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UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ
CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS E LETRAS
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM POLÍTICAS PÚBLICAS
MESTRADO EM POLÍTICAS PÚBLICAS
MARFISA MARTINS MOTA
A RELAÇÃO DE PARCERIA ENTRE A AÇÃO SOCIAL
ARQUIDIOCESANA (ASA) E O PODER PÚBLICO MUNICIPAL DE
TERESINA NA EXECUÇÃO DA POLÍTICA DE ASSISTÊNCIA
SOCIAL: A EXPERIÊNCIA DO PROJETO CASA DE ZABELÊ
TERESINA
2009
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1
MARFISA MARTINS MOTA
A RELAÇÃO DE PARCERIA ENTRE A AÇÃO SOCIAL
ARQUIDIOCESANA (ASA) E O PODER PÚBLICO MUNICIPAL DE
TERESINA NA EXECUÇÃO DA POLÍTICA DE ASSISTÊNCIA
SOCIAL: A EXPERIÊNCIA DO PROJETO CASA DE ZABELÊ
Dissertação apresentada ao Programa de
Mestrado em Políticas Públicas da
Universidade Federal do Piauí (UFPI), como
exigência parcial para obtenção do Título de
Mestre em Poticas Públicas.
Orientadora: Profa. Dra. Simone de Jesus
Guimarães
TERESINA
2009
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MARFISA MARTINS MOTA
A RELAÇÃO DE PARCERIA ENTRE A AÇÃO SOCIAL
ARQUIDIOCESANA (ASA) E O PODER PÚBLICO MUNICIPAL DE
TERESINA NA EXECUÇÃO DA POLÍTICA DE ASSISTÊNCIA
SOCIAL: A EXPERIÊNCIA DO PROJETO CASA DE ZABELÊ
Dissertação apresentada ao Programa de
Mestrado em Políticas Públicas da Universidade
Federal do Piauí (UFPI), como exigência parcial
para obtenção do Título de Mestre em Poticas
Públicas.
Orientadora: Profa. Dra. Simone de Jesus
Guimarães
Aprovada em: _____/______/______.
BANCA EXAMINADORA
_____________________________________________________
Profa. Dra. Simone de Jesus Guimarães (UFPI)
Presidente
_____________________________________________________
1ª Examinadora
_____________________________________________________
2ª Examinadora
3
Aos meus queridos pais, José e Dorinha, pelo
exemplo de vida, amor e proteção.
Ao meu querido esposo, Leonan, pelo estímulo,
amor, dedicação e confiança indispensáveis para
a conquista deste trabalho.
Aos meus amados filhos, José Leonan Júnior e
José Vitor, pela inspiração e compreensão nos
momentos de ausência.
4
AGRADECIMENTOS
A Deus, por se fazer presente em minha vida em todos os momentos como fonte de fé,
sabedoria e inspiração, oportunizando-me mais este aprendizado.
À minha família, pelo apoio, carinho e confiança sempre dispensados.
Aos amigos, pela confiança, força e pela constante dedicação em tornar essa jornada
agradável.
À professora doutora Simone de Jesus Guimarães, pela dedicação em todo o processo de
orientação, com sabedoria e competência.
Aos professores do Mestrado, pelos seus ensinamentos e oportunidades de dialogar
teoricamente, contribuindo para o processo de formação.
Aos meus colegas do Curso de Mestrado, Sônia, Valdomir, Edileusa, Claudia, Patrícia,
Suzana, Eliane, Teresa, Luiza, Pierre, James, Frazão e Robert pelo compartilhamento das
ansiedades e alegrias.
Às professoras Maria D’alva de Macedo e Maria do Rosário, pelas valiosas contribuições no
Exame de Qualificação.
À Coordenação do Programa de s-Graduação em Políticas blicas, pelo apoio
institucional e pelas orientações essenciais ao bom desempenho acadêmico.
À secretária do Mestrado, Neila, pela atenção e carinho sempre dispensados.
Aos gestores da SEMTCAS, ao Presidente da ASA e aos técnicos (as) que fazem essa
parceria, pelo fornecimento de informações e documentações, fundamentais para a construção
deste estudo.
Enfim, a todos que contribuíram para a realização deste trabalho.
5
RESUMO
A presente dissertação tem como objeto de estudo a relação de parceria entre a Ação Social
Arquidiocesana (ASA) e o poder público municipal de Teresina, através da Secretaria
Municipal do Trabalho, Cidadania e Assistência Social (SEMTCAS), mediada pela execução
da Potica de Assistência Social junto a crianças e adolescentes. O trabalho tem por base uma
pesquisa qualitativa, realizada no Projeto Casa de Zabelê, com o objetivo de analisar a relação
de parceria entre a ASA e a SEMTCAS na execução da Política de Assistência Social de
Teresina, junto ao segmento infanto-juvenil atendido pelo Projeto Casa de Zabelê, sob a
perspectiva dos direitos sociais s-Constituição de 1988, tendo como base o período de 2004
a 2008. A entrevista semiestruturada foi o principal instrumento de pesquisa utilizado, que
contou com a participação de quinze entrevistados, escolhidos entre técnicos e representantes
institucionais da ASA e da SEMTCAS, que vivenciaram a experiência do Projeto Casa de
Zabelê no período estudado. As análises empreendidas levam em consideração os avanços
estabelecidos nas relações entre o Estado e a Sociedade Civil, s-Constituição de 1988, no
que respeita: à formulação e garantia de direitos às crianças e adolescentes; à efetivação de
uma nova gestão pública pautada nos princípios de descentralização e participação da
sociedade; ao papel desempenhado pela sociedade civil organizada, especialmente as ONGs,
ao estabelecer parcerias com o poder público para a efetivação da Política de Assistência
Social. Os resultados demonstram que as relações de parceria entre Estado e Sociedade Civil
organizada são dinâmicas e contraditórias, que têm avançado bastante nos últimos anos no
aspecto da concretização dos direitos da criança e do adolescente. Mostra tamm que essas
relações devem ocorrer com base em responsabilidades conjuntas construídas no dia a dia, a
fim de que tanto o Estado quanto a sociedade civil organizada, em suas respectivas
competências legais, possam contribuir para o avanço da cidadania dos segmentos mais
vulneveis da sociedade.
Palavras-chave: Estado. Sociedade Civil. Potica de Assistência Social.
6
ABSTRACT
The present dissertation takes the relation of partnership as an object of study between the
Social Action Arquidiocesana (ASA) and the public municipal power of Teresina, through the
Municipal General office of the Work, Citizenship and Social work (SEMTCAS), mediated
by the execution of the Politics of Social work with children and adolescents. The work takes
as a base a qualitative inquiry carried out in the Zabelê’s House Project, with the objective to
analyse the relation of partnership between the ASA and the SEMTCAS in the execution of
the Politics of Social work of Teresina, near the segment infanto - youthful when Zabelê’s
House answered by the Project, under the perspective of the rights social powders -
constitution of 1988, taking the period from 2004 to 2008 as a base. The semi-structured
interview was the principal instrument of inquiry used, that it told of the participation of
fifteen intervieweers, chosen among technicians and institutional representatives of the ASA
and of the SEMTCAS, that they survived the experience of Zabelê’s House Project in the
studied period. The undertaken analyses take into account the advancements established in the
relations between the State and the Civil Society, powders - constitution of 1988, in which it
respects: to the formulation and guarantee of rights to the children and adolescents; to the
effectivation of a new public management ruled in the beginnings of decentralization and
participation of the society; to the paper fulfilled by the civil organized society, specially the
ONGs, while establishing partnerships with the public power for the effectivation of the
Politics of Social work. The results demonstrate that the relations of partnership between State
and Civil organized Society are dynamic and contradictory, That they have been advancing
enough in these last years in the aspect of the realization of the rights of the child and of the
adolescent. It shows also that these relations have to occur based in joint responsibilities that
must be built in day by day, so that so much the State as for civil organized society, in their
respectives ones legal competences, can contribute to the advancement of the citizenship of
the segments more vulnerable of the society.
Keywords: State. Civil Society. Politics of Social Work.
7
LISTA DE SIGLAS
APAE Associação de Pais e Amigos Excepcionais
ASA Ação Social Arquidiocesana
BID Banco Interamericano de Desenvolvimento
CBIA Centro Brasileiro para a Infância e Adolescência
CEASA Central de Abastecimento SA
CEB Centro Eclesial de Base
CEP Comitê de Ética na Pesquisa
CERIS Centro de Estatística Religiosa e Investigação Social
CF Constituição Federal
CLT Consolidação das Leis Trabalhistas
CMAS Conselho Municipal de Assistência Social
CMDCA Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente
CNAS Conselho Nacional de Assistência Social
CNBB Confederação Nacional dos Bispos no Brasil
CPT Comissão Pastoral da Terra
CREAS Centro de Referência Especializado de Assistência Social
CSI Cáritas Secours Internacional
CUT Central Única dos Trabalhadores
ECA Estatuto da Criança e do Adolescente
FDCA Fórum Nacional Permanente de Entidades Não-Governamentais de
Defesa dos Direito da Criança e do Adolescente
FIA Fundo da Infância e Adolescência
FMI Fundo Monetário Internacional
FUNABEM Fundação Nacional do Bem-Estar do Menor
FMS Fundação Municipal de Saúde
LBA Legião Brasileira de Assistência
LOAS Lei Orgânica da Assistência Social
MLAL Movimento de Leigos para a América Latina
MBES Ministério do Bem-Estar Social
MPAS Ministério da Previdência e Assistência Social
NOB Norma Operacional Básica
8
NUPEC Núcleo de Pesquisa e Estudos Sobre a Criança
OIT Organização Internacional do Trabalho
ONG Organização Não-Governamental
ONU Organização das Nações Unidas
OSCIP Organização da Sociedade Civil de Interesse Público
PBF Programa Bolsa Família
PCS Programa Comunidade Solidária
PMT Prefeitura Municipal de Teresina
PNAS Potica Nacional de Assistência Social
PSDB Partido Social Democrático do Brasil
PT Partido dos Trabalhadores
SAS Secretaria de Assistência Social
SEC Secretaria Especial da Criança
SEMCAD Secretaria Municipal da Criança e do Adolescente
SEMTAC Secretaria Municipal do Trabalho e Ação Comunitária
SEMTAS Secretaria Municipal do Trabalho e Assisncia Social
SEMTCAS Secretaria Municipal do Trabalho, Cidadania e Assistência Social
SERSOM Serviço Social dos Servidores Municipais/ Serviço Social do Município
SINPAS Sistema Nacional de Assistência Social
SUAS Sistema Único de Assistência Social
UBES União Nacional dos Estudantes Secundaristas
UFPI Universidade Federal do Piauí
UNE União Nacional dos Estudantes
UNESCO Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Tecnologia
UNICEF Fundo das Nações Unidas para a Infância
WCF World Childhood Foudation
9
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO
10
1
CAPÍTULO I
A RELAÇÃO ENTRE O ESTADO E SOCIEDADE CIVIL PÓS-
CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988: EXPRESSÕES NA
RELIDADE BRASILEIRA
14
1.1
Estado e sociedade civil: compreensões conceituais e históricas
15
1.2
A Relação entre Estado, sociedade civil e gestão pública
35
2
CAPÍTULO II
A POLÍTICA DE ASSISTÊNCIA SOCIAL E A AÇÃO SOCIAL
ARQUIDIOCESANA
45
2.1
A Lei Orgânica da Assistência Social e a Política de Assistência Social
mediada pela SEMTCAS: a materialização do Sistema Único de
Assistência Social (SUAS)
46
2.2
A Ação Social Arquidiocesana (ASA) e a Assistência Social: da
perspectiva assistencial para a perspectiva dos direitos na execução da
Assistência Social
65
2.3
A relação entre a ASA e a SEMTCAS na implementação da Política de
Assistência Social no município de Teresina
78
3
CAPÍTULO III
A RELAÇÃO DE PARCERIA ENTRE A ASA E O PODER
PÚBLICO MUNICIPAL, ATRAVÉS DA SEMTCAS: A
EXPERIÊNCIA DO PROJETO CASA DE ZABELÊ
84
3.1
Cenário histórico e institucional da relação de parceria entre a ASA e a
SEMTCAS a partir do Projeto Casa de Zabe
85
3.2
Consolidação da relação de parceria entre a ASA e a SEMTCAS:
caracterização
91
3.3
O Projeto Casa de Zabelê: a materialização do atendimento à criança e
à adolescente do sexo feminino na perspectiva dos direitos sociais
98
3.4
A contribuição dos atores institucionais à luz da avaliação do processo
de efetivação da relação de parceria entre a ASA e a SEMTCAS
107
3.5
A relação de parceria entre a ASA e o poder Público Municipal,
através da SEMTCAS: avanços e desafios
111
4
CONSIDERAÇÕES FINAIS
119
REFERÊNCIAS
125
ANEXOS
130
10
INTRODUÇÃO
As alterações que se processaram no bojo da relação entre o Estado e a Sociedade
Civil, pós-Constituição Federal de 1980, têm provocado a construção de um modelo de gestão
pública, pautada em princípios de descentralização, participação e controle social, fazendo
emergir uma nova institucionalidade no cenário brasileiro.
Essa nova institucionalidade, expressa pelo conjunto das prerrogativas legais
apontadas pela Constituição Federal de 1988, tem como destaque no art. 204, que se refere à
primazia das responsabilidades do Estado na condução das políticas blicas, considerando a
participação da sociedade, por meio das organizações representativas, na formulação das
políticas e no controle social das ações em todos os níveis”.
Isso posto, destaca-se que o cenário pós-Constituição Federal de 1988 teceu práticas
sociais e lutas institucionais quando do processo de democratização, que assinalou a primazia
da responsabilidade do Estado, possibilitando a inscrição da Assistência Social como direito
do cidadão e dever do Estado definidos pela Constituição Federal de 1988 e regulamentados
pela Lei Orgânica da Assistência Social (LOAS), em 1993.
Decorrente dessas prerrogativas tem-se também a luta pelo reconhecimento dos
direitos da Criança e do Adolescente, que se fez mais significativa na cada de 90, com a
criação da Lei nº 8.069/90, denominada Estatuto da Criança e do adolescente (ECA).
Paralelo a esse processo, a sociedade civil organizada dinamiza o seu espaço para
atuar no processo de cogestão das poticas blicas, desenvolvendo programas, projetos e
serviços como parte de um conjunto de ações de iniciativa pública para garantir o atendimento
à população baseado nos preceitos democráticos de cidadania e justiça social.
Como desdobramentos dessa forma de gestão têm-se as parcerias que historicamente
aparecem nos discursos e práticas de Assistência Social. Essas parcerias no pós-Constituição
de 1988, passam a ter um tratamento legalizado e normatizado para a efetivação da prestação
de serviços sociais, pelas organizações sociais, a sociedade no âmbito das políticas blicas,
particularmente, na execução da Política de Assistência Social.
O presente estudo busca apreender o modo de relação entre as iniciativas da sociedade
civil e o poder público municipal. Consiste, pois, analisar a relação de parceria entre a Ação
Social Arquidiocesana (ASA) e a Secretaria Municipal do Trabalho, Cidadania e Assistência
Social (SEMTCAS) na execução da Política de Assistência Social de Teresina, junto ao
11
segmento infanto-juvenil, sob a perspectiva dos direitos sociais s-Constituição de 1988, no
período de 2004 a 2008, tendo como foco o Projeto Casa de Zabelê.
O interesse pela análise dessa relação surgiu em decorrência da experiência da autora
no processo de implementação da Política de Assistência Social no município de Teresina.
Portanto, advindas da sua atuação profissional enquanto Assistente Social junto à ASA,
através de uma das suas frentes de ação, o Projeto Periferia”
1
, no período de 1994 a 2004.
Advém, também, da sua atuação profissional como Assistente Social junto ao Departamento
de Proteção Especial à Criança e ao Adolescente da Secretaria Municipal da Criança e do
Adolescente (SEMCAD), vinculada à Prefeitura Municipal de Teresina PMT/ Piauí, desde
1997, bem como da atuação junto aos Conselhos Municipal de Assistência Social (CMAS) e
dos Direitos da Criança e do Adolescente (CMDCAT), enquanto representante da ASA e,
posteriormente, como representante da SEMCAD, extinta em 2007. E na atualidade com
atuação profissional junto a SEMTCAS, gestora da Política de Assistência Social no
município de Teresina.
A partir das referidas experiências de trabalho no âmbito do poder público e de
organização da sociedade civil, houve a necessidade de melhor compreensão acerca da
relação de parceria entre a ASA e a SEMTCAS, pós-Constituição de 1988. Assim, faz-se
necessário tomar o marco legal da Constituição Federal de 1988 e dos seus princípios para
perceber que alterações ocorreram contribuindo para o redesenho da execução das Poticas
Públicas, em especial, da Potica de Assistência Social.
Nessa perspectiva, este estudo desdobrou-se nas seguintes questões de pesquisa: como
se caracteriza a relação de parceria entre a ASA e a SEMTCAS na efetividade da Política de
Assistência Social desenvolvida no Projeto Casa de Zabelê no período compreendido entre
2004 e 2008? Em que medida essa relação de parceria tem contribuído, através das ões do
Projeto Casa de Zabelê, para a efetivão da cidadania do segmento infanto-juvenil? Como os
atores institucionais gestores e técnicos avaliam a parceria entre a ASA e a SEMTCAS,
tendo como base o Projeto Casa de Zabelê?
Para efeito dessa análise, privilegiou-se a utilização de um estudo qualitativo no
processo de investigação que busca “compreender um fenômeno em seu sentido mais intenso,
em vez de produzir inferências que possam levar à constituição de leis gerais ou extrapolações
1
Refere-se a um dos projetos sociais desenvolvido pela ASA, compreendendo as ações da Pastoral do Menor,
Pastoral da Saúde e Cidadania Ativa, operacionalizado desde 1987, atuando na promoção e garantia da
proteção integral de crianças e adolescentes em suas próprias famílias e comunidades (ASA/2006).
12
que permitam fazer previes válidas sobre a realidade futura” (APPOLINÁRIO, 2006,
p.159).
Para tanto, foram utilizados a pesquisa documental, bibliográfica e empírica de campo.
A pesquisa documental foi realizada a partir do levantamento e análise dos documentos
(projetos, leis, convênios, regimentos internos e/ou Estatutos, textos, artigos, relatórios
institucionais) pertinentes à aproximação com a temática e as categorias do estudo em
questão, no sentido de compreender a relação de parceria que se foi construindo entre a ASA
e a SEMTCAS. A pesquisa bibliográfica ocorreu de forma contínua, requerendo uma
constante busca que possibilitasse obter mais subsídios acerca das questões propostas e tomou
por base as categorias teóricas: Estado, Sociedade Civil e Política de Assistência Social.
A pesquisa de campo para apreensão dos dados envolveu a técnica da entrevista.
Nesse sentido, trabalhou-se com questões abertas, enquanto técnica que possibilita a
investigação da realidade social do sujeito entrevistado sobre determinado assunto (GASKEL,
2003), com objetivo de construir dados sobre o conteúdo da pesquisa.
Para tanto, fez-se uso de gravador para o registro da oralidade, devidamente
autorizado pelos sujeitos da pesquisa e compatíveis com as refencias e princípios do Comi
de Ética (CEP) da Universidade Federal do Piauí (UFPI).
A análise e tratamento dos dados apreendidos nesse processo de pesquisa qualitativa
(documentos e entrevistas) consistiu na análise de discurso, pautando-se nos pressupostos
teóricos de Minayo (2006). A análise de discurso é concebida para trabalhar-se com a fala e
seu contexto. Nessa perspectiva, os pressupostos básicos dessa teoria resumem-se em dois
princípios: primeiro, o sentido de uma palavra, de uma expressão ou de uma proposição não
existe em si mesmo, ao contrário, expressa posições ideológicas em jogo no processo sócio-
hisrico no qual as formas de relação são produzidas; e segundo, toda formação discursiva
dissimula, pela pretensão de transparência, sua dependência das formas ideológicas.
Assim, o processo de pesquisa teve como sujeitos os atores institucionais,
configurados por quatro gestores da SEMTCAS, um presidente da ASA, três gerentes, um
coordenador e seis técnicos da Casa de Zabelê, totalizando quinze atores, que desempenharam
o cargo no período de 2004 a 2008. A escolha dos sujeitos da pesquisa aconteceu de forma
intencional, por eles serem significativos para o referido estudo, definidos pelos critérios de
tempo de permanência na instituição. As entrevistas foram realizadas no período de fevereiro
a março de 2008.
A dissertação resultante da pesquisa está estruturada em três capítulos. O primeiro, A
relação entre o Estado e a sociedade civil s-Constituição Federal de 1988: expressões na
13
realidade brasileira, busca apreender as concepções conceituais e hisricas acerca das
categorias de Estado e Sociedade Civil, bem como os desdobramentos e configurações dessa
relação após-Constituição Federal de 1988, que passa a alterar o desenho da relação entre o
Estado e a sociedade civil expresso por uma “nova” gestão pública. Para tanto, são
trabalhadas algumas concepções de autores como: Gramsci (1975), Dallari (1980), O’Donnell
(1990), Neto (1996), Bobbio (2002), Durigueto (2004), Dagnino (1994), dentre outros.
O segundo capítulo, A Potica de Assistência Social s-Constituição Federal de
1988”, tem como pretensão compreender a relação de parceria que se estabelece entre o
Estado e a sociedade civil, mediada pela Assistência Social pós-Constituição Federal de 1988.
Para isso, procura esboçar a construção das concepções de parceria implícita na relação
Estado e sociedade Civil, no contexto das prerrogativas constitucionais, da Lei Orgânica da
Assistência Social, da Política de Assistência Social que contextualizou e materializou o
Sistema Único de Assistência Social (SUAS). Também procura mostrar as relações do poder
público municipal com entidades da sociedade civil, via ASA, na execução da Política da
Assistência Social, distinguindo sua evolução na perspectiva do assistencialismo para a
perspectiva dos direitos.
Por fim, o capítulo terceiro, A relação de parceria entre a ASA e o poder público
municipal, através da SEMTCAS: a experiência do Projeto Casa de Zabelê”, que analisa as
características da relação de parceria entre a ASA e a SEMTCAS no âmbito do Projeto Casa
de Zabelê, no que se refere ao processo histórico e de constituição da parceria, aos papéis, as
atribuições e responsabilidades. Nesse contexto, verifica-se a relação entre a ASA e a
SEMTCAS, através do Projeto Casa de Zabelê, conforme os direitos sociais preconizados
pela PNAS/SUAS e o ECA. Assim, faz-se relevante identificar e caracterizar os objetivos,
finalidades e ações ofertadas pelo Projeto Casa de Zabelê, voltado para o sexo feminino, bem
como, configurar a contribuição dos atores institucionais quanto à avaliação do processo de
efetivação dessa relação de parceria entre os dois órgãos.
Nas considerações finais, esboçam-se as conclues que configuram as apreensões
alcançadas no processo de investigação, que refletem as complexidades da relação entre o
Estado e a sociedade civil e suas múltiplas perspectivas.
Nessa direção, o presente trabalho tem a preocupação de contribuir com reflexões
acerca da relação de parceria entre o Estado e Sociedade Civil, portanto, um passo necessário
para penetrar e qualificar a atuação do poder público e da sociedade civil na gestão pública.
No entanto, é importante considerar que num estudo dessa natureza, as lacunas são
inevitáveis, deixando em aberto as questões.
14
CAPÍTULO I
A RELAÇÃO ENTRE ESTADO E SOCIEDADE CIVIL PÓS-CONSTITUIÇÃO
FEDERAL DE 1988: EXPRESSÕES NA REALIDADE BRASILEIRA
A relação entre Estado e sociedade civil tem marcado profundamente o processo de
organização da vida dos homens em sociedade. Essa relação expressa o processo das lutas
hisricas que concretizam as lutas de classe. As lutas históricas configuram as contradições
decorrentes das condições de vida dos homens em sociedade, ou seja, na construção das
relações de produção e reprodução social vivenciada pelos homens no processo de
organização das suas condições de vida, de forma mais específica na sociedade capitalista.
Nesse processo de gestão da vida dos homens, tanto o Estado como a sociedade tem
protagonizado transformações na sua forma de constituição e papéis frente à realidade,
favorecendo ora o desvelamento dos antagonismos dos interesses, ora o ocultamento e ora
expressando as reciprocidades que se estabelecem na relação entre ambos. Esses aspectos
denotam que a relação entre Estado e sociedade apresenta nos seus liames um forte
tensionamento no bojo de seus interesses.
Assim, ao empreender reflexões acerca da relação entre o Estado e a sociedade civil,
na realidade brasileira, toma-se como ponto de partida, para este estudo, a década de 80 do
culo XX, por entender que esse período possibilita a realização das mediações acerca dos
elementos estruturais e conjunturais que caracterizam a emergência de um processo de
redemocratização das relações entre o Estado e a sociedade e a busca da superação do
autoritarismo e patrimonialismo
2
característicos da gestão pública na realidade brasileira.
Nesse sentido, o processo de redemocratização da relação entre Estado e sociedade
civil acentua-se de forma mais significativa na década de 80, s-Constituição Federal de
1988. Portanto, tomando como referência a Carta Magna, o processo de redemocratização
brasileiro foi pautado em princípios de participação, de descentralização e de controle social,
dando um novo formato à organização da gestão pública no viés constitucional. Essa
perspectiva aponta para a construção da gestão pública assentada na atuação conjunta do
2
O autoritarismo e patrimonialismo são marcas do processo histórico de constituição da sociedade brasileira,
caracteristicamente presentes na gestão pública e na sociedade de forma geral. Assim, a sociedade fundada no
autoritarismo e patrimonialismo se expressa na “apologia do mando tradicional, na tutela e nos privilégios de
categorias e/ou pessoas como regras dessa sociedade (COSTA, 2006, p. 142). Assim, o patrimonialismo consiste
em tratar o bem público como se fosse propriedade privada.
15
Estado e da sociedade civil, tendo como enfoque uma perspectiva pública
3
, a garantia e
efetivação de direitos sociais, objetivando maior qualidade de vida para a população. O
referido quadro remete para uma “nova” institucionalidade
4
na forma da gestão, que passa a
fazer parte do cenário potico brasileiro.
No processo de construção dessas novas relações, torna-se fundamental a capacidade
de expressão pelos mais diferentes atores sociais tanto do poder público quanto dos
organismos da sociedade civil, como as Organizações Não-Governamentais (ONGs), as
associações, os movimentos sociais, o Terceiro Setor, dentre outros, através dos mecanismos
de participação, como conferências, fóruns, conselhos gestores, comis, proporcionando o
exercício da transparência das ações e do controle social pelos mais diferentes atores sociais,
tanto do poder público quanto dos organismos da sociedade civil.
O contexto democrático que se estabeleceu s-Constituição de 88 incide na
configuração de uma esfera blica que se manifesta com visibilidade, expressando a
interpenetração do Estado e da sociedade civil envolvendo, portanto, uma dimensão renovada
do público e do privado.
É nesse contexto que o referido capítulo tem como objetivo a configuração da relação
entre o Estado e a sociedade civils-Constituição de 1988. Nesse sentido, em primeiro lugar,
busca apreender as concepções conceituais e históricas acerca das categorias Estado e
sociedade civil, em especial, a partir da cada de 80; em segundo lugar, procura
compreender os determinantes históricos e políticos que se estabelecem nas bases da relação
entre o Estado e a sociedade civil a partir dessa década, evidenciando os desdobramentos e
configurações dessa relação s-Constituição de 1988, que passam a alterar o desenho dessa
relação e a construção de uma gestão pública que suscita a interpenetração do Estado e da
sociedade civil.
1.1 Estado e sociedade civil: compreensões conceituais e históricas
No intuito de melhor compreender as categorias Estado e sociedade civil, torna-se
imprescindível configurá-las nas relações entre Estado e sociedade. Em outras palavras,
significa dizer que não é possível abordar o tema sobre o Estado sem relacioná-lo ao tema
3
A perspectiva pública refere-se em imprimir à gestão um caráter público, que se configura na concepção de
ações coletivas que concretizam direitos sociais , por meio dos quais são distribuídos ou redistribuídos bens e
serviços em resposta às demandas da coletividade (PEREIRA, 1996, p. 130).
4
A expressão “Nova Institucionalidade” é utilizada neste estudo para expressar o reordenamento e/ou criação de
um conjunto de organizações e ou relações, pós-Constituição Federal de 1988, fundamentadas nos princípios
constitucionais de descentralização político-administrativa, participação e controle social.
16
sociedade, pois, onde quer que ambos compareçam, um tem implicações no outro e se
influenciam mutuamente (PEREIRA, 2008). No entanto, para efeito deste estudo, analisar-se-
á o significado de seus conceitos de forma separada, mas na perspectiva da relação entre
ambos.
Desdobrar sobre a relação entre Estado e sociedade significa tratar de um processo
hisrico complexo e irredutível a generalizações e padronizações. Indica, ademais, que
ambas as categorias têm particularidades e interesses próprios, embora interdependentes e,
portanto, sem autonomia absoluta.
Para a configuração deste estudo, interessa-nos as compreensões conceituais de Estado
e Sociedade Civil na modernidade. Essas serão tomadas, sobretudo, a partir dos seguintes
teóricos: Gramsci (1975), Dallari (1980), O’Donnell (1990), Neto (1996), Bobbio (2002),
Dagnino (1994), Durigueto (2007), dentre outros. As suas abordagens exprimem
consideráveis divergências e convergências, revelando a amplitude e complexidade dessas
categorias e de que a sua existência não é tranquila, mas inserida em um processo dinâmico de
antagonismos e contradições.
Tratar-se-á inicialmente da compreensão dos conceitos de Estado. O Estado como
formação histórica nasceu numa época relativamente recente, no século XVI (BOBBIO,
2002), influenciando todo o pensamento político ocidental, assumindo uma nova configuração
na modernidade, enquanto Estado-Nação. Entretanto, faz-se necessário salientar que a sua
existência ocorre dentro de uma dada formação histórica, que expressa particularidades
condizentes com formas anteriores de organização, mas similar à do Estado hoje.
Seguindo esse raciocínio, parte-se da premissa do Estado enquanto “organização
política da sociedade civil” (BOBBIO, 2002), para expressar a configuração que o Estado
toma no contexto da modernidade, como produto da razão, ou como sociedade racional,
única, na qual o homem poderá ter uma vida conforme a razão, isto é, conforme a sua
natureza. Isso implica conceber o processo de racionalização do Estado a partir do movimento
hisrico, portanto, enquanto um evento da história refletindo as suas dicotomias.
Assim, tomando, ainda, a concepção de Estado a partir dos teóricos da modernidade,
parte-se das contribuões de Gramsci
5
(1979), quanto à concepção de Estado:
“sociedade política ou Estado”, que corresponde à função de “hegemonia” que o
grupo dominante exerce em toda a sociedade e àquele de domínio direto ou de
comando, que se expressa no Estado e no governo jurídico” (GRAMSCI, 1979, p.
11)
5
Quanto ao aprofundamento da Teoria de Estado em Gramsci, a autora remete à leitura de suas contribuições em
os Cadernos do Cárcere (1975) e Os intelectuais e a organizão da cultura (1979).
17
O conceito de Estado em Gramsci assenta-se na sociedade política, ou no Estado, que,
por um lado, assegura a sua legitimidade mediante o consenso sobre as massas, concretizando
a sua hegemonia social que nasce do prestígio que o grupo dominante tem decorrente de sua
posição e de sua função no mundo da produção, e, por outro lado, enquanto aparato de
coerção estatal que assegura legalmente a disciplina dos grupos que não consentem, nem ativa
nem passivamente, mas que constituído para toda a sociedade, na previsão dos momentos de
crise no comando e na direção, nos quais fracassam o consenso espontâneo (GRAMSCI,
1979).
O conceito de Estado em questão remete a uma compreensão do conceito de
Sociedade Civil, que será abordado mais à frente neste estudo, como plano da superestrutura
6
trabalhada por Gramsci. Nesse sentido, significa que o conceito de Estado amplia-se de seu
campo de atuação e de seu significado simbólico. O Estado seria o somatório da sociedade
civil e da sociedade política, não se resumindo assim aos órgãos de poder das esferas
governamentais. Essa concepção extrapola a noção restrita de Estado como simplesmente um
espaço de poder a serviço da classe dominante e aponta para o reconhecimento dos conflitos
sociais e lutas de classes que perpassam os aparelhos estatais (GOHN, 2000).
Nessa perspectiva, a tendência do Estado ampliado em Gramsci reforça a superação da
concepção limitada do Estado como mero espaço de coerção e de poder da classe dominante e
reconhece que os conflitos sociais e de classes permeiam os aparelhos estatais. Sendo assim, a
mudança social é um processo gradual, a tomada do poder por uma nova classe deve ser
precedida de um processo de transformação da sociedade civil, em seus valores e práticas,
pelo desenvolvimento de uma contra-hegemonia sobre a ordem dominante. Destaca-se, pois,
que nessa concepção gramsciana de Estado encontra-se o nexo entre Estado e sociedade civil,
aspectos importantes nesta pesquisa.
Ainda segundo a visão Gramsciana de concepção do Estado, Bobbio (2002) enfatiza o
pensamento do autor em Cadernos do Cárcere:
O Estado não é um fim em si mesmo, mas um aparelho, um instrumento; é o
representante não de interesses universais, mas particulares; não uma entidade
superposta à sociedade, subjacente, mas é condicionado por esta e, portanto, a esta
subordinado; não é uma instituição permanente, mas transitória, destinada a
desaparecer com a transformação da sociedade que lhe é subjacente (GRAMSCI
apud BOBBIO, 2002, p. 47).
6
A superestrutura consiste em uma categoria marxista que compreende as relações jurídicas e políticas, que
emergem das relações de produção que forma a estrutura econômica da sociedade. A superestrutura teorizada
por Gramsci (1979), envolve duas grandes esferas: sociedade civil e sociedade política ou Estado, conforme
exposto neste estudo. Remetemos para maiores leituras as contribuições de Gramsci em Os intelectuais e a
organização da cultura (1979).
18
Ao analisar-se a concepção do autor, o Estado não é o momento último do movimento
hisrico, algo que não possa ser ulteriormente superado, o Estado é uma instituição
transitória, significando que existirão outras formas de organização política posterior a ele.
Enfim, essa concepção sugere a sua supressão e/ou a destruição e a passagem para uma outra
forma de organização sem a presença do aparelho estatal.
Seguindo as análises, outro conceito de Estado consiste no apontado por Dallari, que o
concebe como uma ordem jurídica soberana, que tem por fim o bem comum de um povo
situado em determinado território(DALLARI, 1980, p. 56). A referida noção utiliza-se dos
conceitos de soberania, de povo, de terririo, os quais não serão analisados neste estudo de
forma minuciosa por não ser oportuno. No entanto, serão destacadas algumas considerações
consideradas pertinentes para sua compreensão. Em função da natureza política do Estado, a
ordem jurídica pressupõe uma ordem soberana com a finalidade de atingir o bem comum de
um povo”. Para tanto, requer a delimitação de um território para que não ocorram conflitos e
possibilite a eficácia de seus objetivos.
Na concepção de Estado exposta acima, tem-se definida a noção de Estado-Nação
fortemente presente nas perspectivas conceituais modernas de Estado capitalista. Nessa
concepção, o poder do Estado se assenta nos preceitos jurídicos como uma ordem sobre todos
para a realização do bem comum da sociedade. O território consiste na nação, aparece como o
espaço delimitado para prevalência da ordem jurídica e da soberania. No cerne dessa questão
permeia a síntese do Estado capitalista que fundamenta o Estado Moderno.
A partir daí, manifestam-se as contribuições de O’Donnell (1990) acerca do conceito
de Estado, em que o autor enfatiza o fato de que as teorizações sobre o Estado m
pressupostos a sua coextensividade com a sociedade e com a nação. Nessa perspectiva, “o
Estado pode ser visto como elo entre o sistema de dominação social e as relações capitalistas
de produção, por um lado, e o arco englobante da nação, por outro (O’DONNELL, 1990, p.
35).
Segundo O’Donnell (1990), o Estado enlaça-se com o nacional para assumir
obediência às tendências expansivas do capitalismo em nível mundial. Na referida noção de
Estado em O’Donnell, tem-se evidenciado o comprometimento do Estado com uma ordem
capitalista, assim, esse conceito vai consagrar um tipo hisrico de Estado capitalista
identificado por O’Donnell (1990) como Estado burocrático-autoritário, assim caracterizado:
Constitui-se em um tipo de Estado autoritário que se distingue de outros Estados
autoritários, sintetiza algumas características básicas: incorpora a burguesia
altamente oligopolizada e internacionalizada como principal base social e promove
intensa internacionalização produtiva; institucionalmente, é um conjunto de
19
organizações no qual adquire peso decisivo as especificações na coerção, bem como
as que tentam levar a cabo a normalização da economia. [...] define um sistema de
exclusão política de um setor popular previamente ativado, ao qual submete a
severos controles que visam eliminar a sua prévia presença no cenário político, bem
como a destruir ou capturar os recursos que sustentavam essa ativação [...]. Tal
exclusão provoca a supressão da cidadania e da democracia política. Também é
proibição do popular: impede invocações enquanto povo e, naturalmente, enquanto
classe. [...] também é um sistema de exclusão econômica do setor popular, ao
promover uma normalização econômica particular e um padrão de acumulação de
capital fortemente orientados em benefício das grandes unidades oligopolistas de
capital privado e de algumas instituições estatais, que aumentam as desigualdades
preexistentes. [...] Desde as suas instituições levam-se a cabo tentativas sistemáticas
de “despolitizar” o tratamento de questões sociais, submetendo-as àquilo que se
qualifica como cririos neutros e objetivos de racionalidade técnica. [...] seu regime
implica o fechamento dos canais democráticos de acesso ao governo e, junto com
eles, dos critérios de representação popular ou de classe. Tal acesso fica limitado aos
ocupantes da cúpula de grandes organizações, especialmente as forças armadas e as
grandes empresas, privadas e públicas (O’DONNELL, 1990, p. 61-62).
Ainda nessa perspectiva seguem as contribuições de Netto (1991), com o Estado
Autocrático Burguês, referindo-se ao mesmo Estado burocrático-autoritário, O’Donnell
(1990), enquanto um Estado que estrutura um sistema de poder muito definido, onde
confluem os monopólios imperialistas e a oligarquia financeira nativa” (NETTO, 1991, p. 30).
Nesse sentido, o Estado burocrático-autoritário (O’DONNEL,1990) e/ou Estado
autocrático burguês (NETTO, 1991) expressam uma dominação ecomica, política e
ideológica efetivada pelas instituições estatais, que concentram o controle de recursos
coercitivos, no direito racional-formal e na burocracia da administração. Caracteriza-se por
ser antinacional e antidemocrático.
Por fim, relativamente aos conceitos de Estado abordados pelos teóricos modernos em
destaque neste estudo, apontam para formas complexas de existência do Estado capitalista na
sociedade moderna, apresentam elementos convergentes e divergentes acerca de sua forma de
manifestação. Entretanto, nesse contexto, o Estado estabelece com a sociedade uma relação
dinâmica e complexa, como já mencionado anteriormente.
Todavia, ainda para a conformação da relão entre o Estado e a Sociedade, convém
analisar a categoria sociedade civil, os elementos que a definem, para que se possa
compreender sua dinâmica.
Segundo Telles, a sociedade vem se modificando muito rapidamente, tornando-se
cada vez mais complexa, heterogênea, diferenciada, com novas clivagens surgindo e cruzando
transversalmente a estrutura de classe (TELLES, 1994, p. 92). É nesse processo de
modificações que a sociedade civil vem revelando as suas multifaces, pluralismos e
diversidades. Desse modo, o termo sociedade civil esassociado a diversos atores sociais e o
20
seu significado passou por um processo de reconstrução em que foi recebendo múltiplas e
diversas acepções.
Assim, na configuração da concepção de sociedade civil, acolhem-se as contribuições
provenientes de Gramsci, que aponta a sociedade civil como [...] o conjunto de organismos
chamados comumente de privados” (GRAMSCI, 1979, p. 10).
Nessa perspectiva, a sociedade civil é constituída pelo conjunto de organizações
responsáveis pela elaboração e/ou difusão de ideologias, como os sindicatos, os partidos, as
igrejas, a organização material da cultura e as organizações profissionais. Em resumo, a
sociedade civil é a esfera em que as classes organizam e defendem seus interesses e disputam
a hegemonia
7
. A partir de então, é repensada a concepção de hegemonia, decorrente dos
confrontos entre os diversos projetos de sociedade, que passa a prevalecer na direção da
política, da economia e da cultura.
Como já abordando anteriormente em Gramsci (1997), a dinâmica cio-potica e
organizativa da sociedade civil (DURIGUETO, 2007) é incorporada ao conceito de Estado,
importando na ampliação desse conceito, denominado de Estado ampliado. Em síntese, a
sociedade civil e o Estado são duas esferas que, juntas, levam à noção de Estado ampliado,
como abordado neste estudo anteriormente.
Nessa direção, as contribuições provenientes de Durigueto (2007) convergem para as
de perspectiva gramsciana. Assim, a autora aponta:
A sociedade civil, como palco de um pluralismo de organismos coletivos ditos
“privado (associações, organizações, sindicatos, partidos, atividades culturais,
meios de comunicação etc.) é a nova configuração da dinâmica social, na qual se
precisava a política e sua relação com as esferas da vida social e elaborar novos
termos da hegemonia (DURIGUETO, 2007, p. 55).
O termo sociedade civil (COHEN e ARATO apud MOTA, 2008, p. 168) é
conceituado a partir das contribuições de Habermas:
A sociedade civil come-se de movimentos, organizações e associações, os quais
captam os ecos dos problemas sociais que ressoam nas esferas privadas, condensam-
nos e os transmitem, a seguir, para a esfera pública política. O núcleo da sociedade
civil forma uma espécie de associação que institucionaliza os discursos capazes de
solucionar problemas, transformando-os em questões de interesse geral no quadro
das esferas públicas.
7
O termo hegemonia a partir das contribuições de Gramsci refere-se “a questão da linguagem que aflora de uma
maneira ou de outra, isso significa que se está questionando uma rie de outras coisas: a formação e a
ampliação de uma classe dirigente, a reorganização de uma hegemonia cultural e a necessidade de estabelecer
uma relação mais estreita entre os intelectuais e as massas (BUCI-GLUCKMANN, 1980, p. 44). Para um
aprofundamento acerca da categoria “hegemonia” ainda em Gramsci, essa autora remete à leitura de suas
contribuições em Os intelectuais e a organização da cultura (1979) e em BUCI-GLUCKMANN (1980),
com a obra Gramsci e o Estado”.
21
Nesses termos, a sociedade civil constitui-se de organismos sociais que passam a
interferir na dinâmica social, a partir da absorção dos problemas sociais e, consequentemente,
na realização da mediação entre as demandas e o Estado.
Essa concepção ainda é referendada por Teixeira (2004), que afirma: “na sociedade
civil constata-se uma razoável estabilidade no perfil de mobilização organizacional”, esta
realidade possui fortes implicações no processo organizacional e de enfrentamento dos
problemas sociais. Destaca que a sociedade civil constitui-se por uma diversidade de
associações voluntárias, movimentos, organizações sociais dentre outras que historicamente
o configurando e manifestando o seu foco de intervenção.
Em síntese, o debate acerca dos conceitos de sociedade civil abordado pelos autores
enfocados neste estudo, direcionam, sem deixar de configurar as suas particularidades, para o
entendimento de um espaço plural, dinâmico e contradirio, que reflete interesses que ora
apresentam-se convergentes, ora divergentes, constituindo a dinâmica da sociedade.
Assim, levantadas essas considerações acerca dos conceitos de Estado e sociedade
civil, para efeito deste estudo, far-se-á um recorte para uma maior compreensão do significado
da relação entre ambos na realidade brasileira, a partir da década de 80 do século XX. O
referido recorte faz-se significativo por ser essa década bastante representativa no processo de
transformação da sociedade brasileira. Assim, tem-se, por um lado, até o ano 1984, um
período caracterizado por um sistema político burocrático e autoritário de restrições políticas
e econômicas e acentuada desigualdade social, e por outro, a partir de 1985, tem-se,
subjacente, um processo de mobilização da população instalando o processo de
democratização da sociedade, com desdobramentos no processo histórico e político brasileiro.
Destaca-se, que o modelo de desenvolvimento econômico adotado pelo Estado
brasileiro, que prevaleceu durante todo o período de regime autoritário, com o golpe militar
de 1964, teve suas raízes insurgidas bem antes do referido regime. O Estado seria o agente
coordenador e planificador do processo de crescimento econômico, com forte destaque para a
industrialização, criando as condições para que a instria nacional estivesse apta para
competir no mercado externo e assim fortalecer a soberania nacional. A pobreza era vista
como decorrente da precariedade do desenvolvimento. Assim, para o Estado brasileiro apenas
por intermédio do crescimento econômico era possível construir um país moderno e acabar
com a pobreza (COSTA, 2006, p.132).
O regime militar que se instalou no Brasil via golpe militar apoiado no tri
econômico formado pelo grande capital monopolista, pelo capital nacional e pelo Estado,
22
conforma um tipo de Estado, denominado por O’Donnell (1990), como Estado burocrático-
autoritário.
Assim é que o Estado burocrático-autoritário fortalece o modelo de desenvolvimento
econômico, desse período, adotado no Brasil com forte apoio na iniciativa privada, gerando
diversos problemas para a realidade brasileira. Por um lado, a desigual apropriação da renda,
que dificultava a criação de um potente mercado interno e na organização das forças políticas
ligadas ao poder dos latindios. Por outro lado, havia as desigualdades dos termos de troca
no mercado externo, fazendo a balança comercial registrar ficit comercial, de modo que o
Estado estava sempre preso ao pagamento dos juros dos empréstimos externos. É importante
ressaltar, que as consequências diretas desse processo consistiu na acentuada concentração de
renda e manutenção de um padrão de desigualdade social elevado, com agravamento da
pobreza de extensas classes de trabalhadores.
Nesse período, o Estado autocrático burguês
8
(FERNANDES, 1976; apud NETTO,
1996, p. 34), similar ao Estado burocrático-autoritário (O’DONNELL, 1990), institucionaliza
a modernização conservadora
9
, promovendo forte crescimento da economia, principalmente
na etapa do “milagre econômico”, desarticulando o movimento sindical e eliminando um
conjunto de direitos sociais duramente conquistados pelos trabalhadores (NETTO, 1991).
Configura-se um Estado intervencionista e repressivo, comprometido com a produção das
condições de desenvolvimento do capitalismo e retraimento das liberdades e expressões
populares. Assim, na ditadura, o Estado assume as funções de comando, defensor da ordem
8
Quanto ao Estado “autocrático burguês”, “configura-se na realidade brasileira com os desdo-bramentos das
contradições e conflitos emergentes em décadas anteriores, acentuados nos ciclos de governo que se o do
período de abril de 1964 a março de 1979, do golpe à posse do general Figueiredo. Têm-se profundas marcas
de um regime com feições ditatoriais que expressa o rearranjo político das forças socioeconômicas a que
interessam a manutenção e a continuidade do padrão de desenvolvimento dependente, com aprofundamento da
heteronomia e da exclusão. Tal Estado concretiza um pacto contrarrevolucionário exatamente para assegurar o
esquema de acumulação que garante a prossecução de tal padrão, readequando-o às novas condições internas e
externas que emolduravam, de uma parte, o próprio patamar a que ele chegara e, de outra, o contexto
internacional do sistema capitalista. “[...] É assim, que o pacto contrarrevolucionário refrata-se na divisão do
poder: este é concentrado nas mãos de uma burocracia civil e militar que serve aos interesses consorciados dos
monopólios imperialistas e nativos, integrando o latifúndio e deslocando a camada burguesa industrial que
condensava a burguesia nacional.
9
O conceito de “modernização conservadora” foi desenvolvido por Barrrington Moore Jr. (1993), para estudar o
modelo autoritário de desenvolvimento tardio do capitalismo no séc. XIX. rios autores incorporaram esse
termo nas análises do modelo de desenvolvimento econômico-social adotado no Brasil pelos governos
militares. A modernização conservadora implica em um modelo de modernização altamente excludente e
concentrador, acentuou as desigualdades sociais e agravou a pobreza relativa e absoluta de extensas camadas
das classes trabalhadoras. O aumento das taxas de exploração da força de trabalho foi acompanhado pela
elevação dos níveis de produtividade do trabalho por meio de um conjunto de mecanismos, dentre os quais o
aumento da jornada de trabalho, a intensificação das horas extras, do ritmo de trabalho, da vigilância e
disciplina industriais. “[...] Dessa forma, a modernização conservadora assentou-se sobre a lógica permanente
de privatização dos ganhos e socialização das perdas, favorecendo a simbiose entre interesses estatais e
privados em detrimento dos interesses públicos. Agora, a questão social passa a ser tratada por meio de
articulação assistência/repressão (RAICHELIS, 2000, p. 92). (grifos da autora).
23
por ele editada, ocultando a forte pressão externa que recebia e a sua premente necessidade de
fortalecer setores capitalistas internos e externos. Na sociedade capitalista, a autonomia do
Estado é escamoteada, independentemente do regime de governo estabelecido, uma vez que o
setor produtivo privado, onde são geradas as riquezas do país, influenciam os governos que se
comprometem com esse processo de desenvolvimento econômico.
Em suma, constituem-se marcas desse momento um caráter modernizador do Estado
que “se refere à dominação burguesa pós-64, que conduzia no interesse do monopólio:
benesses ao capitalismo estrangeiro e aos grandes grupos nativos, concentração e
centralização em todos os veis etc” (NETTO, 1991, p. 31). Entretanto, enfatiza-se que esse
caráter implica em manutenção do conservadorismo e autoritarismo prevalecente no processo
hisrico do país.
No período em apreço, tem-se, com o acirramento da questão social, tratada com
formas repressivas pelo Estado autoritário, e a falácia domilagre brasileiro” uma crescente
insatisfação da população quanto ao desenvolvimento e à repressão da ditadura, caracterizado
pelos arranjos poticos, restringindo, e até eliminando, a participação da sociedade civil em
suas decisões. Evidencia-se a crise do regime militar e do Estado, como argumenta Guimarães
(1998):
Em resumo, os rumos da ditadura militar pós-64 conduzem a uma insatisfação
generalizada interna e externa ao país e até de alguns dos antigos aliados do início
do golpe militar. Não conseguindo estabelecer amplos consensos perante a
população e a opinião pública, deslegitimando-se enquanto proposta de política
econômica e social, face ao revigoramento da sociedade civil, entra em crise. A
saída para a crise manifesta-se concretamente na “transição lenta, gradual e segura”,
que tem início no governo de Ernesto Geisel e é concluída no governo de José
Sarney com a Nova Reblica (GUIMARÃES, 1998, p. 26).
Tem-se instalado no Brasil um contexto de crises do regime militar de cunho político e
do capitalismo, que apontam para a necessidade de reformas do Estado, tanto no âmbito
econômico quanto político. A essas crises cabe a “transição lenta, gradual e segura proceder a
passagem do governo militar para um governo civil, sem traumatismos e rupturas”
(GUIMARÃES, 1998, p. 26). Essa transição lenta, gradual e segura” expressa a pactuação
das elites para a condução do fim da ditadura e o reingresso da democracia no país sem
traumas e violências (GUIMARÃES,1998). O Estado, que era apontado pela direita de
ineficiente no controle da inflação e de dificultar o crescimento econômico, e acusado pela
esquerda de favorecer o grande capital internacional e nacional, foi isolando-se cada vez mais,
numa crise de legitimidade (COSTA, 2006).
24
O ressurgimento da sociedade civil organizada, que ocorre no final da década de 70,
expressa mudanças econômicas e sociais substanciais, liberdade, democracia e cidadania
(GUIMARÃES, 1998). Nessa época, os movimentos sociais
10
responsabilizavam o Estado
pela situação de precariedade em que viviam e pela ausência de serviços públicos como
saúde, saneamento, educação, transportes coletivos, dentre outros. Surge no cenário nacional
o levante de mobilizações e lutas da sociedade civil organizada, com práticas de greves,
passeatas, denúncias, dentre outras formas de manifestações. Destacam-se, nesse processo, o
surgimento de novos sujeitos sociais e coletivos
11
, que expressam suas demandas através da
organização de diversos movimentos sociais. Dentre eles, sobressaem a Central Única dos
Trabalhadores (CUT) e do Partido dos Trabalhadores (PT)
É interessante demarcar que no período em referência, a postura dos movimentos
sociais em relação ao Estado caracterizava-se por confrontos, em que o caráter das ações era
de negação ou simplesmente de pressão sobre os aparelhos estatais. A relação entre Estado e
sociedade civil, mediante os movimentos sociais, era vista de forma antagônica, na qual um
tenderia a ser capturado pelo outro, de oposição à opressão (DURIGUETO, 2007). Nesse
sentido, constata-se que predominância do enfoque na interação oposicionista entre um e
outro. Assim, neste momento, a sociedade civil, e aí incluindo os movimentos sociais, se
manifestavam de “costas para o Estado, expressando uma atitude de confronto e oposição.
Ainda nos fins da década de 70 do séc. XX, simulneo aos movimentos sociais,
põem-se em evidência as Organizações Não-Governamentais (ONGs), em pleno processo de
redemocratização do país. O termo ONGs
12
é novo no cenário brasileiro, refere-se a um tipo
10
Os movimentos sociais característicos desse período consistem nos movimentos populares e sindicais que
foram convencionados de “novos movimentos sociais tendo em vista que “novos personagens entram em
cena (SADER, 1988). Esses movimentos são identificados como “novos” em virtude do processo de
recriação de espaços públicos a partir do seu cotidiano: devido à heterogeneidade dos sujeitos envolvidos e das
suas respectivas concepções políticas; pela diversidade das manifestações de luta e forma de organização de
base, diferenciada das décadas anteriores; em decorrência do desenvolvimento por fora da institucionalidade e
dos significados atribuídos à realidade das suas condições de vida. Embora fragmentados, unificavam-se na
luta por direitos sociais e pela democratização do Estado, exigindo a participação direta nas decisões que lhes
afetavam (SILVA, 2003, p. 30).
11
Para o entendimento da expressão novos sujeitos coletivos”, remetemos às contribuições de Sader (1988),
que utiliza a expressão para indicar “uma coletividade onde se elabora uma identidade e se organizam práticas
através das quais seus membros pretendem defender interesses e expressar suas vontades, constituindo-se
nessas lutas”, de sorte que a novidade é tríplice: um novo sujeito (coletivo), lugares políticos novos (a
experiência do cotidiano) numa prática nova (a criação de direitos, a partir da consciência de interesses e
vontades próprias) (SADER, 1988, p. 9).
12
“É sabido que a designação de ONG nasce nas Nações Unidas para identificar as organizações com quem
estabeleceriam relação de cooperação para o desenvolvimento. Nasce o conceito marcado por uma
positividade expressa no sentido de cooperação e de desenvolvimento. Cooperação com o significado de
partilhar, do que supõe uma aliança para além do espectro governamental. E desenvolvimento, que supõe uma
mudança para melhor, o que à ONG o sentido de ação em uma qualificação. [...] ainda, um terceiro
elemento: o cunho Internacional. Na medida em que o conceito nasce de um órgão transnacional, por
25
peculiar de organização da sociedade, sob a forma de uma instituição da sociedade civil, que
se declara sem fins lucrativos, com o objetivo de lutar e/ou apoiar causas coletivas (GOHN,
2003).
Quanto ao trabalho realizado pelas ONGs nesse período, Teixeira (2004, p. 80),
salienta:
Trabalhando com demandas populares de serviço de competência do Estado. Avança
para uma postura de questionamento das ações estatais, buscando formular
alternativas mais condizentes com as necessidades da população, grande parte delas
testadas em experiências concretas nas comunidades, ainda que em pequena escala.
Em conformidade com o exposto acima, a organização da sociedade civil expressa um
caráter de resistência e enfrentamento a toda forma de opressão.
Nesse contexto, constata-se o esgotamento do modelo de desenvolvimento econômico
feito com o aporte do capital internacional. O governo Figueiredo (1979-1985) foi marcado
pela distensão política e pelo processo de transição democrática. Convém destacar, ainda, que,
no processo de transição democrática, o poder militar coloca-se como um poder moderador. O
Estado apresenta-se como o poder tutelar da sociedade, em que se construiu um pacto político
assentado nas bases de uma estrutura de concentração de renda e riquezas dentro da
sociedade. Assim, percebe-se pouca efetividade da democracia (COSTA, 2006).
Desse modo, no âmbito da sociedade brasileira, a luta pela democratização,
protagonizada por amplos movimentos sociais e pelas ONGs, é expressão das lutas pelas
conquistas e pela extensão de direitos, associada à construção democrática da relação entre o
Estado e a sociedade civil, que demarcam uma concepção diferente dos períodos de 70/80.
As práticas dos movimentos sociais efetuaram uma espécie de alargamento do espaço da
política, provocando uma ruptura com os preceitos tradicionais de fazer potica. Conforme
salienta Sader (1988):
Rechaçando a política tradicional instituída e politizando questões do cotidiano dos
lugares de trabalho e de moradia, eles “inventaram” novas formas de política. Mas a
história dos movimentos sociais não é apenas a sua história interna. Os trabalhadores
são o resultado o somente de suas próprias ações, mas também da sua interação
com outros agentes. A “política reinventada” dos movimentos teve de se enfrentar
com a velha política ainda dominante no sistema estatal (SADER, 1988, p. 20-21).
suposto uma mundialização da concepção com a perspectiva de que a cooperação o se filie a um território,
mas também seja transnacional, como o é a própria organização das nações Unidas (ONU). [...] Faz parte do
sistema de “cooperação internacional”, organizações de caráter privado, que visam apoiar projetos de
desenvolvimento nos países do terceiro mundo. São as chamadas Agências de Cooperação Internacional. Hoje
também conhecidas como “ONGs do Norte, por pertencerem aos países do chamado “Primeiro Mundo
(Holanda, Estados Unidos, Canadá, Alemanha, Inglaterra)” (KOGA, 1995, p. 65).
26
Em suma, a década de 80, por um lado, encerra o período de ditadura militar no Brasil,
que deixa marcas profundas para o conjunto da sociedade brasileira, dada a profundidade das
consequências deixadas no rastro histórico do Brasil. Por outro, marca, também, a passagem
para uma outra conjuntura, que passa a ser vislumbrada a partir de 1985, com a eleição de
Tancredo Neves e José Sarney para a presidência e vice-presidência do Brasil, respectivamente.
Contudo, sem deixar de levar para o futuro um legado de acomodações de interesses entre um
governo militar e um governo civil, firmado pela “Aliança Democtica
13
.
Assim, seguem-se os anos 80 do séc. XX, que demarcam no Brasil um tensionamento
entre as forças poticas representadas pelo Estado e a mobilização da sociedade civil, que
apontam para que:
[...] o processo de transição democrática expressou a busca pela igualdade nos
direitos civis, políticos e sociais. A efervescência dos movimentos sociais, a
articulação política da classe trabalhadora e a adesão de setores do empresariado
nacional à luta pela democracia suscitaram o desejo de construir um novo patamar
de relações sociais. Foi nesse clima de anseios pela igualdade que se colocaram os
trabalhos de redação da nova ordem normativa para o Estado democrático no Brasil
(COSTA, 2006, p. 14).
A complexidade da conjuntura da década de 80, no Brasil, pode ser analisada pelo
tensionamento entre as forças poticas representadas pelo Estado e a mobilização da
sociedade civil para a aprovação da nova Constituição Federal. Salienta-se que, pela primeira
vez no país, no plano legal eram garantidos os direitos sociais e a universalização da
cidadania.
Nesse caso, uma forte tendência da atuação da sociedade civil organizada frente à
problemática social expressa pelo empobrecimento da população, a inflação, o desemprego, a
precarização do trabalho, a violência em suas formas mais diversas, que atingiu a sociedade
brasileira durante os anos 80, configurando uma crise de múltiplas dimensões e
complexidades, segundo Diniz (1995), que:
atingiram as formas prevalecentes de articulação Estado-Sociedade, a dinâmica das
relações capital-trabalho, o padrão de administração do conflito distributivo, e,
sobretudo, a modalidade de relacionamento entre os setores público e privado. Sob o
impacto do surto desenvolvimentista dos anos 70, o país experimentaria mudanças
profundas resultando na estruturação de um sistemabrido caracterizado pela
existência de antigas e novas configurações organizacionais e institucionais,
processo que se encontrava em curso, quando eclodiram os primeiros sinais da
reversão de tendências na esfera Internacional (DINIZ, 1995, p. 2).
13
A “aliança democrática” revela o pacto entre as forças políticas do Brasil, no intuito de realizar a transição
democrática de forma a manter o poder militar como um poder moderador. Nesse sentido, assenta-se na
construção de um novo pacto político baseado na mudança de regime, mas sem alterações sobre a mesma velha
estrutura social (COSTA, 2006, p.143).
27
Frente a essa realidade, o processo de redemocratização empreendido pelas
mobilizações sociais no seio da sociedade e o advento da Constituição Federal de 1988
criaram um Estado de Direito
14
no país, com responsabilidades sociais (COSTA, 2006). As
prerrogativas legais e garantias de direito empreendiam uma mudança no Estado com ênfase
na proposta de municipalização, com a descentralização do poder e a ampliação de direitos
sociais, inclusive com a aprovação da Assisncia social, como uma política pública inserida
no conceito de seguridade social, juntamente com a Política de Previdência Social e de Saúde.
Paralela a realidade exposta, destaca-se que as ONGs apesar de historicamente terem
assumido um desenho autônomo frente ao Estado, necessitam no contexto dos anos 80,
redimensionar a sua postura frente ao Estado. Assim, se expressa Paz (1999):
As ONGs brasileiras surgem e crescem com um desenho político de autonomia
frente ao estado, às igrejas, aos partidos políticos, e aos movimentos sociais, com um
compromisso com a constituição de uma sociedade democrática, incluindo o
respeito à diversidade e o pluralismo. Algumas ONGs poderão assumir este papel
complementar em relação ao Estado de forma isolada, mas acreditamos que rias
ONGs, particularmente aquelas reunidas na Associação Brasileira de Organizações
Não-Governamentais (ABONG), defendem e defenderão o estabelecimento de
parcerias responsáveis que contribuam para o desenvolvimento do país e que
avancem no fortalecimento e organização da sociedade civil brasileira (PAZ, 1999,
p. 202).
Pelo exposto acima, verifica-se que a atuação das ONGs engloba, portanto, uma
diversidade de ações, dentre eles os de desenvolvimento de assessoria, de educação, direitos
humanos e de assistência social, qualificação profissional, dentre outros. A sua esfera de
atuação engloba o eixo da cidadania que luta por direitos sociais e o compartilhamento de
responsabilidades frente à problemática social do país.
Scherer-Warren (1995), define ONG como:
Organizações formais, privadas, porém com fins públicos e sem fins lucrativos,
autogovernadas e com participação de parte de seus membros como voluntários,
objetivando realizar mediações de caráter educacional, político, assessoria técnica,
prestação de serviços e apoio material e logístico para populações-alvos específicas
ou para segmentos da sociedade civil, tendo em vista expandir o poder de
participação destas com o objetivo último de desencadear transformações sociais ao
nível micro (do cotidiano e/ou local) ou ao nível macro (sistêmico e/ou global)
(SCHERER-WARREN, 1995, p. 165).
14
O Estado de Direito é marca da sociedade moderna e democrática, sintetiza o conjunto de preceitos legais que
regulam a vida do seu povo, instituindo diretos e a busca de sua efetivação. (COSTA, 2006, p.147). E ainda,
para um maior aprofundamento remetemos às leituras das contribuições de Hayek (1990), em O caminho da
Servidão, que aponta o Estado de Direito como o Estado onde todas as ações do governo são regidas por
normas previamente estabelecidas.
28
Nesse quadro de análise, os movimentos sociais e a sociedade civil em geral, incluindo
as ONGs, assumem configurações diferenciadas no que se refere a sua organização e atuação,
repercutindo, assim, as características políticas e ideológicas de cada época. Nesse sentido,
superam o caráter da emergência heróica
15
, característica dos anos anteriores à Constituição
Federal de 1988, conforme Cardoso (1994), e apontam para a perspectiva da
institucionalização dos movimentos de forma mais expressiva nos anos 90, do que buscam
repensar o seu papel diante desses contextos de forma a enfrentar as diferentes e múltiplas
questões que se imem à realidade social.
Portanto, as mudanças de ordem potica, econômica e societária que ocorreram no
processo de desenvolvimento brasileiro nos anos 90 influenciaram de forma decisiva na
constituição de um conjunto de vulnerabilidades sociais; aos grupos sociais, demarcando uma
nova feitura na relação Estado e sociedade civil, caracterizada pela concepção de sociedade
civil. Segundo Gonh (2000), “Esta relação é resultante das lutas sociais empreendidas pelos
movimentos sociais e organizações sociais, que reivindicaram por direitos e espaços de
participação social”.
Ainda associado a esse contexto de expansão democrática, tem-se a ampliação do
debate acerca da reforma do Estado, decorrente de um conjunto de crises instaladas em vel
mundial e nacional. Nesse intuito, constata-se no Brasil, uma mobilização centrada em uma
concepção reformadora do Estado fortemente concentrado pela diminuição da sua intervenção
para a dimensão fiscal, financeira e patrimonialista (NOGUEIRA, 2004, p. 37-38). Assim,
têm-se nesse contexto, por um lado, na ordem econômica, a crise do capitalismo que leva a
reforma do Estado neoliberal, a crise política, que enseja uma reforma do Estado na
perspectiva ética-potica de sua legitimidade, e por outro lado, tem-se, com a Constituição
Federal de 1988, a instituição de uma nova concepção de gestão pública decorrente de um
processo de mobilização dos movimentos sociais.
Ressalte-se que a análise das crises não se constitui alvo deste estudo, mas sim na
compreensão de que a crise potica possui laços estreitos com as alterações da relação entre o
Estado e a sociedade. Essa relação, no período de consolidação democrática que se expressa
no país, após os anos 80 do século passado, ganha novos contornos. Nesse sentido, implica
em um “novo” pacto entre o Estado e sociedade, com redefinições das relões públicas e
15
A expressão “emergência heróica” dos movimentos é utilizada por Cardoso (1994), em seu estudo a Trajetória
dos movimentos sociais, para designar uma das fases dos movimentos sociais no Brasil, abordadas pela autora,
caracterizada pela ideia de autonomia e ou espontaneidade dos movimentos, que buscavam mudança na cultura
política do país. A participação representava essa mudança, quase fazendo um chavão anti-Estado, anti-partido,
anti-sistema político, sendo o Estado realmente visto como um inimigo. Esta fase é representada pelos
movimentos nos anos 70 e início dos 80.
29
privadas no âmbito da sociedade, possibilitando alterações significativas, remetendo à
construção de um “novo” paradigma de gestão pública. Essa concepção de gestão fundamenta-
se em princípios como: descentralização, municipalização e transparência, dentre outros.
Assim, a compreensão da sociedade civil remete a uma concepção de esfera blica
que, segundo Raichelis (2000), baseia-se na ideia de que sua constituição é parte integrante do
processo de democratização, pela via do fortalecimento do Estado e da sociedade civil. Essa
perspectiva remete à forma de articulação entre o Estado e a sociedade civil, de forma que os
interesses coletivos possam ser confrontados e negociados.
A perspectiva que se coloca é a de constituição da esfera pública no desenvolvimento
das poticas sociais, como parte integrante do processo de democratização e fortalecimento
da relação entre o Estado e a Sociedade, pela participação no processo de decisão e pelo
usufruto dos bens produzidos socialmente. Assim, a esfera pública é compreendida como uma
construção histórica.
Tecida no interior das relações entre sociedade política e sociedade civil, que visa
ultrapassar a dicotomia estatal-privado com a instauração de uma nova esfera capaz
de introduzir transformações, nos âmbitos estatizados e privados da vida social,
resultando daí um novo processo de interlocução pública (RAICHELIS, 2000, p.
74).
Segundo a autora, a esfera blica se estende para além das esferas estatais e envolve
o conjunto das organizações parceiras do Estado, que deve ter a primazia da responsabilidade
por inscrever os interesses coletivos da população. Pondera ainda que o Estado não possa ser
associado automaticamente ao público, e que o privado o se confunda com o mercado ainda
que transite, nessa esfera, interesses de sujeitos privados. É nesse âmbito que a relação entre
público e privado interpõe-se, não se associando o Estado automaticamente ao público, nem o
privado à esfera do mercado (RAICHELIS, 2000).
Embora a discussão do público e do privado não tenha centralidade neste trabalho,
entretanto, essa abordagem é aqui recortada a partir do modo como essas dimensões se
expressam na relação entre o Estado e a Sociedade.
Em seu significado normativo, o conceito de público remete ao interesse de todos, ao
reconhecimento do direito de todos à participação na coisa blica. Assim, entende-se que “o
público é uma construção social e um resultado a ser alcançado, e o Estado é a realização do
público, mas na medida em que represente a sociedade e possibilite que ela se desenvolva”
(RAICHELIS, 2004, apud CHIACHIO, 2006, p. 62).
Nesse sentido, é importante destacar que o privado:
30
Refere-se ao conjunto heterogêneo de entidades que se distinguem das organizações
puramente mercantis, ao exercerem papel de intermediação na prestação de bens e
serviços não contributivos que não derivam da inserção do beneficiário no mercado
de trabalho (RAICHELIS, 2000, p. 29).
No momento pós-Constituição de 1988, a sociedade civil caracteriza-se na sua relação
com o Estado por uma postura de negociação, de diálogo, de parceria, mesmo havendo
conflitos entre ambos. Nesse sentido, caminha também a atuação das ONGs, fortemente
imbricada com os movimentos sociais, com a igreja, com as organizações de trabalhadores e
com as populações excluídas. O protagonismo das ONGs s-Constituição de 1988
empreende-se pela ocupação de espaços participativos na dinâmica potico-institucional,
contribuindo para a ampliação desse debate o fato de um estado democrático no país
(DURIGUETO, 2007).
Nos anos 90, configuram-se, na feição do Estado, as ideias neoliberais na expressão do
então presidente do Brasil, Fernando Collor de Mello, desencadeando uma verdadeira
perseguição de caça aos marajás, no corte dos gastos públicos, no ataque às empresas
estatais, vistas como ineficientes e burocráticas. A Constituição Federal de 1988 evidenciou,
sem dúvida, uma luta potica no país. Uma vez aprovada e sem regulamentar parte
substancial de seus artigos, já era alvo das reformas. Assim, a tarefa de Collor de Mello e do
seu sucessor pode ser a revisão da Constituão para prover a reforma do Estado nos
moldes das propostas neoliberais.
Embora dentro do receituário neoliberal, Collor confronta os interesses do grande
capital instalado no país, com as denúncias de corrupção no seu governo e com setores em
indisposão com a sua política governamental. O Brasil viveu o momento de busca de ética
na potica, com a destituição de Collor da presidência. O movimento popular, que aderiu à
campanha divulgada pela mídia, colocou em questão o comportamento ético do governo,
conseguindo impedi-lo de exercer o cargo de presidente do Brasil.
Nesse aspecto, o Estado, já adubado com as ideias neoliberais, descaracteriza a crise
esvaziando o conteúdo político do tema, passando a colocar o problema como uma questão
administrativa e técnica, e o como opção política e social. (COSTA, 2006) Destaca-se
também o comprometimento do Estado brasileiro com as instituições financeiras
Internacionais, tais como: o Banco Mundial e o Fundo Monetário Internacional (FMI), que
estimulam a reforma do Estado brasileiro na ótica dos interesses capitalistas, comprometendo
a realidade da população. Essa realidade torna-se mais evidenciada no Governo de Fernando
Henrique Cardoso, nos anos 90.
31
Convém salientar que o Estado brasileiro, no Governo FHC, não estabelecia com a
população um diálogo acerca da reforma, realizava-a por meio de medidas provisórias e
centralizadoras. Nesse período, vê-se configurar na realidade brasileira uma reforma liberal
(COSTA, 2004). Assim, o que se constata é a existência de um Estado Social que, no entanto,
o efetivava direitos, visualizando-se de fato o retorno ao Estado liberal.
O Brasil convive com um Estado social de direitos, segundo Costa (2006), pautando-
se no reconhecimento dos direitos da população através de mecanismos legais, com regras
democráticas para a eleição dos representantes poticos, com o funcionamento legal das
instituições em meio a um agravamento dos conflitos sociais e a cronificação da pobreza.
Estabelece-se uma crise potica do Estado, que não leva em conta, na sua gestão, as
instituições democráticas avançadas, como o advento da Carta Magna, que instituiu o sistema
descentralizado e participativo, redefinindo a relação entre o Estado e a sociedade civil,
expressando, pois, uma relação contraditória.
Frente a esse contexto, pois, as ONGs assumem ações de caráter público, demarcando
uma atuação conjunta com o Estado com contornos e caráter de parcerias. Segundo Dagnino
(2002, p. 13), a relação de parceria entre Estado e sociedade revela características com
múltiplas expressões, como de antagonismos, de confronto e oposição, características
herdadas dos anos de ditadura brasileira. Nesse intuito, observa-se que as relações entre o
Estado e a sociedade estão sendo constrdas na esteira das diversidades e dos conflitos
inerentes às transformações econômicas, políticas, sociais e culturais que permeiam a
realidade brasileira.
Assim, compreender a relação entre Estado e sociedade leva-nos a reflexões no
sentido de identificar e compreender os desdobramentos e direções para um efetivo processo
de democratização da sociedade brasileira e a implementação de políticas públicas.
Seguindo essa tendência, na década de 90, amplia-se, ainda, a legislação relativa à
normatização da relação entre o Estado e a sociedade civil, constituindo o que passou a
denominar-se como “Terceiro Setor”, que, segundo Montaño (2003), o conceito carece de
reflexões críticas e compreensões mais profundas para não incorrer em polarização de tudo
que se contrapõe ao Estado (primeiro setor) e ao Mercado (segundo setor) e referindo-se à
Sociedade Civil.
Existem diversas tentativas de definição do Terceiro Setor, motivo de intenso debate e
polêmica. O conceito mais aceito, atualmente, é o de uma esfera de atuação pública, não-
estatal, formada a partir de iniciativas privadas voluntárias, sem fins lucrativos, no sentido do
bem comum.
32
No caso brasileiro, um corte importante para a análise e compreensão do Terceiro
Setor deve ser feito com base na legislação que vigorou até março de 1999, pela qual faziam
parte de sua composição todas as instituições jurídicas, de direito privado, sem fins lucrativos.
Por diversas razões históricas, abrigaram-se sob esta denominação genérica distintos agentes e
Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público (OSCIPs), formando um conjunto
heterogêneo de atuação em causas específicas e gerais, nos campos político, social,
econômico e cultural.
Do ponto de vista dos marcos regulatórios, as legislações mais recentes como a Lei nº
9.732 (11/12/1998), que trata da isenção de contribuição à seguridade das entidades
filantrópicas e a lei 9.970 (23/03/99), que trata das OSCIPs, entre outras, normatizam as
relações entre Estado e sociedade ou parceria, tratando do desempenho de ações no campo das
políticas públicas e do acesso de organizações sem fins lucrativos aos recursos públicos.
O crescimento do Terceiro Setor tem sido bastante evidente nas últimas cadas,
conforme expressa Yazbek (2000):
O crescimento do Terceiro Setor nas últimas décadas evidencia além das persistentes
ambiguidades presentes nestes tipos de organização, como a gestão privada de
financiamentos públicos e a permanência de um modelo de solidariedade
hierarquizado e moralista, outras questões a serem problematizadas. Assim, por
exemplo, lidamos com o risco da privatização de serviços que deveriam ser
universalizados no âmbito público; com uma permanente tensão na relação de
autonomia/dependência relativamente ao Estado; com a questão das isenções e
imunidades fiscais, a “desuniversalização” dos serviços sociais e a localização no
campo da solidariedade de direitos constitucionais (YAZBEK, 2000, p.7-8).
Face ao cenário de forte expressão da sociedade civil que caracterizou as últimas
décadas do século passado e o processo de desmobilização dos movimentos pós-Constituição
de 1988, em decorrência das prerrogativas de participação pautadas na nova conjuntura de
políticas sociais estatais de parcerias entre Estado e entidades da sociedade civil organizada, o
Terceiro Setor, como uma vertente da sociedade civil, abre espaço para o acesso e a
construção de novas práticas que podem levar à democratização de setores estratégicos
governamentais, responsáveis por políticas em áreas sociais.
No cenário dos anos 90, o Estado passa a esboçar mais claramente os preceitos
neoliberais na busca pela superação da crise do Estado. Nesse contexto, o enfrentamento das
problemáticas sociais dá-se com as poticas sociais de caráter compensatório, seletivo e
conservador, frente às questões decorrentes do mundo do trabalho e que extrapolam a relação
de classes sociais, interferindo nas diversas dimenes da vida dos homens.
33
Assim, as respostas ao conjunto da problemática social dão-se motivadas pela
sensibilização e solidariedade. Neste está “em construção uma forma despolitizada e
refilantropizada de abordagem da questão social brasileira, o Estado neoliberal com limitada
ação social reitera as políticas de caráter compensatório, seletivo e conservador (SILVA,
2001, p. 10). Assim, a sociedade vai gradativamente ocupando o espaço que é do Estado.
Ainda no percurso desse período, conforme Dagnino, as relações entre Estado e
sociedade civil passam a configurar “[...] uma postura de negociação, que aposta na
possibilidade de uma atuação conjunta, expressa paradigmaticamente na bandeira da
participação da sociedade civil” (DAGNINO, 2002, p. 13). Nesse âmbito, vale ressaltar que,
nas relações que se estabelecem entre o Estado e a sociedade ganha evidência a participação
das Organizações Não-Governamentais (ONGs) e de outros organismos da sociedade civil,
marcados por um conjunto de mudanças estruturais e societária, resignificando as relações
Estado e Sociedade, que, segundo Almeida:
Compreende as transformações no mundo da produção, os ajustes estruturais, a nova
divisão internacional do trabalho, os acordos internacionais de livre-comércio, as
estratégias multilaterais, dentre outras, somando-se valores, crenças, pontos de vistas
e conceitos considerados fundamentais ao processo de legitimação da governança
global. Dentre eles, a concepção de sociedade civil, metamorfoseada em “terceiro
setor”, vem se destacando em sua virtude de força na construção da hegemonia
neoliberal (ALMEIDA, 2004, p. 98).
Pereira (1997) ressalta que a grande tarefa dos anos 90 é a reforma ou a reconstrução
do Estado. Essa afirmação é decorrente do processo de crise que assolou o país face às
transformações econômicas em nível mundial. Pereira enfatiza que:
A crise do Estado está associada, de um lado, ao caráter cíclico da intervenção
estatal, e de outro, ao processo de globalização, que reduziu a autonomia das
políticas econômicas e sociais dos Estados nacionais. A grande depressão, embora
uma crise do mercado, foi também uma crise do Estado liberal (PEREIRA, 1997, p.
12).
A reforma do Estado passa por uma profunda redefinição da relação entre o Estado e a
sociedade, na consolidação democrática. Nesse sentido, implica em novas definições das
relações públicas e privadas no âmbito da sociedade que possibilitam alterações significativas,
remetendo à construção de um novo paradigma da gestão pública. Assim, é no bojo da
reforma do Estado que se encontra o incentivo para a introdução dos mecanismos de gestão,
conforme Nogueira:
A agenda reformadora, ainda que ao preço de uma hipervalorização da
administração empresarial e de uma entrega do Estado ao mercado, ajudou a que se
criassem focos de incentivo para a atualização do modo burocrático, o aumento do
controle social e a incorporação de mecanismos de participação e de
descentralização à gestão das políticas sociais. Nesse movimento, uma cultura
34
democrático-participacionista floresceu no setor público, ajudando a que se tomasse
maior consciência da relevância do protagonismo social (NOGUEIRA, 2004, p. 39).
Esse cenário expressa continuidade nos anos seguintes, com o governo de Luís Inácio
Lula da Silva, tendo o primeiro mandato no período de 2003 a 2006, e o segundo ainda em
trânsito, de 2007 a 2010. É indiscutível que a vitória de Lula teve um grande significado, visto
que, pela primeira vez, foi eleito um representante dos trabalhadores no país, com forte
experiência de organização potica e oriundo do histórico movimento organizado dos
operários nos últimos 30 anos. Entretanto, salienta-se que a trajetória do seu governo
demonstra uma potica econômica favorável aos interesses do capital financeiro internacional
e nacional, contrariando as expectativas de comprometimento com os movimentos ensejados
pela sociedade civil, através de suas formas de manifestação.
Importa destacar que, se por um lado, o governo do Presidente Lula fortaleceu uma
política econômica comprometida com o sistema capitalista nacional e internacional, por
outro, ressalta-se o alargamento das poticas blicas voltadas para os setores
vulnerabilizados socialmente da sociedade. Vale ressaltar a implementação da política de
Assistência Social, enquanto “política pública”, e o conjunto de ações e programas sociais que
passaram a ser desenvolvidos, haja vista o Programa de Transferência de Renda Mínima e o
Programa Bolsa Família (PBF), que se revelou como o grande programa de liderança” da
área social do governo Lula.
No cenário dos anos 2000, são visíveis também as alterações na relação entre o Estado
e a sociedade, que se fazem sentir na gestão pública, embora persista a luta para dar maior
significado a essa relação, com a afirmação dos direitos constitucionais declarados,
requerendo sua efetivação.
Entretanto, observa-se que, tanto o Estado quanto a sociedade necessitam de mudanças
de comportamento e princípios que vão além das normativas legais, uma vez que o Estado
reflete as forças sociais que existem na sociedade civil.
Assim, decorrente das profundas transformações pelas quais o Brasil tem passado,
dentre elas, o processo de democratização, que remete à necessidade dos governos de
imprimir um redesenho do setor público, de forma que promova a melhoria da qualidade de
vida dos cidadãos. Vale dizer, que esse desenho das poticas e dos programas sociais requer a
superação de práticas tradicionais, comprometidas com uma concepção da gestão
centralizadora, não mais condizente com a realidade institucional, política, econômica e social
da contemporaneidade.
35
Portanto, a tônica na atualidade e do ponto de vista do contexto da realidade brasileira,
está no caráter público, na relação de direito, na continuidade dos serviços e na
responsabilização do Estado. Nessa perspectiva, amplia-se o reconhecimento pelos direitos
sociais e de participação através da criação das instâncias que comem o sistema
descentralizado e participativo, como: conferências, fóruns, conselhos gestores e setoriais,
dentre outros âmbitos das políticas públicas. Por isso, cumpre ressaltar a relevância dos
mecanismos de participação e veis de atuação das ONGs nas suas diferentes acepções e
institucionalização.
1.2 A relação entre Estado, sociedade civil e gestão pública
O modelo de gestão pública em construção pós-Constituição de 1988 reflete as
significativas transformações que as instituições brasileiras estão passando em vel de sua
organização institucional, política e ética, expressando uma redefinição do Estado, da
sociedade civil e do mercado, tendo como suporte princípios constitucionais de
descentralização, municipalização, participação, cidadania etc. Segundo Souza (2004, p. 27),
essas mudanças criaram “nova” institucionalidade, resultado dos compromissos gerados
durante o processo de redemocratização que propugnou os anseios da sociedade por reforma
político-institucional.
A Constituição Federal de 1988 expressa princípios e mecanismos constitucionais
como a descentralização e a participação da sociedade organizada na implementação das
políticas públicas. Esses princípios e mecanismos proporcionam, do ponto de vista legal,
alterações na relação entre Estado e sociedade, pois favorecem a participação e o controle
social das poticas públicas por intermédio da sociedade civil organizada, em especial,
através das ONGs.
Face ao exposto, torna-se necessária para as reflexões acerca dessa “nova
institucionalidade que emergiu no Brasil s-Constituição de 1988, a compreensão dos
elementos que constituíram essa realidade, entendendo-os numa perspectiva hisrica e
política de mudanças ocorridas no cenário nacional.
Nesse sentido, destaca-se o princípio da descentralização preconizado pela
Constituição Federal de 1988, que pode ser considerado antítese da marca da centralização
política adotada no sistema político brasileiro ao longo da história deste país. Portanto, reflete
a emergência da adoção de um modelo descentralizado em substituição ao modelo
36
centralizado, com fortes características autoritárias. No seu art. 204, a Constituição Federal
preconiza:
A descentralização político-administrativa, cabendo a coordenação e as normas
gerais à esfera federal e a coordenação e a execução dos respectivos programas às
esferas estadual e municipal, bem como a entidades beneficentes e de assistência
social; marcada pela transferência de recursos e encargos da União para governos
estaduais e municipais, favorecendo, assim, para uma ampliação das competências
desses níveis de governo e significativa participação dos poderes locais na partilha
dos recursos (C.F/1988).
Constata-se que, embora a Constituição preconize a descentralização, as mudanças nos
papéis dos municípios são marcadas por grandes dificuldades e desafios que se interpõem
frente às suas responsabilidades. Dentre essas dificuldades destacam-se, na realidade concreta,
ambiguidades e superposições de competências dos vários níveis de governo em diferentes
áreas, bem como, dificuldades financeiras frente aos novos encargos assumidos, entre outros
aspectos.
Ainda, quanto aos desafios, salienta-se a absorção da responsabilização de suas novas
competências, quanto a gastos públicos e à promoção de políticas blicas. Nesse quadro de
análise, portanto, os municípios assumem um papel de grande relevância e destaque na
realidade local com a execução de políticas públicas.
Segundo Cohn (2000), frente ao processo de descentralização das políticas blicas, a
literatura apresenta uma vasta e diversificada contribuição, apontando pontos e contrapontos
sobre a questão. Para a autora:
Observa-se a existência de consenso sobre o fato de esse processo vir possibilitar um
leque rico de experiências locais inovadoras e criativas para dar conta do
enfrentamento da pobreza, por outro lado, parte dessa literatura registra contradição
que vem marcando esse processo de descentralização quanto aos interesses do nível
central e local. [...] para o nível central a descentralização significa a possibilidade
de exercício de maior controle sobre o dispêndio de recursos na área social,
contribuindo, portanto, para a redução do déficit público. Em contrapartida, os
municípios acabam sendo pressionados a dar conta da demanda local sobre os seus
equipamentos sociais (COHN, 2000, p. 190).
Cohn (2000) salienta, também, que, no contexto das ambiguidades e complexidades da
descentralização, deve-se levar em conta que as poticas públicas desenvolvidas desde 1994
o expressam na sua totalidade os anseios da sociedade no tocante à relação
desenvolvimento social versus desenvolvimento econômico:
O conjunto das políticas sociais em curso desde 1994 o expressa o esforço
necessário e urgente para superar a fragmentação do desenvolvimento social
brasileiro e a dicotomia entre o desenvolvimento social e econômico, quanto à
segmentação das políticas e programas sociais (COHN, 2000, p. 190).
37
Com base nas observações expostas pela autora acima, as prerrogativas constitucionais
presentes nas políticas sociais não foram suficientes para romper com práticas históricas
centralizadoras e fragmentadas que predominavam no trato dos interesses blicos e,
significativamente, no âmbito da implementação das políticas públicas pelo Estado. Em suma,
visualiza-se, ainda, um distanciamento da aplicabilidade dos preceitos constitucionais na
implementação das poticasblicas, configurando assim, um processo contraditório entre os
preceitos legais e a realidade social.
Entrelaçado com o processo de descentralização, verifica-se que a participação
constitui-se em outra categoria dessa nova institucionalidade da gestão pública. Esse princípio
está preconizado fundamentalmente no art. 204, da Constituição de 88, que expressa o
seguinte: “participação da população por meio de organizações representativas, na formulação
das políticas e no controle das ações em todos osveis”.
É importante ressaltar que o conceito de participação
16
é impregnado de conteúdo
ideológico e utilizado de várias maneiras, por diferentes atores e instituições, isto é, a
denominação do conceito de participação possui expressões diversas na sociedade. Nesse
sentido, tanto é visto na perspectiva de legitimar a dominação das forças hegemônicas
mediante estratégias de manipulação, quanto lhe negando qualquer papel de
institucionalidade, numa idealização da sociedade, em que esta ficaria “contra o Estado”
(TEIXEIRA, 2002, p. 25). Ainda segundo Teixeira (2002), na visão liberal, o conceito de
participação, nas suas origens, remota à polis grega. Aqui, a participação tinha sentido
decisional, restringindo-se ao processo eleitoral e, mesmo assim, limitava-se aos que
dispusessem de patrimônio (voto censitário).
Na atualidade, o conceito de participação vem traduzindo novos conteúdos e sentidos,
às vezes contradirios e tão múltiplos, que se pode chegar à descaracterização do fenômeno.
No âmbito deste estudo, remete-se a compreensão de participação política que, segundo
Teixeira (2002, p. 25), consiste em comparecer a reuniões de partidos, cocios, grupos de
difusão de informações, até o inscrever-se em associações culturais, recreativas, religiosas ou,
ainda, realizar protestos, marchas, ocupações de prédios.
16
A palavra participação vem da palavra parte. Participação é “fazer parte”, “tomar parte” ou “ter parte”, “ser
parte”. No entanto, a concepção de participação requer compreendê-la nas suas diversas manifestações, que
envolve a participação ativa/passiva, participação social/política, dentre outras. Nesse sentido, constata-se que
participação envolve um conjunto de micro e macroparticipação (BORDENAVE, 1995) e (TEIXEIRA, 2002).
Portanto, o conceito de participação envolve um ato ou processo, de uma atividade pública, de ações coletivas.
Refere-se “à parte”, implica pensar o todo, a sociedade, o Estado, a relação das partes entre si e destas com o
todo e, como este o é homogêneo, diferenciam-se os interesses, as aspirações, os valores e os recursos de
poder (TEIXEIRA, 2002, p. 27).
38
Considerando esse conjunto de informações sobre participação, deve-se dizer que,
após a Constituição de 88, ela ganha força enquanto um dos muitos mecanismos de controle
social e de efetivação de direitos, contribuindo para a extensão da cidadania. Possibilitar que a
sociedade civil exerça seu direito à informação e à participação deve fazer parte dos objetivos
de um Estado que se comprometa com a garantia da democracia. Democratizar a gestão
requer que a sociedade civil possa participar no processo de implementação e fiscalização da
gestão das políticas públicas, através de mecanismos institucionais e políticos.
Nessa perspectiva, a participação da população nos processos decisórios que
expressam o controle social da sociedade configura uma dimensão política, que, conforme
Silva e Silva: Trata-se de uma perspectiva que evoca equidade e justiça como princípios que
devem fundamentar as decisões da política social, a participação potica (SILVA e SILVA,
2001, p. 28).
Com base nessas considerações, a participação pode ser compreendida como
instrumento de controle da sociedade sobre o Estado, portanto, de controle social e político.
Salienta Teixeira (2002):
A participação é um instrumento de controle do Estado pela sociedade, portanto, de
controle social e político: possibilidade de os cidadãos definirem critérios e
parâmetros para orientar a ação pública. Esse entendimento opõe-se ao que se
verifica na perspectiva liberal, a chamada “liberdade negativa”, que visaria impedir
maior ação do Estado para garantir maior liberdade possível aos indivíduos. [...] o
entendimento de controle social tem duas dimensões básicas. A primeira
corresponde à accountability, a prestação de contas conforme parâmetros
estabelecidos socialmente em espaços públicos próprios. A segunda, decorrente da
primeira, consiste na responsabilização dos agentes políticos pelos atos praticados
em nome da sociedade, conforme os procedimentos estabelecidos nas leis e padrões
éticos vigentes (TEIXEIRA, 2002, p. 38).
A relação entre o Estado e a sociedade civil torna-se mais próxima em consequência
do processo de descentralização político-administrativa, pois proporcionou o
compartilhamento de responsabilidades entre as esferas governamentais, sobretudo, no que se
refere aos municípios em relação às demais esferas. É no município que a relação dos
munícipes e seus governantes é visivelmente estreita, sendo esse processo perceptível através
da instalação dos Conselhos gestores e setoriais, da realização de conferências, fóruns e do
funcionamento das comissões intergestoras bipartite e tripartite, nos três níveis de governo.
Essas experiências tornam-se espaços de avaliação e decisões para implementação de boa
parte das ações públicas.
O controle social das políticas sociais representa um marco na relão Estado e
sociedade no Brasil, preconizado pela Constituição de 1988. É a partir dessa década que o
39
exercício do controle social passa a ter um significado de acompanhamento das ões e de
formulação das políticas sociais com a participação da sociedade. Essa participação vem
sendo reafirmada mediante os marcos legais
17
das poticas sociais.
Nesse âmbito, Correia (2002) assevera que o controle social pode ser abordado sob
duas concepções, seja nas sociedades modernas ou contemporâneas. Assim, as concepções
apontadas pela autora consistem em que a primeira é aquela que entende o controle social
como controle do Estado sobre a sociedade. Esse controle favorece os interesses da classe
dominante e as poticas sociais são meios utilizados para abrandar conflitos sociais. A
segunda concepção refere-se ao controle social como controle da sociedade sobre o Estado.
Nesta, a sociedade tem possibilidade de controlar as ações do Estado em favor dos interesses
das classes subalternas (CORREIA, 2000).
Na realidade histórica do Brasil, constata-se a presença dessas duas concepções, sendo
a primeira mais evidenciada nos anos anteriores à Constituição, e a segunda, pós-Constituição
de 1988, momento em que a sociedade passa a exercer maior controle social sobre as ações do
Estado.
Na atualidade, o controle social evidencia-se mediante a atuação dos diversos
conselhos, que m se organizando em diferentes setores das políticas sociais e estão
assumindo importância crescente como espaços de participação social nas diferentes esferas
da ação governamental. A sua composição mista e paritária e a natureza deliberativa de suas
funções, como estabeleceu a formatação legal que orienta a sua implantação, constituem uma
das principais inovações democráticas” (RAICHELIS, 2000, p. 30).
No entanto, esse fenômeno, apesar de seu significado, não quer dizer que se
desenvolva isento de contradições. É bastante discutível a participação da sociedade civil
nesses espaços. Assim comenta Raichelis (2000):
Ao contrário, a polêmica a respeito do significado político dos conselhos e
das consequências de sua institucionalização continua despertando posições críticas
e questionadoras quanto à oportunidade e às consequências da participação da
sociedade civil nesses espaços (RAICHELIS, 2000, p. 37).
Salienta-se, que frente ao controle social, encontram-se diferentes desafios e/ou
dificuldades, que se apresentam no campo governamental, no campo da sociedade civil e no
campo das relações entre representantes da sociedade civil. Nesses termos diz Raichelis:
17
Compreende a legislação como: lei nº 7.853, de 24 de outubro de 1989, referente à Política Nacional da Pessoa
Portadora de Deficiência; lei nº 8.069/90, de 13 de julho de 1990: Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA);
lei 8.742, de 7 de dezembro de 1993: Lei Orgânica da Assistência Social; lei nº 10.741, de 1 de outubro de
2003: Estatuto do Idoso. Esse conjunto de leis que regem a sociedade representa a capacidade de mobilização e
participação da sociedade para o exercício do controle social.
40
No campo governamental, uma das principais dificuldades relaciona-se às
resistências para que as definições das políticas públicas sejam abertas à participação
e ao controle social, retirando-as das mãos da burocracia estatal para permitir a
penetração da sociedade civil. No campo da sociedade civil, o reconhecimento da
heterogeneidade dos atores sociais e das concepções práticas, experncias e
propostas acumuladas geradoras de múltiplos interesses e demandas, nem sempre
convergentes, desafia o estabelecimento da agenda comum que deve orientar ações e
decisões coletivas. No campo das relações entre representantes da sociedade civil e
representantes governamentais que integram os conselhos, por fim, impõe-se o
desafio de adotar estratégias políticas que ampliem o arco de alianças capazes de
fortalecer um campo hegemônico progressista na defesa das políticas como terreno
de direitos (RAICHELIS, 2000, p. 37).
Denota-se que a expansão da atuação conjunta do Estado e da sociedade civil no
âmbito das poticas públicas torna-se mais evidente a partir da década de 90, com a inserção
no cenário brasileiro de “novos” atores sociais, como abordado ano item anterior, tais como as
ONGs, o movimento das minorias, etc., que passam a exigir do Estado a efetivação de direitos
em direção a uma sociedade mais justa.
Ao se analisar a situação exposta, é no cenário de democratização das relações entre
Estado e sociedade civil que se acentuaram os anseios pela participação. Segundo Silva e
Silva, os problemas detectados não podem ser resolvidos somente pela via do Estado:
implicam também a participação da sociedade civil (SILVA e SILVA, 2001, p. 27).
No processo referenciado acima, é importante salientar que, historicamente, o conceito
de cidadania foi ganhando conotações diversas, evidenciando sentidos e intenções diferentes,
sendo necessária a fixação do seu significado e de seus limites. Assim, frente aos processos e
avanços democráticos e das relações sociais, vivenciam-se experiências concretas de
cidadania no cotidiano das pessoas e no âmbito dos municípios, afirmando este como o
espaço das lutas cotidianas dos indivíduos por melhores condições de vida.
Buscando melhor delimitar um conceito de cidadania, Dagnino (1994) aponta as
dimensões que presidem esta noção:
O fato de que ela deriva e, portanto, está intrinsincamente ligada à experiência
concreta dos movimentos sociais, tanto do tipo urbano e aqui é interessante anotar
como cidadania se entrelaça com o acesso à cidade quanto aos movimentos de
mulheres, negros, homossexuais, ecológicos etc. Na organização desses movimentos
sociais, a luta por direito tanto o direito à igualdade como o direito à diferença [...]
expressa o novo estatuto teórico e político que assumiu a questão da democracia em
todo o mundo, especialmente a partir da crise do socialismo real [...] ela organiza
uma estratégia de construção democrática, e transformação social, que afirma um
nexo constitutivo entre as dimensões da cultura e da política. Incorporando
características da sociedade contemporânea, como o papel das subjetividades, a
emergência de sujeitos sociais de novo tipo e direitos de novo tipo, a ampliação do
espaço da política (DAGNINO, 1994, p. 104).
41
A construção da cidadania, na perspectiva apontada por Dagnino, remete para a
superação de uma cultura autoritária e a construção de uma sociedade democrática
sedimentada em valores e reconhecimento das subjetividades humanas. A cidadania requer a
constituição de sujeitos ativos, definindo o que consideram ser os seus direitos e lutando pelo
seu reconhecimento. Nesse sentido, ela é uma estratégia dos não-cidadãos, dos excluídos, uma
cidadania “de baixo para cima (DAGNINO, 1994, p. 108). Essa noção de cidadania
transcende uma concepção liberal,
18
e envolve o direito de participar efetivamente da própria
definição do sistema. Isso significa ampliar a relação do indivíduo para além da relação com o
Estado, mas inclui a relação com a própria sociedade civil (DAGNINO, 1994).
Nessa perspectiva, o conceito de cidadania entrelaça-se com a noção de participação.
Enfocando essa relação, Baierle (1996, p. 8) apud Silva (1998, p. 216), afirma que a
cidadania:
Constrói-se pela participação direta e indireta dos cidadãos, enquanto sujeitos
políticos, contribuindo não apenas para a solução de seus problemas sentidos, em
espaços públicos onde as decisões coletivas possam ser cumpridas, mas também,
para um processo de radicalização democrática, através do desempenho de um papel
instituinte, transformador da própria ordem na qual operam (grifos do autor).
Frente a esse quadro, evidencia-se uma concepção de cidadania, constrda a partir dos
processos de transformações poticas, econômicas, sociais e culturais vivenciados nas últimas
décadas do século XX, que consolidam a gestão pública e uma relação entre o Estado e a
sociedade civil sob uma ótica paradigmática, pautada na participação, na transparência, na
descentralização e no controle social, dentre outros princípios.
Nesses termos, o momento atual aponta para a participação de muitos sujeitos
políticos que décadas participam de um processo de lutas para o exercício de sua
cidadania. De acordo com Dagnino:
Esta nova noção de cidadania pode constituir um quadro de referência complexa e
aberto para dar conta da diversidade de questões emergentes nas sociedades latino-
18
A concepção liberal de cidadania vincula-se a uma estratégia das classes dominantes e do Estado para
incorporação política progressiva dos setores excluídos, com vista a uma maior integração social, ou como
condição jurídica e política indispensável à instalação do capitalismo (DAGNINO, 1994, p. 108). Ainda
quanto à visão liberal de cidadania, remetemos a leitura de MARSHALL (1967) em Cidadania, classe social e
status, que define a cidadania constituída pelos elementos civil, político e social. O elemento civil é composto
dos direitos necessários à liberdade individual liberdade de ir e vir, liberdade de imprensa, pensamento e fé,
o direito à propriedade e de concluir contratos válidos e o direito de justiça. As instituições mais intimamente
ligadas aos direitos civis são os tribunais de justiça. Por elementos políticos, se deve entender o direito de
participar no exercício do poder político, como um membro de um organismo investido da autoridade política
ou como um eleitor dos membros de tal organismo. As instituições correspondentes são o parlamento e os
conselhos do governo local. Os elementos sociais se referem a tudo o que vai desde o direito a um nimo de
bem-estar econômico e segurança ao direito de participar, por completo na herança social e levar a vida de um
ser civilizado de acordo com os padrões que prevalecem na sociedade. As instituições mais intimamente
ligadas com ele são o sistema educacional e os serviços sociais (MARSHALL, 1967, p. 63-64).
42
americanas à medida que incorpora tanto a noção de igualdade, como a de diferença
(DAGNINO, 1994, p. 112).
Ainda em Dagnino (1994), a ideia de cidadania implica na perspectiva de estratégia
política que se expressa da seguinte forma:
[...] a ideia de cidadania enquanto estratégia significa enfatizar o seu caráter de
construção histórica, definida, portanto, por interesses concretos e práticas concretas
de lutas e pela sua contínua transformação. Significa dizer que não uma essência
única imanente ao conceito de cidadania, que o seu conteúdo e seu significado não
são universais, não estão definidos e delimitados previamente, mas respondem à
dinâmica dos conflitos reais, tais como vividos pela sociedade num determinado
momento histórico. Esse conteúdo e significado serão sempre definidos pela luta
política (DAGNINO, 1994, p. 107).
Frente ao exposto, constata-se que a relação entre o Estado e a sociedade civil na
atualidade expressa um paradigma que aponta para uma perspectiva da cidadania, consistindo
em um processo em construção, de envolvimento e decisão das camadas populares que
requer, por um lado, a superação de práticas tradicionais de gerir os interesses públicos, e por
outro, possibilitar a realização de uma gestão democrática, emanciparia com o exercício do
protagonismo dos atores sociais e de expansão dos seus direitos sociais em processo de
construção.
Assim, é no bojo dessas transformações que se configura a construção de uma nova
esfera pública na sociedade brasileira. A esfera pública possui suas raízes no âmbito do
processo de organização do regime democrático moderno e diz respeito à constituição e ao
papel desempenhado pelos atores sociais no processo democrático (FEDOZZI, 2000, p. 39).
Nessa direção, essa esfera pública está intimamente entrelaçada com a concepção de
cidadania na modernidade.
A concepção de esfera pública
19
que permeará este estudo baseia-se na ideia de que
sua constituição é parte integrante do processo de democratização pela via do fortalecimento
do Estado e da sociedade civil, expresso pela inscrição dos interesses da maioria nos
processos de decisão potica.
Nesses termos, a esfera pública fortalece-se a partir de um contexto moderno de
sociedade capitalista, conforme expressa Raichelis (2000):
19
As configurações assumidas pela esfera pública no contexto das transformações capitalistas requerem que
sejam refletidas no contexto da formação da sociedade burguesa. Para um maior aprofundamento, remetemos
às contribuições de Habermas (1981), Arendt (1991), Telles (1990). A esfera pública remete a um espaço de
aparecimento e visibilidade. “Tudo que vem a público pode ser visto e ouvido por todos”, e é essa
visibilidade pública que constrói a realidade, forja um mundo comum. Os caminhos de formação dessa esfera
comum são construídos, portanto, pelo discurso e pela ação dos sujeitos sociais que, estabelecendo uma
interlocução blica, possam deliberar em conjunto as questões que dizem respeito a um destino coletivo
(RAICHELIS, 2000).
43
A esfera pública é o Estado e a qualidade das coisas públicas. Trata-se de uma
categoria típica de era do capital, vinculada à evolução histórica da sociedade
burguesa saída da alta Idade dia européia. Essa esfera pública formou-se ao final
do século XVIII, configurando-se em um âmbito específico da sociedade burguesa a
partir do desenvolvimento histórico da cultura material burguesa. A partir da
progressiva emancipação do intercâmbio econômico entre os homens em relação ao
controle estatal, vai se abrindo um espaço social aglutinador dos interesses comuns
ou públicos dos sujeitos privados, que regula as suas relações com o mercado e com
o poder político. Este âmbito social, responsável pela mediação entre sociedade civil
diante do Estado (e também no interior do Estado), denomina-se de esfera pública
burguesa (HABERMANS apud RAICHELIS, 2000, p. 48).
Assim, a esfera blica descortina um universo imenso de fenômenos que se
relacionam às complexas relações entre Estado, Mercado e Sociedade Civil. Nesse campo,
interpenetram-se e imbricam-se as contradições entre as esferas do público e do privado.
Para Fedozzi (2000), o conceito de público na contemporaneidade assume uma
dimensão de um mundo compartilhado com os outros, e não de propriedade privada dos
indivíduos nem do poder estatal. O autor retoma as contribuições de Arendt sobre suas ideias
de espaço público, ao afirmar que:
O espaço público é onde os homens, através de procedimentos discursivos, da
convivência com a pluralidade humana, dos argumentos, podem compartilhar a
construção de um mundo comum legitimado pelo reconhecimento público e
intersubjetivo dos outros. Esse reconhecimento da pluralidade necessita do espaço
público como lugar de reconhecimento da singularidade de cada um (ARENDT
apud FEDOZZI, 2000, p. 41).
Considerando o exposto, não bastam as mudanças legais e de desenhos institucionais,
faz-se necessário trabalhar um processo potico, técnico e pedagógico de absorção de uma
nova cultura de gestão pública pelos organismos blicos, especialmente pelos atores
institucionais e a sociedade em geral, como forma de garantir maior expansão da participação
e decisão dos sujeitos junto às poticas blicas. Em síntese, é imperioso que os referidos
atores institucionais e a sociedade de forma geral, tenham capacidade técnica e política para
participação da gestão, visando oferecer mais qualidade, transparência e eficácia, enfim,
impacto na realidade social e potica da sociedade.
Dessa maneira, constata-se a evolão dos organismos sociais da sociedade civil, em
especial, as ONGs e os movimentos sociais na construção de uma nova relação com o Estado,
no sentido de elaborar estratégias de enfrentamento da problemática social, constituindo-se
parceiros deste, diante da ausência de respostas do Estado às demandas da sociedade,
sobretudo, àquelas dos segmentos mais empobrecidos e dos que sofrem vários tipos de
discriminação, aglutinando em torno de suas carências e da defesa de seus direitos.
44
É sob essa ótica que a gestão pública, mais especificamente, na relação entre Estado e
sociedade civil, toma outras configurações associada às concepções de democracia,
descentralização, participação, cidadania. Observa-se que essa gestão requer uma maior
abertura e dinamicidade do Estado, ou seja, mais comprometido com os interesses blicos.
Em resumo, é importante salientar que essa perspectiva de gestão é pressionada por diversos
atores, dentre eles, a sociedade civil, decorrente das novas demandas desencadeadas pelo
processo de acumulação capitalista em um ambiente globalizado, mas também, dos preceitos
éticos-poticos e das insatisfações populares frente aos descompassos e desajustes dessa
gestão.
É nesse contexto que se averigua o modelo de gestão pública, em construção pós-
Constituição de 1988, que se ressaltam os mecanismos constitucionais com ênfase à
descentralização, à municipalização, ao poder local, como espaço que proporciona a
proximidade das relações entre o Estado e a sociedade, favorecendo a participação e o
controle social.
Como se pode constatar, a relação entre Estado e sociedade civil redefine uma noção
de atuação conjunta através de parceria, que, segundo Mestriner (2005), é aquela que não
desobriga o Estado das suas responsabilidades pelos direitos de seguridade e não retira da
sociedade a autonomia e possibilidades de práticas democráticas.
Conforme analisado em páginas anteriores, verifica-se que, de modo hegemônico, o
caráter do Estado brasileiro é de redução de seu papel e função característicos do Estado
liberal, com um Estado mínimo para o social e máximo para o capital. Mas, no entanto,
ressalta-se que na atuação do Estado encontra-se expressa a sua dimensão de ser o
responsável pela condução das políticas públicas no Brasil.
Dessa maneira comprova-se que, cada vez mais o Estado é chamado a intervir na
realidade, especialmente, junto à problemática social, que remete a uma relação de
compartilhamento de responsabilidades entre o Estado e a sociedade civil, refletindo os
preceitos constitucionais, já expostos neste trabalho. Daí, a necessidade da democratização da
gestão pública como um reforço da cidadania, constituindo-se em fator de democratização da
gestão como um todo e proximidade das relações.
Assim, a construção de uma nova gestão pública aponta para uma sociedade na qual o
reconhecimento dos conflitos em suas manifestações mais amplas possa ser absorvido de
forma crítica e prepositiva pelo conjunto da sociedade e do Estado.
45
CAPÍTULO II
A POLÍTICA DE ASSISTÊNCIA SOCIAL E A AÇÃO SOCIAL ARQUIDIOCESANA
O Estado brasileiro reconhece a Assistência Social como potica blica”,
preconizada pela Constituição Federal de 1988 (arts. 203 e 204) e regulamentada pela Lei
8.742, de 7 de dezembro de 1993: Lei Orgânica da Assistência Social (LOAS), integrando
esta Política ao Sistema de Proteção Social brasileiro
20
com a responsabilidade de garantir a
todos que dela necessitam a provisão de proteção sem prévia contribuição, para o atendimento
de suas necessidades básicas e especiais, na perspectiva dos direitos sociais. Portanto,
rompendo com a Assistência Social enquanto prática negadora dos direitos sociais assumida
historicamente.
Marco importante desse processo são a nova Potica Nacional de Assistência Social
(PNAS/2004) e a Norma Operacional Básica (NOB/2005), que instituem o Sistema Único da
Assistência Social (SUAS/2005), enquanto estratégia de regulamentação e organização dos
serviços socioassistenciais no território nacional.
Observa-se, que nesse processo de construção da Política de Assistência Social, a
participação das diversas organizações da sociedade civil se fez presente de forma marcante,
destacando-se a presença da Igreja Calica e de seus organismos sociais, de forma especial,
em nível de Teresina, a ASA, que, nesse processo de execução da assistência social, buscou
adequar-se ao marco legal constitucional.
O presente capítulo tem como objetivo analisar a Potica de Assistência Social e as
ações da ASA, no sentido de examinar como a Potica de Assistência Social em Teresina se
molda à Potica Nacional de Assistência Social, mediada pela SEMTCAS, com a
materialização do SUAS; bem como, articular essas alterações legais e institucionais com a
atuação da Sociedade Civil, através da ASA, distinguindo como a Política de Assistência
Social evoluiu da perspectiva do assistencialismo para a perspectiva da garantia dos direitos e,
por último, analisar a relação entre a ASA e o poder público municipal quanto a sua natureza,
20
Composto pelas políticas públicas sociais, voltadas para a promoção de um padrão de condição de vida digna
para a população, sendo seu objetivo maior a inclusão social das populações vulnerabilizadas e/ou em situação
de risco, por meio de ações que garantam os chamados mínimos sociais. Portanto, “supõe que os cidadãos
tenham acesso a um conjunto de certezas e seguranças que cubram, reduzam ou previnam os riscos e as
vulnerabilidades sociais” (SPOSATI, 1996).
46
características gerais e evolão da relação na implementação da Potica de Assisncia
Social em Teresina.
2.1 A Lei Orgânica da Assistência Social e a Política de Assistência Social mediada pela
SEMTCAS: a materialização do Sistema Único de Assistência Social (SUAS)
A assistência social é uma prática milenar na história da humanidade. A sua trajetória
hisrica aponta para as práticas de caridade, filantropia, de ajuda e solidariedade como
símbolos da intervenção da sociedade e do Estado.
A construção hisrica da Política de Assistência Social no Brasil expressa a
efetivação de ações de caráter assistencialista, fragmentada e descontínua, que produzem
marcas profundas no processo de constituição dos direitos sociais da população empobrecida.
No Brasil, a Política de Assistência Social teve características diferenciadas com
configurações diversas nos momentos históricos de sua construção. Assim, na tentativa de
resgatar de forma sintética esses passos, a Assistência Social, como campo de ação
governamental, registra no Brasil duas ações inaugurais: a primeira em 1937, com a criação
do Conselho Nacional de Assistência Social (CNSS), constituindo a primeira forma de
regulação da assistência social e, a segunda, na década de 40 do século XX, com a criação da
Legião Brasileira de Assistência Social (LBA), em 1944.
Destaca-se como marca do período a atuação da LBA, com o objetivo de atender as
famílias dos pracinhas combatentes da 2ª Guerra Mundial. Inicialmente, caracterizou-se por
um atendimento materno-infantil, posteriormente esta instituição foi crescendo e sua linha
programática procurou acompanhar as demandas do desenvolvimento econômico e social do
país, bem como da populão em estado de vulnerabilidade social. A gestão pública da LBA
foi centralizada, ao longo dos anos, com representações nos 26 Estados da Federação e do
Distrito Federal, com o desenvolvimento de ações em parceria ou complementares às
unidades regionais e locais da LBA, que cresceu por meio da ação conjunta das primeiras-
damas dos Estados e municípios.
No período da ditadura militar, configuram-se como marcas desse momento, a
utilização do planejamento nas ações governamentais como técnica de consenso social,
refletindo o Estado tecnocrático. A exclusão das classes subalternas do contexto decisório e
ampliação dos mecanismos de intervenção governamental reforçam o caráter assistencial das
47
políticas sociais. Dessa forma, o Estado passa a tratar a questão social através da articulação
repressão assistência, como meio de despolitizar as organizações de trabalhadores.
As práticas assistencialistas do Estado ganham mais estrutura e racionalidade,
desenvolvendo-se um aparato estatal que cresce e se burocratiza continuamente, durante todo
o período autoritário, desmembrando serviços, programas e projetos, seguindo a lógica da
segmentação de necessidades, problemas e faixas etárias. (MESTRINER, 2005, p. 164)
Tais práticas eram centralizadas em órgãos como a LBA, que adequava a sua linha
programática aos ciclos de vida
21
das populações mais vulneráveis, na ótica de promover o
desenvolvimento social e comunitário. E ainda, a LBA estabeleceu ampla parceria com
entidades filantrópicas, governos estaduais, municipais, Confederação Nacional dos Bispos no
Brasil (CNBB), Associação de Pais e Amigos Excepcionais (APAEs), Caixa Econômica
Federal, dentre outros.
É bem verdade que o Estado brasileiro, antes e durante o período da ditadura, sempre
enfrentou a questão da pobreza de forma casuística, descontínua, sem efetividade e sem
planejamento, criando uma forma de dependência, apadrinhamento e clientelismo da
população empobrecida. Nesse processo, muitas vezes, os usuários das instituições de bem-
estar não se reconhecem como sujeitos nessa relação, mas como seres passivos e incapazes
frente à sociedade. Conforme argumenta Torres (2002):
A assistência social passa a ser apropriada pelo Estado como forma de controle dos
conflitos sociais, constituindo uma prática de dominação e disciplinamento da luta
de classe por parte da sociedade burguesa. Dito de outra forma, a assistência social
como resultado da relação contraditória entre Estado e Sociedade cujo
administrador é o próprio Estado , reitera a ordem estabelecida e reproduz as
relações sociais, um processo de mascaramento dos conflitos (TORRES, 2002, p.
131).
A partir de 1977, com a criação do Ministério da Previdência e Assistência Social, a
Assistência Social vinculou-se ao Sistema de Proteção Social sem, contudo, definir-se como
unidade da política de Assistência Social no novo Sistema Nacional de Assistência Social
(SINPAS), (NOB/SUAS, 2005). Nesse período, inexistia uma proposta nacional, capaz de
aglutinar de forma estratégica todas as mudanças que foram ocorrendo, levando a ocorrência
de múltiplas experiências em nível dos governo federal, estadual e municipal que nem
sempre convergiam para os mesmos propósitos.
21
Refere-se à organização dos programas por etapas de vida das pessoas, como; crianças, adolescentes, adultos e
idosos.
48
Convém destacar que, no período pós-ditadura, eram crescentes as insatisfações da
população que almejavam respostas mais ágeis e efetivas de uma potica assistencial. Desde
então, as lutas dos diversos setores sociais, como movimentos sociais, sindicatos, partidos
políticos, trabalhadores da área, intelectuais, profissionais liberais, parcelas da igreja,
organizações blicas e privadas entre outros, foram direcionadas para o debate e construção
uma proposta de Lei Orgânica e da Potica de Assistência Social em favor das pessoas em
situação de vulnerabilidade
22
e exclusão social.
Assim, esse debate e mobilização nacional favoreceram para que no final da década de
80, a assistência social assumisse um status de potica pública, com a promulgação da
Constituição brasileira de 1988. A Constituição Federal traz uma concepção para a
Assistência Social brasileira, incluída no âmbito de Seguridade Social e regulamentada pela
Lei 8.742, Lei Orgânica da Assistência Social (LOAS) em 7 dezembro de 1993, como
política social pública.
Desse modo, a assistência social inicia seu trânsito para um campo novo: o campo dos
direitos, da universalização dos acessos e da responsabilidade estatal. A LOAS, então cria
uma nova matriz para a política de Assistência Social, inserido-a no Sistema de Proteção
Social brasileiro e concebendo-a como campo da Seguridade Social
23
, configurando o
triângulo juntamente com a Saúde e a Previdência Social. (PNAS, 2004)
No entanto, constata-se que, nos governos brasileiros, mesmos pós a Constituição de
1988, a execução da Política de Assistência Social ainda reflete elementos de caráter
assistencialista que denotam um mascaramento da responsabilidade do Estado quanto a à
condução da política. Nesse particular, o Estado ao partilhar responsabilidades não deixa
visível a sua primazia na responsabilidade na execução da Assistência Social.
A criação do Ministério do Bem-Estar Social (MBES), em 1989, não afirmou a
condição da Assistência Social como potica blicanem como integrante da Seguridade
Social. No entanto, fortaleceu o modelo de gestão da LBA enquanto presea da gestão
22
O termo refere-se a situações que envolvem pessoas com redução de capacidade pessoal, com deficiência ou
em abandono; crianças e adultos, vítimas das diversas formas de exploração, de violência e de ameaças;
vítimas de preconceito por etnia, nero e opção pessoal; vítimas de apartação social que lhes impossibilite
sua autonomia e integridade fragilizando a sua existência (PNAS, 2004).
23
A noção de seguridade supõe universalidade de cobertura no âmbito da proteção social. Institui-se assim o
reconhecimento do direito como universal, independentemente do vínculo contributivo com o sistema. A
Constituição, ao estabelecer as fontes de financiamento da seguridade, prevê que a mesma deverá ser
financiada por toda a sociedade através de recursos orçamentários dos municípios, dos Estados e da União. É
também constitucional o caráter democrático descentralizado da gestão administrativa do sistema de
seguridade social no país (YAZBEK, 1995).
49
patrimonial e baixa valorização de novos programas pautados na proteção social, inclusão
produtiva, dentre outros.
Nos anos 90, constata-se um simbólico movimento dos municípios pelo protagonismo
municipal na área da Assistência Social. Em 1995, com a criação da Secretaria de Assistência
Social (SAS) vinculada ao Ministério da Previdência e Assistência Social (MPAS), foram
extintos o MBES, a LBA, o Centro Brasileiro para a Infância e Adolescência (CBIA), dando-
se início ao processo de transição de transferências para os Estados das ações desenvolvidas
pela SAS.
Nesses termos, a SAS passou a negociar com os governadores de cada Estado uma
fase de transição para a implementação da LOAS e para o repasse dos serviços e programas
assistenciais, garantindo que elas não sofressem solução de continuidade. Diante disso, os
Estados assumiram os serviços e programas, e a cessão e/ou doação dos prédios das
Superintendências Estaduais da extinta LBA, mediante convênio de cooperação técnica e
financeira, destinavam esse espaços também para a criação dos Conselhos de Direitos das
áreas afins (assistência social, criança e adolescentes, idosos e outros).
Nesse contexto, o governo Fernando Henrique Cardoso, nos anos 90, posiciona-se
com uma forte Ação Voluntaria Cidao, desencadeada com a implantação do Programa
Comunidade Solidária (PCS)
24
. O referido Programa encontra amplitude no seio da Sociedade
Civil que, convocada com esse forte apelo moral e ético, passa a participar do processo de
enfrentamento da pobreza na realidade brasileira. A Sociedade Civil então se movimenta
conforme as suas diversas expressões, através dos movimentos sociais, das associações, das
Organizações Não-Governamentais (ONGs), do Terceiro Setor e outros.
O voluntariado cidadão
25
agrega nos seus grupos e associações e diversos organismos
o desenvolvimento de suas ações com um maior número de participação, segundo Araújo
(2008):
24
Formalizado pelo Decreto-ato s/n de 7 de fevereiro de 1995, o Programa Comunidade Solidária constitui-se
um conjunto de ações governamentais pensadas no sentido de combater situações agudas ou extremas de
pobreza, historicamente presentes na realidade brasileira. Seu objetivo expresso é coordenar as ações
governamentais voltadas para o atendimento da parcela da população que o dispõe de meios para prover
suas necessidades básicas e, em especial, o combate à fome e à pobreza. Portanto, apresenta-se como uma
estratégia de ação, e não como uma estrutura organizacional, de articulação dos três níveis de Governo
(SILVA E SILVA, 2000, p. 72).
25
Refere-se a práticas realizadas por pessoas, embasadas em princípios éticos e morais impregnados de forte
teor participativo (ARAÚJO, 2008).
50
Assim, a ação voluntária cidadão, no âmbito do Estado, serve para fomentar a
participação dos cidadãos nos assuntos que lhes dizem respeito, provocando
sentimentos solidários. E, por outro lado, mediando entre o Estado, público e
sociedade civil, função historicamente ancorada pela filantropia e ou laica, que na
contemporaneidade se vem configurando em outras formas de organização.
Nesses termos, evidencia-se que a ação voluntária cidadã remete a uma iniciativa de
interesses governistas, que mesmo não tendo uma fundamentação legal nas Poticas Públicas,
embasam discursos e práticas do governo, podem ser bastante fluidas em determinadas
administrações e acentuadas ou desaparecerem em outras.
A Constituição Federal de 1988 e a LOAS são consideradas divisores de água, entre o
que Mota (2008) denomina o feitiço da ajuda
26
e a criação de uma política pública,
constitutiva de direitos. Esse divisor expressa perspectivas opostas da Assistência Social, por
um lado, enquanto caridade e ajuda, por outro, como direitos sociais voltados para os
cidadãos.
Quanto à perspectiva dos direitos, o artigo primeiro da LOAS, preconiza:
A assistência social, direito do cidadão e dever do Estado é política de Seguridade
Social não contributiva, que provê os mínimos sociais, realizada através de um
conjunto integrado de iniciativa pública e da sociedade, para garantir o atendimento
às necessidades básicas (LOAS, 1993, p. 7).
Assim, a Assisncia Social é elevada à categoria de potica blica, resguardando,
portanto, como um direito do cidadão e responsabilidade do Estado de provê-la de forma
compartilhada com a sociedade civil, garantindo à população usuária a condição de ser
cidadão.
Para tanto, a LOAS, art. 2, enfatiza que a Assisncia Social tem como objetivos:
I - a proteção à família, à maternidade, à infância, à adolesncia e à velhice; II - o
amparo às crianças e adolescentes carentes; III a promoção da integração ao
mercado de trabalho; IV a habilitação das pessoas portadoras de deficiência e a
promoção de sua integração à vida comunitária; V a garantia de 1 (um) salário
mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que
comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção ou tê-la provida por
sua família (LOAS, 1997, p. 7-8).
Em vista disso, a LOAS define seus objetivos, demarcando a população usuária da
nova política blica, com enfoque na centralidade do atendimento à família, nas diversas
áreas de abrangência de sua competência. Ressalta ainda sua inter-relação com a política da
Previdência Social quando enfatiza a garantia de um sario mínimo para a pessoa idosa e
deficiente.
26
Expressão utilizada por MOTA (2008), referindo-se às ações de cunho assistencialistas, caritativas e
paliativas que tratavam da despolitização da questão social no Brasil.
51
Assim, em consonância com o disposto na LOAS, no art. 4, configura-se um novo
desenho da Assistência Social com a elaboração da Política Nacional de Assistência Social
(PNAS), que se rege pelos seguintes princípios:
I - A supremacia do atendimento às necessidades sociais sobre as exigências de
rentabilidade econômica; II Universalização dos direitos sociais, a fim de tornar o
destinatário da ação assistencial alcançável pelas demais políticas públicas; III
respeito à dignidade do cidadão, a sua autonomia e ao seu direito a benefícios e
serviços de qualidade, bem como à convivência familiar e comunitária, vedando-se
qualquer comprovação vexatória de necessidade; IV Igualdade de direitos no
acesso ao atendimento, sem discriminação de qualquer natureza, garantindo-se
equivalência às populações urbanas e rurais; V Divulgação ampla dos benefícios,
serviços, programas e projetos assistenciais, bem como dos recursos oferecidos pelo
poder Público e dos critérios para sua concessão (LOAS, 1997, p. 8).
Tomando como referência os princípios acima, a organização da Potica de
Assistência Social tem as seguintes diretrizes, baseada na Constituição Federal de 1988 e na
LOAS (1993):
I Descentralização político-administrativa, cabendo a coordenação e as normas
gerais à esfera federal e a coordenação e execução dos respectivos programas às
esferas estadual e municipal, bem como a entidades beneficentes e de assistência
social, garantindo o comando único das ações em cada esfera de governo,
respeitando-se diferenças e as características socioterritoriais locais; II
Participação da população, por meio de organizações representativas, na formulação
das políticas e no controle das ações em todos os veis; III Primazia da
responsabilidade do Estado na construção da Política de Assistência Social em cada
esfera de governo; IV centralidade na família para concepção e implementação dos
benefícios, serviços, programas e projetos (PNAS, 2004, p. 32-33).
As diretrizes referenciadas acima traduzem o redesenho da política de Assistência
Social, que requer estabelecer consonância com a realidade nacional de alterações
constitucionais do formato das políticas públicas.
Do exposto, foram definidos os objetivos da Política Pública de Assistência Social que
consistem em:
Prover serviços, programas, projetos e benefícios de proteção social básica e, ou,
especial para famílias, indivíduos e grupos que deles necessitarem; Contribuir com a
inclusão e a equidade dos usuários e grupos específicos, ampliando o acesso aos
bens e serviços socioassistenciais básicos e especiais, em áreas urbanas e rurais;
assegurar que as ações no âmbito da Assistência Social tenham centralidade na
família, e que garantam a convivência familiar e comuniria (PNAS, 2004, p. 33).
Nesse cenário, o público usuário da Potica de Assistência Social se redefine, com
centralidade na família, constituída de cidadãos e grupos que se encontram em situação de
vulnerabilidade e riscos, tais como: famílias e indivíduos com perdas ou fragilidades de
vínculos de afetividade. Convém ressaltar que as mudanças ocorridas no âmbito da
Assistência Social Pública alteram, inclusive, a concepção do usuário que, da condição de
52
objeto das práticas assistenciais, passa para a condição de “sujeito de direitos”, enfim,
cidadão”.
A inserção da Assistência Social enquanto uma das poticas que formam o tri da
Seguridade Social aponta para o caráter de política de Proteção Social
27
articulada com outras
políticas do campo social, voltadas para a garantia de direitos e de condições dignas de vida
para a população que necessita. Nesse âmbito, a Assistência Social, enquanto Política Pública
de Proteção Social, deve garantir a segurança de sobrevivência (de rendimento e de
autonomia); de acolhida; de convívio ou de vivência familiar.
Assim, o desenho da Seguridade Social remete-nos a sua compreensão no seio do
processo das transformações econômicas e políticas que se instalam na realidade brasileira
que conformam uma unidade contraditória. Segundo Mota (2008):
As políticas que integram a seguridade social brasileira longe de formarem um
amplo e articulado mecanismo de proteção, adquiriram a perversa posição de
conformarem uma unidade contraditória: enquanto avançam a mercantilização e
privatização das políticas de Saúde e Previdência, restringindo o acesso e os
benefícios que lhe são próprios, a assistência social se amplia, na condição de
política o contributiva, transformando-se num novo fetiche de enfrentamento à
desigualdade social, na medida em que se transforma no principal mecanismo de
proteção social no Brasil (MOTA, 2008, p.134).
Constata-se, pois, a afirmação da Assistência Social como um forte mecanismo de
proteção social no enfrentamento das desigualdades sociais. Entretanto, a análise da
assistência social como política de proteção social remete à compreensão do processo
contraditório que se estabelece no trida seguridade social que institui estabelece restrições
de direitos nas diferentes poticas que comem a seguridade.
Denota-se que o Sistema de Proteção Social brasileiro amplia a abrangência e
organização da política, expressa na Potica Nacional de Assistência Social e no Sistema
Único de Assisncia Social (SUAS), investido da lógica da universalidade da proteção social,
no entanto, o deixa de expressar as contradições contidas no seu bojo (MOTA, 2008).
Face a esse contexto, segundo Mota, o que se constata na realidade é:
27
Entende-se por Proteção Social as formas “institucionalizadas que as sociedades constituem para proteger
parte ou o conjunto de seus membros. Tais sistemas decorrem de certas vicissitudes da vida natural ou social,
tais como a velhice, a doença, o infortúnio, as privações. Nesse conceito, tanto as formas seletivas de
distribuição e redistribuição de bens materiais (como a comida e o dinheiro), quanto os bens culturais (como
os saberes), permitiram a sobrevivência e a integração, sob várias formas na vida social. Ainda, os princípios
reguladores e as normas que, com intuito de proteção, fazem parte da vida das coletividades” (DI GIOVANNI
apud PNAS, 2004, p. 31).
53
Por um lado, o mercado passa a ser uma mediação explícita; de outro, a expansão da
assistência recoloca duas novas questões: o retrocesso no campo dos direitos
consolidados na esfera da saúde e da previdência e a relação entre trabalho e
Assistência Social em tempos de desemprego e precarização do trabalho. O
desdobramento do Brasil real parece indicar que, mais uma vez, o grande capital
utiliza o social como pretexto para ampliar seu espaço de acumulação (MOTA,
2008, p. 134).
Contudo, apesar das contradições implícitas no Sistema de Seguridade Social
brasileiro, expressa na Política de Assistência Social, referenciadas anteriormente, o
significa que não se estejam implementando mecanismos que fortaleçam a potica, na
perspectiva pública, como direito do cidadão e dever do estado. Nessa direção, tem-se a
implantação do SUAS
28
.
É assim, que no governo Luís Inácio Lula da Silva (2003 a 2005), a Política de
Assistência Social é impulsionada na afirmação dos direitos sociais e de um redesenho de sua
organização. Esse impulso deu-se a partir de um amplo movimento de reflexões e debates
realizado pelos atores sociais, gestores e técnicos institucionais e categorias de profissionais
que lidam com a potica acerca da necessidade de reorganização da Assistência Social,
resultando na PNAS (2004) e na NOB e SUAS (2005), como ferramentas de regulação dessa
política.
A Potica Nacional de Assistência Social (2004), que possui como instância
coordenadora da potica o Ministério de Desenvolvimento Social e Combate à Fome
(MDS/FOME ZERO), preconizou o estabelecimento de novas bases para a relação entre
Estado e Sociedade Civil, materializando-se mediante a organização dos eixos estruturantes
do SUAS, mencionados anteriormente. O SUAS fundamenta-se em um modelo de gestão
participativa e descentralizada, que robustece e organiza as ações de Assistência Social.
Assim, o SUAS constitui-se:
Na regulação e organização em todo o território nacional das ações
socioassistenciais. Os serviços, programas, projetos e benefícios têm como foco
prioritário a atenção às famílias, seus membros e indivíduos e o território como base
de organização, que passam a ser definidos pelas funções que desempenham, pelo
número de pessoas que deles necessitam e pela complexidade. Pressupõe, ainda,
gestão compartilhada, cofinancia-mento da política pelas três esferas de governo e
definição clara das competências técnico-poticas da União, Estados e Distrito
Federal e Municípios, com a participação e mobilização da sociedade civil, e estes
têm o papel efetivo na sua implantação e implementação (PNAS, 2004, p. 39).
28
O Sistema Único de Assistência Social (SUAS), foi instituído por meio da Resolução do Conselho Nacional
de Assistência Social (CNAS) de nº 145, de 15 de outubro de 2004 que aprovou a Política Nacional de
Assistência Social, sendo regulamentado apenas em 2005, através da Norma Operacional Básica do SUAS
(NOB).
54
Nesse sentido, o SUAS define e organiza os elementos essenciais e imprescindíveis à
execução da Potica de Assistência Social, possibilitando a normatização dos padrões nos
serviços, na qualidade do atendimento, nos indicadores de avaliação e resultados, na
nomenclatura dos serviços e da rede socioassistencial.
Frente à organização do sistema, o SUAS ainda estabelece os eixos estruturantes do
sistema em conformidade com a política de Assistência Social, como: matricialidade
sociofamiliar; descentralização político-administrativa e territorialização; novas bases para a
relação entre o Estado e a Sociedade Civil, assentadas nos princípios da intersetorialidade e
formação de redes de atendimento; financiamento; controle social e participação popular,
além da potica de recursos humanos, bem como, evidencia elementos inovadores com os
subsistemas de informação, monitoramento e avaliação. Seguindo-se de uma nova
conceituação de vigilância social, proteção social e defesa social e institucional
29
que se
constituem como referências para a organização dos serviços socioassistenciais no SUAS
(PNAS, 2004).
O conjunto dos elementos expostos acima configura o desenho da potica de
Assistência Social pós-Constituição Federal de 1988 e expressam as suas dimensões na
atualidade. Entretanto, salienta-se que esse processo de consolidação da LOAS e PNAS
consiste em grandes desafios que envolvem, dentre outros aspectos, o convívio do arcaico e
do novo, do conservadorismo e da democracia, dificultando a sua implementação tal como foi
concebida. Essa análise expressa os resquícios históricos das práticas assistenciais presente
ainda na gestão da Política de Assistência Social, confrontando-se com uma nova legislação
que preconiza os direitos sociais.
29
Os termos “vigilância social refere-se à produção, sistematização de informações, indicadores e índices
territorializados das situações de vulnerabilidades e risco pessoal que incidem sobre as famílias/pessoas nos
diferentes ciclos de vida (crianças, adolescentes, jovens, adultos e idosos); pessoas com redução da
capacidade pessoal, com deficiência ou em abandono; crianças e adultos, vítimas de formas de exploração, de
violência e de ameaças; vítimas de preconceitos por etnia, gênero e opção pessoal; [...]. Vigilância sobre os
padrões de serviços de Assistência Social, em especial aqueles que operam na forma de albergues, abrigos,
residências, semirresidências, moradias provirias para os diversos segmentos etários. Os indicadores a
serem construídos devem mensurar no território as situações sociais e violação de direitos [...]. Quanto à
Proteção Social, refere-se à segurança de sobrevivência ou de rendimentos e de autonomia: segurança de
convívio ou vivência familiar e segurança de acolhimento. E, por último, a Defesa Social e institucional, que
se refere à proteção básica e especial, e deve ser organizada de forma a garantir aos seus usuários o acesso ao
conhecimento dos direitos socioassistenciais e sua defesa. São direitos socioassistenciais a serem assegurados
na operação do SUAS a seus usuários: direito ao atendimento digno, atencioso e respeitoso, ausentes de
procedimentos vexatórios e coercitivos; direito ao tempo, de modo a acessar a rede de serviços com reduzida
espera e de acordo com a necessidade; direito à informação, enquanto direito primário do cidadão, sobretudo,
àqueles com vivências de barreiras culturais, de leitura, e limitações físicas; direito do usuário ao
protagonismo e manifestação de seus interesses; direito do usuário à oferta qualificada de serviço; direito de
convivência familiar e comunitária” (PNAS, 2004, p. 42-43).
55
Às alterações constitucionais e à implantação da Política blica de Assistência
Social, tem-se, em nível dos Estados e municípios, o debate em torno da PNAS e do
reordenamento político-administrativo para a sua implementação, face à legislação vigente,
que provoca uma ampla participação dos gestores, dos atores institucionais, dos atores sociais,
e, principalmente, da categoria dos assistentes sociais por construir coletivamente o redesenho
da PNAS, na perspectiva do SUAS.
Nesse sentido, o município de Teresina, seguindo a tendência nacional, dá início ao
processo de descentralização e reordenamento institucional nos primeiros anos da década de
90, procurando criar condições para a consolidação dos dispositivos constitucionais no campo
das poticas sociais. Tal fato ocorrerá num contexto em que a administração pública estará
sob o comando do Partido Social Democrata do Brasil (PSDB), que elege, em 1992, para um
terceiro mandato municipal o professor universitário Raimundo Wall Ferraz, que não
completa o mandato, por motivo de falecimento. A prefeitura passa a administração ao então
vice-prefeito, Francisco Gerardo, até 1996, quando assume o candidato do mesmo partido,
Firmino Filho, para o mandato de 1997 a 2004 (RODRIGUES, 2004), reelegendo-se nesse
ano o seu sucessor, lvio Mendes, para o mandato de 2005 a 2008, e reeleito para um
segundo mandato, de 2009 a 2012.
O processo de regulamentação da Assistência Social em Teresina ocorre com a
institucionalização do Conselho Municipal de Assistência Social (CMAS) a partir de 1996. A
força do processo de descentralização, municipalização, controle social e participação
colocam a Assistência Social no patamar de política pública no município de Teresina.
No entanto, anterior a esse processo, é importante que se examine a trajetória da
Assistência Social pública no Município de Teresina. Essa trajetória apresenta os
desdobramentos da assistência social em nível de Brasil, com marcas profundas da potica
clientelista e paternalista.
A Prefeitura Municipal de Teresina estruturou inicialmente os serviços assistenciais
com a criação do Serviço Social dos Servidores Municipais (SERSOM), em 1967, na
administração do prefeito Jofre Castelo Branco, vinculado à Secretaria Municipal de Saúde e
BemEstar Social, atualmente Fundação Municipal de Saúde (FMS), tendo como presidente a
primeira-dama D. Benedita Castelo Branco. O SERSOM tinha como finalidade prestar
atendimento direto aos servidores da PMT, principalmente aos garis, numa perspectiva
assistencialista e de caráter paliativo, mesmo com a presença de um profissional de Serviço
Social. É o que diz um documento da Prefeitura de Teresina de 1986:
56
O SERSOM surgiu face às necessidades dos garis que reivindicavam
frequentemente ao gabinete do prefeito os mais diversos benefícios: medicamentos,
funeral, hospitalização, pequenos empréstimos financeiros, etc.[...] daí a iniciativa
da primeira-dama em satisfazer tais necessidades, começando a atendê-los no
próprio prédio da prefeitura. Com isso os serviços foram sendo ampliados,
recebendo apoio técnico de uma assistente social e outros voluntários nas
comemorações festivas para com os filhos dos garis, Semana Santa com cestas
básicas de alimentos, etc (PMT/SEMTAC, 1986, s/p).
No período que se segue, de 1979 a 1985, o SERSOM passou a denominar-se Serviço
Social do Município, tendo continuidade com a mesma sigla do período anterior, com
extensão de suas ações apenas em nível institucional. No entanto, nesse período, a realidade
brasileira, e consequentemente, a teresinense, passa por mudanças estruturais na ordem
econômica, acarretando maior concentração de riquezas e poder, endividamento externo,
ampliação do papel do Estado e a adoção de medidas de cunho eminentemente recessivo para
o ajuste da economia. Com essa realidade, a pobreza, a fome, o desemprego, a violência
ganham expressão assustadora. As forças sociais que antes estiveram apáticas reaparecem e se
expressam através dos movimentos populares, exigindo do poder público o enfrentamento da
problemática social (PMT/SEMTAC,1986). Por conta dessa realidade, justifica-se a
ampliação das ações do SERSOM com medidas de enfrentamento para a problemática que o
município passa a expressar.
É nesse cenário que o SERSOM, em decorrência do agravamento dos problemas
sociais na cidade de Teresina, amplia a extensão de sua intervenção para além do âmbito
institucional, passando a abranger a totalidade da realidade do município de Teresina. Nesse
contexto, o SERSOM passou a desenvolver as seguintes ações, segundo o documento da
prefeitura de Teresina (1986):
Incentivo ao aleitamento materno, formando grupos de gestantes na periferia com
orientação educativa, confecções de enxoval do bebê pelas próprias gestantes e pré-
natal; Implantação do “Banco de Leite” na maternidade D. Evangelina Rosa;
ampliação da rede de oficinas de produção, nos bairros: Cidade Satélite (oficina
escola Polivalente), com grupos de corte e costura, bordados à mão e à máquina; e
Parque Alvorada (oficina de cerâmica); realização dos primeiros convênios com a
LBA e RONDON, dentre outras (PMT/SEMTAC, 1986, s/p).
A Política Social de então tinha característica assistencialista-promocional-educativa,
destinando-se ao atendimento dos servidores e das pessoas carentes da comunidade, dando
ênfase à formão de grupos de produção e promoção de cursos de capacitação profissional.
No período de 1986 a 1988, agora com o então Prefeito Wall Ferraz, tem-se a
mudança de SERSOM para a Secretaria Municipal do Trabalho e Ação Social (SEMTAC),
como resultado das alterações nas estruturas organizativas e políticas para atender as
57
demandas da população que exigia respostas diferentes dos governos anteriores, como
atendimento em sistema de creches, geração de emprego e renda e organização comunitária.
Portanto, a SEMTAC representa essa resposta enquanto reestruturação administrativa da
Prefeitura, oportunizando a abertura de uma relação entre poder executivo e a população, com
uma prática voltada para o incentivo à organização e à autonomia popular. Nesse período,
destacam-se a oferta de serviços de creches, lavanderias nos bairros, formação de
cooperativas com oleiros, criação de rádio comunitária, instalação de oficinas de produção,
dentre outros.
Salienta-se que os serviços assistenciais existentes até o SERSOM não foram banidos
das ações municipais, requerendo da SEMTAC, nesse momento, uma reorientação, tendo em
vista a ampliação dessas ações. Conforme documento da Prefeitura de Teresina de 1986:
A administração desse período, pautada na organização popular, não negou a
assistência, mas a canalizou para a conquista de direitos e reconhecimento da
cidadania. [...] essa administração inaugurou um relacionamento novo, político,
baseado em critérios técnicos, o que, sem dúvida, contribuiu de maneira relevante
para o crescimento da cidadania na capital piauiense (PMT/SEMTAC, 1986, s/p).
No bojo da perspectiva de organização e autonomia comunitária seguiram-se as
administrações municipais com a SEMTAC, realizando convênios com a Fundação Nacional
de Bem-Estar do Menor (FUNABEM) e LBA, no que tange a ações relacionadas à saúde, à
educação e ao trabalho. Cabe destacar que a saúde e a organização da mulher consistiram em
uma linha intensa de trabalhos desenvolvidos pela Secretaria, com o fortalecimento de grupos
de geração de renda, de forma a incrementar a entrada da mulher no mercado de trabalho,
aliando-se com a oferta de creches para as crianças das mulheres trabalhadoras. Nesse
período, o controle e a gestão da SEMTAC estavam com forças progressistas
30
, com a
preocupação de organização da população e a mulher era a principal presença nos programas.
Com as alterações constitucionais de 1988 e a LOAS a partir do ano de 1993, tem-se
como já analisado anteriormente, o marco legal para as mudanças de concepção, diretrizes e
objetivos da Assistência Social, enquanto política pública”. Assim, o município de Teresina,
agora, através da Secretaria Municipal do Trabalho e Assistência Social (SEMTAS), a partir
de janeiros de 1996 inicia o processo de descentralização e municipalização das ações de
30
As forças progressistas traduzem a inserção dos novos sujeitos políticos através dos sindicatos, associações de
moradores, conselhos populares, etc, significando uma força política emergente no cenário municipal, criando
condições para que essas forças possam se manifestar de forma a darem suas contribuições no processo de
transformação social e inaugurando um novo período na sua gestão pautado em critérios técnicos e no
estabelecimento de uma nova relação com os movimentos (PMT, 1986).
58
Assistência Social, com vistas ao fortalecimento do poder local, considerando que a força da
cidadania está no município (SEMTAS, 1999).
Nesse intuito, a SEMTAS, visando o fortalecimento do Comando Único de
Assistência Social
31
, passa a implantar as seguintes estratégias (SEMTAS, 1999):
Estímulo de parcerias entre órgãos governamentais e Organizações o-
governamentais; Organização da rede municipal de Assistência Social, Combate ao
assistencialismo que se manifesta através do clientelismo, fisiologismo e tutela dos
pobres, dificultando o exercício da cidadania; combate ao paralelismo de ações,
programas e projetos na área de Assistência Social; garantia de qualidade nos
serviços entre conselhos de direitos das políticas sociais, órgãos e entidades que
desenvolvem ações de assistência social (SEMTAS/PMAS,1999, p. 15).
Face ao processo de fortalecimento do comando único de Assistência Social, a
SEMTAS, pautando-se no princípio de participação social, através das organizações
representativas, busca viabilizar a participação da sociedade na formulação das poticas e no
controle das ações no município, mediante a adoção das seguintes medidas (SEMTAS, 1999):
Realização de fóruns municipais, com o objetivo de avaliar o processo de
municipalização da Assistência Social no município de Teresina; formulação,
implementação de um plano de capacitação dos gestores, conselheiros e executores
do plano Municipal de Assistência Social; realização de campanhas de divulgação
das competências e das instâncias deliberativas e executivas do processo de
municipalização da assistência social, visando fortalecer o caráter democrático e
transparente no cumprimento da LOAS; difusão da LOAS, enfatizando os direitos
de cidadania e valorização do negro, idoso, criança, adolescente, pessoa portadora de
deficiência, HIV e mulher, público-alvo da assistência social; criação de banco de
dados sobre os serviços sociais prestados pela rede pública e privada no município:
seu perfil e qualidade dos serviços; articulação entre os conselhos de direitos das
políticas sociais públicas para a implementação de ações conjugadas de
competências comum; criação de fórum permanente de discussão entre ONG’s,
objetivando a capacitação e enriquecimento político dos setores que atuam na área
social; realização de plenárias para definição de propostas à Lei de Diretrizes
Orçamentárias (LDO) que viabilizem as ações de assistência social no município de
Teresina (SEMTAS/PMAS,1999, p.15).
A partir da implementação do comando único das ações de assistência social em
Teresina em 1999, a SEMTAS passa a denomina-se Secretaria Municipal do Trabalho,
Cidadania e Assistência Social (SEMTCAS), com a finalidade de exercer as funções de
coordenação, articulação, acompanhamento, controle e avaliação destas ações, com destaque
31
O Comando Único significa que em cada esfera de governo existirá um órgão que será a referência da gestão
da política de Assistência Social, para aquela esfera. Enfim, constitui-se no órgão gestor, responsável pela
primazia da condução da Potica de Assistência Social. “A SEMTAS, por constituir-se o comando único de
assistência social no município, tem a função de coordenar e executar ações específicas da área, exerce,
também, o papel de articulador e organizador junto aos demais órgãos públicos municipais, estaduais, federais
e organizações não-governamentais, no sentido de que a Assistência Social seja implementada com propostas
articuladas e integradas (PMAS. 2000 - 2001, p.18).
59
à organização, integração operacional e gestão das entidades/instituições que constituem a
Rede de Assistência Social
32
de inclusão e proteção social. (SEMTCAS/PMAS, 1999)
Subjacente à organização da SEMTCAS na década de 90, tem-se a criação e a gestão
da Secretaria Municipal da Criança e Adolescente (SEMCAD).
33
Assim, faz-se necessário
esclarecer que, a Potica de Assistência Social no município de Teresina até o ano de 2007,
estava com a sua execução subdividida entre dois órgãos públicos, a SEMTCAS, como óro
gestor e executor da política municipal de Assistência Social, e a SEMCAD, órgão
responsável pela execução da política de Proteção Especial à Criança e ao Adolescente,
fortemente embalada pelos pressupostos do ECA. Entretanto, com a nova versão da PNAS e a
configuração do SUAS a partir do ano de 2005, estes dois órgãos integram-se em uma única
gestão no município de Teresina, com a absorção e ampliação das ações pela SEMTCAS e,
consequentemente, com a extinção da SEMCAD em abril de 2007.
Em breves considerações, pode-se dizer que a gestão do Prefeito Silvio Mendes, para
primeiro mandato (2005- 2007), tendo sido reeleito para um novo mandato de (2008-2012),
proporcionou no campo da Política de Assistência Social significativas mudanças no
reordenamento institucional. A partir de então, o Sistema Municipal de Assistência Social se
reorganizou para assumir as suas responsabilidades diante do SUAS.
Assim, decorrente das alterações no âmbito da Política Nacional de Assistência Social,
em janeiros de 2005, a SEMTCAS procedeu ao reordenamento Institucional, considerando a
PNAS (2004) e a NOB/SUAS (2005). Nesse contexto, adotou os programas de Proteção
Social Básica; Proteção Social Especial; Apoio Institucional e concessão de benefícios;
Capacitação e Assessoramento técnico, provocando as mudaas tendo em vista a
implementação da PNAS na perspectiva do SUAS.
Face ao cenário nacional e municipal exposto quanto à trajetória da Assistência Social,
o poder público municipal, através da Secretaria Municipal do Trabalho, Cidadania e
Assistência Social (SEMTCAS), responsável pela execução da Política de Assistência Social
32
Entende-se por Rede de Assistência Social um conjunto articulado e organizado de Programas, Projetos,
Serviços e Benefícios, formando um sistema planejado de proteção social à população vulnerabilizada e/ou
excluída do acesso aos direitos sociais e, portanto, em risco social (PMAS, 1999).
33
A SEMCAD foi criada em 1993, consistindo em um órgão público municipal responsável pela coordenação e
execução das políticas de assistência social e proteção especial voltadas para o atendimento de crianças e
adolescentes, jovens e suas famílias no município de Teresina, em conformidade com o Estatuto da Criança e
do Adolescente e a LOAS. Tem como foco de trabalho o combate ao trabalho infantil, enfrentamento à
violência infanto-juvenil, abrigo, atendimento à criança e ao adolescente de rua, desenvolvimento do
protagonismo jovem, creche e pré-escola, bem como o apoio e orientação sócio-familiar às famílias do
segmento infanto-juvenil atendidas pela SEMCAD. [...] conta para a execução dos seus projetos com a
intersetorialidade de órgãos públicos municipais (PMT/SEMCAD, 2004).
60
no município de Teresina, respalda a sua gestão a partir de então à luz das diretrizes e
princípios de descentralização, participação constante na PNAS, NOB
34
e o SUAS,
redefinidos desde o a partir ano de 2004 e 2005, respectivamente, e já mencionados
anteriormente neste trabalho. A reordenação da SEMTCAS, consolidada em 2007, enseja o
estabelecimento de uma cultura institucional pautada nesses princípios constitucionais, tendo
como finalidade tornar o processo de trabalho da Secretaria compatível com a democracia, a
descentralização político-administrativo com comando único das ações, a participação da
população, através das organizações representativas da sociedade civil, a primazia do Estado
na condução da Política de Assisncia Social e a centralidade na família.
Desde então, o poder público municipal, através da SEMTCAS, empreendeu esforços
no sentido de adequar a organização e a oferta de suas ações ao ordenamento legal e
normativo da área, com vistas à concretização e à consolidação do SUAS. Com o SUAS,
inúmeras mudanças ocorreram no marco teórico, na estruturação organizativa, nos
mecanismos de gerenciamento e controle da Política de Assistência Social no Brasil e, por
conseguinte, em Teresina (PNAS/2004).
Nessa perspectiva, o ano de 2007 foi decisivo pela adoção de uma série de medidas,
dentre as quais: a redefinição da estrutura organizacional
35
da SEMTCAS e o consequente
reordenamento operativo dos seus serviços, programas e projetos para uma atuação com foco
na família e no território
36
, a partir de ações integradas e articuladas entre os serviços
oferecidos pela rede socioassistencial e outras políticas setoriais, conforme preceitua a PNAS
(2004). Cabe ainda destacar que o município de Teresina, a partir do reordenamento
34
Refere-se à Norma Operacional Básica, aprovada, segundo Resolução nº 130, do Conselho Nacional de
Assistência Social (CNAS), de 15 de julho de 2005, que define as bases operacionais legais do financiamento,
do repasse de recursos, da gestão, do controle social e das competências entre os entes federados,
disciplinando a operacionalização da gestão da política de Assistência Social, na perspectiva do SUAS
(NOB/2005).
35
O Reordenamento Institucional da SEMTCAS fundamenta-se na LOAS (1993), PNAS (2004) NOB/SUAS
(2005), tendo-se construído um novo organograma Institucional e as diretrizes para a elaboração do
Regimento Interno da Secretaria. Esse estabelece que a SEMTCAS é o órgão da administração direta,
subordinado diretamente ao chefe do poder executivo municipal responsável pelo planejamento, coordenação
e execução da assistência social, política de seguridade social, que afiança proteção social como direito de
cidadania, preceituados nos artigos 203 e 204 da Constituição federal, regulamentada pela Lei federal
8.742/93 (LOAS) (SEMTCAS, 2007).
36
A vertente territorial faz-se urgente e necessária na PNAS(2004) e NOB/SUAS (2005). Leva em consideração
a alta taxa populacional do país e ao mesmo tempo seu alto grau de heterogeneidade e desigualdade
socioterritorial presentes entre os municípios. Ou seja, o principio da homogeneidade por segmento na
definição de prioridades de serviços, programas e projetos tornam-se insuficientes frente às demandas de uma
realidade marcada pela desigualdade social, exige-se agregar ao conhecimento da realidade a dinâmica
demográfica associada à dinâmica socioterritorial em curso (PNAS, 2004, p.46-47). Assim, a área territorial
insere, além do espaço demográfico, o conhecimento da realidade com o mapa das vulnerabilidades sociais e
a dinâmica socioterritorial.
61
institucional, ajusta-se ao nível de gestão plena
37
proposto pelo SUAS
38
. O SUAS pre
quatro tipos e gestão: dos municípios, do Distrito Federal, dos Estados e da União e, no caso
da gestão municipal, três outros níveis: inicial, básica e plena.
Nesse âmbito, a SEMTCAS, em relação à gestão plena, tem as seguintes finalidades e
competências:
I. Formular e executar, em nível municipal de assisncia social, a operacionalização
do Sistema Único de Assistência Social (SUAS), em articulão com órgãos da
administração pública federal, estadual e municipal e com entidades o-
governamentais; II. Implementar a assisncia social em Teresina como política e
direitos de protão social a ser gerida e operada atras de comando único comão
descentralizada, considerando as especificidades sócio-territoriais do município; III.
Organizar e gerir a rede sócioassistencial municipal, composta pela totalidade dos
benefícios, serviços, programas e projetos Governamentais e Não-Governamentais
existentes em área de abrangência; [...] V. Prover serviços, programas, projetos e
benefícios de proteção social básica e/ ou especial para famílias, indivíduos e grupos
que deles necessitam, assegurando a centralidade na família, a convivência familiar e
comunitária; V. Contribuir para a inclusão com equidade dos usuários da assistência
social e grupos específicos, ampliando o acesso aos bens e serviços socioassistencial
básicos e especiais e possibilitando oportunidades para a conquista de autonomia,
sustentabilidade e protagonismo (SEMTCAS, 2007, p. 1).
Frente ao exposto, procedeu-se ao reordenamento institucional em Teresina,
respeitando os objetivos definidos pela PNAS (2004), de prover serviços, programas, projetos
e benefícios de proteção social básica e de proteção social especial para famílias, indivíduos e
grupos que deles necessitarem; de contribuir com a inclusão e a equidade dos usuários e
grupos específicos, ampliando o acesso aos bens e serviços socioassistenciais básicos e
especiais, em áreas urbanas e rurais; e, ainda, assegurar que as ações no âmbito da Assistência
Social tenham centralidade na família
39
e garantam a convivência familiar e comunitária.
37
A gestão Plena refere-se ao nível de gestão, ao qual o município se encontra. Assim, consiste em um nível de
gestão que reúne condições e responsabilidades mais completas, que insere um sistema municipal de
monitoramento e avaliação por nível de proteção social, capacidade instalada de alta complexidade, possuir
gestor de fundo nominado, e lotado no órgão gestor de assistência social e possuir uma política de recursos
humanos com carreira para os servidores públicos. Deve, ainda, possuir projetos e programas de inclusão
produtiva, programa ampliado do CREAS, vínculo SUAS com entidades parceiras e avaliação de resultados
(SPOSATI, 2006, p. 109).
38
Dentre os 224 municípios do Estado do Piauí, apenas a capital, Teresina, encontra-se habilitada à gestão plena
das ações relacionadas à política de Assistência Social. A gestão plena configura-se como o nível em que o
município tem a gestão total das ações de Assistência Social [...] o gestor, ao assumir a responsabilidade de
organizar a proteção social básica especial em seu município, deve prevenir situações de risco, por meio do
desenvolvimento de potencialidades e aquisições, além de proteger as situações de violação de direitos
ocorridas em seu município. Por isso, deve responsabilizar-se pela oferta de programas, projetos e serviços
que fortaleçam vínculos familiares e comunitários, que promovam os beneficiários do Benefício de Prestação
Continuada (BPC) e transferência de renda; que vigiem os direitos violados no território; que potencializem a
função protetiva das famílias e a auto-organização e conquistas de autonomia de seus usuários
(BRASIL,2005, p. 28).
39
O conceito de família refere-se não apenas ao grupo formado pelos pais ou qualquer um deles e seus
dependentes, mas aos diferentes familiares resultantes de agregados sociais por relações consanguineas ou
afetivas, ou de subsistência e que assumem a função de cuidar dos membros (NOB, 2005).
62
Nessa concepção, as ações socioassistenciais devem afiançar duas formas de proteção: a
básica e a especial, configuradas como:
A Proteção Social Básica tem como objetivos prevenir situações de riscos, por
meio do desenvolvimento de potencialidades, aquisições e o fortalecimento de
vínculos familiares e comunitários. Destina-se à população que vive em situação de
vulnerabilidade social, decorrente da pobreza, privação (ausência de renda, precário
ou nulo acesso aos serviços blicos, dentre outros) e/ou fragilização de vínculos
afetivos, relacionais e de pertencimento social. A Proteção Social Especial tem
como objetivos prover atenções socioassistenciais a famílias e indivíduos que se
encontram em situação de risco pessoal e social, por ocorrência de abandono, maus-
tratos físicos e ou psíquicos, abuso sexual, uso de substâncias psicoativas,
cumprimento de medidas socioeducativas, situação de trabalho infantil, entre outras
(NOB/SUAS, 2005, p.18) (grifo nosso).
Dessa forma, a proteção social propõe-se a afiaar acolhimento e desenvolver
atenção socioassistencial à família e indivíduos, para possibilitar a reconstrução dos nculos
sociais e conquistas de maior grau de independência individual e social. Deve, ainda, defender
a dignidade e os direitos humanos e monitorar a ocorrência dos riscos e do seu agravamento.
Nessa perspectiva, os serviços de proteção social especial caracterizam-se por níveis
de complexidade
40
, hierarquizados de acordo com a especialização exigida naão e se
distinguem, respectivamente, entre serviços de proteção social especial de média
complexidade e de alta complexidade.
Após essa abordagem, o Centro de Referência Especializado de Assistência Social
(CREAS)
41
passa a integrar o SUAS, e deve constituir-se como polo de referência, ser
coordenador e articulador da proteção social especial de média complexidade, e responsável
pela oferta de orientação e apoio especializado e continuado de assistência social a indivíduos
com seus direitos violados, mas sem rompimento de vínculos. Assim, compreende-se que o
CREAS estabelece a materialização do nível de proteção especial de dia complexidade que
40
Os níveis de complexidade configuram-se como de Média Complexidade, compreendendo “[...] aqueles que
oferecem atendimento às famílias e indivíduos com seus direitos violados, mas cujos vínculos familiar e
comunitário não foram rompidos. Neste sentido, requerem maior estruturação técnico-operacional e atenção
especializada e mais individualizada e/ ou acompanhamento sistemático e monitoramento, tais como: serviço
de orientação e apoio cio-familiar; plantão social; abordagem de rua; cuidado no domicílio; serviço de
habilitação e reabilitação na comunidade das pessoas com deficiência; medidas sócio-educativas em meio-
aberto (Prestação de Serviço à Comunidade PSC e Liberdade Assistida LA)”; de Alta Complexidade
“pelos serviços que garantem proteção integral moradia, alimentação, higienização e trabalho protegido para
as famílias e indivíduos que se encontram sem referência e, ou, em situação de ameaça, necessitando ser
retirados de seu núcleo familiar e, ou, comunitário, tais como: atendimento integral institucional; casa Lar;
Reblica; Casa de Passagem; Albergue; família acolhedora; família substituta; medidas cio-educativas
restritivas e privativas de liberdade (semi-liberdade, internação provisória e sentenciados); Trabalho
protegido (PNAS, 2004, p. 39-40).
41
O Centro de Referência Especializado de Assistência Social constitui-se numa Unidade Pública estatal, de
prestação de serviço especializado e continuado de média complexidade a indivíduos e famílias com seus
direitos violados, envolvendo um conjunto de profissionais e processos de trabalho que devem ofertar apoio e
acompanhamento individualizado especializado (MDS, GUIA DE ORIENTAÇÃO, Nº 1, 2007, p. 15).
63
organiza as suas ações nos municípios. Portanto, deve ofertar atenção em situações de risco
pessoal e social por ocorrência de negligência, abandono, ameaças, maus-tratos, violência
física, psicológica, sexual, discriminação social e restrição à vida plena com autonomia e
exercício de capacidades, prestando atendimento prioritário a crianças, adolescentes e suas
famílias, nas seguintes situações:
Crianças e adolescentes vítimas de abuso e exploração sexual; crianças e
adolescentes timas de violência doméstica (física, psicológica, sexual,
negligência); famílias inseridas no Programa de Erradicação do Trabalho Infantil
que apresentem dificuldades no cumprimento das condicionalidades; crianças e
adolescentes em situação de mendincia; crianças e adolescentes que estejam sob
“medidas de proteçãoou medidas pertinentes aos pais ou responsáveis; crianças e
adolescentes em cumprimento da medida de proteção em abrigos ou famílias
acolhedoras, e após o cumprimento da medida, quando necessário suporte à
reinserção cio-familiar; adolescentes em cumprimento de medidas sócio-
educativas de liberdade assistida e de prestação de serviço à comunidade;
adolescentes e jovens as cumprimento de medidas socioeducativas de internação
estrita, quando necessário suporte à reinserção sócio-familiar (MDS, 2007, p. 10).
No município de Teresina existem dois CREAS: o CREAS I
42
, implementado a partir
de 2007, e o CREAS II
43
, instituído no ano seguinte. Esse último deu-se com a reestruturação
dos serviços prestados pelo Programa Sentinela
44
, executado através da parceria entre os
governos federal e municipal e a ASA. Porém, com a sua redefinição em 2008, passa a ser
administrado diretamente pela SEMTCAS. Assim, A partir de então, o CREAS passa a
constituir-se como unidade de referência e contra-referência
45
de situações de violação de
direitos, envolvendo todos os ciclos de vida: crianças, adolescentes, jovens, adultos e idosos.
Dentre as ações e serviços oferecidos pelos CREAS, em Teresina, citam-se o Disque-
Denúncia
46
; Serviço de Enfrentamento à Violência Sexual, envolvendo o abuso e exploração
42
O CREAS I situa-se na Rua Álvaro Mendes, nº 1801, centro/norte de Teresina, e a sua área de abrangência
inclui a região entre os rios Parnaíba e Poti.
43
O CREAS II localiza-se na Rua Angélica, nº 215, bairro Jockey Clube, na zona leste de Teresina (sede anterior
do Programa Sentinela). Sua área de abrangência para atendimento compreende a zona leste e sudeste do
município.
44
O Programa Sentinela/Centro de Referência Criança Cidadã foi implantado em Teresina em 2000, tendo em
2007 recebido a denominação de “Núcleo Sentinela Reviver”. O referido Programa tinha como objetivo
prestar serviço de combate à violência doméstica e a exploração sexual praticada contra crianças e
adolescentes, no âmbito do município de Teresina, possibilitando às vítimas e suas famílias, novas formas de
vivências que favoreçam o desenvolvimento de suas relações sociais e interpessoais. O atendimento era
prestado mediante os serviços de abrigo, apoio terapêutico e psicológico e Disque-Denúncia. Funcionava
onde atualmente funciona o CREAS II.
45
O CREAS deve constituir-se como um polo de referência, coordenador e articulador da proteção social
especial de média complexidade, sendo responsável pela oferta de orientação e apoio especializado e
continuado de Assistência Social a indivíduos e famílias com seus direitos violados, mas sem rompimento de
vínculos. E contra-referência quanto aos encaminhamentos destinados às situações de violação de direitos
que deram entrada no CREAS (BRASIL, 2007, p. 4).
46
O Disque - Denúncia é uma estratégia que possibilita à população, de forma geral, meios de denunciar as
situações de violação aos direitos humanos em Teresina, mediante a ligação telefônica gratuita e anônima, ou
64
sexual contra crianças e adolescentes; Serviço de Orientação e Apoio Especializado à
indivíduos e famílias com direitos violados; Serviço de Orientação e Acompanhamento a
adolescentes em cumprimento de medidas cio-educativas de Liberdade Assistida (L.A) e de
Prestação de Serviço à Comunidade (PSC), bem como, possui a função de articulador da rede
socioassistencial de proteção social especial, no âmbito do seu território.
O CREAS I coordena a rede socioassistencial de proteção social especial, ao qual
estão vinculadas todas as ações, projetos e serviços de média complexidade, executados de
forma direta pela SEMTCAS e/ou em convênio com entidades e organizações de Assistência
Social do município. Dentre esses projetos, destaca-se a ASA/ Projeto Casa de Zabelê, através
da parceria entre a ASA e a SEMTCAS, objeto de análise deste estudo.
No que tange à participação das entidades e organizações sociais na execução da
política de Assistência Social, confronte-se o capítulo III, da Organização e Gestão da Política
de Assistência Social previsto na LOAS (1993) no seu art. , na PNAS (2004) e na
NOB/SUAS (2005), que:
As ações na área de assistência social são organizadas em sistema descentralizado e
participativo, construído pelas entidades e organizações de assistência social,
abrangidos por essa lei, que articule meios, esforços e recursos, e por um conjunto
de instâncias deliberativas composto pelos diversos setores envolvidos na área
(LOAS, 1993, p.10).
Nesse intuito, são consideradas entidades e organizações de Assistência Social da
sociedade civil, segundo o art. da LOAS [...] aquelas que prestam, sem fins lucrativos,
atendimento e assessoramento aos beneficiários, abrangidos por essa Lei, bem como as que
atuam na defesa e garantia de seus direitos” (LOAS, 1993, p. 8).
Nesse sentido, as referidas entidades e organizações sociais devem se inscrever nos
Conselhos de Assistência Social, nos diferentes níveis de governo, conforme a sua esfera de
atuação, para então se fazerem aptas a executarem ações públicas de assisncia social, como
regulamenta a LOAS (1993).
Cumpre salientar que, no Brasil, o Estado sempre incentivou a criação e organização
das entidades de assistência social, transferindo-lhes muitas vezes a responsabilidade pelo
atendimento à população, desobrigando-se de oferecer respostas diretas. Esse estímulo
ocorreu pelo reconhecimento de sua utilidade blica e por uma potica de subvenções e
transferência para a prestação de serviços assistenciais. No entanto, se ressentia de uma
não. Assim, têm-se os seguintes números de telefones disponíveis: CREAS I - 0800 280 5688 e CREAS II
0800 280 5242.
65
legislação específica que regulamentasse a organização, financiamento, controle social e
transparência na gestão dos recursos públicos, como as estabelecidas pela Constituição federal
de 1988, a LOAS, a PNAS, a NOB/SUAS a partir dos anos 90.
Assim, com o SUAS tem-se a exigência da regulação estatal, normatização e
monitoramento dos padrões de atenção que passam a direcionar a relação entre o poder
público e as organizações de assistência social.
No próximo item, examinar-se-á como a ASA, entidade sem fins lucrativos, desdobra
a sua atuação no desenvolvimento da assistência social, percorrendo uma trajetória que se
estende da perspectiva assistencialista, da caridade à perspectiva dos direitos sociais
preconizados nos preceitos legais da Constituição de 1988, pela LOAS (1993), pela PNAS
(2004) e pelo SUAS (2005).
2.2 A Ação Social Arquidiocesana (ASA) e a Assistência Social: da perspectiva
Assistencial para a perspectiva dos direitos na execução da Assistência Social
A assistência ao outro é prática bastante antiga na humanidade, presente nas normas
morais de inúmeras sociedades sob diferentes formas, não se limitando nem à civilização
judaico-cristã nem à sociedade urbano-industrial, que conformam, ao mesmo tempo, práticas
de ajuda e apoio em proveito de interesses dominantes. (TORRES, 2002, p. 129)
No entanto, salienta-se que, historicamente, a concepção de assistência enquanto
mecanismo de ajuda e de solidariedade ao outro não remonta somente aos preceitos cristãos,
que envolve um espírito religioso ainda que não possa prescindir dele, mas também ao
espírito laico dos primórdios da civilização humana.
A concepção de assisncia como ajuda e solidariedade encontra sustentação no
entendimento de que, na humanidade, sempre existirão pessoas a quem o destino reservou o
estigma da pobreza, transformando-as em seres frágeis, incapazes, doentes, e que, por isso,
necessitam da ajuda dos outros para sobreviver. Um dos digos morais que melhor explicita
essa questão é a própria Bíblia, a qual institui a assistência como estatuto de ordem religiosa e
humanitária.
Assim, ainda que a assistência aos pobres possua forte espírito religioso presente na
ação de grupos religiosos, tanto da Igreja Católica quanto de outras confissões, como o
espiritismo, filosofia orientais e religiões evangélicas constitui também em uma prática
realizada por grupos filantrópicos que envolvem instituições não-governamentais, tais como:
Rotary Clube, Lions Clubes, Maçonarias, dentre outras. Entretanto, essa concepção de
66
assistência como ajuda e solidariedade, também norteou as práticas assistenciais de órgãos
públicos, como a LBA, FUNABEM’s etc.
É nessa perspectiva que a Assistência Social na sua trajetória sócio-histórica brasileira
apresenta uma forte identificação com práticas sociais caracterizadas como assistencial, de
filantropia, benemerência, tendo como refencia o voluntariado. Nesse sentido, Mestriner
argumenta que essas práticas consistem:
expressões de altruísmo, solidariedade e ajuda ao outro, envolve desde atitudes
ocasionais até formas institucionais praticadas por organizações sem fins lucrativos;
ou, no campo político, formas de regulação do favor “o toma--- quer pelo
primeiro-damismo, quer pelas concessões de benesses por representantes políticos
(MESTRINER, 2005, p. 13).
Os conceitos de assistência, filantropia, benemerência e voluntarismo presentes na
realização de práticas sociais voltadas para a população empobrecida têm confundido e
escamoteado, ao longo dos processos históricos, as responsabilidades e competências do
Estado e da sociedade, frente ao acirramento das desigualdades sociais que marcam a
trajetória da realidade brasileira.
Os termos em referência apontam para aspectos em comum, constituindo-se no campo
filofico, moral, dos valores, que levam a um voluntarismo que não se realiza no estatuto
jurídico, mas no caráter da relação (inter) pessoal.
A assistência tem lugar onde quer que habitam seres humanos. Nesse sentido, a
assistência configura-se com o seguinte significado:
A assistência, no seu sentido mais lato, significa auxílio, socorro. Onde quer que
haja uma necessidade que o interessado não pode resolver por si e não consiga pagar
com o seu dinheiro a assistência tem o seu lugar. Assistência a famintos, a sedentos,
nus, desabrigados, doentes, tristes, ativos, transviados, impacientes, desesperados,
mal aconselhados, pobres de pão ou pobres de consolação, tudo é assistência,
auxílio, socorro (CORREIA, 1999, p.13 apud MESTRINER, 2005, p. 15).
O termo filantropia sempre esteve presente na história da assistência social no Brasil,
apresentando estreita relação com a provisão das políticas sociais. Sua prática inicialmente foi
regulada pela igreja, em especial a Igreja Católica, depois pelo Estado, no sentido de
reconhecer e até incentivar auxílio e subvenções a organizações sem fins lucrativos, passando
por alianças que condicionaram e ainda condicionam sua atuação. O conceito por vezes gera
certa ambiguidade porque se insere no complexo debate acerca do papel do Estado. Mas no
seu sentido lato, Mestriner (2005) pontua que:
A filantropia (palavra originária do grego: philos, significa amor, e antropos,
homem) relaciona-se o amor do homem pelo ser humano, ao amor pela humanidade.
67
No sentido mais restrito, constitui-se no sentimento, na preocupação do favorecido
com o outro que nada tem, portanto, no gesto voluntarista, sem intenção de lucro, de
apropriação de qualquer bem. No sentido mis amplo, supõe o sentimento mais
humanitário: a intenção de que o ser humano tenha garantida condição digna de
vida. [...] É a preocupação com o bem-estar público, coletivo. É a preocupação de
praticar o bem (MESTRINER, 2005, p.14).
No campo das práticas sociais, tem-se também a forte presença da benemerência, que
se constitui na ação do dom, da bondade, que se concretiza pela ajuda ao outro. A
benemerência tem se expressado, historicamente, nas formas de ajuda, como: esmolas,
auxílios (material ou moral), as mais frequentes. Entretanto, outras formas, como a
institucionalizada, que se expressa pelas obras de internação, como asilos, orfanatos, abrigos.
Ainda no bojo das práticas sociais,
destaca-se a concepção de voluntarismo como fonte
de solidariedade social, na sociedade capitalista contemporânea. Para tanto, faz-se necessária
a compreensão da temporalidade do processo de constituição histórica da solidariedade como
forma de assistir às populações pobres, as desprovidas de meios materiais e de serviços na
sociedade (ARAÚJO, 2008).
Ao longo dos culos, a solidariedade subsiste culturalmente na área da assistência
social relativa à pobreza e transmitida, no fluxo da hisria, por valores judaico-cristãos. Uma
concepção que a aliena das determinações poticas e econômicas (ARAÚJO, 2008). Segundo
Araújo (2008), o voluntarismo pode ser entendido em diversas perspectivas, sendo uma delas,
como:
Convergência para uma das suas faculdades: a vontade, que, por sua vez, pode ser
um desejo, um interesse ou um processo de participação social [...]. É senso comum
que essa vontade manifesta pelos agentes sociais voluntários se prende a princípios
de religiosidade, de inquietações sociais e de compensação psicológica. É nue a
sua visão política e econômica da realidade (ARAÚJO, 2008, p. 41).
Na perspectiva do voluntarismo, a solidariedade é percebida como sinônimo de
fraternidade e justiça benfeitora, e sempre esteve presente nos pressupostos da igreja,
interferindo na ordem social e econômica, nos seus princípios de ordem humana espiritual e
de natureza materialista. A ambiguidade se dá à medida que, agregando interesses e
necessidades, dedicação a um trabalho de ajuda ao próximo, pode ser entendida como uma
disponibilidade muito pessoal, aparentemente de que venha a receber algo em retribuição
(ARAÚJO, 2005).
No âmbito da Assisncia Social, ao empreender uma compreensão acerca da atuação
da ASA, mediante a relação com o poder público municipal de Teresina, através da
SEMTCAS, há que se configurar a ASA em sua natureza doutrinária, evangelizadora, social e
política que a identifica como instituição da Igreja Católica.
68
No Brasil, a Igreja Católica Apostólica Romana compõe-se por um caráter
institucional que reflete contradições, complexidades e heterogeneidades. Esses aspectos estão
presentes em toda a sua trajetória de ser e fazer-se igreja (GUIMARÃES, 1998).
Para a compreensão da atuação da Igreja Católica no Brasil, dentro da sua realidade
social, faz-se necessário dimensionar as diferentes concepções que formatam o seu caráter de
ser igreja. Assim, conforme argumenta Guimarães (1998), a Igreja aponta para um caráter
social, político e moral que se expressa:
De um lado, podemos olhar a igreja católica tomando por base o seu caráter
institucional. Como tal, situando-a como instituição hierarquicamente organizada,
que expressa normas, regulamentos e modos de ser e viver no mundo terreno que
visam à unidade, à universalidade e a coerência de seus propósitos. A igreja-
instituição tem na figura do papa a expressão máxima da autoridade e da busca
permanente dessa unidade, dessa universalidade e dessa coerência e tem na
hierarquia dos seus membros (padres, bispos, arcebispos, diácono, etc.) os
executores e guardiães da instituição e de seus valores. [...] De outro lado, podemos
situar a igreja como detentora, formadora e precursora de valores, hábitos, costumes
e comportamentos que buscam uma sincronia ou não entre o sobrenatural e o
transcendente, o racional e o temporal. Nesse aspecto, a igreja católica é carregada
de sentidos, representações e simbologias. É portadora de dogmas, conceitos e
preconceitos em que estão presentes categorias como e razão, transcendência e
imanência, filosofia e ideologia, matéria e espírito, teologia e política, ética e moral.
Com isso, fé e razão misturam-se, entrelaçam-se e ou assumem polos opostos,
divergentes, antagônicos e irreconciliáveis, que a pode adotar e adquirir uma
natureza suprarracional ao se proclamar acima de todos os valores. [...] e finalmente,
podemos entendê-la como instituição integrante da sociedade, estabelecendo
relações e vínculos com indivíduos, grupos, classes sociais e o estado, dentro desses
parâmetros, os movimentos sociais e lutas da sociedade perpassam visceralmente a
Igreja Católica. Sociedade e Igreja mantêm assim uma relação dinâmica e dialética,
influenciando-se, constituindo-se mutuamente (GUIMARÃES, 1998, p. 27).
Do exposto, salienta-se que as concepções de igreja destacadas acima não se exaurem
nelas mesmas, pois, estão imbricadas umas com as outras. Mas, em todas elas, implícita ou
explicitamente, uma preocupação em propagar os valores cristãos (GUIMARÃES, 1998).
Em vista disso, cabe inserir a ASA no bojo dessas concepções enquanto instituição da Igreja
Católica, na sua relação com o Estado e a Sociedade, relativamente ao seu caráter dinâmico e
contraditório.
Ao empreender este estudo, o se constitui alvo uma análise aprofundada do papel da
Igreja Católica, no entanto, convém estabelecer alguns comentários acerca da sua
constituição. No mundo, e de forma específica no Brasil, essa instituição passou por várias
transformações, dilemas, conflitos em decorrência de movimentos dentro e fora dela,
influenciando e recebendo influência nas diferentes conjunturas da realidade brasileira, como
salienta Yazbek (2000):
69
Sempre houve a presença da igreja católica na rede nonprofit”, particularmente
entre as entidades beneficentes. Estas entidades, de origem assistencialista e
religiosa, cuidam de um vastíssimo conjunto de questões e poucas o
autossuficientes. Cuidam de famílias carentes, desempregados, idosos, crianças e
adolescentes, meninos e meninas de rua, mães solteiras, droga, dependentes,
portadores do vírus HIV, arrecadam e doam alimentos, alfabetizam adultos,
protegem testemunhas, defendem direitos humanos e a cidadania, profissionalizam
jovens e adultos, atendem suicidas, adolescentes gvidas, órfãs, combatem a
violência, defendem o meio ambiente, cuidam de portadores de deficiência, de
creches, de questões de saúde, de atendimento médico domiciliar e de muitas outras
questões (YAZBEK, 2000, p. 29).
Conforme Setubal (1983), a intervenção da Igreja Católica no campo social, em
Teresina, se faz sentir após a chegada de D. Avelar Brandão Vilela no dia 5 de maio de 1956.
Sua atuação se dará tanto no meio social quanto da formação profissional das assistentes
sociais da época. Como diz a autora:
Desde então, esse arcebispo, iniciou um trabalho junto às famílias pobres desta
cidade, contando apenas com a ajuda de voluntários. A ASA não só tentou amenizar
alguns dos problemas das famílias pobres de Teresina como também auxiliou
financeiramente várias estudantes piauienses, para que elas cursassem Serviço
Social em outras escolas da Federação, porém com o compromisso de prestarem
serviço nesta entidade, quando regressassem graduadas (SETUBAL, 1983, p. 14).
Cumpre ressaltar que a Igreja Católica no Piauí, nos anos 50 e 60, não obstante
motivações profundamente eclesiásticas, cria organismos de repercussão social e educacional
de pensamento progressista, como: a Faculdade Católica de Filosofia, o Movimento de
Educação de Base (MEB), além das Organizações Juvenis para Leigos, com destaque para a
Juventude Agrária Católica (JAC), Juventude Estudantil Católica (JEC), Juventude Operária
Católica (JOC), Juventude Universitária Católica (JUC). Os setores mais avançados da Igreja
Católica estimulam um compromisso e engajamento social e político cada vez maior, de
forma a fazer avançar rumo às transformações estruturais mais profundas da sociedade
brasileira, e em especial, do Piauí (CONCEIÇÃO, s/d).
Embalada por esse cerio, a ASA surgiu em 13 de junho de 1956, com a missão de
ser um instrumento de solidariedade e uma ação libertadora da Igreja Católica de Teresina,
baseada na dimensão do anúncio da vida e na sua defesa incondicional e na denúncia das
situações de pobreza.
Nessa perspectiva, Dom Avelar Brandão Vilela, então Arcebispo de Teresina e
fundador da ASA, logo no seu primeiro ano organiza várias obras sociais, como os Centros
Sociais Nossa Senhora de Fátima, Leão XIII e Cristo Rei, onde funcionavam as oficinas de
serraria, carpintaria, sapataria e marcenaria e eram distribuídos donativos (inicialmente a
70
todas as pessoas necessitadas que procuravam os Centros, depois, apenas para as pessoas do
bairro (SETUBAL, 1983). Nesse momento, constata-se o caráter da assistência prestada pela
ASA à população com forte teor de filantropia e benemerência, no mesmo sentido abordado
no texto.
A ASA surge então em meio a um processo histórico, econômico e potico permeado
pela onda econômica do desenvolvimentismo e seguindo-se do regime potico autoritário que
se instalou no Brasil em 1964. Nesse momento, a Assistência Social blica faz-se
caracteristicamente pelas ações de cunho paternalista, clientelista e pela forte presença do
primeiro damismo no cenário brasileiro, especialmente, em Teresina. Evidencia-se, nesse
período, além da ASA, a presença da Legião Brasileira de Assistência (LBA), do Serviço
Social do Estado (SERSE) no desenvolvimento de programas sociais no âmbito da assistência
social.
No final da década de 70, a Igreja Católica em Teresina, por dentro da estrutura
eclesiástica, fortalece os sinais de apoio às causas populares, com a chegada de missionários
italianos, e a presença de voluntários do Movimento de Leigos para a América Latina
(MLAL), iniciando o trabalho de organização de Comunidades Eclesiais de Base (CEB’s),
Comissão Pastoral da Terra (CPT) e as pastorais sociais (Saúde, Operária, Menor) e o
estímulo para as lutas sociais a partir dos bairros de maior concentração de empobrecimento
no município (CONCEIÇÃO, s.d).
Na década de 80, a Igreja Católica, através de Dom Miguel Fenelon Câmara, então
bispo metropolitano da igreja na capital e presidente da ASA, cria o Vicariato da Ação Social
da Arquidiocese de Teresina, tendo por “finalidade promover, articular e integrar as pastorais
sociais, no âmbito da igreja em Teresina. Não basta que existam grandes e belos projetos ou
trabalhos na área social” (ASA, 2000). Dessa forma, torna-se importante que os projetos da
igreja estejam articulados entre si, para que haja harmonia no conjunto e os resultados sejam
mais sólidos e duradouros. Nesse período, percebe-se uma ampliação das ações desenvolvidas
pela ASA funcionando como Entidade guarda-chuva
47
(ASA, 2000). E, nesse processo
hisrico, amplia e profunda o caráter político no bojo do desenvolvimento de suas ações,
repercutindo fortemente a dimensão crítica de denúncia da realidade nos diferentes aspectos
da vida humana.
47
O termo refere-se ao fato de que a Instituição ASA passa a oferecer respaldo legal e jurídico, envolvendo
administrando e incentivando os projetos na área social da Arquidiocese de Teresina, como Projeto Periferia,
Lar da Fraternidade, Centro Maria Imaculada, Alfabetização de Adultos, Projeto Escola Aberta, Casa de
Zabelê, Creche Comunitária Vila Bandeirante, Escola Aberta de Fátima, Lar de Misericórdia, dentre outros
(ASA, 2006).
71
A ASA é uma Organização da Sociedade Civil de Interesse Público (OSCIP), de fins
filantrópicos, reconhecida de utilidade pública
48
municipal, estadual e federal. É devidamente
registrada no Conselho Nacional de Serviço Social (CNAS), Conselho Estadual de
Assistência Social (CEAS) e Conselho Municipal de Assistência Social (CMAS). Segundo
seus objetivos, surgiu para servir aos que se encontram em estado de vulnerabilidade social,
mediante ações direcionadas à promoção humana das populações empobrecidas da
Arquidiocese de Teresina. 53 anos, a ASA vem criando, incentivando e apoiando
programas, projetos e serviços sociais desenvolvidos pela Igreja Católica no município de
Teresina, objetivando combater a exclusão social, através deões que transformem em
oportunidades de vida digna, as duras realidades de miséria, fome, desemprego,
analfabetismo, doenças, discriminação, exploração e desesperança junto às populações
periféricas de Teresina. Como preconiza o relatório de atividades da ASA (2006).
A ASA desenvolve um conjunto de ações centradas nas áreas da assistência social e
saúde, [...] vêm contribuindo na construção coletiva e ecumênica, sedimentando uma
cultura de paz e de partilha. A entidade tem por objetivo promover e executar
programas, projetos e serviços a título gratuito, visando a promoção de pessoas
excluídas, nas áreas de assistência social e de saúde, abrangendo a proteção à
família, à infância, à juventude e à velhice, bem como, portadores de deficiências e
enfermidades, especialmente, aids, hanseníase e câncer, desenvolvidas
principalmente na cidade de Teresina, mas estende-se também a rios outros
municípios que compõem a área geográfica da Arquidiocese de Teresina (ASA,
2006, p. 9).
É importante destacar que nos anos pós-Constituição, a Igreja, setores organizados da
sociedade, os movimentos sociais, buscam pela participação no processo de luta pela
ampliação dos seus direitos sociais. Essa luta está associada à construção democrática da
relação entre o Estado e a sociedade civil marcada pelo processo de institucionalização da
participação dos movimentos sociais na relação com o Estado, o condizendo mais com uma
postura anti-Estado (CARDOSO, 1994). Assim, evidencia-se um intenso movimento em favor
das crianças e adolescentes, em consonância com a luta nacional desencadeada por setores da
sociedade insatisfeitos com o tratamento dado pelo Estado à infância e à juventude
(RODRIGUES, 2004). Em 1987, sob a presidência do Arcebispo de Teresina, Dom Miguel
Fenelon Câmara, a ASA cria o Projeto Periferia, tendo como uma das suas frentes de ação a
48
O reconhecimento da ASA como uma entidade de utilidade pública foi oficializado pelo processo nº
50.212/63, CGC 06.870.091/0001-00, isenta de Inscrição Estadual. Foi reconhecida de Utilidade Pública
Municipal, pela Lei nº 608 de 04 de setembro de 1958 e de Utilidade Pública Estadual, pela Lei nº 3.061 de 11
de dezembro de 1970. Também foi reconhecida de Utilidade Pública Federal pelo processo nº 12.428/94 e
Decreto de 17 de junho de 1996.
72
Pastoral do Menor. Realiza-se, nesse mesmo ano, o I Tribunal do Menor e o Fórum de Defesa
dos Direitos da Criança e do Adolescente (Fórum DCA), com uma forte marca de denúncia
das violações dos direitos da criança e do adolescente.
Ressalte-se que a ASA possui registro nos diversos conselhos de políticas blicas
49
e
setoriais, tendo participado do processo de criação de muito deles, dentre os quais, os
Conselhos municipal e estadual de assistência social e dos Direitos da Criança e do
Adolescente, comissões, comitês e fóruns municipal, estadual dos direitos da criança e do
adolescente, num exercício de protagonismo social e comunitário permanente que interfira na
estrutura da sociedade. Como demonstra a citação:
A consolidação de uma sociedade solidária, justa e igualitária. Em direitos e
oportunidades para todos os cidadãos, livres de discriminação, na qual seja possível
harmonizar a diversidade própria do ser humano e que deve ser enriquecedora de sua
predisposição natural para o desenvolvimento de condições melhores de vida e não
empecilho para permitir o acesso aos meios que proporcionam a dignidade plena aos
cidadãos (ASA, 2006, p. 5).
A probabilidade de atuação da ASA aponta para o desejo de participação, numa
perspectiva de direito sociais. No entanto, é importante demarcar que a participação
institucionalizada, através dos Conselhos, incorre em riscos que podem fragilizar o processo
democrático e legitimar o poder.
Do exposto, constata-se que o trabalho desempenhado pela ASA agrega valores e
princípios que vão além dos valores religiosos, mas preceitos éticos para a construção de uma
sociedade solidária, justa, igualitária e mais humana.
Na atualidade, sua missão institucional:
Está fundamentada na Doutrina Cristã, que inspira e dá coragem na luta pela
construção de uma sociedade justa, fraterna e solidária para todos. Portanto, este
serviço está alicerçado na força da e no amor ao próximo, onde cada programa,
projeto e/ou serviço é sinal e expressão da solidariedade, caminho para que tantos
homens e mulheres renovem-se, quebrando as amarras da opressão e da exclusão
social (ASA, 2006, p. 8).
49
Nesse sentido, a ASA participa dos Conselhos Municipais de Saúde, Educação, de Desenvolvimento Rural
Sustentável, da Pessoa Idosa; dos Conselhos Estaduais dos direitos Humanos, dos direitos da Criança e do
Adolescente, de Educação, da Segurança Alimentar/Fome Zero, da Pessoa Idosa, de Saúde e dos Fóruns
Estaduais de Combate ao Trabalho Escravo, Erradicação do Trabalho Infantil, Economia Solidária, Economia
Popular Solidária; Estadual, de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente e dos Comitês da Criança e
Adolescente, do Semiárido, de combate à Tortura e à Impunidade e, Nacional, de Enfrentamento à Violência
Sexual contra Criança e Adolescente/Ponto Focal Piauí (ASA, 2006).
73
Assim, a ASA, na área da Assistência Social, desenvolve ações de proteção e
promoção à família, à infância, à juventude e à velhice, bem como a pessoas com deficiência,
com particular prioridade às pessoas pobres, mediante programas e projetos voltados para o
atendimento, assessoramento, defesa e garantia de direitos dos usuários da Assistência Social.
Nessa perspectiva, a ASA expande as suas ações e serviços, realizados de forma direta e/ou
em parceria com outros óros e setores da igreja e da sociedade civil organizada.
Ao longo desses anos, a ASA vem desenvolvendo a assistência social mediante a
execução de programas, projetos e serviços que expressam uma identidade de ser igreja
50
.
Alguns em parceria com o poder público municipal, estadual e federal, outros com
organismos estrangeiros. Na atualidade, são desenvolvidos os seguintes serviços na área de
Assistência Social (ASA, 2008):
QUADRO I - Serviços executados pela ASA, na área de Assistência Social, em parceria.
PROJETO
DESCRIÇÃO SUMÁRIA DOS SERVIÇOS PRESTADOS (GRATUITO)
PARCEIRO
ABRIGO CASA DE
PUNARÉ
O Projeto presta atendimento em sistema de abrigo a 15 jovens do sexo masculino, em
situação de risco pessoal e social, objetivando o desenvolvimento de uma ação de
resgate da autoestima destes beneficiários e de sua identidade como pessoa, mediante o
desenvolvimento de atividades dicas, pedagógicas, culturais, sociais e a ampliação de
suas habilidades.
PMT/SEMTCAS
ADOLESCENTE
APRENDIZ
Programa de Formação de adolescentes e jovens aprendizes, mediante a participação
dos beneficiários em atividades e cursos desenvolvidos e ministrados pelo(s)
BANCO(S) e pela ASA e outros eventos de orientação profissional e vocacional, em
Teresina-PI:
BANCO DO BRASIL,
BEP,
BNB, BRADESCO e
REAL
ESCOLA ABERTA
FÁTIMA
O Serviço presta atendimento integral a crianças e adolescentes em situação de risco,
através de jornadas ampliadas à escola formal, desenvolvidas mediante um trabalho
sócio-educativo emancipador, colocado em prática por meio de atividades lúdico-
pedagógicas que colaborem no processo de ensino e aprendizagem, favorecendo a
promoção em níveis escolar e social.
PMT/SEMTCAS
ESCOLA ABERTA
CENTRO
O Serviço presta atendimento integral a crianças e adolescentes em situação de risco,
através de jornadas ampliadas à escola formal, desenvolvidas mediante um trabalho
sócio-educativo emancipador, colocado em prática por meio de atividades lúdico-
pedagógicas que colaborem no processo de ensino e aprendizagem, favorecendo a
promoção em níveis escolar e social.
PMT/SEMTCAS
SENTINELA
REVIVER
Prestação de serviço de combate à violência doméstica e a exploração sexual praticada
contra crianças e adolescentes, no âmbito do município de Teresina, possibilitando às
vítimas e suas falias, novas formas de vivências que favoreçam o desenvolvimento de
suas relações sociais e interpessoais.
Convênio 51/08/TA 006/08
PMT/SEMTCAS
CASA DE ZABELÊ
Ação voltada a prevenir, combater e enfrentar as diversas formas de violência, bem
como reduzir os danos causados pela violência física, psicológica e sexual (abuso e
PMT/SEMTCAS
50
A ASA, como instituição vinculada à Igreja Católica, demarca claramente a sua identidade de ser igreja,
mediante o seu agir cristão presente em todas as suas ações, [...] compreendendo o agir como o verbo do
cristão que não aceita ser feliz sozinho, inquieto diante da difícil realidade que rodeia o mundo, ávido para
que o reino aconteça, levando a todos e a todas a vida em abundância que tanto Jesus Cristo semeou. [...] O
agir é o verbo da cidadania cristã, é o verbo da indignação ética, que não admite a omissão, a passividade
inoperante, a indiferença.[...] O agir é servir diariamente, permanentemente e incansavelmente, a cada pessoa
humana. A Ação que se refere é uma ação da Igreja Católica, construída organicamente por seus agentes,
preferencialmente leigos, que fazem uma igreja missionária e dialogante, chamada a ser sinal no mundo,
sempre fiel ao jeito de Jesus (ASA, 2006, p. 7).
74
exploração) em crianças e adolescentes.
CRAS
Fortalecimento das ações na área da Proteção sica às 7.000 famílias objetivando
prevenir situações de risco por meio do desenvolvimento de potencialidades e
aquisições e do fortalecimento dos vínculos familiares e comunitários, mediante a
atuação de equipe técnica.
PMT/SEMTCAS
CONVIVER
Atendimento a 100 pessoas idosas, tendo em vista a promoção humana e social, através
das seguintes atividades: recadastramento dos idosos, acompanhamento sistemático com
atividades de socialização, recreação, danças, jogos e passeios; comemoração do
aniversariante do mês e festas celebrativas; promoção de palestras sócio-culturais e
distribuição de lanches e almoços.
PMT/SEMTCAS
CRECHE
MANUTENÇÃO
Atendimento em 09 Unidades de creche (Heloísa mara, Padre Alfredo, Nazária, São
Francisco, Santa Maria, Santa Rita, Tia Carminha, Tia Lygia e Vovó Maria e Cristo
Rei) funcionando em regime de 04 e/ou 08 horas, a 486 crianças, de ambos os sexos, na
faixa etária de 03 a 06 anos, em situação de vulnerabilidade social, buscando dar-lhes
condições que lhes favoreçam um desenvolvimento integral: pedagógico, psicossocial e
nutricional.
PMT/SEMTCAS
Fonte: Relatório de Atividades da ASA, Teresina, 2008
Do exposto, acentua-se que a partir do ano de 2008, alguns projetos desenvolvidos
pela ASA em parceria foram redimensionados, no caso, o Projeto Sentinela Reviver que
deu lugar à implantação do CREAS II e o Serviço de Educação de Rua (SER), que passou por
um redimensionamento do ponto de vista técnico das ações desenvolvidas, de forma a atender
todo o público em situação de rua, o mais somente à criança e ao adolescente, mais todos os
ciclos de vida que fazem da rua o seu espaço de convincia. Nesse sentido, passou a integrar
as linhas de ações do CREAS I e II e os educadores de rua passaram a denomina-se Agentes
de Proteção Social (APS).
Face ao leque de ações desenvolvidas na área da Assistência Social pela ASA,
destaca-se que a proteção e promoção à família passa pelos seguintes eixos de ação, conforme
relatório ASA/2006:
Pelo estímulo à escolaridade e alfabetização de crianças, jovens e adultos,
associados às atividades esportivas, culturais, recreativas e espirituais, trabalhando a
formação ampla do cidadão e da cidadã, mediante a intervenção direta de
educadores e educadoras sociais devidamente capacitados. Promoção da integração
ao mercado de trabalho, mediante estímulo e orientação para formação e capacitação
de grupos de produção e geração de renda, com vista à promoção de famílias e
comunidades autossustentáveis. Para tanto, promove cursos profissionalizantes em
diversas áreas, com especial atenção à inclusão digital, mediante estabelecimentos
de parcerias técnico-financeiras. A inclusão das pessoas portadoras de deficiência e
doenças tais como AIDS, hanseníase e câncer, através de processos de habilitação,
reabilitação e de luta em defesa de direitos e garantias (ASA, 2006, p. 9).
A assistência social desenvolvida pela ASA exprime os princípios, diretrizes
consubstanciados na Constituição Federal de 1988, no ECA (1990) e na PNAS (2004),
traduzindo a perspectiva dos direitos sociais e autonomia da população atendida como sujeitos
políticos. No entanto, a ASA, por sua vinculação com a Igreja Católica, possui uma “mística
75
própria de promoção humana e comunitária,que se expressa de forma transversal por todas
as suas ações, configurando a sua identidade religiosa cristã.
No que tange aos princípios que embalam as suas ações, destaca-se a cidadania, que
se constitui no direito de ter direitos, na possibilidade de pertencimento e participação da
sociedade, patamar nimo para a realização da condição humana nas suas dimensões social
e potica (DAGNINO, 1994). Esses princípios acentuam-se nas ações e discursos da ASA,
refletindo na sua atuação frente à realidade social.
No que diz respeito à Mística Cristã, a ASA propugna em sua doutrina católica que
todos tenham vida e vida em abundância!” (Jo 10,10). Sua Mística Cristã faz-se, portanto,
enquanto uma ação cristã que nasce na sociedade. Conforme a citação:
É uma ação social que nasce na sociedade e vive com e para ela, porque é pública,
mas não estatal; comunitária, popular, que promove o protagonismo dos
empobrecidos, das minorias, congregando outras dimenes fundamentais para a
construção do reino: cultural, econômica e política (ASA, 2006, p. 7).
Nesse sentido, a ASA se coloca numa perspectiva de intervenção pública, embora não
possua natureza estatal, mas articula seus interesses doutrinários de ser igreja com a realidade
social do mundo. O Quadro II, aponta nessa dirão quanto às iniciativas própria da ASA na
prestação de serviços assistenciais.
QUADRO II - Serviços executados na área de Assistência Social pela ASA, de iniciativa
própria.
PROJETO
DESCRIÇÂO SUMÁRIA DOS SERVIÇOS PRESTADOS
(GRATUITO)
UNESCO
PROJETO PERIFERIA
O projeto desenvolve ões de assistência social através de
atividades lúdico-pedagógicas de reforço escolar para crianças e
adolescentes pobres atendidos em 09 Centros Educacionais
Comunitários em Teresina: Piçarreira, Heloísa Câmara, Alto
Ressurreição, Frei Damião, Santa Maria da Codipi, São
Francisco, Betinho, Planalto Sul, Vila Concórdia e São José,
mediante a intervenção direta de 39 educadores sociais de
periferia (voluntários).
-
PROJETO
PERIFERIA
CIDADANIA ATIVA: oportuniza melhorias nas condições de
vida da população carente, particularmente de crianças e
adolescentes, com as seguintes linhas de ação: implantação e
capacitação de grupos comunitários de produção; fortalecimento
dos vínculos familiares; fortalecimento organizacional das
comunidades, mediante ações de saúde preventiva e capacitação
comunitária para exercício da cidadania e defesa e garantia no
cumprimento dos direitos básicos garantidos pela C.F/88 e o
ECA. Atinge 06 comunidades periféricas da cidade de Teresina
(Alto da Ressurreição, Boa Esperança, Dom Miguel, Ininga,
Santa Cruz e Vila Verde)
MISEREOR e KZE
76
LIBERDADE ASSISTIDA
COMUNITÁRIA (LAC)
Projeto atua no sentido de executar medida sócio-educativa
mediante ações de assistência aos adolescentes e/ou jovens a
quem se atribuiu autoria de ato infracional, assegurando-lhes
convivência familiar e comunitária. Inicialmente executado com
recursos doados pelo Ministério da Justiça/CNBB-Pastoral do
Menor.
PMT/SEMTCAS
SERVIÇO PASTORAL DO
MIGRANTE
O Serviço atua nas cidades de Teresina e Barras, buscando
suscitar, articular e dinamizar a organização coletiva dos
migrantes, levando-os ao exercício do protagonismo. A ação é
focada na formação política e social; na implantação e
acompanhamento de Projetos de geração de renda; no apoio
emergencial às famílias e acolhimento de migrantes inseridos
nas comunidades, além de Caminhoneiros/Arrumadores e
Migrantes em tratamento de saúde.
Congregação Scalabrinianas
COMISSÃO PASTORAL
DA TERRA - CPT
O Serviço contribui no processo de organização e luta dos
lavradores e lavradoras em 10 municípios piauienses, a partir de
um serviço educativo e transformador, na defesa de uma ampla
Reforma Agrária e na construção de alternativas de
desenvolvimento rural sustentável e solidário, a fim de que a terra
e água sejam coletivizadas e o pão multiplicado na mesa de cada
homem e mulher do campo.
CPT Nacional
PROJETO GIRASSOL
Ação voltada à efetivação do ECA de forma participativa e
articulada com os mais diversos organismos, de todos os níveis e
âmbitos, protagonistas na luta pela promoção, proteção e defesa
dos direitos de crianças e adolescentes, especialmente através de
ações de Combate à Violência Sexual Infanto-Juvenil, em todas
as suas manifestações, através da capacitação de gestores de
políticas públicas, representantes de ONG´s, educadores sociais,
professores, agentes de saúde, Conselheiros Tutelares e de
Direitos, Conselhos Escolares e Grêmios Estudantis, além de
beneficiar diretamente 1.130 crianças, adolescentes e jovens.
PETROBRAS- FOME ZERO
CENTRO DE ATENÇÃO À
PESSOA IDOSA “NOSSA
CASA”
O Centro busca assegurar a dignidade e a valorização integral das
pessoas idosas, atras da promoção humana e espiritual, como
processo de formação continuada, respeitados seus diretos e
deveres, proporcionando uma convivência respeitosa, com seus
familiares e comunidade, tornando-os assim protagonistas de
autorrealização.
PMT/SEMTCAS
Fonte: Relatório de Atividades da ASA, Teresina, 2008.
O quadro II, demonstra os serviços executados na área da Assistência Social pela
ASA, sendo estes de iniciativa própria da instituição. Embora, ressalte-se que esses serviços
se realizem em parceria com outros organismos público nacional ou internacional para a
execução de projetos que tratam de questões que perpassam às áreas da criança e do
adolescente, jovens em cometimento de ato infracional, violência sexual (abuso e Exploração
sexual), pessoa com deficiência, pessoa idosa, a questão da terra e do migrante.
Salienta-se que, as mudanças ocorridas na sociedade, de forma particular na Igreja
Católica e nas suas relações com o Estado e a sociedade, refletem o seu comprometimento
com a realidade social, mediante a ampliação e direção dos projetos executados pela
77
Instituição. Nesse sentido, tem-se a Caminhada da Fraternidade
51
que ocorre 18 anos em
Teresina, com uma grande manifestação popular em torno da fé, solidariedade, cidadania e
justiça social propugnada pelos preceitos da Igreja católica, via ASA.
Assim, a ASA, no seu processo de organização, possui uma Diretoria Estatutária
52
que
administra as ações institucionais, tendo na sua composição um presidente
53
, vice-presidente
executivo, um diretor, primeiro e segundo tesoureiro, primeiro e segundo secretário, e
conselho fiscal, sendo que a última diretoria tem competência para o biênio de 2006 a 2009.
É importante salientar que a abrangência das ações, serviços e projetos desenvolvidos
pela ASA
54
estende-se a outros municípios do Estado do Piauí, como se identifica em seu
relatório de atividades de 2007:
A área de abrangência das ações corresponde à área geográfica da Arquidiocese de
Teresina, podendo atuar em rios outros municípios do Estado, considerando a
necessidade de uma intervenção social junto às comunidades e gestores, buscando
ser um apoio e sinal que estimule nestes municípios/comunidades a sua capacidade
protagonista e transformadora, despertando nelas a vontade de se colocar a serviço
da vida e dos irmãos e irmãs em situação de exclusão e pobreza (ASA, 2007, p. 5).
No que se refere à manutenção e sustentabilidade das ações, projetos e serviços
desenvolvidos, salienta-se que a ASA tem-se destacado na captação de recursos financeiros e
materiais nos diferentes veis: nacional (federal, estadual e municipal), internacional e de
doações de terceiros, através de doações físicas e jurídicas. A transferência dos recursos
financeiros é firmada mediante termos de convênios, termos aditivos, subvenções sociais que
estabelecem a cooperação técnica e financeira entre os organismos financiadores e a
51
A Caminhada da Fraternidade nasceu em 1995, como uma iniciativa do Lar da Fraternidade, um dos serviços
da ASA junto a pessoa com o vírus HIV/AIDS. A Caminhada foi estimulada pelo combate a discriminação e
pela busca de arrecadação de recursos financeiros para a manutenção do serviço. Assim, esse movimento
ampliou-se consistindo na atualidade em uma grande manifestação de fé, partilha, sensibilidade e cidadania,
que arrecadam recursos financeiros viabilizando a manutenção dos serviços, programas, projetos da ASA,
como também de outras entidades reconhecidas que desenvolvem trabalhos sociais (ASA, 2008).
52
A referida diretoria é composta por um sacerdote com formação em jornalismo e de leigos da Igreja Católica
com formação diversa: administrador/professor universitário, advogados, nutricionista, engenheiro civil,cnico
em contabilidade e aposentado (ASA, 2006).
53
O cargo de presidente é assumido pelo Arcebispo da Arquidiocese de Teresina, sendo esse nato e vitalício.
Nesse sentido, o primeiro foi D. Avelar Brandão Vilela, seguido de D. José Frei Falcão, D. Miguel Fenelon
Câmara. A partir de 1995, Pe.Tony Batista que já era Vice-Presidente Executivo da ASA desde 1987, assume a
presidência, ficando no cargo até a atualidade. Decorrente de alterações estatutárias quando ao cargo vitalício
de presidente ocorreram mudanças institucionais no ano 2009, assumindo a Secretária Executiva da ASA, a
Assistente Social Iolanda Sá, com a responsabilidade de execução técnica e administrativa (ASA/2009).
54
Além do Município de Teresina, as ações da ASA atingem os municípios de Monsenhor Gil, Água Branca,
Amarante, Palmeirais, Miguel Alves, Parnaíba, Floriano, Picos, Dom Expedito Lopes, Passagem Franca dentre
outros, com os mais diferentes projeto executados pela instituição.
78
executora, no caso, a ASA. A Em nível dos organismos internacionais, são relevantes as
parcerias com a Organização Internacional do Trabalho (OIT), o Fundo das Nações Unidas
para a Infância (UNICEF), o Misereor/Ministério da Cooperação Internacional e
Desenvolvimento da Alemanha, contando ainda, com o apoio técnico do APD/Centro de
Estatística Religiosa e Investigações Sociais (CERIS), Cáritas-Belga, WORLD CHILDHOOD
FOUNDATION (WCF/Brasil), Cáritas Secours Internacional (CSI/ Bélgica) e outros.
A cooperação técnico-financeira, denominada de parceria, permite a utilização dos
recursos financeiros exclusivamente no custeio de despesas, pagamento de pessoal e
manutenção dos serviços, contribuindo para a continuidade dos serviços de assistência social
e de saúde mantidos pela ASA. Nesse sentido, as parcerias blicas da entidade referem-se a
todos os recursos recebidos para a realização de atividades de interesse público (ASA, 2006).
Nesses termos, tendo em vista a execução dos projetos e ações, a ASA conta com
profissionais de diferentes áreas da Assisncia Social, da Saúde, da Educação, dentre outras,
com remuneração efetivada mediante contrato de trabalho, regido pela Consolidação das Leis
Trabalhistas (CLT). Além disso, dispõe de um conjunto de voluntários, profissionais de
diferentes áreas, e também, por comunitários/leigos das áreas de atuação dos projetos da
ASA, regidos pela Lei do Voluntariado.
55
Nessa perspectiva, a ASA como organismo sem fins lucrativos, historicamente tem
desempenhado na área da assistência social ações de caráter público, dinamizando sua
intervenção na realidade social, ora como complementação de ações blicas, com o
compartilhamento de responsabilidade com o repasse técnico-financeiro, ora de forma
autônoma, traduzindo na sua forma de assistência à população vulnerabilizada socialmente.
2.3 A relação entre a ASA e a SEMTCAS na implementação da Política de Assistência
Social no município de Teresina
Historicamente, a Assisncia Social se organiza a partir das relações com as
organizações sem fins lucrativos. No Brasil, o próprio Estado estimulou a criação e
organização das entidades de assistência social, transferindo-lhes, muitas vezes, a
55
Lei nº 9.608, de 18 de fevereiro de 1998, que trata do trabalho voluntário. Em seu art.1º, considera serviço
voluntário, a atividade o remunerada, prestada por pessoa física a entidade pública de qualquer natureza ou
instituição privada de fins o lucrativos, que tenha objetivos cívicos, culturais, educacionais, científicos,
recreativos ou de assistência social, inclusive, mutualidade. O serviço voluntário não gera vínculo
empregatício, nem obrigação de natureza trabalhista previdenciária ou afim. Em seu Art. consta que o
serviço volunrio será exercido mediante a celebração de termo de adesão entre a entidade, pública ou
privada, e o prestador de serviço voluntário, dele devendo constar o objeto e as condições de seu exercício.
79
responsabilidade pelo atendimento à população e desobrigando-se de oferecer respostas
diretas. Esse estímulo ocorreu pelo reconhecimento de sua missão, como de utilidade pública
e por uma política de subvenções e transferência para a prestação, cuja regulação iniciou-se
ainda na década de 30 (CHIACHIO, 2006).
A Constituição Federal de 1988 destaca no seu art. 204, a descentralização política e
administrativa e a participação da sociedade civil tanto na execução dos programas através
das entidades beneficentes e de Assistência Social, quanto na participação, na formulação e no
controle social das ações em todos os níveis. Essa assertiva legal pressupõe que é no âmbito
do município que os acontecimentos do cotidiano das pessoas ocorrem e requer respostas para
as suas demandas por parte do poder público municipal.
A LOAS, em seu art. 1º, estabelece que a Assistência Social é política de seguridade
social não contributiva, que se realiza através de um conjunto integrado de ações de
iniciativas pública e da sociedade”.
E estabelece, ainda, em seu artigo 3º:
Consideram-se organizações de assistência social aquelas que prestam, sem fins
lucrativos, atendimento e assessoramento aos beneficiários, abrangidos por essa Lei,
bem como as que atuam na defesa e garantia de seus direitos (BRASIL, 1993, p. 9).
Dentre as diretrizes da LOAS, ressalta-se a primazia da responsabilidade do Estado na
condução da política de Assistência Social em cada esfera de governo. Na organização da
política de assistência social se reconhecem que as organizações e entidades de Assistência
Social comem o sistema descentralizado e participativo de assistência social, na atualidade
definido como a rede socioassistencial do SUAS.
A Potica Nacional de Assistência Social (2004) regulamenta o artigo da LOAS,
sugerindo o estabelecimento de uma nova relação entre Estado e Sociedade como eixo
estruturante do SUAS. Nesse âmbito, ganha notoriedade a ideia de construção de uma rede
socioassistencial erguida sob a necessidade prático-operativa de estabelecer parcerias com
instituições da sociedade civil como forma de garantir o funcionamento e a prestação dos
serviços públicos (MOTA, 2008).
Assim, é significativo o número de serviços desenvolvidos em parceria com
organizações de Assistência Social, por intermédio dos órgãos gestores de Assistência Social.
Tais considerações apontam para o significado do termo parceria que se expressa como:
80
A denominação atribuída à cooperação firmada entre organizações privadas e o
Estado, financiada por este último, para cumprimento de responsabilidades públicas
nas atenções à população que demanda Serviços de Assistência Social (CHIACHIO,
2006, p. 58).
Em Teresina, capital do Estado do Piauí, essa realidade não se faz diferente do restante
do país. O poder público municipal vem desenvolvendo uma Potica de Assistência Social,
respaldada nos preceitos constitucionais ratificados na LOAS (1993), na PNAS(2004) e na
NOB/SUAS (2005), e sendo realizada de forma integrada com as demais poticas setoriais,
sociais e econômicas, tendo a SEMTCAS o órgão gestor dessa potica de assisncia social.
Acerca dessa questão, convém salientar que o processo de construção das parcerias não se
constitui uma tarefa fácil, pois requer o empreendimento de um exercício regulado pelo poder
público quanto à prestação de serviço.
Nesse contexto, a SEMTCAS vem desenvolvendo, em parceria com a sociedade civil,
rios projetos sociais expostos no item anterior, sendo significativa a construção dessa
relação no âmbito do município. É o caso da parceria para o desenvolvimento de ações com
os idoso, através de Centros de Convincia, com crianças e adolescentes. Além das já citadas
experiências, têm-se as jornadas ampliadas do Programa de Erradicação do Trabalho Infantil
(PETI), desenvolvidas com associações, ONGs e igrejas, dentre outras.
É nesse prisma que se visualiza a atuação de parceria da ASA, instituição da Igreja
Católica de Teresina, entidade da sociedade civil organizada, de fins filantrópicos e a
Prefeitura de Teresina, via SEMTCAS, com o objetivo de atuar no enfrentamento das
vulnerabilidades sociais, com ações voltadas para a população empobrecida de Teresina.
Ao longo dos anos, a ASA tem vinculado a sua atuação à prestação de serviços sociais
no município de Teresina, estabelecendo com o poder público uma relação de colaboração,
permeada ora por conflitos, ora por contradições, ora por negociações, ora por
complementariedade na execução dessas tarefas.
O processo de atuação da ASA na prestação de serviços públicos no município de
Teresina decorre do período de sua criação, em 1956, até a atualidade. Sua intervenção dá-se
nas diferentes áreas: social, educacional e de saúde, com o desenvolvimento de projetos
sociais, referidos no item anterior.
Não obstante todos esses discursos enfatizados, interessa dizer que a relação de
parceria entre a ASA e a SEMTCAS é fortalecida na década de 90, a partir dos marcos legais
regulatórios, que estabeleceram a relação entre Estado e sociedade, tendo como parâmetro a
Constituição Federal de 1988, a LOAS (1993) e a PNAS. A ASA amplia o seu leque de ações
81
com apoio técnico e financeiro do poder público, nas áreas da saúde, da educação e da
assistência social, através da SEMTCAS como órgão gestor, com a execução dos Projetos
Escola Aberta de Fátima; Escola Aberta do Centro; Projeto Vem pra Casa Criança,
substitdo em seguida pelo Serviço de Educação de Rua e hoje denominado Abordagem de
Rua; Projeto Sentinela/Núcleo Reviver; Projeto Casa de Zabelê; Centro de Convincia para
Idosos; Centro da Juventude dentre outros. Algumas dessas ações eram desenvolvidas
diretamente na relação de parceria com a ASA/SEMTCAS, outros eram mediados pela
SEMCAD, até a sua extinção em 2007.
Salienta-se, por oportuno, que a relação de parceria entre a ASA e a SEMTCAS,
anterior ao SUAS, ocorria com repasse de recursos financeiros para a execução da prestação
de serviço por parte da instituição, numa relação de transferência de responsabilidades do
poder público para a sociedade civil, onde a instituição, com base num Plano de Trabalho,
desenvolvia, com certa autonomia, a prestação de serviços. Nessa relação, o processo de
acompanhamento técnico-operacional por parte da SEMTCAS ocorria mediante repasse de
relatório e prestação de contas dos recursos financeiros. No entanto, esse processo de
construção das parcerias entre o poder público e os organismos da sociedade civil não se
constitui uma tarefa fácil, pois requer o empreendimento de uma ão reguladora
56
da relação
pelo poder público sobre a relação de parceria estabelecida quanto à prestação de serviço de
assistência social.
Frente ao exposto, é importante considerar que, as a implantação do SUAS (2005),
têm-se uma cenário da parceria entre a ASA e a SEMTCAS marcado por maior efetividade
das responsabilidades tanto do poder público, com a primazia da condução da política pública,
quanto da sociedade civil, por intermédio da ASA, com a execução de suas atribuições. Nesse
processo, perpassam os princípios da descentralização, participação e também, do controle
social.
Portanto, o referido processo de parceria efetiva a participação de novos sujeitos
políticos na gestão pública. Assim, segundo Silva (1996, p. 223), essa parceria de ações entre
Estado e sociedade civil tem conferido melhor grau de credibilidade ao uso dos recursos
públicos e ao atendimento das demandas sociais postas. Evidenciam-se esforços para o
56
Os regulamentos legais instituídos pela NOB e pelo SUAS (2005) fundamentam-se na identidade de
propósitos na manutenção do SUAS; na unidade de padrões técnicos, na preservação da autonomia das
organizações, na garantia dos direitos socioassistenciais do usuário e no caráter público das atividades e o
cumprimento dos padrões de qualidade na atenção prestada.
82
compartilhamento das forças do poder municipal e da sociedade civil no desenvolvimento de
projetos sociais, tendo em vista a cidadania de pessoas e grupos vulnerabilizados socialmente.
Nesse sentido, a noção de parceria entre o poder público municipal e a sociedade civil
redefine-se, sendo a compreensão adotada por esse estudo a que o desobriga o Estado das
suas responsabilidades pelos direitos de seguridade e não retira da sociedade a autonomia e
possibilidades de práticas democráticas, conforme apontado atrás.
Assim, no âmbito da política de Assistência Social, a LOAS propõe um conjunto
integrado de ações e iniciativas do governo e da sociedade civil para garantir proteção social a
quem dela necessitar, tendo o Estado a primazia da responsabilidade quanto à formulação. Em
observância à realidade municipal e aos instrumentos normativos, especialmente a NOB e o
SUAS (2005), constata-se que a oferta das ações do SUAS (serviços, programas, projetos e
benefícios) buscam construir de forma integrada pelo poder público e complementarmente
pelas entidades e organizações da sociedade civil, compondo uma rede articulada no sentido
de “evitar o paralelismo, fragmentação e dispersão de recursos”.
Destaca-se ainda, que nesse processo de execução da Política de Assistência social na
perspectiva do SUAS, sem prejuízo do papel do Estado em responder pelas poticas públicas,
amplia-se a arena de sujeitos (parceiros e interlocutores) identificados pela vontade potica de
enfrentar os mecanismos de reprodução das variadas formas de exclusão social. Os
mecanismos de articulação entre iniciativas do poder público e iniciativas da sociedade civil
são fundamentais, devendo estabelecer uma relação de parceria, onde os resultados e alcance
social constituem expectativas de ambos.
Nesse sentido, uma nova dinâmica social torna-se expressiva na realidade brasileira,
que possibilita construir, no cotidiano das ações humanas, processos de implementação de
Políticas Públicas em moldes mais democráticos, com controle social e com base nos
princípios constitucionais e de alargamento dos direitos e da cidadania, a exemplo do que
ocorre no município de Teresina entre a ASA e a SEMTCAS.
Ressalta-se neste cenário, parafraseando Silva (1996, p. 210), a constante busca pela
consolidação de novos processos de desenvolvimento pautados na necessidade de
participação da sociedade civil, em que as Organizações Não-Governamentais, veja-se como
exemplo a ASA, m ampliado o nível de conscientização e fortalecimento dos esforços do
município no processo de implementação das Políticas Públicas.
Nesses termos, é importante destacar a crescente relão entre a ASA e a SEMTCAS,
que não se restringe apenas ao aspecto financeiro e à concessão de recursos material e
pessoal, mas implica uma relação política de inserção nas poticas blicas, de participação
83
na gestão do Estado, portanto, significa participar da sua formulação, monitoramento e
controle social.
Em suma, a ênfase se quanto ao aspecto público, na relação de direito, na
continuidade dos serviços e na responsabilização do Estado. Tem-se, portanto, conquistas
constitucionais e políticas que apontam para rupturas profundas na forma de relação entre o
Estado e Sociedade, outrora clientelista e assistencialista, imprimindo na atualidade
prerrogativas baseadas na perspectiva dos direitos sociais.
84
CAPÍTULO III
A RELAÇÃO DE PARCERIA ENTRE A ASA E PODER PÚBLICO MUNICIPAL,
ATRAVÉS DA SEMTCAS: A EXPERIÊNCIA DO PROJETO CASA DE ZABELÊ
No intuito de estabelecer compreensões analíticas acerca da relação de parceria entre a
ASA e a SEMTCAS, na perspectiva da Política de Assistência Social executada no município
de Teresina, definiu-se pelo Projeto Casa de Zabelê
57
com atendimento à criança e ao
adolescente
58
, como ponto de encontro dessa relação de parceria. Assim, o olhar que norteará
essa análise acontecerá à luz dos princípios esbados pela Constituição Federal de 1988, da
Política Nacional de Assistência Social (PNAS), do Sistema Único de Assistência Social
(SUAS) e do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA).
Para tanto, o capítulo visa traçar as características da relação de parceria entre a ASA e
o poder público municipal, através da SEMTCAS, no período de 2004 a 2008, no âmbito do
Projeto Casa de Zabelê, referindo-se ao processo histórico de constituição dessa parceria,
papéis, atribuições e responsabilidades. Nesse contexto, verificou-se se essa relação de
parceria conformam os direitos sociais preconizados pela PNAS/SUAS e o ECA. Assim, faz-
se relevante identificar e caracterizar os objetivos, finalidades e ações ofertados pelo Projeto
Casa de Zabelê, voltada para o sexo feminino, bem como, configurar a contribuição dos atores
institucionais
59
quanto à avaliação do processo de efetivação da relação de parceria, na
perspectiva dos direitos sociais.
57
O termo indígena refere-se à lenda de Zabelê, uma jovem índia, filha do chefe da tribo dos Amanajós. Ela
amava Metara, índio da tribo dos Pimenteiras, terríveis inimigos dos Amanajós. Zabelê e Metara se
encontravam secretamente. Ela saía dizendo que ia caçar mel na beira do rio Itaim. Mas Mandaú desconfiou
daquelas andanças. É que ele vivia magoado com Zabelê, porque se via preterido por um inimigo e nunca
conseguiria que seu amor fosse correspondido. Mandaú descobriu o local de encontro dos dois. Certa vez,
resolveu levar algumas testemunhas para desmascarar Zabelê. Os dois amantes foram surpreendidos, surgindo
uma briga generalizada. Depois de tanta luta, morreram Zabelê, Metara e Mandaú. O fato deu origem a outra
guerra que durou sete is e sete luas, mas Tupã teve pena dos dois amantes e resolveu transformá-los em
duas aves que andam juntas e cantam tristemente ao entardecer. Mandaú foi castigado e transformado num
gato maracajá, que anda sempre perseguido pelos caçadores [por causa de sua pele]. Zabelê vive cantando
ainda hoje a tristeza de seu amor infeliz (BUGYJA, Piauiense de Oeiras).
58
Segundo o art. 2º, da Lei 8.069/90 (ECA), considera-se criança, a pessoa até doze anos de idade incompletos,
e adolescente aquela entre doze e dezoito anos de idade.
59
Para este estudo, adotou-se para análise das entrevistas a seguinte nomenclatura para designar os atores
institucionais envolvidos na pesquisa e garantir o seu anonimato. Assim, definiu-se para os gestores e técnicos
da SEMTCAS a nomenclatura S1, S2, S3, S4, S5, S6 e S7; para o representante da ASA, a nomenclatura A1
e, para os representantes do projeto Casa de Zabelê, definiu-se a nomenclatura Z1, Z2, Z3, Z4, Z5, Z6, e Z7.
85
3.1 Cenário histórico e institucional da relação de parceria entre a ASA e a SEMTCAS a
partir do Projeto Casa de Zabelê
O Brasil traz para os anos 90 as conquistas legais e seus desdobramentos resultantes
das lutas sociais empreendidas pela sociedade e que estão consubstanciadas na Constituição
Federal de 1988. As alterações decorridas desse processo configuram o desenho do Sistema
de Proteção Social Brasileiro que aponta mudanças significativas para a vida dos cidadãos
brasileiros, particularmente para o segmento infanto-juvenil, que passa a ter reconhecidos os
seus direitos, implicando em um novo tratamento, com a afirmação dos direitos
historicamente negados a esse segmento.
A luta pelos direitos da infância e da adolescência resulta de uma mobilização mais
ampla da sociedade, especificamente, de um esforço coletivo dos mais diversos setores da
sociedade organizada que atuavam com o segmento infanto-juvenil e que almejavam formas
diferentes de conceber e tratar a infância no Brasil, evidenciando a nova concepção de
cidadania e de direitos preconizados na Constituição Federal de 1988. Enfoca-se, ainda, que o
movimento acerca dos direitos da criança e do adolescente, foi também fortemente
influenciado pela legislação internacional como: a I Declaração Sobre os Direitos da Criança,
em 1923, em Genebra. Seguindo-se da Declaração Universal dos Direitos Humanos, em 1948,
promulgada pela Organização das Nações Unidas (ONU) e a II Declaração dos Direitos da
Criança, em 1959, também aprovada pela ONU. Ademais, a Convenção Internacional dos
Direitos da Criança (1989), que deu substancialidade ao artigo 227 da Constituição Federal de
1988, que trata do seguinte:
É dever da família, da Sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente,
com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao
lazer, à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma
de negligência, discriminação, exploração e opressão (BRASIL, 2001, p. 135).
Em 1990, o Brasil passa a ser signatário da Convenção Internacional dos Direitos da
Criança, promulgando a lei 8.069, em 13 de julho de 1990, traduzindo-se no Estatuto da
Criança e do adolescente (ECA). O ECA expressa uma nova concepção de criança e
adolescente, consoante Rodrigues (2004):
O ECA, ao adotar uma visão de universalidade e unicidade que supera as dicotomias
entre infâncias ricas e pobres e então, entre infâncias dos “bons pobres” e a dos
“maus pobres”, estes últimos denominados de “menores”, introduz uma nova
concepção de criança e adolescente. Nesse sentido, fixa a ruptura, do ponto de vista
86
legal, com a doutrina do direito do menor, consignada no digo de Menores de
1979, propugnando a Doutrina da Proteção Integral. Aparecem então os termos
criança e adolescente, sem mais distinção de condição econômica, social, racial e
étnica, estabelecendo-se o reconhecimento da igualdade de direitos e deixando claro
que se trata de seres em desenvolvimento, que devem ser respeitados em suas
peculiaridades e necessidades para que possam crescer saudável e harmoniosamente
(RODRIGUES, 2004, p. 101, grifos da autora).
Assim, o ECA introduz no seio da sociedade uma revolução nos costumes e, de forma
especial, provoca mudanças expressivas na gestão pública, com repercussões na implantação
e implementação das Políticas Públicas, configuradas na Constituição Federal de 1988. Essas
alterações configuram-se em três grupos: mudanças de conteúdo, mudanças de método e
mudanças de gestão, conforme Costa (1993). No primeiro grupo, no que se refere às
mudanças de conteúdo, tem-se a introdução de amplos direitos, individuais e coletivos,
buscando garantir formalmente a cidadania plena de crianças e adolescentes. No segundo,
tem-se a mudança de método referindo-se a “um conjunto de ações governamentais e não-
governamentais, da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios”, assim, a
ênfase é na intersetorialidade e conjugação de esforços do poder público e da sociedade frente
à problemática da infância no Brasil. E, por último, tem-se a mudança de gestão que prevê as
diretrizes da política de atendimento à criança e ao adolescente assentadas nos princípios
contidos no artigo 88, da Constituição Federal de 1988, assim expresso:
São diretrizes da política de atendimento: [...] a municipalização do atendimento;
[...] criação de conselhos municipais, estaduais e nacionais dos direitos da criança e
do adolescente, órgãos deliberativos e controladores das ações em todos os níveis de
governo, asseguradas a participação popular paritária por meio de organizações
representativas, segundo leis federais, estaduais e municipais; [...] criação e
manutenção de programas específicos, observada a descentralização político-
administrativa; [...] mobilização da opinião pública no sentido da indispensável
participação dos diversos segmentos da sociedade (BRASIL, 2004, p. 36).
A partir da invocação desses princípios e diretrizes previstos no ECA, respaldados
constitucionalmente, tem-se o formato da gestão pública no que se refere à política de
atendimento à criança e ao adolescente. Convém ressaltar que esses princípios perpassam as
demais poticas blicas, inclusive a Potica de Assistência Social, com destaque na
municipalização, materializando-se o princípio da descentralização político-administrativa,
com o fortalecimento e a ampliação do poder dos municípios na execução das poticas. A
perspectiva da municipalização respalda-se na lógica da racionalização dos recursos humanos
e financeiros, na medida em que a gestão e execução se articulariam entre órgãos
governamentais e não-governamentais, na proximidade dos munícipes dos governantes. Nesse
87
sentido, prevê-se a criação dos Conselhos de Direito, do Plano Municipal de Atendimento à
Criança e Adolescente e do Fundo da Infância e Adolescência (FIA).
Destaca-se, ainda, nesse processo de reordenamento institucional, a participação da
sociedade de forma conjunta com o poder público para a efetivação da política de
atendimento junto à criança e ao adolescente, tendo em vista o reconhecimento desse
segmento como sujeito de direito e a busca pela igualdade de condições que devem ser
construídas, para assegurar acesso a esses direitos. Assim, tem-se, nesse contexto de
participação, a criação do Fórum Nacional Permanente de Entidades Não-Governamentais de
Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente (FDCA), em 1988, repercutindo também a
sua criação nos Estados e municípios, como espaços de debate, autônomos e não
deliberativos, mas que expressam o anseio da sociedade em participar, de forma mais
qualificada e fortalecida, tendo em vista a defesa e a garantia dos direitos do segmento
infanto-juvenil. Os frutos dessa articulação podem ser identificados na crião dos Conselhos
de Direitos, Conselhos Tutelares e outras experiências de Fórum similares (RODRIGUES,
2004).
Em Teresina, essa realidade torna-se evidenciada com a crião do Conselho
Municipal dos Direitos da Criaa do Adolescente (CMDCA), em 1991
60
. É nesse espaço
que ocorrem as discussões iniciais acerca do trabalho com meninas em situação de rua,
segundo a Política Municipal de Atendimento à Criança e ao Adolescente do mesmo ano.
Esse debate é fortalecido pela participação da Arquidiocese de Teresina, através da
ASA/Pastoral do Menor, conforme expressa um documento da ASA de 1996, a saber:
A Arquidiocese de Teresina, através da Pastoral do Menor, vem desenvolvendo
desde 1991, um trabalho de atendimento ao menino e à menina em situação de rua,
direcionado para a conquista de seus direitos básicos de cidadania preconizados no
Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). Com relação à criança e ao
adolescente do sexo feminino, esse atendimento vinha sendo prestado através de um
trabalho de acompanhamento sistemático junto a essas meninas nos espaços da rua,
efetuado pela equipe de rua, composta por educadores sociais que desenvolviam o
trabalho de observação, abordagem, conquista e encaminhamentos dessas meninas
para as unidades de atendimento: Casa Maria Menina”, que se destinava a acolher
meninas em situação de rua e/ou prostituídas nas ruas de Teresina, possibilitando o
resgate de sua autoestima, dignidade e autonomia, dando a continuidade ao trabalho
existente na rua, e Casa Madre Savina Petrilli, cujo objetivo é o de "ser moradia
60
O Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente de Teresina (CMDCAT) foi criado no
contexto do advento do ECA, pela lei 2.052 de 06 de janeiro de 1991, e instalado somente em 1992. O
CMDCAT consiste em um órgão de composição paritária que envolve representantes do governo e da
sociedade civil organizada para atuar no âmbito municipal. A composição do CMDCAT consiste de 16
(dezesseis) representantes, sendo 08 (oito) governamentais e 08 (oito) não-governamentais. Sendo que os
representantes do setor governamental são indicados pelo prefeito municipal e os representantes da sociedade
civil são eleitos no Fórum dos Direitos da Criança e do Adolescente (Fórum DCA). Assim, o CMDCAT tem
como objetivo coordenar a política de atendimento à criança e ao adolescente no município de Teresina.
88
daquelas meninas que, uma vez inseridas nas atividades da Casa Maria Menina
manifestam o desejo de sair da rua, mas não querem voltar para a família ou,
simplesmente, não têm para onde ir" (ASA/Proposta de Trabalho da Casa de Zabelê,
1996, p. 4).
É importante ressaltar a preocupação da igreja com a realidade de crianças e
adolescentes do sexo feminino na situação de prostituição infanto-juvenil nas praças e centro
da cidade de Teresina. É louvável a iniciativa da igreja, através da ASA, junto a crianças e
adolescentes, no sentido de efetivação de parcerias com outras congregações religiosas,
embora reconheçam a insuficiência técnica para a efetivação do trabalho. É o que destaca o
depoimento de um dos entrevistados neste trabalho:
Eu, D. Miguel e, também, uma comunidade de freiras na Alemanha, e que ainda
hoje eu não vou dizer nome porque elas sempre quiseram ficar no anonimato, tinha
uma irmã, assim, tão dedicada, e nos fizeram uma proposta de uma parceria: olha,
se vocês topam, a gente ajuda em alguma coisa. E então nós começamos a
experiência que chamamos Casa “Maria Menina”, “Maria Menina” porque tinha a
ver com o santo nome de Maria que era daquela congregação que nos dava ajuda
financeira; e abrimos uma casa que fica pertinho da Cepisa, “Casa Maria
Menina”, e começamos a desenvolver um trabalho, tinha religiosas no meio; era
aquelas meninas que estavam em situação de prostituição, de drogadição, só que as
coisas eram feitas muito, como se diz, na noitiva, sem muita experiência, sem muita
técnica e as coisas andavam (Representante A1).
Ainda nesse contexto, destaca-se a criação da Secretaria Especial da Criança (SEC), da
Prefeitura Municipal de Teresina, através da lei 2.108, de 30 de dezembro de 1991, com o
objetivo de desenvolver uma política de apoio integral às crianças. Sendo que em 14 de
janeiro de 1993, a SEC é transformada em SEMCAD através da lei 2.184 (FERREIRA,
1997). No cenário municipal, demarca a afirmação de uma política de atendimento as crianças
e adolescentes, que traduz uma concepção de criança e adolescente a partir do
reconhecimento dos seus direitos.
Consoante o trabalho desempenhado pela ASA, houve também a iniciativa da extinta
SEMCAD, em trabalhar com meninas em situação de risco pessoal e social. Essa questão
partiu de uma discussão fomentada pelo Conselho Municipal de Direitos, na qual foi
detectada a necessidade de se iniciar um trabalho junto a essa parcela da população,
justificada por um contexto social marcado por diversas situações de violação dos direitos da
criança e do adolescente, tais como: violência sexual (abuso e exploração sexual); trabalho
infantil; situação de rua, drogadição, dentre outras.
Conscientes de que o "atendimento integral à criança e ao adolescente exige esforço
contínuo e articulado de organizações governamentais e não-governamentais, constituindo
89
uma ação potica, é que a SEMCAD e a Pastoral do Menor da Igreja Católica de Teresina,
num esforço conjunto, decidiram firmar um compromisso para atendimento a meninas em
situação de risco na capital. A realidade exigia a necessidade de se repensar e reconstruir
ações eficazes e sistemáticas, de maneira articulada, evitando-se, assim, o paralelismo e a
fragmentação das ações, tão comuns nas políticas públicas, conforme citação abaixo:
Depois de discutido com o conselho dos direitos da criança e do adolescente, se levou a
situação a ser discutida pela igreja, numa tentativa de se buscar uma alternativa de
trabalho com a gente para que se pudesse atingir mais efetivamente essa questão. Por
que a igreja? Porque na época a igreja, através do movimento Folcolares, ela fazia,
desenvolvia um trabalho de apoio àquelas meninas, que viviam na venda do seu corpo
diretamente, através dos encontros nas proximidades da CEPISA e faziam esse
movimento, de apoio cristão, de dar um momento de guarda a elas, de oferecer uma
refeição, um banho, um local para uma dormida. Aí nasceu a Casa Maria Menina que
era justamente coordenada pela Arquidiocese com o apoio do arcebispo arquidiocesano
na época, que era Dom Miguel Câmara, e ele deu um suporte às ações que faziam esse
apoio (Representante A1).
Em 1994, o Núcleo de Pesquisas e Estudos sobre Crianças Adolescentes (NUPEC), da
Universidade Federal do Piauí (UFPI), atendendo a uma solicitação da SEMCAD, realizou
uma pesquisa sobre a situação da Mulher Menina em Teresina, tendo como órgão financiador
o Centro Brasileiro para a Infância e Adolescente (CBIA). Neste mesmo ano, o CBIA também
financiou a publicação de um estudo realizado por alunas do Curso de Serviço Social da
UFPI, que retratava aspectos relevantes sobre a prostituição infanto-juvenil na cidade de
Teresina.
O processo de constituição do Projeto Casa de Zabelê deu-se a partir do ano de 1996,
após diversas reuniões, discussões sucessivas e realização de um diagnóstico executado pela
SEMCAD e a Pastoral do Menor/ASA, através da equipe de rua, que possibilitou o desenho
do fluxo do atendimento às crianças e adolescentes do sexo feminino em situação de risco em
Teresina. Nesse redesenho foram definidas as funções de cada ente na rede de serviço,
evitando o paralelismo de ações, mas possibilitando a continuidade do atendimento, conforme
a situação de cada menina, a saber:
A Casa das Meninas
61
atende a meninas, em regime aberto com atividades sócio-
psico-pedagógicas e de iniciação profissional; a Casa “Maria Menina
62
: funcionará
61
Refere-se à Casa de Zabelê, recebendo inicialmente a referida denominação.
62
Refere-se ao santo nome da Virgem Maria, ainda “Menina” e que dava nome à congregação que apoiava
financeiramente a ASA nessa iniciativa. Sua primeira localização foi na Praça da Costa e Silva, reconhecida
também por Praça da CEPISA, no centro da cidade de Teresina. Atualmente, a “Casa Maria Menina”
funciona no conjunto Habitacional Dirceu Arcoverde (Dirceu I), que atende as adolescentes grávidas com
90
em regime de albergue noturno, atendendo às meninas que, por razões diversas, não
m como retornar ao convívio familiar (ou onde dormir à noite); e a Casa "Madre
Savina Petrilli"
63
destinar-se-á às meninas que se encontram em um estágio de maior
socialização, mas que perderam totalmente o vínculo familiar e que manifestaram o
desejo de residir em uma casa comunitária, com características comuns de uma vida
familiar (ASA/ Proposta de Trabalho da Casa de Zabelê, 1996, p. 05).
Assim, houve o reordenamento do atendimento à menina em situação de rua,
refletindo os princípios contidos no ECA. São três unidades de atendimento, sendo a primeira
resultante da relação de parceria entre a ASA e a SEMCAD, e as duas últimas, de
responsabilidade direta da ASA, que passariam a funcionar articuladas com uma filosofia de
trabalho única, a fim de manter a unidade e coerência da proposta de atendimento. Posto essa
situação, partiu-se para a construção da Casa de Zabelê denominada inicialmente Casa das
Meninas e para a qualificação da equipe que iria desenvolver a nova proposta. Como ponto
de partida, foi realizado o seminário "Sobre a Problemática da Adolescente em Situação de
Risco" com o seguinte objetivo:
Possibilitar uma ampla discussão sobre os referenciais legal, pedagógico,
psicológico e social, a fim de subsidiar uma intervenção político-pedagógica junto à
menina em situação de risco; promover a mobilização da sociedade para combater a
exploração e violência sexual contra crianças e adolescentes (ASA/Proposta de
Trabalho da Casa de Zabelê, 1996, p. 05).
A realidade da infância e juventude historicamente demarcam um quadro de
abandono e de exploração econômica e social que está a exigir medidas que busquem a
garantia dos direitos individuais e sociais da menina previstos no ECA. A proposta então em
construção, parte do princípio de que às meninas não pode ser atribuída a culpa pela situação
em que se encontram. Todas as carências de que são timas, mais que resultantes da
problemática econômica, são frutos de uma cultura que prega a segregação, a violência sica
e psicológica, a agressividade, o desamor. A menina vitimizada está exposta aos mais
variados tipos de abuso: é violentada psicologicamente, quando a sociedade a como uma
perdedora, bloqueando os seus esforços de autoaceitação; sexualmente é violentada quando
"em lugar de estarem desenvolvendo uma atividade prazerosa para si própria, são exploradas
e atuam para causar prazer a um adulto, com prejuízo inclusive de sua própria saúde mental"
(ASA/ Plano de Trabalho da Casa de Zabelê, 1996, p.6).
ações de saúde e assistência social. A adolescente após o parto continua mantida pela Casa pelo período de até
três meses.
63
Refere-se à jovem Madre Savina Petrilli, fundadora da Congregação das Irmãs dos Pobres de Santa Catarina
de Sena, de origem italiana. A Casa Savina Petrilli consiste em abrigo de proteção para crianças e
adolescentes, do sexo feminino. Funciona no bairro Itaperu, zona norte de Teresina.
91
Nesse sentido, a Pastoral do Menor e a SEMCAD se propõem, numa ação conjunta, a
prestar assistência a crianças e adolescentes do sexo feminino que se encontram em situação
de risco pessoal e social, dentro de uma proposta de trabalho fundamentada em uma potica
de proteção e defesa de seus direitos.
Assim, tem-se o desdobramento da parceria entre a ASA e o poder público municipal
de Teresina, que em um primeiro momento faz-se de forma direta, através da SEMCAD. No
entanto, a SEMTCAS, como órgão gestor da Política de Assistência Social, tem como
atribuição o acompanhamento e supervisão dos programas, projetos e serviços desenvolvidos
pela SEMCAD. Ambas executam as ações em estreita consonância de suas atribuições e
papéis, conforme demonstrado no capítulo anterior.
A consolidação dessa parceria configura-se mais fortemente no item a seguir, com a
caracterização da relação entre a ASA e a SEMTCAS, justificada no interesse político de
combater as violações cometidas contra os direitos da criaa e do adolescente.
3.2 Consolidação da relação de parceria entre a ASA e a SEMTCAS: caracterização
Como expostos no capítulo anterior, em Teresina, até o ano de 1991, o atendimento à
criança e ao adolescente tinha como órgão responsável a SEMTCAS. No entanto, com a
promulgação do Estatuto da Criança e do adolescente em 1990, as atribuições na área da
criança e do adolescente passaram a ser competência inicialmente da SEC
64
, mais
precisamente a partir de 1991, e em seguida da SEMCAD. A princípio, esse órgão teve a
responsabilidade de coordenar e executar a potica de atendimento à criança e ao adolescente
na área de Assisncia Social e da Política de Proteção Especial
65
, em conformidade com o
propugnado pelo Art. 87 do ECA.
Mas, a partir do ano de 1998, a SEMTCAS, em consonância com a LOAS, a Política
Nacional de Assistência Social, e às diretrizes do Plano Municipal de Assistência Social,
assumiu as atribuições de gestora da Potica de Assistência Social, absorvendo, portanto, a
Política de Assistência Social destinada à criança e ao adolescente, em Teresina, de forma
geral. Assim, à SEMTCAS compete a execução da Política de Assistência Social e à
64
A Secretaria Especial da Criança (SEC) consistia em um órgão municipal, vinculado ao Gabinete do Prefeito
responsável, inicialmente, pela Potica de Proteção Especial à criança e ao adolescente em Teresina.
65
Conforme o ECA (1990), a Política de Proteção Especial visa atender crianças e adolescentes que se
encontram em situação de risco pessoal e social no município, tais como os inseridos no trabalho infantil,
usuários de drogas, imersos na prostituição, aqueles que vivem pelas ruas, os violentados, dentre outros”. Já a
Política de Assistência Social tem com propósito garantir condições mínimas de dignidade para quem não tem
assegurada suas necessidades básicas (PNAS, 2004).
92
SEMCAD compete a gestão da Política de Proteção Social Especial à criança e ao adolescente
em conformidade com o ECA.
Do exposto, detecta-se que as atribuões destinadas à SEMTCAS e à SEMCAD, no
que tange à potica de Assistência Social destinada à criança e adolescente, são distintas e
complementares, cabendo à SEMTCAS, como órgão responsável pela potica pública de
Assistência Social, competências mais amplas destinadas a famílias, a idosos, a pessoa com
deficiência, à mulher, dentre outros. No que se refere às ações voltadas para a infância e
adolescência, a SEMTCAS transferia recursos financeiros para a execução por parte da
SEMCAD, realizando o monitoramento e avaliação das ações.
O poder público municipal, no intuito da realização do trabalho com crianças e
adolescentes do sexo feminino, iniciou as negociações para captação de recursos,
apresentando, ainda em 1994, proposta ao CBIA e a LBA no sentido de obter financiamento
para desenvolver ações com crianças e adolescentes em Teresina. Com a extinção destes dois
óros, nesse mesmo ano, a proposta não foi atendida. Os recursos financeiros para
atendimento às meninas foram assegurados no ano seguinte, através de um convênio firmado
entre a SEMCAD, ASA e o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID).
A consolidação da parceria deu-se mediante termo de convênio firmado entre os entes
parceiros, com definições claras de atribuições e responsabilidades a cada um, conforme
demonstra um documento da ASA de 1996, a seguir:
O BID será o órgão financiador responsável pelo repasse de recursos para a
construção, pagamento de pessoal e manutenção da Casa, bem como pelo apoio
técnico no que se refere ao planejamento, execução e avaliação da proposta; À
SEMCAD cabe o acompanhamento, controle e avaliação das ações, através de
técnicos de Departamento de Proteção e Defesa da Criança e do Adolescente; a
ASA, através da Pastoral do Menor, assumirá a execução e coordenação do trabalho
(ASA/ Proposta de Trabalho da Casa de Zabelê, 1996, p. 8).
A percepção das atribuições dos entes parceiros no convênio inicial é visível pelos
atores institucionais, conforme demonstra o depoimento a seguir:
Essa parceria foi firmada através de um convênio entre ASA/PMT/BID. O BID foi o
financiador responsável pelo repasse de recursos para a construção, pagamento de
pessoal e manutenção da Casa, também ficou responsável pelo apoio técnico (que
seria planejamento, execução e avaliação da proposta). A SEMCAD acompanhava,
controlava e avaliava as ações dos técnicos. A ASA, através da Pastoral do Menor,
assumiu a execução e a coordenação da casa (Representante Z4).
93
No mesmo sentido, destaca-se o depoimento abaixo:
Como deveria ser? Qual seria a oferta de trabalho mais importante para o primeiro
momento? Quer dizer, foi tudo muito bem pensado, mastigado e, naturalmente, com
a colaboração técnico-científica, através das pesquisas, dos estudos e da realidade
vivenciada. E foi assim que se montou essa parceria entre a SEMCAD e a ASA, com
o financiamento do Banco Interamericano de Desenvolvimento, que entrou com a
parte na construção da Casa e financiou durante quatro anos toda a parte do
trabalho ali executado, com o pagamento de pessoal e de material utilizado para
atividades sócio-pedagógicas iniciais (Representante S4).
O depoimento acima destaca a proposta de construção da Casa de Zabelê a partir do
convênio entre as instituições parceiras e definições objetivas de suas responsabilidades.
Nessa perspectiva, o Projeto Casa de Zabefoi viabilizado pela parceria entre a sociedade
civil, via ASA e o poder público, com apoio técnico-financeiro com o BID, conforme
demonstra o relato a seguir:
E foi que nasceu a Casa de Zabelê, que chegou a ser negociada pela própria
prefeitura, através da própria SEMCAD com Banco Interamericano de
Desenvolvimento, firmando-se, então, uma parceria de Secretaria da Criança e do
Adolescente com a Ação Social Arquidiocesana, até porque a ASA tinha esse
início de trabalho que não deixa de ter contribuído para um alicerce cristão, para
uma visão de amor, de caridade, inicialmente para essa proposta, mas aí se entrou
com a parte técnica, onde começou-se os estudos, começou-se a pensar em uma
equipe de trabalho, quanto uma casa, uma construção estava sendo feita para
justamente se desenvolver esse trabalho, que continuava sendo como casa de apoio
a meninas em situação de rua, na época, e a gente levantou essa bandeira com a
Arquidiocese, que também se abriu ao trabalho e aceitou fazer uma parceria de
execução das atividades com a Secretaria, quando a Secretaria, ou seja, a
prefeitura repassava o recurso e a coordenação diária e técnica operacional foi de
competência da própria ASA (Representante S4).
No mesmo intuito, o relato pontua de forma mais expressiva o papel da sociedade civil
naquela conjuntura brasileira, denotando a capacidade de assumir a execução de políticas
públicas, conforme demonstra a citação a seguir:
Partiu de uma solicitação do Banco Interamericano de Desenvolvimento para a
Prefeitura, que esta buscasse uma ONG para juntos fazerem essa parceria
(Representante Z1).
Acerca dessa questão o fato de a ASA ter um trabalho consolidado na educação de rua,
através da Pastoral do Menor, essa referência foi decisiva para a sua escolha como entidade
para a realização da parceria entre a Igreja e a Prefeitura no atendimento às crianças e
adolescentes. Essa realidade favoreceu a firmação do convênio entre a ASA e o poder público
municipal, mediante o Projeto Casa de Zabelê, tendo como objetivo o atendimento as meninas
em situação de riscos pessoal e social.
Nesse sentido, tem-se o depoimento a seguir:
94
Essa parceria foi um convênio assinado entre o BID, Banco Interamericano, e a
prefeitura municipal de Teresina. E o Banco Interamericano ele veio através,
inclusive, de escolhas da coordenação, através da Universidade Federal, que com a
Universidade nós ainda firmamos além da colaboração da pesquisa, tida
inicialmente com a Universidade, a Universidade foi quem fez o primeiro, vamos
dizer assim, que não foi uma seleção através de provas, mas foi uma seleção através
de currículo da Universidade, de técnicos da área social que tivesse experiência
com projetos sociais, mas tivesse uma visão, também, de um processo orçamentário
público, então, foi quando nós na Universidade nos submetemos, também, a esse
contexto dessa seleção e o meu nome foi escolhido como coordenadora. Nesse
momento eu representava a Universidade, mas não a Universidade como
Universidade dentro do contexto, mas como Universidade que foi a responsável
pela seleção do técnico para coordenar o programa pelo BID, pelo Banco
Interamericano. Então, nós entramos na prefeitura com essa responsabilidade de
coordenar o BID, dentro do contexto financiador, mas não financiador, mas
também colaborador no que diz respeito à parte de apoio e supervisão técnica ao
projeto, que seria financiado pelo banco. Então, daí entrou a primeira parceria da
ASA com a prefeitura, já que a prefeitura já tinha firmado com o BID, com o banco,
e agora firmaria para a execução, no caso da Casa de Zabelê com a ASA
(Representante S4).
O depoimento acima, expressa a conjuntura dos anos 90 no que se refere ao
estabelecimento de uma atuação conjunta entre o poder público e as entidades da sociedade
civil. Nessa realidade, constata-se que o poder público busca estabelecer com a ASA a gestão
da potica de atendimento à criança e ao adolescente na perspectiva do formato da gestão
pública preconizada pela Carta Magna e a LOAS.
A partir de 2004, com as discussões sobre a PNAS e em seguida sobre o SUAS
(2005), abordadas no capítulo anterior, dá-se icio ao processo de discussão e implantação do
SUAS no município de Teresina, em 2006. A relação de parceria existente entre a SEMCAD
e a ASA, em decorrência do processo de transição das ações da SEMCAD para a SEMTCAS,
fundamentada na nova PNAS e no SUAS, passa a ser assumida na totalidade pela
SEMTCAS, com a extinção da SEMCAD em 2007. A potica de Proteção Especial
anteriormente desenvolvida pela SEMCAD é então absorvida pela SEMTCAS, nas
modalidades de proteção social básica e especial. Quanto ao denominado Processo de
Transição”, este transcorreu em meio a uma discussão, legalização e organização técnico-
operacional, conforme expressa o seguinte depoimento:
Começou-se a discutir a Política Nacional de Assistência Social, que resultou na
PNAS (2004), em seguida a NOB/SUAS, que disciplinava a Política de Assistência
Social. E dentro dessa dinâmica as coisas tiveram que se organizar, convênios
anteriores tiveram que se adaptarem a essa nova filosofia que se concretizou com a
implantação do SUAS, e dentro do SUAS fica clara a definição do papel da gestão
do SUAS, da proteção social básica e proteção especial, o que é isso? E nesse
momento a dificuldade foi a prefeitura ter condições de capacitação de seus
gestores, gerentes e até mesmo ter um nível de informações para passar essas
informações para outros conveniados, no caso específico, a ASA. [...] o SUAS foi
construído por um processo nacional de todos os técnicos ligados à área da
95
Assistência Social. Então, se alguém chegar a este contexto no Brasil, Teresina não
podia ficar de fora. Eu vejo que esse momento de transição foi muito forte,
importante para aprendermos e podermos contribuir para a implantação do SUAS,
se não total mas que se tenha dado um passo largo na concretização do mesmo
(Representante S2).
Para a concretização dessa parceria nesses novos moldes, o instrumento legal que
consolida essa relação consiste nos termos de convênios e/ou termos aditivos ao Convênio
66
celebrado entre a Prefeitura Municipal de Teresina (PMT), através da SEMTCAS com a ASA.
Nesse caso, o convênio celebrado para a implementação do Projeto Casa de Zabelê visa o
combate às diversas formas de violência e redução dos danos causados em crianças e
adolescentes, conforme está prescrito no termo de convênio (2008), a saber:
O presente termo de convênio tem por objeto a ação conjunta entre a
CONCEDENTE e a CONVENENTE, no que se refere à manutenção da Casa de
Zabelê para atendimento de 100 (cem) crianças e adolescentes do sexo feminino na
faixa etária de 08 a 17 anos que se encontram em situação de vulnerabilidades,
timas de todas as formas de violência. [...] tem como objetivo a manutenção da
execução das ões e de atividades na área de assistência e proteção à criança e
adolescente, que visam a melhoria da qualidade de vida das crianças e adolescentes
nas comunidades carentes de Teresina, realizadas pela CONVENENTE, nos termos
que dispõe o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA).[...] Tem por objetivos
específicos: a) a divulgação do projeto de assistência e proteção à criança e ao
adolescente junto à comunidade, às lideranças constituídas, às associações, aos
conselhos e às demais instituições assistenciais, através de folders e cartazes,
palestras e eventos, conclamando-os para colaborar no sucesso das ações sócio-
educativas a serem implementadas; b) a identificação e definição dos sócio-
educadores e do pessoal administrativo de apoio que participaram do Projeto
(SEMTCAS, 2008, p.1).
Os termos de convênios entre a ASA e a Prefeitura, no caso específico do Projeto Casa
de Zabelê, são firmados pelo período menor ou igual a doze meses, sendo renovados
anualmente, quando se faz necessário redefinir as atribuições dos entes envolvidos e atualizar
as planilhas orçamentárias. Assim, as atribuições definidas consoante Termo de Convênio
(2008) consistem em:
Para o fiel cumprimento do objeto pactuado, os partícipes obrigam-se: I - a
SECRETARIA: a) Transferir a ENTIDADE, os recursos financeiros consignados na
Cláusula Terceira do presente connio, mediante repasses mensais fixos, conforme
o previsto no plano de trabalho e consoante o disposto na Cláusula Quarta, deste
instrumento, e seu respectivo parágrafo; b) Orientar a ENTIDADE quanto aos
procedimentos técnicos e operacionais que regem a execução do programa objeto do
connio; c) Assessorar, supervisionar, fiscalizar e avaliar a execução do objeto do
connio; d) Examinar, aprovando, se for o caso, as prestações de contas, parcial e
final, deste convênio; e) Estabelecer o horário de funcionamentos do projeto, em
conformidade com as demandas/necessidades de atendimento e com as normas
66
O referido termo consiste no documento legal de formalização da parceria do poder público com outros órgãos
e/ou entidades, que visa definir os objetivos, diretrizes, finalidades, atribuições, vigência de prazo do convênio
e montante de recursos financeiros envolvidos. Por Temo Aditivo entende-se a formalização legal das
alterações das cláusulas do connio estabelecido, conforme a necessidade (SEMTCAS, 2008, p. 01).
96
legais da CONVENENTE. II a ENTIDADE: a) Executar as ações previstas no
Plano de Trabalho/Atendimento de acordo com o pactuado no presente ajuste; b)
Assegurar à SECRETARIA e ao Conselho Municipal de Assistência Social as
condições necessárias ao acompanhamento, à supervisão, ao controle, à fiscalização
e à avaliação da execução do objeto do Convênio; c) Aplicar, integralmente, os
recursos financeiros repassados pela SECRETARIA, inclusive os provenientes das
receitas obtidas das aplicações financeiras realizadas, na execução do objeto do
presente ajuste; d) Apresentar prestação de contas parcial e final, na forma explícita
na Cláusula Sexta; e) Recolher ao Erário Municipal, quando da prestação de Contas
Final, saldos dos recursos repassados e não utilizados, inclusive os provenientes das
aplicações financeiras realizadas, conforme o disposto no inciso II, “i” da Cláusula
Sexta; f) Manter contabilidade e registros atualizados e em boa ordem como relação
nominal dos beneficiários das ações conveniadas à disposição dos órgãos
fiscalizadores e, ainda, manter registros conbeis específicos relativos aos
recebimentos de recursos oriundos do presente Convênio; g) Manter contabilidade e
registros atualizados e em boa ordem, bem como encaminhar trimestralmente e
anualmente, o relatório Quantitativo e Qualitativo do Atendimento contendo: nome
do beneficiário, endereço, data de entrada, situação em que foi encontrado, situação
atual, data de saída, e outros detalhes que sejam considerados importantes; h) Fazer
constar, obrigatoriamente e em destaque, a participação da Prefeitura Municipal de
Teresina, por intermédio da Secretaria Municipal do Trabalho, Cidadania e
Assistência Social, em materiais de divulgação, tais como: faixas, cartazes,
prospectos, uniformes, bonés, chaveiros, bem como, em qualquer outro produto que
possa ser utilizado para finalidades, observando-se o disposto no § 1º do artigo 37 da
Constituição Federal e no § do artigo 115 da Constituição Estadual, consoante a
legislação específica, que rege a matéria e conforme modelo oficial a ser fornecido
pela SECRETARIA; i) Prestar com recursos oriundos do Convênio, atendimento
gratuito à população carente, em conformidade com o Plano e Atendimento; j) Dar a
contrapartida apresentada no Plano de Trabalho, nos valores apresentados e para as
destinações referidas; l) Garantir a afixação de placas indicativas da participação da
Prefeitura Municipal de Teresina, por intermédio da Secretaria Municipal do
Trabalho, Cidadania e Assistência Social, em lugares visíveis nos locais da execução
dos projetos, consoantes a legislação específica vigente que rege a matéria e
conforme modelo oficial a ser fornecido pela SECRETARIA; m) Reservar vagas
para atender usuários encaminhados diretamente pela SECRETARIA, em razão de
eventuais determinações dos profissionais da Secretaria ou de decisões judiciais
(SEMTCAS, 2008, p. 2-3).
Da perspectiva legal, têm-se os procedimentos que formalizam e definem as
responsabilidades e atribuições dos entes parceiros que expressam uma nova gestão pública,
que se reflete na relação entre o Estado e a sociedade, como expressa o relato a seguir:
Nos termos conveniais, definiu-se o papel da SEMTCAS, responsável pela questão
da organização, da administração a níveis mais gerais, traçar diretrizes gerais da
política pública na área da criança e do adolescente. [...] Assim, além de
estabelecer as diretrizes, deve planejar juntos, acompanhar e monitorar as ões
desenvolvidas pelo parceiro. À ASA compete a execução técnica, administrativa, e
financeira em observância aos termos do convênio (Representante S3).
Além dos compromissos firmados acima com o termo de convênio, tem-se o Plano de
Trabalho e/ou Atendimento com a descrição das ações a serem implantadas no Projeto. O
Plano de Trabalho possibilita o acompanhamento das ações por parte do órgão gestor,
averiguando se estão em consonância com as diretrizes da Política de Assistência Social.
Nesse sentido, aponta o depoimento a seguir:
97
O Poder público define e repassa essas diretrizes gerais e a partir disso eles
constroem um Plano de Ação. Então, eles constroem a Proposta de Ação a ser
apreciada, analisada e avaliada pelo poder público para a firmação do convênio
(Representante S3).
Nesse sentido, destaca-se um grande avanço no que tange à definição e efetivação das
atribuições e responsabilidades das partes envolvidas na parceria. Constata-se o alargamento
das relações, configurando uma maior compreensão do trabalho em parceria com a presença
de maior diálogo entres as partes.
Ademais, nos depoimentos os atores institucionais da ASA e SEMTCAS reconhecem
a existência do termo de convênio para firmar e regular a relação de parceria. No entanto,
quando se indaga acerca das atribuições dos parceiros constantes nos termos do convênio, os
depoimentos revelam que os gestores apontam com maior propriedade as atribuições
relacionadas no referido termo.
Entretanto, os técnicos demonstram desconhecer com maior detalhe essas atribuições,
destacando com maior ênfase, por um lado, a responsabilidade da SEMTCAS com o repasse
de recursos financeiros e, por outro lado, a ASA como executora administrativa das ações e
aplicação desses recursos. Evidenciam, ainda, um desconhecimento acerca das outras
cláusulas do convênio, e ressentem-se de não participarem do processo de renovação do
contrato realizado anualmente, como expressa a entrevista citada:
O convênio é renovado anualmente entre as parcerias, portanto, é discutido
somente nas instâncias superiores das mesmas. Surgem as dificuldades sempre no
inicio do ano quando acontecem os atrasos dos recursos. Mas não temos reuniões
para discutirmos sobre o descumprimento ou não do termo do Convênio
(Representante Z6).
A análise das entrevistas aponta que somente quatro dos entrevistados estão desde o
início da construção da parceria entre a ASA e a SEMCAD, e posteriormente com a
SEMTCAS, estes estão envolvidos com a implementação do Projeto Casa de Zabelê
justamente 13 anos. Os demais entrevistados, no total de onze atores, possuem um tempo
de trabalho entre 1 e 10 anos, mas afirmam que não participam do processo de definição das
atribuições dos entes parceiros, que somente é realizado pelos gestores das instituições
parceiras. Essa realidade denota também uma participação restrita dos demais atores
institucionais quanto às decisões acerca das diretrizes do trabalho. Como afirma o depoimento
abaixo:
Não participei desse processo, pois trabalho três anos na Instituição
(Representante Z7).
98
Os depoimentos analisados destacam que os técnicos tomam conhecimento sobre o
convênio quando de sua finalização que remete algumas definições pelos gestores,
provocando morosidade no repasse dos recursos financeiros e desgastes na execução do
Projeto, como demonstra o relato a seguir:
O convênio é renovado a cada ano, e a cada mudança de gestão surge as
dificuldades, principalmente na demora da assinatura do convênio, causando um
desgaste nos profissionais e atraso e interrupção das atividades desenvolvidas pelas
instituições, sobretudo nas ONG’s, que ficam à mercê da vontade de quem está à
frente da prefeitura, portanto, da secretaria (Representante Z3).
Diante do exposto, os depoimentos revelam, ainda, um significativo distanciamento
sobre o teor das definições das atribuições e responsabilidades das instituições parceiras no
termo de convênio, o que acarreta na incompreensão acerca da parceria, não clarificando os
papéis e atribuões de cada um nesse processo.
3.3 O Projeto Casa de Zabelê: a materialização do atendimento à criança e à adolescente
do sexo feminino, na perspectiva dos direitos sociais
Tendo em vista responder à indagação em que medida essa relação de parceria tem
contribuído, através das ações do Projeto Casa de Zabelê, para a efetivação da cidadania do
segmento infanto-juvenil, busca-se examinar o Projeto Casa de Zabelê quanto à
materialização do atendimento às criaas e adolescentes na perspectiva dos direitos sociais.
A construção da proposta do Projeto Casa de Zabelê aconteceu imersa, como esboçado
anteriormente, no advento do ECA (1993), com a preconização dos direitos da criança e do
adolescente e com o seu reconhecimento como sujeitos de direitos. Essa proposta pauta-se na
Doutrina da Proteção Integral, que ressalta o atendimento à criança e ao adolescente com
prioridade absoluta.
Assim diz o Estatuto da Criança e do Adolescente em seu artigo 3º:
A criança e o adolescente gozam de todos os direitos fundamentais inerentes à
pessoa humana, sem prejuízo da proteção integral de que trata esta Lei,
assegurando-se-lhes, por lei ou por outros meios, todas as oportunidades e
facilidades, a fim de lhes facultar o desenvolvimento físico, mental, moral,
espiritual e social, em condições de liberdade e de dignidade.
O Projeto Casa de Zabelê consiste em uma resposta concreta do poder público
municipal e da sociedade civil, através da ASA e da SEMCAD/SEMTCAS que visa uma
intervenção à problemática da infância, em especial, do sexo feminino, no que tange às
diversas situações de riscos vivenciadas nas ruas de Teresina, como: abuso e exploração
99
sexual, trabalho infantil, uso de substâncias psicoativas, mendicância, dentre outras situações.
Como demonstra o depoimento a seguir:
Com relação a meninas em situação de risco e que viviam nas praças de Teresina,
principalmente, na Praça Rio Branco, vendendo cafezinho e que por detrás dessa
venda de cafezinho tinha todo um processo que se instalava, justamente, de que as
meninas estavam sendo exploradas, principalmente na parte da sexualidade, por
pessoas que faziam da praça os seus pontos de encontro, momentos de folga e
detrás disso tinha as meninas vendendo cafezinho, e começou-se então a perceber
que estava acontecendo algo diferente (Representante S4).
À referida realidade, acrescente-se a constatação de um cenário escamoteado pela
realidade de trabalho infantil, com a coexistência da exploração sexual de crianças e
adolescentes em praças do centro da cidade de Teresina, segundo expressa o relato a seguir:
No levantamento dessa realidade, constatou-se realmente que ali não era só a
simples venda de cafezinho, mas muito mais, um momento de exposição de meninas,
que através de pessoas que estavam por trás desse contexto público, fazia
justamente esse trabalho de amostra das meninas, de exposição das meninas
àqueles homens para programas, para encontros (Representante S4).
A proposta de implantação da Casa de Zabelê foi norteada pela Doutrina da Proteção
Integral
67
defendida pela Organização das Nações Unidas (ONU), com base na Declaração
Universal dos Direitos da Criança (1989), que os considera:
a) Sujeitos de Direitos na medida em que toda criança e adolescente, independente
de sua raça, cor, condição social, tem direito à vida, saúde, alimentação, esporte,
lazer, profissionalização, cultura, dignidade, respeito, liberdade e convivência
familiar e comunitária; b) Pessoas em condição peculiar de desenvolvimento, com
direitos especiais decorrentes do fato de que: ainda não têm acesso ao conhecimento
pleno de seus direitos; ainda não atingiram condições de defender seus direitos
frente às omissões e transgressões capazes de violá-los; não possuem meios próprios
para satisfazerem suas necessidades básicas; c) Prioridade absoluta, na medida em
que as crianças e adolescentes devem ter: "Primazia de receber proteção e socorro
em quaisquer circunstâncias; precedência do atendimento nos serviços blicos ou
de relevância pública; preferência na formulação e na execução das políticas sociais
públicas; destinação privilegiada de recursos públicos nas áreas relacionadas com a
proteção à infância e à justiça" (ASA/Proposta de Trabalho da Casa de Zabelê, 1996,
p. 9).
Face ao exposto, denota-se que o processo de construção da proposta da Casa de
Zabelê se fez assentada nos princípios constitucionais e regulamentados pelo ECA (1990) e
pela PNAS (2004), traduzindo a percepção da criaa e do adolescente como sujeito de
direitos, considerado como sujeito em situação peculiar de desenvolvimento.
67
A Doutrina da Proteção Integral consiste em um conjunto de providências legislativas, administrativas, sociais
e educativas que visam construir um estado social em que os direitos humanos sejam respeitados quando
estejam em jogo os interesses de crianças e adolescentes. É essa doutrina que suporte à Convenção da
ONU sobre os Direitos da criança (SÊDA, 1995).
100
Nesse sentido, em agosto de 1996, foi construída a Casa de Zabelê em um amplo
espaço para sediar o projeto, situada na Av. Pedro Freitas, S/N, bairro Vermelha, Centro Sul
da cidade de Teresina. O seu funcionamento ocorre de 2ª a feira, de 8:00 às 12:00 horas e
de 14:00 às 18:00 horas e aos finais de semana com ações específicas.
O Projeto Casa de Zabelê tem como objetivo combater e enfrentar as diversas formas
de violência, bem como reduzir os danos causados pela violência física, psicológica e sexual
(abuso e exploração) em crianças e adolescentes do sexo feminino, na faixa etária de 7 a 17
anos e seus familiares. Atende a 100 (cem) adolescentes mediante atendimento psicossocial
e educativo, e com o repasse mensal de uma bolsa incentivo no valor de cinquenta reais. Para
tanto, tem como objetivos específicos:
Implementar ações que estimulem, nas educandas, o desenvolvimento de competências
pessoais, sociais, produtivas e cognitivas; Incentivar e acompanhar o ingresso, reingresso e
permanência qualitativa da criança/adolescente na escola formal; Envolver as famílias nas
ações desenvolvidas na Casa, fortalecendo os vínculos familiares, participação na escola e
na comunidade; Estimular ações de prevenção, sensibilização e mobilização das famílias
atendidas, para o combate e enfrentamento à violência sexual; Promover articulação entre
os diversos setores da sociedade, visando o atendimento às demandas das
crianças/adolescentes e suas famílias; Promover atividades interdisciplinares que
favoreçam a exteriorização do “eu”, visando a expressão e superação de estados e
vivências subjetivas e traumáticas; e, Fortalecer ações de protagonismo juvenil
(ASA/Plano de Ação da Casa de Zabelê, 2007).
O projeto, como preconizado no seu plano de ão, em seus objetivos geral e
específicos, favorece ao desenvolvimento integral das crianças e adolescentes em situação de
violação dos direitos, contemplando a perspectiva da proteção especial, conforme preconiza o
ECA (1990) e a PNAS (2004). Tomando por base a proposta formulada pelo Projeto,
pergunta-se: a Casa de Zabelê vem possibilitando concretamente a efetividade dos direitos
sociais das crianças e adolescentes atendidas, conforme preconiza o ECA e PNAS?
Diante de tal questão, os depoimentos analisados neste estudo apontam que no
trabalho realizado pelos técnicos junto ao Projeto, a concepção de criança e adolescente
propagada pelo ECA, PNAS e o SUAS perpassa todas as ações desenvolvidas no Projeto Casa
de Zabelê. De forma especial, salienta-se que as áreas de Pedagogia, Psicologia e Serviço
Social são as que mais sobressaem através de suas ações a prerrogativas de direitos embaladas
pelos preceitos legais. Cumpre ressaltar que as referidas áreas profissionais desenvolvem um
trabalho integrado, fortalecendo o protagonismo das crianças, adolescentes e da família.
A proposta pedagógica da Casa é baseada no diálogo, concretizada através de oficinas
orientadas e no atendimento personalizado, que estimulam nas meninas o desenvolvimento de
competências pessoais, sociais, produtivas e cognitivas. Enfim, no dia a dia, as meninas vão
101
aprendendo um jeito novo de viver, discutindo os mais diversos temas do cotidiano: família,
escola, sentimentos, uso de drogas, higiene, doenças, sexualidade, violência doméstica,
gravidez, amor etc., num permanente exercício de protagonismo juvenil (ASA, 2007). Essa
realidade se expressa através do relato abaixo:
Não estigmatizamos e não rotulamos as crianças e adolescentes atendidas, aliando-
se na busca de alternativas para a redução dos danos causados pelas situações de
vulnerabilidades social e na construção de referências morais e afetivas e com
intuito de fortalecê-las para o exercício da autonomia e do protagonismo. Atuamos
em uma perspectiva interdisciplinar buscando um grau de maturidade e uma
abertura à totalidade, as atividades são executadas contemplando os princípios de
parceria, interação, avaliação, diálogo coletivo e, sobretudo, a participação efetiva
das crianças e adolescentes e famílias atendidas (Representante Z6).
O acompanhamento da vida escolar da criança/adolescente acontece desde o primeiro
momento em que ela é inserida na Casa de Zabelê. Uma das condições para que a
criança/adolescente participe da Casa é estar matriculada e frequentando a escola formal. A
área pedagógica, além de acompanhar a vida escolar da criança/adolescente, desenvolve
atividades tendo o objetivo de facilitar o processo ensino-aprendizagem, favorecendo a
superação de dificuldades, tanto no processo de aprendizagem da leitura e da escrita, quanto
na capacidade de desenvolver raciocínio lógico para a resolução de problemas.
Neste sentido, a área de pedagogia tem como objetivos:
Incentivar e acompanhar o ingresso, reingresso e permanência qualitativa na escola
formal; oportunizar a criação artística, visando o desenvolvimento do processo
cognitivo, o estímulo ao potencial criativo, intuitivo e a compreensão da realidade;
promover atividades culturais e artísticas (arte-educação) que valorizem a produção
individual e coletiva; facilitar o acesso aos espaços culturais e artísticos (ASA/Plano
de Trabalho da Casa de Zabelê, 2007, p. 6).
É pertinente observar que a atuação da área de pedagogia no processo de atendimento
à criança e à adolescente expressa um processo educativo inserido na realidade delas,
estimulando-as para a sua realidade pessoal e social, possibilitando-lhes o desenvolvimento de
suas habilidades e oportunizando momentos de crescimento, mudanças de atitudes,
descobertas de potencialidades e capacidade de intervenção na própria realidade. Conforme
expressa a citação:
Um dos princípios que norteiam esta proposta pedagógica são os pilares da educação
elaborados pela Conferência da Unesco (1990). Que são eles: aprender a conhecer,
aprender a fazer, aprender a viver com os outros e o aprender a Ser. O aprender a
conhecer como desenvolvimento de habilidades necesrias para aquisição e
domínio do conhecimento. O aprender a fazer significando a ampliação do fazer,
isto é, o incentivo às várias estratégias criadas pelo homem como meio de adquirir
novos conhecimentos e trabalho. O aprender a viver com os outros como uma forma
dos educadores darem à escola uma nova “roupagem”, modificando esses espaços e
estimulando os educandos a buscarem, junto aos colegas, propostas e alternativas de
102
solidariedade baseadas na compreensão e no respeito. O aprender a ser como sendo
o desenvolvimento integral do homem, revelando essa capacidade que o ser humano
tem de elaborar pensamentos, refletir e decidir de que forma pode agir com relação
às situações que surgem em sua vida (ASA/Plano de Ação da Casa de Zabelê, 2007,
p. 8).
Acentua-se que a referência que norteia o Projeto é a de que o trabalho com crianças e
adolescentes seja na perspectiva dos direitos e da Proteção Integral. Nesse prisma, entende-se
que as crianças e adolescentes são pessoas em processo de desenvolvimento, devendo ter seus
direitos respeitados e assegurados por lei.
Assim, dentre os vários programas que desenvolvidos pelo Projeto Casa de Zabelê,
destaca-se o Programa de Orientação Sexual no combate ao abuso e à exploração sexual. Esse
programa inclui temas básicos considerados significativos para o processo educativo
desenvolvido pela Casa, tanto para as crianças e adolescentes e seus familiares quanto para
sensibilização dos profissionais do projeto. Compreende as seguintes abordagens:
História da Sexualidade Humana; Anátomo-fisiologia do Sistema reprodutor feminino;
Anátomo-fisiologia do Sistema reprodutor masculino; A resposta sexual humana; O
desenvolvimento da sexualidade; Quem sou eu? (Compreendendo a adolescência);
Gravidez, parto e puerpério; Métodos anticoncepcionais; Gravidez na adolescência:
Aborto; O abuso sexual; Noções sobre DST-AIDS; Psicodinâmica da relação a dois; O
comportamento sexual; Sexualidade e religião; e, Sexualidade e mídia, dentre outros
(ASA/ Plano de Ação da Zabelê, 2007, p. 9).
Cumpre ainda destacar as oficinas de reciclagem e estamparia, de dança, moda,
serigrafia e de esporte como fundamentais para a ação Pedagógica da Casa, pois fortalecem o
processo de aprendizagem, socialização e criatividade das crianças e adolescentes, portanto,
incentivando o protagonismo juvenil.
É importante registrar que o atendimento às meninas tem-se ampliado nos últimos
quatro anos, inserindo o atendimento ao adolescente do sexo masculino, de forma especial,
com participação no núcleo de danças para crianças e adolescentes, oficinas de moda e
serigrafia, que funciona aos finais de semana, envolvendo uma média de sessenta
adolescentes egressos ou não do projeto. As atividades desenvolvidas consistem em
atendimento sócio-psicológico, orientação e acompanhamento pedagógico, orientação e apoio
sócio-familiar; fortalecimento dos vínculos família/escola/projeto; orientação e
acompanhamento para obtenção de documentação civil, assistência médico-odontológica,
suplementação alimentar, atividades esportivas, de lazer e cultura.
No que tange à área da Psicologia, destaca-se o atendimento individual e grupal a
crianças e adolescentes em situação de risco e vulnerabilidade, juntamente com as suas
103
famílias, a partir de uma perspectiva sócio-hisrica do indivíduo. Tal perspectiva compreende
a pessoa, não em seus aspectos individualizantes, em uma identidade fechada numa
essência”, mas como um ser em constante transformação a partir da sua realidade social e
hisrica. Com isso, a prática da Psicologia estará voltada para uma análise permanente dos
diversos sistemas que envolvem o desenvolvimento dessa criança/adolescente, como a
família, a comunidade, a escola, o sistema de garantia de direitos, o próprio processo
institucional de atendimento e todo o macrossistema potico, econômico, social, cultural e
hisrico (ASA/ Plano de ação da Casa de Zabelê, 2007).
A área da Psicologia propõe ao projeto uma intervenção psicoterapêutica que
possibilite a manifestação dos modos de vida peculiares das crianças/adolescentes atendidas,
levando em consideração todos os aspectos que envolvem o contexto de violência vivida, tais
como a comunidade em que vivem, o grupo doméstico e o próprio sistema de garantia de
direitos, e as implicações no seu desenvolvimento. Como demonstra o depoimento abaixo
acerca dos objetivos definidos para o atendimento:
Trabalhar sistematicamente as questões de gênero, abordando a tipificação sexual,
papéis de gênero e estereótipos construídos no contexto social das crianças e
adolescentes atendidas; Potencializar o valor pessoal das crianças/adolescentes e
das suas famílias a partir das características trazidas da sua realidade; Propiciar
aos pais e responsáveis a análise das práticas educativas utilizadas com seus filhos
e as suas influências para o seu desenvolvimento (Representante Z3).
Assim, tendo em vista o alcance desses objetivos, são desenvolvidas as seguintes
atividades na área da Psicologia:
Atendimento individual e grupal às crianças e adolescentes: nesses atendimentos,
buscar-se conhecer a história de vida, fortalecendo o seu valor pessoal e os
vínculos sociais. Na vivência em grupo objetiva-se trabalhar situações referentes à
realidade da menina, como também, as relações intergrupais, aprofundando o seu
universo simbólico, bem como contribuindo para o desenvolvimento de suas
potencialidades. Os grupos de vivência acontecerão quinzenalmente e serão
divididos por faixa etária e por situação de vulnerabilidade apresentada pelas
crianças/adolescentes; Acompanhamento familiar através dos atendimentos
individuais, grupais e visitas domiciliares: essa atividade terá como objetivo
aprofundar mais os conhecimentos sobre a criança/adolescente a partir da dinâmica
familiar e da relação da família com a comunidade onde mora, com os movimentos
populares, as redes de apoio como hospitais e delegacias, a relação com a
vizinhança, as dificuldades de moradia, os sistemas de valores sobre as práticas
parentais, casamento, sexualidade, etc. Reuniões quinzenais (grupos de vivência)
com os responsáveis pelas crianças/adolescentes atendidas, a partir de um enfoque
terapêutico e informativo. No enfoque terapêutico, serão trabalhadas as histórias de
vida trazidas pelas famílias; no enfoque informativo serão discutidos assuntos
referentes à situação das famílias; Interação com os outros sistemas de apoio: O
objetivo é contribuir com o fortalecimento da rede de apoio à
criança/adolescente/família; participação nos fóruns e seminários sobre os temas
104
relacionados à violência doméstica: compartilhar com outras instituições envolvidas
no sistema de garantia de direitos das crianças e adolescentes as experiências
vivenciadas em cada contexto; Participação nas reuniões semanais com a equipe
técnica para estudos de caso, planejamento, avaliação das atividades. O objetivo é
trabalhar a interdisciplinaridade com as áreas: social, pedagógica, esportiva, artística
e a profissionalização. (ASA/SEMTCAS, Plano de Ação, 2007, p. 10).
O depoimento em referência, ressalta a intensidade da intervenção psicológica na
realidade das crianças e adolescentes atendidas pelo Projeto Casa de Zabelê, que enfatiza o
protagonismo pessoal e social, com o reconhecimento dos desejos e atitudes das meninas, que
passam a serem reelaborados mediante o estímulo de seus saberes e potencialidades pelo
profissional. Acentua-se, ainda a extensão do trabalho com as famílias das meninas, através
do grupo de vivência para reflexões acerca das vivências familiares. Esses configuram-se
como bastante oportunos para o fortalecimento dos vínculos menina/ família e menina/Projeto
e família.
Na área do Serviço Social no Projeto Casa de Zabelê, a prioridade de atuação é a
família, considerada como espaço privilegiado para a formão dos valores éticos e morais do
indivíduo, da construção de identidades, da integração social e vínculos relacionais de
pertencimento.
No entanto, a condição social e econômica das famílias atendidas na Casa de Zabelê
configura-se numa realidade de ausência de poticas de emprego e renda, habitação,
educação, saúde e formação profissional, inviabilizando, portanto, o cumprimento de seu
papel de socializadora e protetora das suas crianças/adolescentes.
Diante de um quadro de exclusão social, em que estão inseridas as
crianças/adolescentes e suas famílias, o Serviço Social, na implementação das suas ações na
área de proteção social, parte do princípio que a família apresenta múltiplas configurações,
formas de organizações e particularidades que merecem ser respeitadas para garantir-se os
seus direitos.
Portanto, a área do Serviço Social pretende desenvolver suas ações voltadas para as
crianças/adolescentes e suas famílias, numa perspectiva de participação, integração e inclusão,
em conjunto com as outras áreas, visando a superação das situações de vulnerabilidade nas
quais se encontram, sobretudo, a violência, nas suas diversas formas.
No que tange, ainda, à atuação do Serviço Social no Projeto Casa de Zabelê, este tem
como objetivos:
Identificar o perfil cio-econômico das famílias, buscando mecanismos de
intervenção às demandas apresentadas; Proporcionar a reflexão sobre direitos,
deveres, temáticas e questões que permeiam a realidade das crianças/adolescentes e
suas famílias; Propiciar o fortalecimento dos vínculos familiares e comunitários,
105
valorizando e reconhecendo a família enquanto espaço de referência, proteção e
enfrentamento de exclusão social; Informar e orientar às famílias sobre as redes de
serviços disponibilizados, e os mecanismos utilizados para acioná-las; Discutir com
as crianças/adolescentes acerca de sua problemática e dos assuntos inerentes ao
cotidiano da Casa, da família e do seu meio social, a fim de acompanhar mais
especificamente cada caso; Fortalecer as relações interpessoais entre as meninas e a
socialização das experiências de vida, incentivando-as para o desenvolvimento de
atitudes que elevem sua autoestima, o respeito mútuo e a capacidade crítica
(ASA/SEMTCAS/Plano de Ação da Casa de Zabelê, 2007, p. 18).
Do exposto, evidencia-se que os objetivos que o profissional de Serviço Social
propõe-se realizar, fortalecem os direitos preconizados pela PNAS, tendo como eixos
fundamentais a família, o protagonismo infanto-juvenil, o reconhecimento dos direitos
sociais, a participação e responsabilização conforme expressa o relato a seguir:
As ações na Casa de Zabelê são baseadas na política de Proteção Integral a
criança e adolescentes, proporcionando a reflexão sobre direitos, deveres,
temáticas e questões que permeiam a realidade das crianças e adolescentes e suas
famílias; propiciando o fortalecimento dos vínculos familiares e comunitários,
valorizando e reconhecendo a família enquanto espaço de referência, proteção e
enfrentamento de exclusão social, informando e orientando as famílias sobre as
redes de serviços disponibilizados, e os mecanismos utilizados para acio-las
(Representante Z6).
Essas prerrogativas ainda são percebidas no leque de atividades desempenhadas pelo
profissional de Serviço Social. Dentre essas, destacam-se as seguintes:
Atendimento às crianças/adolescentes e responsáveis para inserção no projeto;
Sistematização de dados e informações da população-alvo atendida, mediante a
alimentação de instrumentais de atendimento e acompanhamento psico-sócio-
pedagógico; Análise da evolução psico-sócio-pedagógica através de equipe
interdisciplinar; Atendimentos individuais e coletivos às crianças/adolescentes, onde
são discutidas questões relacionadas à realidade e a problemática apresentada por
essas crianças/adolescentes, no que se refere ao seu contexto familiar e da Casa de
Zabelê; Atendimentos individuais e coletivos aos responsáveis pelas
crianças/adolescentes, constituem-se de momentos de reflexão, juntamente com a
família, sobre os relacionamentos intra-familiares e orientações referentes ao acesso
à rede de serviços existentes no município; Visitas domiciliares, com a observação
da dinâmica familiar e aprofundamento de aspectos sobre a realidade vivenciada
pelas crianças/adolescentes e suas famílias, no que diz respeito: à vida em
comunidade, à participação em movimentos populares e culturais, à existência das
redes de serviços e às dificuldades relacionadas à habitação, emprego e renda, dentre
outras; Encaminhamentos e visitas institucionais; Grupo de convivência com os pais
ou responsáveis; Grupos de vivência com as crianças e adolescentes, respeitando-se
a situação de risco e faixa-etária, com atividades terapêuticas e reflexões sobre
temas pertinentes a sua realidade; Participação em momentos de sensibilização com
as crianças e adolescentes consistindo em atividades interativas, mediante dinâmicas
que favoreçam o fortalecimento das relações interpessoais (ASA/Plano de Ação da
Casa de Zabelê, 2007, p. 18-19).
A efetivação dos objetivos propostos acima traduz-se em direitos preconizados pelos
meios legais, na promoção, defesa e garantia dos direitos da criança e do adolescente. No que
concerne à efetivação desses direitos, destaca-se o seguinte depoimento:
106
Constata-se a efetividade desses direitos quando, por exemplo, identificamos
através do atendimento psicossocial a situação de violência sexual (exploração e
/ou abuso sexual), buscamos fortalecer e incentivar a tima a denunciar tal
situação, e ainda, informamos aos responsáveis e à vítima do dever profissional de
notificar aos órgãos competentes sobre a violência sofrida (Representante Z4).
Nessa perspectiva, para proporcionar a efetivação aos direitos da criança e do
adolescente, o Projeto Casa de Zabe necessita interagir com uma rede de proteção e defesa
dos direitos da criança e do adolescente mediada pelos serviços públicos e da sociedade civil.
É bem verdade, que a rede de proteção ainda possui suas fragilidades no que concerne a oferta
do atendimento. Essa realidade é mais visível no que concerne aos Órgãos de Justiça quanto
aos procedimentos relativos á violação dos direitos, de forma mais específica, a violência
sexual contra crianças e adolescentes.
A Casa de Zabelê, como enfatizado no capítulo anterior, integra a rede de proteção
social especial que tem como referência o CREAS I
68
, que desenvolve ações articuladas com
os Órgãos de Defesa e Garantia dos Direitos da Infância e da Juventude, como o Juizado da
Infância e Juventude, CMDCAT, Conselhos Tutelares, Delegacia de Proteção da Infância e da
Adolescência e com a rede socioassistencial de Proteção Social Básica e Especial.
Atualmente, a Casa de Zabelê, com 13 anos de existência, possui um leque de
parceiros que apoiam as ões desenvolvidas pela Casa, configurando tanto instituições
internacionais quanto instituições nacionais e locais, como demonstra o relatório ASA (2008).
A referida Casa conta com apoio financeiro da Petrobrás/Fome Zero (Projeto
Girassol) e WCF Brasil, em estrita parceria com outras ações afins desenvolvidas
pela ASA, tais como o Programa Umbuzeiro (ASA/UNICEF), o grupo Pão de
Açúcar, o Grupo Carvalho, a Central de Abastecimento (CEASA), a
UNESCO/Criança Esperança, através do Projeto Nascente, doações de terceiros,
dentre outras (ASA, 2008, p. 11).
Denota-se que, com a ampliação desse leque de parceiros, a Casa de Zabe tem
fortalecido suas ações, com a implantação de linhas de ões inseridas no atendimento a
crianças e adolescentes, como o núcleo de dança, oficina de serigrafia e de moda, tendo
implantado a Zabelê Moda com a conquista de duas lojas, sendo uma na própria sede da Casa
de Zabelê e outra no Teresina Shopping. Além de constantes apresentações do núcleo de
dança em eventos locais e nacionais, bem como, a realização de eventos de moda para
divulgação do trabalho e produções realizados pelo Projeto.
68
O CREAS I tem como área territorial a região que abrange a área entre os rios Parnaíba e Poti, no sentido
norte/sul. Localiza-se na Rua Álvaro Mendes, nº1801, centro/norte de Teresina (SEMTCAS, 2008).
107
Além disso, o Projeto Casa de Zabelê tem-se firmado como referência na luta pelo
enfrentamento à violência sexual contra crianças e adolescentes no Estado do Piauí, tendo
sido definida como instituição ponto focal
69
para as ações de combate e enfrentamento à
questão no âmbito do Estado. Assim, tem expandido a sua experiência como referência para
outros Estados e municípios do país, bem como, recebido premiações pelo êxito do Projeto no
Enfrentamento a Violência sexual.
Do exposto, conclui-se que as ações desenvolvidas no Projeto Casa de Zabelê, têm
traduzido ao longo do seu processo histórico, um forte engajamento com a luta pelos direitos
da criança e do adolescente, ampliando-se o seu foco de abrangência, de denúncia e
efetivação dos direitos sociais s-Constituição de 1988. Assim, tem viabilizado o direito à
proteção, à escola, à saúde, ao acesso a atendimento psicossocial, e principalmente, no
combate e prevenção da violência e o fortalecimento do protagonismo juvenil, tendo em vista
a superação das dificuldades e redução dos danos causados pelas violações sofridas.
3.4 A contribuição dos atores institucionais à luz da avaliação do processo de efetivação
da relação de parceria entre a ASA e a SEMTCAS
A partir das diversas reflexões expostas neste estudo, faz-se importante abordar as
contribuições dos atores institucionais quanto à avaliação do processo de efetivação da
relação de parceria. Essa análise torna-se valorativa, pois implica na avaliação que os atores
realizam sobre a efetividade dessa relação, face ao conjunto das ações que os atores
institucionais imprimem na gestão e no atendimento ofertado às crianças e adolescentes.
O período em referência demarca na sociedade brasileira profundas alterações de
cunho social, institucional e legal, que m se refletido na construção de novas relações entre
o Estado e a sociedade civil, representadas aqui pelo poder público municipal e a Igreja
Católica. No entanto, ressalta-se que na relação entre a ASA e a SEMTCAS, constata-se a
presença de ambiguidades que se expressam no processo histórico de construção da parceria.
Essa realidade reflete as contradições decorrentes da relação entre Estado e sociedade civil.
-se, do exposto em capítulos anteriores e neste capítulo, que os atores sociais e
particularmente para efeito deste estudo, os atores institucionais expressam o desejo de
69
A ASA, através da Casa de Zabelê, desde 2004 foi apontada em um encontro em Natal (Rio Grande do Norte)
como a instituição Ponto Focal para as questões de mobilização e articulação no combate e enfrentamento à
violência sexual contra crianças e adolescentes no Estado do Piauí. Tendo constituído no ano de 2008, o
rum Estadual de Enfrentamento à Violência Sexual, como desdobramento da ASA/Casa de Zabelê.
108
participação e provocar alterações no desenho das poticas blicas, em especial, a Potica
de Assistência Social, inserindo-se nesta, o atendimento a crianças e adolescentes.
Nesse sentido, a Política de Assistência Social tem se configurado em um espaço de
alargamento das relações entre o poder público e a sociedade. Assim, no que se refere às
análises realizadas pelos atores institucionais quanto à avaliação da parceria entre a ASA e a
SEMTCAS, no período em referência do presente estudo, esta pode ser observada a partir da
nova PNAS (2004) e o SUAS (2005), a qual vem tomando novos rumos, conforme
depoimento a seguir:
Então, eu entendo que a gente tem dado passos pequenos, mas tem dado passos
nesse caminho de efetivar uma parceria concreta. [...] uma parceria pautada numa
“política pública” que foque os direitos para além da criança e do adolescente, que
existe um aparato legal que garante os direitos sociais. O reconhecimento das
responsabilidades por cada um dos parceiros, que devem reconhecer-se com
responsabilidades na construção da parceria (Representante S1).
Tal afirmação aponta para a perspectiva de conferir visibilidade ao processo de
construção de um sistema blico de Assistência Social e a uma afirmação da
responsabilidade do Estado, conforme estabelece o sistema descentralizado e participativo
preconizado pela Constituição Federal de 1988 e a LOAS (1993).
Assim, é nesse contexto, que se destaca o número significativo de serviços
desenvolvidos em parceria com as organizações de Assistência Social em convênios com o
poder público, particularizando para os órgãos de gestão da Assistência Social. Nesse
contexto, o termo parceria enfatiza a cooperação firmada entre organizações privadas e o
Estado para o cumprimento de responsabilidades blicas na atenção à população que
demanda serviços de Assistência Social. Como diz o seguinte depoimento:
O termo parceria requer que o trabalho seja realizado com corresponsabilidade,
com cogestão, ninguém cortando o papel do outro, mas as duas missões
complementando-se (Representante S3).
Assim, o enfoque da relação de parceria no relato enfatiza a atuação conjunta entre
organizações privadas e o Estado, onde as competências dos parceiros são respeitadas para o
devido cumprimento de responsabilidades blicas no que tange a prestação de serviços de
assistência Social.
O poder público já assume que é responsabilidade sua a gestão da política pública,
reconhece a sua responsabilidade na execução da política de Assistência Social
(Representante S3).
109
Nesses termos, tem-se, ainda, a percepção da responsabilidade do poder público
municipal na implementação da Potica, enquanto uma “potica blica”, superior aos
interesses do poder público ou da sociedade civil, mas que deve expressar os interesses da
população usuária da Potica de Assistência Social. Tal análise enfatiza a primazia da
responsabilidade do Estado na condução da potica de Assistência Social, conforme
preconiza a PNAS (2004).
Assim, a referida perspectiva de análise ainda proporciona a ruptura com uma
percepção distorcida de que a relação de parceria configura-se somente com a formulação de
convênios para repasse de recursos financeiros, sem um devido acompanhamento e
monitoramento por parte do órgão gestor.
Houve momentos que em seu processo histórico a SEMTCAS estabelecia relação de
parceria para repasse de recurso financeiros, pois, a SEMTCAS não tinha um papel
de executora da ação, mas de repassadora e administradora dos recursos, cabendo
à SEMCAD a execução da política de atendimento à criança e ao adolescente
(Representante S2).
Do exposto, percebe-se que na relação de parceria entre a ASA e a SEMTCAS tem-se
construído uma relação de aprendizados e amadurecimentos, respeitando-se os entes
parceiros, assentando-se nas prerrogativas legais, consubstanciadas nos princípios
constitucionais. Entretanto, não basta ater-se apenas às formalidades dos termos de parceria,
faz-se necessário a absorção de uma cultura de co-responsabilidades por parte dos atores
institucionais para imprimir uma gestão pública a prestação de serviço. Conforme aponta o
relato abaixo:
No processo de construção da parceria, [...] não foi fácil estabelecer, estruturar
ações e normatizar a relação de parceria entre a ASA e a SEMTCAS. Está se
avançando aos poucos, com aprendizado acerca do que preconiza a política de
Assistência Social, com as experiências vivenciadas no processo histórico e o desejo
dos atores de efetivação dos direitos da criança e do adolescente (Representante
S5).
No mesmo sentido, segue outro depoimento:
Quem realiza um convênio acredita que é possível realizar através da parceria um
trabalho sério. Você não pode desconfiar do outro, portanto, foi uma parceria de
credibilidade, transparência e respeito acima de tudo. O poder público tem a
missão de continuar com essa parceria mais qualificada, fortalecida nos laços de
respeito, amizade e autonomia (representante S2).
Nesse âmbito, salienta-se que os atores institucionais passam a ter maior compreensão
acerca de suas atribuições na efetivação dos direitos sociais dos usuários da política, bem
110
como, possuem uma melhor leitura da realidade social e qualificação de sua intervenção
profissional. Segundo aponta o depoimento a seguir:
Os profissionais buscam conhecer a política de Assistência Social e o SUAS,
compreender como esse sistema se efetiva na realidade, embora não tenha sido fácil
para todos compreenderem em um mesmo processo de tempo (Representante S5).
A referida análise assenta-se na perspectiva de que os atores institucionais, tanto do
poder público quanto da sociedade civil organizada, de forma especial, na área da criança e do
adolescente, manifestaram desejos de que esses sujeitos fossem tratados de forma diferentes,
como sujeitos de direitos, buscaram absorver novos conhecimentos e interação com a
sistemática de trabalho proposta pelo SUAS. No entanto, constata-se que não foi um processo
homogêneo, houve conflitos derivados da ansiedade e apreensão quanto às novas diretrizes da
política.
A efetivação dos direitos da criança e do adolescente demanda ações urgentes que
requer uma nova forma de concepção e tratamento as crianças e adolescentes, que
devem ser fortalecidas pelo ECA e pela política de Assistência Social, como política
pública. Essa realidade é permeada de contradições entre ações pontuais e
continuas entre os parceiros. Para que as meninas não fiquem com uma ação
pontual, mais que possam ter um exercício pleno dos seus direitos de saúde,
educação, convivência familiar e comunitária é necessário que o SUAS seja
fortalecido e consolidado (representante S3).
As análises relativas à avaliação da relação de parceria entre a ASA e a SEMTCAS na
efetividade das ações desenvolvidas pelo Projeto Casa de Zabelê apontam para os seguintes
aspectos: que os entes parceiros amadureceram politicamente, exercitando um maior diálogo,
respeitando suas identidades face à realização do trabalho conjunto. Ainda, quanto às análises
da avaliação da relação de parceria, os técnicos destacam que houve um crescimento da
relação no tocante à perspectiva da nova política de Assistência Social.
No entanto, os técnicos ligados à execução do projeto Casa de Zabelê fazem referência
ao distanciamento entre a SEMTCAS e a ASA/Casa de Zabelê, mas reconhecem a
importância da parceria para a efetivação dos direitos das crianças e adolescentes. Conforme
expressa o depoimento a seguir:
A parceria é valiosa e se os pontos críticos existentes forem identificados e
trabalhados adequadamente, somente have ganhos para a sociedade
(Representante Z6).
Ainda, quanto à percepção em referência, destaca-se o depoimento abaixo:
111
Avalio que a inter-relação entre a Casa de Zabelê e a SEMTCAS precisa de mais
entrosamento, mais participação. É sentida uma distância que poderia ser superada
por um processo de mais proximidade, intercâmbio e de trocas de experiências
(Representante Z7).
Acerca do exposto, a relação de parceria ente a ASA e a SEMTCAS demonstra que as
prerrogativas legais preconizadas pela Constituição Federal de 1988, regulamentadas pelo
ECA (1990), pela Política de Assistência Social na perspectiva do SUAS (2004/2005) têm
proporcionado alterações na forma de gestão pública, favorecendo a constituição de novas
bases para a efetividade de direitos sociais para a criança e o adolescente.
É bem verdade que existe ainda um distanciamento entre o que está posto
constitucionalmente e os direitos sociais efetivados. No entanto, a experiência do Projeto Casa
de Zabelê, como o ponto de encontro entre a ASA e a SEMTCAS, abre um leque de
possibilidades para a consolidação de uma parceria efetiva no sentido do reconhecimento e a
garantia dos direitos sociais do segmento infanto-juvenil por parte do poder público e da
sociedade civil.
3.5 A relação de parceria entre a ASA e o poder público municipal, através da
SEMTCAS: avanços e desafios
A parceria entre a ASA e o poder público municipal, através da SEMTCAS,
particularizando o Projeto Casa de Zabelê, no atendimento à criança e à adolescente do sexo
feminino, como demonstra o presente estudo, tem proporcionado a concretização da relação
entre o Estado e a sociedade civil, ou seja, entre o poder público municipal e a Igreja Católica
em Teresina.
Ao longo da trajetória da parceria entre a ASA e a SEMTCAS, se construiu uma
relação pautada em bases legais, institucionais, sociais e poticas, mesclando-se interesses,
vontade de efetivação de uma potica blica voltada para a implementação dos direitos do
segmento infanto-juvenil, que expressa momentos de conflitos, aproximações, recuos,
dificuldades e avanços, que apontam para os desafios e avanços.
As ambiguidades decorrentes do encontro entre o Estado e sociedade civil,
particularmente, pós-Constituição Federal de 1988, inserem uma postura de negociação e de
atuação conjunta fortemente assentada na participação da sociedade civil, conforme expressa
Dagnino (1994). Entretanto, não significa dizer que as ambuiguidades expressas pelos
interesses diversos, ora contradirios, ora de pactuação não se façam presentes nessa relação.
112
O presente estudo, ao percorrer a trajetória da relação de parceria entre a ASA e a
SEMTCAS, aponta para o reconhece das diversidades, expressa pela vivencia da dessa
parceria. Nesse intuito, partir-se-á para o esboço de análises realizadas com base nos
depoimentos da pesquisa, ao pretender analisar como a ASA e a SEMTCAS lidam com os
dilemas e conflitos na sua atuação, refletida nos momentos de aproximações e diálogos,
afastamentos e rupturas.
No exame dos depoimentos, detecta-se a presença de elementos desafiadores para a
efetivação da parceria ASA/SEMTCAS. É o que expõe um dos atores institucionais acerca do
processo de transição da SEMCAD para a SEMTCAS:
O momento de implantação do SUAS houve algumas divergências em relação aos
procedimentos, o que era o poder público e o que era iniciativa da sociedade civil
organizada, no caso da ASA.[...] é porque toda mudança gera dúvidas, gera
preocupações com o que está dando certo, nem sempre a gente quer mudar o que
está dando certo, mas é preciso ter sempre uma operação pra que a gente possa
ganhar mais força para continuar. Não se pode achar que está tudo bem. E esta
caminhada criou algumas arestas, principalmente na questão da condução que era
à luz do SUAS. Agora, a gestão da Política de Assistência Social do município não
pode mais delegar, determinar ões que era da sua competência e isso criou
algumas arestas (Representante S2).
Por outro lado, comprova-se que os problemas e dificuldades mencionados pelos
atores institucionais revelam que o processo de transição das ações de Proteção Social
Especial da SEMCAD para a gestão da SEMTCAS, de certo modo ocorreu em meio a uma
incompreensão, não deixando claro o novo desenho da gestão e concepção da Potica de
Assistência Social na perspectiva do SUAS.
Nesse contexto, salta uma realidade mencionada nos depoimento que expressa as
constantes mudanças de gestores da Potica de Assistência Social, no período em estudo,
como reflete o depoimento a seguir:
Os momentos afastamentos e rupturas sempre vão existir, porque a gente quando
trabalha com o poder público, quando muda o gestor, você querendo ou não, você
quebra uma ação que já vem sendo fortalecida, estabelecida (Representante S5).
Interessa dizer que entre 2004 a 2008, a SEMTCAS abrigou três gestores,
configurando uma agravante por ser um período de reordenamento institucional da
SEMTCAS à luz da PNAS e do SUAS, e a transição das ações de proteção especial da
SEMCAD para a SEMTCAS.
Outrossim, a gestão implementada pelos gestores apontavam, cada um, para um
aspecto da efetivação da Potica de Assistência Social, no que concerne à gestão,
113
reordenamento institucional, reestruturação técnica e organização dos serviços e ações. Esses
fatos ocorreram dentro de um mesmo processo, provocando significativas incompreensões no
contexto da política e no contexto institucional.
Dentre esses dilemas, são destacados momentos pontuais que não expressam uma
tendência de aproximação potica continuada. Essa perspectiva aponta para os momentos de
aproximação, como: participações em eventos, com destaque para atividades de comemoração
do aniversário da Casa de Zabelê, Encontros de capacitação, dentre outros, como demonstra o
depoimento:
Nas ocasiões de festas de aniversário da Casa, onde os gestores da SEMTCAS e
prefeitura comparecem, mas participam como “visitantes”, não como parceiro
(Representante Z4).
Os atores institucionais revelam ainda momentos de afastamento, embora reconheçam
que situações de diálogo não ocorram de forma sistemática.
O afastamento pode se dizer que é constante durante todo ano. Não uma
discussão, reuniões sistemáticas. Por exemplo, nós ainda não conhecemos a atual
secretária e nem sua equipe atual porque não foi marcado nenhum momento para
que isso acontecesse. Os diálogos acontecem esporadicamente (Representante Z4).
Tal situação expressa-se de forma mais acentuada pelos depoimento dos técnicos
quando ressaltam que possuem uma relação de maior proximidade com a ASA, destacando a
presença do Padre X
70
, como uma figura de forte carisma.
O trabalho, o compromisso ético e a credibilidade da ASA, construído ao longo dos
anos, sobretudo, pela capacidade de articulação e diálogo do Pe. X com as
instituições governamentais (Representante Z3).
Os sujeitos da pesquisa salientam que maior proximidade institucional com a ASA.
Isso decorre do fato das ações de execução serem de responsabilidade da referida Instituição,
como a seleção, contratação e pagamento de pessoal.
Eu me sinto mais próximo da ASA, pois, temos os momentos de mística que favorece
a essa maior integração entre os funcionários e reflexões acerca da realidade
pessoal e do trabalho; sente-se a presença da ASA no espaço da Casa e também, a
vinculação empregatícia é realizada diretamente com ela, por mais que a prefeitura
repasse o recurso financeiro para o pagamento (Representante Z2).
Nesse momento, sente-se a forte presea da Igreja Católica mediante à disseminação
da “mística cristã” junto ao funcionários, conforme expressa o depoimento:
70
O Pe. X preside a ASA desde 1987, inicialmente como vice-presidente e, a partir de 1995, como presidente.
Atualmente a ASA possui uma secretária executiva para administrar suas ações.
114
Eu nunca abri mão da dimensão mística dos trabalhos da ASA, por isso o pessoal
todo sempre foi escolhido por mim, todinho, agora não pense que eu escolhi
gente que gosta de água benta, de jeito nenhum, eu escolho pela competência, eu
nunca pedi que uma pessoa aprove o padre Toni, o que eu peço é que não seja
contra o Evangelho, e as coisas funcionaram bem (Representante da A1).
É verdade que nas análises, os representantes entrevistados reconhecem o significado
do novo momento de construção da Política de Assistência Social, pautando-se na busca por
efetivação dos direitos sociais. Mas ainda demonstram incompreensões relativas ao SUAS e à
sistemática de organização dos níveis de proteção social especial. Dentre outros aspectos, essa
análise deriva da ausência de abordagem nos depoimentos por parte dos funcionários da Casa
de Zabelê acerca dessa nova sistemática, o que às vezes enseja compreensões superficiais
sobre o assunto.
Outro aspecto destacado nos depoimentos refere-se à realização esporádica do
monitoramento e avaliação das ações do Projeto da SEMTCAS, que se caracteriza pelo
preenchimento de relatórios e outros formulários pertinentes à consolidação de dados. As
falas demonstram incompreensão quanto ao processo de supervisão:
A presença dos técnicos da SEMTCAS para acompanhamento, controle e avaliação
das ações, conforme reza o convênio, ocorre de forma pontual, ou seja, o
profissional reúne-se com os técnicos da Casa de Zabelê, colhe as informações,
solicita os instrumentais utilizados, inicia-se uma discussão sobre o Plano da Casa e
fica estabelecido que ocorrerão outras reuniões. Cria-se muita expectativa para os dois
lados, no entanto não continuidade desse processo e sinceramente o sei por que
isso ocorre. Dessa forma, um desgaste muito grande nessa relação (Representante
Z4).
Constata-se que, no processo de efetivação da parceria entre a ASA e a SEMTCAS
persistem alguns desafios, como o apontado pelo depoimento a seguir:
Essa questão do acompanhamento e monitoramento das ações ainda esmuito no
papel, não se efetivando na prática. Ou seja, essas funções estão postas nos termos
de convênio, mas ainda não tem se efetivado de forma sistemática e continuada
(Representante S3).
Tal situação expõe uma realidade que deve ser enfrentada, consistindo no processo de
acompanhamento e monitoramento das ações, como possibilidade de superação do
distanciamento, favorecendo o seu controle para que possa atingir eficácia e eficiência no
atendimento.
Outra perspectiva de análise é identificada ainda quanto aos desafios, no que se refere
à relação de parceria, segundo o depoimento abaixo:
Hoje, a gente analisando, acha que foi tudo muito tranquilo essa parceria, agora,
foi difícil o início, principalmente foi difícil para a gente entender até onde ia a
responsabilidade de um, dos participantes, ou seja, da SEMCAD e até onde ia a
responsabilidade da ASA, então, isso às vezes provocava entre nós que não
115
nhamos uma vivência de parceria, um desconforto, porque a gente sentia, parece,
que até mesmo porque nós éramos inseguras, tanto a própria prefeitura, como a
própria ASA e às vezes as situações chegavam a discussões difíceis, que a gente até
pensava de sofrer um processo de descontinuidade, tamanho eram as discussões,
tamanho eram talvez as desconfianças (Representante S4).
Ainda, seguindo o raciocínio de análise dos depoimentos, constata-se a existência de
resistência entre os parceiros.
Nessa relação de parceria, sentiu-se muito e ainda sente-se as resistências por parte
da ASA, de acatar as diretrizes constantes no convênio, percebe-se uma certa
autonomia da entidade e no processo de execução (Representante S6).
Face a esse contexto, sobressaem as ambiguidades presentes na relação de parceria
entre a ASA e a SEMTCAS, reveladas pelo antagonismo, pelo confronto e a oposição
característica das relações entre o Estado e sociedade civil, mediante a atuação dos
movimentos sociais e das ONGs, no período da resistência contra a ditadura. Apesar de
passado esse momento, percebem-se ainda os resquícios desse período expressos pela
resistência, seja ao novo, seja na dimensão potica para não perder espaços e a autonomia.
Dentro dessa perspectiva, outro depoimento:
Eu não acredito que a parceria esteja totalmente efetivada entre a ASA e a
SEMTCAS, o poder público, pois, em alguns momentos eu sou parceiro, eu tenho
uma situação de parceria, em outros momentos eu sou sociedade civil, pra
conseguir determinadas coisas, outra hora eu sou poder público e ser poder
público (Representante S3).
No entanto, a partir dos depoimentos, constata-se um outro olhar quanto à relação
entre os parceiros, que em certos momentos fica nivelada:
Nunca, em hipótese alguma houve bloqueio, houve desistência, houve impasses,
não, nós nunca tivemos, agora, tivemos secretários bem mais presentes, uma
secretária X, ela era presente, tiro o chapéu para aquela mulher, porque ela era
escandalosamente competente, escandalosamente bela, então, diferenças, assim,
por exemplo, ela saía de lá e entrava nos nossos projetos, com a mesma
desenvoltura que entrava em qualquer outro lugar, coisa que eu não vejo de
nenhum outro prefeito, nem de outro secretário; eu não sei, parece que aquele
espaço é mais de Padre X do que nosso, e não é, é tanto da prefeitura quanto da
ASA, mas parece que eles param um pouquinho, parece que eles sentem, assim, uma
área de limite que não passa e eu gostaria que eles passassem, visitassem mais,
entrassem mais e que os ofícios fossem menos usados, que eles descobrissem isso,
não sei é porque eles veem que as coisas estão andando, que não tem problema,
mas a gente se ressente porque deviam chegar mais lá dentro, olhar por dentro,
visitar, tomar um cafezinho, como a secretária X fazia (Representante A1).
Por outro lado, o poder público também denota essas expectativas apontadas
anteriormente, como expressa o depoimento a seguir:
A sociedade civil, através da ASA, avançou muito com a sua atuação junto à
Política de Proteção Especial, destinada à criança e ao adolescente, preconizada
116
pelo ECA. E o poder público tinha um certo medo, era cobrado demais e a ASA
terminou assumindo essa função e o poder público de uma forma minoritária,
apoiando a ação e não fazendo o seu papel de poder público que realmente o dever
era do Estado (Representante S3).
O depoimento ressalta que o poder público também teve suas resistências em assumir
o seu papel frente à problemática social. Essa realidade é apontada no depoimento como de
transferência de responsabilidades do Estado, debatido neste estudo em outro capítulo. Assim,
constata-se que o Estado também teve suas resistências frente à tomada de responsabilização
de seu papel, transferindo parte dessas responsabilidades para a sociedade civil, através das
ONGs, nesse caso, através da ASA, sendo que essa transferência de responsabilidade não
ficou clara quanto ao compartilhamento das responsabilidades por parte dos parceiros,
preconizadas na Constituição de 1988 e na Política de Assistência social.
Quanto aos avanços apontados, estão sendo constatados progressivamente, mas de
forma lenta, pois consistem em um processo de aprendizado e amadurecimento dos parceiros.
Entretanto, é visível nos depoimentos dos gestores tanto do poder público quanto da ASA e
técnicos do poder público, a presença de uma percepção da Potica de Assistência Social e do
SUAS, de forma compreensiva e crítica.
O que é mais marcante é que as pessoas que estão ou estavam à frente desses
projetos têm mais consciência dos seus papéis. Por mais que tenha havido atrito, a
gente via nas pessoas a preocupão de não deixar que o Projeto acabasse, que o
Projeto continuasse [...] a SEMTCAS passou a ver mais a realidade institucional,
as pessoas que fazem a SEMTCAS passaram a ter maior, talvez, estudaram ou
passaram a participar mais, a realizar um processo de leitura da realidade não só
de Teresina mas do Brasil. (Representante S1).
Outro aspecto relevante nessa análise é a concepção de parceria que aparece como
compartilhamento de responsabilidades entre os parceiros, conforme expressa o depoimento:
O termo parceria é muito forte, muito real e que precisa dos dois atores institucionais
estarem juntos, ou seja, esse termo parceria seria uma reunião dos dois atores em
prol de interesse comuns, interesses maior , pactuando responsabilidades e deveres
de cada ente, ninguém fugindo do seu papel (Representante S3).
Outro aspecto detectado, é que o avanço também se visualiza mediante os
instrumentos legais e institucionais que formalizam a relação de parceria, definindo de forma
clara os objetivos e atribuições dos parceiros. Como demonstra o depoimento:
Hoje a relação de parceria está amparada na legislação, na Constituição Federal
de 1988, na LOAS e no ECA, que preconiza a Política de Assistência Social, como
“Política Pública” e enfatiza os direitos sociais que devem ser garantidos. Essa
legislação nos serve de subsídios para melhor clarear os termos do convênio da
parceria (Representante S5).
117
Nos depoimentos são constante as afirmações de efetivação das responsabilidades do
poder público, acentuado pelo contexto do SUAS.
Então, considero que o poder público conseguiu chamar pra si a responsabilidade
de seu papel, nós não fugimos e não estamos hoje apoiando, nós buscamos ser
realmente executor de um ação de fazer garantir um direito, até porque eu entendo
que nós não vamos conseguir virar política pública, se ficar nas mãos da
sociedade civil, não é uma garantia efetiva de um direito ao cidadão, ele é hoje e
amanhã ele pode não estar, então vira realmente uma política pública de
responsabilidade do Estado (Representante S3).
O depoimento acentua a efetivação da Política de Assistência Social, como uma
Potica blica” tal qual é preconizada pela LOAS (1993), PNAS (2004) e, mais uma vez,
enfatiza a primazia do Estado na condução das políticas públicas.
O reordenamento institucional da SEMTCAS, com a efetivação do SUAS em
Teresina, mediante a organização dos serviços e ações desempenhadas pelos CREAS,
evidencia significativos avanços no âmbito da gestão pública, favorecendo a descentralização
e compartilhamento de responsabilidades. Neste contexto, o CREAS I e II concretizam a
referência e a contra-referência da Potica de Assistência Social no combate a violações dos
direitos dos indivíduos e das famílias, no que se refere ao CREAS, e constitui-se como “porta
de entrada” para o atendimento às violações de direito, por um lado, e diante do atendimento
oportunizar os encaminhamentos e devolutivas das situações trabalhadas.
No CREAS, a maioria das parcerias são com a ASA, e dentre essas, tem-se a Casa
de Zabelê, como unidade de atendimento pertencente à rede socioassistencial
vinculada ao CREAS. O CREAS tem o comando das ações, é a referência, mais se
respeita a ASA, pois, sem a ASA nessa parceria, a gente também não ia efetivar as
nossas ações, então tem que ser uma relação construída e uma relação respeitosa
(Representante S7).
Do exposto, conclui-se que a relação entre a ASA e o poder público, através da
SEMTCAS, pós-Constituição Federal de 1988, configura-se com múltiplas possibilidades de
atuação conjunta. Essa realidade confere as conquistas alcançadas pela sociedade civil e
também pelo poder público de assegurar maior participação no âmbito da gestão pública,
transparência e exercício do controle social realizado por ambos.
Em síntese, as alterações citadas acima proporcionaram a formação de nculos entre a
ASA e o poder público, evidenciados mediante três momentos relevantes para a relação, como
salienta Dagnino (1994). O primeiro refere-se à fluidez da relação, caracterizada como uma
relação menos formal, que envolve, por um lado, pressão, monitoramento e crítica por parte
da ASA e, por outro, em alguns casos, proposição, colaboração e acompanhamento dos passos
do órgão do governo, que condiz com os momentos iniciais da relação de parceria.
118
O segundo vinculo refere-se à prestação de serviços desenvolvidos pela ASA, na qual
o poder público se relaciona com ela como se tivesse contratando o seu serviço. Neste
momento, tanto a prefeitura quanto a ASA devem cumprir com responsabilidades. Nesse
encontro, as relações são permeadas por cobranças, avaliações, acirramentos ou o
meramente burocratizadas por meios dos termos de convênios, não sendo caracterizada uma
dimensão mais politizada da relação.
E por último, o terceiro vínculo que menciona Dagnino (1994) refere-se à
concretização de projetos elaborados em conjunto entre a ASA e o Poder Público, em que há
um cunho participativo entre ambos, denotando o caráter participativo e de controle social que
exerce a sociedade civil junto ao poder público. Por fim, constata-se que na relação de
parceria ASA/SEMTCAS encontra-se a presença dos três vínculos permeando a trajetória da
relação de parceria entre ASA e o poder público municipal de Teresina.
119
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Ao empreender, neste estudo, reflexões acerca do tema “A relação entre o Estado e a
Sociedade Civil, na realidade brasileira s-Constituição Federal de 1988”, partiu-se para a
análise da relação de parceria que se estabeleceu entre a Ação Social Arquidiocesana (ASA) e
o poder público municipal de Teresina, através da Secretaria Municipal do Trabalho,
Cidadania e Assistência Social (SEMTCAS), mediada pela execução da Potica de
Assistência Social junto às crianças e adolescentes, atendidos pelo Projeto Casa de Zabelê.
Assim, optou-se por analisar essa relação de parceria sob a perspectiva dos direitos
sociais preconizados pela Constituição Federal de 1988, no intuito de averiguar as mudanças
preconizadas pelos princípios constitucionais de descentralização, de participação e controle
social na construção dessa relação na perspectiva da Política de Assistência Social.
Do exposto, constata-se que, na realidade brasileira, as relações entre o Estado e a
sociedade civil vêm se construindo num processo antagônico na qual se inserem interesses
diversos. Acentua-se que, nessa trajetória da relação entre o Estado e a sociedade civil,
permeiam ora relações autoritárias e centralizadoras, ora relações participativas e
democráticas, configurando uma relação não-linear, mas expressando dinâmicas e
contradições em diferentes momentos históricos.
Na trajetória do estudo, verificou-se que a sociedade civil, compreendida pela
organização dos movimentos sociais, organizações o-governamentais, associações, terceiro
setor entre outros, expressou um revigoramento nas lutas pelo processo de democratização da
sociedade brasileira e pelo fim da ditadura militar. O seu ressurgimento ocorreu no final da
década de 70 e meados da década de 80 do século passado, período que marca um momento
significativo na história da sociedade brasileira no que tange ao processo democrático no
Brasil. Daí em diante, a sociedade civil organizada tem exercido um papel fundamental no
controle social da gestão pública e no alcance de um conjunto de direitos para a maioria da
população brasileira, especialmente a partir da Constituição de 1988.
Nesse quadro de análises, demarca-se a atuação da Igreja Católica como uma das
instituições fundamentais da sociedade civil, que tem se posicionado frente à problemática
social, numa perspectiva de comprometimento com as vulnerabilidades sociais da população
empobrecida. Sua atuação vem expressando grandes avanços se se comparar a outros
momentos históricos do país. Em outras circunstâncias, no entanto, ao estabelecer relações
com a sociedade, posicionou-se contrária aos interesses da maioria da população empobrecida
120
propagando ideias e práticas religiosas baseadas numa perspectiva conservadora da Igreja e da
sociedade (GUIMARÃES, 1998). Relativo aos avanços da Igreja Católica no Brasil, cabe
destacar sua atuação no Piauí, através da ASA, que tem se colocado sob novas possibilidades
e perspectivas no sentido de contribuir para a ampliação da cidadania dos mais pobres. Por
oportuno, convém ressaltar as contradições, dinamismos e complexidades da igreja católica,
que expressam sua dimensão potica, social e moral implícita ou explícita no seu modo de ser
Igreja, analisado ao longo deste estudo.
As lutas evidenciadas pela sociedade civil organizada garantiram um novo marco legal
às relações entre o Estado e a sociedade civil organizada, cujo parâmetro principal é a
Constituição Federal de 2008, mas que tem se ampliado através de inúmeras leis,
instrumentos e garantias sociais. Esse novo marco legal preconiza uma ruptura com um
modelo de gestão pública centralizadora e aponta para uma gestão pública democrática
baseada em princípios constitucionais de descentralização potica e administrativa,
participação da sociedade e controle social.
É no âmbito da nova Carta Magna que a assistência social ganha proemincia como
política blica de Estado. Como tal, é regulamentada pela LOAS (1993), que preconiza a
Assistência Social como direito do cidadão e dever do Estado, que se realiza através de um
conjunto integrado de ações de iniciativa blica e da sociedade, visando garantir o
atendimento às necessidades básicas da população. No âmbito da Constituição de 1988,
também, a criança e o adolescente passam a ser considerados sujeitos de direitos. Nesse
contexto, têm-se o ECA (1990), que estabeleceu a Doutrina da Proteção Integral e preconiza o
princípio da prioridade absoluta ao atendimento à criança e ao adolescente. Posteriormente,
com a implantação da PNAS (2004) e da NOB/SUAS (2005), evidencia-se que a Potica da
Assistência Social, na perspectiva do SUAS, destaca, entre outros aspectos, a primazia do
poder público na condução da Potica de Assistência Social e aponta para o
compartilhamento de responsabilidades com a sociedade civil organizada, através da
definição, de forma transparente, do papel dos entes nesse processo.
Em suma, é inquestionável que a Constituição Federal de 1988 configura-se como um
marco legal fundamental para o estabelecimento de uma “nova” institucionalidade no país.
Reconhecem-se os avaos ocorridos na efetivação dos princípios de descentralização,
participação e controle social que implicam em uma perspectiva de gestão pública
compartilhada entre o Estado e a sociedade civil. Nessa perspectiva, são muitas as
experiências, no Brasil, em que há um dado compartilhamento de ações entre Estado e
sociedade na condução das políticas blicas. É o caso, por exemplo, das experiências de
121
orçamento participativo, dos fóruns de gestão pública, dos conselhos de direitos dentre outras.
No entanto, deve-se destacar que há, ainda, muito a aprimorar nas relações entre Estado e a
sociedade civil no que respeita à condução de uma gestão pública mais democrática,
transparente e voltada para a ampliação dos direitos da maioria da população em seus
cotidianos de vida.
No município de Teresina, a nova institucionalidade se materializou mediante a
criação das condições elementares para a efetivação da Política de Assistência Social e do
ECA, ainda na década de 90, com a criação dos conselhos de potica e dos direitos, com a
mudança na concepção, objetivos e diretrizes da política, e uma nova ordem da estrutura
institucional compatível com a gestão preconizada pós-Constituição de 1988. Mas é a partir
de 2005, que a Política Municipal de Assistência Social passa por um reordenamento no
âmbito da gestão com vista à materialização do SUAS e quanto a sua organização da Política.
No bojo desse contexto é que a relação entre a ASA e o poder público municipal,
através da SEMTCAS, se fortalece, tendo por base a ideia de que a Potica de Assistência
Social deve ser realizada por um conjunto integrado de ões de iniciativa pública e da
sociedade, que pode ser efetivada por intermédio do estabelecimento de parcerias pautadas no
compartilhamento de responsabilidades. É nesse sentido que vem se estabelecendo a parceria
entre a ASA e a SEMTCAS, via termos de convênios firmados entre as duas instituições, que
definem objetivos, atribuições e responsabilidades de cada ente convenente de forma a
proporcionar transparência à gestão pública e dar maior efetividade às ações realizadas. Nesse
caso, a concepção de parceria que alinha as instituições objetos desta pesquisa, no tocante ao
Projeto Casa de Zabelê, compreende a ideia de corresponsabilidade entre as instituições na
execução da Política de Assistência Social junto a criaas e adolescentes, que se materializa
em papéis que se definem, a priori, onde cada ente institucional exerce um conjunto de
atribuições e compromissos. Os encontros e desencontros que ocorrem nas relações entre as
duas instituições a partir daí, fazem parte da dinâmica própria da parceria em que confluem
necessidades, interesses, aspirações, cobranças, avaliações, recuos, avanços e dificuldades.
Outro aspecto visível nessa relação de parceria, é o fato de revelar um caráter público
na prestação dos serviços de Assistência Social por parte da ASA, desconfigurando, assim,
uma prática histórica e predominante da Igreja Católica de caráter conservador e
assistencialista de suas ações ao longo de seu processo de inserção na sociedade brasileira. É
verdade, pois, que esse aspecto ressalta as mudanças no âmbito da ASA, que se “moderniza,
assumindo um novo modo de pensar e agir que caminha em direções variadas
(GUIMARÃES, 1998), tendo em vista absorver as demandas sociais na atualidade. Vale
122
ressaltar que, nesse intuito, ocorreram alterações no Estatuto da Instituição tendo em vista
estar em maior sintonia com a realidade social teresinense. Isso não implica dizer que sua
atuação deixou de evidenciar a sua perspectiva evangelizadora e stica quanto às doutrinas
religiosas. Pelo contrário, um imbricamento entre os objetivos evangelizadores da
Instituição e os seus objetivos de inserção social junto às populações mais pobres. Daí o seu
comprometimento, traduzido em inúmeras parcerias, com várias poticas blicas do Estado,
especialmente com os projetos voltados para a assistência social.
Do ponto de vista do Estado, é importante ressaltar que ele também vem se
modificando nessas décadas pós-Constituição de 88, tanto no que respeita à formulação e à
gestão das políticas blicas mais sintonizadas com os princípios constitucionais ainda que
em certos momentos conjunturais fossem desrespeitados, exceto os garantidos na Cara Magna
no que concerne à garantia da participação da sociedade civil na gestão e no controle social
das ações estatais. Visto por essa ótica, o Estado, através do poder público municipal de
Teresina, vem acompanhando a dinâmica das mudanças decorrentes do processo
constitucional. Nesse caso, a SEMTCAS vem favorecendo a ampliação de forma significativa
dos canais de descentralização, participação e estendendo o atendimento às demandas sociais,
configurando-se com um caráter mais democrático diante dos projetos mais gerais do
município, sem, contudo, deixar de demarcar o caráter público quanto à primazia de sua
responsabilidade na condução da política.
No que diz respeito às relações entre a ASA e o poder público municipal, ao longo dos
processos de parceria existentes entre essas duas instituições, constata-se que uma
dinâmica permeada por interesses e projetos contradirios, nem sempre conciliáveis, que
assumem expressões diversas, ora de conflitos, ora de cooperação, ora de negocião,
configurando um processo dialético no âmbito da gestão da Política de Assistência Social
voltada para crianças e adolescentes. Essa realidade contraditória possibilita analisar que,
embora a relação ocorra dentro de um processo dialógico e, muitas vezes, conflitante, isso não
significa descaracterizar os interesses e identidades das duas instituições, que m natureza,
finalidades e missões diversas, ou seja: a parceria não implica subsunção de uma instituição
sobre a outra; cada ente tem suas dinâmicas e características próprias; ambas as instituições,
no entanto, devem caminhar, ao atuar com a Política de Assistência Social, na direção do
preconizado pela Constituição, pelo SUAS, pelo ECA e por todos os mecanismos legais de
garantia de cidadania da população mais pobre.
Isso posto, ressalta-se que o Projeto Casa de Zabe é uma expressão significativa
desse processo de parceria, que traduz a “nova” institucionalidade posta pelos marcos legais
123
constitucionais. O Projeto Casa de Zabelê vem, ao longo desses treze anos de existência,
efetivando a relação de parceria entre a ASA e a SEMTCAS, pautada numa prática social que
busca a afirmação dos direitos sociais preconizados na PNAS (2004), no SUAS (2005) e no
ECA (1990). Essa experiência faz-se reconhecida em nível nacional e internacional pelo
significado de sua extensão nas condições de vida de crianças e adolescentes atendidas pela
Casa, no que concerne ao enfrentamento da violência sexual contra crianças e adolescentes no
município de Teresina.
Nessa perspectiva, as ações do Projeto Casa de Zabe refletem as mudanças
constitucionais de 1988. Assim sendo, verificou-se que há uma preocupação efetiva, da parte
das instituições responsáveis pela Casa, para que: as ações primem pela qualidade na
prestação dos serviços; haja uma boa estrutura física e lógica do ambiente em que são
realizadas essas ações; haja unicidade do discurso/linguagem e intervenção no trato da
criança, da adolescente e família compatíveis com a postura de estímulo ao protagonismo
pessoal e social; os resultados das ações ampliem a cidadania dos sujeitos sociais atendidos.
A relação de parceria entre a ASA e o poder público, através da SEMTCAS vem
apontando, portanto, para uma experiência exitosa, que é reconhecida pelos próprios entes
parceiros como de grande envergadura no cenário municipal. Mas, importa destacar que os
parceiros reconhecem os desafios e as dificuldades presentes nessa relação. Um dos desafios
que se impõem nessa parceria, está na efetivação de um caráter mais público para a Política de
Assistência Social, no que concerne ao poder público assumir a primazia na responsabilidade
da condução dessa Política, pois o fato de a Política de Assistência Social poder se realizar de
forma integrada, envolvendo ações de iniciativa pública e da sociedade no atendimento às
necessidades da população, não significa dizer que o Estado não traga para si a maior
responsabilidade sobre essa área.
Imbuída nessa lógica, é que se acredita que o CREAS tenha um papel fundamental. O
CREAS em Teresina, enquanto referência da rede socioassistencial, a qual a Casa de Zabelê
está vinculada territorialmente, necessita proceder ao fortalecimento da Política de Assistência
no município. A relação de parceria ASA/SEMTAS necessita ser melhor definida quanto aos
seus papéis principais. São duas instituições distintas: a ASA é de natureza privada; e a
SEMTCAS, pública. É necessário aprofundar, cada vez mais, os papéis, as atribuições e as
responsabilidades de cada ente para a concretização das Poticas de Assistência Social de
forma mais efetiva e consequente nas condições de vida dos usuários. Isso porque a realidade
pesquisada ainda expressa resquícios de um processo histórico característico do final dos anos
124
70, onde as Instituições/unidades de atendimento se colocavam como autônomas frente à
gestão pública.
No que se refere às análises realizadas neste estudo, comprovou-se que tanto a ASA
quanto a SEMTCAS expressam dinâmicas e contradições inerentes às suas concepções e
projetos, que podem se aproximar e se afastar em certos momentos e situações, produzindo
relações variadas em dadas direções e significados e, por fim, podem se colocar com maior
abertura para novas demandas da sociedade (GUIMARÃES, 1998).
Conclui-se afirmando que, em Teresina, tem-se construído uma gestão pública pautada
em uma “nova” institucionalidade, a partir da Constituição de 1988, que se materializa e se
mediatiza nas relações que se estabelecem entre a ASA e a SEMTCAS através do Projeto
Casa de Zabelê. Essa é uma experiência de parceria em constante processo de construção, que
se caracteriza por relações dinâmicas e contraditórias decorrentes tanto da natureza
institucional de cada instituição quanto da dinâmica do processo histórico em que elas se
inserem e das forças presentes na relação de parceria em cada conjuntura. É, por fim, uma
experiência que denota amplas perspectivas democráticas para a construção e concretização
dos direitos sociais das populações mais pobres de Teresina.
125
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130
ANEXOS
131
ANEXO I
ROTEIRO DAS ENTREVISTAS (QUESTÕES-CHAVE)
tulo do Projeto: “A Relação de parceria entre Ação Social Arquidiocesana (ASA) e a
Secretaria Municipal do Trabalho, Cidadania e Assistência Social
(SEMTCAS), na execução da Política de Assistência Social, em
Teresina, junto ao segmento infanto-juvenil, s-Constituição Federal de
1988”.
I. Roteiro de Entrevista para os Gestores Institucionais
01. Por quanto tempo foi gestor da Política de Assistência Social ou da Ação Social
arquidiocesana (ASA)? Descreva as funções e papéis que você exerceu e/ou exerce
como gestor?
02. Descreva como se deu o começo da história da parceria entre a ASA e a SEMTCAS?
Quem foi o incentivador desse processo? Quando começou? E através de que termos
documentais firmaram-se essa parceria?
03. Qual foi o seu papel e responsabilidades nesse processo de construção da relação de
parceria?
04. Nessa trajetória da parceria entre as instituições, teve momento de descontinuidade das
ações, de descumprimento dos termos de convênio, de afastamento e de diálogo?
Descreva esses momentos e Por quê?
05. Quais situações podem ser consideradas mais representativas dos momentos de
afastamentos e/ou de proximidades que se estabelecem na relação de parceria?
(Descrever)
06. Quais os objetivos do Projeto Casa de Zabelê? E quais as ações e serviços oferecidos
pelo Projeto?
132
07. Que direitos preconizados pela Constituição Federal de 1988, PNAS/SUAS (2004) e o
ECA o refletidos nos objetivos e nas ações do Projeto Casa de Zabelê? E o que está
sendo feito de fato para a efetividade desses direitos?
08. Como você avalia a parceria entre a ASA e a SEMTCAS na efetividade das ações
desenvolvidas pelo Projeto Casa de Zabelê?
II. Roteiro de Entrevista para os (as) Técnicos (as) Institucionais
01. quanto tempo você atua como técnico (a) da instituição? Descreva as suas
atribuições e responsabilidades?
02. Descreva como se deu o começo da história da parceria entre a ASA e a SEMTCAS?
Quem foi o incentivador desse processo? Quando começou? E através de que termos
documentais firmaram-se essa parceria?
03. Voparticipou desse processo? Como se deu a sua participação na efetivação da
parceria?
04. A partir do momento em que você se inseriu na instituição/projeto, descreva se nessa
trajetória da parceria entre as instituições, teve momento de descontinuidade das
ações, de descumprimento dos termos de convênio, de afastamento e de diálogo. Em
que momento e Por quê?
05. Quais situações podem ser consideradas mais representativas dos momentos de
afastamentos e/ou de proximidades que se estabelecem na relação de parceria?
(descrever)
06. Quais os objetivos do Projeto Casa de Zabelê? E quais as ações e serviços oferecidos
pelo Projeto?
07. Que direitos preconizados pela Constituição Federal de 1988, PNAS/SUAS (2004) e o
ECA o refletidos nos objetivos e nas ações do Projeto Casa de Zabelê? E o que está
sendo feito de fato para a efetividade desses direitos?
133
08. Descreva a sua avaliação quanto á relação de parceria entre a ASA e a SEMTCAS na
efetividade das ações desenvolvidas pelo Projeto Casa de Zabelê?
134
Serviço de Processamento Técnico da Universidade Federal do Piauí
Biblioteca Comunitária Jornalista Carlos Castello Branco
M887r Mota, Marfisa Martins.
A relação de parceria entre a Ação Social Arquidiocesana (ASA) e
o poder público municipal de Teresina na execução da Política de
Assistência Social [manuscrito]: a experiência do Projeto Casa de
Zabelê / Marfisa Martins Mota. 2009.
133 f.
Cópia de computador (printout).
Dissertação (Mestrado) Políticas Públicas da Universidade
Federal do Piauí, 2009.
Orientação: Profª. Drª. Simone de Jesus Guimarães.
1. Assistência Social Política Social. 2. Estado Moderno 3.
Sociedade Civil. I. Título.
CDD 361.61
135
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