Download PDF
ads:
DENISE DA COSTA NEVES DAUD
A RELAÇÃO ENTRE A HIPERMÍDIA E A APRENDIZAGEM:
UMA ABORDAGEM CONSTRUTIVISTA
Dissertação apresentada à Universidade
Presbiteriana Mackenzie como requisito parcial
para obtenção do título de Mestre em
Educação, Arte e História da Cultura.
Orientador: Prof. Dr. Sérgio Bairon Blanco de
Sant’Anna.
São Paulo
2006
ads:
Livros Grátis
http://www.livrosgratis.com.br
Milhares de livros grátis para download.
D238r Daud, Denise da Costa Neves
A relação entre a hipermídia e a aprendizagem: uma
abordagem construtivista. / Denise da Costa Neves Daud. / - -
São Paulo, 2006.
118 p. : il. ; 30 cm
Dissertação (Mestrado em Educação, Arte e História da
Cultura) - Universidade Presbiteriana Mackenzie, 2006.
Orientação: Prof. Dr. Sergio Bairon Blanco Sant’Anna
Bibliografia: p. 116 - 118
1. Ensino e Aprendizagem. 2. Hipermídia. 3. Construtivismo
I.Título.
CDD: 370.153
ads:
DENISE DA COSTA NEVES DAUD
A RELAÇÃO ENTRE A HIPERMÍDIA E A APRENDIZAGEM:
UMA ABORDAGEM CONSTRUTIVISTA
Dissertação apresentada à Universidade
Presbiteriana Mackenzie como requisito parcial
para obtenção do título de Mestre em
Educação, Arte e História da Cultura.
Aprovado em / / 2006
BANCA EXAMINADOR A
Prof. Dr. Sérgio Bairon Blanco de Sant’Anna
Universidade Presbiteriana Mackenzie
Profª. Drª. Maria de Los Dolores Jimenez Peña
Universidade Presbiteriana Mackenzie
Prof. Dr. Luis Carlos Petry
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo
Dedico este trabalho, em especial, à minha
mãezinha (in memorian) que sempre foi luz em
minha vida.
Ao meu pai que sempre me incentivou para o
estudo.
Ao meu marido Marcelo, minha fonte de amor, por
todo apoio e compreensão nos momentos difíceis.
Ao Vini e ao Fefo, minhas maiores riquezas.
AGRADECIMENTOS
A Deus e a Meishu-Sama pelas bênçãos e graças recebidas.
Ao Prof. Dr. Sérgio Bairon, meu orientador, pelos comentários e sugestões
apresentados durante a realização desta pesquisa.
Aos professores da banca examinadora pelas contribuições que
enriqueceram minha pesquisa.
Aos professores do programa de Pós-Graduação em Educação, Arte e
História da Cultura.
Ao MACKPESQUISA pelo apoio na realização deste trabalho.
RESUMO
Este trabalho de dissertação se propôs a investigar de que forma a hipermídia pode
ser utilizada como recurso pedagógico inovador no processo de ensino e
aprendizado de maneira a favorecer a construção do conhecimento por parte do
educando. A investigação se deu por meio da análise de duas produções em
hipermídia, Leonardo 2.0 O Inventor e História Local nos Processos de
Alfabetização de Crianças, Jovens e Adultos do Município de Diadema composta
pela hipermídia Diadorim, ambas em CD-ROM. O estudo leva em consideração as
propriedades e características dos ambientes digitais, particularmente da hipermídia,
analisando diversas situações e sugerindo caminhos que possam contribuir para
uma aprendizagem mais autônoma dentro desses ambientes partindo de uma
concepção pedagógica construtivista.
Palavras-chave: Hipermídia. Ensino e Aprendizagem. Construtivismo.
ABSTRACT
The objective of this thesis is to research the different ways that hypermedia could be
used as an innovative pedagogical resource in the teaching and learning process; so
that it helps the student to build knowledge. This research began with an analysis of
two hypermedia works, Leonardo 2.0 - The Inventor and The Local History in the
alphabetization process for children, youth and adults of the Diadema municipality;
composed by the Diadorim hypermedia, both available in CD-ROM. This study takes
into consideration the properties and characteristics of digital environments,
particularly hypermedia, analyzing various situations and suggesting ways that
contribute to more autonomous learning within this environment, all based on a
constructivist pedagogical conception.
Keywords: Hypermedia. Teaching and learning. Constructivism.
LISTA DE DESENHO
Desenho 1: Representações do pensamento......................................................................... 66
Desenho 2: Rede conceitual hipertexto em ambiente multijanelas.........................................68
Desenho 3: Rede conceitual o hipertexto na tela do computador...........................................69
Desenho 4: Leonardo da Vinci: estudo da proporção da face e dos olhos.............................70
LISTA DE FIGURAS
Figura 1: Página do Genesis da Bíblia de Mogúncia ....................................................23
Figura 2: História em Quadrinhos.................................................................................. 26
Figura 3: Visão em 3D da Balestra................................................................................ 30
Figura 4: Os quatro estágios da Zona de Desenvolvimento Proximal (ZDP)................ 31
Figura 5: Sistema sensorial demonstrado por recursos multimídia...............................34
Figura 6: Criador de textos malucos.............................................................................. 39
Figura 7: Tela do jogo Fuja da Fortaleza....................................................................... 41
Figura 8: Banco de Dados............................................................................................. 44
Figura 9: The Jazz Singer, 1927..................................................................................47
Figura 10: Detalhe da cena em que o Rei Eduardo esquerda) em seu trono recebe
Haroldo, conde de Wessex, que logo após caminha à frente de seus cinco
milites para Bosham, da Tapeçaria Baieux, 1604........................................ 50
Figura 11: Álbum de Família..........................................................................................51
Figura 12: As memórias do avô de Neco.......................................................................53
Figura 13: Rumo ao Estudo do Lugar ...........................................................................55
Figura 14: Em busca do Lugar. Desenho elaborado por um aluno da classe de
alfabetização de adultos.................................................................... 59
Figura 15: Farmácia do Sakamoto.................................................................................62
Figura 16: Demonstração uma das invenções de Leonardo e sua relação com o esqui
aquático........................................................................................................ 64
Figura 17: Imagem de como seria o MEMEX proposto por Vannevar Bush – 1945..... 65
Figura 18: Ambiente digital hipertextual - Wikipédia .....................................................72
Figura 19: Linha do tempo. ........................................................................................... 76
Figura 20: Biografia de Leonardo e formato hipertextual...............................................78
Figura 21: Sistema de busca por palavra-chave........................................................... 81
Figura 22: Tela da hipermídia Diadorim em formato hipertextual..................................82
Figura 23: Esboço do helicóptero idealizado por Leonardo em comparação a um
modelo atual....................................................................................... 87
Figura 24: Sala de aula em 3D...................................................................................... 89
Figura 25: Instrumento de sopro interativo.................................................................... 90
Figura 26: Escola em 3D............................................................................................... 92
Figura 27: Exemplo de um ícone flutuante.................................................................... 93
Figura 28: Demonstração do funcionamento do Tambor.............................................. 96
Figura 29: Máquina de Ritmo LDV-2000....................................................................... 98
Figura 30: Tela de abertura da hipermídia Leonardo 2.0............................................ 102
Figura 31: Tela demonstrando o conteúdo da hipermídia Leonardo 2.0.....................103
Figura 32: Barco movido a rodas................................................................................104
Figura 33: Efeito de transição na hipermídia Leonardo 2.0........................................ 105
Figura 34: Exemplo de efeitos randômicos.................................................................106
Figura 35: A grande viagem .......................................................................................109
Figura 36: Tela de abertura da hipermídia Diadorim.................................................. 110
Figura 37: O encontro de dois mundos.......................................................................111
Figura 38: Figuras humanas como elemento de transição.........................................113
LISTA DE FOTOS
Foto 1: Comissão de fábrica desenvolvida pelos trabalhadores no município de São
Paulo no final dos anos 70...............................................................................60
Foto 2: Luís Inácio: comissão de fábrica - 1970............................................................60
Foto 3: Fotografia “em sépia” sem identificação........................................................... 61
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO............................................................................................... 12
2 PRESSUPOSTOS DA APRENDIZAGEM NA SOCIEDADE DA
INFORMAÇÃO............................................................................................... 15
2.1 Os ambientes digitais e a aprendizagem.................................................... 20
2.2 Abordagem pedagógica para a utilização da hipermídia............................ 26
2.3 O ensino e as tecnologias digitais: uma outra dimensão do aprender........ 33
2.4 As imagens digitais e o desenvolvimento de conteúdos educacionais ...... 49
3 HIPERTEXTO: UMA TEXTUALIDADE FLUTUANTE................................... 65
3.1 A não-linearidade nos ambientes digitais ................................................... 73
3.2 As lexias e os links como estrutura da navegação hipertextual no âmbito da
aprendizagem ............................................................................................. 74
4 HIPERMÍDIA: O NASCIMENTO DE UMA NOVA LINGUAGEM PARA
AMBIENTES DE APRENDIZAGEM.............................................................. 84
4.1 Interface e Interatividade ............................................................................ 87
4.2 A construção das interfaces em produtos digitais educacionais ................ 91
5 DESCRIÇÃO E ANÁLISE DAS HIPERMÍDIAS........................................... 100
5.1 Leonardo 2.0 – O Inventor ........................................................................ 100
5.2 Processos de Alfabetização de Crianças, Jovens e Adultos do Município de
Diadema – Diadorim.................................................................................. 107
6 CONCLUSÃO.............................................................................................. 114
REFERÊNCIAS....................................................................................................... 116
1 INTRODUÇÃO
O desenvolvimento expressivo dos meios tecnológicos digitais e de sua
influência na comunicação e na informação, aconteceu a partir da disseminação da
Internet nos anos noventa, através da World Wide Web, favorecendo novas formas
de relação com os saberes e o acesso à informação. (SANTAELLA, 2001)
A nova forma de acesso às informações via Web é viabilizada por uma
interface gráfica em forma de hipertexto, permitindo o acesso a diversos dados como
texto, imagem, sons e gráficos, de forma não-linear, configurando uma nova
linguagem: a hipermídia. (SANTAELLA, 2001)
Dessa forma, a tecnologia digital ou tecnologias intelectuais, nas palavras de
Lévy (1999), além de favorecerem novas formas de acesso à informação através da
navegação por hipertextos, também ampliam algumas funções cognitivas na medida
em que podem atuar como auxiliares da memória, estimular a percepção e a
imaginação por intermédio de simulações e realidades virtuais, além do raciocínio.
Compreender e valorizar as diferentes formas de comunicação resultantes da
integração entre as diversas linguagens e a novas formas de representação de
conhecimentos por meio dos meios digitais acaba se tornando um desafio para a
educação atual. Jacques Delors (2001), no Relatório da Unesco sobre a educação
para o século XXI, ressalta que: “a educação deve transmitir, de fato, de forma
maciça e eficaz, cada vez mais saberes e saber-fazer evolutivos. Adaptados à
civilização cognitiva, pois são as bases das competências do futuro”.
Pelas questões apontadas acima, surgiu o interesse em aprofundar o estudo,
por meio desta investigação, com relação às tecnologias da atualidade, em especial
a hipermídia, por ser um recurso inovador e ainda em plena fase de
desenvolvimento, mas que traz desdobramentos significativos quando se observa
mais de perto as modificações que podem produzir na linguagem, na narrativa, na
organização do pensamento, nas ltiplas experiências estéticas e sinestésicas
exclusivas deste meio.
12
Tomando por base as questões enunciadas, pode-se destacar o problema
dessa pesquisa da seguinte forma: a hipermídia pode ser utilizada como recurso
pedagógico inovador em processos de ensino e aprendizado de forma a
favorecer a construção do conhecimento?
Para dar conta desse desafio, pretende-se investigar duas produções em
hipermídia, Leonardo 2.0 - O Inventor e História Local nos Processos de
Alfabetização de Crianças, Jovens e Adultos do Município de Diadema da qual faz
parte uma hipermídia com as aventuras do menino Diadorim, ambas em CD-ROM,
analisando as possibilidades de utilização deste recurso nos processos de ensino e
aprendizado partindo das características e propriedades deste meio destacando
algumas categorias de análise que apontam para uma aprendizagem autônoma
favorecendo à construção do conhecimento por parte do educando.
Do ponto de vista metodológico a pesquisa foi realizada mediante o
levantamento e sistematização bibliográficos com o objetivo de compor o quadro
teórico conceitual do trabalho. Pretende-se analisar o problema estabelecendo
relações entre a bibliografia e a exploração das hipermídias em questão, partindo
das características e propriedades deste meio, bem como, sugerindo atividades
onde é possível conduzir o aluno a uma aprendizagem reflexiva através da criação
de um ambiente construtivista, utilizando-se de ferramentas mediadoras na tentativa
de buscar uma interação e um diálogo maior entre os aprendizes, professores e
conteúdos.
Considera-se que este estudo pode iniciar um processo de reflexão nos
docentes que desejam ter uma postura inovadora em sala de aula revendo seus
antigos paradigmas com relação à transmissão dos saberes, partindo de uma
concepção mais aberta e colaborativa no processo de ensino e aprendizado.
Serão discutidos aspectos da nova cultura de aprendizagem na sociedade da
informação, bem como uma reflexão sobre os ambientes digitais e seus impactos na
comunicação humana e na aprendizagem. Baseados na obra de Janet Murray
(2003) discutir-se-ão as características procedimental, participativa, espacial e
enciclopédica dos ambientes digitais estabelecendo relações com as produções
hipermídia, além da abordagem pedagógica que deve ser utilizada na aplicação
13
deste recurso, trazendo uma reflexão sobre as diversas concepções de
aprendizagem com as quais a escola e os professores ainda convivem.
Em seguida, traçar-se-á um histórico do hipertexto e sua conceituação além
de discutir alguns elementos da interface como a não-linearidade, as lexias e os
links identificando-os como estruturas hipertextuais capazes de proporcionar a
interatividade e a exploração de informações e conhecimentos de forma autônoma
favorecendo os processos de aprendizagem. Apresenta-se ainda a hipermídia como
uma nova linguagem discutindo as mudanças na forma de pensar e adquirir
conhecimentos relacionando algumas de suas propriedades como a interface e a
interatividade.
Por último, analisa-se as hipermídias, Leonardo 2.0 O inventor e Diadorim
com base na taxionomia desenvolvida por Sérgio Bairon (2003), com o objetivo de
compreender melhor os formatos híbridos como fontes confiáveis para a pesquisa e
aquisição de conceitos no âmbito da educação.
14
2 PRESSUPOSTOS DA APRENDIZAGEM NA SOCIEDADE
DA INFORMAÇÃO
As revoluções tecnológicas e científicas sempre trouxeram, no cerne,
transformações na forma de produzir e estruturar os conhecimentos, na forma de
pensar e agir sobre as coisas, na forma de construir e organizar-se culturalmente.
Da transição da sociedade oral, passando pela escrita, pela impressão a a
sociedade digital, muitos séculos se passaram, entretanto as últimas décadas do
século XX (CASTELLS, 1999) trouxeram mudanças expressivas e aceleradas
decorrentes do crescente número de informações causadas pelas novas tecnologias
de comunicação.
Uma nova ordem política, econômica e social emergiu deste cenário
trazendo incertezas e dúvidas. Até o conhecimento científico que outrora se
alicerçava em verdades absolutas, passou a ser relativo diante das mudanças.
Pozo (2002, p.29) ressalta que:
[...] com a ciência probabilística do século XX, devemos aprender a conviver
com saberes relativos, parciais, fragmentos de conhecimento, que
substituem as verdades absolutas de antigamente e que requerem uma
contínua reconstrução ou integração.
Na sociedade da informação
1
a organização social tornou-se complexa na
medida em que os interesses o diversos e ambíguos e as nações estão cada vez
mais interdependentes globalmente.
A intensidade no fluxo de informações acaba imprimindo às atividades
pessoais e profissionais um ritmo nunca visto. As pessoas têm necessidade de se
manter atentas e conectadas aos acontecimentos devido à grande competitividade
imposta pela sociedade. Os indivíduos precisam se tornar mais ativos,
desenvolvendo uma postura crítica diante dos acontecimentos agindo de forma
1
O que caracteriza a sociedade da informação, segundo Chaves (1998, p.23) “é o fato de que nela a maior parte
das pessoas economicamente ativa trabalhou no processamento de informações (lato sensu, envolvendo
comunicação) ou no relacionamento de pessoas (como no comércio, no lazer, no turismo), eo na produção de
bens materiais. Há os que prevêem que por volta de 2015, nos países desenvolvidos, haverá no máximo, cerca de
5% da população economicamente ativa trabalhando no setor agropecuário e industrial. Os restantes 95% estarão
trabalhando em atividades em que o processamento de informações e as relações entre as pessoas são
essenciais”.
15
consciente diante de situações inusitadas, desenvolvendo habilidadespara lidar com
cada uma delas.
Pozo (2002, p. 31) ressalta que:
A necessidade de uma formação permanente e de uma reciclagem
profissional alcança quase todos os âmbitos profissionais como nunca
aconteceu em outros tempos, como conseqüência em boa parte de um
mercado de trabalho mais cambiante, flexível e inclusive imprevisível, junto
a um acelerado ritmo de mudança tecnológica, que nos obriga a estar
aprendendo sempre coisas novas.
Neste contexto, a educação do século XXI precisa redefinir seu papel e
repensar suas funções para a formação das gerações futuras bem como o tipo de
relação que será estabelecida com o conhecimento.
É certo que até o momento a escola veio cumprindo seu papel como
transmissora do saber e como lugar privilegiado para o acesso ao conhecimento,
entretanto, educar neste tempo de transição requer uma mudança nas formas de
conceber o ensino.
Seu papel deve ir além da transmissão dos conteúdos, deve preparar todos
para a vida em uma sociedade moderna, conferindo aos homens liberdade de
pensamento, discernimento e criando condições para que todos possam se
apropriar do conhecimento adquirido, desenvolvendo pessoas mais autônomas.
Para Freire (1996, p. 25)
É preciso, sobretudo [...] que o formando, desde o princípio mesmo de sua
experiência formadora, assumindo-se como sujeito também da produção do
saber, se convença definitivamente de que ensinar não é transferir
conhecimento, mas criar as possibilidades para a sua produção ou sua
construção.
Neste contexto, em que se tem de aprender diversas informações e adotar
estratégias diferenciadas para a atuação no mundo, a aprendizagem assume um
caráter complexo e ao mesmo tempo traz concepções diferentes sobre os seus
princípios.
Desta forma é necessário que o indivíduo cada vez mais desenvolva suas
capacidades por meio de uma aprendizagem contínua. Segundo Pozo (2002, p. 33)
“não é casual que a necessidade de ‘aprender a aprender' (ou de ensinar a
16
aprender) seja outra das características que definem a nossa cultura da
aprendizagem”. O professor passa então a centralizar suas ações mais nas
aprendizagens do que no ensino. Seu papel se redefine na medida em que auxilia
os alunos a aprender a aprender.
Delors (2001), no relatório para a UNESCO da Comissão Internacional sobre
Educação para o século XXI, salienta que a educação deve organizar-se em torno
de quatro aprendizagens fundamentais:
1. aprender a conhecer: que significa também aprender a aprender, possuir o
domínio dos instrumentos do conhecimento, isto é, aprender para
compreender o mundo, viver dignamente e desenvolver suas capacidades
profissionais. Aumentar os saberes utilitários e significativos a fim de agir no
mundo real. Exercitar a atenção, a memória e o pensamento a fim de se
posicionar criticamente frente às informações instantâneas difundidas pelos
meios de comunicação. Apropriar-se e utilizar com discernimento as novas
tecnologias;
2. aprender a fazer: significa ensinar o aluno a por em prática os seus
conhecimentos e como adaptá-los ao trabalho futuro. Possibilitar a aquisição
de competências individuais requeridas pelas novas formas de organização
do trabalho: aptidão para o trabalho em equipe, capacidade de iniciativa, de
comunicação, de gerenciar e resolver conflitos tornam-se cada vez mais
importantes;
3. aprender a viver juntos: significa ensinar a não violência, a resolver conflitos
de forma pacífica, a valorizar o respeito com relação às diferenças individuais,
culturais e sociais através da participação em projetos comuns, gerando
valores como a cooperação e o altruísmo;
4. aprender a ser: significa que a educação deve favorecer o desenvolvimento
do indivíduo como um todo, espírito e corpo, inteligência, sensibilidade,
sentido estético, ética e responsabilidade pessoal a fim de se tornar
autônomo e crítico, formular seu próprio juízo de valor e ter poder de decisão
frente aos desafios da vida pessoal e profissional de forma criativa utilizando-
se de experiências estéticas, artísticas, desportivas, científicas, culturais e
sociais.
17
Em geral, o ensino formal construiu suas bases com um enfoque para o
aprender a conhecer e, em menor escala, para o aprender a fazer (desenvolvimento
de habilidades) considerando os outros pilares como circunstânciais da prática
pedagógica. Acreditava-se que quanto mais conteúdo o aluno adquirisse melhor
seria o seu desempenho nas atividades fora da escola (DELORS, 2001).
Portanto, segundo Pozo (2002, p. 40):
A cultura da aprendizagem direcionada para reproduzir saberes
previamente estabelecidos deve dar passagem a uma cultura da
compreensão, da análise crítica, da reflexão sobre o que fazemos e
acreditamos e não só do consumo, mediado e acelerado pela tecnologia, de
crenças e modos de fazer fabricados fora de nós.
Neste sentido, indaga-se sobre o papel da educação no contexto da
sociedade informacional, pois se sabe que “a educação não é uma área em si, mas
um processo permanente de construção de pontes entre o mundo da escola e o
universo que nos cerca”. (DOWBOR, 2001, p.11).
Nesta mesma perspectiva, Oliveira (2001, p.8) acrescenta que “a atividade
cognitiva do aluno é inseparável do contexto cultural no qual está imerso como
pessoa em desenvolvimento”.
Como conseqüência dos avanços tecnológicos, Belloni (2001, p. 8) aponta
algumas tendências no campo da educação e no perfil dos professores que podem
ser formuladas da seguinte maneira:
1. demandas educacionais ampliadas: clientelas mais numerosas com
mais anos de estudos (formação ao longo da vida);
2. convergência dos paradigmas presencial e a distância e transformações
nos papéis dos dois atores principais: o professor coletivo e
multicompetente e o estudante autônomo;
3. integração das tecnologias de comunicação e Informação de modo
criativo, inteligente e distanciado, no sentido de desenvolver a
autonomia e a competência do estudante e do educador enquanto
“usuários” e criadores das TIC;
4. mediatização do processo de ensino e aprendizagem aproveitando o
máximo as potencialidades comunicacionais e pedagógicas dos
recursos técnicos: criação de materiais e estratégias, metodologias;
formação de educadores (professores, comunicadores, produtores,
tutores); produção de conhecimento.
18
Os espaços de aprendizagem vêm sofrendo modificações na medida em que
o acesso à informação e ao conhecimento pode acontecer em ambientes fora da
escola como: empresas, mídia, ambientes digitais, configurando outras dimensões
de espaço e de tempo concedidos à aprendizagem. (OLIVEIRA, 2001)
Ensinar e aprender é um processo que pode, na atualidade, ser mediado por
diferentes recursos tecnológicos, de forma menos estruturada, com menos conteúdo
fixo dando ênfase a projetos e pesquisas e tornando o aprendiz mais autônomo e
responsável pela busca de conhecimento e informação, cabendo ao professor ajudar
o aluno a interpretar, articular, relacionar e contextualizar as diversas informações e
dados trazidos pelas novas tecnologias. (MORAN, 2000)
Portanto, este é o caminho que se escolhe para explorar a tecnologia da
hipermídia como recurso tecnológico inovador, com potencial para contextualizar os
processos de ensino e aprendizado da atualidade.
Para Moran, (2000, p. 23)
Um dos grandes desafios para o educador é ajudar a tornar a informação
significativa, a escolher as informações verdadeiramente importantes entre
tantas possibilidades, a compreendê-las de forma cada vez mais
abrangente e profunda e a torná-las parte do nosso referencial
É necessário que o sistema educacional realize reformas para atuar na nova
cultura da aprendizagem a fim de poder explorar certas técnicas de ensino, como a
hipermídia e outras tecnologias intelectuais da cibercultura. (LÉVY, 1999)
Ainda nas palavras do autor,
É certo que a escola é uma instituição que cinco mil anos se baseia no
falar ditar do mestre, na escrita manuscrita do aluno e há quatro séculos, em
um uso moderado da impressão. Uma verdadeira integração da informática
(como do audiovisual) supõe, portanto o abandono de um hábito
antropológico mais que milenar o que não pode ser feito em alguns anos.
(LÉVY, 1993, p.9)
Isto significa dizer que se tem consciência de que essa mudança não será
rápida, mas acredita-se que é preciso iniciar o processo, desmistificando o uso de
novas tecnologias no ambiente escolar, trabalhando com a hipótese de que a
utilização adequada dessas tecnologias, e aqui se refere principalmente à hipermídia
19
como campo de investigação, podem ser um caminho inovador para provocar as
mudanças desejadas no processo de ensino e aprendizagem, possibilitando ao
aluno construir o conhecimento, bem como um desafio ao professor na medida em
que poderá vivenciar formas não convencionais para aquisição e produção do saber
e de acordo com Freire (1996, p.29) “se tornar igualmente sujeito do processo”.
Em síntese, é urgente refletirmos sobre uma nova educação para o século
XXI que forme um indivíduo como um todo: tanto intelectual como espiritualmente,
capaz de exercer sua autonomia, gerenciando suas próprias ações, tomando
decisões a partir do seu juízo de valor, capaz de resolver problemas e saber utilizar
com discernimento toda a tecnologia que tem hoje ao seu alcance.
De acordo com Pozo (2002) é a partir do construtivismo que se encontra
estímulo para as novas formas de pensar sobre a aprendizagem e a aquisição do
conhecimento em detrimento das formas tradicionais de aprendizagem.
2.1 Os ambientes digitais e a aprendizagem
O desenvolvimento das tecnologias de informação e comunicação é
resultante da junção de algumas áreas como informática, telecomunicações e mídias
eletrônicas.
Como resultado da junção de meios como o computador, telefone e
programas informáticos, teve-se uma grande expansão das redes mundiais de
telecomunicações, o que foi possível graças ao processo de digitalização das
informações, considerado uma grande revolução na produção e transmissão de
diversos tipos de linguagens: a visual, a verbal e a sonora, pois quaisquer fontes de
informação ou dados podem ser homogeneizados em cadeias seqüenciais de 0 e 1,
denominada de bits, acarretando uma compressão de dados e uma capacidade de
armazenamento de informações infinita. (SANTAELLA, 2001)
Estes dados disponibilizados na “memória hipertextual do computador,
permite múltiplas intervenções-navegações por parte do usuário (SILVA, 2001, p.
68).
20
A conexão dos computadores via rede tornou a comunicação mais rápida e
eficiente podendo ligar pessoas em tempo real, em qualquer parte do planeta,
oferecendo uma quantidade e qualidade maior na informação. O suporte da
informação que antes estava no papel, passa a ser virtual apresentando
características diferenciadas como a facilidade e a rapidez com que podem ser
veiculadas, transformadas e transportadas além da possibilidade na convergência
de diversas mídias em uma só máquina.
Murray (2003, p. 41) assinala que “todas as principais formas de
representação dos primeiros 5 mil anos da história humana foram traduzidas para
o formato digital”.
Antes da era digital, os suportes como o papel, as películas químicas, as
telas, estavam separados por não terem condições de coexistir ou se apresentarem
juntos num mesmo suporte.
Segundo Santaella (2001), depois de passarem pela digitalização, todos os
campos tradicionais de produção de linguagem como o desenho, a pintura, a
fotografia, o filme e os sons, uniram-se na composição da hipermídia.
Muitos autores caracterizam a digitalização como uma revolução na forma
pela qual relaciona-se com as informações, com o conhecimento e com as novas
formas de narrativa, da mesma forma que a prensa tipográfica revolucionou os
manuscritos. A tecnologia digital rompe com as formas de narrativa contínua e
seqüencial. Imagens e textos se apresentam como um fenômeno descontínuo.
A transição de uma sociedade predominantemente oral para uma sociedade
letrada, representou um passo tecnológico muito significativo na medida em que
permitiu, num primeiro momento, que a fala fosse registrada para que outras
pessoas pudessem receber as palavras que a distância e o tempo impediriam de
escutar. (LÉVY, 1993)
A escrita, na forma dos manuscritos, tinha alcance limitado, era feita à mão e,
copiar um livro, por exemplo, era algo que levava muito tempo, além do que,
poderia se tornar suscetível à opinião ou interferência daquele que o estava
copiando.
21
Lévy (1993, p.99) assinala que:
Na época do manuscrito, era no mínimo arriscado transmitir graficamente a
estrutura de uma flor, a curva de uma costa ou qualquer elemento da
anatomia humana. Mesmo supondo que o autor tivesse sido um desenhista
excepcional, era pouco provável que o próximo copista também o fosse.
A impressão, como uma nova técnica, “desenvolvida na Europa a partir do
meio do século XV ofereceu novas possibilidades de recombinação e de
associações em uma rede de textos incomparavelmente mais extensa e disponível
do que nos tempos do manuscrito” (LÉVY, 1993, p. 96).
Com a tipografia, tudo muda. Infinitas cópias de um mesmo exemplar
poderiam ser produzidas, barateando o livro e tornando a cultura acessível a um
grande número de pessoas.
Dessa forma Lévy (1993, p. 98) salienta que “a impressão permitia fixar
corretamente e difundir em grande escala as novas observações astronômicas,
geográficas ou botânicas. Um processo cumulativo, que iria levar à explosão do
saber”.
Os efeitos sobre a educação foram ainda mais amplos, pois nos períodos
anteriores à invenção da escrita e da impressão, as pessoas que tinham interesse
em aprender alguma coisa precisavam se deslocar até a presença daqueles que
possuíam o saber. “Nas sociedades sem escrita, a produção de espaço-tempo está
quase totalmente baseada na memória humana associada ao manejo da
linguagem”. (LÉVY, 1993, p. 78)
Segundo Pozo (2002, p. 28):
As mudanças mais notáveis na cultura da aprendizagem se devem a uma
nova revolução na tecnologia da escrita. A invenção da imprensa, ligada á
cultura do Renascimento, permitirá não uma maior divulgação e
generalização do conhecimento como também um acesso e conservação
mais fáceis do mesmo, libertando a memória da pesada carga de conservar
todo esse conhecimento. Agora a escrita passa a ser a Memória da
Humanidade.
O livro impresso além de auxiliar a memória na retenção dos saberes,
permitiu ao destinatário uma leitura individual e silenciosa transformando o saber em
22
algo que fosse possível ser analisado e comparado, tornando o indivíduo auto-
suficiente na busca dos conhecimentos disponíveis e estocados. (LÉVY, 1993)
Segundo Lévy (1993, p. 96) “dada a quantidade de livros em circulação, não
seria mais possível que cada leitor fosse introduzido às suas interpretações por um
mestre que tivesse, por sua vez, recebido um ensino oral.”
Figura 1: Página do Genesis da Bíblia de Mogúncia
Fonte: Disponível em:
<http://www.escritoriodolivro.org.br/historias/burke.html>
Acesso em: 10. jun. 2006
Os livros tal como se conhece hoje, passaram por várias atualizações.
muito, os escribas, professores, editores e técnicos envolvidos na confecção de
livros, inventaram um mecanismo para aumentar a velocidade da leitura e da
recuperação da informação.
A invenção da página individual e da composição escrita dividida em
capítulos, índices, sumário, paginação regular, elementos gráficos e tabelas são
interfaces específicas dos documentos impressos e permitiram que o processo de
leitura fosse facilitado (LÉVY, 1999).
23
Segundo Lévy (1993, p. 35) “na Idade Média os livros eram enormes,
acorrentados nas bibliotecas, lidos em voz alta no atril”. Pela mudança efetuada na
dobradura dos exemplares o livro passou a ser portátil, e pode difundir-se
maciçamente.
A invenção da escrita alfabética e da imprensa, consideradas tecnologias
revolucionárias permitiram o registro e a disseminação da informação entre diversas
pessoas e lugares diferentes. Além da possibilidade de multiplicar a informação,
revolucionaram também a forma de apresentação do texto por meio de uma
interface padronizada e original.
Lévy (1993, p. 91) afirma que “a escrita, ao separar as mensagens das
situações onde são usados e produzidos os discursos, suscita a ambição teórica”
deixando para trás as narrativas e os ritos como forma de transmissão do saber uma
vez que “a notação escrita é mais cômoda” devido às suas características de
representação.
Apesar destas inovações terem gerado um enorme impacto na forma de
expressar o texto elas não permitiam uma busca e recuperação das informações de
forma rápida, fácil e de interesse para cada leitor em particular.
Segundo Landow (1995, p. 32)
Este problema pode expressar-se de duas maneiras. Em primeiro lugar, que
nenhuma ordenação da informação pode resultar conveniente a todos que a
necessitam e em segundo lugar ainda que ambas ordenações, hierárquicas
e linear, facilitam a informação segundo algum critério de ordem, este nem
sempre coincide com as necessidades dos usuários individuais. (nossa
tradução)
O livro, como forma de expressão da textualidade e organização de
informações de qualquer espécie, apresenta os assuntos de forma catalogada e
organizada, mas ainda permanece preso a uma imutável seqüência linear, embora
possa ser lido aleatoriamente e os olhos do leitor possam passear ao acaso.
Com o surgimento da WWW (Word Wide Web) e da Internet, torna-se
possível a troca de múltiplas informações entre as pessoas, a elaboração de
trabalhos sofisticados e a participação em projetos e pesquisas, em conjunto,
24
aliados à possibilidade de integrar diversas mídias ao processo de comunicação e
interação humana. (VALENTE, 2003).
As páginas da WEB apresentadas em formato de hipertexto, com estruturas
multidimensionais e o seqüenciais de textos e outros documentos, possibilita o
acesso a um número infinito de informações mediante mecanismos de navegação
sob o controle do usuário. O hipertexto, adicionado de elementos visuais, gráficos,
sonoros e outras mídias denomina-se hipermídia.
Murray (2003, p. 41) utiliza o termo incunabular, expressão derivada do latim
que significa “as faixas com as quais os bebês eram envolvidos” para fazer uma
analogia com o livro - como uma tecnologia ainda na infância - referindo-se ao
período de 50 anos que levou para se estabelecer como um meio de comunicação,
tal como se conhece atualmente.
Semelhante ao fenômeno ocorrido com o livro, os meios digitais ainda estão
em plena fase de desenvolvimento e muitos ainda encaram os computadores e as
novas tecnologias com a mesma indignação com que os antepassados, tiveram
diante da televisão e do rádio, entretanto, trazem desdobramentos nas formas de
produção da linguagem, na narrativa e na aquisição de informações e
conhecimentos.
Segundo Bairon (1995, p. 109-110) as experiências com a informática na
educação não significam apenas uma renovação técnico-didática, elas vão além,
pois o seu grande diferencial é a interatividade. Elas podem garantir o que nenhum
professor conseguiria, mesmo ministrando aulas particulares a um aluno, que é “a
interação em quantidade e qualidade das perguntas e respostas no interior de uma
situação de ensino”.
“Aprender dependerá muito mais da iniciativa do estudante,
fundamentalmente, através de ações colaborativas e interdisciplinares”. (BAIRON,
1995, p. 110)
Entretanto navegar em uma estrutura digital, como o hipertexto ou hipermídia,
não é tão fácil. Dominar sua lógica multilinear ou multisequencial requer novos
desafios, ou nas palavras de Silva (2001, p. 57) supõe uma “nova dimensão
comunicacional”.
25
A utilização dessa nova tecnologia no ensino pode interferir de forma
significativa na forma de aquisição de conhecimentos, criando situações de
aprendizagem mais enriquecedoras, dicas, diversificadas e complexas, devido à
característica interativa e imersiva do meio possibilitando formas diferenciadas e
estimulantes de se relacionar com o conteúdo e construir sua própria aprendizagem.
2.2 Abordagem pedagógica para a utilização da hipermídia
Figura 2: História em Quadrinhos
Fonte: Fernando Becker.
Disponível em: <http://www.crmariocovas.sp.gov.br/pdf/ideias_20_p087-093_c.pdf>
As possibilidades do uso do computador ou de novas tecnologias, como a
hipermídia podem favorecer, de várias formas, a aprendizagem. Mas qual deverá
ser a concepção adotada pelo professor ou pela escola no processo de ensino e
aprendizagem através da utilização da hipermídia como recurso pedagógico?
Muitas vezes adotam-se recursos tecnológicos com a visão de que por si
eles serão capazes de intervir e auxiliar nos processos educacionais, mas a forma
como se entende estes processos e a concepção pedagógica subjacente são os
eixos principais para se alcançar resultados na aprendizagem.
Segundo Becker (2001) pode-se detectar diferentes posturas epistemológicas
sobre o ato educativo, que estão embasados em três modelos pedagógicos: o
modelo empirista, o modelo apriorista e o construtivista.
A concepção empirista parte do princípio de que o processo de ensino e
aprendizagem caracteriza-se pela ação determinante dos estímulos selecionados
pelo professor, que é o responsável em escolher os conteúdos e os instrumentos
didáticos e transmiti-los aos alunos que deverão aprender. Segundo esta concepção
26
o aluno é sujeito passivo no processo e considerado tabula rasa, isto é, ele não
possui nenhum conhecimento prévio, tudo precisa ser ensinado a ele. “[...] o
professor está de um lado, o aluno está do outro; o professor ensina, e o aluno
aprende; o professor é o que sabe, e o aluno é o ignorante; o professor decide, e o
aluno é o determinado”. (BECKER, 2001, p. 36)
O uso de tecnologias segundo esta concepção pedagógica se aplicada
apenas como uma transição dos conteúdos de instrução para o ambiente
tecnológico, serão utilizados apenas para recriar o ambiente de sala de aula com a
justificativa de permitir uma maior adequação aos ritmos individuais.
Tomada isoladamente esta estratégia é ainda muito pobre, mesmo
oferecendo recursos multimídia ou hipermídia, pois não promove grandes mudanças
nos processos e ainda acarreta pouco aproveitamento por parte dos alunos.
Atualmente esta seria a maior crítica com relação aos programas
desenvolvidos na modalidade de ensino à distância, que muitas vezes são
apresentados em formatos que reproduzem a sala de aula convencional, com
materiais extensos em forma de texto escrito, com estímulos precários, com pouca
interatividade e sem o auxílio de um professor ou tutor. (OLIVEIRA, 2001)
Segundo a concepção apriorista o processo de aprendizagem é regulado pelo
amadurecimento orgânico das estruturas racionais. Tais estruturas se encontram
na herança genética do aluno e basta um mínimo de esforço para que elas se
desenvolvam. Neste sentido, o amadurecimento paulatino é que confere significado
aos objetos de aprendizagem e a “interferência do meio físico ou social deve ser
reduzida ao mínimo”. (BECKER, 2001, p. 20)
Esta dimensão do ensino está centrada no aluno. A interferência do professor
deve ser a mínima possível, assumindo o papel de facilitador. Nas palavras de
Becker (2001, p. 19) ”é o regime do laissez-faire: deixa fazer, que ele encontrará o
seu caminho. Qualquer ação que o aluno decida fazer é, a priori, boa, instrutiva”.
Neste sentido, algumas ferramentas tecnológicas apresentam a solução
correta ao estudante como se bastasse o contato com a resposta certa para que ele
seja despertado para aquele conhecimento. Aqui não se recorre ao professor como
mediador no processo de aprendizagem, deixando para o aluno as descobertas.
27
E por último, a concepção construtivista do processo de ensino e
aprendizagem que foi fortemente influenciada pelas teorias sócio-interacionistas que
procuravam superar as abordagens e as contradições das concepções
epistemológicas do empirismo e do apriorismo.
Nesta concepção, o processo educacional se concentra na relação que é
estabelecida dentro da sala de aula com o objetivo de favorecer a construção do
conhecimento por parte do aprendiz. Portanto não tem como foco principal nem o
professor, nem o aluno, eliminando desta forma a polarização do ensino. (BECKER,
2001)
Para o enfoque construtivista, o conhecimento não se encontra na estrutura
genética do aluno, nem no meio físico e social e tão pouco na cabeça do professor.
“O conhecimento de por um processo de interação radical entre sujeito e objeto,
entre indivíduo e sociedade, entre organismo e meio” (BECKER, 2001, p.36). Ele
enfatiza a construção de novos conhecimentos e maneiras de pensar mediante a
exploração e a manipulação ativa de objetos e idéias tanto abstratas como concretas
e explicam a aprendizagem através das trocas que o aprendiz realiza com o meio.
Portanto a ação é a ponte que liga o aprendiz ao seu objeto de conhecimento.
(BECKER, 2001)
Os trabalhos de maior significado dentro de uma concepção cio-
construtivista foram os de Piaget (1896-1980) e Vygotsky (1896-1934). A abordagem
construtivista é a que tem gerado mais benefícios e a que melhor contextualiza e
aproveita os recursos tecnológicos nos processos de aprendizagem, pois enfatizam
práticas colaborativas e significativas, impõem novas relações entre professor e
aluno, aluno e professor, alunos e alunos, além de ir ao encontro das expectativas
do momento histórico vivenciado pela sociedade do conhecimento. (POZO, 2002)
Na perspectiva de uma educação construtivista, a hipermídia pode possibilitar
um ambiente de aprendizagem onde o conhecimento não é transmitido
explicitamente para o aluno, mas onde ele, interagindo com os objetos e com as
informações, sejam elas de natureza verbal escrita, sonora e imagética, pode
desenvolver conceitos. Assim “o professor é incentivado a tornar-se um animador da
inteligência coletiva de seus grupos de alunos em vez de um fornecedor direto de
conhecimentos” (LÉVY, 1999, p. 158).
28
Os ambientes hipermídia sugerem uma ampliação das funções cognitivas na
medida em que favorecem:
1. novas formas de acesso à informação por meio de bancos de dados,
hipertextos e arquivos digitais de todos os tipos;
2. possibilitam uma experiência estética conceitual proporcionada pelas
imagens, animações e sons;
3. estimulam a imaginação e o raciocínio na abstração de conceitos
complexos através das simulações de fenômenos do real
possibilitando a repetição, o erro, a construção, sem correr o risco da
punição externa;
4. estimulam a percepção na medida em que é possível a imersão em
ambientes em 3D;
Os programas em hipermídia devem ser vistos, pelo menos nesses primeiros
contatos entre tecnologia e aprendizagem, como complemento das apresentações
formais dos conteúdos e das discussões em sala de aula. Por exemplo, uma
simulação por si não cria a melhor situação de aprendizagem se o professor não
interferir apresentando aos alunos situações problematizadoras.
O uso de simulações ou a manipulação de objetos pode levar o aluno a uma
visão antecipadora e elaborar hipóteses sobre os objetos do conhecimento, criando
oportunidade de desenvolver um esquema de pensamento que lhe garanta não
uma mudança de comportamento, mas também a utilização de novos conceitos em
situações diferentes.
Em um ambiente hipermídia o aprendiz pode traçar suas próprias rotas de
navegação de acordo com seu interesse e curiosidade, podendo levantar hipóteses
sobre as ações que realiza no meio ou nos objetos.
Leonardo 2.0 - O Inventor, em formato de CD-ROM, foi um dos primeiros
trabalhos em hipermídia lançado na Feira de Frankfurt em 1994 e será objeto de
investigação desta pesquisa.
29
Essa versão (ampliada) utiliza modernos recursos de multimídia para
comprovar que Leonardo da Vinci, conhecido principalmente por seu talento
artístico, era capaz de desenvolver grandes invenções. Baseado em pesquisas da
Biblioteca Real do Castelo de Windsor, na Inglaterra, este programa mostra a
relação entre as invenções e anotações de Leonardo da Vinci com as tecnologias
desenvolvidas no século XX, bem como diferentes acontecimentos nos períodos
históricos compreendidos entre os séculos XV e XVI.
Figura 3: Visão em 3D da Balestra
Fonte: CD-ROM Leonardo 2.0 - O Inventor – The Learning Company –s/d
Neste exemplo, a Balestra, um instrumento de guerra utilizado no século XV e
transformado por Leonardo em uma poderosa arma automática, foi projetada em 3D
permitindo a manipulação e facilitando a observação do objeto sob diferentes
ângulos, podendo auxiliar o aluno na construção dos conceitos de movimento e
funcionamento de engrenagens. A exploração do objeto permite a visualização de
detalhes que talvez não fossem possíveis através do livro.
As informações que os alunos obtiveram através da interatividade com o
objeto podem ser reagrupadas pelo professor a fim de criar uma ponte entre o que
foi observado e a demonstração de determinados conceitos.
30
Dessa forma, os processos de desenvolvimento e aprendizado possuem uma
estreita relação com a instrução, isto é, com a intervenção de outra pessoa. As
informações intermediadas pelo professor exercem um papel de suma importância
na relação estabelecida no ensino, uma vez que são reelaboradas pelos alunos
numa espécie de linguagem interna, promovendo um salto qualitativo nos níveis de
conhecimento.
Para explicar este processo, Vygotsky
2
(1997 apud POZO, 1998, p. 197)
desenvolveu o conceito de Zona de Desenvolvimento Proximal que se caracteriza
pela distância entre o desenvolvimento efetivo (aquilo que o sujeito consegue fazer
de forma autônoma) e o desenvolvimento potencial (aquilo que o sujeito é capaz de
fazer com a ajuda de outras pessoas ou de instrumentos mediadores) ele considera
que é o desenvolvimento potencial o que deve atrair o maior interesse, não somente
dos psicólogos mas também dos educadores. (POZO, 1998)
Tharp e Gallimore (1988), demonstram por meio do gráfico abaixo os quatro
estágios de desenvolvimento de uma criança no processo de aquisição da fala e da
linguagem.
Figura 4: Os quatro estágios da Zona de Desenvolvimento Proximal (ZDP)
Fonte: Tharp & Gallimore – 1988
2
VYGOTSKY, L. S. Pensamiento y lenguaje. Buenos Aires: La Pléyade, 1997
31
Observa-se que no estágio I o desempenho é assistido por indivíduos mais
capazes como professores, especialistas, pares ou treinadores que auxiliam o
indivíduo a buscar outros níveis de aprendizado.
Num segundo momento, representado pelo estágio II o desempenho é
auto-assistido. Neste sentido, a ZDP é a que separa o aprendiz de um
desenvolvimento que está próximo, mas ainda não foi alcançado, está, portanto,
num estágio embrionário.
O papel do educador é o de fazer com que o aprendiz alcance estágios de
desenvolvimento mais complexos, auxiliando-o em sua evolução intelectual. Ficando
atento ao que o aluno ainda não sabe.
Este é um ponto fundamental em que a teoria sócioconstrutivista contribui
com a educação, pois o professor não fica à espera do desenvolvimento intelectual
do aprendiz e sim leva o aluno adiante, trabalhando com os conceitos que ele ainda
não sabe, ou melhor, com os conceitos espontâneos, elaborados por ele
informalmente incentivando-o a evoluir para os conceitos científicos. Neste sentido o
educador assume a função de mediador na formação de novos conhecimentos.
(POZO, 1998)
Ao conhecer o processo mental utilizado pelo aprendiz para realizar uma
determinada tarefa, é possível intervir valendo-se de provocações, estímulos ou
simplesmente oferecer um apoio em determinada etapa do processo, de forma a
trabalhar e desenvolver funções que ainda não estejam de todo consolidadas.
(POZO, 1998).
Quando o educador trabalha essas funções por meio de experiências
compartilhadas está atuando na zona de desenvolvimento proximal, constatando a
importância da interação e do diálogo na aquisição de conhecimentos “provocando
avanços que não ocorreriam espontaneamente”. (OLIVEIRA, 1997, p.62)
As principais implicações desses conceitos para a prática pedagógica
passam, não pela valorização do processo em si, mas também por uma
determinante reavaliação do papel do professor que tem como função promover as
intermediações entre o aprendiz e os conhecimentos sistematizados além de
desenvolver conteúdos que valorizem o universo social e histórico, para que ele
possa encontrar significado nos conceitos aprendidos.
32
2.3 O ensino e as tecnologias digitais: uma outra dimensão do aprender
“Divinizar ou diabolizar a tecnologia ou a ciência
é uma forma altamente negativa e perigosa
de pensar errado”.
Paulo Freire (1996, p.37)
Em seu livro Hamlet no Holodeck, Janet Murray (2003, p. 17) diz que
“qualquer tecnologia industrial que estende dramaticamente nossas capacidades
também nos torna inquietos por desafiar o conceito da própria humanidade”.
Somos surpreendidos com o nascimento de novas tecnologias que sempre
nos fazem pensar e questionar se vieram para o bem ou para o mal. Foi assim com
diversas invenções no campo científico.
Neste sentido, o computador, com sua capacidade de transportar o usuário
para lugares virtuais, e colocá-lo em contato, via rede, com outras pessoas do
mundo e de produzir um incontável número de informações, também leva a
questionar este meio como “um gênio onipotente e brincalhão ou como o monstro de
Frankenstein”. (MURRAY, 2003, p. 17)
Ao mesmo tempo em que se acredita ser o computador um meio
revolucionário de processar a informação e a comunicação, ainda se pode
surpreender com relação ao potencial que ainda tem como meio para produzir e
contar histórias, estimular a imaginação, auxiliar nas aprendizagens escolares bem
como nos processos de criação e produção de conceitos científicos mediante
manifestações multimídiáticas e hipermidiáticas.
Inicialmente o uso do computador tenta imitar a atividade que acontece na
sala de aula e, à medida que o seu uso for se disseminando, outras modalidades de
uso poderão ser desenvolvidas.
O objetivo que se deve atingir mediante o seu uso não deve ser o de estudar
o computador, ou criar uma disciplina de informática, mas sim utilizá-lo nas aulas e
nas diversas matérias com o objetivo de pesquisa, resolução de problemas,
aprofundamento de temas, simulações e autoria de textos.
33
Para Lévy (1993, p. 54) “é preciso deslocar a ênfase do objeto (o computador,
o programa, este ou aquele módulo técnico) para o projeto (o ambiente cognitivo, a
rede de relações humanas que se quer instituir)”.
As novas modalidades de uso do computador no sistema educacional podem
nos indicar novos rumos: o uso dessa tecnologia como máquina para aprender e
para produzir conhecimento na medida em que aumenta o número de pessoas com
acesso à informática e aos meios interativos. Neste sentido o sistema educacional
poderá descobrir maneiras inovadoras e mais rápidas de facilitar o aprendizado.
A idéia da aprendizagem mediada pelos meios digitais leva a uma outra forma
de representação do pensamento que muitas vezes não se consegue através da
matriz verbal-escrita.
De acordo com Bairon (1995, p.21) “os sentidos humanos são mais
alcançados pela multimídia do que por outro tipo isolado de meios de comunicação,
esta realidade tecnológica dos multimeios é mais conseqüente no processo de
comunicação”.
Figura 5: Sistema sensorial demonstrado por recursos multimídia
3
Fonte: Disponível em: <www.educacional .com.br> – Acesso 8.out.2005
3
O projeto do Portal Educacional (s/d) que faz parte do Grupo Positivo criou um ambiente on-line onde é
possível aos alunos e professores de escolas conveniadas acessar milhares de informações de diversas áreas do
conhecimento por meio de sistemas multimídia com demonstração e simulação de conteúdos voltados para a
Educação Infantil, Ensino Fundamental e Ensino Médio.
34
O recurso acima explora o sistema sensorial da visão por intermédio de
atividades interativas no qual o aluno, ao clicar sobre qualquer uma das numerações
localizadas ao final da tela, pode compreender os diversos efeitos que a luz provoca
sobre o sistema nervoso.
Os conteúdos são fornecidos por um tutorial
4
, garantindo a orientação do
estudante no sentido de variar sua experiência através da exploração de outras
atividades do ambiente virtual. Este tipo de interação permite ao aluno vivenciar
experiências que através do livro seria praticamente impossível.
Esta simples simulação, graças a um modelo dinâmico e simplificado do
mundo real, pode oferecer ao aprendiz a possibilidade de desenvolver hipóteses,
testá-las, analisar os resultados e refinar os conceitos que já possui sobre o tema.
De acordo com Lévy (1993, p. 125):
A simulação por computador, permite que uma pessoa explore modelos
mais complexos e em maior número do que se estivesse reduzido aos
recursos de sua imagística mental e de sua memória de curto prazo, mesmo
se reforçadas por este auxiliar por demais estático que é o papel.
O uso de programas multimídia e hipermídia podem ser úteis para
aprendizagens que envolvam trabalhos em pequenos grupos e que tenham como
desafios situações problematizadoras.
Seymor Papert, (apud VALENTE, 1993, p. 34) desenvolveu no final da
década de sessenta uma linguagem pioneira de programação para crianças
denominada LOGO, de forma que elas pudessem aprender conceitos manipulando
uma “tartaruga” na tela do computador.
Ele acreditava no computador como uma ferramenta para auxiliar o aluno a
elaborar melhor o pensamento através do aprender fazendo. Desta forma as
crianças poderiam construir seu conhecimento.
Segundo Murray (2003, p. 21) “Papert acreditava que computadores eram
ferramentas para pensar e deviam ser usados para criar ‘micromundos’, nos quais
4
Evento interativo que envolve o fornecimento de feedback ao aluno sobre as tarefas e atividades já executadas
e orientação das tarefas a serem executadas. Disponível em <http://www.escolanet.com.br/dicionário>. Acesso
em 22.maio.2006.
35
estudantes curiosos pudessem aprender por meio de um processo de exploração e
descoberta”
A autora (2003, p. 21) relata suas experiências na construção de ambientes
de aprendizagem imersivos para o ensino de línguas estrangeiras. O aluno poderia
assumir um papel em uma história que se desenvolvia dentro do ambiente,
permitindo que se movessem “através de ambientes fotografados como se
estivessem numa visita a Bogotá ou a Paris”.
Nestes trabalhos ela ressalta que teve oportunidade de se convencer sobre
as vantagens dos sistemas digitais multimídias na medida em que algumas
modalidades de conhecimento eram melhor representados em ambientes digitais do
que no livro impresso.
Murray (2003, p. 24) salienta que esse meio altamente expressivo pode ora
complementar, ora superar o trabalho do livro e da sala de aula. “O computador
promete remodelar o conhecimento de maneira que ora complementam, ora
suplantam o trabalho do livro e da sala de conferências”.
A criação de ambientes digitais traz diversas inovações que possibilitam ao
usurário imergir em ambientes complexos, de experimentação e mediação para a
construção do conhecimento. Muitos criticam o computador por ser um meio
tecnológico com poder de fragmentar as informações e como uma máquina muito
mais ameaçadora do que nossa aliada. (MURRAY, 2003)
Talvez esse fato se deva à condição institucional da escrita como a grande
representante do pensamento analítico-reflexivo.
Segundo Bairon (2002, p. 130):
O acertado caminho percorrido na escola, que reforça a importância da
leitura como conseqüência da alfabetização e causa da competência
profissional, parece ter criado um axioma instransponível de que a única
maneira de valorizar a competência intelectual se através da escrita e da
leitura.
Acredita-se muito mais na coerência do pensamento humano, expresso
através da interface dos livros ou da escrita, do que em outras formas de
representação, como as imagens, sons, gráficos e o design.
36
Isto não significa dizer que as formas tradicionais nos processos de
aquisição tenham que ser abandonados, devendo antes de tudo existir uma
articulação entre um e outro. Segundo Bairon (2002. p.126):
Não que o surgimento das possibilidades midiáticas não-lineares reveladas
a partir das tecnologias digitais interrompam definitivamente os espaços da
manifestação linear-sequencial do pensamento. Por um lado, a narrativa
seqüencial de uma cena ou de uma trama pode ser muito importante no
interior de um ambiente de reflexão; por outro, o encontro desta com o
universo reticular das navegações é o evento que pode subjetivar a própria
conjugação sígnica.
Por meio de uma abordagem construtivista da educação pode-se ensinar com
ou por meio de computadores. Os sistemas informatizados podem ser elaborados e
utilizados como parceiros intelectuais para engajar os aprendizes na elaboração de
pensamentos mais complexos, entretanto, a abordagem pedagógica de como isso
irá acontecer é que se torna um fator importante no processo de ensino e
aprendizagem.
Segundo Murray (2003, p.151):
A world wide web é um ambiente fortemente construtivista, oferecendo
muitos sites que lhe permitem fazer seu próprio cartão-postal, gerar seu
próprio poema, construir uma careta ou simplesmente apropriar-se de sons
e imagens para seu uso próprio.
Sistemas de computadores são meios interativos que possibilitam a
experimentação e o capazes de mediar a construção de soluções e resolução de
problemas pelos alunos. O ensino através do computador implica que o aluno possa
através da interação, adquirir conceitos em praticamente qualquer domínio do
conhecimento.
No relacionamento interativo e participativo possibilitado pelos ambientes
digitais o aprendiz tende a não bloquear o seu processo de aprendizagem, pois os
programas podem permitir que o aprendiz:
1. desenvolva um diálogo consigo mesmo;
2. corrija imediatamente os erros sem interferência externa;
3. repita infinitas vezes a mesma operação por ensaio e erro;
37
4. utilize as linguagens híbridas como representação da organização natural do
conhecimento humano.
Segundo Valente, (2003, p. 22):
O fato de o computador poder executar a seqüência de comandos que foi
fornecida significa que ele está fazendo mais do que servir para representar
idéias. Ele está sendo um elo importante no ciclo de ações descrição-
execução-reflexão-depuração, que pode favorecer o processo de
construção do conhecimento.
Na correção imediata o computador envia uma mensagem de erro sem
aplicar nenhum tipo de punição, cabendo ao aprendiz retomar a tarefa e redirecionar
seu caminho em busca do seu objetivo.
Ao se vivenciar esta experiência de resposta imediata do computador, estar-
se-á lidando com uma das propriedades interativas dos ambientes digitais: a
procedimental.
Murray (2003, p.78)) identifica os ambientes digitais como procedimentais,
participativos, espaciais e enciclopédicos. As duas primeiras características estão
mais próximas às questões relacionadas à interatividade e as outras duas com o
conceito de imersão.
Como procedimental entende-se a capacidade de resposta do computador
aos nossos comandos. O caráter procedimental está relacionado à capacidade do
computador de executar uma série de regras que devem ser projetadas pelo
“cientista da computação”. Seu papel é “pensar em termos de algoritmos e
heurística, ou seja, identificar constantemente as regras exatas ou gerais de
comportamento que descrevem qualquer processo, desde calcular uma folha de
pagamento até fazer voar um aeroplano” (MURRAY, 2003, p.78).
Esta capacidade de resposta está relacionada com a programação do
ambiente, isto é, quais foram as respostas ou comportamentos previstos pelo
programador para diversas situações.
Portanto, ocorre uma transformação entre pensamento e ação, na medida em
que a manipulação de palavras, frases, textos, blocos de sentenças leva um tempo
mínimo para o processamento e organização, realizados pelo computador, e, assim
38
o aprendiz passa a se concentrar mais nas ações mentais, nas representações
sintáticas ou semânticas, se estiver escrevendo um texto, por exemplo.
Figura 6: Criador de textos malucos
Fonte: Disponível em: <www.educacional .com.br> Acesso em: 08.out.2005
A figura mostra uma atividade que consiste em escolher adjetivos,
substantivos, números e verbos para criar histórias malucas e engraçadas. Este
conteúdo foi desenvolvido para alunos de 1ª a 4ª série do ensino fundamental.
Através do lúdico o aluno pode ser autor de seu próprio texto observando se o
que ele criou possui sentido e se está correto do ponto de vista gramatical. Pode ser
uma ferramenta utilizada para a organização do pensamento ao estabelecer uma
ordem sintática e semântica de frases, possibilitar associações de significado entre
as palavras e os temas, permitindo a construção do conhecimento pelo aluno.
A criança pode participar sem a intermediação de um adulto. Entretanto o
valor educativo da atividade pode ser enriquecida por intermédio de sugestões feitas
pelo professor, como por exemplo, imprimir as histórias publicadas e pensar como
poderiam ser continuadas, promover discussões sobre os diferentes títulos para a
história ou criar desfechos variados.
39
Portanto, a interação que o aluno estabelece com o meio digital pode ser mais
produtiva, se mediada por um professor que saiba o significado do processo de
aprender mediante da construção do conhecimento. (VALENTE, 2003)
A velocidade de execução das tarefas é fator diferencial comparado com os
meios tradicionais mediadores da aprendizagem como livros, enciclopédias,
cadernos e todas outras mídias que estão em suportes separados.
Talvez essa rapidez de resposta, das quais as crianças e os adolescentes
estão totalmente familiarizados, possa acarretar uma relação precária com o mundo,
pois muitos jovens têm uma relação provisória com o que está por vir. Muitos
tendem a se fixar na rapidez dos estímulos, pois são atrativos e esteticamente
agradáveis, sem se preocupar em desenvolver o senso crítico com relação ao meio.
(MORAN, 2000)
Neste momento a intervenção do professor é essencial a fim de despertar nos
alunos o senso crítico de forma que ele não se torne dependente dos estímulos
sensoriais, impedindo-o de refletir sobre as informações fornecidas pelo meio.
Os ambientes digitais são participativos porque reagem às informações que
se inserem neles, indo além das questões referentes à programação do ambiente.
As características, procedimental e participativa é que proporcionam a interatividade
e estão presentes na hipermídia na medida em que se pode navegar dentro de sua
estrutura escolhendo caminhos, conteúdos, seguindo pistas, recebendo tarefas para
serem executadas, (fig 7) traçando rotas e assim o ambiente realizará uma série de
procedimentos a partir dessas interações.
O fato de o interator
5
poder mover-se dentro dos ambientes digitais, eles são
considerados espaciais, na medida em que podem representar e simular espaços
navegáveis. (MURRAY, 2003).
Tal sensação não pode ser vivenciada através dos meios lineares como o
livro ou filmes, pois esses meios retratam os espaços apenas através da descrição
verbal ou imagética. No computador, pode-se mover dentro da área de trabalho
procurando arquivos e também por intermédio dos jogos ou pela Internet.
Murray (2003, p. 85) salienta que “a qualidade espacial do computador é
criada pelo processo interativo da navegação”. A navegação é uma característica
5
O termo interator é utilizado pela autora para designar o sujeito que interage com os ambientes digitais.
40
exclusiva dos ambientes digitais. A tela do computador exibe uma história que é
também um lugar onde o jogador está interferindo e enfrentando as conseqüências
de cada ação.
Nessa mesma perspectiva, Bairon (1995, p. 112) ressalta que “a possibilidade
de construção de um mundo ‘virtual’ oferece oportunidade a um estudante de
história de ‘entrar’ num castelo medieval, numa catedral tica ou na cúpula de São
Pedro”.
Figura 7: Tela do jogo Fuja da Fortaleza
Fonte: CD-ROM Leonardo 2.0 – O Inventor: The Learning Company s/d.
Neste jogo, que faz parte do CD-ROM Leonardo 2.0, o usuário pode caminhar
pela Fortaleza idealizada por Leonardo, andando por corredores concêntricos,
colecionando pistas e desvendando mistérios até chegar ao final do jogo que é a
Torre Central. O jogo foi criado a partir da invenção da Fortaleza proposta por
Leonardo como uma nova arquitetura defensiva contra ataques de inimigos.
O ranger e o bater das portas na Fortaleza é um momento de vivência
dramática que é possível de ser vivenciada através dos ambientes digitais e da
41
interação do jogador. Os sons e a música presentes no jogo aumentam a atenção do
jogador ampliando assim a sensação de imersão. Neste sentido o usuário não está
apenas lendo sobre a invenção, mas participando dela.
O ambiente em 3D do jogo transforma a navegação pelos corredores da
Fortaleza numa visita imersiva misteriosa. O mundo tridimensional pode ser
percebido pelo jogador através do processo de navegação, “oferecendo uma ilusão
visual mais rica e, portanto mais convincente”. (MURRAY, 2003, p. 56)
Não inimigos a serem encontrados nem pessoas com quem negociar. A
maior parte da ação consiste em ir em frente abrindo portas e colecionando objetos
para resolver pequenas charadas a fim de se chegar à Torre Central e descobrir o
mistério da Fortaleza. Apesar dos efeitos de programação serem simples é possível
navegar pelos corredores escuros e ter a sensação de “estar na Fortaleza”.
De acordo com Faria (1995, p. 95) “na concepção piagetiana, os jogos
consistem numa simples assimilação funcional, num exercício das ações individuais
aprendidas. Geram, ainda, sentimento de prazer, tanto pela ação lúdica em si,
quanto pelo domínio destas ações”.
Por meio dos jogos, as crianças e os adolescentes podem exercitar por si
mesmos os esquemas construídos anteriormente, com a finalidade de obter prazer
através do exercício lúdico.
De acordo com Faria (1995, p. 97) nem sempre é possível “distinguir o jogo
de uma adaptação inteligente. Muitas vezes, o indivíduo começa desenvolvendo
uma atividade séria, observada através da atenção e, de repente, converte-se em
atividades geradoras de prazer, notada, por exemplo, através do riso”.
Dessa forma, a hipermídia pode contribuir para a construção de conceitos e
aquisição de novos conhecimentos, oferecendo ao aluno, no momento da
navegação, oportunidades lúdicas e estéticas, por diferentes linguagens, tornando o
aprendizado mais prazeroso.
Por meio dos jogos os alunos têm oportunidade de combinar ações
simplesmente pela alegria de agir ou de explorar seu potencial motor (Faria, 1995),
42
entretanto podem, em um momento posterior, serem capazes de elaborações mais
complexas através das vivências com os jogos.
Em Fuja da Fortaleza, o aluno poderia começar a gostar mais de História
mostrando interesse por castelos medievais, pelas moradias características da
Renascença, vestuários, enfim pelos costumes da época e outros.
Embora as regras, no jogo da Fortaleza não sejam complexas, o aluno
precisa desvendar alguns mistérios a fim de passar para o outro corredor. Ao lidar
com as regras o aluno pode adaptá-las para outras situações, onde o
relacionamento com outras pessoas se faz presente. As regras servem para que
haja uma troca genuína entre os indivíduos, bem como regular as ações entre eles.
(FARIA, 1995),
Uma outra característica dos ambientes digitais é que eles são
enciclopédicos, pois permitem armazenar e recuperar grande quantidade de
informações de forma rápida e acessível. Dessa forma pode-se dizer que esses
ambientes são como uma extensão da memória humana.
Como dito anteriormente, todas as formas de representação da linguagem
podem hoje ser convertidas aos ambientes digitais através do processo de
digitalização agrupando as informações num imenso banco de dados ou em uma
biblioteca global, acessível em qualquer parte do planeta.
Nas palavras de Murray (2003, p. 88) “é como se a versão moderna da
grande biblioteca de Alexandria, que continha todo o conhecimento do mundo
antigo, estivesse a ponto de se rematerializar na vastidão infinita do ciberespaço”.
Por intermédio de um banco de dados, por exemplo, obtém-se a informação
de forma rápida, em poucos segundos. Se estas informações fossem obtidas por
meios tradicionais, poderiam levar dias.
Assim, a informação oferecida sobre determinado conhecimento pode ser
apresentada de forma abrangente ou rica em detalhes. Podem ser apresentadas sob
diversas perspectivas e entrecruzadas, formando uma extensa rede de
conhecimentos, levando o estudante a perceber outras relações que o tema pode
trazer para sua pesquisa.
43
Figura 8: Banco de Dados
Fonte: CD-ROM Leonardo 2.0 – O Inventor: The Learning Company s/d.
No ícone Banco de Dados, da hipermídia Leonardo 2.0, encontram-se
aproximadamente 150 temas para pesquisa relacionados à vida e obra do autor
incluindo suas invenções e dados históricos do período do Renascimento. O sistema
de busca comporta pesquisa em formato de textos e imagens que podem ser
fotografias, obras de arte e desenhos originais das mais de 7.000 anotações dos
cadernos de Leonardo, muitos deles exibindo a escrita característica de sua forma
de expressão, da direita para a esquerda.
As informações contidas no Banco de Dados podem ser utilizadas tanto pelo
professor como pelo estudante na exploração dos variados temas e na elaboração
de questões complementares, inserindo o estudante num universo interdisciplinar de
conhecimentos, possibilitando uma visão menos fragmentada dos acontecimentos
históricos.
No exemplo acima ao escolher a palavra anatomia para realizar uma
pesquisa o estudante se depara com uma outra palavra, flauta doce, que,
aparentemente não está relacionada ao tema, entretanto ao acessar as informações
descobre que o instrumento e a forma de uso foram idealizados pelo inventor, muito
44
provavelmente com base nos estudos de anatomia que realizou sobre a laringe e a
traquéia.
Dessa forma, a hipermídia Leonardo propõe um caminho interdisciplinar na
aquisição de conhecimentos na medida em que demonstra a trajetória histórica e
cultural do período do Renascimento, possibilitando a relação com diversas ciências:
matemática, arquitetura, medicina, anatomia, geografia, física e outras.
Ao diversificar as formas de adquirir conhecimento, desmistificando o uso de
tecnologias em sala de aula, o professor aproxima-se da linguagem dos jovens, os
quais, por sua vez, fazem parte de um mundo onde o processamento das
informações é baseado em imagens e ícones muito utilizados nas novas mídias,
videogames, publicidade e clipes musicais.
“Nossos filhos se sentem à vontade com o joystick, o mouse e o teclado.
Eles têm como certo a poderosa presença sensorial e os formatos participativos do
meio digital”. (MURRAY, 2003, p. 25)
A existência dos meios de comunicação de massa como o cinema, a televisão
e o vídeo contribuíram com novas formas de raciocínio e a aprendizagem pode
ocorrer de outras maneiras além da tradicional aula expositiva. O uso cada vez
maior desses meios e de outras tecnologias acabou diversificando as estratégias de
aprendizagem que puderam assumir um caráter mais informal e, quem sabe, mais
interessante e divertido.
Os ambientes digitais abrem os sentidos para que o estudante estabeleça um
diálogo com o conhecimento, enriquecendo o processo de sua construção e tirando
suas próprias conclusões mediante as experiências estéticas oferecidas por esses
meios.
Em seu livro Culturas eXtremas, Massimo Canevacci (2005) aborda as
questões sobre as mudanças comunicativas das culturas juvenis do século XXI,
como sendo culturas plurais, diferenciadas e móveis, não cabendo a elas nenhuma
classificação de cunho metodológico ou científico, devido às suas estruturas líquidas
e em constantes mutações.
45
Nas sociedades complexas não mais espaço para o conceito de “caráter
nacional”
6
(CANEVACCI, 2005, p.17) em que as diferenças precisam ser
homogeneizadas. algo de heterogêneo, fragmentário, plural, fluido, parcial,
disjuntivo e diferente.
Neste sentido o autor assinala que na contemporaneidade
[...] as identidades não são mais unitárias, igualitárias, compactas, ligadas a
um sistema produtivo industrial, a um sistema reprodutivo de tipo familiar, a
um sistema sexual de tipo monossexista, a um sistema racial de tipo purista,
a um sistema geracional de tipo biologista. (CANEVACCI, 2005, p.18)
O fim da era fordista de organização do trabalho e a origem de diferentes
estilos de vida evidenciaram comportamentos e conceitos inovadores como, por
exemplo, as modificações no corpo mediante cirurgias estéticas, ampliando o
conceito de juventude e diminuindo as distinções entre as faixas etárias, tão
marcantes, antigamente.
“O jovem teenager
7
afirma-se com prepotência na comunicação metropolitana
e midiática do Ocidente, particularmente por meio de sua visibilidade musical e
fílmica”. (CANEVACCI, 2005, p.20)
A cultura de massa apresenta ao jovem a mercadoria como visão antecipada,
em 1927, quando nasce o cinema sonoro com The jazz singer [O cantor de jazz]
dirigido por Alan Crosland, um filme mudo com algumas inserções faladas ou
cantadas. (CANEVACCI, 2005)
6
O termo caráter nacional é utilizado pelo autor quando ele se refere à tendência que os diversos campos da
ciência como a antropologia, a filosofia, a psicologia, a sociologia e outras, têm de caracterizar as diferenças
culturais como desordem criando, então, uma apologia á identidade, ao que é homogêneo dentro das
manifestações culturais em detrimento do heterogêneo.
7
Palavra anglosaxônica que significa adolescente. Disponível em: http://www.ipv.pt/anglicismos/ Acesso em:
02.jun.2006.
46
Figura 9: The Jazz Singer, 1927
Fonte: Disponível em: http:<//en.wikipedia.org/wiki/>The_Jazz_Singer
Acesso em: 2.jun.2006
É através do ritmo inovador trazido pelo Rock entendido como meio de
expressão, revolta e anseio de liberdade da juventude dos anos cinqüenta, que
nascem as culturas juvenis, influenciadas por uma indústria cultural nascente nas
grandes metrópoles.
A diversidade, as culturas fragmentadas, híbridas e transculturais fazem da
chamada sociedade um lugar que não serve mais como ponto de partida para
uma pesquisa hegemônica. (CANEVACCI, 2005)
Os jovens tornam-se obsoletos para o modelo do caráter nacional porque
suas identidades o diversas, móveis e nômades. Neste contexto “morrem as
faixas etárias, morre o trabalho, morre o corpo natural, desmorona a demografia,
multiplicam-se as identidades”. (CANEVACCI, 2005, p. 29)
Cada vez mais o jovem em mutação transforma seu ambiente, o ambiente
que muitas vezes é o mesmo que o dos pais, mas que ele transforma num espaço
de apliques e colagens, o modo como se veste, como enfeita seu corpo (piercing e
tatuagens), criando uma identidade própria por meio de signos visuais, que muitas
vezes para o adulto são sinais sem significado.
47
Neste sentido, os estudantes possuem um conhecimento e uma familiaridade
com as imagens visuais que os adultos o possuem. Esta nova geração nasceu
num mundo invadido pelas imagens visuais.
Tardy (1976, p 26), de certa forma antecipa essa visão sobre a influência da
imagem na juventude e fala sobre a familiaridade que os alunos possuem com
relação à imagem:
A nova geração nasceu num universo invadido pela imagem: esta sempre
fez parte de seu horizonte cultural. Em contrapartida, os adultos que
desejam interessar-se seriamente pelas imagens são obrigados a fazer uma
verdadeira conversão mental. [...] os alunos pertencem a uma civilização
icônica, enquanto os professores pertencem ainda a uma civilização pré-
icônica.
Sabe-se que, tradicionalmente, o ensino baseia-se na adoção de livros
didáticos, manuais ou apostilas. Entretanto, na medida em que estes recursos
puderem ser atualizados, revistos e reorganizados podem ser com o passar dos
anos substituídos por documentos digitais e colocados à disposição em forma de
CD-ROM ou em rede.
As aulas mediadas pelo computador podem se tornar mais interessantes,
pois, ocupa o lugar dos desenhos de giz no quadro negro. Um ambiente
hipermidiático permite reproduzir imagens, movimentos, sons e fenômenos como um
verdadeiro balé eletrônico em que os estímulos sensoriais são múltiplos,
estimulando o cérebro e diversificando as formas de aprender.
Neste sentido os professores poderão conciliar estes materiais com as
atividades a serem desenvolvidas com os alunos e integrá-las ao ensino de forma
inovadora.
Reconhecer como forma de expressão as linguagens híbridas dos ambientes
digitais faz com que a escola e principalmente os educadores sintam-se desafiados
a assumir uma postura de aprendiz ativo, crítico e criativo em sua prática de ensino
mediante uma pedagogia ativa.
Murray (2003) denomina o computador como um novo contador de histórias e
também como extensão da própria consciência, na medida em que capta as
palavras com a mesma rapidez com que se pensa nelas.
48
Pode-se, através do computador, expressar livremente as emoções,
pensamentos ou condutas que, na vida real estariam subjugadas pelas convenções.
Esse tipo de comportamento é claramente observado entre os MUDdres (Multi-User
Dungeons) em que os membros projetam facilmente seus desejos e medos mais
profundos para pessoas que conhecem apenas virtualmente. Nos encontros on-line
de cursos à distância, por exemplo, pode-se notar as mudanças de comportamentos
nos quais pessoas inibidas tornam-se mais expansivas utilizando esse meio.
2.4 As imagens digitais e o desenvolvimento de conteúdos educacionais
A escrita desde sua invenção nas grandes civilizações agrícolas da
Antiguidade (LÉVY, 1993) reinou soberana como tecnologia da comunicação
durante muitos anos até o aparecimento dos meios visuais como a televisão e o
cinema, inaugurando uma nova forma de comunicação através das imagens.
Nas sociedades orais que não possuíam a escrita como forma de
comunicação “a palavra tem como função básica a gestão da memória social, eo
apenas a livre expressão das pessoas ou a comunicação prática cotidiana”. (LÉVY,
1993, p. 77)
A transmissão das informações acontecia por meio da fala e as comunidades
orais perpetuavam suas tradições e conhecimentos contando aos mais jovens a sua
história e esses, por sua vez, repetiam para as gerações futuras. Cada grupo
possuía sua história guardada na memória. “Nas sociedades sem escrita, a
produção de espaço-tempo está quase totalmente baseada na memória humana”.
(LÉVY, 1993, p. 78)
Segundo Lévy (1993, p. 82) “as rimas e os ritmos dos poemas e dos cantos,
as danças e os rituais têm, como as narrativas, uma função mnemotécnica”.
A memória humana precisava armazenar todas as informações, pois muitas
sociedades viveram numa época em que não havia tecnologias externas como
auxiliares da memória para facilitar a tarefa de comunicação.
49
A comunicação através do uso de imagens, antes da invenção da escrita,
se fazia presente e eram desenhadas nas paredes de cavernas, contando histórias e
registrando o cotidiano dos ancestrais.
As Tapeçarias de Bayeux, (século XI), por exemplo, retratam a conquista da
Inglaterra pelos Normandos e o uma evidência das narrativas contadas por
imagens. Possuem 60 cm de altura e 70 metros de comprimentos e na época
medieval eram exibidas periodicamente ao povo.
Figura 10: Detalhe da cena em que o Rei Eduardo esquerda) em seu trono
recebe Haroldo, conde de Wessex, que logo após caminha à frente de seus
cinco milites para Bosham, da Tapeçaria Baieux, 1604.
Fonte: Disponível em: <http://www.readingmuseum.org.uk> Acesso em: 17.jun.2006
Contar a história mediante imagens é uma das formas de extrapolar as
restrições de entendimento impostas pela língua falada e escrita.
Segundo Burke (2004, p. 101):
Uma vantagem particular do testemunho de imagens é a de que elas
comunicam rápida e claramente os detalhes de um processo complexo,
como o da impressão, por exemplo, o que um texto leva muito mais tempo
para descrever de forma mais vaga.
A grande inovação na área da tecnologia da imagem nasceu com a fotografia.
(SANTAELLA, 2001). Muitos acreditaram que a fotografia iria se sobrepor à pintura
uma vez que capturava a imagem de forma instantânea e mais realista, originando
uma cópia perfeita da realidade, além de poderem ser transportadas com mais
facilidade que as pinturas chegando aos interessados no mesmo momento em que
os eventos ainda estivessem vivos na memória.
Os álbuns fotográficos apresentam uma biografia visual relatando, através da
imagem, os momentos da vida das pessoas.
50
Figura 11: Álbum de Família
Fonte: Disponível em: <http//: www.educaional.com.br> Acesso em: 08.out.2005
Uma das vantagens da imagem é que com o passar do tempo ela se tornou
acessível a um grande número de pessoas. Passou a fazer parte do cotidiano de
pessoas comuns. O que não acontecia com as pinturas, que muitas vezes eram
encomendadas, exigiam esforço e tempo por parte daqueles que as
encomendavam, tendo que posar para o artista e era privilégio apenas dos
aristocratas.
A imagem, por ser uma linguagem universal pode ser interpretada
independentemente da língua falada e ser um instrumento de análise até mesmo por
pessoas analfabetas. Atingem diversos públicos: jovens, crianças e adultos.
“O ato de ver é, portanto, um ato que antecede a ação”. (PARENTE, 1993,
p.19)
A influência da televisão e do vídeo transformou a imagem e o som num meio
de comunicação mais atrativo para os jovens que preferem muitas vezes assistir
televisão ou versões filmadas de livros a ler o livro impresso ou assistir à aula do
professor. Talvez isso se deva ao fato do jovem ter descoberto meios mais atrativos
de aprender.
51
Não que as mídias substituam o papel exercido pelo professor, mas
modificam a forma pela qual os jovens vêem o mundo. A cultura da imagem é uma
característica forte das novas gerações e talvez possa ser explorada
pedagogicamente nos processo de ensino e aprendizagem.
Como a televisão faz uso da imagem, do som e da linguagem falada as novas
gerações se voltam para uma expressividade mais oral do que escrita uma vez que
o meio audiovisual tem mais densidade informacional do que o meio escrito,
podendo capturar muito mais dados de natureza cultural e psicológica que podem
levar a compreender as ações e os comportamentos muito mais do que as
generalizações feitas pelas ciências sociais ou pelos conceitos teóricos.
Entretanto, a imagem no ambiente escolar é utilizada apenas como ilustração
e complemento do conteúdo e não como uma fonte rica que evidencia que registra
fatos históricos e pode contar muitas coisas sobre os tempos que já se foram.
Segundo Moran (2000, p. 36):
A educação escolar precisa compreender e incorporar mais as novas
linguagens, desvendar os seus códigos, dominar as possibilidades de
expressão e as possíveis manipulações. É importante educar para usos
democráticos, mais progressistas e participativos das tecnologias, que
facilitem a evolução dos indivíduos.
Neste sentido o ensino mediante a hipermídia pode favorecer a aprendizagem
na medida em que as linguagens híbridas, comportadas pelo meio, se aproximam
das linguagens do jovem estudante, motivando e tornando mais interessante a
aquisição de conhecimentos, por meio dos processos formais da educação.
Quando se pensa em imagens como fontes históricas, é necessário lembrar
que fazem parte desta categoria: quadros e gravuras, pinturas e desenhos (em
tumbas e cavernas.) fotografias, iluminuras e mosaicos, mapas, pratos decorados,
esculturas, dentre outros.
Mediante a análise de imagens pode-se reconstruir o passado e entender um
pouco mais sobre os costumes e hábitos de diversos povos ou civilizações, suas
práticas sociais, seu cotidiano e suas experiências mais comuns podendo o
estudante reconhecer o mundo como um lugar em constante transformação bem
como a relação do indivíduo com o seu meio.
52
Segundo Burke (2004, p. 17):
Pinturas, estátuas, publicações e assim por diante permitem a nós,
posteridade, compartilhar as experiências não-verbais ou o conhecimento
de culturas passadas. [...] Trazem-nos o que podemos ter conhecido, mas
não havíamos levado tão a sério antes. Em resumo, imagens nos permitem
“imaginar” o passado de forma mais vívida.
Uma outra hipermídia a ser explorada neste estudo é Diadorim, que faz parte
de um conjunto de materiais produzidos para o Projeto História Local nos Processos
de Alfabetização de Crianças, Jovens e Adultos, financiado pela FAPESP, no
período de 1996 a 2000 e que foram utilizados no processo de ensino e
aprendizagem de crianças, jovens e adultos da Cidade de Diadema.
Figura 12: As memórias do avô de Neco
Fonte: CD-ROM Diadorim - 2001
Informações sobre o tempo histórico referente à escravidão podem ser
descobertas por uma análise mais atenta das fotografias ou desenhos que fazem
referência ao período bem como fotos da época.
53
Dessa forma, descobre-se como os escravos eram tratados, que tipos de
instrumentos eram utilizados para o aprisionamento, em que trabalhavam, como era
a organização social da época e sua influência nas relações sociais e na estrutura
econômica em geral.
Em Diadorim os alunos resgataram, através das histórias de seus familiares e
antepassados, acontecimentos que influenciaram na construção e na organização
social, política e econômica da cidade de Diadema, desde a sua fundação. Quais
foram os primeiros exploradores da região, como a cidade se organizava desde o
início do século XIX até os dias atuais.
Neste sentido o objetivo da atividade era poder articular os elementos do
vivido e do refletido em busca da história do lugar procurando, assim, criar o
significado de identidade para os alunos.
Desse modo a compreensão e assimilação dos conteúdos se deram por
intermédio de aprendizagens significativas.
Segundo Pozo, (1998, p.211) “uma aprendizagem é significativa quando pode
ser incorporada às estruturas de conhecimento que possui o sujeito, isto é, quando o
novo material adquire significado para o sujeito a partir de sua relação com
conhecimentos anteriores”, de forma que o aluno possa relacionar as idéias novas
com as que ele já possui.
A incorporação dessas referências ao cotidiano sugere que a relação
professor-aluno se articule por meio de trocas mais significativas e o aluno passe a
ser um sujeito ativo e portador de saberes.
Segundo Becker (2001, p.41) “numa sala de aula construtivista a proposta do
professor é co-participada pelos alunos, pelas sugestões dos alunos e a proposta
dos alunos é viabilizada pelo professor”.
Neste sentido, se não houver a possibilidade de ação do aluno sobre o
conteúdo, não haverá verdadeira aprendizagem. Se o aluno o tiver oportunidade
de se apropriar do próprio fazer, seu crescimento cognitivo poderá ficar
comprometido.
54
Vale ressaltar que além dos materiais produzidos e estruturados de forma a
favorecer uma aprendizagem significativa, é importante que existam outras
condições para que o aluno aprenda: como a motivação e uma estrutura cognitiva
que permita o estabelecimento de relações num nível de complexidade maior.
(POZO, 1998)
Figura 13: Rumo ao Estudo do Lugar
Fonte: CD-ROM Diadorim - 2001
Nas histórias vividas pelo menino Diadorim o espaço é percebido em virtude
das ações e das observações do personagem no decorrer das narrativas,
possibilitando ao aluno criar o sentido de identidade comparando-a com sua
trajetória.
A história da cidade de Diadema e de seus bairros é reconstruída pelos
alunos partindo de mapas dos diversos bairros da cidade contando com a proposta
do professor em enumerá-los imaginando o significado dos seus nomes partindo do
conhecimento e das experiências simples do dia-a-dia que os alunos possuíam
fora da escolarização formal.
55
Segundo Pozo (1998, p. 204)
[...] o significado dos conceitos científicos não pode ser construído sem
referência aos conceitos cotidianos. Ou, em termos de processo de
aprendizagem, os verdadeiros conceitos somente podem ser adquiridos por
reestruturação, mas essa reestruturação somente é possível se apoiada em
associações prévias.
Alguns bairros guardam vestígios de tempos remotos e permitem recolher dos
fragmentos das fotografias muitas histórias de momentos distantes. A utilização de
pinturas ou fotografias das cidades permite aos estudantes imaginar a aparência
das ruas, a arquitetura dos prédios e das casas, a higiene do local, se os locais são
residenciais ou industriais bem como a presença de pessoas e animais.
A partir do estudo das imagens e fotografias da cidade, os alunos puderam
construir as noções de tempo e espaço, e dos signos culturais que dão o sentido de
pertencimento a uma determinada cultura.
Na narrativa, Rumo ao Estudo do Lugar os alunos têm oportunidade de
vivenciar situações em que possam estabelecer relações entre o presente e o
passado estimulando descobertas em várias dimensões como: as características
físicas e naturais, as atividades sociais e de lazer que eram desenvolvidas naqueles
locais, os meios de subsistência da população dentre outros.
A utilização de mapas como registro simbólico e visual do espaço pode ser
utilizado no processo de alfabetização das crianças, jovens e adultos
proporcionando o estudo e a construção dos conceitos de espaço, fronteiras, limites,
direção e escala, levando-os a compreender que existem diversas formas de
linguagens como possibilidade de expressão.
Dessa forma, os mapas o apresentados como representações simbólicas
de espaços geográficos e que têm como características uma linguagem repleta de
signos como: projeção, escala e legendas.
A relação do homem com o mundo é mediada por instrumentos materiais
(ferramentas) e instrumentos psicológicos (signos e mbolos). Esses permitem ao
homem a apropriação das experiências elaboradas socialmente e lhe dão bases
para a produção de novos conhecimentos.
56
Segundo Pozo (2002, p. 25) “a função fundamental da aprendizagem humana
é interiorizar ou incorporar a cultura para assim fazer parte dela”.
Portanto os signos, como “marca externa que auxilia o homem em tarefas que
exigem memória ou atenção”, ampliam a capacidade do homem na medida em que
facilitam sua atuação no mundo e na convivência com outros, além de “estender”
sua memória, tornando-a mais poderosa. A memória mediada por signos é, pois,
mais poderosa que a memória não mediada. (OLIVEIRA, 1997, p.30)
O manuseio de mapas deve ser incentivado pelo professor a fim de criar
oportunidade aos alunos de desenvolver suas hipóteses sobre as relações espaciais
e construir os conceitos de vizinhança, proximidade, separação, interioridade e
exterioridade.
A ação de colocar os desenhos dos bairros confeccionados pelos próprios
alunos e relacioná-los com o lugar, no mapa, favorece este tipo de construção além
de apreender os elementos característicos da cartografia como as legendas, por
exemplo.
Ao substituir os objetos do mundo real, pelas representações mentais que faz
desses objetos ou situações, o homem liberta-se do espaço e do tempo presentes,
utilizando seu pensamento para a elaboração de planos futuros, para a criação e a
imaginação. Capaz de operar mentalmente sobre o mundo, o indivíduo está
preparado para estabelecer relações, planejar, comparar, lembrar, tomar decisões e
levantar hipóteses sobre fatos e acontecimentos que ainda não aconteceram.
(OLIVEIRA, 1997)
“Ao aprender um conceito, o que os sujeitos fazem é comprovar hipóteses de
maneira sucessiva ou simultânea”. (POZO, 1998, p.75)
As representações espaciais se formam através da organização de ações que
os alunos realizam primeiramente no plano perceptivo e depois no plano
representativo ou intelectual.
Vygotsky
8
(1997 apud POZO, 1998, p. 197) considera:
8
VYGOTSKY, L. S. Pensamiento y lenguaje. Buenos Aires: La Pléyade, 1997.
57
[...] o processo de aprendizagem consiste em uma interiorização
progressiva de instrumentos mediadores. Por este motivo deve iniciar-se
sempre no exterior, por meio de processos de aprendizagem que somente
mais adiante se transformam em processos de desenvolvimento interno.
Na medida em que o aluno for construindo a noção de espaço através das
ações sobre os objetos do conhecimento, se capaz de modificar ações futuras e
generalizar os conceitos aprendidos.
Segundo Becker (2001), o processo de conhecimento está relacionado ao
que o aluno pode retirar ou extrair dos objetos, pela assimilação e modificá-los pela
acomodação. Assim, o aluno pode abstrair dos objetos de conhecimento
características que são observáveis ou não, e depois utilizá-las em outras situações
do cotidiano.
Portanto os conhecimentos “provêm precisamente da capacidade de retirar,
por abstração reflexionante as qualidades da coordenação de suas ações”.
(BECKER, 2001, p.38)
Segundo o autor, (2001, p. 38):
Abstração é agir sobre as coisas e retirar daí algo ou, ainda, agir sobre as
próprias ações e retirar dessas ações, nas suas características materiais,
observáveis, alguma coisa. A esse tipo de abstração Piaget chama de
empírica. Uma outra forma de abstração se sobrepõe a essa primeira: é a
abstração reflexionante. O que caracteriza a abstração reflexionante? Tendo
agido sobre o meio, sobre os objetos, sobre as relações sociais debruça-se
o sujeito, agora, sobre essas ações, retirando qualidades, não mais desse
meio, desses objetos, mas da própria coordenação das ações. Trata-se,
portanto, de uma ação de segunda potência.
As representações futuras resultam de manipulações de elementos do meio
ambiente e não apenas em leituras sobre os acontecimentos desse meio.
58
Figura 14: Em busca do Lugar.
Desenho elaborado por um aluno da classe de alfabetização de adultos.
Fonte: CD-ROM Diadorim - 2001
No exemplo acima os alunos construíram mapas que representavam o
caminho da fábrica, onde trabalhavam, até a escola. Dessa forma trabalharam as
noções de espaço, tomando como referência os locais conhecidos e pleno de
significado em seu cotidiano, para, desta forma, caminhar para uma compreensão
mais global de bairro, município, estado e país.
Além disso, os mapas também podem ser utilizados para a compreensão dos
espaços que estão fora do contexto escolar e seus significados sociais como: o
trabalho assalariado (meio de subsistência das pessoas e de desenvolvimento
social), os processos de industrialização da cidade e a evolução do comércio da
região.
59
Foto 1: Comissão de fábrica desenvolvida pelos trabalhadores no
município de São Paulo no final dos anos 70
Fonte: CD-ROM Diadorim -2001
Foto 2: Luís Inácio: comissão de fábrica - 1970
Fonte: CD-ROM Diadorim -2001
60
Os jornais frequentemente utilizam as fotografias como evidências autênticas
de fatos ocorridos e a textura da fotografia também pode transmitir mensagens. De
acordo com Sarah Grahm-Brown
9
(1980 apud BURKE, 2004, p. 27) “uma fotografia
em sépia pode produzir uma calma aura de ‘passado’, ao passo que uma fotografia
em preto e branco pode transmitir um sentido de dura realidade”.
Foto 3: Fotografia “em sépia” sem identificação
Fonte: CR-ROM Diadorim - 2001
Embora se tenha uma tendência a acreditar nas evidências fotográficas
alguns historiadores, como Peter Burke alerta sobre até que ponto se pode acreditar
nessas imagens, pois muitas fotografias e pinturas seguem convenções artísticas e
ainda sofrem influência do ponto de vista do artista, isto é, sua mentalidade.
Desta forma, é importante ter uma visão crítica sobre a origem da fotografia,
saber quem é seu autor e também saber como analisá-la.
Burke (2004) apresenta alguns pontos importantes que devem ser levados em
consideração a respeito das imagens enquanto evidência histórica. São eles:
9
GRAHAM-BROWN, Sarah. Palestinians and their Society. 1880-1946: A Photographic Essay. London:
Quartet Books, 1980 p.2
61
1. a arte pode fornecer evidência para aspectos da realidade social que
os textos passam por alto, pelo menos em alguns lugares e épocas;
2. ao mesmo tempo a arte da representação é quase sempre menos
realista do que parece e distorce a realidade social mais do que a
reflete por isso precisa se levar em consideração as intenções dos
pintores e dos fotógrafos a fim de procedermos a uma interpretação
correta, tanto no sentido “físico” (o lugar e a posição da foto) como o
ponto de vista “mental” (quais eram as intenções do artista)
Em Diadorim, o conto A praça da moça e a fuga pela Praça Castelo
Branco, aborda a história do centro mediante fotografias da cidade estabelecendo
um contraste entre o antigo e o moderno. As características podem ser estudadas
pelos alunos a partir da análise dos objetos e utensílios que aparecem nas fotos,
como por exemplo, as que retratam A farmácia do Sakamoto, que mostra através
dos vidros, verdadeiros signos visuais, que a manipulação dos remédios era feita de
forma artesanal, isto é, manuseados na própria farmácia.
Figura 15: Farmácia do Sakamoto
Fonte: CD-ROM Diadorim - 2001
62
Portanto, as fotografias e as imagens permitem uma viajem ao passado e
uma descoberta de acontecimentos que muitas vezes estão nos detalhes pequenos,
mas que podem ser significativos, indicando pistas para se extrair informações
importantes para o estudo de um lugar ou de uma época.
Na hipermídia Leonardo 2.0, por exemplo, as imagens são exploradas através
da apresentação de vídeos que demonstram o funcionamento ou utilização de
diversos aparatos tecnológicos da atualidade relacionando-os com as suas
invenções.
Dessa forma é possível atingir os sistemas sensoriais, captar e ampliar
informações que não seriam possíveis por outros meios.
Segundo Moran (2000, p. 34)
A força da linguagem áudio-visual está no fato de ela conseguir dizer muito
mais do que captamos, de ela chegar simultaneamente por muitos mais
caminhos do que conscientemente percebemos e de encontrar dentro de
nós uma repercussão em imagens básicas, centrais, simbólicas,
arquetípicas, com as quais nos identificamos ou que se relacionam conosco
de alguma forma.
Mais adiante o autor acrescenta que “ao colocar pedaços de imagens ou
cenas juntas, em seqüência, criam-se novas relações, novos significados, que antes
não existiam”. (MORAN, 2000, p.35)
63
Figura 16: Demonstração uma das invenções de Leonardo e sua
relação com o esqui aquático.
Fonte: CD-ROM Leonardo 2.0 – O Inventor: The Learning Company s/d.
No vídeo, exibido logo após a demonstração feita em animação da Bóia de
Caminhar, projetada por Leonardo, as cenas que dão continuidade demonstram
outros esportes aquáticos nos quais é possível caminhar na superfície da água.
“Mostrar é igual e demonstrar, a provar, a comprovar” (MORAN, 2000, p. 35)
É possível, então, através do vídeo, partir de uma situação isolada
estabelecendo relações com outras idéias.
Segundo Moran (2000, p. 39) “a linguagem áudio-visual solicita
constantemente a imaginação e reinveste a afetividade com um papel de mediação
primordial no mundo, enquanto a linguagem escrita desenvolve mais o rigor, a
organização, a abstração e a análise lógica”.
Em suma, existem diversas formas de aplicação desse recurso nos ambientes
hipermídia, e o professor pode utilizá-lo para sensibilizar os alunos na iniciação dos
conteúdos da disciplina, para despertar a curiosidade, para demonstrar ou simular
experiências e como forma de diversificar os canais de comunicação em sala de
aula.
64
3 HIPERTEXTO: UMA TEXTUALIDADE FLUTUANTE
A primeira concepção ou idéia de hipertexto foi atribuída a Vannevar Bush em
1945 mediante um artigo publicado no T h e A t l a nt i c Mo nth ly “As we may think”
onde ele lança as idéias fundamentais sobre uma nova articulação da informação.
Lévy (1993)
Sua formação era em matemática e ele trabalhava numa agência de
Desenvolvimento e Pesquisa Científica do Governo Norte-Americano, onde
coordenava cerca de seis mil cientistas.
Bush
10
(1945 apud LANDOW, 1995) sugere a criação de um mecanismo, o
“Memex” (Memory Extension) que seria capaz de processar um número crescente
de informações de forma que cientistas e pesquisadores pudessem compartilhar e
encontrar essas informações de forma rápida e eficiente. Esse mecanismo serviria
como uma memória auxiliar ao pesquisador e seria fundamental para a elaboração
de novos conhecimentos.
Figura 17: Imagem de como seria o MEMEX proposto por Vannevar Bush - 1945
Fonte: Disponível em: <http//www.citi.pt/homepages/espaco/html/memex.html>
Acesso em 17.nov.2005
10
BUSH, Vannevar. “As We May Think”. Atlantic Monthly 176 (Julio de 1945): 101-108
65
Neste artigo, o autor afirma que o raciocínio humano funciona por
associações, saltando de uma representação à outra ao longo de uma rede de
conhecimento e que a maior parte dos sistemas de indexação e organização de
informações em uso na comunidade científica eram artificiais. (LANDOW, 1995)
Tal mecanismo seria análogo aos processos mentais humanos de associação
de idéias e da formação do conhecimento, pois seria uma rede de evocações e
ligações entre os assuntos, apresentados em forma de documentos escritos,
sonoros ou visuais, indexados por meio dos mecanismos hierárquicos e conectados
de múltiplas formas.
Desenho 1: Representações do pensamento
Fonte: Disponível em: <http//www.cos.ufrj.br/~vanessa/disciplinas/mab617/material/01-
Hipermidia-9p.pdf> Acesso em 20. jan. 2006
Na época, o mecanismo de recuperação de informações era baseado em
sistemas manuais de indexação a partir de palavras-chave. De acordo com Bush
11
,
(1945 apud LANDOW, 1995) este novo mecanismo tornaria mais fácil a recuperação
de informações consultadas no passado, não mais por meio de índices, mas sim
de associações estabelecidas na ocasião, uma vez que a pesquisa sobre
determinado tema envolve uma consulta a diversas fontes e a pessoa que realiza
estabelece naturalmente associações com outras fontes expressando seus
comentários e pontos de vista.
11
BUSH, Vannevar. “As We May Think”. Atlantic Monthly 176 (Julio de 1945): 101-108
66
Portanto, o registro dessas associações permitiria que outro pesquisador ao
realizar uma pesquisa sobre o mesmo tema, pudesse recuperar as informações
armazenadas anteriormente.
O volume de dados crescentes, sua organização, seu transporte e as
facilidades de acesso, estudadas por Bush, foram a base para que seus seguidores
desenvolvessem o conceito de hipertexto.
Acredita-se que Bush tenha descrito neste artigo, dentro do contexto da
época, o que viria a ser o computador conectado à Internet. E chegou mesmo a
predizer como seriam as atuais ferramentas de busca da www, que operaria
estabelecendo caminhos úteis em meio à enorme massa de registros comuns. Neste
sentido, o hipertexto serviu como instrumento para apresentação de informações em
ambiente digital.
O termo hipertexto foi utilizado pela primeira vez no início da cada de
sessenta. Foi criado por Theodor Nelson para exprimir a idéia de escrita e leitura
não linear em um sistema de informática. (LÉVY, 1993)
Discípulo de Bush, Nelson idealizava uma imensa rede acessível em tempo
real contendo todos os tesouros literários e científicos do mundo. (LÉVY, 1993). Seu
sistema, denominado de Xanadu, seria utilizado pelas pessoas para escrever, se
interconectar, interagir, comentar textos, filmes e gravações sonoras disponíveis
numa rede.
Alguns teóricos da literatura como Barthes, Derrida e especialistas em
hipertexto como Theodor Nelson e Andries Van Dam, compartilham das mesmas
idéias sobre uma nova textualidade.
Landow (1995, p.14) sintetiza o pensamento de alguns desses autores da
seguinte forma:
Os quatro, como outros especialistas em hipertexto e teoria cultural,
propõem que devem se abandonar os atuais sistemas conceituais baseados
na noção como centro, margem, hierarquia e linearidade e substituí-los por
outras de multilinearidade, nós, nexos e redes. Quase todos os estudiosos
desta mudança de paradigma, que marca uma revolução no pensamento,
consideram a escrita eletrônica como uma reação direta as vantagens e
inconvenientes do livro impresso.
67
O hipertexto altera profundamente a noção de textualidade, pois se constitui
num texto plural, sem centro discursivo, sem margens, sendo produzido por um ou
vários autores e, como texto eletrônico, está em constante mutação. Assim, como o
rio de Heráclito, o hipertexto jamais é duas vezes o mesmo.
Para Lévy (1993, p. 33):
Tecnicamente, um hipertexto é um conjunto de nós ligados por conexões.
Os nós podem ser palavras, páginas, imagens, gráficos ou partes de
gráficos, seqüências sonoras, documentos complexos que podem eles
mesmos ser hipertextos. Os itens de informação não são ligados
linearmente como em uma corda com nós, mas cada um deles, ou a
maioria, estende suas conexões em estrela, de modo reticular. Navegar em
um hipertexto significa, portanto, desenhar um percurso em uma rede que
pode ser tão complicada quanto possível. Porque cada pode, por sua
vez, conter uma rede inteira. Funcionalmente, um hipertexto é um tipo de
programa para a organização de conhecimentos ou dados, a aquisição de
informações e a comunicação.
Desenho 2: Rede conceitual hipertexto em ambiente multijanelas
Fonte: Disponível em: <http://www.facom.ufba.br/hipertexto/nbasicas1.html>
Acesso em: 22.ago.2005
68
Desenho 3: Rede conceitual o hipertexto na tela do computador
Fonte: Disponível em: <http//www.facom.ufba.br/hipertexto/nbasicas1.html>
Acesso em 22.ago.2005
O desenho representa uma tela de computador com quatro janelas, que
corresponderiam à lexias e cada lexia possui nós representados pelas letras A, b, B,
c, C, d, e E. A lexia A contém os nós b e d respectivamente. Nesse exemplo o
usuário acionou a ligação b e uma outra janela se abriu contendo o nó B
sobrepondo-se parcialmente ao anterior (b). Observa-se que o usuário tem uma
visão das páginas, podendo apagar e movimentar cada nó do modo que lhe convier.
Assim, o conceito de hipertexto visualizado acima pode ser expresso nas
palavras der Theodor H. Nelson
12
(1981 apud LANDOW, 1995, p.15):
[...] Com hipertexto me refiro a uma escrita não seqüencial, a um texto que
bifurca, que permite que o leitor selecione e que leia melhor em uma tela
interativa. De acordo com a noção popular, se trata de uma série de blocos
de texto conectados entre si por nexos, que formam diferentes itinerários
para o usuário.
A história do hipertexto não é recente. O exercício da hipertextualidade é
remoto e encontram-se inúmeros exemplos na literatura impressa. Pode parecer que
as discussões sobre hipertexto surgiram com a informática, mas é possível falar do
conceito que está por detrás da idéia de hipertextos como sendo anterior ao
computador.
Murray (2003, p.65) observa que:
12
Theodor H.Nelson, Literary Machines (Swarthmore, Pa., publicación propia, 1981), págs. 0/2).
69
Formatos hipertextuais não são novidade como estruturas intelectuais. O
Talmude, por exemplo, é um hipertexto gigante composto por um texto
bíblico cercado por comentários de múltiplos rabinos. Obras literárias são
hipertextuais nas referências que fazem entre si. No século XX a
referenciação tornou-se tão densa que é praticamente impossível
compreender um livro como Ulisses, de James Joyce, sem o auxílio de
outras obras, inclusive de um mapa de Dublin.
Semelhante ao Talmude, a Bíblia pode ser considerada um tipo de hipertexto
pela forma não linear que a leitura propicia. As notas de rodapé de um texto, as
remissões que nele aparecem e fazem referência a um outro livro, artigo ou autor, as
citações, as informações cruzadas, a definição de uma palavra que remete a outras
num amplo circuito, apresentam um estatuto de hipertexto.
Exemplos de hipertextos podem ser encontrados, também, nos manuscritos
de Leonardo da Vinci. Suas anotações eram repletas de referências que levavam a
outras notas.
Desenho 4: Leonardo da Vinci: estudo da proporção da face e dos olhos
Fonte: Disponível em: <http://www.thais.it/speciali/disegni/foto0074.htm>
Acesso em: 15.maio.2006
Todo texto escrito é um hipertexto na medida em que, durante uma leitura,
ativa-se na mente um conjunto de significações que se relacionam e se conectam
70
com outros conjuntos de significações que se encontram na memória, formando
assim uma rede e muitas vezes remetendo o leitor para fora do texto.
Murray (2003) explica que a leitura também possui características ativas e
imersivas, na medida em que, quando se está lendo constrói-se narrativas
alternativas, se representa as vozes dos personagens nas mentes, questiona-se e
sugere-se saídas, interpreta-se e ajusta-se a história de acordo com os modelos
cognitivos, culturais e psicológicos.
O livro permite viajar pela imaginação, enquanto o hipertexto proporciona uma
viagem virtual, interativa, e muitas vezes imersiva por universos interdisciplinares.
Foi a partir das limitações, anseios e contradições inerentes ao processo da
escrita tradicional que surgiu a necessidade da criação de uma nova textualidade
que pudesse expandir a noção de texto, para uma noção de textualidade ltipla
uma vez que através dos nós ou links, é possível acessar uma infinidade de
informações. O leitor pode seguir a conexão que melhor se adapte às suas
necessidades para obter novas informações ou conhecimento.
Sobre essa nova textualidade, Landow (1995. p. 14) destaca:
Em S/Z Roland Barthes descreve um ideal de textualidade que coincide
exatamente com o que se conhece como hipertexto eletrônico: um texto
composto de blocos de palavras (ou de imagens) eletronicamente unidos
por múltiplos trajetos, cadeias ou seqüências em uma textualidade aberta,
eternamente inacabada e descrita com termos como nexo, nó, rede, trama e
trajeto. (nossa tradução)
Utiliza-se, nesta pesquisa, a definição de hipertexto como um sistema de
visualização de textos ou documentos eletrônicos que permitem ao leitor ou
estudante, por meio de atalhos (links) movimentar-se de um documento ou
conteúdo (lexias) para outro.
Foi a partir do desenvolvimento da informática e das telecomunicações que a
tecnologia do hipertexto revelou o seu potencial revolucionário. E, atualmente, é a
base lógica e conceitual das comunicações mediadas pelo computador. Um dos
sistemas de hipertexto mais conhecido atualmente é a World Wide Web.
71
Figura 18: Ambiente digital hipertextual - Wikipédia
Fonte: Disponível em: <http://pt.wikipedia.org/wiki/World_Wide_Web>
Acesso em: 15.maio.2006
A imensa rede de informações imaginada por Theodor Nelson (1981) se
concretizou através da Internet e fez com que o hipertexto passasse a ser conhecido
por diversas pessoas.
A existência do hipertexto abriu espaço para que os escritores pudessem
experimentar novas formas de encadeamentos de histórias, ramificações,
diversidade de pontos de vista não possuindo um final definitivo. “Histórias escritas
em hipertexto geralmente têm mais de um ponto de entrada, muitas ramificações
internas e nenhum final bem definido” (MURRAY, 2003, p.65)
Segundo Landow (1995, p. 16) “os hábitos de leitura convencionais
permanecem válidos dentro de cada lexia”, entretanto a possibilidade de acesso a
outros textos, comentários, imagens, sons, criam a experiência ao acesso não-linear
das informações, do qual o autor denomina de “multilinear ou multiseqüencial.
No prefácio de Hamlet no Holodeck, Murray (2003) substitui o termo não-
linear por multisequencial ou multiforme, pois revelam uma “dimensão a mais para
expressar a experiência multidimensional da vida”.
72
3.1 A não-linearidade nos ambientes digitais
A não-linearidade nos ambientes digitais é apontada como a vantagem desse
sistema sobre os documentos impressos, pois criaram uma classe de texto flexível,
aberta às necessidades do leitor. Cada um escolherá, entre múltiplas opções, os
caminhos ou rotas que mais lhe interessam.
“Em todos os sistemas de hipertexto o leitor pode escolher seu próprio centro
de investigação e experiência”. (LANDOW, 1995, p. 25). Os hipertextos permitem
multiplicar os trajetos de uma leitura ou pesquisa sobre determinado tema, sem
estabelecer uma hierarquia ou organização no documento. Não segue uma rota pré-
estabelecida, tal como se observa no livro impresso.
O hipertexto configura-se como um sistema tridimensional da escrita (LEÃO,
1999) na medida em que pode conectar trechos de um documento com outras
formas de expressão da linguagem como imagens, sons, gráficos ou diagramas,
expandindo a noção do texto convencional e meramente verbal.
“Tridimensional não em seu aspecto construtivo, mas em seu modo de ser
conceitual. Um lugar não é somente ‘uma tela’ ou ‘uma página’, mas o laboratório
que detém os caminhos da topologia” (BAIRON, 2002, p. 131)
Morgan
13
(1985 apud LANDOW, 1995, p. 22) salienta que intertextualidade
“libera o texto literário dos determinismos psicológico, sociológico e histórico
abrindo-lhe uma gama aparentemente infinita de relações”.
A comunicação que se estabelece por diferentes elementos: visuais, gráficos,
sonoros e textuais vem favorecer a associação de conteúdos de forma
multisensorial, dinâmica, interativa, criativa e analítica, dando oportunidade ao leitor
ou estudante de experimentar e de se expressar por meio de diferentes órgãos dos
sentidos, por intermédio de sinais verbais e visuais.
De acordo com Lévy (1993, 40) “em um contexto de formação, os hipertextos
deveriam, portanto, favorecer, de várias maneiras, um domínio mais rápido e mais
fácil da matéria do que através do audiovisual clássico ou do suporte impresso
habitual”.
13
Thaïs E. Morgan, <Is There na Intertext in This Text?:Literary and Interdisciplinary Aprroaches to
Intertextuality>, American Journal of Semiotics 3 (1985), págs. 1-2.
73
Ao escolher seus caminhos por meio da navegação hipertextual, o aluno
poderá ter maior envolvimento com a aprendizagem e, dessa forma, participar
ativamente do processo de aquisição de conhecimentos, de forma a facilitar a
integração de informações, abrindo espaço para múltiplas conexões de maneira
lúdica e autônoma.
Dessa forma, pode-se considerar o hipertexto e a hipermídia como um
instrumento que pode ser adaptado ao sistema de aprendizagem, na medida em que
através da exploração do ambiente o aprendiz poderá assimilar diversos conteúdos
criando a oportunidade de construir seu conhecimento.
3.2 As lexias e os links como estrutura da navegação hipertextual no âmbito da
aprendizagem
Quando páginas de textos são transportadas para a tela do computador
denominam-se lexias. O conceito de página como comumente se conhece não
existe para o texto eletrônico, pois sua função é diferente, entretanto pode-se
considerá-las como unidades de leitura, como se fossem uma página.
Barthes
14
(1970 apud LANDOW, 1995, p. 15) denomina a lexia como
“fragmentos de textos significativos” unidos por múltiplos trajetos que podem ser
constituídos por diversos dados: imagens, vídeos, ícones, botões, sons, gráficos,
seqüências animadas e outros.
As lexias podem corresponder a molduras, artigos, cartões, ilustrações ou
referências e não depende da leitura previa de outras lexias ou nós. A continuidade
de cada lexia se dá através dos links.
Os links ou atalhos são ligações que possibilitam o relacionamento entre as
lexias. Podem ser representadas na tela por palavras, frases ou letreiros em
destaque (freqüentemente em itálico ou em cores), mas também por meio de ícones,
gráficos ou figuras em movimento.
Quando uma ligação é ativada, um salto é acionado para o ponto onde a lexia
se associa a outros documentos, palavras e imagens.
14
Roland Barthes, S/Z (Paris, Éditions du Seuil, 1970), págs. 11-12; S/Z, trad. Richard Miler (nueva York, Hill y
Wang, 1974, págs. 5-6).
74
Portanto, as formas como os links estão dispostos numa composição
hipertextual é que levam o leitor a explorar toda a potencialidade do texto eletrônico,
pois são os links que permitem as associações semânticas, os comentários mais
aprofundados sobre o assunto, o acesso a diversas referências, a transferência para
um novo tópico, a exibição de ilustrações, gráficos, fotos, definições ou até mesmo
vídeos. Eles são os responsáveis em levar o leitor a um ponto pré-determinado pelo
autor, isto é, pontos programados previamente.
A estrutura de um hipertexto determina e descreve o sistema de ligações ou
relacionamentos entre os nós ou unidades de informação. Ela deve refletir a
estrutura organizacional do assunto relacionado a uma rede semântica de um
especialista. (LÉVY, 1993)
Em Leonardo 2.0 a estrutura é composta de hipertextos, como a Linha do
Tempo, que permite explorar os eventos que ocorreram durante a vida de Leonardo
relacionando-os com os principais acontecimentos históricos da Renascença.
As setas, ao lado esquerdo e direito da barra interativa, se movimentam a fim
de que o leitor possa caminhar através da linha cronológica explorando uma página
de cada vez e percorrendo o período que vai de 1425 a 1570.
Para saltar muitos anos rapidamente ou escolher datas específicas basta
movimentar a seta localizada ao final da página.
Os links que dão acesso aos documentos ou pequenos artigos são
representados por palavras destacadas em vermelho, que ao serem clicadas, dão
origem a um documento relacionado. Estes documentos podem surgir em forma de
texto acrescido de imagens ou animações das obras de Leonardo, como suas
pinturas e invenções, relacionadas à época da criação. (CD-ROM, Leonardo 2.0 - O
Inventor)
Dessa forma o estudante ou leitor pode escolher os conteúdos de seu
interesse, possibilitando o acesso a idéias complementares e estimulando a
aprendizagem incidental.
Neste sentido Bairon (2003, p. 21) ressalta que:
[...] investigar um tema, desde o início, em suas inter-relações híbridas,
entre as matrizes visual, sonora e verbal, bem como produzir ambientes
híbridos a partir desta investigação, indica a possibilidade de exploração de
universos sígnicos que provavelmente não seriam abordados se ficássemos
somente no desenvolvimento verbal formalizado da escrita científica.
75
Figura 19: Linha do tempo.
Fonte: CD-ROM Leonardo 2.0 - O Inventor – The Learning Company –s/d
A linha do tempo pode ser utilizada como uma ferramenta de apoio ao ensino
e à aprendizagem no sentido de ajudar os estudantes a compreender e construir os
conceitos de tempo e espaço, além das noções de anterioridade, posteridade e
contemporaneidade; o que muda e o que permanece ao longo do tempo
Os dados históricos relacionados às invenções podem ser explorados para
evidenciar que a Ciência e os conhecimentos científicos sofrem modificações com o
tempo e que muitas das invenções tecnológicas atuais possivelmente se iniciaram
em outras épocas da história.
Para a exploração desta hipermídia no ambiente escolar é fundamental a
interferência do professor no sentido de levar o aluno a explorar conceitos e eventos
que não estão explicitados pela navegação.
O professor pode apresentar aos estudantes situações desafiadoras ao
propor a construção de linhas do tempo para trabalhar com outros assuntos
relacionados, por exemplo, detalhes dos principais eventos que aconteceram na
76
Guerra dos Cem Anos. Estas atividades podem ser realizadas individualmente ou
em pequenos grupos.
São inúmeros os temas que podem ser escolhidos para a elaboração de uma
linha do tempo. O professor pode iniciar a atividade solicitando aos estudantes que
elaborem uma linha do tempo pessoal: com a história de sua família, bairro ou
cidade. As linhas poderão ser dinâmicas, contendo imagens e textos relacionados
podendo servir como uma boa fonte de consulta e pesquisa além de desenvolver o
trabalho com imagens como registro histórico.
Nesse sentido, o estudante pode se familiarizar e construir conceitos como o
de tempo e espaço, história e memória, além de relacionar fenômenos,
personalidades e eventos históricos inseridos em um determinado período,
permanecendo ativo no processo de ensino e aprendizagem.
Desta forma, a ênfase está na aprendizagem e não no ensino, está na
construção do conhecimento e não na transmissão; está na relação que é
estabelecida em sala entre professor-aluno, aluno-aluno, aluno-professor.
Portanto, ao explorar a estrutura do hipertexto, o estudante não fica preso a
nenhuma hierarquia, podendo escolher em que ponto da linha do tempo deseja se
situar a fim de obter informações específicas, criando assim sua rota de leitura, nem
tão pouco fica à mercê dos conhecimentos elaborados previamente pelo professor.
Ao percorrer um caminho no qual pode estabelecer suas próprias seqüências
e associações, o aprendiz interage com o texto, assumindo um papel ativo na busca
de informações e conhecimentos.
Um outro exemplo de hipertexto pode ser encontrado no menu Biografia. A
trajetória de Leonardo está subdividida em vinte capítulos que remetem às
invenções e obras de arte do inventor. Os links também aparecem por meio de
palavras destacas em vermelho e dão acesso a outros documentos ou informações.
77
Figura 20: Biografia de Leonardo e formato hipertextual
Fonte: CD-ROM Leonardo 2.0 - O Inventor – The Learning Company –s/d
Materiais desenvolvidos em forma de hipertexto ou hipermídia, como no
exemplo acima, possibilitam uma aprendizagem mais interativa, na medida em que o
aluno tem oportunidade de explorar o conteúdo, manipulando dados, estabelecendo
relações e comparações com conceitos que possui sobre o tema, favorecendo a
aprendizagem autônoma.
A biografia do autor pode dar margem à construção de novas linhas do tempo
ou pesquisas mais aprofundadas sobre história da arte ou sobre invenções ao longo
da história.
A exploração adequada de um sistema hipermídia utilizado para finalidades
educacionais envolve a orientação do professor que precisa conhecer em
profundidade os conceitos contidos nos hiperdocumentos e as relações existentes
entre os mesmos, podendo sugerir trilhas segundo uma determinada seqüência
fundamentada em princípios de aprendizagem, incentivar a livre exploração de
associações mediante os links disponíveis, problematizar e promover debates sobre
os pontos relevantes.
78
Para que um ambiente de ensino seja construtivista é fundamental que o
professor conceba o conhecimento como fruto de uma interação entre o sujeito e o
objeto da aprendizagem, a fim de contribuir para a formação de estruturas cognitivas
mais complexas.
O vetor de desenvolvimento e de aprendizagem proposto por Vygotsky
15
(1997 apud POZO, 1998, p.196) “iria desde o exterior do sujeito ao interior, seria um
processo de ‘internalização’ ou transformação das ações externas, sociais, em
ações internas, psicológicas.”
Portanto, a aquisição do conhecimento sempre se inicia por um processo
externo ao sujeito em sua relação com o ambiente social, interpessoal, para depois,
pela internalização, tornar-se intrapessoal. Dessa forma, o conhecimento o é
construído sozinho, e sim por instrumentos mediadores.
A mediação é um processo de intervenção de um elemento intermediário
numa relação; a relação deixa então de ser direta e passa a ser mediada por esse
elemento. (OLIVEIRA, 1997). Assim, o próprio computador passa a exercer a função
primeira de mediador entre o indivíduo e o meio, além do professor.
Pozo (2002, p. 110) salienta que “grande parte do êxito de nossa memória se
deve, em termos vygotskianos, aos ‘mediadores’ culturais (papel e lápis, quando não
calculadora para multiplicar, tecnologias de registro e armazenamento da
informação, etc.)”. Esses instrumentos servem de ajuda porque liberam recursos
cognitivos para outras atividades de ordem mais complexa, evitando o acúmulo de
informações.
Pela tecnologia do hipertexto, o aprendiz é capaz de operar mentalmente
sobre as informações, estabelecendo relações, planejando, comparando e
levantando hipóteses.
Entretanto esta interação não significa apenas o apertar de teclas ou o
escolher entre opções de navegação, ela deve passar disso, integrando o objeto de
estudo à sua realidade, dentro de suas condições, de forma a estimulá-lo e desafiá-
lo, mas ao mesmo tempo permitir que as novas situações criadas possam ser
adaptadas às estruturas cognitivas existentes, propiciando seu desenvolvimento.
15
VYGOTSKY, L. S. Pensamiento y lenguaje. Buenos Aires: La Pléyade, 1997
79
Portanto a interação deve abranger, não o universo do aluno e sua relação
com o computador, mas também a relação com outros alunos e dos alunos com o
professor. O papel do professor será o de facilitador e mediador das aprendizagens,
criando um ambiente motivador mediante atividades interessantes e que possa
acionar conflitos de ordem cognitiva nos alunos.
Na hipermídia Diadorim, o ambiente de navegação é definido por uma
estrutura em 3D de uma escola, disponibilizando ao aluno os materiais coletados
durante a pesquisa para realização do projeto
16
, bem como, as produções
resultantes das atividades desenvolvidas em sala de aula.
Ao interagir com os objetos imagéticos presentes no ambiente de navegação
da escola, uma história é narrada e, ao final, o aluno tem a possibilidade de penetrar
nos hipertextos que exploram os contos de forma mais aprofundada, oferecendo
informações adicionais e dando acesso à idéias complementares através dos links
com palavras em negrito.
Cada tela que se abre permite ao aluno explorar temas relacionados que
podem surgir em forma de texto ou imagens. A barra interativa que aparece no final
da tela do hipertexto possui duas setas laterais que permitem ao aluno fazer uma
leitura do conto e ao mesmo tempo explorar a narrativa através dos links que
aparecem nas palavras em negrito.
Os links foram estabelecidos de forma a facilitar o percurso de trilhas -
seqüências de telas - onde os temas são apresentados de forma mais específica ou
pontual dando acesso à idéias complementares.
16
O Projeto História Local nos Processos de Alfabetização de Crianças, Jovens e Adultos desenvolvido na
cidade Diadema será tratado com mais detalhe no último capitulo do trabalho.
80
Figura 21: Sistema de busca por palavra-chave.
Fonte: CD-ROM Diadorim - 2001
As setas que se localizam no meio da barra interativa funcionam como um
sistema de busca permitindo ao aluno realizar pesquisas por intermédio palavras-
chave e também visualizar as páginas ou contos que foram navegados de forma
que o aluno não se sinta desorientado ou perdido durante a navegação.
81
Figura 22: Tela da hipermídia Diadorim em formato hipertextual.
Fonte: CD=ROM Diadorim -2001
No conto Tarsila é Nossa o hipertexto oferece uma série de informações
relacionadas com alguns movimentos artísticos importantes. Através do conto, são
explorados temas como a Semana de Arte Moderna, seus principais representantes
além de alguns movimentos artísticos como o Cubismo e o Impressionismo
relacionando-os com movimentos históricos importantes do período além de mostrar
algumas obras de artistas famosos como Guernica, de Pablo Picasso.
Dessa forma foi possível recuperar na História brasileira a arte como
manifestação cultural que permite o encontro dos valores sociais de diferentes
épocas bem como dados explicativos de uma realidade social, além das formas de
expressão que os artistas manifestam em suas obras.
O fato de Tarsila ter morado e pintado em Diadema possibilitou o resgate da
história local estabelecendo relações com outros pintores famosos. O
estabelecimento das relações entre presente e passado se deu através da
exploração do trabalho artístico dos grafiteiros bem como dos Muralistas Mexicanos,
82
organizados pelo professor, de forma que os alunos pudessem fazer comparações e
relações com fatos históricos como o golpe de estado de 1937 e o período da
ditadura até 1945. (IOKOI, 2001)
Como se vê, o hipertexto criou uma estrutura dinâmica e aberta nos
documentos da navegação, permitindo ao aluno fazer uma leitura tridimensional da
narrativa, estabelecendo relações e analisando fatos indo além dos aspectos
estritamente estéticos proporcionados pelo meio.
83
4 HIPERMÍDIA: O NASCIMENTO DE UMA NOVA
LINGUAGEM PARA AMBIENTES DE APRENDIZAGEM
Quando o conjunto de meios, como o texto, som, imagens, gráficos se
integram de forma simultânea e de maneira interativa e multisequencial caracteriza-
se como uma hipermídia.
Na visão de Landow (1995, p.15) “o hipertexto expande a noção de texto pelo
fato de poder conectar o discurso verbal a imagens, sons, mapas e diagramas” não
havendo portanto diferença entre hipertexto e hipermídia.
Segundo Santaella (2001, p.392),
Hipermídia significa a integração sem suturas de dados, textos, imagens de
todas as espécies e sons dentro de um único ambiente de informação
digital. O hipertexto digital trouxe de volta a linguagem verbal escrita, sob a
forma inédita de nculos não-lineares entre fragmentos textuais
associativos, interligados por conexões conceituais (campos), indicativas
(chaves) ou por metáforas visuais (ícones) que remetem, ao clicar de um
botão, de um percurso de leitura a outro, em qualquer ponto da informação
ou para diversas mensagens, em cascatas simultâneas e interconectadas.
Neste sentido a hipermídia surge como uma linguagem inaugural, uma vez
que, “ler, perceber, escrever, pensar e sentir” adquire características inéditas.
Landow
12
(apud SANTAELLA, 2001, p. 390). Estabelecendo uma nova relação do
autor com a leitura, com a escrita e com as formas de pensar.
A hipermídia é muito mais que uma tecnologia, é uma nova linguagem, uma
vez que o processo de digitalização substituiu o alfabeto fonético enquanto sistema
universal de tradução.
Sua estrutura permite um encontro interdisciplinar na construção de
conteúdos, principalmente quando utilizada no ensino como ferramenta pedagógica
para a transmissão de conceitos teóricos, além de oferecer uma rie de
experiências sensoriais que um único meio comunicacional não poderia oferecer.
A rede de conhecimentos resultante das conexões tem o potencial de ser
mais rica e forte que o conhecimento obtido com apresentações tradicionais.
84
Desse modo, mediante estímulos variados, o leitor ao interagir com as
informações, tem possibilidades de envolver e mobilizar todos os sentidos num
universo de significações muito diversificado.
Janet Murray (2003, p. 21), por meio de sua vivência com ambientes digitais,
evidencia o potencial da hipermídia aplicado às práticas educacionais:
[...] projetamos aplicativos multimídia para o aprendizado de espanhol e de
francês que motivavam os alunos dando-lhes um papel numa história que
se desenrolava, além de permitir que eles se movessem através de
ambientes autenticamente fotografados, como se estivessem numa visita a
Bogotá ou a Paris.
Mais adiante acrescenta:
Minha experiência com computação na área de humanidades convenceu-
me de que certas modalidades de conhecimento podem ser melhor
representadas em formatos digitais do que seriam na forma impressa. O
conhecimento de uma língua estrangeira, por exemplo, pode ser melhor
transmitido com exemplos de múltiplos falantes em ambientes autênticos do
que com listas de palavras numa página.
Essa forma de aquisição de conhecimentos pela ativação dos sentidos tem a
vantagem de ser imediata podendo estimular a união entre a mente, as imagens e
as sensações num caminho intuitivo na qual a exploração e a descoberta são
inesperadas.
Leitura e escrita se misturam na criação de um texto digital. Ler e escrever
significa interagir para escolher uma ou várias dentre as ligações preestabelecidas
pelo criador da hipermídia ou para estabelecer novas ligações não previstas pelo
autor, criar caminhos e seqüências próprias, deixar marcas, reconfigurar e criar
narrativas pessoais.
Um dos grandes poderes definidores da hipermídia, segundo Santaella (2002,
p. 393),
[...] está na sua capacidade de armazenar informação e, por meio da
interação do receptor, transmutar-se em incontáveis versões virtuais, que
vão brotando na medida mesma em que o receptor se coloca em posição de
co-autor. Ao escolher um percurso, entre muitas possibilidades, o leitor
estabelece sua co-participação na produção das mensagens. Isso é
possível em razão da estrutura de caráter hiper, não-sequencial e
multidimensional, que dá suporte às infinitas opções de um leitor imersivo.
85
Por ser uma linguagem que favorece a interatividade, é impossível o leitor
usá-la de uma forma passiva, uma vez que ele é incentivado pela própria estrutura a
criar movimentos que o seduzam para a leitura, reflexão, criação, resignificação,
troca de experiências e de informações, produção de histórias e criação de seus
próprios hipertextos.
Talvez esse seja o recurso tecnológico que permite de forma mais ampla o
registro de idéias e de visões de mundo, algo que outra tecnologia da informação
não pode oferecer até agora.
Os sistemas hipermídia parecem proporcionar um meio para promover e
desenvolver habilidades cognitivas de ordem superior, como as enunciadas por
Vygotsky (apud OLIVEIRA, 1997) em sua teoria sobre a aprendizagem e
desenvolvimento cognitivo humano. Tais habilidades estariam relacionadas à
atenção voluntária e intencional, memória lógica, pensamento verbal e conceitual.
Permitem ainda a elaboração de propostas educacionais mais compatíveis
com o conceito de aprendizagem significativa. Imagens, animações e vídeos podem
ser utilizados para tornar os temas de estudo mais próximos dos estudantes e
favorecer a ancoragem de conceitos na estrutura cognitiva, na medida em que os
aprendizes vão dando sentido às suas experiências empíricas.
A compreensão de um conteúdo ou de conceitos vai além da justaposição ou
união das informações, o mais importante é como organizar os diversos elementos e
relacioná-los em uma estrutura de significados. (POZO, 2002)
Na hipermídia Leonardo 2.0, cada invenção pode ser relacionada com os
diversos aparatos utilizados na atualidade como alguns meios de transporte, armas
ou instrumentos musicais.
86
Figura 23: Esboço do helicóptero idealizado por Leonardo em
comparação a um modelo atual.
Fonte: CD-ROM Leonardo 2.0 – O Inventor: The Learning Company s/d.
4.1 Interface e Interatividade
As antigas interfaces gráficas surgiram como uma forma sistemática de
organizar a leitura gerando facilidade na manipulação de dados por parte do leitor.
Conforme observa Lévy (1993, p. 52) as interfaces surgiram para humanizar
as máquinas tornando o seu gerenciamento mais amigável, além de mais
“imbricados ao sistema cognitivo humano”.
É no âmbito da interface que se processa a interatividade. Dessa forma a
interface teria por vocação, “traduzir, articular espaços, colocar em comunicação
duas realidades diferentes”, promovendo uma espécie de "conversação" entre o
homem e a técnica. Em outras palavras “é a interface que possibilita a
interatividade”. (BAIRON,1995, p.18)
87
Benjamin
17
(1978 apud BAIRON, 1995, p. 16) conseguia ver na relação
máquina de escrever-homem, os germes das interfaces e interatividades modernas.
Essa nova qualidade de interatividade realizada através dos computadores,
do ciberespaço e também por softwares, pode afetar radicalmente a relação do
homem com o conhecimento.
Segundo Lévy (1999, p. 79) “o termo interatividade em geral ressalta a
participação ativa do beneficiário em uma transação de informação”. Está-se em
constante interação com o ambiente à volta.
Mesmo sentados diante de uma televisão vive-se constantemente
decodificando informações, interpretando e imobilizando o sistema nervoso de
diversas maneiras; recombinando constantemente as mensagens que se recebe.
(Lévy, 1999)
O que caracterizaria uma transação interativa virtual seria a possibilidade de
manipular uma matriz de informações a ponto de interromper uma seqüência, buscar
rotas alternativas, retroceder e apagar ações, possível através da interface
caracterizada por uma superfície de contato, de tradução, de articulação entre duas
realidades ou espaços diferentes (LÉVY, 1999). Criando dessa forma, oportunidade
ao usuário de transitar entre dois mundos e ser capturado pelos estímulos sensoriais
ou cognitivos.
Nos ano cinqüenta, Douglas Engelbart trabalhou a noção de interface e
interatividade. Defendeu a idéia da possibilidade de construir máquinas que agiriam
como amplificadores do espírito, constituindo-se num dos grandes responsáveis
pelo desenvolvimento de interfaces e das transformações que o computador sofreu
para ser uma ferramenta universal de manipulação do conhecimento capaz de
registrar eletronicamente as mutações do saber (LÉVY, 1993)
Uma das funções da interface é proporcionar ao leitor a imersão no mundo
virtual no qual ele é convidado a passar para o outro lado da tela e a interagir com
um mundo de possibilidades. Ela “contribui para definir o modo de captura da
informação oferecido aos atores da comunicação”. (LÉVY, 1993, p. 180)
17
LANDOW, George. Hyper text theory. Baltimore, Maryland: The Johns Hopkins University Press 1994.
88
Em Diadorim, a interface em 3D permite a entrada e navegação no ambiente
da escola criando oportunidade ao aluno de percorrer diversos caminhos procurando
respostas ou fazendo perguntas.
Através das narrativas contendo as aventuras do menino e do jovem
Diadorim, uma busca da própria trajetória do aluno, onde lugares, ícones
flutuantes e narrações, são interfaces que se desdobram em outras interfaces
fazendo ressurgir histórias de seu cotidiano onde é possível estabelecer as relações
do homem como sujeito que constrói a História.
Figura 24: Sala de aula em 3D
Fonte: CD-ROM Diadorim - 2001
A interatividade como característica fundamental da hipermídia “não é a
imbricação das mais variadas mídias, mas a participação conseqüente do usuário no
processo de compreensão de algum tema” (BAIRON, 1995, p. 19). Neste sentido a
interatividade está a caminho de substituir o livro impresso na medida em que a
tecnologia hipermídia pode ir muito mais longe do que o texto impresso.
89
Bairon (2002, p. 131) ressalta ainda que “as expressões hipermidiáticas
devem se liberar da racionalidade linear, procurando a abertura para um mundo
estético que tenha como princípio primeiro contemplar com uma experiência
interativa”.
A interatividade proposta pelos objetos manipuláveis das invenções de
Leonardo permitem ao estudante agir em tempo real diante das informações,
observando o resultado de suas ações além de acionar os sentidos físicos,
favorecendo o processo de imersão no ambiente.
O autor afirma ainda que (1995, p.21) “temos neste novo mundo uma
verdadeira metáfora dos sentidos humanos”, viabilizada pela realidade virtual.
Figura 25: Instrumento de sopro interativo
Fonte: CD-ROM Leonardo 2.0 – O Inventor: The Learning Company s/d.
O estudante ou leitor da hipermídia não poderá utilizar esse meio de forma
passiva, é preciso que ele desempenhe diversas ações para que a navegação
aconteça. Ele precisa escolher para onde quer ir, criando suas próprias rotas de
leitura através dos links.
Diante de tantas possibilidades de busca proporcionada pelas interfaces e
pela interatividade, uma tendência dos alunos se dispersarem diante das
inúmeras possibilidades de conexão.
90
Talvez não haja tempo suficiente para que possam refletir em profundidade as
informações de forma a selecionar as que são mais relevantes das superficiais. Os
alunos mais jovens talvez se impressionem primeiro com a estética do meio e
naveguem mais pela intuição do que de forma consciente.
De acordo com Pozo (2002, p. 103),“quando uma tarefa de aprendizagem
apresenta demasiada informação nova ou independente, nossa memória de trabalho
se sobrecarrega”.
Neste sentido, “a situação de aprendizagem se mais eficaz se o professor
gradua ou distribui melhor a nova informação, de forma que não sature ou exceda os
recursos cognitivos disponíveis dos alunos”. (POZO, 2002, p.103)
Cabe ao professor auxiliar o aluno a contextualizar, a ampliar o universo
alcançado por eles e a descobrir novos significados no conjunto das informações
trazidas pela pesquisa em hipermídia. Ele deve incentivar, apoiar e ao mesmo tempo
gerenciar o processo de aprendizagem, propondo trabalhos em grupo ou individuais,
aprofundando os temas que foram pesquisados pelos alunos, além de observar o
ritmo de cada um.
4.2 A construção das interfaces em produtos digitais educacionais
O meio digital é capaz de traduzir as principais formas de representação
humana, entretanto ainda enfrentar-se-á um longo processo até o estabelecimento
do digital como forma de expressão, com seus próprios princípios estéticos e
estruturais.
Estruturas digitais foram feitas para controlar e auxiliar na complexidade do
conhecimento cada vez mais em expansão através das redes de computadores,
embora muitas informações ainda possam estar fragmentadas, incompletas e até
mesmo serem enganosas. Mas essa condição ainda faz parte de um meio em
desenvolvimento
Murray (2003), fala de forma inovadora e intensa sobre o conceito de
imersão, como um dos aspectos importantes dos meios digitais.
91
A autora conceitua imersão como “a experiência de ser transportado para um
lugar primorosamente simulado. [...] Imersão é um termo metafórico derivado da
experiência física de estar submerso na água”. (MURRAY, 2003, p.102)
Esta característica do meio permite que o sistema sensorial seja envolvido por
uma onda de sensações estranhas e ao mesmo tempo diferentes, mergulhando toda
atenção num outro espaço, num novo lugar.
O prazer do novo, de sair do estado de vigília e descobrir um novo ambiente
é o que faz da imersão um dos fatores mais fascinantes do meio.
Pode-se vivenciar esta experiência quando se acessa a Internet, onde se tem
que aprender a nadar e realizar coisas que esses ambientes tornam possíveis.
(MURRAY, 2003). Ou ainda através dos sistemas hipermídias que podem
apresentar ambientes em 3D tornando a navegação exploratória, participativa e
investigativa.
Figura 26: Escola em 3D
Fonte: CD-ROM Diadorim – 2001
Na hipermídia Diadorim, por exemplo, o espaço tridimensional potencializa o
processo de imersão no ambiente da escola. É possível andar pelos corredores,
subir escadas, entrar e sair de salas, visitar a cozinha e o refeitório.
92
Cada nova navegação é marcada por interações que levam à descoberta de
histórias, objetos flutuantes, fotografias, desenhos, obras de arte, animações e
hipertextos, configurando um universo de descobertas incessantes.
É a experiência de manipular os objetos e de os ver funcionar que origina a
sensação de ser participante daquela história ou do contexto.
“Objetos podem mover-se diante de nós conforme passamos por eles, suas
atuações sendo provocadas pela nossa presença”. (MURRAY, 2003, p. 111)
Figura 27: Exemplo de um ícone flutuante.
Fonte: CD-ROM Diadorim – 2001
Apagadores, tambores, guas,pis, esquadros, balões e aviões são objetos
flutuantes que vão surgindo a partir da exploração do ambiente redefinindo a
imersão a cada nova navegação além de representar diferentes significados para o
estudante inseridos no cotidiano do ambiente escolar.
Os ambientes digitais expandiram as possibilidades de expressão das
narrativas de forma nova e intensa. Ao construirmos ambientes participativos com
capacidade de imersão está-se induzindo comportamentos que fazem com que os
objetos tenham vida.
93
Através dos espaços navegáveis, pode-se vivenciar a experiência de se
transportar para lugares que se gostaria de visitar, o que é possível através do
computador e da criação desses ambientes. Pode-se criar e recriar diversas
situações, realizar experiências (que se fossem reais, poderiam nos colocar em
risco), repetir ações indefinidamente, lutar contra monstros e descobrir tesouros
escondidos.
Murray (2003) denomina o computador como um novo contador de histórias e
também como extensão da própria consciência, na medida em que capta as
palavras com a mesma rapidez com que se pensa nelas.
Segundo a autora os computadores estão na fronteira entre a mente e a
realidade externa, utilizando uma linguagem da psicologia: eles são objetos
liminares
18
. (MURRAY, 2003)
Neste sentido as narrativas podem levar a um envolvimento tal a ponto de
confundir a realidade com o virtual, elas podem ultrapassar as fronteiras. Para
assegurar que isto não aconteça é necessário manter uma distância segura do
mundo virtual garantindo ao mesmo tempo a experiência da imersão.
Segundo Murray (2003, p. 105) “quanto mais próximo o mundo encantado,
mais necessitamos nos assegurar de que ele é apenas virtual e mais precisamos
visualizar a lua de Harold
19
lembrando-nos de que uma saída de volta ao mundo
real”.
Dessa forma em Diadorim o transe imersivo pode ser quebrado pelos objetos
liminares que estão presentes o tempo todo durante a navegação funcionando como
a lua de Harold.
São representados pela figura do palhaço no canto inferior esquerdo das telas
e pela figura de um ônibus escolar no canto inferior direito que também indica a
saída da navegação
18
A autora utiliza o termo liminar para indicar o limiar, entre o mundo que pensamos ser externo e real e os
pensamentos em nossas mentes, que tomamos por fantasias. Quando um contador de histórias capta nossa
atenção e faz com que fiquemos profundamente absortos, estamos num estado liminar, cheios de sensações e
emoções reais por objetos imaginários. Esse é o transe imersivo. (MURRAY, 2003, p. 125)
19
Harold é um personagem do livro de Crockett Johnson, Harold and the Purple Crayon - 1955 (Harold e o
Creiom Púrpura), que carrega um creiom magenta e vai desenhando histórias de sua imaginação, mas a medida
em que vai improvisando começa a temer seu próprio mundo imersivo sentindo-se perdido. Entretanto quando
lembra da lua que emoldura a janela de seu quarto pode então desenhar o caminho de volta para sua cama.
94
O desenho do menino Diadorim, na tela de abertura da hipermídia (fig.36)
também é um objeto liminar na medida em que conduz o estudante para dentro do
ambiente imersivo da escola e coloca em contato com as aventuras do menino.
O mouse, como controlador da navegação, aparece muitas vezes na forma de
objetos do mundo ficcional como uma mão, figuras de livros, carrinhos, lápis, relógio,
mapas, transformando os movimentos reais dos estudantes em movimentos pelo
mundo virtual.
Segundo Murray (2003, p. 113) a grande vantagem de ambientes
participativos na criação da imersão “é sua capacidade de induzir comportamentos
que dão vida a objetos imaginários”.
Com a evolução dos meios digitais será possível no futuro criar muitos objetos
virtuais parecidos com objetos do mundo real e inseri-los dentro de ambientes
hipermidiáticos a fim de intensificar a sensação de participação imersiva nestes
ambientes.
Em Leonardo 2.0 as invenções relacionadas aos instrumentos musicais
permitem ao estudante interagir tocando os instrumentos, transformando-os em
objetos funcionais.
95
Figura 28: Demonstração do funcionamento do Tambor
Fonte: CD-ROM Leonardo 2.0 – O Inventor: The Learning Company s/d.
Segundo Murray (2003, p.127) “quando as coisas que fazemos trazem
resultados tangíveis, experimentamos o segundo prazer característico dos
ambientes eletrônicos - o sentido de agência”.
Segundo a autora, “agência é a capacidade gratificante de realizar ações
significativas e ver os resultados de nossas decisões e escolhas”. (MURRAY, 2003,
p.127)
96
Quando você um duplo clique sobre um arquivo em seu computador e ele
se abre, um resultado foi obtido através desta ação. O sentido de agência está
relacionado ao prazer de você realizar uma ação, pedir alguma coisa e obter a
resposta.
Murray (2003, p. 144) acrescenta que:
[...] qualquer objeto numa narrativa digital, independentemente do grau de
sofisticação da história, deveria proporcionar ao interator uma sensação de
agência tão clara e uma conexão com o mundo imersivo tão direta quanto
aquelas que senti no fliperama, segurando uma arma a laser em forma de
revólver de seis tiros e detonando os foras-da-lei em Mad Dog McCree.
Na hipermídia de Leonardo 2.0 é possível ao usuário ou estudante interagir
com o ambiente tocando os instrumentos (fig. 28). Esta ação é válida para todas as
invenções relativas à música apresentadas pela hipermídia e demonstra muito bem
o sentido de agência.
Ao clicar nas setas para rodar a manivela e imediatamente depois clicar na
cabeça do tambor podem-se ouvir as mudanças de tom que o instrumento emite,
indo do mais grave ao mais agudo. A simulação oferecida por este ambiente
transforma o objeto virtual em funcional ampliando a capacidade de imersão e o
prazer de realizar diversas ações e obter uma resposta.
De acordo com Lévy (1993, p. 126)
O conhecimento por simulação e a interconexão em tempo real valorizam o
momento oportuno, a situação, as circunstâncias relativas, por oposição ao
sentido molar da história ou à verdade fora do tempo e espaço, que talvez
fossem apenas efeitos da escrita.
97
Figura 29: Máquina de Ritmo LDV-2000
Fonte: CD-ROM Leonardo 2.0 – O Inventor: The Learning Company s/d.
Ao final da simulação, clicando no ícone Nossa Época é possível estabelecer
uma relação do tambor mecanizado de Leonardo com um aparelho eletrônico
denominado Máquina de Ritmo- LDV2000.
Interagindo com a máquina o usuário poderá vivenciar uma experiência
estética manipulando oito ritmos diferentes que vão do Jazz ao Pop Eletrônico, além
de poder acionar por meio dos cliques as pequenas baterias que compõem a
máquina.
A manipulação e a simulação como extensão do hipertexto permitem ampliar
e aprofundar as informações num nível sensório e motor agregando à experiência
sons, imagens, cores e narração.
Aqui o aprendiz pode vivenciar a emoção de exercer o poder sobre os
materiais sedutores e plásticos, sem, contudo, ser o autor direto da narrativa. Este é
o sentido de agência, explicitado por Murray (2003)
Inserido no ambiente escolar estas características, como agência e simulação
podem dar início ao estudo sobre a história da música, dos gêneros musicais, da
98
linguagem musical empreendendo uma sensibilização auditiva e também como fonte
de inspiração para a construção de relações com épocas passadas.
Pela análise musical tanto verbal escrita (estudo e compreensão de
partituras) como sonora pode-se desvendar as relações sociais de determinados
grupos na história, suas práticas culturais, seus valores e formas de expressão
artísticas e folclóricas.
Por intermédio desse tipo de análise é possível descobrir que a criação
musical também é marcada ao longo da história por processos evolutivos referente
às técnicas e aos ritmos diferenciados, aos valores estéticos e os gostos
favorecendo a construção da noção de época, de século, ou seja, a longa duração
da História.
Dessa forma, graças à utilização da hipermídia como possibilidade de
ferramenta para a aprendizagem, é possível pôr o aluno em interação - não apenas
em contato - com diversas ciências, com a arte, com diversos autores, músicos,
matemáticos, literatos, pintores, escultores, com diversos valores, com a história da
humanidade. Não é simplesmente repetir ao aluno o que esses pensadores fizeram,
mas sim é saber pensar mediante suas metodologias. (BECKER, 2001)
Este ponto de vista diferenciado sobre o ensino pressupõe um processo de
aprendizagem ativo e que implica compreender o conhecimento como um processo
de construção, e não mera cópia. (BECKER, 2001)
Portanto o professor precisa ser dotado de diversas capacidades como:
dominar o conteúdo pelo qual é responsável; saber criar relações interdisciplinares
entre os conteúdos apresentados em ambientes hipermídia e criar situações
apropriadas para que os alunos possam construir ou reconstruir para si os
conhecimentos vivenciados.
99
5 DESCRIÇÃO E ANÁLISE DAS HIPERMÍDIAS
5.1 Leonardo 2.0 – O Inventor
Neste capítulo pretende-se analisar as hipermídias Leonardo, 2.0 – O inventor
e Diadorim com base no artigo desenvolvido por Sérgio Bairon, na Alemanha em
2003
20
, que contém uma proposta de taxionomia para análise das expressividades
hipermidiáticas.
O objetivo da classificação nesta pesquisa é contribuir para uma melhor
compreensão dos formatos híbridos como expressividades possíveis para a
aquisição de conhecimentos e também fontes confiáveis para pesquisa procurando
demonstrar alguns dos conceitos abordados nos capítulos anteriores: interatividade,
imersão, interface e agência, além de explorar outro formato que não seja a
linguagem verbal-escrita como produtora de conhecimento.
O CD-ROM Leonardo - O Inventor foi um dos primeiros trabalhos em
hipermídia lançado na Feira de Frankfurt em 1994. Nesta investigação utilizar-se-á a
versão ampliada Leonardo 2.0 Inventor.
Este software apresenta a história de Leonardo da Vinci com desenhos e
animações de várias de suas invenções e algumas de suas principais obras de arte.
Toda a produção de da Vinci está relacionada a outros fatores históricos da época
em que viveu.
A versão 2.0 utiliza diversos recursos multimídia para ilustrar a vida e as
obras de Leonardo, conhecido principalmente por seu talento artístico, além de
outras capacidades inerentes à sua personalidade que o levaram a ser um grande
pesquisador em diversas áreas do conhecimento.
Baseado em pesquisas da Biblioteca Real do Castelo de Windsor, na
Inglaterra, este programa mostra a relação entre as invenções e anotações de
Leonardo da Vinci com as tecnologias desenvolvidas no século XX, bem como
diferentes acontecimentos registrados nos períodos históricos compreendidos entre
1425 e 1570.
20
O trabalho teve como resultado o artigo: Tendências da linguagem científica contemporânea em
expressividade digital: uma problematização. (BAIRON, 2003)
100
O argumento
21
está voltado para a história de Leonardo da Vinci, sua biografia
e invenções. O entorno, definido como a construção conceitual da himermídia
(BAIRON, 2003) apresenta a interface com o aspecto de um papel rústico tal como
nos manuscritos do século XV. As bordas do papel aparecem como se estivessem
desgastadas pela ação do tempo além de reproduzirem a escrita de trás para frente,
característica marcante da forma de escrever de Leonardo, compondo a estética do
ambiente e convidando para a imersão.
Nessa hipermídia as imagens referenciais se misturam com o discurso verbal
e se apresentam de formas variadas como manuscritos, desenhos, animações,
vídeo, obras de arte, e desempenham uma função referencial, na medida em que
mostram coisas que as palavras não poderiam alcançar.
A narração feita em voz over
22
tem a função de fornecer informações gerais
que, as imagens não podem dar, sobre a época do Renascimento, como: lugares,
datas, eventos, etc..., com o objetivo de situar o estudante no contexto histórico além
de orientar sobre as formas de exploração dos conteúdos.
Por outro lado, a música tem como função principal complementar a
linguagem verbal oral e a visual, permitindo ao estudante observar, através da
inflexão da voz, as características da oralidade como linguagem híbrida, entre o som
e o verbo. (SANTAELLA, 2001, p.397)
Nas representações dos instrumentos musicais, como o exemplo da Viola
Organista, Santaella (2001, p. 397) ressalta que:
[...] as notas desse instrumento musical estão afinadas no modo ‘dórico’
começando pela nota (própria desse modo). Sob esse ângulo a
hipermídia revela fidelidade documental visto que, na época de Leonardo a
música, ou melhor, a sintaxe convencional da música, vivia seu momento
modal deixado pela herança grega.
21
De acordo com Bairon, o argumento se refere ao “momento em que planejamos o contexto imagético
(tridimensional ou não) no qual habitarão as interações” (2003, p. 2).
22
Lúcia Santaella, em seu livro Matrizes da Linguagem e do Pensamento apresenta uma classificação sobre os
tipos de narração da “matriz áudio que é composta por vozes que se dividem em: voz in, quando o receptor
quem fala, voz off, quando o receptor o quem fala, mas o enunciador dessa fala fica sempre pressuposto.
Trata-se de um narrador interno ao ambiente criado pela hipermídia e voz over, quando o receptor não quem
fala e o enunciador da fala não é localizável dentro do ambiente da hipermídia. Trata-se, pois de um narrador
externo”. (2001, p. 392)
101
Figura 30: Tela de abertura da hipermídia Leonardo 2.0
Fonte: CD-ROM Leonardo 2.0 – O Inventor: The Learning Company s/d.
Os temas centrais são apresentados na tela inicial por meio de oito botões
que dão acesso a um conjunto de temas como: invenções, galeria, introdução,
biografia, banco de dados, linha do tempo, obras e bibliografia por meio de imagens
animadas ou palavras. Os botões que dão passagem para o conteúdo apresentam
um design simples desconfigurando o entorno.
Os ícones que dão acesso à navegação poderiam ser construídos por
imagens reticulares de forma que a exploração pudesse ser feita intuitivamente ou
por associação. No canto direito superior aparecem dois botões de navegação,
Índice e Ajuda, que apresentam os conteúdos por meio de interfaces diferenciadas.
102
Figura 31: Tela demonstrando o conteúdo da hipermídia Leonardo 2.0
Fonte: CD-ROM Leonardo 2.0 – O Inventor: The Learning Company s/d.
O ambiente apresenta inúmeras páginas contendo textos, imagens (incluindo
as obras de arte), imagens animadas, desenhos das invenções de Leonardo
relacionado-as com as invenções do século XIX, por intermédio de vídeos.
São mais de 445 arquivos de áudio, 148 arquivos de vídeos e imagens e 95
arquivos de textos a serem explorados pelo usuário.
Segundo Santaella (2001) pode-se classificar as hipermídias em:
1) instrucionais que estão voltadas para a solução de problemas;
2) as ficcionais, que incorporam a interatividade na escritura ficcional;
3) as artísticas feitas para a produção e transmissão de atividades criativas
para a sensibilidade
4) as conceituais feitas para a produção e transmissão de conhecimentos
teóricos-cognitivos.
103
Nesta investigação, pretende-se deixar em aberto as diversas possibilidades
que a hipermídia, Leonardo 2.0, pode ser utilizada, uma vez que apresenta uma
estrutura interdisciplinar abordando temas como história, arte, arquitetura, física e
música, servindo como fonte de informação para pesquisas bem como à iniciação de
conceitos teóricos e dependem, como visto no capítulo 2, da abordagem
pedagógica adotada para sua utilização.
Os trabalhos de da Vinci, na área de engenharia podem ser utilizados para
que os alunos compreendam alguns princípios e leis da física e o funcionamento de
alguns equipamentos atuais.
Uma das interações mais interessantes nesta hipermídia estão relacionadas
às invenções de Leonardo. O ícone Invenções acesso a cinco modalidades
distintas como aviação, música, água, guerra e engenharia civil, alguns em 3D
demonstrando o funcionamento dos mecanismos por intermédio de animações como
o pára-quedas, o helicóptero e o snorkel.
Figura 32: Barco movido a rodas
Fonte: CD-ROM Leonardo 2.0 – O Inventor: The Learning Company s/d.
104
As passagens ou efeitos de transição (BAIRON, 2003) têm como função
alterar o estado de consciência no processo de imersão e antecipam o novo
ambiente ao navegador. Este efeito fica evidente na tela de introdução às invenções
que logo após a narração surge a imagem da Monalisa e através da aproximação da
tela observa-se outro cenário abrindo-se bem ao fundo de seus olhos dando
passagem para a figura da Dama do Arminho.
Figura 33: Efeito de transição na hipermídia Leonardo 2.0
Fonte: CD-ROM Leonardo 2.0 – O Inventor: The Learning Company s/d.
Os efeitos improváveis ou randômicos propostos pela programação
apresentam poucas variações, entretanto captam a atenção pelas mudanças que
provocam na paisagem, como por exemplo, a figura da Dama do Arminho que cai de
“pernas para o ar” quando o menu Guerra é acionado. Ao ser acionado em uma
outra ocasião, um efeito diferente é apresentado na tela.
105
Figura 34: Exemplo de efeitos randômicos
Fonte: CD-ROM Leonardo 2.0 – O Inventor: The Learning Company s/d.
Estes efeitos, denominados de randomismo, o conceituados por (BAIRON,
2003) como o processo pelo qual os fenômenos da improbabilidade e da
probabilidade dos eventos adquirem proporcionalidade e são oferecidos na
interatividade do ambiente, criando uma estrutura para o surgimento do universo
sígnico. Portanto, algumas das transições oferecidas por esta hipermídia são
realizadas através do dico. Ao acionar um dos botões embaixo da tela que
acesso aos conteúdos: aviação, música, engenharia civil ou guerra, uma brincadeira,
relacionada ao tema aparece mantendo a imersão da navegação.
Portanto, pela sua estrutura de bancos de dados, de textos e imagens, vídeos
e áudio essa obra permite uma inovação nas relações entre a aquisição e
divulgação do conhecimento buscando a compreensão de fatos históricos, alinhados
aos movimentos artísticos e de grande revolução do pensamento tão presentes no
período do Renascimento, podendo contribuir nos processos de ensino e
aprendizado.
106
5.2 Processos de Alfabetização de Crianças, Jovens e Adultos do Município de
Diadema - Diadorim
A hipermídia História Local nos Processos de Alfabetização de Crianças,
Jovens e Adultos do Município de Diadema faz parte de um kit de materiais que
foram utilizados no processo de ensino e aprendizagem tendo como foco central as
experiências históricas dos indivíduos e dos grupos sociais da cidade de Diadema
como forma de resgatar o passado histórico da região.
O projeto teve origem a partir da reivindicação dos professores do Município
de Diadema que estavam convencidos sobre a importância de se estabelecer a
relação da história do lugar juntamente com o processo de ensino e aprendizado
“que busca trabalhar com a perspectiva dos sujeitos, dos homens que nas lides
cotidianas fazem a história”. (IOKOI, 2001, p. 7)
O trabalho teve um período de duração de cinco anos - de 1996 a 2001 - e
contou com o apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo
FAPESP, do Serviço de Educação do Município de Diadema, da Universidade de
São Paulo USP, além da participação de alunos e professores nos processos
coletivos de reflexão sobre a educação popular. (IOKOI, 2001)
Pelo fato do Município contar com uma população de migrantes, negros e
índios além dos imigrantes de diferentes culturas, tanto ocidentais como orientais, e
ser uma região de contraste entre o cotidiano simples e particular típicos da região
inseridos numa totalidade moderna (IOKOI, 2001) sua história é repleta de riquezas
e não poderia ser contada de modo linear.
A forma encontrada para expressar tantos elementos do cotidiano foi o
desenvolvimento de diversos materiais em diferentes linguagens compostos de dois
livros de leitura para crianças, jovens e adultos, pranchas com mapas que
representam a cidade e mapas históricos, pranchas fotográficas, um livro acadêmico
para os professores, uma seleção musical, e um vídeo para estimular os usuários ao
debate sobre o processo educacional desenvolvido e por fim um CD-ROM
hipermídia que contém todos os materiais produzidos na pesquisa imbricados de
forma a criar um ambiente lúdico para que os estudantes pudessem navegar e
serem utilizados como um instrumento de educação à distância. (IOKOI, 2001)
107
Para esta investigação o interesse se direcionou para o material produzido em
hipermídia, que através do personagem Diadorim, recém-chegado do Ceará com a
mãe, remete a diversas narrativas e contos de suas aventuras desde sua chegada à
cidade de Diadema até se tornar adulto e trabalhar como operário nas indústrias da
região.
Através das aventuras cotidianas mais simples do menino, como se
locomover até a escola sozinho ou descobrir novos lugares na cidade é possível
estimular reflexões sobre diversos conteúdos a serem ensinados na geografia, na
matemática, nas ciências, na literatura e na escrita, estabelecendo uma relação com
a história individual dos próprios alunos, de seus pais, e antepassados e a história
da cidade. Neste sentido, a cultura repleta de signos e de memória, foi um dos
elementos utilizados para a construção de diversos conhecimentos científicos
importantes para a formação e cidadania dos indivíduos envolvidos. (IOKOI, 2001)
Na hipermídia o argumento está voltado para as aventuras do menino
Diadorim e apresenta diversas narrativas de seu cotidiano que são acompanhadas
de desenhos produzidos pelos próprios alunos das escolas municipais de Diadema,
como forma de releituras e interpretação sobre os trabalhos desenvolvidos pelos
professores em sala de aula. Como foi dito, este trabalho foi fruto de pesquisa e,
portanto, dependeu de uma reflexão teórica e analítica sobre os temas.
As narrativas apresentam-se em forma de contos expressando um estilo
literário preferido pelas crianças, jovens e adultos, através do poder que possuem de
favorecer a imaginação e facilitar a compreensão.
A narração dos contos em voz over “costuram as cenas, orientando a
significação do conjunto. A narração falada ancora todo o processo de significação”
(MORAN, 2000, p.37).
Boa parte dos contos é acompanhada de documentos fotográficos que
remetem a tempos passados, relacionados com a história individual dos alunos, bem
como imagens de mapas dos lugares de origem dos migrantes nordestinos e sua
trajetória para Diadema utilizando como meio de transporte o trem, bem como dos
imigrantes que vieram para a região.
108
Figura 35: A grande viagem
Fonte: CD-ROM Diadorim - 2001
O argumento procura revelar uma série de temas que trazem conceitos sobre
o tempo (na matemática), o espaço (na geografia: localização, relações de
vizinhança, entorno) e o trabalho mediante símbolos e signos visuais contidos nas
representações cartográficas e nas fotografias. Todo o ambiente procura revelar as
relações entre a história local, política, econômica, movimentos sociais, trabalho e
vida urbana alinhados à história pessoal dos indivíduos.
A partir do conto As memórias do avô de Neco é possível trabalhar com o
tema da escravidão e sua relação com os processos econômicos da época. O
argumento da hipermídia procura revelar ainda as relações entre trabalho e capital,
que são narradas em diversos contos abordando a transição do trabalho escravo
para o assalariado relacionando-os com o papel dos negros e imigrantes neste
contexto.
O entorno definido como uma escola construída em ambiente tridimensional,
continuidade ao trabalho desenvolvido em sala pelo professor e permite o
aprofundamento do tema pelos alunos além de favorecer o processo imersivo.
A tela inicial apresenta a figura de Diadorim e possibilita o acesso a primeira
narrativa. Todas as formas de acesso aos documentos são realizadas por ícones
que vão aparecendo na medida em que se navega pelo ambiente. Podem ser
109
representados por figuras humanas, como a do índio, que também aparece na tela
inicial, ou por desenhos elaborados pelos alunos.
A opção do entorno foi concebida por imagens reticulares-manipuladas que
dão passagem para outros lugares, dentro do mesmo ambiente, estabelecendo a
união entre as expressividades estéticas do meio e os conceitos teóricos.
Segundo Bairon (2003, p. 3-4),
A imagem na hipermídia perde qualquer carcterística do em si’, a partir do
momento em que podem “expandir sua significação para outro lugar. Da
imagem reticular, jamais deve surgir ‘simplesmente’ um complemento, mas
aberturas para outros caminhos; jamais conclusão, mas multiplicação de
juízos; jamais o agora como congelamento.
Figura 36: Tela de abertura da hipermídia Diadorim
Fonte: CD-ROM Diadorim - 2001
Portas, janelas, quadro-de-giz, apagador, lápis, cadernos são signos
flutuantes e atuam como objetos auto-referenciais que favorecem a identificação
com o ambiente e são fatores fundamentais para que o processo de imersão
aconteça, estimulando a curiosidade dos alunos na busca de espaços que sempre
podem revelar uma história, repleta de recortes de fotos, figuras, pinturas, vídeos e
textos.
110
“A imersão depende de uma familiaridade criada não entre conceitos e
‘simulacros’, mas entre a construção de habitações que acolherão determinados
eventos interativos e a predisposição para jogar”. (BAIRON, 2003, p. 24)
Através da imersão no ambiente tridimensional da escola pode-se efetuar um
conjunto de ações, despertar sensações que seriam impossíveis de serem
traduzidas pela escrita. Dessa forma os conceitos teóricos podem ser vivenciados
pelo aluno através das orientações metodológicas e epistemológicas que regem o
trabalho podendo assim oferecer vários caminhos que rompam com a lógica da
construção textual escrita.
A navegação se processa através da reconstrução de caminhos alternativos
dentro da estrutura física da escola que se modifica conforme o lugar que está
sendo explorado. É possível olhar ao redor das coisas, olhar o mundo do interior da
escola.
Durante a narração do conto Encontro de Dois Mundos são abordados
temas sobre os hábitos e costumes de pessoas e lugares diferentes e algumas
cenas de vídeo exemplificam como os índios Curumins tomavam banho, situando os
alunos em temporalidades diferentes. Neste sentido, as fotografias e os vídeos
históricos acrescentam à hipermídia um caráter diacrônico.
Figura 37: O encontro de dois mundos
Fonte: CD-ROM Diadorim - 2001
111
O banco iconográfico da hipermídia é composto por documentos fotográficos
históricos, por desenhos elaborados pelos alunos, pinturas e mapas. As imagens
citadas são apresentadas nos momentos das narrativas, muitas vezes sobrepostas,
tornando possível a visualização de fatos que podem ser relacionados ao tema da
narrativa, da cultura local, acontecimentos passados e atuais, possibilitando uma
abordagem analítica e comparativa por parte do aluno, bem como o levantamento de
hipóteses com relação aos temas.
De acordo com Bairon (2003, p. 3)
As imagens citadas no interior de ambientes digitais são definidas como a
manutenção da integridade imagética do ‘referente original’, mas que,
quando inseridas num ambiente hipermidiático, transformam-se numa peça
de jogos de linguagem.
O áudio produzido nesta hipermídia contém narrações e pequenas locuções
feitas em voz over além de fragmentos de vozes de crianças misturadas às vozes de
adultos, como se estivéssemos no ambiente real da uma escola onde as crianças se
preparam para entrar na aula.
Na sala dos professores o ruído de portas batendo, passos distantes, efeitos
que imitam o manuseio de papel amassado, cadeiras sendo arrastadas dão a
impressão de que alguém está no lugar, transformando o processo de navegação
numa aventura cada vez mais imersiva, um lugar a ser caminhado repleto de
surpresas que se manifestam por meios de imagens, sonoridades e objetos
flutuantes.
“A sica e os efeitos sonoros servem como evocação, lembrança (de
situações passadas), de ilustração associados a personagens do presente, [...] e
de criação de expectativas, antecipando reações e informações”. (MORAN, 2000, p.
37)
Segundo Bairon (2003, p.18) a música funciona também como efeitos de
transições, “passagens do primeiro para o segundo nível de interatividade”
Figuras humanas ou os próprios desenhos dos alunos, aparecem como
efeitos de transição. Portanto, o universo sígnico se completa através das músicas
que compõem as narrativas, juntamente com as imagens, os fragmentos de vozes e
sons, as fotografias, as pinturas, as transições e os objetos flutuantes.
112
Figura 38: Figuras humanas como elemento de transição.
Fonte: CD-ROM Diadorim - 2001
Neste sentido, a proposta desta hipermídia consegue explorar de forma
analítica a relação entre os diferentes temas propostos inicialmente pelos
pesquisadores e responsáveis do projeto e as referências históricas e teóricas
colhidas durante as pesquisas, incluindo as reflexões realizadas pelos grupos de
professores e de alunos.
Através da relação que é estabelecida na programação inicial com as formas
pelas quais os conceitos serão expressos no ambiente hipermídia, torna-se possível
sua utilização na produção de conceitos teóricos e científicos criando uma
possibilidade de composição que vai além da linguagem verbal-escrita.
Sabe-se que os programas hipermídia desenvolvidos nem sempre se
preocupam em estabelecer uma metodologia analítica ou que levem a produção de
conhecimento científico, entretanto estes são desafios que precisam ser superados,
quem sabe, por intermédio de pesquisas, que ainda o em número pequeno, pela
transformação da burocracia do mundo acadêmico e o domínio da linguagem
hipermídia pelos pesquisadores e professores.
113
6 CONCLUSÃO
Tendo sua base na digitalização, o processo de transmissão de informações e
a comunicação humana passaram por uma revolução, principalmente na segunda
metade do século XX devido à convergência de diversas mídias para o meio digital,
resultando na possibilidade de estocar e circular rapidamente uma grande
quantidade de informação. A possibilidade de hibridizar diversas linguagens e
convergir diversas mídias em um único meio, possibilitou o surgimento da
hipermídia.
Entende-se estes fatores como responsáveis pela ampliação dos espaços de
aprendizagem que antes eram praticamente exclusivos da escola. Neste contexto, a
crescente busca por novos conhecimentos e habilidades, exigidos também pela
sofisticação das relações de trabalho, criaram a necessidade de uma formação
contínua dos indivíduos aumentando o tempo de estudo e a diversificação dos
conhecimentos que precisam ser adquiridos de forma rápida para responder às
exigências da sociedade do conhecimento.
Buscando uma melhor compreensão dessa nova condição teve-se que
entender os mecanismos de funcionamento das tecnologias digitais, pois observa-se
que uma tendência de aproximação dos indivíduos no sentido de buscar sua
formação com mais autonomia e de forma rápida tendo que recorrer às novas
tecnologias que servirão de mediadoras no processo de ensino e aprendizado.
Dessa forma, observa-se que a escola deverá passar por um processo de
reflexão realizando algumas mudanças a fim de procurar desenvolver nos indivíduos
habilidades voltadas para o aprender a aprender, centralizando a formação em
práticas voltadas para a aprendizagem e não na simples transmissão do saber
centrado no ensino. Para que estas mudanças se tornem viáveis entende-se que é
necessário haver uma reconfiguração no papel e nas práticas pedagógicas do
professor devendo ainda ser apoiado pela escola que deve levar em consideração
as suas necessidades para que se sintam comprometidos e co-participantes deste
processo de mudança.
114
Passou-se então a se concentrar nas questões conceituais que se configuram
no ambientes digitais, especialmente a hipermídia, procurando estabelecer relações
com os processos de aprendizagem verificando as potencialidades que o meio
apresenta como recurso pedagógico inovador capaz de favorecer a construção do
conhecimento e possibilitando uma aprendizagem autônoma.
Para atingir este objetivo, analisou-se duas produções em hipermídia,
Leonardo 2.0 O Inventor e História Local nos Processos de Alfabetização de
Crianças, Jovens e Adultos do Município de Diadema - Diadorim
Dessa forma, observou-se que a hipermídia pode contribuir para promover
aprendizagens significativas além de auxiliar na compreensão de conceitos teóricos
na medida em que permitem: interagir e manipular objetos em 3D valorizando a
ação do aprendiz sobre os objetos estimulando-o à indagação, a fazer pesquisas e
aprofundar conteúdos através da utilização de hipertextos, utilizar as imagens como
recurso para a compreensão de relações entre espaço e tempo histórico, sobre as
transformações do homem no meio social; na formação do conceito de identidade,
levantar hipóteses sobre fenômenos e acontecimentos, participar de simulações,
ouvir histórias, vivenciar atividades lúdicas e estéticas através dos jogos e da
experiência da navegação.
Entendeu-se, também, que para potencializar os recursos da hipermídia, no
ambiente de aprendizagem, é necessária a mediação do professor como orientador
e sistematizador das informações que foram absorvidas pelos estudantes
motivando-os com atividades desafiadoras de forma a complementar e aprofundar
conceitos e explorar conteúdos que não aparecem explicitamente durante a
navegação.
Logo, o computador e os ambientes hipermidiáticos podem surpreender com
relação ao potencial que possuem como auxiliares da aprendizagem, levando o
aluno a elaborar melhor o pensamento por meio do aprender fazendo,
possibilitando a aprendizagem autônoma de forma a construir seu conhecimento.
Portanto, ao analisar no último capítulo, as hipermídias propostas nesta
investigação, entendeu-se este meio como uma expressividade possível para a
aquisição de conhecimentos e conceitos científicos e também como fonte confiável
para ser explorada na aprendizagem.
115
REFERÊNCIAS
BAIRON, Sérgio; PETRY, Luís Carlos. Hipermídia, Psicanálise e História da Cultura.
Caxias do Sul: EDUCS. São Paulo: Editora Mackenzie. 2000.
______. Multimídia. São Paulo: Global. 1995.
______. Interdisciplinaridade: educação, história da cultura e hipermídia. São Paulo:
Futura. 2002.
______. Tendências da linguagem científica contemporânea em expressividade
digital: uma problematização. Artigo escrito na Alemanha em 2003.
BECKER, Fernando. Educação e construção do conhecimento. Porto Alegre:
Artmed. 2001.
BELLONI, M. Luiza. O que é mídia-educação. Campinas: autores associados. 2001.
BORDENAVE, Juan Dias e PEREIRA, Adair Martins. Estratégias de Ensino-
Aprendizagem. 8. ed. Petrópolis, RJ: Vozes. 1986
BURKE, Peter. Testemunha ocular: história e imagem. São Paulo: EDUSC. 2004.
CANEVACCI, Massimo. Culturas eXtremas: mutações juvenis nos corpos das
metrópoles. Rio de Janeiro: DP&A. 2005.
CASTELLS, Manuel. A sociedade em rede - a era da informação: economia,
sociedade e cultura; v.1 - 6. ed. São Paulo: Paz e Terra, 1999. p.67-118.
CHAVES, Eduardo. Tecnologia e educação: o futuro da escola na sociedade da
informação. Campinas: Mindware, 1998.
COMPANY, The Learning. Leonardo 2.0 : o inventor. London. LNT544AP-CD. 1997.
1 CD-ROM.
DOWBOR, Ladislau. Tecnologias do conhecimento: os desafios da educação.
Petrópolis: Vozes. 2001.
FARIA, Anália Rodrigues de. O desenvolvimento da criança e do adolescente
segundo Piaget. São Paulo: Ática, 1995.
116
FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa.
15. ed. São Paulo: Paz e Terra, 1996.
IOKOI, Zilda Márcia Gricoli (Coord.); BAIRON, Sérgio. História local nos processos
de alfabetização de crianças, jovens e adultos do município de Diadema. São Paulo.
PLCD52505. FAPESP, 2001. 1 CD-ROM
______. Venturas e aventuras do moço diadorim. Material de leitura para jovens e
adultos do Projeto História Local nos Processos de Alfabetização de Crianças,
Jovens e Adultos. FAPESP, 2001.
______. Venturas e Aventuras do menino diadorim. Material de leitura para as
crianças do Projeto História Local nos Processos de Alfabetização de Crianças,
Jovens e Adultos. FAPESP, 2001.
JIMENEZ PEÑA, Maria de los Dolores et al. Prática docente e tecnologia: revisando
fundamentos e ampliando conceitos. Texto disponibilizado no programa de Pós-
Graduação em Educação, Arte e História da Cultura. Universidade Mackenzie. São
Paulo. 2005.
JIMENEZ PEÑA, Maria de los Dolores. Novos modos de conceber o ensinar e
aprender. Texto extraído da Tese de Doutoramento. PUC. São Paulo. 1999.
LANDOW, George P. Hipertexto: la convergência de la teoria crítica contemporânea
y la tecnologia. Barcelona: Paidós. 1995
LEÃO, Lúcia. O Labirinto da Hipermídia: Arquitetura e navegação no ciberespaço.
São Paulo: Iluminuras. 1999.
LÉVY, Pierre. As tecnologias da inteligência. Rio de Janeiro: Editora 34. 1993.
______. Cibercultura. São Paulo: Editora 34. 1999
MORAN, José Manuel; MASETTO, Marcos T.; BEHRENS, Marilda Aparecida.
Novas tecnologias e mediação pedagógica. São Paulo: Papirus. 2000.
MURRAY, Janet H. Hamlet no holodeck: o futuro da narrativa no ciberespaço. São
Paulo: Itaú Cultural: UNESP. 2003.
OLIVEIRA, Celina Couto de; COSTA, José W. da; MOREIRA, rcia. Ambientes
informatizados de aprendizagem: produção e avaliação de software educativo.
Campinas, São Paulo: Papirus. 2001.
117
OLIVEIRA, Martha Kohl de. Vygotsky: aprendizado e desenvolvimento: um processo
sócio-histórico. São Paulo: Scipione. 1997.
PARENTE, André (Org.). Imagem máquina: a era das tecnologias do virtual. Rio de
Janeiro: Ed. 34. 1993.
PEDAGOGIA DE PROJETOS E INTEGRAÇÃO DE MÍDIAS. Boletim Proposta
Pedagógica. MEC: Secretaria de Educação a Distância TV Escola Salto para o
futuro. Setembro de 2003
PIAGET, Jean. Seis estudos de psicologia. 24. ed. Rio de Janeiro: Forense
Universitária. 1999.
POZO, Juan Ignácio. Teorias cognitivas da aprendizagem. 3. ed. Porto Alegre: Artes
Médicas. 1998.
______. Aprendizes e Mestres: a nova cultura da aprendizagem. Porto Alegre:
Artmed, 2002.
SALVAT, Léxico. Dicionário de la lengua. España: Salvat. 2001.
SANTAELLA, Lúcia. Matrizes da linguagem e pensamento - sonora, visual, verbal.
São Paulo: Iluminuras. 2001.
SILVA, Marco. Sala de aula interativa. 2. ed. Rio de Janeiro: Quartet. 2001.
TARDY, Michel. O professor e as imagens. São Paulo: Cultrix. 1976.
UNIVERSIDADE PRESBITERIANA MACKENZIE. Apresentação de Trabalhos
acadêmicos: guia para alunos da Universidade Presbiteriana Mackenzie. 3.ed. São
Paulo: Editora Mackenzie, 2004.
VALENTE, José Armando (Org.). Computadores e conhecimento: repensando a
educação. Universidade Estadual de Campinas. São Paulo: 1993.
VYGOTSKI, Lev S. A formação social da mente: o desenvolvimento dos processos
psicológicos superiores. 6. ed. São Paulo: Martins Fontes. 1998.
118
Livros Grátis
( http://www.livrosgratis.com.br )
Milhares de Livros para Download:
Baixar livros de Administração
Baixar livros de Agronomia
Baixar livros de Arquitetura
Baixar livros de Artes
Baixar livros de Astronomia
Baixar livros de Biologia Geral
Baixar livros de Ciência da Computação
Baixar livros de Ciência da Informação
Baixar livros de Ciência Política
Baixar livros de Ciências da Saúde
Baixar livros de Comunicação
Baixar livros do Conselho Nacional de Educação - CNE
Baixar livros de Defesa civil
Baixar livros de Direito
Baixar livros de Direitos humanos
Baixar livros de Economia
Baixar livros de Economia Doméstica
Baixar livros de Educação
Baixar livros de Educação - Trânsito
Baixar livros de Educação Física
Baixar livros de Engenharia Aeroespacial
Baixar livros de Farmácia
Baixar livros de Filosofia
Baixar livros de Física
Baixar livros de Geociências
Baixar livros de Geografia
Baixar livros de História
Baixar livros de Línguas
Baixar livros de Literatura
Baixar livros de Literatura de Cordel
Baixar livros de Literatura Infantil
Baixar livros de Matemática
Baixar livros de Medicina
Baixar livros de Medicina Veterinária
Baixar livros de Meio Ambiente
Baixar livros de Meteorologia
Baixar Monografias e TCC
Baixar livros Multidisciplinar
Baixar livros de Música
Baixar livros de Psicologia
Baixar livros de Química
Baixar livros de Saúde Coletiva
Baixar livros de Serviço Social
Baixar livros de Sociologia
Baixar livros de Teologia
Baixar livros de Trabalho
Baixar livros de Turismo