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UNIVERSIDADE PRESBITERIANA MACKENZIE
SILVIA ROSA MARQUES PAULO
A POÉTICA DO OLHAR: A IMAGEM DO TRABALHADOR
RURAL NA PINTURA DE CANDIDO PORTINARI E NA
FOTOGRAFIA DE SEBASTIÃO SALGADO NO PROCESSO
ENSINO-APRENDIZAGEM
São Paulo
2008
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SILVIA ROSA MARQUES PAULO
A POÉTICA DO OLHAR: A IMAGEM DO TRABALHADOR
RURAL NA PINTURA DE CANDIDO PORTINARI E NA
FOTOGRAFIA DE SEBASTIÃO SALGADO NO PROCESSO
ENSINO-APRENDIZAGEM.
Dissertação apresentada ao Programa de s-
Graduação em Artes, Educação e História da
Cultura da Universidade Presbiteriana Mackenzie,
como requisito parcial à obtenção do título de
Mestre em Artes, Educação e História da Cultura.
Orientador: Prof. Dr. Norberto Stori
São Paulo
2008
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Paulo, Silvia Rosa Marques
A poética do olhar: A imagem do trabalhador rural na pintura
de Candido Portinari e na fotografia de Sebastião Salgado no
processo ensino-aprendizagem.
Silvia Rosa Marques Paulo-2008
234 f.: il. ; 30cm
Dissertação (Mestrado em Educação, Arte e História da
Cultura) – Universidade Presbiteriana Mackenzie, São Paulo, 2008.
Orientação: Prof. Norberto Stori.
Bibliografia: p. 209 – 217.
1. Arte-Educação. 2. Metodologia Triangular. 3. Leitura de
obras. 4. Propostas poéticas. 5. Fotografia e pintura. 6. Imagens do
trabalhador rural. I. Título.
SILVIA ROSA MARQUES PAULO
A POÉTICA DO OLHAR: A IMAGEM DO TRABALHADOR RURAL NA
PINTURA DE CANDIDO PORTINARI E NA FOTOGRAFIA DE SEBASTIÃO
SALGADO NO PROCESSO ENSINO-APRENDIZAGEM
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-
Graduação em Artes, Educação e História da
Cultura da Universidade Presbiteriana Mackenzie,
como requisito parcial à obtenção do título de
Mestre em Artes, Educação e História da Cultura.
Aprovado em:
BANCA EXAMINADORA
_____________________________________________________
Prof. Dr. Norberto Stori - Orientador
Universidade Presbiteriana Mackenzie
_____________________________________________________
Profª Drª Petra Sanchez Sanchez
Universidade Presbiteriana Mackenzie
_____________________________________________________
Profª Drª Loris Graldi Rampazzo
Universidade São Judas Tadeu
Aos meus pais, José Marques e
Maria Kraus, trabalhadores rurais,
pela inspiração e estímulo para a
escolha do tema na presente
dissertação.
AGRADECIMENTOS
Agradeço muito aos meus filhos: Laura Maria e Artur José pela paciência,
compreensão, apoio e carinho que me dedicaram durante este período de estudos e
ao meu marido João Paulo pela atenção e críticas ao texto.
Aos meus pais, que graças ao esforço como trabalhadores rurais, me
proporcionaram o estudo e, mesmo com simplicidade souberam me mostrar o
caminho correto a percorrer.
A meu amigo de curso Professor Eduardo Mosaner, que me ajudou nas
correções dos textos do projeto, nos empréstimos de livros, sendo um grande
incentivador e por quem tenho grande admiração não pelo seu trabalho, mas
também como ser humano, sempre de bom humor e pronto a colaborar com todos.
À Professora de Arte Michele Gesteira, pela colaboração e sugestões e às
Professoras Márcia Versutti, Zeinep Volfa e Patrícia Lourenço pelo apoio e incentivo.
Também agradeço imensamente a Professora Ana Lúcia pela ajuda na correção e
formatação da dissertação, e ao diretor Adilmício Vieira Gaia por ter concordado e
apoiado a aplicação do projeto na Escola Estadual Professora Zipora Rubinstein.
Aos colegas de curso do Mackenzie, em especial ao grupo dos “Alternativos”:
Silvia Cacace, José Romero, Ewerton Coelho, e Marina, do qual também faço parte.
À Professora Doutora Petra Sanchez e Sanchez, pela contribuição e
empréstimo de materiais, pelas sugestões dadas na qualificação e por todo o
carinho e atenção que sempre demonstrou com todos os seus alunos do Mackenzie.
À Professora Doutora Loris Graudi Rampazzo, pelas sugestões para o texto
da qualificação e pela simpatia e atenção ao trabalho de pesquisa.
Um agradecimento especial ao meu orientador Norberto Stori que acreditou e
incentivou na elaboração desta pesquisa, além de ter sido um excelente professor
durante o curso, se mostrando um grande conhecedor da História da Arte, tendo
também minha admiração pelo seu trabalho como artista plástico.
Ao Instituto Presbiteriano Mackenzie que financiou as despesas efetuadas
nesta pesquisa com verbas do Fundo Mackenzie de Pesquisa.
À secretária da Educação de São Paulo, pela ajuda através do programa
Bolsa Mestrado, pelo financiamento parcial dessa pesquisa.
Agradeço ainda a todos que de alguma forma me auxiliaram nesta jornada.
Obrigada!
RESUMO
Esta dissertação teve por base uma pesquisa sobre metodologia de ensino
em Artes Visuais aplicada no Ensino Médio, na Escola Pública Estadual Professora
Zipora Rubinstein, situada na Zona Leste da cidade de São Paulo. O objetivo foi
aplicar a Metodologia Triangular, enunciada por Ana Mae Barbosa, visando o
desenvolvimento de habilidades para a apreciação, contextualização e elaboração
de propostas poéticas pelos alunos do Ensino Médio. A pesquisa justifica-se pela
utilização de imagens em sala de aula, havendo, portanto, uma preparação em
analisar e entender estas imagens antes do fazer artístico. As imagens analisadas
são de trabalhadores rurais e foram escolhidas por ser uma temática pouco
abordada na área e pouco conhecida pelos alunos. A proposta foi fazer com que os
mesmos conhecessem os artistas e suas obras, o contexto sócio-cultural e histórico
da época de criação, dialogando com as vivências e experiências expressas pelos
autores, criando assim, uma nova perspectiva crítica sobre a atual condição e
realidade na importância do fruir a Arte. A metodologia de pesquisa utilizada foi
qualitativa, tendo como base teórica a pesquisa-ação. Nela, os alunos produziram
respostas poéticas em artes plásticas a partir da leitura, análise e contextualização
da pintura de Candido Portinari e da fotografia de Sebastião Salgado,
reinterpretando-as e criando novas possibilidades de significações para elas. As
discussões que permearam o trabalho tiveram como referência as obras de sentido
social, ou seja, aquelas que tratam da análise dos trabalhadores em dois momentos
específicos e feitas por artistas com diferentes técnicas de abordar o assunto. Se de
um lado Portinari pinta os afrescos com a temática dos trabalhadores, por outro,
Salgado, usando a fotografia põe em evidência a dimensão dessa mesma categoria
de pessoas no momento em que interagem na questão social do Brasil.
Palavras-chave: Arte Visual, Abordagem Triangular, Trabalhador Rural, Pintura,
Fotografia e Pesquisa-Ação.
ABSTRACT
This work was based in a research about a methodology of teaching in Visual
Arts applied in high school, in the Public State School Professora Zipporah
Rubinstein, located in the Eastern Region of o Paulo city. It aims to used the
methodology called “Triangular”, set out by Anna Mae Barbosa, intending to develop
the skills for the appreciation, contextualization and elaboration of poetic proposals of
high school students. The research was justified in using images in the classroom
and, consequently, there was a preparation to analyze and understand them before
making an artistic production. The images are of rural workers and were chosen
because it is an issue rarely studied in the field of Arts and little known by students.
The proposal was that they meet the artists and their works, the socio-cultural context
and history of the time, discussing their life and experiences expressed by the artists,
thus creating a new perspective on the current critical condition and really enjoy the
importance of the Arts. The methodology used was the qualitative research, which is
theoretically based on the Research-Action. In this, the students produced responses
in poetic art, by reading, analyzing and contextualizing painting of Candido Portinari
and pictures of Sebastião Salgado, reinterpreting and creating new readings of
works. The discussions held in this research are related to works that have social
meaning, those dealing with the analysis of workers at two specific moments by
artists who have different techniques to address the issue. In one part, Portinari
paints the frescoes with the theme of workers, on the other, Salgado, using photo
focuses on the dimension of those employees who interact with Brazil social.
Keywords: Visual Art, Triangular Approach, Rural Workers, Painting,
Photography and Research-Action.
LISTA DE ILUSTRAÇÕES
Figura 1 Foto Escola Rural “Água das Perobas”.................................................20
Figura 2 Pintura Os Semeadores Silvia Uny ......................................................22
Figura 3 Pintura O Leiteiro Silvia Uny ................................................................22
Figura 4 Pintura Trabalho ao Entardecer Silvia Uny ..........................................22
Figura 5 Pintura Carpindo a Lavoura Silvia Uny ................................................22
Figura 6 Pintura Os Garimpeiros Silvia Uny .......................................................23
Figura 7 Pintura O Velho Trabalhador Silvia Uny ..............................................23
Figura 8 Modelo gráfico da Metodologia Triangular ...........................................32
Figura 9 Pintura Retrato de Manuel Bandeira Portinari .....................................58
Figura 10 Pintura Retrato de Maria Portinari ........................................................58
Figura 11 Pintura Futebol Portinari .......................................................................59
Figura 12 Pintura Meninos Soltando Pipas Portinari ............................................59
Figura 13 Pintura Lavrador de Café Portinari .......................................................60
Figura 14 Pintura Mestiço Portinari ......................................................................60
Figura 15 Pintura Os Despejados Portinari ..........................................................60
Figura 16 Pintura Café Portinari ...........................................................................61
Figura 17 Pintura Construção da RodoviaIPortinari .............................................62
Figura 18 Pintura Escola de Canto Portinari ........................................................64
Figura 19 Pintura Fogo Portinari ..........................................................................64
Figura 20 Pintura Família Portinari .......................................................................65
Figura 21 Pintura Retirantes - 1944 Portinari .......................................................65
Figura 22 Pintura Retirantes - 1960 Portinari .......................................................66
Figura 23 Pintura Cena Gaúcha Portinari ............................................................67
Figura 24 Pintura Descobrimento Portinari ..........................................................67
Figura 25 Pintura Catequese Portinari .................................................................67
Figura 26 Pintura Santa Luzia e São Pedro Portinari ..........................................68
Figura 27 Pintura Flautista Portinari .....................................................................69
Figura 28 Pintura Jangadeiro Portinari .................................................................69
Figura 29 Pintura O Massacre dos Inocentes Portinari ........................................70
Figura 30 Pintura A Justiça de Salomão Portinari ................................................70
Figura 31 Pintura São Francisco se Despojando das Vestes Portinari ................73
Figura 32 Pintura Jesus Carrega a Cruz às Costas Portinari ..............................73
Figura 33 Desenho Meninos de Brodósqui (A) Portinari ......................................74
Figura 34 Desenho Meninos de Brodósqui (B) Portinari ......................................74
Figura 35 Desenho Meninos de Brodósqui (C) Portinari ......................................74
Figura 36 Pintura Primeira Missa no Brasil Portinari ............................................76
Figura 37 Pintura Tiradentes Portinari .................................................................77
Figura 38 Pintura A Chegada de Dom João VI à Bahia Portinari ........................78
Figura 39 Pintura Guerra Portinari .......................................................................79
Figura 40 Pintura Paz Portinari ............................................................................80
Figura 41 Pintura Simão Cireneu Ajuda Jesus a Levar a Cruz Portinari .............81
Figura 42 Pintura Jesus Morre na Cruz Portinari .................................................81
Figura 43 Pintura Descobrimento do Brasil Portinari ...........................................82
Figura 44 Pintura Frevo Portinari .........................................................................82
Figura 45 Pintura Fundação de São Paulo Portinari ............................................83
Figura 46 Pintura Bandeirantes Portinari .............................................................83
Figura 47 Pintura Colheita de Café - 1958 Portinari ............................................83
Figura 48 Pintura Meninos Soltando Pipas Portinari ............................................83
Figura 49 Pintura Colheita de Café - 1933 Portinari ............................................86
Figura 50 Pintura Café - 1934 Portinari ................................................................86
Figura 51 Pintura Colonos Carregando Café Portinari .........................................86
Figura 52 Desenho Mãos Portinari .......................................................................89
Figura 53 Desenho Pés Portinari .........................................................................89
Figura 54 Desenho Trabalhador de Frente Portinari ............................................89
Figura 55 Desenho Homem com Saca Portinari ..................................................89
Figura 56 Desenho Homem Garimpando Portinari .............................................89
Figura 57 Desenho Colona Portinari ....................................................................90
Figura 58 Desenho Homem Sentado Portinari ....................................................90
Figura 59 Pintura Cana - 1937 Portinari ...............................................................90
Figura 60 Estudo de Pintura Cana Portinari .........................................................90
Figura 61 Pintura Colheita de Algodão Portinari ..................................................91
Figura 62 Pintura Faiscadores de Ouro Portinari .................................................91
Figura 63 Desenho Café Portinari ........................................................................91
Figura 64 Desenho Cana Portinari .......................................................................92
Figura 65 Desenho Algodão Portinari ..................................................................92
Figura 66 Pintura Pau-Brasil Portinari ..................................................................93
Figura 67 Pintura Cana - 1938 Portinari ...............................................................93
Figura 68 Pintura Gado Portinari ..........................................................................93
Figura 69 Pintura Garimpo Portinari .....................................................................93
Figura 70 Pintura Fumo Portinari .........................................................................94
Figura 71 Pintura Algodão Portinari .....................................................................94
Figura 72 Pintura Erva-Mate Portinari ..................................................................94
Figura 73 Pintura Café - 1938 Portinari ................................................................94
Figura 74 Pintura Cacau Portinari ........................................................................95
Figura 75 Pintura Ferro Portinari ..........................................................................95
Figura 76 Pintura Borracha Portinari ....................................................................95
Figura 77 Pintura Carnaúba Portinari ...................................................................95
Figura 78 Pintura Colheita de Feijão Portinari .....................................................98
Figura 79 Pintura Colheita de Arroz Portinari .......................................................98
Figura 80 Pintura Colheita de Milho Portinari .......................................................98
Figura 81 Pintura Canavial Portinari ....................................................................98
Figura 82 Pintura Colheita de Café - 1960 Portinari ............................................99
Figura 83 Pintura Transporte de Café Portinari ...................................................99
Figura 84 Pintura O Arsenal - Frida Kahlo Distribui Armas ................................102
Figura 85 Pintura Jogos Infantis Portinari ..........................................................102
Figura 86 Xilogravura Operário ..........................................................................103
Figura 87 Pintura Mulheres Protestando ............................................................105
Figura 88 Xilogravura Xarqueada ......................................................................108
Figura 89 Xilogravura Camponeses ...................................................................109
Figura 90 Foto Garimpeiros de Serra Pelada Salgado ......................................114
Figura 91 Foto Bóias-Frias Salgado ...................................................................114
Figura 92 Foto Pés de Trabalhadores Salgado .................................................115
Figura 93 Foto Chá Ruanda Salgado .................................................................115
Figura 94 Foto Migração Rural para as Cidades Salgado .................................117
Figura 95 Foto Crianças as Margens da Rodovia Salgado ................................117
Figura 96 Foto Escola para Crianças do MST Salgado .....................................118
Figura 97 Foto A Luta pela Terra: Os ícones da Vitória Salgado .......................118
Figura 98 Foto Camponeses voltando do Trabalho. Salgado ............................120
Figura 99 Foto Kakuma, Quênia. Salgado .........................................................120
Figura 100 Foto Zaire Salgado .............................................................................121
Figura 101 Foto Criança do Êxodo Salgado ........................................................121
Figura 102 Foto Fazenda de Salgado (antes do plantio)......................................122
Figura 103 Foto Fazenda de Salgado (depois do plantio)....................................122
Figura 104 Foto Grupo Dinka num campo de gado Salgado ...............................125
Figura 105 Foto Zebra da montanha Salgado .....................................................125
Figura 106 Foto Pingüins de Adélia Salgado .......................................................126
Figura 107 Foto Baleia franca-austral chamada Adelita Salgado ........................126
Figura 108 Foto Criança Dormindo na Rua Jacob Riis ........................................128
Figura 109 Foto Casa de Um Italiano Trapeiro Jacob Riis ..................................128
Figura 110 Foto Léo com Idade de Oito Anos Lewis Hine ...................................129
Figura 111 Foto Trabalhadores Orientando a Elevação do Cabo Lewis Hine ...129
Figura 112 Foto Família do Campo Walker Evans ...............................................130
Figura 113 Foto Cozinha do Agricultor Walker Evans .........................................130
Figura 114 Foto Cultura da Enxada Dorothea Lange ..........................................132
Figura 115 Foto Mãe Imigrante Dorothea Lange .................................................132
Figura 116 Foto Mulher em Ilhas Virgens Jack Delano .......................................133
Figura 117 Foto Colhedores de Algodão Jack Delano .........................................133
Figura 118 Foto Mãos que lavam Tina Modotti ....................................................134
Figura 119 Foto Mãos do Trabalhador Tina Modotti ............................................134
Figura 120 Foto A miséria Brasileira Pedro Martinelli ..........................................135
Figura 121 Foto Rio Içana Pedro Martinelli ..........................................................136
Figura 122 Foto São Paulo Cristiano Mascaro ....................................................138
Figura 123 Foto Bóias-Frias Rumo ao Ponto João Urban ...................................140
Figura 124 Foto Bóias-Frias João Urban .............................................................140
Figura 125 Foto Família com Onze Filhos Salgado .............................................145
Figura 126 Foto Crianças no Sul da Bahia Salgado ............................................145
Figura 127 Foto Criança Sofrendo de Desnutrição Salgado ................................146
Figura 128 Foto Transporte de Água a Longa Distância Salgado .......................146
Figura 129 Foto Parambu no Ceará Salgado ......................................................147
Figura 130 Foto Negros Correndo em Direção ao Mar Munkácsi ........................150
Figura 131 Foto Índia Cartier-Bresson (1948) ......................................................151
Figura 132 Foto Índia Cartier-Bresson (1950) ......................................................151
Figura 133 Foto Pollock de Chocolate Vik Muniz .................................................157
Figura 134 Foto Medusa no prato de Macarronada Vik Muniz.............................157
Figura 135 Pintura Cana Portinari.........................................................................160
Figura 136 Fotografia Bóias-Frias Salgado ..........................................................160
Figura 137 Pintura Algodão ..................................................................................162
Figura 138 Fotografia Colhedores das Plantações de Algodão Salgado .............162
Figura 139 Pintura Café Portinari .........................................................................163
Figura 140 Fotografia Trabalhadores nas Plantações de Café Salgado .............163
Figura 141 Foto da Escola Estadual Professora Zipora Rubinstein .....................168
Figura 142 Foto da Imagem no Retroprojetor ......................................................172
Figura 143 Foto do Momento Descritivo da Obra ................................................172
Figura 144 Foto da Discussão do Formulário ......................................................172
Figura 145 Foto da Discussão do Formulário ......................................................172
Figura 146 Foto da Discussão do Grupo .............................................................173
Figura 147 Esboço do trabalho: Cortadores de Cana .........................................174
Figura 148 Esboço do trabalho: Caminho de Açúcar ..........................................174
Figura 149 Esboço do trabalho: Os Dois Mundos ................................................175
Figura 150 Esboço do trabalho: A Sombra do Algodão ......................................175
Figura 151 Esboço do trabalho: O Outro Lado da Embalagem ...........................175
Figura 152 Esboço do trabalho: Estudar ou Trabalhar?.......................................175
Figura 153 Foto da Discussão com o Grupo ........................................................176
Figura 154 Foto da Participação do Grupo ..........................................................176
Figura 155 Foto da Discussão com o Grupo ........................................................177
Figura 156 Quadro das Obras Selecionadas .......................................................179
Figura 157 Quadro de Desenvolvimento da Produção Artística ..........................190
Figura 158 Foto de Reinterpretação do Tema Cana - Cortadores de Cana ........190
Figura 159 Foto de Desenvolvimento da Produção Artística ...............................191
Figura 160 Foto de Reinterpretação: Cana - O Caminho de Açúcar ...................191
Figura 161 Foto de Desenvolvimento da Produção Artística ...............................192
Figura 162 Foto de Reinterpretação: Cana - A Escravidão Infantil .....................192
Figura 163 Foto de Desenvolvimento da Produção Artística ...............................193
Figura 164 Foto de Reinterpretação: Cana - O Trabalhador de Açúcar ..............193
Figura 165 Foto de Desenvolvimento da Produção Artística ...............................194
Figura 166 Foto de Reinterpretação: Cana - Vida Simples ..................................194
Figura 167 Foto de Desenvolvimento da Produção Artística ...............................195
Figura 168 Foto de Reinterpretação do Tema Algodão - Os Dois Mundos .......195
Figura 169 Foto do Desenvolvimento da Produção Artística ...............................196
Figura 170 Foto de Reinterpretação: Algodão - A Sombra do Algodão .............196
Figura 171 Foto do Desenvolvimento da Produção Artística ...............................197
Figura 172 Foto da Reinterpretação: Algodão - Pegadas na Plantação ............197
Figura 173 Foto do Desenvolvimento da Produção Artística ...............................198
Figura 174 Foto da Reinterpretação: Algodão - Pés de Um Trabalhador ..........198
Figura 175 Foto do Desenvolvimento da Produção Artística ...............................199
Figura 176 Foto da Reinterpretação: Algodão - Imagens Através da Cortina ....199
Figura 177 Foto do Desenvolvimento da Produção Artística ...............................200
Figura 178 Foto do Desenvolvimento da Produção Artística ...............................200
Figura 179 Foto da Reinterpretação: Algodão - O Outro Lado ............................200
Figura 180 Foto do Desenvolvimento da Produção Artística ...............................201
Figura 181 Foto da Reinterpretação.do Tema Café – O Escuro .........................201
Figura 182 Foto do Desenvolvimento da Produção Artística ...............................202
Figura 183 Foto da Reinterpretação: Café - Estudar ou Trabalhar? ...................202
Figura 184 Foto do Desenvolvimento da Produção Artística ...............................203
Figura 185 Foto da Reinterpretação: Café - O Outro Lado da Embalagem .......203
Figura 186 Foto do Desenvolvimento da Produção Artística ...............................204
Figura 187 Foto da Reinterpretação: Café - Símbolo ..........................................204
Figura 188 Foto da Apresentação da Performance .............................................205
Figura 189 Foto da Apresentação da Performance .............................................205
Figura 190 Foto Orientação da Professora ..........................................................229
Figura 191 Foto da Reinterpretação:Café: Escravidão Infantil ............................229
Figura 192 Esboço do trabalho: Três Esferas ......................................................230
Figura 193 Foto da Reinterpretação: Algodão –Três Esferas .............................230
Figura 194 Foto Desenvolvimento da Produção Artística ....................................231
Figura 195 Foto da Reinterpretação: Café: O Consumo do Café ........................231
Figura 196 Foto da Reinterpretação: Café: Do Campo a Cidade ........................232
Figura 197 Foto da Reinterpretação: Café – O Mundo Gira ................................232
Figura 198 Foto do Desenvolvimento.da Produção Artística ...............................233
Figura 199 Foto da Reinterpretação: Café: Repetição ........................................233
SUMÁRIO
APRESENTAÇÃO .................................................................................................... 17
INTRODUÇÃO .......................................................................................................... 24
CAPÍTULO 1 Arte como Conhecimento e Linguagem .............................................. 30
1.1 Um Olhar sobre a Arte-Educação: Metodologia Triangular .......................... 30
1.2 A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional e os Parâmetros
Curriculares Nacionais. ............................................................................................. 39
1.3 A Linguagem na Arte .................................................................................... 45
1.4 A Leitura de Imagens ................................................................................... 48
CAPÍTULO 2 A Arte de Candido Portinari como Expressão Ideológica .................... 55
2.1 Arte e Ideologia ............................................................................................ 55
2.2 A Temática Social de Candido Portinari: O Trabalhador .............................. 84
2.3 A Arte Social .............................................................................................. 100
CAPÍTULO 3 O Trabalho Fotográfico e Social de Sebastião Salgado .................... 113
3.1 O Poder da Imagem Fotográfica ................................................................ 113
3.2 A Fotografia Social e Ideológica ................................................................. 127
3.3 A Arte Mágica da Fotografia ....................................................................... 148
CAPÍTULO 4 Análise Comparativa das Obras de Candido Portinari e Sebastião
Salgado ................................................................................................................... 159
CAPÍTULO 5 Aplicação da Metodologia de Pesquisa no Ensino Médio ................. 166
5.1 O Método e os Procedimentos da Pesquisa .............................................. 166
5.2 Os Procedimentos Metodológicos .............................................................. 168
5.3 Os Resultados da Pesquisa ....................................................................... 181
5.4 A Produção Artística................................................................................... 189
CONSIDERAÇÕES FINAIS .................................................................................... 206
FONTES .................................................................................................................. 209
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ....................................................................... 213
APÊNDICES ........................................................................................................... 218
ANEXOS ................................................................................................................. 229
17
APRESENTAÇÃO
A presente dissertação surgiu a partir de inquietações para entender as
relações culturais e sociais que permeiam as imagens dos trabalhadores rurais,
através da pintura do artista Candido Portinari (1903–1962) e da fotografia de
Sebastião Salgado (1944), cuja temática trabalhada por ambos, relacionadas a um
contexto social e em seus processos artísticos, estão ligadas à minha experiência de
vida e cultura.
Nasci e morei, até a minha adolescência, em um sítio de nome “Juca Batista”,
que foi de meu avô paterno, situado a 30 quilômetros de uma cidadezinha chamada
Bandeirantes, no Norte do Paraná. Assim como seus irmãos, meu pai trabalhava
desde criança ajudando meu avô na roça e, somente quando eram adultos,
receberam um pedaço de terra como herança, onde meus pais criaram seus nove
filhos.
Por ser de família humilde os dois não tiveram instrução formal e nem
oportunidade de freqüentar a escola, que tinham que trabalhar na lavoura desde
cedo para ajudar suas respectivas famílias.
Ainda criança, minha mãe conheceu algumas letras, durante o trabalho na
roça, através de uma latinha de banha usada para levar seu almoço. Neste período,
interessou-se por elas e perguntava ao pai o significado das letras e o significado
obtido pela junção das mesmas, aprendendo assim, praticamente sozinha, a soletrar
e fazer leituras básicas, embora não escrevesse.
Também criança, meu pai tinha que derrubar a mata para fazer plantação de
lavoura, período no qual foi instruído a fumar a fim de espantar a grande quantidade
de insetos existentes no local, através da fumaça que o cigarro de palha produzia.
Desde então não parou mais, o habito se tornou um vício que o acompanhou até o
final de sua vida. Ambos tiveram uma infância difícil, muitas vezes não tinham o que
comer, nem o que vestir e calçar. Trabalharam a vida toda na lavoura, pois não
tiveram outra opção e nem muita perspectiva de vida.
Assim, cresci vendo meu pai trabalhar na roça, e minha mãe que além de
auxiliar nessa tarefa também lavava roupa no rio para ajudar no sustento da família,
carregando lata de água na cabeça, cuidando da casa e dos filhos. Ela deu a luz aos
18
sete primeiros filhos em casa, com a ajuda de minha avó materna, sendo que
apenas os dois caçulas nasceram no hospital da cidade Eu nasci em uma
madrugada de Abril sob a luz de querosene, pesando aproximadamente um quilo, e
quando pequena recebi um apelido “Uny”, dado por minha irmã mais nova e que
ainda permanece, posteriormente adotei-o como pseudônimo para identificar meus
trabalhos de pintura. Dessa maneira, todos os irmãos foram crescendo sem muitos
cuidados e aprendendo cedo os afazeres domésticos para ajudar nos serviços de
casa.
Quando criança, nadava nos rios, brincava na terra com os pés no chão,
subindo em árvores, lembro-me que quando chovia andava pela enxurrada chutando
a água suja e, em seguida, eu e minhas irmãs plantávamos mudas de flores,
aproveitando a terra molhada. Às vezes passava carro na estrada, saíamos correndo
para abrir a porteira para ganhar uma moeda ou talvez um pão do padeiro. Muitos
dos nossos brinquedos eram inventados com pneus velhos, latinhas, sucatas e a
boneca era de sabugo de milho. Fiquei muito feliz quando ganhei uma boneca de
verdade, comprada na cidade de Aparecida do Norte, São Paulo, como pagamento
de uma promessa feita por minha mãe pela cura de uma doença chamada Crupe,
que quase me levou à morte.
No sítio onde morávamos não havia energia elétrica, usávamos a luz de
querosene ou lampião a gás, o tínhamos TV, nem geladeira, somente um dio à
pilha. Em época de geadas, preparávamos o leite com açúcar na tigela e
colocávamos em cima do telhado, para que se transformasse em gelo durante a
noite. No dia seguinte, bem cedo, tomávamos o sorvete que achávamos muito
saboroso.
A casa era de madeira, com poucos quartos, em um deles todas as meninas
dormiam juntas, em colchões de palha desconfortáveis. Todas as manhãs meu pai
levantava cedo, antes do sol nascer, acendia o fogão de lenha e preparava um copo
de café com leite para cada filho e depois ia trabalhar na lavoura. E nós íamos para
a escola rural caminhando a uma longa distância, muitas vezes descalças, e quando
íamos de chinelo, tínhamos que tirá-lo para entrar na escola.
Na época de colheita de algodão, antes do nascer do sol, íamos todos para a
roça para ajudar na colheita, sentindo a terra fria nos pés e os espinhos, que eram
tirados em todo o caminho até a roça. Durante todo o dia, arrastávamos o fardo
amarrado pela cintura, que quando cheio, era trocado por outro vazio. Recordo-me
19
que à tarde, na hora da pesagem, ficávamos curiosos para saber quantos quilos
cada um havia colhido e no final da semana saberíamos quanto cada um
receberia Com esse dinheiro fazíamos muitos planos do que comprar, mas na
realidade era muito pouco e não se podia comprar quase nada.
Éramos uma família grande, crescemos sem muitos cuidados higiênicos ou
médicos, quando ficávamos doentes, minha mãe preparava chás medicinais que na
maioria das vezes ajudava a passar a dor. Não tínhamos muita vaidade, todas as
nossas roupas eram costuradas pela minha mãe, que nos ensinou e nos educou a
sua maneira, para sermos pessoas de bem.
Embora meus pais, com toda a dificuldade de vida, se preocupavam em
proteger seus filhos, mas não conseguiram evitar a maior dor que um ser humano
pode sentir que é perder um filho, eles passaram por esse sofrimento quando meu
irmão faleceu aos 18 anos de idade em conseqüência do trabalho na lavoura,
intoxicado indiretamente pelo veneno utilizado na plantação de algodão, pois era ele
quem ajudava meu pai na roça. Após o acidente restou o filho caçula, e as filhas que
não possuíam as mesmas habilidades de lidar com a terra.
três anos, em 2006, passamos por sofrimento parecido com o falecimento
de meu pai, grande homem, que viveu e trabalhou na roça a vida toda, conhecia a
terra, os fenômenos da natureza, e com suas mãos calejadas de trabalhar com a
enxada, plantou e fez muitas colheitas durante sua vida de trabalho na lavoura, uma
pessoa simples, falava pouco mais tinha grande sabedoria.
Meu avô paterno trabalhava apenas com uma das mãos, pois ainda jovem
perdeu o braço esquerdo durante o trabalho no engenho de cana-de-açúcar, porém,
isto não o impossibilitou de continuar o trabalho na roça, estava sempre com uma
foice ou um machadinho para cortar lenha e para roçar a trilha por onde passava.
Deste modo, toda a família, pais, avós e bisavós maternos e paternos, foi
formada por trabalhadores rurais. Existem muitas lembranças significativas da época
que morei no sítio, testemunhei, participando de atividades relacionadas a este tipo
de trabalho que foram significativas para mim. Os trabalhadores, inclusive minha
família, lavrar a terra para o plantio, esperando a chuva chegar para semear os
grãos, acompanhando o nascimento da plantação e, na época das colheitas,
arrancar e bater o feijão, dobrar o milho na roça, cortar o arroz, derriçar o café e
espalhar no terreirão para a secagem, colher o algodão entre outros.
20
Estas cenas marcantes trazem recordações de uma época de grande
dificuldade para os trabalhadores da roça, onde não havia maquinários e o serviço
era feito manualmente. Durante muito tempo o transporte até a cidade ou outras
localidades era feito a cavalo ou de carroça atrelada ao burro, senão caminhando
durante horas até chegar ao local pretendido.
Portanto, participei da angústia e ansiedade deste grupo de pessoas,
aguardando o momento da colheita para então receber algum dinheiro que vinha
apenas na época da venda do produto, isto é, se a geada ou um período longo de
estiagem não destruíssem a plantação antes, dando fim à esperança de uma boa
colheita, levando embora o sonho e a esperança de um ano de safra melhor.
Foi a partir desse contexto histórico-cultural que surgiu o grande interesse por
essa tetica voltada ao trabalho rural, ou seja, pela vida do homem e sua labuta na
lavoura, que tira seu sustento da terra, que sobrevive na dependência de grandes
transformações e da esperança de que um dia a vida irá melhorar, vivendo de
sonhos.
Essa vivência está na memória e uma das lembranças mais forte é a
interação com a natureza. Talvez esse processo espontâneo fizesse relacionar a
experiência particular ao artístico. Trata-se de uma escolha surgida pela junção da
história de vida e da arte em um momento de reflexão e experiências significativas,
construídas pelas relações vividas junto à família, ao meio social e cultural.
O período educacional mais marcante foi o do ensino primário, realizado em
uma escola rural de madeira (figura 1), situada no mesmo bairro em que morava no
Estado do Paraná, onde eram realizadas, ao ar livre, atividades artísticas que
despertavam grande emoção e interesse como: cantigas de roda, danças, teatros,
brincadeiras infantis e os desenhos que adorava fazer.
Figura 1 – Silvia Uny.
Escola Rural Água das Perobas.
2007.
Fotografia
Bairro Juca Batista, Bandeirantes, Paraná
.
Foto: Silvia
21
Embora no sítio tivesse o curso primário, havia a preocupação de que
todos fossem à escola. Assim, todos cresceram até que eu e minhas irmãs tivemos
que viajar aproximadamente 30 quilômetros por dia até a cidade de Abatiá para
fazer o ensino ginasial.
A principal habilidade sensível direcionada a expressão plástica era o
artesanato aprendido com irmãs mais velhas entre outras coisas as colchas de
retalhos que minha mãe fazia, pois na infância e adolescência nunca tive
oportunidade de ir ao museu ou ver qualquer tipo de obra de arte. Estas
experiências foram com certeza as mais notáveis formas de expressão de “arte” em
minha vida, além das atividades da escola no antigo ginásio, como dança de
quadrilha, artesanatos, teatros, fanfarras, que a disciplina de Educação Artística
não fazia parte do currículo escolar da região, exceto o desenho geométrico.
Aos 19 anos deixei a casa de meus pais e vim para o município de Mogi das
Cruzes, São Paulo, com o objetivo de procurar um trabalho e também porque
gostaria de dar continuidade aos estudos, depois de muitas dificuldades comecei a
cursar a faculdade de Educação Artística, despertando em mim o grande interesse
pelas artes visuais, aprendendo assim, a técnica de desenho, pintura, xilogravura
entre outras.
Tornei-me professora de Arte, apesar de, no momento da escolha, o estar
consciente da influência das situações vividas na infância. A formação artística
constitui o meu repertório em relação à valorização educacional e ideológica no
campo da Arte, como também o contexto social no qual permanecem minhas raízes
culturais.
Todos esses fatos sempre foram muito inquietantes, fazendo-me refletir sobre
a vida e a cultura do homem do campo, da vida difícil e árdua do trabalhador rural
que não é valorizado e que, na maioria das vezes, o pouco que ganha perde devido
ao clima, ou em outras ocasiões, todo o dinheiro conseguido com a venda da
colheita do ano é repassado aos bancos, por causa dos financiamentos feitos para
realizar a plantação.
Toda essa problemática e vivência, com uma preocupação ideológica e
social, trouxe a reflexão sobre a cultura do trabalhador rural e sua história de vida,
fazendo com que fossem buscados temas da realidade vivenciada por mim,
possibilitando assim, a produção e estudo de imagens relativas ao assunto e que
evidenciam o homem trabalhando na roça. Comecei então, alguns anos, o
22
desenvolvimento de um trabalho voltado à temática rural, com um estilo de pintura
moderna como: Os Semeadores (figura 2), O Leiteiro (figura 3), Trabalho ao
Entardecer (figura 4), Carpindo a Lavoura (figura 5), Os Garimpeiros (figura 6) e O
Velho Trabalhador (figura 7). As obras representam imagens da vida cotidiana de
trabalhadores rurais e foram feitas aplicando-se pinceladas com gestos
espontâneos, buscando-se um colorido alegre e cujo objetivo é transmitir uma
mensagem ideológica de uma verdade social, assim como a valorização dos ideais
da cultura rural, com a esperança de transformar a consciência do ser humano
através das emoções provocadas por elas, como se observa abaixo:
Figura 2 - Silvia Uny.
Os Semeadores. 2005.
Pintura a óleo s/tela, 100x120 cm.
Figura 3 - Silvia Uny.
O Leiteiro, 2004.
Pintura a óleo s/tela, 100x80 cm.
23
Figura 6 – Silvia Uny.
Os Garimpeiros, 2004.
Pintura a óleo s/tela, 100x120cm.
Figura 7 – Silvia Uny.
O Velho Trabalhador, 2003.
Pintura a óleo s/tela, 80X100 cm.
As figuras mostram a realidade de um contexto social, do trabalho árduo que
retrata a força, a luta pela sobrevivência, a importância e a dificuldade do homem do
campo. Tendo como referencial as pessoas mais simples, lembranças da infância e
adolescência vividas na zona rural, das pessoas humildes e maltratadas pela
condição do trabalho braçal, expostas ao sol e ao peso de um trabalho necessário,
que nem todas as pessoas têm o interesse ou condições de realizar. Ainda que as
obras transmitam um colorido alegre, as figuras dos trabalhadores sem identidade
demonstram um grande cansaço e desânimo de uma rotina diária, sem esperança
de um futuro próspero.
Portanto, sinto a necessidade de pintar, retratando essa classe que muitas
vezes é esquecida, com pouca valorização e reconhecimento na sociedade e no
mercado de trabalho, pessoas a quem não é dado o devido valor, mas dos quais
todos dependemos para a alimentação. Gente que, na maioria das vezes, não sabe
ler nem escrever, mas que possui a habilidade de lidar com a terra, conhecendo a
melhor época do plantio, com pouca vaidade, que possuem o mesmo hábito, ou
seja, acorda muito cedo, trabalha o dia todo de “sol a sol” e vai dormir cedo para, no
dia seguinte, começar tudo de novo, pensando em melhorar a situação de vida.
Porém, este dia não chega, trabalha mesmo para tirar o sustendo para viver, e
nada mais.
Foto: Silvia
Foto: Silvia
24
INTRODUÇÃO
A experiência como professora de Arte na rede pública durante mais de
quinze anos foi um processo abrangente, ocorrido em várias escolas, em contato
com as mais diversificadas culturas e contextos sociais e trabalhando com vários
projetos artísticos de teatro, música e artes visuais, enfatizando propostas
interdisciplinares, que propiciaram maior participação dos alunos, direcionando a
reflexão da Arte inserida ou relacionada às suas vivências diárias.
Esta pesquisa surgiu a partir do interesse por diferentes linguagens artísticas,
principalmente, a pintura e a fotografia, pois, com os anos de experiência na área da
educação foi possível constatar sua importante função no ensino-aprendizagem,
através de análises de contextos culturais e histórico-sociais expostos na
representação artística. O trabalho propõe aos alunos de Ensino Médio uma
abordagem mais ampla sobre a imagem a respeito da cultura do trabalhador do
campo, oferecendo aos participantes a oportunidade de se tornar conhecedores,
leitores e apreciadores de obras de arte.
A temática dessa dissertação foi influenciada por algumas obras de dois
grandes artistas brasileiros: Candido Portinari
1
(1903-1962) e Sebastião Salgado
2
(1944) cujos temas, de certa forma, estão relacionados com as inquietações que
instigaram a presente pesquisa. Os autores revelam a complexidade da vida rural,
retratando os trabalhadores brasileiros, na pintura e fotografia, visualizando as
mesmas temáticas.
Na pesquisa foram analisadas as imagens do trabalhador rural, retratadas
pelo artista Candido Portinari, nascido no interior de São Paulo em Brodósqui. O
recorte analisado foi em sua fase conhecida como “Ciclos Econômicos”, pintura em
1
Candido Torquato Portinari. O artista pintou quase cinco mil obras, de pequenos esboços a gigantescos murais.
Foi o pintor brasileiro a alcançar maior projeção internacional. Nasceu em 29 de dezembro de 1903, numa
fazenda de café, no interior de São Paulo, filho dos imigrantes italianos Giovan Battista Portinari e Domenica
Torquato, que tiveram doze filhos, sendo ele o segundo. Candido Portinari faleceu no Rio de Janeiro em 06 de
fevereiro de 1962.
2
Salgado, Sebastião. Nasceu em Aimorés, Minas Gerais, em 08 de fevereiro de 1944, reside em Paris, onde
permanece a maior parte de sua vida. Formado em economia pela Universidade de São Paulo, trabalhou na
Organização Internacional do Café em 1973, e trocou a Economia pela fotografia.
O artista dedicou-se a fazer crônicas sobre a vida das pessoas excluídas. Este trabalho esdocumentado na
publicação de dez livros e realização de várias exposições, tendo recebido vários prêmios e homenagens na
Europa e no continente americano. Fundou em 1994 a sua própria agência de notícias, "a Imagens da
Amazônia", que representa o fotógrafo e seu trabalho.
25
afresco nos murais para o Ministério da Educação e Cultura no Rio de Janeiro, hoje
Palácio Gustavo Capanema
3
, entre os anos de 1936 a 1944, tendo como objeto de
análise três de suas obras: Cana de Açúcar (1938), Algodão (1938) e Ca (1938).
Também, serão examinadas as fotografias de Sebastião Salgado, autor nascido em
Aimorés, Minas Gerais, cujas obras são: Cortadores de Cana (1987) Plantações de
Algodão (1980) e Café (2002).
Deste modo, foram estudadas as representações artísticas pelo ponto de
vista histórico-social, estimulando a formação estética e cultural do educando e
desenvolvendo conceitos sobre a pintura e a fotografia, estabelecendo significações
e interpretações nas relações de construção de conceitos como a crítica e estética,
histórica e artística. Esses pontos são essenciais, uma vez que estabelecem práticas
de aprendizados do currículo de Ensino Fundamental e Médio no Brasil.
Os educandos, ao utilizarem a comparação entre estas técnicas
diferenciadas, passaram a observar de maneira mais apropriada, identificando as
mudanças e permanências das ações do trabalho rural e as relações do presente e
do passado, contribuindo assim, para esclarecer uma abordagem crítica, social e
cultural a partir de sua realidade.
A proposta possibilitou aos educandos condições para que percebessem as
relações entre a obra, o artista e seus contemporâneos, suas influências e o
contexto no qual foram criadas e seu próprio cotidiano. A maneira que cada
indivíduo e interpreta uma imagem varia de acordo com a pessoa, cultura, época
e experiência de vida O intuito foi observar a opção estética e o modo como cada
artista se utiliza de técnicas, criando um novo discurso, por vezes social, político e
histórico a partir da observação de fatos reais.
Desta forma, foi traçado um paralelo entre as duas linguagens artísticas,
possibilitando que a fruição, a análise estética, a contextualização e a elaboração de
uma proposta poética através das imagens, tornem-se possíveis na sala de aula,
estabelecendo assim, uma leitura e apreciação das obras na pintura e fotografia.
Por meio das duas linguagens podemos observar igualdades na mesma
temática. Foram transmitidas informações que puderam colaborar para elaboração
de conceitos e reflexões, estimulando, deste modo, um encontro com o objeto
3
Palácio Gustavo Capanema - O atual Edifício Gustavo Capanema ou Palácio Capanema (também conhecido
pelo seu uso original, o Ministério da Educação e Saúde, ou ainda como MEC) é um edifício público localizado
no centro da cidade do Rio de Janeiro, na rua da Imprensa, número 16.
26
artístico e possibilitando ao aluno uma experiência estética, sendo que a mesma
será vivida por cada um à sua maneira, conforme sua vivência, ou seja, suas
condições sociais e econômicas.
Este percurso educativo trabalhou o olhar cuidadoso, apreciativo, crítico e
criador, pois as pessoas o estão, em sua maioria, habituadas a ver, costumam
olhar sem ver, principalmente quando se trata de imagens artísticas. O intuito foi
trabalhar a leitura da imagem, conhecendo-a, produzindo e valorizando a arte como
conhecimento, podendo-se fazer uma observação dos acontecimentos sócio-
econômicos, políticos e culturais.
A leitura e o recorte utilizados na pesquisa criaram uma nova realidade e uma
nova gica frente ao contexto social e histórico. Além disso, a necessidade de
refletir sobre as obras de Portinari e Salgado transmitiram novas perspectivas do
processo de criação, criando novas características do meio em que a imagem do
trabalhador foi analisada. Tratou-se de referenciar e investigar as linguagens através
das obras, verificando como a opção estética leva a uma reflexão sobre as
definições da ação do trabalho humano. Portanto, o objetivo da imagem é o homem
em ação e o exercício do trabalhador em uma visão externa. Para tanto, a
apreciação estética é o próprio ato de perceber, ler, analisar, interpretar, criticar e
refletir sobre o contexto visual.
Portinari e Salgado sempre desenvolveram seus trabalhos demonstrando
uma preocupação com o povo simples, o trabalhador rural e as pessoas sofridas que
lutam pela necessidade de sobrevivência. Mesmo vivendo em épocas diferentes,
existem nas obras desses artistas, sejam na tela ou no papel fotográfico, flagrantes
coincidências geradas pela imposição das desigualdades sociais.
As produções trabalhadas revelam os problemas da sociedade, por isso a
importância de contextualizá-las como fortes instrumentos na educação, capazes de
estimular o desenvolvimento das inteligências, respeitando os limites e as
expectativas de cada um. Isoladamente, as linguagens têm suas características
próprias, com riqueza de opções a serem trabalhadas sob um olhar diferenciado,
sendo usadas para o enriquecimento crítico e sensitivo do educando.
O aluno pode transformar-se em seu encontro com a obra de arte, quando
possibilidade de estabelecer e compartilhar relações pessoais de significado na
experiência estética com a arte e a cultura, desenvolvendo um olhar ativo, uma
27
percepção imaginativa, podendo assumir uma atitude de participação individual e
grupal mais densa nas transformações culturais do mundo em que vive.
Todavia, o problema foi como trabalhar um processo de alfabetização visual,
de contextualização e produção de obras de acordo com a Metodologia Triangular,
em sala de aula, com adolescentes de Ensino Médio de uma Escola Pública
Estadual?
O objetivo foi aplicar a referida metodologia elaborada pela Professora Ana
Mae Barbosa
4
que é apreciar, contextualizar e produzir, visando à ampliação de
conhecimentos dos alunos de Ensino Médio, que seguirão a proposta acima e
integraram a História da Arte, o fazer artístico e a leitura da obra, visto como uma
das maneiras mais completas de trabalhar os conteúdos, visando o desenvolvimento
de habilidades e competências.
O caminho metodológico deste trabalho se insere na pesquisa qualitativa, da
Pesquisa-Ação, desenvolvida no campo de Arte-Educação, no ambiente de sala de
aula, na disciplina de Arte do Ensino Médio do ano da Escola Pública Estadual
“Professora Zipora Rubinstein”, situada em Guaianazes, na Zona Leste na cidade de
São Paulo.
Como mencionado, as atividades foram desenvolvidas com a seleção de três
imagens de trabalhadores rurais na pintura de Portinari e três fotografias de
Sebastião Salgado tendo as mesmas temáticas. Para cada obra selecionada foi
completado um ciclo de atividades, que é repetido para todas as imagens, sempre
apresentando diferentes momentos correspondentes aos três passos da Proposta
de Metodologia Triangular de Ana Mae Barbosa: o “fruir” (ou apreciar e ler a
imagem), o “contextualizar” (conhecer obra e o artista) e o “fazer” (ou produzir uma
obra poética).
No primeiro capítulo foi examinado o ensino da Arte como parte do currículo
no processo de ensino-aprendizagem, discutindo e analisando a proposta Triangular
elaborada pela educadora Ana Mae. Além disso, será dada uma ênfase maior na
leitura de imagens.
4
Ana Mae Tavares Barbosa nasceu no Rio de Janeiro, mas foi criada em Pernambuco, graduou-se em Direito,
carreira que abandonou logo após a formatura. Atualmente, é professora titular aposentada e pesquisadora da
Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo (ECA/USP). É a principal referência no Brasil
para o ensino da Arte nas escolas, tendo sido a primeira brasileira com doutorado em Arte-Educação, defendido
em 1977, na Universidade de Boston USA.
28
O sistema aplicado foi o Image Watching, elaborado pelo Professor Robert
William Ott
5
, que estabelece cinco categorias para a leitura de imagens:
descrevendo, analisando, interpretando, fundamentando e revelando. Trata-se de
uma abordagem que fornece conceitos voltados à produção artística, valorizando o
modo crítico e criativo de aprender arte na educação, proporcionando meios para
obter respostas assimilativas e interpretativas.
Outra análise igualmente abordada foi sobre a Arte-Educação, e a Lei número
9.394/96, de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, designando a área por Arte e
não mais Educação Artística, incluindo-a no currículo com conteúdos próprios. Além
disso, os Parâmetros Curriculares Nacionais, publicados pelo Ministério da
Educação também foram mencionados.
O segundo capítulo trata-se da significação ideológica do artista Candido
Portinari, cuja temática sica foi à questão social, que foi demonstrada nos seus
diversos painéis com temas históricos, religiosos, culturais e sociais espalhados pelo
Brasil e exterior. Na mesma parte, há uma ênfase maior aos trabalhos em afresco
que retratam os ciclos econômicos, desenvolvidos para o Ministério da Educação e
Cultura no Rio de Janeiro e que serão analisadas na pesquisa por manifestarem o
referido tema.
O terceiro capítulo abordou a fotografia de Sebastião Salgado, considerado
um dos maiores fotógrafos do mundo, cujas obras mostram pessoas desprezadas
pela sociedade, trabalhadores que lutam pela sobrevivência e por um pedaço de
terra. O autor sempre se preocupou com o povo, o trabalhador, a miséria humana e,
por essa razão, suas fotos expõem a realidade da vida.
A utilização do trabalho de Salgado nesta pesquisa foi em decorrência da sua
própria origem, pois era filho de agricultores e as luzes e os focos projetaram parte
da realidade dele, a existência de imagem do homem trabalhador e de suas
condições de vida.Também foi destacado o trabalho de fotógrafos americanos e
brasileiros que se preocuparam com a questão social e demonstram isso através de
suas imagens fotográficas.
Outro assunto mencionado é o papel social do fotógrafo, a criação do Instituto
Terra, na cidade de Aimorés em Minas Gerais, uma Organização Não-
5
Professor Robert William Ott (1935-1998). Arte-educador norte-americano. Desenvolveu o método de leitura de
imagem, o sistema de crítica artística Image Watching. Em 1988 veio ao Brasil ministrar cursos no MAC-USPcom
o método de análise de imagem.
29
Governamental (ONG) com o projeto de recuperação do meio-ambiente, tendo como
objetivo desenvolver um processo educacional e de pesquisa voltado para a
recuperação de áreas degradadas. Foi enfatizado o trabalho minucioso do fotógrafo
e a importante função da fotografia enquanto elemento de arte e fotojornalismo.
No quarto capítulo foram analisadas de maneira comparativa as duas
linguagens artísticas, sendo três imagens na pintura de Portinari e três na fotografia
de Salgado, sendo as mesmas utilizadas na aplicação da Proposta Triangular.
Finalmente no quinto capítulo, foram abordados os fundamentos teóricos e a
metodologia utilizada, sendo ela uma pesquisa qualitativa, tendo como base a
Pesquisa-Ação e a referência teórica dos autores Michel Thiollent
6
e Antonio
Chizzoti
7
. Seu objetivo foi a descoberta de novos conhecimentos coletivos na
resolução de um problema com envolvimento do pesquisador e participantes do
trabalho prático e intelectual. Foram apresentados também os resultados da
pesquisa, a metodologia utilizada e seus procedimentos, bem como os objetivos
satisfatórios e consistentes alcançados.
No apêndice foi demonstrado o desenvolvimento da pesquisa feita com
alunos do Ensino Médio através de formulários por eles respondidos, durante a
aplicação da Metodologia Triangular de Ana Mae e os cinco momentos da leitura de
imagem de Robert Ott.
Encontra-se em apêndice os formulários respondidos pelos alunos
participantes da pesquisa, e no anexo o trabalho do ano do Ensino Médio
realizado pela professora Michele Gesteira
8
que desenvolveu o mesmo projeto com
alunos de outras salas de aula.
6
Michel Thiollent (1947-), sociólogo, Doutor em Sociologia e Economia. É autor de livros sobre metodologia da
Pesquisa-Ação, por isso, considerado um "metodólogo". Suas áreas de estudos abrangem desenvolvimento
local, extensão universitária, sistemas agroindustriais, inovação tecnológica e organizacional.
7
Antonio Chizzotti, filósofo e Doutor em Educação. Atualmente é Professor associado da Pontifícia Universidade
Católica de São Paulo. Tem experiência na área de Educação, com ênfase em Filosofia da Educação, atuando
principalmente nos seguintes temas: Epistemologia da Educação, Políticas Públicas de Educação e Currículo, e
pesquisas em Ciências Humanas.
8
Michele Gesteira - (1984-) professora de Arte da Escola Estadual Zipora Rubstein.
30
CAPÍTULO 1
Arte como Conhecimento e Linguagem
O papel na Arte educação está relacionado aos
aspectos artísticos e estéticos do conhecimento.
Expressar o modo de ver o mundo nas linguagens
artísticas, dando forma e colorido ao que, até
então, se encontrava no domínio da imaginação,
da percepção, é uma das funções da Arte na
escola.
(Analice Dutra Pillar. 2007, p. 71).
1.1 Um Olhar sobre a Arte-Educação: Metodologia Triangular
A arte é conhecimento construído pelas pessoas através dos tempos,
identificando-se com os meios que permitem a comunicação entre indivíduos,
possibilitando a compreensão de mundo, da sociedade e da cultura.
O ensino desta disciplina vem passando por transformações devido às
grandes mudanças ocorridas no processo de educação em geral, principalmente na
própria área. No presente capítulo sobre Arte-Educação é necessário que a Arte seja
percebida como sendo uma área de conhecimento, como uma forma de identificação
e expressão de valores e experiências adquiridos em sua trajetória histórica. É
importante que ela seja tratada como uma disciplina, em outras palavras, um ramo
de conhecimento artístico, semelhante ao científico, que tem suas linguagens e
conteúdos próprios constituída pelo conjunto de conhecimentos sobre esse assunto.
A partir dos anos 80, seu ensino passou a ser repensado pelos profissionais
da educação, professores e especialistas, que começaram a refletir e trabalhar não
a produção como também a leitura da imagem e a contextualização histórica,
estabelecendo assim, relações que permitem a interdisciplinaridade no processo de
ensino e aprendizagem.
Nesta perspectiva, a inclusão dos fundamentos do trabalho da pesquisadora
Ana Mae Barbosa, doutora em Arte-Educação, garantiu novas práticas que
representam uma importante contribuição na análise da proposta dos anos 70 nos
31
Estados Unidos, no qual professores e artistas começam a pesquisar e trabalhar no
DBAE, Discipline-Based Art Education, ou seja, Arte-Educação baseada em
disciplinas, determinando as reflexões sobre o trabalho do filósofo e pedagogo
americano Jonh Dewey
9
, das Escuelas al Aire Libre mexicanas nos anos de 1913 e
1920 a 1933, identificado pela Professora Ana Mae como o único movimento
modernista do ensino que, deliberadamente, integrou a idéia de arte como livre
expressão e como cultura.
O DBAE, patrocinado pelo Getty Center Foundation, que fornece auxílio para
instituições e indivíduos do mundo inteiro, financiando projetos que promovem as
artes visuais, passou então a preparar e capacitar professores de Arte nos Estados
Unidos e Canadá, em projetos que, além da produção, incluíam a História, Estética e
a Crítica de Arte.
Estas bases teóricas garantiram que no Brasil, no final dos anos 80, surgisse
uma proposta de ensino em Arte, esta metodologia foi difundida e, inicialmente posta
em prática no Museu de Arte Contemporânea da Universidade de São Paulo,
(MAC/USP) pela Arte-educadora citada anteriormente, então diretora do museu
entre os anos de 1986 e 1993. Deste modo, somente nos anos 90 uma nova
metodologia foi aplicada no meio acadêmico do país, apresentando assim uma linha
de pesquisa mais consistente, discutida em encontros da área, tornando-se uma
opção importante na busca por um ensino diferenciado em Artes, difundido em
várias regiões através da Fundação Iochpe
10
, por professores e por outras
instituições de ensino.
Esta metodologia foi denominada “Proposta Triangular”, que permite o
envolvimento de três vertentes: Apreciação Artística, Contextualização Histórica e o
Fazer Artístico, de acordo com essa abordagem, o conhecimento e o
desenvolvimento na área de artes visuais é obtido quando os três elementos são
simultaneamente colocados em prática. Assim, desenvolve-se um novo contexto ao
ensino das Artes nas escolas brasileiras. Na seqüência, o quadro ilustrativo ajuda a
visualizar o processo:
3
. John Dewey (1859-1952), Filósofo e Educador, um dos fundadores da Escola Progressista norte-americana,
conhecida também como Escola Nova.
4
. Iochpe-Maxion S/A, instituiu em 1989 a Fundação Iochpe, a qual desenvolve programas nas áreas de
Educação, Cultura e Bem Estar Social realizando parcerias com entidades públicas e privadas. Mantém a
educação de crianças e adolescentes como prioridade e apóia ações de investimento social e atividades
culturais, beneficiando mais de cento e vinte mil pessoas em vários Estados. É uma organização civil sem fins
lucrativos, qualificada como OSCIP, que se dedica a apoiar profissionais e empresas em suas ações de
investimento social.
32
Figura 8 - Modelo Gráfico da Metodologia Triangular.
Esta proposta do ensino de Arte é uma nova leitura do DBAE, que reúne
várias disciplinas como Arte Visual, Estética, Crítica e História da Arte as quais foram
re-elaboradas pela autora Ana Mae Barbosa, em três substratos: a análise ou leitura
da obra, a contextualização através da História da Arte e a produção da obra. A
metodologia Triangular na visão da autora é:
A proposta Triangular é construtivista, interacionista, diagonal,
multiculturalista e pós-moderna por tudo isso e por articular arte
como expressão e como cultura na sala de aula, sendo essa
articulação o denominador comum de todas as propostas pós-
modernas do ensino da arte que circulam internacionalmente na
contemporaneidade (BARBOSA, 1998, p. 41).
Com foco neste conceito e tendo uma abordagem direcionada às questões
que envolvem a Arte estruturada em conhecimento e saberes, o ensino da disciplina
deve conciliar a História, a Crítica Artística e as relações da obra a partir de
características sociais e culturais da época. Esta pode ser considerada a
metodologia mais completa utilizada em sala de aula, com base na concepção de
A
preciar/Fruir
(leitura da obra)
ABORDAGEM
TRIANGULAR
(Ana Mae Barbosa)
Conhecer/Contextualizar
(o autor e seu tempo)
Fazer/Produzir
(elaborar respostas poéticas)
33
que a Arte auxilia na fundamentação de uma proposta de ensino e aprendizagens
artísticas.
A referida proposta é inserida como parte integrante e significativa, pois inclui
fatores eficazes e essenciais, associando e inter-relacionando elementos
fundamentais no processo de ensino. Como destaca Ana Mae:
Esta metodologia do ensino da Arte corresponde às quatro mais
importantes coisas que as pessoas fazem com arte: elas as
produzem, as vêem, procuram entender seu lugar na cultura através
do tempo, fazem julgamento acerca de sua qualidade (1991, p.3).
Desta forma, ela proporciona uma contribuição ampla ao desenvolvimento e
às experiências humanas.
Assim sendo, percebe-se que as propostas idealizadas pela Professora Ana
Mae não se restringem à produção artística, mas contribuem para a valorização do
empenho do professor em sala de aula, que, por sua vez, deve compreendê-la e
evidenciar sua dimensão histórica, apreciação e crítica.
Do mesmo modo, coloca-se em evidência a leitura de imagens, que tem como
objetivo tornar possível o perfeito entendimento, para os alunos, do que é arte e
quais as formas de expressá-la tanto no aspecto de identidade como de cultura. Por
esta razão, a compreensão de uma obra exige muito mais do que ver e ouvir; requer
conhecer os parâmetros que transcendem o gosto pessoal, que também é histórica
e socialmente construída. O ato de ler a imagem e escrever a palavra inicia-se na
leitura de mundo. Neste sentido, levando-se em consideração as idéias do educador
e pedagogo Paulo Freire
11
verifica-se que:
Ler é entrar nos textos, com vias a compreendê-lo, desde sua
relação dialética com seus contextos e o nosso contexto O contexto
do escritor e o contexto do leitor. Ao ler eu preciso estar informando-
me do contexto social, político, ideológico, histórico do autor. Eu
tenho de situar o autor num determinado tempo (FREIRE, 1995, pp.
4-5).
Através da observação detalhada das obras de arte, é que se permite divagar,
na acepção de imaginar, e visualizar uma nova forma de entender o mundo, fato
11
Paulo Freire (1921-1997) Educador brasileiro. Destacou-se por seu trabalho na área da educação popular,
voltada tanto para a escolarização como para a formação da consciência. É considerado um dos pensadores
mais notáveis na história da pedagogia mundial, tendo influenciado o movimento chamado Pedagogia Crítica.
34
este que inclui questões estéticas e de consciência crítica. Isto remete ao
entendimento do conceito de alfabetização estruturado por Paulo Freire, que atua de
maneira a conectar o ato de ler e escrever com a tomada de consciência de nossa
historicidade e com a possibilidade de questionar e de transformar a realidade em
que vivemos.
A leitura de produções artísticas envolve o questionamento, a busca, a
descoberta e o despertar da capacidade crítica dos alunos e, é exatamente o que a
proposta mencionada sugere, ou seja, desenvolver as habilidades de ver, julgar e
interpretar as obras, compreendendo os elementos e as relações estabelecidas
entre o contexto histórico em que foram criadas e o momento em que se encontra
seu observador, que diferentes gerações as observam, analisam e compreendem,
conforme seus preceitos e convicções.
Outra importante questão, que merece ser destacada nas interpretações
deste novo procedimento, demonstra que estas não apresentam um sentido de certo
ou errado, pois as variáveis intervenientes, surgidas do sujeito/obra/contexto, lhe
confere uma conotação muito mais ampla. A interpretação deve ser realizada com
foco na obra e não no artista que a produziu, isto inviabiliza qualquer tentativa de
adivinhar a idéia do autor, mas permite a ação de criar sua própria maneira de
entender o teor artístico de seu trabalho. Este ato determina que ao ler determinada
imagem, o educando tenha que “saboreá-la”, fornecendo seus inúmeros significados
e garantindo que ele próprio crie, de maneira prazerosa, a enorme gama de
interpretações possíveis de uma mesma obra. De modo mais resumido, aprender a
ler uma imagem é saber explorá-la, interpretá-la e buscar conhecimento significativo,
pois trata-se de uma tarefa flexível e diversificada que depende da sensibilidade do
olhar de cada um.
Ao se trabalhar a Arte com o educando, é necessário que se conceda a
liberdade de criação, sendo um fator importante para produção de conhecimento
trazendo várias interpretações e reflexões, ampliando assim sua capacidade crítica
positiva e construtivista. Deve-se ainda considerar que o objetivo ao ensinar Arte,
não é a intenção de formar artistas, mas sim, indivíduos com maior sensibilidade
desenvolvida a partir da familiarização com os objetos de arte, havendo assim um
expressivo aprimoramento da capacidade de diálogo, principalmente sobre as
diferentes opiniões e as produções culturais e artísticas.
35
Uma distorção percebida e apontada pela educadora Analice Dutra Pillar
12
(1996) sobre releituras, é que, a maioria dos professores ainda se dedica, de forma
muito pragmática, sobre a Proposta Triangular, acarretando um enrijecimento dos
conceitos, que é totalmente inadequado quando se lida com atividades totalmente
soltas e desprovidas de regras, o que está direcionando este apoio à produção de
cópias, sem o devido cuidado de promover, o despertar da interpretação,
transformação do aluno, que difere muito de modelos estáticos existente nas demais
ciências, que a cópia se destina apenas a garantir um aprimoramento das
técnicas, não agindo como fator predominantemente criativo e interpretativo.
Ambas são atividades de ensino, mas uma é da ordem de reprodução e a
outra da criação. O fazer é uma das atividades que estimula a aprendizagem da
História da Arte e a leitura de imagens, pois é assim que o estudante pode descobrir
as possibilidades e limitações das linguagens expressivas, de seus diferentes
materiais e instrumentos.
Dessa forma, sendo a contextualização, uma das propostas defendidas por
Ana Mae Barbosa:
Nossa aproximação da história da arte não é linear, mas pretende
contextualizar a obra de arte no tempo e explorar suas
circunstâncias. Em lugar de estarmos preocupados em mostrar a
chamada ‘evolução’ das formas artísticas através do tempo,
pretendemos mostrar que a arte não está isolada de nosso cotidiano,
de nossa história pessoal. Apesar de ser um produto da fantasia e
imaginação, a arte não está separada da economia, política e dos
padrões sociais que operam na sociedade. Idéias, emoções,
linguagens diferem de tempos em tempos e de lugar para lugar e não
existe visão desinfluenciada e isolada. Construímos a história a partir
de cada obra de arte examinada pelas crianças, estabelecendo
conexões e relações entre outras obras de arte e outras
manifestações culturais. (BARBOSA, 1998, p. 19).
Como é possível observar, a autora dimensiona a História da Arte não como
um contexto racional e cientifico, mas que trata de perceber a produção artística
como intimamente ligada ao viver social, respeitando suas formas, maneiras e
temporalidade. Como resultado, ao contextualizar o objeto de estudo, opera-se no
domínio da História da Arte, que permite situar o artista e a obra no seu tempo e
12
Analice Dutra Pillar, professora e pesquisadora da faculdade de Educação da Universidade Federal do Rio
Grande do Sul (UFRGS), na área de Artes Visuais do curso de Pedagogia e no programa de Pós-Graduação em
Educação. Mestre e Doutora em Artes pela Escola de Comunicações e Arte da Universidade de São Paulo
(ECA/USP).
36
espaço, relacionando as questões históricas e sociais, na arte, educação e cultura, e
que estiveram presentes no momento de sua realização. Quando o aluno
contextualiza a imagem no seu tempo, ele busca conhecer todos os elementos que
a cerca e que fez parte do período de sua criação.
A Professora e Doutora em Arte-Educação, Rosa Iavelberg
13
, (2004) entende
que a aplicação da Proposta Triangular deve ser realizada após o educando
apresentar suas condições, ou seja, ao manifestar seus pontos de vista e mostrar
que as criações artísticas elaboradas na sala de aula favorecem a construção de
uma imagem positiva de si mesmo, assim como conhecedor e produtor de arte. A
Proposta Triangular, que não se apresenta como um procedimento dominante ou
hierárquico, é resultante da combinação dos mais variados conteúdos e apontam
para o conceito de pertinência na escolha de determinada ação, enfatizando sempre
a coerência entre os objetivos e os métodos.
Então, pode-se reafirmar que o contato do aluno com a obra de arte favorece
a apreciação de inúmeras interpretações e significações como o contexto histórico
social e os fatores econômicos e culturais. Verifica-se que diante de uma produção
artística, as habilidades de percepção, intuição, raciocínio e imaginação, criam a
sensibilidade entre o educando e a obra. Segundo o filósofo Pareyson
14
:
A interpretação da obra constrói relações de simpatia,
congenialidade, sintonia, dos infinitos aspectos presentes nos pontos
de vista do indivíduo, o que se pode conceituar que o interpretar
significa conseguir sintonizar à realidade de uma forma através da
feliz adequação entre um de seus aspectos e a perspectiva pessoal
de quem a olha. (PAREYSON, 1989, p. 29).
Portanto, a obra de arte tem como aspecto fundamental a garantia de
conseguir conectar as sensações, emoções e reflexões, permitindo que seu
conteúdo seja reinventado internamente. É importante destacar que cada educando
pode ter uma interpretação própria, nunca sendo indiferente, uma vez que causa um
impacto que parte do indivíduo e, ao mesmo tempo, é impregnado de novas
sensibilidades. Sendo assim, não se deve procurar uma intenção do artista e sim
7
. Rosa Iavelberg é doutora em Arte-Educação pela Escola de Comunicação e Artes (ECA) da Universidade de
São Paulo (USP) e coordenou e elaborou os Parâmetros Curriculares Nacionais de Arte no Ensino Fundamental.
8
. Luigi Pareyson (1918-1991) um dos maiores filósofos italianos do século XX. Concluiu sua licenciatura em
1939 na Universidade de Turim, onde também lecionou. Ao longo da sua vida destacou-se ainda por sua
atividade política, tendo participado na resistência antifascista italiana.
37
desenvolver uma interpretação individual, através da produção de significados,
elaborando suas próprias conclusões.
Antes de apreciar determinada obra de arte, é importante que se consiga
situá-la no tempo, conhecer as expressões poéticas existentes, pois esta se
consagra em refletir o significado em determinado lapso de tempo, onde o ambiente
influenciou o artista e fez com que determinados valores tenham sido estabelecidos,
pela forma como a sociedade se estruturava considerando ainda outros aspectos,
como o contexto histórico e social, a cultura e a política. De acordo com a Professora
Doutora Miriam Celeste Martins
15
:
A obra de arte permite várias leituras, estando vinculada ao nível de
informação que o espectador possui, sempre lembrando que uma
obra não envelhece, pois em cada período sempre surge uma
significação, que lhe rejuvenesce e permite que renasça, permitindo
que ocorram infinitas leituras, uma vez que se reconhece que o ser
humano tem uma capacidade igualmente infinita de perceber, sentir,
pensar, imaginar e emocionar-se (MARTINS, 1998, p. 61).
A Professora Miriam Celeste defende a posição de que ao se apreciar
determinada obra de arte realiza-se, automaticamente, a ressignificação atualizando
e produzindo interpretações dinâmicas que estão ligadas à sensibilidade de cada
indivíduo. A afirmação deste, por sua vez, pode produzir uma significação própria
frente às produções artísticas. Percebe-se que as obras produzidas no passado
podem não ter o mesmo significado que é percebido no momento de sua leitura,
pois, os contextos culturais se modificam de acordo com as experiências vivenciadas
pelos indivíduos, as pessoas que estavam presentes na ocasião em que a obra foi
produzida e, de outra forma, aqueles que a apreciam no presente, atribuindo-lhe
novos sentidos.
As obras de arte somente são perecíveis no que se refere à matéria, porém
são perpetuadas na lembrança, na significação e na representação de um fato
ocorrido. Por este motivo, sua restauração e reprodução passam a ter o objetivo de
conservar o patrimônio histórico-cultural da humanidade. Todavia, não se pode
esquecer o que é confirmado, uma vez que sua simbologia e interpretação estão
15
Mirian Celeste Martins é doutora pela Faculdade de Educação da USP e professora da pós-graduação do
Instituto de Artes da Universidade do Estado de São Paulo (UNESP). Coordenadora da “DVDteca” do Instituto
Arte na escola da Fundação Iochpe. Atualmente é docente do curso de pós-graduação "Educação, Arte e
História da Cultura" na Universidade Presbiteriana Mackenzie, sócia-diretora do Rizoma Cultural; assessora de
instituições educacionais e culturais e co-responsável pela Proposta Curricular de Arte da Secretaria de Estado
da Educação de São Paulo.
38
diretamente relacionadas ao contexto do observador. Este, ao tomar contato com a
obra, estabelece conexões externas, induzidas pelo seu entendimento internalizado
e que possui suas próprias aspirações.
Ana Mae defende a articulação entre as disciplinas que fazem parte do
processo de ensino, afirmando:
Quando falo de conhecer arte falo de um conhecimento que nas
artes visuais se organiza inter-relecionando o fazer artístico, a
apreciação da arte e a história da arte. Nenhuma das três áreas
sozinhas corresponde à epistemologia da arte (BARBOSA, 1991, p.
31).
Compreende-se que o conhecimento da arte passa, invariavelmente, pela
experiência do fazer artístico, pela leitura, não obrigatoriamente nesta ordem,
alcançando a contextualização. A educação e o espaço escolar podem se tornar
mais eficiente para desenvolver no indivíduo a percepção para a leitura e o
entendimento das imagens que o rodeiam.
O educador em Arte exerce um papel importante, como mediador entre o
público e a arte, identificando-se com a proposta na educação e sugerindo uma
metodologia que abrange todas as etapas do aprendizado. O ensino da Arte visa,
principalmente, à formação reflexiva, que perpassa as diversas formas de
expressão.
Em resumo, a reflexão sobre a Metodologia Triangular do ensino de Arte
inclui a maneira de apreciar o ato do fazer artístico” dos alunos, visando que estes
se conscientizem sobre o uso dos diversos materiais e procedimentos artísticos,
percebendo outras maneiras de reinterpretar, utilizando diversas linguagens
artísticas, como as instalações, as intervenções, as performances e outras, que
possibilitam a compreensão de como a organização destes elementos no espaço
traz análises acerca de sua visão no seu mundo. A produção de uma obra pode ser
uma criação ou uma releitura, é um fazer a partir dela, é reler e reinterpretar, criando
novos significados, a partir de novos olhares, novas linguagens artísticas na
contemporaneidade.
39
1.2 A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional e os Parâmetros
Curriculares Nacionais.
O ensino da Arte passou a ser reconhecido como atividade educativa
obrigatória através da Lei de Diretrizes e Bases
16
, da Educação Nacional - LDB
5691/71, recebendo o nome de Educação Artística, porém não possuindo ainda o
status de disciplina.
Sua implantação no currículo escolar apresentou resultados contraditórios, já
que não havia dentre o corpo docente indivíduos habilitados para as várias
modalidades, isto é, polivalentes, e, por esta razão, não tinham os conhecimentos
das várias formas de linguagens, tornando-se incoerente aos princípios
estabelecidos pela própria diretriz.
Após a promulgação da Constituição de 1988, desencadearam-se discussões
acerca da nova composição da LDB da Educação Nacional que somente foi
sancionada em 20 de dezembro de 1996.
Com a edição da Lei n° 9394/96, a nomenclatura do componente curricular
Educação Artística foi alterada para Arte, passando a ser obrigatória na Educação
Básica, com reflexos importantes tanto no Ensino Médio como na Educação de
Jovens e Adultos, como destacado no parágrafo do artigo 26 da LDB: O ensino
da arte constituirá componente curricular obrigatório, nos diversos níveis da
educação básica, de forma a promover o desenvolvimento cultural dos alunos (p.
12).
A nova Lei de Diretrizes e Bases (LDB/96) prevê dois níveis de ensino: o
Básico, e o Superior. Sendo a Educação Básica formada pela Educação Infantil,
Ensino Fundamental e Médio, que tem por finalidade, segundo o Artigo 22º,
“desenvolver o educando, assegurar-lhe a formação indispensável para o exercício
da cidadania e fornecer-lhe meios para progredir no trabalho e em estudos
posteriores” (p. 9). O ensino Superior está direcionado a formação profissional
específica.
16
Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Será grafado como LDB.
40
O Ensino Médio passa a ser a etapa final da educação básica, com duração
mínima de três anos. Uma de suas diretrizes curriculares, conforme o artigo 36
(LDB/96),
I - destacará a educação tecnológica básica, a compreensão do
significado da ciência, das letras e das artes; o processo histórico de
transformação da sociedade e da cultura; a língua portuguesa como
instrumento de comunicação, acesso ao conhecimento e exercício da
cidadania (p. 15).
Nessa perspectiva, o incorporados os quatro pilares do conhecimento
definidos no relatório de Jacques Delors
17
e apontado pela UNESCO
18
em 1996,
como eixos estruturais da educação na sociedade contemporânea como diretrizes
gerais e orientadoras da proposta curricular: aprender a conhecer, aprender a fazer,
aprender a viver e aprender a ser. Todos eles ganharam expressão nas práticas
educativas.
Para complementar a legislação após a promulgação da LDB/96, o MEC
redige e publica os Parâmetros Curriculares Nacionais
19
em 1998, definindo assim
as principais linhas de referência para a prática educacional, tendo como finalidade a
orientação e elaboração das propostas curriculares, os projetos pedagógicos das
instituições de ensino, bem como as atividades dos docentes, nas diversas áreas e
níveis de ensino, apoio ao planejamento e ao desenvolvimento do currículo escolar.
O PCN é um documento sem caráter de lei, ou seja, de adoção não obrigatória por
parte dos sistemas de ensino.
Os temas transversais, que incluem Meio Ambiente, Saúde, Pluralidade
Cultural, Orientação Sexual, Ética, Trabalho e Consumo, são trabalhados nos
conteúdos de todas as linguagens da Arte e demais áreas de conhecimento, de
modo separado ou interdisciplinar.
No trecho do PCN que trata da Arte, encontram-se as quatro propostas para
as linguagens artísticas no Ensino Médio, a saber: Artes Visuais, Música, Teatro e
Dança. No documento, são estabelecidas diretrizes básicas para a ação
17
Jacques Delors - (1925) Político europeu de nacionalidade francesa, tendo sido Presidente da Comissão
Européia entre 1985 e 1995. De origem humilde, foi funcionário do Banco de França em 1945, após a Segunda
Guerra Mundial, e estudou Economia na Sorbonne. Foi autor e organizador do relatório para a UNESCO da
Comissão Internacional sobre Educação para o século XXI, intitulado: Educação, um Tesouro a descobrir (1996),
em que se exploram os Quatro Pilares da Educação.
18
UNESCO - Organização das Nações Unidas para a Ciência, Educação e Cultura.
19
PCN - Parâmetros Curriculares Nacionais: referência produzida a partir da nova LDB/96.
41
pedagógica, que recomenda articular o conteúdo de ensino da Arte em “três eixos
norteadores: produzir, apreciar e contextualizar” (MEC, p. 49). Esses elementos
mantêm seu espaço próprio, mas devem estar relacionados na prática, e seus
conteúdos podem ser trabalhados em qualquer ordem, conforme a proposta
curricular. Os mesmos evidenciam uma política pedagógica pautada pela interação
do contexto histórico-social do aluno, objetivando a aprendizagem e considerando o
ensino da Arte como promotor da abertura da relação do mundo interior do aluno
com seu próprio contexto social.
A criação dos PCNs por si provam que o sistema educacional brasileiro
tem preocupações na promoção de uma educação democrática, garantindo que este
atinja todas as camadas sociais. Nesta proposta, não se indica um ensino estático
de conteúdos generalizados, mas sim currículos escolares dinâmicos pautados em
observar os problemas sociais e, de maneira autônoma, elaborar sua própria
proposta pedagógica.
Para tanto três áreas foram organizadas para compor o currículo da escola: 1.
Linguagens, Códigos e suas Tecnologias, 2. Ciências da Natureza, Matemática e
suas Tecnologias e 3. Ciências Humanas e suas Tecnologias, todas interligadas
entre si, colaborando no desenvolvimento dos projetos educacionais de maneira
significativa.
Com estes instrumentos ocorre uma valorização da Arte na formação de
crianças e jovens, pois seus fundamentos destacam justamente os aspectos dos
desenvolvimentos essenciais inerentes à criação e percepção estética dos alunos.
Deve-se mencionar também, que isso alterou profundamente o modo de se tratar os
conteúdos, visando adequá-los à realidade, que se norteia pelo aprimoramento
cultural do cidadão contemporâneo.
De acordo com os Parâmetros Curriculares de Arte:
As formas artísticas apresentam uma síntese subjetiva de
significações construídas por meio de imagens poéticas (visuais,
sonoras, corporais, ou de conjuntos de palavras, como no texto
literário ou teatral). Não se trata de um discurso linear sobre objetos,
fatos, questões, idéias e sentimentos. Antes, a forma artística é uma
combinação de imagens que são objetos, fatos, questões, idéias e
sentimentos, ordenados pela objetividade da matéria articulada à
lógica do imaginário. O artista seleciona, escolhe, reordena, recria,
reedita os signos, transformando e criando novas realidades. Ele
pode fazer uma árvore azul, o céu verde, aludir com sons à idéia de
uma catedral. A arte não representa ou apenas reflete a realidade,
42
mas é também a realidade percebida, imaginada, idealizada,
abstraída (BRASIL, 1998, p. 32).
Para trabalhar com Arte, o professor se utiliza de suas vivências para realizar
a transposição de aprendizagem que envolve o fazer, apreciar e refletir sobre o fazer
artístico, promovendo ao aluno a oportunidade de fruir a arte, garantindo a liberdade
de sentir-se livre para expressar suas opiniões através da arte que produziu,
partindo de outro ponto de vista. Deve-se ainda ressaltar que a comunicação
pessoal se amplia, principalmente por ter se direcionado a intensificar as relações
dos indivíduos, tanto com ele mesmo, como com o seu semelhante.
De maneira concomitante, percebe-se que o estudante sente-se estimulado a
aprofundar seu conhecimento, buscando os aspectos ligados à percepção,
observação, imaginação e sensibilidade e que, de acordo com o PCN do Ensino
Fundamental:
O papel da escola é estabelecer os vínculos entre os conhecimentos
escolares sobre arte e os modos de produção e aplicação desses
conhecimentos na sociedade. Por isso um ensino e aprendizagem de
arte que se processe criadoramente poderá contribuir para que
conhecer seja também maravilhar-se, divertir-se, brincar com o
desconhecido, arriscar hipóteses ousadas, trabalhar muito, esforçar-
se e alegrar-se com descobertas. Porque o aluno desfruta na sua
própria vida as aprendizagens que realiza (BRASIL, 1998, p. 31).
Ao pensar sobre os PCNs em sua construção, observa-se que os
conhecimentos ou as formas de aprendizagem passa pela busca de vivências e
experiências vividas no dia-a-dia, de maneira que, se a aprendizagem do educando
for organizada na escola em conjunto com outras áreas de conhecimento, em
contato com a produção artística, pode exercitar suas capacidades cognitivas,
sensitivas e imaginativas ampliando o entendimento de situações problemas que
estão presentes no cotidiano e na sociedade em geral.
Conforme demonstrado no documento: “a arte ensina que nossa experiência
gera um movimento de transformação permanente que é preciso reordenar
referências a cada momento, ser flexível” (PCN, 1998, p.20). Sobre esse ponto de
vista, para Ana Mae Barbosa (2001) deve-se ter uma preocupação com as
deficiências educacionais ainda presentes nos dias atuais, muito embora se deva
reconhecer que os educadores se apresentem conscientes da importância do
ensino, agregando-se às propostas presentes nos PCNs, que exige que o sistema
43
educacional seja igual para todos, sendo um dos pontos principais que reflete sobre
a sobrevivência do educando, que a grande maioria ao terminar ainda os
primeiros anos do Nível Básico de Ensino, tem que entrar no mercado de trabalho e
conseqüentemente abandonar os bancos escolares.
Deste modo, fica evidente que na proposta curricular do Ensino Fundamental
e Médio, é importante integrar não apenas o desenvolvimento das habilidades e
competências formais, mas também deve-se encontrar na Arte a dimensão da
criação, da apreciação e da comunicação.
Sobre esta questão, o sociólogo Francês Louis Porcher
20
, se pronuncia da
seguinte forma:
O problema de uma democratização da cultura coloca-se com
extrema precisão neste terreno; a escola deve assegurar a igualdade
das oportunidades, ou seja, fornecer a cada criança os meios de
acesso à arte existente. Não é mais necessário demonstrar, hoje em
dia, que as crianças dos ambientes sócio-culturais desfavorecidos se
acham prejudicados no acesso à cultura estética porque as
condições para esse acesso não lhes serão oferecidas dentro das
respectivas famílias (PORCHER, 1982, p.16).
Em relação ao acesso à cultura estética como forma de representação e
entendimento sobre o espaço vivido e percebido nas suas realizações, como forma
de planejar e apreciar as expressões e modos, o sociólogo relata que durante algum
tempo as justificativas para se sentirem injustiçados era a falta do contato com a arte
no ambiente familiar. No presente, este acesso deve ocorrer na escola, pois a
cultura estética é fundamental na construção da identidade do educando.
A introdução da Arte no Ensino Fundamental e Médio é de grande
importância, requer dos educadores um conhecimento histórico e que seja
transmitido de forma a possibilitar seu pleno entendimento, garantindo a fluidez da
capacidade de criar através de estilo estético e a capacidade de decodificá-lo. Desta
maneira, o aluno deve entender que a Arte é uma atividade criadora histórica, social
e cultural, que se integra facilmente ao lazer, ao conhecimento e ao
desenvolvimento criativo. Segundo o PCN que trata do Ensino Fundamental:
20
Louis Porcher (1940-):sociólogo e escritor Foi o "professor"durante dez anos nos Estados Unidos e chefe da
língua francesa no Ministério da Educação Nacional de 1981 a 1984. Terminou a sua carreira como professor
universitário em uma unidade de formação e ensino do francês de investigação e investigação na Universidade
da Sorbonne Nouvell – Paris.
44
A arte na escola tem uma função importante a cumprir. Ela situa o
fazer artístico dos alunos como fato humanizador, cultural e histórico,
no qual as características de arte podem ser percebidas nos pontos
de interação entre o fazer artístico dos alunos e o fazer dos artistas
de todos os tempos, que sempre inauguram formas de tornar
presente o inexistente. Não se trata de copiar a realidade ou a obra
de arte, mas sim de gerar e construir sentidos (BRASIL, 1998, p.35).
Para que se consiga estabelecer a conexão entre o objeto artístico e o sujeito,
é necessário, que os elementos, os símbolos e os códigos sejam perfeitamente
entendidos, e que consigam compor uma obra. Percebe-se ainda, que os artistas e
os educadores contribuem de forma decisiva na relação entre o sujeito e o objeto
artístico, desde que estejam cientes e envolvidos de maneira direta com o ensino-
aprendizagem.
Os PCNs apontam para uma política pedagógica pautada pela interação do
contexto histórico-social, objetivando a aprendizagem e considerando o ensino da
Arte como promotor da abertura para a relação do mundo interior do aluno, com seu
próprio contexto social. A criação dos PCNs comprovam que o sistema educacional
brasileiro tem preocupações na promoção de uma educação democrática,
garantindo que este atinja todas as camadas sociais.
No Ensino Médio, a disciplina de Arte tem por objetivo colaborar para que se
estimule a percepção, expressão, criação e reflexão sendo sempre pautada pelo
diálogo entre o aluno e a realidade. Assim, aprender esta disciplina deve ser
encarado como direito de todo aluno, que é um ser pensante, e dando possibilidade
que estes criem outras verdades. O sistema de ensino, por sua vez, torna-se uma
instituição social, com a função de transmitir, articulando os conhecimentos, através
de projetos em salas de aulas, que se estendem para além dos muros escolares e
que devem apontar soluções para questões da comunidade local. Desta forma, a
escola pode ser responsável pela conservação de culturas adequando seus
currículos ao contexto social.
As instituições de ensino aproximam os seres humanos, fundamentados no
contexto cultural e artístico da humanidade, o que permite que se conheçam os
aspectos mais significativos da cultura, fruto das diversas manifestações,
aprofundando estudos que contribuam para a ampliação dos saberes artísticos.
As escolas ampliaram a forma de ensinar e estão atuando num universo
muito mais amplo, sendo necessário que o educar insira estes novos elementos em
45
suas atividades e planejamentos, contando com a ampliação das concepções de
mundo. Esta situação impõe mudanças profundas tanto na postura do profissional
docente como pelas instituições de ensino. Portanto, o professor é constantemente
desafiado a sair do seu estado de inércia para um total redirecionamento de suas
práticas e atitudes diante dessa nova realidade que se lhe apresenta.
Redimensionamento este, que poderá partir de um estudo mais aprofundado e
histórico da estética, a fim de contribuir para ampliar a visão de Arte na escola.
1.3 A Linguagem na Arte
A expressão artística, em sua extensa gama de atuação, faz uso de possíveis
linguagens que o produzir não é uma ação limitada ao contato com o objetivo,
sua intenção é, sobretudo, partir de uma maneira explícita em sua forma de
manifestar-se. As linguagens, ao estabelecerem certa relação significativa entre
símbolos e representações, criam um novo modo de expressão. Na área de Arte,
embora pouco exploradas, elas extrapolam as diferentes formas de comunicação
tradicionalmente vinculadas à fala ou ao idioma. Os indivíduos fazem uso das
linguagens para exercer a comunicação, utilizam sistemas de representação com o
intuito de elaborar e objetivar seus pensamentos e sentimentos, projetando e
compreendendo os acontecimentos do mundo.
Conforme ponto de vista defendido pela artista plástica e Professora Fayga
Ostrower
21
(1987, p. 19.), “as linguagens têm por característica a busca de
conteúdos significativos e, portanto, nossa penetração na realidade é sempre
mediada por linguagens, como sistemas de representações”. Ao comentar sobre o
tema comunicação, a autora enfatiza os tipos de linguagens possíveis e suas formas
de representação, como sendo, a dança, o teatro, a música e outras expressões que
produzem sentimentos.
A Professora Miriam Celeste Martins (1998) deixa claro que quando se fala
em linguagem vêm à mente a fala e a escrita, pois se está condicionado a pensar
21
Fayga Ostrower (1920-2001) Foi uma renomada artista plástica, nascida na Polônia. Atuou como gravadora,
pintora, desenhista, ilustradora, teórica de arte e professora. Chegou ao Rio de Janeiro na década de 1930,
naturalizando-se brasileira em 1934. Realizou diversas exposições individuais e coletivas no Brasil e no exterior.
Seus trabalhos podem ser encontrados nos principais museus brasileiros, da Europa e das Américas.
46
que a comunicação acontece somente através das formas verbais, orais e escritas,
sendo as únicas maneiras utilizadas para alcançar o saber, compreender, interpretar
e produzir conhecimento no mundo. Mas este pensamento exclui outras expressões
de sentido que, mesmo sem serem verbais, também comunicam e produzem
conhecimento.
Na arte, os diversos modos de exprimir idéias e sentimentos, como, por
exemplo, as representações nas linguagens plásticas, visuais, cênicas, musicais,
entre outras, abrem caminho para expressar diferentes percepções, intuições,
sentimentos, pensamentos e, por conseguinte, o conhecimento. Quanto mais as
linguagens se enriquecem e se ampliam, maiores são as possibilidades de
interpretar, simular e imaginar. Além disso, as leituras devem envolver os vários
aspectos da comunicação humana que, como mencionado, não se limitam aos
verbos. Por outro lado, é imprescindível que elas sejam entendidas como um
processo que estabelece a interlocução entre o indivíduo e outro elemento,
resultando na absorção de uma mensagem.
Conseqüentemente, a arte é comunicação e sua linguagem se resume ao
discurso de natureza visual, cujo único propósito está contido na imagem, no simples
recado que o artista quis transmitir. A arte fala por si, mesmo que seus admiradores
não consigam captar a mensagem do artista. Quanto a isso, nas palavras de
Picasso, citadas por Herchel B. Chipp (1913-1992):
Todos querem compreender a pintura. Porque não tentam
compreender o canto dos pássaros? Por que se ama uma noite, uma
flor, tudo que rodeia o homem, sem tentar compreendê-los? Mas no
caso da pintura as pessoas querem compreender. Se ao menos
compreendessem que o artista trabalha por necessidade, que ele
próprio é um infinito elemento do mundo [...]. Como querem que um
espectador viva o meu quadro como eu vivi? Um quadro me vem de
longe [...] Como penetrar nos meus sonhos, nos meus instintos, nos
meus desejos, nos meus pensamentos, que levaram tanto tempo
para amadurecer e vir a luz? (CHIPP, apud BUORO, 1988, p. 276).
Acredita-se que quando um observador se depara com uma obra de arte, não
é capaz de compreender todas as idéias e simbologias existentes, até porque, nem
o próprio artista consegue explicar completamente suas aspirações.
Podemos refletir que o artista deve ter liberdade de criação, e que as pessoas
devem respeitá-la sem querer compreender pontualmente, uma vez que, a arte é
acima de tudo, a exteriorização da vivência, significações, sentimentos e
47
sensibilidade do artista. As obras podem informar o contexto onde foram produzidas,
contendo informações históricas e sociais, dialogando com outros tempos e lugares,
ou seja, para entender o contexto ao seu redor precisamos da arte.
Portanto, os objetos artísticos e estéticos são carregados de informações e
que, por meio da leitura, é possível desenvolver a sensibilidade, ampliando a
compreensão do educando. Pode-se trabalhar a percepção e a imaginação criadora
por meio de elementos formais e estéticos, construindo conhecimento das
percepções sobre o mundo e dos diálogos com outras linguagens.
As linguagens se apresentam, no dia-a-dia, de forma a incluir as informações
acerca das artes produzidas em vídeos, revistas, outdoors, jornais, livros, cinema,
galerias e museus, valorizando autores locais, nacionais ou universalmente
consagrados. Isto leva os observadores a refletir sobre a arte e seus códigos. Os
diversos tipos de leitura de imagens podem apresentar diferentes aspectos na sua
dimensão cultural.
A Professora Analice Pillar destaca, ainda, que:
Ao lermos uma obra de arte, estamos nos valendo do nosso
conhecimento artístico ou não para dar um significado à obra. A idéia
de leitura dominante, geralmente implica uma ação decifradora entre
um sujeito percebedor e pensante sobre um objeto geralmente fixo.
Alerta ainda que o perigo das leituras ficam aprisionadas em técnicas
de interpretação, ou em significados fechados que não levam em
conta o prazer e o diálogo com a obra. É ‘apropriar-se de um objeto
de conhecimento em nível de representação e como interpretação
que permite interpretações sobre a realidade’. (PILLAR, 1996, p.45).
Nesse sentido, a interpretação difere de uma pessoa para outra, dependendo
de sua realidade, reflexões e se a obra tem algum significado ou não para o
indivíduo. Do mesmo modo, a leitura é um dialogo entre formas, cores, texturas e
espaços, ou seja, é a explicitação de sua sensibilidade. A proposta Triangular no
Ensino da Arte mostra a importância da leitura de imagens, denominada apreciação,
produzida através da observação, em que se busca explicitar relações de um texto
com o contexto de seu apreciador, através do diálogo do leitor com a obra.
É necessário “alfabetizar” os indivíduos para a prática dessa ação. Por meio
dela, o aluno é preparado para a decodificação da gramática visual, dialogando e
relacionando cultura, conhecimento e experiência estética, ou seja, a partir de dados
48
referenciais podem ser lançados diferentes olhares, fazendo diversas leituras de
mundo.
Também é imprescindível destacar que aprender arte requer tempo, tanto
quanto qualquer outro tipo de aprendizado, esperando por uma leitura de uma
imagem sob o olhar de um conhecedor de arte, o qual exige que este seja inserido
neste universo. Porém, é muito mais que isto, pois se trata do domínio dos
“vocábulos”, no sentido de símbolos que transmitem significados, e da gramática, a
organização de todos os seus elementos, que lhe garantirá a produção de uma
leitura efetiva.
1.4 A Leitura de Imagens
O ensino de Arte tende a proporcionar leituras de imagens em sala de aula,
refletir e dialogar sobre sua importância nos dias atuais, o que se pode aprender
através dela e como analisá-la de maneira significativa e de que qual forma ela está
sendo inserida cada vez mais no mundo contemporâneo. O termo leitura, nesta
questão, deve ser entendido como sendo a interpretação da obra como um texto,
apresentando início, meio e fim e seguindo uma ordenação livre de acordo com seu
tipo. Pode-se afirmar que a valorização da imagem divulgada na televisão, na
publicidade e em outros meios que a usam para comunicação, impressiona as
pessoas atualmente, mesmo em um mundo predominantemente imagético. Muitas
são as possibilidades de caminhos para entrar numa imagem, desvendar seus
códigos e dialogar com ela.
Segundo Analice Dutra Pillar, o conceito de leitura seria:
Ler uma imagem é saboreá-la em seus diversos significados,
criando distintas interpretações, prazerosamente. uma
decomposição visual da imagem no momento da leitura e ao mesmo
tempo uma interpretação pessoal do observador. Comparar imagens
destacando semelhanças e diferenças é um estudo muito
enriquecedor acerca da gramática visual, dos significados que as
obras possibilitam, de sua sintaxe e do vocabulário próprio de cada
linguagem. Uma imagem permite diversas leituras, feitas de acordo
com as relações que seus elementos sugerem. (PILLAR, 1999,
p.12).
49
Observar e fazer leituras são duas maneiras distintas de entender as
imagens, porque cabe ao leitor interpretar de acordo com seus sentimentos e suas
experiências. É o que a Professora Pillar considera, o leitor é aquele que sabe
apreciar e obter prazeres significativos por meio de diferentes olhares sobre a
imagem. Seu diálogo com uma obra se realiza, efetivamente, pela observação das
formas, cores, texturas, volumes; garantindo que sejam obtidas informações e
inferências sobre o objeto e suas características.
Sendo assim, o professor deve ter algumas estratégias que propiciem e
favoreçam a realização do diálogo entre os alunos e o objeto de estudo; explorando
seus significados, aspectos técnicos, formais e contextuais; analisando e
estimulando a interpretação que cada um atribui na observação.
Porém, deve-se antes aquecer o olhar, ou, em outras palavras, preparar os
participantes fazendo um levantamento prévio sobre o objeto cultural. Durante a
leitura, é necessário estimular os alunos a participar por meio de perguntas, para
que seja compreendido o que eles pensam sobre a arte. Algumas sugestões seriam:
O que os alunos vêem em uma imagem? O que analisam? Como interpretam? Por
que eles lêem de formas diferenciadas?
É importante ainda, destacar que a leitura depende muito da forma em que o
leitor observa a partir de uma leitura externa, o impacto sugerido nos permite sentir
as reações de estímulo interno, considerando os resultados das reflexões que o
sujeito está pronto a produzir. Tudo que é observável deve estar sempre
fundamentado no conhecimento significativo da imagem concebida pelo observador,
levando em consideração seus saberes e fazeres. Desta maneira as variáveis
dependem do sujeito dentro de determinado espaço e o período no qual se
encontra. Estas afirmações preceituam que as pessoas agem de forma diferente,
sofrendo a influência dos diferentes momentos e, assim, são capazes de criar
diferentes modos de entendimento e interpretação da obra.
Considerando que essas significações se constroem a partir da origem social,
da vivência familiar e contexto histórico do indivíduo, a partir da experiência se
estabelece uma relação dialética entre o contexto de produção do objeto lido e o
contexto presente, em que envolve não somente o inteligível, mas também o
sensível.
Existem diferentes métodos de realizar a leitura das imagens. Porém, a
abordagem utilizada nesta pesquisa tem por base os trabalhos do pesquisador
50
norte-americano Robert William Ott, que criou uma metodologia para o olhar em
relação às obras de arte que abrange cinco estágios: descrever, analisar, interpretar,
fundamentar e revelar. A proposta do autor inclui a relação entre a escola e os
espaços expositivos de Arte.
O sistema de leitura e interpretação de obras Image Watching, elaborado pelo
Professor Ott, é uma das formas de utilização e aplicação do DBAE pela Getty
Foundation e pela Metodologia Triangular, adaptada no Brasil na década de 80, pela
Professora Ana Mae. Este processo direcionado ao estudo das Artes visa a crítica, a
apreciação estética, a história da arte e a produção dos alunos nas aulas. Desta
forma, são expostas a seguir as cinco categorias que compõem o sistema de leitura:
1 - Descrevendo
É um momento de observação para aproveitar tudo o que uma imagem pode
oferecer. Os olhos precisam percorrer o objeto de estudo com atenção. Quando a
imagem é mostrada, é preciso esperar alguns instantes para que os alunos a
observem cuidadosamente. Em seguida, pedir para que eles descrevam o que estão
vendo. A partir desse exercício, poderão posteriormente identificar e interpretar os
detalhes visuais. Os mesmos escreverão tudo o que é perceptível na obra de arte
que está sendo estudada. O professor ajudará fazendo perguntas, que auxiliarão
quando forem expor o que perceberam, as deduções feitas por eles próprios.
2 - Analisando
Nesta parte é necessário perceber os detalhes e a postura do professor é
muito importante. Possui por objetivo estimular o aluno a prestar atenção na
linguagem visual, se harmonizando com seus elementos, texturas, dimensões,
materiais, suportes e técnicas. Possibilitando assim, um exercício verbal de análise,
reflexão e construção de idéias sobre conteúdos e temas relativos à obra.
3 - Interpretando
A partir das idéias colocadas pelos alunos, o professor poderá aproveitá-las
para as diversas atividades pedagógicas possíveis. Com a ajuda dos alunos, deve-
51
se listar e eleger aquelas que correspondem aos objetivos de ensino. Este é o
momento de maior participação e fornece elementos para análise sensorial,
emocional e pessoal de cada um. Todos devem ter espaço para expressar as
próprias interpretações, bem como sentimentos e emoções. Outra sugestão é
mostrar outras manifestações visuais que tratem do mesmo tema e estimular os
estudantes a fazer comparações (cores, formas, linhas, texturas, organização
espacial, entre outras).
4 - Fundamentando
Nesta fase, a interpretação da obra terá como base informações adicionais
fundamentadas no conhecimento da História da Arte, ou seja, a contextualização,
podendo ser utilizados livros, textos, slides, vídeos, filmes e DVDs. É importante que
eles pesquisem informações sobre a vida e a obra do autor, no contexto histórico,
sócio-cultural e artístico da época, que eles percebam as influências de outras
tendências ou artistas contemporâneos. Neste estágio, os participantes receberão
informações sobre a obra, o autor, o título e seu contexto. A partir de então, é
importante verificar se houve mudança na interpretação e em quais aspectos elas
ocorreram. Conseqüentemente, poderá ser proposta a elaboração de uma síntese
escrita, em grupo, em forma de redação ou dissertação, reunindo todos os
elementos analisados e discutidos nos momentos anteriores.
5 - Revelando
É o momento de produzir uma resposta poética a partir do entendimento da
obra de arte estudada e vivenciada. Com tantas novidades e aprendizados, os
alunos certamente estarão estimulados. É a ocasião de revelarem, através do fazer
artístico, o resultado do processo de construção de conhecimento no qual
participaram, expondo o progresso conseguido. Nesta etapa, uma nova obra é
criada pelo aluno e é preciso encorajar a atividade grupal e experimentar as
representações nas três dimensões, investigar materiais plásticos, formas, cores,
texturas e linhas e exercitar as habilidades para recorte, colagem e modelagem.
Na produção realizada pelos estudantes, é importante que eles entendam que
o fazer artístico, como a releitura, não é uma cópia e sim uma reinterpretação,
52
podendo haver uma relação entre as duas obras, a apresentada ao aluno e a
produzida por ele.
Cabe lembrar que ao se propor a realização da leitura e releituras, todos os
materiais e recursos devem estar prontos, de maneira a vincular às abordagens
históricas, sociais, estéticas, formais, ou ainda a partir de aspectos sensoriais,
emocionais ou cognitivos. Muitas metodologias de leitura de imagem podem ser
ampliadas e aprofundadas, partindo de novos subsídios teóricos que auxiliem o
educador de Arte nesse trabalho.
É preciso considerar que, para se fazer a leitura, um dos aspectos a serem
cultivados pelos professores diz respeito ao tempo de contemplação dedicado a uma
obra de arte, que deve ir se ampliando, tanto para o aluno quanto para o professor.
Quanto à leitura, a Professora Anamelia Bueno Buoro
22
afirma:
A questão da relação visual com a imagem é a primeira a ser
abordada na caminhada até sua leitura propriamente dita. Ela revela
diversas facetas, quando se trata de ensino aprendizagem da arte.
Uma delas é a relação do tempo de ver e do olhar do sujeito-aluno
diante da mesma imagem. Outra é a do tempo de ver do sujeito-
educador. (BUORO, 2001, p. 43).
Antes da leitura da obra tem se, no primeiro momento, uma relação visual
com a imagem. Uma única obra expressa diversificados sentidos para o
entendimento do olhar, tanto para os estudantes como para o educador. Este tem
um olhar diferenciado daqueles, pois considera suas experiências de vida e
conhecimentos sobre o mundo atual interagindo as formas de ver, entendendo a
imagem como forma de explicitar emoções sensíveis aos educandos.
Por outro lado, durante a leitura, o aluno descreve, analisa, interpreta e
contextualiza uma obra. Ele constrói, gradualmente, uma teoria de arte, que usa
para explicitar a sua compreensão, são idéias que ele adquire no decorrer de suas
experiências cotidianas, em seus encontros com trabalhos de arte.
Porém, deve-se ter cautela na metodologia da utilização de algumas imagens,
para não cairmos no “fazer outra vez, fazer de novo, refazer”, ou simplesmente nos
apropriarmos das imagens, como um exercício de cópia descontextualizada,
desconectada e desprovida de qualquer apropriação do conhecimento.
22
Anamelia Bueno Buoro é mestre e doutoranda em Comunicação e Semiótica pela PUC-SP. Atua como
coordenadora de Artes do IBECC-SP e como professora de e grau. Trabalha na formação de professores
dando cursos de História da Arte e Metodologia de Ensino de Arte em diferentes escolas de São Paulo.
53
Assim, é fundamental valorizar a leitura de imagens e enfatizar as
características de sua forma narrativa, associando-as a objetos reais e aos signos.
Esta é a metodologia a ser aplicada nesse contexto, visando estimular, aprofundar e
conhecer as imagens das mídias e obras de arte usadas nas salas de aula.
No entanto, sabe-se da impossibilidade de utilização de trabalhos artísticos no
ambiente escolar. Por este motivo, recomenda-se a visita aos museus, galerias,
ateliês de artistas e de artesãos e outros locais que possam ser agendados pelas
escolas. Um dos modos de a arte estar mais próxima da educação é por meio das
reproduções, mas algumas imagens utilizadas são, muitas vezes, cópias de péssima
qualidade, com grande perda da resolução de cores, formas e proporções.
Geralmente, elas não mostram nem o vestígio do que a obra realmente é. Por essa
razão, é importante o cuidado com as reproduções usadas, pois grande parte dos
materiais apresentados aos educando está muito distante da obra original.
Quando as reproduções são usadas como recurso, alguns passos
processuais podem ser feitos pelos educadores. Por exemplo: destacar o título, o
nome do autor, o local onde se encontra a obra, a data da criação e as medidas
originais. Além disso, a utilização de aparelhos de reprodução também é
interessante, como retroprojetor, data show, uma vez que possibilitam a
demonstração pela aproximação e pelo distanciamento, com a real medida que a
obra possui.
Cabe aos educadores a responsabilidade de trazer a discussão e reflexão
sobre o olhar do estudante para a leitura de imagens. É imprescindível lembrar que
se trata de um ato de interpretá-las, traduzi-las e estabelecer relações visuais com o
contexto em que foram produzidas, atentando sempre para o fato de que o exercício
de ler imagens é tão importante quanto produzir e não pode, de maneira alguma, ser
interpretado como um “fazer nada”.
A Professora Marisa Vorraber Costa
23
(2003), alerta sobre o papel que os
educadores têm desempenhado na escola, se é o de transmitir a cultura dominante
que classifica e discrimina, ou o de levar nossos alunos a perceberem seu papel. Na
prática, deve refletir, entre outras coisas, o cotidiano, abordando conteúdos que
23
Marisa Vorraber Costa é licenciada em Filosofia, doutora em Ciências Humanas e professora titular em Ensino
e Currículo. Atua presentemente nos Programas de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal do
Rio Grande do Sul e da Universidade Luterana do Brasil, onde ministra as disciplinas Sociologia da Educação,
Educação e Pós-Modernidade, Escola e Cultura Contemporânea, Introdução aos Estudos Culturais, entre outras.
54
levem em conta a diversidade ética sobre o mesmo tema, possibilitando ao
educando problematizar sua própria posição dentro da sociedade.
Pode-se e deve-se permitir que o educando, ao olhar as imagens, possa
traçar percursos pessoais e coletivos, percebendo a narratividade existente nelas, as
relações que podem ser estabelecidas com outras figuras, outras sonoridades,
outras gestualidades, para que, a partir delas e nelas, se percebam como sujeitos.
Ao refletirmos sobre uma proposta, considerando que a arte o envelhece,
pois os objetos artísticos podem ser vistos, sentidos, apreendidos em qualquer
tempo, pois a arte transpõe barreiras, transcende o tempo, espera-se que ela
proporcione ao educando o encontro dele consigo mesmo, deixando um canal
aberto para os sentidos, sensações e sentimentos. Neste contexto é importante que
o educador esteja comprometido com a arte, para abastecer os olhares por diversos
percursos, e que, ao mesmo tempo, seja capaz de se auto-avaliar dentro desse
processo de ensino-aprendizagem.
55
CAPÍTULO 2
A Arte de Candido Portinari como Expressão Ideológica
A arte não é apenas um “fenômeno social”, mas
algo que surge instintivamente, independente de
uma função social, mais como uma “necessidade
vital” de expressão.
(Aracy Amaral, 2003, p. 10)
2.1 Arte e Ideologia
A ideologia é um fenômeno social que surge em um determinado contexto
histórico como tomada de consciência coletiva de certos valores e idéias
manifestadas.
Neste sentido aparece como sistema cultural, expressando pensamentos,
interpretando crenças, idéias, comportamentos e normas pertencentes a uma
sociedade que participa e se reproduz de maneira social não consciente, surgindo
como um elemento de consciência coletiva, isto é, através de idéias e explicações
apresentada dentro de uma estrutura social em processo de mudança. Nas palavras
de Marilena Chauí
24
, a ideologia é:
[...] um fenômeno moderno, substituindo o papel que antes dela,
tinham os mitos e as teologias. Com a ideologia, a explicação sobre
a origem dos homens, da sociedade e da política encontra-se nas
ações humanas, entendidas como manifestação da consciência ou
das idéias. (CHAUI, 2002, p.222).
Os contornos sobre ideologia buscam estabelecer vínculos com as idéias
políticas que conduzem significados e mbolos de forma e modos do ser. Neste
caso a ideologia pode ser conectada a espaços de ão. Assim, partindo de suas
experiências, não como forma de mito ou de religião, mas sim como forma de
discussão sobre o domínio dos exercícios sociais e políticos, em razão dos fatores e
24
Marilena de Sousa Chauí, (1941) Filósofa, Professora de Filosofia Política e História da Filosofia Moderna da
Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo.
56
valores, apresentando uma interpretação do contexto social, sendo ela uma forma
de representação da realidade em relação ao homem em grupo.
A análise das ideologias tem como marco teórico e prático a ciência das
formações sociais em seu processo de modificação. Como diz o Professor Benedito
Nunes
25
(2008, p.93), “As formas da vida social, como o direito e a política, a
religião, a filosofia e a própria arte, relacionam-se com a infra-estrutura econômica,
através do papel que as classes antagônicas desempenham no processo de
produção.”
As classes sociais adversas desempenham funções diferentes no processo
de produção e, por essa razão, apresentam culturas próprias. Não são as idéias
filosóficas, religiosas, políticas e artísticas que são consideradas como as forças que
movimentam a história, mas sim a necessidade de produção dos homens. No
entanto, a verdadeira essência que move a história é a modificação de todas essas
ideologias.
Com relação à arte da metade do século XX, ela deixou de ser vista apenas
como uma idéia de beleza estética e começou a questionar e propôs um
pensamento crítico sobre ela mesma, sendo um meio para expressar uma idéia,
uma reflexão, produzindo outros significados, não correspondendo mais à proposta
da arte moderna anterior. Conforme esclarece a Professora de Filosofia Marilena
Chauí:
As artes deixaram de ser pensadas exclusivamente do ponto de vista
da produção da beleza para serem vistas sob outras perspectivas,
tais como expressão de emoções e desejos, interpretação e crítica
da realidade social, atividade criadora de procedimentos inéditos
para a invenção de objetos artísticos, etc. Essa mudança fez com
que a idéia de gosto e de beleza perdesse o privilégio estético e de
poética, a arte como trabalho e não como contemplação e
sensibilidade, fantasia e ilusão. (CHAUÍ, 2002, p. 149).
A arte tem uma finalidade de crítica social e política, devendo estar
comprometida e engajada, servindo de instrumento de comunicação entre seres
humanos, por ser um instrumento de reafirmação das relações de força, permitindo a
preservação da cultura e relações sociais.
25
Benedito José Viana da Costa Nunes (1929-) filósofo e escritor brasileiro. Foi professor titular de Filosofia na
Universidade Federal do Pará, ensinou literatura e filosofia em outras universidades do Brasil, da França e dos
Estados Unidos.
57
Chauí diz que “O artista é um ser social que busca exprimir seu modo de
estar no mundo na companhia dos outros seres humanos, reflete sobre a sociedade,
volta-se para ela, seja para criticá-la, seja para afir-la, seja para superá-la” (2002,
p. 150).
O artista como um intelectual tem a capacidade de julgar, criticar idéias, e
transformá-las através de sua arte engajada, levando à reflexão a conscientização
de uma sociedade. Ele pode denunciar, isto é, expressar seus ideais através de sua
arte, dando sua contribuição. Quando ele tem um projeto voltado à arte ideológica,
busca não a igualdade social, mas sim a reflexão sobre uma situação atual, social,
política e também mudanças de atitudes.
Por conseguinte, pode-se enquadrar Candido Portinari como um dos
principais agentes de produção artística e ideológica no Brasil. Filho de imigrantes
italianos, Candido Portinari nasceu no início do século XX em uma fazenda de café,
chamada Santa Rosa, no interior de São Paulo, em Brodósqui. Teve uma infância
pobre, mas livre, caçou passarinho com estilingue, empinou papagaio, jogou futebol
com bola de meia e cresceu em contato com o duro trabalho braçal dos colonos nos
cafezais de terra roxa. Teve seu primeiro contato com a pintura como ajudante da
decoração da Igreja matriz de Brodósqui.
Aos quinze anos se separou da família e foi para o Rio de Janeiro sem
proteção, sem dinheiro e tímido. Para viver, trabalhou em várias profissões, inclusive
a de garçom. Estudou no Rio de Janeiro no período de 1919 a 1928, sua vida de
pintor e estudante foi muito difícil, morava em uma pensão em troca de pequenos
serviços. Sua pintura era acadêmica e participou de vários salões de arte, recebendo
algumas medalhas. Mas no ano de 1928, Portinari ganhou um prêmio de viagem à
Europa, com o retrato do poeta Olegário Mariano. Após dois anos de estudos e
visitas aos grandes museus, voltou para o Brasil com a idéia dominante de Paris e
de fazer uma pintura brasileira, descobrindo assim o modernismo.
O crítico de arte Antonio Bento
26
declarou em seu livro Portinari:
[...] tendo como temas as cenas de Brodósqui, com sua gente
humilde e sofrida, apresentar um Brasil ainda não revelado e que
permanecia virgem em seu espírito, tornou-se o alto propósito que
motivou Portinari, como resultado dos estudos e reflexões no
exterior. Fazer principalmente uma gente viva, de temática ligada a
26
Antônio Bento, político, escritor, crítico de arte e amigo pessoal de Candido Portinari.
58
nossa gente, deixando de parte, tanto quanto possível, as obras de
caráter internacional vistas na Europa, foi a decisão fecunda que o
artista havia tomado antes de voltar ao Rio. (BENTO, 2003, p.60).
Sendo assim, Portinari queria pintar paisagens com a cor de sua terra natal,
representando sua infância em Brodósqui e também aquela gente simples que
conheceu e se lembrava.
Em seu retorno ao Brasil em 1931, o artista foi acolhido pela crítica moderna,
sobretudo por Mário de Andrade
27
e Oswald de Andrade
28
.
Logo recomeçou a pintar
intensamente, sobretudo retratos, (figuras 9 e 10), para garantir sua sobrevivência.
Graças à ajuda dos amigos, sempre teve encomendas.
No Brasil, pouco antes de sua chegada, aconteceu em outubro a Revolução
de 1930, que encerrou a República Velha. Em 15 de novembro foi instalado o
Governo Provisório, presidido pelo Presidente Getúlio Vargas
29
:
Figura 9 – Candido Portinari.
Retrato de Manuel Bandeira, 1931.
Pintura a óleo s/tela, 73 x 60 cm.
Rio de Janeiro, RJ.
Coleção particular, Rio de Janeiro.
Fonte: http://www.portinari.org.br
Figura 10 – Candido Portinari.
Retrato de Maria, 1934.
Pintura a óleo s/tela, 46 x 38 cm.
Rio de Janeiro, RJ.
Coleção particular, São Paulo, SP.
Fonte: http://www.portinari.org.br
27
Mário Raul de Morais Andrade, (1893-1945) poeta, romancista, crítico de arte, folclorista, musicólogo,
Professor universitário e ensaísta brasileiro. Em 1922 participou ativamente da Semana de Arte Moderna,
movimento que teve grande influência na renovação da literatura e das artes no Brasil. Seu segundo livro de
poesias, Paulicéia Desvairada, publicado no mesmo ano, marca, para muitos, o início da poesia modernista
brasileira.
28
José Oswald de Sousa Andrade (1890 -1954) escritor, ensaísta e dramaturgo brasileiro, foi um dos promotores
da Semana de Arte Moderna de 1922 em São Paulo, tornando-se um dos grandes nomes do modernismo
literário brasileiro. Foi o autor de dois manifestos modernistas: O Manifesto da Poesia “Pau Brasil” e o “Manifesto
Antropófago”.
29
Getúlio Dornelles Vargas (1882-1954) político brasileiro, chefe civil da Revolução de 1930, que pôs fim à
República Velha, foi duas vezes presidente da República do Brasil. Na primeira vez, de 1930 a 1945, governou o
Brasil em três fases distintas: de 1930 a 1934, no governo provisório; de 1934 a 1937, no governo constitucional,
eleito pelo Congresso Nacional; e de 1937 a 1945, no Estado Novo. Depois, de 1951 a 1954, voltou a governar o
Brasil como Presidente eleito por voto direto.
59
Entre 1931 e 1939, o pintor produziu uma enorme galeria de retratos e ao
mesmo tempo produziu uma série de telas em que o Brasil e sua gente foram os
elementos fundamentais. Ao contrário das demais obras deste período, a paisagem
é o elemento fundamental da composição, talvez por isso as figuras se tornem
menores em suas telas, talvez para dar espaço à terra vermelha. Às lembranças de
Brodósqui, sua cidade, suas casas brancas, as pequenas plantações, cenas de
circo, a igreja e o pequeno cemitério ao fundo, além das crianças brincando,
representadas em: Futebol (figura 11) Meninos Soltando Pipas (figura 12).
Figura 11 - Candido Portinari.
Futebol, 1935.
Pintura a óleo s/ tela, 97 x 130 cm.
Rio de Janeiro, RJ.
Fonte: http://www.portinari.org.br/
Figura 12-Candido Portinari.
Meninos Soltando Pipas, 1938.
Pintura a guache s/papel, 28.5 x 35 cm.
Coleção particular, Rio de Janeiro, RJ.
Fonte: http://www.portinari.org.br/
Essa primeira fase de pintura moderna, de caráter construtivo, desponta em
Portinari uma tendência do homem e da paisagem, ele possuía um grande
domínio técnico de desenho e de um grande cromatismo, despontando uma
tendência ao expressionismo, as gigantescas figuras deformadas com pés e mãos
grandes, em uma composição geométrica, equilibrada, buscando uma relação com a
paisagem, com apenas o fundo em perspectiva, retratando a atividade social do
homem que cerca a paisagem. A deformação expressiva foi à linguagem que o
artista utilizou para valorizar o trabalho, o negro, que é visível na obra O Lavrador de
Café, e Mestiço pintados em 1934 (figuras 13 e 14). Devido à deformação
configurada em seu expressionismo, que é associada a um conhecimento do
desenho afinado com as normas acadêmicas, é definido como um artista, ao mesmo
tempo, clássico e moderno.
60
Figura 13 - Candido Portinari.
Lavrador de Café, 1934.
Pintura a óleo s/tela, 100 x 81 cm.
Rio de Janeiro, RJ.
Museu de Arte de São Paulo Assis Chateaubriand.
São Paulo, SP.
Fonte: http://www.portinari.org.br/
Figura 14 – Candido Portinari.
Mestiço, 1934.
Pintura a óleo s/ tela, 81 x 65,5cm.
Rio de Janeiro, RJ.
Pinacoteca do Estado de São Paulo, SP.
Fonte: http://www.portinari.org.br/
O artista revelou através de uma tendência estilística uma visão pessoal
sobre os temas sociais. Preocupado com essas questões e com suas
desigualdades, denunciava a miséria através de sua arte, como protesto às
injustiças aos menos favorecidos. Desenvolvendo assim essa temática através de
sua pintura, retratando a situação do povo e o seu tipo de vida, no ano de 1934
ele pintou Os despejados (figura 15) que foi sua primeira obra com temática social.
Seus trabalhos evidenciam a história e cultura nacional, constituindo assim um
valoroso panorama da realidade brasileira.
Figura 15 Candido Portinari.
Os Despejados, 1934.
Pintura a óleo s/tela.
37 x 65 cm.
Fonte: http://www.portinari.org.br
Portinari, entrevistado pelo jornal paulista Folha da Noite, em 20 de Novembro
de 1934, sobre o aspecto social de sua pintura afirmou: “Estou com os que acham
61
que o arte neutra. Mesmo sem nenhuma intenção do pintor, o quadro indica
sempre um sentido social”.
Após a produção da obra Café (Figura 16), o elemento humano passou a ser
compreendido em termos sociais e históricos, tornou-se primordial se sobrepondo à
paisagem na arte de Portinari, voltada para a captação da realidade natural
expressiva. A figura humana foi apresentada com vigor escultórico, realçada pela
deformação expressiva de mãos e pés. O artista conquistou prêmio nos Estados
Unidos com esta obra na exposição Internacional de Pittsburg (1935), promovida
pelo Instituto Carnegie. Essa premiação foi um marco decisivo em sua carreira.
Figura 16 - Candido Portinari.
Café (1935).
Pintura a óleo s/tela.
130 x 195 cm.
Coleção Museu Nacional de
Belas-Artes/MNBA, Rio de
Janeiro, RJ.
Fonte: http://www.portinari.org.br
A nova problemática social brasileira apresentada na sua pintura e
influenciada por movimentos mundiais, com destaque para o Muralismo mexicano,
levou-o a criar imagens alicerçadas no trabalho e em suas raízes rurais. Em uma
entrevista para o jornal Diário de São Paulo em 21 de Novembro de 1934, declarou
sobre seus próximos projetos:
Quanto à pintura moderna, tende ela francamente para a pintura
mural. Com isso, bem entendido, não quero afirmar que o quadro de
cavalete perca o seu valor, pois a maneira de realizar não importa.
No México e nos Estados Unidos já há muitos anos essa tendência é
uma realidade, e noutros países se opera o mesmo movimento, que
de impor à pintura o seu sentido de massa. Naturalmente, no
Brasil, país em formação, o artista não tem possibilidades. Tudo aqui
está por fazer, havendo apenas alguns casos excepcionais. E a
causa disso tudo é ainda o governo, que se obstina a não ter, como
no México se observa, interesse direto pelas coisas da arte. (1934,
apud, PROJETO PORTINARI
30
).
30
Candido Portinari. Projeto Portinari. Disponível em: <http://www.portinari.org.br/ppsite/ppacervo/cronobio.pdf>.
Acesso em: 20 de março de 2008.
62
Percebe-se que o artista acreditava na tendência do crescimento da pintura
mural, mas não havia muito interesse político em produzir e valorizar a arte no Brasil.
Os murais, que fazem parte de seu acervo, revelam o vigor de sua obra,
sendo um exemplo os primeiros grandes painéis executados no Monumento
Rodoviário (figura 17) situado no Eixo Rio de Janeiro São Paulo (conhecida hoje
como “Via Dutra”), em 1936, sendo quatro telas medindo 96 x 768 cm.
Figura 17 - Candido Portinari.
Construção de Rodovia I, 1936.
Painel a óleo s/tela. 96 x 768 cm.
Museu Nacional de Belas Artes. Rio de Janeiro, RJ.
Fonte: http://www.portinari.org.br
Em seguida os afrescos
31
realizados no edifício do recém-criado Ministério da
Educação e Cultura
32
, entre 1936 e 1944. O projeto arquitetônico foi realizado por
um grupo de jovens: Afonso Eduardo Reidy
33
(1909-1964), Carlos Leão
34
(1906-
1983), Oscar Niemeyer
35
(1907), Jorge Moreira
36
(1904-1992) e Ernani
Vasconcelos
37
(1912-1987) liderados por Lucio Costa
38
(1902-1998), arquiteto e
urbanista brasileiro. O prédio recebeu a influência do arquiteto e urbanista francês
31
A palavra afresco é empregada, muitas vezes, para designar a pintura mural em geral.
No entanto, a técnica original, do italiano "buon afresco", refere-se à técnica mais antiga e resistente da história
da arte. Trata-se de uma pintura com pigmentos à base d’água, feita sobre argamassa ainda fresca de cal
queimada e areia.
32
Ministério da Educação fica alocado no atual Edifício Gustavo Capanema ou Palácio Capanema.
33
Affonso Eduardo Reidy (1909-1964) foi um arquiteto brasileiro. É considerado um dos pioneiros na introdução
da arquitetura moderna no país.
34
Carlos Leão (1906-1983) foi arquiteto, pintor, aquarelista e desenhista brasileiro. Formou-se pela Escola
Nacional de Belas-Artes em 1931. Foi amigo e sócio de Lúcio Costa e integrou-se a equipe de jovens arquitetos
que projetou o Ministério da Educação e da Saúde (1937-1943) no Rio de Janeiro.
35
Oscar Ribeiro de Almeida de Niemeyer Soares Filho (1907) é um arquiteto brasileiro, sendo considerado um
dos nomes mais influentes na Arquitetura Moderna internacional. Foi pioneiro na exploração das possibilidades
construtivas e plásticas do concreto armado.
36
Jorge Machado Moreira (1904-1992) brasileiro, Arquiteto-chefe responsável pela equipe que fez o plano
urbanístico e arquitetônico do campus da Universidade Federal do Rio de Janeiro (então Universidade do Brasil),
na ilha do Fundão. Participou da equipe que projetou o Ministério da Educação e Saúde (mais tarde Ministério da
Educação e Cultura).
37
Ernani Mendes de Vasconcelos (1912-1987) foi arquiteto, pintor e muralista brasileiro. Formou-se em
arquitetura pela Escola Nacional de Belas Artes em 1933.
38
Lúcio Marçal Ferreira Ribeiro Lima Costa (1902-1998) foi arquiteto e urbanista brasileiro. Pioneiro da
arquitetura modernista no Brasil, ficou conhecido mundialmente pelo projeto do Plano Piloto de Brasília. Em 1932
foi nomeado diretor da Escola Nacional de Belas Artes onde implantou um curso de arquitetura moderna. Entre
seus alunos estava o jovem Oscar Niemeyer. Costa convenceu Le Corbusier a vir ao Brasil em 1936 para uma
série de conferências (enquanto colaborava no projeto da sede do recém-criado Ministério da Educação e da
Saúde Pública). A arquitetura moderna do projeto ia ao encontro dos objetivos da ditadura Vargas, ao passar
ares de modernidade e progresso ao país. Costa, embora convidado a projetar o edifício sozinho, preferiu dividir
o projeto com uma equipe que incluía o seu antigo aluno Oscar Niemeyer e os seus sócios Carlos Leão, Ernani
Vasconcellos, Jorge Moreira e Affonso Eduardo Reidy.
63
Le Corbusier
39
(1887-1965) e uniu os maiores nomes do modernismo brasileiro, com
azulejos e pinturas de Portinari, esculturas de Alfredo Ceschiatti
40
(1918-1989) e
jardins do arquiteto e paisagista Roberto Burle Marx
41
(1909-1994). A obra é
considerada o primeiro grande marco da Arquitetura Moderna no Brasil, visando
integrar pintura, escultura, arquitetura e paisagismo.
Estes trabalhos, como conjunto e como concepção artística, representam uma
referência na evolução da arte de Portinari, afirmando a opção pela temática social,
que é o fio condutor de toda a sua obra desde então. Esses painéis contribuíram
para a fama dele de Portinari e sua produção artística ganhou nova dimensão.
As primeiras decorações em afresco para o Ministério da Educação e Cultura
foram as dos ciclos econômicos no Brasil, constituídas por doze murais com a
temática do trabalho e com uma figuração expressionista dos homens e mulheres. O
salão Portinari se encontra no andar do prédio e é utilizado para reuniões e
eventos diversos.
No mesmo local, pintou em seguida um mural, substituindo o afresco pela
têmpera, com uma composição predominantemente cubista. A temática, então, era
dos jogos infantis no interior do Brasil, com crianças em gangorra, armando
arapucas, jogando pião entre outros. Também localizado no andar, sendo
utilizado para recepções e outros eventos.
Retratou em outros murais, conjunto de coral (figura 18), tema adequado à
finalidade do salão, referindo-se ao ensino da música ministrada pelos jesuítas na
catequese dos índios brasileiros. Neste trabalho o artista uniu o expressionismo e o
cubismo, representando pela primeira vez blocos de figuras, ou seja, pessoas
aglutinadas. O painel à têmpera e com cores frias se encontra junto ao palco do
auditório no salão de conferências que recebeu o nome do sociólogo e escritor
Gilberto Freyre
42
(1900-1987):
39
Charles-Edouard Jeanneret-Gris, (1887-1965) mais conhecido pelo pseudónimo de Le Corbusier, foi arquiteto,
urbanista e pintor francês de origem suíça. É considerado um dos mais importantes arquitetos do século XX. Aos
29 anos mudou-se para Paris, onde adotou o seu pseudônimo, que foi buscar ao nome do seu avô materno. A
sua figura era marcada pelos seus óculos redondos de aros escuros.
40
Alfredo Ceschiatti (1918—1989) foi escultor, desenhista e professor brasileiro. Fez parte da Comissão
Nacional de Belas Artes e ensinou escultura e desenho na Universidade de Brasília (UnB). Tornou-se conhecido
por criar obras para decoração de prédios projetados por Oscar Niemeyer.
41
Roberto Burle Marx (1909—1994) foi artista plástico brasileiro, ganhou renome internacional ao exercer a
profissão de arquiteto-paisagista. Morou grande parte de sua vida no Rio de Janeiro, onde estão localizados
seus principais trabalhos, embora sua obra possa ser encontrada ao redor de todo o mundo.
42
Gilberto de Mello Freyre (1900-1987) foi sociólogo, antropólogo,escritor e pintor brasileiro, considerado como
um dos grandes nomes da história do Brasil.
64
Figura 18 - Candido Portinari.
Escola de Canto, 1945.
Pintura mural a têmpera, 490 x
405 cm.
Palácio Gustavo Capanema, Rio
de Janeiro, RJ.
Fonte:
http://www.portinari.org.br
Finalmente, realizou pinturas para o Ministério da Educação e Cultura, criando
representações simbólicas dos quatro elementos: Fogo (figura 19), Terra, Ar e Água.
Devido ao tema, essas pinturas tornaram-se abstratas, segundo Antonio Bento,
Portinari foi o pioneiro a pintar uma série de telas abstratas no Brasil, embora a arte
abstrata não fosse de sua preferência.
Figura 19 – Candido Portinari
Fogo, 1945
Painel a óleo s/tela.
200 x 250 cm (aproximadas)
Palácio Gustavo Capanema, Rio
de Janeiro, RJ.
Fonte:
http://www.portinari.org.br
Através da tendência voltada ao expressionismo, Portinari configurou uma
visão peculiar do homem e da terra. O volume dos corpos com o agigantamento de
pés e mãos não foi adotada quando começou a abordar a temática das famílias
acampadas nos arredores de seu povoado.
Quando criança, ele observava e conversava com os retirantes que passavam
por Brodósqui, sempre famintos após longas caminhadas a , fugindo da seca e
em busca de socorro, de trabalho e de uma vida nova em são Paulo. Passavam por
Brodósqui a procura de um cemitério, trazendo o morto numa rede pendurada em
um pau, apoiado nos ombros de dois homens. Quando o artista começou em 1935 a
abordar em sua pintura esta temática dos flagelados, alguns desses quadros tinham
65
o nome de Famílias (figura 20), não tinham ainda está preocupação social e nem a
designação de retirantes.
Figura 20 – Candido Portinari.
Família, 1935.
Pintura a óleo s/tela.
60 x 73 cm.
Rio de Janeiro, RJ
Fundação José e Paulina
Nemirovsky, São Paulo, SP.
Fonte: http://www.portinari.org.br
Somente mais tarde a série dos Retirantes (1944-1945) trouxe uma feição
acentuadamente social na carreira do mestre brasileiro, em virtude da Segunda
Guerra Mundial, iniciada em 1939, e a terrível seca do nordeste, que transformaram
o artista em um denunciante das misérias do mundo.
Em suas obras, os retirantes nordestinos, os trabalhadores rurais com
membros deformados, os tons de marrom e os de roxo dos campos cultivados,
expressam a força da terra. Uma das fases mais notáveis de sua obra não era
apenas composta de quadros sociais, mas de um símbolo universal do homem,
tanto as vítimas da guerra quanto as da miséria, tornaram-se representações de
problemas vividos e tratados pela arte moderna.
Essa fase social chegou ao auge com a grande tela Retirantes (1944) (figura
21), e com as obras: Enterro na Rede (1944) e Criança Morta (1944), pertencentes
ao acervo do Museu de Arte de São Paulo.
Figura 21 - Candido Portinari
Retirantes, 1944
Painel a óleo s/ tela.
190 x 180 cm
Petrópolis, RJ
Museu de Arte de São Paulo
Assis Chateaubriand, São
Paulo, SP
Fonte:
http://www.portinari.org.br
66
Portinari mostrou, com seus retirantes nordestinos, seus meninos de
Brodósqui, no ano de 1946, os quadros de lavradores, o abismo que existia, e ainda
existe entre um país grandioso e a vida real de pessoas e trabalhadores em
condições, muitas vezes, precárias. Suas obras demonstraram um ecletismo social
considerável, porém, de um modo orgânico como símbolo dramático da diversidade
brasileira, representada na luz e nas formas mutáveis da natureza, nas variedades
de tipos humanos e suas relações morais e culturais. As tentativas de explicação
das obras do artista acabam por evidenciar os traços geométricos contrastados com
os contornos humanos e agigantados.
Mesmo os Retirantes (figura 22), pintados nos últimos anos de sua vida, eram
flagelados vistos em grupo e usando chapéus de jornal. O artista retomou o tema
com o emprego de cores quentes, antes não utilizadas pelo pintor.
Figura 22 – Candido Portinari.
Retirantes, 1960.
Pintura a óleo s/ tela. 73 x 60 cm.
Rio de Janeiro, RJ.
Coleção particular, São Paulo,
SP.
Fonte: http://www.portinari.org.br/
De qualquer modo, de todas as suas fases, o Realismo, o Neo-
Expressionismo e o Cubismo, a série que tratou da miséria dos retirantes serão
sempre os trabalhos mais significativos da arte brasileira de todos os tempos, pois
apresenta um ambiente muito comum e fiel à maioria dos habitantes que vivem em
território nacional, em especial na região nordeste.
Alguns anos antes da série Retirantes, no ano de 1939, Portinari pintou no
exterior três painéis a têmpera
43
: Nordeste, Centro-Oeste e Sul, com temáticas
nacionais, representado figuras dessas regiões brasileiras. A encomenda feita por
43
Têmpera é um termo usado para tintas opacas à base de água, mas aplica-se também a uma técnica que usa
gema de ovo como aglutinante. Os quadros são feitos sobre madeira ou pasta de madeira com base de gesso. A
têmpera é uma técnica que já era usada por egípcios, gregos e romanos.
67
Armando Vidal, comissário geral da representação do Brasil na feira em 1939 para o
Pavilhão brasileiro da Feira Mundial de Nova York. O primeiro painel, também
conhecido como Jangada”, o segundo “Brasil Central”, constitui-se de várias figuras
numa composição variada e a terceira obra, apresenta uma cena Gaúcha (figura 23).
Figura 23 - Candido Portinari.
Cena Gaúcha, 1939.
Painel a têmpera s/tela.
315 x 345 cm (aproximadas).
Rio de Janeiro, RJ.
Ministério das Relações Exteriores, Brasília, D.F.
Fonte: http://www.portinari.org.br/
Os murais de Portinari, executados à têmpera no ano de 1941, para sala da
Fundação Hispânica na Biblioteca do Congresso, em Washington, nos Estados
Unidos, evidenciam uma maior preocupação com a dimensão humana do que com
os acontecimentos históricos. O artista levou alguns meses trabalhando neles, tendo
como temáticas: Descobrimento (figura 24), Desbravamento da Mata, Catequese
(figura 25) e Descoberta do Ouro. No conjunto das obras existe todo um jogo de
correspondências externas e de contrastes geométricos internos, que destacam o
trabalho, como é possível observar a seguir:
Figura 24 – Candido Portinari
Descobrimento, 1941
Pintura mural a têmpera.
316 x 316cm
Washington, D.C.USA.
Fonte: http://www.portinari.org.br/
Figura 25 – Candido Portinari
Catequese, 1941
Pintura mural a têmpera.
494 x 463 cm (irregular)
Washington, D.C. USA
Fonte: http://www.portinari.org.br/
68
Ao retornar dos Estados Unidos em 1942, o artista foi até sua cidade natal em
Brodósqui e realizou uma série de retábulos
44
que reproduziam a Santa Luzia e São
Pedro (figura 26), Sagrada Família, a Anunciação, São Francisco, São João Batista,
e Santo Antonio na capela que mandara construir para sua avó paterna. Eram
santos devotos de sua família. A casa que o pintor viveu durante sua infância foi
adquirida e incorporada ao patrimônio artístico do Estado, transformando-se no
Museu Casa de Portinari, onde se encontram muitos trabalhos do pintor, como:
Figura 26 - Candido Portinari.
Santa Luzia e São Pedro, 1941.
Pintura mural a têmpera.
274 x 240 cm (irregular).
Museu Casa de Portinari, Brodósqui, SP.
Fonte: http://www.portinari.org.br/
Portinari realizou nesta época duas séries de painéis para decorar a sede da
Rádio Tupi do Rio de Janeiro e de São Paulo. O tema para a emissora era a vida do
carioca. O artista procurou demonstrar através dessas obras o carinho e admiração
pela gente simples, do povo, o homem comum e brincalhão. Retratou os músicos em
Flautista (figura 27) e Sambistas, e os trabalhadores como: Tintureiro, Jangadeiros
(figura 28) e Lavadeiras. A encomenda foi feita por Assis Chateaubriand
45
no ano de
1942, proprietário de uma das mais importantes redes de jornais e rádios da época,
porém, um incêndio na sede da Rádio Tupi do Rio de Janeiro destruiu todas as
obras no dia 12 de março de 1949.
44
Retábulo é uma construção de madeira, de mármore, ou de outro material, integrados à arquitetura religiosa
com função estética, que fica por trás ou acima do altar e que, normalmente, são pintados em baixo-relevo.
45
Francisco de Assis Chateaubriand Bandeira de Melo, mais conhecido como Assis Chateaubriand, ou Chatô
(1892-1968) foi um jornalista, empreendedor e político brasileiro. O paraibano criou e dirigiu a maior cadeia de
imprensa do país, os Diários Associados, compostos por 34 jornais, 36 emissoras de rádio, 18 estações de
televisão, uma agência de notícias, uma revista semanal (O Cruzeiro), uma mensal (A Cigarra), várias revistas
infantis e uma editora.
69
Figura 27- Candido Portinari
Flautista, 1942.
Painel a têmpera sobre tela.
300 x 200 cm (estimadas).
Rio de Janeiro, RJ.
Fonte: http://www.portinari.org.br/
Figura 28- Candido Portinari.
Jangadeiro, 1942.
Painel a têmpera sobre tela.
300 x 200 cm (estimadas).
Rio de Janeiro, RJ.
Fonte: http://www.portinari.org.br/
a outra série elaborada, destinada a decoração da sede da emissora da
Rádio Tupi de São Paulo, conhecida como série bíblica, foi pintada em 1943. Foram
executados num dos períodos mais atormentados do nosso tempo. O artista
transforma os episódios bíblicos em símbolos de condição humana, com vigor e
expressividade. Os temas dos sete painéis: O Pranto de Jeremias, Ressurreição de
Lázaro, O Massacre dos Inocentes (figura 29), As Trombetas de Jericó, A Justiça de
Salomão (figura 30), O Sacrifício de Abraão e último Baluarte. Estes trabalhos foram
fortemente influenciados pela visão picassiana de Guernica e sob o impacto da
Segunda Guerra Mundial. Os painéis foram inaugurados em setembro e entre os
vários discursos pronunciados destaca-se o da pintora Tarsila do Amaral
46
ara jornal
O Diário de São Paulo em 1943, no dia 11 de setembro:
Tendo recebido uma delegação especial por parte dos pintores
modernos de São Paulo para saudar o nosso glorioso Portinari,
estou certa de que todos eles, embora com orientações diferentes,
se acham solidários comigo nesta solenidade, que representa mais
46
Tarsila do Amaral (1886-1973) foi pintora brasileira, mais representativa da primeira fase do Movimento
Modernista Brasileiro. Em 1922, une-se a Anita Malfatti, Menotti del Picchia, Mário de Andrade e Oswald de
Andrade, formando o chamado Grupo dos Cinco, que defende as idéias da Semana de Arte Moderna e toma a
frente do movimento modernista no país, embora não tenha participado da Semana de 22. Casa-se com Oswald
de Andrade em 1926 e, no mesmo ano, realiza sua primeira exposição individual, na Galeria Percier, em Paris.
Seu quadro Abaporu, de 1928, inaugura o movimento antropofágico nas artes plásticas, essa teoria propunha
que os artistas brasileiros conhecessem os movimentos estéticos modernos europeus, criando uma feição
brasileira.
70
uma grande conquista da pintura moderna do nosso meio (1943,
apud PROJETO PORTINARI).
Assim, a artista parabeniza o artista, visto como um dos grandes artistas do
modernismo brasileiro da época em questão.
Figura 29 – Candido Portinari.
O Massacre dos Inocentes, 1943.
Painel a têmpera s/tela 150x150.
Museu de Arte de São Paulo Assis
Chateaubriand, SP.
Fonte: http://www.portinari.org.br/
Figura 30- Candido Portinari.
A Justiça de Salomão, 1943.
Painel a têmpera s/tela,179 x 191 cm.
Rio de Janeiro, RJ.
Museu de Arte de São Paulo Assis
Chateaubriand, São Paulo, SP.
Fonte: http://www.portinari.org.br/
O crítico de arte Antonio Bento (2003, p.102) acredita que a tonalidade
acinzentada dominante proveio da sugestão do quadro Guernica, de Picasso
47
, que
o artista havia visto no Museu de Arte Moderna de Nova York, embora as formas
fossem diversas de Picasso.
Nas obras, Portinari cria um contraste proposital entre figura e fundo,
chegando ao que pode se chamar “expressionismo cubista”, com figuras
gigantescas, em que a deformação parece ter atingido o auge. Como diz o crítico e
jornalista Ruben Navarra
48
:
Não devemos procurar nos Profetas os empréstimos tomados a
Picasso, mas a busca por parte de Portinari, de um novo caminho
expressionista. Guernica, de fato, deve ser vista como um ponto de
partida, uma sugestão e não como uma solução final por ele
buscada. No grito de dor de Picasso, a emoção é contida pelo
racionalismo da composição cubista. O grito de dor de Portinari
47
Pablo Picasso, (1881-1973) foi reconhecidamente um dos mestres da Arte do século XX. É considerado um
dos artistas mais famosos e versáteis de todo o mundo, tendo criado milhares de trabalhos, não somente
pinturas, mas também esculturas e cerâmica, usando, enfim, todos os tipos de materiais. Ele também é
conhecido como sendo o co-fundador do Cubismo, junto com Georges Braque.
48
Ruben Navarra, escritor, jornalista e crítico de arte do Jornal de Arte, Campina Grande, 1966.
71
parece não ter limites: o pintor deforma, desarticula suas figuras,
transforma-as em gigantescos seres emblemáticos de gestos amplos
e poderosos. Ao Homem, impotente diante da dor, restam as
lágrimas. Lágrimas petrificadas e mãos levantadas num gesto de
súplica ou de maldição. (1966, apud FABRIS, 1990, p. 58)
Conforme é possível notar, o crítico não condena as telas de Portinari, mas
nelas um novo caminho de trajetória artística para o artista que transforma os temas
bíblicos em símbolos da condição humana.
A influência de Picasso em algumas obras de Portinari foi percebida por
alguns críticos, seu trabalho recebeu comentários negativos de ser apenas cópia do
Cubismo Picassiano, sem criar um estilo novo. Na edição de 23 de junho de 1993 da
Revista Veja, o crítico de arte e editor da Revista Novos Estudos (Cebrap), Rodrigo
Naves, analisou a influência de Picasso sobre o trabalho de Portinari, da seguinte
forma:
[...] Essa ânsia de reconhecimento e obtenção de uma dimensão
pública teve de pagar o seu preço. Basta ver o uso que ele fez do
cubismo de Picasso. A bem dizer, Portinari diagramava Picasso. O
pintor de Brodósqui lançava sobre figuras mais ou menos realistas
uma trama decorativa que, à maneira de fachos de luz, as recortava
e lhes conferia algum dinamismo, preservando, contudo sua forma
natural. Sem grande função estrutural, essa malha servia de
camuflagem moderna a uma pintura de forte teor acadêmico.
(NAVES, 1993).
Todavia, esse tipo de crítica não é pertinente, porque nem todo artista deve
criar um novo estilo para ter reconhecimento, ele deve estar aberto a todas as
experimentações, pois o próprio traço define seu estilo e a forma como o trabalho é
realizado é sempre individual e marcante. Em Portinari, apesar de haver realmente
influência do Cubismo de Picasso, não se pode falar em cópia. Sua inovação está
na maneira pessoal de abordar os temas, tamanhos e formas, nas características
que o identificam e fazem com que a suas obras sejam diferente das demais. Nas
palavras de Annateresa Fabris
49
:
49
Annateresa Fabris nasceu em São Paulo, historiadora, crítica de arte, professora do programa de pós-
graduação em Artes da Universidade de São Paulo, pesquisadora do CNPq. Foi curadora de diversas
exposições, das quais a mais recente é Mercosul Cultural - modernidade e contemporaneidade nas artes
plásticas, realizada no Centro Cultural São Paulo, em 1996. Recebeu o Prêmio Jabuti de Ciências Humanas pelo
livro O futurismo Paulista, e o Prêmio Sérgio Milliet da Associação Brasileira de Críticos de Arte pelo livro
Cândido Portinari.
72
[...] Se usou recursos expressivos estrangeiros, soube revê-los,
reelaborá-los, adaptá-los a peculiaridade do país. Se enveredou pelo
Expressionismo, presente até mesmo em suas composições
“clássicas” e “cubistas”, é porque, através dele, pôde plasmar uma
visão peculiar do homem e da terra brasileiros. E sua visão do
expressionismo é própria: é uma profissão de fé nas potencialidades
do homem. Isso, através de uma interpretação crítica da realidade
brasileira, que nada tem do desenvolvimentismo e do ufanismo
oficiais. (FABRIS, 1990, pp. 39-40).
Ao refletir sobre as questões da produção artística social, Annateresa chama
a atenção para as temáticas utilizadas por Portinari que soube ver o Brasil sob uma
visão estética brasileira que contribuiu para a diversidade de uma temática nacional.
Neste período, a denúncia social marcou esta fase do artista, seja como decorrência
da precariedade da situação social brasileira ou como reflexo das calamidades da
guerra que sensibilizaram tantos pintores europeus, dentre os quais Picasso, que
naquele momento exercia forte influência sobre Portinari.
Em uma entrevista feita no Brasil para a Revista Acadêmica, em maio de
1941. Portinari declarou que:
Observaram que faço lembrar Picasso o que não é exato. Se eu
quisesse poderia imitá-lo, e a prova disso é que algum tempo,
como experiência, tentei o cubismo. Mas desisti imediatamente,
porque é uma forma que pertence a outro e não a mim. Acho o
cubismo maravilhoso para aqueles que o criaram, mas insuportável
nos imitadores. [...] A pintura não deve ser fotográfica; deve ser
composta. Eu componho meus quadros. Cada detalhe, cada tipo,
cada grupo, cada ângulo, são diretamente arrancados da realidade,
mas o conjunto do quadro é composto pela visão que o pintor tem
dessa realidade (1941, apud FABRIS, 1996, p. 153).
Deste modo, o artista permaneceu fiel a uma visão realista da arte e sua
temática, embora tenha feito experiências com outras tendências estilísticas como a
abstração geométrica, porém sem encontrar afinidades com essas linguagens.
Portinari, muitas vezes recebeu críticas de conhecedores de arte contestando
a originalidade de seu estilo, sendo acusado até mesmo de reinterpretar o cubismo
de Picasso, sem desenvolver um estilo próprio, se realmente foi influenciado por
outras tendências artísticas, o artista superou a todas, se mantendo fiel a sua
ideologia, criando e desenvolvendo sua própria arte. “Salvador Dali recebeu
influência de muitos surrealistas e a todos superou, se é que se deve falar dessa
73
maneira. Melhor dizer que Dali, felizmente, foi influenciado pelos surrealistas”
(CHIARELLI, Tadeu. 1999, p. 103).
Segundo a historiadora da Arte, Annateresa Fabris, (1990, p. 125) Portinari
através de seus painéis voltado à temática sobre o trabalho denuncia a
imparcialidade existente no governo populista, pois todas as categorias sociais eram
consideradas igualmente trabalhadoras. Assim o artista fazia questão das imagens
de personagens negros em suas obras, contrapondo-se à política do governo
Getulio Vargas, portanto, não acreditando na ideologia étnica de exclusão velada
que existia no período de vigência do Estado Novo no Brasil (1934-1945).
O início da década de 1940, mais precisamente o ano de 1944, marcou a
volta de Portinari com a cor e o reencontro com o rigor clássico. A iniciativa do
projeto da construção de Pampulha para a igreja de São Francisco de Assis, em
Belo Horizonte, Minas Gerais, deve-se ao então prefeito da cidade, Juscelino
Kubitschek
50
, o conjunto arquitetônico foi projetado pelo arquiteto Oscar Niemeyer e
a decoração por outros artistas brasileiros, entre eles Candido Portinari.
O artista utilizou a têmpera para decorar a parede do fundo do altar da igreja
com a pintura dedicada a São Francisco de Assis, padroeiro da igreja (figura 31), em
seguida, produziu a Via Sacra, composta por vários quadros expressionistas (figura
32). Nessas composições, o artista não se preocupou tanto com o religioso, mas em
realçar o humano:
Figura 31 - Candido Portinari.
São Francisco se Despojando das Vestes, 1945.
Pintura mural a têmpera, 750 x 1060 cm.
Igreja de São Francisco de Assis da Pampulha.
Belo Horizonte, MG.
Fonte: http://www.portinari.org.br/
Figura 32 - Candido Portinari.
Jesus Carrega a Cruz às Costas, Passo II da
Via Sacra, 1945.
Pintura a têmpera s/madeira, 49 x 60 cm.
Rio de Janeiro, RJ.
Fonte: http://www.portinari.org.br/
50
Juscelino Kubitschek de Oliveira (1902-1976). Médico, militar e político brasileiro, ficou conhecido como JK e
foi prefeito de Belo Horizonte, governador de Minas Gerais e presidente do Brasil entre 1956 e 1961, sendo, na
época, o último mineiro a ser eleito presidente do Brasil pelo voto direto.
74
Nesse período, os horrores da Segunda Guerra Mundial reforçaram o caráter
social e trágico de sua obra, levando-o à produção das séries Retirantes (figura 20
da página 65) e Meninos de Brodósqui (figuras 33, 34, e 35), que mostram a
pobreza e o sofrimento marcantes entre 1944 e 1946. A partir desta data passou a
abordar também temas de sua infância no interior paulista.
Figura 33 - Candido Portinari.
Menino de Brodósqui, 1946 (A).
Desenho a óleo e pastel s/papel.
96 x 56 cm (aproximadas).
Brodósqui, SP. Coleção particular,
Rio de Janeiro, RJ.
Fonte: http://www.portinari.org.br/
Figura 34 - Candido Portinari.
Menino de Brodósqui, 1946 (B).
Desenho a óleo s/ papel.
Dimensões desconhecidas.
Brodósqui, SP. Coleção
desconhecida. Obra não localizada.
Fonte: http://www.portinari.org.br/
Figura 35 - Candido Portinari.
Menino de Brodósqui, 1946 (C).
Desenho a óleo s/papel.
93.5 x 52 cm (aproximadas).
Brodósqui, SP.
Sotheby's, New York, NY.
Fonte: http://www.portinari.org.br/
Na época, o artista aceitou a inclusão de seu nome ao Partido Comunista
Brasileiro (PCB), e candidatou-se a deputado federal. Resolveu filiar-se porque
considerava que esse partido de esquerda era a única grande muralha contra o
fascismo
51
, e que poderia haver uma mudança na qual o ser humano conseguisse
uma vida mais digna. No entanto, para ele, a arma mais eficaz para essa conquista
seria a pintura (PORTINARI, 1945
).
No dia 3 de março de 1953, ao ser entrevistado por seu amigo, o poeta
Vinicius de Morais, na Revista Manchete do Rio de Janeiro:
Não pretendo entender de política. Minhas convicções, que são
fundas, cheguei a elas por força da minha infância pobre, de minha
vida de trabalho e luta, e porque sou um artista. Tenho pena dos que
sofrem, e gostaria de ajudar a remediar a injustiça social existente.
51
Fascismo deriva de fascio, nome de grupos políticos ou de militância que surgiram na Itália entre fins do século
XIX e começo do século XX; mas também de fasces, que nos tempos do Império Romano era um símbolo dos
magistrados: um machado cujo cabo era rodeado de varas, simbolizando o poder do Estado e a unidade do
povo.
75
Qualquer artista consciente sente o mesmo (1953 apud FABRIS,
1996, p. 150).
Como é possível notar, o artista afirmou o estar, na verdade, habilitado
para as atividades políticas. Seu campo de atuação era a pintura e não a política.
Fazia seu discurso político com eficácia, sem a ideologia pessoal de atuação
partidária. Apesar de todas essas qualidades e participação política, em 1948
começou a se afastar aos poucos de qualquer atividade militante.
Conforme Annateresa Fabris, em seu livro Portinari, Pintor social (1990), a
ideologia presente nas obras de Portinari deve ser entendida mais como
posicionamento na esfera de uma esquerda afetiva, enraizada na história pessoal do
filho de camponeses de Brodósqui, do que como opção intelectual. O artista servia
ao Partido Comunista como figura simbólica, para mostrar a possibilidade de uma
arte realista, de mensagem social. Suas respostas em relação ao partido eram
apaixonadas, não apenas a adesão a esse ou aquele modelo analítico, mas um ato
contínuo de revisão do que significou o modernismo no Brasil, para o qual sua
presença continuou a ser determinante, não importando se positiva ou
negativamente.
Portinari manteve a sua tendência social, isento das investidas que os
governantes do período do Estado Novo fizeram no sentido de utilizar as suas obras
como propaganda oficial, contudo, mesmo que ela tenha ocorrido, não houve a
complacência do artista. Sua obra não mostra um mundo novo e apenas imaginário,
mas a recriação intensificada e surpreendente do mundo que o artista conhecia
bem, o de sua terra natal, sua temática e suas experiências da vida longe dos
centros urbanos.
Dizer, no entanto, que tenha havido uma estética oficial nas obras de
Portinari, seria exagero, compreendendo por esta estética, como sendo um estilo
adotado e determinado pelo governo de Getulio Vargas, talvez uma tática adotada
durante o movimento modernista, quando o governo apoiava Portinari demonstrando
sua proteção generosa.
Apesar disso, para Fabris (1990), ele não foi um artista oficial, o que não
significa que o seu estilo não pudesse também ser assimilado pela ideologia do
Governo. No que se refere ao aspecto temático, embora a orientação de Portinari
76
não correspondesse a um patriotismo evidente e épico, como porventura fosse o
desejo do governo, não quer dizer que isso não pudesse ser recuperado.
Após 1947, Portinari começou uma nova fase de mudanças em sua arte, a
dramaticidade expressiva e a preocupação social por um peodo não foram
trabalhadas. Os novos temas eram, principalmente, históricos, como exemplo, em
1948 foi chamado a decorar uma das paredes interiores do Banco Boavista no Rio
de Janeiro, um projeto de Oscar Niemeyer e encomendado pelo presidente do
banco, Thomaz Saavedra. O artista pintou A primeira Missa no Brasil (figura 36)
recorrendo a um suporte, já que o trabalho foi realizado em Montevidéu.
Sua composição nada tem haver com a realidade histórica. O tema é tratado
em termos mais abstratos, com alguns fragmentos de caráter cubistas. O artista
desviou-se da realidade histórica, ou seja, não obedeceu a descrição original. A obra
foi executada em três meses de trabalho, sendo uma criação que marcou uma nova
época na pintura mural de Portinari, abandonando as tonalidades cinza de sua fase
anterior, conforme ilustração abaixo:
Figura 36 – Candido Portinari.
A Primeira Missa no Brasil.
1948.
Painel a têmpera s/tela.
265 x 500 cm.
Montevidéu, Uruguai.
Coleção particular, Rio de
Janeiro, RJ.
Fonte:
http://www.portinari.org.br/
Mario Pedrosa
52
, crítico de arte e militante político, escreveu sobre a Primeira
Missa:
A primeira missa nos mostra um Portinari em pleno domínio de seus
recursos [...] O mestre brasileiro não carece de truques para impor-se
ou ser compreendido. Ele está agora diante do caminho que ainda
tem de percorrer, sozinho. E deve mesmo caminhar sozinho. A
52
Mario Pedrosa, crítico de arte e militante político Mário Xavier de Andrade Pedrosa (1901-1981) foi militante
político e crítico de arte, iniciador da crítica de arte moderna brasileira e das atividades da Oposição de Esquerda
Internacional no Brasil, organização liderada por Leon Trótski. Em suas atividades como crítico de arte, destaca-
se como diretor do Museu de Arte Moderna de São Paulo, colaborando na criação do Museu de Arte do Rio de
Janeiro, com papel destacado no surgimento do movimento concretista nesta cidade. Foi curador da segunda
Bienal Internacional de Arte de São Paulo (1953) e secretário-geral da IV Bienal Internacional de Arte de São
Paulo, 1957.
77
solução que acaba de dar a um gênero histórico como o da missa é a
prova de seu poder criador. Resolutamente, ele suprimiu uma série
de problemas falsos, como o da luz natural, da realidade histórica,
etc. foi mais longe, e suprimiu a natureza do tema que devia transpor
para a tela. Era o seu direito. E apresentou a sua solução de modo
magistral. (PEDROSA, 1981, p. 33)
Segundo Mario Pedrosa (1981) ninguém ignora a influência que Picasso
exerceu sobre Portinari e que exerce em vários artistas modernos americanos e
europeus, mas com o painel a Primeira Missa no Brasil o artista demonstra que não
pertence à família picassiana, que ele tem a sua própria personalidade de artista.
O enorme painel de Tiradentes (figura 37), decoração feita à têmpera sobre
tela para o colégio de Cataguases, em uma pequena cidade de Minas Gerais,
Portinari deu ao mural uma estrutura organizada, utilizando-se dos elementos
geométricos, harmonia das formas, de cores e de luzes, narrando episódios do
julgamento e execução de Tiradentes
53
, que lutou contra o domínio colonial
português. O painel encontra-se, desde 1989, no Memorial da América Latina, em
São Paulo:
Figura 37 – Candido Portinari.
Tiradentes, 1948-1949.
Painel a têmpera s/tela, 3,15 x 18 cm.
Rio de Janeiro, RJ.
Fundação Memorial da América Latina, São Paulo-SP.
Fonte: http://www.portinari.org.br/
Em uma mesma abordagem temática de aspectos historiográficos, o painel da
chegada da família real portuguesa à Bahia, (figura 38), foi uma encomenda do
diretor do Banco do Brasil da Bahia, obra que mostra a vinda do monarca luso à
terra brasileira. A tela apresenta um jogo entre a realidade e abstração. Os vários
grupos de figuras articulam-se geometricamente, criando uma composição clara e
sólida. Sendo uma das melhores decorações do artista no que diz respeito à riqueza
do cromatismo:
53
Joaquim José da Silva Xavier, o Tiradentes, (1746-1792) dentista, tropeiro, minerador, comerciante, militar e
ativista político luso-brasileiro. No Brasil, é reconhecido como mártir da Inconfidência Mineira, patrono cívico e
herói nacional, que lutou contra o domínio colonial português. O movimento da Inconfidência Mineira, liderado
por Tiradentes, pretendia transformar o Brasil numa República independente de Portugal.
78
Figura 38 – Candido Portinari.
A Chegada de Dom João VI à Bahia.
1952.
Painel a óleo s/tela. 381 x 580 cm.
Rio de Janeiro, RJ.
Banco BBM, Salvador, BA.
Fonte: http://www.portinari.org.br/
Iniciam-se, na mesma época, os estudos para os painéis Guerra e Paz,
oferecidos pelo governo brasileiro à nova sede da Organização das Nações Unidas
(ONU), foram os maiores painéis pintados por Portinari, concluídos em 1956.
Atualmente, encontram-se no saguão de entrada dos delgados de edifício-sede da
Organização das Nações Unidas (ONU), em Nova York. Para a elaboração dessa
obra o artista realizou estudos detalhados produzindo muitos desenhos e pinturas a
óleo.
Ao elaborar o painel com o tema, A Guerra (figura 39), Portinari optou pelo
tema intemporal dos Quatro Cavaleiros do Apocalipse
54
representando o sofrimento
do povo e não de soldado em combate, parecendo-lhe uma melhor solução do que
pintar a guerra com um caráter realista. As cores empregadas foram os tons de
azuis e laranjas. Os sofrimentos estão estampados nos rostos e nos corpos dos
homens, mulheres e crianças, bem como o pranto, as desgraças e o medo estão
representadas nas figuras em todo o grande painel.
54
Os Quatro Cavaleiros do Apocalipse são as forças de “Revelação” divinas descritas na Bíblia no capítulo seis
do Livro do Apocalipse. Os quatro cavaleiros são tradicionalmente chamados através dos Símbolos que eles
representam: Violência, Guerra, Fome e Morte.
79
Figura 39 - Candido Portinari.
Guerra, 1952-1956.
Painel a óleo s/madeira compensada.
1400 x 1058 cm.
Fonte: http://www.portinari.org.br/
Para a produção de Paz (figura 40), teve como matéria-prima, suas
lembranças de infância. Foram os meninos de Brodósqui, às vezes nas gangorras,
como aparecem em várias de suas telas, outras em cambalhotas e piruetas, pulando
carniça ou armando arapuca, moças dançando e cantando, um coral de crianças de
várias raças, como os brasileiros, uma noiva da roça na garupa de um cavalo
branco, um palhaço, uma mulher carregando o cordeiro, dois cabritos dançando no
centro do painel como se fossem o núcleo da Paz, na faixa de cima uma égua e um
potro e camponeses plantando e colhendo, um espantalho, batedores de arroz e
abaixo desta faixa pode-se visualizar homens, mulheres e meninos cantando.
80
Figura 40 - Candido Portinari.
Paz, 1952-1956.
Painel a óleo s/madeira compensada.
1400 x 953 cm.
Rio de Janeiro, RJ.
Fonte: http://www.portinari.org.br/
Em 1953, Portinari recebeu uma encomenda para pintar alguns painéis e uma
Via Sacra para a matriz do Senhor Bom Jesus da Cana Verde, na cidade de
Batatais, São Paulo. A principal pintura, num conjunto de 28 trabalhos, é a do altar-
mor, o políptico, Cristo entre os Apóstolos. Os rostos e os corpos o realistas,
conforme lhe foi pedido, mas o tratamento da pintura é abstrato, nas chapadas
geométricas das vestes e do chão. As principais pinturas da igreja: A Fuga para o
Egito, o Batismo de Jesus, A sagrada Família, Transfiguração e Via Sacra,
compostas por quatorze quadros, (figuras 41 e 42).
A decoração da igreja de
Batatais foi inaugurada em março, o povo da região não deixou de assistir ao
evento. Aos críticos que o acusaram de contradizer-se com sua pintura sacra,
Portinari respondeu à Folha da Manhã de São Paulo. “Pinto a dor, a alegria, o
trabalho, a miséria, o meu povo, enfim. Eu não poderia, sem fugir à realidade, deixar
de fazer quadros de fundo religioso” (PORTINARI, 1953, p. 6).
81
Figura 41 - Candido Portinari.
Simão Cireneu Ajuda Jesus a Levar a Cruz,
Passo V da Via Sacra. 1953.
Pintura a óleo s/tela, 61 x 50 cm.
Brodósqui, SP.
Fonte: http://www.portinari.org.br/
Figura 42 - Candido Portinari.
Jesus Morre na Cruz, Passo XII da Via Sacra.
1953.
Pintura a óleo s/ tela, 61 x 50 cm.
Brodósqui, SP:
Fonte: http://www.portinari.org.br/
Entre 1954 e 1955, o painel Descido dos Pioneiros foi feito por encomenda do
Banco Português, passando a pertencer ao Banco Central do Brasil desde 1976. A
decoração assinala a posse da terra pelos primeiros colonizadores portugueses
chegados à terra de Santa Cruz. Como era de costume, o pintor não se ateve à
realidade do fato. Na verdade, a figuração está toda ligada à história e vida dos
brasileiros. Ele utilizou a técnica do óleo e da têmpera.
Em todos os trabalhos, as figuras aparecem em fundos abstratos, constituindo
verdadeiros cenários bidimensionais, provindos do Cubismo, com cores e formas
coerentes. Os painéis representam cenas de diversas temáticas, épocas e regiões
do país: Descobrimento do Brasil (figura 43), Anchieta, Os Bandeirantes, Os
Garimpeiros, Seringueiros, Gaúchos, Jangada, Vaqueiros do Nordeste, Frevo (figura
44), Bumba-Meu–Boi, Baianas e Samba.
82
Figura 43 - Candido Portinari.
Descobrimento do Brasil, 1954-1955.
Painel a óleo e têmpera s/tela, 492 x 393 cm.
Banco Central do Brasil, Brasília, D.F.
Fonte: http://www.portinari.org.br/
Figura 44 - Candido Portinari.
Frevo, 1956.
Painel a óleo s/tela, 198 x 168 cm.
Rio de Janeiro, RJ.
Fonte: http://www.portinari.org.br/
Também nesta época, a Galeria Barão, em São Paulo, encomendou um
painel abstrato, sendo sua única decoração inteiramente não representativa, exceto
os quatro elementos pintados para o palácio Gustavo Capanema.
No ano de 1956, Portinari viajou para Israel a convite da Associação dos
Museus e do Centro Cultural Brasil-Israel. Naquele país, ele desenhou paisagens e
pessoas das regiões por onde percorreu. Seus desenhos expressionistas retratam
bem a emoção do artista, revivendo cenários dos tempos antigos, mostrando
interesse pela solução de problemas sociais.
Em 1959 o Banco Central de Boston de São Paulo encomendou cinco
painéis, com a temática ligada à vida social do estado: Fundação de São Paulo
(figura 45), Bandeirante (figura 46), Colheita de Café, Transporte de Café e
Industrialização do Brasil, sendo este o último conjunto de decorações feito pelo
artista sob encomenda de um banco. O fundo das pinturas é todo geometrizado, do
mesmo modo que as figuras, com cores chapadas, linhas horizontais e verticais
cortando a composição, enfim, foram decorações mais elaboradas, de natureza
construtiva, típicas da fase final de sua pintura.
83
Figura 45 - Candido Portinari.
Fundação de São Paulo, 1960.
Painel a óleo s/madeira.
239 x 411 cm (aproximadas).
BankBoston, Rio de Janeiro, RJ.
Fonte: http://www.portinari.org.br/
Figura 46 - Candido Portinari.
Bandeirantes, 1960.
Painel a óleo s/madeira.
239 x 413,5cm (aproximadas).
Bank Boston, Rio de Janeiro, RJ.
Fonte: http://www.portinari.org.br/
Nesta fase, o artista começou a fazer experiências com a abstração geométrica,
deixando-se seduzir pela cor, influenciado pelo cubismo do frans Jacques Villon
55
,
pintor que admirado por ele há algum tempo. Portinari, ao seu novo estilo,
reinterpreta na nova linguagem um conjunto de temas já conhecidos, como cenas de
trabalho da Colheita de Café (figura 47) e Meninos Soltando Pipas (figura 48).
Figura 47- Candido Portinari.
Colheita de Café, 1958.
Pintura a óleo s/madeira, 60 x 73 cm.
Brodósqui, SP.
Coleção particular, São Paulo, SP.
Fonte: http://www.portinari.org.br
Figura 48 - Candido Portinari.
Meninos Soltando Pipas, 1959.
Pintura a óleo s/madeira.
156 x 105 cm.
Coleção particular, Rio de
Janeiro, RJ.
Fonte: http://www.portinari.org.br
55
Jaques Villon (1875/1963) - pintor cubista, cuja importância de sua obra está na demonstração de uma lógica
existente entre as diversas escolas de pintura daquele momento, deve muito ao Neo-Impressionismo, pela
preocupação matemática, e ao cubismo, pelo uso de formas geométricas puras.
84
Embora o pintor, utilizando-se ainda da deformação expressiva, sobrepõe planos
geométricos coloridos a um desenho realista, se preocupa com a estruturação
geométrica do espaço e as figuras transformam-se num prisma colorido que se
cruzam entre si. Na verdade, o artista consegue a abstração através do próprio
processo pictórico de elementos formais como linhas e cores, o deixando
completamente de lado a relação com a realidade e renunciar aos todos e
técnicas realistas. Para definir o estilo de Portinari, Fabris argumenta:
Definir estilisticamente Portinari não é tarefa fácil, [...] pois o artista,
experimentador nato, atraído por todas as novidades e todas as
descobertas, passa abruptamente de uma expressão a outra e, não
raro, faz coincidir no mesmo período várias expressões. Sua obra,
entretanto, apresenta uma unidade subjacente - uma marcada
tendência expressionista [...]. Num primeiro momento ele funde o
classicismo a alguns elementos expressionistas, e depois o
expressionismo se mostra numa trágica e corrosiva deformação.
(FABRIS, 1990, pp. 69-70).
Visto que é na pintura que o pintor encontra sua expressão mais verdadeira e
influência estilística, seja ela qual for, Expressionista, Cubista, ou figuração semi-
abstrata, é para ele um modo de falar do homem e da terra. O tema trabalhador, a
retratação do povo brasileiro ocupa uma parte importante da obra de Portinari,
permanecendo como sua marca maior. Desta forma, homenageou toda a
diversidade figurativa brasileira através de suas obras em função dos seus
propósitos sociais. Não fez discriminações a respeito das camadas sociais ou às
diversas misturas étnicas que formam o povo brasileiro. Retratou brancos, negros e
índios, em razão de sua arte engajada com o social e o humano.
2.2 A Temática Social de Candido Portinari: O Trabalhador
A dignidade que Portinari confere ao homem laborioso e o destaque que deu
ao personagem popular em todos os temas que abordou, não podiam ser negados
por um governo ou por um sistema democrático, para quem a questão social,
mesmo que dentro de uma ótica conservadora, constituía uma das bases de sua
política, o trabalhador. Mas, se a pintura de Portinari pode ser recuperada ou até
85
ressignificada no presente, foi principalmente porque a sua concepção formal era
conciliável com a estratificação simbólica e ideológica desta classe social.
Conforme a crítica de Arte Ana Maria de Moraes Belluzzo
56
, em seu livro
Modernidade e Vanguardas Artísticas (1943), o movimento modernista não estava
mais direcionado para problemática estética na década de 30 do século passado,
mas pela tentativa de definir o caráter de uma Arte Moderna no Brasil. Sobretudo em
busca de respostas a uma rie de indagações colocadas pelo contexto político e
social do momento. Nos anos 20 se buscava uma definição de uma identidade
artística, na década seguinte o que importava era a identidade social, levando os
artistas a buscarem uma linguagem mais simples, mais acessível ao público.
Assim, foi conferido nessa época um novo significado à poética do
Expressionismo proposta por Anita Malfatti na exposição de 1917. Este Movimento
converteu-se em poética do ser social, o recurso da deformação tornou-se uma
maneira de criticar a realidade, engajado na tentativa de propor soluções para os
problemas, acabando por convergir com a revitalização do realismo crítico doculo
XIX, gerando um intenso debate sobre a função da arte na sociedade
contemporânea.
O ano de 1933 foi decisivo para a definição sobre a função da arte, Di
Cavalcanti
57
(1897-1976) defendeu o Realismo Social, que se procurava em criar
uma arte política que fosse simultaneamente moderna e acessível às pessoas
comuns e uma arte a serviço da coletividade. Nesse contexto estão os murais em
afrescos pintados por Portinari para o Ministério da Educação e Cultura, no Rio de
Janeiro, iniciados em 1936. Trata-se de um marco da arquitetura contemporânea no
qual se verifica uma grande aproximação com a arte muralista mexicana.
Segundo Ana Maria Belluzzo (1943), a arte de Portinari era mais social do
que política, pois se tornou veículo de uma mensagem com preocupação plástica
bem definida e que, mesmo partindo de uma realidade imediata, não a refletiu nos
termos de uma leitura ideológica tão absoluta e direta, mas, sobretudo, uma arte
engajada com o social e humano. No caso de Portinari utiliza-se a expressão “social”
querendo com isso designar uma arte que reafirma a relação homem/trabalho.
56
Ana Maria de Moraes Belluzzo, pesquisadora e crítica de arte, professora de História da Arte na Faculdade de
Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo (USP). Foi curadora das exposições “A Modernidade”
(Tradição e Ruptura, 1985) e “Waldemar Cordeiro” (1986).
57
Emiliano Augusto Cavalcanti de Albuquerque e Melo, (1897-1976 mais conhecido como Di Cavalcanti foi um
pintor, ilustrador e caricaturista brasileiro. Além de quadros e ilustrações para revistas, fez desenhos para jóias,
tapetes e painéis.
86
Para a historiadora Aracy Amaral
58
:
Sempre haverá, por outro lado, artistas que dirão que toda arte é
automaticamente social, posto que emana do homem e, assim,
indiretamente, reflete seu contexto. Nunca faltarão os que digam que
fazem uma arte “autônoma”, sem preocupação social aparente, mas
que pensam revolucionariamente, e desejam uma alteração da
estrutura da sociedade em que vivem e firmam manifestos e
consideram suficientes suas participações divididas. (AMARAL,
2003, p. 05)
Deste modo, pode-se perceber que todo artista deveria se preocupar com a
popularização de suas obras, considerando o contexto histórico e social em que foi
criada, refletindo sobre a temática e o conceito da arte como forma de expressão
ideológica e de análise da sociedade. Percebe-se que os trabalhos de Portinari são
considerados um conjunto em sua concepção artística, e representam um marco
importante na evolução de sua arte, afirmando a opção pela temática social.
O artista em 1934 retratava os trabalhadores rurais na lida com o café
(figuras 49, 50 e 51), com uma tendência voltada ao Expressionismo, com pés e
mão grandes.
Figura 49 - Candido Portinari.
Colheita de Café, 1933.
Desenho a aquarela s/papel.
27 x 34 cm (aproximadas).
Rio de Janeiro/RJ.
Fonte: http://www.portinari.org.br
Figura 50 - Candido Portinari.
Café, 1934.
Pintura a óleo s/tela.
43 x 49 cm.
Rio de Janeiro/RJ.
Coleção particular, São Paulo/SP
Fonte: http://www.portinari.org.br
Figura 51 - Candido Portinari.
Colonos Carregando Café, 1935.
Pintura a óleo s/tela.
67 x 83 cm. Rio de Janeiro/RJ.
Coleção particular, São Paulo/SP.
Fonte: http://www.portinari.org.br
Se considerarmos a expressão artística de Portinari, as contradições da
sociedade se tornam bastante evidentes e o debate sobre a condição do homem,
como ser social, inevitável. Neste sentido, o pintor pode servir de referencial para a
58
Aracy A. Amaral, historiadora e crítica de arte, professora de História da Arte na Faculdade de Arquitetura e
Urbanismo da Universidade de São Paulo (USP), diretora da Pinacoteca do Estado de São Paulo (1975/1979) e
do Museu de Arte Contemporânea da USP (1982/86).
87
reflexão que segue, visto que ele mesmo dá as chaves para acessar a complexidade
do tema, ao dizer que:
[...] a condição de um artista é ser um homem sensível. Não é
possível que as emoções mais altas do mundo não toquem um
homem normal. A injustiça humana, a miséria, as crianças famintas
são um grito tão grande que não pode deixar de ser ouvido (1963,
apud FABRIS, 1990, p. 57).
A sensibilidade do artista pode ser reproduzida nas formas que ele observa o
seu meio sentimental e procura estabelecer um canal de ação entre aquilo que viveu
e o contexto no qual se vive. É perceptível que as figuras criadas pelo artista
possuem um ar de dignidade, essa era a sua maneira de enaltecer o trabalhador
conferindo-lhe o valor que muitas vezes não lhe era dado.
O objetivo maior de toda sua pintura era algo mais envolvente do que um
relatório cnico sobre a situação do negro ou do trabalhador. Desta maneira,
observa-se que as obras de Portinari possuíam um contexto que denunciava as
injustiças sofridas pela população, e por este motivo, retratava preferencialmente o
negro e o trabalhador, sempre os representando anonimamente.
Deste modo, foi reconhecido como um pintor que contrariava o populismo do
Governo de Getúlio Vargas, de uma maneira muito sutil. O regime do Estado Novo
era de fato antidemocrático, Portinari foi convidado a realizar os trabalhos para o
Ministério da Educação e Cultura em razão de sua habilidade profissional e não de
sua posição política.
Destaca-se que os Ciclos Econômicos representados no Ministério da
Educação e Cultura não representavam uma obra do getulismo, pois difere em
termos ideológicos e estéticos, que apresentavam a liberdade do artista frente a
um governo fundamentado e reconhecido como ditatorial. Deste modo, Portinari
impôs uma visão própria e histórica da economia brasileira. Este histórico reconduz
o pintor ao contemporâneo, dando vida a uma idéia do trabalho, não se dispondo a
nenhum modelo oficial apresentado pelo governo.
Pode-se perceber que as obras de Portinari diferem com a idéia do
populismo, denunciando a falsa equidade presente no pacto populista, que os
discursos de Getulio Vargas sempre se declinavam a defender que todas as
categorias sociais são consideradas igualmente trabalhadoras.
88
Antonio Bento, crítico de arte, declarou no jornal A Tarde, do Rio de Janeiro,
em 02 de abril de 1938:
Faltava ao Brasil uma pintura mural de caráter e de assunto
nacionais, ligados aos temas históricos da nossa formação étnica ou
da vida econômica e social do país. Essa obra está sendo
atualmente realizada por Candido Portinari, para o novo edifício do
Ministério da Educação
(1938 apud BENTO, 1980, p. 186).
Em 1935, Portinari ganhou a premiação na exposição em Pittsburg, com a
tela Café, e teve sua carreira projetada no meio artístico e intelectual, alcançando
renome internacional e impulsionando a imagem do Brasil para o mundo. Com isso,
em 1936, o ministro Gustavo Capanema
59
encomendou-lhe uma série de afrescos
para decorar o edifício da nova sede do Ministério da Educação e Cultura, tendo
como tema os ciclos econômicos. O pintor estudou cada ciclo, sendo assessorado
por Rodolfo Garcia e Afonso Arinos de Mello Franco (1905-1990).
No início do projeto os desenhos eram realistas, mas no momento que
passou a pintá-los fez algumas alterações nos murais, como ficaram evidentes as
deformações expressionistas nas figuras e algumas abstrações nos cenários.
Antonio Bento escreveu sobre o desenvolvimento da criação artística:
[...] antes de pintar, o artista desenha. E é no desenho, ainda quando
criança na maior parte das vezes, ainda sem estudo e prática, ainda
sem técnica e conhecimento, que o artista revela, no gesto simples
de um rabisco, a sua personalidade e o seu talento. Depois se cria o
pintor, que usa telas e tintas, mas a alma verdadeira do artista nasce
com os primeiros rabiscos de um lápis sobre o papel [...] com o
passar do tempo e evolução do talento, o desenho torna-se
secundário. (BENTO, 1980, p. 183).
No caso de Portinari, Bento afirma que não foi assim, o desenho nunca se
tornou secundário. Ao contrário, o ato de desenhar acompanhou o artista por toda a
vida. Na época que ficou impedido de usar tintas por questões de saúde, foi o
desenho, o risco simples sobre o papel que o ajudou a continuar o seu trabalho
artístico.
Para a realização do trabalho em afresco, Portinari traçou durante longos
meses, vários desenhos, usando modelos vivos, realizando muitos estudos a carvão,
como se observa nas figuras de 52 a 58.
59
Gustavo Capanema Filho (1900-1985) foi importante político brasileiro, sendo o Ministro que mais tempo ficou
no cargo em toda a história do Brasil.
89
Figura 52 – Candido Portinari.
Mãos. 1937.
Desenho a carvão s/papel. 49 x 32 cm.
Coleção particular.
Obs.: estudo para uma das pinturas murais
dos Ciclos Econômicos.
Palácio Gustavo Capanema, Rio de Janeiro/RJ.
Fonte: http://www.portinari.org.br
Figura 53 – Candido Portinari.
Pés. 1938.
Desenho a carvão s/papel Kraft.
115 x 128 cm (aproximadas).
Coleção particular.
Rio de Janeiro, RJ.
Obs.: fragmento do desenho p/transporte
“Cana”.
Fonte: http://www.portinari.org.br
A ligação do homem brasileiro com a terra, a exaltação do braço escravo, é
bem nítida em todas as obras ligadas ao trabalho. Para Portinari, o verdadeiro
agente do desenvolvimento brasileiro está ligado à imagem do negro. Os murais do
Ministério da Educação e Cultura foram mais uma oportunidade que o artista teve
para dar vida aos personagens de corpos escultóricos, de mãos e pés valorizados.
Figura 54 - Candido Portinari.
Trabalhador de Frente.
16/11/1937.
Desenho a carvão s/papel.
71 x 49 cm (aproximadas).
Coleção particular, Rio de
Janeiro, RJ.
Obs.: Estudo p/ pintura mural
“Fumo”.
Fonte: http://www.portinari.org.br
Figura 55 – Candido Portinari.
Homem com Saca.
11/02/1938.
Desenho a carvão s/papel.
60.5 x 49 cm (aproximadas).
Coleção particular, São Paulo, SP.
Rio de Janeiro, RJ.
Obs.: Estudo p/pintura mural “Algodão”.
Fonte: http://www.portinari.org.br
Figura 56 – Candido Portinari.
Homem Garimpando.
30/11/1937.
Desenho a carvão e sépia
s/papel.
58 x 44 cm (aproximadas).
Coleção particular, Rio de
Janeiro, RJ.
Obs.: Estudo p/pintura mural
“Garimpo”.
Fonte:
http://www.portinari.org.br
90
Figura 57- Candido Portinari.
Colona, 1938.
Desenho a carvão s/ papel Kraft.
135.5 x 178,5 cm (aproximadas).
Coleção particular, Rio de Janeiro, RJ.
Obs.: fragmento do desenho para transporte “Café”.
Fonte: http://www.portinari.org.br
Figura 58 – Candido Portinari.
Homem Sentado, 1938.
Desenho a carvão s/ papel Kraft.
142 x 110 cm.
Coleção particular, Rio de Janeiro, RJ.
Obs.: Fragmento do desenho para transporte
“Cacau”.
Fonte: http://www.portinari.org.br
O artista realizou também vários estudos sobre a temática, utilizando a
têmpera, guache, pastel e aquarela com alterações nas cores e nas formas. É
possível observar que foram eliminados diversos elementos nas composições e se
forem comparados aos projetos iniciais e às pinturas mostradas a seguir (figuras de
59 a 62).
Figura 59 – Candido Portinari.
Cana, 1937.
Pintura a guache s/ cartão pardo, 42,5 x 30.5cm.
Rio de Janeiro, RJ.
Obs.: estudo para a pintura mural “Cana”.
Coleção particular, São Paulo, SP.
Fonte:
http://www.portinari.org.br
Figura 60 – Candido Portinari.
Cana – 1938.
Pintura a guache e grafite s/papel, 70 x 50 cm.
Rio de Janeiro, RJ.
Banco Bradesco, Osasco, SP.
Obs.: Maquete para a pintura
mural “Cana”.
Fonte:
http://www.portinari.org.br
91
Figura 61 – Candido Portinari.
Colheita de Algodão, 1937.
Pintura a guache e grafite s/ papel Kraft
37,5 x 26,5cm.
Rio de Janeiro, RJ.
Maquete para a pintura mural “Algodão”.
Coleção particular, São Paulo, SP.
Fonte:
http://www.portinari.org.br
Figura 62 – Candido Portinari.
Faiscadores de Ouro, 1938.
Pintura a aquarela e guache s/papel pardo.
41 x 38.5 cm.
Rio de Janeiro, RJ.
Maquete para a pintura mural “Garimpo”.
Fonte:
http://www.portinari.org.br
Os desenhos feitos para transporte em tamanhos naturais ocuparam o pintor
durante um longo período. Nos painéis aconteceram algumas modificações entre os
estudos e a obra final devido à necessidade da simplificação em sua pintura, em
função da técnica adotada, sendo que o afresco exigia rapidez na sua execução.
Assim, muitos elementos foram eliminados como se pode notar nas imagens desde
o início até a sua finalização (figura 63, 64 e 65).
Figura 63 - Candido Portinari.
Café, 1938.
Desenho a carvão s/papel Kraft.
280 x 297 cm (estimadas).
Rio de Janeiro, RJ.
Desenho para transporte para a
pintura mural “Café”.
Fonte:
http://www.portinari.org.br
92
Percebe-se que Portinari expressa em suas obras a realidade social,
representando as deformidades apresentadas pelos homens com o peso dos sacos
que trazem aos ombros. Os pés das figuras, na sua forma enorme, parecem ligar-se
a terra, como se fizessem parte dela. Fica evidente a intenção de Portinari em
apresentar nas suas obras algumas deformações anatômicas através da reprodução
de pés e mãos desproporcionais.
Figura 64 – Candido Portinari.
Cana, 1938.
Desenho a carvão/papel Kraft.
280 x 247 cm (estimadas).
Rio de Janeiro, RJ.
Fonte: http://www.portinari.org.br
Figura 65 – Candido Portinari.
Algodão, 1938.
Desenho a carvão/papel Kraft.
280 x 300 cm (estimadas).
Rio de Janeiro, RJ.
Fonte: http://www.portinari.org.br
O desafio técnico do conjunto de obras para o Ministério da Educação e
Cultura foi grandioso, para as realizações dos projetos de estudos desses painéis
Portinari recorreu a modelos vivos, como as pessoas da família, alunos e seus
auxiliares. Os murais que compõem os Ciclos Econômicos foram produzidos entre
1936 a 1945, desenvolvendo temas sobre o trabalhador braçal, no qual o artista
apresenta o homem brasileiro como força do trabalho.
Os afrescos começaram a ser pintados em 1939 com o auxílio de alguns
colaboradores como o pintor, desenhista e ilustrador italiano Enrico Bianco
60
, Héris
Guimarães, Diana Barbieri e Roberto Burle Marx. Nestes trabalhos foram
representados os Ciclos Econômicos do Brasil desde a época do descobrimento,
retratados em ordem cronológica. Com isso, pode-se observar que o pintor
60
Enrico Bianco (1918) nasceu em Roma. Embora italiano, veio para o Brasil ainda na adolescência,
desenvolvendo sua arte em meio à efervescência do modernismo brasileiro, ativado a partir do Movimento
Modernista de 1921 no Rio de Janeiro e ganhando consistência a partir da Semana da Arte Moderna de 1922 em
São Paulo.
93
representou primeiro o painel do corte do Pau-Brasil (figura 66), em seguida a
colheita da Cana (figura 67), a criação de Gado (figura 68), a garimpagem do ouro -
Garimpo (figura 69), as lavouras de Fumo (figura 70), Algodão (figura 71), Erva-Mate
(figura 72), Café (figura 73), Cacau (figura 74), fundição de Ferro (figura 75),
extração de Borracha (figura 76) e cera de Carnaúba (figura 77). Visualiza-se que a
obra compõe-se de 12 afrescos, com 2,80 metros de altura, por 2,5 a 3 metros de
largura. A composição é disposta no salão de maneira que uma fica ao lado da outra
(unidas), colocada no alto de três paredes:
Figura 66 - Candido Portinari.
Pau-Brasil, 1938.
Pintura mural a afresco, 280 x 250 cm.
Palácio Gustavo Capanema, Rio de Janeiro, RJ.
Fonte: http://www.portinari.org.br
Figura 67– Candido Portinari.
Cana, 1938.
Pintura mural a afresco, 280 x 247 cm.
Palácio Gustavo Capanema, Rio de Janeiro/RJ.
Fonte: http://www.portinari.org.br
Figura 68 – Candido Portinari.
Gado, 1938.
Pintura mural a afresco. 280 x246 cm.
Palácio Gustavo Capanema, RJ.
Fonte: http://www.portinari.org.br
Figura 69 – Candido Portinari.
Garimpo, 1938.
Pintura mural a afresco. 280 x 298 cm.
Palácio Gustavo Capanema, RJ.
Fonte: http://www.portinari.org.br
94
Figura 70 – Candido Portinari.
Fumo, 1938.
Pintura mural a afresco, 280 x 294 cm.
Rio de Janeiro, RJ.
Palácio Gustavo Capanema, RJ.
Fonte: http://www.portinari.org.br
Figura 71 – Candido Portinari.
Algodão, 1938.
Pintura mural a afresco. 280 x 300 cm.
Rio de Janeiro, RJ.
Palácio Gustavo Capanema, RJ.
Fonte: http://www.portinari.org.br
Figura 72 – Candido Portinari.
Erva-Mate, 1938.
Pintura mural a afresco.
280 x 297 cm.
Rio de Janeiro, RJ.
Palácio Gustavo Capanema, Rio de Janeiro, RJ.
Fonte: http://www.portinari.org.br
Figura 73 – Candido Portinari.
Café, 1938.
Pintura mural a afresco.
280 x 297 cm.
Rio de Janeiro, RJ.
Palácio Gustavo Capanema, Rio de Janeiro, RJ.
Fonte: http://www.portinari.org.br
95
Figura 74 – Candido Portinari.
Cacau, 1938.
Pintura mural a afresco.
280 x 298 cm.
Rio de Janeiro, RJ.
Palácio Gustavo Capanema, Rio de Janeiro, RJ.
Fonte: http://www.portinari.org.br
Figura 75 – Candido Portinari.
Ferro, 1938.
Pintura mural a afresco.
280 x 248 cm.
Rio de Janeiro, RJ.
Palácio Gustavo Capanema, Rio de Janeiro, RJ.
Fonte: http://www.portinari.org.br
Figura 76 – Candido Portinari.
Borracha, 1938.
Pintura mural a afresco.
280 x 248 cm.
Rio de Janeiro, RJ.
Palácio Gustavo Capanema, Rio de Janeiro, RJ.
Fonte: http://www.portinari.org.br
Figura 77 – Candido Portinari.
Carnaúba, 1944.
Pintura mural a afresco.
280 x 248 cm.
Rio de Janeiro, RJ.
Palácio Gustavo Capanema, Rio de Janeiro, RJ.
Fonte: http://www.portinari.org.br
O sentido dado às obras garante o registro da fertilidade da terra e a
abundância dos recursos naturais do Brasil, destacando o trabalhador com pés e
mãos representadas em escala maior, fazendo com que as figuras pareçam
relacionar-se intimamente com a terra, o que ajuda a perceber a posição do artista
que exibe a importância do homem enquanto trabalhador e o trata como
96
protagonista e responsável pelo desenvolvimento do país. Observando seus painéis,
verifica-se que Portinari destaca uma única categoria de personagem, tanto o
proletariado como o camponês.
Os trabalhadores são percebidos na obra do artista com uma tendência
expressionista, ou seja, os personagens são exagerados, em que percebe-se certa
deformação física dos membros que foram recuperadas através de suas
lembranças, além de se fundamentar em elaborar uma simbologia, que o remete a
sua infância, observando em seu texto autobiográfico Retalhos de minha vida de
infância:
[...] Impressionavam-nos os pés dos trabalhadores das fazendas de
café. Pés disformes. Pés que podem contar uma história.
Confundiam-se com as pedras e os espinhos. Pés semelhantes aos
mapas: com montes e vales, vincos como rios. Pés sofridos com
muitos e muitos quilômetros de marcha. Pés que os santos têm.
Sobre a terra, difícil era distingui-los. Os pés e a terra tinham a
mesma moldagem variada. Raros tinham dez dedos, pelo menos dez
unhas. Pés que inspiravam piedade e respeito. Agarrados ao solo,
eram como os alicerces, muitas vezes suportavam apenas um corpo
franzino e doente. Pés cheios de nós que expressavam alguma coisa
de força, terríveis e pacientes (PORTINARI, 1979, pp. 52-53).
Os pés grandes dos trabalhadores fincados a terra, demonstrava figura
poderosa, gigantesca, sendo estes pés o símbolo de ligação entre o homem e o
solo, estes detalhes foram marcantes nas suas recordações de infância.
Pode-se entender a figura do como sendo uma trajetória de vida das
pessoas, representando suas vivências e suas experiências, a vida percebida e
analisada a partir de momentos marcantes. Sendo os pés a parte do corpo que
expressa a forma de percepção que revelam as sagas de sua trajetória. A
simbologia desta representação traz a idéia de um contato quase que direto ao
trabalho, da natureza, da sua condição de vida e nos desmandos de sua realidade.
De modo semelhante, a mão surge como um elemento autônomo, mantendo
a visibilidade da força de vontade presente nas relações de trabalho, contando com
a criatividade destes trabalhadores que lutam diariamente para estabelecer seu
sustento. Para o artista e ilustrador Quirino Campofiorito:
quem diga que os assuntos desenvolvidos por Portinari não são
próprios para o Ministério da Educação e Saúde.[...]. Mas quem disse
que os assuntos desenvolvidos por Portinari não são de efeitos
profundamente cultural? Então quando vemos nossa atenção atraída
97
para o homem que trabalha, para as fontes de riquezas do nosso
país, então não sofremos um impulso educativo? Quando Portinari
escraviza a nossa simpatia pelo homem que colhe a borracha e o
algodão, que planta o café e o fumo, que esgota suas energias na
cata do ouro ou no trabalho fatigante das grandes usinas, o que é
isso senão educação necessária a nós das cidades que gozamos
os benefícios do progresso? Então, não é educar, dizer tão
expressivamente nós da cidade que usamos luvas para que nossas
mãos não gastem ao levar uma vaidosa bengala, que tudo nos é
assim possível porque longe, quando as cidades se acabam e a
natureza domina, seres semelhantes a nós que trabalham de sol
a sol e por isto seus pés são rudes, suas mãos pesadas e seus
corpos tostados? (s.d., apud FABRIS, 1996, pp. 83-84).
Como se observa, ele expressa de forma pertinente as reflexões sobre a
imagem do trabalhador, isto é, do próprio homem, inclusive nos afrescos pintados
para o Ministério da Educação e Cultura. A retratação do indivíduo é, sobretudo,
uma percepção social da importância do trabalho no campo, que se não por opção
ou necessidade tem grande responsabilidade de produzir as principais fontes de
riquezas do país. O que não se pode fazer é ignorar suas capacidades de saberes e
viveres tão pouco reconhecidos nos grandes centros urbanos.
Os pés, as mãos e os corpos são transformados conforme as exigências de
um trabalhador rural, que caminha descalço por muitos quilômetros sob as
intempéries. Suas mãos grandes e calejadas, pela rigidez do cabo da enxada, foram
retratadas pelo artista.
A obra de Portinari delineia uma condição de extrema tensão existente entre o
trabalho e o trabalhador, esmiuçado na cronologia do desenrolar dos Ciclos
Econômicos, apresentando o trabalhador de maneira crítica, fazendo da pose,
geralmente estática, o elemento de negação daquela que poderia ser uma visão
oficial, enquanto força expropriada a uma visão heróica mostrada pela deformação
de mãos e pés.
Percebe-se o intuito do Ciclo Econômico presente na obra, vinculado ao teor
profundamente expressionista, visando alcançar um significado social e étnico
relacionando o homem à sua paisagem. Identifica-se que o ambiente externo se
condensa em traços sintéticos, garantindo o realce dado na figura do trabalhador,
como tendo uma participação efetiva no desenvolvimento econômico brasileiro.
A conjuntura social e étnica incluída nas obras constitui uma unidade
indissolúvel, possibilitando que se elabore uma visão crítica concedendo um papel
heróico, dessa forma, surgindo à deformação apresentada que evidencia o padrão
98
de esforço destes indivíduos e a relação de grande carga e sofrimento aos quais
foram infringidos na exploração de sua mão-de-obra.
A imagem de exaltação do trabalho nas obras de Cândido Portinari confirma
que eles foram vítimas de uma alienação e dependência dos empresários, fruto dos
hábitos enraizados da época da escravidão, retratados pela desproporção das
figuras.
Seu trabalho ideológico e social é muito diversificado, pode-se verificar em
suas produções, paisagens, brincadeiras infantis e como mencionado, trabalhadores
rurais em atividade como Colheita de Feijão (figura 78), Colheita de Arroz (figura 79),
Colheita de Milho (figura 80) e o Canavial (figura 81). É surpreendente a valorização
de detalhes que o artista ao retratar nas suas pinturas o trabalho do homem do
campo mostrando todo o processo das colheitas feitas nas lavouras.
Figura 78 – Candido Portinari.
Colheita de Feijão, 1957.
Painel a óleo s/tela, 139 x 179 cm.
Rio de Janeiro, RJ.
Fonte: http://www.portinari.org.br
Figura 79 - Candido Portinari.
Colheita de Arroz, 1957.
Painel a óleo s/tela, 139 x 179 cm.
Rio de Janeiro, RJ.
Fonte: http://www.portinari.org.br
Figura 80 - Candido Portinari.
Colheita de Milho, 1959.
Pintura a óleo s/tela, 65 x 81 cm.
Rio de Janeiro, RJ.
Coleção particular, São Paulo, SP.
Fonte: http://www.portinari.org.br
Figura 81– Candido Portinari.
Canavial, 1959.
Pintura a óleo s/tela, 64 x 80 cm.
Rio de Janeiro, RJ.
Coleção particular, São Paulo, SP.
Fonte: http://www.portinari.org.br
99
Assim, é possível perceber a realidade do trabalhador rural, apesar do
trabalho excessivo percebe-se a alegria e a humildade das pessoas retratadas pelo
artista. São imagens apresentadas com amor, não pela miséria e o trabalho
incessante, mas sim pela mulher, pelo homem, pela criança, ricos ou pobres,
transmitem sentimentos ao serem representados por Portinari. Ele os pinta com
pleno conhecimento das condições em que vivem em sua terra, retratando a vida
que levam, e pela simplicidade e sabedoria que aprenderam de seus antecessores
que por sua vez as transmitem para seus filhos, mostrando que a vida no campo,
apesar de todas as dificuldades, vale a pena ser vivida.
Mesmo na fase final de sua vida o pintor ainda recorreu ao mesmo tema,
como aparece em destaque no painel Colheita e Transporte de Café, (figuras 82 e
83), pintada para o Banco de Boston de São Paulo, nestas obras uma tendência
direcionada ao estilo cubista, tendo em evidência as formas geométricas feitas de
cruzamento de linhas e de cores.
Figura 82 - Candido Portinari.
Colheita de Café, 1960.
Painel a óleo s/madeira.
239 x 270,5 cm.
Bank Boston, Rio de Janeiro, RJ.
Fonte:
http://www.portinari.org.br
Figura 83 - Candido Portinari.
Transporte de Café, 1960.
Painel a óleo s/madeira.
239 x 226,5 cm.
Bank Boston, Rio de Janeiro, RJ.
Fonte:
http://www.portinari.org.br
Nota-se que não houve decadência da forma criativa nas telas do último
período de suas atividades artísticas, apenas começou a dar mais ênfase aos
recursos formais, nas construções e nas linhas geometrizadas, as figuras passaram
a ser mais abstratizadas.
Para o artista a arte não eraconstituída de formas figurativas, abstratas ou
de deformações, era também vista de forma político-social que se integrava em
função de um contexto realista. Neste período artístico variavam seus traçados,
100
oscilando entre o Realismo, o Expressionismo, o Cubismo e a figuração Semi-
Abstrata.
2.3 A Arte Social
A arte social em uma de suas muitas variações está ligada intimamente com
saberes e expressões de pessoas que vivenciam o dia-a-dia da sociedade. Portanto,
não é difícil perceber que seu cunho crítico é uma das principais características da
forma de comunicação que essa temática produz. A maneira pela qual o artista
aborda certos problemas através de sua arte traduz sem dúvida algo exclusivo de
sua personalidade, reflete seu caráter particular a partir de suas vivências e
experiências. Esses aspectos se reportam a sociedade, a partir de inter-relações
sociais em um determinado contexto social. Nas palavras do Professor Benedito
Nines
61
:
O Artista não somente cristaliza na sua criação uma dada realidade
social, mas responde ativamente às solicitações de seu meio, as
exigências de sua classe, aos problemas morais, sociais e políticos
de sua época. Sua resposta importa num desvendamento ou numa
contestação, numa descoberta ou numa recusa, sem excluir-se a
própria aceitação daquilo que existe, e que, no entanto, recebe, na
obra autenticamente artística, uma expressão reveladora e ampla
dirigida a todas as consciências (NUNES, 2008, p.98).
Refletindo sobre a idéia citada, a arte é um reflexo ideológico do artista que
depende de sua criação e a relação com sua produção. Através dela, ele contesta,
sobretudo, as condições dos problemas sociais e políticos da vida do ser humano
em função do contexto, partindo de uma expressão artística dirigida a
conscientização de uma sociedade.
Nesta perspectiva, as várias contraposições e contestações existentes,
principalmente no início do século XX, passaram a coexistir e influenciar
principalmente nos chamados países emergentes da América Latina, na década de
1920, a preocupação social surgiu de maneira clara e definida nos meios culturais e
artísticos.
61
Benedito Nunes (1929-), professor da Universidade Federal do Pará, é autor de numerosos artigos e ensaios
sobre temas filosóficos e literários.
101
No México, depois da revolução de 1910, a pintura Mural
62
surgiu com o
objetivo de exaltar os valores nacionais e o heroísmo do povo na luta por melhores
condições de vida. A realização desses murais coube a três artistas: Diego Rivera
63
(1886-1957), José Clemente Orozco
64
(1883-1949) e David Alfaro Siqueiros
65
(1896-
1974), que podem ser considerados pioneiros da pintura moderna, alicerçados no
trabalho e em suas raízes rurais. A pintura mural mexicana retratou o homem do
campo, das fábricas, das cidades, do povo, influenciando no Brasil artistas como Di
Cavalcanti e Portinari.
Portanto, neste período do muralismo mexicano, a arte era utilizada para
mobilizar o grande público, o povo, dignificando o trabalho do artista em função de
suas reivindicações.
Não vidas de que foi Siqueiros quem influenciou uma geração de
artistas, sua temática sempre teve um conteúdo social revolucionário, audacioso,
empreendeu novas pesquisas com materiais e técnicas, além de viajar para difundir
a arte mural, tendo realizado trabalhos em vários países da América Latina.
A grande distinção entre a obra muralista de Portinari e a do muralismo
mexicano de Rivera, foi a diversidade da abordagem, embora as posições
ideológicas fossem as mesmas. No primeiro caso havia uma preocupação formal
mais intensa, enquanto que no segundo, mesmo tendo se utilizado das massas
trabalhadoras como estímulo, o enfoque era mais de conotação política.
Fabris escreveu sobre o assunto que “sendo fruto de duas realidades
nacionais diferentes, não poderiam exprimir a mesma atmosfera nacional e
62
Muralismo - movimento artístico de caráter social que surgiu depois da Revolução Mexicana de 1910 como
parte de um programa destinado a socializar a arte. O movimento repudiava a pintura tradicional de cavalete,
assim como qualquer outra obra procedente dos círculos intelectuais. Propunha a produção de obras
monumentais para o povo, retratando a realidade mexicana, as lutas sociais e outros aspectos de sua história.
63
Diego Rivera, de (1886-1957), de origem judaica, foi um dos maiores pintores mexicanos. Ao longo de sua
vida, criou mais de dois mil quadros, cinco mil desenhos e cerca de quatro mil metros quadrados de pintura
mural. Iniciou uma fase de gigantescos murais que contavam a história política e social do México, mostrava a
vida e o trabalho do povo mexicano, seus heróis, a terra, as lutas contra injustiças, as inspirações e aspirações.
Em 1929 casou-se com a pintora mexicana Frida Kahlo.
64
José Clemente Orozco (1883-1949) foi um dos maiores pintores mexicanos e um dos protagonistas do
muralismo mexicano, juntamente com Rivera e Siqueiros.Orozco. Destacou-se principalmente na pintura mural,
mas também se dedicou à pintura de cavalete, à aquarela, ao desenho e à caricatura, que fazia mais como
forma de sustento do que como arte. A temática central da sua obra é a revolução, a luta do povo para atingir os
seus ideais e uma nova sociedade.
65
David Alfaro Siqueiros (1896-1974) pintor mexicano e um dos protagonistas do muralismo mexicano,
juntamente com Rivera e Orozco. Siqueiros fez pintura de cavalete, mas distinguiu-se principalmente pela pintura
mural, onde foi um inovador em termos técnicos. A grande temática da sua obra é a Revolução Mexicana e o
povo mexicano, que ele representou como o protagonista da luta por uma sociedade melhor, a sociedade
socialista utópica. A sua pintura é uma pintura de intervenção política, de crítica da sociedade capitalista e de
defesa dos ideais comunistas, que em Siqueiros assumem uma dimensão monumental pela força e franqueza
das suas convicções.
102
intelectual” (1990, p. 50). O muralismo no xico colocou-se a serviço da
propagação dos novos ideais, acessíveis a massa, tendendo a uma arte épica e
trágica, conforme a ilustração da figura 84.
Enquanto Portinari evidenciou as raízes nacionais de caráter estético e social,
expressando-se numa linguagem serena e lírica, equilibrada por um sentimento
plástico, concentrando-se nos efeitos pictóricos e aspectos humanos (figura 85). O
que parece ter havido em certos momentos é muito mais que uma semelhança de
concepção vinda de uma mesma ideologia política.
Figura 84 - Diego Rivera.
O Arsenal - Frida Kahlo Distribui Armas.
1928.
Pintura mural.
Fonte:
http://i133.photobucket.com/albums/q77/jacint
ogomes/rivera25.jpg
Figura 85 - Candido Portinari.
Jogos Infantis, 1944.
Pintura mural a têmpera 477 x 1295 cm.
Palácio Gustavo Capanema, Rio de Janeiro, RJ.
Fonte: http://www.portinari.org.br
Deste modo, a produção do artista brasileiro foi muitas vezes comparada à
produção dos muralistas mexicanos não quanto ao suporte, mas também pela
temática, o interesse pela questão social e a monumentalidade. No mural produzido
por Rivera O Arsenal, produzido em 1928, percebe-se, no centro, Frida cercada de
armas demonstrando sua preocupação em relação à situação política vivida no país
naquele período. Portinari transferiu para os seus murais, Jogos Infantis de 1944,
outra perspectiva mais clara e leve ao se tratar de brincadeiras de crianças com
cores vivas que representavam a harmonia e o distanciamento dos conflitos que
ocorriam na Segunda Guerra Mundial.
Sendo o muralismo visto como uma tendência de uma época, evidenciando
uma ideologia política. As composições de Portinari mostram um caráter humano de
cunho social e não somente político, enfatizando através da deformação expressiva,
a força do trabalhador brasileiro e sua ligação com a terra. Enquanto os murais
mexicanos tinham caráter social e também político, estando mais relacionados à
propaganda, desempenhando seu estilo na arte popular.
103
Para o crítico de arte Mario Pedrosa:
No Brasil essa pintura constitui uma profunda tendência
generalizada, social, criando uma verdadeira escola e um estilo
nacional. No Brasil, porém, ela não teve esse caráter generalizado,
limitada que ficou a uma fase de evolução de um pintor. Não chegou
até aqui a ser um movimento. Ao artista brasileiro, este gênero se
apresentou sobretudo como um meio de desenvolver em campo
mais vasto as qualidades de estrutura a todas as possibilidades da
plástica monumental a que havia chegado em sua pintura a óleo
(PEDROSA, 1981, p. 14-15).
Sendo o muralismo visto como uma tendência de uma época, evidenciando
uma ideologia política, ao passo que as composições de Portinari mostram um
caráter humano de cunho social e o somente político, enfatizando através da
deformação expressiva, a força do trabalhador brasileiro e sua ligação com a terra.
Em São Paulo, o artista Lívio Abramo
66
(1903-1992) foi o pioneiro da
militância e preocupação social, refletindo em suas criações artísticas com influência
do Expressionismo alemão, abordando a vida do proletariado como cenas de
operário na fábrica (figura 86) e cenas de greve, levando seu protesto nos anos 30
através de desenhos e gravuras.
Figura 86 – Lívio Abramo.
Operário, 1935.
Xilogravura 18,5 x18 cm.
Coleção Instituto de Estudos Brasileiros – USP.
Fonte: livro - Arte para que? p, 75.
66
Lívio Abramo (1903-1992). foi um gravador, desenhista e pintor brasileiro de renome internacional. Trotskista e
militante sindical torna-se membro da Oposição de Esquerda Internacional no Brasil, junto com Mário Pedrosa,
Lívio Xavier e Aristides Lobo, organização liderada por Leon Trótski {(1879-1940) foi um intelectual marxista e
revolucionário bolchevique, fundador do Exército Vermelho e rival de Stalin na tomada do PCUS à morte de
Lenine}. Realiza suas primeiras gravuras em 1926 quando, bastante influenciado pelos temas humanos e sociais
do expressionismo europeu, introduz no Brasil a gravura moderna.
104
De acordo com o crítico Mario Pedrosa:
Se no Brasil houve artista de autêntica consciência, social, foi ele
que, desde a mocidade dura, bela e generosa, fez sua, proletário
também que era, a épica da luta contra a miséria e pela dignificação
do trabalho. E jamais caiu na demagogia, quer brutal, quer
sentimental: sua disciplina visual não o deixou resvalar até ela
(1981, p. 95).
Sendo assim, consciente das questões sociais, o artista permaneceu com sua
temática, expondo e contestando a exploração dos trabalhadores e sua condição de
vida operária, dignificando a profissão daquela sociedade trabalhadora,
engrandecendo-a através de sua arte.
Em 1913, Lasar Segal
67
chegou ao Brasil, onde realizou uma exposição de
pintura com nítidas características do Expressionismo alemão, uma arte que
deformava as imagens, privilegiando a representação interior e psicológica ao invés
da simples imitação da realidade. Caracterizava-se então um momento de ruptura,
cujas mostras o consideradas dentre as primeiras pinturas de Arte Moderna
realizadas no Brasil. Na década de 20 e 30 retratou a temática do drama social,
focalizando cenas da vida do mangue, no Rio de Janeiro, abordando na gravura em
metal, a temática dos imigrantes.
No mesmo período, a exposição feita em São Paulo por Anita Malfatti
68
(1896-
1964) no ano de 1917 também foi marcante, a artista estudou na Europa e Estados
Unidos e trouxe para o Brasil influências do Expressionismo. Essa mostra sofreu
críticas do escritor paulista Monteiro Lobato
69
, que se manifestou através do artigo
com o título Paranóia ou mistificação?, no jornal Estado de São Paulo, em que
desconstruía de forma negativa a exposição mencionada da pintora e, sobretudo, os
princípios da Arte Moderna. Em defesa de Anita juntaram-se jovens intelectuais e
artistas das mais diversas áreas, o grupo modernista começava a se tornar mais
coeso e a perceber a necessidade de uma atitude construtiva.
67
Lasar Segal (1891-1957) Nasceu, na cidade de Vilna, capital da Litânia, país que na época pertencia ao
Império Russo. Em 1906 vai para Berlim, na Alemanha, onde cursa a Escola de artes Aplicadas e em seguida a
Academia Imperial de Belas Artes. Em 1912, vem pela primeira vez ao Brasil e em 1923, emigra para o Brasil,
fixando-se em São Paulo.
68
Anita Catarina Malfatti (1889-1964) foi pintora, desenhista, gravadora e professora da Universidade Mackenzie.
69
José Bento Renato Monteiro Lobato (1882-1948) foi um dos mais influentes escritores brasileiros do século
XX. Foi o "precursor" da literatura infantil brasileira e ficou popularmente conhecido pelo conjunto educativo, bem
como divertido, de sua obra de livros infantis, o que seria aproximadamente metade da sua produção literária.
105
O artista Emiliano Di Cavalcanti
70
, ilustrador e pintor, foi idealizador e um dos
estimuladores da realização da Semana de Arte Moderna de 1922, juntamente com
os escritores Oswald de Andrade e Mário de Andrade. A semana de 22 foi uma
espécie de festival em que os modernistas brasileiros mostraram seus trabalhos com
tendências modernistas.
Além de expor suas telas, Di Cavalcanti desenhou o programa e os convites
da mostra, ele retratou temas nacionais e populares, como favelas, operários,
soldados, marinheiros e festas populares. Também ficou conhecido por seus belos
retratos de mulatas. Em 1926 filiou se ao Partido Comunista e a partir de então, as
temáticas sociais e nacionais tornaram-se presentes em suas obras (figura 87),
como em uma de suas pinturas sociais:
Figura 87 Emiliano Di Cavalcanti.
Mulheres Protestando, 1941.
Pintura óleo s/tela.
Fonte: endereço eletrônico.
A Semana de Arte Moderna, também chamada de Semana de 22, ocorreu no
período de 11 a 18 de fevereiro no Teatro Municipal de São Paulo. Durante os dias
de exposição de telas, esculturas e maquetes de arquitetura, com desenhos
arrojados e modernos foram exibidas, além das apresentações de poesia, música e
palestras sobre a modernidade, que deixou alguns ilustres escritores e artistas de
renome indignados. A Semana aconteceu em uma época em que o Brasil passava
por turbulências políticas, sociais, econômicas e culturais.
As novas vanguardas estéticas surgiam e o mundo se espantava com as
novas linguagens desprovidas de regras. Sendo o modernismo brasileiro um
70
Emiliano Di Cavalcanti. É importante lembrar que os primeiros murais modernos pintados no Brasil são de sua
autoria. As obras, que datam de 1931 e que representam cenas da vida carioca, foram executadas para o foyer
do Teatro João Caetano, no Rio de Janeiro.
106
movimento inovador de vanguarda, dentro do contexto do retorno à ordem
71
,
buscava resgatar a arte realista e o retorno à tradição e às culturas visuais
nacionais. Tarsila do Amaral (1886-1973), Di Cavalcanti, Lasar Segall, Cícero Dias
72
(1908-2003) e Portinari, artistas considerados símbolos do modernismo em suas
diferentes fases tiveram em comum a produção de parte de suas obras, um
repertório visual ligado à realidade do país e ao homem brasileiro, um dos principais
propósitos do movimento.
Na década de 30, Candido Portinari, retornou de sua viagem na Europa,
sem os traços acadêmicos, mas também sem o radicalismo dos artistas
vanguardistas. Conseguiu que o Brasil passasse a ser conhecido
internacionalmente, e melhor ainda, garantiu que suas obras fossem conhecidas no
país, partindo sempre do pressuposto que sua arte atingisse todas as camadas da
sociedade, sem distinção entre elas. O fundamento maior de seus trabalhos era
justamente que tivessem por missão idealizar, transformar e revolucionar os
homens, num artigo para a revista 365, Carlos Marques escreveu:
O sucesso, no entanto, não apagou em “Candinho” o tema social. A
mágica de seu pincel continuou registrando a alma da gente simples,
o trabalhador brasileiro, o homem-terra de mãos calejadas, s
desfigurados. A vida que retratou com amor é a das favelas, dos
retirantes, da terra brasileira mais sofrida. Com desenho firme e
cores sensíveis fixou para sempre essa realidade amarga ao longo
de numerosos quadros e murais. Jamais, até morrer, deixou de ser
fiel ao seu povo (s.d., apud FABRIS, 1990, pp. 37-38).
Portanto, percebe-se que os trabalhos de Portinari são considerados um
conjunto, como concepção artística, e representam um marco na evolução de sua
arte, afirmando a opção pela temática social. O artista, ao expor a vida simples do
interior, a forma de vida dos retirantes, os festejos populares e os trabalhadores,
dedicou-se à pintura social como forma de denunciar as injustiças e desigualdades
do povo brasileiro. Essa preocupação passou a ser refletida por vários grupos e em
outras regiões do Brasil.
71
Retorno à ordem - Uma tendência estética de oposição às vanguardas e que ganhou força entre o período da
e guerras mundiais. Trata-se de uma clara reação às experimentações empreendidas pelas vanguardas a
partir da recuperação da dicção realista, da reabilitação da tradição e dos valores culturais nacionais.
72
Cícero Dias foi pintor brasileiro. Em 1927, realizou sua primeira exposição individual, no Rio de Janeiro e, em
1928, abandonou a Escola de Belas Artes, passando a dedicar-se exclusivamente à pintura. A partir de 1937 o
pintor viveu na Europa, onde entrou em contato com intelectuais e artistas, ligando-se primeiramente ao
Surrealismo e, depois da Segunda Guerra Mundial, ao Abstracionismo.
107
Na década de 50, surgiu o Clube de Gravura, formado por artistas de Porto
Alegre, no Rio Grande do Sul, conhecido como grupo de Bagé, que teve importante
participação na renovação das artes gráficas do Estado, com repercussão nacional.
Carlos Scliar
73
(1920-2001), um dos principais membros do Clube de Gravura,
atuou desde 1940, como importante intermediário entre os artistas de São Paulo e
os daquele Estado com o propósito de incentivar a modernização artística local.
Entre os artistas que faziam parte do grupo estavam Vasco Prado
74
(1914-
1998), Glênio Bianchetti
75
(1928), Danúbio Gonçalves
76
(1925), cuja obra aparece na
figura 88, e Glauco Rodrigues
77
(1929-2004), e outros.
Em defesa da arte figurativa, a temática regional gauchesca, o folclore, o
registro da vida do trabalhador rural e urbano, seu ambiente de trabalho, as lutas
reivindicatórias da classe trabalhadora e a tentativa de levar a arte ao povo através
das gravuras realistas a serviço da comunicação pela imagem, era esse o objetivo
do Clube de Gravura de Porto Alegre.
Deve-se lembrar que José de Morais(1921), integrante do Clube de Bagé,
havia colaborado com Portinari no conjunto da Pampulha, projetado por Oscar
Niemeyer, entre 1942 e 1944, na cidade de Belo Horizonte, Minas Gerais.
73
Carlos Scliar (1920-2001) foi destacado desenhista, gravurista, pintor, ilustrador, cenógrafo, roteirista e
designer gráfico. Participou constantemente de exposições no Brasil. Ativista social, engajou-se em vários
movimentos, como o Congresso da Juventude Democrática, na Tchecoslováquia e em manifestações
brasileiras, seja produzindo cartazes, seja ilustrando livros e revistas. Gravurista por opção, apaixonou-se pela
serigrafia, em cuja técnica desenvolveu várias séries.
74
Vasco Prado (1914-1998) foi escultor e gravador brasileiro. Nos anos 50 fundou o Clube da Gravura com
Carlos Scliar, Danúbio Gonçalves, Glênio Bianchetti e Glauco Rodrigues, que foi um dos marcos na história da
arte gaúcha, realizando uma obra de cunho social, e em especial enfocando a temática regionalista do gaúcho
em sua vida no campo. Além da maestria apresentada no manejo da pedra e do bronze, também foi um grande
gravador, ceramista e desenhista. Tem obras espalhadas tanto pelo Brasil quanto pelo exterior.
75
Glênio Alves Branco Bianchetti (1928-) pintor, gravador, ilustrador e professor brasileiro. Foi aluno de Iberê
Camargo no Instituto de Belas Artes de Porto Alegre. Seu trabalho começou a ser conhecido na década de 1950,
quando participou da fundação, em 1951, do Clube de Gravura de Bagé.
76
Danúbio Vilamil Gonçalves (1925-) pintor, desenhista, gravador e escritor brasileiro. Em 1950 foi para Paris,
onde estudou na Academia Julian e fez contato com Carlos Scliar e Iberê Camargo, além de Portinari. Retornou
ao Brasil em 1951 e fundou o Grupo de Bagé.
77
Glauco Rodrigues (1929-2004) pintor, desenhista e gravador brasileiro. Começou a pintar em 1945, e expôs
pela primeira vez em 1948, na mostra Os Novos de Bagé, em Porto Alegre, onde freqüentava a Escola de Belas-
Artes. Logo depois transferiu-se para o Rio de Janeiro, onde estudou na Escola Nacional de Belas Artes.
Voltando a Porto Alegre, criou o Clube da Gravura de Porto Alegre e o Clube da Gravura de Bagé. De volta ao
Rio no final da década, iniciou-se na carreira de ilustrador.
108
Figura 88 - Danúbio Gonçalves.
Xarqueada, 1952.
Xilogravura para o álbum
Xarqueada.
Fonte: Livro- Arte para que? p. 207
A gravura, sobretudo a xilogravura e a linoleogravura
78
parecia se prestar com
perfeição a esses propósitos, pela facilidade com que o trabalho podia ser
reproduzido e divulgado em livros, jornais, revistas e cartazes, que tinham os artistas
atuando como ilustradores e que eram os canais mais adequados nesta época de
militância engajada na questão social. A gravura como técnica colocou-se a serviço
das causas sociais e da formação do povo, não sendo a obra única, ou seja, a
gravura podia ser reproduzida.
Os artistas faziam uma abordagem social da gravura, como forma técnica de
divulgação fácil e barata, acessível às pessoas comuns, seguindo os princípios do
Realismo Socialista
79
, com obras figurativas de imediata identificação com o
universo das classes sociais mais baixas, especialmente do povo gaúcho, mas não
ignoravam as qualidades puramente estéticas desta produção. Eles marcaram o
panorama nacional do pós-guerra, dando ênfase ao realismo e à temática regional e
social bem como à democratização da arte.
A consciência da responsabilidade social do artista e da arte a serviço de um
ideário influenciou o resto do país, tornando o Rio Grande do Sul um pólo irradiador
da gravura, tanto como técnica de reprodução de imagens quanto revolucionário
meio de transmissão de mensagens.
78
Linoleogravura - Processo de gravura semelhante à xilogravura, em que a imagem é recortada em linóleo
colado em uma base de madeira.
79
Realismo Socialista - Estilo artístico oficial da União Soviética entre as décadas de 1930 e 1960,
aproximadamente. Na prática, foi uma política de Estado para a estética em todos os campos de aplicação da
forma, desde a Literatura até o Design de produto, incluindo todas as manifestações artísticas e culturais
soviéticas (Pintura, Arquitetura, Design, Escultura, Música, Cinema, Teatro etc.). No realismo socialista se
procurava criar uma arte política que fosse simultaneamente moderna e acessível às pessoas comuns.
109
Após cinco anos de intensa atuação, os envolvidos com o Clube de Gravura
avaliaram ter cumprido seus propósitos, criando uma tradição de gravura no país e
chamando a atenção dos artistas para a realidade social. No ano de 1955 encerrou-
se as atividades do Clube, que enquanto durou conseguiu vários adeptos. A
disseminação da experiência em outros Estados e cidades, como Rio de Janeiro,
São Paulo, Santos e Recife pareceu atestar, segundo eles, o êxito da experiência.
Então, foi fundado O clube da Gravura em São Paulo, pelos artistas: Mario
Gruber (1927), Luís Ventura, Otávio Araujo
80
(1926) e Regina Katz (1925) cuja obra
aparece na figura 89. Teve um caráter efêmero, com apenas cem associados que
garantiram o funcionamento da organização por alguns meses, sendo Clovis
Graciano
81
eleito o primeiro presidente deste Clube.
Figura 89 - Regina Katz.
Camponeses.
Xilogravura.
Sem data.
Fonte: Livro: Arte para que? p. 225.
Entre as décadas de 1940 e 1950, foram realizados novos eventos, sendo
dois com tendências abstracionistas, como a exposição de Alexander Calder
82
(1898-1975) no Rio de Janeiro, com uma característica do Neoconcretismo, e de
Max Bill
83
(1908-1994) em São Paulo, com o Concretismo. Assim, começaram a ser
80
Otávio Araujo (1926-). No ano de 1947 passou a integrar-se o Grupo dos 19, dois anos depois passou a
freqüentar o curso de gravura da École dês Beaux Arts, na França, onde ajudou Portinari na execução do mural
“Pescadores”; trabalhou novamente como artista no ano de 1952, dessa vez no Brasil. A respeito do artista é
interessante observar que enquanto negro e brasileiro raramente retratava o Brasil e a negritude. Sua obra foi
norteada pelo Realismo, chegando pouco a pouco ao Expressionismo. Ao voltar da União Soviética, sua pintura
somava o mágico ao irreal, mas vincula-se a velhos pintores europeus.
81
Clovis Graciano (1907-1988) foi pintor, desenhista, cenógrafo, figurinista, gravador e ilustrador brasileiro. Em
1927 empregou-se na Estrada de Ferro Sorocabana, em Conchas, interior do Estado de São Paulo, passando a
pintar postes, tabuletas, letreiros e avisos para as estações ferroviárias. Em 1937,tendo travando contato com
a arte de Alfredo Volpi, o artista e integra-se ao Grupo Santa Helena, com os artistas Francisco Rebolo, Mario
Zanini, Aldo Bonadei, Fulvio Pennacchi e outros, além do próprio Volpi. Fez amizade com Portinari e, ao final da
década de 40, foi estudar em Paris, onde aprendeu técnicas de produção de murais, inclusive com mosaicos.
82
Alexander Calder (1898-1976), também conhecido por Sandy Calder, foi escultor e artista plástico
estaduniense famoso por desenvolver seus móbiles. Formou-se em engenharia e antes de se dedicar à escultura
foi pintor e ilustrador.
83
Max Bill (1908-1994) foi designer gráfico, designer de produto, arquiteto, pintor, escultor, professor e teórico do
design, cuja obra o coloca entre os mais importantes e influentes designers do século XX.
110
criadas polêmicas em defesa do Realismo e do Abstracionismo, que invadiu o meio
artístico.
Em 1948, Di Cavalcanti escreveu um artigo intitulado Realismo e
Abstracionismo, manifestando a importância do ato criativo e da obra de arte. De
certa forma, ele rejeitou o Abstracionismo, defendendo o Realismo e a importância
de uma arte utilitária brasileira.
Portinari, preocupado com o povo, defendeu a pintura temática, em uma
entrevista ao jornalista Ibiapaba Martins no ano de 1949, disse que era um erro
trazer o Abstracionismo para o Brasil, que na Europa, o mesmo havia sido
incorporado e superado pelos grandes artistas, afirmando que a tendência era para
a arte Figurativa, que devia ser sempre a representação idealizada do real e legível
para a compreensão do povo. Portanto, a obra do artista se enquadrou no fenômeno
chamado “retorno a ordem”, fundamentalmente realista e contra o excessivo de
experimentalismo formal das vanguardas, era contra qualquer tipo de abstração e
favorável à volta das qualidades artesanais da pintura.
O Abstracionismo era encarado por muitos artistas politizados como uma
forma de fuga do mundo exterior. Esse era o clima presente em São Paulo na
véspera da primeira Bienal de Artes em 1951, que colocou o artista local em contato
direto com a produção dos principais representantes das artes internacionais.
A partir desta época, Portinari entrou em choque com os abstracionistas que
viam nele e em artistas como Segall e Di Cavalcanti, a persistência de uma arte
moderna, não mais adequada com os novos tempos e com o que a nova geração de
artistas propunham em termos de arte. Foram criticados pelos artistas concretos que
buscavam uma renovação da arte brasileira.
Esse grande acontecimento artístico possibilitou aos artistas e ao público
brasileiro entrar em contato com a produção de obras internacionais e apreciar
assim a arte moderna e contemporânea no campo das artes visuais.
A inauguração da primeira Bienal de São Paulo, em 20 de outubro, teve cerca
de dois mil trabalhos de pintura, escultura, arquitetura e gravura de 19 países. Entre
os artistas estrangeiros figuraram Pablo Picasso (1881-1973), Fernand Léger
84
(1881-1955), George Rouault
85
(1871-1958), Alberto Giacometti
86
(1901-1966),
84
Jules-Fernand-Henri,Léger (1881-1955), pintor francês e autor de muitas litografias. A partir do ano de 1911,
conheceu Pablo Picasso e Georges Braque, os quais lhe transmitiram influências cubistas, nas quais se aplicou
e trabalhou durante a maior parte da sua carreira artística.
85
George-Henri Rouault (1871-1958) foi um pintor francês.
111
Jackson Pollock
87
(1912-1956), Giorgio Morandi
88
(1890-1964), René Magritte
89
(1898-1967), Calder e Torres-Garcia
90
(1874-1949). Entre os brasileiros, foram
convidados: Portinari, Segall, Victor Brecheret
91
(1894-1955), Di Cavalcanti, Bruno
Giorgi
92
(1905-1993), Lívio Abramo, Maria Martins
93
(1900-1973) e Oswaldo Goeldi
94
(1895-1961).
A tendência desta exposição era voltada para o abstracionismo, Portinari
participou apenas como convidado, a arte abstrata não era preferida por ele, seu
trabalho era voltado abertamente para a figuração humana ou social.
Candido Portinari retratou várias temáticas e tendências artísticas durante sua
vida em suas diversas obras. Ele expressou seus sentimentos em relação às
práticas políticas vivenciadas em sua época, tratou de assuntos sociais e cotidianos
da vida simples e das pessoas comuns, assim como também das questões
percebidas com realidade pela maior parcela da população brasileira, o trabalhador,
as crianças, enfim o tema que no presente permite refletir sobre seu campo de
atuação crítica em suas obras.
Portanto, tendo experienciado várias influências artísticas, passou por várias
fases distintas, como o Academicismo, Cubismo e Expressionismo, utilizando todas
as técnicas de pintura e suportes possíveis. Suas obras propiciaram elucidar
situações de produções artísticas voltadas para a razão do ser ideológico e social,
86
Alberto Giacometti (1901-1966) foi artista suíço que se distinguiu pelas suas esculturas e pinturas surrealistas.
87
Jackson Pollock (1912-1956) foi um importante pintor dos Estados Unidos da América e referência no
movimento do expressionismo abstrato.
88
Giorgio Morandi (1890 1964) foi um importante pintor italiano. Ficou conhecido por sua precisão na pintura de
natureza morta.
89
René François Ghislain Magritte (1898-1967) foi um dos principais artistas surrealistas belgas, Em 1926
produziu sua primeira pintura surrealista, Le jockey perdu, tendo sua primeira exposição apresentada no ano
seguinte. Com tendência para o surrealismo realista, ou “realismo mágico”. Começou imitando a vanguarda, mas
precisava realmente de uma linguagem mais poética e viu-se influenciado pela pintura metafísica de Chirico.
90
Joaquín Torres García foi um artista uruguaio, em uma variedade de meios de comunicação e da arte teórico,
também conhecido como o fundador da Construtivo Universalismo.
91
Victor Brecheret (1894-1955). Escultor ítalo-brasileiro, considerado um dos mais importantes do país. É
responsável pela introdução do modernismo na escultura brasileira. Sua figura ficou marcada pela boina que
costumava vestir, ressaltando uma imagem tradicional do "artista".
92
Bruno Giorgi (1905-1993) foi escultor e professor brasileiro. Em São Paulo, no ano 1939, trabalhou com os
artistas do Grupo Santa Helena e participou do grupo Família Artística Paulista. A convite do ministro Gustavo
Capanema, em 1943, mudou-se para o Rio de Janeiro, onde instalou ateliê na Praia Vermelha, e deu aulas,
entre outros, para Francisco Stockinger.
93
Maria Martins (1900-1973) foi uma escultora brasileira, influenciada pelo surrealismo, as suas obras foram
reconhecidas internacionalmente, possuindo obras no Museu de Arte Moderna da Filadélfia e no Museu
Metropolitano de Nova Iorque. No Brasil foi considerada a melhor escultora brasileira da Bienal de São Paulo em
1955
.
usou a terracota, o mármore, a cera polida e o bronze como matérias-primas.
94
Oswaldo Goeldi (1895-1961) foi desenhista, ilustrador, gravador e professor brasileiro. A partir de 1923
dedicou-se intensamente à xilogravura e fez ilustrações para revistas, livros e periódicos. Consolidado como
ilustrador, expôs na 25ª Bienal de Veneza, em 1950, e ganhou o Prêmio de Gravura da 1ª Bienal Internacional de
São Paulo, em 1951. Sua carreira como professor começou em 1952 e, após três anos, passou a ensinar
xilogravura na Escola Nacional de Belas Artes.
112
ou seja, foi um pintor complexo, deu grande ênfase à produção social, mesmo que
aos olhos menos críticos, pareça ser inconsciente, ele exerceu através de sua arte
uma crítica de transformação social.
113
CAPÍTULO 3
O Trabalho Fotográfico e Social de Sebastião Salgado
Eu tenho uma maneira de fotografar, com a minha
história, a minha ideologia. Quando alguém não quer
te dar a imagem, você pede desculpas, faz as malas e
vai embora. Eu não roubo imagens.
(Sebastião Salgado, 1997, p. 12)
3.1 O Poder da Imagem Fotográfica
Muitos foram os trabalhos realizados pelo prestigiado fotógrafo brasileiro
Sebastião Salgado, sendo reconhecido mundialmente como um dos mestres da
fotografia documental contemporânea.
É adepto da "fotografia engajada”, ou seja,
utiliza-se de seu trabalho fotográfico para transmitir a sociedade sua ideologia, suas
idéias, como forma de protesto, denunciando as injustiças, através de suas imagens
e suas reportagens que são principalmente sobre a condição humana e social.
Muitos são os comentários sobre o fotógrafo, como o apresentado abaixo por
Simonetta Persichetti
95
:
O instrumento utilizado por Salgado para agir sobre a sociedade é a
fotografia, que ele acredita ser o instrumento apropriado para
resgatar a memória e criar uma discussão na sociedade. Sua
fotografia, capaz de transmitir suas sensações, que ele cristaliza na
sua obra, se torna um instrumento mediador entre o indivíduo e o
mundo que ele quer transformar (
PERSICHETTI
, 1995, p.73).
Nos anos 80 e 90, Salgado publicou grandes trabalhos de denúncia social,
apresentando as imagens em livros como: Trabalhadores (1993), Terra (1997) e
Êxodos (2000) todos publicados pela Editora Companhia das Letras. No primeiro,
como o próprio título enfatiza, fez uma homenagem aos homens e mulheres que têm
95
Simonetta Persichetti nascida em Roma, além de colaborar como jornalista no Caderno 2 de O Estado de São
Paulo, onde vem realizando esta série de entrevistas desde 1996, tem formação paralela em fotografia. É mestre
em Comunicação e Artes e doutoranda em Psicologia Social. Estuda e trabalha com fotografia 20 anos.
Recebeu o Prêmio Jabuti de Reportagem em 1999 por Imagens da Fotografia Brasileira, lançado por esta
editora.
114
trabalhado desde o início dos tempos até os dias atuais, mas, em especial, com
ênfase no período da Revolução Industrial. O livro possui 350 fotografias das
atividades que têm sido sinônimo de trabalho duro e árduo. Registrou várias
temáticas sobre o assunto, como: a agricultura, indústria, construção e pesca, além
de documentar o momento de transição em que algumas profissões desaparecem
em virtude da revolução tecnológica. As fotos abaixo retratam os Garimpeiros da
Serra Pelada, conhecido também como “formigueiro humano” (figura 90), e Bóias-
Frias durante um repouso do corte da cana, consumindo a comida fria (figura 91).
Figura 90 - Sebastião Salgado.
Garimpeiros de Serra Pelada, 1980.
Fotografia.
Serra dos Carajás, Estado do Pará.
Fonte: Livro Trabalhadores, p. 316.
Figura 91 - Sebastião Salgado.
Bóias-Frias. A comida fria consumida durante um repouso na tarefa do
corte de cana, 1987.
Fotografia.
Fonte: Livro Trabalhadores, p. 35.
O fotógrafo Sebastião Salgado retratou a miséria humana provocada pela
desigualdade econômica e pelos efeitos da globalização e da tecnologia no mundo
atual, traz através dos veículos de comunicação informações sobre a miséria e a
fome que surgem na sociedade de maneiras variadas. Assim, são utilizados
instrumentos como a literatura, música, pintura, fotografia e outras, para mostrar aos
mais favorecidos que existem outros segmentos sociais que precisam de apoio para
viver. Muitos enxergam as fotos de Salgado como documentos históricos e se
surpreendem com a quantidade de miséria espalhada pelo mundo. Nas figuras 92 e
93, os s calejados usando sandálias impressionam pelo impacto da situação ao
qual o trabalhador é exposto a partir de sua condição de vida. Não somente a face,
115
os braços, mas os pés e as mãos “relatam” sua experiência como trabalhador
miserável:
Figura 92 - Sebastião Salgado.
Os pobres trabalhadores da terra, 1983.
Fotografia.
Ceará.
Fonte: Livro Terra, p. 59.
Figura 93 - Sebastião Salgado.
Chá Ruanda, 1990.
Fotografia.
Fonte: Livro Trabalhadores, pp. 40-41.
As fotos acima provocam a reflexão sobre a difícil vida dos trabalhadores e
suas condições de vida precárias, sua luta pela sobrevivência sendo obrigados a
conviver com as incertezas do amanhã, não tendo a certeza se haverá condições
físicas de recomeçar no dia seguinte, antes mesmo do nascer do sol, acreditando e
não perdendo a esperança de um futuro melhor para seus filhos, diferente do que
lhe foi proporcionado pelas conseqüências de um passado que ele não escolheu,
mas que a vida lhe apresentou. Deste modo, Salgado não fotografa apenas o
cotidiano e o trabalhador, mas sim a história da humanidade
.
O ideal de uma sociedade justa, igualitária e fraterna distancia-se a cada
momento com a denúncia social de miséria escancarada pelos rostos de pessoas
sem nomes. O que os identifica é o olhar, os pés, as mãos, enfim a condição do
proletário. O que aproxima seres que vivem em realidades tão distintas pode ser
justamente as suas vivências. O escritor Milton Aguiar esclarece sobre as questões
estruturais:
[...] 'a fome é um problema estrutural [...]'. Ao faminto do século XX
não interessa se ao final do século XXIII a fome não passará de
amarga lembrança histórica de uma avançadíssima sociedade
igualitária. E a todos nós do final do século XX, mesmo os que estão
bem alimentados, também não interessa que pessoas adoeçam e
morram ou vivam oprimidas e infelizes em virtude de carecimentos
que podem ser atendidos. Uma ideologia que nos torne cegos para
esta evidência só pode ser uma perversidade, uma abominação!
(AGUIAR, 1997, p. 43).
116
Espera-se que essas ações humanitárias consigam ultrapassar o objetivo
imediato de sanar um problema para estabelecer um encontro de idéias de
dignidade, de reconhecimento do outro enquanto cidadão. se pode pensar em
um novo espaço social contribuindo efetivamente para a construção deste. Ficar
esperando que instituições realizem o que cada um pode e deve fazer é eximir-se de
"ouvir" 50 milhões de pessoas excluídas em todo Brasil "quando uma pessoa chega
a o ter o que comer é porque tudo o mais lhe foi negado", dizia Herbert de
Sousa
96
, “Betinho”.
A produção do livro Terra, em 1997, teve grande essência ideológica, pois a
obra foi doada ao Movimento dos Sem-Terra, que, além de ficarem com o dinheiro
arrecadado com a venda dos livros, usam as fotografias nos materiais de divulgação
do Movimento. O material foi dedicado às famílias brasileiras sem propriedades, que
sobrevivem em acampamentos e lutam na esperança de conquistar um pedaço de
terreno. Os moradores abandonam suas casas no campo e vão à busca de
melhores condições de vida nas cidades, tornando ainda mais forte o problema do
êxodo rural, aumentando o número de pessoas sem moradia na zona urbana.
alguns anos a maioria da população no Brasil vivia na zona rural, hoje ela
está nas cidades, ou seja, o mundo atual é predominantemente urbano. Muitas
pessoas perdem seu trabalho e são expulsas da zona rural, pois a mão-de-obra
desses trabalhadores rurais é substituída pelos maquinários.
Nas palavras do escritor Antonio Candido
97
:
Modernamente, o êxodo rural separa com mais freqüência o
indivíduo da família, criando novo fator de instabilidade e ameaçando
a sua estrutura. E a circulação constante de famílias em busca de
melhores condições de trabalho continua como antes a agricultura
itinerante a dificultar a integração regular de grupos familiais em
estruturas mais amplas. É uma nova forma de instabilidade que
obriga a família a concentrar-se como unidade social. Agora, todavia,
não se concentra mais em face do isolamento geográfico e cultural,
mas em contato com as forças atuantes da urbanização. Por isso,
embora persista coesa como grupo, altera-se cada vez mais como
estrutura tradicional, ao aceitar os padrões transmitidos pela
40
Herbert de Sousa (1935-1997) sociólogo e líder comunitário brasileiro, também conhecido como Betinho.
Opondo-se ao Movimento Militar de 1964, esteve exilado em diversos países (Cuba, Chile, Canadá, Grã-
Bretanha e México). Ao retornar do exílio, fundou uma Organização não-governamental (ONG), o Instituto
Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas (IBASE), atuando intensamente em campanhas de grande
significado social, como a da prevenção da Síndrome de Imunodeficiência Adquirida (Aids), através do controle
do sangue; a defesa da causa indígena; a reforma agrária e campanhas contra o desemprego. Em 1993 liderou
a Campanha Nacional de Combate à Fome.
97
Antonio Candido de Mello e Souza (1918) é poeta, ensaísta, professor universitário e um dos principais críticos
literários brasileiros. É professor-emérito da USP e da UNESP, e doutor honoris causa da Unicamp.
117
influência urbana que vai desligando da placenta original da sua
cultura rústica (CANDIDO, 1971, p 253).
Sobre essa idéia relacionada à questão do êxodo rural (figuras 94 e 95),
percebe-se que as famílias em busca de melhores condições de vida fora do campo
acabam por desestruturar-se, pois a busca individual de seus sonhos e
necessidades perpassam pelas simples condições de saciar a fome nos centros
urbanos, procuram estabelecer relações igualitárias criando novos anseios e
distanciando-se assim do convívio comum de seus laços afetivos.
Figura 94 - Sebastião Salgado.
Migração rural para as cidades, 1983.
Fotografia.
Fonte: Livro Terra, p. 74.
Figura 95 – Sebastião Salgado.
Crianças às margens da rodovia PR-158,
1996.
Fotografia.
Fonte: Livro Terra, p. 117.
A luta pela terra é um conflito político, cultural e social, é uma luta, mais do
que pela propriedade, é uma luta pela identidade e pela vida, é a luta de qualquer
um que se esforça pelo reconhecimento de seus direitos humanos, pela
permanência e o pertencimento a um grupo social que o dignifica e o reconhece
como participante e contribuinte de um sistema complexo de oportunidades e ações.
As pessoas passam meses nos acampamentos, vivem de maneira
subumana, sem condições de higiene, se alimentam mal, ficam doentes, as crianças
estudam em condições precárias, como podemos observar na figura 96, todos
sofrem a dor da esperança, enquanto aguardam o decreto da desapropriação da
118
terra para então ter uma vitória, que na realidade deveria ser um ato de justiça
(figuras 97).
Figura 96 – Sebastião Salgado.
Escola para crianças do Movimento Sem-Terra no
acampamento de Santa Clara, 1996.
Fotografia.
Sergipe, Brasil.
Fonte: Livro Terra, pp. 114-115.
Figura 97 - Sebastião Salgado.
A luta pela terra: os ícones da vitória, 1996.
Fotografia.
Sergipe.
Fonte: livro Terra, pp. 132-133.
O livro Terra, de Sebastião Salgado, é um trabalho de engajamento e que traz
três grandes artistas, expoentes também na participação política, cada qual com seu
gênero: Sebastião Salgado na fotografia, José Saramago
98
na Literatura e Chico
Buarque
99
na sica, com trechos de Guimarães Rosa
100
, um dos escritores
brasileiros que tem como temática, na maior parte de suas obras, a luta do homem
pela terra e com o homem do campo. O livro deixa de pertencer apenas a um autor,
passando a ser uma criação coletiva, com um claro propósito ideológico de
demonstrar a luta pelo direito a viver com dignidade. As fotos temáticas de Sebastião
Salgado retratam: Gente da Terra”, Trabalhadores da Terra”, A força da Vida”,
Migrações para as Cidades” e a “Luta pela Terra”.
Os trabalhos de Salgado, com suas imagens do ser humano que luta pela
sobrevivência e interage com o meio em que se encontra, valoriza a condição
humana, expondo sua história, tristeza e o sofrimento da vida real. Ele acredita na
98
José de Sousa Saramago (1922) é escritor, roteirista, jornalista e poeta português, galardoado em 1998 com o
Nobel da Literatura. Também ganhou o Prêmio Camões, o mais importante prêmio literário da língua portuguesa.
99
Francisco Buarque de Hollanda (1944) é músico, dramaturgo e escritor brasileiro. Filho do historiador Sérgio
Buarque de Hollanda, iniciou sua carreira na década de 1960, destacando-se em 1966, quando venceu, com a
canção A Banda, o Festival de Música Popular Brasileira. Em 1969, com a crescente repressão da Ditadura
Militar no Brasil, exilou-se na Itália, tornando-se, ao retornar, um dos artistas mais ativos na crítica política e pela
democratização do Brasil. Na carreira literária, foi ganhador do Prêmio Jabuti, pelo livro Budapeste, lançado em
2004.
100
João Guimarães Rosa (1908-1967) foi um dos mais importantes escritores brasileiros de todos os tempos. Foi
também médico e diplomata. Os contos e romances escritos por João Guimarães Rosa ambientam-se quase
todos no chamado sertão brasileiro. A sua obra destaca-se, sobretudo, pelas inovações de linguagem, sendo
marcada pela influência de falares populares e regionais.
119
força da fotografia como instrumento para levar a uma discussão e reflexão sobre a
dura realidade do país.
Compreender a complexidade do fenômeno da miséria é entender que a
solução dessa questão não passa somente pela esfera política, mas sim por
atuações baseadas na generosidade e na solidariedade, além do interesse pessoal
das classes mais altas em manter um equilíbrio social, não tendo que conviver com
a pobreza e a miséria e com as suas desagradáveis conseqüências.
Nas palavras da jornalista e escritora Simonetta Persichetti:
Nas imagens de Salgado não vemos apenas homens e mulheres,
mas toda a história de um povo, não vemos apenas fotos de guerra,
mas toda uma ideologia por trás dela, não vemos apenas cerimônias
religiosas, mas toda a força da que movimenta muitos povos e é
responsável pelo seu comportamento. Não vemos apenas o
indivíduo, vemos toda a humanidade (PERSICHETTI, 1995, p.50).
Salgado, através de suas lentes, registra seus sentimentos, suas expressões
ao focar imagens de indivíduos que se relacionam em diferentes formas e maneiras
de entender a vida. A autora traz a reflexão sobre este posicionamento quando cita
que a ideologia faz parte de um campo de ação ao qual Salgado está inserido, pois
o indivíduo que vemos pertence às nossas experiências, isto é, não é desconhecido
nas imagens focadas por ele, os observadores reconhecem e são reconhecidos
nessas imagens. Assim, se por um lado, elas remetem às experiências anteriores
dos antepassados de quem as observa, por outro, percebe-se também a existência
desses elementos dentro do âmbito social no presente, como por exemplo, na feira,
no mercado e na rua.
No ano de 2000, ele produziu o livro Êxodos, que é uma continuação do livro
Trabalhadores, mostrando a degradação da família, a fuga da guerra e o abandono
do campo. O trabalho é resultado de uma pesquisa documentada em fotografias,
que foi dividida em quatro temáticas: 1ª “Migrantes e Refugiados: o instinto da
sobrevivência”, 2ª “A Tragédia Africana: um continente à deriva”, “A América
Latina: êxodo rural, desordem urbanae “Ásia: a nova face urbana do mundo”.
Esse trabalho foi realizado em vários países do mundo. O livro retrata a vida de
retirantes, dos refugiados e migrantes, que procuram escapar da pobreza, repressão
e das guerras e perseguições raciais.
Portanto, na introdução do livro Êxodos, Salgado escreveu:
120
Mais do que nunca, sinto que a espécie humana é uma só. Há
diferenças de cor, de idioma, de cultura e de oportunidades, mas os
sentimentos e reações das pessoas se parecem muito. Elas fogem
das guerras para esquivar-se da morte, migram para melhorar de
vida, edificam novas vidas em países estranhos, adaptam-se a
condições extremamente adversas. Em todo lugar, impera o instinto
individual de sobrevivência. Mesmo assim, como espécie, parecemos
propensos à autodestruição" (SALGADO, 2000
, p.
15).
Ao pensar sobre a crítica expressa por Salgado, em relação à expressão
humana, percebe-se que o foco do olhar das relações de sentimentos são possíveis
e são retratados de forma muito próximas, principalmente, ao referir-se às tragédias
como a morte e a guerra, em que é possível notar a reação das pessoas, sobretudo
no que aproxima e no que afasta da realidade, a espécie humana.
Figura 98.
Sebastião Salgado.
Camponeses voltando do trabalho no assentamento,
1996.
Fotografia.
Santa Clara, Sergipe, Nordeste do Brasil.
Fonte: Livro Êxodos, p. 303.
Figura 99.
Sebastião Salgado.
Kakuma, 1993.
Fotografia.
Quênia.
Fonte: Livro Êxodos, p.159.
Nas figuras acima nota-se o impacto causado por duas realidades em
diferentes momentos. Mais uma vez, as características dos trabalhadores rurais são
destacadas na forma de busca por saciar suas necessidades. O trabalhador
empunha a sua enxada e assim com passos lentos e determinados segue com o
olhar fixo no horizonte (figura 98). a mulher da fotografia ao lado mostra as
dificuldades e a solidão de quem vive um momento sublime na vida, ao dar à luz,
transfere seus sonhos para outros que buscam sua própria sobrevivência em nome
de seus descendentes. Ela teve o filho, no caminho do Sudão, ao norte do Quênia,
dois dias antes de ser fotografada (figura 99).
No período de seis anos, Salgado vivenciou as dolorosas experiências junto à
miséria humana e à pobreza em diversos países nas piores condições de
121
sobrevivência a que o ser humano pode ser submetido. Retratando as diferenças
sociais, religiosas e raciais, mostradas pelo fotógrafo, de maneira fiel e verdadeira.
Na figura 100, observa-se que, “na aldeia de Biaro, a Cruz Vermelha zairense foi
convocada pelas forças de Kabila para enterrar os mortos (a fim de se evitar a
propagação de doenças) e fazer uma contagem dos órfãos (cerca de mil)”.
Neste projeto sobre o livro Êxodos, Salgado acabou desdobrando em outro
livro de menor tamanho com retratos das crianças do Êxodo, em suas viagens,
sempre encontrou crianças, todas elas loucas para serem fotografadas. Como
podemos observar ao lado na figura 101, uma criança, cujo olhar é de melancolia,
sem muitas esperanças, com o olhar fixo para a câmera como se estes estivessem
pedindo ajuda.
Figura 100.
Sebastião Salgado.
Zaire, 1997.
Fotografia.
Fonte: Livro Êxodos, p. 213.
Figura 101.
Criança do Êxodo.
Fotografia.
Fonte:http://janebonatto.multiply.co
m/photos/album/29/29
O fotógrafo produziu e editou vários livros sobre a realidade do mundo,
mostrou cenas que emocionam e surpreendem. Muitas foram as ações definidas e
defendidas por ele, sendo uma delas, a criação de uma ONG, na fazenda que
pertenceu a seus pais. Salgado e sua esposa deixaram o Brasil em 1969 e quando
retornaram em 1980, a fazenda havia se acabado, a floresta, a água, o gado
estavam desaparecendo (figura 102), foi quando sua esposa teve a idéia de plantar
uma floresta, tentando recompor a paisagem (figura 103). Após a elaboração de
projetos, foi então criado no início de 1999 o Instituto Terra com sede na fazenda
122
Bulcão, de 650 hectares, situada na periferia da pequena cidade de Aimorés, de 18
mil habitantes, no sudeste de Minas Gerais.
Figura 102.
Vista geral da fazenda de Salgado antes do primeiro
plantio.
Fotografia.
Fonte. http://www.institutoterra.org/
Figura 103.
Vista da fazenda depois do Reflorestamento
Fotografia.
Fonte: http://www.institutoterra.org/
Portanto, o Instituto Terra criado por Salgado e sua esposa Lélia Wanick no
qual investiram gastos dez anos na recuperação ambiental da Fazenda Bulcão, foi a
primeira propriedade privada oficialmente aprovada, em 1998, como RPPN (Reserva
Particular do Patrimônio Natural), em área degradada no ecossistema de Floresta
Atlântica.
O programa realiza um projeto em parceria com a Prefeitura Municipal de
Aimorés, visando o desenvolvimento sustentável da zona rural do município. Para
tanto, foi adotado o modelo de planejamento por micro bacia, sendo uma rede de
drenagem (córregos) que deságua em um rio principal; nas quais os trabalhos vêm
sendo desenvolvidos em conjunto com os produtores rurais e comunidades locais. O
objetivo central foi desenvolver um processo educacional e de pesquisa voltado para
a recuperação de áreas degradadas, utilizando as atividades de recuperação
florestal como demonstração. Sendo realizados cursos de capacitação com
professores, pequenos produtores, lideranças políticas, população local, lideranças
técnicas, entre outros.
A solução dos problemas ambientais tem sido cada vez mais urgente para
garantir o futuro da humanidade, apontando para a necessidade da busca de novos
valores e atitudes individuais e coletivas em relação ao meio ambiente. De acordo
com os temas transversais propostos pelo Parâmetro Curricular Nacional (PCNs) do
Ensino Fundamental.
123
O termo “meio ambiente” tem sido usado para indicar um “espaço [...]
em que um ser vive e se desenvolve, trocando energia e interagindo
com ele, sendo transformado e transformando-o. No caso dos seres
humanos, ao espaço físico e biológico soma-se o espaço
sociocultural. Interagindo com os elementos do seu ambiente, a
humanidade provoca tipos de modificação que se transformam com o
passar da história. E ao transformar o ambiente, os seres humanos
também mudam sua própria visão a respeito da natureza e do
ambiente em que vivem (BRASIL, 1998, p. 233).
Atualmente, quando se fala em questão ambiental, discorre-se sobre os
inúmeros problemas atuais como poluição e desmatamentos. A mídia veicula uma
grande quantidade de informações em relação ao assunto, exercendo grande
influência sobre a população. Algumas dessas informações, no entanto, sensibilizam
e levam às reflexões sobre os fatos que afetam a vida de todos, porém, poucas são
as pessoas que participam efetivamente do trabalho ambiental, tão urgente no país,
assim, esse tema é um grande desafio na educação.
Nesse sentido, é importante que as escolas e as instituições se proponham a
trabalhar com atitudes, com formação de valores que contribuam para a formação de
cidadãos conscientes, prontos para decidir e atuar na realidade socioambiental.
Entretanto, não se deve esquecer que a escola não é o único meio para a
solução do problema, já que ele não depende só da responsabilidade individual, mas
da família, da comunidade, de mudanças de atitudes, como também da
responsabilidade coletiva, de políticas públicas, assim como, as informações
veiculadas pela mídia, que exercem grande influência sobre a população.
Deste modo, o fotógrafo declarou em uma entrevista à repórter Juliana Arini,
da Revista Época, em 10 de Novembro de 2007 (Edição nº 495):
Temos de voltar à idéia de sustentabilidade. O moderno não é você
ter computador. Não é ter tecnologia. O moderno é a
sustentabilidade. Essa é a preocupação real do planeta. A
humanidade vai conseguir resistir como espécie se pensarmos
dessa forma. Hoje, a tônica principal é voltar a pensar no interior, nas
nascentes, nas águas, no equilíbrio e na agricultura dessas regiões.
Mudar a degradação atual do planeta é possível por meio da
agricultura. E não vamos conseguir isso se seguirmos essa loucura
que está acontecendo no Brasil, de querer exportar a todo preço.
Precisamos de uma agricultura sustentável. E o mundo urbano e rico
está disposto a pagar um pouco mais caro por isso. Primeiro, para ter
um produto limpo e sem agrotóxicos. Segundo, para consumir um
produto que não degrade a Terra. E, terceiro, porque as pessoas
querem ter interação com o planeta (ÉPOCA, 2007).
124
Além disso, a educação ambiental é uma prática que propõe a busca de
valores baseada em uma postura ética e política. É uma ação democrática que não
estabelece separações entre educadores e aprendizes. Trabalhá-la em um processo
interdisciplinar é o caminho para alterar a forma como a sociedade se relaciona com
a natureza, desta maneira, o processo educacional deve cumprir sua função social,
havendo contribuições de várias disciplinas, compreendendo e explicando o tema
tratado de maneira específica, com projetos nas escolas, ONGs e demais
instituições.
A valorização do processo de aprendizagem é complexo, procura-se
desenvolver todas as questões sobre a formação contínua, desenvolvimento cultural
das pessoas e da comunidade, com características próprias dentro de um contexto.
Trabalhar projetos sobre o meio ambiente nas escolas e outras instituições,
com realidades diferenciadas, envolvendo outros profissionais, buscando a inter-
relação com a comunidade, utilizando os recursos existentes (humanos, materiais,
ambientais, etc.) em favor de resultados para a sociedade.
O projeto para a preservação do meio ambiente coordenado por Salgado e
sua esposa, desde 1998, é um grande exemplo para a humanidade, no qual
puderam interferir na paisagem e na vida dos moradores de Aimorés. A iniciativa de
recriar a floresta (Instituto Terra) atendeu mais de 5 mil pessoas e plantou 1
milhão de mudas de plantas da Mata Atlântica, fazendo a água retornar e trazendo
animais silvestres de volta. Em uma entrevista ao Globo Rural, exibido pela TV
Globo, no dia 09 de dezembro de 2007, Salgado e sua esposa Lélia, mostraram a
fazenda aos repórteres e ele disse entusiasmado:
Olha o processo ao revés. Embaixo dessa planta o que tem aqui:
uma moita de capim colonião, ela tá aqui como marca da fazenda de
gado. Quando você olha do outro lado do barranco, você as
samambaias que são da floresta, já voltando e competindo, cobrindo
o colonião e ele vai desaparecendo (SALGADO, 2007).
A criação de sua ONG em Minas Gerais e o retorno à sua terra, levaram o
fotógrafo a refletir sobre as questões ambientais, voltando seu foco para a
paisagem, para o meio-ambiente, não esquecendo a ação do homem. Foi plantando
árvores na Mata Atlântica que Sebastião Salgado despertou para fotografar a
natureza. No ano de 2007 lançou no Brasil um livro dedicado à África (figuras 104 e
125
105) com suas primeiras fotos de natureza, retratando a história de um continente
que está fazendo de tudo para continuar existindo.
Figura 104 - Sebastião Salgado.
Grupo Dinka num campo de gado, 2006.
Fotografia.
Pagarau, Sul do Sudão.
Fonte:.
http://www.fotografa.ro/images/cms/media/fo_salgado_africa
_05.jpg
Figura 105 - Sebastião Salgado.
Zebra da Montanha, 2005.
Fotografia.
Vale do rio Hoanib Damaraland, Namibia.
Fonte: endereço eletrônico.
Sebastião desenvolveu também o tema sobre a questão ecológica em seu
último grande projeto, cujo nome é Gênesis, lançado em Vitória, Espírito Santo, no
ano de 2006, revelando uma busca a lugares intocados, fazendo uma reverência ao
planeta Terra. Sendo que o projeto está no terceiro ano com duração prevista de
aproximadamente oito anos, ou seja, tendo previsão para seu término em 2013.
O trabalho é realizado em parceria com a UNESCO e é dividido em quatro
capítulos, constituídos por fotografias que mostram as partes do planeta que ainda
não foram destruídas. As paisagens remontam à origem do planeta, a animais em
harmonia com a natureza (figuras 106 e 107), sociedades que mantém suas culturas
e tradições, como tribos do Congo, na África, e do Xingu, no Mato Grosso, além de
comunidades que trazem em seu cotidiano características que remetem aos
primórdios da humanidade.
O autor, utilizando suas imagens fotográficas, tem o intuito e desejo de
despertar a consciência sobre a necessidade e importância de proteger e preservar
o mundo das conseqüências desastrosas geradas pela própria humanidade. Tendo
em sua concepção questões sociais, econômicas e políticas ligadas ao ideal de
preservação ambiental. Conforme comentário de Simonetta:
Salgado está sempre entre aqueles que escolheram a imagem como
instrumento de expressão. Ele percebeu que a força emocional de
uma fotografia chegaria de imediato ao centro de nossas emoções.
126
Salgado escreve com a luz. Quando ele direciona um facho de luz
para um ponto determinado, ele quer chamar nossa atenção, quer
nos fazer refletir, nos mostrar aquilo que precisamos ver para
transformar nossa consciência (
PERSICHETTI
, 1995, p.72
).
As imagens que Salgado apresenta são utilizadas como instrumento para
chamar a atenção da dura realidade social que preferimos não ver, acaba por
provocar os sentimentos, fazendo-nos refletir sobre a necessidade de mudança em
nossas atitudes.
Figura 106 – Sebastião Salgado.
Pingüins-de-Adelia.
Fotografia.
Baía de Hope.
Fonte: endereço eletrônico.
Figura 107 - Sebastião Salgado.
Baleia franca-austral chamada Adelita.
Fotografia.
Patagônia, Argentina.
Fonte: endereço eletrônico.
A idéia do projeto Gênesis é, também, educacional, pois cria um tipo de
acervo para ajudar na discussão da preservação do planeta, estimulando a reflexão
sobre a importância da preservação da biodiversidade e do desenvolvimento
sustentável. A proposta é que os professores, que são multiplicadores, possa
utilizar-se das fotografias da natureza como base para a formulação de cartilha que
será distribuída nas escolas. No material, além das fotos, existem informações sobre
a teoria da evolução e conceitos sobre biodiversidade. As fotografias serão utilizadas
em várias estratégias de ensino para que os alunos, sensibilizados, possam refletir
sobre o ambiente onde vivem e sobre sua própria vida, praticando novas atitudes.
Educação, sensibilização e reflexão são as palavras-chave do projeto educacional,
cujo objetivo é transformar a relação do ser humano com a natureza.
O projeto possibilita a conciliação dos temas sociais, econômicos e políticos
ao ideal de preservação, com o objetivo principal de educar crianças, jovens e
adultos para a preservação do meio ambiente e o modo responsável de organizarem
suas vidas e se relacionarem em suas comunidades.
127
Na entrevista a Revista Época (2007) citada anteriormente, Salgado disse que
não havia se transformado em um fotógrafo de paisagens ou de animais, apenas
queria começar uma série de fotografias que também incluíssem a biodiversidade do
planeta e o meio ambiente.
Portanto, o fotógrafo, através da criação do projeto Gênesis, quer mostrar que
ainda é possível enxergar o florescimento do equilíbrio ecológico mundial e da
harmonia entre homem e natureza, desvendando uma parte do planeta ainda não
ameaçada pelo descuido e pela falta de consciência do homem em suas atividades
cotidianas. Sebastião está trabalhando nesses paraísos ecológicos, onde se pode
enxergar o florescimento da biodiversidade, algo que remete a um passado distante,
quando ainda existia um equilíbrio ecológico.
3.2 A Fotografia Social e Ideológica
Em tempos difíceis, o engajamento pessoal não deve ser sinônimo de
heroísmo, de sacrifício, de abstenção a uma vida prazerosa, cômoda, mas sim de
um jeito de ser, visto como opção ideológica de vida. São diversos os caminhos que
podem ser percorridos para efetuar uma ação engajada como forma de expressão
ideológica, de respeito ao direito de igualdade.
A fotografia acabou exercendo, desde o início de sua produção, um papel
extremamente forte, registrando todas as transformações que estavam acontecendo
no mundo. Surgiu então a fotografia social, engajada e de denúncia. Suas imagens
políticas e ideológicas procuram a valorização do ser humano, preservando a
memória de seu tempo. Alguns fotógrafos tiveram esta tendência com uma
consciência crítica, registrando fatos, através de imagens de denúncias históricas.
Os primeiros trabalhos realizados com esta intenção foram feitos por nomes
importantes como Jacob Riis
101
, fotógrafo e jornalista nasceu na Dinamarca vindo de
uma família grande e pobre, e trabalhou como carpinteiro antes de migrar para os
Estados Unidos da América (EUA) em 1870, onde poderia ter mais oportunidade de
101
Jacob August Riis (1849-1914) nasceu em Ribe, Dinamarca, um dinamarquês-americano jornalista, fotógrafo,
e reformador social. Ele é conhecido pela sua dedicação ao usar seu talento jornalístico e fotográfico para ajudar
os menos afortunados na cidade de Nova York, sendo este seu maior objetivo em seus escritos e fotografias.
128
sobrevivência. Por essa razão, foi operário, pedreiro e, alguns anos depois,
conseguiu um emprego numa agência de notícias em Nova York, tornando-se, mais
tarde, repórter, quando descobriu a técnica da fotografia. Durante muitos anos
retratou favelas da cidade, guetos de imigrantes miseráveis em situações de semi-
escravidão e sem o mínimo de condições sanitárias e outras pessoas que buscavam
fama e fortuna.
Figura 108 - Jacob Riis.
Criança dormindo na rua, 1890.
Fotografia.
Fonte: endereço eletrônico.
Figura 109 - Jacob Riis.
Casa de um Italiano Trapeiro, 1888.
Fotografia.
Fonte: endereço eletrônico.
Suas fotos (figuras 108 e 109), chocantes para a época, ajudaram a mobilizar
a opinião pública em favor de leis relativas à educação, trabalho e moradia. Sentiu
na própria pele a pobreza e o preconceito. Mesmo assim, acabou sendo pioneiro de
algumas técnicas, como por exemplo, o uso de flash, que o permitia fotografar em
interiores escuros. Em 1890, publicou o livro Como Vive a Outra Metade, obra que
teve grande sucesso.
Do mesmo modo que a pobreza nunca acabou, o trabalho de Jacob Riis
também nunca teve pausa. Ele seguiu fotografando e escrevendo sempre sobre o
mesmo assunto, até morrer aos 65 anos,tima de um ataque cardíaco. Deixou mais
de uma dúzia de livros publicados e o seu nome na história da fotografia. Era um
homem com uma missão: denunciar as condições precárias a que estavam
submetidas grande parte da sociedade. Escrevia textos de teor altamente político e
os ilustrava com suas fotos, que era somente um instrumento que serviu de
denúncia das más condições humanas.
129
De modo semelhante à abordagem de Riis, o sociólogo americano Lewis
Hine
102
(1874-1940) retratou no começo do século a chegada dos imigrantes
europeus na América, mostrando suas terríveis condições de trabalho e moradia.
Em 1908, continuou seus estudos sociológicos com fotografias de trabalhadores
metalúrgicos de Pittsburg, acreditando no poder da imagem passou a usá-la em
campanhas para persuadir as autoridades, expondo à opinião pública as péssimas
condições trabalhistas. O resultado obtido foi a aprovação das leis contra o trabalho
infantil e de segurança para os trabalhadores. Hine viajou pelos Estados Unidos
tirando fotos de crianças trabalhando nas fábricas (figura 110) e da situação de
escravidão a que eram submetidas. Assim, conseguiu chamar a atenção do governo
americano que acabou criando uma lei de proteção aos menores.
Esse sempre foi seu tema favorito e ele fotografou os trabalhadores em
situações precárias e, também as modernas tecnologias emergentes. Na década de
1920, realizou uma série que denominou Obra Retratos, mostrando o homem e a
máquina trabalhando em conjunto (figura 111). Em 1932, publicou o livro Homem
trabalhando, que era um ensaio sobre os operários americanos.
Figura 110 – Lewis Hine.
Leo com Idade Compreendida entre os 8 Anos,
Trabalhando em uma Fábrica Têxtil, 1910.
Fotografia.
Tennessee.
Fonte: http://www.spartacus.schoolnet.co.uk/IRhine.htm
Figura 111 – Lewis Hine.
Trabalhadores Orientando a Elevação do Cabo,
1930-1931.
Fotografia.
Fonte: endereço eletrônico.
Na cada de 30, alguns artistas passaram a usar a fotografia com o objetivo
de despertar a consciência da cidadania, frente a uma nova atitude, perante as
injustiças, a pobreza e a opressão. Logo, surgiu o conceito de Fotografia
102
Lewis Wickes Hine (1874–1940) sociólogo Norte-Americano, nasceu em Oshkosh, Wisconsin, foi fotógrafo
estadunidense, para ele a câmera era tanto uma ferramenta de pesquisa quanto um instrumento para a reforma
social. Hine comprou sua primeira câmera em 1903, aplicou suas fotografias em seu ensino e estabeleceu o que
ficou conhecido como Fotografia Documental.
130
Documental, neste contexto está situado o trabalho do americano Walker Evans
103
(1903-1975), Dorothea Lange
104
(1895-1965).
Walker Evans queria ser escritor e descobriu sua paixão pela fotografia nos
anos 20. Em 1935, entrou para o serviço da F.S.A. (Farm Security Administration),
uma organização federal criada pelo presidente Roosevelt
105
, cuja função desta
administradora era fazer um levantamento da situação agrícola do país e dar
solução à crise dos Estados Unidos da América durante o período da Grande
Depressão. O projeto foi lançado pelo presidente para dar provas de que a sua
política de assistência era a única solução para a pobreza do país (figura 112 e 113).
Figura 112 - Walker Evans.
Família do campo, 1936–1937.
Fotografia.
Fonte: http://media-2.web.britannica.com/eb-media/12/71212-004-
E27BC52A.jpg
Figura 113 - Walker Evans
Cozinha do agricultor, 1936.
Fotografia.
Alabama.
Fonte: http://www.twi-
ny.com/walkerevans.jpg
103
Walker Evans (1903-1975) fotógrafo americano mais conhecido por seu trabalho para a Farm Security
Administration para documentar os efeitos da Grande Depressão, que foi o período de grande recessão
econômica mundial na década de 1930.
104
Dorothea Lange (1895-1965) foi fotógrafa estadunidense. Nos anos 30, a serviço da Farm Security
Administration, ela percorreu vinte e dois estados do Sul e Oeste dos Estados Unidos, recolhendo imagens que
documentam o impacto da Grande Depressão na vida dos camponeses. É a autora da fotografia "Mãe
Emigrante", de 1936. Trata-se da mais famosa fotografia saída da FSA e uma das mais reproduzidas da história
da fotografia, tendo aparecido em mais de dez mil publicações.
105
Theodore "Teddy" Roosevelt, Jr. (1858-1919) foi um estadista, o 25° vice-presidente e o 26° (1901-1909)
presidente dos Estados Unidos da América. Em sua vida acadêmica estudou direito nas universidades de
Harvard e de Columbia. Em 1904 foi eleito presidente dos Estados Unidos, desta vez atuou de forma expressiva
na criação de reservas minerais e naturais para promover o desenvolvimento a todo custo do país. Investiu e
fortaleceu a Marinha e o Exército.
131
Além dos dois referidos artistas, fazia parte deste grupo: Russell Lee
106
(1903-
1986), Gordan Parks
107
(1912-2006), Jack Delano
108
(1913-1997), Arthur
Rothstein
109
(1915-1985) e outros, que foram empregados para divulgar as
condições das populações rurais pobres nos Estados Unidos. O projeto F.S.A. foi o
maior e um dos mais significativos na área documental na história da fotografia, que
era usada como prova e registro da miséria dos agricultores americanos,
dignificando, apesar de tudo, a pobreza que viviam.
O preto-e-branco caracteriza a história da fotografia documental. As imagens
mostram os americanos em casa e representam os grandes efeitos da Grande
Depressão com ênfase na pequena vila rural e o aumento da mecanização agrícola.
Algumas das mais famosas imagens retratam pessoas que foram deslocadas de
fazendas e migraram para cidades industriais ou para o Oeste em busca de trabalho.
A americana Dorothea Lange constitui uma das mais importantes
contribuições para documentários sociais de fotografia do século XX. Chocada com
o número de desalojados à procura de emprego durante a Grande Depressão
decidiu registrar imagens de pessoas na rua para chamar a atenção para aquela
situação e denunciou as condições de vida nas zonas rurais dos EUA (figura114).
De uma forma inflexivelmente direta, documentou a cruel pobreza dos trabalhadores
migrantes e das suas famílias. Uma das fotografias mais famosas do projeto FSA é
Mãe Migrante, o retrato de uma trabalhadora que migrou da Califórnia com os seus
três filhos (figuras 115).
106
Russell Lee (1903-1986) fotógrafo e jornalista formou-se como engenheiro químico em 1936, e tornou-se um
membro da equipe de fotógrafos reunidos sob Roy Stryker federal patrocinado pela Farm Security Administration.
Lee mudou-se para Austin, Texas, em 1947 e tornou-se o primeiro professor de fotografia na Universidade do
Texas em 1965.
107
Gordon Parks Roger Alexander Buchanan (1912-2006) foi um fotógrafo americano, músico, poeta,
romancista, jornalista, ativista e cineasta. Ele é mais lembrado por seu trabalho fotografia para a Revista Vida e
como diretor do filme 1971 Shaft.
108
Jack Delano (1913-1997) foi um fotógrafo americano, trabalhou para a Farm Security Administration (FSA) e
um compositor célebre pela sua utilização do material folclórico Porto-riquenho.
109
Arthur Rothstein (1915-1985) fotógrafo americano que durante a Depressão foi convidado por Roy Stryker
para aderir ao patrocínio federal da Farm Security Administration juntamente com um grupo de fotógrafos para
divulgar as condições das populações rurais pobres nos Estados Unidos.
132
Figura 114 – Dorothea Lange.
Cultura da enxada, 1936.
Fotografia.
Anniston, Alabama.
Fonte:
http://oseculoprodigioso.blogspot.com/2006/04/lange-
dorothea-fotografia.html
Figura 115 - Dorothea Lange.
Mãe imigrante, 1936.
Fotografia.
Nipomo, California.
Fonte:
http://oseculoprodigioso.blogspot.com/2006/04/lang
e-dorothea-fotografia.html
Durante a Segunda Guerra Mundial, Lange se afastou do trabalho da FSA,
mas a guerra abriu um novo capítulo em sua vida como fotógrafa. Entre 1942 e 1945
passou a documentar os nipo-americanos forçados a viver em campos de
concentração na Califórnia. Esses fotógrafos tiveram o mérito de documentar a
Depressão Americana dos anos trinta e, ao mesmo tempo, promover o valor artístico
da fotografia.
O norte-americano, de origem russa, Jack Delano, preocupado com a
condição humana, também comprometeu-se a abordar as questões sociais com a
sua fotografia. Ele começou a trabalhar para a FSA, em 1942, e retratou os
trabalhadores migrantes, produtores de tabaco, aviões, motor, plantas, barragens, e
a vida em Porto Rico, como podemos ver nas imagens abaixo.
133
Figura 116 – Jack Delano.
Mulher,em Ilhas Virgens 1941.
Fotografia.
Fonte:
http://farm3.static.flickr.com/2198/2114440238_01d
4e49072.jpg?v=0
Figura 117 - Jack Delano.
Colhedoras de Algodão, 1941.
Fotografia.
White Plains, Georgia.
Fonte:
http://www.bbc.co.uk/radio3/programmes/images/choppi
ngcotton.jpg
Outro nome que se destacou no campo da fotografia documental o da italiana
Tina Modotti
110
(1896-1942), grande personalidade no cenário artístico e político das
décadas de 20 e 30. O início de sua carreira ocorreu na sua mudança para os
Estados Unidos da América, onde conheceu o fotógrafo Edward Weston
111
(1886-
1958). Por muito tempo trabalhou como sua modelo e assistente e depois adquiriu
sua própria câmera. Após a morte de seu marido, foi para o México, país pelo qual
se apaixonou. Aprendeu com Weston a fotografar e foi, sem sombra devida, uma
das mulheres mais fascinantes de todo o seu tempo, como fotógrafa ou como
revolucionária sempre fez questão de retratar a realidade de maneira complexa.
110
Tina Modotti (1896-1942) foi uma fotógrafa italiana e grande personalidade nos cenários artístico e político
das décadas de 20 e 30. Foi sem sombra de dúvida, uma das mulheres mais fascinantes de todo o seu tempo.
Como fotógrafa ou como revolucionária sempre fez questão de retratar a realidade da maneira complexa e
concisa como via.
111
Edward Weston (1886-1958) nasceu em Highland Park, Illinois, foi um dos fotógrafos estadunidenses mais
importantes do século XX.
134
De 1923 a 1930, Modotti viveu no México se envolvendo na política
revolucionária, o tema de seu trabalho foi principalmente sobre os trabalhadores, as
mulheres e crianças, procurando denunciar as injustiças contra a população
mexicana. Durante a Guerra Civil Espanhola, entre 1936 e 1939, dedicou-se
completamente à fotografia e à luta contra o fascismo, regressou ao México somente
no final de sua vida.
As imagens produzidas por ela revelam um cuidado muito especial na arte de
fotografar. A luz é trabalhada nos detalhes e resulta em reproduções visuais cheias
de contrastes e texturas, podendo o apreciador, através de suas obras, até "sentir" o
calor do sol mexicano. Ao focalizar as várias perspectivas de imagens não se
reportou somente em temáticas sociais como a miséria e a dor, mas também
imagens alegres, símbolos e retratos, principalmente de mulheres. Portanto, trata-se
de uma artista complexa na produção imagética.
Figura 118 – Tina Modotti.
Mãos que Lavam, 1927.
Fotografia.
Fonte:http://maraclick.blogspot.com/2007/06/tina-
modotti.html
Figura 119 - Tina Modotti.
Mãos do Trabalhador, 1927.
Fotografia.
Fonte:http://maraclick.blogspot.com/2007/06/tina-
modotti.html
Atualmente no Brasil, alguns fotógrafos também trabalham com essa mesma
ideologia, como é o caso do brasileiro Pedro Martinelli
112
(1950-), que busca
denunciar os fatos que estão acontecendo no país, sobre miséria, destruição,
112
Pedro Martinelli (1950-) iniciou a carreira de fotógrafo no Diário do Grande ABC de Santo André, SP (1968).
Entre 1970 e 1975 trabalhou nos jornais Última Hora e O Globo no Rio de Janeiro. Nesta época passou três anos
na Amazônia com a expedição dos irmãos Villas-Boas para documentar o primeiro contato com os índios
Kranhacãrore. De volta a São Paulo foi fotógrafo contratado pelo Governo do Estado de São Paulo (1975-1977),
fotógrafo e editor de fotografia na revista Veja (1977-1983) e diretor de serviços fotográficos no conjunto de
revistas da Editora Abril (1983-1994).
135
injustiças, desmatamento da Amazônia e o pouco que está sendo feito pela
população e autoridades para reverter esse quadro.
Martinelli começou como fotojornalista quase trinta anos e trabalhou nos
principais jornais e revistas do Brasil. Esteve em muitos lugares, fotografou guerras,
futebol, alegrias e misérias. A imagem abaixo foi capa da Revista Veja exibida em 23
de Janeiro de 2002, edição 735, mostrando a miséria da população brasileira no
Vale do Jequitinhonha, em Minas Gerais, onde as pessoas vivem em condições
extremamente precárias, dormindo num entrelaçado de palhas (figura 120).
Figura 120 - Pedro Martinelli.
A Miséria Brasileira, 2002.
Fotografia.
Fonte:
http://atualaula.vilabol.uol.com.
br/miseria.htm
Em 1970, Pedro Martinelli, trabalhando para o jornal O Globo, foi chamado
para acompanhar os irmãos Villas Boas
113
, Orlando (1914-2002) e Cláudio (1916-
1998), em uma expedição histórica à Amazônia em que teve o primeiro contato com
os índios gigantes, os Kranhacãrore, hoje conhecidos como Panarás. Depois de
viajar pelo mundo, resolveu deixar o emprego formal, e em 1994, transformou a
Amazônia em objetivo de vida. Viajou por seis anos e fez os livros Amazônia, O
Povo das Águas
e Mulheres da Amazônia (Figura 121). Por desenvolver este
trabalho é considerado um dos fotógrafos mais importantes e audaciosos do país.
113
Irmãos Villas Boas - Orlando (1914-2002) e Cláudio (1916-1998) - Nasceram em Botucatu, no interior de são
Paulo, e resolveram trocar o emprego e a vida na cidade pela selva, dedicando grande parte de sua vida à
defesa dos povos indígenas.
136
Figura 121 - Pedro Martinell.
Rio Içana, 1997.
Fotografia.
Amazonas, Brasil.
Fonte:http://site.pirelli.14bits.com.br/files/work/ima
ge/730/400px_CP0730_13_42.jpg
Em uma entrevista à Revista Claúdia, realizada pela jornalista Sibelle Pedral,
em agosto de 2006, fez um desabafo sobre o desmatamento da Amazônia
afirmando que o plano de manejo sustentável que indica as espécies que precisam
ser preservadas é tratado com desleixo, sendo pura ficção. Disse ainda que as
madeireiras o as grandes predadoras da Amazônia, pois deixam de lado os
planos de manejo que recebem porque não há fiscalização. Outro comentário foi que
o Parque Nacional do Xingu virou uma ilha com um deserto em volta, estando
cercado de pastos e soja, e mesmo tendo gente séria tentando salvá-lo todo o
processo é muito lento não acompanhando a tecnologia da destruição que é rápida.
O fotógrafo também mencionou as comunidades ribeirinhas, cuja cultura se
destaca pela arte, estética, arquitetura, culinária e por habitantes que pescam em
rios violentos e o atacados por formigas na roça. Nessas regiões, a miséria existe
mas não a fome, que tem peixe e mandioca. Martinelli finalizou dizendo que não
tinha esperança que a situação melhorasse, confiava que haveria uma revisão total
delimitando áreas de utilização, que iriam dar um basta no desmatamento aleatório e
137
indiscriminado, mas que agora não tem mais jeito, a Amazônia é muito frágil e que a
vegetação foi destruída de tal modo que os corredores da fauna estão
desaparecendo, mas não iria desistir de brigar pela preservação da maior reserva de
mata nativa do planeta.
Atualmente está realizando um projeto que é o de resgatar as raízes do povo
brasileiro, contando a história do indivíduo que habita a Amazônia, resgatando a
história do índio, do caboclo que vive às margens do rio.
A escritora e jornalista Simonetta Persichetti fez uma entrevista a Pedro
Martinelli, para o jornal O Estado de São Paulo publicada no dia 01 de março de
1996, editado em seu livro Imagens da fotografia Brasileira em 2000, no qual o
fotógrafo esclareceu que:
A fotografia no mundo é um documento real da vida como ela é. Não
tem mentira. Se você montar, ela mostra que foi montada, se você
produzir, ela mostra que foi produzida e, se você fotografar o que
está acontecendo, ela mostra o que está acontecendo. Você aperta
um botão e, no mínimo, está registrando um momento único de uma
época, de uma geração, de um pedaço de terra. É emoção. Ou você
passa o que quer dizer ou não passa. Ela é imediatista. Ou você
gosta ou não gosta. Comunicação imediata. Eu vivo disso. É o meu
oxigênio (1996 apud PERSICHETTI, 2000, p. 50.).
Conforme as palavras de Martinelli, as fotos são representações de um fato
em uma realidade específica, sua característica fotográfica é levar a verdade,
despertar a consciência da população e resgatar a história de pessoas que lutam
para sobreviver. Através de seu trabalho, consegue mostrar a realidade do Brasil,
em especial da Amazônia, que está aos poucos sendo destruída pelo homem.
Ao contrário de Martinelli, que sente paixão pela floresta, o fotógrafo Cristiano
Mascaro
114
é atraído pela vida urbana. Ele consegue extrair da cidade o que melhor
existe nela, sendo chamado de arquiteto da fotografia, de narrador da cidade.
Arquiteto por formação teve seu primeiro contato com a fotografia através da
imagem do fotógrafo Cartier-Bresson
115
editada em 1954. vinte anos a paisagem
114
Cristiano Mascaro (1944-) além de arquiteto é um dos mais importantes fotógrafos da arquitetura da capital
paulista, documentando-a sistematicamente há mais de duas décadas.
115
Cartier-Bresson (1908-2004) nasceu em Chanteloup, na França. Jovem, descobriu o universo das artes
plásticas e tornou-se pintor e desenhista antes de completar 20 anos. Foi um dos mais importantes fotógrafos do
século XX, considerado por muitos como o pai do fotojornalismo. Foi fotógrafo oficial do exército francês durante
a Segunda Guerra Mundial, documentou a Rússia comunista após a morte de Stalin, em 1954, fotografou o
décimo aniversário da Revolução Popular Chinesa.
138
urbana (figura 122) é o foco de seus trabalhos dando grande importância ao
cotidiano, ao comportamento humano.
Figura 122 – Cristiano Mascaro.
São Paulo, 1990.
Fotografia.
Gelatina/prata tonalizada.
25,7 x 26,0 cm.
Bolsa Vitae de Artes, 1998.
Fonte:
http://site.pirelli.14bits.com.br/autores/11/obra/37
O humanista paranaense João Urban (1943)
116
também trabalhando com a
tendência social, é fotografo publicitário e durante anos registrou a imigração
polonesa e o trabalho de bóias-frias no Paraná, principalmente em Curitiba. Desde
os anos 60 se dedica à fotografia documental e publicitária, especialmente aos
ensaios sobre temas sociais com forte apelo pelo registro da memória.
O ano de 1966 marcou o ingresso de João Urban nas atividades da
resistência à ditadura. Sua fotografia, que naquela época recebia influência dos
fotógrafos do FSA
117
, colocou-o frente a frente aos graves problemas do campo, da
cidade e às questões impostas pelo regime político. Foi neste contexto que a
imagem estava fortemente marcada pela intenção de denúncia social e política.
A partir daí, sua câmera voltou-se para as pessoas na rua, para as passeatas,
presídios, pescadores, trabalhadores do campo, tendência que, de uma forma ou de
outra, foi marcante em sua trajetória. Em seus livros retratou os trabalhadores rurais
e urbanos, o cotidiano, a religiosidade, o folclore, os hábitos e as características de
comunidades de pequenas e grandes cidades expressando sua predileção pelas
origens e raízes do povo paranaense.
116
João Urban (1943-) nasceu em Curitiba, Paraná, em 1943, filho de pai polonês e mãe filha de imigrantes
poloneses, é fotógrafo publicitário desde 1977, faz ensaios fotográficos sobre bóias-frias e imigrantes poloneses
no Paraná. Teve interesse em documentar suas raízes e memórias, após ser convidado por um Banco para
fotografar as colônias polonesas perto de Curitiba para uma exposição em homenagem ao papa João Paulo II
quando este visitou o Brasil em 1980. Entre os principais livros estão Bóias frias, publicado primeiro na Alemanha
em 1984 e, somente, em 1988 no Brasil; Tropeiros (1992); Aparecidas (2002); e Tu i Tam (1984).
117
Farm Security Administration: Serviço de Previdência Rural da época da depressão americana.
139
Entre 1976 e 1981, organizou um trabalho voltado aos trabalhadores rurais,
de qual resulta o seu primeiro livro Bóias-frias, lançado no Brasil em 1988.
A jornalista Simonetta Persichetti também editou em seu livro “Imagens da
Fotografia Brasileira no ano 2000” a entrevista a João Urban, para o jornal O Estado
de o Paulo publicada no dia 01 de março de 1996, na qual o fotógrafo definiu o
bóia-fria da região agrícola do sul como:
[...] uma pessoa tão desprovida de tudo, com uma vida tão difícil,
usufrui tão pouco do desenvolvimento que isso acaba sendo uma
indefinição. Imagine uma pessoa que as quatro da madrugada vai
para um ponto onde, se houver trabalho, se apanhada por um
caminhão e conduzida para uma lavoura a dezenas de quilômetros.
Se for durante o inverno, provavelmente a temperatura estará perto
de zero grau. Ela trabalha até o final da tarde, voltando para a cidade
na boca da noite, onde vai beber a cachaça da pior espécie e
recomeçar o ciclo do dia seguinte. E os filhos e as filhas... É meio
difícil de definir (1996 apud PERSICHETTI, 2000, p. 39).
Essa rotina de vida realmente acontece com o bóia-fria, que trabalha de sol a
sol, que se alimenta da comida gelada e não tem muita esperança de um dia
melhorar de vida. Infelizmente, este fato ocorre para a maior parte dos trabalhadores
que vivem no interior de muitos estados do país, principalmente aqueles que vivem
na zona rural.
A imagem dos bóias-frias retrata a situação real dessa gente, seres humanos
que lutam pela sobrevivência, homens e mulheres que estão em busca de algo mais,
pessoas trabalhadoras que ainda de madrugada saem para o trabalho, cada qual
com sua enxada nas mãos, ferramenta de seu trabalho. Fazem parte de uma classe
que é produto da história servindo de exemplo e de coragem, mas que pode um dia
não existir mais. Urban registra com sua câmera a imagem de um grupo de pessoas
com seus valores culturais, para que o homem trabalhador brasileiro, digno pelo seu
valor e ideais humanos, não seja esquecido.
140
Figura 123 – João Urban.
Bóias–Frias Rumo ao Ponto, 1984.
Fotografia.
Fonte: endereço eletrônico.
Figura 124 - João Urban.
Série Bóias-Frias: Colhedores de Algodão,
1987.
Fotografia.
Bandeirantes, Paraná.
Fonte: Livro Imagens da fotografia
Brasileira, p. 44.
Como se pode observar na figura 123 os ias-frias estão saindo para o
trabalho ainda de madrugada, indo enfrentar um dia de trabalho árduo pela frente.
Na outra fotografia (figura 124), nota-se que é final de tarde, pois as pessoas
possuem aparência de cansaço, após um dia inteiro de colheita. Percebe-se que os
trabalhadores aguardam a pesagem do algodão para, então, poder ir para a casa de
caminhão ou talvez a pé. Com certeza as mulheres ainda terão que fazer os serviços
domésticos, como dar banho nos filhos, lavar a louça, fazer a janta e deixar
preparada a refeição do dia seguinte.
Esse é mais um exemplo que permite afirmar como a fotografia expressa a
realidade, é o registro de algo que aconteceu num determinado momento da história,
servindo como prova e testemunho de uma verdade autêntica, podendo ser um
documento histórico. Cada fotógrafo tem o seu trabalho, retratando cada um sua
temática, buscando as mais diversificadas imagens da vida humana e das
paisagens. O resultado de sua produção é a história de uma cultura de um povo,
fruto de um momento, a fotografia é o resultado daquele instante congelado que se
modificará em seguida e jamais sefotografado novamente em sua totalidade.
141
Deste modo, um dos mestres da Fotografia Documental, atualmente, é o
brasileiro Sebastião Salgado, no início de sua formação fez mestrado em economia,
pela Universidade de o Paulo, mas não seguiu essa profissão. Nos anos 60
mudou-se para Paris, momento esse conturbado politicamente. Em 1973 decidiu
tornar-se fotógrafo. Leila, sua esposa, comprou a primeira câmera fotográfica do
casal. Salgado trabalhava para a organização Internacional do Café em Londres e
foi enviado para Angola para coordenar um projeto sobre a cultura do café no país.
Levou a câmera e vários filmes, que passou desde então a registrar o mundo, o ser
humano, ou seja, trocou a economia pela fotografia:
Salgado não faz distinção entre mundo e indivíduo. Eles estão
misturados, o indivíduo se relaciona de maneira dialética com o
mundo, transformando e sendo transformado por ele. Ele e
registra esse mundo que como afirma é um mundo de exploração,
desencontros, descobertas, sonhos, discussão e consciência. Um
mundo que é momento e realidade. Um mundo feito pelo “bicho-
homem”, pela ideologia, pela história e pelo trabalho
(PERSICHETTI, 1995, p.73.).
Na reflexão feita por Simonetta, é possível perceber que Sebastião Salgado
retrata a desvalorização do ser humano, a miséria, a falta de recursos e cultura de
grande parte da população brasileira. Ele fotografa sentimentos comuns a toda a
humanidade, acreditando que a fotografia tem muita força, servindo de instrumento
para uma abordagem crítica provocando o pensamento e a possível transformação
do real.
Apesar de seu trabalho ter pouca divulgação no país, pelo fato de ter passado
muito tempo em Paris, Salgado é profundamente brasileiro. Em uma entrevista à
Revista Veja de 1997, publicada no dia 12 de março, diz que em seu apartamento
na capital francesa, canta-se, samba-se e ainda come-se comida capixaba,
acrescentando também:
Tudo o que eu faço tem a ver com o Brasil. Eu não quero morrer no
estrangeiro, não. Concordo que não sou um fotógrafo brasileiro, no
sentido de que não aprendi fotografia no Brasil, não conheci as
dificuldades de obter equipamentos nem a falta de material do país.
Mas, na fração de segundo de cada foto que tiro, eu estou
interferindo com minha Aimorés, minha mãe, meu pai, minha escola,
com a minha vida, a minha luz. E tudo isso é brasileiro (REVISTA
VEJA, 1997, pp. 75 e 80).
142
Desta maneira o fotógrafo sempre desenvolveu suas obras demonstrando
uma preocupação com o povo, o trabalhador, retratando a miséria humana
provocada pela desigualdade econômica e pelos efeitos nefastos da globalização
que acontece no mundo, jamais se esqueceu do país onde nasceu e viveu grande
parte de sua vida.
Por meio de sua arte preocupa-se com o momento histórico em que vive, sem
pretensão nenhuma de ser um artista. Em uma entrevista para o editor da Revista
Playboy, Humberto Werneck, no ano de 1997, Salgado declarou que:
Eu me defino como repórter, como um fotógrafo documentarista.
Estou ligado no momento histórico em que vivo. Não tenho pretensão
nenhuma à priori de ser um artista. De forma nenhuma. Faço
exposição no mundo inteiro, mas não é porque expus nos maiores
museus que sou um artista. Minhas fotos poderão ser consideradas
arte se vierem a ser trabalhos de referência, se várias gerações
vierem a se inspirar nelas (REVISTA PLAYBOY, 1997, p. 21).
Portanto, este é o grande diferencial de Salgado em seu trabalho profissional
não apenas em função da arte, mas da mensagem que ela pode levar, criando
conceitos sobre um contexto social. Suas imagens poderiam até ser consideradas
arte, revelam o mundo com base em conhecimentos universais a partir de
interpretações críticas e políticas.
Existe, portanto, um paralelo entre o pintor Portinari e Salgado, pois
desenvolvem a mesma temática de crítica social sobre a imagem do trabalhador
brasileiro na zona rural.
Um brasileiro que esteve pelo mundo inteiro convivendo com as maiores
belezas naturais do planeta, contudo priorizou em seus registros a dor do mundo,
expressada na pobreza, na miséria, na fome e nos trabalhos desumanos. Assim a
jornalista Simonetta Persichetti escreve:
As fotos de Salgado são um contar sem palavras, são imagens que
não precisam de explicação, que sobrevivem sozinhas. Não importa
muito saber em que parte do mundo foram conseguidas essas
imagens, mas sim como elas nos contam sua história, como se
deixam desvendar para quem se propõe a isso, como contam sua
vida, que vai muito além do que aquilo que a luz fixou no filme e foi
revelado no papel, como elas acabam sendo criadoras de modelos
de vivência (PERSICHETTI, 1995, p. 49).
143
Assim, a fotografia apresenta questões que estão além das imagens que
permitem pensar sobre o que o foco da câmera é capaz de revelar e que,
independentemente da interpretação, causam impacto nas situações encontradas
pelo próprio homem, expressando a sensibilidade do artista ao revelar suas
angústias e paixões. Trata-se de um instrumento de exploração da imagem vivida e
desvendada a partir do plano político e sentimental, fatos ou situações que devem
ser compreendidos, levando a uma abordagem crítica do contexto. Ele retrata o
instante da história social vivenciada pelo ser humano.
Sebastião Salgado se destaca porque suas fotos mostram a realidade da
vida; não a realidade burguesa e confortável, mas sim a “realidade real”, aquela que
não se esconde atrás de estatísticas oficiais nem de propagandas eleitoreiras, mas
uma realidade nua e crua da vida do povo, e isso é pura ideologia. É um trabalho
profissional, não em função da arte, mas em função da mensagem que pode levar,
criando a conscientização.
Na Revista Fórum, edição 8 de 2002, entrevistado por Eduardo Maretti,
Salgado deu a seguinte declaração sobre seu trabalho:
A cultura não pode ser dissociada do mundo em que vive. Precisa ter
comprometimento. Não estou falando em comprometimento militante,
mas tem de servir para informar, para integrar. Acho que essa idéia
difundida aqui no Brasil de uma cultura puramente elitista tem que
mudar (REVISTA FÓRUM, 2002, p. 7.).
Logo, o fotógrafo acredita que a cultura deve ser difundida a toda população,
pois os bens de consumo desaparecerão e restará apenas um pouco de literatura,
música, pintura, sendo essa a nossa verdadeira história.
Salgado, por exemplo, mostra a realidade do trabalhador seguindo a linha
artística de contornos, luzes e enquadramento. Ele utiliza as lentes de sua quina
para contar histórias através de fotos, como um narrador que, em vez de palavras,
usa a imagem fotográfica para registrar uma verdade.
A função social da arte fica clara à medida que ela denuncia e transforma o
conhecimento realista do mundo. O artista transforma os elementos da cultura, em
sua natureza poética, através da leitura de mundo. Suas produções são frutos de
seu universo particular e coletivo, de situações íntimas e sociais, retratando e
relatando fatos históricos, culturais, registrando padrões estéticos de uma época ou
144
sociedade, percebendo o mundo e criando formas de interpretação sensíveis.
Novamente, de acordo com Simonetta:
[...] desde o nascimento da fotografia vários foram os fotógrafos que
acreditaram neste papel da imagem. Devemos ter o cuidado de não
vê-la apenas como denuncia, panfletagem, ou militância, mas
perceber que ela é um resgate de um momento que é único. Um
pintor pode pintar de memória, um escritor pode se deixar levar por
seus delírios, mas um fotógrafo precisa estar ali no lugar certo, no
momento certo, precisa estar atento ao que lhe acontece ao seu
redor, precisa conhecer, além de seu equipamento, a luz, matéria-
prima de seu trabalho, precisa estar disposto a agir, ter vontade,
estar consciente de seu papel (PERSICHETTI, 1995, p. 74).
Tratando-se do papel da construção social e artística, a fotografia e o
fotógrafo são representados pela presença e sensibilidade de transformação ou até
de permanência em que a imagem não é simplesmente vista, mas discutida em uma
realidade visual. Portanto, ela é o foco de ações congeladas sob o olhar atento de
um espectador. Ao escolher o tema principal de seu trabalho, que é o ser humano,
cria situações para modificar nosso pensamento, para refletir através da imagem
sobre o momento de ruptura que ocorre ao depararmos com suas fotografias, que
nos mostra a realidade do mundo.
A fome e a miséria, além de causarem muitas mortes e sofrimentos, também
arrancam raízes, "desmemoriam" a sociedade que se depara como em outros
tempos com grupos nômades ansiosos por chegarem a algum lugar, predestinados
a obterem coisas, sejam elas quais forem.
O final do século XX, denominado pelo historiador britânico Eric Hobsbawm
118
como “desmoronamento”, revelou uma situação de crise, de incerteza, mas, como
toda crise, trouxe consigo possibilidades de mudanças. Essas possibilidades podem
ser potencializadas por agentes solidários e sonhadores. O mesmo autor afirmou
que:
O culo XX foi o mais assassino de que temos registro, tanto na
escala, freqüência e extensão da guerra que o preencheu, mal
cessando por um momento na década de 20, como também pelo
volume único das catástrofes humanas que produziu, desde as
maiores fomes da história até o genocídio sistemático (HOBSBAWM,
1995, p. 201).
118
Eric J. Hobsbawn nasceu em 1917, em Alexandria no Egito, historiador, professor e escritor de diversos livros,
como: A era das revoluções, A era do capital, A era dos imrios, A era dos extremos, entre outros.
145
Quem sabe, o século XXI possa entrar na história com uma feição mais
solidária, afinal, este é o momento em que se vive, e a ação, portanto, deve
acontecer no presente para que o futuro possa incluir em seu conteúdo os atuais
excluídos.
Milhares de pessoas passam fome no mundo inteiro, o Brasil não poderia
fugir a essa regra, tanto é que existe muita pobreza espalhada por seu continente,
no qual a grande maioria da população tem renda muito baixa e vive em situações
precárias. A ONU considera a população do sertão nordestino e do vale do
Jequitinhonha, em Minas Gerais, com rendimento abaixo da linha da pobreza,
equiparada com as regiões pobres da África. Esperar que somente as autoridades
competentes resolvam a situação é se esquivar de uma ação solidária e urgente, é
se esquecer do dever de cidadãos, pois este problema é secular e que nunca houve
tentativa eficaz de solucioná-las. Felizmente, a sociedade, cada qual a sua maneira,
mobiliza-se para auxiliar as pessoas atingidas pelas dificuldades de sobrevivência, e
também por tragédias naturais.
Salgado retratou todos os tipos de seres humanos e paisagens, para ele o
importante é que suas imagens possam transmitir uma mensagem que traga
reflexão e conscientização sobre os problemas que atingem a todos, como nas
figuras a seguir:
Figura 125 – Sebastião Salgado.
Família com onze filhos, 1983.
Fotografia.
Tauá, Ceará.
Fonte: Livro Terra, p. 33.
Figura 126 – Sebastião Salgado.
Itabuna, 1990.
Fotografia.
Sul da Bahia, Brasil.
Fonte: Livro Terra, p. 32.
As fotos acima revelam, de forma não explicita, o interesse de Salgado em
expressar imagens de crianças em atividades ou ações diferenciadas. Na figura 125,
pode-se notar uma família no interior de uma casa, provavelmente na parte da
cozinha, onde o espaço comum é dividido pelos habitantes mais íntimos. Entre os
146
membros, aparecem onze filhos, cena que mostra a popularmente conhecida
“escadinha” entre irmãos, que é comum no interior do Brasil, pois estes representam
parte da mão-de-obra no campo. A simplicidade envolve o ambiente que tem em
suas paredes utensílios de uso diário e registros fotográficos dividindo esse espaço
que abriga pessoas e animais.
Por outro lado, na figura 126, de acordo com o livro Terra (1997, p. 32),
uma criança
fazendo os deveres escolares e tomando conta de dois irmãos,
enquanto a mãe trabalha na colheita de cacau na região de Itabuna, no sul da Bahia
(1990). Outra realidade que percebemos através da imagem é a atividade das
crianças como participantes da sociedade rural.
Figura 127 – Sebastião Salgado.
Criança sofrendo de desnutrição, 1983.
Fotografia.
Ceará
Fonte: Livro Terra, p. 65
Figura 128 – Sebastião Salgado.
Transporte de água a longa distância, 1983.
Fotografia.
Piauí.
Fonte: Livro Terra, p. 66.
A fuga e procura por melhores condições de vida principalmente nas cidades
do interior do Brasil, passou a ter representações trágicas como a falta de água e as
longas caminhadas feitas durante o processo de migração. Geralmente, as crianças
são as mais prejudicadas e devido a sua fragilidade, tanto na formação como na
composição de sua estrutura corporal, acabam contraindo doenças e males
permanentes em sua vida, como se observa nas figuras anteriores (127 e 128).
147
Figura 129 – Sebastião Salgado.
Parambu, 1983.
Fotografia.
Ceara.
Fonte: Livro Terra, p. 21
Na fotografia (figura 129), de 1983 em Parambú, o fotógrafo mostra que não
esqueceu da experiência e suas marcas. Pode-se observar a idéia de expressão
que o autor procura transmitir a partir do sofrimento, simplicidade e reconhecimento
das transformações que o tempo e as forças da natureza provocam.
Em virtude de seus projetos fotográficos Salgado esteve em muitos países
e conseguiu retratar as dificuldades enfrentadas por este enorme contingente
populacional que se desloca em todo mundo em busca de condições sociais mais
dignas. O sonho de viver segundo os padrões ocidentais do primeiro mundo e a
necessidade de fugir da fome e da miséria levam essas pessoas a se movimentarem
constantemente.
A dor, o sofrimento e o olhar triste, embora esperançoso, que a câmera deste
fotógrafo humanista consegue registrar, lembra o quanto tem que ser feito pela
sociedade. Salgado, ao mostrar a face dessa gente sofrida, mostra também que não
é possível permanecer passível diante dessa situação.
As pessoas lutam cada uma à sua maneira, pela sobrevivência, pelo direito à
vida. A diferença vem dos recursos que cada cidadão dispõe para enfrentar a
batalha. A seca, sempre expulsou impiedosamente o retirante de seu habitat, sem
permitir sequer uma chance de recomeço. Ele se locomove em busca de algo que
está sendo negado em um determinado espaço, mas que poderá ser oferecido por
outro, mais generoso, que comporta sonhos e desejos.
148
3.3 A Arte Mágica da Fotografia
A fotografia surgiu oficialmente no dia 19 de agosto de 1839, quando se
anunciou em Paris que o artista Francês Louis-Jacques Mandré Daguerre
119
(1798-
1851) havia inventado um processo para fixar uma imagem num papel especial.
Tanto o processo, quanto o aparelho utilizado e o resultado final receberam o nome
de daguerreótipo
120
. Esse procedimento foi aperfeiçoado até produzir o que
conhecemos atualmente como fotografia.
Segundo pesquisas realizadas pelo fotógrafo e estudioso Boris Kossoy
121
, um
brasileiro de origem francesa, chamado Hercules Florence
122
(1804-1879) vinha
fazendo avanços na técnica de registrar imagens, com o objetivo de imprimir rótulos
de produtos farmacêuticos, seis anos antes da invenção de Daguerre vir a público.
Ele foi também o primeiro a usar a palavra photographie, em meados de 1833, seu
invento era capaz de registrar o negativo da imagem em um papel revestido com
nitrato de prata. Entretanto, oficialmente, considera-se o ano de 1839 e os trabalhos
de Daguerre como ponto de partida da fotografia.
No entanto, a invenção não pode ser apresentada como pertencente a uma
única pessoa, mas resultou de intensas pesquisas de vários cientistas. O fato é que
em 1840, os fotógrafos podiam percorrer o mundo com seus equipamentos e
retratar as pessoas e paisagens, embora fosse impossível a captação de um
flagrante, de um movimento rápido, sendo que o objeto retratado tinha que ficar
imóvel por alguns minutos. Os equipamentos eram muito pesados e de difícil
manuseio, considerando também o alto custo do processo. A possibilidade do
registro da imagem em movimento só aconteceu no ano de 1860.
119
Louis-Jacques Mandré Daguerre (1798-1851) foi comerciante e pesquisador francês, tendo sido o primeiro a
conseguir uma imagem fixa pela ação direta da luz (1835 - o daguerreótipo).
120
Daguerreótipo - Imagem produzida pelo processo positivo criado pelo francês Daguerre. No daguerreótipo, a
imagem era formada sobre uma fina camada de prata polida, aplicada sobre uma placa de cobre e sensibilizada
em vapor de iodo. Após a exposição a placa era revelada em vapor de mercúrio e fixada em solução de tio
sulfato de sódio.
121
Boris Kossoy (1941-) nasceu em São Paulo, formado em arquitetura pela Universidade Mackenzie, historiador
da fotografia, fotógrafo, pesquisador, professor, crítico, museólogo, desde meados dos anos de 1960 dividia seu
tempo entre a prancheta de arquiteto e a câmara fotográfica.
122
Antoine Hercule Romuald Florence (1804-1879) foi um polígrafo e desenhista francês que passou a maior
parte de sua vida no Brasil, na cidade de Campinas. Foi um dos pioneiros da fotografia na América Latina.
149
No ano de 1888, um cidadão comum podia possuir seu próprio equipamento,
que era um caixote preto, de trinta centímetros, nesta mesma época, surgiu no
mercado a câmera Kodak
123
, a primeira a utilizar um filme de rolo.
Na cada de 1920 é que o repórter fotográfico ganhou as ruas, deixando de
lado o pesado equipamento utilizado no final do século XIX, realizando a fotografia
instantânea, surgiu a discreta câmera Leica
124
, inventada pelo alemão Oskar
Barnak
125
(1879-1936), que possuía proporções pequenas, trabalhava com filme de
até 36 poses, fazendo com que o repórter pudesse atuar sem ser visto e captar
qualquer ação em décimos de segundo. Surgiu então o Fotojornalismo Moderno.
O francês Henri Cartier-Bresson descobriu, aos 22 anos, verdadeiramente, a
fotografia inspirado por uma imagem captada pelo húngaro Martin Munkacsi
126
,
publicada na revista Photographies no ano de 1931. Nessa fotografia são mostrados
três rapazes negros correndo em direção ao mar, no Congo (figura 130):
123
câmera Kodak, em 1878 George Eastman, um jovem bancário norte-americano, incentivado por amigo,
decidiu fotografar um passeio, o que fez com e se apaixonasse pela fotografia. Em 1880, descobriu a fórmula
ideal para produzir chapas fotográficas e fundou a Eastman Dry Plate, em Rochester, Nova Iorque, fabricante da
máquina fotográfica Kodak, demonstrando a vocação global da Kodak, pois gradativamente instalou filiais ao
redor do mundo. Em 1888, os norte-americanos conheceram a primeira câmera portátil, era do tipo caixão,
carregada com um rolo de papel para 100 exposições. Em 1889 foram colocados à venda os primeiros rolos de
película transparente. Com base nesta película, Tomas Edison constrói um aparelho para registrar as imagens
em movimento. Também neste ano é formada a Eastman Kodak Company.
124
câmera Leica foi uma máquina fotográfica produzida por uma empresa alemã, Ernst Leitz Wetzlar, a partir de
1912. Era uma pequena caixa de metal, na qual foi colocada uma lente do tipo das que eram usadas em
telescópios, um obturador de velocidade única (1/40s) e o mecanismo para que ela usasse o filme de cinema da
época, porém com o tamanho do fotograma duplicado. O fotograma do cinema usava 12x36mm e Oskar Barnack
passou a usar 24x36mm, pois acreditava que assim as fotografias teriam uma melhor qualidade de imagem para
as ampliações. Estava então criada a câmera que seria conhecida como Ur-Leica, ou Leica, o protótipo de uma
nova era na fotografia mundial.
125
Oskar Barnack (1879-1936) foi um alemão, na infância sonhava em ser pintor, mas seu pai lhe induziu a ser
técnico em mecânica de precisão, designer industrial, em suas folgas dedicava-se na construção de câmeras
para o cinema, conseguindo fazê-la em 1912, também desenvolveu a câmera fotográfica para que essa fosse
realmente portátil, criando assim o primeiro protótipo da câmera Ur-Leica.
126
Martin Munkácsi (1896-1963), fotógrafo húngaro, foi o precursor da fotografia moderna, sobretudo, do
fotojornalismo, especializado em esportes. Na época a fotografia só podia ser feito pela iluminação natural. Foi o
inovador dos esportes, pois suas fotografias eram meticulosamente compostas pela ação, que obrigava ambas
as habilidades técnicas e artísticas.
150
Figura 130 - Martin Munkácsi.
Negros correndo em direção ao mar, 1929.
Fotografia.
Fonte:
http://fotobibliografica.ca/media/Munkacsi_Tanganyika.jpg
Em 1932, iniciou sua carreira fotográfica com sua câmera alemã leica, tornou-
se o mais influente fotojornalista de sua época, inspirando gerações de fotógrafos e
desenvolvendo um estilo definido como a busca pelo "momento decisivo", ou seja, o
instante, a essência de uma situação, considerando que o registro de uma imagem
deveria ser rápida. Desprezava fotografias arranjadas e cenários artificiais e não
realizava nenhum tipo de retoque ou manipulação da imagem.
Ele procurava valorizar o momento exato de apreensão da imagem,
considerando que o nosso instinto deve estar preparado para captá-lo e que o
flagrante do movimento e do equilíbrio é essencial para atingir assim a perfeição da
fotografia. O mesmo registrou vários temas em sua trajetória de trabalho, como as
guerras e a fome (figuras 131 e 132).
151
Figura 131 - Henri Cartier-Bresson.
Índia, 1947-1948.
Fotografia.
Fonte: endereço eletrônico.
Figura 132 – Henri Cartier-Bresson.
Índia, 1950. Tamil Nadu.
Fotografia.
Fonte:
endereço eletrônico.
No ano de 1947, Cartier-Bresson decidiu fundar uma cooperativa de
fotógrafos, batizada com o nome de Magnum Photos. Com o tempo a agência foi
aumentando seu quadro de profissionais, seguindo um processo de triagem, em
1979 acolheu o brasileiro Sebastião Salgado como associado. Embora os dois
nunca tenham trabalhado juntos, que Bresson se afastou da Magnum treze anos
antes de Salgado fazer parte da cooperativa, pois retornou a sua dedicação à
pintura e ao desenho.
Qualquer que seja o tema representado numa fotografia, ela traz lembranças
de uma época que passou, sendo um instrumento de descobertas e análises de
fatos passados. Como afirma o pesquisador e historiador Boris Kossoy:
O fragmento da realidade gravado na fotografia representa o
congelamento do gesto e da paisagem, e portanto a perpetuação de
um momento, em outras palavras, da memória: memória do
indivíduo, da comunidade, dos costumes, do fato social, da paisagem
urbana, da natureza. A cena registrada na imagem não se repetirá
jamais. O momento vivido, congelado pelo registro fotográfico, é
irreversível (KOSSOY, 2001, p. 155).
152
Portanto, a fotografia passa a ser um meio de expressão individual, mas
também um instrumento de conhecimento do mundo. O fotógrafo registra e
documenta uma determinada realidade visual, reproduzindo-a com muita perfeição,
passando a gerar informações como valor documental e artístico.
O sistema produz uma imagem obtida através de um recurso mecânico, como
a máquina fotográfica, e o simples fato do fotógrafo escolher o que vai retratar,
demonstra sua sensibilidade. Ele procura a intensidade da luz que acha mais
adequada, selecionando outros elementos que poderão compor a imagem. Com
isso, altera de certa forma, a realidade e imprime seu modo original de ver o mundo
ao redor.
O surgimento dessa invenção criou um debate entre os artistas e críticos
sobre a arte em geral, provocando alguns questionamentos como: se a fotografia
substituiria a pintura e, principalmente, se seria capaz de reproduzir a realidade. Um
século depois, pode-se dizer que a pintura tem seu espaço enquanto elemento de
arte, e a fotografia representa a realidade registrada por ela, porém com uma
linguagem própria, podendo ser analisada e interpretada como um objeto histórico e
iconográfico.
Desde sua criação, passou-se a viver em um mundo cada vez mais dominado
pela imagem. Nas palavras de Boris Kossoy:
A partir do momento que a fotografia permitiu sua reprodução na
página impressa dos jornais, das revistas, e das inúmeras
publicações ilustradas, passaram a transmitir as imagens
encomendadas dos fatos da história cotidiana do século XX,
proporcionando o nascimento do fotojornalismo, porém, não raro,
moldando em função da manipulação da imagens/textos a
opinião pública segundo interesses e ideologias determinados, o
mesmo ocorrendo com a exploração da imagem fotográfica quando
veiculada pelo cinema e pela televisão (KOSSOY, 1999, p. 88).
Sendo assim, a imagem está presente em todo momento da vida cotidiana,
trazendo informações. O importante de uma foto é que ela possa ser compreendida
sem palavras por qualquer ser humano, em qualquer lugar do mundo. Ela estimula a
reflexão, comove, além de ser mais rápida do que a linguagem escrita. Porém, do
mesmo modo que para produzir um texto existe uma intencionalidade, a fotografia
também exige um propósito. Ambas não podem ser pensadas isoladamente, pois se
completam.
153
Todavia, para a compreensão da fotografia seria necessário separá-la em
dois segmentos: a fotografia iconográfica (arte) e a fotografia funcional (informação).
Na primeira, o fotógrafo pensa na imagem como um objeto de arte que tem vida
própria, ultrapassa o real, penetra no imaginário. Na segunda, o fotógrafo trabalha
com a notícia, cria imagens informativas, sua função é fazer um trabalho de leitura
fácil e que seja atraente, facilitando a atenção do leitor para a notícia e a
transmissão de uma mensagem objetiva e direta.
O conceito e a prática de fotojornalismo são complexos. O profissional não é
apenas um fotógrafo, nem um jornalista, o produto de seu trabalho não se limita
apenas à manchete de jornal, mas também da notícia escrita. Esse trabalho envolve
diferentes temas: sociais, políticos, históricos, enfim recortes da realidade. Ela
aparece como informação, como uma leitura da realidade, partindo de uma idéia, de
um conceito, podendo estabelecer uma sintonia com a arte. Assim, a imagem passa
a ser um meio de comunicação, no nível da oralidade, como diz o escritor e fotógrafo
Walter Benjamim
127
:
Pela primeira vez no processo de reprodução da imagem, a mão foi
libertada das responsabilidades artísticas mais importantes, que
agora cabiam unicamente ao olho. Como o olho apreende mais
depressa do que a mão desenha, o processo de reproduções das
imagens experimentou tal aceleração que começou a situar-se no
mesmo nível que a palavra oral (BENJAMIM, 1996, p.167).
Neste sentido, a câmera é uma extensão do olho, tornando a percepção
fotográfica um processo criativo e significativo, podendo revelar o mundo além do
material, do aparente. Para tanto, é preciso expor a sensibilidade, a capacidade de
compreensão do fotógrafo diante de seu objeto visual. A fotografia é um registro do
real, do passado, de um momento que jamais será repetido.
Personagens retratadas desaparecem, cenários se transformam, mas a
fotografia sobrevive, preservando o momento congelado da realidade. Fixa um
período de tempo, cria uma história que exige uma restituição de um contexto
imaginário por parte do observador. Com isso não se pode falar em objetividade
absoluta. Toda e qualquer foto pode conter significados não explícitos. Boris Kossoy
afirma que:
127
Walter Benedix Schönflies Benjamin (1892-1940) foi um ensaísta, crítico literário, tradutor, filósofo e
sociólogo.
154
Uma única imagem contém em si um inventário de informações
acerca de um determinado momento passado; ela sintetiza no
documento um fragmento do real visível, destacando-o do contínuo
da vida. O espaço urbano, os momentos arquitetônicos, o vestuário,
a pose e as aparências elaboradas dos personagens estão ali
congelados na escala habitual do original fotográfico: informações
multidisciplinares nele gravadas – já resgatadas pela heurística e
devidamente situadas pelo estudo técnico iconográfico apenas
aguardam sua competente interpretação (KOSSOY, 2001, p.102).
Conseqüentemente, ler fotos é mais que olhar através de uma câmera, é uma
leitura do real por meio da fotografia, exigindo uma reflexão, um conceito e uma
interpretação da imagem, sendo também um meio de expressão individual e um
meio de conhecimento das diversidades do mundo.
As grandes produções cinematográficas, revistas, jornais e televisão utilizam-
se a fotografia para ilustrar a imagem. Sendo assim, sua linguagem cultural passa a
ser determinante nos vários aspectos de abstração dos elementos políticos sociais e
econômicos, uma vez que é o meio catalisador que fornece às várias áreas do
conhecimento de elementos para apreciação. É um registro de parte de uma
realidade vivida em determinada época e contexto, é também uma forma de
expressão visual daquele que registrou o momento e que congelou o instante.
O ser humano é um producente e decodificador de imagens, utiliza-se delas
para tornar concreto algo que é totalmente abstrato, como seus sentimentos e
pensamentos. Elas carregam em si um potencial de memória contextual, podendo
receber uma leitura visual. O crítico de arte Walter Benjamim questionou que “o
analfabeto do futuro não será aquele que ignora o alfabeto, mas aquele que ignora a
fotografia. Mas será que não é menos analfabeto o fotógrafo que não sabe ler a
suas próprias imagens?” (1985, p. 240).
Desta maneira, visto que ler imagem, seja ela pintura ou fotografia, exige
reflexão, conceitos e sensibilidade, cada leitor terá um olhar diferenciado,
dependendo de sua vivência e experiência sócio-cultural.
É comum comparar a linguagem da fotografia à outra linguagem não visual. A
palavra pode expor uma idéia, conceituar, transmitir uma informação verbal,
enquanto a imagem é emocional, sintética, direta, podendo ser compreendida em
toda parte do mundo, por qualquer indivíduo. Sua capacidade de comover, de fazer
155
pensar, é mais rápida do que a da linguagem escrita. Sebastião Salgado
128
afirmou:
“Que as pessoas vejam que essas fotografias são parte de sua vida, do número de
imagens que vê todos os dias, desse mundo fabuloso que é o idioma das imagens, a
verdadeira linguagem” (2000, p. 57). Para tanto, a função da fotografia não é apenas
informar, mas também representar uma época, ela visa, além de mostrar, convencer
o observador de uma determinada situação de um contexto, ela assume um caráter
de linguagem informativa e cultural de uma sociedade.
Sendo assim, o reconhecido fotógrafo brasileiro utiliza as lentes de sua
máquina fotográfica do seu jeito, modo e todo de escrever, sendo uma espécie
de narrador que, em vez de utilizar a palavra, usa a imagem. Como destacou em
uma entrevista à Revista semanal Isto É, Fotografia, para mim, é uma forma de
escrever, de contar histórias” (SALGADO, 1993, p. 74). Para tanto o jornalista Jânio
Freitas, esclareceu que:
É um engano corrente, que percorre o mundo e o tempo, o de que a
câmera fotografa o que o olho vê. Não, ela registra o que a alma vê.
E os olhos da alma não são os olhos do rosto, também meras
câmeras. Os olhos da alma são este mistério impenetrável, que se
chama sensibilidade um confuso amálgama de talentos, história
pessoal de vida, instinto, reflexos, convívio, raízes culturais e todo o
inexplicável humano (FREITAS, 1992, p. 5).
De tal modo, a foto de Salgado tem muita força de expressão, é crítica e
revela uma sincera preocupação social. Ela tem funções muito claras a cumprir, é
devido a sua autonomia como fotógrafo que as imagens por ele produzidas têm algo
de veracidade e impressiona; fascina tanto quanto qualquer obra de arte. Por isso,
se enquadra em duas categorias ao mesmo tempo, tanto com função iconográfica
como também documental.
Para elaborar uma análise formal de uma obra de arte ou estrutura de uma
foto várias características devem ser consideradas como: espaço, linhas,
cruzamentos, sobreposições, perspectivas, pontos de fuga entre outras
características. Isso depende do objetivo que o fotógrafo tem na elaboração ou
montagem de uma imagem e daquilo que o artista quer transmitir por meio de sua de
sua arte visual.
128
PAES, Maria Helena. DUARTE, Geni Rosa. VANNUCHI, Camilo. Leituras da imprensa/fotografia Sebastião
Salgado. São Paulo: Bei Comunicação, 2000. (Coleção êxodos: programa educacional), Volume 3 A narrativa
do olhar, p. 57.
156
Assim sendo, a forma, a luminosidade, a cor e a textura são elementos
artísticos que ajudam a estabelecer identidades. A luz é essencial na fotografia,
dando contorno, volume, profundidade ao objeto retratado e definindo sua forma.
Sebastião Salgado, por exemplo, é conhecido como o fotógrafo do preto-e-branco e
da contraluz. Ele explicou sua visão fotográfica em uma entrevista cedida à Revista
Veja no dia 12 de março de 1997:
É claro que eu tenho de trabalhar contra a luz. A minha cidade,
Aimorés, tinha um sol incrível. A gente vivia na sombra. Eu sempre
olhei meu pai chegando em casa na contraluz. Eu na sombra, ele
vindo do sol. Numa fração de segundo, eu restituo tudo isso
(SALGADO, 1997, p. 81).
Logo, o enquadramento de uma foto depende de ângulos, formas e contorno,
sendo características não fixas que se transformam de acordo com o olhar do
fotógrafo, dependendo do contexto e de sua relação significativa com a realidade
conhecida, com o meio no qual se encontra.
A fotografia pode desencadear uma tensão e impacto maior que a pintura,
devido a suas possibilidades de recorte. A arte contemporânea buscou mostrar a
desconstrução do figurativo. Sendo o fotojornalismo mais conservador,
representando a tendência realista. O objetivo da leitura de uma foto é assimilar a
cena da vida real. Ao passo que na pintura pode haver incertezas, pois não oferece
ao espectador a certeza da realidade.
Na década de 1840, a pintura aproximou-se da realidade, tornando-se mais
realista, se desligando dos temas mitológicos e religiosos. O interesse do artista pela
realidade, pela natureza e pela luz cresceu, dando possibilidade de produzir
trabalhos naturalísticos com predominância da luminosidade como os
impressionistas. A necessidade de produzir as cores e as formas reais, e não
somente as imaginadas, passou a ser a meta dos artistas. Para alguns, a fotografia
foi a libertação da arte de copiar a realidade, outros compreenderam que poderiam
usar a cnica não apenas como documento da realidade, mas como uma forma de
expressão artística, provocando emoções, transmitindo idéias e pensamentos, além
da reprodução de imagens.
157
Atualmente, em pleno século XXI, a fotografia sofreu grandes alterações,
muitos artistas criaram estilos diferentes, como é o caso de Vik Muniz
129
que, meio
século depois da invenção, reinventou a linguagem e a mídia fotográfica, utilizando-
se de procedimentos contemporâneos (figuras 133 e 134). Ele cria ilusões
fotográficas, ou seja, desenhos brincando com a materialidade, trabalha com figuras
vistas, dando-lhes novas formas em releituras irônicas e os fotografa, destruindo-
os em seguida. Sua obra de arte é a fotografia, sendo usada como meio de
representação a partir de materiais inusitados como: sucatas, chocolate líquido,
terra, açúcar, macarrão, lixo, fios de algodão, entre outros, criando deste modo, um
diálogo com a História da Arte.
Seu processo de trabalho consiste em compor as imagens com materiais
normalmente instáveis e perecíveis sobre uma superfície e fotografá-las. Nessas
séries, as fotografias, em edições limitadas, são o produto final do trabalho. O artista
não é um fotógrafo, apenas utiliza a máquina fotográfica como um meio de transmitir
suas idéias e provocar o espectador.
Figura 133 - Vik Muniz
Pollock de chocolate.
Fotografia.
Fonte:
http://images.artnet.com/artwork_images/42452
0152/246328.jpg
Figura 134 - Vik Muniz.
Medusa no prato de macarronada.
Fotografia.
Fonte:
http://www.eba.ufmg.br/alunos/kurtnavigator/arteartesanato/i
magens
129
Vik Muniz nasceu em São Paulo no ano de 1961. Fotógrafo, desenhista, pintor, gravador, divide residência
entre Rio de Janeiro, São Paulo e Nova York. Realiza, desde 1988, séries de trabalhos nas quais investiga,
principalmente, temas relativos à memória, fazendo uso de técnicas diversas.
158
Neste sentido, as reflexões sobre as produções de fotógrafos brasileiros
ganharam significativa importância nesta pesquisa, pois tratando a imagem como um
processo político e histórico, ela perpassa pelas dificuldades dos cidadãos como
forma de registro de um processo estético e social. Também compreendido em
outros cantos do mundo, a fotografia é discutida como referencial de construção
ideológica em discursos impactantes sobre a imagem e a capacidade de abstração.
Assim, o fotógrafo passou a ser valorizado como um agente histórico social, ou seja,
um artista.
159
CAPÍTULO 4
Análise Comparativa das Obras de Candido Portinari e Sebastião
Salgado
No presente capítulo, três pinturas dos murais em afresco de Candido
Portinari que retratam os Ciclos Econômicos são comparadas a três fotografias de
Sebastião Salgado que mostram o trabalho do homem em diversos locais do Brasil.
Na análise, foram destacadas apenas obras que possuem as mesmas temáticas
artísticas, sendo no primeiro caso: Algodão, Cana e Café; e no segundo: Colheita de
Algodão, Corte da Cana de açúcar e Café.
Em todas elas, é possível observar semelhanças, entendendo que estes dois
tipos de imagens, apesar de serem produzidos por técnicas distintas, são iguais no
que diz respeito ao tema. Por conseguinte, esse aspecto induz a uma reflexão: por
que em quase meio culo que separa um artista do outro a temática continua
atual? Provavelmente porque os anos passaram, mas os problemas sociais
continuam os mesmos.
O Professor e escritor Arnold Hauser
130
discorreu sobre a função do artista em
seu livro: “Cada arte tem como objetivo parecer evocatória e provocar nos seus
ouvintes, espectadores ou leitores, emoções e exortações à ação ou a oposição”
(HAUSER, 1984, p. 92).
Assim, pode-se considerar que o trabalho artístico deve transmitir uma
mensagem ao espectador, seja ela uma crítica positiva ou negativa, contanto que
possa ser refletida e interpretada por diferentes olhares da sociedade.
Para tanto, pretende-se identificar a possibilidade de interpretação das obras
desses artistas, sob o ponto de vista social, cultural e econômico que os dois
transmitem para a sociedade a realidade vivida pelo homem da roça e sua relação
com o trabalho.
130
Arnold Hauser (1892-1978) foi um historiador da British Arte de, origem húngara, desenvolveu a teoria da arte
em que explora o fenômeno artístico, em estreita relação com seu contexto histórico e social e fenômenos sócio-
econômicos.
160
semelhança de temática e até mesmo a posição física das pessoas
retratadas entre ambos faz com que seja usada a teoria de Georg Lukács
131
na
questão da “originalidade artística e reflexo da realidade”. Para ele:
A modificação histórica do conteúdo como base para a
transformação da arte no que toca à forma, no estilo, à composição,
etc., é claro que no centro da criação artística deve estar
precisamente este momento da transformação, do nascimento do
novo, da morte do velho, das causas e das conseqüências das
modificações estruturais da sociedade nas relações recíprocas entre
os homens. A originalidade artística, entendida como um voltar-se
para a própria natureza e não para o que a arte produziu no
passado no que diz respeito ao conteúdo e à forma, manifesta-se
precisamente nesta importância que tem a descoberta e a
determinação imediata do que de novo é produzido pelo
desenvolvimento histórico-social (LUKÁCS, 1968, p.207).
Sendo assim, ainda existem possibilidades de problemas estruturais e sociais
a serem resolvidos em parte ou a mesmo sanados. Outros artistas
contemporâneos poderão repetir estas mesmas temáticas daqui a 49 anos e
continuarão sendo originais.
Na seqüência, são analisados as imagens a fim de tornar mais compreensível
a comparação entre as obras dos referidos artistas.
Temática da Cana
Figura 135 - Cândido Portinari.
Cana – 1938.
Pintura mural a afresco, 280x247cm.
Figura 136 - Sebastião Salgado.
Bóias-frias nas plantações da Usina de São Marinho, 1987.
Fotografia. Fonte: Livro: Trabalhadores, p. 35.
131
Georg Lukács (1885-1971) foi um filósofo húngaro de grande importância no cenário intelectual do século XX.
Segundo Lucien Goldmann, Lukács refez, em sua acidentada trajetória, o percurso da filosofia clássica alemã:
inicialmente um crítico influenciado por Kant, depois o encontro com Hegel e finalmente, a adesão ao marxismo.
161
Portinari retratou os cortadores de cana no momento do corte e do
carregamento. No primeiro plano, nota-se a força do negro carregando os feixes de
cana. No segundo, uma figura muito semelhante à primeira, com um facão em
posição para fazer o corte. A imagem do trabalhador negro é monumental, percebe-
se uma ligação dos personagens com a terra, expressada pelos pés e mãos
grandes, solidamente plantados no chão. O agigantamento das mãos simboliza a
força dos trabalhadores. O pintor criou registros temporais simultâneos, sugerindo
movimento na composição estática.
Além disso, a pintura mostra o carregador curvado pelo peso da carga que
transporta, e que não seria colocada no dorso de um animal, muitas vezes mais bem
cuidado do que um ser humano.
As cores utilizadas na composição são fortes, com valorização do branco,
novamente utilizado como luz. O chão é muito vermelho, assim como o sangue do
trabalhador que molha a terra com suor de seu trabalho.
Não obstante, Salgado também registra o momento do corte da cana, com
trabalhadores em vários planos. Percebe-se ao fundo a linha do horizonte, um céu
claro, indicando que o sol quente e o calor, bem como o carvão que ficou após a
queima da cana, estão incomodando os trabalhadores. O fotógrafo posicionou de
baixo para cima para agigantar as figuras fotografadas, valorizou a perspectiva e a
proximidade para realçar a força da imagem.
A curvatura nas costas dos dois personagens, nas duas poéticas, não denota
somente a carga do trabalho, mas o peso de serem a base da pirâmide social. O
detalhe dos pés, na obra de Portinari, merece destaque mostrando uma tendência
do artista de considerar os pés do trabalhador como suporte da sociedade. Na
fotografia, eles aparecem como se estivessem irremediavelmente plantados na terra
como raízes humanas, de alguém que não encontrará outro campo no futuro, senão
aquele de plantar, cultivar e colher da terra o produto a ser comercializado. Muito
provavelmente serão condenados para todo o sempre àquela vida. De modo
metafórico poderia dizer que a faca que corta a cana recebe o suco adocicado da
planta; ao trabalhador, resta apenas o suor do próprio rosto: salgado e
desagradável.
Apesar dos 49 anos que separam uma obra da outra, as duas poderiam muito
bem ser contemporâneas, pois a questão social dos trabalhadores no corte de cana-
de-açúcar continua sem muitas conquistas.
162
Temática do Algodão
Figura 137 - Candido Portinari.
Algodão – 1938.
Pintura mural em afresco, 280 x 300 cm.
Figura 138 - Sebastião Salgado.
Trabalhadores das plantações de algodão, 1980.
Fotografia. Região de Cajazeiras, Paraíba.
Fonte: Livro Terra, p. 54.
Como se observa, Portinari congelou a imagem de uma trabalhadora no
primeiro plano, repetindo-se num plano posterior. Ele usou poucas cores, os tons
são acinzentados e a luz foi focada nos personagens com o uso do branco num jogo
de luz e sombra delimitando as silhuetas, porém um dos personagens não está
iluminado. Por outro lado, exceto a menina de azul, todos estão curvados, como se o
peso e a dureza do trabalho estivessem sobre suas costas. O fundo é fragmentado,
os traços são simplificados e a geometria também se faz presente na composição,
lembrando a influência do cubismo. O uso do branco foi colocado na forma de luz e
também faz conexão entre a frente e o fundo da obra, o que representa a cor do
algodão, como se fosse a única luz da vida destes trabalhadores. Visualiza-se uma
menina a margem da pintura com um traje de algodão azul, propositadamente
diferenciada das cores utilizadas na obra. O artista mostra várias fases de um
mesmo trabalho, porém sendo feitas simultaneamente por diferentes trabalhadores.
Do mesmo modo, Salgado captou uma jovem fazendo a colheita de algodão
num dia de sol, pois pelo uso do seu chapéu é possível perceber a sombra. Em
primeiro plano, destacam-se a garota e também o de algodão antes da linha do
horizonte. O fotógrafo se posicionou no mesmo nível da personagem, retratando a
163
cena num plano geral. A aba do chapéu sombreia o rosto da garota e o
enquadramento foi feito na vertical, valorizando a perspectiva e a proximidade para
realçar a imagem de unicidade entre a trabalhadora e o pé de algodão. Um
exuberante cacto ao fundo indica a aridez da região, o que induz o observador a
pensar em um sol causticante que maltrata todos os trabalhadores da roça inclusive
os catadores de algodão.
Percebe-se tanto em Portinari quanto em Salgado a preocupação pela
imagem social, mostrando o contraste existente entre a vida rude e calejada, sem
muita perspectiva de mudança, e a natureza árida que maltrata, mas mesmo assim
fornece o sustento do trabalhador.
Pode-se destacar ainda, que além da temática existem outras semelhanças
entre as duas obras como: as mulheres, os trajes, os chapéus. No entanto, também
existem diferenças bem perceptíveis.
Os trabalhadores de Portinari estão todos curvados demonstrando,
possivelmente, a inferioridade social, vários planos são representados
simultaneamente, ele utiliza várias cores e o biótipo de seus personagens com
estruturas exageradas enfatizando a força do trabalho braçal. a garota
fotografada por Salgado está esguia e altiva, todos os elementos estão centralizados
e a linha do horizonte está em evidência. Trata-se de uma imagem em preto-e-
branco que indica que o meio e a natureza são indomáveis, pois a seca é
evidenciada pelo cacto, o maior elemento na foto.
Temática do Café
Figura 139 - Candido Portinari.
Café – 1938.
Pintura mural em afresco, 280 x 297 cm.
Figura 140 - Sebastião Salgado.
Trabalhadores das plantações de café, 2002. Minas Gerais.
Fotografia.
Fonte: http://fotosite.terra.com.br/images/noticias/salgado.jpg
164
Portinari pintou os vários momentos do carregamento do café, concentrando
poucas figuras e detalhes na composição. No primeiro plano, expõe uma mulher de
proporções e densidades “escultóricas” com seus pés grandes e com o rosto
caracterizado numa expressão de expectativa. A dramaticidade dessa figura,
aparentemente tão cansada, é realçada pela geometrização do espaço, criando um
conjunto harmonioso entre os trabalhadores, as sacas de café e a colina esboçada
ao fundo. Observa-se também um comando indireto ao fundo, talvez alguém dando
ordens expressas para um melhor desempenho do trabalho. A cor branca se
destaca entre os tons de marrom e ocre e os bronzeados das figuras criam um
contraste iluminando o painel.
Por outro lado, Salgado enquadrou o primeiro plano da foto no exato
momento em que os grãos de café colhido estão sendo abanados, os grãos do café
encobrem outros elementos, inclusive sobrepondo-se ao trabalhador, o que mostra a
sua importância. Simultaneamente, no segundo plano nota-se a presença de um
cachorro que subentende-se que acompanhou seu dono para a roça, e ao fundo
outros trabalhadores que também ajudam a fazer a colheita, percebe-se a
perspectiva que o fotógrafo captou, sem muito contraste, com enquadramento na
horizontal. O recurso da utilização do filme em preto-e-branco ajuda a manter um
realismo cruel que é a vida do homem do campo, que prepara a terra, carpe, aduba,
planta, observa suas flores brancas, aguarda sua transformação em grãos para
colher o produto e espalhá-los para a secagem.
O café foi o principal produto da economia brasileira, propiciou o
desenvolvimento de regiões e grandes fortunas, mas também favoreceu a
desigualdade social. Proporcionou o enriquecimento exagerado de poucos em
detrimento do empobrecimento extremo de muitos, devido ao excesso de produção
e geadas que chegaram, enfraquecendo ainda mais a classe trabalhadora.
Enquanto muitos carregavam pesados fardos de grãos de café e outros
peneiravam o produto sob um sol forte, os donos da terra acumulavam riquezas com
a exportação do chamado ouro negro.
Pode-se destacar, também nas duas obras, os seguintes detalhes: tanto do
lado esquerdo quanto do direito, as mulheres parecem que serviram de modelo aos
artistas. Possuem roupas simples, lenço na cabeça, uma sentada (Portinari), a outra
de cócoras (Salgado). Ambas fazem a seleção dos grãos de café, separando os
bons dos ruins. Metaforicamente, da mesma maneira que a sociedade capitalista
165
acaba fazendo com as pessoas, isolando-as em grupos sociais, relegando-as muitas
vezes, à miséria e à desesperança.
Conclui-se ainda, que as duas obras juntas são complementares, pois
Salgado enfatizou a colheita e a abanação do café, enquanto Portinari, ressaltou as
etapas seguintes, o ensacamento e estocagem do produto. São composições muito
semelhantes, enquanto as colinas do mural de Portinari são simples esboços
deixando claro a força do trabalho, em Salgado, as montanhas são majestosas e,
apesar de distantes, realçam uma natureza que prepondera sobre o ser humano.
166
CAPÍTULO 5
Aplicação da Metodologia de Pesquisa no Ensino Médio
5.1 O Método e os Procedimentos da Pesquisa
A metodologia de pesquisa possui características de uma abordagem
qualitativa, do tipo Pesquisa-Ação, sendo desenvolvida no campo da Arte-Educação,
utilizadas por professores e pesquisadores tendo como estratégia e objetivo com a
intenção de modificar de modo positivo o sujeito e aprimorar o ensino promovendo a
produção de conhecimento através de pesquisas. Desta maneira, são usadas as
referências teóricas dos autores Michel Thiollent e Antonio Chizzotti.
As principais características da pesquisa são o estudo e a reflexão durante
seu processo de desenvolvimento, envolvendo a observação participante e a
experiência, levantando questões interessantes e, ao mesmo tempo, gerando
instabilidades entre os sujeitos integrantes da pesquisa.
De acordo com o docente e pesquisador francês Thiollent:
Pesquisa-ação é um tipo de pesquisa social com base empírica que
é concebida e realizada em estreita associação com uma ação ou
com a resolução de um problema coletivo e no qual os
pesquisadores e os participantes representativos da situação ou
problema estão envolvidos de modo cooperativo ou participativo
(THIOLLENT, 2005, p.16).
Assim, a metodologia da Pesquisa-Ação deve ser participativa, devendo ter
uma ligação entre teoria e prática, descobrindo novos conhecimentos coletivos na
resolução de um problema com envolvimento do pesquisador e dos participantes
que trabalham juntos e que refletem sobre suas ações no trabalho prático e
intelectual.
Para o pesquisador Antonio Chizzotti:
A abordagem qualitativa parte do fundamento de que a relação
dinâmica entre o mundo real e o sujeito, uma interdependência viva
entre o sujeito e o objeto, um vínculo indissociável entre o mundo
objetivo e a subjetividade do sujeito. O conhecimento não se reduz a
um rol de dados isolados, conectados por uma teoria explicativa: o
167
sujeito observador é parte integrante do processo de conhecimento e
interpreta os fenômenos, atribuindo-lhes um significado (CHIZZOTTI,
1995, p.79).
Portanto, trata-se de um método participante, que tem como objetivo produzir
conhecimento entre a teoria e a prática em um processo educativo que estabelece
diversas técnicas de pesquisa social, com as quais se estabelece uma estrutura
coletiva, participativa e ativa no nível da captação da informação, exigindo, assim, a
participação das pessoas envolvidas no processo. Esse procedimento articula a
produção de conhecimentos com a ação educativa, num processo de investigação
da realidade intervindo na prática e propondo mudanças na realidade, durante seu
desenvolvimento.
Para o pesquisador André Morin (2004), a Pesquisa-Ação é participativa,
sendo que os alunos e pesquisadores utilizam a interação de várias maneiras, ou
seja, no momento em que perguntam e respondem as questões, se tornam também
autores do processo. Esta participação deve ser analisada de maneira diferenciada,
pois depende do grau de intensidade na prática educativa ou social e da área em
que o método é utilizado.
Logo, o conhecimento não se de forma isolada, mas conectado por uma
teoria. O aluno é parte integrante do processo, interpreta e atribui significado às
informações e também ao objeto e suas relações. Deste modo, o autor elabora o
método da Pesquisa-Ação, tornando-o cada vez mais integral e sistêmica, levando
em conta métodos de observação participante baseada na autonomia dos
educandos, no qual os mesmos participam na resolução dos problemas, com
conhecimentos diferenciados.
De acordo com Thiollent (1992), os princípios da Pesquisa-Ação, os aspectos
práticos de concepção e organização do trabalho apresentam fases que não são
rigorosamente seqüenciais, sendo seu planejamento flexível e passível de
adequação às necessidades do pesquisador e dos participantes.
Sendo assim, a Pesquisa-Ação é flexível, ao contrário de outros tipos de
pesquisa, não segue uma série de fases rigidamente ordenadas. sempre uma
retomada em função das circunstâncias e da dinâmica interna do grupo e da
pesquisa no seu relacionamento com a situação investigada. Em cada situação, o
pesquisador, junto com os demais envolvidos, precisa reelaborar o projeto de acordo
com os resultados obtidos.
168
A abordagem da Pesquisa Qualitativa, segundo Antonio Chizzotti (1995),
parte do fundamento de que o sujeito-observador é parte necessária do processo de
conhecimento e interpreta os fenômenos, atribuindo-lhes um significado. Assim, “na
pesquisa qualitativa todas as pessoas que participam da mesma são conhecidas
como sujeitos que elaboram conhecimentos e produzem práticas adequadas para
intervir nos problemas identificados” (CHIZZOTTI, 1995, p. 83).
Quanto ao problema, segundo o mesmo autor ”não pode ficar reduzido
somente a uma hipótese, previamente aventada, ou algumas variáveis que serão
avaliadas por um modelo teórico preconcebido” (p. 81). Assim, o problema decorre
de um processo indutivo que vai se definindo no decorrer da análise.
Considerando que a Pesquisa-Ação serve de instrumento e participação com
enfoque na colaboração, informação e interação para a produção de conhecimentos,
foram utilizados instrumentos como: questionários, formulários, fichas elaborados de
modo colaborativo com os participantes durante todo o processo.
5.2 Os Procedimentos Metodológicos
A pesquisa teve como público-alvo aproximadamente 120 alunos, com a faixa
etária entre 16 e 17 anos de idade, matriculados no ano do Ensino Médio da
Escola Pública Estadual Professora Zipora Rubinstein (figura 141), situada na Zona
Leste da cidade de São Paulo. O projeto foi aplicado em duas aulas semanais na
disciplina de Arte, nos 2º e 3º bimestres de 2008.
Figura 141.
Foto da E. E. Profª. Zipora
Rubinstein.
Ano 2008.
Foto: Silvia
169
Nesta pesquisa, foi aplicada como modelo teórico a abordagem Triangular
elaborada pela Professora Ana Mae Barbosa que é: Apreciar, Contextualizar e Fazer
no processo artístico. Em seu desenvolvimento, foi utilizado o sistema de leitura e
interpretação de imagens Image Watching, proposto pelo Professor Robert Ott,
caracterizado por: Descrever, Analisar, Interpretar, Fundamentar e Revelar. Todos
esses processos de leitura, contextualização e de elaboração da proposta da
produção artística, devem ser valorizados, pois dessa forma o conhecimento sobre a
obra de arte será significativa, proporcionando maior compreensão estética e
artística.
As atividades foram desenvolvidas a partir da seleção de seis obras, sendo
três pinturas em afresco, de Portinari, com a temática “Trabalhadores Rurais”,
pertencentes ao Ministério da Educação e Cultura do Rio de Janeiro, e três
fotografias de Salgado, que também retratou os trabalhadores brasileiros em
atividade do campo.
Desta forma, foram feitas leituras interpretativas, contextualização e fazer
artístico das obras apresentadas. Considerando que estas linguagens, tanto na
pintura quanto na fotografia, estabelecem uma inter-relação através de uma
abordagem imagética, ambos os objetos de pesquisa foram abordados em uma
mesma temática social: as imagens dos trabalhadores rurais.
Os alunos, a partir de suas preferências, formaram seis grupos com cinco ou
seis integrantes e, em cada um deles, foi eleito um coordenador.
Nos procedimentos metodológicos fizeram parte a síntese dos passos dados,
de acordo com a Abordagem Triangular, durante a realização do trabalho,
apresentando os momentos da leitura, da contextualização e orientação para a
proposta do fazer artístico e também a elaboração e reprodução do material e obras
produzidas pelos alunos.
Etapas realizadas:
Pesquisa e estudo sobre a vida e obra dos artistas Candido Portinari e
Sebastião Salgado;
Análise, fazendo uma relação temática das obras destes artistas;
Leitura das reproduções das obras citadas acima, baseadas no roteiro de
análise do pesquisador William Ott. (Image Watching);
170
Contextualização, através da leitura e História da Arte;
Releituras (reinterpretações);
Registro de dados através de relatórios, denominados formulários;
Aplicação, avaliação e análise dos resultados sobre a forma de questionário;
Comentários sobre o método utilizado no ensino de Arte, e a importância da
leitura de imagens em sala de aula e sobre a metodologia de pesquisa
adotada, no caso a Pesquisa-Ação;
Elaboração e reprodução de material escrito, de imagens que apoiaram a
leitura de obras de arte e apresentações de DVDs referentes à História da
Arte;
Documentação de todo o material escrito pelos alunos e das propostas do
fazer artístico construídas a partir das obras.
Atividades desenvolvidas:
Apresentação das três obras de Candido Portinari: Cana-de-açúcar (1938),
Algodão (1938) e Café (1938), pertencentes à sua fase conhecida como
“Ciclo Econômico”. Foram utilizadas reproduções (cópias) ampliadas de
tamanho 0,40 X 0,50 cm.
Apresentação das três obras fotográficas de Sebastião Salgado: Colheita de
Algodão (1980), Cortadores de Cana (1987) e Café (2002). Foram utilizadas
reproduções (cópias) ampliadas de tamanho 0,40 x 0,50 cm.
A cada duas semanas, uma pintura e uma fotografia, com a mesma temática,
foram trabalhadas. Os alunos fizeram a descrição, análise, interpretação e
contextualização das obras, de acordo com a metodologia Imagem Watching,
Willian Ott, e com a proposta da Metodologia Triangular de Ana Mae: apreciar
(ler a obra), contextualizar e fazer (produzir).
No decorrer das aulas, os alunos conheceram dados como: nome das obras
apresentadas, dos autores, épocas, estabelecendo relações entre as imagens
e aspectos da realidade.
Por fim, foi proposto um “fazer artístico”, no qual os alunos criaram um objeto
artístico bidimensional ou tridimensional, com materiais diversificados, com
base na leitura e na atividade de releitura (reinterpretação), pensando sobre a
própria arte e fazendo uma análise crítica na contemporaneidade.
171
Síntese dos passos dados, de acordo com a Abordagem Triangular, durante a
realização do trabalho
1. Promoveu-se a leitura de reproduções de obras: pintura e fotografia através
de roteiros de análise denominados formulários, construídos
colaborativamente com os alunos participantes. Esses instrumentos tiveram
que ser sugeridos, a partir de um eixo norteador, e completados
coletivamente pelos envolvidos, de modo que percebessem que não existe
uma única leitura da mesma obra, pois cada um deve ter um olhar diferente
de acordo com sua vivência e seu nível sócio-cultural.
2. Discutiu-se e contextualizou-se as obras em seu tempo e espaço através da
História da Arte, considerando as influências e tendências artísticas da época
de sua produção, de outras obras do mesmo artista, de seus contemporâneos
e daqueles que os influenciaram.
3. Elaborou-se propostas poéticas a partir da leitura, contextualização de novas
leituras individuais e reinterpretações das obras. Orientando que releitura não
é copia, mas interpretação, a produção daquilo que se entendeu, sem
qualquer preocupação de semelhança com a obra original. Reler é
reinterpretar, é uma nova construção, um novo significado, uma nova leitura.
Durante o processo, os trabalhos de Portinari e Salgado foram expostos,
analisados e discutidos.
1º mês
O primeiro momento: leitura da obra.
1. Somente a imagem da obra (figura 142) foi projetada através do retroprojetor
em tela branca. Não houve qualquer outra referência. Os alunos tiveram que
olhar lentamente, com muita atenção, todos os detalhes da obra projetada.
2. Em seguida, anotaram e descreveram, em folha avulsa, tudo que viram,
sentiram e entenderam (figura 143).
172
Figura 142.
Fotografia da imagem no retroprojetor.
Figura 143.
Momento descritivo da obra.
3. A seguir iniciou-se uma breve discussão do grupo sobre a obra projetada.
4. O formulário número 1 foi apresentado para cada grupo, que teve que
preenchê-lo com uma síntese elaborada a partir do que eles haviam escrito e
discutido. Depois, foi recolhido pelo professor.
5. Posteriormente, foi distribuído o formulário 2, no qual eles responderam todas
as questões e após discussão, chegaram a um acordo do que deveria constar
ou não neste formulário (figuras 144 e 145).
Figura 144.
Momento de discussão sobre as questões do
formulário.
Figura 145
Discussão do formulário.2
6. O coordenador do grupo foi preenchendo o formulário à medida que o grupo
chegou às suas conclusões em cada questão. Em seguida foi recolhido pelo
professor.
7. Esse processo aconteceu com as obras citadas para essa análise, tanto de
Portinari quanto de Salgado.
Foto: Silvia
Foto: Silvia
Foto: Silvia
Foto: Silvia
173
2 º mês
O segundo momento: contextualização da obra.
1. Através de um DVD com textos breves e algumas imagens foram passadas
as informações técnicas sobre a obra estudada como: nome e título da obra,
nome do artista, local e data de nascimento e morte, cnica e materiais
utilizados e dimensões. Este DVD expôs, por meio da História da Arte, o
período em que o autor viveu e o momento em que a obra foi produzida.
Também houve a comparação com outras obras do mesmo autor e com as
obras de seus contemporâneos e de artistas que o influenciaram.
2. Após a apresentação, o formulário número 3 foi distribuído para que o grupo
discutisse e respondesse. O coordenador do grupo foi preenchendo o
formulário à medida que o grupo chegava às suas conclusões em cada
questão. (figura 146).
3. Depois de preenchido, o formulário 3 foi recolhido.
Figura 146.
Discussão do grupo.
Apresentação e orientação para a Proposta do fazer artístico
1. A etapa seguinte foi destinada ao planejamento e execução de uma
produção artística, elaborada pelo grupo, sendo relacionadas às
temáticas analisadas. Foi proposto aos grupos trabalhar com as
diferentes linguagens da arte contemporânea como: intervenção,
performance, instalação, etc.
Foto: Silvia
174
2. Foi pedido para que o grupo pensasse na idéia de uma proposta do
fazer, produzir uma reinterpretação da obra analisada.
3. Para a execução da proposta, o grupo levou em conta o tempo
disponível e também os tipos de materiais que foram utilizados.
4. O projeto foi esboçado (figuras 147, 148, 149, 150, 151 e 152),
detalhado através de desenhos e indicações de material e local de
desenvolvimento. Cada um escolheu um espaço adequado na escola,
utilizando qualquer suporte, podendo a obra ser tanto bi como
tridimensional.
5. O grupo também trouxe e utilizou diferentes materiais para trabalhar as
temáticas propostas como cana-de-açúcar, folhas, grãos e de café,
algodão, e outros tipos de materiais.
Esboço- Tema Cana
Figura 147. Digitalização Silvia.
Esboço do projeto de trabalho.
Cortadores de Cana.
Figura 148. Digitalização Silvia.
Esboço do projeto de trabalho.
Caminho de Açúcar.
175
Esboço - Tema Algodão
Figura 149. Digitalização Silvia.
Esboço do projeto de trabalho.
Os Dois Mundos.
Figura 150. Digitalização Silvia.
Esboço do projeto de trabalho
A Sombra do Algodão.
Esboço - Tema Café.
Figura 151. Digitalização Silvia.
Esboço do projeto de trabalho.
Do Outro Lado da Embalagem.
Figura 152. Digitalização Silvia.
Esboço do projeto de trabalho.
Estudar ou Trabalhar.
176
3ª mês
A análise dos formulários elaborados pelos grupos:
1. O professor elaborou uma síntese a partir da análise de alguns
formulários preenchidos pelos alunos na semana anterior. Este
documento abrangeu todas as respostas dadas por cada grupo, para
cada questão dos formulários 1, 2 e 3.
2. Durante a apresentação da síntese, houve uma discussão com os
alunos sobre as frases e palavras repetidas, termos indefinidos e
conflitantes para que fossem eliminados, retificados ou confirmados em
consenso.
3. Neste momento foi importante trabalhar com a reflexão da “fala” dos
participantes, permitindo que apresentassem seus conceitos e pontos de
vista sobre o tema abordado. As informações produzidas pelo grupo
foram essencialmente qualitativas. Trata-se de uma técnica participativa,
dinâmica, de participação voluntária. É essencial que haja interação
entre os participantes e o pesquisador, promovendo assim o
envolvimento de todos integrantes do projeto. A seguir o momento de
discussão e participação do grupo.
Figura 153.
Discussão com o grupo de alunos.
Figura 154.
Participação do grupo.
Foto: Silvia
Foto: Laura
177
Figura 155.
Discussão com o grupo de alunos
Após este processo colaborativo, chegou-se a uma síntese de tudo que foi
visto e discutido na primeira semana, durante os momentos de leitura e
contextualização da obra.
Em seguida, os alunos elaboraram um texto a partir de todos os elementos ou
itens discutidos e apontados na sala de aula. Assim, houve uma síntese de leitura
e contextualização da obra de cada grupo.
O terceiro momento: elaboração de uma produção/fazer artístico.
1. O trabalho foi desenvolvido com três turmas do ano (2ªA, 2ºC e 2ºG).
Em cada turma de aproximadamente 40 alunos, formaram-se entre 6 e 7
grupos com 5 e 6 integrantes cada.
2. A escola não tinha um espaço disponível, então foi utilizada a própria
sala de aula, e no momento da proposta do fazer artístico os alunos
usaram o refeitório, como também, outros locais da escola.
3. Foi estipulado o prazo de duas aulas para que discutissem o projeto e
encaminhassem uma proposta de trabalho.
4. Dispôs-se o material necessário e iniciou-se o trabalho.
5. Foi utilizado o tempo de quatro aulas para realizar as etapas de
elaboração da proposta de produção/fazer artístico de cada grupo.
Finalização do trabalho: exposição, leitura e discussão das obras expostas.
1. Após conclusão dos trabalhos, foi promovida uma discussão sobre a
obra produzida e avaliação dos trabalhos expostos.
Foto: Laura
178
2. Todo o processo, assim como cada trabalho final apresentado, foi
documentado através de fotografias, sendo uma maneira de guardar os
acontecimentos, o que permite resgatá-los, interpretá-los e refletir sobre
eles, sendo as fotografias utilizadas como um recurso pedagógico.
3. Os trabalhos ficaram expostos para que todos pudessem interagir com
os alunos, comunidade, funcionários, e outros interessados.
Síntese das etapas de acordo com a Abordagem Triangular.
1. Promoveu-se a leitura de reproduções de obras dos artistas Portinari e
Salgado através de roteiros de análise denominados formulários. Eles
foram construídos colaborativamente com os alunos participantes a partir
de sugestões dadas por eles e pelo professor. É importante ressaltar que
não existe uma única leitura de uma mesma obra cada aluno teve um
olhar a partir de suas vivências e experiências sócio-cultural.
2. As obras foram discutidas e contextualizadas em seu tempo e espaço
através da História da Arte considerando as influências das tendências
artísticas da época de sua produção, assim como de outros trabalhos do
mesmo artista e de seus contemporâneos.
3. Os alunos foram orientados quanto à elaboração de propostas poéticas
a partir da leitura, da contextualização, e de novas leituras individuais e
reinterpretações das obras construídas a partir de um novo significado e
de uma nova leitura da obra.
4. A exposição, análise e discussão das obras produzidas neste trabalho,
foram reproduções das pinturas em afresco do artista Portinari e das
fotografias de Salgado com as temáticas: Cana, Algodão e Café.
179
O resumo ilustrativo das seis obras: três pinturas em afresco de Portinari e
três fotografias de Salgado que foram selecionadas e utilizadas nesta pesquisa,
dentro dos critérios expostos anteriormente, para desenvolvimento das aulas de Arte
do Ensino Médio, é apresentada a seguir:
Cândido Portinari.
Cana – 1938.
Pintura mural a afresco, 280 x 247 cm.
Palácio Gustavo Capanema, Rio de Janeiro.
Sebastião Salgado.
Bóias-frias nas plantações da Usina de São
Marinho, 1987.
Fotografia.
Pradópolis. São Paulo.
Candido Portinari.
Algodão – 1938
Pintura mural em afresco, 280x 300 cm
Palácio Gustavo Capanema, Rio de Janeiro.
Sebastião Salgado.
Trabalhadores das plantações de algodão.
Fotografia, 1980.
Região de Cajazeiras, Paraíba
Candido Portinari.
Café – 1938.
Pintura mural em afresco, 280x 297 cm.
Palácio Gustavo
Capanema, Rio de Janeiro.
Sebastião Salgado.
Trabalhadores das plantações de café, 2002.
Fotografia.
Minas Gerais.
Figura 156 – Quadro das obras selecionadas.
180
Os Instrumentos de pesquisa e avaliação
Os instrumentos utilizados na coleta de dados durante o desenvolvimento
desta pesquisa foram:
1. Formulários
Os formulários e as Sínteses buscaram identificar informações importantes,
podendo ser consultadas a todo o momento como fonte de análise e informação.
Formulário 1 (apêndice A)
O formulário orientou o aluno a elaborar mentalmente as perguntas, fazendo a
análise da obra, a partir da apreciação dessas as respostas foram escritas
livremente no formulário. Este tipo de analise permite muitas interpretações do
observador. Cada ser humano e sente a obra de arte de acordo com a sua
história de vida, portanto, não existe certo ou errado.
Formulário 2 (apêndice B)
Este formulário foi constituído por trinta e oito perguntas objetivas abrangendo
os momentos: Descrevendo, Analisando e Interpretando através do sistema de
leitura e interpretação de obras de arte Image Watching, proposto pelo Professor
Robert Ott. A finalidade, segundo ele, é indicar caminhos para apreciar e interpretar
imagens, sendo um método direcionado ao ensino de Arte. Neste inventário
aparecem os elementos que participam da construção de uma obra: como o tema ou
assunto, formas predominantes, figura e fundo, profundidade, formas das linhas,
diagonais e horizontais, o claro e o escuro, cores, luz, sombras, texturas,
sentimentos e emoções.
Formulário 3 (apêndice C)
O terceiro formulário foi composto de cerca de oito perguntas objetivas
abrangendo o momento Contextualizando do sistema de leitura Image Watching.
Sendo um sistema de interpretação que fornece conceitos para a crítica em direção
a produção artística, descrevendo um roteiro para o olhar. Foram nesse momento
discutidas as informações sobre o autor e sua obra, conhecendo-os em seu contexto
histórico, social e artístico, descobrindo as tendências artísticas e influências nas
181
obras e seus contemporâneos. Dados técnicos sobre a obra como nome, data,
técnicas, materiais e as dimensões das obras.
2.
2.2.
2.
Sínteses (apêndice D)
As sínteses foram constituídas por textos dissertativos nos quais os alunos
escreveram um resumo geral de tudo que foi visto, ou seja, uma conclusão dos itens
levantados e analisados nos formulários de cada obra.
3.
3.3.
3.
Questionário
O Questionário foi um dos procedimentos mais utilizados para que o
pesquisador obtivesse informações sobre o desenvolvimento da pesquisa. Eles
foram utilizados para saber as opiniões, comportamento e outras questões. No caso
desta pesquisa, sendo de caráter qualitativo, foi utilizado um breve questionário
composto por quatro perguntas que, de alguma maneira, complementaram a
avaliação do projeto de pesquisa. Cerca de cem alunos preencheram e entregaram
o questionário.
5.3 Os Resultados da Pesquisa
A pesquisa teve um resultado satisfatório no aspecto qualitativo e quantitativo,
conforme a análise dos dados coletados e os diferentes procedimentos utilizados.
Formulários
Os formulários foram totalmente preenchidos pelos alunos durante os
momentos de leitura, análise e contextualização da obra, a partir do sistema de
leitura adotado Image Watching, de Robert Ott, a partir da observação das imagens
trabalhadas.
SÍNTESES
As Sínteses, textos provenientes dos formulários, foram elaboradas na forma
de texto dissertativo, envolvendo a leitura da obra em todos os aspectos de
observação, leitura e contextualização da obra.
182
QUESTIONÁRIO
O questionário foi aplicado após a finalização da produção artística
(reinterpretação) das obras, ou seja, após a aplicação da Metodologia Triangular em
seis obras, sendo três pinturas de Portinari e três fotografias de Salgado.
A seguir são apresentadas as quatro questões do Questionário e as transcrições das
respostas fidedignas de alguns alunos:
1. As atividades de observação, leitura da imagem e contextualização da
obra ajudam ou o no processo de criação/produção do trabalho
artístico? Explique por quê.
2º A= 37 alunos 2º C= 38 alunos 2º G = 37 alunos Total = 112 alunos
Respostas Quantidade
%
Responderam que estas atividades “ajudam”.
105
94
Responderam que estas atividades são “indiferentes”.
07 6
TOTAL
112 100
Pode-se perceber que nas duas fases iniciais do processo metodológico a
leitura da imagem e contextualização ajudam, criando situações facilitadoras para a
produção de um fazer artístico. Quase todos os alunos acharam que as fases
anteriores à elaboração do fazer são importantes no processo de criação. Como
confirmam as falas dos próprios alunos:
Ajudaram muito, porque deu para ter uma noção de como é na vida
real as plantações de café, açúcar e algodão. No trabalho plástico as
imagens que vimos nos ajudaram a ter idéias para a execução do
trabalho (Micael, 2º A).
Fizemos a observação de todas as obras, pesquisamos, analisamos
na sala de deo, planejamos o projeto até concluí-lo como obra de
arte. Com certeza este processo ajudou no planejamento. O grupo
pode ter uma boa base, uma ajuda na própria criação (Jéssica
Amanda 2º A).
Da mesma forma, conhecer outros trabalhos dos artistas estudados e ter
acesso a obras de artistas da mesma época ou tendências, também colaboraram
para um melhor entendimento da criação e produção artística.
183
Todo processo feito foi fundamental para criação do trabalho plástico,
porque com as observações e o conhecimento das obras e artistas,
podemos analisar e estudar como seria nosso projeto e isso ajudou
muito na elaboração, até os pequenos detalhes foram fundamentais
(Lais C. 2º C).
Sim, porque para que pudéssemos ter noção de como interpretar
uma obra precisamos conhecer e estudá-la, assim como fizemos nas
obras de Portinari e Salgado, pois se não tivéssemos analisado as
obras não teríamos conseguido fazer o nosso trabalho (Alessandra
2º C).
O processo de leitura e contextualização ajudou sim, para podermos
realizar o nosso trabalho, pois através das imagens passamos a
conhecer muitas realidades que não conhecíamos e assim seria
difícil a realização do trabalho (Priscila 2º C).
Ajudam, tornam o entendimento mais simples, faz com que as
mentes se tornem mais abertas, as idéias mais claras a cerca do
tema apresentado (Aline 2º A).
No entanto, pouquíssimos alunos declararam que ao tomar contato com uma
obra, fazer a leitura, conhecer mais profundamente seu autor e época, tanto ajudam
como limitam, pode-se observar este fato nas argumentações expostas por alguns
alunos.
Ajudam, porque deram noção de como percorrer o caminho e
limitam, pois você fica preso apenas àquela obra” (Laura 2º A).
De certa forma ajudou muito principalmente para nós iniciantes, pois
um ponto de referencia para a gente seguir, mesmo que
vagamente nos limita, no sentido de já ter um tema definido, porém
quando se trata de “releitura” a interpretação é individual (Lays Marie
2º A).
2. O que sentiu ao fazer uma reinterpretação da obra de arte, considerando
as temáticas analisadas? Explique por quê.
2º A= 37 alunos 2º C= 38 alunos 2º G = 37 alunos Total = 112 alunos
Respostas
Quantidade %
Respostas positivas – liberdade de criação
108 96
Respostas negativas - indiferentes
4 4
TOTAL 112 100
184
Como pode ser notado no quadro acima, dos cento e doze alunos
consultados, a grande maioria respondeu de forma positiva sobre o trabalho plástico
de reinterpretação, envolvendo a criação de outra obra, a partir daquela trabalhada
pelo professor.
É uma sensação de orgulho e de prazer, porque fomos nós que
tivemos a idéia inspirada no tema e executamos essa idéia e logo
estava criada a obra (Micael 2º A).
Foi um sentimento maravilhoso poder descrevê-las com nossas
próprias palavras, com nossos sentimentos, pude pensar na origem
da fotografia e refletir sobre a pintura nos caminhos que os artistas
percorreram (Salomé 2A).
A sensação foi de satisfação, pois através das imagens
passamos tantas mensagens e causam muitas histórias na
imaginação de quem observa a obra (Kethully 2º G).
É uma sensação muito boa, incorporamos um artista e inventamos o
nosso modelo, nossa obra sendo muito satisfatório quando depois de
todo trabalho percebemos que valeu a pena, que aprovaram o nosso
trabalho e que também somos artistas (Priscila 2º A).
Uma sensação de conhecimento, pois quando vemos uma obra às
vezes não entendemos bem o que ela quer mostrar, de quando
fazemos a reinterpretação a gente passa a entender a obra e o que
ela quer mostrar (Nathalia Moreira 2º A).
Ao mesmo tempo em que você se sente desafiado a fazer algo que
atinja as expectativas de professores, alunos e todos que trabalham
na escola, você se sente prestigiado, famoso o que é uma sensação
prazerosa (Ketyn 2º C).
Me senti ótima, pela primeira vez nós criamos uma obra de verdade,
não que as outras não tenha sido, mas essa foi mais verdadeira, nós
conseguimos explorar o espaço escolhido (palco da escola) e fazer
uma verdadeira obra (Lais C. 2º C).
Foi uma sensação boa, diferente de todas que senti, foi a primeira
vez que uma professora se propôs a fazer o seu trabalho mesmo,
pois não trabalhamos com textos e pinturas no caderno,
colocamos a mão na massa e fizemos a arte (Priscila 2º C).
A sensação foi de redescoberta, pois achávamos que o que
sabíamos era suficiente, mais não, temos de estar abertos a ver a
185
obra como realmente é, e mudá-la do nosso jeito para entendê-la
melhor (Roselaine 2º C).
Diferente, pois ao mesmo tempo em que é igual e totalmente
diferente e extremamente pessoal com objetivos coletivos, é como
falar com os mais diversos materiais ao invés de usar palavras
(Vinicius 2º C).
O que senti foi uma sensação de artista por alguns dias. Eu gostei
muito desse projeto, porque é algo que não copiamos, mas criamos
(Mariana 2º C).
Uma sensação de “poder“, de ter nas mãos a possibilidade de passar
através de imagens, as conclusões a que o grupo chegou, de passar
a nossa opinião a respeito do tema trabalhado (Aline 2º A).
3. Qual foi a importância de trabalhar com obras, cuja temática foi voltada ao
trabalhador rural? Explique por quê.
2º A= 37 alunos 2º C= 38 alunos 2º G = 37 alunos Total = 112 alunos
Respostas Quantidade %
Teve importância
110
98
Não teve importância/indiferente
2 2
Total 112 100
Nesta questão, o número de respostas positivas foi de quase cem por cento,
isto é, os estudantes consideraram ser de grande importância trabalhar com
temáticas relacionadas à vida rural, embora seja um tema comum em nosso país,
trata-se uma classe social de pessoas que não são muito lembradas nas escolas, ou
na realidade da vida urbana. Esse tema fez com que os alunos pudessem refletir
sobre a questão econômica e social dos trabalhadores, bem como o processo e
etapas pelos quais passam as mercadorias antes de chegarem à mesa das casas.
Importância muito grande. Acredito que quando se começa a lidar
com esse tipo de temática, se começa a pensar e refletir sobre esses
trabalhadores e a precária situação do seu modo de vida, nos
causando compaixão pelo pouco que eles têm. Essas pessoas
possuem apenas seu trabalho, que é de onde tiram seu sustento.
Muito legal refletir sobre a temática e aplicar expressando nas artes
(MicaelA).
186
Foi extremamente importante. Foi necessário criar uma opinião sobre
o tema que não conhecíamos bem. Precisamos analisar, discutir,
questionar. então notamos a real dimensão e real importância do
tema rural (Aline 2º A).
Foi importante porque vimos coisas do mundo rural, até então não
dávamos valor aos trabalhadores que são pessoas que se esforçam
para ganhar pouco e vivem seu dia-a-dia sem a tecnologia da cidade
grande, nos usamos muito essa tecnologia e acomodações do
nosso mundo globalizado e achamos nossa vida difícil, dura e injusta
(Lucas 2º G).
Foi importante conhecer mais sobre o trabalho e a vida rural que
muitas vezes é desprezada e ignorada por quem mora na cidade.
Também foi bom para se perceber as etapas dos produtos ate
chegar a nossas mãos (Franciele 2º G).
Foi muito importante, pois com esse trabalho podemos conhecer um
pouco mais sobre a cultura e o trabalho rural, a importância é maior,
que as fotos mostram um fato real, é legal fazer uma espécie de
homenagem a esse trabalho (Patricia 2ªA).
É importante lembrar-se da existência das pessoas que trazem
nossos alimentos, roupas, porque com tanta tecnologia acabamos
“deletando” da nossa memória que ainda existem pessoas que
sofrem sem tecnologias e que utilizam seu próprio corpo para se
manterem e a todos que estão a sua volta, mesmo que distantes
(Kety 2º C).
Foi essencial, pois muitos de nós, não damos a mínima importância
para o trabalho rural, mas é desse trabalho que sai praticamente
todos os alimentos que consumimos. Foi super importante, acho que
cada um de nós tem que valorizar essas pessoas que trabalham no
setor rural, pois apesar de todo processo de industrialização ainda
existem pessoas que vivem na área rural (Priscila 2º C).
Conscientização de que um mundo muito maior do que
imaginamos e ainda pessoas sofrendo pelos seus iguais, algo que
tratávamos com desdém. Talvez pela falta de conhecimento da
temática (Vinicius 2º C).
Podemos nos conscientizar de que às vezes para tirar um esmalte da
unha, trabalhadores rurais trabalharam para que o algodão chegue
até nós, ou seja, com esse projeto passamos a nos importar com
esse tipo de trabalho que passa despercebido (Alessandra 2º C).
A importância de trabalhar com imagens com as temáticas voltadas
ao trabalho rural é muito grande, porque assim aprendemos um
pouco do processo do trajeto da cana, ca e algodão, sendo
diferente daquilo que pensávamos (Gislaine 2º A).
187
4. O que achou de produzir um fazer artístico, voltado para a Arte
Contemporânea, utilizando diferentes materiais? Por quê?
2º A= 37 alunos 2º C= 38 alunos 2º G = 37 alunos Total = 112 alunos
Respostas Quantidade %
Não encontrou dificuldade
80 73
Encontrou dificuldade
32 27
Total 112 100
Como se observa, nesta questão alguns alunos encontraram certa
dificuldade, visto que o “novo” e o “diferente” sempre trazem algumas indagações e
reflexões. Para eles foi um trabalho diferenciado daqueles que estavam
acostumados a fazer nas aulas de Arte, onde se trabalhava apenas o bidimensional
na produção de suas obras, sem pensar numa proposta de fazer, produzir e elaborar
idéias novas, ou seja, reinterpretar.
Na verdade foi mais trabalhoso do que usar lápis, que é o que
estamos acostumados a fazer, usamos de tudo desta vez, tiras de
pano, roupas, colagem, bambus, algodão, foi bem legal (Adriane
A).
Um pouco complicado, pois não conhecia muito sobre a arte
contemporânea, mas depois do projeto e das pesquisas melhorou e
podemos criar nos espaços da escola, nas paredes, bonecos
espalhados e muitas coisas diferentes (Marlon 2º A).
Sim, pois era uma proposta diferente daquela que normalmente é
executada na escola, diferente do que se costuma trabalhar (Aline 2º
A).
Encontrei algumas, pois realmente saímos do nosso dia-a-dia, mas
nada que não fosse impossível de realizar, sempre é bom conhecer
coisas novas (Taisa 2º C).
Por outro lado, muitos alunos não encontraram dificuldades, pelo contrário
adoraram pensar na idéia de criar sua obra a partir de sua própria interpretação,
utilizando diferentes materiais.
Não, o contemporâneo é mais liberal, te deixa mais livre para
produzir uma obra, não importando o mais absurdo que pareça. É
interessante trabalhar com outros tipos de materiais com que não
188
estamos acostumados, trazendo algo criativo e fantástico podendo
ser a obra bi ou tridimensional. (Lays Marie 2º A).
Não encontrei dificuldade de trabalhar as diferentes linguagens de
arte e nem com os materiais, pois antes de realizar a obra, vimos
várias obras contemporâneas e tivemos a noção de como realizar, ou
seja, produzir o nosso trabalho (Priscila 2º C).
Achei muito interessante, pois nunca tinha trabalhado com Arte
Contemporânea, foi uma experiência muito boa, que eu nunca tive e
jamais vou esquecer (Rebeca 2º C).
Não, pois com a Arte Contemporânea temos mais liberdade de
expressão, fugindo um pouco da arte convencional (Franciele 2º G).
A partir das respostas do questionário elaborado, observamos que o projeto
teve muitos pontos positivos, principalmente na questão da aplicação da Proposta
Triangular, visto que muitos alunos passaram a acreditar no seu potencial de
produção de um fazer artístico, valorizando a idéia, construindo, assim a sua
proposta poética de criação.
A utilização de diferentes materiais para a elaboração do trabalho foi muito
significativa para eles, passando também a conhecer mais a Arte Contemporânea,
possibilitando assim maior facilidade de reinterpretação das obras.
A maioria dos alunos, durante o projeto, passou a refletir sobre a questão
social e econômica do nosso país, perceberam então que no interior do Brasil
existem seres humanos que executam um trabalho manual dependendo muito do
corpo físico, sem muito conhecimento intelectual, pois muitos nunca foram à escola,
mas possuem o conhecimento de vivência, obtida através de suas experiências
cotidianas.
A partir dos questionamentos sobre a desvalorização do trabalho rural
possibilitou-se uma maior conscientização e reflexão sobre o processo de produção
agrícola do país.
Alguns alunos acrescentaram também ao responder o questionário que se
sentiram apoiados no sentido de colaboração, união entre toda a equipe no decorrer
do projeto, observadas nas respostas cedidas por esses alunos:
189
O apoio da direção foi fundamental, mas o que ajudou mesmo foi o
auxílio da professora antes e durante a realização do projeto. O
desenvolvimento do grupo foi ótimo, podendo, assim finalizar
perfeitamente nosso projeto (Priscila 2ºC).
Com relação ao professor, foi ótima. Deu-nos idéias, sugestões,
críticas, nos guiando para o caminho certo, além de nos auxiliar com
os materiais. Os colegas do grupo, também fizeram um ótimo
trabalho, se revezando para não pesar somente para uma pessoa, as
idéias se fundiram, tornando o trabalho mais perfeito. Quanto à
direção ficamos agradecidos pela colaboração, pela liberação do
espaço (Claudia 2ºA).
5.4 A Produção Artística
A produção artística dos alunos foi realizada no refeitório, utilizando o suporte
escolhido dentro do espaço da escola como: mesas, palco, pilastras, paredes, piso,
teto, enfim, locais que propiciassem o desenvolvimento da elaboração do fazer
artístico. Além disso, foram utilizadas cerca de 4 aulas para a realização da
produção e montagem do trabalho.
Este foi o momento mais importante de todo o processo, quando a partir da
leitura e da contextualização, o aluno foi estimulado a produzir um trabalho plástico
que refletiu a temática e as informações discutidas e sintetizadas na parte teórica.
Os alunos foram instruídos a trabalhar escolhendo uma das temáticas
abordadas: café, algodão ou cana, propostas para serem elaboradas e executadas,
utilizando-se das linguagens artísticas contemporâneas (instalação, performance,
intervenção e outras), ou seja, podendo desenvolver tanto um trabalho bidimensional
ou tridimensional escolhidos pelos alunos na fase de planejamento do trabalho
prático, bem como os diferentes materiais como e grãos de café, açúcar, cana,
retalhos de tecidos, tinta, colagem, arame e outros.
190
Fotos da elaboração das produções artísticas com a temática cana-de-açúcar
Figura 157.
Desenvolvimento
da Produção
Artística
.
Materiais
utilizados:
Cana-de-açúcar;
Roupas;
Chapéu de palha;
Papelão;
Terra e outros.
Figura 158.
Obra: Cortadores
de Cana.
Autores/alunos:
Kethully,
Jenifer,
Andressa,
Larissa,
Jaqueline, 2º G.
O nosso grupo pensou em desenvolver um trabalho a partir de
nossas reflexões sobre as pessoas que trabalham duro para
conseguir seu sustento, através do corte da cana. Tentamos
representar essas pessoas na parede do patamar da escada, para
que todos percebessem que eles existem.
Foto: Silvia
Foto: Silvia
191
Figura 159.
Desenvolvimento
da Produção
Artística no
chão do palco.
Materiais
utilizados:
Açúcar,
livros,
brinquedos e
outros.
Figura 160.
Obra: O
Caminho de
Açúcar.
Autores/alunos:
Priscila S.
Laís C.
Diego
Bruno, 2º C.
Nossa mensagem foi transmitir a realidade de muitas crianças, que
ainda hoje, principalmente no interior deixam de estudar e brincar
para trabalhar na roça, cortando cana, entre outros serviços
Foto: Silvia
Foto: Silvia
192
Figura 161.
Desenvolvimento da
Produção Atística
na parede do palco.
Materiais
utilizados:
Cana-de-açúcar,
roupas de crianças,
bagaço de cana
terra e outros.
Figura162.
Obra: Escravidão
Infantil.
Autores/alunos:
Anderson,
Bruno,
Hadina,
Tais,
Salomé,
Thais. 2º A.
Refletir sobre a escravidão, ou seja, o trabalho infantil, que hoje é
muito comum em nosso país, muitas crianças vão para a roça muito
cedo ajudar os pais, crescem sem estudos e sem oportunidades.
Foto: Silvia
Foto: Silvia
193
Figura 163.
Desenvolvimento
da Produção
Artística, sobre
Madeira.
Materiais
utilizados:
açúcar,
suporte de madeira,
pó de café,
casca de cana
entre outros.
Figura 164.
Obra: O Trabalhador
de Açúcar.
Autores/alunos:
Jéssica B.,
Jéssica,
Dayane,
Greice,
Érica,
Eliene, 2ºC.
O nosso trabalho é um cortador de cana construído com açúcar,
que ela vem do produto que ele corta e vai para a usina se
transformar em açúcar ou bebida alcoólica.
Foto: Silvia
Foto: Silvia
194
Figura 165.
Desenvolvimento da
Produção Artística
no refeitório.
Materiais
utilizados:
cana-de-açúcar,
enxada,
chapéu,
pano,
colher,
e outros.
Figura 166.
Obra: Vida Simples.
Autores/alunos:
Alexandre,
José Lucas,
Karen,
Nathalia,
Patricia F.,
e Thais, 2º B.
Pensamos no trabalhador que sai pela manhã para ir trabalhar na
roça e leva sua água e sua marmita, comendo a comida fria e
tomando a água que esquenta durante o dia. Representamos a cena
com mbolos que faz parte da vida desse homem que trabalha nos
canaviais.
Foto: Silvia
Foto: Silvia
195
Elaboração das produções artísticas com a temática algodão
Figura 167.
Desenvolvimento
da Produção
Artística, na parede.
Materiais
utilizados:
revistas,
tecidos,
roupas,
algodão,
bambu,
isopor,
e outros.
Figura 168.
Obra: Os Dois
Mundos.
Autores/alunos:
Priscila A.,
Paloma,
Jéssica A.,
Ariane,
e Viviane, 2º A.
A nossa idéia foi o de mostrar o contraste e as diferenças entre os
dois mundos: o globalizado e o rural. No primeiro a tecnologia, a
facilidade e a eficiência do mundo globalizado e no segundo a
simplicidade, naturalidade do mundo rural.
Foto: Silvia
Foto: Silvia
196
Figura 169.
Desenvolvimento
da Produção
Artística na parede
do 2º andar.
Materiais
utilizados:
tinta,
algodão,
arame,
retalhos de tecido,
papel pardo,
entre outros.
Figura 170.
Obra: A Sombra do
Algodão.
Autores/alunos:
Laura,
Aline,
Claudia,
Lays,
e Ailton, 2º A.
A nossa idéia foi de transmitir o significado que o algodão tem para
cada ser humano, ou seja, para o trabalhador rural, é o objeto de seu
sustento, e para o consumidor o algodão é mais um produto, que
pode proporcionar roupas da moda.
Foto: Silvia
Foto: Silvia
197
Figura 171.
Desenvolvimento
da Produção
Artística
Materiais
utilizados:
algodão,
galho seco,
tecido,
pó de café,
entre outros.
Figura 172.
Obra: Pegadas na
Plantação.
Autores/alunos:
Joyce,
Renata,
Daniela,
Thiago,
Luísa,
e Douglas, 2ºG.
Quisemos representar a força de pés e mãos, principais instrumentos
de interação utilizada para o trabalho rural, transmitindo a força
apreendida no desempenho desta função, através da mãoes e pes
dos trabalhadores.
Foto: Silvia
Foto: Silvia
198
Figura 173.
Desenvolvimento
da Produção:
Artística,
no chão do
Palco.
Materiais
utilizados:
papel pardo,
terra,
e algodão.
Figura 174.
Obra: Pés de um
Trabalhador.
Autores/alunos:
Camila,
Kelvin,
Izaias,
Diego,
Wesley, 2º G.
Normalmente um trabalhador tem os pés grandes, andam descalços
e deixam suas marcas na terra, trabalham de sol a sol ou chuva com
dificuldade para conquistar o alimento para sua família,
representamos as pegadas dos pés, pois, são a base e a estrutura
do homem.
Foto: Silvia
Foto: Silvia
199
Figura 175.
Desenvolvimento
da Produção
Artística
na parede
secretaria.
Materiais
utilizados:
fotografias,
retalhos
de tecido,
tinta,
papel pardo,
entre outros.
Figura 176.
Obra: Imagens
Através da
Cortina.
Autores/alunos:
Evellyn,
Francieli,
Rebeca,
Roselaine
e Taisa, 2ºC.
As fotos e as imagens mostram o trabalho rural, mas é como se
estivesse uma cortina entre as duas realidades, da vida urbana e
rural, nos damos conta de que existem pessoas trabalhando para
o nosso sustento quando algum produto falta na nossa mesa, assim
abrimos a cortina.
Foto: Silvia
Foto: Silvia
200
Figuras 177 e 178.
Desenvolvimento
da Produção Artística
no refeitório..
Materiais
utilizados:
algodão,
tinta,
chapéu,
entre outros.
Figura 179.
Obra: O Outro Lado.
Autores/alunos:
Ariane Moreira,
Ariane C.,
Juliane,
Jucimara,
e Patricia, 2º A.
Queriamos representar o processo de colheita do algodão, o
trabalhador que lavra a terra, planta e colhe, quase não aparece, não
tem muito valor, mesmo sendo o autor principal, apenas quem se
destaca é o comprador que repassa o produto para a
industrialização.
Foto: Silvia
Foto: Marta
Foto: Silvia
201
Elaboração das produções artísticas com a temática café
Figura 180.
Desenvolvimento
da Produção
Artística.
Materiais
utilizados:
tecidos,
papelão,
fotografia,
arame,
boneca,
tapete,
entre outros.
Figura 181.
Obra: O Escuro.
Autores/alunos:
Ketyn,
Jefferson,
Fabiola, 2º C.
A instalação é uma crítica as pessoas que se fecham em seu mundo
próprio e não prestam atenção ao seu redor, logo do outro lado da
janela, ou seja, naqueles que trabalham para nosso sustento. o
olha pela janela e sim para a TV, que geralmente mostra futilidade.
Foto: Silvia
Foto: Silvia
202
Figura 182.
Desenvolvimento
da Produção
Artística.
Materiais
utilizados:
folhas de café,
tecidos,
tintas,
cartolina,
papel,
linha.
Figura 183.
Obra: Estudar ou
Trabalhar?
Autores/alunos:
Gislaine,
Pâmela,
Sâmela
e Thalira, 2º A.
Pensamos na exploração infantil, naquelas crianças que às vezes
tem de fazer uma escolha: deixam de lado os estudos e as
brincadeiras de crianças ou vão trabalhar na roça, para ajudar na
renda familiar.
Foto: Silvia
Foto: Silvia
203
Figura 184.
Desenvolvimento
da Produção
Artística
.
Materiais
utilizados:
Embalagem de
café,
papelão,
cola,
tinta
e outros.
Figura 185.
Obra: O Outro
Lado da
Embalagem.
Autores/alunos:
Micael,
Luan,
Mauricio,
Felipe,
Robson,
Diego
e Rogério, 2º A.
Através da criação deste trabalho quisemos transmitir o quanto os
trabalhadores rurais são explorados pelas grandes empresas de
café, parece querer esconder o trabalhador, pois o trabalho do
mesmo não é enfatizado, por isso a colagem de embalagens de café
cobrindo o corpo dos trabalhadores.
Foto: Silvia
Foto: Silvia
204
Figura 186.
Desenvolvimento
da Produção
Artística, na
parede da
quadra.
Materiais
utilizados:
tintas,
folha,
grãos de café,
e outros.
Figura 187.
Obra: Símbolo.
Autores/alunos:
Franciele,
Daiane,
Flavia,
Wanessa,
Wesley
e Diego, 2º G.
Mostrar uns dos processos finais do café, o resultado de todo um
processo que vai da colheita até o produto final, vendido nos
mercados que compramos e preparamos obtendo o nosso café, mas
não esquecendo que antes esse produto passou pelas mãos,
normalmente, calejadas do trabalhador.
Foto: Silvia
Foto: Silvia
205
Figura 188 e 189.
Apresentação da
Performance: Sem
Colheita sem Café.
Materiais
utilizados:
folhas e grãos de café,
roupas de trabalhador
rural,
mesa,
xícaras,
bule,
e outros.
Autores/alunos:
Thamise,
Nathalia M.,
Camila,
Leticia,
Marlon, 2º A.
Quisemos mostrar que a maioria não valor aos colhedores de
café, e se não fosse eles preparar a terra, plantar, carpir, adubar e
colher não teria o nosso café todos os dias.
Foto: Silvia
Foto: Silvia
206
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A presente pesquisa foi direcionada a uma metodologia de ensino em Artes
Visuais, teve como objetivo a aplicação da Abordagem Triangular enunciada por Ana
Mae, e utilização do sistema de leitura Image Watching, de Robert Ott, constatou-se
que suas respectivas aplicações provaram ser muito eficientes no processo ensino-
aprendizagem e, também, como instrumentos motivadores nas atividades da
disciplina de Arte. Assim, analisando os resultados obtidos com a aplicação de
instrumentos metodológicos, constata-se que o objetivo desta pesquisa, a aplicação
da Proposta Triangular em seus três momentos propostos foi atingido de forma
positiva, envolvendo a participação de quase todos os alunos do Ensino Médio.
Durante o desenvolvimento da pesquisa, houve grande interesse e
participação pela maioria dos alunos do ano do Ensino Médio da Escola Estadual
Professora Zipora Rubinstein, observando através do resultado da pesquisa que a
maioria deles acredita que o processo de leitura, análise e contextualização da obra
facilita a criação de um fazer artístico, pois sentiram-se livres para interpretar e
produzir novos trabalhos, utilizando-se de diversos materiais.
No decorrer do projeto, as aulas tornaram-se atraentes por incluir a imagem
como forma de comunicação e fonte de informação. Além disso, outro fator muito
relevante foi a escolha de uma temática que faz parte do cotidiano brasileiro, mas
não está presente na vida da cidade: o trabalhador rural. Isso possibilitou o estudo
dos consagrados artistas, Candido Portinari e Sebastião Salgado, que foram
essenciais para a realização do desenvolvimento da pesquisa, na qual foi discutido
um tema que não faz parte do repertório dos alunos, possibilitando assim uma
reflexão sobre essa questão social. Desta maneira os alunos passaram a reconhecer
e valorizar todo o processo da plantação e da colheita e perceberam que antes dos
produtos chegarem à mesa, passam antes por muitos processos que envolvem a
mão-de-obra do trabalhador.
Não obstante, os estudantes encontraram algumas dificuldades para o
desenvolvimento, visto que a escola fica localizada em um bairro periférico da cidade
de o Paulo, com todos os problemas existentes nas escolas públicas, sem levar
207
em consideração a falta de espaço adequado para as aulas de Arte, tendo pouco
material disponível para o desenvolvimento da produção artística.
Uma das maiores resistências foi quanto ao deslocamento dos alunos dentro
da própria escola, que a direção prefere manter os alunos dentro da sala de aula,
por ser uma instituição de grande porte, e conseqüentemente, cujas tarefas são de
difícil controle quando realizadas em espaços externos. O ideal seria haver mais
envolvimento e colaboração entre as partes, o que viabilizaria consideravelmente a
realização de todas as etapas de modo adequado. Sem vida esses foram os
principais obstáculos encontrados no decorrer do trabalho que envolveu a média de
120 participantes do Ensino Médio.
Sendo assim, em relação ao espaço, foi um processo tumultuado, pois todos
os grupos de alunos queriam reservar o seu “cantinho”, ou seja, um lugar da escola
para assim garantir o desenvolvimento do seu projeto.
Outro item negativo foi a assiduidade de alguns alunos o que comprometeu o
aproveitamento pleno de determinados grupos, porém, para outros o
comprometimento foi acima das expectativas, o que ficou comprovado pelo
desenvolvimento notório e pelo grande avanço em suas expectativas de
conhecimento e práticas artísticas.
Foi percebido também que a grande maioria dos alunos não tinha acesso ou
sequer conheciam os artistas Portinari e Salgado, bem como as imagens analisadas.
No contato que tiveram com as obras passaram a refletir sobre a vida do trabalhador
rural, reconhecendo suas práticas com certa intimidade, passando a ser objeto de
crítica sobre suas próprias condições de lazer e cultura. Muitos deles não têm
acesso e nem estão acostumados ou nunca tiveram a oportunidade de conhecer
museus e freqüentar exposições que a cidade de São Paulo proporciona aos seus
moradores.
Em relação ao momento de desenvolvimento das habilidades para produção,
ou seja, reinterpretação da obra, certos alunos encontraram algumas dificuldades
para sua concretização. O fato ocorreu por não estarem acostumados a desenvolver
esse tipo de atividade na escola, visto que antes o suporte utilizado por eles era
apenas o caderno de desenho, o sulfite e a cartolina, o que tornava a criação e o
aprendizado limitado.
Considerando ainda que tiveram um conhecimento mais aprofundado do
assunto, com foco voltado à Arte Contemporânea e a possibilidade de utilização de
208
diferentes materiais que fugiam à rotina de “trabalhinhos” de arte, que puderam ter a
liberdade de criação, ocupando qualquer suporte e espaço escolar com dimensões
variadas e tendo a opção para a produção artística bidimensional e tridimensional,
pode-se afirmar que aconteceu uma integração entre esse novo “fazer artístico”, a
criação e a liberdade de escolha na construção de idéias para o desenvolvimento do
trabalho.
Todavia, um ponto importante em relação à pesquisa foi motivo de crítica
positiva de muitos docentes, funcionários e alunos, como também estimulou a
Professora de Arte Michele Gesteira a se interessar pelo projeto sobre Arte
Contemporânea, integrando-o à Proposta Curricular da Secretaria da Educação.
Assim, participou de sua aplicação em outras salas de ano do Ensino Médio da
referida escola, desenvolvendo um belo trabalho junto a seus alunos, como se pode
ver em anexo.
Do mesmo modo, a participação e interesse dos alunos foram satisfatórios,
durante toda a aplicação da Abordagem Triangular e em todo o desenvolvimento
metodológico da pesquisa. Portanto, o processo de construção dos trabalhos
elaborados pelos alunos através das reinterpretações feitas sobre os trabalhadores
rurais, tendo como temáticas as obras: Cana, Algodão e Café, partindo das pinturas
em afresco de Portinari e das fotografias de Salgado, teve grande aproveitamento na
prática de ensino-aprendizagem, como pôde ser comprovado pelas declarações dos
alunos que se sentiram importantes diante de um desafio que foi além das tarefas
rotineiras da aula. Todos eles puderam experimentar a sensação de expor seus
sentimentos por meio de suas próprias obras de arte e, como relatou a estudante
Mariana (2º C), que teve a sensação de ser artista por alguns dias [...] porque é algo
que nós não copiamos, mas criamos. Com esse depoimento percebe-se a grande
importância das práticas e de incluir novos desafios na sala de aula e que as
atividades artísticas são essenciais nas escolas, pois envolvem o comportamento e
os sentimentos de pertencimento e afirmação dos estudantes como construtores e
agentes sociais críticos e reflexivos em relação à Arte, à história e às suas próprias
ações.
209
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Pesquisa sobre diversos artistas (pintores, fotógrafos entre outros).
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Câmera Leica. Disponível em:
< http://www.espacofotografico.com.br/Dicasequipamentoshistoriadaleica.htm>.
Acesso em: 16 de agosto de 2008.
Figura 84 – O Arsenal.
Fonte: http://i133.photobucket.com/albums/q77/jacintogomes/rivera25.jpg
Figura 87 - Mulheres Protestando.
http://www.palegre.blog.br/wp-
content/uploads/2007/04/di_cavalcanti_mulheres_protestando.jpg
211
Figura 105 - Zebra da Montanha.
Fonte:
http://revistaepoca.globo.com/Revista/Epoca/0,,EDG80007-9556-495,00-
SEBASTIAO+SALGADO+E+A+NATUREZA+INTOCADA.html
Figura 106 – Pinguins de Adélia.
Fonte: http://oglobo.globo.com/fotos/2006/10/31/31_MHG_cult_salgado02.jpg
Figura 107 – Baleia franca-austral chamada Adelita.
Fonte: http://www.nosrevista.com.br/media/2006/07/baleiafranca.jpg
Figura 108 - Crianças Dormindo na Rua.
Fonte:
http://img.photobucket.com/albums/v280/tomasutpen/Album%202b/9f69dfd8.jpg
Figura 109 - Casa de um Italiano Trapeiro.
Fonte: http://www.masters-of-photography.com/R/riis/riis_italian_ragpicker.html
Figura 111 – Trabalhadores Orientando a Elevação do Cabo.
Fonte: http://www.nypl.org/research/chss/spe/art/photo/hinex/empire/empire.html
Figura 123 - Bóias-Frias Rumo ao Ponto.
http://www.itaucultural.org.br/brasil_brasis/migrante/images/migrante_sessao2_03.jp
g
Figura131 - Índia 1947-1948.
http://www.takegreatpictures.com/content/images/cartier79_india.jpg
Figura 132 - Índia, 1950.
http://www.npr.org/templates/story/story.php?storyId=1318621
212
Revistas
Revista Isto É, Editora Três, São Paulo, 1993, semanal, ISSN 104-3943.
Revista Playboy, Companhia das Idéias, São Paulo, 1997, mensal, ISSN 0104-1746.
Revista Veja, Editora Abril, São Paulo, 1993, semanal, ISSN 0100-7122.
______. 1997.
Revista Fórum. Editora Publisher Brasil, São Paulo, 2002, mensal, ISSN 1519-8952.
213
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218
APÊNDICES
APÊNDICE A - FORMULÁRIO 1
Alise da obra: Algodão - Portinari
219
Alise da obra: Colhedores de Algodão - Salgado
220
APÊNDICE B - FORMULÁRIO 2
Leitura da imagem: Cortadores de Cana - Portinari
221
FORMULÁRIO 2 (verso)
222
FORMULÁRIO - 2
Leitura da imagem: Cortadores de Cana - Salgado
223
FORMULÁRIO 2 (verso)
224
APÊNDICE C - FORMULÁRIO 3
Contextualização – Cana - Portinari
225
Contextualização - Obra: Cortadores de Cana – Salgado
226
APÊNDICE D – SÍNTESE
227
SÍNTESE (verso)
228
SÍNTESE
229
ANEXOS
A Professora de Arte Michele Gesteira, também desenvolveu o projeto com
outras salas do ano do Ensino Médio, na Escola Estadual Professora Zipora
Rubinstein.
Abaixo alguns dos trabalhos desenvolvidos pelos seus alunos.
Figura 190 - Professora
Michele orientando
seus alunos no refeitório
da escola
Reinterpretação das temáticas: Cana, Algodão e Café.
Figura 191.
Obra: Escravidão Infantil
Materiais
Utilizados:
cana-de-açúcar,
barbante,
roupas,
pregadores,
entre outros.
Autores/Alunos:
Débora,
Joseana,
Leidislaine,
Geice,
Janaine, 2º D.
Nossa idéia foi refletir sobre a difícil vida dos escravos na época da
escravidão. E hoje da dificuldade dos trabalhadores que enfrentam o
trabalho do corte da cana,que ainda lembra um trabalho escravo.
Foto: Silvia
Foto: Silvia
230
Figura 192.
Digitalização: Silvia
Esboço do projeto:
Três Esferas.
Instalação no
teto do refeitório.
Materiais
Utilizados:
algodão,
arame,
prego.
Figura 193.
Obra: Três Esferas.
Autores/Alunos:
Roger
e Samara, 2º I.
Foto: Michele
231
Figura 194.
Desenvolvimento da
Produção Artística.
Materiais
Utilizados:
peneiras,
folhas de café,
grãos de café,
papel crepon,
embalagem,
coador de papel,
xícara,
entre outros.
Figura 195.
Obra: O Consumo do Café.
Autores/Alunos:
Andressa,
e Tuany, 2º .H
A nossa interpretação sobre o tema café diz respeito às etapas:
Plantio e colheita representadas pelas folhas, grãos de café em coco
e as peneiras, a fase de beneficiamento representada pelo café
torrado, a industrialização representada pela embalagem do café e a
fase do consumo representada pela xícara e os filtros
utilizados,transmitindo assim o desejo de tomar um bom café.
Foto: Michele
Foto: Michele
232
Figura 196.
Materiais
utilizados:
bandeja,
grãos de café,
xícara,
pires,
colher,
café coado,
entre outros.
Obra: Café: Do
Campo à Cidade.
Autores/Alunos:
Vinicius,
Lucas
e Elias, 2º D.
Tivemos a chance de criar uma coisa que partisse da união de
nossas idéias e demonstrar a capacidade de produzir o “diferente”. A
idéia foi de mostrar o produto não industrializado, ou seja, o produto
antes de ser vendido, pois todos estão acostumados a ver o produto
só no mercado.
Figura 197.
Obra: O Mundo Gira.
Materiais
Utilizados:
tinta,
grãos de café,
entre outros.
Autores/Alunos:
Bruna,
Caroline,
Cássia,
Janiele,
Renato
e Thissiane, 2º E.
Pensamos neste tema “O Mundo Gira” porque mostra que apesar do
tempo o trabalhador tem essa força, mesmo, o cansaço e todas as
dificuldades, eles sentem uma alegria, que vem de seu amor e sua
cultura e até mesmo de encerrar seu trabalho no fim do dia.
Foto: Silvia
Foto: Silvia
233
Figura 198.
Desenvolvimento da
Produção Artística.
.
Materiais
utilizados:
tinta,
cartolina,
desenho
molde vazado,
e outros.
Figura 199.
Obra: Obra: Repetição.
Autor/Aluno:
Renan, 2º.H
Foto: Michele
Foto: Michele
234
A aplicação e o desenvolvimento desta pesquisa foi autorizado pelo Senhor
Diretor da Escola Estadual Professora Zipora Rubinstein, nas séries dos anos do
Ensino Médio.
As reproduções de fotos, textos, questionário e imagens de trabalhos de artes
produzidas envolvendo os alunos desta pesquisa, foram incluídas nesta dissertação,
mediante documento de autorização assinado pelos pais ou responsáveis.
A quem possa interessar os documentos referidos estão em posse da autora
desta pesquisa.
Prof.ª Silvia Rosa Marques Paulo.
Escola Estadual Professora Zipora Rubinstein.
Guaianazes - São Paulo – SP / Fone: 11-25579855
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