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astecas, dentro da imagem do bom selvagem de Rousseau
. Elas descrevem a laboriosa
produção de têxteis organizada em Tenochtitlán, capital asteca sobre a qual hoje repousa a
Cidade do México, para enfatizar o valor das plantas e animais dos quais se podem produzir
fibras, como o algodão e o maguey, ou extrair corantes, como é o caso do pequeno inseto
denominado grana cochinilha
, responsável pela disseminação do uso do tom vermelho na
Europa.
A dificuldade nos processos de exportação por vezes estava ligada ao ato de
comunicar ao Velho Continente que tipo de riquezas se encontravam no reino da Nova
Espanha. Era preciso recorrer a distintos métodos, já que a idéia de ilustrar conserva parte
de seu antigo significado em latim: iluminar, explicar, esclarecer. Aprender a desenhar uma
planta é, em certo sentido, aprender a vê-la. Nomeá-la, por fim, é conceder-lhe certa
familiaridade. Os naturalistas que integraram as expedições além-mar desenvolveram
descrições detalhadas fazendo uso de referentes domésticos e recorreram às analogias para
gerar vinculação com o desconhecido
. A presença de determinada memória comum entre
produtor e consumidor de imagens reforça a comunicação. Para LOTMAN (1997: 111),
inclusive, “a ausência dessa condição faz o texto indecifrável”. Essa pode ser uma das
razões pelas quais o Códice Bórgia
, cujo original encontra-se na biblioteca do Vaticano,
Jean-Jacques Rousseau (1712-1778), filósofo suíço, escritor, teórico político e compositor musical
autodidata, é uma das figuras marcantes do Iluminismo francês. Coloca o problema das relações entre
natureza e cultura, sendo precursor da etnologia. Rousseau é chamado o filósofo do bom selvagem, em alusão
às qualidades superiores que, a seu ver, exibiam os indivíduos que viviam no estado de natureza.
A cor da cochinilha é chamada nocheztli, que significa sangue, e é extraída do inseto que se abriga sob as
folhas de cactus. Nas culturas pré-hispânicas, a cochinilha foi cultivada com fins de produzir tintura nessa
tonalidade. Esse cultivo é bastante sofisticado e tecnicamente complexo, resultando num tributo importante
para os astecas. Fray Bernardino de Sahagún documenta que dezenas de comunidades, especialmente
zapotecas e mixtecas, tinham de contribuir com cinco, vinte ou quarenta sacos de cochinilha a cada 80 dias
Em 1660, a exportação desse corante correspondia à segunda maior fonte de renda da Coroa Espanhola depois
da prata (TUROK, 2000:92).
Sob esse aspecto, são notórias as pinturas comissionadas por Maurício de Nassau e realizadas por Albert
Eckout em território pernambucano, analisadas por OLIVEIRA (2000:10-30) no texto “Mauritsstad e visões
Brasiliae: aos europeus, o além-mar, e aos brasileiros, uma outra história”. A autora discute, no modo de
expor a fauna nativa, a postulação de um modo de ver no qual os elementos desconhecidos são comparados a
artigos europeus de forma a propiciar a leitura plástica e permitir associações entre imagens exógenas e
endógenas.
Os códices (ou codex, da palavra latina que significa "tábula", "livro", "bloco de madeira") são manuscritos
gravados sobre cascas de árvores que possibilitam uma leitura não-linear e o recurso do uso de várias
linguagens. Neles, texto e desenho atuam simultaneamente sobre o leitor. Esse tipo de suporte é conhecido
pela designação em náhuatl amatl, geralmente contendo desenhos e ilustrações da vida cotidiana dos povos
mesoamericanos, bem como referências ao contexto cósmico dos deuses, permitindo compreender calendários
e rituais. Geralmente, são denominados conforme o local onde estão guardados.