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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO
PUC–SP
Eugenia Cristina Cleto Marolla
O equilíbrio econômico-financeiro nas concessões regidas pela Lei nº 8.987/95.
MESTRADO EM DIREITO
Dissertação apresentada à Banca Examinadora
como exigência parcial para obtenção do tulo
de Mestre em Direito do Estado, área de
concentração Direito Administrativo pela
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo
sob a orientação da Profª. Dra. Dinorá Adelaide
Musetti Grotti.
São Paulo
2010
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Banca Examinadora
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AGRADECIMENTOS
A meu marido, André, luz na minha jornada, companheiro e amigo que me auxiliou
em todos os momentos, apoiando-me e contribuindo com sua clareza e
discernimento.
Para minha mãe, Maria Amelia, que me mostrou a importância dos estudos e da
persistência para o crescimento como ser humano.
A meu pai, Glauco, por me fazer ver que a tranquilidade também é essencial ao
aprendizado.
A meus irmãos, Glauco e Ana Paula, sempre presentes, carinhosos e
incentivadores.
A meu cunhado, Márcio, pela torcida.
À professora Dinorá, por me conduzir nesse caminho, que se revelou uma grande
lição de vida.
RESUMO
A utilização da concessão para a prestação dos serviços públicos é
instrumento que vem sendo utilizado em larga escala pelos governos Municipal,
Estadual e Federal. Por meio dela, o Estado transfere a prestação de um serviço
público a terceiro, que o executará por sua conta e risco, remunerando-se por meio
da exploração do serviço. A concessão abriga, portanto, dois objetivos contrapostos:
de um lado, o interesse do Estado na prestação de um serviço adequado; de outro,
o intento do particular em obter lucro com a prestação do serviço. O equilíbrio
desses dois interesses resulta na equação econômico-financeira, ferramenta apta a
garantir a manutenção da relação entre as vantagens e obrigações acordadas pelas
partes, tida por elas como ideais para a consecução de seus objetivos. Esse
equilíbrio deve ser mantido durante toda a execução, necessariamente longa, do
contrato.
Na atualidade, a manutenção do equilíbrio econômico-financeiro ganha
relevo ante ao incremento dos riscos e da necessidade de grandes aportes de
recursos para a viabilização da concessão. A consecução dos deveres do Estado
demanda a atração de investimentos elevados, implicando na exigência da outorga
de garantias maiores para que o capital particular seja atraído para esse fim.
Os litígios decorrentes da quebra da equação econômico-financeira o dos
mais recorrentes e tormentosos no dia a dia das concessões de serviços públicos,
levando as partes, não raramente, a longas e custosas disputas judiciais.
Por essa razão, faz-se necessária a reflexão sobre o princípio do equilíbrio
econômico-financeiro e sua conformação na atualidade, principalmente após a
edição da Lei 8.987/95.
Afigura-se imperativo o aperfeiçoamento de instrumentos de prevenção de
litígios como o planejamento, a redação de cláusulas contratuais mais claras e bem
elaboradas e a realização de revisões ordinárias e extraordinárias.
Pretende-se mostrar, na presente dissertação, que a segurança jurídica cria
um círculo virtuoso em relação aos contratos de concessão e a manutenção do
equilíbrio econômico-financeiro mostra-se essencial para a efetivação desse intento.
Palavras-chave: Contratos administrativos. Concessão de serviços públicos.
Equilíbrio econômico-financeiro. Equação econômico-financeira.
ABSTRACT
The use of concessions for the provision of public services is a tool that has
been widely employed by the Local, State and Federal Governments. Through them
the State transfer the provision of a public service to a third party, which will perform
it at its own risk and being paid for such services. Therefore, the concession
encompasses two conflicting interests: on one side the State interests for a suitable
service provision and, on the other side, the private interests in profiting through
rendering the service. The balance between both interests results in a economic-
financial equation, a tool that can guarantee the relationship maintenance, among the
benefits and duties agreed by the parties, and which they view as ideal for the
attainment of their interests and which should be kept throughout the whole
necessarily-long performance of the contract.
Nowadays, the maintenance of economic-financial balance stands out in face
of the increasing risks and of the need for heavy fund allocation for making the
concession viable, which demands luring investments in an extremely competitive
market, which has been increasingly requiring greater guarantees. On the other
hand, the problems brought forth by the breakdown of the economic-financial
equation are the most frequent and stormy in the daily routine of public services
concessions, often leading the parties to lengthy and costly litigations. Thus, the
reflection on the principle of economic-financial balance and its adaptation to the
present situation is necessary, and mainly after the enactment of Law 8.987/95,
about the points that generate more questions and about the importance for the
improvement of tools for preventing disputes, such as planning, straightforward well-
prepared agreement clauses and the performance of ordinary and extraordinary
reviews. This paper aims at portraying that legal security creates a virtuous circle
concerning the concession agreements, thus being the maintenance of the
economic-financial balance mandatory for the accomplishment of this purpose.
Keyword: Administrative Agreements. Public Services Concession. Economic-
Financial Balance. Economic Financial Equation.
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO 9
2 O SURGIMENTO E A EVOLUÇÃO DAS CONCESSÕES COMUNS NO BRASIL.
12
2.1 A prestação dos serviços públicos no regime da Constituição Federal de 1988. 20
3 A NATUREZA JURÍDICA DAS CONCESSÕES DE SERVIÇOS PÚBLICOS. 24
3.1 A concessão de serviços públicos como contrato administrativo. 25
3.2 O princípio da força obrigatória dos contratos. 29
3.3 A cláusula rebus sic stantibus e a teoria da imprevisão na teoria geral dos contratos. 30
3.4 Os poderes exorbitantes da Administração Pública e o princípio da obrigatoriedade dos contratos. 33
4 O EQUILÍBRIO ECONÔMICO-FINANCEIRO. 36
4.1 O equilíbrio econômico-financeiro nas concessões – instrumento de garantia do princípio da obrigatoriedade
dos contratos. 36
4.2 A origem do princípio do equilíbrio econômico-financeiro. 37
4.3 Objeto da garantia do equilíbrio econômico-financeiro. 41
4.4 Fatores relacionados à composição do equilíbrio econômico-financeiro. 43
4.5 Formação da equação econômico-financeira. 45
4.6 A intangibilidade da equação econômico-financeira. 47
4.7 A garantia do equilíbrio econômico-financeiro é uma via de mão dupla. 48
4.8 O equilíbrio econômico-financeiro no direito brasileiro. 51
4.8.1 O artigo 37, inciso XXI da Constituição Federal do Brasil e o equilíbrio econômico-financeiro dos
contratos administrativos. 53
4.9 Princípios garantidores do equilíbrio econômico-financeiro dos contratos de concessão. 57
5 ROMPIMENTO DO EQUILÍBRIO ECONÔMICO-FINANCEIRO DOS CONTRATOS
DE CONCESSÃO. 63
5.1 O rompimento do equilíbrio econômico-financeiro dos contratos de concessão e a alocação de riscos. 64
5.1.1 Áleas ordinárias. A exploração do serviço por “conta e risco do concessionário”. 67
5.1.1.1. A álea ordinária na lei geral de concessões. O artigo 10 da Lei 8.987/95. 71
5.1.2 Áleas extraordinárias: administrativas e econômicas. 73
5.1.2.1 Teoria do Fato do príncipe (álea administrativa). 74
5.1.2.2 Fato da Administração. 76
5.1.2.3 Poder de alteração unilateral das cláusulas regulamentares. 77
5.1.2.4 Teoria da imprevisão. 79
5.1.2.5 Força maior. 82
5.1.2.6 Sujeições Imprevistas. 83
5.2 Áleas extraordinárias e a quebra do equilíbrio econômico-financeiro das concessões de serviços públicos
segundo o ordenamento jurídico brasileiro. 84
5.2.1 As áleas extraordinárias na Lei nº 8.987/95. 85
5.2.2 As áleas econômicas extraordinárias. 89
5.2.2.1 A Lei nº 8.666/93 e a máxima garantia do concessionário. 90
5.2.2.2 A Lei nº 8.666/93 e a consolidação da construção francesa. 95
5.2.3 Síntese das posições doutrinárias. 99
5.2.4 A cláusula rebus sic stantibus e a teoria da imprevisão. 104
5.2.5 A teoria da imprevisão no Código Civil brasileiro. 106
6 INSTRUMENTOS PARA A VERIFICAÇÃO DO ROMPIMENTO E
RECOMPOSIÇÃO DO EQUILÍBRIO ECONÔMICO-FINANCEIRO DOS
CONTRATOS DE CONCESSÃO DE SERVIÇOS PÚBLICOS. 107
6.1 Instrumentos para a recomposição do equilíbrio econômico-financeiro. 108
6.2 Reajuste e Revisão: uma diferenciação prévia. 111
6.2.1 Reajuste 112
6.2.1.1 Periodicidade para a realização do Reajuste. 116
6.2.1.2 Índices de Reajuste. 117
6.2.1.3 Homologação. 119
6.2.2 A revisão. 121
6.2.2.1 O processo de revisão. 122
6.2.2.2 Revisões ordinárias e extraordinárias. 123
6.2.2.3 O processo de revisão na nº Lei 8.987/95. 124
6.2.2.4 Prazo para a realização da revisão. 125
6.2.3 Instrumentos para a recomposição do equilíbrio econômico-financeiro. 126
6.2.3.1 Mecanismos internos de recomposição do equilíbrio econômico-financeiro: alteração do valor da
tarifa, redução dos encargos do concessionário, prorrogação do prazo da concessão. 127
6.2.3.1.1 Fontes de receitas alternativas, complementares, acessórias ou de projetos associados como
mecanismos de recomposição do equilíbrio econômico-financeiro. 130
6.2.3.2 Mecanismos externos de recomposição do equilíbrio econômico-financeiro: indenizações pagas
com recursos públicos e o subsídio estatal. 132
7 A GARANTIA DA EQUAÇÃO ECONÔMICO-FINANCEIRA NA ATUALIDADE. A
REMUNERAÇÃO DO CONCESSIONÁRIO E A PRESTAÇÃO DO SERVIÇO POR
SUA CONTA E RISCO. 134
7.1 A repartição contratual de riscos nos contratos de concessão. 135
7.1.1 O planejamento da concessão. 138
7.1.2 A divisão de riscos nas concessões de serviços públicos e o equilíbrio econômico-financeiro segundo o
ordenamento jurídico brasileiro. 143
7.2 Novos modelos tarifários. 150
7.2.1 Modelos de estruturação tarifária nas concessões de serviços públicos. 152
7.2.1.1 Custo do serviço 152
7.2.1.2 Novas perspectivas nos cálculos tarifários. 155
7.2.2 O equilíbrio econômico-financeiro e sua relação com os modelos tarifários. 157
7.3 O artigo 10 da Lei nº 8.987/95 como instrumento de atualização da concessão. 160
CONCLUSÃO 164
REFERÊNCIAS 171
9
INTRODUÇÃO
O presente trabalho tem por objetivo investigar o tema do equilíbrio econômico-
financeiro nas concessões de serviços públicos regidas pela Lei 8.987/95, no
contexto de seu ressurgimento.
Conquanto o panorama histórico crie um abismo entre os caracteres atuais do
instituto e os vigentes à época de sua gênese, no século XIX, seu objetivo se
mantém intocado: a prestação de serviços sem ônus financeiro para a
Administração.
O instituto da concessão revela sua idade, foi o primeiro modo de
descentralização de serviços públicos da história. Entrementes, o propósito de
utilização da concessão como meio de privatização é novo.
Não bastasse a dualidade de interesses inerente à concessão – o Estado
investido no mister da prestação do serviço público adequado como curador do
interesse público e o concessionário imbuído na obtenção de lucro e responsável
pela gestão do serviço toma maior relevância, a cada dia, a tutela dos direitos
subjetivos de usuários e investidores.
Com efeito, a equação econômico-financeira é a ferramenta apta a assegurar a
manutenção da relação entre encargos e vantagens, com as quais as partes se
comprometeram voluntariamente na celebração do acordo. Trata-se de instrumento
que permite sopesar os benefícios e as obrigações a que cada contratante se
comprometeu, mantendo-as durante toda a execução do acordo.
A delimitação precisa dessa relação tem gerado profundas controvérsias
doutrinárias e jurisprudências, tendo-se em vista os interesses envolvidos. A
relevância deflui do princípio da obrigatoriedade dos contratos na esfera
administrativa, compatibilizando a mutabilidade inerente ao interesse público à
necessidade de garantia do equilíbrio econômico-financeiro.
Frequentemente, o impasse entre os personagens da concessão afeta a
credibilidade do Estado no cumprimento de suas obrigações, afasta o aporte de
investimentos externos e eleva a taxa de juros dos financiamentos semelhantes.
A necessidade de se assegurar maior segurança nas relações contratuais
estatais faz com que os instrumentos de prevenção do desequilíbrio e de pronta
recomposição da equação econômico-financeira ganhem espaço.
10
Usuários e investidores conquistam papel especial nesse novo cenário, por
força da imperatividade da prestação eficiente do serviço, exigindo a introdução de
ferramentas de acréscimo de produtividade e uma maior atenção aos riscos nas
concessões comuns. Todos esses fatores alteram a relação entre encargos e
vantagens do contrato.
Dessa mudança de panorama, que toma velocidade a cada dia, decorre a
atualidade do tema e a justificativa de sua reflexão.
Não se deve esquecer, ainda, que a edição da Lei de Parcerias Público-
Privadas (Lei 11.079/04) jogou novas luzes sobre o equilíbrio econômico-
financeiro das concessões comuns, fomentando a discussão sobre a possibilidade
de divisão contratual de riscos entre as partes.
Fixado o objeto do trabalho, apresenta-se uma síntese do modo pelo qual a
matéria será tratada.
O estudo se desenvolve em sete capítulos. Após a introdução do tema, no
capítulo 2, apresenta-se o desenvolvimento histórico das concessões de serviços
públicos no Brasil, com o exame da natureza jurídica da concessão e suas
consequências em relação às obrigações assumidas pelas partes, a aplicação do
princípio da força obrigatória e as hipóteses de sua atenuação, cláusula rebus sic
stantibus e teoria da imprevisão.
Algumas especificidades dos contratos administrativos são dissecadas, como
as cláusulas exorbitantes que permitem ao Poder Público realizar alterações
unilaterais nos contratos poderes inexistentes no direito comum e a sua
repercussão direta no equilíbrio econômico-financeiro no capítulo 3.
No capítulo 4, o quociente entre vantagens e obrigações do contrato sofreu
estudo detido em seus vários aspectos (origem, objeto e garantias, balizamento
legal no ordenamento jurídico brasileiro, elementos relacionados, formação,
intangibilidade, reciprocidade) sempre relacionados às concessões comuns.
Perquiriu-se, no capítulo 5, quais fatores levam ao rompimento do equilíbrio
econômico-financeiro, ensejando sua recomposição: o papel das áleas ordinárias e
extraordinárias e o poder de alteração unilateral das cláusulas contratuais pelo
Poder Público.
No capítulo 6, foram objeto de análise os instrumentos de constatação do
rompimento e seus remédios: o reajuste, a revisão e os demais mecanismos de
recomposição do equilíbrio econômico-financeiro: a alteração do valor da tarifa,
11
redução de encargos do concessionário, a prorrogação do prazo da concessão, as
indenizações pagas com recursos públicos, os subsídios estatais e a ampliação de
benefícios do concessionário, a utilização das receitas alternativas, complementares,
acessórias ou de projetos associados.
Ao final, no capítulo 7, são explorados dois aspectos mais relevantes do
instituto no novo contexto da concessão de serviços blicos: a remuneração do
concessionário e a prestação do serviço por sua conta e risco.
Em relação aos riscos, o estudo centrou-se na possibilidade de repartição
contratual em matriz diversa da consagrada pela teoria das áleas, tal como ocorre
nas parcerias público-privadas. O papel do planejamento, como ferramenta para a
determinação dos riscos, também compôs esse capítulo.
Novos modelos tarifários como estímulo à eficiência do concessionário e
sua relação com o equilíbrio econômico-financeiro foram avaliados em razão do
aumento da aleatoriedade das cláusulas contratuais.
Por fim, são apresentadas as conclusões extraídas ao longo do estudo
realizado.
12
2 O SURGIMENTO E A EVOLUÇÃO DAS CONCESSÕES COMUNS NO BRASIL.
No Brasil, a prestação dos serviços públicos foi realizada de várias maneiras ao
longo do tempo, tendo sido importados e colocados em prática, com algum atraso,
os modelos utilizados nos países capitalistas da Europa continental.
Inicialmente, a opção recaiu sobre a prestação direta dos serviços públicos, por
meio dos próprios órgãos componentes da pessoa jurídica de direito público interno.
A partir dos anos 20 do século XX, teve início o processo de descentralização
estatal, pelo qual se transferiu a execução dos serviços públicos para terceiros,
pessoas jurídicas de direito blico criadas pelo Estado, com essa espefica
finalidade. Nasciam as autarquias.
1
O movimento de descentralização ganhou força após a Revolução de 1930,
momento em que, além das funções de índole administrativa, foram transferidas a
terceiros a exploração da indústria e do comércio, em ramos outrora dominados pelo
Estado. A concessão
2
em favor de pessoas privadas (nacionais e estrangeiras)
ganhou relevo como fator de desenvolvimento de infra-estrutura criação e
expansão da rede de estrada de ferro, de portos, da rede de saneamento básico, de
água e de energia – essenciais para permitir o desenvolvimento econômico.
3
Por meio da concessão, o Estado transfere a um terceiro a prestação de um
serviço público essencial, sem o comprometimento de recursos públicos, porquanto
1
Segundo Maria Sylvia Zanella Di Pietro o primeiro conceito legal de autarquia no direito brasileiro foi dado
pelo Decreto-Lei 6.016 de 22-11-43 que a definia como “o serviço estatal descentralizado, com personalidade
de direito público, explícita ou implicitamente reconhecida por lei.”, DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella.
Direito Administrativo. 22 ed, São Paulo: Atlas, 2009, p. 427.
2
Karina Houat Harb, com base nos ensinamentos de Manuel Maria Diez, afirma que registros da utilização
das parcerias entre Poder Público e particulares desde a Antiguidade, especialmente quanto à concessão de
obra pública, pela qual a Grécia e Roma construíram alguns de seus portos. Para ela, embora não se possa
precisar a origem da concessão de serviços públicos, ela foi utilizada no Brasil, com os contornos de sua
concepção clássica ou tradicional, que ganhou destaque com o Estado de Direito, no seu modelo de Estado
liberal, que vigorou do final do século XVIII até o século XIX. (HARB, Karina Houat. A revisão na concessão
comum de serviço público. 2009. 226 f. Tese (doutorado em direito) – Faculdade de Direito, Pontifícia
Universidade Católica de São Paulo, São Paulo, 2009. p.14.
3
Registra Caio Tácito que a criação e expansão da rede de estradas de ferro, de portos, de energia elétrica, de
serviços de transporte coletivo se realizaram satisfatoriamente mediante a concessão destes serviços. Nossa
história econômica está pontilhada de nomes ilustres que se ocuparam destas atividades, mobilizando recursos
em empreendimentos desta natureza. Mauá, no setor das ferrovias, foi um criador e coordenador de empresas
concessionárias de serviços públicos. Um homem como Teófilo Ottoni sonhou abrir um caminho marítimo
para Minas Gerais, através do Vale do Mucuri, no Espírito Santo, numa realização que não teve êxito e que
fora planejada através do esquema de uma empresa concessionária. O grande desenvolvimento da região Sul,
especialmente de São Paulo, foi em grande parte possibilitado pela existência de suficiente potencial elétrico
fornecido por empresa concessionária” (Reformas do estatuto de concessões de serviços Públicos. In: Temas de
direito público (estudo e pareceres). Rio de Janeiro: Renovar, 1997, p. 754-755).
13
o terceiro presta o serviço em seu próprio nome e por sua conta e risco, por longos
prazos de duração, necessários à recuperação dos investimentos efetuados e
reembolso dos custos realizados para a prestação do serviço. Ao Estado cabe a
tarefa de fiscalizar e controlar a prestação do serviço, inclusive em relação à
remuneração cobrada dos usuários.
4
As exigências da sociedade pela subvenção de serviços, financiamento, saúde,
moradia, transporte
5
no período do “Estado Social” impuseram ao Estado a
assunção de novos encargos sociais e econômicos, exigindo grandes investimentos
financeiros, em pessoal técnico especializado e na adoção de novas formas de
gestão do serviço público, fazendo com que as concessões se tornassem
instrumentos importantes para o atendimento dessas demandas.
Nesse período, além da economia de recursos públicos com a utilização da
concessão, a obtenção de melhores resultados na prestação do serviço público por
meio da especialização e da utilização de métodos de gestão privada, mais flexíveis
e mais adaptáveis aos novos tipos de atividades assumidas pelo Estado
6
se
mostraram imperativas.
Todavia, a necessidade de maximizar a prestação dos serviços públicos e de
intervenção no domínio econômico, com vistas a realizar os novos papéis estatais
em atendimento às demandas sociais, não se coadunavam com a concepção
clássica de concessão de serviços públicos
7
, o que levou à alteração dos traços
iniciais da concessão.
Surgiram princípios como o da continuidade dos serviços públicos, tomou
relevo a demanda por maior intervenção estatal nas concessões, como forma de
garantir os interesses da coletividade. Ao Estado, curador do interesse público,
titular do serviço concedido, cabia garantir, em última instância, a sua prestação.
O Estado passou a participar dos prejuízos advindos da concessão, como nas
cláusulas de “garantias de juros” e a utilização da teoria da imprevisão, que tornaram
4
DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 22 ed, São Paulo: Atlas, 2009, p. 291.
5
DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Parcerias na administração pública: concessão, permissão, franquia,
terceirização, parceria público-privada e outras formas. 7. ed. São Paulo: Atlas, 2009, p.11.
6
DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 22 ed, São Paulo: Atlas, 2009, p. 291.
7
A concepção clássica da concessão de serviços públicos foi desenvolvida no Estado Liberal. Segundo Karina
Houat Hart, a concessão caracterizava-se pela outorga da prestação de serviços públicos a um particular, que o
executava em seu próprio nome e por sua conta e risco, sem ônus financeiro e riscos econômicos para o Poder
Público, a quem cabia tão-somente exercer a fiscalização e o controle sobre a prestação. (HARB, Karina
Houat. A revisão na concessão comum de serviço público. 2009. 226 f. Tese (doutorado em direito) –
Faculdade de Direito,
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo, 2009, p.14.
14
a concessão desinteressante para o Poder Público, porquanto onerosa à
Administração.
Além da assunção do risco, outro fator catalisou o declínio das concessões de
serviços públicos no Brasil: a crise econômica mundial desencadeada pelas duas
grandes guerras. Por causa da escassez de recursos privados, não havia solução
diversa da estatização e da nacionalização de atividades anteriormente
desempenhadas por particulares, levando a uma maior intervenção estatal no
domínio econômico. O Estado passou a criar pessoas jurídicas de direito privado
sociedades de economia mista para absorver as concessões que haviam sido
outorgadas aos particulares.
A utilização, pelo Estado, de pessoas jurídicas de direito privado tem como
finalidade conferir maior flexibilidade e eficácia à máquina administrativa. De outro
lado, o Estado arca com os riscos do empreendimento, por deter o controle acionário
das empresas exploradoras da atividade. Como conseqüência, a concessão perdeu
a grande vantagem que proporcionava à Administração: a prestação de serviços
sem o dispêndio de recursos públicos.
8
Outro entrave à utilização das sociedades de economia mista como
concessionárias de serviços públicos decorre do conflito entre os interesses do
Estado e do particular acionista, frutos da oposição das finalidades por eles
perseguidas. Com efeito, enquanto o sócio-Estado objetiva garantir o interesse
público – o que significa fixar preços mais baixos aos usuários do serviço – o
particular mira o maior lucro em menor tempo possível, o que implica na cobrança de
preços mais elevados pela prestação do serviço.
Em razão das desvantagens, as sociedades de economia mista
desapareceram, aos poucos, cedendo lugar às empresas públicas, com capital
integralmente público. Essas transformações são resumidas por José Cretella
Júnior:
O Estado, numa primeira fase, delega ao empresário concessionário;
numa segunda fase, passa à categoria de sócio, menor ou maior;
numa terceira fase, é o acionista maior; na fase final, é o proprietário
exclusivo do empreendimento – é o empresário público.
9
Nessa fase de grande centralização e intervenção, a prestação dos serviços
públicos pelo Estado foi realizada sem preocupação com as fontes de custeio, o
8
DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 22 ed, São Paulo: Atlas, 2009, p. 291-292.
9
CRETELLA JUNIOR, JOSÉ. Regime jurídico das empresas públicas. Revista Forense, v. 237, n. 823-5, mar.
1972, p. 5-13, p.12.
15
elevou o endividamento externo, gerou enormes déficits públicos, comprometeu a
capacidade de investimento estatal e levou à crise desse modelo de prestação de
serviços públicos.
Motivada pelo colapso do modelo de prestação de serviços por empresas com
capital público e ante a necessidade de atender às novas demandas da sociedade
contemporânea, surgidas, em grande parte, pelo avanço tecnológico, ressurgiu, no
final dos anos 80 do século XX, o interesse na concessão de serviços públicos a
particulares, que haviam recuperado o seu potencial de investimento, perdido em
razão dos problemas econômicos advindos das duas guerras mundiais.
Paralelamente, teve início a “Reforma do Estado”, fenômeno de abrangência
mundial, que levou à redefinição do papel do Estado no âmbito econômico,
alterando significativamente as prestações de serviços públicos, com o desmonte do
Estado prestador, produtor, interventor, protecionista e o redimensionamento de sua
função de regulador da atividade econômica.
10
O fim almejado pela reforma era diminuir o aparelhamento estatal, por meio da
transferência, à iniciativa privada, do exercício de algumas funções administrativas
que estavam a cargo da administração direta ou indireta. Com isso, pretendeu-se
tornar a prestação do serviço público mais eficiente, fazendo frente à crise financeira
do Estado.
11
A “Reforma do Estado” trouxe o contrato para o centro das relações entre o
Estado e os particulares, que os autores chamam de “contratualização”,
12
termo
utilizado “para abranger os diversos ajustes que expressam a colaboração entre
entidades públicas ou entre entidades públicas e setor privado, ou, ainda, entre
todas estas partes, envolvendo, assim, uma pluralidade de atores”,
13
buscando-se o
consenso na atividade da Administração, com relações fundadas na discussão entre
10
GROTTI, Dinorá Adelaide Musetti. A experiência brasileira nas concessões de serviço público. In:
SUNDFELD, Carlos Ari (Coord.). Parcerias público-privadas. São Paulo: Malheiros, 2007, p. 182-231, p.187.
11
DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Parcerias na administração pública: concessão, permissão, franquia,
terceirização, parceria público-privada e outras formas. 7. ed., São Paulo: Atlas, 2009, p. 67.
12
Nesse sentido, Dinorá Adelaide Mussetti Grotti (GROTTI, Dinorá Adelaide Musetti. A experiência brasileira
nas concessões de serviço público. In: SUNDFELD, Carlos Ari (Coord.). Parcerias público-privadas. São
Paulo: Malheiros, 2007, p. 182-231, p.187), Odete Medauar (MEDAUAR, Odete. O direito administrativo em
evolução. 2. ed. rev. atual e amp. São Paulo: RT, 2003, p. 213), Maria João Estorninho (ESTORNINHO, Maria
João. A fuga para o direito privado. Coimbra: Almedina, 1996, p. 44).
13
MEDAUAR, Odete. O direito administrativo em evolução. 2. ed. rev. atual e amp. São Paulo: RT, 2003, p.
213.
16
os interessados, no qual o acordo substitui os atos unilaterais de vontade.
14
Para
Maria João Estorninho,
trata-se de uma forma de administração nova, “negociada ou
contratual”, em que o acordo vem substituir os tradicionais atos
unilaterais de autoridade, aparecendo em relação a eles como uma
verdadeira alternativa e em que os administrados deixam de ser
meros destinatários passivos das decisões unilaterais da
Administração Pública.
15
O movimento ganhou força no início dos anos 90 do século XX, com a adoção
do programa nacional de desburocratização e de privatização das empresas estatais
brasileiras. Várias empresas estatais ou áreas anteriormente absorvidas pelo Estado
foram transferidas para o setor privado por concessão, instituto que ressurgiu com a
mesma justificativa adotada no século XIX: a realização de serviços sem ônus
financeiro para a Administração, embora em outro contexto.
16
Diferentemente do que ocorria até então, as concessões de serviços públicos
não eram outorgadas, necessariamente, em regime de exclusividade a um único
particular.
A concorrência, típica das atividades econômicas exploradas em regime de
mercado, foi introduzida na exploração dos serviços públicos. A justificativa,
segundo Dinorá Adelaide Musetti Grotti, está ligada ao ideal de eficiência, pois
mercados em concorrência são mais eficientes que mercados
monopolistas, entendendo-se por eficiência a prestação de serviços
com qualidade desejada e preços justos, sujeitando-se tanto a
regimes de regulação como às regras nacionais de defesa da
concorrência.
17
Nessa nova fase da concessão, a exclusividade na prestação dos serviços
passou a ser a exceção. Ela ocorreu nos caso de impossibilidade material ou
econômica da prestação do serviço público em regime concorrencial. Essas
barreiras, que permitiram a manutenção de monopólios naturais
18
limitadores da
14
GROTTI, Dinorá Adelaide Musetti. A experiência brasileira nas concessões de serviço público. In:
SUNDFELD, Carlos Ari (Coord.). Parcerias público-privadas. São Paulo: Malheiros, 2007, p.182-231, p. 187-
188.
15
ESTORNINHO, Maria João. A fuga para o direito privado. Coimbra:Almedina, 1996, p. 44.
16
A novidade nesse momento, segundo Dinorá Adelaide Musetti Grotti, é a utilização da concessão como meio
de diminuição do aparelhamento do Estado, com o objetivo de privatização. Também Maria Sylvia Zanella Di
Pietro alerta que a retomada do instituto da concessão no Brasil, na última década do século passado, teve
como mote a privatização. (GROTTI, Dinorá Adelaide Musetti. A experiência brasileira nas concessões de
serviço público. In: SUNDFELD, Carlos Ari (Coord.). Parcerias público-privadas. São Paulo: Malheiros,
2007, p. 182-231, p.189).
17
GROTTI, Dinorá Adelaide Musetti. A experiência brasileira nas concessões de serviço público. In:
SUNDFELD, Carlos Ari (Coord.). Parcerias público-privadas. São Paulo: Malheiros, 2007, p. 182-231, p.
190.
18
Sobre o monopólio natural, Marçal Justen Filho ensina que trata-se de uma situação que se apresenta quando
uma certa utilidade pode ser ofertada por preço inferior quando existente um único fornecedor.JUSTEN
17
concorrência, estão sendo superadas, dia a dia, pelos avanços tecnológicos.
Exemplo disso está no compartilhamento de infra-estrutura pelos competidores que
prestam o mesmo serviço, tal como ocorreu com a prestação de serviço de
fornecimento de energia elétrica. Nesses casos, o monopólio da infra-estrutura, por
um dos competidores, não impede a participação dos demais, havendo o dever do
titular do monopólio permitir o acesso, ante ao pagamento de uma remuneração
adequada, dos demais competidores ao conjunto de bens de infra-estrutura
necessários à prestação do serviço.
19
Essa visão “traduz a nova concepção sobre a função social da propriedade,
que é a de servir como instrumento de competição, com a dissociação entre
propriedade e exploração da rede.”
20
A concessão passou a se desenvolver em bases diferentes das existentes até
então monopólio anteriormente, concorrência na atualidade o que traz
consequências importantes, especialmente em relação à garantia econômica que o
Estado deve fornecer a cada um dos concessionários.
Com efeito, a existência de um único prestador do serviço blico concedido
comprometia o Estado com a garantia de rentabilidade do empreendimento, pois a
existência de problemas econômicos ou financeiros, com esse concessionário,
FILHO, Marçal. Algumas considerações acerca das licitações em matéria de concessão de serviços públicos.
Revista Eletrônica de Direito Administrativo Econômico. Salvador, n. 1, fev. 2005, p. 10. Disponível em:
<http://www.direitodoestado.com.br>. Acesso em: 10 dez. 2008.
19
É o caso do modelo econômico de oferta de energia elétrica, “construído a partir da idéia de ciclo completo,
em que uma única e mesma empresa dominava todas as atividades pertinentes (desde a geração até a
comercialização de energia). Mas o progresso científico ao longo das últimas duas décadas, propiciou alteração
radical. Novas tecnologias permitem a geração de energia por processos muito mais baratos e com
elevadíssima eficácia. Há plena possibilidade de competição no plano da geração da energia. [...] Mais ainda, a
dissociação entre a titularidade econômica da fonte de geração da energia e da rede de transmissão propicia
uma revolução significativa, fundada no conceito amplamente desenvolvido no estrangeiro acerca de essential
facilities e Third Party Access(TPA). [...] uma forte tendência na Europa e nos EUA a impedir que o titular
da infra-estrutura explore outra atividade econômica além dela própria.Assim, o proprietário dos trilhos não
poderá prestar serviços de transporte ferroviário: oferecerá a estrutura que permite a exploração dos serviços,
obtendo lucro através da remuneração paga pelos agentes na área de transporte. A grande decorrência consistiu
no fracionamento econômico das atividades, o que inviabilizou o tratamento jurídico unitário” (JUSTEN
FILHO, Marçal. Algumas considerações acerca das licitações em matéria de concessão de serviços públicos.
Revista Eletrônica de Direito Administrativo Econômico. Salvador, n. 1, fev. 2005, p. 11, Disponível em:
<http://www.direitodoestado.com.br>. Acesso em: 10 dez. 2008.
20
GROTTI, Dinorá Adelaide Musetti. A experiência brasileira nas concessões de serviço público. In:
SUNDFELD, Carlos Ari (Coord.). Parcerias público-privadas. São Paulo: Malheiros, 2007, p. 182-231, p.
192.
18
colocava em risco não a adequação na prestação do serviço, como a sua própria
continuidade.
21
Com a introdução da competição, segundo Dinorá Adelaide Musetti Grotti, a
garantia de rentabilidade ao concessionário deixou de ser fundamental, mas ao
Estado se impôs o dever de tratar os prestadores de maneira igualitária.
22
A mudança de paradigma apontada é essencial para a análise da concessão
de serviços públicos e do equilíbrio econômico-financeiro na atualidade e será
retomada no desenvolvimento do trabalho.
Embora não constituam objeto desse estudo, deve-se mencionar que, mais
recentemente, diante da crescente experiência internacional na criação de novas
formas de parceria com a iniciativa privada na gestão dos negócios do Estado, da
escassez de recursos orçamentários para projetos de alto custo e do déficit de
projetos de infra-estrutura em áreas como transportes, saneamento e saúde, foi
editada a Lei nº 11.079, de 30 de dezembro de 2004, que institui normas gerais para
licitação e contratação de parceria público-privada, no âmbito da Administração
Pública, estendendo sua aplicação aos fundos especiais, às autarquias, às
fundações públicas, às empresas blicas, às sociedades de economia mista e às
demais entidades controladas direta ou indiretamente pela União, Estados, Distrito
Federal ou Municípios (art.1º , parágrafo único).
23
O referido diploma legal acrescenta, ao direito positivo brasileiro, as
modalidades de concessão patrocinada e administrativa, com peculiaridades que as
21
GROTTI, Dinorá Adelaide Musetti. A experiência brasileira nas concessões de serviço público. In:
SUNDFELD, Carlos Ari (Coord.). Parcerias público-privadas. São Paulo: Malheiros, 2007, p. 182-231, p.
192.
22
GROTTI, Dinorá Adelaide Musetti. A experiência brasileira nas concessões de serviço público. In:
SUNDFELD, Carlos Ari (Coord.). Parcerias público-privadas. São Paulo: Malheiros, 2007, p. 182-231, p.
192.
23
Os estados de Minas Gerais, São Paulo, Santa Catarina, Distrito Federal, Goiás, Bahia, Sergipe, Ceará, Rio
Grande do Sul, Pernambuco, Amapá, Piauí, Rio Grande do Norte, Maranhão, Rio de Janeiro, Alagoas, Paraíba,
Pará, Amazonas e Espírito Santo já aprovaram suas leis, respectivamente, de números 14.868, de 16-12-2003,
11.688, de 19-05-2004 (alterada pela Lei 1079, de 17/12/08), 12.930, de 04-02-2004, 3.418, de 04-08-2004,
14.910,de 11-08-2004, 9290, de 27-12-2004, 5.507, de 28-12-2004, 13.557, de 30-12-2004, 12.234, de 13-01-
2005, 12.765, de 17-01-2005 (alterada pela lei 13.282, de 23/08/07), 921, de 18-08-2005, 5.494, de 19 de
setembro de 2005, Lei Complementar 307, de 11 de outubro de 2005, Leis nº 8.437, de 26-07-2006, 5.068, de
10/07/2007, 6.972, de 07-08-2008, 8.684, de 07-11-2008, 8.684, de 08-11-2008, 3.363, de 30-12-2008, e Lei
Complementar 492, de 11-08-2009. Estados como Mato Grosso do Sul e Tocantins possuem projetos em
curso. Os municípios de Vitória, Pelotas, Porto Alegre, Gravataí, Novo Hamburgo/RS, Curitiba, São Paulo e
Mauá editaram, respectivamente, as Leis de nos 6.261, de 23-12-2004, 5.115, de 04-05-2005, 9.875, de 08-12-
2005, 2.467, de 18-01-2006, 1.408, de 31-05-2006, 11.929, de 03-10-2006, 14.517, de 16 de outubro de 2007,
alterada pela lei 14.583, de 16/10/2007 e 4.280, de 19-12-2007.
19
diferenciam das concessões comuns até então existentes.
24
A definição dessas
novas modalidades acha-se delimitada na Lei 11.079/04, que preceitua em seu art.
2º:
Art.2º - Parceria público-privada é o contrato administrativo de
concessão, na modalidade patrocinada ou administrativa.
§ 1º- Concessão patrocinada é a concessão de serviços públicos ou
de obras públicas de que trata a Lei 8.987, de 13 de fevereiro de
1995, quando envolver, adicionalmente à tarifa cobrada dos usuários,
contraprestação pecuniária do parceiro público ao parceiro privado.
§ 2º-Concessão administrativa é o contrato de prestação de serviços
de que a Administração Pública seja a usuária direta ou indireta,
ainda que envolva execução de obra ou fornecimento e instalação de
bens.
As parcerias público-privada destinam-se àqueles serviços e/ou obras públicas
cuja exploração não é suficiente para remunerar o contratado, ou para aquelas em
que não há contraprestação dos usuários (ex.: construção e gerenciamento de
presídios ou hospitais públicos). Nesses casos, a participação estatal na composição
da contraprestação do concessionário e na garantia dos investidores é necessária,
ante a impossibilidade da exploração do empreendimento gerar receita suficiente,
por si, para remunerar o concessionário e o investidor privado.
Além dessa característica, o parágrafo do art. estatui hipóteses em que é
vedada a celebração dos contratos de parcerias público-privadas, quais sejam: I -
valor do contrato inferior a R$ 20 milhões de reais; II prazo inferior a 5 (cinco)
anos; III objeto único e exclusivo o fornecimento de mão de obra, o fornecimento e
instalação de equipamentos ou a execução de obra pública. Também está proibida
a utilização dessas espécies contratuais quando o objeto envolver a delegação de
funções de regulação, jurisdicional, o exercício do poder de polícia e outras
atividades exclusivas do Estado, nos termos do art. 4º, III da Lei.
25
As parcerias público-privadas não se confundem com as concessões comuns
de serviços públicos tratadas nesse trabalho, possuindo estrutura contratual e
econômica diversas, que justificam o tratamento legislativo diferenciado.
24
A própria Lei 11.079/04 denomina as concessões de serviços públicos da Lei 8.987/95 como concessões
comuns, conforme disposição do parágrafo 3º do artigo , segundo o qual “§ 3
o
Não constitui parceria
público-privada a concessão comum, assim entendida a concessão de serviços públicos ou de obras públicas de
que trata a
Lei n
o
8.987, de 13 de fevereiro de 1995, quando não envolver contraprestação pecuniária do
parceiro público ao parceiro privado.”
25
GROTTI, Dinorá Adelaide Musetti. A experiência brasileira nas concessões de serviço público. In:
SUNDFELD, Carlos Ari (Coord.). Parcerias público-privadas. São Paulo: Malheiros, 2007, p. 182-231, p.223.
20
2.1 A prestação dos serviços públicos no regime da Constituição Federal de
1988.
A Constituição Federal de 1988 adotou, assim como havia acontecido na
Constituição de 1967 e na Emenda Constitucional 1, de 1969, o princípio da
subsidiaridade da atuação do Estado na ordem econômica.
26
Esse princípio, segundo Maria Sylvia Zanella Di Pietro, abarca a garantia dos
direitos individuais calcada na premissa de que a iniciativa privada tem primazia
sobre a estatal. Como consequência, o Estado não deve executar atividades que o
particular tenha condições de exercer por sua iniciativa e com recursos próprios.
Contudo, isso não significa que o Estado esteja liberado de suas tarefas. A ele
compete fomentar, coordenar e fiscalizar a iniciativa privada, além de subsidiá-la,
quando for necessário. O norte é a parceria entre o público e o privado, o incentivo à
colaboração entre essas duas esferas.
27
Na Constituição de 1967, o princípio encontrava sede no artigo 163, segundo o
qual a atividade econômica deveria ser explorada preferencialmente pela iniciativa
privada, cabendo ao Poder Público estimular e apoiar sua organização e
desenvolvimento. A exploração de atividade econômica pelo Estado somente era
admitida de maneira suplementar.
A Emenda Constitucional 1 de 1969 alterou a redação do artigo 163,
restringindo a atuação do Estado à exploração de atividade econômica. A partir dela,
a exploração da atividade econômica pelo Estado, permitida apenas de maneira
suplementar, seria autorizada por motivo de segurança nacional ou ante a
necessidade de se organizar setor econômico que o pudesse ser desenvolvido,
com eficácia, no regime de competição e de liberdade de iniciativa.
Embora presente nos textos constitucionais de 67 e 69, o princípio da
subsidiariedade não foi observado durante suas vigências, como alerta Maria Sylvia
26
Sobre o princípio da subsidiariedade, consultar a obra de José Alfredo de Oliveira Baracho. O princípio da
subsidiariedade: conceito e evolução. Rio de Janeiro: Forense, 1996.
27
DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Parcerias na administração pública: concessão, permissão, franquia,
terceirização, parceria público-privada e outras formas. 7. ed. São Paulo: Atlas, 2009, p. 15-16.
21
Zanella Di Pietro.
28
Apesar disso, ele foi mantido na Constituição de 1988, como
princípio geral da atividade econômica.
A regra adotada pela Constituição de 1988 é a de liberdade de iniciativa e de
livre concorrência na exploração de atividades econômicas pelos particulares,
cabendo ao Estado, nos termos do artigo 174, o papel de agente normativo e
regulador, exercendo as funções de fiscalização, incentivo e planejamento. A
exploração direta de atividade econômica pelo Estado, nos termos do artigo 173,
é permitida se necessária aos imperativos da segurança nacional ou relevante
interesse coletivo, conforme definidos em lei, ressalvados os casos previstos na
própria Constituição. De outro lado, o artigo 175 da Constituição Federal estabelece
que a competência para a prestação de serviços públicos é do Poder Público.
A definição de atividade econômica e de serviço público deflui da determinação
da titularidade do serviço e, consequentemente, na definição do regime jurídico
aplicável a sua exploração.
29
Essa definição remete ao plano da concepção política
do Estado e seu papel, como afirma Dinorá Adelaide Musetti Grotti,
30
não havendo,
de fato, diferença ontológica entre atividade econômica e serviços públicos. Assim, a
classificação de uma atividade como serviço público ou atividade econômica decorre
de uma escolha política, que pode estar fixada na Constituição, na lei, nas tradições
ou nos costumes. O ordenamento jurídico fixa o que deve ser considerado serviço
público.
Embora a Constituição de 1988 atribua a titularidade dos serviços públicos ao
Estado, ela não delimita a forma para a realização desses serviços, o que permite,
ao administrador público, optar por prestá-los diretamente, por meio dos órgãos da
administração direta; ou indiretamente, utilizando-se de mecanismos como a
concessão, a permissão, criando sociedades de economia mista ou empresas
públicas. No entanto, mesmo quando outorgados a particulares, a prestação de
serviços públicos nunca poderá ser realizada exclusivamente sob regime jurídico de
direito privado, dado que sua titularidade não se transfere, permanecendo com o
Poder Público.
28
DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Parcerias na administração pública: concessão, permissão, franquia,
terceirização, parceria público-privada e outras formas. 7. ed. São Paulo: Atlas, 2009, p. 26.
29
JUSTEN FILHO, Marçal. Algumas considerações acerca das licitações em matéria de concessão de serviços
públicos. Revista Eletrônica de Direito Administrativo Econômico, Salvador, n. 1, fev. 2005, p. 8. Disponível
em: <http://www.direitodoestado.com.br>. Acesso em: 10 dez. 2008.
30
GROTTI, Dinorá Adelaide Musetti. O serviço público e a constituição brasileira de 1988. São Paulo:
Malheiros, 2003, p. 87.
22
Nos termos do artigo 175 da Lei Maior, a prestação indireta dos serviços deve
ser regulada por lei ordinária, competindo ao legislador a tarefa de regular o regime
das empresas concessionárias e permissionárias, o caráter especial de seu contrato
e de sua prorrogação, as condições de caducidade, a fiscalização e a rescisão, os
direitos dos usuários, a política tarifária e a obrigação de manter serviço adequado.
Não , na Constituição Federal, formulação conceitual sobre o instituto da
concessão.
Até o ano de 1995, não havia sido promulgada lei que tratasse das
concessões; aplicavam-se a essa espécie de contratos as disposições da Lei Geral
de Licitações e Contratos, Lei nº 8.666 de 1993.
O regime jurídico para as concessões de serviços públicos foi alcançado com a
edição da Lei 8.987, de 1995, conhecida como Lei Geral das Concessões. Essa
lei é apontada como o marco legal inicial do chamado “ciclo de parcerias” no Brasil,
desencadeando a elaboração de legislação especial para setores específicos como
o de telecomunicações e o de energia.
31
A Lei 8.987/95 regula duas espécies de concessão, a de serviço público e a
de serviço público precedida da execução de obra pública, definindo cada uma
delas, respectivamente, em seu art. 2º, incisos II e III.
As definições dadas por essa lei foram objeto de severas críticas da doutrina,
principalmente por trazerem elementos que não são requisitos para a existência da
concessão, mas que condizem com condições e procedimentos.
32
Além disso, o conceito de concessão de serviço público precedida de obra
pública faz confusão entre a concessão de serviços e a concessão de obras quando,
em seu inciso III do art. 2º, menciona “exploração do serviço ou da obra”. A
31
Sobre esse tema é importante assinalar a opinião de Carlos Ari Sundfeld, para quem “toda essa legislação tem
um sentido geral comum – que é o de viabilizar a gestão não exclusivamente estatal dos interesses públicos e
adota orientações normativas que se repetem, e são de algum modo contrária a tendências legislativas
anteriores.” (SUNDFELD,Carlos Ari. Guia jurídico das parcerias público-privadas. In: SUNDFELD, Carlos
Ari (Coord.). Parcerias Público-Privadas. São Paulo: Malheiros, 2007, p. 19. p. 15-44).
32
Para Marçal Justen Filho “grande parte da formulação verbal contemplada no artigo da Lei 8.987 deve
ser desconsiderada, eis que não apresenta função descritiva (normativa), mas claramente prescritiva”.
(JUSTEN FILHO, Marçal. Teoria geral das concessões de serviços públicos. São Paulo: Dialética, 2003, p.
54). Sobre a definição legal, o autor aponta que a outorga da concessão mediante licitação pode ser exigência
do ordenamento jurídico brasileiro, mas não é da essência da concessão. Isto porque o pressuposto para a
utilização do regime de licitação que exista a concessão. O mesmo raciocínio seria aplicado em relação aos
requisitos de idoneidade do particular. (p. 54-55). Vide também a opinião de Celso Antônio Bandeira de Mello.
(BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Curso de direito administrativo. 26 ed. São Paulo: Malheiros,
2009, p. 701).
23
exploração de obra pública decorrente de concessão configura concessão de obra
pública e não concessão de serviço público.
33
As definições do artigo 2º não pecam apenas pelo excesso. Com efeito, deixou-
se de lado requisito essencial à existência das concessões de serviços públicos: o
fato de a remuneração do concessionário decorrer da exploração do serviço público
concedido. De outro lado, o texto legal preserva características do conceito clássico
de concessão, tais como o fato de o Poder Público permanecer como titular do bem
e de o concessionário executar o serviço em seu próprio nome
34
, contraindo os
riscos normais do empreendimento, fazendo jus à inalterabilidade do objeto
concedido, ao equilíbrio econômico-financeiro e à percepção de tarifas cobradas dos
usuários.
A lei também veicula algumas novidades, como a regra da ausência de
exclusividade na outorga da concessão (art. 7º, III e 16), garantindo ao usuário
liberdade de escolher o prestador do serviço, sempre que houver viabilidade técnica
e econômica, a possibilidade de serem dados em garantia os direitos emergentes da
concessão, até o limite que não comprometa a operacionalização e a continuidade
da prestação do serviço, viabilizando as operações de project finance (art. 28),
35
o
reconhecimento de direitos aos usuários e possibilidade de utilização de formas
amigáveis de solução de litígios contratuais.
Em que pesem as críticas, a Lei Geral de Concessões continua vigente,
disciplinando as concessões de serviços públicos no Brasil.
33
No mesmo sentido, o entendimento de Marçal Justen Filho para quem “a hipótese do inc. III não se configura
como concessão de serviço, mas como concessão de obra pública [...].” (JUSTEN FILHO, Marçal. Teoria
geral das concessões de serviços públicos. São Paulo: Dialética, 2003, p. 81).
34
Há doutrinadores que entendem que o concessionário não age em nome próprio, mas sim em nome do
concedente. Este é o entendimento esposado por Antônio Carlos Cintra do Amaral. Para o autor “dizer-se que a
concessionária age ‘em nome próprio’ teria sentido se houvesse a transferência da titularidade do serviço,
eximindo-se o concedente da responsabilidade por sua prestação. Ou seja: se a concessionária exercesse
função privada. Assim, o que distingue a concessão da terceirização não é o fato de que a concessionária age
‘em nome próprio’, enquanto a empresa contratada mediante terceirização age ‘em nome do Poder Público.
Ambas agem ‘em nome do Poder Público’. Grifos no original. (CINTRA DO AMARAL, Antônio Carlos.
Concessão de serviço público. São Paulo: Malheiros, 2002, p.36).
35
Tal estruturação é definida na doutrina como “a captação de recursos para financiar um projeto de
investimento de capital economicamente separável, no qual os provedores de recursos vêem o fluxo de caixa
vindo do projeto como fonte primária de recursos para atender aos serviços de seus empréstimos e fornecer o
retorno sobre seu capital investido no projeto”. (FINNERTY, John.D. Project Finance: engenharia financeira
baseada em ativos. Rio de Janeiro: Qualitymark, 1998, p.2).
24
3 A NATUREZA JURÍDICA DAS CONCESSÕES DE SERVIÇOS PÚBLICOS.
No capítulo anterior, foi traçado o histórico das concessões comuns de serviços
públicos no Brasil. No entanto, o avanço no estudo do tema tratado demanda a
análise de premissa essencial, cuja definição traz consequências importantes no
estudo do objeto proposto: a natureza jurídica das concessões de serviços públicos.
diversas correntes doutrinárias que explicam a natureza jurídica das
concessões. Romeu Felipe Bacellar Filho sistematizou-as em três grandes grupos:
teorias unilaterais, teorias bilaterais ou contratuais e teoria mista.
36
Para os adeptos da concepção alemã, a concessão é ato unilateral da
Administração Pública, que estabelece, com exclusividade, as condições de outorga
do serviço, cabendo, ao concessionário, apenas aceitá-las. Como o objeto da
concessão prestação de um serviço público está fora do comércio, constituindo
emanação do poder de império, não é permitido ao concessionário alterar qualquer
disposição estabelecida pela Administração. Na concessão, as partes estão em
condição de desigualdade.
Dentro dessa corrente, os que entendem que a concessão é composta por
dois atos unilaterais: o da Administração ato de império – fixando as condições da
outorga do serviço e o ato privado do concessionário, aceitando os parâmetros
impostos. Nesse caso, a manifestação de vontade do particular, aceitando a
proposta, constitui-se em elemento essencial para a constituição do negócio.
Para os defensores das teorias bilaterais, o vínculo gerado entre o particular e a
Administração Pública na concessão é de natureza contratual, havendo divergência
com relação ao regime jurídico a ser aplicado a esse contrato, se de direito privado,
de direito público ou um regime misto.
Para quem entendem que a concessão é um contrato de direito privado, entre a
Administração blica e o concessionário, o regime jurídico aplicável é o do direito
comum, tal como ocorre aos contratos celebrados entre particulares.
36
BACELLAR FILHO, Romeu Felipe. A natureza contratual das concessões e permissões de serviço público.
In: BACELLAR FILHO, Romeu Felipe; BLANCHET, Luiz Alberto (Cords). TRYBUS, Daiana; RIBAS,
Paulo Henrique; CASTRO, Rodrigo Pironti Aguirre de (Orgs) Serviços Públicos: estudos dirigidos. Belo
Horizonte: Fórum, 2007, p. 11-46, p. 25-27.
25
Mas aqueles que defendem ser a concessão típico contrato de direito
público, submetido ao regime jurídico publicístico, derrogatório e exorbitante do
direito comum.
Por fim, os que sustentem a natureza jurídica mista do contrato celebrado
entre o concessionário e a Administração Pública, parcialmente sujeito às regras de
direito privado, no que diz respeito ao aspecto econômico-financeiro e parcialmente
sujeito às regras de direito público, em relação à organização e ao fundamento do
serviço público concedido.
Mas, aqueles que, como Celso Antônio Bandeira de Mello, entendem que a
natureza jurídica das concessões de serviços públicos é mista, composta de uma
relação jurídica complexa formada por um ato-regulamentar, um ato-condição e um
contrato. O ato-regulamentar é praticado pelo Estado para fixar, de maneira
unilateral, as condições e o modo de prestação do serviço concedido ao particular.
o ato-condição é praticado pelo concessionário que, voluntariamente, deseja se
vincular à situação jurídica objetiva estabelecida pelo Poder Público. O contrato
garante a equação econômico-financeira, resguardando os legítimos objetivos de
lucro do concessionário.
37
3.1 A concessão de serviços públicos como contrato administrativo.
O contrato expressa uma relação formada pelo acordo de duas ou mais
vontades, na conformidade da ordem jurídica, destinada a estabelecer uma
regulamentação de interesse entre as partes, que se obrigam reciprocamente a
prestações concebidas como contrapostas, com o escopo de adquirir, modificar ou
extinguir relações jurídicas de natureza patrimonial. Segundo Maria Helena Diniz
O contrato repousa na idéia de um pressuposto de fato querido pelos
contratantes e reconhecido pela norma jurídica como base do efeito
jurídico perseguido. Seu fundamento é a vontade humana [...] Seu
efeito é a criação, modificação ou extinção de direitos e obrigações,
ou melhor, de vínculos jurídicos de caráter patrimonial.
38
37
BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Curso de direito administrativo. 26 ed. São Paulo: Malheiros, 2009,
p. 706-708.
38
DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: teoria das obrigações contratuais e extracontratuais.
24. ed. São Paulo: Saraiva, 2008, v.3, p. 14.
26
Esse conceito não é dado pelo direito privado, embora seja esse o ramo do
direito no qual os contratos possuem maior aplicação. Segundo a teoria geral do
direito, que se aplica aos contratos da administração
39
-
40
, o contrato administrativo
é,
na lição de Celso Antônio Bandeira de Mello:
a relação jurídica formada por um acordo de vontades, em que as
partes obrigam-se reciprocamente a prestações concebidas como
contrapostas e de tal sorte que nenhum dos contratantes pode
unilateralmente alterar ou extinguir o que resulta da avença. Daí o
dizer-se que o contrato é uma forma de composição pacífica de
interesses e que faz lei entre as partes.
41
A existência de acordo de duas ou mais vontades, a existência de interesses e
finalidades contrapostos, a produção de efeitos jurídicos para ambas as partes
42
e a
existência de conteúdo patrimonial na relação jurídica são características de todos
os contratos, sejam eles de direito privado ou público. Como alerta Edmir Netto de
Araújo
caso esse acordo seja de vontades opostas (e não paralelas, como
nos convênios ou consórcios), criando obrigações recíprocas (e,
portanto, sinalagmáticas), cujas prestações sejam intrinsecamente
equivalentes (e, portanto comutativas), sendo tal acordo obviamente
consensual e realizado intuito personae, estaremos diante de
negócio jurídico denominado contrato. E, na hipótese de que tal
contrato envolva objeto e finalidades públicos, celebrado pela
Administração por seu agente competente, após o devido
procedimento legal, e contenha explícita ou implícitamente cláusulas
exorbitantes do direito comum (que preferimos chamar de cláusulas
“de prerrogativa”), que o submetam a regime jurídico de Direito
Administrativo, firmando a supremacia da Administração na relação
jurídica, quando prevalece o interesse público, sob certas condições,
sobre o particular, esse será um contrato administrativo.
43
39
A doutrina administrativista costuma distinguir os contratos administrativos dos contratos da administração.
Segundo Maria Sylvia Zanella Di Pietro a expressão contratos da administração possui sentido mais amplo,
abrangendo todos os contratos celebrados pela Administração Pública, seja em regime de direito público, seja
em regime de direito privado. A expressão contrato administrativo, por seu turno designa apenas os ajustes
realizados pela Administração Pública nessa qualidade, isto é, com prerrogativas de Poder Público, para a
consecução de fins públicos e sob o regime jurídico de direito público. DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella.
Direito administrativo. 22 ed. São Paulo: Atlas, 2009, p. 251.
40
A diferença entre os contratos de direito público e os contratos de direito privado será dada pelo regime
jurídico ao qual estarão submetidos. Quando o contrato estiver submetido ao regime jurídico de direito público,
estará subordinado às regras do regime jurídico administrativo e, portanto, às prerrogativas e sujeições
especiais que lhe são características.
41
BANDEIRA DE MELLO. Celso Antônio. Curso de direito administrativo. 26 ed. São Paulo: Malheiros, 2009,
p. 608.
42
Nesse sentido, DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo. 22 ed. São Paulo: Atlas, 2009, p.
253-255. Marçal Justen Filho também traz definição similar: “o contrato administrativo é um acordo de
vontades com efeitos vinculantes, de que participa a Administração Pública e cujo objeto consiste em numa
prestação de dar, fazer ou não fazer algo economicamente avaliável.”( JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários
à lei de licitações e contratos administrativos. 12. ed. São Paulo: Dialética, 2008, p. 11).
43
NETTO DE ARAÚJO, Edmir. A nova lei federal de concessões e permissões de serviços públicos e obras
públicas. Revista da Procuradoria Geral do Estado/SP. São Paulo, v. 43, 1995, p. 89-116, p. 92.
27
Esses pressupostos também se aplicam às concessões de serviços públicos,
como registra Maria Sylvia Zanella Di Pietro, ao afirmar ser a concessão contrato
administrativo sujeito ao regime jurídico de direito público, no qual estão presentes
todas as características de um contrato: acordo de vontades sobre determinado
objeto, interesses contraditórios e reciprocamente condicionantes e efeitos jurídicos
que se irradiam sobre as partes.
44
A concessão de serviços públicos reveste-se, portanto, da roupagem de
negócio jurídico administrativo, razão pela qual exige a convergência, em acordo ou
consenso, de duas manifestações de vontade, que visam produzir efeitos jurídicos
desejados pelas partes, gerando uma relação jurídica nova, na forma prescrita ou
admitida pelo ordenamento jurídico para atribuir as conseqüências jurídicas
desejadas às declarações emitidas.
45
Não concessão se faltar a manifestação de vontade das partes. A
manifestação da vontade do particular se opera com a apresentação de sua
proposta, nos termos das estipulações constantes do edital. De outro lado, as
estipulações constantes do edital são formuladas de maneira unilateral pela
Administração blica e produzem efeito se houver apresentação de proposta
pelo particular. As normas do edital não possuem imperatividade, não sendo
capazes de obrigar terceiros que com ela não anuírem voluntariamente.
A contraposição de, no mínimo, dois interesses existe na concessão: de um
lado, a prestação de serviços públicos; de outro, a exploração empresarial visando à
obtenção de lucro. Nesse caso, tanto o interesse do Poder Público quanto o do
particular encontram amparo constitucional.
O conteúdo patrimonial, em relação ao concessionário está na busca do lucro
com a exploração do serviço e, em relação à Administração Pública, na prestação
do serviço público com o menor dispêndio de recursos.
A natureza contratual da concessão também encontra amparo no ordenamento
jurídico brasileiro, conclusão que pode ser extraída da leitura do inciso I, do
parágrafo único, do artigo 175 da Constituição Federal, segundo o qual a lei disporá
sobre o caráter especial do contrato de concessão e de permissão de serviços
44
DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo. 22 ed. São Paulo: Atlas, 2009, p. 256. Nesse
mesmo sentido é a opinião de Lúcia Valle Figueiredo, para quem a concessão é espécie de contrato
administrativo pelo qual o Poder Público transfere ao particular, por licitação, a execução de serviços públicos,
que serão executados em nome e por conta e risco desse particular. (FIGUEIREDO, Lúcia Valle. Curso de
direito administrativo. 9. ed. São Paulo: Malheiros, 2008, p. 100).
45
NETTO DE ARAÚJO, Edmir. Administração Indireta Brasileira. Rio de Janeiro: Forense, 1997, p. 29.
28
públicos. As disposições da Lei 8.987/95 também conferem natureza contratual às
concessões de serviços públicos comuns (art. 4º), estabelecendo as cláusulas que,
necessariamente, deverão constar do contrato (art. 23).
Ante ao perfil traçado, pode-se dizer que a concessão comum de serviços
públicos é o contrato administrativo pelo qual o Poder Público transfere a prestação
de um serviço público a outrem, que o executaem seu próprio nome e por sua
conta e risco, sendo-lhe assegurada remuneração advinda da própria exploração do
serviço, em geral por meio de tarifa paga pelos usuários.
46
O caráter contratual da concessão não se altera, nem mesmo ante a
prerrogativa dada à Administração Pública de alterar unilateralmente as cláusulas
contratuais, pois, como ressalta Marcel Waline
na origem da concessão, existe um acordo de vontades gerador de
obrigações, consequentemente um contrato. Se as condições de
execução do contrato podem ser posteriormente modificadas pela
vontade unilateral do concedente, isto se explica pela circunstância
de estarem sob regime jurídico de direito público. Mas isto não exclui
a característica contratual da concessão, porque estas modificações
unilaterais devem ser compensadas por uma remuneração.
Parece mais exato dizer que o ato de concessão é um contrato, mas
que o concessionário apriorísticamente aceita que certas cláusulas
possam ser alteradas unilateralmente, assegurando-se que o
equilíbrio financeiro do empreendimento seja salvaguardado.
47
A concessão, assim como os demais contratos, é fonte de direito e obrigações
para as partes; após sua celebração vincula os contratantes, obrigando-as a cumprir
46
Celso Antônio Bandeira de Mello critica a posição doutrinária que considera a concessão de serviços públicos
como contrato administrativo. Afirma o autor que “é curioso notar que os doutrinadores afirmam, muitas
vezes, reportados aos ‘contratos administrativos’ em geral e não apenas a esta espécie ora cogitada que
neles se contém “cláusulas regulamentares” (as mutáveis) e as cláusulas imutáveis atinentes a parte econômica.
Esta assertiva faz de si mesma, prova de que certas disposições que o regulam o integram o contrato. É
dizer, não são contratuais, pois não podem ser objeto de avença. Estão à margem da influência da vontade do
contratante privado. Em suma: são alheias ao acordo. E, se lhe são estranhas, como podem ser contratuais?
Segue-se que o contratual seria apenas o que poderia ser objeto de pacto e foi pactuado, a saber: a parte
econômica convencionada. Logo, existe contrato com relação a isto. O mais provém de ato unilateral da
Administração Pública sob cuja regência coloca-se o particular, sujeitando-se a uma situação cambiável. Tais
circunstâncias deveriam ser suficientes para evidenciar que as relações jurídicas constituídas entre o Poder
Público e o particular sob a égide do regime em apreço apresentam radical disparidade em relação aos
contratos. Daí a inconveniência de abrigar sob um único rótulo figuras jurídicas tão distintas e submissas a
critérios e princípios completamente diversos. Essa argumentação, entretanto, não sensibilizou nossa doutrina e
jurisprudência.” Grifos no original. (BANDEIRA DE MELLO. Celso Antônio. Curso de direito
administrativo. 26 ed. São Paulo: Malheiros, 2009, p. 613-614).
47
No original: “Cependant, à l’origine de la concession, il y a bien un accord de volontés générateur
d’obligations, donc un contrat. Si les conditions d’exécution du contrat peuvent être par la suite, modifiées par
la volonté unilatérale du concédant, cela s’explique par la circonstance que l’on est en droit public. Mais, cela
n’exclut pas le caractère cntractuel de la concession, car ces modifications unilatérales doivent être compensées
par une indemnité. Il semble plus exact de dire que l’acte de concession est un contract, mais que le
concessionnaire a accepté d’avance que certaines clauses pussent être modifiées unilatéralement, pourvu que
l’equilibre financier de l’enterprise t sauvegardé.” (WALINE, Marcel. Traité élémentaire de droit
administratif. 6 ed, Paris: Recueil Sirey, 1950, p. 392).
29
as suas prestações, sob pena de responsabilização pelos danos causados pelo
inadimplemento.
3.2 O princípio da força obrigatória dos contratos.
A vinculação das partes aos termos do pacto decorre do princípio da força
obrigatória dos contratos. Segundo Orlando Gomes, esse princípio “consubstancia-
se na regra de que o contrato é lei entre as partes.”
48
Uma vez celebrado, com a observância de todos os pressupostos e requisitos
de validade, o contrato deve ser executado pelas partes como se suas cláusulas
fossem preceitos legais imperativos,
49
incorporando-se ao ordenamento jurídico
como verdadeira norma de direito. Além de se tornar lei entre as partes, o contrato
validamente celebrado é ato jurídico perfeito, obrigando as partes a cumprir tudo o
que convencionaram, no tempo, local e na forma estipulados.
50
As partes são livres para se vincular, ou não, ao acordo de vontades que forma
o contrato. Entretanto, a sua celebração gera nos contratantes a confiança de que
as obrigações livremente acordadas sejam cumpridas.
O princípio da força obrigatória dos contratos tem como finalidade proteger a
confiança que cada uma das partes tem na observância do que foi estipulado, o que
preserva a segurança jurídica.
51
Para Orlando Gomes, essa garantia é a “pedra
angular da segurança do comércio jurídico”.
52
Este princípio não é afastado, nem mitigado, nos contratos administrativos. Ao
contrário, nesse tipo de contrato, o princípio é encarecido, pois o que está em jogo,
além da crença que a sociedade deve ter nos contratos, é a expectativa de que a
Administração Pública aja de maneira lídima e pautada na lei.
Após sua celebração, o contrato se dota de intangibilidade, significando que o
acordo de vontades se torna irretratável. Pacta sunt servanda.
48
GOMES, Orlando. Contratos. 6 ed. São Paulo: Forense, 1977, p 44.
49
GOMES, Orlando. Contratos. 6 ed. São Paulo: Forense, 1977, p 44.
50
O ato jurídico perfeito é garantido constitucionalmente, artigo 5º, XXXVI da Constituição Federal de 1988.
51
DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: teoria das obrigações contratuais e extracontratuais.
24 ed. São Paulo: Saraiva, 2008. v. 3, p. 30
52
GOMES, Orlando. Contratos. 6 ed. São Paulo: Forense, 1977, p 44.
30
3.3 A cláusula rebus sic stantibus e a teoria da imprevisão na teoria geral dos
contratos.
As partes se obrigam ao cumprimento de certas parcelas levando em conta,
para a manifestação de sua vontade, as circunstâncias de fato e de direito existentes
à época da celebração do acordo. Com base nessas premissas, se obrigam e
esperam obter um determinado resultado.
Em razão do lapso temporal entre a celebração do acordo e sua execução, os
contratos que possuem execução diferida ou continuada
53
estão sujeitos a
ocorrência de fatos imprevisíveis à época de sua celebração, que podem onerar a
execução para, pelo menos, um dos contratantes. Nesses casos, a aplicação
irrestrita do princípio do pacta sunt servanda pode levar à quebra da justiça
contratual estabelecida na celebração do acordo, à quebra da equivalência objetiva
das prestações
54
com o enriquecimento sem causa
55
de um contratante em
detrimento do outro, o que não é admitido pelo direito.
53
Isto é contratos cuja execução não se dá no mesmo instante em que a vontade é manifestada.
54
Para Paulo Luiz Netto Lobo “O princípio da equivalência material busca realizar e preservar o equilíbrio real
de direitos e deveres no contrato, antes , durante e após sua execução, para hamonização dos interesses. Esse
princípio preserva a equação e o justo equilíbrio contratual, seja para manter a proporcionalidade inicial dos
direitos e obrigações, seja para corrigir os desequilíbrios supervenientes, pouco importando que as mudanças
de circunstâncias pudessem ser previsíveis. O que interessa não é mais a exigência cega de cumprimento do
contrato, da forma como foi assinado ou celebrado, mas se sua execução não acarreta vantagem excessiva para
uma das partes e desvantagem excessiva para outra, aferível objetivamente, segundo as regras da experiência
ordinária. O princípio clássico pacta sunt servanda passou a ser entendido no sentido de que o contrato obriga
as partes contratantes nos limites do equilíbrio dos direitos e deveres entre elas.” (LOBO, Paulo Luiz Netto.
Princípios dos contratos e mudanças sociais. Revista Jurídica. Porto Alegre, n. 329, p. 9-17, 2005, p. 10).
55
Em relação ao enriquecimento sem causa, adotamos a mesma posição de Maria Candida do Amaral Kroetz
para quem A idéia fundamental do enriquecimento sem causa é a obrigatoriedade de restituição do que
se obteve à custa de outrem quando não uma causa reconhecida pelo ordenamento jurídico como
apta a sustentar a retenção do obtido. Note-se que o enriquecimento sem causa opera em parâmetros
distintos tanto do contrato quanto da responsabilidade civil. Para seus fins são mitigados conceitos como
comportamento culposo ou ilícito e vontade das partes. A origem da obtenção de uma vantagem que gere a
obrigação de restituir por enriquecimento sem causa pode derivar de um comportamento do beneficiado,
daquele que exige a restituição, de um terceiro ou até mesmo de um acontecimento natural. A rigor, a
obrigação de restituir o enriquecimento independe de qualquer imputação de conduta ao obrigado ou de sua
declaração de vontade. Na base do enriquecimento sem causa há sempre uma idéia de deslocação patrimonial;
de fluxo e refluxo de valores. Ainda que libertados das idéias iniciais de necessidade de verificar-se um
empobrecimento concomitante ao enriquecimento verificado, de identidade exata entre o perdido por um e o
obtido pelo outro ou de translação de uma coisa corpórea de um patrimônio a outro, não como negar que o
enriquecimento sem causa supõe o trânsito de valores entre distintos patrimônios. A intromissão ilícita na
esfera jurídica alheia está freqüentemente presente no enriquecimento sem causa, mas não lhe é essencial,
porque muitas vezes a obrigação de restituir é gerada independentemente de qualquer conduta ilícita. Note-se
ademais que as preocupações preventivas e sancionatórias que, ainda que por via reflexa, sejam satisfeitas pela
obrigação de restituição do enriquecimento sem causa, não lhe são inerentes e centrais como na
31
A obrigatoriedade contratual está ligada à ideia de comutatividade entre as
prestações a que as partes se obrigaram. A alteração do equilíbrio inicial entre as
prestações afeta a justiça contratual e demanda o seu restabelecimento. Nessa
hipótese, a flexibilização do princípio da obrigatoriedade dos contratos é essencial
para restabelecer a justiça contratual inicialmente estabelecida, reestruturando a
equivalência das prestações, tal como pactuadas.
56
As duas principais maneiras de se afastar a aplicação do princípio da
obrigatoriedade dos contratos são a cláusula rebus sic stantibus e a teoria da
imprevisão.
57
-
58
A cláusula rebus sic stantibus teve origem no direito canônico e se reputava
inserida nos contratos de duração continuada e nos de execução diferida, para
considerar que o vínculo obrigatório estava subordinado à continuação do estado de
fato vigente no tempo da estipulação (contractus qui habent tractum sucessivum et
dependentium de futuro rebus sic stantibus).
59
Dessa forma, a simples alteração do estado de fato existente à época da
celebração do contrato dava ensejo à revisão contratual, não havendo outros
requisitos para sua aplicação. A imprevisibilidade do fato para as partes e a
responsabilidade civil em que os juízos de culpabilidade, ilicitude e censurabilidade são essenciais. Sublinhe-se
que a obrigação de restituir o enriquecimento sem causa não depende necessariamente de qualquer
comportamento do enriquecido, culposo ou não, não depende sequer de qualquer conduta da própria pessoa
que vem a exigir a restituição ou de terceiro, porque pode derivar de um acontecimento natural. A culpa e a
vontade, que ocupam papéis centrais em outros institutos, podem ser irrelevantes para efeitos de
enriquecimento sem causa que independe de qualquer imputação de conduta ao obrigado.” Grifos no original.
(KROETZ, Maria Candida do Amaral. Enriquecimento sem causa no direito civil brasileiro contemporâneo e
recomposição patrimonial. 2005. 207 f. Tese (doutorado em direito) Faculdade de Direito, Universidade
Federal do Paraná, Curitiba, 2006. p. 73-76).
56
É o que afirma Renata Faria de Silva Lima, quando aduz que “a obrigatoriedade contratual está
indissoluvelmente ligada à comutatividade ou ao equilíbrio entre as prestações das partes. Se eventos
posteriores por elas não previstos afetam esta comutatividade e, consequentemente, a justiça contida na
equação econômico-financeira inicialmente avençada, a aplicação do pacta sunt servanda se torna flexível com
vistas ao restabelecimento do equilíbrio das prestações.” (LIMA, Renata Faria da Silva. Equilíbrio econômico
financeiro contratual: no direito administrativo e no direito civil. Belo Horizonte: Del Rey, 2007, p. 10).
57
GOMES, Orlando. Contratos. 6 ed. São Paulo: Forense, 1977, p 46,47.
58
Renata Faria da Silva Lima afirma que atualmente no Brasil não se faz distinção conceitual entre a cláusula
rebus sic stantibus e a teoria da imprevisão. Segundo a autora “De acordo, pois com o princípio do pacta sunt
servanda, o contrato, ‘celebrado que seja com observância de todos os pressupostos e requisitos necessários à
sua validade, deve ser executado pelas partes como se suas cláusulas fossem preceitos legais imperativos’,
sujeitando-se as partes contratantes a deveres e obrigações recíprocos. A não observância a este princípio foi
admitida apenas diante de acontecimentos passíveis de aplicação da cláusula rebus sic stantinbus ou da teoria
da imprevisão, acolhidas indistintamente pelos tribunais pátrios, pela doutrina e por algumas leis especiais que
permitem a rescisão ou a revisão dos contratos pelo Judiciário em razão de mudanças ocorridas durante sua
execução, em relação à época em que fora firmado (exemplos: a Lei do Inquilinato e o Código de Defesa do
Consumidor).” (LIMA, Renata Faria da Silva. Equilíbrio econômico financeiro contratual: no direito
administrativo e no direito civil. Belo Horizonte: Del Rey, 2007, p.3).
59
GOMES, Orlando. Contratos. 6 ed. São Paulo: Forense, 1977, p 46-47.
32
existência de ônus em razão da sua ocorrência não eram levados em conta quando
da utilização da cláusula rebus sic stantibus, o que acabou por inverter a regra da
força obrigatória dos contratos, tornando a alteração regra e a manutenção do
contrato a exceção. Tal fato representava uma vulneração ao princípio maior da
segurança jurídica.
A correção dessa distorção foi feita com a adoção da teoria da imprevisão.
Segundo ela, o princípio da obrigatoriedade dos contratos somente pode ser
afastado se houver alteração das circunstâncias inicialmente previstas, por evento
extraordinário e imprevisível, que onere a relação contratual, gerando a
impossibilidade subjetiva de se executar o contrato.
60
A aplicação da teoria da imprevisão no direito privado exige que a onerosidade
causada a uma das partes pelo evento imprevisto e extraordinário seja excessiva.
Ressalta Orlando Gomes que a modificação quantitativa da prestação deve ser de
tal monta que, para satisfazê-la, o devedor seja obrigado a se sacrificar
economicamente. A onerosidade excessiva não pode levar à impossibilidade
superveniente de cumprimento da obrigação, caso em que se aplica a força maior.
Ela cria dificuldade excessiva na execução da prestação, que deve ser demonstrada
por aquele que invoca sua aplicação para afastar o princípio da força obrigatória dos
contratos.
61
Maria Helena Diniz também ressalta ser imprescindível, na aplicação da teoria
da imprevisão, que a modificação da situação econômica e social do contrato seja
radical, violenta e inesperada, sendo de rigor a restituição da justiça contratual
nesses casos.
62
No direito público, não há consenso sobre a necessidade de onerosidade
excessiva para a aplicação da teoria da imprevisão.
63
Atualmente, a teoria da imprevisão é reconhecida pela doutrina e jurisprudência
brasileira, sendo utilizada para abrandar o princípio da força obrigatória dos
contratos de direito privado e de direito público, inclusive nas concessões de
serviços públicos. Nessa espécie de contrato administrativo, a teoria da imprevisão
60
DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: teoria das obrigações contratuais e extracontratuais.
24 ed. São Paulo: Saraiva, 2008. v. 3, p. 27
61
GOMES, Orlando. Contratos. 6 ed. São Paulo: Forense, 1977, p 48.
62
DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: teoria das obrigações contratuais e extracontratuais.
24 ed. São Paulo: Saraiva. v. 3, 2008, p. 27
63
A aplicação da teoria da imprevisão aos contratos de concessão será tratada em tópico específico.
33
é invocada para restabelecer o equilíbrio econômico-financeiro, restabelecendo-se a
justiça contratual inicialmente estabelecida, conforme se verá.
64
3.4 Os poderes exorbitantes da Administração Pública e o princípio da
obrigatoriedade dos contratos.
Na concessão de serviços públicos, o concedente transfere, ao concessionário,
o direito de prestar o serviço (a execução) e não sua titularidade, mantendo total
disponibilidade do serviço concedido e o direito de reavê-lo, quando assim desejar.
A cura do interesse público impõe diversos poderes-deveres ao concedente.
Para as concessões de serviços públicos, esses poderes-deveres estão previstos,
em grande maioria, no artigo 29 da Lei 8.987/95. São eles (a) poder de inspeção
e fiscalização, que o autoriza a acompanhar diretamente as atividades
desenvolvidas pelo concessionário;
65
(b) poder de alteração unilateral das cláusulas
regulamentares, isto é, as concernentes às condições do funcionamento,
organização do serviço e desfrute pelos usuários, incluindo as tarifas a serem
cobradas; (c) poder de extinguir a concessão antes de findo o prazo inicialmente
estatuído, sempre que o interesse público o aconselhar; (d) poder de intervir
extraordinária e temporariamente na administração do concessionário, ocupando
instalações e exercitando a gerência do pessoal, quando indispensável para
assegurar a continuidade do serviço, sua normalidade ou o adequado cumprimento
das obrigações assumidas pelo concessionário, por não existir outro meio hábil
64
“Além disso, a flexibilização do princípio do pacta sunt servanda, como conseqüência da crise do modelo
liberal codificado de direito patrimonial, é que possibilita mais uma relação entre o contrato e o enriquecimento
sem causa. A expressão da autonomia da vontade das partes no contrato justifica-se como causa do
enriquecimento ainda que o seja respeitado o princípio da equivalência econômica das prestações. Ocorre
que em situações especiais como de alterações drásticas das circunstâncias de celebração do contrato (cláusula
rebus sic standibus), de desvalorização da moeda, de inflação, de usura ou de benefícios excessivos para uma
das partes justificam que recorra-se ao enriquecimento sem causa para a resolução das questões. Isto porque a
tendência atual do direito é de privilegiar a igualdade material das partes contratantes, expressa no princípio da
equivalência material das prestações, em detrimento do princípio liberal da autonomia da vontade.” (KROETZ,
Maria Candida do Amaral. Enriquecimento sem causa no direito civil brasileiro contemporâneo e
recomposição patrimonial. 2005. 207 f.. Tese (doutorado em direito) Faculdade de Direito, Universidade
Federal do Paraná, Curitiba, 2006. p. 181-182).
65
A Lei 8.987/95 se refere a este Poder em outras passagens como nos arts. 3º, 29, I, 30 e parágrafo. único; 31,
V, 23, VII.
34
capaz de salvaguardar os aludidos interesses; (e) poder de impor sanções ao
concessionário inadimplente.
Tais poderes são conhecidos como cláusulas exorbitantes, por conferirem, à
Administração Pública, prerrogativas que o particular não possui. Elas não
encontram correspondência no âmbito do direito privado, em que a igualdade e a
autonomia das partes são pressupostas.
O poder de alteração unilateral das cláusulas contratuais é uma das cláusulas
exorbitantes, conferida à Administração pelo ordenamento jurídico, em razão da cura
do interesse público que é a finalidade última da atividade administrativa.
O interesse público, por sua vez, é dinâmico, mudando de acordo com a
realidade dos fatos, razão que, ao mesmo tempo, legitima e exige o reconhecimento
da supra-ordenação da Administração em relação ao concessionário, dando-lhe a
possibilidade de impor alterações às cláusulas contratuais, sem necessária anuência
do concessionário. A possibilidade de alteração unilateral das cláusulas ligadas à
execução do serviço nas concessões de serviços públicos decorre, portanto, do
regime jurídico de direito público e não do contrato de concessão.
Essa prerrogativa conferida à Administração Pública é limitada, não podendo
ser utilizada indiscriminadamente. Os motivos que levam a Administração Pública a
realizar alterações em cláusulas contratuais são passíveis de controle, pelo que
deverão estar explicitadas na motivação. Ademais, essas alterações o podem
alterar o objeto da avença e a garantia dos direitos patrimoniais do particular
66
,
casos em que serão consideradas ilícitas.
Contudo, as alterações impostas unilateralmente pelo concedente podem
alterar as condições do pacto inicial, criando obrigações a que o concessionário não
se vinculou voluntariamente. O concessionário não pode se eximir do cumprimento
das prestações as quais se vinculou, em razão do regime jurídico de direito público
ao qual a concessão está submetida. A Administração blica deve, em
contrapartida, garantir a manutenção da equivalência entre encargos e vantagens
inicialmente estabelecida. Havendo aumento dos encargos com maiores ônus ao
concessionário, seja por ato da Administração, seja pela ocorrência de evento
imprevisível e alheio à vontade das partes, deverá sobrevir um proporcional aumento
66
BANDEIRA DE MELLO. Celso Antônio. Curso de direito administrativo. 26 ed. São Paulo: Malheiros, 2009,
p. 620-621.
35
das vantagens a que ele faz jus, de forma a se restabelecer a proporcionalidade
inicial.
67
Para se permitir que a obrigatoriedade do contrato não prejudique a justiça
contratual, ajustando o dever de prestação de um serviço de interesse público à
impossibilidade de se onerar um único particular além do que se comprometeu, tem-
se, como ferramenta, o princípio da manutenção do equilíbrio econômico-financeiro
dos contratos.
A finalidade da teoria é a de garantir o particular contra as instabilidades
advindas do transcurso do tempo sobre a execução do contrato, pela preservação,
durante toda sua execução, da relação de fato entre o conjunto de encargos
impostos e as vantagens correspondentes, com os quais as partes anuíram na
celebração do contrato. Desta forma, permite-se a realização das alterações
necessárias à consecução do interesse público, com a preservação da contrapartida
econômica, que moveu o particular a realizar a contratação.
68-69
67
As vantagens não estão adstritas à remuneração a que o concessionário faz jus em razão da prestação do
serviço, embora este seja o seu aspecto mais relevante. Elas englobam outras diversas variáveis relevantes à
execução do pacto como os prazos de início, de execução, de recebimento provisório e definitivo previstos no
ato convocatório, os processos tecnológicos a serem aplicados, o prazo estimado para o pagamento e sua
periodicidade. (JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à lei de licitações e contratos administrativos. 12. ed.
São Paulo: Dialética 2008, p.716).
68
ARAGÃO, Alexandre Santos de. Direito dos serviços públicos. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2008, p. 635.
69
JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à lei de licitações e contratos administrativos. 12. ed. São Paulo:
Dialética 2008, p.716.
36
4 O EQUILÍBRIO ECONÔMICO-FINANCEIRO.
4.1 O equilíbrio econômico-financeiro nas concessões instrumento de
garantia do princípio da obrigatoriedade dos contratos.
O princípio do equilíbrio econômico-financeiro dos contratos de concessão visa
ao restabelecimento da equivalência entre os encargos e as vantagens inicialmente
pactuadas, pela aplicação da teoria da imprevisão ou nos casos em que o interesse
público ensejar a alteração unilateral do contrato por parte da Administração Pública,
restituindo-se a justiça contratual e a equivalência objetiva da prestação e da
contraprestação.
Baseia-se no pressuposto de que a relação inicialmente estabelecida entre os
encargos e as vantagens do concessionário reflete a melhor proposta para a
execução do serviço público, tanto para a Administração blica quanto para o
particular. A equivalência honesta
70
entre os direitos atribuídos às partes
contratantes e o que lhes é exigido constitui-se na base do acordo, a razão pela
qual as partes se comprometem ao celebrarem o contrato e se traduz na equação
econômico-financeira da concessão.
O que se garante com a aplicação do princípio é a equivalência da relação e
não a garantia das cláusulas que tenham expressão econômica em si mesma
consideradas. Sobre esse ponto, Caio Tácito, citando Duez e Debeyere, registra que
as obrigações recíprocas que figuram na concessão não tem valor
absoluto, elas possuem um valor de relação: entre elas se
estabelece uma determinada proporção e é esta proporção que deve
ser mantida. Não são as prestações (A,B,C) do concedente que são
imutáveis, nem aquelas (a,b,c) da concessionária, mas a relação que
foi estabelecida entre A,B,C e a,b,c.
71
Também nas concessões, as disposições contratuais são únicas e exclusivas
para cada contrato que, uma vez celebrado, torna intangível o pacto estabelecido e
70
TÁCITO, Caio. O equilíbrio econômico financeiro nas concessões de serviços públicos. In: Temas de direito
público (estudo e pareceres). Rio de Janeiro: Renovar, 1997, p. 199-255, p. 202.
71
DUEZ, Paul ; DEBEYERE, Guy. Traité de droit administratif. Paris: Dalloz, 1952, p. 566. apud TÁCITO,
Caio. O equilíbrio econômico financeiro nas concessões de serviços públicos. In: Temas de direito público
(estudo e pareceres). Rio de Janeiro: Renovar, 1997, p. 199-255, p. 201.
37
irretratável a relação formada entre os encargos e as vantagens anuídos pelas
partes (equivalência objetiva entre a prestação e a contraprestação).
72
Assim, o equilíbrio econômico-financeiro é o instrumento que permite a
observância do princípio força obrigatória dos contratos em sede administrativa e a
sua conformação com o princípio da continuidade do serviço público e da melhor
realização deste.
4.2 A origem do princípio do equilíbrio econômico-financeiro.
O princípio do equilíbrio econômico-financeiro possui origem jurisprudencial,
sendo seu marco inicial apontado no julgamento do caso da Compagnie Générale
Française de Tramways” pelo Conselho de Estado francês no ano de 1910.
Neste aresto, reconheceu-se a existência de normas de natureza regulamentar
nos contratos de concessão decorrentes da puissance publique.
73
Essas normas
permitiriam que a Administração Pública realizasse alterações unilaterais nos
contratos celebrados, para adequá-los à realidade, de forma a melhor atender o
interesse público. Tais modificações, realizadas pela Administração Pública à revelia
do contratado, poderiam ocorrer em relação às condições do serviço, sem que
isso significasse alteração do objeto contratado e desde que fossem mantidas as
cláusulas financeiras inicialmente avençadas. Reconheceu-se a existência de um
aspecto econômico-financeiro nos contratos celebrados entre a Administração
Pública e os particulares, assegurando ao particular (concessionário) uma relação
de equilíbrio entre as atribuições por ele assumidas e os benefícios econômicos por
ele auferidos.
74
72
Conforme os ensinamentos de Orlando Gomes: “diz-se que é intangível para significar a irretratabilidade do
acordo de vontades. Nenhuma consideração de equidade justificaria a revogação unilateral do contrato ou a
alteração de suas cláusulas”. (GOMES, Orlando. Contratos. 18. ed. São Paulo: Forense, 1999, p. 36).
73
Segundo Celso Antônio Bandeira de Mello o termo “puissance publique” indica a “existência de poderes de
autoridade detidos pelo Estado e exercitáveis em relação aos administrados”. (BANDEIRA DE MELLO,
Celso Antônio. Curso de Direito Administrativo. São Paulo: Malheiros, 26. ed., 2009, p.44). Poder de comando
do Estado ligado à autoridade deste em relação aos particulares.
74
A análise do julgado pode ser encontrada no sítio do Conselho de Estado Francês: “Pelo aresto Compagnie
nouvelle du gaz de Deville-lès-Rouen , o Conselho de Estado deu o primeiro passo para a admissão da
mutabilidade dos contratos administrativos. A cidade de Deville-lès-Rouen tinha concedido em 1874 para a
Compagnie nouvelle du gaz de Deville-lès-Rouen o privilégio exclusivo de iluminação por gás. Entretanto, a
iluminação elétrica se desenvolvia e a prefeitura tentou persuadir a companhia a prestar o serviço de
38
O segundo julgado do Conselho de Estado francês que aborda o tema do
equilíbrio econômico-financeiro na concessão de serviços públicos é o da
“Compagnie Générale D´Eclairage de Bordeaux”. Nele, reconheceu-se a
possibilidade de aplicação da teoria da imprevisão
75
aos contratos administrativos,
iluminação por eletricidade. Face a sua recusa, ela foi trocada por uma companhia de eletricidade. A
companhia de s reclamou uma indenização pela reparação dos prejuízos sofridos pelo fato da nova
concessão ferir o monopólio de iluminação que ela dispunha. Posto o litígio, o Conselho de Estado entendeu
que o contrato que ligava a companhia de gás e o município havia sido prorrogado em uma época na qual a
eletricidade funcionava em outras cidades, como reconhecendo um monopólio de iluminação não
importando qual o meio. Mas, ele considerou que a cidade possuía a faculdade de escolher a prestação do
serviço por meio da eletricidade, compreendendo a concessão deste a um terceiro, se a companhia de gás se
recusasse em prestá-lo. O Conselho de Estado admitiu, assim, um poder de modificação unilateral do contrato
em benefício da administração, poder este consagrado de maneira mais clara no aresto Compagnie Générale
Française des Tramways (21 mars 1910, p. 216). Eles julgaram, nessa oportunidade, que a administração tinha
o direito de impor ao seu concessionário o aumento do número de ramos em serviço, mesmo que esse número
resultasse em aumento de encargos, “por assegurar, no interesse público, a prestação normal do serviço”.
Segundo o comissário do governo Léon Blum ‘É evidente as necessidades que um serviço público dessa
natureza deve satisfazer e, por conseguinte, as necessidades de sua exploração não possuem uma característica
imutável [...] O Estado não pode se desinteressar do serviço público de transporte uma vez concedido...[II]
intervirá necessariamente para impor, em caso superveniente, ao concessionário, uma prestação superior àquela
que estava prevista---, utilizando não mais os poderes que lhe conferem a convenção, mas o poder que lhe
pertence em decorrência da puissance publique”. As modificações podem ocorrer nas condições do serviço:
as cláusulas financeiras não serão tocadas. De outro lado, este poder de modificação unilateral, no interesse do
serviço, comporta uma contrapartida para o concessionário sob a forma de indenização se as novas obrigações
excederem as previsões iniciais do contrato, de modo a restabelecer o equilíbrio financeiro inicial. A resilição
pode ser pronunciada pelo juiz em benefício do concessionário, se as modificações ocorridas no contrato
afetem completamente o aspecto econômico. A partir do momento em que o contrato não corresponda mais aos
desejos do serviço público, a administração pode declarar a resilição unilateral do contrato no interesse do
serviço. O Conselho de Estado confirmou ainda recentemente esta possibilidade, por motivo de interesse geral
em matéria audiovisual (Ass. 2 février 1987, Société TV6 , p. 29). O exercício desse poder deve dar lugar ao
direito de indenização por parte do concessionário.”(Tradução nossa). Disponível em: <http://www.conseil-
etat.fr/cde/fr/presentation-des-grands-arrets/10-janvier-1902-compagnie-nouvelle-du-gaz-de.html>. Acesso
em: 03 nov. 2008.
75
“Pelo caso da Compagnie Générale d’ Eclairage de Bordeaux, o Conselho de Estado desenvolveu a teoria da
imprevisão, a qual permitiu assegurar a manutenção dos contratos administrativos em caso de desordem
econômica temporária, ou acontecimentos que as partes não puderam prever. A Compagnie Générale
d’Eclairage de Bordeaux procurou obter da cidade de Bordeaux que ela suportasse o sobrecusto resultante do
grande aumento do preço do carvão, multiplicado por cinco entre a assinatura da concessão de iluminação e o
ano de 1916. Com efeito, em razão da guerra, a maior parte das regiões produtoras de carvão foram ocupadas
pela Alemanha e o transporte por mar se tornava a cada dia mais difícil. Nessa oportunidade, o Conselho de
Estado decidiu que a variação do preço das matérias-primas em razão de circunstâncias econômicas constituía
uma álea do mercado que deveria ser assumida pelo concessionário. De outro lado, como no caso a economia
do contrato se encontra absolutamente alterada, pois o aumento do custo de fabricação do gás decorreu do fato
do preço do carvão ter ultrapassado os limites do que poderia ser previsto pelas partes, o concessionário não
poderia ser compelido a assegurar o funcionamento do serviço nas condições previstas na origem. Convinha,
para por fim as dificuldades temporárias procurar uma solução que levasse em conta que o interesse geral
exigia a continuidade do serviço, mas também das circunstâncias particulares. Assim, o Conselho de Estado
decidiu que a companhia deveria assegurar o serviço, mas que ela teria o direito de ser indenizada pela
concessionária pelas conseqüências pecuniárias da situação de força maior que excedia a álea econômica
normal. A jurisprudência posterior precisou as condições de aplicação da teoria da imprevisão. Em primeiro
lugar, os acontecimentos que afetam a execução do contrato devem ser imprevisíveis. Estes acontecimentos
podem ser circunstâncias econômicas, fenômenos naturais ou medidas tomadas pelo poder público, mas, em
todos os casos, devem ultrapassar as previsões que poderiam ser razoavelmente feitas quando da celebração do
contrato. Em segundo lugar, eles devem ser exteriores as partes. Se eles forem atribuídos à administração
contratante, será a teoria do fato do príncipe e não esta da imprevisão que deverá valer. Em terceiro lugar, os
acontecimentos devem alterar a economia do contrato. Certo que eles não podem impedir a execução do
39
assegurando-se, àqueles que contratam com a Administração Pública, a
manutenção do equilíbrio econômico-financeiro do ajuste no caso de problemas na
economia e na ocorrência de acontecimentos que as partes não podiam prever
quando da pactuação. Significa dizer que eventos que afetem a execução do
contrato, cuja ocorrência era imprevisível quando da celebração do acordo e que
independam da atuação de qualquer uma delas,
76
geram, para o contratado, o
direito à recomposição do aspecto econômico-financeiro, de forma a restituir a
equivalência entre obrigações assumidas e o benefício econômico estabelecido
quando da contratação. O concessionário tem o direito de receber, senão a
totalidade, ao menos a maior parte do encargo extracontratual, isto é, do montante
do déficit que a execução do contrato gerou durante o período no qual a situação
excepcional se manteve.
A aplicação da teoria da imprevisão aos contratos de concessão demandava,
segundo a jurisprudência francesa, que a situação geradora do encargo
extracontratual fosse transitória. Se a alteração no equilíbrio econômico do contrato
se mostrasse definitiva, a imprevisão era considerada como caso de força maior,
justificando a rescisão da avença. A recomposição do equilíbrio econômico-
financeiro só era possível nos casos em que o evento imprevisível não tivesse
impedido a execução do contrato.
Além disso, nesse mesmo julgado, o Conselho de Estado francês pacificou o
entendimento de que a mera ausência de lucro não pode ser tida como causa
suficiente para a aplicação da teoria da imprevisão. Desta maneira, apenas se o
encargo extracontratual trouxer déficit para o concessionário é que a recomposição
contrato, pois neste caso serão irresistíveis e exonerarão o contratante de suas obrigações, mas eles não devem
ser apenas uma simples ausência de lucro. A imprevisão não é um caso de força maior, o co-contratante deve
perseguir a execução do contrato, ele cometerá uma falta se interromper a prestação do serviço. Em
contrapartida, ele tem o direito de ser indenizado senão da totalidade, ao menos da maior parte do encargo
extracontratual, isto é, do montante do déficit que a execução do contrato durante o período no qual a situação
excepcional se mantiver. Duas conseqüências podem ocorrer: o equilíbrio contratual se restabelece pelo
desaparecimento das circunstâncias imprevisíveis ou novos arranjos entre as partes são efetuados, se a
alteração no equilíbrio econômico do contrato se mostrar definitivo, a imprevisão se transforma em caso de
força maior justificando a resilição do contrato. È interessante constatar que a teoria da imprevisão conduziu a
administração e seus contratante a introduzirem em seus contratos as cláusulas de revisão que permitem uma
adaptação às evoluções das situações econômicas e financeiras, conferindo um papel subsidiário ao jogo da
imprevisão.” (Tradução nossa). Disponível em: <http://www.conseil-etat.fr/cde/fr/presentation-des-grands-
arrets/30-mars-1916-compagnie-generale-declairage.html>. Acesso em
: 03 de nov. 2008.
76
Exterior aqui deve ser entendido no sentido de que as partes não contribuem com qualquer conduta sua para a
realização do evento que altera as disposições contratuais gerando ônus econômico superior ao anuído pelo
contratante quando da celebração do contrato.
40
será devida pelo Poder Público. O que se preserva é, sobretudo, o interesse público
na manutenção da prestação do serviço, nos limites do que foi pactuado.
Renata Faria Silva Lima adverte para o fato de estar o julgado francês baseado
na “experiência concreta havida em uma determinada época e num específico
país”.
77
Apesar dessa observação, a jurisprudência francesa influenciou todos os
estudos acerca do equilíbrio econômico-financeiro dos contratos de concessão.
A partir dessa jurisprudência, verificou-se a existência de duas ordens de
eventos capazes de alterar o pacto inicialmente estabelecido pelas partes na
concessão: as alterações unilaterais efetuadas pelo Poder Público e os eventos
externos ao contrato, imprevisíveis e alheios à vontade das partes. Consequências
diversas foram atribuídas a esses eventos.
A contrapartida da prerrogativa de alteração unilateral do contrato pela
Administração Pública, em razão de sua puissance publique,
78
é o direito do
concessionário à manutenção da relação entre os encargos e as vantagens
inicialmente pactuadas. O aumento do encargo deve corresponder a um aumento
proporcional das vantagens auferidas.
Além disso, o concessionário não pode ser compelido a assegurar o
funcionamento do serviço nas condições previstas na origem, se estas condições se
alteraram radicalmente, causando-lhe grave prejuízo econômico, razão pela qual o
concedente é chamado para garantir monetariamente a execução do serviço.
Segundo Waline
O princípio da compensação devida pelo Estado concedente ao seu
concessionário, em vista a lhe auxiliar a suportar uma crise, não
pode, evidentemente, encontrar sua justificação na idéia de culpa.
[...] De um lado, ela corresponde à obrigação do concessionário de
assegurar a gestão do serviço público custe o que custar, sem
interrupção e sem cortes. Ela é, por consequência, corolário da idéia
de que todo serviço público deve funcionar de maneira regular e
contínua. [...] Mas esse argumento se encontra reforçado por uma
segunda consideração, esta de ordem jurídica: é a idéia que o
concessionário tem o direito de continuar a exploração da concessão
(nas condições normais) enquanto nenhuma falta grave não lhe for
imputada, porque ele deve recuperar os investimentos e as despesas
77
LIMA, Renata Faria da Silva. Equilíbrio econômico financeiro contratual: no direito administrativo e no
direito civil. Belo Horizonte: Del Rey, 2007, p. 58.
78
Segundo Celso Antônio Bandeira de Mello o termo “puissance publique” indica a existência de poderes de
autoridade detidos pelo Estado e exercitáveis em relação aos administrados”. (BANDEIRA DE MELLO, Celso
Antônio. Curso de Direito Administrativo. São Paulo: Malheiros, 26. ed., 2009, p.44). Poder de comando do
Estado ligado à autoridade deste em relação aos particulares.
41
contraídas para realizar o serviço, o que não ocorrerá, em princípio,
até que expire o prazo da concessão.
79
O evento que causa gravame à execução do acordo deve ser transitório
80
, sob
pena de se efetuar um novo contrato.
A jurisprudência francesa constitui a base da noção de equilíbrio econômico-
financeiro dos contratos, influenciando, até os dias de hoje, as concessões de
serviços públicos.
4.3 Objeto da garantia do equilíbrio econômico-financeiro.
Explicar a lógica do equilíbrio econômico-financeiro é de certo modo cil e
intuitivo. Entretanto, o seu conteúdo não pode ser definido de maneira genérica e
abstrata, tampouco de forma apriorística. Adverte Jacintho de Arruda Câmara, que
“nem nos mais complexos e profundos trabalhos acadêmicos é possível encontrar
elementos ou fórmulas que indiquem o conteúdo do mencionado equilíbrio”.
81
A indeterminação é intrínseca ao conceito de equilíbrio econômico-financeiro e
não decorre de qualquer falha ou imprecisão do contrato ou dos contratantes. Como
consequência, o equilíbrio econômico-financeiro é descrito no plano abstrato, de
maneira bastante genérica, como a relação entre encargos e vantagens existente
quando da celebração do acordo.
A descrição abstrata do equilíbrio delimita o princípio cabendo, contudo, à
situação concreta precisar esse quadro; o equilíbrio econômico-financeiro dependerá
das particularidades de cada contrato, de cada serviço e de cada concessão.
A simples comparação entre a aplicação do princípio em diferentes espécies
contratuais, empreitada, concessão comum e parcerias público-privada (concessões
79
Tradução nossa. No original: “Le principe d’une indemnité due par la ville concédante à son concessionaire,
en vue de l’aider à supportes une crise ne peut évidemment trouver sa justification dans une idée de faute. [...]
D’abord, il est corrélatif à l’obligation pour le concessionaire d’assurer la gestion du service public côute que
côute, sans interruption ni à-coup. Il se trouve par suite être un corollaire de l’idée que tout service public doit
fonctionner de façon régulière et continue. [...] Mais cet argument se trouve renforcé par une deuxiéme
considération, clle-là d’ordre juridique: c’est l’idée que <<le concessionaire a le droit de continuer à exploiter
la concession (dans des conditions normales) tant qu’aucune faute grave ne peut lui être reprochée>> parce
qu’il << nést pas encore rémunére des dépenses quíl a engagées et ne devra l’être, en principe, qu’à
l’expiration de la concession.” (WALINE, Marcel. Traité élémentaire de droit administratif. 6 ed, Paris:
Recueil Sirey, 1950, p. 390).
80
Atualmente utiliza-se o princípio do equilíbrio econômico-financeiro dos contratos de concessão para os casos
em que a turbação seja definitiva e enseje a renegociação do contrato, como se verá.
81
CÂMARA, Jacintho de Arruda. Tarifas nas concessões. São Paulo: Malheiros, 2009, p.169.
42
administrativas e patrocinadas) é útil para mostrar a indeterminação do conteúdo do
princípio.
Assim, nos contratos de empreitada os riscos são integralmente assumidos
pela Administração Pública, a qual deve garantir o recebimento de uma certa
contraprestação, independentemente dos eventos que surjam ao longo da execução
do ajuste
82
, nas parcerias público-privada, a garantia do equilíbrio econômico-
financeiro deverá considerar a existência de um compartilhamento contratual de
riscos entre as partes e o fato de o serviço concedido não ser auto-sustentável, o
que faz com que o reequilíbrio dependa em grande parte das disposições
contratuais. nas concessões comuns, o risco ordinário do empreendimento corre
por conta do concessionário e a sua remuneração advém da exploração do serviço,
o que faz com que alguns ônus sejam assumidos exclusivamente pelo particular,
quando se tratar de risco ordinário do negócio (por exemplo, elevação no número de
indenizações por responsabilidade objetiva). De outro lado, os fatos imprevisíveis e
as alterações unilaterais impostas pela Administração Pública para atendimento do
interesse público devem ser, necessariamente, compensadas pelo Estado. O
equilíbrio econômico-financeiro nas concessões comuns depende, assim, da
espécie de álea a qual o evento se enquadra.
83
Mas não são apenas essas as peculiaridades do equilíbrio econômico-
financeiro nos contratos de concessão comum. A alteração da equação deverá,
ainda, levar em conta a situação concreta do contrato, verificando, em dado
momento, se a criação de ônus ou obrigação não foi compensada por uma
vantagem ou por uma diminuição de outras obrigações, de forma que, no fim das
contas, o equilíbrio se restabeleça. Não se pode afirmar, de plano, que qualquer
novo ônus ou obrigação imposta ao concessionário ensejo à quebra do equilíbrio
inicialmente estabelecido. A caracterização do desequilíbrio dependerá de detida
análise do caso concreto, avaliando-se a nova obrigação e a realidade na qual o
contrato está inserido. De fato, pode ocorrer que o ônus econômico da nova
obrigação seja compensado pela redução de custos incorridos na execução do
82
MARQUES NETO, Floriano de Azevedo Marques. Breves considerações sobre o equilíbrio econômico
financeiro nas concessões de serviços públicos. Revista de Informação Legislativa. v.40, n. 159, p. 193-197,
jul./set. de 2003, p. 196. Disponível em:< http://www2.senado.gov.br/bdsf/item/id/884>. Acesso em: 28.out.
2009.
83
MARQUES NETO, Floriano de Azevedo Marques. Breves considerações sobre o equilíbrio econômico
financeiro nas concessões de serviços públicos. Revista de Informação Legislativa. v.40, n. 159, p. 193-197,
jul./set. de 2003, p. 196. Disponível em:< http://www2.senado.gov.br/bdsf/item/id/884>. Acesso em: 28.out.
2009.
43
serviço como, por exemplo, na aplicação de novas técnicas de gerenciamento.
Nesse caso, o equilíbrio econômico-financeiro inicial pode permanecer intocado, em
que pesem as alterações verificadas nos encargos e vantagens do concessionário.
Conclui-se, assim, com Jacintho de Arruda Câmara, que
de se reconhecer que a noção de equilíbrio econômico-financeiro
é, por origem (uma vez que se inspira na teoria da imprevisão) e
funcionalidade, conceito vago, impreciso, indeterminado. Ele é útil
justamente porque é flexível e comporta ponderações na sua
aplicação. A tentativa de prendê-lo numa fórmula rígida é inviável e
seria também ineficiente (caso alguém conseguisse fazê-lo).
84
4.4 Fatores relacionados à composição do equilíbrio econômico-financeiro.
A garantia do equilíbrio econômico-financeiro está no âmbito do direito. No
entanto, a ciência econômica fornece os métodos para a análise dos custos e
benefícios da concessão,
85
tanto do ponto de vista da Administração blica quanto
do concessionário. Nessa seara, equilíbrio econômico e equilíbrio financeiro não se
confundem.
Segundo Roy Martelanc, o equilíbrio econômico garante a rentabilidade do
concessionário, em equivalência aos patamares praticados no mercado, mais seus
méritos, menos seus deméritos, não sendo, entretanto, suficiente para se assegurar
a viabilidade financeira da concessão. O equilíbrio financeiro, por sua vez,
corresponde ao suficiente fluxo de recursos financeiros, sem os quais a
concessionária não consegue prover, adequadamente, o serviço que lhe foi
outorgado.
86
Embora o conceito de equilíbrio econômico-financeiro seja indeterminado,
dependendo, para sua configuração, das disposições contratuais, do regime da
outorga da concessão (exclusividade, concorrência) e do próprio serviço concedido,
84
CÂMARA, Jacintho de Arruda. Tarifa nas concessões. São Paulo: Malheiros, 2009, p.171.
85
A análise da rentabilidade esrelacionada aos investimentos, às receitas, aos custos e ao fluxo de caixa em
um espaço de tempo. Os métodos indicados para esta análise são Taxa interna de retorno TIR e Valor presente
líquido – VPL.
86
MARTELANC, Roy. Equilíbrio econômico x equilíbrio financeiro em concessões: um caso de transporte
urbano de passageiros. X Congreso Internacional del CLAD sobre la Reforma del Estado y de la Administración
Pública. Santiago, Chile, 18 - 21 Oct. 2005, p. 1-12. Disponível em
<http://www.iij.derecho.ucr.ac.cr/archivos/documentacion/inv%20otras%20entidades/CLAD/CLAD%20X/docu
mentos/martelan.pdf>. Acesso em 22 fev. 2010.
44
bem como de métodos e equações econômicas para se obter o seu resultado,
algumas variáveis que deverão ser consideradas na sua composição.
Assim, a remuneração a ser paga ao concedente pela outorga, os custos e
despesas do concessionário na prestação do serviço, os valores necessários à
amortização dos investimentos efetuados, o lucro operacional do concessionário, a
receita tarifária, as receitas alternativas, complementares ou acessórias ou de
projetos associados e o prazo da concessão são elementos que devem compor a
equação econômico-financeira nas concessões de serviços públicos.
87
Além disso, é importante que se leve em consideração o regime adotado para
a fixação da tarifa, principal instrumento para o restabelecimento do equilíbrio
econômico-financeiro.
Antônio Carlos Cintra do Amaral alerta para o fato de a Lei 8.987/95 ter
adotado o regime de tarifa pelo preço em substituição ao regime de tarifa pelo custo.
87
Segundo Roy Martelanc, o cálculo do equilíbrio econômico dinâmico é feito da seguinte maneira: “1.
Projetam-se as receitas, geralmente a partir da multiplicação do potencial de mercado projetado pela participação
estimada da concessionária. O crescimento do mercado potencial é função de projeção demográfica e da
evolução de hábitos de consumo. A participação de mercado depende da percepção de benefício e de custo em
relação a serviços concorrentes. 2. Projetam-se os custos e despesas operacionais necessários à concessão, com
base nos demonstrativos contábeis auditados, modificadas para refletir a sua efetiva necessidade operacional
futura. 3. Projeta-se o lucro operacional da empresa, calculado após o imposto de renda. As alíquotas e normas
dos tributos sobre a renda, com alterações não passíveis de reequilíbrio, são as da data da proposta comercial
inicial. 4. Projetam-se os investimentos definidos em contrato e outros necessários à operação, tanto em ativo
fixo como em capital de giro. A concessionária tem a opção de buscar a solução mais econômica e reduzir seus
custos correntes por meio de investimentos, que incorrem no custo de oportunidade do capital. 5. Projeta-se o
fluxo de caixa da concessionária, pela adição da depreciação e diminuição dos investimentos necessários à
concessão. São excluídos os itens referentes exclusivamente à concessionária. 6. Calcula-se o investimento
passado a remunerar, composto de investimentos líquidos necessários à operação, além de eventuais
desequilíbrios, negativos ou positivos, a compensar. 7. Estima-se uma taxa de desconto que reflita o custo de
oportunidade de longo prazo no mercado financeiro de investimentos de risco semelhante. 8. Calcula-se a tarifa
que anula o valor presente líquido para a concessionária. O equilíbrio econômico dinâmico é obtido pela
equiparação do valor presente do FC passado a remunerar com o FC futuro.” O autor adverte que “para o
equilíbrio financeiro, é necessário mais, é necessária a efetiva entrada de caixa em tempo hábil para a solução de
problemas imediatos. [...] O equilíbrio financeiro é obtido quando a concessão consegue pagar seus custos e
despesas operacionais, fazer os investimentos necessários à operação e, se houver, saldar suas dívidas atrasadas
com fornecedores e com o fisco. Os primeiros dois componentes estão considerados no fluxo de caixa
operacional, portanto os passos iniciais são os mesmos do cálculo do equilíbrio econômico, seguidos de: 6. É
somada, como fonte adicional de financiamento e com o efeito de reduzir a tarifa de equilíbrio financeiro, uma
programação de recebimento dos créditos que a concessionária tem com o Estado. Estes são supostos recebíveis
em recursos financeiros, sendo a distribuição temporal deste recebimento a mesma do plano de amortizações dos
passivos operacionais vencidas, com a incidência da taxa de juros real. 7. É diminuída a amortização dos
passivos operacionais em atraso, amortizada na forma da Lei para impostos e de forma conveniente e negociável
para os fornecedores. 8. A tarifa de equilíbrio financeiro é a que torna possível o pagamento destes gastos
operacionais”. (MARTELANC, Roy. Equilíbrio econômico x equilíbrio financeiro em concessões: um caso de
transporte urbano de passageiros. X Congreso Internacional del CLAD sobre la Reforma del Estado y de la
Administración Pública. Santiago, Chile, 18 - 21 Oct. 2005, p. 1-12. Disponível em
<http://www.iij.derecho.ucr.ac.cr/archivos/documentacion/inv%20otras%20entidades/CLAD/CLAD%20X/docu
mentos/martelan.pdf>. Acesso em: 22 fev. 2010).
45
Na nova sistemática, a remuneração do concessionário é mutável, o sendo
baseada, tão-somente, nos custos inerentes à execução do serviço.
Por se tratar de serviço explorado por conta e risco do concessionário, a
apuração do valor da tarifa sofre influência de variáveis (receita tarifária, as receitas
alternativas, complementares e acessórias ou de projetos associados, os custos, o
ônus da concessão, a amortização dos investimentos efetuados e o lucro),
relacionadas ao prazo da concessão, parâmetro para a fixação da equação
econômico-financeira do contrato. A equação pode ser representada da seguinte
maneira:
88
-Remuneração ao concedente pela outorga
da concessão (quando for o caso)
-Custos
- Amortização dos investimentos efetuados
- Lucro
-Receita tarifária (a tarifa pode resultar da
proposta ou ser fixada pelo concedente)
- Receitas Alternativas, complementares,
acessórias ou de projetos associados (com
vista a
favorecer a modicidade da tarifa).
Prazo da Concessão
4.5 Formação da equação econômico-financeira.
Definir o momento em que se tem por formada a equação econômico-
financeira é de essencial importância, pois se consolidam, nessa data, os estados
88
CINTRA DO AMARAL, Antônio Carlos. O reequilíbrio econômico-financeiro dos contratos de concessão de
rodovias. Revista do advogado, São Paulo, v. XXIX, n. 107, p. 25-32, dez. 2009, p. 26.
46
fático e jurídico nos quais repousam a equação, cuja alteração pode tornar mais ou
menos onerosa a execução da prestação.
89
A equação econômico-financeira dos contratos de concessão de serviços
públicos não se forma em um único ato, embora se possa identificar um momento
inicial a partir do qual ela deverá ser considerada pelos contratantes.
Na fase de planejamento, começam a ser desenhadas as vantagens e
obrigações de cada uma das partes. Esse desenho evolui durante o procedimento
licitatório. No edital, são fixadas as obrigações do concessionário e na proposta a
contrapartida econômica para fazer frente a elas. Os riscos previsíveis, os valores
necessários para financiar a implementação da prestação do serviço, os prazos de
amortização do investimento deverão ser considerados, pelas partes, na celebração
do acordo e na equação que se forma.
Após o fim do procedimento licitatório, a equação econômico-financeira está
formada. Entrementes, ela se aperfeiçoa apenas após a assinatura do contrato,
passando a produzir efeitos. Preleciona Diogo de Figueiredo Moreira Neto que “pelo
contrato administrativo, assegura-se a equivalência das prestações ajustadas,
sempre apreciável em termos econômico-financeiros, com termo inicial
contemporâneo à formação do vínculo contratual”.
90
Marçal Justen Filho adverte que os conteúdos do ângulo ativo e passivo da
equação, aperfeiçoada com a assinatura do contrato, reportam-se não à data de
assinatura, mas a momentos anteriores, especialmente o da apresentação das
propostas. Dessa forma, o princípio do equilíbrio econômico-financeiro “pode
conduzir a que, no momento da contratação, haja necessidade de adequar o
conteúdo do instrumento às variações ocorridas”.
91
Isto acontecerá se houver
decorrido mais de um ano entre a data limite da apresentação da proposta, ou do
orçamento a que ela se referir e a assinatura do contrato, nos termos do artigo 2º, §
1º da Lei 10.192/01.
92
Esse tema será tratado em tópico específico.
89
JUSTEN FILHO, Marçal. Teoria geral das concessões de serviço público. São Paulo: Dialética, 2007, p. 396.
90
MOREIRA NETO, Diogo de Figueiredo. Curso de direito administrativo. 15. ed. Rio de Janeiro: Forense,
2009, p. 191.
91
JUSTEN FILHO, Marçal. Teoria geral das concessões de serviço público. São Paulo: Dialética, 2007, p. 396.
92
Segundo resenha da Diretoria Técnica de Normas e Jurisprudência do Tribunal de Contas da União “na
repactuação dos contratos de serviços de natureza continuada deverá ser observado o interregno mínimo de um
ano, a contar da data da proposta ou da data do orçamento a que a proposta se referir. Nas repactuações
subseqüentes à primeira, o prazo mínimo de um ano conta-se a partir da data da última repactuação.“ Disponível
em
<https://contas.tcu.gov.br/pls/apex/f?p=175:11:763532139861463:pg_R_585869923812256598:NO&pg_min_ro
w=6&pg_max_rows=5&pg_rows_fetched=5>. Acesso em: 22 fev.2010.
47
4.6 A intangibilidade da equação econômico-financeira.
A intangibilidade da equação econômico-financeira constitui-se na
impossibilidade de se alterar a relação inicialmente pactuada entre encargos e
vantagens da concessão. Decorre do princípio da força obrigatória dos contratos,
que torna irretratável o acordo de vontades.
93
Trata-se de princípio fundamental dos
contratos administrativos, em particular das concessões de serviços públicos.
Segundo Caio Tácito,
Quaisquer modificações unilaterais da situação objetiva do serviço,
desde que aumentem os encargos do concessionário, implicam a
obrigação para o poder público de adaptar o outro tempo da equação
econômica, de modo a que se mantenha a mesma relação
convencionada entre concedente e concessionário, que somente de
comum acordo pode ser modificada.
94
A celebração do acordo torna o contrato ato jurídico perfeito e gera, em relação
ao equilíbrio econômico-financeiro, direito adquirido para os concessionários de
serviços públicos.
95
O equilíbrio econômico-financeiro não é inteiramente determinado pela
Administração Pública, dependendo da apresentação da proposta do
concessionário, representando o aspecto patrimonial do negócio, o resultado da
equação custos e benefícios do contrato.
A intangibilidade do equilíbrio econômico financeiro, por sua vez, objetiva
preservar o contrato e a manifestação livre de vontades que gerou o vínculo
obrigacional. Se o contrato é fonte de obrigações e faz lei entre as partes, sua
observância deve ser garantida pelo ordenamento jurídico, sob pena de se macular
o princípio da segurança jurídica. Esse entendimento não está presente apenas no
Direito Privado, mas também no Direito Público, como se depreende das lições de
Waline, citado por Celso Antônio Bandeira de Mello, para quem
93
GOMES, Orlando. Contratos. 18. ed. São Paulo: Forense, 1999, p 36.
94
TÁCITO, Caio. O equilíbrio econômico financeiro nas concessões de serviços públicos. In: Temas de direito
público (estudo e pareceres). Rio de Janeiro: Renovar, 1997, p. 199-255, p. 239; BANDEIRA DE MELLO,
Celso Antônio. Curso de direito administrativo. 26. ed. São Paulo: Malheiros, 2009, p. 238.
95
TÁCITO, Caio. O equilíbrio econômico financeiro nas concessões de serviços públicos. In: Temas de direito
público (estudo e pareceres). Rio de Janeiro: Renovar, 1997, p. 199-255, p. 239; BANDEIRA DE MELLO,
Celso Antônio. Curso de direito administrativo. 26. ed. São Paulo: Malheiros, 2009, p. 651.
48
o equilíbrio financeiro ou equação financeira do contrato é uma
relação que foi estabelecida pelas próprias partes contratantes no
momento da conclusão do contrato, entre um conjunto de direitos do
contratante e um conjunto de encargos deste, que parecem
equivalentes, donde o nome de equação; desde então essa
equivalência não pode ser alterada.
96
4.7 A garantia do equilíbrio econômico-financeiro é uma via de mão dupla.
Nem sempre a ocorrência de um evento, que interfere na execução da
prestação contratada, resulta em novo encargo para o concessionário ou é apto a
alterar a equação econômico-financeira formada na celebração da concessão. Pode
ocorrer, ao contrário, que esse evento venha a desonerar o concessionário,
tornando a prestação por ele devida menos gravosa do que o inicialmente previsto.
Tal situação gera um desequilíbrio entre a relação de encargos e vantagens
inicialmente estabelecida (equação econômico-financeira) em favor do
concessionário do serviço público.
Nessas situações, deve-se realizar a readequação dos encargos e prestações
de forma a se restabelecer o equilíbrio econômico-financeiro inicialmente
estabelecido pelas partes.
O princípio do equilíbrio econômico-financeiro foi construído pela jurisprudência
para garantir a prestação dos serviços públicos concedidos, quando a situação
imprevisível tornasse extremamente onerosa a prestação para o concessionário, ou
para fazer frente a uma nova obrigação criada a posteriori pela Administração
Pública em razão do interesse público. Baseia-se em princípios como a isonomia, a
supremacia do interesse blico, a indisponibilidade do interesse público, a
continuidade do serviço público, a segurança jurídica, a boa-fé, o direito adquirido e
a vedação do enriquecimento sem causa. Esses princípios não podem ser aplicados
exclusivamente na hipótese de prejuízo ao concessionário de serviços públicos.
A relação estabelecida entre o concessionário de serviços públicos e a
Administração Pública é de parceria, na qual o concessionário busca a obtenção de
lucro com a exploração empresarial de um serviço público e a Administração a
96
WALINE, Marcel. Droit Administratif. 1963, p. 618. Apud BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio
Bandeira. Curso de direito administrativo. 26. ed. São Paulo: Malheiros, 2009, p. 636.
49
execução do serviço da forma mais adequada com o menor ônus possível para o
erário.
O interesse público impõe a justa remuneração do concessionário. De outro
lado, o toca ao concessionário a prestação de um serviço adequado (art. 6º,§1º da
Lei 8.987/95), que inclui a tarifa mais módica possível aos usuários do serviço
concedido. Se as vantagens do concessionário aumentam sem base no pacto inicial,
em razão de eventos alheios a sua vontade, essa majoração o pode ser
incorporada ao patrimônio do concessionário, sob pena de enriquecimento sem
causa. Além disso, a relação de parceria e de isonomia impõe que os ganhos extras
sejam compartilhados com os usuários do serviço concedido, não podendo ser
inteiramente apropriados pelo concessionário de serviços públicos.
As vantagens e encargos existem para ambas as partes que anuem com suas
prestações e vantagens por ocasião da pactuação. Dessa forma, estão obrigados a
cumprir as obrigações a que se comprometeram e a receber os valores a que
anuíram.
O acordo celebrado é ato jurídico perfeito e gera, para as partes, o direito ao
equilíbrio econômico-financeiro. Assim, não como a relação entre encargos e
vantagens valer para apenas um dos contratantes. Uma vez firmado o acordo, ele
obriga a todos que com ele assentiram.
Assim, se houver qualquer alteração na relação entre os encargos e vantagens
inicialmente pactuados, ocorrerá o desbalanceamento da equação, e a consequente
necessidade de restabelecê-la pois, da mesma forma que um evento imprevisível
não pode gerar o enriquecimento da Administração Pública e de toda a sociedade
em detrimento de um único particular, não é lícito ao particular auferir vantagem sem
causa jurídica.
Ademais, o benefício de um único concessionário, que se vale da ocorrência de
um fato para obter um bônus, em detrimento de toda a sociedade, sem causa
jurídica, fere os princípios da isonomia e da boa-fé, norteadores da atuação da
Administração Pública e de todos os contratantes.
A propósito, esclarecem Eduardo García de Enterría e Tomás-Ramón
Fernández,
o jogo da teoria do risco imprevisto é, pois, duplo, e pode atuar tanto
a favor da administração concedente como a favor do
50
concessionário, segundo o sentido do desequilíbrio econômico
produzido pelos eventos extraordinários ocorridos.
97
Os princípios constitucionais, as leis e os princípios gerais de direito também
são aplicáveis em favor do Poder Público, pois não distinção em relação ao
destinatário dessas normas.
O legislador pátrio incluiu, nas hipóteses de reequilíbrio da equação
econômico-financeira das concessões, casos em que o evento turbador da equação
beneficie o concessionário. Nesse sentido, o parágrafo 3º, do artigo da Lei
8.987/95, prevê a necessidade de reequilíbrio econômico-financeiro das concessões
nos casos em que ocorrer a extinção de tributos ou encargos legais, após a
apresentação da proposta.
Na hipótese legal, pressupõe-se que a extinção de tributos pagos pelo
concessionário redunde em custo econômico menor, consequentemente, maior
lucro. Como esse lucro não houvera sido previsto inicialmente, será necessário
realizar a readequação do pacto, para que volte a espelhar a relação inicialmente
estabelecida e anuída entre os encargos e as vantagens das partes.
Conclui-se que, ocorrendo o evento que desequilibre a relação contratual em
favor da Administração Pública, a recomposição da equação inicial é de rigor.
Ademais, a recomposição do equilíbrio econômico-financeiro em favor da
Administração Pública não constitui gravame ou sanção para o concessionário, mas
apenas a aplicação das normas jurídicas ao contrato por ele firmado, mantendo-se
os termos econômicos iniciais.
98
97
GARCÍA DE ENTERRÍA, Eduardo; FERNÁNDEZ, Tomás-Ramón. Curso de derecho administrativo. 12. ed.
Madrid: Civitas, 2004, p. 757. No original: “El juego de la teoría del riesgo imprevisible es, pues, doble y
puede actuar tanto a favor de la Administración concedente como a favor del concesionario, según sea el
sentido del desequilibrio económico producido por los eventos extraordinarios acaecidos.”
98
No Brasil, caso recente em que os concessionários foram beneficiados por eventos imprevistos aos quais
não deram causa. O primeiro deles decorreu do fim da cobrança da CPMF (contribuição permanente sobre
movimentações financeiras). Nesse caso, muitos contratos de concessão não foram revistos para excluir a
parcela relativa ao tributo do valor pago aos concessionários. Como se verifica na notícia veiculada no site do
Tribunal de Contas da União: “Órgãos públicos continuam pagando CPMF. Desde de janeiro de 2008, nós
brasileiros não precisamos mais pagar a Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira, a CPMF.
Mas o Tribunal de Contas da União verificou que muitos órgãos públicos continuam pagando o tributo em
contratos com empresas privadas. Além de ser ilegal, a prática traz prejuízos aos cofres públicos. Ao continuar
pagando a CPMF, o governo aumenta o lucro dos empresários. Mas a lei de Licitações determina que a
extinção de tributos deve gerar uma revisão dos preços contratados. Portanto, os valores da CPMF não podem
ser mais pagos. Uma das auditorias realizadas verificou que mais de 3 milhões de reais foram pagos
indevidamente como CPMF. O TCU determinou que vários órgãos públicos deixem de fazer esse pagamento e
cobrem das empresas contratadas a devolução do dinheiro que foi pago indevidamente.” Disponível em:
<http://portal2.tcu.gov.br/portal/page/portal/TCU/imprensa/voz_brasil/repositorio_voz_brasil>. Acesso em: 30
out. 2009.
51
4.8 O equilíbrio econômico-financeiro no direito brasileiro.
O princípio do equilíbrio econômico-financeiro desenvolveu-se na França no
início do culo XX, em um momento de predomínio do ideário liberal. Indaga-se,
porém, se os valores que norteavam a concessão de serviços públicos naquele
momento histórico permanecem no ordenamento jurídico brasileiro. Questiona-se se
o princípio do equilíbrio econômico-financeiro pode ser entendido nas mesmas
bases em que era aplicado na França no início século XX.
Para se responder a essas indagações, deve-se analisar como o equilíbrio
econômico-financeiro das concessões de serviços públicos tem sido tratado nas
Constituições brasileiras e quais as controvérsias advindas desse tema.
No Brasil, segundo Caio Tácito,
99
as primeiras manifestações de garantia do
equilíbrio econômico-financeiro dos contratos de concessão podem ser encontradas
nas cláusulas de garantia de juros e na cláusula-ouro.
A cláusula de garantia de juros foi expediente utilizado nos contratos de
concessão para oferecer, aos capitais privados, garantia de juros mínimos, cobertos
por subvenções temporárias, a serem ressarcidas quando a receita do serviço fosse
superavitária.
A cláusula-ouro visava prevenir oscilações cambiais, por meio da substituição
da dívida em dinheiro por dívida em valor (ouro), de forma a garantir a equivalência
das prestações, tendo como base a remuneração do capital investido.
Tais garantias constituíam “a síntese, ainda que sumária, do princípio
financeiro nos contratos administrativos”.
100
Apenas em 1934, a garantia de alguns aspectos atinentes à remuneração do
concessionário passou a ter previsão constitucional. O artigo 137 determinava, ao
Poder Público, a realização da revisão do valor das tarifas dos serviços concedidos,
para garantir que os lucros do concessionário não ultrapassassem a justa
remuneração do capital, permitindo, ainda, o atendimento normal das necessidades
99
TÁCITO, Caio. Concessão de energia elétrica Tarifas equilíbrio econômico. Parecer. Revista de Direito
Administrativo. Rio de Janeiro, n. 242, p. 335-342, out./dez 2005, p. 336-337.
100
Segundo o autor, a cláusula de garantia de juros foi prevista na Lei 641, de 26 de junho de 1952, que
autorizou a criação de estrada de ferro, consolidando-se no Decreto 2.450 de 24 de setembro de 1873.
TÁCITO, Caio. Concessão de energia elétrica Tarifas equilíbrio econômico. Parecer. Revista de Direito
Administrativo. Rio de Janeiro, n. 242, p. 335-342, out./dez 2005, p. 336-337.
52
públicas de expansão e melhoramento dos serviços. Esse texto constitucional não
possui menção específica à garantia do equilíbrio econômico-financeiro.
A mesma norma foi repetida e aperfeiçoada na Constituição de 1937. O seu
artigo 147 garantia a justa retribuição do capital investido, de forma a permitir a
adequada e regular prestação dos serviços, por revisão de tarifas. A principal
mudança observada em relação à Carta de 1934 estava no fato de que essa
garantia a justa retribuição do lucro, aquela falava em justa retribuição do
capital.
101
No entanto, em ambos os casos, a remuneração do concessionário estava
diretamente ligada à tarifa.
O tema do equilíbrio econômico-financeiro é tratado de maneira semelhante na
Constituição de 1946. Todavia, essa carta ressaltou, textualmente, a dupla função
da tarifa: remunerar o capital investido e permitir a expansão e o melhoramento do
serviço.
As Constituições de 1967 e 1969 revelaram grande avanço na garantia do
equilíbrio econômico-financeiro dos contratos de concessão. Pela primeira vez, a
expressão apareceu, literalmente, no texto constitucional. Essa garantia, assim
como da justa retribuição do capital investido e do financiamento da expansão do
serviço, passou a ser, por expressa disposição constitucional, assegurada pela
tarifa.
A Constituição Federal de 1988 não repetiu as disposições das constituições
anteriores, ao tratar do tema das concessões de serviços públicos, em seu artigo
175. Embora tenha atribuído ao legislador ordinário a tarefa de dispor sobre o
regime da empresas concessionárias de serviços públicos, foi mais sintética que as
anteriores, ao disciplinar a tarifa e o equilíbrio econômico-financeiro dessa espécie
de contrato.
As Constituições de 1967 e 1969 impunham à lei o papel de estabelecer tarifas
que remunerassem, de forma justa, o capital, assegurassem o melhoramento e a
expansão dos serviços e o equilíbrio econômico e financeiro do contrato, carreando
ao Poder Público o dever de realizar sua fiscalização permanente e revisão
periódica.
101
Em termos econômicos, diferença entre capital e juros. Assim, capital é o estoque de equipamentos e
estruturas utilizados para a produção. Representa o estoque de bens produzidos no passado que está sendo
usado no presente para se produzirem novos bens e serviços. Já os juros consistem na diferença entre a receita
total e o custo total de produção. (MANKIW, N. Gregory. Introdução à economia. Tradução da 3. edição
norte-americana Allan Vidigal Hastingel. São Paulo: Cengage Leaning, 2009, p. 268,404.
53
A sua vez, a Carta de 1988 estabeleceu competência à lei ordinária para dispor
sobre a política tarifária nas concessões de serviços públicos.
102
As diferenças entre uma e outra disposição são claras. Sob o regime das
Constituições de 1967 e 1969, o equilíbrio econômico-financeiro dos contratos
deveria ser garantido pela tarifa, cabendo ao Poder blico a sua fiscalização e a
realização de revisões periódicas.
A partir de 1988, coube à lei dispor sobre a política tarifária a ser aplicada às
concessões de serviços públicos, portanto os contratantes poderão utilizar outros
instrumentos para a recomposição do equilíbrio rompido, como a alteração do prazo
de concessão ou algum tipo de compensação financeira.
103
Mas, se o princípio do equilíbrio econômico-financeiro não é mais tratado no
capítulo que cuida das concessões de serviços públicos, teria ele sido contemplado
pela Constituição Federal de 1988? Em qual dispositivo?
4.8.1 O artigo 37, inciso XXI da Constituição Federal do Brasil e o equilíbrio
econômico-financeiro dos contratos administrativos.
Incluído no capítulo que trata da Administração Pública, o artigo 37, inciso XXI
da Constituição Federal é regra que deve nortear a elaboração das normas gerais
sobre licitação e contratação, em todas as suas modalidades, para a Administração
Pública direta, autárquica e fundacional (art. 22, inciso XXVII da Constituição
Federal). Preceitua tal dispositivo:
Art. 37 [...]
XXI - ressalvados os casos especificados na legislação, as obras,
serviços, compras e alienações serão contratados mediante
processo de licitação pública que assegure igualdade de condições
a todos os concorrentes, com cláusulas que estabeleçam
obrigações de pagamento, mantidas as condições efetivas da
proposta, nos termos da lei, o qual somente permitirá as exigências
102
Há, na doutrina, discussão acerca da Emenda Constitucional 1 de 1969. Parte dos doutrinadores entende
que essa emenda constitucional alterou de tal forma a Carta de 1967, que pode ser considerada como um novo
diploma constitucional, enquanto que outro grupo de doutrinadores entende que a emenda apenas alterou os
preceitos da constituição de 1967, sem, contudo, representar um novo diploma. Não entraremos nessa seara de
discussão e trataremos a Emenda Constitucional nº 1 como uma nova Constituição.
103
DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Parcerias na administração pública: concessão, permissão, franquia,
terceirização, parceria público-privada e outras formas. 7. ed. São Paulo: Atlas, 2009, p. 106.
54
de qualificação técnica e econômica indispensáveis à garantia do
cumprimento das obrigações.
A interpretação desse artigo gera o primeiro grande ponto de divergência
doutrinária em relação ao regime jurídico do equilíbrio econômico-financeiro dos
contratos de concessão no direito brasileiro contemporâneo.
A maior parte da doutrina
104
costuma identificar a garantia do equilíbrio
econômico-financeiro dos contratos administrativos em geral, incluindo os contratos
de concessão de serviços públicos, neste preceito constitucional.
Partidário desse entendimento, Celso Antônio Bandeira de Mello explica que
“para serem mantidas as efetivas condições da proposta (constantes da oferta
vencedora do certame licitatório que precede o contrato), a Administração terá de
manter íntegra a equação econômico-financeira inicial”.
105
Ao aceitar a proposta
apresentada pelo concessionário, a Administração Pública a considera idônea para
cobrir os custos da prestação do serviço e para garantir ao concessionário uma
margem de lucro, anuindo com a relação entre encargos e vantagens
apresentadas.
106
Após a celebração do acordo, essa relação passa a produzir
efeitos e a remuneração do concessionário deve assegurar “os termos econômicos
que as partes assumiram ao compor o ajuste da equação econômico-financeira,
traduzido na proposta aceita ao cabo da licitação”.
107
A disposição do artigo 37, inciso XXI da Constituição Federal garante que a
Administração blica deve manter sempre as “condições efetivas da proposta” em
relação a suas obrigações de pagamento, o que redunda na manutenção da relação
entre encargos e vantagens inicialmente estabelecida pelas partes, correspondente
à garantia do equilíbrio econômico financeiro.
Para os adeptos dessa corrente, a garantia do equilíbrio econômico financeiro
está contemplada na Constituição de 1988, no artigo 37, inciso XXI, ainda que o
da mesma forma e nos mesmos termos das Constituições de 1967 e 1969.
um segundo grupo de doutrinadores sustentando que, além desta garantia
não estar expressa nesse dispositivo constitucional, ela não seria aplicável aos
contratos de concessão de serviços públicos.
104
Celso Antônio Bandeira de Mello, Marçal Justen Filho, Jessé Torres Pereira Junior, dentre outros.
105
BANDEIRA DE MELLO. Celso Antônio. Curso de direito administrativo. 26. ed., São Paulo: Malheiros,
2009, p. 619.
106
BANDEIRA DE MELLO. Celso Antônio. Curso de direito administrativo. 26. ed., São Paulo: Malheiros,
2009, p. 736.
107
BANDEIRA DE MELLO. Celso Antônio. Curso de direito administrativo. 26. ed., São Paulo: Malheiros,
2009, p. 736.
55
Defensora desse entendimento, Maria Sylvia Zanella Di Pietro afirma que o
artigo 37, inciso XXI da Constituição Federal é uma garantia de âmbito restrito, que
não se aplica às concessões de serviços públicos, que possuem tratamento
diferenciado e especial em relação aos demais contratos administrativos dado pelo
artigo 175 do Diploma constitucional.
108
Fernando Dias Menezes de Almeida alerta para outro ponto em relação ao
artigo 37, inciso XXI da Constituição. Segundo o autor, se autonomia de
administração dos Estados artigo 18 e se o artigo 22 da Constituição Federal
atribui competência para a União estabelecer normas gerais sobre licitação e
contratação, se pode concluir que contrato é uma coisa e contratação outra,
esclarecendo:
contratação é a ação de contratar. Contrato é o objeto dessa ação.
Sendo assim, estariam contidos na noção de contrato, mas não na
de contratação, os aspectos estruturais dos contratos administrativos
(ex. tipos contratuais, cláusulas necessárias, regime jurídico próprio).
Por outro lado, contratação diria respeito a normas de regência do
ato de contratar (ex. necessidade de previsão de recursos
orçamentários, respeito ao resultado do procedimento licitatório,
controles externos e internos pertinentes).
109
De acordo com esse entendimento, o artigo 175 da Constituição Federal trata
do contrato de concessão de serviços públicos (objeto) e o artigo 37, inciso XXI trata
da ação, do processo de escolha e contratação.
As “cláusulas que estabeleçam obrigações de pagamento, mantidas as
condições efetivas da proposta, nos termos da lei” deverão estar contempladas no
processo de contratação. A Constituição Federal deixa à lei ordinária a tarefa de
estabelecer os parâmetros dessa manutenção, o que poderá ser feito de maneira
diversa por cada ente da federação.
Antônio Carlos Cintra do Amaral, embora não se utilize dos mesmos
fundamentos apresentados por Maria Sylvia Zanella Di Pietro, aponta a ausência de
previsão expressa à manutenção do equilíbrio econômico-financeiro dos contratos
de concessão na Constituição Federal de 1988, afirmando que, apesar disso, sua
108
DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Parcerias na administração pública: concessão, permissão, franquia,
terceirização, parceria público-privada e outras formas. 7. ed. São Paulo: Atlas, 2009, p. 104-105.
109
MENEZES DE ALMEIDA, Fernando Dias. Contratos administrativos. In: PEREIRA JUNIOR, Antonio;
JABUR, Gilberto Haddad (coords.). Direito dos Contratos II. São Paulo, Quartier LAtin, 2008, p. 200-201.
56
recomposição seria dever do concedente, em razão da aplicação da teoria da
imprevisão (em sentido amplo).
110
Comungamos do entendimento de que a garantia do equilíbrio econômico-
financeiro dos contratos de concessão de serviços blicos não está expressa na
Constituição Federal de 1988, tal como ocorria nas Constituições de 1967 e na
Emenda Constitucional 1, de 1969. Entretanto, a ausência de previsão expressa
não diminui ou enfraquece a garantia, que pode ser inferida da interpretação
sistemática de vários preceitos constitucionais.
Ademais, a regra prevista no artigo 37, inciso XXI, deve ser observada no
procedimento de contratação da concessão, conforme disposição do artigo 22,
inciso XXVII da Constituição, por ser a concessão espécie de contrato
administrativo. Como consequência, o contrato de concessão deverá possuir
“cláusulas que estabeleçam obrigações de pagamento, mantidas as condições
efetivas da proposta, nos termos da lei”, lei da esfera de governo do Ente
concedente.
A Lei Maior deixou para o legislador ordinário a determinação do conceito de
manutenção das condições efetivas da proposta. O limite do legislador ordinário é a
Constituição, não sendo possível restringir a garantia constitucional a ponto de
torná-la inexistente.
111
O Supremo Tribunal Federal ainda não sufragou seu entendimento sobre o
tema, se o equilíbrio econômico financeiro das concessões encontra sede
constitucional no artigo 37, XXI.
112
110
Antônio Carlos Cintra do Amaral também aponta a ausência de previsão expressa à manutenção do equilíbrio
econômico-financeiro dos contratos de concessão na Constituição Federal de 1988, afirmando que, apesar
disso, sua recomposição seria dever do concedente em razão da aplicação da teoria da imprevisão (em sentido
amplo). (AMARAL, Antônio Carlos Cintra do. Concessão de serviço público. 2. ed. São Paulo: Malheiros,
2002, p. 25).
111
É em razão dessa disposição que a Lei 8.666/93 impõe ao contratado, em seu artigo 65, §1º aceitar, nas
mesmas condições contratuais, “os acréscimos ou supressões que se fizerem nas obras, serviços ou compras,
até 25% do valor inicial atualizado do contrato, e, no caso particular de reforma de edifício ou de equipamento,
até o limite de 50% para os seus acréscimos.”
112
A relação entre o artigo 37, inciso XXI da Constituição Federal e o princípio do equilíbrio econômico-
financeiro dos contratos de concessão ainda não foi objeto de ampla discussão pelo Supremo Tribunal Federal.
Não se analisou a limitação trazida pelo dispositivo constitucional que remete à lei ordinária o delineamento da
efetiva manutenção das condições da proposta. Aliás, essa é a constatação exarada pelo Ministro Sepúlveda
Pertence na decisão tomada no agravo de instrumento 574.845/MG, razão que o levou a receber o recurso e
convertê-lo em recurso extraordinário: “[...] O tema trazido pelo RE manutenção do equilíbrio econômico-
financeiro dos contratos administrativos, ainda que estes sejam nulos, por terem sido firmados sem a realização
de concurso público, sob pena de enriquecimento ilícito do Estado ainda não foi apreciado pelo Supremo
Tribunal Federal. Dou provimento ao agravo: suficientes as peças trasladadas, determino sua conversão em
recurso extraordinário (art. 544, §§ e , C. Pr. Civil). Após a conversão em RE, determino seja-lhe
apensado os autos do RE 417.040. Manifeste-se o Ministério Público acerca do recurso extraordinário.”
57
4.9 Princípios garantidores do equilíbrio econômico-financeiro dos contratos
de concessão.
Embora não esteja expresso na Constituição Federal de 1988, o princípio do
equilíbrio econômico-financeiro pode ser extraído da interpretação sistemática do
ordenamento jurídico, defluindo de princípios constitucionais e de regras e princípios
gerais de direito.
A correlação entre esse princípio e os princípios que norteiam a teoria geral
dos contratos princípio da força obrigatória, da equivalência objetiva das
prestações e do enriquecimento sem causa – foi abordada no capítulo 2.
Entretanto, por ser aplicável aos contratos submetidos ao regime jurídico de
direito público, a garantia do equilíbrio econômico-financeiro está intimamente
relacionada aos princípios que regem a atuação da Administração Pública. Dessa
maneira, os princípios da razoabilidade, da moralidade, da supremacia do interesse
Disponível em:
<http://www.stf.jus.br/portal/diarioJustica/verDiarioProcesso.asp?numDj=27&dataPublicacaoDj=07/02/2006&
incidente=2327673&codCapitulo=6&numMateria=5&codMateria=3>. Acesso em: 05 jan. 2010. Este agravo
foi reautuado como RE n. 483.379, apenso ao RE n. 417.040 sendo que o último andamento desse processo
ocorreu em 24.10.2009 com a substituição do Ministro relator. “DECISÃO: Cuida-se, na origem, de ação
ordinária em que os recorrentes pediram indenização por prejuízos verificados no período de 1990 a 1995,
além de perdas e danos correspondentes à depreciação das empresas. Alegam que eram permissionárias de
linhas municipais e intermunicipais de transporte urbano, conforme termos de permissão firmados com o
Estado de Minas Gerais, representado por órgãos de sua administração indireta. Relatam a existência de
órgãos gerenciadores que elaboram a planilha de custos operacionais das permissionárias, posteriormente
submetida à apreciação do Conselho Deliberativo da Região Metropolitana de Belo Horizonte (controlado pelo
Estado de Minas Gerais e pelo Município de Belo Horizonte). Sustentam que o Conselho Deliberativo,
frequentemente, impõe tarifas em bases inferiores aos aumentos de custos detectados pelo próprio órgão
responsável pelo gerenciamento, o acarretou em graves desequilíbrios entre a receita e o custo do sistema. Os
recorrentes tiveram seu pedido negado no primeiro grau, razão pela qual interpuseram recurso de apelação,
cujo julgamento, realizado pelo Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, restou assim ementado (f. 102):
“Administrativo. Permissão. Concessão. Situações fáticas. Enquadramento. Natureza Jurídica. Se a autorização
para exploração de transporte coletivo, embora se revele pelo nome de ‘permissão’, tenha todas as
características de concessão, deve ser como tal tratada, inclusive no que toca à exigência de limitação, que
fazia necessária até mesmo na ordem constitucional anterior. Faltando-a, nula a outorga, o que inviabiliza o
exame do equilíbrio econômico-financeiro.” Contra esse acórdão foram interpostos recursos especial e
extraordinário. O recurso extraordinário foi inadmitido (f. 164/165) na origem, o que resultou na interposição
deste agravo de instrumento. O tema trazido pelo RE manutenção do equilíbrio econômico-financeiro
dos contratos administrativos, ainda que estes sejam nulos, por terem sido firmados sem a realização de
concurso público, sob pena de enriquecimento ilícito do Estado ainda não foi apreciado pelo Supremo
Tribunal Federal. Dou provimento ao agravo: suficientes as peças trasladadas, determino sua conversão em
recurso extraordinário (art. 544, §§ e , C. Pr. Civil). Após a conversão em RE, determino seja-lhe
apensado os autos do RE 417.040. Manifeste-se o Ministério Público acerca do recurso extraordinário.
Brasília, 05 de dezembro de 2005. Ministro SEPÚLVEDA PERTENCE - Relator 1”. (grifo nosso).
58
público, da indisponibilidade do interesse público, da continuidade do serviço público
e da adequação são apontados como vetores do equilíbrio econômico-financeiro.
Com efeito, a tutela do equilíbrio econômico-financeiro dos contratos de
concessão visa atender o interesse público primário de prestação adequada do
serviço público que, segundo Renato Alessi, é formado pelo “conjunto de interesses
individuais prevalentes em uma determinada organização jurídica da coletividade”,
113
razão que o sobrepõe ao interesse da Administração Pública na obtenção de lucro
com a exploração do serviço, interesse esse secundário. Alerta de Karina Houat
Harb:
diante da ordem jurídica pátria, impensável admitir que o Estado,
enquanto ente contratante, como em uma concessão de serviço
público, aja em relação ao particular contratado, como se fosse
pessoa jurídica, interessada em alcançar somente as vantagens que
lhe são próprias enquanto aparelho organizado, valendo-se inclusive
de sua posição de vantagem legalmente estabelecida, pois isto
configuraria deslealdade em relação ao particular e implicaria
locupletamento à custa deste.
114
O contrato de concessão é instrumento utilizado pela Administração Pública
para atendimento de uma necessidade imperiosa da coletividade e, como
consequência, o interesse blico na sua execução é indisponível, cabendo, em
última instância, à Administração assegurar sua prestação.
115
A continuidade do
serviço blico é princípio que decorre da obrigatoriedade do desempenho da
atividade pública pela Administração, ou por quem lhe faça as vezes, típico do
regime administrativo, dada a supremacia e a indisponibilidade do interesse público.
A Administração Pública é curadora desse interesse, possuindo o dever de mantê-lo,
razão pela qual o serviço público concedido jamais poderá deixar de ser prestado à
comunidade.
116
O particular não pode ser obrigado a realizar prestação a qual se vinculou se
os pressupostos econômicos, que o levaram a celebrar o acordo, restaram
113
ALESSI, Renato. Instituciones de Derecho Administrativo. Barcelona: Bosch, 1960. T. I, traducción de la 3
edición italiana p. 184.
114
HARB, Karina Houat. A revisão na concessão comum de serviço público. 2009. 226 f.. Tese (doutorado em
direito) – Faculdade de Direito, Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo, 2009. p.48.
115
DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Parcerias na administração pública: concessão, permissão, franquia,
terceirização, parceria público-privada e outras formas. 7. ed., São Paulo: Atlas, 2009, p. 98.
116
BANDEIRA DE MELLO. Celso Antônio. Curso de direito administrativo. 26. ed., São Paulo: Malheiros,
2009, p. 81. Para o autor “uma vez que a Administração é curadora de determinados interesses que a lei define
como públicos e considerando que a defesa, e prosseguimento deles, é, para ela obrigatória, verdadeiro dever, a
continuidade da atividade administrativa é princípio que se impõe e prevalece em quaisquer circunstâncias. É
por isso mesmo que Jèze esclarecia que a Administração tem o dever, mesmo no curso de uma concessão de
serviço público, de assumir o serviço, provisória ou definitivamente, no caso de o concessionário, com ou sem
culpa, deixar de prossegui-lo convenientemete.”
59
superados por fatores alheios a sua vontade. Essa desobrigação do concessionário
poderia levar, contudo, à interrupção da prestação, desatendendo o princípio da
continuidade do serviço público.
117
A solução para compatibilizar a garantia do interesse público e o direito do
particular está no princípio do equilíbrio econômico-financeiro, de forma a
compensar o concessionário pelo ônus decorrente da ocorrência de fato imprevisível
e alheio à sua vontade, ou da alteração unilateral perpetrada pelo Poder Público,
garantindo a continuidade da prestação do serviço e o interesse público.
Além de permitir a continuidade da prestação do serviço, a garantia do
equilíbrio econômico-financeiro dos contratos de concessão evita a violação do
princípio da adequação do serviço, que ocorreria se a alteração dos pressupostos
econômicos da concessão redundasse em perda de qualidade, atualidade ou
segurança da prestação, como pontua Floriano de Azevedo Marques Neto.
118
A lealdade e a boa-fé, que devem nortear a atuação administrativa, são
princípios dos quais decorrem a garantia do equilíbrio econômico-financeiro dos
contratos de concessão.
A Administração deve atuar em seus contratos com a mais absoluta lisura e
respeito aos legítimos interesses econômicos do concessionário.
119
Como alerta
Agustín Gordillo
Se diz, portanto, que os contratos administrativos são
essencialmente de boa-fé, o que leva a que a Administração não
deva atuar como se se tratasse de um negócio lucrativo, nem tratar
de obter vantagens ilegítimas as custas do contratado, nem
aproveitar-se de situações legais ou fáticas que a favoreçam em
detrimento do contratado.
120
Desta forma, é vedado à Administração Pública utilizar-se de interpretação de
normas e cláusulas contratuais para reduzir o valor a que o concessionário faz jus
em razão do contrato, ou para exigir que o concessionário suporte prejuízos em sua
execução.
O princípio da boa-fé, que deve guiar a atuação da Administração blica, é
corolário do princípio da moralidade administrativa (art. 37, caput, da Constituição
117
MARQUES NETO, Floriano de Azevedo. Breves considerações sobre o equilíbrio econômico-financeiro nas
concessões. Revista de Direito Administrativo. Rio de Janeiro, n. 227, p. 105-109, jan./mar. 2002, p. 106.
118
MARQUES NETO, Floriano de Azevedo. Breves considerações sobre o equilíbrio econômico-financeiro nas
concessões. Revista de Direito Administrativo. Rio de Janeiro, n. 227, p. 105-109, jan./mar. 2002, p. 106.
119
BANDEIRA DE MELLO. Celso Antônio. Curso de direito administrativo. 26. ed., São Paulo: Malheiros,
2009, p. 636.
120
GORDILLO, Augustín. Derecho de la economia. Buenos Aires: Macchi, 1967, p. 340. Apud BANDEIRA
DE MELLO, Celso Antônio Curso de direito administrativo. 26. ed. São Paulo: Malheiros, 2009, p. 642.
60
Federal), segundo o qual a Administração e seus agentes devem agir em
conformidade com princípios éticos.
121
Ressalta Almiro Couto e Silva que o princípio
da boa-fé objetiva aplica-se também no direito público, podendo ser percebida nos
contratos administrativos, pois nestes há
Substancialmente essa concepção de que, nas relações jurídicas, as
partes nela envolvidas devem proceder corretamente, com lealdade
e lisura, em conformidade com o que se comprometeram e com a
palavra empenhada (a fides como fit quod dictur da definição
ciceroniana) que, em última análise, dá conteúdo ao princípio da
segurança jurídica, pelo qual, nos vínculos entre o Estado e os
indivíduos, se assegura uma certa previsibilidade da ação estatal, do
mesmo modo que se garante o respeito pelas situações constituídas
em consonância com as normas impostas ou reconhecidas pelo
poder público, de modo a assegurar a estabilidade das relações
jurídicas e uma certa coerência na conduta do Estado.
122
Deve ser mencionado o princípio da segurança jurídica, considerado em seu
aspecto objetivo, que diz respeito ao direito adquirido e ao ato jurídico perfeito.
123
Com efeito, a equação econômico-financeira dos contratos está abrangida pela
norma do artigo 5º, inciso XXXVI da Constituição Federal de 1988, constituindo
direito adquirido do contratado, o qual não pode sofrer alteração por qualquer norma
posterior, como assevera Celso Antônio Bandeira de Mello.
124
Ademais a outorga da
concessão não constitui, tão-só, direito adquirido do concessionário; ela torna a
equação econômico-financeira ato jurídico perfeito a partir da celebração do
contrato.
Maria Sylvia Zanella Di Pietro aponta o princípio da razoabilidade como base
do equilíbrio econômico-financeiro, considerando que ele garante a proporção entre
o custo e o benefício na prestação do serviço, de forma que, se houver alteração
121
BANDEIRA DE MELLO. Celso Antônio. Curso de direito administrativo. 26. ed., São Paulo: Malheiros,
2009, p. 119.
122
COUTO E SILVA, Almiro do. O princípio da segurança jurídica (proteção à confiança) no direito público
brasileiro e o direito da administração pública de anular seus próprios atos administrativos: o prazo decadencial
do art. 54 da lei do processo administrativo da União (Lei 9.784/99). Revista eletrônica de direito público do
estado. Salvador: Instituto de Direito Público da Bahia, 2, abr/maio/junho, 2005, p. 3. Disponível na internet:
<http://www.direitodoestado.com/revista/REDE-2-ABRIL-2005ALMIRO%20DO%20COUTO%20E%20 SILVA.pdf>.
Acesso em: 22 fev. 2010.
123
A natureza objetiva do princípio da segurança jurídica envolve a questão dos limites à retroatividade dos atos
do Estado até mesmo quando estes se identifiquem como legislativos. (COUTO E SILVA, Almiro do. O
princípio da segurança jurídica (proteção à confiança) no direito público brasileiro e o direito da administração
pública de anular seus próprios atos administrativos: o prazo decadencial do art. 54 da lei do processo
administrativo da União (Lei 9.784/99). Revista eletrônica de direito público do estado. Salvador: Instituto de
Direito Público da Bahia, 2, abr/maio/junho, 2005, p. 4. Disponível na internet:
<http://www.direitodoestado.com/revista/REDE-2-ABRIL-2005ALMIRO%20DO%20COUTO%20E%20 SILVA.pdf>.
Acesso em: 22 fev. 2010).
124
BANDEIRA DE MELLO. Celso Antônio. Curso de direito administrativo. 26. ed. São Paulo: Malheiros,
2009, p. 620.
61
nos custos da parte, sem que ela tenha agido com culpa, a adequação dos
benefícios se mostrará de rigor, de forma a manter a relação inicialmente
acordada.
125
Marçal Justen Filho invoca o direito à propriedade como garantia ao equilíbrio
econômico-financeiro dos contratos de concessão. Princípio previsto no artigo 5º,
inciso XXII, impede que a Administração Pública se aproprie de patrimônio privado
sem a prévia e justa indenização. Dessa forma, é vedado à Administração blica
beneficiar-se do patrimônio do particular para a consecução de um interesse público,
sem que houvesse a prévia e justa indenização.
126
Sobretudo, a garantia do equilíbrio econômico-financeiro decorre do princípio
da isonomia, previsto no artigo 5º, caput, da Constituição Federal, pois impede que
um dos contratantes se locuplete indevidamente em detrimento do outro. Por essa
razão, a Administração Pública não pode promover a alteração das cláusulas
contratuais, para atendimento do interesse público, sem compensar o particular. Da
mesma forma, os eventos extraordinários que causem gravame para o prestador do
serviço público o podem redundar em benefício da Administração blica, nem
para a coletividade, pois o direito de um único particular não pode ser sacrificado
para o benefício de toda a coletividade.
Tanto os bônus quanto os ônus da res publica devem ser repartidos
igualitariamente. Eles pertencem a toda a comunidade, indistintamente, que deve
ser beneficiada ou onerada. Pela mesma razão, vedação do resultado oposto,
isto é, não se permite que um único particular tenha seus benefícios aumentados em
razão de um evento extraordinário, em detrimento de toda a comunidade. Nesses
casos, a Administração Pública deverá rever as condições do pacto para readequar
a relação entre encargos e vantagens à forma inicialmente estabelecida.
127
Esses são alguns dos diversos princípios (gerais ou constitucionais) que dão
guarida à manutenção da equação econômico-financeira dos contratos de
125
DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Parcerias na administração pública: concessão, permissão, franquia,
terceirização, parceria público-privada e outras formas. 7. ed., o Paulo: Atlas, 2009, p. 98. Para a autora o
princípio da razoabilidade, quando relacionado à proporcionalidade está prevista implicitamente no artigo ,
parágrafo único da Lei 9.784/99. A Constituição do Estado de São Paulo faz menção expressa a esse princípio
em seu artigo 111. DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 22 ed., São Paulo: Atlas, 2009,
p. 79,80.
126
JUSTEN FILHO, Marçal. Teoria geral das concessões de serviço público. São Paulo: Dialética, 2003, p.
392-394.
127
JUSTEN FILHO, Marçal. Teoria geral das concessões de serviço público. São Paulo: Dialética, 2003, p.
394.
62
concessão de serviços blicos. Assim, seja em decorrência da aplicação do artigo
37, inciso XXI, que garante a manutenção das condições da proposta, seja em razão
dos princípios da isonomia, da segurança jurídica, da indisponibilidade do interesse
público, da supremacia do interesse público, da continuidade do serviço público, da
boa-fé, da segurança jurídica, da moralidade, o equilíbrio econômico financeiro dos
contratos de concessão deve ser observado pelos contratantes durante toda a
execução do pacto, sendo dever da Administração Pública a sua cura.
63
5 ROMPIMENTO DO EQUILÍBRIO ECONÔMICO-FINANCEIRO DOS CONTRATOS
DE CONCESSÃO.
Nas concessões de serviços públicos, o fator risco
128
é de extrema importância,
cerne da análise da quebra da equação econômico-financeira inicialmente
estipulada, seja em razão do longo prazo de duração contratual das concessões, da
natureza pública do serviço transferido, ou dos reflexos econômicos que defluem de
sua ocorrência, os quais podem alterar a situação inicial do contrato causando ônus
a uma das partes.
No entanto, a verificação do rompimento do equilíbrio econômico-financeiro
demanda a constatação de que a equação foi afetada, com a quebra da correlação
entre encargos e vantagens, bem como a distribuição de responsabilidades pelo
risco do acontecimento do fato. Apenas os fatos cuja responsabilidade não foi
imputada ao concessionário podem alterar a equação econômico-financeira
inicialmente estabelecida.
duas espécies de eventos que alteram a equação econômico-financeira
inicialmente estabelecida. A primeira delas decorre do poder de alteração unilateral
do contrato pela Administração Pública, a qual Antônio Carlos Cintra do Amaral
designa como interna, por estar relacionada ao objeto contratado. A alteração, nesse
caso, deve ter como finalidade a adequação do contrato ao atendimento do
interesse público. A segunda espécie corresponde ao conjunto de circunstâncias
externas ao contrato, alheias à vontade das partes e imprevisíveis quando da
contratação, capazes de turbar o equilíbrio entre vantagens e obrigações
inicialmente estabelecido.
129
Essas duas hipóteses são classificadas pela doutrina
como áleas extraordinárias, que não poderiam ser quantificadas e incluídas na
proposta apresentada, não integrando a equação econômico-financeira inicialmente
estabelecida.
128
Risco é a possibilidade de perda ou prejuízo, cuja ocorrência e avaliação não pertencem ao mundo do Direito.
O risco trata de fatos que podem, ou não, acontecer: se não ocorrerem ou se ocorrerem de maneira mais
atenuada do que a esperada, o prejuízo esperado não se efetiva. Entretanto, se o risco incidir em absoluto,
haverá prejuízo.
129
AMARAL, Antônio Carlos Cintra do. Breves notas sobre o reequilíbrio econômico-financeiro dos contratos
de obras blicas. Comentários Cintra do Amaral, comentário 127, 2005. Disponível em:
<http://www.celc.com.br/comentarios/127.html>. Acesso em: 1 out. 2009.
64
5.1 O rompimento do equilíbrio econômico-financeiro dos contratos de
concessão e a alocação de riscos.
O direito não fica alheio aos riscos incidentes nas contratações de longo prazo,
como é o caso das concessões de serviços públicos.
Se, por um lado, as normas jurídicas não têm o condão de inibir a ocorrência do
evento risco, vez que ele pertence ao mundo dos fatos, por outro, é tarefa do direito
o desenvolvimento de instrumentos jurídicos possibilitem a mitigação de seus
efeitos. Dessa forma, cabe ao direito determinar a quem compete a responsabilidade
econômica por sua ocorrência (alocação), bem como realizar a atribuição subjetiva
da gestão da parcela do negócio que pode dar margem ao risco.
Essa preocupação, muito tempo, está presente nas concessões de serviços
públicos. Encontrar a melhor forma de se alocar os riscos e atribuir
responsabilidades tem sido objeto de constantes estudos por parte da doutrina e da
jurisprudência.
A divisão de riscos nos contratos de concessão de serviços públicos sempre
existiu. Tradicionalmente, os riscos a que está sujeita a concessão de serviços
públicos são classificados em duas espécies: ordinários e extraordinários.
Assim, atribui-se ao concessionário a responsabilidade pelos riscos
relacionados à própria gestão da prestação do serviço e à Administração Pública a
responsabilidade pelos riscos imprevisíveis, ou os decorrentes de sua atuação em
busca da consecução do interesse público.
Além dos riscos relacionados à própria gestão do negócio, consideram-se
ordinários aqueles cuja ocorrência foi prevista pelas partes e levados em
consideração na efetivação do acordo. Em contrapartida, os extraordinários
correspondem a eventos de ocorrência imprevisível, portanto, impossíveis de serem
considerados na formação do vínculo contratual.
A divisão de riscos é aplicada aos contratos de concessão e faz com que a
garantia do equilíbrio econômico-financeiro não seja uma proteção ilimitada, que
protege o particular contra toda espécie de insucesso econômico ou diminuição das
perspectivas de lucro.
130
O concessionário não está imune a toda a sorte de fatores
130
BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Curso de direito administrativo. 26. ed. São Paulo: Malheiros,
2009, p. 732-733.
65
que podem afetar o desenvolvimento de sua atividade e a que estão sujeitos todos
aqueles que exploram, comercial ou industrialmente, uma atividade de conteúdo
econômico.
Segundo Pedro Gonçalves
Está agora em causa uma relação jurídica em que o particular
assume o dever específico de desempenhar uma tarefa ou atribuição
que a lei confia inicialmente à Administração Pública. Neste vel de
colaboração, que designamos colaboração primária, ocorre pois uma
partilha de responsabilidades entre a Administração e o particular,
que à primeira passa a caber essencial e genericamente a tutela e o
controlo da atuação do particular, assumindo este o dever de
executar, exercer, gerir ou desempenhar a tarefa administrativa.
131
Não é qualquer alteração na equação econômico-financeira que gera para o
concessionário o direito de recomposição. Apenas a ocorrência dos riscos cuja
responsabilidade não lhes foi atribuída pelo contrato (ou não decorre de sua atuação
como gestor da prestação do serviço) geram o direito ao reequilíbrio. Isto porque, se
de um lado, a concessão de serviços públicos representa uma oportunidade de
obtenção de lucros pelo concessionário, pela exploração econômica do negócio; de
outro, ela não pode ser executada inteiramente às custas da Administração Pública.
A concessão não representa qualquer renúncia da Administração aos seus
direitos sobre o serviço, cabendo-lhe a responsabilidade por alcançar os objetivos do
serviço público, do qual continua a ser titular. Na verdade, a Administração Pública
transfere apenas parte do direito sobre o serviço, deixando de realizar sua prestação
direta. Como a Administração mantém a titularidade, muitas vezes ela influenciará,
ou até mesmo determinará, aspectos de sua prestação, interferindo na esfera de
liberdade do particular.
132
Nesses casos, a medida da responsabilidade do
concessionário pela gestão dos serviços por seus próprios meios dependerá da
medida de sua autonomia na gestão dos serviços.
133
Quanto maior for a influência
da Administração Pública na gestão do serviço, menor será a responsabilidade do
particular.
134
Os riscos ordinários a que o particular está sujeito variam de concessão
131
GONÇALVES, Pedro. A concessão de serviços blicos (uma aplicação da técnica concessória). Coimbra:
Almedina, 1999, p.169.
132
GONÇALVES, Pedro. A concessão de serviços blicos (uma aplicação da técnica concessória). Coimbra:
Almedina, 1999, p.175.
133
A responsabilidade aqui referida é sobre a álea ordinária. Quanto menos o concessionário puder decidir sobre
a prestação do serviço, menor será a álea ordinária, pois não se pode a ele imputar a responsabilidade por
decisão que não foi sua.
134
Nesse ponto, importante a explicação de Marçal Justen Filho: “Na França, a delegação de serviços públicos à
gestão privada era acompanhada de regulação exaustiva, de molde a assegurar que todas as decisões
empresariais essenciais estivessem sujeitas a controle político. Não se podia cogitar de uma efetiva autonomia
empresarial no âmbito das atividades de serviço público. Daí derivava, como uma espécie de contrapartida, o
66
para concessão, dependendo, em larga escala, da própria intervenção do Poder
Público na prestação do serviço.
A álea extraordinária, por outro lado, é imprevisível, inevitável e não pode ser
imputada a qualquer ato do contratado.
135
“A imprevisibilidade não se refere,
necessariamente, ao elemento perturbador em si mesmo, mas aos seus efeitos que
ultrapassam à razoável previsão humana”.
136
Subdivide-se, segundo a doutrina mais
tradicional, em econômica, oriunda de circunstâncias externas ao contrato e às
partes e administrativa, oriundas de ato do próprio ente estatal contratante.
No direito francês, apenas as áleas extraordinárias geram o dever de
recomposição do equilíbrio econômico-financeiro rompido. No Brasil, alguns
doutrinadores entendem que a Administração Pública responde, inclusive, pela álea
ordinária. Todavia, esse entendimento se mostra contrário à definição tradicional de
concessão, segundo a qual a execução do serviço se faz por conta e risco do
concessionário.
Maria Sylvia Zanella Di Pietro, adotando as lições do direito francês, defende
que o-só a álea extraordinária permite a recomposição do equilíbrio econômico-
financeiro do contrato, vez que os riscos eram imprevisíveis para as partes quando
da celebração do acordo, diferentemente do que ocorre com álea ordinária, na qual
o risco esrelacionado a uma atuação do contratado, ou a uma situação a que
estariam sujeitos todos os empresários, como a flutuação do mercado.
137
A jurisprudência nacional reconhece a distinção das áleas e esposa o
entendimento de que apenas as áleas extraordinárias são aptas a romper o
equilíbrio econômico-financeiro dos contratos de concessão.
138
princípio da intangibilidade da equação econômico-financeira do contrato administrativo. Sob esse enfoque,
pode questionar-se a tradicional definição acerca de que o concessionário assume a gestão do serviço público
por conta e risco próprios. Não havia cabimento para risco ilimitado do particular, na medida exata em que não
se verificava autonomia efetiva. Ou seja, quanto maior a competência da Administração para determinar as
alternativas a serem seguidas pelo particular, tanto menor será o risco dele. [...] Enfim, somente pode haver
empreendimento por conta e risco do particular quando se reconhece a liberdade dele para determinar as
opções empresariais fundamentais.” (JUSTEN FILHO, Marçal. Algumas considerações acerca das licitações
em matéria de concessão de serviços públicos. Revista eletrônica de direito administrativo econômico.
Salvador: Instituto de Direito Público da Bahia, n. 1, fev. 2005, p. 38. Disponível em:
<http://www.direitodoestado.com.br>. Acesso em: 10 dez. 2008.
135
PEREZ, Marcos Augusto. O risco nos contratos de concessão de serviços públicos. Belo Horizonte: Fórum,
2006, p. 108.
136
TÁCITO, Caio. O equilíbrio econômico financeiro nas concessões de serviços públicos. In: Temas de direito
público (estudo e pareceres). Rio de Janeiro: Renovar, 1997, p. 199-255, p. 209.
137
DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo. 22. ed. São Paulo: Atlas, 2009, p. 276-277.
138
Nesse sentido, o acórdão prolatado nos autos do recurso de apelação 8093315700, do Tribunal de Justiça
de São Paulo, relatora Regina Capistrano, julgado em 17/02/2009, cuja ementa dispõe: “CONTRATO
ADMINISTRATIVO CERCEAMENTO DE DEFESA INOCORRENTE. O indeferimento de pedido de
67
5.1.1 Áleas ordinárias. A exploração do serviço por “conta e risco do
concessionário”.
Na concepção clássica de concessão, a gestão do serviço é confiada, em
princípio, a uma pessoa privada que conserva as suas características e seu estatuto
pessoal de direito privado. A Administração Pública, de outro lado, mantém o
controle do serviço transferido.
139
Tal entendimento deflui da definição clássica de
concessão de serviço público, que, segundo Jean Rivero e Jean Waline
é um modo de gestão de um serviço em que uma pessoa pública, o
concedente, encarrega por um contrato uma pessoa privada, o
concessionário, de fazer funcionar o serviço durante um certo tempo,
assumindo os seus encargos, mediante o direito de ser remunerado
através de prestação dos usuários.
140
Segundo a definição clássica, o particular assume o encargo de fazer funcionar
o serviço, razão pela qual se diz que essa exploração se dá por sua conta e risco.
O dever de implementar e manter a execução do serviço inclui a realização de
investimentos com capitais próprios ou obtidos a crédito, além de relativa autonomia
na gerência da execução do serviço. O particular deve utilize sua experiência
negocial para realizar a exploração empresarial do serviço concedido, implicando em
manifestação após terminada a instrução probatória não caracteriza cerceamento de defesa. Contrato
administrativo previsibilidade dos fatos qüe ocasionaram perda patrimonial à Concessionária -. Pretensão à
recomposição do equilíbrio econômico-financeiro não configuração dos pressupostos constantes no artigo 65,
inciso II, "d" da lei n° 8.666/93. Recursos oficial e voluntário interposto pelos réus aos quais se provimento,
ficando prejudicado, pois, o recurso adesivo.” Do voto da relatora extrai-se o seguinte excerto: “Não se ignora
que, nos contratos administrativos, a cláusula do equilíbrio econômico-financeira deve ser sempre preservada.
Contudo, no vertente caso, os fatos que ensejaram o ajuizamento da presente ação não consubstanciam
desequilíbrio econômico-financeiro, na medida em que se encontram inseridos na álea ordinária ou
empresarial, correspondentes aos riscos normais do exercício da atividade econômica e que, portanto, devem
ser suportados pela concessionária. Frise-se que o contrato de concessão não pode ser utilizado exclusivamente
como meio de obtenção de lucros, em outras palavras, a garantia do equilíbrio,econômico não pode servir de
proteção contra diminuições de expectativas de lucro, até porque a concessionária exerce o serviço estatal por
sua conta e risco.” Disponível em: << http://esaj.tj.sp.gov.br/cjsg/getArquivo.do?cdAcordao=3513454>>.
Acesso em 02 mar. 2010.
139
WALINE, Jean e RIVERO, Jean. Droit administratif. 18. ed. Paris: Dalloz, 2000, p. 461. Também para
Marcello Caetano a concessão é realizada primordialmente em favor de particulares. Segundo o autor: “A
concessão a particulares é o caso normal e típico, pois a concessão destina-se fundamentalmente a utilizar os
recursos, a técnica e a produtividade da iniciativa privada em benefício da realização do interesse público”.
(CAETANO, Marcello. Manual de Direito admininistrativo. 10. ed. Coimbra: Almedina, 2004, v. II, p. 1107.).
140
WALINE, Jean e RIVERO, Jean. Droit administratif. 18. ed. Paris: Dalloz, 2000, p. 461. No original: La
concession de service public est um mode de gastion d’um service dans lequel une personne publique, le
concédant, charge par contract, une personne privée, le concessionnaire, de faire fonctionner le service,
pendant um certain temps, en en assumant les charges, moyennant le droit de se rémunérer sur les usagers.
68
maior eficiência a esta prestação e desonerando o erário público. Na concessão de
serviços públicos precedida de obra pública, por exemplo, o concessionário se
compromete a fazer funcionar o serviço e se encarrega a empreender, ele próprio, a
sua custa, as obras públicas necessárias ao funcionamento. A gestão do serviço
deve permitir-lhe, simultaneamente, suportar os encargos e amortizar as despesas
feitas para a realização das obras de base, que no termo de concessão, passam
para o concedente.
Dessa forma, quando se diz que a concessão corre por conta do
concessionário, está se querendo significar, segundo Egon Bockmann Moreira
o processo que abrange a obrigação contratual de projetar e realizar
o investimento (capital, tecnologia e recursos humanos), conjugado
com o dever de prestar o serviço adequado e responder por suas
próprias ações. Para utilizar uma palavra intraduzível, trata-se de
accountability: a legítima capacidade de agir e a transparência de
seus processos, conjugados com a responsabilização do agente. A
primeira parte da locução não tem o condão de gerar controvérsias.
Como em qualquer empreendimento sério, o interessado de
avaliar com precisão qual é o volume de receita que torne possível
arcar com o planejamento, a execução do projeto e seus custos
estes compreendidos desde a sua avaliação física e jurídica até a
execução propriamente dita e respectiva margem de desvio nas
projeções.
141
Ao concessionário cabe a realização dos investimentos necessários à
implementação e manutenção da prestação do serviço, bem como as decisões
relativas a sua efetiva prestação, pois os riscos advindos dessa sua atuação lhe são
naturalmente imputados. Isso é da natureza do negócio, pois a exploração
empresarial pressupõe a possibilidade de o empresário aumentar os seus lucros por
sua atuação, seja obtendo recursos necessários ao investimento de forma mais
barata no mercado, seja por meio de decisões negociais que aumentem a eficiência
econômica do serviço prestado.
Assim, em razão de sua posição jurídica, basicamente duas espécies de
riscos ordinários a que os concessionários estão sujeitos.
A primeira delas decorre da própria gestão do serviço público concedido. Como
os riscos decorrem da própria atividade de exploração do serviço, o de
responsabilidade do concessionário. Devem ser levados em conta por todos aqueles
que exploram a atividade atuando em regime de mercado, vez que ligados à
141
MOREIRA, Egon Bockmann. Riscos, incertezas e concessões de serviço público. Revista de Direito Público
da Economia - RDPE, Belo Horizonte, v. 5, n. 20, out./dez. 2007. Disponível em:
<http://www.editoraforum.com.br/bid/bidConteudoShow.aspx?idConteudo=49831>. Acesso em: 1 out. 2009.
69
exploração empresarial do negócio. Correspondem aos riscos inerentes a qualquer
atividade desenvolvida por particulares, que todo o empresário corre como resultado
da própria flutuação do mercado.
142
A outra espécie diz respeito aos riscos imputados ao concessionário pelo
contrato, sempre relacionados ao gerenciamento da atividade concedida.
143
São
riscos externos, que não estão propriamente relacionados com a atividade gerencial
do concessionário, mas que dizem respeito à exploração do serviço concedido,
decorrentes do regime jurídico aplicável à concessão de serviços blicos e, por
força do qual, passam a integrar a álea ordinária do contrato de concessão. Como
bem explicita Jacintho de Arruda Câmara
Basicamente, o concessionário assume duas categorias de risco. A
primeira envolve os riscos pela gestão de sua empresa. Ou seja, são
os riscos oriundos de eventuais falhas ou ineficiências na
administração dos recursos (humanos, equipamentos, infra-estrutura)
utilizados na execução do serviço público delegado. Outra espécie
de risco é de natureza externa, por assim dizer, mas está claramente
imputado à ‘administração’ da empresa concessionária. Seria o caso,
por exemplo, do risco inerente à demanda pela utilização do
serviço.
144
Celso Antônio Bandeira de Mello adverte para o fato de a álea ordinária no
direito francês compreender os casos em que o concessionário, por ineficiência,
negligência ou incapacidade suas, sofre prejuízos, bem como na hipótese de
insucesso da exploração e o revés patrimonial decorrerem de oscilações normais de
preços de mercados, estimativa inexata em relação à captação ou manutenção de
clientela ou de medidas gerais emanadas do Poder Público que afetem, de maneira
142
DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo. 22. ed. São Paulo: Atlas, 2009, p. 275-276. Para
Marçal Justen Filho, esses riscos decorrem de circunstâncias previsíveis ou de pequenos reflexos econômicos,
ainda que imprevisíveis, que devem ser suportadas pelo particular contratado, pois se inserem na normalidade
do processo econômico. (JUSTEN FILHO, Marçal. Teoria geral das concessões de serviço blico. São
Paulo: Dialética, 2003, p. 401). Segundo o autor “os eventos econômicos, embora imprevisíveis, que se
insiram na normalidade do processo econômico não autorizam a modificação do preço”.
143
Essa idéia está expressa no documento do governo francês entitulado Les contrats de partenariat príncipes et
méthodes. No direito francês, as concessões de serviços públicos transferem a um terceiro, sob o controle da
administração, a gestão de um serviço público de forma que o concessionário deverá assegurar a prestação do
serviço e o fará, de maneira geral, por seus próprios meios. A remuneração é diretamente assegurada pela
exploração do serviço. As concessões de serviços públicos são contratos cujos termos evoluem pouco, mesmo
se a sua duração for longa. Os riscos ligados ao consumo do serviço são transferidos ao concessionário,
mesmo se a intensidade dos riscos variar conforme a natureza dos serviços fornecidos. In verbis:Les
délégations de service public permettent de confier à un tiers, sous le contrôle de l’administration, la gestion
et l’exploitation d’un service public. Il s’agit d’un service assuré par l’entreprise, en général avec ses propres
moyens, et qui produit une activité économique (distribution del’eau, concession de plage, autoroute…) dont
la rémunération est directement assurée par l’exploitation. Les conventions de délégation de service public
sont, à l’instar des marchés publics, des contrats dont les termes évoluent peu, même si leur durée est longue.
À la différence des marchés publics, l’entreprise se voit transférer le risque lié à la consommation du service
par les usagers, même si l’intensité de ce risque varie en réalité selon la nature du service fourni.”
144
CÂMARA. Jacintho Arruda. Tarifas nas Concessões. São Paulo: Malheiros, 2009, p. 189.
70
indiscriminada, toda a sociedade, desde que não lhe torne ruinosa a exploração do
serviço:
Os riscos que o concessionário deve suportar sozinho abrangem,
além dos prejuízos que lhe resultem por atuar canhestramente, com
ineficiência ou imperícia, aqueloutros derivados de eventual
estimativa inexata quanto à captação ou manutenção da clientela de
possíveis usuários, bem como, no caso de fontes alternativas de
receita, os que advenham de uma frustrada expectativa no que
concerne aos proveitos extraíveis de tais negócios. É dizer: não lhe
caberia a pretensão de eximir-se aos riscos que todo empresário
corre ao arrojar-se em empreendimentos econômicos, pois seu
amparo não pode ir além do resguardo, de si peculiar, conferido
pelas proteções anteriores mencionadas e cuja existência é
justificável por estar em causa vínculo no qual se substancia um
interesse público.
145
Os ônus resultantes da álea ordinária estão sempre ligados à atuação do
concessionário, o que demanda, para determinar se houve quebra da equação
econômico-financeira, a verificação do nexo de causalidade entre a sua conduta e o
resultado experimentado.
Determinar se o risco é ordinário ou extraordinário altera o resultado da quebra
do equilíbrio econômico-financeiro. Isto, na prática, pode se mostrar bastante difícil,
como se constata no exemplo trazido por Marcos Augusto Perez, sobre frustações
nas projeções de demanda
Muitas vezes, é impossível saber se o excesso ou a insuficiência da
demanda, em relação àquela projetada nos estudos de viabilidade da
concessão (que, suponhamos, gere, no primeiro caso, maiores lucros
para o concessionário e, no segundo caso, menores lucros ou, até
mesmo, prejuízos para o concessionário), é fruto de seu talento ou
de sua inépcia empresarial, de sua capacidade de atrair novos
usuários para o serviço ou de sua negligência comercial ou, por fim,
de projeções de demanda absolutamente equivocadas, ainda que
realizadas pela administração pública.
146
Como no exemplo dado, o aumento de eficiência ou o prejuízo advindo da
atuação direta do concessionário (álea ordinária) devem por ele ser apropriadas.
Isso não ocorrerá se os resultados econômicos não se relacionarem estritamente a
sua conduta. Assim, a alteração da demanda decorrente das projeções efetuadas
pela Administração não podem gerar maior ou menor enriquecimento do
concessionário, dando ensejo à alteração da equação econômico-financeira.
145
BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Curso de direito administrativo. 26. ed. São Paulo: Malheiros,
2007, p. 736-737.
146
PEREZ, Marcos Augusto. O risco nos contratos de concessão de serviços públicos. Belo Horizonte: Fórum,
2006, p. 117.
71
O dirigismo estatal em relação à concessão, como visto, também pode influir na
classificação da álea. Quanto maior for a intervenção do Poder Público na
determinação do modo de prestação do serviço, menores serão os riscos assumidos
pelo concessionário. Nesse caso, a álea será de responsabilidade do
concessionário quando a ele puder ser imputada a consequência de uma decisão
sua em relação à execução do objeto contratual, pois, apenas nesse caso, terá
manifestado sua vontade em relação à consecução de determinado resultado. O
concessionário só poderá assumir o risco por uma decisão de negócio, quando
efetivamente tiver se utilizado de sua autonomia no exercício dos poderes
concedidos para a gestão do serviço público.
147
5.1.1.1. A álea ordinária na lei geral de concessões. O artigo 10 da Lei 8.987/95.
O equilíbrio econômico-financeiro dos contratos administrativos em geral e dos
de concessão, em particular, obedecem à divisão entre álea ordinária e
extraordinária desenvolvida pela jurisprudência francesa.
Essa classificação de riscos foi prevista pelo legislador pátrio na Lei
8.987/95 em pelo menos dois de seus dispositivos. O primeiro deles é o do artigo
da lei, que estabelece que a concessão corre “por conta e risco do concessionário.”
A segunda está contemplada no artigo 10, ao preceituar que “sempre que forem
atendidas as condições do contrato, considera-se mantido seu equilíbrio econômico-
financeiro“.
Segundo a doutrina clássica, nos termos desse artigo, cabe ao concessionário
a responsabilidade pelos encargos extras oriundos da exploração ordinária da
atividade empresarial, das quais ele não pode se eximir “sob a genérica e abstrata
invocação de um equilíbrio econômico-financeiro desvinculado do teor contratual”
148
pois, na concessão, a despeito de se garantir a equação econômico-financeira, não
se exime o concessionário dos riscos ordinários a que estão sujeitos todos aqueles
que exploram empresarialmente atividade de cunho econômico.
147
CAETANO, Marcello. Manual de Direito administrativo. 10. ed. Coimbra: Almedina, 2004, v. II, p. 1100.
148
BANDEIRA DE MELLO. Celso Antônio. Curso de direito administrativo. 26. ed. São Paulo: Malheiros,
2009, p. 737.
72
Vale a pena transcrever as lições de Celso Antônio Bandeira de Mello ao
afirmar, em relação ao artigo 10 da Lei Geral de Concessões, que
O que dele validamente se poderá extrair é o propósito de firmar,
com ênfase, ainda que mediante linguagem imprópria, que a garantia
do equilíbrio econômico-financeiro baliza-se fundamentalmente pelo
teor do contrato. [...] Dito artigo terá pretendido esclarecer que a
expressão “equilíbrio econômico-financeiro” não traz consigo uma
imunização do concessionário a eventuais prejuízos ou mesmo
malogro de seu empreendimento pessoal, quando, nos termos
dantes mencionados, venha a sofrer vicissitudes da vida negocial.
Aliás, é inerente às particularidades do instituto da concessão de
serviços públicos uma proteção ao equilíbrio econômico-financeiro
menos completa do que a existente na generalidade dos contratos
administrativos.
149
A equação econômico-financeira da concessão é determinada com base nos
encargos e vantagens previstos no edital e na proposta apresentada e o resultado
dela extraível deve ser mantido durante toda a execução do acordo. Esse resultado
é congelado no momento da celebração do pacto, garantindo-se, ao concessionário,
a projeção dessa relação nos exatos termos pactuados durante todo o período de
sua execução. Segundo Roberto Dromi
na equação contratual dos contratos públicos, a equação econômica
está destinada a manter um equilíbrio entre as prestações que o
concessionário deve cumprir, em especial quanto ao investimento
compromissado e efetivamente realizado, e as obrigações a cargo da
Administração, a fim de não desvirtuar a rentabilidade estruturada
originariamente na formulação estática do contrato, isto é, entre os
dois pólos, custo e benefício previstos contratualmente.
150
Entretanto, isso não significa que o concessionário esteja absolutamente
imunizado pela garantia do equilíbrio econômico-financeiro, mormente em se
considerando que a Lei Geral de Concessões prevê que a execução do serviço deve
correr por sua conta e risco.
A forma de se compatibilizar o fato de a concessão correr por conta e risco do
concessionário com a garantia do equilíbrio econômico financeiro, para os adeptos
da doutrina clássica, está baseada na partilha de riscos nas concessões de serviços
públicos, que deve seguir a divisão clássica entre as áleas ordinária e extraordinária,
sendo vedado o estabelecimento de outra divisão, pelas partes, no contrato.
149
BANDEIRA DE MELLO. Celso Antônio. Curso de direito administrativo. 26. ed., São Paulo: Malheiros,
2009, p. 737.
150
Tradução nossa. No original “en la ecuación contractual de los contratos públicos la ecuácion económica está
destinada a mantener um equilibrio entre lãs prestaciones que debe cumplir el contratista, em especial cuanto a
la inversión comprometida y efectivamente realizada, y las obligaciones a cargo de La Administrácion, a fin de
no desvirtuar la rentabilidad estructurada originariamente em la formulación estática del contrato, es decir,
entre los dos pólos, costo y beneficio previstos contractualmente.” (DROMI, Roberto. Ecuaciones de los
contratos públicos. Buenos Aires: Ciudad Argentina; Madrid: Hispania Libros, 2008, p. 279).
73
Sob essa perspectiva, a álea ordinária do negócio, econômica ou não, será
sempre de responsabilidade do concessionário, por estar diretamente ligada a sua
atuação como empresário, não importando a existência de previsão contratual a
respeito.
5.1.2 Áleas extraordinárias: administrativas e econômicas.
As áleas extraordinárias são costumeiramente classificadas em duas espécies:
as administrativas e as econômicas.
As áleas administrativas correspondem ao risco a que o concessionário está
sujeito de que o pacto seja alterado em razão de um ato que afete, direta ou
indiretamente, a economia do contrato. Caso o risco se concretize, são invocadas as
teorias do fato do príncipe, das alterações unilaterais e do fato da Administração
para a proteção do concessionário.
Segundo a jurisprudência francesa, nos casos de áleas administrativas, a
proteção do concessionário é integral, de forma que todos os ônus contratuais
correm inteiramente por conta da Administração Pública, que deu causa ao evento
que gerou o desequilíbrio da relação entre os encargos e vantagens inicialmente
estabelecidas no contrato.
151
As áleas econômicas levam à aplicação da teoria da imprevisão e da cláusula
rebus sic stantibus aos contratos de concessão. São casos em que o desequilíbrio
do contrato ocorre em razão de fatos estranhos à vontade das partes contratantes,
imprevisíveis ou previsíveis, mas de consequências incalculáveis, geralmente
ligados a alterações relevantes no mercado ou na economia em geral.
Destaca Celso Antônio Bandeira de Mello que, na França, as áleas econômicas
concernem aos riscos derivados de situações anômalas, excepcionais e
imprevisíveis para as partes, como crises e bloqueios econômicos, desvalorização
de moeda pelo governo ou acidentes naturais como terremotos ou inundações. Para
151
Ensina Celso Antônio Bandeira de Mello: “No Direito francês a álea administrativa corre inteiramente por
conta do concedente. Concerne aos riscos derivados da modificação unilateral as cláusulas da concessão ou de
medidas do concedente alheias à sua posição “contratual”, mas que repercutem especialmente sobre o
equilíbrio econômico-financeiro.” (BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Curso de direito administrativo.
26. ed. São Paulo:Malheiros, 2009, p. 733). (grifos no original)
74
a doutrina e jurisprudência francesas, os prejuízos derivados dessa espécie de álea
são divididos entre o concedente e o concessionário.
152
5.1.2.1 Teoria do Fato do príncipe (álea administrativa).
Diverge a doutrina francesa acerca da aplicação da teoria do fato do
príncipe.
153
Parte dos autores entende que o fato do príncipe engloba todo e
qualquer poder de alteração unilateral do contrato pela Administração Pública, seja
por medidas de ordem geral ou por medidas que digam respeito ao próprio contrato.
Em ambos os casos, as alterações verificadas na execução do contrato autorizam o
particular a pleitear indenização pelos prejuízos a ele causados.
154
No Brasil, nessa linha, Caio Tácito afirma que a teoria do fato do príncipe
resguarda o equilíbrio econômico-financeiro do contrato, sendo irrelevante se a
ofensa decorre de modificação direta de uma estipulação contratual, ou da
incidência de ato administrativo que atinja indiretamente as condições de execução
do contrato. Para esse fim, impende que o desequilíbrio seja gerado por um ato
oriundo da mesma autoridade que é parte na concessão.
Contudo, para os adeptos da outra corrente, o fato do príncipe abrange apenas
as medidas de ordem geral tomadas pela Administração Pública contratante,
exteriores ao contrato, mas que nele repercutam, tornando mais onerosa a execução
de seu objeto, alterando o equilíbrio econômico-financeiro inicialmente estabelecido.
Sustentam que o direito do concessionário pleitear indenização em virtude de
alterações unilaterais feitas pela Administração Pública não pode ser enquadrado no
conceito de fato do príncipe. Isto porque a alteração unilateral influi diretamente no
152
BANDEIRA DE MELLO. Celso Antônio. Curso de direito administrativo. 26. ed., São Paulo: Malheiros,
2007, p. 732.
153
Celso Antônio Bandeira de Mello aponta essa divergência entre os doutrinadores franceses. Segundo o autor,
Laubadère, Waline e Rivero entendem que a teoria do fato do príncipe aplica-se tanto quando os prejuízos
resultarem da modificação unilateral das cláusulas da concessão quanto as que provenham de medidas tomadas
com base em competência diversa daquela que o concedente exercitou ao praticar o ato concessivo. De outro
lado, Vedel e Benoit consideram que apenas nessa última hipótese tem aplicação a teoria do fato do principie,
Para esses autores a indenização devida em razão da utilização pelo concedente do poder de alteração
unilateral das cláusulas contratuais funda-se na própria relação específica da concessão e não no exercício de
um poder genérico ao qual se deve ligar o fato do príncipe. (BANDEIRA DE MELLO. Celso Antônio. Curso
de direito administrativo. 26. ed. São Paulo: Malheiros, 2009, p. 734, nota de rodapé n. 37).
154
Marçal Justen Filho aponta Rivero e Waline como autores adeptos dessa 2 corrente. (JUSTEN FILHO,
Marçal. Teoria geral das concessões de serviço público. São Paulo: Dialética, 2003, p. 384).
75
contrato, produzindo alterações nas prestações das partes, o que torna a
responsabilidade do Poder Público pela recomposição da equação econômico-
financeira contratual. O mesmo não ocorre nas hipóteses de fato do príncipe.
Nesses casos, a atuação do Poder Público não se refere especifica e diretamente ao
contrato, nele repercutindo apenas de maneira reflexa. A responsabilidade do Poder
Público, nessa hipótese, é extracontratual.
Esposando o entendimento doutrinário dessa corrente, o fato do príncipe pode
ser caracterizado como uma determinação geral, jurídica ou material da própria
Administração, que atinge o contrato apenas reflexamente, sendo imprevisível às
partes quando da celebração do acordo.
155
Para a caracterização do fato do príncipe, o ato que altera o equilíbrio
econômico-financeiro do contrato deve ser praticado pela própria autoridade
contratante, não podendo advir de pessoa diversa. Dessa forma, o ato geral de uma
autoridade federal que cause ônus a uma concessão pactuada entre um particular e
uma autoridade municipal ou estadual não poderia ser caracterizado como fato do
príncipe.
De se ressaltar que foi apenas a partir de 1949 que o Conselho de Estado
francês limitou a aplicação da teoria do fato do príncipe aos casos de medidas gerais
tomadas pela própria Administração concedente, remetendo para a teoria da
imprevisão as hipóteses em que o prejuízo do contratado é oriundo de ato de
autoridade estranha ao contrato de concessão.
156
O direito brasileiro adota esse
entendimento, como mostra Maria Sylvia Zanella Di Pietro:
No direito brasileiro, de regime federativo, a teoria do fato do príncipe
somente se aplica se a autoridade responsável pelo fato do príncipe
for da mesma esfera de governo em que se celebrou o contrato
(União, Estados e Municípios); se for de outra esfera, aplica-se a
teoria da imprevisão.
157
155
ARAGÃO. Alexandre Santos de. Direito dos serviços públicos. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2008, p. 643.
156
TÁCITO, Caio. O equilíbrio econômico financeiro nas concessões de serviços públicos. In: Temas de direito
público (estudo e pareceres). Rio de Janeiro: Renovar, 1997, p. 199-255, p. 207.
157
DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo. 22 ed. São Paulo: Atlas, 2009, p. 279. Cumpre
ressaltar, contudo a opinião de Celso Antônio Bandeira de Mello:”agravos resultantes de medidas tomadas sob
titulação jurídica diversa da contratual, isto é, no exercício de outra competência, cujo desempenho vem ater
repercussão direta na economia contratual estabelecida na avença. É o chamado ‘fato do príncipe’, tomada a
expressão com o âmbito específico a que se reporta Francis-Paul Bénoît, ao dizer: ‘ Convém entender por ‘fato
do príncipe’ os atos jurídicos e operações materiais, tendo repercussão sobre o contrato, e que foram efetuados
pela coletividade que celebrou o contrato, mas agindo em qualidade diversa da de contratante.’ [...] O fato do
príncipe não se confunde com aquilo que alguns autores denominam de ‘fato da Administração [...].
9BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Curso de direito administrativo. 26. ed. São Paulo: Malheiros,
2009, p. 6380.
76
O ressarcimento pelos encargos nos casos de fato do príncipe deve ser integral
e se suportado pela Administração Pública que foi a causadora, ainda que de
maneira indireta, do desequilíbrio contratual. Deve-se ressaltar, que uma
tendência jurisprudencial de reconhecer a aplicação dessa teoria apenas se as
medidas do Poder Público atingirem o concessionário de modo especialmente
oneroso em relação aos demais cidadãos.
158
5.1.2.2 Fato da Administração.
Consiste em uma ação ou omissão ilícita do Poder Público contratante, que
atinge direta e concretamente a concessão.
159
Nesse sentido, a Administração
Pública, como contratante, pratica um comportamento irregular, que viola o acordo
do qual é parte.
Para Celso Antônio Bandeira de Mello, a aplicação da teoria do fato da
Administração para recomposição do equilíbrio econômico-financeiro rompido o
demanda que o fato tenha impedido ou retardado a execução do contrato, bastando
a ocorrência do comportamento violador da Administração e do dano ao
concessionário.
160
Contudo, para Maria Sylvia Zanella di Pietro, o fato da
Administração “compreende qualquer conduta ou comportamento da Administração
que, como parte contratual, pode tornar impossível a execução do contrato ou
provocar seu desequilíbrio econômico”.
161
Diferentemente do que ocorre no fato do príncipe, em que o ato perturbador
não consiste em medida diretamente relacionada ao contrato, no fato da
administração, o ato que interfere na economia da avença, praticado pela própria
Administração Pública contratante, relaciona-se diretamente a ele.
158
JUSTEN FILHO, Marçal. Teoria geral das concessões de serviço público. São Paulo: Dialética, 2003, p.
385.
159
ARAGÃO, Alexandre Santos. Direito dos serviços públicos. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2008, p. 642.
160
BANDEIRA DE MELLO. Celso Antônio. Curso de direito administrativo. 26. ed. São Paulo: Malheiros,
2009, p. 641.
161
DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo. 22. ed. São Paulo: Atlas, 2009, p. 279-280. No
mesmo sentido Hely Lopes Meirelles: Fato da Administração é toda ação ou omissão do Poder Público que,
incidindo direta e especificamente sobre o contrato, retarda ou impede a sua execução.” (MEIRELLES, Hely
Lopes. Direito administrativo brasileiro. 33. ed. Atualizadores AZEVEDO, Eurico de Andrade; Aleixo,
Délcio Balestero; BURLE FILHO, José Emanuel.
São Paulo: Malheiros, 2007, p. 240).
77
Marcos Augusto Perez menciona como exemplos de fatos da administração: a
suspensão dos serviços por motivo de ordem pública e a assunção de atividades
não previstas inicialmente no contrato pelo concessionário em caráter emergencial e
precário.
162
No que tange à responsabilidade, assim como ocorre com o fato do príncipe,
não se admite a repartição dos prejuízos oriundos dos fatos da administração.
Tendo dado causa ao desequilíbrio inicialmente estabelecido, onerando
sobremaneira a execução do contrato por ato seu, cabe ao concedente arcar
integralmente com os prejuízos provocados.
Como a conduta que gera o dano é praticada pela Administração Pública, como
parte do contrato, tem-se que a responsabilidade pelo seu ressarcimento é
contratual.
5.1.2.3 Poder de alteração unilateral das cláusulas regulamentares.
O poder de alteração unilateral dos contratos confere à Administração Pública a
possibilidade de alterar as condições de funcionamento do serviço, seja em relação
a sua organização, a seu funcionamento ou até mesmo quanto às tarifas cobradas
dos usuários.
Lúcia Valle Figueiredo adverte que o poder de modificar as cláusulas do
contrato é nuclear para a Administração Pública, que não pode ficar inerte aos
reclamos do interesse público.
163
O concessionário não pode, em regra, opor-se a essas modificações, que
decorrem da posição especial do Poder Público na relação, sempre em busca do
atendimento do interesse público. A Administração Pública deve buscar a
consecução das necessidades e conveniências públicas, que são essencialmente
mutáveis. A possibilidade de alterar unilateralmente as normas de serviço para
adaptá-las às novas necessidades coletivas é prerrogativa da Administração.
164
162
PEREZ, Marcos Augusto. O risco nos contratos de concessão de serviços públicos. Belo Horizonte: Fórum,
2006, p. 111.
163
FIGUEIREDO, Lúcia Valle. Curso de direito administrativo. 9. ed. São Paulo: Malheiros, 2008, p. 538.
164
É nesse sentido a lição de Caio Tácito. O autor cita a doutrina de quignot no direito francês sobre a
mutabilidade do contrato administrativo em oposição a imutabilidade do contrato privado, bem como a
78
A oposição do concessionário é admissível, exclusivamente, na hipótese de
alteração efetuada pelo Poder Público que implique em alteração do objeto
contratado, desnaturando-o ou desvirtuando-o, ou caso a alteração impedisse a
execução do avençado, por torná-la de tal modo onerosa que levaria o
concessionário à ruína econômica.
O poder de alteração, necessário à adaptação da execução do serviço público,
de que é titular a Administração Pública, afronta diretamente um dos pressupostos
básicos da instituição contratual, o pacta sunt servanda, (contractus lex inter
partes),
165
razão pela qual a demonstração da existência de interesse público na
realização da alteração é essencial, sob pena de ilegalidade. Não se trata, portanto,
de um poder livre e ilimitado da Administração Pública.
Em contrapartida a esse poder de alteração unilateral das cláusulas
contratuais, surge, para o concessionário, o direito ao reequilíbrio econômico-
financeiro do contrato.
As alterações unilaterais promovidas nas cláusulas regulamentares pelo Poder
Público deverão ter como causa e finalidade exclusiva o atendimento do interesse
público.
Além disso, a vinculação da Administração Pública às regras de competência,
aos princípios legais e regulamentares especiais, à eficácia dos motivos e à
correspondência dos serviços à sua finalidade, são apontadas por Caio cito como
outros limites à alteração unilateral do contrato pelo Poder Público.
166
De acordo com Lúcia Valle Figueiredo, os limites da alteração estão no objeto
do contrato, que não poderá ser desfigurado pela modificação, observadas as
limitações quantitativas e qualitativas discriminadas pelas leis.
167
Se a alteração unilateral do contrato, promovida pela Administração Pública,
ocasionar alteração no equilíbrio econômico-financeiro do contrato, deverá haver o
seu restabelecimento. Como o ato é imputável exclusivamente à Administração, ela
deverá arcar integralmente com o ônus dessa recomposição.
doutrina de Waline sobre o reconhecimento da supremacia da Administração quanto a faculdade de inovar
unilateralmente as normas de serviço, adaptando-as as estipulações contratuais e conveniências públicas.
(TÁCITO, Caio. O equilíbrio econômico financeiro nas concessões de serviços públicos. In: Temas de direito
público (estudo e pareceres). Rio de Janeiro: Renovar, 1997, p. 199-255, p. 203).
165
GONÇALVES. Pedro. A concessão de serviços públicos. Coimbra: Almedina, 1999, p. 256.
166
TÁCITO, Caio. O equilíbrio econômico financeiro nas concessões de serviços públicos. In: Temas de direito
público (estudo e pareceres). Rio de Janeiro: Renovar, 1997, p. 199-255, p. 241.
167
FIGUEIREDO, Lúcia Valle. Curso de direito administrativo. 9 ed. São Paulo: Malheiros, 2008, p. 538.
79
5.1.2.4 Teoria da imprevisão.
A teoria da imprevisão é aplicável aos contratos de concessão quando se
verificar a ocorrência de um evento imprevisível e inevitável,
168
externo ao contrato e
estranho à vontade das partes que cause um gravame muito severo no seu aspecto
econômico, de forma a tornar sua execução extremamente onerosa para uma das
partes. Trata-se da mesma fórmula encontrada na teoria geral dos contratos e que
excepciona a aplicação do princípio da força vinculante.
A teoria da imprevisão foi criada pelo Conselho de Estado Francês e
corresponde à aplicação da cláusula rebus sic stantibus,
169
condicionando a
execução das prestações futuras ou continuadas dos contratos à manutenção dos
pressupostos fáticos da época de sua celebração. Segundo a jurisprudência desse
Conselho
A imprevisão não é caso de força maior. O co-contratante deve
perseguir a execução do contrato, cometendo uma falta se
interromper suas prestações. Em contrapartida, ele possui o direito
de ser indenizado, senão da totalidade, ao menos da maior parte do
encargo extracontratual, a dizer, do montante do déficit provocado
pela execução do contrato durante o período no qual ocorreu a
turbação no contrato em razão da ocorrência de circunstâncias
imprevisíveis. Duas figuras podem surgir: ou o equilíbrio contratual
se restabelece pelo desaparecimento das circunstâncias
imprevisíveis, ou se deve realizar um novo arranjo entre as partes.
Se a turbação da economia do contrato se revelar definitiva a
imprevisão se transforma em força maior justificando a rescisão do
168
Celso Antônio Bandeira de Mello, com base nas lições de Vedel, diferencia o agravo econômico proveniente
de fatos imprevistos dos provenientes das sujeições imprevistas. Estas m lugar quando “óbice material
imprevisível acarreta problema de ordem técnica que reclama despesas maiores que as previstas inicialmente.
O que entra em causa, pois, é um obstáculo técnico, como, por exemplo, o encontro de um lençol freático
inesperado”. Nesses casos, a indenização a ser paga pelo Poder Público deve ser total. (BANDEIRA DE
MELLO. Celso Antônio. Curso de direito administrativo. 26. ed., São Paulo: Malheiros, 2009, p. 734-735).
Maria Sylvia Zanella Di Pietro se refere a estes fatos como imprevistos. Para a autora estes seriam “fatos de
ordem material, que podiam já existir no momento da celebração do contrato, mas que eram desconhecidos
pelos contratantes [...]” Sendo fatos imprevisíveis, afirma a autora que a solução estará na aplicação da teoria
da imprevisão ou da força maior, conforme o caso. (DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo.
22. ed. São Paulo: Atlas, 2009, p. 285).
169
A cláusula rebus sic stantibus e a teoria da imprevisão constituem institutos jurídicos diferentes, embora sua
aplicação se dê indistintamente. É que para a aplicação da cláusula rebus sic stantibus bastaria que as
condições existentes quando da assinatura do contrato de sua execução futura viessem a se modificar quando
da sua execução, independentemente da onerosidade excessiva ou da imprevisibilidade do fato que causa o
desequilíbrio. Esses dois requisitos (onerosidade excessiva e imprevisibilidade do evento) são pressupostos da
aplicação da teoria da imprevisão. Para um estudo mais aprofundado do tema ver LIMA, Renata Faria da
Silva. Equilíbrio econômico financeiro contratual: no direito administrativo e no direito civil. Belo Horizonte:
Del Rey, 2007, p. 10-17.
80
contrato. É interessante notar que a teoria da imprevisão conduziu a
Administração Pública e seus co-contratantes a introduzir em seus
contratos cláusulas de revisão, que permitem uma adaptação às
evoluções da situação econômica e financeira, conferindo, assim um
caráter subsidiário à imprevisão.
170
Dessa forma, o Poder Público deve arcar parcialmente com os prejuízos que
resultam de acontecimento imprevisível, a que os contratantes não tenham dado
causa e que provoquem profundo e substancial desequilíbrio na equação
econômico-financeira, tornando ruinosa, embora não impossível, a prestação do
serviço para o concessionário.
171
O acontecimento que dá ensejo à aplicação da teoria da imprevisão deve ser
transitório. De acordo com a jurisprudência francesa, a turbação definitiva deve levar
à realização de novo pacto ou à rescisão do contrato por impossibilidade de
execução do seu objeto.
A utilização da teoria da imprevisão tem origem na cláusula rebus sic stantibus,
que remonta ao direito romano, tendo praticamente desaparecido após a Revolução
Francesa com a expansão do individualismo e do liberalismo. Nessa fase, o princípio
norteador dos contratos era o pacta sunt servanda, ou o princípio da força
obrigatória dos contratos. Tendo as partes contratantes manifestado livremente sua
vontade, obrigam-se, uma com a outra, em razão dessa livre manifestação, devendo
cumprir integralmente o avençado. A livre manifestação de vontade nos contratos é
fonte de direito. Segundo Maria Helena Diniz, esse princípio faz com que os
contratos celebrados tenham
força vinculante, pois, se não tivesse obrigatoriedade em relação aos
contratantes, jamais poderia desempenhar sua função jurídica
econômica. O contrato tem, portanto, força de lei entre as partes,
vinculando-as ao que pactuaram, como se essa obrigação fosse
oriunda de um dispositivo legal.
172
170
No original: “L’imprévision n’étant pas un cas de force majeure, le cocontractant doit poursuivre l’exécution
du contrat ; il commettrait une faute en interrompant ses prestations. En contrepartie, il a le droit d’être
indemnisé, sinon de la totalité, du moins de la plus grande partie de la charge extracontractuelle, c’est-à-dire
du montant du déficit provoqué par l’exécution du contrat pendant la période au cours de laquelle il y a eu
bouleversement par les circonstances imprévisibles. Deux cas de figure peuvent ensuite se produire : soit
l’équilibre contractuel se rétablit, par disparition des circonstances imprévisibles ou du fait de nouveaux
arrangements entre les parties, soit le bouleversement de l’économie du contrat se révèle définitif, et
l’imprévision se transforme alors en cas de force majeure justifiant la résiliation du contrat. Il est intéressant de
constater que la théorie de l’imprévision a conduit l’administration et ses cocontractants à introduire dans leurs
contrats des clauses de vision qui permettent une adaptation aux évolutions de la situation économique et
financière, conférant ainsi un caractère subsidiaire au jeu de l’imprévision.” Disponível em:
<http://www.conseil-etat.fr/ce/jurisp/index_ju_la11.shtml>. Acesso em: 06 jun. 2009.
171
BANDEIRA DE MELLO. Celso Antônio. Curso de direito administrativo. 26. ed. São Paulo: Malheiros,
2009, p. 734.
172
DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: teoria das obrigações contratuais e extracontratuais.
24. ed. São Paulo: Saraiva, 2008, v.3, p.104.
81
Até a primeira guerra mundial, o princípio do pacta sunt servanda era
rigidamente aplicado, não sofrendo qualquer tipo de atenuação. Entretanto, as
flutuações econômicas advindas do desequilíbrio social e político gerados pela
guerra no continente europeu levaram a um grande aumento no preço das matérias
primas, como o carvão, inviabilizando a execução dos contratos celebrados antes da
eclosão do conflito. Tal situação levou os tribunais a reverem a aplicação irrestrita do
princípio pacta sunt servanda, de forma a mitigá-lo em situações excepcionais,
restabelecendo-se a utilização do princípio rebus sic stantibus.
A utilização da cláusula rebus sic stantibus e da teoria da imprevisão
constituem exceção à regra da força obrigatória dos contratos, valor extremamente
importante e caro na manutenção da segurança jurídica das relações contratuais.
Para que exista segurança entre os contratantes, deve haver a maior certeza
possível em relação à execução do acordo, nos termos em que foi pactuado. A
vontade das partes inicialmente manifestada deve ser mantida ao final. Apenas
situações excepcionais, imprevisíveis e inevitáveis, alheias às partes e de tal
gravidade que possam gerar o comprometimento financeiro de um dos contratantes
são capazes de afastar o princípio do pacta sunt servanda. Sem esse princípio, o
haveria qualquer garantia de execução do avençado.
A doutrina francesa aponta alguns exemplos de alterações econômicas que
podem levar à aplicação da teoria da imprevisão, como crises e bloqueios
econômicos, desvalorização da moeda pelo governo central ou fatos da natureza,
como terremotos ou inundações.
No direito francês, a aplicação da teoria da imprevisão faz com que os
prejuízos sejam partilhados entre o concedente e o concessionário, de forma a se
evitar a ruína deste e, ao mesmo tempo, manter a prestação do serviço público
concedido.
A excepcionalidade da aplicação da teoria da imprevisão aos contratos de
concessão demanda a verificação da ocorrência concomitante de certos requisitos.
A jurisprudência francesa exige que o fato gravoso seja de ocorrência
imprevisível quando da celebração do contrato, alheio a qualquer ato ou vontade das
partes, inevitável e causador de um grave e grande desequilíbrio na economia do
contrato. A execução do contrato deve continuar a ser possível, mas
82
economicamente ruinosa para uma das partes.
173
Sem a observância desses
requisitos, não há que se falar em aplicação da teoria da imprevisão.
Se o fato era previsível, ele deveria ter sido considerado pelo concessionário
na formulação de sua proposta. Assim, não que se falar em quebra da equação
econômico-financeira quando ocorre um evento previsível, pois ele corresponde a
uma álea ordinária. Nesse caso, se o concessionário não tiver incluído a previsão da
ocorrência do evento em sua proposta, deverá arcar de per si com as
consequências do evento. Ao não levar em conta fato previsível, age com culpa
exclusiva, não podendo imputá-la ao concedente. Cabe ao concessionário prever e
empreender esforços para evitar a ocorrência de eventos previsíveis.
Se o evento não afetar gravemente o equilíbrio econômico-financeiro do
contrato, isto é, se não extrapolar o “preço-limite, a margem de variação que o
particular deveria ter como um risco normal e inerente à atividade desempenhada”,
deverá ser suportado pelo próprio concessionário. Apenas se este limite for
ultrapassado, haverá o direito à indenização.
174
Na França, para haver a indenização por parte do Poder Público, o evento
turbador do equilíbrio econômico-financeiro não pode ser passageiro. Nesta
hipótese, a solução consistia em uma nova pactuação ou até mesmo a rescisão
contratual, com a aplicação da teoria da força maior.
175
Nesse caso, como a
aplicação da teoria da imprevisão exige que o evento seja transitório, não se fala em
alteração do valor da tarifa.
176
Essa alteração é possível nos casos em que
houver repactuação, hipótese em que a elevação da tarifa é necessária para fazer
frente aos novos custos impostos ao concessionário em razão da alteração da
situação fática e dos novos encargos a ele impostos.
5.1.2.5 Força maior.
173
JUSTEN FILHO, Marçal. Teoria geral das concessões de serviço público. São Paulo: Dialética, 2003, p.
385.
174
JUSTEN FILHO, Marçal. Teoria geral das concessões de serviço público. São Paulo: Dialética, 2003, p.
386.
175
JUSTEN FILHO, Marçal. Teoria geral das concessões de serviço público. São Paulo: Dialética, 2003, p.
385.
176
Conforme Marçal Justen Filho nestes casos “a solução imediata não reside na modificação da tarifa. Mas,
como as partes deverão encontrar uma solução amigável a propósito, poderá resultar na elevação da tarifa.”
(JUSTEN FILHO, Marçal. Teoria geral das concessões de serviço público. São Paulo: Dialética, 2003, p.
386).
83
A força maior constitui fato estranho à vontade das partes, inevitável e
imprevisível, que altera as condições de execução do contrato. A força maior torna
absolutamente impossível a execução do avençado.
Nesse caso, as partes são liberadas de quaisquer ônus, inclusive a mora e
responsabilidades pelo inadimplemento, pois o impedimento para a execução da
avença é fático e independe de sua vontade.
A teoria da imprevisão não é aplicável a essas situações pois, ainda que haja a
indenização do concessionário, a execução da avença é materialmente impossível.
A solução é a resolução do contrato, sem ônus para as partes.
Com a ocorrência da força maior, há impossibilidade absoluta de se prosseguir
com a execução do contrato. Nos termos do artigo 78, inciso XVII da Lei nº 8.666/93,
a força maior constitui fundamento para a rescisão do contrato, com efeito
meramente declaratório de uma situação de fato impeditiva da execução.
177
5.1.2.6 Sujeições Imprevistas.
Toda vez em que o contratado se deparar com uma dificuldade material na
execução do objeto, exterior à vontade das partes e imprevisível, mas que onere a
execução da prestação, deverá ser indenizado.
As sujeições imprevistas o fatos anteriores à contratação, que não eram
conhecidos pelas partes, mas que são revelados durante a execução da avença.
Marçal Justen Filho cita como exemplo de sujeição imprevista a falha geológica do
terreno, que inviabiliza a execução da obra de engenharia tal como originalmente
concebida.
178
A falha geológica é fato preexistente ao contrato, desconhecido pelas
partes. Sua existência gera um encargo adicional na execução do objeto pactuado,
interferindo na relação entre vantagens e encargos, implicando na necessidade de
indenização integral pelo encargo.
177
DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo. 22 ed. São Paulo: Atlas, 2009, p. 284.
178
JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à lei de licitações e contratos administrativos. 12. ed. São Paulo:
Dialética 2008, p.721.
84
As sujeições imprevistas não se confundem com as hipóteses de aplicação da
teoria da imprevisão, como adverte Celso Antônio Bandeira de Mello. Para a
aplicação da teoria da imprevisão, o pressuposto é a existência de fatores
econômicos que alterem o equilíbrio do contrato. Nas sujeições materiais, a
execução contratual é obstada pela ocorrência de um incidente técnico, um fato
material.
179
O que se visa é evitar o enriquecimento sem causa da Administração Pública,
pois o concessionário não poderia arcar sozinho com o ônus adicional, proveniente
da alteração nas condições contratuais, alheias a sua vontade, para manter a
prestação de um serviço estatal. Se isso fosse possível, a Administração, sem
qualquer dispêndio extra, manteria a prestação de um serviço de sua
responsabilidade às custas do particular. O concessionário tem direito à
remuneração pelas prestações suplementares, necessárias à execução do pacto.
5.2 Áleas extraordinárias e a quebra do equilíbrio econômico-financeiro das
concessões de serviços públicos segundo o ordenamento jurídico brasileiro.
As Leis 8.987/95 e 9.074/95 são diplomas legais que contêm normas gerais
aplicáveis aos contratos de concessão de serviços blicos, delimitando o regime
jurídico da equação econômico-financeira do contrato administrativo por ela
abordado.
180
A aplicação da Lei 8.666/93 é subsidiária nos casos de concessões de
serviços públicos e limitada aos aspectos procedimentais do certame licitatório e da
realização da contratação, razão pela qual a análise do equilíbrio econômico
financeiro da concessão de serviços blicos remunerada por pagamento de tarifa
pelos usuários do serviço deve se iniciar pela lei que rege essa espécie contratual,
qual seja, a Lei nº 8.987/95 e suas alterações posteriores.
A Lei nº 8.987/95 veicula normas reguladoras da concessão de serviços
públicos (objeto), nos termos do artigo 175 da Constituição Federal. A seu turno, a
179
BANDEIRA DE MELLO. Celso Antônio. Curso de direito administrativo. 26. ed., São Paulo: Malheiros,
2009, p. 639.
180
também lei setoriais sobre concessões. Entretanto, no presente trabalho, vamos tratar o equilíbrio
econômico-financeiro de maneira mais global, nos termos das leis gerais.
85
Lei 8.666/93 se afigura aplicável às licitações e contratações administrativas, nos
termos do artigo 22, inciso XXVII da Constituição Federal, que impôs a observância
do artigo 37, XXI.
181
5.2.1 As áleas extraordinárias na Lei nº 8.987/95.
O dever da Administração blica de realizar, de ofício, o reequilíbrio
econômico-financeiro dos contratos de concessão é previsto de forma expressa em
duas hipóteses pela Lei nº 8.987/95, que impõem, ainda, o modo pelo qual a
recomposição deve ser realizada.
A primeira delas está disciplinada no artigo 9º, parágrafo 3º, que determina a
realização de revisão tarifária para fazer frente à criação, alteração ou extinção de
quaisquer tributos ou encargos legais, após a apresentação da proposta, quando
comprovado seu impacto sobre o contrato.
A revisão da tarifa, nesse caso, é decorrência da alteração da carga tributária
imposta ao concessionário e poderá ser feita para aumentá-la ou diminuí-la.
A realização da revisão tarifária para sua adequação, quando comprovada a
repercussão da alteração da carga tributária sobre a equação econômico-financeira
do contrato, é dever da Administração Pública, imposto pela Lei 8.987/95. Verificada
a repercussão da nova carga tributária sobre a equação inicialmente contratada, o
agente público deverá proceder à revisão tarifária. O início do procedimento é ato
vinculado, podendo haver responsabilização do agente administrativo competente
que não agir dessa forma.
A disposição do parágrafo 3º, do artigo da Lei 8.987/95, é clara nessa
direção, ao dispor que “ressalvados os impostos sobre a renda, a criação, alteração
ou extinção de quaisquer tributos ou encargos legais, após a apresentação da
proposta, quando comprovado seu impacto, implicará a revisão da tarifa, para mais
ou para menos, conforme o caso”.
O parágrafo 3º do artigo 9º da Lei 8.987/95 prevê uma exceção à regra que
dispõe sobre a necessidade de recomposição do equilíbrio econômico-financeiro em
181
A Lei 8.666/93 e a Lei 9.074/95 não trazem apenas normas gerais sobre licitações e contratos aplicáveis a
todos os entes federativos, mas também normas de caráter federal.
86
razão da alteração da carga tributária. Trata-se da hipótese de aumento ou
diminuição do imposto sobre a renda, caso em que, por expressa determinação
legal, não haverá revisão tarifária, tampouco recomposição do equilíbrio econômico-
financeiro do contrato.
Neste caso, a norma consolida a disposição do artigo 150, parágrafo da
Constituição Federal, que afasta a aplicação do princípio da imunidade recíproca ao
patrimônio, à renda e aos serviços relacionados com a exploração de atividades
econômicas regidas pelas normas aplicáveis a empreendimentos privados, ou em
que haja contraprestação ou pagamento de preços ou tarifas pelo usuário.
Na concessão, a remuneração do concessionário é baseada no pagamento de
tarifa pelos usuários dos serviços. A exploração do serviço público é realizada pelo
concessionário de maneira empresarial. A conjugação dessas duas características
implica na impossibilidade de se aplicar a regra da imunidade prevista na
Constituição.
Além disso, tem-se que a exploração do serviço público pelo concessionário
visa o lucro, como ocorre com todos aqueles que exploram uma atividade
econômica. Impedir a tributação sobre a renda do concessionário de serviço público
violaria, nesse ponto, o princípio da isonomia.
O reequilíbrio econômico-financeiro dos contratos de concessão nos casos de
alteração da carga tributária, ou dos encargos impostos ao concessionário,
corresponde à hipótese de aplicação da teoria do fato do príncipe (se o tributo for da
competência do concedente), ou da teoria da imprevisão, (se essa competência for
de ente diverso). No entanto, a consequência jurídica em ambos os casos é a
mesma e decorre de expressa previsão legal: determina, ao concedente, a
realização da revisão tarifária para permitir a recomposição integral da equação
econômico-financeira rompida, ponto que será abordado no tópico 6.2.2.3.
A solução adotada para essa hipótese difere daquela consagrada pela
jurisprudência francesa. No Brasil, o concedente deve arcar, exclusivamente, com
todos os ônus advindos do aumento em razão da criação de um tributo, ainda que
essa alteração de carga tributária não se restrinja ao contrato, mas afete de maneira
indistinta toda a coletividade. Essa diferença é levada em consideração pelo direito
francês para avaliar a quebra do equilíbrio econômico-financeiro.
Dessa forma, embora se possa enquadrar a hipótese nas classificações
teóricas elaboradas pela doutrina e jurisprudência francesas, a consequência
87
prevista na lei brasileira se mostra diversa, tornando a classificação, nesse caso, de
pouca utilidade.
Outra hipótese de recomposição do equilíbrio econômico-financeiro,
expressamente prevista na Lei Geral de Concessões, está no artigo 9º, parágrafo 4º.
Esse dispositivo preceitua o dever de restabelecimento da equação econômico-
financeira quando a Administração Pública realizar alterações unilaterais, que
afetem a relação entre os encargos e vantagens inicialmente estabelecidos, em
razão do interesse público.
A disciplina legal determina que esta recomposição seja realizada de maneira
concomitante à alteração contratual imposta pelo concedente, devendo ser plena,
isto é, suficiente para fazer frente a todos os novos encargos advindos dessa
alteração. A lei impôs à Administração Pública contratante a responsabilidade por
todos os ônus advindos das modificações que realizar na concessão em razão do
interesse público.
182
Essa hipótese se assemelha à teoria geral do direito: quem deu causa ao
evento danoso responde pelas consequências. A diferença é que, nesse caso, o
dano advém de um ato lícito do Poder Público, que beneficiará toda a comunidade.
A recomposição da equação econômico-financeira em razão de alteração
unilateral do contrato realizada pela Administração Pública é sedimentada na
doutrina e na jurisprudência francesas. Trata-se da clássica recomposição da
equação econômico-financeira da concessão, segundo a qual, aos poderes
exorbitantes da Administração Pública corresponde o direito do concessionário ao
equilíbrio econômico-financeiro inicialmente pactuado. Como quem deu causa ao
encargo foi a própria Administração Pública, a ela compete arcar com todos os ônus
advindos de sua atuação.
A solução, nesses casos, é a mesma tanto no Brasil quanto na França:
corresponde ao restabelecimento do pacto inicial, devendo a Administração Pública
arcar integralmente com os ônus.
Em que pese a similitude na solução preconizada nos dois ordenamentos
jurídicos, uma diferença pode ser apontada. No Brasil, a lei determina que a
recomposição da equação econômico-financeira se de maneira concomitante à
182
Nesse aspecto importante ressaltar as lições de Lúcia Valle Figueiredo que adverte que o poder de alteração
unilateral da Administração Pública não é ilimitado. Apenas se houver interesse público é que as alterações
deverão ser realizadas.
88
imposição das novas obrigações ao concessionário. Dessa forma, a quebra do
equilíbrio econômico-financeiro não deve estender seus efeitos no tempo, vez que a
lei impôs uma atuação preventiva ao Poder Público com o intuito de evitar a
ocorrência do dano ao concessionário.
Portanto, a recomposição da equação não depende de qualquer iniciativa do
concessionário. Ela deve ser realizada, de ofício, pela Administração Pública,
tratando-se de dever a ela imposto pela lei. O Poder Público deverá apurar,
antecipadamente, os efeitos que a alteração trará ao contrato, procedendo aos
ajustes necessários para compensar as consequências da modificação que será
implementada.
Diferentemente do que ocorre nos casos de alteração da carga tributária, a lei
não vinculou o restabelecimento da equação econômico-financeira à tarifa. Assim, o
administrador público poderá, nessa hipótese, utilizar-se de outros instrumentos para
realizar a recomposição da equação, como o aumento de prazos, a diminuição de
encargos, o pagamento de subsídios ao concessionário
183
, ou a utilização de
receitas alternativas, complementares, acessórias ou de projetos associados
184
.
Caso o concedente não realize a recomposição da equação econômico-
financeira de maneira concomitante à alteração contratual, como determina a Lei
8.987/95, caberá ao concessionário pleiteá-la judicialmente, estando a
Administração Pública sujeita a todos os encargos legais resultantes de sua
omissão.
Alexandre Santos de Aragão sustenta que, caso a Administração Pública não
realize a recomposição da equação econômico-financeira de maneira concomitante
à alteração contratual, a implementação dessa alteração ficará com sua eficácia
suspensa, condicionada à definição da forma de manutenção da equação
econômico-financeira inicial.
185
Ocorre que, em ambas as hipóteses, o concessionário deverá socorrer-se do
Judiciário, vez que está legalmente impedido de deixar de prestar o serviço público
183
Nos termos do artigo 17 da Lei 8.987/95, os subsídios devem estar previamente autorizados em lei, de forma
a permitir que todos os interessados apresentem a suas propostas considerando a existência do subsídio.
184
Esse tema será tratado no tópico 6.2.3.1.1.
185
ARAGÃO, Alexandre Santos de. Direito dos serviços públicos. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2008, p. 644.
89
concedido até o trânsito em julgado da sentença que reconhecer o descumprimento
das obrigações contratuais pelo concedente.
186
A Lei 8.987/95 prevê apenas duas hipóteses de reequilíbrio econômico-
financeiro dos contratos de concessão por ela regulados. São ocorrências
específicas que, todavia, não exaurem as possibilidades de rompimento do equilíbrio
econômico-financeiro contratual. diversos outros fatos que podem levar ao
desequilíbrio econômico-financeiro da concessão e que não estão previstos de
maneira precisa na lei.
5.2.2 As áleas econômicas extraordinárias.
Afora as duas hipóteses legais de reequilíbrio econômico-financeiro, a Lei
8.987/95 permitiu às partes estipularem contratualmente mecanismos de revisão de
tarifa para a sua manutenção (art. 9º, §2º) sem, contudo, disciplinar a divisão dos
ônus decorrentes de eventos extraordinários e alheios à vontade das partes, isto é,
sem dizer se esses prejuízos deveriam ser divididos entre as partes, dado que
nenhuma delas deu-lhes causa.
A ausência de disposição na Lei Geral de Concessões leva à utilização das
disposições existentes na Lei nº 8.666/93, que regulamenta o artigo 37, inciso XXI
da Constituição, estabelecendo normas gerais de licitação e contratos da
Administração Pública. Sua aplicação subsidiária aos contratos de concessão de
serviços públicos é irrestritamente reconhecida, até mesmo por quem defende a não
186
Dispõe o artigo 39 da Lei 8.987/95: “Art. 39. O contrato de concessão poderá ser rescindido por iniciativa da
concessionária, no caso de descumprimento das normas contratuais pelo concedente, mediante ação judicial
especialmente intentada para esse fim. Parágrafo único. Na hipótese prevista no caput deste artigo, os serviços
prestados pela concessionária não poderão ser interrompidos ou paralisados, até a decisão judicial transitada
em julgado.” Segundo Marçal Justen Filho, esse dispositivo deve ser interpretado de acordo com os preceitos
do Estado Democrático de Direito consagrados pela Constituição Federal de 1988. “Por isso, apenas pode
interpretar-se o dispositivo como uma reiteração, no âmbito das concessões, do princípio constitucional da
universalidade da jurisdição (art. 5º, inc. XXXV). Recorrer-se-á ao Poder Judiciário quando houver conflito de
interesses e o concedente reputar existente fundamento jurídico para opor-se às pretensões do particular,
Portanto, se o Estado não dispuser de motivos jurídicos para rejeitar o pleito do particular, não poderá invocar
a conveniência fática de não lhe pagar ou de espoliá-lo. Isso seria desmerecer o Estado Democrático de Direito
imposto constitucionalmente.” (JUSTEN FILHO, Marçal. Teoria geral das concessões de serviços públicos.
São Paulo: Dialética, 2007, p 609).
90
aplicação do artigo 37, inciso XXI aos contratos de concessão de serviços
públicos.
187
-
188
Seu artigo 65, inciso II, “d” disciplina a aplicação, aos contratos administrativos,
de remédios para salvaguardar os contratos de desequilíbrios decorrentes de álea
econômica extraordinária e extracontratual,
Art. 65. Os contratos regidos por esta Lei poderão ser alterados,
com as devidas justificativas, nos seguintes casos: [...]
II - por acordo das partes: [...]
d) para restabelecer a relação que as partes pactuaram inicialmente
entre os encargos do contratado e a retribuição da administração
para a justa remuneração da obra, serviço ou fornecimento,
objetivando a manutenção do equilíbrio econômico-financeiro inicial
do contrato, na hipótese de sobrevirem fatos imprevisíveis, ou
previsíveis porém de conseqüências incalculáveis, retardadores ou
impeditivos da execução do ajustado, ou, ainda, em caso de força
maior, caso fortuito ou fato do príncipe, configurando álea econômica
extraordinária e extracontratual.
Embora exista convergência doutrinária em relação à aplicação desse
dispositivo legal aos contratos de concessão, uma série de divergências,
principalmente em relação à extensão de sua proteção e à responsabilidade pela
realização da recomposição da equação inicial, sendo possível identificar duas
grandes correntes de pensamento.
5.2.2.1 A Lei nº 8.666/93 e a máxima garantia do concessionário.
A primeira corrente formada em relação à interpretação a ser dada ao artigo
65, II, “d” da Lei 8.666/93 confere máxima amplitude de aplicação ao dispositivo
legal, tornando a garantia do equilíbrio econômico-financeiro a mais abrangente
187
É o caso de Maria Sylvia Zanella Di Pietro. Afirma a autora “A Lei 8.987 prevê a revisão das cláusulas
financeiras, para restabelecimento do equilíbrio econômico, apenas nos casos de aumento de impostos (fato do
princípe) e de alteração unilateral do contrato (art. 9º, §§ 3º e 4º). Mas é evidente que, em outras circunstâncias
aí não previstas, que caracterizem ‘fato da Administração’, ‘fato do príncipe” ou álea econômica imprevisível e
não imputável à vontade das partes, aplicar-se-ão subsidiariamente as normas constantes da Lei 8.666, em
especial o inciso II, d, e §§ e 6º. E ainda que não houvesse essa previsão legal, aplicar-se-iam aquelas
teorias, com a consequente revisão das cláusulas financeiras do contrato, por força dos referidos princípios
da equidade, da razoabilidade, continuidade do serviço público, indisponibilidade do interesse público.” (DI
PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Parcerias na administração pública: concessão, permissão, franquia,
terceirização, parceria público-privada e outras formas. 7. ed., São Paulo: Atlas, 2009, p. 105-106).
188
Para os adeptos da possibilidade de distribuição contratual de riscos nos contratos de concessão, as
disposições da Lei 8.666/93 aplicam-se subsidiariamente, caso não exista disposição contratual a respeito da
responsabilidade pela álea econômica extraordinária ocorrida.
91
possível, se comparada à proteção dada ao concessionário de serviços públicos
pelo direito francês e a proteção dada aos contratantes pelo direito privado
nacional.
189
Sustentam seus adeptos que o artigo 65, II, “d” da Lei 8.666/93 conferiu
proteção máxima ao concessionário em relação à equação econômico-financeira
dos contratos administrativos, impondo à Administração Pública a responsabilidade
integral por todos os ônus que alterem a equação econômico-financeira do acordo,
advindos da álea econômica extraordinária, seja ela caso fortuito, força maior, fato
do príncipe ou fatos imprevisíveis, ou previsíveis, porém de consequências
incalculáveis, retardadores ou impeditivos da execução do ajustado.
Segundo eles, a Lei 8.666/93 equiparou, para os contratos administrativos,
os efeitos da aplicação das teorias do caso fortuito, força maior, fato do príncipe e
imprevisão, impondo à Administração Pública a responsabilidade integral pelos ônus
advindos de eventos extraordinários e extracontratuais.
Essa solução difere da construção francesa, segundo a qual os ônus pelos
encargos advindos de áleas econômicas extraordinárias devem ser repartidos entre
o concessionário e o concedente.
A razão de se imputar ao Poder Público a responsabilidade integral sobre os
encargos oriundos das áleas econômicas extraordinárias está relacionada à
realização do interesse público, que pode ocorrer com a total e irrestrita
preservação da equação econômico-financeira inicialmente estabelecida. Com
efeito, a continuidade do serviço blico depende da possibilidade de manutenção
econômica do serviço pelo concessionário, o que estará garantido, na hipótese
de ocorrência de evento extraordinário e extracontratual, pela responsabilidade
econômica do Poder Público. A continuidade do serviço público é dever da
Administração Pública e decorre do princípio da indisponibilidade do interesse
público, razão pela qual os ônus advindos das áleas econômicas extraordinárias
deverão por ela ser suportados. Ao concessionário não pode ser imposto esse ônus
se não houver a respectiva contraprestação.
Além disso, se os concessionários tivessem de arcar com as áleas econômicas
extraordinárias, no todo ou em parte, teriam de formular propostas mais onerosas,
precificando o risco a que estariam sujeitos. A Administração e os usuários teriam de
189
São adeptos desse posicionamento Celso Antônio Bandeira de Mello, Marçal Justen Filho.
92
arcar com o ônus econômico da precificação de eventos de ocorrência meramente
possível, os quais permitiriam a remuneração do concessionário pelo risco a que ele
estaria sujeito. Nessa seara, uma conclusão se impõe: é mais vantajoso, para o
interesse público, que o ônus econômico por um evento futuro e incerto seja
suportado pelos usuários do serviço ou pela Administração Pública, tão-somente,
quando ele se tornar efetivo.
190
Essa sistemática permite aos interessados formular a menor proposta possível
no certame, uma vez que estão, aprioristicamente, isentos dos ônus advindos das
áleas extraordinárias econômicas e aos usuários dos serviços públicos pagar a
menor tarifa possível, participando economicamente do risco apenas no caso dele
efetivamente se concretizar.
191
O intuito não é beneficiar o concessionário, mas proteger o interesse público na
realização do serviço concedido, razão pela qual se permite que aquele que contrata
com a Administração Pública disponha de garantias superiores àqueles que atuem,
exclusivamente, no âmbito privado. A salvaguarda do concessionário de serviços
públicos implica, de forma indireta, na preservação do interesse público, dever da
Administração Pública.
192
Em decorrência, o restabelecimento da equação econômico-financeira somente
poderia ser negado pela Administração Pública em quatro hipóteses: caso não se
comprovasse a alteração na equação econômico-financeira do contrato, se o evento
gravoso ocorresse antes da formulação da proposta, se não houvesse relação de
causalidade entre o evento e a majoração dos encargos do contratado, ou nos casos
de culpa do contratado pela majoração dos encargos.
193
Na primeira hipótese, se o evento não gerou qualquer alteração na equação
econômico-financeira do contrato, não que se falar em seu restabelecimento. Se
não há dano, não há responsabilização.
190
JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à lei de licitações e contratos administrativos. 12. ed. São Paulo:
Dialética 2008, p.77-78.
191
JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à lei de licitações e contratos administrativos. 12. ed. São Paulo:
Dialética 2008, p.718.
192
Sobre o tema, Marçal Justen Filho transcreve citação de Francis Paul Bénoit para quem “O regime do
contrato de direito público pode, muito ao contrário, comprovar-se muito mais favorável para os particulares
co-contratantes da Administração do que para eles seria o regime de contrato de direito privado, na medida em
que se configure necessário para defender o interesse geral por meio do interesse particular: a jurisprudência
administrativa sobre a imprevisão ilustra esse fato de modo marcante”. (Bénoit, Francis-Paul. Le droit
administratif français. Paris: Dalloz, 1968, p. 588. apud JUSTEN FILHO, Marçal. Teoria geral das
concessões de serviço público. São Paulo: Dialética, 2003, p. 392).
193
JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à lei de licitações e contratos administrativos. 12. ed. São Paulo:
Dialética 2008, p.718.
93
De outro lado, se o evento danoso ocorreu antes da formulação da proposta
pelo concessionário, seu ônus financeiro poderia ser incorporado a ela, de forma a
compor a equação econômico-financeira formada. Se o concessionário não integrou
o encargo a sua proposta, agiu com culpa, não podendo a Administração Pública
arcar com a responsabilidade por um dano que o próprio concessionário causou.
Além disso, se o evento danoso ocorreu antes da celebração do acordo, ele se deu
em momento anterior à formação da equação econômico-financeira.
Nas hipóteses em que a quebra do equilíbrio econômico-financeiro se der por
culpa exclusiva do concessionário, a responsabilidade pela sua recomposição não
poderá ser imputada ao Poder Público, pois o evento danoso decorreu da atuação
do próprio agente que sofreu o dano.
Se não houver prova de que a equação econômico-financeira foi afetada pelo
evento imprevisível, a sua recomposição não poderá ocorrer. Não
responsabilidade sem a efetiva comprovação da ocorrência do dano.
O desequilíbrio da equação econômico-financeira do contrato de concessão é
matéria de fato, cabendo ao concessionário a prova de ter suportado os encargos
advindos do evento, assim como a prova de que não lhe deu causa e que este o
está inserido na álea ordinária, que por ele deve ser suportada.
De outro lado, como a aplicação da teoria da imprevisão não gera divisão dos
encargos oriundos do evento danoso, basta que se verifique a alteração na equação
econômico-financeira inicial do contrato, não se exigindo que a afetação da equação
seja grave, isto é, que seja ultrapassado o “preço-limite, a margem de variação que
o particular deveria ter como um risco normal e inerente à atividade
desempenhada”.
194
Esse entendimento distancia a aplicação da teoria da imprevisão nos contratos
administrativos da teoria geral do direito, pois desconsidera a onerosidade excessiva
para um dos contratantes, com o consequente enriquecimento sem causa do outro,
como elemento essencial à aplicação da teoria da imprevisão.
Para os doutrinadores que defendem a ampla proteção do concessionário,
basta que se verifique que os encargos não mais correspondem às vantagens
acordadas inicialmente, não sendo necessária a verificação da extensão ou do
reflexo do dano causado.
194
JUSTEN FILHO, Marçal. Teoria geral das concessões de serviço público. São Paulo: Dialética, 2003, p.
386.
94
A lei não faz qualquer exigência nesse sentido, não sendo lícito ao intérprete
condicionar a aplicação do dispositivo do artigo 65, II, “d” da Lei nº 8.666/93 à
comprovação de que o ônus advindo do evento imprevisto foi excessivo. A lei não
criou requisitos à aplicação da teoria da imprevisão, ao intérprete não compete fazê-
lo.
Outro ponto que distancia a aplicação da teoria da imprevisão no direito
brasileiro do direito francês está no fato de não haver, na norma do artigo 65, II, “d”
da Lei nº 8.666/93, qualquer referência em relação à transitoriedade do evento
imprevisível que alterou a equação econômico-financeira inicialmente estabelecida.
Assim, ao contrário do que ocorre no direito francês (a alteração definitiva na
equação econômico-financeira leva à rescisão do contrato), no Brasil, a solução é a
alteração do acordo, com vistas ao restabelecimento da relação encargos/vantagens
inicialmente instaurada.
A ampla proteção dada ao concessionário pelos adeptos dessa primeira
corrente também se estende ao conceito de imprevisibilidade do fato ou de suas
consequências.
Sobre essa matéria, Celso Antônio Bandeira de Mello, com base nas lições de
Francis-Paul Bénoit, ensina que se tornou menos severa do que o preconizado pela
doutrina francesa, de forma a englobar o imprevisto e o razoavelmente não-previsto.
Para o autor, imprevisível será tudo aquilo que não foi estipulado no contrato e que
não disser respeito às áleas ordinárias.
195
Neste ponto, a lei difere da construção francesa. Para os franceses, apenas os
eventos imprevisíveis levam à aplicação da teoria da imprevisão. Marcel Waline
assinala:
A indenização não cobrirá a totalidade do déficit: primeiro porque ela
é calculada não em função do déficit, mas da elevação
extracontratual, isto é da parte do aumento que ultrapassa as
previsões extremas que puderam ser feitas pelas partes no momento
da conclusão do contrato; ou o déficit se manifestou antes que esse
limite fosse atingido: em segundo lugar, porque a indenização não
atinge jamais 100% desse encargo extracontratual, mas uma
proporção arbitrariamente fixada pelo juiz (de fato, eles a têm fixado,
na média, em torno de 80% do encargo)
196
195
BANDEIRA DE MELLO. Celso Antônio. Curso de direito administrativo. 26. ed., São Paulo: Malheiros,
2009, p. 647-648.
196
No original “L’indemnité ne couvrira donc pas la totalité du déficit: d’abord, parce qu’elle est calculée en
fonction, non du ficit, mais de la hausse extra-contractuelle, c’est-à-dire de la part de hausse qui dépasse les
prévision extrêmes qu’avaient pu faire les parties au moment de la conclusion du contract; or, le déficir a pu se
manifester avant que cette limite soit atteinte: en seconde lieu, parce que l’indeminité n’atteint jamais 100% de
95
E Devolvé, mais recentemente ratifica esse entendimento:
Mas, a Administração deve assumir uma parte dos encargos
extracontratuais (isto é, perdas demonstradas, déficit demonstrado
do período extracontratual), não apenas porque o co-contratante tem
direito a um certo equilíbrio financeiro, mas porque a falência que ele
está ameaçado de sofrer comprometea continuidade do serviço.
Como consequência, se a Administração contratante não chegar a
um entendimento com o seu parceiro sobre uma revisão do contrato
(a qual o juiz forçará as partes a realizarem), ele deverá ajudar o seu
co-contratante tomando como seu encargo uma parte do encargo do
concessionário, sob a forma de uma indenização de imprevisão a
qual o juiz lhe condenará (e que praticamente cobrirá a maior parte
do déficit).
197
No Brasil, a proteção ao contratado é mais ampla, de forma que a
recomposição do equilíbrio econômico financeiro dos contratos administrativos
deverá ocorrer nas hipóteses de ocorrência de fatos imprevisíveis, também nos fatos
previsíveis à data da pactuação, cujas consequências não podiam ser calculadas
naquela oportunidade. Dessa forma, se elas extrapolarem as previsões ordinárias,
deverá haver a recomposição total do equilíbrio econômico financeiro inicial.
5.2.2.2 A Lei nº 8.666/93 e a consolidação da construção francesa.
Um segundo grupo de doutrinadores interpretação diversa ao artigo 65, II,
“d” da Lei 8.666/93, entendendo que a responsabilidade pelos encargos
decorrentes de eventos imprevisíveis e alheios à vontade das partes deve ser
repartida entre o concedente e o concessionário.
198
Sustentam que o ônus pela ocorrência de um fato que não era previvel
quando da pactuação, ou cujas consequências não poderiam ser dimensionadas e
cette charge extra-contractuelle, mais une proportion arbitrairement fixée par le juge (en fait, celui-ci a en
moyenne fixé cette indemnité autour de 80% de cette charge). (WALINE, Marcel. Traité élémentaire de droit
administratif. 6 ed, Paris: Recueil Sirey, 1950, p. 391).
197
No original: “Mais l’administration doit prendre à son compte une partie des charges extracontratuelles (c’est-
à-dire pertes nettes, déficit net de la periode extracontractuelle), non seulement parce que le cocontractant a
droit à un certain équilibre financier, mais parce que la faillite qu’il risquerait de subir compromettrait la
continuité du service. En conséquence, si l’administration contactante ne parvient pas à s’entendre avec son
partenaire sur une révision du contrat ( à laquelle le juge invite d’abord les partes à s’efforcer de próceder), elle
doit aider son cocontractant en prenant à sa charge une partie du déficit de celui-ci, sou la forme d’une
indemnité dímprevision à laquelle le juge la condamnera (et qui pratiquement couvre la plus large parte du
déficit).(DEVOLVÉ, Pierre. Droit publique de l’economie. Paris: Dalloz, 1998, p. 619).
198
Nesse sentido, Maria Sylvia Zanella Di Pietro Parcerias na administração pública: concessão, permissão,
franquia, terceirização, parceria público-privada e outras formas. 7. ed. São Paulo: Atlas, 2009, p. 104 e Lúcia
Valle Figueiredo (Extinção dos contratos administrativos. 3. ed. São Paulo: Malheiros, 2002, p. 109).
96
que não decorreram da atuação de qualquer um dos contratantes, não pode ser
integralmente suportado por apenas um deles, mormente porque a prestação dos
serviços públicos concedidos corre por conta e risco do concessionário,
diferentemente do que acontece com os outros contratos administrativos.
Segundo esses autores, o artigo 65, II, “d” da Lei 8.666/93 não poderia ser
aplicado às concessões de serviço público da mesma forma com que é aplicado aos
demais contratos administrativos, pois a sua interpretação deve ser feita levando-se
em consideração a Lei 8.987/95, lei especial em relação à lei geral de licitações e
contratos administrativos.
Como a Lei 8.987/95 define a concessão como uma transferência da
prestação de um serviço público a uma pessoa jurídica ou consórcio de empresas
que desempenhará a atividade “por sua conta e risco”, caberia ao concessionário,
nos casos em que se verificasse a ocorrência de álea econômica extraordinária e
extracontratual, pleitear ajuda suficiente para lhe minorar os prejuízos, de forma a
permitir o cumprimento do contrato, garantindo a prestação do serviço público
concedido.
199
Essa solução também considera a preservação do interesse público na
realização do acordo do qual decorre a necessidade de continuidade da prestação
do serviço contratado. Por essa razão, a Administração Pública é chamada a
garantir a prestação do serviço todas as vezes em que eventos não previstos
alterem a economia do contrato, colocando em risco sua prestação dada a
excessiva onerosidade.
Como os eventos que alteram a economia do contrato são imprevisíveis ou
de consequências imprevisíveis o podem ser predeterminados pelas partes,
cabendo ao concessionário a prova do desequilíbrio e de sua repercussão sobre a
economia do contrato para, somente após, ter direito à recomposição do prejuízo
sofrido.
Para se realizar a repartição dos ônus que recaíram sobre o contrato, faz-se
necessária a verificação da repercussão do evento em relação a cada um dos
contratantes.
A recomposição da equação econômico-financeira deverá levar em conta a
nova situação gerada pelo evento para ambos os contratantes, não apenas em
199
FIGUEIREDO, Lúcia Valle. Extinção dos contratos administrativos. 3. ed. São Paulo: Malheiros, 2002, p.
109.
97
relação à equação econômico-financeira inicialmente pactuada. Aplica-se o princípio
da equidade, verificando-se as consequências do evento danoso sobre os aspectos
econômicos atinentes a cada uma das partes.
A situação é diversa daquelas que ensejam a aplicação da teoria do fato da
Administração ou das hipóteses de alteração unilateral dos contratos, nos quais a
própria Administração Pública gera o gravame para o contratado.
A previsão de responsabilidade pelo risco decorrente das áleas econômicas
extraordinárias, para os adeptos dessa corrente, segue, no direito brasileiro, a
solução francesa, de forma que o equilíbrio econômico-financeiro será recomposto
apenas se o evento for imprevisível, alheio à vontade das partes e apto a gerar um
gravame maior do que a remuneração do contratado possa suportar, pois apenas
nessa hipótese a continuidade da prestação do serviço estaria em risco.
200
Na realidade, o artigo 65, II, “d” da Lei 8.666/93 permite a realização de
alteração contratual, por acordo das partes, para introduzir no pacto a nova
realidade trazida pelo evento, restabelecendo a relação entre as vantagens e
encargos inicialmente estabelecidos em face dessa nova realidade.
A lei o exige, para estas hipóteses, que a recomposição do equilíbrio
econômico-financeiro se de maneira concomitante à ocorrência do evento. Não
poderia fazê-lo, vez que não há como se verificar, de antemão, as consequências do
fato sobre a economia do contrato. A recomposição é feita a posteriori para
compensar os prejuízos já sofridos.
201
Na realidade, há dois eventos distintos: o da recomposição pelos danos
suportados por aquela parte que primeiro arcou com as consequências econômico-
financeiras da ocorrência do evento e o da celebração de novo acordo para a
preservação da equação econômico-financeira, garantia da continuidade da
prestação do serviço público concedido.
A alteração contratual, permitida pelo dispositivo legal, não pode desnaturar a
natureza do contrato e seu objeto, sob pena de burlar o princípio da licitação. Ela
deve, tão-somente, internalizar o evento danoso em razão de sua definitividade,
distribuindo os ônus dele resultantes para restabelecer a equivalência da equação
econômico-financeira inicialmente estabelecida.
200
Inclusive em relação às conseqüências.
201
Isto não significa que a recomposição não deva ser feita de maneira imediata, mas apenas que haverá um
lapso temporal entre a ocorrência do evento e o fim do procedimento de recomposição do equilíbrio
econômico-financeiro rompido.
98
A previsão desse dispositivo legal diz respeito à hipótese de o evento danoso
ao equilíbrio econômico-financeiro do contrato não ser transitório. Nesse caso, o
simples ressarcimento do concessionário pelos prejuízos sofridos não será o
bastante. A alteração do acordo mostra-se necessária para espelhar a nova
realidade fática no contrato, recompondo a equação econômico-financeira
inicialmente estabelecida.
Nos casos em que os ônus gerados pela ocorrência do fato imprevisível sejam
tão grandes que impeçam o concessionário de executar o ajustado, a Lei
8.666/93 avança em relação à construção francesa, permitindo a realização de
alteração do contrato pelas partes, para restabelecer a relação inicial entre encargos
e vantagens sem a necessidade de se recorrer a um juiz. A solução clássica do
direito francês, para esses casos, consiste na rescisão do acordo celebrado, sob o
argumento de que um novo contrato deverá ser celebrado, uma vez que houve
alteração na situação de fato subjacente ao contrato.
O dispositivo legal determina, ainda, a recomposição do equilíbrio econômico-
financeiro dos contratos quando o evento for retardador de sua execução ou quando
a impedir. Contudo, nas hipóteses em que os fatos imprevisíveis incidentes sobre as
concessões inviabilizem o contrato, fazendo com que seu objeto se torne
juridicamente impossível ou ilícito, a única solução é sua rescisão, conforme
previsão do artigo 78, inciso XVII da Lei nº 8.666/93.
O evento extraordinário que impede, de maneira definitiva, a execução da
avença, não enseja a recomposição do equilíbrio econômico financeiro, pois uma
impossibilidade fática de se executar as prestações pactudas. O contrato será
desfeito, sem ônus para as partes, não havendo como se restabelecer o equilíbrio
econômico-financeiro, por impossibilidade da prestação.
Nesse sentido, é o entendimento de Maria Sylvia Zanella Di Pietro, ao distinguir
álea econômica da força maior. Afirma que, em ambos os casos, estão presentes
um fato estranho à vontade das partes, inevitável e imprevisível. Não obstante, na
álea econômica, esse fato o impede a execução do acordo, havendo apenas uma
oneração econômica da parte na execução de sua parcela. no caso de força
maior, verifica-se a impossibilidade absoluta da execução da prestação em razão da
ocorrência do evento.
202
202
DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo. 22. ed. São Paulo: Atlas, 2009, p. 283-285.
Entretanto, cumpre ressaltar que na doutrina entendimentos em sentido diverso. Marçal Justen Filho, ao
99
Como a recomposição do equilíbrio rompido é sempre realizada após a
ocorrência do dano, o concessionário sempre arcará, pelo menos inicialmente, com
os encargos do evento o que, impende reconhecer, influencia a composição do
preço, em virtude do risco a que o particular se expõe.
A diferença na adoção da primeira ou da segunda corrente, nesse ponto, está
no valor incorporado pelo concessionário à proposta, para fazer frente aos gastos
extras porventura advindos de eventos imprevisíveis e extraordinários. O quantum
agregado ao preço dependerá da circunstância de ser a responsabilidade pelo
evento suportada apenas pelo concedente ou se será repartida com o
concessionário.
5.2.3 Síntese das posições doutrinárias.
A análise do artigo 65, inciso II, “d” da Lei 8.666/93 não pode ser realizada
de maneira autônoma, desvinculada dos preceitos veiculados pela Lei Geral de
Concessões, a Lei 8.987/95, pois esta é norma especial em relação à disciplina
geral da Lei nº 8.666/93, aplicável aos contratos administrativos.
Não se pode aplicar a norma do artigo 65, II, “d” aos contratos de concessão
sem considerar que, nessa espécie de contrato administrativo, a exploração do
serviço se dá por conta e risco do concessionário.
Isto não significa que todos os riscos estão a cargo do concessionário, nem
pode implicar em que todos os riscos corram por conta do Poder Público
concedente. Se isso fosse possível, a concessão de serviços públicos aos
particulares se assemelharia à concessão de serviços públicos aos entes ligados à
própria Administração, nas quais todos os riscos acabam sendo suportados, direta
ou indiretamente, pelo concedente, o que torna letra morta a determinação de que a
concessão se faz por conta e risco do concessionário.
comentar a alínea “d” do inciso II do artigo 65 da Lei 8.666/93 afirma que “a amplitude da redação consagrada
abrange as diversas manifestações de caso fortuito e força maior, na mais ampla extensão adotada para tais
institutos pela doutrina e pela jurisprudência”. Para o autor, a lei não distinguiu entre as áleas extraordinárias
para determinar a recomposição do reequilíbrio da equação econômico-financeira contratual. (JUSTEN
FILHO, Marçal. Comentários à lei de licitações e contratos administrativos. 12. ed. São Paulo: Dialética
2008, p.718).
100
A determinação de quais riscos estão a cargo do concessionário o está
especificada na lei. A construção é doutrinária e jurisprudencial e está baseada na
teoria das áleas ordinárias e extraordinárias, com as diferenças apontadas em
relação à doutrina francesa.
A extensão da álea ordinária a cargo do concessionário é essencial para a
aplicação do artigo 65, II, “d” da Lei nº 8.666/93, uma vez que influi na configuração
de álea econômica extraordinária.
Ocorre que a definição das áleas está baseada em conceitos jurídicos
indeterminados, que dificultam a uniformização do tratamento da matéria.
Se, anteriormente, as áleas ordinárias eram relacionadas aos eventos
previsíveis ao empresário no desenvolvimento de sua atividade, hoje essa afirmação
não é mais aceitável. O artigo 65, II, “d” alterou o critério sobre a amplitude da álea
extraordinária para abarcar os eventos imprevisíveis, bem como os previsíveis de
consequências imprevisíveis.
Além disso, adverte Marçal Justen Filho que a plausibilidade da ocorrência de
evento futuro e incerto é uma avaliação relativa, que comporta graus de intensidade,
de forma que a diferença entre extraordinariedade e ordinariedade se faz com
simplicidade em situações extremas. De outro lado, a diferenciação entre elas não
pode ser feita com base em puro subjetivismo, pendendo a solução das dúvidas de
conhecimento técnico específico. Ao concessionário, cabe adotar todas as
precauções científicas atinentes ao evento, devendo incluir, em suas projeções,
todas as circunstâncias inseridas no âmbito da normalidade.
203
A verificação da ordinariedade ou extraordinariedade da álea será feita no caso
concreto, devendo haver uma interpretação razoável da situação. As dificuldades de
diferenciação são muito grandes, pois não existe um critério objetivo,
predeterminado, para diferenciar as áleas ordinárias das áleas extraordinárias,
exigindo do intérprete uma atuação efetiva, sempre motivada, para que possa
permitir o controle de sua decisão.
Dessa forma, a interpretação do artigo 65, inciso II, letra “d” variará conforme o
juízo formado com os conceitos indeterminados de álea ordinária e extraordinária.
Esta interpretação não pode ser feita de maneira abstrata, devendo levar em
203
JUSTEN FILHO, Marçal. Teoria geral das concessões de serviço público. São Paulo: Dialética, 2003, p. 402.
101
consideração as circunstâncias de cada contrato de concessão, o que torna a
análise mais complexa.
204
O dispositivo legal permite a repactuação do acordo, por vontade das partes,
após a ocorrência de fato imprevisível ou de fato previsível, porém de
consequências incalculáveis, retardador ou impeditivo da execução do contrato, ou
nos casos de força maior, caso fortuito ou fato do príncipe, quando configurarem
álea econômica extraordinária extracontratual.
Para a Administração Pública, a repactuação é um dever, em razão do
interesse público, não havendo discricionariedade quanto à conveniência e
oportunidade do ajuste da equação econômico-financeira afetada pela álea
econômica extraordinária e extracontratual.
A Lei 8.987/95 o determina como deve se dar a divisão de
responsabilidade com a ocorrência desses eventos, isto é, ela não determina se a
Administração Pública deve arcar integralmente com os encargos advindos da álea
econômica extraordinária. Essa ausência de previsão legal gera grandes
divergências.
Assim, há aqueles que entendem que os riscos extraordinários devem ser
inteiramente suportados pela Administração Pública, porque o direito à manutenção
do equilíbrio econômico-financeiro consiste em garantia constitucional e, dessa
forma, não pode ser parcialmente atendido com a divisão dos ônus. Essa é a razão
pela qual o Poder Público deveria ser chamado a arcar com todos os encargos
advindos da ocorrência do evento extraordinário e extracontratual.
De outro lado, quem defenda que esses fatos, além de não dependerem da
vontade das partes, podem atingir a ambos os contratantes, ainda que em graus
diversos. Conferir toda a responsabilidade pelo evento ao Poder Público, em tais
situações, feriria o princípio da equidade.
Não outra forma de analisar a responsabilidade pelos riscos nos contratos
de concessão que a verificação do caso concreto, com o devido sopesamento dos
princípios envolvidos. A conjugação do artigo 37, XXI da Constituição Federal, com a
norma do artigo 65, II, “d” da Lei 8.666/93, levam à conclusão de que, também na
concessão de serviços públicos, a recomposição da equação econômico-financeira
afetada por álea econômica extraordinária deve ser integral. O interesse público é o
204
PEREZ, Marcos Augusto. O risco nos contratos de concessão de serviços públicos. Belo Horizonte: Fórum,
2006, p. 132.
102
que justifica essa ampla garantia, que se sobrepõe aos interesses secundários do
concessionário e da Administração.
Ao se tornar definitivo, o evento altera as condições fáticas tidas pelas partes
quando da celebração do acordo, criando uma nova realidade para o contrato. Se a
obrigatoriedade da execução do acordo é dever das partes, a alteração definitiva
das condições iniciais impõe a revisão da equação econômico-financeira.
Deve se considerar que concessionário exerce uma atividade de interesse
público, que não pode sofrer interrupções em sua prestação.
Ademais, na concessão de serviços públicos, o caráter de parceria entre
concessionário e Estado é reconhecido pela doutrina, que costuma tratar essa
espécie contratual como técnica de participação dos particulares na gestão
pública.
205
A participação de um particular na concessão não afasta a aplicação do regime
jurídico de direito público a essa espécie de contrato administrativo, razão pela qual
estão presentes, na concessão, o objeto público (prestação de índole pública), a
finalidade de tutela a um interesse público e a satisfação de necessidades gerais,
isto é, a satisfação de um interesse público.
A parceria coloca o concessionário em posição ativa na gestão do bem comum,
o que implica na realização dos objetivos da República previstos no artigo da
Constituição Federal de 1988. O papel do concessionário supera a índole privado,
passa a ter uma conotação pública, no exercício de um serviço que lhe foi confiado,
mas cuja titularidade continua com a Administração Pública.
A lei impõe deveres de ordem pública (art. 31, I da Lei 8.987/95) ao
concessionário. O artigo da Lei 8.987/95 determina a prestação de um serviço
adequado ao pleno atendimento dos usuários, de forma a satisfazer as condições de
regularidade, continuidade, eficiência, segurança, atualidade, cortesia na prestação
e modicidade na tarifa.
Nesse sentido, a continuidade e a regularidade na prestação do serviço público
é a regra que deve ser observada pelo concessionário. Segundo Roberto Dromi
A continuidade se funda na finalidade própria do contrato
administrativo: a satisfação do interesse público. Se complementa
com o espírito de colaboração que rege a contratação pública e que
se exterioriza no obrigatório entendimento das partes para superar e
205
DROMI, Roberto. Ecuaciones de los contratos públicos. 2. ed. Buenos Aires: Ciudad Argentina; - Madrid:
Hispania Libros, 2008, p. 29.
103
evitar todos os obstáculos que se oponham ou atentem contra o
cumprimento eficiente do vínculo contratual.
206
Esses objetivos deverão nortear a solução das questões vinculadas à
execução do objeto contratado. Consequentemente, o intérprete deverá zelar pela
continuidade, regularidade da prestação do serviço público, sem se descuidar da
eficiência em sua prestação, atualidade e da necessidade de modicidade tarifária.
De outro lado, os princípios da segurança jurídica, da boa-fé e da equidade,
que devem nortear os contratos em geral e os contratos administrativos em
particular merecem prestígio irrestrito.
O contraste entre a segurança jurídica advinda dos termos contratuais
(formulação estática) e a defasagem desse marco jurídico em razão de fenômenos
da realidade econômica superveniente a sua celebração, sejam contratuais ou
extracontratuais, demandam o restabelecimento da adequada equivalência das
prestações inicialmente pactuadas.
207
O interesse público subjacente aos contratos de concessão afasta as soluções
preconizadas no direito privado. Desta forma, contrariamente ao que ocorre no
direito privado, no qual a parte pode pleitear a rescisão contratual em razão da
onerosidade excessiva; no direito público, os contratos não se interpretam em prol
da rescisão, hipótese excepcional que deverá estar expressamente prevista em lei.
A regra prevista na Lei Geral de Concessões prevê a rescisão contratual
exclusivamente por decisão judicial, caso se comprove que o concedente
descumpriu as normas contratuais, devendo a concessionária manter a prestação
regular do serviço público concedido até o trânsito em julgado da decisão de
rescisão.
O concessionário não poderá deixar de prestar o serviço ao qual se
comprometeu, sob pena de declaração de caducidade da concessão, ressalvadas
as hipóteses de caso fortuito ou força maior (art. 38, III).
208
A lei admite a interrupção da prestação do serviço motivada, o-somente, por
razões de ordem técnica ou de segurança das instalações ou pelo interesse da
206
DROMI, Roberto. Ecuaciones de los contratos públicos. 2. ed. Buenos Aires: Ciudad Argentina; Madrid:
Hispania Libros, 2008, p. 62.
207
DROMI, Roberto. Ecuaciones de los contratos públicos. 2. ed. Buenos Aires: Ciudad Argentina; Madrid:
Hispania Libros, 2008, p. 281.
208
“Art. 38. A inexecução total ou parcial do contrato acarretará, a critério do concedente, a declaração de
caducidade da concessão ou a aplicação das sanções contratuais, respeitadas as disposições deste artigo, do art.
27, e as normas convencionadas entre as partes. [...] III - a concessionária paralisar o serviço ou concorrer para
tanto, ressalvadas as hipóteses decorrentes de caso fortuito ou força maior; [...]
104
coletividade; desde que haja prévio aviso ou em situação de emergência (art. 6º,
§3º).
A solução aplicada dependerá de se sopesar princípios, de forma motivada e
por decisão escrita. As dificuldades na sistematização das soluções refletem a
indeterminação dos critérios utilizados e do próprio conceito de equilíbrio econômico-
financeiro.
Com propriedade, observa Jacintho de Arruda Câmara que a indeterminação
faz parte do conceito de equilíbrio econômico-financeiro. Ele o pode ser preso a
fórmulas estanques, preconcebidas em análises abstratas, mesmo se feitas para a
aplicação a uma dada categoria de contratos.
209
Para Marçal Justen Filho, o conteúdo da garantia do equilíbrio econômico-
financeiro dos contratos de concessão não pode ser precisado por elementos ou
fórmulas predeterminadas, não sendo possível “formular considerações teóricas e
abstratas, pretendendo abranger todas as contratações mantidas pelo Poder
Público”.
210
Essa é a razão pela qual a recomposição do equilíbrio econômico-
financeiro dos contratos de concessão, nas hipóteses de superveniência de eventos
extraordinários e extracontratuais deverá ser feita caso a caso.
5.2.4 A cláusula rebus sic stantibus e a teoria da imprevisão.
Embora a doutrina e a jurisprudência nacionais invoquem indistintamente a
cláusula rebus sic stantibus e a teoria da imprevisão para restabelecer a
comutatividade dos contratos de trato sucessivo ou execução diferida, diferença
entre os dois institutos.
Como anteriormente salientado, a aplicação da cláusula rebus sic stantibus
demanda a alteração da situação de fato existente quando da celebração do
contrato, independentemente da verificação da existência de vontade das partes ou
de onerosidade excessiva para uma delas, com o enriquecimento sem causa do
outro contratante.
209
CÂMARA, Jacintho Arruda. Tarifa nas concessões. São Paulo: Malheiros, 2009, p. 169-171.
210
JUSTEN FILHO, Marçal. Teoria geral das concessões de serviço público. São Paulo: Dialética, 2003, p.
362.
105
Por sua vez, o princípio da obrigatoriedade dos contratos pode ser afastado
aplicando-se a teoria da imprevisão, se houver alteração das circunstâncias
inicialmente previstas, por evento extraordinário e imprevisível que torne
excessivamente onerosa a relação contratual, gerando a impossibilidade subjetiva
de se executar o contrato.
A adoção da corrente doutrinária da máxima proteção do concessionário
aproxima-se da aplicação da cláusula rebus sic stantibus aos contratos de
concessão de serviços públicos, uma vez que não é necessária a prova da
onerosidade excessiva da relação contratual, tampouco da impossibilidade subjetiva
de se executar o contrato, bastando a prova de que houve alteração na equação
econômico-financeira inicialmente pactuada em razão de evento imprevisível ou de
consequências imprevisíveis. Para a aplicação da cláusula rebus sic stantibus
Não seria, pois, essencial, a existência de uma onerosidade
excessiva ou da imprevisibilidade de um fato que lhe cause
desequilíbrio, sendo suficiente que sobrevenha fato que lhe cause
uma modificação no estado das coisas para justificar a mudança na
execução do ato jurídico.
211
A aplicação da teoria da imprevisão somente é possível para aqueles que
entendem que os ônus do evento futuro e incerto devem ser repartidos entre as
partes, de forma a se preservar a comutatividade do acordo inicial, impedindo-se o
enriquecimento sem causa de um contratante em detrimento do outro, em razão da
onerosidade excessiva gerada pela ocorrência de fato externo às partes.
Nesse contexto, não basta a prova da ocorrência do evento danoso, mister se
faz a comprovação de que ele trouxe ônus extra ao contratado ao mesmo tempo em
que criou situação mais favorável para o outro contratante. A proteção extra dada
pelo direito administrativo, nesse caso, cinge-se à garantia de continuidade da
prestação do serviço, de forma que o concedente arcacom as consequências do
evento para garantir o funcionamento do serviço concedido.
A obrigatoriedade contratual está indissoluvelmente ligada à comutatividade ou
ao equilíbrio entre as prestações das partes, considerado como a fonte da justiça
contida na equação econômico-financeira inicialmente avençada.
211
LIMA, Renata Faria Silva. Equilíbrio econômico-financeiro contratual: no direito administrativo e no direito
civil. Belo Horizonte: Del Rey, 2007, p. 13.
106
5.2.5 A teoria da imprevisão no Código Civil brasileiro.
No direito privado, a consequência da ocorrência de áleas extraordinárias é
diversa do direito público.
Nos termos dos artigos 478, 479 e 480 do Código Civil brasileiro, os eventos
extraordinários que causem onerosidade excessiva para uma das partes com
extrema vantagem para a outra podem dar ensejo à revisão das cláusulas
contratuais ou à resolução do contrato.
A lei civil exige que a onerosidade decorrente do fato extraordinário seja
excessiva, critério não repetido no direito público, seara em que a mera alteração da
equação econômico-financeira se constitui em razão bastante à recomposição do
pacto.
Além da onerosidade excessiva, a lei civil pressupõe a extrema vantagem para
outra parte. Significa dizer que a parte prejudicada, para requerer a resolução do
acordo ou a sua revisão, tede provar não a ocorrência do evento imprevisível,
como a onerosidade excessiva na prestação decorrente desse fato e a vantagem
extrema percebida pela parte contrária. Os requisitos legais para a aplicação da
teoria da imprevisão, no direito privado, são maiores que no direito público.
107
6 INSTRUMENTOS PARA A VERIFICAÇÃO DO ROMPIMENTO E
RECOMPOSIÇÃO DO EQUILÍBRIO ECONÔMICO-FINANCEIRO DOS
CONTRATOS DE CONCESSÃO DE SERVIÇOS PÚBLICOS.
Ensina Marçal Justen Filho que a quebra do equilíbrio econômico-financeiro é
fenômeno essencialmente econômico. Consiste na alteração do resultado
econômico extraível da contratação administrativa, quando a realidade verificada na
execução do contrato não corresponder às projeções inicialmente elaboradas pelas
partes
212
em relação ao vínculo jurídico de conteúdo patrimonial.
213
O equilíbrio econômico-financeiro é uma relação de fato entre encargos e
vantagens impostos às partes quando da celebração do acordo, sendo possível
figurar, como em um balanço contábil, os encargos como contrabalançados pela
remuneração. Estabelece-se uma relação convencional de equivalência entre os
encargos e as vantagens.
214
Não significa, contudo, que o valor absoluto das
obrigações recíprocas deva ser mantido, pois o que se preserva é a relação entre as
obrigações e vantagens. Nesse sentido, cabe mais uma vez lembrar a lição Duez e
Debeyere, citados por Caio Tácito, para quem não são as prestações (A,B,C) do
concedente que são imutáveis, nem as (a,b,c) do concessionário, mas a relação
estabelecida entre A,B,C e a,b,c.
215
A quebra dessa relação pode ser verificada por comparação de duas
realidades, a projetada pelas partes quando da contratação e a ocorrida. A quebra
do equilíbrio econômico-financeiro é questão de fato, que deve ser provada pela
parte prejudicada. Essa deverá demonstrar que a realidade do contrato não condiz
com o pactuado.
Além disso, a quebra da equação econômico-financeira demanda que a
desconformidade entre a realidade projetada e a verificada decorra de uma álea
212
JUSTEN FILHO, Marçal. Algumas considerações acerca das licitações em matéria de concessão de serviços
públicos. Revista eletrônica de direito administrativo econômico. Salvador: Instituto de Direito Público da
Bahia, n. 1, fev. 2005, p. 32. Disponível em: <http://www.direitodoestado.com.br>. Acesso em: 10 dez. 2008.
213
DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: teoria das obrigações contratuais e extracontratuais.
24. ed. São Paulo: Saraiva, 2008, v. 3, p. 14.
214
JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à lei de licitações e contratos administrativos. 12. ed. São Paulo:
Dialética 2008, p.716.
215
TÁCITO, Caio. O equilíbrio econômico financeiro nas concessões de serviços públicos. In: Temas de direito
público (estudo e pareceres). Rio de Janeiro: Renovar, 1997, p. 199-255, p. 201.
108
extraordinária,
216
isto é, de um evento imprevisível e alheio à vontade das partes, ou
de uma alteração unilateral do contrato realizada pela Administração Pública, capaz
de alterar a relação entre encargos e vantagens, gerando um ônus não previsto.
Os fatos inerentes à atividade empresarial, abrangidos no risco comum e
normal do negócio, constituem álea ordinária e não podem ser invocados pelas
partes para a recomposição da equação econômico-financeira. As áleas ordinárias
são previsíveis e podem afetar todos aqueles que explorem atividade econômica.
Também é requisito para a configuração da quebra da equação econômico-
financeira inicial que a parte onerada o tenha dado causa ao evento danoso. A
conduta culposa da parte, que levar a sua própria oneração, não gera obrigação de
ressarcimento para o outro contratante. Neste caso, o encargo não decorreu de
qualquer ato ilícito ou de responsabilidade da outra parte e deve ser inteiramente
suportado por quem lhe deu causa.
6.1 Instrumentos para a recomposição do equilíbrio econômico-financeiro.
De nada adiantaria a existência da garantia do equilíbrio econômico-financeiro
se não existissem mecanismos para efetivar o seu restabelecimento. Essa ausência
faria com que o concessionário que se sentisse prejudicado procurasse o Judiciário
para efetivar a sua garantia, o que redundaria em custos extras, longos prazos de
disputas, além de representar risco para a continuidade da prestação do serviço
público e para a credibilidade do instituto da concessão.
A manutenção do equilíbrio econômico-financeiro não favorece apenas o
concessionário dos serviços, mas é imprescindível à Administração, garantindo a
continuidade dos serviços, a sua prestação adequada e a observância dos princípios
da boa-fé, da moralidade e da eficiência.
217
216
De se salientar que a Lei 8.666/93 ampliou o conceito tradicional de álea extraordinária para abarcar,
inclusive, os fatos previsíveis, mais de conseqüências incalculáveis.
217
Nesse sentido, cabe trazer a conclusão de estudos realizados pelo Banco Interamericano de Desenvolvimento
sobre renegociação nas concessões de serviços públicos na América Latina. Segundo esse estudo os
procedimentos de resolução de conflitos ambíguos e com terminologia vaga ou imprecisa em relação às
condições de renegociação ou de resolução da concessão levam a uma sensação de ausência de transparência
no procedimento e de colusão entre os concessionários com a anuência do governo. O mesmo estudo concluiu
que o efeito da reputação é crítico na direção de condutas e incentivos aos operadores e, consequentemente,
nas concessões. Ao agir de maneira transparente e lídima o Poder Público cria um circulo virtuoso na
109
Nunca é demais lembrar que a prestação do serviço público é o fim último da
Administração e que a garantia de sua continuidade e da prestação adequada é seu
dever, razão pela qual a Administração Pública deve primar pela manutenção do
equilíbrio econômico-financeiro. A consecução da finalidade se viabiliza pela
garantia, ao concessionário, dos meios necessários à realização da prestação.
Anotam Eduardo García de Enterría e Tomás-Ramón Fernández:
Sem embargo, a maior onerosidade superveniente, capaz de levar o
concessionário a uma situação insustentável pode resultar, também,
independentemente da conduta da Administração e com
independência da boa gestão dela, de acontecimentos imprevistos e
imprevisíveis no momento da celebração do contrato. Quando esses
acontecimentos se produzem, a administração titular do serviço
público se diante de uma situação difícil. Certamente, nada a
obriga a compensar o concessionário, que os fatos causadores do
desequilíbrio contratual são absolutamente alheios e independentes
da atividade administrativa. Nada se opõe, tampouco a aplicação
rigorosa e taxativa da lex contractus e, em conseqüência, a
resolução do contrato com a perda da fiança prestada pelo
concessionário, no caso deste se ver obrigado ao cumprimento do
pactuado. Ocorre, em embargo, que esta solução em nada beneficia
o interesse público que, pelo contrário, restará insatisfeito ante a
interrupção brusca na gestão do serviço. A lógica da lex contractus,
que postula a rescisão ante ao não cumprimento, enfrenta, assim, a
lógica do serviço público, que advoga em prol de uma solução que
garanta a sua continuidade. Deste conflito nasce a teoria da
imprevisão e do risco imprevisível, segundo o qual a Administração
deve, nestes casos, ajudar o concessionário compartilhando os
riscos que de forma imprevista possam surgir com o fim de evitar o
colapso total do serviço concedido.
218
concessão, minimizando atitudes oportunistas do concessionário e dos participantes do processo licitatório.
STRONG, John S.; GUASCH, José-Luis; BENAVIDES, Juan. Managing Risks of Infraestructure Investment
in Latin America: Lessons, Issues and Prescriptions. Disponível em:
<http://www.ppp.mg.gov.br/biblioteca/downloads/Managing%20Risks%20of%20Infrastructure%20Investmen
t%20in%20Latin%20America%20Lessons%20Issues%20and%20Prescriptions.pdf>. Acesso em: 15 set. 09.
218
ENTERRÍA, Eduardo García; FERNÁNDEZ, Tomás-Ramón. Curso de derecho administrativo. 12. ed.
Madrid: Civitas, 2004. p. 753. No original: “Sin embargo, esa mayor onerosidad sobrevenida capaz de colocar
al contratista en una situación insostenible puede resultar yambién, al margen de la conducta de la
Administración y con independencia de la buena gestión de aquél, de acontecimientos imprevistos e
imprevisibles en el momento de celebrar el contrato. Cuando estos acontecimientos se producen, la
Administración titular del servicio público se ve colocada en una difícil situación. Ciertamente, nada la obliga
a compensar al concesionario, ya que los hechos causantes del desequilíbrio contractual son absolutamente
ajenos e independientes de la actividad administrativa. Nada se opone tampoco a la aplicación taxativa y
rigurosa de la lex contractus y, en consecuencia, a la resolución del contracto con pérdida de la fianza prestada
por el contratista, en el caso de que éste se vea obligado al cumplimento de lo pactado. Sucede, sin embargo,
que esta solución en nada beneficia al interés público que, por el contrario, quedará insatisfecho al
interrumpirse bruscamente la gestión del servicio. La lógica del contractus lex, que postula la recisión por
incumplimiento, se enfrenta así a la lógica del servicio público, que aboga en pro de una solución que
garantice la continuidad del mismo. De este conflicto nasce la teoría de la imprevisión o del riesgo
imprevisible, según la cual la Administración debe en estos casos acudir también en ayuda del concesionario,
compartiendo con él los riesgos que de forma imprevista hayan podido surgir con el fin de evitar el colapso
total del servicio concedido.
110
Para Maurício Portugal Ribeiro e Lucas Navarro Prado, a manutenção do
equilíbrio econômico-financeiro se opera, basicamente, por dois mecanismos. O
primeiro, que os ingleses denominam de compensation events, consiste no
ressarcimento das consequências da efetivação de riscos cuja responsabilidade é
atribuída a uma das partes, mas suportada, em primeira mão, pela outra. Trata-se
de mecanismo de atualização das consequências da distribuição dos riscos
incidentes no contrato. O outro segundo é a compensação do concessionário pela
modificação, realizada pela Administração Pública, nos parâmetros originalmente
previstos no contrato em razão do interesse público.
219
As observações desses autores não diferem da exposta pela doutrina
tradicional de que o equilíbrio econômico-financeiro rompido em razão da ocorrência
de áleas extraordinárias, ou de alteração unilateral das cláusulas regulamentares,
deverá ser recomposto. O mérito está no fato de colocarem em destaque a
existência de divisão de riscos nas concessões de serviços públicos e o fato de que,
muitas vezes, esses riscos são de responsabilidade de uma das partes, mas afetam
e causam prejuízos à outra.
Como o prejuízo nesses casos ocorreu, a recomposição consistiria em uma
compensação a ser paga por aquele a quem foi atribuída a responsabilidade pela
sua verificação, restabelecendo-se a matriz de riscos.
Caio cito ensina que os mecanismos de recomposição do equilíbrio
econômico-financeiro dos contratos de concessão tiveram origem no Direito
Francês, no final do século XIX, generalizando-se a partir de 1919, como
consequência do prestígio jurisprudencial da teoria da imprevisão. Visavam prevenir
a álea econômica extraordinária mediante a adoção de cláusulas contratuais de
variação ou de revisão de preços e de tarifas sem, contudo, afastar a utilização da
teoria da imprevisão nos casos em que os eventos econômicos extraordinários ou
outras causas inesperadas superassem a mutabilidade contratualmente estipulada.
Afirma o autor haver uma distinção entre as cláusulas de variação de preços ou
tarifas (cláusulas automáticas) e as cláusulas de revisão (cláusulas de princípios).
Nas cláusulas de tarifas, o ajuste da equação realiza-se automaticamente em
conformidade com índices ou referências previamente estabelecidos, que na França
219
RIBEIRO, Maurício Portugal; PRADO, Lucas Navarro. Comentários à lei de PPP parceria público-privada
fundamentos econômicos-jurídicos. São Paulo: Malheiros, 2007, p. 118.
111
estavam relacionados com os salários (paràmetres-salaires), matérias-primas
(paràmetres-materières), ou com a carga fiscal. Nas cláusulas de revisão, a equação
é obrigatoriamente revista em razão da superveniência de fatores especificados,
mas o novo preço ou tarifa será fixado por meio de um processo, não havendo
automatismo na modificação do elemento financeiro, embora seja sempre
assegurada às partes a manutenção da equivalência contratual.
220
Por serem mecanismos de recomposição do equilíbrio econômico-financeiro,
essas medidas não são preventivas, mas incidem de forma concomitante ou
posterior à ocorrência do evento que gerou o desequilíbrio. Assim, mesmo nos
casos de reajuste contratual, no qual é adotado um índice para atualização
automática de valores, a realização da readequação da equação se dá em momento
posterior ao de seu desbalanceamento.
Ainda hoje, o reajuste e a revisão são os dois grandes mecanismos de
recomposição do equilíbrio econômico-financeiro utilizados nos contratos de
concessão de serviços públicos.
221
6.2 Reajuste e Revisão: uma diferenciação prévia.
Reajuste e revisão o instrumentos de verificação e recomposição do
equilíbrio econômico-financeiro que não se confundem e podem ser aplicados
simultaneamente.
Evento não previsto e alheio à vontade das partes, que cause grave ônus ao
concessionário, colocando em risco a prestação do serviço pode ocorrer na mesma
época da realização do reajuste, demandando a realização da revisão contratual. As
causas que ensejam a realização da revisão e do reajuste são diversas, assim como
são diferentes seus procedimentos e a sua finalidade, não havendo qualquer óbice
legal a sua utilização concomitante.
220
TÁCITO, Caio. O equilíbrio econômico financeiro nas concessões de serviços públicos. In: Temas de direito
público (estudo e pareceres). Rio de Janeiro: Renovar, 1997, p. 199-255, p. 211.
221
divergência quanto à nomenclatura adotada pela doutrina em relação aos mecanismos de recomposição do
equilíbrio econômico-financeiro. Nesse sentido, Marçal Justen Filho adota o termo recomposição para
designar o gênero dos mecanismos de reequilíbrio econômico-financeiro. Para este autor a recomposição do
equilíbrio econômico-financeiro dos contratos de concessão consiste na adoção de providências que
compensem ou contrabalancem a redução das vantagens ou ampliação das desvantagens que a contratação
inicial impunha as partes contratantes.”
112
Jacintho Arruda Câmara aponta com clareza essa diferença, mencionando dois
mecanismos distintos de alteração do valor das tarifas para manutenção do
equilíbrio econômico-financeiro.
O primeiro deles, de feição ordinária, consiste em um mecanismo
contratualmente estabelecido com vistas a preservar o valor real da tarifa ao longo
da execução do contrato. Normalmente, esse mecanismo é aplicado
automaticamente pela utilização de índices de reajuste.
A outra ferramenta se destina à recomposição do equilíbrio econômico-
financeiro em situações excepcionais, nas quais o equilíbrio econômico-financeiro do
contrato se mostre abalado em razão da ocorrência de fatos imprevisíveis.
222
Celso Antônio Bandeira de Mello observa que, no reajuste, a tarifa não muda
substancialmente, permanecendo os mesmos fatores inicialmente levados em conta
para a sua fixação, alterando-se apenas o preço que a exprime, de forma a
acompanhar a variação normal do preço dos insumos.
Por outro lado, na revisão, procede-se à reconsideração ou reavaliação do
próprio valor inicial da tarifa tomado em consideração para fazer frente, de maneira
adequada, aos encargos impostos. Nesse caso, alteração efetiva da tarifa, não
apenas em sua expressão numérica, mas na qualificação do seu valor de forma a
manter o equilíbrio inicialmente estabelecido entre encargos e vantagens turbado em
razão de eventos imprevistos.
223
Na hipótese de um contrato não prever cláusula de reajuste de preços, ou a
cláusula nele contida revelar-se em desacordo com a realidade, Antônio Carlos
Cintra do Amaral defende a existência de um poder-dever, a cargo da
Administração, de a) incluir no contrato cláusula de reajuste ou b) rever cláusula
existente sempre com vistas a restabelecer o equilíbrio econômico financeiro.
Nesses casos, a alteração contratual deverá ser realizada por meio da revisão.
224
6.2.1 Reajuste
222
CÂMARA, Jacintho Arruda. Tarifa nas concessões. São Paulo: Malheiros, 2009, p. 175.
223
BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Curso de direito administrativo. 26. ed. São Paulo: Malheiros,
2009, p.730-731.
224
AMARAL, Antônio Carlos Cintra do. Concessões de serviços públicos. 2 ed. São Paulo: Malheiros, 2002, p.
93.
113
O reajuste é instrumento de recomposição da equação econômico-financeira
dos contratos de concessão inicialmente acordada, atualizando a tarifa, recompondo
o seu valor nominal, de forma a evitar que os efeitos da inflação incidam sobre ela,
preservando, desta forma, o seu valor real. A tarifa, portanto, não sofre alteração
substancial, apenas se altera o preço que a exprime.
225
Segundo Antônio Carlos Cintra do Amaral, o reajuste é efetivado pela
indexação dos preços contratuais, submetendo-os à variação periódica e automática
relativa à flutuação predeterminada do índice adotado. O reajuste apenas se opera
na equação econômica do contrato.
226
O mecanismo de indexação de preços a um ou mais índices tenta refletir e
mitigar os efeitos da inflação sobre os contratos de execução diferida. A indexação
faz com que a alteração dos componentes do preço da prestação seja refletida pela
tarifa, nas mesmas bases, isto é, utilizando-se o mesmo índice de variação da
inflação para sua atualização.
Como adverte Aline Paola Correa Braga Camara de Almeida, o reajuste não
leva, propriamente, a um aumento do valor da tarifa, mas tão-somente à
recomposição de seu valor nominal de forma que o seu valor real seja integralmente
mantido.
227
Considera-se que a variação do índice eleito traz presunção absoluta de ofensa
ao equilíbrio econômico-financeiro contratual, tornando necessária a adequação dos
valores do contrato, nos exatos termos dessa variação. O reajuste reflete a
manutenção do equilíbrio econômico-financeiro inicial. Desta forma,
como a equação estabelecida entre as partes é uma relação de
equivalência entre prestações recíprocas, fica entendido que ao
custo de uma prestação (x) que se compõe de encargos
econômicos por ela implicados e a margem de lucro remuneratório ali
embutida correspondem os pagamentos (y) que a acobertam. Esta
relação de igualdade ideal, convencionada, deve ser mantida. Assim,
se os custos dos insumos necessários à prestação (x) sofrem
elevações constantes como é rotineiro entre nós -, os pagamentos
(y) têm de incrementar-se na mesma proporção, sem o q a
225
BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Curso de direito administrativo. 26. ed. São Paulo: Malheiros,
2009, p.730.
226
AMARAL, Antônio Carlos Cintra do. Concessão de serviços blicos. 2 ed. São Paulo: Malheiros, 2002, p.
92-96.
227
CAMARA DE ALMEIDA, Aline Paola Correa Braga. As tarifas e as demais formas de remuneração dos
serviços públicos. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2009, p. 183.
114
igualdade denominada “equação econômico-financeira deixa de
existir; decompõe-se.
228
A aplicação automática do reajuste dispensa as partes de realizarem
levantamentos sobre a ocorrência de fatos e os seus reflexos sobre a economia do
contrato, em razão da presunção absoluta de quebra da equação econômico-
financeira inicial. Dessa forma, o concessionário não precisa demonstrar que houve
inflação e que esta repercutiu sobre os valores contratuais.
Para Celso Antônio Bandeira de Mello, com a adoção das cláusulas de
reajuste, as partes visam acautelar-se dos riscos derivados das áleas que
normalmente ocorrem, renegando a imutabilidade do valor fixo contratado e
adotando como pressuposto a cláusula rebus sic stantibus, isto é, internalizando no
contrato a atualização do preço.
229
A adoção de cláusula de reajuste é uma tentativa de se preservar a equação
econômico-financeira do contrato. No entanto, essa tentativa pode falhar em razão
da ocorrência de eventos imprevisíveis. Nestes casos, necessidade de produção
de prova da ocorrência do desequilíbrio por parte do concessionário.
Além da alteração do índice, a desvalorização da moeda pode gerar o direito
ao reequilíbrio, desde que a inflação não tenha sido agregada aos custos
apresentados na proposta do particular.
230
Nessas hipóteses, em que é necessária a
produção de prova por parte do concessionário, o instrumento de readequação da
equação econômico-financeira será o de revisão não simplesmente o reajuste
pois o desbalanceamento da equação ocorreu, cabendo ao concessionário
demonstrar, ao Poder Público, essa ocorrência.
O reajuste tem, portanto, caráter prospectivo,
231
visa evitar o
desbalanceamento da equação econômico-financeira, promovendo sua adequação
à variação de um índice inflacionário eleito pelas partes em lapsos temporais
predeterminados.
228
BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Curso de direito administrativo. 26. ed. São Paulo: Malheiros,
2009, p. 629.
229
BANDEIRA DE MELLO. Celso Antônio. Curso de direito administrativo. 26. ed. São Paulo: Malheiros,
2009, p. 649.
230
LIMA, Renata Faria Silva. Equilíbrio econômico-financeiro contratual no direito administrativo e no direito
civil. Belo Horizonte: Del Rey, 2007, p. 160.
231
AMARAL, Antônio Carlos Cintra do. Concessão de serviços públicos. 2. ed. São Paulo: Malheiros, 2002,
p.92.
115
A revisão, por outro lado, tem caráter retrospectivo e visa o restabelecimento
da equação econômico-financeira em qualquer momento da fase de execução
contratual, apenas se verifique o desequilíbrio da equação.
O reajuste deverá ser considerado na etapa de planejamento da concessão,
quando se escolherá o índice que se considere melhor refletir a realidade do
contrato e os prazos para a sua realização, devendo ser incluídos no edital de
licitação, por expressa exigência legal.
A Lei 8.987/95, em seu artigo 18, inciso VIII, dispõe acerca da necessidade
de discriminação dos critérios de reajuste e revisão no edital de licitação. Determinar
as regras para a realização do reajuste não é faculdade do concedente, mas sua
obrigação, sendo essencial à validade de todo o procedimento.
A gica econômica, assumida pelo legislador para os contratos de concessão,
como alerta Jacintho de Arruda Câmara, é de se conferir segurança à manutenção
do valor real a que o concessionário tem direito a título de remuneração, de forma a
permitir que a participação de um maior número de interessados em assumir um
contrato de concessão.
232
Esse aspecto revela-se particularmente importante nos casos em que a
estrutura financeira da concessão esteja baseada no project finance, o que, em
termos amplos, significa que a garantia do investimento é a própria receita gerada
pela exploração. Nesses casos, o valor da tarifa ganha especial relevância, assim
como a sua atualização:
É fácil identificar a razão que levou o legislador a impor tal regra aos
contratos de concessão. Como se trata de um modelo de relação
jurídica por meio do qual normalmente o particular assume
investimentos imediatos e de grande vulto, em troca do direito de
exploração econômica de um serviço público por prazo longo,
mostra-se necessária a existência de regras jurídicas que assegurem
o pleno retorno do investimento durante o período de vigência do
contrato. Uma dessas regras é a que assegura a manutenção do
valor real da remuneração do concessionário (tarifa).
233
O reajuste se constitui em instrumento importante para a garantia do equilíbrio
econômico-financeiro do contrato de concessão, além de viabilizar a parceria entre
os setores público e privado, bem como representar uma importante ferramenta para
garantir o aporte de investimentos privados na realização dos serviços públicos.
232
CÂMARA, Jacintho Arruda. Tarifa nas concessões. São Paulo: Malheiros, 2009, p.178.
233
CÂMARA, Jacintho Arruda. Tarifa nas concessões. São Paulo: Malheiros, 2009, p.178.
116
O atraso na implementação do reajuste ou a criação de entraves para a sua
realização potencializa os efeitos danosos do desequilíbrio econômico-financeiro e
desestimula a participação dos entes privados na consecução do interesse público.
6.2.1.1 Periodicidade para a realização do Reajuste.
O reajuste dos valores contratuais deverá ser realizado periodicamente, sob
pena de tornar o mecanismo sem valia.
A finalidade da realização do reajuste é adequar os valores nominais do
contrato, principalmente o da tarifa, de forma a manter o valor real inicialmente
ajustado.
Portanto, de nada adiantaria prever apenas reajustes contratuais isolados, ou
intervalos distantes entre suas realizações. Avolumando-se a defasagem da
retribuição do capital privado, compromete-se a própria finalidade do mecanismo, de
manter o valor real das tarifas.
A Lei 8.987/89, contudo, não fixou qualquer regra quanto à periodicidade,
resumindo-se a especificar a necessidade de figurar o reajuste no edital de licitação.
A definição cabe, portanto, à legislação específica de cada serviço ou ao
concedente, que deverá fixá-la previamente à divulgação do edital.
De outro lado, a partir de 1994, com o Plano Real, adotou-se uma
periodicidade mínima para as cláusulas de reajuste. Assim, nos termos artigo 2º, §
da Lei 10.192/01, os reajustes contratuais só podem ocorrer após 12 meses da
data limite de apresentação da proposta ou do orçamento a que esta se referir. Essa
regra continua é aplicada aos contratos de concessão de serviços públicos. Nesse
sentido, a orientação do Tribunal de Contas da União:
Na repactuação dos contratos de serviços de natureza continuada
deverá ser observado o interregno mínimo de um ano, a contar da
data da proposta ou da data do orçamento a que a proposta se
referir. Nas repactuações subseqüentes à primeira, o prazo mínimo
de um ano conta-se a partir da data da última repactuação.
234
234
Disponível em:
<https://contas.tcu.gov.br/pls/apex/f?p=175:11:3061877228629951::NO::P11_NO_SELECIONADO,P11_TEL
A_ORIGEM,P11_ORIGEM:0_4_438_197_1606,LOGICA,0>. Acesso em: 22 fev. 2010.
117
A previsão de um prazo contratual para a realização do reajuste é obrigatória
nos contratos de concessão de serviços públicos. Verificado o termo para a sua
realização, nasce para o concessionário o direito subjetivo de exigir a aplicação do
reajuste, que podeser realizado, de ofício, pela Administração Pública nos prazos
estabelecidos ou a requerimento do concessionário.
6.2.1.2 Índices de Reajuste.
A Lei 8.987/95 não dispõe expressamente sobre os índices de reajuste que
devem ser adotados nas concessões de serviços públicos. Dessa forma, parte da
doutrina costuma identificar o artigo 40, inciso XI, da Lei 8.666/93 como a norma
reguladora dos índices de reajustes a serem utilizados nos contratos de concessão.
O dispositivo em questão exige, como requisito do edital, a apresentação de
critério de reajuste, que retrate a variação efetiva do custo de produção, admitindo a
adoção de índices específicos ou setoriais, desde o dia previsto para apresentação
da proposta, ou do orçamento a que essa proposta se referir, até a data do
adimplemento de cada parcela.
Entretanto, divergência doutrinária sobre a aplicação subsidiária da Lei
8.666/93 na determinação do índice a ser aplicado aos reajustes dos contratos de
concessão de serviços públicos.
Para Antônio Carlos Cintra do Amaral, não basta a escolha de um índice
específico ou setorial, que retrate a variação efetiva do custo de produção pois, nos
contratos de concessão, o reajuste não tem apenas a função de atualizar a tarifa e
cobrir os custos e o lucro.
A parcela referente à amortização do investimento efetuado, que não constitui
custo relacionado aos insumos utilizados na prestação do serviço, também deve ser
reajustada. Desta forma, para o doutrinador, a adoção de um índice geral poderia
solucionar adequadamente a questão, promovendo um reajuste conjunto dos
valores de custos, do lucro e da amortização do investimento.
235
235
AMARAL, Antônio Carlos Cintra do. Concessões de serviços públicos. 2. ed. São Paulo: Malheiros, 2002, p.
96
118
Entretanto, a Lei 10.192/01 vedou a indexação automática de preços a
índices gerais e limitou a periodicidade de reajustes a doze meses.
Essa vedação não representou a supressão da garantia ao equilíbrio
econômico-financeiro dos contratos de concessão pois, conforme salienta Marçal
Justen Filho, a fixação de periodicidade para a realização de reajustes na equação
econômico-financeira dos contratos era compatível com uma economia estável, com
inflação decrescente.
A estabilização da moeda permite o enquadramento das pequenas variações
dos índices de preços à álea ordinária. O concessionário passou a receber o
encargo de promover a estimativa da elevação de seus custos em um período de
doze meses e incluí-la em sua proposta.
236
De outro lado, a adoção dessa perspectiva não excluía a possibilidade de
ocorrência de eventos extraordinários aptos a produzir alterações na equação
econômico-financeira. Os eventos extraordinários permitem a alteração do valor da
remuneração em prazo inferior a doze meses, devendo ser aplicada a teoria da
imprevisão, não sendo caso de reajuste, mas em revisão extraordinária de preços.
237
Renata Faria Silva Lima
238
não esposa esse entendimento. Com base nas
lições de Diógenes Gasparini e Florivaldo Dutra de Araújo, sustenta que a fixação
legal de nulidade das estipulações contratuais de reajuste ou correção monetária de
periodicidade inferior a doze meses é inconstitucional, pois viola o disposto no artigo
37, inciso XXI da Constituição Federal, uma vez que as condições efetivas da
proposta devem ser mantidas e a Carta Política não estabeleceu prazos para o
exercício da garantia do equilíbrio econômico-financeiro do contrato. Dessa forma,
para a citada doutrinadora, a limitação encontra óbice na norma constitucional, por
implicar em ônus ao contratante.
De outra banda, o índice a ser adotado deverá observar as condições da
localidade de sua prestação e as especificidades do serviço, não podendo ser
utilizado qualquer critério, em descompasso com a realidade da concessão. Nesse
sentido, se pronunciou o Supremo Tribunal Federal, ao negar a possibilidade de
reajuste de tarifas de transporte coletivo para um município do interior do Estado
236
JUSTEN FILHO, Marçal. Teoria geral das concessões de serviço público. São Paulo: Dialética, 2003, p.
392-404.
237
JUSTEN FILHO, Marçal. Teoria geral das concessões de serviço público. São Paulo: Dialética, 2003, p.
392-404.
238
LIMA, Renata Faria da Silva. Equilíbrio econômico financeiro contratual: no direito administrativo e no
direito civil. Belo Horizonte: Del Rey, 2007, p. 180.
119
com base em índice utilizado para a revisão de tarifas do mesmo serviço pela
capital:
I- Concessão de serviço público municipal de transporte coletivo:
revisão de tarifas: questionamento relevante da validade de cláusula
do contrato de concessão que a determina sempre e conforme os
mesmos índices da revisão das tarifas do mesmo serviço deferida no
município da capital. O reajuste de tarifas do serviço público é
manifestação de uma política tarifária, solução, em cada caso, de um
complexo problema de ponderação entre a exigência de ajustar o
preço do serviço às situações econômicas concretas do seguimento
social dos respectivos usuários ao imperativo de manter a viabilidade
econômico-financeiro do empreendimento do concessionário: não
parece razoável, à vista do art. 30, V, CF, que o conteúdo da decisão
política do reajustamento de tarifas do serviço de transportes de um
município, expressão de sua autonomia constitucional, seja vinculada
ao que, a respeito, venha a ser decidido pela administração de outro.
II. [...]
239
Cumpre ressaltar que a definição do índice de reajuste a ser utilizado faz parte
da política tarifária. Não tendo sido determinada por lei, está no âmbito de
discricionariedade do concedente, que deverá avaliar as peculiaridades do objeto da
concessão.
O índice escolhido deve refletir a variação monetária dos insumos que
tenham efetivo impacto sobre os custos da prestação do serviço e o valor da
amortização dos investimentos, isto é, os montantes que tenham comprovada
influência no equilíbrio econômico-financeiro do contrato de concessão.
240
6.2.1.3 Homologação.
A Lei 8.987/95 estabelece, em seu artigo 29, inciso V, a necessidade de
homologação dos reajustes pelo concedente, impondo a ele essa obrigação
Art. 29. Incumbe ao poder concedente: [...]
239
Brasil. Supremo Tribunal Federal. 1 Turma, Recurso Extraordinário 191532/Sp. Relator Ministro
Sepúlveda Pertence, DJ 29.08.1997, p. 40234. Disponível em:
<http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.asp?s1=(RE$.SCLA. E 191532.NUME.) OU
(RE.ACMS. ADJ2 191532.ACMS.)&base=baseAcordaos>. Acesso em: 15.out.09.
240
Em pesquisa realizada nos Tribunais Superiores sobre os índices de reajustes adotados pelas agências
reguladoras, Lílian de Castro Peixoto verificou que “a jurisprudência mais recente do STJ vem se firmando no
sentido de fazer valer os atos regulatórios das agências”, o que significa a manutenção dos índices por ela
adotados, reconhecendo a competência regulatória das agências e o seu caráter técnico. (PEIXOTO, Lilian de
Castro. A proteção aos investimentos das concessionárias de serviço blico na jurisprudência dos tribunais
superiores. 2009. 144 f. Tese (Mestrado em Direito do Estado)Faculdade de Direito, Pontifícia Universidade
Católica de São Paulo, São Paulo 2009, p.91,95.
120
V - homologar reajustes e proceder à revisão das tarifas na forma
desta Lei, das normas pertinentes e do contrato;
Em razão dessa norma, a realização do reajuste fica condicionada à expedição
do ato homologatório pelo concedente. Assim, ainda que a definição contratual
permita a realização de um reajuste de maneira automática, predefinindo, de
maneira clara, o termo de sua realização e o índice a ser utilizado, a aprovação
formal pelo concedente, por ato homologatório, faz-se necessária.
Para Jacintho de Arruda Câmara, a imperatividade de homologação, pelo
concedente, confere à Administração a prerrogativa de avaliar a conveniência do
reajuste, em face das circunstâncias de fato notadas no momento em que ela deve
ocorrer.
Nessa avaliação, tem cabimento a averiguação dos impactos provocados por
peculiaridades do setor diretamente envolvido nos custos suportados pela
concessionária do serviço, de forma que, verificando a discrepância entre o índice
fixado e a real oscilação de custos suportados pela prestação do serviço, o
concedente realize verdadeira revisão tarifária e não mero reajuste de valores,
preservando, realmente, o equilíbrio econômico-financeiro da avença.
241
Contudo, observa Carlos Ari Sundfeld que o ato de homologação é vinculado e
se traduz na competência para a simples verificação quanto à regularidade do
exercício, não cabendo, ao concedente, realizar qualquer apreciação subjetiva em
relação ao reajuste. A homologação o é condição para o reajuste, mas simples
reconhecimento de um direito existente.
242
Antônio Carlos Cintra do Amaral chama atenção para o fato de cabimento da
não homologação do reajuste em pelo menos uma hipótese: nos casos em que o
reajuste torne o valor da tarifa demasiadamente alto para os usuários, fora de seus
padrões aquisitivos. Nesse caso, estará caracterizado um “fato da administração”,
cabendo à concessionária uma indenização pela perda da receita decorrente.
243
Jacintho de Arruda Câmara também admite essa hipótese, classificando-a
como caso de reformulação da política tarifária aplicável. Nesse caso, a indenização
não é o único meio de recomposição do equilíbrio econômico-financeiro do contrato
241
CÂMARA, Jacintho Arruda. Tarifa nas concessões. São Paulo: Malheiros, 2009, p. 180, 181.
242
SUNDFELD, Carlos Ari. A regulação de preços e tarifas dos serviços de telecomunicação. In: SUNDFELD,
Carlos Ari (Coord.). Direito administrativo econômico. São Paulo: Malheiros, 2006, p. 317-328, p. 328.
243
AMARAL, Antônio Carlos Cintra do. Concessão de Serviço Público. 2. ed. São Paulo: Malheiros, 2002, p.
99.
121
de concessão, sendo possível a adoção de qualquer medida compensatória, pelo
Poder Público, como a autorização para a exploração de um projeto associado.
244
De qualquer forma, o reajuste contratualmente previsto depende, nos termos
da lei, da homologação pelo concedente. Detectado o desequilíbrio da equação
econômico-financeira, o resta alternativa ao Poder Público que a sua
recomposição. Caso a autoridade competente para realizar a homologação entenda
não ser o caso da aplicação do índice previsto, deverá, necessariamente, realizar a
revisão contratual com vistas à preservação do equilíbrio econômico-financeiro
inicial, ou seja, se não houver a homologação do índice de reajuste, impõe-se a
revisão contratual de forma a verificar o rompimento e realizar a recomposição da
equação econômico-financeira.
6.2.2 A revisão.
A revisão é processo de verificação da equação econômico-financeira, pelo
qual se procede à minuciosa análise da relação entre os encargos e vantagens e
sua correspondência com a relação inicialmente estabelecida, permitindo que se
verifique se a remuneração do concessionário se mantém suficiente para fazer
frente a todos os encargos assumidos.
Nos contratos de concessão de serviços públicos, o processo de revisão não
coincide exatamente com o aplicável aos contratos administrativos em geral.
Segundo Antônio Carlos Cintra do Amaral, nesses contratos, o preço é fixado com
referência a uma determinada data e é formado com base na avaliação dos custos
adicionando-se o lucro a que o contratado faz jus. Nos contratos de concessão, a
situação é diferente, pois a tarifa não se destina apenas a cobrir os custos mais
lucro, como nos contratos administrativos em geral, mas a amortizar investimentos
efetuados pelo concessionário para a prestação do serviço.
Além disso, para se proceder à revisão tarifária nas concessões de serviços
públicos, deve-se verificar a existência de receitas alternativas, complementares ou
acessórias, ou de projetos associados, tal como previsto no artigo 11 da Lei nº
244
CÂMARA, Jacintho Arruda. Tarifa nas concessões. São Paulo: Malheiros, 2009, p. 182.
122
8.987/95. Nesses casos, a tarifa refletirá os custos, lucros e a amortização dos
investimentos realizados menos o valor dessas outras receitas.
245
A existência de outros componentes na determinação da tarifa, que não
apenas os custos e lucros torna, o procedimento de verificação e manutenção do
equilíbrio econômico-financeiro mais complexo nas concessões de serviços
públicos. Por essa razão, a utilização do reajuste pode se mostrar insuficiente,
quando o índice adotado não refletir a alteração real dos valores para todas as
variáveis envolvidas.
A revisão é o instrumento adequado para suprir a insuficiência do reajuste de
preços, com vistas à manutenção do equilíbrio econômico-financeiro:
sua função não é apenas retificar desequilíbrios verificados pelo
descompasso entre o preço reajustado e a realidade. Sua função é,
também, retificar eventual descompasso resultante da aplicação de
um índice geral para reajustar custos e a relação destes com as
receitas alternativas.
246
A alteração da remuneração do concessionário, em especial a revisão do valor
da tarifa, é o instrumento primordial para a realização da recomposição do equilíbrio
econômico-financeiro. Todavia, não é o único: o reequilíbrio poderá ser alcançado,
por exemplo, com a prorrogação do prazo da concessão ou pela redução dos
encargos do concessionário.
6.2.2.1 O processo de revisão.
A singularidade do objeto da concessão e a necessidade de compatibilização
dos interesses da Administração com os do concessionário (lucro) fazem com que
seja dever da Administração a busca da verdade material pela revisão.
Por conseguinte, a revisão não pode ser mero procedimento administrativo de
verificação da relação entre encargos e vantagens; deve permitir a participação ativa
do concessionário, que tem direito à prova da repercussão econômica da álea
extraordinária e o desequilíbrio que ela gerou na relação entre encargos e
vantagens.
245
AMARAL, Antônio Carlos Cintra do. Concessão de Serviço Público. 2. ed. São Paulo: Malheiros, 2002, p.
96.
246
AMARAL, Antônio Carlos Cintra do. Concessão de Serviço Público. 2. ed. São Paulo: Malheiros, 2002, p.
96.
123
O Poder Público deverá assegurar, na revisão, o contraditório e a ampla
defesa, com vistas à obtenção da verdade real.
A finalidade da Administração não se resume ao sucesso econômico da
exploração como ocorre com o concessionário mas envolve a realização do
interesse público, razão pela qual é seu dever garanti-lo, possibilitando a utilização
de todos os meios para que se chegue, o mais próximo possível, da realidade.
Somente dessa forma o interesse público será resguardado.
Destaca Marçal Justen Filho que a revisão abrange várias etapas: a verificação
de todos os custos originariamente previstos pelo contratado para a formulação de
sua proposta, a verificação dos custos que efetivamente o oneraram, a comprovação
da ocorrência de evento imprevisível apto a produzir a diferença entre os custos
estimados e os efetivamente verificados.
247
Trata-se, portanto, de procedimento
complexo, que demanda a produção de provas.
A revisão é mecanismo essencial à manutenção da equação econômico-
financeira, sendo obrigatória a sua realização nas concessões de serviços
públicos.
248
Contudo, sua conclusão não leva, necessariamente, à realização da
recomposição dessa equação. A análise rigorosa dos encargos e vantagens e sua
relação com o pacto inicial pode levar à conclusão de que a equação não sofreu
alteração, em que pese ter havido alteração de encargos e vantagens. Sem quebra
do equilíbrio, não há que se falar em recomposição.
6.2.2.2 Revisões ordinárias e extraordinárias.
As revisões podem ser realizadas de maneira ordinária, conforme estipulação
contratual, ou de maneira extraordinária, em razão da ocorrência de algum evento
que coloque em risco a própria continuidade da prestação do serviço.
A revisão extraordinária é realizada a qualquer tempo, desde que ocorra evento
imprevisível, que não tenha se originado em qualquer conduta do concessionário
247
JUSTEN FILHO, Marçal. Teoria geral das concessões de serviço público. São Paulo: Dialética, 2003, p.
392-404, 405.
248
Conforme se depreende das disposições da Lei 8.987/95.
124
(omissiva ou comissiva), capaz de causar um grave desbalanceamento da equação
econômico-financeira, que comprometa a prestação adequada dos serviços.
Nos casos em que ela não decorra de determinação legal expressa – alteração
da carga tributária e alterações unilaterais impostas pelo poder público caberá à
parte prejudicada alegá-la, assim como provar que as vantagens iniciais não mais
correspondem aos encargos que sobre ela recaem.
6.2.2.3 O processo de revisão na nº Lei 8.987/95.
A previsão de critérios de revisão da tarifa dos serviços concedidos é exigência
legal para os contratos de concessão de serviços blicos, nos termos do artigo 18,
inciso VIII, da Lei 8.987/95. O artigo 9º dessa lei disciplina a revisão para as
concessões de serviços públicos. O caput do artigo prevê que a tarifa do serviço
público concedido será “preservada pela regras de revisão previstas nesta Lei, no
edital ou no contrato”. A finalidade é a manutenção do equilíbrio econômico-
financeiro da concessão.
Assim, nas concessões, a revisão tarifária não decorre apenas de fato
superveniente e imprevisível, hipótese de revisão extraordinária, mas também por
determinação legal ou aplicação de cláusula contratual.
A criação, alteração ou majoração de quaisquer tributos ou encargos legais,
“ressalvados os impostos sobre a renda” (fato do príncipe) e a alteração unilateral do
contrato pelo concedente são causas legais de revisão da tarifa, nos termos do
artigo 9º, parágrafos 3º e 4º.
Nesses casos, a Administração Pública deverá realizar a revisão,
independentemente do pedido do concessionário, que não terá de comprovar a
quebra do equilíbrio econômico-financeiro para pleitear seu direito de recomposição.
presunção legal de que esses eventos alteram o equilíbrio inicialmente
estabelecido, sendo dever da Administração blica a promoção da revisão tarifária
nessas hipóteses.
Além dessas hipóteses de revisão, o contrato pode prever outros
mecanismos para a realização da revisão, com a finalidade de adequar a relação
125
entre encargos e vantagens que compõe o equilíbrio econômico-financeiro. (art. 9º, §
2º).
Nesse caso, as partes deverão observar a restrição do artigo 10 da Lei
8.987/95, segundo a qual a recomposição apenas poderá ser realizada em razão da
ocorrência de álea extraordinária. Se forem mantidas as condições do contrato,
presume-se que não houve alteração do equilíbrio econômico-financeiro, não
havendo fundamento para a sua recomposição.
Em relação ao arcabouço legal da revisão e da recomposição do equilíbrio
econômico-financeiro nas concessões de serviços públicos, deve ser ressaltado que
a Constituição Federal de 1988 não vinculou a manutenção do equilíbrio,
exclusivamente, à revisão da tarifa: possibilita a utilização de outros mecanismos
para a promoção de sua recomposição.
Com isso, a revisão nos contratos de concessão não deve se ater ao aspecto
tarifário. Seu objeto é mais amplo e permite a revisão de outros elementos
contratuais, permitindo à Administração Pública realizar a readequação da equação
econômico-financeira por outros aspectos relacionados à remuneração, como pela
redefinição de vantagens ou encargos que compõem o contrato.
Assim, a manutenção do equilíbrio econômico-financeiro pode se dar, entre
outros, pela implantação de outras fontes de receitas previstas no edital e no
contrato, da outorga de subsídios pelo poder público, ou pela alteração do prazo de
concessão. A lei não impõe uma solução predeterminada para o restabelecimento
da equação inicial.
249
De outro lado, a revisão não pode ser tão ampla, de forma a alterar o objeto
contratado, pois a sua função é a de adequar os encargos e vantagens do
concessionário, de forma a manter a correlação inicialmente estabelecida durante a
execução do acordo.
6.2.2.4 Prazo para a realização da revisão.
249
DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Parcerias na administração pública: concessão, permissão, franquia,
terceirização, parceria público-privada e outras formas. 7. ed. São Paulo: Atlas, 2009, p. 106.
126
A Lei 8.987/95 não fixou prazo mínimo a ser observado para a realização de
revisões nos contratos de concessão de serviços blicos. Todavia, essa ausência
de previsão não torna a sua realização faculdade da Administração Pública, pois o
artigo 18, inciso VIII, impõe, ao administrador, o dever de prever e fazer constar do
edital os critérios de reajuste e revisão das tarifas. A ausência dessa previsão gera
nulidade do edital de licitação e poderá ser alegada por qualquer interessado.
O artigo 23, inciso IV, da Lei 8.987/95 contém disposição semelhante, no
sentido de ser cláusula contratual essencial a relativa aos critérios e procedimentos
para o reajuste e a revisão das tarifas.
O Poder Público não pode se furtar ao dever de realizar revisões periódicas,
com vistas à manutenção da equação econômico-financeira, contratualmente
prevista. Entretanto, a periodicidade dessa realização poderá ser determinada por
leis setoriais ou pelo contrato, uma vez que não há limitação legal nas concessões.
O administrador público poderá levar em consideração as peculiaridades de
cada concessão e de cada serviço para determinar os prazos de realização das
revisões ordinárias.
As revisões extraordinárias, por outro lado, podem ser requeridas a qualquer
tempo, bastando que se verifique a existência de fato que repercuta na equação
econômico-financeira do contrato.
6.2.3 Instrumentos para a recomposição do equilíbrio econômico-financeiro.
Verificada a ocorrência de desequilíbrio na equação econômico-financeira,
deverá ser efetuada a sua recomposição.
Conforme explicitado, na concessão de serviços públicos, diversos
instrumentos podem ser utilizados para a realização dessa recomposição.
Esses instrumentos podem, ou não, estar vinculados ao âmbito da concessão,
por tal motivo são classificados em dois grupos de providências: internas e externas.
A adoção das providências internas é preferencial pois, por meio delas, a
recomposição do equilíbrio econômico-financeiro será realizada com recursos
inerentes à própria concessão, sem a alocação de verbas estatais, preservando-se o
postulado da concessão de que os custos dos serviços devem ser arcados pela
127
exploração do serviço concedido. Podem ser consideradas medidas de ordem
interna: o aumento do valor da tarifa, a redução dos encargos do concessionário e a
prorrogação do prazo da concessão.
Todavia, pode ocorrer, no caso concreto, que essas medidas internas se
mostrem insuficientes ou insatisfatórias para a recomposição integral da equação
econômico-financeira. Como o dever de recomposição desse equilíbrio não pode ser
afastado, o Poder Público terá que se socorrer de mecanismos de recomposição
que extrapolam o âmbito da própria concessão. Nesses casos, deverão ser
observadas as limitações e formalidades específicas relacionadas à alocação de
verbas estatais.
Marçal Justen Filho aponta duas hipóteses de necessidade de se recorrer a
mecanismos de recomposição externos à concessão. A primeira delas se dá quando
os recursos internos, extraídos da concessão ou decorrentes indiretamente de sua
utilização, forem insuficientes para compensar o concessionário. A segunda ocorrerá
se houver risco de redução do nível de prestação do serviço a nível mínimo,
quantitativa ou qualitativamente.
250
Como medidas de ordem externa podem ser apontadas: as indenizações
pagas com recursos públicos e o subsídio estatal.
6.2.3.1 Mecanismos internos de recomposição do equilíbrio econômico-
financeiro: alteração do valor da tarifa, redução dos encargos do
concessionário, prorrogação do prazo da concessão.
Normalmente, a recomposição do equilíbrio rompido se faz pelo aumento da
remuneração do concessionário pois, como alerta Marcel Waline
Do princípio da atribuição dos riscos financeiros ao concessionário
subsiste a idéia de que os gastos com a prestação do serviço devem
ser recuperados prioritariamente, e na medida do possível, dos
usuários; a intervenção do concedente para cobrir os déficits do
concessionário é apenas subsidiária.
251
250
JUSTEN FILHO, Marçal. Teoria geral das concessões de serviço público. São Paulo: Dialética, 2007, p .
407.
251
Tradução nossa. No original: “Mais du principe de la prise des risques financiers par le concessionaire a
subsisté l’idée que les frais du service doivent être récupéré d’abord, et dans la mesure du possible, sur les
128
Contudo, não basta que exista uma remuneração paga ao concessionário.
Como expõe Celso Antônio Bandeira de Mello, é do interesse público que a garantia
a ele dada seja de justa remuneração. Reportando-se às lições de Waline, ensina
que, na concessão, o vínculo estabelecido entre a Administração Pública e o
particular está baseado no pressuposto de que o contratante privado é um
colaborador da Administração, um associado que contribui com as suas iniciativas
em favor da consecução de um interesse público. Por essa razão, o interesse do
Estado é o de lhe garantir uma remuneração condizente e não o menor lucro
possível.
A finalidade do Poder blico deve ser sempre a consecução do interesse
público e não a obtenção de lucro com a transferência da prestação do serviço
público ao particular.
252
Ao garantir a justa remuneração do particular, a Administração Pública
viabiliza o aporte dos recursos necessários à adequada prestação desse serviço. A
diminuição da remuneração do particular se afigura indesejável, pois pode levar à
interrupção da prestação do serviço por falta de recursos, a uma diminuição de sua
qualidade, da rede de atendimento, do não suprimento das metas de ampliação e
modernização, o que é frontalmente contrário ao princípio da prestação de serviço
público adequado.
253
A ampliação da tarifa paga pelos usuários ao concessionário permite a
preservação do equilíbrio econômico-financeiro pela manutenção de sua
remuneração em níveis que sejam suficientes à amortização de seus investimentos
e à justa remuneração prevista contratualmente (margem de lucro).
254
Contudo, o princípio da modicidade deve nortear a fixação da tarifa, mesmo se
sua alteração se der em razão do rompimento da equação econômico-financeira. Os
usuários não podem ser onerados excessivamente com a cobrança de tarifa.
O reequilíbrio econômico-financeiro pode implicar em aumento da tarifa em
patamar que extrapole a modicidade. Nessa hipótese, o Poder Público deverá
usagers; que l’intervention du concédant pour covrir le concessionnaire du déficit n’est que subsidiaire.”
(WALINE, Marcel. Traité élémentaire de droit administratif. 6 ed, Paris: Recueil Sirey, 1950, p. 388).
252
BANDEIRA DE MELLO. Celso Antônio. Curso de direito administrativo. 26. ed., São Paulo: Malheiros,
2009, p. 636.
253
MARQUES NETO, Floriano de Azevedo Marques. Breves considerações sobre o equilíbrio econômico
financeiro nas concessões de serviços públicos. Revista de Informação Legislativa. v. 40, n. 159, p. 193-197,
jul./set. 2003, p. 194. Disponível em:< http://www2.senado.gov.br/bdsf/item/id/884>. Acesso em 28.out. 2009.
254
CÂMARA, Jacintho Arruda. Tarifa nas concessões. São Paulo: Malheiros, 2009, p. 174.
129
utilizar outros meios para a recomposição da equação rompida, podendo adotar
fontes complementares de receita ou oferecer subsídios tarifários.
Nos casos de o aumento da tarifa se mostrar inadequado à recomposição do
equilíbrio econômico-financeiro, em razão de seus valores terem atingido o limite
de absorção pelos usuários (de forma que a elevação possa desencorajar a fruição
do serviço pelo público, colocando em risco o sucesso da concessão), a
Administração Pública poderá proceder à redução dos encargos do concessionário.
Trata-se de mecanismo de recomposição do equilíbrio econômico-financeiro
pelo qual se compensa o aumento dos ônus ou das obrigações do concessionário
com a redução de encargos ou qualquer medida que implique redução ou
eliminação de custos.
Segundo Marçal Justen Filho, esse mecanismo pode se traduzir em uma vasta
gama de providências, que dependerão da natureza e das condições concretas da
outorga, podendo consistir, por exemplo, na redução de exigências no tocante a
investimentos, na postergação de sua realização ou até mesmo na alteração dos
padrões de qualidade do serviço, tendo-se em vista que não impedimento legal
se alcançar a essa finalidade.
Pode-se, ainda, diminuir o valor a ser pago ao Poder Público pela outorga da
concessão, caso o concessionário possa ser satisfeito com a dispensa do dever de
executar esses pagamentos em favor do Poder Público, mantendo-se os valores das
tarifas.
255
Todos os encargos do particular representam um custo, levado em
consideração na formulação da proposta e na formatação da tarifa. Com a redução
dos encargos do concessionário, tem-se a diminuição ou eliminação de uma dessas
fontes de custo, de forma que a remuneração volta a ser suficiente para fazer frente
às obrigações do concessionário.
Além da redução de encargos contratuais, a Administração Pública poderá se
valer de outros mecanismos para proceder à recomposição do equilíbrio econômico-
financeiro, como a prorrogação do prazo contratual, permitindo ao concessionário
atingir os seus objetivos em período de tempo maior do que o inicialmente
avençado, possibilitando a amortização dos custos e investimentos em um período
maior, diluindo seus valores.
255
JUSTEN FILHO, Marçal. Teoria geral das concessões de serviço público. São Paulo: Dialética, 2007, p. 405.
130
Elucida Marçal Justen Filho que essa solução é perfeitamente compatível com
os preceitos constitucionais, “especialmente quando todas as outras alternativas
para produzir a recomposição acarretariam sacrifícios ou lesões irreparáveis às
finanças públicas ou aos interesses dos usuários.”
256
6.2.3.1.1 Fontes de receitas alternativas, complementares, acessórias ou de
projetos associados como mecanismos de recomposição do equilíbrio
econômico-financeiro.
A concessão não pode ignorar as alterações verificadas na atualidade,
principalmente em relação às inovações tecnológicas e das novas concepções de
exploração econômica advindas da evolução do estudo das ciências econômicas.
A evolução das técnicas empresariais na atualidade, decorrente principalmente
dos fatores acima relatados, tem redundado em uma lucratividade maior para os
empresários. Essas novas técnicas, segundo Marçal Justen Filho, residem
principalmente no aproveitamento de todas as alternativas de rentabilidade da
atividade empresarial, o que significa aproveitar todas as utilidades acessórias e
marginais dos bens econômicos, ampliando a fonte de receitas e racionalizando as
despesas.
Essa nova concepção não pode ser ignorada pelo setor público nas
concessões de serviços, seja em razão do princípio da eficiência, seja pela
aplicação do princípio da modicidade das tarifas.
O princípio da eficiência deve nortear a atuação da Administração Pública,
como princípio constitucional expresso. O administrador público deve atuar em
acordo com a lei, e deve procurar, nos limites legais, a solução que atenda ao
interesse público de maneira mais eficiente.
No caso das concessões de serviços públicos, a Lei nº 8.987/95 prevê a
possibilidade de o Poder Público utilizar fontes de receitas alternativas,
complementares, acessórias ou de projetos associados, com ou sem exclusividade,
256
JUSTEN FILHO, Marçal. Teoria geral das concessões de serviço público. São Paulo: Dialética, 2007, p. 406.
131
com vistas a favorecer a modicidade das tarifas, devendo ser consideradas para a
determinação da equação econômico-financeira inicial.
Receitas de outras fontes podem ser, por exemplo, as verbas advindas da
exploração de publicidade; o direito de exploração de áreas do subsolo ou contíguas
à obra pública (para instalação de shopping centers, supermercados, postos de
abastecimento de combustível, estacionamentos de automóveis, galerias, lojas
etc.).
257
O rendimento econômico obtido dessas outras fontes pode adquirir relevância
na remuneração do concessionário, representando importante fonte de receita.
Como a finalidade visada pela lei é a modicidade da tarifa, a adoção dessas
fontes alternativas não pode ser eliminada ou excluída pelo administrador público.
Nos termos do artigo 18, VI, tais fontes têm de ser identificadas no edital da
licitação, devendo estar à disposição de todos os interessados em dela participar,
compondo, obrigatoriamente, a aferição do equilíbrio econômico-financeiro inicial do
contrato.
258
Contudo, não se pode excluir a possibilidade dessas fontes alternativas de
receitas surgirem na etapa de execução do contrato. Nesses casos, elas poderiam
ser consideradas na composição da tarifa, com vistas a torná-la mais módica?
A inclusão dessas receitas após a formação da equação econômico-financeira
do contrato não têm o condão de alterá-la, desde que elas sejam consideradas
257
BANDEIRA DE MELLO. Celso Antônio. Curso de direito administrativo. 26 ed. São Paulo: Malheiros,
2009, p. 732. Antônio Carlos Cintra do Amaral aponta serem “receitas alternativas, complementares ou
acessórias, por exemplo, as decorrentes, em uma rodovia concedida, da exploração, por terceiros, de
restaurantes, postos de abastecimento de combustível e outras iniciativas paralelas. Em um aeroporto,
restaurantes, hotéis, lojas, guichês de locação de veículos, etc. Exemplo de projeto associado é a exploração de
atividade turística ou de navegação em uma eclusa, ou aproveitamento dos resíduos do tratamento de lixo.
Vale dizer: projetos associados, ao contrário de atividades alternativas, complementares ou acessórias, não
guardam relação direta com o objeto da concessão” (AMARAL, Antônio Carlos Cintra do. Concessões de
serviços públicos. 2 ed.. São Paulo: Malheiros, 2002, p. 51).
258
Na hipótese de essas receitas surgirem na etapa de execução do contrato, deverá ser revista a equação
econômica inicial do contrato (AMARAL, Antônio Carlos Cintra do. Concessões de serviços públicos. 2 ed.
São Paulo: Malheiros, 2002, p. 50, nota de rodapé n. 1). Marçal Justen Filho observa: “Ora, é impossível
avaliar de antemão todos os aspectos potencialmente exploráveis de um empreendimento. A dificuldade é
ainda maior quando se considera a evolução tecnológica, o progresso científico e as inovações econômicas. É
perfeitamente imaginável que, durante o prazo da concessão, surjam novas modalidades de exploração
econômicas desconhecidas por ocasião da outorga. o haveria caimento supor que o concessionário estaria
impedido de valer-se de tais fontes de receita apenas porque não prevista no momento inicial da concessão.
Isso significaria congelar o modelo de exploração econômica da concessão, impedindo suas modificações,
acréscimos e melhoramentos.” (JUSTEN FILHO, Marçal. Teoria geral das concessões de serviço blico.
São Paulo: Dialética, 2003, p. 374).
132
como elemento da remuneração do concessionário em substituição a parte da tarifa
paga pelos usuários.
Para realizar essa adequação, é necessário proceder-se a uma revisão,
realinhado-se a equação econômica inicial da concessão. A ausência de explicitação
antecipada dessas fontes de receita acessórias, alternativas ou complementares não
pode implicar vedação a seu aproveitamento. Marçal Justen Filho resume os
motivos pelos quais não se pode deixar de considerar essas fontes alternativas após
a outorga, afirmando que esse raciocínio não pode ser encampado, pois frustraria a
finalidade do dispositivo.
Como a concessão é executada em prazos muito dilatados, mostra-se
impossível prever todos os aspectos potencialmente exploráveis do
empreendimento. Supor que seria vedado, ao concessionário, beneficiar-se das
fontes alternativas de receita (apenas porque não previstas no edital) significaria
congelar o modelo de exploração econômica, impedindo que a evolução tecnológica,
o progresso científico e as inovações econômicas tornassem a concessão mais
eficaz e as tarifas mais módicas.
Tem-se constatado a forte tendência ao acolhimento desses modelos de fontes
alternativas de receitas, com a finalidade de que o cômputo desses aportes seja
utilizado exclusivamente em benefício dos usuários, assegurada a remuneração da
concessionária.
As novas fontes devem ser consideradas como elementos do equilíbrio
econômico-financeiro do contrato, passando a integrá-lo.
6.2.3.2 Mecanismos externos de recomposição do equilíbrio econômico-
financeiro: indenizações pagas com recursos públicos e o subsídio estatal.
O Poder Público poderá compensar a ampliação dos encargos ou a redução
das vantagens do concessionário com o pagamento de uma indenização em
dinheiro. Nesse caso, o evento que causou o desequilíbrio da equação deve ser
transitório pois, se essa contraprestação pecuniária paga pelo Poder Público se
tornar habitual, não será indenização, mas subsídio.
133
O subsídio, por sua vez, consiste na assunção, por parte do Estado, do dever
de custear, com recursos próprios, valor suplementar à tarifa, de forma a garantir ao
concessionário a sua justa remuneração, assegurando a modicidade da tarifa para
algumas, ou para todas, categorias de usuários.
A concessão não transforma o serviço público em atividade puramente privada.
Assim, as utilidades fornecidas pelo concessionário continuam a apresentar o
caráter de essencialidade demandando a qualidade de sua prestação aos usuários.
Dessa forma, quando se verificar a frustração do atendimento dos usuários do
serviço causado por evento econômico extraordinário, inviabilizando o consumo dos
usuários, o subsídio pode ser utilizado como ferramenta de recomposição do
equilíbrio econômico-financeiro.
259
Entretanto, segundo Marçal Justen Filho, o subsídio estatal é medida altamente
indesejável, por frustrar as finalidades da concessão, de outorgar a prestação de um
serviço público sem onerar o erário com a prestação do serviço.
260
259
JUSTEN FILHO, Marçal. Teoria geral das concessões de serviço público. São Paulo: Dialética, 2007, p.
336,337.
260
JUSTEN FILHO, Marçal. Teoria geral das concessões de serviço público. São Paulo: Dialética, 2007, p. 407.
134
7 A GARANTIA DA EQUAÇÃO ECONÔMICO-FINANCEIRA NA ATUALIDADE. A
REMUNERAÇÃO DO CONCESSIONÁRIO E A PRESTAÇÃO DO SERVIÇO POR
SUA CONTA E RISCO.
A retomada da utilização da concessão, como forma de prestação de serviços
públicos no início dos anos 90 do século passado, trouxe novidades. Como
verificado no Capítulo I, nessa fase, a utilização da concessão visou trazer maior
eficiência à prestação do serviço público e fazer frente à crise econômica e
financeira pela qual passava o Estado. As concessões não são mais outorgadas em
regime de exclusividade, adotando-se, como regra a concorrência. O Estado
assumiu o papel de agente normativo e regulador, exercendo as funções de
fiscalização, fomento, incentivo e planejamento da atividade econômica.
261
A adoção do regime de concorrência, em detrimento ao de exclusividade,
permitiu a utilização de modelos de regulação com enfoque na autonomia dos
particulares em relação à gestão do serviço público, privilegiando o alcance dos fins
determinados pela Administração Pública, sem deixar de assegurar a liberdade de
escolha dos meios ao alcance do concessionário. Como alerta Marçal Justen Filho
A solução regulatória propicia a ampliação da autonomia empresarial
e o desaparecimento de planejamento centralizado, assegurando o
poder de escolha dos agentes privados no tocante aos meios, ainda
que acentuando a restrição atinente aos fins.
A regulação visa a aproximar o desempenho da atividade de
interesse público a um mecanismo de mercado, de modo que
liberdade e risco permeiem o regime jurídico aplicável.
262
Nessa nova perspectiva, o equilíbrio econômico-financeiro do concessionário
suplanta as garantias dadas, pelo Poder Público, no modelo clássico, em que a
exclusividade da outorga e a intervenção do concedente nos meios de prestação do
serviço constituía a regra.
No entanto, persistem as características essenciais da concessão comum de
serviços públicos: o serviço é prestado por conta e risco do concessionário e sua
remuneração advém de sua exploração comercial.
261
Conforme dispõe o artigo 174 da Constituição Federal de 1988.
262
JUSTEN FILHO, Marçal. Algumas considerações acerca das licitações em matéria de concessão de serviços
públicos. Revista Eletrônica de Direito Administrativo Econômico. Salvador, n. 1, fev. 2005, p. 38. Disponível
em: <http://www.direitodoestado.com.br>. Acesso em: 10 dez. 2008.
135
Por essa razão, é essencial verificar o que o equilíbrio econômico-financeiro
garante ao concessionário na atualidade. Para isso, será realizada, nesse capítulo, a
análise das duas premissas das concessões de serviços públicos, a prestação do
serviço por conta e risco do concessionário e sua remuneração, verificando sua co-
relação com a ausência de exclusividade na prestação do serviço e as
consequências trazidas à garantia do equilíbrio econômico-financeiro.
7.1 A repartição contratual de riscos nos contratos de concessão.
O incremento na complexidade dos serviços públicos a serem concedidos, seja
porque a sociedade se tornou mais complexa, seja porque os serviços mais
sofisticados foram objeto de concessão, faz com que o campo fértil para a sua
realização seja a área de obras e serviços de infra-estrutura complexos. Essas
concessões demandam vultuosos aportes de recursos para sua implementação
e
manutenção sendo que, na maior parte das vezes, os concessionários não dispõem
de recursos próprios para realizar esses investimentos, o que rende ensejo à
participação de investidores.
A busca por investidores não é fenômeno localizado, nem está restrito ao
âmbito das concessões; o concessionário deverá buscar, no mercado, os recursos,
competindo com todos aqueles (nacionais e estrangeiros, públicos e privados) que
também procuram pelo escasso capital.
263
A competição por recursos será ganha
pelo empreendimento que oferecer o maior retorno para o investimento efetuado.
Para o investidor, risco é a possibilidade de se ganhar ou perder dinheiro. A
análise do custo-benefício de um empreendimento passa sempre pela análise dos
riscos que o envolvem. Assim, a intensidade e a indeterminação de alguns riscos
atuam como fatores determinantes para a escolha dos projetos nos quais os
recursos serão alocados, além de serem essenciais à definição da taxa de juros a
ser paga pela aplicação dos recursos financeiros necessários para a implementação
263
As regras prudenciais do Banco Central exigem que os agentes financeiros diretos ou indiretos assumam
obrigações em função da qualidade de suas carteiras. Ao risco existente somar-se-á o risco do projeto (SPE)
para definir o limite de crédito a ser oferecido pelos agentes financeiros. Não parece estar havendo um
movimento de participação ativa dos bancos privados nesse primeiro momento, ao contrário do que ocorreu
em project finances de telecomunicações, logística e energia na década passada.
136
do serviço. Quanto maior o risco, maior será o valor requerido para lhe fazer frente.
Adverte Egon Bockmman Moreira:
Na justa medida em que não há decisões empresariais em regime de
certeza absoluta (nem sob o manto de leis probabilísticas), supõe-se
que o investidor somente deva aplicar seu dinheiro num projeto
quando conseguir esquadrinhar o grau do risco assumido, a fim de
desenvolver instrumentos que sejam capazes de mitigar os efeitos
daninhos dele (seguros, coberturas contratuais, derivativos etc.)
os quais, além de não terem o condão de extinguir o risco, integrarão
os custos do projeto. Ou seja, não um preço a ser pago pela
previsão analítica dos riscos, mas existe outro, igualmente devido,
derivado da sua inserção no empreendimento. Essa compreensão
depende da quantidade e da fidelidade das informações disponíveis
previamente ao investimento.
264
A exposição a riscos muito intensos pode afastar os investidores dos projetos,
ou aumentar o valor a ser pago como retorno pelo investimento efetuado. Na lógica
econômica, os riscos são sempre precificados e, no caso específico dos
investimentos, essa precificação se dá com o incremento do percentual das taxas de
juros e da remuneração a ser paga nesses contratos.
Os riscos nas concessões de serviços públicos não trazem consequências
apenas aos investidores. Nessa espécie de contratos, eles adquirem grande
relevância em razão do objeto, a prestação de um serviço público. Assim, os riscos
aos quais as partes estão sujeitas não podem comprometer a prestação adequada
do serviço público.
A importância dos riscos nas concessões foi percebida muito tempo, sendo
que a teoria das áleas ordinárias e extraordinárias tem sido utilizada para resolver,
ou pelo menos atenuar, os problemas por eles gerados.
Conforme verificado no capítulo IV, as áleas ordinárias, ligadas ao
desenvolvimento da prestação do serviço, estão a cargo do concessionário,
enquanto as extraordinárias, imprevisíveis quanto a sua ocorrência ou quanto a suas
consequências, cabem à Administração.
265
264
MOREIRA, Egon Bockmann. Riscos, incertezas e concessões de serviço público. Revista de Direito Público
da Economia - RDPE, Belo Horizonte, ano 5, n. 20, out./dez. 2007. Disponível em:
<http://www.editoraforum.com.br/bid/bidConteudoShow.aspx?idConteudo=49831>. Acesso em: 1 out. 2009.
265
Segundo Maria João Estorninho, no direito comunitário “as concessões são actos imputáveis ao Estado, pelos
quais uma autoridade pública confia a um terceiro – seja por acto contratual seja por acto unilateral, com
consentimento de terceiro a gestão total ou parcial de serviços que relevem normalmente da sua
responsabilidade e pelos quais o terceiro assume os riscos da exploração [...] Na verdade, a propósito da
distinção entre contratos públicos e concessões, a Comissão afirma que concessão <<quando o operador
suporta os riscos ligados ao serviço em causa (estabelecimento do serviço e sua exploração)>>, ou seja, quando
os <<imprevistos inerentes à montagem da operação>> são de sua responsabilidade. Assim, na perspectiva da
Comissão, sem álea económico-financeira, sem risco, não concessão.” (ESTORNINHO, Maria João. Direito
europeu dos contratos- um olhar português. Coimbra: Almedina, 2006,p. 93,94)
137
Ao concessionário toca o dever de gerir as áleas ordinárias e evitar a sua
ocorrência, pois a concessão de prestação do serviço corre por sua conta e risco, o
que impede a transferência dessa espécie de álea à Administração.
Essa responsabilidade se mostra ainda mais intensa na atualidade, porquanto
a adoção do regime de concorrência impõe maior liberdade de meios aos
concessionários. Desta forma, a transferência de riscos ordinários à Administração
Pública pode colocar em risco a concorrência estabelecida, permitindo que um
prestador seja beneficiado em detrimento dos demais. Manter a igualdade de
condições entre os competidores é tarefa precípua da Administração Pública.
As áleas extraordinárias, por sua vez, correspondem aos eventos cuja
ocorrência, ou consequência, não poderiam ser previstas pelas partes no momento
da celebração do acordo, além de serem alheios a sua vontade. Nesses casos, a
responsabilidade pelos ônus é da própria Administração Pública, em razão do
interesse público na continuidade da prestação adequada do serviço.
Não se olvide que, em última instância, os encargos das áleas, seja pelo
aumento das tarifas, seja pela dilação do prazo da concessão, recaem sobre o
usuário.
Há, portanto, na concessão uma divisão prévia de riscos, que fornece aos
investidores, aos concessionários e à Administração Pública a possibilidade de
analisarem a viabilidade (custo/benefícios) de se engajarem no projeto.
Contudo, no caso concreto, a utilização da teoria das áleas não é tão simples
quanto parece. A análise da ordinariedade ou extraordinariedade da álea pode se
mostrar tormentosa. Ademais, ocorrido o evento, deve-se verificar se ele decorreu
da conduta de um dos contratantes, hipótese na qual quem deu causa deverá arcar
com os prejuízos advindos, ou se ele decorreu de evento imprevisível e alheio a
vontade das partes. Essa verificação nem sempre é fácil, podendo demandar tempo,
além de, em muitos casos, levar a um custoso e prolongado processo judicial.
De outro lado, como alerta Egon Bockmann Moreira, muitas vezes, o poder
concedente incrementa a taxa de risco, em razão da falta de uma cultura relativa a
projetos de longo prazo, unida a pressões populares (e respostas populistas dos
governantes), que levam à intervenções nas cláusulas regulamentares da
concessão, ou descumprimento de obrigações a cargo do Poder Público, gerando
ônus que serão suportados, em primeira mão pelos concessionários.
138
Todos esses riscos e incertezas induzem os concessionários a incluírem a
perspectiva de perdas no preço que compõe a proposta, para fazer frente aos ônus
que suportarão. No entanto, essa quantificação parte de uma pressuposição
abstrata e subjetiva dos riscos a que o concessionário supõe estar sujeito durante a
prestação do serviço.
A solução, nesses casos, parece a realização de planejamentos mais
detalhados da concessão, com o desenvolvimento de minuciosos estudos técnicos,
nos quais se determine e quantifique os riscos a cargo do concessionário.
Ademais, elaboração de cláusulas contratuais mais claras, além do viabilizar o
cumprimento sereno da avença, tem a finalidade de blindar o projeto contra as
soluções longas e custosas e as alterações arbitrárias por parte do concedente.
266
-
267
7.1.1 O planejamento da concessão.
A globalização, o avanço tecnológico e o desenvolvimento da economia
demandam, cada vez, mais a estabilidade dos contratos. Os investimentos externos,
bem como os juros dos financiamentos dependem, em grande medida, da confiança
dos agentes econômicos na realização do acordado. A estabilidade contratual
assume um valor jurídico essencial. Consequentemente, o planejamento prévio da
concessão reveste-se de papel fundamental na prática dessas contratações.
268
266
MOREIRA, Egon Bockmann. Riscos, incertezas e concessões de serviço público. Revista de Direito Público
da Economia - RDPE, Belo Horizonte, ano 5, n. 20, out./dez. 2007. Disponível em:
<http://www.editoraforum.com.br/bid/bidConteudoShow.aspx?idConteudo=49831>. Acesso em: 1 out. 2009.
267
Foi constatado por estudo do Banco Interamericano de Desenvolvimento que a falta de uma atribuição de
riscos clara e objetiva nos contratos de concessão dava margem para que as concessionárias tirassem vantagem
do setor público em renegociações posteriores. Nessas renegociações, a pressão competitiva da licitação não
existe, o que coloca o Poder Público em uma situação desfavorável. Essa desvantagem torna-se ainda maior
diante da responsabilidade do Estado de fazer com que os serviços públicos continuem funcionando
adequadamente. Nessa situação, é freqüente que o Estado ceda às pressões do concessionário, que, aliás, tem à
disposição informações da melhor qualidade e ótimo assessoramento técnico. O resultado dessas negociações
é, muitas vezes, ruim para os cofres públicos e injusto para os concorrentes derrotados na licitação. (STRONG,
John S., GUASCH, José-Luis, BENAVIDES, Juan. Managing Risks of Infrastructure Investment in Latin
America: Lessons, Issues, and Prescriptions. Disponível em:
<http://www.ppp.mg.gov.br/biblioteca/downloads/Managing%20Risks%20of%20Infrastructure%20Investmen
t%20in%20Latin%20America%20Lessons%20Issues%20and%20Prescriptions.pdf>. Acesso em: 15 set.
2009).
268
PEREZ, Marcos Augusto. O risco nos contratos de concessão de serviços públicos. Belo Horizonte: Fórum,
2006, p. 138.
139
O planejamento não é, em si mesmo, um instrumento para a fixação prévia da
equação econômico-financeira do contrato. Entrementes, cuida-se de uma
ferramenta valiosa, no curso da concessão, como elemento balizador da
manutenção do equilíbrio.
O correto planejamento deve objetivar a identificação dos riscos inerentes à
concessão, permitindo que haja tratamento contratual expresso em relação a eles.
A previsão e avaliação dos riscos não é importante para a verificação da
viabilidade econômica e financeira da concessão, também para a condução, do
ponto de vista estritamente jurídico, dos mecanismos de atenuação contratual das
áleas e de solução de conflitos entre as partes, incluindo a divisão dos ônus
269
.
A solução dos impasses relativos aos acontecimentos imprevisíveis e alheios à
vontade das partes deverá ser realizada no caso concreto, levando-se em conta as
peculiaridades de cada concessão.
O planejamento não elimina os riscos da concessão, mas os prevê e os
equaciona, reduzindo a ocorrência de conflitos durante a execução do contrato, o
que traz maior estabilidade. Quanto melhor o planejamento for realizado, mais bem
definidas estarão as áleas ordinárias, diminuindo a chance de litígios.
O planejamento deve ser efetuado antes da publicação do edital, para que
suas conclusões sejam incorporadas a ele e ao contrato.
O estudo de viabilidade é essencial para que a Administração Pública possa
cumprir a obrigação que lhe é imposta pelo artigo da Lei nº 8.987/95, de publicar
ato, justificando a conveniência da outorga de concessão, caracterizando seu objeto,
área e prazo antes da publicação do edital de licitação.
Desse estudo é possível se verificar a conveniência da outorga e o prazo de
duração do contrato. O domínio técnico e econômico-financeiro do esquema da
concessão, condição necessária para despertar a confiança dos interessados em
contratar, também depende do planejamento realizado pela Administração Pública.
Quanto melhor o planejamento realizado, maior a estabilidade e a segurança
daqueles que se interessam em participar do certame.
270
Os interessados devem receber, da Administração Pública, todos os estudos e
projetos levantados na fase de preliminar, que devem ser colocados à disposição
269
PEREZ, Marcos Augusto. O risco nos contratos de concessão de serviços públicos. Belo Horizonte: Fórum,
2006, p. 138, 139.
270
AMARAL, Antônio Carlos Cintra do. Concessão de Serviço Público. 2. ed. São Paulo: Malheiros, 2002, p.
50-51.
140
antes da elaboração de suas propostas, devendo constar do edital de licitação
prazo, local e horário em que serão fornecidos, nos termos do artigo 18, inciso IV, da
Lei nº 8.987/95.
A lei pressupõe a existência de fase de planejamento da concessão, na qual
serão feitos todos os estudos pelo Poder Público. Essas pesquisas, ao integrarem o
edital e posteriormente o contrato, obrigam as partes durante toda a execução do
pacto.
A fase de planejamento precede, portanto, a abertura da licitação, servindo de
base para a sua elaboração, além de fornecer critérios que o considerados, pela
lei, como cláusulas essenciais dos contratos.
Esses estudos prévios permitem à Administração Pública verificar a existência
de fontes de receitas alternativas, complementares, acessórias e provenientes de
projetos associados, a serem indicadas no edital, para comporem a remuneração do
concessionário, com vistas a favorecer a modicidade da tarifa, nos termos do artigo
11 da Lei 8.987/95. As fontes alternativas de receita devem influenciar a
determinação do equilíbrio econômico-financeiro inicial dos contratos.
Os critérios e instrumentos de reajuste e revisão tarifários são frutos da fase de
planejamento da licitação, assim como os indicadores, rmulas e parâmetros a
serem utilizados no julgamento técnico e econômico-financeiro da proposta. O
estudo deve prever, também, os direitos e obrigações do concedente e da
concessionária em relação a alterações e expansões a serem realizadas no futuro,
para garantir a continuidade da prestação do serviço, os bens considerados
reversíveis, o responsável pelo ônus das desapropriações necessárias à execução
do serviço ou da obra pública, as condições de liderança da empresa responsável,
na hipótese em que for permitida a participação de empresas em consórcio, bem
como os parâmetros definidores da qualidade do serviço.
Com o planejamento da licitação, a Administração Pública consegue
determinar metas, prazos, componentes da remuneração, condições necessárias à
prestação adequada do serviço, de forma a oferecer, aos interessados, todos os
dados, estudos e projetos úteis à elaboração dos orçamentos e apresentação das
propostas.
Tornando claras, aos interessados, as regras que serão adotadas na
contratação e na execução do acordo, permite-se a formulação de propostas mais
adequadas.
141
O planejamento da concessão, com o rigoroso estudo da fórmula e parâmetros
econômico-financeiros, possibilita à Administração Pública a avaliação das
propostas, desclassificando as manifestamente inexequíveis ou flagrantemente
incompatíveis com o objeto da licitação.
271
Na fase de planejamento, inserem-se os estudos de viabilidade econômico-
financeira da concessão. Neles, constarão os parâmetros que permitirão, aos
interessados, avaliar as chances de êxito do empreendimento, alicerçando o futuro
contrato em bases sólidas, fundamentadas em critérios objetivos colhidos pela
Administração.
O desiderato de se utilizar o planejamento nas concessões é fazer, do contrato,
instrumento de regulação da concessão, determinando a lei concreta que deverá ser
observada pelas partes. O contrato, como a lei, é fonte de direitos e obrigações e
assim deve ser encarado.
272
271
AMARAL, Antônio Carlos Cintra do. Concessão de Serviço Público. 2. ed. São Paulo: Malheiros, 2002, p.
51.
272
As decisões mais recentes do Supremo Tribunal Federal têm enfatizado a importância de se preservar o
conteúdo do acordo nas concessões de serviços públicos. Nesse sentido, o acórdão proferido no REsp
1007703/RS, Rel. Ministra ELIANA CALMON em 18/03/2008, (DJe 18/11/2008), cuja ementa dispõe:
“RECURSO ESPECIAL PROCESSO CIVIL E DIREITO ADMINISTRATIVO SERVIÇO DE
TELECOMUNICAÇÕES – TELEFONIA FIXA – TARIFA DE ASSINATURA BÁSICA. 1. Divergência
jurisprudencial não comprovada, em face do óbice sumular (Verbete 13/STJ). 2. De acordo com o art. 21, XI,
da CF/88 e com a Lei 9.472/97 - Lei Geral de Telecomunicações, a ANATEL detém o poder-dever de
fiscalização e regulação do setor de telefonia em relação às empresas concessionárias e permissionárias, o que
inclui o papel de controle sobre a fixação e o reajuste das tarifas cobradas do usuário dos serviços de telefonia,
a fim de, dentro dessa linha principiológica, garantir o pleno acesso às telecomunicações a toda a população em
condições adequadas e com tarifas razoáveis. 3. Nos termos do art. 175 da CF/88 e da Lei Geral de
Concessões, Lei 8.987/95, a fixação das tarifas devidas em retribuição ao serviço prestado pelas
concessionárias ocorre no ato de concessão, com a celebração do contrato público, precedido do indispensável
procedimento de licitação, sempre buscando o equilíbrio econômico-financeiro do contrato. 4. A despeito
disso, não existe regra específica quanto à quantidade de tarifas ou quanto aos limites dessa cobrança, deixando
a Lei Geral de Telecomunicações ao prudente arbítrio da ANATEL o papel de regulação e fiscalização dos
serviços de telefonia fixa e móvel. 5. A cobrança da assinatura básica mensal está prevista na Resolução 85/98
da ANATEL e nas Portarias 217 e 226, de 3 de abril de 1997, editadas pelo Ministro de Estado das
Comunicações, nas quais são observados critérios técnicos tanto para permitir a cobrança da tarifa básica
quanto para assegurar ao usuário padrões mínimos e compatíveis de acessibilidade e utilização do serviço
telefônico e obrigando, ainda, as prestadoras a dar publicidade aos seus planos de serviços. 6. o existe
incompatibilidade entre o sistema de regulação dos serviços públicos de titularidade do estado prestados de
forma indireta e o de proteção e defesa do consumidor, havendo, ao contrário, perfeita harmonia entre ambos,
sendo exemplo disso as disposições constantes dos arts. 6º, inc. X, do CDC, da Lei 8.987/95 e 3º, XI; e
19, XVIII, da Lei 9.472/97. 7. Os serviços públicos são prestados, na atualidade, por empresas privadas
que recompõem os altos investimentos realizados no ato da concessão com o valor recebido dos usuários,
através dos preços públicos ou tarifas, sendo certa a existência de um contrato estabelecido entre
concessionária e usuário, de onde o ser possível a gratuidade de tais serviços, o que inclui a
disponibilidade do "tronco" telefônico na comodidade do lar dos usuários, cobrado através do plano
básico mensal. 8. Recurso especial não provido.” Disponível em
<http://www.stj.jus.br/SCON/jurisprudencia/doc.jsp?livre=concess%E3o+e+contrato+e+servi%E7o+e+gratuid
ade+n%E3o+idoso&&b=ACOR&p=true&t=&l=10&i=4#>. Acesso em 22 fev. 2010. No mesmo sentido é a
conclusão de Lilian de Castro Peixoto, no estudo realizado sobre a proteção aos investimentos das
concessionárias de serviço público na jurisprudência dos Tribunais Superiores. Segundo a autora A análise
142
O concessionário será beneficiado com definições mais claras em relação à
divisão de riscos e responsabilidades. Além de elaborar a proposta com bases mais
concretas, o concessionário poderá atuar, durante a execução do acordo, para evitar
a ocorrência dos riscos aos quais estiver sujeito, adotando medidas profiláticas,
como a contratação de seguros. Haverá maior segurança em relação aos conflitos
que surgirem durante a execução do acordo. A aplicação das regras previstas no
contrato abrevia o procedimento de recomposição do equilíbrio econômico-
financeiro, tornando mais claras as responsabilidades, o que facilita o papel dos
aplicadores do direito.
Quanto mais claro for o contrato celebrado com a Administração, maior será a
segurança das partes em relação a ele, mais amplas serão sua confiabilidade e
estabilidade, beneficiando as partes contratantes e os usuários de serviços públicos.
Nesse sentido, Lilian de Castro Peixoto afirma que:
Para cada contrato, individualmente, se deve estabelecer uma
distribuição de riscos e custos entre as partes contratantes,
independentemente desta distribuição ter que respeitar ou não a
teoria das áleas ordinárias e extraordinárias. A ausência de uma
divisão clara e inequívoca dos riscos da contratação é um dos fatores
que mais gera insegurança nas partes, bem como nos intérpretes do
contrato em caso de conflito.
273
Para que atinja sua finalidade, o planejamento da concessão deverá ser conter
informações pormenorizadas, com detalhados estudos realizados pelo Poder
Público.
A definição prévia das responsabilidades, o balizamento de quais fatos
configuram as áleas ordinárias e extraordinárias e a disposição acerca dos
mecanismos de solução do conflito minimizam as probabilidades de que o
desequilíbrio inviabilize ou dificulte o regular alcance do objeto do contrato de
concessão.
O planejamento não tem o condão de eliminar todos os riscos de uma
concessão, mas é instrumento essencial na sua previsão e equacionamento,
conferindo às partes maior segurança na contratação, com a preservação dos fins
dessas decisões evidencia que o STF, desde 1997, e o STJ, desde o final de 2004, vêm fazendo prevalecer o
respeito às condições contratuais inicialmente pactuadas, estabelecidas nos editais de licitação e respectivos
contratos”. (PEIXOTO, Lilian de Castro. A proteção aos investimentos das concessionárias de serviço público
na jurisprudência dos tribunais superiores. 2009.144 f. Tese (Mestrado em Direito do Estado) Faculdade de
Direito, Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo 2009, p.87.
273
PEIXOTO, Lilian de Castro. A proteção aos investimentos das concessionárias de serviço público na
jurisprudência dos tribunais superiores. 2009. 144 f. Tese (Mestrado em Direito do Estado) Faculdade de
Direito, Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo 2009, p.51.
143
da concessão e a solução acordada para os impasses surgidos durante a execução
do acordo.
274
A verificação da quebra do equilíbrio econômico-financeiro, como salientado,
depende do cotejamento da realidade prevista e da realidade concretizada. Pelo
estudo de viabilidade econômico-financeira, os encargos do concessionário e os
elementos de sua remuneração são definidos anteriormente, o que facilita a
comparação.
O planejamento é essencial na determinação do processo de formação e
recomposição do equilíbrio econômico-financeiro, seja porque deve prever e alocar
os riscos a que a concessão está sujeita,
275
definir os encargos do concessionário,
estimar o tempo de duração do contrato, antever os índices de reajuste e a
periodicidade das revisões contratuais ordinárias. O planejamento é, sem dúvida,
essencial ao equilíbrio econômico-financeiro.
7.1.2 A divisão de riscos nas concessões de serviços públicos e o equilíbrio
econômico-financeiro segundo o ordenamento jurídico brasileiro.
A Lei 8.987/95 não contém previsão para a realização da repartição
contratual de riscos entre as partes, tal como ocorre com a Lei 11.079/04, que
dispõe sobre a concessão patrocinada e a concessão administrativa. Essa ausência
de previsão gera controvérsias doutrinárias acerca da possibilidade de repartição
consensual de riscos nas concessões de serviços públicos.
No entanto, a análise da partição de riscos nas concessões comuns de
serviços públicos não pode ser realizada à luz das normas existentes para as
parcerias público-privadas (concessões patrocinadas e administrativas) disciplinadas
na Lei nº 11.079/04, uma vez que são institutos jurídicos diversos.
Aliás, Lei nº 11.079/04, em seu artigo 3º, parágrafo 2º, dispõe que suas normas
não se aplicam às concessões comuns de serviços públicos regidas pela Lei
8.987/95.
274
PEREZ, Marcos Augusto. O risco nos contratos de concessão de serviços públicos. Belo Horizonte: Fórum,
2006, p. 140.
275
Obedecendo a divisão entre áleas ordinárias e extraordinárias.
144
Na concessão de serviços públicos, a prestação do serviço é transferida para o
concessionário, que a realizará por sua conta e risco, fazendo jus a uma
remuneração decorrente da exploração do serviço, normalmente por meio de tarifas
pagas pelos usuários. Portanto, na concessão, a prestação do serviço e a
remuneração do concessionário defluem de sua exploração.
Isso não ocorre nas parcerias público-privadas, em que as obras e serviços
exigem investimentos vultosos, assumidos por pessoas privadas, sem que lhes seja
assegurada a remuneração. Nesse caso, em que a exploração do serviço não gera
recursos suficientes para sustentar os custos e investimentos necessários a sua
prestação, a mobilização de financiamentos privados demanda que o contrato
assegure uma divisão de riscos muito rigorosa ao longo de toda a execução,
necessariamente longa do contrato.
As parcerias público-privadas, embora sejam espécie de contrato
administrativo, utilizam sistemática mais afeita aos contratos de direito privado,
pressupondo maior equilíbrio entre os contratantes e uma divisão prévia e rígida das
responsabilidades no instrumento contratual. Isto implica que todas as partes
(administração, bancos, operadores...) tenham relações contratuais que determinem
com precisão os riscos a que o contrato está sujeito, assim como os riscos que lhe
são atribuídos, além de determinar a parte que cada um possui nos resultados ou
nas garantias mútuas.
Com efeito, as parcerias público-privadas, regidas pela Lei 11.079/04, estão
baseadas na PFI (private finance initiative) inglesa, que “consistia em um programa
do governo britânico, visando a encorajar a realização de obras e a gestão de
serviços, mediante o apoio de um financiamento ou de um pré-financiamento
privado”
276
realizado por contratos com estrutura financeira padronizada. Ocorre
que, no direito inglês (common law), nascedouro das PFI, não existe distinção entre
contrato de direito público e privado.
A Administração Pública inglesa, quando contrata, age como o particular,
aplicando-se à avença o regime de direito comum. Como adverte Philippe
276
COSSALTER, Philippe. A Private Finance Initiative. In: TALAMINE, Eduardo; JUSTEN, Monica Spezia
(coords). Parceria Público Privada: um enfoque multidisciplinar. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005.
p.425-489. Segundo o autor, a principal caracterítica da PFI é o objetivo de um recurso sistemático à delegação
das atividades públicas, por meio de contratos com estrutura financeira padronizada.
145
Cossalter,
277
esse regime jurídico comum é regido por duas regras básicas: a
liberdade de contratar e a inviolabilidade do contrato (freedom of contract e sanctity
of contract). A inviolabilidade do contrato, no direito inglês, impõe que todas as
circunstâncias aptas a alterar as condições de execução do contrato sejam por ele
previstas, o importando o tempo de sua duração, nem a qualidade particular da
Administração Pública.
Segundo essa regra, mesmo nos contratos de longuíssima duração, todas as
circunstâncias que alterem as condições de execução devem estar previstas desde
o início, inclusive as relacionadas à evolução técnica ou da necessidade do serviço.
A prática contratual na common law é a de utilização de contratos completos,
sendo comum a recusa dos juízes em realizar alterações nas condições econômico-
financeiras da execução do contrato no caso de enriquecimento de uma das partes.
Não existe, no direito inglês, um paralelo para a solução de problemas gerados em
razão de fatos supervenientes e estranhos à vontade das partes, que gerem o
enriquecimento de uma das partes em detrimento da outra.
O direito inglês não reconhece a teoria da imprevisão, a teoria do fato do
príncipe ou de sujeições imprevistas.
278
Em virtude da supremacia absoluta do
princípio da inviolabilidade do contrato e da aplicação do regime comum à
Administração Pública, a common law não possibilita, à Administração Pública,
realizar alterações unilaterais nos contratos em que ela seja parte. As alterações das
condições contratuais podem ser negociadas pelas partes. A concordância das
partes envolvidas é necessária para a realização de alterações. Dessa forma, nada
garante que as razões invocadas pela Administração Pública para a realização da
alteração pretendida sejam acolhidas pelo outro contratante.
Segundo Philippe Cossalter, a diferença entre os contratos da Administração
britânica e francesa (ascendente da teoria contratual adotada no Brasil) pode ser
resumida na ideia segundo a qual “o equilíbrio econômico e as obrigações de
interesse geral devem estar integradas ao contrato”.
279
Não existe, no direito inglês,
277
COSSALTER, Philippe. A Private Finance Initiative. In: TALAMINE, Eduardo; JUSTEN, Monica Spezia
(coords). Parceria Público Privada: um enfoque multidisciplinar. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005.
p.425-489. p. 463.
278
COSSALTER, Philippe. A Private Finance Initiative. In: TALAMINE, Eduardo; JUSTEN, Monica Spezia
(coords). Parceria Público Privada: um enfoque multidisciplinar. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005.
p.425-489, p. 464.
279
COSSALTER, Philippe. A Private Finance Initiative. In: TALAMINE, Eduardo; JUSTEN, Monica Spezia
(coords). Parceria Público Privada: um enfoque multidisciplinar. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005.
p.425-489, p. 465.
146
a garantia geral do equilíbrio econômico financeiro dos contratos administrativos,
salvo expressa previsão contratual.
Entretanto, a prática tem mostrado a necessidade de um regime jurídico
diferenciado para os contratos celebrados pela Administração Pública na Inglaterra,
razão pela qual se reconhece que muitas das cláusulas dos contratos de
modelagem PFI têm por finalidade atenuar os efeitos da falta de um regime jurídico
de direito público no sistema da common law, principalmente no que concerne à
responsabilidade pelos riscos e na possibilidade de realização de alterações
unilaterais nas condições de execução do contrato pela Administração Pública,
desde que exista a justa indenização do outro contratante.
Contudo, essa mudança de paradigma não é bastante para afastar a principal
diferença entre os contratos de PFI ingleses e os contratos administrativos dos
países que tenham seguido o modelo europeu continental, como o Brasil: esses
devem ser celebrados dentro de parâmetros estabelecidos previamente pela lei,
aqueles não contam com prévia determinação legal, adaptam-se à vontade dos
contratantes.
280
A alocação eficiente dos riscos e sua mitigação são essenciais à realização dos
projetos de parceria, fazendo parte da estrutura contratual, mesmo em se tratando
de contrato típico, como ocorre no Brasil. Essa composição contratual complexa,
destinada a assegurar uma divisão de riscos precisa, distingue as parcerias dos
contratos da concessão de serviços públicos.
A garantia dada ao concessionário nas concessões é ampla, atribuindo à
Administração Pública os riscos não previsíveis. Isso porque o interesse primário na
concessão é a prestação do serviço de interesse público. Os interesses do
concessionário e da Administração Pública são secundários e se submetem,
sempre, ao interesse maior de prestação do serviço adequado e sem interrupções.
Ademais, a prestação do serviço corre por conta e risco do concessionário e os
riscos ordinários dessa exploração não podem ser transferidos à Administração
Pública. Sobrariam, para a divisão entre concedente e concessionário, os riscos
extraordinários, imprevisíveis e alheios à vontade das partes por definição.
280
COSSALTER, Philippe. A Private Finance Initiative. In: TALAMINE, Eduardo; JUSTEN, Monica Spezia
(coords). Parceria Público Privada: um enfoque multidisciplinar. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005.
p.425-489, p. 466.
147
De outro lado, os riscos previsíveis, em que pese a incerteza de sua
ocorrência, são determináveis e quantificáveis, o que permite sejam encarados
como um item dos custos que compõem a proposta do licitante. Sua nitidez os torna
passíveis de uma melhor avaliação e alocação mais fina. Os riscos devem ser
conhecidos e estimados, dever que é imposto a ambos os contratantes (concedente
e concessionário), em prol da estabilidade do projeto (e dos usuários).
281
A verificação prévia dos riscos a que uma concessão está sujeita gera
sentimento de segurança jurídica no parceiro privado, nos investidores e no Poder
Público, pois ninguém setomado de surpresa caso o evento previsto efetivamente
ocorra, permitindo, ainda adoção de mecanismos para evitar a sua ocorrência ou
minimizar os seus efeitos.
282
A Administração Pública deve prever e quantificar os riscos, o que torna mais
clara a avaliação acerca da viabilidade da concessão como modalidade mais
indicada para a prestação do serviço considerado. Para os interessados na outorga
da concessão, a previsão e a quantificação permitem a formulação de propostas
mais atrativas, considerando, de fato, os riscos que estarão sob sua
responsabilidade, permitindo, ao vencedor do certame, empreender todos os
esforços para evitar a sua ocorrência.
Entretanto, a Lei 8.987/95 preceituou que a concessão corre por “conta e
risco” do concessionário, incorporando a atribuição de riscos e responsabilidades
ordinárias a ele, mas não detalhou quais seriam esses riscos ordinários
283
atribuídos
ao concessionário, o que torna o planejamento essencial à identificação e
classificação das áleas.
O planejamento prévio divulgado aos concorrentes na licitação permite aos
concessionários a adoção de cautelas para evitar os prejuízos decorrentes dos
riscos (a contratação de seguro, por exemplo) e seus valores, que passam a integrar
281
MOREIRA, Egon Bockmann. Riscos, incertezas e concessões de serviço público. Revista de Direito Público
da Economia - RDPE, Belo Horizonte, v. 5, n. 20, out./dez. 2007. Disponível em:
<http://www.editoraforum.com.br/bid/bidConteudoShow.aspx?idConteudo=49831>. Acesso em: 1º out. 09.
282
Segundo estudos desenvolvidos pelo Banco Interamericano de desenvolvimento, modelos de repartição de
riscos e responsabilidades entre o setor público e o privado condicionam as iniciativas de financiamento. Esses
modelos são ferramentas colocadas à disposição dos contratantes para aumentar a eficiência e a segurança do
contrato. TRUJILLO DEL VALLE, Jose Antonio. Financiación de infraestructuras. Los riesgos y su
mitigación. Publicaciones IFM División de Infraestructura y Mercados Financieros. Banco Interamericano de
Desenvolvimento. Disponível em: < http://www.iadb.org/sds/doc/IFM-TrujilloJ-Infraest-2004-S.pdf>. Acesso
em: 15 set. 09.
283
Segundo Jacintho de Arruda Câmara, as áleas ordinárias estão relacionadas à administração dos recursos
utilizados para a realização da atividade transferida, sejam eles humanos, de equipamentos ou de infra-
estrutura. (CÂMARA, Jacintho de Arruda. Tarifa nas concessões. São Paulo: Malheiros, 2009, p. 189).
148
a proposta apresentada, consequentemente, as cláusulas contratuais. Dessa forma,
é as áleas ordinárias não estão na lei, mas no contrato. Nesse sentido, aplica-se a
lição de Celso Antônio Bandeira de Mello:
a garantia do equilíbrio econômico-financeiro baliza-se
fundamentalmente pelo teor do contrato. Donde, de fora parte as
proteções específicas aludidas as quais, de resto, apóiam-se
quase integralmente na lei retora dos termos do contrato -, não pode
o concessionário esperar eximir-se da álea própria de qualquer
empreendimento negocial sob genérica e abstrata invocação de um
equilíbrio econômico-financeiro desvinculado do teor contratual.
284
As áleas ordinárias não levam ao rompimento do equilíbrio econômico
financeiro, pois se presume que os riscos ordinários foram considerados na proposta
apresentada. O risco (encargo) foi inicialmente previsto e a ele correspondeu uma
parcela da remuneração paga ao concessionário (vantagem).
De outro lado, no regime das concessões comuns de serviços públicos,
previsto na Lei 8.987/95, a responsabilidade pelas áleas extraordinárias
decorrentes de alteração unilateral do contrato (artigo 9º, § da Lei 8.987/95) e
da alteração da carga tributária (artigo 9º, § da Lei 8.987/95) o imputados à
Administração Pública, o podendo, em qualquer hipótese ser transferidos aos
concessionários.
No caso das alterações unilaterais efetuadas pela Administração Pública em
razão do interesse público, sempre se reconheceu que a responsabilidade pelos
efeitos da alteração deveriam ser inteiramente suportadas pela Administração, que
dera causa ao prejuízo. Aliás, essa é a hipótese clássica de realização do
reequilíbrio econômico-financeiro dos contratos de concessão de serviços públicos.
Todavia, em que pese a inexistência de disposição expressa na Lei
8.987/95, compete, à Administração Pública, a responsabilidade pelos riscos
imprevisíveis, ou de consequências incalculáveis, que extrapolem a álea ordinária
imposta ao concessionário pois, como elucidam Eduardo Garcia de Enterria e
Tomaz-Ramon Fernandez:
se os riscos são realmente imprevisíveis e excedem a álea normal de
toda a atividade empresarial é justo que a administração deles
compartilhe e, inclusive, os assuma com exclusividade. Se não o
fizer, o concessionário não poderá suportar a carga econômica e
284
BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Curso de Direito Administrativo. 26. ed. São Paulo: Malheiros,
2009, p. 737.
149
será levado a abandonar a concessão, prejudicando de maneira
inaceitável ao interesse público e dos usuários do serviço.
285
A preservação do interesse público e o princípio da continuidade do serviço
público são as razões pelas quais se entende que a Administração Pública deve
suportar a carga econômica advinda das áleas extraordinárias e extracontratuais.
Por essa mesma razão, a lei permite uma verdadeira repactuação do contrato
nos casos em que a turbação da equação econômico-financeira retarde ou impeça a
prestação do serviço, desde que não decorra da conduta do concessionário.
No caso de verificação de risco imprevisível quando da celebração do contrato,
que coloque em risco a continuidade da prestação do serviço e a preservação do
interesse público, deverá a Administração ser chamada a arcar com as
consequências econômicas surgidas. A ausência de previsão do risco no contrato de
concessão leva à aplicação da disposição do artigo 65, inciso II, “d” da Lei nº
8.666/93.
Na concessão de serviços públicos, a divisão contratual de riscos se de
maneira diversa da que ocorre nas parcerias público-privadas, em que as partes
possuem total liberdade para alocá-los. Na concessão, a previsão contratual dos
riscos tem a finalidade de explicitar as áleas ordinárias, permitindo a sua
quantificação, evitando discussões futuras. O que for imprevisível às partes quando
da celebração o pode ser imputado ao concessionário, uma vez que seria
impossível avaliar, de antemão, as consequências desses eventos, onerando
sobremaneira a proposta.
A ocorrência desses fatos, de outro lado, quando afetar a equação econômico-
financeira, gera o direito à recomposição, em razão do interesse público na
continuidade da prestação do serviço concedido. Isso não significa que o
concessionário estará sempre protegido de um desequilíbrio econômico-financeiro
do contrato.
Esse entendimento não viola as disposições previstas no artigo 37, inciso XXI
da Constituição Federal, segundo o qual se garante “a manutenção das condições
efetivas da proposta, nos termos da lei”. A partir do momento em que um risco é
contratualmente atribuído ao concessionário, passa a integrar o seu plexo de
responsabilidades ordinárias. Seguindo essa lógica, o concessionário deverá
quantificar a ocorrência desses riscos e os valores necessários para evitar a sua
285
ENTERRÍA, Eduardo García; FERNÁDEZ, Tomás-Ramón. Curso de derecho administrativo. 12 ed.
Madrid: Civitas, 2004, p. 757.
150
ocorrência e incluir os respectivos valores na proposta. A proposta, portanto, refletirá
essa divisão de responsabilidades, que estaincluída na equação econômico-
financeira. A ocorrência do evento, cujo risco foi previsto e alocado nessa
sistemática, não tem o condão de alterar as condições da proposta, porque a
integrou.
O dispositivo constitucional previsto no artigo 37, XXI não cria uma divisão de
riscos, tampouco interfere nas disposições contratuais feitas pelas partes. A
Constituição garante a manutenção das condições da proposta do concessionário
durante toda a execução do contrato. O artigo 10 da Lei nº 8.987/95 prevê a
manutenção do equilíbrio econômico-financeiro. As garantias do equilíbrio
econômico-financeiro não impedem a existência da divisão prévia e contratual de
riscos entre as partes, entendida como a explicitação dos riscos previsíveis, que
estão a cargo do concessionário, nos limites da lei.
A finalidade da garantia do equilíbrio econômico financeiro não é a de afastar
os riscos ou incertezas que incidem na concessão, o que seria faticamente
impossível, tendo em vista tratar-se de questão de fato externo ao contrato.
Seu objetivo repousa na preservação, no curso do tempo, da relação entre
encargos e vantagens inicialmente estabelecida pelas partes.
Desta forma, os contratantes anuem com a divisão de riscos, que passa a
integrar a relação entre encargos e vantagens inicial e o equilíbrio econômico-
financeiro. Como álea ordinária, sua ocorrência o leva ao rompimento da equação
estabelecida e não enseja sua recomposição.
Assim, na concessão de serviços públicos, a responsabilidade pelos riscos
deve obedecer à teoria das áleas ordinárias e extraordinárias, devendo, contudo,
haver um maior rigor na realização do planejamento e na elaboração das cláusulas
contratuais, de modo a tornar mais claros os riscos ordinários a que o
concessionário está sujeito.
7.2 Novos modelos tarifários.
No modelo clássico de concessão, a outorga feita com exclusividade a um
único concessionário implicava em se fixar a remuneração no modelo de custo do
151
serviço: a tarifa era calculada com base nos custos suportados pelo concessionário
para a prestação do serviço público.
A adoção do modelo de concorrência e a utilização de outros métodos para a
determinação da remuneração do concessionário implicaram em alterações na
garantia do equilíbrio econômico-financeiro das concessões de serviços públicos.
Explica-se: anteriormente, a atuação da Administração Pública nas concessões
era diferente, eis que deveria garantir a prestação de um serviço público adequado
por um único concessionário. A existência de um único concessionário exigia que a
garantia dada pela Administração fosse mais abrangente, uma vez que os
problemas econômicos do prestador poderia significar o colapso do serviço.
Portanto, as garantias dadas pela Administração Pública deveriam abranger a
continuidade da execução do serviço de maneira adequada, razão pela qual
englobavam a remuneração e a rentabilidade do empreendimento.
A adoção do modelo de concorrência mudou esse quadro. O risco de
descontinuidade da prestação, quando mais de um prestador, diminui
significativamente. A existência de problemas econômicos com um dos prestadores
pode ser contornada pelos demais, sem graves prejuízos à continuidade da
prestação do serviço público adequado.
Por essa razão, a garantia dada pelo Poder Público deixou de priorizar a
rentabilidade do particular e passou a privilegiar a igualdade de tratamento entre os
concessionários,
286
o que permitiu, à Administração Pública, utilizar modelos
tarifários nos quais a remuneração final do contratado é variável.
A Lei 8.987/95 refletiu essa alteração, adotando o modelo de tarifa pelo
preço, como forma do concessionário exercer o serviço por sua conta e risco.
No modelo de tarifa pelo custo, o risco do concessionário era bastante
minimizado, pela necessidade de se garantir a continuidade da prestação do
serviço.
287
Os novos modelos tarifários visam à promoção de eficiência nas concessões,
além de serem instrumentos para a implementação de políticas públicas,
fomentando a aleatoridade do ganho do concessionário, vinculando-o a variáveis
relacionadas a ganhos de eficiência.
286
GROTTI, Dinorá Adelaide Musetti. A experiência brasileira nas concessões de serviço público. In:
SUNDFELD, Carlos Ari (Coord.). Parcerias público-privadas. São Paulo: Malheiros, 2007, p. 182-231, p. 192.
287
CINTRA DO AMARAL, Antônio Carlos. O reequilíbrio econômico-financeiro dos contratos de concessão de
rodovias. Revista do advogado, São Paulo, v. XXIX, n. 107, p. 25-32, dez. 2009, p. 26.
152
A utilização de um sistema de tarifas, que preveja a variabilidade da
remuneração assegurada ao particular, leva a uma alteração na forma de se
considerar a equação econômico-financeira do contrato.
Para compreender essa mudança, faz-se necessária uma breve incursão aos
modelos tarifários utilizados nas concessões de serviços públicos.
7.2.1 Modelos de estruturação tarifária nas concessões de serviços públicos.
A tarifa não é a única fonte de vantagens para o concessionário; todavia, é a
principal, necessária para cobrir, ao mesmo tempo, os custos e investimentos do
concessionário.
De outro lado, a tarifa é instrumento para a garantia de acesso dos usuários ao
serviço público concedido.
Não uma fórmula única para a realização de seu cálculo. Os critérios
deverão ser adotados de acordo com as peculiaridades do serviço a ser concedido,
considerando-se, entre outros, a forma de sua prestação (se em regime de
exclusividade ou concorrência) e o perfil econômico dos futuros usuários. A Lei
8.987/95 previu a possibilidade de fixação de tarifas diferenciadas “em função das
características técnicas e dos custos específicos provenientes do atendimento aos
distintos segmentos de usuários” (art. 13).
Os critérios genéricos da estruturação tarifária do serviço e seu modo de
aferição deverão estar expressos na lei que define a política tarifária do setor,
editada pelo ente federativo titular do serviço, cabendo ao contrato detalhá-las.
diversos modelos de estruturação tarifária que podem ser adotados nas
concessões de serviços públicos. A Lei 8.987/95 não limitou a escolha de
modelos de forma que cabe ao concedente a realização dessa escolha.
7.2.1.1 Custo do serviço
288
288
Esse sistema é também é conhecido como “cost-plus”, “cost-of-service” ou rate of return”.
153
Neste modelo, a estrutura da tarifa está baseada na taxa de retorno do
investimento e visa cobrir as despesas geradas com a prestação do serviço. O valor
da tarifa considera os preços necessários à remuneração dos custos totais mais
uma margem que garanta a taxa de retorno, assegurando a amortização dos
investimentos do concessionário, a compensação de seus custos e um lucro
satisfatório.
Foi adotado na maior parte das concessões de serviços públicos no Brasil.
A dificuldade deste método de estruturação tarifária está no estabelecimento
dos tipos de custos, os critérios para sua avaliação e investimentos que podem fazer
parte do cálculo que, nem sempre, podem ser fixados de maneira minuciosa pelo
contrato de concessão.
Outro grave problema para a utilização desse modelo tarifário está no fato de
ser impossível, para o Poder Público, realizar o controle efetivo sobre os custos do
particular, pois o empresário sempre dispõe de meios para impedir o exato
conhecimento dos dados. Trata-se da denominada assimetria de informações.
Adverte Marçal Justen Filho que:
a tarifa fundada no custo do serviço produz a transferência para os
usuários de todos os custos excessivos, desnecessários ou
equivocados, realizados pelo prestador de serviço. O usuário, como
condição para usufruir o serviço de que necessita, paga a fatura que
lhe é apresentada. Não possibilidade de interferir sobre a
estrutura empresarial do concessionário para verificar se os custos
são os menores possíveis.
289
A utilização desse critério permite o ressarcimento dos custos da prestação do
serviço, mas não é instrumento para estimular a eficiência do concessionário. Como
todos os gastos com a execução da prestação são compensados, não motivação
para que o concessionário torne a prestação mais eficiente, com a diminuição dos
custos para a prestação do mesmo serviço de forma adequada.
7.2.1.1.1 Custo marginal.
289
JUSTEN FILHO, Marçal. Teoria geral das concessões de serviço público. São Paulo: Dialética, 2003, p.
357.
154
O cálculo do custo do serviço pode levar em consideração o custo dio ou o
custo marginal.
A adoção do custo marginal não considera o custo gerado com os
investimentos realizados, mas apenas o custo que viabiliza a produção de uma
unidade a mais (ou a menos) do que as produzidas e a análise do lucro adicional
gerado.
Para Marçal Justen Filho, quando o mercado funciona sobre o critério do custo
marginal, os investimentos são eficientemente alocados e incrementa-se a
racionalidade do sistema, fomentando a competição e a possibilidade de obtenção
de maiores vantagens pelos usuários.
Esse critério pode ser utilizado nos setores em que a infra-estrutura para a
prestação do serviço esteja pronta, sendo desaconselhável a sua adoção quando
a execução de serviços for precedida de obra que envolva grandes investimentos.
Nesses casos, o vulto dos investimentos demandados pode não ser coberto se
houver economia de escala, situação na qual os custos marginais são decrescentes.
Como essa forma de aferição de custos o leva em conta o montante de
investimentos realizados, gera ganhos para o usuário e perdas para o
concessionário. Nesse sistema
quanto maior a produção, maiores são as perdas. Tal deriva de que a
multiplicação da produção pode reduzir o custo marginal, mas o
empresário nunca receberá o valor suficiente para cobrir os custos
em que incorreu para a instalação do empreendimento.
290
7.2.1.1.2 Custo médio.
O custo médio consiste na divisão de tudo o que foi despendido para a
execução do serviço por todos os usuários, de modo proporcional ao seu consumo.
Esse método não considera a necessidade de fixação de tarifas diferenciadas
em razão dos usuários, considerando-os em sua totalidade, sem levar em
consideração as suas diferenças.
290
JUSTEN FILHO, Marçal. Teoria geral das concessões de serviço público. São Paulo: Dialética, 2003, p.
354.
155
Além disso, o custo médio tende a ser constante, de forma que a tarifa
calculada com esta base possui a tendência de não ser reduzida,
independentemente do número de usuários vinculados ao serviço ou o volume de
consumo.
7.2.1.2 Novas perspectivas nos cálculos tarifários.
Os critérios de cálculo da tarifa pelos custos vêm sendo abandonados pelos
órgãos reguladores, que passaram a utilizar fórmulas de regulação incentivada, que
levam em consideração o custo para a prestação do serviço e criam incentivos para
o aumento de eficiência do concessionário. entre essas novas formas de regulação
tarifária, estão o price cap e o yardstick regulation.
7.2.1.2.1 Custo pelo teto (price cap)
Nesse método, o órgão competente fixa uma tarifa inicial suficiente para cobrir
adequadamente os custos do concessionário, prevendo, desde logo, um reajuste
vinculado a determinado índice, mas sujeito a uma redução pré-determinada.
A finalidade da utilização desse método de cálculo de tarifa é fazer com que o
concessionário busque ganhos de eficiência na prestação do serviço.
A Administração Pública estabelece uma tarifa inicial para a prestação do
serviço e impõe a aplicação de um deflator à tarifa. Assim, o concessionário deverá
incrementar a sua eficiência para manter as margens de lucro.
A possibilidade de diminuição de receita serve como estímulo à elevação da
produtividade e eficiência do concessionário.
Este modelo permite que o concessionário mantenha e amplie
consideravelmente seus lucros. Quanto maior for a sua eficiência, que corresponde
à diferença entre o custo real para a manutenção dos serviços e amortização dos
investimentos e o valor da tarifa, maior será o seu lucro. Esse será incorporado ao
patrimônio do concessionário até a realização do reajuste.
156
7.2.1.2.2 Regulação de desempenho (Yardstick Regulation)
A utilização desse método visa à redução de custos e preços por meio da
comparação entre o desempenho dos concessionários, razão pela qual deverá ser
aplicado nas concessões sem exclusividade de prestador.
Nesse sistema, o regulador fixa o preço da tarifa com base na comparação
entre os balanços anuais das concessionárias, estabelecendo um padrão de tarifa
baseado nos dados da empresa mais eficiente do setor.
A heterogeneidade das concessionárias, mesmo consideradas em relação a
um único setor, levou a uma derivação desse método. Assim, passou-se a admitir a
existência de sub-grupos de concessionárias, reunidas em razão de características
semelhantes. Para realizar a comparação entre esses concessionários de um
mesmo grupo, passou-se a adotar como padrão uma empresa hipotética (shadow
firm) composta pela média das variáveis representativas das empresas do sub-
grupo, utilizando-a como modelo de referência (benchmark) para estimular a
competição entre as concessionárias.
Aline Paola Correa Braga Camara de Almeida observa que esse método pode
ser utilizado de forma complementar qualquer critério de tarifação, sendo
normalmente conjugado como método do price cap, de forma que o preço-teto
estabelecido é o necessário para remunerar adequadamente os investimentos da
empresa hipotética (shadow firm).
291
Arnoldo Wald afirma que a adoção desse critério, alheio à consideração da
evolução dos custos da própria concessionária, não preserva a tarifa inicialmente
pactuada, afetando o equilíbrio econômico-financeiro inicialmente avençado.
Para Marçal Justen Filho, também constitui finalidade da concessão o
aproveitamento das oportunidades marginais do sistema para transferir vantagens à
comunidade. O concessionário deve explorar a atividade por sua conta e risco,
cabendo-lhe o dever de organizar os fatores de produção. Em decorrência, a ele são
imputadas as consequências de suas escolhas e os efeitos de sua conduta ao longo
291
ALMEIDA, Aline Paola Correa Braga Camara de. As tarifas e as demais formas de remuneração dos
serviços públicos. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2009, p. 177.
157
do tempo. Como contrapartida ao risco empresarial assumido, tem o direito de
auferir lucro.
A eficiência do concessionário é mecanismo para a ampliação de receitas e
racionalização de despesas que deve nortear a concessão, sem que isso
comprometa a qualidade dos serviços prestados ou a modicidade das tarifas.
7.2.2 O equilíbrio econômico-financeiro e sua relação com os modelos
tarifários.
A tarifa baseada no preço do custo pelo serviço visa remunerar o
concessionário de serviços públicos para compensar seus custos diretos e indiretos,
inclusive os investimentos necessários à ampliação de sua prestação, assim como
garantir-lhe uma margem de lucro predefinida.
A sistemática assegura ao concessionário uma remuneração suficiente para
lhe permitir amortizar os investimentos efetuados, executar o serviço concedido,
compensá-lo pelos custos com essa prestação e garantir um retorno satisfatório pela
prestação do serviço aos usuários.
O modelo tarifário pelo custo do serviço faz com que não exista qualquer
perspectiva de alteração do valor da tarifa durante o prazo de execução do pacto.
Uma vez fixado esse valor, suficiente para garantir a remuneração do
concessionário, ele deve ser mantido durante toda a execução do pacto. A
modificação da remuneração do concessionário seria admissível em caso de
alteração na economia do contrato, decorrente de evento extraordinário, futuro e
desconhecido para as partes no momento da celebração do acordo.
Outras formas de fixação da tarifa têm sido adotadas nas concessões de
serviços públicos, baseadas em critérios diversos do custo do serviço,
consagradoras de um dever de eficiência para o concessionário.
Segundo essa nova perspectiva, o aumento do retorno esperado da
concessão, em razão do incremento da eficiência na prestação do serviço, justifica
uma ampliação na aleatoridade de sua exploração. Dessa forma, admite-se que o
concessionário esteja sujeito a riscos maiores do que os tradicionalmente aceitos
158
pela doutrina, tendo, como contrapartida, uma possibilidade de lucros maiores do
que os obtidos com os modelos anteriores.
A ampliação da aleatoridade e a demanda por maior eficiência exigem que se
faculte, ao concessionário, as escolhas sobre os meios de execução da prestação
do serviço. A fixação da tarifa nessa nova base pressupõe a aptidão, do
concessionário, a prospectar os meios mais eficazes para a prestação do serviço:
diminuindo custos, aumentando lucros e mantendo a prestação do serviço de forma
adequada, nos termos da lei.
Para que isso seja possível, deve haver a diminuição da intervenção estatal
sobre os meios de execução da concessão. A Administração Pública deve controlar
o atingimento dos fins contratualmente previstos e dos legalmente impostos. Não
deve interferir nos meios utilizados pelos concessionários para a obtenção desses
resultados.
Aumentando-se o campo de escolhas do concessionário em relação aos
meios, permitindo que ele adote as providências que entender mais eficazes à
obtenção de lucro, a aleatoridade pode ser incrementada. Nessa perspectiva,
transfere-se ao agente econômico executor a livre decisão sobre os meios mais
rentáveis, correspondendo, a esse bônus, o ônus decorrente da majoração da
aleatoriedade.
Exemplo desse modelo tarifário é o price cap. Segundo essa sistemática, o
órgão competente fixa uma tarifa inicial, que deve ser suficiente para cobrir os
custos, prevendo, desde logo, reajuste futuro vinculado a determinado índice, mas
sujeito a uma redução predeterminada.
292
A adoção desse modelo inova a configuração da equação econômico-
financeira dos contratos de concessão, passando da concepção clássica de
equilíbrio econômico-financeiro como uma relação estática entre encargos e
vantagens para um liame dinâmico, no qual se admite a utilização de variáveis
previamente conhecidas, mas determináveis durante a execução do acordo.
293
Nesse caso, a equação econômico-financeira é definida pelos contratantes
quando da celebração do contrato, admitindo-se, por disposição expressa, que seu
valor (resultado) possa variar durante a execução do acordo, desde que essa
292
JUSTEN FILHO, Marçal. Teoria geral das concessões de serviço público. São Paulo: Dialética, 2003, p.
359.
293
JUSTEN FILHO, Marçal. Teoria geral das concessões de serviço público. São Paulo: Dialética, 2003, p.
361.
159
variação ocorra sem que haja alteração nas cláusulas contratuais ou nas condições
aceitas para a sua execução.
Marçal Justen Filho alerta para o fato de não existir qualquer vedação legal ao
estabelecimento de uma relação dinâmica entre encargos e vantagens, constituindo
dever do concessionário a ampliação de sua eficiência e redução de seus custos.
Na fixação da tarifa pelo price cap a redução é prevista contratualmente,
constituindo produto do acordo de vontades. A equação econômico-financeira será
obedecida, desde que mantidas as condições contratuais, exatamente nos termos
do que dispõe o artigo 10 da Lei nº 8.987/95.
Assim, o concessionário não poderá alegar rompimento da equação quando a
diminuição da tarifa for resultado da aplicação do deflator previamente estabelecido,
se ele tiver embolsado os ganhos de eficiência no período anterior à realização da
revisão ordinária. A redução tarifária é a contrapartida da possibilidade do
concessionário obter lucro superior aos previamente estimáveis ao longo da
execução.
A aplicação do deflator sem que o concessionário tenha embolsado qualquer
ganho de eficiência implicará em diminuição em sua perspectiva de remuneração,
sem a contrapartida da vantagem. Nessa hipótese, salienta Marçal Justen Filho,
duas alternativas se abrem para à Administração Pública.
Se a ausência de ganhos, verificada pelo concessionário, não decorrer de ato
seu, retratando as condições efetivas do empreendimento, no qual a ampliação de
eficiência se mostrou impossível, nenhuma redução tarifária poderá ser cogitada.
Contudo, se a ausência de ganhos for produto da ineficiência do
concessionário, que por vontade própria deixou de incrementar o empreendimento
ou perdeu a oportunidade de realizar bons negócios, a solução será a caducidade
da concessão, uma vez que o concessionário descumpriu dever contratual
essencial.
A redução tarifária não pode ser utilizada para punir o concessionário que não
obteve o resultado adequado, pois não é prevista em lei como sanção.
294
294
JUSTEN FILHO, Marçal. Algumas considerações acerca das licitações em matéria de concessão de serviços
públicos. Revista Eletrônica de Direito Administrativo Econômico. Salvador, n. 1, fev. 2005, p. 50. Disponível
em: <http://www.direitodoestado.com.br>. Acesso em: 10 dez. 2008.
160
A adoção da tarifa pelo price cap não constitui burla às garantias do
concessionário. Ela pode ser adotada pelas partes contratantes em harmonia com
os preceitos constitucionais e legais.
Com efeito, a Administração Pública deverá fazer constar do edital a utilização
desse sistema tarifário. Os interessados formularão suas propostas sabendo, de
antemão, que a remuneração do vencedor será apurada de acordo com esse
sistema.
A sistemática também não confronta com a disposição do artigo 37, inciso XXI
da Constituição Federal, porquanto as condições de pagamento refletirão as
condições efetivas da proposta. Nesse caso, não é o valor resultante da equação
encargos e vantagens que é mantido, mas a própria equação em si, introduzindo-se
na relação elementos que permitem a interiorização, no contrato, de elementos a ele
externos, de forma consentida e controlada. Essa possibilidade está contemplada no
artigo 10 da Lei nº 8.987/95.
Além disso, o artigo 9º, parágrafo 2º, da Lei nº 8.987/95 prevê a possibilidade
de revisão de tarifa nas hipóteses de ocorrência de fatos imprevisíveis, mas de
maneira ordinária, a critério dos contratantes, com a análise periódica da planilha de
custos, permitindo a verificação dos ganhos e perdas de eficiência pelo
concessionário.
A operacionalização da sistemática de fixação de tarifas pelo price cap se
coaduna com o regime de reequilíbrio da equação econômico-financeira.
295
De se ressaltar que a existência desse modelo não afasta a adoção do modelo
de fixação da tarifa pelo custo do serviço ou de outros métodos porventura
existentes. A escolha do modelo tarifário aplicável à concessão deverá levar em
conta o próprio serviço público a ser concedido, escolhendo-se a sistemática que
melhor atenda ao interesse público no caso concreto, o que poderá ser verificado na
fase de planejamento da concessão.
7.3 O artigo 10 da Lei 8.987/95 como instrumento de atualização da
concessão.
295
ARAGÃO, Alexandre Santos de. Direito dos serviços públicos. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2008, p. 648.
161
A adoção dessas novas concepções está calcada no artigo 10 da Lei nº
8.987/95, que recebe uma interpretação diversa da tradicional, com a introdução de
novos elementos na análise da garantia do equilíbrio econômico-financeiro dos
contratos de concessão de serviços públicos regidos por essa lei.
Dessa forma, o artigo 10 da Lei nº 8.987/95 garante a manutenção do equilíbrio
econômico-financeiro das concessões de serviços públicos vinculada às disposições
contratuais, de forma que a consideração dos elementos contratualmente
estabelecidos não pode ser considerada como fator de desequilíbrio.
Na verdade, uma alteração na interpretação de todo o sistema, permitindo-
se que as partes disponham contratualmente sobre variáveis, desde que as
condições dessa alteração sejam claras e estejam expressas no edital de licitação,
sem que isso represente uma afronta ao disposto no artigo 65, inciso II, “d’ da Lei
8.666/93.
296
Não qualquer limitação à ampliação da aleatoridade das cláusulas
contratuais, seja pela Constituição, seja pela lei. Esta limitação não é o objetivo da
garantia da equação econômico-financeira, uma vez que a finalidade desta é a de
permitir a observância do princípio da obrigatoriedade dos contratos, adequando-os
às necessidades públicas.
A garantia do equilíbrio econômico-financeiro não determina previamente as
cláusulas contratuais, não imuniza o concessionário quanto aos riscos a que está
sujeito em razão da concessão, não garante uma remuneração determinada.
Seu objetivo é a manutenção da relação entre os encargos e vantagens
inicialmente estabelecidos nas cláusulas contratuais anuídas pelas partes e não
como um valor certo e determinado que cada um representa. O importante não é a
garantia do resultado fixo, mas a manutenção das variáveis que levam a esse
resultado.
Esse entendimento vai ao encontro da disposição constitucional prevista no
artigo 37, inciso XXI, ao assegura a manutenção das condições efetivas da
proposta, não o resultado econômico dela extraível.
Assim, se o concessionário apresentou sua proposta baseado em um modelo
tarifário que permite a alteração do lucro auferido em razão do seu desempenho, o
296
JUSTEN FILHO, Marçal. Teoria geral das concessões de serviço público. São Paulo: Dialética, 2003, p.
395.
162
fez sob essas condições. O direito protege essa relação contratualmente
estabelecida, mas não salvaguarda a remuneração, o lucro ou a ausência de riscos
individualmente considerados.
O concessionário faz jus à contraprestação pelo serviço prestado, ao lucro e à
garantia por riscos estranhos ao contrato de concessão.
A garantia do equilíbrio econômico-financeiro existe em qualquer contrato de
concessão para garantir ao concessionário que a relação entre os encargos e
vantagens por ele anuída seja mantida.
Os fatores que rompem com esse equilíbrio continuam a ser os mesmos:
alterações unilaterais nas cláusulas contratuais efetuadas pela Administração e fatos
imprevistos e alheios à vontade das partes que alterem a economia contratual.
Nesse ponto, não há qualquer alteração na garantia.
Concordamos com Marçal Justen Filho, para quem “alterações no modo de
considerar a equação econômico-financeira” à falta de identidade da equação
vigente com o “retrato” da remuneração a ser paga ao concessionário estabelecida
na celebração do acordo.
O risco foi consagrado como elemento inerente à concessão, considerando-o
como elemento formador da equação econômico-financeira, intrínseco ao equilíbrio
econômico-financeiro.
Nesse novo modelo, a relação entre vantagens e encargos ganha outra
conformação com a introdução de variáveis que encerram a bilateralidade das
modificações, fazendo com que a redução de riscos de perdas corresponda ao
reconhecimento da legitimidade dos ganhos. Fortalece-se a idéia de que a
concessão é um empreendimento sob risco do particular:
o caráter dinâmico que as relações contratuais possuem no mundo
contemporâneo, em que as constantes mudanças sociais,
econômicas e tecnológicas inviabilizam o tratamento jurídico do
contrato como congelamento de determinadas relações jurídicas no
momento de sua celebração, adaptáveis apenas a fatos
imprevisíveis.
297
A garantia do equilíbrio econômico-financeiro não se à garantia da
remuneração; corresponde à manutenção da relação entre as cláusulas contratuais
que impõem direitos e obrigações. Dessa forma, permite-se uma maior elasticidade
na remuneração com a ampliação da possibilidade de lucro do concessionário. Caso
ele tenha sucesso na implementação de medidas que evitem a ocorrência do risco
297
ARAGÃO, Alexandre Santos de. Direito dos serviços públicos. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2008, p. 655.
163
ou que aumentem sua eficiência, ele terá seu lucro aumentado. Entretanto, caso não
seja bem-sucedido, amargará com os prejuízos. Nas palavras de Marçal Justen Filho
Sob esse ângulo, esse novo modelo consagra o risco como inerente
à concessão. Essa solução apenas poderia ser adotada na medida
em que o risco fosse estabelecido para ambas as partes. Logo, não é
possível determinar que somente o Estado ou apenas o
concessionário arcará com os riscos. A situação é bilateral e
recíproca, tal como o era no regime tradicional anteriormente vigente.
Apenas que, no sistema anterior, eliminava-se a variação do lucro ou
do prejuízo. No novo modelo, o particular está sujeito a ambos.
298
Essas inovações fazem com que a equação econômico-financeira deixe de ser
considerada estática (a garantia de manutenção do valor da remuneração do
concessionário) e ganhe dinamismo. Essa nova conformação demanda a realização
de revisões periódicas pelo concedente para verificar, avaliar o desempenho do
concessionário, apurando os ganhos de eficiência obtidos no período.
A consequência da adoção dessas doutrinas é a maior complexidade para a
verificação do equilíbrio econômico-financeiro e a necessidade de se adotar revisões
periódicas do contrato, além de um custo relativamente alto para viabilizá-los, eis
que demandam estudos mais técnicos e aprofundados, além de um
acompanhamento mais rigoroso da execução da prestação.
298
JUSTEN FILHO, Marçal. Algumas considerações acerca das licitações em matéria de concessão de serviços
públicos. Revista Eletrônica de Direito Administrativo Econômico. Salvador, n. 1, fev. 2005, p. 50. Disponível
em: <http://www.direitodoestado.com.br>. Acesso em: 10 dez. 2008.
164
CONCLUSÃO
1. No Brasil, a utilização da concessão de serviços blicos foi retomada na
década final do século passado com o objetivo de diminuir o aparalhamento estatal,
transferindo a sua execução ao setor privado, para fazer frente à crise fiscal e
financeira do Estado.
2. Muito embora a concessão comum mantenha as características do
conceito clássico (a prestação se dar por conta e risco do concessionário, sua
remuneração decorre da exploração do serviço), a outorga não é mais realizada com
exclusividade. A concorrência passa a ser a regra nessa espécie de contrato
administrativo.
3. A concessão de serviços públicos possui natureza jurídica de contrato de
direito público, estando presentes todas as características essenciais de um
contrato: acordo de vontades sobre determinado objeto, interesses contraditórios e
reciprocamente condicionantes, efeitos jurídicos que se irradiam sobre as partes,
conteúdo patrimonial.
4. O ordenamento jurídico brasileiro reconhece essa natureza às
concessões de serviços públicos no artigo 175 da Constituição Federal e artigo 4º da
Lei nº 8.987/95.
5. A possibilidade de alteração das cláusulas de maneira unilateral pelo
Poder Público não altera a natureza contratual, eis que decorre do regime jurídico ao
qual o contrato de concessão está submetido.
6. Após sua celebração, o contrato vincula os contratantes e torna
obrigatório o cumprimento de suas disposições.
7. Em relação aos contratos administrativos, o princípio da obrigatoriedade
dos contratos reforça a crença da sociedade nesse tipo de acordo, como também
privilegia a confiança na Administração Pública, que deve sempre pautar sua
atuação pela legalidade e pela boa-fé.
8. Em sede administrativa, o princípio da obrigatoriedade dos contratos
garante o interesse público; nas concessões de serviços públicos, preserva a
continuidade da prestação do serviço.
165
9. Os contratantes se obrigam ao cumprimento das obrigações por eles
pactuadas, levando em conta, para a manifestação de sua vontade, as
circunstâncias de fato e de direito existentes.
10. Entretanto, o decurso de tempo entre a manifestação de vontade e o
termo final da concessão faz com que estejam sujeitos à ocorrência de fatos
imprevisíveis à época de sua celebração.
11. Estes fatos imprevisíveis podem decorrer da prerrogativa de alteração
unilateral das cláusulas contratuais pela Administração Pública ou de outros
eventos, cuja ocorrência não depende da vontade das partes.
12. A aplicação irrestrita do princípio da obrigatoriedade dos contratos,
nesses casos, levaria à quebra da justiça contratual, gerando ônus para um dos
contratantes, que não foram considerados quando da celebração do acordo.
13. O princípio do equilíbrio econômico-financeiro dos contratos de
concessão é ferramenta que visa conciliar a obrigatoriedade dos contratos e a
necessidade de adaptação das concessões de serviços públicos ao ius variandi,
inerente ao interesse público. É salvaguarda à continuidade da prestação do serviço,
nos casos de ocorrência de eventos imprevisíveis e alheios à vontade das partes,
que alteram a relação entre encargos e vantagens inicialmente estabelecida.
14. Determinar o conteúdo do equilíbrio econômico-financeiro de maneira
genérica e abstrata não é possível; a indeterminação é intrínseca ao conceito. Essa
é a razão pela qual, no plano abstrato, descreve-se o equilíbrio econômico-financeiro
como a relação entre encargos e vantagens existentes no momento da celebração
do acordo, consentida pelas partes.
15. Considera-se que a relação inicialmente estabelecida entre encargos e
vantagens reflete a melhor proposta para a execução do serviço público.
16. Conquanto se afigure impossível descrever, abstratamente, o equilíbrio
econômico-financeiro, pode-se apontar alguns elementos que o compõem. Nas
concessões de serviços públicos, devem ser considerados os valores pagos pelo
concessionário ao Poder Público pela outorga, os custos da prestação do serviço, os
valores necessários à amortização dos investimentos efetuados, o lucro do
concessionário, as receitas tarifárias e as alternativas, complementares acessórias
ou de projetos associados, além do prazo de duração do acordo.
17. A relação entre os encargos e vantagens não se forma em um único
momento, embora passe a produzir efeitos após a celebração do acordo. Isto porque
166
devem ser levados em conta, para sua formação, fatores determinados na fase de
planejamento, no edital e na apresentação da proposta pelo concessionário.
18. A celebração do acordo marca o momento a partir do qual a equação
econômico-financeira passa a produzir efeitos para as partes e torna intangível a
relação consagrada.
19. O equilíbrio econômico-financeiro dos contratos de concessão não é
garantia exclusiva do concessionário; deve beneficiar, outrossim, a Administração
Pública, nos casos em que o evento imprevisível não gere encargos, mas sim
vantagens que não tenham sido previstas no acordo, desbalanceando a equação
inicialmente formada.
20. O princípio do equilíbrio econômico-financeiro não está explicitado norma
da Constituição Federal de 1988. Entretanto, a garantia pode ser extraída da
interpretação sistemática dos preceitos constitucionais.
21. A principal regra constitucional da qual se extrai essa garantia, embora
não seja a única, é o artigo 37, inciso XXI, segundo a qual a Administração Pública
deve prever ”cláusulas que estabeleçam obrigações de pagamento, mantidas as
condições efetivas da proposta, nos termos da lei.”
22. Embora a concessão de serviços blicos seja tratada de maneira
especial em relação aos demais contratos administrativos no artigo 175 da
Constituição Federal, seus procedimentos de licitação e de contratação seguem a
regra comum prevista no artigo 37, XXI, pois a concessão é espécie de contrato
administrativo, sendo que sua outorga também se por meio do procedimento de
licitação e contratação.
23. A garantia do equilíbrio econômico-financeiro pode ser extraída, ainda, de
princípios gerais dos contratos como a vedação do enriquecimento sem causa, a
força obrigatória, a equivalência objetiva das obrigações e de princípios que regem a
Administração Pública tais como a razoabilidade, a moralidade, a supremacia do
interesse público, a adequação além de outros princípios constitucionais como a
segurança jurídica e a proteção a propriedade privada.
24. A garantia do equilíbrio econômico-financeiro é ampla, mas não ilimitada.
Ela não isenta o concessionário de todos os riscos aos quais estaria sujeito durante
a execução do contrato.
25. Nos termos do artigo da Lei 8.987/95, execução do serviço
concedido é realizada por conta e risco do concessionário. Outorgado o direito de
167
prestar o serviço, é transferida a responsabilidade pelos riscos ordinários dessa
prestação.
26. Os riscos ordinários são os intrínsecos ao negócio, a que estão sujeitos
todos aqueles que desenvolvem a atividade econômica. A lei o define quais são
os riscos. No entanto, eles são previsíveis e determináveis, razão pela qual devem
ser considerados na proposta formulada.
27. Presume-se, por essa razão, que os riscos ordinários foram considerados
na proposta, de forma que as vantagens necessárias para lhes fazer frente foram
contempladas no acordo.
28. Tendo sido previstos por ocasião da contratação, os ônus advindos da
ocorrência desses eventos não rompem a equação econômico-financeira e não
geram direito a recomposição do equilíbrio, embora possam redundar em perdas
econômicas para o concessionário.
29. Os riscos extraordinários são imprevisíveis quanto a sua ocorrência ou
suas consequências e não devem ser repassados ao concessionário, pois
onerariam a proposta. Apenas a sua efetivação é que faz com que os Poder Público
e os usuários sejam chamados a arcar com os seus ônus.
30. O direito à recomposição do equilíbrio econômico-financeiro rompido é
qualificado pelo direito, significa dizer que o desequilíbrio econômico ou financeiro
pode, ou não, levar ao direito de recomposição da equação.
31. A proteção legal abrange apenas o desequilíbrio gerado por alterações
unilaterais no contrato realizadas pelo Poder blico e a ocorrência de áleas
extraordinárias, imprevisíveis quanto a sua ocorrência ou consequências e que
independam da vontade das partes, podem gerar o direito à recomposição do
equilíbrio econômico-financeiro.
32. o se exige que o evento imprevisto traga onerosidade excessiva a uma
das partes, bastando que ocorra a quebra da equação econômico-financeira.
33. As revisões ordinárias, previstas contratualmente para ocorrer
periodicamente, independentemente da provocação do interessado e as
extraordinárias, suscitadas pelo interessado em razão da ocorrência de evento
extraordinário, são procedimentos de verificação da relação entre encargos e
vantagens, da existência de quebra do equilíbrio econômico-financeiro e da
ocorrência dos pressupostos necessários a sua recomposição.
168
34. Além das revisões, também se aplicam às concessões de serviços
públicos o reajuste, mecanismo que tem a função de manter o equilíbrio econômico-
financeiro do contrato pela atualização do valor real da remuneração paga ao
concessionário, mediante a aplicação de índices de variação de preços.
35. A Lei nº 8.987/95 prevê duas hipóteses em que a recomposição da
equação econômico-financeira é devida ao concessionário independentemente de
sua manifestação: nos casos de alteração unilateral nas cláusulas regulamentares e
nos casos de alteração na carga tributária.
36. Como na concessão de serviços públicos a remuneração do
concessionário se pela exploração do serviço, sem ônus para a Administração,
esta deve ser a forma prioritária de recomposição do equilíbrio rompido.
37. Entretanto, casos em que o aumento da tarifa pode ferir o princípio da
modicidade das tarifas ou trazer ônus maiores à concessão (com a diminuição da
demanda, por exemplo). Nesses casos, a recomposição do equilíbrio rompido
deverá ser feita de outra forma, podendo ser utilizado o aumento do prazo da
concessão, a diminuição do valor pago pela outorga do serviço, ou os subsídios
pagos pela Administração Pública.
38. O pagamento de subsídios pela Administração Pública é
desaconselhável, pois vai de encontro à ideia essencial da concessão: a
remuneração do concessionário se dar pela exploração do serviço.
39. A adoção da concorrência para a prestação dos serviços públicos
concedidos traz alterações à garantia do equilíbrio.
40. Anteriormente, a existência de um único prestador do serviço fazia com
que a garantia fosse mais abrangente, com vistas a evitar que problemas
econômicos, com o concessionário, levassem ao colapso na prestação do serviço.
41. A adoção da concorrência diminui significativamente o risco de
descontinuidade da prestação. Problemas econômicos com um dos prestadores
podem ser contornados e a prestação do serviço pode ser assegurada pelos demais
prestadores, sem graves prejuízos à continuidade do serviço público adequado.
42. A garantia dada pelo Poder Público privilegia a igualdade de tratamento
entre os concessionários em vez da rentabilidade.
43. A adoção do regime concorrencial permite à Administração Pública utilizar
modelos tarifários nos quais a remuneração final do contratado seja variável.
169
44. Nesses casos, admite-se um aumento na aleatoridade da remuneração
do concessionário, permitindo-se que ele obtenha lucros superiores ao pactuado,
arcando, de outro lado, com os prejuízos resultantes da não ampliação de sua
eficiência.
45. A ampliação da aleatoridade das cláusulas contratuais o é vedada pela
Constituição ou pela lei. Exige-se que todas as informações estejam disponíveis ao
concessionário no edital, permitindo aos interessados conhecerem previamente as
condições e formularem suas propostas de acordo com elas.
46. O equilíbrio econômico-financeiro, nesse caso, garante a relação entre os
encargos e vantagens inicialmente estabelecidos nas cláusulas contratuais; não se
considera como garantia a um valor certo de remuneração.
47. Assim, não se garante um resultado fixo, mas sim a manutenção das
variáveis que compõem a equação. Esse entendimento vai ao encontro da
disposição constitucional prevista no artigo 37, inciso XXI, pela qual devem ser
mantidas as condições efetivas da proposta, não o resultado econômico dela
extraível.
48. O aumento da aleatoriedade das cláusulas contratuais, com a adoção de
modelos tarifários pelo preço, não representa alteração na matriz de riscos
existentes na concessão, segundo a qual os riscos ordinários estão a cargo do
concessionário e os extraordinários a cargo da Administração Pública.
49. Diferentemente do que ocorre nas concessões patrocinadas e nas
administrativas, regidas pela Lei 11.079/04, a divisão de riscos nas concessões
comuns de serviços públicos não pode ter sua matriz alterada contratualmente,
razão pela qual não se pode atribuir a responsabilidade pelos riscos extraordinários
aos concessionários e os ordinários à Administração Pública.
50. Essa impossibilidade não decorre apenas da vedação trazida pelo
parágrafo do artigo da Lei 11.079/04 de aplicar essa lei às concessões
comuns regidas pela Lei 8.977/95, mas também do modelo legal de cada um desses
institutos.
51. Na concessão, diferentemente do que ocorre com as parcerias público-
privadas, o serviço é prestado por conta e risco do concessionário e a remuneração
advém da exploração do serviço concedido.
52. Por essa razão, não se permite, na concessão, a alteração contratual da
matriz de riscos. Ficam as partes autorizadas, por outro lado, à determinação e à
170
quantificação dos riscos ordinários atribuíveis ao concessionário (eis que as
extraordinárias são, por definição, imprevisíveis), o que torna ainda mais importante
a realização do planejamento prévio.
53. Uma concessão bem planejada, na qual os riscos são bem
dimensionados, o edital reveste-se de detalhamento mais preciso possível,
permitindo ao concessionário a formulação de propostas mais realistas e seguras,
gerando cláusulas contratuais claras. Evitando-se litígios entre os contratantes, gera-
se um sentimento de segurança em toda a sociedade, usuários e investidores,
criando um círculo virtuoso.
54. O planejamento não evita a ocorrência dos riscos, mas permite que sejam
tomadas providências para evitar a sua ocorrência ou minimizar seus efeitos.
55. O planejamento deve ter como finalidade a elaboração de cláusulas
contratuais mais claras, permitindo que o contrato se efetive como o instrumento
essencial à superação dos litígios, não apenas prevenindo-os, mas trazendo as
diretrizes para a sua solução.
56. O fortalecimento do contrato traz maior confiança aos concessionários,
aos usuários e aos investidores, fortalecendo a segurança jurídica e a credibilidade
do Poder Público.
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