
não-marxistas, geógrafos de formação marxista e geógrafos com formação
anarquista (ANDRADE, 1986, p. 122-123). O marco do pensamento crítico é o
lançamento da revista Hérodote, lançada por Yves Lacoste em 1976, na França. O
essencial da crítica de Lacoste diz respeito à Escola francesa de Geografia. Para
esta corrente uma das formas mais importantes da Geografia é a geopolítica,
segundo o qual a disciplina geográfica constitui-se fundamentalmente em torno da
geopolítica, e durante todo o século XIX, a orientação militar foi predominante. A
geopolítica estava presente em Humboldt, da mesma forma que nas obras de
Ratzel e Reclus (GOMES, 2003, p. 285 a 288).
Lacoste é muito incisivo ao colocar a Geografia como instrumento de
dominação da burguesia, dotada de alto potencial prático e ideológico. Fazendo uma
análise dessa afirmativa, percebe-se que Lacoste propõe uma Geografia como mais
um elemento de superação da ordem capitalista. As raízes da Geografia Crítica
situam-se na ala mais progressista da Geografia regional francesa, que aos poucos
vai se interando dos processos econômicos e sociais, no direcionamento da
organização do espaço. Jean Dresch é um dos que aparece nesse movimento como
expoente de um discurso crítico, todavia é com Pierre George que mais se destaca
nesse movimento. O grande mérito de P. George é a introdução de alguns conceitos
marxistas na discussão geográfica, assim como a tentativa de conciliação da
metodologia de análise regional com o instrumental conceitual do materialismo
histórico, propiciando a discussão das relações de produção, de trabalho, de ação
do capital, da força produtiva, etc. (MORAES, 2002, p. 115 a 119).
O espaço geográfico é a materialidade do trabalho. O processo do
trabalho implica uma certa organização, porque a produção dos meios de existência
dos homens tem que se repetir indefinidamente. Assim, como a máquina o espaço é
condição de reprodução (MOREIRA, 1985, p. 85-86). Segundo Santos (1987, p. 91-
92) os geógrafos às vezes silenciam sobre o espaço. Em sua frase celebre a
Geografia é a vva do espaço” demonstra que a base do ensino e pesquisa da
Geografia é a História dos historiadores, a natureza e a Economia neoclássica, que
por vezes substitui o espaço real. Por muitas vezes se discute o que é Geografia,
mas não se discute espaço como sendo o seu objeto, o seu conteúdo. É preciso
definir o que é espaço para se descobrir o que é Geografia.
Milton Santos foi um dos críticos com propostas mais bem
elaboradas da Geografia Crítica, exemplificando de forma clara a postura política e o
posicionamento social que a caracterizam. As propostas de Milton Santos convivem
com outras perspectivas que lhe são diferenciadas e por vezes antagônicas em
alguns pontos. De certo modo isso induz a outra questão, a da dialética entre
unidade e diversidade, no interior do pensamento geográfico crítico. Nesse sentido a
Geografia Crítica, obedecendo objetivos e princípios comuns, convive com
propostas divergentes. Por sua vez, a unidade da Geografia Crítica, manifesta-se na
oposição de uma realidade sócio-espacial contraditória e injusta, fazendo do
conhecimento uma arma de combate face a situação existe. Ademais a Geografia
Crítica tem uma unidade de propósitos, dado seu posicionamento social, sua
concepção de Ciência, e por uma aceitação plena e explícita do conteúdo político do
discurso geográfico (MORAES, 2002, p. 126).
5 A PROPEDÊUTICA DO DIREITO AMBIENTAL
Discorrer sobre o Direito Ambiental o é uma tarefa simples, pois a
sua imensidão agrega diversos temas dos mais variados assuntos, que em apenas
uma apresentação, necessariamente não seria capaz de integralmente expô-lo. O
presente capítulo alinhando-se a este pensamento, pontuará inicialmente o contexto
introdutório desta ciência, em processo de evolução, e, por vezes, carente de uma
maior sistematização pela doutrina e pela jurisprudência. É de fundamental
importância tamm que se consiga estabelecer uma adequada definição sobre o
Direito Ambiental. Demonstrando coerência, far-se-á a exposição dos princípios que
informam o Direito do ambiente. Esta providência, ademais, é inafastável porque os
princípios fazem, às vezes, de verdadeiras ferramentas hermenêuticas,
indispensáveis para a compreensão normativa.
Apraz-me dizer que a pesquisa realizada, visa trazer luz e incentivo
ao enfoque doutrinário do Direito Ambiental brasileiro.
5.1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS
A partir de 1960 a ocorrência de alguns grandes acidentes alertou a
humanidade para a magnitude das agressões a natureza e suas repercussões sobre
a vida. Ainda nos anos 60, foi publicado o livro Silent Spring (Primavera
Silenciosa), de autoria de Rachel Carson que, chamou a atenção para a questão
ambiental. Nesta obra a autora procurava demonstrar como seria a primavera sem o
canto dos pássaros, exterminados pelo uso do diclorodifeniltricloretano DDT
(MOURA, 1998, p. 01-02). Para Dias (2006, p. 74) com a publicação do trabalho-
denúncia de Carson, a temática ambiental passaria a fazer parte das inquietações
políticas internacionais, e o movimento ambientalista mundial iria tomar um novo
impulso, promovendo uma série de eventos que formariam a sua história.
No final dos anos 60 o Estado social entra em crise. Os defeitos da
sociedade afluente parecem ter ficado evidentes naquela época, notadamente em
razão das conseqüências ambientais do modelo keynesiano de produção e o
surgimento da denominada crise do petróleo nos anos 70, a seu turno, obrigou a
uma tomada generalizada de consciência dos limites do crescimento econômico e
da esgotabilidade dos recursos naturais. Desse modo, verifica-se que o foi por
acaso mas fruto de um processo amplo e cumulativo de mudança econômicas,
sociais e políticas o surgimento, nos anos 60 e 70, de organizações o-
governamentais ligadas à questão ambiental. Nota-se que estas organizações não-
governamentais surgem, com ideário renovado. As preocupações preservacionistas
e conservacionistas de cunho estético e científico que dominaram os movimentos
existentes em épocas anteriores se acresciam as preocupações sociais. O
ambientalismo trazido pelas ONGs era o resultado de uma significativa mudança de
valores na sociedade civil, assim como na global, a busca de substanciais
transformações na economia, nos modos de vida e no próprio comportamento
reprodutivo da sociedade (DUARTE, 2003, p. 41).
Ainda segundo Duarte (2003, p. 41) pode-se dizer que o período de
1962 a 1970 confirma a denominada Revolução Ambientalista, caracterizada pela
crescente efervescência de um movimento destinado a implementar mudanças para
uma sociedade global aparentemente propensa à destruição. As preocupações
iniciais de alguns cientistas, administradores e grupos conservacionistas floresceram
num fervente movimento de massas que varreu o mundo ocidental industrializado,
notadamente nos Estados Unidos. Esse movimento, entendido como o novo
ambientalismo, passou a adquirir um caráter mais dinâmico, mais sensível, com uma
base mais ampla, com um maior apoio público e centrado basicamente na
preocupação com a sobrevivência da humanidade.
Em uma análise sociológica da questão ambiental, numa perspectiva
mundial, verifica-se importantes fatores que explicam a ascensão do ambientalismo
na década de 1970, dentre eles podendo-se destacar em primeiro lugar as
preocupações com as partículas radioativas resultantes de uma eventual explosão
nuclear (remetendo-se aos tempos da Guerra Fria), o envenenamento com
pesticidas, o aumento da população, a poluição atmosférica urbana, e o
conhecimento concernente aos impactos de eventos como esses. Em segundo
lugar, a fusão da Ecologia e da Ética, unindo a perspectiva teórica, e não obstante,
dinâmica, a um conteúdo moral. E, por último o aumento da força política do
movimento ambiental, seja em decorrência do incremento da autoridade científica da
Ecologia como Ciência, seja pela perspectiva holística própria da Ecologia que
acabou atraindo uma variedade bastante eclética de simpatizantes, o que propiciou
a divulgação das informações a toda a sociedade, num momento em que a
comunicação de massa recebia um grande incremento por conta das inovações
tecnológicas que se tornavam acessíveis (HANNIGAN, 1987, p. 156 a 158).
Segundo Moura (1998, p. 03) a década de 70 caracteriza-se pelo
aumento das atividades de regulamentação e controle ambiental. Com a
Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente, realizada em junho de
1972, em Estocolmo, na Suécia, o meio ambiente transformou-se em uma questão
de relevância internacional. Com a presença de 113 países a Conferência reuniu
tanto os países desenvolvidos quantos aqueles em desenvolvimento evidenciando-
se a diferença na visão ambiental; os desenvolvidos (ricos) achavam que deveriam
ser realizados controles internacionais rígidos para reduzir a poluição que atingia
níveis alarmantes, em contrapartida os em desenvolvimento (pobres) não aceitavam
esse controle por interpretá-lo como um freio ao seu desenvolvimento. Essa foi, por
sinal, a posição inicial do Brasil, que não se importaria em degradar o meio ambiente
para manter seu crescimento.
Segundo Marcelo Pereira de Melo (1998, p. 89), a confrontação
entre crescimento e proteção ao meio ambiente, reporta o seguinte fato:
No, Brasil a disposição do governo militar de não submeter o projeto
nacionalista e desenvolvimentista posto em curso com o apoio das
elites locais à política ambiental do país pode ser ilustrada com dois
decretos do general Ernesto Geisel. O primeiro deles, o Decreto-lei
1.413, de 14.10.1975, cujo objetivo em seu artigo 2º, afirmava o
seguinte: “Compete exclusivamente ao Poder Executivo Federal, nos
casos de inobservância do disposto no art. 1º deste Decreto-lei,
determinar ou cancelar a suspensão do funcionamento de
estabelecimento industrial cuja atividade seja considerada de alto
interesse do desenvolvimento e da segurança nacional.”
O outro decreto, 76.389, de 3 de outubro do mesmo ano, reafirmava
a competência exclusiva do Poder Executivo Federal para determinar
ou cancelar a suspensão do funcionamento de qualquer
estabelecimento industrial no país por motivos de poluição nos
seguintes termos, conforme seu artigo : “No estabelecimento de
critérios, normas e padrões (de poluição industrial) será levado a
capacidade autodepuradora da água, do ar, e do solo, bem como a
necessidade de não obstar indevidamente o desenvolvimento
econômico e social do país.”
Verifica-se assim claramente o conflito entre crescimento econômico
e a proteção do meio ambiente, e mais, a falta de disposição do governo brasileiro
para a implementação de políticas que efetivamente levassem à proteção das
condições ambientais. O modelo nacional de crescimento econômico deveria ser
mantido sem restrições por parte de uma política ambiental, política essa criada a
partir da pressão externa. De fato, as iniciativas legislativas e institucionais adotadas
no Brasil a partir da Conferência de Estocolmo tiveram por impulso o fator exógeno,
atribuído pelo grande peso político que os países desenvolvidos impuseram a
discussão sobre a proteção do meio ambiente (MODÉ, 2006, p. 23).
Mister se faz ressaltar que a Declaração sobre o Meio Ambiente
Humano, constante de 26 princípios e um plano de ação com 109 recomendações,
deu origem ao chamado Espírito de Estocolmo uma preocupação com a
degradação da biosfera. Registre-se ainda que em nível internacional a Declaração
era o primeiro grande passo dado, para consagrar a importância do meio ambiente
para o homem e assegurar a tutela jurídica do meio ambiente. A partir dessa
Declaração, começa haver aceitação dos princípios pelas nações em geral e, desde
então, o espírito não cessou de evoluir, mediante assinatura de acordos,
protocolos, além de convenções para a proteção internacional do meio ambiente
(LANFREDI, 2002, p. 71).
Dentre tantos encontros promovidos, a Conferência de Estocolmo
constituiu um marco histórico decisivo para a busca das soluções dos problemas
ambientais. Naquele momento decidiu-se que seriam necessárias mudanças
profundas nos modelos de desenvolvimento, nos hábitos e comportamentos dos
indivíduos e da sociedade, e isso somente poderia ser atingido por meio da
educação. Entretanto reconheceu-se na época, que a educação então vigente, pelas
suas características de rigidez e distanciamento das realidades da sociedade, e até
pela situação por que passava em todo o mundo, não seria capaz de promover as
mudanças necessárias (DIAS, 2006, p. 74).
Assim, diante dessa realidade, o Direito, como instrumento de
organização que procura o maior bem-estar da coletividade, evidentemente não
pode ser alheio a complexa problemática ambiental, e nesse sentido conclama
novos instrumentos que permitam superar o tradicional antagonismo que tem
existido desde longa data entre as atividades econômicas e o meio ambiente. Nesse
sentido, o Direito deve, portanto, propiciar um desenvolvimento sustentável que
garanta um meio ambiente ecologicamente equilibrado, direito humano este da
terceira geração, que se constitui como um dos pressupostos indispensáveis para
uma vida digna (MONTEIRO, 2008, p. 258).
5.2 O DIREITO AMBIENTAL SISTEMATIZADO
O Direito é uma ciência complexa que se estrutura sobre uma
grande diversidade de bases. Diferentemente do que pensa o leigo, o Direito não se
confunde com as normas positivadas na legislação. Estas formam, apenas e tão
somente, uma parte da ordem jurídica, em sistemas como o adotado no Brasil, cuja
tradição se filia ao modelo romano germânico, a norma escrita é importantíssima e,
não seria exagerado afirmar, se constitui no eixo central ao redor do qual os demais
elementos constitutivos da ordem jurídica gravitam (ANTUNES, 2005, p. 24). É
preciso esclarecer que não coube ao Direito a primazia do estudo do meio ambiente;
muito pelo contrário, veio a reboque de outras Ciências e disciplinas. Entretanto,
coube ao Direito, a responsabilidade pela elevação do meio ambiente à categoria
dos bens tutelados pelo ordenamento jurídico positivo (DUARTE, 2003, p. 72).
A crescente conscientização do homem em relação ao seu meio
ambiente favoreceu o surgimento de diversas disciplinas científicas, nos campos da
Ecologia, Economia e Ciências Sociais, com características eminentemente
interdisciplinares em seus conteúdos (PORFÍRIO JR, 2002, p. 32-33). Nesse
diapasão, o Direito Ambiental surge da necessidade de ordenar e sistematizar as
normas relativas ao meio ambiente com vista a buscar uma boa qualidade de vida
para todos (DUARTE, 2003, p. 72). Todavia, no Direito Ambiental, a produção
legislativa tende a perder as suas principais características que são abstração e a
generalidade. Em verdade, o que se observa no Direito Ambiental é o crescimento
de províncias específicas que se multiplicam em uma verdadeira metástase
legislativa (ANTUNES, 2005, p. 24).
No âmbito do Direito a necessidade de se estudar as relações
específicas e as consequências jurídicas dos fenômenos ambientais ensejaram o
surgimento do Direito Ambiental, cuja sistematização ainda se encontra em fase de
desenvolvimento. Em 1976 ainda não se reconhecia o status de disciplina jurídica,
mas a partir de então, com a necessidade de se aperfeiçoarem instrumentos hábeis
a efetivar as recém-surgidas políticas ambientais, se começou a identificar novos
princípios que passaram a orientar a adaptação e a aplicação nas questões
ambientais de regras jurídicas clássicas oriundas de outros ramos. Além disso,
passou-se a identificar questões próprias, cujo equacionamento não cabia
exatamente dentro das áreas tradicionais (PORFÍRIO JR, 2002, p. 32-33).
No Brasil, somente a partir de 1980, é que a legislação tutelar do
meio ambiente passou a desenvolver com maior celeridade. Convém sublinhar as
palavras do ilustre Miguel Reale, em “Mémorias” que se antes o legislador recorria a
natureza para dar base ao Direito (daí o origem do Direito Natural) hoje “numa
trágica inversão, o homem é obrigado a recorrer ao Direito para salvar a natureza
que morre.” Toda regulamentação, via de regra o é feita a priori, até porque seria
desnecessária se a qualidade dos produtos, de per si, fosse eficazmente satisfatória.
Assim, o direito nasce, pois, de fatos a eles anteriores e visa ao ordenamento de
suas conseqüências quando atentem contra a ordem e o bem estar individual e
coletivo. Primeiro vem a sociedade, depois o Direito, consoante o adágio ubi
societas, ibi jus (GRASSI, 1995, p. 21 a 23).
Outro aspecto importante está em considerar o Direito Ambiental
como um dos ramos integrantes do Direito Público, assim considerado como toda
disciplina jurídica que crie e/ou regulamente obrigações entre o Estado e o
particular, enquanto aquele esteja envolvido em face de disposição legal e com
natureza normatizadora (MORAES, 2004, p. 17). De comum acordo Liberato (2007,
p. 38) salienta que o Direito Ambiental constitui um ramo do Direito Público formado
por um aspecto objetivo (conjunto de normas disciplinadoras do meio ambiente) e
outro, científico (conhecimento sistematizado das normas e princípios ordenadores
da qualidade do meio ambiente).
O Direito Ambiental é uma ciência relativamente recente no Direito
brasileiro. É sabido que o Direito Ambiental era um apêndice do Direito
Administrativo e recentemente adquiriu a sua autonomia com base na legislação
vigente e, em especial, com o advento da Lei 6.938, de 31 de agosto de 1981, que
trouxe em seu bojo os requisitos necessários para torná-lo uma ciência
independente, ou seja, com regime jurídico próprio, definições e conceitos, objetivos,
princípios e diretrizes dentre outras características. Existem várias definições de
Direito Ambiental elaboradas pelos mais renomados juristas. Dentre eles, Sirvinskas
(2005, p. 27-28) que adota um conceito simples:
Direito Ambiental é a ciência jurídica que estuda, analisa e discute as
questões e os problemas ambientais e sua relação com o ser
humano, tendo por finalidade a proteção do meio ambiente e a
melhoria das condições de vida no planeta.
Em caráter pioneiro a definição de Direito Ambiental no Brasil, é de
Luís Fernando Coelho, como sendo “um sistema de normas jurídicas que,
estabelecendo limitações ao Direito de propriedade e ao Direito de exploração
econômica dos recursos da natureza, objetivam a preservação do meio ambiente
com vistas à melhor qualidade da vida humana.” Tal denominação acabou
preponderando sobre outras, como Direito Ecológico, ou mesmo à posição daqueles
que negavam sua existência, pois argumentavam que ainda não havia suficiente
sedimentação principiológica. Atualmente a denominação Direito Ambiental
encontra-se consagrada (FREITAS, 2005, p. 19).
Segundo Machado (2005, p. 148-149) o Direito Ambiental é um
Direito sistematizador, que faz a articulação da legislação da doutrina e da
jurisprudência concernentes aos elementos que integram o ambiente procurando
evitar o isolamento dos temas ambientais e sua abordagem antagônica. Não se trata
mais de construir um Direito das águas, um Direito da atmosfera, um Direito do solo,
um Direito florestal, um Direito da fauna e da flora ou um Direito da biodiversidade. O
Direito Ambiental não ignora o que cada matéria tem de específico, mas busca
interligar estes temas com os instrumentos jurídicos de prevenção e de reparação,
de informação, de monitoramento e de participação. Destaca-se ainda porque em
sua estruturação busca-se elementos nos demais ramos do Direito, não se fechando
em sim mesmo. Segundo Antunes (2005, p. 09) o professor Paulo Afonso Leme
Machado não define um conceito de Direito Ambiental, ou seja, apenas fornece ao
leitor uma metodologia para que este possa compreender o seu conteúdo e o
significado do Direito Ambiental.
Para outros autores como Freitas e Freitas (2001, p. 23) o Direito
Ambiental apresenta peculiaridades especiais. Por esta ótica entende-se que o
Direito Ambiental está ligado diretamente a profissionais de outras áreas do
conhecimento científico. Assim, o Direito une-se à Biologia, a Engenharia florestal, a
Química e outras especialidades do saber, para dar suporte teórico e legal a conduta
do homem. Considerando que o Direito Ambiental integre um novo ramo do Direito
blico, pode ser considerado sob dois aspectos: primeiramente de forma
objetiva, consistente no conjunto de normas jurídicas disciplinares da proteção da
qualidade do meio ambiente; e secundariamente como Ciência, uma vez que tem
por finalidade o conhecimento sistematizado das normas e princípios ordenadores
da qualidade do meio ambiente.
A denominação Direito Ambiental parece encontrar quase que a
conceituação unânime na doutrina nacional e internacional, muito embora alguns
poucos autores, como Diogo de Figueiredo Moreira Neto, preferem a expressão
Direito Ecológico. Ao fazer uma análise desta denominação, verifica-se a
possibilidade de restrição ao objeto de estudo desta ciência, uma vez que, por mais
amplas que sejam as fronteiras da Ecologia enquanto ciência não comporta em seu
foco o meio ambiente cultural (MODÉ, 2006, p. 43).
Por outro enfoque, Antunes (2005, p. 09) entende que o Direito
Ambiental pode ser definido como um Direito que tem por finalidade regular a
apropriação econômica dos bens ambientais, desde que se faça levando em
consideração a sustentabilidade dos recursos, o desenvolvimento econômico e
social, assegurando aos interessados a participação nas diretrizes a serem
adotadas, bem como padrões adequados de saúde e renda. Nesse sentido o Direito
Ambiental, desdobra-se em três vertentes fundamentais, constituídas do seguinte
modo: a) Direito ao meio ambiente; b) Direito sobre o meio ambiente; e c) Direito do
meio ambiente.
Ainda segundo Antunes (2005, p. 09) tais vertentes existem, na
medida em que o Direito ao meio ambiente é um Direito humano fundamental que
cumpre a função de integrar os Direitos a saudável qualidade de vida, ao
desenvolvimento econômico e a proteção dos recursos naturais, mais do que um
ramo autônomo da seara jurídica, o Direito Ambiental é uma concepção de aplicação
da ordem jurídica que penetra, transversalmente, todos os ramos do Direito. O
Direito Ambiental tem uma dimensão humana, uma dimensão ecológica e uma
dimensão econômica que devem ser harmonicamente. Evidentemente que, a cada
nova intervenção humana sobre o ambiente, o aplicador do Direito Ambiental deve
ter a capacidade de captar os diferentes pontos de tensão entre as três dimensões e
verificar, no caso concreto, qual delas é a que esta mais precisada de tutela em um
dado momento.
Nada obsta que se diga tamm que a questão da denominação não
é idêntica em todos os países. O Professor chileno Rafael Valenzuela Fuenzalida
denomina Derecho Del Entorno e o conceitua como:
O conjunto de normas jurídicas, cuja vigência prática se traduz ou é
suscetível de se traduzir em efeitos ambientais estimáveis, benéficos
ou prejudiciais, seja ou não que a motivação de ditas normas
jurídicas haja reconhecido uma inspiração fundamentada em
considerações de índole ecológica (Machado, 2005, p. 147).
Nunca é demais lembrar o peso e o significado do Direito Ambiental,
uma vez que penetra significativamente em todos os ramos da Ciência Jurídica. Os
chamados novos direitos que vem surgindo ultimamente, sobretudo a partir da
década de 60 do século XX, são essencialmente direitos de participação, ou seja,
Direitos que se formam em decorrência de uma crise de legitimidade da ordem
tradicional que não incorpora a manifestação direta dos cidadãos na resolução de
seus problemas imediatos. O movimento de cidadãos conquista espaços políticos
que se materializam em leis de conteúdo, função e perspectivas mui diversas dos
conhecidos pela ordem jurídica tradicional. Assim, o Direito Ambiental inclui-se
dentre os novos Direitos como um dos mais importantes. Acresce-se ainda que o
Direito Ambiental é um direito de coordenação, e nessa posição, impõe aos demais
seguimentos do universo jurídico o respeito às normas que o formam, e a sua
autonomia. A discussão sobre sua autonomia, esta ontologicamente superada, pois
o seu fundamento de validade é emanado diretamente da norma constitucional
(ANTUNES, 2005, p. 22-23).
A partir dessa compreensão é que se constata a especificidade e
importância do Direito Ambiental na sociedade atual, que vem ultrapassar aquela
função inicialmente ordenadora e sistematizadora das normas ambientais,
alcançando à relevante tarefa (integrativa e complexa) de auxiliar na proteção do
bem ambiental, de importância transcendental para todos os seres vivos. Na busca
deste fim, ao Direito Ambiental exige-se uma nova postura, não podendo se limitar a
imposição de leituras dogmáticas próprias ou de disciplina afins, mas devendo
buscar a compreensão da complexa teia de fatos e valores que traduzem a
realidade de uma determinada sociedade. Além disso, esta Ciência se vale de
conhecimentos de outras Ciências não jurídicas, como a Ecologia (no amplo
espectro das relações entre as espécies), a Economia (na avaliação econômica de
dano ambiental), a Antropologia (na análise dos valores e comportamentos sociais, a
Estatística (nos cálculos de probabilidades em estudo de impacto ambiental), além
de outras a depender da situação a ser trabalhada (DUARTE, 2003, p. 76).
Por isso, Sirvinskas (2005, p. 38) salienta que o Direito Ambiental
está intimamente relacionado com vários outros ramos do direito. Em rápidas
pinceladas o Direito Ambiental mantém relação com o Direito Constitucional (quando
disciplina as normas fundamentais de proteção ao meio ambiente), com o Direito
Civil (quando trata do direito de propriedade, direito de vizinhança, etc.), Direito
Administrativo (quando cuida do poder de polícia, de atos administrativos, etc.),
Direito Processual (quando cuida dos princípios processuais e das ações coletivas),
Direito Penal (quando dispõe sobre normas de proteção à saúde), Direito Tributário
(quando disciplina a incidência ou isenção de tributos em áreas de preservação
permanente ou reserva florestal legal), Direito Internacional (quando cuida de
sistematizar a adoção de regras internacionais uniformes por meio de convenções,
pactos ou tratados). Segundo Antunes (2005, p. 45) o Direito Ambiental em suas
intensas relações com os principais ramos do Direito, influência os seus rumos na
medida em que carreia para o interior dos núcleos tradicionais do Direito a
preocupação com a tutela jurídica do meio ambiente.
Muito embora o Direito Ambiental seja dotado de peculiaridades de
seus componentes e até o seu objeto de tutela estejam ligados a própria natureza
humana, é inegável que o tratamento do tema visto sob uma perspectiva autônoma,
altruísta e com alguma similitude com o sentido que se lhe tem dado atualmente,
não é tão primevo assim. Como qualquer processo evolutivo a manutenção do modo
de se encarar a proteção do meio ambiente é feita de marchas e contramarchas,
motivo pelo qual não se pode identificar com absoluta precisão onde inicia ou
termina a mudança de ângulo visual do ser humano para com o meio ambiente
(RODRIGUES, 2002, p. 73-74). Sendo as fontes do Direito um tema extremamente
problemático em todas as áreas do Direito, com o Direito Ambiental não seriam
diferente (ANTUNES, 2005, p. 40).
Diante disso, é preciso mencionar que o estudo sobre as fontes do
Direito Ambiental recai sobre os postulados do Direito posto, expresso, positivado e
que esteja vigente. Assim, os estudos recaem sobre os elementos reservados pelas
normas postas e a elas antecedentes. E aí, vários são os aspectos relacionados à
realidade social, e as instituições sociais que imponham certo conteúdos em relação
as normas ditadas pelas autoridades. Por todo o exposto pode-se dizer que é no dia-
a-dia que os aplicadores das normas jurídicas ambientais deverão confrontar-se com
situações que preconizam a utilização das fontes do Direito Ambiental
(RODRIGUES, 2002, p. 88-89). Os autores costumam dividir as fontes do Direito
Ambiental em fontes materiais e fontes formais.
Para Antunes (2002, p. 40 a 44) as fontes materiais do Direito
Ambiental podem ser múltiplas, e guardam relações complexas entre si. Dentre as
fontes materiais podem ser encontradas: a) os movimentos sociais populares; que
buscam uma melhor qualidade de vida, que lutam contra os riscos efetivos
decorrentes da utilização de determinados produtos e práticas; b) as descobertas
científicas significativas; que colaboram com o desenvolvimento de pesquisas
crucias que demandam uma regulamentação jurídica, às vezes, princípios científicos
são incorporados no mundo jurídico; c) doutrina jurídica; a doutrina se faz, por meio
da elaboração de estudos de juristas nacionais e internacionais. Por sua vez as
fontes formais, dispensam comentários, são elas: a Constituição, as leis, os atos
internacionais firmados pelo Brasil, as normas administrativas originadas dos órgãos
competentes e a jurisprudência. No tocante a jurisprudência refere-se ao conjunto de
decisões de casos concretos e interpretações das leis, que são reiteradamente
aplicadas. Moraes (2004, p. 18-19) salienta que a lei [...] é a fonte precípua do
Direito Ambiental.”
Segundo Antunes (2005, p. 20) pretende-se que o Direito Ambiental
seja a expressão da ruptura do antropocentrismo na ordem jurídica. Sustenta-se que
ao proteger a vida animal e vegetal, o Direito Ambiental teria reconhecido novos
sujeitos de Direito que, conjuntamente com os seres humanos passariam a ocupar o
centro do mundo jurídico. Na visão de Antunes, este raciocínio é primário, pois o
Direito é uma construção humana para servir os propósitos humanos. O fato de que
o Direito estar evoluindo para uma posição de respeito às formas de vida não
humanas seja uma obrigação jurídica cada vez mais relevante, mesmo assim, não é
suficiente para deslocar o eixo ao redor do qual a ordem jurídica circula.
Fiorillo (2005, p. 15 a 18) numa profícua discussão em sua obra
Curso de Direito Ambiental brasileiro aborda a questão sobre a visão
antropocêntrica do Direito Ambiental esboçando seu pensamento quanto ao
destinatário do Direito Ambiental, ou seja, se o meio ambiente é voltado para a
satisfação das necessidades humanas ou se o aludido Direito deve ser destinado
para todas as formas de vida. Seu pensamento é claro e coaduna com o exposto
por Antunes ao mencionar que o Direito Ambiental deve ser voltado para a
satisfação das necessidades humanas, porquanto o homem como único animal
racional, assim, incumbe a ele a preservação das espécies, incluindo a sua própria.
O Direito Ambiental tem um árduo campo de atuação fazer com
que as normas jurídicas possam orientar as ações humanas em outras palavras,
isto significa dizer, que o Direito Ambiental permearia todo o processo de produção e
reprodução da vida social. Que fique bem claro ainda que a produção social refere-
se não apenas a produção de bens, mas a toda relação e comportamento do
homem em sociedade, numa perspectiva com a natureza. O Direito Ambiental reflete
uma tensão política sem precedentes, cabendo o legislador ou ao agente normativo
tomar as decisões políticas, dando-lhes uma roupagem de norma jurídica, e
consequentemente possibilitar os meios de execução pela administração e pelos
particulares (DERANI, 1997, p. 85-86).
Dada as especificidades do Direito Ambiental é possível cogitar sua
transdisciplinaridade por meio do exercício de um discurso ecológico de integridade,
qualificando a juridicidade do discurso ambiental pelo prévio estabelecimento de
uma relação de interdependência priorizando o desenvolvimento, da função de
mediação, definida pelo princípio democrático, que por sua vez, privilegia seu poder
de dialogicidade, de estabelecimento de vínculo e de comunicação dialógica e
aberta que relacione homem e natureza, de forma essencialmente interativa e
dinâmica, de modo que a abertura comunicacional proporcionada pelo discurso
ecológico atue diretivamente na orientação de qualquer conduta e atividade de
intervenção sobre o ambiente. Nessa leitura transdiciplinar, o Direito do Ambiente
deixa de ser compreendido como direito horizontal para assumir as feições
interativas de um direito transversal (WOLKMER; LEITE, 2003, p. 243).
Assim, corroborando este entendimento Antunes (2005, p. 47)
salienta que em matéria de Direito Ambiental, as fronteiras entre os diversos
segmentos do conhecimento humano tornam-se cada vez menores. Na análise de
uma medida a ser tomada pelo aplicador da lei em matéria ambiental,
necessariamente, estão presentes considerações que não são apenas jurídicas, pois
é necessário que se observe critérios que não são apenas jurídicos. Observa-se que
as normas de Direito Ambiental, muitas vezes, necessitam de um preenchimento
que é feito por portarias e outros atos administrativos, cujo conteúdo é fornecido por
disciplinas não jurídicas. Decorre daí a imperiosa necessidade de que o jurista, ao
tratar de questões ambientais, tenha conhecimento de disciplinas que não são a
sua, ou que busque tal conhecimento onde ele se encontra disponível. Logo a
metodologia jurídico-ambiental, é eclética e construída na base do caso a caso, pois
somente em uma análise casuística que, iluminada pela lei, pela principiologia e pela
jurisprudência é que se poderá chegar a uma solução que pela ótica do Direito
Ambiental seja considerada justa.
5.3 OS PRINCÍPIOS DO DIREITO AMBIENTAL
5.3.1 Noções Preliminares
O Direito, como ciência humana e social, pauta-se tamm pelos
postulados da Filosofia das Ciências, entre os quais está a necessidade de
princípios constitutivos para que a Ciência possa ser considerada autônoma, ou
seja, suficientemente desenvolvida e adulta para existir por si e situando-se num
contexto científico dado. Por isso, no natural empenho de legitimar o Direito
Ambiental como ramo autônomo da árvore da ciência jurídica, tem os estudiosos se
debruçado na identificação dos princípios ou mandamentos básicos que
fundamentam o desenvolvimento da doutrina e que dão consistência às suas
concepções (MILARÉ, 2004, p. 136). Para Antunes (2005, p. 25), os princípios
jurídicos ambientais devem ser buscados na Constituição e nos fundamentos éticos
que iluminam as relações entre os seres humanos.
A palavra princípio, segundo Milaré (2004, p. 1236) em sua raiz
latina última, significa aquilo que se toma primeiro (primum capere), designando
início, começo, ponto de partida. Corresponde, mutatis mutandis, aos axiomas,
teoremas e leis em outras determinadas Ciências. Gomes Canotilho apud Machado
(2005, p. 53), ensina que:
Os princípios são normas jurídicas impositivas de uma otimização,
compatíveis com vários graus de concretização, consoante os
condicionalismos fáticos e judicos. Permitem o balanceamento de
valores e interesses (não obedecem, como as regras, à lógica do
tudo ou nada), consoante seu peso e ponderação de outros
princípios eventualmente conflitantes.
Importante se faz ressaltar a definição do professor Celso Antonio
Bandeira de Mello:
Princípio é, por definição, mandamento nuclear de um sistema,
verdadeiro alicerce dele, disposição que se irradia sobre diferentes
normas compondo-lhes o espírito e servindo de critério para sua
exata compreensão e inteligência exatamente por definir a lógica e a
racionalidade do sistema normativo, no que lhe confere a tônica e lhe
dá sentido harmônico. É o conhecimento dos princípios que preside a
intelecção das diferentes partes componentes do todo unitário que há
por nome jurídico positivo. Violar um princípio é muito mais grave que
transgredir uma norma qualquer (BANDEIRA DE MELLO, 1996, p.
545).
Corroborando, Sirvinskas (2005, p. 33) aduz princípio como a base,
o alicerce, o início de alguma coisa. É a regra fundamental de uma Cncia.
Entretanto quem entenda que o princípio é fonte normativa. Segundo Antunes
(2005, p. 25) os princípios jurídicos ambientais podem ser implícitos ou explícitos.
Explícitos são aqueles que estão claramente escritos nos textos legais e,
fundamentalmente, na Constituição da República Federativa do Brasil; implícitos são
os princípios que decorrem do sistema constitucional, ainda que não se encontrem
escritos. É importante frisar que, tanto os princípios explícitos como os princípios
implícitos são dotados de positividade e, portanto, devem ser levados em conta pelo
aplicador da ordem jurídica, tanto no âmbito do poder judiciário, como no âmbito do
poder executivo ou legislativo.
De modo a contribuir nessa discussão sobre princípios, Liberato
(2007, p. 41) afirma que os princípios são normas de natureza ou com um papel
fundamental no ordenamento jurídico, devido à sua posição hierárquica no sistema
das fontes (v.g. princípios constitucionais) ou à sua importância estruturante dentro
do sistema jurídico (v.g. princípios do Estado de Direito). Não como negar a
importância dos princípios, sejam eles explícitos ou implícitos, como expostos por
Sirvinskas, pois são eles que dão ao ordenamento jurídico estrutura e coesão,
constituindo o alicerce fundamental para que sejam determinados o sentido e o
alcance das expressões do Direito. Roque Antônio Carrara (1995, p. 29) em sua
obra Curso de Direito Constitucional Tributário, quando se refere a princípios, aduz
que:
Princípio jurídico é um enunciado lógico, implícito ou explícito, que,
por sua grande generalidade, ocupa posição de preeminência nos
vastos quadros do Direito e, por isso mesmo, vincula, de modo
inexorável, o entendimento e a aplicação das normas jurídicas que
com ele se conectam.
Quando se fala em princípios do Direito Ambiental, deve-se ter a
exata noção do que está sendo exposto. É que, conquanto sejam identificáveis
princípios do Direito do ambiente no texto da Carta Magna, é certo que
absolutamente tudo que se relaciona ao meio ambiente está ligado ao Direito à vida,
motivo pelo qual uma sobreposição natural, senão topológica ao menos
teleológica, do objeto de tutela do meio ambiente em relação às demais Ciências.
Destarte, por ser uma ciência autônoma, o Direito Ambiental é informado por
princípios que regulam seus objetivos e diretrizes que devem se projetar para todas
as normas ambientais, norteando os operadores desta ciência e salvando-os de
dúvidas ou lacunas na interpretação das normas ambientais (RODRIGUES, 2002, p.
133).
Em linhas gerais o Direito Ambiental possui os seus próprios
princípios diretores, presentes no art. 225 da Constituição Federal. Vale esclarecer
que aludidos princípios constituem pedra basilar do sistema político-jurídico dos
Estados civilizados, sendo adotados internacionalmente como fruto da necessidade
de uma Ecologia equilibrada e indicativo do caminho adequado para a proteção
ambiental, em conformidade com a realidade social e os valores de cada Estado.
Desta forma é possível identificar os princípios da Política Nacional do Meio
Ambiente e princípios relativos a uma Política Global do Meio Ambiente. Os
princípios da Política Global do Meio Ambiente foram inicialmente formulados na
Conferência de Estocolmo de 1972 e ampliados na Eco 92. São princípios genéricos
e diretores aplicáveis à proteção do meio ambiente. Por outro lado os princípios da
Política Nacional do Meio Ambiente são a implementação dos princípios globais,
adaptados a realidade cultural e social de cada país (FIORILLO, 2005, p. 26-27).
É sobremodo importante assinalar que o Direito Ambiental não é um
Direito estanque separado das outras manifestações da sociedade. Assim sendo,
esses princípios, que o delimitam e orientam não podem fechar-se nos objetos
tratados pelas normas de proteção ambiental, ou porque sua presença em outros
ramos do direito acaba por revelar a existência, em última análise, de normas que,
de alguma maneira, provocam alterações no ambiente (DERANI, 2001, p. 160).
Ilustrando a assertiva Milaré (2004, p. 136) afirma que entre ciências afins, um
princípio pode não ser exclusivo, cabendo na fundamentação de mais de uma
Ciência; isto ocorre, sabidamente, quando os princípios o mais gerais e menos
específicos.
5.3.2 Princípio do Ambiente Ecologicamente Equilibrado como Direito Fundamental
da Pessoa Humana
O reconhecimento do Direito a um ambiente sadio configura-se, na
verdade, como extensão do direito à vida, quer sob o enfoque da própria existência
física e saúde dos seres humanos, quer quanto ao aspecto da dignidade dessa
existência a qualidade de vida , que faz com que valha a pena viver. Deveras, o
caráter fundamental do direito à vida torna inadequados enfoques restritos do
mesmo em nossos dias; sob o direito a vida, em seu próprio e moderno, não se
mantém a proteção contra qualquer privação arbitrária da vida, mas além disso
encontram-se os Estados no dever de buscar diretrizes destinadas a assegurar o
acesso aos meios de sobrevivência a todos os indivíduos e todos os povos. Este é
sem dúvida o princípio transcendental de todo o ordenamento jurídico ambiental,
ostentando, o status de verdadeira cláusula pétrea (MILARÉ, 2004, p. 137).
Segundo Antunes (2005, p. 25) o primeiro e mais importante
Princípio do Direito Ambiental é o Direito ao ambiente equilibrado. Tal princípio
decorre do texto expresso do caput do art. 225 da Constituição Federal. Salienta
ainda que deste Princípio basilar decorrem todos os demais princípios e que seu
reconhecimento internacional pode ser verificado nos princípios 1 e 2 da Declaração
de Estocolmo, proclamada em 1972 e reafirmado pela Declaração do Rio, proferida
pela Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento em
1992.
5.3.3 Princípio da Natureza Pública da Proteção Ambiental
Este princípio decorre da previsão legal que considera o meio
ambiente como um valor a ser necessariamente assegurado e protegido para uso de
todos ou como queiram, para a fruição coletiva. Isto significa, em outro modo de
dizer, que o reconhecimento do direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado
não resulta em nenhuma prerrogativa privada, mas apenas na fruição em comum e
solidária do mesmo ambiente com todos os seus bens. De fato, não é possível, em
nome desse Direito, apropriar-se individualmente de parcelas do meio ambiente para
o consumo privado. O caráter jurídico do meio ambiente ecologicamente equilibrado
é de bem de uso comum do povo. Assim, a realização individual deste direito
fundamental esintrinsecamente ligada à sua realização social (MILARÉ, 2004, p.
138).
Para Milaré (2004, p. 138) a partir desta constatação, a proteção ao
meio ambiente não pode mais ser considerada um luxo ou uma utopia, pois o
reconhecimento deste interesse geral permiti um novo controle de legalidade e
estabelecerá instrumentos aptos e fazer respeitar o novo objetivo do Estado.
Existiria, assim, uma ordem pública ambiental, tendo por fonte básica a lei, e
segundo a qual o Estado asseguraria o equilíbrio harmonioso entre o homem e seu
ambiente. Ainda segundo o autor, no ordenamento brasileiro, este Princípio aparece
com muita ênfase, já que não só a lei ordinária reconhece o meio ambiente como um
patrimônio público, a ser necessariamente assegurado e protegido, tendo em vista o
uso coletivo, mas tamm a Lei Fundamental brasileira a ele se refere como um bem
de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo ao poder
público e à coletividade, como um todo, a responsabilidade por sua proteção.
5.3.4 Princípio da Participação
A participação popular visando à conservação do meio ambiente
insere-se num quadro ainda mais amplo da participação diante dos interesses
difusos e coletivos da sociedade. É uma das notas características da segunda
metade do século XX. A Declaração do Rio de Janeiro, da Conferência das Nações
Unidas para o Meio Ambiente e o Desenvolvimento, de 1992, em seu art. 10 diz: “o
melhor modo de tratar as questões do meio ambiente é assegurando a participação
de todos os cidadãos interessados, no nível pertinente. Em nível nacional, cada
pessoa deve ter a possibilidade de participar no processo de tomada das decisões.
Contudo, tem-se que reconhecer que são indissociáveis informação e participação
(MACHADO, 2005, p. 89).
Outrossim, oportuno considerar que o resultado dessa omissão
participativa é prejuízo a ser suportado pela própria coletividade, porquanto o Direito
ao meio ambiente possui natureza difusa. Além disso, o fato de a administração
desse bem ficar sob a custódia do poder público não elide o dever do povo atuar na
conservação e preservação do direito a qual é titular. Assim o Princípio da
Participação constitui ainda um dos elementos do Estado Social de Direito,
porquanto todos os Direitos Sociais são a estrutura essencial de uma saudável
qualidade de vida, que, como sabe-se é um dos pontos cardeais da tutela ambiental
(FIORILLO, 2005, p. 41-42).
O Princípio da Participação, expressa a ideia de que para a
resolução dos problemas do ambiente deve ser dada especial ênfase a cooperação
entre o Estado e a sociedade, através da participação dos diferentes grupos sociais
na formulação e na execução da política ambiental. Ademais, o Direito à
participação pressupõe o Direito de informação e está a ele intimamente ligado. É
que os cidadãos com acesso a informação tem melhores condições de atuar sobre a
sociedade, de articular mais eficazmente desejos e ideias de tomar parte ativa nas
decisões que lhes interessam diretamente (MILARÉ, 2005, p. 140).
5.3.5 Princípio da Reparação
O Princípio da Reparação determina a obrigatoriedade do poluidor
em reparar o meio ambiente lesado, em decorrência de atividade prejudicial por ele
realizada. Significa a obrigação de reparar os danos causados independentemente
da existência de culpa. Não se aprecia subjetivamente a conduta do poluidor, mas a
ocorrência do resultado prejudicial ao meio ambiente. Ou seja, aquele que danificar
o meio ambiente tem o dever jurídico de repará-lo. A responsabilidade sem culpa
tem incidência na indenização ou na reparação dos danos causados ao meio
ambiente e aos terceiros afetados por sua atividade (LIBERATO, 2007, p. 50).
A Declaração do Rio de Janeiro de 1992, diz em seu Princípio 13
que:
Os Estados deverão desenvolver legislação nacional relativa à
responsabilidade e à indenização das vítimas da poluição e outros
danos ambientais, os Estados deverão cooperar, da mesma forma,
de maneira rápida e mais decidida, na elaboração das novas normas
internacionais sobre responsabilidade e indenização por efeitos
adversos advindos dos danos ambientais causados por atividades
realizadas dentro de sua jurisdição ou sob seu controle, em zonas
situadas fora de sua jurisdição.
Ainda segundo Liberato (2007, p. 50), é relevante mencionar que
reparação não é sinônimo de recuperação, é preciso esclarecer que: a reparação
permite o retorno do meio ambiente à situação em que se encontrava anteriormente,
dentro de um determinado lapso temporal necessário; a recuperação existe quando
o meio ambiente não retorna ao status quo ante, mas os efeitos da degradação
podem ser minorados, permitindo o equilíbrio ecológico.
Convém ressaltar que a Declaração do Rio de Janeiro de 1992 é
tímida em relação ao regime da reparação, pois se limita a preconizar indenização
às vítimas. O Direito Ambiental Internacional tem que evoluir no sentido da obtenção
da reparação ao meio ambiente danificado. Assim, ocorrendo o dano ao meio
ambiente, surge a discussão jurídica da obrigação da reparação desse dano no
plano internacional. Dependeda existência de convenção onde esteja prevista a
responsabilidade objetiva ou sem culpa ou a responsabilidade subjetiva ou por
culpa. A Comissão de Direito Internacional das Nações Unidas está estudando a
possibilidade de os Estados poderem chegar a incorrer em responsabilidade pelas
conseqüências prejudiciais de atos não proibidos pelo Direito Internacional
(MACHADO, 2005, p. 83-84).
5.3.6 Princípio do Poluidor-Pagador
Assenta-se esse Princípio na vocação redistributiva do Direito
Ambiental e se inspira na teoria econômica de que os custos sociais externos que
acompanham o processo produtivo precisam ser internalizados, vale dizer, que os
agentes econômicos devem levá-los em conta ao elaborar os custos de produção e,
conseqüentemente, assumi-los. Busca-se, no caso, imputar ao poluidor o custo
social da poluição por ele gerada, engendrando um mecanismo de responsabilidade
por dano ecológico abrangente dos efeitos da poluição não somente sobre bens e
pessoas, mas sobre toda a natureza. Em termos econômicos, é a internalização dos
custos externos (MILARÉ, 2004, p. 142).
Para Antunes (2005, p. 39) o Princípio do Poluidor-Pagador parte da
constatação que os recursos naturais são escassos e que o seu uso na produção e
no consumo acarretam a sua redução e degradação. Ora, se o custo da redução dos
recursos naturais não for considerado no sistema de preços, o mercado não será
capaz de refletir a escassez. Assim sendo, são necessárias políticas públicas
capazes de eliminar a falha de mercado, de forma a assegurar que os preços dos
produtos reflitam os custos ambientais. Reforça-se ainda que o elemento que
diferencia este Princípio da responsabilidade é que ele busca afastar o ônus do
custo econômico das costas da coletividade e dirigi-lo diretamente ao utilizador dos
recursos ambientais. Ele não pretende recuperar um bem ambiental que tenha sido
lesado, mas estabelecer um mecanismo econômico que impeça o desperdício de
recursos ambientais, impondo-lhes preços compatíveis com a realidade.
O Princípio o objetiva, por certo, tolerar a poluição mediante um
preço, nem se limita apenas a compensar os danos causados, mas sim,
precisamente, evitar o dano ao ambiente. Nesta linha, o pagamento pelo lançamento
de efluentes, por exemplo, não alforria condutas inconseqüentes, de modo a ensejar
o descarte de resíduos fora dos padrões e das normas ambientais. A cobrança
pode ser efetuada sobre o que tenha respaldo em lei, pena de se admitir o Direito de
poluir. Trata-se do Princípio Poluidor-pagador (poluiu, paga os danos), e não
pagador-poluidor (pagou, então pode poluir). A colocação gramatical não deixa
margem a equívocos ou ambiguidades na interpretação deste Princípio (MILARÉ,
2004, p. 143). Sirvinskas (2005, p. 37) salienta que o poluidor deverá arcar com o
prejuízo causado ao meio ambiente da forma mais ampla possível. Impera, no
sistema brasileiro, a responsabilidade objetiva, ou seja, basta a comprovação do
dano ao meio ambiente, a autoria e o nexo causal, independentemente da existência
da culpa.
Para Derani (2001, p. 163) o Princípio do Poluidor-pagador se
concretiza através da obrigação do poluidor de diminuir, evitar e reparar danos
ambientais, com instrumentos clássicos do direito bem como através de novas
normas de produção e consumo. Salienta ainda que, este Princípio, por excelência
envolve o relacionamento entre as normas de Direito Econômico e de Direito
Ambiental. Contudo, é necessário remarcar a herança da teoria econômica, fundada
no ótimo de Pareto, absorvida pelas normas jurídicas que expressam o Princípio do
Poluidor pagador.
5.3.7 Princípio da Prevenção
De início, convém ressaltar que juristas que se referem ao
Princípio da Prevenção, enquanto outros reportam-se ao Princípio da Precaução.
Há, também, os que usam ambas as expressões, supondo ou o diferença entre
elas. Com efeito, cambiantes semânticos entre essas expressões, ao menos no
que se refere à etimologia, prevenção é substântivo do verbo prevenir, e significa ato
ou efeito de antecipar-se, chegar antes; induz uma conotação de generalidade,
simples antecipação no tempo, é verdade, mas com intuito conhecido. Precaução é
substântivo do verbo precaver-se (do latim prae = antes e cavere = tomar cuidado),
e sugere cuidados antecipados, cautela para que uma atitude ou ação o venha a
resultar em efeitos indesejáveis. A diferença etimológica e semântica sugere que
prevenção é mais ampla do que precaução e que, por seu turno, precaução é atitude
ou medida antecipatória voltada preferencialmente para casos concretos (MILARÉ,
2005, p. 143-144).
O dever jurídico de evitar a consumação de danos ao meio ambiente
vem sendo salientado em convenções, declarações e sentenças de tribunais
internacionais, como na maioria das legislações internacionais (MACHADO, 2005, p.
80). De fato, a prevenção é um preceito fundamental, uma vez que os danos
ambientais, na maioria das vezes, são irreversíveis e irreparáveis. Assim, diante da
impotência do sistema jurídico, incapaz de restabelecer, em igualdade de condições,
uma situação idêntica à anterior, adota-se o Princípio da Prevenção do dano ao
meio ambiente como sustentáculo do Direito Ambiental, consubstanciando-se como
seu objetivo fundamental (FIORILLO, 2005, p. 39).
Este Princípio é decorrente do Princípio 15 da Declaração do Rio/92.
Diz o citado Princípio:
De modo a proteger o meio ambiente, o Princípio da Precaução deve
ser amplamente observado pelos Estados, de acordo com suas
capacidades. Quando houver ameaça de danos sérios ou
irreversíveis, a ausência de absoluta certeza cientifica não deve ser
utilizada como razão para postergar medidas eficazes e
economicamente viáveis para prevenir a degradação ambiental
(SIRVINSKAS, 2005, p. 36).
A prevenção e a preservação devem ser concretizadas por meio de
uma consciência ecológica, a qual deve ser desenvolvida através de uma política de
educação ambiental. De fato, é a consciência ecológica que propiciará o sucesso no
combate preventivo do dano ambiental. Todavia, deve-se ter em vista que a
realidade brasileira ainda não contempla aludida consciência, de modo que outros
instrumentos tornam-se relevantes na realização do Princípio da Prevenção. Além
disso, a efetiva proteção do dano deve-se também ao papel exercido pelo Estado na
punição correta do poluidor, pois, dessa forma, ela passa a ser um estimulante
negativo conta a prática de agressões ao meio ambiente (FIORILLO, 2005, p. 40).
Oportuno ainda salientar segundo o autor (2005, p. 40), que uma
legislação severa que imponha multas e obrigações pesadas funciona como
instrumento da prevenção. Entretanto é imprescindível considerar o poder
econômico do poluidor, de modo a não desvirtuar o Princípio por meio de cálculos
aritméticos. Isto significa dizer que a penalidades impostas devem estar atentas aos
benefícios experimentados com a atividade degradante. Detalhe, ao se busca
eliminar atividade econômica do degradante, mas enquadrá-lo as normas
ambientais, uma vez que os recursos naturais são escassos e se destinam a todos
de forma indeterminada.
5.3.8 Princípio do Desenvolvimento Sustentável
A terminologia empregada a este princípio surgiu, inicialmente na
Conferência Mundial de Meio Ambiente, realizada, em 1972, em Estocolmo e
repetida nas demais Conferências sobre o meio ambiente, em especial na Eco/92, a
qual empregou o termo em onze de seus vinte e sete princípios. Na Constituição
Federal de 1988, o Princípio do Desenvolvimento Sustentável encontra-se esculpido
no caput do art. 225. Constata-se que os recursos ambientais não são inesgotáveis,
tornando-se inadmissível que atividades econômicas desenvolvam-se alheias a esse
fato. Busca-se com isso a coexistência harmônica entre economia e meio ambiente.
Permite-se o desenvolvimento, mas de forma sustentável, planejada, para que os
recursos hoje existentes não se esgotem ou tornem-se inócuos (FIORILLO, 2005, p.
27).
Cumpre observar que existem diferentes interpretações para o termo
desenvolvimento sustentável. Alguns autores enquadram o desenvolvimento
sustentável no rol dos princípios do Direito Ambiental aludindo a sua previsão na
Declaração do Rio de 1992. Contudo a mencionada declaração não estabelece
expressamente o desenvolvimento sustentável enquanto um princípio, mas como
um critério, resguardando apenas ao desenvolvimento uma configuração
principiológica. O governo brasileiro adota a definição apresentada no documento
Nosso futuro comum, publicado em 1987, tamm conhecido como Relatório
Bruntland, no qual desenvolvimento sustentável é concebido como “o
desenvolvimento que satisfaz as necessidades presentes, sem comprometer a
capacidade das gerações futuras de suprir suas próprias necessidades” (LIBERATO,
2007, p. 61).
Para Milaré (2005, p. 148) o Princípio aqui preconizado infere-se de
um duplo ordenamento e, por conseguinte, de um duplo direito com profundas
raízes no Direito Natural e no Direito Positivo: o Direito do ser humano desenvolver-
se e realizar as suas potencialidades, individual ou socialmente, e o Direito de
assegurar aos seus pósteros as mesmas condições favoráveis. Neste Princípio,
talvez mais do que nos outros, surge tão evidente a reciprocidade entre Direito e
dever, porquanto o desenvolver-se e usufruir de um Planeta plenamente habitável
não é apenas direito, é dever precípuo das pessoas e da sociedade. Como se
percebe, o princípio possui grande importância, porquanto numa sociedade
desregrada, à deriva de parâmetros de livre concorrência e iniciativa, o caminho
inexorável para o caos ambiental é uma certeza. Não dúvidas que o
desenvolvimento econômico tamm é um valor precioso da sociedade. Todavia, a
preservação ambiental e o desenvolvimento econômico devem coexistir, de modo
que aquela não acarrete a anulação deste (FIORILLO, 2005, p. 28).
A exploração desastrada do ecossistema planetário, de um lado, e a
ampliação da consciência ecológica e dos níveis de conhecimento científico, de
outro lado, produziram mudanças de natureza técnica e comportamental que,
embora ainda tímidas, vêm concorrendo para superar a falsa antinomia proteção ao
meio ambiente versus crescimento econômico. Na realidade, começou-se a
trabalhar melhor o conceito de desenvolvimento, que transcende o de simples
crescimento econômico, de modo que a verdadeira alternativa excludente está entre
desenvolvimento harmonizado e mero crescimento econômico. Assim, no Princípio
do Desenvolvimento Sustentável, Direito e dever estão de tal forma imbricados entre
si que, mais do que termos relativos, são termos recíprocos, mutuamente
condicionantes. Daí a legitimidade, a força e a oportunidade deste Princípio como
referência basilar do Direito Ambiental (MILARÉ, 2005, p. 150).
6 AS INTERFACES DA GEOGRAFIA E DO DIREITO AMBIENTAL
O meio ambiente, assim concebido, inscreve-se dentro de uma
representação ampla, que reúne subsistemas que interagem e até compartilham
elementos comuns, embora organizem-se segundo propriedades estruturais e
funcionais diferentes. O avanço do ponto de vista conceitual destacado na presente
dissertação, constitui uma representação sincrética da realidade, na medida em que
supera a dicotomia do homem e o resto do mundo, dicotomia esta muito
questionada. Entretanto do ponto de vista da construção do conhecimento científico
induz significativamente um questionamento teórico e metodológico. Como se
depreende, o se pode analisar a rede de um sistema complexo, a partir de uma
interação generalizada, é preciso identificá-los e diferenciá-los, ressaltando as suas
especificidades (RAYNAUT, 2004, p. 28).
É sabido que os diferentes contextos científicos e tecnológicos
desenvolvem epistemologias que influenciam e são influenciadas pelo debate que as
sociedades mantêm e desenvolvem. A eclosão do diálogo de saberes científicos é a
expressão do conteúdo cultural latente no sistema representativo das ciências
(FLORIANI, 2004, p. 35). Apoiando-se sobre a perspectiva complexa e dinâmica das
relações sociedades/natureza, por meio de um enfoque interdisciplinar, a pesquisa
científica pode, se não trazer respostas definitivas, ao menos ajudar a esclarecer as
questões colocadas e produzir um saber complexo com nuances significativas
(RAYNAUT, 2004, p. 31).
Coadunando com o pensamento exposto, Leff (2002, p. 96) salienta
que o intercâmbio de ideias, que gera um processo interdisciplinar, faz com que
surjam perguntas a partir de uma especialidade para outras, tais questionamentos
representam a inquietação sobre o potencial aplicativo do conhecimento dessas
disciplinas, como também podem reformular problemas teóricos e práticos que não
surgem do desenvolvimento interno dos paradigmas das Ciências e do saber
disciplinar atual, induzindo assim, um desenvolvimento do conhecimento ambiental.
Todavia, as ciências o progridem apenas das demandas de aplicação dos seus
conhecimentos, mas dependem do trabalho teórico produzido dentro dos complexos
processos históricos, ideológicos e discursivos de onde emergem e se desenvolvem.
Por outro enfoque, parece que na convergência para a prática da
interdisciplinaridade, os maiores desafios a vencer são os de caráter intradisciplinar,
ou seja, aqueles obstáculos que teriam de ser superados no interior das disciplinas,
per si. No caso da Geografia, o mais grave seria a superação da dicotomia “natural-
social”. O grande legado dos fundadores da Geografia como Ciência é a
compreensão dos lugares pelo jogo de relações dinâmicas entre diferentes fatos da
natureza e da sociedade. A superação da antiga concepção do determinismo
ambiental, induziu a outro determinismo, mais grave ainda, o econômico. O pretenso
geógrafo que for incapaz de superar a dicotomia física-humana não teaptidão
para qualquer prática interdisciplinar (MONTEIRO, 2004, p. 63).
Da mesma forma, abordando o viés jurídico da interdisciplinaridade
do Direito Ambiental é importante trabalhar nas questões internas sobre sua
autonomia, possibilitando uma avaliação da abordagem jurídica do meio ambiente
como um novo ramo da Ciência do Direito e não apenas uma refração dos ramos
tradicionais do Direito. Não é possível fugir da evolução da maturidade do Direito
Ambiental, pois este, tem uma enorme e complexa tarefa de auxiliar a proteção do
bem ambiental, de importância fundamental para todos os seres vivos. Um exemplo
típico é o estudo prévio de impacto ambiental, que, apesar de estar incluído em
procedimentos clássicos, mostra-se como um novo mecanismo do Direito Ambiental,
possibilitando medir antecipadamente os riscos ambientais (WOLKMER; LEITE,
2007, p. 220).
A discussão a respeito das interfaces da Geografia e do Direito
Ambiental, emerge para o estudo da efetividade das normas ambientais no espaço
geográfico, por ser aquela propriamente dita, um instrumento para coordenar a vida
em sociedade. Diante disso, denota-se a relevância da efetividade das normas em
todas as suas dimensões, assim definidas até por uma questão didática: existência,
validade e eficácia. A delimitação desse plano demonstra a importância das novas
visões sobre o Direito no estudo integrado entre as Ciências Sociais para a
compreensão da realidade, refletindo a flexibilização dos conceitos positivistas, dada
a dificuldade latente de se oferecer uma visão mais coerente aos complexos
fenômenos sociais (AZEVEDO; LIMA, 2009, p. 11).
Para Lopes (2009, p. 52 a 58) a análise da efetividade das normas
de Direito Ambiental pressupõe avaliação das categorias que lhe são precedentes. A
perspectiva relacionada à existência da norma jurídica está, intrinsecamente, ligada
à escolha feita em torno dos fatos da vida. Este mecanismo é marcado pela
correlação gica estabelecida entre o fato transformado em norma e o valor que se
lhe imprime. Quanto a validade há que se verificar a harmonia com o sistema
jurídico adotado por um contexto específico de tempo e de espaço. Isto pode ser
compreendido pela percepção de que será válida a norma que contiver os atributos
do ato jurídico perfeito, atendendo aos requisitos impostos pelo sistema em que
estiver inserida. Por sua vez a eficácia refere-se a possibilidade de produção dos
efeitos jurídicos, aliando-se a ideia e obtenção de resultados junto a comunidade a
que se destina a norma. A eficácia da norma jurídica refere-se a sua aplicabilidade,
ao seu poder de realização.
A norma jurídica para a Geografia pode ser vista como o resultado
da tensão e/ou da harmonia entre objetos e ações que constituem o espaço
geográfico, em outras palavras, como decorrência da indissociabilidade entre a
configuração territorial e o uso do território, de determinantes diferentes tipos de
normas. É preciso mencionar que não são todas as normas oriundas das relações
entre os indivíduos que interessam a Geografia, como por exemplo, as normas de
trato social (cumprimentos, modos de comportamento, vestimenta, etc.) que não
apresentam elementos explicativos de grande expressão para o conhecimento das
realidades territoriais. Entretanto há normas dos objetos sobre as ações e normas da
sociedade sobre os objetos cujo exame fornece subsídios profícuos sobre a
dinâmica territorial de um determinado período (Decreto n° 2.519, de 16 de março de
1998, que incorpora ao arcabouço jurídico brasileiro a Convenção da
Biodiversidade) (ANTAS JR, 2005, p. 61).
Para Brosset e Truilhé-Marengo (2009, p. 141) cumpre observar
que:
[...] a realidade é uma interação complexa entre várias forças sociais
e políticas que resultam em uma regra de direito frequentemente
confrontada a contradições internas. Esta falta de consenso é
exacerbada na área do meio ambiente, pois pouco conhecimento
e recorre-se frequentemente, a noções extrajurídicas. Para
determinar os objetivos ambientais a serem atingidos e os métodos a
serem perseguidos, é necessário conhecer as necessidades
ambientais e técnicas para alcançá-las [...] ao contrário do que a
doutrina positivista tem afirmado por muito tempo, a legitimidade do
Direito não é intrínseca, mas extrínseca, pois depende do estado das
práticas sociais. A legislação torna-se, assim, um problema de
consenso.
A humanidade ao produzir os espaços geográficos, interfere na
natureza com diferentes graus de transformação, com a preocupação de gerar
riquezas, empregos e renda. Essas intervenções transformam agressivamente os
ambientes naturais promovendo modificações marcantes nos fluxos de energia e
matéria, alterando a intensidade da funcionalidade intrínseca existente entre os
componentes da natureza fato este que atinge a própria sociedade. A natureza
modificada permanentemente pela humanidade, tanto em seus aspectos
fisionômicos como fisiológicos (forma e dinâmica), o sofrem modificações em sua
essência, porque os humanos, por mais que aplique tecnologias sofisticadas, não
conseguem modificar o funcionamento geral do sistema terrestre (ordem
estruturante), cujas leis (da natureza), o mais poderosas do que qualquer
intervenção humana (ROSS, 2006, p. 198).
O homem não apenas existe, mas coexiste em companhia de outros
homens. Em virtude da coexistência estabelecem relações de coordenação, de
subordinação, de integração, ou de outra natureza, relações essas, que não ocorrem
sem o concomitante aparecimento de regras de organização e de conduta (REALE,
1978, p. 23). Os componentes do espaço são os mesmos em todo o mundo e
formam um continuum no tempo, mas variam quantitativamente e qualitativamente
segundo o lugar, do mesmo modo que variam as combinações entre eles e seu
processo de fusão. Daí vem as diferenças entre os espaços (SANTOS, 2004, p. 20).
Nesse sentido, Kouakou e Silva (2007, p. 349) esclarece que:
a organização do espaço deve ser realizada em função de regras
que precisam aproximar-se o mais possível da realidade; realidade
esta baseada em princípios que definem a estruturação espacial.
Cumpre observar que a realidade ambiental tem elementos físicos,
geobiofísicos, socioeconômicos e culturais. Nesse sentido segmentar
o espaço, é o mesmo que dividi-lo para fins de organização. A
segmentação territorial tem uma importância político administrativa, e
sua validade é imprescindível para a aplicação otimizada dos
recursos disponíveis.
Ao proceder uma análise do meio geográfico, obriga-se ao
pesquisador uma abordagem combinada entre diferentes disciplinas do
conhecimento, cujo objetivo é definir as necessidades humanas no território, suas
causalidades e finalidades. Assim, as conquistas das necessidades sociais revelam
relações entre o desenvolvimento e a organização do território, bem como as
diversas fases e trajetórias das configurações daquele (PIRES, 2007, p. 55-56). Nas
sociedades submetidas ao processo civilizatório da modernidade ocidental, a
organização da convivência entre as diferenças, se faz por meio da autoridade
política centralizada no Estado (CASTRO, 2005, p. 50). Nesse contexto, passa-se a
exigir do Estado, enquanto organização suprema da sociedade dotada de poderes
para regular e orientar o convívio social, normas para que as atividades humanas
sejam desenvolvidas de forma racional (PORFÍRIO JUNIOR, 2002, p. 29).
Nenhuma sociedade, entendida como um sistema de relações, em
que o comportamento é uma forma de comunicação, poderia subsistir sem um
mínimo de ordem (AZEVEDO; LIMA, p. 12). Fazendo alusão a organização estatal,
Castro (2005, p. 195), pondera que:
A organização política do território nacional pode ser percebida
também em dois níveis: aquela da administração pública,
representada politicamente pelo poder central, através dos
instrumentos de intervenção no espaço, e aquele que resulta dos
interesses que se organizam em locais específicos e que se
confrontam com a tendência homogeneizadora do poder central do
Estado. No primeiro, respaldado pela sociedade política, ou seja, a
estrutura de poder do Estado [...] configura-se uma divisão do
Estado, que é funcional à administração territorial das decisões
políticas que operam através de instituições de níveis local e
regional. No segundo, constituído pela fragmentação territorial da
sociedade civil, os interesses particulares confrontam-se, muitas
vezes, com aqueles ditos da maioria, ou seja, nacionais, em
situações de normalidade institucional, a sociedade civil se vale das
instituições no recorte territorial e utiliza os seus canais para fazer
chegar suas reivindicações aos centros de decisão sobre as
alocações de políticas públicas, que podem se tanto leis como
investimentos econômicos ou sociais.
Cumpre observar, que as organizações voltadas para fins
produtivos, políticos e culturais, mais as relações de conflito e solidariedade geradas
pelas variadas identidades interagindo no mesmo fragmento do território, dão forma
a região instrumental do exercício da justiça: a Comarca. A Comarca é a região
basal da aplicabilidade do Direito. Em sua acepção moderna em vigor no Brasil, o
termo designa o território sob jurisdição de um juiz ou grupo de juízes. Portanto, a
Comarca é a região que referencia a organização da divisão do trabalho jurídico na
formação socioespacial brasileira. O poder judiciário, diferentemente do poder
executivo e do legislativo é exclusivamente estadual ou federal e se vale dessa
divisão territorial para a organização funcional necessária à administração do Direito
(ANTAS JR, 2005, p. 25-26).
Ainda segundo Antas Jr (2005, p. 26-27) as Comarcas representam
classificações que as diferenciam de acordo com seu movimento forense e sua
importância, como também, representam degraus sucessivos para a carreira de um
juiz. As classificações são denominadas entrâncias: primeira entrância, segunda
entrância e entrâncias especiais, por vezes, podem ser nominadas de entrância
inicial, intermediária e final. Os limites territoriais são definidos a partir das
exigências mínimas, como por exemplo, o número de habitantes, a receita tributária,
o movimento forense e situação geográfica que cada lei orgânica estadual
estabelecer. A Comarca pode constituir-se de um ou mais municípios.
No tocante a organização judiciária faz se necessário mencionar que
a mesma, constitui um conjunto de norma e preceitos que regulam o arcabouço e a
administração do poder judiciário em todo o país (LISBOA, 1999, p. 15). Na
definição de José Frederico Marques (1987, p. 90) “é o conjunto de regras e
preceitos sobre a criação de tribunais e cargos de juízes e de seus respectivos
auxiliares, bem como sobre a investidura nesses cargos, os direitos e deveres de
seus ocupantes ou titulares de atribuições”, sendo que para Moacyr Amaral Santos
(1980, p. 95) “a disciplina do aparelhamento judiciário dos órgãos principais e
auxiliares, no que concerne à sua constituição, composição, discriminação de suas
atribuições, se enfeixa sob a denominação de organização judiciária.
No Estado do Paraná a Lei estadual 14.277, de 30 de dezembro
de 2003, atualizada pela Lei 16.352, de 22/12/2009, dispõe sobre o Código de
Organização e Divisão Judiciária. No Livro V, Título I, Capítulo II, dispõe sobre a
criação e instalação de Comarcas, Varas e Distritos:
Art. 216. São requisitos para a criação e instalação de comarcas:
I Para criação:
a) cidade-sede de município;
b) população não inferior a trinta mil (30.000) habitantes, com um
nimo de dez mil (10.000) eleitores;
c) existência de renda tributária significativa do desenvolvimento
econômico do município ou da microrregião, que não poderá ser
inferior ao dobro da exigida para a criação de municípios no Estado;
d) movimento forense anual, nos municípios que comporão a
comarca, equivalente, no mínimo, à distribuição de quatrocentos
(400) feitos, observando-se o que for estabelecido pelo Órgão
Especial quanto à natureza dos processos.
II Para instalação:
a) existência de edifícios públicos apropriados ao Fórum, à Delegacia
de Polícia e à Cadeia Pública, esta dotada da indispensável
segurança e em condições de abrigar presos;
b) existência de prédios públicos apropriados para residência do Juiz
de Direito e do Promotor de Justiça;
c) preenchimento de todos os cargos judiciais, por designação, até o
provimento efetivo, este no prazo de seis (6) meses.
§ 1º. As condições referidas no inciso I deste artigo poderão ser
excepcionalmente dispensadas pelo Órgão Especial do Tribunal de
Justiça se a distância e a dificuldade de acesso à sede da comarca
de origem aconselharem a criação de nova unidade judiciária.
§ 2º. A comarca poderá ser extinta por proposta do Órgão Especial
do Tribunal de Justiça, quando deixarem de existir quaisquer dos
requisitos que justificaram sua criação, ressalvando-se o disposto no
parágrafo anterior.
Art. 217. Para a criação de vara, observar-se-ão, além dos requisitos
enumerados no artigo anterior, no que couber, a ocorrência das
seguintes condições:
a) se vara cível, um mínimo de quatrocentos (400) feitos
contenciosos por ano, não computadas as execuções não-
embargadas;
b) se criminal, um mínimo de duzentos (200) processos por ano.
Art. 218. A instalação de comarca sefeita em audiência pública.
§ 1º. Presidirá a audiência de instalação o Presidente do Tribunal de
Justiça ou o magistrado designado.
§ . Do termo lavrado, remeter-se-ão cópias autenticadas aos
Presidentes dos Tribunais de Justiça e Regional Eleitoral, ao
Governador do Estado, ao Presidente da Assembléia Legislativa, ao
Procurador-Geral de Justiça e às Justiças Federal e do Trabalho no
Estado (redação dada pela Lei 14.925 de 24/11/2005 DOE
7109 de 25/11/2005).
Art. 219. Distribuídos, no ano imediatamente anterior, mais de
oitocentos (800) feitos cíveis, não computados nesse número as
execuções fiscais e execuções não-embargadas, os pedidos de
alvarás, as ações consensuais e as precatórias, ou quatrocentos
(400) processos criminais, o Juiz da comarca ou da vara dará conta
do ocorrido à Corregedoria-Geral da Justiça, para as providências
necessárias à criação de nova unidade judicial, observado o disposto
neste Capítulo (redação dada pela Lei 14.925 de 24/11/2005
DOE nº 7109 de 25/11/2005).
Parágrafo único. No caso de comarca de Juízo único, computar-se-á
a soma das ações penais com as cíveis para os fins da comunicação
de que trata este artigo.
Art. 220. Para a criação de Distrito Judiciário, ressalvado o previsto
no § do art. 216, exige-se a preexistência de Distrito
Administrativo, de população não inferior a quatro mil (4.000)
habitantes e de colégio eleitoral de, no nimo, mil e quinhentos
(1.500) eleitores.
Parágrafo único. Os Distritos Judiciários serão instalados mediante
prévia autorização do Presidente do Tribunal de Justiça.
Tomar a organização judiciária como tema de estudo, demonstrando
a interface do espaço geográfico e a materialização das normas ambientais, requer
assunção de dois pressupostos básicos. Primeiro, o Direito num todo deve ser
entendido como uma instância social e não somente como Ciência; segundo, porque
por mais estranho que possa parecer, os sistemas normativos que constituem as
diferentes formas do Direito no mundo contemporâneo (Civil Law e Common Law),
tem íntima ligação com as formações territoriais, enfim de certo modo, como está
sendo abordado, relaciona-se com as categorias de estudo da Geografia (lugar,
ambiente, território e paisagem, entre outras). Considerada essa relação
condicionante entre Direito e Geografia, afirma-se a relevância deste tema: desde
sua origem, a ciência geográfica toma como unidade territorial básica de referência a
formação socioespacial, inclusa a concepção de Direito que a erigiu e mantém
(ANTAS JR, 2005, p. 68).
Segundo Ross (2006, p. 199) as informões e os métodos de
análise fornecidos pela Geografia possibilitam a adoção de novas práticas de
planejamento e gestão ambiental de base territorial com elevado grau de eficiência,
o que se torna possível, devido a sua sólida base conceitual e condução com
qualidade técnica. Por sua vez, o problema da análise geográfica, na perspectiva
ambiental, está em considerar que a humanidade, ao promover as intervenções nos
componentes da natureza, altera as intensidades dos fluxos de energia e matéria
entre as partes, promove impactos ambientais de diferentes magnitudes e, com isso,
deteriora a qualidade ambiental. A aplicação da Geografia, perante seu objeto
principal de estudo, que é conhecer e analisar as relações da humanidade com o
seu meio natural, necessita do uso de tecnologias de informação. O avanço
tecnológico na direção da geração e tratamento de dados é, cada vez, mais rápido e
eficiente.
Ao tomar a comunicação e a informação em sua condição de
elementos constitutivos de toda e qualquer forma de organização, notar-se-á que os
agentes sociais mudaram e/ou se potencializaram, delineando um novo uso dos
territórios. No seu sentido mais elementar, a informação constitui parte da
experiência humana. A informação aparece sob diversas formas e com diferentes
conteúdos. No contexto da sociedade da informação e devido ao uso das novas
tecnologias, formas inovadoras de tratamento da informação tornaram possível
organizar e apresentar, sob formatos diversos, uma maior quantidade e diversidade
de fatos, dados e conhecimentos (ANTAS JR, 2005, p. 154-155). Quanto mais
informação e desenvolvimento tecnológico, mais normas ambientais para regular os
impactos ambientais.
Evidenciada sua existência no princípio da prevenção do dano
ambiental o estudo de impacto ambiental (EIA) e o relatório de impacto ambiental
(RIMA), constituem um dos mais importantes instrumentos de proteção do meio
ambiente. A sua essência é preventiva, podendo compor uma das etapas do
licenciamento ambiental. Com a Constituição de 1988, o estudo de impacto
ambiental passou a ter índole constitucional, porque anteriormente somente havia
instrumento similar na Lei de Zoneamento Industrial (Lei 6803/80), no seu art. 10,
§ , que exigia um estudo prévio acerca das avaliações de impacto para a
aprovação das zonas componentes do zoneamento urbano. Entretanto,
diferenciava-se muito do atual EIA/RIMA, que no anterior (Lei de Zoneamento)
não previa a participação pública. Além disso, o seu campo de aplicação estava
restrito aos casos de aprovação de estabelecimento das zonas estritamente
industriais e, ainda, não integrava um procedimento de licenciamento ambiental
(FIORILLO, 2005, p. 85).
Para Fiorillo (2005, p. 86) por meio do art. , III, da Lei da Política
Nacional do Meio Ambiente, Lei 6.938/81, o EIA/RIMA, foi erigido a categoria de
instrumento da política ambiental. Entretanto não havia exigência do conteúdo
mínimo, bem como não havia disposição expressa que determinasse que o estudo
prévio fosse feito ao desenvolvimento do empreendimento. Com o Decreto
99.274/90, outorgou-se a competência ao Conselho Nacional do Meio Ambiente
(Conama), para fixar os critérios norteadores do EIA/RIMA com a finalidade de
licenciamento. A Resolução Conama 1/86, tratou desse tema, exemplificando
situações em que o EIA/RIMA se fazia necessário, tornando-o significativamente
expressivo.
Do ponto de vista de Bugalho (1999, p. 33), o estudo de impacto
ambiental foi inserido no texto constitucional porque se constitui um importante
instrumento de defesa do meio ambiente, obrigatório para o licenciamento de obras
ou atividades consideradas potencialmente causadoras de significativo impacto
ambiental, e por essa razão, deveria a lei consagrar as hipóteses de sua
exigibilidade, assim como dispor sobre a forma e o seu conteúdo, e não delegar a
outro órgão da administração a sua regulamentação através de resoluções, isso
porque a edição destas não é precedida dos debates que o tema requer, não se
coadunando o moderno Estado Democrático de Direito.
De forma mais crítica Antunes (2005, p. 249) menciona que a
experiência jurídica brasileira, demonstra que a norma constitucional tem suscitado
muitas dúvidas e divergências no que se refere à sua adequada compreensão. A
constitucionalização dos estudos de impactos ambientais não foi acompanhada de
uma legislação ordinária apta a concretizar a determinação constitucional no plano
da prática diária a administrativa. Fato é que a norma constitucional é aberta e
necessita que o poder executivo defina os critérios capazes de estabelecer o
conceito de atividade que efetivamente ou potencialmente, possa ser causadora de
significativa degradação ambiental.
O fato é que o EIA/RIMA, como instrumento da Política Nacional do
Meio Ambiente, corrobora para a produção de conhecimento entre a Geografia e o
Direito Ambiental. Uma vez que deve ser realizado por uma equipe técnica
multidisciplinar, que contará com profissionais das mais diferentes áreas, como por
exemplo, geógrafos, advogados, geólogos, biólogos, físicos, psicólogos, sociólogos,
antropólogos entre outros, os quais avaliarão os impactos ambientais positivos e
negativos do empreendimento. Objetiva-se com isso a elaboração de um estudo
completo e profundo a respeito da pretensa atividade (FIORILLO, 2005, p. 89).
Bugalho (1999, p. 22) chama a atenção para o objeto do grupo cnico habilitado,
pois, embora o grupo seja multidisciplinar, seu objeto de estudo envolve múltiplos
aspectos ambientais, tais como aqueles atinentes ao meio físico, meio biológico,
ecossistemas naturais e meio socioeconômico.
Por sua vez, a conservação ambiental diz respeito a não afetação
degenerativa do meio ambiente. Esses espaços são objeto de maior atenção no que
diz respeito à aplicação de critérios técnico-científicos. Nessas áreas serão
aplicados todos os conhecimentos científicos e tecnológicos para promover os
arranjos e rearranjos espaciais, no sentido de garantir um adequado ordenamento
territorial, respeitando as potencialidades naturais, as fragilidade ambientais, as
potencialidades e as fragilidades culturais, chegando às proposições de zoneamento
econômico ecológico, que se referem não apenas a mapas, mas a um conjunto de
diretrizes que indicam espaços territoriais de usos produtivos de diferentes tipos e
não produtivos de interesse ecológico, logo, de preservação (ROSS, 2006, p. 204).
Nada obsta que se diga tamm sobre os zoneamentos, que visam
a ordenação territorial com embasamento técnico-científico, colocando em primeiro
nível de preocupação a legislação ambiental, incidente sobre os espaços do
território, que acabam por definir categorias de zonas de interesse
ecológico/ambiental. Um exemplo típico, são as áreas de preservação permanente e
as reservas particulares do patrimônio natural, os parques e as reservas biológicas,
os porcentuais das chamadas terras da reserva legal para cada uma das
propriedades rurais, e a proteção legal dada aos fragmentos florestais da mata
atlântica. A legislação ambiental existente, estabelece um zoneamento não
demarcado em mapas, mas que é incidente nos espaços territoriais do país. Ao se
promover estudos com a finalidade de promover o ordenamento territorial, essas leis
precisam ser representadas nos mapas, para que forneçam uma melhor dimensão
das áreas de abrangência (ROSS, 2006, p. 204).
Diante de todo o entendimento da interdisciplinaridade entre
Geografia e Direto Ambiental verifica-se que não diluiu as abordagens específicas e
as perspectivas de cada ciência. Muito pelo contrário, o trabalho interdisciplinar
toma sentido como a associação de análises peculiares, como uma conjunção que
afirma individualidades. O resultado desse trabalho aparece como somatório de
enfoques individuais de cada disciplina, que nesse cruzamento adquire novas
qualidades. O interdisciplinar se constrói sobre e a partir das análises individuais de
cada ciência. Dessa forma, não prescinde dos conhecimentos particulares (e
parciais ante a temática em questão), mas alimenta-se deles (do resultado de sua
aplicação ao tema em foco). O recorte temático que funda o ponto de convergência
do trabalho interdisciplinar o anula a diversidade dos objetos científicos e suas
apreensões ímpares. Na verdade tais recortes criam novos objetos, ao inaugurarem
novas formas de abordar a realidade (MORAES, 2002, p. 85).
É bem verdade que a eficácia da prática da interdisciplinaridade no
diagnóstico e resolução de problemas concretos desprende-se dos processos que
ocorrem de forma simultânea, a comunicação intersubjetiva dos especialistas
reunidos por um projeto e a organização dos conhecimentos científicos e técnicos
trazidos pelas disciplinas presentes. A especificidade de cada disciplina adquire
maior relevância quando possibilita a geração de conhecimento necessário para
implementar formas alternativas de aproveitamento sustentável dos recursos
naturais. As experiências interdisciplinares abordadas mostraram os benefícios, mas
também as dificuldades do diálogo e da comunicação intersubjetiva entre as
especialidades entre o Direito Ambiental e a Geografia. Neste trabalho, defendeu-se
o projeto de gerar um discurso homogêneo interdisciplinar expressando uma visão
holística dos processos ambientais a partir de pontos de observação de cada
especialidade e de seus interesses disciplinares, da vontade de domínio sobre
outras teorias e enfoques metodológicos focando na entropia do intercâmbio
interdisciplinar de saberes (LEFF, 2002, p. 96-97).
Postas essas considerações, é preciso refletir no sentido de volver
um olhar para o passado, para reavaliar os princípios que foram construídos, é
preciso refletir sobre a complexidade do presente e vislumbrar possibilidades
futuras. A Geografia quando de seu embasamento e instituição científica, assenta na
condição cognitiva de interações, conexões, já que a essência do fato geográfico
torna o objeto fundamentalmente complexo pelo entrosamento do natural e do social
(MONTEIRO, 2004, p. 65). Aos operadores do Direito é preciso adequadamente
justificar a proteção do ambiente, por meio de critérios exclusivamente normativos. É
preciso evidenciar a integração do discurso ético do respeito a alteridade, como
revisão do moderno discurso ambiental, propulsor de uma democracia ambiental. A
proposta do desenvolvimento de um olhar de integridade do Direito Ambiental
estrutura-se a partir da proteção de condições adequadas para o desenvolvimento e
conservação integral da vida (WOLKMER; LEITE, 2007, p. 245).
CONCLUSÃO
A partir do estudo desenvolvido, embora breve, faz-se necessário
nesse processo de difusão científica, sintetizar algumas constatações e reflexões da
temática exposta, fruto das consequências lógicas, decorrente do árduo trabalho
teórico construído. O fundamental maior neste trabalho era demonstrar a intrínseca
relação que o meio ambiente estabelece com a Geografia e o Direito Ambiental, e,
principalmente reconhecer que os fatos e fenômenos naturais, políticos e jurídicos,
constituem a base para a complexa dialética ambiental. Dialética aqui compreendida
como integração progressiva por meio de uma tensão renovada a cada etapa
reflexionada neste trabalho. Nega-se veementemente, a sobreposição do primado
jurídico sobre a ciência geográfica, e vice-versa também. O interdisciplinar rompe
com as barreiras do tradicional ensejando a reflexão dos geógrafos e operadores do
direito.
De início, impende destacar que, ao buscar uma melhor
compreensão entre a natureza, o homem e a sociedade, é possível afirmar que seja
a mais antiga relação tricotômica no decorrer dos tempos, sendo formulada,
representada e problematizada, desde as mais antigas civilizações até a presente
data. Do homem probo medievo ao intelectual hodierno e pelos mais diversos
pensadores reconhecidos pela História e a Ciência, colhem-se frutos da evolução
face a apropriação da natureza. A natureza é a primeira condição material de
existência do homo sapiens, que por sua vez, suporta as inúmeras transformações
concretizadas pela ação humana, visando assegurar-lhe uma melhor condição de
vida.
Por óbvio que, o conceito de natureza aprimorou-se no decorrer dos
séculos. Indubitavelmente as concepções ou representações sobre a natureza e o
meio ambiente são definidas a depender do lugar e momento histórico, e sempre,
não apresentam nenhuma neutralidade. No mundo primitivo a natureza apresentava-
se como um elemento natural, uma fonte inesgotável de mistérios, uma natureza
mágica. Nesse período homem e natureza integravam a mesma trama social e
espacial. Por sua vez na Idade Média apresenta uma conotação religiosa, uma
natureza esculpida aos desígnios de Deus, em suma, uma natureza sacralizada, e
que ainda perdura. O romper das estruturais feudais, o desenvolvimento das
ciências, o aprimoramento do homem e a consolidação do modo capitalista de
produção, respalda a dessacralização da natureza e estabelece uma nova
denominação a de recurso. Toda a evolução da sociedade humana hodierna,
origina-se às expensas da natureza-recurso, dentro desse contexto, se construiu e
se reconstrói toda a sociedade contemporânea. Assim, paulatinamente o conceito de
natureza vem sendo repensado e substituído por uma nova percepção, a do
momento: meio ambiente.
Conquanto a postura hegemônica da civilização tenha sido a de
apropriação da natureza, passa-se na sociedade contemporânea, a erigir o meio
ambiente ou seja, a natureza transformada pelo homem (meio técnico científico
informacional) como sua maior expressão. Na seara jurídica em quatro décadas, o
meio ambiente, tornou-se objeto de discussões doutrinárias e legiferação específica,
tendo sua importância relacionada a diversos aspectos: proteção, preservação e
manutenção. Não obstante o meio ambiente simbolizar o homem e seu entorno, não
existe consenso sobre sua definição no meio acadêmico, favorecendo novas
conceituações. Assim, sem apresentar falso juízo de valor, a presente dissertação
lança nesse arcabouço pluriconceitual a sua própria definição de meio ambiente de
igual jaez, a autores colacionados nesse trabalho.
Notadamente, o conceito de meio ambiente aqui expresso apresenta
como característica um neologismo, ou seja, uma nova expressão. Na esteira desse
raciocínio define-se o meio ambiente como um conjunto de elementos físicos,
químicos, biológicos e sociais, em que o homem carrea uma característica especial
a inter-sociogeopolitecnocultural”. O prefixo inter agrega valores duplos, podendo ser
conotado como interdisciplinar, face as vicissitudes da temática ambiental e também
internacional, dada a inexistência de fronteiras para o meio ambiente. O sufixo
sociogeopolitecnocultural, designa outras interfaces do meio ambiente: socio como
expressão da uma sociedade no espaço geográfico; geo expressando a
representação geográfica; poli na relevância da política, em pensar as mudanças e
de criar as condições para torná-las efetivas; tecno referindo aos conhecimentos
técnicos e científicos, utilizados em favor da complexidade ambiental; e cultural, no
sentido de agregar as interações do ambiente natural e construído, pois, cada
cultura atribui uma conotação ímpar ao meio ambiente. Como se depreende busca-
se maior abrangência com este conceito.
Para estudar o meio ambiente, necessariamente deve-se partir de
uma visão sistemática e interdisciplinar, pois este tema envolve praticamente todas
as áreas do conhecimento humano, das ciências a filosofia. O recorte optativo pela
Geografia e pelo Direito Ambiental remonta a dificuldade destas disciplinas em
comunicarem-se entre si, com o exterior e, sobretudo de fornecer respostas para a
realidade. Na sociedade contemporânea é preciso urgentemente transcender a
concepção mecanicista cartesiana do conhecimento compartimentado, é preciso
romper o reducionismo, é preciso estabelecer uma nova relação sujeito-objeto, ora,
o objeto tamm se transforma em sujeito. A interdisciplinaridade é o caminho, o
método factível, para a integração do saber face às novas necessidades da praxis
científica. O panorama geral apresentado mostra a importância dos trabalhos
interdisciplinares, para o alargamento do horizonte da ciência, convalidando a
perspectiva sistêmica e a visão holística do processo de integração do
conhecimento.
Na pesquisa desenvolvida demonstrou-se que a Geografia esta
marcada historicamente por sua militância na busca incessante para conhecer as
relações da sociedade com a natureza. Assim, caberia a essa ciência por sua
ontologia, dinamizar tais processos, porém, em seu percurso histórico, estabeleceu-
se um paradigma clássico, o a permitindo fornecer maiores contribuições para a
sociedade. A Geografia é uma ciência integradora, e não excludente, tudo perpassa
pelo seu substrato material e imaterial, seus conhecimentos, em todo momento, são
reverberados. Não se pode reificar a Geografia, é preciso resgatar seus princípios
norteadores.
Examinando-se o Direito Ambiental, este trabalho pondera seu
caráter normativo inovador, resultante de um processo histórico evolutivo, produto
das conflituosidades sociais. O recente Direito Ambiental serve como elemento
paradigmático e inquiridor dos direitos tradicionais, e como elemento impugnador do
significado de justiça e da configuração do Estado Contemporâneo. Por essa
perspectiva, alguns de seus princípios objetivam a responsabilidade compartilhada,
a prevenção, a precaução, a cooperação e a informação (publicidade), uma vez que
executam uma função estruturante da organização democrática, equitativa e
perspectiva do Direito Ambiental contemporâneo e atuante. Entretanto, para o seu
aperfeiçoamento carece de operadores jurídicos sensíveis e com capacidade técnica
para conhecer este complexo ramo do saber jurídico.
Todo trabalho acadêmico encontra suas limitações e com este não
seria diferente, demonstrar as interfaces entre a Geografia e o Direito Ambiental no
capítulo final, foi uma árdua tarefa, que desde os primeiros escritos, era motivo de
preocupação, a escassa bibliografia para escrever algo ainda não escrito, era um
obstáculo aparentemente intransponível, que geravam dúvidas e incertezas
enormes. Como fazer para coadunar disciplinas aparentemente tão diferentes e em
contextos mais diferentes ainda, enquanto uma tem séculos de existência, a outra
ainda encontra em fase afirmatória. Foi imperativo entregar-se a este desafio, sem
os subterfúgios de teorias indecifráveis, e o confortável refúgio do academicismo.
Procurou-se, verdadeiramente esgrimir o tema, investigando em autores que se
debruçam sobre o estudo da Geografia e do Direito Ambiental. Não foram raros os
momentos em que tudo ficou parado, buscando-se uma forma de exprimir com
clareza os pensamentos, na tentativa de abordar o melhor ponto, dirimir a dúvida e
provar as afirmações.
Ao adentrar num trabalho com tamanha seriedade é preciso muitas
leituras e pesquisa. Destarte, mediano concluir que a interfaces são plausíveis e
concretas, e a principal dela diz respeito a configuração do espaço geográfico e
aplicabilidade das normas jurídicas ambientais. Permite-se ainda, concluir que os
movimentos geográficos desiguais corroboram para uma produção geográfica
desigual, nesse sentido, as normas jurídicas ambientais são fixadas nesse substrato
geográfico como se fossem camadas sobrepostas. De forma geral, uma série de
efeitos e processos produzem rebatimentos e mudanças no espaço, de modo que, o
mosaico intersocio-geopolitecnocultural corrobora para acentuar as múltiplas
atividades humanas. Em outras palavras, as diferenças geográficas são legados
históricos, cujo desenvolvimento desigual não favorece a unificação, quiçá a
pacificação social, incumbindo ao Direito tal missão. Enfim, cabe ao Direito
Ambiental ocupar seu espaço e reafirmar a proteção ao meio ambiente.
Finalmente, conclui-se neste trabalho, apresentando algumas ideias
e tudo aquilo que se pode compreender com intuito de fomentar a
interdisciplinaridade do meio ambiente, da Geografia ao Direito Ambiental. Espera-
se, que o debate exposto possa ser um alento aqueles que buscam a integração do
saber e aperfeiçoar-se.
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