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Aline Guedes Pinheiro
O PATRIMÔNIO CULTURAL EDIFICADO E A TRANSFERÊNCIA
DO DIREITO DE CONSTRUIR:
Os exemplos de Curitiba e Belo Horizonte
Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa de
s-Graduação em Urbanismo - PROURB, da
Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da
Universidade Federal do Rio de Janeiro, como parte
dos requisitos necessários para a obtenção do grau de
Mestre em Urbanismo.
Orientadora: Prof. Drª. Sônia Azevedo Le Cocq
d’Oliveira
Rio de Janeiro
Universidade Federal do Rio de Janeiro
Agosto de 2009
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Pinheiro, Aline Guedes.
G924 O patrimônio cultural edificado e a transferência do direito de construir: os
exemplos de Curitiba e Belo Horizonte / Aline Guedes Pinheiro. - Rio de
Janeiro: UFRJ/FAU, 2009.
xviii, 228 f.: il.; 30 cm.
Orientadora: Sônia Azevedo Le Cocq d‟Oliveira
Dissertação (mestrado) - UFRJ/PROURB/ Programa de Pós-
Graduação em Urbanismo, 2009.
Referências bibliográficas: f. 188 199.
. 1. Urbanismo. 2. Patrimônio cultural. 3. Política urbana Curitiba (PR). 4.
Política urbana Belo Horizonte (MG). I. Oliveira, Sônia Azevedo Le Cocq d‟. II.
Universidade Federal do Rio de Janeiro, Faculdade de Arquitetura e Urbanismo,
Programa de Pós-Graduação em Urbanismo. IV. Título.
CDD 711
Aline Guedes Pinheiro
O PATRIMÔNIO CULTURAL EDIFICADO E A TRANSFERÊNCIA
DO DIREITO DE CONSTRUIR:
Os exemplos de Curitiba e Belo Horizonte
Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa de
Pós-Graduação em Urbanismo (PROURB), Faculdade
de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal
do Rio de Janeiro, como parte dos requisitos
necessários para a obtenção do grau de Mestre em
Urbanismo.
Aprovado em:
______________________________________________
Professora Drª. Sônia Azevedo Le Cocq d‟Oliveira
(Orientadora - PROURB-FAU/UFRJ)
_______________________________________________
Professor Dr. Cláudio Antônio Santos Lima Carlos
(DAU-UFRRJ)
______________________________________________
Denise Barcellos Pinheiro Machado
(PROURB-FAU/UFRJ)
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
5
Á minha filha Sophia que nasceu durante o período
deste mestrado e hoje é a razão da minha vida.
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
6
AGRADECIMENTOS
Agradeço primeiramente a Deus, ao nosso mestre Jesus e a todos os amigos espirituais que vem me
acompanhando nesta trajetória, me guiado e dando força nos momentos de desânimo.
Agradeço ao meu esposo Marcelo por seu apoio e amor em todos os momentos e a minha filhinha
Sophia Guedes que ao nascer iluminou a minha vida e me deu mais animo para tudo. Aos meus pais
Eustaquio e Margarida que sempre lutaram pela minha educação e dos meus irmãos, em especial à
minha mãe que cuidou da minha filha no período de dedicação final desta dissertação. E aos meus
irmãos David e Felipe que sempre estão presentes em minha vida.
Agradeço à minha orientadora, Sônia Le Coq e todos os professores e funcionários do Prourb que
foram importantes na construção deste trabalho. Á CAPES pela concessão de bolsa de estudo que me
possibilitou cursar este mestrado. E à minha ex-professora e orientadora de Pesquisa de Iniciação
Cientifica da Universidade Federal de Viçosa, Aline Werneck, por seus ensinamentos científicos que
me ajudaram a concluir esta pesquisa.
Agradeço também aos funcionários da Prefeitura Municipal de Curitiba Lorene Rothe, Neila, Joaquim
e Carla Choma e ao arquiteto curitibano Jéferson Novalar. E aos funcionários da Prefeitura Municipal
de Belo Horizonte Valéria Braga, Ana Cristina e Micheli Arroyo.
Agradeço aos meus amigos e colegas de mestrado Marcelo, Viviane, Carol, Ana Luisa, Maria Luisa
por todo o apoio e troca de informações e em especial a Luise estar sempre presente para ouvir meus
desabafos e tentar esclarecer minhas dúvidas no decorrer da pesquisa.
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
7
RESUMO
Com a aprovação do Estatuto da Cidade, Lei Federal 10.257 de 2001, que estabelece as diretrizes para
a viabilidade do capítulo da política urbana da Constituição de 1988, tem-se a regulamentação a nível
federal de diversos instrumentos que podem ser extremamente importantes em auxílio à gestão do
patrimônio cultural edificado dentro de uma perspectiva urbanística. Dentre estes instrumentos
encontra-se a Transferência do Direito de Construir (TDC), que vinha sendo aplicada em cidades
brasileiras desde antes do Estatuto da Cidade. Porém apesar da progressiva utilização da TDC nos
grandes centros urbanos brasileiros, ainda permanece muitas lacunas para uma aplicação eficaz deste
instrumento, principalmente por falta de estudos sobre ele.
Assim, esta pesquisa tem como objetivo principal investigar e avaliar, a partir das experiências nas
cidades de Belo Horizonte e Curitiba, se de fato a aplicação do instrumento Transferência TDC está
facilitando/viabilizando a preservação e conservação do patrimônio cultural edificado.
Para tal, parte-se de uma revisão bibliográfica que visa o esclarecimento conceitual sobre temas
chaves desta pesquisa: o patrimônio cultural e o instrumento da TDC. Posteriormente foram
elaborados os estudos empíricos sobre as cidades de Belo Horizonte e Curitiba, que tiveram a mesma
base metodológica, constituída em: revisão bibliográfica da evolução urbana, arquitetônica e das
políticas de preservação do patrinio cultural edificado; análise da aplicação do instrumento da TDC
nas duas cidades com base em dados coletados nas prefeituras e entrevistas com os agentes
envolvidos; e análise de “casos referências” que abrangem diferentes aspectos práticos da utilização da
TDC.
A partir de todos os dados analisados concluiu-se que apesar de diversos problemas no processo de
aplicação em ambas as cidades, de uma forma geral a TDC demonstrou ser um instrumento de grande
sucesso quanto aplicado no patrimônio cultural edificado, promovendo a preservação e a valorização
de muitos imóveis.
Palavras-chave: Patrimônio Cultural Edificado, Transferência do Direito de Construir, Curitiba, Belo
Horizonte
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
8
ABSTRACT
With the approval of the City Statute, Federal Law 10.257 of 2001, which establishes guidelines for
the viability of the chapter about urban policy of the 1988 Constitution, there is the regulation at
federal level of various instruments, which can be extremely important as support to the building
heritage management within an urban perspective. Transfer of the Development Right is among these
instruments, and it has been applied in Brazilian cities since before the City Statute. But, in despite of
the increasing use of Transfer of the Development Right in large Brazilian cities, there is still many
gaps for effective implementation of this instrument, mainly for lack of studies on it.
Thus, this research has as main objective to investigate and evaluate, using the experiences of the
cities of Belo Horizonte and Curitiba, if this instrument is, in fact, enabling the preservation and
conservation of the building heritage.
For such, this work starts with a literature review to getting the conceptual clarification on the key
issues: the building heritage and the instrument of Transfer of the Development Right. Subsequently it
was developed the empirical studies on the cities of Belo Horizonte and Curitiba, which had the same
basic methodology, that consists in: a literature review of urban development, architecture and politics
of preservation of building heritage; analysis of the application of the Tranfer of the Developmente
Right in both cities based on data collected in the city halls, interviews with stakeholders, and analysis
of "reference cases" that cover different aspects of the practical use of theinstrument.
From all the data that were analyzed it was concluded that in despite of several problems in the
implementation process in both cities, in general, the Transfer of the Development Right proved to be
a great success when applied in buildings heritage, promoting the preservation and enhancement of
many buildings.
Keywords: Building Heritage, Transfer of the Development Right, Curitiba, Belo Horizonte
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
9
LISTA DE ILUSTRAÇÕES
Figura 1: Heraa--------------------------------------------------------------------------------------------
33
Figura 2: Evolução das tendências técnicas construtivas que levaram a possibilidade gradual
verticalização das construções-----------------------------------------------------------------------------
47
Figura 3: Exemplificações hipotéticas de como acontece a TDC de imóveis para outro-----------
49
Figura 4: Exemplo hipotético da TDC em Chicago-EUA----------------------------------------------
52
Figura 5: III Avenida Perimetral, onde segundo Guimarães (2007, p.105) a TDC foi utilizada--
59
Figura 6: Casa das Rosas Av. Paulista, SP-------------------------------------------------------------
61
Figura 7: Mapa com a localização de Curitiba-----------------------------------------------------------
64
Figura 8: Mapa Estado do Paraná no século XVI com destaque para os caminhos pré-
cabralinos------------------------------------------------------------------------------------------------------
66
Figura 9: Planta de Curitiba entre 1830 e 1950----------------------------------------------------------
68
Figura 10: Vista de Curitiba em 1855---------------------------------------------------------------------
68
Figura 11: Antiga Igreja Luterana-------------------------------------------------------------------------
69
Figura 12: Arquitetura da imigração déc. 1920----------------------------------------------------------
69
Figura 13: Vista Parcial de Curitiba em 1905------------------------------------------------------------
70
Figura 14: Rua XV de Novembro--------------------------------------------------------------------------
72
Figura 15: Evolução Urbana de Curitiba entre 1955 e 1995-------------------------------------------
72
Figura 16: Casa Romário Martins-------------------------------------------------------------------------
74
Figura 17: Teatro Paio--------------------------------------------------------------------------------------
75
Figura 18: Esquema de liberação de potencial conforme o Decreto 625/04-------------------------
83
Figura 19: Categorias para Transferência Potencial Construtivo--------------------------------------
85
Figura 20: Parque Tamg----------------------------------------------------------------------------------
85
Figura 21: Parque Birigui-----------------------------------------------------------------------------------
85
Figura 22: Bosque Fazendinha-----------------------------------------------------------------------------
86
Figura 23: Bosque Português-------------------------------------------------------------------------------
86
Figura 24: Vila Terra----------------------------------------------------------------------------------------
86
Figura 25: Casa das Pinturas--------------------------------------------------------------------------------
88
Figura 26: Gráfico com a Cronologia da expedição de CCPC-----------------------------------------
88
Figura 27: Casa Louvre, atual Lojas Mariza na Rua XV de Novembro------------------------------
89
Figura 28: Casa Issa M. Issa, imóvel art deco na Rua XV de Novembro----------------------------
89
Figura 29: Casa Vermelha no Largo da Ordem----------------------------------------------------------
89
Figura 30: Casa Ligia Stolz no Largo da Ordem---------------------------------------------------------
89
Figura 31: Igreja da Ordem Terceira----------------------------------------------------------------------
89
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
10
Figura 32: Mapa do Município de Curitiba dividido sobre Regionais Administrativas e com
Bairros concederam a TPC até junho de 2008-----------------------------------------------------------
90
Figura 33: Quadro contendo exemplo de cálculo de Potencial Construtivo de imóveis que
cedem potenciais---------------------------------------------------------------------------------------------
92
Figura 34: Mapa da área central de Curitiba com a espacialização dos imóveis que concederam
TPC até junho de 2008, em seus respectivos zoneamentos---------------------------------------------
95
Figura 35: Novelas Curitibanas doada ao município em 1991---------------------------------------
95
Figura 36: Casa Wichter doada ao município em 1992-----------------------------------------------
96
Figura 37: Cha eclético uso comercial------------------------------------------------------------------
96
Figura 38: Palacete Ectico uso original residencial---------------------------------------------------
96
Figura 39: Sobrado Eclético de uso misto----------------------------------------------------------------
96
Figura 40: Casa eclética de porão alto---------------------------------------------------------------------
96
Figura 41: Palacete com características de Art Nouveau-----------------------------------------------
96
Figura 42: Colégio Marista, características neoclássicas-----------------------------------------------
96
Figura 43: Casa típica da imigração italiana--------------------------------------------------------------
96
Figura 44: Antigo Moinho edificação fabril------------------------------------------------------------
96
Figura 45: Casa modernista - autoria Vilanova Artigas-------------------------------------------------
96
Figura 46: Casa Imobline antes do restauro--------------------------------------------------------------
97
Figura 47: Casa Imobline após o restauro----------------------------------------------------------------
97
Figura 48: Sociedade Polono antes do restauro----------------------------------------------------------
97
Figura 49: Sociedade Polono após o restauro------------------------------------------------------------
97
Figura 50: Hotel Íbis antes do restauro--------------------------------------------------------------------
98
Figura 51: Hotel Íbis após restauro com nova edificação ao fundo-----------------------------------
98
Figura 52: Casa dos Anjos primeira a ter liberação de TPC em etapas-------------------------------
98
Figura 53: UIEP Museu Metropolitano de Arte de Curitiba-------------------------------------------
101
Figura 54: Mapa da área central de Curitiba com a espacialização das UIEPs----------------------
101
Figura 55: UIEP União Paranaense de Estudantes antes do restauro---------------------------------
102
Figura 56: UIEP Prédio do Ministerio Público antes do restauro-------------------------------------
102
Figura 57: Antiga sede do museu em obras 2008------------------------------------------------------
103
Figura 58: Antiga sede do museu restaurada 2009----------------------------------------------------
103
Figura 59: Praça Tiradentes requalificada 2009-------------------------------------------------------
103
Figura 60: Mapa da área central de Curitiba com a espacialização dos imóveis casos referência.
104
Figura 61: Localização da Casa Hauer--------------------------------------------------------------------
104
Figura 62: Rua Jo Bonifácio com Casa Hauer a direita em 1904-----------------------------------
105
Figura 63: Casa Hauer antes da concessão de TPC------------------------------------------------------
105
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
11
Figura 64: Casa Hauer após incêndio de 1998-----------------------------------------------------------
106
Figura 65: Casa Hauer em 2008----------------------------------------------------------------------------
107
Figura 66: Catedral Basílica com a Casa Hauer à esquerda--------------------------------------------
107
Figura 67: Localização do Palacete Leão Junior---------------------------------------------------------
107
Figura 68: Palacete Leão Junior no início do século XX-----------------------------------------------
108
Figura 69: Palacete Leão Junior com Leões de Porcelana----------------------------------------------
108
Figura 70: Palacete Leão Junior com grades de ferro sobre o muro de pedra------------------------
108
Figura 71: Fachadas frontal e lateral esquerda do Palacete Leão Junior------------------------------
109
Figura 72: Vista dos fundos com a Torre do Palacete Leão Junior------------------------------------
109
Figura 73: Vista do teto da sala principal do Palacete Leão Junior------------------------------------
109
Figura 74: Vista interna da sala de lareira com papel de parede floral do Palecete-----------------
109
Figura 75: Prédio aos fundos do Palacete Leão Junior--------------------------------------------------
110
Figura 76: Croqui com o Palacete dos Leões e a nova edificação-------------------------------------
111
Figura 77: Localização da Casa Vilanova Artigas-------------------------------------------------------
114
Figura 78: Casa Vilanova na dec. de 1970----------------------------------------------------------------
114
Figura 79: Face que recebe mais luz na Casa Vilanova-------------------------------------------------
115
Figura 80: Fachada principal da Casa Vilanova 3 pavimentos--------------------------------------
115
Figura 81: Sala da Residência Bettega com pé direito duplo-------------------------------------------
115
Figura 82: Escada em espiral da Casa Vilanova---------------------------------------------------------
115
Figura 83: Fachada da Casa Vilanova Artigas antes do restauro--------------------------------------
116
Figura 84: Sala principal da Casa Vilanova Artigas antes do restauro-------------------------------
116
Figura 85: Localização da Casa Amarela-----------------------------------------------------------------
117
Figura 86: Sobrados de uso misto Av. Marechal Floriano Casa Amarela a primeira à esquerda
118
Figura 87: UIPs na Av. Marechal Floriano que concederam PC--------------------------------------
118
Figura 88: Casa Amarela em 1950-------------------------------------------------------------------------
118
Figura 89: Casa Amarela em 1979-------------------------------------------------------------------------
119
Figura 90: Casa Amarela em 1999-------------------------------------------------------------------------
119
Figura 91: Casa Amarela as recuperação em 2004 com nova edificação aos fundos----------
119
Figura 92: Casa Amarela antes da restauro em 2000----------------------------------------------------
120
Figura 93: Casa Amarela as restauro em 2009--------------------------------------------------------
120
Figura 94: Localização da Capela Santa Maria----------------------------------------------------------
121
Figura 95: Conjunto de edificações do Colégio Santa Maria em 1944-------------------------------
121
Figura 96: Interior da Capela em 1942--------------------------------------------------------------------
122
Figura 97: Área embaixo da Capela em 1950------------------------------------------------------------
122
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
12
Figura 98-Capela Santa Maria e prédio de três pavimentos como entrada---------------------------
122
Figura 99- Teto decorado e vitrais da Capela------------------------------------------------------------
122
Figura 100- Capela antes do restauro----------------------------------------------------------------------
123
Figura 101- Capela durante o restauro--------------------------------------------------------------------
126
Figura 102 - Capela as o restauro-----------------------------------------------------------------------
126
Figura 103 - Pátio interno do Colégio---------------------------------------------------------------------
126
Figura 104- Antigas Salas do Colégio---------------------------------------------------------------------
126
Figura 105: Mapa com a Localização de Belo Horizonte----------------------------------------------
127
Figura 106: Igreja Matriz da Boa Viagem no Arraial Curral Del Rei---------------------------------
129
Figura 107: Planta Geral da Cidade de Minas Gerais, organizada pela Comissão Construtora da
Nova Capital, coordenada por Aarão Reis, 1895--------------------------------------------------------
130
Figura 108: Machas da ocupação urbana em Belo Horizonte, 1900 1910 -1920------------------
131
Figura 109: Antigo prédio dos Correios e Telégrafos (demolido)-------------------------------------
131
Figura 110: Residência do período eclético na Rua Sapucaí-------------------------------------------
131
Figura 111: Mancha da ocupação urbana de BH em 1940---------------------------------------------
132
Figura 112: Croqui de Oscar Niemeyer do Conjunto Arquitetônico da Pampulha------------------
133
Figura 113: Imóvel na Rua dos Caetés com dois processos de 1997 para gerar TDC.-------------
145
Figura 114: Gráfico com a Cronologia de entrada e efetivação de processos de TDC em BH----
146
Figura 115: Igreja Santa Efigênia com destaque para o terreno vizinho que gerou TDC----------
147
Figura 116: Mapa do Município de Belo Horizonte dividido sobre Regionais Administrativas e
com áreas (Bairros, Seções Urbanas e Suburbanas) que geraram TDC até junho de 2008--------
149
Figura 117: Mapa da área central de BH com a espacialização dos imóveis que geraram TDC
até junho de 2008, em seus respectivos zoneamentos---------------------------------------------------
150
Figura 118: Sede Social do Minas Tênis Clube na Rua da Bahia, gerou TDC em 2001-----------
151
Figura 119: Imóvel residencial ectico na Rua Paraíba, 866.-----------------------------------------
152
Figura 120: Imóvel comercial eclético na Rua da Bahia, 1416----------------------------------------
152
Figura 121: Imóvel eclético na Av. Cristóvão Colombo------------------------------------------------
152
Figura 122: Imóvel residencial eclético (neocolonial) na Rua Espírito Santo, 1920.---------------
152
Figura 123: Imóvel residencial Art Decó na Av. Brasil, 1433-----------------------------------------
152
Figura 124: Imóvel do Colégio Imaculada, Art Decó na Rua da Bahia, 1534-----------------------
152
Figura 125: Imóvel do Instituto Isabela Hendrix, Art Decó na Rua da Bahia, 2020----------------
152
Figura 126: Imóvel Moderno na Rua da Bahia, 1723.--------------------------------------------------
152
Figura 127: Imóvel Moderno na Rua Bernado Guimaes, 2751--------------------------------------
152
Figura 128: Mapa da área central de BH com a espacialização dos imóveis “casos referência”--
155
Figura 129: Localização da Casa Niemeyer--------------------------------------------------------------
155
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
13
Figura 130: Desenhos técnicos da configuração original da Casa Niemeyer------------------------
156
Figura 131: Casa Niemeyer em 2000----------------------------------------------------------------------
157
Figura 132: Fachada Bernardo Guimarães da Casa Niemeyer -2000---------------------------------
157
Figura 133: Croqui do projeto de Restauro da Casa Niemeyer----------------------------------------
158
Figura 134: Fachadas para Rua Bernardo Guimarães da Casa Niemeyer 2008 ------------------
159
Figura 135: Fachada para Rua Araguari da Casa Niemeyer 2008 ---------------------------------
159
Figura 136: Localização da Casa Klus Modas-----------------------------------------------------------
159
Figura 137: Esquina da Rua Aimoré com Rio Grande do Sul em 1995------------------------------
160
Figura 138: Barracões ao fundo na Rua Rio Grande do Sul--------------------------------------------
160
Figura 139: Croqui do Projeto de restauro, adequação e construção de nova edificação em
1996 da Casa Klus-------------------------------------------------------------------------------------------
160
Figura 140: Casa Klus Modas em 2000-------------------------------------------------------------------
161
Figura 141: Casa Klus Modas em 2008-------------------------------------------------------------------
162
Figura 142: Fachada da Rua Rio Grande do Norte da Casa Klus Modas em 2008-----------------
162
Figura 143: Localização da Casa Daldegan--------------------------------------------------------------
162
Figura 144: Casa Daldegan em 2001----------------------------------------------------------------------
163
Figura 145: Casa Daldegan em 2008----------------------------------------------------------------------
165
Figura 146: Localização do Conjunto Arquitetônico da Avenida Oiapoque-------------------------
166
Figura 147: Vista do Conjunto Arquitetônico do Oiapoque em 1991---------------------------------
167
Figura 148 : Fachada da Avenida Oiapoque do Conjunto Arquitetônico do Oiapoque em 2000-
167
Figura 149: Vista interna do Conjunto Arquitetônico do Oiapoque em 2000-----------------------
167
Figura 150: Diretrizes de ocupação para a quadra 5381 onde situava a Cervejaria Antártica ----
168
Figura 151: Área Objeto da Operação Urbana do Conjunto da Avenida Oiapoque----------------
168
Figura 152: Shopping Pátio Savassi-----------------------------------------------------------------------
171
Figura 153: Praça Jo Nogueira Sá-----------------------------------------------------------------------
171
Figura 154: Terminal de Ônibus da BH Bus avistado da Rua Curitiba-------------------------------
171
Figura 155: Terminal de Ônibus da BH Bus avistado da Rua São Paulo-----------------------------
171
Figura 156: Shopping Oiapoque em 2007----------------------------------------------------------------
172
Figura 157: Shopping Oiapoque internamente-----------------------------------------------------------
172
Figura 158: Shopping Oiapoque internamente-----------------------------------------------------------
172
Figura 159: Projeto de Restauro proposto em 2003 com a Operação Urbana-----------------------
173
Figura 160: Quarteirão do Conjunto Arquitetônico do Oiapoque totalmente ocupado em 2009.
173
Figura 161: Localização do Instituto Isabela Hendrix--------------------------------------------------
174
Figura 162: Croqui do prédio principal do Instituto Isabela Hendrix feito por Rafaelo Berti-----
174
Figura 163: Localização das edificações s do Isabela Hendrix tombadas em 1998 e 2007--------
175
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
14
Figura 164: Instituto Isabela Hendrix em outubro de 2008 Fachada da Rua Alvarenga Peixoto
178
Figura 165: Instituto Isabela Hendrix em outubro de 2008 Fachada da Rua da Bahia-----------
178
Figura 166: Capela do Instituto Isabela Hendrix em outubro de 2008--------------------------------
178
Figura 167: Instituto Isabela Hendrix em outubro de 2008---------------------------------------------
178
Figura 168: Organograma da Prefeitura Municipal de Curitiba contendo apenas os órgãos
envolvidos na operacionalização da TDC----------------------------------------------------------------
201
Figura 169: Organograma da etapas básicas de operacionalização da TPC em Curitiba-----------
202
Figura 170: Fluxograma da operacionalização da Concessão de Potencial Construtivo em Ctba
205
Figura 171: Fluxograma da operacionalização da Transferência da Titularidade da Concessão
de Potencial Construtivo em Curitiba---------------------------------------------------------------------
206
Figura 172: Fluxograma da operacionalização da Transferência de Potencial Construtivo em
Curitiba--------------------------------------------------------------------------------------------------------
208
Figura 173: Organograma da Prefeitura Municipal de Belo Horizonte contendo apenas os
órgãos envolvidos na operacionalização da TDC--------------------------------------------------------
210
Figura 174: Fluxograma da operacionalização da Geração de Potencial Construtivo--------------
212
Figura 175: Fluxograma da operacionalização da Recepção de Potencial Construtivo------------
214
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
15
LISTA DE TABELAS
Tabela 1: Lista das UIEPs em Curitiba -------------------------------------------------------------------
100
Tabela 2: Dados e cálculos para chegar ao valor de potencial concedido do Palacete Leão Jr----
111
Tabela 3: Dados e cálculos para chegar ao valor do Pt de imóvel recebedor de TPC -Cristo Rei
113
Tabela 4: Dados e cálculos para chegar ao valor do Pt de imóvel recebedor de TPC no Santa
Felicidade------------------------------------------------------------------------------------------------------
113
Tabela 5 : Dados e cálculos para chegar ao valor de potencial concedido subtraído da Capela
com venda de parte de sua cota de potencial construtivo para imóvel no Bairro Batel-------------
125
Tabela 6 : Dados e cálculos para chegar ao valor de potencial concedido subtraído da Capela
com venda de parte de sua cota de potencial construtivo para imóvel no Bairro Água Verde----
125
Tabela 7: Dados e cálculos para chegar ao valor das UTDCs da Casa Niemeyer-------------------
157
Tabela 8: Dados e cálculos para chegar ao valor da AR de imóvel receptor de TDC--------------
158
Tabela 9: Dados e cálculos para chegar ao valor da UTDC da Casa Klus Modas------------------
161
Tabela 10: Dados e cálculos para chegar ao valor da UTDC da Casa Daldegan--------------------
164
Tabela 11: Dados e cálculos para chegar ao valor da AR de imóvel receptor de TDC-------------
165
Tabela 12: Dados e cálculos para chegar ao valor da AR de imóvel receptor de TDC-------------
165
Tabela 13: Dados e cálculos para chegar ao valor da UTDC do Conjunto Arq. do Oiapoque----
170
Tabela 14: Dados e cálculos para chegar ao valor de ATs do Instituto Isabela Hendrix-----------
177
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
16
LISTA DE SIGLAS E ABREVIATURAS
BELO HORIZONTE
ADE - Áreas de Diretrizes Especiais
AT - Área liquida transferível (AT)
AR - Área líquida adicional a ser edificada
CDL Câmara de Dirigentes Lojistas
CDPCM-BH - Conselho Deliberativo do Patrimônio Cultural do Município
COMAM - Conselho Municipal de Ambiente
CPTDC - Comissão Permanente de Transferência do Direito de Construir
CTDC - Certidão de Transferência do Direito de Construir
DIPC - Diretoria de Patrimônio Cultura
FMC - Fundação Municipal de Cultura
GAM’s - Guias de Arrecadação Municipal
GCON - Gerência de Controle Urbano
GEPROEX - Gerência de Protocolo e Expedição
ITBI - Imposto sobre Transmissão Inter Vivos de Bens Imóveis
PMBH - Prefeitura Municipal de Belo Horizonte
SMAMA - Secretaria Municipal Adjunta do Meio Ambiente
SMARU - Secretaria Municipal Adjunta de Regulação Urbana
SMC - Secretaria Municipal da Cultura
SMCT - Secretaria Municipal de Cultura e Turismo
SMMA - Secretaria Municipal de Meio Ambiente
TDC - Transferência do Direito de Construir
UTDC - Unidade de Transferência do Direito de Construir
VG - valor venal do metro quadrado do imóvel gerador.
VR - valor venal do metro quadrado do imóvel receptor.
ZEIS-2 - Zona de Especial Interesse Social 2 (ZEIS-2)
ZAP - Zona de Adensamento Preferencial (ZAP)
ZAR - Zona de Adensamento Restrito (ZAR)
ZP - Zona de Proteção (ZP)
CURITIBA
CAPC Comissão de Avaliação do Patrimônio Cultural
Cr - Coeficiente de aproveitamento do imóvel que recebe o potencial
Cc - Coeficiente de aproveitamento do imóvel que cede o potencial
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
17
FCC - Fundação Cultural de Curitiba
IPPUC Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano de Curitiba
PGM - Procuradoria Geral do Município
PMC - Prefeitura Municipal de Curitiba
Ptr - Potencial construtivo do imóvel que recebe o potencial
Pc - Potencial construtivo do imóvel que cede o potencial
RMC - Região Metropolitana de Curitiba
SE - Setor Especial Estrutural
SE-PE - Setor Especial Preferencial de Pedestres
SMF - Secretaria Municipal de Finanças
SMU - Secretaria Municipal de Urbanismo
TPC Transferência de Potencial Construtivo
UIEP Unidade de Especial Interesse de Preservação
UIEP - Unidades de Especial Interesse de Preservação
UIP - Unidades de Interesse de Preservação
Vmc - Valor do metro quadrado do imóvel que cede o potencial
Vmr - Valor do metro quadrado do imóvel que recebe o potencial
ZC- Zona Central
ZT-NC - Zona de Transição Nova Curitiba
ZR - Zona Residencial
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
18
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO------------------------------------------------------------------------------------
CAPITULO I
1. A QUESTÃO DO PATRIMÔNIO CULTURAL EDIFICADO: Importância,
Políticas e Gestão --------------------------------------------------------------------------
1.1. A importância do patrimônio cultural: uma questão de rememoração--------
1.2. A trajetória da noção de patrimônio: retrospectiva de um conceito-----------
1.3. A política e a gestão do patrimônio cultural no Brasil: breve histórico-------
CAPITULO II
2. O INSTRUMENTO DA TRANSFERÊNCIA DO DIREITO DE
CONSTRUIR-------------------------------------------------------------------------------
2.1. Origens e institucionalização da Transferência do Direito de Construir------
2.2.1. A Transferência do Direito de Construir no âmbito internacional-
2.2.2. A Transferência do Direito de Construir no Brasil-------------------
2.2.3. A Transferência do Direito de Construir no Estatuto da Cidade---
2.3. Experiências nacionais da previsão e aplicação daTDC------------------------
CAPITULO III
3. A APLICAÇÃO DA TRANSFERÊNCIA DO DIREITO DE CONSTRUIR
EM CURITIBA-----------------------------------------------------------------------------
3.1 História da evolução urbana e arquitetônica de Curitiba-------------------------
3.2 A atuação da Administração Municipal de Curitiba na preservação do seu
patrimônio cultural-------------------------------------------------------------------------
3.3 Análise da aplicação da transferência de potencial construtivo em Curitiba--
3.3.1 Histórico e análise da documentação legal que trata da TPC em
Curitiba----------------------------------------------------------------------------
3.3.3 A aplicação da TDC em Curitiba----------------------------------------
A) A aplicação da TPC em UIPs-------------------------------------
B) A aplicação da TPC em UIEPs-----------------------------------
3.3.4 Alguns casos para exemplificação da aplicação do instrumento----
A) Casa Hauer (objeto de TPC em 1986)---------------------------
B) Palacete Leão Junior (objeto de TPC em 2001)----------------
C) Residência João Luiz Bettega - Casa Vilanova Artigas
(objeto de TPC em 2003)----------------------------------------------
D) Casa Amarela (objeto de TPC em 2004)------------------------
E) Capela Santa Maria (objeto de TPC em 2006)------------------
29
33
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39
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50
50
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117
121
19
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
19
CAPITULO IV
3. A APLICAÇÃO DA TRANSFERÊNCIA DO DIREITO DE CONSTRUIR
EM BELO HORIZONTE-----------------------------------------------------------------
3.1 História da evolução urbana e arquitetônica de Belo Horizonte----------------
3.2 A atuação da Administração Municipal de Belo Horizonte na preservação
do seu patrimônio cultural----------------------------------------------------------------
3.3 Análise da aplicação da transferência de potencial construtivo em Belo
Horizonte------------------------------------------------------------------------------------
3.3.1 Histórico e análise da documentação legal que trata da TPC em
Belo Horizonte -------------------------------------------------------------------
3.3.3 A aplicação da TDC em Belo Horizonte ------------------------------
3.3.4 Alguns casos para exemplificação da aplicação do instrumento----
A) Casa Niemeyer (objeto de TDC em 2000)----------------------
B) Casa Klus Modas (objeto de TDC em 2001)--------------------
C) Casa Daldegan (objeto de TDC em 2001)-----------------------
D) Conjunto Arquitetônico da Avenida Oiapoque (objeto de
TDC em 2004)----------------------------------------------------------
E) Instituto Metodista Isabela Hendrix (objeto de TDC em
2006)---------------------------------------------------------------------
CONSIDERAÇÕES FINAIS -------------------------------------------------------------------
REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFICAS --------------------------------------------------------
APÊNDICES ---------------------------------------------------------------------------------------
ANEXOS --------------------------------------------------------------------------------------------
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128
134
139
139
145
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200
215
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
19
INTRODUÇÃO
A partir da segunda metade do século XX, houve um enorme avanço industrial no
Brasil, que trouxe consigo a destruição de paisagem natural e cultural numa intensidade
jamais vista (YAGIZI, 1996, p. 133-155). A industrialização juntamente com a urbanização
fez crescer a migração para as cidades e com ela a valorização do solo urbano, o que devido à
falta de planejamento urbano adequado, resultou em ocupações desordenadas, segregações
sócio-espaciais e também na destruição e substituição de construções e ambiências
tradicionais e significativas em nome da modernidade e do desenvolvimento urbano.
Em um mundo habituado a conceber o desenvolvimento sob uma ótica
unicamente construtiva a preservação de edificações de valor simbólico,
arquitetônico e histórico dentro do espaço urbano, representava um retrocesso,
principalmente nas áreas centrais. (ARAÚJO et al, 2002, p. 123)
O processo de desconstrução/construção nos espaços urbanos é uma realidade
intrínseca à dinâmica urbana de qualquer cidade, porém é muito importante a manutenção dos
artefatos que fazem parte de nosso patrimônio cultural, pois estes bens estruturam uma
pontepara o conhecimento e memória de valores do passado que reforçam a identidade e o
sentido de pertencimento a uma comunidade, elemento essencial para o exercio da cidadania
(MANZATO, 2007, p. 20). A preservação desse patrimônio garante, além da manutenção da
identidade urbana, o relacionamento do passado e presente na construção do futuro, dentro do
conceito de desenvolvimento sustentável.
Preservar ou destruir são duas formas de atribuição de valor, valor esse que, no
segundo caso é negativo. No entanto, é bom lembrar que preservar ou destruir
implica certo projeto de construção para o futuro que parte do presente. (FREIRE,
1997, p.162)
Por muito tempo as práticas de preservação e conservação do patrimônio cultural das
cidades foram consideradas um impedimento para o desenvolvimento urbano, sendo estas
duas questões vistas como antagônicas e conflitantes entre si (MANZATO, 2007, p. 74).
Contudo a partir da década de 70, com a ampliação do conceito de patrimônio e das práticas
de preservação, esta mentalidade vem mudando e as práticas preservacionistas passaram a
caminhar juntas com as práticas de ordenamento territorial, estando presentes em legislações
urbanísticas de cidades como São Paulo, Porto Alegre e Salvador. Esta mudança reflete
principalmente a ampliação sofrida no próprio conceito de patrimônio passando do
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
20
monumento isolado a grupos de edificações históricas, à paisagem urbana e aos espaços
públicos” (CASTRIOTA, 2003, p.2).
Contudo, apesar de todas estas mudanças no entendimento do patrimônio e nos
avanços das leis municipais, o patrimônio edificado ainda é frágil frente às ameaças
especulativas do mercado imobiliário capitalista, que superestima o valor de troca e o valor
econômico em detrimento do valor de uso e do valor cultural, dificultando as ações
preservacionistas (FERES, 2002, p.15-16). O patrimônio cultural edificado é visto como
entrave para os negócios imobiliários, principalmente nas áreas centrais onde o solo é mais
valorizado e muitas vezes se concentram os bens mais significativos (CARDOSO, 1996, p.
100). De acordo com Cardoso (1996, p. 102), dentro de um quadro de capitalismo periférico,
muito se perdeu da memória patrimonial do país, particularmente nas grandes cidades com
intenso crescimento econômico”. Assim deve-se buscar uma preservação e manutenção
ordenada e constante do patrimônio urbano, juntamente com as práticas de planejamento,
porque a degradação também é ordenada e constante, e tem como agentes forças que têm
necessidade de ser controladas pelo bem da qualidade de vida urbana, como enfatiza Pires ao
ponderar que:
(...) o poder econômico, se não tangido a seguir rigorosas pautas, preordenadas
pelo Estado e pela sociedade, esta por meio das instâncias de participação, tende
a arvorar-se titular de poder de confirmação da cidade e até de sua desfiguração,
do que decorre virtual ameaça ao patrimônio cultural pela predominância da
ordem do mercado de terra e dos interesses econômicos. (PIRES, 2002, p.145)
A última Constituição Federal brasileira, que foi aprovada no ano 1988, reflete a nova
articulação das práticas preservacionistas com as de controle urbano e com o direito
urbanístico. Ela é considerada um marco, visto que, além de eliminar os resquícios do
autoritarismo do governo militar, estende o conceito de patrimônio contido no Decreto-Lei
25/1937 e introduz na legislação brasileira uma “concepção de proteção cultural em sintonia
com as Cartas de Proteção internacionais” (ARAUJO, op. cit., p.44). Esta Constituição ainda
ampliou consideravelmente a autonomia dos municípios brasileiros, caracterizando uma
descentralização potica que está sendo aplicada e promovida em diferentes esferas da gestão
pública como as da preservação do patrimônio cultural.
É neste quadro de valorização da municipalização na atuação da preservação do
patrimônio cultural que se insere o Estatuto da Cidade (Lei Federal 10.257 de 2001), que vem
estabelecer as diretrizes para a viabilidade do capítulo da potica urbana da Constituição de
1988, trazendo um leque de novos instrumentos urbanísticos capazes de propiciar a melhor
gestão municipal. Estes instrumentos, atrelados ao princípio da função social da cidade e da
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
21
propriedade, podem ser utilizados na potica urbana dos municípios de maneira a trazer uma
nova dimensão para a gestão e preservação do seu patrimônio dentro de uma perspectiva
urbanística. De acordo com Feres (2002, p.25), os instrumentos do Estatuto da Cidade
representam um avanço significativo no campo da preservação do patrimônio das cidades
contemporâneas e para sua efetivação deve-se “romper com dispositivos limitados e
formalistas que ainda estão em vigor, impedindo o entendimento e atuação mais realista sobre
o tecido urbano vivo e dinâmico das cidades.
Por buscarem novas formas de interação entre os diversos atores e interesses atuantes
no espaço urbano, adequando-se melhor ao processo dinâmico da urbanização, os
instrumentos do Estatuto da Cidade são considerados mais flexíveis na preservação do
patrimônio cultural do que a atuação isolada de instrumentos tradicionais como o
tombamento. Segundo Fróes, o tombamento denota uma atitude de isolamento e defesa da
preservão” contribuindo para o acirramento do antagonismo entre preservação e
desenvolvimento urbano (FRÓES, 2006). Entretanto, a aplicação prática dos instrumentos do
Estatuto da Cidade ainda é muito recente e percebe-se a falta de entendimento por parte das
gestões municipais de formas mais eficazes de aplicação e operacionalização destes
instrumentos. Apesar dos instrumentos do Estatuto da Cidade atualmente estarem previstos
em diversos planos diretores municipais, muitas vezes as prefeituras não têm o conhecimento
empírico necessário para concretizar uma aplicação satisfatória dos mesmos.
“A aplicação do Estatuto da Cidade (Lei nº. 10.257/2001), portanto, é pertinente
por propiciar a construção de um outro modelo de planejamento e gestão,
podendo permitir que a preservação seja, de fato, tratada como uma forma de
desenvolvimento e não o que tradicionalmente tem ocorrido com a falsa visão e
porque não dizer, falso dilema entre preservação e desenvolvimento, como se
fossem coisas antagônicas. Ele possui, desta forma, no seu bojo, uma intenção
educativa de mudança de mentalidade sobre que tipo de desenvolvimento a
sociedade pode alcançar e de que modo ele pode ser alcançado.” (BRITO, 2003)
Dentre os instrumentos presentes no Estatuto da Cidade, pode-se destacar o
instrumento da Transferência do Direito de Construir
1
(TDC), que apesar de ter sido
regulamentado a vel federal somente em 2001 com o Estatuto da Cidade, vinha sendo
aplicado em cidades brasileiras desde a década de 1980
(CÂMARA DOS DEPUTADOS,
2001, p. 67). Este instrumento jurídico de natureza urbanística consiste basicamente em
autorizar o proprietário de um imóvel objeto de limitação administrativa de cunho social,
ambiental ou cultural, a transferir seu potencial de construção, ou parte dele, para outro
imóvel, tendo como objetivo principal viabilizar a preservação de áreas ou imóveis onde
1
Instrumento está previsto no artigo 35 da Lei Federal 1257 de julho de 2001 (Estatuto da Cidade).
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
22
incida interesse público de preservação através de compensação urbanística aos proprietários
(CÂMARA DOS DEPUTADOS, 2001, p. 67).
A TDC é considerada por autores como Rodrigues (2002) a “solução jurídica para a
efetivação do tombamento como instrumento de proteção do patrimônio cultural”, pois o
proprietário de imóvel tombado terá a “possibilidade de ser ressarcido do prejuízo alegado
pelo tombamento, visto que poderá utilizar o coeficiente de aproveitamento em outro imóvel
ou, ainda, alienar seu direito de construir”. Essa consideração é enfatizada por Bessa e Rangel
(2004, p.20), ao afirmar que a “transferência do direito de construir compensa eventual perda
econômica promovida pelo tombamento de bens culturais”.
“A transferência do direito de construir poderá ser a solução eficiente para a
efetivação do tombamento com o afastamento da alegativa de prejuízos e a
cessação das condutas criminosas de destruição das obras, muitas vezes as
escondidas, outras com a participação omissiva do poder público.” (RODRIGUES,
2002)
Segundo Gaio (2002, p.81), apesar da TDC ser um instrumento que se destaca por sua
progressiva utilização nos grandes centros urbanos brasileiros, ainda permanece muitas
lacunas para uma aplicação eficaz deste instrumento, principalmente por falta de estudos
sobre ele. Para a TDC ser utilizada realmente a favor de fatores benéficos para o equilíbrio no
espaço urbano, como a real conservação e preservação do patrimônio ambiental das cidades,
deve-se ter maior entendimento e “clareza sobre quais os procedimentos mais justos para a
sua operacionalização, bem como quais são suas principais limitações” (2002, p.81).
Desta forma questiona-se: como vem acontecendo a aplicação do instrumento
urbanístico/jurídico da TDC nas cidades brasileiras? Como ele está sendo utilizado em prol da
preservão do patrimônio cultural edificado? E qual a real repercussão na
conservação/preservação dos bens envolvidos?
Buscando responder a estas questões, a presente dissertação tem por objetivo
investigar e avaliar, a partir de experiências concretas, se de fato a aplicação do instrumento
Transferência do Direito de Construir está facilitando/viabilizando a preservação e a
conservação do patrimônio cultural edificado nas cidades onde vem sendo aplicado. Para tal,
foram tomados como estudos de caso a aplicação da TDC em duas cidades brasileiras,
Curitiba e Belo Horizonte (BH), cujas administrações municipais aplicam este instrumento.
Justifica-se a escolha de dois estudos de caso por acreditar-se que através do entendimento
comparativo da aplicação do instrumento amplia-se a percepção dos problemas e
potencialidades que aconteceram ao longo do processo e assim pode-se apresentar um maior
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
23
arcabouço empírico para auxílio de gestores municipais na aplicação satisfatória da
Transferência do Direito de Construir.
A cidade de Curitiba, capital do estado do Paraná, foi escolhida como estudo de caso
do instrumento por tê-lo aplicado de forma pioneira no cenário nacional, desde a década de
1980, tendo seu uso aprimorado e seu universo de aplicabilidade ampliado desde sua
implantação, sendo hoje utilizado em imóveis de valor cultural, imóveis constituídos de áreas
verdes e ainda para a implantação de programas habitacionais e equipamentos comunitários.
Já na cidade de Belo Horizonte, capital do estado de Minas Gerais, a aplicação do instrumento
é mais recente, desde o final da década de 1990, mas não menos importante, tendo sido
escolhida como estudo de caso porque através de experiências anteriores a autora desta
dissertação já conhecia de uma forma mais pormenorizada a aplicação da TDC nesta cidade.
Em Belo Horizonte o instrumento é utilizado principalmente em imóveis de valor cultural
apesar de estar prevista na legislação também a utilização para fins de preservação de áreas
verdes e de implantação de habitação social.
A metodologia utilizada para este trabalho baseou-se primeiramente em levantamento
e revisão de fontes bibliográficas para o esclarecimento conceitual sobre alguns temas chaves
desta dissertação que são o patrimônio cultural e o instrumento da TDC. Esta revisão
culminou nos dois primeiros capítulos, que são desenvolvidos basicamente a partir das fontes
bibliográficas consultadas nas bibliotecas da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ),
da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), em sites de bancos de teses e dissertações
da internet e junto ao acervo pessoal da autora e de sua orientadora.
Os estudos empíricos de aplicação da TDC tiveram a mesma base metodológica para
as duas cidades, para destarte ter parâmetros mais consistentes de comparão e confrontação
dos dois estudos de caso. Este estudo baseou-se primeiramente na análise da evolução urbana,
aprofundando-se nas poticas de preservação do patrimônio cultural edificado em cada um
dos municípios, para conhecer melhor a realidade de ambos. Em um segundo momento,
foram levantados e analisados documentos, legislação urbanística e legislação específica de
cada uma das cidades onde constam os parâmetros de aplicação da TDC. Estas duas etapas
foram pautadas por uma extensa pesquisa feita, principalmente, nos sites oficiais das
prefeituras e mara de vereadores de cada um dos municípios e junto a publicações
bibliográficas sobre estas cidades.
Posteriormente foram realizadas visitas às duas cidades onde de-se coletar os dados
necessários para esta dissertação e efetuar entrevistas com diferentes agentes envolvidos na
aplicação e utilização do instrumento da TDC. As primeiras entrevistas foram direcionadas
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
24
aos agentes das prefeituras responsáveis pelo gerenciamento dos processos de TDC
2
, visando
esclarecer todas as questões relativas ao processo de operacionalização e aplicação do
instrumento. Junto a estes agentes de-se ter acesso aos documentos da TDC, coletando
dados sobre os imóveis, que posteriormente foram tabulados para facilitar a percepção da
utilização do instrumento ao longo do tempo e no espaço urbano da cidade.
Ainda foram entrevistados agentes das prefeituras responsáveis pelas questões
relativas ao patrimônio cultural edificado
3
, verificando junto a eles, dentre outras coisas, a real
repercussão do instrumento na preservação a longo prazo dos imóveis e na valorização deste
patrimônio.
Devido ao grande número de imóveis de valor cultural objeto da TDC nas duas
cidades estudadas, optou-se por, através da ajuda dos agentes das prefeituras envolvidos na
aplicação, selecionar um numero restrito de casos referências para serem estudados com
maior detalhamento. Na escolha destes casos buscaram-se aqueles que, segundo os agentes,
abrangem diferentes aspectos práticos da utilização do instrumento e podem, de uma maneira
geral, mostrar como vem sendo tratados os imóveis objeto do instrumento ao logo do tempo,
divulgando alguns pontos negativos e outros positivos da aplicação do instrumento na cidade.
Após selecionar os casos referências foram tiradas fotografias externas in loco para observar o
estado geral e atual de conservação dos mesmos, montando-se o hisrico dos respectivos
bens, a partir da consulta aos acervos de órgãos das prefeituras
4
e livros.
Foram efetuadas ainda entrevistas escritas, enviadas por meio eletrônico, a outros
agentes envolvidos no processo de aplicação do instrumento nas respectivas cidades, sendo
eles: proprietários dos imóveis que geraram e venderam potencial construtivo; incorporadores
imobiliários que compraram potencial construtivo; e arquitetos envolvidos no restauro dos
imóveis que geraram potencial construtivo.
Destarte, o presente trabalho estrutura-se em cinco capítulos que apontam e
esclarecem os elementos necessários à compreensão do estudo que se propõe a realizar:
O primeiro capítulo - a Questão do Patrimônio Cultural Edificado: importância,
políticas e gestão - aborda a importância da preservação do patrimônio cultural para a
2
Em Curitiba foram entrevistados agentes da Secretaria Municipal de Urbanismo (SMU) e do Instituto de
Pesquisa e Planejamento Urbano (IPPUC) e em Belo Horizonte foram entrevistados agentes da Secretaria
Municipal Adjunta de Regulação Urbana (SMARU).
3
Em Curitiba foi entrevistado a técnica do Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano de Curitiba (IPPUC),
responsável pelos imóveis que fazem parte do acervo cultural, e em Belo Horizonte foi entrevistada a diretora da
Diretoria de Patrimônio Cultural (DPC).
4
No caso de Curitiba, foram feitas as pesquisas junta à Fundação Cultural de Curitiba que faz parte da Prefeitura
de Curitiba. E no caso de Belo Horizonte, foram feitas as consultas na Diretoria de Patrimônio Cultural que faz
parte da Fundação Municipal de Cultura.
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
25
manutenção da memória coletiva e da identidade de um povo, enfatizando a importância do
patrimônio formado pelas permanências da arquitetura de valor cultural no espaço urbano, o
denominado patrimônio cultural edificado. Neste capítulo é abordada toda a trajetória do
conceito de patrimônio até se chegar ao conceito abrangente que se tem atualmente de
patrimônio ambiental urbano e ainda a institucionalização do patrimônio cultural, suas
políticas e gestão no âmbito nacional desde a década de 1930 até o Estatuto das Cidades em
2001.
O segundo capítulo O Instrumento da Transferência do Direito de Construir
contempla as bases conceituais da TDC, suas origens e institucionalização no âmbito
internacional e nacional, enfocando sua previsão no Estatuto das Cidades em 2001. Ainda
neste capítulo são discutidas algumas experiências nacionais de aplicação do instrumento da
Transferência do Direito de Construir.
O terceiro capítulo - A Aplicação da Transferência do Direito de Construir em
Curitiba é dedicado ao estudo de caso na cidade de Curitiba, abordando primeiramente a
contextualização e a história de evolução urbana e arquitetônica da cidade e a evolução da
atuação da administração municipal na preservação do patrimônio cultural edificado. Em um
segundo momento é exposta a análise e avaliação da aplicação do instrumento da TDC na
cidade (que ali é denominado como Transferência do Potencial Construtivo - TPC), contando
com uma análise cronológica da documentação legal envolvida na utilização do instrumento e
análise da operacionalização do mesmo dentro da Prefeitura Municipal de Curitiba. Ainda
dentro das análises da aplicação da TPC inserem-se a apresentação e avaliação de cinco
casos referência”.
O quarto capítulo - Aplicação da Transferência do Direito de construir em Belo
Horizonte tem a mesma estrutura do terceiro capítulo, porém dedicando-se ao estudo de
caso na cidade de Belo Horizonte, onde é abordada primeiramente a contextualização e a
história de evolução urbana e arquitetônica da cidade e a evolução da atuação da
administração municipal na preservação do patrimônio cultural edificado. Em um segundo
momento está exposta a análise e avaliação da aplicação da TDC na cidade, contando com
uma análise cronológica da documentação legal envolvida na utilização do instrumento e
análise da operacionalização do mesmo dentro da Prefeitura Municipal de Belo Horizonte.
Ainda dentro das análises da aplicação da TDC inserem-se a apresentação e avaliação de
cinco “casos referência”.
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
26
Por fim, nas considerações finais, é apresentada uma reflexão sobre a análise a que o
estudo se propôs, enfatizando uma avaliação comparativa sobre as considerações da aplicação
do instrumento em Belo Horizonte e Curitiba.
Capitulo I
A questão do Patrimônio Cultural Edificado
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
27
CAPITULO I
1. A QUESTÃO DO PATRIMÔNIO CULTURAL EDIFICADO:
Importância, Políticas e Gestão
A questão do patrimônio cultural edificado e sua preservão é bastante problemática
em uma sociedade como a brasileira, onde ao lado da diversidade de contextos culturais,
existem profundas desigualdades sociais. Esta problemática pode ser percebida facilmente ao
tomarmos os opostos das classes sociais brasileiras, que de um lado encontra-se a grande
maioria da população lutando pelos meios materiais básicos de sobrevivência e, na maior
parte das vezes, colocando questões como a preservação do seu patrimônio como irrelevantes,
frente a tantas dificuldades. E do outro lado, tem-se uma minoria provida da maior parte dos
recursos financeiros que, quando formada pelos detentores do capital imobiliário, muitas
vezes, em sua avidez por aumentar ainda mais seu capital, não se importa em destruir ou
descaracterizar bens culturais insubstituíveis.
O patrimônio cultural das cidades, para ser mais valorizado e, portanto, preservado,
deve ser entendido pela população como elemento importantíssimo para a qualidade de vida
no ambiente urbano, visto que o patrimônio é o suporte e o estímulo da memória coletiva de
um grupo social e contribui para garantir a identidade cultural, que é fundamental no exercício
da cidadania
5
.
O entendimento de qualidade de vida muitas vezes é associado apenas a questões
básicas, como acesso à infra-estrutura e moradia, porém “a refleo sobre a relação entre o eu,
o nós e os outros, na perspectiva da construção de uma cidadania ativa e dialógica, deve
somar-se às estruturas que comem a questão da qualidade de vida (LIMA, ALMEIDA,
2001, 37). Para existir uma cidade justa hoje, onde todos os cidadãos tenham seus direitos
respeitados, é necessário que as pessoas se reconheçam nos lugares e objetos materiais que
foram construídos no passado, pois “diferentemente dos animais, os homens realizam suas
vidas através da noção de tempo, onde o “presente” é um tempo contínuo, cada vez mais
envolvendo “passados” e “futuros” (CARDOSO, 1996, p.101-102).
Ao se acionar a memória coletiva como uma dimensão fundamental da cidadania é
revelada a conotação política da questão da preservação do patrimônio e, conseqüentemente a
5
De acordo com FONSECA (2005) “a noção de cidadania envolve atualmente, uma gama diversificada de direitos políticos
(de primeira geração, fundados no valor de liberdade); direitos econômicos, sociais e culturais (de segunda geração, fundados
no valor da igualdade); direitos de solidariedade (de terceira geração, fundados no valor da fraternidade)”
Capitulo I
A questão do Patrimônio Cultural Edificado
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
28
necessidade de poticas blicas para efetivação desta gestão. É a política de preservação,
que irá organizar, legitimar e gerir os processos que envolvem a tarefa de preservar a memória
de um grupo social. Esta política, normalmente, é conduzida pelo Estado, o qual segundo
Millet (1988, p.28) “serve de pêndulo mantenedor do „equilíbrio‟” entre as forças que atuam
dualmente no espaço urbano, estando de um lado o interesse coletivo da preservação dos bens
significativos para a memória da cidade e do outro os proprietários que se sentem
prejudicados e os especuladores imobiliários. Para o sucesso deste equilíbrio é imprescindível
na potica de preservação a participação ativa da população e também a articulação desta com
outras áreas de conhecimento como a educação, o direito, o urbanismo e o planejamento
urbano.
Segundo Magali o objetivo maior do urbanismo é a garantia da qualidade de vida dos
habitantes da cidade”, devendo o planejamento urbano e regional ter como uma de suas
premissas básicas a fórmula “Preservação = Identidade Cultural + Qualidade de Vida”
(MAGALDI, 1992, p. 23). Desta forma tem-se na incorporação da iia de planejamento
urbano nas poticas preservacionistas, a possibilidade de tornar as ações dos órgãos de
patrimônio efetivas, eficazes e capazes de contribuir para a transformação do presente
(MAGALDI, 1992, p. 22). Instrumentos consagrados das poticas urbanas, como a Lei de
Uso e Ocupação do Solo e o Plano Diretor, dentre outros, podem ser usados com sucesso a
favor da preservação. O domínio do controle e ordenamento do solo urbano pode viabilizar a
coexistência de diversas gerações de bens em um desenho contextualizado, ao estabelecer:
“(...) a demanda para os ambientes em função das características e qualidades a
ele atreladas, que ao se articularem com os conteúdos sociais, relativos aos
significados das diferentes localizadas, estabelecem níveis diferenciados de valor
de uso do solo urbano para diferentes situações.” (MILLET, 1988, p.27)
Assim, iniciativas atuais que atrelam as políticas de preservação do patrimônio cultural
com as políticas urbanas são de extrema importância para o desenvolvimento das cidades em
todos os seus aspectos. Dentre estas iniciativas cabe aqui ressaltar, talvez a mais importante a
nível federal, o Estatuto da Cidade, lei da potica urbana de 2001, a qual veio para fornecer
um suporte jurídico aos municípios brasileiros no que tange a gestão urbana. Nesta lei além de
diretrizes, são apresentados diversos instrumentos jurídico-urbanísticos que podem ser
utilizados visando à proteção do patrimônio cultural brasileiro.
Capitulo I
A questão do Patrimônio Cultural Edificado
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
29
1.1. A importância do Patrimônio Cultural: uma
questão de rememoração
O homem é um ser social por natureza
6
, necessitando estar inserido em uma
comunidade para realizar sua existência humana, absorvendo dela as fontes culturais que irão
formá-lo como homem e possibilitar, posteriormente, com suas próprias manifestações
contribuir para a formação de outros homens, de geração em geração (MANZATO, 2007,
p.22). Estas fontes culturais são imprescindíveis para se conhecer uma pessoa e a sociedade
na qual está inserida, uma vez que a cultura
7
tem um papel essencial em todos os aspectos da
vida social humana, consistindo em elemento definidor e caracterizador de um dado grupo
social, o diferenciando dos demais. E conforme Cunha (2004, p.20) ressalta “cada cultura
segue o próprio e individual caminho em função dos diferentes eventos históricos que
enfrentou”.
É a cultura de um grupo, uma comunidade, uma sociedade ou uma nação e suas
manifestações, que simboliza o que é aprendido e partilhado entre os seus indivíduos,
favorecendo suas individualidades, particularidades e, portanto considerada “elemento
primordial para conferir identidade a um determinado grupo social, desde a pré-história até os
dias de hoje” (ANDRADE, 2002, p.75). A cultura pode ser considerada como um “veículo
para a compressão da identidade social e individual do ser humano, porque é através da soma
das características culturais mais marcantes de um grupo social, as quais o distinguem dos
demais, que podemos identificá-lo e conferir a ele a chamada identidade cultural. A
identidade cultural de uma sociedade é o elemento que fornece raízes ao homem, o
vinculando a alguma coisa ou a alguém. É considerada por Yagizi (2003, p. 58) “legitimadora
de direitos e privilégios e, por isso, contribui para a segurança do grupo social
.
O conceito de identidade implica semelhança a si próprio, formulada como
condição de vida psíquica e social. Nessa linha, está muito mais próxima dos
processos de re-conhecimento, do que de conhecimento. A busca de identidade
se alia mal a conteúdos novos, pois o novo constitui uma ameaça, sempre. Ao
contrario, ela se alimenta do ritmo que é a repetição portando a segurança.
(grifo nosso) (MENESES, 1984, p.33).
Para se constituir uma identidade seja ela cultural ou pessoal é necessário que
conheçamos o nosso passado, nossas origens, reconhecendo quem fomos e quem somos. E
6
Segundo Aristóteles (1991, p.4) “o homem é um animal cívico, mais social do que as abelhas e outros animais que vivem
juntos.”
7
De acordo com Martins (apud Marchesan, 2007, p.17) a expressão cultura é polissêmica, se tratando de “um conceito de
extensão miseravelmente vasta. A rigor, que dizer tudo que não é exclusivamente natureza e passa a significar praticamente
tudo num mundo como o de hoje penetrado por todas as partes pela ação criadora do trabalho humano.”
Capitulo I
A questão do Patrimônio Cultural Edificado
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
30
para tal é essencial o elemento memória, como enfatiza Choay (2001, p.112) ao afirmar que
“indivíduos e sociedade não podem preservar e desenvolver sua identidade senão pela
duração e pela memória”. Meneses (1979, p.34) também ressalta a importância da memória
como suporte fundamental da identidade, a definindo como um mecanismo de retenção de
informações, conhecimentos, experiências, tanto em vel individual quanto coletivo, que
torna legível e identificável o fluxo dos acontecimentos humanos.
De acordo com Freire (1997, p.127) “a memória é, antes de mais nada, um processo,
uma construção dinâmica, passível de ser reelaborada constantemente, diante das experiências
vividas”, sendo considerada uma força viva do presente, por responder a suas solicitações e
constituir uma plataforma de referência a qual evita a alienação e desagregação diante das
transformações que fazem parte da existência humana (MENESES, op.cit., p.34). É a
rememoração que nos possibilita “diante de um turbilhão de mudanças que não nos
desmanchemos no ar” (LOVISOLO apud LIMA e ALMEIDA, 2001, p.37). Através da
memória, o passado significativo
8
vem à tona, mesclando-se com as percepções do presente e
favorecendo a produção de conhecimento que estabelecerá a baliza de comparação e a medida
para a construção de um futuro (ROSSI, 2001, p.37). É o avanço deste conhecimento, baseado
na memória, que possibilita alcançar novos saberes e práticas e, principalmente, evitar que
erros do passado sejam repetidos.
Exercitando nossa memória podemos identificar aquilo que nos une enquanto
povo, enquanto nação e, isso é essencial para que, conscientes de quem somos,
nós tornemos menos vulneráveis às manipulações políticas e ideológicas, bem
como passamos a evitar repetir o passado, nos pontos negativos que marcaram a
caminhada de nossa sociedade.” (MANZATO, 2007, p. 23)
A memória não deve ser entendida apenas como um fenômeno individual, inserida na
dimensão pessoal, mas “deve ser entendida também ou, sobretudo, como um femeno
coletivo e social, ou seja, como um fenômeno construído coletivamente” (POLLACK, 1992,
p. 201). Freire (1997, p.198), referindo-se aos pensamentos de Halbwachs, ressalta que a
memória individual se mistura às experiências sociais e está constantemente ligada ao grupo,
à cultura
9
, às tradições e ao universo coletivo. Desse modo, todas as lembranças individuais
do homem têm seus alicerces sociais e são influenciadas pelas memórias coletivas
10
da
8
O passado significativo seria aquele que foi retido pela memória, pois ela é por natureza seletiva, tendo como filtro a
cultura, retém espontaneamente apenas o que possui especial significado.
9
De acordo com Von Simson (2008)é a cultura de uma sociedade que fornece os filtros através dos quais os indivíduos que
nela vivem possam exercer o seu poder de seleção realizando as escolhas que determinam aquilo que será descartado e aquilo
que precisa ser guardado ou retido pela memória”.
10
A questão da memória coletiva e seus diversos aspectos, bem como sua relação com a memória individual e histórica é
tratada com maior profundidade na obra de HALBWACHS, 1990.
Capitulo I
A questão do Patrimônio Cultural Edificado
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
31
comunidade de refencia e de pertencimento deste indivíduo. Esta memória coletiva é
formada a partir de lembranças e referências com significados e valores compartilhados entre
os membros de um determinado grupo social e, juntamente com a cultura deste grupo, é
responsável pelos liames que unem as pessoas em torno do sentido comum de pertencimento,
de identidade, noção básica para a formação e exercício da cidadania.
Para a construção da memória coletiva de uma sociedade é essencial se ter referências,
através de permanências
11
de vestígios históricos que podem ser tanto imateriais quanto
materiais. De acordo com Freire (1997, p.128) é a “permanência das coisas que dão o suporte
necessário para a memória coletiva”, pois é o passado, tangível no presente através da
permanência de bens, que possibilitam que as pessoas se reconheçam neles e encontrem uma
proximidade com as gerações anteriores na linha de transmissão dos conteúdos coletivos”.
Estas permanências, interpretadas na atualidade, formam o patrimônio cultural de uma
comunidade, o qual segundo Castriota “cristaliza em suas manifestações as especificidades de
uma cultura (...) sendo o maior depositário de sua identidade”. Destarte, este patrimônio é
formado por bens culturais que permanecem por serem suportes de um sentido, um
significado especial, ou seja, um valor cultural que os distingui dos demais e os torna o ponto
de apoio da memória de uma comunidade, guardando, portanto relação direta com sua
identidade.
A importância do patrimônio cultural para a memória e identidade é confirmada pela
UNESCO (United Nations Educational, Scientific and Cultural Organization) através de uma
definição atual do conceito patrimônio cultural, entendido como:
"(...) o legado que recebemos do passado, vivemos no presente e transmitimos às
futuras gerações. Nosso patrimônio é fonte insubstituível de vida e inspiração,
nossa pedra de toque, nosso ponto de referência, nossa identidade, sendo de
fundamental importância para a memória, a criatividade dos povos e a riqueza
das culturas" (grifo nosso) (UNESCO, 2008)
Dentro das categorias do patrimônio cultural material tem-se no patrimônio cultural
edificado, na arquitetura presente nas cidades, um elemento de extrema importância para a
rememoração, como enfatiza Ruskin (apud CHOAY, 2001, p. 139) ao afirmar que “nós
podemos viver sem [arquitetura], adoramos nossos deuses sem ela, mas sem ela não podemos
nos lembrar”. Rossi (2001, p.3) explana também sobre esta ligação ao declarar que “a
arquitetura é a cena fixa das vicissitudes do homem, carregada de sentimentos de gerações, de
acontecimentos públicos, de tragédias privadas, de fatos novos e antigos” e por isso fornece
11
De acordo com Rossi (1996, p.49), permanências “são um passado que ainda experimentamos” o que condiz muito bem
com o entendimento de memória que apesar de ter sua base no passado é uma força viva no presente.
Capitulo I
A questão do Patrimônio Cultural Edificado
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
32
aos homens referenciais urbanos significativos para selecionar as suas lembranças. E quando
portadora de valores culturais, a arquitetura se torna testemunha concreta e tangível do
processo de construção de um lugar, fornecendo estímulos externos para tornar vivos traços
da memória coletiva em uma formação sócio-espacial. Deste modo, a arquitetura pode ser
considerada parte fundamental do patrimônio cultural de uma cidade, tendo sua importância
na rememoração enfatizada por Choay (2001, p.140):
“Fazendo nos ver e tocar o que viram e tocaram as gerações desaparecidas, a
mais humilde habitação possui, da mesma forma que o mais glorioso edifício, o
poder de nos por em comunicação, quase em contato, com elas. (...) Os edifícios
do passado nos falam, eles nos fazem ouvir vozes que nos envolvem em um
dialogo.”
É na cidade, no espaço urbano, que os cidadãos encontram mais forte o sentimento de
familiaridade, de pertencimento, de reconhecimento de sua identidade, pois como Rossi
afirma “a cidade é o lócus da memória (...) que é o fio condutor de toda a complexa estrutura”
urbana, estando “no interior dessa estrutura, a consciência da cidade”. A cidade e seu
patrimônio são, além de um dado cultural, a base da fruição dos valores culturais que
permitem um contanto maior entre os habitantes e a alma da cidade”. E como bem coloca
Ítalo Calvino (1990, p.14):
“A cidade se embebe como uma esponja dessa onda que reflui das recordações e
se dilata. (...) a cidade não conta o seu passado, ela o contém como as linhas da
mão, escrito nos ângulos das ruas, nas grades das janelas, nos corrimãos das
escadas, nas antenas dos para raios, nos mastros das bandeiras, cada segmento
riscado por arranhões, serradelas, entalhes, esfoladuras”.
Destarte, os ambientes construídos pelos homens seja no vel da cidade como no
nível da arquitetura, corporificam a cultura e guardam as lembranças e a história da trajetória
do homem no tempo e no espaço por ele percorrido (MILLET, 1998, p.15 e 23). o nestes
ambientes urbanos que a memória coletiva mostra o seu caráter dinâmico (envolvendo
passado, presente e futuro). Além de ser materializada enquanto passado nos espaços sicos,
no patrimônio, é enquanto presente, “a própria transformação do espaço, a cargo da
coletividade” (ROSSI, 2001, p.198-199). Esta transformação que Rossi cita seria aquela em
que a partir da consciência das memórias coletivas, as quais ajudam a entender a formação e a
evolução de uma cidade, que aconteceriam as inovações, o crescimento saudável e qualitativo
no espaço urbano, e não apenas um crescimento quantitativo onde as prioridades são apenas
as necessidades estruturais, se esquecendo das necessidades simbólicas e culturais.
Desta forma podemos entender que a preservação do patrimônio cultural urbano não
está envolvida somente pelo saudosismo, que tem a intenção de congelar a cidade, ao
Capitulo I
A questão do Patrimônio Cultural Edificado
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
33
Figura 1: Herança
Fonte:
http://img458.imageshack.us/img458/5186/enf
antetvieillardlw5.jpg
contrário, esta ação visa construir um ambiente urbano vivo, contemporâneo (CARVALHO,
1998 p.108) e com qualidade de vida, onde as pessoas possam exercer seu direito à memória,
à identidade e à cidadania.
É a preservação dos bens culturais a forma mais autêntica e eloqüente de
transmiso de maneiras de agir, pensar e sentir das gerações passadas às
sociedades contemporâneas. O monumento, o sítio e o objeto trazem em si todo
um elenco de realizações humanas: características familiares, concepções
religiosas, valores morais, organizações políticas, estruturas econômicas. È
inegável o valor social do patrimônio cultural. (...) É o patrimônio cultural a própria
memória do povo, exemplificação viva do passado dos grupos e fundamental
apoio para as construções sociais do futuro.” (COELHO, 1992, p.59)
1.2 A trajetória da noção de patrimônio: retrospectiva
de um conceito
A palavra Patrimônio tem sua “origem ligada
às estruturas familiares, econômicas e jurídicas de
uma sociedade estável, enraizada no espaço e no
tempo” (CHOAY, 2001, p.11), associada ou à noção
do sagrado, ou à noção de herança, de memória do
indivíduo, de bens de família. Esta palavra quando
associada a adjetivos como cultural, histórico, natural,
dentre outros, passa a ter uma trajetória diferente,
tendendo a um sentido mais público e coletivo do que
aquele restrito, familiar e individual que marcou sua
origem (PEREIRO, 2008, p.24). Esta nova trajetória
para Sant‟Anna se caracteriza pela peculiar
propriedade de expansão do conceito patrimônio, ao
que tudo indica ilimitada (SANT'ANNA, 1985, p.22). Contudo a noção de patrimônio,
mesmo ampliada, sempre esteve ligada à questão do passado, da herança a nós deixada, seja
ela a nível individual ou a nível coletivo.
Uma categoria de patrimônio que possui estreita relação com a idéia de herança é a
que abarca o adjetivo cultural, o patrimônio cultural. Para Pereiro (2008, p.25) este tipo de
patrimônio mantém uma relação simlica e direta com a cultura de um povo,
independentemente das noções que o classificam e distinguem. Ainda segundo este autor o
patrimônio cultural é a expressão da cultura dos grupos humanos que recupera memórias,
ritualiza sociabilidades, seleciona bens culturais e os transmite para o futuro (PEREIRO,
Capitulo I
A questão do Patrimônio Cultural Edificado
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
34
2008, p.25). Entretanto houve um longo caminho para se chegar à noção abrangente de
patrimônio cultural qual se tem hoje, onde este tipo de patrimônio abarca não somente
edifícios monumentais, mas também todo o “meio ambiente cultural”
12
em suas
manifestações materiais e imateriais.
Este caminho percorrido para a concepção contemporânea do patrimônio cultural tem
sua origem ligada à imagem de monumento, que é um termo evoluído do “latim
monumentum, que por sua vez deriva de monere (advertir, lembrar), aquilo que traz a
lembrança a alguma coisa” (CHOAY, 2001, p.17), estando assim ligado à idéia de
rememoração, portando, também características materiais excepcionais. O próprio conceito de
monumento tem sua evolução, que vai levar a adição do adjetivo histórico, a partir do
Renascimento, no século XV, quando o passado coma a ser analisado sob uma perspectiva
histórica até então inédita” (SANT‟ANNA, 1985, p.22) e deixa-se de edificar monumentos
para olhar-se para os monumentos históricos existentes
13
. Porém de acordo com Fonseca, a
preservão destes monumentos históricos, no início mais conhecidos como antiguidades”,
apesar de ter sido sentida como necessária por alguns indivíduos e grupos, se manifestou até o
século XVIII apenas por algumas iniciativas isoladas, formadoras do que chama “o sentido do
patrimônio (FONSECA, 2005, p. 55).
As primeiras preocupações oficiais com a preservação dos monumentos históricos,
surgiram apenas no decorrer no século XVIII, no denominado Século das Luzes, onde os
valores históricos e estéticos do monumento foram amadurecidos e a idéia de nação foi
alterada pelos recém formados Estados Nacionais, que buscaram garantir a coesão do seu
grupo, através da “criação e consolidação de símbolos nacionais (MARCHESAN, 2007, p.32
e 36). Segundo Marchesan (2007, p. 33) , pode-se tomar como marco deste processo
institucional de preservação o advento da Revolução Francesa
14
que “desencadeou diversos
movimentos em torno da questão patrimonial, com ela surgindo poticas públicas necessárias
à preservação e valorização dos bens imóveis representativos da nação”. Contudo, durante
esta Revolução o termo patrimônio foi “forjado para designar bens pertencentes à nação” (o
12
Este conceito atualmente é estudado e empregado em obras de autores na área de direito ambiental e urbano, na medida em
que eles entendem o meio ambiente como “a interação do conjunto de elementos naturais, artificiais, e culturais que
propiciam o desenvolvimento equilibrado da vida em todas as suas formas” (José Afonso da Silva apud Manzato, 2007). Para
maiores conhecimentos sobre esta questão pode-se buscar as obras de Manzato (2007), Marchesan (2007), Reisewitz (2004) e
Richter (1999).
13
De acordo com A. Reigl (apud Choay, 2001) em obra do no começo do século XX, “o monumento é uma criação
deliberada cuja destinação foi pensada a priori, de forma imediata, enquanto o monumento histórico não é, desde o principio,
desejado e criado como tal; ele é constituído a posteriori pelos olhares convergentes do historiador e do amante da arte, que o
selecionam na massa dos edifícios existentes, dentre os quais os monumentos representam apenas uma pequena parte”.
14
A Revolução Francesa é o nome que se deu ao conjunto de acontecimentos que alteraram o quadro político e social da
França, entre os anos de 1789 e 1799.
Capitulo I
A questão do Patrimônio Cultural Edificado
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
35
denominado patrimônio nacional), prevalecendo os bens arquitetônicos excepcionais, os
monumentos históricos, que continham um valor nacional (CHOAY, 2001, p.117).
No início da Revolução Francesa ocorreu o que Choay (2001, p.107-108) denominou
de “vandalismo ideológico”, que foi o estímulo, por parte dos revolucionários, à destruição
ou danificação do patrimônio nacional-histórico por razões ideológicas”, principalmente para
manifestar repúdio aos valores que representavam o poder do antigo regime, “encarnados pelo
clero, pela monarquia e pelos senhores feudais”. Este processo de destruição e perda suscitou
numa reação de defesa por parte dos próprios revolucionários
15
, com o objetivo de conservar
o apenas as igrejas medievais, “mas, em sua riqueza e diversidade, à totalidade do
patrimônio nacional (grifo nosso) (Choay, 2001, p.97), através de procedimentos mais
metódicos para preparar o inventário da herança e definir regras de gestão
16
. Assim, para
Fonseca (2005, p.55):
“Foi preciso que surgissem ameaças concretas de perda dos monumentos,
então valorizados como expressões históricas e artísticas o vandalismo da
reforma e da revolução francesa e uma mística leiga vinculada a um interesse
político especifico - o culto à nação - para que a preservação dos monumentos se
tornasse um tema de interesse público.”
Esta questão da perda, enfatizada por Fonseca, está presente em diversos momentos da
evolução das políticas de preservação patrimoniais, pois a proximidade da perda na cultura
ocidental muitas vezes traz os olhares para aquele bem, o que de certa forma o “valoriza”, ou
seja, passa-se a perceber os valores culturais intrínsecos a ele e, portanto enxergar a
necessidade da sua preservação. No caso da Revolução Francesa, a perda desencadeou em
políticas de preservação que colocaram aquele país pioneiro no cenário mundial nesta
questão, porém segundo Choay (2001, p. 20), as o fim da Revoluçãoencerrou-se os
trabalhos das comissões responsáveis e sua obra não teve continuidade do ponto de vista
oficial (...) mas determinou em longo prazo a evolução da conservação dos monumentos na
França”.
Outra ruptura histórica que também resultou em grandes perdas do patrimônio
edificado, dos denominados na época monumentos históricos, foi a Revolução Industrial que
se espalhou pelo mundo ocidental a partir do século XIX e mudou completamente o modo de
15
De acordo com Choay (1992, p.109) “paradoxalmente, a conservão reacional não emana dos mesmos homens, mas do
mesmo aparelho revolucionário de que deriva o vandalismo ideológico. O Comitê de Instrução Pública e as Comissões de
Arte publicaram quase ao mesmo tempo decretos contraditórios, dos quais os primeiros (destruidores) são anulados ou
atenuados pelos segundos (conservadores)”.
16
Segundo Marchesan (2007, p.33), para inventariar a herança histórica e preparar as regras de geso foi criada em 1789 a
comissão dos ditos Monumentos, que “iniciou pelo tombamento das diferentes categorias de bens recuperados pela Nação.
Em seguida, de acordo com decreto de 1790 promover-se-ia o inventário das categorias e se estabeleceria o estado de
conservação de cada um dos bens”
Capitulo I
A questão do Patrimônio Cultural Edificado
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
36
viver do povo. Com o advento desta revolução, as cidades se transformaram e expandiram
vertiginosamente, todavia sem a regulamentação necessária, levando a uma enorme
degradação do meio ambiente urbano, incluindo muitos monumentos históricos. A partir deste
período, o solo urbano passou a ser muito valorizado tornando-se mercadoria sujeita à
especulação imobiliária e as construções tiveram o custo minimizado e o método construtivo
simplificado devido às novas tecnologias e a produção em série, o que promoveu um maior
número de demolições das edificações para reconstrução de outras que atendessem melhor às
necessidades da época”(CERQUEIRA, 2006, p.6).
A mutação que transforma ao mesmo tempo os modos de vida e a organização
espacial das sociedades urbanas européias torna obsoletos os aglomerados
urbanos antigos. Os monumentos que neles se encontram afiguram-se
subitamente como obstáculos e entraves a serem eliminados ou destruídos para
vagar lugar ao novo modo de urbanização, a seu sistema e escalas viárias e
parcelares.” (CHOAY, 2001, p. 144)
Este icio do período de industrialização levou a fase de “consagração do monumento
histórico europeu, que para Choay (2001, p.44), baseou-se não no reconhecimento de
conteúdos e valores novos, mas “num conjunto de práticas cuja institucionalização foi
catalisada pelo poder das forças destrutivas, não mais deliberadas e ideológicas, mas inerentes
à lógica da era industrial, que doravante ameaçava os monumentos históricos”. O conceito de
monumento histórico, além de ser consagrado neste período, teve a sua preservação ampliada
geograficamente para a escala mundial, principalmente no século XX, o que contribuiu para
acelerar o estabelecimento de leis de proteção, fazer da restauração uma disciplina conhecida
e também facilitar a ampliação do sentido de patrimônio, como ressalta Marchesan.
(...) pondera ter sido conseqüência da Revolução Industrial a ampliação
significativa do sentido de patrimônio, que cede no tocante da monumentalidade
para acolher, além dos bens dotados de valor histórico, científico e arquitetônico,
também aqueles vinculados a artes menores, artes plásticas, artes decorativas,
utensílios cotidianos e industriais. O conceito de bem cultural transcende as
premissas materialistas e histórico-estéticas para abarcar todo e qualquer bem
que constitua manifestação ou testemunho significativo da cultura humana,
patrimônio cultural. (MARCHESAN, 2007, p.40)
No século XX, com o aumento do engajamento internacional nas questões do
patrimônio cultural, são efetuados diversos encontros de entidades internacionais que
contribuíram de sobremaneira para a ampliação e consolidação das poticas e práticas de
preservão do patrimônio cultural. Nestes encontros são produzidas as chamadas “Cartas
Patrimoniais”, as quais de acordo com o IPHAN são “documentos, muitos dos quais firmados
internacionalmente, que representam tentativas que vão além do estabelecimento de normas e
Capitulo I
A questão do Patrimônio Cultural Edificado
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
37
procedimentos, criando e circunscrevendo conceitos às vezes globais, outras vezes locais.
(IPHAN, 2000)
A primeira destas Cartas Patrimoniais foi a Carta de Atenas, produzida a partir da
Conferência de Atenas que aconteceu na cidade de mesmo nome em outubro de 1931 e foi
promovida pela então Sociedade das Nações. De acordo com Araújo (2002, p.33), “a Carta de
Atenas vem consolidar a importância da preservação do patrimônio cultural para a
humanidade e ressaltar a necessidade de atuação conjunta dos Estados na defesa do
patrimônio artístico e arqueológico universal”. Este documento tem como principal objetivo a
proteção física apenas dos "monumentos de interesse histórico, artístico ou científico,
pertencentes às diferentes nações", ou seja, apenas o patrimônio arquitetônico composto por
obras de caráter excepcional e monumental, ligadas a fatos importantes da história oficial do
país. Para Sant‟Anna a Carta de 1931:
“(...) É um documento voltado, principalmente, para o estabelecimento de
princípios gerais para a restauração de monumentos e para a afirmação da
primazia do interesse da coletividade, isto é, do interesse público, sobre a
propriedade privada, questão crucial para a legitimação da proteção legal do
patrimônio naquele momento” (SANT‟ANNA, 1985, p.44)
Muitos outros documentos se sucederam à Carta de Atenas, entretanto vale ressaltar
aqui, devido ao objeto dessa pesquisa, a Carta de Veneza desenvolvida no II Congresso
Internacional de Arquitetos e Técnicos dos Monumentos Históricos, que ocorreu em Veneza
em maio de 1964. Esta Carta representou uma grande mudaa na noção de patrimônio
defendida pela Carta de Atenas, porque além de superar a noção de monumento como obra
independente, isolada, consolidando o fato de que “o monumento é inseparável do meio em
que se situa”
17
, ampliou as tipologias a serem preservadas, incluindo, “também, as obras
modestas que adquirem com o tempo um significado cultural
18
.
De acordo com Araújo (2002, p.36), apesar desta nova concepção de patrimônio na
Carta de Veneza ter sido um grande avanço, foi na década de 1970, com os encontros
mundiais patrocinados pela UNESCO, que vai se sedimentar uma concepção mais ampla e
inovadora do conceito de patrimônio. A partir destes encontros foram produzidas diversas
cartas, podendo-se destacar: a “Carta de Paris” de 1972 que documenta preocupações em
relação à preservação do patrimônio natural além do edificado, “elevando o meio ambiente ao
padrão de maior patrimônio da humanidade” e inserindo este patrimônio nas “poticas
17
CARTA DE VENEZA (1964). Disponível em http://portal.iphan.gov.br/portal/baixaFcdAnexo.do?id=236. Acesso em
março de 2007, artigo 7º.
18
Ibidem, artigo 1º.
Capitulo I
A questão do Patrimônio Cultural Edificado
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
38
públicas e no planejamento urbano”
(ARAUJO, 2002, p. 37). E, também, a “Declaração de
Amsterdã” de 1975 que teve como objetivo a inserção e ampliação da dimensão histórica e
cultural no ambiente urbano e no cotidiano, expressando uma transformação no entendimento
do espaço urbano ao tratar a preservação “enquanto um dos principais objetivos do
planejamento urbano e de uma política de ordenação do terririo(ARAUJO, 2002, p. 39)
Dentro da perspectiva histórica aqui adotada, é importante abordar ainda o documento
produzido na Convenção de Nairobi em 1976, intitulado “Recomendação de Nairobi”. Este
documento tem grande preocupação em integrar os conjuntos históricos e suas ambiências às
exigências da vida contemporânea buscando a implementação de uma potica que oriente a
ordenação urbana e rural e o planejamento sico-territorial. Esta política dentre outras coisas,
deveria “revisar as leis relativas ao planejamento físico-territorial e ao urbanismo, de modo a
coordenar e harmonizar suas disposições com as leis relativas à salvaguarda do patrimônio
arquitetônico (UNESCO. Recomendação de Nairobi, Nairobi, 1976).
Assim, pode-se perceber que as cidades e o ambiente cultural urbano passam a ser
cada vez mais entendidos como parte do patrimônio cultural, tendo no planejamento urbano
um importante aliado para sua manutenção, quando tratado juntamente com as práticas
preservacionistas. Neste sentido novos adjetivos o sendo incorporados à palavra
patrimônio. Contemporaneamente, o conceito de patrimônio ambiental urbano é considerado
por Castriota (2003, p.7) a “matriz a partir da qual podemos pensar hoje a preservação do
patrimônio sem cair nas limitações da visão tradicional”. Autores como Yagizi (2003) e
Meneses (1978, p.45-46) tratam muito bem deste conceito, considerando que ele pode fixar
um quadro referencial indispensável para entender o mundo de hoje, por ser entendido como
um “sistema de objetos socialmente apropriados, percebidos como capazes de alimentar as
representações do ambiente urbano”. Nesta abordagem, o patrimônio deixa de vez de ser
entendido como bens isolados e excepcionais, para ser entendido como bens articulados em
conjunto, inseridos no processo e no cotidiano urbano e, principalmente, sujeitos a uma gama
de valores intangíveis, que o torna importante para uma determinada cidade ou para todo o
planeta.
"Abordar o patrimônio ambiental urbano vai ser assim, como se pode perceber,
muito mais que simplesmente tombar determinadas edificações ou conjuntos: é
antes, conservar o equilíbrio da paisagem, pensando sempre como inter-relacionar
a infra-estrutura, o lote, edificação, a linguagem urbana, os usos, o perfil histórico
e a própria paisagem natural. Não se trata mais, portanto, de uma simples questão
estética ou artística controversa, mas antes da qualidade de vida e das
possibilidades de desenvolvimento do homem.” (CASTRIOTA, 2003, p.8)
Capitulo I
A questão do Patrimônio Cultural Edificado
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
39
Mesmo ainda não se utilizando largamente o conceito de patrimônio ambiental urbano,
o próprio conceito de patrimônio cultural, ao logo do século XX, extrapolou as noções de
monumentos e museus, bases iniciais da atuação das políticas públicas de cultura, para
absorver as noções de urbano, meio ambiente e, mais recentemente, o intangível, o imaterial"
(SILVA, 2006, p.28). Assim, segundo Yazigi (2003, p. 57), hoje, o conceito de patrimônio
pode abarcar um samovar, uma casa, uma cidade, um documento, uma floresta...”. Mas seja
qual for o entendimento, o objeto e o adjetivo atrelado à palavra patrimônio, deve-se ter
sempre em mente que sua significação plenaé alcançada no cotidiano de uma comunidade,
enquanto vivenciado, partilhado pela coletividade e inserido no processo dinâmico que é a
cidade.
1.3 A política e a gestão do patrimônio cultural no
Brasil: breve histórico
No Brasil, como no restante do mundo, a questão do patrimônio e suas políticas
passaram por uma evolução enorme, porém na sociedade brasileira a preocupação com o
patrimônio cultural, principalmente por parte do governo, é relativamente recente. Excetuando
algumas ações isoladas por parte de alguns particulares, foi a partir da década de 1920 que os
movimentos em prol da preservação do patrimônio nacional tomaram corpo. Segundo
Fonseca (2005, p.82) foram dois movimentos que marcaram fortemente este início das
políticas de preservação no Brasil: o movimento modernista e a instauração do Estado Novo,
em 1937, corolário da Revolução de 30”.
Os intelectuais do movimento modernista, que se tornou conhecido após a “Semana de
22”
19
, foram muito importantes na valorização do patrimônio brasileiro, pois foram estes que
iniciaram a implantação da política cultural abrangendo todo o país. Para estes modernistas,
o Brasil adentraria o mundo moderno através da busca de sua identidade própria,
civilizando-se. „Ser brasileiro‟ significava „ser moderno‟ e isto implicava em entender o
próprio Brasil, buscar sua história e suas raízes (SIMÃO, 2001 p.28).
E os modernistas buscaram as raízes por meio das chamadas “caravanas paulistas” que
visitaram as cidades coloniais mineiras durante os anos de 1920. E fascinados, acreditaram
estar ali uma produção artística, genuinamente brasileira (SAN‟ANNA, 1985, p.12),
diferentemente das obras ecléticas inspiradas nos estilos europeus, presentes em São Paulo e
19
A Semana de 22, também conhecida como Semana da Arte Moderna aconteceu em São Paulo em fevereiro de 1922 e
reuniu diversos artistas plásticos, arquitetos, músicos e poetas ligados ao movimento moderno que começava a surgir no
Brasil naquela época.
Capitulo I
A questão do Patrimônio Cultural Edificado
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
40
no Rio de Janeiro naquele momento. Estas visitas suscitaram na valorização e
conseqüentemente na necessidade de preservação e proteção destas obras coloniais,
principalmente as monumentais, que para os modernistas eram fontes de inspiração para
forma e conteúdo de uma autêntica arte moderna brasileira, além de serem formadoras da
identidade nacional a qual buscavam afirmar.
Após a Revolução de 1930, com a instauração da República Nova e posteriormente do
Estado-Novo, as discussões dos modernistas sobre a necessidade de preservação do
patrimônio nacional “acabam indo ao encontro das premissas da realidade potica que os
governantes da época buscavam afirmar e difundir: a hegemonia do Estado brasileiro”(
ARAÚJO, 2002, p.34). Durante todo o governo de Getúlio Vargas (1930-1940), mesmo após
a instauração do Estado Novo em regime ditatorial, o nacionalismo foi exaltado, gerando um
campo procio para o projeto dos modernistas em direção à preservação da identidade e do
patrimônio nacional. Assim pode-se dizer que como na Europa no século XVIII, a noção e as
políticas patrimoniais no Brasil foram institdas oficialmente como formas de construção e
afirmação do nacionalismo.
Foi neste contexto que em 1933 aconteceu à primeira ação real do Governo Federal
sobre a temática patrimonial, através do Decreto n º 22.928, pelo qual a cidade de Ouro Preto
foi erigida à categoria de Monumento Nacional (FERES, 2002, p.16). Segundo Sant‟Anna
(1985, p.122-123), este ato foi o coroamento do esforço de vários intelectuais que, desde o
início da década, mobilizaram-se neste sentido”, porém este decreto “não significou muito em
termos de garantir a preservação da cidade porque não previa nenhum instrumento concreto
de ação de particulares ou do Poder Públicoe, também, porque a idéia por trás do decreto
o era preservar a cidade em si mesma, mas sim o cenário das obras excepcionais que ela
continha.
A primeira Constituição a abordar a preservação do patrimônio foi a de 1934,
colocando a proteção como obrigatória por parte do poder público ao expor em seu artigo 10
que “compete concorrentemente à União e aos Estados (...) proteger as belezas naturais e os
monumentos de valor histórico ou artístico
20
. Tamm nesta constituição é materializado
pela primeira vez o sentido da “função social” da propriedade ao instituir que o direito de
propriedade é garantido, mas “não poderá ser exercido contra o interesse social ou coletivo,
na forma que a lei determinar”
21
.
20
BRASIL. Constituição da República dos Estados Unidos do Brasil de 16 de julho de 1934. Disponível em:
http://www.planalto.gov.br. Acesso em outubro de 2008.
21
Ibidem.
Capitulo I
A questão do Patrimônio Cultural Edificado
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
41
Voltando a aludir aos intelectuais modernistas, tem-se em Mário de Andrade e Lúcio
Costa, dentre outros, os percussores e formadores do corpo técnico inicial do Serviço do
Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (SPHAN)
22,
, que começou a ser organizado em
junho de 1934 e passou a funcionar experimentalmente em 1936, presidido por Rodrigo Mello
Franco de Andrade (FERES, 2002, p.16). E de acordo Marchesan (2007, p.51) “em janeiro do
ano seguinte, o SPHAN foi definitivamente instalado, constituindo-se num dos mais
importantes ícones da cultura preservacionista nacional”.
Uma das prioridades do SPHAN no primeiro momento era a elaboração de um projeto
de lei que regulasse sobre a preservação do patrimônio nacional e para tal foi solicitado a
Mário de Andrade, no ano de 1936, um anteprojeto de lei a pedido do então Ministro da
Educação Gustavo Capanema. Nesse anteprojeto Mário de Andrade “desenvolveu uma
concepção de patrimônio extremamente avançada para seu tempo” (FONSECA, 2005, p.10),
onde este conceito contemplou diversas categorias tipológicas como a arte popular e a
indígena, não envolvendo apenas os bens materiais, mas também os bens imateriais. Porém, o
anteprojeto elaborado por Mário de Andrade acabou sendo pouco aproveitado na construção
do Decreto-Lei 25 que foi sancionado pelo presidente, em novembro de 1937. Segundo
Millet, o anteprojeto de Mario o foi aceito por:
“(...) mesmo considerando sua maior adequação ao ideário modernizador, era
incompatível com o projeto preservacionista das oligarquias, na medida em que
rompe com seus valores identitários, que se pretendia como base preferencial da
própria construção da Nação e inclusive, incorporada pela burguesia industrial”
(MILLET, 1988, p.149)
Agora o Decreto Lei 25-1937 atendia aos interesses políticos em jogo e teve como
base para Fonseca, o modelo francês de potica de preservação “estatal e centralização, que
se desenvolveu em torno da noção de patrimônio, de forma planificada e regulamentadora,
visando o atendimento de interesses poticos do Estado (2005, p.20). Mas nada pode tirar a
importância deste Decreto que foi “a primeira norma de amplitude territorial e substância
nacional a conferir uma potica de patrimônio cultural brasileiro” e utilizada até hoje. A
definição de patrimônio adotada neste Decreto-Lei reflete as premissas da Carta de Atenas”
de 1931, definindo o que se denominou Patrimônio Histórico e Artístico Nacionalcomo:
“(...) o conjunto dos bens móveis e imóveis existentes no País e cuja conservação
seja de interesse público, quer por sua vinculação a fatos memoráveis da história
22
Criado em 1937 como Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (SPHAN), em 1946 passou a ser Diretoria
(DPHAN), e em 1970 Instituto (IPHAN). Uma nova reforma em 1979 transformou o órgão em Secretaria (SPHAN), porém
hoje é novamente Instituto. (SIMÂO, 2001, p.30)
Capitulo I
A questão do Patrimônio Cultural Edificado
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
42
do Brasil, quer por seu excepcional valor arqueológico ou etnográfico, bibliográfico
ou artístico.”
23
O Decreto 25 tem como principal instrumento jurídico o tombamento, que não implica
na aquisição do bem (quando particular) pelo do poder blico, mas “restringe o direito de
propriedade, a partir do momento que o proprietário deverá seguir uma série de normas de
ordem do fazer (conservar) e não fazer (não demolir)” (FERES, 2002, p.17). O tombamento
se caracterizou principalmente pelo reconhecimento do valor do bem, inscrevendo-o em um
dos quatro Livros de Tombo: 1°- Arqueológico, Etnográfico e Paisagístico; - Histórico; 3°-
das Belas-Artes; e 4°- das Artes Aplicadas.
Durante os primeiros 30 anos das poticas de preservação no Brasil, os critérios que
orientavam a seleção de bens a serem inscritos nestes Livros de Tombo baseavam-se nos
ideários modernistas, com o predonio da proteção da arquitetura e dos sítios urbanos do
período colonial brasileiro (SIMÃO, 2001, p.31). Isto se reflete nas áreas históricas tombadas
no início da atuação do SPHAN, que eram todos formados por núcleos homogêneos com
predomínio de características coloniais, como a própria cidade de Ouro Preto e posteriormente
Tiradentes, Recife e Olinda. É importante ressaltar que estes conjuntos urbanos tombados não
eram abordados enquanto organismos vivos e dinâmicos, pois neste momento se tinha como
conceito vigente o de patrimônio como “„cidade monumento‟, ou seja, a cidade histórica era
encarada como um grande quadro estático do passado que deveria ser mantido intacto”
(FERES, 2002, p. 18). As diretrizes de preservação neste período partiam também de valores
fechados de monumentos arquitetônicos e ligados a fatos importantes da história oficial,
avaliando o bem patrimonial por sua relação com eventos edificantes da nacionalidade, ou por
seu caráter singular e excepcional, destacando-se monumentos pontuais na cidade.
Na década de 1950, segundo Sant‟Anna (1985, p.129), comam a acontecer
tombamentos de exemplares do século XIX, como o centro histórico do Rio de Janeiro,
indicando “que o critério de brasilidade foi se flexibilizando”. Porém as mudanças
substanciais nas poticas nacionais de preservação aconteceram a partir da década de 1970,
em um período de grandes transformações poticas e econômicas no país (MILLET, 1988,
p.166). Com o fim do Estado Novo e a principalmente a partir do governo de Juscelino
Kubitschek (1956-1961), começou a arrancada industrial e as cidades passaram a ter um
crescimento vertiginoso, tornando as poticas de preservação atuantes até então insuficientes
para preservar o patrimônio cultural até das cidades consideradas monumentos. O SPHAN
23
BRASIL. Decreto-lei nº. 25, de 30 de novembro de 1937. Organiza a proteção do patrimônio histórico e
artístico nacional. Disponível em: < https://www.planalto.gov.br> . Acesso em: novembro de 2007.
Capitulo I
A questão do Patrimônio Cultural Edificado
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
43
teve que mudar muitas de suas concepções de patrimônio e de atuações preservacionistas
através do apoio técnico da UNESCO, que enviou ao Brasil na década de 1960, após a
publicação da Carta de Veneza, o então Inspetor Principal dos Monumentos Franceses Michel
Parent, que:
“(...) percorreu quase o Brasil inteiro em duas viagens, entre 1966 e 1967. A partir
delas elaborou um relatório que passou a constituir a base de toda a atuação
futura não do SPHAN, mas de todo o governo Federal com relação ao
patrimônio: sua preservação através do planejamento urbano e do turismo”
(SANT‟ANNA, 1985, p.148)
A abertura democrática no final da Ditadura Militar (1964-1985), também ajudou na
instituição de novas poticas de preservação do patrimônio cultural brasileiro, pois “faz com
que novamente os olhares se voltem para as discussões mundiais sobre preservação e traz
nova perspectiva ao patrimônio cultural, visto agora atrelado aos direitos humanos”
(ANDRADE, 2002, p.44). Com as demandas da democratização, surgem poticas de
patrimônio voltadas para as camadas desprivilegiadas, minorias étnicas e religiosas e outros
segmentos da “sociedade” que antes não tinha suas manifestações preservadas.
Nesse momento, a modernização e ampliação da noção de patrimônio e suas práticas,
foi marcada também pela necessidade de olhar para as questões urbanas dos locais de
interesse de preservação, baseando principalmente nas tendências das Cartas Patrimoniais.
Destarte as práticas preservacionistas municipais vão ganhado importância e passando a atuar
em conjunto com as práticas de planejamento e gestão urbana, reforçando a importância do
entendimento do patrimônio ambiental urbano e a busca de mecanismos mais eficientes para a
efetiva preservação do patrimônio nas cidades. O que pode ser confirmado por Miller:
“É através dos encontros internacionais que se introduz no Brasil a tendência de
substituir uma prática de proteção punitiva por uma prática de estímulo à proteção
do bem cultural; em outros termos, a substituição de uma proteção baseada em
legislação que estabelece restrições aos proprietários, por mecanismos
“modernos e ativos que „sensibilizem os agentes urbanos na proteção à coisa
cultural e que devem ser mediatizados pelas instâncias de planejamento urbano
(MILLER, 1988, p.165)
Após o fim da Ditadura é aprovada uma nova Constituição Federal, em 1988, que é
batizada de “Constituição Cidadã” por, além de marcar o processo de democratização do país,
ter em sua nese a interferência de movimentos sociais, como o movimento da Reforma
Urbana
24
. Nesta Constituição pode se perceber o novo entendimento do patrimônio
demonstrando a atualização do pensamento jurídico à contemporaneidade”(FERES, 2002,
24
Para maiores detalhes ver: GRAZIA, 2003, p.53-69.
Capitulo I
A questão do Patrimônio Cultural Edificado
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
44
p.19). Este texto dedicou importante espaço às questões culturais, surgindo no que concerne a
legislação federal o conceito de “patrimônio cultural”, estendendo consideravelmente a noção
e o entendimento de patrimônio presente no Decreto-lei n° 25 de 1937.
Na Constituição, a percepção de preservação passa a se dar a partir de uma grande
preocupação com a qualidade de vida nos territórios urbanos, deixando estes de ser o
congelamento de um tempo passado e se tornando palco de acontecimentos sociais e
culturais” (ARAÚJO, 2002, p.44). Em seu artigo 216, define patrimônio cultural como “os
bens de natureza material e imaterial, tomados individualmente ou em conjunto, portadores de
referência à identidade, à ação e à memória dos diferentes grupos formadores da sociedade
brasileira”, incluindo entre estes bens
“(...) as formas de expressão; os modos de criar, fazer e viver; as criações
científicas, artísticas e tecnológicas; as obras, objetos, documentos, edificações e
demais espaços destinados às manifestações artístico-culturais; os conjuntos
urbanos e sítios de valor histórico, paisagístico, artístico, arqueológico,
paleontológico, ecológico e científico.”
25
O texto Constitucional de 1988 pode ser considerado uma ampliação concreta de ações
públicas relativas à proteção cultural, porque criou toda uma série de novas "linhas de frente"
na questão da preservação do patrimônio cultural. Ele estabeleceu outros mecanismos de
proteção, além do tombamento, e definiu que não é apenas da União, mas também dos
Estados, Municípios e da Comunidade a responsabilidade pela preservação do nosso
patrimônio.
Hoje, os órgãos como o IPHAN no âmbito federal, e IEPHA (Instituto Estadual do
Patrimônio Histórico e Artístico Minas Gerais) e a SEEC (Secretaria de Estado da Cultura
do Paraná) no nível estadual, trabalham na preservação do patrimônio das cidades em
conjunto com os órgãos municipais de cultura e planejamento urbano. Isto leva a uma maior
valorização do patrimônio local, cotidiano, que apesar de muitas vezes não fazer parte do
imaginário nacional, ou ainda não estar “vinculado a fatos memoráveis da hisria do Brasil” -
como disposto no Decreto 25 de 1937 - pode ser importante na construção da memória
coletiva de uma cidade ou de uma comunidade. É justificada a preservação, ou o tombamento,
apenas na esfera municipal ou estadual, pela “impossibilidade prática do poder federal atuar
em todo o território protegendo bens de interesse estadual e municipal” (FERES, 2002, p.19).
Constata-se assim que é de suma importância se internalizar nas poticas de desenvolvimento
urbano as preocupações com a preservação do patrimônio, pois é na esfera municipal que se
25
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil, de 05 de outubro de 1988. Disponível em: <
https://www.planalto.gov.br> Acesso em: agosto de 2007.
Capitulo I
A questão do Patrimônio Cultural Edificado
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
45
pode trabalhar mais facilmente com a absorção da importância da preservação do patrimônio
cultural no cotidiano da sociedade.
Como anteriormente visto, a Constituição Federal de 1988 foi o marco na questão da
descentralização das poticas de preservação do patrimônio e, portanto, fortaleceu a
importância das poticas urbanas municipais direcionadas para a atuação em conjunto com
políticas preservacionistas. Para tanto, nela foi previsto um capítulo
26
que tratou
exclusivamente das políticas urbanas, dispondo de alguns instrumentos que poderiam ser
utilizados pelos municípios em prol da preservação do patrimônio cultural que, entretanto,
necessitavam de uma regulamentação federal. Regulamentação esta que viria a acontecer
em 2001, através da Lei 10.257, denominada Estatuto da Cidade.
O Estatuto da Cidade foi aprovado em 2001, após mais de dez anos tramitando no
Congresso Nacional com sucessivas emendas e substitutivos
27
, e é considerado uma das mais
importantes e inovadoras leis que entraram em vigor recentemente no país (DALLARI, 2002,
p.12). Esta lei viabiliza o capítulo da potica urbana da Constituição, por apresentar as
diretrizes gerais da mesma, além de detalhar a aplicação dos instrumentos previstos neste
documento e referir-se a outros tradicionais, como o tombamento e a desapropriação
28
,
apresentando novos instrumentos que vinham sendo utilizados em diversos municípios e
necessitavam de uma regulamentação na esfera federal. Juntos, estes instrumentos são capazes
de auxiliar as administrações municipais a realizar uma gestão coerente com o conteúdo
Constitucional e, principalmente, responder as demandas da população por direitos básicos”
(GRAZIA, op. cit., p.59), incluindo o direito à memória e à cultura.
Dentre as diretrizes gerais do Estatuto da Cidade, consta a de “proteção, preservação e
recuperação do meio ambiente natural e constrdo, do patrimônio cultural, histórico,
artístico, paisagístico e arqueológico”
29
. Esta proteção deve ser garantida pelos instrumentos
urbanísticos que, atrelados ao princípio da função social da cidade e da propriedade, previstos
na Constituição de 1988, podem ser utilizados na política urbana dos municípios para a gestão
do patrimônio cultural edificado.
26
Titulo VII, Capitulo II, artigos 182 e 183.
27
Para maiores detalhes ver: MOREIRA, 2002, p.27-45
28
O Estatuto da Cidade apenas cita em seu artigo 4° inciso V, os instrumentos de desapropriação e “tombamento
de imóveis ou de mobiliário urbano” como parte dos instrumentos “institutos jurídicos e políticos.
29
BRASIL. Lei Nº 10.257, de 10 de julho de 2001. Regulamenta os artigos 182 e 183 da Constituição Federal,
estabelece diretrizes gerais da potica urbana e dá outras providências. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br > Acesso em: julho de 2007.
Capitulo I
A questão do Patrimônio Cultural Edificado
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
46
Alguns autores através da análise dos instrumentos presentes no Estatuto da Cidade
aludem àqueles que poderão ser utilizados na preservação do patrimônio cultural edificado,
que é enfoque desta pesquisa. Analisando a exposição destes autores, pode-se concluir que de
algum modo a maioria dos instrumentos presentes no Estatuto tem a possibilidade de ter
aplicação com enfoque preservacionista, contudo é importante ressaltar que alguns podem ser
utilizados de uma maneira mais eficaz e direta que outros. Compete destacar aqui alguns
instrumentos que foram considerados como viáveis para a preservação do patrimônio cultural
por Bessa (2004, p.23), Marchesan (2007, p.231-239) e Silva (2006), podendo para maiores
detalhes serem consultadas as obras destes autores. Estes instrumentos são:
Desaproprião com Pagamento de Títulos da Dívida Pública (art. 8º);
Direito de Preempção (arts. 25 a 27);
Outorga Onerosa do Direito de Construir (arts. 28 a 31);
Transferência do Direito de Construir (art. 35);
Operações Urbanas Consorciadas (arts. 32 a 34);
Consórcio Imobiliário (art. 46).
Estudo de Impacto de Vizinhança (arts 36 a 38);
Plano Diretor Participativo (arts. 39 a 42)
Dos instrumentos citados acima, cabe evidenciar a Transferência do Direito de
Construir, que é o objeto de estudo desta pesquisa, sendo um instrumento que tem as raízes e
objetivos ligados diretamente às questões relativas ao patrimônio cultural edificado. No
próximo capítulo ele será melhor detalhado.
Capitulo II
O Instrumento da Transferência do Direito de Construir
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
47
47
CAPITULO II
2. O INSTRUMENTO DA TRANSFERÊNCIA DO DIREITO DE
CONSTRUIR
O avanço das tecnologias de construção civil possibilitou a verticalização das
edificações urbanas através da construção de um número cada vez mais elevado de pisos
sobrepostos e tamm de pisos no subsolo, tornando, deste modo, a propriedade horizontal
passível de receber uma área edificada muito superior a aquela apoiada diretamente sobre o
solo natural. (Figura 2). Segundo Monteiro e Silveira (2002, p.294):
“(...) a partir da constatação da viabilidade de criação artificial de áreas
adicionais ao solo natural, sob a forma de unidades autônomas horizontais,
surge o modelo de construção vertical, que se proliferou a ponto de originar um
novo padrão de cidade: a cidade que não se limita a expano no plano
horizontal, mas que cresce em direção às alturas.”
A verticalização permitiu um maior aproveitamento do solo urbano das cidades,
que vinham sofrendo com o fenômeno da urbanização, levando assim a uma maior
absorção da nova demanda habitacional da população que migrava das regiões rurais.
Porém, esta verticalização não pode ser ilimitada, visto que, para o aumento da densidade
populacional de um local deve-se ter todo um preparo e equilíbrio no que tange à infra-
estrutura e às áreas e equipamentos públicos urbanos, para não prejudicar a qualidade de
vida do lugar. Destarte, cabe ao Poder Público, como principal agente das poticas
urbanas, a responsabilidade de colocar normas e condições para que o direito de construir
de uma propriedade individual seja exercido primeiramente em prol da função social da
Figura 2: Evolução das tendências técnicas construtivas que levaram a
possibilidade gradual de verticalização das construções.
Fonte: VERISSIMO e BITTAR, 1999, p.29.
Capitulo II
O Instrumento da Transferência do Direito de Construir
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
48
48
cidade
30
, pois a destinação que o proprietário ao seu bem gera externalidades que
afetam toda a coletividade” (MANZATO, 2007, p.149).
Para atender à função social, portanto, o direito de construir que é concedido a um
proprietário, fica sujeito a regras de um determinado contexto regulatório urbanístico,
sendo garantido o direito de propriedade, desde que seu exercício guarde relação com uma
finalidade social (MANZATO, 2007, p.129). Basicamente, o direito de construir de uma
propriedade é estabelecido pelo Poder Público proporcionalmente à área do seu terreno,
por meio do coeficiente de aproveitamento sico (relação entre a área edificada e a área
do terreno) definido para a área da cidade em que se encontra a propriedade, sofrendo
limitações tanto horizontalmente (afastamentos máximos) como verticalmente (gabaritos
máximos).
Segundo Gasparini, quando o direito de construir passa a não estar mais sujeito
apenas à vontade do proprietário, coma a ser debatida a hipótese desse direito ser um
direito autônomo em relação ao direito de propriedade e, conseqüentemente, “sendo um
direito aunomo, estaria, em tese, sujeito a negociação entre particulares e entre o
proprietário e o Poder Público”. Estas “negociações” que o autor menciona, tem sido
utilizadas pelo Poder Público brasileiro e de outros países na forma de instrumentos
urbanísticos de natureza jurídica como o Solo Criado ou Outorga Onerosa do Direito de
Construir e a Transferência do Direito de Construir, entre outros. Estes instrumentos têm
como objetivo principal “compatibilizar o crescimento da cidade com as exigências do
bem-estar social” (MONTEIRO e SILVEIRA, 2002, p.296), baseando-se principalmente
na separação do direito de propriedade do direito de construir.
Muitas vezes, a oposição por parte de proprietários às limitações urbanísticas que
causam reduções na expectativa em relação à edificabilidade máxima de sua propriedade
em prol do atendimento de interesses coletivos, como a preservação do patrimônio cultural,
leva a um conflito entre agentes que em nada favorece o cumprimento da função social da
cidade e da propriedade. Para promover uma negociação favorável entre os agentes neste
tipo de conflito, tem-se o instrumento da Transferência do Direito de Construir (TDC).
Através do seu uso, o Poder Público permite a transferência do exercício do direito de
construir de um imóvel para outro imóvel, nos casos em que no primeiro não se pode
exercer o direito de construir em sua plenitude devido a interesses coletivos, como
30
Para complementar o entendimento: “se a cidade possui funções sociais a desenvolver, qualquer propriedade assentada
em seu âmbito de possuir por conseqüência, uma função social que venha a ser compatibilizada com as próprias
funções da cidade”. (MELO, 2002, 105)
Capitulo II
O Instrumento da Transferência do Direito de Construir
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
49
49
exemplifica a Figura 3. Essa transferência de potencial pode ser feita tanto para imóveis do
mesmo proprietário como para imóveis de outros proprietários, mediante uma parceria na
transação de troca entre duas partes: a que cede e a que recebe o direito de construir, numa
relação mediada pelo Poder Público. Deste modo busca-se compatibilizar os interesses do
proprietário com o atendimento satisfatório da função social de uma propriedade.
As discussões do conceito da TDC têm início no âmbito internacional na década de
70 e é utilizado até hoje em países como Estados Unidos, México, França e Nova Zelândia
(GUIMARÃES, 2007, p.21-31) para distintos fins. No cenário nacional, o conceito da
FIGURA 3: Exemplificações hipotéticas de como acontece a TDC de imóveis para outro.
Capitulo II
O Instrumento da Transferência do Direito de Construir
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
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50
TDC também começou a ser discutido na década de 1970, quando foi incorporado nas
legislações de algumas cidades brasileiras, porém realmente efetivado em poucas delas.
Apesar de sua previsão e aplicação desde a década de 1970, a regulamentação formal da
TDC na esfera federal aconteceu em 2001, com a aprovação do Estatuto da Cidade, que
estabeleceu as diretrizes para a viabilidade do capítulo da potica urbana da Constituição
de 1988, fornecendo o suporte jurídico para a atuação dos municípios no seu papel
constitucional de principal executor da política urbana.
2.1 Origens e Institucionalização da Transferência do
Direito de Construir
O instrumento da TDC tem sua origem muito ligada ao conceito de “Solo Criado”,
pois assim como este, ela tem como fundamento principal a separação entre o direito de
propriedade e o direito de construir. Contudo, as propostas do Solo Criado e Transferência
do Direito de Construir são muito diferentes como enfatiza Bitencourt:
“(...) O Solo Criado visa à eqüidade na distribuição dos ônus e benefícios
oriundos da construção do espaço urbano, uma vez que limita o pleno direito
do proprietário privado, que passa a arcar com um ônus na medida em que se
beneficia da infra-estrutura instalada pelo poder público e da valorização dela
decorrente. a Transferência do Direito de Construir constitui-se num
mecanismo compensatório para os proprietários privados de unidades com
restrições construtivas, em face da supremacia do interesse público sobre o
privado”. (BITENCOURT, 2005, p 45)
2.2.1 A Transferência do Direito de Construir no âmbito
internacional
Na esfera internacional, os primeiros discursos sobre a TDC originaram-se dos
debates sobre o Solo Criado na França e na Itália no começo da década de 70 (RIBEIRO E
CARDOSO, 2003, p.120). Segundo Ribeiro e Cardoso (2003, p.120) “o solo criado surge
como uma proposta de enfrentamento dos efeitos perversos da dinâmica capitalista de
produção do espaço urbanoe tem a idéia original nascida na cidade de Roma, na Itália,
em 1971, quando:
“(...) um grupo de especialistas da Comissão Econômica para a Europa da
ONU, juntamente com especialistas em planejamento urbano, habitação e
construção, firmaram um documento defendendo a necessidade de separação
entre o direito de propriedade e o de construir, no qual este último deveria
pertencer à coletividade, donde somente poderia ser concedido aos
particulares por concessão ou autorização do Poder Público.” (RIBEIRO E
CARDOSO, 2003, p.120)
Capitulo II
O Instrumento da Transferência do Direito de Construir
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
51
51
Na França, em 1975 foi instituído o chamado “plafond legal de densité (“teto legal
de densidade”) através da Lei nº. 75-1.328, que estabeleceu um limite legal máximo de
densidade a ser utilizado em todo o país. A legislação proposta tinha como objetivo
corrigir a grande distorção existente entre os preços muito elevados dos terrenos, onde se
podiam construir prédios com alto gabarito e os preços baixos em um bairro vizinho, onde
os limites de construção eram severos (CÂMARA DOS DEPUTADOS, 2005, p.66).
Segundo Melo (2002, p.7), embora esta lei ainda reconheça a inerência do direito de
construir à propriedade do solo, definiu um limite para seu exercício de um para toda a
França e de um e meio para a cidade de Paris. Além desse limite, o direito de construir
passa a pertencer à coletividade, subordinando-se aos interesses desta e podendo ser
concedido pelo Poder Público ao proprietário mediante pagamento de uma soma igual ao
valor do terreno, para ressarcir parte dos investimentos públicos provenientes da
estruturação do espaço urbano (MANZADA, 2007, p.143).
De acordo com Ribeiro e Cardoso (2003, p.121) nos Estados Unidos, mais
propriamente em Chicago, a proposta do Solo Criado introduz o conceito de Transferência
do Direito de Construir, com a denominação de “Space Adrift” (Espaço Flutuante”) no
Plano de Chicago, elaborado por John Costonis em 1973
31
. Este instrumento tinha como
finalidade ajudar a solucionar o problema da proteção do patrimônio arquitetônico em
áreas com alto valor imobiliário, compensando proprietários privados cujos imóveis
preservados estavam submetidos às restrições construtivas, como enfatiza Bitencourt:
“(...) o Plano de Chicago foi motivado pelos conflitos decorrentes da aplicação
da legislação de tombamento de bens com valor histórico. O tombamento de
imóveis com poucos pavimentos em zonas cujos coeficientes permitiam um
grande adensamento construtivo faziam com que os proprietários se sentissem
prejudicados, porquanto estes não poderiam exercer plenamente, sobre os
seus terrenos, o potencial que lhes era concedido pela legislação. Com o
objetivo de compensar tais proprietários, foi criada a TDC, possibilitando-lhes a
transferência do seu direito de construir, em outra áreas onde esta limitação
não existisse” (BITENCOURT, 2005, p.40).
Desta forma, segundo Costonis apud Manzato, a aplicação da TDC acontece
quando o proprietário pode utilizar apenas uma fração do direito de construir previsto para
o seu terreno, sendo o restante transferido para outros lugares, podendo ser até para prédios
vizinhos. Costonis explica, conforme a Figura 4 extrda do seu livro Space Adrif,” como
acontece a TDC no caso de prédios vizinhos:
31
O autor detalha a aplicação do “Plano de Chicago” em seu livro Space Adrift publicado em 1974.
Capitulo II
O Instrumento da Transferência do Direito de Construir
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
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52
O Plano proposto por Costonis foi aprovado pelo Estado de Ilinois e utilizado tanto
em Chicago como em outras cidades do Estado. Ele previa a operacionalização da TDC
através de um “banco de direitos de construção” administrado pelas autoridades blicas
(RIBEIRO E CARDOSO, 2003, p.121). Neste banco, os créditos ofertados eram o
potencial construtivo não utilizado dos imóveis históricos, devido às restrições construtivas
necessárias para sua preservão.
Estas experiências internacionais tiveram forte inflncia na concepção e na
proposta dos instrumentos ligados ao Solo Criado aqui no Brasil. Segundo Manzato, a
TDC proposta aqui foi influenciada diretamente pela experiência de Chicago e o Solo
Criado (que posteriormente foi denominado Outorga Onerosa do Direito de Construir) foi
bastante influenciado pela experiência francesa (MANZATO, 2007, p. 147).
2.2.2 A Transferência do Direito de Construir no Brasil
Tal qual em outros países, as discussões sobre o instrumento da TDC por técnicos e
intelectuais brasileiros iniciaram-se na década de 1970, como um dos pressupostos
indispensáveis para a corporificação do Solo Criado e, portanto, torna-se indispensável que
a análise dos fundamentos da TDC seja procedida no bojo do instituto do solo criado
(MONTEIRO E SILVEIRA, 2002, p.295). O Solo Criado foi o primeiro instrumento desta
Figura 4: Exemplo hipotético da TDC em Chicago-EUA
Explicação de Costonis apud Manzada: “A propriedade construída (A) utiliza
apenas uma fração do direito de construir do local. O restante (B) é transferido a
vários outros lugares em apenas uma região de transferência e se mostra como
potencial adicional (C) nos prédios da vizinhança”
Fonte: Manzada, 2007, p.154.
Capitulo II
O Instrumento da Transferência do Direito de Construir
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
53
53
natureza a aparecer nas discussões das administrões públicas brasileiras. Segundo
Ribeiro e Cardoso (2002, p.122), estas discussões começaram incipientes em 1974, após
um seminário promovido pela prefeitura da cidade de São Bernardo do Campo no estado
de São Paulo, onde foram reunidas várias entidades municipais de urbanização, sendo a
proposta então lançada à discussão”.
Entretanto o debate mais significativo sobre a criação de solos e que acabou
levando a um documento muito importante, tanto para a concepção do Solo Criado como
da TDC, foi o promovido a partir de 1975 pelo órgão de apoio ”da administrão paulista,
o então Centro de Estudos e Pesquisas em Administração Municipal (CEPAM), atual
Fundação Prefeito Faria Lima. Com o objetivo de dar suporte às discussões que se vinha
acalentando sobre o solo criado, o CEPAM organizou em dezembro de 1976 um
Congresso que tinha este instrumento como tema, na cidade de Embu-SP, reunindo
urbanistas, arquitetos, juristas e economistas e resultando na produção da chamada “Carta
de Embu”.
De acordo com Gaio (2002, p.87), foi por meio da Carta de Embu que a idéia de
solo criado e da transferência do direito de construir ganhou visibilidade nacional”. No
bojo desta carta, encontram-se considerações importantes que levam à fundamentação
teórica do solo criado, definido como toda edificação acima do coeficiente único, quer
envolva a ocupação de espaço aéreo quer a de subsolo (SILVA apud MONTEIRO E
SILVEIRA, 2002, p.293). Essa definição do solo criado presente na carta parte da iia de
que:
“(...) assim como o loteador é obrigado a entregar ao Poder Público, áreas
destinadas ao sistema viário, equipamentosblicos e lazer, igualmente, o
criador de solo deverá oferecer à coletividade as compensações necessárias
ao reequilíbrio urbano reclamado pela criação do solo adicional” (SILVA apud
MONTEIRO E SILVEIRA, 2002, p.293).
A partir da definição do solo criado e da admissão de um coeficiente básico a ser
utilizado pelo proprietário urbano sem contrapartida à coletividade, a carta expõe em seus
dois últimos itens a idéia da TDC, mesmo ainda não a tendo nomeado, como pode se
apreender abaixo:
“2.1. O proprietário de imóvel sujeito a limitações administrativas, que impeçam
a plena utilização do coeficiente único de edificação, poderá alienar a parcela
não-utilizável do direito de construir.
2.2. No caso de imóvel tombado, o proprietário poderá alienar o direito de
construir correspondente à área edificada ou ao coeficiente único da
edificação.” (SILVA apud MONTEIRO E SILVEIRA, 2002, p.293)
Capitulo II
O Instrumento da Transferência do Direito de Construir
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
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54
Em 1977, no âmbito de toda essa discussão em vel nacional, foi formulada uma
primeira tentativa de introdução dos instrumentos do Solo Criado e da TDC em lei federal.
Esta tentativa se deu através do denominado Anteprojeto da Lei de Desenvolvimento
Urbano, elaborado pelo Conselho Nacional de Potica Urbana (CNPU) e, ao ser enviado
para a Câmara dos Deputados em 1983, transformou-se no Projeto de Lei 775/83
(BITENCOURT, 2005, p.41). Moreira (2002, p.32), mencionando o Projeto de Lei 775,
afirma que este condicionou o uso do solo e o direito de construir à função social da
propriedade, criando novos instrumentos jurídicos e administrativos como “o direito de
transferência do potencial construtivo para garantir a preservação do patrimônio
urbanístico, artístico, arqueológico e paisagístico, bem como para a implantação de
equipamentos urbanos e comunitários”.
O Projeto de Lei de 1977 acabou por fazer parte de uma luta maior desencadeada
pelos movimentos sociais urbanos, a luta por Reforma Urbana Nacional
32
. No entanto, este
Projeto de Lei tramitou no Congresso, recebendo muitas alterações advindas
principalmente de entidades privadas vinculadas ao setor imobiliário, sem aprovação até a
promulgação da Constituição de 1988 (MOREIRA, 2002, p.32). Segundo Cardoso (2002,
p.29), juntamente com toda a movimentação e as lutas empreendidas pelo Movimento
Nacional de Reforma Urbana, “o acúmulo de debates e propostas que cercaram a discussão
do PL 775 na mara permitiu que rias propostas fossem formuladas, tendo em vista a
elaboração de um capítulo específico no texto constitucional, referente à potica urbana”.
O Capítulo da Constituição que Cardoso menciona é o Capitulo II do Título VII, que
incorpora os artigos 182 e 183 e tem como principal diretriz o cumprimento da função
social da propriedade e também da cidade
33
, em busca de uma melhor qualidade de vida
para as populações. Para tal, neste Capítulo que trata da Política Urbana estão presentes
alguns instrumentos urbanísticos previstos no PL 775/83, porém:
“(...) apesar do longo caminho percorrido pelo Movimento Nacional de Reforma
Urbana poucos instrumentos propostos na PL n.º 775/83 foram incorporados
ao Capítulo da Política Urbana da Constituição Federal de 1988, abrindo-se a
possibilidade, porém, a algumas municipalidades de proporem e regularem
ditos instrumentos por específica legislação municipal.” (BITENCOURT, 2005,
p. 56)
Dos instrumentos previstos na Constituição Federal de 1988 não foram incluídos
nem o Solo Criado nem a Transferência do Direito de Construir, discutidos há muitos anos
32
Para maiores detalhes ver: GRAZIA, 2003, p.53-69.
33
De acordo com Cardoso este “texto constitucional institui uma figura até então inexistente: a „função social da cidade‟.
Capitulo II
O Instrumento da Transferência do Direito de Construir
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
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55
no Brasil. Contudo, ao subordinar o direito à propriedade urbana ao cumprimento da
função social da cidade e da propriedade, sujeitando o uso do solo urbano e o próprio
direito de construir aos interesses coletivos, o texto constitucional possibilita aos
legisladores dos municípios instituírem outros instrumentos normativos, como o Solo
Criado e a TDC (MONTEIRO E SILVEIRA, 2002, p.299). Este respaldo dado aos
municípios pela Constituição permitiu que muitos utilizassem instrumentos como a TDC, o
que segundo Bitencourt gerou muitas discussões quanto à constitucionalidade desta
aplicação (MONTEIRO E SILVEIRA, 2002, p.290). Porém, ainda faltava uma lei federal
para prever e detalhar a aplicação destes instrumentos, bem como regulamentar os
instrumentos incorporados pelo CF de 1988. Esta lei tão aguardada veio a ser aprovada no
ano de 2001, com o nome de Estatuto da Cidade (Lei 10257/2001), consolidando o
instrumento da TDC na legislação brasileira no âmbito federal.
2.2.3 A Transferência do Direito de Construir no Estatuto
da Cidade.
O Estatuto da Cidade, segundo Dallari e Ferraz é considerado uma das mais
importantes e inovadoras leis que entraram em vigor recentemente no país, outorgando
contornos à fuão social da propriedade estabelecida pela CF de 1988 e trazendo como
grande novidade “a criação de instrumentos que possibilitarão uma intervenção mais
concreta e efetiva do Poder Público no desenvolvimento urbano” (DALLARI; FERRAZ,
2002, p.90).
Dentre os diversos instrumentos da política urbana que o Estatuto da Cidade
apresenta em seu Capitulo II, está o instrumento da Transferência do Direito de Construir
(artigo 35), bem como o da Outorga Onerosa do Direito de Construir (artigo 28 a 31), por
muito tempo denominado Solo Criado. Como o objeto dessa dissertação é o instrumento da
Transferência do Direito de Construir, este será tratado com maior ênfase.
O Estatuto não detalha a operacionalização e as condições relativas de aplicação do
instrumento da TDC, deixando isso a cargo de uma Lei Municipal Específica que deverá
ser baseada no Plano Diretor Municipal. Entretanto, no caput do artigo 35, o texto do
Estatuto deixa claro o objetivo principal do instrumento, que não difere muito de outros
textos já mencionados e enfatiza a importância da Lei Municipal, oferecendo também a
possibilidade dele ser aplicado tanto em imóveis públicos como em imóveis privados:
Capitulo II
O Instrumento da Transferência do Direito de Construir
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
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56
“Art. 35. Lei municipal, baseada no plano diretor, poderá autorizar o proprietário
de imóvel urbano, privado ou público, a exercer em outro local, ou alienar,
mediante escritura pública, o direito de construir previsto no plano diretor ou em
legislação urbanística dele decorrente (...)”
Além disso, vale ressaltar que como consta no caput acima transcrito, o Estatuto da
Cidade permite não somente ao proprietário exercer em outro local de sua propriedade o
direito de construir, mas alienar para outro proprietário, mediante escritura pública e nas
mesmas condições, o potencial construtivo previsto no Plano Diretor ou em outra
legislação, o qual ele não possa exercer no imóvel de sua propriedade.
O instrumento da TDC foi concebido originalmente para ser usufruído pelos
proprietários de imóveis que sofrem com restrições no direito de construir devido à
necessidade de preservação do ambiente natural e construído
34
, tanto que foi aplicado em
alguns municípios para este fim mesmo antes da regulamentação pelo Estatuto. Porém, o
texto do Estatuto da Cidade traz uma ampliação dos objetos passíveis de gerar a
transferência do direito de construir, possibilitando que o instrumento possa ser aplicado
tanto em imóveis onde incida o interesse de preservação histórica, ambiental, paisagística,
social ou cultural; quanto em imóveis necessários para fins de implantação de
equipamentos urbanos e comunitários; ou ainda servir a programas de regularização e/ou
urbanização de áreas ocupadas por população de baixa renda como as favelas e
implantação de habitação social.
A publicação “Estatuto da Cidade: guia para implementação pelos municípios e
cidadãos”, da Câmara dos Deputados (CÂMARA DOS DEPUTATOS, 2005, p. 122), ao
tratar sobre o instrumento da TDC no Estatuto da Cidade exemplifica bem como este
poderá ser aplicado em cada uma das finalidades presentes no Estatuto, cabendo aqui
ressaltar estas exemplificações para um maior entendimento da aplicabilidade do
instrumento:
No caso de imóveis necessários para fins de implantação de equipamentos
urbanos e comunitários:
“(...) os proprietários de imóveis urbanos não utilizados, não edificados ou
subutilizados definidos no Plano Diretor, considerados como imóveis que não
cumprem a função social, poderão ter seus imóveis destinados para a
implantação de equipamentos urbanos e comunitários nos termos de lei
municipal específica exigida pelo § do artigo 182 da Constituição. Neste
caso, esta lei municipal pode permitir a transferência do direito de construir
34
Como podemos perceber nos caso da aplicação da TDC em Chicago e também em sua previsão na Carta de Embu.
Capitulo II
O Instrumento da Transferência do Direito de Construir
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
57
57
para outro local, de modo que sejam implantados no imóvel os equipamentos
necessários.” (CÂMARA DOS DEPUTATOS, 2005, p. 122)
no caso dos imóveis necessários para programas de regularização fundiária,
urbanização e habitação de interesse social:
“[...] o Plano Diretor pode definir como Zonas Especiais de Interesse Social as
áreas ocupadas por população de baixa renda que serão regularizadas e
urbanizadas, bem como as áreas urbanas não utilizadas ou subutilizadas de
modo que sejam utilizadas para fins de habitação de interesse social.
A conjugação das ZEIS com a transferência do direito de construir pode
permitir a solução amigável de diversos conflitos de terra urbana, e de moradia
existentes nas favelas e cortiços com a possibilidade de doação dos imóveis
pelos particulares ao Poder Público nos termos do § do artigo 35.”
(CÂMARA DOS DEPUTATOS, 2005, p. 122)
No caso específico dos imóveis de interesse histórico, ambiental, paisagístico,
social ou cultural, os quais se enquadram o objeto desta dissertação, a publicação
enfatiza que o instrumento:
[...] já vem sendo aplicado em diversos Municípios para os imóveis que o
declarados através do instituto do tombamento de interesse histórico ou
paisagístico.
Uma área litorânea com imóveis de baixo potencial construtivo pode ser
definida como área de preservação ambiental de modo a impedir a
verticalização que acarretará um impacto ambiental, social e cultural
negativo para a cidade, pode ser objeto do instrumento da transferência
do direito de construir.
Também pode ser utilizado no caso de um imóvel estar situado numa área
declarada de proteção aos mananciais, o que restringe o direito de construir a
um potencial de construção menor que o definido para a zona urbana da
cidade. (CÂMARA DOS DEPUTATOS, 2005, p. 122)
Tanto no caso dos bens de interesse de preservação, como nos outros dois, a Lei
Municipal específica mencionada no Estatuto da Cidade é de extrema importância, pois
ela, juntamente com o Plano Diretor, i guiar os caminhos da aplicabilidade e da
operacionalização do instrumento pelo Poder Público em cada município, considerando as
especificidades de cada lugar. Assim, cabem a estas leis, dentre outras questões: (a) definir
para quais finalidades de restrão do direito de construir previstas no Estatuto
(implantação de equipamentos, preservação, habitação social) a necessidade de o
instrumento ser utilizado naquele município; (b) definir e delimitar as áreas da cidade onde
o instrumento poderá ser aplicado, tanto transferindo direito de construir como recebendo;
(c) determinar o limite máximo de potencial construtivo do imóvel gerador que poderá ser
transferido e, também, o limite máximo que cada imóvel poderá receber; (d) definir as
condições de transferência, se poderá ser de uma única vez ou aos poucos, parcelada para
Capitulo II
O Instrumento da Transferência do Direito de Construir
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
58
58
rios imóveis ou para apenas um; (e) definir os procedimentos de controle das
transferências na prefeitura e da utilização do imóvel gerador, bem como as modalidades
de extião da transferência e as obrigações tanto do proprietário como do Poder Público
35
.
35
Partes destas informações foram retiraras de MARA DOS DEPUTADOS, 2005, p.123.
Capitulo II
O Instrumento da Transferência do Direito de Construir
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
59
59
Figura 5: III Avenida Perimetral, onde segundo
Guimarães (2007, p.105) a TDC foi utilizada.
Fonte: Prefeitura de Porto Alegre.
2.3 Experiências nacionais da previsão e aplicação da
TDC
No Brasil, como foi mencionado anteriormente, alguns municípios previram em
suas leis e até aplicaram o instrumento da TDC antes de sua regulamentação em nível
federal no ano de 2001 pelo Estatuto da Cidade. Estas previsões e aplicações basearam-se
tanto nas discussões difundidas a partir da Carta de Embu como nas experiências
estrangeirais, tendo sido ampliadas principalmente a partir da aprovação da Constituição
Federal de 1988 (MANZATO, 2007, p. 155).
A TDC foi prevista em leis municipais das cidades de Belém (PA), Belo Horizonte
(MG), Campinas-SP, Campo Grande (MS), Curitiba (PR), Goiânia (GO), Natal (RN),
Porto Alegre (RS), Recife (PE), Salvador (BA), São Paulo (SP), Uberlândia (MG), Viçosa
(MG), Vitória (ES), dentre outras
36
. Entretanto, obtiveram-se informações
37
da aplicação do
mesmo em poucas cidades, podendo-se destacar as cidades de Belo Horizonte, Campo
Grande, Curitiba, Porto Alegre, Salvador, São Paulo e Viçosa, tendo cada uma destas
cidades toda uma especificidade de aplicação e operacionalização que vale a pena estudar
detalhadamente. No caso desta dissertação, se estudará nos capítulos seguintes de forma
mais detalhada apenas os casos de
aplicação da TDC nas cidades de Belo
Horizonte e Curitiba, contudo vale a
pena discorrer um pouco sobre algumas
das experiências de outros municípios
quanto à previsão e aplicação da TDC,
baseado em fontes de pesquisas
secundárias.
Na cidade de Porto Alegre, o
instrumento da TDC é denominado
Transferência do Potencial Construtivo
(TPC) e tem sua origem em 1975 no Decreto 5.162/75. Neste decreto, o instrumento,
36
Estas cidades foram citadas como municípios onde houve ou legislação prevendo o instrumento da TDC por:
BITENCOURT, 2005, p.45; MARA DOS DEPUTADOS, 2005, p. 239; GAIO, 2002, p. 85; GASPARINE, 2005,
p.74; GUIMARÃES, 2007, p.34; LUCCHESE, 2001, p.342; MANZADA, 2007, p.155; MELO, 2002, p. 132,
MARCHESAN, 2007, p.237.
37
Estas informações foram extraídas de: BITENCOURT, 2005; MARA DOS DEPUTADOS, 2005, p. 239; GAIO,
2002; GUIMARÃES, 2007; MANZADA, 2007, p.176-181; MELO 2002;
Capitulo II
O Instrumento da Transferência do Direito de Construir
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
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60
previsto ainda de forma embrionária, de ser utilizado no caso de desaproprião
necessária para recuos viários ou áreas verdes através da computação do potencial
construtivo da parte desapropriada na parte remanescente do próprio terreno (GAIO, 2002,
p.82). Esta forma embrionária foi ampliada no ano de 1979 pelo I Plano Diretor de
Desenvolvimento Urbano (I PDDU)
38
de Porto Alegre, quando foi autorizada “a
transferência do potencial construtivo a terceiros, sendo o imóvel doado àquele município
para a implantação de equipamentos públicos, tais como praças e parques”( GAIO, 2002,
p.85). Segundo Guimarães, com a lei de 1979, a TPC passou a ser mais atrativa ao
mercado imobilrio, pois o uso do potencial transferido não estava mais restrito apenas às
áreas remanescentes dos terrenos, mas as áreas dentro da mesma Unidade Territorial de
Planejamento (UTP), e que, no caso de imóveis de interesse de preservação, o potencial
poderia ser utilizado em outra UTP (GUIMARÃES, 2007, p.43).
O Plano Diretor subseqüente de Porto Alegre, Lei 434 de 1999, não alterou
muito o Plano Direto de 1979, mantendo o raciocínio básico que permeia a utilização do
instrumento naquela cidade. De acordo com Guimarães, este raciocínio é aquele que “parte
da idéia de que o município poderá fazer uso de potenciais construtivos não utilizados em
áreas públicas para outorgá-los a proprietários privados, mediante permuta (TPC) ou
onerosamente (Solo Criado)” (GUIMARÃES, 2007, p.43). Neste Plano são estabelecidos
diversos critérios para a aplicação do instrumento na cidade, valendo a pena destacar aqui
as finalidades colocadas como passíveis à utilização da TPC:
“Art. 51. Denomina-se Transferência de Potencial Construtivo a possibilidade
do Município de transferir o direito correspondente à capacidade construtiva
das áreas vinculadas ao sistema viário projetado, à instalação dos
equipamentos públicos arrolados no § 1º do art. 52
39
, bem como à preservação
de bens tombados, como forma de pagamento em desapropriação ou outra
forma de aquisição.
40
Em São Paulo, segundo publicação da Câmara dos Deputados de 1982, foi
apresentado um anteprojeto de Lei de Transferência do Direito de Construir para imóveis
históricos como reação às continuas demolições de construções históricas tombadas
localizadas em áreas de alto valor imobiliário, principalmente a dos casarões na Avenida
38
Lei Complementar n°43/2979, que foi aperfeiçoada, tendo nova redação, em 1987 pela Lei Complementar 158/87.
39
Art.52. §1º Os equipamentos públicos cujo potencial construtivo é passível de transferência são: I - praças e parques
municipais; II - equipamentos municipais, tais como: de ensino, de saúde, de transporte e de lazer e cultura, constituídos
de auditórios, cinemas e teatros; III - equipamentos municipais de abastecimento de água e de esgoto cloacal ou pluvial.
40
PORTO ALEGRE, Lei Complementar 434, de 1999. Dispovel em:
http://www.portoalegre.rs.gov.br/planeja/lc463.htm. Acesso em: dezembro de 2009.
Capitulo II
O Instrumento da Transferência do Direito de Construir
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61
61
Paulista (CÂMARA DOS DEPUTADOS, 2005, p.67). Porém, o instrumento foi
institucionalizado em 1984 pela Lei n.º 9.725, de autoria da Secretaria Municipal de
Planejamento de São Paulo (SEMPLA), dispondo em seu 1° artigo que:
“(...) o potencial construtivo dos imóveis de caráter histórico ou de excepcional
valor artístico, cultural ou paisagístico, preservados por lei municipal, poderá
ser transferido, por seus proprietários, mediante instrumento público,
obedecidas as disposições desta Lei” (SÃO PAULO apud MANZATO, 2007,
p.155)
Em 1986, foi aprovada em São Paulo a Lei Municipal 10.209, que buscava uma
nova aplicação da iia da TDC, desta vez como mecanismo de desfavelização” que ficou
conhecido como operações interligadas, segundo a qual:
“(...) os proprietários de terrenos ocupados por favelas ou núcleos poderão
requerer, à Prefeitura do Município de São Paulo, a modificação dos índices e
características de uso e ocupação do solo do próprio terreno ocupado pela
favela, ou de outros, de sua propriedade, desde que se obriguem a construir e
doar, ao Poder Público, habitações de interesse social para a população
favelada (GASPARINI, 2005, p.75)
O instrumento foi, no entanto
pouco utilizado, sendo legalizada apenas
uma transferência em 10 anos
(BITENCOURT, 2005, p 44). Esta
aplicação foi feita em um casarão na
Avenida Paulista, a denominada Casa das
Rosas (Figura 6), que é um imóvel da
década de 1930 tombado pelo Poder
Público e considerado de interesse histórico
e cultural, o qual vinha sofrendo a forte pressão da especulação imobiliária que acabou por
destruir boa parte dos casarões da mesma época naquela avenida (CÂMARA DOS
DEPUTADOS, 2005, p.123). Freitas apud Bitencourt (2005, p.44) afirma que são vários os
motivos para a não efetividade do instrumento na cidade São Paulo, os principais são o
caráter complexo para a implementação da lei e por ser considerada, pelos empreendedores
imobiliários, menos atrativa que o instrumento das Operações Urbanas Interligadas”, o
qual foi implantado na cidade a partir da década de 1980, quando lidava com a criação de
solo de uma maneira muito mais flexibilizada do que a prevista na lei da TDC
41
.
41
Para maiores informações ver CÂMARA DOS DEPUTADOS, 2005, p. 68.
Figura 6: Casa das Rosas Av. Paulista, SP
Fonte: www.sampaonline.com.br .
Capitulo II
O Instrumento da Transferência do Direito de Construir
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62
62
Após a aprovação do Estatuto da Cidade, o município de São Paulo instituiu o seu
Plano Diretor Estratégico através da Lei 13.430 de 2002, tendo o Estatuto como base
para todas as proposições. Esta lei trouxe a TDC dentre os seus instrumentos urbanísticos e
teve suas normas complementadas em 2004 pela Lei 13.885 (MANZATO, 2007, p.179).
Nelas, a TDC é passível de ser utilizada para as mesmas finalidades previstas no Estatuto
da Cidade, sendo que, no caso da finalidade ser a de preservação, são incluídos os imóveis
localizados nas chamadas ZEPEC (Zonas Especiais de Preservação Cultural)
42
e imóveis
objetos de Operações Urbanas. Nestas duas leis são detalhados diversos parâmetros para a
aplicação e a operacionalização da TDC no município de São Paulo, incluindo as fórmulas
para cálculos das áreas a serem recebidas e transferidas e ainda informações para o
controle das transferências
43
.
Em Salvador, a Transferência do Direito de Construir, conhecida pela abreviatura
Transcon, foi instituída pela Lei 3.805 de 1987, onde foram detalhadas diversas
questões referentes à aplicação do instrumento na cidade. Nesta lei, o proprietário era
autorizado a exercer o potencial em outro local, desde que doasse ao Poder Público o seu
imóvel. O instrumento deveria ser utilizado para fins de:
“(...) preservação de áreas de interesse do patrimônio histórico, artístico,
paisagístico e ecológico, implantação de infra-estrutura urbana, equipamentos
urbanos ou comunitários, ou utilização pelo próprio Município, regularização de
situação fundiária e formação de estoque de terrenos pelo Município.”
(MANZATO, 2007, p.155)
No ano de 1990, a Lei Orgânica do Município de Salvador absorveu uma parte da
Lei de 1987, reafirmando o uso da Transcon na cidade. Nesta lei acontece uma ampliação
nas formas de aplicação do instrumento, pois passa a ser permitido aos proprietários de
imóveis de interesse de preservação, além de exercer, alienar a terceiros o direito de
construir que o pode ser utilizado no seu terreno(GUIMARÃES, 2007, p.52). De acordo
com Guimarães (2007, p.52), na Lei Orgânica igualmente fica estabelecida, como na
experiência de Porto Alegre, a possibilidade das “indenizações referentes às
desapropriações de infra-estrutura ou equipamentos urbanos ou comunitários serem
satisfeitas mediante a transferência do direito de construir para o proprietário, desde que
haja a sua concordância (GUIMARÃES, 2007, p.52). Nesta lei ainda são estabelecidos
42
De acordo com o artigo da Lei 13.430/2002 as Zonas de Preservação Cultural - ZEPEC são porções do território
destinadas à preservação, recuperação e manutenção do patrimônio histórico, artístico e arqueológico, podendo-se
configurar como sítios, edifícios ou conjuntos urbanos” (MANZATO, 2007, p.179)
43
Para maiores informações sobre este assunto favor consultar Manzato, 2007, p.179-181.
Capitulo II
O Instrumento da Transferência do Direito de Construir
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
63
63
critérios para a valoração do potencial construtivo a ser transferido, determinando uma
obrigatória proporcionalidade entre os valores dos imóveis transmissores e receptores” (
GUIMARÃES, 2007, p.830).
O Plano Diretor de 2004, institdo pela Lei 6.586/2004, estabelece entre seus
instrumentos de política urbana a TDC e contém alguns critérios especiais para a aplicação
da Transcon, contudo sem muitos detalhes sobre as formas e os fins de sua aplicação.
Portanto, seguem vigentes como bases legais para a instituição do instrumento no
município a Lei 3.805/1987 e a Lei Orgânica de 1990, aludidas acima. É importante
salientar outra finalidade para a aplicação da Transcon que está prevista artigo 121,
parágrafo único do Plano Diretor:
“O terreno que tiver seu respectivo Coeficiente de Aproveitamento Básico
ampliado em relação ao vigente previsto pela Lei 3.377/84 e suas
modificações posteriores deverá utilizar-se dos instrumentos de Transferência
do Direito de Construir ou da Outorga Onerosa como pagamento do diferencial
do potencial construtivo para beneficiar-se desse novo parâmetro.”
(SALVADOR, 2004)
Não se sabe ao certo o quanto o instrumento foi utilizado na cidade de Salvador,
mas confirma-se sua utilização através das informações extrda de Guimarães (2007, p.
51-53). Esta autora menciona que os principais problemas na aplicação da Transcon
decorrem principalmente da pressão exercida no mercado imobiliário, pois os estoques de
potencial construtivo são grandes e, portanto, grande pressão dos proprietários para ser
exercido de forma mais abrangente possível” (GUIMARÃES, 2007, p. 45). Este estoque é
grande por na cidade, além de ser aplicado o instrumento da Transcon, também ser
utilizado o instrumento da Outorga Onerosa do Direito de Construir, cabendo deste modo,
ao Poder Público regular melhor os parâmetros de utilização dos dois instrumentos.
Destarte falar sobre a proposta de revisão do Plano Diretor de Salvador, Guimarães
enfatiza que:
“A intenção é de não deixar a Outorga Onerosa do Direito de Construir e a
Transcon como instrumentos concorrentes, mas sim como instrumentos
complementares, definindo em quais áreas seriam aplicados os instrumentos,
não havendo aplicação simultânea sobre a mesma área.” (GUIMARÃES, 2007,
p.99)
Capitulo IV
A Aplicação da TDC em Curitiba
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
64
CAPITULO III
3. A APLICAÇÃO DA TRANSFERÊNCIA DO DIREITO DE
CONSTRUIR EM CURITIBA
A cidade de Curitiba é a capital do Estado do Paraná (PA) e localiza-se a noventa
quilômetros do Oceano Atlântico na região leste deste estado (Figura 7). Foi fundada
oficialmente em 1693, como Vila da Nossa Senhora da Luz dos Pinhais
44
e abriga
atualmente uma população de 1.797.408 (um milhão setecentos e noventa e sete mil
quatrocentos e oito)
45
habitantes distribuída em seus 435 (quatrocentos e trinta e cinco)
quilômetros quadrados de terririo
46
. Geograficamente a área do município esta localizada
em um planalto com terreno levemente ondulado, onde estão presentes seis bacias
hidrográficas principais, sendo a bacia do Rio Barigui a que abrange maior parte do
território da cidade (ESTRADA, 2006, p. 107).
44
Informação extraída do Histórico de Curitiba contido no IBGE Cidades@. Disponível em:
http://www.ibge.gov.br/cidadesat/topwindow.htm?1. Acesso em junho de 2009.
45
População no ano de 2007 segundo o IBGE. Disponível em: <http://www.ibge.gov.br/cidadesat/topwindow.htm?1>.
Acesso em: março de 2009
46
Informação extraída do IBGE. Disponível em: <http://www.ibge.gov.br/cidadesat/topwindow.htm?1> .Acesso em:
março de 2009.
Figura 7: Mapa com a localização de Curitiba
Capitulo IV
A Aplicação da TDC em Curitiba
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
65
Com uma história de ocupação que data do início do século XVII, Curitiba passou
por muitos ciclos econômicos que marcaram fortemente sua paisagem urbana. Uma
paisagem que sempre teve como pano de fundo o ordenamento territorial, guiado por
muitos planos urbanísticos e preocupações ligadas a esta esfera. Muitas foram as
intervenções estruturais, remodelando ruas e abrindo avenidas, que juntamente com um
acelerado crescimento populacional advindo da imigração, contribuiu para que se perdesse
grande parte do patrimônio cultural edificado da cidade. Mas também foram medidas
ligadas ao planejamento urbano que desencadearam a potica de preservação do
patrimônio a nível municipal, marcando para sempre a ligação destas duas poticas na
busca da preservação da memória da cidade de Curitiba.
Nesta cidade não existindo lei que regulamente o tombamento em nível municipal,
a prefeitura utiliza de incentivos construtivos e fiscais para preservar a sua arquitetura de
valor cultural. Um dos incentivos que vem proporcionando o restauro de vários imóveis é a
Transferência do Direito de Construir, conhecida em Curitiba como Transferência do
Potencial Construtivo (TPC), instrumento institucionalizado em Curitiba no ano de 1982,
dezenove anos antes do Estatuto da Cidade, que regulamentou a TDC em legislação federal
brasileira.
Prevista inicialmente para uso apenas em imóveis de valor cultural, ao longo dos
anos o escopo da TPC foi se ampliando, tanto que atualmente ela pode ser aplicada para
rias finalidades, como para o patrimônio natural, além da promoção de habitação social e
de equipamentos públicos e comunitários. E, juntamente com a ampliação do escopo do
instrumento, a quantidade de leis municipais utilizadas em sua aplicação também
aumentou, tendo atualmente na Lei 9.803/00 as premissas sicas a serem seguidas.
Quanto ao patrimônio cultural arquitetônico, apesar de ter sido prevista em 1982, a
TPC para esta finalidade teve a primeira aplicação somente em 1986, passando a ser
utilizada com maior freqüência na década de 1990. Até junho de 2008, quando foram
finalizadas as pesquisas de campo, o instrumento havia sido utilizado em setenta e sete
imóveis de valor cultural, promovendo a recuperação e a preservação da grande maioria
deles.
Em mais de vinte anos de aplicação na cidade de Curitiba, a TPC teve muitas
alterações em sua forma de utilização e operacionalização, todas baseadas em uma
dinâmica de erros que vão sendo corrigidos e acertos que passam a ser repetidos ou
melhorados, na busca de utilizar o instrumento de maneira satisfatória dentro da realidade
Capitulo IV
A Aplicação da TDC em Curitiba
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
66
Figura 8: Mapa Estado do Paraná no século XVI com destaque para
os caminhos pré-cabralinos
Fonte: IPEA, 2002
do município. São muitos os exemplos de imóveis históricos beneficiados com a utilização
da TPC, entretanto alguns casos são considerados controversos e desvirtuam os objetivos
do instrumento, porém estes fazem parte de todo um processo de aprendizado e evolução
de aplicação em Curitiba.
3.1 História da evolução urbana e arquitetônica de
Curitiba
A região onde se encontra atualmente a cidade de Curitiba até o século XVII era
ocupada por diferentes grupos indígenas. Estes grupos ocuparam o território de maneira
transitória e formaram caminhos que foram usados pelos bandeirantes na busca de índios e
ouro naquela região, como o Caminho do Peabiru que ligava os Andes ao Oceano
Atlântico (Figura 8). Segundo publicação do IPEA (2002, p.66) a utilização dos caminhos
feitos pelos índios possibilitou o conhecimento de diversas regiões do planalto
paranaense, muito tempo antes de terem se estabelecido no local os primeiros moradores”.
O Povoado Nossa Senhora da Luz e Bom Jesus dos Pinhais, que veio a dar origem
à cidade de Curitiba, foi consolidado a partir da fixação em território paranaense de
membros remanescentes das bandeiras. Esta primeira povoação cresceu ao redor de uma
pequena Capela localizada onde hoje é a Praça Tiradentes. Em 29 de março de 1693, o
povoado recebeu o atributo de Vila, passando a ter autoridade administrativa com a
realização de eleições e a criação de Justiça e Câmara (BARZ et al, 1997). Esta data
atualmente é considerada a data de fundação do município de Curitiba.
Preocupações ligadas ao ordenamento do território, ao ambiente natural e também à
produção arquitetônica são em Curitiba observadas desde o início do século XVIII. Nesta
Capitulo IV
A Aplicação da TDC em Curitiba
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
67
época, o então Ouvidor Rafael Pires Paladino detalhou indicações orientando o
crescimento da Vila e as atividades que deveriam ser exercidas ali (BARZ et al, 1997.),
determinando igualmente cuidados com a natureza por parte dos habitantes
47
e exigindo
que cada nova construção tivesse a aprovação da Câmara (NOVALAR, 2006, p.19). A
definição espacial a qual adveio das orientações do Ouvidor refletia a preocupação com
uma ocupação ordenada do solo urbano, composta de ruas contínuas e retilíneas e com
edificações contíguas que foram “construídas com materiais encontrados ao redor da vila,
como madeira, barro, taquara e pedra” (BARZ et al, 1997).
A mineração, a primeira atividade econômica exercida nos campos de Curitiba, não
se desenvolveu por muito tempo naquela região, pois os garimpeiros começaram a se
deslocar em direção às Minas Gerais no século XVII em busca das minas de ouro e
diamantes. Desta forma passaram a ser exploradas outras atividades como o comércio e
criação de gado, impulsionada com a abertura da Estrada do Viamão no início do século
XVIII, ligando o sul do país ao sudeste e passando por Curitiba
48
. Com este segundo ciclo
de povoamento, chamado “Tropeirismo (IPPUC, 2003b, p.90), houve crescimento do
comércio e dos serviços trazendo conseqüentemente, grandes transformações em toda a
região.
Entretanto foi no ciclo econômico da erva-mate, o chamado “Ouro Verde”, que as
transformações na então Vila de Nossa Senhora dos Pinhais de Curitiba se intensificaram,
levando a pacata Vila a ganhar contornos urbanos e ares de modernidade (IPPUC, 2003b,
p.90) . As atividades de exploração e comércio de erva-mate iniciaram na região ainda no
século XVIII e foram impulsionadas no século XIX pela paralisação da exportação da
erva-mate paraguaia que a partir de 1813 passou a priorizar o consumo do público
interno, em detrimento das exportações do produto” (IPPUC, 2003b, p.90). Com isso, aos
poucos a região de Curitiba vai se transformando na principal exportadora do produto para
os países da região do Rio Prata e o Ciclo da Erva-mate vai se tornando para a cidade de
Curitiba mais importante que a pecuária e o “tropeirismo”, trazendo mudanças não
econômicas, mas também físicas e sociais.
Segundo o IPPUC, até a década de 1830 quando o Ciclo da Erva-mate teve seu
apogeu, Curitiba era uma cidade portuguesa, com igrejas barrocas e altares folheados a
ouro, como a Igreja da Ordem Terceira de São Francisco. As casas eram tão baixas que os
47
www.curitiba.pr.gov.br
48
Ibidem
Capitulo IV
A Aplicação da TDC em Curitiba
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
68
Figura 10: Vista de Curitiba em 1855
Fonte: Coleção Newton Carneiro - www.casadamemoria.org.br
Figura 9: Planta de Curitiba entre
1830 e 1950
Fonte: www.ippuc.com.br
homens colocavam seus chapéus em cima do telhado( IPPUC, 2003b, p.92). Após este
período, o crescimento da então Comarca de Paranaguá
49
se intensifica, havendo um
aumento considerável da população e uma maior preocupação com o ordenamento da
cidade que de acordo com Novalar (2002, p.20) teve em 1829 o seu Primeiro Código de
Posturas o qual:
“(...) entre outras providências, propõe o primeiro zoneamento para a cidade,
estabelecendo o tipo de construção autorizada para cada região:[...] nas ruas
principais casas de pedra e cal, taipa de pilão ou estuque, nas ruas afastadas
do quadro urbano principal, as choupanas de pau a pique cobertas de palha.”
O desenvolvimento econômico que o
comércio de exportação de erva-mate trouxe para a
região de Curitiba acabou a elevar a então Comarca
à categoria de Cidade, em 1842, e à Capital da
recém desmembrada Província do Paraná em 1854.
Nesta época Curitiba era ainda apenas um
aglomerado de casas de feões coloniais ao redor
de uma praça e com algumas poucas ruas (Figura 9
e 10). Desta forma para adequar-se estruturalmente
a cidade de Curitiba à condição de Capital do
Paraná, foi contratado em 1855 o engenheiro
francês Pierre Tauloi para elaborar o seu primeiro plano de urbanização. Este engenheiro,
segundo Bitencourt, “estabeleceu um novo traçado para a cidade, marcado pela
regularidade e ortogonalidade dos eixos viários”, transformando a feição colonial das vias
em um desenho reticulado (BITENCOURT, 2005, p.69).
49
Em 1812 a Vila de Curitiba torna sede da Comarca de Paranaguá.
Capitulo IV
A Aplicação da TDC em Curitiba
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
69
Nesta mesma época, a cidade recebia as primeiras levas de imigrantes de diferentes
etnias, principalmente europeus (alemães, italianos, poloneses, entre outros) que vieram
para o Brasil atraídos pela potica de incentivo à colonização adotada pelo governo e
denominada “open door” (portas abertas) (BITENCOURT,2005, p.69) Estes imigrantes,
além de impulsionar ainda mais a economia local, principalmente no que tange à
agricultura, influenciaram fortemente o cenário cultural curitibano, deixando seus traços
tradicionais, tanto na gastronomia e crenças, como no espaço urbano e na arquitetura
(Figuras 11 e 12).
“A partir de 1868 até aproximadamente 1878, os núcleos coloniais vão povoar
os vazios demográficos de Curitiba e cooperar de maneira significativa para o
desenvolvimento da região. (...) Todos contribuindo com técnicas e
características próprias vão transformar a estrutura econômica, social e urbana.
Essa transformação é observada principalmente na construção de edifícios e
na diferenciação de estilos arquitetônicos.” (IPPUC, 2003b, p.93)
O final do século XIX foi marcado por diversas mudanças no cenário urbano de
Curitiba, visto o grande crescimento populacional devido à quantidade de imigrações
ocorridas. Destas mudanças, pode-se destacar a construção da estrada de ferro, a
implantação da primeira linha de bonde, além do primeiro parque da cidade em 1886, o
Passeio Público, que segundo Bitencourt (2005, p.69), reflete a preocupação, desde aquele
período, com as questões relativas ao saneamento, preservação ambiental e áreas de
lazer”
50
. O crescimento urbano também gerou problemas na infra-estrutura da cidade,
necessitando de normas e padrões urbanos que foram disciplinados pelo digo de
Posturas de 1895.
50
.
Figura 11: Antiga Igreja Luterana
Fonte: Coleção Newton Carneiro
www.casadamemoria.org.br
Figura 12: Arquitetura da imigração déc. 1920
Fonte: www.curitiba-parana.net
Capitulo IV
A Aplicação da TDC em Curitiba
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
70
No início do século XX, as mudanças no espaço
urbano de Curitiba continuaram, influenciadas pela
chegada da luz elétrica e pelo início da hierarquização
de usos na cidade, através de leis municipais que
determinaram padrões construtivos conforme as regiões
da cidade. Uma destas determinações influenciou toda a
paisagem da região central, porque passou a ser
permitido ali somente construções em alvenaria, em
detrimento às de madeira que eram maioria na época pela
abundância deste material nos arredores da cidade
(
BARZ
et al, 1997)·. O primeiro prefeito engenheiro de Curitiba, Cândido Ferreira de Abreu, eleito
em 1913, também influenciou nas mudanças que levaram a região central a ganhar
contornos cada vez mais urbanos e europeus. Este prefeito, além de criar uma Comissão
de Melhoramentos”, que buscou remodelar Curitiba inspirando-se nos “Les Grands
Travauxde Haussmann em Paris trazendo vários benefícios como calçamento nas ruas e
alargamento de ruas e construção do Paço Imperial, ajudou a implantar na cidade o estilo
eclético utilizado principalmente nas residências dos barões da erva-mate
(NOVALAR,
2006, p.28).
“Merece também destaque a participação de Cândido Ferreira de Abreu na
Comiso Construtora da Cidade de Belo Horizonte (1896), pois é nesta
oportunidade que teve contato com o estilo arquitetônico que iria ajudar a
implantar em Curitiba, o ecletismo republicano. Cândido de Abreu foi o
arquiteto dos “ervateiros”, os quais dividiam o domínio político e econômico
da cidade com os “tropeiros
Na década de 1920, a prefeitura de Curitiba foi assumida novamente durante dois
mandatos por um engenheiro civil e urbanista, Moreira Garcez, que encontrou a cidade em
expansão após alguns anos de recessão devido à Primeira Guerra Mundial (BARZ et al,
1997). De acordo com Bitencourt (2005, p.70), no governo de Moreira Garcez “passaram a
ser evidenciados planos com enfoque no embelezamento de áreas centrais da cidade, na
abertura e alargamento de avenidas, constituindo ainda hoje, importantes corredores
viários”. Data igualmente da década de 20 o aparecimento dos primeiros edifícios de vários
andares na cidade. O primeiro “arranha céu” foi o Edifício Garcez construído em 1929
com estrutura de troncos de madeira embebecidos em óleo cru”( IPPUC, 2003b, p.99).
Figura 13: Vista Parcial de
Curitiba em 1905
Fonte: Coleção Julia Wanderley -
www.casadamemoria.org.br
Capitulo IV
A Aplicação da TDC em Curitiba
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
71
Segundo Bitencourt, na década de 1940 ocorreu o marco temporal das ações
concernentes ao planejamento formal da cidade de Curitiba, que foi a elaboração do Plano
Diretor de Urbanização, conhecido como Plano Agache. Este plano foi elaborado pelo
arquiteto francês Donat-Alfred Agache em 1943 com o intuito de disciplinar a ocupação do
solo urbano da cidade. Assim o plano:
“(...) estabeleceu diretrizes e normas técnicas para ordenar o crescimento
físico, urbano e espacial da cidade, disciplinando o tráfego, organizando as
funções urbanas, além de coordenar e zonear as atividades, codificar as
edificações, estimulando e orientando desta maneira o desenvolvimento.”
(BARZ et al, 1997)
Apesar de toda a sua importância para a consolidação de uma cultura de
planejamento urbano em Curitiba, o Plano Agache “envelheceu rapidamente, devido a sua
rigidez e em virtude do crescimento imprevisto da cidade” (PINTO, 2008), que passou de
180 mil habitantes nos anos 50 para 360 mil nos anos 60. Destarte, em 1964 foi realizado
um concurso público promovido pela Prefeitura para a elaboração de um novo Plano
Urbanístico para Curitiba, reexaminando e atualizando as diretrizes do Plano Agache. Este
plano de 1964 originou o primeiro Plano Diretor da cidade, aprovado em 1966 através da
Lei 2828/66. Entretanto, a implantação deste Plano Diretor teve início somente na década
de 1970, quando o arquiteto e urbanista Jaime Lerner
51
foi prefeito de Curitiba. Sua
implantação foi a partir das diretrizes pautadas no tripé: sistema viário, uso do solo e
transporte coletivo e segundo Bitencourt:
“Com a implantação do Plano Diretor da cidade, mudanças profundas foram
produzidas no tecido urbano, cujos eixos foram a determinação de um novo
desenho de vias estruturais associando a elas um uso de solo específico e um
modelo de transporte coletivo de ônibus expressos, para circular ao longo das
vias estruturais.”( BITENCOURT, 2005, p.73)
51
De acordo com Novalar (2006, p.38), o profissional que capitalizou a imagem da Cidade - e um dos grandes
executivos do planejamento urbano em Curitiba - foi o arquiteto Jaime Lerner, que fez parte da estrutura do IPPUC na
década de 1960 e também foi prefeito de Curitiba na década de 1970 e 1980.
Capitulo IV
A Aplicação da TDC em Curitiba
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
72
Figura 14: Rua XV de Novembro
Fonte: Dario Dadario
Uma das ações incentivadas pelo Plano
Diretor de 1966, que estava dentro da potica
de disciplinar e remodelar a região central de
Curitiba e foi implantada em 1971, foi o
fechamento de parte da Rua XV de Novembro
para tráfego de veículos. Esta iniciativa foi a
primeira do tipo no Brasil e “criou uma via de
animação central, reservada à convivência
social e ao lazer exclusivo dos pedestres”
(PINTO, 2008), que atualmente é conhecida
como “Rua das Flores” e é um dos cartões
postais da cidade de Curitiba (Figura 14).
Nas décadas de 1970, 1980 e 1990,
a cidade continuou crescendo em ritmo
acelerado e sua mancha urbana foi se
expandido e espraiando sobre os
municípios vizinhos, formando a Região
Metropolitana de Curitiba (Figura 15).
Igualmente, nestas últimas décadas o
cenário urbano da cidade de Curitiba foi se
modificando cada vez mais por meio de
iniciativas urbanas de sucesso, que
envolveram a realização de obras infra-
estruturais conjugadas com programas
sociais, ambientais e culturais”, trazendo à
Curitiba a melhoria da qualidade de vida
de seus habitantes e a denominação de
“Capital da Qualidade de Vida
(BITENCOURT, 2005, p.78). Desta forma questões como a proteção do meio ambiente
cultural e natural passaram a fazer parte do cotidiano dos curitibanos, seja através dos
muitos parques, bosques e áreas verdes que compõe a paisagem da cidade, como nas
políticas de incentivo à preservação de seu patrimônio edificado.
Figura 15: Evolução Urbana de Curitiba entre
1955 à 1995
Fonte: IPEA, 2002
Capitulo IV
A Aplicação da TDC em Curitiba
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
73
3.2 A atuação da administração municipal de
Curitiba na Preservação do seu Patrimônio Cultural
Em virtude do acelerado crescimento da cidade de Curitiba a partir da década de
1950, juntamente com as grandes intervenções estruturais que estiveram sempre presentes
na sua evolução urbanística, muito do seu patrimônio cultural edificado foi perdido.
Segundo inventário elaborado pelo governo estadual em 1977, “a grande maioria das
edificações construídas nos séculos XVIII e XIX, havia sido totalmente destruída ou
mutilada” (NOVALAR, 2006, p.69). Outro agravante para a destruição do patrimônio
cultural curitibano corresponde ao fato de que apenas o órgão federal e o órgão estadual
atuaram na tutela de unidades culturais da cidade de Curitiba até a década de 1970,
tombando trinta e três imóveis e deixando sem proteção muitos outros que acabaram por se
perderem (BITENCOURT, 2005, p.99). E foi a conscientização desta perda, bem como da
deterioração, descaracterização e subutilização de alguns exemplares de edificações de
valor cultural para a cidade, que levou a municipalidade a iniciar suas poticas
preservacionistas (BITENCOURT, 2005, p.18).
Com uma história fortemente ligada a questões referentes ao planejamento e
ordenamento do seu espaço urbano, a potica de preservação do patrimônio cultural
edificado na esfera municipal de Curitiba acabou por nascer ancorada à política de
planejamento urbano, antecipando uma tendência atual que é o enlace entre estas duas
políticas. Embora algumas considerações sobre o patrimônio cultural tenham sido
apontadas de forma genérica pelo Plano Agache em 1943, foi no Plano Diretor de 1966
que a questão cultural se tornou representativa e fortalecida através do estabelecimento de
diretrizes para uma efetiva potica de preservação do patrimônio cultural (BITENCOURT,
2005, p.72).
SECÇÃO V PRESERVAÇÃO E REVITALIZAÇÃO DOS SETORES
HISTÓRICO-TRADICIONAIS
Artigo 52 - Fica estabelecida no Município de Curitiba, a Política de
Preservação e Revitalização de Setores Históricos-Tradicionais, com a
finalidade de resguardar os valores históricos e urbanos de determinadas
áreas.
Artigo 53 - São objetivos da Política de Preservação e Revitalização dos
Setores Históricos-Tradicionais :
1 - fixar uma escala urbana de determinada época.
2 - garantir, na medida do possível a imutabilidade das edificações e dos
logradouros quanto a alargamentos, tratamentos dos passeios e leito das ruas.
3 -recuperar edificações características de determinada época, destinando-as a
usos adequados.
Capitulo IV
A Aplicação da TDC em Curitiba
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
74
Figura 16: Casa Romário Martins
Fonte: www.curitiba-parana.net
4 - orientar e incentivar nesses setores, usos e atividades compatíveis com
suas características.
5 - incrementar o turismo.
Artigo 54 - São instrumentos para a implantação dessa Política:
1 - Convênios com o Patrimônio Histórico do Estado e da União, ... V E T A D
O ..., visando o tombamento das edificações e logradouros pertencentes a
esses setores.
2 - Estímulos tributários para usos e atividades adequadas
3 - Penalidades pelo não cumprimento das medidas que regulamentarem a
preservação desses setores.
Artigo 55 - O Executivo Municipal fixará por decreto as áreas Históricas-
Tradicionais, assim definidas pelo IPPUC.”
52
Um dos primeiros detalhamentos das diretrizes propostas no Plano Diretor de 1966,
foi à criação e delimitação do Setor Histórico, dando início ao processo de valorização
urbanística e cultural do patrimônio da cidade (BITENCOURT, 2005, p.74). Segundo
Novalar (2006, p.82), neste Decreto além dos imóveis no Setor Histórico serem
classificados em três categorias (“unidades-monumentos, unidades de acompanhamento e
unidades desprovidas de importância arquitetônica”), fica subentendido ao IPPUC a função
de aprovar ou não os projetos de restauro nestas edificações. Ainda para este autor uma das
principais conseqüências deste Decreto foi a:
“(...) inauguração na cidade o olhar do “urbanista” tamm sobre o patrimônio
arquitetônico, sendo que, uma das conseqüências principais é a aceitação do
“fachadismo” nos projetos, privilegiando as visualidades” outra tendência
local.” (NOVALAR, 2006, p.82)
Juntamente com a crião do Setor
Histórico, outra ação cultural de imensa
importância para a cidade de Curitiba adveio das
diretrizes do Plano Diretor de 1966. Esta
iniciativa foi a criação da Fundação Cultural de
Curitiba (FCC) através de uma lei de janeiro de
1973, cujo objetivo principal era a formulação da
Política Cultural do município por meio da
articulação com órgãos públicos e privados (NOVALAR, 2006, p. 86). Esta Fundação, até
hoje atuante no município, dentre as diversas ações culturais, como a promoção de
exposões e festividades populares, também promove a recuperação e defesa do
patrimônio cultural edificado, que teve como uma de suas primeiras ações a recuperação da
52
Lei 2828/66 (Plano Diretor de Curitiba)
Capitulo IV
A Aplicação da TDC em Curitiba
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
75
Figura 17: Teatro Paio
Fonte: www.curitiba-parana.net
Casa Romário Martins, no Setor Histórico, uma das mais antigas edificações da cidade em
estilo colonial (Figura 16).
No início da década de 1970 ocorreram
outras transformações culturais na cidade, como a
reciclagem e restauração de prédios históricos a
exemplo do Paiol de lvora que hoje abriga o
Teatro Paiol (Figura 17); e também a
pedestrianização” da Rua XV de Novembro a
qual favoreceu a preservação da escala
arquitetônica de imóveis de valor cultural
(BITENCOURT, 2005, p.75).
Como conseqüência da potica cultural iniciada depois do Plano Diretor, no ano de
1979, foi estabelecido pelo Decreto nº 1.547, o Setor Especial das Unidades de Interesse de
Preservação (UIPs), cujo objetivo era o de proteger imóveis representativos da arquitetura
histórica do município de Curitiba, por meio de inventário e com a ancia da Comissão de
Avaliação do Patrimônio Cultural (CAPC) . Este Decreto classificou 586 (quinhentos e
oitenta e seis) imóveis como UIPs e foi alvo de muitas críticas que acabaram por ter o
número UIPs reduzido para 308 (trezentas e oito) em 1982. No ano de 1992, o IPPUC
revisou as listas publicadas nos decretos de 1979 e 1982, excluindo imóveis já demolidos e
acrescentando aqueles que não tinham sido contemplados, totalizando então 681
(seissentas e oitenta e uma) UIPs (BITENCOURT, 2005, p. 101).
São registradas como UIPs em Curitiba apenas edificações de propriedade privada,
o podendo ser reformadas, modificadas e/ou demolidas, sem a prévia autorização do
Serviço de Patrimônio Histórico (SPH) que é um dos setores do IPPUC. Para um imóvel
ser registrado como UIP o utilizados critérios baseadas nas seguintes características:
“O SIGNIFICADO SOCIAL DA EDIFICAÇÃO:
Representa a “carga” significante que a edificação possui para a
sociedade, podendo ser a herança de um passado remoto de que a
unidade é testemunho material ou a transmissão atual de valores
simbólicos da comunidade. (...)
A QUALIDADE ARQUITENICA:
É o critério pautado pela representatividade de determinado estilo ou
expreso na evolução da arquitetura de Curitiba ou pela sua
expressividade plástica. (...)
A QUALIDADE CONSTRUTIVA:
Fundamenta-se em um critério de ordem técnica, onde são considerados
o sistema estrutural em desuso, ou em vias de desaparecimento, e a
excepcional qualidade técnico-construtiva da edificação. (...)
Capitulo IV
A Aplicação da TDC em Curitiba
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
76
A PRESENÇA NA PAISAGEM.
É um critério urbanístico e paisagístico, onde relaciona a interação da
unidade com o entorno, ou seja, com o conjunto no qual a mesma se
encontra inserida. (...)” (BITENCOURT, 2005, p. 101-103)
Em Curitiba, até hoje não existe uma lei municipal para o tombamento de seus
imóveis de valor cultural, sendo o cadastramento de um imóvel como UIP a forma que o
Poder Público municipal utiliza para sua tutela e salvaguarda. De acordo com o IPPUC
(2003-1, p.29), em Curitiba o há tombamentos em nível municipal por preferirem
utilizar o cadastramento de imóvel de valor cultural como UIP, trabalhando-se com formas
de incentivos construtivos e fiscais, a utilizar apenas a forma clássica de tombamento.
Os incentivos que fornecem os subsídios para o restauro, recuperação, manutenção
e preservação das UIPs em Curitiba foram criados logo depois do estabelecimento destas
no início da década de 1980. O primeiro incentivo a ser criado, por meio do Decreto
161/1981, forneceu a possibilidade de dedução ou isenção do Imposto Predial Territorial
Urbano (IPTU) das UIPs. O percentual de redução do IPTU é definido pela CAPC em
função de critérios pautados nas condições de conservação e uso da edificação, observadas
em vistorias técnicas realizadas a cada dois anos. Este incentivo é muito importante no que
tange à conservação da UIP, uma vez que o proprietário pode utilizar o valor que deixa de
pagar com IPTU para viabilizar obras de manutenção do ivel.
Outro incentivo de extrema importância no que tange a salvaguarda das UIPs, é o
incentivo construtivo da Transferência do Potencial Construtivo (TPC)
53
, que foi instituído
em 1982. De acordo com o IPPUC (2003, p.29), o instrumento da TPC “consiste na
autorização para a construção acima dos limites previstos na legislão em vigor, mediante
o compromisso formal do proprietário do imóvel de valor em preservá-lo segundo
orientação da Prefeitura Municipal”. A utilização deste instrumento será explicada mais
detalhadamente no próximo item desta pesquisa.
No ano de 1993, foram criadas as Unidades de Especial Interesse de Preservão
(UIEP) com o objetivo de salvaguardar imóveis de excepcional valor cultural para a
cidade”( IPPUC, 2003, p.30)·. A instituição destas UIEPs apesar de ter o mesmo objetivo
final das UIPs, a salvaguarda de imóvel cultural, apresenta propósito diferente daquele
estabelecido para estas, visto que nas UIEPs o escopo inicial foi, além do registro das
unidades mais significativas da cidade, a utilização do instrumento da TPC de forma
53
Em Curitiba, o instrumento da Transferência do Direito de Construir previsto no Estatuto da Cidade recebe a
denominação de Transferência do Potencial Construtivo.
Capitulo IV
A Aplicação da TDC em Curitiba
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
77
diferenciada das UIPs” (BITENCOURT, 2005, p. 104). Outra diferença marcante das UIPs
para as UIEPs é que nas últimas o imóvel deve ser de uso público e sua criação já está
condicionada ao uso da TPC.
3.3 Análise da aplicação da Transferência de Potencial
Construtivo em Curitiba
3.3.1 Histórico e análise da Documentação legal que trata
da TPC em Curitiba
Em Curitiba, o instrumento da TPC foi previsto pela primeira vez na Lei
Municipal 6.337 de 1982. Esta lei institucionalizou o instrumento no município apesar de
denominá-lo apenas como “incentivo construtivo para a preservação de imóveis de valor
cultural, histórico ou arquitetônico
54
. Composta apenas por sete artigos a Lei 6.337/82
trata do incentivo de forma relativamente superficial, definindo-o como uma autorização
para construir acima do patamar previsto na Lei de Uso e Ocupação do solo, desde que o
proprietário de imóvel de valor cultural o preservasse sob a orientação da Prefeitura
Municipal de Curitiba (PMC). No seu artigo 3º, ela indica que a aplicação do incentivo
pode ser feita no mesmo terreno do imóvel de valor cultural, desde que se respeite o
entorno deste bem, o que segundo Novalar (2006, p.95) reforça uma tenncia prevista no
Plano Diretor de 1966, o re-loteamento. Esta lei também oferece a possibilidade de
transferência do potencial quando este não puder ser utilizado no mesmo terreno e tamm
estabelece penalidades para o proprietário que não preservar o imóvel após a concessão do
incentivo.
Em 1991, a Lei de 1982 foi regulamentada pelo Decreto 408/91, que além de
aprofundar em detalhes essenciais no que concerne às formas de aplicação do incentivo,
instituiu a CAPC, definindo seus membros constituintes e suas atribuições. Neste Decreto
consta a possibilidade de doação do imóvel de valor cultural ao Poder Público, as formas
de gestão e operacionalização do instrumento, bem como a especificação das áreas para as
quais pode ser transferido o incentivo. Um ponto importante também tratado neste Decreto
diz respeito à ampliação das obrigações do proprietário de imóvel beneficiado com o
incentivo, que passa a ter que restaurar sua edificação e consultar a CAPC antes de efetuar
qualquer alteração na mesma.
54
Lei 6.337/1982, ementa.
Capitulo IV
A Aplicação da TDC em Curitiba
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
78
No ano de 1993 foi aprovado o Decreto 308/93 que deu continuidade à ampliação
do escopo da Lei de 1982, com a regulamentação do incentivo construtivo, que pela
primeira vez foi denominado TPC, “para a restauração e preservação de imóveis de
Interesse Especial de Preservação”. Estes imóveis devem ser de uso público e foram
intitulados Unidades de Interesse Especial de Preservação (UIEP), devendo ser
determinados pela CAPC, que também fixará cotas de potencial construtivo para cada
caso. A quantidade destas cotas a serem comercializadas será relacionada ao valor da obra
de restauração da UIEP, pois os recursos arrecadados com a sua venda devem ser
destinados exclusivamente para o restauro da Unidade.
O Decreto 308/93 oferece ainda a possibilidade do restabelecimento do potencial
concedido a uma UIEP para nova utilização dentro de um prazo de dez anos, a critério da
PMC. Segundo técnico do IPPUC, este restabelecimento do potencial já utilizado foi
previsto para possibilitar novo restauro e também reformas para manter as UIEPs sempre
em ótimo estado de conservação
55
. Nas UIEPs isso é possível por o potencial construtivo
o ser vinculado à área do imóvel e sim ao valor da obra de restauro. Esta possibilidade
nova de uso da TDC ainda não foi utilizada em Curitiba então não se sabe quais as
possíveis repercussões de seu uso.
Para regulamentação de uma UIEP deve-se ter um Decreto específico aprovado
pelo Poder Público, que irá definir a quantidade do potencial gerado transformado em cotas
a serem vendidas para viabilizar a obra de restauro, o valor destas cotas, a forma de
recolhimentos dos valores recebidos, as características e localização do recebedor de
potencial, bem como os seus parâmetros urbanísticos. O primeiro Decreto de
regulamentação de UIEPs foi o Decreto 381/1993, aprovado no mesmo dia do Decreto
380/93. Este Decreto definiu ao mesmo tempo três UIEPs: Catedral Metropolitana de
Curitiba, Sede da Sociedade Garibaldi e o edifício Central da Universidade Federal do
Paraná. Posteriormente foram regulamentadas mais nove UIEPs, sendo elas: Reservatório
Alto São Francisco (Decreto 234/1996); Prédio do Ministério Público (Decreto997/1997);
União Paranaense de Estudantes (Decreto 881/1999); Fundação Cultural de Curitiba
(Decreto 814/2001); Sede da Sociedade Operaria Beneficente Treze de Maio (Decreto
662/2001); Antiga Sede do Museu Paranaense(Decreto 83/2002); Capela Santa Maria
(Decreto 1034/2004); Museu Metropolitano de Arte de Curitiba (Decreto 1443/2007);
Casa do Estudante Universitário (Decreto 588/2007).
55
Informações obtidas através de entrevista concedida por Carla Choma Frankl em junho de 2008.
Capitulo IV
A Aplicação da TDC em Curitiba
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
79
Significativas alterações da TPC, visando seu ajuste aos novos tempos e
necessidades do município, aconteceram no ano 2000 com a aprovação da nova Lei do
Zoneamento, Uso e Ocupação do Solo no Município de Curitiba (Lei 9800/00) e de outras
Leis urbanísticas que a complementaram. A Lei 9.800 trata do incentivo à proteção e
preservão do Patrimônio Cultural, Natural e Ambiental no Municípioem seu Capítulo
VI, oferecendo uma nova delimitação para o instrumento da TPC, que passa a poder ser
destinado também na preservação do Patrimônio Natural e Ambiental. A TPC, além disso,
passa a poder ser utilizada para a desapropriação parcial ou total, de imóveis necessários à
adequação do Sistema Viário Básico, e à instalação de equipamentos urbanos e
comunitários de uso público
56
. Outro ponto importante desta lei é a definição do que seria
o Patrimônio Cultural, Natural e Ambiental do município:
Parágrafo único. Constitui o Patrimônio Cultural, Natural e Ambiental do
Município de Curitiba o conjunto de bens existentes em seu território, de
domínio público ou privado, cuja proteção e preservação seja de interesse
público, quer por sua vinculação a fatos memoráveis da história, quer por seu
significativo valor arqueológico, artístico, arquitetônico, etnográfico, natural,
paisagístico ou ambiental, tais como:
I - Unidades de Interesse de Preservação;
II - Unidades de Conservação;
III - Anel de Conservação Sanitário-Ambiental;
IV - Áreas Verdes.
57
A Lei 9801/00, complementando a Lei de Zoneamento, dispõe sobre os
Instrumentos da Política Urbana de Curitiba, incluindo, dentre eles, a TPC. Nesta lei foi
ampliado o tipo de patrimônio natural previsto na Lei de Zoneamento, passando a abranger
a proteção e a preservação dos mananciais. Entretanto a grande inovação desta lei foi que
para assegurar as condições ambientais adequadas à preservão dos mananciais, passou a
admitir-se a transferência de potencial construtivo, mediante convênios ou consórcios
entre Curitiba e os demais municípios que compõem a Região Metropolitana de Curitiba
(RMC)”
58
, proporcionando a utilização regional do instrumento.
Atualmente, a lei mais representativa em Curitiba, no que tange à aplicação da
TPC, é a Lei 9.803/00, a qual é uma das complementares à Lei de Zoneamento. Esta lei
permite a transferência parcial ou total do potencial construtivo previsto na Lei de
Zoneamento, Uso e Ocupação do Solo que não pode ser utilizado plenamente em um
imóvel por limitações urbanísticas relativas à preservão e proteção do Patrimônio
56
Lei 9.800/00, artigo 44.
57
Lei 9.800/00, artigo 43.
58
Lei 9.801/00, artigo 3º, parágrafo 2º.
Capitulo IV
A Aplicação da TDC em Curitiba
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
80
Histórico, Cultural, Natural e Ambiental definidas pelo Poder Público, por meio de
autorização da administração municipal. Além disso, foi estabelecida, também, a utilização
do instrumento como forma de indenização, através de acordo com o proprietário, nas
seguintes situações:
“(...) nas desapropriações destinadas a melhoramentos viários, equipamentos
públicos, programas habitacionais de interesse social, programas de
recuperação ambiental, e na subutilização de potencial construtivo por
limitações urbanísticas, de imóveis situados no Setor Estrutural.”
59
Anexo à Lei 9.803 encontram-se dois quadros que contém as especificações das
zonas e setores especiais
60
onde se pode receber potencial construtivo e ainda os usos e
parâmetros urbanísticos máximos admitidos para estes imóveis, parâmetros estes que
ultrapassam aqueles previstos na Lei 9800.
Na Lei 9.803, foi estabelecida pela primeira vez em legislação curitibana uma
fórmula para a determinação do potencial construtivo do terreno do imóvel que cede
potencial e uma fórmula para cálculo do potencial transferível, que é aquele o qual o
imóvel recebedor irá utilizar em seu terreno. Na primeira fórmula, é utilizada apenas a área
total do terreno do imóvel cedente e o coeficiente de aproveitamento da região onde este se
encontra inserido, agora na segunda fórmula é utilizada a quantidade de potencial
construtivo que o imóvel cederá, bem como os coeficientes de aproveitamento e valores do
metro quadrado
61
tanto do imóvel cedente como do recebedor. As fórmulas mencionadas
acima se encontram nos artigos 4º e 5º, os quais seguem abaixo:
Art. 4º. O potencial construtivo de um terreno é determinado em metros
quadrados de área computável, e equivale ao resultado obtido pela aplicação
da seguinte fórmula:
Pc = Ca x A onde:
Pc = Potencial Construtivo
Ca = Coeficiente de aproveitamento permitido na zona ou
setor onde está localizado o imóvel cedente
A = Área total do terreno cedente.
59
Lei 9.803/00, artigo
60
Estas Zonas e Setores Especiais são delimitados pela Lei 9.800/00, sendo que além dos parâmetros estabelecidos nos
anexos da Lei 9.803/00 “os imóveis que recebem o potencial construtivo deverão atender aos demais parâmetros da Lei
de Zoneamento e Uso do Solo” (Lei 9.803/00, artigo 6º, parágrafo único).
61
De acordo com o parágrafo único do artigo "O valor do metro quadrado do terreno que cede e do que recebe o
potencial, será avaliado com base nos critérios definidos na Lei n º,7291, de 12 de dezembro de 1988, utilizados na
apuração do Imposto de Transmissão Intervivos de Bens Imóveis ITBI."
Capitulo IV
A Aplicação da TDC em Curitiba
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
81
Art. 5º. O potencial construtivo transferível é determinado em metros quadrados
de área computável e equivale ao resultado obtido pela aplicação da seguinte
fórmula:
Pt = Pc x Vmc x Cc
Vmr Cr onde:
Pt = Potencial Construtivo Transferível
Pc = Potencial Construtivo
Vmc = Valor do metro quadrado de terreno do imóvel que
cede o potencial
Vmr = Valor do metro quadrado de terreno do imóvel que
recebe o potencial
Cc = Coeficiente de aproveitamento da zona ou setor onde
está localizado o i-móvel que cede o potencial
Cr = Coeficiente de aproveitamento da zona ou setor onde
está localizado o imóvel que recebe o potencial
Como se pode perceber na fórmula, tanto os valores do metro quadrado, quanto do
coeficiente de aproveitamento dos imóveis cedentes e recebedores têm grande importância
para se chegar à quantidade de potencial transferível, porque o estes valores que mantém
uma equivalência entre o potencial cedido e recebido, independente do local ou do valor do
solo urbano. E pela fórmula pode-se concluir que o valor do potencial cedido e recebido só
será o mesmo se a transferência for para uma zona ou setor que possua as mesmas
condições que o terreno cedente, ou seja, se o coeficiente de aproveitamento e o valor
metro quadrado forem os mesmos.
Em 2001, o Decreto 894/01, que regulamentou a Lei 9.803/00, alterou a fórmula de
cálculo do potencial transferível mencionada acima, acrescentando a ela um fator de
correção, definido de acordo com o tipo de atividade, zona ou setor onde se localiza o
terreno que recebe o potencial, e origem do potencial construtivo”
62
e estabelecido nos
Anexos deste Decreto. A fórmula para cálculo do potencial transferível estabelecida no
Parágrafo Único do Artigo 7º do Decreto 894/01 segue abaixo:
Parágrafo Único - A fórmula para o cálculo de transferência de potencial
construtivo será aplicada da seguinte forma:
Pt = Pc x Vmc x Cr x 1
Vmr Cc Fc
Onde:
Pt = Potencial construtivo transferível para o imóvel que recebe o
potencial
Pc = Potencial construtivo do imóvel que cede o potencial
Vmc = Valor do metro quadrado do imóvel que cede o potencial
Vmr = Valor do metro quadrado do imóvel que recebe o potencial
Cr = Coeficiente de aproveitamento do imóvel que recebe o potencial
Cc = Coeficiente de aproveitamento do imóvel que cede o potencial
62
Decreto 894/00, artigo 7º.
Capitulo IV
A Aplicação da TDC em Curitiba
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
82
Fc = Fator de correção
Vale ressaltar que o fator de correção foi instituído com o objetivo de incentivar a
transferência de potencial construtivo para as áreas de maior interesse de adensamento pela
administração municipal e, quanto mais baixo o fator de correção mais alto o valor do
potencial transferível para o imóvel recebedor. Na tabela que estabelece o fator de
correção, os valores destes fatores são agrupados pelas zonas e setores que podem receber
potencial, segundo a Lei 9.803/00, e são diferentes quando a transferência é utilizada para
acréscimo de coeficiente e pavimentos ou somente para pavimentos, assim como quando o
potencial vem de uma UIP ou de outro tipo de imóvel. Pode-se ainda observar na tabela
que o fator de correção é sempre menor para o acréscimo de pavimentos e quando oriundos
de UIPs, o que incentiva a utilização de potencial no aumento de gabarito de imóveis e a
compra do potencial advindo de UIPs.
Em 2004 o Decreto 894/01 foi substituído pelo Decreto 625/04, devido à
“necessidade de adequação e simplificação do regulamento definido pelo Decreto 894/01”,
e com ele a fórmula do cálculo do potencial transferível foi reorganizada, dividindo-se em ,
de forma a calcular-se também a quantidade de potencial construtivo que o imóvel cedente
deverá transferir para se obter a quantidade de potencial que o imóvel recebedor deseja
adquirir. Foi apenas uma inversão da fórmula original, isolando o potencial cedente de
forma a facilitar a operacionalização do instrumento da TPC. Seguem as fórmulas
presentes no Artigo 13, § 1º do Decreto 625/04:
§ A fórmula para o cálculo de transferência de potencial construtivo será
aplicada da seguinte forma:
Para o imóvel que recebe o potencial
Ptr = Pc x Vmc x Cr x 1
Vmr Cc Fc
Para o imóvel que cede o potencial:|
Pc = Ptr x Vmr x Cc x Fc
Vmc Cr
Onde:
Ptr = Potencial construtivo do imóvel que recebe o potencial;
Pc = Potencial construtivo do imóvel que cede o potencial;
Vmc = Valor do metro quadrado do imóvel que cede o potencial;
Vmr = Valor do metro quadrado do imóvel que recebe o potencial;
Cr = Coeficiente de aproveitamento do imóvel que recebe o potencial;
Cc = Coeficiente de aproveitamento do imóvel que cede o potencial;
Fc = Fator de correção.
Capitulo IV
A Aplicação da TDC em Curitiba
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
83
Figura 18: Esquema de liberação de potencial conforme o Decreto 625/04
Tanto o Decreto 895/00, como o Decreto 625/04 estabelecem de forma detalhada a
operacionalização da aplicação do instrumento da TPC em Curitiba, bem como
complementam e modificam alguns dos parâmetros urbanísticos das zonas e setores
especiais recebedores previstos nos anexos da Lei 9.803/00. Sobre a operacionalização do
TDC, estes dois decretos regulamentaram uma rotina que vinha sendo estabelecida pelos
óros municipais envolvidos na aplicação do instrumento e que é exposta e analisada no
Apêndice A desta pesquisa.
O Decreto de 2004 substitui o de 2001, renovando os seus procedimentos e
trazendo a regulamentação de novas questões como aquela presente no seu Título IV, que
trata da concessão e transferência de potencial construtivo das unidades de interesse de
preservão”. Neste título foi disposto que “a transferência total de potencial construtivo,
somente será autorizada após a expedição do CVCO
63
do restauro da UIP que originou o
potencial”
64
pois as transferências de potencial construtivo passaram a ser liberadas em
parcelas, mediante análises da CAPC baseadas no cronograma físico-financeiro da obra e
em vistorias. Segundo os parágrafos e deste Decreto a primeira parcela de potencial
construtivo, inferior a 35% (trinta e cinco por cento) do total, poderá ser liberada para o
início das obras de restauro e, somente 70% (setenta por cento) do total, poderão ser
liberados antes da finalização da obra e de acordo com o cronograma apresentado.
Também no ano de 2004 foi aprovado o novo Plano Diretor de Curitiba, Lei
11.266/04, que tratou sobre a adequação do Plano Diretor de 1966 às diretrizes e
instrumentos institdos pelo Estatuto da Cidade. Entre os instrumentos da política urbana
que este Plano Diretor estabelece, encontra-se no Capítulo V o instrumento da
Transferência do Direito de Construir. Em seu artigo 1º, a TDC é denominada TPC, como
tem sido nomeada em Curitiba, mostrando que a diferença entre TDC e TPC é apenas uma
questão de nomenclatura. Nesta lei são estabelecidas as diretrizes gerais do instrumento
conectando o que está previsto nas leis que regulamentam a TPC em Curitiba com o que o
63
CVCO significa Certificado de Vistoria de Conclusão de Obras.
64
Decreto 625/04, artigo 11º.
Capitulo IV
A Aplicação da TDC em Curitiba
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
84
Estatuto da Cidade aborda, deixando a cargo de lei específica maior detalhamento da
aplicação.
Em maio de 2009 foi aprovado um Decreto (Decreto 689/09) que regulamentou a
utilização da TPC para uma das finalidades prevista na Lei 9003/00 e no novo Plano
Diretor, que é a implantação de equipamentos urbanos e comunitários. Este Decreto
concede incentivo para a implantação do Programa de Expansão do Atendimento
Educacional da Secretaria Municipal de Educação, sendo que este incentivo é a concessão
de parâmetros por transferência do potencial construtivo (...), mediante a aquisição de cotas
de potencial construtivo fixadas de acordo com a necessidade do Programa”
65
.
3.3.2 A aplicação da TDC em Curitiba
Em Curitiba, como aludido anteriormente, a TPC teve o seu universo de
aplicabilidade muito ampliado nos últimos anos, assim atualmente é utilizada tanto para
imóveis de valor cultural privados (UIPs) como públicos (UIEPs), para imóveis que fazem
parte do patrinio natural da cidade, e para implantação de programas sociais e de
equipamentos urbanos e comunitários (Figura 19). Como o objeto de estudos desta
pesquisa é a aplicação do instrumento para preservação do patrimônio cultural edificado,
as outras categorias serão analisadas apenas de forma superficial, deixando em aberto para
novas pesquisas maior dedicação ao assunto.
65
Decreto 689/09, artigo 1º, parágrafo único.
Capitulo IV
A Aplicação da TDC em Curitiba
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
85
Figura 20: Parque Tamguá
Fonte: Estrada, 2006
Figura 21: Parque Birigui
Fonte: www.pampasonline.com.br
No caso do patrimônio natural de Curitiba, desde 1993 (através do Decreto
8.353/93) os proprietários de imóveis que integram o Setor Especial de Áreas Verdes
passaram a receber estímulos para a preservação destas áreas, mediante incentivo
construtivo que possibilitava o aumento do gabarito de uma nova edificação desde que se
preservasse o restante da cobertura vegetal do terreno. No ano 2000, com o advento da Lei
9.800/00, o incentivo, denominado TPC, adquiriu contornos bem delimitados e passou a
ter maior aplicabilidade em Curitiba, possibilitando a preservação de áreas verdes e a
arrecadação de recursos para o Fundo Municipal de Meio Ambiente, que resultaram na
criação de parques, praças e programas ambientais, assim como na proteção de regiões de
fundos de vales. Por meio da utilização da TPC foi viabilizada a transformação de áreas
verdes nos Parques Tanguá, Vista Alegre das Mercês, Barigui Sul, Nascentes e nos
Bosques Fazendinha, Uberaba, Solitude, Portugal (Figura 20 a 23), entre outros.
Figura 19: Categorias para Transferência Potencial Construtivo
Fonte: IPPUC, 2003a
Capitulo IV
A Aplicação da TDC em Curitiba
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86
Figura 22: Bosque Fazendinha
Fonte: www.curitiba-parana.net
Figura 23: Bosque Fazendinha
Fonte: www.curitiba-parana.net
Figura 24: Vila Terra
Fonte: www.construtoravillage.com.br
Na utilização do instrumento para fins de programas
habitacionais, instituído pela Lei 9.802/00, o proprietário
pode doar seu lote urbano localizado em área de interesse
social, para implantação de programa habitacional em troca
de potencial construtivo, ou adquirir solo criado diretamente
da prefeitura, de forma que os recursos da venda sejam
encaminhando para o Fundo Municipal de Habitação. Um
exemplo de utilização para da TPC para este fim foi o
Programa de Habitação de Interesse Social Vila Terra implementado pelo Decreto 665/04,
que viabilizou a concessão de potencial construtivo para relocação de 500 (quinhentas)
famílias moradoras de áreas de risco, através da geração de 12.400 (doze mil e
quatrocentas) cotas de um metro quadrado, vendidas no valor de R$200,00 cada uma
(Figura 24).
Atualmente, a TPC também é utilizada para a implantação de equipamentos
urbanos e comunitários, no caso, equipamentos voltados para a área educacional. A
implantação destes equipamentos através do Programa de Expansão do Atendimento
Educacional foi prevista em uma lei de maio de 2009, Lei 689/09, que, para viabilizar o
programa, concede 28.000 (vinte e oito mil) cotas de potencial construtivo de um metro
quadrado no valor de R$350,00 cada uma. Este Programa tem o objetivo de “acelerar a
abertura de vagas para o atendimento de crianças de 0 a 5 anos, na educação infantil
66
,
criando mais de nove mil novas vagas nas creches construídas e ampliadas, entretanto, este
programa ainda está em processo de implantação em vista do curto período de sua
vigência.
66
Portal Administrativo do Município, 2009.
Capitulo IV
A Aplicação da TDC em Curitiba
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
87
“Para o secretário municipal de Urbanismo, Luiz Fernando Jamur, a concessão
de recursos ao Programa de Expansão do Atendimento Educacional é uma
medida que prevê o equilíbrio social e econômico da cidade. „É mais um
avanço nas políticas urbanas de Curitiba para melhor atender a população
mais carente com educação. É uma ação que reverte em qualidade de vida
para todos na cidade‟, diz Jamur”
67
A) A aplicação da TPC em UIPs
Quando se trata do patrimônio cultural edificado, tem-se a utilização do
instrumento da TPC em UIPs e UIEPs. Quanto às UIPs em Curitiba, até junho de 2008
68
,
foram arquivadas na CAPC-SMU sessenta Certies de Concessão de Potencial
Construtivo (CCPC), porém cerca de cinco imóveis
69
que tiveram potencial concedido
antes de 1991 não possuem certidão arquivada. A falta de CCPC e de maiores informações
sobre a concessão de potencial construtivo para estes imóveis podem ser justificadas
porque somente em 1991 foi aprovado o Decreto 408/91, que regulamentou pela primeira
vez a operacionalização do instrumento e instituiu a CAPC.
A primeira concessão de potencial construtivo para uma UIP em Curitiba aconteceu
no ano de 1986, quatro anos depois da aprovação da Lei 6.337/82, o que demonstra que
houve um tempo de assimilão e conhecimento do novo instrumento pela população que
poderia se beneficiar do incentivo. Este primeiro caso de utilização do instrumento
evidenciou a falta de maturidade para uma aplicação eficaz do incentivo e, também, o
conflito entre os agentes envolvidos, visto que o proprietário do imóvel beneficiado
70
não
cumpriu o acordo com a prefeitura de restaurar a UIP em troca da concessão do potencial
construtivo, que foi todo vendido. Entretanto, este caso serviu para promover modificações
nas normas para a liberação do potencial construtivo, que na década de 1990 passou a ser
liberado em parcelas, na medida em que a recuperação do imóvel fosse efetuada.
A pesquisa junto a SMU de Curitiba foi finalizada em junho de 2008, No entanto,
a última CCPC para uma UIP a qual se teve acesso, tinha sido fornecida um ano antes, em
junho de 2007 (Certidão 60). Esta última concessão foi solicitada através de um
processo de 2006, mostrando que os procedimentos para a concessão demoraram cerca de
um ano. Esta disparidade entre o ano de solicitão da certidão e o ano de sua concessão
67
Portal Administrativo do Município, 2009.
68
Julho de 2008 foi quando ocorreram as últimas atualizações dos dados sobre a aplicação da TPC junto à PMC.
69
Segundo NOVALAR (2006, p.214) e Back (2004, p.120) os cinco imóveis que tiveram potencial concedido antes de
1991 foram: Casa Hauer (1986), Casa Padre Emir (1988), Circulo de Estudos Bandeirantes (1989), Palacete Bastel
(1990) e Casa Ninon (1990).
70
Este imóvel é a Casa Hauer, que terá sua utilização da TPC exposta no próximo item deste Capítulo.
Capitulo IV
A Aplicação da TDC em Curitiba
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
88
Figura 26: Gfico com a Cronologia da expedição de CCPC
Fonte: Gráfico Construído a partir de dados retirados das CCPC arquivadas na SMU
está presente em mais da metade dos
processos de TPC em Curitiba,
chegando, alguns processos, a levarem
três anos ou mais para obtenção da
CCPC. O caso que mais demorou a ser
concluído, entre os pesquisados, foi o da
Casa das Pinturas, cujo proprietário deu
entrada no processo de solicitação em
1989 e só obteve a certidão em 1996 (Figura 25).
Cronologicamente, as concessões de CCPC pela administração municipal de
Curitiba, que iniciaram em 1986 com a Casa Hauer não tiveram um crescimento contínuo,
tendo picos como no ano de 2003 quando foram concedidas onze certidões. Contudo, com
o passar dos anos, o número de certidões concedidas anualmente aumentou, como pode ser
observado no gráfico abaixo:
Todos os sessenta e cinco imóveis aludidos acima são classificados como UIPs,
enquadrando-se na finalidade de utilização da TPC determinada pelo Plano Diretor de
2004 em seu artigo 65, que é a de promoção, proteção e preservação do patrimônio
histórico cultural, natural e ambiental”
71
. Entretanto, alguns destes imóveis (menos da
metade) são tombados emvel estadual ou ainda fazem parte do entorno de imóveis
tombados, tendo um valor cultural ainda maior. Vale aqui destacar os imóveis tombados na
esfera estadual por fazerem parte da paisagem urbana da Rua XV de Novembro, como a
Casa Louvre, atual Lojas Mariza e a Casa Issa M. Issa (Figuras 27 e 28); a Casa Vilanova
71
Lei 11.296/04 (Plano Diretor), artigo 65, inciso I.
0
1
2
3
4
5
6
7
8
9
10
11
12
1986
1887
1988
1989
1990
1991
1992
1993
1994
1995
1996
1997
1998
1999
2000
2001
2002
2003
2004
2005
2006
2007
Figura 25: Casa das Pinturas
Fonte: www.curitiba-parana.net
Capitulo IV
A Aplicação da TDC em Curitiba
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
89
Figura 27: Casa Louvre, atual
Lojas Mariza na Rua XV de
Novembro
Fonte: Banco de dados da SMU
Figura 28: Casa Issa M. Issa,
imóvel art deco na Rua XV de
Novembro
Fonte: Banco de dados da SMU
Figura 29: Casa Vermelha no
Largo da Ordem
Figura 30: Casa Ligia Stolz no Largo
da Ordem
Figura 31: Igreja da Ordem Terceira
Artigas e o Palacete Leão Junior
72
(Figuras 69 e 45) tombados isoladamente em nível
estadual; e a Casa Vermelha e a Casa Ligia Stolz (Figuras 29 e 30) que fazem parte do
entorno da Igreja da Ordem Terceira (Figura 31) tombada em nível estadual. É importante
ressaltar que a UIP tombada ou localizada no entorno de bens tombados, além das
restrições e limitações administrativas municipais, apresenta ainda restrições quanto à
utilização do seu potencial construtivo em virtude da sua salvaguarda e da sua ambiência
em nível estadual/federal.
Quanto à localização das UIPs que receberam a concessão de potencial até 2008, a
grande maioria encontra-se inserida na região central de Curitiba, onde o traçado urbano é
mais antigo, mais especificamente na Regional Matriz (Figura 32). Apenas três imóveis se
localizam fora desta regional, um no Bairro Semirio, na divisa com a Regional Matriz,
outro no Bairro Santa Felicidade e o terceiro no Bairro Campo Comprido, todos incluídos
na Regional Santa Felicidade. Vale ressaltar que os dois últimos imóveis mencionados
73
são de tipologia rural, construídos por imigrantes quando o seu entorno ainda era pouco
72
A Casa Vilanova Artigas e o Palacete Leão Junior terão sua utilização da TPC expostas no próximo item deste
Capítulo
73
Um destes imóveis é a Casa das Pinturas (Figura 25) localizada no Bairro Santa Felicidade que foi
construída por imigrantes italianos no final do século XIX e atualmente abriga um restaurante e ainda
conserva em seu interior a decoração e pinturas feitas pelos imigrantes da época.
Capitulo IV
A Aplicação da TDC em Curitiba
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
90
ocupado, o que explica o seu afastamento físico das demais UIPs localizadas no perímetro
central de Curitiba.
A Regional Matriz foi onde começou a evolução urbana da cidade de Curitiba,
tendo sua história de formação e urbanização iniciada no século XVII, como pode ser visto
no Mapa da Evolução da Ocupação Urbana de Curitiba contido no Anexo C. Destarte, é
nesta região que se encontra a maior parte do acervo do patrimônio cultural edificado do
município e, conseqüentemente, onde se concentram a maior parte das UIPs. Como
aludido anteriormente é nesta Regional que se situam as UIPs que tiveram concessão de
Figura 32: Mapa do Munipio de Curitiba dividido sobre Regionais Administrativas e com Bairros
que concederam a TPC até junho de 2008
Fonte: Dados das CCPTs sobre Mapa de Bairros e Regiões Administrativas do IPPUC
MAPA SEM ESCALA
Capitulo IV
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91
potencial, sendo que quase todas estão localizadas nos Bairro Centro e São Francisco, os
mais antigos de Curitiba (Figura 33). Vale ressaltar que no Bairro Centro, juntamente com
parte do Bairro Batel, onde se localizam três UIPs que geraram potencial, o custo do solo
urbano é o mais alto de Curitiba, tendo também o Bairro São Francisco o solo muito
valorizado, incluído no segundo valor mais alto da cidade, conforme o Mapa do Custo da
Terra no Anexo D. O alto valor do metro quadrado nestes Bairros foi fator fundamental
para o interesse dos proprietários das UIPs em buscar a concessão da TPC
74
, porque,
quanto mais alto o valor do metro quadrado do solo da UIP, menor será a quantidade de
potencial construtivo (Pc) que ele necessitará vender para se obter a mesma quantidade de
potencial transferível (Pt), conforme exemplificado no quadro abaixo:
Fórmula do Decreto 625/04:
Pc = Ptr x Vmr x Cc x Fc
Vmc Cr
Onde:
Ptr = Potencial construtivo do imóvel que recebe o potencial;
Pc = Potencial construtivo do imóvel que cede o potencial;
Vmc = Valor do metro quadrado do imóvel que cede o potencial;
Vmr = Valor do metro quadrado do imóvel que recebe o potencial;
Cr = Coeficiente de aproveitamento do imóvel que recebe o potencial;
Cc = Coeficiente de aproveitamento do imóvel que cede o potencial;
Fc = Fator de correção.
Proprietário do imóvel recebedor
localizado no Bairro Rebouças em uma
ZR-4
Vmr = R$ 50,00
Cr = 2,5
Fc = 0,55
Ptr = 200 m²
Cálculo quando o Proprietário do imóvel
1 deseja transferir o seu potencial
Vmc1 = R$ 100,00 - Cc = 2 *
Pc = 200 x 50 x 2,5 x 0,55 Pc1 = 68,75 m²
100 2
Cálculo quando o Proprietário do imóvel
2 deseja transferir o seu potencial
Vmc2 = R$ 20,00 - Cc = 2 *
Pc = 200 x 50 x 2,5 x 0,55 Pc2 = 343,75 m²
20 2
Obs:
Todos os exemplos utilizados são hipotéticos
* para melhor entendimento da exemplificação utilizou-se o mesmo valor de Cc para ambos os imóveis, entretanto nunca
este valor é o mesmo para valores de solo urbano tão distintos.
74
Informações obtidas através de questionários respondidos por proprietários de UIPs que transferiram potencial.
Figura 33: Quadro contendo exemplo de cálculo de Potencial Construtivo de imóveis que cedem
potenciais..
Capitulo IV
A Aplicação da TDC em Curitiba
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
92
Como pode ser percebido na Figura 34 acima, as UIPs que se encontram na
Regional Matriz estão inseridas, em sua maioria, nos Zoneamentos que a Lei de
Zoneamento, Uso e Ocupação do Solo de Curitiba denomina Zona Central (ZC)
75
e Zona
Residencial 4 (ZR-4)
76
. A ZC é caracterizada por ser uma área de grande verticalização,
com parâmetros urbanísticos mais flexíveis - o número de pavimentos máximo é livre e o
75
De acordo com o artigo 6º da Lei 9.800/00, ZC é o “centro tradicional da cidade, caracterizada pela grande
concentração de atividades e funções urbanas de cater setorial”.
76
As ZRs têm o perfil direcionado para uso habitacional e de acordo com o artigo da Lei 9.800/00 são
divididas em onze “segundo suas características e intensidade de uso e ocupação do solo”.
Figura 34: Mapa da área central de Curitiba com a espacialização dos imóveis que concederam TPC
até junho de 2008, em seus respectivos zoneamentos.
Fonte: Dados das CCPCs sobre mapa do IPPUC
MAPA SEM ESCALA
Capitulo IV
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93
coeficiente de aproveitamento é o maior da cidade, com valor de cinco, podendo ser
estendido para sete quando utilizada a TPC. Desta forma, na ZC os imóveis são bem mais
valorizados, estando mais vulneráveis à especulação imobiliária, ao mesmo tempo em que
são mais propícios à utilização da TPC, pois o potencial construtivo que a UIP o pode
utilizar por razões preservacionistas é maior que em outras regiões da cidade, devido ao
alto valor do coeficiente de aproveitamento nesta zona. Logo a ZR-4 possui um caráter
bem mais restritivo que a ZC, apesar de ser mais flexível que as outras ZRs. Na ZR-4, o
coeficiente máximo permitido pela Lei Zoneamento é dois, com a possibilidade de
acréscimo de 0,5 (zero rgula cinco) ao utilizar-se a TPC.
Uma parte das UIPs que cedeu potencial construtivo, além de estar inserida em
alguma zona, está ainda inserida em Setores Especiais
77
·. Na Figura 34 pode-se observar
que um número considerável de UIPs está no Setor Especial Histórico que é “parte da área
central de Curitiba e engloba um grande número de edificações originárias do processo de
ocupação da cidade do fim do século XIX e início do século XX, caracterizando o núcleo
urbano com maior expressão histórica e cultural”
78
. Este setor é definido em função da
proteção dos remanescentes históricos e sua ambiência e tem parâmetros construtivos bem
restritivos, tendo o coeficiente de aproveitamento igual a, no máximo, 2,6 (dois vírgula
seis) podendo ser estendido até quatro no caso de UIP que transfira todo o seu potencial
construtivo para outro lote. Esta diferença nos valores de coeficiente é utilizada para
incentivar o fim do re-loteamento” que é a utilização de parte ou de todo o potencial
concedido no mesmo terreno da UIP.
Algumas UIPs que cederam a TPC estão inseridas no Setor Especial Preferencial de
Pedestres (SE-PE)
79
, como aquelas localizadas na Rua XV de Novembro e no Largo da
Ordem, tendo também parâmetros construtivos restritivos, com coeficiente de
aproveitamento de valor 3,6 (três rgula seis) e máximo de cinco pavimentos, não
podendo receber potencial construtivo por TPC. UIPs, ainda, inseridas no Setor
Especial Estrutural, que possui caráter antagônico ao SH, pois é definido como área de
expansão do centro tradicional e como corredor comercial, de serviço e de transporte,
possuindo, desta forma um coeficiente de quatro que pode chegar a seis na área central.
77
De acordo com o artigo 15 da Lei 9.800/00 “Os Setores Especiais, compreendem áreas para as quais são estabelecidas
ordenações especiais de uso e ocupação do solo, condicionadas às suas características locacionais, funcionais ou de
ocupação urbanística, já existentes ou projetadas, e aos objetivos e diretrizes de ocupação da cidade.
78
Lei 9.800/00, artigo 23.
79
Segundo o artigo 24 da Lei 9.800/00, o Setor Especial Preferencial de Pedestres - SE-PE compreende os terrenos com
testada para as vias públicas bloqueadas total ou parcialmente ao tráfego de veículos.
Capitulo IV
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94
Os cálculos para se chegar ao potencial construtivo de uma UIP, conforme a
fórmula prevista na Lei 9.803/00
80
, além de levar em conta o coeficiente de
aproveitamento da região na qual está inserida (Cc), utiliza-se a área total do terreno
cedente (A). Entretanto, o valor do potencial construtivo que realmente será cedido varia
muito da análise de cada caso, visto que, algumas vezes, ao valor da área do terreno é
subtraída a área edificada da UIP e, em outras vezes, além de não ser subtraída esta área,
ela é somada como uma bonificação, aumentando bastante o potencial construtivo total
cedido. Esta somatória mostra que a avaliação da quantidade de potencial construtivo a ser
concedido é avaliada pelo órgão responsável de uma maneira diferente para cada pedido de
concessão de potencial, não havendo um procedimento definido para esses cálculos. Na
maioria dos casos de concessão acontece o somatório da área da UIP, principalmente nas
concessões mais recentes, entretanto em alguns casos a área não é somada, como no UIP
pertencente à Sociedade Polono Brasileira
81
, que tinha o potencial do terreno com valor de
1.826 (mil oitocentos e vinte e seis) metros quadrados e foi este o valor concedido ao seu
proprietário.
As UIPs têm na questão de sua propriedade a diferença mais nítida em relação às
UIEPs, uma vez que as primeiras eram originalmente de propriedade privada, tendo,
algumas, passado para propriedade blica após doação do imóvel à prefeitura, em troca
da concessão de todo o potencial construtivo da UIP para ser utilizado em outro terreno. A
concessão de potencial através da doação da UIP à municipalidade tem como exemplos a
UIP denominada Teatro de Novelas Curitibanas, que hoje abriga um teatro para setenta
pessoas e a Casa Wichter, onde funciona um Museu de Arte (Figuras 35 e 36). Atualmente,
a concessão de potencial em troca da doação do imóvel está em desuso em Curitiba porque
a municipalidade possui vários imóveis históricos sob sua propriedade, demandando
muitos recursos para manutenção.
80
Pc = Ca x A onde:
Pc = Potencial Construtivo
Ca = Coeficiente de aproveitamento permitido na zona ou setor onde está localizado o imóvel cedente
A = Área total do terreno cedente.
81
Conforme a 10ª CCPC, a UIP pertencente à Sociedade Polono Brasileira, localiza-se no SH e teve a concessão do
potencial construtivo no ano de 1995, gerando, a partir de 690 metros quadrados de terreno, 1.826 metros quadrados de
potencial construtivo transferidos em duas parcelas.
Capitulo IV
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95
Figura 35: Novelas Curitibanas
doada ao município em 1991
Fonte: www.skyscrapercity.com
Figura 36: Casa Wichter doada ao
município em 1992
Fonte: Banco de dados da SMU
A grande maioria dos proprietários privados das UIPs assimilou bem o instrumento
da TPC, vendo sua utilização como um direito por estarem mantendo aquele imóvel
preservado para usufruto de toda a comunidade. Estes proprietários utilizam os recursos
advindos da venda de potencial para a restauração, recuperação e, principalmente, para a
readaptação do seu imóvel a um novo uso (principalmente comercial ou de serviço), visto
que, muitas vezes, o mesmo se encontrava subutilizado. Com a recuperação, o imóvel
passa a ser mais valorizado tanto pelo proprietário, que muitas vezes não percebia o valor
cultural de seu prédio antigo em “ruínas”, como por empreendedores privados interessados
em utilizar a imagem do prédio histórico para valorizar seu negócio. Além disso, segundo
técnicos da PMC, a intensificação dos restauros e recuperações das UIPs em função da
concessão de TPC, repercutiram diretamente sobre a percepção da população curitibana em
relação à importância da preservação dos imóveis que contam a história da sua cidade,
porque esta passou a enxergar aquele patrimônio que muitas vezes estava esquecido
debaixo de muitas camadas de tintas, mofo e poeira
82
.
Quanto às tipologias das UIPs que cederam potencial construtivo, observou-se,
através de informações coletadas junto a SMU, um predonio de imóveis cedentes
classificados como ecléticos, do final do século XIX e início do século XX, principalmente
com características de chalé por apresentar telhado colonial aparente e bastante inclinado,
típico das regiões mais frias do país (Figura 37). Os imóveis ecléticos tiveram influência
dos construtores e moradores de várias nacionalidades, como poloneses, alemães e
italianos, variando entre palacetes de uso original residencial, sobrados de uso misto ou
resincias de um pavimento e porão alto, muitos contendo elementos de Art-Nouveau e
Neoclássicos (Figura 38 a 42). Além disso, estão presentes alguns imóveis típicos da
imigração italiana do início do século XX (Figura 43), um imóvel de tipologia industrial
82
Informações obtidas através de entrevista concedida por e Lorene Elizabeth Rothe técnica da SMU e por Carla Choma
Frankl técnica do IPPUC, em junho de 2008
Capitulo IV
A Aplicação da TDC em Curitiba
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96
Figura 37: Chalé eclético uso
comercial
Fonte: Banco de dados da SMU
Figura 38: Palacete Eclético uso
original residencial
Figura 39: Sobrado Eclético
de uso misto.
Fonte: Banco de dados da SMU
Figura 40: Casa eclética de
porão alto
Fonte: Banco de dados da SMU
Figura 41: Palacete com
características de Art Nouveau
Fonte: Banco de dados da SMU
Figura 42: Colégio Marista,
características neoclássicas
Fonte: Banco de dados da SMU
Figura 43: Casa típica da
imigração italiana
Fonte: Banco de dados da SMU
Figura 44: Antigo Moinho
edificação fabril
Fonte: Banco de dados da SMU
Figura 45: Casa modernista -
autoria Vilanova Artigas
Fonte: Banco de dados da SMU
(Figura 44), imóvel de tipologia Art Decô (Figura 26) e um imóvel de tipologia moderna,
de autoria do arquiteto João Batista Vilanova Artigas (Figura 45).
Todas as UIPs devem ser restauradas por arquitetos, assim, estes são os principais
agentes de conscientização dos proprietários das UIPs, pois ficam encarregados de discutir
com os técnicos da prefeitura todos os detalhes do restauro antes de apresentar o projeto
para solicitar o Alvará de Restauração. De acordo com técnico do IPPUC, os critérios para
as intervenções nos imóveis históricos são definidos “caso a caso” e, muitas vezes, as
restrições quanto às intervenções vão sendo compatibilizadas de forma a viabilizar a
conservação do imóvel da melhor maneira possível, nem que para isso seja necessário
aprovar mudanças internas para abrigar um novo uso
83
. Através de imagens do antes e
depois de imóveis restaurados para a concessão de TPC, pode-se observar que pelo menos
em suas fachadas houve a preocupação em preservar ou restabelecer os elementos originais
83
Informações obtidas através de entrevista concedida por Carla Choma Frankl técnica do IPPUC, em junho de 2008
Capitulo IV
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97
Figura 46: Casa Imobline antes
do restauro
Fonte: Banco de dados da SMU
Figura 48: Sociedade Polono
antes do restauro
Fonte: Banco de dados da SMU
Figura 49: Sociedade Polono
após o restauro
Fonte: Banco de dados da SMU
Figura 47: Casa Imobline após
o restauro
Fonte: Banco de dados da SMU
de forma a tornar legível o valor cultural que aquele imóvel tem para a cidade (Figura 46 a
49).
Praticamente todas as UIPs que receberam a CCPC transferiram potencial
construtivo para pelo menos um imóvel recebedor, sendo que algumas, além de transferir
para outro lote, utilizaram parte do potencial no mesmo terreno em uma nova construção
ou ampliação da UIP, mediante aprovação da CAPC, que define as exigências como
afastamentos e gabaritos para cada caso. Pôde-se observar que apenas uma minoria dos
imóveis utilizou o potencial concedido pela CCPC no mesmo lote. Este número reduzido,
segundo técnicos da PMC, deve-se ao fato de que a utilização de potencial no mesmo lote
nem sempre mostra-se a mais viável, devido ao tamanho reduzido de alguns terrenos.
Além do que, nos últimos anos, a administração municipal tem oferecido vantagens para
quem preservar o imóvel em seu estado original, incluindo quintais e jardins
84
. Um
exemplo de UIP que utilizou o potencial construtivo no mesmo terreno é a UIP que abriga
atualmente Hotel Íbis, no qual, o proprietário preservou a edificação histórica como
entrada e recepção e ergueu nos fundos uma nova edificação que abriga os apartamentos
do hotel.
84
A principal vantagem é a definição de um coeficiente de aproveitamento maior nos casos em que o se construa
novas edificações no terreno da UIP, o que aumenta a quantidade de potencial construtivo concedido quando o
proprietário pretende apenas transferir este potencial para outros terrenos. Desta forma, a preservação da UIP acontece
como um todo, favorecendo a manutenção de detalhes que fazem parte do seu conjunto, como jardins e quintais.
Capitulo IV
A Aplicação da TDC em Curitiba
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98
Figura 50: Hotel Íbis antes do
restauro
Fonte: Banco de dados da SMU
Figura 51: Hotel Íbis após restauro
com nova edificação ao fundo
Fonte: Banco de dados da SMU
Figura 52: Casa dos Anjos primeira
a ter liberação de TPC em etapas
Das UIPs que transferiram potencial
construtivo para outros terrenos a que mais tinha
transferido potencial até junho de 2008 era a
edificação denominada Casa dos Anjos, a qual
transferiu o potencial por treze vezes até esgotar
todo o seu saldo (Figura 52). Esta UIP foi a
primeira a ser recuperada dentro da regra de
liberação do potencial construtivo em parcelas de
acordo com o avanço da obra de restauro, disposta pela Resolução 02/99 da CAPC. Como
o proprietário da Casa dos Anjos, outros que receberam a CCPC a partir de 2000 também
fizeram a transferência do seu potencial em várias etapas, refletindo a nova regra de
liberação em parcelas do potencial construtivo.
Outro fator importante na aplicação da TPC em Curitiba é que a maior parte das
unidades realizou a primeira TPC no mesmo ano de concessão da CCPC, contudo
demoraram mais para realizar as outras transferências, o que demonstra certa lentidão no
processo, principalmente na parte de venda do potencial construtivo. Por meio de
entrevista com proprietários, percebeu-se a dificuldade enfrentada por eles na venda do
potencial construtivo, porque, apesar da demanda por parte do mercado imobiliário ser
grande, a oferta de potencial vem aumentando com a geração do mesmo através de outras
categorias de utilização da TPC.
Buscando facilitar a venda do potencial construtivo dos proprietários de UIPs que,
em sua maioria, é em pequena quantidade e objetivando ainda promover maior divulgação
do potencial construtivo disponível em Curitiba, a PMC desenvolveu o Banco de Potencial
Construtivo, que é, na verdade, um banco de dados disponibilizado na web site da
Capitulo IV
A Aplicação da TDC em Curitiba
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
99
prefeitura
85
, no qual se apresenta o potencial construtivo disponível para venda, advindo
tanto de UIP, como de áreas verdes e programas habitacionais. No banco de dados estão
disponíveis informações do imóvel cedente, como o nome do proprietário e seu contato, o
zoneamento da UIP, a metragem inicial e saldo atual de potencial, assim como o número
de transferências efetivadas, a localização dos recebedores e a metragem recebida por cada
um.
Quanto aos imóveis que receberam o potencial transferido das UIPs, a grande
maioria localiza-se em Zona Residencial-4 e em Setor Especial Estrutural (SE), que são
regiões da cidade de Curitiba onde é incentivada a ocupação e a expansão, estando entre as
zonas nas quais a Lei 9.003/00 admite o recebimento de TPC. Outras zonas residenciais
também receberam potencial construtivo, devido à vocação residencial, porém a ZR-4 foi a
que mais recebeu, principalmente por apresentar parâmetros construtivos menos rígidos
que as demais. A ZC apesar de apresentar um coeficiente de aproveitamento alto, possui
menos imóveis recebedores que a ZR-4 e o SE, mas recebeu maior quantidade de potencial
transferido, uma vez que com o uso da TPC os imóveis recebedores podem aumentar o seu
coeficiente até o valor de sete.
O potencial construtivo utilizado nos imóveis recebedores foi usado principalmente
para o aumento do gabarito das edificações, tendo sido utilizado, em alguns casos, para a
regularização de obras que estão em desacordo com as normas municipais e, ainda, com a
intenção de obter a autorização da mudança de uso de imóveis. A principal vantagem que
os proprietários destes imóveis, incorporadores imobiliários em sua maioria, entendem na
utilização do instrumento da TPC é a possibilidade de flexibilizar os parâmetros
construtivos estabelecidos na Lei de Zoneamento, tornando mais viável o
empreendimento
86
. Alguns destes proprietários vêem, também, o uso da TPC ou da
Outorga Onerosa do Direito de Construir
87
em Curitiba como uma regra imposta pela
prefeitura, visto que, ou se compra o potencial, ou o custo do empreendimento não é
viabilizado, uma vez que ao possibilitar mais construções em um local da cidade o custo
daquele solo eleva-se.
85
http://www2.curitiba.pr.gov.br/gtm/pmat_potencialconstrutivo/potencialconstrutivo.aspx
86
Informações obtidas através de entrevistas escritas concedidas por incorporadores imobiliários que adquiriram
potencial construtivo.
87
O Outorga Onerosa do Direito de construir esta prevista em Curitiba na Lei Ordinária 7.841/1990.
Capitulo IV
A Aplicação da TDC em Curitiba
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
100
B) A aplicação da TPC em UIEPs
As UIEPs são imóveis de uso público e de grande valor cultural para o município,
caracterizadas como UIEPs com o objetivo principal de arrecadação de fundos para o seu
restauro. Desde 1993, ano da instituição do decreto que dispôs sobre as UIEPs, até 2008
foram definidas como UIEPs doze imóveis de valor cultural em Curitiba. Estas UIEPs
juntas totalizaram a concessão de 89.636 (oitenta e nove mil seiscentos e trinta e seis)
metros quadrados de potencial construtivo representando 89.636 (oitenta e nove mil
seiscentos e trinta e seis) cotas que foram vendidas (ou ainda estão sendo, no caso de
UIEPs mais recentes) a R$200,00 cada uma, viabilizado a arrecadação de quase dezoito
milhões de reais para as obras de restauro destas Unidades, conforme Tabela 1.
UIEP
Ano
Potencial
Concedido
(m²)
Valor do
Restauro
(R$²)
Nº de
cotas de
1 m²
Valor da
Cota
(R$)
1
Catedral Basílica de Curitiba
1993
6850
1.370.000,00
6850
200,00
2
Universidade Federal do
Paraná
1993
5200
1.040.000,00
5200
200,00
3
Sociedade Garibaldi
1993
3100
620.000,00
3100
200,00
4
Reservatório Alto de São
Francisco
1996
2450
490.000,00
2450
200,00
5
Ministério Público
1997
10200
2.040.000,00
10200
200,00
6
União Paranaense de
Estudantes
1999
3560
712.000,00
3560
200,00
7
Sociedade 13 de Maio
2001
1893
378.600,00
1893
200,00
8
Fundação Cultural de
Curitiba
2001
3325
665.000,00
3325
200,00
9
Antiga Sede do Museu
Paranaense
2002
12500
2.500.000,00
12500
200,00
10
Capela Santa Maria
2004
6557 *
1.311.400,00
6557 *
200,00
11
Museu Metropolitano de
Arte de Curitiba
2007
15611
3.122.200,00
15611
200,00
12
Casa do Estudante
Universitário
2007
18390
3.678.000,00
18390
200,00
Total
-
89636
17.927.200,00
89636
-
* A este valor foram acrescidas as 12.500 cotas oriundas da Antiga Sede do Museu Paranaense, somando 19.057.
Tabela 1: Lista das UIEPs em Curitiba
Fonte: Elaborado pela autora
Capitulo IV
A Aplicação da TDC em Curitiba
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
101
Figura 116: UIEP Museu Metropolitano
de Arte de Curitiba
Fonte: www.curitiba-parana.net
Quanto à localização, praticamente todas
as UIEPs estão localizadas na Regional Matriz,
sendo que cinco estão no Bairro Centro, cinco
no Bairro Alto São Francisco, e apenas uma no
Bairro Rebouças (Figura 54). A única UIEP que
o se localiza na região central de Curitiba é o
Museu Metropolitano de Arte de Curitiba
(MUMA), localizado no Bairro Portão na Regional Portão e é ainda o único exemplar das
UIEPs de tipologia Moderna (Figura 53).
53
Figura 54: Mapa da área central de Curitiba com a espacialização das UIEPs
Fonte: Dados da SMU sobre mapa do IPPUC
MAPA SEM ESCALA
Capitulo IV
A Aplicação da TDC em Curitiba
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
102
Figura 55: UIEP União Paranaense
de Estudantes antes do restauro.
Fonte: BITENCOURT, 2005.
Figura 56: UIEP Prédio do Ministério
Público antes do restauro
Fonte: BITENCOURT, 2005
O restauro destas edificações devolveu a elas a vivacidade que o tempo e a falta de
recursos para manutenção haviam retirado. Algumas se encontravam em precário estado de
conservação, como a Sede da União Paranaense de Estudantes (UPE), que teve que ser
abandonada em 1994 por se encontrar com estruturas bastante danificadas (Figura 55),
permanecendo sem uso até 1999, quando foi restaurada por meio da utilização da TPC. O
prédio do Ministério Público também se encontrava muito degradado antes de se tornar
uma UIEP e ser restaurado, uma vez que passou por diversas administrações, reformas e
ampliações, o que o fez perder muitas de suas características originais, como as pinturas
decorativas que foram redescobertas com as prospecções do restauro debaixo de várias
camadas de tinta. (Figura 56)
Das UIEPs vale citar o caso do Paço Imperial ou Antiga Sede do Museu
Paranaense, tombado pelo Instituto de Patrimônio Histórico e Artístico Nacional e pelo
Estado do Paraná, que foi classificada como UIEP em 2002 e gerou 12.500 (doze mil e
quinhetas) cotas de potencial construtivo. Em 2003, o Governo do Estado do Paraná
assumiu financeiramente as obras de restauração do referido imóvel e através do Decreto
203/04 todos os recursos captados com a venda de suas cotas de potencial construtivo
foram transferidas para viabilizar a recuperação da UIEP conhecida com Capela Santa
Maria
88
. Em junho de 2008, as obras de restauro da Capela Santa Maria, transformada em
Espaço Cultural, tinham sido finalizadas e os da Antiga Sede do Museu Paranaense
continuavam em andamento (Figura 57). Atualmente o Museu encontra-se restaurado,
fazendo parte de um programa maior de revitalização do centro de Curitiba, que contou
também com a recuperação de praças como a Praça Tiradentes (Figura 58 e 59).
88
O caso da Capela Santa Maria será exposto no próximo item deste Capítulo para melhor entendimento da aplicação da
TPC em UIEPs.
Capitulo IV
A Aplicação da TDC em Curitiba
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
103
3.3.3 Alguns casos para exemplificação da aplicação do
instrumento
Em Curitiba, até junho de 2008, foram expedidas pela PMC sessenta Certies de
Concessão de Potencial Construtivo para sessenta UIPs diferentes, que juntamente com as
UIPs que cederam potenciais até 1990 sem a expedição de certidão, totalizam sessenta e
cinco UIPs que concederam potencial construtivo. Compondo o patrimônio cultural
edificado, objeto da TPC em Curitiba, ainda estão as doze UIEPs, totalizando assim
setenta e sete bens arquitetônicos envolvidos no uso do instrumento da TPC. Apesar do
objeto de estudo desta pesquisa ser o patrimônio cultural edificado, um estudo de cada um
dos setenta e sete casos de aplicação da TPC em Curitiba ficaria demasiadamente extenso
para uma pesquisa deste porte. Desta forma, optou-se por, através da ajuda dos agentes da
prefeitura envolvidos na utilização da TPC, selecionar um número restrito de casos
referênciaspara serem estudados com maior detalhamento.
Destarte, foram selecionados cinco imóveis que, segundo os agentes da prefeitura,
abrangem diferentes aspectos práticos da utilização da TPC voltada para o patrimônio
cultural edificado em Curitiba, e podem, de uma maneira geral, mostrar como tem sido o
tratamento dos imóveis objeto do instrumento ao longo do tempo, divulgando alguns
pontos negativos e outros positivos da aplicação da TPC na cidade. Destes imóveis, quatro
são UIPs e um é UIEP e localizam-se em diferentes regiões da área central de Curitiba,
abrangendo as principais tipologias arquitetônicas dos imóveis objetos de TPC, como pode
ser observado na Figura 60 na próxima página:
Figura 57: Antiga sede do
museu em obras - 2008
Figura 58: Antiga sede do
museu restaurada - 2009
Fonte: www.skyscrapercity.com
Figura 59: Praça Tiradentes
requalificada - 2009
Fonte: www.skyscrapercity.com
Capitulo IV
A Aplicação da TDC em Curitiba
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
104
Figura 61: Localização da Casa Hauer
Fonte: Google earth (com alterações)
A) Casa Hauer (objeto de TPC em 1986)
A edificação denominada Casa Hauer
localiza-se no alinhamento da esquina formada
pela Rua José Bonifácio a pela Travessa Padre
Júlio de Campos, no Bairro Centro e tem este
nome por ter sempre pertencido a uma tradicional
família curitibana, a Família Hauer. O imóvel foi
edificado em 1897 pelo construtor Neumann,
Figura 60: Mapa da área central de Curitiba com a espacialização dos imóveis “casos
referência”.
Fonte: Dados da SMU sobre mapa do IPPUC
MAPA SEM ESCALA
Capitulo IV
A Aplicação da TDC em Curitiba
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
105
Figura 62: Rua José Bonifácio com Casa Hauer à direita em 1904
Fonte: Acervo Julia Wanderley - www.casadamemoria.org.br
Figura 63: Casa Hauer antes da
concessão de TPC
Fonte: Banco de dados da SMU
famoso na época por participar de diversas obras, a pedido dos imigrantes alemães
Francisco e Augusto Hauer. No local do novo prédio havia uma construção de apenas um
pavimento que sediava a loja de Ferragens Hauer e Irmão iniciada em 1888 e
posteriormente demolida. O prédio novo foi construído em estilo eclético com influência
da arquitetura alemã, para abrigar com mais comodidade a loja e também as residências
das famílias dos dois proprietários. Suas dependências foram distribuídas em três
pavimentos distintos e espaçosos, sendo que o primeiro abrigava a loja, o segundo a parte
residencial e o terceiro a dependência dos empregados (Figura 62). Internamente a
edificação possuía um pátio aberto, afrescos pintados no teto e escadas em madeira
torneada ricas em ornamentos e com corrimão em estilo colonial
89
.
Este é considerado um dos exemplares mais significativos da arquitetura ale em
Curitiba e encontra-se inserido no Setor Especial Histórico, que é a região mais antiga e
tradicional da cidade. A edificação também é muito importante por compor o entorno da
Catedral Basílica de Curitiba, tombada pelo Estado do Paraná, situando-se aos fundos desta
catedral em um local que se caracterizou no início do século por ser uma via de intenso
comércio. Esta edificação é classificada com UIP desde a
década de 1970.
Em 1986, os proprietários da Casa Hauer
solicitaram a concessão da TPC comprometendo-se a
restaurar o imóvel que se encontrava em precário estado
de conservação, principalmente nas partes do segundo e
do terceiro piso que, na época, abrigavam uma pensão
89
As informações históricas deste imóvel foram coletadas junto ao acervo documental da Fundação Cultural de Curitiba
em junho de 2008.
Capitulo IV
A Aplicação da TDC em Curitiba
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
106
Figura 64: Casa Hauer após
incêndio de 1998
Fonte: Marco Antônio Campos Acervo
da Casa da Memória/Diretoria de
Patrimônio Cultural / FCC
para rapazes. Eles foram os primeiros proprietários de UIPs a utilizar o instrumento da
TPC previsto quatro anos antes. O potencial concedido para este imóvel foi de 3.154 (três
mil cento e cinquenta e quatro) metros quadrados, transferidos em sua totalidade em uma
única parcela no ano de 1988 para o imóvel pertencente à Construtora Hauer e localizado
no Bairro Centro, no zoneamento ZC como a Casa Hauer. Como na SMU não registro
de CCPC da utilização da TPC pela Casa Hauer não se tem maiores informações sobre os
cálculos para o estabelecimento do potencial concedido e transferido, assim como do
imóvel que recebeu todo o potencial transferido.
Apesar de ter obtido a concessão de potencial construtivo e de ter transferido este
potencial, os proprietários da Casa Hauer não cumpriram o acordo com a PMC e não
restauraram o imóvel, que ficava com o passar do tempo em pior estado de conservação.
Desta maneira, em 1992 a Procuradoria Geral do Município de Curitiba entrou com uma
ação contra a Família Hauer, exigindo a devolução ao município dos valores recebidos
com a venda do potencial construtivo.
Ainda na década de 1990, o imóvel passou a
ser alvo de outra ação judicial, desta vez movida por
membros da Família Hauer que brigavam pela posse
do mesmo, avaliado na época em um milhão e
quinhentos e quarenta mil reais. Em 1998, um mês
após a desocupação do imóvel a mando da Justiça
por parte da loja Ferragens Hauer, pertencente a um
dos membros da família e que por mais de um século
ocupou o primeiro piso da edificação, houve um
incêndio que destruiu praticamente toda a parte
interna da edificação. Após investigações policiais
constou-se que o incêndio foi criminoso, porém, por
o haver provas desta acusação ninguém foi punido.
Atualmente, o prédio, que foi escorado por estruturas de madeira, encontra-se em
estado sico lastimável. Esta deprecião intensificou-se quando a edificação foi ocupada
por mendigos e marginais, que além de depredarem ainda mais suas estruturas, provocaram
rios outros incêndios devido às fogueiras feitas no inverno por estes “moradores”. Do
terceiro piso só restou a fachada, o primeiro piso teve as aberturas vedadas com tijolos para
evitar as invasões e até os escoramentos de madeira estão deteriorados (Figura 65).
Capitulo IV
A Aplicação da TDC em Curitiba
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
107
Figura 65: Casa Hauer em 2008
Figura 66: Catedral Basílica com a
Casa Hauer à esquerda
Figura 67: Localização do Palacete Leão Junior
Fonte: Google earth (com alterações).
Destarte, o edifício, que antes se destacava no entorno por sua imponência, adornos e
pintura vermelha, hoje continua se destacando, mas em função de seu estado de abandono,
tão próximo à Catedral mais importante da cidade e a uma praça recém revitalizada, como
pode ser percebido na Figura 66.
Segundo o IPPUC (2003), o exemplo da Casa Hauer é o mais controvertido de TPC
de unidade histórica em Curitiba, principalmente por não ter cumprido com o principal
objetivo do instrumento que é a recuperação e preservação do bem de valor cultural. A
ação da prefeitura contra a Família Hauer ainda corre na justiça e de acordo com
reportagem de 2007 do Jornal Bem Paraná, a família após receber a indenização do seguro,
que vinha sendo reclamado na justa, pretende reformar o prédio e dar outro destino a ele
(EHLERT, 2007).
B) Palacete Leão Junior (objeto de TPC em 2001)
A edificação conhecida como Palacete
Leão Junior localiza-se no antigo Boulevard
Dois de Julho, hoje Avenida João Gualberto, no
Bairro Alto da Glória, e tem esta denominação
por ter sido construída para abrigar a residência
de Agostinho Ermelino de Leão Junior e sua
esposa Maria Clara de Abreu Leão. O projeto do
palacete foi de autoria do engenheiro e ex-
prefeito de Curitiba ndido Ferreira de Abreu,
tendo a construção se iniciado em 1987 e
Capitulo IV
A Aplicação da TDC em Curitiba
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
108
Figura 68: Palacete Leão Junior no início doculo XX.
Fonte: IBM Brasil, 1987.
Figura 69: Palacete Leão Junior com
Leões de Porcelana.
Fonte: Fundação Municipal de Cultura
Figura 70: Palacete Leão Junior com grades de ferro
sobre o muro de pedra
Fonte: Fundação Municipal de Cultura
finalizado em 1902, quando a Família Leão Junior se mudou para o imóvel
90
.
O palacete reflete toda a riqueza, imponência e requinte do Ciclo da erva-mate na
economia e na vida social do estado do Paraná, pois Agostinho Leão Junior era um dos
principais industriais do produto do estado. Construído na parte central de um terreno de
9.309 (nove mil trezentos e nove) metros quadrados que continha aos fundos um pequeno
bosque, o imóvel tem seu aspecto palaciano favorecido pela visão dos jardins enfeitados
por les de louça importados de Portugal (Figura 69) e grades de ferro ornamentadas nos
portões e muros (Figura 70).
O palacete tem estilo eclético, típico da arquitetura da época, com predomínio de
elementos de Art Nouveau e Neoclássicos e é dividido em apenas um pavimento e porão
alto, com uma torre de dois pavimentos nos fundos (Figura 71 e 72). Possui cerca de 950
(novecentos e cinquenta) metros quadrados construídos e uma série de detalhes externos e
90
As informações históricas deste imóvel foram coletadas junto ao acervo documental da Fundação Cultural de Curitiba
em junho de 2008.
Capitulo IV
A Aplicação da TDC em Curitiba
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
109
Figura 71: Fachadas frontal e lateral
esquerda do Palacete Leão Junior
Figura 72: Vista dos fundos com a Torre do
Palacete Leão Junior
Figura 74: Vista interna da sala de lareira
com papel de parede floral do Palacete
Figura 73: Vista do teto da sala principal do
Palacete Leão Junior.
internos que dão a ele todo o requinte esperado para a época e para as condições
financeiras de seus proprietários (Figura 72 e 73).
A composição do Palacete obedece a um partido arquitetônico simétrico
inspirado na plástica renascentista, com momentos de evocação barroca. O
resultado conciso e harmonioso da fusão dos dois estilos pode ser
acompanhado no jogo de contrastes e no contraponto, presentes no caráter
estático da fachada de inspiração renascentista e no dinamismo da escadaria
principal com características barrocas; na fachada modulada por capitéis
coríntios e na profusa ornamentação; nos óculos decorados com cabeça de
leão que compõe a base do edifício, contrastando com a inspiração
renascentista do tratamento das paredes; na platibanda com abalaustrado
interrompido por pilaretes encimados de ornamentos em forma de jarro, onde
também aparecem cabeças de leão; nos elementos ecléticos que compõe as
portas com vidros decorados com motivos florais, formando cercaduras nos
monogramas dos proprietários.
Internamente, destacam-se os forros de estuque ornamentados com motivos
florais de influência rococó, os papéis de parede originais, acompanhando o
tema do forro e as portas de cedro, decoradas com verdadeiros painéis em
modelo clássico, produto de excelentes artesões e artistas de origem italiana e
aleque atuavam em Curitiba no final do século XIX. (IBM BRASIL, 1987)
Como pode ser observado no texto acima, o Palacete Leão Junior possui uma
riqueza arquitetônica e profusão de detalhes que dão a ele uma grande importância dentro
do contexto da história de Curitiba e do estado Paraná, enfatizada ainda mais por ele ser
uma das poucas testemunhas arquitetônicas que restaram do período áureo da erva-mate.
Capitulo IV
A Aplicação da TDC em Curitiba
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
110
Figura 75: Prédio aos fundos do
Palacete Leão Junior
Portanto além de ter sido caracterizado pelo município de Curitiba como UIP na década de
1970, foi tombada em nível estadual no ano de 2003.
O imóvel abrigou os descendentes de Augusto Leão Junior até o final da década de
1980 quando foi vendido para a empresa IBM Brasil, para instalar sua Sede da Regional
Sul. A empresa adquiriu o imóvel e todo o seu terreno consciente de que a edificação
existente ali tinha um valor histórico inestimável para a cidade de Curitiba, apesar de não
estar mais em seu estado original devido às rias adaptações e reformas que sofreu ao
logo dos anos. Como, na época, o terreno respondia a um zoneamento com parâmetros
construtivos muito restritivos, a construção do edifício para a nova Sede e a preservação do
Palacete seriam incompatíveis, caso a administração municipal não tivesse interferido.
Assim, foi permitida a construção da Sede da IBM em local antes proibido desde que:
- se preservasse ao máximo a vegetação de porte existente;
- se preservasse também o Palacete, devendo este ser destinado
exclusivamente a atividades culturais abertas ao público;
- o novo espaço cultural deveria ser administrado por um colegiado onde a IBM
seria minoria;
- a nova construção não devia ultrapassar a maior altura do Palacete;
- o acesso de veículos de carga deveria ser localizado na rua dos fundos.
(NOVALAR, 2006, p.144)
Seguindo as orientações da prefeitura, a IBM contratou os serviços de uma equipe
de profissionais e restaurou o Palacete Leão Junior, preservando-o em sua integridade e
recuperando vários detalhes encobertos por intervenções que ocorreram ao longo do
tempo, como os papéis de paredes da sala da lareira que tinham sido camuflados por um
painel de madeira (Figura 74). Foram recuperados ainda bens móveis como cortinas e
tapetes originais, que devolveram ao palacete todo o ar de requinte do início do século
passado.
Posteriormente ao restauro, em 1987, o
Palacete foi inaugurado como o Espaço Cultural
Palacete dos Leões, abrigando exposições artísticas de
rios tipos. Nos fundos do terreno foi erguida uma
edificação moderna, de linhas retas e de dois
pavimentos, para receber os escritórios da empresa
IBM (Figura 75 e 76). Entre o Palacete e a nova
construção, como uma linha divisória, foi preservado
Capitulo IV
A Aplicação da TDC em Curitiba
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
111
Figura 76: Croqui com o Palacete dos Leões e a nova edificação
Fonte: IBM Brasil, 1987
parte do bosque de vegetação de grande porte, o que de certa forma permitiu uma transição
suave e nada impactante entre as duas edificações de épocas tão diferentes.
Com o advento da Lei 9.800/00, os parâmetros construtivos do terreno foram
modificados e, tomando conhecimento do instrumento da TPC, os proprietários solicitaram
a concessão da mesma, para desta forma, segundo Novalar (2006, p.144), viabilizar, “o
retorno financeiro do capital anteriormente investido na restauração”. A CCPC foi
expedida em 2001, obedecendo cálculos diferenciados do potencial construtivo concedido,
visto que o imóvel localiza-se entre dois zoneamentos (ZR-4 e ZR-AG) com coeficientes
de aproveitamento distintos, , conforme pode-se constatar na Tabela 2 abaixo:
Área Total do terreno (ATer)
9.308,97
Coeficiente de
Aproveitamento(Cc) ZR-4
Área do terreno
contida na ZR-4
Coeficiente de
Aproveitamento(Cc) ZR-4
Área do terreno
contida na ZR-AG
2
6.049,67
1
3.259,00
Potencial Construtivo da ZR-4
(Cc x Area na ZR-4)
Potencial Construtivo da ZR-AG
(Cc x Area na ZR-AG)
12.099,34
3.259,00
Potencial total do terreno (Pt)
15358,34
Área Construída no terreno
3387,78 m²
Potencial remanescente do terreno (Pt-Ac)
11.970,78 m²
Bonificação da área do Palacete
945,17 m²
Potencial Construtivo Concedido
12915,95
Como se percebe na Tabela 2, o proprietário do Palacete foi beneficiado com o não
desconto da área do imóvel preservado ao potencial construtivo concedido. Não se sabe o
Tabela 2: Dados e cálculos para chegar ao valor de potencial concedido do Palacete Leão Junior
Fonte: CCPC do Palacete Leão Junior
Capitulo IV
A Aplicação da TDC em Curitiba
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
112
porquê deste tipo de decisão por parte da prefeitura, pois o potencial construtivo a ser
concedido tinha valor elevado devido às grandes dimensões do terreno. Mas isso
demonstra que a análise do potencial a ser concedido é realmente feita “caso a casocomo
os técnicos da prefeitura e os agentes imobiliários envolvidos na aplicação da TPC haviam
revelado, uma vez que há casos em que este potencial não é somado.
Do potencial construtivo concedido ao Palacete, 2.500 (dois mil e quinhentos)
metros quadrados foram separados para utilização posterior no próprio terreno do imóvel, e
do potencial restante foram efetivadas duas transferências, uma em 2003 e outra em 2002,
restando ainda ao proprietário 7.507 (sete mil quinhentos e sete) metros quadrados, que é
considerada uma quantidade alta para ficar parada” por cinco anos. Entretanto, este
potencial está disponível para venda no “Banco de Potencial Construtivo”, no site da PMC,
o que mostra que ele não foi negociado ainda pela falta de comprador.
Os dois imóveis que receberam potencial do Palacete Leão Junior localizam-se em
regiões diferentes de Curitiba. O primeiro encontra-se no Bairro Cristo Rei na Regional
Matriz, em uma ZR-4 e o segundo, no Bairro Mossunguê na Regional Santa Felicidade, na
Zona de Transição Nova Curitiba (ZT-NC). O primeiro imóvel adquiriu o valor de 500
(quinhentos) metros quadrados de potencial (Pt), mesmo valor descontado no saldo de
potencial do Palacete, uma vez que ambos estão próximos fisicamente e têm valores de
coeficiente de aproveitamento e de solo muito semelhantes. no segundo imóvel
recebedor, 1.452 (mil quatrocentos e cinquenta e dois) metros quadrados de potencial
cedido (Pc) se transformaram em 3.858 (três mil oitocentos e cinqüenta e oito) metros
quadrados de potencial construtivo transferível(Pt). Esta diferença ocorreu principalmente
dado o custo da terra na região do imóvel recebedor ser bem menor que na área do imóvel
cedente e, como explicado anteriormente, conforme a fórmula de potencial transferível
(Pt), quanto menor o custo do solo do imóvel recebedor, maior será o potencial
transferível.
Capitulo IV
A Aplicação da TDC em Curitiba
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
113
Data da
TDC
Localização do
Imóvel Receptor
Potencial
concedido pelo
imóvel cedente
(Pc)
Valor médio do solo
do imóvel cedente
(Vmc)
Coeficiente de
Aproveitamento do
imóvel cedente (Cc)
dia- ZR-4 (2) e ZR-AG
(1)
Pt
Pt= Pc x Vcm x Cc
Vmr Cr
2/7/2003
Rua Anselmo Nicco,
240 - Bairro
Mossunguê -
Regional Santa
Felicidade
1452,04 m²
96,24 *
1,64
Ordem da
TDC
Área do terreno do
imóvel recebedor
Valor médio do solo
do imóvel cedente
(Vmr) *
Coeficiente de
Aproveitamento quando
uso da TPC do imóvel
recebedor (Cr) ZT-NC
2ª de 2
5385,15 m²
33 *
1,8
3858
* Valores aproximados baseados no mapa de Custo da Terra em Curitiba disponível no Anexo D
Atualmente, o Palacete Leão Junior encontra-se em ótimo estado de conservação, e
continua abrigando um Espaço Cultural que passou a ser mantido pelo novo proprietário da
área, o Banco Regional de Desenvolvimento do Extremo Sul (BRDE), o qual ocupa o
edifício de escritórios aos fundos do terreno. Desde a concessão de potencial construtivo, o
palacete passou por outras intervenções sicas visando principalmente a sua manutenção.
A principal das intervenções foi a que resgatou a cor externa original (azul anil). Uma das
mais recentes, recuperou os Leões de porcelana que adornam os jardins do prédio. Assim
sendo, a utilização da TPC neste imóvel é considerada pelos técnicos da PMC uma das
mais bem sucedidas, pois mesmo o restauro tendo sido feito antes da concessão do
potencial, o proprietário tem preservado e mantido o imóvel em ótimo estado de
conservação com obras de manutenção constantes
Data da
TDC
Localização do
Imóvel Receptor
Potencial
concedido pelo
imóvel cedente
(Pc)
Valor médio do solo
do imóvel cedente
(Vmc)
Coeficiente de
Aproveitamento do
imóvel cedente (Cc)
média - ZR-4 (2) e ZR-
AG (1)
Pt
Pt= Pc x Vcm x Cc
Vmr Cr
25/11/2002
Rua Fioravante
Dalla Stella, 420 -
Bairro Cristo Rei -
Regional Matriz
500
96,24 *
1,64
Ordem da
TDC
Área do terreno do
imóvel recebedor
Valor médio do solo
do imóvel cedente
(Vmr) *
Coeficiente de
Aproveitamento
quando uso da TPC do
imóvel recebedor (Cr)
ZR-4
1ª de 2
2608,15 m²
78,9 *
2
500
* Valores aproximados baseados no mapa de Custo da Terra em Curitiba disponível no Anexo D
Tabela 3: Dados e cálculos para chegar ao valor do Pt de imóvel recebedor de TPC no Cristo Rei
Tabela 4: Dados e cálculos para chegar ao valor do Pt de imóvel recebedor de TPC no Santa Felicidade
Fonte: CCPC do Palacete dos Leões
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114
Figura 78: Casa Vilanova na dec. de
1970
Fonte: www.g-arquitetura.com.br
Figura 77: Localização da Casa
Vilanova Artigas
Fonte: Google earth (com alterões)
C) Residência João Luiz Bettega - Casa Vilanova Artigas (objeto de TPC
em 2003)
O imóvel denominado Residência João
Luiz Bettega e que atualmente é conhecido como
Casa Vilanova Artigas, localiza-se na Rua da Paz,
479 no Bairro Centro de Curitiba. A primeira
denominação está presente no livro de tombo do
imóvel e deve-se ao seu primeiro proprietário ter
sido o Dr. João Luiz Bettega, enquanto a segunda
deve-se ao arquiteto que projetou a resincia.
A Casa Vilanova Artigas foi projetada em
1949 pelo arquiteto modernista João Batista Vilanova
Artigas e construída entre 1953 e 1957 para abrigar o
médico João Luiz Bettega e sua família. O arquiteto
que hoje nome a casa era curitibano, contudo tem
poucas obras suas naquela cidade
91
, que atuou
principalmente em São Paulo aonde se graduou e
lecionou por muitos anos. Da escola modernista
paulista, Vilanova Artigas é um arquiteto conhecido
internacionalmente, tendo quase 700 (setecentos)
projetos e obras espalhados pelo Brasil
92
.
A Casa que o arquiteto construiu para o Dr. Bettega em Curitiba foi projetada em
estilo modernista influenciado pelos traços de Le Corbusier. Ela está inserida no meio do
terreno, tendo uma composição retangular tipicamente moderna e entrada lateral no centro
da edificação que, segundo Portela, criou uma solução rara na cidade de Curitiba dos anos
de 1950, assim como o quase esvaziamento da fachada, tornando-a semelhante à face
lateral (PORTELO, 2004). Nela todos os ambientes são voltados para a face que recebe
mais, proporcionando maior conforto térmico (Figura 79). Os 487 (quatrocentos e oitenta e
sete) metros quadrados de área construída são distribuídos em três pavimentos,
91
Em Curitiba Vilanova Artigas projetou o Hospital São Lucas, a Casa Vilanova Artigas e a Residência Niclievicz.
92
As informações históricas deste imóvel foram coletadas junto ao web site oficial da Casa Vilanova Artigas - Instituto G
Arquitetura.
Capitulo IV
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115
Figura 79: Face que recebe mais luz
na Casa Vilanova
Fonte: www.g-arquitetura.com.br
Figura 80: Fachada principal da
Casa Vilanova 3 pavimentos.
Fonte: www.g-arquitetura.com.br
Figura 81: Sala da Residência Bettega
com pé direito duplo
Fonte: www.g-arquitetura.com.br
Figura 82: Escada em espiral da Casa
Vilanova
Fonte: www.g-arquitetura.com.br
aproveitando o terreno inclinado. No nível da rua encontra-se a garagem e uma rampa que
dá acesso ao segundo piso, que é em parte composto por pilotis, tendo sala espaçosa de pé-
direito duplo, que se articula com o último nível da construção (Figura 80 e 81). Um dos
destaques da construção é uma escada em espiral que liga o primeiro piso ao apartamento
dos empregados (Figura 82). De acordo com a descrição da edificação no Livro de Tombo
Histórico do Estado do Paraná, a Casa Vilanova:
“(..) é uma das primeiras obras em que o arquiteto faz uso da circulação em
rampas e pavimentos em meios níveis, articulados pelo pé-direito duplo da
sala. Esse partido compreende as características mais marcantes das suas
obras posteriores inclusive em edifícios públicos.
93
A Casa Vilanova Artigas possui um enorme valor arquitetônico por ter inspirado a
construções de outros iveis dentro dos mesmos padrões, tanto por Vilanova Artigas
como por outros arquitetos. Historicamente, ela representa um ícone da arquitetura
moderna em Curitiba, mesmo tendo sido “esquecida” por vários anos. Tamanha é a
importância desta obra que em 1999 foi tombada em vel estadual a pedido de rios
agentes atuantes no campo da arquitetura na cidade
94
.
93
www.patrimoniocultural.pr.gov.br
94
Maiores informações sobre o tombamento deste imóvel encontram-se em:
http://www.patrimoniocultural.pr.gov.br/modules/conteudo/conteudo.php?conteudo=232
Capitulo IV
A Aplicação da TDC em Curitiba
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
116
Figura 83: Fachada da Casa Vilanova
Artigas antes do restauro
Fonte: Banco de dados da SMU
Figura 84: Sala principal da Casa
Vilanova Artigas antes do restauro
Fonte: Banco de dados da SMU
Em 2003, a casa foi adquirida pela arquiteta Gisele Portelo, que naquele mesmo
ano solicitou a CCPC, expedida em fevereiro de 2004. A arquiteta conhecia o instrumento
por ter trabalhado no restauro do Reservatório São Francisco em 1997 (uma UEIP que foi
restaurada com verba vinda da venda de potencial construtivo) e, ao adquirir a residência,
buscou o que considera ser direito de todo proprietário de UIP
95
. Localizado no Setor
Especial Estrutural Via Central, o coeficiente de aproveitamento do imóvel é igual a quatro
unidades, que multiplicada pela área do terreno (720 m²) resultou em 2.880 (dois mil
oitocentos e oitenta) metros quadrados de potencial construtivo concedido. A este potencial
concedido não foi descontada a área utilizado na edificação da UIP, pelo contrário, foi
somada a ele esta área, totalizando 3.367 (três mil trezentos e sessenta e sete) metros
quadrados de potencial concedido.
Com o potencial construtivo concedido, a proprietária efetuou as vendas por meio
do Banco de Potencial Construtivo da prefeitura, transferindo o seu potencial para quatro
imóveis diferentes e esgotando o seu saldo. Todos os imóveis recebedores localizam-se em
ZR-4 e, em sua maioria, estão inseridos na Regional Matriz, que é a mesma da Casa
Vilanova Artigas, o que resultou em valores de potencial concedido e recebido muito
próximos.
O valor arrecadado com a venda do potencial construtivo foi totalmente utilizado na
obra de restauro da Casa que se encontrava em péssimo estado de conservação (Figura 83 e
84). Segundo a proprietária, a verba adquirida com o uso da TPC não foi suficiente para
toda a recuperação do imóvel, visto que ele possui grandes dimensões. A empresa que
geriu a obra pertence à proprietária e efetuou uma restauração buscando o resgate dos
elementos originais da edificação que haviam se perdido com o tempo.
95
Informações obtidas junto a Gisele Portelo através de entrevista escrita realizada em julho de2008.
Capitulo IV
A Aplicação da TDC em Curitiba
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
117
Figura 85: Localização da Casa Amarela.
Fonte: Google earth (com alterações)
Atualmente o imóvel abriga um centro cultural para estudos destinados à
arquitetura, o Instituto G Arquitetura Casa Vilanova Artigas, e encontra-se em ótimo
estado de conservação. Após o restauro além de ter havido a divulgação de uma obra
arquitetônica e historicamente tão importante, antes desconhecida na cidade, o arquiteto
Vilanova Artigas passou a ter a homenagem devida em sua cidade natal. Outro fator
importante no caso da Casa Vilanova Artigas é a atuação da arquiteta que adquiriu o
imóvel, o restaurou utilizando em parte recursos próprios e está promovendo a divulgação
da importância daquele bem para a cidade. Isso demonstra que os profissionais arquitetos
em Curitiba, tão importantes por serem os únicos autorizados a elaborar projetos de
restauro, estão atuando na luta pela preservação da história urbana da cidade como agentes
promotores diretos da preservação. Desta forma, a utilização da TPC neste imóvel também
é considerada um caso de sucesso, uma vez que viabilizou parte do restauro do imóvel tão
importante para patrimônio cultural de todo o estado do Paraná, que se encontrava em
péssimo estado de conservação.
D) Casa Amarela (objeto de TPC em 2004)
O imóvel aqui denominado Casa
Amarela localiza-se na Avenida Marechal
Floriano Peixoto, no Bairro Centro,
próximo a imóveis tombados pelo estado
do Paraná, como a Praça Eufrásio Correia
e a Antiga Estação Ferroviária. A Avenida
Marechal Floriano Peixoto, onde o imóvel
se insere, corta diversos bairros de
Curitiba, entre eles o centro da cidade,
com ocupação datada nas primeiras
décadas do século XX. Nesta avenida ainda se encontram muitas edificações em estilo
eclético construídas no início do século XX, configurando-se como sobrados com uso
original misto (comercial e residencial) a maioria, como acontece com a Casa Amarela
(Figura 86 e 87). Considerada pela prefeitura um importante eixo de patrimônio histórico e
cultural de Curitiba, na avenida encontram-se dezoito imóveis classificados como UIPs,
dos quais seis utilizaram o instrumento da TPC para promover a sua recuperação. Em
Capitulo IV
A Aplicação da TDC em Curitiba
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
118
Figura 86: Sobrados de uso misto na
Av. Marechal Floriano Casa Amarela a
primeira à esquerda
Figura 87: UIPs na Av. Marechal
Floriano que concederam PC.
Figura 88: Casa Amarela em
1950.
Fonte: Acervo do IPPUC
Figura 88: Casa Amarela em
1950.
Fonte: Acervo do IPPUC
2008, a avenida vinha passando por uma revitalização, ganhando novo paisagismo e
tratamento urbanístico dentro do projeto de revitalização do centro de Curitiba, que
buscava ainda incentivar os proprietários a recuperarem e preservarem os seus imóveis.
96
Na prefeitura de Curitiba não registro de quando
exatamente a Casa Amarela foi construída, por quem e para
quem, pois o primeiro registro que se encontra sobre este
imóvel é uma fotografia de 1950 da fachada original da
resincia (Figura 88). Sabe-se que na época o imóvel
pertencia ao Senhor Esperidião Francisco Brandão e no
primeiro piso abrigava a Padaria do Brandão”.
Posteriormente à década de 1950, o imóvel abrigou vários
outros estabelecimentos comerciais, que acabaram por
danificar a sua estrutura original, principalmente a
fachada do primeiro piso, que teve as aberturas alargadas
e substituídas por portas metálicas, como pode-se perceber na fotografia de 1979 (Figura
89). Na década de 1970, o imóvel foi classificado como UIP, porém seu estado de
degradação só veio a aumentar conforme se em uma fotografia de 1999 (Figura 90)
96
As informações históricas deste imóvel foram coletadas junto ao acervo documental do IPPUC em junho de 2008.
Capitulo IV
A Aplicação da TDC em Curitiba
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
119
Figura 91: Casa Amarela após recuperação em 2004
com nova edificação aos fundos
Fonte: Banco de dado da SMU
Figura 89: Casa Amarela em 1979.
Fonte: Haraton Maravalhas- Acervo Casa da
Memória/Diretoria de Patrimônio Cultural/ FCC
Figura 90: Casa Amarela em 1999.
Fonte: Fernando Augusto - Acervo Casa da
Memória/Diretoria de Patrimônio Cultural/ FCC
No ano de 2002, a empresa
Fleep S/A, proprietária do imóvel na
época, solicitou a concessão da TPC da
Casa Amarela, tento sido atendida
somente em março de 2004, com a
expedição da CCPC. Como o imóvel
localiza no Setor Especial Estrutural
Via Central, o potencial construtivo foi
igual à área do terreno multiplicada
pelo coeficiente quatro, que como no
caso da Casa Vilanova Artigas, teve a bonificação do somatório da área edificada da UIP,
totalizando assim um potencial construtivo concedido de 2.993 (dois mil novecentos e
noventa e três) metros quadrados. A esta UIP ainda foi concedido pelo IPPUC e CAPC à
permissão de construir uma nova edificação aos fundos do terreno, utilizando 898
(oitocentos e noventa e oito) metros quadrados do potencial construtivo concedido no
mesmo terreno, desde que fossem seguidas orientações que não prejudicassem a ambiência
e a percepção da UIP (Figura 91). De acordo com técnico do IPPUC estas orientações são
em relação ao projeto da nova edificação que deve ter um gabarito que preserve o entorno
da UIP
97
, além de afastamentos que fam uma transição leve entre as duas edificações, e,
principalmente, adotando uma tipologia de linguagem contemporânea para marcar bem a
diferença de tempo entre a UIP e a nova edificação ao seu lado
98
.
O potencial construtivo foi vendido em três parcelas, para três imóveis diferentes,
sendo que a última transferência foi efetivada em 2008 zerando o saldo de potencial
97
Quando a UIP esta inserida em uma região cercada por edifícios altos, como foi o caso do Holtel Íbis, é permitida a
edificação de edifício no mesmo terreno da UIP com um gabarito elevado.
98
Informações obtidas através de entrevista concedida por Carla Choma Frankl em junho de 2008.
Capitulo IV
A Aplicação da TDC em Curitiba
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
120
Figura 92: Casa Amarela antes da
restauro em 2000
Fonte: Acervo do IPPUC
Figura 93: Casa Amarela após
restauro em 2009
construtivo do imóvel. Todos os terrenos recebedores localizam-se na Regional Matriz,
dois no Bairro Batel e um no Bairro Bigorrilho.
O restauro da UIP foi finalizado em 2004, em seguida à concessão do potencial
construtivo e buscou preservar externamente as características originais da casa,
reconstituindo o que não era mais possível recuperar. Desta forma, foi preservada a
volumetria da edificação e sua fachada principal teve elementos como volumes, vãos,
esquadrias, revestimentos e outros detalhes artísticos e arquitetônicos, restaurados ou
reconstituídos quando muito descaracterizados, baseando-se na fotografia de 1950 (Figura
88). Internamente o imóvel foi todo remodelado para abrigar um novo uso.
Atualmente o imóvel encontra-se em ótimo estado de conservação e abriga uma
escola de curso preparatório para concursos na área de direito. Ao lado desta UIP foi
construída recentemente uma nova edificação de tipologia contemporânea que conta com
três pavimento e não é avistada facilmente desde a rua, o que demonstra que foram
seguidas as orientações do IPPUC, promovendo pouco impacto físico na ambiência do
imóvel de valor cultural. A TPC utilizada neste caso promoveu a recuperação de um
imóvel que tinha sido descaracterizado e encontrava-se muitos anos em péssimo estado
de conservação. Mesmo que para tal, tenha sido necessário permitir a construção de uma
nova edificação no mesmo terreno da UIP, a experiência é considerada muito lida para
os agentes envolvidos.
Capitulo IV
A Aplicação da TDC em Curitiba
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
121
Figura 95: Conjunto de edificações do Colégio Santa Maria em 1944
Fonte: Boletim Casa Romário Martins, 2007, p.23
Figura 94: Localização da Capela
Santa Maria
Fonte: Google earth (com alterações)
E) Capela Santa Maria (objeto de TPC em 2006)
A edificação conhecida com Capela
Santa Maria, localiza-se na Rua Conselheiro
Laurindo no Bairro Centro e é assim
denominada por ter abrigado por muitos anos a
Capela do Colégio de mesmo nome. O edifício
da Capela fazia parte de todo um conjunto de
edificações construídas para abrigar
estabelecimento de ensino. O mesmo,
primeiramente, foi dirigido pela Congregação de
Nossa Senhora do Sion e, a partir da década de
1920, pela Congregação Marista, com o nome
na época de Instituto Santa Maria
99
(Figura 95).
Como o complexo educacional era dirigido por representantes da igreja católica e
seus alunos também eram católicos, assim como a maior parte da populão paranaense na
época, uma Capela interna ao Instituto era considerada um elemento fundamental para a
educação religiosa dos estudantes. Desta maneira, em 1938, foi encomendado ao escririo
de Eduardo Fernando Chaves o projeto de uma Capela anexa ao complexo educacional,
que foi finalizada em janeiro de 1939. Segundo Weigrt e Valente, a edificação da Capela
99
As informações históricas deste imóvel foram coletadas junto à publicação BOLETIM CASA ROMÁRIO MARTINS
2007.
Capitulo IV
A Aplicação da TDC em Curitiba
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
122
Figura 96: Interior da Capela em 1942
Fonte: Boletim Casa Romário Martins, 2007, p.61
Figura 97: Área embaixo da Capela em 1950
Fonte: Boletim Casa Romário Martins, 2007, p.61
Figura 99- Teto decorado e vitrais da Capela
Fonte: Boletim Casa Romário Martins, 2007, p.125
Figura 98-Capela Santa Maria e prédio de três
pavimentos como entrada
foi projetada seguindo o modismo eclético vigente na época, utilizando elementos e
detalhes construtivos neoclássicos (WEIGRT e VALENTE, 2007, p.113).
A capela era formada por uma nave única retangular com doze metros de largura e
trinta de comprimento e possuia -direito alto, típico das igrejas católicas (Figura 96). No
entanto, ela não se encontrava no mesmo nível do tio central do colégio, pois estava
localizada sob uma área utilizada em dias de chuva para o lazer dos alunos (Figura 97). O
acesso à capela era feito por uma edificação de três níveis na esquina da Rua Conselheiro
Laurindo com Rua Marechal Deodoro, necessitando subir alguns degraus para ter acesso à
nave (Figura 98). Externamente, a capela tinha como destaque as janelas em pares com
detalhes formados por frisos e outros elementos artísticos e ainda o arremate da platibanda
com balaustres que contornam todas as paredes. Internamente, o destaque era para o teto e
parte da parede, trabalhados com elementos de relevo em gesso, e para os vitrais das
janelas em várias cores (Figura 99)
).
Capitulo IV
A Aplicação da TDC em Curitiba
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
123
Figura 100- Capela antes do restauro
Fonte: Boletim Casa Romário Martins, 2007, p.71.
A Capela Santa Maria é considerada de
enorme importância para o patrimônio histórico
e cultural da Cidade de Curitiba (BAPTISTA,
2007, p.9) por ter sido frequentado por
diferentes gerações de curitibanos que
estudaram no Instituto Santa Maria,
posteriormente denominado Colégio Marista, e
também por conter elementos que descrevem os
padrões arquitetônicos estabelecidos em
Curitiba na primeira metade do século XX
(WEIGRT e VALENTE, 2007, p. 116). Devido a esta importância histórica e
arquitetônica, a Capela foi declarada UIP na década de 1970. Entretanto, depois da
transferência do Colégio para novo endereço em 1983, algumas das instalações
remanescentes do complexo
100
foram depreciadas. Com o fim das atividades do Colégio no
local, a Capela acabou esquecida, abandonada e “depois de suportar a subutilização,
acabou por se tornar abrigo de ndalos e pompos”( WEIGRT e VALENTE, 2007, p. 116)
(Figura 100).
No ano de 1998, foi doado à prefeitura parte do antigo complexo de edificações do
Colégio Santa Maria, abrangendo o pátio central, algumas salas de aula e ainda a Capela.
Em novembro de 2003, a Capela foi definida como Unidade de Especial Interesse de
Preservação (UIEP) por meio do Decreto 1034/03, tendo sido aprovada em 2004 a
regulamentação específica (Decreto 203/04), que dispôs sobre a forma de concessão da
TPC para o caso da Capela. O Decreto 203/04, primeiramente, estabeleceu a transferência,
para o restauro da Capela, do potencial construtivo relativo a UIEP Sede do Museu
Paranaense e, respectivamente, dos recursos captados com a venda deste pontecial, que
era de 12.500 (doze mil e quinhentas) cotas de um metro quadrado. Esta transferência de
potencial entre UIEPs aconteceu porque o Governo do Estado do Paraná assumiu
financeiramente as obras de restauração do Antigo Museu e, portanto, não era mais
necessária a utilização dos valores arrecadados com a venda das cotas de potencial
construtivo.
100
Ao longo dos anos, as edificações do Colégio Santa Maria foram sendo modificadas e demolidas visando
a modernização e ampliação das atividades da instituição.
Capitulo IV
A Aplicação da TDC em Curitiba
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
124
Em maio de 2006, o Decreto 203/04 foi atualizado pelo Decreto 563/06, uma vez
que o valor arrecadado com potencial estabelecido no primeiro Decreto se mostrara
insuficiente para garantir o completo restauro da Capela. Assim, foram acrescidas à cota de
potencial recebida da Antiga Sede do Museu 6.557 (seis mil quinhentos e cinquenta e sete),
novas cotas de um metro quadrado cada, totalizando 19.057 (dezenove mil e cinquenta e
sete) e sendo vendidas a R$ 200,00 cada uma. O valor arrecadado deveria ser recolhido em
conta bancária vinculada, em nome da PMC, com a finalidade de possibilitar as obras de
reforma e restauro estabelecidas em projeto arquitetônico e complementares, com
orçamento e cronograma específicos
101
. A venda das cotas poderia ser parcelada em até
oito vezes, no entanto, o Certificado de Vistoria de Conclusão de Obras (CVCO) do imóvel
recebedor somente seria expedido após a quitação de todas as parcelas pelo proprietário do
imóvel recebedor de potencial.
De acordo com o Decreto 563/06, para se calcular a quantidade de potencial que
deveria ser transferido da UIEP, dever-se-ia multiplicar a área solicitada pelo proprietário
do imóvel recebedor por um índice que foi estabelecido de acordo com a zona ou setor
deste imóvel, conforme a tabela em anexo ao Decreto. Este índice é maior quanto maior
for o coeficiente de aproveitamento da zona e do setor. Por exemplo: na ZC que possui
coeficiente de aproveitamento máximo sete o índice é igual a 1,25 (um vírgula vinte e
cinco), enquanto que na ZR-2, que possui coeficiente máximo 1,5 (um vírgula cinco) o
índice é igual a 0,30 (zero rgula trinta). O decreto também estabeleceu as zonas/setores e
os usos que poderão receber potencial advindo da UIEP da Capela Santa Maria.
Ao valor arrecado com a venda das cotas originárias da Antiga Sede do Museu (R$
2.500.00,00), foram acrescentados os valores arrecadados com a venda das 6.557 (seis mil
quinhentos e cinquenta e sete) cotas da Capela. Estas 6.557 (seis mil quinhentos e
cinquenta e sete) foram transferidas em cinqüenta e duas parcelas diferentes, entre junho de
2006 e agosto de 2007. Os imóveis recebedores localizam-se principalmente em ZR-4,
cujo índice para calcular a cota a ser subtraída da UIEP é igual a 0,60 (zerorgula seis). O
potencial adquirido foi utilizado principalmente para a ampliação ou regularização de
ático, que segundo Albrenaz e Limz é o último pavimento da edificação, geralmente
menos elevado que os demais, onde se situam casas de máquina, caixa-d‟água, depósitos,
etc” (ALBERNAZ e LIMA, 2003). O potencial, am disso, foi utilizado para a construção
de edificão com mais pavimentos e para regularização de ampliações irregulares, dentre
101
Decreto 563/06, artigo 3º.
Capitulo IV
A Aplicação da TDC em Curitiba
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
125
outros usos. Abaixo se encontram duas tabelas expondo dois casos de recepção de TPC da
UIEP Capela de Santa Maria, para melhor entendimento do processo:
Data da
venda
Localização do
Imóvel Receptor
Índice (I)
Área Solicitada pelo
recebedor (Ar)
Potencial
concedido (Pc)
Pc = Ar x I
Valor pago pelo
potencial (Vr)
Vr= Pc x R$200
19/6/2006
Rua
Desembargador
Motta, 1831- Bairro
Batel - ZR-4
0,6
180,75 m²
109 m²
R$ 21.800,00
Ordem da
TDC
Área concedida para:
Ampliação de área de um
Ático
1ª de 52
Data da
venda
Localização do
Imóvel Receptor
Índice (I)
Área Solicitada pelo
recebedor (Ar)
Potencial
concedido (Pc)
Pc = Ar x I
Valor pago pelo
potencial (Vr)
Vr= Pc x R$200
4/12/2006
Rua Baltazar
Carrasco dos Reis,
nº 2790 - Bairro
Água Verde - ZR-3
0,3
23,4 m²
78 m²
R$ 15.600,00
Ordem da
TDC
Área concedida para:
Regularização de terceiro
pavimento de edificação
29ª de 52
No total, foi adquirido pelo uso da TPC no imóvel cerca de R$ 3.811.400, que
foram totalmente utilizados no restauro e reestruturação da Capela Santa Maria, do pátio
interno e de algumas salas do colégio. A obra na Capela tinha como objetivo, além da
recuperação da UIEP para o patrimônio cultural de Curitiba, reestruturar a mesma com o
objetivo de abrigar salas de ensaios e apresentações da insigne Camerata Antiqua de
Curitiba, uma orquestra de música de mara. O restauro executado por uma empresa
especializada, recuperou telhados e todas as fachadas das edificações e, internamente,
restaurou pinturas decorativas e elementos arquitetônicos responsáveis pelas características
de estilo impressas na Capela, como painéis de gesso decorados no teto e nas paredes.
Arquitetonicamente, a nave da edificação foi bastante modificada para a adequação do
espaço à sala de concertos da Camerata. Para tal, a área sob a Capela, utilizada como pátio
coberto na época do Colégio, perdeu o teto e articulou-se com o espaço antes utilizado
pelos bancos dos fiéis, fazendo assim surgir “um novo ambiente, com altura total de doze
metros em seu pé-direito e que passou a conter palco e platéia (BOLETIM CASA
ROMÁRIO MARTINS 2007, p.100) (Figura 100 e 102).
Tabela 5: Dados e cálculos para chegar ao valor de potencial concedido subtraído da Capela
com venda de parte de sua cota de potencial construtivo para imóvel no Bairro Batel
Tabela 6: Dados e cálculos para chegar ao valor de potencial concedido subtraído da Capela
com venda de parte de sua cota de potencial construtivo para imóvel no Bairro Água Verde
Fonte: CCPC do UIEP Capela Santa Maria
Fonte: CCPC do UIEP Capela Santa Maria
Capitulo IV
A Aplicação da TDC em Curitiba
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
126
Figura 101- Capela durante o restauro
Fonte: Boletim Casa Romário Martins, 2007, p.79.
Figura 102- Capela após o restauro
Fonte: Boletim Casa Romário Martins, 2007, p.87.
Figura 103- Pátio interno do Colégio
Fonte: Boletim Casa Romário Martins, 2007, p.79.
Figura 104- Antigas Salas do Colégio
Fonte: Boletim Casa Romário Martins, 2007, p.79.
A obra de restauro e reestruturação abrangeu o pátio central do antigo colégio, que
foi recuperado e passou a integrar-se com a rua, se tornando um espaço alternativo para
apresentações e concertos, além de algumas salas do antigo colégio que devem servir de
apoio as atividades da Camareta (Figura103 e 104).
O restauro da capela foi finalizado em 2007 e ela foi inaugurada em janeiro de 2008
com o evento da 26º Oficina de Música de Curitiba, que promoveu três dias de Concertos.
Atualmente o imóvel encontra-se em ótimo estado de conservação e é cada vez mais
freqüentado pela população curitibana e por turistas que buscam resgatar a história e a
memória da cidade. O caso da utilização da TPC nesta UIEP é considerado pelos agentes
envolvidos de muito sucesso por ter promovido financeiramente, através de parceria
público-privada, a recuperação para o patrimônio cultural da cidade de um imóvel que
estava na iminência de desaparecer.
Capítulo IV
A Aplicação da TDC em Belo Horizonte
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
127
CAPITULO IV
4. A APLICAÇÃO DA TRANSFERÊNCIA DO DIREITO
DE CONSTRUIR EM BELO HORIZONTE
A cidade de Belo Horizonte é a capital de Minas Gerais (MG) e localiza-se na
região central deste estado (Figura 105). Ela foi planejada e constrda no final do século
XIX para ser a nova sede administrativa estadual, abrigando, atualmente, uma população
de 2.412.937
102
(dois milhões quatrocentos e doze mil e novecentos e trinta e sete) de
habitantes, distribuídos em seus 331 (trezentos e trinta e um) quilômetros quadrados de
território
103
. Geograficamente, a área do município está localizada em uma planície que
coma a leste no sopé da Serra do Curral, abrangendo as microbacias dos ribeies
Arrudas e da Oa, ambos afluentes do Rio das Velhas e pertencentes à Bacia do Alto o
Francisco (MONTE-MÓR, 1994, p.12-13).
102
População no ano de 2007 segundo o IBGE. Disponível em: <http://www.ibge.gov.br/cidadesat/topwindow.htm?1>.
Acesso em: fevereiro de 2009.
103
Informação extraída do IBGE. Disponível em: <http://www.ibge.gov.br/cidadesat/topwindow.htm?1> . Acesso em:
fevereiro de 2009.
Figura 105: Mapa com a Localização de Belo Horizonte
Capítulo IV
A Aplicação da TDC em Belo Horizonte
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
128
O desenvolvimento urbano de Belo Horizonte, desde seu planejamento, foi baseado
em ideais de transformação e de modernidade que fizeram com que boa parte de seu
patrimônio cultural edificado fosse destruído em pouco mais de um século de existência.
Entretanto, depois de muitas perdas e aprendizados, sua potica municipal de preservação
do patrimônio se fortaleceu e é hoje referência para outras cidades que buscam preservar o
seu acervo material, dentro de uma potica engajada com as questões de planejamento
urbano.
Em Belo Horizonte, apesar da potica de preservação do patrimônio ser recente
(década de 1980), logo em seus primeiros passos teve, na Lei Orgânica de 1990,
parâmetros para uma proteção vinculada à potica urbana, através da previsão nesta lei de
instrumentos urbanísticos como a Transferência do Direito de Construir (TDC). Porém,
apesar de sua previsão desde 1990, na legislação belo-horizontina a TDC foi realmente
utilizada no ano de 1996 quando o Plano Diretor, que fornece maiores detalhes de sua
aplicação, foi aprovado. Deste tempo em diante a TDC foi cada vez mais utilizada,
principalmente após a aprovação da Lei Específica que a regulamenta. Assim, até junho de
2008, quando foram finalizadas as pesquisas de campo, cinqüenta e oito processos de
imóveis que desejavam gerar potencial construtivo tinham dado entrada na Prefeitura
Municipal de Belo Horizonte (PMBH) e mais de quatrocentas transferências diferentes
haviam sido efetivadas.
Em todo este tempo de utilização da TDC em Belo Horizonte, rios foram os
aprendizados e mudanças em sua aplicação e operacionalização, refletindo toda uma
dinâmica de erros e acertos que vão moldando-se em busca de uma utilização satisfatória
do instrumento para a realidade belo-horizontina. São muitos os exemplos das diferentes
formas de utilização e apropriação da TDC nesta cidade, onde casos considerados bem
sucedidos e outros nem tanto, mas todos fazem parte da história da evolução da sua
aplicação em Belo Horizonte.
4.1 História da evolução urbana e arquitetônica de
Belo Horizonte
A ocupação da rego onde hoje se encontra a cidade de Belo Horizonte, iniciou-se
a partir das viagens dos bandeirantes no século XIII em busca de metais preciosos nas
Minas Gerais. O clima ameno, a topografia favorável e as terras férteis da placie logo
após a Serra do Curral impressionaram o bandeirante João Leite da Silva Ortiz, que no
Capítulo IV
A Aplicação da TDC em Belo Horizonte
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
129
Figura 106: Igreja Matriz da Boa
Viagem no Arraial Curral Del Rei
Fonte: CASTRIOTA, 1998, p.44.
começo do século XIII fixou-se ali, fundando a Fazenda do Cercado
104
, onde
posteriormente foi formado um povoado denominado Arraial de Curral Del Rei.
No final do século XIX, o povoado de
Arraial de Curral Del Rei foi praticamente todo
destruído
105
para dar lugar a uma nova capital
para o Estado de Minas Gerais, que antes se
localizava na cidade de Ouro Preto. Muitos
fatores levaram à mudança da capital, sendo um
deles “o esgotamento das minas e a desagregação
econômica e social do Estado que tinham tornado
Ouro Preto decadente e inoperante como capital”
(ANDRADE E MAGALHÃES, 1998, p.41).
Além disso, a conformação urbana da cidade de Ouro Preto, confinada entre montanhas,
bem como sua arquitetura de tipologia colonial, lembrando o momento da dominação
portuguesa, não condiziam com os ideais reformistas, progressistas e positivistas da recém
criada República do Brasil.
Assim, com a proclamão da República em 1889, a questão da mudança da capital
de Minas Gerais, muitos anos discutida, finalmente de tornar uma realidade. A sua
construção nasceu planejada como o sonho de uma ordem, a ordem positivista filha dos
desdobramentos do Iluminismo em suas manifestações do final do século XIX”, tornando
um dos marcos referenciais da vontade de mudança do Brasil Republicano (MONTE-
MÓR, 1994, p.14). O próprio engenheiro que foi encarregado em 1891 de chefiar o projeto
para a nova capital, segundo Andrade e Magalhães (1998, p.410, era um positivista e
republicando, como a maioria de seus colegas formados pela Escola Politécnica do Rio de
Janeiro.
Como conseqüência, Belo Horizonte nasce com todo um planejamento e
ordenamento que condizia com os ideais almejados, após a realização de estudos técnicos
modernos para a escolha do tio em que iria localizar-se a capital estadual, quando foram
consideradas diversas variáveis naturais, como a topografia, a salubridade e o
abastecimento de água (ASSIS apud BARROS, 2004). A Planta Geral, elaborada pela
104
Informação extraída do Histórico de Belo Horizonte contido no IBGE Cidades@. Disponível em:
http://www.ibge.gov.br/cidadesat/topwindow.htm?1. Acesso em fevereiro de 2009.
105
Com exceção a Igreja Matriz de Nossa Senhora da Boa Viagem que também foi demolida em 1911 para dar lugar a
nova Catedral. (Figura 106), e da sede da Fazenda Leitão que não foi demolida e onde está instalado atualmente o Museu
Alio Barreto
Capítulo IV
A Aplicação da TDC em Belo Horizonte
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
130
Comissão Construtora da Nova Capital coordenada por Aarão Reis e apresentada em 1895
(Figura 107), é um reflexo da ideologia de ordem e progresso, que visava substituir a
configuração urbana “desordenada” gerada pela imprevisibilidade, pelo planejamento
técnico e racional dos espaços, com inflncia barroca
106
, como pode ser percebida na
descrição da planta feita por Julião (apud BARROS, 2004):
"As ruas, criteriosamente mensuradas, formando quarteirões regulares,
desenhavam um traçado semelhante a um tabuleiro de xadrez. A malha urbana
retilínea era pontuada por algumas praças, das quais se irradiavam avenidas
longas e largas, que cruzavam, em diagonal, os pontos extremos da cidade.
Uma área de 51.220.804 m
2
foi dividida em 27 triângulos, que passaram a ser
designados por secções. Com base nesse mapa, foram demarcadas as zonas
urbana, suburbana e rural. O zoneamento funcionava como instrumento
fundamental para o controle da cidade. Fixava previamente os seus limites;
classificava e hierarquizava seus territórios que deixavam de ser uma
dimensão fluida e indefinida para se transformarem em áreas delimitadas e
imediatamente identificáveis. (...) a uniformidade da malha urbana proclamava
a transparência e orientação plena do espaço, assegurando uma legibilidade
imediata da cidade."
106
De acordo com LEMOS (1998), “a primeira referência urbanística evidenciada no plano de Belo Horizonte vincula-se
ao ideal perspectivo barroco restituído pelo neoclassismo experimentado em Paris e Washington.”, sendo a Avenida
Afonso Pena o eixo monumental marcadamente barroco.
Figura 107: Planta Geral da Cidade de Minas Gerais, organizada pela Comissão Construtora
da Nova Capital, coordenada por Aarão Reis, 1895.
Fonte: CASTRIOTA, 1998, p. 48.
Capítulo IV
A Aplicação da TDC em Belo Horizonte
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
131
Ainda dentro da noção positivista de progresso, o planejamento da cidade de Belo
Horizonte estabelecia a separação das áreas urbanas e suburbanas, delimitadas pela
Avenida do Contorno. Após sua inauguração ainda inacabada, em 1897, sua ocupação
passa a desenvolver prioritariamente da periferia para o centro, ao inverso do que tinha
sido planejado, sendo que em 1912, Belo Horizonte tinha 70% dos 38.000 habitantes fora
da zona urbana”(ANDRADE E MAGALHÃES, 1998, p.47) (Figura 108). Isso aconteceu,
segundo Monte-Mor, por ter sido a população trabalhadora, excluída do espaço central da
cidade, do poder, da cidadania, da ágora estendida, que de fato determinou a produção da
cidade( MONTE-MÓR, 1994, p.15).
A tipologia arquitetônica que marcou as primeiras construções na capital mineira
foi a arquitetura eclética, que de acordo com Lemos, veio para reforçar o traçado planejado
por Aarão Reis, atuando na cidade comoobjeto constituinte da paisagem”, buscando
erigir espaços que evocassem o prazer ao espectador, bem como a conformação de uma
memória, através de imagens figurativas do passado”( LEMOS, 1998, P.104). A tipologia
eclética estava presente tanto nas construções monumentais (Figura 109), como nas
resincias dos funcionários do Governo do Estadual, projetadas pela Comissão
Construtora e denominadas “casas-tipo
107
(Figura 110).
107
Para maiores informações sobre estas construções consultar LEMOS, 1998, p. 105.
Figura 109: Antigo prédio dos Correios e
Telégrafos (demolido)
Fonte: CASTRIOTA, 1998, p.98
Figura 110: Residência do período
eclético na Rua Sapucaí
Fonte: CASTRIOTA, 1998, p.106
Figura 108: Machas da ocupação urbana em Belo Horizonte, 1900 1910 -1920
Fonte: CASTRIOTA, 1998, p.46.
Capítulo IV
A Aplicação da TDC em Belo Horizonte
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
132
Segundo Castriota e Passos (1998, p. 130),
é a partir da década de 1930 que BH vai se firmar
como o mais importante pólo industrial e
financeiro do Estado, fazendo-se sentir a mudança
rápida na cena urbana, que passa a ser marcada
pela “verticalização e remodelão de algumas
áreas do centro e, principalmente, pelo incontido
crescimento da cidade planejada que se espalha
em todas as direções” transbordando a avenida do contorno. (Figura 111). A fisionomia
arquitetônica da capital também muda, adaptando-se aos novos tempos de industrialização
através da construção e difusão de tipologia edilícia de “linhas cruas e secas, concreto
armado e ferro, ousadia de varandas sem apoio, em balanço, de concreto, terraços em vez
de telhados”, denominada então, estilo moderno” e, posteriormente, conhecida como Art
Déco (CASTRIOTA E PASSOS, 1998, p. 150). Esta tipologia é considerada o primeiro
exemplar de uma variante do modernismo vanguardista, que vai se estabelecer na cidade a
partir das obras de Oscar Niemeyer no complexo da Pampulha, se tornando hegemônico a
partir dos anos de 1950 (CASTRIOTA, 1998, p.28)
No início da década de 1940, o governo, buscando firmar de vez a industrialização
e o desenvolvimento da região de Belo Horizonte, começa a preparar a infra-estrutura
necessária para a efetivação deste processo com atitudes como a implantação da Cidade
Industrial no município de Contagem, vizinho a Belo Horizonte, e também do complexo de
lazer e turismo da Pampulha (Figura 112) (ANDRADE E MAGALHÃES, 1998, p.55). A
primeira atitude citada demorou a ser consolidada, mas foi um dos fatores que levaram à
mudança da forma da cidade de Belo Horizonte, que “vai dando sinais prematuros da
formação do aglomerado metropolitano” (ANDRADE E MAGALHÃES, 1998, p.55). A
segunda atitude, por sua expressão arquitetônica de impacto internacional, segundo Monte-
Mor, representou um paradigma para cidade, “reafirmando a modernização da Capital e
dando origem a um metadiscurso arquitetônico, hoje presente em várias outras cidades”
(MONTE-MÓR, 1994, p.18).
'“A pacata cidade, até pouco tempo pontuada por „palácios adolescentes‟,
começa a tomar ares de metrópole quando a arquitetura modernista, que
chegara timidamente nos anos 30, apenas como fachadismo‟ cubista e
futurista, aporta integral em conceito e prática à sua paisagem construída e os
novos prédios de „cimento armado‟ começam a substituir as „casinhas‟, como
Figura 111: Mancha da ocupação
urbana de BH em 1940
Fonte: CASTRIOTA, 1998, p.56.
Capítulo IV
A Aplicação da TDC em Belo Horizonte
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
133
Figura 112: Croqui de Oscar Niemeyer do Conjunto Arquitetônico da Pampulha
Fonte: CASTRIOTA, 1998, p.189
signos do progresso e da modernidade.” (ANDRADE E MAGALHÃES, 1998,
p.57)
Segundo Magalhães e Andrade (1998, p.63), a urbanização da área interna do
perímetro da Avenida Contorno é finalizada na segunda metade da década de 1940 com
o fim da Segunda Grande Guerra Mundial e do Estado Novo. Após este período, o
crescimento urbano e demográfico de Belo Horizonte se torna cada vez mais intenso,
principalmente em função do grande êxodo rural das populações do interior de Minas, o
que fez a o número de habitantes da capital passar de 350 mil, em 1950, para 700 mil, no
ano de 1960. Neste mesmo período, juntamente com a criação de uma série de
instrumentos para acelerar ainda mais o crescimento econômico, é elaborado o primeiro
Plano Diretor da cidade que abordava principalmente questões da sua estrutura física.
A partir da década de 1970, a verticalização e construção de arranha-céus no
município se torna mais intensa e a malha urbana da capital vai se expandindo para os
municípios vizinhos, dando origem à Região Metropolitana de Belo Horizonte. Aos
poucos, a cidade vai ganhando as áreas da metpole que se conhece hoje, tendo sua
estrutura urbana e arquitetura modificada intensamente, principalmente em sua área
central, chegando ao ponto de que
“(...) em menos de cem anos, alguns lugares fossem reconstruídos até quatro
vezes, que seus espaços públicos fossem sistematicamente ocupados e
privatizados, que suas árvores fossem cortadas, tudo em nome da
modernidade e do progresso. A pressa em direção ao futuro fez que a cidade
se esquecesse seus planejadores e seu início calcado sobre o gido projeto e
navegasse a deriva, sem norte (...)” (CARSALADE, 1998, p.16)
A partir da década de 80, com a redemocratização no Brasil, as administrações
municipais de Belo Horizonte passaram a dispensar maiores cuidados para a cidade, sendo,
a partir daí, implantadas importantes experiências de poticas públicas municipais, que se
Capítulo IV
A Aplicação da TDC em Belo Horizonte
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
134
traduziram em inúmeras legislações, planos e projetos, buscando proporcionar uma melhor
qualidade de vida urbana e social para os cidadãos belo-horizontinos. Dentre estas
políticas, encontra-se aquela que visava à preservação do patrimônio cultural edificado do
município, tão desgastado e destruído pela sede de modernização que caracterizou a sua
evolução urbana.
4.2 A atuação da administração municipal de Belo
Horizonte na Preservação do seu Patrimônio Cultural
A sedução pelo novo e pelo moderno, baseadas em ideário modernizante, presentes
na fundação de Belo Horizonte, levou à destruição quase completa do povoado Arraial de
Curral Del Rei para dar lugar à cidade moderna. Conforme Andrade e Magalhães (1998,
p.39), a destruição deste Arraial “marca o destino transitóriode Belo Horizonte, onde se
instala um processo de transformações que não permite que a cidade acumule memória”,
de forma que “nem mesmo o projeto original chega a ser implantado sem mudanças”.
Assim, as renovações constantes em busca da almejada modernizão mostraram também
sua fase perversa de destruição, pois:
“(...) a metrópole viu sua memória ser devorada, numa antropofagia irracional
da qual hoje se lamenta e busca reverter, afinal seus ícones não pertencem ao
passado, mas são patrimônio de toda uma civilização que um dia resolveu
ocupar o vale do Ribeirão Arrudas, ao da Serra do Curral.” (CARSALADE,
1998, p.16)
Devido a esse ideário renovador, que aumentou com o desenvolvimento econômico
e crescimento vertiginoso da região
108
, o patrimônio cultural de Belo Horizonte teve por
muito tempo sua importância e significação negadas, retardando as poticas de
preservão, principalmente na esfera municipal (FERES, 2002, p.19). Antes da atuação
municipal tomar corpo, muitas foram as renovações, comandadas em sua maioria pelos
grupos privados, que destrram grande parte do acervo cultural da cidade (ANDRADE,
2002, p.170). A criação do órgão estadual (IEPHA), apesar de refletir a dominância do
poder Estadual no que tangia as ações de cunho municipal, foi de grande importância para
a preservação de ícones da paisagem belo-horizontina, como o Palácio da Liberdade
(FERES, 2002, p.20).
108
A cidade de Belo Horizonte, projetada para abrigar cerca de 250.000 pessoas, em pouco mais de cem anos de
existência teve sua população aumentada quase dez vezes além do planejado.
Capítulo IV
A Aplicação da TDC em Belo Horizonte
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
135
Foi nos anos de 1980 que se iniciou o movimento de consolidação da potica
municipal de proteção do patrimônio cultural em Belo Horizonte. Esta consolidação
aconteceu após muitas perdas, desencadeadas principalmente pelo franco adensamento
populacional e a verticalização das edificações a partir da década de 1970, tendo como fato
impulsionador a demolição, em 1983, do Cine Metrópole, antigo Teatro Municipal. Todo o
processo que culminou na demolição da edificação gerou a “mais ampla manifestação pela
preservão do patrimônio cultural da cidadee revelou “aspectos que seriam decisivos na
formação das poticas de proteção” (ANDRADE, 2002, p.171).
Assim, em julho de 1984 foi estabelecida a Lei 3.802, organizando a Proteção do
Patrimônio Cultural do Município de Belo Horizonte e tendo uma estrutura muito parecida
com o Decreto federal de 1937. Nesta lei foi instituido o tombamento no vel municipal,
estabelecendo a inscrição dos bens tombados em quatro livros de tombo, que ficariam sob
a guarda da Secretaria Municipal de Cultura e Turismo (SMCT). Em seu artigo 28, esta lei
cria o Conselho Deliberativo do Patrimônio Cultural do Município (CDPCM-BH),
vinculado originalmente à SMCT, antecipando-se à Constituição Federal de 1988, que
estabelece a municipalização da preservação. O Conselho é composto por representantes
de rios setores da administração pública municipal e da sociedade civil organizada,
cabendo a ele a organização da proteção e conservação do patrimônio cultural do
município, trabalhando em conjunto com o órgão municipal responsável pela preservação
da memória urbana na cidade, atualmente representado pela Diretoria de Patrimônio
Cultura (DIPC) da Fundação Municipal de Cultura (FMC).
Apesar de ter sido regulamentado em 1984, tendo seus membros definidos nesta
ocasião, o Conselho se reuniu apenas esporadicamente até o final daquela década
(ANDRADE, 2002, p.171). O Regimento Interno do Conselho foi publicado em 1986. Já,
em 1990, através da publicação na Lei Orgânica do Município, o CDPHM-BH realizou
vinte e nove tombamentos
109,
que “em sua maioria eram de prédios blicos e áreas de
preservão ambiental” (FERES, 2002, p.20). Segundo Feres (2002, p.20-21), em 1993 as
reuniões do Conselho passaram a ser públicas, “fato que gerou um cenário mais
democrático para as reuniões”, havendo o início da prática vanguardista em Belo
Horizonte denominada:
“‟negociação urbana‟, que marca um período da gestão municipal (...) e
consiste na concessão de construção em área previamente tombada ou de
109
Ver artigo 224 da Lei Orgânica do Município de Belo Horizonte, de 21 de março de 1990.
Capítulo IV
A Aplicação da TDC em Belo Horizonte
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
136
interesse de preservação, em troca de algum beneficio para a região na qual a
obra será executada. Esta negociação desencadeou um novo tipo de marketing
institucional no mercado imobiliário e incentivou a instituição de uma prática
preservacionista que dialoga com o mercado, ao invés de simplesmente negá-
lo”
A utilização das Negociações Urbanas foi muito importante durante algum tempo,
como instrumento de diálogo inicial entre os interesses da potica do CDPCM-BH e os
interesses dos proprietários, mostrando que era possível o investimento particular para a
preservão do bem tombado. Entretanto, com o tempo, este instrumento veio a ser
restringido pelo Conselho, na medida em que as diretrizes de proteção das edificações iam
se tornando mais rígidas em direção à uma maior garantia de integridade dos valores
culturais dos imóveis. De acordo com Andrade, a utilização das Negociações Urbanas fez
parte das etapas necessárias para o amadurecimento das dinâmicas de proteção do
patrimônio cultural em Belo Horizonte, inserindo-se “em um processo de ampliação dos
conceitos fundamentais do patrimônio e de sua gestão”( ANDRADE, 2002, p. 177).
Desde 1994, quando aconteceram as primeiras ações neste sentido, até os dias de
hoje, um dos fundamentos da política de protão dos bens culturais na cidade são os
Conjuntos Urbanos
110
, que segundo o Anexo I da Deliberação 01/2005 do CDPCM,o:
“(...) áreas definidas com o objetivo de se proteger lugares representativos da
cidade, denominados espaços polarizadores, onde são encontradas
ambiências, edificações ou mesmo conjunto de edificações que apresentam
expressivo significado histórico e cultural. Os espaços polarizadores dos
conjuntos urbanos destacam-se por desempenharem uma função estratégica e
simbólica na estruturação e compreensão urbana”.
111
A potica de preservação, tendo como um dos fundamentos os Conjuntos Urbanos,
mostra a ampliação em Belo Horizonte do próprio conceito de patrimônio, tratada no
Capítulo I desta pesquisa, pois os Conjuntos são entendidos como ambiências urbanas a
serem conservadas, se desvinculado totalmente do conceito de monumento cultural
preservado isoladamente e se aproximando do conceito atual de patrimônio ambiental
urbano. Esta percepção dos conjuntos como incorporadores do conceito de patrimônio
110
Segundo Feres (2002, p.130) os primeiros tombamentos de Conjunto aconteceram no ano de 1994, quando foram
tombados onze conjuntos na área central de Belo Horizonte. Através de informações obtidas na DIPC, em março 2009,
atualmente são quatorze Conjuntos Protegidos, sendo eles: 1) Conjunto Urbano Avenida Afonso Pena e adjacências; 2)
Conjunto Urbano Avenida Álvares Cabral e adjacências; 3) Conjunto Urbano Avenidas Carandaí-Alfredo Balena e
adjacências; 4) Conjunto Urbano Bairro Floresta; 5) Conjunto Urbano Bairro Santo Antônio; 6) Conjunto Urbano Praça
da Liberdade - Avenida João Pinheiro e adjacências; 7) Conjunto Urbano Praça Hugo Werneck e adjacências 8) Conjunto
Urbano Praça Floriano Peixoto e adjacências; 9) Conjunto Urbano Praça Rui Barbosa e adjacências; 10) Conjunto urbano
Rua da Bahia e adjacências; 11) Conjunto Urbano Rua dos Caetés e adjacências. 12) Conjunto Urbano da Praça Raul
Soares e Olegário Maciel; 13) Conjunto Arquitetônico de Tipologia de Influência da Comissão Construtora; 14) Conjunto
Arquitetônico Sylvio de Vasconcelos.
111
Deliberação nº. 01/2005.
Capítulo IV
A Aplicação da TDC em Belo Horizonte
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
137
ambiental urbano, pode ser percebida na definição do perímetro estabelecida pela
Deliberação de 2005, como a concordância de dois espaços, sendo eles:
“Espaço de Valor Simbólico e/ou Polarizador: é o espaço urbano que
apresenta grande importância para a cidade, tanto por seu valor histórico-
urbanístico (vinculado à planta original de Aarão Reis), quanto por seus
espaços edificados que, ao longo do tempo, incorporaram-se no imaginário
coletivo, na configuração da cena urbana e no cotidiano dos seus moradores.
Espaço de Valor Urbastico: é o espaço que, apesar de possuir ainda o
traçado original da cidade, apresenta uma ocupação bastante heterogênea,
conformando um cenário urbano variado onde se localizam, em pequenos
grupos ou isoladamente, edificações e/ou ambiências de valor histórico-
arquitetônico específico. Tal espaço influencia e vincula-se diretamente - sob o
aspecto histórico, visual ou ambiental - ao Espaço Simbólico que o polariza.”
112
Essa gestão do patrimônio traz uma série de instrumentos de proteção e articula os
óros responsáveis por esta proteção com outros órgãos da prefeitura, como a Secretaria
Municipal Adjunta de Regulação Urbana
113
(SMARU) e a atual Secretaria Municipal da
Cultura (SMC). Esta ação conjunta é considerada um fato positivo para a preservação do
patrimônio, articulando-o ao planejamento municipal. Segundo Feres, (...) hoje, a
informão básica de determinado terreno expedida pela SMRU contém informações
sobre o grau de proteção e indica a necessidade de comparecimento no óro responsável
pela gestão do conjunto ou do imóvel” (FERES, 2002, p.21).
É importante fazer referência aos graus de proteção como forma de gestão dos
Conjuntos Urbanos e dos bens tombados pelo município. De acordo com o Decreto de
2005, graus de proteção de imóveis inseridos em conjuntos urbanos se dividem em
Edificações de Interesse Cultural (todas as edificações inseridas no conjunto), Edificações
de Valor Especial (Registro Documental) e Edificações de Valor Polarizador e ou
Simlico (Tombamento Específico). Dentre os tombamentos ainda graus de distinção,
que dizem respeito ao Tombamento Integral e ao Tombamento Parcial. Também são
diretrizes dos Conjuntos Urbanos e imóveis tombados o controle da altimetria, as diretrizes
especiais de projeto, a normatização e regularização de engenhos publicitários (letreiros),
marquises e toldos, além da instalação de antenas de telefonia
114
.
Outro tipo de área de proteção do patrimônio e da paisagem urbana no município de
Belo Horizonte o as denominadas Áreas de Diretrizes Especiais (ADEs), que foram
112
Deliberação nº. 01/2005.
113
A Secretaria Municipal Adjunta de Regulação Urbana faz parte da Secretaria Municipal de Políticas Urbanas,
conforme o art. 24 da Lei 9.011 de 1º de janeiro de 2005.
114
Deliberação nº. 01/2005.
Capítulo IV
A Aplicação da TDC em Belo Horizonte
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
138
previstas na Lei de Uso e Ocupação do Solo e no Plano Diretor de 1996. De acordo com
Araújo et al, as ADEs são:
“Área definida no perímetro da cidade que necessite da intervenção
diferenciada do Poder Público em função das suas potencialidades ecológicas,
sociais, culturais, ambientais e da vontade social predominantes à época de
sua instituição” (ARAÙJO et al, 2002, p. 105)
Em Belo Horizonte também existe alguns incentivos à preservação dos imóveis
tombados, inseridos ou não nos Conjuntos Urbanos. São eles
115
:
Isenção de IPTU: instrumento aplicável em bens com tombamento
específico, isolado ou em conjunto, após uma vistoria anual dos técnicos da DIPC,
que ao comprovarem o bom estado de conservação do imóvel comunicam ao órgão
responsável pelo recolhimento do tributo, que concede a isenção. O dinheiro que o
proprietário deixa de gastar com a isenção do IPTU deve ser utilizado para a
manutenção do imóvel para que ele possa usufruir deste beneficio anualmente.
Transferência do Direito de Construir: Consiste basicamente na
possibilidade de transferência para outro imóvel ou outros imóveis, daquela parcela
de potencial construtivo que o tombamento e as diretrizes de proteção impedem o
uso no imóvel de origem.
Leis de Incentivo: possibilitam o financiamento da recuperação de imóveis
tombados através da instância federal (Lei Rouanet), estadual (Lei Estadual de
Incentivo à Cultura) e municipal (Lei Municipal de Incentivo à Cultura).
Linhas de cditos: são financiamentos promovidos pela iniciativa privada
para a promoção da manutenção ou recuperação de imóveis tombados, como é o
caso dos financiamentos promovidos pela Câmara dos Dirigentes Lojistas (CDL)
para a recuperação e adequação de lojas comerciais às diretrizes de preservação do
patrimônio.
Atelier de Acompanhamento de Projetos: formado por arquitetos
restauradores da DIPC, atua na elaboração de anteprojetos de restauração e
acompanhamento de obras em imóveis tombados, ou na assessoria técnica a
arquitetos que estão desenvolvendo projetos em imóveis tombados, tudo sem custos
para os proprietários.
115
Informações obtidas através de entrevista concedida por Michele Abreu Arroyo, diretora da DIPC, em outubro de
2008.
Capítulo IV
A Aplicação da TDC em Belo Horizonte
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
139
4.3 Análise da aplicação da Transferência do Direito
de Construir em Belo Horizonte
4.3.1 Histórico e análise da Documentação legal que trata
da TDC em Belo Horizonte
No município de Belo Horizonte, o instrumento da TDC é previsto pela primeira
vez na Lei Orgânica de 1990. A TDC, nesta lei, está entre os instrumentos de
planejamento urbano citados no artigo 185 e tem suas condições de aplicação previstas de
maneira superficial em seu artigo 191, porém com muitos parâmetros que seriam seguidos
e estabelecidos com maiores detalhes em leis posteriores. De acordo com Valéria Braga, a
iniciativa de utilização deste instrumento em Belo Horizonte partiu da Câmara Municipal
na elaboração a Lei Orgânica.
116
.
Em 1994 foi disposta também pela mara Municipal uma Lei Específica para
regulamentação da TDC: Lei nº. 6706, de 5 de agosto. Esta lei regulamenta o instrumento
previsto na Lei Orgânica, aprofundando mais em detalhes essenciais no que concerne às
suas formas de aplicação, porém ela não chegou a ser aplicada, sendo revogada
posteriormente.
Em 1996, o instrumento foi previsto na legislação urbanística que pode ser
considerada a mais importante do município, o Plano Diretor (Lei 7.165/96 modificada
pela Lei 8137/00). E posteriormente, teve na Lei de Parcelamento, Ocupação e Uso do
Solo (Lei 7.166/96 modificada pela Lei 8137/00) também de 1996, a complementação que
faltava referente à espacialização das áreas passíveis de recepção e geração de TDC através
do zoneamento da cidade
117
.
Contudo, somente em junho de 1998 se deu a aprovação da Lei Específica
(Decreto 9.616/98) que regulamentou o capítulo do Plano Diretor que dispõe sobre a TDC
e também revoga o Decreto de 1994. Este decreto apresenta novas considerações e maior
detalhamento do instrumento, estabelecendo as suas condições e formas de aplicação, além
de sua operacionalização. Apesar de ser considerado defasado pelos gestores municipais,
necessitando ser atualizado de forma a adequar-se aos procedimentos adotados
116
Informações obtidas através de entrevista concedida por Valéria Braga Penha, chefe do Gabinete da Secretaria
Municipal Adjunta de Regulamentação Urbana e coordenadora da CPTDC à autora em outubro de 2008.
117
Um estudo mais aprofundado sobre a Lei Orgânica, Plano Diretor e a Lei de Uso e Ocupação do Solo de Belo
Horizonte em seus pontos voltados para o Patrimônio Cultural, pode ser encontrado em: PINHEIRO, 2006, p 62-78.
Capítulo IV
A Aplicação da TDC em Belo Horizonte
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
140
ultimamente pela PMBH
118
, até hoje, o Decreto de 1998 é o mais importante e utilizado no
que tange o instrumento da TDC em Belo Horizonte. Em função disto, aqui será analisado
mais profundamente este Decreto, juntamente com análises de proposições que o
complementam e estão presentes no Plano Diretor de 1996, bem como nas atualizações em
portarias e resoluções posteriores a 1998.
No Decreto de 1998 o uma definição do que seja a TDC, valendo assim a
definição do instrumento presente no Plano Diretor de 1996: Transferência do Direito de
Construir é o direito de alienar ou de exercer em outro local o potencial construtivo
previsto na Lei de Parcelamento, Ocupação e Uso do Solo que não possa ser exercido no
imóvel de origem”
119
. Esta definição é muito parecida com as demais até aqui
apresentadas, entretanto mostra-se mais específica ao vincular o potencial não utilizável
àquele previsto na Lei Parcelamento, Ocupação e Uso do Solo.
Os imóveis que originam o potencial construtivo a ser transferido são denominados
no Decreto de 1998 como imóveis geradores e divididos nas três categorias listadas
abaixo:
Imóveis tombados ou incluídos em Conjuntos Urbanos Tombados que sofram
restrições em exercer todo o potencial construtivo definido pela Lei de
Parcelamento, Ocupação e Uso do Solo, condicionados à comprovação do bom
estado de conservação, mediante laudo técnico feito pelo órgão municipal
responsável pelo patrimônio cultural (órgão que no momento é a DIPC).
Imóveis com cobertura vegetal e classificados como ADE, em que haja interesse
público de preservação ambiental definido pelo Conselho Municipal de Ambiente
(COMAM) e baseado em parecer técnico da Secretaria Municipal de Meio
Ambiente (SMMA).
Imóveis destinados à implantação de programas habitacionais e que estejam
classificados com Zona de Especial Interesse Social 2 (ZEIS-2)
120
.
118
Esta adequação vem sendo buscada através de uma Minuta de Decreto que ainda não foi aprovada pela Câmara
Municipal. Esta Minuta traz alterações de ordem técnica referente ao Decreto de 6706/1998, “visando eliminar exigências
desnecessárias e simplificar os procedimentos(Justificativa contida na Minuta que foi disponibilizada pelo Gabinete da
SMARU). Uma copia desta minuta encontra-se no Anexo A
119
Lei 7.165/98, artigo 60.
120
ZEI-2 Segundo a Lei 7.166/95, artigo 12, inciso II, são as regiões não edificadas, subutilizadas ou não utilizadas,
nas quais interesse público em promover programas habitacionais de produção de moradias, ou terrenos urbanizados
de interesse social”.
Capítulo IV
A Aplicação da TDC em Belo Horizonte
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
141
Não são mencionados neste decreto os imóveis que não poderão ser geradores de
potencial, como foi feito no Plano Diretor. Apenas é mencionado que “áreas não passíveis
de serem parceladas, pela legislação urbanística, não são consideradas para efeito de
Transferências do Direito de Construir
121
, à semelhança das áreas definidas como “non
aedificandae” estabelecidas no Plano Diretor. Como o Decreto vem a complementar as
considerações feitas pelo Plano Diretor, vale ressaltar que os outros imóveis impedidos de
originar TDC são os desapropriados ou adquiridos por usucapião e os imóveis blicos ou
privados obtidos por doação.
Nos imóveis passíveis de recepção de potencial construtivo, denominados
receptores, foram acrescentados aos determinados no Plano Diretor, aqueles localizados
em áreas receptoras previstas nos Conjuntos Urbanos Protegidos, respeitando as diretrizes
de tais conjuntos. No decreto, a área de recepção delimitada pela Lei de Parcelamento,
Ocupação e Uso do Solo, é aquela classificada como Zona de Adensamento Preferencial
(ZAP)
122
. Reafirmando o que foi previsto no Plano Diretor, também são considerados
imóveis receptores os que fazem parte de projeto específico de Operação Urbana e os
localizados no entorno do imóvel gerador, em zona contínua àquele imóvel, respeitando as
diretrizes de proteção dos Conjuntos Urbanos tombados e ADEs e nunca se localizando em
Zona de Adensamento Restrito (ZAR)
123
.
O decreto esclarece também que os imóveis classificados como Zona de Proteção
(ZP)
124
, situados em áreas em que “haja interesse público na proteção ambiental e na
preservão do patrimônio histórico, cultural, arqueológico ou paisagístico
125
, somente
poderão receber transferência do direito de construir da mesma zona após parecer técnico
favorável da SMMA, aprovado pelo COMAM e, em caso de estarem em área tombada,
aprovado pelo CDPCM- BH. Quando se refere ao uso do instrumento para imóveis em
condomínio, o decreto estabelece que a transferência deve ficar condicionada à
concordância de todos os proprietários, tanto para imóveis receptores, quanto para imóveis
geradores.
121
Decreto 9.616/98, art. 2º, §1º.
122
ZAP - Segundo a Lei 7.166/96, artigo 10 “são as regiões passíveis de adensamento, em decorrência de condições
favoráveis de infra-estrutura e de topografia.
123
ZAR Segundo a Lei 71666, artigo 8, “são as regiões em que a ocupação é desestimulada, em razão de ausência ou
deficiência de infra-estrutura de abastecimento de água ou de esgotamento sanitário, de precariedade ou saturação da
articulão viária interna ou externa ou de adversidade das condições topográficas.
124
ZPs - Segundo a Lei 7166/96, artigo 7, “são as regiões sujeitas a critérios urbanísticos especiais, que determinam a
ocupação com baixa densidade e maior taxa de permeabilização, tendo em vista o interesse público na proteção ambiental
e na preservação do patrinio histórico, cultural, arqueológico ou paisagístico”.
125
Lei nº. 7.165/96 Art. 52.
Capítulo IV
A Aplicação da TDC em Belo Horizonte
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
142
Para que a aplicação deste instrumento não crie transtornos na área receptora, tanto
o Decreto de 1998, como o Plano Diretor estabelecem um limite máximo de recepção de
potencial transferido. Este limite é de 20% da área permitida a ser edificada no terreno
receptor, segundo o coeficiente de aproveitamento fixado pela Lei de Parcelamento,
Ocupação e Uso do Solo. Em caso de Operação Urbana, esse limite poderá exceder 20%,
por meio de determinação em lei específica para cada operação. Conforme o Plano Diretor,
o potencial construtivo recebido não poderá ser objeto de nova transferência, tornando-se
vinculado ao imóvel receptor.
De acordo com o Decreto de 1998, na aplicação da TDC devem-se observar todas
as limitações impostas pela Lei de Parcelamento, Ocupação e Uso do Solo, como o
coeficiente de aproveitamento por ela estabelecido, sendo transferida apenas a área
correspondente ao “impedimento construtivo imposto pelo interesse público de
preservão ambiental e cultural ou pela necessidade de implantação de programa
habitacional”
126
. Defini-se também que para os imóveis dotados de cobertura vegetal,
quando edificados, a área transferida deve ser calculada a partir da área líquida do projeto
arquitetônico
127
ou do levantamento para regularização
128
. Agora, se o imóvel não possuir
edificação, o cálculo deverá ser feito a partir da área do lote ou terreno passível de
parcelamento. No caso de imóveis destinados à implantação de programas habitacionais,
um limite de transferência, que é de 50% da área do terreno gerador, excluindo-se as
áreas não parceláveis.
os imóveis tombados ou incluídos em Conjuntos Urbanos Tombados, quando a
restrição for do volume ou integral, o cálculo deverá ser feito a partir da área líquida
cadastral da edificação e nos demais casos, a partir da área quida do projeto arquitetônico
ou levantamento usado na regularização. Quando se trata de imóveis tombados e com
possibilidade legal de acréscimo, é oferecida a oão de transferência total do saldo da área
líquida a ser transferida, desde que mantenham a mesma área construída e as características
da edificação objeto de tombamento.
126
Decreto 9.616/98 Art. 4º, caput e § 3º.
127
Segundo o glossário da Lei 7.166/96, área líquida edificada é a “área total edificada, deduzidas as áreas não
computadas para efeito do cálculo do coeficiente de aproveitamento, conforme previsto no texto legal.
128
Somente após a “Baixa de Construção” e “Habite-se”.
Capítulo IV
A Aplicação da TDC em Belo Horizonte
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
143
O Decreto analisado ainda estabelece que o processo da TDC ocorra na Secretaria
Municipal de Atividades Urbanas
129
, onde deverá ser expedida a Certidão de Transferência
do Direito de Construir (CTDC) para o imóvel gerador, efetuada a transferência do direito
de construir mediante autorização dos proprietários do imóvel gerador e receptor, emitida
uma certidão a cada transfencia, além de ser mantido o cadastro de todas as certidões
emitidas e todas as transferências efetuadas.
O Decreto de 1998 estabelece que o cálculo e o controle da TDC deverão realizar-
se utilizando uma unidade de transferência denominada UTDC (Unidade de Transferência
do Direito de Construir), estabelecido a partir da relação da área transferida ou
recepcionada pelo valor venal do metro quadrado
130
do imóvel envolvido gerador ou
receptor. Desta forma é mantida uma equivalência entre os valores do potencial
construtivo, independente do local ou do valor do solo urbano, não havendo prejuízos para
nenhuma das partes. Segue o artigo 6º do Decreto 9.616/1998, onde se encontram as
fórmulas para o cálculo das UTDCs:
Art. 6.º - O cálculo da transferência do direito de construir será feito com a
utilização das seguintes fórmulas:
I - para se calcular o número de UTDCs provenientes do imóvel gerador:
UTDC = AT(m2) x VG (reais/m²), em que:
R$1.000
AT é o saldo da área líquida transferível e
VG é o valor venal do metro quadrado do imóvel
gerador.
II - para se calcular o número de UTDCs correspondentes ao imóvel receptor:
UTDC = AR(m2) x VR (reais/m²), em que:
R$ 1.000
AR é a áreaquida adicional a ser edificada e
VR é o valor venal do metro quadrado do imóvel
receptor.
Em agosto, também do ano de 1998, foi instituída a Comissão Permanente de
Transferência do Direito de Construir (CPTDC), através da Portaria 3605/98, devido à
“necessidade de estabelecer rotinas para a aplicação do Decreto 9.616/98”, em vistas do
129
Em janeiro de 2005, a Lei nº. 9.011, que “dispõe sobre a estrutura organizacional da Administração Direta do Poder
Executivo e outras providências”, estabeleceu que a Secretaria Municipal Adjunta de Regulação Urbana (SMARU)
assumisse a função de gerir a TDC no lugar da então Secretaria de Atividades Urbanas que foi extinta nesta ocasião.
130
Segundo o Decreto 9.616/98, § , para o cálculo do valor venal do metro quadrado do imóvel envolvido na TDC
deverá ser utilizada como referência a Planta de Valores Imobiliários usada para cálculo do Imposto sobre Transmissão
Inter Vivos de Bens Imóveis - ITBI.
Capítulo IV
A Aplicação da TDC em Belo Horizonte
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
144
caráter inovador e ltiplo deste instrumento, envolvendo vários óros”. Esta Comissão
ficou vinculada a atual Secretaria Municipal Adjunta de Regulação Urbana (SMARU) e é
muito importante na operacionalização do instrumento da TDC em Belo Horizonte.
Em 2007, a CPTDC, através da Resolução de 16 de janeiro de 2007
131
, alterou a
rotina de cálculo e controle da TDC presente no artigo 5º e do Decreto de 1998,
desvinculando desta as UTDCs. Segundo Valéria Braga, esta alteração ocorreu porque a
UTDC foi criada com o objetivo de ser “um tipo de valor imobiliário que pudesse ser
comercializado livremente no mercado e como não conseguiram “operacionalizar o
instrumento desta forma, de maneira segura e sem possibilidade de falsificações”
132
,
optaram por vincular o instrumento somente ao lote e não mais a uma unidade “virtual”.
Outro motivo que levou à supressão da UTDC do cálculo foi a desatualização do valor das
UTDCs que os imóveis geradores tinham em saldo a cada novo reajuste da tabela de ITBI,
que sugere o valor da Área Isótima
133
a que pertence o terreno gerador.
Portanto, após a Resolução de 2007 não foi mais necessária a utilização de fórmula
para lculo das UTDCs quando o imóvel gerador gera potencial, pois os saldos de
potencial construtivo destes imóveis passaram a ser arquivados em metros quadrados de
área liquida transferível (AT) e não mais em UTDCs. Os imóveis que tinham gerado
potencial construtivo antes de 2007 e ainda possuíam saldo, tiveram estes saldos em
UTDCs convertidos em AT, para arquivamento e controle
134
.
Uma “nova rmula baseada na equivalência daquela presente no Decreto de
1998
135
passou a ser utilizada sempre que uma nova transferência de potencial
construtivo, seja ela parcial ou total. Nesta nova fórmula utiliza-se o valor venal do
metro quadrado do terreno gerador (VG), bem como o valor venal do metro quadrado do
imóvel receptor (VR) e a área liquida adicional (AR) que o proprietário do imóvel receptor
131
Esta resolução encontra-se no Anexo B.
132
Citação retirada de entrevista escrita concedida à autora por Valéria Braga Pena, chefe do Gabinete da SMARU e
coordenadora da CPTDC, em outubro de 2008.
133
Área Isótima é a área no município de Belo Horizonte onde o valor venal do metro quadrado é o mesmo. Esta decisão
é tomado através de um mapeamento específico e tem os valores venais atualizados constantemente.
134
As conversões de UTDC e AT foram feitas da seguinte forma: AT = UTDC x 1000 /VG
135
Equivalência:
Se UTDCs geradas = UTDCs recebidas
Então se conclui que: AT x VG/1000 = AR x VR/1000
AT x VG = AR x VR
Capítulo IV
A Aplicação da TDC em Belo Horizonte
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
145
deseja edificar
136
, para calcular a área líquida transferível (AT) pelo imóvel gerador para
um determinado caso:
AT(m²) x VG(reais/m²) = AR(m²) x VR(reais/m²)
AT (m²)= AR(m²) x VR(reais/m²)
VG(reais/m²)
Os procedimentos para a aplicação da TDC em BH foram previstos de forma
superficial no Decreto de 1998, entretanto com a prática de utilização deste instrumento
pelos órgãos municipais envolvidos estabeleceu-se uma rotina de operacionalização, que
acabou por ser regulamentada pela SMARU em abril de 2006, através da Portaria
SMARU nº. 001. Tal portaria determina a maior parte da operacionalização do
instrumento da TDC em Belo Horizonte. Sua análise, bem como maiores detalhes sobre a
operacionalização do instrumento da TDC em Belo Horizonte, encontram-se no Apêndice
B desta pesquisa.
4.3.2 A aplicação da TDC em Belo Horizonte
Em Belo Horizonte, até junho de 2008
137
, deram entrada na Prefeitura cinenta e
oito processos solicitando a TDC, de acordo com “Controle de Processos de Transferência
do Direito de Construir” disponibilizado pela
Assessoria do Gabinete da SMARU. O primeiro
processo deu entrada na PMBH em 1996,
entretanto ao ano 1999 nenhum dos processos
solicitando a TDC tiveram como resultado a
transferência de potencial. Neste período apenas
oito processos foram protocolados e destes, seis
foram indeferidos, não obtendo a Certidão de
TDC por motivos como: o péssimo estado de
conservação, a falta de regularização do imóvel,
ou solicitação de transferência de potencial de
136
É importante ressaltar que conforme Decreto 9.616/98 Art. 3º, § 2º o valor da AR não pode ultrapassar os 20% da área
edificável no terreno, baseado no coeficiente de aproveitamento estabelecido pela Lei de Parcelamento, Ocupação e Uso
do Solo para a região onde se encontra o imóvel receptor.
137
As últimas atualizações dos dados sobre a aplicação da TDC junto à PMBH ocorreram em julho de 2008.
Figura 113: Imóvel na Rua dos Caetés com
dois processos de 1997 para gerar TDC.
Os processos foram indeferidos pelo péssimo estado de
conservação do bem e por se tratar de pedido de TDC
para duas salas, o que não é permitido.
Capítulo IV
A Aplicação da TDC em Belo Horizonte
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
146
salas de um prédio e não dele inteiro (Figura 113). Estes primeiros processos ocorreram
ainda sobre a vigência da Lei de 1994 (que foi revogada) e também do Plano Diretor,
sendo que a partir do Decreto de 1998 os processos começaram a ter efetividade, não
havendo mais casos de indeferimento
138
. Isso se deve principalmente a um maior
esclarecimento aos interessados sobre as condições de aplicação do instrumento neste
último Decreto.
Assim, cronologicamente, observa-se que foi somente a partir de 1999 que deram
entrada processos que posteriormente seriam efetivados. A primeira transferência de
potencial construtivo aconteceu mesmo em 2001, ou seja, cinco anos após o início dos
processos. A partir de então, foi constante a crescente entrada de processos que seriam
efetivados de fato, havendo alguns picos de aumento, como nos anos de 2004 e 2007, de
acordo com o observado no Gráfico na próxima página:
A grande maioria dos imóveis com processo para gerar potencial construtivo em
Belo Horizonte são tombados, destinados à preservação cultural e ou histórica, tratando-se
principalmente de edificações que comem os Conjuntos Urbanos protegidos pelo
Município. O único imóvel o tombado pelo município, nem em conjunto, nem,
138
Todos os dados quantitativos foram retirados em junho de 2008 do “Controle de Processos de Transferência do
Direito de Construir” disponibilizado pela Acessória do Gabinete da SMARU.
Figura 114: Gráfico com a Cronologia de entrada e efetivação de processos de TDC em BH
Fonte: Gráfico Construído a partir de dados retirados do “Controle de Processos de Transferência do Direito de Construir”
0
1
2
3
4
5
6
7
8
9
10
1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008*
Nº de Processos Nº de Processos efetivados
* Dados coletados até o mês de junho
de 2008
Capítulo IV
A Aplicação da TDC em Belo Horizonte
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
147
Figura 115: Igreja Santa Efigênia com destaque para
o terreno vizinho que gerou TDC
isoladamente, que gerou potencial enquadra-
se no inciso III do artigo 61 do Plano Diretor
por ser sujeito a formas de acautelamento e
preservão (...) que restrinjam o potencial
construtivo. Este imóvel o era
considerado de valor cultural ou histórico,
mas sofria de impossibilidade de exercer seu
pleno potencial por estar localizado ao lado
de imóvel tombado (Igreja Santa Efigênia
Figura 115), que exige restrições de
altimetria e afastamento para sua
preservão. Para a geração de TDC neste imóvel, que na verdade era um lote vazio, foi
necessária a elaboração um projeto arquitetônico que demonstrasse o máximo potencial
construtivo permitido para ele após as restrições, possibilitando assim o lculo da área
passível de ser transferida.
Dos cinqüenta e oito processos que deram apresentados à prefeitura até junho de
2008, apenas um era de imóvel que gerou potencial por se enquadrar na categoria de bens
com restrições devido a sua cobertura vegetal. Este exemplar localiza-se no Bairro Estoril
(Regional Oeste) na ADE Buritis, que é de interesse ambiental. Seu processo de TDC deu
entrada em 2002, porém não foi efetivada nenhuma transferência até a última pesquisa,
apesar do bem possuir um saldo de AT de quase 2000 (dois mil) metros quadrados. O
instrumento, até a última pesquisa junto à prefeitura, não foi utilizado para fins de
implantação de programas habitacionais como previsto no Decreto de 1998. De acordo
com Valéria Braga, a aplicação do instrumento para fins exceto o de preservação do
patrimônio cultural, não se tornou viável tecnicamente em Belo Horizonte principalmente
pela falta de pessoal habilitado para se ocupar com as medidas necessárias de aplicação do
instrumento nas outras secretarias envolvidas. Outro motivo da falta de utilização da TDC
para fins de preservação ambiental, enfatizado na justificativa da “Minuta de Decreto que
visa atualizar o Decreto de 1998, é a limitação da geração de potencial apenas àqueles
imóveis classificados como ADE de interesse ambiental.
Os imóveis de interesse cultural que geraram potencial construtivo localizam-se em
sua totalidade na região mais central de Belo Horizonte, onde o traçado urbano é mais
antigo, especificamente na Regional Centro-Sul e Leste (Figura 116). Tanto que todos eles
Capítulo IV
A Aplicação da TDC em Belo Horizonte
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
148
estão inseridos nas denominadas Seções Urbanas e Suburbanas, que são as divisões da
cidade estabelecidas na época da planta oficial de construção da nova capital (Figura 107).
Esta planta reparte em oito Sões Urbanas a área interna do perímetro da Avenida
Contorno e em quatorze Seções Suburbanas a área em volta deste perímetro
139
. Assim, por
ter uma história de formação que data de mais de um século, é nesta região de Belo
Horizonte onde se encontram a maior parte dos Conjuntos Urbanos protegidos e do acervo
do patrimônio cultural edificado do município.
139
A denominação de Seções Urbanas e Seções Suburbanas ainda é utilizada de maneira oficial pelos Cartórios e pela
Prefeitura de Belo Horizonte, entretanto as mesmas Seções Urbanas e Suburbanas possuem nomenclaturas populares, que
dizem respeitoà forma como a população identifica aquele local em seu dia a dia. Um exemplo disso é o Bairro
conhecido como Floresta que encontra parte inserido na 14ª Seção Urbana (dentro do perímetro da Avenida do Contorno)
e parte inserido na 6º Seção Suburbana (fora do perímetro da Avenida do Contorno).
Capítulo IV
A Aplicação da TDC em Belo Horizonte
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
149
Por estarem na região central de Belo Horizonte, os imóveis geradores de interesse
de preservação cultural localizam-se, em sua maioria, no Zoneamento o qual a Lei de
Parcelamento, Ocupação e Uso do Solo denomina de Zona Central (ZC), mais
especificamente em suas subdivisões Zona Hipercentral (ZHIP) e Zona Central de Belo
Horizonte (ZCBH), como pode ser comprovado na Figura 117. Estas ZCs encontram-se no
perímetro interno da Avenida do Contorno e o “regiões nas quais é permitido maior
Figura 116: Mapa do Município de Belo Horizonte dividido sobre Regionais Administrativas e com
áreas (Bairros, Seções Urbanas e Suburbanas) que geraram TDC até junho de 2008
Fonte: Dados do Controle de processos de TDC sobre Mapa de Bairros da PMBH
MAPA SEM ESCALA
Capítulo IV
A Aplicação da TDC em Belo Horizonte
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
150
adensamento demográfico e maior verticalização das edificações, em razão de infra-
estrutura e topografia favoráveis e da configuração de centro"
140
. Os imóveis geradores que
se localizam fora do perímetro da Avenida Contorno estão em ZAP, inclusive o imóvel de
interesse ambiental no Bairro Estoril.
Devido às características definidas na Lei Parcelamento, Ocupação e Uso do Solo,
que estabelece para a ZCBH e ZHIP o maior Coeficiente de Aproveitamento da cidade
(coeficiente igual a três), bem como outras variáveis econômicas, os imóveis da área
central de Belo Horizonte possuem maior valorização no mercado imobiliário. Deste
modo, o potencial construtivo que os imóveis tombados em áreas de ZCs não podem
utilizar por razões preservacionistas, além de ser em quantidade geralmente elevada, dado
o alto coeficiente de aproveitamento, também possuem um alto valor de venda devido à
valorização econômica da área.
Todos os imóveis que geraram TDC são atualmente de propriedade privada e para a
maioria de seus proprietários a utilização do instrumento é considerada uma forma de
minimizar os prejuízos que consideram sofrer por não poder fazer intervenções físicas,
140
Lei 7166/96, art. 11.
Figura 117: Mapa da área central de BH com a espacialização dos imóveis que geraram TDC até
junho de 2008, em seus respectivos zoneamentos.
Fonte: Dados do Controle de processos de TDC sobre Mapa da Lei 7166/96
MAPA SEM ESCALA
Capítulo IV
A Aplicação da TDC em Belo Horizonte
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
151
Figura 118: Sede Social do Minas Tênis Clube
na Rua da Bahia, gerou TDC em 2001.
nem utilizar o valorizado potencial construtivo a que teriam direito caso o seu imóvel não
fosse tombado
141
. De acordo com o Plano Diretor de Belo Horizonte, os imóveis “de
propriedade blica ou que, em sua origem, tenham sido alienados pelo Município, pelo
Estado ou pela União de forma não onerosa” não podem utilizar a TDC e é o que acontece
nesta cidade, em quase todos os casos. A única exceção é um imóvel que atualmente é de
propriedade do Minas Tênis Clube e que foi doado a esta entidade pelo poder público
(Figura 118). O processo que solicitou a TDC
da sede social do mesmo teve pareceres
técnicos e da CPTDC contrários, entretanto
houve uma autorização especial que partiu
diretamente do gabinete da SMARU
permitindo a emissão da Certidão de TDC.
Este caso evidencia um conflito notório entre
os agentes do Poder Público envolvidos na
operacionalização da TDC, tanto que o
processo do Minas Tênis Clube não tramita da
mesma forma que os demais, atendendo a um
trâmite especial e um controle também à parte, segundo Valéria Braga.
Quanto às tipologias dos imóveis tombados que geraram potencial construtivo,
observou-se, através de visita a alguns deles e informações coletadas na DIPC, que
predominância de imóveis geradores caracterizados como ecticos, variando entre bens
com características da época da construção do município (os chamando modelos da
Comissão Construtora), até os com características de sobrado eclético, chalés e elementos
de Art-Nouveau ou neocoloniais
142
(Figuras 119 a 123). Isso se deve ao fato do ecletismo
ter sido a primeira tipologia arquitetônica adotada em Belo Horizonte, sendo os imóveis
assim caracterizados os mais antigos remanescentes na paisagem da região central deste
município
143
. Foram observados, também, entre os imóveis que geraram potencial
construtivo, alguns de construção mais recente classificados como Art Déco (Figuras 124 e
141
Informações obtidas através de questionários enviados aos proprietários de imóveis geradores através de email, em
maio de 2006 e em julho de 2008.
142
Para maiores informações consultar CASTRIOTA, Leonardo Barci. Arquitetura da Modernidade. Onde há um maior
detalhamento dos estilos arquitetônicos e dos seus períodos de predominância na cidade de Belo Horizonte.
143
Como enfatizado anteriormente, pouco restou da arquitetura colonial que imperava na região onde foi construída a
cidade de Belo Horizonte, podendo destacar como remanescente do Arraial de Curral Del Rei apenas o imóvel da antiga
sede da Fazenda Leitão no Bairro Cidade Jardim, onde está instalado o Museu Abílio Barreto.
Capítulo IV
A Aplicação da TDC em Belo Horizonte
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
152
125), além dos modernos propriamente ditos marcados por obra residencial de Oscar
Niemeyer e por prédio de três andares de Sylvio de Vasconcelos (Figuras 126 e 127).
Mais da metade destes imóveis geradores transferiu potencial construtivo para, pelo
menos, um receptor. Aqueles que não tinham transferido potencial até junho de 2008
tratavam-se de processos mais antigos, como os que foram indeferidos nos primeiros anos
de aplicação do instrumento, ou eram processos que tinham dado entrada mais
recentemente. Através de comparação dos dados do Controle de Processos de TDCde
junho de 2008, com dados coletados por Pinheiro em 2006
144
, pôde ser constatado que nos
últimos dois anos houve um grande aumento do número de transferências do direito de
144
Pinheiro, 2006, p.62-79.
Figura 119: Imóvel residencial
eclético na Rua Paraíba, 866.
Figura 120: Imóvel comercial
eclético na Rua da Bahia, 1416.
Figura 121: Imóvel eclético na
Av. Cristóvão Colombo
Figura 124: Imóvel do Colégio
Imaculada, Art Decó na Rua da
Bahia, 1534
Figura 122: Imóvel residencial
eclético (neocolonial) na Rua
Espírito Santo, 1920.
Figura 123: Imóvel residencial
Art Decó na Av. Brasil, 1433.
Figura 125: Imóvel do Instituto
Isabela Hendrix, Art Decó na
Rua da Bahia, 2020.
.
Figura 127: Imóvel Moderno na
Rua Bernado Guimarães, 2751
Obra de Oscar Niemeyer
Figura 126: Imóvel Moderno na
Rua da Bahia, 1723.
Obra de Sylvio de Vasconcelos
.
Aline Guedes - 10/ 2008
Capítulo IV
A Aplicação da TDC em Belo Horizonte
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
153
construir. Este aumento é muito significativo
145
e deveu-se principalmente ao aumento do
número de TDCs realizadas por cada imóvel gerador. Antes, o imóvel que tinha efetivado
maior número de transferências alcançou o número de dezenove, já em 2008, o imóvel que
transferiu em maior número o fez para cinquenta receptores. de-se observar que este
aumento considerável de TDC se deu, principalmente, porque neste período imóveis que
possuíam grande área a ser transferida (AT) realizaram transferências para imóveis que,
obedecendo ao limite de recepção de 20% do potencial construtivo do terreno, o
poderiam adquirir grandes áreas (ARs). Um destes casos é o do imóvel gerador do Instituto
Isabela Hendrix, que será exposto no próximo item desta pesquisa.
Apesar do número elevado de TDCs efetivadas em Belo Horizonte, estas
transferências ocorreram em pontos isolados da cidade e para regiões onde a recepção de
potencial construtiva é permitida, salvo casos excepcionais em que aconteceram mudanças
nos parâmetros estabelecidos pelo Decreto de 1998 no que diz respeito ao zoneamento dos
imóveis receptores. Estes casos são os dos imóveis receptores de TDCs a partir de imóvel
gerador envolvido na Operação Urbana do Conjunto Arquitetônico da Avenida Oiapoque,
estabelecida pela Lei 8725/2003, e de um imóvel receptor localizado no Bairro Sion
(ZA
146
), onde o potencial adquirido teve como fim a regularização das áreas de varandas
que foram fechadas irregularmente, conforme concessão estabelecida na Lei nº.
9.074/2005, art. 26
147
.
A despeito dos casos mencionados acima, a grande maioria dos imóveis receptores
estão em Zonas permitidas e incentivadas pela Lei de Parcelamento, Ocupação e Uso do
Solo, que são a ZAP e ZCBH, onde a infra-estrutura e a topografia são favoráveis para um
maior adensamento. Seguindo os parâmetros impostos pelo Decreto de 1998, todas as
transferências para a ZCBH vieram de imóveis localizados nesta mesma zona, por isso ali
foi permitido o uso da TDC. Desta forma, a ZCBH, mesmo possuindo um potencial
construtivo alto devido ao seu coeficiente de aproveitamento igual a três, configurou-se
145
Das setenta e seis TDC que PINHEIRO (2006, p.102) informou através de dados coletados até dezembro de 2005
passaram para 463 (quatrocentos e sessenta e três) TDC efetivadas até junho de 2008.
146
ZAs: Segundo a Lei 7166/96, artigo “são as regiões nas quais o adensamento deve ser contido, por apresentarem
alta densidade demográfica e intensa utilização da infra-estrutura urbana, de que resultam, sobretudo, problemas de
fluidez do tráfego, principalmente nos corredores viários.
147
A Lei nº. 9.074 de 18 de janeiro de 2005, "Dispõe sobre a regularização de parcelamentos do solo e de edificações no
nicípio de Belo Horizonte e dá outras providências", tratando deste assunto em seu art.26, transcrito abaixo:
"art. 26 - O fechamento de varanda construída irregularmente em edificação vertical poderá, no que se refere ao
Coeficiente de Aproveitamento, ser regularizado alternativamente, também por meio da aquisição de Unidades de
Transferência do Direito de Construir - UTDC.
Parágrafo único - As UTDC utilizadas para a regularização, de que trata o caput, poderão ser oriundas de imóveis
tombados, situados em qualquer zoneamento."
Capítulo IV
A Aplicação da TDC em Belo Horizonte
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
154
como a região que mais recebeu potencial construtivo através da TDC, pois, devido à alta
potencialidade construtiva, os 20% de recepção admitidos se transformam em AR também
altas, o que possibilita uma melhor viabilidade de grandes empreendimentos conseqüente
lucro do investidor.
De acordo com Valeria Braga, o acréscimo de somente 20% de potencial
construtivo nos imóveis receptores e o fato de todo eles estarem de acordo com este e
outros parâmetros estabelecidos no Decreto 9.616/98, art. 3ª, a utilização da TDC não
causou impactos no espaço urbano de Belo Horizonte. Para ela, também os acréscimos de
20% atrelados à localização isolada na cidade, não chegam a ser percebidos do ponto de
vista urbanístico. O único caso que de certa forma trouxe um impacto urbano para uma
área da cidade foi o de TDC dentro da Operação Urbana do Conjunto Arquitetônico da
Avenida Oiapoque, que será tratada no próximo item desta pesquisa.
4.3.3 Alguns casos referência para exemplificação da
aplicação do instrumento da TDC
Em Belo Horizonte, até junho de 2008, foram apresentados na Prefeitura cinqüenta
e oito processos solicitando TDC, como foi aludido anteriormente, entretanto, destes
processos houve dois casos em que o imóvel solicitando a geração de potencial era o
mesmo de um processo anterior
148
. Assim, pode-se inferir que os cinqüenta e oito
processos equivalem a cinqüenta e seis imóveis diferentes solicitando a TDC em Belo
Horizonte. Destes, cinqüenta e cinco
149
fazem parte do que denominamos patrimônio
cultural edificado, que é o objeto de estudo da presente dissertação, tornando o estudo de
cada um dos casos de aplicação da TDC muito extenso para uma pesquisa deste porte.
Assim, optou-se por, através da ajuda dos agentes da prefeitura envolvidos na aplicação do
instrumento da TDC, selecionar um número restrito de casos referências” para serem
estudados com maior detalhamento.
Destarte, foram selecionados cinco imóveis que, segundo os agentes da prefeitura,
abrangem diferentes aspectos práticos da utilização da TDC em Belo Horizonte e podem,
de uma maneira geral, mostrar como vêm sendo tratados os imóveis objeto do instrumento
148
Um destes casos de acordo com o “Controle de Processos de TDC” foi de um imóvel na Rua dos Caetés que teve o
pedido de TDC indeferido em 1996 devido ao mau estado de conservação do bem e que após restauro solicitou e
conseguiu a Certidão de TDC em 2006. O outro caso é de dois processos solicitando a TDC de duas salas de um mesmo
imóvel em 1997. (Figura 113)
149
Dos 56 imóveis que solicitaram a TDC, um é de interesse ambiental e outro é um terreno no entorno de imóvel
tombado, como já foi tratado anteriormente.
Capítulo IV
A Aplicação da TDC em Belo Horizonte
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
155
Figura 129: Localização da Casa Niemeyer
Fonte: Google earth (com alterações)
ao logo do tempo, divulgando alguns pontos negativos e outros positivos da aplicação da
TDC na cidade. Estes imóveis são todos tombados, isoladamente ou em conjunto, e
localizam-se em diferentes regiões da área central de Belo Horizonte, abrangendo as
principais tipologias arquitetônicas presentes na paisagem urbana da cidade, como pode ser
observado na figura abaixo:
A) Casa Niemeyer (objeto de TDC em 2000)
O imóvel ao qual denomina-se Casa
Niemeyer” encontra-se em um lote na esquina
formada pela Rua Araguari com a Rua Bernardo
Guimarães, no Bairro Funciorios e foi
projetado pelo arquiteto Oscar Niemeyer no
início da década de 1940, tendo sua aprovação
na prefeitura datada de 1943
150
. De acordo com
Macedo, esta obra residencial
150
As informações históricas deste imóvel foram coletadas junto ao acervo documental da DIPC em junho de 2008.
Figura 128: Mapa da área central de BH com a espacialização dos imóveis “casos referência”.
Fonte: Dados do Controle de processos de TDC sobre Mapa da Lei 7166/96
MAPA SEM ESCALA
Capítulo IV
A Aplicação da TDC em Belo Horizonte
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
156
conceitualmente, constitui um elo entre as pesquisas nativistas da primeira etapa da obra
de Oscar e as suas obras à beira da represa” da Pampulha. Portanto, com seus traços retos,
cobertura “asas de borboleta” em telhas coloniais sobre laje inclinada, pátio interno,
azulejaria tradicional, cobogós, áreas sociais integrados e bem iluminadas, além do
paisagismo de Roberto Burle Max, esta obra é considerada um autêntico exemplar da
arquitetura moderna projetada por Oscar Niemeyer em Belo Horizonte (MACEDO, 2006,
p.22) (Figura 130).
Esta resincia foi construída em 1946 e teve como primeiros proprietários João de
Pádua e Lúcia Valadares de Pádua (filha do governador Benedito Valadares). Em 1959, o
imóvel junto com todo o mobiliário foi adquirido por Adalberto de Castro, que em 1968
efetuou uma grande reforma na residência, levando a perda de parte características
originais, principalmente na Rua Araguari. De 1990 até o ano 2000, o bem ficou
desocupado e sujeito a depreciações devido à falta de manutenção, mas nada que afetasse
suas características essenciais. O tombamento do imóvel de forma isolada
151
aconteceu em
1999 e acabou sofrendo pedido de impugnação pela então proprietária (herdeira do Sr.
Adalberto), não atendido pela CDPCM-BH. Nas conclusões do CDPCM sobre a não
aceitação do processo de impugnação do tombamento, dentre outras coisas, o conselheiro
sugeriu à proprietária a utilização do instrumento da TDC, como uma contrapartida ao
151
Esta residência foi tombada de forma isolada por não ter uma história atrelada a das outras edificações do seu entorno,
como acontece com os imóveis com tombamento específico, localizados dentro do perímetro de um Conjunto Urbano.
(Informação obtida através de entrevista concedida por Michele Abreu Arroyo, diretora de da DIPC, em outubro 2008)
Figura 130: Desenhos técnicos da configuração original da Casa Niemeyer.
Fonte: MACEDO, 2006, p.22.
Capítulo IV
A Aplicação da TDC em Belo Horizonte
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
157
tombamento que ele reconhece “ser uma limitação à utilização de todo o potencial
construtivo do imóvel”.
Seguindo então o conselho da CDPCM-BH, a proprietária da Casa Niemeyer
solicitou a TDC de seu imóvel em novembro do ano 2000. A vistoria efetuada pelo órgão
do patrimônio que tinha tal responsabilidade na época produziu laudo favorável,
constatando o bom estado de conservação do imóvel, apesar de “necessitar de pequenas
intervenções para que se possibilite o uso da edificação
152
(Figura 131). N momento em
que o processo de TDC deste imóvel deu entrada, os cálculos ainda eram feitos utilizando
as UTDC, assim, para chegar a estas unidades foram utilizados os dados e lculos
contidos na Tabela 7 abaixo:
Área do terreno
(ATer)
Coeficiente de
Aproveitamento(CA) ZCBH
Área líquida máx. permitida
(Almax)
Almax = ATer. x CA
Área Construída total
(ACT)
438, 38 m²
3
1315,14 m²
285,00 m²
Área Líquida Transferível
(AT)
AT = ALmax x ACT
Valor venal (VG) para área
isótima OB22 em fev. 2001
1030,14 m²
R$ 586,69
UTDC
UTDC = AT(m2) X VG(R$/m2)
R$1.000,00
604,37 UTDC
Com todos os cálculos efetuados e com a aprovação do CPTDC, a Certidão de TDC
foi expedida em março de 2001. Em 2003, todo o potencial construtivo que este imóvel
gerou foi esgotado através de quatro transferências que aconteceram entre março de 2002 e
abril de 2003. Todas estas quatro transferências foram adquiridas por uma construtora de
Belo Horizonte que é conhecida por negociar potencial construtivo para seus
empreendimentos. Os imóveis que receberam a TDC da Casa Niemeyer localizam-se na
ZCBH, mesma zona que o imóvel gerador e, devido ao coeficiente de aproveitamento alto,
152
Informações coletadas no processo de TDC deste imóvel (processo 01.119.801/ 00-90).
Fonte: Processo de TDC nº. 01.119.801/ 00-90
Tabela 7: Dados e cálculos para chegar ao valor das UTDCs da Casa Niemeyer
Figura 131: Casa Niemeyer em 2000
Fonte: Documentação da DIPC
Figura 132: Fachada Bernardo
Guimarães da Casa Niemeyer -2000
Fonte: Documentação da DIPC
Capítulo IV
A Aplicação da TDC em Belo Horizonte
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
158
Figura 133: Croqui do projeto de
Restauro da Casa Niemeyer
Fonte: Documentação da DIPIC
o esgotaram seu limite de recepção, portanto, poderia ter sido adquirido mais potencial
construtivo de outros imóveis. Na Tabela 8 da página seguinte, se encontram os dados e os
cálculos utilizados para um dos quatro casos de recepção de TDC da Casa Niemeyer:
Data da TDC
Localização do Imóvel Receptor
11/4/2003
Lotes 16 e 17 no quarteirão 20 da 12ª Seção Urbana, à Rua Martim de
Carvalho, 395/411, Santo Agostinho.
Ordem da TDC
4º de 4
Área do terreno
(ATer)
Coeficiente de Aproveitamento
(CA) - ZCBH
Limite de Recepção
ALimit = (ATer. x CA)x20%
1350 m²
3
810 m²
UTDCs adquiridas
Valor venal (VR) para área isótima
OB22 em mar. 2003
Observações
49,09
(zerando o saldo do imóvel gerador)
R$ 776,44
Estes lotes já tinham recebido
potencial construtivo em 03/2003 de
outro imóvel gerador e
posteriormente receberam mais
duas TDC de outros imóveis,
totalizando quatro TDC recebidas. E
mesmo assim eles não esgotaram
os seus Limites de Recepção
AR
AR(m²) = UTDC X R$1.000,00
VR(R$/m²)
54,21m²
Após a solicitação da TDC foi apresentado
ao conselho um projeto de restauro da Casa
Niemeyer, visando adequar o seu espaço a uma loja
de roupas femininas e buscando resguardar as suas
feições originais, apesar de abrirem para a rua o
pátio que antes era interno. Este projeto foi
aprovado pelo CDPCM-BH no final do ano 2000 e
executado como previsto durante o ano de 2001
(Figura 133). O novo uso funcionou somente até 2004, quando o imóvel ficou novamente
desocupado e vulnerável a invasões e depreciações. Em 2006, uma vistoria efetuada pela
DIPIC constatou que tinham sido realizadas intervenções na Casa sem a devida aprovação
do Conselho. Em visita ao local em outubro de 2008 constatou-se que o imóvel encontra-se
atualmente ocupado por uma empresa prestadora de serviços e que externamente seu
estado de conservação é regular devido à falta de manutenção nas paredes, jardins e pisos.
Tabela 8: Dados e cálculos para chegar ao valor da AR de imóvel receptor de TDC
Fonte: Processo de TDC nº. 01.119.801/ 00-90
Capítulo IV
A Aplicação da TDC em Belo Horizonte
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
159
B) Casa Klus Modas (objeto de TDC em 2001)
A edificação conhecida por Casa Klus Modas
localiza-se no alinhamento da esquina da Rua Rio
Grande do Norte com a Rua Aimorés, no Bairro
Funcionários, e tem este nome por abrigar desde a
década de 1990 uma famosa Boutique de roupas
masculinas, a Klus Modas (Figura 136). Este imóvel
foi projetado para fins residenciais no final da década
de 1920 e é caracterizado dentro do estilo eclético, de
apenas um pavimento e porão alto. De acordo com
documentação sobre o imóvel disponível na DIPIC
ele “é um exemplar singelo, mas significativo da história da arquitetura de Belo
Horizonte”
153
.
Este imóvel encontra-se inserido no Conjunto Urbano da Avenida Afonso Pena e
adjacências e teve tombamento específico de fachadas e volumes em 1995. Em maio de
1995, a edificação principal, que originalmente continha quartos e sala, encontrava-se em
bom estado de conservação, mas uma varada lateral e barracões grosseiros construídos no
terreno agrediam a edificação original (Figuras 137 e 138).
153
As informações históricas deste imóvel foram coletadas junto ao acervo documental da DIPC em outubro de 2008.
Figura 134: Fachadas para Rua Bernardo
Guimarães da Casa Niemeyer 2008 -
Figura 135: Fachada para Rua Araguari
da Casa Niemeyer 2008 -
Figura 136: Localização da Casa
Klus Modas
Fonte: Google earth (com alterações)
Capítulo IV
A Aplicação da TDC em Belo Horizonte
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
160
Figura 139: Croqui do Projeto de
restauro, adequação e construção de
nova edificação em 1996 da Casa Klus
Fonte: Documentação da DIPC
No ano de 1996 foi apresentando ao CDPCM-BH projeto de restauro das fachadas
e reformulação interna do imóvel para abrigar a loja Klus Modas, além da construção de
uma nova edificação de sete pavimentos, para abrigar outras necessidades da loja, no fundo
do terreno, com a demolição dos barracões. De acordo com o memorial do projeto de
restauro e adequação:
“A nova construção tem características arquitetônicas singelas, utiliza
linguagem moderna e pretende se harmonizar estética e funcionalmente com a
edificação existente. Na sua implantação procurou-se levar em conta as
condições do terreno e a premissa básica de liberar a casa de qualquer
constrangimento visual”
154
A CDPCM-BH não aprovou o projeto da
nova edificação com sete andares por ela não
adequar-se as diretrizes de altimetria do conjunto
urbano tombado. Entretanto, através de diálogo
com os arquitetos responsáveis e os proprietários,
levando-se em conta que a área do quarteirão onde
se encontra a edificação tombada vinha sofrendo
um processo de verticalização acentuado, o
Conselho acabou por aprovar um novo projeto,
desta vez com a edificação proposta contando com
cinco pavimentos (Figura 139). Atualmente, as
diretrizes do Conselho se tornaram mais rígidas, o
que levaria à o-aprovação de projetos como este,
caso não possuísse, no nimo, um afastamento de cinco metros da edificão original.
Segundo Michele Arroy, aprovações como a que aconteceu neste imóvel em 1996 fizeram
154
Informações históricas coletadas na documentação disponibilizada pela DIPIC sobre este imóvel em agosto de 2008.
Figura 137: Esquina da Rua Aimoré com
Rio Grande do Sul em 1995.
Fonte::Documentação da DIPC
Figura 138: Barracões ao fundo na Rua
Rio Grande do Sul.
Fonte: Documentação da DIPC
Capítulo IV
A Aplicação da TDC em Belo Horizonte
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
161
parte de todo um processo de amadurecimento das diretrizes do Conselho e da tentativa de
viabilizar investimentos privados nos iveis
tombados.
Com o imóvel restaurado e com um uso que
manteve o seu bom estado, em 2001 o proprietário
solicitou à TDC. Como previsto, a vistoria do orgão de
patrimônio cultural deu laudo favorável devido ao bom
estado de conservão do bem (Figura 140). Apesar da
área do terreno ser relativamente pequena e do
acréscimo de área construída com a nova edificação,
este imóvel ainda possuía uma aréa quida transferível
(AR) de mais de 500 m², devido ao seu alto coeficiente
de aproveitamento, como pode ser visto na Tabela 9
abaixo::
Área do terreno
(ATer)
Coeficiente de
Aproveitamento(CA) ZCBH
Área líquida máx. permitida
(Almax)
Almax = ATer. x CA
Área Construída total
(ACT)
380 m²
3
1140 m²
558,63 m²
Área Líquida Transferível
(AT)
AT = ALmax - ACT
Valor venal (VG) para área
isótima OB22 em fev. 2001
581,72 m²
R$ 707,98
UTDC
UTDC = AT(m2) X VG(R$/m2)
R$1.000,00
411,60 UTDC
Após a emissão da Certidão de TDC, o proprietário da Casa Klus Modas efetuou
duas transferências do direito de construir e zerou o seu saldo de potencial construtivo.
Estas transferências foram efetivadas no ano de 2003 para dois imóveis diferentes
localizados na ZCBH, sendo um deles de propriedade da mesma construtora que adquiriu
todo o potencial da Casa Niemeyer. Devido ao alto valor do solo urbano e do coeficiente
de aproveitamento, ambos os imóveis não esgotaram o limite de potencial construtivo que
têm direito de acordo com o Decreto de 1998. Os cálculos para a área transferível e o
limite de recepção deles foram efetuados da mesma forma que o exemplo da Tabela 6. Os
proprietários destes dois imóveis juntos adquiriram uma área de 524 (quinhentos e vinte e
quadro) metros quadrados, mas os terrenos poderiam receber uma área adicional de 1470
Tabela 9: Dados e cálculos para chegar ao valor da UTDC da Casa Klus Modas
Fonte: Processo de TDC nº. 01.049.808/01-85
Figura 140: Casa Klus Modas em
2000
Fonte: Processo de TDC nº 01.049.808/01-85
Capítulo IV
A Aplicação da TDC em Belo Horizonte
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
162
(mil quatrocentos e setenta) metros quadrados, o que a estes proprietários a
possibilidade de continuar adquirindo potencial até esgotar o limite
155
.
Atualmente, o imóvel encontra-se em ótimo estado de conservação e a edificação
de cinco pavimentos construída na década de 1990 tem um gabarito bem menor que as
edificações do entorno, contribuindo para a percepção do imóvel tombado (Figura 141 e
142). Outro fator de extrema importância para a preservação do entorno imediato do bem,
o o deixando comprimido entre prédios, foi a preservão das áreas livres em seu
terreno, propriciadas principalmente pela venda do potencial construtivo que poderia ser
edificado nestes locais.
C) Casa Daldegan (objeto de TDC em 2001)
O imóvel chamado de “Casa
Daldegan está localizado na Avenida do
Contorno, 3379, no Bairro Santa Efinia e
foi denominado assim por pertencer a uma
senhora com este sobrenome. Este imóvel foi
projetado em 1915 pelo arquiteto italiano
Octaviano Lapertosa, com linguagem eclética
influenciada pela Comissão Construtora da
Nova Capital. Ele foi construído
155
Dado retirado em junho de 2008 do “Controle de Processos de Transferência do Direito de Construir”
disponibilizado pela Acessória do Gabinete da SMARU.
Figura 141: Casa Klus Modas
em 2008
Figura 142: Fachada da Rua Rio Grande do
Norte da Casa Klus Modas em 2008
Figura 143: Localização da Casa Daldegan.
Fonte: Google earth (com alterações)
Capítulo IV
A Aplicação da TDC em Belo Horizonte
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
163
originalmente para uso residencial, em um único pavimento e sobre porão alto, tendo como
característica marcante o tratamento formal em sua fachada principal com balaustrada e
pilares ornamentais, além de pináculo. Seu mérito de preservação é principalmente por se
tratar de um dos poucos exemplares remanescentes da Comissão Construtora da Capital,
como enfatizado no processo de tombamento do mesmo:
"A preservação dos poucos exemplares remanescentes da CCNC é de grande
pertinência, uma vez que, em sua grande maioria, as chamadas "casas tipo"
desapareceram do cenário urbano, deixando uma lacuna evidente na memória
da capital, não em termos do registro das soluções arquitetônicas
empregadas como tamm na perpetuação de documentos materiais sobre as
antigas formas de morar da população."
156
Esta edificação pertence ao perímetro de proteção do Conjunto Urbano da Praça
Floriano Peixoto e Adjancias, protegido por tombamento desde 1994, e foi tombada de
forma específica no final da década de 1990. Não se sabe ao certo desde quando o imóvel
deixou de ter o uso residencial, mas apesar da mudança de uso não foi descaracterizado
externamente (o tombamento atinge fachadas e volume), pelo contrário, foi sempre
mantido com reformas para manutenção, o que favoreceu a sua Isenção Anual de IPTU.
Em 2001 foi então solicitada pela
proprietária a Certidão de TDC para
transferir o potencial construtivo excedente
de seu imóvel. A vistoria feita constatou seu
bom estado de conservão e manutenção,
sendo expedido o laudo positivo e
posteriormente a Certidão de TDC.
Diferente dos outros imóveis tratados aqui
localizados na ZCBH, este encontra-se na
ZAP, pois apesar de estar na Avenida do
Contorno situa-se do lado da avenida oposto ao perímetro que ela delimita, como pode ser
visto na Figura 144. Deste modo, a Casa Daldegan é um dos poucos imóveis geradores de
TDC localizado em uma Seção Suburbana, em vez de Seção Urbana como os demais.
Devido à sua localização em uma ZAP, o coeficiente de aproveitamento da edificação é
menor (1,7), o que leva à geração de menos AR, ou UTDCs como ainda era calculado na
época.
156
As informações históricas deste imóvel foram coletadas junto ao acervo documental da DIPC em outubro de 2008.
Figura 144: Casa Daldegan em 2001
Fonte: Processo de TDC nº 01.112.682/01-26
Capítulo IV
A Aplicação da TDC em Belo Horizonte
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
164
Área do terreno
(ATer)
Coeficiente de
Aproveitamento(CA) ZCBH
Área líquida máx. permitida
(Almax)
Almax = ATer. x CA
Área Construída total
(ACT)
704,25 m²
1,6
1140 m²
188,66 m²
Área Líquida Transferível
(AT)
AT = ALmax - ACT
Valor venal (VG) para área
isótima OB22 em fev. 2001
1008,56 m²
R$ 471,53
UTDC
UTDC = AT(m2) X VG(R$/m2)
R$1.000,00
475,57 UTDC
As transferências do direito de construir efetuadas pela proprietária da Casa
Daldegan foram o primeiro caso em que um proprietário alienou seu potencial construtivo
para mais de vinte receptores diferentes. Posteriormente, esta prática se tornou freqüente,
como mencionado, havendo casos de transferência para até cinqüenta receptores. As
vinte e três transferências oriundas da Casa Daldegan aconteceram entre março de 2003 e
abril de 2005, quando o saldo de UTDCs foi zerado.
Diferente da Casa Niemeyer e da Casa Klus Modas, quase todas as transferências
da Casa Daldegan foram para ZAPs, por ser esta a mesma zona do imóvel gerador. Além
disso, a demanda por potencial construtivo nesta área é alta, apesar de ser em pequenas
quantidades. O único caso de transferência para uma zona diferente foi de um imóvel no
Bairro Sion, na Regional Sul de Belo Horizonte, que se encontra em uma ZA e teve a TDC
permitida por se tratar de edifício em situação irregular devido ao fechamento das varandas
dos apartamentos. Das vinte e três transferências geradas por este imóvel, dezenove foram
para a Regional Pampulha, onde uma quantidade relativamente pequena de UTDCs
adquirida gerou ARs, esgotando o limite de recepção de todos os imóveis. Isso acontece
porque naquela região de Belo Horizonte o valor do solo é menor que nas áreas mais
centrais e ao observarmos a fórmula de cálculo da AR podemos ver que ela é inversamente
proporcional ao valor venal do metro quadrado do imóvel receptor (VG), o que torna a área
adquirível de um terreno maior, quanto mais baixo for o valor do solo
157
. Através das
Tabelas 11 e 12 pode-se comparar dois casos de TDC para imóveis receptores de potencial
da Casa Daldegan em que o valor dos terrenos receptores eram bem diferentes e que após a
157
Fórmula no utilizada atualmente na PMBH: AR= AR x VG
VR
Onde o valor venal (VR) é inversamente proporcional ao valor da área a ser adquirida (AR).
Tabela 10: Dados e cálculos para chegar ao valor da UTDC da Casa Daldegan
Fonte: Processo de TDC nº.112.682/01-26
Capítulo IV
A Aplicação da TDC em Belo Horizonte
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
165
compra de um número de UTDCs também bem diferentes, resultou em ARs com valores
relativamente próximos.
Data da
TDC
Localização do
Imóvel Receptor
Área do terreno
(ATer)
Limite de
Recepção
ALimit = (ATer.
x CA)x20%
VR para área isótima
2C05 em 09/2003
AR
AR = UTDC X 1.000,00
VR
29/9/2003
Lotes 12 e 13 do
quarteirão 040, do
Bairro Dona Clara -
Regional Pampulha
720 m²
R$ 90,00
Ordem da
TDC
Coeficiente de
Aproveitamento
(CA) - ZAP
244,8 m²
UTDCs adquiridas
244,4 m²
7º de 23
1,7
22
Data da
TDC
Localização do
Imóvel Receptor
Área do terreno
(ATer)
Limite de
Recepção
ALimit = (ATer.
x CA)x20%
VR para área isótima
2C05 em 09/2003
AR
AR = UTDC X 1.000,00
VR
8/4/2005
Rua La Plata, 49 -
Bairro Sion
Regional Sul
(Edifício que
recebeu TDC para
regularização de
varandas)
1250 m²
R$ 526,75
Ordem da
TDC
Coeficiente de
Aproveitamento
(CA) - ZA
375 m²
UTDCs adquiridas
270,8 m²
23º de 23
1,5
142,5 (zerou o saldo
do imóvel gerador)
Atualmente, a Casa Daldegan
encontra-se em bom estado de
conservação apesar de estar
desocupada aguardando aluguel. Suas
fachadas são pintadas regularmente
percebendo-se o zelo e a
conscientização por parte de sua
proprietária (Figura 145). É importante
ressaltar que de acordo com
informações coletadas com agentes da
prefeitura
158
, a proprietária da Casa
Daldegan vendeu seu potencial construtivo aos poucos para ter um tipo de renda sempre
que necessitava, tanto para conservação do imóvel quanto para outros usos particulares.
Pode-se perceber que esta forma de utilização do instrumento da TDC foi tão proveitosa
para a proprietária que em 2005, logo após ter esgotado o saldo do imóvel aqui tratado, ela
solicitou a TDC para outro imóvel tombado de sua propriedade, gerando quinze TDCs até
junho de 2008.
158
Não foi possível entrevistar a proprietária deste imóvel por não ter conseguido agendar uma entrevista.
Tabela 11: Dados e cálculos para chegar ao valor da AR de imóvel receptor de TDC
Tabela 12: Dados e cálculos para chegar ao valor da AR de imóvel receptor de TDC
Fonte: Processo de TDC nº. 112.682/01-26
Fonte: Processo de TDC nº. 112.682/01-26
Figura 145: Casa Daldegan em 2008
Capítulo IV
A Aplicação da TDC em Belo Horizonte
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
166
D) Conjunto Arquitetônico da Avenida Oiapoque (objeto de TDC em
2004)
O imóvel que denominamos
“Conjunto Arquitetônico da Avenida
Oiapoque”, localiza-se em todo um
quarteirão entre a Avenida Contorno,
Avenida Oiapoque, Rua Curitiba e Rua
São Paulo e abrange onze edificações
construídas entre as décadas de 1900 e
1960
159
. As primeiras edificações
construídas pelo empresário italiano
Carlos Fornaciari para abrigar uma fábrica
de cerveja eram consideradas arrojadas e
tinham características do ecletismo dominantes no período. Ao longo dos anos, o núcleo
original foi sofrendo acréscimos e adaptações próprias da evolução do processo produtivo
e das muitas mudanças de proprietários da instria. A Cervejaria Antártica foi a última
indústria que funcionou no local.
Este Conjunto Arquitetônico, denominado por muito tempo como da “Antiga
Cervejaria Antártica”, trata-se de um conjunto que se destaca no traçado urbano da cidade
pela grande variedade de tipologias de edificações comerciais e de serviço, e tem nos
estilos e soluções de arquitetura testemunhas das diferentes fases da evolução arquitetônica
da cidade. Pelo seu inquestionável valor cultural, todo o conjunto arquitetônico do
quarteirão foi tombado em 1998, contudo as fachadas da Avenida Oiapoque haviam sido
tombadas em 1900 pela Lei Orgânica do município e todo o conjunto encontrava-se
inserido no perímetro de proteção do Conjunto Urbano da Rua dos Caetés e Adjacências
desde 1994 (Figura 147).
159
As informações históricas deste imóvel foram coletadas junto ao acervo documental da DIPC em outubro de 2008.
Figura 146: Localização do Conjunto
Arquitetônico da Avenida Oiapoque
Fonte: Google earth (com alterações)
Capítulo IV
A Aplicação da TDC em Belo Horizonte
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
167
Figura 149: Vista interna do Conjunto
Arquitetônico do Oiapoque em 2000
Fonte: Documentos da DIPC
Figura 148 : Fachada da Avenida Oiapoque do
Conjunto Arquitetônico do Oiapoque em 2000
Fonte: Documentos da DIPC
Figura 147: Vista do Conjunto Arquitetônico do Oiapoque em 1991
Fonte: Documentos da DIPC
Por algum tempo todo o quarteirão deste Conjunto Urbano ficou desocupado e
sujeito à deterioração. Devido a seu mau estado de conservação, o foi concedida isenção
de IPTU ao imóvel pela Prefeitura, apesar das muitas tentativas por parte dos proprietários.
Neste contexto de descaso, no ano 2000, o bem sofreu sérias demolições não autorizadas e
suas edificações foram mutiladas principalmente internamente. Foram retiradas telhas,
estruturas do telhado, esquadrias, forros e houve demolição de alvenaria, deixando a
edificação internamente em ruínas (Figura 148 e 149).
Após esta enorme depredação da edificação, foram elaboradas novas diretrizes de
proteção, posteriormente acrescidas ao dossiê de tombamento do bem. Nestas diretrizes
priorizou-se a preservação das fachadas, que de acordo com os técnicos ainda guardavam
as características arquitetônicas que motivaram a sua proteção, e foram fixados os vazios
existentes a serem preservados (Figura 150). A degradação do Conjunto Arquitetônico
refletia o seu entorno, que se encontrava muito deteriorado e ocupado de forma irregular e
Capítulo IV
A Aplicação da TDC em Belo Horizonte
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
168
Figura 150: Diretrizes de ocupação para a quadra 5381 onde situava a Cervejaria
Antártica 2002 -
Fonte: Pinheiro, 2006
tumultuada por vendedores ambulantes, fatores que tornavam a área pouco atrativa para a
comunidade.
No ano de 2003, todo Conjunto bem como sua área de entorno foram objeto de uma
Lei Específica (Lei 8725/2003) de Operação Urbana que deriva do Plano Diretor de 1996,
tendo sido solicitada pelo então proprietário que adquiriu o quarteirão em novembro de
2002. Esta Lei instituiu a Operação Urbana do Conjunto Arquitetônico da Avenida
Oiapoque e adjacências” e tinha como finalidade contribuir para a requalificação da área
localizada na ZHIP, viabilizando a instalação de terminal de ônibus, recuperando o
conjunto arquitetônico tombado e disponibilizando o espaço restaurado para atividades de
interesse público relacionadas ao lazer, à cultura e à economia popular (Figura 151).
Figura 151: Área Objeto da Operação Urbana do Conjunto Arquitetônico da Avenida
Oiapoque
Fonte: Pinheiro, 2006.
Capítulo IV
A Aplicação da TDC em Belo Horizonte
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
169
A Lei da Operação Urbana traz o detalhamento de todas as queses relativas à
Operação, como a delimitação da área de abrangência, as formas de aplicação, os
mecanismos compensatórios para a iniciativa privada, a operacionalização, os prazos e as
penalidades. Dentre os mecanismos compensatórios à iniciativa privada, participante na
recuperação do imóvel tombado, na implantação de terminal de ônibus da BHBus e na
requalificação urbanística da área, está a mudança de diretrizes do instrumento da TDC
previstas no Decreto 9616/98. Tal mudança se deu nos Zoneamentos que o Decreto
estabelece como receptores de TDC, pois foi permitida a transferência de potencial
construtivo do Conjunto Arquitetônico da Oiapoque para terrenos inseridos na ZA
160
e
também na ZCBH, que não são a mesma zona do imóvel gerador. Esta mudança foi uma
contrapartida para o proprietário do imóvel gerador que ficou encarregado de recuperar o
imóvel e destiná-lo a atividades de lazer, cultura ou economia popular, desde que em
sintonia com a política de requalificação da área central, além de oferecer apoio a essas
atividades por meio dos serviços necessários
161
. Segundo Lage (2008, p.74), esta
contrapartida favorecia a venda de maior quantidade de potencial construtivo por vez, de
forma a viabilizar recursos rápidos para obra de restauro. Caso o proprietário do imóvel
gerador fosse vender seu potencial apenas para os locais onde era permitido e havia
demanda - as ZAPs
162
- ele teria que vender aos poucos, uma vez que uma pequena área
transferível oriunda do imóvel gerador esgota o limite de potencial receptível de imóvel na
ZAP. Isso acontece porque nas regiões das ZAPs o solo é bem menos valorizado que na
ZHIP onde se encontra o Conjunto.
A TDC foi solicitada em fevereiro de 2004, três meses após a aprovação da Lei de
Operação Urbana. O saldo de potencial construtivo que o imóvel teria teve um valor
bastante alto, visto que o terreno do Conjunto Urbano tem grandes dimensões e o CA da
área tem o valor máximo permitido pela Lei de Parcelamento, Uso e Ocupação do Solo,
como pode se ver na Tabela 13 na próxima página
160
A ZA é uma zona não passível de receber a TDC por se tratar de região muito adensada e com sistema viário saturado.
161
Lei 8728/03, art.5º, inciso I.
162
Segundo Lage (2008, p.74), na ZHIP, que é a mesma “mancha contínua de zoneamentoque o imóvel gerador, não
havia demanda de compra de grandes quantidades de potencial construtivo.
Capítulo IV
A Aplicação da TDC em Belo Horizonte
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
170
Área do terreno
(ATer)
Coeficiente de
Aproveitamento(CA) ZHIP
Área líquida máx. permitida
(Almax) Índice Construtivo
Almax = ATer. x CA
Área Construída total
(ACT)
6.457,5 m²
3
19.372,5 m²
8.343,24
(Área máxima permitida
pelas Diretrizes de
preservação do
Conjunto, que foi
utilizada como área
máx. a ser edificada
adequação ao novo
uso)
Área Líquida Transferível
(AT)
AT = ALmax - ACT
Valor venal (VG) para área
isótima OA22 em 02/2004
11.029,26 m²
(Liberados em 2 parcelas)
R$ 783,98
UTDC
UTDC = AT(m2) X VG(R$/m2)
R$1.000,00
8.646 UTDC
De todo o saldo de potencial construtivo do ivel gerador, segundo a Lei da
Operação Urbana, seria liberado inicialmente 50% (cinqüenta por cento) para viabilizar o
início da recuperação do conjunto arquitetônico, ficando a segunda metade liberada de
forma proporcional à recuperação do conjunto e condicionada à conclusão de toda obra.
Assim, inicialmente foram liberadas 4.323 (quatro mil trezentos e vinte e três) UTDCs, que
resultaram nas primeiras duas transferências de potencial construtivo deste imóvel, sendo
que uma delas foi para um imóvel também envolvido na Operação Urbana.
Este segundo imóvel envolvido na Operação Urbana, consistia em um terreno
muito grande, entre a Avenida Contorno, Avenida Nossa Senhora do Carmo e Rua Lages
no Bairro Carmo, onde iria se instalar um empreendimento denominado “Pátio
Savassi”(Figura 152). Ao proprietário deste imóvel foi concedida pela Lei da Operação
Urbana, a mudança de seus parâmetros urbanísticos para viabilizar a recepção de um
potencial construtivo do imóvel no Oiapoque bem maior que o permitido pelo Decreto de
1998. Desta maneira, com o envolvimento da Operação, esquecendo-se que não poderia
haver transferência para uma ZA, o limite de área a ser adquirida para este local, seria de
aproximadamente 2.640 (dois mil seiscentos e quarenta) metros quadrados, entretanto foi
permitida a transferência de 7920 (sete mil novecentos e vinte) metros quadrados em
função da mudança nos parâmetros urbanísticos da área. Como contrapartida ao interesse
coletivo, coube ao proprietário do Pátio Savassi a implantação do terminal de ônibus da
BHBus, inaugurado em maio de 2004 e a realização do tratamento urbanístico do entorno
da área da Operação (Figura 152 a 155).
Tabela 13: Dados e cálculos para chegar ao valor da UTDC do Conjunto Arq. do Oiapoque
Fonte: Processo de TDC nº. 01-021862-04-27
Capítulo IV
A Aplicação da TDC em Belo Horizonte
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
171
Figura 152: Shopping Pátio Savassi
Figura 153: Praça José Nogueira Sá
Figura 154: Terminal de Ônibus da BH
Bus avistado da Rua Curitiba
Figura 155: Terminal de Ônibus da BH
Bus avistado da Rua São Paulo
O Pátio Savassi recebeu o potencial construtivo do imóvel gerador através de duas
transferências, por ter que aguardar a liberação de saldo de potencial construtivo após a
conclusão de cerca de 50% (cinquenta portento) da obra no Conjunto Arquitetônico da
Oiapoque. Com a segunda transferência, o limite de recepção do Pátio Savassi se esgotou,
tendo ele adquirido sozinho mais da metade das UTDCs que o Conjunto Arquitetônico
tinha gerado, cerca de 4700 (quatro mil e setecentas) UTDCs.
O Conjunto Arquitetônico Oiapoque foi recuperado para a instalão de um Centro
de Comércio Popular denominado Shopping Oiapoque, que atualmente é muito conhecido
e freqüentado em Belo Horizonte (Figura 156 a 158). O saldo de potencial construtivo que
ainda restava ao imóvel gerador foi liberado aos poucos na medida em que a obra ia
evoluindo, sendo vistoriada pela CDPCM-BH. Até junho de 2008 ainda faltava a liberação
de 107,66 (cento e sete vírgula sessenta e seis) metros quadrados. Todo o saldo liberado foi
transferido para imóveis localizados em ZA, através de mais quarenta e duas transferências
diferentes. Este número elevado de transferências deveu-se principalmente aos valores
venais do metro quadrado do imóvel receptor (VR) ser menor que o valor venal do metro
quadrado do ivel gerador (VG). Para se ter uma idéia, no ano de 2007, quando
aconteceu a transformação das UTDC em ARs, o VG do Conjunto Arquitetônico valia
Capítulo IV
A Aplicação da TDC em Belo Horizonte
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
172
Figura 156: Shopping Oiapoque
em 2007
Fonte: Lage, 2008, p.95
Figura 157: Shopping
Oiapoque internamente
Fonte: Lage, 2008, p.96
Figura 158: Shopping
Oiapoque internamente
Fonte: Lage, 2008, p.96
mais de R$1000,00 o metro quadrado, enquanto um de seus imóveis receptores, localizado
no Bairro Cidade Nova, tinha um VR de R$ 440,00 por metro quadrado
163
. Também vale
ressaltar que nenhum dos outros imóveis receptores possuía um terreno e um limite de
recepção com valores tão altos como os do Pátio Savassi.
.
De acordo com Michele Arroyo, da DIPC, o proprietário do imóvel não terminou
de restaurar todo Conjunto Arquitetônico conforme previsto na Lei da Operação Urbana,
tanto que ainda não foi liberado todo o seu saldo de potencial construtivo. Porém, este é
um dos menores problemas de ordem blica que envolveu e continuam envolvendo este
imóvel após todo o processo da Operação Urbana e da TDC descrito acima. Além da
polêmica envolvida em torno da Operação Urbana, com pontos complexos que foram e são
criticados como a questão das contrapartidas para iniciativa privada terem sido bem
maiores que os benefícios ao interesse coletivo, o empreendedor do atual Shopping
Oiapoque passou a não respeitar todos os parâmetros da legislação urbanística, indo contra
o interesse de um município que o tinha favorecido com a aprovação de tal Operação.
Segundo informações coletadas na DIPC, o proprietário do Shopping Oiapoque
após ter vendido quase todo o potencial construtivo liberado, apresentou vários projetos
para a construção de mais pavimentos de estacionamento, com o argumento que
estacionamento não entra nos cálculos para a TDC, pois segundo a Lei de Parcelamento do
Solo, ele é contado como área bruta construída, não como área quida. Este e outros
projetos apresentados por ele à DIPC não foram aprovados principalmente por não
atenderem as diretrizes de ocupação da área e, também, por mudar a volumetria da área
tombada. A “brecha” na Lei que este proprietário encontrou desvirtua totalmente o
163
Dado retirado em junho de 2008 do “Controle de Processos de Transferência do Direito de Construir” disponibilizado
pela Acessória do Gabinete da SMARU
Capítulo IV
A Aplicação da TDC em Belo Horizonte
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
173
objetivo do instrumento da TDC que é a preservação do imóvel tombado evitando
construir mais do que o permitido pelas diretrizes de seu tombamento.
Porém, segundo Michele Arroy, o problema mais grave do Shopping Oiapoque,
atualmente, é que o seu proprietário mesmo não tendo projeto de acréscimos aprovado em
nenhum órgão da prefeitura e nem potencial construtivo para utilizar, edificou novas áreas
dentro do Conjunto, ocupando os vazios que deveriam ser deixados livres, conforme o
projeto de restauro e adaptação aprovado em 2003 pela CDPCM-BH (Figura 159 e 160). E
para piorar, ele entrou com um processo de regularização do equipamento junto à
SMARU, buscando se beneficiar da Lei 9.074/05, mencionada aqui, que propicia a
regularização, através de pagamento de imóveis que têm metros quadrados edificados a
mais que o permitido. O processo está sendo analisado, entretanto, a DIPC se
pronunciou contrária por considerar que o imóvel, além de ser tombado, obteve muitos
benefícios por parte da PMBH. E, além disso, a aprovação do pedido de regularização por
parte de um proprietário que tinha transferido todo o seu o potencial construtivo poderá
servir como exemplo a ser seguido por outros proprietários que buscam sempre o benefício
próprio em detrimento dos interesses coletivos.
Figura 159: Projeto de Restauro proposto
em 2003 com a Operação Urbana
Fonte: Documentos da DIPIC
Figura 160: Quarteirão do Conjunto
Arquitetônico do Oiapoque totalmente
ocupado em 2009.
Fonte: Documentos da DIPIC
Capítulo IV
A Aplicação da TDC em Belo Horizonte
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
174
E) Instituto Metodista Isabela Hendrix (objeto de TDC em 2006)
O imóvel que abriga o Instituto Metodista
Isabela Hendrix é utilizado para fins
educacionais, e ocupa por inteiro o Quarteirão
19, entre a Rua da Bahia, a Rua Tomás
Gonzaga, a Rua Espírito Santo e a Rua
Alvarenga Peixoto, no Bairro Lourdes, bem
próximo à Praça da Liberdade. O prédio
principal deste Conjunto Arquitetônico tem o
projeto básico elaborado pela arquiteta e
missioria da Igreja Metodista Miss Mary
Sue Brown e adaptado em Belo Horizonte
pelo arquiteto italiano radicado no Brasil Rafaello Berti, autor de muitos outros projetos na
cidade durante a década de 1930, como a Prefeitura Municipal de Belo Horizonte e o
Minas Tênis Clube
164
(Figura 118). Seguindo o estilo arquitetônico adotado por Rafaello
Berti na época e muito difundido em Belo Horizonte, o projeto básico elaborado por Miss
Mary foi adaptado para a tipologia Art Déco (Figura 162). Esta edificação teve sua
construção iniciada em 1937 e é constituída por três pavimentos, com volumes de
composão geométrica e revestimento externo em de pedra, muito característicos do
estilo Art Déco.
164
Todos os dados históricos foram fornecidos por Alexandre Campos, arquiteto do Escritório de Projetos do Instituto
Metodista Isabela Hendrix, em entrevista escrita realizada em outubro de 2008.
Figura 162: Croqui do prédio principal do Instituto Isabela Hendrix feito por Rafaelo Berti
Fonte: www.skyscrapercity.com
Figura 161: Localização do Isabela Hendrix
Fonte: Google earth (com alterões)
Capítulo IV
A Aplicação da TDC em Belo Horizonte
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
175
Pouco tempo após a construção do prédio principal foram construídas três outras
edificações, destinadas ao internato, ao refeitório e à lavanderia e, também, ao auditório
(atualmente teatro). Estes prédios foram finalizados no início da década de 1940 e são de
autoria do arquiteto Luiz Pinto Coelho, seguindo a mesma tipologia arquitetônica do
prédio principal. Em 1957, houve um concurso para projeto de uma Capela, que foi
vencido pelos arquitetos Sylvio de Vasconcelos e Paulo Humberto Batista, os quais
edificaram uma obra em estilo moderno.
Todo o quarteirão do Instituto
Metodista Isabela Hendrix encontra-se
inserido no perímetro de proteção do
Conjunto Urbano Praça da Liberdade -
Avenida João Pinheiro e adjacências. O
Edifício Sede, o Auditório e a Capela foram
tombados isoladamente em 1998 e mais
duas edificações, uma situada na Rua Tomas
Gonzaga e outra na Rua Espírito Santo,
tiveram o tombamento no final de 2007.
Em maio de 2006, o Instituto
solicitou junto à SMARU a Certidão de
TDC das três edificações tombadas na época. De acordo com informações coletadas
junto à representante do Instituto e da DIPIC, os imóveis estavam em ótimo estado de
conservação por terem sido objetos de restauro recente financiado por uma empresa de
engenharia belo-horizontina que intermedia compra e venda de potencial construtivo. Para
tal, esta empresa, que é a primeira do ramo na cidade e funciona cinco anos, criou um
banco interno de potencial construtivo adquirido de proprietários de imóveis tombados, os
quais muitas vezes nem sabem do instrumento da TDC
165
. Assim, é através do contato
desta empresa, que busca geradores à medida de suas necessidades, que muitos
proprietários ficam sabendo do instrumento. Com acessória da mesma empresa entram
com um processo na prefeitura solicitando a TDC caso seu imóvel se encontre em bom
estado de conservação. Se o imóvel candidato a gerar potencial não se encontrar em bom
estado, necessitando de um restauro ou recuperação para pedir a TDC, a própria empresa
165
Informações obtidas junto a um dos sócios da Empresa Decisão Engenharia, por meio de entrevista realizada em
março de 2009.
Figura 163: Localização das edificações s do
Isabela Hendrix tombadas em 1998 e 2007
Fonte: GoogleEarth (com alterações)
Capítulo IV
A Aplicação da TDC em Belo Horizonte
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
176
de engenharia financia e executa as obras (como foi o caso do Instituto Isabela Hendrix) e
na medida em que o potencial construtivo gerado for vendido ela é restituída em seus
investimentos.
Esta empresa de engenharia que financiou e executou a obra de restauro do Isabela
Hendrix, após a geração do potencial construtivo por imóvel gerador de seu cliente,
compra o potencial ou fica responsável por ele por meio de contrato assinado pelo
proprietário do bem. Destarte, restaurando ou não o imóvel, a empresa foi formando um
banco de potencial construtivo com potencial advindo de diversos zoneamentos da cidade e
com VGs diferentes, para atender da melhor maneira à demanda de cada tipo imóvel
receptor
166
. Na busca por imóveis receptores esta empresa presta um serviço de
viabilidade técnica e financeira de empreendimento imobiliário para mostrar o quanto mais
lucrativo o empreendimento pode ficar com a aquisição do potencial construtivo através da
TDC. Na maioria das vezes, este serviço é prestado sem o pedido do proprietário do
imóvel receptor, sendo uma forma de divulgação dos serviços da empresa, que ao
apresentar as vantagens à construtora do empreendimento acaba por formar uma clientela
que atualmente já os procura para verificar a viabilidade de adquirir potencial construtivo.
No caso do Isabela Hendrix, o dinheiro da venda do potencial gerado foi todo para
o restauro das edificações, que têm muitos metros quadrados de área de interesse de
preservão
167
. Após gerar potencial dos três prédios tombados em 1998, foi liberado para
venda apenas a metade dele, que as obras de restauro de todas as edificações não tinham
sido concluídas. Neste primeiro momento, foram efetivadas nove transferências, e em um
segundo momento, quando as obras de restauro foram concluídas e o saldo retido liberado,
foram efetivadas mais onze transferências, totalizando vinte TDC até dezembro de 2007,
quando outros imóveis do Instituto foram tombados e geraram mais potencial construtivo.
Após ter gerado mais potencial, o Instituto Metodista Isabela Hendrix efetuou mais vinte e
quatro TDC, totalizando, portanto, quarenta transfencias até junho de 2008, que foram
efetivadas para imóveis localizados na ZCBH e na ZAP. Apesar do número elevado de
TDCs, ainda restou ao Instituto Metodista Isabela Hendrix um saldo considerável a ser
transferido como mostra a Tabela 14 na próxima página:
166
Como já foi exposto aqui, só se pode transferir potencial para imóveis no mesmo zoneamento que o imóvel geradorou
em ZAP e, também, se torna mais vantajoso tanto para o proprietário receptor, quanto para o gerador que seus imóveis
tenham um VG e VR com valores próximos, pois assim acontece certa equidade de AT e AR.
167
Informações obtidas através de entrevista escrita em outubro de 2008 concedida por Alexandre Campos, arquiteto do
Escritório de Projetos do Instituto Metodista Isabela Hendrix.
Capítulo IV
A Aplicação da TDC em Belo Horizonte
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
177
Calculos da AT
das edificações
do tombamento
de 1998
Área do terreno
(ATer)
Área líquida máx.
permitida
(Almax)
Almax = ATer. x CA
Área
Construída
Total (ACT)
Área Líquida
Transferível (AT)
AT = ALmax - ACT
Saldo após a
20ª TDC
7188 m²
Coeficiente de
Aproveitamento
(CA) - ZCBH
21.564
10588 m²
10.975,48 m²
(Liberadas em duas
parcelas iguais)
10,62 m²
3
Calculos da AT
das edificações
do tombamento
de 2007
Área do terreno
(ATer)
Área líquida máx.
permitida
(Almax)
Almax = ATer. x CA
Área
Construída
Total (ACT)
Área Líquida
Transferível (AT)
AT = ALmax - ACT
Saldo Total de
AT após a 20ª
TDC
7.200 m²
Coeficiente de
Aproveitamento
(CA) - ZCBH
21.600
5.625,37
15974,63
15985,25
3
AT total gerada pelo Instituto
Metodista Isabela hendrix
Nº de TDC efetivadas até junho de
2008
Saldo de AT
em 06/2008
43.164 m²
44
3343,86 m²
Os prédios objeto de TDC atualmente encontram-se em ótimo estado de
conservação, tendo uma grande valorização por parte da instituição que os ocupa,
principalmente por serem “marcos representativos da tradição de uma instituição de 104
anos de existência” e em função de todo o processo de restauro recente ter servido como
uma boa iniciativa em termos de marketing para a escola (Figura 164 a 167)
168
. Agentes da
Prefeitura de Belo Horizonte vêem este como um ótimo exemplo de utilização do
instrumento da TDC por ter proporcionado o restauro de um imóvel relativamente grande,
onde todas as intervenções seriam de grande porte tanto quanto os investimentos para sua
realizão, além de a utilização do instrumento ter trazido um retorno institucional ótimo
para um estabelecimento educacional formador de opiniões.
168
Informações obtidas através de entrevista escrita em outubro de 2008concedida por Alexandre Campos, arquiteto do
Escritório de Projetos do Instituto Metodista Isabela Hendrix.
Tabela 14: Dados e cálculos para chegar ao valor de ATs do Instituto Isabela Hendrix
Fonte: Processo de TDC nº. 01-021862-04-27
Capítulo IV
A Aplicação da TDC em Belo Horizonte
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
178
Figura 164: Instituto Isabela Hendrix em
outubro de 2008 Fachada da Rua
Alvarenga Peixoto
Figura 165: Instituto Isabela Hendrix em
outubro de 2008 Fachada da Rua da
Bahia
Figura 166: Capela do Instituto Isabela
Hendrix em outubro de 2008
Figura 167: Instituto Isabela Hendrix em
outubro de 2008
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
179
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Curitiba e Belo Horizonte, duas capitais estaduais brasileiras distantes fisicamente e
com realidades culturais e históricas bem diferentes, tiveram a evolução da política e da
valorização do seu patrimônio cultural também traçando caminhos distintos, porém chegando
à atualidade com a busca do mesmo propósito que é o de articular as poticas
preservacionistas a outras políticas, como a de planejamento urbano. Para tal, as
administrações municipais destas cidades previram em sua potica urbana instrumentos que
podem ser utilizados a favor da preservação e da valorização do patrimônio cultural. Dos
instrumentos previstos, um dos realmente aplicados nas duas cidades é a Transferência do
Direito de Construir (TDC), que em Curitiba recebe a denominação de Transferência do
Potencial Construtivo. Apesar da denominação e da evolução da aplicação do instrumento ser
diferente, a base conceitual é a mesma quando se trata do patrimônio cultural edificado,
porque em ambas as cidades houve inflncia, direta no caso de Curitiba e indireta no caso de
Belo Horizonte, da experiência do Space Adrif” de Chicago/EUA.
Em Curitiba, o instrumento da TDC foi previsto no início da década de 1980 e
aprimorou-se ao longo dos anos, materializando-se na publicação de uma enorme gama de
decretos e leis complementares que delimitaram contornos cada vez mais precisos quanto a
sua aplicação e operacionalização. Em Belo Horizonte, a previsão é mais recente, data do
início da década de 1990, no entanto, também houve um relevante aperfeoamento das
formas aplicação do instrumento. A previsão da TDC em legislação municipal destas cidades
o foi sinônimo de aplicação imediata, pois nos dois casos houve um tempo de assimilação e
conhecimento do instrumento pela população e pelos agentes públicos. A aplicação no
patrimônio cultural edificado de Curitiba iniciou-se no ano de 1986 e em Belo Horizonte no
ano de 1996, porém os primeiros casos não foram de muito sucesso mostrando a imaturidade
dos agentes envolvidos e ainda das próprias leis.
Como se de perceber, a previsão da TDC tanto em Belo Horizonte, quanto em
Curitiba foram anteriores à Lei Federal que regulamentou o instrumento em 2001, o Estatuto
da Cidade. Nas duas cidades muito do que está regulamentado no Estatuto havia sido
estabelecido em leis municipais e também vinha sendo aplicado. Essa experimentação
concreta do conteúdo do Estatuto da Cidade, bem antes de sua regulamentação, aconteceu
principalmente porque o processo de formulação e negociação desta lei foi muito longo e seu
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
180
conteúdo acabou por ser divulgado e implementado em municípios engajados nas questões de
política urbana como Belo Horizonte e Curitiba.
Nesta última, todas as finalidades para emprego da TDC previstas em lei
169
foram
aplicadas, envolvendo agentes de diversas esferas da administração pública e demonstrando o
empenho dos mesmos em fazer a quina governamental funcionar em prol do cumprimento
da legislação municipal. O mesmo não aconteceu em Belo Horizonte, onde apesar de ter
previsto em lei a aplicação da TDC em imóveis de valor cultural, com cobertura vegetal ou
destinados a implantação de habitação de interesse social, apenas os dois primeiros casos
foram realmente efetivados, com o segundo se restringindo a apenas um imóvel. Isso reflete a
falta de interesse de agentes públicos da esfera ambiental e habitacional em viabilizar a
aplicação do instrumento para tais fins, uma vez que deles depende, por um lado, a divulgação
do instrumento para os proprietários interessados, e por outro, a articulação de parte
importante das medidas operacionais para a sua aplicação.
Diferentemente de Curitiba, em Belo Horizonte alguns parâmetros de aplicação do
instrumento da TDC devem ser adaptados para atender à regulamentação do Estatuto da
Cidade, sendo o principal deles a utilização do instrumento em imóveis blicos ou doados
pelo poder público. Esta restrição de utilização do instrumento prevista na lei de
regulamentação da TDC em Belo Horizonte impossibilita o seu aproveitamento em bens de
grande valor cultural ou ambiental para a cidade. Esta falta de regulamentação em lei gerou
um dos casos mais polêmico de aplicação da TDC na cidade, que foi o do Minas Tênis Clube.
O imóvel era originariamente público e apesar de não ser permitido em lei, gerou potencial
construtivo, a contragosto dos agentes envolvidos diretamente na operacionalização do
instrumento, refletindo notório conflito entre diversas esferas da Prefeitura Municipal de Belo
Horizonte.
Em Curitiba, como é permitida a utilização da TDC em imóveis blicos foi
viabilizada a recuperação de doze edificações de uso público de grande valor cultural para a
cidade através da venda de potencial construtivo. O valor cultural e a importância destes
imóveis de propriedade pública são mais legíveis pela população, principalmente por serem
freqüentados e conhecidos por ela, tornando-se importantes referências para estimular a sua
memória coletiva e garantir a identidade cultural. Assim, a utilização da TDC nestes imóveis,
como em Curitiba, viabilizando a sua recuperação muitas vezes para novo uso, além de
169
A TDC em Curitiba foi utilizada para a preservação do patrimônio cultural edificado, público e privado,
preservação do patrimônio natural, implantação de habitação de interesse social e de equipamentos públicos
comunitários.
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
181
aumentar o grau de legibilidade do bem, ajuda na divulgação do próprio instrumento. O caso
da Capela Santa Maria, de propriedade da prefeitura retrata fielmente o quão importante foi a
utilização da TDC neste imóvel, visto que, além de viabilizar a recuperação de edificação
importante para a memória da cidade de Curitiba e que se encontrava abandonada, sua
reestruturação para abrigar um novo uso cultural ajuda na divulgação do próprio imóvel e de
sua história.
Quando utilizada com a finalidade de preservação do Patrimônio Cultural Edificado,
seja particular ou público, a TDC aplicada em Curitiba e Belo Horizonte tem diferenças que
marcam toda a trajetória de utilização do instrumento. A diferença mais marcante é que em
Belo Horizonte os imóveis de valor cultural, objeto do instrumento, devem ser tombados ou
inseridos nos Conjuntos Urbanos tombados, fazendo da TDC um complemento ao
tombamento municipal que incide sobre os imóveis. Por considerarem que com o
tombamento os proprietários são obrigados a manter o imóvel em bom estado de conservação,
em Belo Horizonte a concessão do potencial construtivo não esta intrínseca a uma obra de
restauro, tendo a TDC mais o objetivo de compensar os proprietários que mantém seus bens
em bom estado de conservação. Entretanto, em Curitiba não existe uma lei municipal que
regulamente o tombamento, havendo apenas o cadastramento como UIPs ou UIEPs, o que
torna a TDC um dos principais instrumentos da política preservacionista, tendo como objetivo
principal viabilizar a recuperação do imóvel de valor cultural, seja através de restauro ou de
reforma, pois nesta cidade a liberação de potencial está vinculada às etapas da obra de
recuperação do imóvel.
Nem sempre o tombamento de uma edificação é sinônimo de sua manutenção em bom
estado de conservação, pelo contrário, muitos proprietários a abandonam por falta de
condições financeiras de promover a sua manutenção. Deste modo, considera-se de maior
sucesso, no caso de utilização da TDC, a vinculação da concessão de potencial construtivo à
recuperação do imóvel como acontece em Curitiba. Havendo esta vinculação é propiciado ao
proprietário de um bem de valor cultural em estado degradado de conservação, que se
encontra muitas vezes subutilizado ou abandonado, utilizar o instrumento na recuperação da
mesma, promovendo assim sua reinserção na dinâmica urbana da cidade.
No caso dos imóveis de Curitiba, a partir da utilização da TDC e conseqüente
realizão das obras de recuperação, eles se tornaram mais legíveis e valorizados pela
população, porque esta passou a perceber aquele patrimônio que muitas vezes estava
esquecido debaixo de muitas camadas de tintas, mofo e poeira. Após as obras, o imóvel passa
a ser mais valorizado também pelo proprietário, que muitas vezes não percebia o valor
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
182
cultural de seu prédio antigo em “ruínas” e por empreendedores privados que passam a
utilizar a imagem do prédio histórico para promover o seu negócio. A valorização financeira
das edificações é tangível, uma vez que se torna mais fácil alugar ou vender as mesmas,
garantindo ao proprietário o retorno financeiro que ele não pode receber diretamente com a
venda de potencial construtivo, como acontece em Belo Horizonte.
Nesta última cidade, também há casos de empreendedores privados que se utilizam da
imagem do prédio histórico para promover o seu negócio, como o proprietário da Casa Klus
Modas, que tem no edifício eclético da década de 1920 a sede e logomarca de sua Boutique.
Porém ali, o restauro que renovou o imóvel e tornou sua arquitetura um atrativo para a
Boutique e para cidade, não está vinculado diretamente aos recursos financeiros advindos da
TDC, como acontece em Curitiba, mas foi fator predominante para a concessão do
instrumento uma vez que antes do restauro promovido pelo proprietário o ivel não se
encontrava em bom estado de conservação. Desta forma, em Belo Horizonte os proprietários
que têm condições financeiras, promovem o restauro ou recuperação de suas edificações para
se tornarem aptas a receber o incentivo da TDC.
Como nem sempre os proprietários de imóveis de valor cultural têm recursos para
viabilizar a recuperação dos mesmos e, assim, obter a concessão de potencial construtivo, em
Belo Horizonte coube à iniciativa privada contornar esta situação através do financiamento do
restauro de imóveis que antes não teria condições de gerar potencial. Foi o que aconteceu com
o edifício que abriga o Instituto Isabela Hendrix, o qual teve o restauro efetuado por uma
empresa imobilria que financiou e executou a obra tendo seu investimento restituído com a
venda do potencial construtivo que ela mesma negociou com os receptores. Isso retrata como
o mercado imobilrio está presente na dinâmica de aplicação da TDC em Belo Horizonte, o
que muitas vezes pode ser prejudicial, mas no caso descrito acima foi vantajoso para ambas as
partes, uma vez que o proprietário teve seu imóvel restaurado e a empresa teve o potencial
construtivo para negociar.
A presença do capital privado é de extrema importância para a efetivação do
instrumento da TDC, porque o sucesso do instrumento depende da demanda pela compra de
potencial construtivo. Se não houvesse interesse da iniciativa privada pela compra de
potencial construtivo remanescente dos bens de valor cultural, não haveria compensação ao
proprietário belohorizontino pelo bom estado de conservação do seu imóvel, nem verba para
as devidas obras nas edificações curitibanas, o que levaria à não-efetivaçãodo instrumento da
TDC.
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
183
Em Belo Horizonte, o interesse pela compra de potencial construtivo é crescente e
desta forma vem aumentando gradativamente a quantidade de imóveis que geraram e
esgotaram seu potencial construtivo. Nesta cidade, também é progressivo o número de
construtoras que buscam proprietários de imóveis geradores de potencial quando o edificar
empreendimentos em áreas passíveis de receber potencial construtivo, tornando a TDC cada
dia mais conhecida, tanto pelos proprietários de bens tombados, como pelos empreendedores
imobiliários. Assim, acredita-se que ao longo do tempo, se a administração municipal não
modificar a legislação vinculando a TDC ao restauro da edificação, será crescente o número
de proprietários que, seguindo o exemplo do Instituto Isabela Hendrix, irão recorrer a
empresas privadas para financiar a recuperação de seus imóveis e assim gerar potencial
construtivo para uma demanda crescente.
Em Curitiba, a TDC por ser utilizada para diversas finalidades, sendo o potencial
construtivo disponível para venda mais elevado que em Belo Horizonte. Esta situação leva a
uma oferta, muitas vezes, maior que a demanda, o que acarreta na baixa dos preços do
potencial construtivo. Este potencial vem aumentando demasiadamente a partir da instituição
das UIEPs, pois o potencial colocado a venda pela prefeitura para promover o restauro destes
imóveis, normalmente de grandes dimensões e em estado ruim, tem valores muito altos
quando comparados ao potencial gerado pelas UIPs. No caso das UIEPs, o potencial
concedido não está vinculado a sua área e sim ao valor do restauro, o que torna ainda mais
alto o potencial construtivo disponível para venda. Para agravar a situação, a prefeitura
oferece muitas facilidades para quem adquire o potencial construtivo advindo das UIEPs,
como o baixo preço do metro quadrado, o parcelamento do pagamento e a possibilidade de
utilizá-lo em regiões da cidade onde, originalmente, não seria permitido o uso de potencial
originário de UIP. Assim, a atuação facilitadora da prefeitura para as UIEPs, bem como o
aumento da oferta de potencial em detrimento da demanda, acabam estabelecendo
concorrência desleal aos proprietários de UIPs com pouco potencial a vender. Isso pode
desestimular o uso da TDC e a conseqüente recuperação destes bens, que mesmo não sendo
ícones como as UIEPs são de extrema importância para a memória da cidade.
Os proprietários dos imóveis de valor cultural, bem como o mercado imobiliário, tanto
em Belo Horizonte como em Curitiba, apropriaram-se de maneiras diferentes do instrumento
da TDC, refletindo a flexibilidade do próprio instrumento. Algumas apropriações são
consideradas positivas e foram repetidas, agora outras foram consideradas desastrosas e as
administrações municipais buscaram corrigir os erros cometidos. Destas diferentes
apropriações de um único instrumento vale destacar o caso da proprietária da Casa Daldegan
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
184
em Belo Horizonte que vendeu o seu potencial em várias parcelas na medida de suas
necessidades, diferentemente de outros proprietários naquela cidade como o da Casa Klus
Modas e da Casa Niemeyer que venderam em poucas parcelas para obter rapidamente os
valores da venda. Outras apropriações bem sucedidas foram a da Casa Vilanova em Curitiba
cuja proprietária, com a verba da TDC restaurou o imóvel de forma integral, o transformando
em um centro cultural e da Casa Amarela onde foi restaurada/reconstitda apenas a fachada
do imóvel que incluiu a construção de uma nova edificação aos fundos para abrigar uma
escola particular.
As apropriações desastrosas do instrumento da TDC foram muito poucas considerando
o número de imóveis de valor cultural objeto da mesma em Curitiba e em Belo Horizonte, que
somaram até junho de 2008 setenta e sete e cinenta e quatro imóveis, respectivamente. Em
todos os casos desastrosos percebeu-se como a lógica do mercado imobiliário conseguiu
reverter as metas desejadas para o instrumento da TDC, prejudicando tanto o patrimônio
cultural como a percepção e divulgação do instrumento na cidade.
Em Curitiba o único caso que desvirtuou o objetivo principal da TDC na cidade, que é
a recuperação do imóvel de valor cultural, foi o da Casa Hauer. Este caso, por ter sido o
primeiro de aplicação da TDC, refletiu a falta de maturidade dos agentes envolvidos para a
aplicação do instrumento naquele momento e a apropriação indevida do instrumento pelos
proprietários que o cumpriram o acordo de restaurar a edificação mesmo após terem
vendido todo o seu potencial construtivo. O que aconteceu na Casa Hauer mostrou um ponto
frágil na aplicação da TDC em Curitiba, uma vez que o potencial era concedido antes do
início do restauro, dependendo da boa índole do proprietário para efetivar o acordo. Desta
forma, os agentes públicos modificaram a legislação, vinculando a liberação de potencial à
efetivação de etapas da recuperação do imóvel, evitando a repetição do erro acontecido
anteriormente.
Em Belo Horizonte, o caso considerado de maior insucesso de utilização da TDC foi o
do Conjunto Arquitetônico da Avenida Oiapoque, principalmente pela má índole do seu
proprietário. Este proprietário mesmo tendo sido muito beneficiado pelo município com a
aprovação da Operação Urbana, que teve a TDC como um dos mecanismos compensatório,
passou a não respeitar os parâmetros da legislação urbanística da cidade, indo contra o
interesse do município. Mesmo tendo transferido todo o seu potencial construtivo, o
proprietário ficou buscando “brechas” nas leis para conseguir edificar novas áreas dentro do
conjunto e, assim, aumentar os lucros do seu empreendimento. E mesmo sem conseguir
aprovar seus projetos de aumento de área junto ao órgão do patrimônio, ele os edificou de
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
185
forma clandestina, ocupando vazios que deveriam ser deixados livres conforme diretrizes de
tombamento da área. Atualmente, é visível no empreendimento - um Shopping popular - a
quase total ocupação da área pelos boxes” dos comerciantes Todavia, deve-se destacar que a
situação chegou a este ponto principalmente pela falta de fiscalização da administração
municipal, que foi anuente ao permitir novas construções em um imóvel que além de não ter
potencial a ser utilizado, deveria seguir as diretrizes do tombamento.
Hoje, o caso do Conjunto Oiapoque é considerado um péssimo exemplo tanto de
utilização de Operação Urbana, uma vez que as contrapartidas à iniciativa privada foram
consideradas bem maiores que os benecios públicos, como de utilização da TDC. Além
disso, atualmente encontra-se em processo de análise pela prefeitura um pedido do
proprietário de regularizar as áreas edificadas ilegalmente através de uma lei belo-horizontina
que propicia a regularização de imóveis com metros quadrados edificados a mais que o
permitido. Se este processo for aprovado poderá servir como exemplo a ser seguidos por
outros proprietários de imóveis que transferiram todo o seu potencial construtivo e desejam
edificar novas áreas, desvirtuado totalmente os objetivos do instrumento da TDC em Belo
Horizonte.
A grande maioria os imóveis de valor cultural que geraram potencial construtivo em
Belo Horizonte e Curitiba localizam-se nas regiões centrais destas cidades, onde o solo é mais
valorizado e a pressão imobiliária muito mais forte. Devido a isso, estes imóveis sofreram de
forte especulação imobiliária, que com a utilização do instrumento da TDC acredita-se ter se
tornado mais fraca, pois com a transferência do seu potencial estas edificações ficaram menos
atrativas para aqueles que desejavam aproveitar em uma nova construção o máximo dos
parâmetros urbanísticos ali permitidos. E assim, quando não acontecem atos ilegais como no
Conjunto do Oiapoque, a aplicação da TDC no patrimônio cultural edificado garante a não
construção de novas edificações que poderiam vir a prejudicar o entorno do imóvel cultural e
a própria paisagem da cidade, além de uma maior preservação da integridade deste imóvel por
tornar sua destruição menos atrativa.
O processo de operacionalização da TDC é bem claro em Belo Horizonte, com todos
os procedimentos bem estabelecidos por leis, decretos e regulamentações. Quando analisada a
aplicação propriamente dita percebeu-se que todos os procedimentos foram seguidos na
grande maioria dos casos, não ficando dúvidas quanto às decisões tomadas pelos agentes da
prefeitura envolvidos. O mesmo não acontece em Curitiba, onde apesar de diversas leis e
decretos que regem o instrumento da TDC, quando analisada a aplicação do instrumento
percebeu-se que a questão da quantidade de potencial construtivo a ser concedido fica a juízo
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
186
dos técnicos da PMC que analisam “caso a caso”, somando ou não a área do imóvel de valor
cultural. Outrossim, não fica claro quando se pode abrir mão do restauro de um imóvel, como
aconteceu no caso do Palacete Leão Junior. Esta falta de critérios específicos a serem
seguidos em todos os casos é considerada uma falha relevante na aplicação da TDC em
Curitiba, levando o processo a perder parte de sua legitimidade, pois um proprietário pode ser
beneficiado em detrimento a outro, sem uma justificativa plausível e legal.
No processo de operacionalização e aplicação do instrumento da TDC nas cidades de
Curitiba e Belo Horizonte, observou-se que não controle, nem fiscalização do estado de
conservação dos imóveis de valor cultural após a utilização deste instrumento. Nas próprias
leis e decretos que o regulamentam, nada é mencionado sobre a preservação dos imóveis a
longo prazo, uma vez que o instrumento da TDC pode ser utilizado apenas uma vez, no caso
dos imóveis particulares. Isso reflete no estado de conservação dos mesmos que, com o passar
dos anos, podem ficar depreciados principalmente pela falta de manutenção, como aconteceu
na Casa Niemeyer em Belo Horizonte que oito anos após a concessão do potencial encontra-
se em regular estado de conservação. Assim, pode-se concluir que o instrumento da TDC,
quando aplicado em Curitiba e Belo Horizonte, por si não resolve o problema da
conservação daquele bem ao longo dos anos, pois o proprietário tem o custo da sua
manutenção que não é viabilizado pelo uso da TDC.
Tanto em Curitiba, como em Belo Horizonte, é utilizado outro incentivo importante
nos imóveis de valor cultural, tendo como objetivo viabilizar a manutenção do ao longo dos
anos. Este incentivo é a Iseão/Redução de IPTU, que é aplicado mediante vistorias anuais
ou bienais que compravam o bom estado de conservão da edfiicação. A Isenção/Redução de
IPTU é utilizada em muitos dos imóveis que geraram potencial construtivo, principalmente
porque estes, quando vistoriados, apresentam-se conservados. Assim, percebeu-se que
principalmente em Curitiba, onde a TDC promove a recuperação de imóveis que não se
encontravam em bom estado de conservação, o incentivo fiscal da Isenção/Redução do IPTU
pode vir a ser mais utilizado após esta recuperação, atuando em um ponto falho da TDC que é
a manutenção dos imóveis recuperados ao longo dos anos. Em Belo Horizonte, esta pareceria
entre os dois instrumentos também é muito favorável e até incentivada pelos agentes públicos
do órgão de patrimônio cultural.
Por tudo o que foi exposto, de forma sintética, pode-se concluir que a TDC em Belo
Horizonte e Curitiba, apesar dos diversos problemas aludidos, demonstrou ser um instrumento
de grande sucesso, quando aplicado no patrimônio cultural edificado, promovendo a
preservão e a valorização de muitos imóveis. A experiência da aplicação da TDC nas duas
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
187
cidades mostrou que ele é um instrumento que facilita e viabiliza a preservação da
integridade e do entorno imediato do imóvel de valor cultural por diminuir a pressão exercida
pela especularão imobiliária e por aumentar a legibilidade e a valorização dos mesmos por
parte dos proprietários e também da população da cidade. Entretanto, o instrumento da TDC
sozinho não viabiliza a conservação dos imóveis ao longo do tempo, visto que é aplicado
apenas uma vez, não promovendo a manutenção das edificações com o passar dos anos.
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O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
200
APÊNDICES
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
201
APÊNDICE A - A Operacionalização da TPC em Curitiba
Os procedimentos para a aplicação da TPC em Curitiba foram previstos de forma
superficial no Decreto 408/91 e na Lei 9.803/00, todavia com a prática de utilização deste
instrumento pelos óros municipais foi se estabelecendo uma rotina de operacionalização
que acabou por ser regulamentada em setembro de 2001 pelo Decreto 894/01. Este Decreto
complementa a Lei 9.803, estabelecendo as condições para a concessão e utilização de
potencial construtivo, porém, como foi aludido anteriormente, ele foi substituído
posteriormente pelo Decreto 625/04, que rege a questão atualmente.
O Decreto 625/04 determina que a maior parte da operacionalização da TPC, dentro
da PMC aconteça na Secretaria Municipal de Urbanismo (SMU) especificamente por meio
da Comissão Municipal de Urbanismo (CMU). No processo de aplicação da TPC são
envolvidos também outros órgãos da Prefeitura, como a Secretaria Municipal de Finanças
(SMF) e a Procuradoria Geral do Município (PGM). O Decreto não especifica os órgãos
competentes envolvidos para cada finalidade de utilização da TPC, apenas indica as etapas
onde estes órgãos deverão ser consultados. Entretanto, através de entrevistas com os
agentes envolvidos, sabe-se que no caso específico do patrimônio cultural edificado, das
UIPs e das UIEPS
170
, além de outros setores da SMU como a CAPC estão envolvidos o
Setor de Patrimônio Histórico (SPH) do IPPUC e de forma indireta a Fundação Cultural de
Curitiba (FCC) por fornecer o material histórico e iconográfico para subsidiar a restauração
das UIPs ou das UIEPs.
170
Como para cada categoria de aplicação a operacionalização da TPC assume formatos institucionais específicos, este
item aborda, exclusivamente, a aplicação da TPC em imóveis de valor cultural.
Figura 168: Organograma da Prefeitura Municipal de Curitiba contendo apenas os órgãos
envolvidos na operacionalização da TDC
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
202
No caso das UIPs, que são a ênfase desta pesquisa, a operacionalização do
instrumento da TPC, conforme o Decreto 625/04, se divide basicamente em duas etapas:
Concessão de Potencial Construtivo do imóvel que cede potencial e Utilização do
Potencial Construtivo pelo imóvel que recebe potencial. Na primeira etapa o proprietário
da UIP deve solicitar à administração municipal a concessão do potencial construtivo que
tem direito mediante apresentação de Alvará de Restauro, se comprometendo com a
recuperação do imóvel. Na segunda etapa o potencial concedido ao proprietário da UIP
poderá ser transferido para outros lotes parcial ou totalmente através da Transferência de
Potencial Construtivo ou comercializado mediante a Transfencia da Titularidade da
Concessão de Potencial Construtivo para sua utilização posteriormente por terceiros.
Segundo informações obtidas em entrevista com técnicos da SMU e IPPUC, a
primeira coisa que o proprietário de imóvel cadastrado como UIP que deseja a Concessão
do Potencial Construtivo deverá fazer será procurar a CAPC para solicitar o lculo do
potencial do seu terreno e saber se há a necessidade de restaurar ou recuperar sua UIP para
receber o benefício
171
. Caso o proprietário deseje utilizar o potencial construtivo no mesmo
lote da UIP deverá consultar a CAPC para saber se será possível. Para as consultas ele
deverá apresentar o levantamento de todas as edificações existentes no terreno da UIP com
suas respectivas áreas, bem como a certidão de registro de imóveis do lote. Com a
documentação anexada o processo será encaminhado para o SPH do IPPUC para o cálculo
do potencial construtivo que pode ser transferido. Após os cálculos o processo se
171
171
Informações obtidas através de entrevista concedida por e Lorene Elizabeth Rothe
técnica da SMU e por Carla Choma Frankl técnica do IPPUC, em junho de 2008.
Figura 169: Organograma da etapas básicas de operacionalização da TPC em Curitiba
Fonte: Organograma construído pela autora
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
203
analisado pela CAPC que emite um parecer, o qual quando favorável pode haver
condições, como a obrigatoriedade de restaurar a edificação de valor cultural para a
concessão e transferência do potencial concedido. Quando for o caso de necessitar de
restauro o proprietário deverá apresentar um projeto de restauro ao IPPUC que ao aprová-
lo emitira um Alvará de Restauro.
Posteriormente, ciente das condições de utilização do instrumento e com as
documentações e o Alvará de Restauro em mãos o proprietário da UIP deverá solicitar a
concessão do potencial construtivo mediante um requerimento específico entregue ao
protocolo geral da PMC e encaminhado ao CMU. Este requerimento é um documento
padrão de consulta e solicitações à CMU
172
, sendo que quando utilizado para solicitar a
concessão de potencial construtivo deve ter em anexo os seguintes documentos:
Proposta assinada pelo proprietário quanto a concessão pretendida;
Certidão de Registro de Imóveis atualizado nos últimos 90 dias.
No caso de pessoa jurídica deverá anexar contrato social e a última
alteração ou estatuto e ata da assembléia que elegeu a última diretoria.
A CMU faz uma análise e homologa a solicitação encaminhando para o Núcleo de
Assessoramento Jurídico (NAJ) da SMU para prova de donio da UIP. Depois de parecer
da NAJ o processo será devolvido para a CMU “o qual o encaminhará aos órgãos
competentes, para se manifestarem quanto a viabilidade”
173
. Como se trata de imóvel de
valor cultural (UIP) o processo será encaminhado para a CAPC, que solicita ao proprietário
o preenchimento de um requerimento modelo oficial da CAPC (Anexo F). Neste
requerimento deve constar em anexo a seguinte documentação:
Consulta Amarela atualizada - 180 (cento e oitenta) dias - Original;
Registro de imóveis atualizado - 90 (noventa) dias;
Alvará de Restauro Aprovado com projeto completo de restauro da
Unidade de Interesse de Preservação, apresentando: Plantas, Cortes,
Elevações, Implantação, Estatística e demais detalhes inerentes ao
projeto;
Esta solicitação será protocolada junto à CAPC que em reunião decide sobre a
concessão do potencial construtivo, ou não, e sobre as condições desta concessão. Caso o
parecer seja favorável o processo será reencaminhado para a CMU para se necessário
solicitar ao proprietário da UIP a anexação documentação complementar e providencia a
avaliação do imóvel com base no valor utilizado para cálculo do Imposto de Transmissão
172
O Requerimento à CMU entra-se no Anexo E.
173
Decreto 625/04, artigo 4º, inciso III.
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
204
Intervivos de Bens Imóveis (ITBI)”
174
. Após avaliar a documentação a CMU fará à análise
e novo cálculo do potencial construtivo, estabelecendo as condições para a concessão e
utilização com base no parecer da CAPC.
Com o potencial construtivo concedido pela CMU, caberá a SMU avisar ao
proprietário requerente, implantar alerta na indicação fiscal do imóvel e encaminhar para a
PGM para a averbação da concessão no registro de imóveis do lote. A SMU também fica
responsável de expedir a Certidão de Concessão do Potencial Construtivo (CCPC), em
duas vias, que deverão ser assinadas pelo proprietário do imóvel cedente com firma
reconhecida e pelo presidente da CAPC. Uma das vias deste documento deverá ser
entregue ao proprietário e a outra ficará arquivada junto à CAPC. Segundo o Decreto
625/04, artigo 4º, parágrafo único a CCPC deverá conter:
I - nome do proprietário e sua identificação;
II - endereço do imóvel a ser concedido o potencial e sua indicação fiscal;
III - endereço do imóvel a ser transferido ao Município, quando for o caso, e
sua indicação fiscal;
IV - valor do metro quadrado do imóvel;
V - potencial construtivo concedido;
VI - condições de concessão e transferência do potencial estabelecidas pelo
CMU.
174
Decreto 625/04, artigo 4º, inciso IV.
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
205
Como foi aludido acima o proprietário que obtém a concessão de potencial
construtivo poderá optar por comercializar com terceiros esta concessão por meio da
Transferência da Titularidade da Concessão de Potencial Construtivo prevista no
tulo II do Decreto 625/04. Esta transação poderá ser efetuada pelo proprietário ou
titular e “a critério do CMU, ouvidos os óros competentes, desde que comporte a
integralidade da concessão ou o total remanescente”
175
. Para tal o proprietário da UIP
interessado em transferir a titularidade de seu potencial construtivo, deverá apresentar um
requerimento
176
ao protocolo geral da PMC que direcionará a CMU para análise da
solicitação. A CMU, se necessário, encaminhará para o órgão competente o processo, que
175
Decreto 625/04, artigo 5º.
176
Este requerimento é o mesmo modelo presente no Anexo X1, e deve ter em anexo a seguinte documentação: Proposta
assinada pelo proprietário quanto à transferência pretendida; Certidão de Registro de imóveis atualizado nos últimos 90
dias.
Figura 170: Fluxograma da operacionalização da Concessão de Potencial Construtivo em Curitiba
Fonte: Fluxograma construído pela autora baseando-se no Decreto 625/04 e informações de técnicos da SMU e IPPUC
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
206
no caso de UIP será encaminhado para a CAPC que efetuará análise e produzira um
parecer. Quando parecer da CAPC for favorável a CMU autorizará a transferência, ficando
a cargo da SMU:
a) dar ciência ao requerente quanto ao parecer e condições estabelecidas pelo
CMU;
b) implantar alerta na indicação fiscal do imóvel, quanto a transferência de
titularidade do potencial construtivo;
c) emitir Certidão de Transferência de Titularidade do Potencial Construtivo nas
condições estabelecidas pelo CMU, em 02 (duas) vias contendo os requisitos
estabelecidos no § 3º, deste artigo e entregá-las ao requerente para
providenciar o reconhecimento de firma da(s) assinatura(s) do(s)
proprietário(s);
177
d) providenciar as devidas anotações e controle da transferência de
titularidade.
178
O proprietário que obteve a concessão de potencial construtivo ainda pode optar
pela Transferência do Potencial Construtivo de seu imóvel total ou em partes para outro
imóvel, conforme o tulo III do Decreto 625/04. A operacionalização desta etapa se
incidirá com a apresentação de um requerimento específico à SMU solicitando a
transferência do potencial construtivo. Este requerimento consta no Anexo G e solicita
informações do imóvel que irá receber o potencial construtivo, como a quantidade e o tipo
177
De acordo com o Decreto 625/04, artigo 5º, parágrafo 3º, a Certidão de Transferência de Titularidade da Concessão de
Potencial Construtivo deve conter: I - nome do transmitente e adquirente e respectivas identificações; II - identificação do
imóvel que originou a concessão de potencial; III - valor do metro quadrado do imóvel; IV - potencial construtivo
original e o concedido na transferência de titularidade; V - condições de transferência de titularidade do potencial
estabelecidas pelo CMU.
178
Decreto 625/04, artigo 5º, parágrafo 2º, inciso III
Figura 171: Fluxograma da operacionalização da Transferência da Titularidade da Concessão
de Potencial Construtivo em Curitiba
Fonte: Fluxograma construído pela autora baseando-se no Decreto 625/04
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
207
de incentivo pretendido, que pode ser acréscimo de coeficiente de aproveitamento, de
pavimentos ou de porte comercial, e o uso da edificação. Estas informações que constam
no requerimento o importantes para definir se o que o requerente pretende está em
acordo com os parâmetros urbanísticos máximos previstos na Lei 9.803/00. A este
requerimento de solicitação da TPC deverão ser anexados os seguintes documentos:
I - proposta assinada pelos titulares do potencial concedido e pelo proprietário
do imóvel a receber o potencial, contendo os seguintes dados:
a) área computável a ser acrescida (coeficiente);
b) número de pavimentos a serem acrescidos (altura);
c) área total dos pavimentos acrescidos;
d) uso da edificação;
e) porte, no caso de uso não habitacional.
II - registro de imóveis atualizado nos últimos 90 (noventa) dias, do lote a
receber o potencial construtivo;
III - registro de imóveis atualizado nos últimos 90 (noventa) dias, do lote que
cede o potencial com a averbação da concessão;
IV - cópia ou número da Certidão de Concessão de Potencial.
179
A SMU de posse de toda a documentação efetuará uma análise previa da
solicitação, com análise dos parâmetros máximos solicitados e verificação de atendimento
das condições estabelecidas pelo CMU, por ocasião da concessão do potencial
construtivo
180
. Depois da análise a SMU encaminhará o processo ao NAJ para prova de
domínio do imóvel recebedor, e este emitirá parecer e devolverá o processo à SMU que
deverá solicitar à SMF a avaliação dos lotes que receberão o potencial, baseando-se no
valor do ITBI. O processo então retornará à SMU que efetivará os cálculos da
transferência, baseando-se na fórmula presente no Título V do Decreto 625/04, e autorizará
a transferência do potencial avisando o requerente, emitindo duas vias da Certidão de
Transferência de Potencial Construtivo (CTPC)
181
e atualizando a Certidão de Concessão
de Potencial Construtivo da UIP que cedeu potencial.
179
Decreto 625/04, artigo 7º.
180
Ibidem, artigo 8º, inciso I.
181
De acordo com o Decreto 625/04, artigo 8º, parágrafo único, a Certidão de Transferência de Titularidade da
Concessão de Potencial Construtivo deve conter: I - nome do transmitente e adquirente e sua identificação; II - endereço
do imóvel a receber o potencial e sua Indicação Fiscal; III - área a ser acrescida; IV - números de pavimentos a serem
acrescidos; V - coeficiente de aproveitamento máximo; VI - número de pavimentos máximo; VII - área comercial; VIII -
uso da edificação; IX - potencial construtivo do imóvel que cede; X - potencial construtivo do imóvel que recebe; XI -
potencial remanescente.
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
208
No caso das UIEPs a legislação que estabelece parte da operacionalização da TPC
para sua preservação é a mesma que a regulamenta (Decreto 308/93). Uma UIEP é
definida já com o objetivo de utilização do instrumento da TPC, assim a operacionalização
da TPC para este fim inicia-se com a solicitação junto à CAPC da definição de um imóvel
como UIEP. Ao ser aprovada a solicitação do requerente é elaborado uma regulamentação
específica para cada caso, que junto com os procedimentos administrativos acima
mencionados para a Concessão de Potencial Construtivo de uma UIP irão guiar todo o
processo. No caso das UIEPs a participação da administração municipal no processo é
ainda mais intensa, pois a ela cabe:
(...) o comparecimento na celebração dos contratos de restauração, na
qualidade interveniente-anuente, visando assegurar-lhe a possibilidade de
acompanhar e fiscalizar as obras de restauro, bem como a efetiva aplicação
dos recursos provenientes das cotas de potencial construtivo estabelecidas em
regulamentação específica.”
182
Como visto acima a comercialização do potencial construtivo das UIEPs é toda
feita pela PMC, diferente das UIPs que a comercialização é toda realizada pelos seus
respectivos proprietários, atuando a Prefeitura apenas na autorização e fiscalização das
transferências. Assim, buscando facilitar a venda do potencial construtivo dos proprietários
de UIPs que em sua maioria é em pequena quantidade e objetivando ainda promover maior
182
Decreto 308/93, artigo 6º.
Figura 172: Fluxograma da operacionalização da Transferência de Potencial Construtivo em
Curitiba
Fonte: Fluxograma construído pela autora baseando-se no Decreto 625/04
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
209
divulgação do potencial construtivo disponível em Curitiba a PMC desenvolveu o Banco
de Potencial Construtivo. Este banco de potencial é na verdade um banco de dados
disponibilizado no web site da prefeitura
183
, que apresenta o potencial construtivo
disponível para venda, advindo tanto de UIP, como de áreas verdes e programas
habitacionais. No banco de dados estão disponíveis informações do imóvel cedente como o
nome do proprietário e seu contato, o zoneamento da UIP, a metragem inicial e saldo atual
de potencial, assim como o número de transferências efetivadas, a localização dos
recebedores e a metragem recebida por cada um.
183
http://www2.curitiba.pr.gov.br/gtm/pmat_potencialconstrutivo/potencialconstrutivo.aspx
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
210
APÊNDICE B - A Operacionalização da TDC em Belo
Horizonte
Os procedimentos para a aplicação da TDC em BH foram previstos de forma
superficial no Decreto de 1998, entretanto com a prática de utilização deste instrumento
pelos órgãos municipais envolvidos foi sendo estabelecida uma rotina de
operacionalização. Esta operacionalização acabou por ser regulamentada pela SMARU em
abril de 2006, através da Portaria SMARU nº. 001.
A Portaria determina que a maior parte da operacionalização do instrumento, dentro
da Prefeitura Municipal de Belo Horizonte, aconteça na SMARU, envolvendo a DIPC da
FMC no caso de imóveis tombados, a Secretaria Municipal Adjunta do Meio Ambiente
(SMAMA), quando se tratar de imóveis de preservação ambiental e a Secretaria Municipal
Adjunta de Habitação (SMAHAB)
184
, quando forem imóveis para implantação de
programa habitacional, respectivamente. Dentro da SMARU os procedimentos contam
com a participação de diversas gerências como pode ser visto na Figura 173:
No caso de imóveis tombados, que é a ênfase desta pesquisa, a operacionalização
inicia-se com a solicitação, por parte do proprietário de imóvel gerador, da Certidão de
TDC. Esta solicitação deve ser feita na Central de Atendimento da SMARU, onde deverão
ser entregues as Guias de Arrecadação Municipal (GAM‟s) relativas aos preços públicos
184
Estas duas Secretarias, bem como a SMARU, fazem parte da Secretaria Municipal de Políticas Urbanas que é
ligada diretamente ao Poder Executivo.
Figura 173: Organograma da Prefeitura Municipal de Belo Horizonte contendo apenas os órgãos
envolvidos na operacionalização da TDC
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
211
previstos para vistoria, exame documental e emissão de certidão
185
, pagas; o
“Requerimento Certidão de TDC - Imóvel Gerador(Anexo H) devidamente preenchido e
assinado pelo proprietário (ou representante, mediante procuração); e também os seguintes
documentos:
Informação básica do imóvel gerador
pia do registro em cartório do imóvel gerador;
Cópia do IPTU do exercício corrente, onde conste a Àrea Isótima do
imóvel;
Planta de situação;
Plantas baixas de todos os níveis da edificação existente;
Memória de cálculo de áreas construídas e líquidas reais existentes por
pavimento;
186
Cabe à Central de Atendimento abrir processo de TDC após análise da
documentação e recolhimento das GAMs e encaminhá-lo para a DIPC. Neste órgão da
FMC a documentação e o próprio imóvel serão examinados, “considerando o estado de
conservação e a existência de restrição de utilização plena do potencial construtivo do
imóvel, para posterior emissão de laudo favorável ou desfavorável à Transferência do
Direito de Construir”
187
. De acordo com Michele Arroyo
188
, diretora da DIPIC, as
informações sobre o estado de conservação dos bens para a emissão do laudo favorável ou
desfavorável à TDC, são extraídas das vistorias de rotina feitas anualmente pelos técnicos
da DIPIC em todos dos imóveis tombados de Belo Horizonte, como parte das etapas de
fornecimento do instrumento da Isenção de IPTU. Apenas em casos especiais a DIPIC faz
uma vistoria especifica no imóvel que pretenda gerar TDC.
Se o laudo emitido pela DIPC for desfavorável o processo será encaminhado para a
Assessoria do Gabinete da SMARU, onde será indeferido. Em seguida, será enviada uma
comunicação ao proprietário, que pode entrar novamente com pedido, após adequação do
estado de conservação do imóvel e ou da documentação, quando for o fato.
Caso o laudo da DIPC seja favorável, o processo será encaminhado diretamente à
Gerência de Controle Urbano (GCON) para vistoria da edificação existente, conferindo a
área total construída do imóvel com a prevista no projeto e no registro. As a vistoria, o
185
Portaria SMARU nº. 001/2006, art. 2º.
186
Informações retiradas do “Requerimento Certidão de TDC - Imóvel Gerador” que se encontra no APENDICE VIII.
187
Portaria SMARU nº. 001/2006, art. 2º, Parágrafo Único.
188
Informações obtidas através de entrevista concedida por Michele Abreu Arroyo, diretora da DIPC de Belo Horizonte,
em outubro de 2008.
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
212
processo ipara a Assessoria do Gabinete da SMARU, onde será elaborado um Relatório
para posterior avaliação e assinatura (ou indeferimento) da CPTDC.
A Comissão Permanente de Transferência do Direito de Construir está ligada
diretamente à Assessoria do Gabinete da SMARU, que é um dos principais setores da
SMARU envolvidos na operacionalização da TDC. É nesta Assessoria que trabalha o
coordenador da Comissão, que após a assinatura do relatório encaminhará a Minuta da
Certidão de TDC” para a Gerência de Protocolo e Expedição (GPROEX). Nesta Gerência
será emitida a Certidão da TDC comunicado ao proprietário da disponibilidade da sua
Certidão de TDC na Central de Atendimento da SMARU e portanto a possibilidade de
negociação de seu potencial construtivo. Após a expedição da certidão, o processo será
conduzido e arquivado na Assessoria do Gabinete, onde fica aguardando a solicitação das
transferências. De acordo com Valéria Braga, da Assessoria do Gabinete, todo o processo
descrito acima para a geração de potencial construtivo dura em média de trinta a noventa
dias, o que foi confirmado com alguns proprietários de imóveis que geraram TDC, pois
estes consideram que o processo na PMBH foi rápido, eficiente e tranqüilo
189
.
A operacionalização da recepção da TDC acontece por processo inicial parecido
com o de geração de potencial, pois o proprietário do imóvel receptor deve procurar
primeiramente a Central de Atendimento e apresentar: o Requerimento Certidão de TDC -
189
Informações obtidas através de questionários enviados aos proprietários de imóveis geradores através de email, em
maio de 2006 e em julho de 2008.
Figura 174: Fluxograma da operacionalização da Geração de Potencial Construtivo
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
213
Imóvel Receptor (Anexo I); as GAM‟s “relativas aos preços públicos previstos para
exame documental e emissão de certies”
190
, já pagas; e apresentar a mesma
documentação exigida no caso do imóvel gerador, exceto o levantamento arquitetônico e
memória de cálculo.
A documentação recebida será examinada na Central de Atendimento e
encaminhada à Assessoria do Gabinete, onde será anexada ao processo do respectivo
imóvel gerador. Em seguida procede-se à análise para elaboração de Relatório a ser
encaminhado a CPTDC, onde deverão constar os cálculos da área liquida transferível (AT)
pelo ivel gerador, caso seja favorável a transferência da área liquida (AR) que o
proprietário do imóvel receptor que deseja adquirir
191
, e também o saldo do imóvel gerador
após a transferência
192
. Após a análise será solicitado ao requerente da transferência uma
carta de autorização assinada pelo proprietário do imóvel gerador, constando a quantidade
da área líquida adicional (AR) a ser transferida para o imóvel receptor.
Com a carta do proprietário gerador anexada ao processo, a Assessoria do Gabinete
emite Minutas das Certies de Transferência do Direito de Construir que são
encaminhadas para a GPROEX, onde serão feitas duas Certies de Transferência do
Direito de Construir. Uma das Certies será para o proprietário do imóvel gerador,
indicando o saldo restante de potencial construtivo em metros quadrados e a outra para o
proprietário do imóvel receptor, indicando a área quida adicionada a seu bem. Após a
entrega das Certies aos proprietários, o processo se arquivado na Assessoria do
Gabinete da SMARU onde aguardará novas transferências. Este processo de transferência
de potencial para outros imóveis, de acordo com Valéria Braga, é realizado em um prazo
muito mais curto que o processo de geração de TDC, durando de quinze à vinte dias.
190
Portaria SMARU nº. 001/2006, art. 10º.
191
A quantidade AR que o proprietário deseja adquirir só será aceita após verificação na documentação apresentada se a
quantidade desejada não ultrapassa os 20% do potencial construtivo que o imóvel tem direito. Caso o valor seja superior
aos 20% considera-se para os cálculos a AR igual aos 20% permitidos.
192
No próximo item desta dissertação serão apresentados alguns casos referências para melhor entendimento destes
cálculos.
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
214
Figura 175: Fluxograma da operacionalização da Recepção de Potencial Construtivo
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
215
ANEXOS
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
216
ANEXO A - Minuta de Decreto da SMARU da Prefeitura
Municipal de Belo Horizonte
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
217
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
218
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
219
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
220
ANEXO B - Resolução de 16 de janeiro de 2007 da
Comissão Permanente de Transferência do Direito de
Construir da Prefeitura Municipal de Belo Horizonte
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
221
ANEXO C - Mapa da Evolução da Ocupação Urbana de
Curitiba
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
222
ANEXO D - Mapa do Custo da Terra de Curitiba
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
223
ANEXO E - Requerimento padrão da Secretaria Municipal
de Urbanismo de Curitiba Curitiba
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
224
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
225
ANEXO F - Requerimento modelo oficial da Comissão de
Avaliação do Patrimônio Cultural Curitiba
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
226
ANEXO G - Requerimento para solicitar a Transferência
do Potencial Construtivo Curitiba
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
227
ANEXO H - Requerimento de Certidão de Transferência
do Direito de Construir imóvel gerador Belo Horizonte
O Patrimônio Cultural Edificado e a Transferência do Direito de Construir
228
ANEXO I- Requerimento de Certidão de Transferência do
Direito de Construir imóvel receptor Belo Horizonte
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