filosófica e a práxis
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, tema que ele retoma de Aristóteles. Conforme coloca Joel
Weinsheimer, a hermenêutica é explicada por Gadamer tendo como base a ética
aristotélica, pois a ética, “tal como a hermenêutica, envolve a questão do
conhecimento aplicado.”
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Para Duque-Estrada, compreensão para Gadamer
significa, portanto, “o processo de mútua compreensão que vai se desdobrando ao
longo da experiência (Erfahrung) de uma vida em comum que, sempre e
novamente, se preserva e se projeta para novas possibilidades.”
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De fato, podemos afirmar que a hermenêutica filosófica abre caminho para
novas experiências de verdade, que pode ser revelada em três momentos: o da
experiência marcada pelas estruturas ontológicas da arte, o do entendimento
histórico e o da linguagem. Assim, um dos temas desenvolvidos por Gadamer na
primeira parte de Verdade e Método, articulado com a questão da compreensão é
o conceito de jogo (Spiel), pois ele sustenta que o alcance universal e a dimensão
ontológica do jogo não devem ser ignorados. Como premissa de sua investigação
acerca do jogo, Gadamer parte da obra Homo Ludens (1938), do antropólogo
holandês Johan Huizinga (1872-1945)
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e deste modo, a temática do jogo
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vai se
constituir como fio condutor da explicação ontológica. Como veremos, jogar e
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Gadamer define o âmbito prático da hermenêutica filosófica fazendo uma relação entre práxis
com a vida humana como um todo: “’Práxis’ exprime melhor, como o demonstrou especialmente
Joaquim Ritter, a forma de comportamento dos seres vivos, em sua mais ampla generalidade. A
práxis, como o ser vivo, está situada entre a atividade e o ‘encontrar-se em um estado ou situação’.
Como tal, não está limitada ao homem, que atua exclusivamente por livre escolha (prohairesis).
Práxis significa melhor realização da vida (energeia) do ser vivo, a quem corresponde uma ‘vida’ ,
uma forma de vida, uma vida que é levada a cabo de uma determinada maneira (bios). Também os
animais tem práxis e bios, isto é, uma forma de vida.” In: GADAMER, Hans-Georg. A Razão na
Época da Ciência, tradução de Ângela Dias. Rio de Janeiro, Tempo Brasileiro, 1983, doravante
referido como REC, p.59.
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WEINSHEIMER, Joel C. Gadamer’s Hermeneutics: A reading of Truth and Method, Yale
University Press, 1985, p.187, tradução minha.
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DUQUE-ESTRADA, Paulo Cesar. Limites da Herança heideggeriana: A Práxis na
hermenêutica de Gadamer. Revista Portuguesa de filosofia. A Idade Hermenêutica da Filosofia:
Hans-Georg Gadamer. Faculdade de Filosofia de Braga, 2000, p.520.
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Johan Huizinga tem como objeto de seu estudo o jogo como forma específica de atividade,
‘como forma significante’, como função social. No prefácio de Homo Ludens ele afirma: “Já há
muitos anos que vem crescendo em mim a convicção de que é no jogo e pelo jogo que a
civilização surge e se desenvolve. É possível encontrar indícios dessa opinião em minhas obras
desde 1903. (...) Assim, jogo é aqui tomado como fenômeno cultural e não biológico, e é estudado
em uma perspectiva histórica, não propriamente científica em sentido restrito”. HUIZINGA,
Johan. Homo Ludens: o jogo como elemento da cultura, tradução de João Paulo Monteiro. São
Paulo: Ed. Perspectiva, 2004, grifos meus.
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Tal temática, também é desenvolvida por Gadamer em Conferência feita em 1974 na
Universidade de Salzburgo intitulada: A Atualidade do Belo: A arte como jogo símbolo e festa
(Die Aktualität des Schönen, Kunst als Spiel, Symbol und Fest), onde ele afirma ser necessário
considerar o jogo “uma função elementar da vida do homem, de tal sorte que a cultura humana,
sem um elemento de jogo, é impensável”, AB, p.38, grifos meus.