Mas o que queremos com isso? Nem sabemos exatamente. Temos
certeza de que nos move aqui não é somente apontar investimentos
discursivos e estratégias nas experimentações orais, poéticas e musicais
construídas pelo compositor Tom Zé, mas significá-los, ou seja, discutir seus
efeitos de sentidos.
Ao iniciar o trabalho, foi possível, antecipadamente, relacionar nosso
motivo de pesquisa, ou canonicamente, nosso objeto, as canções de Tom Zé, à
teoria da Análise do Discurso de Maingueneau e elegê-la como apoio teórico.
Percebemos adiante que o referido apoio não nos instigou a utilizar
positivamente
as categorias de análise discursivas, já que optamos por
dialogar também com outros pensadores e conseqüentemente com outras
categorias, que de certo modo se integram à perspectiva discursiva. Os
pensadores referem-se a Bakhtin (1997,1999) que traz as idéias da refração,
do dialogismo, do caráter grotesco e carnavalizante do signo lingüístico; a Paul
Zumthor (1998, 2001), que nos apresenta um olhar antropológico sobre a
poética e performance vocal e a idéia de inacabamento; a Décio Pignatari, que
discute aspectos da não linearidade do signo, e Campos(1993) no que se trata
do código apriorístico da linguagem.
Dá-se mérito a Maingueneau por expor uma metodologia sistematizada
sobre elementos discursivos voltada para a análise de textos como práticas
discursivas. Para ele, as unidades que compõem o discurso compreendem
sistemas de significantes, enunciados ligados a uma semiótica textual,
relacionados à história e à sociedade. Uma análise discursiva, portanto, parte
O uso de pronomes que se dirigem a pessoas do discurso no decorrer desse trabalho não é
linear, ou seja, não conservamos do início ao fim uma única pessoa (1º pessoa, 3º pessoa).
Ora assumimos nosso discurso em primeira pessoa quando nos mostramos mais
sensivelmente envolvido por dado momento do trabalho (como se apresentou na Introdução),
ora nos colocamos em terceira pessoa do plural. E noutro momento não assumimos
pessoalidade. Esse uso “indisciplinado” da pessoa discursiva no nosso texto se deu de modo
inconsciente e imperceptível, foi um gesto que se percebeu no fim do percurso e que
atribuímos a ele um significado relevante: reflete espontaneidade e o não assujeitamento do
autor sobre convenções de ordem formal, gramatical. A pessoa do discurso manifestada aqui é
múltipla, heterogênea, é um eu que não se livra da interferência de outros eus. A multiplicidade
pessoal não é mascarada e nem omitida em nenhum momento, dada a vontade indomável do
eu se colocar diante da leitura do mundo: do percurso do trabalho científico, da interpretação
da canção com base numa fundamentação teórica.