consciência.” Sua concepção de democracia passa, portanto, muito pela maneira como ele
entendia a questão da liberdade. E a liberdade, para Marx, não podia existir efetivamente
enquanto o trabalho não for, efetivamente, controlado pelo grande conjunto das pessoas, de tal
forma que todas as necessidades fundamentais do homem sejam plenamente supridas, sem
qualquer tipo de coação ou constrangimento. Isso quer dizer que para que haja liberdade
pressupõe-se o atendimento, pela sociedade, das necessidades.
A liberdade, bem como sua possibilidade, não é algo dado por
natureza, não é um dom do alto e nem sequer uma parte
integrante – de origem misteriosa – do ser humano. É o produto
da própria atividade humana, que decerto sempre atinge
concretamente alguma coisa diferente daquilo que se propusera,
mas nas suas consequências dilata – objetivamente e de forma
contínua – o espaço no qual a liberdade se torna possível; e tal
dilatação ocorre, precisamente, de modo direto, no processo de
desenvolvimento econômico, no qual, por um lado, acresce-se o
número, o alcance, etc., das decisões humanas em alternativas,
e, por outro, eleva-se ao mesmo tempo a capacidade dos
homens, na medida em que se elevam as tarefas a eles
colocadas por sua própria atividade. Tudo isso, naturalmente,
permanece ainda no reino da necessidade (LUKÁCS, 1978 p.
15).
É evidente que essas formulações, no geral, não são inéditas, Marx não criou essas
proposições do nada, ou do mundo das ideias. Elas já existiam. Por exemplo, as constituições
derivadas das revoluções burguesas, sobretudo as que foram produzidas no processo da
Revolução Francesa, que estruturaram, juridicamente, um modelo de sociedade
predominantemente liberal, baseada num certo equilíbrio dos poderes. Estas constituições,
que até hoje vigoram nos seus pontos centrais no mundo ocidental, orientou todo um processo
de civilização que se sustentava no mercado que, segundo seus ideólogos, era autorregulável.
Elas estabeleciam uma distinção forte entre o homem e o cidadão, entre o “reino da
necessidade” e o “reino da liberdade” (LUKÁCS, 2008,).
Além disso, é importante dizer que essas conquistas, por mais importantes que tenham
sido, contribuíram pouco para a consolidação de um regime democrático, mesmo nos limites
do sistema capitalista. Isto porque os proprietários, sobretudo os mais conservadores, sempre
que tiveram oportunidades, procuravam e, geralmente conseguiam anular os direitos que
tinham sido conquistas do movimento popular. Isto sempre obrigou os trabalhadores a uma
ação permanente, não só para manter as conquistas, como também para fazer avançar um
processo de acordo com seus interesses.
Até aqui, mesmo sem poder desenvolver o tema, tenho falado
da vida cotidiana dos homens. E é precisamente a partir desta
vida cotidiana que poderemos mais facilmente nos aproximar