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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO
PUC/SP
Fabio de Vasconcellos Menna
Limites da Arbitragem
MESTRADO EM DIREITO PROCESSUAL CIVIL
SÃO PAULO
2010
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2
PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO
PUC/SP
MESTRADO EM DIREITO PROCESSUAL CIVIL
LIMITES DA ARBITRAGEM
Fabio de Vasconcellos Menna
Dissertação apresentada ao
Programa de Pós-
Graduação
de Direito Processual Civil
para obtenção do título de
Mestre em Direito Processual
Civil sob orientação do Prof.-
Dr. Nelson Nery Junior
SÃO PAULO
2010
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3
BANCA EXAMINADORA
_________________________________________
_________________________________________
_________________________________________
4
AGRADECIMENTOS
O agradecimento sincero é um ato nobre. O ato nobre dignifica o ser
humano.
Graças a Deus tenho muitas pessoas para agradecer, para admirar, para amar
e me
dedicar.
Certamente,
algumas não serão mencionadas aqui,
mas
vão
compreender porq
ue entendem meu modo de ser.
Quero agradecer ao meu orientador Prof. Dr. Nelson Nery Junior,
que
desde
muito
admiro e aos
ilustres
membros da banca Prof. Dr. Francisco José Cahali
e
Prof. Dr.
João Ricardo Brandão Aguirre.
Compartil
ho também este trabalho com o Prof.
Dr.
Oswaldo Henrique Duek
Marques por todas as orientações e por ter participado da banca de
qualificação
.
Agradeço ao meu pai (in memorian) por tudo que me proporcionou e a minh
a
mãe
, símbolo de força e alegria.
Não tenho palavras para agradecer ao amigo Gustavo Octaviano Diniz
Junqueira,
pois
mesmo que pudesse escrever um livro para expressar a sua
importância seria muito pouco.
De forma especial agradeço à Daniela, por me acompanhar nos momentos
difíceis
na elaboração do presente trabalho com muita delicadeza e alegria.
Da
mesma forma,
agradeço
à Carolina por todo o apoio.
Agradeço aos meu
s amigos:
Paulo Henrique
Aranda Fuller
, Renato Montans
de
Sá, Andre Paes de Almeida e Gustavo Fernandes,
que
sempre me serviram
como exemplo de dedicação.
Enfim
,
agradeço
a minha esposa Thaisa, por toda a compreensão, apoio e
dedicação e
a
s minhas filhas
,
Luiza e Maria Victoria
, cujos olhos possuem tanto
brilho que iluminam minha vida.
5
Rui Barbosa, no início deste século, preconizou que: O século vinte
vai ser o século do arbitramento nos conflitos entre as nações. E,
quando o arbitramento reinar entre os povos exaustos pela política
marcial do século dezenove, o papel arbitral desse soberano
descoroado e desinteressado entre as ambições territoriais, que
impelem os Estados uns contra os outros, aumentará infinitamente o
valor da sua situação excepcional, da sua atitude semi-oracular no
mundo civilizado. Quem sabe se o papa não será então o grande
pacificador, o magistrado eleito, de hipótese em hipótese, entre os
governos, para solver as contestações grávidas de ameaças, e
conduzir à harmonia, pela submissão voluntária aos ditames da
justiça, as grandes famílias human
as inimizadas?
Batista Pereira
Coletânea Literária
6
RESUMO
Esta dissertação pretende analisar a forma de resolução de conflitos conhecida
por Arbitragem, diante da necessidade de intensificar a aplicação dos
dispositivos previstos na Lei de Arbitragem (Lei 9.307/96), que visam limitar
o procedimento arbitral sem lhe tirar aquilo que é fundamental, isto é, a
liberdade de convenção das partes e a escolha pela forma de julgamento, por
equidade ou de direito. É feita uma breve revisão da literatura acerca da
história da Arbitragem, com foco no Brasil, e de sua natureza jurídica,
abordando os princípios constitucionais e os princípios da Arbitragem a fim de
viabilizar a relação entre eles, principalmente no que tange à crise resultante no
Judiciário. Com
base na relação entre os princípios, serão tratados temas como
equidade, matéria de ordem pública, autonomia da vontade da parte diante do
devido processo legal e obrigatoriedade ou não de o árbitro adotar a súmula
vinculante. O escopo deste trabalho é buscar melhor compreensão sobre as
vantagens da Arbitragem, entre as quais o descongestionamento do Judiciário,
e formas de garantir aos que optam por esse meio de resolução de conflitos a
segurança jurídica.
Palavras
-
chave:
Arbitragem. Lei de Arbitragem. Ju
risdição Arbitral. Convenção
de Arbitragem. Princípios Constitucionais. Princípios da Arbitragem. Matéria de
Ordem pública. Súmula Vinculante.
Autonomia da Vontade das Partes.
7
ABSTRACT
This dissertation intends to analyze the conflict
resolution way called Arbitration,
due to the need of intensifying the application of the devices foreseen in the
Law of Arbitration (Law nº. 9.307/96), that aim to limit the Arbitration procedure
s
without removing what it has as fundamental, that is, the freedom of convention
of the parts and the choice for the judgement form,
by
equality
before law
or
legal right. A brief revision of literature concerning the history of the Arbitration
is made, with focus in Brazil and in the juridical nature of that inst
itute,
approaching constitutional and arbitrable principles, in order to make possible
the relationship among them, mainly with respect to the resulting crisis in the
Judiciary. Based on the relationship among principles, themes as
equality
before law, matter of public order, autonomy of parts will before the due legal
process and compulsory nature or not of the referee to adopt the
linked
summary
. The mark of this work is
seeking
for
a
better understanding about the
advantages of Arbitration, among them the decongestion of the Judiciary, and
forms of guaranteeing to
one
that
opt
ed
for that solving conflicts way the
juridical safety.
Word
-key: Arbitration, law of arbitration
,
jurisdiction
by arbitration, convention of
arbitration
,
constitutional
princip
les,
arbitration
principles,
matter of public order
,
linked summary,
autonomy of
parts
will.
8
LISTA DE SIGLAS
Ac.
-
acórdão
a.
C.
-
antes de Cristo
Ap.
-
apelação
Ag
.
-
Agravo de Instrumento
AgRg
.
-
Agravo Regimental
Art
.
-
artigo
Arts
.
-
artigos
CC
-
Código Civil
CDC
- Código de
Defesa do Consumidor
CF
-
Constituição
Federal
CPC
- Código do
Pr
ocesso
Civil
d.
C.
-
depois
de
Cristo
De
c
,
Lei
ou
DL
'-
Decreto
-
Lei
D
es.
-
Desembargador
DJ
-
Diário Oficial da Justiça
DOU
-
Diário Oficial da União
Ed.
-
Editora
ed.
-
edição
Ibid.
-
Ibidem
inc.
- inciso
Larb
-
Lei de Arbitragem (n
o
9.307/96)
Op
.
cit.
opus citatum
=
obra
citada
p.
-
página
par. ou §
-
parágrafo
reI.
-
relator
RE
-
Recurso Extraordinário
REsp.
-
Recurso Especial
RISTF
-
Regimento Interno
do Supremo rribunal Federal
RST J
-
Revista do Superior Tribunal de Justiça
RT
-
Revista dos Tribunais
STJ
-
Superior Tribunal de Justiça
STF
-
Supremo Tribunal Federal
Trad.
-
Tradução
V
ol
.
-
Volume
V.g.
-
verbi gratia
9
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO
................................................................
................
11
1. ARBITRAGEM: HISTÓ
RICO E NATUREZA JURÍ
DICA
...........
17
1.1
SOLUÇÃO
DE
CONFLITOS:
UM
BREVE
HISRICO
................................
...................
17
1.1.1 Sociedade e Conflito
................................ ................................ ................................
.......
19
1.1.2 Da Sociedade Primitiva
................................ ................................ ................................
..
22
1.1.3 Da Mitologia Grega
................................ ................................ ................................
..........
23
1.1.4 Direito Romano
................................ ................................ ................................ ................
25
1.1.5 Da formação da arbitragem na Europa Ocidental
................................
.....................
31
1.2 A ARBITRAGEM NO BRASIL
................................ ................................
...................
34
1.3
NA
TUREZA
JURÍDICA
DA
ARBITRAGEM
................................
................................
...........
46
1.3.1 Da Natureza Contratualista
................................ ................................
..............................
47
1.3.2 Teoria Híbrida
................................ ................................ ................................
....................
51
1.3.3 Teoria Publicista
................................ ................................ ................................ ................
53
2. ANÁLISE DOS PRINC
ÍPIOS DA ARBITRAGEM
PELA ÓTICA
DA CONSTITUIÇÃO FEDE
RAL
................................
....................
59
2.1
PRINCÍPIOS
CONSTITUCIONAIS
DA
ARBITRAGEM
................................
.........................
61
2.1.1 Do Princípio Do Devido Processo Legal
................................ ................................
.........
65
2.1.2 Do Acesso À Justiça
................................ ................................ ................................
.........
70
2.1.3 Do Contraditório E Da Ampla Defesa
................................
................................
..............
76
2.1.3.1 Do Principio da Igualdade das Partes
................................ ................................ .......................
80
2.1.4 Princípio do Juiz Natural
................................
................................
................................
...
82
2.2
PRINCIPIOS
DA
ARBITRAGEM
................................ ................................
..............................
89
2.2.1 Autonomia da Vontade da Parte e Vontade Privada
................................
.....................
89
2.2.2 Princípio da Obrigatoriedade da Sentença
................................ ................................
.....
94
2.2.3 Efeito Vinculante Da Cláusula Arbitral
................................ ................................
............
99
2.2.3.1 Da Convenção de Arbitragem
................................ ................................ ................................
.....
99
2.2.3.2 Efeitos Da Convenção Arbitral
................................
................................ ................................
..
102
2.2.3.3 Efeito negativo da convenção de arbitragem
................................ ................................
.........
103
2.2.3.4 Convenção De Arbitragem E O Juízo Arbitral
................................ ................................ ........
106
2.2.3.5 Efeito positivo da convenção de arbitragem
................................ ................................
...........
107
2.3 KOMPETENZ-KOMPETENZ
................................
................................
....................
109
3. CRISE NA RELAÇÃO ENTRE OS PRINCIPIOS
DA
ARBITRAGEM E AS NORMAS CONSTITUCIONAIS: LIMITES DA
ARBITRAGEM
................................................................
..............
115
3.1
CONCEITO
DE
MATÉRIA
DE
ORDEM
PÚBLICA
................................
...............................
115
3.1.1 Da Distinção Do Direito Público E Privado
................................ ................................
...
117
3.1.2 Classificação
................................ ................................
................................
....................
120
3.1.3 Finalidade Da Ordem Pública Na Arbitragem
................................
..............................
121
3.1.4 Das Condições Da Ação No Âmbito Da Arbitragem
................................
...................
123
3.1.4.1 A Possibilidade Jurídica Do Pedido
................................ ................................
.........................
127
3.1.4.2 Interesse De Agir
................................ ................................ ................................ ........................
1
29
3.1.4.
3 Legitimidade Ad Causam
................................ ................................ ................................
...........
131
3.1.4.4 Momento Para A Decretação Da Carência De Ação
-
Matéria De Ordem Pública
.............
132
3.1.4.5 Conclusão
................................ ................................ ................................ ................................ ....
135
3.2
JULGAMENTO
POR
EQUIDADE
E
CONVENÇÃO
DE
ARBITRAGEM
............................
136
3.2.1 A aplicação da equidade
................................ ................................ ................................
138
3.2.2 Limitações à aplicação da equidade
................................ ................................
.............
141
3.2.3
A arbitragem e a equidade
................................ ................................
.............................
142
3.3
SÚMULA
VINCULANTE
................................ ................................
................................
.........
147
10
3.3.1 Efeito Vinculante Das Decisões Judiciais
................................ ................................
.....
154
3.3.2 Imperatividade
................................ ................................ ................................
.................
157
3.3.3 Aspectos Particulares Da Súmula Vinculante
................................
..............................
159
3.3.4 Súmula Vinculante E Arbitragem
................................ ................................
...................
161
3.4
LIMITAÇÃO
DO
PRINCIPIO
DA
AUTONOMIA
DA
VONTADE
DAS
PARTES
EM
FACE
DO
DEVIDO
PROCESSO
LEGAL
................................ ................................ ................................
164
CONCLUSÃO
................................................................
...............
173
BIBLIOGRAFIA
................................................................
............
178
11
INTRODUÇÃO
O tema arbitragem foi escolhido em razão do crescente interesse pelo
instituto no Brasil, fomentado pela notória ineficiência do Poder Judiciário em
atender às demandas com a velocidade e a razoabilidade exigidas pela
dinâmica das relações sociais na modernidade. O incremento das atividades
arbitrais
gera indagações ainda não suficientemente estudadas na ciência
jurídica brasileira, pelo que o presente trabalho ganha pertinência.
Dentre as questões mais freqüentes, avultam as referentes ao
ajustamento d
e
limites
, tanto no que se refere ao procedimento quanto à
sentença arbitral. É justamente este ponto que será abordado neste trabalho:
os limites da arbitragem.
Para
Osmir Antonio Globekner
1
:
Os limites, quer os impostos pela natureza das coisas, quer os
culturalmente elegíveis pelo indivíduo e pelo agrupamento social,
seriam, sempre, o fruto da existência de uma tensão e da necessidade
de equilíbrio, fruto de uma delimitação entre extremos, ou da
necessidade de estabelecimento de um ponto intermédio, um ponto de
equilíbrio
.
O que se pretende neste trabalho, ao analisar os limites da arbitragem
no Brasil, não é restringir o campo da via arbitral ou diminuir sua importância,
ao contrário, é conferir às litigantes maior segurança jurídica e aos árbitros
maio
r responsabilidade na resolução de conflitos, enfim, é a busca pelo ponto
de equilíbrio acima mencionado. Isto porque, conforme Osmir Antonio
Globekner
2
:
1
LIMITES DA INTERPRETAÇÃO JURÍDICA
-
www.conpedi.org/manaus/arquivos/
2
LIMITES DA INTERPRETAÇÃO JURÍDICA
-
www.conpedi.org/manaus/arquivos/
12
Não havendo delimitação, não podemos derivar a idéia de entidade ou
de identidade. Podemos imaginar que, se um ente não fosse
comportado dentro de uma fronteira ou limite, esta se colocaria em
uma expansão contínua, infinita e indefinida que findaria por
descaracterizar o próprio ente como tal, ao não se encontrar aquilo que
com ele confrontando, possa
de
limitá
-
lo.
A Lei de Arbitragem
(Larb)
prevê e impõe limites ao procedimento
arbitral conforme dispõe o art. 2º, §2º e art.
21,
§2º, ambos da lei
9307/96.
Ocorre
que estes dispositivos apresentam situações que exigem a
interpretação dos operadores do direito,
pois
expressam conceitos amplos e
polêmicos.
Dai então, a importância do trabalho
ora apresentado
.
Ao delimitar o tema do presente trabalho à arbitragem int
erna
, excluem-
se do seu âmbito os contratos internacionais e as sentenças arbitrais
estrangeiras.
Procuramos analisar limites da jurisdição arbitral frente aos
princípios constitucionais e de seus próprios princípios.
Para tanto, será efetuada a divisão
em três capítulos:
(I)
Aspectos gerais
da arbitragem, (II) Análise dos princípios sob a ótica constitucional e (III) Crise
na relação entre os princípios da arbitragem e as normas constitucionais:
limites da arbitragem.
No primeiro cap
í
tulo faremos um
esboço histórico da arbitragem a fim de
demonstrar que o monopólio estatal da atividade jurisdicional é fruto de uma
opção de organização do próprio Estado. Tal esboço analisa a solução de
conflitos desde a sociedade primitiva até a edição da
Larb
. Este co
ntexto
histórico é fundamental para a pesquisa acerca da natureza jurídica da
a
rbitra
gem.
13
Aqui, é de bom alvitre ressaltar que adentramos nesta seara, pois
apenas com o conhecimento da natureza jurídica dos institutos, pode-
se
aprofundar o estudo acerca de determinado assunto em direito. Por isso que
para Joel Dias Figueira Junior
3
:
a natureza jurídica deve refletir a verdadeira expressão ontológica da
matéria em estudo, levando-se em consideração os seus elementos
constitutivos; qualquer esboço classificatório dependerá sempre da
prévia e antecedente fixação da natureza jurídica do fenômeno,
instituto ou instituição jurídica analisada
.
Outrossim, é de se registrar ainda que o tema em comento é dos mais
polêmicos, havendo na doutrina três corr
entes
que concernem à natureza
jurídica da arbitragem. Uma primeira teoria defende ter a arbitragem uma
natureza privatista, ao passo que a segunda defende a natureza jurisdicional
da
arbitragem
e a
ú
ltima uma teoria hibrida.
Para os defensores da teoria privatista, em suma, não se pode admitir a
natureza jurisdicional da arbitragem em virtude da decisão do árbitro
pretensamente não possuir força jurisdicional, ou seja, continuar sendo,
em
essência, a extensão do acordo celebrado entre as partes, terreno exclusivo do
direito obrigacional. Ademais, aduzem os defensores da teoria contratual que
em função do árbitro não deter os poderes de execução e de cautelaridade,
que são monopólio do Estado, falta investidura do árbitro para tal fim, razão
pela qual não s
e poderia reconhecer a natureza jurisdicional
da arbitragem
.
3
FIGUEIRA JÚNIOR, Joel Dias. Arbitragem, Jurisdição e Execução, 2
a
. Ed., p. 108. São Paulo, RT,
1999, p.107.
14
Para os adeptos da corrente denominada jurisdicional ou publicista, o
árbitro, tal como o juiz de direito, tem a função judicante, ou seja, ambos têm o
poder de aplicar o direito ao caso concreto. Afirmam, também, que a jurisdição
não se daria somente no âmbito do Estado, podendo também ser exercida pelo
árbitro, mesmo que este não goze da condição de agente público. Ainda,
alegam que o exercício da arbitragem se revelaria numa autêntica particip
ação
popular na administração da Justiça, o que não prejudica o caráter público da
atividade julgadora.
A
última corrente, denominada hibrida ou mista, mistura conceitos de
ambas as correntes anteriormente mencionadas. Assim, acreditam seus
seguidores, que a
arbitragem
possui seu aspecto contratual, pois no momento
de sua adoção a necessidade de uma convenção pelas partes; mas não
negam que sua função fosse judicante, ou seja, acreditam que o papel do
árbitro se assemelhava com o de um juiz.
A partir da
an
á
lise
da natureza jurídica passamos a estudar a aplicação
dos princípios na
arbitragem.
Dividimos em princípios constitucionais aplicados
na arbitragem e nos princípios específicos da arbitragem.
An
alisamos
os
princípios relacionados com o te
ma do presente trabalho, quais sejam, o devido
processo legal, do acesso a justiça,
do
contraditório e da ampla defesa, juiz
natural,
autonomia da vontade das partes, efeito vinculante da convenção de
arbitragem e competência
-
comp
ê
tencia.
15
A importância da apreciação dos princípios se dá, principalmente, no
que tange a sua eficácia imediata. Eis aqui um limite da autonomia da vontade
das partes: não se
podem
excluir os princípios.
Trata
-se de uma leitura mais
abrangente
do
binômio a
rbitragem
-
princí
pios.
No
terceiro capítulo analisaremos a crise existente entre algumas regras
da
arbi
tragem e algumas normas constitucionais face à proposta deste
trabalho.
Num primeiro momento exploraremos a relação matéria de ordem
blica
e arbitragem. Conceituar matéria de ordem pública é uma das tarefas
mais difíceis do operador do Direito, motivo pelo qual, vamos apresentar os
pontos esse
ncia
is para
relacioná
-la com a arbitragem, como por exemplo,
a
an
á
lise das condições da ação no juízo arbitral.
Posteriormente,
discutir
emos a questão da súmula vinculante,
essencialmente, seu conceito e aplicação no procedimento arbitral.
Vamos
enfrentar um ponto de alta relevância: se a
arbi
tragem é privada, a
mula
vinculante editada pelo STF pode determinar a decisão do
á
rbitro?
Em s
eguida
, passaremos ao tema da equidade face à convenção de
arbitragem
na tentativa de demonstrar que, embora a opção das partes pela
equidade seja legitima e legal, devem ser observados limites a fim de se evitar
decisões arbitrais sem qualquer fundamento, garantindo, assim a segurança
jurídica da via arbitral.
16
Por
ú
ltimo
, será objeto de análise o princípio da autonomia da vontade
das partes face ao devido processo legal.
Ambos
, sem vida, representam os
princípios mais importantes na arbitragem e, por isso, devem ser rigidamente
adotado
s pelo árbitro. A vontade das partes não pode se sobrepor ao devido
processo legal, ou seja, as partes não podem, por exemplo, renunciar o direito
ao contraditório, pois este
é inerente a um processo judicial ou arbitral por força
da Constituição Federal.
O que se pretende é levar o operador do Direito a uma reflexão sobre os
limites da arbitragem. Não pretendemos, pelo menos neste trabalho,
apresentar soluções ou criticar a L
arb
. O objetivo é, através de breves, mas
importantes palavras, demonstrar a importância do estudo acerca da
arbitragem e de sua utilização pela sociedade, pois os eventuais limites não
diminuem sua importância, ao contrário, atribuem segurança jurídica e
vitando
que a arbitragem seja utilizada de maneira indevida e irresponsável,
como
ocorre no Brasil.
17
1. ARBITRAGEM: HISTÓRICO E NATUREZA JURÍDICA
O tema ora abordado vem ao encontro da necessidade de soluções
efetivas em conflitos sem a participação do Estado. Trata-se de fato
incontroverso a busca da sociedade por uma prestação jurisdicional lastreada
na rapidez, segurança e efetividade. Isso porque o Estado, conforme será
exposto a seguir, diante de um conflito que envolve algum de seus
administrados, assumiu a responsabilidade de dizer a quem o direito pertence,
observando, sempre, o princípio da substitutividade, no qual a imposição de
sua vontade, ao substituir a das partes, é uma obrigação.
1.1 SOLÃO DE CONFLITOS: UM BREVE HISTÓ
RICO
O Estado obriga-se a garantir aos cidadãos a tutela de seus direitos,
que, ao impedi
-
los de escolher a forma mais adequada para pacificar conflitos,
diante da resistência de um direito que, subjetivamente, possuem, torna-
se,
então, o Estado
-
juiz,
exclusivo possuidor do monopólio da jurisdição.
Segundo
Ovídio A. Baptista da
Silva
4
, o conceito de direito no Estado
moderno suscita desde logo a
ideia
de jurisdição. O pensamento
contemporâneo tende irresistivelmente a equiparar o direito à norma jurídica
editada pelo Estado, cuja inobservância lugar a uma sanção. Na verdade,
4
SILVA, Ovídio A. Baptista da.
Curso de pr
ocesso civil,
v. I, tomo I: Processo de conhecimento,
8ª ed., rev. e atualizada
Rio de Janeiro: Forense, 2008.
18
o crescimento avassalador do Estado moderno está intimamente ligado a um
mo
nopólio da produção e aplicação do direito, portanto a sua criação, seja em
âmbito legislativo, seja jurisdicional.
Esse monopólio estatal foi-se atenuando com o decorrer dos tempos,
como nas hipóteses de Justiça Desportiva e Mediação, mas essencialmente
com a utilização da
arbitragem
. A flexibilização não se deu de forma aleatória,
pois para muitos comentadores o Estado não tem estrutura suficiente para dar
resposta a todas as demandas, determinando a busca de alternativas. Como
resume
Joel Dias
Figueira
Junior
5
:
Esta nova forma de prestar a jurisdição
desta feita privada
significa antes de tudo um avanço legislativo que vem refletir uma
nova modalidade que, por sua vez, procura se adequar às
tendências do processo civil contemporâneo na busca de
formas
alternativas de solução dos conflitos de interesse.
Para muitos, ao tentar escapar ao exaurimento, o Estado distribui parte
da jurisdição que detinha com exclusividade e possibilita ao particular declarar
às partes, na forma de sentença arbitral, o direito, como fez com a aprovação
da Lei 9.307/96
L
arb
. Destacam
-
se os ensinamentos de
J.E. Carreira
Alvim
6
,
que alega que:
existem diversos sistemas que possibilitam a resolução de litígios
sendo mais prestigiado deles o sistema jurisdicional, em, que
o
Estado se encarrega de instituir adrede órgãos destinados a esta
finalidade (juízos), reservando-se com exclusividade ou não o
monopólio da distribuição da justiça. É denominado sistema da
justiça pública que tem no Estado o seu organizador e fiel garan
tidor
pela força que põe (e ele pode por) a serviço da atividade
jurisdicional. Ao lado desse sistema, que é o adotado pela
generalidade dos países, viceja outro, em que o Estado, em vez de
5
FIGUEIRA JUNIOR, Joel Dias.
Arbitragem:
jurisdição e execução. Análise crítica da Lei 9.307
de 23 set. 1996. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999, 2ª ed., p.109.
6
ALVIM, J.E. Carreira.
Comentários à lei de arbitragem
. Curitiba: Juruá, 2008, 2ª ed., p.40
19
interferir diretamente nos conflitos de interesse solucionando-os com
a força da sua autoridade, permite que uma terceira pessoa o faça
segundo determinado procedimento e observado o mínimo de regras
legais, mediante uma decisão com autoridade idêntica a de uma
sentença judicial. É o denominado sistema de arbitragem que, a
grosso modo
[sic]
nada mais é do que a resolução do litígio por meio
de árbitros, com a mesma eficácia da sentença judicial.
Com o surgimento da Larb, criam-se mecanismos práticos de
pacificação social, desta feita particular e, ainda, embora separado da
chancela do Poder Judiciário, produzindo efeitos semelhantes aos do ente
estatal.
Desde que se aceite que a eficácia da sentença arbitral é a mesma de
uma sentença judicial, muito se questiona acerca da existência da atividade
jurisdicional dentro da arbitragem. Para responder a esta questão, outro não é
o caminho, senão analisar a história.
1.1.1
Sociedade e Conflito
É consagrada a afirmação: o homem é um animal político e social
(Santo Tomás de Aquino), e a simples convivência entre duas pessoas é
suficiente para o surgimento de conflitos, o que impõe a necessidade de
serem criadas regras de convivência, estabelecendo-se direitos e deveres. E
é justamente da necessidade de estabelecer regras que surge o direito, pois,
onde pessoas, direito (ubi societas, ibi jus
).
Mas as pessoas,
independentemente de religião ou credo, dependem, sobremaneira, das
coisas, dos objetos que as cercam. Muito além de propiciar conforto e prazer,
20
os bens são necessários à manutenção da vida e perpetuação da espécie
humana. Desde a era primitiva, a vida depende dos alimentos, do calor, dos
instrumentos para proteção, entre tantos outros e
lementos.
Se há pessoas e coisas, haverá sempre uma forte relação entre ambas.
O ser humano não encontra no habitat todos os elementos de que necessita
para a sobrevivência e bem-estar. Essa escassez natural faz com que se
estabeleçam normas para delimitar a atuação do indivíduo em relação ao
grupo social e aos bens. Portanto, o direito regrará o comportamento dos
indivíduos entre si e a conduta que cada um deverá adotar com o que o
rodeia.
A história vai muito além da narração de fatos do passado. Deve-s
e,
contudo, tentar eliminar a ideia de que separação dos tempos: moderno e
passado. A história é uma só: ontem e hoje se combinam. Sendo impossível
alterar fatos passados, cabe utilizar todos os meios e esforços para melhor
entendimento do ocorrido, e, assim, os fatos podem servir como base para
decisões futuras.
Gregos e romanos estão entre os responsáveis pelos maiores relatos
históricos das civilizações antigas. Desses registros são extraídas
informações que servem de paradigma na atualidade.
A Grécia é o berço da doutrina do Direito Natural, em que a razão era
associada à natureza de forma quase que inseparável. De vem a ideia de
21
liberdade, educação, segurança, subsistência, bens da cultura, vida etc.
Confronta
-se com a escola positivista do Direito Romano, que se exprime por
meio de regras
escritas
. O conjunto destas regras forma o ordenamento
jurídico. Os princípios darão as diretrizes que as regras devem seguir e, junto
ao ordenamento, comporá o sistema jurídico presente ainda nos dias atuais
na sociedade moderna. Esses sistemas, aglomerados, formam três grandes
grupos, a saber: romano-
germânico
(civil law
);
common law
(anglo
-
americano); e direitos socialistas.
Seja qual for o sistema adotado o fim é o mesmo, ou seja, dar à
sociedade a possibilidade de viver em harmonia, uma vez que qualquer
desrespeito às regras será
dirimido
por meio de sistemas de
resolução
de
conflitos. Foi assim nas principais sociedades antigas e até mesmo nos povos
primitivos, como noticia
Joel Dias
Figueira Junior
7
:
é com esse espírito de investigação que poderemos constatar que o
instituto jurídico da arbitragem é, por certo, um dos mais antigos que
se tem notícia na história do Direito e, especificamente, acerca da
jurisdição ou justiça privada, noticiado na
Babilôni
a de 3000 anos
a.C, na G
récia antiga e em Roma.
7
FIGUEIRA JUNIOR, op.cit., p.24
.
22
1.1.2
Da Sociedade Primitiva
Antes da formação dos Estados, os
indivíduos,
na maioria das vezes,
pacificavam os problemas por meio da força. A tutela de direitos era garantida
por atos de violência e imposição. Essa fase foi chamada de autotutela ou
justiça de mão própria, onde cada um defendia à força sua pretensão
8
.
A capacidade de uma pessoa agir, ou reagir, praticando qualquer
atitude, mesmo que estivesse fazendo apenas prevalecer a força de se
u
instinto
.
A tutela dos direitos originou-se nos povos primitivos do próprio
instinto humano de preservação e da concepção individualista do justo e
injusto.
A forma mais primitiva de composição de uma lide utilizada pelos
indivíduos foi a força física. Essas ações eram exclusivamente privadas, visto
que nem sequer ideia de Estado havia, menos ainda de qualquer
ordenamento jurídico que viesse a coibir tais ações.
Num processo evolutivo, o homem se obrigado a abandonar a força
física,
preferindo a mediação de pessoas que, de certa forma, detinham
o
8
Se
gundo Miguel Reale, essa posição do homem primitivo uma coloração mágica às
primeiras regras jurídico-sociais, que se ocultam na noite dos tempos. Não pensem que Direito
surgiu com os romanos ou que tenha a história curta do Código de Hamurabi, que é d
e dois mil
anos antes de Cristo. Os etnólogos nos afirmam que, em épocas remotas, houve cavernas em
que trabalhavam dezenas de indivíduos empenhados na fabricação de machados neolíticos,
para serem vendidos em feiras distantes. A existência dessas cavernas implica uma
discriminação de tarefas naquela época e, por conseguinte, uma relação entre senhores e
escravos, primeira e tosca forma de relação de trabalho . Lições preliminares de direito
. 26ª ed.
ajustada ao novo Código Civil
São Paulo: Saraiva, 20
02.
23
respeito
de ambos os envolvidos em uma desavença,
confiando
a terceiros a
tarefa de julgar suas lides.
1.1.3
Da Mitologia Grega
O pensamento grego por volta de 500 a.C. é de fundamental
importância para o estudo da arbitragem, visto que a cidade de Atenas
colhia as consequências de rias guerras travadas nos últimos 100 anos,
momento no qual atingiu o ápice do poder. A mitologia e a história da
Grécia possuem inúmeros exemplos da aplicação da arbitragem (e da
mediação
)
9
nos conflitos e divergências entre os deuses. Prevalecia o
panteísmo (palavra que vem do grego,
pan
= tudo, +
theós
= deus), o que
fazia com que deuses comuns unissem e aproximassem o povo grego a fim
de que se mediassem dos conflitos para uma solão amigável do mesmo,
ou, quando infrutífera tal mediação, principalmente nas queses de limites
envolvendo as Cidades-Estados, a arbitragem era aplicada.
Segundo
José
Cretella Neto
10
:
aparece, então, nas polis, ou Cidades-
Es
tados, a figura do árbitro,
que decide o litígio de modo breve, com o sim ou o não ,
9
Segundo José Luiz Bolzan de Morais, em Mediação e Arbitragem: alternativas de jurisdição,
orivas de arbitragens entre os povos gregos, tanto entre particulares como entre cidades-
estados
, este ultimo podendo ser exemplificado pelo Tratado de Paz estabelecido por
Esparta
e Atenas, em 455.a.C. Mediação e Arbitragem: Alternativas à Jurisdição! Edição
.
Porto
Alegre: Livraria do Advogado, 2008, p. 168
10
CRETELLA NETO, José. Comentários à lei de arbitragem
Rio de Janeiro: Editora Forense,
2007 p.3
.
24
julgando de modo mais flevel, sem ater-se às regras
processuais formais e à lei, como o juiz estatal, laando mão,
quando considerava apropriado, da epieiquia, ou seja, da
equidade. Na realidade, sua fuão era dividida em duas fases, a
tentativa de concilião das partes e, não obtendo êxito, julgava,
isto é, proclamava a sentença.
A base jurídica da arbitragem entre particulares ou entre cidades
gregas era um compromisso, contrato especial, ou uma cláusula
compromissória inserta nos contratos ou tratados de comércio, de aliança ou
de paz. O direito aplicado era o direito comum dos helenos.
11
A aplicação da arbitragem era tão sólida a ponto de ser mantida mesmo
após
a invasão romana, isso porque os invasores assim permitiram, ou seja,
além de conhecerem a arbitragem, perceberam que a mudança do sistema
não seria conveniente.
A apologia da equidade, marcante na obra de Aristóteles
12
comprova a
marca do mais influente filósofo da Antiguidade grega na cultura ocidental
mode
rna
13
: a vigente Larb faz referência expressa à equidade, com conteúdo
que se abebera nas lições aristotélicas e merecerá o devido desenvolvimento
nos próximos capítulos.
11
Joel Dias Figueira Junior cita Guido Fernando Silva Soares em Arbitragem Internacional.
Introdução História, Enciclopédia Saraiva, 7/379, n.9. Arbitragem, jurisdição e Execução:
análise crítica da Lei 9.307 de 23.09.1996. Ed. - São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999,
p.30.
12
ARISTOTELES.
Ética a Nicômaco
. Tradução: Pietro Nassetti. São Paulo: Martin Claret, 2007.
13
CINTRA, Fausto Gonçalves. A equidade como instrumento de integração de lacunas no
Direito Civil Brasileiro. A ideia de equidade é de longa tradição no pensamento humano,
notavelmente no decurso da historia ocidental. É possível mesmo remontar a tempos pré-
históricos, observando a semelhança do termo latino
æquitas
, que originou eqüidade em
português, com o
sânscrito
aika
e com o grego (
epieikeia
), usado por Aristóteles. Nos três
vocábulos, é imanente a noção comum de proporção, equilíbrio, igualdade
.
25
1.1.4
Direito Romano
O sistema jurídico brasileiro está
enraizado
no
civil law
14
e, sendo certa
sua origem no Direito Romano, torna-se imprescindível uma abordagem
histórica deste direito, especialmente das fontes, ordenamento jurídico e a
suas transformações.
Segundo José Cretella Neto
15
:
em Roma, a arbitragem surge com a extensão dos poderes do juiz e
jus
titia bonae fidei. O receptum compromissum e a exceptio conventi
do direito
pretoriano,
contraposto ao ius civile, adaptam a
litis
contestatio
às peculiaridades dessa forma de solução de litígios.O
pretor
outorgava
às partes o emprego da actio bonae fidei e, sem
ficar preso às formulas o árbitro julga conforme o que lhe pareça
mais consentâneo com a fórmula estabelecida.
O Direito Romano, no período arcaico, à época da instauração da fase
monárquica (510 a.C.), era caracterizada por decisões baseadas nos
costumes (direito consuetudinário). Em 461 a.C., surge a Lex Tarantilla ou Lei
das XII Tábuas, que é exaltada como fonte de todo o Direito Romano pela
inequívoca relevância para o estudo do processo da época. O caráter romano
restou visível em praticamente todas as disposições da Lei: primitivo, prático,
concreto, imediatista, religioso e violento.
16
14
Segundo Miguel Reale Cabe, nesse sentido, distinguir dois tipos de ordenamento, o da
tradição romanística (nações latinas e germânicas) e o da tradição anglo-americana (common
law). A primeira caracteriza-se pelo primado do processo legislativo, com valor secundário as
demais fontes do direito. A tradição latina ou continental (civil law) acentuou-se especia
lmente
após a Revolução Francesa, quando a lei passou a ser considerada a única expressão
autentica da Nação, da vontade geral, tal como verificamos na obra de Jean-
Jacques
Rousseau,
Du Contrat Social ,
op.cit., p.141.
15
CRETELLA NETO, op.cit., p.4.
16
Dhenis Cruz Madeira afirma que: Somente com as legis actiones, surgidas no primeiro
período histórico-romana (Realeza), viu-se uma sistematização na resolução dos conflitos.
Contudo, nesse tempo, a palavra ainda possuía grande magicismo e significado, tanto é que o
26
No período clássico, aparece a figura dos pretores romanos
pessoas
que detinham a função jurisdicional. Com a evolução, os pretores passaram
a
publicar editos anuais que continham, basicamente, o plano de atuação
durante sua gestão. Os editos (edictum perpetuum) constituíam verdadeiras
fontes do Direito e vieram para completar, suprir e interpretar as lacunas
deixadas na lei.
Destaca
-se que, na época, a solução dos conflitos não era exercida
pelo Estado
17
.
Extraem
-se então informações históricas das diversas obras literárias,
tais como as escritas por Cícero, grande orador dos fins da época republicana
e Aulo Gélio, autor de Noites Áticas, tratando esta última das atividades como
iudex.
No período pós-clássico, pode-se citar o Código Theodosiano. Esta
obra é composta por dezesseis livros, contendo Constituições Imperiais
(
leges
),
desde o reinado de Constantino. Com grande relevância nos aspe
ctos
recursais, e embora ainda pouco explorado, mostra-se importante no âmbito
da fase
cognitio extra ordem
ou conhecimento extraordinário.
rito bastava a si mesmo. Havia um misto de atos públicos e privados, sendo que este último
predominava. A arbitragem privada detinha maior importância que os atos dos agentes
públicos. As ações de lei não separavam, de forma clara, norma material de norma
processual e, caso uma parte inobservasse a forma (palavras bradadas ou gestos mímicos
previamente estabelecidos), não veria sua pretensão acolhida. A oralidade era a máxima. A
cognição, se é que se pode assim chamar, restringia-se à análise da observância da forma,
com uma tímida análise do direito e fatos propriamente ditos (Processo de conhecimento e
cognição:
uma inserção democrática de direito. Curitiba: Juruá, 2008 p.98.
17
Para Joel Dias Figueira Junior, tendo-se em conta que a justiça privada antecedeu
historicamente aos juízes ou tribunais estatais, é no Direito Romano que vamos encontrar as
raízes mais profícuas do instituto da arbitrag
em ou do compromisso arbitral , op.cit.,
p.25.
27
Enfim, Justiniano
18
nomeou uma comissão para organizar e compilar o
Direito Clássico e P
ós
-C
lássico
. Sua magistral obra ficou conhecida como
Corpus Iuris Civile. Divide-se em quatro partes: Codex repititae praelectiones
(de 534 d.C., continha doze livros com Constituições Imperiais desde o fim do
século II);
Digesta
ou
Pandactae
(de 533 d.C., monumental compilação de
fragmentos extraídos de mais de 14.000 livros escritos por juristas clássicos; é
a principal fonte de estudo do Direito Romano na fase de esplendor);
Intitutiones
(de 533 d.C., inspiradas na obra de Gaio); e
Novellae
(compilação
do
Corpus Iur
is
e corresponde às novas constituições, 168 d.C., na época
de Justiniano)
19
. Assim, -se continuidade à fase chamada justiça privada
,
todavia não mais diretamente pelo ofendido, mas pelo grupo social ou por
terceiros designados especialmente para dirimir determinadas controvérsias.
Apenas em momento histórico muito posterior é que vem à tona a justiça
pública oferecida pelo Estado. A justiça privada antecedeu aos juízes ou
tribunais. Assim, a instituição Estatal advém do Direito Romano, onde se
encontra
m as principais fontes do instituto da arbitragem ou do compromisso
arbitral.
Quatro foram as fases evolutivas dos meios empregados pelos
romanos para a solução dos conflitos. A primeira, estabelecida ainda na Lei
das XII Tábuas, trazia a ideia de vingança privada e não era um código com
destinações específicas a cada área do direito, ao contrário, era uma lei geral
18
Altavila
aponta
que de sorte que o mérito imperial se circunscrevia à fatura da unidade
legislativa, porque a contingência humana dali por diante o tornara contraditória, quando
mandava punir juízes faltosos e quando adulterava o texto legal, na satisfação de seus
interesses . ALTAVILA, Jayme de. Origem dos direitos dos povos. 11ª ed. São Paulo: Editora
Ícone, 2006,
p.90.
19
ALVES, José Carlos Moreira. Direito Romano volume. ed. Rio de Janeiro: Forense,
2003. p.71.
28
(direito público e privado). Esta Lei, segundo José Carlos Moreira
Alves
20
,
resultou da luta entre a plebe e o patriciado, sendo que um dos objetivos dos
plebeus era acabar com a incerteza do direito por meio da elaboração de um
código
o que viria a refrear o arbítrio dos magistrados patrícios contra a
plebe. A segunda ocorreu durante toda a evolução do direito romano, pois
sempre se permitiu que os conflitos fossem conciliados por árbitros. Com o
advento da Lei das XII Tábuas
21
em 455 a.C., o processo é bipartido em fases
distintas. A fase in iure
desenvolvia
-se perante um tribunal, com a presença
de um magistrado. Por fim, a fase apud iudicem transcorria diante de um
cidadão privado. Na primeira fase fixavam-se os pontos da controvérsia,
enquanto na segunda o juiz privado analisava as razões das partes e proferia
a sentença. Isso ocorria nas situações que envolviam partilha de bens
hereditários (actio familiae irciscundae), quando após exposição das causas
era solicitada ao magistrado a nomeação de um árbitro (
arbiter
). Isso se devia
à natureza de aquela ação exigir não somente a aplicação das normas
jurídicas, mas, como de fato, implicava a medição e avaliação das
glebas
de
terras, animais e vários outros bens que seriam então por ele divididos
,
o que
certamente reclamava conhecimento e experiência extrajudicial. O terceiro
nos dois primeiros
sistemas de processo civil romano
legis actionem
(a
ções
da lei)
apresentava resquícios da autodefesa e trazia forte influência dos
elementos de natureza religiosa. Caracterizada por um rígido formalismo,
resultante de uma estilização ou esquematização ritual, em gestos e
formulários fixos, de atos de defesa privada e o per formulas
(formulário)
. O
20
ALVES,
Op. cit.
p.24
21
A importância da Lei das XII Tábuas é incontestável. Os próprios romanos aceitando a
observação do historiador Tito Lívio consideravam-na como a fons omnis publici privatique
juris
, fonte de todo direito publico e privado . CRETELLA JR., José. Curso de Direito Romano.
31ªed. Forense, 2007, p. 33.
29
processo formulário supera o rígido formalismo e ameniza-se a utilização da
autodefesa diante da consolidação da autoridade estatal. Conserva-se a
separação do processo em duas fases (in iure
e
apud iudicem).
Ad
quirem,
aqui,
as partes a atribuição do poder de decidir a controvérsia por meio de
uma pessoa livremente escolhida entre os litigantes
.
Finalizando, o quarto
meio de solução de conflitos processual romano
a
cognitio
extraordinár
ia
(extraordinário), Justiça e
blica
. Suas principais características eram o
abandono do formalismo residual do processo formular e o incremento à
participação estatal, com relativa abolição das duas fases (in iure e
apudi
iudicem
), diminuição da interve
nção das partes e redução da defesa privada
22
.
O desenvolvimento do processo transcorria, do início ao fim, perante órgão
estatal. Este era o responsável por impulsionar o feito e também a quem era
reservado à emanação da sentença
23
.
Sálvio de Figueiredo
Teixeira
24
, em perfeita síntese, relata o resultado
de aprofundado estudo que realizou sobre a presença da arbitragem em
várias ordens jurídicas dos povos antigos. Eis a sua manifestação:
Historicamente, a arbitragem se evidenciava nas duas formas do
processo romano agrupadas na ordo judiciorum privatorum: o
processo das
legis actiones
e o processo per formulas. Em ambas as
espécies, que vão desde as origens históricas de Roma, sob a
22
Dhenis Cruz Madeira ensina que: Viu-se no item anterior que o direito romano clássico,
situado no período formular, institui o sistema per formulas, no qual o pretor, servidor público,
instruía o árbitro, via editos, sobre como deveria conduzir e julgar as demandas que se lhe
apresentavam. Outrossim, afirmou-se que após as Legis Iuliae (Século I a C) o pretor passou
a, ele mesmo nomear o árbitro alterando-se o sistema anterior no qual as partes é que
indicavam o julgador. Ao final do período formular a arbitragem assumiu um maior caráter
público, dada a nomeação pretoriana . MADEIRA, Dhenis Cruz. Processo de conhecimento e
cognição
: uma inserção democrática de Direito. Curitiba: Juruá, 2008, p.99.
23
ALVES, op. cit., p.
222.
24
TEIXEIRA,
Sálvio de Figueiredo. A arbitragem como meio de solução de conflitos no
âmbito
do Mercosul e a imprescindibilidade da Corte Comunitária
.
www.arbitragemsantos.com.br.
30
Realez
a (754 a.C.) ao surgimento da
cognitio
extraordinária sob
Diocleciano (século III d.C.), o mesmo esquema procedimental
arrimava o processo romano: a figura do pretor, preparando a ação,
primeiro mediante o enquadramento na ação da lei e, depois,
acrescenta
ndo a elaboração da fórmula, como se na
exemplificação de Gaio, e, em seguida, o julgamento por um
iudex
ou arbiter, que não integrava o corpo funcional romano, mas era
simples particular idôneo, incumbido de julgar, como ocorreu com
Quintiliano, gramático de profissão e inúmeras vezes nomeado
arbiter,
tanto que veio a contar, em obra clássica, as experiências do
ofício.
Esse arbitramento clássico veio a perder força na medida em que o
Estado romano se publicizava, instaurando a ditadura e depois
assumin
do, por longos anos, poder absoluto, em nova relação de
forças na concentração do poder, que os romanos não mais
abandonaram até o fim do Império.
Foi nesse contexto, como visto, que surgiu a figura do juiz como órgão
estatal. E com ela a jurisdição na sua feição clássica,
poder
-dever de dizer
o
Direito na solução dos litígios.
Segundo
Marco Aurélio Gumieri
Val
é
rio
25
: Todavia, no final do século
III d.C, o Estado acaba por instituir-se na capacidade de exercer a função
jurisdicional em sua plenitude, mon
opolizando
-
a, tendo
-
se, nesse momento, a
passagem de árbitros para os juízes estatais .
A arbitragem, que em Roma se apresentava na modalidade obrigatória,
antecedeu, assim, à própria solução estatal jurisdicionalizada.
25
VALÉRIO, Marco Aurélio Gumieri. Arbitragem no Direito Brasileiro. São Paulo: Livraria e
Editora Universitária de Direito, 2
004, p.36.
31
1.1.5
Da formação da
arbitragem na Europa Ocidental
A prática da arbitragem foi difundida com sucesso na Idade Média, do
século V até o XV pela Igreja Católica
26
, no chamado período de trevas .
Pregadores bíblicos como Paulo, na Primeira Carta aos Coríntios,
aconselhava que não recorressem à justiça romana, concitando-os a resolver
as questões no interior da comunidade, escolhendo entre eles um irmão,
conforme o
,
Capítulo 6 da
Bíblia:
Versículo1: Ousa algum de vós, tendo algum negócio contra outro, ir a
juízo perante os
injustos, e não perante os santos?
Versículo 5: Para vos envergonhar o digo. Não há, pois, entre vós
sábios, nem mesmo um, que possa julgar entre seus irmãos?
27
Através da arbitragem, as cidades recém independentes do norte da
Itália resolviam seus conflitos aplicando os usos e costumes locais. Os
julgamentos eram enviados a um terceiro de confiança das partes, face à
informalidade. É dever analisar o período da Idade Média,
que
foi marcado pelo
empobrecimento do Estado, forte presença da Igreja, ausência de leis e a
consequ
ente falta das garantias fundamentais para os cidadãos, grande
variedade de
ordenamentos e conflitos entre I
greja e Estado.
26
Maurilio Cesar de Lima diz que Os papas exerciam seu poder acima dos demais bispos,
metropolistas e patriarcas reintegrando os ilegitimamente depostos, constituindo-se na mais
alta instancia de apelação da Igreja, apesar de certo sínodo romano declará-
lo
s sujeitos as
arbitragens dos imperadores, direito que Graciano nem sequer mencionou na constituição
relativa que o emanou . LIMA, Maurilio Cesar. Introdução à história do Código de Direito
Canônico
. São Paulo: Loyola, 1999, p.38.
27
BIBLIA SAGRADA. Livro d
e Lucas, Capítulo 6. Versículo
s
1 e 5.
32
Este cenário em muito contribuiu para o ressurgimento, a partir do
século XII, da arbitragem, desta feita, com uma nova roupagem: entre
cavaleiros, barões, proprietários feudais e entre soberanos distintos.
Apareceram, na Europa, impulsionadas pela expansão marítima e suas novas
descobertas, as arbitragens comerciais. Os comerciantes resolviam suas
controvérsias
evitando o dispêndio de tempo e buscando desvincular-se ao
máximo do Estado soberano e absolutista. Ainda neste período, a Igreja, uma
extensa e rígida organização social, dotada de ordem jurídica interna das mais
rígidas, também foi adepta da arbitragem. O direito canônico teve sua origem
na arbitragem e na disciplina. O declínio desta prática ocorreu apenas no
século XVI, com a decadência dos tribunais eclesiásticos.
No direito lusitano medieval, a arbitragem estava presente antes mesmo
de Portugal ser elevada à condição de Reino. O Fórum
Iudicium
representou o
direito presente na comunidade Hispânica.
Ensinam Jovi Barboza e Malu de Lourdes Darienzo
28
que somente em
1794 é que se tem registro do ressurgimento da arbitragem como solução de
conflito in
ternacional,
com o pacto firmado entre os Estados Unidos e a Grã-
Bretanha, isto
é,
o Tratado de Jay de amizade,
com
ércio e navegação .
Na monarquia lusitana, D. Afonso III publicou normas sobre
juyzes
aluydores.
Em seqüência, o instituto passou a ser regulado nas Ordenações
28
BARBOZA, Jovi e DARIENZO, Malu de Lourdes. Arbitragem no Brasil
solução amigável de
conflitos. Maringá: Projus, 2009, p.35.
33
Afonsinas, Manuelinas e Filipinas, sendo estas últimas com aplicação nas
terras brasileiras, inclusive, mesmo depois da sua independência.
29
A partir do culo XVIII desenvolveu-se o Estado Liberal, sob a
inspiração dos movimentos revolucionários, vivenciados, notadamente, nos
Estados Unidos e na França. Foram proclamadas a liberdade, a igualdade e a
fraternidade, ficando os indivíduos protegidos pelo princípio da não-
intervenção
estatal, o que trouxe como conseqüência uma profunda alteração no
tratamento jurídico da autonomia privada. Todos podiam, teoricamente,
acessar a propriedade, a liberdade, a igualdade e construir a fraternidade.
no
século XX estava evidenciado que a não intervenção estatal deixava um
vazio de poder invariavelmente ocupado pelos mais poderosos. Deixava o mais
forte em situação privilegiada na luta econômica pelo controle dos recursos
disponíveis. A desigualdade real entre as pessoas, no contexto de uma
liberdade dissociada de políticas estatais compensatórias e práticas
democráticas participativas, acarretava mais poder para os poderosos e mais
dependência para os mais fracos. A liberdade entre desiguais não pode
dispe
nsar um ordenamento jurídico que contemple
políticas
eficientes de
solidariedade. Continuava, pois, a autonomia privada a sofrer, impotente, a
injunção das desigualdades. Ensina Irineu Strenger
30
que
no século XIX
definia
-se freqüentemente o direito como sendo o justo limite imposto ao uso
29
Segundo Antonio Sodré Com a supremacia político-militar francesa, na época napoleônica
,
ocorreu a difusão da legislação francesa, notadamente a codificação, pela Europa,assim como
na América portuguesa e espanhola, nos países que conquistavam sua independência. No
entanto, em Portugal, as ordenações Afonsinas , Manuelinas e Filipinas já dis
punham de algum
modo sobre os juízos arbitrais, o que também repercutiu no Brasil, uma vez que as
ordenações, principalmente as Filipinas, tiveram longa vigência no território nacional . SODRÉ,
Antonio. Curso de Direito arbitral.
Leme: JH Mizuno, 2008. p.1
13.
30
STRENGER, Irineu. Da autonomia da vontade: direito interno e internacional. ed. São
Paulo: LTr, 2000, p.115.
34
exterior da liberdade humana por causa da coexistência dos homens.
A
liberdade é, em principio,
ilimitada, mas ela comporta
, entretanto, uma restrição
jurídica, uma
só, que é a obrigação de respeitar igual liberdade do próximo .
Desta forma, através deste esboço histórico, resta demonstrado que a
arbitragem sempre esteve presente na sociedade, o que a torna hoje
indispensável em qualquer Estado, caracterizando-se como atividade
puramente jurisdicional, inclusive no Brasil.
1.2 A ARBITRAGEM NO BRASIL
Após as ordenações lusitanas, a Constituição do Império de 1824, no
título destinado ao Poder Judiciário, desta feita com a ideia da separação
dos poderes concebida por Montesquieu
31
, tratava a matéria no art.
160,
facultando às partes a escolha de árbitros nas lides cíveis e penais
32
.
Em 1831 e 1837, passa a arbitragem a ser obrigatória em demandas
que envolvessem, respectivamente, seguro
33
e locação
34
, ampliando a
31
MONTESQUIEU,
Charles de.
O espírito das leis
. 1748.
32
Artigo 160: Nas cíveis, e nas penais civilmente intentadas, poderão as Partes nomear Juízes
Árbitros. Suas Sentenças serão executadas sem recurso, se assim convencionarem as
mesmas Partes.
Constituição Brasileira de 25 de março de 1824.
33
Resolução de 26/07/1831.
34
Lei 108 de 11/10/1837
-
Lei 108 de 11 de outubro, promulgada ainda no contexto dos tratados
com a Inglaterra, contempla a prestação de serviços por imigrantes estrangeiros na lavoura,
prevendo punições severas aos que fugissem sem pagar as dívidas
.
35
obrigatoriedade, com o advento do Código Comercial em 1850, para
abranger, segundo José Cretella Neto
35
, todas as questões de natureza
mercantil, acompanhando o Código Comercial Francês de 1807. O dispositivo
legal referente ao caso (regulamento 737, art. 4
11
et seq.) passa a fazer
distinção entre arbitragem voluntária e necessária
36
. Em 1866, por força da Lei
1.350 de 14 de setembro, a arbitragem obrigatória foi derrogada, estipulando-
se que o juízo arbitral seria sempre voluntário mediante o compromisso das
partes, que podem autorizar os árbitros a julgarem por equidade
independentemente das regras e formas de direito.
A arbitragem foi mantida no Código de Processo Civil vigente na
república, embora algumas alterações tenham sido praticadas. No Código
Nacio
nal (ou unificado) de 1939, foi tratado em dezesseis dispositivos. O
Código Buzaid e o Código Civil Pátrio (Lei 3.071/16) também dispunham
sobre a matéria.
37
35
CRETELLA, op.cit.,
p.
11.
36
Segundo Cândido de OLIVEIRA FILHO, eram as seguintes questões sujeitas à arbitragem:
1) resultantes de locação mercantil (art.245); 2) suscitadas entre os sócios durante a existência
da sociedade ou companhia, sua liquidação e partilha (arts.294, 302 parágrafo5º e 348); 3)
relativas a salário ou prêmio das pessoas empregados do serviço do navio ou carga (art. 736);
4) que se movessem sob os pagamentos de salvados (art.739); 5) relativas a estimação do
dano causado por abalroação de navios (arts.749 e 750); 6) referência a impugnação de
crédito nas falências . Curso de Prática do Processo.
Rio de Janeiro. Cândido de Oliveira Filho
,
198. V.I, p.318; SAREDO. Procedura Civile, V.I, parágrafo
171, P.124.
37
Cumpre
notar que o Regulamento 7373, também de 1850, primeiro
corpus
brasileiro de leis
processuais, instituía duas espécies de arbitragem, a
voluntária
e a
necessária,
mas a forma
obrigatória foi abolida pela Lei 7.542, de 1986. O Decreto 3900, de 1867, no
vamente
regulamentou a arbitragem comercial, sendo importante ressaltar que o art. 9 do referido
decreto estipulava que uma cláusula arbitral sobre litígios futuros somente tinha valor de
promessa. Esse Decreto coexistiu com o Código Civil de 1916, mas foi
, aos poucos, substituído
por leis processuais promulgadas em cada Estado brasileiro. Passou-se a considerar como
anticonstitucional a obrigatoriedade da jurisdição arbitral, estabelecida por leis estaduais.
Decisões jurisprudenciais, da lavra do STF, de 06.04.1918 e de 19.05.1923 passaram a
considerar como não obrigatório o disposto no art. 783 do Código Comercial, assim como as
relativas à arbitragem compulsória para o direito marítimo. Na lei material brasileira, a
arbitragem
facultativa
veio a ser também prevista no primeiro Código Civil brasileiro (Lei
3071, de 01.01.1916), que entrou em vigor em 01.01.1917, tratando da matéria no Livro III,
Título II (Dos Efeitos das Obrigações), Capítulo X (Do Compromisso), referente ao direito das
36
A Constituição de 1934 incluída na Carta Constitucional de 1937
manteve
o sistema da unidade processual, sendo promulgado o Código de
Processo Civil por meio do Decreto 1608 de 19 set. 1939, o qual no Livro IX,
parágrafo
único, arts. 1031 a 1046,
disciplinou
o juízo arbitral, não obstante a
omissão constitucional sobre a matéria
38
.
Tendo em vista que não era muito utilizada no Brasil, chegou-se a
afirmar que a arbitragem era um fracasso e por isso não deveria mais ser
contemplada por nosso sistema. Tal tese foi sustentada por Pontes de
Miranda
39
, um crítico contumaz ao instituto:
é primitivo, regressivo mesmo, a que pretendem volver, por atração
psíquica a momentos pré
-estatais, os anarquistas de esquerda e os
de
alto capitalismo. E mais: é arma eficacíssima do capitalismo tardio,
eliminador da concorrência e da segurança extrínseca (da certeza
da
lei que regeu
e rege os negócios de cada um).
A falta de hábito de utilização deste instituto não se deve ao fato da não
previsão expressa nos Códigos, pois esta esteve sempre presente no
regulamento
pátrio, desde as
ordenações
Afonsinas. Muito provavelmente, a
justificativa histórica pode ser apontada como sendo entraves criados pelas
obrigações,
contemplada nos artigos 1037 a 1048, ora expressamente revogados pela Lei de
Arbitragem de 1996. O art. 1307 do Código Civil de 1916 dispunha: As pessoas capazes de
contratar poderão, em qualquer tempo, louvar-se mediante compromisso escrito, em árbitros,
que lhes resolvam as pendências judiciais e extrajudiciais. Também o art. 1041 desse diploma
legal merece ser mencionado, pois equipara a jurisdição estatal à jurisdição arbitral: Os
árbitros são juízes de direito e de fato, não sendo sujeito o seu julg
amento a alçada ou recurso,
exceto se o contrário convencionarem as partes. C
RETELLA
NETO
,
op.cit.,
p.
11.
38
ALVIM,
op. cit.,
p.21
.
39
MIRANDA, Pontes de. Comentários do Código de Processo Civil. Rio de Janeiro: Forense,
1977,
p.71
37
legislações, sempre no sentido de desencorajar os interessados em
solucionar as lides por meio da arbitragem.
Vários autores, das mais variadas áreas do direito, jurist
as,
economistas e empresários estrangeiros consideravam a arbitragem no Brasil
e América Latina, de forma geral, de impossível implantação. Viam os
tribunais nacionais como um entrave danoso. Segundo esses autores e
juristas, tribunais nacionais são tendenciosos, sempre decidindo em favor dos
patrícios; sentenças refletem o enaltecimento do espírito nacionalista,
patriótico, deixando de priorizar a técnica, esquecendo as razões do próprio
Direito.
Segundo
Carlos Alberto
Carmona
40
, outros entusiastas veem na
arbitragem a panacéia para os males de que padece o Poder Judiciário . A
esses, parece que a arbitragem resolverá todos os males. Aqui, a princípio,
exige
-se o bom senso. Um dos grandes problemas enfrentados ainda no
século XXI pelo instituto da arbitragem é o modo com que é ofertada a
pacificação de conflitos, por caminho diverso que não o Poder Judiciário, vez
que, depois de declarada a solução arbitral, esta estaria, ainda, adstrita à
homologação perante um juiz togado. Ou seja, depois de entregue, o l
audo
arbitral estaria adstrito à homologação por parte dos tribunais estatais.
Não bastasse a necessidade dessa homologação pelo Poder Judiciário,
pode
-se, ainda, citar a ineficácia obrigacional de observância da cláusula
40
CARMONA, Carlos Alberto. Arbitragem e processo: um comentário à Lei 9.307/96. São
Paulo: Atlas, 2004, 2ª ed., p.22
36.
38
compromissória, dispositivo contratual em que as partes preveem que os
conflitos possam ser resolvidos por meio da arbitragem. Com efeito, em que
pese o fato de ser estipulada a cláusula compromissória entre as partes,
nenhuma
delas
estaria obrigada a submeter-se a tal imposição, tornando-
as
letra morta no contrato, já que
a cláusula
, por si só, não permite a oposição da
exceção de que trata o Estatuto Processual Civil na versão original, antes da
Lei 9.307/96. Nos moldes da aplicação do artigo 301, IX, do CPC, as decisões
de todos os tribunais pátrios foram no sentido da obrigatoriedade do
compromisso arbitral, e não apenas bastava a referida cláusula arbitral.
Segundo
Carlos Alberto
Carmona
41
, doutrina e jurisprudência transformaram
na prática o pacto de
contrahendo
(cláusula compromissória) em verdadeiro
pactum nudum, contribuindo para que empresas estrangeiras abandonassem
a escolha da solução arbitral de controvérsias no Brasil .
Ocorre que não a questão da cláusula compromissória foi um
obstáculo. Outro entrave foi o reconhecimento e a execução de sentenças
arbitrais advindas do estrangeiro, perante o Supremo Tribunal Federal (STF),
que exigia a dupla homologação (duplo exequat
ur)
da sentença ou laudo
arbitral alienígena. A exigência fazia-se valer tanto do país originário, que
emitira a sentença ou laudo, quanto da Corte Suprema brasileira. Acabava-
se
por extinguir, na prática, a composição por meio da arbitragem dos tribunais
nacionais
42
. Certo é
que
, uma vez levada a lide ao judiciário (para a
homologação),
restariam comprometidos vários benefícios deste instituto: a
rapidez para uma solução definitiva ao problema, o sigilo dos negócios
41
CARMONA,
op.cit,
p.22
-
36
42
FIGUEIRA JUNIOR, Joel Dias. Manual da Arbitragem. São Paulo: Revista dos Tribunais,
1997
, p.45
.
39
envolvidos (já que para a homologação o processo teria de obedecer ao
princípio da publicidade), entre tantos outros.
Diante desse quadro, verificou-se a necessidade de colocar o Brasil no
mesmo patamar dos demais países, motivo pelo qual foi nomeada uma
comissão, coordenada pelo desembargador Severo da Costa, publicando-
se
no
Diário Oficial da União (DOU) de 27 de maio de 1981, anteprojeto que não
prosperou
43
, no entanto, trouxe questões interessantes, como a equiparação
da cláusula compromissória e compromisso arbitral e um regramento próprio
pa
ra os casos em que houvesse resistência de alguma das partes em cumprir
o ajustado, no sentido da instauração da arbitragem
44
.
Foi publicado no
DOU
de 27
de
fev
ereiro de
1987, por determinação do
Ministério da Justiça, outro anteprojeto também frustrado. S
egundo
Carlos
Alberto
Carmona
45
, a este projeto faltou vontade política. Se houvesse um
amplo debate dos setores sociais envolvidos, o projeto certamente culminaria
em aprovação,
depois de
superadas as falhas técnicas.
Em
14
de julho de
1988
46
, o Ministério de Estado da Justiça trouxe
novo anteprojeto. Em seu texto incorreram rios erros que o inviabilizaram,
tais como: a) preservação da unidade do Código processual alterando apenas
alguns artigos; b) disciplinava-se a cláusula compromissória e compromisso
arbitral, pretendendo alterar o artigo 1.074, de tal modo que ambas teriam de
43
FIGUEIRA JUNIOR,
op.cit
., p.47.
44
CARMONA,
op.cit.
p.22
-
36
45
CARMONA,
op.cit.
p.22
-
36
46
FIGUEIRA JUNIOR,
op.cit
., p.45
.
40
dispor sobre o objeto do litígio, sob pena de nulidade; c) nova redação do
artigo 1.078, parágrafo e do Estatuto Processual, que estabelecia que a
sentença arbitral estaria sujeita a Recurso de Apelação pelo Tribunal de
Justiça local
desnecessário citar os desserviços que esta cláusula traria ao
instituto, pois na prática ocorreriam as desvantagens da jurisdição estatal;
d) obrigatoriedade de o árbitro ser bacharel em
Direito
47
.
A dificuldade de aprovar os anteprojetos pelo governo mostrava-
se
evidente. Assim como também o anseio de toda a sociedade por um todo
de composição de conflitos que não passasse pelas prerrogativas inerentes
ao Estado. Buscava-se o método utilizado praticamente em todo o mundo,
cada vez mais, e que por certo provocaria estímulo nos diversos setores da
economia. Economia esta carente de recursos econômicos e financeiros
capazes de incentivar a área de
serviços,
incrementarem
a produção e
financiar obras de cunho social. Diante desse quadro, a própria sociedade se
manifestou.
O impulso inicial foi dado pelo Instituto Liberal de Pernambuco, no final
de 1991. A Chamada Operação Arbiter mobilizou vários setores da sociedade
para
que fosse elaborado um anteprojeto de lei unindo experiências práticas a
rigor científico.
O início efetivo da Operação Arbiter deu-se em 05 de novembro de
1991, conforme relata Carlos Alberto
Carmona
48
, quando foi escolhida a
47
CARMONA,
op.cit
p.22
-
36
.
48
CARMONA,
op.cit.
p.22
-
36
.
41
comissão relatora e estipulado prazo para apresentação do projeto de
elaboração do anteprojeto de lei, em 09 de dezembro de 1991. Após a
apresentação, o anteprojeto foi debatido e aprovado, sendo que sugestões
foram incorporadas, de plano, ao texto original. Novamente foram distribuí
das
cópias do texto aos órgãos interessados. Estipulou-se nova data para que se
continuassem as discussões. Ressalta-se que a repercussão dos trabalhos foi
além das expectativas e, em reunião na Associação Comercial de São Paulo,
em fevereiro de 1992, foi apresentado o texto por professores universitários,
membros do Poder Judiciário, Câmara de Comércio Internacional, entre
outros. O anteprojeto na forma final foi discutido no Seminário Nacional sobre
Arbitragem Comercial, na cidade de Curitiba, Paraná, em
27
de
ab
ril de
1992.
É por meio da narrativa dessas e principalmente das pessoas envolvidas que
se pode entender, na plenitude, a extensão deste instituto.
O processo legislativo teve início em junho de 1992, pelo então senador
da República Marco Maciel, que se dignou a apresentar o esboço de lei ao
Congresso Nacional, onde o projeto recebeu o número 78/92.
Em 30 de janeiro de 1975, o Brasil assinou a Convenção
Interamericana sobre Arbitragem Comercial Internacional, sendo a mesma
ratificada em 12
de
junho de 1995 por meio do Decreto Legislativo nº 90. O
que levou à aprovação do referido projeto pela Câmara dos Deputados em
junho de 1996. Devolvido o projeto à casa de origem, o Senado Federal, este
42
restou aprovado com a alteração de dois artigos, sem que, contudo, fosse
abalada a norma em pontos vitais
49
.
É fato notório a discussão da constitucionalidade da L
arb
, no entanto, o
Supremo Tribunal Federal (STF), após anos em apreciação, entendeu ser a
mesma constitucional, em que pese a existência de votos
vencidos.
A
respeito
da matéria comenta Marco Aurélio Gumieri Valério
50
:
A discussão que surgiu a quase quatro anos no Supremo Tribunal Federal em
torno da Lei n. 9307/96, concluída somente no dia 12 de dezembro de 2001,
devido à grande quantidade de pedidos de vista por partes dos Ministros,
colocou em tela a constitucionalidade, não somente das inov
ações introduzidas
pela legislação especial mas a da própria arbitragem debatida como incidente
de inconstitucionalidade no julgamento Agravo Regimental em Sentença
Estrangeira 5206 do Reino de Espanha.
O relator, Ministro SEPULVEDA PERTENCE, proferida o primeiro voto
reconhecendo a constitucionalidade do compromisso arbitral quando as partes
de uma lide atual renunciam à via judicial e escolhem a alternativa da
arbitragem para solução do litígio, porém, declarou inconstitucional a prévia
manifestação de vontade da parte na cláusula compromissória por considerar
seu objeto indeterminado.
Também destacou em seu voto que, a possibilidade de uma das partes, em
caso de resistência da outra, poder recorrer à via judicial para obrigá-
la a firmar
o compromisso, violaria o princípio ao livre acesso ao Poder Judiciário,
analisado em momento anterior.
Assim, declarou inconstitucional o § único do art. 6º, o art. 7º e §§ e, no art. 41,
as novas redações atribuídas ao art. 267, inc. VII e art. 301, inc. IX do CPC,
além do art. 42 todos da Lei nº. 9307/96, acompanhado, pelo menos em parte,
pelo voto dos Ministros, SYDNEY SANCHES, NERI DA SILVEIRA e MOREIRA
ALVES.
Segundo o Ministro: a renúncia à jurisdição estatal na cláusula compromissória
ainda é genérica de objeto indefinido à garantia constitucional de acesso a
jurisdição, cuja validade os princípios
repelem .
Se essa interpretação prevalece no tribunal, suprimindo-se a executividade da
cláusula arbitral, haveria quebra na convenção, tornando a Lei de Arbitragem
letra morta, porém, esse julgamento tomou
outro
rumo, evitando-se alteração
no procedimento que acarretaria a regressão do instituto ao seu estado anterior
à aprovação do dispositivo legal em comento.
Os Ministros ELLEN GRACIE, MAURICIO CORREA, MARCO AURÉLIO E
CELSO DE MELO proferiram votos no sentido de declarar a
49
Luiz Fernando do Vale de Almeida Guilherme nos ensina: Esta Lei reforçou a pr
edominância
da autonomia da vontade das partes, dentro de seus limites, a excelência do árbitro, o sigilo
das decisões, sendo que o vínculo pacificador que a decisão arbitral cria entre as partes faz
que o procedimento arbitral seja a forma mais eficaz para eliminar as controvérsias existentes
nas rel
ações patrimoniais disponíveis .
Manual de Arbitragem.
ed. São Paulo: Método, 2007,
p.77.
50
VALÉRIO, op.cit., p.111
-
114.
43
constitucionalidade da lei de Arbitragem, acompanhando os votos proferidos
por NELSON JOBIM E ILMAR GALVÃO, assim, por seis votos a quatro
afastou
-se a possibilidade de se perder todo o avanço conquistado na matéria
arbitral, declarando-se constitucional a Lei 9307/96, considerando assim, que a
manifestação de vontade da parte na cláusula compromissória na celebração
do contrato e a permissão dada ao juiz para que substitua a vontade da parte
rec
alcitrante em firmar compromisso não ofendem o art. 5º, inc. XXXV, da CF.
Esse posicionamento transparece no voto do Ministro MARCO AURELIO
MELLO, que considerou este julgamento um dos mais importantes
submetidos ao STF, pronunciando-se favorável à constitucionalidade da
arbitragem e das novações da Lei Marco Maciel, enfatizando que: o legislador
foi cuidadoso, não barrou o acesso ao judiciário quando os conflitos envolvem
direitos indisponíveis. Os dois artigos não impedem isso, ao contrário,
consagram
a liberdade e o principio da vontade do cidadão garantidos na
Constituição .
O mesmo no voto da Ministra ELLE GRACIE NORTHFLEET: não vejo
renuncia à tutela judicial neles, mas uma mudança no foco e na ocasião em
que se dará o apelo ao judiciário. O cidadão pode invocar o Judiciário para
solucionar os conflitos, mas não esta proibido de cessar outros meios.
Esse resultado configurou-se num passo decisivo para o pleno êxito no Brasil,
reconhecida f
inalmente, como constitucional.
Destaca
-se o voto no Ministro Carlos Velloso que esclareceu que a lei trata de
direitos patrimoniais disponíveis e, assim, as partes podem renunciar ao direito
de recorrer à justiça estatal, visto que, o art.5º, XXXV, representa um direito à
ação e não um dever.
A constitucionalidade da arbitragem advém da ideia sica da
desmistificação do monopólio da Justiça em mãos do Estado-Juiz, haja vista
que a atividade jurisdicional não é de sua exclusividade,
v.g.,
quando o
Senado Federal julga o presidente da República por crime de
responsabilidade (art. 52, n. I, da
CF) etc.
Além disso, é de mencionar que nosso sistema jurídico admite outras
formas de composição de conflitos fora da jurisdição estatal como, por
exemplo, a transação, figura jurídica próxima do juízo arbitral como meio legal
posto à disposição dos contendores para a solução de pendências
e
ninguém pretende defender que a transação desrespeita o princípio antes
mencionado. Com a instauração do juízo arbitral, pela celebração da
convenção de arbitragem, acertada anteriormente pela cláusula arbitral ou,
44
posteriormente, pelo compromisso arbitral, o que fazem as partes é transferir
a jurisdição para um destinatário privado.
Com isso, os princípios da ubiquidade da Justiça e do juiz natural
mantêm
-se íntegros e ilesos com o advento da arbitragem facultativa no
ordenamento pátrio.
César Fiuza
51
aponta que:
Em análise mais detida, devemos destacar dois momentos distintos.
Num primeiro momento, temos que reconhecer que a arbitragem, de
fato, exclui da apreciação do Poder
Judiciário o mérito do litígio. Mas,
num segundo momento, vemos a presença essencial do Judiciário. É
a ele que são dirigidos os recursos; é ele que revê a decisão dos
árbitros, buscando nela vícios; é ele, enfim, que faz cumprir a
sentença arbitral. Concl
ui
-se, pois, que a arbitragem,
aparentemente, exclui da apreciação do Judiciário lesão ou ameaça
a direito.
A cláusula do due process
of
law
não é sequer ameaçada pela Lei
9.307/96, que prevê expressamente no art. 21, parágrafo
que:
Serão,
sempre, respeitados no procedimento arbitral
os
princípios do contraditório, da
igualdade das partes, da imparcialidade do árbitro
e
do seu livre
convencimento .
Não há óbice,
igualmente
, quanto ao acesso à via recursal, pois é certo
que a sentença arbitral é irrecorrível e o duplo grau de jurisdição não é
princípio absoluto, tanto que não é expresso na Carta Política, mas de
admissão implícita em função da divisão hierárquica dos órgão
s
51
FIUZA, Cezar. Teoria da Arbitragem.
Belo Horizonte: Del Rey, 1995, p.36.
45
jurisdicionais do Estado e não dos órgãos privados.
Esse é o entendimento de
José Carlos Barbosa Moreira
52
, para o qual vale observar que embora a parte
considerável da doutrina desde época anterior ao advento da atual Carta da
República tenda a
considerá
-lo ínsito em nosso sistema constitucional, nem o
texto da constituição anterior nem o da vigente ministra, no particular, conceito
que se imponha ao legislador ordinário . Assim também ensina Araken de
Assis
53
, o duplo grau de jurisdição não representa uma imposição constante
da Carta Política (...). Os meios e recursos inerentes à ampla defesa e
explicitamente mencionados no art. LV da Constituição de 1988 limitam-
se
àqueles instituídos pelo legislador ordinário.
Portanto
,
é indubitável a c
onstitucionalidade
da Lei n
º
9.307/96 o
que
se justifica pelas mais diversas razões, entre elas a inexistência de monopólio
estatal
da jurisd
ição,
autonomia da vontade para acionar ou renunciar à
jurisdição estatal, de vez que as partes podem dispor livremente dos bens
patrimon
iais, a previsão expressa na lei da arbitragem da atuação e
intervenção do Poder Judiciário em certos casos e exclusão dos incapazes do
processo arbitral.
O
que
não
se pode
tolerar
,
por
flagrante
inconstitucionalida
de
,
é a
exclusão
, pela le
i,
da apreciação de lesão pelo Poder Judiciário
,
que não é o
caso
do juízo
arbitral
, pois conforme acima exposto é conseqüência da
vontade das partes. Cumpre, então, a análise detalhada da natureza jurídica
da arbitragem, objeto do próximo capítul
o.
52
MOREIRA, José Carlos Barbosa. Comentários ao Código de Processo Civil, Lei n. 5.869, de
11 de janeiro de 1973. Vol. V. Rio de Janeiro: Forense, 2006, p. 240.
53
ASSIS, Araken. Manual dos recursos. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2007, p. 72.
46
1.3
NATUREZA JURÍDICA DA ARBITRAGEM
A natureza jurídica corresponde ao fenômeno de compreensão teórica
dos institutos jurídicos, diz-se da afinidade que um instituto jurídico guarda
para com uma grande categoria jurídica por diversos pontos estruturais, de
modo
à nela poder ter ingresso classificatório. Deve, assim, a natureza
jurídica refletir a expressão da matéria, levando em consideração
seus
elementos constitutivos.
A análise da natureza jurídica da arbitragem permite a compreensão
acerca dos limites do processo arbitral e da atuação dos árbitros. É antiga a
polêmica em torno da natureza jurídica
54
do instituto da arbitragem, dividindo-
se
a doutrina, basicamente, em três correntes: a contratualista, híbrida e
jurisdicional.
55
54
Pa
ra Joel Dias Figueira Junior a natureza jurídica deve refletir a verdadeira expressão
ontológica da matéria em estudo, levando-se em consideração os seus elementos
constitutivos; qualquer esboço classificatório dependerá sempre da prévia e antecedente
fixação da natureza jurídica do fenômeno, instituto ou instituição jurídica analisada
,
op.cit.,
p.178.
55
Para
José Carlos de Magalhães, a importância da averiguação da natureza jurídica da
arbitragem assume maior importância quando se defronta com a participação do Estado na
arbitragem privada, com as respectivas consequências que disso advém. , MAGALHÃES, José
Carlos de.
Do Estado na arbitragem privada
, RDP 71/164, n.4, p.100.
47
1.
3.1 Da Natureza Contratualista
A teoria contratualista, também chamada de privatista, atribui à
arbitragem caráter privado ou contratual, similar ao da transação. Ou seja, a
decisão proferida pelo árbitro seria apenas uma decorrência do acordo
firmado pelas partes, não tendo, portanto, caráter jurisdicional.
Tal corrente, encabeçada por autores tais como
Salvatore
Satta
56
,
Giuseppe
Chiovenda
57
e
Elio Fazza
lari
58
, defende que a arbitragem não
possui natureza jurisdicional, uma vez que o árbitro não tem poder para
executar as decisões proferidas e que a arbitragem sofre intervenção estatal
de forma plena, já que a parte pode requerer ao Estado que aprecie o
mérito e a validade da sentença arbitral. Os autores entendem, ainda, que o
árbitro, ao exercitar as funções de julgador, não é detentor de dois elementos
da jurisdição, quais sejam:
coertio
(direito de fazer respeitar a lei, reprimindo
ofensas à mesma) e
executio
(direito de tornar obrigatória e coercitiva a
própria ordem ou decisão). Isto é, o mesmo está impedido de realizar os atos
de império.
56
SATTA, Salvatore. Direito processual civil. 7. Ed. Luiz Autuori (Trad.) Rio de Janeiro: Borsoi,
1973.v.II, n.520, p.775: um erro dizer que a faculdade legal (de instituir juízo arbitral) tenha um
cunho jurisdicional, pois de jurisdição não têm os árbitros qualquer elemento, nem podem fazer
jurar o testemunho, nem ordenar sequestro, nem acertar uma injunção. A confiança depositada
no juiz particular é a expressão de um resultado modo e reservado de imediata renúncia à
jurisdição e, portanto, à ação.
57
Nestes termos, Chiovenda afirma que o compromisso constitui um importantíssimo contrato
dotado de relevância processual negativa (CHIOVENDA, Giuseppe. Instituições de Direito
Processual Civil
. Trad. Paolo Capitano, 3ªed.,Campinas: Bookseller, 2002, p.104.
58
FAZZALARI, Elio.
Instituzioni di Diritto Processuale,
5 ed. Padova:
Cedam, 1989
, p.459
. Para
Fazzalar
, os árbitros realizam uma espécie de justiça cognitiva privada, ou seja, ditada por um
particular antes do que por um jui
z.
48
Observando que os poderes do árbitro derivam exclusivamente da
vontade das partes, as quais não têm competência para delegar jurisdição, os
contratualistas afirmam que o laudo arbitral por ele emitido seria mero parecer
ou opinião cnica, constituindo não mais que obrigação contratual decorrente
da convenção, que somente surtiria os respectivos efeitos de direito
mediante
a chancela estatal, isto é, não se reconhece o exercício da jurisdição do
árbitro, alegando a existência de um monopólio estatal sobre ela. Não
obstante, tais fundamentos asseguram que faltam poderes inerentes ao
exercício da jurisdição, como coerção e execução, os quais são necessários
para impor sanções.
Os argumentos contratualistas se baseiam na constatação de que: a)
inexistirá arbitragem sem convenção de arbitragem; b) o caráter fundante da
arbitragem é o consenso entre as partes, enquanto a jurisdição se assenta na
soberania do Estado; c) o árbitro não compõe a estrutura judiciária; d) o laudo
arbitral não tem coercibilidade assegurada.
Os referidos adeptos da corrente contratualista entendem que o árbitro
é destituído de alguns direitos exclusivos dos juízes estatais, de forma que,
em determinadas situações, será necessária a intervenção destes no
procedimento da arbitragem. Nesse sentido, o art. 7º da Lei nº 9.307/96
dispõe:
Art. 7º. Existindo cláusula compromissória e havendo resistênci
a quanto
à instituição da arbitragem, poderá a parte interessada requerer a citação da
49
outra parte para comparecer em juízo a fim de lavrar-se o compromisso,
designando o juiz audiência especial para tal fim.
Ou seja, uma vez que não detém poderes para submeter as partes à
arbitragem, o árbitro deve se socorrer do Poder Judiciário. Os privatistas
observam que o julgador nomeado pelas partes controvertidas também não
pode conduzir coercitivamente as testemunhas renitentes, necessitando da
intervenção da autoridade judiciária para a realização de tal ato, conforme
disposição do parágrafo 2º do art. 22 do mesmo dispositivo legal.
Ressalta
-se, ainda, entre os argumentos, que o juiz estatal pode
executar a própria sentença, prerrogativa esta que o árbitro não p
ossui.
Os contratualistas apontam outras situações, expressas na Lei de
Arbitragem, em que o árbitro tem a competência restringida pela
obrigatoriedade da atuação do magistrado, tais como a determinação do
artigo 22, parágrafo 4º, e artigo 25, da referida
norma, que assim preveem:
Art. 22. Poderá o árbitro ou o tribunal arbitral tomar o depoimento das
partes, ouvir testemunhas e determinar a realização de perícias ou outras
provas que julgar necessárias, mediante requerimento das partes ou de ofício.
Parágrafo Ressalvado o disposto no parágrafo 2º, havendo
necessidade de medidas coercitivas ou cautelares, os árbitros poderão
50
solicitá
-las ao órgão do Poder Judiciário que seria, originariamente,
competente para julgar a causa.
Art. 25. Sobrevindo no curso da arbitragem controvérsia acerca de
direitos indisponíveis e verificando-se que de sua existência, ou não,
dependerá o julgamento, o árbitro ou o tribunal arbitral remeterá as partes à
autoridade competente do Poder Judiciário, suspendendo o procedim
ento
arbitral.
Dessa forma, os referidos juristas defendem a tese de que a arbitragem
não é jurisdição pelo fato de
serem
limitados os poderes do árbitro, sendo
este destituído das prerrogativas acima explanadas, confrontando-
se,
portanto, com os poderes plenos que os magistrados possuem para exercer
suas funções.
Em que pesem os argumentos trazidos pelos contratualistas, o fato de
a arbitragem não integrar a organização judiciária estatal não tira do árbitro a
possibilidade e o poder de solucionar confli
tos aplicando o direito na essência.
Tal corrente não se adapta ao sistema arbitral brasileiro pelo fato de
que o laudo arbitral necessitaria de homologação pelo Poder Judiciário,
enquanto a L
arb
confere à decisão arbitral a qualidade de sentença, a qual
é
autônoma e independe de homologação.
51
1.
3.2 Teoria Híbrida
ainda os adeptos da teoria híbrida, que apresenta o aspecto
contratual na primeira fase, em razão do acordo de vontade entre as partes
e,
em um segundo momento, caráter jurisdicional, consistente no
desenvolvimento do juízo arbitral e nos efeitos da sentença. Fundamenta-se a
primeira fase em contratual, na convenção arbitral, uma vez que neste
momento prevalece a autonomia de vontade dos interessados, os quais vão
conferir a terceiros a solução do litígio, e ainda estabelecer as normas que
irão regê-lo. Todavia, tal vontade estará limitada à disponibilidade do objeto,
devendo respeitar os princípios e a ordem pública.
Dar
-
se
início à fase jurisdicional, quando for instituído o árbitro ou
juízo arbitral e, ainda, aceita a nomeação com base no que fora acordado
anteriormente pelas partes, resolver o litígio, em conformidade com o disposto
em lei, dentro dos limites que lhe fora conferido.
Em concordância com essa co
rrente
manifesta
-
se
José Carlos de
Magalhães
59
:
As duas posições, contudo, são extremadas e podem ser
conciliadas. A arbitragem possui base contratual, que é o
compromisso, de característica estritamente consensual e que
estabelece as diretrizes do juízo arbitral que institui. Mas o laudo não
é ato integrativo do compromisso, nele tem seus fundamentos e seus
limites, mas seus efeitos decorrem da Lei e não da vontade das
partes. Assim, as duas posições devem ser entendidas como
radicais, pois se a arbitragem é contratua
l em seu fundamento inicial,
é também jurisdicional, ante a natureza pública do laudo arbitral,
como forma privada de solução de litígios.
59
MAGALHÃES, op.cit., p.
98
.
52
No mesmo sentido, Joel Dias Figueira Júnior
60
:
O instituto Jurídico da Arbitragem com as novas questões proferidas
pela Lei n. 9.307/96, reveste-se de natureza eminentemente
contratual, privatista, em paralelismo tangencial sincronizado e com a
jurisdição estadual publicista, sem que se verifique qualquer
sobreposição entre elas, a verdadeira simetria jurisdicional.
Po
rquanto norteado pela faculdade concedida pelo microssistema
específico aos interessados que desejarem, em comum acordo,
solucionar os seus conflitos.
Corrobora
Irineu
Strenger
61
, formulando a natureza mista da arbitragem
e traduzindo-a como instância jurisdicional praticada em função de regime
contratualmente estabelecido, para dirimir controvérsias entre pessoas de
direito privado e/ou público, com procedimentos próprios e força executória
perante tribunais estatais.
A vantagem da teoria híbrida é permitir a incidência de princípios
contratualistas e publicistas, partindo de um fundamento contratualista e
alcançando desenvolvimento jurisdicional.
Ensina, ainda,
José Carlos de
Magalhães
62
que:
a doutrina moderna concilia as duas tendências anteriores, vendo na
arbitragem uma instituição sui generis de natureza hibrida, que
nasce da vontade das partes e, portanto, de caráter obrigacional, e
regula uma relação de direito processual de natureza pública. Assim,
a convenção arbitral seria, na verdade, contrato provado que
disciplina matéria de direito publico, que interessa a ordem publica,
nacional ou internacional, à medida que destina a compor
controvérsia que, mesmo entre particulares, afeta essa ordem
pública.
60
FIGUEIRA JUNIOR, op.cit., p.96.
61
STRENGER, Irineu. op. cit., p
.17
62
MAGALHAES, op.cit., p.99.
53
E confirma Marcelo Dias Gonçalves
Vilela
63
que
:
não se pode, assim, aquartelar a natureza jurídica da arbitragem
reduzindo
-a a um de seus traços caracterizadores, contratual na
origem (formação) e jurisdicional na finalidade (resultado), devendo
assim admitir-se sua natureza híbrida ou mista. Isto porque a
contratualidade e a jurisdicionalidade deverão funcionar como
verdadeiros pêndulos no estudo e na utilização do instituto,
demandando ao jurista o conhecimento da teoria geral das
obrigações e dos contratos e da teoria geral do processo
para
enfrentar as questões e afastar eventuais perplexidades da utilização
da própria arbitragem.
Tal teoria não pode ser admitida, pois considerar a natureza contratual
da arbitragem, mesmo que de forma híbrida, retira do árbitro os poderes
jurisdicionai
s conferidos pela Larb, visto que o mesmo ficaria adstrito ao
pactuado pelas partes na convenção arbitral, afastando-lhe, assim, a
liberdade de atuação, deixando
-
o mais longe da real solução do conflito.
1.
3.3 Teoria Publicista
A teoria jurisdicional, ou publicista, por sua vez, atribui ao instituto da
arbitragem uma natureza processual, equiparável à jurisdição estatal, pelo
fato de a sentença arbitral não necessitar de homologação pelo Poder
Judiciário e por haver autonomia e eficácia da cláusula compromissória, que
submete as partes contratantes ao juízo arbitral.
64
63
VILELA, Marcelo Dias Gonçalves. Arbitragem no direito societário. Belo Horizonte:
Mandamentos, 2004, p. 46.
64
O professor Nelson Nery Junior assevera que a atividade jurisdicional é típica, mas não
exclusiva do Poder Judiciário , acentuando que O conceito de jurisdição não tem sido
desenvolvido pela doutrina brasileira, no sentido de acompanhar a evolução que o instituto vem
sofrendo nos ordenamentos mais modernos. Ainda estamos sob a influência estática das
54
Antes da promulgação da Lei nº 9.307, de 23 set. 1996, predominava
no Brasil a teoria contratualista, pois se fazia necessário que o laudo arbitral
fosse homologado judicialmente para que este tivesse força de sentença.
Então, fazia coisa julgada somente o ato homologatório do juiz estatal e não
propriamente a decisão proferida pelo árbitro.
Entretanto, com o advento da Lei nº 9.307/96, o legislador conferiu ao
decisório arbitral o nome e o status de sentença, dando a
este
poder para
fazer coisa julgada, bem como de constituir-se título executivo judicial, sem
nenhuma interferência da Justiça oficial, dispensando a necessidade de que
esta fosse homologada judicialmente.
Optou, então, o legislador nacional por atribuir ao juízo arbitral caráter
publicístico, tornando-o equivalente ao juízo oficial, por livre escolha das
partes. Segundo Clavio de Melo Valença Filho
65
, a visão errônea e totalitária
da jurisdição como atividade exclusiva do Estado sedimentou-se entre nós, a
partir do ordenamento jurídico fascista italiano na formação de nosso direito
processual civil moderno.
E continua: ora, o fato de não integrar a organização judiciária do
Estado não retira do árbitro o poder de dizer o
d
ireito
-
jurisdicere
.
noções chiovendiana de jurisdição, de atuação da lei no caso concreto e função es
tatal
substitutiva das partes , op.cit.,
p.
153.
65
VALENÇA FILHO, Clavio de Melo. Poder Judiciário e sentença arbitral
de Acordo com a
nova jurisprudência constitucional. V
ol
. 2. 4ª
reimpressão. Curitiba: Juruá, 2008, p.47.
55
Confirma
-se tal afirmação pela análise do texto da referida lei, como,
por exemplo, no art. 31, onde se prevê que a sentença arbitral produz, entre
as partes e seus sucessores, os mesmos efeitos da sentença proferida pelos
órgãos do Poder Judiciário e, sendo condenatória, constitui título executivo ,
ou no art. 17, que equipara os árbitros aos funcionários públicos, para os
efeitos da legislação penal, e também o art. 18, que dispõe que para os fins
processuais o árbitro é juiz de fato e de direito, e a sentença que proferir não
fica sujeita a recurso ou a homologação do Poder Judiciário .
Assim, os publicistas concedem caráter jurisdicional à arbitragem pelo
fato de que, embora os árbitros sejam nomeados pelas partes, o poder de
julgar deriva da lei, ou seja, de um devido dispositivo legal.
Cumpre aqui observar novamente o significado do termo jurisdição, o
qual significa dizer o direito, aplicando-o na situação concreta. Dessa forma,
os árbitros, ao decidir o conflito entre as partes, estariam ditando o direito
aplicado, exercendo atividade jurisdicional.
Os adeptos dessa corrente também observam que, ainda que o Estado
remanesça com a exclusividade da
coertio
e da
executio
, o árbitro
permanecerá detentor dos demais componentes da jurisdição, quais sejam: a
notio
(conhecimento da causa), a
vocatio
(prerrogativa de fazer intervir em
juízo o que seja útil ao conhecimento da verdade) e, principalmente, o
judicium
(direito de judicar e de pronunciar a sentença). Dentre os defensores
56
estrangeiros, podem-se destacar nomes como Hugo Rocco
66
e
Ludovico
Mortara
67
.
Por sua vez, na doutrina brasileira, assim entendem importantes
nomes
como Humberto Theodoro Junior e Nelson Nery
Juni
or
, dentre outros. Eis,
pois, alguns dos ensinamentos de nos
sos doutrinadores:
fácil é concluir que a opção do legislador foi pela atribuição do
caráter publicístico ao juízo arbitral, tornando-o um completo
equivalente jurisdicional, por escolha das partes. Se a justificação de
seu cabimento radica-se numa relação negocial privada (a
convenção arbitral), o certo é que, uma vez instituído o juízo arbitral,
sua natureza é tão jurisdicional como a dos órgãos integrantes do
Poder Judiciário. O que fez, pois, a Lei 9.307 foi instituir
terminantemente
a jurisdicionalização da arbitragem no Brasil, à
medida que lhe atribuiu natureza jurisdicional contratual decorrente
do seu caráter volitivo privado
68
.
A natureza jurídica da arbitragem é de jurisdição. O árbitro exerce
jurisdição porque aplica o direito ao caso concreto e coloca fim à lide que
existe entre as partes. A arbitragem é instrumento de pacificação social.
Sua decisão é exteriorizada por meio de sentença, que tem qualidade
de título executivo judicial, não havendo necessidade de ser homologada pela
jur
isdição estatal. A execução da sentença arbitral é aparelhada por título
66
Segundo J.E.Carreira Alvim, citando Hugo Rocco , o autor sustenta que nada impede
considerar a arbitragem como um dos casos em que o Estado deixa ao particular a faculdade
de exercer uma função pública ou, em geral , em serviço público, sem perder , no entanto, a
qualidade de simples particular, ou seja, sem assumir a qualidade de verdadeiro órgão do
Estado, senão obtendo a equiparação mais ou menos completa de sua atividade privada à de
um func
ionário público ,
op.cit.,
p.
42.
67
Segundo J.E. Carreira Alvim, citando Ludovico Mortara, o autor via na arbitragem a natureza
jurisdicional, ao sustentar que os árbitros são investidos de jurisdição, pelo que a lei lhes
concede o cumprimento de ato de soberania; se este poder não lhes é atribuído em toda a sua
plenitude , nem por
isso se altera a sua natureza , op.cit.,
p.
41
.
68
Theodoro Junior, Humberto. Curso de Direito Processual Civil
Procedimentos especiais -
volume III
41ª ed.
-
Rio de Janeiro: Forense, 2009, p.
324.
57
judicial, sendo passível de embargos do devedor com fundamento no CPC
714, segundo
a Larb 33
, parágrafo 3.
Ou seja, assim como o juiz estatal, o árbitro, substituindo a atividade
da
s partes, também aplica o Direito ao caso concreto, resolvendo o conflito
entre os litigantes. Ressalte-se, ainda, que as hipóteses em que ele está
impedido de atuar, consoante art. 14 da L
arb
, conforme visto são as mesmas
que se aplicam aos magistrados de forma geral.
Isso reforça o entendimento dos publicistas, que também se apoiam na
obrigatoriedade de cumprimento, pelas partes, da sentença arbitral, a qual
independe da homologação do juiz estatal. Tal corrente, sem dúvida alguma,
deve prevalecer.
A atividade jurisdicional, na busca pela solução de conflitos, não é e
nem pode ser monopólio do Estado, isso porque a Constituição Federal (CF)
assegura o acesso à justiça estatal desde que fruto da vontade dos
interessados, conforme abordagem em capítulo futuro, que trata do acesso à
Justiça.
A afirmação anterior permite a crítica de que a jurisdição dita estatal
seria necessária no caso de direitos indisponíveis. Cumpre salientar,
replicando tal argumento, que o limite da utilização da arbitragem, previsto no
art.1º
da Larb, qual seja, a impossibilidade de se submeter direitos
indisponíveis e interesses de incapazes, também é questão de opção
58
legislativa, pois, nada impede que num futuro seja revista, tornando possíveis
tais situações.
A natureza juris
dicional da arbitragem impõe ao árbitro o dever de atuar
de acordo com os princípios fundamentais de nosso ordenamento, assim
como respeitar matéria de ordem pú
blica e, até mesmo, súmulas vinculantes.
59
2. ANÁLISE DOS PRINCÍPIOS DA ARBITRAGEM PELA ÓTICA
D
A
CONSTITUIÇÃO FEDERAL
Todo estudo jurídico deve trazer no bojo considerações acerca dos
princípios regentes. Assim, no estudo da arbitragem, apresenta-
se
fundamental a análise dos princípios constitucionais
eis que a CF é a lei
fundamental que estrutura
todo o ordenamento jurídico pátrio.
Nesse sentido, é o ensinamento de
Nelson
Nery Junior
69
:
a Constituição é a ordem jurídica fundamental da coletividade:
determina os princípios diretivos, segundo os quais devem formar-
se
a unidade política e as tarefas estatais a serem exercidas; regula
ainda procedimentos de pacificação de conflitos no interior da
sociedade, para isso cria bases e normaliza trações fundamentais de
ordem total jurídica.
Luís Roberto
Barroso
70
acentua que
toda interpretação constitucional se assenta no pressuposto da
superioridade jurídica da Constituição sobre os demais atos
normativos no âmbito do Estado. Por força da supremacia
constitucional, nenhum ato jurídico, nenhuma manifestação da
vontade pode subsistir validamente se for incompatível com a Lei
Fundamental.
Significa que a CF se coloca no vértice dos sistemas jurídico do país, a
que confere validade, e que todos os poderes estatais são legítimos desde
que ela os reconheça e na proporção por ela distribuídos. O sistema tem
como elementos identificadores e basilares os princípios.
69
NERY JUNIOR, Nelson.
Princípios do processo na Constituição Federal:
processo civil, penal
e administrativo. 9ª ed., rev. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009, p.38.
70
BARROSO, Luís Roberto. Interpretação e Aplicação da Constituição: Fundamentos de uma
dogmática constitucional transformadora.
7ª ed., rev. São Paulo:
Saraiva,
2009, p.164.
60
Nesse sentido, alega
Eduardo
Cambi
71
que, diferentemente da
concepção incorporada no modelo positivista de direito (art. da LICC e art.
126 do CPC), que conferia caráter secundário e subsidiário aos princípios
jurídicos, a CF se firma como uma ordem objetiva de valores ou um sistema
aberto de princípios e regras .
Segundo
José
Crettela Neto
72
:
princípios são vigas-mestras que sustentam a estrutura
organizacional e operativa do sistema jurídico, atuando também
como elo de ligação
[sic]
entra a lei, a doutrina e jurisprudência,
possibilitando a regulamentação harmônica e equânime da
sociedade.
73
Para
Alexandre de
Moraes
74
:
os princípios condicionais estabelecidos consistem em determinadas
normas que se encontram espalhadas pelo texto da Constituição e,
além de organizarem a própria federação, estabelecem preceitos
centrais de observância obrigatória aos Estados-membros em sua
auto
-
organização.
Assim considerados preceitos fundamentais que dão forma e caráter
aos sistemas jurídicos, os princípios têm considerável importância visto que
fundamentam o direito positivo, orientam a interpretação das normas jurídicas
em geral, possibilitando a compreensão do sentido, e, ainda, são fontes
subsidiá
rias em casos de lacunas na lei, como fator de integração do direito.
71
CAMBI, Eduardo. Neoconstitucionalismo e Neoprocessualismo: Direitos Fundamentais,
Politicas Publicas e Protagonismo Judiciario. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2009,
p.87.
72
CRETELLA NETO, José. Fundamentos principiológicos do Processo Civil. ed. Rio de
Janeiro: Forense, 2006, p. 26
73
Para Cambi, compartilhando do entendimento de Jose Cretella Neto, os princípios são
reconhecidos como pilares axiológicos do sistema jurídico e, consequentemente, possui força
normativa imediata , op.cit.,
p.87.
74
MORAES, Alexandre de.
Direito Constitucional.
21ª ed. São Paulo: Atlas, 2007,
p. 257
.
61
Segundo
José
Cretella Neto
75
:
a maioria desses princípios, por terem forte conteúdo ético e moral,
são plurivalentes, que são comuns a outras disciplinas do
conhecimento humano. Outros são monovalentes, que envolvem
fundamento especifico do Direito, no caso o de Contratos. De
qualquer forma são aplicáveis a todas as disciplinas jurídicas.
2.1 PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS DA ARBITRAGEM
Os princípios juntamente com as regras formam uma norma
76
. A
norma jurídica é um comando prescritivo que visa à concretização de uma
conduta e interfere no plano do dever-ser. Uma vez não observados
acarretam uma sanção, a qual, segundo
Miguel
Reale
77
:
é toda conseqüência que se agrega, intencionalmente, a uma norma,
visando o seu cumprimento obrigatório. Quando a medida se reveste
de uma expressão de força física, temos o que propriamente se
chama de coação, de que tanto falam os juristas e, assim, uma
espécie de sanção, ou seja, a sanção de ord
em física.
Maria Helena
Diniz
78
leciona no mesmo sentido, sustentando que:
75
CRETELLA NETO,
op.cit.,
p.15.
76
Não é objetivo desse trabalho a discussão acerca da distinção entre princípios e regras. No
entanto, adotamos a teoria de Robert Alexy para o qual, segundo Eros Roberto Grau o jurista
sustenta que o ponto decisivo para a distinção entre regras e princípios está e que esses
últimos são normas que ordenam que algo seja realizado na maior medida possível dentro das
possibilidades jurídicas e materiais existentes. As regras, ao contrário, são normas que
somente podem ser cumpridas ou não cumpridas. Se uma regra é valida, então se de fazer
exat
amente o que ela exige: nem mais, nem menos. Logo, as regras são determinações no
âmbito do fática e juridicamente possível. Isso significa que a diferença entre regras e
princípios é qualitativa e não de grau, e que toda norma é uma regra ou um principio.
GRAU,
op.cit.,
p.182.
77
REALE,
op.cit.,
p.72.
78
DINIZ, Maria Helena. Compêndio de introdução à ciência do Direito. 18ª ed. rev. atual. São
Paulo: Saraiva, 2006, p.358.
62
a norma jurídica é imperativa porque prescreve as condutas devidas
e ou comportamentos proibidos e, por outro lado, é autorizante, uma
vez que permite ao lesado pela sua violação exigir o seu
cumprimento, a reparação do dano causado ou, ainda, a reparação
de coisas ao seu estado anterior.
Segundo
Humberto
Avila
79
:
as
normas atuam sobre as outras normas do mesmo sistema
jurídico, especialmente definindo-lhes o seu sentido e o seu valor. Os
princípios, por serem normas imediatamente finalísticas,
estabelecem um estado ideal de coisas a ser buscada, que diz
respeito a outras normas no mesmo sistema, notadamente das
regras. Sendo assim, os princípios são normas importantes para a
compreensão e sentido das regras.
No mesmo sentido vai Eros Roberto
Grau
80
, para quem a força dos
princípios é tal que em situações revolucionarias, novos princípios
incorporados pela ordem jurídica importam em inúmeras regras contempladas
por esta ordem seja retirada a vigência .
Uma abordagem analítica da eficácia dos princípios envolve uma
perspectiva interna e outra externa
81
. Pela perspectiva interna, o foco é a
atuação dos princípios constitucionais sobre outras normas do mesmo
ordenamento jurisdição. Nesse diapasão, os princípios exercem função
integrativa pelo fato de que justificam agregar elementos não previstos em
subprincípios e regras. A perspectiva interna indireta, segundo
Humberto
Avila
82
, traduz-se na atuação com intermediação ou interposição de outro
principio ou regra.
79
AVILA,
op.cit., p
. 97
.
80
GRAU, Eros Roberto. Ensaio e DISCURSO sobre a interpretação/aplicação do Direito. 4ª ed.
São Paulo: Malheiros, 2006, p. 53.
81
AVILA,
op.cit.,
p. 97
82
AVILA, op.cit
.
, p. 98
63
A análise da classificação acima se justifica pela necessidade de
demonstrar no presente trabalho a plena eficácia dos princípios
constitucionais na arbitragem, ou seja, as partes não podem dispor a respeito.
Seja qual for a perspectiva, a eficácia dos princípios é plena e a não aplicação
dos mesmos acarreta uma sanção, que o ato jurisdicional estatal ou arbitral
que não observá
-
los será nulo.
Pela própria natureza e função, os princípios não carecem de sede fixa
no texto constitucional; os que lhe não sejam exteriores (ou anteriores) podem
dele ser simplesmente introduzidos, no entanto, o constituinte procura
in
troduzi
-los literalmente na Carta Constitucional. Sua importância deve ser
sempre ressaltada, que por fazer parte do texto constitucional, os princípios
se aplicam a todo ordenamento jurídico, mesmo que implícitos.
Nesse sentido, Eduardo Cambi
83
afirma que:
os direitos fundamentais, por terem caráter geralmente
principiológicos, informa os atos do Estado e dos cidadãos, impondo
a cada decisão de agir um processo racional de ponderação cujo
resultado não é único nem absoluto. Não direitos fund
amentais
absolutos na medida em que são dotados por imanente reserva legal
de ponderação, vale dizer, independentemente da forma e da força
constitucionais que lhes são atribuídas, pode ter de ceder diante da
maior força ou peso que apresentar, no caso con
creto, os direitos, os
bens, os princípios ou os interesses em sentido contrário.
Ressalte
-se que os princípios constitucionais, por se referir a valores,
guardam grande carga ideológica, razão pela qual as funções acima
mencionadas são desenvolvidas de maneira diferente em cada ordenamento
83
CAMBI, op.cit., p.103.
64
jurídico. Assim, por exemplo, não se admite, no Brasil, o aborto, salvo
nos
caso expressos em lei.
Considerando
-se que a arbitragem se apresenta como meio alternativo
de solução de conflitos de interesses e que o Estado, cuja organização está
disciplinada na CF, exerce a jurisdição como atividade para solução dos
mesmos conflitos, é preciso estabelecer uma relação entre os princípios
constitucionais e o instituto da arbitragem para que não pairem vidas sobre
a constitucionalidade ou não da lei que regulamenta o Juízo Arbitral e para
restar
caracterizado
o
cerne
publicista.
Isso resta claro na medida em que, tomando por base que os princípios
constitucionais são aplicáveis a todo o ordenamento jurídico, tem-se que eles
possibilitarão a consecução das finalidades do instituto da arbitragem, que é
pacificar conflitos de interesses de determinada categoria
(direitos
patrimoniais disponíveis), com a justa aplicação do direito.
A arbitragem, enquanto meio de solução de conflitos, não poderia
deixar de observar os princípios norteadores da legislação processual civil,
muito menos os princípios constitucionais. Caso isso ocorra, a sanção é
inevitável e, neste caso, acarretará a nulidade da sentença arbitral.
84
84
Sobre o assunto comenta Donaldo Armelin: Concluindo, verifica-se que a Lei 9307/96, ao
disciplinar a arbitragem no sistema jurídico brasileiro, não cogitou do tratamento da inexistência
na estrutura, procedimento e sentenças arbitrais. Não obstante a doutrina, sob a influência
dessa matéria na orbita do processo civil, passou a cogitar da aplicação à arbitragem.
Evidentemente o que não existe não se reveste da imortabilidade da coisa julgada, fenômeno
também existente na tela arbitral. Consequentemente, as sentenças arbitrais reputadas
inexistentes, seja ou ausência de jurisdição arbitral, em razão, pois, de falta de um de seus
elementos estruturantes, seja por outras razões, escapam da indiscutibilidade decorrente da
coisa julgada material e mesmo da possibilidade de terem decretada a sua nulidade, mediante
65
2.1.
1
Do Princípio Do Devido Processo Legal
A Constituição da República do Brasil é repleta de princípios que dão
fundamento e dinamicidade a todo embasamento teórico do corpo normativo.
No
art. 5, são definidos princípios fundamentais de proteção e efetividade dos
direitos inerentes aos cidadãos. T
em
-se, pois, um novo Estado Democrático
de Direito no qual o bem-estar das pessoas é elevado à categoria primária de
proteção integral
sob
amparo do Direito Processual Constitucional.
São positivados os princípios constitucionais processuais no intuito de
fazer jus a tais direitos. Diante do modelo histórico e jurídico surge o devido
processo legal como meio inerente ao processo, dele se originando todos os
demais princípios, ante o caráter mantenedor e garantidor de uma ordem
social justa. Esse princípio de origem na jurisprudência anglo-saxônica faz-
se
presente em todos os outros de forma implícita e coerente.
Prev
isto no art. 5, LIV e LV, ambos da CF, o princípio do devido
processo legal informa o conjunto de garantias constitucionais que, de um
lado,
asseguram às partes o exercício de faculdades e poderes processuais e,
de outro, são indispensáveis ao correto exercício da jurisdição.
a atuação da jurisdição estatal. Sendo assim o reconhecimento da inexistência afetando as
sentenças arbitrais tal como sucede com aquelas judiciais implica um esgarçamento da
segurança jurídica que, em relação a tutela arbitral se faz mais necessário, considerando-se as
suas peculiaridades. A ação declaratória com a sua imunidade à prescrições, decadências ou
preclusões que a caracterizam é um instrumento adequado para o reconhecimento da
inexistência das sentenças arbitrais, a ela equiparada a impugnação, com carga declaratória
relativamente à inexistência do titulo executivo extrajudicial correspondente a sentença arbitral.
Contudo o seu manejo deve ser reservado aquelas situações que, efetivamente, comportam o
reconhecimento da inexistência da sentença arbitral, reduzindo-se ao mínimo as hipóteses em
que sua nulidade seja convolada em figuras de inexistência. Com isso manter-
se
o
necessário tônus da segurança jurídica, que deve emergir da tutela arbitral. DONALDO,
Armelin. A ação declaratória em matéria arbitral
.
In:
Revista de Arbitragem e Mediação
(Coord.:
Arnoldo Wald). Ano 3
-
9. Editora Revista dos Tribunais: Sâo Paulo, 2006, p. 111.
66
Segundo
Nelson
Nery
Jun
ior
85
, o principio constitucional do processo
civil que entendemos como a base sobre o qual todos os outros princípios e
regras se sustentam, é o do devido processo legal, expressão oriunda da
inglesa
due process law .
No mesmo sentido,
José Afonso da
Silva
86
diz que:
garante
-se o processo e quando se fala em processo, e não em
simples procedimento,
alude
-se, sem dúvida, as formas
instrumentais adequadas, a fim de que a prestação jurisdicional
quando entregue pelo Estado dê a cada um o que é seu, segundo os
imperativos da norma jurídica. E isso envolve a garantia do
contraditório, a plenitude do dire
ito de defesa, a economia processual
e a bilateralidade doa atos procedimentais.
Definir o papel do devido processo legal inicia por reconhecer esse
cont
exto: por se tratar de um princípio vago, de interpretação aberta, tanto por
parte da doutrina quanto da jurisprudência, fica-se diante de um princípio
cujos elementos em grande medida estão definidos em normas de igual
hierarquia e regrados na legislação ordinária. Conforme
Nelson
Ne
ry J
unior
87
:
em nosso parecer, bastaria a norma constitucional haver adotado o
principio do due process of law para que ddecorressem todas as
consequências processuais que garantiriam aos litigantes o direito a
um processo e a uma sentença justa. É, por
assim dizer, o gênero do
qual todos os demais princípios e regras constitucionais são
espécies.
85
NERY, op., cit., p. 77
86
SILVA, José Afonso. Curso de Direito Constitucional Positivo. 23ª ed., rev. e atual. São
Paulo: Malheiros, 2009, p. 432
87
NERY, op., cit., p. 77.
67
No mesmo sentido,
Cândido Rangel
Dinamarco
88
colaciona:
a expressa garantia do
due process of law,
contida no inc. LIV do art.
da Constituição Federal, tem um significado sistemático de fechar
o rculo das garantias e exigências constitucionais relativas ao
processo mediante uma formula sintética destinada a afirmar a
indispensabilidade de todas e reafirmar a autoridade de cada uma.
Esse enunciado explícito vale ainda como norma de encerramento
portadora de outras exigências não tipificadas em formulas mas
igualmente associadas à ideia democrática que deve prevalecer na
ordem processual (art. 5º, parágrafo2º). A doutrina tem muita
dificuldade em conceituar o devido processo legal e precisar os
contornos dessa garantia
justamente porque vaga e caracterizada
por uma amplitude indeterminada e que não interessa determinar. A
jurisprudência norte-
americ
ana, emprenhada em expressar o que
sente
por
due process of law, diz que é algo que esem torno de
nós e não sabemos bem o que é, mas influi decisivamente em
nossas vidas e em nossos direitos (Juiz Frankfurter, da Corte
Suprema americana). A essa clausula atribui-se hoje uma dimensão
que vai alem dos domínios do sistema processual, apresentando-
se
como um devido processo legal
substancial
que, em essência,
constitui um vinculo autolimitativo do poder estatal como um todo,
fornecendo meios de censurar a própria legislação e ditar a
ilegitimidade de leis que afrontem as grandes bases do regime
democrático (
substantive due process of law
).
Nas palavras de
José
Cretella Neto
89
:
o conceito do due process law não se restringe, portanto, a mera
garantia das formas processuais preconizadas pela Constituição,
mas é a própria substância do processo que permite a efetiva
aplicação das leis e, quando se diz processo , entenda-se que o
termo é aqui empregado com a maior amplitude possível,
abrangendo quaisquer procedimentos que possam violar direitos
fundamentais.
Tem
-se que a adequada assimilação do conceito na prática jurídica
brasileira passa, efetivamente, por levar a cabo essa tarefa. E reduzir a
indeterminação do devido processo legal implica definir a nature
za
constitucional que o prevê, estabelecer pontes com as soluções da doutrina e
a jurisprudência, construídas sob a égide de Constituições anteriores, bem
88
DINAMARCO, Candido Rangel. Instituições de Direito Processual Civil I. ed. rev. at. São
Paulo: Editora Malheiros, 2009, p. 250.
89
CRETELLA
NETO
,
op.cit.,
p.44
.
68
como encontrar
seu
lugar entre as múltiplas e explícitas garantias, não apenas
processuais inscritas na CF. Para Fredie Didier Jr.
90
como se vê, o devido
processo legal fundamental de conteúdo complexo. Trata-se de uma clausula
geral e, portanto, aberta, que a experiência histórica cuida de preencher.
Para que se possa definir o significado do devido processo legal é
interessante como marco inicial
uma
delimitação conceitual: a leitura do inciso
LIV do art. revela que o devido processo legal é uma norma da mais alta
hierarquia dentro do ordenamento jurídico, pois o texto que a abriga é a CF,
atribui
ndo
-lhe status de princípio constitucional.
O inciso LIV do art. não deve ser entendido como suficiente para
delimitar os contornos do devido processo legal, o qual é parte de um sistema
tanto no sentido restrito de parte de um mesmo diploma normativo, quanto no
sentido amplo de elemento de uma ordem jurídica. Para
Rui
Portanova
91
:
o principio é tão amplo e tão significativo que legitima a jurisdição e
se confunde com o próprio Estado de Direito. Assim, aplica-se tanto
na jurisdição civil e na penal como nos procedimentos
administrativos. Ademais, engloba a reivindicação de direitos
(inclusive de declarar a inconstitucionalidade de lei), a eficaz defesa
e a produção de provas. No devido processo legal são
enfeixadas
garantias representadas principalmente pelos princípios do
contraditório, ampla defesa, duplo grau, publicidade, juiz na
tural,
assistência judiciária gratuita.
A lei é garantia das relações humanas. Com a aplicação da legislação,
as partes têm a sensação de que a Justiça se concretizou plenamente. Assim,
90
DIDIER Jr, Fredie. Curso de Direito Processual Civil: Teoria Geral do Processo e Processo
de Conhecimento. Vol. I. 6ª Ed. ampl. rev. e at. Salvador: JusPODIVM, 2006, p. 53.
91
PORTANOVA, Rui. Princípios do Processo Civil. 3ª Ed.
Porto A
legre: Livraria do Advogado,
1999, p.146.
69
observado o devido processo legal, que visa exatamente às formalidades e
exigências previstas em lei, fica afastada a hipótese do procedimento
arbitrário, insegurança jurídica e privação de direitos e bens.
92
Nas lições de
Maria Helena
Diniz
93
:
por extensão, a justiça aplica-se aos princípios superiores da ordem
social, visto que esta só será justa na medida em que garantir ao
indivíduo o seu direito; à legislação, porque esta deve assegurar a
cada um o que lhe é devido no seio da sociedade ; e aos órgãos
encarregados da sua aplicação. Como, em regra, o dever de dar a
cada
um o que é seu vem imposto por norma jurídica, pode-
se
afirmar que o justo é o que exige o direito. Daí ser a justiça o próprio
ordenamento jurídico e o ideal a que deve tender o direito.
Analisar o devido processo legal implica, pois, situar a norma dentro da
CF e, em sentido mais amplo, no ordenamento jurídico brasileiro, como no
caso do artigo 21 da Larb, que estabelece que o árbitro tem de respeitar o
devido processo legal. Efetivamente a arbitragem, enquanto instituto de
caráter jurisdicional
,
reclama
a aplicação dos princípios constitucionais
jurídicos informadores do processo civil.
O devido processo legal não é um fim em si mesmo, como o próprio
processo judicial ou arbitral não o é, mas é, efetivamente, um meio de conferir
proteção aos direitos fundamentais. Trata-se de dar significado mais preciso
ao texto constitucional, por meio do destaque de um aspecto funcional da
92
DIAS, Jefferson Aparecido. Princípio do Devido Processo Legal. In: Princípios Processuais
Civis na Constituição.
Rio de Janeiro: Elsevier, 2008, p. 45.
93
DINIZ,
op.cit.,
p.407.
70
norma que determina a observância do devido processo legal em relação às
outras normas referentes a direitos fundamentais.
94
O devido processo legal alcança da mesma forma a arbitragem, pois,
ao determinar o procedimento que regerá o Juízo Arbitral, as partes se
vinculam a ele, devendo observá-lo, no entanto, sem se sobrepor ao devido
processo legal, sob pena de nulidade do pr
óprio procedimento.
2.
1.
2 Do Acesso À Justiça
No Brasil, o acesso à Justiça figura entre os direitos e garantias
fundamentais
(CF, art. 5º, XXXV) na intenção de, segundo
Rui
Portanova
95
,
colocar o Poder Judiciário como local onde todos os cidadãos podem fazer
seus direitos individuais e sociais . Fica evidente que o acesso à Justiça é
uma faculdade que tem a sociedade de provocar o Estado diante da
ocorrência de um conflito
96
.
94
Para Nelson Nery Junior, o direito a tutela jurisdicional adequada garantido pela CF
XXXV, pressupõe a existência e o desenvo
lvimento de um processo devido , op.c
it.
, p.173.
95
PORTANOVA,
op.cit., p
.113.
96
Ne
ste sentido Nelson Nery Junior afirma que embora o destinatário principal desta norma
seja o legislador o comando constitucional atinge a todos indistintamente, vale dizer, não pode
o legislador nem ninguém mais impedir que o jurisdicionado vá a juízo deduzir pretensão ,
op.cit., p.170.
71
No século passado,
Mauro
Cappelletti e
Bryant
Garth
97
idealizaram
três
ond
as
de renovação do processo civil: a primeira voltou-se à assistência
judiciária, isto é, aos hipossuficientes; a segunda, à representação judicial dos
interesses metaindividuais; e a terceira cuidou da ampliação do acesso à
Justiça,
propondo nova compreensão, não mais exclusivamente
centrada
na
prestação judiciária estatal
,
mas permitindo modalidades alternativas, auto e
heterocompositivas, chamadas
pour cause,
meios alternativos .
98
A necessidade de criar meios alternativos para a solução de conflitos
advém do fato de que a sociedade contemporânea gera conflitos
intersubjetivos e de massa, os quais exigem decisões rápidas e eficientes,
levando com frequência os aplicadores da norma sistematizada a agir
casuística e pragmaticamente, o raras vezes afrontando os demais
poderes.
O Judiciário, que luta contra a morosidade, contra o excessivo volume
de demandas (muitas vezes sobre um tema) e contra a constante
divergência de opiniões presentes em seus escalões, é exatamente o maior
r
esponsável pelo insucesso da tutela jurisdicional.
Segundo Adriana S. Silva
99
,
97
CAPPELLETI, Mauro & GARTH, Bryant. Acesso à Justiça. Trad. Ellen Gracie Northfleet -
Porto Alegre: Fabris, 1998, p.8.
98
CAPPELLETI & GARTH, op., cit., O novo enfoque de acesso à Justiça, no entanto, tem
alcance muito mais amplo. Essa terceira onda de reforma inclui a advocacia, judicial ou
extrajudicial, seja por meio de advogados particulares ou públicos, mas vai além. Ela centra
sua atenção no conjunto geral de instituições e mecanismos, pessoas e procedimentos
utilizados para processar e mesmo prevenir disputas nas sociedades modernas. Nós o
denominamos o enfoque do acesso à Justiça por sua abrangência. Seu método não consiste
em. abandonar as técnicas das duas primeiras ondas de reforma, mas em tratá-las como
apenas algumas de uma série de possibilidades para melhorar o acesso .
99
SI
LVA, Adriana dos Santos. Acesso à justiça e arbitragem: um caminho para a crise do
judiciário
Barueri, SP: Manole, 2005, p.110.
72
Tem
-se percebido, com isso, que o acesso à Justiça tornou-se arcaico
em relação à realidade contemporânea. O sistema jurídico não
acompanha o progresso da sociedade, e em contrapartida, deixa, por
vezes, lacunas na resolução dos litígios bem como não satisfaz os
auspícios de uma prestação jurisdicional adequada e satisfatória, para
o que deveria estar preparado o Poder Judiciário. Os problemas são
abundantes, desde as custas elevadas até o tempo do processo, que
não mais condiz com a velocidade da informatização.
O conceito atual de jurisdição não é mais tão centrado no Estado
(soberano) para se
encontra
r
com
a função que o Estado Social de Direito
deve desempenhar no sentido de promover a resolução justa dos conflitos em
tempo razoável. Conforme
Nilton César
Antunes da Costa
100
:
Assim, é cada vez mais constante o exercício jurisdição não mais
como monopólio estatal na distribuição da Justiça, mas na busca por
outras modalidades, visto que desempenham com maior efetividade
suas atribuições, o que, por si só, explica a notória evolução dos
chamados
meios alternativos
ou
equivalentes jurisdicionais,
conforme acima demonstrado.
Para
Mauro
Cappellet
i
e
Bruant
Garth
101
, o acesso à justiça pode ser
encarado como requisito fundamental
o mais sico dos direitos humanos
de um sistema jurídico moderno e igualitário que pretenda garantir, e não
apenas proclamar, o direito de todos .
Embora inserida no capítulo dos direitos e deveres individuais e
coletivos (art. e incisos), trata-se de norma é dirigida ao Legislativo. No
mesmo sentido vai
Nelson
Nery Junior
102
: embora o destinatário final da
norma seja o legislador, o comando constitucional atinge a
todos
100
COSTA, Nilton César Antunes. Efeitos Processuais da Convenção de Arbitragem.
Campinas: Servanda, 2006, p.78.
101
CAPPELLETI &
GARTH, op.cit
.,
p.8.
102
NERY
JUNIOR
,
op.cit.,
p.170.
73
indistintamente, vale dizer que não pode o legislador nem ninguém mais
impedir que o jurisdicionado vá a juízo deduzir pretensão .
No entanto a norma atinge indiretamente aos jurisdicionados, porque
aquele inciso adverte esse Poder para que não apresente proposição
tendente a suprimir lides. Vale lembrar, desde logo, que o verbo apreciar
é
neutro,
e assim aquela garantia não implica compromisso de que
necessariamente todo e qualquer conflito, submetido à jurisdição, será
dirimido, isso porque o enfrentamento destes depende da presença de certos
elementos, sem os quais o processo não irá prosperar, quais sejam entre
outros, as condições da ação, a litispendência, a exceção de coisa julgada, a
convenção de arbitragem (CPC, art. 267, V, VI, VII).
O
conteúdo da norma c
onstitucional deve ser entendido
no ambiente da
resolução das controvérsias, a qual não é exclusiva do Judiciário,
tanto que os
conflitos desportivos devem previamente ser submetidos aos Tribunais
Desportivos
(CP,
art. 217, parágrafo 1°) e determinadas matérias e processos
são destinados a órgãos parajurisdicionais , como os Tribunais de Contas
(CP,
art. 71), a Justiça de Paz
(CP,
art. 98), os tabelionatos (Lei 11.441/2007:
CPC, arts. 982, 983, 1.031 e 1.124
-
A).
É justamente nesse sentido, ou seja, na tendência de
dessacralização
do acesso à Justiça, que surge a arbitragem, uma vez que o art. 18 da Lei
9.307/96 reza: O árbitro é juiz de fato e de direito', e a sentença que proferir
não fica sujeita a recurso ou a homologação pelo Poder Judiciário .
74
Segundo
Antonio Carlos de Araújo Cintra, Ada Pellegrini
Grinnover
e
Cândido Rangel Dinamarco
103
, ao analisar a arbitragem no contexto do
acesso à Justiça:
essa garantia não é infringida pela Lei de Arbitragem, que não mais
submete o laudo arbitral à homologação pelo Poder Judiciário,
produzindo ela os mesmo efeitos da sentença judicial (art.18 e 31). A
eficácia da sentença arbitral é legitimada pela vontade das partes
manifestada ao optar por esse modo de solução de conflitos, assim
renunciand
o à solução pela via judicial; e, se uma delas não quiser
cumprir a cláusula compromissória a outra deverá recorrer ao Poder
Judiciário para o suprimento da vontade de que se recusa. Além
disso, a lei contempla o acesso aos tribunais para a decretação da
n
ulidade da sentença arbitral, nos casos nela previstos.
No mesmo sentido,
Nelson
Nery Junior
104
alerta que:
o fato das [sic] partes constituírem convenção de arbitragem não
significa ofensa ao direito de ação. Isto porque somente os direitos
disponíveis
podem ser objeto de convenção de arbitragem, razão
porque as partes ,quando o celebram, estão abrindo mão da
faculdade de fazerem uso da jurisdição estatal, optando pela
jurisdição arbitral. Terão, portanto, sua lide decidida pelo árbitro, não
lhes sendo
negada a aplicação da atividade jurisdicional.
Esta leitura do con
stante no inciso XXXV do art. 5
° da CF deve ser feita
para o fim de tornar o acesso à Justiça compatível com a atividade
jurisdicional
105
, a qual vive imersa num infinito números de processos. Numa
103
CINTRA, Antonio Carlos de Araújo; GRINOVER, Ada Pellegrini; DINAMARCO, Cândido
Rangel.
Teoria Geral do Processo.
23ª ed.
São Paulo: Malheiros, 2007, p. 87
104
NERY, op.cit.,
p.172.
105
Para Eduardo Cambi, o art. 5º, XXXV, da CF não assegura apenas o direito de acesso à
justiça. De nada adiantaria possibilitar o ingresso à justiça se o processo judicial não garantisse
meios e resultados. Por isto, especialmente após o acréscimo, pela Emenda Constitucional
45/2004, do inciso LXXVIII ao art. da CF, a exemplo da interpretação do art. 6º, n. 1, da
Convenção Européia dos Direitos do Homem e do Cidadão, o inciso XXXV da CF deve ser
interpretado como um direito fundamental à tutela jurisdicional adequada, célere e efetiva. Por
exemplo, o excesso de prazo da prisão cautelar, quando não atribuível à defesa, sendo
exclusivamente imputável ao aparelho judiciário, e mesmo tratando-se de crimes hediondos,
afronta o valor constitucional da dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, CF), a garantia
constitucional do devido processo legal (art. 5º, LIV, CF) e da presunção de inocência (art. 5º,
LVII, CF), além do direito fundamental à razoável duração do processo (art. 5º, LXXVIII, CF).
Por outro lado, o direito fundamental à tutela jurisdicional efetiva, adequada e eficiente vincula
75
análise mais profunda, a crise do acesso à justiça é a própria crise do Poder
Judiciário
106
. Por isso, o P
oder
J
udiciá
rio
deve ser visto como
garantia
subsidiária,
destinada a controvérsias não solucionadas pelos outros meios.
Dessa forma, o Estado poderá dedicar-se aos processos de forma mais
eficaz, em vez de produzir Justiça de massa. Nesse sentido, Flávio Luis de
Oliveira
107
afirma que
:
(...) os atos emanados pelos Poderes estatais devem estar
respaldados por um contexto jurídico-social, caracterizado pela nota
da efetividade, no sentido plenamente material, portanto, substancial,
para que, realmente, caracterize
-
se como um Estado Democrático de
Direito. Assim sendo, urge intensificar as diversas formas de
participação do ser humano no processo de decisão. Destarte, a
Constituição brasileira fundou o Estado Democrático de Direito que
deve concretizar a democracia de modo a efetivar um processo de
convivência social numa sociedade livre, justa e s
olidária;
envolvendo a participação crescente do povo no poder; e pluralista,
porque respeita a pluralidade de ideias, culturas e etnias. Logo, a
democratização da administração da justiça é uma dimensão
fundamental da democratização da vida social, econômica e política.
Essa democratização, portanto, não se deve limitar à constituição
interna do processo e do procedimento, pois, apesar de amplas, têm
limites óbvios. Com efeito, o Poder Judiciário deve estar apto a
eliminar os obstáculos econômicos, sociais e culturais inerentes às
diferentes classes ou estratos sociais, de modo a ensejar a
concretização dos direitos sociais.
É preciso, pois, que o operador do Direito esteja atento para não extrair
do art. 5°, XXXV da CF, mais do que ele contém em termos de extensão,
compreensão e finalidade, dado que, realisticamente, cuida-se de dispositivo
endereçado ao legislador.
o legislador, seja para obrigá-lo a regulamentar dispositivos constitucionais para melhor
assegurar a proteção judiciária (v.g., art. , LXVII, CF) seja para limitar a atuação legislativa
(v.
g., vedando a criação de taxas judiarias não razoáveis). Desse modo, o art. , XXXV, da
CF não tem teor somente técnico-processual, assumindo aspectos extrajudiciais e
substanciais. ,
op.cit.,
p. 219
-
220.
106
Segundo Neil Andrews, analisando o Poder
Judici
ário inglês Hoje em dia, o fato é que
poucos casos cíveis. Isso explica porque os departamentos jurídicos das empresas inglesas se
redefiniram como serviços de resolução de questões e muitos
barristers
se tornaram
mediadores conceituados , p.29.
107
OLIVEIRA, Flávio Luís de. Principio do Acesso à Justiça .
In:
Princípios Processuais Civis
na Constituição / [coordenadores Maria Elisabeth de Castro Lopes, Olavo de Oliveira Neto].
Rio de Janeiro: Elsevier, 2008, p.81
-
82.
76
De fato, a arbitragem surge como mecanismo alternativo na solução de
conflitos, via de regra, mais célere e mais eficaz que o Poder Judiciário. No
entanto, este instituto tem de ser analisado, necessariamente, como opção
dos interessados, não sendo possível (com exceção da ação de cumprimento
da clausula compromissória) a alguém ser obrigado a submeter um conflito a
um árbitro, motivo pelo qual o juiz não poderá de oficio extinguir o feito pela
existência de convenção de arbitragem, conforme o art. 267,VII do CPC. Tal
tema será abordado neste trabalho, posteriormente.
2.1.3
Do Contraditório
E Da
Ampla Defesa
O princípio do
contraditório
está previsto no art. 5º, inc. LV, da CF/88 e
informa que aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos
acusados em geral são assegurados o contraditório e a ampla defesa, com os
meios e recursos a ela inerentes . Tal princípio está intimamente relacionado
ao princípio da igualdade das partes, disciplinado no art. 5º, I, da CF e
reproduzido, no âmbito processual, no art. 125, inc. I do CPC, que intenta
assegurar às partes igualdade de tratamento .
77
Nesse sentido Nelson Nery Junior
108
lecion
a que:
o princípio do contraditório, além de constituir fundamentalmente em
manifestação do princípio do estado de direito, tem íntima ligação
com o da igualdade entre as partes e do direito de ação, pois o texto
constitucional, ao garantir aos litigantes o contraditório e a ampla
defesa, quer significar que tanto o direito de ação quanto o direito de
defesa são manifestações do principio do contraditório.
Dentre os princípios processuais fundamentais do processo destaca-
se
o princípio do contraditório e da ampla defesa como garantia aos cidadãos
de seus direitos e deveres e da previsão legal de que o processo ocorrerá de
forma justa e eficaz. Além de ser um princípio, é um direito; e a parte tem de
ser informada sobre os atos processuais e de se manifestar. Nesse sentido,
Maria
Elizabeth
de Castro
Lopes
109
afirma que, por se cuidar de princípio
constitucional, o contraditório não pode ser suprimido pela legislação
ordinária, embora caiba a esta a disciplina de sua forma de atuação.
Para
Rui
Portanova
110
:
o contraditório assenta-se em fundamentos lógico e político. A
bilateralidade da ação (e da pretensão) que gera a bilateralidade do
processo (e a contradição recíproca) é o fundamento lógico. O
sentido de que ninguém pode ser julgado sem ser ouvido é o
fundamento político. Sustentado entre estes dois pilares, o princípio
dinamiza a dialética processual e vai tocar, como no momento
argumentativo, todos os atos que preparam o espírito do juiz.
108
NERY, op.cit.,
p.205.
109
LOP
ES, Maria Elizabeth de Castro. Principio do Contraditório .
In:
Princípios Processuais
Civis na Constituição / [coordenadores Maria Elisabeth de Castro Lopes, Olavo de Oliveira
Neto].
Rio de Janeiro: Elsevier, 2008, p.103.
110
PORTANOVA,
op.cit.,
p.161.
78
Para
Antonio Carlos de Araújo Cintra, Ada
Pellegrini
Grinover
e
Cândido Rangel Dinamarco
111
:
o princípio do contraditório também indica a atuação de uma garantia
fundamental de justiça: absolutamente inseparável da distribuição da
justiça organizada, o princípio da audiência bilateral encontra
expressão no brocardo ro
mano
audiatur et altera pars. Ele é tão
intimamente ligado ao exercício do poder, sempre influente sobre a
esfera jurídica das pessoas, que a doutrina moderna o considera
inerente mesmo à própria noção de processo.
Uma de suas maiores características é valorar a igualdade, provas,
argumentações e oportunidades que as partes têm a oferecer.
Consequentemente, nesta dialética em que uma parte se contrapõe à outra na
presença de um árbitro, far-
se
-á a fundamentação de forma imparcial no
processo.
Destaca
-se aqui, ainda, a importância do Estado Democrático de
Direito, representado pelo juiz ou árbitro, como mediador e garantidor de tais
direitos sociais. O juiz (estatal ou privado), em regra, a partir do contraditório
busca os elementos necessários para um julgamento justo. O contraditório lhe
dá essa possibilidade de convicção, segurança e imparcialidade quanto à
decisão. Para
Cândido Rangel
Dinamarco
112
:
a participação a ser franqueada aos litigantes é uma expressão da
ideia, plantada na ordem política, de que o exercício do poder se
legitima quando preparado por atos idôneos segundo a Constituição
e a lei, com a participação dos sujeitos interessados. Tem-se por
ponto de partida a essencial distinção entre atos de poder, que
atingirão a esfera jurídica de pessoas diferentes de quem os realiza;
e
atos de vontade, ou negócios jurídicos, que se destinam à auto-
regulação de interesses e não realizados pelos próprios titulares
destes (autonomia da vontade). A força vinculante dos negócios
111
CINTRA, GRINOVER
e
DINAMARCO,
op.cit.,
p.61.
112
DINAMARCO,
op.cit., p. 220.
79
jurídicos tem origem e legitimidade na vontade livremente
manifestada. A daqueles, na participação dos destinatários segundo
as regras pertinentes.
Diz
Humberto
Theodoro Júnior
113
que o princípio do contraditório
reclama, outrossim, que se oportunidade à parte não de falar sobre
alegações do outro litigante, como também de fazer a prova contrária . Ainda,
para
Eduardo Arruda
Alvim
114
:
significa, esse princípio, que se deve dar conhecimento da
existência da ação e de todos os atos do processo às partes e, de
outro, a possibilidade de as partes reagirem aos atos que lhes sejam
desfavoráveis . Nesse diapasão, percebe-se a intima correlação
existente entre o principio do contraditório e o da isonomia (art. 5º,
caput
e inc. I, da CF/88; art. 125, I, do CPC), estando ainda
relacionada ao principio do amplo e irrestrito acesso ao Judiciário.
Portanto, as oportunidades devem ser garantidas às partes sempre em
número compatível, facultando seu exercício. O contraditório é princípio
garantid
or, de respeito às partes e suas manifestações, sempre que houver
interesse e necessidade.
O contraditório, portanto, institui-se como pedra fundamental de todo
processo e, particularmente, do procedimento arbitral. E assim é porque,
como cláusula de garantia instituída para a proteção das partes na arbitragem
diante da Larb, tem como fundamento o interesse público da realização de
seu objetivo, que é
a solução do conflito.
113
THEODORO JUNIOR, op.cit.,
p.28.
114
ALVIM, Eduardo Arruda. Direito Processual Civil. ed. reform. atual. e ampl.
São Paulo:
Editora Revista dos Tribunais, 2008, p.123.
80
Considerando o exposto anteriormente, verifica-se que a aplicação dos
princípios
constitucionais ao juízo arbitral confere aos litigantes maior
segurança na solução de conflitos e reitera a supremacia das normas
constitucionais, pois que aplicadas a todo o ordenamento jurídico.
Segundo
José
Cretella Neto
115
, esse princípio não está apenas ligado
ao princípio da ampla defesa, mas também ao princípio da imparcialidade do
juiz ou árbitro, pois o dever da imparcialidade obriga o julgador a ouvir todas
as partes da mesma maneira.
2.1
.3.1 Do Principio da Igualdade das Partes
Quanto ao princípio da igualdade, conforme Carlos Alberto
Carmona
116
:
que estabelece a paridade entre os litigantes, necessário notar que
não existem no processo arbitral os mesmos mecanismos de
transformação da igualdade formal em igualdade material e que
dispõe o juiz estatal. Desta forma, a igualdade de que trata a Lei
permanece numa dimensão estática, dificilmente superável. É
preciso, porém, lembrar que no processo arbitral as partes
encontram
-se e normalmente em situação bastante equilibrada e
escolhem
espontaneamente o meio através do qual resolverão seu
litígio: no processo estatal, ao contrário, o equilíbrio das partes não é
a regra, e a participação no processo não é voluntária, mas sim
obrigatória. Se aqui a intervenção estatal é necessária para eq
uilibrar
partes ontologicamente desiguais, esta intervenção pode ser
confortavelmente dispensada. Assim, enquanto a paridade de armas
é uma inquietação para o juiz togado
a ponto de a Lei 9.099/95 ter
determinado que, comparecendo uma das partes acompanhada de
seu advogado, caberá ao Estado proporcionar representação técnica
para o adversário
o árbitro não deverá preocupar-se com o tema,
estando na esfera de disponibilidade das partes nomear ou não
advogados, pois pressupõe-se que os litigantes, ao escolherem a via
115
CRETELL
A NETO,
op.cit.
116
CARMONA,
op.cit.,
p.253.
81
arbitral, estejam bem informados sobre suas possibilidades e
dificuldades, até porque escolheram livremente o procedimento que
pretendiam ver aplicado à solução da controvérsia. Da mesma forma,
não haverá preocupação com ampliação de prazo para um dos
litigantes (como técnica de nivelamento entre partes desiguais),
dispensa de cauções, redução de verba honorária para este ou
aquele litigante, o que revela desde logo que, figurando o Estado (em
sua forma autárquica ou nas vestes da empresa pública, para ficar
nos exemplos mais factíveis) como parte em juízo arbitral, não
poderá invocar qualquer das prerrogativas de que goza no processo
estatal. Em síntese, quis o legislador
ao inserir o princípio da
igualdade como fundamento da arbitragem
deixar claro que as
partes devem ter a mesma oportunidade de indicar árbitros, de
produzir provas, de expor suas razões e fazer valer suas próprias
razões, sem privilégios ou prerrogativas.
Tal princípio pode ser constatado na CF e no diploma processual
civil e,
é claro, foi absorvido pela L
arb
, impondo-se ao árbitro a observância, pois, do
contrário a sentença arbitral, eivada de nulidade, não poderá produzir os
efeitos esperados pelas partes, visto que, segundo José Cretella
Neto
117
:
o valor da igualdade é imposto tanto ao
legislador
impedindo que
elabore leis arbitrarias
quanto ao
particular
, para que ninguém seja
diferençado em função de determinadas características, tais como
raça, religião ou sexo. São, no entanto, permitidas diferenciações
quando
estas não forem ofensivas à dignidade humana. A lei pode
exigir, por exemplo, que somente sejam admitidos ao serviço militar
indivíduos acima de determinada altura, ou que não preencham
determinados requisitos quanto à saúde; da mesma forma, um clube
de golfe pode não admitir sócios não praticantes da modalidade. Em
nenhum desses casos estará configurada qualquer
inconstitucionalidade. A questão central não o critério diferenciador
em si, mas sim, o
vínculo
existente entre o critério diferenciador e a
fina
lidade da diferenciação. (...)
O
princípio da igualdade processual das partes domina o processo
civil e, nesse aspecto, está a Lei de Arbitragem em perfeita sintonia
com todos os sistemas processuais e arbitrais modernos.
117
CRETELLA NETO
,
op.cit.
,
p.123.
82
2.1
.4 Princípio do Juiz
Natural
O constituinte disciplinou o princípio do juiz natural como meio hábil a
garantir o direito de todos serem processados apenas por juízes
constitucionalmente
competentes, pré-constituídos, imparciais e
independentes por natureza, com fulcro no Est
ado Democrático de Direito
.
Para
Enrico Tullio
Liebman
118
, a garantia do juiz natural surgiu:
para evitar que uma controvérsia possa ser entregue a órgão
judiciário diverso daquele que segundo a lei seria competente (...). O
mesmo sentido tem os arts. 6º da Convenção Européia e 14 do
Pacto Internacional, ao dizerem que o juiz deve ser estabelecido por
lei.
Segundo
Antonio Carlos de Araújo Cintra, Ada Pellegrini
Grinover
e
Cândido Rangel Dinamarco
119
, o princípio do juiz natural:
apresenta um duplo significado: no primeiro consagra a norma que
só é juiz o órgão investido de jurisdição (afastando-se desse modo, a
possibilidade de o legislador julgar impondo sanções penais sem
processo prévio, através de leis votadas pelo parlamento, muito em
voga no antigo direito inglês, através do Bill Attainder; no segundo
impede a criação de tribunais ad hoc e de exceção, para o
julgamento de causas penais e civis.
O princípio do juiz natural é previsto no direito brasileiro nos incisos
XXXVII
e LIII, do art. 5º, da CF, que procura garantir a imparcialidade do
Judiciário e todos aqueles que exercem atividade jurisdicional, como o árbitro.
118
LIEBMAN, Enrico Tullio. Manual de Direito Processual Civil. Tradução e notas: Cândido
Rangel Dinamarco. 2ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 1985, p.
28
119
CINTRA, GRINOVER e DINAMARCO,
op.cit.,
p.58.
83
Nesse sentido, pode-se afirmar que o juiz natural no ordenamento jurídico
brasileiro é aquele constitucionalmente competente, ou seja, derivado de
fontes constitucionais, portanto, imparcial por natureza. Considera
Olivar
Augusto
Roberti Coneglian
120
que:
o princípio do juiz natural pode ser visto como uma manifestação do
Estado Democrático de Direito, e tem suas bases nos princípios da
imparciabilidade, da legitimidade e da igualdade, sendo que,
normalmente é exteriorizado sobre um duplo aspecto à proibição de
tribunais
ad hoc ou de exceção e a necessidade de o julgamento ser
proferido por um juiz competente.
para Nelson Nery J
unior
121
, a garantia do juiz natural tem três
vertentes: a) não haverá juízo ou tribunal de exceção ou ad hoc; b) todos têm
o direito de ser julgados por juiz competente, pré-constituído na forma da lei;
c) e o juiz competente deve ser imparcial.
Aduzindo, tribunal de exceção é aquele criado para julgar
determinado caso, isto é, de encomenda, criado ex post facto para julgar com
parcialidade, no ímpeto de beneficiar ou prejudicar alguém. Não se deve
confundi
-lo com prerrogativa de função, que é garantia assegurada à
independência e imparcialidade da Justiça, com supedâneo no interesse
público geral.
Ademais, o direito a um juiz ou árbitro imparcial, além de constituir
garantia fundamental para a administração da Justiça em um Estado de
120
CONEGLIAN, Olivar Augusto Roberti. Principio do Juiz Natural .
In
: Princípios Processuais
Civis. [coordenadores Maria Elisabeth de Castro Lopes, Olavo de Oliveira Neto.
Rio de
Janeiro: Elsevier, 2008, p.155.
121
NERY,
op.cit.,
p.126.
84
Direito como o nosso, também serve de substrato para a previsão
infraconstitucional de hipóteses de impedimento e suspeição de órgãos
julgadores.
Conforme defendem Antonio Carlos de Araújo Cintra, Ada
Pellegrini
Grinover
e Cândido Rangel Dinamarco
122
, o princípio do juiz
natural, relacionado com o anterior, assegura que ninguém pode ser privado
do julgamento por juiz independente e imparcial, indicado pelas normas
constitucionais e legais. A Constituição proíbe os chamados tribunais de
exceção,
instituídos para o julgamento de determinadas pessoas ou de crimes
de determinada natureza sem previsão constitucional (art. , inc. XXXVII). É
preciso
distinguir tribunais de exceção de Justiças especiais (como a Militar, a
Eleitoral e a Trabalhista); estas são instituídas pela Constituição com
anterioridade à pratica dos fatos a serem apreciados e não constituem ultra
je
ao princí
pio em ep
í
grafe.
Ante
o exposto, depreende-se que o princípio do juiz natural colima
assegurar a todo o cidadão o direito de ser julgado por juiz ou árbitro
constitucionalmente competente, imparcial por natureza, pré-constituído por
lei, para o pleno desempenho da função jurisd
icional.
A independência dos árbitros se relaciona com a autonomia no
exercício da jurisdição, porque nenhuma relação hierárquica no plano da
organização judicial poderá ter incidência sobre o exercício, propriamente dito,
da função jurisdicional, salvo nos casos de tutela de urgência e mediadas
coercitivas.
122
CI
NTRA, GRINOVER
e DINAMARCO,
op.cit.,
p.154.
85
Conforme Olivar
Augusto
Roberti Coneglian
123
explica:
(...) o conceito de juiz natural não implica, necessariamente, com
estabelecimento do Poder Judiciário como órgão único de jurisdição.
O Poder Judic
iário existe primordialmente para julgar, e sua atividade
constitui a jurisdição ordinária. Todavia, essa atividade não lhe é
exclusiva; o princípio do juiz natural está e deve estar presente
sempre que um julgamento de determinado caso por um órgão
com poderes cuja investidura, que deve ser de acordo com o
ordenamento constitucional, ocorreu previa e abstratamente, e de
forma geral. Sendo assim, também se enquadram dentro do conceito
de juiz natural os casos de julgamentos feitos perante os outros
pod
eres (jurisdição especial ou extraordinária) como, por exemplo, o
disposto no art. 52, I, da CF em que o presidente da República é
processado pelo Senado Federal. É de se considerar ainda que o art.
5º, LIII, da CCF não faz distinção sobre qual tipo de processo é
assegurado pelo princípio ora mencionado, além de não apresentar
nenhuma ressalva no sentido de que o processo deve ser entendido
somente como o procedimento que corre perante o Poder Judiciário.
Ao estabelecer que ninguém será processado nem sent
enciado
senão pela autoridade competente , a Constituição determina que o
princípio do juiz natural seja aplicado tanto ao processo civil como ao
processo penal, ou ainda em processo de natureza jurídico
-
política, e
até mesmo nos procedimentos administrati
vos disciplinares.
O ordenamento jurídico brasileiro tem estendido os limites do princípio
do juiz natural, prestigiando-o cada vez mais, razão pela qual se constata
nele, atualmente, características que tocam tanto à jurisdição em geral, como
no caso da
Arbitragem.
Segundo José Cretella Neto
124
:
no caso da arbitragem, hoje regulada em nosso ordenamento jurídico
pela Lei 9307/96, de 23 nov. 1996, o juízo arbitral, instituído pelas
partes, é competente para proferir sentença em matéria de direitos
patrimoniais disponíveis, donde ser inegável a atividade do árbitro de
caráter jurisdicional.
Como analisado neste trabalho, a arbitragem é jurisdição, ou seja, é
a divisão da atividade jurisdicional criada por lei. Está, portanto, prevista com
123
CONEGLIAN,
op.cit.
, p. 157.
124
C
RETELLA
NETO,
op. cit.,
p. 131.
86
antece
dência, de forma abstrata e geral, com a finalidade de julgar matéria
específica prevista pela Lei
9307/96.
Dessa forma, estrita observância ao princípio do Juízo Natural, pois
a autoridade competente para o julgamento da arbitragem, qual seja, o ár
bitro,
está previamente estabelecido pela lei, com as características da
generalidade e permanência (intangibilidade), para se colocar em condições
de fazer observar o princípio da igualdade de todos perante a lei de modo
imparcial.
Portanto, conforme foi visto, não que falar em inconstitucionalidade
em função da violação do princípio do Juízo Natural, visto que o juízo arbitral
se encontra legalmente previsto em momento anterior ao que ocorre o fato
a ser julgado, não existindo nenhum julgamento de
exceção.
A imparcialidade exigida pelo princípio do juiz natural deve ser
entendida como apta a possibilitar que o magistrado julgue conforme a livre
convicção legal, independentemente de qual seja a parte litigante ou o objeto
do litígio, motivo pelo qual o árbitro precisa estar atento aos institutos da
suspeição e impedimento. Todavia, essa situação deve ser apreciada com
temperamento, vez que não se pode exigir do juiz imparcialidade plena, alheia
a sentimentos e preconceitos típicos da natureza humana.
87
Conforme Olivar
Augusto Roberti Coneglian
125
:
Não basta ser legítimo e ter autonomia. O julgador que toma decisão
tem que ser imparcial, sendo então esse o terceiro elemento
complementador do princípio do juiz natural. Necessário deixar claro,
contudo, que o juiz, como ser humano, não é neutro; nele, como em
qualquer outra pessoa, se encontram elementos irracionais e
ideológicos que transparecem de maneira camuflada nas decisões.
Nos dizeres de Calamandrei é difícil para o juiz encontrar o ponto de
equil
íbrio de justo e neste o espírito de independência em relação
aos outros e o espírito de humildade em relação a si mesmo. (...)
Para a observação do princípio do juiz natural o é necessário que
a pessoa seja um ente imparcial por natureza, imune de qual
quer
influência externa e que não tenha certa convicção sobre a
questão de Direito em debate. Não deve o juiz ser um indiferente,
mas sim uma pessoa que aprecia os argumentos e provas
produzidas, e procura compreender a sociedade e os valores
trazidos no ordenamento constitucional em confrontação com o
momento social, para então dar uma solução ao caso.
Fredie
Didier
Jr.
126
entende que:
substancialmente, a garantia di juiz natural consiste na exigência da
imparcialidade e da independência dos magistrados. Não basta o
juízo competente, objetivamente capaz, é necessário que seja
imparcial, subjetivamente capaz. As regras de distribuição servem
exatamente para fazer valer a garantia do juiz natural estabelecem-
se critérios prévios, objetivos, gerais e aleatórios para identificação
do juízo que será responsável pela causa. É por isso que o
desrespeito às regras da distribuição por dependência implica
incompetência absoluta. Não se desconhecem as tentativas de
escolha do juiz, quer com a postulação em períodos de recesso ou
em plantões, com a ciência de qual tal juiz será o responsável pela
decisão, quer com a burla ao sistema informatizado de distribuição.
A CF prevê que não haverá tribunal de exceção (art.5º XXXVII). O
mesmo se aplica na arbitragem, pois não se pode criar uma câmara arbitral
apenas para solucionar determinado conflito já existente.
125
CONEGLIAN,
op.cit.,
p.165.
126
DIDIER JR.,
op.cit.,
p. 94.
88
A sistemática do procedimento arbitral é diferente da justiça estatal, de
vez que a autoridade para julgar o processo apresentado ao juízo advém da
escolha feita pelas partes, da submissão voluntária à decisão deste, sendo
incorreto, assim, falar em violação ao princípio do juiz natural em sede de
arbitragem.
O argumento de que na arbitragem se cria um tribunal de exceção não
pode ser considerado, uma vez que a CF permite a existência de meios
alternativos de solução de controvérsia, impedindo, apenas, que seja atribuído
o poder jurisdicional a tribunais criados em caráter temporário, de cunho
excepcional, com o objetivo de julgar casos determinados, carecendo, dessa
forma, de legalidade, legitimidade, ferindo a imparcialidade do juiz, do direito à
defesa, ao contraditório e ao devido processo legal. No entanto, a criação de
Câmaras de Arbitragem com a finalidade de atender grupos ou interesses
econômi
cos deve ser coibida, pois, neste caso, não se recepciona o principio
do juiz natural.
89
2.2 PRINCIPIOS DA ARBITRAGEM
2.2.1
Autonomia da Vontade da Parte e Vontade Privada
As partes maiores e capazes
,
pessoas físicas ou jurídicas
,
podem
instituir convenção de arbitragem
,
escolhendo o juízo arbitral no lugar do juízo
estatal
,
a lei aplicável (nacional ou estrangeira)
,
desde que não contrarie a
ordem
públi
ca o os bons costumes
,
o numero de árbitros
,
o procedimento que
será empreendido e se
a decisão será de direito ou por equidade.
Para
Im
annuel
Kant
127
,
a autonomia da vontade da parte quer
representar a possibilidade de estabe
lecer
-
se
um autorregramento
dos
próprios interesses do individuo
,
enfim
,
a possibilidade de constituir a vontade
pela qual é para si mesma uma lei.
A vontade é força criadora de direitos e obrigações
,
e a vontade jurídica
é projeção da vontade humana
,
manifestada livremente e capaz de produzir
efeitos na esfera jurídica. Para
Irineu
Strenger
128
:
a força da autonomia da vontade
,
praticamente
,
concentra
-se no
contrato que
,
em sendo uma relação entre sujeitos de direito é
,
em
conseqüência
,
o campo mais abrangido por essa categoria jurídica
,
notadamente porque a relação obrigacional se estabelece entre
pessoas
.
127
KANT,
Im
manuel.
Fundamentos da metafísica dos costumes. Trad. Lourival de Queiroz.
Henkel: Tecnoprint, 1975, p. 92.
128
STRENGER, op.cit., p.70.
90
Daí porque os efeitos produzidos do exercício da autonomia da vontade
da parte podem ser produzidos na esfera da liberdade humana sem a
necessidade da ingerência do Estado.
Nesse sentido ensina Nilton C
ésar Antunes da
Costa
129
que:
a teoria clássica do contrato
,
que adotou como parâmetro o Estado
Liberal
,
no final do século XVIII e inicio do século XIX
,
tinha como
valor predominante a liberdade de manifestação de vontade
,
impulsionada pela forte reação ao intervencionismo Estatal. A
obrigação contratual adotou como fonte principal a vontade das
partes para criar ou modificar os direitos. A teoria contratual
,
no
decorrer do século XX
,
começou a sofrer influência da concepção do
Estado Social
,
que resgata a idéia do dirigismo contratual
,
impulsionada pela necessidade da intervenção estatal na economia
,
para fins de se assegurar a
igualdade
formal e substancial dos
contratantes. Nesse contexto
,
em nosso ordenamento jurídico
,
tem
-
se
[sic]
as chamadas leis sociais
,
tais como a Lei do Inquilinato
,
Código de Defesa do Consumidor etc.
A autonomia privada não significa
nem poderia
significar
, dada sua
natureza de princípio
a manutenção absoluta e incontestável do que foi
acordado. A autonomia privada
,
por si
,
não é fonte de justiça ou de
equilíbrio na relação contratual. Tampouco
,
porém
,
é por si só
,
causa de
injustiça e de desequilíbrio ou um mal a ser evitado.
O princípio da autonomia privada não basta para a configuração de
contratos condizentes com os demais valores assegurados pelo ordenamento
jurídico. Entretanto
,
sem o importante papel julgado pelo princípio ordenador
da autonomia privada
,
restariam sem sentido os demais princípios contratuais.
A autonomia privada
,
expressão do princípio da dignidade
da pessoa humana
,
129
COSTA, O
p. cit.
, p.77.
91
é
,
no campo econômico
,
motor da livre iniciativa econômica privada
,
idéia
nuclear da ordem econômica idealizada pela CF.
A autonomia privada
,
como princípio
,
deve ser valorada e ponderada
no caso concreto. Tem de ser harmonizada com os demais princípios
integrantes do sistema móvel
,
devendo adequar-se a estes sempre
que
apresentem em relação àquele
peso igual ou superior.
Fator predominante
,
então
,
dentro da análise da autonomia da vontade
das partes envolve a caracterização dos limites necessários para que a
mesma possa ser valida. Esta análise é essencial para fins de ser
estabelecidos limites às partes numa convenção arbitral. Assim
,
passa
-
se
a
analisar tais situações na concepção de
Luigi
Ferri
130
apud
Eduardo
Silva da
Silva
131
,
segundo
o qual:
Para Luigi Ferri
,
não é possível falar-se em autonomia sem
relacionar
-la ao direito. A autonomia privada
,
como poder de auto-
regulação dos particulares
,
pode ser concebida desde a ideia de
limites. Dentro destes limites
,
os particulares são livres para dispor
de seus interesses e agirem livremente. A grande marca destes
limites é fixada pela lei
,
mas outras esferas de regulação
,
como a
moral e os bons costumes limitam a autonomia privada.
A ideia de limites é característica no pensamento de Luigi Ferri. Antes
de restringir o potencial do conceito
,
tal visão o amplia
,
uma vez que
concebido não apenas como
princípio,
liberdade
,
faculdade ou capacidade de
agir. A autonomia adquire contornos de um espaço específico
,
de um campo
130
FERRI, Luigi. La autonomia privada. Trad. espanhola. Madrid: Editorial Revista de Derecho
Privado, 1969, p. 130
131
SILVA, Eduardo Silva da. Arbitragem e Direito da empresa: dogmática e implementação da
cláusula compromissória. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003, p.
68.
92
ou órbita jurídica no qual os particulares podem exercer o poder de
autorregulação no sentido de satisfazer interesses e objetivos. A construção
desse espaço é possível justamente pela delimitação que lhe é emprestada
de forma cogente pelo Estado. A norma posta pela autonomia privada tem
conteúdo próprio
,
determinado negativamente pelo Estado
,
subtraindo ao
poder privado autônomo certas matérias
,
certos grupos de interesse que o
Estado reserva à própria disciplina. Evidencia
-
se
,
dessa forma
,
a existência de
diversos graus de regulação segundo a intensidade dos interesses postos em
jogo, tal qual a esfera pú
blica e a esfera privada
,
que convivem paralelamente.
A autonomia privada seria
,
portanto
,
não apenas a expressão de mera
licitude ou faculdade
,
mas manifestação de poder e
,
precisamente
,
o poder de
criar
,
dentro dos limites da lei
,
normas jurídicas por meio da categoria do
negócio jurídico.
Para melhor evidenciar a autonomia privada é preciso escoimá-la de
traços que não correspondam a sua efetiva identidade. De plano
,
afasta
-
se
,
com fundamento na obra de Santi Romano
,
qualquer confusão entre o termo
poder (de caráter genérico e sem objeto determinado
,
incapaz de gerar
pretensão em relação a outro sujeito) e direito subjetivo (desenvolvido em
relacionamentos concretos e particulares e em relação a determinado ente). A
autonomia privada não se confunde também com autonomia contratual: a
primeira
,
mais ampla e extensa
,
contém a segunda.
93
A liberdade aqui enfocada não se reduz à mera capacidade de agir
,
mas a efetivo exercício de criação jurídica em relação direta com o negócio
jurídico
,
como inst
ânc
ia normativa destinada à intervenção dos particulares.
O poder que permite ao particular realizar
tais
estipulações
,
em
determinado espaço do universo jurídico
,
limitado
negativamente pelo Estado
,
reside na autonomia privada.
Para Luigi Ferri
,
portanto
,
a autonomia privada é um poder normativo, e
o negó
cio jurídico fonte normativa.
Da autonomia privada
,
enquanto conceito genérico do Direito Privado
,
distingue
-
se
a autonomia negocial
,
extrato
,
derivação e especificação
daquela
.
O instituto da arbitragem está intimamente ligado ao princípio da
autonomia da vontade, podendo-se dizer, a exemplo de João Bosco Lee e
Clavio de Melo
Valença Filho
132
, que o princípio da autonomi
a da vontade está
onipresente no instituto da arbitragem. A atuação do Estado fica
comprometida, pois sua força criadora é vontade das partes
base do
procedimento arbitral. É na convenção de arbitragem que se encontra a
origem da vontade de forma expressa. Se não houver essa vontade expressa
o conflito será dirimido pelo Estado.
132
BOSCO LEE, João e VALENÇA FILHO, Clávio de Melo. A Arbitragem no Brasil. ed.,
Programa CACB-BID de Fortalecimento da Arbitragem e da Mediação Comercial no Brasil.
Brasília, 2001.
94
A autonomia de vontade das partes é básica para compreender a
arbitragem
,
pois é o fundamento de tal instituto
,
observados os limites aqui
apresentados
no momento da celebração da convenção de arbitragem.
Assim
,
a convenção de arbitragem
,
fundada no princípio da autonomia da
vontade
,
busca a composição do conflito de uma questão arbitrável por um
terceiro imparcial nomeado pelos contratantes
,
qual seja
,
o árbitro.
Ocorre que a vontade das partes tem limite nos princípios
constitucionais
,
nos bons costumes e nas matérias de ordem
públi
ca. Ess
es
limites devem ser respeitados pelas partes e fiscalizados pelo
árbitro,
sob
pena d
e
a sentença arbitral não produzir os efeitos esperados
,
pois
se
autoriza a parte prejudicada a promover ação anulatória.
2.2.2
Princípio da Obrigatoriedade da Sentença
Devemos salientar que
,
para a arbitragem atingir sua finalidade
,
não
basta estabelecer normas garantidoras do procedimento no intuito de
chegar
a uma solução justa
.
E
,
conforme o Direito é necessário que se assegure seu
acatamento e obrigatoriedade
,
o que somente é possível se não mais houver
a possibilidade de discussão das decisões
,
incorporando
-se o decidido ao
patrimônio das partes. Segundo
Ricardo Ramalho
Almeida
133
:
133
ALMEIDA, Ricardo Ramalho.
A anulação de sentenças arbitrais e ordem pública.
In:
Revista
de Arbitragem e Mediação, ano 3, nº
9. São Paulo: Edito
ra Revista dos Tribunais, 2006
, p
275.
95
a atividade arbitral consiste fundamentalmente em decidir o litígio
,
apreciando as alegações fáticas e jurídicas das partes e o mérito de
suas pretensões
,
sob o crivo do contraditório e na forma do devido
processo legal
,
proferindo sentença determinativa da procedência ou
improcedência do pedido.
Sem esse caráter
,
a estabilidade e segurança na utilização do instituto
estariam comprometidas
,
servindo como meio protelatório e um empecilho a
sua aplicação
,
vez que retiraria uma de suas principais vantagens que é
,
além
de ser meio idôneo
,
a de ser
via
célere de resolução de conflitos
,
diante dos
procedimentos estatais
,
passando a servir como entrave à Justiça
,
quando
prete
nde ser
via
rápid
a e eficaz de fazer justiça.
bias as palavras de
Ricardo Ramalho
Almeida
134
:
A sentença arbitral
,
coerentemente
,
assemelha
-se à judicial na sua
forma e elementos (art. 26 da Lei 9. 307/96)
,
assim como nos seus
efeitos
,
força obrigatória e exeqüibilidade como título executivo
judicial
,
se condenatória (art. 31 da mesma Lei
,
c/c o art. 475-N
,
IV
,
do CPC).
Essa característica da jurisdição que confere segurança às relações
desenvolvidas e albergadas pela sentença e torna obrigatório o
acat
amento
pelas partes envolvidas é a imutabilidade da decisão. Nesse sentido
,
Marcus
Vinicios Tenório da Costa
Fernandes
135
defende que, no juízo arbitral
,
a
eficácia da sentença é imediata
,
produzindo
-se seus efeitos tão logo proferida
a sentença
,
até porque não cabe recurso contra a sentença arbitral
,
nos
termos do artigo 18 da Lei de Arbitragem
.
134
ALMEIDA, op.cit., p. 277.
135
FERNANDES, Marcus Vinicios Tenório da Costa. Anulação da sentença arbitral. São Paulo:
Atlas, 2007, p.47.
96
Essa força da sentença é decorrente da lei e não da vontade do
julgador ou das partes. A característica de imutabilidade
,
própria da
jurisdicionalidade
,
impossibil
ita a revisão ou modificação da sentença arbitral
por outro órgão jurisdicional
,
pelo legislador ou
,
até mesmo
,
de vir a ser
rediscutida pelas partes
.
A fim de atender à necessidade de segurança e estabilidade
,
existe o
fenômeno da coisa julgada. Para
Enr
ico Tullio
Liebman
136
,
a coisa julgada é a
imutabilidade do efeito produzido na sentença , enquanto para Luiz Eduardo
Ribeiro
Mourão
137
o que a lei quer dizer é que a existência da coisa julgada
obsta a continuação do processo instaurado por demanda repetida
.
Depois de esgotados todos os recursos
,
a decisão judicial to
rn
a-
se
imutável
,
não podendo ser alterada ainda que
,
objetivamente
,
tenha concluído
contrariamente ao direito.
A Larb denomina a decisão arbitral de sentença arbitral e lhe outorga o
caráte
r de definitividade e a mesma força da sentença do Judiciário
,
constituindo
-
se
,
inclusive
,
em título executivo judicial
,
sem necessidade de
homologação
138
. Portanto
,
as partes não podem opor-
se
a seu cumprimento
,
pois a autoridade da sentença arbitral é outorgada pela lei e é independente
da vontade dos litigantes ou do juiz
,
que não podem furtar-
se
a seu
136
LIEBMAN
,
op. cit
., p.
57
.
137
MOURÃO, Luiz Eduardo Ribeiro.
Coisa Julgada.
Belo
Horizonte: Ed
itora Fórum, 2008.
138
Pondera Carmona que é possível que o legislador, ao empregar a consagrada expressão
juiz de fato de direito tenha tido em mente a idéia de que em alguns juízos separam-
se
decisões de fato e direito (como ocorre no julgamento do júri, onde apenas os fatos são
submetidos aos jurados, enquanto toca ao juiz togado aplicar o direito), querendo deixar
consolidada a idéia de que no juízo arbitral não
se fará tal separação ,
op.cit
.,
p.229
.
97
cumprimento
nem lhe alterar a força e
eficácia
. Ou seja
,
é definitiva e
imutável
,
devendo as partes sujeitar-
se à autoridade do órgão arbitral.
Nesse
sentido
,
Nelson
Nery J
unior
139
ensina:
Pel
a
sentença
arbitral o juiz não togado escolhido pelas partes
decide
toda
a controvérsia formada entre elas
,
cuja sentença tem
força de coisa julgada. (...) A sentença arbitral como é aplicação do
direito ao caso concreto por juiz não estatal
,
é manifestação de
atividade jurisdicional. A conseqüência disso é que se reveste de
autoridade da coisa julgada.
O preceito do art. 18 não obsta à possibilidade de recursos internos
para o próprio juízo arbitral desde que previsto na convenção
,
veda
-o ao
Judiciário
,
com exceção dos casos de nulidade da sentença previstos no art.
32
,
que possibilitam a rescisão da sentença por meio de ação de nulidade ou
arg
uição de nulidade em embargos do devedor. Pelo que se constitui o ju
ízo
arbitral em instância definitiva e irrecorrível
,
cuja decisão tem caráter
obrigatório e imutável depois de submetido o objeto do litígio a todos os níveis
previstos na convenção arbitral para o procedimento.
Para
Ricardo Ramalho
Almeida
140
:
O
legislador pretendeu reservar a ação anulatória somente para
casos de desvios muito graves
,
que comprometessem
insuportavelmente a sentença arbitral. Por conta mesmo da
necessária limitação no escopo do controle judicial da validade e
eficácia das sentenças arbitrais
,
todas as hipóteses de anulabilidad
e
listadas no art. 32 da Lei 9.307/96 12 têm maior ou menor relação
com a ordem pública
,
inteiramente subjacente ao espírito desse
dispositivo legal. Assim
,
pretendeu a Lei garantir a integridade do
pacto arbitral (incisos I
,
IV
,
V e VII do art. 32)
,
assegurar a
independência e imparcialidade do julgador (incisos II e VI) e tutelar
139
NERY
JUNIOR
,
op. cit.
,
p.
154.
140
ALMEIDA, op. cit.266.
98
os direitos processuais fundamentais das partes (incisos
III
,
VIII e
novamente VII). Considerou
,
porém
,
o legislador que somente as
hipóteses específicas listadas no art. 32 da Lei seriam
suficientemente relevantes
,
a ponto de justificar a medida drástica da
anulação da sentença
,
inexistindo um preceito de caráter geral
,
uma
válvula de escape
que alcance outras situações não
expressamente contempladas. Notadamente
,
inexiste qualquer
dispositivo
,
específico ou geral
,
que diga respeito à ordem pública
material
,
isto é
,
a questões relacionadas ao mérito da causa.
Em que pesem os brilhantes argumentos do jurista acima mencionado
,
não
há como
concorda
r com a posição
,
is
so porque quando se trata de
vi
olação a uma matéria de ordem pú
blica ou a um
princípio
constitucional
,
não
se pode falar em desvios mais ou menos grave
,
pois
tal
violação acarreta
a
nulidade da sentença arbitral e a possibilidade da propositura da competente
ação. Admitir desvios menos graves
é admitir que as partes possam
conviver com essas violações
,
o que
,
de certo
,
não é suportado pelo nosso
sistema.
A lei
,
ao conferir aos árbitros o poder de dizer definitivamente o direito
aplicável à questão
,
sem a necessidade do controle prévio do Estado
,
para
sua obrigatoriedade e executoriedade
,
ou a possibilidade de recursos
,
estabeleceu a força de coisa julgada da decisão arbitral
,
garantindo a
segurança e a estabilidade da resolução apresentada ao litígio e da relação
desenvolvida no juízo arbitral.
Uma das
inovações
mais importantes trazidas pela Larb
,
a atribuição
da característica de coisa julgada em relação à sentença arbitr
al
,
acentuou o
aspecto jurisdicional do juízo arbitral, tornando sua adoção mais atrativa
,
favorecendo a descentralização da justiça
,
a adaptação e evolução do direito
99
de acordo com o cenário interno e internacional
,
maior utilização da
arbitragem
,
por possibilitar julgamento mais célere
,
e o consequ
ente
desafogamento do Judiciário.
2.2.3
Efeito Vinculante Da Cláusula Arbitral
2.2.3.1
Da Convenção de Arbitragem
O conceito de convenção de arbitragem esta diretamente relacionado a
autonomia da vontade das partes, por isso que J. E Carreira Alvim
141
afirma
que a convenção de arbitragem nada mais é que o acordo entre as partes de
submeter o litígio a decisão de árbitros, seja através de uma cláusula
compromissória seja através do compromisso arbitra
l.
A convenção de arbitragem está diretamente relacionada à
manifestação de vontade das partes interessadas em submeter ao juízo
arbitral a solução de conflitos
,
mas deve-se reconhec
er
que a história do
direito revela não haver sido aplicada tal doutrina
em
termos extremos em
momento algum pelos diversos sistemas legislativos. A autonomia da vontade
assumiu
,
em verdade
,
o sentido específico
,
que jamais perderá
,
de poder de
regulamentação das próprias relações
,
ou dos próprios interesses dentro das
141
ALVIM,
op.cit
.,
p. 65.
100
limitaç
ões maiores ou menores ditadas pela equação do bem individual com o
bem comum. Segundo
Pedro A. Batista
Martins
142
:
registre
-se que a convenção de arbitragem é de natureza consensual
e afirma interesses comuns das partes. Não lança direitos
contrapostos, ao contrário, o objetivo é de mão única. É da índole
dos contratos plurilaterais onde os direitos e as obrigações são
voltados para um único e comum objetivo, qual seja, solucionar a
controvérsia, futura ou presente, pela via da arbitragem, com a
conseqüente
exclusão da jurisdição estatal.
O conceito apresentado não distingue a cláusula compromissória e o
compromisso arbitral. Nes
s
e sentido
J. E.
Carreira Alvim
143
explica
que:
a arbitragem traduz o modo de resolução de conflitos que se
contrapõe a jurisdição estatal; o juízo arbitral é o órgão encarregado
da resolução do litígio, substituindo o juízo judicial; a convenção da
arbitragem nada mais é do que o acordo das partes de submeter o
litígio à decisão dos árbitros, seja através de uma
cláusula
compromissória seja através do compromisso arbitral.
A convenção arbitral deverá expressar a vontade das partes de
submeter a solução de todas as questões conflituosas
,
nascidas ou
que
possam surgir de relações jurídicas determinadas
,
sejam ou não contratuais
,
à
decisão de um ou mais árbitros
,
assim como expressar a obrigação de
cumprir tal decisão. Esse é pensamento de José Carlos de Magalhães
144
para
o qual a convenção de arbitragem é contrato privado que disciplina matéria
de interesse particular e
,
num segundo plano
,
à ordem
públi
ca nacional ou
internacional
,
à medida que se destina compor controvérsia que
,
mesmo entre
particulares, afeta essa ordem pú
blica
.
Tal
conceito corresponde ao estabelecido na Lei n. 9. 307/96
,
a qual
confere
autonomia (art.
,
da Larb) e execução específica à
cláusula
142
MARTINS, Pedro A. Batista. Apontamentos sobre a Lei de Arbitragem. Rio de Janeiro:
Forense, 2008, p. 62.
143
ALVIM,
op. cit.,
p. 65.
144
MAGALHÃES,
op.cit.
,
p. 120.
101
compromissória (art.
,
da Larb
)
,
afastando o entendimento anterior
145
,
o qual
não via na cláusula compromissória uma convenção de arbitragem
,
mas uma
simples promessa de celebrar o compromisso
,
que
,
se descumprida
,
poderia
resultar em perdas e danos
.
Não obstante a distinção entre a cláusula compromissória (art. 5º) e
compromisso (art. 9º)
,
a Lei
9307/96
admite que a convenção de
arbitragem abranja tanto a primeira quanto o segundo
,
conforme clara
disposição do art. 3º. Para
Joel Dias
Figueira
Junior
146
, com a redação do art.
,
simplificou
-se o assunto
,
ao dispor com meridiana clareza que se deve
entender por convenção arbitral a cláusula compromissória e o compromisso
arbitral
. Esta análise é de fundamental importância para a melhor
compreensão do
parágrafo
do art. 301 do Código de Processo Civil
,
o qual
será
objeto deste trabalho mais adiante.
Nilton
César Antunes da Costa
147
ensina:
A natureza jurídica da convenção de arbitragem é
puramente
convencional,
pois proveniente da manifestação de vontade das
partes interessadas numa mesma direção, no sentido de instituir o
juízo arbitral em caso de conflito (atual ou futuro) decorrente de uma
determinada relação contratual ou extracontratual.
A concepção contratual pura
,
estritamente privatista
,
de direito material
,
deve ser evitada para que a arbitragem possa ocupar o espaço que o Estado
Democrático de Direito necessita
,
at
ingindo a todos
,
de qualquer nível social
,
principalmente nos conflitos internos
,
pois
,
efetivamente
,
é um mecanismo
alternativo eficaz de resolução de conflitos que envolvam matérias passí
veis
da arbitragem. Nesse sentido, Pedro A. Batista
Martins
148
esclar
ece que
o
145
Segundo
Carlos Alberto Carmona, antes do advento da Lei de Arbitragem, era corrente em
nosso país a idéia de que a clausula compromissória criava apenas uma obrigação de fazer,
constituindo
-se em pacto preliminar
,
op. cit.,
p. 101.
146
FIGUEIRA JUNIOR,
op.cit.
,
p. 183.
147
COSTA,
op.cit.,
p. 90.
148
MARTINS,
op. cit.,
p. 61
102
pacto de arbitragem foi cercado de rígida blindagem jurídica
,
de modo a
produzir todos os efeitos de direito
.
2.2.3.2 Efeitos Da Convenção Arbitral
A convenção de arbitragem tem natureza jurídica convencional
,
cujo fim
último do pactuado entre as partes é a instituição do juízo arbitral. Os efeitos
que repercutem na esfera processual são: o negativo (neutralização do juízo
estatal com relação à análise do mérito do conflito objeto da convenção
arbitral) e o posi
tivo
(submissão da questão conflituosa objeto da convenção
arbitral a
o juízo arbitral). Segundo Tarcí
sio
Araújo Kroetz
149
:
o caráter negativo revela-se pela prorrogação de competência que
retira da via judicial estatal a função de julgamento sobre o mérito. O
positivo, ao implicar atribuições jurisdicionais aos árbitros de
solucionar as controvérsias.
Os efeitos processuais,
negativo
ou
positivo
, da convenção arbitral não
colidem com o art.
,
XXXV
,
da Constituição Federal, que prevê
a
inafastabilidade de apreciação pelo Poder Judiciário de lesão ou ameaça a
direito
,
pois a arbitragem jurisdicional não é
obrigatória
,
impo
sta
unilateralmente
,
mas facultativa
,
fruto da vontade das partes.
149
KROETZ
, Tarcísio Araújo.
Arbitragem:
conceito e pressupostos de validade. São Paulo
:
Revista dos Tribunais
, 1998, p. 131.
103
2.2.3.3
Efeito negativo da convenção de arbitragem
O efeito negativo está atrelado à derrogação da jurisdição estatal que a
convenção de arbitragem acarreta
,
impedindo o juiz ordinário de adentrar no
mérito da controvérsia que deva ser
submetida
à
arb
itragem. Ao optar pela
solução privada do conflito
,
as partes afastam a possibilidade de interferência
jurisdicional do Estado no mérito de uma controvérsia
.
No entanto, tal afastamento da atividade jurisdicional não é definitivo. A
convenção de arbitragem não tem o condão de extinguir a jurisdição ordinária
,
mas
,
apenas
, de afastá
-
la
temporariamente e exclusivamente no que se refere
ao conhecimento e julgamento do objeto da convenção. Claro
está
que
,
se
a
sent
ença arbitral for proferida dentro dos
consectá
rios da Larb
,
a mesma fará
coisa julgada e ficará blindada de qualquer ação do juízo estatal. No entanto
,
se o processo arbitral exigir medidas de urgência
,
medidas constritivas ou se
a
sentença arbitral for nula, a atuação do Estado passa a ser essencial para a
equação do conflito.
Tal entendimento é reforçado pelo Código de Processo Civil
,
o qual
trata da arbitragem no art. 267
,
VII e do art. 301
,
IX
, parágrafo
,
que
,
de
forma corre
ta
,
definem a conduta do magistrado diante da propositura de uma
ação judicial
dada
a existência de convenção de arbitragem entre as partes.
A questão que se coloca é a seguinte: pode o juiz estatal de o
cio
extinguir o feito
diante da pactuação da co
nvenção de arbitragem?
104
O código de processo civil não incluiu entre as matérias que são aptas
a indeferir a petição inicial a Convenção de Arbitragem. Haja vista que o
deferimento da petição inicial ocorre necessariamente antes da citação
,
não é
intenção
do legislador que o juiz de ofício extinga o feito. Tanto isso é verdade
que o
parágrafo
do art. 301 exclui dentre as matérias contidas no
dispositivo
d
a
convenção de a
rbitragem
,
indicando que a mesma é de
interesse apenas das partes
,
o que impede a declinação da mesma pelo juiz
sem requerimento das partes.
Vale o entendimento de
Nelson
Nery J
unior
150
para o qual o juiz não
poderá conhecer dessa matéria de oficio, devendo aguardar a provocação do
réu
. E continua o autor
,
a única maté
ria do rol do CPC 301 que não pode ser
conhecida de oficio pelo juiz é a Convenção de Arbitragem. Para o juiz
examiná
-
la
,
é preciso que o réu
,
tomando a iniciativa
,
argua em preliminar de
contestação
151
.
Embora a redação do
parágrafo
do art. 301 indique apenas o
compromisso arbitral
,
resta claro que tal denominação
fo
i um equivoco do
legislador
,
cuja intenção era indicar a convenção de arbitragem. Nesse
sentido
,
Nelson
Nery J
unior
152
alerta que a Lei de Arbitragem alterou o inciso
150
NERY
,
op. cit.,
p. 487
-
98.
151
Em sentido contrário, Marcato entende que a lei 9. 307 de 23. 09. 1996, conhecida como a
Lei de Arbitragem, revogou os artigos 1.072 e 1.102 do Código do Processo Civil e regulou,
sob denominação genérica de Convenção de Arbitragem, art. 3º, a cláusula compromissória
(ou cláusula arbitral
arts. a 8º) e o compromisso arbitral (arts. a 12º), enquanto a
cl
áusula tem natureza de objeção processual (podendo por isso mesmo ter sua existência
reconhecida pelo juiz de oficio), o compromisso é uma exceção processual, daí a ressalva
contida no parágrafo do art. 301 do CPC. MARCATO, Antonio Carlos. Código de
Processo
Civil Interpretados.
3ª ed, rev, e atual.
São Paulo: Editora Atlas, 2008, p.992.
152
NERY, op. cit., p. 496.
105
9
,
esquecendo
-se de também alterar o
parágrafo
4º. Deve-se ler no
parágrafo
Convenção de Arbitragem
,
em lugar de compromisso arbitral
.
Para corroborar tal tese
,
Marcelo Abelha
Rodrigues
153
sustenta que
:
pela regra do art. 301, parágrafo do CPC, a exceção do
compromisso arbitral, o juiz conhecerá de oficio de todas as
preliminares, mostrando, pois, que são verdadeiras objeções, que
sobre tais matérias não se opera a preclusão. Apenas o compromisso
ar
bitral é que admite a alegação sob a forma de exceção, já que dele o
juiz não conhece de oficio (assim como não conhece da Convenção
Arbitral, como determina o art. 276, parágrafo 3º). Isso nos leva a crer,
à semelhança do parágrafo 1027 do
ZPO
alemão, introduzido pela lei
de simplificação de 1976, que se não alegada nesse momento à
exceção de renúncia arbitral haverá renúncia tácita do julgamento pelo
árbitro.
Portanto
,
uma vez que a Convenção de Arbitragem não é matéria de
interesse público,
se
o réu não alegá-la na contestação
,
subtende
-se que não
deseja mais solucionar o conflito p
or
via arbitral. Opera-
se
,
assim
,
a preclusão
consumativa
,
pois a existência da convenção de arbitragem não poderá mais
ser suscitada no processo.
Pode
-se dizer
,
então
,
que a convenção de arbitragem produz
imediatamente a constituição
,
modificação ou extinção de direitos processuais
(art. 158,
caput
, do CPC) com reflexo direto na eventual relação jurídica
processual estatal
,
com a ressalva de que nela o juiz ordinário deve aguardar
a manifestação do réu na primeira oportunidade que tem e
ste
de se
153
RODRIGUES, Marcelo Abelha. Manual de Direito Processual Civil
Teoria geral: premissas
e institutos fundamentais, Relação Jurídica
Pro
cedimentos em primeiro e segundo graus
Recursos
Execução
Tutela de urgência. ed., ref
.,
ampl
., atual. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 2008, p. 352.
106
manifestar nos autos
ato da parte que se traduz como ato dispositivo
,
tendo em vista que o pacto arbitral trata de direito renunciável.
2.2.3.4
Convenção De Arbitragem
E O Juízo Arbitral
O juízo arbitral tem a peculiaridade de que seu poder, função e
exercício têm início no momento em que houve a aceitação do árbitro para
dirimir o conflito
,
ocasião em que a relação jurídica processual arbitral se
integraliza
,
diversamente do que ocorre com o processo estatal
,
que tem a
completude com a citação válida do réu.
J. E.
Carreira Alvim
154
esclarece que:
Com a aceitação do encargo pelo árbitro indicado no compromisso
(ou até, anteriormente, na cláusula compromissória)
ou pela entidade
delegatória da indicação tem·se por completada a relação processual
arbitral e, portanto, vinculados todos os sujeitos do processo arbitral
(autor
-
árbitro
-réu). Neste sentido orientou-se a jurisprudência
italiana, assentando que a relação processual arbitral se instaura
somente com a aceitação da nomeação por todos os árbitros, pois,
antes deste momento, não se pode falar na constituição da relação
processual, ante a inexistência de um órgão judicante.
O compromisso e a cláusula compromi
ssória
lato sensu
,
como atas
convencionais
,
no que tange aos efeitos processuais
,
impõem que as partes
se
comprometam à instituição da arbitragem em ocorrendo conflito
,
sendo
154
ALVIM,
op. cit.,
p. 130.
107
certo que a instituição do juízo arbitral é o fim almejado pelos
convolentes
é
que isso acontecendo não desfigura a convenção de arbitragem
,
mas
,
ao
contrário
,
lhe inteireza e fortalecem-
se
seus efeitos
,
em especial os
processuais (positivo e negativo).
2.2.3.5
Efeito positivo da convenção de arbitragem
O efeito positivo da convenção de arbitragem procura conduzir as
partes contratantes no sentido de obrigar que se mantenham no procedimento
a
rbitral
,
bem como viabilizar a execução da cláusula compromissó
ria
,
caso
ocorra resi
stê
ncia de uma das partes. Clavio de Melo
Valenç
a Filho
155
esclarece que:
Enquanto o efeito negativo restringe a liberdade de comportamento
do juiz estatal, os efeitos positivos procuram dirigir a conduta das
partes contratantes, obrigando a permanência delas sobre a via
arbitral eleita, garantindo, inclusive, a possibilidade de execução
especifica da convenção de arbitragem.
A convenção de arbitragem é manifestada por meio da
cláusula
compromissória e do compromisso arbitral. A
cláusula
compromissória é a
convenção
por meio da qual as partes em um mo
mento
se
comprometem a
submeter à arbitragem os litígios que possam vir a surgir relativamente a tal
155
VALENÇA FILHO, op.cit.,
p. 76.
108
contrato. o compromisso arbitral
156
,
segundo
Luiz Fernando do Vale
Guilherme
157
,
é a convenção bilateral pela qual as partes renunciam a jurisdição
estatal e se obrigam a submeter à decisão de árbitros por eles
indicados ou ainda o instrumento de que se valem os interessados
para, de comum acordo, atribuírem a terceiro (denominado árbitro) a
solução de pendências entre eles existentes.
O efeito positivo da cláusula compromissória está previsto no art. da
Larb
,
o qual prevê ação judicial de instituição de arbitragem no caso de
resistência por uma das partes na viabilização do processo arbitral. Pa
ra
José
Cretella Neto
158
:
o comparecimento do réu em juízo para a lavratura judicial do
compromisso representa a primeira ocasião em que se manifesta
aquilo que se denomina jurisdicionalização da arbitragem , pois, não
sendo firmado o compromisso, não como a parte interessada ou
instituição indicada na cláusula arbitral compelirem o réu a
comparecer ao juízo (arbitral) ou à entidade arbitral designada para
defender
-
se, como ocorre no processo judicial.
159
O efeito positivo da convenção de arbitragem impõe limites ao próprio
procedimento
,
pois
,
tratando de matérias não arbitráveis como
,
ordem pública
,
bons costumes e direitos indisponíveis, súmula vinculante e de capacidade
,
156
Para Cezar Fiuza, a própria definição nos oferece a diferença específica. Dissemos ser ela
o pacto acessório pelo qual as partes convêm em submeter à jurisdição arbitral as disputas que
surjam no transcorrer de determinada relação jurídica, termos genéricos, porém, sem menção à
espécie de litígio, nem ao nome dos árbitros. Há quem concentre toda a diferença no tempo do
verbo surgir. Atente-se para o emprego do subjuntivo presente
surjam
, indicando situação
fática, irreal, futura, incerta. Eis aí a diferença específica entre cláusula compromissória e
compromisso arbitral. Este diz respeito a litígio atual e específico, aquela refere-se a litígio
futuro e incerto , op.cit.,
p.145
.
157
GUILHERME, Luiz Fernando do Vale. Manual de arbitragem:
doutrina
,
legislação
,
jurisprudência. 2ª
Ed.
São
Paulo: Método, 2007, p. 83
.
158
CRETELLA Neto, José.
Curso de Arbitragem.
e
d.
Campinas: Milennium, 2009, p. 66.
159
Outro ponto relevante é a análise do artigo da Lei de Arbitragem juntamente com o
principio da competência-competência, daí porque se analisará tal situação isoladamente a fim
de dar maior ênfase ao tema.
CRETELLA NETO, op., cit.
p.53
109
não há qu
e falar em incidência do efeito
positivo
.
Admitindo
-se a existência de
um juízo arbitral em que se verifica a presença dessas matérias,
faz
-
se
necessári
a a propositura de uma ação judicial a fim de que seja suspensa a
via arbitral. Assim
,
caberá ao juiz estatal resolver a questão e, sem
vida
,
nes
se ponto,
não
como sustentar que a autonomia da vontade das partes
,
expressa na convenção
,
prevaleça
.
2.3 KOMPETENZ-KOMPETENZ
A arbitragem moderna é marcada pela incidência do princípio da
competência
-
competência
(kompetenz
-
kompetenz).
Tal
princípio
,
segundo
Rodrigo Garcia da
Fonseca
160
:
embora hoje muito associado ao direito arbitral, tem origem no direito
tradicional, estatal. Trata
-se de fórmula originária dos processualistas
alemães, conhecida como princípio
kompentez
-
kompetenz
, segundo
o qual cada juiz é o senhor da própria competência para apreciar o
mérito das ações que lhes são submetidas.
O conceito
acerca
da competência é fundamental para a compreensão
desse princípio. Assim, segundo Cândido Rangel
Dinamarco
161
,
competência
é a quantidade de jurisdição cujo exercício se atribui a um especifico órgão
judiciário ou a órgãos da mesma espécie, pertencente à mesma Justiça,
160
FONSECA, Rodrigo Garcia da. O princípio competência-competência na arbitragem.
Uma
perspectiva brasileira. Revista de Arbitragem e Mediação. ano 3-9. São Paulo:Editora Revista
dos Tribunais, 2006, p.280.
161
DINAMARCO,
op.cit
.,
p.
562
.
110
localizados no mesmo grau de jurisdição e ocupando a mesma base
territorial
. Ocorre que o se pode limitar a aplicação do conceito de
competência apenas à atividade jurisdicional estatal e sim a qualquer
atividade desta natureza, como ocorre na arbitragem. Por isso, para Arruda
Alvim
162
:
Competência é atributo do órgão (juízo, tribunal, câmara etc.) e não
do agente (=juiz). Nessa conceituação compreendem-se, além dos
critérios de determinação da competência (critério objetivo, Livro I,
Título IV, Cap. III, Seção I, ao qual a lei, assim, explicitamente, não
denomina, aludindo só às suas espécies: competência em razão do
valor e material, critério territorial ou de foro, e critério funcional, que
comporta espécies, mas a lei, expressamente, deu destaque à
competência hierárquica), também aquilo que de denominar de
critério de fixação de competência, isto é, a prevenção.
O
legislador, assimilando tais conceitos, inseriu na Larb o principio aqui
suscitado, apontando claramente no seu art. que o árbitro detém a
competência para dirimir sobre sua própria competência. Dessa forma, cabível
o entendimento de Carlos Alberto Carm
ona
163
, para o qual o principio se
refere à
:
competência do árbitro para decidir sua própria competência,
resolvendo as impugnações que surjam acerca de sua capacidade
de julgar, da extensão de seus poderes, da arbitrabilidade da
controvérsia, enfim, avaliando a eficácia e a extensão dos poderes
que as partes lhes conferiram.
164
162
ALVIM,
op. ci
t., p. 282.
163
CARMONA, Carlos Alberto. Arbitragem e processo. 2ª ed. São Paulo: Atlas, 2004, p.160.
164
Para Pedro A. Batista, detém o árbitro competência para decidir sobre sua
jurisdição
e não
como vulgarmente tratado,
competência
para dirimir sua
competência
. O rigor técnico assim
impõe, pois a arbitragem afasta a jurisdição estatal e não a competência de um órgão do
próprio Poder Judiciário. Trata-se de analisar qual das duas jurisdições
estatal e arbitral
está legitimada a apreciar e julgar a controvérsia. Nesse particular, merece aplausos a Lei de
Arbitragem inglesa, de 1996, cuja redação dos arts. 30 a 32 emprega o termo com esse rigor
técnico.
MARTINS
, op. cit
., p. 136.
111
A competência do tribunal arbitral pode ser entendida como a medida
do respectivo poder jurisdicional. A contrário senso, existe incompetência do
tribunal nos casos em que no seu âmbito de poderes jurisdicionais não cabe o
de julgar certo litígio ou categoria de litígios. Daí porque o princípio da
competência
-competência é uma das colunas que sustenta a via arbitral.
Nesse sentido
,
segundo
Rodrigo Garcia da
Fonseca
165
,
é
fator decisivo para
o desenvolvimento do instituto
,
evitando interferências indevidas do Poder
Judiciário e preservando a íntegra daquilo que foi pactuado pelas partes
.
Caso
a definição da competência do árbitro fosse de responsabilidade
do órgão estatal
,
a Larb seria incoerente
,
pois nesse caso estaria
questionando a autonomia do instituto. Por isso Pedro A. Batista
Martins
166
esclarece que no confronto com as autoridades judiciais deterá o
árbitro
preferência na análise da questão. É do
árbitro
o benefí
cio da
dúvida
167
.
Com
efeito o tribunal arbitral, como qualquer outra jurisdição, pode e deve verificar
a sua competência para conhecer de determinado litígio submetido a sua
apreciação.
Esse princípio se justifica por si só, pois se o art. da Larb não o
conte
mplasse, o sistema arbitral brasileiro estaria imerso numa grande
incoerência, pois seria de competência do órgão judicial a decisão sobre a
competência do juízo arbitral o que, por certo, estaria em confronto com o
165
FONSECA,
op.,cit.
, p.277.
166
MARTINS,
op. cit
., p.
142
.
167
Em sentido contrário,
Carmen
Tiburcio diz que, sobre a questão da validade da cláusula no
Brasil, a regra adotada determina que o árbitro i decidir acerca de sua competência em
primeiro lugar, podendo essa questão ser reexaminada posteriormente pelo Judiciário
.
TIBURCIO, Carmen. O princípio da Kompetenz Kompetenz revisto pelo Supremo Tribunal
Federal de Justiça Alemão (Bundesgerichtshof). In: Arbitragem
Estudos em Homenagem ao
Prof. Guido Fernando da Silva Soares. São Paulo: Editora Atlas, 2007, p.425
.
112
próprio espírito da arbitragem. Assim corrobora o entendimento de
Rodrigo
Garcia da
Fonseca
168
, para o qual cabe ao árbitro
:
o poder de decidir em cada caso inclusive de oficio se a Convenção
de Arbitragem existe juridicamente e se é valida e eficaz. Ao fazê-
lo
estará o árbitro decidindo sobre sua própria competência para
apreciar o mérito da demanda que lhe for submetida, pois o árbitro
pode julgar uma causa que as partes estiverem
convencionado
a
convenção
da controvérsia por arbitragem, o que justamente se
opera através de uma convenção de
arbitragem.
A problemática reside na situação em que o árbitro de forma
equivocada lhe atribui a própria competência, isto porque como não existem
recursos previstos na Larb, cabe às partes, no nosso ver, apenas a
possibilidade de se promover uma ação anulatória da sentença (art. 32 da
Larb) ou a propositura de uma medida cautelar perante o Poder Judiciário
para a suspensão do procedimento arbitral.
Carlos Alberto Carmona corrobora com o entendimento da ação
anulatória
, apontando que
169
:
a decisão que o árbitro tomar a respeito da questão que vier a ser
submetida acerca da existência, validade, extensão e eficácia da
Convenção de Arbitragem não será de qualquer modo inatacado, eis
que poderá a parte eventualmente inconformado, utiliza-se do
expediente de
que trata o art. 32 para impugnar a decisão final.
Cumpre ressaltar que não ocorre preclusão durante o procedimento
arbitral se a parte não alegar eventual vicio da convenção, no que se refere à
competência arbitral, uma vez que envolve matéria de ordem
pública e não de
168
FONSECA,
op. cit.
,
p.
282
.
169
C
ARMONA,
op.cit.,
p.
160
.
113
interesse privado. Nesse sentido
,
mais uma vez citando o ilustre prof
essor
Carlos Alberto
Carmona
170
:
não existe preclusão que possa impedir eventual ataque do laudo
sob alegação de invalidade da convenção arbitral, poderá o juiz
togado
mediante provocação do interessado, anular o laudo por
reconhecer, por exemplo, que a convenção arbitral era nula.
Conforme acima exposto, sustentamos a possibilidade da propositura
de uma ação cautelar a fim de suspender o procedimento arbitral, caso o
árbitro não analise adequadamente a sua própria competência. A ação
cautelar tem por objetivo assegurar direitos, sejam bens, pessoas ou
coisas.
171
Uma vez que é direito das partes um procedimento arbitral justo,
que atenda à matéria de ordem pública, o cabimento da ação cautelar é
indubitável, pois se faz necessário evitar um dano irreparável que poderão
sofrer as partes diante de um ato exacerbado do árbitro, no que tange a sua
atividade.
Trata
-se de uma medida excepcional a qual deve ser utilizada em
casos extremos, em que efetivamente o árbitro desrespeitou uma matéria de
ordem pública. Do contrário, se a ação cautelar for promovia imotivadamente,
caberá ao juiz a aplicação de sanções como a litigância de má-fé, prevista no
art. 17 do CPC.
Em suma
,
o
princípio
ora abordado não pode ser colocado acima dos
princípios convencionais nem de matérias de ordem
públi
ca
,
ficando
170
CARMONA
,
op.
cit
., p.89
171
THEODORO JR.,
op. cit
., p.487.
114
caracterizada
,
assim
,
a necessidade nesses casos de limitar a via arbitral para
que seja dada a mais plena segurança jurídica ao instituto da arbitragem.
115
3. CRISE NA RELAÇÃO ENTRE OS PRINCIPIOS DA
ARBITRAGEM E AS NORMAS CONSTITUCIONAIS: LIMITES DA
ARBITRAGEM
3.1 CONCEITO DE MATÉRIA DE ORDEM PÚBLICA
Primeiramente
,
faz
-
se
necessária
,
para a tentativa de conceituação de
ordem
públi
ca
, a análise do sentido da expressão
ordem
. Ordem vem do
latim
ardo
e, etimologicamente falando
,
significa: colocação
,
plano
,
simetria
,
série
,
regularidade
,
disciplina
,
organização
,
boa disposição e equilíbrio entre
partes de um todo.
De acordo com as espécies de lei
,
seja eterna
,
natural
,
humana ou
divina
,
tem
-
se
as ordens correspondentes. E com base numa dessas leis
podemos
construir
as diversas ordens: cósmica
,
social
,
moral
,
jurídica
,
etc.
Com tais o
bservações
,
tenha
-se que a palavra
ordem
possui diferentes
sentidos
,
porém
,
tendo em vista o âmbito do tema em estudo
,
a análise resta
limitada
,
ou seja
,
a análise será feita com base na Larb. Segundo
José
Augusto Fontoura
Costa
e Rafaela Lacorte Vital Pimenta
172
, isto posto
,
torna
-
se de fundamental relevância definir os conceitos de ordem
públi
ca e bons
costumes
,
definição esta problemática
,
por envolver a busca de
princípio
norteador de toda a coerência de um sistema jurídico
.
172
COSTA, José Augusto Fontoura e PIMENTA, Rafaela Lacorte Vital. Ordem Publica na Lei
nº. 9307/96.
In:
Arbitragem
: lei brasileira e praxe internacional. ed., São Paulo: LTr, 1999,
p.
374
.
116
Diante do teor da afirmação acima
,
vale dizer que a ordem pública
se
encontra intimamente ligada à ordem jurídica
,
o que torna a sua conceituação
tarefa árdua dos juristas
,
conforma ensina Maria Helena Diniz
173
:
a
delimitação conceitual de
ordem
públi
ca
é um desafio
à
argúcia e à
sagacidade dos juristas que
,
apesar disso, são unânimes no entendimento de
que é o reflexo da ordem jurídica vigente em dado momento
,
numa
determinada sociedade
.
A indefinição do conceito de ordem pública conferiu a esta extr
ema
elasticidade
,
ou seja
,
possibilitou incluir novas matérias como sendo de ordem
pública (segundo a tradição a respeito dos usos da noção de ordem pública) e
sua constante atualização e manipulação pela doutrina e pela jurisprudência.
Assim
,
sem embargo a tais observações
,
constatou
-se que a ordem pública
interessa à vida
,
à incolumidade da prosperidade da comunidade
,
à
organização da vida social
,
sendo
,
por isso
,
oficialmente reconhecida pela
ordenação jurídica.
Para Maria Helena Diniz
174
:
a ordem pública, por ser um critério axiológico, caracteriza-se pela
sua apreciação de conformidade com o fórum no momento atual.
Como a noção de ordem pública é ambígua, imprecisa e variável no
tempo e no espaço, ao órgão judicante caberá, caso a caso, se
a
ordem pública esta ou não em jogo. (...) as leis de ordem pública são
as que, em um país, estabelecem os princípios indispensáveis a
organização do Estado, sob o prisma social, político, econômico e
moral, seguindo os princípios de direito. Como tão bem
define
Clovis
Bevillaqua
, fazendo com que todos caiam sob seu comando, por
serem leis marcadas pelo interesse público relevante, não permite
que a vontade individual interfira
175
.
173
DINIZ,
op. cit.,
p. 455.
174
DINIZ,
op. cit.,
p. 456.
175
DINIZ,
op.cit.,
p.458.
117
Portanto
,
em todos os países civilizados a ordem pública é
indispensável à t
ranq
uilidade do povo para o progresso e o engrandecimento
nacionais
.
Irineu
Strenger
176
afirma que
:
o conceito de ordem pública é controvertido, mas, no direito interno,
pode
-se dizer que uma lei tem essa natureza sempre que o acordo
entre as partes não possa afastar suas consequências, ou quando
estas sejam inarredáveis, ainda que as partes diretamente no litígio a
desejem
. (...) por ordem pública entende-se um conjunto de
princípios, implícita ou explicitamente conhecidos na ordenação
jurídica que, considerados fundamentais, impõe-se imperativamente,
excluindo qualquer validade a relações jurídicas volitivas que lhe
sejam contrá
rias.
É dessa premissa que partimos para o desenvolvimento do
entendimento acerca da matéria de ordem
públi
ca na arbitragem. O não
atendimento
à matéria e aos princípios constitucionais
acarreta
,
sim
,
a
possibilidade da suspensão do procedimento por ordem judicial bem como
a
nulidade da sentença arbitral.
3.1.1
Da Distinção Do Direito Público E Privado
A distinção entre o direito
públi
co e o privado é essencial na análise da
matéria de ordem
pública
,
tarefa
, aliás
,
árdua em todos os sentidos
,
pois
176
STRENGER,
op.
cit.,
p. 23.
118
conforme será exposto
,
seu conceito depende da sociedade de onde ela é
aplicada
,
momento histórico e necessi
dade das pessoas.
No que diz respeito à arbitragem
,
a importância é ainda maior
ao
analisar a matéria de ordem
públi
ca enquanto elemento limitador do processo
arbitral e da atuação do
árbitro,
o qual
,
pela sistemática da própria Larb,
deve
observar
,
rigo
rosamente
,
a vontade do Estado contida na norma. Aqui
,
a
autonomia da vontade das partes sofre limitação
,
pois
es
sa vontade não pode
superar ou ignorar matéria de interesse
público.
Segundo
Norberto
Bobbio
177
, os dois termos de uma dicotomia podem
ser
definidos um independente do outro
,
ou então apenas um deles é definido
e outro ganha uma definição negativa (a
paz
como não-
guerra)
. É ess
a
dicotomia que se apresenta entre direito
públi
co e privado
,
pois
,
conforme nos
ensina o mesmo mestre
;
no segundo caso diz-se que o primeiro termo é o forte e que o
segundo o termo fraco. A definição de direito público e privado é um
exemplo do primeiro caso, mas dos dois termos o mais forte é o
primeiro, na medida em que ocorre frequentemente de privado ser
definid
o como não
-
público, raramente ao contrário.
O sentido da dicotomia não é a separação dos elementos, público e
privado
, ao contrá
rio
, um escondicionado ao outro, visto que não como
falar no interesse
públi
co sem falar no interesse privado. Para
Norberto
Bobbio
178
:
177
Bobbio, op. cit., p.13
178
Bobbio, op. cit., p.13
119
no interior do espaço que os dois termos delimitam, a partir do
momento em que esse espaço é totalmente ocupado, eles por sua
vez se delimitam reciprocamente, no sentido de que a esfera pública
chega até onde começa a esfera do privado e vice
-
versa.
Exi
stem vários critérios de distinção entre
públi
co e privado
,
mas
um
deles é fundamental para o alcance do objetivo do presente trabalho:
a
análise das fontes. Conform
e
Norberto
Bobbio
179
:
como se aqui o critério de distinção entre o público e privado é o
diverso modo com o qual um e outro passam a existir enquanto
conjunto de regras vinculatórias de conduta: o direito público é tal
enquanto posto pela autoridade política, e assume a forma
espec
ífica, sempre mais predominante com o passar do tempo da lei
no
sentido moderno da palavra, isto é, de uma norma que é
vinculató
ria porque posta pelo detentor do supremo poder (o
soberano) e habitualmente reforçada pela coação(cujo exercício
exclusivo pertence exatamente ao soberano); o direito privado é o
conjunto das normas que os singulares estabelecem para regular
suas recíprocas relações, as mais importantes das quais são as
relações patrimoniais mediante acordo bilatérias, cuja força
vinculatória repousa primeiramente, isto é independente de
regulamentação públic
a, sobre o princípio da reciprocidade.
Partindo da distinção acima
,
passa a ser relevante
,
a tentativa de
conceituação da matéria de ordem
públi
ca e privada e seus reflexos na
arbitragem.
179
Bobbio, op. cit., p.13
120
3.1.2 Classificação
José Augusto Fontoura
Costa
e Rafaela Lacorte Vital Pimenta
180
entende
m
que a ordem
públi
ca pode ser interna e internacional
,
ou seja
:
a ordem pública interna significa aquelas normas e princípios que
não podem ser afastados pela vontade das partes e a ordem blica
internacional incide sobre leis, sentenças estrangeiras e atos
praticados no exterior que busquem eficácia no território nacional
181
.
Confira
-se a tese sustentada por Maria Helena Diniz
182
, para quem
ordem
públi
ca é conjunto de normas essenciais à convivência nacional; logo
não comporta classificação em ordem
públi
ca interna e ordem
públi
ca
internacional
,
mas tão somente a de cada Estado
.
A ordem pública dita todas as normas coativas do país
,
sejam
imperativas
ou proibitivas
,
todas aquelas que não tenham caráter meramente
supletivo ou dispositivo
,
ou seja
,
têm império absoluto e coativo sobre os
cidadãos e às quais não se admite derrogação.
180
COSTA e PIMENTA,
op. cit., p. 375.
181
STRENGER
,
op. cit.,
p. 24.
182
DINIZ,
op. cit.,
p. 457.
121
3.1.3 Finalidade Da Ordem Pública Na Arbitragem
A limitação do conteúdo material da arbitragem por matéria de ordem
pública não significa que qualquer relação jurídica que esteja sujeita a normas
de ordem pública não possa ser submetida à arbitragem. O que torna a
decisão arbitral nula não é o fato de o litígio envolver questões de ordem
pública relativas a uma matéria arbitrável
,
mas sim o fato de a ordem pública
ter sido violada na aplicação dessas normas de natureza cogente.
Nes
s
e sentido
Tarcísio Araújo
Kroetz
183
afirma que:
a idoneidade do objeto revela a licitude em conformidade com a
ordem pública (art. 2º, parágrafo LA). Independentemente da
liberdade de contratar e da autonomia da vontade, os preceitos de
ordem pública aderem ao conteúdo dos negócios, não podendo ser
afastados. Como critério geral pode-se dizer que a lei exclui como
objeto do juízo arbitral as relações que não dizem respeito ao Direito
Privado. Assim, as controvérsias que versarem sobre direitos sobre
os quais as partes não têm faculdade de disposição são de
competência exclusiva da jurisdição estatal.
Ao
árbitro
competirá a difícil tarefa de qualificar o conceito em apreço
,
com a finalidade de salvaguardar interesse público. A ordem pública
,
por ser
um critério axiológico
,
caracteriza
-se pela sua apreciação de conformidade
com o
fórum
no momento atual. Nas palavras de
Maria Helena
Diniz
184
,
como
a noção de ordem pública é ambígua
,
imprecisa e variável no tempo e no
espaço
,
ao órgão judicante
caberá
,
caso por caso
,
averiguar se a ordem
pública está ou
não em jogo
.
183
KROETZ,
op. cit.,
p.45.
184
DINIZ,
op. cit.,
p. 456.
1
22
Segundo
Mano
el J. Pereira do
Santos
185
:
Se é verdade que a ordem pública se contrapõe ao princípio da
autonomia da vontade, restringindo a liberdade das partes, seja na
esfera contratual, seja na esfera extracontratual, a garantia
constitucional impede que qualquer lesão de direito ou ameaça de
lesão seja afastada da apreciação dos tribunais estatais. Em outras
palavras, o princípio da ordem pública jamais restringe o escopo de
atuação do Judiciário no exame de controvérsias ou litígios entre as
partes, ainda que possa determinar a solução da lide de maneira
diversa daquela pretendida pelas partes. Na arbitragem, porém, a
ordem pública implica a própria negativa do juízo arbitral, que é
afastado quando a lide constitui matéria de ordem pública.
Qualquer tentativa de definição é insatisfatória. A matéria de ordem
pública reflete o que é relevante para o processo
,
ou seja
,
é o perfeito reflexo
da busca ao acesso à justiça. Por isso
,
será o princípio maior do acesso à
justiça que inspirará a correta aplicação das matérias de ordem pública
processu
ais
princípio maior que determina quais são as matérias de ordem
pública. Somente esse princípio
,
orientador do processo
,
reconhece o que
realmente é relevante. É por isso
,
ainda
,
que
se
consegu
e identificar a
importância dos pressupostos processuais e das condições da ação; também
foi pelo
princípio
que
se
verifica a relevância das garantias constitucionais
,
que por própria força hierárquica têm profunda influência no processo arbitral.
É
e
ntão que
Irineu
Strenger
186
afirma que
:
a nulidade da convenção arbitral (cláusula compromissória ou
compromisso pode ocorrer de duas situações possíveis: ou bem a
cláusula de arbitragem é nula de pleno direito por causa da nulidade
da convenção inicial, que versa sobre matéria da qual toda
mani
festação individual é excluída, ou bem é a contestação
185
SANTOS,
Mano
el J. Pereira dos. Ordem Pública e Arbitragem. In: Arbitragem: lei brasileira e
praxe internacional. Coordenador: Paulo B. Casella; apresentação Marco Maciel. ed. rev. e
ampl. São Paulo: LTr, 1999
,
p. 391.
186
STRENGER,
op. cit.,
p. 24.
123
submetida aos árbitros que versa diretamente sobre questões de
ordem pública e acarreta a nulidade da convenção.
Os estudos que discutem a matéria de ordem pública na arbitragem
são
,
em regra
,
dirigi
dos à arbitragem internacional
,
no entanto
,
o objetivo
deste trabalho é analisar os limites via arbitral interna a fim de evitar situações
extremas ocorrem
em
nosso país. Tanto as partes na convenç
ão
arbitral
quanto os árbitros ao prolatar a sentença devem
,
sob pena de nulida
de,
observar as matérias de ordem
públi
ca.
Neste contexto surge uma questão de grande importância:os árbitros
devem analisar a presença das condições da ação ou eles poderão superá
-
las
por se tratar de situação afeta ao procedimento judicial?Procuraremos no
próximo item abordar o assunto.
3.1.4
Das Condições Da Ação No Âmbito Da Arbitragem
Em torno das chamadas condições da ação giram inúmeras discussões
doutrinárias. A primeira delas
,
e a mais comum
,
trata da própria natureza
deste instituto que para a doutrina clássica
,
esculpida por Enrico Tullio
Liebman
187
,
seria de questões apartadas do mérito
,
mas que o condicionavam
de forma que sua carência seria um óbice
,
ao magistrado
,
a decidir
de
meritis.
187
LIEBMAN, Enrico Tullio.
Manual de Direito Processual Civil
, vol. 1. Trad. e notas de Cândido
Rangel Dinamarco. Tradução de Manuale di diritto processuale civile, I. ed., 1980. Rio de
Janeiro: Forense, 1984, p 133.
124
Outra doutrina
,
com lastro em juristas como José Joaquim Calmon de
Passos
188
,
traz o problema da carência de ação como exame da própria
pretensão
,
importando
,
assim
,
em julgamento com exame de mérito .
Segundo
Fredie
Didier J
unio
r
189
:
eis a síntese dos problemas doutrinários que surgem com a adoção
das condições da ação, nos moldes em que propostas por Liebman:
a) em caso de carência de ação, não haveria direito de ação? E o
que teria acontecido até o momento em que a sentença de carênc
ia
foi prolatada?; b) a sentencia de carência de ação faz ou não coisa
julgada material?; c) é possível examinar a presença das condições
da ação a qualquer tempo, mesmo que isso dependa de instrução
probatória?
O conceito de ação foi alterado durante o decurso da história da
processualística que deixou de compreendê-la como parte integrante do
direito material e mero reflexo do direito
na
fase ativa e agressiva
190
.
Conforme afirma Enrico Tullio
Liebman
191
,
a doutrina, mais de um
século
,
demonstrou a autonomia da ação perante o direito subjetivo
substancial
,
chegando a individualizar nela o direito subjetivo substancial
192
.
Nes
se sentido
,
o autor italiano desenvolve a chamada Teoria Eclética
da Ação, em que diferencia o poder de agir em j
uízo
da
ação
,
assim:
o
poder de agir em juízo é reconhecido a todos,
vi
sta
também a razão dessa
ilimitada abertura: uma garantia constitucionalmente instituída
,
que é o reflexo
188
PASSOS, José Joaquim Calmon de. Esboço de uma teoria das nulidades aplicadas às
nuliddades processuais.
Rio de janeiro: Forense, 2005,p.73
189
DIDIER JR., op. cit., p. 168.
190
LIEBMAN,
op. cit.
, p. 148.
191
Idem, Ibidem.
192
Idem, Ibidem.
125
ex
subiecti
da instituição dos tribunais pelo Estado;
que
têm a tarefa de dar
justiça a quem pedir. Por isso, uma das regras fundamentais de
nosso
ordenamento constitucional assegura a todos a possibilidade de levar-lhes a
pretensão a obtê
-
la
,
com isso fazendo que o juiz venha a examinar seu caso.
Tal
poder pertence à categoria dos direito cívicos ; ele é
absolutamente genérico e indeterminado
,
inexaurível e inconsumível
,
não se
ligando a qualquer situação concreta.
Assim
,
sabe
-
se
agora que no âmbito
daqueles
todos , referidos na segunda parte do art. 24
,
se encontram
também aqueles que não tanto podem propor
uma demanda qualquer
,
mas
são titulares de um verdadeiro direito que
,
com referência a uma situação
determinada e concreta
,
visa obter um pronunciamento sobre a demanda
,
para que ela seja julgada procedente ou improcedente
,
sendo com isso
concedida ou negada a tutela pedida. Esse direito é precisamente a ação ,
que tem por garantia constitucional o genérico poder de agir
,
mas que em si
mesma nada tem de genérico: ao contrário, guarda relação com uma
situação
concreta
,
decorrente de uma alegada lesão a direito ou a interesse legítimo d
e
seu titular e identifica-se (como
se
ver
á) por três elementos bem precisos: os
sujeitos
(autor e réu)
,
a
causa
petendi
(é o direito ou relação jurídica
indicada como fundamento do pedido) e finalmente o petitum (que é o
concreto provimento judicial postulado para a tutela do direito lesado ou
ameaçado)
193
.
193
Idem, ibidem.
p.150
-
1.
126
Des
sa forma
,
inicialmente desenvolvidas por Enrico Tullio Liebman
194
no âmbito de sua teoria eclética
,
as condições da ação configuravam um juízo
de admissibilidade para o exercício in concreto da ação e consistiam em três
elementos: impossibilidade jurídica do pedido
,
interesse de agir e legitimidade
.
Por isso
,
Cândido Rangel
Dinamarco
195
refere
que
:
a tendência à universalização da tutela jurisdicional é refreada pela
legitima conveniência de impedir a realização de processos sem a
mínima condição de produzir algum resultado útil ou predestinados a
resultados que contrariem regras fundamentais da Constituição ou
da própria lei. Daí os requisitos do interesse de agir, caracterizado
pela utilidade do provimento jurisdicional postulado ou a postular; da
legitimatio ad causam, sem a qual o provimento se endereçaria a
pessoas que não são titulares dos interesses em conflito e por isso
seria também inútil; e da possibilidade jurídica da demanda, que é a
compatibilidade, em tese, entre esta e a ordem jurídica nacional
como um tod
o. Presentes todas essas
condições
da ação, diz
-
se que
o sujeito tem direito de ação
e consequentemente só o terão
aqueles que se encontrarem amparados por elas. Carece de ação
quem não esteja amparado por esses requisitos, ainda que
apenas
um
deles lhe falte. Não se trata de condições para o
exercício
da
ação, mas para sua própria
existência
como direito ao processo
porque seria estranho afirmar que um direito existe, mas não pode
ser exercido quando lhe faltar um dos requisitos constitutivos.
Perfil
hando tal doutrina
,
o jurista italiano acabou por desenvolver duas
concepções distintas de juízos formulados pelo julgador. Assim
,
desenvolve
-
se a noção do juízo de admissibilidade e juízo de mérito. No primeiro caso
,
uma análise dos requisitos de exist
ência
,
eficácia e validade da relação
processual. no juízo de mérito
,
o magistrado examina aquilo que se
pleiteia
,
ou seja
,
a procedência ou não do pedido formulado na inicial. Para
Cássio Scarpinella
Bueno
196
:
194
PASSOS
, op. cit.,
p.
117.
195
DINAMARCO, vol. II,
op. cit
., p.
305.
196
BUENO, Cássio Scarpinella. Curso sistematizado de Direito Processual Civil: Teoria geral
d
o Direito Processual Civil
Volume I.
São Paulo: Saraiva, 2007
,
p. 53
127
a proposta reformadora que marca a terceira onda de acesso à
justiça
é a que rende ensejo à maior gama de possibilidades críticas
ao estudo e à transformação do direito processual civil. É ela que, de
forma consciente ou não, predomina na doutrina e jurisprudência
nacionais. É ela também que acabou por levar as amplas
transformações experimentadas pelo código de processo civil e que
ocupa boa parte da produção legislativa produzida mais
recentemente no direito brasileiro.
No Brasil
,
com ampla aceitação
,
tal pensamento insurgiu de forma a
ser positivado no Código de Processo Civil de 1973 no art. 267
,
inciso VI
,
determinado que
extingue
-se o processo
,
sem resolução do mérito: quando
não concorrer qualquer das condições da ação
,
como a possibilidade jurídica
,
a legitimidade das partes e o
interesse processual.
3.1.4.1 A Possibilidade Jurídica Do Pedido
Es
ta condição da ação
se
afigura como a vedação explicita no
ordenamento jurídico da pretensão aduzida. Nos dizeres de Arruda Alvim
197
,
a possibilidade jurídica
,
portanto
,
enquanto
condição da ação entende-
se que
ninguém pode intentar uma ação sem que peça providência que esteja em
tese
,
prevista
,
ou que a ela óbice não haja
,
no ordenamento jurídico material
.
Neste sentido Nelson Nery
Jun
io
r e Rosa Maria de Andrade Nery
198
expõe
m
que
:
197
Alvim,
op. cit., p.
417
.
198
NERY JUNIOR, Nelson e NERY, Rosa Maria de Andrade. Código de Processo Civil
comentado e legislação extravagante. 9ª ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 2006, p. 436.
128
o pedido é juridicamente possível quando o ordenamento não o
proíbe expressamente. Deve entender-se o termo pedido não em
seu sentido estrito de mérito, pretensão, mas conjugado com a causa
de pedir. Assim, embora o pedido de cobrança, estritamente
con
siderado, seja admissível pela lei brasileira, não o será se tiver
como
causa petendi dívida de jogo (CC 814
caput
; CC/1916 1477
caput
) (Nery, RP 64/37; Cruz e Tucci, Causa petendi, p. 159). É
juridicamente impossível pedido de
revogação
de adoção, se esta
tiver sido concedida sob o regime do Estatuto da Criança e do
Adolescente (ECA 48). Será juridicamente possível, todavia, o
pedido de decretação de nulidade ou de anulação da adoção.
199
Para Humberto Theodoro
200
:
a possibilidade jurídica, então, deve ser localizada no pedido
imediato, isto é, na permissão, ou não, do direito positivo a que se
instaure a relação processual em torno da pretensão do autor.
Assim, no caso de impossibilidade jurídica do pedido poderia ser
encontrado no dispositivo legal que não admite a cobrança em juízo
de divida de jogo, embora seja válido o pagamento voluntário feito
extrajudicialmente.
Os mesmos ensinamentos o aplicáveis à arbitragem
,
isto é
,
o
árbitro
ao analisar um conflito deve verificar se o pedido encontra lastro legal para
que
assim possa solucionar o conflito. Aqui o limite da autonomia da vontade
das partes é mais intenso
,
pois
não
podem
as partes optar por afastar o
199
DIDIER JR., Fredie. Curso de Direito Processual Civil: teoria geral do processo e processo
de conhecimento. 6ª ed., vol. 1. Salvador: JusPODIVM, 2006, p. 173 Em substituição à
categoria denominada por CHIOVENDA de existência do direito (que era fiel à teoria concreta
do direito de ação), também considerada
como condição da ação, criou Enrico Tullio Liebman a
possibilidade jurídica do pedido, com a manifesta preocupação de extremá
-
la do mérito
talvez
por isso se tenha utilizado da palavra possibilidade , que denota aquilo que pode ser, e não
aquilo que necessariamente é/será. Como informa dileto discípulo do mestre italiano, Candido
Dinamarco, tendo sido permitido o divórcio na Itália, em 1970, Liebman, a partir da 3ª edição de
seu
Manuale
, retirou a possibilidade jurídica do rol das condições da ação
po
is esse, o
divórcio, era o principal exemplo de impossibilidade jurídica do pedido , passando a integrar o
conceito de interesse de agir .
200
THEODORO JUNIOR, Humberto.
Curso de Direito Processual Civil
Teoria Geral do Direito
Processual Civil e Processo de Conhecimento - volume I
50ª ed. - Rio de Janeiro: Forense,
2009,
p. 61.
129
pedido juridicamente impossível por se tratar de condição essencial ao
desenvolvimento do procedimento arbitral
.
3.1.4.2 Interesse De Agir
O interesse de agir não se confunde com o interesse concreto ou
substancial
201
do autor
, dado o fato de
que
,
para
Fredie
Didier J
unior
202
:
cabe distinguir, antes de examinar os aspectos do interesse de agir,
interesse substancial de interesse processual. O interesse
processual se distingue do interesse substancial, para cuja proteção
se intenta a ação, da mesma maneira com se distinguem os d
ois
direitos correspondentes: o substancial que se afirma pertencer ao
autor e o processual que se exerce para a tutela do primeiro.
Interesse de agir é, por isso, um interesse processual, secundário e
instrumental com relação ao interesse substancial primário; tem por
objeto o provimento que se pede ao juiz como meio para obter a
satisfação de um interesse primário lesado pelo comportamento da
parte contrária, ou, mais genericamente, pela situação de fato
objetivamente existente. Constitui objeto do interesse de agir a
tutela jurisdicional e não o
bem da vida a que ela se refere .
O interesse, pelo enfoque da necessidade, está
relacionado
à
impossibilidade de cumprimento espontâneo de obrigações. Conforme explica
Cândido Rangel
Dinamarco
203
:
201
Interesse substancial para Arruda Alvim é aquele diretamente protegido pelo direito
material; é um interesse de índole primária, dado que incide diretamente sobre o bem. Assim
,
por exemplo, o intersse do proprietário, pela coisa de quem tem o domínio, é utilizar-se da
mesma em função dos direito que lhe são inerentes; o do credor, tendo em vista o seu crédito,
é o de recebê
-lo. Se o primeiro (o
dominus)
puder fruir a coisa, alu
-
la, dá
-
la em usufruto, etc.,
não que cogitar de interesse processual; se o credor receber o seu crédito, identicamente,
não que se pensar em interesse processual para acionar o seu devedor, que já terá pago .
Manual de Direito Processual Civil
Vol. I: Parte Geral. 11ª ed. rev., ampl. e atual. com a
reforma processual 2006/2007. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2007,
p
. 418.
202
DIDIER Jr.,
op. cit.,
p.183.
130
o interesse de agir quando o provimento jurisdicional postulado
for capaz de efetivamente ser útil ao demandante, operando uma
melhora em sua situação na vida comum
ou seja, quando for capaz
de trazer-lhe uma verdadeira
tutela
, a tutela jurisdicional. O interess
e
de agir constitui o núcleo fundamental do direito de ação, por isso
que só se legitima o acesso ao processo e só é licito exigir do Estado
o provimento pedido, na medida em que ele se tenha essa utilidade e
essa aptidão.
O interesse, do enfoque da
adequação
,
é a compatibilidade entre
procedimento e pretensão. Dessa forma seria carente aquela ação cujo
procedimento
,
requerido na inicial
,
fosse inadequado para a tutela desejada.
Assim
orienta
m
Nelson
Nery
Juni
or
e Rosa Maria de Andrade Nery
204
:
(.
..
) D
e
outra parte
,
o autor movendo a ação errada ou utilizando-se do procedimento
incorreto
,
o provimento jurisdicional não lhe será útil
,
razão pela qual a
inadequação procedimental acarreta a inexistência de interesse processual.
No que tange à arbitragem
,
o
árbitro
deve
observar
se
,
efetivamente
,
há necessidade do pleito
,
tanto no sentido da utilidade do procedimento
,
quanto
na verificação de existência de uma demanda judicial idêntica em
andamento ( litispendência ), oportunidade em que o
árbitro
deve afastar o
conflito por falta de interesse das partes postulantes. Por outro lado
,
entende
-
se
que
,
no que se refere ao interesse
,
enquanto adequação
,
o mesmo não se
aplica
à
arbitragem
,
visto que as partes poderão escolher o meio que
entenderem adequa
do
s para proceder.
203
DINAMARCO, op., cit,
vol. 2, p. 309.
204
NERY JUNIOR, Nelson e NERY, Rosa Maria de
Andrade.
Código de Processo Civil
Comentado. 4ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999,
p. 437.
131
3.1.4.3
Legitimidade
Ad Causam
legitimidade ad causam
quando
existe a coincidência entre a
legitimação do direito material que se quer discutir em juízo e a titularidade do
direito de ação
205
. Dessa forma
,
insurgem duas espécies de legitimidade
,
a
ordinária e a extraordinária. A primeira configura-se com a coincidência entre
parte e titular do direito aduzido
;
a segunda corresponde à dissociação
entre titularidade e parte
,
ou seja
,
entre parte material e parte processual.
Nes
se diapasão o legitimado ordinário vai a juízo em nome próprio defender
interesse próprio
,
enquanto o extraordinário vai a juízo também em nome
próprio
,
mas a fim de resguardar interesse alheio. Assim, aufere-
se
,
também
,
a distinção entre legitimação extraordinária e representação
,
que
,
na última
hipótese
,
o representante vai, em nome do representado
,
defender interesse
alheio
,
figurando como mero representante e não como parte processual
,
posição assumida pelo legitimado extraordinário.
Fredie
Didier J
un
io
r
206
aponta que
:
legitimação ordinária quando houver correspondência entre a
situação legitimante e as situações jurídicas submetidas à
apreciação do magistrado. Coincidem as figuras das partes com os
pólos da relação jurídica, material ou processual, real ou apenas
afirmada, retratada no pedido inicial. Legitimado ordinário é aquele
que defende em juízo interesse próprio. A regra geral da legitimidade
somente poderia residir na correspondência dos figurantes do
processo com os sujeitos da lide. Há legitimação extraordinária
(legitimação anômala ou substituição processual) quando não houver
correspondência total entre a situação legitimante e as situações
jurídicas submetidas à apreciação do magistrado. Legitimado
extraordinário é aquele que defende em nome próprio interesse de
outro sujeito de direito. É possível que, nesses casos, o objeto
litigioso
também
lhe diga respeito, quando então o legitimado reunirá
as situações jurídicas de legitimado ordinário (defende direito
também
seu) e extraordinário (defende direito
também
de outro); é o
que acontece, p. ex., com os condôminos, na ação reivindicatória do
bem, art. 1. 314 do CC-2002. Enfim, na legitimação extraordinária
205
NERY e NERY,
op. cit.,
p.436.
206
DIDIER JR.,
op. cit.,
p.
175.
132
confere
-se a alguém o poder de conduzir processo que versa s
obre
direito do qual não é titular ou do qual não é titular exclusivo.
No caso da arbitragem não há
nenhum
óbice em termos de substituição
processual ou de representação
,
desde que envolve direitos disponíveis e
pessoas capazes. A aplicação da substituição processual ocorre com
freq
u
ência
em
dissídio coletivo do trabalho, em que as partes envolvidas
podem eleger árbitros para a solução do conflito (CF
,
art. 114, parágrafo
e
2º).
No que tange à legitimidade das partes
,
seja ordinária,
seja
extraordiná
ria
,
é indissociável da função do árbitro verificá-
la
. Uma vez
constatada a inexistência de relação jurídica entre os interessados e o caso
concreto
, o juiz deve encerrar o procedimento arbitral
,
pois
,
por se tratar de
matéria de ordem
públi
ca
,
não pode o
árbitro
admitir como legitimo alguém
que não
o
é
,
mesmo que as partes assim manifestem a vontade.
3.1.4.4 Momento Para A Decretação Da Carência De Ação-Matéria De Ordem
Pública
Para
Cândido Rangel
Dinamarco
207
:
não basta que o demandante descreva formalmente uma situação
em que estejam presentes as condições da ação. É preciso que elas
existam realmente. Uma condição da ação é sempre uma condição
207
DINAMARCO,
op., cit, volume II, p. 323.
133
da ação e por falta dela o processo deve ser extinto sem julgamento
do mérito, quer o autor descreva uma situação em que ela falte,
quer dissimule a situação e mais tarde os fatos revelem ao juiz a
realidade. Seja ao despachar a petição inicial, ou no julgamento
conforme o estado do processo ou em qualquer outro mom
ento
intermediário do procedimento
ou mesmo afinal, no momento de
proferir sentença
o juiz é proibido de julgar o mérito quando se
convence de que a condição falta.
Ou seja
,
o primeiro momento de exame das condições da ação reside
na análise da própria inicial
,
antes da citação do réu
,
momento em que
,
sendo
carente
,
há o indeferimento da petição inicial. Assim
,
para esta doutrina
,
haveria uma análise em abstrato do pedido para aferir a admissibilidade ou
não da ação.
De modo a conformar doutrina e
legislação
,
foi desenvolvida a Teoria
da Asserção
,
pela qual os elementos que compõem as condições da ação
poderiam sofrer dois exames: o primeiro diz respeito a um juízo abstrato
,
no
qual
se leva em consideração apenas o quanto alegado na inicial. Trata-se
,
aqui
,
de um juízo de admissibilidade
,
pois
,
ainda
,
não se teria adentrado ao
cerne da demanda (mérito)
,
levando-se em con
ta
apenas abstratamente os
fatos. Após tal juízo
,
e sendo esse positivo
,
haveria um segundo
,
este sim
capaz de anterior fase probató
ria
,
na qual se averiguariam os fatos de forma
que a carência
,
ou não
,
da ação implicaria verdadeiro julgamento de mérito.
Assim entende Fredie
Didier Jr.
208
:
sem olvidar o direito positivo, e considerando a circunstância de que,
para o legislador, carência de ação é diferente de improcedência do
pedido, propõe-se que a análise das condições da ação, como
questões estranhas ao mérito da causa, fique restrita ao momento de
prolação do juízo de admissibilidade inicial do procedimento. Essa
análise, então, seria feita à luz das afirmações do demandante
contidas em sua petição inicial (in statu assertionis). Deve o juiz
208
DIDIER JR.,
op. cit
., p. 170.
134
racionar admitindo, provisoriamente, e por hipótese, que todas as
afirmações do autor são verdadeiras, para que se possa verificar se
estão presentes as condições de ação. O que importa é a afirmação
do autor, e não a correspondência entre a afirmação e a realidade,
que seria problema de mérito. Não se trata de um juízo de
cognição sumária das condições da
ação, que permitiria um reexame
pelo magistrado, com base em cognição exauriente. O juízo definitivo
sobre a existência das condições da ação far-
se
-ia nesse momento:
se positivo o juízo de admissibilidade, tudo o mais seria decisão de
mérito, ressalvados fatos supervenientes que determinassem a
perda de uma condição de ação. A decisão sobre a existência ou
não de carência de ação, de acordo com esta teoria, seria sempre
definitiva. Chama
-
se de
teoria da asserção
ou da
prospettazione
.
Cândido Rangel
Dinamarco
209
não admite tal teoria. Para ele
:
goza, no entanto de crescente prestigio a teoria da asserção, que
afirma o contrário. Segundo seus seguidores, as condições da ação
deveriam ser aferidas in statu assertionis, ou seja, a partir do modo
como a demanda é construída
de modo que se estaria diante de
questões de mérito sempre que, por estarem as condições
corretamente expostas na petição inicial, depois se verificasse a
falta de sua concreta implementação. Ao propor arbitrariamente essa
estranha
mo
dificação da natureza de um pronunciamento judicial
conforme o momento em que é produzido (de uma sentença
terminativa a uma de mérito), a
teoria della prospettazione
incorre em
uma série de erros e abre caminho para incoerências que
desmerecem desnecess
ária e inutilmente o sistema.
Compactuamos com a posição de que a teoria da asserção não está
de acordo com o sistema do Código de Processo Civil
,
pois
o mesmo prevê a
extinção do feito pela carência de ação
,
tanto no art. 267
,
I (indeferimento da
petiçã
o inicial)
,
quanto no art. 267
,
VI
,
conferindo ao juiz o poder de extinguir o
feito tanto no início quanto no decorrer do feito. Nesse sentido,
Nelson
Nery
Junior
e Rosa Maria de Andrade Nery
210
afirma
m
que
:
no exame da peça vestibular deve o juiz verificar a existência das
condições da ação. Se a parte for manifestamente ilegítima ou
carecer o autor de interesse processual, o juiz deve indeferir a
petição inicial (CPC 295 II e III). Quando a ilegitimidade da parte não
for manifesta, mas depender de prova, o juiz não poderá indeferir a
inicial (Nery, RP 64/37) A impossibilidade jurídica do pedido é causa
209
DINAMARCO,
op.cit.,
p. 324.
210
NERY e NERY,
op. cit
., p. 436.
135
de inépcia da petição inicial (CPC 295 par. ún. III), acarretando
também o indeferimento da exordial (CPC 295 I). Casos existentes
quando da propositura da ação, mas faltante uma delas durante o
procedimento, carência superveniente ensejando a extinção do
processo sem julgamento do mérito.
3.1.4.5 Conclusão
As condições da ação constituem matéria de
ordem
públi
ca
,
uma vez
que
,
independentemente da posição adotada quanto à Teoria de Liebman
,
são preceitos que obrigatoriamente devem ser aplicados
,
inclusive pelos
árbitros
,
conforme exposto
,
os quais
têm
de se submeter a qualquer matéria
de ordem pública
,
sob pena
de nulidade da sentença arbitral. Reitere
-
se
que
o
limite da arbitragem apenas contribui para o fortalecimento do próprio instituto
,
impedindo que sejam proferidas decisões temerárias.
RECURSO ESPECIAL Nº 1.054.847
-
RJ (2008/0099222
-
6)
RELATO
R: MINISTRO LUIZ FUX
RECORRENTE: TEREZINHA FUNKLER
ADVOGADO: LÍDIA MARIA SCHIMMELS E OUTRO(S)
RECORRIDO: BANCO CENTRAL DO BRASIL
REPR. POR: PROCURADOR
-
GERAL DO BANCO CENTRAL
RECORRIDO: BANCO ITAÚ S/A
ADVOGADO: RAUL QUEIROZ NEVES E OUTRO(S)
EMENTA
PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. CONDIÇÕES DA AÇÃO. LEGITIMIDADE AD
CAUSAM. BACEN. CORREÇÃO MONETÁRIA. PLANO COLLOR. CRUZADOS NOVOS
RETIDOS. MEDIDA PROVISÓRIA 168/90 E LEI 8.024/90. MATÉRIA DE ORDEM
PÚBLICA. PRECLUSÃO PRO JUDICATO. INOCORRÊNCIA. INCOMPETÊNCIA DA JUSTIÇA
FEDERAL. REMESSA DOS AUTOS AO JUÍZO COMPETENTE.
1. As condições da ação, como sói ser a legitimidade ad causam , encerram questões de
ordem pública cognocíveis de ofício pelo magistrado, e, a fortiori, insuscetíveis de preclusão
pro judicato. Precedentes do STJ: EREsp 295.604/MG, PRIMEIRA SEÇÃO, DJ 01/10/2007 e
AgRg no Ag 669.130/PR, QUARTA TURMA, DJ 03/09/2007.
136
2. In casu, o acórdão recorrido reconheceu a incompetência da Justiça Federal, em razão da
ilegitimidade passiva do Banco Cen
tral
- BACEN, para responder pela correção monetária
relativa a período anterior à transferência dos ativos retidos para o BACEN.
3. É que os bancos depositários são responsáveis pela correção monetária dos ativos retidos
até o momento em que esses foram transferidos ao Banco Central do Brasil.
Conseqüentemente, os bancos depositários são legitimados passivos quanto à pretensão de
reajuste dos saldos referente ao mês de março de 1990, bem como ao pertinente ao mês de
abril do mesmo ano, referente às contas de poupança cujas datas de aniversário ou
creditamento foram anteriores à transferência dos ativos. Precedentes: REsp 637.966 - RJ, DJ
de 24 de abril de 2006; AgRg nos EDcl no REsp 214.577 -
SP, DJ de 28 de novembro de 2005;
RESP 332.966
-
SP; DJ de 30 de
junho 2003.
4. Deveras, o reconhecimento da incompetência absoluta da Justiça Federal, em razão da
ilegitimidade ad causam do Banco Central, impõe a anulação dos atos decisórios e, a fortiori,
remessa dos autos à Justiça Estadual, a teor do que dispõe o ar
t. 113, caput, e § 2º, do CPC).
5. Recurso Especial parcialmente provido para determinar a remessa dos autos à Justiça
Estadual (art. 113, caput, e § 2º, do CPC).
211
3.2 JULGAMENTO POR
EQUIDADE
E CONVENÇÃO DE ARBITRAGEM
Como disse A
ristóteles
212
: a equidade é a justiça do caso particular ,
ou seja
,
o ato de moldar a justiça à especificidade de uma situação real
,
via
flexibilização da lei. A equidade consiste
,
assim
,
em corrigir a impessoalidade
das leis
,
para aplicá-las com espírito de compreensão e
coerência
,
dosando o
rigor da norma e medindo a intensidade das sanções. Não é
,
pois
,
forma
especial de justiça
,
mas um critério de aplicação. Para
Irineu
Strenger
213
,
a
equidade é
,
antes
,
a integração
,
em uma gama de meios
,
de interpretação de
decisão
,
colocados à disposição do
árbitro,
de critérios variados
,
dos quais
211
www.stj.gov.br
.
Documento: 7351181 - EMENTA / ACORDÃO - Site certificado -
DJ:
02/02/2010
. Acesso
em 16/01/2010.
212
ARISTÓ
TELES.
Ética a Nicômaco. Tradução: Pietro Nassetti. São Paulo: Martin Claret,
2007.
213
STRENGER,
op. cit.,
p. 19.
137
pode livremente fazer uso da maneira que lhe parecer mais adequado a
dirimir o litígio
.
De fato
,
a equidade é o abrandamento dos rigores da lei,
que
,
entretanto
,
deve ser empregada em situações específicas e
expressamente autorizadas. Apresenta-
se
a equ
idade
no momento da
adaptação da norma à situação de fato
,
como atenuação do rigor e da rigidez
da lei
,
pois sua aplicação crua e simples pode revelar-se de uma dureza
injusta e
,
muita
vez
,
cruel
,
conduzindo a uma inconveniência
,
a um absurdo
,
a
uma iniq
u
idade
214
.
Do ponto de vista do ordenamento objetivo, a equidade não se opõe à
aplicação da justiça. O que ocorre é a complementação do sistema jurídico
,
tornando a tutela plena ao reduzir o rigor da norma. Silvio de Salvo
Venosa
215
afirma que o conceito de equidade não se afasta do conteúdo do próprio
Direito
,
pois
,
enquanto o Direito regula a sociedade com normas gerais do
justo e equ
itativo
,
a equidade procura adaptar essas normas a um
caso
concreto
.
Nas lições de Vicente Ráo
216
, a aplicação da equidade busca a
efetividade do ideal de justiça
, pois:
214
ESPÍNOLA
, Eduardo e ESPÍNOLA FILHO,
Eduardo
. A lei de introdução ao Código Civil
Brasileiro comentada na ordem de seus artigos, vol. 1°. São Paulo: Freitas Bastos,
1943,
p.
246.
215
VENOSA
,
Sílvio de Salvo
.
Direito Civil
.
Parte geral
,
ed.
São Paulo:
Atlas,
2004
,
p. 53.
216
RÁO, Vicente. O direito e a vida dos direitos. ed. anotada e atual. por Ovídio Rocha
Sandoval. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2004, p. 94.
138
em conseqüência, a aplicação rígida da rmula geral usada pelo
legislador, dela poderia excluir os casos aparentemente não previstos,
ou revestidos de modalidades ou circunstâncias novas, os quais, por
justiça, deveriam receber solução idêntica à prevista e prescrita pela
mesma fórmula; poderia, isto é, a aplicação rígida da fórmula geral,
importar desigualdade e, pois, injustiça, dando azo à condenação que
Cícero condensou no o celebrado anátema summun jus summa
injuria
.
Em suma, a equidade é expressão completa e prática da justiça,
podendo ser considerada um valor superior, espelho de todas as normas.
Constitui assim, num instrumento que o juiz dispõe para moldar a disposição
legal, podendo em certos casos até mesmo profe
rir decisões contra
legem
.
3.2.1
A aplicação da equidade
A equidade pode ser entendida, segundo Vicente Ráo
217
, como
atributo do direito, quer seja conferido pelo legislador ao formular a norma
jurídica, quer pelo juiz ao aplicá-la. Assim, a equidade amplia os poderes do
órgão julgador, possibilitando, portanto, uma decisão mais justa e capaz de
solucionar defin
itivamente o conflito.
Segundo
Maria Helena
Diniz
218
:
217
RÁO,
op. cit
., p.
92.
218
DINIZ,
op., cit.,
p. 477.
139
a equidade confere, pode-se assim dizer, um poder discricionário ao
magistrado, mas não uma arbitrariedade. É uma autorização,
segundo a lógica do razoável, interesses e fatos não determinados a
priori
pelo legislador, estabelecendo uma norma individual para o
caso concreto o singular, sempre considerando as pautas axiológicas
contidas no sistema jurídico, ou seja, relacionando sempre os
subsistemas normativos, valorativos e fáticos.
Outrossim
,
Antonio
Carlos de Araújo
Cintra
,
Ada
Pelegrini
Grinover
e
Cândido Rangel
Dinamarco
219
propõem
que
:
decidir por equidade significa decidir sem as limitações impostas pela
precisa regulamentação legal; é que às vezes o legislador renuncia a
traçar desde logo ma lei
a exata disciplina de determinados institutos,
deixando uma folga para a individualização da norma através dos
órgãos judiciários(CC, arts. 400 e 1456). É nesses casos que o juiz
exerce a jurisdição de equidade, a que se refere à doutrina em
contraposição
à
jurisdição de direito.
A aplicação da arbitragem em cunho subjetivo independe no caso do
Poder Judiciário da vontade do juiz ou de autorização legal (como ocorre, por
exemplo, no art. 413, do CC) e, no caso da arbitragem, da vontade das partes
expressa
na convenção de arbitragem. A equidade poderá
,
em primeiro lugar
,
ser aplicada
220
:
como meio supletivo de integração e interpretação de normas: é toda
decisão proferida no sentido de encontrar o equilíbrio entre normas,
fato e valor (aplicação do direito ao caso concreto), na hipótese de
constatação de uma contradição entre a norma legal e a realidade,
gerando uma lacuna.
A equidade pode ser aplicada inda na elaboração das leis, pois o
legislador sensível à necessidade da sociedade, pode utilizar como critério do
219
CINTRA, GRINOVER e DINAMARCO,
op. cit.,
p. 162.
220
GAGLIANO
, Pablo Stolze e PAMPLONA FILHO,
Rodolfo
. Novo curso de Direito Civil.
Parte
geral
, v. 1,
5ª ed.
São Paulo:
Saraiva,
2004
,
p. 28
140
processo legislativo a necessidade de se aplicar a justiça em certas normas
jurídicas.
Para Vicente Ráo
221
, a equidade influencia o legislador através de três
modos, em poucas palavras: a) como fundamento na norma legislativa,
quando esta abre exceção à outra norma de caráter geral ou ao principio
básico de certo instituto; b) quando a norma legal implicitamente confere ao
juiz maior amplitude de poderes e c) quando a norma legal expressamente
autoriza o recurso da equidade.
São características inerentes à equidade tanto o ideal de justiça quanto
o de igualdade, isto é, a equidade é fruto da necessidade da natureza do ser
humano. Tanto que p
ara
Selma Ferreira
Lemes
222
:
observa
-se, assim, que muitas vezes o conceito de equidade
confunde
-se com o de justiça e igualdade. Esta similaridade justifica-
se na raiz histó
ri
ca, filosófica e jurídica do instituto. No pensamento
grego, a equidade ( epieikeia )
que etimologicamente significava o
reto, equilibrado, temperador das exigências da justiça
teve com
o
precursor Aristóteles, que abordou o tema em duas obras (Ética a
Nicômaco
e
Retórica).
Do ponto de vista do ordenamento objetivo a equidade não se opõe à
aplicação da justiça. De fato, a equidade é o abrandamento dos rigores da lei
que, entretanto, deve ser empregada em situações especificas e
expressamente autorizadas, como ocorre na arbitragem. O que se verifica é a
221
RÁO,
op. cit
., 97.
222
LEMES, Selma Ferreira. A arbitragem e a decisão por equidade no direito brasileiro e
comparado. In:
Arbitragem
: estudos em homenagem ao Prof. Guido Fernando da Silva Soares.
Coordenadores: Selma Ferreira Lemes, Carlos Alberto Carmona e Pedro Batista Mar
tins.
São
Paulo: Atlas, 2007, p. 193.
141
complementação do sistema jurídico
,
tornando a tutela plena
,
ao reduzir o
rigor da norma. Silvio de Salvo
Venosa
223
afirma que o conceito de equ
idade
não se afasta do conteúdo do próprio Direito
,
pois
,
enquanto o Direito regula a
sociedade com normas gerais do justo e equ
itativo
,
a equidade procura
adaptar essas normas a um caso concreto
.
3.2.2
Limitações à aplicação da equidade
O
órgão julgador não pode
,
ao julgar a lide
,
deixar de apresentar os
argumentos pelos quais demonstra estar sendo a lei aplicada. Ainda que
sejam empregados métodos interpretativos flexíveis
,
fica o
mesmo
,
portanto
,
adstrito aos princípios constitucionais. Nesse sentido é que Pablo Stolze
Gagliano e
Rodolfo
Pamplona Filho
224
afirmam
que
,
em relação à aplicação
da eq
u
idade
:
nesta oportunidade, o julgador deixa de ser juiz
aplicador de regras
estatais rígidas
para ser árbitro (que é diferente de arbítrio
ressalte
-se), vinculado somente à sua consciência e percepção da
justiça, naquele caso concreto, segundo sua própria r
acionalização
do problema.
A aplicação da equidade
,
segundo Nelson Nery
Junior
e Rosa Maria de
Andrade Nery
225
, tê
m como premissa
223
VENOSA
,
op. cit.,
p. 53.
224
GAGLIANO e PAMPLONA FILHO,
op.cit
., p.
26.
225
NERY e NERY,
op. cit.,
p. 552.
142
o fato que é o elemento primário e, a partir dele, deve o juiz
interpretar a norma, invertendo o procedimento interpretativo
tradicional. O fundamento dessa escola é a necessidade de atingir-
se o bem estar social da lei e o bem comum, elementos que
constam do nosso direito positivo (LICC 5°) como norteadores da
atividade julgadora do juiz.
É importante diferenciar o julgamento com equidade do julgamento por
eq
uidade. Na primeira situação as decisões judiciais devem ser proferidas
,
sempre
,
com equ
idade
,
ou seja
,
no sentido de busca do ideal de justiça. A
decisão por eq
u
idade é aquela na qual o juiz deixa de aplicar o direito
positivo
:
é toda decisão que tem por base a consciência e percepção de justiça do
julgador
,
que não precisa estar preso a regras de direito positivo e métodos
preestabelecidos de interpretação
226
.
A equidade é ponto fundamental dentro da arbitragem, tanto nos casos
de conflitos internos como nos casos de conflitos internacionais.
Cumpre
observar mais uma vez que o objetivo desse trabalho é a análise da
arbitragem interna e seus limites, o que se aplica plenamente nas questões
envolvendo a equidade.
3.2.3
A arbitragem e a equidade
A Larb
brasileira
prevê no art. 2° que a arbitragem poderá ser de direito
ou de equidade
,
a critério das partes. De acord
o
com o
s
parágrafo
s
1° e 2°
,
as
226
GAGLIANO e PAMPLONA FILHO,
op.cit.,
p. 28.
143
partes poderão escolher livremente as regras de direito que serão aplicadas
na arbitragem
,
desde que não haja violação aos bons costumes e à ordem
pública
,
e convencionar que a arbitragem se realize com base nos princípios
gerais do direito
,
nos usos e costumes e nas regras internacionais de
comércio
.
Joel
Dias
Figueira Junior
227
escreve em defesa:
entendemos que, diferentemente do que ocorreu no micros
sistema
dos Juizados Especiais, a Lei de Arbitragem autoriza o árbitro a
decidir baseado exclusivamente em critérios de equidade, ou, se
preferirmos, nos moldes aristotélicos, à margem do sistema
normativo em
vigo
r, como pica jurisdição de equidade.
(...)
a
equidade deixa o julgador mais livre para ordenar medidas
preventivas, e sob, algumas circunstâncias, medidas sanead
oras,
restritivas de direito,
inibitó
rias, diante da situação de perigo
demonstrada, por exemplo. Confere-se ao árbitro poder
discricionário, o qual estará permeado por um forte e preponderante
juízo de equidade, na busca as solução mais justa e equânime p
ara
a solução do caso concreto.
Para Selma
Ferreira Lemes
228
:
nesse sentido, o árbitro, na busca da solução que considere mais
justa, decidirá de acordo com a prudência e a consciência,
alcançando o justo e equânime, pautando-se nos princípios morais
básicos da convivência social, afastando ou temperando as regras
do direito estrito. Ao ditar a sentença arbitral por equidade, o árbitro
firma compromisso solene com a justiça, que o conclama a proferir
decisões justas, sem formalismos ou comodismos. Impe
nde
sublinhar que a arbitragem por equidade se limita às questões de
fundo (mérito) e o quanto às regras de procedimento, de validade
da convenção de arbitragem e da competência dos árbitros.
Embora se dev
a
destacar que a refe
rida l
ei restringe o proce
sso arbitral
às relações jurídicas entre pessoas capazes
,
tendo por objeto apenas direitos
227
FIGUEIRA JUNIOR,
op. cit.,
p. 238.
228
LEMES,
op. cit.,
p. 203.
144
patrimoniais disponíveis
,
é de fundamental importância a análise sobre o
alcance da equidade
,
que
refletirá na sentença. Embora o moderno processo
arbitral
,
interno
e internacional
,
expresse o novo paradigma da autonomia
privada
,
consectário da instituição democrática e
,
pois
,
do princípio da
democracia universal
,
o julgamento
,
por mais livre e autônomo que seja
229
,
estará viciado
,
por afrontar o princípio da segurança
jurídica
,
caso o árbitro
não tenha atendido aos princípios constitucionais
,
valores jurídicos
,
internos
ou internacionais
,
mesmo quando a arbitragem seja por equidade. Esse é o
entendimento de Irineu Strenger
230
, que diz que:
para as partes, trata-se da aceitação de não serem julgados
exclusivamente segundo regras de direito estatal, sem, entretanto, que
o árbitro seja autorizado a recusar aplicação, em nome da equidade,
de uma convenção legalmente formada. É em consideração a essa
convenção que a equidade deve exercer-se, excluindo-se, porem, a
possibilidade de qualquer desnaturação. Em outros termos, a
faculdade oferecida pelo presente artigo (art. LA), de não aplicar
exclusivamente as regras de direito, não deve ser analisada como uma
renuncia ao direit
o, ou um consentimento do não
-
direito.
Com efeito
,
o julgamento por equidade não pode afrontar os bons
costumes e a ordem pública juridicamente regulados
,
sob pena de nulidade da
sentença. Co
munga
com
es
sa posição Pedro A. Batista
Martins
231
,
que
assegura
:
que a liberdade do árbitro que julga por equidade, em não aplicar no
caso concreto as regras de direito positivo, encontra seu limite quando
frente à regra de ordem pública, nela inseridos os bons costumes e os
princípios do contraditório e igualdade das partes. Assim, conforme a
communis opinio doctorum, os amigables componedores
devem
229
Para Irineu, a equidade configura um fim procurado pelo árbitro, indefinidamente
perfectível, que tende a ultrapassar as interpretações provisórias do direito positivo e supõe o
reconhecimento de um direito superior aos direitos estatais. Assim, esta conduta seria, para os
árbitros, tentativa de exceder o direito em nome d
o próprio direito .
STRENGER,
op. cit
., p. 19.
230
STR
E
NGER, op. cit., p.19.
231
MARTINS,
op. cit.,
p. 52.
145
observar sempre, e sob todas as circunstâncias, os ditames
processuais da ampla defesa e os preceitos de ordem pública,
podendo manter-se alheio às demais normas positivas, se o justo
assim demandar.
Sendo conveniente
,
as partes poderão, ao estabelecer a arbitragem
para dirimir a lide
,
determinar que a solução do caso se dê com o emprego da
eq
u
idade. Para Joel
Dias Figueira Junior
232
:
desde que acordada entre as partes e insculpida de maneira
expressa no compromisso arbitral a autorização para que o árbitro ou
árbitros julgue por equidade, poderão eles aplicar subjetivamente os
princípios imutáveis de justiça calçados em critérios de igualdade,
moderação e bem comum, ainda que em detrimento ou oposição ao
direito objetivo vigente.
233
O Direito brasileiro admite a adoção da eq
u
idade
,
de maneira geral
,
nas
hipóteses dos arts. e 5° da Lei de Introdução ao Código Civil
234
,
ou seja: a)
como meio supletivo de integração e interpretação de normas; e b) para
232
FIGUEIRA JUNIOR,
op. cit.,
p. 239.
233
Contrários a isso, CINTRA, GRINOVER e
DINAMARCO
:
É nesses casos que o juiz exerce
a jurisdição de equidade, a que se refere a doutrina em contraposição à jurisdição de direito.
No direito processual civil, sua admissibilidade é excepcional (CPC, art. 127), mas nos
processos arbitrais podem as partes convencionar que o julgamento seja feito por equidade
(LA, art. 11, inc. II). Na arbitragem ajustada perante os juizados especiais, o julgamento por
equidade é sempre admissível, independentemente de autorização pelas partes (lei 9. 099, de
26. 9.
1995, art. 25)
,
op. cit.,
p. 162.
234
Para
Maria Helena Diniz, quando, ao solucionar um caso, o magistrado não encontra
norma que lhe seja aplicável, não podendo subsumir o fato a nenhum preceito, porque falta
de conhecimento sobre um status jurídico de certo comportamento, devido a um defeito do
sistema que pode consistir numa ausência de norma, na presença de disposição legal injusta,
ineficaz socialmente, ou seja, em desuso, estamos diante dos problemas das lacunas.
Imprescindível será um desenvolvimento aberto que o aplicador adquire metodicamente. É
nesse desenvolvimento aberto que o aplicador adquire consciência da modificação que as
normas experimentam, continuamente, ao serem aplicadas às mais diversas relações de vida,
chegando a se apresentar, no sistema jurídico, omissões concernentes a uma nova exigência
vital. Essa permissão de desenvolver o direito compete aos aplicadores sempre que se
apresentar uma lacuna, pois devem integrá
-la, criando uma norma individual, dentro dos limites
estabelecido
s pelo direito (LICC, arts. e 5º). As decisões dos juízes devem estar em
consonância com o conteúdo da consciência jurídica geral, com o espírito do ordenamento,
que é mais rico do que a disposição normativa, por conter critérios jurídicos e éticos, idé
ias
jurídicas concretas ou fáticas que não encontram expressão na norma de direito. Assim sendo,
em caso de lacuna, a norma individual completante do sistema jurídico não é elaborada fora
dele, pois o órgão judicante, ao emiti-la, terá que se ater aos subconjuntos valorativo, fático e
normativo, que o compõem
,
op. cit.,
p. 115.
146
atender aos fins sociais e bem comum determinados pela lei. Necessário se
faz lembrar que o Código de Processo Civil limita a adoção da equidade aos
casos previstos em lei conforme acima mencionado.
Silvio
de Salvo
Venosa
235
,
ao
concluir posicionamento a propósito da
eq
u
idade
,
manifesta
-
se da seguinte forma:
Na realidade, sintetiza-se que a eqüidade se traduz na busca
constante e permanente do julgador da melhor interpretação legal e
da melhor decisão para o caso concreto. Trata-se, como se vê, de
um raciocínio que busca a adequação da norma ao caso concreto.
Em momento algum, porém, salvo quando expressamente
autorizado pela lei, pode o julgador decidir exclusivamente pelo
critério do justo e do equânime, abandonando o texto legal, sob o
risco de converter
-
se em legislador
.
Para Selma
Ferreira Lemes
236
,
portanto, nestas condições nenhuma contradição entre a equidade
e o Direito, pois tende a alargar suas fontes para permitir a solução de
um litígio com o auxilio de considerações mais variadas do que as
regras do direito posto. A decisão por equidade e de acordo com as
regras de direito se identificam e constituem dois aspectos do mesmo
ideal de justiça, que é a finalidade da equidade. Destarte, a arbitragem
por equidade constitui um método de pesquisa do direito e da
equidade a ser desenvolvido pelo árbitro para obter a solução mais
justa. Por ela (equidade) se alarga o direito positivo. Para ela
(equidade), se positiva a justiça do caso concreto. Ao outorgar poderes
para
o árbitro decidir por equidade, pretende-se que a sentença
arbitral reflita um direito. E esse direito expresso na sentença arbitral
por equidade representa extravasar o formalismo do direito estatal,
que resulta no alargamento das fontes de direito
.
Em
suma
,
o julgamento por equidade é fruto da vontade das partes
,
expresso na convenção de arbitragem
,
permitindo ao
árbitro
um julgamento
235
VENOSA,
op. cit.,
p. 53.
236
LEMES,
op. cit.,
p. 213.
147
mais justo. No entanto
,
reitera
-
se aqui a
posição no sentido de que a sentença
arbitral deva atender a todos os princípios constitucionais
,
bem como
,
matérias de ordem
pública
,
pois
,
caso
contrário,
a decisão resultará
injusta
,
alé
m de caracterizar insegurança jurídica no caso concreto e
,
porque não
,
deixará vulnerável o próprio instituto da
arbitragem
, viabilizando, inclusive, a
possibilidade da propositura da competente ação anulatória.
3.3
SÚMULA VINCULANTE
Como origem do direito
sumular
brasileiro
,
segundo
Odelmir Bilhalva
Teixeira
237
, a súmula existe no Supremo Tribunal Federal desde 1963
,
quando do dia 28 de
agosto
uma emenda ao regimento interno instituiu a
súmula
da jurisprudência predominante com a finalidade de compendiar
teses jurídicas já assentadas em seus julgados.
Atualmente
,
as preocupações da sociedade e a evolução científica
impulsionam o desenvolvimento do processo a fim de garantir o mais amplo
acesso à justiça. Ocorrem que essa busca tr
az
conseq
uências danosas ao
237
TEIXEIRA, Odelmir Bilhalva. mula vinculante: perigo ou solução. Campinas: Editores,
2008, p.104
148
próprio poder judiciário
,
o que motiva o legislador a criar um sistema
amoldado à jurisprudência. Por isso
,
a utilização cada vez
maior das
súmula
s.
Ante a complexidade do sistema legal brasileiro
, é
grande a importância
que as súmulas têm na construção do conhecimento da jurisprudência
,
mesmo que algumas sejam questionáveis num ou noutro momento. A
segurança j
urídica surge automat
icamente à
edição da súmula.
Segundo
Encarnacion Alfonso
Lor
238
,
as
súmula
s refletem o
entendimento de um Tribunal
de
determinadas questões controvertidas e
reiteradamente levadas à apreciação do Judiciário. Isso porque
,
na busca pela
isonomia e da segurança jurídica, repugnam decisões diferentes sob uma
mesma controvérsia.
No sentido jurídico
,
súmula
(do latim
summula
-
sumá
rio/índice) refere
-
se
a entendimentos solidamente assentes pelos tribunais acerca de uma mesma
questão
,
dos quais se retira um enunciado. Nesse sentido,
Cassio
Scarpinella
Bueno
239
argui que as chamadas
súmula
s são a cristalização de
entendimentos jurisprudenciais que predominam nos tribunais em certo
espaço de tempo. A palavra quer indicar as decisões reiteradamente
proferidas em
determinado sentido pelos Tribunais
.
238
LOR, Encarnacion Alfonso. Súmula vinculante e repercussão geral: novos institutos de
direito processual constitucional. São Pau
lo: Revista dos Tribunais, 2009, p.
18
239
BUENO,
op. cit.,
p.
371
.
149
Esclarece o jurista
240
que:
não se trata de verificar a ocorrência de um ou outro julgamento em
um sentido, mas mais amplamente, de constatar objetivamente a
tendência de que o Tribunal ou, quando menos, seus órgãos
fracionários tendem a decidir certas questões de determinada forma.
Súmula é indicativo de jurisprudência, e não de julgados.
Na atualidade
,
o direito
sumula
r tem revelado importância como ramo
do Direito
,
no elastério das relevantes questões jurídicas que sofreram
sumula
ção dos tribunais superiores. Afirma Andre Ramos Tavares
241
que
é a
força da jurisprudência agindo na construção das decisões judiciais
.
Diante da crescente valorização e aplicação das denominadas
súmula
s
simples
,
o legislador optou por aplicá-las além do propósito
a
que foram
concebidas. É o que acontece primeiramente na
súmula
impeditiva
do
recurso de apelação (art. 318, parágrafo do CPC) e de forma mais
contundente com a criação das
súmula
s vinculantes por meio da emenda 45
de 2004. Tal tema é de grande relevância na arbitragem no que tange à
aplicação obrigatória pelos árbitros.
No que diz respeito,
todavia
,
à criação das súmulas com efeito
vinculante
,
polarizaram
-se as discussões, visto que elas deixaram a
característica original de mero método de trabalho
,
passando a obrigar os
240
Idem, Ibdem.
241
TAVARES, Andre Ramos. Nova lei da súmula
vinculante:
estudos e comentários à Lei 11.
417, de 19. 12. 2006. São Paulo: Método, 2007, p. 25.
150
juízes e administradores quanto aos casos futuros
,
judicial e
extrajudicialmente. Pondera
Rodolfo de Camargo
Mancuso
242
que
:
a súmula vinculante projeta uma eficácia expandida panproc
essual,
estendendo
-se a todos os órgãos judiciais e à Administração Pública
direta e indireta, certo ainda que seu descumprimento, demonstrado
em reclamação atendido apelo STF, leva a cassação da decisão
judicial ou à anulação do ato administrativo.
A
s
úmula
vinculante é instituto semelhante à
súmula
simples
,
acrescida
, porém
,
de um poderoso efeito que a torna não apenas um
referencial
,
mas um instrumento de aplicação obrigatória pelos juízes de
instâ
ncias superiores ou pelo Poder
Públi
co nos processos administrativos.
Ao acrescentar o adjetivo vinculante, o simples enunciado da súmula
muda de
status;
não mais é mero instrumento de trabalho do tribunal
,
é
comando que se espalha no seio jurídico
,
vinculando juízes e administradores.
Segundo Cassio Scarpinella Bueno
243
,
pode ser objeto da
súmula
vinculante a validade
,
a interpretação e a eficácia de normas determinadas
acerca das quais haja controvérsia atual entre os órgãos judiciários ou entre
esses e
a
administração
públi
ca que acarrete grave insegurança política e
relevante multiplicação de processos sobre questão idêntica. As normas
determinadas
,
contudo
,
devem versar sobre matéria condicional
,
exigência
feita pelo caput do art. 103A da Constituição Federal.
242
M
ANCUSO,
op. cit
.,
p
.
344
.
243
BUENO,
op. cit.,
p. 374.
151
A distinção da
súmula
vi
nculante com a lei é imprescindível para a
análise do instituto
,
tanto assim que
José Miguel Garcia
Medina
244
afirma que
:
a lei e a súmula não se encontram num mesmo plano. Na verdade, a
súmula deve se subordinar à lei. O que ocorre é que a norma
jurídica,
geral e abstrata, pode dar ensejo ao surgimento de duas ou
mais interpretações diversas, sobre um mesmo assunto. A súmula,
assim, desempenha função importantíssima, pois registra qual
interpretação da norma seria a correta, e que, uma vez revelada, irá
ins
truir julgamentos posteriores, sobre o mesmo tema.
Rodolfo de Camargo
Mancuso
245
aponta que
:
a súmula vinculante apresenta uma gênese diferenciada: só pode ser
emitida, revista ou cancelada pelo STF; incide sobre validade,
interpretação ou eficácia de norma determinada, de conteúdo
condicional sobre a qual se registra controvérsia atual entre órgã
os
judiciais ou entre esses e administração pública, de tal sorte a poder
provocar grave insegurança jurídica e relevante multiplicação de
processo sobre questão idêntica. Presente essas particularidades,
que colocam a súmula vinculante num patamar sobranc
eiro,
compreende
-se a opção pelo trato da matéria no texto constitucional,
até porque o efeito vinculante
erga omnes
de tais enunciados
vinculativos pouco fica a dever à impositividade da norma legal e é
sobre esta que repousa o primado do nosso sistema jurídico-
político.
Compreende
-se, assim, a opção pela regulamentação do tema no
próprio texto constitucional.
Se a súmula não-vinculante deixa livre o julgador para seguir os
caminhos da
própria
consciência jurídica
,
desde que devidamente motivado
,
a
súmula de efeito vinculante muda profundamente es
s
a liberdade.
A súmula vinculante prestigiou os princípios da celeridade e da
segurança jurídica; e mais
,
foi além para realçar o princípio da igualdade
,
244
MEDINA, José Miguel Garcia.
O pré
-questionamento nos recursos extraordinário e especial
.
2ª Ed., Sã
o Paulo: Revista dos Tribunais, 1999, p. 272.
245
BUENO,
op. cit
., p. 344.
152
justamente porque opera tratamento igualitário para todos os casos idênticos.
Como anotou
Fábio Cardoso
Machado
246
:
em suma, a instituição da súmula vinculante não pretende garantir a
coerência e a harmonia entre as diversas decisões jurisprudenciais,
consideradas as particularidades dos casos no contexto dos quais
estas decisões sejam proferidas, mas pré-determinar em abstrato as
premissas normativas do raciocínio prático-jurídico, com a intenção
de assegurar a igualdade formal das decisões, consideradas apenas
as circunstâncias de fato relevantes à subsunção do caso a um
unívoco critério normativo, permitindo que a decisão resulte de um
raciocínio lógico
-
dedutivo estritamente silogístico.
Efetivamente ocorreu o fortalecimento do controle de
constitucionalidade pelo STF
,
na antevisão de Antônio Cláudio da Costa
Machado
247
:
com efeito, se o Supremo é o guardião da Constituição e a súmula
vinculante pode dizer respeito à matéria constitucional, o que nos
parece é que o presente art. 103-A está criando mais uma forma de
controle de constitucionalidade, porém bastante atípica e híbrida.
O comando constante da súmula vinculante atinge
,
assim
,
todas as
pesso
as que se encontrem na situação objeto da então controvérsia judicial.
Seus efeitos são projetados para além do processo
,
alcançando
,
inclusive
,
situações extraprocessuais
,
como no caso da administração pública e
Arbitragem
, que devem seguir a ordem
sumula
da e
,
nem mesmo
,
promover
mais o acesso ao Judiciário para discussão da matéria.
246
MACHADO, Fábio Cardoso. Da uniformização jurídico-decisória por vinculação às súmulas
de jurisprudência. In: MACHADO, Fábio Cardoso e outro (coord.). A reforma do Poder
Judiciário.
São Paulo: Quartier Latin, 2006, p. 249.
247
MACHADO, Antônio Cláudio da Costa. Código de Processo Civil interpretado, ed. rev. e
atual. de acordo com a Reforma do Judiciário e as recentes reformas do Código de Processo
Civil, São Paulo: Manole, 2006, p
. 2136.
153
Tema polêmico é a relação
da
súmula
vinculante aos particulares
,
pois
é pacifico até por força normativa que ela se aplica ao poder Judiciário e à
ad
mi
nistração
públi
ca.
José Afonso da
Silva
248
sustenta a ineficácia da
súmula
vinculante
perante os particulares
da seguinte forma
:
A súmula vinculante não tem eficácia geral, porque vincula os
órgãos do Poder Judiciário e da Administração Pública; ou seja, não
tem eficácia contra todos, não vincula diretamente os particulares,
por isso não tem força de lei. Os particulares não estão sujeitos às
súmulas vinculantes, não são obrigados a se conduzir na forma por
eles determinada, podem desobedecer a elas sem que isso implique
sanção.
Por outro lado, Rodolfo de Camargo
Mancuso
249
argumenta
que a
súmula
vinculante atinge a todos
,
posição da qual
aqui se
compartilha
, pois:
à primeira vista, o efeito vinculativo da súmula alcançaria somente os
juízes e os administradores públicos, mas esta perspectiva é parcial
e reducionista. Tirante o ato privado puro, entre duas ou mais partes
capazes para a consecução de certo negócio envolvendo interesse
disponível, no mais, e de ordinário, as pessoas físicas e jurídicas, de
direito privado e público, relacionam-se com os poderes constituídos,
formulando pretensões ou resistências junto às instâncias
administrativas e judicial; assim de modo indireto ou reflexo,
cidadãos e pessoas jurídicas privadas e públicas acabam sob a
erradiação
dos efeitos das súmulas vinculantes, por exemplo,
determinada cláusula poderá deixar de ser inserida num edital de
concurso público, por se revelar desconforme ao enunciado de
súmula vinculante, assim afetando os interessados no certame.
248
SILVA, José Afonso da.
Comentário contextual à Constituição.
2ª ed
.
São Paulo: Malheiros
Editores, 2006, p. 562
.
249
MANCUSO, op. cit., p.
421.
154
Negar os efeitos de
súmula
vinculante aos particulares
,
como
,
por
exemplo
,
aos árbitros
,
é negar a essência da
súmula
vinculante aqui
demonstrada.
Quanto ao Poder
Legislativo
250
,
a vinculação não deve ser tida como
engessamento da atividade precípua de seus órgãos. O Legislativo continuará
produzindo textos
,
mas
, enquanto não editada norma em sentido diverso
,
valerá o comando
sumula
do
,
isto é
,
a validade
,
a interpretação e a eficácia da
norma serão aquelas previstas na súmula.
3.3.1 Efeito Vinculante Das Decisões Judiciais
O efeito vinculante que se quer outorgar à súmula não é novidade no
ordenamento jurídico pátrio
,
estando presente
,
por exemplo
,
nos assentos
portugueses que aqui vigoraram por certo lapso temporal (confira-se o
Decreto nº 2. 684
,
de 1875
,
regulamentado pelo Decreto nº 6.1
42
,
de 1876).
250
Para
Andre Ramos Tavares, em síntese, pois, poderá haver a edição de nova lei com
conteúdo exatamente idêntico ao de anterior lei que havia sido objeto de súmula que lhe
atrelava,
v. g., a nota da inconstitucionalidade, ou que lhe atribuía (a súmula) eficácia diversa
da eficácia constante de nova previsão legal (numa interpretação conforme,
v.g.
). Nessas
situações, consideradas legítimas pela sistemática adotada para a extensão dos efeitos
próprios da súmula, pode-se concluir que o Legislativo estará a reabrir (uma espécie
de
legitimidade indireta) a discussão anteriormente encerrada pela edição da súmula vinculante
versando sobre a primeira lei .
op. cit.,
p. 38.
155
Segundo
Andre Ramos
Tavares
251
,
o art. 479 do CPC
,
tratando do
assunto de uniformização de jurisprudência (e sinalizando para a necessária
unidade jurídico
-
judicial)
lembra que
:
o julgamento tomado pelo voto da maioria absoluta dos membros
que integram o tribunal será objeto de súmula. Quanto às súmulas
(sem efeito vinculante formal), o RISTF reconhece expressamen
te de
há muito como repositório oficial da jurisprudência do Tribunal a
súmula de jurisprudência predominante do STF
(...)
as súmulas
sempre foram compreendidas na sistemática brasileira, portanto
como a sedimentação de orientações adotadas topicamente pel
os
tribunais em decisões diversas (jurisprudência compendiada). É, em
essência, essa a ideia que foi resgatada pela súmula vinculante na
reforma do Judiciário.
O legislador criou a possibilidade de o relator decidir monocraticamente
naquelas matérias em que houvesse consenso jurisprudencial (art. 557 e
parágrafo
,
o que para alguns
,
como
Lenio Luiz
Streck
252
,
denotava certa
forma de efeito vinculante
:
Não havia maiores dúvidas acerca do fato que as súmulas muito
tempo tinham efeito vinculante. Entretanto, não eram considerados
textos normativos, no sentido de ato normativo obrigatório... Tal
questão sempre facilmente detectável também a partir do art. 557 do
CPC, pela qual o relator negará seguimento a recurso
manifestamente inadmissível, improcedente, prejudicado ou contrário
à súmula do respectivo tribunal ou tribunal superior. Mais ainda, se a
decisão recorrida estiver em manifesto confronto com súmula ou com
jurisprudência dominante do Supremo Tribunal Federal, ou de
Tribunal Superior, o relator poderá dar provimento aos recursos.
Portanto, a vinculação das súmulas existia antes mesmo da
emenda constitucional.
251
TAVARES,
op. cit.,
p. 23.
252
STRECK, Lenio Luiz. Hermenêutica Jurídica e(m) Crise: uma exploração hermenêutica da
construção do direito
. 8ª ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2009
,
p. 190.
156
Segundo Os
m
ar
Mendes Paixão Côrtes
253
:
a súmula vinculante tem três funções principais. A primeira, da
mesma forma que as súmulas em geral, é tornar conhecida a
jurisprudência consolidada no âmbito do STF, facilitando a sua
observância. A segunda, evitar que sejam tomadas decisões
discrepantes
da sumulada, por economia, celeridade processual e
político
-
judiciária
. A terceira, dar segurança jurídica ao sistema e às
relações sociais.
Silvio Nazareno
Costa
254
observa que
:
a vinculação representa
forma excepcional de manifestação do poder
hierárqui
co, uma vez que implica a possibilidade de interferir sobre a
decisão inferior mesmo antes de esta ser objeto de recurso. Trata
-
se,
pois, de exceção ao princípio da independência jurisdicional. A
posição hierárquica, contudo, não é condição suficiente a garantir a
vinculação, visto que nem toda decisão superior é dotada dessa
autoridade. Normalmente, apenas os tribunais superiores, ou mesmo
apenas a Corte Constitucional, gozam dessa prerrogativa.
Em que pese a posição do autor acima mencionado
,
a adoção da
súmula
vinculante acarreta efeitos positivos a todo
o
sistema judiciário
,
is
s
o
porque diminui a morosidade dos processos
,
evita decisões contraditórias
,
maior segurança jurídica às decisões e viabiliza o estado democrático de
direito.
253
CÔRTES
,
Osmar Mendes Paixão. Súmula Vinculante e Segurança Jurídica. São Paulo:
Editora Revista dos Tribunais, 2008
, p. 200.
254
COSTA, Silvio Nazareno.
Súmula
vinculante
e reforma do Judiciário. Rio de Janeiro:
Forense, 2002, p. 15
.
157
3
.3.2
Imperatividade
A imperatividade ou impositividade é a qualidade que impõe a
observância de algo, a obrigação de seguir certa regra ou disposição. A lei é
imperativa por excelência, quando exige uma ação, impõe; quando quer uma
abstenção, proíbe.
Ma
ria Helena Diniz
255
leciona que imperar é exigir um dever, a norma
jurídica, portanto, é manifestação de um ato de vontade do poder, por meio do
qual uma conduta humana é obrigatória, permitida ou proibida .
Para
Norberto
Bobbio
256
:
os imperativos
são
aquelas prescrições que têm maior força
vinculante. Esta maior força vinculante se exprime dizendo que o
comportamento previsto pelo imperativo é obrigatório, ou, em outras
palavras, o imperativo gera uma obrigação à pessoa a quem se
dirige. Imperativo e o
brigação são dois termos correlatos: onde existe
um, existe o outro
.
A mula vinculante carrega em si a mesma característica da
imperatividade. Ocorrendo aprovação, após regular procedimento e
observados os requisitos legais, o entendimento expresso pelo STF importará
na observância estrita pelos demais órgãos judiciários e administrativos.
Diversamente da súmula não-vinculante, a vinculante não tem feição
meramente persuasiva, de orientação ou aconselhamento a tais órgãos.
Decidido e aprovado, o verbete terá o mesmo condão da lei, até porque a
255
DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil brasileiro. V
.
I, 21ª
ed.
, São Paulo: Saraiva,
2004, p. 33.
256
BOBBIO, Norberto.
Teoria da norma jurídica.
Trad
. Fernando Pavan Baptista e Ariani Bu
eno
Sudatti
.
Bauru: Edipro, 2005, p. 96
.
158
súmula vinculante nada mais é que interpretação da norma. Por isso que, para
Osmar Mendes Paixão
Côrtes
257
:
existe a norma geral (emanada da autoridade competente, sem
ruptura ao principio da separação dos Poderes) que, interpretada por
quem também competente (Poder Judiciário, em especial o STF),
origem a uma decisão que, se refletir a posição dominante na corte,
será vinculativa, obrigando, além do próprio Tribunal, os órgãos
inferiores do Poder Judiciário e os administrativos. Tudo isso para
que não haja discrepância do posicionamento consolidado do
Supremo Tribunal e cause insegurança jurídica, com decisões em
diferentes sentidos.
Em suma, entende
-
se que a sú
mula vinculante detém até mais força que
a lei, pois a autoridade nela contida não permite discussão da interpretação
dada; a Constituição conferiu, exclusivamente, ao STF o poder de reputar
constitucional ou não certo ato.
A modificação
258
da súmula vinculante poderá ocorre tanto pelas
modificações fáticas ou jurídicas entendidas como relevantes à pacificação
social, quanto pelo Poder Legislativo, se desejar modificar o entendimento por
meio de função típica, poderá apresentar novo dispositivo constitucional, isto é,
deverá produzir nova Emenda Constitucional, o que exigirá, inclusive, um
quorum maior do que o utilizado pelo STF para aprovar a súmula vinculante.
257
CÔRTES,
op. cit.,
p.
203.
258
Tavares
aponta que o STF poderá, de oficio, preceder à edição de súmula vinculante. Não
margem para uma discussão nesse ponto. O mesmo, porém, não ocorre quanto à revisão
ou cancelamento, tendo em vista a péssima técnica de redação adotada pela Reforma do
Judiciário e seguida à risca pelo legislador nesse dispositivo. É que se poderia pensar ser a
atuação de oficio do STF circunscrita à edição da súmula, mas afastada para os demais c
asos,
a saber, de revisão e cancelamento. A redação
insista
-
se
oferece essa leitura como
possível. Do ponto de vista prático, porém, o poder de editar súmula poderia facilmente incluir
a capacidade de rever ou alterar súmula anterior, bem como seu eventual cancelament
o
(superando as armadilhas lingüísticas). Sim, é consistente o raciocínio que concebe no
caminho da edição de nova súmula também o da revisão e o do cancelamento de súmula
anterior
,
op. cit.,
p.
34.
159
3.3
.3
Aspectos Particulares Da Súmula Vinculante
A p
artir da leitura do ao art. 103
A da CF
,
é p
ossível constatar a presença
de
requisitos para a edição de uma súmula vinculante, os quais são exigência
lega
l, pois, uma vez não atendidos
,
a súmula será tida por inválida ou poderá
ser tomada como súmula não-
vinculante.
Igualmente
, a necessidade d
e
o
STF, responsável pelo controle de constitucionalidade no Brasil, fi
car
atento
aos requisitos, sob pena de suscitar dúvidas derivadas de comando legislativo
conflitante.
Nelson
Nery
Junior
e
Rosa Maria de Andrade
Nery
259
apresentam os
seguintes requisitos para
que a súmula vinculante sej
a va
lida
da:
a) tese jurídica que se quer afirmar em verbete de Súmula vinculante
tem de dizer respeito à norma constitucional; b) o objeto do verbete
tem de ser a validade, a interpretação ou a eficácia de norma
constitucional; c) controvérsia atual entre órgãos do Poder Judiciário
ou entre eles e a administração pública sobre a validade,
interpretação ou eficácia da norma constitucional questionada; d)
grave insegurança: a controvérsia atual deve ter aptidão para gerar
grave insegurança jurídica; e) relevante multiplicação de processos
sobre questão idêntica, acarretada pela controvérsia a respeito da
norma constitucional questionada; f) reiteração das decisões do STF
no mesmo sentido da afirmação da tese jurídica objeto do verbete
vinculante; g) quorum qualificado: decisão por 2/3 dos membros do
STF (oito Ministros) afirmando a tese do verbete vinculante; h)
publicação do verbete vinculante na imprensa oficial (DOU e/ou
DJU).
Tendo em vista o objetivo do presente trabalho, não se pretende
adentrar pela
análise
de cada um dos requisitos acima, no entanto, a indicação
do rol se faz necessária para a compreensão do instituto
súmula
vinculante
e
a consequente aplicação na arbitragem.
259
NERY e NERY,
op. cit.,
p. 301
.
160
A EC 45/04 não prevê sanção ao magistrado ou administrador que
venha a descumprir os comandos constantes de súmula vinculante. O
legislador constitucional ficou atento apenas ao elemento objetivo, à previsão
de anulação do ato administrativo violador ou cassação da decisão judicial que
contrariar a súmula.
Daí
, então, a existência da reclamação, a qual, segundo
Gilmar Ferreira
Mendes
, Inocêncio Mártires Coelho e Paulo Gustavo Gonet
Branco
260
, é fruto de criação jurisprudencial
e a falta de contornos definidos
sobre o instituto da reclamação fez, portanto, com que a sua construção inicial
repousasse sobre a teoria dos poderes implícitos .
A reclamação destina-se a preservar a competência do STF, bem como
garantir a autoridade de suas decisões. O cabimento de reclamação não tem
por objetivo compelir os destinatários da súmula ao seu cumprimento, iss
o
porque, de acordo com
Andr
é
Ramos Tavares
261
:
no caso de ser procedente a reclamação, o STF não julgará o caso
concreto (que ensejou a reclamação) em consonância com a súmula
vinculante (desrespeitada). A decisão do STF cinge-
se
exclusivamente à análise acerca do descumprimento (em quaisquer
das modalidades) da súmula pela decisão impugnada e, em caso de
reconhecer esse descumprimento, cingem-se à desconstituição
( cassará ) a decisão judicial impugnada e ( anulará ) o ato
administrativo. Portanto, a decisão do STF não substitui a decisão
(judicial ou administrativa) impugnada, decidindo o caso concreto.
Apenas determina que o caso deve ser
novamente
julgado (pela
instancia operativa competente originariamente), que, desta feita,
nos termos da decisão exposta na reclamação (provavelmente
conforme a s
úmula vinculante anteriormente descumprida).
Em síntese, a finalidade da reclamação é dar eficácia à súmula
vinculante, evitando-se a mantença da insegurança jurídica trazida pela não
260
M
ENDES, COELHO e BRANCO,
op. cit.,
p.
1.
291
261
TAVARES,
op. cit.,
p.86.
161
uniformidade de decisões. Terá cabimento em casos de não aplicação ou
de
aplicação indevida, vale dizer, quando não for aplicada nos casos em que teria
de ser respeitada, quando for aplicada a um caso concreto que não se
identifica com aquele em função do qual a súmula foi editada ou quando forem
distorcidos o sentido e o al
cance da súmula.
Cumpre, então, analisar
se a
súmula
vinculante alcança a arbitragem.
3.3.4
Súmula Vinculante E Arbitragem
Diante da incorporação da súmula vinculante ao ordenamento jurídico
brasileiro,
conforme acima noticiado, é de salutar discussão a obrigatoriedade
de o árbitro observá-lo em procedimento arbitral. Não custa reiterar que o
objetivo deste trabalho é a
análise
da arbitragem interna, portanto, o que se
pretende explorar neste momento é aplicação da
súmula
vinculante cujo mérit
o
seja regido pela legislação brasileira.
A extensão dos efeitos da
súmula
vinculante, como já visto, não se limita
à esfera judicial e administrativa, isso porque, além da matéria ali apontada ser
de interesse de todos, seja qual for o meio escolhido para a solução de um
conflito, ela tem caráter de norma, sendo, portanto, inevitável sua aplicação.
Tamanha é a força vinculativa d
as
súmulas
que
Gilmar Ferreira
Mendes
,
162
Inocêncio Mártires Coelho e Paulo Gustavo Gonet Branco
262
assinala
m: como
se vê, com o efeito vinculante pretendeu
-
se conferir eficácia adicional à decisão
do STF, outorgando
-lhe amplitude transcendente ao caso concreto .
Uma v
ez
que existem órgãos alheios à estrutura do Poder Judiciário,
mas que desenvolvem atividades de julgamento , embora não jurisdicionais.
Estes igualmente devem seguir o entendimento sumulado. Sérgio Seiji
Shimura
263
pactua des
s
e entendimento:
Conquanto haja decisões não-jurisdicionais, portanto, exaradas por
órgãos não integrantes do Poder Judiciário, devem as mesmas ser
consideradas como administrativas , para fins de vinculação à
súmula (ex.: justiça desportiva, cf. Art. 217 da CF); e decisões
proferidas por órgão não integrante do Poder Judiciário, mas de
conteúdo jurisdicional (ex.: arb
itragem, cf. Lei 9.307/96).
No
mesmo sentido
Rafaella
Ferraz
264
argumenta:
Como visto acima, é indubitável que o enunciado integra o
ordenamento jurídico brasileiro, como fonte do direito praticamente
equivalente à lei e, nessa qualidade, deve ser aplicado pelos árbitros
quando se defrontarem com situação idêntica àquela contida no
enunciado de súmula do Supremo Tribunal Federal. Isto porque, ao
se eleger determinadas regras de direito, não se aplicam umas em
detrimento de outras.
Não é diferente a posição de Rodolfo de Camargo
Mancuso
265
, para
quem
:
o efetivo vinculante das súmulas como tal
confirmadas
pelo STF (art.
da EC 45/2004) projeta-se em face de todos os órgãos
262
MENDES, COELHO e BRANCO,
op. cit
., p.
1285
.
263
SHIMURA, Sérgio Seiji. Súmula vinculante. In: WAMBIER, Teresa Arruda Alvim (coord.
)
Reforma do Judiciário
primeiros ensaios críticos sobre a EC n. 45/2004. São Paulo:
Revista
dos
Tribunais, 2005, p. 764
264
FERRAZ, Rafaella. Arbitragem comercial, internacional e enunciado de sumula vinculante
pelo STF. In: Revista de Arbitragem e Mediação. Ano 5. N.17. São Paulo: Editora Revista dos
Tribunais, 2008, p.98.
265
MANCUSO,
op, cit,
p.414.
163
jurisdicionais (CF, art. 103-A; art. da Lei 11.417/2006), os quais
constam,
em
numerus clausus, art. 92 da CF. É que, por um lado, o
STF
é o órgão de cúpula em nossa organização judiciária, e, de
outro lado, é ele o
guarda
da Constituição (CF, art. 102,
caput
).
Integrando as súmulas vinculantes o corpo da Constituição, é natural
que caiba ao STF zelar por sua impositividade e credibilidade, para
tanto conhecendo de
reclamação
do art. 103-A) fundada em
recusa injustificada ou aplicação indevida de tais súmulas, sendo
aquele instituto voltado à garantia de autoridade de suas
decisões
(CF, art. 102, I, l). a garantia de acesso à justiça
indeclinabilidade
da função jurisdicional: CF, art. 5º, XXXV
deve, hoje, ser revista,
passando a operar como uma
clá
usula de reserva, por modo a não
impedir que as controvérsias sejam
compostas
/resolvidas perante
outras instâncias estabelecidas no ordenamento ou com ele
compatíveis (donde o prestigio crescente das ADR s
alternative
disput resolutions e o dos chamados equivalentes jurisdicionais
).
Assim, os órgãos decisórios parajurisdicionais são, por exclusão,
instâ
ncias administrativas, em sentido largo, que não integram a
estrutura do Judiciário (
v.g.
, a Justiça de Paz
CF art. 98, II), nem a
do Legislativo (com refração espacial para os Tribunais de Conta,
que são órgãos de auxilio técnico desse poder
CF, art. 71). Sob tal
enquadramento conceitual, os órgãos decisórios não jurisdicionais
sujeitam
-se, ao nosso ver, a terem seus atos e decisões sindicados,
via reclamação, pelo STF, que,
acolhendo
-a, poderá anulá-
los,
inclusive avisando tais colegiados que deverão adequar as futuras
decisões administrativas em casos semelhantes, sob pena de
responsabilização nas esferas cível, administrativa e penal
(art. 64
-
B
da Lei 9.784/99, inserido pelo art. da Lei 11.417/2006). Ainda não
se
pode descartar possam tais instâncias parajurisdicionais intervir
no processo de reclamação na qualidade de amicus curiae, como
parecem sinalizar os textos de regência (Lei 11.417/2006, § 2º do art.
3º, e, antes, Lei 8.038/90, art. 15).
Indubitável,
assim, o dever do árbitro em aplicar e acatar a
súmula
vinculante no procedimento arbitral, sob pena de violação à ordem pública e a
conseq
u
ente nulidade da sentença.
164
3.4 LIMITAÇÃO DO PRINCIPIO DA AUTONOMIA DA VONTADE DAS
PARTES EM FACE DO DEVIDO PROCESSO LEGAL
É
de
fundamental importância a discussão acerca da aplicação
do
devido processo legal na arbitragem. Conforme exposto acima, o devido
processo legal, enquanto princí
pio constitucional deve ser respeitado, sob pena
de limitação da própria via arbitral.
Faz
-
se
necessário, assim, descobrir quais
são os parâmetros para caracterizar a violação dos princípios constitucionais e
a nulidade da sentença arbitral sob esse fundamento.
Conforme
propõe
Rafael
Francisco Alves
, ess
a análise deve ser
realizada
em três etapas:
a primeira para controlar, em abstrato, a escolha que as partes
fizeram sobre as regras que irão disciplinar o processo arbitral,
conforme os ditames do devido processo legal; a segunda, para
verificar se a eventual inobservância de determinada regra acarretou
em concreto a violação do devido processo legal; e a terceira, para
verificar se seria possível desconsiderar tal violação, diante da
ausência de prejuízo material, afastando assim a nulidade da
sentença arbitral. A falta de uma análise criteriosa dos princípios
processuais constitui talvez um dos pontos mais frágeis da
dogmática da arbitragem em nosso país: o problema está justamente
em se determinar quais são as circunstâncias que caracterizariam o
desrespeito
ao devido processo legal neste campo e quando a
sentença arbitral seria nula, sob pena de tudo se resolver em um
exercício de puro subjetivismo, tendendo à arbitrariedade, como
costuma ocorrer em discussões principiológicas, quando mal
conduzidas
266
.
A aplicação do devido processo legal na arbitragem tem como
fundamento o parágrafo segundo do art. 21 da L
ei
9.307/96. Segundo Carlos
Alberto Carmona
267
: pinçou o legislador, dentre os princípios gerais do
266
ALVES, Rafael Francisco. A imparciabilidade do árbitro no direito brasileiro: autonomia
privada ou devido processo legal? In: Revista de Arbitragem e Mediação. Ano 2. N.7. São
Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2005,
p.413.
267
CARMONA
,
op. cit.,
p.
251
.
165
processo, aqueles capazes de prestar às partes razoável garantia de um
julgamento justo .
Como exposto, diante da eficácia dos princípios, a violação dos
mesmos acarreta a nulidade da sentença arbitral, nos termos do art. 32, inciso
VIII, da mesma lei. A anulação da sentença arbitral poderá ser requerid
a
perante os órgãos do Poder Judiciário por meio da ação anulatória prevista no
art.
33. É importante ressaltar a consequência da nulidade da sentença arbitral,
pois, quando as partes resolvem submeter um conflito à arbitragem, exercem
es
sa opção por entender que a via arbitral é mais segura e rápida, logo, não
esperam que seja necessária a propositura de uma ação anulatória.
No
entanto, a ação anulatória da sentença arbitral deve ser promovida diante da
ausência da aplicação dos princípios, notadamente o devido processo legal,
sem que isso cause qualquer prejuízo ao instituto ou retire dele a credibilidade,
ao contrário, a possibilidade da ação anulatória (a qual não é objetivo deste
trabalho) deixa as partes mais seguras, uma vez que, cientes dess
a
possib
ilidade, terão todos os direitos respeitados.
A violação do devido processo legal, sem vida, é a mais grave dentre
todas.
Segundo
Rafael Francisco Alves
268
:
A falta de clareza na definição das circunstâncias caracterizadoras
dessa violação acaba servindo à má-fé de determinados litigantes
que se apropriam do discurso principiológico como instrumento de
retórica e se valem da ação de nulidade como se fosse um autêntico
expediente recursal, ou seja, como se fosse o instrumento
apropriado para manifestações de inconformismo com o mérito da
decisão dos árbitros.
268
ALVES,
op., cit,
p.413.
166
A
Larb
veda a interposição de recursos
,
ou seja, não existem meios para
impugnar a sentença durante o procedimento, de fato constitui característica
importante
de proteção da arbitragem.
Entendemos
que tal situação deve
permanecer no sistema, no entanto, a ausência de recursos faz com que
muitos árbitros profiram decisões sem fundamento e contrariando princípios
constitucionais, justificando, assim, a propositura de muitas ações anulatórias.
Trata
-
se
, portanto, de buscar o equilíbrio entre essas duas situações: de um
lado, a observância do pactuado na convenção arbitral e, de outro, a
indiferença, por parte de alguns, com a violação de princípios constitucionais
no processo arbitral
.
A arbitragem, conforme exposto, tem natureza jurisdicional. Enquanto
as regras que governam o processo judicial são impostas pela lei, as regras
que governam a Arbitragem são estabelecidas pelas próprias partes
envolvidas. Para
J. E.
Carreira Alvim
269
:
por disciplinar situações diversas, deveria a lei ter disciplinado, num
parágrafo, a possibilidade da escolha das regras de direito, que
alcança tanto as de direito interno quanto externo; e, noutro a
advertência (ou proibição) quanto origem publica e os b
ons
costumes.
A autonomia privada, origem de qualquer negócio jurídico, é o poder de
auto
rregulamentação de interesses particulares
270
. É por meio do exercício
dessa autonomia que os interessados não apenas optam pela arbitragem,
269
ALVIM,
op. cit.,
p.
55
.
270
Para Irineu
Strenger
a força da autonomia da vontade, praticamente, concentra-se no
contrato que, sendo
um
a relação entre sujeitos de direito, é, em conseqüência, o campo mais
abrangido por essa categoria jurídica notadamente porque a relação obrigaciona
l se estabelece
entre pessoas , op. cit.,
p.70.
167
como também definem todo o seu modo de ser. Ocorre que este poder que os
interessados possuem de disciplinar o modo de ser da arbitragem encontra
certos limites impostos pela lei, inclusive, a própria autonomia privada é um
poder conferido pela lei
.
O devido processo legal insere-se no contexto de matéria de ordem
pública dentro da disponibilidade de direitos, como limite ao exercício da
autonomia privada. Por isso afirma Carlos Alberto
Carmona
271
:
o exercício da autonomia privada ocorre, na fase pré-arbitral, a qual se
inicia com assinatura da convenção de arbitragem, sendo que se
prolongará até a aceitação da nomeação dos árbitros. o momento
de incidência do devido processo legal ocorre na fase arbitral
propriamente dita, ou seja, no desenrolar do processo arbitral, que é
regu
lado pela convenção celebrada no início.
No âmbito judicial, costuma-se entender o devido processo legal como o
ponto de convergência de todos os princípios processuais, conforme
anteriormente exposto. A busca é pelo julgamento justo
272
, o qual garante a
participação das partes de forma equânime e a medida desta participação que
271
CARMONA,
op. cit.,
p. 329.
272
Leciona Humberto Theodoro Junior: Nesse âmbito de comprometimento com o justo , com
a correção , com a efetividade e a presteza da prestação jurisdicional, o due process of
law
realiza, entre outras, a função de um superprincípio, coordenando e delimitando todos os
demais princípios que informam tanto o processo como o procedimento. Inspira e torna
realizável a proporcionalidade e razoabilidade que deve prevalecer na vigência e harmonização
de todos os princípios do direito processual de nosso tempo. Como justo, para efeito da nova
garantia fundamental, não se pode aceitar qualquer processo que se limite a ser regular no
plano formal. Justo, como esclarece Trocker, é o processo que se desenvolve respeitando os
parâmetros fixados pelas normas constitucionais e pelos valores consagrados pela
coletividade. E tal é o processo que se desenvolve perante um juiz imparcial, em contraditório
entre todos os interessados, em tempo razoável, como a propósito estabelece o art. 111 da
Constituição . Prossegue o Autor afirmando que No plano substancial, o processo justo deverá
proporcionar a efetividade da tutela àquele a quem corresponda à situação jurídica amparada
pelo direito aplicado à base de critérios valorizados pela equidade concebida, sobretudo, à luz
das
garantias e d
os princípios constitucionais. ,
op. cit.,
p. 24 e 26.
168
vai servir para se analisar a observância ou a inobservância da garantia
constitucional do devido processo legal, projetada também sobre a arbitragem.
Na arbitragem, a definição dos atos processuais e de sua forma está no
princípio
da autonomia privada, devendo garantir a igualdade de participação
das partes. Este controle deve ser feito, ao me
nos num primeiro momento, pelo
árbitro, sob pena, de não ser observado o devido processo legal
273
, ou seja, é
próprio da função do árbitro verificar se a regra eleita pelas partes respeita aos
princípios processuais. Caso o árbitro perceba que as regras escolhidas estão
em confronto com o devido processo legal, a mesma será nula e conseqüência
imediata é a sua
desconsideração.
Verifica
-se, portanto, neste caso, um limite
à autonomia privada, qual seja, o da ampla autonomia para estabelecer o
procedimento arbitral.
Corrobora com esta posição Rafael Francisco Alves
274
:
Arbitragem é, pois, liberdade. Dizer que ela tem uma origem contratual
é dizer que está fundada sobre o princípio da autonomia privada.
Autonomia privada, substrato de qualquer negócio jurídico, é o poder
de autoregulamentação de interesses particulares. É por meio do
exercício dessa autonomia que os interessados não apenas optam pela
arbitragem, como também definem todo o seu modo de ser. Em termos
mais simples, a arbitragem será, via de regra, como as partes de
comum acordo quiserem que ela seja. Mas não existe liberdade
ilimitada. Por isso, também o poder que os interessados possuem de
disciplinar o modo de ser da arbitragem encontra certos limites
impostos pela lei. Aliás, a própria autonomia privada é um poder
conferido pela lei e a ela deve se submeter. O primeiro limite diz
respeito ao âmbito de aplicação da arbitragem, a chamada
arbitrabilidade objetiva: a autonomia privada deve ser exercida no
âmbito dos direitos patrimoniais disponíveis, conforme estatui o artigo
primeiro da lei 9.307/96. O segundo limite são as chamadas normas
cogentes ou imperativas que visam a proteger um interesse público,
273
Uma vez que compete ao arbitro analisar a nulidade da cláusula integralmente, conforme
dispõe o
caput
e parágrafo único do artigo da lei 9.307/963, a ele compete analisar a
nulidade
de apenas uma parte dessa cláusula.
274
ALVES, op. cit., p.387
-
388.
169
como aquelas que dizem respeito à ordem pública. Pelo visto, não se
pode confundir o conceito de disponibilidade com o conceito de ordem
pública. Mesmo na esfera dos direitos disponíveis pode ser necessária
a aplicação de normas de ordem pública, sem que isso impeça a
utilização da arbitragem (também o árbitro tem o dever de aplicar as
normas de ordem pública e as p
artes de se submeterem a elas).
Em suma a arbitragem está envolvida por uma dicotomia: de um lado a
autonomia privada e do outro o devido processo legal. Não se nega a
existência de uma ampla liberdade conferida às partes para regularem
o
procedimento da arbitragem, mas o que se pretende é demonst
ra
r que a
obediência ao devido processo legal é um imperativo de ordem pública e que a
sua inobservância acarreta a nulidade de uma eventual sentença arbitral
.
Para
Humberto Theodoro
Junior
275
:
A garantia do devido processo legal, porém, não se exaure na
observância das formas da lei para a tramitação das causas em juízo.
Compreende algumas categorias fundamentais como a garantia do
juízo natural (CF, art. 5º, inc. XXXVII) e do juiz competente (CF, art. 5º,
inc. LIII), a garantia de acesso à Justiça (CF, art. 5º, inc. XXXV), de
ampla defesa e contraditório (CF, art. 5º, inc. LV) e, ainda, a de
fundamentação de todas as decisões judiciais (art. 93, inc. IX).
Cabe,
então a analise da arbitragem no contexto do contraditório, da
onde, podemos extrair que é dever do arbitro de ouvir e dar iguais
oportunidades de defesa para todas as partes envolvidas durante todo o
procedimento arbitral.
Para
Alexandre
Freitas
Camara
276
:
ao afirmar a lei de arbitragem que o procedimento arbitral deve ser
realizado em contraditório (o que faz dele um mero procedimento
transformando
-se em processo), impõe-se a estrita observância deste
275
THEODORO JUNIOR,
op. cit.,
p. 24.
276
CAMARA
,
op. cit.,
p.
76
.
170
principio, segundo o qual as partes deverão tomar conhecimento de
todos os atos e termos do process
o
,podendo ainda
manifestar
-
se sobre
os mesmos.
Nesses termos, existem basicamente dois elementos integrantes deste
princípio: de um lado, a ciência ou informação de todos os atos processuais e,
de outro, a oportunidade de reagir aos mesmos.
E continua Alexandre
Freitas
Camara
277
:
assegura
-se com isto, a participação efetiva dos interessados na
formação do provimento que ora solucionar o conflito de interesses
existentes entre os litigantes.
Neste sentido, também o árbitro deverá oferecer iguais possibilidades de
defesa e de participação a ambas as partes e igualmente deverá ouvir,
cientificar e dar oportunidade de reação aos envolvidos,
conforme ensina Cezar
Fiuza
278
:
toda
prova apresentada ou recolhida, todo fato que ocorra no
transcorrer do processo deverá ser notificado pelas
partes
, para que
eles tomem conhecimento e s
obre eles possa se manifestar.
Um
a crise, clara, entre o principio do contraditório e arbitragem
diz
respeito aos poderes instrutórios do árbitro.
Segundo
Carlos Alberto
Carmona
279
:
277
CAMARA,
op. cit.,
p. 76
278
FIUZA,
op. cit.,
p.138
279
CARMONA,
op. cit.,
p. 259
260.
171
da mesma forma que o juiz togado, o árbitro devera instruir a causa, ou
seja, prepará-la para decisão, colhendo provas
úteis
, necessária e
pertinentes para form
ar o seu convencimento.
Pode ocorrer que uma parte não compareça a uma audiência para
prestar depoimento pessoal determinado pelo árbitro. Uma vez que o árbitro
não detém poder de coação, ele deverá se socorrer do Poder Judiciário para
que a parte preste depoimento, pois, mesmo com todos os seus poderes
instrutó
rios não tem autoridade para aplicar pena de confissão e, por
conseguinte, admitir como verdadeiros os fatos alegados pela parte
contraria
280
. A aplicação da pena de confissão, neste caso, fere o principio do
contraditório pela falta de poder de coação do árbitro, ou seja, a parte ausente
tem
o
direito de ser ouvida judicialmente.
Para Rafael
Francisco Alves
281
:
Da mesma forma que ocorre com o juiz togado, é também salutar a
ampliação dos poderes instrutórios do árbitro. Ao contrário do que
possa parecer, essa ampliação não significa necessariamente uma
afronta ao princípio do contraditório, pois, é uma forma de garantir
o
equilíbrio entre as partes.
Os
atos cometidos em excesso pelo árbitro, afrontando, assim, o
princí
pio do contraditório e da igualdade entre as partes encerram a nu
lidade
da sentença arbitral. É certo, porém, que limitação da arbitragem em razão dos
princípios, especialmente do devido processo legal,
não é tarefa fácil, tendo em
vista sua carga de subjetividade, no entanto, este esforço é válido, pois a
280
No sentido oposto, Carlos Alberto Carmona entende que os árbitros, em tal
hipótese,
levarão em conta o procedimento da parte (procedimento não colaborativo, refratário,
até
mesmo suspeito) no momento de julgar, aplicando-se as regras de experiência e
fundamentando as conclusões que podem tirar da evasiva conduta da parte dentro do contexto
do conjunto probatório .
op. cit.,
p.
262
-3.
281
ALVES,
op. cit.,
p.
406
407
.
172
limitação da autonomia da vontade das partes apenas contribui para um
p
rocedimento arbitral mais justo, essência do próprio instituto.
173
CONCLUSÃO
A arbitragem esta em evidência no Brasil. Cada dia novas
câmaras
de
arb
itragem iniciam suas
atividades
, bem como, a sociedade intensifica a
procura pela via arbitral, indicando a necessidade de se garantir que os
preceitos da L
arb
sejam aplicados, sempre na busca pela segurança jurídica
das sentenças arbitrais.
O crescimento da arbitragem se deve a dois fatores: à lentidão do Poder
Judiciário
e
à confiança na via arbitral por aqueles que a utilizaram.
Tal
crescimento reflete na sua implantação nas grades curriculares em diversas
searas, entre elas, no Direito e na grande atenção que os operado
res do Direito
vêm
dedicando ao instituto na tentativa de compreender, não a sua
natureza,
mas, essencialmente,
os
seus limites, aspecto polêmico dentro de
uma atividade privada.
No que tange à lentidão do Poder
Judiciário
, a mesma é inquestionável.
As principais críticas à tutela jurisdicional do Brasil são a ineficiência do
Judiciário, o papel dos
juízes
e a insegurança de suas decisões
sempre
passí
veis de inúmeros recursos. No dizer do Ministro Sálvio de Figueiredo
Teixeira
282
, constitui-se preocupação e inquietação "ante a ineficiência das
decisões judiciais, ensejadas pelo arcaísmo das organizações judiciárias e pela
282
Atualidades Nacio
nais, Repro 85, jan./mar. 1997.
174
inexistência de órgãos permanentes de planejamento e reflexão no universo
estatal do judiciário"
.
Notadamente, a demora nas decisões traz um risco adicional às partes,
que convivem com as incertezas de terem suas questões decididas por
juízes
muitas vezes inexperientes e sobrecarregados de processos. O alto
custo dos pleitos também é um dado importante que dificulta o acesso à
Justiça. O excesso de formalismo e a sacramentalização do rito processual,
manifesto de todos aqueles que participam do sistema e os procedimentos
emperrados, descritos nos nossos digos, fazem com que o processo perca
seu objetivo, que é conhecer a verdade dos fatos e determinar, em função
disto, os direitos que cada uma das partes em conflito possui, afastando
qualquer medida protelatória. Esta discussão não é nova e era tema de um
brocardo latino: "summum jus summa in jur
ia
"
- o excesso de formalismo
processual leva à injustiça.
Quanto
à confiança da sociedade na arbitragem, deve ser considerado
que
, diante do aumento da complexidade de determinadas relações jurídicas
na sociedade moderna e da necessidade de uma r
esolução
mais célere dos
feitos
, os litigantes optam por mecanismos alternativos para a solução de
conflitos.
Ao encontrar
em
a arb
itragem
, se deparam com procedimento ágil e
eficaz onde prevalece a autonomia da vontade, inclusive na escolha dos
árbitros e regras d
e procedimento.
175
Em nenhum momento deste trabalho procuramos diminuir a importância
da arbitragem no contexto nacional. Entendemos ser a arbitragem a melhor via
na solução de conflitos por se tratar de uma atividade jurisdicional mais
democrática com a participação ativa dos interessados, o que, efetivamente, a
faz ficar muita próxima daquilo que se entende como ideal de justiça.
Ocorre que, justamente para proteger a arbitragem de árduas críticas de
seus opositores, bem como de uma eventual desvirtuação de sua essência,
é
que
se faz necessário que os limites previstos na L
arb
sejam observados.
Neste trabalho procuramos analisar estes limites.
Examinamos a questão histórica e da natureza arbitral.
Demonstramos
que deve prevalecer a natureza jurisdicional em que pese argumento
importante
contra esta posição.
Posteriormente,
observamos a importância dos
princípio
s constitucionais na arbitragem, bem como dos princípios específicos
,
sem os quais, o procedimento arbitral não pode ser reconhecido
,
em face da
nuli
dade da sentença arbitral. Tudo isso diante da eficácia dos princípios,
enquanto normas. Por último, nos debruçamos sobre a existência de uma crise
da arbitragem a partir da conf
ront
ação de alguns institutos, como a profunda
aná
lise da necessidade de se reconhecer matéria de ordem pública no
procedimento e da limitação da autonomia da vontade das parte
s em virtude do
devido processo legal.
O trabalho não t
em
a proposta de encontrar soluções, mas, acima de
tudo, apontar a necessidade de se limitar a arbitragem dentro da realidade
176
brasileira.
Tanto que discutimos a questão da súmula vinculante, tema árido,
poré
m de fundamental importância dentro da atividade do árbitro. É evidente
que a solução do problema recai na ação anulatória. Mas, deve ser perguntado
se o prazo de 90 dias previsto no art. 33 da L
arb
deve mesmo ser observado
ou é possível a propositura da ação além dele, se a anulação tiver por base os
pontos aqui desenvolvidos? A resposta deve ser enfrentada por todos os
operadores do Direito.
Nossa dedicação se deu no sentido de proteger as
câmaras
de
arbitragem sérias e vocacionadas existentes no Brasil, pois tendo em vista o
que anteriormente exposto, houve uma expansão do número de árbitros e
câmaras de arbitragem por todo o Brasil
283
.
Trata
-se de um fator positivo,
mas
se faz necessário o ajustamento de limites
,
a fim de evitar a utilização indevida
da arbitragem.
Daí, então, a limitação do tema à arbitragem interna. Sabemos da
importância da via arbitral para o direito internacional, mas, por outro lado, se
não ficarmos atentos à realidade da arbitragem brasileira, corremos o risco de
perder a confiança do próprio instituto, que tanto tempo é construída
.
283
O crescimento anual do número de profissionais que atuam como árbitros comerciais é um
reflexo do aumento da demanda da arbitragem, meio alternativo ao Poder Judiciário para a
resolução de conflitos. Hoje, mais de 1,3 mil exercem a arbitragem no País. E um dos motivos
que levam a arbitragem a ser mais rápida e eficiente do que a Justiça é a especialidade desses
julgadores. Ao contrário do que muitos pensam, os árbitros nem sempre são advogados.
economistas, engenheiros, administradores de empresas, médicos e contabilistas atuando na
arbitragem, o que garante conhecimento técnico sobre a questão a ser analisada. Hoje,
cerca de 130 câmaras de arbitragem em funcionamento no Brasil, de acordo com dados do
Conselho Nacional das Instituições de Mediação e Arbitragem (Conima). Segundo o presidente
do conselho, Cássio Telles Ferreira Netto, vêm surgindo cada vez mais câmaras
especializadas. "Devemos chegar a 200 câmaras em breve. não alcançamos esse número
ainda porque demora de 6 meses a 1 ano para uma câmara abrir e funcionar", explica.
177
Ignorar a importância da arbitragem interna, valorizando apenas a
internacional, significa fazer da arbitragem um reduto elitista. Entendemos que
a arbitragem pode ser aplicada a todos os casos, desde que atendidos seus
requisitos,
mesmo
aqueles que não sejam tão complexos.
A arbitragem não pretende e não pode substituir a atividade jurisdicional
do
Estado na sua totalidade, mas deve servir como opção da s
ociedade
brasileira. Para tanto, devemos divulgá-
la
e apresentá-la como alternativa na
busca pela solução de conflitos.
178
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