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representam politicamente os quilombolas da região, ou captam recursos próprios. A
ARQMO, com sede na cidade de Oriximiná, centraliza e hierarquiza as funções de
representação, articulação, captação e implantação de projetos de desenvolvimento nas
comunidades.
Todavia, nem todas as comunidades de Oriximiná estão vinculadas à ARQMO.
Segundo dados levantados por ANJOS (2005), existem quarenta comunidades no município.
Uma delas é a comunidade de Cachoeira Porteira, que fundou, em 2002, a Associação de
Moradores da Comunidade Remanescente de Quilombo de Cachoeira Porteira -AMORCREQ
– CPT, movimento dissidente do ARQMO em Oriximiná
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.
As comunidades remanescentes de quilombo do Trombetas são uma arqueologia viva
do antigo quilombo Maravilha e outros tantos que existiram na região no século XIX
56
. São
descendentes dos escravos que fugiram para a mata, como forma de luta e resistência à
escravidão e ao sistema escravista, deslumbrando construir territórios alternativos ao modelo
colonialista, repressor e racista.
A ocupação negra no Vale do Trombetas teve início nas partes altas do rio, acima das
cachoeiras, onde a morfologia funcionava como uma barreira natural protetora, separando o
mundo dos negros do mundo dos brancos. Neste período, houve a aproximação e a
miscigenação com povos indígenas, que lhes proporcionaram o conhecimento sobre a
dinâmica da floresta e das águas, um dos elementos essenciais da cultura negra no Trombetas.
No fim do século XIX e início do XX, com a diminuição da pressão e o término da
escravidão, iniciou-se o processo de descenso dos negros, que aos poucos ocuparam o médio
curso do Trombetas, localidade onde ainda se encontram (SALLES, 1971; ANDRADE, 1995;
ACEVEDO e CASTRO, 1993; FUNES, 2000).
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A comunidade de Cachoeira Porteira, de caráter misto - quilombolas e migrantes recentes, representa uma
grande perda à ARQMO. Esta localidade tem um significado histórico para os negros do Trombetas: simbolizava
a porteira da liberdade (CASTRO & ACEVEDO, 1993). Todavia, os quilombolas de Cachoeira Porteira não
quiseram aderir ao movimento municipal. Em 2002, fundaram a AMORCREQ – CPT, uma associação
representativa própria que ainda luta pelo título da terra. As divergências entre as duas entidades são de cunho
político-ideológico. Para a AMORCREQ, a gestão dos recursos não é igualmente partilhada pela ARQMO, que
está muito ligada às correntes políticas de esquerda no município. A formação da oposição quilombola teve
apoio e financiamento da Igreja Evangélica e dos políticos de direita (com destaque para Luis Gonzaga Viana,
prefeito de 1996 a 2004). A posição em Cachoeira Porteira se deve ainda ao caráter heterogêneo dos laços
familiares entre negros e migrantes recentes, e a forte influência das Igrejas Evangélicas.
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Os primeiros quilombos da bacia do Trombetas datam por volta de 1821, sendo originários do reagrupamento
dos quilombos Inferno e Cipotema, destroçados, em 1812, pela expedição punitiva no rio Curuá em Alenquer.
Em 1854, já existia ali o quilombo Cidade da Maravilha, que se tornou o maior quilombo amazônico,
alcançando níveis superiores a dois mil habitantes. Após a destruição da Cidade da Maravilha, os negros
permaneceram escondidos de forma esparsa no curso do rio Trombetas e seus afluentes, furos e lagos, onde
ainda se situam. Sobre a história dos negros do Trombetas, consultar: CRULS, 1930; SALLES, 1971;
ANDRADE, 1995; ACEVEDO e CASTRO, 1993; FUNES, 2000.