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A UNE organizou plebiscito junto aos estudantes sobre a Lei n. º 4464. Um
percentual de 92,5% dos estudantes se posicionou contrário à política educacional do
governo. Diante desta situação, a UNE lançou um manifesto a sociedade denunciando as
agressões da ditadura militar às instituições e aos movimentos sociais.
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No mesmo dia do
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“A União Nacional dos Estudantes, hoje cada vez mais perseguida por representar o pensamento dos
estudantes, ao recusar a compactuar com a traição à democracia praticada continuamente pelo Governo
Federal, manifesta a sua posição, repudiando as recentes manobras da ditadura, que se pronunciou pelo
diálogo com os intelectuais, estudantes e trabalhadores.
Tal diálogo é apenas uma tentativa de encobrir a impopularidade de uma ditadura repudiada pelos
brasileiros, porque estes têm a consciência de que sua vontade não é respeitada e que a Democracia
inexiste no País.
1 – Desde abril de 64 vem o governo mantendo a nação em permanente clima de terror. A perseguição aos
representantes de nossa cultura continua sendo uma realidade. Vimos recentemente a prisão de oito dos
mais expressivos intelectuais brasileiros, pelo simples motivo de se terem manifestado por Democracia e
Liberdade. Ao mesmo tempo, assistimos o desmantelamento de nossas universidades e da autonomia
universitária, como aconteceu recentemente na Universidade de Brasília.
2 – Pretenderam suprimir aos estudantes suas entidades representativas, através de intervenções em
diretórios acadêmicos e UEEs e por meio da Lei n.º4464, que criava o peleguismo no movimento
estudantil, reconhecendo como lideranças e acenando com a bandeira da corrupção através da promessa de
um bilhão de cruzeiros, a oportunistas sempre repudiados nas eleições estudantis.
3 – Mas são aqueles a quem o governo federal mais tenta envolver com suas manobras e demagogia, os
trabalhadores, os mais perseguidos e reprimidos pelo governo da ditadura. Seus sindicatos foram fechados
ou submetidos a intervenções que ainda perduram. O direito de greve foi praticamente suprimido. As
conseqüências da política econômica da ditadura recaíram sobre os trabalhadores, agravando o
desemprego e levando à miséria mais crítica grande parte da população.
São, pois os autores da perseguição e da violência que hoje falam em diálogo. Falam de aproximação.
Falam de entendimento. O que na verdade propõem é que esqueçamos os três mil universitários presos,
expulsos, expatriados, desde 1.º de abril de 1964. Querem que ignoremos a mão esfacelada do colega
Ezequiel Gomes, ferido na Guanabara.
O que na verdade propõem é que abandonemos um diretor da UNE, Heitor da Laola, preso há meses no
Ceará. Propõem anular a juventude. Moldá-la fascista, violenta, corrupta, transforma-la em força de
peleguismo e não de renovação.
E conscientes do compromisso assumido e do risco que daí advém, que continuamos exigindo a liberdade
e o respeito aos direitos humanos. Permanecemos lutando por Democracia, embora sabendo que
espancamentos serão nossas medalhas. Queremos justiça, mesmo que injustamente sejamos presos.
Por isso nos dirigimos aos intelectuais, hoje, no sentido de que se unam a nós, na recusa deste diálogo, que
não passa de um monólogo de imposições. Que conosco, só aceitem o diálogo, na medida que cessem as
perseguições e violências. Na medida que haja anistia. Na medida em que se respeitem os direitos
fundamentais da pessoa humana.
Voltamo-nos aos intelectuais, para que só aceitem diálogo verdadeiro, e isto quando de fato e não de
promessas, se crie um clima de liberdade política e cultural.
Queremos lembrar-lhes que a História é irreversível e que o julgamento das gerações é severo.” Correio
da Manhã, 17 de dezembro de 1965, apud FÁVERO, Maria de Lourdes. A Une em tempos de
autoritarismo, pp. 62-64.