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primordial de la demande. [...] Le drame se présente d´une façon toujours double, ses
éléments étant à la fois inter et intrasujectifs. Donc dans la pespective même du sujet, du
prince Hamlet, ce désir de l´autre, de désir de la mère se présente essentiellement comme
un désir qui est entre un objet éminent, entre cet objet idéalisé, exalté qu´est son père, et
cet objet déprécié, méprisable qu´est Claudius, le frère criminel et adultère, ne choisit pas.
(Lacan, Jacques. Le désir et son interpretation, 15 de abril de 1959, pp. 516-517)
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A Rainha é incapaz de luto, diz Lacan. E o jovem filho capitula. Tal situação só se
alterará mais adiante na peça quando, já tendo partido para a Inglaterra, desistido no meio
do caminho, e retornado, Hamlet depara-se com o túmulo de Ofélia. Só diante desta visão é
que algo sucederá ao príncipe que o levará a uma mudança radical de posição na trama. A
partir do texto “Luto e Melancolia” [Trauer und Melancholie] de Freud (1917), Lacan vai
elaborar a hipótese de que é nesta cena que se faz possível para o jovem o trabalho do luto,
o qual, bem sucedido que é, coloca-o na posição de sujeito desejante.
Em “Luto e Melancolia”, Freud afirma que o trabalho do luto consiste em deslocar a
libido do objeto perdido de volta ao eu, para que o sujeito se coloque novamente em
condições de desejar ou, nos termos de Freud, que possa então deslocá-la para outro objeto.
Lacan reconhece esta virada em Hamlet, quando ele se entrega a uma rivalização que chega
a ser engraçada, de tão descabida, lançando a Laertes o desafio de que aquele – em luto
pela irmã – não o poderia superar em sua dor:
HAMLET – I loved Ophelia. Forty thousand brothers / Could not with all their quantity of
love / Make up my sum. What wilt thou do for her? [...] ‘Swounds, show me what thou´t
do. / Woo´t weep, woo´t fight, woo´t fast, woo´t tear thyself, / Woo´t drink up eisel, eat a
crocodile? / I´ll do it. Dost <thou> come here to whine? / To outface me with leaping in
her grave? / Be buried quick with her, and so will I. / And if thou prate of mountains, let
them throw / Millions of acres on us, till our ground, / Singeing his pate against the
burning zone, / Make Ossa like a wart. Nay, an thou´tl mouth, / I´ll rant as well as thou.
(Shakespeare, Hamlet, 5º ato, cena I, p. 255-7)
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“O primeiro passo que fizemos neste caminho foi de articular o quanto a peça é dominada por este Outro, a Mãe, isto é,
o sujeito primordial da demanda. A omnipotência de que falamos sempre na análise é, primeiramente, a omnipotência do
sujeito como sujeito da primeira demanda, e é à Mãe que deve ser referida. [...] Como é que o desejo do outro se apresenta
na própria perspectiva do sujeito, do príncipe Hamlet? Esse desejo, desejo da mãe, apresenta-se essencialmente assim:
entre um objecto eminente, idealizado, exaltado, que é o pai, e um objecto desvalorizado, desprezível, que é Cláudio,
irmão criminoso e adúltero, ela não escolhe.” (Lacan, “O objecto Ofélia” in O desejo e sua interpretação, 15 de abril de
1959, p. 73).
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“HAMLET – Amei Ofélia. / Quarenta mil irmãos, por mais que a amassem, / Não somariam mais que o meu amor. Que
queres tu fazer então por ela? [...] Pelas chagas de Cristo, que pretendes? / Chorar? Lutar? Jejuar? Despedaçar-te? / Beber
fel? Engolir um crocodilo? / Eu o farei. Vieste para queixar-te? / Desafiar-me, saltando em sua cova? / Enterra-te com ela
e eu o farei. / Se falas das montanhas, que nos cubram / Jogando sobre nós milhões de acres, / Até que a nossa tumba,
chamuscada / No tôpo por tocar as zonas tórridas, / Faça da Ossa um botão! Se o que pretendes / É atroar os ares, eu te
sigo / E clamarei tão alto como tu.” (Shakespeare, Hamlet, 5º ato, cena I, p. 215-216)