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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE MONTES CLAROS - UNIMONTES
PRÓ-REITORIA DE PESQUISA E PÓS-GRADUAÇÃO
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM DESENVOLVIMENTO SOCIAL
A FORMAÇÃO DE PROFESSORES DAS SÉRIES INICIAIS DO
ENSINO FUNDAMENTAL NO CURSO NORMAL SUPERIOR
MODULAR EMERGENCIAL: UMA ANÁLISE DA EXPERIÊNCIA DA
UNIMONTES
ANDRÉA MARIA OLIVEIRA VERSIANI SANTIAGO
MONTES CLAROS
2010
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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE MONTES CLAROS - UNIMONTES
PRÓ-REITORIA DE PESQUISA E PÓS-GRADUAÇÃO
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM DESENVOLVIMENTO SOCIAL
ANDRÉA MARIA OLIVEIRA VERSIANI SANTIAGO
A FORMAÇÃO DE PROFESSORES DAS SÉRIES INICIAIS DO
ENSINO FUNDAMENTAL NO CURSO NORMAL SUPERIOR
MODULAR EMERGENCIAL: UMA ANÁLISE DA EXPERIÊNCIA DA
UNIMONTES
Dissertação de mestrado apresentado ao Programa
de Pós-Graduação em Desenvolvimento Social.
Orientadora: Profª. Dra. Regina Célia Lima
Caleiro.
Co-orientadora: Profª. Dra. Maria Helena de Souza
Ide.
MONTES CLAROS
2010
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SANTIAGO, Andréa Maria Oliveira Versiani.
A Formação de Professores das Séries Iniciais do Ensino Fundamental no Curso
Normal Superior Modular Emergencial: uma análise da experiência da UNIMONTES.
Orientadora: Profª. Drª. Regina Célia Lima Caleiro
Dissertação (Mestrado) – Universidade Estadual de Montes Claros/UNIMONTES.
139 p.
Para minha mãe, professora a vida inteira, que
está na origem do tema que aqui se coloca.
Para os meus alunos do Curso Normal
Superior da UNIMONTES, assim como das
Faculdades Integradas Pitágoras, personagens
e co-autoras dessa pesquisa.
Aos muitos professores do Ensino
Fundamental, espalhados por esse Brasil que
anonimamente se inquietam e lutam por uma
educação de qualidade.
AGRADECIMENTOS
À professora Dra. Régina Célia Caleiros, orientadora dedicada que acreditou em mim e no
meu tema corajosamente desde o primeiro momento;
À professora Dra. Maria Helena Ide, Bárbara, pela co-orientação, presença, interlocução
sempre enriquecedora.
Aos professores do Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento Social – PPGDS, Dr.
Hebert Toledo Martins, Dr. João Batista de Almeida Costa, Dr. Gilmar Ribeiro dos Santos,
Dra. Luci Helena Silva Martins, Dr. Anelito de Oliveira, Dr. Antônio Dimas Cardoso, Dr.
Carlos RenatoTheophilo, Dra. Luciene Rodrigues pela contribuição teórica;
À professora Dra. Márcia Pereira, pelo desprendimento em colocar-se ao meu dispor, dando-
me informações valiosas sobre a História Oral.
Aos colegas (Turma 2008) do PPGDS que compartilharam ansiedades, expectativas, autores e
textos, fazendo-me sentir novamente aluna;
Aos funcionários da UNIMONTES que facilitaram o meu acesso a documentos institucionais,
especialmente a prof. Maria de Lourdes Ribeiro Paixão;
A minha família, meu marido Paulo Afonso, meus filhos Lucas e Ana Paula que souberam
entender ausência, livros espalhados pela casa e dias intermináveis frente ao computador;
Ao meu pai, Manoel Versiani, minha irmã Bel e meu sobrinho/ afilhado Pedro pela força e
confiança constante.
As professoras Rosane Bastos e Bernadete Versiani pela revisão inconteste e as muitas
vírgulas colocadas;
Ao apoio técnico da minha digitadora Daniella Mota, sempre pronta a me socorrer.
Aos amigos e colegas de caminhada Rosina, Clinton, Cássio, Ester, Elisângela, Luciano,
Regina Fernandes e Eugênio que de diferentes formas contribuíram para o andamento da
minha pesquisa e ajudaram-me a transpor dificuldades de várias ordens.
A professora Dra. Rosângela Silveira, participante da banca de qualificação pelas muitas
sugestões bibliográficas.
Aos profissionais entrevistados, pela acolhida e disponibilidade para concessão de
informações valiosas para a realização dessa pesquisa.
“Podemos supor então que somos, todos
juntos, sujeitos viventes e críticos de iguais
sentimentos: a fé na educação e a crença no
que se pode fazer na escola, a esperança no
homem, a dedicação ao trabalho de educar
dentro e fora dos muros da escola; mas
também a vidência de que a educação
desejada pelo educador não é a educação
consentida pelos senhores da sociedade e, às
vezes, é o oposto dela... Daí, no fundo do
poço, a esperança da prática de uma nova
educação que, de algum modo, aponte para
um novo mundo e que comece , portanto, por
reinventar essa própria prática pedagógica,
através de incluir o sentimento de uma
verdadeira luta política dentro de um
verdadeiro trabalho de educador” (Carlos
Rodrigues Brandão).
Andréa Maria Oliveira Versiani Santiago
A FORMAÇÃO DE PROFESSORES DAS SÉRIES INICIAIS DO ENSINO
FUNDAMENTAL NO CURSO NORMAL SUPERIOR MODULAR EMERGENCIAL:
uma análise da experiência da UNIMONTES
Montes Claros, 2010.
Banca Examinadora
_________________________________________________________________
Orientadora: Profª. Dra. Regina Célia Lima Caleiro.
_________________________________________________________________
Co-orientadora: Profª. Dra. Maria Helena de Souza Ide.
_________________________________________________________________
Membro da Banca Examinadora: Profª. Dra. Ilva Ruas Abreu
_________________________________________________________________
Membro da Banca Examinadora: Profº. Dr. Gilmar Ribeiro dos Santos
Data: _____/_____/_____
Resultado:____________
SANTIAGO, Andréa Maria Oliveira Versiani. A Formação de Professores
das Séries Iniciais do Ensino Fundamental no Curso Normal Superior
Modular Emergencial: uma análise da experiência da UNIMONTES. 2010.
Dissertação (Mestrado em Desenvolvimento Social) – Universidade Estadual de
Montes Claros – UNIMONTES.
RESUMO
O presente estudo tem como tema a discussão da formação de professores das séries iniciais
do Ensino Fundamental, no contexto das políticas educacionais no país após a Lei de
Diretrizes e Bases nº 9394/96. Delineamos como objeto de estudo a formação de professores-
alunos egressos do Curso Normal Superior/Modular da Universidade Estadual de Montes
Claros (UNIMONTES), no período 2000-2002. Analisamos os antecedentes históricos do
processo de formação de professores, dando ênfase às conseqüências da reestruturação
produtiva equacionada pelo modelo neoliberal na educação brasileira. Apresentamos o Curso
Normal Superior da Universidade Estadual de Montes Claros – UNIMONTES, bem como
caracterizamos os professores-alunos egressos do mesmo. Escolhemos gestores, docentes e
discentes como porta-vozes do Curso Normal Superior emergencial/ modular da
UNIMONTES. Buscamos refletir sobre a contribuição do Curso Normal Superior para a
prática profissional dos ex alunos, bem como as razões que levaram a escolher o referido
curso. Trata-se de uma pesquisa de natureza qualitativa para a qual se utilizaram bibliografias
específicas do tema, documentos oficiais e entrevistas.
Palavras-Chave: Formação de Professores – Políticas Públicas – Lei de Diretrizes e Bases –
Normal Superior
ABSTRACT
This study is subject to discussion of teacher’s training in early grades of elementary school,
in the context of educational policies in our country after the Law of Directives and Bases,
called LDB n.º 9394/96 at Brazil. The epistemological outlining of this study is a search
whose object was the training teacher’s process at the Universidade Estadual de Montes
Claros – UNIMONTES from 2000 to 2002 years. Our choice for outlining process was egress
teachers and students from the above-mentioned university. The outlined course was the
Teachers College Course, known at Brazil as Curso Normal Superior Modular. We analyzed
the historical background of the process of teacher’s training, emphasizing the consequences
of the restructuring process considered by the neo-liberal model in Brazilian education. We
also present the Teachers College Course in its own curriculum and other features like
managers, teachers and students profiles. We chose these people as spokespersons of the two
arrangements of the course in question: modular and emergency modes. We reflect on the
contribution of the Teachers College Course for the professional practice of former students
as well as their reasons to choose that course. This is a qualitative research for which we refer
to specific subject bibliographies, official documents and interviews.
Keywords: Teachers Training – Public Policies – Law of Directives and Bases – Teachers
College Course.
LISTA DE SIGLAS E ABREVIATURAS
ANDES – Associação Nacional de Docentes do Ensino Superior
ANFOPE – Associação Nacional pela Formação dos Profissionais da Educação
BIRD – Banco Internacional de Desenvolvimento
CEE/MG – Conselho Estadual de Educação de Minas Gerais
CEFAM – Centros de Formação e Aperfeiçoamento do Magistério
CEPAL – Comissão Econômica para América Latina e Caribe
CEPEX – Conselho de Ensino Pesquisa e Extensão
CFE – Conselho Federal de Educação
CNE/CES – Conselho Nacional de Educação
CNE/CP – Conselho Nacional de Educação/Conselho Pleno
EFA9 – Education For All
FADENOR – Fundação de Apoio ao Desenvolvimento do Ensino Superior do Norte de Minas
FAFIL – Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras
FMI – Fundo Monetário Internacional
FUNDEF – Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de
Valorização do Magistério
FUNM – Fundação Norte Mineira de Ensino Superior
LDB – Lei de Diretrizes e Bases
LDBEN – Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional
HEM – Habilitação Específica para o Magistério
IES – Instituto Superior de Educação
INEP –Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais
IPEA – Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada
IPES – Instituto de Pesquisas Especiais para a Sociedade
MEC-USAID – Ministério da Educação e Cultura e United Satates Agency for Internacional
Development
PAES – Programa de Avaliação Seriada para Ingresso no Ensino Superior
PCN – Parâmetros Curriculares Nacionais
PPP – Projeto Político Pedagógico
UNESCO – Organização das Nações Unidas para Educação, a Ciência e a Cultura
UNICEF – Fundo das Nações Unidas para a Infância
UNIMONTES – Universidade Estadual de Montes Claros
xi
LISTA DE FIGURA
FIGURA 01: UNIMONTES: 47 anos para você se orgulhar .................................................. 79
xii
LISTA DE QUADRO
QUADRO 01: Currículo para o Ensino Normal 1º e 2º Ciclo ................................................. 42
QUADRO 02: Legislação Referente à Constituição da UNIMONTES..................................81
xiii
SUMÁRIO
LISTA DE SIGLAS E ABREVIATURAS ............................................................................ xi
LISTA DE FIGURA .............................................................................................................. xii
LISTA DE QUADRO ............................................................................................................ xiii
INTRODUÇÃO ...................................................................................................................... 14
CAPÍTULO I: FORMAÇÃO DE PROFESSORES: ANTECEDENTES HISTÓRICOS21
1.1 A Institucionalização da Escola Pública Moderna ............................................................. 22
1.2 A Formação Histórica da Escola Pública e da Escola Normal .......................................... 24
1.3 A Formação de Professores no Brasil: primeiros tempos .................................................. 29
CAPÍTULO II:A POLÍTICA DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES PARA A
EDUCAÇÃO BÁSICA NOS ANOS 1990 ............................................................................. 48
2.1 A Reforma do Estado: o contexto para mudanças educacionais dos anos 1990 ................ 49
2.2 A Educação como Estratégia de Desenvolvimento na Lógica dos Organismos
Internacionais............................................................................................................................ 51
2.3 Novos Espaços de Formação: LDB, Normal Superior e Institutos Superiores de Educação
...........................................................................................................................................64
CAPÍTULO III: O CURSO NORMAL SUPERIOR DA UNIVERSIDADE ESTADUAL
DE MONTES CLAROS: ELEMENTOS PARA UMA ANÁLISE ................................... 78
3.1 Breve Histórico e apresentação de dados organizacionais da Universidade Estadual de
Montes Claros – UNIMONTES .............................................................................................. 79
3.2 O Curso Normal Superior da UNIMONTES ..................................................................... 82
CAPÍTULO IV: O CURSO NORMAL SUPERIOR NA VOZ DE SEUS
PROTAGONISTAS ............................................................................................................... 99
4.1 Os Protagonistas da Pesquisa .......................................................................................... 100
4.2 A Contribuição do Curso Normal Superior para a Prática Profissional dos Alunos
Egressos .................................................................................................................................. 101
4.3 As Razões da Procura pelo Curso Normal Superior da UNIMONTES ........................... 111
CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................................................... 117
REFERÊNCIAS ................................................................................................................... 123
ANEXOS ............................................................................................................................... 134
ANEXO A – Tópico Guia – Discentes Normal Superior. ..................................................... 135
ANEXO B – Tópico Guia – Docentes Normal Superior. ...................................................... 136
ANEXO C – Carta de Cessão. ............................................................................................... 137
ANEXO D – Estrutura Curricular do Curso Normal Superior de Natureza Emergencial. .... 138
INTRODUÇÃO
Profundas e rápidas mudanças acontecidas nas últimas décadas, ocasionadas por
fatores múltiplos, oportunizaram uma nova sociabilidade do tempo presente. As mudanças
resultaram de complexos fenômenos societários, perpassados pela reestruturação do mundo
produtivo, pelos políticos neoliberais, pelo fenômeno da globalização e uma nova
configuração do papel do Estado. Os anos de 1990 foram marcados pelas decorrências mais
diretas dessas mudanças nas diferentes esferas do tecido social, permitindo recolocar em
discussão as tarefas historicamente atribuídas à Educação.
O período tornou-se campo fértil para os debates sobre a qualidade da Educação e
as condições necessárias para assegurar às crianças, aos jovens e aos adultos as aprendizagens
necessárias ao desenvolvimento de competências que a contemporaneidade demanda.
Vivemos tempos de globalização econômica, com níveis elevados de pobreza e a introdução
de novas tecnologias. Tais transformações exigem novas aprendizagens e novos saberes. Todo
esse contexto coloca enormes desafios para a sociedade e, inevitavelmente, também para a
educação escolar. Há uma necessidade crescente de um novo docente, capaz de desempenhar
suas ações em cenários complexos e de construir-se continuamente em busca da excelência –
outra exigência da contemporaneidade.
O crescimento da literatura específica, e o incremento da produção teórica dessa
área de estudo ensejaram reflexões no campo da educação escolar, permitindo o
estabelecimento pelo Estado as reformas educacionais.
A reflexão acerca das políticas educacionais, à luz de teorias específicas, nos
permite a compreensão da moldura que delineia relações sociais mais amplas, apreendendo a
relação entre políticas e gestão da educação e os processos macrossociais marcados pelas
políticas neoliberais. O tema “Formação de Professores” é apontado como uma estratégia
fundamental no enfrentamento dos problemas de qualidade na Educação Básica no Brasil. O
assunto tem sido reforçado inclusive pela mídia, com a divulgação de dados de pesquisas.
Para citar um exemplo, em 2003, o ex-Ministro da Educação, Cristovam Buarque, denominou
de “tragédia nacional” os altos índices de reprovação, evasão e exclusão social da Educação
Básica
1
.
1
Dados do Indicador de Analfabetismo Funcional – INAF. Disponível em: < http://www.ipm.org.br>. Acesso
em: dezembro de 2008.
16
Para alguns educadores, como Vera Maria Candau (1997), é impossível pensar
num ensino de qualidade e numa escola comprometida com a educação para a cidadania se
não se considerar a discussão sobre a formação de professores. Ainda, segundo Nóvoa (1995,
p. 09), “não há ensino de qualidade, sem reforma educativa, sem inovações pedagógicas, sem
uma adequada formação de professores”.
Profundamente envolvida com as questões acima delineadas, visto minha
experiência profissional como professora do Curso Normal Superior de uma instituição
particular da cidade de Montes Claros, Minas Gerais, assim como professora, do Curso
Normal Superior da Universidade Estadual de Montes Claros – UNIMONTES, na
organização modular, ao me deparar com essa nova realidade, senti a necessidade de
pesquisar, compreender e analisar a realidade dos professores-alunos formados no contexto
das políticas educacionais equacionadas pelo modelo neoliberal e pelas reformas educativas
dos anos 1990.
Com este propósito, elegemos como universo de investigação, discutir a formação
de professores do Curso Normal Superior da Universidade Estadual de Montes Claros –
UNIMONTES, dentro de um novo momento educacional, analisando o processo de
construção sócio-histórico da profissão docente concomitantemente com o perfil profissional
dos seus sujeitos. Procuramos também, analisar as políticas de formação de professores,
centrando-se na análise da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional - LDBN, Lei nº
9.394/96, enfatizando as diversas facetas das políticas de formação, desde a definição das
competências e habilidades até a avaliação de desempenho e organização escolar.
Acreditamos que, para não sermos apenas plateia das reformas educacionais ora
implementadas no País, faz-se necessário questioná-las, uma vez que todos os “atores” do
processo ensino-aprendizagem necessitam refletir sobre o papel desempenhado, para que a
práxis pedagógica do professor ultrapasse a função de mero transmissor de conteúdo.
Cabe, portanto, à Universidade criar as condições propícias aos professores-
alunos, para que possam investigar a realidade na qual estão inseridos e questionar a sua
prática, gerando assim, campo fértil para a autonomia de seu pensamento, considerando os
contextos sociais específicos em que eles vêm atuando.
A partir dos anos de 1990, questões como a formação de professores,
descentralização, a expansão do ensino superior, incentivos para o estabelecimento da
educação privada tornaram-se questões amplamente debatidas nos meios educacionais.
As forças de mercado, a hegemonia conservadora e as agendas dos organismos
internacionais atuam em conexão sobre as políticas públicas brasileiras. Na Conferência
17
Mundial de Educação para Todos, realizada em Jomtien (Tailândia), o Brasil foi apontado
como um dos nove países com maior taxa de analfabetismo do mundo. A eleição do
presidente Fernando Collor à Presidência da República permitiu a concretização do ideário
defendido na Conferência. O estabelecimento da Lei de Diretrizes e Bases nº 9394/96, no
Governo Fernando Henrique Cardoso, garante, na legislação, as reformas e a legitimação do
consenso neoliberal.
No bojo dessa reformas, as universidades ganham autonomia. A Universidade
Estadual de Montes Claros, recém-reconhecida e amparada pela lei, inaugura o processo de
interiorização, oferecendo o Curso Normal Superior numa lógica diferenciada das demais
graduações ofertadas pela instituição.
Escolhemos como locus da pesquisa os professores-alunos egressos do Curso
Normal Superior da Universidade Estadual de Montes Claros – UNIMONTES, devido à
relevância, abrangência e tradição dessa instituição, principal formadora de professores do
norte de Minas. De 1999 a 2007, a UNIMONTES ofereceu o Curso Normal Superior na
modalidade licenciatura, com habilitações para as séries iniciais do Ensino Fundamental, no
sistema modular (objeto de nossa pesquisa) e regular, em conformidade com as orientações
explicitadas na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional.
Elegemos, como objetivo geral, discutir o processo de formação de professores
das séries iniciais do ensino fundamental no contexto histórico contemporâneo, com ênfase
nas mudanças instituídas pela Lei 9394/96 (Lei de Diretrizes e Bases), que recriou o Curso
Normal Superior. Especificamente, objetivamos: historiar o processo de formação docente
para as séries iniciais do Ensino Fundamental – na Europa a partir da Idade Moderna, e no
Brasil, com ênfase nos anos de 1990, discutir as possíveis influências, na educação brasileira,
das agências internacionais reguladoras instituídas pelo modelo neoliberal, caracterizar o
perfil dos professores-alunos egressos do Curso de Normal Superior da UNIMONTES – sede,
explicitado a partir de 1996, com as novas políticas de formação docente.
Para alcançar esses objetivos, houve a necessidade de investigar e pontuar algumas
questões mais específicas, que consideramos de fundamental importância. Diante da situação
criada pela LDBN, como o aluno egresso percebe a contribuição do Curso Normal Superior
para a sua prática profissional? O que determinou ao aluno procurar esse curso? Exigências
dos órgãos responsáveis pelo sistema de educação ou a iniciativa de aperfeiçoar a prática
docente, reconhecendo, nesse Curso, o caminho que lhe permitiria ter contato com estudos
desenvolvidos e reflexões acerca do papel da escola na formação de cidadãos?
18
Nessa perspectiva, tomamos como hipótese que a atual política para a formação
de professores, via Curso Normal Superior, instituída pela Lei 9394/96 (LDB), sob o discurso
de valorização e profissionalização do magistério, tem-se configurado como mero processo de
certificações e/ou diplomação, pouco contribuindo para o aprimoramento das condições do
exercício profissional dos professores-alunos egressos da UNIMONTES.
Para alcançar os objetivos propostos lançamos mão de uma abordagem
metodológica assim divida: no primeiro momento, organizamos um referencial teórico, com o
intuito de fundamentar a análise da formação docente no Brasil, imprimindo ênfase nas
mudanças instituídas pela nova LDB que recriou o Curso Normal.
Informações prévias sobre o campo de interesse específico advirão de
levantamento de dado de variadas fontes – Ministério da Educação – MEC, Instituto Superior
da Educação – ISE, Fundação de Amparo ao Ensino Superior do Norte de Minas –
FADENOR, resoluções e pareceres.
No segundo momento, abandonando a idéia de amostragem estatística, embora
reconhecendo sua utilidade para alguns tipos de pesquisa social, proceder-se-á a entrevistas
qualitativas, temáticas, utilizando como instrumento técnicas de gravação e entrevistas
semiestruturadas escritas, organizadas a partir de um tópico guia
2
(ANEXO A e B) com os
Gestores – GE, Docentes – DO e Discentes – DE do Curso Normal Superior da
UNIMONTES.
Segundo Gaskeall (2002):
O emprego da entrevista qualitativa para mapear e compreender o mundo da
vida dos correspondentes é o ponto de entrada para o cientista social que
introduz, então, esquemas interpretativos para compreender as narrativas dos
atores em termos conceptuais e abstratos, muitas vezes em relações a outras
observações (GASKELL, 2002, p. 65).
Entendendo que toda pesquisa com entrevista é um processo interativo e não
apenas um mero processo de informação, prevê a necessidade de novas questões no decurso
do processo.
As entrevistas, determinadas para o período de dezembro de 2009 a fevereiro de
2010, e com um contingente de 71 profissionais – 6 gestores, 16 docentes e 49 discentes de
diferentes núcleos onde o Curso foi oferecido pela Universidade, contou com a assinatura, de
2
Tópico guia é como sugere o próprio nome um norteador, de maneira que o entrevistador não se perca na
entrevista. Ou seja, um lembrete, conforme Gaskell (2002).
19
entrevistados, da Carta Cessão (ANEXO C), autorizando a utilização da entrevista
integralmente ou em partes, neste trabalho.
Para complementação da abordagem metodológica entre o primeiro e segundo
momento proposto na pesquisa, será utilizada a História Oral como técnica, resgatando a
memória e ampliando a possibilidade de diálogo.
Usá-la como técnica é um processo respeitável, mas subjacente a outras
fontes que são um caminho a mais, completar, para se atingir um objetivo
que por sua vez, depende de outros fatores que podem ou não ser
qualificados como fontes orais. Usar a história Oral como técnica equivale a
dizer que as entrevistas não se compõem como objetivo central e, sim, como
um recurso a mais (MEIHY, 2005, p. 51).
Os entrevistados deverão configurar atores capazes de refletir a realidade proposta
pela pesquisa, revelando-se participantes diretos da discussão.
A escolha dos entrevistados não dever ser predominantemente orientada por
critérios quantitativos, por uma preocupação com amostragens e, sim, a
partir da posição do entrevistado no grupo, do significado de sua
experiência. Assim, em primeiro lugar, convem selecionar os entrevistados
entre aqueles que participaram, viveram, presenciaram ou se interaram de
ocorrências ou situações ligadas ao tema e que possa fornecer depoimentos
significativos (ALBERT, 2005, pp. 31/32).
No terceiro e último momento, tornou-se necessário fazer a análise qualitativa das
entrevistas, na tentativa de comprovar as hipóteses e responder os problemas propostos.
No Capítulo I, foi contextualizada a formação de professores para a Educação
Básica no Brasil, na Europa, a partir do Estado Moderno, e no Brasil, desde seu período
colonial até os anos noventas.
No capítulo II focalizamos a importância da centralidade da formação dos
profissionais da educação, dentro de um processo maior de reestruturação produtiva
equacionada pelo modelo liberal e por organismos internacionais. Também identificar-se-ão
as concepções de educação e a qualificação para o magistério, subjacentes às diretrizes
estabelecidas na Lei 9394/96, que se refere à formação de professores para o Ensino
Fundamental no Curso Normal Superior. A análise será feita a partir dos autores Aguiar
(2002), Brzezinski (1999), Dourado; Paro (2001), Fidalgo (2008), Kisshimoto (1999),
Kuenzer (1998), Leher (1999), Saviani (2001), Schultz (1973), Tardif (2004), dentre outros.
O capítulo III, foi dedicado á uma retrospectiva do Curso Normal Superior da
Unimontes, partindo de uma análise documental fundamentada nas seguintes fontes: Curso
20
Normal Superior: Formação de Professores de 1ª a 4ª Série do Ensino Fundamental –
Emergencial 2000-2002 – Magistério das Séries Iniciais do Ensino Fundamental, Relatório
Final do Curso Normal Superior – Magistério das Séries Iniciais do Ensino Fundamental,
Termo de Convênio entre a Prefeitura Municipal de Montes Claros e Fundação de Apoio ao
Desenvolvimento de Ensino Superior do Norte de Minas (FADENOR)
3
, dados sobre os
professores da rede municipal da Secretaria Municipal de Educação de Montes Claros, leis,
regulamentos, normas e pareceres dos três níveis de Governo, referentes à temática em
questão.
No capítulo IV apresentarmos as entrevistas feitas com os gestores, professores da
UNIMONTES e professores-alunos, com o intuito de dialogar com o referencial teórico e
documentos analisados. Abordamos também a trajetória profissional dos professores-alunos e
a influência do Curso Normal Superior da Universidade na atuação profissional deles.
Finalmente, serão apresentadas nossas conclusões e possíveis respostas aos objetivos e às
questões que motivaram a pesquisa.
3
Convênio firmado com a intervenção da Universidade Estadual de Montes Claros.
CAPÍTULO I
FORMAÇÃO DE PROFESSORES: ANTECEDENTES HISTÓRICOS
A fixidez e a evidência com que as ortodoxias conceptuais (...) se nos
apresentam tendem a obscurecer os processos históricos, mais ou menos
longos e quase sempre contraditórios, da sua constituição. A reflexão crítica
sobre elas não pode, pois, deixar de começar pelo desvelamento da sua
historicidade (BOAVENTURA SANTOS, 2008).
Atentos ao que nos indica o professor Boaventura Santos, na epígrafe, o que
vamos expor nesse capítulo visa subsidiar a discussão acerca das políticas educacionais
públicas de formação de professores. Julgamos importante evidenciar as políticas
educacionais de formação de professores dentro de um contexto histórico geral, para se
observar a concomitância entre a sua ordenação e a do sistema político-social. Essa sincronia
não deve ser vista apenas como simples paralelismo entre fatos da educação e da história. Na
verdade, fica evidente que muitas questões educacionais são geradas nas relações que os
homens estabelecem, ao produzir sua existência. Portanto, as políticas públicas educacionais,
a partir do momento em que são imperiosamente ordenadas pelo Estado, tornam-se elementos
ideológicos úteis para a concretização dos objetivos das classes dirigentes. Daí a importância
de refazermos a trajetória da formação docente como forma de descobrir as relações de poder
e os entraves que delas resultam, para reorientar a ação.
Objetiva-se, por meio da história da educação, analisar os fundamentos teóricos
que motivaram a criação da escola normal pública como espaço de formação de professores,
com a demanda das chamadas escolas de primeiras letras. Dessa forma, este primeiro capítulo
buscará historiar o processo inicial da escola normal e compreender os fundamentos teóricos
da organização e a afirmação dessa instituição, inserindo-se nas circunstâncias políticas,
econômicas e religiosas do período em questão.
Em termos metodológicos, utilizamos da literatura disponível para compreender a
trajetória da formação docente, buscamos conhecer a historiografia e autores pertinentes ao
tema e para tanto elegemos as seguintes questões: Como a Escola Normal pública se
consolidou como lócus de formação docente no século XVIII? Qual o papel dessa instituição
escolar no contexto do Estado capitalista moderno? Ao longo das reformas educacionais
22
brasileiras, como a Escola Normal pública se firmou como proposta política voltada para a
formação de professores?
1.1 A Institucionalização da Escola Pública Moderna
Os acontecimentos históricos do século XVI, notadamente a Reforma Protestante
e a Contra-Reforma católica, fomentaram mudanças na formação de professores, na
institucionalização da escola pública e no papel a ser desempenhado pelo novo Estado
burguês.
Preocupada em adotar medidas concretas no instante em que os movimentos de
Reforma passaram a questionar seriamente o corpo doutrinário e a ameaçar o poder político-
econômico do clero, a Igreja Católica realizou o Concílio do Trento (1545 a 1563), marcado
pela defesa do monopólio da Igreja sobre a educação e condenação das mudanças culturais.
Também favoreceu a criação de ordens religiosas com o duplo escopo: posicionar-se frente às
críticas protestantes e catequizar países do Novo Mundo.
O movimento católico foi, então, reforçado pela estruturação da Companhia de
Jesus, fundada por Inácio Loyola em 1540, dentro do contexto exposto. A Companhia de
Jesus foi a ordem religiosa que consolidou as decisões da Contra-Reforma, ao desenvolver um
sistema orgânico de instrução firmado em escala mundial. De acordo com Ponce (1989),
(...) especializados, sobretudo no ensino médio, os jesuítas conseguiram de
tal forma realizar os seus propósitos que, desde os fins do século XVI,
ninguém se atreveu a disputar à Companhia de Jesus a hegemonia
pedagógica que a igreja havia conquistado. Essa época corresponde aos
tempos áureos da monarquia absoluta e podemos compreender porque,
durante longo tempo em que a pequena e média burguesia tivera de conter as
suas impaciências, esteve nas mãos dos jesuítas a educação dos nobres e da
alta burguesia (PONCE, 1989, p. 112).
No campo pedagógico, os padres jesuítas inauguraram uma cultura escolar
voltada para a constituição de sujeitos neutros, esvaziados de qualquer conteúdo libertador
adaptados às novas exigências da sociedade (DURKHEIM, 1995). Passaram a ensinar o latim,
que logo se tornou a língua do saber da elite, favorecendo a categorização e o ordenamento do
novo mundo.
23
A Revolução Científica, do século XVII, cujas origens remontam ao movimento
renascentista (séculos XIV – XVI), permitiu às novas forças sociais emergentes (Estado e
burguesia), a busca de inovadoras referências culturais, baseada no domínio da ciência, no
processo de transição feudo-capitalista.
Sendo assim,
iluministas europeus, ao preconizarem a tolerância religiosa, acabaram por
oportunizar a grupos minoritários protestantes exercerem atividades ligadas
à educação. O interesse pela instrução popular intensificou o desejo de
promover a educação religiosa, assim como avanços na educação elementar
e na formação de professores (FERREIRA, 1993, p. 77).
Nesse contexto, marcado pela crítica à tradição, também a educação busca bases
naturais, não religiosas, a fim de se tornar instrumento adequado para a difusão de valores
burgueses. Nem sempre alcançado nas escolas, esse ideal é defendido com vigor na obra de
literatos, filósofos e pedagogos.
Três movimentos tornaram-se significativos no processo da condução da instrução
popular (ANGOLA, 2008). O primeiro, criado por S. João Batista de La Salle, em 1684,
através das Escolas Cristãs, dedicava-se ao ensino gratuito de crianças no ensino elementar e a
disseminação de princípios cristãos necessários para a vida social (GADOTTI, 2006).
O segundo movimento foi influenciado pelos filósofos e pedagogos Wihelm Von
Humboldt (1767 – 1835) e Johann Gottlieb Fichte (1762 – 1814), pensadores protestantes que
acreditaram ser possível cuidar da alma do povo, através da organização de um sistema de
educação que atendesse todas as crianças (GADOTTI, 2006).
O terceiro, marcadamente influenciado pela reação conservadora do Congresso de
Viena (1814 – 1815), tratava a educação como forma de estabelecer valores religiosos,
nacionalistas e militares. Em 1830 foi criada a Volksschule para os filhos do povo e escolas
preparatórias do ensino secundário para os filhos da classe dirigente (GADOTTI, 2006).
Nesses cenários, abrem-se espaços para os primeiros fundamentos dos sistemas
públicos de formação.
24
1.2 A Formação Histórica da Escola Pública e da Escola Normal
A organização social do Antigo Regime foi cedendo espaço para um novo ator
social na Europa Moderna: a burguesia. Porém, as escolas doutrinárias religiosas não
correspondiam às aspirações burguesas.
O Estado liberal capitalista, que tinha no iluminismo seus alicerces fundantes,
tornou o individualismo, defendido por John Locke (1652 – 1704), parte da ordem social
instituída pela nova classe, marcada pela existência de relações mercantis e pela competição
entre indivíduos autônomos. Além de Locke, no momento histórico em questão temos forte
influência de pensadores como Voltaire, Diderot, Rosseau, Montesquieu, Adam Smith, entre
outros. Nesse contexto, a educação estatal tornou-se mecanismo significativo de coerção. Os
contratualistas John Locke e Jean Jaques Rosseau voltaram-se para a organização da educação
profissional no mundo moderno. As idéias de organização do chamado Estado Moderno, por
vezes, mostraram-se divergentes, enquanto Thomas Hobbes (1588 – 1679) falava em
subordinação da igreja às necessidades do Estado, John Locke defendia a separação entre
Igreja e Estado. Locke indagava sobre a utilidade do latim para os homens que vão trabalhar
nas fábricas. Para eles estes, talvez o melhor fosse aprender mecânica e cálculo. A educação
da nobreza e do clero era voltada para a humanidade.
A pedagogia realista contrapunha-se ao formalismo humanista pregando a
superioridade do domínio do mundo exterior sobre o domínio do mundo
interior, a supremacia das coisas sobre as palavras. A educação humanista
vai cedendo espaços à educação científica. O conhecimento só possuía valor
quando preparava para a vida e para a ação (GADOTTI, 2006, p. 78).
Embora o pensamento liberal de Locke se apresente como democrático, é
inevitável encontrar entre sua raiz o elitismo que o distingue como expressão da burguesia.
O pensamento Lockeano, voltado para interesses burgueses, coloca o
gentleman”, o gentil homem, como centro das suas reflexões, apontando-o como modelo
ideal a ser seguido pelas classes dirigentes, para o qual tem-se um curriculum baseado na
autonomia e nas virtudes sociais. Aparece a figura do preceptor, responsável pela construção
de valores morais, sobretudo por meio de exemplo. Ao criticar o racionalismo de Descartes
4
,
Locke desenvolve uma concepção da mente infantil e da educação. Salienta o papel do mestre
4
René Descartes (1596 – 1650) escreveu o famoso Discurso do Método (1637), mostrando os passos para o
estudo e a pesquisa, criticou as ideias medievais e propôs a matemática como modelo de ciência perfeita.
25
ao proporcionar experiências significativas, que proporcionem à criança o uso correto da
razão. Mostra-se severo, quando se trata de criança em idade mais tenra, com o objetivo de
submetê-la à vontade dos adultos e de tornar-lhe o “espírito dócil e obediente”.
Para Locke, o propósito maior da educação deve ser a formação do caráter, muito
mais significativa que a formação apenas intelectual, embora esta não deva ser descuidada.
Propõe o tríplice desenvolvimento físico, moral e intelectual, característico do “gentleman”, o
gentil homem. Para tanto, aconselha escolher com acuidade os preceptores, que dentro de casa
cuidarão da educação da criança, evitando-se a escola, onde a criança poderia não ser bem
acompanhada ou vigiada.
Razão, experiência, autonomia ocupam o lugar da religiosidade e do misticismo.
Universalidade, individualidade e autonomia são temas de um projeto civilizável iluminista.
Todas essas transformações contribuíram tanto para a re-elaboração do pensamento
pedagógico quanto para o redimensionamento dos métodos educacionais, agora livres de
dogmas religiosos. O declínio da tradição eclesiástica favoreceu a introdução de conteúdos de
base científica e profissionalizante.
A burguesia, ao defender novos valores e novas ideias, passou a conduzir as
transformações sociais, político-econômicas, tornando a educação um elemento fundamental
para a universalização de sua consciência. No campo pedagógico, passou a contratar
preceptores, capazes de instruírem seus filhos dentro de uma nova lógica voltada para a
produção e comércio
5
. Esses novos mestres inserem-se numa situação jurídico-social,
introduzindo uma relação notadamente mercantil ou burguesa.
Para Gadotti (2006):
Os séculos XVI e XVII assistiram à ascensão de uma nova e poderosa classe
que se opunha ao modo de produção feudal, esse estrato da sociedade
impulsionou, modificou e concentrou novos meios de produção. Iniciou o
sistema de cooperação, precursor do trabalho em série do século XX.
O homem lançou-se ao domínio da natureza desenvolvendo técnicas, artes,
estudos matemáticos, autonomia, ciências físicas, geografia, medicina,
biologia. Tudo o que foi ensinado até então era considerado suspeito
(GADOTTI, 2006, p. 76).
5
O século do absolutismo favorece a formação no campo educativo de duas diferentes estruturas organizacionais
de instrução. A educação dos nobres realizou-se através de preceptores particulares, cujo objetivo era a formação
intelectual e de hábitos e atitudes por meio de um currículo baseado nas línguas modernas, ciências e em
atividades de vida prática. A educação do povo foi confiada à igreja, cujo objetivo essencial era ensinar a ler e
escrever (CAMBI, 1999, p. 296).
26
A pedagogia humanística propicia uma significativa renovação na cultura escolar,
introduzindo novos programas e métodos de ensino.
A dignidade humana, concebida por Johann Heinrich Pestalozzi
6
(1746 – 1827),
estabelece aos mestres o dever de valorizar a natureza da criança no seu duplo sentido:
considerar a sua tenra idade e de educar cada criança de acordo com a sua índole. “O
humanismo pedagógico condenava castigos corporais e procurava oferecer diferentes
experiências de aprendizagem: artes, música, atividades físicas” (CAMBI, 1999, p. 330).
O pensamento dos educadores, Jan Amos Komenski – Comenius (1592 – 1670) e
Wolfoano Rafkle (1571 – 1635) contribuiu para, na segunda metade do século XVII, a
organização das escolas comuns na Alemanha. Buscando concretizar o ensino científico, a
formação deveria compreender os aspectos humano, cósmico e metafísico. Deveria acontecer
por parte do Estado uma rigorosa supervisão das atividades escolares, bem como o
estabelecimento da frequência obrigatória. Em consonância com esses educadores, tal ensino
permitia ao aluno um vasto conhecimento; e ao professor, uma forma rápida e segura de
ensinar. Esse é o empenho de toda a vida de Comenius.
Comenius, considerado o maior educador e pedagogo do século XVII (ARANHA,
1996), produziu uma obra fecunda e sistemática, cujo principal livro é Didática Magna.
Tornou-se um dos maiores reformadores sociais da sua época, em que emerge das camadas
populares a necessidade de acesso às escolas, em decorrência dos pressupostos iluministas.
Em consonância com o espírito do seu tempo, Comenius quis “ensinar tudo a
todos”, atingir a pansofia, isto é, sabedoria universal, sem que isso se traduzisse em erudição
vazia. Fruto de sua época, a serviço dos interesses da sociedade burguesa emergente, mesmo
não reconhecido de imediato, teve suas idéias difundidas na Europa por muito tempo após sua
morte. Não se pode esquecer que o forte engajamento religioso e civil orientado para uma
significativa reforma nutrida por um conceito plurilateral de formação, emanada de sua obra e
que auxilia no entendimento de seu projeto educativo com a intenção de difundir
conhecimentos para formar progressivamente o cidadão ideal, ainda hoje é muito atual nos
currículos das escolas brasileiras (RODRIGUES, 2006).
Para ele, o complemento de sua pansofia é a aspiração democrática do ensino, ao
qual todos teriam acesso, “desconsiderando o fato de que nem todos estão aptos a aprender
todos os conhecimentos da mesma forma, tendo em vista as diversas diferenças existentes
6
Pestalozzi (1746 – 1827) educador suíço, queria a reforma da sociedade através da educação das classes
populares (...) Sustentava que a educação geral devia proceder a profissional, que os poderes infantis brotavam
de dentro e que o desenvolvimento precisava ser harmonioso (GADOTTI, 2006, p. 91).
27
entre os indivíduos” (RODRIGUES, 2006, p. 40). Ao contrário de Locke, que defende uma
formação diferenciada para os que irão governar, Comenius defende a universalização da
educação. Percebe-se, com essas referências, o aspecto inovador do pensamento de Comenius.
No século XVII, a Europa ainda se debate nas consolidações advindas da
permanência de características feudais em um mundo que se constrói com os valores
burgueses. Essas contradições repercutem na educação. Por um lado, existe a aspiração de
uma pedagogia realista e, em alguns casos, até universal. Por outro, de maneira geral, as
escolas permaneciam oferecendo um ensino conservador.
O século XVII ainda estava bastante voltado para a formação do “gentleman”, do
honnête homme”, do cortesão, modelo de uma nobreza aburguesada (ou de um burguês que
desejava ser fidalgo). Na realidade, na educação percebe-se um dualismo, que vai
caracterizar-seclaramente no século seguinte.
Enquanto na Europa se estabelecia a contradição entre o ideal da pedagogia
realista e a forma conservadora, no Brasil, assim como em outras áreas coloniais portuguesas,
a atuação da Igreja foi muito mais forte e duradoura.
A nova ordem capitalista, no século XVIII, gerou protestos contra o monopólio da
Igreja sobre a educação, sobretudo contra os jesuítas. A primeira ação contra a Companhia de
Jesus foi desferida por Pombal, ministro do rei de Portugal, que em 1759 suprimiu a
Companhia de Jesus, expulsando-a das áreas portuguesas e confiscando seus bens. Seguiram-
se atitudes semelhantes na França (1763)
7
, Espanha (1767) e Áustria. Por fim, em 1773, o
Papa Clemente XIV extingue a Companhia de Jesus. Com esse acontecimento, o sistema
escolar sofre uma desestabilização, porque os jesuítas possuíam muitas escolas, além de terem
sido responsáveis de, por longo período, formar professores e disciplinar alunos.
A laicidade dos processos formativos configurou o mundo moderno e contribuiu
para que a educação se tornasse elemento definidor da vida social, contribuindo para o
estabelecimento de classes e grupos.
O Estado capitalista tomava para si o papel de formar trabalhadores ordeiros,
patrióticos imbuídos de espírito nacionalista e com condutas voltadas para a formação de mão
de obra especializada. Esse mesmo papel seria retomado em diferentes momentos históricos,
inclusive nos anos de 1990, e será objeto de reflexão no capítulo II desta dissertação.
7
Em 1763, Voltaire e Louis Renë de Chantolais exigiram que o ministro da França seguisse o exemplo do
Marquês de Pombal, logo depois ações semelhantes foram tomadas por autoridades da Espanha, Parma e
Áustria.
28
Embora surja novo tempo, o ideal liberal não consegue sanar algumas
dificuldades prementes: escolas insuficientes para atender à demanda, mestres sem
qualificação adequada. Mal remunerados, os professores permaneciam em sua atividade até
arrumar outra melhor. Com formação deficiente, tinham dificuldades em disciplinar as classes
e ainda abusavam da prática de castigos corporais.
Arroyo (2000, p. 42), falando dos tempos atuais, atesta que as condições acima
descritas ainda fazem parte da realidade da docência do Ensino Básico. As condições
precárias de trabalho, os péssimos salários, a falta de estabilidade, a condição de aulista, o
fraco ambiente cultural das escolas, a duplicidade de turmas de docência e ainda o trabalho
doméstico não apenas limitam a qualidade da docência, como ainda impossibilitam a
necessária e esperada autoformação.
O novo momento histórico teve como desdobramento uma organização das
primeiras instituições responsáveis para formar o professor: as escolas normais. Absorta nas
mudanças sociais e econômicas, a burguesia viu na criação dessas instituições responsáveis
para formar o professor um elemento importante na consolidação das relações de produção
capitalista. A ideia de formar professores em instituições específicas, mantida pelo Estado
Moderno, que tenha tido suas origens durante a Revolução Francesa, tornou-se possível a
partir do século XIX, período que se estabeleceu a relação entre ordem social e educação. A
constituição de um ensino público tornou-se estratégico para garantir a uniformidade nacional
e a legitimação ideológica burguesa. A educação passou a ser utilizada para divulgar valores
próprios burgueses: igualdade perante as leis, a fraternidade como consenso entre duas partes,
propriedade privada e democracia. Ao mesmo tempo, contribuiu com a finalidade de formar o
povo para exercer a sociabilidade, obediência, civismo e civilidade.
A consolidação desse projeto burguês afasta a educação de seu compromisso com
a superação do estado geral de injustiça social, da formação de cidadãos atuantes, capazes de
participar politicamente, utilizando-se daquilo que o homem histórico produziu. A educação
configura-se como importante elemento na mediação da produção e da reprodução da
sociedade. A estabilidade do processo de formar professores torna-se fundamental para a
consolidação dos preceitos burgueses.
Contraditoriamente, a burguesia amparada pelos teóricos do laisser-faire que
defendiam uma menor participação do Estado na economia, são “ao contrário, favoráveis à
sua intervenção no ensino” (PETITAT, 1994, p. 142).
Essa realidade, marcada pela conivência entre a burguesia e a educação escolar no
sentido de aquela exercer manipulação objetivando atender seus interesses, foi duramente
29
criticada por Marx, que entendia que “a classe burguesa não possui os meios nem o desejo de
oferecer ao povo uma educação verdadeira” (MARX; ENGELS, 1978, pp. 73 – 74).
O pensamento marxista ao propor a superação do Modo de Produção burguês,
permite-nos inferir “a necessidade de superar as instituições escolares como instâncias que
medeiam a apropriação do conhecimento em vista do privilegiamento de determinada classe,
ou mesmo de condenação às partes restritivas em torno da educação da classe trabalhadora”
(ARAÚJO, 2005, p. 54).
Embora Marx e Engels não tenham elaborado exatamente uma teoria educacional,
sua crítica se faz contemporânea, deixando claro que o marxismo ainda tem muito coisa a
dizer sobre a educação aventada neste início do século XXI.
Ainda que no século XVIII o estado capitalista tenha assumido a
institucionalização da educação, o poder religioso não foi inteiramente suplantado,
continuando a fazer parte da educação.
Nesse contexto, formar um professor significava formar um indivíduo capaz de
transmitir bens culturais, garantir a construção identitária nacional e, ao mesmo tempo,
instrumentalizá-lo para manter os indivíduos sob o controle do Estado. Com base nessa visão,
os Estados capitalistas passaram a constituir e estruturar seus sistemas de instrução pública.
Entendemos que a História do Brasil no século XVI não pode ser desvinculada
dos acontecimentos da Europa, já que a colonização resultou da necessidade de expansão
comercial da burguesia enriquecida com a Revolução Comercial. Assim, dado o grande
volume de informações e o extenso recorte de tempo escolhido, preferimos analisar o
processo de formação de professores no Brasil (da colônia aos anos de 1980) em item
separado da história europeia.
1.3 A Formação de Professores no Brasil: primeiros tempos
Refletir acerca da formação atual de nossos professores requer que vislumbremos
primeiramente o contexto histórico de sua formação, no Brasil.
Cumpre ressaltar que o item 1.3 do Capítulo I procurará apresentar uma síntese da
evolução do ensino normal, da perspectiva da ação do Estado e da política educacional por ele
desenvolvida. Isso não significa que se subestimem as novas abordagens, objetos e temáticas
hoje discutidos. Essa é a síntese por nós escolhida e julgamos que ela contribui para a atual
30
discussão sobre a formação de professores, tendo em vista a historiografia específica sobre o
tema.
No Brasil, a ação educativa colonial sempre esteve relacionada à organização
social e ao conteúdo cultural transportado da Europa. A organização social consistia na
predominância de uma minoria de donos de grandes propriedades e de escravos. Apenas a
eles cabia o direito à educação e, mesmo assim, em número restrito, porquanto estavam
excluídos dessa minoria as mulheres e os filhos primogênitos. Aos filhos se reservava a
direção dos futuros negócios do pai.
Do conteúdo cultural foram portadores os padres jesuítas e outras ordens que
colaboraram efetivamente no processo de colonização do Brasil.
A chegada dos jesuítas ao Brasil, em 1543, veio atender a determinações do Rei
de Portugal e a autoridades eclesiásticas católicas envolvidos na Contra-Reforma. O plano
iniciava-se com o aprendizado do português pelos indígenas, sem jamais perder de vista o
objetivo prático da ação jesuítica no Novo Mundo: a de recrutar fiéis e servidores.
A promulgação do Ratio Studiorum
8
, em 1599, deu início a uma segunda fase,
que visava ofertar aos filhos dos colonos uma educação universalista e elitista:
E foi com esta característica que ela se firmou durante o período em que
estiveram presentes no Brasil os seus membros e também com essa mesma
característica que ela sobreviveu à própria expulsão dos jesuítas, ocorrida no
século XVIII. Dela estava excluído o povo e foi graças a ela que o Brasil se
“tornou, por muito tempo, um país da Europa”, com os olhos voltados para
fora, impregnado de uma cultura intelectual transplantada, alienada e
alienante. Foi ela, a educação dada pelos jesuítas, transformada em educação
de classe, com as características que tão bem distinguiam a aristocracia rural
brasileira, que atravessou todo o período colonial e imperial e atingiu o
período republicano, sem ter sofrido, em suas bases, qualquer modificação
estrutural, mesmo quando a demanda social da educação começou a
aumentar, atingindo as camadas mais baixas da população e obrigando a
sociedade a ampliar sua oferta escolar, era natural que assim fosse, por que
esse tipo de educação veio a transformar-se no símbolo da própria classe,
distintivo desta, fim, portanto, almejado por todo aquele que procurava
adquirir status (ROMANELLI, 2001, pp. 35/36).
Quando o primeiro governador geral, Tomé de Souza, chegou ao Brasil, em 1549,
acompanhado por diversos jesuítas, fundou, na cidade de Salvador, uma escola “de ler e
escrever”. É o início do processo de criação de escolas elementares, secundárias, de
8
Ratio atquee Institutio Studiorum significa “Organização e plano de estudos”, trabalho publicado em 1599 pelo
padre Aquaviva. Obra cuidadosa, com regras práticas sobre a ação pedagógica, a organização administrativa e
outros assuntos, destinava-se a toda a hierarquia, desde o provincial, o reitor e o prefeito dos estudos até o mais
simples professor, sem se esquecer do aluno, do bedel e do corretor (ARANHA, 1996, p. 128).
31
seminários e missões. O magistério era exercido pelos padres-professores preparados pela
ordem para exercer tanto a função evangelizadora como a função educadora, garantindo um
ensino que pregava a ordem, o rigor, a disciplina e o autoritarismo. O ensino era baseado na
cultura europeia, enciclopedista e refinada. Para os jesuítas, o principal objetivo era a
formação do homem burguês, descurando a formação das classes populares. Seu fundador,
Inácio de Loyola (1491 -1556).
Essa organização, na condição de magistério oficial e público, permaneceu
durante dois séculos, sendo liderada pela Companhia de Jesus, ordem religiosa detentora de
significativa riqueza durante seu período de dominação. Os jesuítas tomaram para si o papel
de ensinar meninos brancos e catequizar as populações indígenas. Negros e meninas se viam
fora do processo, confirmando o caráter elitista. A Companhia de Jesus, durante os dois
séculos em que esteve responsável pela educação no Brasil-colônia, criou dezessete colégios
secundários e duas centenas de escolas primárias (ARANHA, 1996; RIBEIRO, 2003).
Estudos superiores eram oferecidos por meio dos cursos de filosofia e teologia. O
currículo filosófico compunha-se das seguintes disciplinas: 1º ano: lógica e introdução às
ciências; 2º ano: cosmologia, psicologia, física e matemática; 3º ano: psicologia, metafísica e
filosofia moral. O currículo teológico era previsto para durar quaro anos; estudava-se teologia
escolástica e moral (CUNHA, 1980; SAVIANI, 2007).
Sebastião José de Carvalho e Melo, o Marquês de Pombal
9
, influenciado pelas
ideias iluministas, subordinou organismos sociais e políticos coloniais ao poder central,
expulsou os jesuítas, fundou o Colégio dos Nobres (1761) e estabeleceu o decreto da reforma
dos estudos menores (1759) e maiores (1763). A expulsão dos padres jesuítas, a falta de
recursos e a escassez de mestres capazes de substituí-los causaram profundas consequências
no trabalho educativo até o período imperial. Para Azevedo (1958), tal fato não significou
apenas uma reforma de ensino, mas a significativa destruição de todo o sistema colonial do
ensino jesuítico.
Não foi um sistema ou tipo pedagógico que se transformou ou substituiu por
outro, mas uma organização escolar que se extinguiu sem que essa
destruição fosse acompanhada de medidas imediatas bastante eficazes para
lhe atenuar os efeitos ou reduzir sua extensão (AZEVEDO, 1988, p. 47).
9
Aclamado rei de Portugal em 1750, Dom João nomeou Sebastião José de Carvalho, Marquês de Pombal, como
Ministro responsável pela Secretaria do Exterior e da Guerra. Bastante influenciado por Maria Tereza da Áustria,
na linha do despotismo esclarecido, empreendeu a reforma da instrução pública, submetendo-a ao Estado e
afastando-a da influência da igreja.
32
O Marquês de Pombal só deu início à reconstrução do ensino uma década mais
tarde, provocando o retrocesso de todo o sistema educacional brasileiro.
Em substituição, o Marquês de Pombal instituiu o Alvará de 28/06/1759, criando
o Cargo de Diretor Geral dos Estudos e “aulas régias” constituídas da retórica, latim e grego.
Os professores eram nomeados pela Coroa e remunerados pelas Câmaras
Municipais com recursos advindos do “subsídio literário”, tributo variável de acordo com
cada vila ou cidade.
Antes mesmo que se fundassem as primeiras instituições destinadas a formar
professores laicos para as escolas primárias, já havia preocupações no intuito de selecioná-los.
Iniciativas relacionadas à seleção não somente antecedem as de formação, mas permanecem
concomitantemente com estas, uma vez que, criadas as escolas normais, essas seriam por
muito tempo insuficientes, quer numericamente, quer pela incapacidade de atrair candidatos,
para preparar o pessoal docente para as escolas primárias. Ressalte-se, por exemplo, o Alvará
de 6/11/1772, que institucionaliza os exames a que deviam ser submetidos os professores do
ensino elementar em Portugal e áreas coloniais.
I. Ordeno: que os exames dos mestres que forem feitos em Lisboa; quando
não assistir o presidente na presença de um deputado, com dois
examinadores nomeados pelo dito presidente, dando seus votos por escrito
que o mesmo deputado assistente entregará com a informação do tribunal.
Em Coimbra, Porto e Évora (onde só poderá haver exames), serão feitos na
mesma conformidade por um comissário e dois examinadores, também
nomeados pelo presidente da mesa; os quais remeterão a ela os seus
pareceres, na sobredita forma; nas Capitanias do Ultramar se farão exames
na mesma conformidade. Sempre de tudo será livre aos opositores virem
examinar-se em Lisboa, quando declararem que assim lhes convém. II.
Ordeno: que o sobredito provimento de mestres se mandem afixar editais nos
reinos e seus domínios para a convocação dos opositores aos magistérios. E
que assim se fique praticando no futuro em todos os casos de cadeiras
(MOACYR, 1936, p. 24).
Com a transferência da família real portuguesa para o Brasil, o país passa por
significativas transformações no setor intelectual. No âmbito educacional propriamente dito, a
instalação da família real no Brasil favorece a construção de um sistema único de ensino, à
adoção de métodos unificadores, para que a pluralidade de formação (na igreja, família, em
preceptores particulares etc.) pudesse ser única. No entanto, o sistema de ensino era incipiente
,e foi somente a partir de 1827, com a implantação da Lei Geral de Ensino, única
regulamentação do ensino elementar até 1946, que houve uma organização docente no Brasil.
“Esta [lei] era (...) onde estavam presentes as ideias da educação como dever do Estado, da
33
distribuição racional por todo o território nacional das escolas dos diferentes graus e da
necessária graduação do processo seletivo (...)” (RIBEIRO, 2003, p. 43).
Iniciativas mais significativas aconteceram com o Ato Adicional de 1834, que
passava para as províncias a responsabilidade pela organização dos sistemas de ensino
primário e secundário e a formação de seus docentes. Para tanto, passariam a existir no Brasil:
a) uma rede de aulas particulares e cursos preparatórios criados por iniciativa particular sem
estar submetida a imposições governamentais; b) aulas avulsas, com professores escolhidos e
pagos pelo governo, funcionando de forma autônoma do governo central, que, aos poucos,
seriam reunidas pelos governos provinciais recém-instituídos; c) uma descentralização do
sistema escolar primário e secundário, organizado pelas autoridades provinciais, não
necessariamente articulados com o ensino superior, este último de responsabilidade do
governo central; d) um sistema escolar primário e secundário organizado pelo governo central
em cada província independentemente do sistema já existente; e) a não obrigatoriedade de
passar por esses sistemas para ser admitido às faculdades de ensino superior.
Essas reformas estabelecidas pelo Ato Adicional de 1834 descentralizam o ensino,
atribuindo à Coroa a função de promover e regulamentar o ensino superior, enquanto às
províncias são destinadas a escola elementar e a secundária. Dessa forma, a educação da elite
fica a cargo do poder central, e a do povo, confiada às províncias.
Dentro do contexto, em 1835, cria-se a primeira Escola Normal Brasileira, em
Niterói, Rio de Janeiro, objetivando uma melhora na formação docente, sendo sua duração
constituída de dois anos em âmbito secundário.
Ribeiro (2003) tece uma crítica à Escola Normal, afirmando que os cursos
ministrados eram instáveis. Somente em 1880 os cursos passaram a ter três anos de duração.
A criação das Escolas Normais visava acabar com a improvisação da formação docente e com
a contratação dos professores que vinham atuando nas escolas primárias. Entretanto,
esbarraram na falta de professores habilitados para atuar na formação das normalistas.
A carência de professores habilitados não ficou restrita à realidade do século XIX.
“Faltam 270 mil professores de diversas áreas nas escolas do país, segundo dados do
Ministério da Educação (...)”
10
(BRASIL, 2010). Essa situação comprova ser este um
problema de ordem estrutural e não exclusivamente emergencial (FREITAS, 2007), pois
expõem como vem sendo historicamente retirada a responsabilidade do Estado na manutenção
de uma educação pública de qualidade e de formação de seus professores.
10
“MEC pode usar Ensino a Distância por falta de docentes”. Disponível em: <www.mec.gov.br>. Acesso em:
janeiro de 2010.
34
Freitas (2007) coloca o Curso Normal Superior, objeto de nossa pesquisa, como
parte das políticas implementadas pelo Estado para equacionar o grave problema da carência
de professores. A reflexão feita pela autora, e por nós compartilhada, é a de que muitos
programas (licenciaturas “rápidas”, Programa da Universidade Aberta) não “equacionarão a
escassez na direção de uma política de valorização da formação de professores” e que, ao
contrário, “aprofundarão o quadro de desprofissionalização pela flexibilização e aligeiramento
da formação” (FREITAS, 2007, p. 2007).
Tais informações são provocativas e fazem-nos pensar que questões do século
XIX ainda estão por ser verdadeiramente enfrentadas no século XXI.
Tendo em vista o despreparo do mestre e o descaso com a educação elementar, as
escolas normais foram instituídas aos poucos, principalmente no final do século XIX.
Villela (2003) nos lembra que, em 1845, o vice-presidente da Assembléia
Legislativa fluminense afirmava: “A nossa primeira necessidade é a instrução; não a instrução
concentrada em poucos, senão derramada por todas as classes”. (VILLELA, 2003, p. 51).
Discurso político, marcado pela retórica. A ideia premente, na época, era a utilização da
educação para conter os “bárbaros” que ameaçavam a ordem nacional. Tratava-se de garantir
a “civilidade”, assumindo a educação, desde já, um de seus papéis mais cruéis, que é a
reprodução de classes sociais. Retornariam, então, a consolidar a educação romana quando do
processo de conquista dos espanhóis: “As armas não tinham conseguido submetê-los a não ser
parcialmente; foi a educação que os domou” (BRANDÃO, 2002 apud GADOTTI, 2006, p.
97).
D. Pedro I, em 1824, outorgou a primeira Constituição do Império,
instituindo no início 32 do 179 do título VIII que a instrução primária seria
gratuita a todos os cidadãos e distribuída em quatro graus: 1º grau:
pedagogias; 2º grau: liceus; 3º grau: ginásio e 4º grau: academia (SAVIANI,
2007, p. 124).
Ao longo de todo o Império brasileiro, as políticas públicas tornaram-se campo de
contradições e conflitos. Uma das discussões prementes era se a formação do magistério seria
do ente federado ou das províncias. Nesse sentido, a Lei de 15/10/1827 consagra a instituição
do ensino mútuo no Brasil, dispondo em seu artigo 5º que “os professores que não tiverem a
necessária instrução deste ensino irão instruir-se em curto prazo e à custa de seus ordenados
nas escolas da Capital”.
Pouco resultou o estabelecimento dessa lei referente ao ensino de primeiras letras
e preparo de seus docentes. A criação das Escolas Normais Públicas só viriam, por iniciativa
35
das Províncias, logo após a reforma constitucional de 12/08/1834, que, atendendo aos
propósitos descentralizadores, conferiu às Assembleias Legislativas Provinciais, recém-
criadas, entre outras atribuições, a de legislar “sobre a instrução pública e estabelecimentos
próprios a promovê-la” (art. 10, item 2), com exclusão das já existentes escolas superiores e
demais estabelecimentos criados por lei geral.
Nesse contexto, desde a sua criação, as escolas normais brasileiras fizeram parte
dos sistemas provinciais. O modelo europeu seguido, mais especificamente o francês,
confirma o caráter transplantado de nossas instituições – sobre o qual muito se tem discutido -
a historiografia recente tem também apontado sua articulação com as contradições internas de
nossa sociedade. Assim, o grupo conservador utilizou-se da criação de Escolas Normais para
garantir a hegemonia de seu projeto político. Como afirma Villela (2003),
(...) somente pela compreensão desse projeto político mais amplo, de direção
da sociedade, é que foi possível entender que a criação da Escola Normal da
Província do Rio de Janeiro não representou apenas a transplantação de um
modelo europeu, mas que, pelo seu potencial organizativo e civilizatório, ela
se transformava numa das principais instituições destinadas a consolidar e
expandir a supremacia daquele segmento da classe senhorial que se
encontrava no poder.
A primeira Escola Normal brasileira foi criada na Província do Rio de
Janeiro, pela Lei nº 10, de 1835, que determinava:
Haverá na capital da Província uma Escola Normal para nela se habilitarem
as pessoas que se destinarem ao magistério da instrução primária e os
professores atualmente existentes que não tiverem adquirido necessária
instrução nas escolas de ensino mútuo, na conformidade de 15/10/1827
(VILLELA, 2003, p. 28).
“De curta duração (extinta em 1849), a primeira Escola Normal do Brasil formou
apenas 14 alunos, dos quais 11 se dedicaram às atividades docentes” (MOACYR, 1936, p.
199).
Nos anos que se seguiram à criação da primeira Escola Normal, a experiência se
repetiu em outras províncias. A verdade é que a Escola Normal foi marcada por uma trajetória
efêmera e atribulada, submetida a um processo constante de criação e extinção.
Tanuri (2000) salienta a falta de interesse da população pelo magistério, marcada
por fracos atrativos financeiros e pelo pouco apreço social de que gozava. Acrescenta ainda
que há necessidade de uma formação específica para a docência de primeiras letras. Todos
esses fatores contribuíram para o desanimador quadro da instrução pública provincial.
A partir de 1868/70, mudanças políticas, ideológicas e culturais repercutiram no
setor educacional. A ideia de que “um país é o que a sua educação o faz ser” generaliza-se,
36
fundindo-se com preceitos iluministas. A obrigatoriedade da instrução básica, a liberdade de
ensino em todos os níveis e a participação do poder central passam a ser debatidos com maior
intensidade.
Vale ressaltar que, no final do Império, as Escolas Normais, vistas como
prolongamento de atividades maternas, foram franqueadas às mulheres. O magistério era a
única profissão que conciliava as funções domésticas da mulher com o movimento em favor
de sua instrução. A docência feminina apresentava-se, também, como resposta para o
problema de mão de obra para a escola primária. Além disso, era considerada uma atividade
socialmente aceita, por se pensar que estava ligada à experiência maternal das mulheres –
novamente o aspecto artesanal da educação.
A maioria das mulheres do Império vivia em uma situação de completa
dependência e inferioridade, com remota possibilidade de instrução.
O final do II Império foi marcado por uma revalorização das Escolas Normais e
por uma discussão mais significativa da educação brasileira. A confirmar tal afirmativa,
podemos destacar: a) retorno das discussões acerca da criação de uma universidade no Brasil;
b) convocação do Primeiro Congresso Nacional de Educação para o ano de 1883; c) um
extenso tratado sobre a problemática educacional brasileira, redigido por Rui Barbosa; d)
discurso proferido por D. Pedro II em 3 de maio de 1889, que previa, dentre outros aspectos, a
criação de um Ministério da Educação.
No entanto, as tentativas de reforma ainda eram modestas em um país marcado
por contradições sociais e políticas, com uma economia agrária exportadora, que fazia as
primeiras tentativas de industrialização. Nesse cenário, debatem-se segmentos renovadores,
que aspiram aos ideais liberais e positivistas da burguesia europeia e as forças retrógradas da
tradição agrária escravocrata.
O ato da Proclamação da República, acontecido em 15 de novembro de 1889,
trouxe, junto com o ideal republicano, a ideia de democratizar a educação, estendendo-a a
todo o povo brasileiro. Entretanto, nada disso aconteceu.
Nem todas as metas estabelecidas pelos reformadores republicanos tornaram-se
realidade. Não se instalou a Escola Normal Superior, embora ela tenha permanecido na
legislação até 1920. Também os chamados cursos complementares não se instalaram com o
objetivo de integralizar o primário, mas com o sentido de preparar professores para as escolas
preliminares, mediante apenas o acréscimo de um ano de prática de ensino nas escolas modelo
(Lei nº 374, de 03/09/1895). O estabelecimento do curso complementar definiu um elo entre
37
escola primária e a normal, e o ingresso na última passava a exigir maiores requisitos de
formação.
No período subsequente à Primeira Guerra Mundial (1914 – 1918), estabeleceu-
se, em âmbito internacional e nacional, uma maior preocupação com a questão educacional. A
escola novista
11
inspirou, em maior ou menor grau, reformas do ensino primário e normal,
fornecendo elementos para uma revisão crítica das escolas normais existentes. No entanto, o
ensino universitário ainda não era uma prioridade, sendo que, somente
em 1920, data próxima as comemorações do centenário da independência,
foi criada a primeira universidade no Rio de Janeiro. Esse fato revela que o
ensino superior brasileiro além de ter surgido tardiamente apresentou como
aspecto marcante um caráter elitista, pois priorizou a formação de técnicos
indispensáveis à consolidação do Estado Nacional (ABREU, 2006, p. 14).
A Revolução de 1930, marco histórico de mudanças significativas em diversos
setores, impôs transformações também no campo educacional, aflorando velhas questões
vivenciadas na educação desde a expulsão dos jesuítas no Brasil. Percebeu-se a precariedade
das instituições escolares, assim como a necessidade de uma formação mais sólida para os
professores.
Para intelectuais e educadores, o crescente processo de industrialização iniciado
na Era Vargas demandava políticas educacionais que garantissem uma educação moderna,
capaz de incorporar novos métodos e técnicas e que permitisse a formação do perfil de
cidadania adequada a esse processo.
Azevedo (1994, p. 64) salienta que o “entusiasmo” pela educação sucede o
“otimismo pedagógico
12
”. Consolida-se, assim, a idéia de desdobramento dos estudos
propedêuticos e profissionais, e estabelecem-se dois passos significativos: o primeiro,
marcado pela criação dos estudos complementares, preparatórios ao normal; e, em alguns
estados, a divisão do curso normal em dois ciclos, um geral ou propedêutico e outro especial
ou profissional, ainda que nem sempre diferenciados.
11
A Escola Nova representa o mais vigoroso movimento de renovação da educação depois da criação da escola
pública burguesa. A ideia de fundamentar o ato pedagógico na ação, na atividade da criança, já vinha se
formando desde a “Escola Alegre” de Vitorino de Feltre (1378 – 1446). Mas foi só no início do século XX que
se tornou forma concreta e teve consequências importantes sobre os sistemas educacionais e a mentalidade dos
professores (GADOTTI, 2006, p. 142).
12
A tendência escolanovista costuma ser identificada com a expressão “otimismo pedagógico”, à medida que
seus divulgadores estão imbuídos da esperança de democratizar e de transformar a sociedade por meio da escola.
38
Na década de 1930, o Movimento da Reconstrução Nacional pela Educação,
através do Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova apontou a
necessidade de repensar a formação do magistério primário, com a
preparação nas escolas normais, uma vez que esse estabelecimento não
conseguia a contento, oferecer sólida preparação pedagógica, nem a
educação geral que deveria (AZEVEDO, 1994, p. 73).
As ideias defendidas pelo Manifesto dos Pioneiros ocasionaram novas e
significativas remodelações no âmbito da escola normal, destacando-se a reforma realizada
por Anísio Teixeira no Distrito Federal, pelo Decreto 3.810, de 19/03/1932. O Manifesto
argumentava que o Brasil estava avançando economicamente, mas a educação estava ficando
para trás. Como a formação docente deveria ocorrer nos cursos superiores, criaram-se os
Institutos de Educação, que substituíram as Escolas Normais.
Na justificativa que permitiu a criação da Escola de Professores, Anísio Teixeira
reforçou a ideia de que “nenhuma reforma, nenhum melhoramento de ordem essencial pode
se fazer em educação que não dependa, substancialmente, do mestre a que vamos confiar a
escola” (TEIXEIRA, 2000, p. 110).
Segundo Lopes (2006), Anísio Teixeira, ao estabelecer a Escola de Professores,
elevada a nível superior, com caráter nitidamente profissional, seletivo e vocacional,
consolidaria a base da cultura geral necessária ao professor para o desempenho de suas
funções.
Para Teixeira (2000):
Um alvo suplementar, mas igualmente indispensável seria o da formação do
magistério, tornando-se obrigatório que dentro dos cinco anos do plano, pelo
menos um décimo do professorado primário tivesse a formação completada
com dois anos de estudos em nível superior. Por outras palavras, a formação
do magistério primário se faria em duas etapas, atual de nível médio, para o
início de carreira, e dois anos complementares, de nível superior, para a sua
continuação e, exercício, depois de cinco anos probatórios. Esses dois anos
de estudo se faria em cursos regulares. De sorte que, tão depressa quanto
possível, pudesse o professorado contar, em cada dez professores de
formação média, com um de formação superior, que como supervisor, os
assistisse e guiasse nos variados trabalhos (TEIXEIRA, 2000, p. 109).
O Manifesto dos Pioneiros e a atuação de seus signatários vão marcar a evolução
do sistema educacional, nas décadas seguintes, e definir o conjunto de ideias e ações
utilizadas ou rechaçadas por Gustavo Capanema, ao longo de seus onze anos à frente do
Ministério da Educação.
39
Redigido por Fernando de Azevedo e assinado por mais de 26 educadores e
intelectuais, o documento dirigido ao povo e ao governo trazia a marca da diversidade teórica
e ideológica do grupo que o concebeu. Em comum havia a ideia de um programa de
reconstrução educacional em âmbito nacional e o princípio da escola pública, leiga,
obrigatória e gratuita.
O manifesto, a rigor, movia-se no âmbito de teorias diversas – Fichte e Dewey,
por exemplo, o que comprova sua ambiguidade teórica em sua formulação. Provocou reações
da direita católica e da alta hierarquia da igreja. A terminologia sociológica do documento,
que colocava a educação como ciência que propunha uma “escola socializada, pragmática
vinculada à vida do trabalho, substituindo a estrutura tradicional de classe por uma sociedade
meritocrática, devendo ser pública, laica e universal, soava como puro bolchevismo para a
Igreja Católica da época” (DIAS, 2010, p. 26).
Seguiram-se, por parte do Sindicato dos Trabalhadores do Ensino, denúncias da
despolitização das propostas da “Escola Nova”.
Nesse período também foram criadas diversas Faculdades de Filosofia, Ciências e
Letras para a formação do professor em grau superior.
Na vigência do Estado Novo (1937- 1945), durante a ditadura do Getúlio Vargas,
definiu-se o papel da educação no projeto de nacionalidade que o Estado esperava construir.
A Constituição de 1937 dedicou menos espaço à educação do que a anterior, mas o suficiente
para incluí-la em seu quadro estratégico, com o explícito objetivo de solucionar a “questão
social” ou combater a subversão ideológica.
Como todos os outros setores, a formação de professores primários também foi
atingida pelo estabelecimento do Estado Novo, ficando voltada para o desenvolvimento do
patriotismo, nacionalismo e tendo a União como elemento central, controlador da sua
organização, dos seus propósitos e dos conteúdos estabelecidos.
Capanema empreendeu reformas do ensino regulamentadas por diversos
Decretos-leis assinados de 1942 a 1946 e conhecidas como Leis Orgânicas do Ensino
13
. A Lei
Orgânica também regulamenta o curso de formação de professores. Embora as Escolas
Normais já existissem, pertenciam à alçada do Estado. Agora a lei propõe a centralização
nacional das diretrizes. Permanece, no entanto, a predominância de matérias de cultura geral
13
Vale destacar algumas dessas regulamentações por decretos-leis. Em 1942, a Lei Orgânica do Ensino
Industrial, a criação do Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (SENAI), a Lei Orgânica de Ensino
Secundário. Em 1943, a Lei Orgânica do Ensino Comercial e, em 1946, após a queda de Vargas, a Lei Orgânica
do Ensino Primário, a Lei Orgânica do Ensino Normal, a criação do Serviço Nacional de Aprendizagem
Comercial (SENAC), a Lei Orgânica do Ensino Agrícola.
40
em detrimento das de formação profissional, bem como o caráter rígido de avaliação. Com o
tempo, as Escolas Normais tornaram-se reduto das moças de classe média em busca da
“profissão feminina” (ARANHA, 1996).
O Decreto-lei nº 8530, de 02 de janeiro de 1946, concretizou os interesses pela
interdependência do ensino, uma antiga reivindicação da monarquia brasileira.
Mesmo em outro contexto histórico, pós-ditadura Varguista, a formação de
professores primários permaneceu com uma estrutura nacionalista, estabelecida pelas Leis
Orgânicas do Ensino Primário e Normal de 1946.
As Leis Orgânicas do Primário e do Ensino Normal determinaram as finalidades
da formação de professores, em âmbito médio: possibilitar a formação pessoal docente
necessária às escolas primárias, habilitar administradores escolares destinados às mesmas
escolas; propagar os conhecimentos e as técnicas relativas à educação da infância, ainda
determinou a criação dos institutos de educação que passaram a funcionar com o Curso
Normal, com o Jardim de Infância e escolas primárias anexos, e os Cursos de Especialização
de professor primário, pré-primário e habilitação de administradores escolares, em âmbito
pós-normal.
O Ensino Normal, estabelecido pela Lei Orgânica, pretendeu garantir a
uniformidade da formação de professores em todo o território nacional, unindo os mesmos
princípios e normas, conteúdos programáticos, métodos e processos didáticos. Isto nos
permite concluir que tal reforma, apesar de ter-se tornado realidade em um momento
caracterizado pela retomada da democracia, caminhava no sentido oposto, impondo um
modelo centralizado e uma emblemática subordinação dos Estados à União, impedindo,
também, qualquer tentativa de autonomia dos educadores da época.
Portanto, a Lei Orgânica do Ensino Normal oficializou como finalidades do
ensino normal:
1 – Promover a formação do pessoal docente necessários às escolas
primárias;
2 – Habilitar administradores escolares destinados às mesmas escolas;
3 – Desenvolver e propagar os conhecimentos e técnicas relativas à educação
da infância (ROMANELLI, 2001, p. 164).
Além das finalidades, foram definidos também currículos e estruturas dos cursos:
A Estrutura dos Cursos: Seriam cursos de dois níveis – de 1º ciclo como curso
de formação de regentes de ensino primário, com duração de 4 anos e funcionamento em
Escolas Normais Regionais; de 2º ciclo, dando continuidade aos cursos de formação de
41
professores primários, com duração de 3 anos, funcionando nas Escolas Normais. Instituíram-
se também, os Institutos de Educação, onde funcionariam, também, o chamado Jardim de
Infância e a Escola Primária, como anexos, e cursos de especialização e habilitação
administradora escolares.
Os Currículos: Foram estabelecidos pelo artigo 7º, com a mesma configuração
para todas as escolas normais, apresentando diferenças para os cursos de 1º e 2º ciclos, como
se pode ver no quadro abaixo:
QUADRO 01 – Currículo para o Ensino Normal 1º e 2º Ciclo
Currículo para o ensino normal de 1º ciclo
Currículo para o ensino normal de 2º ciclo
Português
Matemática
Geografia Geral
Geografia do Brasil
História Geral
História do Brasil
Ciências Naturais
Anatomia e Fisiologia Humana
Higiene
Educação Física
Desenho e Caligrafia
Canto Orfeônico
Trabalhos Manuais
Psicologia e Pedagogia
Didática e Prática do Ensino
Português
Matemática
Física e Química
Anatomia e Fisiologia Humanas
Musica e Canto Orfeônico
Desenho e Artes Aplicadas
Educação Física, Recreação e Jogos
Biologia Educacional
Psicologia Educacional
Higiene, Educação Sanitária e Puericultura
Metodologia do Ensino Primário
Sociologia Educacional
História e Filosofia da Educação
Prática de Ensino
Fonte: Dias (2003, p. 30).
Ao analisarmos os dois currículos, verificamos a predominância da disciplina de
formação geral sobre as de formação profissional, o que nos leva a crer que havia um
descuido em relação ao processo de formação do professor, já que se tratava de um curso de
caráter terminal e profissionalizante, uma vez que muitos de seus cursantes jamais retornariam
aos bancos escolares, pois a inflexibilidade dos currículos limitava o ingresso dos estudantes
apenas a alguns cursos das Faculdades de Filosofia.
Outros elementos dificultadores eram as exageradas provas e exames a que era
submetido o aluno, assim como a faixa etária inferior a 25 anos. Este último aspecto
dificultava a qualificação de grande parte dos professores leigos que atuavam no magistério,
trazendo mais um obstáculo para a adequação do quadro do magistério nacional.
Constatamos que essas Leis Orgânicas não sanaram as demandas do período
histórico marcado pela retomada da democracia. No entanto, foram utilizadas por duas
42
décadas, configurando uma situação de difícil solução, exigindo novas medidas e reformas
urgentes e acentuadas às discussões em torno da necessidade da elaboração de uma Lei de
Diretrizes e Bases para a Educação Nacional.
A primeira Lei de Diretrizes e Bases, promulgada em dezembro de 1961, foi
antecedida por calorosas discussões das correntes divergentes que a produziram.
Em 1960, a Lei de Diretrizes e Bases nº 4.024/61 – LDB não instituiu soluções
inovadoras para o Ensino Normal, mantendo as linhas mestras da organização anterior, quer
seja em termos de duração dos estados ou de divisão em ciclos. Porém, determinou a
equivalência legal de todas as modalidades de ensino médio, assim como, a descentralização
administrativa e as flexibilidades curriculares, rompendo com a padronização do currículo das
escolas normais. “A maior parte dos estados manteve o sistema dual, com escolas de nível
ginasial, com quatro séries no mínimo, e as de nível colegial, com três séries no mínimo”
(ROMANELLI, 2001, p. 171).
No que diz respeito ao aumento dos estudos e à elevação do nível de
formação do professor, começam a aparecer iniciativas favoráveis à
formação de professor primário em nível superior, neste sentido, é
importante destacar o primeiro Parecer do Conselho Federal de Educação
referente ao currículo mínimo do Curso de Pedagogia (Parecer CFE 251/62)
“deixa antever que nele se apoiarão os primeiros ensaios de formação
superior do professor primário”, prevendo a superação próxima do modelo
de formação em nível médio nas regiões mais desenvolvidas do país
(TANURI, 2000, p. 79).
Já o parecer CFE 252/69, que altera o já citado currículo mínimo, retoma essa
posição e garante também a possibilidade de exercício do magistério primário pelos formados
em Pedagogia, mesmo em cursos de menor duração que realizarem estudos em Metodologia e
Prática do Ensino Primário. Tal resolução acabou por embasar o movimento de remodelação
curricular dos cursos de Pedagogia, acontecido nos anos de 1980 e 1990, no intuito de
adequá-los à tarefa de preparar o professor para os anos iniciais de escolaridade.
No capítulo específico que trata da formação de professores para atuarem no
ensino primário, foi conferida aos estados autonomia, para estabelecerem sua própria política
de formação, de acordo com o estabelecido em Lei, mantendo o mesmo esquema de 1946 e
apresentando três diferentes níveis para esta formação: o nível ginasial, ministrado em escolas
normais de grau ginasial; o nível colegial, ministrado em escolas normais de grau colegial ou
Institutos de Educação e o nível pós-normal, considerando cursos de especialização de
43
professores primários e de formação de Administradores, Orientadores e Supervisores
Escolares para as escolas primárias, ministradas nos Institutos de Educação.
O estabelecimento dessa hierarquização dos sistemas estaduais de ensino,
adequando-os às particularidades regionais, permitiu uma desigualdade de preparo de
professores, sendo apontado como uma das fragilidades dessa lei.
Com a ditadura militar instituída em 1964, caracterizada por um governo
arbitrário, espalha-se na educação um caráter antidemocrático da proposta ideológica do
governo, marcada pela perseguição, demissão e prisão de inúmeros professores, invasão de
universidades, imposição curriculares, enfrentamento com estudantes. Muitos daqueles que se
colocaram contra o “tecnicismo militar” perderam seus direitos políticos, foram silenciados,
exilados ou mesmo banidos do universo oficial do ensino brasileiro. Paulo Freire é um
exemplo disso, ao propor uma pedagogia social revolucionária, antiautoritária, dialógica, e
enfim, uma educação cidadã.
Vale ressaltar que, na conjuntura histórica pós – 1964, a literatura educacional
desloca-se para aspectos internos da escola, voltando-se essencialmente para os
“instrumentos” destinados a “modernizar” a ação docente. Fica evidente o objetivo de garantir
“eficiência e produtividade” - a escola, operacionalizando a preparação para o trabalho, para o
modelo de desenvolvimento econômico vigente e principalmente para a segurança nacional
propalada.
As reformas acontecidas nos anos de 1960 e 1970 vincularam-se aos termos
precisos do regime militar instalado em 1964: desenvolvimento, ou seja, educação para a
formação de “capital humano”, vínculo entre educação e mercado de trabalho, modernização
dos hábitos de consumo, integração da política educacional aos planos gerais de
desenvolvimento e segurança nacional, defesa do Estado, repressão e controle político-
ideológico da vida intelectual e artístico do país.
Percebe-se, no âmbito da escola normal, uma alegada “descaracterização”
profissional dessas escolas, levando-se em conta o crescente desinteresse de seus egressos
pelo exercício do magistério. Muitas escolas normais e os próprios Institutos de Educação
funcionavam sem maior significação, dentro de um conjunto de cursos médios.
Duas significativas reformas alteraram o perfil educacional brasileiro: a do ensino
superior (Lei 5.540/68) e a do ensino básico (Lei 5.692/71). O Plano Decenal de
Desenvolvimento Econômico e Social (1967 – 77) foi a tônica dessas reformas, tendo como
objetivo propiciar condições para, através do fortalecimento do Estado, construir um modelo
de desenvolvimento extremamente favorável à entrada do capital estrangeiro, buscando
44
implantar uma infraestrutura voltada para tornar o Brasil uma potência econômica. Para isso,
era necessário controlar o crescimento dos movimentos sociais que ocupavam o cenário
nacional, criando um clima político-social de grande instabilidade, garantindo os interesses da
classe dominante nacional.
“A partir daí, desenvolve-se uma reforma autoritária, vertical, domesticadora, que
visa atrelar o sistema educacional ao modelo econômico dependente, imposto pela política
norte-americana para a América Latina” (ARANHA, 1996, p. 213).
A Lei 5.692/71, por meio das Diretrizes e Bases para o Ensino de 1º e 2º graus,
estabeleceu mudanças na legislação do ensino, inserindo a escola normal no contexto da
profissionalização obrigatória adotada para o segundo grau, transformou-a em Habilitação
Específica para o Magistério (HEM). Desta forma, desapareciam os Institutos de Educação, e
a formação de especialistas e professores para o curso normal passou a ser feita nos cursos de
Pedagogia.
Apesar do caráter flexível, integrado e progressivo adotado pela nova lei em
relação formação de professores, Gatti (1997, p. 10) ressalva que “pouco disto se concretizou
e muito se burocratizou pelas normatizações subsequentes, quer em nível federal, quer em
nível estadual”.
No que diz respeito ao currículo de Habilitação Magistério – HEMs, muitas foram
as críticas recebidas: dicotomia entre teoria e prática, entre conteúdo e método, entre núcleo
comum e parte profissionalizante, além da desvalorização da profissão. Entidades acadêmicas
e trabalhos sobre o tema são unânimes em apontar a “desmontagem”, o “vazio” e a
“descaracterização” sofrida pela escola normal no período, tendo levado inclusive a sua
“desativação” nos anos imediatamente posteriores à reforma, devido à baixa procura e o
fechamento de vários cursos (MELLO, 1985; GATTI, 1997).
A Lei 5.692/71, além de atender à realidade político-social inaugurada pelo Golpe
Militar de 1964, está também relacionada com os acordos MEC – USAID
14
, que reordenavam
a educação brasileira, a partir de três aspectos: educação e desenvolvimento
15
, educação e
segurança
16
, e educação e comunidade
17
. Esses três aspectos permitiram a construção de um
14
Diversos acordos, realizados a partir do golpe de 1964, só se tornaram públicos em 1966. São os acordos
MEC-USAID (Ministério da Educação e Cultura e United Satates Agency for Internacional Development), pelos
quais o nosso pai recebia assistência técnica e cooperação financeira para a implantação da reforma.
15
Educação e Desenvolvimento: Formação de Profissionais para atender às necessidades urgentes de mão-de-
obra especializada num mercado em expansão (ARANHA, 1996, p. 213).
16
Educação e Segurança: Formação do cidadão consciente. Daí as disciplinas sobre civismo e problemas
brasileiros (Educação Moral e Cívica, Organização Social e Política do Brasil e Estudos de Problemas
Brasileiros) (ARANHA, 1996, p. 213/214).
45
projeto educacional que visava atrelar o sistema de ensino ao modelo econômico dependente,
imposto pela política norte-americana para a América Latina. Uma das mudanças
provenientes de tal reordenamento promoveu a extinção do Curso Normal de nível médio, até
então única instância formadora de professores para as séries iniciais do 1º grau.
Essa alteração favoreceu uma crescente desqualificação profissional, uma vez que
os docentes formados nesse nível de ensino teriam uma formação inferior aos formados em
níveis mais elevados. Também exigiu a formação urgente de um número maior de professores
para atuarem, não só nos cursos profissionalizantes, como também nas escolas de 1º grau.
Vários cursos normais tiveram seus currículos adaptados por força da Lei
5.692/71 e homologados pelo parecer 349/72, que estabelecia um núcleo comum obrigatório
em todos os cursos de “habilitação específica de 2º grau para o exercício do magistério”, e
uma parte diversificada, atendendo às especificidades de cada estado brasileiro.
Tais currículos permitiram uma formação generalista, voltados para o domínio de
técnicas pedagógicas.
Foi criada uma licenciatura curta com o propósito de atender, provisoriamente, à
demanda de qualificação, em regiões necessitadas de profissionais habilitados. Essa
licenciatura manteve-se por longo tempo e foi extinta em 1999 pela Resolução CNE/CES nº
2/99. Em todo o Brasil, criaram-se muitas faculdades que, em muitos casos, viram na
licenciatura curta uma oportunidade de lucro.
Chauí (1977) assim coloca sobre esse tipo de formação docente:
O que é um professor curto? Um licenciado encurtado é curto em todos os
sentidos: formado em tempo curto, a curto preço para a escola (mas a alto
custo para o estudante intelectualmente curto). Portanto, um profissional que
dará aulas medíocres a baixo preço, remunerados apenas pela hora-aula, sem
condições de prepará-las. Incapacitado para a pesquisa, é um professor dócil.
Dócil às empresas, porque é mão de obra farta e barata; dócil ao Estado,
porque não pode refletir face à sociedade e ao conhecimento. Com esta
degradação do professor em termos sociais e intelectuais, trazida pela
reforma, reduz-se o nível do ensino e prepara-se a morte da pesquisa
(CHAUÍ, 1977, p. 11).
Tal crítica demonstra a realidade da educação brasileira a partir do período militar.
Embora a licenciatura curta tenha sido extinta, outras formas a substituem, levando à
permanência de uma dura realidade do modelo educacional brasileiro, ainda marcado por
faculdades isoladas, que funcionam em precárias condições, apresentando um baixo nível de
17
Educação e Comunidade: Estabelecer a relação entre escola e comunidade, criando conselhos de empresários e
mestres (ARANHA, 1996, p. 214).
46
qualificação de seus docentes, gerando consequências na formação dos futuros docentes e
comprometendo o ensino de maneira geral.
A partir de 1980, tem-se uma discussão acadêmica, já numa perspectiva
sociológica, baseada nas teorias do conflito
18
. Com o advento da Constituição Federal de
1988 e de novos atores sociais, uma nova onda de pedagogos literários, apoiados tanto em
Paulo Freire, quanto em Celestino Freinet e Vigotsky, criaram uma pedagogia social crítica
dos conteúdos, que tomou como fundamento os conceitos marxistas, recebendo também o
nome de Pedagogia História crítica. Em geral, situaram a formação do professor no contexto
sócio-histórico, distanciando-se das abordagens psicológicas ou tecnicistas, ou de aspectos
meramente legislativos ou técnicos.
Dentro do novo momento histórico foram criados os CEFAMs:
Com o intuito de reverter a crise que se instalou, em 1982, o Ministério da
Educação e Cultura e as secretarias estaduais propuseram a criação dos
Centros de Formação e Aperfeiçoamento do Magistério (CEFAM), com o
objetivo de redimensionar as Escolas Normais e adequá-las para formar
professores em formação inicial e continuada para atuar na pré-escola e no
ensino das séries iniciais (CAVALCANTE, 1994, p. 59).
O projeto procurou a articulação da Escola Normal com o ensino de 1º e 3º graus
tendo como objetivo o enriquecimento curricular, com habilitação já a partir da 1º série do
segundo grau, por meio da observação da prática educativa. Dentro dessa nova perspectiva de
formação de professores, procurou-se enfatizar um currículo interdisciplinar; o exame seletivo
para o ingresso no curso de formação; funcionamento em tempo integral, com período
específico dedicado às atividades regulares do currículo e outro às de enriquecimento e
estágio, remunerado; e criação de escolas de aplicação (CAVALCANTE, 1994; TANURI,
2000).
Entretanto, embora os CEFAMs tenham sido criados com o objetivo de oferecer
uma formação efetiva garantindo o aprimoramento da formação dos professores das séries
iniciais, poucos se mantiveram. Alguns estados, assim como o governo federal, não deram a
devida atenção à elaboração e manutenção de projetos que visassem à estruturação e
valorização da formação docente.
18
No final dos anos de 1970, um grupo de filósofos e pedagogos passa a rever a nossa educação, iniciando uma
teoria que se apoiava no materialismo dialético de Marx, Makarenko e Gramsci, na teoria progressista de
Georges Snyders e também em Bernard Charlot e Bogdan Suchodoski. Recebeu diversas denominações, entre as
quais, pedagogia crítico-social, pedagogia dialética e, finalmente, pedagogia histórico-crítica.
47
No período de 1986/89, as políticas públicas educacionais definidas pelo Plano
Nacional de Desenvolvimento da Nova República, com o intuito de dar prosseguimento às
ações do Centro Específico de Formação e Aperfeiçoamento do Magistério - CEFAM,
iniciaram projetos complementares paralelos
19
, que tiveram também existência efêmera,
notadamente pela descontinuidade administrativa no Ministério da Educação – cuja pasta, ao
longo de 1985 e 1989, foi ocupada por cinco titulares.
Nas últimas três décadas, acentuou-se de forma significativa o debate acerca da
qualidade da formação docente no Brasil. Embora a história educacional brasileira, descrita
neste capítulo, nos aponte uma inequívoca subordinação da educação aos preceitos da classe
dominante, não é menos verdade que sempre houve uma resistência popular de cunho
socialista que, no Brasil, lentamente foi sendo assumida por pedagogos de esquerda,
perceptível na ocupação de posições-chave na educação, como é o caso de Dermeval Saviani
– para ficar num exemplo. A idéia amplamente defendida é apoderar-se para empoderar-se,
seguindo uma concepção histórica-crítica. O contexto histórico exposto neste primeiro
capítulo oferece uma breve noção de como se iniciou o processo de formação dos professores,
assim como as implicações das ações governamentais. No Brasil, tal debate alcançou
proporções maiores a partir dos anos de 1990, com a promulgação da LDB 9394/96,
sobretudo com o surgimento de um novo espaço de formação, os Institutos Superiores de
Educação, e de uma nova modalidade de formação: o curso Normal Superior – aspectos de
que trataremos com mais detalhes no capítulo II.
19
Os projetos “Normalista” e “Ajudando a vencer”. O primeiro buscava apoiar financeiramente os alunos do
CEFAM para realização de estágios nas escolas de 1º grau. O Segundo visava preparar estudantes de escolas
públicas (CAVALCANTE, 1994, p. 68).
CAPÍTULO II
A POLÍTICA DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES PARA A EDUCAÇÃO BÁSICA
NOS ANOS 1990
A luta contra a velha escola era justa, mas a reforma não era uma coisa
simples como parecia, não se tratava de esquemas programáticos, mas de
homens, e não imediatamente dos homens que são professores, mas de todo
o complexo social do qual os homens são expressão (GRAMSCI, 1978).
O objetivo desta pesquisa é discutir a formação de professores do Curso Normal
Superior da Universidade Estadual de Montes Claros – UNIMONTES-sede, dentro de um
novo momento educacional. Visamos, neste capítulo, analisar o modo como o eixo das
políticas educativas foi-se redefinindo, desde 1988 até 1998, isto é, desde o período
constituinte até o primeiro governo de Fernando Henrique Cardoso. Para entendermos as
atuais reformas que permeiam o sistema educacional brasileiro, há a necessidade de situá-las
diante do processo de re-estruturação da organização do trabalho capitalista e de novos
modelos de gestão.
No capítulo II, focalizar-se-á a importância da centralidade da formação dos
profissionais da educação, dentro de um processo maior de re-estruturação produtiva
equacionada pelo modelo neoliberal e por organismos internacionais.
Discutir-se-ão as novas políticas educacionais na década de 90, que permitiram,
além de um novo modelo de formação de professores, a criação de novas instâncias
formadoras, como o Curso Normal Superior e os Institutos Superiores de Educação. Essas
políticas centraram-se na análise da promulgação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação
Nacional – LDBEN, Lei 9.394/96, em que foram definidas as linhas mestras do ordenamento
geral de educação brasileira e, de forma específica, a Formação de Professores e Valorização
do Magistério.
49
2.1 A Reforma do Estado: o contexto para mudanças educacionais dos anos 1990
Ainda que o período militar no Brasil (1964 – 1985) já balizasse transformações
nos rumos do desenvolvimento capitalista nacional, somente no final da década de 1980 e
início de 1990, mudanças significativas vieram a se concretizar, marcando a inserção do
Estado brasileiro nos ditames do capitalismo internacional em tempos de crise. De fato, a
preeminência do tema “Reformas no Brasil” tem suas origens nos anos de 1980, mas só ganha
formas evidentes com a eleição do presidente Fernando Collor de Mello, em 1989.
Sobre a década de 1980, assim se posiciona Melo (2005):
(...) aprofundaram-se os processos de liberalização, desregulamentação e
privatização de cunho antissocial, ou seja, em detrimento dos interesses da
maioria da população dos países. A implantação de medidas
macroeconômicas cada vez mais conservadoras e a intensa exploração pelos
países periféricos fizeram com que ficassem cada vez mais claras e
declaradas as intenções dos representantes do grande capital mundial na
exploração e conformação da classe trabalhadora, estabelecendo um discurso
legitimador que, incorporando demandas das classes populares, planeja a
condução de ações estratégicas focalizadas e restritivas e, ao mesmo tempo,
de incentivo ao pluralismo e a democracia de caráter universalista (MELO,
2005, p. 72).
Para que essas intenções se concretizassem, tendendo à lógica neoliberal e à re-
estruturação produtiva da era da acumulação flexível, inicia-se, concretamente, a chamada
Reforma do Estado. Oliveira (1999, p.70/71) afirma que essa reordenação torna-se necessária
na medida em que é preciso reinstituir a relação Estado-sociedade, perdida com as décadas de
crise. Primeiro, porque nos anos 1980 a “capacidade de domínio” que as classes dominantes
impõem, através do Estado, sobre as classes dominadas, “havia sido contestada” com o fim da
ditadura militar e a ascensão de importantes movimentos sociais, com destaque para as lutas
sindicais no ABC paulista. Segundo, porque a Constituição Federal de 1988 significou um
verdadeiro “tropeço” frente às forças históricas do capital, uma vez que “instituiu o conflito”
ao reconceder direitos sociais.
Na perspectiva do grupo que assume o comando das políticas públicas,
esgotavam-se as potencialidades do modelo nacional-desenvolvimentista, principalmente em
relação ao papel do Estado.
Para Oliveira (2002):
50
A superação desta crise demandara, portanto, a retirada dos entraves
colocados pela nova Constituição (“o retrocesso de 1988”) e a
implementação de um projeto de reformas que viesse preparar o Brasil para
uma nova inserção no cenário internacional. O “novo Estado”, de acordo
com este projeto, deixaria de ser o responsável direto pelo desenvolvimento
econômico e social pela via da produção de bens e serviços, e teria
fortalecida sua função de promotor e regulador desse desenvolvimento. Sua
função estaria restrita a uma ação redistributiva dos bens sociais e ao
cumprimento do clássico objetivo de garantir a ordem interna e a segurança
externa. Portanto, tornava-se premente a transferência, para o setor privado,
das atividades que pudessem ser controladas pelo mercado. A privatização e
a constituição do setor público não-estatal seriam os grandes instrumentos de
execução dos serviços que não demandariam o exercício do poder do Estado,
mas apenas o seu subsídio. Neste campo, por exemplo, junto com os serviços
de saúde e cultura, estaria a educação (OLIVEIRA, 2002, p. 70).
Nesse sentido, as reformas têm o claro objetivo de ocupar um poder antes
pertencente ao governo militar, instituído em 1964. No que concerne à Constituição de 1988
percebe-se, em muitos aspectos, uma profunda regressão no campo social, em que se
articulam e potencializam políticas neoliberais e a mundialização do capital. A constituição
torna-se mera ficção, e o governo passa a usar de formas, não menos ditatoriais, de exercício
do controle sobre o poder estatal, com vistas a atender às necessidades do novo capital.
Tomem-se como exemplo, de um lado, as sucessivas edições de Medidas
Provisórias nos anos de 1990, confirmando a supremacia do Poder Executivo sobre os demais
poderes e, de outro, o controle não menos significativo do poder da mídia.
A dinâmica do estabelecimento do Estado neoliberal reproduz a lógica imamente
à acumulação capitalista, que é a de manter um modelo de hierarquias sociais, definidas,
favorecendo o modelo concentracionista. O Consenso de Washington
20
vem para concretizar
o estabelecimento desse Estado.
Daí porque, no caso brasileiro, os termos deste “consenso” implicam no
abandono definitivo das pretensões nacionalistas de desenvolvimento
autônomo, em favor das novas formas de associação da burguesia nacional
com a grande burguesia internacional, e a execução de uma série de reformas
no sentido de promover essa readaptação necessária do Estado brasileiro às
novas exigências da acumulação. A reforma do Estado caracteriza-se,
portanto, como um processo de crescente descontrole sobre a reprodução
social. Eis, então, o ponto de partida essencial para compreender as políticas
20
Em 1989, no bojo do reganismo e do tatcherismo, máximas expressões do neoliberalismo em ação, reuniram-
se em Washington, convocados pelo Institute for Internacional Economics, entidade de caráter privado, diversos
economistas latino-americanos de perfil liberal, funcionários do Fundo Monetário Internacional (FMI), Banco
Mundial e Banco Interamericano de Desenvolvimento (BIRD) e do governo norte-americano. O tema do
encontro – Latin Americ Adjustment: Howe Much has Happend? – visava avaliar reformas econômicas em curso
no âmbito da América Latina (NEGRÃO, 1998, p. 41).
51
para o ensino superior brasileiro, nos anos 90 (LIMA FILHO, 1999 apud
MINTO, 2010).
2.2 A Educação como Estratégia de Desenvolvimento na Lógica dos Organismos
Internacionais
As implicações da educação no desenvolvimento de um país tem sido
exaustivamente discutidas. A educação engloba ensinar e aprender. É um fenômeno presente
em toda e qualquer sociedade, responsável por sua manutenção e perpetuação, ao permitir a
transmissão, às gerações que se seguem, dos meios culturais necessários à convivência de um
membro em sua sociedade. Nos mais variados espaços de convívio social, ela está presente.
No caso específico da educação formal, desenvolvida em instituições, esse processo se dá de
forma intencional e com objetivos determinados, como no caso das escolas. Essa dinâmica
sedimenta a idéia de que o desenvolvimento só existe se houver educação. Em outras
palavras, a educação é condição “sine qua non” para o desenvolvimento.
Educação, saúde, cultura, previdência, seguridade, informação, habitação, defesa
do consumidor tornam-se elementos significativos para a consolidação das políticas públicas
sociais do Estado capitalista, que utilizam o discurso desenvolvimentista como estratégia. Por
um lado, apontam as características próprias do controle de um Estado submetido aos
interesses do capital na organização e na administração da “res pública” e contribuem para
garantir e aumentar os diferentes mecanismos de cooptação e controle social. Por outro, como
o Estado não se coloca à disposição de uma ou outra classe para seu uso alternativo, não se
desobriga dos comprometimentos com as diferentes forças sociais em confronto. Tal como
estabelecidas, as políticas públicas de caráter social, são mediatizadas pelos conflitos entre
elas. Conclui-se que não são imóveis ou decorrentes de iniciativas abstratas, mas utilizadas no
andamento dos conflitos sociais, mostrando, em grande medida, a capacidade administrativa e
gerencial para estabelecer medidas governamentais, que burocratas têm por hábito chamar
“governança” (SHIROMA, 2007).
Portanto, uma reflexão das políticas sociais se obrigaria a levar em consideração
não somente a dinâmica do movimento do capital e suas correlações, mas os diferentes
processos sociais que com ele se confrontam. As especificidades das políticas públicas não
podem ser entendidas por si só, constituem parte de um projeto social, ordenadas pelo Estado,
compondo um todo marcado por contradições de várias ordens.
52
As políticas públicas educacionais marcadas pela ideia do desenvolvimento,
assinalam as contradições suprarreferidas. Não por mero acaso. Ao longo da história, como
tratado no capítulo I, a educação reafirma suas características marcadamente
reprodutoras/inovadoras da sociabilidade humana. Principalmente à produção e à reprodução
das formas de organização do trabalho e da vida. A formação educacional possibilita a
definição de aptidões e comportamentos necessários, tornando a escola um dos loci
privilegiados para a concretização de tais propósitos. Por isso mesmo, teóricos conservadores,
neoliberais consideram a educação como bem de consumo e fator estratégico para aumentar a
produção. Milton Friedman (1966 apud SANTOMÉ, 2003, p. 48), ao fazer comentários sobre
o ensino, equipara o investimento em educação a investimentos em maquinarias e instalações.
A relação entre educação e desenvolvimento já foi profundamente aprovada pelo
órgão nacional Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada - IPEA, e pelos órgãos
internacionais vinculados às Nações Unidas: a Comissão Econômica para América Latina e
Caribe - CEPAL, Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura -
UNESCO e Fundo das Nações Unidas para a Infância - UNICEF. Todos alertam que há
riscos, quando não se investe na educação como condição para deter o aumento das
desigualdades e o avanço da pobreza. Kliksberg (2001), a partir de dados da CEPAL e do
Banco Internacional de Desenvolvimento - BIRD demonstra essa relação, analisando a
situação da América Latina, onde a diferença de tempo de escolaridade entre os 10% mais
ricos e os 30% mais pobres é de, pelos menos, sete anos de estudo. No caso do Brasil, estudos
do IPEA de 2002 demonstram que “o impacto de um ano extra na escolaridade média da
população deve aumentar a taxa de crescimento anual da renda per capita em 0,35 pontos
percentual” (KLIKSBERG, 2001, p. 28).
No entanto, a fórmula “mais educação, maior prosperidade” não pode ser
apontada, dentro de uma sociedade de mercado com escassas possibilidades de emprego e
precárias condições de trabalho, como único nem principal aspecto de transformação, porque
vivemos um momento singular, em que a economia mundial alcançou um patamar de
inigualável crescimento econômico e tecnológico. A educação não conseguiu acompanhar o
progresso que se fez de forma “milagrosa e rápida”, segundo defensores do modelo capitalista
industrial. A consciência dos indivíduos não se instrumentalizou para a formação de uma
cultura voltada para a autossuficiência econômica, para a efetivação da cidadania e a
construção de uma relação social integrada. Diante do exposto, há teóricos que defendem que
a raiz das desigualdades sociais, essencialmente no Brasil, está na má distribuição do acesso a
53
uma formação educacional modernizadora e, consequentemente, na inexistência de indivíduos
instrumentalizados, com as devidas competências necessárias ao mundo moderno.
Para Kliksberg (2001):
A taxa de retorno em educação é uma das mais altas possíveis para a
sociedade. Hoje a competitividade dos países está fortemente ligada ao nível
de capacitação de sua população. Alguns dos países mais bem-sucedidos do
planeta nos mercados internacionais estão exportando basicamente produtos
como “high tech” totalmente baseados no capital educativo que souberam
desenvolver. A absorção de novas tecnologias, a inovação local a partir
delas, a pesquisa e desenvolvimento, o progresso tecnológico dependem dos
níveis de educação alcançados. Os cálculos demonstram, assim, entre outros
casos, que um dos investimentos macroeconomicamente mais rentáveis que
um país pode fazer é investir na educação de meninas. Acrescentar anos de
escolaridade a meninas desfavorecidas aumentará seu capital educativo e,
através dele, reduzirá as taxas de gravidez na adolescência, de mortalidade
materna, de mortalidade infantil e morbidade. Todas elas estão
correlacionadas estatisticamente com os anos de escolaridade da mãe
(KLIKSBERG, 2001, p. 30).
Kliksberg (2001), ao discutir as formas de ampliar e estimular o empoderamento
em regiões diversas do mundo utiliza o “capital social e cultural”, existentes em países
periféricos como uma alavanca para o desenvolvimento, e coloca a educação como um
elemento central que poderia contribuir para o processo.
Dados como esses reforçam as discussões nacionais e mundiais acerca do papel da
educação. Organismos internacionais, assim como políticas educacionais do governo
brasileiro, atribuem à educação um papel propulsor do potencial econômico dos países
pobres, elevando as possibilidades de os indivíduos sobreviverem no mercado competitivo do
capital. Assim, elaborações do papel da educação na amenização da pobreza permeiam
propostas políticas, como se fosse impossível outra lógica ao capital, mais humanas, mais
justas e mais democráticas.
Nos anos de 1930 como vimos no capítulo I, reivindicou-se para a educação a
função de formar cidadãos e de modernizar as “elites”, simultaneamente à de solucionar a
“questão social”. No período militar a ela foi atribuído o ofício de formar o capital humano,
baseado na doutrina da segurança nacional, impeditiva para o modelo que ora se instaura Nos
anos de 1990, a educação volta a ganhar centralidade, dentro do contexto da reestruturação
produtiva que coloca o mercado como realidade inescapável, como capaz de garantir
benefícios ampliar a utilidade do recusdescimento do Estado e criar novas formas de
persuasão com o intuito de exigir um novo consenso sob o imperativo da eficiência
54
capitalista. Nessa realidade, é necessário convencer com o uso mínimo de ação estatal e da
força. Trata-se de persuadir e construir novo consenso.
Com o intuito de obter esse consenso, diversas estratégias têm sido validadas,
inclusive um sutil exercício linguístico posta em prática nos últimos tempos. Palavras como
“neoliberalismo”, “globalização”, “flexibilização” e “reformas” tomaram de assalto o nosso
dia a dia, transformando-se em nossos companheiros de viagem (SHIROMA, 2007)
Em revelador artigo, Fernando Henrique Cardoso propõe substituir a “ação
estatal” –burocrata, ineficiente – pela “ação pública”, baseada na responsabilidade e na
solidariedade do cidadão (SHIROMA et al., 2007, p. 13). Tais termos não deixam dúvidas do
ônus da população e, ao mesmo tempo, da desresponsabilidade do Estado frente às questões
sociais.
Os dados educacionais a que temos acesso são capazes de falar por si e anular
qualquer discurso de “efeito”. Vale refletir sobre dados obtidos junto ao Instituto de Pesquisa
Educacional – IPEA, sobre as condições estruturais das escolas do país: “25% delas não têm
nenhum banheiro; em 27% não existe sequer água de poço. No meio rural esse número sobe
para 33%, sendo que 48% não dispõem de energia elétrica, nem mesmo de bancos suficientes
para os alunos, obrigados a dividir a carteira e a sentar no chão” (FRANCO, 1995).
Do ponto de vista ideológico, países desenvolvidos necessitam, de tempos em
tempo, organizar formas de controle para completa segurança dos seus negócios mundiais. Os
sistemas econômicos movidos por interesses meramente lucrativos e antagônicos do capital
internacional, exemplificado pelas megaempresas e seus Estados, organizam políticas e
projetos para as áreas subdesenvolvidas, com o objetivo da amenização dos efeitos nocivos
desse sistema sócio-metabólico sobre países em que atuam. Tais projetos terão seu conteúdo
ideológico ressignificado, dependendo das possibilidades históricas abertas pelo crescimento
econômico de uma época, ou de um momento de crise vivenciado pelo sistema. Leher (1999,
p.25-26) exemplifica, em um de seus estudos, as várias modificações de investimentos e
intenções do Banco Mundial em relação aos países subdesenvolvidos.
O Banco mundial é um organismo multilateral de financiamento, criado no pós-
guerra e que conta com 176 países participantes, inclusive no Brasil. Seu perfil veio sofrendo
alterações ao longo de sua história. Inicialmente seus investimentos priorizavam áreas como
agricultura e infra-estrutura e, no período mais recente, a educação ganhou centralidade. O
Banco vem desempenhando papel estratégico no reordenamento da ordem mundial através do
incremento às políticas de ajuste estrutural nos países em desenvolvimento. Tais políticas
sofrem críticas de várias ordens. O Banco Mundial é acusado de ter propiciado um “tipo de
55
desenvolvimento econômico desigual e perverso socialmetne, que ampliou a pobreza
mundial, concentrou renda, aprofundou a exclusão e destruiu o meio ambiente” (VIEIRA,
2001, p. 75).
A centralidade adquirida pela educação no discurso do Banco Mundial nos anos
1999 é recente.
Na década de 1960, um vice-presidente do Banco, Robert Gardner, afirmou:
“Nós não podemos emprestar para educação e saúde. Nós somos um
banco!”. Esta situação começou a mudar na gestão de Woods (1963-1968) e,
mais acentuadamente, na presidência da McNamara, quando a ênfase no
problema da pobreza fez a educação sobressair entre as prioridades do
Banco. Na década de 1970, esta instituição considerava o financiamento às
escolas primárias e secundárias de formação geral um contrassenso,
defendendo o ensino técnico e profissional, modalidades tidas como mais
adequadas às necessidades (presumidas) dos países em desenvolvimento. Na
virada neoliberal da década de 1980, a orientação educacional do Banco
sofreu uma inflexão em direção ao ensino elementar. A orientação anterior
foi então duramente atacada como voluntarista e dispendiosa. Na década de
1990, a inflexão neoliberal não apenas permanece válida, como é
radicalizada (LEHER, 1999, p. 25-26).
Uma questão importante é entendermos as razões que levaram O Banco mundial a
centralizar atenções nas questões educacionais.
O panorama mundial aponta para um desolador quadro social, com cerca de 1
bilhão de pobres no mundo. Tal realidade levou o Banco a colocar a educação como fator de
sustentação para sua política de contenção da pobreza, um “ajuste com caridade”, como
descreveu Marília Fonseca (1995).
A mudança da política para as décadas subsequentes levou a publicação do
documento Prioridades y Estratégias para La Educación, análise significativa sobre o setor e
que passou a nortear as políticas do Banco.
O texto analisa as opções de políticas educacionais para os países que apresentam
problemas no setor e reitera o objetivo de eliminar o analfabetismo até o final do século. Para
isso, a solução seria eliminar o analfabetismo e melhorar o rendimento. Defende uma
reestruturação das funções do Estado e a busca de novas fontes de recursos. O Banco Mundial
recomenda maior atenção aos resultados, sistema de avaliação de aprendizagem, investimento
em capital humano, atentando para o custo-benefício; busca, além da descentralização da
administração das políticas sociais, maior eficiência no gasto social.
O documento retorna à velha fórmula, que apresenta a educação como elemento
significativo no crescimento econômico e na diminuição da pobreza.
56
Dentro dessa fórmula, a educação básica é tida como prioridade. Auxiliaria a
diminuir a miséria ampliando a produtividade do trabalho dos pobres, diminuindo a
fecundidade, melhorando os indicativos da saúde e contribuindo para que as pessoas possam
participar plenamente da economia e da sociedade.
Atendendo a essa política
(...) Fernando Henrique Cardoso apontava a educação como uma das cinco
metas prioritárias de seu programa de governo, destacando seu papel
econômico como base do novo estilo de desenvolvimento. O dinamismo e a
sustentação dessa base viriam da verdadeira parceria que deveria ser
construída entre o setor privado e o governo, entre universidade e indústria.
As propostas derivadas dessa concepção de educação, e que guardam
estrema similaridade com os organismos multilaterais, dariam o tom da
LDBEN aprovada em 1996 (SHIROMA et al., 2007, p. 65).
Entendendo que os professores eram estratégicos na consolidação desse “novo”
momento da educação, o documento recomendou, em relação à formação de professores:
1. Revisão e implantação do currículo do curso de formação de
professores para as quatro primeiras séries do 1º grau;
2. Revalorização da prática de ensino;
3. Reformulação dos cursos de pedagogia, visando à formação de
professores alfabetizadores e desenvolvimento de pesquisas e novos métodos
e técnicas pedagógicas por o ensino fundamental;
4. Reestruturação dos cursos de formação de professores (licenciaturas e
cursos de pedagogia);
5. Descentralização dos cursos de licenciatura, de modo que cada
instituto ou faculdade ofereça formação pedagógica;
6. Extinção dos atuais cursos de habilitação em magistério;
7. Criação de poucas e boas escolas normais superiores para formação e
aperfeiçoamento de professores dos cursos de licenciatura;
8. Estruturação de planos de carreira, com mecanismos de progressão
funcional vinculados tanto à qualificação quanto ao desempenho em sala de
aula e incentivos salariais à permanência em regência de classe (SHIROMA
et al., 2007, p. 67).
As políticas educacionais estabelecidas pelo Estado nos anos de 1990 articularam-
se a essas recomendações. Especificamente no caso da formação de professores, assiste-se à
ênfase em políticas da formação inicial, compreendida como capacitação pedagógica de
cunho estritamente técnico.
Para consolidar seus propósitos, o Banco Mundial aponta a necessidade da busca
de capital, através de projetos e políticas sociais voltadas para a manutenção da ordem,
deixando pouco espaço para um viés ideológico plural. Partindo do discurso da amenização
da pobreza absoluta, as políticas educacionais são vistas como necessárias para que os
57
indivíduos possam capacitar-se segundo as necessidades de mercado, participando dos
empregos possíveis, criando novas alternativas de trabalho em áreas ainda não exploradas
pelo capital. Dessa forma, apontam as políticas compensatórias como única forma de
amenizar a pobreza, o desemprego e outras mazelas sociais..
Para Melo (2005):
(...) o FMI e o Banco mundial fazem a apologia de uma cidadania ativa,
dirigindo as ações entre países e indivíduos para ações de interdependência
de colaboração, evocando a imagem de uma sociedade harmoniosa, em que
instituições sociais, comunidades e cidadãos participariam ativamente de
seus destinos e de seu progresso e sucesso no mundo do trabalho a partir de
suas habilidades e competências. Saberes que cada um, de forma individual,
teria a responsabilidade de construir para si próprio, como aquisição de um
capital de conhecimento (MELO, 2005, p. 69/70).
A fala de Melo (2005) clarifica a idéia de como os organismos internacionais
utilizam-se de várias estratégias de ação, tanto no direcionamento das políticas econômicas
quanto na conformação social dos países. Dessa forma, reafirmam sua concepção de mundo e,
ao mesmo tempo, a defesa de um pensamento único em favor do mercado e do capital.
O Banco Mundial tem evidenciado que a economia do mundo pobre está restrita à
produção de mercadorias de baixo valor agregado. Com isso, defende-se que a formação do
trabalhador deve ser direcionada à satisfação desse mercado de trabalho. Se a produção se dá
de maneira débil e subordinada, o conhecimento do trabalhador deve seguir essa mesma
lógica. Essa lógica de formação segue a idéia de que vivemos numa aldeia global, ou melhor,
cada nação, explorando seus recursos naturais e econômicos, pode e deve participar do
chamado mercado mundial. O Banco Mundial afirma que os países devem explorar suas
potencialidades, participando dos nichos de mercado para os quais estejam preparados. Os
efeitos desses postulados se fazem sentir nas políticas educacionais, implantadas em vários
países, inclusive na educação brasileira, ao priorizar os segmentos básico e fundamental,
vistos como necessários pelo Estado brasileiro. Por esse viés ideológico, cada país participa
do sistema produtivo mundial, colaborando com o que pode, e beneficiando-se
“harmoniosamente” desse sistema.
Segundo Frigotto (1998 apud DOURADO; PARO):
As agências educacionais passam a ser vislumbradas como um dos elos de
socialização dos conhecimentos técnico-científicos historicamente
produzidos pelo desenvolvimento de habilidades, capacidades e
competências sociais requeridas, predominantemente, em sintonia com o
setor produtivo, no qual “educação formal e a qualificação formal são
58
situados como elementos de competitividade, reestruturação produtiva e da
empregabilidade” (FRIGOTTO, 1998 apud DOURADO; PARO, 2001, p.
49).
A antiga articulação educação/desenvolvimento firma-se a partir da Teoria do
Capital Humano, formulada por Theodore W. Shultz
21
. Para ele, o trabalho humano, quando
qualificado por meio da educação, é um dos mais importantes meios para o aumento da
produção econômica e aumento das taxas de lucro do capital. Tal ideia gerou uma concepção
tecnicista sobre o ordenamento do ensino, o que acabou por mistificar seus reais objetivos.
Essa visão tecnicista contribuiu para a consolidação da idéia de que a educação é o
pressuposto do desenvolvimento econômico, assim como da melhora das condições do
indivíduo, que, ao educar-se, estaria acrescendo valor a si próprio, na mesma lógica em que se
valoriza o capital. Portanto, a Teoria do Capital Humano deslocou para o âmbito individual as
questões relacionadas à inserção social, ao emprego e ao desempenho profissional e fez da
educação um “valor econômico”, numa relação que equipara capital e trabalho como se
ambos fossem meros “fatores de produção” (da teoria econômica neoclássica). Também
legitima a ideia de que investimentos em educação sejam analisados e selecionados pelos
preceitos do capital, uma vez que a educação é o principal fator de desenvolvimento.
A partir da década de 1970, a Teoria do Capital Humano tem sido objeto de
muitas críticas.
Shaffer (1961 apud ALMEIDA; PEREIRA, 2009) sustenta que, em geral, é
desaconselhável listar o homem como capital humano, corroborando seus argumentos com
aqueles que acreditam que é moralmente errado aplicar os conceitos de investimentos e de
capital às pessoas. Também demonstra sua preocupação de utilização inapropriada dessa
teoria nas decisões políticas para o setor educacional.
Outra questão apontada pelos críticos diz respeito às despesas com educação,
quando elas eram destinadas ao consumo e, explicitamente, destinadas à produção de
capacitação. Os críticos questionam a possibilidade de distingui-las e afirmam que os custos
educacionais são somente despesas de consumo.
Em relação à discussão sobre a natureza das despesas em educação, Shultz (1973)
argumenta:
(...) se a educação fosse integralmente gratuita, uma pessoa com toda a
possibilidade a consumiria até que estivesse saciada e investiria nela até que
não mais aumentasse os seus futuros ganhos. Se uma parte das despesas
21
Em 1968, Shultz recebeu o prêmio Nobel de Economia pelo desenvolvimento da teoria do Capital Humano.
59
educacionais fosse suportada pelos cofres públicos, os custos privados
diretos de educação seriam, sem dúvida, menos que os custos totais com a
educação e, à medida que a educação incremente os rendimentos futuros do
estudante, sua taxa privada de rendimento e relação ao que gastara com a
educação seria mais alta do que a taxa de rendimento em relação aos gastos
totais educacionais que entrassem nesta parte de sua educação. Desta forma,
os incentivos privados para consumir e para investir na educação são
afetadas pelas despesas públicas educacionais que entrassem nesta parte de
sua educação. Desta forma, os incentivos privados para consumir e para
investir na educação são afetados pelas despesas públicas educacionais, mas
o fato de haver tais despesas públicas não tem qualquer ressonância na
questão de saber se a educação é consumo ou produção de capacitações
(SHULTZ, 1973, p. 56).
Embora Shaffer (1961 apud ALMEIDA; PEREIRA, 2009) reconheça a educação
como fator constitutivo do desenvolvimento, ele encontra dificuldades para identificar e medir
o aumento dos rendimentos que se associam a ela, pois outros fatores, como capacidades
inatas, tipo de emprego, estrutura familiar devem, também, ser considerados.
Outro aspecto crítico a ser considerado refere-se à utilização política da Teoria do
Capital Humano, por parte daqueles que definem as políticas públicas. Shaffer (1961 apud
ALMEIDA; PEREIRA, 2009) chama atenção para as decisões políticas que poderiam
privilegiar o aspecto econômico, em detrimento de aspectos sociais e culturais. Os críticos do
Capital Humano temem que a sociedade negue educação aos grupos sociais cujo investimento
educacional apresente menor taxa de retorno. Lembram que as políticas sociais públicas
corretas seriam inversas, aumentariam os gastos da educação, atenderiam aos grupos
historicamente menos favorecidos.
Nessa perspectiva, remetemo-nos à definição de uma agenda internacional para a
educação, iniciada com a Conferência Mundial de Educação para Todos, que se realizou em
Jomtien, na Tailândia, de 5 a 9 de março de 1990 e foi patrocinada pelo Programa da Nações
Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), pela Organização das Nações Unidas para a
Educação, Ciências e a Cultura (UNESCO), pelo Fundo das Nações Unidas para a Infância
(UNICEF) e pelo Banco Mundial.
O objetivo da Conferência, conforme Miranda (1996), foi “promover a
universalização do acesso à educação e a promoção da equidade, das prioridades à
aprendizagem, ampliar os meios e alcance da educação básica e fortalecer o ajuste de ações
educativas” (MIRANDA, 1996, p. 46).
Analisando o documento resultante dessa Conferência, percebe-se um discurso
ideológico, que coloca a educação como motor da transformação social, inferindo que as
60
desigualdades sociais, a violência, a miséria, tudo isso existe já que a maioria dos indivíduos
dos países periféricos não tem acesso à educação. Portanto, segundo os relatórios da
Conferência Mundial de Educação para Todos, a união de todos em torno da educação
permitirá o almejado desenvolvimento econômico, que, por sua vez, dará fim às mazelas
sociais referidas.
Embora a Conferência tenha tido como mérito recolocar a educação no centro das
atenções mundiais, seguiram-se críticas de várias ordens, como nos coloca Shiroma (2007):
Um primeiro problema aqui enfrentado refere-se à expressão “para todos”,
que sugeria uma universalização da educação básica, que no Brasil
compreendia desde a educação infantil até o ensino médio, que a
Conferência não pretendia. Em segundo lugar, alguns autores
compreenderam o conceito NEBA em sua função ideológica de indicar a
natureza do ensino a ser ministrado. Isto é, para estratos sociais diferentes,
ensinos diferentes, uma vez que as necessidades básicas de um e outro não
poderiam ser as mesmas. Reeditava-se o dualismo na educação brasileira,
partindo-se do suposto de que, se as necessidades das amplas camadas
empobrecidas eram peculiares, deveriam continuar tendo atendimento
diverso do demandado por clientela mais seleta. (SHIROMA et al., 2007, p.
52).
Vale observar que até os defensores do modelo capitalista atual já admitem que os
países periféricos não conseguirão alcançar, em médio espaço de tempo, o mesmo patamar de
desenvolvimento da equidade, que nada mais é do que uma nova roupagem da Teoria do
Capital Humano. Segundo Jimenez e Mendes (2007, p. 123), “a noção de equidade está
adstrita à competência e à ação do indivíduo de conquistar o seu lugar ao sol, em substituição
àquela velha igualdade entre os homens”.
É nesse contexto que foram formuladas as políticas educacionais brasileiras nos
anos de 1990, em resposta aos organismos internacionais e permitindo ao “Brasil tornar-se,
portanto, sócio da agenda definida em tais cenários” (DOURADO; PARO, 2001. p. 61).
Em dezembro de 1990, o Ministério da Educação elaborou, no Governo Collor, o
Programa Setorial de Ação, na área da Educação (1991 – 1995), o qual apresentou como
fundamentos a educação na Constituição Federal de 1988 e a modernização do Brasil com sua
inserção na ordem econômica internacional. O documento colocava a tarefa urgente para o
Brasil inserir-se no quadro das transformações contemporâneas, que se operavam em âmbito
mundial, por força de uma revolução científico-tecnológica sem precedentes (BRASIL, 1990,
p. 09).
61
Com o impeachment do presidente Fernando Collor de Melo, assumiu o vice-
presidente Itamar Franco, interrompendo a implantação do projeto neoliberal e dando uma
configuração mais populista ao governo.
No entanto, a eleição de Fernando Henrique Cardoso e a escolha de Murílio de
Avellar Hingel para o Ministério da Educação possibilitaram a retomada neoliberal. O então
Ministro da Educação participou da Conferência de Educação para Todos, na China, quando
concluiu que o Brasil não cumprira os acordos estabelecidos em 1990, em Jontien:
Participando de uma Conferência de Educação para Todos, em março de
1993, na China, verifiquei que o Brasil não tinha ainda tomado iniciativas
consistentes para cumprir o compromisso da Declaração Mundial de
Educação para Todos de Jontien, Tailândia, de 1990. Retornando ao Brasil,
após ter convivido alguns dias com esta frustrante experiência de indiferença
do nosso país em torno de um compromisso assumido internacionalmente,
tomei a decisão de elaborar o Plano Decenal de Educação para Todos,
determinando que sua metodologia se orientasse por uma ampla participação
e mobilização da sociedade (PERONI, 2003, p. 94)
22
.
Pode-se verificar, através dessa declaração do ministro, que o estabelecimento do
Plano Decenal foi realizado num contexto em que o Brasil tinha a obrigatoriedade de prestar
contas aos organismos internacionais sobre os caminhos ou descaminhos da área educacional.
O Encontro Mundial de Cúpula pela Criança (Nova York, setembro de 1990)
reforça os princípios da Declaração Mundial sobre Educação para Todos,
através da Declaração sobre a Sobrevivência, a Proteção e o
Desenvolvimento da Criança. Esse documento, no qual o Brasil foi
signatário, foi constituído por quatro objetivos: expansão e desenvolvimento
do atendimento em educação infantil, universalização do acesso à educação
básica e finalização do ensino fundamental por pelo menos 80% das crianças
em idade escolar até o ano 2000; redução significativa do analfabetismo
adulto, aumento da aquisição dos conhecimentos, habilidades e valores
requeridos para a melhoria da vida e desenvolvimento sustentável para
indivíduos e famílias (DOURADO;PARO, 2001, p. 154/155).
O conceito de Educação Básica já apontado na Declaração Mundial sobre
Educação para Todos é definido na perspectiva de “fundamento de aprendizagem para todos
os cidadãos”, incluindo “ensino fundamental para criança, e alfabetização, e educação
continuada não formal para jovens e adultos” (VIEIRA, 2001, p. 64).
22
Discurso do ministro de Estado da Educação e do Desporto, Murílio de Avelar Hingel, na abertura da
Conferência Nacional de Educação para Todos, no dia 29 de Agosto de 1994.
62
As decisões tomadas pelos países integrantes do EFA-9, reunidos em 1993 em
Nova Delhi
23
, também contribuíram para a reorientação no panorama político educacional
subsequente: ênfase na melhoria qualitativa dos sistemas educacionais, filosofia de ação
integral, atendimento da questão educacional como responsabilidade de toda a sociedade, foco
na questão do magistério, direcionamento de recursos para a “educação básica e melhoria de
gerenciamento dos recursos educacionais” ofertados (BRASIL, 1993, p. 125).
A Declaração instituída em Nova Delhi aponta que educação é responsabilidade
de todos, envolvendo sociedade, governos, famílias, comunidades etc.
A Declaração de Nova Delhi também chama atenção para a necessidade da
melhoria da qualidade da educação básica e, para isso, sugere a intensificação de esforços
para aperfeiçoar o status, o treinamento e as condições de trabalho do magistério, bem como
melhorar os conteúdos educacionais e o material didático utilizado. Percebe-se uma explícita
relação entre esse documento e as políticas esboçadas, ainda no governo Itamar Franco, em
relação à formação do magistério do ensino fundamental. O primeiro exemplo acontece com a
formulação do Pacto pela Valorização do Magistério e Qualidade da Educação, assinado em
1994. Outro exemplo é a criação do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino
Fundamental e de Valorização do Magistério (FUNDEF), instituído pela Emenda
Constitucional nº 14/96 e regulamentado pela Lei nº 9.424/96, implementado a partir de 1998
em todo o país.
Passadas quase duas décadas de Jomtien, percebe-se que os ganhos obtidos foram
modestos, ficando aquém dos objetivos ensejados pelo Brasil como um dos nove países do
EFA-9.
De fato, os progressos educacionais realizados pelo Brasil na segunda
metade da década de 90 foram notáveis. Mesmo assim, estes avanços não
foram suficientes para satisfazer adequadamente as demandas existentes, até
porque as exigências da sociedade mudaram, acompanhando as
transformações tecnológicas. Hoje, já não basta garantir a universalização do
ensino compulsório, que no Brasil é de oito anos. Para uma cidadania plena e
uma vida produtiva exige-se, no mínimo, 12 anos de escolaridade básica.
(BRASIL, 2000, p. 03).
Influenciadas pela discussão latino-americana Educação e Conhecimento: eixo da
transformação produtiva com equidade (UNESCO, CEPAL, 1992 e CEPAL, UNESCO,
23
Refere-se a um grupo de países pobres e populosos que buscam alcançar as metas estabelecidas pela Education
For All – EFA/UNESCO
63
IPES, INEP, 1995) e Focalizaciōn y Pobreza
24
(UNESCO, CEPAL, 1992), novas políticas
públicas educacionais começam a se firmar, deixando evidente o entrelaçamento entre os
compromissos internacionais e as propostas nacionais. A ideia de equidade ganha corpo,
passando a se constituir matriz das novas políticas públicas, não mais orientadas por uma
óptica universalista, mas focalizada, permitindo a racionalização do gasto e a incorporação de
novos atores sociais como executores.
Mais uma vez reafirmam-se compromissos globais para a educação, permitindo
uma significativa sintonia entre agências internacionais e os governos locais.
Vieira (2001) conclui:
Finalmente, há que se perceber que, num cenário de globalização das
agendas educacionais, é praticamente impossível deter as ondas que chegam
ao país através de novas-velhas prioridades das quais a descentralização é
um exemplo, assim como a gestão e a descoberta do papel dos atores na
execução e financiamento das políticas, agora mais e mais focalizadas. Por
entre as brumas desse cenário tão amplo, movem-se embaçadas as
perspectivas da educação como um direito universal de todos (VIEIRA,
2001, p. 87).
Portanto, a análise das políticas intervencionistas defendidas pelos organismos
internacionais evidencia a expansão das políticas mais convenientes aos interesses do capital.
Tais políticas contam com o apoio decisivo dos governos e das elites nacionais que viabilizam
sua inserção e operacionalização, de acordo com as orientações das agências que monitoram,
por meio de mecanismos de condicionalidades, as metas estabelecidas nos ditos acordos de
cooperação internacional. Nesse sentido, a anunciada “co-operação” consiste, de fato, em
estratégia de expansão das políticas e interesses do capital internacional, sendo a educação
elemento significativo na reprodução da força de trabalho para o capital.
O resultado dessas políticas no Brasil tem apontado para políticas sociais inócuas e
de baixa eficácia. No âmbito da educação, os problemas permanecem, incluída aí a questão da
formação de professores. A grande mídia, em consonância com o discurso modernizador,
defende as reformas como necessárias, e aqueles que ousam desqualificá-lo são considerados
como uma expressão do atraso ou como expressão de um esquerdismo saudosista,
ultrapassado, que deveria ter “caído” com o muro de Berlim nos anos de 1980.
Essa realidade, amparada em falsos mitos, marcada pela sociabilidade de
capitalista, vem ganhando a disputa hegemônica na sociedade contemporânea brasileira. As
políticas dos anos de 1990, segundo Falleiros (2005):
24
O primeiro documento sobre o tema foi publicado em 1990, sob o título: Transformación productiva con
equidad: la tarea prioritaria del desarrollo de América Latina y el Caribe en los años noventa.
64
Vêm demandando uma educação capaz de conformar o “novo homem” de
acordo com os pressupostos técnicos, psicológicos, emocionais, morais e
ético-políticos da “flexibilização” do trabalho e com um modelo de
cidadania que não interfira nas relações burguesas fundamentais no contexto
de ampliação da participação política (FALLEIROS, 2005, p. 211).
As palavras de Falleiros (2005) levam-nos a propor a desconstrução de toda uma
estratégia que até aqui tem contribuído para paralisar a sociedade brasileira em torno de um
“pensamento único”. Temos certeza de que se trata de uma tarefa lenta e árdua, mas que se faz
necessária por aqueles que pensam a educação além do discurso oficial.
2.3 Novos Espaços de Formação: LDB, Normal Superior e Institutos Superiores de
Educação
Os princípios norteadores da educação nacional enunciados no texto
constitucional devem ser ajustados, em sua aplicação, a situações reais, que contemplem: o
funcionamento das redes escolares; a formação dos especialistas e docentes; as condições de
matrícula; aproveitamento da aprendizagem e promoção de alunos; os recursos financeiros,
materiais, técnicos e humanos para o desenvolvimento do ensino; a participação do poder
público e da iniciativa particular no esforço educacional; a superior administração dos
sistemas de ensino; as peculiaridades que caracterizam a ação didática nas inúmeras regiões
do país etc. São esses ajustamentos, essas diretrizes emanadas da Carta Magna que se
constituem a matéria-prima de uma Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional.
Mal se concretizou a promulgação da Constituição Federal de 1988, deu entrada
na Câmara o Projeto de Lei nº 1258/88, de autoria do deputado Octávio Elísio, propondo um
novo texto para a Lei de Diretrizes e Bases. Iniciava-se, então, com essa proposta, uma longa
jornada de discussão, em que as posições ideológicas se contrapuseram.
O senador Darcy Ribeiro, com a colaboração dos senadores Marco Maciel e João
Calmon, elaborou um projeto alternativo de LDB, que levou o nº 67, em 1990. Esse projeto só
foi discutido, atendendo a preceitos regimentais, após o arquivamento do anterior.
As artimanhas que permitiram a substituição do projeto inicial construído com
ampla participação de diversos segmentos organizados da sociedade civil e com o apoio de
entidades educacionais – causaram indignação em muitos parlamentares e entidades do Fórum
Nacional.
65
Ao aprovar seu projeto, o senador Darcy Ribeiro qualifica o projeto inicial como
retrógrado e detalhista.
Contrariando as críticas do Senador, Saviani (1990) considera o Projeto da LDB
Democrática e Popular como sendo necessária para “superar a visão fragmentada e o estado
de desagregação em que se encontra a educação”, permitindo o caminho para a consolidação
de um sistema nacional de educação, para a “(...) construção de uma escola comum, extensiva
a todo o território nacional, unificada pelos mesmos objetivos, organizada sob normas
também comuns e regida pelo mesmo padrão de qualidade” (SAVIANI, 1990, p. 103).
A LDB 9394/96 inviabiliza a concretização de um sistema nacional de educação,
pois nela as diretrizes não são contempladas. A coordenação do Sistema de Ensino fica
restrita ao Poder Executivo, afastando uma maior participação dos setores organizados da
sociedade civil. A Lei reafirmou o papel político-estratégico do Ministério da Educação, que
passa a atuar em âmbito estratégico-gerencial e coloca à escola no âmbito gerencial-
operacional.
Tais níveis de atuação devem ser compreendidos à luz de políticas estabelecidas
pelo Banco Mundial no setor educacional. Segundo Tommasi (1996), apesar de os
empréstimos para os países em desenvolvimento somarem apenas 0,5% do total de gastos
com educação, o Banco visa influenciar nas políticas educativas, particularmente em
mudanças nas formas de gestão e na alocação de recursos.
Fica evidente que o Planejamento Político-Estratégico do MEC não são respostas
aos anseios dos profissionais da educação e, sim às determinações do Banco Mundial.
O projeto do senador mostrou-se polêmico, inspirado em princípios liberais,
marcado por uma concepção de democracia representativa, na qual a participação da
sociedade se limita ao momento do voto, através do qual se dá a escolha de nossos
governantes. Escolhidos, tornam-se representantes legais da sociedade para tomar decisões
sem, necessariamente, consultá-la. O projeto aprovado pelo senado foi considerado como uma
interferência no processo democrático e foi visto como ilegítimo por amplos setores
educacionais que o contestaram.
O Fórum Nacional em Defesa da Escola Pública considerou a Lei nº 9394/96, a
nova LDB, como a “vitória de uma determinada concepção de Estado e de sociedade que
pode ser denominada de neoliberal” (FÓRUM NACIONAL EM DEFESA DA ESCOLA
PÚBLICA, 1997, p. 04). Esse mesmo documento ressalta “o fato de o governo conseguir na
legalidade institucionalização de mecanismos antidemocráticos para fazer valer o seu projeto
66
que, portanto, traz um vício de origem: a falta de legitimidade” (FÓRUM NACIONAL EM
DEFESA DA ESCOLA PÚBLICA, 1997, p. 05).
A partir da justificativa apresentada por seus autores de que o projeto pretendia
desengessar a educação brasileira, assim se coloca Saviani (2001):
Em verdade o que se desengessava era o governo, isto é, o Poder Executivo
que ficava livre para formular a política educacional segundo as
conveniências dos círculos que lhe são próximos, sem nenhum mecanismo
de controle por parte da sociedade organizada (SAVIANI, 2001, p. 128).
Devidamente aprovado pela Câmara e pelo Senado brasileiro, o projeto
transformou-se, em 20 de dezembro de 1996, na lei de nº 9394/96. Sua estrutura apresenta
nove Títulos e 92 Artigos. à semelhança da primeira LDB (Lei nº 4024/61), cuida, no mesmo
texto, de todos os assuntos e de todos os graus de ensino, segundo a seguinte distribuição dos
temas: Da Educação; Dos Princípios e Fins da Educação Nacional; Do Direito à Educação e
do Dever de Educar; Da Organização da Educação Nacional; Dos Níveis e Modalidades de
Educação e Ensino; Dos Profissionais de Educação; Dos Recursos Financeiros; Das
Disposições Transitórias.
Essa LDB tem dois textos de lei complementares e alguns decretos que, em
conjunto com ela, dão os vetores maiores da política educacional em vigência no país.
O contexto atual da formação de professores tem como marco legal a atual LDB
nº 9394/96. Na referida lei, foram estabelecidas mudanças, dentre as quais as concernentes à
política de formação de professores das séries iniciais do Ensino Fundamental em Nível
Superior, no Curso Normal Superior; e à criação dos Institutos Superiores de Educação.
Na parte específica da formação dos profissionais da educação, Título VI, Artigo
62, é estabelecido que:
A formação de docentes para atuar na educação básica far-se-á em nível
superior, em curso de licenciatura, de graduação plena, em universidades e
institutos superiores de educação, admitida como formação mínima para o
exercício do magistério na educação infantil e nas quatro primeiras séries do
ensino fundamental, a oferecida em nível médio, na modalidade Normal
(BRASIL, 1996).
Apresentada como novidade, a formação em nível superior dos professores das
séries iniciais, como nos lembra Kishimoto (1999) e Brzezinski (1999), já fora proposta pelo
Movimento dos Pioneiros da Escola Nova.
67
O texto legal aprovado em 1996 não resultou, exatamente, da realidade em pauta,
do diálogo com entidades sindicais e acadêmicas dos profissionais da educação, no sentido de
oportunizar respostas ao universo escolar. Mais uma vez, foram formuladas políticas
educacionais desvinculadas das necessidades da sociedade brasileira e voltadas para o
mercado, confirmando que, ao longo da história da educação nacional, nossas autoridades
foram mais suscetíveis a fatores externos do que às demandas estritamente educacionais
(ROMANELLI, 2001).
Com o propósito de escamotear essa realidade, foram divulgados argumentos
relativos à formação docente no período anterior ao estabelecimento da Lei nº 9394/96. Tais
argumentos receberam inúmeras críticas por parte de entidades representativas dos
movimentos dos profissionais da educação, estudiosos e pesquisadores.
Para Macedo (2000), utilizou-se como justificativa o fato de que os professores
formados “desconhecem os documentos que tratam de propostas curriculares ou os conhecem
apenas superficialmente” (MACEDO, 2000, p. 24). Ainda segundo a autora, a divulgação de
tais ideias teve como objetivo dar legitimidade às mudanças propostas, desqualificando
políticas anteriores. Macedo (2000, p. 08) salienta, ainda, que “as diretrizes para a formação
de professores para a educação básica excluem a discussão acerca das finalidades da
educação, entendendo que nada precisa ser deliberado a esse respeito”.
Ao tratar a educação como “bem privado” e “serviço”, já era possível antever o
novo paradigma político e o novo pacto social que se viria a produzir no país, legitimando
dogmas de Hayek e Friedman, erigidos e disseminados pelo mundo. O austríaco Friedrich
August Von Hayek e o norte-americano Milton Friedman foram os idealizadores da corrente
econômica do neoliberalismo - “propunham o afastamento do Estado em relação às atividades
econômicas, assim como reformas institucionais que favorecessem a livre competição e
liberdade de circulação de capitais, concedendo ao mercado o papel único regulador”.
(SANTIAGO; IDE, 2009, p. 03).
A concepção legal do Curso Normal Superior se encontrava expressa,
cronologicamente, na Resolução CNE/CP nº 01, de 30 de setembro de 1999 e, a seguir, no
Decreto 3.276/99, que regulamenta os Artigos 61, 62, 63 da Lei Federal 9394/96.
Art. 2º - Os cursos de formação de professores para a educação básica serão
organizados de modo a atender aos seguintes requisitos:
I – compatibilidade com a etapa da educação básica em que atuarão os
graduados;
II – possibilidade de complementação de estudos, de modo a permitir aos
graduados a atuação em outra etapa da educação básica;
68
III – formação básica comum, com concepção curricular integrada, de modo
a assegurar as especificidades do trabalho do professor na formação para
atuação multidisciplinar e em campos específicos do conhecimento;
IV – articulação entre os cursos de formação inicial e os diferentes
programas e processos de formação continuada (BRASIL, 1999).
O artigo 2º aponta que o Curso Normal Superior deve ser compatível com as
características das séries iniciais do Ensino Fundamental. Não deve encerrar-se em si mesmo.
A formação em questão deverá garantir que o professor atue de modo multidisciplinar e
articulado com a chamada formação continuada. Tais aspectos fazem parte de uma concepção
ideal, que necessitará ser objeto de reflexões no instante da organização e do desenvolvimento
do Curso Normal Superior pelas instituições de ensino.
Entretanto, pensamos que nem sempre o ideal e o real, se tornam realidade. Em
relação à atuação do professor, os currículos são organizados de forma que o aluno-professor
aprenda noções básicas, sem maiores preocupações com o aprofundamento. Muitas vezes o
que encontramos é a formação de um profissional ilustrado, com conhecimentos
rudimentares, não qualificado para desenvolver pesquisas que contribuam para o seu
cotidiano docente. Pereira (1999), baseando-se em Jacque Buaquet, ironiza essa realidade:
Imagine uma escola de natação que se dedica um ano a ensinar anatomia e
fisiologia de natação, psicologia do nadador, química de água e formação
dos oceanos, custos unitários das piscinas por usuário, sociologia da natação
(natação e classes sociais), antropologia da natação (o homem e a água) e,
ainda, a história mundial da natação, dos egípcios aos nossos dias. Tudo isso,
evidentemente, à base de cursos enciclopédicos, muitos livros, além de giz e
quadro-negro, porém sem água. Em uma segunda etapa, os alunos-nadadores
seriam levados a observar, durante outros vários meses, nadadores
experientes; depois dessa sólida preparação, seriam lançados ao mar, em
águas bem profundas, em dia de temporal (PEREIRA, 1999, p. 112).
Tal formação não possibilita ao docente ver-se como sujeito histórico de sua
própria prática, ficando incapaz de confrontar-se com seu percurso de formação. Uma
formação que prioriza a autonomia e o compromisso com a realidade, torna-se, sem dúvida,
significativa para um profissional autônomo capaz de inserir-se no mercado de trabalho e, ao
mesmo tempo construir um passaporte para a cidadania. Essa formação supera a simples
aquisição de competências mínimas estabelecidas nos currículos dos cursos de formação. A
construção da cidadania – oposto da exclusão – não pode ser pensada de forma isolada,
fragmentada e descontextualizada. Cidadania, portando, encontra-se relacionada à ideia de um
profissional da educação participativo na vida social, ciente do seu papel político e reflexivo.
69
Para Chaves; Amorim (2006), para propor a formação de professor reflexivo,
parte-se do pressuposto de que é na análise reflexiva da prática, sustentada
por uma sólida fundamentação teórica e por um envolvimento
compromissado e ético com e no contexto que se constrói o conhecimento, a
partir da concepção de que todo conhecimento é resultado da busca e da ação
do sujeito sobre seu entorno. Para pensar na reflexão como ponto de partida
para o encontro de respostas aos desafios, da realidade educativa, social e
cultural, buscam-se fundamentos na concepção de Marx de que não há
prática social ou educativa que não implique uma teoria de conhecimento,
orientada por uma antropologia e por uma visão de homem e de mundo
implícita ou explícita (CHAVES; AMORIM, 2006, p. 207/208).
Percebe-se, hoje, na realidade brasileira, a necessidade de que o professor se torne
um investigador. A premissa por nós defendida é a de que o primeiro passo de avanço para a
formação do professor investigador é que ele seja reflexivo e que, no processo de reflexão
sistemática, vá-se estabelecendo o espírito de observação e análise, que conduz ao caminho da
investigação. Uma formação aligeirada, voltada para o mercado de trabalho não será capaz de
atender a essa premissa.
Partindo da concepção teórica do professor reflexivo, Pimenta (2002) coloca a
posição de Donald Shön, fundamentada em Dewey. Shön (1992) critica a formação de
professores a partir de um currículo normativo “que primeiro apresenta a ciência, depois a sua
aplicação e por último um estágio que supõe a aplicação pelos alunos dos conhecimentos
técnico-profissionais” (PIMENTA, 2002, p. 19). A profissionalização docente desenvolvida
nesse formato “não consegue dar respostas às situações que emergem no dia a dia
profissional, porque ultrapassam os conhecimentos elaborados pela ciência, e as respostas
técnicas que esta poderia oferecer ainda não estão formuladas” (PIMENTA, 2002, p. 19).
Essa realidade de formação, marcada pelas especificidades do ambiente escolar
permite-nos alguns questionamentos importantes: Como poderá o professor pensar a sua
prática, se não foi formado para tanto? Com uma formação precária, poderá esse professor,
confrontado com disposições e com identidades plurais que são fontes de tensão, construir
uma outra realidade escolar? Assumirá esse professor uma posição cômoda, culpabilizando o
Estado e o aluno, eximindo-se de qualquer responsabilidade? Por fim, distante de uma posição
político-reflexiva, perguntará: O que fazer? Como agir?
Freire (1996) alerta que:
(...) uma prática docente espontânea ou quase espontânea, “desarmada”,
indiscutivelmente produz um saber ingênuo, um saber de experiência feito, a
que falta a rigorosidade metódica que caracteriza a curiosidade
70
epistemológica do sujeito. Este não é o saber que a rigorosidade do pensar
certo procura. Por isso, é fundamental que, na prática da formação docente, o
aprendiz de educador assuma que o indispensável pensar certo não é
presente dos deuses nem se acha nos guias de professores que iluminados
intelectuais escrevem desde o centro do poder, mas, pelo contrário, o pensar
certo que supera o ingênuo tem que ser produzido pelo próprio aprender em
comunhão com o professor formado (FREIRE, 1996, p. 38).
Se as autoridades competentes estivessem realmente imbuídas de atender às
demandas educacionais, no que concerne à formação de professores, poderiam adotar outra
política, conforme nos leva a refletir Tardif (2004):
A pedagogia não pode ser outra coisa senão a prática de um profissional, isto
é, de uma pessoa autônoma, guiada por uma ética do trabalho e confrontada
diariamente com problemas para as quais não existem receitas prontas. Um
profissional do ensino é alguém que deve habitar e construir seu próprio
espaço pedagógico de trabalho de acordo com limitações complexas que só
ele pode assumir e resolver de maneira cotidiana, apoiado necessariamente
em uma visão de mundo, de homem e de sociedade (TARDIF, 2004, p. 149).
Os idealizadores das políticas educacionais brasileiras não parecem
comprometidos com a formação desse profissional reflexivo e ético tratado nos parágrafos
anteriores. A criação do Curso Normal Superior, dentro de uma lógica voltada para o aumento
da escolaridade dos professores, envolta na “fetichização da moderna empregabilidade”, vem
comprovar o descaso com questões significativas da educação escolar. (OLIVEIRA, 2003, p.
76). Pensada na lógica do mercado e dentro das reformas neoliberais dos anos de 1990, o
Curso Normal Superior sofreu e sofre significativas críticas. Destaca-se o fato desse curso não
propiciar a formação de professores reflexivos.
Propõe-se que o professor não separe a reflexão de sua prática. A reflexão
contínua acerca de sua ação permitirá ao docente aprimorar o seu ofício, torná-lo-á um
pesquisador da sua práxis. A pesquisa toma contornos próprios na formação de professores,
apresenta-se como princípio educativo que gera autonomia no sujeito, produz conhecimento,
no qual ele mesmo seja a referência central.
Como abordamos no início deste capítulo, as inúmeras e significativas
intervenções na educação brasileira na década de 1990 definem as atuais políticas públicas no
campo da educação, principalmente na formação de professores. Foram apresentadas no
Parecer 115/99 de 10/08/1999, com a criação dos Institutos Superiores de Educação e, ainda,
nas Diretrizes Curriculares para a Formação Inicial de Professores para a Educação Básica em
Nível Superior, determinadas pelo parecer CNE/CP 009/2001 de 08/05/2001 (AGUIAR,
71
2002, p. 571-606) e pela Resolução CNE/CP nº 01 de 18/02/2002 (AGUIAR, 2002, p. 565-
569).
É estabelecido na LDB, no Artigo 63, que os Institutos Superiores de Educação
manterão:
I – cursos formadores de profissionais para a educação básica, inclusive o
Curso Normal Superior, destinado à formação de docentes para a educação
infantil e para as primeiras séries do ensino fundamental;
II – programa de formação pedagógica para portadores de diplomas de
educação superior que queiram se dedicar à educação básica (BRASIL,
1996).
O Artigo 63 evidencia a habilitação específica do magistério, que se dará nos
Institutos Superiores de Educação; o parecer nº. 115/99 da Câmara de Ensino Superior do
CNE regulamenta os Institutos Superiores de Educação e esclarece que concepção de
formação de professores permeia as propostas atuais. A preparação dos profissionais da
educação básica se dará fundamentalmente em uma instituição de ensino de caráter técnico-
profissional.
A regulamentação dessa nova organização acadêmica, os ISE, negligencia as
experiências positivas de formação de professores em universidades, principalmente no que
tange à formação de professores para a educação infantil e séries iniciais. A criação do ISE,
consubstanciada em políticas deliberadas de intervenção na organização institucional e nos
processos formativos, influenciam, portanto, a formação de professores.
Resoluções subsequentes ao Artigo, ao caracterizar os ISE como instituições de
caráter profissional – que objetivam a formação inicial, continuada e complementar, podendo
incluir, também o Curso Normal superior para licenciatura de profissionais em educação
infantil e de professores para os anos iniciais do ensino fundamental – estabelecem ações
contrárias ao movimento de diversas entidades educacionais e sindicais, que defendem a
docência como base da formação de todo educador.
Evidencia-se, portanto, um modelo de formação cujo cerne é a propalada melhoria
dos indicadores educacionais em relação à titulação docente, sem uma efetiva melhoria da
qualidade de formação e das condições de trabalho.
Tornaram-se realidade cursos voltados para o aligeiramento da formação docente
(entendida como municiamento prático, voltada para a aquisição de habilidades e
competências, constituindo expressão do como fazer), diversificação e diferenciação dos
72
lócus de formação (dissociação entre ensino e pesquisa), interpenetração entre as esferas
pública e privada, em detrimento da esfera pública.
O aligeiramento na formação docente, principalmente do ensino fundamental,
vem acompanhado do financiamento público (recursos do Fundo de Manutenção e
Desenvolvimento do Ensino Fundamental e Valorização do Magistério – FUNDEF). Essas
políticas propiciaram um “boom” na instalação de Cursos Normal Superior e Pedagogia em
todo o país nos anos que se seguiram à Lei.
As implicações dessa forma de organização do Ensino Superior para a formação
dos profissionais da educação geraram um debate nacional, envolvendo diferentes entidades
acadêmicas, como a Associação Nacional pela Formação dos Profissionais da Educação
(ANFOPE) – e vários estudiosos da área como Aguiar (1999); Kuenzer (1998); Freitas
(1999).
(...) a ANFOPE tem assumido historicamente uma posição contrária a
qualquer proposta que vise criar centros específicos de formação de
professores, separados dos centros e dos cursos que formam os profissionais
da educação e pretendam separar a formação de professores da formação dos
demais profissionais da educação e do ensino, ou dos especialistas
(FREITAS, 1999, p. 22).
O Conselho Nacional de Educação, antes do Decreto Federal nº. 3.276, de
dezembro de 1999, havia regulamentado os Institutos Superiores de Educação, por meio da
Resolução CP nº. 01, de 30 de setembro de 1999. Em seu Artigo 1º, são fixados os objetivos
dos Institutos e os tipos de cursos por eles oferecidos.
Art. 1º - Os institutos superiores de educação, de caráter profissional, visam
à formação inicial, continuada e complementar para o magistério da
educação básica, podendo incluir os seguintes cursos e programas:
I – curso normal superior, para licenciatura de profissionais em educação
infantil e de professores para os anos iniciais do ensino fundamental;
II – cursos de licenciatura, destinados à formação de docentes dos anos finais
do ensino fundamental e do ensino médio;
III – programas de formação continuada, destinados à atualização de
profissionais da educação básica dos diversos níveis;
IV – programas especiais de formação pedagógica, destinados a portadores
de diploma de nível superior que desejem ensinar nos anos finais do ensino
fundamental ou no ensino médio, em áreas de conhecimento ou disciplinas
de sua especialidade, nos termos da Resolução CNE nº 2/97;
V – formação pós-graduada, de caráter profissional, voltada para a atuação
na educação básica (BRASIL, 1999a).
O Artigo 3º estabelece sobre a organização dos Institutos:
73
Art. 3º - Os institutos superiores de educação poderão ser organizados:
I – como instituto superior propriamente dito, ou em faculdade, ou em
faculdade integrada ou em escola superior, com direção ou coordenação do
conjunto das licenciaturas ministradas;
II – como unidade de uma universidade ou centro universitário, com direção
ou coordenação do conjunto das licenciaturas ministradas;
III – como coordenação única de cursos ministrados em diferentes unidades
de uma mesma instituição (BRASIL, 1999a).
Em relação à organização dos cursos, o Conselho Nacional de Educação publicou
a Resolução CNE/CP nº 02, de 19 de fevereiro de 2002. Nessa resolução, foram dadas as
especificações que deveriam ser observadas pelas instituições de ensino superior na
organização da grade curricular dos cursos de licenciatura:
Art. 1º - A carga horária dos cursos de Formação de Professores da
Educação Básica, em nível superior, em curso de licenciatura, de graduação
plena, será efetivada mediante a integralização de, no mínimo, 2800 (duas
mil e oitocentas) horas, nas quais a articulação teoria-prática garanta, nos
termos dos seus projetos pedagógicos, as seguintes dimensões dos
componentes comuns:
I – 400 (quatrocentas) horas de prática como componente curricular,
vivenciadas ao longo do curso;
II – 400 (quatrocentas) horas de estágio curricular supervisionado a partir do
início da segunda metade do curso;
III – 1800 (mil e oitocentas) horas aulas para os conteúdos curriculares de
natureza científico-cultural;
IV – 200 (duzentas) horas para outras formas de atividades acadêmico-
científico-culturais.
Parágrafo único. Os alunos que exerçam atividade docente regular na
educação básica poderão ter redução da carga horária do estágio curricular
supervisionado até o máximo de 200 (duzentas) horas.
Art. 2º - A duração da carga horária prevista no Art. 1º desta Resolução,
obedecidos os 200 (duzentos) dias letivos/ano dispostos na LDB, será
integralizada em, no mínimo, 3 (três) anos letivos (BRASIL, 2002).
O Curso Normal Superior passa a ser oferecido em concomitância com as
determinações da Década da Educação, fixada no Artigo 87 da Lei 9394/96, sobretudo o
parágrafo 4º: “Até o fim da Década da Educação, somente serão admitidos professores
habilitados em nível superior ou formados por treinamento em serviço” (BRASIL, 1996).
A interpretação desse artigo, assim como a Lei 9424/96, que regulamentou o
Fundo Nacional de Desenvolvimento do Ensino Fundamental e Valorização do Magistério –
FUNDEF, permitiu, sobretudo, aos municípios pressupor que os professores que tinham
formação de nível médio deveriam obrigatoriamente completar seus estudos em âmbito
superior.
74
As leis 9399 e 9424 criaram uma demanda, sobretudo para as instituições
acadêmicas privadas no sentido de oferecer a formação em nível superior às professoras das
séries iniciais do Ensino Fundamental. Esse novo nicho permitiu uma grande oferta por parte
da iniciativa privada de cursos de nível superior, entre eles o Curso Normal Superior.
Apresentada a fundamentação legal que permitiu a instituição do Curso Normal
Superior e as demandas criadas a partir da criação desse curso, procuraremos, agora, refletir
sobre o papel e as condições de formação de professores, buscando identificar seus
fundamentos no quadro atual.
Trata-se de um curso de caráter técnico-profissionalizante. A carga horária de
3.200 horas estabelecida em lei pode ser reduzida, podendo chegar até a 1.600 horas,
dependendo da experiência e da formação anterior do professor-aluno.
Para Freitas (1999):
(...) pela primeira vez se abre a possibilidade de aproveitamento, em nível
superior, dos estudos realizados em nível anterior de escolaridade,
desqualificando e banalizando o rigor necessário que deveria ser exigido dos
estudos superiores.
Outra característica discriminatória é a exigência de qualificação do corpo
docente – 10% de mestres e doutores – que contrasta com a exigência de
qualificação nas universidades – 30% de mestres e doutores – caracterizando
uma desqualificação dos formadores de professores, com sérias implicações
no ensino e nos estudos desenvolvidos nessas instituições (FREITAS, 1999,
p. 43).
Outro aspecto a ser evidenciado diz respeito às diretrizes curriculares que
orientarão a elaboração dos currículos. Dentro do curso em questão, os estudos tomarão por
base as diretrizes para a educação básica, ao contrário de outras graduações, que priorizavam
os conhecimentos científicos. Cremos que esse modelo curricular permitirá uma formação
técnica instrumental, retirando do profissional da educação a possibilidade de desenvolver-se
como “intelectual responsável por uma área específica do conhecimento, atribuindo a ele uma
dimensão tarefeira, para o que não precisa se apropriar dos conteúdos da ciência e da pesquisa
pedagógica” (KUENZER, 1998 apud AGUIAR, 1999, p. 111).
Hoje, o debate nacional sobre a formação de professores, suas concepções, seu
conteúdo e forma vão dando lugar a regulamentações, propostas, documentos e políticas
oficiais, garantindo, assim, os propósitos reformadores do Estado.
Para Nóvoa (1991 apud FIDALGO et al. 2008):
75
A profissionalização do professorado acompanha-se de uma política de
normatização e de controle estatal. As escolas normais constituem lugar
certo para disciplinar os professores, transformando-os em agentes do
projeto social e político da modernidade; os discursos aqui produzidos e
difundidos, bem como as práticas que lhes dão corpo – edificam um novo
modelo de professor, no qual as “antigas” referências religiosas se cruzam
com o “novo” papel de servidores do Estado e da sua razão. Este processo é
parte integrante de um discurso que tende a redefinir a questão do ensino em
paralelo com as novas modalidades de intervenção do Estado na vida social
(NÓVOA, 1991 apud FIDALGO et al. 2008, p. 65).
A criação de novos cursos e instituições – como o curso Normal Superior e os
Institutos Superiores de Educação – é parte da estratégia da nova modalidade de intervenção
do Estado na vida social, permitindo o cumprimento das exigências dos organismos
internacionais. Com relação a essa modalidade de formação de professores, critica-se que eles
“são expropriados de seus saberes, ao transformarem-se em executores de “pacotes virtuais”,
elaborados por “especialistas”, geralmente de outras instituições, inclusive internacionais,
resgatando-os, assim, o taylorismo e sua dicotomização entre a concepção e execução
(OLIVEIRA; FREITAS, 2008, p. 57).
Ainda segundo os autores:
A profissionalização, além de acentuar o clima de competitividade e
industrialização do trabalho docente, vem contribuindo para
desprofissionalização, na medida em que deprecia e marginaliza a
qualificação, a autonomia dos professores submetendo-os a um aumento do
tempo e da intensidade do trabalho, além de promover a precarização dos
salários e as condições do exercício do magistério (OLIVEIRA; FREITAS,
2008, p. 58).
Esse modelo favorece as políticas governamentais que apontam para uma
formação diferenciada, contribuindo para a precariedade do trabalho docente. A inconsistente
formação, acrescida de salário baixo, das precárias condições de trabalho e das ameaças de
desemprego, tem levado o professor à vivência de diferentes sintomatologias físicas e
psíquicas, que se traduzem em diversas síndromes, como burnout
25
.
Arroyo (2003), referindo-se à questão em pauta, considera que a
qualificação/formação dos mestres é, apenas, um dos aspectos da desqualificação do próprio
sistema escolar. Todo “cidadão-trabalhador” tem direito a uma formação adequada ao
exercício de sua função; contudo, o despreparo do mestre foi sempre um mecanismo para
25
O burnout se constitui como uma síndrome multideterminada; ou seja, uma combinação de fatores que
favorece o seu aparecimento. Essa síndrome, em resumo, se traduz no esgotamento profissional. Sua
denominação é originária da expressão inglesa burn out, que significa queimar-se completamente.
76
mantê-lo fraco, disponível às manobras e conchaves político-burocráticos. Decorrentemente,
o despreparo do professor está na raiz de sua desfiguração social e de sua fragilidade
profissional. Defender uma consciente capacitação profissional é requisito tanto para a
profissionalização do professor, quanto para lhe conferir uma identidade social e política.
Nas circunstâncias atuais da escola básica, esse professor-aluno emanado do
Curso Normal Superior é estratégico para os propósitos reformistas do Estado.
Provavelmente, o professor-aluno é o profissional que, formado em bases tecnicistas e
pragmatistas, atue firme e decisivamente, cumprindo as metas da reforma e das políticas
educacionais iniciadas nos anos de 1990.
Como discutimos neste capítulo, as políticas educacionais no Brasil vêm sendo
marcadas por significativas mudanças, destacando-se – especialmente as de ordem legal/
institucional – no contexto das reformas empreendidas a partir dos anos de 1990.
Depreende-se dessa realidade que repensar a educação no Brasil implica
considerar esses novos atores, os limites da intervenção da política educacional, a
compreensão do Estado como expressão da correlação de forças contraditórias, entendendo-a
para além dos limites da classe dominante, pela força e pelo consenso, ou seja, hegemonia
encouraçada de coerção. Para tanto, é importante buscar em Gramsci (1984) a noção de
Estado ampliado (integral), entendendo a articulação entre a sociedade civil (sistema privado
de produção e aparelhos ideológicos de hegemonia) e a sociedade política, o que nos faz
voltar à luta por uma formação inicial sólida, marcada pela qualidade.
Fomentar a discussão sobre a formação, relacionando-a ao processo de
profissionalização, constitui tarefa complexa. Transformações acontecidas no mundo do
trabalho, resultado das políticas globalizantes, têm levado ao surgimento de novos espaços,
permitindo assumirem a formação. Contraditoriamente, salários são diminuídos, e o
desemprego estrutural encontra-se em franca expansão.
A busca por um padrão de qualidade social no processo de formação de
professores deve ser perseguindo e deve contar com interlocuções com a sociedade civil
organizada. Universidades, entidades educacionais, sindicatos de professores devem ocupar
importantes espaços nessa discussão.
Nesse contexto, quaisquer políticas que estejam voltadas para a formação
profissional devem partir da realidade estabelecida, das necessidades prementes e das
condições objetivas dos profissionais que, em sua maioria, têm sido caracterizados por baixa
remuneração, longas jornadas e, portanto, precárias condições de trabalho.
77
A universidade, na contramão das reformas, deve pautar-se por garantir um
padrão de qualidade a ser efetivada através da indissociabilidade entre ensino, pesquisa e
extensão e pela articulação com a sociedade civil e as demandas do setor produtivo.
Não temos como negar que a formação em nível superior coloca-se como
caminho fértil para a formação e a profissionalização. Considerando que a educação, como
prática social, não se limita à escolarização, prática educativa institucionalizada, mas tem
nessa o seu espaço privilegiado. É importante colocarmos que essas políticas não podem ser
entendidas pela submissão à lógica utilitarista de vinculação ao processo produtivo. A
universidade não pode estar à mercê do mercado. Há de se resgatar seu papel político-
institucional, sua função social no novo cenário que se delineia.
Reservamos o Capítulo III para enfocar o Curso Normal Superior oferecido pela
Universidade Estadual de Montes Claros – UNIMONTES. Para tanto, apresentar-se-á a
organização desse curso e refletir-se-á como ele foi oferecido, considerando o Curso Normal
Superior: Formação de Professores de 1ª a 4ª Série do Ensino Fundamental – Emergencial
2000-2002 – Magistério das Séries Iniciais do Ensino Fundamental, Relatório Final do Curso
Normal Superior – Magistério das Séries Iniciais do Ensino Fundamental, Termo de
Convênio entre a Prefeitura Municipal de Montes Claros e Fundação de Apoio ao
Desenvolvimento de Ensino Superior do Norte de Minas (FADENOR), dados sobre os
professores da rede municipal da Secretaria Municipal de Educação de Montes Claros, leis,
regulamentos, normas e pareceres dos três níveis de Governo, referentes à temática em
questão.
CAPÍTULO III
O CURSO NORMAL SUPERIOR DA UNIVERSIDADE ESTADUAL DE MONTES
CLAROS: ELEMENTOS PARA UMA ANÁLISE
UNIMONTES, conhece a ti mesmo! (JOSÉ GERALDO DE FREITAS
DRUMOND)
26
.
A epígrafe deste capítulo é decorrente da nossa indignação frente às dificuldades
de acesso a documentos institucionais necessários para a nossa reflexão e prosseguimento da
pesquisa. Julgamos de grande importância que a universidade possa conhecer-se. Para tanto, é
importante que se abra para a pesquisa, sendo, inclusive, ela o próprio objeto a ser pesquisado.
A descoberta da própria realidade possibilitará à universidade ampliar o diálogo com o
universo acadêmico, assim como contribuirá para que não fique centrada em ouvir verdades
iguais às suas, no que Alves (2004) chama de “desinquisição do saber”.
Acrescentar-se-ão, neste capítulo, a estrutura organizacional do Curso Normal
Superior da UNIMONTES, a reflexão sobre o projeto pedagógico inicial que tangencia a
formação de professores de 1ª a 4ª série do Ensino Fundamental, assim como, considerações
feitas a partir do Relatório Final do Curso Normal Superior.
Para fundamentá-la, utilizaremos um levantamento bibliográfico de referências
recentes, incluindo dados obtidos em sites específicos, assim como uma análise dos
documentos a que tivemos acesso.
Reservamos o Capítulo III para enfocar o Curso Normal Superior oferecido pela
Universidade Estadual de Montes Claros – UNIMONTES. Tendo como fundamento nosso
referencial teórico, analisaremos os dados produzidos pelas entrevistas, assim como o Projeto
Político-Pedagógico do Curso Normal Superior: formação de Professores de 1ª a 4ª séries do
Ensino Fundamental, o Relatório Final do Curso Normal Superior – Magistério das Séries
Iniciais do Ensino Fundamental, o Termo de Convênio entre a Prefeitura Municipal de
Montes Claros e Fundação de Apoio ao Desenvolvimento de Ensino Superior do Norte de
Minas (FADENOR), dados sobre os professores da rede municipal da Secretaria Municipal de
26
Frase pronunciada pelo ex-reitor da Universidade Estadual de Montes Claros – UNIMONTES, na abertura do
I Seminário de Avaliação Institucional, acontecido de 25 a 27 de setembro de 2009.
79
Educação de Montes Claros, leis, regulamentos, normas e pareceres dos três níveis de
Governo, referentes à temática em questão.
3.1 Breve histórico e apresentação de dados organizacionais da Universidade Estadual
de Montes Claros – UNIMONTES
FIGURA 01 – UNIMONTES: 47 anos para você se orgulhar.
Fonte: Versiani (2009).
Com o slogan veiculado na mídia “UNIMONTES, orgulho de todos!”, a
Universidade Estadual de Montes Claros completou, em 2009, 47 anos de existência. A
mesma mídia informa a existência de sete mestrados próprios, duzentos projetos em
andamento e 440 mil pessoas atendidas anualmente.
A Unimontes resultou da transformação da Fundação Norte-Mineira de Ensino
Superior – FUNM –, de acordo com o artigo 82, parágrafo 03, do “Ato das Disposições
Constitucionais Transitórias”, da Constituição
27
.
A antiga FUNM foi criada em 24 de maio de 1962, a partir de um projeto
apresentado pelo ex-deputado norte-mineiro Cícero Dumont. A Lei foi sancionada pelo
Governador Magalhães Pinto, sob o número de Lei 2.165.
Os anos de 1960, data da criação da FUNM, foram marcados por um significativo
crescimento das universidades. Tal crescimento atingiria o auge nas décadas posteriores,
apontando que a discutida “democratização” do ensino universitário, pleiteada pelas entidades
estudantis, era apenas o início de um processo assinalado por uma maior oferta de vagas e
proliferação de cursos de nível superior. O período em questão foi assinalado por uma
27
Universidade Estadual de Montes Claros – UNIMONTES. Disponível em: <www.unimontes.br>. Acesso em:
agosto de 2009.
80
profunda efervescência ideológica, em que estudantes e entidades ligadas à educação e à
cultura popular criticavam a universidade brasileira, por considerá-la elitista, desvinculada da
realidade nacional e não comprometida com um projeto social e político. A promulgação da
Lei de Diretrizes e Bases nº 4.024 (LDB), em 1961, veio acirrar tais discussões.
Não parece ter sido esse contexto que contagiou políticos e autoridades da região
para a criação da FUNM. Abreu (2006, p. 173) apresenta como propósitos de interiorização
do ensino superior em Minas “formar pessoas tanto com potencial para estimular o
desenvolvimento local quanto para desenvolver uma maturidade intelectual que as tornasse
aptas a constituírem novas lideranças”. Apesar de estar se referindo a um outro contexto, a
justificativa parece atender aos propósitos dos grupos envolvidos com a criação da FUNM.
Silva (2008) assim descreve o processo de nascimento da instituição:
As primeiras iniciativas em prol da criação do ensino superior no norte de
Minas, precisamente na cidade de Montes Claros, ocorreram no ano de 1961.
Essa origem está relacionada diretamente com a formação de professores
visando à melhoria da qualidade do ensino de 1º e 2º grau na região, que era
exercido, em sua maioria, por professores leigos. Outro aspecto motivador
para a criação do ensino superior foi o caráter terminal do curso de 2º grau.
Muitos jovens ficavam parados sem estudar, por falta de opção, enquanto
aqueles que tinham melhores condições financeiras migravam para estudar
nos grandes centros e acabavam não retornando à região (SILVA, 2008, p.
48).
Através da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras – FAFIL –, foram oferecidos
os cursos de História, Geografia, Letras e Pedagogia. Inicialmente funcionava no prédio do
Colégio Imaculada Conceição, pertencente às irmãs da Congregação do Sagrado Coração de
Maria, depois no casarão localizado na Rua Coronel Celestino, nº. 75, até sua completa
mudança para o atual Campus Universitário Professor Darcy Ribeiro, localizado na Vila
Mauriceia.
O Decreto Estadual nº. 30.971, de 09 de março de 1990, instituiu a Universidade
Estadual de Montes Claros, dentro do contexto da promulgação da Constituição Mineira de
1989, em seu parágrafo 3º, Artigo 82, e estabeleceu a transformação da FUNM em autarquia.
A efetivação da UNIMONTES como autarquia
28
aconteceu a partir do momento em que
antigos servidores da FUNM foram incorporados à nova UNIMONTES.
28
A portaria de número 1116, datada de 21/07/1994, homologou, via Ministério da Educação, o reconhecimento
da UNIMONTES como Universidade, em conformidade com o Parecer nº. 232/94 do Conselho Estadual de
Educação de Minas Gerais (UNIVERSIDADE ESTADUAL DE MONTES CLAROS, 2009).
81
O reconhecimento da UNIMONTES como Universidade ocorreu em um
momento marcado pela reordenação do capitalismo em âmbito mundial. A temática foi
discutida no capítulo II desta dissertação. O Brasil foi signatário dessas mudanças, marcadas
pela adesão à política dos organismos multilaterais, como o Banco Mundial e o Banco
Internacional de Desenvolvimento.
Nos anos 1990, Minas Gerais, durante o governo de Eduardo Azeredo (1995 –
1998), aderiu à agenda de reformas educacionais que vinham sendo implementadas pelo
governo de Fernando Henrique Cardoso. A educação ganhou, então, centralidade, e o discurso
oficial passou a defender o aumento da qualidade e da eficiência para o próximo milênio.
Foram tomadas medidas que alteraram a configuração, a organização e a gestão da educação
no Estado, e que tinham como emblema “Minas aponta o caminho”
29
.
É no contexto dessas mudanças que se dá a constituição da Universidade Estadual
de Montes Claros. Embora nova na condição da universidade, a UNIMONTES, utilizando-se
da autonomia e descentralização, criou outros cursos, “bem como instituiu em suas bases uma
fundação (FADENOR), face ao recuo do Estado mínimo na contenção de despesas com a
universidade” (SILVA, 2008, p. 57).
QUADRO 02 - Legislação Referente à Constituição da UNIMONTES
Legislação Especificação
Constituição do Estado de Minas Gerais, de 21 de
setembro de 1989, art. 82, § 3
o
, do Ato das Disposições
Constitucionais Transitórias.
Transforma em Autarquia, com a denominação de
Universidade Estadual de Montes Claros - Unimontes,
a Fundação Norte-Mineira de Ensino Superior -
FUNM.
Decreto n
o
31.840 de 24 de novembro de 1990, do
Governador do Estado de Minas Gerais.
Aprova o Estatuto da Unimontes com base no Parecer
do Conselho Estadual de Educação n
o
556, de 16 de
agosto de 1990.
Decreto n
o
30.971 de 09 de março de 1990, do
Governador do Estado de Minas Gerais.
Institui a Universidade Estadual de Montes Claros e dá
outras providências.
Lei n
o
11.517 de 13 de julho de 1994, do Governador
do Estado de Minas Gerais.
Reorganiza a Universidade Estadual de Montes Claros
e dá outras providências.
Parecer n
o
232/94 de 12 de abril de 1994, do Conselho
Estadual de Educação do Estado de Minas Gerais.
Reconhece a Universidade Estadual de Montes Claros.
Portaria n
o
1.116 de 21 de julho de 1994, do Ministro
de Estado da Educação e do Desporto.
Reconhece a Universidade Estadual de Montes Claros.
Fonte: Assessoria Jurídica - UNIMONTES.
Podemos acompanhar, pelo quadro acima, a evolução da legislação referente à
constituição da Universidade Estadual de Montes Claros. Jardim et al. (2002) fala da
29
“O projeto reformista mineiro teve como propósito garantir a oferta da educação básica para todos,
respondendo às exigências impostas pelo atual sistema de reestruturação capitalista”. (PEDROSA, 2010).
Disponível em: <http://cac-php.unioeste.br/projetos/gpps/midia/seminario2/trabalhos/educacao/medu21.pdf>.
Acesso em: janeiro de 2010.
82
necessidade de um recorte geográfico, social e político da região para entendermos o
nascimento da FUNM/UNIMONTES.
Diante das inúmeras problemáticas sociais que se apresentam no âmbito da
educação, saúde, moradia e mão-de-obra qualificada o Norte de Minas que
tem Montes Claros como centro polarizador, não podia prescindir do ensino
de nível superior, em que uma interrelação de saberes tivesse como objetivo
minimizar os problemas que serviam de empecilho ao seu progresso. Este
seria o propósito constante da universidade do Norte de Minas (JARDIM et
al., 2002, p. 19).
Tal propósito foi lembrado na propaganda oficial da instituição, que sempre
propalou a UNIMONTES como “Universidade de Integração Regional”. A UNIMONTES
vem atuando em uma extensa região, alcançando mais de 336 municípios, sendo a única
instituição pública estadual de ensino universitário, situada no norte de Minas. Trata-se da
principal instituição da DGE-17 (Distrito Geoeducacional), abrangendo mais de 150
municípios.
Desde sua fundação, “a faculdade das meninas
30
” – como ficou conhecida – já
apontava sua preocupação com relação à formação de professores nas graduações de
Pedagogia, Letras, Geografia e História (MAIA; CORDEIRO, 2002).
Hoje, além dos cursos acima citados, oferece também as licenciaturas de
Matemática, Biologia, Educação Física, Filosofia, Educação Artística, Letras-espanhol,
Letras-inglês e Pedagogia.
A efetivação do ingresso do aluno nos cursos de graduação oferecidos pela
instituição ocorre através de Processo Seletivo, aberto a candidatos que tenham concluído o
Ensino Médio ou estudos equivalentes.
É essa instituição que passa a oferecer, a partir de 2000, o Curso Normal Superior
em Montes Claros e cidades adjacentes.
3.2 O Curso Normal Superior da UNIMONTES
A UNIMONTES, procurando atender às exigências da Lei de Diretrizes e Bases
da Educação Nacional – LDB –, passou a oferecer, a partir de 2000, o Curso Normal Superior
30
“Assim foi conhecida a FAFIL nos seus primeiros tempos por seus alunos, em sua maioria mais idosos que as
fundadoras e primeiras mestras” (MAIA; CORDEIRO, 2002, p. 55).
83
em duas modalidades: o Regular e o Emergencial Modular. “O curso teve início em
02/01/2000, com término previsto para janeiro de 2002. Sua segunda edição, autorizada pelo
Decreto Estadual nº. 41.598, de 30/03/01, teve início em julho de 2000 com término previsto
para julho de 2002” (UNIVERSIDADE ESTADUAL DE MONTES CLAROS, 2002, p. 04).
De acordo com a legislação vigente, o Curso Normal Superior Modular –
Magistério das Séries Iniciais do Ensino Fundamental e Normal Superior Magistério da
Educação Infantil foram organizados pelo Instituto Superior de Educação
(ISE/UNIMONTES)
31
, a partir de 2001.
Os municípios participantes do projeto do Curso Normal Superior foram
organizados
(...) em núcleos com infra-estrutura e organização que permitissem o
desenvolvimento das atividades de cunho administrativo e acadêmico. Os
critérios para a definição do núcleo, foram estabelecidos a partir das
condições de infra-estrutura e melhor acesso nas diversas microrregiões. Os
municípios de cada núcleo se consorciaram para dar o suporte financeiro e
logístico ao projeto, resultando em 21 núcleos, na segunda fase, com 900
vagas oferecidas, totalizando 235 municípios envolvidos (UNIVERSIDADE
ESTADUAL DE MONTES CLAROS, 2002, p. 05).
Logo no início, a Secretaria da Educação do Estado e resoluções CEPEX,
autorizaram o imediato início do Curso Normal Superior – Magistério das Séries Iniciais do
Ensino Fundamental, com organização Emergencial/ Modular em 25 núcleos
32
.
Foram autorizados cursos regulares, conforme legislação do CEPEX e da
Secretaria de Educação do Estado em Almenara (Resolução CEPEX, nº. 27/2000, Decreto nº.
41434/2000); Janaúba e Januária (Resolução CEPEX nº. 61/2001); Pirapora (Resolução
CEPEX º 51/2001); Montes Claros e Espinosa (Resolução CEPEX nº. 144/2003); Paracatu
(Resolução CEPEX nº. 183/2003). O Curso Normal Superior – Magistérios das Séries Iniciais
do Ensino Fundamental, com a organização Emergencial/Modular.
Para uma maior compreensão dessa pesquisa, procuramos dar uma visão geral do
curso, por isso recorremos ao primeiro projeto apresentado ao Conselho Estadual de Educação
(CEE/MG), o Projeto do Curso Normal Superior-Formação de Professores de 1ª a 4ª séries do
31
O ISE/UNIMONTES foi instalado de acordo com a Resolução nº. 019 de 26 de janeiro de 2001, do Conselho
de Ensino Pesquisa e Extensão (CEPEX) da instituição, no campus de Montes Claros e nos campi de Almenara,
Januária, Janaúba e Pirapora.
32
Foi primeiramente autorizado para 25 núcleos, através dos Pareceres do Conselho Estadual de Educação de
Minas Gerais – CEE/MG, nº. 741 de 03/11/1999; nº. 63 de 02/02/2000; nº. 70 de 31/01/2001; e dos Decretos nº.
41598 de 30/03/2001 e nº. 42367 de 01/02/2002, conforme dados constantes do Projeto Político-Pedagógico
(1999) do Curso em questão.
84
Ensino Fundamental – Emergencial. O projeto analisado passou por significativas mudanças
no transcorrer da existência do curso. No entanto, julgamos ser ele a base e a essência do
Curso Normal Superior instituído pelo ISE.
Tivemos enorme dificuldade de acesso a esse documento, pois ele não se encontra
arquivado na Reitoria de Ensino. Após várias idas ao Instituto Superior de Educação (ISE),
uma professora desse Instituto nos emprestou o documento, com autorização da coordenadora
de graduação da época, para uma apreciação. É fato que eu não sou professora da
UNIMONTES. Isso dificultou significativamente essa pesquisa.
Consta na identificação do Projeto Político-Pedagógico 2000/2002 que o Curso
Normal Superior Modular – Magistério das Séries Iniciais do Ensino Fundamental tem como
entidade mantenedora a Fundação de Apoio ao Desenvolvimento do Ensino Superior do
Norte de Minas – FADENOR – e, como entidade coordenadora, a Pró-Reitoria de Ensino/
Coordenadoria de Ensino Superior/ Instituto Superior de Educação (UNIVERSIDADE
ESTADUAL DE MONTES CLAROS, 2002).
A FADENOR veio atender a uma estratégia explicitada no documento-base
QUESTÕES CRÍTICAS DA EDUCAÇÃO BRASILEIRA, que, em relação ao ensino
superior, tangenciava que “a autonomia universitária deve vir acompanhada de práticas de
gestão mais profissionais, com vistas a maior captação de recursos próprios, através tanto de
melhor gestão do patrimônio como de maior cooperação com o sistema produtivo”
(SHIROMA et al., 2007, p. 67).
A educação, como elemento significativo do sistema produtivo, constitui um bem
de serviço, não mais um direito social. Passa a valer, não pelo que de fato representa em
termo de conhecimento, mas pelo que poderá oportunizar na conquista de espaços na
sociedade capitalista. Analisando criticamente esse processo, percebe-se o quanto as reformas
implementadas vieram favorecer a construção de uma cultura do trabalho, que permitiria
padrões de comportamento úteis ao sujeito no mercado produtivo e, consequentemente, de
consumo. Nessa realidade, a escola se afasta dos princípios éticos, do respeito mútuo, das
responsabilidades sociais, de seu compromisso de formar cidadãos conscientes e participantes
de seu meio social.
Dentro das políticas marcadas pelo recrudescimento do Estado mínimo e com
respaldo na LDB/96, a UNIMONTES (prestadora de serviços educacionais), através da
FADENOR (contratada), estabeleceu parcerias com MUNICÍPIOS (contratante) com o intuito
de operacionalizar os novos cursos.
85
Ao qualificar os professores por meio de cursos de licenciatura, com esse formato
para atuar no Ensino Fundamental e na Educação Infantil, em concomitância com a LDB
9.394/96, os organizadores do referido Projeto Político Pedagógico assim justificam
Tendo em vista as preocupações advindas dos municípios em atender suas
necessidades, principalmente no que se refere à redução do número de
professores leigos ou com apenas o 2º grau, presentes ainda nos seus quadros
funcionais e em razão da nova legislação, é que os administradores
municipais vêm procurar medidas para alterar o atual quadro desses
municípios, proporcionando-lhes a melhoria do processo educativo. Essa
melhoria está intrinsecamente ligada à formação dos profissionais da
educação, e essa formação é condição fundamental para a melhoria da
qualidade de vida, para o desenvolvimento, de um modo geral, e para o
exercício pleno da cidadania.
É importante destacar a necessidade de uma intervenção educacional no
sentido de minimizar o hiato que existe entre a oferta e a demanda no ensino
superior por meio do oferecimento de um curso de formação para os
profissionais da educação capaz de devolver a valorização e o prestígio
social aos professores que atuam da 1ª à 4ª série do Ensino Fundamental.
O princípio base deste projeto, que é oferecer uma educação de qualidade,
está fundamentado na prioridade nacional de valorização do magistério, por
meio da recuperação do papel social e pedagógico do professor
(UNIVERSIDADE ESTADUAL DE MONTES CLAROS, 2002, p. 38).
Os autores do projeto político-pedagógico do Curso Normal Superior, em nosso
entender, apenas reproduzem o discurso oficial, ao colocar a educação como elemento central
no crescimento econômico e no recrudescimento dos péssimos indicadores sociais da região.
Desconsideraram reflexões e críticas importantes feitas por entidades
educacionais como a Associação Nacional de Pesquisa e Pós-graduação em Educação
(ANPED) e, Associação Nacional pela Formação de Profissionais de Educação (ANFOP);
Associação Nacional de Docentes do Ensino Superior (ANDES), que apontavam os riscos de
esse modelo contribuir para a desqualificação da universidade, assim como uma depreciação
no papel do professor, advinda desse processo de formação.
A desconsideração com as críticas das entidades representativas do movimento
dos profissionais da educação e de pesquisadores da temática reafirma a negação dos poderes
públicos em possibilitar um projeto de escola que teria como objetivo não só incluir
indivíduos na sociedade, participantes e conscientes do seu papel de cidadão.
Fica evidente que “educação de qualidade” e “valorização do magistério” –
termos recorrentes entre aqueles que justificam o modelo de formação empreendido pelas
reformas e utilizados no documento UNIMONTES – prendem-se a uma concepção de
“qualidade” imposta pelos organismos financeiros internacionais. Mais uma vez, adota-se um
86
processo de formação distanciado das necessidades do cenário educacional brasileiro e ligado
a fatores relativos ao mercado. Esse modelo caracteriza uma velha situação da educação
nacional observada por Romanelli (2001), as autoridades, buscando equacionar problemas
educacionais, foram mais sensíveis a fatores externos do que às demandas educacionais
nacionais.
Ainda segundo o Projeto Político-Pedagógico 2000/2002 o objetivo geral seria
“Atender às necessidades de cumprir o que determina a LDB nº. 9.394, de 20/12/96 e, assim,
garantir a melhoria da qualidade da educação básica da rede pública municipal dos municípios
da região mineira do nordeste” (UNIVERSIDADE ESTADUAL DE MONTES CLAROS,
2002, p. 40).
Quanto aos objetivos específicos, são alistados:
1. Atender à política de graduação da UNIMONTES e implantar a proposta
de formação de professores da 1ª à 4ª série do Ensino Fundamental, em
consonância com a proposta da nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação
Nacional.
2. Favorecer o desenvolvimento da formação de profissionais da educação,
contribuindo para a melhoria do sistema de ensino municipal.
3. Habilitar professores para o ensino fundamental (1ª a 4ª série) em nível
superior, com sólida formação acadêmica e técnica, centrada na competência
intelectual, criatividade e construção de uma consciência profissional e
política.
4. Contribuir para o desenvolvimento da pesquisa relativa à formação do
professor e ao processo ensino/aprendizagem, com retroalimentação da
qualificação profissional.
5. Promover e implantar, de forma gradativa, o curso de formação de
professores de 1ª à 4ª série do Ensino Fundamental, nos municípios que
apresentarem condições favoráveis para sua efetivação.
6. Desencadear um processo de formação em serviço, por meio de realização
de ações presenciais e atividades orientadas, a partir da ação reflexiva sobre
a prática pedagógica e a relação ensino-aprendizagem dominante na sala de
aula.
7. Aprofundar o domínio dos conteúdos básicos do Ensino Fundamental, a
fim de que o professor-aluno resolva situações-problema que exijam análise,
síntese, avaliação e aplicação dos conhecimentos historicamente
acumulados.
8. Ampliar a formação didático-pedagógica do professor-aluno,
possibilitando-lhe o desenvolvimento de suas habilidades, de seus saberes e
de suas atitudes.
9. Criar condições para que o supervisor itinerante ofereça acompanhamento
mais sistemático a seus alunos e atendimento àqueles que apresentarem mais
dificuldades nesse processo (UNIVERSIDADE ESTADUAL DE MONTES
CLAROS, 2002, pp. 40/41).
87
A concretização – ou não – de tais objetivos é questão de reflexão deste e no
próximo capítulo, principalmente, à luz da análise dos depoimentos colhidos dos vários atores
participantes do processo.
As características do Curso Normal Superior e seus destinatários estão presentes
no Projeto Político-Pedagógico (PPP):
O curso será oferecido aos professores da rede pública, especialmente a
municipal, terá a duração de dois anos, devendo realizar-se com uma carga
horária de 3.200 h de atividades acadêmicas, com acompanhamento
permanente do estágio curricular da carga horária destinada a seminário e à
elaboração do trabalho de conclusão de curso, realizando de forma
intervalar/intensiva nos meses de janeiro e julho, as atividades teóricas
ministradas pelos professores-formadores, compondo-se de quatro módulos
de disciplinas teórico-práticas (UNIVERSIDADE ESTADUAL DE
MONTES CLAROS, 2002, p. 40).
No que tange à clientela, vale ressaltar que o corpo discente foi selecionado entre
professores pertencentes à rede pública de ensino municipal da região norte-mineira, por isso
o professor- aluno candidato ao Curso Normal Superior deveria:
ser portador da habilitação em Magistério (antigos cursos normais) em
nível médio ou outro curso de Ensino Médio ou equivalente;
estar em exercício em sala de aula de 1ª a 4ª série do Ensino
Fundamental da Rede Pública de Ensino;
ter sido classificado em processo seletivo específico da
UNIMONTES. (UNIVERSIDADE ESTADUAL DE MONTES CLAROS,
2002, p. 44).
Com o objetivo de cumprir a legislação que se refere à redução do número de
professores leigos ou com apenas o 2º grau, presentes ainda no quadro de funcionários
municipais, foram firmados convênios com o município, por meio das prefeituras.
“A oferta deste curso, sob a responsabilidade financeira da instituição e do Estado,
não seria possível, por não haver dotação orçamentária para tal fim. Tal fito levou a
UNIMONTES a compartilhar com o setor demandante, as prefeituras municipais, os custos de
implantação e manutenção” (UNIVERSIDADE ESTADUAL DE MONTES CLAROS, 2002,
p. 04).
A Prefeitura Municipal de Montes Claros – MG, na gestão do ex-prefeito Jairo
Athayde, tendo à frente da Secretaria de Educação a professora Silvina Fonseca, assinou
contrato de prestação de serviços com a Universidade Estadual de Montes Claros –
88
UNIMONTES – via Fundação de Apoio ao Desenvolvimento de Ensino do Norte de Minas
(FADENOR). A cláusula primeira desse contrato estabelece que:
O presente contrato tem por objetivo a valorização do magistério através do
interesse comum das partes convenientes, garantindo aos professores da rede
municipal de ensino o direito de participar em curso de Licenciatura, de
Graduação Plena, de Formação em Nível Superior de 1ª a 4ª Série do Ensino
fundamental, ministrado pela UNIMONTES, através de processo seletivo,
em turmas de, no mínimo 50 (cinquenta) alunos (UNIVERSIDADE
ESTADUAL DE MONTES CLAROS, 1999, p. 03).
Embora esse tenha sido o contrato específico da UNIMONTES com a prefeitura
de Montes Claros, outros foram firmados com demais prefeituras demandantes, que
receberam o Curso Normal Superior. Tivemos acesso a dois outros convênios (Janaúba/
Pirapora) e percebemos que a obrigatoriedade da Lei e a necessidade de valorização do
magistério foram sempre lembradas.
Não nos esqueçamos de que é prática comum no norte de Minas a utilização de
nossos professores, principalmente contratados, como cabos eleitorais em eleições. E que
aquilo que é “dado” pelas prefeituras é cobrado em dobro nesse período.
De forma a viabilizar o Curso Normal Superior, os municípios puderam
estabelecer convênios ou parcerias com instituições de nível superior para os professores em
exercício. A UNIMONTES ofereceu módulos presenciais, com ocorrência em períodos de
férias escolares, em caráter especial.
Os convênios/ parcerias estabelecidos não podem ser vistos de forma simplista.
Apontam uma sintonia entre sujeitos e instituições envolvidas.
Em relação ao Normal Superior Modular da UNIMONTES, havia uma total
separação entre os aspectos pedagógicos e acadêmicos, de responsabilidade do Instituto
Superior de Educação (ISE) e as questões financeiras que deveriam ser tratadas com a
FADENOR. A operacionalização do Curso Normal Superior Modular oportuniza a separação
público/privado e exemplifica o recrudescimento do Estado em relação ao financiamento da
Universidade e as novas formas de captação de recursos financeiros pela instituição. Essa
realidade, tal como posta, proveniente de discussões históricas que precederam a LDB
9394/96, possibilita reflexões sobre o papel das universidades públicas no país.
Muitos acordos foram firmados apressadamente, fazendo com que as condições
materiais oferecidas por algumas prefeituras fossem escassas – poucos livros para pesquisa,
ausência de material didático específico, deficiente infra-estrutura etc.
89
Embora universitários da UNIMONTES, alguns participantes jamais vieram a
conhecer o campus Darcy Ribeiro ou tiveram a oportunidade de vivenciar a “vida
universitária”. A UNIMONTES oferecia-lhes o diploma de nível superior, sem dar-lhes a
oportunidade de trocar experiências com outras graduações, participarem de congressos e
eventos da instituição.
Na elaboração do Projeto Pedagógico, foram considerados os seguintes
fundamentos básicos de ordem filosófica.
A preocupação pela qualidade na formação dos profissionais da educação é o
princípio-base deste projeto, fundamentado na prioridade nacional de
valorização do magistério, buscando a recuperação do papel pedagógico e
social do professor, através de novas estratégias de formação, qualificando-
os adequadamente face às exigências da nova LDB de Educação Nacional
(UNIVERSIDADE ESTADUAL DE MONTES CLAROS, 2002, p. 41).
Sem dúvida, como explicitado nos fundamentos básicos de ordem filosófica do
Projeto, há uma necessidade premente de valorizar o magistério e recuperar seu papel social.
No entanto, o curso Normal Superior vem sendo alvo de inúmeras críticas, que alertam para a
possibilidade de o Curso estar contribuindo para a precarização descuidada que tem como
objetivo maior atender às demandas do Estado, ou seja, “brincando de profissionalização”
(FRIGOTTO, 2000).
Leite (1997) alerta para a possibilidade de que o aumento da escolaridade das
docentes, através do Normal Superior, pode estar favorecendo uma precarização maior do
emprego e um rebaixamento da função docente, contradizendo uma antiga crença da
Sociologia do Trabalho, segundo o qual a tendência à utilização de mão de obra mais
escolarizada implicaria a melhoria das condições de trabalho.
A realidade tem mostrado que a valorização do professor do Ensino Fundamental
tem sido mais retórica do que realidade.
No tocante à grade curricular, ela foi organizada em três grandes núcleos,
compreendendo o Básico (área de conhecimento básico gerais da educação); Pedagógico (área
de Língua e Linguagem, Ciências da Natureza/ Matemática, Ciências Humanas/ Geografia/
História: Teoria e Prática); Prático (área da Prática de Formação/ Estágio Supervisionado).
No que diz respeito à implementação do currículo, assumiu-se a seguinte posição:
“O currículo do Curso de Formação de Professores de 1
a
a 4
a
Série do Ensino Fundamental
apresenta uma estrutura curricular própria, e compreende um elenco de conteúdos
90
programáticos das diversas disciplinas que deverão ser adequadas aos objetivos do curso e à
realidade regional” (UNIVERSIDADE ESTADUAL DE MONTES CLAROS, 2002, p. 46).
A organização curricular (ANEXO D) foi dividida em blocos modulares, com
disciplinas de natureza teórico-prática e práticas organizadas em módulos, de forma a permitir
a integralização curricular em dois anos.
Ainda segundo o Projeto Político Pedagógico, a estrutura curricular priorizará:
interdisciplinaridade, pressuposto fundamental da organização e
operacionalização do curso, permeando a definição de modalidades de ação
pedagógica (aulas, trabalhos coletivos e individuais);
possibilidade de aprofundar as áreas de estudo, através da realização
de seminários, oficinas pedagógicas e outras atividades;
busca de integração teoria e prática, através de experiências
inovadoras em sala de aula.
A organização curricular está estruturada em três grandes blocos:
Área de Fundamentação Básica;
Área de Fundamentação Pedagógica;
Área Prática (UNIVERSIDADE ESTADUAL DE MONTES
CLAROS, 2002, p. 46).
Em termos teóricos sabemos que a estrutura curricular constante do Projeto
Político-Pedagógico é bem pertinente, uma vez que possibilita o redimensionamento da
prática docente, a interdisciplinaridade, o aprofundamento de estudos e a integração teoria/
prática.
No entanto, nem sempre a realidade aproxima-se do ideal. A estrutura da
organização curricular pensada em blocos distintos acaba por favorecer a formação de um
profissional possuidor de conhecimentos básicos não preparados para desenvolver estudos e
pesquisas que subsidiem a sua prática docente. Professores com esse tipo de formação têm
dificuldade de resolver situações próprias emanadas do seu dia-a-dia profissional, uma vez
que os problemas do cotidiano ultrapassam os conhecimentos elaborados pela ciência e as
“técnicas” aprendidas não resultam em soluções.
Essa má formação tem contribuído para os professores a se sentirem “perdidos”,
não responsáveis pelos problemas escolares, incapazes de refletirem sobre o seu cotidiano,
assumindo uma posição, por vezes cômoda.
O Estado ao permitir a organização do Curso Normal Superior nesses moldes,
sem dúvida, contribui para o aumento da escolaridade, para a certificação e/ou diplomação
dos professores mas esquece-se, da necessidade premente de docentes capazes de atuarem em
complexas e diferentes ambientes escolares.
91
O Projeto Político-Pedagógico objetivava que, ao final do Curso Normal Superior
das séries iniciais do Ensino Fundamental, o professor-aluno fosse capaz de reelaborar seu
saber e assumir uma atitude crítico-reflexiva sobre sua prática, articulando a formação inicial
à continuada, devendo, pois, apresentar o seguinte perfil:
Competência intelectual e técnica:
domínio dos conteúdos gerais das séries iniciais do Ensino
Fundamental e dos fundamentos da educação;
conhecimento do processo de ensino e da aprendizagem;
polivalência e capacidade de integração dos conteúdos.
Criatividade:
trabalho interdisciplinar;
renovação das práticas pedagógicas;
inovação tecnológica;
abertura cultural.
Consciência profissional e política:
conhecimento do papel social da escola e do educador;
conhecimento do meio sócio-cultural;
conhecimento do seu potencial de transformador do meio social em
que atua;
ética profissional (UNIVERSIDADE ESTADUAL DE MONTES
CLAROS, 2002, p. 45).
Concebido na lógica do mercado, voltado para aumentar a escolaridade do
magistério e garantir a “qualidade” do ensino, dentro das reformas dos anos de 1990 fica
difícil garantir o perfil descrito no Projeto.
As discussões que permearam a criação do projeto-político pedagógico, em
concomitância com a literatura educacional que amparou a proposta da LDB, chamada por
Shiroma et al (2007, p. 69) “arautos da reforma”, evidenciaram a necessidade da formação de
um profissional da educação emanado do novo contexto político-pedagógico, portador de
habilidades e competências capazes de responder às demandas colocadas pela realidade
educacional brasileira e dominar os códigos culturais básicos da modernidade. Profissionais
capazes de incorporar mudanças impostas pela globalização, atento às novas tecnologias
disponíveis, possuidores de identidades que garantiria a formação de sujeitos para um mundo
cada vez mais transnacional e transcultural.
O perfil estipulado para o profissional-aluno do Curso Normal Superior das séries
iniciais do Ensino Fundamental do Projeto Político-Pedagógico em questão, mesmo que não
de forma direta, utiliza-se de algumas nominações que indicam estarem voltadas para a
formação desse profissional definido nos anos de 1990 (domínio de conteúdos gerais,
polivalência, inovação tecnológica, abertura cultural etc).
92
No entanto, percebe-se, pela leitura da estrutura da grade curricular e do perfil
citado, que houve, por parte dos elaboradores do Projeto, uma preocupação em fazer uso de
um arcabouço teórico que refletia o sugerido pelas entidades dos movimentos dos
profissionais da educação. Resta-nos averiguar se o Projeto Político Pedagógico, na prática,
efetivou-se ou não. Isso será feito no capítulo IV desta dissertação.
A partir do ano 2005, dentro de outro momento vivenciado pela UNIMONTES, os
critérios de ingresso no curso e a sua natureza sofreram modificações. O Normal Superior,
antes oferecido em 24 meses, foi estendido para 36 meses. A condição inicial de estar atuando
em sala de aula da rede pública, não mais seria necessária. A natureza emergencial/modular
foi substituída apenas pelo modular, portanto, aberto a qualquer pessoal que quisesse
ingressar no ensino superior. A justificativa é que o fator emergencial já havia sido sanado,
portanto não havia mais a necessidade de o aluno ter experiência em sala de aula.
Sobre as mudanças acima mencionadas, Silva (2008) se posiciona:
É essa mentalidade que vai reorientar a mudança nos propósitos e objetivos
da UNIMONTES quanto à formação de professores. Nesse momento, o
acesso a essa modalidade de curso se distancia dos propósitos da LDBEN
quanto à formação de professores aprofundando ainda mais o processo de
desqualificação do curso e dos profissionais da educação básica (SILVA,
2008, p. 86).
Em 18 de agosto de 2006, foi suspenso temporariamente o Curso Normal Superior
em todos os campi e núcleos pertencentes à UNIMONTES
33
. A justificativa apresentada é
que a Universidade já havia cumprido as determinações do artigo 62 da LDB 9394/96, de
formar, em nível superior, os profissionais da 1ª à 4ª série do Ensino Fundamental.
Os meios de comunicação social e muitos profissionais da educação equivocaram-
se ao procederem à extinção do Curso Normal Superior no país. O Artigo 63 da LDB 9394/96
é enfático ao citar que esse Curso se destina à formação de professores para a educação
infantil e séries iniciais do ensino fundamental. É preciso atentar, ainda, para a LDB 9394/96,
que distingue (e não extingue) os Cursos Normal Superior dos Cursos de Pedagogia. A
Resolução do Conselho Nacional de Educação/ Conselho Pleno CNE/CP nº. 1/2002 abre
espaço para as instituições decidirem pela substituição dos Cursos Normais Superiores,
conforme artigo 15, parágrafo 3º: “As instituições de ensino superior decidirão pela aplicação,
ou não, das Diretrizes Curriculares Nacionais para a Formação de Professores da Educação
Básica, em nível superior, aos cursos de Licenciatura, de graduação plena” (BRASIL, 2009).
33
Atendendo à Resolução do Conselho de Ensino, Pesquisa e Extensão nº. 144.
93
Isso significa que o Ministério da Educação – MEC oferece a opção para a
instituição aceitar ou não a transposição dos Cursos de Pedagogia para os Cursos Normais
Superiores; ou ainda continuar com os dois, caso haja demanda de alunos, como ocorre em
estados mais carentes do país.
Não foi essa a realidade da UNIMONTES, pois, através da Resolução CNEP/CP
nº. 1, de 15 de maio de 2006, optou pela transformação do Curso Normal Superior Modular
para Pedagogia.
Antes da suspensão do curso, em 2006, a coordenação fez uma pesquisa com os
professores-alunos, que resultou no Relatório Final do Curso Normal Superior, do período
2000-2002. Entendemos que as informações descritas no relatório são importantes e
contribuem para a nossa pesquisa, permitindo-nos algumas reflexões necessárias.
Consta, no relatório, que a pesquisa
foi realizada nos núcleos, por meio da aplicação de questionários, os quais
contribuíram para uma melhor caracterização do alunato. O questionário foi
aplicado pelo Coordenador do módulo presencial. Esse instrumento
possibilitou obter informações relativas a dados pessoais, acadêmicos,
escolaridade, nível sócio-econômico, posição no mercado de trabalho e,
ainda, a profissão e o grau de escolaridade dos pais (UNIVERSIDADE
ESTADUAL DE MONTES CLAROS, 2002a, p. 42).
Desde o início tivemos a preocupação de conhecermos a clientela do curso.
Quando nos deparamos com o Relatório Final do Curso Normal Superior, do período 2000-
2002, que trazia informações gerais sobre os professores-alunos, julgamos desnecessária a
aplicação de um questionário com as mesmas questões, por acreditarmos na seriedade das
informações já existentes. Um elemento dificultador para a realização de um questionário
próprio com esses professores-alunos é que eles se encontram dispersos por várias cidades do
norte de Minas. Nem o ISE, nem a Secretaria Geral da UNIMONTES possuem informações
cadastrais atualizadas que nos permitissem entrar em contato com os alunos egressos. A
Secretaria Geral da UNIMONTES justificou que o acelerado processo de interiorização/
expansão da Instituição não levou em conta a necessidade da contratação de novos
funcionários no setor e de uma outra logística capaz de armazenar tais dados. Ainda hoje não
houve a digitalização desses dados cadastrais. Tivemos acesso a documentos escritos.
Optamos, então, por aqui apresentar os dados do Relatório Final, como forma de obtermos a
caracterização desses alunos, e de aprofundar a análise das questões investigativas.
O Relatório Final foi aplicado em duas etapas, sendo a primeira realizada em
janeiro de 2000, portanto, no início do curso. “A população constituída pelo universo de 3.739
94
professores-alunos do Curso Normal Superior oriundos de 235 municípios, agrupados em 25
núcleos, abrangendo 11 microrregiões distribuídas nas Associações com os respectivos
municípios e 10 Superintendências Regionais de Ensino” (UNIVERSIDADE ESTADUAL
DE MONTES CLAROS, 2002a, p. 42).
Do total de 3.739 professores-alunos do curso, 3.413 responderam ao questionário
e 326 não o desenvolveram, constituindo 10% do universo pesquisado.
A segunda etapa da aplicação aconteceu em janeiro de 2002, ao término do curso.
O questionário teve 26 questões abertas e fechadas, sendo que 2.820 alunos pertencentes aos
25 núcleos responderam a ele.
A análise e os resultados obtidos nos questionários aplicados na primeira fase
permitem traçar o seguinte perfil dos alunos:
“Predominância de alunos do sexo feminino (93,9%)”. O fato é facilmente
identificado pelo senso comum: o magistério das séries iniciais do ensino fundamental vem
sendo uma profissão predominantemente feminina, e essa escolha se dá por diferentes
motivos: vocação, necessidade, sobrevivência, tradição familiar. A feminização do magistério
faz parte de uma série de dinâmicas sociais, como o acesso da mulher ao ensino, maior
expectativa de vida e fundamentalmente ter sido esse o setor utilizado pela mulher para
participar do mercado de trabalho, sendo a docência utilizada e bem aceita socialmente para
que a mulher deixasse o âmbito doméstico em que se encerrava, de acordo com o modelo
patriarcal brasileiro (UNIVERSIDADE ESTADUAL DE MONTES CLAROS, 2002a, p. 42).
“A maioria dos professores-alunos respondentes ao questionário, 43,5% têm mais
de 31 anos e 36,1% são jovens, na faixa etária entre 18 e 26 anos”. Chamou-nos a atenção o
fato de a maioria dos pesquisados ter mais de 31 anos, o que normalmente já lhes
possibilitaria terem concluído o ensino superior. É um dado com um significado social que
pode ser entendido a partir das condições sócio-econômicos, a dificuldade de acesso ao
universo universitário e o fato de muitos já trabalharem na docência e não pensarem numa
formação de nível superior (UNIVERSIDADE ESTADUAL DE MONTES CLAROS, 2002a,
p. 42).
“Quanto ao estado civil, a grande maioria dos alunos é casada e possui dois filhos
(41,6%)”. Dados estatísticos nacionais recentes tem apontado uma significativa redução do
número de filhos por família. Tal realidade pode ser também confirmada na pesquisa
realizada pelo ISE, em relação aos cursantes do Normal Superior (UNIVERSIDADE
ESTADUAL DE MONTES CLAROS, 2002a, p. 43).
95
“95,5% dos alunos respondentes concluíram o 2º grau no Normal/Magistério e,
destes, 82,6% cursaram-no na rede pública”. Nas cidades do interior onde os núcleos foram
estabelecidos quase não existe escola privada. Ainda tradicionais muitos pais resistem em
enviarem suas filhas para estudarem em cidades maiores. Dados do MEC
34
apontam que a
maioria dos alunos das licenciaturas é oriunda das Escolas Públicas, ficando nossa realidade
dentro dos índices nacionais (UNIVERSIDADE ESTADUAL DE MONTES CLAROS,
2002a, p. 43).
“99,2% dos professores-alunos trabalham na área de educação, sendo que 29%
têm o tempo de serviço no magistério variando de dois a cinco anos de trabalho na área de
educação; 29,6% tem mais de 10 anos e 29% têm de 2 a 5 anos”. Esse dado é previsível, uma
vez que era necessário que o aluno estivesse na regência para ingressar no Curso Normal
Superior. A coordenação do ISE esclareceu, quando perguntado por nós, que o percentual não
atingiu 100%, uma vez que alguns poucos alunos não estavam na regência e ganharam na
justiça o direito de cursarem a graduação por entenderem que estavam em atividades afins
ligadas ao universo escolar (UNIVERSIDADE ESTADUAL DE MONTES CLAROS, 2002a,
p. 43).
Aspectos sócio-econômicos também foram lembrados, permitindo concluir que a
maioria dos alunos vem de escola pública e exerce atividade remunerada; 99,2% dos
pesquisados trabalham na educação e, desses, 84,6% têm uma renda mensal, variando entre 1
e 5 salários, 90,9% dos alunos contribuem com seu salário para o orçamento da casa e, destes,
58% auxiliam no sustento da família. “A renda familiar de 43,5% dos pesquisados fica de 3 a
5 salários; a de 33,6% situa-se em menos de três salários, e apenas 0,6% tem uma renda acima
de 20 salários”. O baixo rendimento desses professores/alunos clarifica não só as condições
materiais do professor do Ensino Fundamental em nossa região, como também demonstram
como eles contribuem de forma significativa para o rendimento familiar. É sabido, nas
cidades menores do norte de Minas, que o comércio se movimenta no dia do pagamento do
professor (UNIVERSIDADE ESTADUAL DE MONTES CLAROS, 2002a, p. 43).
“Outro aspecto evidenciado na pesquisa foi a instrução dos pais dos professores-
alunos. 58,2% dos pais e 58,7% das mães possuem apenas o 1º grau incompleto; apenas 0,4%
dos pais e 0,7% das mães são concluintes do ensino superior”. A baixa escolaridade dos pais
dos professores-alunos permite-nos afirmar que a graduação em nível superior é, sem dúvida,
inusitada no universo familiar. Trata-se de um indicativo para percebermos o processo de
34
Disponível em: <www.mec.gov.br>. Acesso em: janeiro de 2010.
96
mobilidade social decorrente da escolarização. A graduação em nível superior, permitirá aos
professores-alunos ocuparem na sociedade um lugar social diferente de seus pais: deixarão a
condição de filhos de agricultores, lavradores, domésticas, costureiras, pequenos
comerciantes, e de outras atividades que não exigem grau superior de ensino, e passarão a
constituir uma nova ordenação familiar (UNIVERSIDADE ESTADUAL DE MONTES
CLAROS, 2002a, p. 44-58).
Em relação ao 2º questionário - “Avaliação do curso e seu impacto nos
municípios-núcleos”, apresentam-se as respostas dos professores-alunos e algumas
informações pessoais:
A grande maioria dos professores-alunos, durante os módulos
presenciais, hospedam-se em “casa alugada, fazem suas refeições em “sua
casa” e um percentual significativo em “restaurantes” e fazem suas compras
em “supermercados”;
Pequena parte dos professores-alunos realizam atividades
remuneradas, vinculadas ao mercado informal e, destes, a grande maioria
vende bijuterias e roupas utilizando esta renda (mais de R$ 100,00) para
ajudar nas despesas durante os módulos presenciais;
Das formas de lazer, a preferida pela maioria dos professores-alunos é
assistir à TV;
Foi constatado que a maioria dos professores-alunos enfatiza que a
“melhoria obtida, ao cursar o Normal Superior, foi a melhoria dos
conhecimentos”; um grande número diz “formação necessária para obter um
melhor emprego”;
Ficou evidenciado que a grande maioria dos professores-alunos afirma
ter ocorrido melhoria no município-núcleo, por ocasião da realização dos
módulos presenciais, e essa melhoria se deu nas “instalações físicas da rede
escolar”, nos “transportes” e nos “serviços de saúde” (UNIVERSIDADE
ESTADUAL DE MONTES CLAROS, 2002a, p. 77).
Embora muitas prefeituras tenham favorecido a acessibilidade ao Curso, muitas
foram as dificuldades vivenciadas no cotidiano pelas alunas-professoras. Retornamos à velha
ideia da carência econômica dos professores do interior do Brasil, uma vez que essa realidade
não se apresenta apenas no norte de Minas. O acesso a livros e cursos necessários para um
bom desempenho de suas funções não pertence ao universo de boa parte dos docentes do
ensino fundamental. Inúmeros foram os depoimentos “de marmitas divididas” e de vendas de
produtos artesanais necessários para complementar o dinheiro gasto durante os módulos.
No campo da avaliação do curso, constata-se que os professores-alunos ficaram,
em sua totalidade, de 01 a 10 anos sem estudar, e esse retorno aos estudos se deu, segundo as
suas respostas, pela “exigência da LDB”.
97
Ficaram satisfeitos com a estrutura curricular proposta e o
atendimento e comunicação dados pela Tutoria e Pró-Reitoria. Alguns
acharam que os professores-formadores não devolveram as avaliações no
tempo hábil para os alunos;
A totalidade dos professores-alunos considera que a exigência do
curso foi na “medida certa” e de grande “utilidade” para a vida profissional,
a aplicação dos conhecimentos no cotidiano da sala de aula;
A maioria dos alunos aprova a qualidade do trabalho desenvolvido
pela coordenação Geral; Supervisores de Núcleo e Supervisor Itinerante;
A grande maioria sente necessidade de dar continuidade aos estudos,
fazendo uma “pós-graduação”;
Grande número de sugestões, em relação à ideia do curso, antes de
fazê-lo, refere-se à ideia de “melhoria a prática pedagógica” e que
“complementaria o magistério”;
Em relação às mudanças, na profissão, baseadas nos conhecimentos
adquiridos, recai na “melhoria da prática pedagógica” e que
“complementaria o magistério”;
Os pontos positivos indicados foram a possibilidade de “troca de
experiência”, o “excelente material didático” e, ainda, “a teoria aliada à
prática”.
Os pontos considerados negativos pelos alunos foram “pouco a
pouco” para a realização dos trabalhos intermodulares e o “espaço físico
ruim” para desenvolver atividades durante os módulos presenciais;
A maioria dos alunos não encontrou dificuldade para acompanhar o
curso, empenhou-se para superar suas próprias limitações, participando das
atividades propostas;
Os alunos estão satisfeitos com o exercício da profissão “docente”;
Durante a realização do curso e de suas atividades, demonstraram um
relacionamento muito bom com os professores-formadores, colegas e com o
pessoal administrativo (UNIVERSIDADE ESTADUAL DE MONTES
CLAROS, 2002a, p. 77-78).
Para os professores/alunos pesquisados, a escolha pelo Curso Normal Superior da
UNIMONTES aconteceu face às das novas políticas que determinaram a necessidade de uma
formação superior, conforme o artigo 87, constante da LDB 9394/96.
Uma leitura dessa realidade vem sendo feita por profissionais da educação como
uma exigência para o exercício do magistério, não como desejo próprio, mas pela
obrigatoriedade da lei e o medo de perder o emprego. Por trás dessa realidade, os
professores/alunos acreditam na possibilidade de melhoria salarial, assim como
aperfeiçoamento e especialização da docência. Configura-se, assim, a ideia de uma formação
mais adequada para competir no mercado de trabalho. Os dados apontam, ainda, que alguns
alunos do Curso Normal Superior buscam aprimorar seus conhecimentos e práticas
pedagógicas. Dessa forma, o Curso Normal Superior estaria, para esses professores
pesquisados, sendo visto como um curso de formação continuada e não de formação inicial.
98
Esses dados explicitados no Relatório levam-nos a concluir que, em sua maioria,
os alunos do Curso Normal Superior da UNIMONTES, período 2000/2002, objetivava uma
formação que lhes desse um maior reconhecimento profissional numa carreira que, ao longo
dos anos, tem sido preterida pelas autoridades políticas. A valorização do magistério acontece
como retórica, principalmente em períodos eleitorais, mas não se torna realidade nas
condições materiais e pedagógicas oferecidas a boa parte dos professores deste país.
Esses graduados do Normal Superior, em sua maioria, levam uma prática e uma
postura já marcadas em sua atuação profissional e se vêem diante de dificuldades que
ultrapassam a simples questão de ensino e aprendizagem. No seu dia-a-dia são desafiados a se
tornarem profissionais da educação capazes de realizar seu trabalho como parte integrante da
prática social globalizante e mostrar uma visão ampla de todos os aspectos e mediações
inerentes à ação pedagógica, nas múltiplas contradições, estabelecendo em seu ofício, o
aspecto histórico-social do processo de conhecimento. Desafios que aceitaram, por razões
diversas relacionadas com o estabelecimento de uma lei nacional, necessidade de
aperfeiçoamento, de reconhecimento.
No capítulo IV analisaremos o Curso Normal Superior através das vozes de seus
protagonistas.
CAPÍTULO IV
O CURSO NORMAL SUPERIOR NA VOZ DOS SEUS PROTAGONISTAS
A formação de professores mal feita não compromete apenas o sistema
educacional, mas toda uma sociedade. É necessário pensarmos a educação
em uma outra lógica, mais humana, que oportuniza uma melhora para todos
e não apenas para alguns (...)
35
.
Neste capítulo, reproduzir-se-ão fragmentos das entrevistas realizadas com os
sujeitos pesquisados, com o objetivo de apreender e desvelar o objeto inserido em uma
totalidade maior. Para que tal intento se concretize, selecionamos trechos que julgamos mais
significativos, no intuito de darmos continuidade à análise qualitativa, como também
favorecer o acesso às informações que contribuam para ampliar a necessária discussão sobre a
formação de professores no Curso Normal Superior da UNIMONTES. A composição do
conjunto dessas entrevistas não tem a pretensão de apresentar um discurso unívoco do tema,
mas contribuir para um debate em contínua transformação, tendo sempre a defesa da
necessidade de se instituir uma educação de excelência, democrática e acessível a todos.
Procuramos sistematizar as questões presentes nas entrevistas, a partir de temas
conectados com a problemática que nos propusemos investigar no decurso desta dissertação e
constante na introdução.
Consideraremos as entrevistas como um material privilegiado de análise. Na
condição de pesquisadores, reputamos as entrevistas como um momento de aprendizagem,
reflexão, oportunizando-nos retornar aos nossos questionamentos iniciais, assim como
suscitaram novas janelas de indagações que não temos a pretensão de “fechar” ao término
deste trabalho.
Portelli (1997) afirma que a palavra “entrevista”, em inúmeras situações
oportuniza incorretamente a ideia de uma perspectiva unilateral. No entanto, entrevista
permite mais de uma perspectiva. Para nós, significou a oportunidade de dar voz aos atores
sociais envolvidos no Curso Normal Superior da UNIMONTES. Constituiu-se uma tarefa
desafiadora e instigante, que oportunizou entender a real dimensão do indivíduo como sujeito
35
DI (17) do Curso Normal Superior da UNIMONTES, núcleo Pirapora.
100
da história. Nossos entrevistados não foram vistos como simples depoentes, mas como
colaboradores (MEIHY, 2005).
4.1 Os protagonistas da pesquisa
Tomamos como protagonistas da pesquisa aqueles que diretamente estiveram
envolvidos no Curso Normal Superior da UNIMONTES: gestores, professores do curso,
professores-alunos.
Consideramos gestores, ou GEs, aqueles responsáveis pela coordenação,
organização, logística, condução da política de formação docente do Normal Superior
UNIMONTES e também pessoas envolvidos na criação do Projeto Político-Pedagógico 2000
– 2002.
Ao proceder às entrevistas, tomamos o cuidado de nos distanciarmos de uma
possível polemização. Os entrevistados forneceram-nos dados institucionais e, como era de se
esperar, posicionaram-se sempre ao lado da Universidade. Em nossa pesquisa, os Gestores
serão contrapontos para nossas reflexões.
Os docentes, ou DOs, professores do Curso Normal Superior no período 2000-
2002, são chamados no projeto de professores formadores. Como o processo de interiorização
aconteceu rapidamente, não havia, nos quadros da UNIMONTES, professores suficientes para
atender à demanda. Por isso, foram contratados profissionais não pertencentes à instituição
que passaram por um breve treinamento, bem como se fez a avaliação de seus currículos. Vale
questionarmos: Que profissionais eram esses? Que concepção de educação possuíam? E que
grau de envolvimento tiveram nos módulos? Tivemos o cuidado de entrevistar os dois
universos: professores já então pertencentes à UNIMONTES (cerca de 180), que, em sua
maioria trabalhavam no curso de Pedagogia ou em licenciaturas; e também professores
contratados. O grupo de docentes envolvidos foi diversificado, tanto em relação à formação
acadêmica quanto às experiências anteriores na docência.
Os discentes, ou DIs, são chamados pelos gestores de “professores-alunos”, pela
lógica do próprio curso, que exigia estarem na docência do Ensino Fundamental os alunos
cursantes.
101
Ao longo de sua existência passaram pelo Normal Superior 3.739 professores-
alunos, oriundos de 235 municípios, agrupados em 25 núcleos
36
abrangendo 11 microrregiões
distribuídas nas Associações Regionais e 10 Superintendências Regionais de Ensino.
Os dois eixos desenvolvidos a seguir subsidiam os problemas que nos propomos a
responder.
4.2 A contribuição do Curso Normal Superior para a prática profissional dos alunos
egressos
A formação profissional sempre se mostrou como um processo em constante
transformação, marcado pela busca de saberes. Para Tardiff (2008), os saberes profissionais
são adquiridos nas instituições de formação de professores (escolas normais ou faculdades de
ciências da educação). Embora reconheçamos que os saberes profissionais são também
adquiridos ou complementados em outros contextos e lugares, julgamos de grande
importância avaliar esse lócus de formação profissional, buscando saber se realmente vem
cumprindo seu papel. A docência jamais foi impermeável às mudanças de ordem social e o
ofício do professor é uma das profissões mais aludidas no centro das exigências sociais.
Há uma urgência de profissionais competentes no mundo atual, não só em termos
de título, como exige o mercado, como – e principalmente – instrumentalizados para
desenvolver sua práxis de acordo com exigências mais amplas.
Passamos a apresentar e discutir os resultados das entrevistas. Com o intuito de
organizar e categorizar, favorecendo nossa análise e interpretação do leitor, unimos várias
questões constantes do tópico-guia com os protagonistas, visando atender a um dos nossos
problemas: - Diante da situação criada pela LDB, qual a contribuição do Curso Normal
Superior para a prática profissional do aluno-egresso?
Com intuito de analisarmos as transformações na vida profissional dos
professores-alunos recorremos aos aspectos 01 ao 08 dos discentes e 01 a 09 dos docentes do
tópico-guia em anexo.
Como utilizamos entrevistas semiestruturadas, foi-nos possível adicionar novas
questões, com o intuito de elucidar aspectos que não haviam ficado claros.
36
Os municípios que contaram com o Curso Normal Superior foram organizados em núcleos. Os municípios que
compunham os núcleos responsabilizaram-se pela infra-estrutura, logística e suporte financeiro necessário ao
desenvolvimento das atividades acadêmicas.
102
Lembramos que, com os gestores, as entrevistas foram não estruturadas, visando a
que as questões fossem mais individualizadas, para melhor comunicação. Para Minayo
(1993), a entrevista não estruturada é utilizada quando o pesquisador deseja obter o maior
número possível de informações sobre um determinado tema, bem como um melhor
detalhamento do assunto em questão.
Passamos, então, a apresentar e analisar, os dados produzidos pelas entrevistas no
que diz respeito à contribuição do Curso Normal Superior na prática profissional dos alunos.
Sobre o tema, assim se posicionaram os gestores:
GE (1) (...) fomos para cumprir até mesmo o nosso papel social, a nossa
propaganda apresenta a UNIMONTES como universidade de integração
regional. (...) Tinha localidade que faculdade nenhuma chegaria, municípios
de difícil acesso e nós fomos lá, chegamos e oferecemos a nossa logística.
Mudamos a vida dessas pessoas, demos um diploma a pessoas, que se não
fosse, assim jamais teriam oportunidade de graduar-se. (...) Hoje os nossos
professores possuem diplomas e participamos desse processo, conforme
desejava o governo estadual. Decidimos pela interiorização após um
encontro de reitores no Nordeste.
GE (2) (...) a UNIMONTES entrava na cidade deles. Hábitos foram
incorporados. Foram relatos e mais relados de como o curso mudou a vida
dessas pessoas. Se sentiram gente. Teve uma que suicidou porque o marido
não a deixou prosseguir. (...) Fez diferença na prática deles. É claro que
não radicalmente, mas eles procuraram melhorar as suas aulas, passaram a
buscar qualidade. Se espelhavam nos professores. Bem difícil dizer se se
tornaram refletivos, críticos. Fico pensando se era esse o propósito maior.
(...) foi o aligeiramento, não houve uma sólida formação teórica. Mas,
convenhamos, melhor que nada (...) essa crítica do que o ISE separou
ensino de pesquisa é relativo. Depende do conceito de pesquisa. Houve sim
a pesquisa dentro de uma outra lógica de pesquisa. Pesquisas desenvolvidas
ao longo das aulas.
GE (4) (...) é claro que a prática docente dos professores que cursaram o
Normal Superior foi alterada. Elas ficaram mais preocupadas com as suas
aulas, aprenderam coisas que jamais haviam ouvido falar. A idéia era a
valorização do magistério, melhora no desempenho.
GE (5) (...) eu não digo que todas, mas a maioria mudou a sua prática
profissional. Algumas prosseguiram, fizeram cursos, Pedagogia e até pós-
graduação. (...) Eu não saberia dizer exatamente o que mudou, mas elas se
sentiram mais importantes. Por aqui poucos tem curso superior. (...)
passaram a andar mais arrumados, teve até uma que todo mundo sabia que
apanhava do marido e no último módulo se separou, procurou a itinerante
37
37
O supervisor itinerante dentro do Projeto Político-Pedagógico “era responsável pelo acompanhamento da
aprendizagem dos professores-alunos durante todo o período do curso, registrando todas as dificuldades
103
para contar que o curso fez com ela se sentisse importante e tomasse tal
decisão.
GE (6) Difícil essa questão. Deixe-me ver (...) Que mudou, mudou. Tudo que
a gente aprende nos muda de alguma maneira. Mas também tinha que
acontecer de qualquer maneira, havia toda uma política nacional no sentido
de valorizar o magistério garantindo a diplomação.
Os gestores, como era de se esperar, mantiveram os seus papéis de agentes do
discurso oficial, defendendo a Instituição, os acordos firmados e o modelo implementado.
O processo de interiorização foi colocado como uma decisão do Reitor, em
concomitância com as políticas públicas educacionais do ex-governador do Estado de Minas
Gerais Eduardo Azeredo e do ex-presidente da república Fernando Henrique Cardoso.
Comprova-se, assim, que as reformas empreendidas nos anos de 1990 aconteceram em rede,
garantindo o estabelecimento do ideário liberal. Foi lembrado que a UNIMONTES não agiu
sozinha; “outras universidades inseriram-se no modelo, após reunião de reitores acontecida
no Ceará
38
”(GE 2).
As políticas públicas que regem às universidades são contraditórias ao
estabelecerem, por um lado a descentralização e flexibilização, e por outro o controle e a
padronização da produção acadêmica através de processos avaliativos estandartistas, como
temos presenciado nos últimos anos.
Em conformidade com esses aspectos, Mello (2000), influente no governo
Fernando Henrique Cardoso, declarou que:
(...) a educação inicial de professores deve ter como primeiro referencial as
normas legais e recomendações pedagógicas da educação básica. Os
professores não são necessários para qualquer projeto pedagógico, mas para
aqueles que vão trabalhar de acordo com as diretrizes estabelecidas na lei,
promovendo a constituição das competências definidas nas diferentes
instancias de normatização e recomendação legal e pedagógica, para ensinar
e fazer aprender os conteúdos que melhor podem ancorar a constituição
dessas competências. Os modelos ou instituições de formação docente que
interessam ao país são, portanto, aqueles que propiciam ou facilitam a
constituição de um perfil de profissional adequado a essa tarefa (MELLO,
2000, p. 08).
manifestadas e acionando imediatamente o Núcleo de Tutoria, quando necessário” (UNIVERSIDADE
ESTADUAL DE MONTES CLAROS. 2002, p. 43).
38
Reunião do Conselho de Reitores das Universidades brasileiras, acontecida em Fortaleza, Ceará, 1999.
104
As ideias, também expressas no Projeto Político-Pedagógico, de que os objetivos
eram a formação, produtividade, eficiência, eficácia, valorização do magistério, e a
possibilidade de a UNIMONTES cumprir seu papel social foram largamente utilizadas como
justificativa para a implementação do Normal Superior.
Percebe-se, assim, a assimilação do discurso educacional corrente nas reformas,
fomentadas pelas agências multilaterais. Reformas que estabeleceram-se muito mais como
uma continuação do que uma ruptura.
Na fala dos gestores, chamou-nos atenção a declaração de que a ideia de mudança
da prática profissional oportunizada pelo Curso ser bastante difusa. Acreditam que o simples
fato de cursarem uma graduação oportuniza mudanças no desempenho profissional. Tratam a
educação dentro de uma visão redentorista, e embora não tenham utilizado o termo, associam
à concepção de Capital Humano. Um entrevistado chega a utilizar a expressão
“aligeiramento” em relação à formação docente oferecida pelo Curso.
Para os docentes:
DO (1) Mudanças certamente ocorreram. Contudo, penso que o impacto
delas na prática foi superficial, haja visto os resultados das avaliações
externas e/ou outros indicadores de eficiência que tive oportunidade de ler.
(...) avalio que o tempo foi exíguo para reflexões e práticas mais profundas.
DO (4) Os alunos das primeiras turmas apesar de já professoras chegaram
com conhecimentos elementares, leituras superficiais (...).
DO (9) eles tiveram acesso a mais informações e com isso tiveram a
oportunidade de alterar a forma como exerciam o magistério.
DO (10) O tempo de cada módulo era muito curto, impossibilitando
reflexões mais profundas que oportunizaram mudanças na prática dessas
pessoas e garantisse o conhecimento . (...) devido ao curto espaço de tempo
os livros não eram lidos, só as apostilas fornecidas.
DO (12) (...) quanto maior o tempo de serviço, maior a resistência do aluno
em desconstruir sua prática. Incrível! Já tinham práticas muito arraigadas,
eram resistentes ao novo. Nos viam como cheios de belas teorias, sem
conhecimento da realidade que viviam.
DO (13) A carga horária para a disciplina que lecionei (Metodologia da
Matemática) foi pequena para tratar questões polêmicas e significativas no
que se refere o ensino de matemática proposto atualmente. Como as aulas
mostravam-se esgotadas. O apego ao tecnicismo e a idéia do conteúdo por
partes foi o maior entrave para que os alunos entendessem a matemática
105
como processo. A carga horária não permitia era pequena, tínhamos que
cumprir o “ritual” dos conteúdos. O “pensar” não foi alterado, quando
muito os alunos adquiriam mais informações. Tenho dúvida de como
aplicaram isso na sala de aula.
DO (15) Acredito que poucos, efetivamente mudaram suas práticas em
função do processo de formação via o Curso Normal Superior. A maioria
achava que já sabiam demais ou que não precisavam daquele conteúdo,
uma vez que eles já atuavam em sala de aula com informação que tinham e
que tudo “caminhava bem”, não tenho dados, mas chego a dizer que alguns
poucos até foram capazes de refletirem sobre suas práticas, mas não
conseguiram modificá-lo. Há um hiato enorme entre refletir e promover
modificações.
DO (16) Olha, o Curso foi importante para a vida dessas pessoas. Fui em
duas formaturas e fiquei emocionada. Passaram a ter o sentimento de
pertencimento, agora eram alunas formadas, com o diploma da
UNIMONTES. Isso sem dúvida significava muito no universo pessoal deles.
Mas sinceramente ... fico triste e até decepcionada comigo que trabalhei
nesse processo, muito pouco mudou na prática profissional desses
professores. Era difícil, as classes eram heterogêneas, a maioria era bem
fraquinho. A educação, os indicadores estão aí para indicar, continuamos
com as nossas crianças sabendo pouco, apenas o elementar. (...) não sei se
você deve usar isso, mas ... é vou dizer o que penso, o Curso foi montado
lindo, maravilhoso apenas na cabeça do ISE. A realidade foi outra. Coloca
aí, formar professores em dois anos, no sistema modular é complicado. É
descaso com a educação. O pior é que os prefeitos iam lá, no dia da
formatura, tiravam fotos e pegavam na mão de todo mundo.
Em relação aos docentes entrevistados, houve por parte desses uma significativa
preocupação em expor suas considerações de forma crítica e reflexiva.
Todos apontaram a carga horária como um elemento dificultador do
aprofundamento das disciplinas. A heterogeneidade da turma, assim como o fato de já
trabalharem na docência, foram também lembrados como obstáculos. Retornando ao
Relatório Final do Curso Normal Superior, vale lembrar que os envolvidos em sua maioria,
são professores-alunos com mais de trinta e entre dois de idade e cinco anos de trabalho na
área da educação. Os docentes criticaram de forma significativa o comodismo de muitos
alunos, que possuíam práticas pedagógicas cristalizadas. De acordo com Ferraz (2005, p. 73),
“as pessoas tendem a se apegar num referencial idealizado dos fenômenos passados como
forma de combater o novo, que tendencialmente é encarado como perigoso, dúbio e não
confiável”.
A superficialidade com que os temas foram tratados nas disciplinas leva-nos a
questionar a estrutura organizacional destinadas a essa formação. Os docentes mostraram-se
106
preocupados com o conhecimento propiciado aos professores-alunos, falta de tempo para
aprofundar temáticas, permitindo reflexões sobre a prática e a leitura de teorias específicas.
Linhares (2002) enfatiza que:
Não basta concordar com a importância da escola e do conhecimento, mas é
preciso perguntar: Que conhecimento? Para quê? Como ele foi produzido,
apropriado e vem sendo articulado no universo escolar? Com que práticas
sociais eles se articulam e se reforçam? Os circuitos dos conhecimentos
abrem perguntas ou fecham pensamentos? Alimentam curiosidades e
investigam a invenção? Ou, pelo contrário, promovem o conformismo e os
processos de submissão? Perguntas como estas podem clarear distinções
entre aprendizagens do tipo reprodutor e servil e outras endereçadas à
reinvenção da escola e da cultura (LINHARES, 2002, p. 16).
Um dos pontos mais contundentes da formação de professores do Ensino
Fundamental, via Normal Superior, diz respeito ao tipo de profissional ensejado. No Projeto
Político-Pedagógico, o perfil é o de um profissional capaz de “reelaborar o seu saber e
assumir uma atitude crítico-reflexiva sobre sua prática, articulando a formação inicial à
continuada” (UNIVERSIDADE ESTADUAL DE MONTES CLAROS, 2002, p. 45).
Resta-nos saber se tal perfil foi alcançado. Os docentes apontam aspectos que
inviabilizariam sua concretização: alunos com conhecimentos elementares, leituras
superficiais, dificuldade de acesso a livros, carga horária diária exaustiva, o que levava a
pouco aproveitamento; graduação em dois anos, teoria separada da prática, professores com
diferentes concepções e metodologias.
Além das questões levantadas pelos docentes entrevistados, reportamo-nos à super
valorização das disciplinas práticas, em detrimento dos conteúdos ideológicos. A Equipe de
Avaliação do Curso Normal Superior do Conselho Estadual de Educação do Estado de Minas
Gerais
39
(CEE/MG) assim se posicionou:
A estrutura curricular está, de modo geral, adequada ao perfil psicográfico
do discente que se pretende formar, entretanto deveriam ser feitas
modificações na disciplina Educação e Sociedade, de maneira a proporcionar
de forma mais efetiva, uma formação voltada para a consciência profissional
e, sobretudo, política do discente, de acordo com o que se pretende alcançar.
A questão apontada pelo avaliador mostra a ausência de uma discussão voltada
para a conscientização dos fatores políticos e sociais que envolvem a profissão docente no
Projeto Político Pedagógico.
39
Parecer nº 892/02.
107
Na visão dos docentes, o Curso Normal Superior não permitiu como deveria para
que seus professores-alunos adquirissem o arcabouço teórico necessário para uma prática
transformadora.
O que se viu foi uma habilitação de profissionais, dentro da lógica do mercado,
ávido por técnicas ou metodologias que lhes garantissem conhecer fórmulas prontas e
acabadas, que poderiam ser aplicadas em sala de aula – a famosa “receita do bolo”.
Nesse cenário, acontece o que Bottega (2000) chama de “ilusão de formação”. As
políticas públicas educacionais, balizadas pela validade quantitativa, conforma-se com os
resultados obtidos, caracterizando-se mais por um treinamento do que propriamente uma
formação.
Nesse modelo de formação, o ensino é desqualificado, reduzindo-se a um
conjunto de técnicas e práticas funcionais. Professores tornam-se elementos centrais, a serviço
do Estado, responsáveis pela eficácia do processo. Nesse contexto, o processo educativo
afasta-se de seu caráter histórico e político, escamoteando as contradições da sociedade,
reduzindo a formação do professor a uma perspectiva adaptativa (FRIGOTTO, 2000).
Segundo o relato daqueles que estiveram lado a lado com os professores-alunos,
constituindo-se importantes observadores do processo, as mudanças nas práticas desses
alunos não se mostraram significativas a ponto que pudessem colaborar para que os
indicadores sociais apontem melhoras no saber de nossas crianças.
A formação de professores pragmáticos e tecnicistas pode ser identificada na fala
dos professores-formadores. Estamos convencidos de que esse processo acabou por gerar uma
formação deficiente.
Os docentes, ao criticarem o Curso Normal Superior da UNIMONTES,
prenderam-se a aspectos logísticos e técnicos. Unanimemente disseram não acreditar que o
mesmo tenha oportunizado mudanças concretas e significativas nas práticas profissionais dos
professores-alunos. Desconsideraram também a possibilidade de formação de alunos
reflexivos e politizados. No entanto, contraditoriamente, fizeram parte do processo. Alguns
mais de uma vez. Foram esses docentes, no exercício da sua profissão, coniventes com o
modelo de formação que ora criticaram? Talvez essa contradição deva ser aprofundada e
objeto de outra investigação.
Como anteriormente dito, o Curso Normal Superior, orientado pela LDB, articula-
se com as necessidades do mercado de trabalho e os novos processos de produção. Porém,
desprezam a heterogeneidade e a diversidade que convivem no interior de uma mesma
sociedade e organização (RAMOS, 2002).
108
Sobre a questão levantada são essas as posições dos professores-alunos:
DI (2) É meio complicado, mas serviu de base para o meu crescimento
profissional e pessoal. Passei a ter mais, participar de cursos de reciclagem.
Fiquei mais interessada em assuntos como inclusão social e meio ambiente
que foram tratados em algumas disciplinas.
DI (3) (...) os professores eram bons o tempo e que era curto para tanta
coisa. Não dava para a gente ler como deveria, embora eu sabia a
importância da leitura e fale isso todos os dias para os meus alunos.
Confesso que não li nenhum livro no curso. Aqui não tem livraria, custa
caro. Comprei computador, ainda não sei mexer. Meu filho me disse que tem
muita coisa de educação. Quem sabe lendo tudo eu não vou melhorar a
minha prática profissional?
DI (11) fui da 2ª turma a se formar em Montes Claros. Já dava aula há dois
anos na rede municipal e andava querendo cursar Letras. Quando veio a
oportunidade, aproveitei e fiz o Normal Superior. Após o término
esperávamos reconhecimento, principalmente financeiro. Até hoje não temos
um piso salarial e nem um plano de carreira definido. O que mudou
realmente foram os nossos olhares com a educação. Ganhamos mais
capacitação (...).
DI (13) O Curso abriu o mundo para a gente. Conhecemos Emília Ferreiro,
Paulo Freire. Vimos coisas novas. (...) Eu passei a ter mais ideias para
minhas aulas. Além do mais teve muita falação. Eu acho que deveriam ter
dado mais dicas de como a gente fazer na sala de aula. Isso tornaria o
Curso mais prático.
DI (17) Eu achei que tem muita falação. Muitos textos, professores bons
mais que não sabem como é a nossa lida. É fácil viver em Montes Claros,
ser professor da UNIMONTES e vir aqui falar que a gente faz tudo errado.
Nossas crianças não tem nada, quando a gente pede o pai vem e reclama
falando que é obrigação da escola fornecer.
DI (22) Eu fiz o Curso, mas faço as coisas do meu jeito. Tenho muita
experiência. Sei o que dá certo e o que não dá certo.
DI (23) Didática foi a matéria mais importante.
DI (27) Na didática a gente aprendeu uma série de técnicas que ajudaram a
gente a ter ideias.
DI (31) Mudei muito minha prática. Li dois livros.
109
DI (32) O Curso é ótimo. Me ensinou muito. Aprendi uma série de coisas
que aplicava na minha sala de aula. Hoje tô sem emprego, tendo que vender
doce para sobreviver. Fazer o curso não foi certeza de emprego como disse
a secretaria da educação na época. Tem outras colegas minhas na mesma
situação.
DI (38) Eu aprendi a fazer planejamento, a gente mexeu com fantoches,
teatro, viu vídeos. A grande maioria dos professores era de bom nível. Só
leve um que ficou só falando de política e que ninguém gostou. Cada um
pensa de um jeito e ele dizia que a gente tinha que pensar igual a ele para
mudar o mundo.
Recorrendo às entrevistas, passamos, agora, a refletir sobre à fala dos alunos. Com
relação à contribuição para a prática pedagógica, fica clara a existência de opiniões
divergentes. Muitos imaginavam encontrar um curso nos moldes de treinamentos pontuais,
comumente oferecidos pelas Secretarias de Educação. Essa ideia de “treinamento” relaciona-
se a formação continuada “dos professores em serviço” que ganhou corpo dos anos de 1990.
Elencam como aspectos importantes adquiridos no curso: maior interesse em
assuntos relacionados à educação, aquisição de embasamento teórico, domínio de “técnicas
com o intuito de favorecer a prática pedagógica, conhecimentos de autores da área
educacional. Vale lembrar que a maioria desses alunos estava retornando à escola depois de
longo tempo sem estudar, e “95,5% dos alunos haviam concluído o 2º grau no
Normal/Magistério, sendo que 82,6% o fizeram na rede pública” (UNIVERSIDADE
ESTADUAL DE MONTES CLAROS, 2002a, p. 44).
Em boa parte das cidades/ núcleos onde o Curso foi oferecido não existem opções
culturais e de lazer. A falta de infra-estrutura dos espaços físicos disponibilizados por algumas
prefeituras oportuniza-nos questionar a possível representação negativa que esses alunos terão
da docência.
Foi importante agregarmos à nossa pesquisa a fala dos alunos, no que diz respeito
às mudanças provocadas pelo curso. Para nós, embora no tópico-guia tenhamos feito
referência às contribuições do Curso para a atividade profissional, em sua quase totalidade os
depoimentos mencionaram aspectos pessoais como: prestígio social, realização pessoal,
reconhecimento no universo escolar, autorrealização, estabelecimento de amizades, orgulho
em possuir um certificado de nível superior.
Conforme dados expostos no capítulo III desta dissertação, os pais dos
professores-alunos eram, em sua maioria, detentores apenas de 1º grau incompleto, portanto o
110
prestígio familiar e social tornou-se de grande importância. Em boa parte, tratava-se do
primeiro membro da família a obter uma titulação superior.
As dificuldades financeiras desses alunos impediam-os de deslocar-se para outras
cidades a fim de continuar seus estudos. Por isso, segundo relatos, a chegada da
UNIMONTES nesses municípios-núcleos foi saudada como a possibilidade de concretização
de um sonho.
O convívio de dois anos, a “hospedagem comum em casas alugadas”, a venda de
produtos artesanais produzidos por eles, a divisão de refeições permitiram que esses alunos
estreitassem laços de amizade (UNIVERSIDADE ESTADUAL DE MONTES CLAROS,
2002a).
Quando convidados a citar exemplos de mudanças propiciadas pelo Curso Normal
Superior na prática profissional, as respostas são evasivas, contraditórias, carregadas de
clichês. Citam algumas metodologias, didáticas (fazer fantoches, plano de aula, usar vídeos) e
autores que foram lidos de forma fragmentada, impossibilitando um aprofundamento da
teoria. Em sua maioria os autores foram lidos com o intuito de serem apresentados em
seminários. Possuem a ideia de que a teoria pode contribuir para melhorar a prática docente,
no entanto têm dificuldades de relacionar teoria e prática. Entendemos que somente uma
sólida formação técnica será capaz de permitir o domínio de conteúdos, o entendimento e a
aplicação dos seus significados em diferentes contextos, e sua articulação interdisciplinar.
Para Sacristan (2000), é imprescindível que a teoria e a prática dialoguem permitindo alcançar
avanços, transformando de fato a prática docente. Pimenta (2002, p. 24) observa que “o saber
docente não é formado apenas da prática, sendo também nutrido pelas teorias da educação”. A
autora reafirma a importância de uma boa construção teórica, no sentido de favorecer os
sujeitos a compreender contextos diversos e a si próprios como profissionais. Daí a
necessidade de as teorias serem bem trabalhadas, de ter-se tempo para aprofundá-las,
permitindo que os discentes reconstruam seus pontos de vista, suas posturas e práticas
profissionais.
Os alunos pesquisados não se reportaram aos aspectos políticos da formação. A
DI (38) manifestou-se incomodada com as posições e a forma de abordagem que um
determinado professor utilizou para falar de modo pessoal da política. Mostraram notória
preferência por disciplinas de caráter prático, nas quais podiam ser apontadas soluções para as
questões que fazem parte do dia-a-dia da sala de aula. Julgamos que essa preferência se deve
ao fato de as autoridades terem alardeado na mídia nacional melhorias nas estatísticas
educacionais e, principalmente, o número de aprovados e reprovados face às exigências dos
111
organismos financeiros nacionais e internacionais no tocante à obtenção de verbas. Os
professores do Ensino Fundamental se sentem pressionados a aprovarem mais.
Portanto, disciplinas práticas permitiriam apreender “receitas”, métodos, que
favoreceriam melhores resultados nas avaliações escolares. Confirma-se assim, o efeito
quantitativo ensejado pelas reformas.
Concluindo esta parte de nossa pesquisa, observamos que os protagonistas do
processo reconhecem e validam a importância do Curso Normal Superior. Isso não significa
que aprovem, na íntegra, a realidade configurada pela UNIMONTES em relação à formação
de professores do Ensino Fundamental.
O fundamento básico das soluções propostas pelo Projeto Político-Pedagógico,
amparado na LDB, configura, na realidade uma reforma de ordem política, fundamentalmente
marcada pelo gerenciamento do mercado. A formação, tal como posta, tem-se mostrado muito
mais preocupada em coisificar do que em permitir que os sujeitos exerçam sua autonomia.
Ao historiciarmos, no capítulo I deste trabalho, o processo de formação de
professores ficou evidente que a imposição do Estado nas questões educacionais vem de
longo tempo. Tais determinações não tem contribuído para que possamos avançar na
construção cotidiana da sala de aula, delinearmos um novo profissional da educação capaz de
desempenhar o seu papel como sujeito e não como um mero consumidor de modelos pré-
fabricados; capaz de reconhecer a importância de seu processo de formação em sua prática
profissional, indo muito além das mudanças pessoais. Ou seja, um professor capaz de
reinventar o seu papel nesse século que hora se inicia.
4.3 As razões da procura pelo Curso Normal Superior da UNIMONTES
Os aspectos de 9 a 11 dos discentes e 1 e 10 dos docentes levantados no tópico-
guia foram importantes para as conclusões aqui descritas.
Esclarecimentos importantes sobre a logística, convênios e leis foram dados pelos
gestores e favoreceram no entendimento das razões da procura do Curso Normal Superior da
UNIMONTES:
GE (1) Os convênios foram firmados com o intuito de atender a LDB. O
reitor viu na lei uma oportunidade para atender às necessidades do ensino
no norte de Minas, e mesmo fora, em outras regiões onde nos
112
estabelecemos. (...) A UNIMONTES foi pioneira e escolheu começar como
Curso Normal Superior pela demanda.
GE (2) A LDB nos forçou a adequarmos às novas exigências. A
UNIMONTES acabava de nascer e viu na lei um nicho para a sua
interiorização. O ISE foi criado com esse intuito.
GE (3) Diante da Lei, LDB, as prefeituras ficaram loucas. Passaram a nos
procurar. Como não havia previsão orçamentária, a FADENOR estabeleceu
convênios e, em alguns casos, passou a cobrar valores baixos. Acho que era
cerca de R$ 125,00. Não acho que com isso deixamos de sermos pública,
continuamos a serviço da comunidade.
GE (6) O governo Eduardo Azeredo deu início às reformas no sentido de
desordenar o Estado que não possuía recursos pra investir na educação
pública. Essa foi a saída. As palavras de ordem eram descentralização,
autonomia e parcerias. A ideia era mudar o quadro de educação, garantir
qualificação, fazer com que o Brasil abandonasse os piores indicadores
sociais. (..) era distribuir diplomas para todos. E olhar, sem hipocrisia, ela
ficaram felizes, felizes. Os prefeitos também. Ajudamos a mudar o perfil de
cidades onde o Estado nunca aparecia. (...) desculpe, mas eu acho que é
bobagem discutir o que e como mudou a vida desses alunos. Se não fosse a
UNIMONTES e nós, nada teria sito feito.
Acerca do problema exposto, os docentes assim se posicionaram:
DO (2) Nos três em que trabalhei as condições materiais e a infra-estrutura
eram muito precárias. Havia uma sala apertada, TV e videocassete. Eu e
outro professor comíamos na casa do cantineiro. Os alunos dispunham de
apostilas com textos bons sobre o meu conteúdo que era Metodologia da
Ciência. O Plano de Curso não podia ser alterado e as provas vinham
prontas. A meu ver eram bem fraquinhas. Como “saltávamos” de um lugar
para outro era difícil criar vínculos. Fizemos um curso no ISE, mas percebi
que era um grupo de professores bastante heterogêneo. Penso, não tenho
dados comprobatórios, é meu “achismo” que isso dificultou os propósitos
do curso.
DO (3) Foi um corre-corre para atender a lei. Todo mundo queria graduar-
se. Pensavam que se não o fizessem estariam fora da regência. Foram pouco
esclarecidas sobre o assunto.
DO (11) já era professora da UNIMONTES. O ISE nos oportunizou
trabalharmos com um grupo de professores do ensino fundamental,
diferentes do que tínhamos na Pedagogia. Vinham com imensa defasagem,
muitos não conheciam nada além da sua cidade, desenvolviam o seu
trabalho do jeito que julgavam certo. Ao tomarem conhecimento da lei,
viram a tabus de salvação. Havia grande expectativa, principalmente de
melhoria salarial.
113
DO (14) Era formada em Pedagogia e trabalhava como supervisora em uma
escola particular de Montes Claros. Fiquei sabendo por uma amiga que a
UNIMONTES estava selecionando professores para o Normal. (...) achei
muito mal preparado o “treinamento” para atuar no Curso. Entregaram-no
uma apostila, disseram que tínhamos que cumpri-la e pronto. Não houve
uma discussão maior sobre metodologia linhas teóricas-pedagógicas. (...) o
sistema modular contribuiu para a fragmentação do saber, a casa seis
meses uma nova disciplina, desarticulada do todo. O tempo para o
desenvolvimento do conteúdo era pequeno. A grande questão que
“incendiava” a turma era se o Curso possibilitaria salários melhores. (...)
acho que foi uma salada de fatores: a lei, a oportunidade, o imaginário da
graduação, a perspectiva de salário.
A LDB nº 9394/96, ao estabelecer que no prazo de 10 anos todos os professores
das séries iniciais do Ensino Fundamental deveriam formação em nível superior, ocasionou
uma busca por parte dos professores em serviço pelo Curso Normal Superior
40
. Em várias
instituições de ensino superior, privadas e públicas, foram instituídos processos de formação
de professores, seja na modalidade inicial, seja continuada em serviço, com o objetivo de
atender reformas educacionais.
Com o intuito de impor um novo modelo de formação para a área educacional,
foram criados os Institutos Superiores de Educação
41
, desvinculados do ensino universitário e
caracterizado por ofertar uma preparação técnico-profissionalizante de nível superior
(SHEIBE, 2003).
Em conformidade com a Resolução nº 019 de 26 de janeiro de 2001, do Conselho
de Ensino, Pesquisa e Extensão (CEPEX), foi instituído o ISE/UNIMONTES, com o objetivo
de instituir o “Curso Normal Superior – Magistério das Séries Iniciais do Ensino
Fundamental” e “Normal Superior – Magistério da Educação Infantil”, em duas modalidades
– o Regular e o Emergencial/ Modular –, objeto de nosso estudo.
A criação dos ISEs foi amplamente questionada pelas entidades educacionais.
Apontavam estarem os referidos Institutos favorecendo um ensino técnico-profissionalizante,
com exigências menores do que em outras graduações, permitindo o aligeiramento da
formação docente, não valorizando a pesquisa e utilizando um número menor de mestres e
doutores em seus quadros funcionais. Portanto, com a criação dos Institutos as universidades
perderam a exclusividade da formação de professores. Kuenzer (1998) critica que se trata de
uma proposta elitista e que confirma as políticas dos organismos financeiros internacionais,
40
Os Cursos Normais Médios continuaram existindo, perderam sua força, sendo muitos desativados.
41
A criação dos ISEs ocorreu em 30 de setembro de 1999, através da Resolução da Câmara Plena, nº 1, instituiu
que os “Institutos superiores de Educação, de caráter profissional, visam à formação continuada e complementar
para o magistério da educação básica”. Em acordo com o parecer do Conselho Nacional de Educação/ Câmara
Plena (CNE/CP) nº 115/93.
114
“que dispensa o rigor da qualificação científica e da apropriação de metodologias adequadas à
produção do conhecimento” (KUENZER, 1998, p. 115).
Os gestores ouvidos confirmam a ideia de que o Curso Normal Superior da
UNIMONTES veio para atender uma lei federal. Apontam que não foram os únicos e que
entenderam essa realidade como um nicho mercadológico que se abria para a instituição. A
relação ISE/ FADENOR apresenta indícios de que a criação do Curso Normal Superior foi
tratada com características de ensino público/ privado. Para Gentile (2001):
(...) a saída que o neoliberalismo encontra para a crise educacional é produto
de combinação de uma dupla lógica centralizadora e descentralizadora:
centralização e do controle pedagógica (em nível curricular, de avaliação do
sistema de formação docente) e descentralização dos mecanismos de
financiamento e gestão do sistema (GENTILE, 2001, p. 25).
Os gestores confirmam o recuo do Estado, face às reformas implementadas. O
Estado passou a oferecer o mínimo em termos orçamentários, levando a UNIMONTES a
diversificar sua fonte de recursos, tendo à frente a FADENOR, alterando seu papel como
instituição pública. O GE (3) reconheceu a necessidade de adequação ao mercado, mas
justificou que o fato de estar a serviço da comunidade conferiria UNIMONTES o status de
pública.
No Brasil a expansão do ensino superior não é novidade. Basta relembrarmos a
Reforma Universitária dos anos de 1968 e a promulgação da LDB nº 5692/71, que não só
falavam em expansão, como também preconizavam a necessidade de controlar o acesso das
camadas populares ao ensino superior. O elemento histórico novo dessa realidade é a relação
explícita entre a expansão e a lógica da reestruturação produtiva do mundo globalizado. Do
processo de reestruturação produtiva percebe-se a prescrição de políticas educacionais
reformistas balizadas pelo ideário liberal, cuja lógica de racionalização do campo educativo
deveria complementar a lógica do campo econômico. Cada vez mais têm-se um reducionismo
economicista, baseado na visão de custos e benefícios.
Não por acaso a expansão da UNIMONTES, acontecida através de seu Programa
de Interiorização do Ensino Superior, iniciou-se com o Curso Normal e seguido por outras
licenciaturas – cursos de baixo custo, que parecem atrair uma clientela de baixa renda,
provenientes da escola pública e com baixo rendimento escolar
42
.
42
Uma pesquisa conduzida pela fundação Carlos Chagas aponta que apenas 2% dos estudantes brasileiros
pretendem seguir o magistério. Os poucos que optam pela docência se concentram justamente no grupo dos 30%
de alunos com as piores notas (REVISTA VEJA, 2010, p. 87)
115
A necessidade urgente de uma logística que permitisse o funcionamento do Curso
foi apontado pelos gestores e docentes entrevistados em diferentes momentos, como um fator
gerador de dificuldades diversas. Isso explicaria acordos assinados às pressas, falta de uma
infraestrutura mais adequada, convocação de professores não pertencentes às áreas
educacionais da UNIMONTES, pouco tempo para discussão do material a ser trabalhado,
bem como ausência de uma concepção pedagógica única.
Os discentes justificaram a sua procura do Curso:
DI (1) Há muito já queria fazer um curso superior. Faltava oportunidade e
recursos, já que não tenho parentes em Montes Claros e não sei se teria
condições de me sustentar lá. Achei ótimo a UNIMONTES vir aqui. Aprendi
coisas novas. Se não fosse pela lei, talvez as prefeituras não tivessem feito
nada.
DI (5) Quando veio o decreto, eu já tinha quase 10 anos de profissão. A
gente aprende é no dia a dia. Para não perder o emprego, fiz o curso.
DI (11) Fiz para aprimorar o meu conhecimento. Somos muito comodistas
na nossa prática. A lei nos obrigou, mas fiz e não me arrependo.
DI (18) Em muitas comunidades rurais, o professor é visto como alguém que
sabe tudo, que tem que dar conta de tudo. Foi muito difícil para mim nos
períodos dos módulos. O prefeito e a secretaria fizeram uma reunião
falando que agora era assim, ou fazia, ou perdia o contrato. Mas
ofereceram pouco pra gente, que é pobre, tem filhos, mora na roça. (...) os
professores falavam bonito, mas vai lá dar aula para meninos que não
sabem nada, não têm material e não têm ligança dos pais.
DI (37) Ao ficar sabendo da LDB, procurei a Secretaria da Educação e pedi
para me colocarem na lista. Pensei também que poderia melhorar o que já
sabia. Aprendi muita coisa, li todos os textos, fiz todos os trabalhos e passei.
Aprendi a ser professora.
Para nós ficou claro que os professores-alunos optaram pelo Curso Normal
Superior por exigência de uma lei. Levando em consideração esse dado, podemos inferir que
o ingresso no Curso Normal Superior não se associa, de forma direta, a uma busca pelo
aperfeiçoamento profissional, mas de acomodação ao novo modelo educacional em que o
nível de escolaridade se apresenta como fator determinante na habilitação profissional, bem
como a desejada garantia de emprego.
No decorrer do curso, alguns professores-alunos reconheceram nele uma
possibilidade para a busca de soluções dos problemas da prática docente. Além desses fatores,
116
a opção também foi feita levando em consideração os aspectos financeiros, do baixo custo do
curso, da necessidade de se ter curso superior, bem como ser oferecido nas próprias cidades
dos alunos, e da busca do conhecimento.
Sentimos a ausência de professores-alunos que fizeram suas opções a partir de um
projeto profissional e político, reconhecendo o papel social do professor e a importância da
educação como fator significativo de inclusão social.
Os dados produzidos por nossas entrevistas mostram uma realidade para a qual
não podemos fechar os olhos, pois se relacionam ao processo de formação que foi oferecido
aos professores em exercício dos anos iniciais do Ensino Fundamental. Na perspectiva em que
o Curso foi oferecido, fica difícil formar professores capazes de buscar soluções e analisar
seus resultados com o intuito de garantir aos educandos uma aprendizagem que os possibilite
assumir o seu papel enquanto cidadão e contribuir para o pleno desenvolvimento de suas
competências individuais.
Sem dúvida, a UNIMONTES, através do Curso Normal Superior, concretizou seu
processo de expansão, garantindo o aspecto emergencial e itinerante. Ressalta-se que não
houve concorrência de outras instituições educacionais de nível superior que comprometesse,
nos primeiros anos, a hegemonia da UNIMONTES nessa modalidade de curso.
O objetivo estabelecido na LDB foi cumprido. A “Década da Educação” permitiu
a formação em nível superior da maior parte dos professores em exercício. A certificação foi
garantida. O Brasil cumpriu o que foi proposto em Jontien. No entanto, para Libâneo (2005),
“a ênfase sobre as questões de qualidade do ensino revela, contraditoriamente, certo desprezo
pelas questões políticas que condicionam o sucesso do aluno e a obtenção da cidadania, bem
como responsabiliza o professor pelo fracasso escolar” (LIBÂNEO, 2005, p. 130).
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Quando nos propusemos pesquisar o processo de formação dos professores das
séries iniciais do Ensino Fundamental, egressos do Curso Normal Superior da UNIMONTES
(período 2000 – 2002) no contexto das reformas educacionais, levamos em consideração as
diretrizes impostas pelas atuais políticas educacionais brasileiras.
Passados quatorze anos da promulgação da Lei de Diretrizes e Bases nº 9394/96,
percebe-se ainda a necessidade de refletir sobre o tema. Os grandes embates e discursos em
torno da ideia de formação de professores têm-se mostrado bastante férteis, porém,
consideramos que as ressonâncias nessa formação ainda são tímidas. Queremos acreditar que
as reflexões propiciadas por esta pesquisa podem, na pequenez das imensas possibilidades do
trabalho cotidiano, estabelecer alguma dose de dúvida e de incerteza, neste imenso universo
de formação de professores. Dúvida, por colocar em prova um determinado modelo; de
formação e incerteza, por desfazer-se de algumas verdades estabelecidas pelos “arautos da
reforma” que desconsideraram as heranças culturais e as estruturas sociais de nosso povo,
permitindo que nosso sistema educacional se transformasse em um seara profícua para
modelos transplantados, com nítidos interesses político-econômicos externos.
A postura política de nossos governantes, no que tange à educação, possui um
caráter tecnocrático, em que as vozes dos diversos segmentos interessados são ignoradas,
apesar das tentativas de buscar suas próprias diretrizes de ação. As circunstâncias têm
impedido um diálogo produtivo, dificultando uma colaboração intelectual interprovocativa,
interfecundante, à base de uma reflexão ampliada, persistente e coerente.
Cabe às universidades o enfrentamento da concretude dos problemas, superando a
simples constatação e crítica e, assim, assumindo seu papel político de sustentar uma ação
transformadora dos cursos de formação de professores.
A lógica que permeou a criação do Curso Normal Superior da UNIMONTES foi
amplamente marcada pelas pressões do mercado e representa a massificação da formação de
professores dentro do Curso Emergencial Modular do Normal Superior.
A UNIMONTES foi a primeira a ofertar o Curso em Minas Gerais, atendendo a
um projeto estadual de interiorização, e o fez justamente no momento de seu reconhecimento
como universidade. Via FADENOR, organizou uma rápida operacionalização do mesmo,
118
propiciando a certificação de um vasto universo docente do norte de Minas, Jequitinhonha e
região central.
A rapidez com que o fez, amparada pelas leis cartoriais, comprometeu a qualidade
da formação de professores da educação básica. O recrudescimento das funções do Estado
levou a universidade a buscar completar seus recursos orçamentários, modificando sua
identidade como instituição pública, através da criação de cursos como o Normal Superior,
estabelecidos através de convênios e parcerias com prefeituras.
Nossa pesquisa foi pautada pelo objetivo geral que pretendeu discutir o processo
de formação de professores das séries iniciais do Ensino Fundamental do Curso Emergencial
Modular da UNIMONTES (2000 – 2002).
Para atender ao objetivo geral, estabelecemos objetivos específicos, que foram
tratados nos capítulos desta dissertação.
No capítulo I, julgamos importante apresentar o cenário histórico que propiciou à
burguesia estabelecer lugares próprios de formação, assim como o modelo ideal de professor,
que, amparado pelos grupos dominantes e pelo Estado, sobreviveu ao passar do tempo,
chegando ao presente.
A própria existência de uma significativa reflexão acerca do tema que
historicamente vem de longe, sem ser superado, valida a permanência dessa problemática. O
processo de formação de professores deve ser entendido dentro de uma visão de totalidade
histórica, marcada por contradições. A ausência dessa perspectiva favorece a um projeto
burguês, negando o fato de as políticas públicas de formação do professores aconteceram em
uma arena marcada pela luta de classe. Ainda no capítulo I, explicitamos a política de
formação docente no Brasil como um projeto que esteve sempre a serviço dos grupos
hegemônicos – Educação e Política utilizadas para concretizar o modelo de Estado Nacional
ensejado pelos grupos dominantes.
No capítulo II, procuramos refletir sobre as políticas educacionais no Brasil a
partir dos anos de 1990, enfatizando, nesse contexto, a promulgação da LDB 9394/96, os
Institutos Superiores de Educação e o Curso Normal Superior.
Sentimos a necessidade desse recorte temporal, com o intuito de evidenciar que a
criação do Curso Normal Superior da UNIMONTES não aconteceu devido a decisões
individuais da instituição, mas, sim, em decorrência de reformas instituídas com o objetivo de
atender um novo cenário político-econômico.
Para nós, ficou evidente que a Teoria do Capital Humano foi amplamente
utilizada como justificativa para a ingerência dos organismos internacionais nas reformas que
119
ganharam corpo nos anos de 1990. O velho discurso educação/ desenvolvimento foi
retomado, dentro de uma roupagem marcada pela ideia da equidade.
Os documentos institucionais apresentados no capítulo III permitiram consolidar à
ideia que, se houve o amparo da LDB, houve também, por parte da UNIMONTES, a
aceitação por esse processo de formação de professores do Curso Normal Superior para as
séries iniciais do ensino fundamental.
Analisando a regulamentação do Curso, concluímos que os gestores prescindiram
do diálogo com entidades educacionais que se opunham a esse modelo de formação. Na
elaboração dos textos institucionais, os gestores desconsideraram o saber construído e
constituído pelo professores que atuam em sala de aula.
Observamos que a UNIMONTES ocupou o espaço aberto no “mercado” a partir
da promulgação da LDB. Em relação à regulamentação do curso, todas as determinações
legais foram cumpridas; já no que concerne à sua implementação, muito ficou a dever.
No capítulo IV, procuramos valorizar a oralidade por meio de entrevistas,
objetivando responder aos problemas norteadores dessa investigação.
Ao retornarmos à hipótese da pesquisa – de que a atual política para a formação
de professores, via Curso Normal Superior da UNIMONTES, instituída pela Lei 9394/96
(LDB), na verdade respondia muito mais a interesses governamentais do que às questões de
melhoria da educação nacional –, constatamos que ela se confirma.
Não há como negar a importância da UNIMONTES no sentido de ela favorecer o
acesso de um imenso contingente de professores leigos ou formados em nível médio ao
ensino superior. O processo de interiorização oportunizou isso a alunos de baixa renda,
residentes em municípios carentes, que talvez jamais tivessem oportunidade de ingressar em
uma graduação.
No entanto, percebemos, no conjunto das falas dos protagonistas entrevistados,
que o Curso Normal Superior Emergencial Modular não cumpriu o seu papel, estipulado no
Projeto Político-Pedagógico, de desenvolver docentes dotados dos instrumentos necessários
para refletirem a sua prática, oportunizando mudanças no campo profissional.
Ficou claro, no decorrer da pesquisa, que a demanda pelo curso não aconteceu
pela necessidade de aperfeiçoar o desempenho dos professores em sala de aula, mas de
atender ao disposto em lei, garantindo os objetivos governamentais.
O ingresso no Curso representou, por parte dos professores-alunos, um
investimento pessoal em uma possível mobilidade social gerada pela escolarização em nível
120
superior. A pesquisa apontou, também, que esses alunos, face à lei, temiam perder empregos.
Não há uma preocupação maior, significativa com as questões educacionais.
Depoimentos dos professores-alunos registraram a importância do Curso Normal
Superior para sua vida pessoal. No entanto, não foram capazes de citar mudanças efetivas
para sua formação profissional. E, quando o fizeram, utilizaram-se de discursos ingênuos e
confusos.
Não se tem como negar que o Curso Normal Superior da UNIMONTES foi
importante na vida profissional de professores que atuavam na docência sem qualquer
aperfeiçoamento profissional. No entanto, isso não significa que o Curso tenha conseguido
sanar dificuldades de várias ordens desses professores-alunos.
As entrevistas apontaram que a opção pelo Normal Superior da UNIMONTES,
em sua maioria, decorreu de fatores não vinculados à questão de formação em si. Isso indica
que a opção pelo curso foi feita da mesma maneira como foram implementadas as chamadas
reformas educacionais da LDB, ou seja, por fatores externos ao universo educacional: os
políticos reformadores, atendendo aos compromissos estabelecidos com os organismos
internacionais; os discentes, devido à necessidade por formação de nível superior ou
imposição mercadológica. Portanto, podemos concluir que, mais uma vez, o projeto de
desenvolvimento brasileiro foi reduzido aos interesses específicos de uma economia marcada
pela globalização, e estes se sobrepuseram a um projeto eminentemente nacional. Assim, a
formação de professores do Ensino Fundamental não atendeu às demandas educacionais; os
interesses mercadológicos impuseram-se, em detrimento das necessidades da educação.
A formação de professores, em condições materiais escassas, tornou-se uma
mercadoria vendida a baixos preços. Tais condições tornaram-se menores diante do projeto de
certificar o maior número possível de professores em nível superior, oferecendo um curso que
não atendeu às reais demandas sociais, mas, sim, aos propósitos das autoridades educacionais,
submissas aos interesses externos, e omissas para fiscalizar as condições em que o Curso foi
oferecido, em unidades fora da sede.
A oferta do curso em condições comentadas anteriormente, assim como as
entrevistas com os DOs e DIs, permitem-nos afirmar que a formação de um profissional capaz
de transformar o seu fazer pedagógico existiu apenas no Projeto Político-Pedagógico do ISE.
As transformações citadas pelas discentes (preocupações com questões atuais da
educação, mais leitura, aquisição de técnicas etc.) não são suficientes para afirmarmos que
redimensionaram o papel do professor e da sua ação na escola. Ainda que tenham sido
apontadas algumas transformações, permanece a preocupação em encontrar fórmulas mágicas
121
que possibilitam ao aluno obter bons resultados nos processos avaliativos. Isso nos leva a
deduzir que o professor emanado do Curso Normal Superior da UNIMONTES não
desenvolveu o pensamento crítico/ reflexivo capaz de permitir que as teorias refletissem em
sua prática. Esse mesmo profissional dificilmente perceberá que boa parte das questões
ligadas à aprendizagem não surge da metodologia escolhida, mas de um processo maior de
formação que não se preocupa em formar profissionais capazes de desenvolver seus
potenciais e exercitar sua cidadania.
Sendo assim, o Curso Normal Superior Emergencial/ Modular oferecido no
período de 2000 a 2002 não permitiu a formação de professores que de forma plena se
assumissem como autores do fazer pedagógico. Conclui-se que esse curso foi oferecido em
espaços físicos nem sempre ideais, em algumas cidades, bem como utilizou-se de mão de obra
de professores, apenas legalmente habilitados para dar aulas das disciplinas constantes na
grade curricular citada no Projeto Pedagógico, mas nem sempre comprometidos com os
objetivos constantes do curso.
Para finalizar, sabemos que a formação de professores é uma questão revelante da
realidade brasileira. Realidade esta em que se buscam respostas que não podem acontecer
apenas no campo de impressões, mas de investigações cuidadosas.
Atualmente, o Curso Normal Superior não é mais oferecido pela UNIMONTES.
A justificativa dada pelos gestores é que a demanda foi atendida. Isso nos possibilita concluir
que a massificação da docência foi cumprida. O Curso perdeu a sua validade. Foi retomada a
formação por meio do Curso de Pedagogia, sendo que muitos alunos egressos vieram fazer a
"complementação", julgando sua formação anterior insuficiente.
Notoriamente percebe-se o negligenciamento do papel social da educação
superior. Sendo assim, a universidade pública, pensada como um espaço de construção
coletiva e a lógica do trabalho acadêmico tornaram-se reféns das exigências mercadológicas.
Souza (2005) e Zuba (2006) pesquisaram sobre o tema “formação de professores
no Curso Normal Superior da UNIMONTES”, em perspectiva diferenciada da nossa, e
obtiveram resultados diferentes. Isso só vem mostrar o quão vasto é o universo da pesquisa
educacional. A diferença de resultados não invalida nenhuma das pesquisas. Pelo contrário,
valida as contradições e a necessidade de que outras pesquisas se debrucem sobre o tema.
Talvez assim possamos apontar caminhos para uma reflexão acurada capaz de favorecer a
redefinição da política de formação de professores no fértil universo acadêmico da
UNIMONTES.
122
Acreditamos na possibilidade de um processo de formação sólido, capaz de dar
respostas à realidade escolar de nossa região. Urge prepararmos educadores que possam
enfrentar os desafios colocados por uma sociedade em mudança. Ser professor neste novo
contexto significa assumir o compromisso com a construção de uma nova realidade.
Esta é a nossa utopia!
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________. Pró-Reitoria de Ensino. Coordenadoria de Graduação. Projeto do Curso Normal
Superior/Magistério das Séries Iniciais do Ensino Fundamental: Licenciatura Plena –
Modular. Montes Claros, 2004.
VEIGA, Ilma Passos; AMARAL, Ana Lúcia. Formação de professores: políticas e debates.
Campinas, São Paulo: Papirus, 2003.
VIEIRA, Sofia Lerche. Políticas Internacionais e Educação – Cooperação ou
Intervenção? In: DOURADO, Luiz Fernandes; PARO, Vitor Henrique (orgs.) Políticas
Públicas e Educação Básica. São Paulo: Xamã, 2001.
VILLELA, Heloísa. 500 Anos de Educação no Brasil. In: LOPES, Eliane M. Teixeira (org.).
3. ed. Belo Horizonte: Autêntica, 2003.
ZUBA, Janete Aparecida Gomes. Ensino de Geografia e formação dos Professores das
Séries Iniciais do Ensino Fundamental: das expectativas do Curso Normal Superior da
UNIMONTES à realidade. Tese de Mestrado. Universidade Federal de Uberlândia. Instituto
de Geografia, 2006.
ANEXOS
134
ANEXO A - TÓPICO GUIA – DISCENTES NORMAL SUPERIOR
Parte I – Informação contextual sobre a entrevista e o entrevistado
a) Data:
b) Local:
c) Duração:
d) Entrevistador:
e) Profissão do entrevistado:
f) Onde nasceu/viveu:
g) Local onde cursou o Normal Superior:
h) Escola em que trabalha:
i) Tempo de serviço:
j) Escolaridade dos pais:
Parte II – Sobre o Curso Normal Superior
1. Mudanças acontecidas na vida profissional, após o término do Curso.
2. Contribuições do Curso para possíveis reflexões sobre a atuação profissional.
3. Disciplinas e/ou atividades que mais contribuíram para o processo de
formação.
4. Questões contemporâneas educacionais tratadas ao longo do Curso.
5. Colaborações do Curso Normal Superior para o aperfeiçoamento das atividades
docentes.
6. Contribuições do Curso para uma prática docente crítica e reflexiva.
7. Números e livros lidos ao longo do Curso.
8. Aspectos positivos e negativos do Curso Normal Superior.
9. Razões que o levaram o Curso Normal Superior.
10. Se não houvesse obrigatoriedade da lei, ainda assim você faria o Curso
Normal Superior. Cite razões.
11. Aponte os materiais didáticos utilizados nas aulas.
135
ANEXO B - TÓPICO GUIA – DOCENTES NORMAL SUPERIOR
Parte I – Informação contextual sobre a entrevista e o entrevistado
a) Data:
b) Local:
c) Duração:
d) Entrevistador:
e) Formação do entrevistado:
f) Tempo de atuação no Normal Superior – UNIMONTES:
g) Disciplinas lecionadas:
Parte II – Sobre o Curso Normal Superior
1. Aspectos positivos e negativos do Curso.
2. Contribuição do Curso para a reflexão e modificação da prática dos
professores-alunos.
3. Questões contemporâneas da educação brasileira tratadas na disciplina
trabalhada.
4. Linha teórica pedagógica utilizada.
5. Média de número de livros lidos pelos seus alunos na disciplina.
6. Condições materiais disponibilizadas pela UNIMONTES e prefeituras para o
desenvolvimento do seu trabalho.
7. Opinião sobre o sistema modular e a duração de dois anos do Curso.
8. Como os alunos-professores chegaram do ponto de vista pedagógico e
cognitivo ao ensino superior.
9. Possibilidades de alterar planos de curso e inserir novas metodologias nas suas
aulas.
10. Vínculo empregatício com a UNIMONTES quando trabalhou no Curso
Normal Superior.
136
ANEXO C - CARTA DE CESSÃO
Local:
Data:
Eu, ____________________________________________, declaro para os devidos fins que
cedo os direitos de minha entrevista para ser usado integralmente ou em partes, sem restrição
de prazos e limites de citações, desde o presente dado.
Montes Claros, ______________ de ___________ de _____________.
______________________________________________
Assinatura do colaborador
137
ANEXO D - ESTRUTURA CURRICULAR DO CURSO NORMAL SUPERIOR DE
NATUREZA EMERGENCIAL
Habilitação: Magistério das Séries Iniciais do Ensino Fundamental
DISCIPLINAS CARGA HORÁRIA
Módulo I
Educação e Sociedade
Desenvolvimento Bio-Psicossocial da Criança
Fundamentos da Didática I
Fundamentos da Prática de Ensino e de Estágio Supervisionado
Estágio Supervisionado
100
100
100
60
245
Total 605
Módulo II
Fundamentos da Didática II
Organização Escolar
Leitura e Produção de Textos
Metodologia da Pesquisa em Educação
Fundamentos Metodológicos da Educação Infantil
Princípios e Métodos de Alfabetização
Literatura Infanto-Juvenil
Atividades Físicas, Recreação, Jogos e Artes
Estágio Supervisionado
65
65
65
65
65
65
65
45
245
Total 745
Módulo III
Fundamentos e Metodologia da Língua Portuguesa I
Fundamentos e Metodologia da Matemática I
Fundamentos e Metodologia das Ciências I
Fundamentos e Metodologia da Geografia e História I
Estágio Supervisionado
120
120
110
110
245
Total 705
Módulo IV
Fundamentos e Metodologia da Língua Portuguesa II
Fundamentos e Metodologia da Matemática II
Fundamentos e Metodologia das Ciências II
Fundamentos e Metodologia da Geografia e História II
Currículo e Práxis
Arte e Educação
Educação e Inovações Tecnológicas
Estágio Supervisionado
Seminários
Atividades Orientadas
Trabalho Final do Curso
65
110
65
65
65
75
65
245
144
144
102
Total 1.145
CARGA HORÁRIA TOTAL 3.200
Quadro Demonstrativo das Áreas de Fundamentação Curricular
ÁREAS
CARGA HORÁRIA
TOTAL DA
CARGA
HORÁRIA
Presencial
Modular
Presencial
Intermodular
Prática de
Formação
em Serviço
1 - Fundamentação Básica 300 546 - 846
2 - Fundamentação Pedagógica 600 714 - 1.314
3 – Prática 60 - 980 1.040
TOTAL 960 1.260 980 3.200
138
Quadro Demonstrativo da Carga Horária Modular
CARGA HORÁRIA
MÓDULOS
1
o
2
o
3
o
4
o
TOTAL
Jan/Jun
2000
Jul/Dez
2000
Jan/Jun
2001
Jul/Dez
2001
Presencial Modular 240 240 240 240 960
Presencial Intermodular 300 320 320 320 1.260
Prática de Formação de Serviço 245 245 245 245 980
TOTAL 785 805 805 805 3.200
DISCIPLINAS
Área de Fundamentação Básica – 846 horas
DISCIPLINAS
CARGA HORÁRIA
Presencial
Modular
Presencial
Intermodular
1 – Educação e Sociedade
2 – Desenvolvimento Bio-Psicossocial da Criança
3 – Metodologia da Pesquisa em Educação
4 – Currículo e Práxis
5 – Educação e Inovações Tecnológicas
6 – Organização Escolar
7 – Leitura e Produção de Textos
8 – Arte e Educação
9 – Seminários
10 – Trabalho Final do Curso
60
60
30
30
30
30
30
30
-
-
40
40
35
35
35
35
35
45
144
102
TOTAL 300 546
Área de Fundamentação Pedagógica – 1.374 horas
DISCIPLINAS
CARGA HORÁRIA
Presencial
Modular
Presencial
Intermodular
1 – Fundamentos Prática Ensino e Estágio Supervisionado
2 – Fundamentos e Metodologia da Língua Portuguesa
3 – Fundamentos e Metodologia da Matemática
4 – Fundamentos e Metodologia de Ciências
5 – Fundamentos e Metodologia de Geografia e História
6 – Atividades Físicas, Recreação, Jogos e Artes
7 – Princípios e Métodos da Alfabetização
8 – Fundamentos e Metodologia da Educação Infantil
9 – Literatura Infanto-Juvenil
10 – Fundamentos de Didática
11 – Atividades Orientadas
60
90
120
90
90
30
30
30
30
90
-
-
95
110
85
85
15
35
35
35
75
144
TOTAL 660 714
Área Prática – 980 horas
DISCIPLINAS CARGA HORÁRIA
Prática de Formação em Serviço 980