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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO
PUC/SP
Eneias de Almeida Prado
Alunos que completaram um curso de extensão em
Álgebra Linear e suas concepções sobre base de um
espaço vetorial
MESTRADO EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA
SÃO PAULO
2010
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1
PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO
PUC/SP
Eneias de Almeida Prado
Alunos que completaram um curso de extensão em
Álgebra Linear e suas concepções sobre base de um
espaço vetorial
Dissertação apresentada à Banca Examinadora da
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, como
exigência parcial para obtenção do título de MESTRE
EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA, sob a orientação da
Professora Doutora Silvia Dias Alcântara Machado.
SÃO PAULO
2010
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Banca Examinadora
3
Autorizo, exclusivamente para fins acadêmicos e científicos, a reprodução
total ou parcial desta Dissertação por processos de fotocopiadoras ou
eletrônicos.
Assinatura: Local e Data:
A minha avó Guilhermina, pela sua história de vida,
que com paciência, sempre quando lhe peço, não
cessa de me contar.
A meus pais, Antonio e Tereza, pelo amor, carinho e
pela confiança depositados durante toda minha
trajetória como estudante.
A minha esposa, Livian, pelo carinho, paciência,
compreensão e dedicação.
AMO MUITO TODOS VOCÊS.
5
AGRADECIMENTOS
A Deus, pelo direito de ter sua companhia em meu caminhar.
À Professora Doutora Silvia Machado, pela paciência,
compreensão, ensinamentos, dedicação e o mais importante,
muitos momentos de discussões que permitiram meu
crescimento profissional.
Aos membros da banca, Professoras Doutoras Angela
Marta Savioli, Bárbara Bianchini e Karly Alvarenga, que
leram a primeira versão e contribuíram para a finalização
deste trabalho.
À Professora Doutora Maria Trigueiros, pela oportunidade
de tê-la conhecido e discutido aspectos sobre a Teoria APOS.
Aos sujeitos desta pesquisa, pela colaboração.
Aos colegas do GPEA, pelas inúmeras segundas-feiras, em
que discutimos os trabalhos uns dos outros, proporcionando,
assim, o crescimento de todos.
Aos professores do Programa de Estudos Pós-graduados
em Educação Matemática da PUC-SP, pois aprendi muito
com eles, seja em sala de aula, nas reuniões de colegiado ou
em bate-papo pelo corredor.
Aos amigos, Jean, Maurício e Lucimar, com certeza, os
vários sábados e feriados na PUC, em Embu-Guaçu ou em
São Bernardo, serão inesquecíveis, aliás, o apoio de vocês
durante o período em que me preparava para o casamento,
foi fundamental, obrigado.
Ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e
Tecnológico CNPq pela bolsa concedida que possibilitou
minha dedicação exclusiva a este trabalho.
Aos funcionários da PUC-SP, pelo zelo com a instituição,
pois, com certeza, isso torna o ambiente favorável para
exercer um bom trabalho. E claro, em especial, ao
Francisco, pelas conversas e momentos de descontração.
Aos colegas de curso que compartilharam suas histórias de
sala de aula e experiências de vida.
Aos amigos que fiz durante o curso, Ana Rebeca, Gilson,
Harryson, Juliano, Luciane e Rafael.
Aos amigos e professores da Universidade Estadual de
Londrina UEL –, pois foram eles que me incentivaram a
prosseguir nos estudos.
Aos amigos e professores, Friaza, Milton e Wellington.
A meus pais, com muito amor e carinho, sempre confiaram e
acreditaram no meu sonho, amo vocês!
A meu amor, minha esposa, minha companheira de todos
os dias que compreendeu e auxiliou-me nessa caminhada.
A meus irmãos e familiares que, de alguma forma, torcem
por mim e também compartilham desse sonho.
À família Caetano que sempre me abraçou e torceu por
mim.
Enfim, a todas as pessoas que, de alguma forma,
colaboraram na efetivação desse sonho.
7
RESUMO
Este estudo teve o objetivo de identificar a concepção de base de um IR-espaço
vetorial finitamente gerado de alunos que concluíram um curso de extensão em
Álgebra Linear. A relevância da pesquisa reside na importância atribuída a essa
disciplina na formação de profissionais das Ciências Exatas e afins, e na
necessidade de investigar seu ensino e sua aprendizagem, conforme opinião de
vários pesquisadores, como Dubinsky (1991; 2001); Dorier et al. (1997); Machado e
Bianchini (2009). Para tanto, utilizou-se o aporte da teoria APOS, desenvolvida por
Dubinsky e colaboradores que permitiu o refinamento de uma decomposição
genética para a noção de base que abordou os três pontos de vista dessa noção:
conjunto maximal de vetores linearmente independentes; conjunto minimal de
vetores gerador e a justaposição entre as duas anteriores. A coleta de dados foi
realizada por meio de entrevistas semiestruturadas a 10 sujeitos concluintes de um
mesmo curso de extensão, caracterizando-se como um estudo qualitativo de caso. A
análise realizada indica que cinco estudantes construíram uma concepção objeto e
incorporaram a noção de dimensão a seu esquema, utilizando indistintamente a
dimensão a uma das três noções de base. Um estudante mostrou ter construído
concepção processo e outro, concepção ação. Após dois cursos de Álgebra Linear,
os estudantes concebem base, sobretudo, como sendo um conjunto gerador
linearmente independente, e só dois dos entrevistados perceberam a equivalência
entre os pontos de vista abordados.
Palavras-chave: Álgebra Linear; Concepção de base; Estudantes;Teoria APOS.
ABSTRACT
The purpose of this study was to indentify the basis conception of the IR–vetorial
space finitely generated by students who concluded an extension course in Linear
Algebra. The relevance of the research is in the importance attributed to this
discipline in the professional education of Exact Sciences and others, and in the
need to investigate its teaching and its learning, according to the opinion of many
researchers, as Dubinsky (1991;2001); Dorier et al (1997); Machado e Bianchini
(2009). For such, the theoretical ground used was APOS, developed by Dubinsky
and collaborators that allowed the refinement of a genetical decomposition for the
notion of basis which approached three points of view from this notion: maximal
group of vectorials linearly independent; minimal group of generating vectors and
justaposition between the two latters. The data survey was held by semistructured
interviews to 10 subjects graduating from the same extension course, characterizing
it as a qualitative case study. The analysis held indicates that five students built an
object conception and incorporated the notion of dimension to their scheme, using
indistincvely the dimension to one of three notions of basis. A student was able to
build a process conception and another, an action conception. After two courses of
Linear Algebra, the studens conceived basis, mainly, with being the independent
linearly generating group, and only two of the interviewed perceived the equivalence
among the points of view approached.
Keywords: Linear Algebra, Basis Conception; Students; APOS Theory.
9
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO .................................................................................................................. 11
CAPÍTULO 1 ..................................................................................................................... 15
PROBLEMÁTICA E OBJETIVO ..................................................................................... 15
Motivações para o estudo ............................................................................................................................. 15
Delimitação do problema .............................................................................................................................. 17
As questões e o objetivo do estudo ............................................................................................................ 22
CAPÍTULO 2 ..................................................................................................................... 25
ESCOLHAS TEÓRICAS .................................................................................................. 25
A Teoria APOS ............................................................................................................................................... 25
Os tipos de abstrações reflexionantes ........................................................................................................ 29
Mas em que consiste a Teoria APOS?....................................................................................................... 31
Elementos observados em pesquisas afins ............................................................................................... 37
CAPÍTULO 3 ..................................................................................................................... 45
ESCOLHAS METODOLÓGICAS ................................................................................... 45
Abordagem metodológica ............................................................................................................................. 45
O método de coleta de dados ...................................................................................................................... 48
Procedimentos metodológicos ..................................................................................................................... 50
CAPÍTULO 4 ..................................................................................................................... 53
ANÁLISE TEÓRICA ......................................................................................................... 53
A noção de base de um espaço vetorial em dois livros ........................................................................... 53
A decomposição genética de Euán (2007) e Euán et al. (2008) ............................................................ 60
Refinamento da decomposição genética apresentada ............................................................................ 64
Expansão da decomposição genética ........................................................................................................ 74
Roteiro utilizado nas entrevistas .................................................................................................................. 85
CAPÍTULO 5 ..................................................................................................................... 95
AS ENTREVISTAS E SUAS ANÁLISES ....................................................................... 95
Entrevista com Carol ..................................................................................................................................... 96
Entrevista com Rodolfo ............................................................................................................................... 103
Entrevista com André .................................................................................................................................. 109
Entrevista com Bruno .................................................................................................................................. 117
Entrevista com Lucas .................................................................................................................................. 123
Entrevista com Mariana .............................................................................................................................. 129
Entrevista com o Fernando ........................................................................................................................ 135
Entrevista com Daniel ................................................................................................................................. 139
Entrevista com Juliano ................................................................................................................................ 146
Entrevista com Thaís ................................................................................................................................... 151
Um olhar panorâmico das entrevistas ...................................................................................................... 155
CAPÍTULO 6 ................................................................................................................... 167
CONSIDERAÇÕES FINAIS ........................................................................................... 167
REFERÊNCIAS ............................................................................................................... 173
ANEXOS .......................................................................................................................... 179
ANEXO 1 – Convite para participar da entrevista ................................................................................... 179
ANEXO 2 – Lista com as ações, processos e objetos. .......................................................................... 180
ANEXO 3 – Roteiro para as entrevistas ................................................................................................... 183
ANEXO 4 – Encartes ................................................................................................................................... 185
11
INTRODUÇÃO
A disciplina Álgebra Linear no decorrer dos anos alcançou seu papel de
destaque no estudo de Matemática. Segundo Dubinsky (2001), sua importância está
atrelada às aplicações na própria Matemática, como por exemplo, no caso do
Cálculo com múltiplas variáveis, no qual a derivada é quase incompreensível sem a
utilização de matrizes e transformações lineares, no estudo das equações
diferenciais lineares, na geometria diferencial e na análise funcional.
No entanto, essa disciplina traz consigo a teoria axiomática dos espaços
vetoriais que, segundo Dorier (1990), é uma descoberta do final do século XIX que
teve seu desenrolar, após 1920, cujas noções imbricadas a Álgebra Linear
assumiram um caráter polimórfico, pois elas apareceram, ainda que implicitamente
em diferentes áreas, como por exemplo, nos sistemas de equações lineares, na
geometria, na aritmética, nas transformações lineares, etc.
Assim, essa disciplina constituiu-se essencialmente em razões de uma
organização, unificação e simplificação das áreas de estudo, com diferentes
ferramentas e métodos semelhantes. Por isso,
[...] não é de se espantar que seja difícil ao estudante compreender,
desde o início de seu estudo de Álgebra Linear, a generalização e a
unificação que o conceito de espaço vetorial trouxe para a
Matemática como um todo, pois a forma axiomática da definição de
espaço vetorial, por si só, não lhe revela esses aspectos (MACHADO
e MARTINS, 2003, p.3).
Na Pontifícia Universidade Católica de o Paulo, um grupo de pesquisa
que desenvolve um subprojeto dedicado especificamente à Álgebra Linear, a saber,
o Grupo de Pesquisa em Educação Algébrica GPEA –. Assim, ao ingressar no
programa, incorporei-me ao GPEA e iniciei minha pesquisa que está atrelada ao
subprojeto: Em busca de situações propícias para a aprendizagem de conceitos
básicos de Álgebra Linear”. Esse subprojeto tem como objetivo desenvolver
Eneias Prado Introdução
12
pesquisas relacionadas às noções elementares de Álgebra Linear, isto é, investigar
o ensino e a aprendizagem dessa disciplina em cursos das Ciências Exatas e afins.
Desse modo, esta pesquisa foi organizada em seis capítulos, mais as
referências e os anexos.
No capítulo 1, descrevo a problemática que me conduziu às questões de
pesquisa e ao objetivo, ou seja, que foi identificar a concepção que os alunos que
concluíram um curso de Álgebra Linear têm sobre a noção de base de um espaço
vetorial. Este objetivo é fruto de minhas reflexões sobre as questões: Qual o
caminho que um indivíduo deve trilhar ao construir a noção de base de um IR-
espaço vetorial finitamente gerado? Como os alunos, ao concluírem um curso de
Álgebra Linear, concebem a noção de base de um IR-espaço vetorial finitamente
gerado? Como um aluno que concluiu, pelo menos, um curso de Álgebra Linear
correlaciona as noções elementares desta disciplina?
Para abarcar essa problemática, no capítulo 2, apresento o referencial teórico
que suporte ao desenvolvimento deste estudo, isto é, a Teoria APOS de
Dubinsky e seus colaboradores, sobretudo, baseei-me nos artigos de Dubinsky e
Lewin (1986) e Asiala et al. (1996). Neste capítulo, também apresento resultados de
pesquisas que utilizaram, como aporte teórico a ideia de alavanca-meta, sugerida
por Dorier et al. (1997).
Já, no capítulo 3, apoiado em Bogdan e Biklen (1994) e Lüdke e André
(2001), descrevo as escolhas metodológicas adotadas. Isto é, optei por uma
pesquisa qualitativa, especificamente, por um estudo de caso que é característico
desta metodologia. Os métodos utilizados na coleta dos dados foram: entrevistas
semiestruturadas, mensagens trocadas, anotações feitas por mim e protocolos
produzidos pelos entrevistados, ambos durante as entrevistas. Ainda nesse capítulo,
descrevo os procedimentos metodológicos que segui durante a pesquisa.
No capítulo 4, apresento o desenrolar da noção de base de um espaço
vetorial em dois livros de Álgebra Linear, Callioli et al. (1995) e o de Coelho e
Lourenço (2001); a decomposição genética da noção de base de um espaço vetorial
proposta por Euán (2007) e Euán et al. (2008); um refinamento dessa decomposição
genética; uma expansão propiciada por esse refinamento; e, para finalizar, a
descrição e análise do roteiro que utilizei durante as entrevistas.
Eneias Prado Introdução
13
No capítulo 5, descrevo e analiso cada uma das entrevistas realizadas.
Primeiro, fiz uma análise “vertical” das entrevistas e, posteriormente, uma análise
“horizontal”.
No capítulo 6, apresento as minhas considerações finais sobre o estudo, às
respostas que obtive para minhas questões de pesquisa e as questões e reflexões
que surgiram ao longo da elaboração deste texto.
Na versão impressa, destaco o anexo 4, nele o leitor terá acesso a dois
encartes. No primeiro, apresento uma lista com todas as ões, processos e objetos
que foram iluminados durante a análise teórica. No segundo, apresento o roteiro
utilizado nas entrevistas. na versão digital, o leitor terá os anexos 2 e 3, também,
listo essas ações, processos e objetos e apresento o roteiro utilizado para as
entrevistas.
Eneias Prado Introdução
14
15
CAPÍTULO 1
PROBLEMÁTICA E OBJETIVO
“Um problema de pesquisa é um problema!
(LAVILLE e DIONNE, 1999, p.85)
Neste capítulo, apresento a problemática que me levou a desenvolver este
trabalho, isto é, o quadro no qual se situa o problema de pesquisa. Pautado nesta
problemática, delimito os objetivos da pesquisa.
Motivações para o estudo
Minha descrição inicia-se, na época em que cursava o bacharelado em
Matemática, pois, uma das poucas disciplinas em que sentia dificuldade era à
Álgebra Linear, não via sentido naquele conteúdo! No entanto, com o desenrolar da
graduação, percebi a importância das ferramentas que a Álgebra Linear fornecia ao
tratar, por exemplo, dos problemas que envolviam equações diferenciais.
Dubinsky (2001) comenta a importância da Álgebra Linear em aplicações na
própria Matemática, como por exemplo, no caso do Cálculo com múltiplas variáveis,
no qual a derivada é quase incompreensível, sem a utilização de matrizes e
transformações lineares, no estudo das citadas equações diferenciais lineares, na
geometria diferencial e na análise funcional.
Minha percepção, como estudante, foi a de que as ferramentas fornecidas
pela Álgebra Linear, para o desenvolvimento de outras disciplinas da Matemática,
não eram facilmente identificadas e, por conseguinte, não eram empregadas pelos
estudantes da licenciatura que não lhe atribuíam a importância devida à disciplina.
Eneias Prado Capítulo 1: Problemática e Objetivo
16
Esses fatos despertaram meu interesse para investigar quais as contribuições
da Álgebra Linear na formação inicial do professor de Matemática e, também,
levaram-me a pensar, como podem ser superadas as dificuldades desses futuros
professores em um curso inicial de Álgebra Linear.
Ao terminar a graduação, essas questões conduziram-me ao programa de
pós-graduação em Educação Matemática da Pontifícia Universidade Católica de São
Paulo – PUC/SP –, pois, nesta instituição, um grupo de pesquisa que desenvolve
um subprojeto dedicado especificamente à Álgebra Linear, a saber, o Grupo de
Pesquisa em Educação Algébrica – GPEA –.
Desta forma, ao ingressar no programa, incorporei-me ao GPEA e tomei como
orientadora Silvia Machado que desenvolve pesquisas ligadas ao subprojeto: Em
busca de situações propícias para a aprendizagem de conceitos
1
básicos de Álgebra
Linear”.
O grupo concentra seus estudos, sobretudo, na linha de pesquisa:
“Matemática na estrutura curricular e formação de professores”, visando responder à
questão: Qual a Álgebra a ser ensinada na formação de professores?
Na procura de elementos para responder a tal pergunta, um dos subprojetos
que se constituiu no GPEA foi sobre o desenvolvimento da noção de base de um
espaço vetorial, finalizado, em 2006. O objetivo deste subprojeto foi o de identificar
os recursos-meta
2
utilizados por professores de Álgebra Linear, livros didáticos,
vídeos e programas computacionais que pretendiam apresentar a noção de base de
um espaço vetorial.
Após a identificação dos recursos-meta, buscava-se verificar quais deles
teriam potencialidade de se tornar uma alavanca para a compreensão de alguma
noção matemática pelo aluno. Caso se verificasse que algum recurso-meta auxiliou
1
A palavra conceito (ou noção) é utilizada, assim como para Sfard (1991), para expressar uma ideia
matemática em uso em sua forma ‘oficial’, ou seja, como uma construção teórica dentro do universo
formal da Matemática. No que segue, ao me referir a essas ideias matemáticas, utilizo a palavra
noção.
2
O termo recurso-meta passou a ser considerado pelo GPEA, a partir do trabalho de Oliveira (2005),
para designar o que o grupo francês coordenado por Jean Luc Dorier chamou, ora de
metaconhecimento matemático, ora de metamatemática. Assim, a este termo, recurso-meta,
considera-se “[...] as informações ou conhecimentos sobre a Matemática a ser aprendida que podem
envolver as operações matemáticas, seu uso e a própria aprendizagem da Matemática” (OLIVEIRA,
2005, p.20). Por este motivo, de agora em diante, irei sempre me referir ao termo metaconhecimento
matemático (metamatemática) como sendo recurso-meta, mesmo que o autor citado tenha utilizado o
termo metaconhecimento matemático (metamatemática).
Eneias Prado Capítulo 1: Problemática e Objetivo
17
a compreensão de um ou mais alunos esse era chamado de “alavanca-meta”
(DORIER et al., 1997).
Conforme Machado et al. (2008), do ponto de vista dos recursos-meta que se
tornam alavancas-meta para os estudantes, o subprojeto supracitado permitiu uma
rica discussão sobre a noção de base de um espaço vetorial. Mas vale ressaltar que
o assunto não se esgotou.
Com as reflexões proporcionadas pelo subprojeto descrito acima, constituiu-
se o atual subprojeto: Em busca de situações propícias para a aprendizagem de
conceitos básicos de Álgebra Linear. Por sua vez, este subprojeto tem como objetivo
desenvolver pesquisas relacionadas às noções básicas de Álgebra Linear, isto é,
investigar o ensino e a aprendizagem de Álgebra Linear em cursos das Ciências
Exatas e afins.
Delimitação do problema
Para entender melhor a seara em que estava adentrando, passei a estudar os
trabalhos desenvolvidos no âmbito da Educação Matemática que discutiam o ensino
e a aprendizagem de Álgebra Linear. Assim, verifiquei que as dificuldades
enfrentadas por meus colegas com o estudo de Álgebra Linear eram também
experimentadas por alunos do mundo inteiro, conforme conclusões de
pesquisadores, como Dorier et al. (1997), Machado e Martins (2003), Oliveira (2005),
entre outros.
Constatei, também, que as questões que me conduziram ao curso de pós-
graduação, eram um tanto quanto amplas e exigiam um refinamento. Na tentativa de
identificar e minimizar essas dificuldades, muitas pesquisas foram e estão sendo
desenvolvidas. Várias delas foram apresentadas no livro L’enseignement de
I’algèbre linéaire en question
3
de Dorier et al. (1997).
Uma das dificuldades apontadas pelos autores desse livro é que os alunos,
ao iniciarem um curso de Álgebra Linear, deparam-se com uma estrutura algébrica
axiomática que utiliza registros próprios, o que gera muita dificuldade de
compreensão durante a aprendizagem das noções elementares de Álgebra Linear.
3
O ensino de Álgebra Linear em questão. (Todas as traduções apresentadas no decorrer deste
trabalho são de minha autoria)
Eneias Prado Capítulo 1: Problemática e Objetivo
18
As noções elementares o são necessariamente as mais simples. No
contexto da Álgebra Linear, o termo elementar significa que são noções essenciais
para construir todas as demais noções de Álgebra Linear. Combinação linear,
dependência linear, base e dimensão são noções elementares de Álgebra Linear,
que, segundo Dorier et al. (1997), merecem a atenção dos pesquisadores em
Educação Matemática.
Machado e Martins constataram, por exemplo, que:
[...] não é de se espantar que seja difícil ao estudante compreender,
desde o início de seu estudo de Álgebra Linear, a generalização e a
unificação que o conceito de espaço vetorial trouxe para a
Matemática como um todo, pois a forma axiomática da definição de
espaço vetorial, por si só, não lhe revela esses aspectos (MACHADO
e MARTINS, 2003, p.3).
Afinal, esses autores descrevem que “a história do desenvolvimento da noção
de espaço vetorial revela as dificuldades vividas pelos estudiosos para passar da
concepção operacional
4
(de processo) para a estrutural
5
(de objeto matemático)”
(MACHADO e MARTINS, 1997, p.3). Segundo Sfard (1991), é a articulação entre
essas concepções, que são complementares que permitirá a construção de um
objeto matemático
6
.
Além dessa “dificuldade epistemológica”, a questão levantada por Dreyfus
(1991), ao dizer que, um típico curso de Matemática, sobretudo no primeiro ano
universitário, apresenta uma ementa elegantemente definida, e o professor,
geralmente, demonstra conhecê-la bem. O professor inclusive pensa em diversas
maneiras de abordar os conteúdos, de forma a estabelecer uma estrutura
“logicamente clara”; mas, o que faz, na prática, é escolher um número de teoremas a
serem provados e como suas aplicações podem ser desenvolvidas. O autor ainda
destaca que esse professor
4
Concepção operacional, termo cunhado por Sfard (1991), remete às construções dinâmicas,
sequenciais e detalhadas, concebidas como um processo computacional.
5
Concepção estrutural, termo cunhado por Sfard (1991), remete às construções estáticas,
integradoras, concebidas com base em objetos abstratos, que são construídas por sua vez com o
auxílio de outros objetos também abstratos.
6
Objetos matemáticos, segundo Chevallard (1991), são noções construídas em forma de definição,
ou por uma sequência de operações. Essas noções, geralmente, apresentam propriedades e
oportunidades de uso na própria Matemática.
Eneias Prado Capítulo 1: Problemática e Objetivo
19
[...] provavelmente distribui isso nas várias aulas disponíveis e falará
durante parte considerável dessas aulas, fazendo uso extensivo de
formalismos extraordinariamente convenientes, de domínio
específico da matemática envolvida (DREYFUS, 1991, p. 26-27)
7
.
Quando não, a abordagem pedagógica adotada é aquela citada por Dubinsky
(1997), em que é apresentado um exemplo, e os alunos são convidados a realizar
uma lista de exercícios similares. Conforme esse autor, o fato de os alunos não
compreenderem as noções, deve-se a não terem oportunidade de construir tais
noções. Isso vem corroborar com Dreyfus (1991), ao afirmar que um aspecto muito
importante da Matemática se perde quando o professor apresenta somente o
produto final, refinado e acabado, que assim o aluno não tem consciência das
abstrações que permitiram todo o desenvolvimento da Matemática.
Dubinsky afirma ainda
[...] estar convencido de que os estudantes desenvolvem a
compreensão conceitual, como resultado da reação a situações-
problema, fazendo construções mentais de objetos matemáticos e de
processos, e usando-os para dar sentido fora do problema e
tentando resolvê-lo (DUBINSKY, 1997, p.5)
8
.
O autor também menciona acreditar que existem evidências suficientes para
torná-lo mais do que um ponto de vista plausível e explica que “[...] antes de se
considerar estratégias pedagógicas, devem-se analisar epistemologicamente
aqueles conceitos específicos que causam dificuldades para os estudantes de
Álgebra Linear” (DUBINSKY, 1997, p. 5-6)
9
.
Com isso, o autor cita que é:
necessário determinar as construções mentais específicas que um
estudante deve realizar, a fim de compreender tais conceitos. Então,
7
[...] probably distribute these into as many class periods as are available and lecture during a
considerable part of these class periods, making extensive use of the strikingly convenient formalisms
of the specific domain of mathematics concerned.
8
I am convinced that students develop conceptual understanding as a result of responding to problem
situations by making mental constructions of mathematical objects and processes and using them to
make sense out of the problem and trying to solve it.
9
[…] before pedagogical strategies are considered, the particular concepts that give students difficulty
in linear algebra need to be analyzed epistemologically.
Eneias Prado Capítulo 1: Problemática e Objetivo
20
devem ser desenvolvidas estratégias pedagógicas que levem os
estudantes a fazer estas construções e usá-las para resolver
problemas (DUBINSKY, 1997, p. 6)
10
.
Dentre os trabalhos já realizados pelo GPEA, destaco o de Araújo (2002), que
teve como objetivo verificar como se desenvolveu a noção de base de um espaço
vetorial em três livros didáticos, utilizados por universidades tradicionais de São
Paulo.
Seguindo a sugestão de Dorier et al. (1997), a autora buscou por recursos-
meta que possam se tornar alavancas-meta para a aprendizagem de uma
determinada noção matemática e, em suas considerações finais, afirmou existirem
poucos recursos-meta sobre a noção de base de um espaço vetorial, passíveis de
se tornarem alavancas-meta ao estudante.
O trabalho de Padredi (2003) verificou os recursos-meta que surgem no
discurso de professores de Álgebra Linear sobre a noção de base de um espaço
vetorial, e quais desses recursos-meta podem ser destacados, como possíveis
alavancas-meta para o ensino e a aprendizagem dessa noção. Por meio de
entrevistas, a autora identificou não recursos-meta relativos à noção de base de
um espaço vetorial, mas também recursos relacionados a outras noções
elementares, isto é, combinação linear e dependência linear.
Sobre a noção de base de um espaço vetorial, considerada pelos
entrevistados, como uma noção prioritária em um curso de Álgebra Linear, Padredi
(2003) identificou recursos que permitem três abordagens: um conjunto maximal de
vetores linearmente independentes, um conjunto minimal de vetores geradores e
uma justaposição entre um sistema gerador e vetores linearmente independentes.
Um dos professores entrevistados pela autora afirmou, também, que
as noções introduzidas durante um primeiro curso, em especial a de
base, vai ‘clareando’ aos poucos para alguns alunos como, por
exemplo, quando trata de transformações lineares, sendo que cada
um tem a sua hora certa para compreender essa noção (PADREDI,
2003, p.71).
10
[…] is needed to determine the specific mental constructions that a student might make in order to
understand these concepts. Then, pedagogical strategies need to be developed that can lead to
students making these constructions and using them to solve problems.
Eneias Prado Capítulo 1: Problemática e Objetivo
21
Assim como observado por Araújo (2002), Padredi (2003) identificou a
retomada de uma noção matemática antiga para se ensinar uma nova, isto é, parte-
se da Geometria Analítica para introduzir noções de Álgebra Linear.
na pesquisa de Oliveira (2005), o olhar dado à disciplina de Álgebra Linear
é por outro ângulo, diferente dos que foram apresentados, ou seja, seu estudo
buscou verificar se o professor utilizava, em sala de aula, recursos-meta que
auxiliassem os alunos na apreensão das noções elementares de Álgebra Linear, e
se esses recursos-meta tornaram-se alavancas-meta para alguns dos alunos em
estudo.
O professor observado por Oliveira (2005) discutiu, nas primeiras aulas,
algumas ideias relacionadas à noção de base de um espaço vetorial. O fato permitiu-
lhe listar nove recursos-meta passíveis de se tornarem alavancas-meta aos alunos,
por exemplo: o uso de contraexemplos para mostrar que um conjunto não é um
subespaço de um espaço vetorial; a frase: “(...) umas das características mais
importantes (...)” (OLIVEIRA, 2005, p.91), utilizada pelo professor para tentar chamar
a atenção dos alunos para a importância da noção de combinação linear.
Outras pesquisas foram realizadas pelo GPEA, sendo dada ênfase à noção de
base, em razão de seu papel essencial no estudo da estrutura de um espaço vetorial
sobre um corpo. Segundo Machado e Bianchini (2009), essas pesquisas foram de
cunho documental e diagnóstico, podendo ser agrupadas em quatro modalidades:
estado da arte, análise de livros didáticos, análise do papel da Álgebra Linear em
diferentes cursos e análise de intervenções didáticas.
No entanto, com as leituras, em parte apresentadas, pretendo colaborar com
as pesquisas desenvolvidas no GPEA, ao verificar com as lentes de outro referencial
teórico, o da Teoria APOS (action, processes, object e schema)
11
de Ed Dubinsky, a
problemática existente no bojo da noção de base de um IR-espaço vetorial,
finitamente gerado.
Este referencial teórico define níveis de concepções relacionadas aos
conjuntos de representações e articulações expressadas pelo indivíduo ao trabalhar
com atividades matemáticas. Como afirma Sfard (1991, p.3)
12
, “as construções em
matemática avançada são totalmente inacessíveis aos nossos sentidos, ou seja,
11
Ação, processo, objeto e esquema.
12
[…] advanced mathematical constructs are totally inaccessible to our senses - they can only be
seen with our mind's eyes.
Eneias Prado Capítulo 1: Problemática e Objetivo
22
podem ser percebidas com os olhos da nossa mente”. A esse respeito, Dubinsky e
Lewin, afirmam:
[...] parece que nunca se terá acesso direto ao processo cognitivo
pois é uma atividade inconsciente da mente mas, no melhor caso,
acessa-se somente aquilo que um indivíduo pode articular ou
demonstrar no momento da própria percepção. Precisamente o que
ocorre no momento parece tão inacessível quanto essencial
(DUBINSKY e LEWIN, 1986, p.57)
13
Assim, o pesquisador deve ser atento e coletar informações que lhe permitam
descrever o tipo de concepção que o indivíduo demonstra possuir naquele instante.
No caso, da Teoria APOS, pode ser uma concepção ação, concepção processo ou
concepção objeto
14
.
Segundo Trigueros (2008), as construções dessas concepções não ocorrem,
necessariamente, de forma linear, pois um indivíduo pode possuir por certo tempo
concepções intermediárias ou ter uma concepção de um tipo para alguns aspectos
de uma determinada noção e, de outro, para certos aspectos dessa noção.
As questões e o objetivo do estudo
Assim, à luz da Teoria APOS, deparei-me com as seguintes questões:
Qual o caminho que um indivíduo deve trilhar ao construir a noção de
base de um IR-espaço vetorial finitamente gerado
15
?
Como os alunos, ao concluírem um curso de Álgebra Linear, concebem
a noção de base de um espaço vetorial?
13
It would seem one never has direct Access to cognitive processes thought is an unconscious
activity of mind but, at best, only to what an individual can articulate or demonstrate at the moment
of insight itself. Precisely what occurs at that moment seems as inaccessible as it is essential.
14
No capítulo 2, deste trabalho, abordo e exemplifico os termos concepção ação, concepção
processo e concepção objeto.
15
De agora em diante, ao dizer espaço vetorial refiro-me a um IR -espaço vetorial finitamente gerado.
Quando não for esse o caso, especifico qual é o espaço tomado.
Eneias Prado Capítulo 1: Problemática e Objetivo
23
Como um aluno que concluiu, pelo menos, um curso de Álgebra Linear
correlaciona as noções elementares desta disciplina?
Estas questões permitiram-me formular o seguinte objetivo: identificar a
concepção que os alunos que concluíram um curso de Álgebra Linear têm
sobre a noção de base de um espaço vetorial.
Assim, com as questões e o objetivo desta pesquisa descritos, no próximo
capítulo, apresentarei os pontos essenciais da Teoria APOS que me auxiliaram no
desenvolvimento desta pesquisa, como também os resultados de pesquisas que
forneceram subsídios às análises.
Eneias Prado Capítulo 1: Problemática e Objetivo
24
25
CAPÍTULO 2
ESCOLHAS TEÓRICAS
Os professores de matemática sempre consideraram a
compreensão, mais do que o conhecer ou ser habilidoso, como um
objetivo importante. A compreensão, quando está acontecendo, é um
processo que ocorre na mente do estudante; pode ser rápido, um
“Eureca!”, um clique da mente; frequentemente está baseada em
uma longa sequência de atividades de aprendizagem durante a qual
ocorrem e interagem grandes variedades de processos mentais
(DREYFUS, 1991, p.25)
16
.
Neste capítulo, apresento o referencial teórico que dará suporte ao
desenvolvimento do trabalho. O referencial Teoria APOS busca compreender o
processo que ocorre na mente do estudante ao se construir uma noção matemática.
Neste capítulo, também, apresento resultados de pesquisas relacionadas à
problemática descrita no capítulo anterior.
A Teoria APOS
Dreyfus (1991, p.25)
17
apresenta a compreensão do que se passa na mente
dos estudantes, como sendo uma das razões para se realizar investigações em
Educação Matemática, pois “[...] não é suficiente, por exemplo, definir e exemplificar
um conceito abstrato, como espaço vetorial. Os estudantes devem então construir as
propriedades de tal conceito por meio de deduções a partir da definição”.
16
Understanding, more than knowing or being skilled, has always been considered an important goal
by mathematics teachers. Understanding, as it happens, is a process occurring in the student’s mind,
it may be quick, an “Aha-Erlebnis”, a click of the mind; more often, it is based upon a long sequence of
learning activities during which a great variety of metal processes occur and interact.
17
[...] it is not sufficient, for example, to define and exemplify an abstract concept such as vector
space. Students must then construct the properties of such a concept through deductions from the
definition.
Eneias Prado Capítulo 2: Escolhas Teóricas
26
Ao se discutir a respeito dos processos envolvidos nas construções de
conhecimentos matemáticos, tem-se o pensamento matemático elementar e o
pensamento matemático avançado. Embora muitos processos de pensamento
matemático avançado estejam presentes no processo de pensamento matemático
elementar, pode-se distingui-los quanto à capacidade do sujeito em apresentar
definições e deduções formais. Para Dreyfus (1991), a diferença entre esses
processos de pensamentos matemáticos é tênue, sendo a complexidade de como se
trabalha com a noção uma das características que os distinguem.
Segundo Asiala et al. (1996), foi no seio do pensamento matemático
avançado que se desenvolveu o referencial teórico que passo a descrever, pois a
Teoria APOS constituiu-se da necessidade encontrada pelos pesquisadores que,
atualmente, compõem o grupo de pesquisa Research in Undergraduate Mathematics
Education Community
18
RUMEC –, em “[...] considerar os processos mentais pelos
quais novos conceitos abstratos são adquiridos” (DUBINSKY e LEWIN, 1986,
p.55)
19
.
Essa necessidade ocorreu pela percepção dos autores, Dubinsky e Lewin
(1986), de que o professor ao tentar ensinar uma nova noção está, na verdade,
induzindo o desenvolvimento cognitivo de seu aluno. Em razão da Epistemologia
Genética de Piaget ser uma “[...] descrição de como a estrutura cognitiva se
desenvolve ao longo do tempo de acordo com leis gerais” (p. 57)
20
, em que o
interesse é exclusivamente sobre o sujeito conhecedor que é tido como “sujeito
epistêmico”, os autores afirmam acreditar ser essa epistemologia, rica o suficiente
para fornecer uma estrutura que permita uma psicologia geral de instrução para a
Matemática pós-básica, universitária.
Dubinsky e Lewin, também, afirmam estar
implícita na análise de Piaget, a ideia de que o conhecimento e a
compreensão são adquiridos somente quando um sujeito epistêmico
adapta sua estrutura cognitiva existente, a esta da qual se torna
consciente, ao qual nos referiremos como ‘alimento cognitivo’. Os
alimentos são integrados fazendo as modificações necessárias em
18
Comunidade de pesquisa em Educação Matemática Universitária.
19
[...] to consider the mental processes by which new abstract concepts are acquired.
20
[...] describing how cognitive structures develop over time according to general rules.
Eneias Prado Capítulo 2: Escolhas Teóricas
27
uma ou mais estruturas cognitivas (DUBINSKY e LEWIN, 1986,
p.58)
21
.
A organização estabelecida pelo sujeito epistêmico para alocar o alimento
cognitivo se dá por meio da equilibração. Isto é,
a equilibração se refere a uma série de ações cognitivas realizadas
por um ‘conhecedor’ buscando compreender os alimentos cognitivos.
O alimento como tal, é experienciado como novo, resistente,
perturbador, desequilibrador termos que são ‘a grosso modo’
sinônimos para o sistema cognitivo do conhecedor (DUBINSKY e
LEWIN, 1986, p.60)
22
.
Nessa experiência de desequilíbrio, o sujeito epistêmico é motivado a se
reequilibrar. Nas palavras dos autores, esse processo chamado de assimilação, é
como se fosse “uma coceira que precisa ser coçada” (DUBINSKY e LEWIN, 1986,
p.60)
23
.
Assim, o sujeito epistêmico em busca do reequilíbrio utiliza operações
cognitivas previamente construídas, mas, “em geral, o alimento oferecerá resistência
para a assimilação, levando o conhecedor a modificar suas estruturas cognitivas (um
processo chamado de ‘acomodação’), até que o alimento seja experienciado não
mais como resistente” (DUBINSKY e LEWIN, 1986, p.60)
24
. Para os autores, nesse
ponto, o sujeito epistêmico compreende o alimento, e o sistema cognitivo reequilibra-
se, após ter se reconstruído e se reorganizado.
Para Dubinsky e Lewin (1986, p.59)
25
, a interpretação dada por Piaget para o
conhecimento, ou seja, o conhecimento, como interações do conhecedor com o
alimento cognitivo, mediada pela estrutura cognitiva, “são construídas desde o
princípio e sofrem mudanças sistemáticas de crescente diferenciação e integração
hierárquica” e, ainda,
21
[...] implicit in Piaget’s analysis is the Idea that knowledge and understanding are acquired only as
the epistemic subject applies its existing cognitive structures to that of which it become aware, which
we will refer to as ‘cognitive aliments’. Aliments are integrated by making the appropriate modifications
in one or more cognitive structures.
22
Equilibration refers to a series of cognitive actions performed by a knower seeking to understand
cognitive aliments. The aliment as such, is experienced as novel, resistant, perturbing, disequilibrating
– terms which are roughly synonymous – to the cognitive system of the knower.
23
[…] an itch that must be scratched.
24
In general, the aliment will offer resistance to assimilation, leading the knower to modify its cognitive
structures (a process called ‘accommodation’) until the aliment is no longer experienced as resistant.
25
[...] are constructed from the outset and undergo systematic changes of increasing differentiation
and hierarchic integration.
Eneias Prado Capítulo 2: Escolhas Teóricas
28
são métodos de ação sobre o mundo como um sistema organizado
de transformação. Elas são construídas progressivamente por meio
de interação com os alimentos cognitivos e progressivamente
reconstruídas como resultado das interações continuadas com os
últimos alimentos cognitivos, em um processo chamado de
‘abstração reflexiva’
26
(DUBINSKY e LEWIN, 1986, p.59)
27
.
Por sua vez, a abstração reflexionante é tida por Dubinsky e Lewin (1986,
p.61)
28-29
como “a forma de equilibração mais poderosa e cognitivamente mais
interessante”, pois “é aquela na qual uma estrutura cognitiva particular se reequilibra
de um distúrbio, submetendo-se a um grau maior ou menor de reconstrução”.
Dubinsky e Lewin descrevem duas facetas da abstração reflexionante, a
saber:
a primeira é um reflexo de uma ou mais estruturas sobre um plano
mais elevado no qual as estruturas funcionam em maior
generalidade, sendo aplicadas a novos alimentos que podem ser até
mesmo estruturas funcionando em planos mais baixos. A segunda é
a reconstrução dessas estruturas refletidas em novas estruturas que
são diferentes das antigas, embora importantes similaridades
possam continuar a ser evidentes (DUBINSKY e LEWIN, 1986,
p.61)
30
.
No que concerne à teoria APOS, discutirei somente os tipos de abstrações
reflexionantes analisadas por Piaget, das quais Dubinsky (1991) seleciona quatro,
pois as considera importantes para o desenvolvimento do pensamento matemático
avançado, e uma quinta que Piaget não considera, como uma abstração
reflexionante, mas Dubinsky (1991) acrescenta-a ao grupo, sendo elas:
interiorização, encapsulação, generalização, coordenação e reversibilidade. Estas
26
Abstração reflexiva também chamada de abstração reflexionante, conforme a chamou Piaget
(1977-a e 1977-b): abstraction réfléchissante. No decorrer deste trabalho utilizo o termo abstração
reflexionante para representar o processo que é dinâmico.
27
[...] are modes of action on the world which function as organized systems of transformation. They
are progressively constructed through interaction with cognitive aliments and progressively re-
constructed as a result of continued interactions with later cognitive aliments in a process called
‘reflective abstraction’.
28
The most powerful, and cognitively, the most interesting form of equilibration.
29
[…] is that in which particular cognitive structures re-equilibrate to a disturbance by undergoing a
greater or lesser degree of re-construction.
30
The first is a reflection of one or more structures onto a higher plane in which the structures function
in greater generality by being applied to new aliments which can even be structures functioning on
lower planes. The second is a reconstruction of these reflected structures into new structures that are
distinct from the old ones, although important similarities may continue to be apparent.
Eneias Prado Capítulo 2: Escolhas Teóricas
29
várias formas, nas quais a abstração reflexionante ocorre é, na verdade, alguma
combinação das duas facetas supracitadas.
Os tipos de abstrações reflexionantes
A interiorização verifica-se quando o sujeito é capaz de “usar símbolos,
linguagens, imagens e imagens mentais [...] para representar (...), isto é, para
construir processos internos, como forma de dar sentido às percepções sobre os
fenômenos observados” (DUBINSKY, 1991, p.101)
31
. No caso, o sujeito constrói
uma série de ações sobre um objeto matemático que podem ser executadas, em sua
mente, sem necessariamente realizar todas as indicações descritas durante a ação.
Um exemplo de interiorização ocorre na comutatividade da adição, na qual,
inicialmente, o indivíduo precisa realizar os cálculos para verificar que dois números
inteiros quaisquer, a e b adicionados, a+b e b+a, resultam no mesmo valor, e,
posteriormente, interioriza o fato de a+b=b+a.
Outro exemplo de interiorização, apresentado por Parraguez (2009), ocorre
quando inicialmente são dados uma operação binária
32
específica e os elementos
específicos de um conjunto a um indivíduo. Este, então, aplica essa operação
binária a esses elementos e observa seus efeitos, posteriormente, executa a
operação com outros elementos desse mesmo conjunto. Assim, interioriza a ação no
processo que lhe permite “pensar na maneira, como obtém os elementos calculados
mediante a aplicação de uma operação binária a qualquer elemento de um conjunto”
(PARRAGUEZ, 2009, p.62)
33
.
A encapsulação é descrita por Dubinsky (1991) como sendo, talvez, a mais
importante (na Matemática) e a mais difícil (aos estudantes), pois é a conversão de
um processo (dinâmico) em um objeto (estático). Para tanto, o indivíduo deve estar
consciente desse processo, como uma totalidade.
Um exemplo de encapsulação, segue ao anterior, pois Parraguez (2009)
afirma que um indivíduo ao pensar na maneira de obter os elementos de um
31
use symbols, language, pictures, and mental images, […] to represent (...), that is, to construct
internal processes as a way of marking sense out of perceived phenomena.
32
Parraguez (2009) afirma utilizar a expressão operação binária em um sentido geral. E que, está
consciente que em uma multiplicação por escalar, os elementos operados o provêm do mesmo
conjunto.
33
[...] pensar en la manera con que se están dando los elementos, resultante de aplicar una
operación binaria a cualesquiera elementos de un conjunto.
Eneias Prado Capítulo 2: Escolhas Teóricas
30
conjunto, calculados por meio de uma operação binária, pode encapsulá-los em um
objeto matemático, ou seja, um conjunto com uma operação binária. Isto é, o
processo que era dinâmico, passou a ser estático, pois o indivíduo, agora, possui um
conjunto com uma operação binária definida que lhe permite, por exemplo, verificar
certas propriedades.
A generalização, segundo Dubinsky (1991, p.101)
34
, ocorre quando um
sujeito “aplica um esquema existente para uma ou para uma vasta coleção de
fenômenos”, isto é, com base nas particularidades, o indivíduo pode induzir e
estender características comuns a um domínio de validade maior.
Um exemplo de generalização, segundo Parraguez (2009, p.52)
35
, ocorre
quando um indivíduo que conhece previamente os axiomas relacionados à operação
binária da adição, utilizados para verificar se um dado conjunto é um espaço vetorial,
toma o objeto conjunto com uma operação binária e percebe que “o esquema de
axiomas pode ser generalizado para incluir este objeto”, isto é, o indivíduo verifica se
esse conjunto com operação binária satisfaz os axiomas, para assim, dar lugar ao
novo objeto: conjunto com uma operação binária que satisfaz os axiomas.
A coordenação é “a composição ou a reorganização de dois ou mais
processos para construir um novo” (DUBINSKY, 1991, p.101)
36
. Nesse caso, pode-
se ter, também, a composição entre objetos para evidência um novo objeto (ou
processo), a composição entre ações para construir uma nova ação (ou processo)
ou, até mesmo, a composição de ações com processos (ou processos com objetos)
para construir uma nova ação (ou processo, ou objeto).
Um exemplo de coordenação é o do estudante que demonstra ter construído
o objeto conjunto com uma operação binária que satisfaz certos axiomas e o objeto
corpo. Esse estudante coordena tais objetos e verifica a possibilidade de se definir
uma nova operação binária, em que um elemento pertencente ao conjunto e um
elemento pertencente ao corpo (multiplicação por escalar) são considerados, e o
resultado dessa operação será um elemento pertencente ao conjunto. Segundo
Parraguez (2009, p.62)
37
, “isto é possível, pois o estudante construiu um conjunto
como sendo um objeto, então, podem ser definidas novas operações”.
34
[…] apply an existing schema to a wider collection of phenomena.
35
[…] el esquema de axiomas puede generalizarse para incluir este objeto.
36
[…] the composition or coordination of two or more processes to construct a new one.
37
[...] esto es posible porque el estudiante ha construido un conjunto como un objeto, entonces puede
definir nuevas operaciones.
Eneias Prado Capítulo 2: Escolhas Teóricas
31
Por último, a reversibilidade que foi incluída por Dubinsky (1991, p.102)
38
,
como uma forma adicional de construção, aparece definida como “um novo processo
que consiste em inverter o processo original”. Um exemplo de reversibilidade é o do
indivíduo que manipula as operações de exponenciação e radiciação, ou ainda, a
adição e a subtração.
Na Álgebra Linear, tem-se o caso de um indivíduo que, ao lhe ser
apresentado um conjunto pertencente a um espaço vetorial, ele verifica se esse
conjunto é uma base para esse espaço. Agora, o processo pode ser revertido, isto é,
apresenta-se um espaço vetorial, e o indivíduo deve obter um conjunto que seja
base desse espaço.
Esses tipos de abstrações reflexionantes foram apresentados de forma
particionada, mas, segundo Dubinsky e Lewin (1986, p.62)
39
, “é muito comum o
caso em que diferentes formas de abstração reflexionante podem ser combinadas”.
Mas em que consiste a Teoria APOS?
Segundo Asiala et al. (1996), a teoria APOS, também, pode ser adotada como
uma metodologia de pesquisa para o ensino de Matemática e o desenvolvimento
curricular. A abordagem pedagógica adotada por esta teoria, consiste no Ciclo ACE
(Activities, Class discussion, Exercises)
40
, em que os alunos trabalham em grupos
colaborativos. No entanto, irei assumir somente as características que permitem
explorar a problemática apresentada neste trabalho, isto é, o interesse sobre esse
referencial está subjacente à possibilidade de identificar as concepções construídas
pelos sujeitos desta pesquisa.
Contudo, os três componentes que compõem essa teoria, como metodologia,
são: a análise teórica, o planejamento e implementação e a observação e a
avaliação.
Conforme referem Asiala et al. (1996, p.7)
41
, a análise teórica consiste em
propor um modelo cognitivo, isto é, uma descrição específica das possíveis
38
[…] a new process which consists of reversing the original process.
39
[…] It is often the case that different forms of reflective abstraction can be combined.
40
Atividades, Discussão em Classe e Exercícios.
41
[…] a description of specific mental constructions that a learner might make in order to develop her
or his understanding of the concept.
Eneias Prado Capítulo 2: Escolhas Teóricas
32
construções mentais utilizadas por um aprendiz, a fim de desenvolver sua
construção sobre um conceito”. A esta análise, o grupo RUMEC denomina
Decomposição Genética da noção investigada que, em outras palavras, é
entendida como um conjunto de construções mentais que permitem ao indivíduo
construir noções matemáticas.
Segundo Dubinsky e Lewin (1986), a decomposição genética não representa
necessariamente a forma que um matemático praticante compreende as noções
matemáticas, mas, sim, um mapeamento da forma com que os estudantes formulam
empiricamente suas compreensões.
O componente planejamento e implementação está diretamente
relacionado à análise teórica, pois a partir dela o investigador desenvolve interações
que visam a fazer com que o aluno efetive tais construções. Em razão dos
interesses desta pesquisa, não realizo esta etapa, pois o pretendo fazer com que
os sujeitos construam uma noção, mas, sim, identificar quais noções eles podem ter
construído.
Prosseguindo, tem-se a observação e a avaliação, que estão relacionadas
com a coleta e análise de dados. Existem vários tipos de dados que podem ser
recolhidos em estudos no âmbito da Teoria APOS. Podem ser informações sobre os
alunos e do (s) curso (s) do qual participaram. Nos casos em que são reunidos
dados sobre os estudantes que já tenham concluído um determinado curso de
Matemática, a preocupação é com as concepções que esses alunos possuem sobre
uma noção matemática específica. Nesta pesquisa, é a noção de base de um
espaço vetorial.
Desta forma, a análise teórica serve de referência às observações e às
avaliações dos dados, da mesma maneira que as observações e as avaliações
servem para um possível refinamento da análise teórica. Assim, para Asiala et al. o
principal objetivo da análise de dados é:
estabelecer um paralelo entre as construções mentais, que vão
desde aqueles que aparentemente construíram muito pouco, aqueles
que construíram partes, e aqueles que demonstraram ter feito todas
Eneias Prado
as construções propostas pela análise teórica (
p.27)
42
A construção mental de uma noção matemática é descrita em Asiala
(1996), ao considerar que a compreensão começa na manipulação de objetos físicos
ou mentais em forma de
ações
que são encapsulados em
desencapsulados nos processos
as ações, os processos e os objetos podem ser organizados ou
esquemas. Vide Figura 1.
Figura 1
: Construção de um esquema, segundo a teoria APOS (DUBINSKY, 1991, p.107)
Observa-se que,
do
conhecimento matemático passa pelas etapas básicas:
esquema, não
necessariamente nesta ordem. Baseado em Dubinsky (1991)
et al. (1996),
apresento a interpretação que adoto para essas etapas.
A ação
é uma transformação executada pelo indivíduo sobre um objeto
matemático. Esse tipo de transformação é percebida
próprio
, isto é, a transformação é compreendida, como sendo uma reação a
indicações que fornecem informações precisas sobre os passos que devem ser
realizados.
Um exemplo de ação é a do aluno que
polinomial de primeiro grau, busca mais de dois pares ordenados que satisfaçam a
lei descrita pela função.
42
[…] establish a parallel spectrum of mental constructions, going from those who appeared to
construct very little, through those who constructed bits and pieces, to those who seemed to have
made all of the constructions proposed by the theoretical analysi
Capítulo 2:
Escolhas Teóricas
as construções propostas pela análise teórica (
ASIALA
42
.
A construção mental de uma noção matemática é descrita em Asiala
(1996), ao considerar que a compreensão começa na manipulação de objetos físicos
ações
. As ações são, então,
interiorizadas em
que são encapsulados em
objetos
matemáticos. Os objetos podem ser
desencapsulados nos processos
com base, nos quais,
foram formados e
as ações, os processos e os objetos podem ser organizados ou
reorganizados
: Construção de um esquema, segundo a teoria APOS (DUBINSKY, 1991, p.107)
do
ponto de vista dessa teoria, a construção do
conhecimento matemático passa pelas etapas básicas:
ação,
processo
necessariamente nesta ordem. Baseado em Dubinsky (1991)
apresento a interpretação que adoto para essas etapas.
é uma transformação executada pelo indivíduo sobre um objeto
matemático. Esse tipo de transformação é percebida
, c
omo algo exterior a ele
, isto é, a transformação é compreendida, como sendo uma reação a
indicações que fornecem informações precisas sobre os passos que devem ser
Um exemplo de ação é a do aluno que
,
para esboçar o gráfico de uma funçã
polinomial de primeiro grau, busca mais de dois pares ordenados que satisfaçam a
[…] establish a parallel spectrum of mental constructions, going from those who appeared to
construct very little, through those who constructed bits and pieces, to those who seemed to have
made all of the constructions proposed by the theoretical analysi
s.
Escolhas Teóricas
ASIALA
et al., 1996,
A construção mental de uma noção matemática é descrita em Asiala
et al.
(1996), ao considerar que a compreensão começa na manipulação de objetos físicos
interiorizadas em
processos
matemáticos. Os objetos podem ser
foram formados e
, finalmente,
reorganizados
em
: Construção de um esquema, segundo a teoria APOS (DUBINSKY, 1991, p.107)
ponto de vista dessa teoria, a construção do
processo
, objeto e
necessariamente nesta ordem. Baseado em Dubinsky (1991)
e Asiala
é uma transformação executada pelo indivíduo sobre um objeto
omo algo exterior a ele
, isto é, a transformação é compreendida, como sendo uma reação a
indicações que fornecem informações precisas sobre os passos que devem ser
para esboçar o gráfico de uma funçã
o
polinomial de primeiro grau, busca mais de dois pares ordenados que satisfaçam a
[…] establish a parallel spectrum of mental constructions, going from those who appeared to
construct very little, through those who constructed bits and pieces, to those who seemed to have
Eneias Prado Capítulo 2: Escolhas Teóricas
34
Outro exemplo de ão é apresentado em Oliveira (2005), quando o autor
solicitou que os entrevistados verificassem quais, dentre os conjuntos, ܣ =
{(1,2),(2,4),(3,6)}, ܤ = {(1,1,1),(3,-1,2),(0,-4,-1)}, ܥ = {(7,0,0,1),(0,1,1,0)} e
ܦ = {(0,0,0,0,0)}, eram linearmente dependentes. Como resposta, obteve que era o
conjunto A, pois ao “[...] somar o primeiro elemento do conjunto A com o segundo, a
gente tem o terceiro (OLIVEIRA, 2005, p.111). Isto é, o sujeito aparenta ter
executado a ação em que verifica a possibilidade de escrever um vetor, como sendo
combinação linear dos outros.
Um indivíduo pode executar uma ão, mas não está necessariamente
limitado a operar com ações. Mas, se limitar sua compreensão de uma dada noção à
realização de ações, diz-se que ele possui uma concepção ação para tal noção.
Um exemplo de um sujeito que demonstra possuir uma concepção ação, no
caso, para a noção de dependência linear de vetores de um conjunto, é observado
no seguinte trecho:
[...] eu acho que era quando, a partir de dois, combinando dois, dois
ou mais, combinando alguns elementos dentro do conjunto. Você
podia formar alguns elementos que estão dentro do conjunto. A partir
desse princípio, então, por exemplo, combinando esses dois eu
posso formar esse. Eu acho que é só o A (OLIVEIRA, 2005, p.113).
Esse sujeito demonstra possuir uma concepção ação para a noção de
dependência linear, pois, ao analisar os vetores pertencentes ao conjunto A,
aparentou ter utilizado a ação que lhe permite verificar a dependência linear de
vetores de um conjunto. No entanto, foram-lhe apresentados quatro conjuntos de
vetores, sendo três linearmente dependentes
43
, e ele deu indícios de reconhecer
o primeiro.
Uma concepção ação, embora seja limitada, constitui a essência da
construção de uma noção matemática, pois o indivíduo ao executar a mesma ação,
por várias vezes e refletir sobre ela poderá interiorizá-la em um processo.
O processo é caracterizado por uma construção interna que possibilita ao
indivíduo realizar uma ação, ação essa não necessariamente conduzida por
estímulos externos, isto é, o indivíduo passa a ter controle da transformação
43
Entendo por conjunto linearmente dependente, um conjunto em que os vetores são linearmente
dependentes. E, da mesma maneira, um conjunto linearmente independente, como sendo um
conjunto em que os vetores são linearmente independentes.
Eneias Prado Capítulo 2: Escolhas Teóricas
35
realizada sobre o objeto matemático, podendo descrever os passos envolvidos e
invertê-los quando necessário. Um exemplo de processo é o do aluno que, para
esboçar o gráfico de uma função polinomial de primeiro grau, obtém dois pares de
números que lhe possibilitam traçar o gráfico da reta.
Outro exemplo observado no trabalho de Parraguez (2009), foi quando a
autora apresentou a seguinte questão a um de seus sujeitos:
Se definirmos sobre I às seguintes operações:
+: I× I I
(
ݔ,ݕ
)
,
(
ܽ,ܾ
)
(
ݔ,ݕ
)
+
(
ܽ,ܾ
)
=
(
2ݕ + 2ܾ,−ݔ ܽ
)
⊗: IR × I I
ܽ,
(
ݔ,ݕ
)
ܽ
(
ݔ,ݕ
)
=
(
ܽݔ,−ܽݕ
)
É o I com as operações anteriormente definidas um espaço vetorial
sobre IR? (PARRAGUEZ, 2009, p.83).
Assim, obteve como resposta: “não é espaço vetorial com as operações
definidas, já que não existe um vetor nulo para a adição, tal que:
(
ݔ,ݕ
)
+
(
∗,∗
)
=
(
ݔ,ݕ
)
,∀(ݔ,ݕ) I (Parraguez, 2009, p.107)
44
. Isto é, o sujeito aparenta ter
interiorizado o processo que lhe permite verificar se um conjunto com as operações
binárias definidas é um espaço vetorial, sem a necessidade de verificar todos os
axiomas.
Quando um indivíduo, ao resolver problemas, indícios de utilizar
transformações do tipo processo, diz-se que possui uma concepção processo para
a noção matemática em estudo. Por exemplo, os estudantes que demonstram ter
uma concepção processo para a noção de operação binária, segundo Parraguez
(2009, p.107)
45
, “consideram a operação binária aplicada a todo um conjunto de
maneira geral, isto é, eles podem pensar sobre a maneira com que eles estão
tomando os elementos resultantes de uma operação binária aplicável a todos os
elementos de um conjunto”.
Assim, ao indiduo que realiza transformações sobre um processo por meio
de ações ou de outros processos e tem consciência dessas transformações e, ainda,
44
No es espacio vectorial con las operaciones definidas ya que no existe un elemento neutro para la
suma talque (sic.)
(
x,y
)
+
∗,∗
=
(
x,y
)
(
x,y
)
IR².
45
[...] consideran la operación binaria aplicada a todo un conjunto de manera general, es decir, ellos
pueden pensar en la manera con que se están dando los elementos, resultante de aplicar una
operación binaria a cualesquiera elementos de un conjunto.
Eneias Prado Capítulo 2: Escolhas Teóricas
36
é capaz de construí-las e reconstruí-las, diz-se que encapsulou os processos
envolvidos em um objeto, ou seja, o objeto é a encapsulação de um processo.
Um exemplo de encapsulação é quando o indivíduo reconhece um esboço do
gráfico de uma função polinomial de primeiro grau, e é capaz de descrevê-la em
linguagem algébrica da mesma maneira que, ao se deparar com a linguagem
algébrica desse objeto, é capaz de esboçar seu gráfico.
Outro exemplo é observado no trabalho de Oliveira (2005), pois ao apresentar
a seus sujeitos um quadro com quatro afirmações que definem a noção de base de
um espaço vetorial e questioná-los sobre qual das afirmações melhor expressava a
ideia de base, obteve como resposta que seria a alternativa D
46
, com a seguinte
justificativa
[...] juntou tudo e fez uma bola e melhorou bastante. A gente fala
que ele é finitamente gerado, ele é um conjunto finito de vetores.
Todos os outros vetores são uma combinação do que está junto e
todos os vetores desse conjunto, realmente, são necessários, ou
seja, eles são linearmente independentes (OLIVEIRA, 2005, p.116).
Esse sujeito demonstrou ter encapsulado a noção de base de um espaço
vetorial, como sendo um conjunto gerador de vetores linearmente independentes.
Diz-se de um indivíduo que encapsulou um processo e realiza tais reflexões
que possui uma concepção objeto da noção em estudo. Um exemplo de
concepção objeto para a noção de operação binária, segundo Parraguez (2009,
p.108)
47
, é o do aluno que considera a operação binária “como sendo uma
componente da estrutura do espaço vetorial”.
Conforme referem Asiala et al. (1996, p.12)
48
, “uma coleção de processos e
objetos pode ser organizada de uma maneira estruturada que forme um esquema.
Os próprios esquemas podem ser tratados, como objetos e ser incluídos na
organização de um esquema de nível superior”.
Trigueros (2005) sugere que, ao utilizar a teoria APOS em uma investigação
ou no desenvolvimento de material didático, seja feita uma decomposição genética
46
Base de um espaço vetorial V, finitamente gerado, é um subconjunto finito de vetores de V, tal que
qualquer outro vetor de V seja uma combinação linear dos elementos desse conjunto, e mais, que
todos os vetores desse conjunto realmente sejam necessários para gerar V (OLIVEIRA, 2005, p.96).
47
[…] como una componente de la estructura del espacio vectorial.
48
A collection of processes and objects can be organized in a structured manner to form a schema.
Schemas themselves can be treated as objects and included in the organization of higher level
schemas.
Eneias Prado Capítulo 2: Escolhas Teóricas
37
das noções de interesse. Essa decomposição pode não ser a única. Para a autora, o
importante é que, qualquer decomposição genética de uma noção matemática seja
um instrumento que dê conta de descrever o comportamento do sujeito observado,
segundo as ações, processos e objetos que este venha a mobilizar.
A preocupação com os problemas envolvidos no ensino e na aprendizagem
de Álgebra Linear, como exposto no capítulo 1, o é recente e tem despertado a
atenção de diversos pesquisadores. A seguir, apresento resultados de pesquisas,
que auxiliaram nas análises teóricas e possibilitaram as observações e
considerações realizadas nesta pesquisa.
Elementos observados em pesquisas afins
Como já foi dito, várias pesquisas foram e estão sendo realizadas objetivando
identificar e minimizar as dificuldades enfrentadas pelos alunos ao cursarem Álgebra
Linear. Os referenciais teóricos utilizados são diversos, por exemplo, as Alavancas-
meta de Dorier et al. (1997), os três princípios
49
de Harel (1997), a Teoria APOS de
Ed Dubinsky e seus colaboradores, os Campos Semânticos
50
de Rômulo Lins, entre
outros.
Analisei vários desses trabalhos, inclusive, o de Silva (2003) e o de Julio
(2007) que utilizaram a Teoria dos Campos Semânticos. O primeiro fez um estudo a
respeito do processo que ocorre durante a produção de significados para a noção de
base de um espaço vetorial, por alunos de um curso de pós-graduação em
Educação Matemática. O segundo, sobre a produção de significados para a noção
de dimensão.
No entanto, nesta seção, faço um recorte e apresento elementos daqueles,
dentre os trabalhos, que estudei que permitiram o desenvolvimento da análise
49
Segundo Harel (1997), os três princípios são: concretização, necessidade e generalização. Isto é, o
aluno deve reconhecer a noção matemática em estudo, como partindo de algo concreto, ver
necessidade intelectual em estudá-la, para então, abstrair e generalizá-la. Um exemplo é a passagem
do estudo da noção de base para o espaço vetorial I, para o estudo da noção de base para o
espaço vetorial dos polinômios de grau menor ou igual a ݊, em que ݊ é um inteiro não negativo.
50
Segundo Silva (2005, p.21), a Teoria dos Campos Semânticos quando instituída visava a analisar
os diferentes significados que poderiam ser produzidos para objetos matemáticos “aquilo que o
sujeito pode e efetivamente diz sobre um objeto no interior de uma atividade. No entanto, em sua
tese, focou no processo de construção de significados e não nos significados que poderiam ser
produzidos.
Eneias Prado Capítulo 2: Escolhas Teóricas
38
teórica sugerida pela Teoria APOS. Havendo necessidade, trarei outros resultados
para complementar as discussões proporcionadas ao longo desta pesquisa.
Inicio com o estudo de Parraguez (2009) que utilizou como aporte teórico a
APOS, para investigar a evolução cognitiva da noção de espaço vetorial por
estudantes de Álgebra Linear e as correlações estabelecidas por esses estudantes a
outras noções, como por exemplo, dependência linear em um conjunto e base de
um espaço vetorial. Com esse estudo, a autora afirma que, muitas vezes, os
estudantes não reconhecem a série de requisitos que um conjunto deve possuir para
ser um espaço vetorial. Considera o fato da noção de espaço vetorial ser uma noção
unificadora e generalizadora, um aspecto crucial das dificuldades enfrentadas pelos
alunos.
Assim, a autora propõe uma decomposição genética, na qual descreve que
para um indivíduo construir a noção de espaço vetorial e reconhecê-la, como uma
estrutura geral, deve possuir esquemas formados sobre as noções de conjunto e
operação binária. Dessa forma, o indivíduo ao encapsular o objeto conjunto com a
operação binária que satisfaz axiomas, define a multiplicação por escalar,
multiplicação de um elemento do conjunto (vetor), por um elemento pertencente ao
corpo (escalar).
Esse objeto, o conjunto com a adição entre vetores e a multiplicação por
escalar, segundo a autora pode ser coordenado pelo indivíduo com o esquema de
axiomas, de forma que o sujeito obtenha o objeto espaço vetorial.
Para Parraguez (2009, p.69)
51
, dependendo da maneira como o indivíduo
organizou as ações, os processos e os objetos, ele poderá reconhecer vários
exemplos de espaços vetoriais familiares e, no entanto, não realizar relações entre
esses espaços vetoriais nem a seus subespaços, o que faz com que não exista
“uma clara conexão entre as noções de espaço vetorial, independência/dependência
linear e base, fato que se detecta nas aplicações concretas quando o estudante
utiliza as noções de independência/dependência linear e base”.
Em outra situação, o estudante pode estabelecer relações entre diferentes
espaços vetoriais e seus subespaços, fazendo uso de isomorfismos, transformações
lineares e da dimensão. Neste caso, o estudante dependerá do contexto em que o
51
[...] una clara conexión entre las nociones espacio vectorial, independencia/dependencia lineal y
base, hecho que se detecta en las aplicaciones concretas cuando estudiantes utilizan las nociones de
independencia/dependencia lineal y base.
Eneias Prado Capítulo 2: Escolhas Teóricas
39
problema estiver inserido para relacionar os objetos dependência linear de um
conjunto e base e, ainda, podem existir algumas dificuldades.
Para Parraguez (2009, p.64)
52
, o estudante pode, ainda, utilizar a noção de
espaço vetorial de maneira coerente e estabelecer relações entre as noções
elementares, sendo possível “determinar quando a estrutura é aplicável (a um
problema) e quando, o”. Com isso, a autora afirma que o indivíduo reconhece o
espaço vetorial como sendo uma estrutura abstrata e é capaz de apresentar,
trabalhar e identificar espaços vetoriais não familiares. Independente do contexto do
problema, o indivíduo “coordena as noções de independência - dependência linear e
base, e igualmente trabalha e compreende todas as técnicas diretas ou indiretas que
estão relacionas a essas noções” (PARRAGUEZ, 2009, p.71)
53
.
Outro resultado descrito por Parraguez (2009, p.150)
54-55-56
é “a não
linearidade da aprendizagem”, pois constatou que os estudantes podem “ir e vir
entre diferentes concepções, para isso, basta que usem uma compreensão
adequada”. Assim, como também constatou que os estudantes podem apresentar
outros caminhos durante a construção da noção de espaço vetorial. Afinal, os
estudantes podem possuir “elementos de uma construção objeto (pode-se chamar
assim porque mostram que há uma compreensão do conceito como uma construção
objeto) sem executar algumas construções prévias”.
Desta pesquisa, considero as noções de conjunto e operações binárias, como
sendo necessárias à construção da noção de base de um espaço vetorial, pois para
um estudante construir uma estrutura coerente para as noções elementares de
Álgebra Linear, ele deverá estabelecer correlações entre essas noções.
Uma pesquisa de intervenção didática desenvolvida pelo GPEA é a de
Padredi (2003) que investigou, por meio de entrevistas semiestruturadas, quais os
recursos-meta sobre a noção de base de um espaço vetorial que são evidenciados
no discurso de professores universitários.
Dentre os professores entrevistados, um afirmou que a noção de base de um
espaço vetorial surge “da necessidade e do lucro: ...trabalhar esse conjunto com
52
[...] capaz de determinar cuándo dicha estructura es aplicable y cuándo no.
53
coordinan las nociones de independencia-dependencia lineal y base, e igualmente manejan y
comprenden todas las técnicas directas e indirectas que se relacionan con esas mismas nociones.
54
[...] la no linealidad del aprendizaje.
55
[...] ir y venir entre diferentes concepciones, hasta que logren una comprensión adecuada.
56
[...] elementos de la construcción objeto (se puede llamar así porque muestran que hay uma
comprensión del concepto como una construcción objeto) sin lograr algunas construcciones previas.
Eneias Prado Capítulo 2: Escolhas Teóricas
40
menos elementos...’ e ‘quero ter o mínimo de trabalho possível...’[...]” (PADREDI,
2003, p.49).
Considero que, em seu discurso, esse professor apresenta a noção de base
de um espaço vetorial, como sendo uma justaposição entre um conjunto minimal
gerador e um conjunto maximal de vetores linearmente independentes, pois ao
buscar pelo menor conjunto que representa todo o espaço, tem-se o menor gerador,
que, ao mesmo tempo, permite ao indivíduo identificar os elementos “extras”, como
vetores linearmente dependentes, ou seja, tem-se um conjunto maximal de vetores
linearmente independentes.
Segundo a autora, o professor supracitado afirma que, com o apoio nas
noções já estudadas na Geometria Analítica, procura estimular os alunos a refletirem
primeiro sobre a noção de conjunto gerador, recorrendo, assim, aos conhecimentos
anteriores para utilizá-los na nova estrutura, ou seja, a de espaço vetorial.
O entrevistado descreve da seguinte forma:
[...] a gente quer buscar no conjunto, uma maneira de representá-lo
usando elementos de modo a não ter que considerar os infinitos (o
número infinito deles), que m alguns que eu consigo representar
usando os outros. Como em Geometria Analítica, eles têm um
pouco dessas noções, eles começam... [...] quais os vetores que
eu preciso para conseguir obter os outros? Então, trabalhando nisso
vem a idéia de gerador. Então, a gente consegue achar geradores de
um conjunto. Então, em geral, a gente trabalha primeiro no I e no
I, porque na Geometria Analítica foi onde eles trabalharam.Só que
a gente vê que não tem uma maneira só, não tem um conjunto de
geradores” (PADREDI, 2003, p.51).
Assim, o entrevistado apresenta a lei da economia: “o mínimo de vetores
possível” (PADREDI, 2003, p.52) de onde julga sair a noção de independência
linear. E complementa, “então, a base vem como conseqüência: que é uma maneira
de eu trabalhar o conjunto, de eu conhecer o conjunto, de eu representar o conjunto
usando um mínimo de vetores” (PADREDI, 2003, p.52).
Penso que a noção de base ao ser concebida como sendo: um conjunto
maximal de vetores linearmente independentes, um conjunto minimal de vetores
geradores e uma justaposição entre um conjunto minimal gerador e um conjunto
maximal de vetores linearmente independentes permite ser a base, um conjunto que
representa o espaço vetorial como um todo, o que pode conduzir o aluno a refletir
sobre a vantagem de empregar uma ou outra abordagem, dependendo da situação.
Eneias Prado Capítulo 2: Escolhas Teóricas
41
Outro professor utilizou o termo “vetores bem comportados”, isto é, também
recorreu à Geometria Analítica para discutir a noção de vetores linearmente
independentes. Segundo Padredi (2003, p.63), este professor relacionou o termo
“bem comportado” com “vetores não colineares, vetores que não estão na mesma
reta”.
Nesse aspecto, ressalto a pesquisa de Costa e Catarino (2007) realizada em
Portugal, em que é apresentado um diagnóstico da descontinuidade existente entre
a noção de dependência linear, no ensino superior e a noção de colinearidade no
ensino básico. Esta pesquisa vem corroborar com as falas dos professores
entrevistados por Padredi (2003). Costa e Catarino, consideram:
quer a invenção Matemática, quer a aprendizagem da Matemática,
pressupõem o estabelecimento de conexões entre conceitos. Quanto
mais finas forem as redes (matemáticas ou mentais) criadas, mais
efectiva se torna a aprendizagem. Neste sentido, consideramos
existir uma descontinuidade quando, nessa rede, não se realiza
ligação explícita entre conceitos matemáticos interligados (COSTA e
CATARINO, 2007, p.152, itálico dos autores).
Apesar das descontinuidades existentes, descritas por esses autores, serem
por: mudanças de símbolos, mudanças de configurações e de significados. No caso
particular da dependência linear, também, é necessário entender como ocorre a
reorganização intelectual de modo que este novo conhecimento entre em harmonia
com os anteriores (colinearidade, vector, entre outros)” (COSTA e CATARINO, 2007,
p.155).
Ainda sobre a questão da descontinuidade existente entre as noções vistas
no ensino básico e no ensino superior, Gueudet-Chartier (2000) afirma que, no caso
da noção de base de um espaço vetorial, a passagem do que é estudado no ensino
básico implicaria um grau elevado de generalização e não pode ser identificada,
como uma extensão natural, pois
na verdade, na escola os alunos sabem que uma base para um
plano é um par de vetores não colineares, e que uma base para o
espaço é uma terna de vetores não coplanares. Estas definições são
específicas para o contexto: em particular, a dimensão do espaço é
conhecida e a independência linear parece germinar. A transição
para o conceito geral necessitará da introdução do conceito de
Eneias Prado Capítulo 2: Escolhas Teóricas
42
família geradora e, portanto, uma importante mudança conceitual
(GUEUDET-CHARTIER, 2000, p.8)
57
.
Esses resultados são importantes no momento da elaboração da análise
teórica, pois uso por parte dos professores, conforme Padredi (2003) e, por parte
de livros didáticos, conforme Araújo (2002), dos recursos provindos da Geometria
Analítica para o desenvolvimento das noções de Álgebra Linear. E, ainda, as
evidências apontadas por Costa e Catarino (2007) ao estabelecer conexões entre
essas noções. No entanto, Gueudet-Chartier (2000) aponta para os devidos
cuidados com a generalização abusiva dessas noções.
Retornando à pesquisa de Padredi (2003), um dos professores ao fazer uma
analogia entre o processo de se construir uma parede e as noções de espaço
vetorial, base e dimensão, afirma que:
a noção de base é importante, mas não pode existir sozinha,
separada do seu corpo, ou seja, da noção de espaço vetorial e de
todas as propriedades, características desse espaço que está sendo
construído: ‘Então, a parede para mim é mais importante do que a
base. Então, eu olho na parede... o meu propósito de olhar para
construir a parede. Eu sei que tenho que fazer com as duas
dimensões para construir a parede’ (PADREDI, 2003, p.105).
Penso que esse professor considera, assim como Parraguez (2009), a
dimensão como necessária durante a construção das noções elementares de
Álgebra Linear, pois permite caracterizar um espaço vetorial. Sendo, assim, acredito
ser importante considerá-la durante a análise teórica.
Já Oliveira (2005), observou 13 aulas de um professor que ministrava Álgebra
Linear, em busca de recursos-meta que fossem passíveis de se tornarem alavancas-
meta para alguns dos alunos.
O professor observado, após ter discutido com seus alunos as noções de
espaço vetorial, subespaço vetorial, combinação linear, conjunto gerador e
subespaço gerado, propôs uma lista que, segundo Oliveira (2005), permitia que os
alunos observassem que um mesmo espaço vetorial poderia ser gerado por
diferentes conjuntos geradores. A lista ainda permitia que os alunos refletissem
57
En effet, les élèves savent au lycée que une base du plan est un couple de vecteurs non colinéaires,
que une base de le espace est un triplet de vecteurs non coplanaires. Ces définitions sont spécifiques
au contexte: en particulier, la dimension de le espace concerné étant connue à de indépendance
linéaire y apparaît en germe. Le passage à la notion générale cessitera le introduction de la notion
de familie génératrice, et donc un important glissement conceptuel.
Eneias Prado Capítulo 2: Escolhas Teóricas
43
sobre a reversibilidade das noções, isto é, “todo conjunto de vetores gera um
subespaço vetorial e, por outro lado, todo subespaço vetorial é gerado por um
conjunto de vetores” (OLIVEIRA, 2005, p.67).
Em outra aula, o professor inicia com uma lista de exercícios em que o
enunciado, segundo Oliveira (2005), pretendia despertar nos alunos a ideia de que
conjuntos distintos que são geradores de um mesmo espaço vetorial, possuem
alguma relação, no caso, um desses conjuntos possui um elemento a mais do que o
outro e, ainda, o elemento “extra” pode ser escrito como combinação linear dos
elementos do conjunto com um número menor de vetores.
Tal atividade proporcionou um diálogo que fez com que os alunos refletissem
“sobre as vantagens de um conjunto gerador minimal, sugerindo a idéia de conjunto
linearmente independente” (OLIVEIRA, 2005, p.70).
Mais uma vez, a noção de dependência linear surge da necessidade de se
obter o menor conjunto gerador. Assim, questiono: será possível construir a noção
de base de um espaço vetorial iniciando pela noção de dependência linear? Esta
questão fica para ser verificada na análise teórica.
Em continuidade, o professor em aula apresentou aos alunos uma maneira de
verificar a dependência linear em um conjunto de vetores, no seguinte comentário:
[...] um deles como combinação linear dos outros, é uma diferença
que eu vou ter que ficar olhando. (...) Essa é uma das características
de um conjunto que a gente vai chamar de L.D., ou seja, linearmente
dependente. Eu tenho alguém que está dependendo dos outros,
dentro do meu conjunto (OLIVEIRA, 2005, p.71).
Segundo Oliveira (2005), após a discussão sobre esta afirmação o professor
mostrou a definição formal para dependência linear; ou seja, sendo ܸ um espaço
vetorial e ܥ um subconjunto de ܸ, é dito que ܥ é linearmente independente se
ܽ
ݒ
+ ⋯+ ܽ
ݒ
= 0, para ݒ
ܥ e ܽ
IR, ݅ = 1,,݊, implica que ܽ
= = ܽ
= 0.
Na próxima lista de atividades propostas pelo professor aos alunos, foi
apresentado o seguinte enunciado:
queremos encontrar dentro de um espaço vetorial ܸ, finitamente
gerado, um conjunto finito de vetores, tal que qualquer outro vetor de
ܸ seja uma combinação linear dele, e mais, que todos os vetores
desse conjunto realmente sejam necessários para gerar ܸ. A esse
conjunto, daremos o nome de base (OLIVEIRA, 2005, p.74).
Eneias Prado Capítulo 2: Escolhas Teóricas
44
Penso que a citação acima permitiria que o aluno refletisse sobre a noção de
base de um espaço vetorial, como sendo um conjunto minimal gerador e um
conjunto maximal linearmente independente. No entanto, o professor, ao apresentar
na mesma lista de atividades a definição de base, como sendo um conjunto gerador
com vetores linearmente independentes, não permitiu tal reflexão.
Segundo Oliveira (2005), o professor propiciou vários momentos de discussão
de maneira tal que levou os alunos a conceituarem a noção de dimensão e, ainda,
que um conjunto possui infinitas bases. Assim, como conduziu os alunos a
associarem as noções de dimensão e de conjunto linearmente independente para se
obter a base de um espaço vetorial, ou verificar se um conjunto de vetores é uma
base para um determinado espaço.
Desses resultados, observo que a base é uma representante fundamental de
um espaço vetorial e pode ser abordada em sala de aula de formas distintas. Assim
como observo a importância da dimensão que, correlacionada a noções de
dependência linear ou de combinação linear, permite a construção da noção de base
de um espaço vetorial.
Em síntese, na análise teórica, pretendo levar em consideração:
As noções de operação binária e de conjunto;
As correlações entre as noções elementares de Álgebra Linear;
Os três pontos de vista sobre a noção de base de um espaço vetorial;
A articulação da noção de dimensão com as demais noções
elementares; e
A correlação entre a noção de colinearidade e dependência linear.
Com essas considerações, das questões e do objeto de pesquisa, no próximo
capítulo apresentarei a metodologia adotada neste trabalho e os procedimentos
metodológicos.
45
CAPÍTULO 3
ESCOLHAS METODOLÓGICAS
O verdadeiro, em ciências humanas, apenas pode ser um verdadeiro
relativo e provisório [...] O verdadeiro, em ciências humanas, é ainda
mais relativo porque, com freqüência, não pode basear sua
construção sobre uma medida objetiva dos fenômenos estudados
(LAVILLE e DIONNE, 1999, p.35).
Apesar do verdadeiro, em ciências humanas, depender dos fenômenos
imbricados à pesquisa nessa área, é imprescindível ao pesquisador “trabalhar com
rigor, com método, para assegurar a si e aos demais que os resultados da pesquisa
serão confiáveis, válidos” (LAVILLE e DIONNE, 1999, p.11).
Com esta perspectiva, neste capítulo descrevo a abordagem metodológica
adotada, os métodos utilizados para a coleta dos dados e os procedimentos
metodológicos que segui ao descrever e interpretar os dados coletados.
Abordagem metodológica
Para justificar a abordagem metodológica adotada, retomo as questões
norteadoras:
Qual o caminho que um indivíduo deve trilhar ao construir a noção de
base de um espaço vetorial?
Como os alunos, ao concluírem um curso de Álgebra Linear, concebem
a noção de base de um espaço vetorial?
Como um aluno que concluiu, pelo menos, um curso de Álgebra Linear
correlaciona as noções elementares desta disciplina?
Estas questões permitiram-me formular o seguinte objetivo: identificar a
Eneias Prado Capítulo 3: Escolhas Metodológicas
46
concepção que os alunos que concluíram um curso de Álgebra Linear têm sobre a
noção de base de um espaço vetorial. Por ser, esse, o objetivo principal da
pesquisa, ou seja, considerar os diferentes pontos de vista dos participantes, optei
por desenvolver uma pesquisa qualitativa, que permite “iluminar o dinamismo interno
das situações, geralmente inacessível ao observador externo” (LÜDKE e ANDRÉ,
2001, p.12).
A respeito desta abordagem, Bogdan e Biklen (1994, p.47), em seu livro
“Investigação Qualitativa em Educação”, discutem as cinco principais características
que determinam uma pesquisa ser qualitativa. Pois, uma pesquisa pode possuir
essas características em sua integridade, ou não. Afinal, segundo esses autores, as
investigações nem sempre “patenteiam estas características com igual eloqüência”.
As características a que Bogdan e Biklen (1994) se referem são: a fonte direta
dos dados é o ambiente natural, constituindo o investigador o instrumento principal;
a pesquisa é descritiva; o interesse é mais pelo processo do que simplesmente pelos
resultados ou produtos; a análise tende a ser indutiva; e a maneira como o sujeito
observado encara as situações em estudo é de extrema importância.
Nesta pesquisa, a fonte dos dados é o ambiente natural, pois os dados foram
coletados por meio de entrevistas com estudantes de um curso específico de
Álgebra Linear, do qual o pesquisador também foi aluno. Os materiais foram
coletados exclusivamente pelo pesquisador, tanto durante o curso como na
efetivação das entrevistas, constituindo, assim, o pesquisador como o principal
instrumento de coleta dos dados.
Dessa forma, a pesquisa também é descritiva, pois contempla dados
recolhidos durante as entrevistas, transcrições das entrevistas, assim como as
observações realizadas durante o curso do qual os sujeitos de pesquisa
participaram.
Mesmo sendo o principal interesse desta pesquisa, identificar a concepção
que os alunos que concluíram um curso de Álgebra Linear têm sobre a noção de
base de um espaço vetorial, não se pode esquecer, das questões de pesquisa, visto
que, o objetivo emergiu das questões, e elas visam não só a um momento estanque,
mas todo um processo de construção.
a maneira com que foram coletados os dados, sobretudo as entrevistas,
pressupôs uma análise inicial que, posteriormente, orientou as inter-relações
Eneias Prado Capítulo 3: Escolhas Metodológicas
47
efetuadas nas análises dos dados. Isto é, as análises foram efetuadas de maneira
indutiva.
Com essas considerações, em especial, a importância atribuída à maneira
com que o sujeito observado encara a situação em estudo, afirmo que realmente
esta pesquisa adapta-se às características descritas por Bogdan e Biklen (1994) ao
se referirem a um estudo qualitativo.
Assim, descrevo e especifico os sujeitos da pesquisa, pois são alunos que
concluíram um mesmo curso de Álgebra Linear, ou seja, é um grupo bem delimitado.
Apesar de eles terem objetivos distintos que os levaram a participar do curso, todos
vivenciaram uma mesma abordagem de ensino.
O curso de Álgebra Linear, do qual os sujeitos participaram, foi oferecido por
uma Universidade de renome em São Paulo. É um curso de extensão com duração
de 120 horas, que tem como público-alvo estudantes ou profissionais interessados
em complementar sua formação.
Para a inscrição no curso, a única exigência foi que o interessado fosse
graduado ou estivesse matriculado em um curso das Ciências Exatas. O curso foi
ministrado nos meses de janeiro e fevereiro de 2009.
O sítio de divulgação dos cursos de extensão dessa instituição apresentava,
no início de 2009, o seguinte programa para a disciplina de Álgebra Linear: vetores
no IR
n
, espaços vetoriais, subespaços, transformações lineares e matrizes,
semelhanças e diagonalização.
No primeiro dia de aula, indicou-se a bibliografia a ser utilizada no curso:
Callioli et al. (1995) e Coelho e Lourenço (2001). A metodologia de ensino do curso
foi a tradicional, conforme exposto nas páginas 18 e 19 deste trabalho: dada a
definição, passava-se a exemplos, lista de exercícios padrões, teoremas e
proposições e aplicações.
Na realidade, no curso foram abordados os IR-espaços vetoriais finitamente
gerados, e os exemplos trabalhados no curso restringiram-se aos espaços vetoriais:
das n-úplas de números reais IR
n
–, dos polinômios de grau menor ou igual a ݊,
com coeficientes reais ܲ
(IR) –, das matrizes com ݊ linhas e ݉ colunas, com os
elementos pertencentes aos reais ܯ
௡×௠
(IR) e o conjunto dos números complexo
C
|
–.
Além da noção de espaço vetorial, foram abordadas outras noções que eram
apresentadas no título das listas de atividades propostas aos alunos. Tal como
Eneias Prado Capítulo 3: Escolhas Metodológicas
48
apresentados aos alunos os tulos foram: Espaços vetoriais; Subespaços vetoriais;
Combinações lineares e subespaços gerados; Dependência linear; Bases; Espaços
finitamente gerados e dimensão; Sistemas de coordenadas; Transformações
lineares; Inversa e núcleo de uma transformação; Transformações lineares e
espaços de dimensão finita; Matrizes de transformações lineares, Matriz de
mudança de base; O espaço ܮ,ܸ)
58
; Diagonalização; Produto interno e norma; e
Ortogonalização e funcionais lineares versus produto interno.
Segundo Lüdke e André (2001), quando se estuda uma situão específica
em que os sujeitos compartilham de uma mesma experiência, de maneira a
evidenciar o que o grupo tem em particular, a pesquisa é caracterizada como sendo
um estudo de caso.
Desta forma, a metodologia adotada é a qualitativa, sendo “o estudo de caso
[...] uma escolha do objeto a ser estudado” (ANDRÉ, 2005, p.16), em que a
particularidade consiste na abordagem dada ao desenvolvimento das noções de
Álgebra Linear, comum a todos os sujeitos participantes do curso. Ressalto que o
objeto de estudo foi identificar a concepção que os alunos que concluíram um curso
de Álgebra Linear têm sobre a noção de base de um espaço vetorial e não
propriamente o curso.
Segundo André (2005), dentre os principais aspectos que qualificam um
estudo de caso, estão: a particularidade, que foi exposta, e a descrição
minuciosamente do estudo que, neste caso, visa a identificar a multiplicidade de
concepções que podem ter sido construídas pelos sujeitos, e as possíveis inter-
relações entre as noções elementares de Álgebra Linear estabelecidas por eles.
O método de coleta de dados
Para responder as questões e atingir ao principal objetivo desta pesquisa,
busquei por um método de coleta de dados que permitisse dialogar com o sujeito e o
fizesse revisitar as noções elementares de Álgebra Linear, de maneira que
mobilizasse seus esquemas mentais e possibilitasse identificar indícios de quais
concepções eles possuem.
58
O espaço ܮ,ܸ) é o espaço vetorial sobre IR das transformações lineares de ܷ em ܸ.
Eneias Prado Capítulo 3: Escolhas Metodológicas
49
Segundo Lüdke e André (2001), para iniciar a pesquisa de campo o
pesquisador deve ter bem estruturado seu instrumento de coleta, para que consiga
obter os dados necessários para desenvolvimento de seu estudo. Com esta
preocupação, procurei por vários métodos de coleta, optando pela entrevista, pois
segundo Bogdan e Biklen (1994, p.134), na pesquisa qualitativa, a entrevista é
“utilizada para recolher dados descritivos na linguagem do próprio sujeito, permitindo
ao investigador desenvolver intuitivamente uma idéia sobre a maneira como os
sujeitos interpretam aspectos do mundo” e, ainda, permite correções,
esclarecimentos e adaptações que a tornam sobremaneira eficaz na obtenção das
informações desejadas” (LÜDKE e ANDRÉ, 2001, p.34).
Para se desenhar uma entrevista individual, interesse desta pesquisa, Lüdke
e André (2001) apresentam três tipos: estruturadas, semiestruturadas e não
estruturadas (ou não totalmente estruturada).
Nas entrevistas não estruturadas, “não a imposição de uma ordem rígida
de questões, o entrevistado discorre sobre o tema proposto com base nas
informações que ele detém e que no fundo são a verdadeira razão da entrevista”
(LÜDKE e ANDRÉ, 2001, p.33-34). No caso das entrevistas serem do tipo
estruturada, “o entrevistador tem que seguir muito de perto um roteiro de perguntas
feitas a todos os entrevistados de maneira idêntica e na mesma ordem” (LÜDKE e
ANDRÉ, 2001, p.34). nas entrevistas do tipo semiestruturadas, que é um meio
termo entre as estruturadas e as não estruturadas, tem seu desenvolvimento
associado, “a partir de um esquema básico, porém não aplicado rigidamente,
permitindo que o entrevistador faça as necessárias adaptações” (LÜDKE e ANDRÉ,
2001, p.34).
Desta forma, para a coleta dos dados, optei pela entrevista semiestruturada,
pois permite que o entrevistador tenha certa liberdade para, caso necessário,
reconduzir a entrevista, ou seja, enfatizar, ou esclarecer, certas atitudes do
entrevistado e, ao mesmo tempo, permite que o entrevistador o perca o foco de
seu estudo, pois terá em mãos um roteiro que o guiará durante as entrevistas.
Apesar de todas as vantagens de se utilizar as entrevistas para a coleta de
dados, os autores Bogdan e Biklen (1994) e Lüdke e André (2001) afirmam que se
devem tomar certas precauções ao realizá-las; a primeira delas, o investigador deve
estabelecer uma relação com o sujeito em que haja confiança mútua, o investigador
Eneias Prado Capítulo 3: Escolhas Metodológicas
50
deve informar ao sujeito os objetivos e garantir-lhe o anonimato e fazer com que o
sujeito não fique apreensivo ao responder às perguntas.
Os autores citados afirmam que uma boa entrevista deve ser agradável para
ambas as partes, o entrevistador deve ter a capacidade de ouvir e fazer com que a
entrevista ocorra naturalmente. O entrevistador, também, deve atentar a todas as
expressões do entrevistado e, ao mesmo tempo, evitar expressá-las; cada ação de
ambas as partes pode alterar o andamento da entrevista. Outra questão não menos
trabalhosa é que as entrevistas devem ser transcritas, isto é, passadas ao papel de
forma clara e que reproduza o mais próximo possível, o que realmente ocorreu.
Caracterizado o estudo e apresentado como foram coletados os dados, na
próxima seção, apresento os passos desenvolvidos no decorrer desta investigação,
lembrando que esses se intercalaram de tal maneira que se torna, em linhas gerais,
difícil precisá-los e separá-los.
Procedimentos metodológicos
Como o interesse desta pesquisa repousa na construção de uma noção
matemática, base de um espaço vetorial, busquei por um curso de extensão
promovido por uma instituição pública de renome em São Paulo. Este curso de
Álgebra Linear ocorreu, no primeiro semestre de 2009, exigia ao efetuar a matrícula
apenas que o aluno fosse graduado ou estivesse matriculado em um curso das
Ciências Exatas.
Durante o decorrer do curso, fiz anotações e recolhi materiais que
fornecessem informações da construção realizada para a noção de base de um
espaço vetorial. Verifiquei, também, como era apresentada a noção de base de um
espaço vetorial nos livros utilizados durante o curso, a saber: Callioli et al. (1995) e
Coelho e Lourenço (2001).
Em paralelo ao curso, realizei leituras, em parte descritas, para elaborar a
análise teórica proposta pela Teoria APOS. Nesta fase, o primeiro passo foi
conhecer a decomposição genética da noção de base de um espaço vetorial,
proposta por Euán (2007) e Euán et al. (2008). “Aprender pelos exemplos de um
campo de pesquisa envolve mais que aprender o conteúdo deste campo; é também
Eneias Prado Capítulo 3: Escolhas Metodológicas
51
saber olhar, pensar sobre e agir em relação ao mundo” (ROMBERG, 1992, p. 53)
59
e
mais
a identificação das relações entre os conceitos depende muito, por
suposição, como em todos os estudos em educação matemática, da
amostra de estudantes que se estuda e como eles aprenderam, entre
outros fatores; pois sendo um caso particular, os estudos
comparativos podem ser mais uma amostra para confirmar ou refutar
os resultados. Esta possibilidade é o que torna possível estabelecer
a educação matemática como uma ciência (TRIGUEROS, 2005, p.
18)
60
.
Da leitura do material selecionado, efetuei uma análise preliminar que permitiu
refinar a decomposição genética proposta por Euán (2007) e Euán et al. (2008).
Desse refinamento, dos resultados de pesquisa apresentados no capítulo 2 e de
minhas concepções, apresentei uma expansão da decomposição genética de Euán
(2007) e de Euán et al. (2008).
Separadamente da análise teórica, apresentei o roteiro de entrevista que foi
desenhado, segundo os moldes de uma entrevista semiestruturada. A entrevista
consta de duas partes: a primeira, em que se busca identificar certas características
do entrevistado (formação acadêmica e atuações profissionais), e a segunda,
identificar a concepção que o entrevistado demonstra possuir sobre a noção de base
de um espaço vetorial, além de, verificar as correlações que o sujeito estabelece
entre as noções elementares de Álgebra Linear.
As questões da segunda parte foram desenhadas de maneira que o sujeito as
analisasse oralmente. Segundo Machado e Nogueira (2005, p.66), na argumentação
“são utilizados modelos, visualizações e outros meios similares a fim de expressar
algo sobre a Matemática”. Assim, acredito que, ao permitir que o sujeito argumente
sobre questões relacionadas a noções matemáticas, o número de elementos listados
para esta análise será maior.
Além do que, segundo Machado e Nogueira (2005), o sujeito ao explicar o
que concebe sobre uma determinada noção matemática, permite ao pesquisador
59
[…] learning the exemplars of a Field of inquiry involves more than learning the content of the Field;
it is also learning how to see, think about, and act toward the world.
60
[…] la identificación de las relaciones entre conceptos depende mucho, por supuesto, como en
todos los estudios en educación matemática, de la muestra de estudiantes que se estudia y de la
manera cómo aprendieron, entre otros factores; pero una vez encontradas en un caso particular,
pueden hacerse estudios con nuevas muestras para confirmar o refutar los resultados. Esta
posibilidad es la que permite ir estableciendo la educación matemática como una ciencia.
Eneias Prado Capítulo 3: Escolhas Metodológicas
52
avaliar como tal noção está estruturada. No entanto, as autoras alertam que
argumentar é uma tarefa extremamente difícil aos alunos, mesmo àqueles
considerados hábeis e com bom domínio da noção investigada.
Após ter elaborado o roteiro de entrevista, procurei o professor que ministrou
o curso de Álgebra Linear, e obtive uma lista com os e-mails dos alunos que
participaram da última prova, na lista constavam 14 e-mails.
Todos os 14 alunos foram convidados a participar da pesquisa. Mas, apenas
oito responderam ao convite enviado por e-mail (anexo 1). Então, reenviei o e-mail,
para os sujeitos que não haviam respondido ao primeiro convite e obtive a resposta
de mais dois. Totalizando, assim, dez sujeitos.
Dos dez sujeitos, um deles por residir em outro Estado solicitou que a
entrevista fosse realizada com o auxílio de ferramentas computacionais, e outro, por
residir no interior de São Paulo e não encontrar tempo para efetuarmos a entrevista,
solicitou que lhe enviasse o roteiro por e-mail. Os demais, oito, foram entrevistados
individualmente, conforme acordo estabelecido entre as partes.
As entrevistas foram audiogravadas e transcritas, com exceção de duas, uma
em que os dados foram coletados por meio de anotações durante a entrevista e
outra em que o sujeito respondeu por e-mail.
Assim como combinado com os entrevistados, após transcrever as
entrevistas, eu as enviei, para que eles pudessem verificar, caso quisessem
complementar suas respostas.
Em seguida, analisei cada uma das entrevistas, ou seja, efetuei uma análise
“vertical”. Para isso, utilizei a análise do roteiro e a decomposição genética das
noções de base e de dimensão de um espaço vetorial. Em cada entrevista,
apresento sínteses sobre as considerações, nas quais identifico as concepções e as
relações evidenciadas pelos entrevistados.
Por fim, analisei todas as entrevistas com um olhar “horizontal”, ou seja, um
olhar panorâmico que permitiu tecer considerações sobre seu conjunto.
No próximo capítulo, apresentarei a análise teórica, isto é, a preparação para
ida a campo. Nesta análise, identifico como se a noção base de um espaço
vetorial nos livros utilizados no curso de extensão, apresento e analiso a
decomposição genética de Euán (2007) e Euán et al. (2008) e proponho uma
extensão dessa decomposição genética. Além de apresentar o desenho e a análise
do roteiro de entrevista utilizado.
53
CAPÍTULO 4
ANÁLISE TEÓRICA
Este capítulo está subdividido em cinco seções. Na primeira, apresento o
desenrolar da noção de base de um espaço vetorial nos livros utilizados no curso de
que os sujeitos desta pesquisa participaram. Na segunda, apresento a
decomposição genética da noção de base de um espaço vetorial, proposta por Euán
(2007) e Euán et al. (2008). Na terceira, é feito um refinamento dessa decomposição
genética. Deste refinamento, surge a quarta seção na qual apresento uma
decomposição genética das noções de base e de dimensão de um espaço vetorial,
isto é, uma expansão da decomposição genética apresentada inicialmente. Para
finalizar o capítulo, na última seção, descrevo e analiso o roteiro que utilizei nas
entrevistas.
A noção de base de um espaço vetorial em dois livros
Durante o curso de extensão de Álgebra Linear, os livros textos utilizados
foram os de Callioli et al. (1995) e o de Coelho e Lourenço (2001). Nesta seção,
refiro esses livros por Livro 1 e Livro 2, respectivamente. O Livro 1, mais utilizado
durante o curso, foi um dos analisados por Araújo (2002).
Livro 1
Embora o livro utilizado no curso tenha sido o de 1995 edição
61
sua
primeira edição foi publicada em 1977. Está dividido em duas partes; na primeira de
“teoria”, são abordadas as noções elementares de Álgebra Linear, e na segunda, as
“aplicações”. Segundo Araújo (2002), até a edição desta obra, não foi realizada
nenhuma alteração nos capítulos da “teoria”, interesse desta pesquisa.
61
Observo que essa não, necessariamente, foi à edição consultada pelo aluno.
Eneias Prado Capítulo 4: Análise Teórica
54
Esse livro “foi elaborado quando a Álgebra Linear passou a ser reconhecida
como uma disciplina importante, não só para a Matemática como também para
outras áreas científicas” (ARAÚJO, 2002, p.28-29). Fato esse, que, segundo a
Araújo (2002, p.29), “indica que os autores pretendiam atingir um grande número de
leitores, das mais diferentes origens e interesses”.
Araújo (2002), também, descreve que uma das premissas adotadas para
elaboração do livro é que a aprendizagem em Álgebra Linear ocorre com base nos
conhecimentos da geometria. Quanto à exposição dos conteúdos, foi feita da
seguinte forma: “definição, exemplos das noções desenvolvidas na teoria, teoremas,
exercícios resolvidos e exercícios propostos” (ARAÚJO, 2002, p.33), isto é, da forma
tradicional.
No segundo capítulo, a noção de espaço vetorial é abordada, sendo todos
espaços vetoriais finitamente gerados e sobre o corpo dos reais. um exemplo de
espaço vetorial não finitamente gerado, no apêndice. Vale ressaltar que os espaços
vetoriais abordados no Livro 1 são os mesmos que foram trabalhados pelo professor
que ministrou o curso de extensão, veja página 47 deste trabalho.
Em alguns dos exemplos e demonstrações apresentados durante o texto, os
autores afirmam ser resultados “óbvios”, “fáceis de verificar”. A esse respeito, Araújo,
afirma que
por um lado dizer que é fácil ou é óbvio, pode estar confirmando a
um aluno que esteja compreendendo o assunto que o resultado
obtido é de fácil acesso. Por outro lado, para aquele aluno iniciante
e/ou com dificuldade, que não percebe a obviedade ou facilidade da
verificação do assunto, esse discurso pode desmotivá-lo, por conta
da impressão de incapacidade de perceber o que parece tão fácil ou
óbvio ao outro (ARAÚJO, 2002, p.36-37).
Após os exemplos, os exercícios resolvidos e as propriedades relacionadas
aos espaços vetoriais, os autores apresentam a definição de combinação linear,
seguida de um único exemplo de espaço gerado, sendo o conjunto gerador um
conjunto minimal. A próxima seção, espaços vetoriais finitamente gerados, também
é iniciada com um exemplo em que o conjunto gerador utilizado é um conjunto
minimal.
A esse respeito, concordo com Araújo (2002, p.38) ao afirmar que: “[...] as
informações dadas não são suficientes para que o aluno atente para a existência de
Eneias Prado Capítulo 4: Análise Teórica
55
conjuntos finitos com diferentes números de elementos geradores de um mesmo
espaço vetorial”. Para a autora, essa falta de informações pode, ainda, conduzir o
aluno a pensar que todo conjunto gerador é minimal.
Dos seis exemplos de espaços vetoriais finitamente gerados, cinco
constituem-se em base canônica. Segundo Araújo (2002, p.39-40), esta escolha
dos autores, [...] pode levar o aluno a conceber a idéia de que o espaço vetorial
finitamente gerado só pode ser gerado por um conjunto minimal finito”, e ainda, “isto
pode refletir na concepção de base do aluno, pois ele não atentará para o fato de
que pode existir outro conjunto gerador e conseqüentemente, outras bases”.
A autora relata que, dos dez exercícios resolvidos sobre espaços vetoriais,
apenas dois tratam de conjuntos geradores, sendo todos minimais. Quanto aos
exercícios propostos aos alunos de um total de 25, nove solicitam ao aluno mostrar
ou encontrar um conjunto gerador de um espaço vetorial.
Os autores iniciam o terceiro capítulo, Base e Dimensão, com um exemplo em
que recorrem à geometria analítica para afirmarem que três vetores não coplanares
formam uma base do espaço vetorial I. Após esse exemplo, os autores
apresentam, como sendo o objetivo do capítulo
mostrar que em todo espaço vetorial finitamente gerado ܸ existe um
subconjunto finito ܤ tal que todo elemento de ܸ é combinação linear,
de uma única maneira, desse subconjunto. E que todos os outros
subconjuntos de ܸ que têm também essa propriedade (sempre os
há) possuem o mesmo número de elementos que ܤ.
Daí saíra então o conceito de ‘dimensão’” (CALLIOLI et al., 1995,
p.67).
Sem realizarem nenhum comentário, os autores iniciam uma seção com o
título “Dependência Linear”. Para Araújo (2002, p.41), “a notável desarticulação da
introdução com o assunto abordado em seguida [...] dificulta que o aluno perceba as
intenções dos autores explicitadas nesta introdução”.
Nessa seção, o apresentadas as definições de um conjunto de vetores
linearmente independentes e linearmente dependentes
62
, exemplos e propriedades.
Assim como, um exemplo de espaço vetorial gerado por três e por quatro vetores.
No entanto, Araújo (2002, p.42) afirma que “o explicitado no texto, é que o exemplo
62
A definição para um conjunto de vetores linearmente independentes é semelhante à apresentada
na página 43, do segundo capítulo desta pesquisa. Já, um conjunto de vetores é chamado de
linearmente dependente se não for linearmente independente.
Eneias Prado Capítulo 4: Análise Teórica
56
se refere a uma determinada propriedade” e não ao fato de que “é interessante que
o conjunto gerador seja o minimal”.
Logo após o exemplo, a definição de base é apresentada, como sendo um
conjunto gerador de vetores linearmente independentes. Todos os exemplos são
representados pelas bases canônicas. Segundo Araújo (2002, p.42), escolha tal
“pode induzir alguns alunos à crença de que um conjunto gerador é suficiente para
ser uma base de um espaço vetorial, além disso, pode causar a falsa idéia de que a
base é única, e sempre a canônica” (grifo do autor).
Em seguida, é enunciado e demonstrado o fato de que todo espaço vetorial
finitamente gerado admite uma base, mas não é feita uma abordagem que permita o
aluno abstrair reflexivamente sobre o fato de haver mais de uma base.
Os autores encerram o capítulo com o Teorema da invariância
63
, a noção de
dimensão, o Teorema do completamento
64
seguido de duas proposições e, por
último, um processo prático para determinar uma base, esse processo baseia-se em
três observações que, segundo Araújo (2002, p.42), “tais observações [...] não
passam de três propriedades de um sub-espaço gerado”.
Penso que a maneira como foi conduzida a construção das noções
elementares de Álgebra Linear não permite que o aluno conceba essas noções
como objeto matemático. Além de não proporcionar desequilíbrios, conforme
sugerem Dubinsky e Lewin (1986), os autores do Livro 1 apresentam características
particulares que dificultam a abstração reflexionante que poderia conduzir o aluno a
uma generalização dessas noções e, assim, concebê-las como objeto.
Livro 2
Este livro foi utilizado no curso de extensão, como uma segunda fonte de
pesquisa, não foi escrito com o objetivo de suprimir um texto elementar de Álgebra
Linear, mas, sim, um texto para um segundo curso, onde os conceitos algébricos
pudessem ser amadurecidos e aprofundados para posterior utilização” (COELHO e
LOURENÇO, 2001, p. 13-14).
63
Seja ܸ um espaço vetorial finitamente gerado. Então duas bases quaisquer de ܸ têm o mesmo
número de vetores (CALLIOLI et al., 1995, p.78).
64
Seja ܸ um espaço vetorial de dimensão ݊ 1. Se
,ݑ
,,ݑ
} ܸ é um subconjunto L.I. com ݎ
vetores e ݎ < ݊, então existem ݊ − ݎ vetores ݑ
௥ାଵ
,,ݑ
ܸ, de maneira que
ܤ =
,,ݑ
,ݑ
ାଵ
,,ݑ
} é uma base de ܸ (CALLIOLI et al., 1995, p.79).
Eneias Prado Capítulo 4: Análise Teórica
57
Segundo os autores, o livro é oriundo de suas reflexões ao ministrarem as
disciplinas de Álgebra Linear I e II, tanto nos cursos de graduação como nos de pós-
graduação. O enfoque dado às noções abordadas, segundo Coelho e Lourenço
(2001, p.14), é “principalmente algébrico, sem, porém, relegar a segundo plano os
aspectos geométricos”.
Neste livro, são abordados os espaços vetoriais sobre um corpo qualquer, ou
seja, não se restringe ao corpo dos reais. O livro está dividido em seis capítulos, e os
dois primeiros tratam de assuntos referentes a esta pesquisa.
No primeiro capítulo, é feita uma espécie de revisão em que o retomadas
as noções de corpo, matrizes e sistemas lineares. No segundo capítulo, são
apresentadas as noções de espaço vetorial e de base.
No curso de extensão do qual os sujeitos desta pesquisa participaram, o
professor tratou quase sempre dos IR–espaços vetoriais finitamente gerados. Apesar
disso, descrevo a abordagem adotada por esse livro, pois alguns dos alunos podem
tê-lo consultado.
Os autores iniciam o segundo capítulo definindo um espaço vetorial sobre um
corpo qualquer, diversos exemplos são apresentados, entre eles, o corpo dos reais
sobre o corpo dos racionais. A noção de base de um espaço vetorial é o título da
segunda seção desse capítulo que Coelho e Lourenço (2001, p.41) afirmam ser “um
dos conceitos mais importantes envolvendo a estrutura de espaço vetorial”. Após
esta afirmação, os autores apresentam a definição da noção de combinação linear
entre vetores e de conjunto gerador.
São apresentados exemplos e algumas propriedades, entre elas, que,
qualquer subconjunto de um espaço vetorial que contenha um conjunto gerador
desse espaço é também um conjunto gerador. Em um dos exercícios, sobre
combinação linear, é solicitado que o aluno mostre que não existe nenhum conjunto
gerador para o I que contenha menos de três elementos. Da maneira como os
autores apresentaram as propriedades e os exercícios, acredito que o estudante
pode perceber a ideia de conjunto gerador minimal e de dimensão.
Após os exercícios sobre combinação linear e conjunto gerador, os autores
afirmam que
em geral, um espaço vetorial possui muitos conjuntos geradores e
muitas vezes é importante termos um conjunto gerador que seja o
Eneias Prado Capítulo 4: Análise Teórica
58
menor possível. A situação ideal é que exista um conjunto gerador
onde cada elemento de ܸ se escreva de maneira única como
combinação linear dos elementos deste conjunto gerador. Por trás
dessa unicidade está o importante conceito de conjunto linearmente
independente (COELHO e LOURENÇO, 2001, p.43).
Nesta citação, penso ter um dos princípios de Harel (1997), isto é, o da
necessidade: “[...] muitas vezes, é importante termos um conjunto gerador que seja o
menor possível” (COELHO e LOURENÇO, 2001, p.43). Essa necessidade conduz à
noção de dependência linear em um conjunto que os autores definem logo em
seguida.
Mesmo os autores aparentemente tendo apresentado definições semelhantes
às descritas neste trabalho, penso que o aluno pode ser conduzido a abstrair
reflexivamente, pois são feitas cinco observações, entre elas, um alerta, ou seja, que
as definições apresentadas dependem do corpo base do espaço vetorial
considerado. Para enfatizar, os autores apresentam, também, o exemplo: “seja
ܤ = {
(
1,0
)
,
(
݅,0
)
,
(
0,1
)
, (0,݅)} C
|
². Se considerarmos C
|
², como espaço vetorial sobre
C
|
, então, ܤ é linearmente dependente” (COELHO e LOURENÇO, 2001, p.44).
Após os exemplos sobre dependência linear, os autores definem base de um
espaço vetorial, como sendo um conjunto gerador com vetores linearmente
independentes.
Nos exercícios, solicita-se que o aluno mostre que um conjunto é uma base,
encontre uma base para um espaço vetorial sobre um corpo dado e, ainda, são
apresentados espaços vetoriais finitamente gerados e que não são finitamente
gerados. Nesses exercícios, também, é solicitado que o aluno mostre que o número
de elementos de uma base para um mesmo espaço vetorial é invariante.
Na próxima seção, os autores definem um espaço vetorial finitamente gerado
e mostram que todo espaço vetorial finitamente gerado possui uma base; no
apêndice, os autores mostram que esse resultado vale para todo espaço vetorial e
não só os finitamente gerados.
Alguns resultados são apresentados, entre eles: “seja ܸ um ܭ-espaço vetorial
finitamente gerado não nulo e assuma que
,,ݒ
} seja um conjunto gerador de
ܸ. Então, todo conjunto linearmente independente de vetores de ܸ tem no máximo ݉
elementos” (COELHO e LOURENÇO, 2001, p.47). Penso que o estudante ao
considerar a base de um espaço vetorial como sendo um conjunto linearmente
Eneias Prado Capítulo 4: Análise Teórica
59
independente com no máximo ݉ elementos, pode vir a conceber a noção de base,
como sendo um conjunto maximal de vetores linearmente independentes.
Em seguida, o resultado é apresentado: “Seja ܷ um ܭ-espaço vetorial
finitamente gerado não nulo. Então, duas bases quaisquer de ܸ têm o mesmo
número de elementos” (COELHO e LOURENÇO, 2001, p.48). É, confirmada, a
existência de um invariante que, posteriormente, é definido, qual seja a dimensão de
um espaço vetorial finitamente gerado.
Outros resultados são enunciados e demonstrados, retomando a ideia, até
então tímida, de um conjunto maximal de vetores linearmente independentes, isto é,
os autores apresentam o seguinte resultado: “seja ܸ um espaço vetorial finitamente
gerado e seja ܤ um conjunto linearmente independente em ܸ. Então existe uma
base de ܸ contendo ܤ” (COELHO e LOURENÇO, 2001, p. 51).
Os autores descrevem que sendo ܸ um espaço vetorial não nulo finitamente
gerado, a demonstração do resultado “de que ܸ possui uma base foi estender um
conjunto linearmente independente, até chegarmos a uma base” (COELHO e
LOURENÇO, 2001, p.51). Isto é, apesar de implícita, penso que a noção de base de
um espaço vetorial pode ser concebida, como sendo um conjunto maximal
linearmente independente. Diferente da maneira com que o Teorema do
completamento foi enunciado e trabalhado pelos autores do Livro 1.
Assim, penso que o autor utilizou vários recursos-meta, entre eles: uso de
contraexemplos sobretudo nos exercícios e os princípios de Harel (1997), pois
mostrou resultados válidos para os espaços vetoriais de dimensão finita e
generalizou-os para os de dimensão infinita.
Penso que um estudante ao utilizar esse livro pode refletir sobre a
possibilidade de conceber a noção de base, como sendo: um conjunto maximal
linearmente independente, um conjunto minimal gerador, a justaposição entre um
conjunto maximal linearmente independente e um conjunto minimal gerador e
correlacionada a noção de dimensão.
Apresentadas as abordagens utilizadas no Livro 1 e no Livro 2 para
construção das noções elementares de Álgebra Linear, passo à exposição da
decomposição genética da noção de base de um espaço vetorial, elaborada por
Euán (2007) e Euán et al. (2008).
Eneias Prado Capítulo 4: Análise Teórica
60
A decomposição genética de Euán (2007) e Euán et al. (2008)
Em sua dissertação de mestrado, Euán (2007) apresentou uma
decomposição genética da noção de base de um espaço vetorial. Durante a
elaboração da dissertação, a autora tomou como orientadora a professora Asuman
Oktaç e como coorientadora a professora Maria Trigueros. No ano seguinte, após
concluir seu mestrado, a autora escreveu um artigo em conjunto com essas
professoras, a saber: Euán et al. (2008).
Assim, ao descrever a decomposição genética de Euán (2007), apresento a
versão proposta na dissertação e as considerações efetuadas no artigo Euán et al.
(2008). No que segue, estabeleço o código, no qual ao enunciar pela primeira vez
uma ação tal, indico por Aݔ, um processo tal, indico por Pݔ e um objeto tal, indico
por Oݔ
65
, com ݔ IN.
Euán (2007, p.28)
66
inicia propondo que, para um indivíduo construir a noção
de base de um espaço vetorial, ele deve estar “[...] em um nível de processo para o
conceito de espaço vetorial, e em um nível de ação para as operações entre vetores,
incluindo a multiplicação por um escalar”.
no artigo, é proposto que o indivíduo deve ter uma concepção processo
sobre o conceito de espaço vetorial, o que inclui um bom gerenciamento das
operações entre vetores, incluindo a multiplicação por um escalar” (EUÁN et al.,
2008, p.71)
67
.
Considero que, para Euán (2007), o indivíduo deve possuir uma concepção
processo sobre a noção de espaço vetorial.
Euán et al. (2008, p.72)
68
afirmam que um estudante que possui uma
concepção processo para a noção de espaço vetorial pode, por exemplo, “construir
exemplos de conjuntos que são espaços vetoriais e exemplos que não são; também,
pode decidir quais operações binárias podem ser definidas sobre um conjunto dado
para que este seja um espaço vetorial”.
65
Tanto na versão impressa como na versão digital (no anexo 2), existe uma lista com tais códigos.
Já, na versão impressa, o leitor poderá utilizar o encarte (anexo 4) na leitura.
66
[...] en un nivel de proceso del concepto de espacio vectorial y en un nivel de acción con las
operaciones entre vectores incluyendo la multiplicación por un escalar.
67
[...] una concepción proceso del concepto de espacio vectorial, lo que incluye un buen manejo de
las operaciones entre vectores, incluida la multiplicación por un escalar.
68
[...] construir ejemplos de conjuntos que son espacios vectoriales y ejemplos de conjuntos que no
lo son; también puede decidir cuáles operaciones binarias pueden definirse sobre un conjunto dado
para que éste sea un espacio vectorial.
Eneias Prado Capítulo 4: Análise Teórica
61
Dadas essas primeiras considerações, segundo Euán (2007), o indivíduo
deverá realizar ações com os elementos de um espaço vetorial, isto é, deverá
operar
69
com vetores pertencentes ao espaço vetorial tomado (A1).
O indivíduo prossegue executando a ação que lhe permite verificar se um
dado vetor pode ser escrito como combinação linear de outros vetores (A2), e a ação
que lhe permite verificar a dependência linear entre os vetores de um dado conjunto
(A3), cada uma delas nos termos da aplicação de sua definição.
Euán et al. (2008, p.72)
70
afirmam que, segundo a teoria APOS, “um indivíduo
que não mostra possibilidades de ir além da realização destas ações, demonstra
possuir uma concepção ação sobre o conceito correspondente”.
Para a construção da noção de base de um espaço vetorial, Euán (2007)
exige que o indivíduo execute a ação em que deve repetir as ações A2 e A3 com
vetores pertencentes a diversos espaços vetoriais (A4).
Dessa forma, o indivíduo, ao refletir sobre a ação A4, interioriza essa ação em
um “processo que lhe permite estabelecer se um dado vetor ou um conjunto de
vetores, pertencentes a um espaço vetorial podem ou não ser escritos como
combinação linear dos vetores do conjunto original” (EUÁN, 2007, p.29, grifo do
autor)
71
(P1).
Em relação à construção apresentada, Euán et al. (2008, p.72)
72
, afirmam
que, um indivíduo que possui uma concepção processo sobre a noção de conjunto
gerador pode, por exemplo, “decidir sobre quais propriedades tem que ter os vetores
pertencentes a um espaço vetorial gerado por um dado conjunto gerador”.
A partir do processo interiorizado, P1, Euán (2007) refere que o indivíduo
pode encapsulá-lo em um objeto matemático, ou seja, o indivíduo, ao considerar
como um todo o conjunto de vetores que pode ser escrito em termos dos vetores
dados, encapsula o objeto matemático conjunto gerador (O1).
Segundo Euán (2007), essa encapsulação implica um processo em que o
indivíduo é capaz de reconhecer quais os subconjuntos do espaço vetorial que
podem ser gerados a partir de um dado subconjunto de vetores desse espaço (P2).
69
As operações a que a autora refere-se às operações binárias que definem o espaço vetorial.
70
[...] un individuo que no muestra posibilidades de ir más allá de la realización de estas acciones
muestra una concepción acción del concepto correspondiente.
71
[…] proceso que le permite establecer si un vector dado o un conjunto de vectores pertenecientes a
un espacio vectorial pueden o no ser escritos como combinaciones lineales de los vectores del
conjunto original.
72
[...] decidir que propriedades tienen que tener los vectores pertencientes a un espacio vectorial
generado por un conjunto generador dado.
Eneias Prado Capítulo 4: Análise Teórica
62
Além disso, o indivíduo ao manusear a ação A1 pode desenvolver uma nova ação,
ou seja, ao lhe ser dado um conjunto de vetores, ele identifica dentre as possíveis
combinações lineares, as que produzem o vetor nulo (A5). Assim como a ação que
lhe permite identificar quais seriam os subconjuntos em que existe uma única
combinação linear que resulte no vetor nulo (A6).
Dessa forma, para Euán (2007), as ações A5 e A6 são coordenadas no
processo que permite ao indivíduo determinar se um conjunto de vetores é
linearmente independente (P3).
Euán et al. (2008, p.73)
73
afirmam que um indivíduo que possui uma
concepção processo sobre a noção de dependência linear em um conjunto pode,
por exemplo, “decidir os vetores que podem ser excluídos de um conjunto para
reduzi-lo a um conjunto linearmente independente”.
O processo P3 pode ser considerado como um todo, isto é, encapsulado em
um objeto que permitirá ao indivíduo identificar os conjuntos de vetores que
satisfazem tal propriedade, no caso, define a dependência linear em um conjunto
(O2).
Construídos os objetos O1 e O2, o indivíduo poderá reverter o trajeto
percorrido para formar esses objetos e interiorizar o processo que lhe permite
estabelecer as propriedades vetoriais que justificam a construção (P4), nas palavras
da autora “o indivíduo pode, além disso, reverter os objetos nos processos que lhes
deram origem, para verificar as propriedades dos vetores que os formam” (EUÁN,
2007, p.29)
74
Para Euán (2007), esses processos P1, P2, P3 e P4, ao serem coordenados,
permitem a construção de um novo processo, este permitirá ao indivíduo reconhecer
quais vetores de um determinado conjunto são linearmente independentes e quais
vetores de um espaço vetorial podem ser gerados a partir deles. Para a autora, o
processo inclui dizer se esse conjunto de vetores é indispensável para gerar todos
os elementos de um determinado espaço vetorial (P5).
O processo P5, segundo Euán (2007), pode ser encapsulado pelo indivíduo,
como um todo, isto é, o objeto base de um espaço vetorial, como sendo um conjunto
gerador linearmente independente (O3).
73
[...] decidir cuáles vectores se pueden quitar de un conjunto para reducirlo a un conjunto
linealmente Independiente.
74
[…] el individuo puede además revertir los objetos en los procesos que les dieron origen para
verificar las propiedades de los vectores que los conforman.
Eneias Prado Capítulo 4: Análise Teórica
63
A base permite ao indivíduo, por um lado, caracterizar o espaço vetorial e,
por outro, exercer novas ações, como por exemplo, compará-la com outras bases e
conjuntos, tomá-la como ponto de partida para a mudança de base, etc.” (EUÁN et
al., 2008, p.73)
75
.
Assim, Euán (2007) afirma que o indivíduo ao ser capaz de relacionar essas
ações, esses processos e objetos descritos começa a organizá-los em sua mente, a
partir dessas relações, mais ou menos consistentes, é possível dizer qual concepção
o indivíduo demonstra ter sobre a noção de base de um espaço vetorial, isto é, se é
uma concepção ação, concepção processo ou concepção objeto.
Feita a decomposição genética, Euán (2007) descreveu um roteiro de
entrevista. Com esse roteiro, entrevistou estudantes que haviam cursado Álgebra
Linear e concluiu que, para um estudante construir uma concepção objeto sobre a
noção de base de um espaço vetorial, além de uma concepção processo sobre a
noção de espaço vetorial, é necessário que ele possua uma concepção processo
sobre as noções de conjuntos e subespaços, pois os entrevistados o atentaram
que os vetores de uma base para um espaço vetorial ou para um subespaço devem
pertencer ao espaço vetorial considerado.
Ainda, em suas conclusões, Euán (2007), também, afirma que, com a parte
empírica, foi possível verificar que a decomposição inicial deu conta de explicar as
dificuldades que os alunos têm ao construir uma concepção processo sobre a noção
de base de um espaço vetorial. No entanto, não foi possível observar a
encapsulação dos processos em objetos matemáticos, pois nenhum dos estudantes
que participou das entrevistas, mostrou tê-lo encapsulado.
A seguir, analiso a decomposição genética proposta por Euán (2007) e Euán
et al. (2008), para a noção de base de um espaço vetorial.
75
[…] por una parte, caracterizar el espacio vectorial y, por la otra, ejercer sobre él nuevas acciones,
como por ejemplo, compararlo con otras bases y conjuntos, tomarlo como punto de partida para
cambiar de base, etcétera.
Eneias Prado Capítulo 4: Análise Teórica
64
Refinamento da decomposição genética apresentada
Na seção anterior, descrevi a decomposição genética da noção de base de
um espaço vetorial elaborada por Euán (2007) e Euán et al. (2008). Segundo
Trigueros (2005), uma decomposição genética não é algo fechado, pronto, ela
depende, geralmente, da maneira como o pesquisador concebe a noção em estudo.
No meu caso, minha concepção sobre a noção de base de um espaço vetorial
era somente, como sendo um conjunto gerador com vetores linearmente
independentes. Mas, ao estudar os trabalhos, sobretudo, os desenvolvidos no
âmbito do GPEA, essa concepção pôde ser ampliada e passei a conceber a noção
de base, como sendo: um conjunto minimal gerador, um conjunto maximal de
vetores linearmente independentes e a justaposição entre um conjunto minimal
gerador e um conjunto maximal de vetores linearmente independentes. Assim,
analiso a decomposição genética de Euán (2007) e Euán et al. (2008) sobre o ponto
de vista dessas três concepções.
Euán et al. (2008) iniciaram afirmando que, para um indivíduo construir a
noção de base de um espaço vetorial, ele deverá possuir uma concepção processo
sobre a noção de espaço vetorial, conjunto e subespaço. As autoras, também,
referem que o indivíduo, ao possuir uma concepção processo sobre a noção de
espaço vetorial, deve ter um bom gerenciamento das operações binárias.
Nesse aspecto, concordo com as autoras e destaco que o indivíduo que
possui uma concepção processo sobre a noção de espaço vetorial é capaz de,
segundo Parraguez (2009), realizar as ações que lhe permitem identificar um espaço
vetorial, citar exemplos de espaços vetoriais e de conjuntos que não são espaços
vetoriais e, ainda, operar com vetores desses espaços, sendo as operações: a
adição entre vetores e a multiplicação de um vetor por um escalar pertencente ao
corpo, no caso desta pesquisa, o corpo dos reais.
Outro ponto que observo é que todo subespaço vetorial é um espaço vetorial
e, ainda, todo espaço vetorial é subespaço de si mesmo. Assim, no momento em
que o principal interesse é a construção de uma concepção objeto sobre a noção de
base de um espaço vetorial, não necessidade do indivíduo possuir uma
concepção processo sobre a noção de subespaço.
Eneias Prado Capítulo 4: Análise Teórica
65
Quanto à noção de conjunto, é real a necessidade de sua inclusão, afinal
Dorier et al. (1997) e Rogalsky (1997) o apontavam, com a linguagem de
conjuntos, como sendo noções essenciais para introdução das noções elementares
de Álgebra Linear, assim como Parraguez (2009), também, descreveu em sua
decomposição genética.
Pode-se, dizer que a não compreensão dessa noção permite que os alunos
considerem como base de um espaço vetorial, um conjunto de vetores que não
esteja totalmente contido no espaço ou, até mesmo, não possua nenhum vetor
pertencente ao espaço em questão. Desta forma, apresento como o indivíduo que
possui uma concepção objeto sobre a noção de conjunto, aquele que é capaz de
reconhecer os elementos de um conjunto, apresentar exemplos de conjuntos e ter
domínio da linguagem da teoria dos conjuntos.
Com a concepção objeto sobre a noção de conjunto, penso que o indivíduo
deverá possuir, também, uma concepção objeto sobre a noção de subconjunto e
sobre a pertinência de um elemento a um conjunto. Assim, considero que um
indivíduo que possui uma concepção objeto sobre a noção de subconjunto é capaz,
por exemplo, de dado um conjunto apresentar seus subconjuntos e dado um
subconjunto dizer em qual conjunto ele está contido. Um indivíduo que possui uma
concepção objeto sobre pertinência de elemento a conjuntos é capaz de
identificar os elementos que pertençam a um dado conjunto.
Feitas essas considerações, proponho como necessário para a construção
da noção de base de um espaço vetorial que o indivíduo tenha concepção objeto
sobre conjunto, subconjunto e pertinência de elemento a conjunto, além de
concepção processo sobre espaço vetorial. Nos dados do Quadro 1, sintetizo essas
considerações.
Quadro 1: Concepções que um indivíduo deve ter para construir a noção de base
Propostas
Concepções
Euán (2007) Refinamento
Processo
Espaço Vetorial;
Conjunto;
Subespaço.
Espaço Vetorial.
Objeto ----
Conjunto;
Subconjunto;
Pertinência de elemento a um conjunto.
Eneias Prado Capítulo 4: Análise Teórica
66
Ao tecer as considerações sobre a inserção da concepção objeto sobre a
noção de conjunto, acrescento que, para Dorier et al. (1997), uma das dificuldades
que os alunos apresentam ao cursarem Álgebra Linear ocorre pelo formalismo
exigido pela disciplina que, segundo Rogalsky (1997), não se deve a linguagem
conjuntivista, mas em parte ocorre também pelo uso do critério de verdade utilizado
em Matemática, pela prática com a lógica elementar, pois constatou por exemplo,
[...] que a implicação e a equivalência geram dificuldades,
particularmente em álgebra, se as mesmas não forem diferenciadas;
assim, os estudantes concluem frequentemente uma demonstração
de independência por (se os ܽ
são nulos, mostra-se que ܽ
ݑ
+
ܽ
ݑ
+ ⋯+ ܽ
ݑ
= 0, por consequência ݑ
são independentes)!
(ROGALSKY, 1997, p. 161)
76
.
Ainda sobre o uso do critério de verdade em Matemática, Machado e
Nogueira (2005, p.68) descrevem ser esse um ponto conflitante para o aluno, pois
foge de sua prática cotidiana, foge do “senso comum”. Conduzindo, assim, a duas
confusões epistemológicas. A primeira, está relacionada ao silogismo matemático
ܣ ֜ ܤ”, aceito apenas formalmente pelos alunos, pois as autoras afirmam que “se
em uma dedução o resultado obtido B é inverossímil, ainda assim é aceito, sem que
a própria demonstração seja contestada”. A segunda, que essa confusão se pelo
fato de, no cotidiano, o critério de verdade ser relacionado ao grande número de
ocorrências encontradas. Isto é,
uma das regras fundamentais da Matemática: um contra-exemplo é
suficiente para determinar que uma propriedade é falsa, na vida
cotidiana é transformada em uma regra paradoxalmente oposta que
afirma que um fato que ocorre na maior parte dos casos, mesmo que
não ocorra em todos os casos, é considerado verdadeiro
(MACHADO e NOGUEIRA, 2005, p.69).
As autoras, também, afirmam que “para a maior parte dos alunos, tal forma de
pensar não é adquirida ‘naturalmente’” (MACHADO e NOGUEIRA, 2005, p.69) e, em
geral, nos cursos de Matemática os alunos retêm apenas o discurso do professor e
76
[…] que le implication et le équivalence soulèvent des difficultés, particulièrement en algèbre, si on
ne les distingue pas; ainsi, les étudiants concluent assez souvent une démonstration de
indépendance par <<si les ܽ
sont nuls, on a montré que ܽ
ݑ
+ ܽ
ݑ
+ ⋯+ ܽ
ݑ
= 0, donc les ݑ
sont indépendants>>!
Eneias Prado Capítulo 4: Análise Teórica
67
reproduzem por imitação suas técnicas e maneiras de demonstração” (MACHADO e
NOGUEIRA, 2005, p.70).
Assim, levando em conta que, durante o trabalho de um matemático, as
formulações e resoluções de conjecturas são fundamentais, porque não utilizar a
Álgebra Linear, que é um campo fértil de resultados a serem justificados, para
estimular o uso dessa ferramenta, ou seja, o uso de contraexemplos?
Retornando a decomposição genética apresentada por Euán (2007), tem-se
que o indivíduo constrói a noção de base de um espaço vetorial a partir das três
ações, a saber, A1, A2 e A3.
Discordo de Euán (2007), pois um indivíduo que aparenta possuir uma
concepção processo sobre espaço vetorial, ao realizar a ação A1 com vários
elementos pode generalizá-la, e assim, construir a ação que lhe permite verificar a
combinação linear entre vetores (A7).
Um exemplo dessa construção é o do indivíduo que, considerando três
vetores ݏ = (1,5,0,
), ݐ = (−1,0,1,
షభ
) e ݑ = (2,5,−1,1) pertencentes ao espaço
vetorial com as operações binárias usuais IR
4
, ao verificar se o vetor ݏ pode ser
escrito como combinação linear dos vetores ݐ e ݑ, utiliza a ação A1, ou seja,
(−1,0,1,
షభ
) + (2,5,−1,1) = (−1 + 2, 0 + 5, 1 +
(
−1
)
,
షభ
+ 1) = (1,5,0,
),
e conclui que o vetor ݏ pode ser escrito como combinação linear dos outros dois
vetores.
Nos dados do Quadro 2, sintetizo as ações que Euán (2007) e Euán et al.
(2008) consideram e as que percebo, como sendo necessárias para um indivíduo
construir a noção de base de um espaço vetorial.
Quadro 2: Primeiras Ações proposta para a construção da noção de base
Proposta por Euán (2007)
Refinamento
A1: operar (operações binárias que definem
um espaço vetorial) com vetores pertencentes
a um espaço vetorial e com escalares
pertencentes ao corpo dos reais.
A1: operar (operações binárias que definem
um espaço vetorial) com vetores pertencentes
a um espaço vetorial e com escalares
pertencentes ao corpo dos reais.
A2: verificar se um dado vetor pode ser
escrito como combinação linear de outros
vetores, nos termos da definição.
A7: verificar a combinação linear entre
vetores a partir da ação A1.
A3: verificar a dependência linear entre os
vetores de um dado conjunto, nos termos da
definição.
Eneias Prado Capítulo 4: Análise Teórica
68
As demais concepções que o indivíduo deve possuir, em parte, estão
relacionadas à concepção processo sobre espaço vetorial e, em parte, servem de
suporte para a construção da noção de base de um espaço vetorial.
Segundo Euán (2007), o indivíduo ao coordenar as ações A1, A2 e A3,
constrói a ação A4 que é interiorizada no processo P1. Esse processo permitir-lhe-á
estabelecer se um dado vetor ou um dado conjunto de vetores pertencentes a um
espaço vetorial pode(m) ser escrito(s), como combinação linear de vetores
pertencentes a um certo conjunto. Para a autora, esse processo P1 –,
posteriormente, é encapsulado no objeto conjunto gerador O1 que, por meio da
reversibilidade, permite ao indivíduo construir o processo P2, ou seja, o processo em
que é possível reconhecer quais os subconjuntos do espaço vetorial que podem ser
gerados a partir de um dado subconjunto de vetores desse espaço. Esta construção
está representada na Figura 2.
Figura 2: Construção da noção de Conjunto Gerador – Euán (2007)
Divergindo de Euán (2007), penso que, para esta construção, não
necessidade das ações A2 e A3, pois o indivíduo ao generalizar a ação A1 constrói
a ão A7 que pode ser interiorizada no processo P1. Esse processo pode ser
encapsulado no objeto O1 que, posteriormente, possibilita ao indivíduo abstrair
reflexivamente e construir o processo P2. Assim, o P2 poderá ser encapsulado no
objeto matemático Conjunto Gerador/Espaço Gerado (O4). Afinal, da construção do
objeto conjunto gerador tem-se, naturalmente, a noção de espaço gerado. A
construção descrita está representada na Figura 3.
Encapsulação
O1
A4
P1
Interiorização
Coordenação
Coordenação
A2
A1
Coordenação
A3
P2
Reversibilidade
Eneias Prado Capítulo 4: Análise Teórica
69
Figura 3: Refinamento – Construção da noção de Conjunto Gerador/Espaço Gerado
Um exemplo, desta construção proposta ocorreu na pesquisa de Oliveira
(2005, p.66) durante a análise das aulas de um professor que questionou seus
alunos sobre a possibilidade de substituir os “__” por números reais, de maneira que
a seguinte igualdade fosse verdadeira __
0 0
1 2
ቁ + __
0 5
1 0
=
0 − 5
0 2
e,
posteriormente, questionou-os sobre quais vetores poderiam ser escritos a partir
desses vetores. Enquanto apresentava a questão, o professor comentou que “a idéia
é ... combinação linear. O que seria combinação linear? ... A partir de alguns vetores
dados, alguns vetores que eu tenho, eu produzir outros vetores”.
Assim, o estudante ao verificar a validade da igualdade pode utilizar a ação
A1 que, posteriormente, poderá conduzi-lo à construção da ação A7. E, então, ao
verificar quais vetores podem ser escritos a partir dos vetores dados, o estudante
poderá, ainda, interiorizar essas ações no processo P1 que, por sua vez, conduzirá à
construção da noção de conjunto gerador e, consequentemente, o objeto O4.
Tendo o indivíduo construído o objeto O4, suponho, por meio da
reversibilidade, que ele poderá construir o processo que lhe permitirá obter um
conjunto minimal gerador (P6), pois como afirmam Coelho e Lourenço (2001, p.43),
citados na página 57 e 58 deste trabalho, “[...] um espaço vetorial possui muitos
conjuntos geradores e, muitas vezes, é importante termos um conjunto gerador que
seja o menor possível”.
O indivíduo, então, poderá encapsular o objeto base de um espaço vetorial,
isto é, base como sendo um conjunto minimal gerador (O5). Este refinamento é
interpretado na Figura 4.
Figura 4: Refinamento – base: um conjunto minimal gerador
Encapsulação
O5
Reversibilidade
P6
O4
Reversibilidade
Encapsulação
O1
A1
Generalização
A7
Interiorização
P1
O4
P2
Encapsulação
Eneias Prado Capítulo 4: Análise Teórica
70
Em sua construção, Euán (2007) propõe que, a partir da ação A1, o indivíduo
construa duas outras ações, A5 e A6. Na primeira, deverá identificar dentre as
possíveis combinações lineares de um conjunto de vetores quais resultam no vetor
nulo; na segunda, deverá identificar dentre esses conjuntos, quais permitem obter
combinações lineares que resultem de maneira única no vetor nulo.
Segundo Euán (2007), essas ações, A5 e A6, são coordenadas no processo
P3 que permite ao indivíduo determinar se um conjunto de vetores é linearmente
independente. O processo, posteriormente, é encapsulado no objeto O2,
dependência linear em um conjunto. Na Figura 5, apresento um diagrama para esta
construção.
Figura 5: Construção da noção de dependência linear – Euán (2007)
Neste ponto, Euán (2007) descreveu o trajeto para construir o objeto O2, isto
é, para esta construção o indivíduo executa sobretudo as ações A5 e A6. No
entanto, penso que a ação A5 é desnecessária, pois a dependência linear da
maneira como é proposta pela autora, está relacionada com o modo único de se
obter o vetor nulo.
Assim, proponho que o indivíduo coordene o objeto O4, conjunto
gerador/espaço gerado e o processo P6 que lhe permite obter o menor conjunto
gerador, de maneira que realize a ão em que deve considerar vetores do conjunto
gerador e verificar se esses vetores podem ser escritos, como combinações lineares
um dos outros (A8).
Caso nenhum dos vetores considerados possam ser escritos como
combinações lineares uns dos outros, o indivíduo escolherá mais vetores no
conjunto gerador e verificará se esses outros vetores continuam ou não sendo
combinações lineares um dos outros. Caso haja vetores que possam ser escritos
como combinação linear, o indivíduo realiza a ão em que deve eliminar esses
Coordenação
Coordenação
Coordenação
A5
A1
A6
Encapsulação
O2
P3
Eneias Prado Capítulo 4: Análise Teórica
71
vetores (A9). Assim, o indivíduo repete a ação A9, até que todos os vetores desse
conjunto não possam ser escritos, como combinações lineares entre si.
Desta maneira, o indivíduo ao coordenar as ações A8 e A9 constrói o
processo P3, ou seja, o processo que lhe permite verificar a dependência linear em
um conjunto de vetores. Esta construção diferencia-se da apresentada por Euán
(2007), pois o indiduo irá identificar os vetores que não formam combinações
lineares entre si, como sendo vetores linearmente independentes e os que formam
combinações lineares como linearmente dependentes. Assim, o processo P3,
posteriormente, será encapsulado no objeto O2, veja a Figura 6.
Figura 6: Refinamento – Construção da noção de dependência linear
Um exemplo dessa construção é o do indivíduo que obtém o conjunto
ܩ = {5,,
+ 2,ݔ
} e afirma ser um conjunto gerador do espaço vetorial ܲ
(IR).
Como o conjunto não é minimal, o indivíduo busca pelo menor conjunto gerador, ou
seja, verifica que os vetores 5 e não podem ser escritos um como combinação
linear do outro. Assim, toma o vetor
+ 2 e verifica que também não pode ser
escrito como combinação linear de 5 e . O indivíduo, então, toma o vetor ݔ
e
verifica que, ݔ
=
షల
భఱ
.5 + 0. +
.3ݔ
+ 2, ou seja, afirma que o vetor ݔ
é
linearmente dependente. Dessa forma, obtém um conjunto gerador minimal, ou seja,
o conjunto
{
5,,
+ 2
}
.
Em seguida, ao reverter o objeto O2 poderá construir o processo que lhe
permite obter o maior conjunto de vetores linearmente não dependentes
(independentes) (P7). E, posteriormente, encapsulá-lo no objeto base de um espaço
vetorial, como sendo um conjunto maximal de vetores linearmente independentes
(O6). Essa construção pode ser observada na Figura 7.
Encapsulação
O2
P3
Coordenação
A8
A9
Coordenação
O4
P6
Eneias Prado Capítulo 4: Análise Teórica
72
Figura 7: Refinamento – base: um conjunto maximal linearmente independente
Um exemplo de encapsulação da noção de base de um espaço vetorial, como
sendo um conjunto maximal de vetores linearmente independentes, poderá ser
observado quando um sujeito ao justificar que o conjunto
{
5,,
+ 2
}
é uma
base para o ܲ
(IR), afirma que esse conjunto é uma base, pois é um conjunto
maximal de vetores linearmente independentes e, qualquer outro vetor considerado
no espaço vetorial, é linearmente dependente desses vetores.
Euán (2007) referiu que o indivíduo ao coordenar os processos P1, P2, P3 e
P4 constrói o processo P5, que é encapsulado no objeto base, como sendo um
conjunto gerador linearmente independente O3 –, conforme representado na
Figura 8.
Figura 8: Base: um conjunto gerador linearmente independente – Euán (2007) –
No entanto, penso que um indivíduo, ao coordenar os processos P6 e P7,
poderá construir o processo que lhe permite identificar um conjunto minimal gerador,
como sendo um maximal linearmente independente (P8). Esse processo poderá,
ainda, ser encapsulado no objeto base de um espaço vetorial, como sendo uma
justaposição entre um conjunto maximal linearmente independente e um conjunto
minimal gerador, isto é, no objeto O3: base, como sendo um conjunto gerador
linearmente independente, veja Figura 9.
Figura 9: Refinamento – base: um conjunto gerador linearmente independente
Coordenação
P6
P7
Encapsulação
P8
O3
Encapsulação
O6
Reversibilidade
P7
O2
Coordenação
P2
P1
P3
P4
O3
P5
Encapsulação
Eneias Prado Capítulo 4: Análise Teórica
73
Nesta seção, abordei as ações, os processos e os objetos que podem ser
construídos pelo indivíduo (veja Figura 10). Mas não discuti as concepções que
podem ser formadas, pois, em linhas gerais, um indivíduo com uma concepção ação
sobre uma noção matemática está limitado a operar somente com ações, assim
como um indivíduo que possui uma concepção processo sobre uma noção
matemática, está limitado a operar com processos e um indivíduo que possui uma
concepção objeto sobre uma noção matemática tem estruturado essas ações e
processos de maneira que possa utilizá-los quando lhe for conveniente.
Figura 10: Refinamento
Na próxima seção, retomarei esse refinamento da decomposição genética da
noção de base de um espaço vetorial, farei uma expansão para a noção de
dimensão. Nesta decomposição, estabelecerei as correlações entre as noções
Coordenação
O2
Encapsulação
Encapsulação
Coordenação
O3
O5
O6
Coordenação
Interiorização
Generalização
Encapsulação
A1 A7
P1
O1
Reversibilidade
Coordenação
A8
A9
Encapsulação
P3
O4
P2
Encapsulação
Reversibilidade
P6
Reversibilidade
P7
Encapsulação
P8
Eneias Prado Capítulo 4: Análise Teórica
74
elementares de Álgebra Linear, assim como, definirei o que considero ser uma
concepção ação, concepção processo e concepção objeto sobre essas noções.
Expansão da decomposição genética
Ao retomar a análise feita na seção anterior, descrevo e justifico a
decomposição genética que proponho para as noções de base e de dimensão de
um espaço vetorial. Essa decomposição é uma expansão daquela apresentada por
Euán (2007) e Euán et al. (2008), pois, além dos três pontos de vista que podem ser
adotados ao se conceber a noção de base de um espaço vetorial, estabeleço
correlações entre as ações elementares de Álgebra Linear, sobretudo, com o
importante invariante dessa estrutura, a dimensão.
Para construir as noções de base e de dimensão de um espaço vetorial o
indivíduo deve possuir:
concepção objeto sobre as noções de conjunto, subconjunto e
pertinência de elemento a conjunto; e
concepção processo sobre a noção de espaço vetorial.
Conforme ilustrado na Figura 10, o indivíduo executa a ação A1 com
elementos de diferentes espaços vetoriais. Essa ação é generalizada, e ele constrói
a ação A7. Essas duas ações sustentam a decomposição genética a qual proponho,
pois, por meio delas, o indivíduo poderá construir a noção de base de um espaço
vetorial, segundo os três pontos de vista: um conjunto maximal de vetores
linearmente independentes; um conjunto minimal gerador; e um conjunto gerador
linearmente independente.
O indivíduo após ter generalizado a ação A1, repete a ação A7 com diversos
vetores de espaços vetoriais distintos e a interioriza no processo P1. Tendo
interiorizado esse processo, ele por meio da coordenação da ação A1 com P1,
poderá construir o processo que lhe permite expressar todas as combinações
lineares que podem ser obtidas a partir de um conjunto de vetores (P9).
Um exemplo dessa construção é o do aluno que descreve os conjuntos de
vetores que podem ser escritos como combinação linear dos conjuntos de vetores
dados ܷ = {
(
3,2
)
}, ܵ = {
(
2,1
)
,
(
0,1
)
,(1,1)} e ܮ = {
(
1,0
)(
1,1
)
}. No caso, ܣ = {
(
,
)
߳
Eneias Prado Capítulo 4: Análise Teórica
75
I: ܽ ߳ IR}, ܤ = {
(
+ 1ܿ,ܽ + ܾ + ܿ
)
߳I:ܽ,ܾ,ܿ ߳IR} e ܥ = {
(
ܽ + ܾ,ܾ
)
߳I:ܽ,ܾ ߳IR},
respectivamente. A construção descrita está representada na Figura 11.
Figura 11: Construção do processo P9
O indivíduo revertendo o processo P9 poderá construir o processo que lhe
permite identificar subconjuntos de vetores de um espaço vetorial que são conjuntos
geradores desse espaço (P10). Prosseguindo, o indivíduo coordena os processos
P9 e P10 de maneira que possa construir o objeto matemático conjunto gerador e,
consequentemente, o objeto espaço gerado – O4 –, veja Figura 12.
Figura 12: Construção do objeto O4
Um exemplo dessa construção segue ao anterior, pois o indivíduo reconhece
que os conjuntos ܵ e ܮ, por exemplo, são conjuntos geradores do espaço vetorial
com as operações binárias usuais em IR². Por outro lado, os conjuntos ܣ, ܤ e ܥ são
espaços gerados pelos conjuntos ܷ, ܵ e ܮ.
Assim, o indivíduo tendo diversos conjuntos geradores para um mesmo
espaço vetorial, procura “descartar” os vetores “desnecessários”, pois são
combinações lineares uns dos outros A8/A9 –. Desta forma, coordena A8 e A9 no
processo P6 que, posteriormente, é encapsulado no objeto base de um espaço
vetorial, como sendo um conjunto minimal gerador – O5 –, veja Figura 13.
P10
O4
Coordenação
Reversibilidade
P9
A7
P1
Coordenação
P9
A1
Generalização
Interiorização
Eneias Prado Capítulo 4: Análise Teórica
76
Figura 13: Construção do objeto O5
Ao reverter o processo P6, o indivíduo poderá construir a ação que lhe
permitirá identificar vários conjuntos minimais geradores para um mesmo espaço
vetorial e observar a existência de um invariante (A10). Esta ação é interiorizada no
processo que lhe permitirá dizer qual o menor número de vetores necessários para
gerar tal espaço (P11). Esse número de vetores é, então, encapsulado no objeto
Dimensão (O7). Esta construção é representada na Figura 14.
Figura 14: Construção da noção de dimensão
O indivíduo que construiu o objeto O7, poderá coordená-lo com o objeto
conjunto gerador/espaço gerado O4 e construir o objeto base de um espaço
vetorial, como sendo um conjunto gerador com o número de vetores, exatamente,
igual à dimensão desse espaço (O8), veja Figura 15.
Figura 15: Base de um espaço vetorial correlacionada à noção de dimensão
Um exemplo é o do aluno que conhece a dimensão do conjunto das matrizes
dois por três ܯ
ଶ×ଷ
(IR) –, ou seja, a dimensão é seis. Esse indivíduo, então, busca,
por um conjunto gerador para esse espaço com exatamente seis vetores, obtendo,
assim, a base.
Encapsulação
Interiorização
P11
A10 O7
Reversibilidade
P6
O8
Coordenação
O4
O7
P10
Encapsulação
O5 P6
Coordenação
A8
A9
Reversibilidade
Eneias Prado Capítulo 4: Análise Teórica
77
A construção da noção de base de um espaço vetorial, como um conjunto
minimal gerador, da noção de dimensão e a correlação entre elas está representada
na Figura 16.
Figura 16: Construção das noções de base e de dimensão de um espaço vetorial
Essa construção permitiu o desenvolvimento das noções de: combinação
linear, conjunto gerador/espaço gerado, dimensão e base de um espaço vetorial.
Como a noção de dependência linear de um conjunto está implícita nessa
construção, no que segue, descrevo-a de maneira explícita e, consequentemente,
apresento a construção de outro ponto de vista para a noção de base de um espaço
vetorial, ou seja, como sendo um conjunto maximal linearmente independente.
Para iniciar tal construção, retomo a ideia de Costa e Catarino (2007) que se
assume o fato da aprendizagem em Matemática pressupor a conexão de novas
P1
A1 A7
Interiorização
Generalização
Coordenação
P9
Reversibilidade
Reversibilidade
P10
O5
A8
A9
Coordenação
P6
Encapsulação
Reversibilidade
P11
A10
Interiorização
Encapsulação
O7
O4
Coordenação
Coordenação
O8
Eneias Prado Capítulo 4: Análise Teórica
78
noções a noções já estudadas. O fato, também, foi discutido nos trabalhos de Araújo
(2002), Padredi (2003) e Oliveira (2005). Mas, Costa e Catarino (2007) centralizaram
em seu estudo a descontinuidade existente entre as noções de colinearidade e
dependência linear.
Penso que sempre a noção de dependência linear em um conjunto aparenta
estar atrelada à necessidade de obter um conjunto minimal gerador, ou a
necessidade de se escrever combinações lineares de uma única maneira. Assim,
também, retomo a questão apresentada na página 43 deste trabalho: será possível
construir a noção de base de um espaço vetorial iniciando pela noção de
dependência linear?
Na tentativa de minimizar a descontinuidade descrita por Costa e Catarino
(2007) e responder à questão, proponho que o indivíduo retome a ação A1 em que
deve operar com vetores pertencentes ao espaço vetorial em estudo. No entanto, o
ele executará a ão com vetores pertencentes ao I e ao I. Posteriormente,
generalizará essa ação de maneira que possa construir a ação A7, para esses
espaços.
Então, deverá recorrer à Geometria Analítica e retomar os objetos vetores
colineares e vetores coplanares. Não estou interessado no vetor com sua
representação “geométrica”, pois esta poderá ser um obstáculo para o indivíduo,
assim como verificou Gueudet-Chartier (2000).
Dessa forma, com o uso da coordenação entre a ação A7 com a ação que lhe
permite verificar se os vetores são colineares (ou coplanares) (A11), o indivíduo
constrói o processo que lhe permite dizer se um vetor pertencente ao espaço vetorial
I (ou I) depende do outro ou não (P12). Esta construção está representada na
Figura 17.
Figura 17: Construção do processo P12
Há, agora, a necessidade de o indivíduo generalizar esta definição para todos
os espaços vetoriais, porém Dreyfus afirma que
P12
A11
A7
Coordenação
Eneias Prado Capítulo 4: Análise Teórica
79
na transição do espaço vetorial I
concreto para um espaço vetorial
abstrato, o foco de atenção repousa nas relações entre os vetores
[...]. A fim de fazer essa transição, é necessário que o sujeito seja
capaz de conceber o objeto ‘vetor’ em termos puramente de suas
relações com outros objetos semelhantes, ou diferentes (vetores ou
escalares), e aceite que o próprio objeto não é mais especificado por
mais nenhuma outra propriedade intrínseca. Considerando somente
essas relações, possibilita o sujeito tirar conclusões a partir delas que
geralmente serão válidas, independentemente das propriedades
intrínsecas específicas desses vetores (DREYFUS, 1991, p.36)
77
.
Assim, o indivíduo, ao generalizar a ação A11 e o processo P12, constrói o
objeto O2, isto é, a dependência linear para qualquer conjunto.
Como exemplo dessa generalização, é o do aluno ao expressar: os vetores
de um conjunto são ditos linearmente independentes, se nenhum deles for escrito
em função dos outros, ou ainda, for proporcional aos outros vetores do conjunto.
A partir do objeto O2, o indivíduo utiliza-se da reversibilidade e constrói a
ação que lhe permite encontrar subconjuntos de vetores que não sejam linearmente
dependentes, isto é, obtém os vetores linearmente independentes e, com isso,
observa a existência de subconjuntos com diferentes números de vetores (A12).
Esta ação é, então, interiorizada no processo P8, ou seja, no processo que lhe
permite obter o maior subconjunto de vetores linearmente independentes.
Posteriormente, esse processo seencapsulado no objeto matemático base de um
espaço vetorial, como sendo um subconjunto maximal de vetores linearmente
independentes – O6–, veja Figura 18.
Figura 18: Construção do objeto O6
Dessa maneira, o indivíduo vai considerar o conjunto de vetores obtido, como
sendo o maior conjunto de vetores linearmente independentes, quando qualquer
outro vetor considerado no espo e incluído ao conjunto torná-lo um conjunto
linearmente dependente.
77
In the transition from the concrete vector space IR³ to the notion of an abstract vector space, the
relationships between the vectors become the focus of attention […]. In order to make this transition,
one needs to be able to conceive of the object “vector” purely in terms of its relationships to other
similar or different objects (vectors or scalars), and accept that the object itself is not further specified
by any intrinsic properties. Considering only these relationships, enables one to draw conclusions from
them which will be generally valid, independently of the specific intrinsic properties of the vectors.
A12
O2
Reversibilidade
Interiorização
P8
Encapsulação
O6
Eneias Prado Capítulo 4: Análise Teórica
80
Depois, o indivíduo, assim como fez para os conjuntos geradores, reverte o
processo P8 e constrói a ação que lhe permite identificar para um mesmo espaço
vetorial, distintos conjuntos maximais de vetores linearmente independentes e,
consequentemente, observar a existência de um invariante (A13), isto é, esses
subconjuntos distintos têm a mesma dimensão.
A ação A13 é interiorizada no processo que lhe permite dizer qual o maior
número de vetores linearmente independentes que pode ser obtido em um
determinado espaço vetorial (P13). Esse processo é, então, encapsulado no objeto
Dimensão – O7–, veja Figura 19.
Figura 19: Construção do objeto O7
Um exemplo é o do indivíduo que obtém os conjuntos, pertencentes ao
espaço vetorial ܲ
(IR), ܣ = {1,
}, ܤ = {
ݔ,ݔ
,−ݔ
+ 2}, ܥ = ,ݔ
,ݔ
}, ܦ =
{
1,1 + ݔ,ݔ
,
}
e ܧ =
{
1,ݔ,ݔ
,ݔ
}
, todos linearmente independentes e observa
que eles possuem quantidades diferentes de vetores. Esse indiduo procura pelo
maior conjunto linearmente independente e, então, observa que os maiores
conjuntos linearmente independentes são os conjuntos ܦ e ܧ, com quatro vetores. E
mais, qualquer outro conjunto maximal de vetores linearmente independentes desse
espaço vetorial terá, exatamente, quatro vetores.
Assim, o indivíduo coordenando o objeto Dimensão – O7– com o objeto
conjunto linearmente independente O2–, poderá construir o objeto base de um
espaço vetorial, como sendo um conjunto linearmente independente com o número
de vetores, exatamente, igual à dimensão desse espaço (O9), Figura 20.
Figura 20: Construção do objeto O9
Encapsulação
Interiorização
P13
A13 O7
Reversibilidade
P8
O9
Coordenação
O2
O7
Eneias Prado Capítulo 4: Análise Teórica
81
A construção da noção de base de um espaço vetorial, como sendo um
conjunto maximal de vetores linearmente independentes, da noção de dimensão e a
correlação entre essas noções é representada na Figura 21.
Figura 21: Base: um conjunto maximal linearmente independente
Descrevi a construção da noção de base de um espaço vetorial sob dois
aspectos principais, base como sendo um subconjunto maximal de vetores
linearmente independentes e como sendo um subconjunto minimal gerador, assim
como a correlação com a noção de dimensão.
Sendo a intuição um dos processos que permeia o pensamento matemático
avançado, pois, segundo Dreyfus (1991, p.40)
78
, é a que “ocorre imediatamente da
cognição direta, sem evidência de pensamento racional”. O indivíduo intui que: ou as
duas definições para a noção de base de um espaço vetorial são complementares
ou são equivalentes (P14).
78
by immediate direct cognition without evidence of rational thought.
A11
A1
com vetores do I e
do
I
R
³
Generalização Coordenação
A7
com vetores do IR² e
do
I
R
³
P13O
4
Generalização
O9
Coordenação
O2
A12
Interiorização Encapsulação
O6
Reversibilidade
P8
Reversibilidade
A13
Interiorização
P14
Encapsulação
O7
Eneias Prado Capítulo 4: Análise Teórica
82
Esta indagação visa a conduzir o indivíduo a um segundo processo, o de
verificar (P15), que Dreyfus (1991, p.40)
79
define, como sendo o ato de “utilizar
recursos para se convencer de que um resultado realmente responde à questão que
foi feita e se responde corretamente. Um caminho útil é verificar com o uso de um
procedimento inverso”.
Aqui vale salientar que, segundo Dreyfus,
comumente, a verificação não é vista pelo estudante como uma parte
essencial da atividade matemática. Embora a verificação possa lhe
dar muita segurança, a maioria dos estudantes parece não estar
muito interessado nessa segurança. Isto pode e deve ser modificado
pela transferência de mais responsabilidade pelo processo de
aprendizagem do professor para o estudante [...] (DREYFUS, 1991,
p.40-41)
80
.
Com esta abordagem, proponho que a primeira ação que o indivíduo irá
realizar para verificar suas hipóteses, será obter um subconjunto maximal de vetores
linearmente independentes do espaço vetorial. Feito isso, o indivíduo irá verificar se
esse subconjunto é um subconjunto minimal gerador do espaço em questão (A14).
Posteriormente, executará a ão em que deve obter um subconjunto minimal
gerador do espaço vetorial e verificar se esse subconjunto é maximal linearmente
independente (A15).
O indivíduo realiza essas ações para diversos espaços vetoriais, tanto
considerando um subconjunto maximal linearmente independente como
considerando um subconjunto minimal gerador, que o conduzirá à ação em que
conjectura a existência de uma equivalência entre O5 e O6 (A16) e, utilizando os
processos mais formais, o indivíduo provará que todo conjunto maximal linearmente
independente é, ao mesmo tempo, um conjunto minimal gerador – P15 –.
O processo P15 é, então, encapsulado no objeto matemático, base de um
espaço vetorial, em que a base é concebida, como sendo um conjunto gerador
linearmente independente – O3 –, conforme é ilustrado na Figura 22.
79
taking actions to convince oneself that a result indeed does answer the question that was asked,
and does answer it correctly. One useful way of checking is to use an inverse procedure [...]
80
All too often, checking is not seen by students as an essential part of mathematical activity. Although
checking could give them a lot of security, most students appear not to be very interested in this
security. This could and should be changed by transferring more of the responsibility for learning
processes from the teacher to the student […]
Eneias Prado Capítulo 4: Análise Teórica
83
Figura 22: Base: um conjunto gerador linearmente independente
Observo que, embora tenha apresentado separadamente a construção da
noção de base, segundo os pontos de vista adotados nesta pesquisa, não há uma
“desarticulação”, mas uma preferência por um deles. Cabe salientar que a
consistência de uma concepção objeto se quando estas construções estão
completamente imbricadas.
A partir dessa decomposição genética, apresento o que considero ser uma
concepção ação, uma concepção processo e uma concepção objeto sobre as
noções de base e de dimensão de um espaço vetorial.
Saliento que a instituição de categorias é necessária, pois é um meio
provisório para organizar um conjunto de dados. Como afirmam Dubinsky e Lewin
(1986), essas categorias constituem-se em um instrumento indispensável para a
análise de processos formativos que, segundo a epistemologia genética, ocorrem de
maneira dinâmica.
Assim, retomo o que foi apresentado na página 34 deste trabalho, ou seja, um
indivíduo que demonstra possuir uma concepção ação sobre uma noção
matemática, tem sua compreensão limitada à realização de ações, isto é, necessita
de informações precisas sobre os passos que devem ser realizados ao manipular
essa noção.
Dessa forma, considero que um indivíduo que possui uma concepção ação
sobre a noção de base é, capaz de, por exemplo, operar com vetores pertencentes
a um espaço vetorial; verifica se um vetor poderá ser escrito como combinação
linear de outros vetores. Quando o espaço vetorial em estudo for o IR² ou o I
correlacionar a dependência linear com a noção de vetores colineares ou
Coordenação
O6
P14
O5
P15
A14
A15
A16
Coordenação
Reversibilidade
Reversibilidade
Interiorização
Encapsulação
O3
P15
Eneias Prado Capítulo 4: Análise Teórica
84
coplanares, assim como verificar se um espaço vetorial poderá ser escrito em função
de um conjunto de vetores.
E, considero que um indivíduo que possui uma concepção ação sobre a
noção de dimensão é, capaz de, por exemplo, identificar que vários conjuntos
minimais geradores de um mesmo espaço vetorial possuem o mesmo número de
vetores e, que distintos subconjuntos maximais de vetores linearmente
independentes, também, possuem o mesmo número de vetores. Ou seja, que a
quantidade de vetores de uma base de um espaço vetorial é invariante.
A próxima concepção é a concepção processo, conforme foi descrito na
página 35, é evidenciada quando o indivíduo ao resolver problemas dá indícios de
utilizar transformações do tipo processo. Isto é, quando passa a ter controle da
transformação realizada sobre o objeto matemático, podendo descrever os passos
envolvidos e invertê-los quando necessário; no entanto, ainda não o concebe como
um todo.
Assim, um sujeito que demonstra possuir uma concepção processo sobre a
noção de base é, capaz de, por exemplo, identifica e expressa conjuntos geradores
de um espaço vetorial; identificar os espaços gerados a partir de um subconjunto;
obter o menor conjunto gerador, decidir quais propriedades têm os vetores
pertencentes a um espaço vetorial gerado por um dado conjunto; verificar a
dependência linear em um dado conjunto de vetores; identificar as propriedades que
permitem obter conjuntos de vetores linearmente independentes; obter um maior
conjunto de vetores linearmente independentes; assim como verificar se os vetores
de um conjunto dado são linearmente independentes e se esse conjunto de vetores
é indispensável para gerar todos os elementos de um determinado espaço vetorial.
Assim, um indivíduo que possui uma concepção processo sobre a noção
de dimensão é, capaz de, por exemplo, dizer qual o menor número de vetores
necessários para gerar o espaço vetorial em questão e, também, qual o maior
número de vetores linearmente independentes que podem ser obtidos para um
determinado espaço vetorial.
Por último, tem-se a concepção objeto, quando o indivíduo considera o objeto
encapsulado, como um todo, sendo capaz de manipulá-lo e utilizá-lo quando
necessário.
Desse modo, o indivíduo que demonstra ter uma concepção objeto sobre a
noção de base de um espaço vetorial tem construído os objetos conjunto gerador,
Eneias Prado Capítulo 4: Análise Teórica
85
espaço gerado, dependência linear e pode conceber a base, como sendo: um
conjunto minimal gerador, ou um conjunto maximal linearmente independente, ou um
conjunto gerador linearmente independente.
O indivíduo que possui uma concepção objeto sobre a noção de
dimensão, pode conceber a dimensão como um invariante, ou seja, reconhecer que
todas as bases de um mesmo espaço vetorial, possuem o mesmo número de
vetores. Além disso, poderá correlacionar a noção de dimensão ou com a de
conjunto gerador ou com a de dependência linear, para dizer quantos vetores esses
conjuntos deverão possuir para ser uma base.
Feito isso, após a análise dos livros utilizados no curso de extensão, dos
quais os sujeitos desta pesquisa participaram e, apresentada a decomposição
genética para as noções de base e de dimensão de um espaço vetorial. Na seção
que segue, descreverei a elaboração do roteiro utilizado nas entrevistas.
Roteiro utilizado nas entrevistas
Nesta seção, apresento o roteiro que foi utilizado nas entrevistas, elaborado
com o objetivo de identificar a concepção que os alunos que concluíram um curso de
Álgebra Linear têm sobre a noção de base de um espaço vetorial.
O roteiro contempla duas fases. Na primeira, com quatro questões, objetivei
identificar certas características do entrevistado, por exemplo, formação acadêmica
e atuações profissionais, assim como “quebrar o gelo inicial”, isto é, procurar uma
oportunidade para começar a construir uma relação. Na segunda parte, composta
por duas situações, a intenção foi coletar elementos que auxiliassem a responder às
questões de pesquisa, ou seja: Qual o caminho que um indivíduo deve trilhar ao
construir a noção de base de um espaço vetorial? Como os alunos, ao concluírem
um curso de Álgebra Linear, concebem a noção de base de um espaço vetorial?
Como um aluno que concluiu, pelo menos, um curso de Álgebra Linear correlaciona
as noções elementares desta disciplina?
Eneias Prado Capítulo 4: Análise Teórica
86
Apresento as situações propostas aos entrevistados, assim como uma análise
dessas situações, ou seja, identifico o objetivo, as variáveis didáticas
81
envolvidas e
as possíveis soluções de cada uma das situações.
O presente roteiro segue o modelo de uma entrevista semiestruturada, pois
permite ao entrevistador adaptar e reformular o percurso da entrevista durante seu
desenvolvimento. O tempo previsto para a realização de cada entrevista individual,
será de, aproximadamente, 30 minutos.
I PARTE: Características do entrevistado
Nesta primeira parte da entrevista, inicio promovendo um diálogo com o
entrevistado sobre temas que não estejam diretamente relacionados com a
pesquisa, de maneira que o ambiente torne-se agradável para ambas as partes.
Após essa interação, apresento brevemente o objetivo que tenho com o estudo,
aproveitando para garantir ao entrevistado que todas as informações serão tratadas
confidencialmente. Sendo assim:
1. Solicitei se poderia audiogravar a entrevista
Pois, a gravação depende de autorização do entrevistado.
2. Solicitei que o entrevistado comentasse sobre sua formação
acadêmica e profissional
Necessito identificar qual a formação do sujeito para contextualizar o curso
em relação à sua individualidade. Assim como identificar a atuação profissional e
quais relações (se existem) entre as funções exercidas e as noções de Matemática e
Álgebra Linear, especificamente.
3. Solicitei que o entrevistado comentasse o(s) motivo(s) que lhe fez
(fizeram) participar do curso de extensão de Álgebra Linear
81
Variáveis didáticas, Termo cunhado por Guy Brousseau, “são aquelas para as quais a mudança de
valor provoca modificações nas estratégias [...]” (ALMOULOUD, 2007, p.36).
Eneias Prado Capítulo 4: Análise Teórica
87
Preciso coletar indícios que justifiquem certas atitudes no decorrer da
entrevista, por exemplo: um aluno que cursou Álgebra Linear pode buscar por
uma nova abordagem de ensino ou suprir certas fragilidades enfrentadas em seu
primeiro curso.
4. Solicitei que o entrevistado comentasse se suas expectativas com o
curso foram alcançadas
Necessito coletar elementos que descrevam seu comportamento como aluno,
por exemplo, se participava das monitorias, se dedicava um tempo aos estudos,
entre outras coisas.
Ao perceber que o entrevistado encontra-se à vontade, retomo aspectos
relacionados ao curso de extensão de Álgebra Linear, como por exemplo, que os
estudos realizados, geralmente, eram sobre os IR-espaços vetoriais finitamente
gerados. Para, então, iniciar a segunda parte da entrevista.
II PARTE: Identificar as concepções do entrevistado sobre as noções
elementares de Álgebra Linear
Esta parte da entrevista é composta por duas situações, que foram
apresentadas ao entrevistado, conforme anexo 3
82
.
Assim, ao entregar a folha com a primeira situação para o entrevistado,
contarei que se trata de uma questão extraída de uma prova (fictícia) de Álgebra
Linear. Nesta questão, o professor afirmou que os vetores ܠ
=
(
૚,
)
, ܠ
= (૝,૞) e
ܠ
= ቀ−૚,
, formam uma base para o I. E, solicitou que os alunos
verificassem se tal afirmação era verdadeira ou falsa.
Contarei, também, que das respostas dadas pelos alunos, que realizaram
essa prova, selecionei quatro das quais gostaria que ele comentasse a respeito.
82
Na versão impressa, o leitor terá um encarte (anexo 4) com as situações propostas.
Eneias Prado Capítulo 4: Análise Teórica
88
A) Verdadeira, eles formam uma base do Iporque são do I.
B) Falsa, porque a base do I é {(૚,૙),(૙,)}.
C) Falsa, porque tem três vetores.
D) Verdadeira, porque esses vetores geram o I.
Após a apresentação da situação ao entrevistado, dar-lhe-ei tempo para que
analise cada uma das respostas, pois, espero com esta situação coletar indícios do
que o entrevistado concebe, como sendo base de um espaço vetorial e quais as
ações, os processos e os objetos que são mobilizados, ao verificar se um conjunto
de vetores é uma base de um espaço vetorial.
Nesta situação, as variáveis didáticas são: a maneira como a questão foi
apresentada, pois o título “Extratos da prova do dia 16_06_2009”, visa a fazer com
que o sujeito não seja pressionado; afinal, estará analisando a resposta de outro
aluno que no caso é fictício. Além disso, são apresentadas noções e elementos para
que o entrevistado possa argumentar sobre. O entrevistado deverá conhecer o
assunto para então verificar cada uma das respostas, podendo, no caso de ser
verdadeira, justificar e, no caso de ser falsa, apresentar um contraexemplo.
Outras variáveis didáticas envolvidas são: o espaço vetorial considerado, no
caso o I, pois acredito que este seja um espaço familiar aos sujeitos desta
pesquisa, a representação utilizada para descrever os vetores; o vetor ݔ
que em
suas coordenadas apresenta valores negativos, além de uma delas ser um número
racional, representado por uma fração; e, a maneira como as respostas dos alunos
foram dispostas no protocolo (Anexo 3), porque permitem ao indivíduo ter uma
noção do assunto para então argumentar.
A seguir, apresento a análise de cada uma das quatro respostas.
Na resposta do aluno A (Verdadeira, eles formam uma base do I porque
são do I), o objetivo é verificar se o entrevistado considera, como sendo condição
necessária, mas não suficiente, os vetores de uma base de um espaço vetorial
pertencerem a tal espaço. O entrevistado poderá:
Eneias Prado Capítulo 4: Análise Teórica
89
Afirmar que os vetores formam uma base para o I, pois pertencem ao
IR².
Afirmar que necessita de uma definição sobre a noção de base de um
espaço vetorial para, então, analisar a resposta do aluno.
Afirmar que o conjunto apresentado não se constitui em uma base para
o IR², pois para ser base deve ser um conjunto gerador linearmente
independente, ou um conjunto minimal gerador, ou um conjunto
maximal linearmente independente, ou utilizar o fato da dimensão ser
dois e o conjunto possuir três vetores, ou ainda, apresentar uma base
para esse espaço.
Nas duas primeiras possibilidades, há indícios de que o entrevistado não
tenha construído uma concepção objeto para a noção de base de um espaço
vetorial. Já na terceira, indícios de que reconhece o fato que, para ser base de
um espaço vetorial, o vetor deverá pertencer ao espaço, e ainda, utiliza em sua
argumentação correlações entre as noções elementares de Álgebra Linear.
Na resposta do aluno B (Falsa, porque a base do I é {(1,0),(0,1)}), o
objetivo é verificar se o entrevistado reconhece a base canônica, e o fato de existir
distintas bases para um mesmo espaço vetorial. O entrevistado poderá ter como
possíveis respostas:
Não concordar com a afirmação do aluno, pois acredita que o conjunto
{x
,x
,x
} é uma base para o I.
Afirmar que a resposta dada pelo aluno é verdadeira, pois a base
canônica é a base desse espaço vetorial.
Afirmar que a resposta dada pelo aluno está errada, pois a base de um
espaço vetorial não é única, podendo até apresentar outras bases.
Na primeira afirmação, há indícios de que o entrevistado concebe base, como
sendo um conjunto gerador ou que basta o conjunto estar contido no espaço
vetorial. Na segunda afirmação, o entrevistado apresenta indícios de não reconhecer
Eneias Prado Capítulo 4: Análise Teórica
90
outros subconjuntos de vetores de um espaço vetorial que sejam bases desse
espaço, podendo, até mesmo, supor que exista uma única base. na terceira
afirmação, há indícios de que o entrevistado reconheça a base canônica e que
existem distintas bases para um mesmo espaço vetorial.
Na resposta do aluno C (Falsa, porque tem três vetores), o objetivo é verificar,
como o entrevistado correlaciona a noção de base de um espaço vetorial com a
noção de dimensão. O entrevistado poderá ter como possíveis respostas:
Afirmar que a resposta do aluno é falsa e alegar que não existe
nenhuma relação entre a base e o número de vetores. Ou não
concordar com a afirmação, pois acredita que o conjunto apresentado é
uma base para o I.
Afirmar que a resposta do aluno é verdadeira.
Afirmar que a resposta do aluno é verdadeira e justificar com o fato de a
dimensão do I ser dois, e o subconjunto apresentado possuir três
vetores.
Na primeira afirmação, há indícios de que o entrevistado não estabelece
correlações entre as noções elementares de Álgebra Linear; ou que concebe base,
como sendo um conjunto gerador. Na segunda afirmação, indícios de que o
entrevistado utilizou a noção de dimensão, mas não argumentou a respeito. Por fim,
na terceira afirmação, indícios de que o entrevistado correlacionou a noção de
base de um espaço vetorial com a noção de dimensão.
Na resposta do aluno D (Verdadeira, porque esses vetores geram o I), o
objetivo é verificar se o entrevistado concebe base, como um conjunto minimal
gerador ou se o entrevistado considera o fato do conjunto de vetores ser gerador,
como condição necessária, mas não suficiente. Assim, o entrevistado poderá ter
como possíveis respostas:
Afirmar que a resposta do aluno é verdadeira.
Eneias Prado Capítulo 4: Análise Teórica
91
Afirmar que a resposta do aluno é falsa, pois concebe a noção de base,
como sendo um conjunto minimal gerador ou como um conjunto gerador
com vetores linearmente independentes.
Afirmar que a resposta do aluno é falsa, pois para ser base, além de ser
um conjunto gerador, tem de possuir exatamente dois vetores.
Afirmar que a resposta do aluo é falsa, pois para ser base acredita que
o conjunto tem de ser formado por vetores linearmente independentes
ou porque acredita que a noção de base não tem relação alguma com a
de conjunto gerador.
Na primeira afirmação, há indícios de que o entrevistado concebe base, como
sendo um conjunto gerador. Na segunda, que concebe base, como sendo um
conjunto minimal gerador ou como um conjunto gerador com vetores linearmente
independentes. Na terceira, indícios do entrevistado ter correlacionado a noção
de conjunto gerador com a noção de dimensão; na quarta afirmação, o entrevistado
apresenta indícios de conceber base, como sendo um conjunto linearmente
independente.
A seguir, apresento e analiso a segunda situação (anexo 3), que elaborei,
pois viso a coletar indícios que me permitam inferir sobre a concepção que o
entrevistado possui sobre a noção de base de um espaço vetorial. Ele poderá
responder de maneira a opinar por uma das noções de forma exclusiva,
correlacionar as três noções, ou não concordar com nenhuma das apresentadas.
Assim, ao entregar ao entrevistado a folha com essa situação, contarei que se
trata de uma discussão em sala de aula, em que um aluno apresenta um problema e
seus colegas dizem o que pensam a respeito. O entrevistado deverá, então, analisar
a argumentação desses alunos. Considerando A, B, C e D os alunos e P o
professor, segue a transcrição dessa discussão.
Eneias Prado Capítulo 4: Análise Teórica
92
A- Professor, esse conjunto {૛,૜࢞,૝࢞²} é base do conjunto dos
polinômios de grau 2?
P- (dirigindo-se à classe) O que vocês acham?
B- É sim! Porque é o maior conjunto LI (linearmente independente) de
(IR).
C- É. Porque é o menor conjunto de vetores que gera todo esse
espaço.
A- O quê?
D- É uma base sim, pois é um conjunto de vetores linearmente
independentes e gera esse espaço.
Nesta situação, as variáveis didáticas envolvidas são: o espaço vetorial ܲ
(IR)
que embora tenha sido esta a representação utilizada no curso de extensão, poderá
não ser o familiar aos entrevistados; a base que não é a trivial {1,ݔ,ݔ²}; e a
maneira como as noções: dependência linear, conjunto gerador, base, conjunto
maximal e conjunto minimal estão correlacionadas. Assim como a maneira que a
situação foi apresentada, pois pretendo que o sujeito não se sinta obrigado a
resolver uma atividade, mas, sim, analise a produção de outra pessoa.
A situação permite que o entrevistado analise a noção de base de um espaço
vetorial baseado em três pontos de vista. E, também, estabeleça correlações entre
as noções elementares de Álgebra Linear, dependência linear, combinação linear,
conjunto gerador, espaço gerado, dimensão e base. Assim, penso que o
entrevistado, ao argumentar sobre essas noções matemáticas, apresentará
elementos que possam ser confrontados com os que evidenciarem durante a
argumentação da situação anterior.
Espero, também, que o entrevistado argumente sobre o fato do conjunto
apresentado não ser base do conjunto de polinômios de grau igual a 2, mas, sim, do
conjunto dos polinômios de grau menor ou igual a 2, mais o polinômio nulo. Tal
Eneias Prado Capítulo 4: Análise Teórica
93
argumentação apresentará elementos que permitirão identificar se o entrevistado
está familiarizado com os espaços vetoriais ܲ
(IR).
No caso em que o entrevistado não esteja familiarizado com os espaços
vetoriais dos polinômios de grau menor ou igual a ݊, ele poderá associar
erroneamente o índice 2 da representação ܲ
(IR) à base desse espaço, ou seja, que
a base deva conter apenas dois vetores, podendo até citar exemplos de conjuntos
que acreditam ser base para esse espaço vetorial, um deles seria o conjunto {1,4x²}.
Quanto às demais concepções sobre a noção de base de um espaço vetorial,
o entrevistado poderá verificá-las, explicitando as concepções que possui sobre a
noção de base. Tal ato permitirá identificar as ações, os processos e os objetos
mobilizados pelo entrevistado e, então, supor qual concepção ele tem para as
noções elementares de Álgebra Linear, base, especificamente.
A análise do roteiro foi apresentada de forma fragmentada. Mas, para
identificar a concepção que um sujeito demonstra possuir, é necessário uma
combinação dessas análises que, no entanto, não é simples! Afinal, Dubinsky e
Lewin (1986, p.57)
83
afirmam ser possível acessar “somente aquilo que o indivíduo
pode articular ou demonstrar no momento da própria percepção”, pois até mesmo a
maneira como interpreto a concepção que um entrevistado demonstra possuir,
estará atrelada à descrição e organização da entrevista, pois a análise será
resultado do conjunto dessas percepções.
Assim, no próximo capítulo descreverei as entrevistas e apresentarei suas
análises.
83
[...] only to what an individual can articulate or demonstrate at the moment of insight itself.
Eneias Prado Capítulo 4: Análise Teórica
94
95
CAPÍTULO 5
AS ENTREVISTAS E SUAS ANÁLISES
Neste capítulo, descrevo e analiso cada uma das entrevistas realizadas e
eventuais trocas. Para isso, utilizei as anotações feitas durante os encontros, as
transcrições das audiogravações, os protocolos produzidos pelos entrevistados e as
mensagens trocadas por e-mail.
O capítulo está dividido em 11 seções. As dez primeiras correspondem a uma
análise “vertical” sobre as entrevistas, isto é, apresento uma análise em que procuro
identificar aspectos particulares de cada um dos entrevistados. a última seção,
corresponde a uma análise “horizontal” sobre as entrevistas, isto é, apresento uma
análise em que viso a identificar similaridades entre as argumentações realizadas
pelos entrevistados.
Os nomes atribuídos aos entrevistados são fictícios, sendo eles: Carol,
Rodolfo, André, Bruno, Lucas, Mariana, Fernando, Daniel, Juliano e Thaís. A ordem
segue, em parte, àquela em que as entrevistadas foram realizadas.
Eneias Prado Capítulo 5: As Entrevistas e suas Análises
96
Entrevista com Carol
“E se eu colocar o cinco? Olha! Está sobrando!
(CAROL)
A descrição desta entrevista pautou-se em minhas anotações e no protocolo
produzido pela entrevistada, ambos durante o encontro e, também, nas mensagens
trocadas. Embora tenha levado dois gravadores nenhum deles funcionou.
A primeira a responder ao convite enviado por e-mail (anexo 1) foi Carol; em
que sugeriu que marcássemos a entrevista no IME-USP
84
na semana seguinte, pois
residia em Santo André, cidade próxima a São Paulo e precisaria vir a São Paulo
para resolver alguns problemas.
Assim, na data combinada encontramo-nos na biblioteca e como todas as
saletas de estudo estavam ocupadas, procuramos uma sala de aula no IME-USP
que estivesse vaga.
Por ser a primeira entrevista que realizava, estava preocupado e mais tenso
fiquei quando Carol disse que havia vindo a o Paulo para conversar com seu
orientador de doutorado.
Ao encontrarmos uma sala desocupada, procurei me acalmar ao lembrar da
sugestão de Lüdke e André (2001) sobre a importância de tornar aquele um
momento agradável para ambas as partes. Acomodamo-nos à mesa do professor e
comecei a explicar a finalidade de minha pesquisa à entrevistada, ela, por sua vez,
fez algumas questões sobre minha formação.
Quando senti que estávamos mais à vontade, pedi autorização para
audiogravar a entrevista. Carol concordou com a solicitação, liguei os dois
gravadores. A entrevista durou quase 30 minutos.
A entrevistada contou que se licenciou em Matemática no final de 1980; após
a conclusão, exerceu sua profissão durante alguns anos na escola básica. Tendo
decidido dar aulas no Ensino Superior, no início de 1990, buscou por um curso de
especialização em Matemática em uma universidade pública do Estado de São
Paulo.
84
Instituto de Matemática e Estatística da Universidade de São Paulo.
Eneias Prado Capítulo 5: As Entrevistas e suas Análises
97
Na época, resolveu fazer o maior número de disciplinas que pudesse, pois
deslocava-se de Santo André, o que lhe exigia muito tempo. Como o curso de
especialização em Matemática oferecia poucas disciplinas por semestre, cursou
algumas disciplinas da área de Estatística. A partir do contato com professores de
Estatística, interessou-se por fazer o mestrado nessa área, que a levou,
posteriormente, ao doutorado em Estatística, este concluído ao final de 2008.
O motivo alegado pela entrevistada para fazer o curso de extensão de
Álgebra Linear foi que estava se dedicando exclusivamente a estudar para prestar
concursos públicos, esse assunto é um dos principais temas exigidos. Como em sua
graduação cursou Álgebra Linear, porém “muito superficialmente e com uma
abordagem um tanto diferente, pois o foco era nas técnicas para se resolver os
exercícios”.
Carol, também, relatou que tanto no mestrado como no doutorado em
Estatística utilizou muito dos resultados de Álgebra Linear, pois os dados coletados
são interpretados como vetores”. No entanto, enfatizou que nunca foi instada a fazer
qualquer demonstração, “como por exemplo, verificar se um dado conjunto é um
espaço vetorial”. Assim, o curso de extensão em foco foi realmente seu segundo
curso de Álgebra Linear.
Após obter as informações sobre o perfil da entrevistada, quando já nos
mostrávamos mais à vontade, retomei à questão de meu interesse para melhor
entender as dificuldades enfrentadas pelos alunos ao trabalhar com os assuntos de
Álgebra Linear, apresentei a primeira situação a Carol.
Carol mostrou-se receosa e brincou, “você disse pelo e-mail que seria
somente uma conversa”. Expliquei que era para ela comentar sobre as quatro
respostas dadas pelos alunos que fizerem uma prova de Álgebra Linear. Assim, a
entrevistada leu, pensou durante um tempo e afirmou: o terceiro aluno (C)
85
está
correto, pois a dimensão desse espaço é dois”.
Após essa afirmação, Carol não fez nenhum comentário sobre as outras
respostas, o que me conduziu a pensar que a entrevistada interpretou a situação
como sendo de múltipla escolha e, por conhecer a dimensão do I, optou pela
resposta do aluno C.
85
(C) – frase inserida pelo entrevistador para facilitar a compreensão do leitor.
Eneias Prado Capítulo 5: As Entrevistas e suas Análises
98
Como queria que Carol argumentasse cada uma das quatro respostas, pedi
para que retomasse e justificasse, o que poderia estar por trás de cada resposta.
Carol retomou a situação e analisou cada uma das respostas; na do aluno A,
afirmou: “o aluno não tem claro a noção de base de um espaço vetorial, pois utilizou
somente o fato de os vetores serem do I”.
Na fala, “[...] pois utilizou somente o fato de os vetores serem do I(grifo do
autor), Carol enfatiza que os vetores de uma base de um espaço vetorial devem
pertencer ao espaço.
Prosseguindo, ao argumentar sobre a resposta do aluno B, afirmou: “esse
aluno conhece a base do I, como é mesmo o nome? ... Canônica, mas se
esqueceu de que a base não é única”. Nesta afirmação, a entrevistada apresentou
indícios de utilizar, pelo menos, um dos processos que lhe permite obter conjuntos
que sejam base de um espaço vetorial, assim como reconhece a base canônica.
Na resposta do aluno C, a entrevistada retomou sua fala inicial e alegou:
“como eu disse, ele deve ter pensado na dimensão”.
Até o momento, Carol utilizou a noção de dimensão para determinar se um
conjunto dado é uma base para um espaço vetorial, isso pode ser observado nas
falas: “a dimensão desse espaço é dois” e “como eu disse, ele deve ter pensado na
dimensão”. Isto é, a entrevistada aparenta utilizar um processo implícito na análise
teórica, ou seja, o processo em que sendo conhecida a dimensão do espaço
vetorial, qualquer candidato à base desse espaço deve possuir o número de vetores
exatamente igual à dimensão (P16). No entanto, observo que o P16 deverá ser
interiorizado, como sendo uma condição necessária, mas não suficiente. Pois, o
número de vetores pertencentes a um conjunto deverá ser correlacionado à noção
de conjunto gerador ou de conjunto linearmente independente.
Por fim, na resposta do aluno D, Carol pensou por um instante e afirmou que
os vetores geravam o I, mas ficando, em dúvida, fez algumas anotações, conforme
a Figura 23.
Eneias Prado Capítulo 5: As Entrevistas e suas Análises
Figura 23: Anotações realizadas por Carol durante a análise da primeira situação
Enquanto escrevia, a entrevistada comentava: “é, eles geram o I, mas um é
combinação linear do outro”. Após pensar por um instante, disse: hum! isso (a
combinação linear entre os vetores) deve ser igual a zero” e rindo, comentou: “você
está me fazendo estudar!”.
Apesar de Carol recorrer às anotações para verificar que os vetores geram o
IR², na fala: “é, eles geram o I, mas um é combinação linear do outro”, aparenta ter
coordenado as ações A7 e A8 no processo P10, em que identifica subconjuntos de
vetores necessários para gerar o espaço vetorial em questão.
No momento, em que Carol diz: hum! isso (a combinação linear entre os
vetores) deve ser igual a zero”, recorre à ação A6 para determinar se a partir desse
conjunto ela poderia obter o vetor nulo de uma única maneira. O fato é explicitado
quando Carol obtém ܾ em função de ܿ e verifica se é possível obter ܽ,ܾ,ܿ IR, tais
que, ܽ = ܾ = ܿ = 0.
Esta última verificação foi feita oralmente (a sequência seguida por Carol está
representada nos círculos da Figura 24, da esquerda para a direita), no caso, ela
verifica que estando ܾ escrito em função de ܿ a combinação linear que resulta no
vetor nulo não é única. Ao concluir seus cálculos, Carol afirma: “Isso! Esses vetores
são LI... quer dizer são LD”.
Figura 24: Sequência utilizada por Carol para verificar a dependência linear entre os vetores
Eneias Prado Capítulo 5: As Entrevistas e suas Análises
100
Carol concluiu sua argumentação dizendo que os vetores não podiam ser
base e que o aluno havia se confundido, pois não verificou se o conjunto de vetores
apresentado era linearmente independente.
Desta situação, penso que Carol reconhece o fato que, para um conjunto ser
base de um espaço vetorial, o conjunto deve estar contido no espaço e deve ser um
conjunto gerador com vetores linearmente independentes, isto é, considera o fato do
conjunto ser gerador, como sendo uma condição necessária, mas não suficiente.
Apresentei a segunda situação para Carol logo, após ela ter concluído sua
argumentação sobre a primeira. Ela leu, pensou durante um tempo e disse: “olha, o
aluno B e o aluno C são complementares. Não, não! Essas afirmações são
opostas... Ai meu Deus! Eu deveria ter estudado”.
Penso haver indícios de que Carol reconhece a noção de base, como sendo
um conjunto minimal gerador e um conjunto maximal linearmente independente.
Mas, por demonstrar ter dúvidas sobre essas afirmações, ela aparenta verificá-las, e
isso se evidencia na fala: “o aluno B está correto, pois...”. A entrevistada a medida
que dizia, escrevia (Figura 25).
“... um polinômio de grau dois tem a cara, hum...”
Figura 25: Anotação realizada por Carol para representar um polinômio de grau dois
“Ah! E se fosse de grau três?”, veja Figura 26.
Figura 26: Anotação realizada por Carol para representar um polinômio de grau três
Carol após representar os polinômios de grau dois e três (Figuras 25 e 26)
afirmou: “é isso mesmo! Esses vetores (referindo-se ao conjunto {2,,4ݔ²}) formam
um polinômio de grau dois”.
Eneias Prado Capítulo 5: As Entrevistas e suas Análises
101
A entrevistada afirmou que o aluno B estava correto e apresentou indícios
que iria verificar essa afirmação. No entanto, concluiu que o conjunto apresentado
gerava o espaço vetorial e não que esse conjunto é um maximal linearmente
independente.
Em suas afirmações, penso haver indícios de que Carol articulou sobre as
ações que lhe permitem construir o processo P2, mesmo não tendo se atentado para
o fato de o conjunto ܲ
(IR) ser o conjunto dos polinômios de grau menor ou igual a
dois.
Outra consideração, Carol utiliza o verbo “formar”, ao dizer que um conjunto
gera um determinado espaço.
Em continuação, Carol tentou verificar se a afirmação do aluno C estava
correta, para isso, escreveu os vetores dados e disse: e se eu colocar o cinco?
Olha! Está sobrando!”, neste momento (Figura 27), ticou o cinco como se estivesse
excluindo-o.
Figura 27: Exemplo utilizado por Carol para verificar a afirmação do aluno C
Mas, com receio, afirmou: “não sei, eu ficaria com o aluno D”.
A entrevistada ao acrescentar o vetor 5 e depois excluí-lo do conjunto original
demonstrou abstrair reflexivamente, ou seja, aparentou coordenar os processos em
que intui e verifica, para assim, concluir sua afirmação. Mas, em razão de apresentar
dúvidas optou pela resposta dada pelo aluno D.
Síntese das observações da entrevista
Carol fez a licenciatura e a especialização em Matemática. Já, o mestrado e o
doutorado, em Estatística. Procurou pelo curso de extensão, por ter tido necessidade
de estudar Álgebra Linear para prestar concursos. Assim, o curso de extensão,
efetivamente, foi o segundo curso de Álgebra Linear do qual foi aluna.
Durante a entrevista, apresentou indícios de ter utilizado em suas
argumentações as ões A1, A3, A6, A7, A8 e A9, pois, como apresentado, operou
Eneias Prado Capítulo 5: As Entrevistas e suas Análises
102
com os vetores para verificar a dependência linear em um conjunto de vetores,
assim como para verificar se um conjunto gera um determinado espaço vetorial.
Destaco a iniciativa de acrescentar um vetor ao conjunto dado na segunda situação
e depois verificar que esse vetor não era necessário para gerar o espaço vetorial
ܲ
(IR).
os processos que identifiquei durante a entrevista, foram: P1, P2, P3, P7,
P11 e P12. O processo P15, em que a entrevistada intui que os objetos base, como
sendo um conjunto maximal linearmente independente e um conjunto minimal
gerador, ou são complementares, ou são equivalentes, foi citado. No entanto,
aparenta não estar completamente interiorizado, além desses, penso que ela
também utilizou o P16.
Quanto aos objetos, Carol tem construídas as noções de conjunto gerador,
dependência linear, base e dimensão. A noção de base de um espaço vetorial
aparenta ser concebida, como sendo um conjunto gerador com vetores linearmente
independentes–O3–, como um conjunto gerador com o número de vetores,
exatamente, igual à dimensão do espaço vetorial considerado –O8–.
Contudo, penso haver evidências de que Carol possua uma concepção objeto
sobre a noção de base de um espaço vetorial. Assim como sobre as demais noções
elementares de Álgebra Linear que foram citadas, pois, demonstrou em suas
argumentações estabelecer correlações entre essas noções matemáticas,
sobretudo, a correlação entre a noção de dimensão e de base de um espaço
vetorial. Dessa forma, parece que, após dois cursos de Álgebra Linear, Carol pôde
incorporar a noção de dimensão ao esquema que construiu para a noção de base de
um espaço vetorial.
Eneias Prado Capítulo 5: As Entrevistas e suas Análises
103
Entrevista com Rodolfo
“O aluno D usa para justificar justamente a definição de base,
ou seja, que os vetores sejam linearmente independentes
e que gerem o espaço”(RODOLFO)
A descrição desta entrevista pautou-se em minhas anotações e no protocolo
produzido pelo entrevistado, na transcrição da audiogravação e, também, nas
mensagens trocadas.
Rodolfo logo após ser convidado por e-mail (anexo 1), respondeu-me
agradecendo o convite, mas alegou que seria difícil me ajudar, a não ser que
realizássemos a entrevista via o MSN Messenger
86
, pois residia em outro Estado.
Marquei a data e o horário para a entrevista, pois acreditei ser essa uma
experiência interessante. No entanto, na data combinada estava chovendo em São
Paulo e, por esse motivo, a conexão com a internet foi comprometida. Mesmo assim,
ela foi realizada e durou cerca de 45 minutos. Durante a entrevista, aproveitamos os
recursos de áudio e de vídeo que o MSN Messenger oferece.
Nas primeiras tentativas de conexão, o áudio do entrevistado não funcionou,
então, cogitamos a possibilidade de fazer a entrevista mais à noite, mas não foi
necessário, pois na terceira tentativa conseguimos reparar os problemas.
Com os equipamentos funcionando, agradeci a colaboração e apresentei os
objetivos desta pesquisa. Em seguida, solicitei autorização para gravar a entrevista.
Com o aceite do entrevistado, iniciei a audiogravação.
Rodolfo é aluno de um curso de licenciatura e bacharelado em Matemática e
está matriculado no oitavo semestre, de um total de dez. Nos quatros primeiros
semestres do curso, os alunos, tanto do bacharelado como da licenciatura,
participam do chamado núcleo comum que são disciplinas ofertadas para ambos os
cursos. No quinto semestre, os alunos podem optar por uma das duas habilitações
(bacharelado ou licenciatura); no entanto, Rodolfo optou prosseguir matriculado nos
dois cursos.
86
O MSN Messenger é um programa computacional que permite o envio e/ou recebimento de
mensagens instantâneas pela Internet.
Eneias Prado Capítulo 5: As Entrevistas e suas Análises
104
A opção de Rodolfo deu-se por ter realizado trabalhos relacionados à
Matemática Aplicada e ao Ensino de Matemática. Segundo ele, a Matemática
Aplicada:
aconteceu devido no início do curso, por ser um curso comum aos
alunos do bacharelado e da licenciatura e, o fato de os professores
em sua maioria serem Doutores em Matemática Pura ou em
Matemática Aplicada, focarem bastante as disciplinas para suas
respectivas áreas, deixando de lado a parte de ensino de quem
deseja a licenciatura.
Para o entrevistado, os quatro primeiros semestres fizeram com que ele se
acostumasse a estudar, em suas palavras: “a me esforçar bastante, até mesmo a
ser autodidata para acompanhar certas disciplinas”. O que fez com que
[...] nós, alunos, estudássemos bastante e nos acostumássemos com
as cobranças. Assim, uma parte dos que entram no curso de
Matemática acabam escolhendo o bacharelado, porque é mais ou
menos o caminho, pois no quarto semestre quando devemos optar
se passaram 2 anos estudando bastante Matemática Pura e
Matemática Aplicada, ou seja, muita matéria abstrata e nada da
Licenciatura!
Rodolfo iniciou o curso com a intenção de fazer a licenciatura, mas ao cursar
as disciplinas do núcleo comum interessou-se em prosseguir matriculado, também,
no bacharelado. Para ele, essa escolha é comum entre os alunos, pois após os
quatro primeiros semestres é que, os alunos, têm contato com disciplinas
relacionadas ao ensino de Matemática. Além disso, também, participa de uma
iniciação científica em Teoria Econômica dos Jogos.
Já, o interesse em participar do curso de extensão de Álgebra Linear surgiu
pelo incentivo de seus professores. A escolha pelo local, ocorreu por ter conhecidos
em São Paulo que o hospedariam. E, também, por acreditar que teria a possibilidade
de aprender e melhorar seu currículo. No entanto, Rodolfo alegou que “esperava,
por ser São Paulo, que seria muito difícil!”.
Retomei alguns aspectos do curso, como por exemplo, que trabalhamos com
espaços vetoriais finitamente gerados sobre o corpo dos reais. Enquanto
conversávamos, tentei enviar a primeira situação para ele. Mas, em razão da
oscilação do sinal da internet, meu computador finalizou o programa. Abri-o,
novamente, na segunda tentativa de enviar o arquivo, o programa finalizou. Então,
Eneias Prado Capítulo 5: As Entrevistas e suas Análises
105
reconectei o MSN Messenger e utilizei a janela de conversação para enviar a
primeira situação.
Enquanto digitava a situação, expliquei que era uma questão extraída de uma
prova e quatro respostas de alunos para essa questão. Ele deveria comentar essas
respostas.
Em razão dos problemas da conexão com a internet, a transferência das falas
passou a ser interrompida, dificultando a compreensão do que era dito. Então,
combinamos falar mais devagar, pausadamente. Assim aconteceu, até o final da
entrevista.
Rodolfo iniciou sua argumentação pela resposta do aluno B: “ele (o aluno)
confundiu a base canônica com o conceito de base [...] Na verdade, base canônica é
uma base, mas não é a única”. Nesta afirmação, indícios de que o entrevistado
reconhece a base canônica do I, como também a existência de diferentes bases
para um mesmo espaço vetorial.
“Já na terceira resposta (a do aluno C): Falsa, porque tem três vetores.
Parece que...”, Rodolfo parou, pensou durante um tempo e continuou, “o I
necessita de dois vetores LI na base. Mais do que dois vetores nesse conjunto
resulta que um ou mais deve ser combinação linear de um ou dos dois vetores LI”.
Ao argumentar a resposta do aluno C, o entrevistado apresentou indícios de
utilizar, ou o processo P13, ou o processo P16, pois, parece ter tido inferência da
noção de dimensão em sua argumentação, isto é, por conhecer a dimensão desse
espaço correlaciona-a com a noção de vetores linearmente independentes. Ele
demonstrou conceber a noção de vetores linearmente dependentes, como sendo
vetores que podem ser escritos, como combinação linear de vetores linearmente
independentes.
Na resposta do aluno D, Rodolfo alegou que “alguma coisa tem a ver com o
conjunto gerador e acho que está certo. Não fiz as contas, mas me parece que
esses vetores geram o I...”.
Nesta afirmação, faço duas considerações. A primeira, Rodolfo aparenta
recordar que existe alguma relação entre a noção de base de um espaço vetorial
com a de conjunto gerador. Segunda, apesar de não ter feito as “contas”, há indícios
de que ele utiliza a ação A1 e tem interiorizado o processo P2, pois aparenta
reconhecer que o conjunto dado gera o espaço vetorial I.
Rodolfo, após uma pausa, disse:
Eneias Prado Capítulo 5: As Entrevistas e suas Análises
106
a primeira (a resposta do aluno A), que eu tinha pulado,
Verdadeira, eles formam uma base do IR² porque são do I. Aqui
não está correto, pois não são todos os vetores do I que vão formar
o I. Ah... São diferentes, não é? Cada um pensou uma coisa. Eu
agora fiquei até em dúvida se é a terceira ou se é a última, pois...
Não consegui compreender o que Rodolfo disse, pois a conexão com a
internet ficou muito ruim. Então, pedi para que ele repetisse. Rodolfo afirmou que na
resposta do aluno C “[..] realmente, é isso mesmo, pois se tem três vetores um é
linearmente dependente dos outros dois. Assim, a terceira resposta está correta,
mas está incompleta”.
Rodolfo demonstrou que reconhece a condição dos vetores pertencerem ao
espaço vetorial em estudo, como sendo necessária, mas, não suficiente. Ao retomar
a argumentação sobre a resposta do aluno C, ele demonstrou, também, estabelecer
correlações entre as noções de conjunto linearmente independente com a de
dimensão. Assim, considero que ele utilizou o processo P16.
Rodolfo aparenta ter interpretado essa situação, como sendo uma questão de
múltipla escolha, “eu agora fiquei até em dúvida se é a terceira ou se é a última”.
Apesar do entrevistado ter dito: “não são todos os vetores do IR² que vão formar o
I”, ele indícios de considerar a resposta do aluno D, como sendo correta e,
ainda, considerar o verbo “formar”, como sendo o verbo “gerar”.
Enviei a segunda situação da mesma maneira que fiz com a primeira,
expliquei que se tratava de uma discussão em sala de aula da qual gostaria que ele
comentasse.
Rodolfo leu, pensou por um tempo e disse: “a resposta do aluno D é a que
define base....”.
Mais uma vez, houve queda na conexão com a internet. Reconectei e Rodolfo
prosseguiu: “o aluno D usa para justificar justamente a definição de base, ou seja,
que os vetores sejam linearmente independentes e que gerem o espaço”.
Penso que Rodolfo ao analisar a segunda situação coordenou os argumentos
utilizados na primeira situação, de maneira que afirmou: “o aluno D usa para
justificar justamente a definição de base”. Isto é, o entrevistado concebe base como
descrito em O3.
Questionei as outras afirmações, e ele disse:
Eneias Prado Capítulo 5: As Entrevistas e suas Análises
107
Ah! Sim. O aluno B: é o maior conjunto LI, acredito que tem que ser
o maior conjunto, que tem que ter três vetores. Porque o espaço dos
polinômios de grau menores ou iguais a dois tem dimensão três,
então, no máximo tem três vetores LI, acho que ele quis dizer isso.
Embora Rodolfo não questionasse o enunciado, aparentou reconhecer que o
conjunto apresentado não é base somente do conjunto de polinômios de grau igual a
dois, mas, sim, do conjunto dos polinômios de grau menor ou igual a dois e, ainda,
mais uma vez, correlacionou a noção de dimensão com a noção de base de um
espaço vetorial. Por conhecer a dimensão, ele utilizou o processo P13.
Rodolfo demonstrou conceber a noção de base, como sendo um conjunto
maximal linearmente independente, quando a dimensão do espaço vetorial é
conhecida, pois afirma “o espaço dos polinômios de grau menores ou iguais a dois
tem dimensão três, então, no máximo tem três vetores LI”.
Quanto ao aluno C, Rodolfo pensou por um tempo e disse: “é! Agora eu não
consigo entender exatamente o que ele estava pensando”. O entrevistado releu,
pensou por mais um tempo e afirmou: “realmente, agora não consigo dizer o que ele
estava pensando”.
Apesar de Rodolfo ter dito na primeira situação, “não são todos os vetores do
I que vão formar o IR², ou seja, indicar que existe um conjunto gerador que seja
minimal; na segunda situação, aparentou não reconhecer base como sendo um
conjunto minimal gerador.
Questionei o entrevistado sobre a relação entre a Álgebra Linear e a
Matemática, e ele respondeu:
as noções de transformação linear, autovalor, autovetor, o trabalho
com matrizes, mas, principalmente, transformações lineares, sempre
dão amparo para o desenvolvimento da Matemática. Mas não da
maneira como são tratadas, com muitas demonstrações, pois pode
ser que, para alguns alunos, não seja tão necessária.
Rodolfo citou as relações que considera importantes entre Matemática e
Álgebra Linear no desenvolvimento da própria Matemática. No entanto, ao afirmar
que “da maneira como é tratada, com muitas demonstrações, [...] pode ser que para
alguns alunos não seja tão necessária”, aparenta não considerar importante o uso
de teoremas e demonstrações.
Eneias Prado Capítulo 5: As Entrevistas e suas Análises
108
Por não ter citado as noções de base de um espaço vetorial e dimensão,
questionei-o, ele alegou que nos problemas de Teoria dos Jogos ao combinar
as estratégias de todos os jogadores temos um produto cartesiano
que gera um espaço, as possibilidades de um jogador contra as
possibilidades de muitos outros [...] esse espaço que está sendo
gerado admite base, assim, é necessário um mínimo de
conhecimento de Álgebra Linear. É muito comum utilizar matrizes
para representar os ganhos associados às estratégias escolhidas por
cada jogador, sendo mais uma vez necessário o conhecimento de
Álgebra Linear.
Síntese das observações da entrevista
Rodolfo faz licenciatura e bacharelado em Matemática e participa de uma
iniciação científica em Teoria dos Jogos. Procurou o curso de extensão de Álgebra
Linear por incentivo de seus professores, assim, efetivamente, esse foi seu segundo
curso de Álgebra Linear.
Dos elementos evidenciados durante a análise dessa entrevista, Rodolfo
demonstrou ter construído a ação A1 e os processos P2, P3, P13 e P16, pois,
percebeu que os espaços vetoriais considerados poderiam ser gerados a partir do
subconjunto de vetores dado. Determinou quando um conjunto de vetores é
linearmente independente, utilizou a dimensão do espaço vetorial para determinar
um conjunto maximal linearmente independente, e ainda, correlacionou a noção de
dimensão com a de vetores linearmente independentes, para determinar se um
conjunto é base de um espaço vetorial.
Quanto aos objetos, indícios de que Rodolfo tem construído as noções de
dependência linear, conjunto gerador, espaço gerado, base e dimensão. A noção de
base de um espaço vetorial aparenta ser concebida, como sendo um conjunto
linearmente independente, com o número de vetores, exatamente, igual à dimensão
do espaço, e, como um conjunto gerador com vetores linearmente independentes.
Rodolfo mostrou ter uma concepção objeto sobre a noção de base de um
espaço vetorial, como também sobre as noções elementares que foram citadas.
Após dois cursos de Álgebra Linear, parece que pode incorporar a noção de
dimensão ao esquema que construiu para a noção de base de um espaço vetorial.
Eneias Prado Capítulo 5: As Entrevistas e suas Análises
109
Entrevista com André
“[...] se o espaço é o I que tem dimensão dois, então precisamos
somente de dois vetores linearmente independentes e não três”
(ANDRÉ).
A descrição desta entrevista baseou-se em minhas anotações e no protocolo
produzido pelo entrevistado, na transcrição da audiogravação e, também, nas
mensagens trocadas.
André respondeu ao convite feito por e-mail (Anexo 1) poucas horas, após ter
recebido. Em sua resposta, demonstrou disposição para participar da pesquisa, mas
solicitou que aguardasse alguns dias, para que a agendássemos, pois estava em
período de provas na Universidade.
Ao concluir suas provas, enviou-me um e-mail solicitando que marcássemos a
data e o local para a realização da entrevista. Marcamos na biblioteca do IME-USP.
Na data escolhida, cheguei antes do horário combinado e reservei uma das
saletas de estudo para o encontro. Assim, quando André chegou, encontramo-nos
no saguão da biblioteca e dirigimo-nos à saleta.
Na saleta, após os cumprimentos de praxe e estarmos acomodados,
expliquei-lhe a finalidade da pesquisa e pedi autorização para audiogravá-la. André
concordou e, então, liguei dois gravadores. A entrevista durou, aproximadamente, 30
minutos.
O entrevistado é aluno de Matemática Aplicada de uma Universidade pública
do Estado de São Paulo, iniciou o curso, após ter se aposentado, como professor do
departamento de Química de uma Universidade. Pois, é bacharel, mestre e doutor
em Química. Concluiu a graduação, em 1970; o mestrado, em 1976, e o doutorado
em 1988, ambos em Universidades públicas do Estado de São Paulo.
Durante sua trajetória, tanto profissional como acadêmica alegou que se
deparou por várias vezes com as noções de Álgebra Linear; no entanto, o processo
de aprendizagem dessas noções ocorreu “individualmente [...] por este motivo ficou
muitas falhas, não aprendi quase nada!”, pois, no mestrado e no doutorado, ele
declarou ter visto aplicações de Álgebra Linear, afinal
Eneias Prado Capítulo 5: As Entrevistas e suas Análises
110
ao falarmos de partículas pequenas, tipo: os elétrons e os átomos,
que são os objetos de estudo da Química, utilizamos para descrevê-
las um modelo, cuja base é a equação de Schrödinger, que é uma
equação diferencial parcial. Vamos pensar nesta equação, como
sendo independente do tempo, que é uma situação mais simples!
Então, toda vez que você vai tentar entendê-la, você tem que pensar
em espaço de funções, não tem jeito! Então, o pessoal da Química
precisa de Álgebra Linear!
Na licenciatura e no bacharelado em Química, a disciplina Álgebra Linear não
é oferecida, sendo este um dos motivos pelos quais André alegou que “os químicos
são pessoas que entendem pouco de estruturas atômicas. Os químicos entendem
muito menos do que eles deveriam entender!”
O entrevistado disse que a Álgebra Linear é muito importante para se
trabalhar com reações químicas, pois “para entender a Química a pessoa deve
trabalhar basicamente com as reações químicas, e com as estruturas atômicas e
moleculares”. Com isso, afirma não estar dizendo que os outros assuntos não sejam
importantes, mas quer enfatizar que
nós (químicos) não escapamos da Álgebra Linear, pois uma reação
química é no mínimo uma equação diferencial, mesmo que a
equação seja simples, nós damos um jeitinho de simplificar ainda
mais, por exemplo, não mexe na temperatura, hem! Temperatura
constante! Mas, quando a reação química acontece na natureza ou
quando você mesmo programa a temperatura para variar e aquela
equação simples passa a depender da temperatura, as coisas não se
resolvem mais assim, como uma equação bem simples! A equação
se torna bem mais complicada e, então, recorremos à Álgebra
Linear.
André contou que, na Química analítica, sempre o usadas ferramentas da
Álgebra Linear e apresentou o exemplo:
vamos supor que eu seja um farmacêutico e vou trabalhar em um
laboratório. Um cliente me traz um frasco de perfume com massa de
tomate e pede para que eu o analise. Bom! Vou tentar fazer uma
análise clássica, usando métodos clássicos e depois vou fazer uma
análise, usando métodos modernos, digamos que irei fazer a análise
da cor, da luminosidade, do carboidrato, da proteína, etc. Farei estas
análises uma a uma e depois todas de uma vez, por exemplo,
usando infravermelho próximo, que é uma faixa de comprimento de
onda característica. Com todas essas análises, posso, então,
relacionar minha espectroscopia com certos parâmetros, e através
de uma matriz para tal comprimento de onda efetuo a análise. Agora,
se mudarmos um pouquinho essa amostra e fizermos a análise
Eneias Prado Capítulo 5: As Entrevistas e suas Análises
111
novamente podemos relacioná-las. Quer dizer, na Química analítica,
que é imprescindível para o presente da Química, você sempre usa a
Álgebra Linear, resumindo, não temos por onde escapar! (risos)
Em razão do interesse desta pesquisa, repousar na construção das noções
elementares de Álgebra Linear, sobretudo, a noção de base de um espaço vetorial,
questionei se na graduação em Matemática Aplicada, André havia cursado
Álgebra Linear. O entrevistado contou que, no primeiro semestre, teve uma disciplina
chamada Matemática e Modelagem; assim, afirmou ter trabalhado com noções
relacionadas à Álgebra Linear, mas não declarou que noções foram essas.
Além da disciplina Matemática e Modelagem, contou que, no segundo
semestre de 2008, teve um curso de Álgebra Linear que “foi pouco (risos). Com o
passar do tempo, percebi que ficou faltando muita coisa, por exemplo, a noção de
espaço dual”. André disse que o fato de não ter sido ensinado essa e outras noções
deixou-o curioso,
pois, nós (alunos da Matemática Aplicada) não aprendemos, não deu
tempo! Os cursos, tanto o do primeiro semestre quanto o de Álgebra
Linear do segundo semestre, foram ótimos! Mas foram bem corridos
e mesmo nos tomando muito tempo com muito material para
entregar, faltaram coisas! Para se aprender Cálculo, se tem quatro
semestres e Álgebra Linear, não! Álgebra Linear você tem, vamos
dizer uma e meia, entendeu? Muito pouco! Esse é um dos motivos
da dificuldade, pois fica faltando, não é?
Pela curiosidade em aprender certas noções que não foram abordadas nos
cursos do qual participou, procurou o curso de extensão em Álgebra Linear. No
entanto, ao questioná-lo se suas expectativas com o curso de extensão foram
alcançadas, alegou que “muita coisa ficou faltando ou trabalhamos pouco, por
exemplo, com os funcionais que são importantes para se compreender equações
diferenciais... Praticamente, não deu tempo, ficou faltando muita coisa de Álgebra
Linear”.
Traçada a trajetória acadêmica e profissional de André, apresentei-lhe a
primeira situação e dei-lhe folhas para possíveis anotações. André leu todas as
quatro respostas, pensou um pouco, riu e referindo-se à resposta do aluno A, disse:
“não sei se isso forma uma base para o I, mas para o I, sim, isso é uma base
para o I, que preciso somente de dois vetores, o terceiro é linearmente
dependente”.
Eneias Prado Capítulo 5: As Entrevistas e suas Análises
Nesta afirmação, embora justificasse que, “para o I [...] preciso somente de
dois vetores, o terceiro é linearmente dependente”, ele não explicitou que, para um
conjunto ser base de um espaço vetorial, uma das condições necessárias é que os
vetores pertençam ao espaço, pois a afirmação: “não sei se isso forma uma base
para o IR³”, aparenta ser uma dúvida. Penso que essa dúvida pode se referir ao fato
de o IR³ ter dimensão três e, terem-lhe sido apresentados três vetores.
Em linhas gerais, André demonstrou reconhecer a dimensão dos espaços
vetoriais I e I, assim como correlacionou a noção de dimensão com a de base e
de dependência linear em um conjunto.
Para a resposta do aluno B, afirmou: “Não! Isso daqui (apontando para o
conjunto {(1,0), (0,1)}) é a base canônica, e não precisa ser a base canônica!”,
parou, pensou por um instante e rascunhou, conforme a Figura 28.
Figura 28: Anotações realizadas por André durante a análise da primeira situação
Enquanto escrevia, André disse: “eu responderia que são necessários
somente dois vetores para formar uma base, por exemplo, x
1
e x
2
são suficientes.
Esse daqui (referindo-se ao vetor x
3
) pode ser escrito como uma combinação linear
dos outros dois, não é?”
Observo que, ao rascunhar, André demonstrou utilizar o processo que lhe
permite determinar se um vetor dado, pode ser escrito como combinação linear de
outros vetores – P1 –, com isso, determina a dependência linear entre os vetores, ou
seja, utiliza o processo – P3 –.
André demonstrou reconhecer a base canônica e, ainda, que a base de um
espaço vetorial não é única. Além disso, a correlação entre as noções de
dependência linear e dimensão são evidenciada, pois como afirmou: “são
necessários somente dois vetores para formar uma base [...] esse daqui (referindo-
se ao vetor x
3
) pode ser escrito como uma combinação linear dos outros dois”.
Eneias Prado Capítulo 5: As Entrevistas e suas Análises
113
Dessa forma, demonstrou conceber a noção de base, como sendo um
conjunto linearmente independente com o número de vetores, exatamente, igual à
dimensão do espaço vetorial em estudo – O9 –.
Em continuação, o entrevistado parou, leu e referindo-se à resposta do aluno
C, disse: “verdade, pois basta tomarmos dois vetores e não três!”. Neste caso, mais
uma vez, André utilizou a dimensão em sua argumentação.
André retornou seu comentário sobre a resposta do aluno B e disse: “esse
aqui pensou que a única base é a base canônica! (risos)”; em seguida, parou,
pensou e afirmou: “neste caso (resposta do aluno C), o precisamos de três
vetores, basta dois. Aqui mesmo, temos mais de uma base! Eu poderia fazer esse
aqui, e esse aqui (referindo-se aos vetores x
2
e x
3
) e, também, formar uma base, não
é?”.
Com esses elementos, penso que André tem interiorizado o processo que lhe
permite dizer, qual o maior número de vetores linearmente independentes que pode
ser obtido em um determinado espaço vetorial – P13 –.
Como André não argumentou sobre a resposta do aluno D, prossegui
interrogando-o sobre o que poderia estar por de trás de cada uma das quatro
respostas, ou seja, o que os alunos poderiam ter pensado ao responder à questão
apresentada pelo professor, então, disse:
tem mais informações, que isso no curso de extensão nós
deveríamos ter aprendido melhor, não é? Por exemplo, poderíamos
ter aprendido que se o espaço é o I que tem dimensão dois, então
precisamos somente de dois vetores linearmente independentes e
não três. Por isso, que o aluno B deve ter feito esta confusão, ele
não percebeu que a base não é única. Outra coisa é que se o espaço
é o I e tivermos três vetores, um deles é linearmente dependente
dos outros, não é?
Embora no curso de extensão, o Teorema da invarncia tenha sido
enunciado e demonstrado, André mostrou não o ter correlacionado ao processo
citado, “se o espaço é o I que tem dimensão dois, então precisamos somente de
dois vetores linearmente independentes e não três”. Esse fato é evidenciado quando
ele afirma que “no curso de extensão nós deveríamos ter aprendido melhor [...]”.
Como André, mais uma vez não citou a resposta do aluno D, prossegui a
entrevista pedindo para que lesse e comentasse a segunda situação. André leu,
pensou durante um tempo e afirmou: “para mim, esse conjunto é uma base para o
Eneias Prado Capítulo 5: As Entrevistas e suas Análises
114
espaço dos polinômios de grau dois. E o aluno que acredito estar correto é o aluno
D, pois é esse exatamente o caso, um conjunto de vetores linearmente
independentes que gera esse espaço”.
Ao afirmar: “para mim, esse conjunto é uma base para o espaço dos
polinômios de grau dois”, indícios de que André não esteja familiarizado com o
espaço vetorial ܲ
(IR), pois aparentou não ter se atentado para o fato do conjunto
apresentado ser base para o espaço dos polinômios de grau menor ou igual a dois.
Por outro lado, afirmou que, para ser base, deve ser “um conjunto de vetores
linearmente independentes que gera esse espaço”, ou seja, ele mostrou conceber o
objeto base de um espaço vetorial, como descrito em O3.
Para coletar mais elementos, pedi para que argumentasse sobre o que levou
os outros alunos a responderem de tal maneira, e ele disse: “o aluno B. Não existe
esta questão de maior conjunto. É um conjunto de vetores LI que gera o espaço”. O
entrevistado olhou à resposta dada pelo aluno C e não fez nenhum comentário.
Penso que André concebeu a noção de base, como um conjunto gerador de
vetores linearmente independentes e não reconhece as outras abordagens, no caso,
base como um conjunto maximal linearmente independente e um conjunto minimal
gerador.
Ao se referir à base de um espaço vetorial, André afirmou: “é esse
exatamente o caso, um conjunto de vetores linearmente independentes que gera
esse espaço”, prossegui a entrevista, pedindo para que retomasse a primeira
situação, assim, após pensar André disse:
Na resposta do aluno A, o aluno não pensou que para formar uma
base para esse espaço você não precisa de três vetores, você
precisa somente de dois, não é? Então, está faltando ele dizer quem
é esse conjunto e, também, está faltando, ele utilizar aquele
teoremazinho que diz: se a dimensão for ݊ e se ele tiver ݊ + 1
vetores, um deles é combinação linear dos outros vetores.
Ao dizer “se a dimensão for ݊ e se ele tiver ݊ + 1 vetores, um deles é
combinação linear dos outros vetores”, enfatiza o fato de conceber base, como
sendo um conjunto linearmente independente com o número de vetores,
exatamente, igual à dimensão do espaço vetorial.
Ao afirmar que
Eneias Prado Capítulo 5: As Entrevistas e suas Análises
115
o aluno B só conhece a base canônica (risos). Já o aluno C, tem uma
lógica, pelo menos, está falando que tem vetor a mais, não é? Eu
acho que nenhuma das respostas está completa. Agora o aluno D,
os vetores geram o I, mas não precisa dos três vetores, pois dois
vetores são suficientes. Cada um deles está faltando alguma
coisa! Talvez o conceito foi discutido rapidamente, e os alunos não
perceberam que são necessários apenas dois vetores!
André demonstrou ter interiorizado o processo – P11 –, conceber a dimensão,
como sendo um objeto e, ainda, correlaciona-a com as noções de base de um
espaço vetorial e dependência linear em um conjunto.
Síntese das observações da entrevista
André é bacharel, mestre e doutor em Química. Após se aposentar iniciou um
curso de Matemática Aplicada, em que participou de um curso de Álgebra Linear.
Pelo, seu interesse para estudar certas noções de Álgebra Linear, não abordadas no
primeiro curso, fez o curso de extensão que, efetivamente, foi o segundo curso de
Álgebra Linear do qual participou.
As ações e os processos identificados durante a entrevista foram A1, A7 e A9
e, P1, P3, P11 e P13. André para verificar a combinação linear existente entre os
vetores apresentados na primeira situação, utilizou as operações binárias que
definem esse espaço vetorial. E eliminou um dos vetores para tornar o conjunto em
um conjunto linearmente independente.
Em vários momentos, André utilizou a dimensão do espaço vetorial I para
argumentar sobre a base desse espaço vetorial, ou seja, o entrevistado demonstrou
correlacionar a noção de dimensão com as noções de base de um espaço vetorial,
dependência linear e conjunto gerador, como por exemplo, na fala: “agora o aluno D,
os vetores geram o I, mas não precisa os três vetores, pois dois vetores são
suficientes”. Essa correlação, também, pode ser observada quando André afirma:
“está faltando ele utilizar aquele teoremazinho que diz: se a dimensão for ݊ e se ele
tiver ݊ + 1 vetores, um deles é combinação linear dos outros vetores”.
Assim, penso que André tem construído, como sendo objeto as noções:
dependência linear, conjunto gerador, base e dimensão.
Contudo, André demonstrou ter concepção objeto sobre a noção de base de
um espaço vetorial. Assim como, sobre as noções elementares de Álgebra Linear
que foram citadas. Afinal, o entrevistado demonstrou correlacioná-las durante sua
Eneias Prado Capítulo 5: As Entrevistas e suas Análises
116
argumentação. Além das evidências de ter incorporado a noção de dimensão ao
esquema que possui sobre a noção de base de um espaço vetorial.
Eneias Prado Capítulo 5: As Entrevistas e suas Análises
117
Entrevista com Bruno
“Não lembro! Só lembro que tinha um negócio de maior e menor,
mas agora que estão juntos, não dá para saber qual é ....”
(BRUNO)
A descrição desta entrevista apoiou-se nas minhas anotações, no protocolo
produzido pelo entrevistado, na transcrição da audiogravação e, também, nas
mensagens trocadas.
Bruno, no mesmo dia em que recebeu o convite por e-mail (anexo 1), tentou
realizá-la já no dia seguinte. Solicitei que ele esperasse por mais uma semana, pois
a análise do roteiro da entrevista ainda não havia sido finalizada, tendo obtido sua
concordância.
Passados alguns dias, reatei o contato com o aluno e marcamos um encontro
na praça de alimentação do Shopping Metrô Tatuapé
87
. A entrevista ocorreu às dez
horas da manhã, horário em que pouco movimento nos shoppings o que
possibilitaria não sermos incomodados por barulho.
Após nos acomodarmos em uma mesa isolada entabulamos uma conversa na
qual expliquei em linhas gerais, o objetivo de minha pesquisa, aproveitando para
solicitar sua permissão para audiogravar a entrevista. Após seu aceite, liguei dois
gravadores. A entrevista teve duração de quase 20 minutos, sem qualquer
interrupção.
Bruno contou que obteve seu título de bacharel e licenciado em Matemática
em uma Universidade particular de São Paulo. Durante a graduação fez uma
iniciação científica em Estatística. Comentou, também, que estava fazendo um curso
de especialização em Educação Matemática.
Quanto ao curso de extensão de Álgebra Linear em questão, o entrevistado
se declarou um aluno que sempre desejou fazer parte da Instituição promotora.
Explicou que procurou tal curso com a intenção de complementar sua formação e
“conhecer outras formas de ensino”. Para ele, o curso foi “[...] interessante. Afinal,
não esperava muito do curso. Era apenas para conhecer. Mas, gostei e pretendo
fazer outros”.
87
Shopping localizado na zona leste da cidade de São Paulo.
Eneias Prado Capítulo 5: As Entrevistas e suas Análises
118
Prossegui a entrevista, e apresentei a primeira situação para que Bruno a
analisasse. Após ler e pensar por um tempo, ele riu e disse: “você deveria ter me
falado para que eu tivesse estudado!”. Então, tentei tranquilizá-lo, afirmando não ser
um teste, mas, sim, um guia para conversarmos. Assim, enquanto eu separava
folhas e uma caneta para o caso dele querer escrever, ele prosseguiu dizendo:
“apesar de já ter feito a disciplina, pois (quando fiz o curso) era formado, não tinha
visto nem a metade do que o professor passou”.
Solicitei que ele comentasse as respostas dos quatro alunos A, B, C e D.
Bruno, após ler e pensar por um tempo, perguntou: “tenho que escolher uma?”.
Percebendo que o entrevistado supunha que uma das respostas estava certa e as
outras erradas, expliquei-lhe novamente que era para ele comentar cada uma das
quatro respostas dadas. Após observar de novo a atividade o entrevistado
perguntou: “tenho que escrever?”. Expliquei que era para ele comentar cada
resposta, mas se precisasse, poderia escrever.
O entrevistado continuou a observar a atividade entregue e disse: “Não
entendi!”. Nesse momento, decidi ler o enunciado em voz alta, explicando que a
questão foi dada aos alunos em uma prova, que eu escolhi quatro respostas de
alunos diferentes. Assim, gostaria de saber sua opinião sobre como e por que cada
um dos quatro alunos interpretou-a.
O entrevistado eu a resposta do aluno A e disse: “não é especificamente por
que eles o do I que eles irão formar uma base para o I [...] você deveria ter
falado para eu estudar”. Nesse momento percebi que o entrevistado estava
constrangido, pois parece que se sentiu avaliado. Esse fato me desconcertou, mas
resolvi continuar com a entrevista assim mesmo.
Apesar dos indícios de que Bruno estava com receio de argumentar sobre as
respostas dos alunos, “você deveria ter me falado para que tivesse estudado!”,
“tenho que escolher uma?”, “tenho que escrever?”, e ainda, “não entendi!”, ele ao
dizer: “não é especificamente, porque eles são do I que eles irão formar uma base
para o I”, mostrou reconhecer a condição de que para um conjunto ser base de um
espaço vetorial, ele deve estar contido no espaço vetorial.
Como Bruno não prosseguiu em sua análise, pedi-lhe para que observasse as
próximas respostas dadas não, necessariamente, na ordem apresentada na
situação proposta. Então, ele leu a resposta do aluno B e disse: “essa daqui é falsa,
pois é a base canônica e pode ser outra base, ou não? Não tem nada a ver!”. O
Eneias Prado Capítulo 5: As Entrevistas e suas Análises
entrevistado parou e aguardou que eu o auxiliasse, mas, como não disse nada,
Bruno me questionou: “não vai me ajudar?”
O entrevistado demonstrou lembrar as noções estudadas no curso de
extensão, mas, não as correlacionou, e ainda, por apresentar ter dúvidas, sempre
pedia para que eu o auxiliasse. No entanto, continuei em silêncio enquanto Bruno lia
e relia a situação proposta. Assim, após um tempo, ele rascunhou conforme a Figura
29.
Figura 29: Anotações realizadas por Bruno durante a análise da primeira situação
Mais uma vez o entrevistado disse: “vai, me ajude!” Então, retomei sua fala e
no momento em que repetia sua afirmação sobre a resposta do aluno B, ele me
interrompeu e disse: “ele falou (o aluno B) que é falsa, mas pode ser uma base sem
ser a base canônica”.
Ao rascunhar, Figura 29, Bruno demonstrou recorrer, ainda que vagamente, à
ação A3, na qual verifica a dependência linear nos termos da definição. Quando
afirmou “[...] é falsa, mas pode ser uma base sem ser a base canônica”, mostrou que
reconheceu o fato de existir diferentes bases para um mesmo espaço vetorial.
Como Bruno novamente não argumentou, questionei-o sobre a resposta do
aluno C, e ele olhando para sua anotação, Figura 29, disse: não, porque eu zero
qualquer um desses aqui (ߙ, ߚ e ߛ) e zera do mesmo jeito”. Nesta fala, indícios
de que o entrevistado, utilizando-se da ação A3 identificou que os vetores são
linearmente dependentes.
O entrevistado não disse mais nada, então, acreditei que, ao apresentar a
segunda situação, ele teria acesso a afirmações sobre a noção de base de um
espaço vetorial e, assim, poderia retomar suas argumentações. No entanto, antes
mesmo de lhe entregar a segunda situação, ele me interrompeu dizendo: “eu acho
que o aluno D está correto, pois os três vetores geram o I”. Nesta afirmação,
Bruno aparenta reconhecer que os vetores geram o IR².
Eneias Prado Capítulo 5: As Entrevistas e suas Análises
120
Mas, por ele, novamente não argumentar, apresentei-lhe a segunda
situação. Bruno, após ter lido, disse: “uma hora, eu chego lá, está processando [...]
Tenho que comentar o que cada aluno disse?”. Confirmei que sim, e ele voltou a ler
a situação.
“Minha cabeça está toda confusa. Se você tivesse me perguntado perto do
curso de extensão, talvez eu lembrasse ...”. Bruno, então disse: “o aluno A, quer
saber se isso é uma base [...] então, o aluno B, fala que é o maior conjunto e o
aluno C que é o menor conjunto ...”.
O entrevistado voltou a pensar e gesticulou com as mãos sobre as falas dos
alunos B e C. Após um tempo, afirmou: “não lembro! Só lembro que tinha um
negócio de maior e menor, mas agora que estão juntos não dá para saber qual é ...”.
Questionei que se fosse para ele definir a noção de base de um espaço
vetorial, qual dos alunos acreditava que estava correto. Ele releu os itens, pensou e
disse: é uma base porque é um conjunto linearmente independente que gera esse
espaço”.
Bruno finalizou sua argumentação sobre a segunda situação e, então,
retomou a primeira situação: na resposta do aluno A, eles formam uma base do
I porque são do I, mas não é isso que precisa”; na resposta do aluno B, “não
é falsa, porque ele fala da base canônica, mas porque não necessariamente tem
que ser a base canônica”, na resposta do aluno C, “não é falsa, pois eu posso zerar
uma letra aqui (referindo-se à Figura 29), e ele continua sendo uma base” e, na
resposta do aluno D: “acredito que esses três vetores geram o IR²”.
Bruno reconheceu que os vetores da base devem pertencer ao espaço
vetorial, assim como, existem diferentes bases para um espaço vetorial. No entanto,
ao afirmar, “não é falsa, pois eu posso zerar uma letra aqui (referindo-se à Figura
29), e ele continua sendo uma base”, indícios de que admite o conjunto dado,
como sendo uma base para o IR², o que pode ser observado, também, na fala: “eu
acho que o aluno D está correto, pois os três vetores geram o I”.
Ao analisar a segunda situação, mostrou conceber a noção de base, como
sendo um conjunto gerador linearmente independente. Mas, ao retomar sua
argumentação sobre a primeira situação, não a utiliza.
Por fim, Bruno disse:
Eneias Prado Capítulo 5: As Entrevistas e suas Análises
121
eu acostumei a fazer isso daqui (referindo-se à Figura 29). Eram
tantos exercícios, aquele monte de listas, e eu não estava
acostumado a fazer aquele monte de lista na faculdade. Então, eu
passava a tarde com o professor tirando dúvidas, pois eu não estava
acostumado a fazer tantas demonstrações e daí a gente se pega
tanto na demonstração que acaba se esquecendo do conceito, não
é?
Bruno ao dizer “... eram tantos exercícios, aquele monte de listas ...”, remete-
se a abordagem pedagógica citada no primeiro capítulo, em que é apresentado um
exemplo, e os estudantes são convidados a realizar uma lista de exercícios
similares. O que vem colaborar com as afirmações de Dubinsky (1997) e Dreyfus
(1991), nos quais os autores dizem que os estudantes não compreendem as noções
por não terem oportunidade de construir tais noções.
Ainda nesta perspectiva, perguntei-lhe sobre seu desenvolvimento no curso
de extensão, e ele disse: “em termos de Matemática, eu fiquei mais familiarizado
com o processo de demonstrar”. E ainda,
da minha parte, foi bem construtivista, pois eu tive que buscar,
pensar e descobrir. Afinal, eu fazia de um jeito e estava errado,
então, precisava fazer de outra maneira. Se eu fosse direto para a
prova, não teria como fazer, pois não estava acostumado com
aquelas atividades...
Apesar de Bruno citar o processo em que teve de “... buscar, pensar e
descobrir. Afinal, eu fazia de um jeito e estava errado, então, precisava fazer de
outra maneira...”, assim como cita Dubinsky (1997), o entrevistado não era
convidado a fazer, mediante a situações-problema, construções mentais de objetos
matemáticos e de processos, usar esses resultados para dar sentido fora do
problema, e quando o entrevistado afirma, por exemplo, “eu não estava acostumado
a fazer tantas demonstrações e, daí, a gente se pega, tanto na demonstração que
acaba se esquecendo do conceito”, aparenta inverter um processo, isto é, a
demonstração como consequência da organização e coerência de definições e
propriedades de uma noção.
Eneias Prado Capítulo 5: As Entrevistas e suas Análises
122
Síntese das observações da entrevista
Bruno é licenciado em Matemática. Faz um curso de especialização em
Educação Matemática. Para ele, o curso de extensão, efetivamente, foi o segundo
de Álgebra Linear do qual participou.
Durante a entrevista, mostrou-se receoso com as situações apresentadas,
sempre aguardando por uma confirmação de suas respostas. Apesar de citar
algumas noções elementares de Álgebra Linear, combinação linear, conjunto
gerador e dependência linear, apresentou indícios de não ter concepções ação
sobre essas noções. Isto é, mesmo após dois cursos de Álgebra Linear o
entrevistado não pôde construí-las.
Eneias Prado Capítulo 5: As Entrevistas e suas Análises
123
Entrevista com Lucas
“Bom, o aluno [...] está com a base canônica presa na cabeça (risos).
Base para ele só pode ser a base canônica e isso aí é um erro”
(LUCAS)
A descrição desta entrevista baseou-se em minhas anotações e no protocolo
produzido pelo entrevistado, ambos durante o encontro, na transcrição da
audiogravação e, também, nas mensagens trocadas.
Dois dias após Lucas ter sido convidado por e-mail (anexo 1) para participar
da pesquisa, respondeu indicando quais datas e locais possíveis para sua
realização. Combinamos realizar a entrevista na Biblioteca do IME-USP.
Cheguei antecipadamente à biblioteca e, assim, reservei uma das saletas
para a realização da entrevista. Em seguida, Lucas chegou carregando giz e dois
livros de Álgebra Linear, o de Callioli et al. (1995) e o de Coelho e Lourenço (2001).
Nós nos dirigimos à saleta, após os cumprimentos de praxe, expliquei-lhe a
finalidade de minha pesquisa e perguntei se poderia gravar a entrevista. Com seu
aceite, iniciei a audiogravação que durou cerca de 35 minutos.
Lucas é aluno de um curso de bacharelado em Física de uma Universidade
pública de São Paulo, participa de um grupo de iniciação científica no departamento
de Física Nuclear e de um grupo teórico na Matemática.
A procura pelo curso de extensão em Álgebra Linear deu-se por vários
motivos, sendo um deles, “adiantar conceitos”, pois o entrevistado alegou saber que
no semestre seguinte iria cursar Álgebra Linear. Outro motivo foi por considerar a
Álgebra Linear, em Física, uma ferramenta importante, Lucas, inclusive, apresentou
um exemplo: “na Física Quântica, a Mecânica Quântica mexe muito com Análise
Funcional, que é um assunto que junta Análise Real com Álgebra Linear”.
Lucas comentou que: “gostei muito do curso, foi um nível legal, aliás, foi até
mais do que eu esperava. Eu imaginava que fosse alguma coisa do tipo: vamos dar
palestra a respeito de, no entanto, foi até melhor, foi aula mesmo”.
Prossegui a entrevista, comentando que no curso de extensão tínhamos
trabalhado com espaços vetoriais finitamente gerados, Lucas me interrompeu
Eneias Prado Capítulo 5: As Entrevistas e suas Análises
124
dizendo: “isso! Sobre o corpo dos reais também, não é? O professor não estendeu
para outros corpos...”.
Sabendo que, após o curso de extensão Lucas havia participado de um curso
regular de Álgebra Linear na Física, questionei-o se, nesse segundo curso de
Álgebra Linear, o professor tinha abordado outros corpos, além do corpo dos reais.
O entrevistado contou que trabalhou com as noções de espaço vetorial, de operador
linear, funcional linear, entre outras. No entanto, a ênfase dada no segundo curso foi
sobre as aplicações das noções estudadas em Álgebra Linear. Lucas considerou
que “foi um curso mais voltado à Física. Por exemplo, uma coisa que o teve no
curso de extensão, mas teve no curso deste semestre foi o método dos mínimos
quadrados”.
Prossegui apresentando a primeira situação. Lucas após ler e pensar, disse:
Na resposta do aluno A, para ver que ele confundiu dois
conceitos, o de conjunto gerador com o de base. Base é um conjunto
LI e gerador, não é? que, como você pode ver, é multiplicar o
vetor ݔ
= (−1,−5/4) por menos quatro que obtemos o ݔ
=
(4,5). Então, eles já não são linearmente independentes. Aqui, o
aluno mostrou que está confundindo o conceito de base com o de
conjunto gerador. Esses três vetores se você botar para gerar o I,
eles geram sim, com certeza, sem dúvida! O problema foi que ele
confundiu dois conceitos.
Lucas apresentou o que concebe, como sendo uma base de um espaço
vetorial, “base é um conjunto LI e gerador”. Em seu comentário, utilizou o processo
P1 para verificar a dependência linear, assim como, identificou o conjunto dado
como sendo um conjunto gerador do I.
Apesar dos elementos apontados, Lucas aparenta não ter se atentado para o
que foi solicitado, pois o objetivo era verificar se o entrevistado reconhecia o fato de
que para ser base uma condição necessária é que o conjunto esteja contido no
espaço. Assim, penso que o entrevistado interpretou a palavra “formar” no sentido
de “gerar”, pode ser por isso que, aparentemente, não compreendeu o que era
solicitado.
Ao analisar a resposta do aluno B, o entrevistado disse:
bom, o aluno B está com a base canônica presa na cabeça (risos).
Base para ele pode ser a base canônica e isso é um erro,
porque até mesmo se eu pegar os vetores ݔ
e ݔ
, eu tenho uma
Eneias Prado Capítulo 5: As Entrevistas e suas Análises
125
base para o I. Esse aqui (o aluno B) está dizendo que existe uma
única base para cada espaço.
O entrevistado mostrou reconhecer o fato da base não ser única, e ainda,
apresentou outra base para o espaço vetorial considerado.
Lucas prosseguiu sua análise, afirmando: “o aluno C está pior. Está com um
problema aqui. O fato de ter três vetores não tem nada a ver. Por exemplo, eu posso
ter os três vetores e gerar o I...”. Nesse momento, interferi questionando se ele
poderia gerar o IR³ e Lucas alegou:
Ah! Não! Espera ai! O fato de ter três vetores não é suficiente para
negar que seja base.... Uma parte ele entendeu! Como se está
trabalhando com o IR², é suficiente que hajam dois vetores para
gerar, três vetores virou um conjunto gerador, mas não uma base,
certo? Ah!... esse fato dos três vetores foi uma afirmação boa, mas
não foi completa.
Questionei como Lucas completaria a resposta, e ele disse:
eu completaria assim, botaria mais defeito no conjunto, por exemplo,
além de ter mais de dois vetores do I, eu escreveria que uma base
do I pode ter dois vetores, isso significa que, por exemplo, o ݔ
é combinação linear de ݔ
e ݔ
. Assim, não é um conjunto
linearmente independente. Pelas respostas dos alunos, eu acho que
a que está mais próxima do correto é esta a C, só que achei que está
meio incompleta.
Assim, Lucas, por reconhecer a noção de dimensão e a utilizar nas
afirmações: “como se está trabalhando com o IR², é suficiente que hajam dois
vetores para gerar, três vetores virou um conjunto gerador, mas o uma base” e
“uma base do I só pode ter dois vetores”, mostrou correlacionar a noção de
dimensão com as noções de base, conjunto minimal gerador e dependência linear.
Lucas prosseguiu analisando a resposta do aluno D, quando disse:
a resposta dada pelo aluno na D, contém um erro, pois é falsa.
Esses vetores geram o I, mas gerar é uma condição necessária
para ser uma base, não é uma condição suficiente, pois é
necessário, também, que os vetores sejam linearmente
independentes.
Eneias Prado Capítulo 5: As Entrevistas e suas Análises
126
No início da entrevista, afirmou que “base é um conjunto LI e gerador” e,
agora, retomou sua argumentação. Sendo assim, Lucas mostrou que concebe a
noção de base de um espaço vetorial, como sendo um conjunto gerador linearmente
independente.
Prossegui a entrevista, apresentando a segunda situação. Lucas após ler e
pensar, disse:
tudo bem! O aluno B, não é? Ele deu uma consequência. O que ele
falou é, na verdade, consequência de se tomar uma base, certo?
Porque quando se trabalha com o conceito de dimensão, por
exemplo, a dimensão do ܲ
é três, quer dizer o conjunto mais
compacto, no sentido de menor mesmo, o menor conjunto que você
pode ter é realmente uma base. Acho que o único erro foi ele ter
trocado a consequência pela causa. Essa afirmação é consequência
da definição de base.
O entrevistado pensou um pouco e disse:
mas vai depender de como o professor definiu a base, às vezes, ele
pode ter definido desse jeito! Eu não consigo encontrar erro nisso! O
conjunto está gerando, e é o maior conjunto de elementos
linearmente independentes do ܲ
, pois, quando se toma o maior
conjunto tem que ser com três vetores e, a partir deles, você
consegue gerar os outros. O problema é que somente dizer “maior”
fica uma coisa muito subjetiva. E, assim, eu não vejo erro!
Simplesmente, o que ele fez foi trocar a definição por uma
consequência da definição.
Penso que Lucas enquanto argumenta sobre a fala do aluno B, está
abstraindo reflexivamente, pois concebe base, como sendo um conjunto gerador
linearmente independente e reconhece a dimensão. A partir dessas noções,
correlaciona-as para verificar se a fala do aluno está correta. Isso pode ser
observado no trecho: “[...] pois, quando se toma o maior conjunto têm que ser com
três vetores e a partir deles você consegue gerar os outros [...]”.
Lucas prosseguiu analisando a fala do aluno C:
o aluno C disse que é o menor conjunto de vetores que gera todo o
espaço. Isso é verdade! Porque se você tiver um conjunto com o
número de vetores menor, vai ter algum vetor que não vai ser
gerado, por exemplo, se você tiver um termo de grau zero e um
de grau um, você não gera o ܲ
, não é? No caso, somente afirmar
que é menor conjunto que gera todo o espaço, também, é uma
consequência da definição. Assim, tanto o aluno B quanto o aluno C
Eneias Prado Capítulo 5: As Entrevistas e suas Análises
127
estão corretos, pois base, tamm, é o menor conjunto de vetores
que gera o espaço. Contudo, eles trocaram a causa pela
consequência.
Mais uma vez, Lucas correlacionou os objetos que aparenta ter construído,
para verificar a afirmação. Com isso, acredito que iniciou a construção do processo
que lhe permite obter a base, como sendo um conjunto minimal gerador e/ou um
conjunto maximal linearmente independente, pois indícios de que concorda com
as afirmações se a dimensão for conhecida.
Para finalizar sua análise, afirmou:
na verdade, o aluno D apresentou a resposta mais completa. Ele
trouxe a definição que o professor deu. Provavelmente, o professor
deu a definição formal que nós conhecemos, e o aluno a utilizou. Ou
seja, esse aluno mostrou que soube aplicar o conteúdo que o
professor deu, não é? Aliás, é uma pergunta simples, e os três
apresentaram respostas condizentes, mas se fosse para eu escolher
optaria pelo que recorreu à definição. Certo?
Esta última afirmação vem corroborar com a evidência de que Lucas concebe
base, como sendo um conjunto linearmente independente que gera o espaço.
Embora dê indícios de ter construído o objeto base, como sendo um conjunto
gerador com vetores linearmente independentes, não se atentou que o conjunto
apresentado na segunda situação é base do conjunto dos polinômios de grau menor
ou igual a dois mais o polinômio nulo.
O entrevistado prosseguiu argumentando que:
uma grande dificuldade que vejo nas pessoas que estão aprendendo
Álgebra Linear, por exemplo, é transpor a ideia de espaço vetorial do
I e IR³ para a ideia de espaço de funções. Para mim, a Álgebra
Linear é uma linguagem, uma linguagem criada, assim como existe o
inglês, o português, as línguas humanas. A Álgebra Linear é uma
linguagem para ser usada dentro da Matemática que serve para
tratar de problemas de natureza completamente diferentes, usando a
mesma metodologia, entende? Os mesmos conjuntos de ideias que
você teria com o IR
n
, vai ter para um problema de equações
diferenciais, vai ter quando no laboratório você encontra uma função,
mas não quer trabalhar com ela e, então, a aproxima por uma outra
função, por exemplo. São as mesmas ideias quando você trabalha
com projeção, você trabalha com distância, você trabalha com
operadores, está entendendo?
Eneias Prado Capítulo 5: As Entrevistas e suas Análises
128
O exemplo citado por Lucas sobre a dificuldade enfrentada por um estudante
de Álgebra Linear, “transpor a ideia de espaço vetorial do I e I para a ideia de
espaço de funções”, é tratado por Dreyfus (1991), citado na página 78, no qual o
estudante deverá conceber o objeto ‘vetor’ desassociado do próprio objeto, isto é,
sem considerar suas propriedades intrínsecas. Quando Lucas declara que concebe
a Álgebra Linear, como sendo uma linguagem unificadora, “os mesmos conjuntos de
ideias que você teria com o IR
n
, vai ter para um problema de equações diferenciais
[...]”, demonstra ter compreendido o que Dorier (1990), citado na página 11,
descreveu sobre a constituição dessa disciplina.
Síntese das observações da entrevista
Lucas é aluno de um curso de Física e participa de uma iniciação científica
em Física Nuclear. O primeiro curso de Álgebra Linear que fez, foi o de extensão. No
entanto, quando realizei a entrevista, ele havia participado de um segundo curso
de Álgebra Linear.
Da análise dessa entrevista, Lucas mostrou ter construído as ões A1, A7,
A8, A9, A10 e A13. No entanto, o está restrito a elas, pois indícios de já ter
interiorizado os processos P1, P2, P5, P6, P7, P11, P12 e P13 que, aparentemente,
o conduziu a encapsulação dos objetos O2, O3, O4 e O7. Há, também, indícios de
que Lucas ao conhecer a dimensão de um espaço vetorial tem encapsulado os
objetos O8 e O9. Quanto à noção de base, como sendo um conjunto maximal
linearmente independente ou um conjunto minimal gerador, o entrevistado aparenta
reconhecê-las, como sendo consequência da noção de base descrita em O3.
Lucas aparentou ter uma concepção estruturada sobre a noção de base de
um espaço vetorial. Isto é, ele mostrou ter uma concepção objeto para a noção de
base de um espaço vetorial, e, em razão das correlações, uma concepção objeto
para as noções elementares de Álgebra Linear que foram citadas, sobretudo, a
noção de dimensão.
Eneias Prado Capítulo 5: As Entrevistas e suas Análises
129
Entrevista com Mariana
“Uma base do I é algo que pode gerar
todo o I, não é isso?”(MARIANA).
A descrição desta entrevista pautou-se em minhas anotações e no protocolo
produzido pela entrevistada, ambos durante o encontro, na transcrição da
audiogravação e, também, nas mensagens trocadas.
Após cinco dias de ter recebido o convite (anexo 1) por e-mail, Mariana
respondeu-me solicitando maiores esclarecimentos sobre a pesquisa, pois alegou
não dominar bem o assunto, e não ter tido um bom rendimento no curso de
extensão de Álgebra Linear. Em resposta a seu e-mail, expliquei sobre minha
preocupação com o ensino e a aprendizagem de Álgebra Linear, realçando a
importância de sua participação para o desenvolvimento desta pesquisa.
Passados 8 dias, Mariana respondeu-me com opções de horários e locais
para que agendássemos a entrevista. Assim, acertamos o local e o horário.
Mariana compareceu à entrevista no horário combinado, e esta ocorreu no
SESC
88
Vila Mariana e teve duração de, aproximadamente, 30 minutos. Como
cheguei com meia hora de antecedência, procurei por um local para realizarmos a
entrevista, mas todas as salas de estudo estavam ocupadas, com isso, sentamo-nos
em um canto mais calmo da lanchonete do próprio SESC. No horário, não havia
muitos clientes, como ficamos bem afastados, a entrevista ocorreu naturalmente,
sem incômodos.
Após os cumprimentos de praxe, a entrevistada começou a relatar sua
dificuldade com a Álgebra Linear e mostrou-me as anotações feitas durante o curso
de extensão. Em meio a essa conversa, expliquei a finalidade de minha pesquisa, e
perguntei-lhe se poderia audiogravar a entrevista. A entrevistada espontaneamente
concordou com a solicitação e, então, iniciei a gravação.
Mariana é Engenheira Elétrica, concluiu sua graduação, em 1975, ela recorda
ter sido um bom curso. Nos 4 anos teve apenas duas dependências. Ela contou,
também, que em razão de seu interesse para fazer o mestrado em Engenharia
88
Serviço social do comércio.
Eneias Prado Capítulo 5: As Entrevistas e suas Análises
130
Elétrica, nos dias que antecederam à entrevista, foi rever o caderno utilizado durante
o curso de extensão de Álgebra Linear, folheando o caderno relatou que:
[...] fui re-estudar Álgebra Linear e me peguei com dificuldades, já no
primeiro dia de aula. Tentei fazer os exercícios de novo. Quando é
necessário fazer a soma de dois vetores tudo bem, mas, quando
tenho que voltar para fazer uma demonstração, eu empaco! Não está
no automático, bater o olho e falar! Nas somas, você pode separar
em dois conjuntos e fazer a soma de dois conjuntos. No caso você
tem dois conjuntinhos, dois elementos de cada espaço, faz a soma,
você vai e faz o caminho direto. Mas fazer o inverso é uma forma
diferente de ver as coisas, não é o comum da álgebra normal em que
se faz rápido, pois você consegue enxergar a ida e a vinda. Na
demonstração, parece que tem alguma coisa que nos prende. O
professor fazia as demonstrações de maneira que pareciam óbvias,
eram até ridículas de tão óbvias! Mas como que eu vou demonstrar
isso numa prova, passo a passo? Então, a sensação que nos é
que você tem que decorar, porque é tão óbvio! Então, em vários
momentos eu interrompia a leitura, o estudo, e ia dar umas voltas. Eu
penso que tem que ter outra forma de apresentar essa matéria que
leve para o foco desde o início do curso.
Penso que uma das dificuldades apontada em diversos trabalhos, como no
de Dorier et al. (1997), é uma das enfrentadas por Marina, pois ao afirmar que “[...]
quando tenho que voltar para fazer uma demonstração, eu empaco! Não está no
automático, bater o olho e falar!” E ainda, “na demonstração parece que tem alguma
coisa que nos prende. O professor fazia as demonstrações de maneira que pareciam
óbvias, eram até ridículas de tão óbvias!”, vem confirmar o que Dubinsky e Lewin
(1986), Dreyfus (1991) e Dubinsky (1991) afirmaram, isto é, os estudantes devem
participar do processo de abstração e não serem simples receptores do produto
final. Além disso, vem, também, corroborar com Araújo (2002, p.37), pois a
percepção de que um assunto, ou uma demonstração é fácil ou é óbvia, pode
desmotivar um aluno com dificuldades, por “conta da impressão de incapacidade de
perceber, o que parece tão fácil ou óbvio ao outro”.
Outra dificuldade citada por Dorier et al. (1997) e Rogalsky (1997) penso que
foi evidenciada na fala de Mariana, isto é, a linguagem matemática, pois, quando a
entrevistada afirma “nas somas, você pode separar em dois conjuntos, fazer a soma
de dois conjuntos. No caso você tem dois conjuntinhos, dois elementos de cada
espaço, faz a soma, você vai e faz o caminho direto”. Acredito que Mariana
confundiu o termo coordenada de um vetor, com os termos conjunto e elemento.
Eneias Prado Capítulo 5: As Entrevistas e suas Análises
131
Em continuação, Mariana ao me contar sobre o curso de Álgebra Linear que
teve em sua graduação, disse:
[...] tive um excelente professor, ele mostrava as coisas e não foi
muito diferente do que nós aprendemos agora, pelo menos, o
começo que eu lembrava, pois, na realidade, naquela época era
apresentado de outra forma: era muita matriz! Neste aspecto o curso
de extensão de Álgebra Linear foi mais abrangente, não é? Naquele
tempo, tive dificuldade para entender a lógica da disciplina, sabia que
se fizesse daquela forma, vamos dizer, seguisse a receita de bolo o
resultado saia. Então, eu aprendi uma receita de bolo!
A entrevistada prosseguiu contando que, recentemente, participou de um
curso em uma Universidade e, por ter tido necessidade de estudar Cálculo, recorreu,
então, a ajuda de um professor seu amigo. Este indicou que ela se inscrevesse no
curso de extensão de Álgebra Linear. Mariana acabou participando do curso, como
ouvinte.
Apesar de ter assistido como ouvinte, não faltei em nenhuma aula, se
faltei foi uma aula em que tive de levar minha mãe ao médico.
Minha intenção em participar do curso de extensão foi realmente a
de absorver aquela informação! Olha, se eu tiver novamente
dificuldade e não conseguir me inscrever, mais uma vez irei pedir
permissão para assistir, até eu dominar a matéria, pois agora virou
questão de honra (risos), não é?
Destas afirmações, pode-se depreender que Mariana concebe a
aprendizagem, como uma aquisição de um “produto”, “minha intenção em participar
do curso de extensão foi realmente a de absorver aquela informação”, e ainda, ao se
referir ao curso de Álgebra Linear que fez na graduação, “sabia que se fizesse
daquela forma, vamos dizer, seguisse a receita de bolo o resultado saia. Então, eu
aprendi uma receita de bolo!”.
Mariana alegou que a Álgebra Linear não tem nenhuma relação com sua
carreira profissional de engenheira, a importância surge “na hora de você fazer um
mestrado”.
Prossegui a entrevista comentando um pouco sobre o desenrolar do curso de
extensão e apresentei a primeira situação para que Mariana analisasse.
Mariana leu todos os itens e disse: “Bom. Uma base do I é algo que pode
gerar todo o IR², não é isso? Então, esses vetores
,ݔ
,ݔ
), eu acho que não
Eneias Prado Capítulo 5: As Entrevistas e suas Análises
132
formam uma base, pois memorizei que a base deve ser composta por zero e um,
você entendeu? Esse quatro e cinco...”
A entrevistada parou, pensou e disse:
[...] ou, teria que ver se consigo gerar todo o contexto do I com
esses três vetores. Mas eu acho que não vai gerar! Sabe? Comecei
a estudar e estou bem no comecinho. Mas, é claro que uma base
para o I tem que ser vetores do I, certo? Assim, entendo que
base é o que gera todo o I. E, neste caso, como irei fazer para
gerar todo o espaço do I?
Embora Mariana indícios de que reconhece o fato de os vetores de uma
base pertencerem ao espaço vetorial, é claro que uma base para o I tem que ser
vetores do IR²”, e aparentar conceber base, como sendo um conjunto gerador, “uma
base do I é algo que pode gerar todo o I”, não demonstrou realizar a ação sobre
combinação linear para gerar o espaço, como se pode notar em sua fala “neste
caso, como irei fazer para gerar todo o espaço do I?”. Além do que, ao afirmar,
“[...] memorizei que a base deve ser composta por zero e um [...]”, penso que ela
recorda as representações abordadas no curso de extensão e não associa a base
como sendo um conjunto em que são válidas certas propriedades.
Mariana prosseguiu dizendo: “O aluno A está totalmente por fora, ele não
sabe o que é uma base, nunca ouviu esse termo! O aluno B está com uma proposta
interessante, pois a base do Ié composta por zero e um. Agora, porque tem três
vetores...”.
Nesse momento, parou, pensou por um instante e recorreu a seu caderno,
enquanto o folheava, comentou: “tinha outra coisa envolvida, mas agora o vou
saber dizer”. Então, fechou o caderno, leu o próximo item e disse: “já o aluno D está
errado, pois esses vetores não geram o I”.
Apesar de afirmar que base é um conjunto gerador, indícios de que não
possua concepção ação para a noção de base de um espaço vetorial. pois, afirmou
que “uma base do I é algo que pode gerar todo o I”, depois disse: “como irei
fazer para gerar todo o espaço do I?”, e ainda, o “aluno D está errado, pois esses
vetores não geram o IR²”. Mas em nenhum momento demonstrou ter verificado tal
afirmação.
Mariana reconhece a base canônica, pois no primeiro instante disse:
“memorizei que a base deve ser composta por zero e um”, quando leu a resposta do
Eneias Prado Capítulo 5: As Entrevistas e suas Análises
133
aluno B, afirmou: “o aluno B está com uma proposta interessante, pois a base do I
é composta por zero e um”.
Dessa forma, penso que a entrevistada não interiorizou a ação que lhe
permite identificar várias bases para um mesmo espaço vetorial.
Quanto à noção de dimensão, ao analisar a resposta do aluno C, Mariana deu
indícios de existir algum resultado, mas não soube dizer qual.
Prossegui a entrevista apresentando a segunda situação, mas ela me
interrompeu dizendo: “Aí não dá! Se você me falasse, eu ia estudar mais um
pouquinho (risos)”. Então, tentei contornar a situação explicando que era apenas
uma conversa entre os alunos e, da mesma maneira, que na situação anterior era só
para ela comentar.
Após ler a situação, Mariana disse: “já tinha até me esquecido do conceito de
LI, não é?” Parou por um instante, referindo-se ao conjunto {2,,
}, disse: “eu
acho que ainda não é uma base. Não me lembro, teria que ter estudado um
pouquinho mais...”
Voltei a dizer que era para ver o que os alunos tinham respondido. Mariana
releu e pensou mais um tempo. “Maior conjunto LI... Não lembro, teria que ter dado
uma estudada melhor”.
Mariana deu indícios de se lembrar da noção de dependência linear quando
afirmou “já tinha até me esquecido do conceito de LI, não é?”. Mas não a associou
com as demais noções. Quando disse “maior conjunto LI... Não lembro, teria que ter
dado uma estudada melhor”, penso que Mariana não concebe base como definido
em O6.
Enquanto agradecia sua colaboração, Mariana disse-me: “que mico! Eu vou
querer fazer a entrevista de novo. Daqui a duas semanas, por causa do exame para
o mestrado, eu vou ter tudo isso digerido” e justificou
se não estudei a primeira aula não dá para ir para a segunda,
entendeu? Eu comecei a estudar, e ainda, estou na primeira aula.
vi o que são vetores independentes e, normalmente, a base tinha
aquela carinha de zero e um, zero e um, zero e um, entendeu? E
você me mostra com outros números, será que pode? E aí, ao invés
de multiplicar por valores, você multiplica pelas frações. Assim, a
conta fica complicada, não é? Mas eu tenho que estudar mais um
pouco.
Eneias Prado Capítulo 5: As Entrevistas e suas Análises
134
Ao final da entrevista, afirmou que reviu “o que o vetores independentes” e
que “normalmente a base tinha aquela carinha de zero e um, zero e um, zero e um”,
ela demonstrou não ter construído a noção de dependência linear e, até mesmo, a
base canônica, penso que não reconhece, pois da maneira como diz, acredito que
ela se refere a vetores do I, mas não a base canônica.
Síntese das observações da entrevista
Mariana é engenheira aposentada. Após a sugestão de um professor seu
amigo, procurou o curso de extensão de Álgebra Linear que, efetivamente, foi o
segundo de Álgebra Linear do qual participou. No entanto, mesmo tendo concluído
um segundo curso de Álgebra Linear, ela mostrou não ter construído concepções
ação para as noções elementares de Álgebra Linear.
Eneias Prado Capítulo 5: As Entrevistas e suas Análises
135
Entrevista com o Fernando
“Aparentemente, o aluno b) sabia que a base é
formada por um conjunto LI [...]” (FERNANDO).
A descrição desta entrevista foi baseada nas mensagens trocadas por e-mail.
No mesmo dia que enviei o convite, por e-mail, Fernando respondeu-me
dizendo que residia no interior de São Paulo e, por trabalhar o dia todo, seria melhor
que fizéssemos a entrevista utilizando o Skype
89
.
Agradeci seu contato e disse que pretendia realizar a entrevista no mês de
julho. Mas, tive alguns problemas e só voltei a contatá-lo no início de agosto.
Fernando respondeu que seria difícil agendar um horário, pois estava com muito
trabalho a fazer, então, sugeriu que lhe enviasse as questões por e-mail.
Descrevi as situações e enviei-lhe. Na descrição, iniciei agradecendo sua
colaboração, para com minha pesquisa e apresentei os objetivos do estudo. Garanti
seu anonimato e passei as questões da primeira parte.
Fernando concluiu o curso de: Arquitetura e Urbanismo, em 1986; Direito, em
1988; Filosofia, em 1999; mestrado em Direito, em 1997; mestrado em Filosofia, em
2001; e, é aluno de um curso de Licenciatura em Matemática. Todos esses cursos
foram realizados em universidades públicas do Estado de São Paulo.
O entrevistado trabalha há 34 anos:
durante os 10 primeiros anos, trabalhou como garçom e ajudante de
escritório. Durante 2 anos, aproximadamente, trabalhou como
desenhista projetista. Depois, basicamente, foi servidor público.
Trabalhou como agente de vistoria de bagagens na Secretaria da
Receita Federal no Aeroporto Internacional de São Paulo (Cumbica).
Depois passou a ser Técnico da Receita Federal na mesma
Secretaria da Receita Federal. Por cerca de um ano, atuou como
advogado. Depois ingressou na carreira da magistratura,
inicialmente, na Justiça do Estado de São Paulo e, depois, na Justiça
do Trabalho, onde permanece, mas está afastado das funções,
desde 2005.
89
Software que permite comunicação pela Internet por meio de conexões de voz.
Eneias Prado Capítulo 5: As Entrevistas e suas Análises
136
O entrevistado disse não existir nenhuma relação entre as funções exercidas
e a disciplina Álgebra Linear. Quanto ao curso de extensão de Álgebra Linear, ele
disse que o procurou com “perspectiva de um curso de qualidade”. Mas, alegou que:
as expectativas não foram atingidas, pois o curso foi muito aquém do
esperado, com sérios problemas de ordem pedagógica e educacional
por parte da docência, tanto quanto ao domínio do assunto, didática
e sistema de avaliação. Imagino que respalda minha opinião o alto
índice de abandono do curso, não obstante ser de pequena duração.
quem diga que o abandono teria sido motivado pela dificuldade,
mas isso é uma justificativa do ponto de vista, talvez, do docente,
pois quanto aos alunos, pelo que pude observar e extrair das
conversas, houve muitas queixas, sobretudo, da qualidade didática
das aulas.
Quanto a primeira situação, Fernando respondeu: na resposta do aluno A
“imagino que o aluno não estava sabendo a matéria e deu uma resposta qualquer”.
Penso que Fernando não se atentou para a condição de que, para um
conjunto de vetores ser base de um espaço vetorial, deve, primeiramente estar
contido no espaço vetorial. Por outro lado, o entrevistado aparenta possuir uma
concepção sobre base de um espaço vetorial, mas, por enquanto, não se pode
determiná-la.
Na resposta do aluno B, Fernando respondeu:
aqui o aluno parece ter entendido, o que seria uma base para o I,
mas não foi capaz de verificar se a partir dos vetores dados seria
possível concluir racionalmente se aqueles vetores, também,
poderiam ser outra base. Depois, tive a impressão que o aluno
poderia estar com a ideia de que os vetores que formam a base,
devem ser necessariamente ortogonais.
No trecho, “o aluno parece ter entendido, o que seria uma base para IR², mas
não foi capaz de verificar [...]”, há indícios de que o entrevistado possua uma
concepção ação sobre a noção de base de um espaço vetorial. Mas não foi possível
identificar quais ações descritas na decomposição genética ele utiliza. no trecho,
“seria possível concluir racionalmente se aqueles vetores também poderiam ser
outra base [...], o aluno poderia estar com a ideia de que os vetores que formam a
base devem ser necessariamente ortogonais”, têm-se duas considerações: primeiro,
indícios de que reconhece que a base de um espaço vetorial não é única, ou
seja, utiliza o processo P5; e ainda, há indícios de que Fernando estabelece uma
Eneias Prado Capítulo 5: As Entrevistas e suas Análises
137
correlação entre a base canônica e vetores ortogonais, assim como sugerido na
decomposição genética e por Costa e Catarino (2007).
Na resposta do aluno C, Fernando afirma: “aqui, novamente, parece retornar
ao problema do aluno A, ou seja, não parece ter entendido o que seria uma base e
os subespaços possíveis dentro de um espaço vetorial com dimensão maior”.
Nesta afirmação, Fernando não explicitou o fato de que um subespaço do
espaço vetorial, no caso I, deve ter no máximo dimensão dois. O fato permite
inferir que Fernando embora aparente ter uma concepção ação para a noção de
base de um espaço vetorial, não a correlacionou com a noção de dimensão.
Na resposta do aluno D, “aqui o aluno aparentemente não sabe ou estava
com preguiça de justificar”.
Da mesma maneira que nos itens anteriores, Fernando aparentou conhecer
as ações sobre a noção de base de um espaço vetorial, mas não apresenta
elementos que permitam identificar quais seriam as ações utilizadas por ele.
Descrevi a segunda situação e da mesma maneira que a primeira, expliquei
que era para ele comentar as respostas dos alunos.
Fernando iniciou alegando que “a pergunta (aluno A) me pareceu boa
enquanto exemplo didático”. Penso que, em sua afirmação, o entrevistado atentou a
maneira de conduzir a discussão e não ao fato de a base apresentada, ser base dos
espaços vetoriais dos polinômios de grau menor ou igual a dois.
Fernando ao analisar a fala do aluno B, disse:
aparentemente, o aluno b) sabia que a base é formada por um
conjunto LI, mas, oralmente, talvez tenha dado uma resposta
provisória, justificável, pois era um questionamento oral, já que tudo
indicava que, para se assegurar, deveria ter sido feito alguns cálculos
ou, eventualmente, o aluno já tinha bem claro o que respondia.
Penso que Fernando concebe a base, como sendo formada por vetores
linearmente independentes. Mas, não permite dizer se para ser base de um espaço
vetorial, um conjunto deve ser um maximal linearmente independente desse espaço.
Quanto à afirmação do aluno C, Fernando alegou que a “resposta pareceu
meio vaga, pois não se sabe ao certo o significado dos termos usados, quer dizer,
pode ser que (o aluno) estava dominando o assunto, ou falou meio vago para
aumentar as possibilidades de acertar”.
Eneias Prado Capítulo 5: As Entrevistas e suas Análises
138
Fernando ao dizer pode ser que (o aluno) estava dominando”, aparentou
conceber a noção de base de um espaço vetorial, como sendo um conjunto minimal
gerador, mas seria necessário esclarecimentos.
Ao analisar a resposta do aluno D, o entrevistado respondeu:
A mesma situação de b) aparentemente, repetiu-se com d); conhece
o assunto. Mas, como estamos avaliando uma resposta oral, não
teria muito sentido daí extrair uma certeza de se foi um chute ou uma
resposta segura. Oralmente, mesmo para quem estivesse sabendo e
dominando o assunto, as respostas são mais rápidas.
Penso que Fernando ao dizer: “a mesma situação de b) aparentemente
repetiu-se com d); conhece o assunto [...]”, aparentou conceber base como sendo o
menor conjunto gerador e, também, a justaposição, isto é, um conjunto linearmente
independente que gera o espaço.
Síntese das observações da entrevista
Fernando tem três graduações e dois mestrados concluídos e, é aluno de um
curso de licenciatura em Matemática. O curso de extensão de Álgebra Linear,
efetivamente, foi o segundo curso. No entanto, apresentou indícios de ter uma
concepção ação sobre a noção de base de um espaço vetorial, e ainda, não ter uma
concepção ação sobre a noção de dimensão, pois alegou que o aluno “não parece
ter entendido, o que seria uma base e os subespaços possíveis dentro de um
espaço vetorial com dimensão maior”.
Eneias Prado Capítulo 5: As Entrevistas e suas Análises
139
Entrevista com Daniel
“Uma Base é um conjunto linearmente independente
que gera o próprio espaço” (DANIEL)
A descrição desta entrevista baseou-se em minhas anotações feitas durante o
encontro, na transcrição da audiogravação e, também, nas mensagens trocadas.
Daniel é aluno de um curso de Mestrado em Educação Matemática e, apesar
de nos encontrarmos com frequência, também, enviei-lhe o convite por e-mail
(anexo 1). Após 10 dias, ele me respondeu, sugerindo que agendássemos a
entrevista para o início do segundo semestre de 2009, pois reside em outro Estado.
Como solicitou, agendamos a data e o local para realizar a entrevista. Daniel
compareceu à PUC-SP e dirigimo-nos a uma sala de aula da instituição.
Após nos acomodamos, expliquei-lhe a finalidade de minha pesquisa, assim
como solicitei se poderia audiogravá-la. Com seu aceite, iniciei a gravação. A
entrevista durou cerca de 25 minutos.
Daniel fez a Licenciatura em Matemática no Estado onde reside. Segundo ele,
apesar de ter trabalhado durante o período em que se graduou, pôde concluí-la
“sem grandes problemas”, sendo ele um dos nove alunos que terminaram no tempo
regular, sem reprovação nem dependências.
Daniel contou que, após concluir a graduação, iniciou um curso de pós-
graduação em Educação Matemática na própria Universidade em que se graduou,
mas participou de apenas dois encontros, pois passou em um concurso público para
ser professor de Matemática da rede municipal de uma cidade vizinha. Nesta cidade,
participou de cursos promovidos pela prefeitura, todos voltados à Educação, mas
nenhum especificamente ligado à Matemática, segundo o entrevistado, “eram mais
voltados à parte educacional e pedagógica”.
Ao iniciar o mestrado, Daniel afastou-se do trabalho para residir em São
Paulo. Assim, aproveitou para participar dos cursos de extensão: Cálculo no IR
n
e
Álgebra Linear.
Quando questionado sobre os motivos que o levaram a participar do curso de
extensão de Álgebra Linear, alegou que “um profissional da Educação,
principalmente por ser em Educação Matemática, tem que ter um bom conhecimento
Eneias Prado Capítulo 5: As Entrevistas e suas Análises
140
em Matemática”, e por ter concluído a licenciatura há praticamente 4 anos, acreditou
ser “interessante voltar e rever alguns conceitos que talvez possam ter sido
deficientes”, em sua formação. Além do que, acreditou que o curso poderia lhe
“proporcionar uma preparação matemática”, pois ele tem “a intenção de prosseguir
na carreira acadêmica, inclusive, atuando como professor”. Segundo ele, é essencial
que sua “bagagem Matemática forneça subsídios para que possa assumir as aulas”.
Além da preocupação com a carreira acadêmica, o entrevistado alegou que a
Álgebra Linear possui uma nítida ligação com o restante da Matemática e disse:
“antes do mestrado, eu via a Álgebra Linear mais ligada à Computação, com o
tratamento de imagens... Mas no mestrado, percebi sua importância também nas
Engenharias, principalmente na Elétrica”.
Prossegui a entrevista, retomando alguns aspectos do curso de extensão,
como por exemplo, o fato de que no curso de extensão temos estudado os espaços
vetoriais finitamente gerados sobre o corpo dos reais e, em seguida, apresentei a
primeira situação para que ele a analisasse.
Após ler toda a situação Daniel questionou-me: “o que devo fazer em relação
a isso aqui?” Expliquei-lhe que era para comentar cada uma das quatro respostas.
Ele releu, pensou por um tempo e disse: na resposta do aluno A: “essa pessoa pode
ter tido um erro na hora de compreender o que seria uma base, ela viu três vetores e
viu que dois deles poderiam gerar o I”. Nesse momento, Daniel apontou para os
vetores como se calculasse e confirmou que eles realmente geravam o IR².
Daniel prosseguiu dizendo:
ela pensou que se dois geram, então, o terceiro não deixa de gerar o
I, mas ela não viu que isso transformava o conjunto em um
conjunto linearmente dependente, o que não é uma base. Uma Base
é um conjunto linearmente independente que gera o próprio espaço,
neste caso, o I. Então, ela partindo deste princípio, sem atentar
para o fato de o conjunto ser LI ou LD, afirmou que era uma base
porque gerava o I. Assim na resposta A, ela diz que é verdadeira
porque esses vetores formam uma base do I e porque são do I.
Ah! Sim, tem essa outra parte... Não me atentei a essa outra parte,
porque são do I, não entendi porque ela colocou isso aqui.
Embora Daniel não tenha se atentado ao que lhe foi solicitado, ou seja,
verificar se o aluno A considerava como sendo condição necessária, mas não
suficiente, os vetores de uma base de um espaço vetorial pertencerem a tal espaço,
pois penso que interpretou o verbo “formar” como sendo o verbo “gerar”. O
Eneias Prado Capítulo 5: As Entrevistas e suas Análises
141
entrevistado aparenta utilizar o processo P2, em que verifica se um conjunto gera
um determinado espaço, e ainda, o processo P11, em que identifica o menor número
de vetores necessários para gerar o espaço, “ela viu três vetores e viu que dois
deles poderiam gerar o IR²”.
O entrevistado, também, considerou o conjunto gerador, como sendo um
conjunto qualquer que lhe permite obter todos os elementos do espaço vetorial e,
não, necessariamente, conjuntos minimais, “ela pensou que se dois geram, então, o
terceiro não deixa de gerar o I”. A esse fato, o entrevistado aparentou associar a
noção de dependência linear, ou seja, utiliza o processo P3
90
, “ela não viu que isso
transformava o conjunto em um conjunto linearmente dependente”, pois identificou
os vetores que não são escritos como combinações lineares entre si, como sendo
vetores linearmente independentes, e os que são escritos como combinações
lineares, como sendo linearmente dependentes.
O entrevistado mostrou conceber uma base de um espaço vetorial, como
sendo “um conjunto linearmente independente que gera o próprio espaço”.
Prosseguindo, o entrevistado parou, pensou por um tempo e afirmou: é que,
neste exemplo, não se pode dizer, mas se fosse outro exemplo, de repente três
vetores quaisquer que não gerassem o I, aparentemente, ela diria que é uma base
só porque os vetores pertencem ao espaço”.
Daniel aparentou reconhecer que, para ser base de um espaço vetorial, não é
suficiente que os vetores somente pertençam ao espaço, pois ao considerar, mesmo
que, implicitamente, o contraexemplo em que o conjunto será linearmente
dependente, ele apresenta uma situação em que o conjunto não é um gerador;
mesmo assim, seria considerado pelo aluno como sendo uma base para o IR².
Para a resposta do aluno B, Daniel disse: “aqui está nitidamente claro que o
aluno não tem noção, que não existe uma única base para um espaço vetorial. Ele
apresentou uma base, uma base verdadeira; no entanto, não relacionou que existem
outras bases para o mesmo espaço”. Isto é, Daniel aparenta conhecer a base
canônica, e o fato de a base de um espaço vetorial não ser única, ou seja, utiliza o
processo P5.
Na resposta do aluno C, alegou:
90
Conforme proposto no refinamento apresentado na página 70 desta pesquisa.
Eneias Prado Capítulo 5: As Entrevistas e suas Análises
142
aqui o aluno levou em consideração a dimensão do I. E como foram
apresentados três vetores, não pode ser uma base, logo ele descarta
os vetores serem LI ou LD. Ele não quer nem saber disso! m três
vetores, e o I tem dois, pronto acabou, não é uma base! Ele
pensou somente na dimensão e se esqueceu do resto, pois é uma
questão de verdadeiro ou falso, então, fez um comentário e se safou,
pode não ser a resposta mais adequada, mas é considerável.
Penso que Daniel conhece a dimensão do I e estabelece correlações entre
a noção de dimensão e as noções de dependência linear e conjunto gerador. Ainda,
por ter utilizado o fato de o conjunto apresentado possuir um número de vetores
maior do que a dimensão do espaço para tomar sua decisão, aparenta ter
interiorizado o processo P16 em que sendo conhecida a dimensão do espaço
vetorial, para qualquer candidato, a base desse espaço deve possuir o número de
vetores exatamente igual à dimensão.
Na resposta do aluno D, o entrevistado leu, pensou por um tempo e
disse:
sim! Eu estava confundindo com a primeira, neste caso é o
comentário que estava fazendo equivocadamente na letra A. O aluno
levou em consideração que os vetores geram o IR²; no entanto, tenho
três vetores, o que faz com que o conjunto seja LD, ou seja, a noção
de base não ficou clara, pois, também tem que ser um conjunto LI.
Na afirmação, “a noção de base não ficou clara, pois também tem que ser um
conjunto LI”, o entrevistado, mais uma vez, apontou para o fato de conceber base,
como sendo um conjunto gerador com vetores linearmente independentes.
Para finalizar sua análise da primeira situação, Daniel releu e afirmou: “na
letra C, o aluno levou em consideração a dimensão. Na letra D, ficou claro que o
aluno não tem uma ideia sobre base. Na letra A, não entendi o que ele quis dizer
sobre ser do I”.
Acredito que apesar de ter dito: “na letra A, não entendi o que ele quis dizer
sobre ser do I”, reconhece o fato de que os vetores da base devem pertencer ao
espaço vetorial em questão, como afirmou “[...] de repente, três vetores quaisquer
que não gerassem o I, aparentemente, ela diria que é uma base porque os
vetores pertencem ao espaço”.
Eneias Prado Capítulo 5: As Entrevistas e suas Análises
143
Prossegui a entrevista apresentando a segunda situação, para que Daniel
analisasse. Ele pegou a situação, leu e pensou em cada item, após um bom tempo
disse:
a questão que o aluno fez não me parece pertinente, pois isso aqui
(apontando para o conjunto de vetores) não é uma base do polinômio
de grau dois, no caso, deveria ter somente a variável elevada ao
quadrado. Agora se o aluno tivesse dito ser base de um polinômio de
grau menor ou igual a dois, sim! Da maneira como está, às outras
respostas ficam sem sentido.
Daniel discute sobre o conjunto apresentado não ser base somente do
conjunto de polinômios de grau igual a dois, mas, sim, do conjunto dos polinômios
de grau menor ou igual a dois. No entanto, ao dizer “[...] o é uma base do
polinômio de grau dois, no caso, deveria ter somente a variável elevada ao quadrado
[...]”, ele aparentou acreditar que existisse um subespaço do ܲ
(IR) que contesse
somente os polinômios de grau 2! Assim, para prosseguir, o entrevistado assumiu
que o conjunto fosse base dos polinômios de grau menor ou igual a dois e afirmou:
o aluno B que disse ser uma base, pois é o maior conjunto LI. A
resposta está correta, apesar de ele não ter levado em consideração
se o conjunto gera ou não o ܲ
(IR). Aparentemente, ele tem implícito
o fato de que se um conjunto LI é o maior que ele consegue obter no
espaço, vai gerar esse espaço.
Acredito que o entrevistado conceba base, como sendo um conjunto maximal
linearmente independente, mas indícios de que a noção de base, assim
apresentada, para ele é consequência da noção de base, como sendo um conjunto
gerador linearmente independente, “aparentemente, ele tem implícito o fato de que
se um conjunto LI é o maior que ele consegue obter no espaço, vai gerar esse
espaço”.
A respeito da resposta do aluno C, Daniel afirmou:
o aluno C, respondeu de maneira parecida ao aluno B; no entanto,
diferem, pois ele não pensa no maior LI, e, sim, no menor conjunto
possível que gera o espaço, ou seja, ele pensou na menor
quantidade de elementos necessários para gerar todo esse espaço.
O que não deixa de ser uma base!
Eneias Prado Capítulo 5: As Entrevistas e suas Análises
144
Penso que Daniel associou a noção de base, como sendo o minimal gerador
à noção de dimensão, o que indica que, para assumir que um conjunto seja o menor
gerador possível, ele deverá ter de antemão a dimensão do espaço.
Daniel prosseguiu lendo a resposta do aluno D e afirmou:
os alunos B, C e D, disseram noções de base distintas, estando
todas corretas. No entanto, a do aluno D é a mais comum de se
encontrar nos livros de Álgebra Linear [...]. No caso do maior
conjunto LI, temos que levar em consideração que o aluno conhece a
dimensão, assim, um conjunto de vetores LI que tem a mesma
dimensão do espaço, obviamente, é base. A mesma coisa com o
aluno C, pois no item C, o aluno tem a ideia de LI; no entanto a
ideia de ser o menor gerador possível lhe permite, no caso de ser um
conjunto LD, tirar um elemento... Não lembro o nome, mas sei que
existe um teorema que garante que se tirarmos um vetor LD, o
conjunto de vetores tomado, continuaria gerando o espaço.
Acredito que Daniel concebe base como sendo um conjunto gerador
linearmente independente, e as outras vertentes, como sendo consequências, por
exemplo, se ele conhecer a dimensão, é possível obter um conjunto maximal
linearmente independente que seja base, “no caso do maior conjunto LI, temos que
levar em consideração que o aluno conhece a dimensão”. Agora, a noção de base
como sendo um conjunto minimal gerador, ele associou com à noção de
dependência linear, “a ideia de ser o menor gerador possível lhe permite, no caso de
ser um conjunto LD, tirar um elemento [...] (e) o conjunto de vetores tomado
continuaria gerando o espaço”.
Dessa afirmação, penso que Daniel utiliza a ação A9, ou seja, a ação que lhe
permite eliminar de um conjunto gerador os vetores que possam ser escritos, como
combinação linear de vetores pertencentes a esse conjunto.
Para concluir sua análise, ele disse:
apesar de ambos trazerem consigo a ideia de LI, nesse (apontando
para o aluno B) é explicito, nesse (apontando para o aluno C) não.
Olha, esse a ideia de LI, e esse a ideia de gerador. Ambos
definiram base, mas cada um deles dá ênfase a uma noção.
As correlações que Daniel aparenta realizar, indicam que construiu o objeto
base de um espaço vetorial, como sendo um conjunto gerador linearmente
Eneias Prado Capítulo 5: As Entrevistas e suas Análises
145
independente. O fato faz com que o entrevistado considere os objetos O5 e O6,
como sendo consequência de O3.
Síntese das observações da entrevista
Daniel é licenciado em Matemática e está cursando o mestrado em Educação
Matemática. O curso de extensão de Álgebra Linear, efetivamente, foi o segundo
dessa disciplina do qual participou.
O entrevistado mostrou utilizar a ão A9 e os processos P2, P3, P5, P11 e
P16, e ainda, demonstrou coordenar esses processos de maneira que obteve os
objetos O2, O3, O4 e O7.
Durante sua argumentação, também, utilizou a noção de dimensão para
determinar se um conjunto é base, das seguintes maneiras: o conjunto apresentado
possui o número de vetores maior do que a dimensão do espaço, então, não pode
ser uma base; se o conjunto é um conjunto gerador e possui o número de vetores
maior do que a dimensão, eliminam-se os vetores linearmente dependentes,
obtendo, assim, o menor conjunto gerador; e conhecendo a dimensão, tomam-se
vetores de maneira a obter o maior conjunto linearmente independente em um
espaço vetorial.
Assim, Daniel demonstrou ter construído concepções objeto para as noções
elementares de Álgebra Linear, pois utiliza das ações, dos processos e dos objetos,
e ainda, estabelece correlações entre essas noções matemáticas.
Dessa maneira, após dois cursos de Álgebra Linear, mostrou ter incorporado
a noção de dimensão ao esquema que possui sobre a noção de base de um espaço
vetorial.
Eneias Prado Capítulo 5: As Entrevistas e suas Análises
146
Entrevista com Juliano
“[...] acho que (ele) não aprendeu muito bem a definição de base,
que é um conjunto LI e que ao mesmo tempo forma
o espaço vetorial, não é?” (JULIANO)
A descrição desta entrevista baseou-se em minhas anotações durante o
encontro, na transcrição da audiogravação e, também, nas mensagens trocadas.
Passados 20 dias após o primeiro convite, feito por e-mail (anexo 1), não
obtive resposta de Juliano. Então, enviei-lhe um novo convite, também, por e-mail e,
no mesmo dia, ele respondeu-me indicando a data e o local para a realização da
entrevista.
Cheguei antecipadamente ao local combinado, a saber, a Biblioteca do IME-
USP. Procurei por uma das saletas de estudo, mas, todas estavam em uso. Voltei, à
entrada da biblioteca e aguardei por Juliano.
Assim que Juliano chegou, dirigimo-nos a uma sala de aula vazia do instituto,
acomodamo-nos, agradeci sua presença e informei os objetivos da pesquisa.
Conversamos por um tempo, ao perceber que Juliano estava tranquilo, solicitei se
poderia audiogravar a entrevista. Com seu aceite, iniciei a gravação que durou cerca
de 20 minutos.
O entrevistado estava no quarto semestre de um curso de licenciatura em
Física de uma Universidade pública do Estado de São Paulo. Ele disse, também, ter
a intenção de participar de uma iniciação científica, em que pretende estudar
espectroscopia com íons leves, para então, elaborar materiais didáticos.
Outra intenção de Juliano é cursar o bacharelado em Física, pois, tem
interesse em estudar certas disciplinas que não constam na grade curricular da
licenciatura, por exemplo, Álgebra Linear.
Seguindo os conselhos de uma amiga, procurou por cursos de extensão, e
por não ter feito Cálculo II, optou participar do curso de Álgebra Linear, pois acredita
que “para quem quer completar fazendo o bacharelado, é uma boa ajuda”, pois,
apesar de não ter trabalhado com Mecânica Quântica, tem consciência da
importância atribuída à Álgebra Linear nessa disciplina, pois “a Álgebra Linear é
Eneias Prado Capítulo 5: As Entrevistas e suas Análises
147
como se fosse o Cálculo para a Física. É muito útil”. Isto é, efetivamente, o curso de
extensão foi o primeiro curso de Álgebra Linear que Juliano participou. Segundo ele,
esperava pegar bastante, como é que se fala? Absorver bastante
conteúdo de Álgebra Linear, mas sabia que era uma coisa meio
complicada de se entender numa primeira vez. Então, não tinha a
expectativa de passar, ia tentar, como tentei. Pois, o irmão da minha
amiga, ele é bacharel em Matemática e fez três vezes o curso de
extensão em Álgebra Linear, reprovando em duas delas. Então,
sabia o que podia acontecer.
Comentei sobre o desenvolvimento do curso de extensão de Álgebra Linear e,
enquanto dizia que, embora o professor tivesse tratado, sobretudo, de espaços
vetoriais finitamente gerados, ele apresentou um ou outro exemplo que eram
considerados espaços vetoriais sobre outro corpo, Juliano interrompeu-me dizendo:
“isso mesmo! E, foi sobre o corpo dos complexos”.
Prossegui apresentando a primeira situação. Juliano após ler e pensar por
um tempo, perguntou: “o que mesmo eu devo fazer?” Assim, pedi que olhasse para
as quatro respostas dadas e comentasse sobre o que poderia ter conduzido-os a
responder de tal maneira.
O entrevistado releu e disse:
Bom! Esse aluno aqui (aluno A), acho que não aprendeu muito bem
a definição de base, que é um conjunto LI e que, ao mesmo tempo,
forma o espaço vetorial, não é? Aqui no caso, o subespaço. Ele falou
que isso é uma base, mas se esqueceu que isso daqui (referindo-se
aos vetores ݔ
,ݔ
e ݔ
) não são vetores LI, eles são LD (Grifo do
autor).
Juliano ao ler a resposta do aluno A, “verdadeira. Eles formam uma base [...]”,
aparenta ter interpretado o verbo “formar”, como sendo o verbo “gerar” que, em
Álgebra Linear é utilizado ao tratar da noção de conjunto gerador. Essa interpretação
pode tê-lo conduzido em sua análise, pois o atentou ao fato de que um conjunto
para ser base de um espaço vetorial, deve estar contido no espaço.
Por outro lado, apresentou, o que aparenta conceber como sendo base de um
espaço vetorial, ou seja, “é um conjunto LI e que, ao mesmo tempo, forma o espaço
vetorial”. Além de, evidenciar o uso do processo P3 que lhe permite dizer se um
conjunto é linearmente independente, “isso daqui (referindo-se aos vetores ݔ
,ݔ
e
ݔ
) não são vetores LI, eles são LD”,
Eneias Prado Capítulo 5: As Entrevistas e suas Análises
148
Em continuação, Juliano afirmou que a questão feita pelo professor “é falsa”,
assim como respondeu o aluno B, “mas, poderia ser outra base também! Tipo não
precisava ser a canônica, ele (aluno B) fixou bastante na canônica porque é a mais
fácil, é a mais simples que tem!”
Juliano conhece a base canônica e, ainda, o fato de a base de um espaço
vetorial não ser única. Com isso, penso que o entrevistado utiliza o processo P5 que
lhe permite reconhecer vetores linearmente independentes e se esse conjunto de
vetores é indispensável para gerar o espaço vetorial em estudo.
O entrevistado prosseguiu analisando a resposta do aluno C: “o aluno está
certo, ele utilizou o fato de ser o I, e a dimensão ser dois. A dimensão do espaço
vetorial é a quantidade de elementos da base... É, eu acho que ele pensou nisso!”.
Juliano demonstrou conhecer a dimensão do espaço vetorial I, apresentou o
que concebe, como sendo a dimensão de um espaço vetorial, ou seja, “é a
quantidade de elementos da base”. Dessa forma, o entrevistado correlacionou à
noção de base de um espaço vetorial com a noção de dimensão, pois utilizou o
processo P16, isto é, a dimensão do espaço vetorial é conhecida e o conjunto
apresentado possui um número de elementos maior do que a dimensão, logo esse
conjunto não pode ser uma base para o espaço vetorial em questão.
Na resposta do aluno D, o entrevistado alegou ser “mais ou menos essa daqui
de cima, a primeira, pois pensou no sentido de formar o espaço vetorial e não
pensou que os vetores que formam a base devem ser LI”.
Juliano considera o fato do conjunto de vetores ser gerador, como sendo
condição necessária, mas não suficiente, pois ao afirmar que o aluno “[...] só pensou
no sentido de formar o espaço vetorial e não pensou que os vetores que formam a
base devem ser LI”, enfatiza o que concebe como sendo base de um espaço
vetorial, ou seja, como apresentada em O3.
Após finalizar sua argumentação, apresentei-lhe a segunda situação. Ele
leu, pensou durante um tempo e disse: “não entendi muito bem... maior conjunto...”,
parou e voltou a pensar por mais um tempo.
O entrevistado releu e afirmou:
o aluno A, que pergunta se o conjunto {2,,
} é uma base dos
polinômios de grau dois, estava só tentando confirmar, para ver se
aprendeu. Agora, o aluno B, é, sim, porque é o maior conjunto LI...
Não entendi muito bem, o que ele quis dizer com maior LI de ܲ
(IR),
Eneias Prado Capítulo 5: As Entrevistas e suas Análises
149
mas acho que ele sabe mais ou menos... É, estou meio perdido... Eu,
também, não sou muito bom... Mas acho que ele estava pensando
que a base poderia ser menor, poderia ter ,
... É! ,
, no
máximo, se não, não seria de grau dois.
Juliano não está familiarizado com os espaços vetoriais ܲ
(IR), e ainda,
aparenta não reconhecer a noção de base de um espaço vetorial como definida em
O6, ou seja, base, como sendo um conjunto maximal linearmente independente.
Após pensar um pouco, afirmou:
o outro, porque é menor conjunto que gera... o aluno C está ainda
mais perdido, ele está tão perdido quanto eu, porque ele fala que é o
menor conjunto que gera todo esse espaço, mas se tivesse mais um,
mais um grau aqui, já não seria base do polinômio dois. Eu acho que
ele não pensou muito bem nisso. Se tivesse mais outra coisa
também não seria LI.
O entrevistado indícios de não conceber base como apresentado em O5,
ou seja, como sendo um conjunto minimal gerador. Além disso, os elementos, do
espaço vetorial apresentado, não são percebidos como sendo vetores, “[...] mas se
tivesse mais um, mais um grau aqui já não seria base do polinômio 2 [...] se tivesse
mais outra coisa também não seria LI” (Grifo do autor).
Juliano parou, leu novamente a resposta do aluno D e disse: “o aluno D está
com a definição completa, ele explica que uma base é um conjunto de vetores
linearmente independentes que acaba gerando o espaço do polinômio de grau dois,
com todos os seus coeficientes”. Mais uma vez, apresentou o que concebe como
sendo base.
Síntese das observações da entrevista
Juliano é aluno de licenciatura em Física, pretende participar de uma iniciação
científica e, posteriormente, cursar o bacharelado.
Seguindo a orientação de uma amiga, fez o curso de extensão que,
efetivamente, foi o primeiro de Álgebra Linear que participou. Pretende refazer esse
curso, pois acredita que o conhecimento é tido como um conteúdo que deve ser
absorvido, pois “esperava pegar bastante, como é que se fala? Absorver bastante
conteúdo de Álgebra Linear”.
Eneias Prado Capítulo 5: As Entrevistas e suas Análises
150
Quanto às percepções desta entrevista, julgo que ele possa ter interpretado o
verbo “formar” como sendo o verbo “gerar”, o que possivelmente conduziu sua
análise da primeira situação. na segunda situação, há indícios de que o espaço
vetorial considerado não lhe seja familiar, pois os vetores desse espaço vetorial não
são percebidos por ele, como sendo vetores.
Por outro lado, durante sua argumentação utilizou os processos P3, P5 e P16.
Desde o início, apresentou o que concebe como sendo base de um espaço vetorial
e dimensão. Além disso, demonstrou estabelecer correlações entre as noções
elementares de Álgebra Linear, sobretudo, entre as noções de base e dimensão.
Após um curso de Álgebra Linear, acredito que Juliano tenha uma concepção
processo sobre a noção de base de um espaço vetorial. Assim como para a noção
de dimensão.
Eneias Prado Capítulo 5: As Entrevistas e suas Análises
151
Entrevista com Ths
“[...] como calcular a base, não lembro, não posso falar a respeito.
Como que calculo uma base?” (Thaís)
A descrição desta entrevista pautou-se em minhas anotações feitas durante o
encontro, na transcrição da audiogravação e, também, nas mensagens trocadas.
Como Thaís não respondeu ao primeiro convite (anexo 1) feito por e-mail,
passados 20 dias enviei-lhe um novo e-mail. Ela, então, respondeu-me indicando a
data e o local para a realização da entrevista.
Cheguei ao local combinado, Biblioteca do IME-USP, com antecedência e,
procurei uma saleta para a entrevista. Mas, todas estavam em uso, então, aguardei
por Thaís para procurarmos por uma sala de aula vazia no instituto.
Todas as salas de aulas estavam ocupadas, por não encontrarmos outro local
para realizar a entrevista, dirigimo-nos a uma das recepções do instituto. Durante
todo o período, que estivemos ali, permaneceu vazia, proporcionando, assim, um
ambiente favorável.
Enquanto seguíamos em direção à recepção, Thaís disse-me ter dificuldade
na audição e na fala, assim, solicitou que eu falasse devagar e pausadamente para
que ela compreendesse.
na recepção, sentamo-nos próximos, um de frente para o outro. Ao nos
acomodarmos, agradeci a presença de Thaís e contei-lhe os objetivos desta
pesquisa, como também pedi autorização para audiogravar a entrevista. Com seu
aceite, liguei dois gravadores. A entrevista teve duração de, quase, 25 minutos.
Thaís fez Engenharia da Comunicação em uma universidade pública em outro
Estado. Após se formar, em 2006, veio para São Paulo para trabalhar em um projeto
de instrumentação. Depois, tentou fazer o mestrado em Astrofísica, mas mudou de
ideia e iniciou o mestrado em Ciência da Computação.
Ela fez o curso de extensão em Álgebra Linear “mais para aprender a fazer
provas, ter uma base teórica. Então, fiz o curso de extensão, mas não acompanhei
direito...”. Thaís disse, também, que durante o curso não alcançou seu objetivo, pois
as provas vistas no curso de extensão de Álgebra Linear eram muito
curtas, eram esboços de provas, depois quando fui tentar aplicar
essas técnicas na Teoria de Grafos, o professor dizia que minha
Eneias Prado Capítulo 5: As Entrevistas e suas Análises
152
prova não estava completa. Acho que essa parte deveria ser um
pouco melhor! Pois, o professor no curso de extensão foi direto sem
explicar os tipos de provas, por exemplo, por indução, por
contradição e outros... Então, acho que, na primeira aula, o professor
deveria dar uma olhada nisso e não pressupor que todo mundo
sabia.
Em continuação, Thaís comentou que havia cursado Álgebra Linear em sua
graduação, mas o nome dado à disciplina era Geometria Analítica. Quanto à
existência de relações entre as noções abordadas em Álgebra Linear e os trabalhos
que tem desenvolvido, a entrevistada alegou que
por enquanto, não sei estimar, pois não iniciei a revisão bibliográfica.
Mas, quando você precisa desenvolver um novo conceito matemático
ou computacional, você precisa testar uma nova técnica, então, você
testa isso matematicamente. Então, acho que a Álgebra Linear vai
ser importante, no momento de se provar, ver se a matemática
construída é consistente.
Prossegui a entrevista retomando aspectos do curso de extensão e
apresentei-lhe a primeira situação. Thaís disse: “tudo bem! não me peça para
demonstrar...”. Novamente, expliquei que era para que ela comentasse as quatro
respostas dadas pelos alunos.
Thaís leu toda a situação proposta e, após um tempo, disse: “preciso me
lembrar sobre o que era mesmo base, não me lembro...”. A entrevistada pensou por
mais um tempo e questionou: “você quer que eu comente? Assim, que diga se está
certo, errado, se é suficiente, se está próximo?”. Confirmei com a cabeça que sim e
ela após pensar disse: “achei a afirmação muito pouco desenvolvida, não é? Acho
que primeiro eu precisaria de uma frase que resumisse o conceito de base, para daí
pegar esse conceito de base e esses vetores e, então, dizer se é verdadeiro ou
não”.
Ela apresentou indícios de não recordar a definição dada durante o curso
para a noção de base de um espaço vetorial. Aparentou demonstrar que não pode
ter construído esta noção durante o curso. Esta percepção prosseguiu durante a
entrevista, pois Thaís sempre aguardava que eu lhe apresentasse uma definição.
Para prosseguir a entrevista, perguntei-lhe sobre as afirmações apresentadas
pelos alunos, ela disse que o aluno A mostrou-se “[...] redundante, é base do I
porque são do I. Aqui o aluno não especificou nada sobre o que é base do espaço
Eneias Prado Capítulo 5: As Entrevistas e suas Análises
153
I. Acho que é insuficiente. Agora como calcular a base, não lembro, não posso
falar a respeito. Como que calculo uma base?”
Nesta afirmação, Thaís aparentou ter necessidade de calcular um resultado e
não de obter um conjunto. Então, prossegui, repetindo sua questão “Hum! Como
encontrar a base?” Ela interrompeu e disse: “É porque eu pego o vetor, me
desculpe, mas esqueci de como que...”, ela parou e me olhou, então, li a questão
feita pelo professor, e como ela afirmou que a resposta do aluno A era insuficiente,
iniciei a leitura da resposta do aluno B, enquanto lia, ela me interrompeu e disse:
“Ah!... Então, (apontando para a base canônica), eu acho que eu gostei mais disso,
porque é o primeiro que pega a base, e a partir dessa base ele diz se é verdadeiro
ou falso”.
Penso que Thaís reconheceu a representação da base canônica e, com isso,
alegou: “é o primeiro que pega a base, e a partir dessa base ele diz se é verdadeiro
ou falso”, mas não evidenciou como concebe a noção de base de um espaço
vetorial.
Ela prosseguiu com a leitura da resposta do aluno C e disse: “esse, enumerar
os vetores. Hum! Não sei...” Thaís, aparentou não ter construído a noção de
dimensão, pois deu indícios de não recordar de tal noção.
Sobre a resposta do aluno D, afirmou: “este aluno que diz, por que esses
vetores geram o I, dá para verificar matematicamente calculando a base. É isso?”
No momento da entrevista, pensei que, ao lhe apresentar a segunda situação,
ela teria contato com a “definição” de base de um espaço vetorial, e assim, poderia
retomar suas argumentações. Mas, ao apresentar a segunda situação, ela me
interrompeu questionando: “qual é a resposta, eu não me lembro?”
Penso que Thaís identificou a situação, como sendo uma questão de ltipla
escolha, sendo assim teria uma única resposta correta. Então, novamente expliquei
que não se tratava de uma questão de múltipla escolha, e, sim, uma situação em
que ela deveria analisar todos os itens.
Prossegui a entrevista, sugerindo que ela comentasse sobre a segunda
situação e caso quisesse poderia retomar a primeira. Thaís leu, pensou durante um
tempo e questionou: “Bom! Assim, você quer que eu comente sobre a forma de
ensinar?”
Eneias Prado Capítulo 5: As Entrevistas e suas Análises
154
Respondi que poderia ser, mas seria interessante que ela olhasse para o que
cada aluno poderia ter pensado ao responder e Thaís disse: “achei interessante o
professor perguntar primeiro para a classe. Mas, não teve muita participação”.
Thaís retomou sua leitura e disse:
uma coisa que eu achei bem contraditório, é o maior conjunto LI e o
menor conjunto de vetores. Isso não ficou muito claro. Ninguém
corrigiu! Ninguém falou se era maior ou menor. Ninguém falou mais
nada! É, gostei mais disso (aluno D), pois deu para entender bem.
Mas, depois o professor não disse mais nada, por exemplo, quem
estava certo. É mais ou menos isso que você queria?
Penso que Thaís associou a afirmação do aluno D com o que estudamos
durante o curso de extensão; no entanto, aparentou necessitar de uma confirmação,
pois apresentou ter dúvidas que a conduziram a dizer “[...] o professor não disse
mais nada, por exemplo, quem estava certo”.
Enquanto agradecia sua participação ela me interrompeu dizendo:
outra coisa, aquelas aulas foram uma “encheção de linguiça”, tem
que ter uma definição um pouco mais concisa e depois partir para o
exemplo. No meu caso, aprendo mais com exemplos, pois somente
dando a definição não consigo desenvolver muita coisa. Outra coisa,
nesse curso, quase não tinha exemplo numérico, somente na lista de
exercícios apareceram alguns que nem sempre foram de grande
ajuda; na hora de fazer a prova, vinha coisa numérica enquanto que
na aula eu sofria.
Síntese das observações da entrevista
Thaís é engenheira formada e faz curso de mestrado em Ciências da
Computação. Segundo ela, o curso de extensão foi o segundo de Álgebra Linear do
qual participou.
Com os elementos evidenciados em suas argumentações, Thaís demonstrou
não ter uma concepção ação sobre a noção de base de um espaço vetorial. Na
primeira situação, por exemplo, buscava por uma definição; na segunda situação,
em que a noção de base é apresentada sobre três pontos de vista, ela demonstrou
recordar da definição dada durante o curso de extensão, mas, aparentou incerteza
sobre a afirmação. Isto é, mesmo após dois cursos de Álgebra Linear, a entrevistada
não construiu as noções elementares de Álgebra Linear.
Eneias Prado Capítulo 5: As Entrevistas e suas Análises
155
Um olhar panorâmico das entrevistas
Na primeira parte, apresentei uma análise vertical das entrevistas. Agora, as
analiso com um olhar panorâmico, em que viso a identificar similaridades ou
discrepâncias entre as argumentações apresentadas pelos entrevistados.
Quanto à caracterização dos sujeitos de pesquisas
Nos dados do Quadro 3, destaco o resumo da formação acadêmica do grupo
entrevistado:
Quadro 3: Formação Acadêmica dos entrevistados
Em curso
Concluído
Graduação Pós-graduação
Licenciatura
Bacharelado Strictu sensu Lato sensu
Mestrado Doutorado
André Química/ Mat. Apl. Química Química
Bruno Matemática Matemática Edu.Matemática
Carol Matemática Estatística Estatística Matemática
Daniel Matemática Edu.Matemática
Fernando Matemática Arq./Direito/Filosofia
Direito/Filosofia
Juliano Física
Lucas Física
Mariana Engenharia
Rodolfo Matemática Matemática
Tais Engenharia C. Computação
Observo que dos 10 entrevistados, seis concluíram ou estão matriculados em
um curso de pós-graduação. Dos quatro que não fizeram ou estão em cursos de
pós-graduação, três são jovens que adentraram à Universidade recentemente. Ainda
é interessante notar que seis dos dez sujeitos não vieram da Matemática, mas de
áreas afins, como Arquitetura, Engenharia, Física e Química.
Dos entrevistados Juliano, na época da entrevista, não havia ainda
participado de outro curso de Álgebra Linear, pois o de extensão foi seu primeiro
curso sobre o assunto. Os demais, efetivamente, ao serem entrevistados haviam
participado de, ao menos, dois cursos de Álgebra Linear.
Eneias Prado Capítulo 5: As Entrevistas e suas Análises
156
1ª Situação proposta aos sujeitos entrevistados
A seguir, apresento a análise dos comentários dos sujeitos sobre a primeira
situação proposta.
A análise dos comentários sobre a resposta do aluno A: Verdadeira, eles
formam uma base do I porque são do I. Nos dados do Quadro 4, sintetizo esses
comentários.
Quadro 4: Primeira situação: comentários sobre a resposta do aluno A
Nome
Resumo dos comentários
Thaís
Está redundante [...] O aluno não especificou nada sobre o que é base do espaço I.
Acho que é insuficiente. Agora como calcular a base, não lembro, não posso falar a
respeito. Como que calculo uma base?
Mariana
O aluno
está totalmente por fora, ele não sabe o que é uma base, nunca ouviu esse
termo!
Fernando
O aluno não estava sabendo a matéria e deu uma resposta qualquer.
Carol
O aluno não tem clara a noção de base de um espaço vetorial, pois
utilizou
somente o fato de os vetores serem do IR².
Bruno
Não é especificamente por que eles são do IR² que eles irão formar uma base para o
I [...] não é só isso que precisa.
Rodolfo
Não está correto, pois não são todos os vetores do I que vão formar o IR².
André
O aluno não pensou que
para formar uma base
para esse espaço
, você não
precisa de três vetores, você precisa somente de dois, não é? Então, está faltando
ele dizer quem é esse conjunto e, também, está faltando ele utilizar aquele
teoremazinho que diz: se a dimensão for
e se ele tiver
+
vetores, um deles
é combinação linear dos outros vetores.
Lucas
Ele confundiu dois conceitos, o de conjunto gerador com o de base.
Base
é um
conjunto LI e gerador [...] Como você pode ver, é só multiplicar o vetor
=
(−1,−5/4) por menos quatro que obtemos o ݔ
= (4, 5). Então, eles não são
linearmente independentes. [...] Aqui o aluno mostrou que está confundindo o
conceito de base com o de conjunto gerador. Esses três vetores [...] geram (o IR²),
sim, com certeza, sem dúvida!
Daniel
Ela pensou que se
dois geram
, então, o
terceiro
não deixa de gerar o I, mas ela
não viu que isso transformava o conjunto em um conjunto linearmente dependente,
o que não é uma base. Uma Base é um conjunto linearmente independente que
gera o próprio espaço, neste caso, o I. Então, ela partindo deste princípio, sem
atentar para o fato de o conjunto ser LI ou LD, afirmou que era uma base porque
gerava o I.
Juliano
Esse aluno [...] não aprendeu muito bem a definição de
base
, que é um
conjunto
LI
e que, ao mesmo tempo, forma o espaço vetorial [...] (ele) se esqueceu que isso
daqui (referindo-se aos vetores
,
e
) não são vetores LI, eles são LD.
Nos dados do Quadro 5 sintetizei o conjunto desses comentários.
Eneias Prado Capítulo 5: As Entrevistas e suas Análises
157
Quadro 5: Síntese do Quadro 4
Sem
justificação
matemática
Não é suficiente
que o conjunto
pertença ao espaço
vetorial
Análises bem justificadas
Base: conjunto
LI que gera
Base do I:
conjunto LI com 2
vetores
Base do I:
conjunto LI que gera e
tem 2 vetores
3 3 2 1 1
3 3 4
Em relação à resposta do aluno A, sete entrevistados comentaram que para
um conjunto ser base de um espaço vetorial, além de estar contido no espaço
vetorial, ele deverá atender a outras propriedades. Dentre esses casos, dois
referiram-se à dimensão do I, o que mostra que, para eles, a noção de base está
fortemente associada à de dimensão, o que é natural, pois se trata do I que é um
dos espaços vetoriais mais tratados em cursos de Álgebra Linear. Será que o
mesmo aconteceria se fosse o espaço vetorial real dos polinômios de grau 7?
Análise dos comentários dos sujeitos sobre a resposta do aluno B: Falsa,
porque a base do IR² é {(1,0),(0,1)}. . Nos dados do Quadro 6, sintetizo esses
comentários.
Quadro 6: Primeira situação: comentários sobre a resposta do aluno B
Nome
Resumo dos comentários
Thaís
[...] Gostei mais disso (indicando a base canônica), porque é
o primeiro que
pega a
base, e a partir dessa base ele diz se é verdadeiro ou falso.
Mariana
O aluno está com uma proposta interessante, pois
a base do
I
é composta por
zero e um.
Fernando
O aluno parece ter entendido o que seria uma base para o I, mas não foi capaz de
verificar se a partir dos vetores dados seria possível concluir racionalmente se
aqueles vetores também poderiam ser outra base. Depois, tive a impressão que o
aluno poderia estar com a ideia de que os vetores que formam a base devem ser
necessariamente ortogonais.
Carol Esse aluno conhece a base do IR² [...], mas se esqueceu que a base não é única
Rodolfo
Ele confundiu a base canônica com o conceito de base [...] Na verdade,
base
canônica é uma base, mas não é a única.
André [...] Esse aqui
pensou que a única base é a base canônica!
(risos).
Bruno
É falsa, pois é a base canônica e pode ser outra base, ou o? Não tem nada a ver!
[...] Não é falsa porque ele fala da base canônica, mas porque não necessariamente
tem que ser a base canônica.
Lucas
O aluno está com a base canônica presa na cabeça (risos).
Base para ele
,
pode
ser a base canônica e, isso, é um erro, porque até mesmo se eu pegar os
vetores
e
eu tenho uma base para o I.
Daniel
[...] o aluno não tem noção que
não existe uma única base para um espaço
vetorial. Ele apresentou uma base, uma base verdadeira; no entanto, não relacionou
que existem outras bases para o mesmo espaço
Juliano
É falsa, mas poderia ser outra base também! Tipo
não precisava ser a canônica
,
ele fixou bastante na canônica porque é a mais fácil, é a mais simples que tem!
Eneias Prado Capítulo 5: As Entrevistas e suas Análises
158
Dois dos entrevistados em seus comentários demonstraram recordar algumas
das características da representação algébrica de uma base canônica. Os demais,
oito, reconheceram a base canônica e comentaram, explicitamente, que ela não é a
única e que existem diferentes bases para um mesmo espaço vetorial.
Análise dos comentários dos sujeitos sobre a resposta do aluno C: Falsa,
porque tem três vetores. Nos dados do Quadro 7, sintetizo esses comentários.
Quadro 7: Primeira situação: comentários sobre a resposta do aluno C
Nome Resumo dos comentários
Thaís
Esse enumerar os vetores. Hum! Não sei...
Mariana
Agora, porque tem três vetores... Tinha outra coisa envolvida, mas agora não vou
saber dizer.
Fernando
O aluno [...] não parece ter entendido, o que seria uma base e os subespaços
possíveis dentro de um espaço vetorial com dimensão maior.
Bruno
Não é falsa, pois eu posso zerar uma letra aqui (
ߙ
,
ߚ
ou
ߛ
, referindo-se à Figura 29
apresentada na página 119), e ele continua sendo uma base.
Carol
O terceiro aluno está correto, pois
a dimensão desse espaço é dois
.
André
Verdade, pois
basta tomarmos dois vetores e não três
! [...] O aluno tem uma
lógica, pelo menos, está falando que tem vetor a mais, não é?
Juliano
O aluno está certo,
ele utilizou o fato de ser o
I
, e a dimensão ser dois
. A
dimensão do espaço vetorial é a quantidade de elementos da base... É, eu acho que
ele pensou nisso!
Rodolfo
O aluno afirmou que é falsa, realmente, é isso mesmo, pois
se tem três vetores um
é linearmente dependente dos outros dois. Assim, a terceira resposta está
correta, mas está incompleta.
Daniel
O aluno levou em consideração a dimensão do
IR². E como
foram apresentados três
vetores, não pode ser uma base, logo ele descarta os vetores serem LI ou LD.
Ele não quer nem saber disso! Têm três vetores e o I tem dois, pronto acabou, não
é uma base! Ele pensou somente na dimensão e se esqueceu do resto [...].
Lucas
O fato de ter três vetores não é suficiente para negar que seja base.... Uma parte ele
entendeu! Como se está trabalhando com o I, é suficiente que hajam dois
vetores para gerar, três vetores virou um conjunto gerador, mas não uma
base, certo? Ah!... esse fato dos três vetores foi uma afirmação boa, mas não foi
completa.
Seis dos entrevistados explicitaram que o aluno C utilizou a noção da
dimensão do I em sua resposta. Destes entrevistados, dois, correlacionaram a
dimensão com vetores linearmente independentes e, um, com a noção de conjunto
Eneias Prado Capítulo 5: As Entrevistas e suas Análises
159
gerador. Quatro entrevistados não usaram argumentos matemáticos para decidir se
a afirmação do aluno C estava correta ou não.
Análise dos comentários dos sujeitos sobre a resposta do aluno D:
Verdadeira, porque esses vetores geram o I. No Quadro 8, sintetizo esses
comentários.
Quadro 8: Primeira situação: comentários sobre a resposta do aluno D
Nome Resumo dos comentários
Thaís
Este aluno que diz, por que esses vetores geram o I, para verificar
matematicamente calculando a base. É isso?
Mariana
O aluno está errado, pois esses vetores não geram o IR².
Fernando
Aparentemente (o aluno) não sabe ou estava com preguiça de justificar.
Bruno
Está correta, pois os três vetores geram o I.
Rodolfo
Não são todos os vetores do I que vão formar o IR², pois
se tem três vetores um é
linearmente dependente dos outros dois.
André
Os vetores geram o
I, mas,
não precisa dos três vetores
, pois
dois
vetores
são suficientes [...] Talvez o conceito foi discutido rapidamente e os alunos não
perceberam que são necessários apenas dois vetores!
Carol
[...] Eles geram o I, mas um é combinação linear do outro [...] Isso! Esses
vetores são [...] são LD”.
Lucas
Esses vetores
geram o
I, mas
gerar é uma condição necessária
para ser uma
base, não uma condição suficiente [...] É necessário, também, que os vetores
sejam linearmente independentes.
Daniel
[...] O aluno levou em consideração que
os vetores geram o
IR²; no entanto,
tenho
três vetores o que faz com que o conjunto seja LD, ou seja, a noção de base não
ficou clara, pois também tem que ser um conjunto LI.
Juliano
[...] Ele
pensou no sentido
de formar
o espaço vetorial e
não pensou que os
vetores que formam a base, devem ser LI.
Três entrevistados fizeram comentários o pertinentes em suas análises.
Bruno, um dos entrevistados, parece que se dispersou e comentou que os três
vetores geravam o I, o que é verdade, porém não foi isso, o que lhe foi solicitado.
Seis entrevistados comentaram que, para um conjunto ser base de um espaço
vetorial, além de ser gerador, ele deverá ser um conjunto linearmente independente.
Outros dois, ao comentarem, utilizaram a noção de dimensão.
Eneias Prado Capítulo 5: As Entrevistas e suas Análises
160
Durante a análise dessa primeira situação, a noção de base, como sendo um
conjunto gerador com vetores linearmente independentes foi evidenciada nos
comentários de cinco entrevistados. Outra noção elementar que se evidenciou nas
argumentações foi a de dimensão, utilizada por um dos entrevistados para
argumentar sobre três das quatro respostas dos alunos e, por dois entrevistados, ao
comentarem sobre duas das respostas. E ainda, na resposta do aluno C, seis
entrevistados, explicitamente, utilizaram-na.
2ª Situação Proposta aos sujeitos entrevistados
A seguir, apresento a análise dos comentários dos sujeitos sobre a segunda
situação proposta.
Análise dos comentários dos sujeitos sobre o espaço vetorial considerado, o
conjunto dos polinômios de grau menor ou igual a dois. Nos dados do Quadro 9,
sintetizo esses comentários.
Quadro 9: Segunda situação: comentários sobre o espaço vetorial considerado
Nome Resumo dos comentários
Carol
Esses vetores formam um polinômio de grau dois.
André
[...] Esse conjunto é uma base para o espaço dos polinômios de grau dois.
Juliano
[...] O conjunto
{
2
,
3
,
4
}
é uma base dos polinômios de grau dois.
Rodolfo
[...] o espaço dos polinômios de grau
2 tem dimensão três.
Daniel
A questão que o aluno fez, não me parece pertinente, pois isso aqui (apontando para
o conjunto de vetores) não é uma base do polinômio de grau dois; no caso, deveria
ter somente a variável elevada ao quadrado. Agora, se o aluno tivesse dito ser base
de um polinômio de grau menor ou igual a dois, aí sim! Da maneira como está, as
outras respostas ficam sem sentido.
Thaís Não fizeram comentários sobre a forma do aluno se referir ao conjunto dos
polinômios de grau
2
Bruno
Lucas
Mariana
Fernando
Pelo resumo acima, percebeu-se que nenhum dos entrevistados discutiram
que o espaço vetorial real dos polinômios, ao qual o aluno A se referia, não é dos
“polinômios de grau 2”, mas, sim, dos polinômios de grau menor ou igual a dois mais
o polinômio nulo. Um deles até imaginou que existisse um subespaço do ܲ
(IR) que
continha somente os polinômios de grau 2! No entanto, é conhecido que os registros
Eneias Prado Capítulo 5: As Entrevistas e suas Análises
161
de representação semiótica da Álgebra Linear o de difícil assimilação pelos
alunos, ainda mais se o espaço vetorial tratado é diferente dos espaços vetoriais
reais IR
n
.
Nos dados do Quadro 10, sintetizo os comentários da transcrição
apresentada aos entrevistados
Quadro 10: Segunda situação: comentários sobre a transcrição apresentada
Nome Resumo dos comentários
Mariana [...] Acho que ainda não é uma base.
Não me
lembro
.
Thaís
[...] Achei
bem contraditório, é o maior conjunto LI e o menor conjunto de
vetores. Isso não ficou muito claro. Ninguém corrigiu! Ninguém falou se era maior ou
menor. Ninguém falou mais nada! [...] É, gostei mais disso (aluno D), pois deu para
entender bem. Mas, depois o professor o disse mais nada, por exemplo, quem
estava certo.
Carol
O aluno
B
e
o aluno
C
são complementares
.
Não, não!
Essas afirmações
são
opostas [...] Não sei, eu ficaria com o aluno D.
Juliano
O aluno
A
, [...] estava só tentando confirmar, para ver se aprendeu. Agora, o aluno
B
,
[...] Não entendi muito bem o que ele quis dizer [...] O aluno C, está ainda mais
perdido [...] O aluno D está com a definição completa[...].
Rodolfo
O aluno
B
:[...] Acredito que
tem que ser o maior conjunto
, que
tem que ter três
vetores. Porque o espaço dos polinômios de grau menores ou iguais a dois tem
dimensão três, então no máximo tem três vetores LI, acho que ele quis dizer isso.
[...] É! Agora eu não consigo entender exatamente o que ele (aluno C) estava
pensando. [...] A resposta do aluno D é a que define base.... [...] (ele) usa para
justificar justamente a definição de base, ou seja, que os vetores sejam linearmente
independentes e que gerem o espaço.
André
O aluno
B
.
Não existe esta questão de maior conjunto
. É um conjunto de vetores
LI que gera o espaço. [...] O aluno que acredito estar correto é o aluno D, pois é
esse exatamente o caso, um conjunto de vetores linearmente independentes que
gera esse espaço.
Bruno
Não lembro! lembro que tinha um negócio de maior e menor
, mas agora que
estão juntos não para saber qual é ... [...] É uma base porque é um conjunto
linearmente independente que gera esse espaço.
Fernando
O aluno
B
sabia que a base é
formada por um conjunto LI
, mas, oralmente, talvez
tenha dado uma resposta provisória, justificável, pois era um questionamento oral [...]
A resposta (do aluno C) pareceu meio vaga, pois não se sabe ao certo o
significado dos termos usados, quer dizer, pode ser que (o aluno) estava
dominando o assunto ou falou meio vago para aumentar as possibilidades de acertar.
[...] (O aluno D) conhece o assunto. Mas, como estamos avaliando uma resposta
oral, não teria muito sentido daí extrair uma certeza de se foi um chute ou uma
resposta segura.
Lucas
[...] quando se toma
o maior conjunto têm que ser com três vetores
e a partir
deles voconsegue gerar os outros. [...] O menor conjunto de vetores que gera
todo o espaço. Isso é verdade! Porque se você tiver um conjunto com o
número de vetores menor vai ter algum vetor que não vai ser gerado [...] Assim,
tanto o aluno B quanto o aluno C estão corretos [...] Contudo eles trocaram a
causa pela consequência. [...] O aluno D apresentou a resposta mais completa.
[...] Os três apresentaram respostas condizentes [...]
Daniel
Os alunos
B, C e D, disseram noções de base distintas, estando todas corretas
.
[...]. No caso do maior conjunto LI, temos que levar em consideração que o
aluno conhece a dimensão [...]. A mesma coisa com o aluno C, pois [...] já tem a
ideia de LI, no entanto a ideia de ser o menor gerador possível lhe permite, no
caso de ser um conjunto LD [...] se tirarmos um vetor LD, o conjunto de vetores
tomado continuaria gerando o espaço. Ambos definiram base, mas cada um
deles da ênfase a uma noção.
Eneias Prado Capítulo 5: As Entrevistas e suas Análises
162
Dos entrevistados, um demonstrou não ter construído ainda a noção de base,
disse não se lembrar. Sete mostraram conceber base, como sendo um conjunto
gerador com vetores linearmente independentes, mas não atentaram ao fato das
três definições de base serem equivalentes. Apenas dois entrevistados, perceberam
a equivalência das três “definições” de base.
Quanto às concepções de base evidenciadas pelos sujeitos
Conforme citado na página 22 deste trabalho, realizei um estudo do que cada
indivíduo articulou ou demonstrou utilizar durante a entrevista que se constituiu,
realmente, em uma tarefa árdua, pois só tive acesso ao que os entrevistados
expressaram em suas argumentações. Da análise de suas entrevistas, procurei
identificar as concepções que os entrevistados demonstraram ter construído.
Os dados do Quadro 11 sintetizam as ações, processos e objetos
evidenciados durante a argumentação dos sujeitos que demonstraram possuir uma
concepção objeto sobre a noção de base de um espaço vetorial:
Quadro 11: Síntese das Ações, processos e objetos evidenciados pelos sujeitos
Ação - A
i
Processo - P
i
Objeto - O
i
1
3
6
7
8
9
10
13
1
2
3
5
6
7
11
12
13
16
1
2
3
4
7
8
9
André
x x x x x x x x x x x x x
Carol
x x x x x x x x x x x x x x x x x x
Daniel
x x x x x x x x x x x x
Lucas
x x x x x x x x x x x x x x x x x x x x
Rodolfo
x x x x x x x x x x
4 1 1 3 3 4 2 2 3 4 4 2 1 2 4 2 3 3 2 5 5 3 5 3 4
Das 16 ações previstas na decomposição genética apresentada na análise
teórica, 8 foram evidenciadas no caso dos sujeitos que demonstraram ter uma
concepção objeto. Dessas 8, as mais presentes foram a A1: operar (operações
binárias que definem um espaço vetorial) com vetores pertencentes a um espaço
vetorial e com escalares pertencentes ao corpo dos reais e A9: eliminar de um
conjunto gerador os vetores que possam ser escritos, como combinação linear dos
vetores pertencentes a esse conjunto.
Eneias Prado Capítulo 5: As Entrevistas e suas Análises
163
Dos 16 processos previstos, 10 foram evidenciados por esses sujeitos. Entre
tais processos, os mais presentes foram o P2: reconhecer subconjuntos de um
espaço vetorial que podem ser gerados a partir de um dado subconjunto desse
espaço, P3: determinar se um conjunto de vetores é linearmente independente e
P11: dizer qual o menor número de vetores necessários para gerar um espaço
vetorial.
dos 9 objetos, apenas dois não foram evidenciados. Desses 9, os mais
presentes foram o O2: dependência linear, O3: base, como sendo um conjunto
gerador linearmente independente, O7: dimensão e O9: base, como sendo um
conjunto linearmente independente com o número de vetores, exatamente, igual à
dimensão do espaço vetorial.
Na página 71, apresentei que um indivíduo ao coordenar o objeto O4, com o
processo P6 constrói as ações A8 e A9. Desta maneira, esse indivíduo ao coordenar
essas ações, A8 e A9, constrói o processo P3, em que identifica os vetores que não
formam combinações lineares entre si, como sendo vetores linearmente
independentes, e os que formam combinações lineares como linearmente
dependentes. Por sua vez, esse processo é encapsulado no objeto O2.
Dos dados observados, há indícios que, assim como proposto no refinamento,
um indivíduo ao coordenar as ações A8 e A9 constrói o processo P3 que é,
posteriormente, encapsulado no objeto O2. Mas, além disso, indícios de que o
indivíduo a partir desta construção poderá coordenar os objetos O2 e O4 e, então,
construir o objeto O3. Na Figura 30, represento essa consideração.
Figura 30: Construção da noção de base
Outra construção evidenciada foi apresentada na página 80, isto é, que um
indivíduo ao coordenar o objeto dimensão O7– com o objeto conjunto linearmente
independente O2–, poderá construir o objeto base de um espaço vetorial, como
Coordenação
Coordenação
Encapsulação
O2
P3
O4
P6
A8
A9
O3
Coordenação
Eneias Prado Capítulo 5: As Entrevistas e suas Análises
164
sendo um conjunto linearmente independente com o número de vetores,
exatamente, igual à dimensão desse espaço – O2–.
Desse conjunto de análises, evidencia-se a presença da noção de dimensão,
sobretudo, quando incorporada ao esquema sobre base de um espaço vetorial de
um indivíduo. Pois, quando isso ocorre, esse indivíduo demonstra conceber a noção
de dimensão, como sendo um dos principais representantes de um espaço vetorial,
o que lhe propicia a oportunidade de estabelecer correlações entre as noções
elementares de Álgebra Linear.
Os dados do Quadro 12 sintetizam os processos e objetos evidenciados,
durante a argumentação do sujeito que demonstrou possuir uma concepção
processo sobre a noção de base de um espaço vetorial:
Quadro 12: Síntese dos processos e objetos evidenciados pelo sujeito
Processo - P
i
Objeto - O
i
Juliano
3 5 11 16 3 7
Os processos evidenciados na argumentação desse entrevistado foram P3:
determinar se um conjunto de vetores é linearmente independente; P5: reconhecer
quais os vetores de um conjunto que são linearmente independentes, e se esse
conjunto de vetores é indispensável para gerar todos os elementos de um
determinado espaço vetorial; P11: dizer qual o menor número de vetores
necessários para gerar um espaço vetorial; e P16: sendo conhecida a dimensão de
um espaço vetorial, qualquer candidato à base desse espaço, deve possuir o
número de vetores, exatamente, igual à dimensão.
evidências que Juliano construiu o objeto base, como sendo um conjunto
gerador linearmente independente e, ao incorporar a dimensão, coordena os objetos
O3 e O7 no processo P11. No entanto, indícios de que o espaço tomado na
segunda situação proposta não lhe seja familiar, pois os vetores do espaço vetorial
apresentado não são percebidos por ele, como sendo vetores.
Eneias Prado Capítulo 5: As Entrevistas e suas Análises
165
Um dos entrevistados, Fernando, em suas argumentações apresentou
indícios de conhecer as ações que lhe permitem construir a noção de base de um
espaço vetorial, mas ele não as explicitou.
Dos outros três entrevistados, Bruno apresentou indícios de reconhecer
algumas das noções elementares de Álgebra Linear, como por exemplo,
combinação linear, conjunto gerador e dependência linear; no entanto, aparentou
ainda construir uma concepção ação para essas noções matemáticas. Mariana e
Thaís apresentaram indícios de reconhecerem alguns termos e/ou representações
utilizadas em Álgebra Linear; no entanto, não construíram uma concepção ação para
a noção de base de um espaço vetorial.
Como citam Laville e Dionne (1999, p.229), é o momento de “fechar o círculo,
abrir novos horizontes”, sendo assim, no próximo capítulo, apresentarei as
considerações finais, nas quais retomo o desenrolar desta pesquisa, destacando
alguns dos pontos conclusivos evidenciados durante o texto.
Eneias Prado Capítulo 5: As Entrevistas e suas Análises
166
167
CAPÍTULO 6
CONSIDERAÇÕES FINAIS
“Não existe nenhum tema que não precise de ser
mais investigado; é esta crença que dá sentido
à vida de investigador” (BOGDAN e BIKLEN, 1994, p. 257)
Nesta pesquisa, o objetivo enunciado foi identificar a concepção que os
alunos que concluíram um curso de Álgebra Linear têm sobre a noção de base de
um espaço vetorial. Esse objetivo foi fruto de reflexões sobre as questões
norteadoras do estudo, a saber: Qual o caminho que um indivíduo deve trilhar ao
construir a noção de base de um espaço vetorial? Como os alunos, ao concluírem
um curso de Álgebra Linear, concebem a noção de base de um espaço vetorial?
Como um aluno que concluiu, pelo menos, um curso de Álgebra Linear correlaciona
às noções elementares desta disciplina?
Em busca de respostas a estas questões, tomei como principal referencial
teórico a APOS de Dubinsky e seus colaboradores, sobretudo, Dubinsky e Lewin
(1986) e Asiala et al.(1996), assim como utilizei resultados de estudos que se
basearam na ideia de alavanca-meta de Dorier e seus colaboradores, Dorier et al.
(1997).
A teoria APOS foi utilizada para descrever um possível caminho para a
construção da noção de base de um espaço vetorial. Essa descrição foi realizada
por meio de uma decomposição genética que auxiliou a responder a primeira
questão: Qual o caminho que um indivíduo deve trilhar ao construir a noção de
base de um espaço vetorial?
Para a elaboração desta decomposição genética, diferente, do que Euán
(2007) e Euán et al. (2008) consideram, assumi que, para um estudante construir a
noção de base de um espaço vetorial, ele deverá possuir uma concepção objeto
sobre conjunto, subconjunto e pertinência de elemento a conjunto, além
Eneias Prado Capítulo 6: Considerações Finais
168
de concepção processo sobre espaço vetorial.
Com essas concepções, na decomposição genética que apresentei, descrevi
a construção da noção de base de um espaço vetorial sob três pontos de vista,
iluminados, sobretudo, por Dorier et al. (1997), Padredi (2003) e Oliveira (2005), a
saber, base, como sendo um conjunto minimal gerador, um conjunto maximal de
vetores linearmente independentes e um conjunto gerador com vetores linearmente
independentes, pois o estudante poderá, assim, refletir sobre a vantagem de
empregar uma ou outra abordagem, dependendo da situação.
Na construção da noção de base, como sendo um conjunto minimal gerador,
foi proposto que o estudante estabelecesse correlações entre as noções de:
combinação linear, conjunto gerador/espaço gerado e dimensão. A noção de
dependência linear aparece implícita nesta construção, pois, como citam Coelho e
Lourenço (2001. P.43), “muitas vezes, é importante termos um conjunto gerador que
seja o menor possível”, tendo a ideia que o estudante, assim como cita Padredi
(2003, p.49), perceba as vantagens de trabalhar com menos vetores, o que lhe
propiciará “o mínimo de trabalho possível”.
A construção da noção de base, como sendo um conjunto maximal
linearmente independente, aparece implícita em Coelho e Lourenço (2001), nas
entrevistas realizadas por Padredi (2003) e nas aulas analisadas por Oliveira (2005)
e, ainda, surge da necessidade de se obter o menor conjunto gerador. Assim,
busquei construir a noção de base de um espaço vetorial, segundo esse ponto de
vista, iniciando pela noção de dependência linear e não pela de conjunto gerador.
Essa construção torna explícita a noção de dependência linear, para isso,
retomo a discussão feita por Costa e Catarino (2007, p.155) ao tratarem da
descontinuidade existente entre as noções de colinearidade e dependência linear,
pois “é necessário entender como ocorre a reorganização intelectual, de modo que
este novo conhecimento entre em harmonia com os anteriores (colinearidade,
vector, entre outros)”. No entanto, não estou interessado no vetor com sua
representação “geométrica”, pois pode ser um obstáculo para o indivíduo, como
verificou Gueudet-Chartier (2000).
Assim, com a noção de base tendo sido construída por esses dois pontos de
vista, foi proposto que o estudante utilizasse o processo da intuição e o processo de
verificação, ambos descritos por Dreyfus (1991), para construir a noção de base
como sendo uma justaposição entre um conjunto minimal gerador e um conjunto
Eneias Prado Capítulo 6: Considerações Finais
169
maximal linearmente independente, isto é, base como sendo um conjunto gerador
com vetores linearmente independentes.
Mas, ao descrever essas construções, identifiquei possíveis correlações que
um estudante pode realizar entre as noções elementares de Álgebra Linear. Dentre
estas correlações, um estudante, também, pode conceber base, como sendo um
conjunto linearmente independente (ou gerador) com o número de vetores,
exatamente, igual à dimensão do espaço. Como cita Parraguez (2009), a dimensão
é necessária durante a construção das noções elementares de Álgebra Linear,
afinal, permitirá o estudante caracterizar um espaço vetorial.
Posteriormente, baseei-me em Bogdan e Biklen (1994) e Lüdke e André
(2001) na escolha do tipo de entrevista a ser utilizada. Assim, optei por elaborar um
roteiro que seguisse os moldes de uma entrevista semiestruturada. Ao todo, foram
entrevistados dez estudantes. Todos participaram de um mesmo curso de extensão
de Álgebra Linear que foi proposto por uma Universidade de renome em São Paulo.
A metodologia escolhida, a qualitativa, permitiu evidenciar e listar elementos
que respondessem às questões de pesquisa. No entanto, na entrevista realizada
com auxílio do MSN Messenger, houve perda de elementos em razão de problemas
da conexão com a internet. Já, na entrevista realizada por e-mail, houve perda por
não ter a oportunidade de obter esclarecimentos sobre os pontos listados pelo
entrevistado. Nesta questão, ressalto a importância de o pesquisador ter estruturado
seu instrumento de coleta, para que o método escolhido possa ser flexível e, assim,
adaptar-se às situações que, porventura, evidenciarem no momento da coleta.
Quanto à análise das entrevistas, dentre os entrevistados, nove deles,
participaram de dois cursos de Álgebra Linear, para apenas um, o curso de extensão
foi o único do qual participou.
Assim, a questão: Como os alunos, ao concluírem um curso de Álgebra
Linear, concebem a noção de base de um espaço vetorial? Pode ser respondida,
com o auxílio da decomposição genética.
O único estudante que havia participado de apenas um curso de Álgebra
Linear demonstrou ter construído uma concepção processo sobre a noção de base
de um espaço vetorial. Dos demais, cinco demonstraram ter construído uma
concepção objeto sobre a noção de base, um mostrou ter construído uma
concepção ação e três, não terem construído, ao menos, uma concepção ação.
Eneias Prado Capítulo 6: Considerações Finais
170
Entre os entrevistados que demonstraram não terem construído uma
concepção ação para a noção de base de um espaço vetorial, indícios de
recordarem algumas das noções ou representações abordadas durante o curso de
extensão. No entanto, essas noções ou representações o explicitadas de maneira
fragmentada ou com generalizações indevidas. Um exemplo é o de Mariana que
demonstrou recordar a representação utilizada para a base canônica ao dizer: “[...]
memorizei que a base deve ser composta por zero e um [...] esse quatro e cinco...”,
e ainda, “normalmente, a base tinha aquela carinha de zero e um, zero e um, zero e
um, entendeu? E você me mostra com outros números, será que pode?”.
O estudante que demonstrou ter construído uma concepção processo para a
noção de base, aparentou conceber base, como sendo um conjunto gerador com
vetores linearmente independentes, “um conjunto LI e que, ao mesmo tempo, forma
o espaço vetorial” (JULIANO). Em suas argumentações, demonstrou que utilizou
processos que foram descritos na decomposição genética, assim como estabeleceu
correlações entre as noções de base, conjunto gerador, vetores linearmente
independentes e dimensão.
Já, dos cinco entrevistados que demonstraram ter construído uma concepção
objeto sobre a noção de base, houve indícios que concebam base, como sendo um
conjunto gerador com vetores linearmente independentes.
Embora em um dos livros indicados para consulta durante o curso de
extensão, Coelho e Lourenço (2001), o estudante ter a possibilidade de refletir sobre
a noção de base como sendo um conjunto maximal linearmente independente e um
conjunto minimal gerador, no curso de curso de extensão, esses pontos de vista não
foram abordados. O fato pode ter refletido na concepção apresentada pelos
entrevistados, pois, dois deles apresentaram essas concepções, como sendo
consequência da noção de base, como sendo um conjunto gerador com vetores
linearmente independentes.
Outros dois assumiram que “não existe esta questão de maior conjunto”
(ANDRÉ) ou “[...] não consigo entender exatamente, o que ele estava pensando”
(RODOLFO). Um dos entrevistados apresentou indícios de procurar demonstrar a
validade de tais afirmações; no entanto, não conseguiu.
Isto é, mesmo os entrevistados tendo participado de dois cursos de Álgebra
Linear e tendo demonstrado possuir concepções objeto sobre as noções
elementares de Álgebra Linear, apresentaram indícios de não conceberem a noção
Eneias Prado Capítulo 6: Considerações Finais
171
de base, como sendo um conjunto maximal linearmente independente e como um
conjunto minimal gerador.
A terceira questão: Como um aluno que concluiu, pelo menos, um curso
de Álgebra Linear correlaciona as noções elementares desta disciplina? Pode
também ser respondida, pois, das argumentações dos entrevistados, evidenciou-se
correlações entre as noções de: combinação linear e dependência linear, “o ݔ
é
combinação linear de ݔ
e ݔ
, assim, o é um conjunto linearmente independente”
(LUCAS); base e dimensão, “ele utilizou o fato de ser o I, e a dimensão ser dois. A
dimensão do espaço vetorial é a quantidade de elementos da base...” (JULIANO);
dependência linear e dimensão, “[...] se o espaço é o IR² que tem dimensão 2, então,
precisamos somente de 2 vetores linearmente independentes e não 3” (ANDRÉ);
conjunto gerador e dimensão, “[...] como se está trabalhando com o I, é suficiente
que hajam dois vetores para gerar, três vetores virou um conjunto gerador, mas
não uma base, certo?” (LUCAS); conjunto gerador, dependência linear e base, “se
dois geram, então o terceiro não deixa de gerar o I, mas [...] isso transformava o
conjunto em um conjunto linearmente dependente, o que não é uma base”
(DANIEL).
Outra correlação evidenciada durante a análise das entrevistas foi em relação
a um processo que não considerei explicitamente na decomposição genética, ou
seja, o processo em que sendo conhecida a dimensão do espaço vetorial, qualquer
candidato a base desse espaço deve possuir o número de vetores, exatamente,
igual à dimensão. Este processo pode ser compreendido, como sendo uma condição
necessária, mas não suficiente e está correlacionado à noção de dimensão
construída pelo estudante.
O entrevistado que demonstrou ter construído uma concepção processo
sobre base de um espaço vetorial, mostrou ter construído ações, processos e alguns
objetos, pois como cita Parraguez (2009), os estudantes podem possuir concepções
objetos sobre determinadas noções matemáticas, sem antes ter construído noções
tidas como antecessoras.
os estudantes que demonstraram ter construído uma concepção objeto
sobre a noção de base de um espaço vetorial, podem ser separados em dois
grupos: os que estabelecem correlações entre diferentes espaços vetoriais e entre
as noções elementares, no entanto, dependerá do contexto em que o problema
estiver inserido, para que ele efetive tais correlações, pois, ainda podem existir
Eneias Prado Capítulo 6: Considerações Finais
172
algumas dificuldades. O grupo dos que demonstraram utilizar a noção de espaço
vetorial de maneira coerente e estabelecer correlações entre as noções elementares
e, assim como descreveu Parraguez (2009), é capaz de determinar quando a
estrutura é aplicável a um problema e quando, não.
Como descrito, as escolhas teóricas e metodológicas permitiram responder às
questões de pesquisa e, assim, alcançar o objetivo que foi identificar a concepção
que os alunos que concluíram um curso de Álgebra Linear têm sobre a noção de
base de um espaço vetorial.
No entanto, durante a elaboração desta pesquisa surgiram novas questões e
sugestões. A primeira questão estava relacionada à possibilidade de construir a
noção de base de um espaço vetorial, iniciando pela noção de dependência linear, o
que pode ter sido feito durante a construção da noção de base, como sendo um
conjunto maximal linearmente independente. a sugestão foi utilizar a Álgebra
Linear, que é um campo fértil de resultados a serem justificados, para estimular o
uso de contraexemplo como ferramenta.
Outra questão, que não pôde ser verificada nesta pesquisa, está relacionada
à decomposição genética apresentada, pois para confirmar os passos descritos
penso ser necessário um estudo que implemente essa construção, e assim, valide
ou proponha um refinamento.
Assim, espero que esta pesquisa possa contribuir com o GPEA na busca por
situações propícias para a aprendizagem de noções elementares de Álgebra Linear,
pois com base na decomposição genética apresentada pode-se implementá-la de
maneira que venha propiciar estratégias pedagógicas que levem os estudantes a
fazer as construções e usá-las na resolução de problemas.
Outras questões que surgiram deste estudo foram: Que concepção poderá
construir um estudante de Álgebra Linear, ao serem elaboradas propostas
pedagógicas que utilizem esta decomposição genética? Sepossível elaborar uma
proposta pedagógica, seguindo o ciclo ACE que permita fazer com que o estudante
efetive as construções indicadas nesta decomposição genética? Quais adaptações,
ou que refinamento seria necessário ser feito sobre a decomposição genética para
estendê-la a um corpo qualquer?
173
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Eneias Prado Referências
178
179
ANEXOS
ANEXO 1 – Convite para participar da entrevista
Caro colega,
Sou aluno do mestrado Acadêmico em Educação Matemática da PUC/SP.
O motivo de meu contato é que, em janeiro e fevereiro de 2009, também participei
do CURSO DE EXTENSÃO de ÁLGEBRA LINEAR. Como minha pesquisa está
inserida no contexto da Álgebra Linear, necessito, caso possível, marcar um horário
para conversarmos sobre esta temática.
Esclareço desde que sua participação será de grande importância para o
desenvolvimento de minha dissertação.
O local e horário ficam a seu critério para que o o atrapalhe (estimo uma duração
de 50 minutos). Peço que, caso haja interesse, responda a este e-mail com sua
disponibilidade de dia e horário, para que possamos nos programar.
Atenciosamente,
Eneias de Almeida Prado
Eneias Prado Anexos
180
ANEXO 2 – Lista com as ações, processos e objetos.
As ações negritadas foram propostas por mim no refinamento ou na expansão
apresentada. As sublinhadas foram propostas por Euán (2007) e Euán et al. (2008)
e utilizadas por mim. Já, as demais, foram propostas por Euán (2007) e Euán et al.
(2008), mas, não consideradas no refinamento e na expansão. Para os processos e
objetos, utilizo a mesma regra.
Lista de Ações
A1: operar (operações binárias que definem um espaço vetorial) com vetores
pertencentes a um espaço vetorial e com escalares pertencentes ao corpo dos reais.
A2: verificar se um dado vetor pode ser escrito como combinação linear de outros
vetores, nos termos da definição.
A3: verificar a dependência linear entre os vetores de um dado conjunto, nos termos
da definição.
A4: repetir as ações A2 e A3 com vetores pertencentes a diversos espaços vetoriais.
A5: dado um conjunto de vetores, identificar dentre as possíveis combinações
lineares as que produzem o vetor nulo.
A6: identificar quais seriam os subconjuntos em que existe uma única combinação
linear que resulte no vetor nulo.
A7: verificar a combinação linear existente entre vetores, a partir da ação A1
A8: verificar se os vetores pertencentes ao conjunto gerador podem ser
escritos como combinações lineares uns dos outros.
A9: eliminar de um conjunto gerador os vetores que possam ser escritos como
combinação linear uns dos outros.
A10: identificar conjuntos minimais geradores para um mesmo espaço vetorial,
e observar a existência de um invariante.
A11: verificar se os vetores são colineares (ou coplanares).
A12: obter conjuntos linearmente independentes e, observar a existência de
conjuntos linearmente independentes com diferentes números de vetores.
Eneias Prado Anexos
181
A13: identificar para um mesmo espaço vetorial, distintos subconjuntos
maximais linearmente independentes e, observar a existência de um
invariante.
A14: obter um subconjunto maximal linearmente independente e verificar se
esse subconjunto é um subconjunto minimal gerador.
A15: obter um subconjunto minimal gerador e verificar se esse subconjunto é
maximal linearmente independente.
A16: conjecturar a existência de uma equivalência entre os objetos O5 e O6.
Lista de Processos
P1: estabelecer se um vetor dado, ou um conjunto de vetores, pertencentes a um
espaço vetorial podem ser escritos como combinação linear entre vetores
pertencentes a um conjunto dado.
P2: reconhecer quais os subconjuntos do espaço vetorial que podem ser gerados a
partir de um dado subconjunto de vetores desse espaço.
P3: determinar a dependência linear em um conjunto.
P4: estabelecer as propriedades que permitem obter conjuntos geradores e
conjuntos linearmente independentes.
P5: reconhecer quais os vetores de um conjunto que são linearmente
independentes, e se esse conjunto de vetores é indispensável para gerar todos os
elementos de um determinado espaço vetorial.
P6: obter um conjunto minimal gerador.
P7: obter um conjunto maximal linearmente independente.
P8: identificar um conjunto minimal gerador, como sendo um maximal
linearmente independente.
P9: expressar todas as combinações lineares que podem ser obtidas a partir
de um conjunto de vetores.
P10: identificar subconjuntos de vetores de um espaço vetorial que são
conjuntos geradores desse espaço.
P11: dizer qual o menor número de vetores necessários para gerar o espaço
vetorial em questão.
P12: dizer se um vetor pertencente ao espaço vetorial IR² (ou IR³) depende do
outro ou não.
Eneias Prado Anexos
182
P13: dizer qual o maior número de vetores linearmente independentes que
pode ser obtido em um determinado espaço vetorial.
P14: intuir que os objetos O5 e O6 ou são complementares, ou são
equivalentes.
P15: verificar o processo P15.
P16: sendo conhecida a dimensão de um espaço vetorial, qualquer candidato à
base desse espaço, deve possuir o número de vetores, exatamente, igual à
dimensão.
Lista de Objetos
O1: Conjunto Gerador.
O2: Dependência Linear.
O3: Base de um espaço vetorial, como sendo um conjunto gerador linearmente
independente.
O4: Conjunto Gerador/Espaço Gerado.
O5: Base de um espaço vetorial, como sendo um conjunto minimal gerador.
O6: Base de um espaço vetorial, como sendo um conjunto maximal
linearmente independente.
O7: Dimensão.
O8: Base de um espaço vetorial, como sendo um conjunto gerador com o
número de vetores, exatamente, igual à dimensão do espaço.
O9: Base de um espaço vetorial, como sendo um conjunto linearmente
independente com o número de vetores, exatamente, igual à dimensão do
espaço.
Eneias Prado Anexos
183
ANEXO 3 – Roteiro para as entrevistas
1- Extratos da prova do dia 16_06_2009
Os vetores
=
૚,
,
= ሺ૝,૞ሻ e
= ቀ−૚,
formam uma base para
o I. Verifique se essa afirmação é verdadeira ou falsa.
A
B
C
D
Eneias Prado Anexos
184
2- O seguinte trecho é a transcrição de uma gravação da conversa do
professor com seus alunos neste semestre:
A, B, C e D são alunos e P é o professor.
A- Professor, esse conjunto
{
,
૜࢞
,
૝࢞
²
}
é base do conjunto dos
polinômios de grau 2?
P- (dirigindo-se à classe) O que vocês acham?
B- É sim! Porque é o maior conjunto LI (linearmente independente) de
(IR).
C- É. Porque é o menor conjunto de vetores que gera todo esse espaço.
A- O quê?
D- É uma base sim, pois é um conjunto de vetores linearmente
independentes e gera esse espaço.
Eneias Prado Anexos
185
ANEXO 4 – Encartes
Os encartes correspondem: a lista com as ões, processos e objetos
apresentados no decorrer da dissertação e, o roteiro que foi utilizado durante as
entrevistas.
As ações negritadas foram propostas por mim no refinamento ou na expansão
apresentada. As sublinhadas foram propostas por Euán (2007) e Euán et al. (2008)
e utilizadas por mim. Já, as demais, foram propostas por Euán (2007) e Euán et al.
(2008), mas, não consideradas no refinamento e na expansão. Para os processos e
objetos, utilizo a mesma regra.
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