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Universidade do Estado do Rio de Janeiro
Centro Biomédico
Faculdade de Enfermagem
Érika Machado Pinto da Silva
Representações sociais da Aids para pessoas que vivem com HIV e
suas interfaces cotidianas
Rio de Janeiro
2010
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1
Érika Machado Pinto da Silva
Representações sociais da Aids para pessoas que vivem com HIV e suas
interfaces cotidianas
Dissertação apresentada, como requisito
parcial para obtenção do título de Mestre,
ao Programa de Pós-Graduação em
Enfermagem, da Universidade do Estado do
Rio de Janeiro. Área de concentração:
Enfermagem, Saúde e Sociedade.
Orientador: Prof. Dr. Antônio Marcos Tosoli Gomes
Co-orientadora: Prof
a
. Dr
a
. Denize Cristina de Oliveira
Rio de Janeiro
2010
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2
CATALOGAÇÃO NA FONTE
UERJ/REDE SIRIUS/CBB
Autorizo, apenas para fins acadêmicos e científicos, a reprodução total ou parcial
desta dissertação.
________________________________________ _________________________
Assinatura Data
S586 Silva, Érika Machado Pinto da.
Representações sociais da Aids para pessoas que vivem com HIV
e suas interfaces cotidianas / Érika Machado Pinto da Silva. - 2010.
195 f.
Orientador: Antonio Marques Tosoli Gomes.
Co-orientadora:Denize Cristina de Oliveira.
Dissertação (mestrado) Universidade do Estado do Rio de
Janeiro, Faculdade de Enfermagem.
1. Representações sociais. 2. HIV (Virus). 3. AIDS (Doença) 4.
Doenças crônicas. I. Gomes, Antônio Marcos Tosoli. II. Oliveira,
Denize Cristina de. III. Universidade do Estado do Rio de Janeiro.
Faculdade de Enfermagem. IV. Título.
CDU
614.253.5
3
Érika Machado Pinto da Silva
Representações sociais da Aids para pessoas que vivem com HIV e suas
interfaces cotidianas
Dissertação apresentada, como requisito
parcial para obtenção do título de Mestre,
ao Programa de Pós-Graduação em
Enfermagem, da Universidade do Estado do
Rio de Janeiro. Área de concentração:
Enfermagem, Saúde e Sociedade.
Aprovada em 25 de fevereiro de 2010.
Banca Examinadora:
____________________________________________
Prof. Dr. Antônio Marcos Tosoli Gomes (Orientador)
Faculdade de Enfermagem da UERJ
____________________________________________
Profª. Drª. Florence Romijn Tocantins
Escola de Enfermagem Alfredo Pinto da UNIRIO
____________________________________________
Prof. Dr. Sérgio Corrêa Marques
Faculdade de Enfermagem da UERJ
Rio de Janeiro
2010
4
DEDICATÓRIA
A Deus, por estar sempre ao meu lado, segurando na minha mão, me sustentando e
me conduzindo à vitória!!!!!!
À minha querida mãe, pelo seu amor incondicional, dedicação, força, exemplo e
sabedoria.
Ao Rodrigo, esposo, amigo e companheiro. O grande amor da minha vida! Obrigada
pelo seu amor, cuidado, zelo, paciência e compreensão.
Ao meu filho Davi, que veio ao mundo durante a construção deste trabalho, e todos
os dias me alegra com o seu sorriso doce.
Às pessoas que vivem com HIV, especialmente aquelas que gentilmente forneceram
os seus depoimentos para a efetivação deste trabalho. O meu muito obrigada!!!!!
5
AGRADECIMENTOS
Ao meu pai por ter me estimulado a buscar novos conhecimentos e a ampliar
os meus horizontes!
Ao Prof. Antônio Marcos Tosoli Gomes, pela sua paciência, dedicação,
incentivo e compreensão, e com quem muito aprendi nestes dois anos de
convivência. É com orgulho que compartilho com você esta conquista.
À Profª. Denize Cristina de Oliveira, pela suas palavras de incentivo, pelos
seus ensinamentos que foram fundamentais para o meu crescimento.
Aos Profs. Florence Romijn Tocantins, Sérgio Corrêa Marques, Kaneji
Shiratori e Denize Cristina de Oliveira, pelas sugestões preciosas durante a banca
de qualificação.
A todos os professores da UERJ pelas trocas de conhecimentos em sala de
aula.
Ao meu irmão Jonis, e sua esposa Klézia pelo amor, carinho e orações. Além
de terem me ajudado a transcrever as gravações das entrevistas. A suas
contribuições foram fundamentais !!!!!
Ao meu irmão Lucyelles, pelo seu amor, carinho, palavras de incentivo. Vocês
são muito importantes para mim, obrigada por existirem.
À minha sogra, Bárbara e ao meu sogro Severiano, por terem me apoiado e
cuidado do meu filho, com muito amor e carinho, nos momentos em que precisei
estar ausente.
Às minhas amigas, Alessandra e Graziella, pelo carinho e amizade que
ultrapassam décadas e gerações. Mais uma vez estamos compartilhando
conquistas.
À minha amiga Carla, que acompanhou muito de perto toda a minha trajetória
de vida e acadêmica, afinal são quase 20 anos de convivência. Obrigada minha
irmã, pelo amor, carinho, incentivo e amizade sincera.
À minha amiga Emily, por ter me socorrido inúmeras vezes. Nos momentos
mais ―bizarros‖ estava com as duas mãos estendidas prontas para me ajudar.
6
Obrigada amiga, este foi mais um capítulo da nossa história, que mistura Minas,
Bahia e Rio de Janeiro, em quase duas décadas de amizade...
À amiga Márcia Matos, que em o pouco tempo veio ocupar um lugarzinho
muito especial no meu coração. Neste dois anos de mestrado pudemos trocar
experiências, alegrias, tristezas, angústias e conquistas... Amiga, conseguimos,
acabou!
Às amigas de turma, Letícia, Ana Raquel e Ana Paula, pelo apoio e carinho.
A toda minha turma do mestrado, pelo carinho e cuidado comigo e meu filho
Davi, que desde o ventre foi muito amado e respeitado por todos. O nosso muito
Obrigado!!!!!
Aos bolsistas Gabriela, Michele, Camila e Fábio pela disposição e dedicação
atribuída à transcrição das entrevistas realizadas.
A todo o grupo de pesquisa ―A Promoção da Saúde de Grupos Populacionais‖
que, de forma direta e indireta, contribuíram na construção deste trabalho.
A todos os amigos que me apoiaram e torceram por mim.
Aos mestrandos do primeiro ano, Maria, Monique e Leandro pessoas
boníssimas!!!!!
Ao Cnpq, por incentivar à pesquisa em nosso país, que tanto carece de
investimentos científicos.
7
Nada existe em caráter permanente, a não ser a mudança.
Heráclito (501 a.C.).
8
RESUMO
SILVA, Érika Machado Pinto da. Representações sociais da Aids para pessoas
que vivem com HIV e suas interfaces cotidianas. 2010.195 f. Dissertação
(Mestrado em Enfermagem) Faculdade de Enfermagem, Universidade do Estado
do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2010.
O presente estudo teve como objetivo descrever o conteúdo das
representações sociais acerca da Aids para os usuários soropositivos em
acompanhamento ambulatorial da rede pública de saúde e analisar a interface das
representações sociais da Aids com o cotidiano dos indivíduos que vivem com o
HIV, especialmente no que concerne à sua organização e ao processo de adesão ao
tratamento. Trata-se de um estudo exploratório-descritivo, pautado na abordagem
qualitativa e orientado pela Teoria das Representações Sociais. Os sujeitos
consistiram em 30 usuários em acompanhamento ambulatorial de um Hospital
Público Municipal localizado na cidade do Rio de Janeiro referenciado para clientes
soropositivos ao HIV/Aids. Os dados foram coletados por meio de entrevista e
analisados através da análise de conteúdo. Como resultados, emergiram 6
categorias, quais sejam: Elementos de memória da Ancoragem da Aids na
sociedade e o seu processo de transformação, onde foi explicitada a ancoragem da
Aids no outro, na África, no macaco, no homossexual e uma nova ancoragem
apresentada consiste na cronicidade do diabetes, deixando a síndrome de ser
sinônimo de morte; Transmissão e Prevenção da Aids segundo as pessoas que
convivem com a síndrome, na qual os sujeitos apresentaram quase todas as formas
cientificamente comprovadas quanto aos meios de transmissão do vírus HIV; O
cotidiano dos indivíduos soropositivos permeado pelo processo de vulnerabilidade
ao HIV, no âmbito do qual entende-se que o reconhecimento do risco individual
frente à epidemia irá influenciar, sobretudo, as práticas e os comportamentos das
pessoas; Discriminação e ocultamento no conviver com o HIV, onde se apresenta
como estratégias de sobrevivência social o ocultamento do estado de
soropositividade ao HIV. Assim, podem continuar a vida como pessoas consideradas
normais, sem serem acusadas e discriminadas, sejam no âmbito familiar, social ou
no trabalho; além disso, os sujeitos do estudo declararam que eram preconceituosos
antes do diagnóstico; o processo de adesão ao tratamento na cotidianidade de
indivíduos soropositivos, observando-se, nesta categoria, que um dos grandes
motivadores da adesão ao tratamento consiste no fato dos usuários acreditarem no
resultado positivo da terapêutica; o enfrentamento cotidiano experiênciado pelos
sujeitos que convivem com o HIV, onde a forma como os sujeitos organizam o seu
cotidiano para enfrentar e conviver com o HIV reflete diretamente em suas atitudes e
em suas práticas, tanto no processo da adesão, como nas relações sociais (o outro)
e, principalmente, na relação individual (o eu). Conclui-se que a representação social
da Aids apresenta-se multifacetada e dependente do contexto histórico e social no
qual o indivíduo está inserido, seus valores, cultura, nível de informação e
conhecimento.
Palavras-chave: Representação Social. HIV. Aids. Doença crônica.
9
ABSTRACT
The current study had as its purpose describes the content of the social
representations concerning to AIDS for the serum positive users with ambulatorial
attendance of the public health system and to analyze the interface of the social
representations of AIDS with the daily routine of the individuals who live with HIV,
particularly in what concerns to its organization and to its process of adhesion to the
treatment. It attends of an exploratory descriptive study, ruled in the qualitative
approach and guided by the Theory of the Social Representations. The subjects
consisted of 30 users with ambulatorial attendance of a Municipal Public Hospital
located in the Rio de Janeiro City referenced for serum positive customers
concerning to HIV/AIDS. The data were collected through interview and analyzed
through the analysis of great content. As results, emerged 6 categories, as they
follow: Elements of memory of the Anchoragement of the Aids in the society and its
process of transformation, where it was explicated the anchoragement of Aids in the
other one, in Africa, in the monkey, in the homosexual and a new presented
anchoragement consists in the chronicity of the diabetes, omitting the syndrome of
being synonymous of death; Transmission and Prevention of the Aids according to
the people that live together with the syndrome, in which the subjects presented
almost all the ways scientifically confirmed according to the ways of the HIV virus
transmission; The day by day of the serum-positive individuals permeated by the
vulnerability to the HIV virus, at the range in which gets along with the recognition of
the individual risk heading to the epidemy will influence, overall, the practices and the
people‘s behaviors; Discrimination and concealing in living with the HIV virus, where
its introduces as strategies of social survival the concealing of the serum positive
state to the HIV virus. In such case, it can be continued the life as people being
considered as normal ones, without being accused and discriminated, whatever in
the familiar range, social or at work; moreover, the subjects of the study declared that
they were prejudiced before the diagnosis; the process of adhesion to the treatments
concerning to the serum positive individuals day by day routine, observing, in this
category, that one of the greatest inciters of the adhesion to the treatment consists in
the fact of the users make believing in the positive result of the therapeutics; the daily
facing experienced by the subjects who live with the HIV virus, where the way they
organize their own day by day to face and to live together with the HIV virus reflects
directly in their attitudes and also in their practices, such as in the adhesion process,
or as in the social relations (the other one) and, essentially, in the individual relation
(the ones themselves). It follows that the social representation of the Aids presents
itself multifaced and depends on the historical and social context in what the
individual is filled in, their values, culture, level of information and knowledge.
Keywords: Social Representation. HIV. Aids. Chronic Disease.
10
LISTA DE TABELAS
Tabela 1 -
Tabela 2
Tabela 3
Tabela 4
Tabela 5
Tabela 6
Tabela 7
Tabela 8
Tabela 9
Tabela 10 -
Tabela 11
Tabela 12
Tabela 13
Tabela 14
Tabela 15
Distribuição dos sujeitos do estudo de acordo com o sexo.
Rio de Janeiro, 2009 .................................................................
Distribuição dos sujeitos do estudo segundo a idade e o sexo.
Rio de Janeiro, 2009 .................................................................
Distribuição dos sujeitos do estudo conforme o estado
conjugal e marital atual. Rio de Janeiro, 2009 ..........................
Distribuição dos sujeitos do estudo conforme o número de
filhos. Rio de Janeiro, 2009 ......................................................
Distribuição dos sujeitos do estudo de acordo com a situação
de moradia. Rio de Janeiro, 2009 .............................................
Distribuição dos sujeitos do estudo conforme número de
pessoas que moram juntas. Rio de Janeiro, 2009 ...................
Distribuição dos sujeitos conforme escolaridade. Rio de
Janeiro, 2009 . ..........................................................................
Distribuição dos sujeitos conforme situação no trabalho. Rio
de Janeiro, 2009 .......................................................................
Distribuição dos sujeitos conforme renda pessoal mensal. Rio
de Janeiro, 2009 .......................................................................
Distribuição dos sujeitos conforme o tempo de diagnóstico.
Rio de Janeiro, 2009 .................................................................
Distribuição dos sujeitos conforme o tempo de atendimento
na unidade de saúde da pesquisa. Rio de Janeiro, 2009 .........
Distribuição dos sujeitos conforme o tempo de utilização dos
antirretrovirais. Rio de Janeiro, 2009 .......................................
Distribuição dos sujeitos conforme mudança na terapia
medicamentosa. Rio de Janeiro, 2009 .....................................
Distribuição dos sujeitos conforme as principais fontes de
acesso à informação sobre HIV/Aids. Rio de Janeiro, 2009 ....
Distribuição dos sujeitos conforme a tendência sexual. Rio de
Janeiro, 2009 ............................................................................
55
57
58
58
59
59
60
61
63
63
64
65
65
66
66
11
Tabela 16
Distribuição dos sujeitos de acordo com a religião. Rio de
Janeiro, 2009 ............................................................................
67
12
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
AIDS -
Síndrome da Imunodeficiência Adquirida
ATR -
Antiretroviral
CDC -
Centers for Disease Control and Prevention
CNS -
Conselho Nacional de Saúde
DST -
Doença Sexualmente Transmissível
HAART -
Highly Active Antiretroviral Therapy
HIV -
Vírus da Imunodeficiência Adquirida
RS -
Representações sociais
SAE -
Serviço de Assistência Especializada
SUS -
Sistema Único de Saúde
TARV -
Terapia Antiretroviral
TRS -
Teoria das Representações Sociais
UDI -
Usuários de Drogas Injetáveis
UR -
Unidade de Registro
13
SUMÁRIO
1
1.1
1.2
1.3
1.4
1.5
1.6
2
2.1
2.2
2.3
2.4
2.5
3
3.1
3.2
3.2.1
3.2.2
3.2.2.1
3.2.2.2
3.2.2.3
3.2.3
3.2.4
INTRODUÇÃO...................................................................................
REFERENCIAL TEÓRICO ...............................................................
A Teoria das Representações Sociais um breve histórico .........
As representações sociais da Aids ...............................................
HIV/Aids no Brasil aspectos históricos, políticos e
epidemiológicos ..............................................................................
HIV/Aids: aspectos sociais ............................................................
HIV/Aids: aspectos clínicos ...........................................................
Adesão terapêutica: um desafio diário..........................................
PERCURSO METODOLÓGICO .......................................................
Campo de estudo ............................................................................
Aspectos éticos da pesquisa ...............................................................
Os sujeitos do estudo ....................................................................
Coleta de dados ..............................................................................
Análise dos dados ..................................................................................
DESVELANDO A REPRESENTAÇÃO SOCIAL DA AIDS .............
Caracterização dos sujeitos ..........................................................
O conteúdo da representação social da Aids ..............................
Elementos de memória da ancoragem da Aids e seu processo de
transformação nas memórias e representações ...............................
Transmissão e prevenção da Aids segundo as pessoas que
convivem com o HIV..........................................................................
Meios de transmissão do vírus HIV segundo os soropositivos .........
Comportamento de risco e prevenção na perspectiva das pessoas
soropositivas .....................................................................................
Mitos relacionados à transmissão do vírus do HIV para os
indivíduos soropositivos ...................................................................
O cotidiano dos indivíduos soropositivos permeado pelo processo
de vulnerabilidade ao HIV .................................................................
Discriminação e ocultamento no conviver com o HIV........................
15
21
21
26
31
34
38
40
47
47
49
50
50
53
55
55
68
70
81
81
87
100
102
111
14
3.2.4.1
3.2.4.2
3.2.4.2.1
3.2.4.2.2
3.2.5
3.2.5.1
3.2.5.2
3.2.5.3
3.2.6
3.2.6.1
3.2.6.2
4
Ocultamento como estratégia de proteção .......................................
Preconceito e discriminação no conviver com o HIV ........................
O preconceito a partir do próprio sujeito soropositivo .......................
preconceito social vivenciado pelos sujeitos soropositivos ..............
O processo de adesão ao tratamento na cotidianidade de
indivíduos soropositivos ....................................................................
O tratamento como uma arma contra a morte no contexto da
representação social da Aids ............................................................
O cotidiano e o processo de adesão ao tratamento vivenciados
pelos sujeitos soropositivos ..............................................................
Religião e fé no processo da adesão ................................................
O enfrentamento cotidiano experienciado pelos sujeitos que
convivem com o HIV .........................................................................
Enfrentando os sentimentos negativos no conviver com o HIV ........
Há vida depois da Aids .....................................................................
CONSIDERAÇÕES FINAIS .............................................................
REFERÊNCIAS.................................................................................
APÊNDICE A - Termo de Consentimento de Livre e Esclarecido ..
APÊNDICE B - Instrumento de Caracterização dos Sujeitos ...........
APÊNDICE C - Roteiro de Entrevista com Usuários ........................
APÊNDICE D - Quadro de operacionalização da análise de
conteúdo ..........................................................................................................................
ANEXO - Parecer do Comitê de Ética do Sistema Municipal de
Saúde ...............................................................................................
112
117
118
121
128
129
134
140
141
142
149
156
163
176
177
180
181
195
15
INTRODUÇÃO
A Síndrome da Imunodeficiência adquirida (AIDS) tem se configurado como
um dos sérios problemas de saúde pública, caracterizando-se como uma epidemia
global com rápida disseminação e agravamento. Neste contexto, exige resposta
premente e a necessidade de criação de recursos econômicos, políticos, sociais e
psicológicos que faça frente a uma problemática com tal magnitude.
No início da epidemia, ainda na década de 80, a Aids era considerada no
conhecimento reificado como uma doença que atingia um grupo restrito, o
denominado ―grupo de risco‖, dos quais faziam parte homossexuais, hemofílicos,
haitianos e heroínômanos, caracterizando a síndrome como a doença dos quatro H.
O uso da expressão grupo de risco, embora comum no âmbito da epidemiologia,
marcaria de forma considerável a construção histórica, cultural, imaginária e social
da Aids. (BARBARÁ; SACHETTI; CREPALDI, 2005; BASTOS; SZWARCWALD,
2000; OLIVEIRA et al., 2007).
Um segundo momento de resposta à epidemia foi caracterizado como
―comportamento de risco‖, em que qualquer pessoa poderia adotar um
comportamento de risco e se expor ao Vírus da Imunodeficiência Adquirida (HIV).
Este modelo foi fortemente criticado por culpabilizar o indivíduo por ter falhado nos
esforços de prevenção. No entanto, atualmente, o conceito de comportamento de
risco foi substituído pelo de vulnerabilidade, onde a chance de exposição das
pessoas ao HIV e ao adoecimento pela Aids não é resultante apenas de um
conjunto de aspectos apenas individuais, mas também coletivos e contextuais, que
acarretam maior suscetibilidade à infecção e ao adoecimento e, de modo
inseparável, maior ou menor disponibilidade de recursos de todas as ordens para se
proteger de ambos. (AYRES et al., 2006).
Determinados autores, como Parker e Camargo Júnior (2000), por exemplo,
destacam a existência de uma conexão entre o subdesenvolvimento econômico e a
vulnerabilidade ao HIV/Aids. Com efeito, o próprio processo de desenvolvimento
cria, com frequência, formas de deslocamento social, as quais, por seu turno,
produzem ações e práticas sociais que aumentam o risco de infecção pelo HIV.
Tal situação ressalta a importância da criação de estratégias que não se
limitem a disponibilização de informações sobre a prevenção, com a chamada
16
―conscientização‖ da população sobre o problema. É preciso trabalhar as pré-
disposições culturais e os limites materiais para práticas protegidas (vulnerabilidade
sócio-econômica), assim como incrementar serviços e programas capazes de dar
acesso a essas discussões e aos meios preventivos disponíveis (vulnerabilidade
programática), para que, no plano de suas atitudes e práticas pessoais
(vulnerabilidade individual) as pessoas possam, de fato, ter atitudes que não
comprometam as suas vidas e a dos seus parceiros frente a Aids. (FIGUEIREDO;
AYRES, 2002).
Considerando as profundas desigualdades da sociedade brasileira, a
propagação da infecção pelo HIV no país revela a Aids como uma epidemia de
múltiplas dimensões que vem, ao longo do tempo, sofrendo transformações
significativas em seu perfil epidemiológico, sendo hoje marcada pela sua
feminização, heteressexualização, interiorização, envelhecimento, baixa
escolarização e pauperização (BARBARÁ; SACHETTI; CREPALDI, 2005; BASTOS;
SZWARCWALD, 2000). Ao refletir sobre a sua disseminação é preciso considerar as
transformações desta epidemia em seu contexto histórico, principalmente em
relação à sua forma de transmissão, às tendências de sua instabilidade e
vulnerabilidade e, também, aos significados construídos para enfrentar essa
realidade.
No que tange aos portadores, a compreensão inicial de que eram
responsáveis pela situação em que se encontram e que, em função disto, são um
peso para a seguridade social e o sistema de saúde, conformou uma maneira
própria de se relacionar com a equipe profissional e com as instituições, diminuindo
a auto-estima e tornando-os objeto de favores e ajudas. (ESTEVES, 1997). Frente a
esta realidade, as pessoas soropositivas ao HIV, ainda convivem no seu cotidiano
com níveis excepcionalmente altos de estigma, discriminação, negação coletiva e
medo da morte, culminando em isolamento social. É importante considerar que tais
pessoas dependem de um tratamento medicamentoso que requer disciplina e
vontade de viver, ambos indispensáveis à adesão e ao sucesso do controle da
síndrome, melhorando assim a sua qualidade de vida.
Constituindo um processo de transformação nesta relação, é válido ressaltar
que, em 1996, foi implementada a política brasileira de distribuição gratuita e
universal de antirretrovirais, disposta na Lei 9.313, de 13 de novembro de 1996,
17
prevendo que todos os portadores do HIV e os doentes de Aids receberiam
gratuitamente do Sistema Único de Saúde (SUS), as medicações necessárias para o
seu tratamento. (BRASIL, 1996).
Nota-se que o restam dúvidas da importância da admissão dos
medicamentos que combatem o HIV, entretanto, somente disponibilizá-los às
pessoas com Aids não é suficiente, considerando que os rmacos apresentam
inúmeros efeitos adversos que, na grande maioria das vezes, dificultam a
manutenção da terapêutica. Assim, diante do impasse decorrente da eficácia do
tratamento e sua dificuldade de manutenção, a atenção da saúde pública hoje é
focada em parte, para a adesão aos antirretrovirais como meio relevante e
importante para a redução da mortalidade por Aids. (SCHAURICH; COELHO;
MOTTA, 2006).
Considerando que a adesão terapêutica apresenta-se como um desafio diário
enfrentado pelos sujeitos soropositivos, o Ministério da Saúde enfoca que não se
inicia a terapia até que os objetivos e a necessidade de adesão ao tratamento sejam
compreendidos e aceitos pelo usuário. Destaca-se que, entre os fatores que podem
contribuir para uma baixa adesão, estão a ocorrência de efeitos colaterais,
esquemas com posologias incompatíveis com a rotina diária do paciente, número
elevado de comprimidos/cápsulas, necessidade de restrição alimentar, falta de
entendimento da prescrição e falta de informação sobre as conseqncias da não-
adesão. (BRASIL, 2003).
Por conseguinte, a evolução dos conhecimentos e da utilização de
tecnologias cada vez mais eficazes fez com que a Aids tivesse sua história natural
alterada. Com um desfecho letal rápido nos primeiros casos descritos, a doença
assumiu caráter crônico e, atualmente, possui evolução prolongada, onde longos
períodos assintomáticos são interrompidos pelo surgimento de infecções
oportunistas (BRITO; CATILHO; SZWARCWALD; 2001). Neste sentido, o papel do
sistema de saúde é fundamental na vida destes atores sociais. Os serviços de saúde
precisam ter uma mínima estrutura para o acolhimento e o prosseguimento ao
tratamento destes usuários, seja ele em nível primário, secundário ou terciário. Os
profissionais de saúde devidamente qualificados são essenciais neste processo para
garantir uma terapêutica eficaz e promover processos de empoderamento social
daquelas pessoas que vivem com o HIV.
18
Entende-se aqui que a intervenção técnica necessita se articular com uma
compreensão mais abrangente do ser humano, gerando um cuidar que contemple
as diversas dimensões do ser humano. Este cuidado, contudo, como destacado
não se restringe somente à aplicação mecânica das tecnologias disponíveis para
alcançar um estado fisiológico e hemodinâmico estável, mas inclui o
estabelecimento de um diálogo entre os profissionais e os usuários que, mesmo
reconhecendo as diferenças existentes entre si, buscam meios de gerarem maior
qualidade de vida e maior controle de seu processo de tratamento (AYRES, 2004).
Um cuidado adequado às necessidades dos diferentes indivíduos exige do
profissional de saúde a capacidade de perceber e identificar as necessidades do
outro. Quanto mais sensível for a percepção do profissional tanto mais poderá
prestar o cuidado de acordo com as peculiaridades e as singularidades de cada
indivíduo. Neste contexto, a interação é o elo entre o cuidador e o ser cuidado e
permite, ao primeiro, a percepção e a identificação das necessidades do segundo
(BAGGIO, 2006). Ressalta-se que, no processo de adesão à terapêutica
medicamentosa, é essencial que toda a equipe esteja envolvida, estimulando as
pessoas que convivem com o HIV ou com a Aids a desempenharem o seu papel não
com a visão de paciente e sim de cidadão com voz ativa, que tem seu espaço no
mundo e seus direitos, destarte é essencial que correspondam ao tratamento
efetuando o autocuidado com responsabilidade e compromisso, respeitando e
valorizando, sobretudo a sua própria vida.
Em relação aos sujeitos soropositivos ao HIV, enfatiza-se ainda que este
cuidado requeira uma compreensão ainda mais ampla da equipe de saúde,
especialmente nas questões referentes aos aspectos históricos, políticos,
epidemiológicos e suas representações sociais construídas ao longo de quase três
décadas da síndrome. Essas representações realizaram uma reconstrução cognitiva,
cultural e social, a partir de representações que já fazem parte do cotidiano social.
Neste sentido, Moscovici (1981) considera as representações sociais como
uma série de opiniões, explicações e afirmações que são produzidas a partir do
cotidiano dos grupos, sendo a comunicação interpessoal fundamental no processo
de sua formação. Segundo Abric (2000), as representações se constituem em um
sistema que favorece a interpretação da realidade e que dirige as relações dos
19
indivíduos com o seu meio social, determinando assim seus comportamentos e as
suas práticas.
Entende-se que tais representações elaboradas sobre o HIV são resultantes
da interação entre dois universos, quais sejam, o reificado e o consensual, no qual
existe uma relação de influência mútua e permanente e, desta influência contínua,
resultam diversos significados. Estes significados, por sua vez, circulam através das
conversas cotidianas, dos meios de comunicação e sofrem influência direta da
mídia, sendo assimilados e reelaborados socialmente.
Frente ao exposto, percebe-se que a Teoria das Representações Sociais
(TRS) tem sido muito utilizada em estudos no campo da saúde, em especial na
temática HIV/Aids, pela sua apropriação aos objetos de estudo ligados aos
fenômenos sociais. Dentre as várias categorias profissionais no campo da saúde, a
enfermagem tem corroborado com destaque em pesquisas cujo referencial teórico
tem sido a citada teoria. Oliveira et al. (2007) confirmam este fato ao constatar que,
entre 1980 e 2006, 26,5% dos artigos publicados sobre a temática do HIV/Aids à luz
da TRS, foram produzidos por estes profissionais.
O presente estudo justifica-se por buscar compreender o universo
representacional e consensual dos usuários soropositivos ao HIV/Aids, em
acompanhamento ambulatorial. Dar voz a estes sujeitos que são os motivadores e
receptores das ações de saúde específicas para esta clientela permite conhecer os
seus anseios, medos, imagens, dificuldades, atitudes, barreiras e sentimentos
construídos diante de um diagnóstico que constitui de um fenômeno social que vem
sofrendo transformações ao longo de quase três décadas da síndrome.
Considerando que através da representação social, que é uma teoria do senso
comum, produzida pelas práticas interativas do cotidiano, pode-se, então, captar
uma realidade ora vivida por estes usuários. Conhecer as diversas facetas e as
nuances das experiências construídas no cotidiano destes sujeitos contribuirá para
melhorar a qualidade de vida daqueles que vivem com HIV/Aids, através de ações
em saúde mais adequado e satisfatório.
Entendendo que a Teoria das Representações Sociais seja apropriada para a
investigação desta temática, tem-se como objeto de estudo a representação social
da Aids para indivíduos que convivem com o HIV e são atendidos em ambulatório
especializado no atendimento ao HIV/Aids. Como objetivo geral delimitou-se
20
caracterizar as representações sociais da Aids para as pessoas soropositivas ao HIV
atendidos em um ambulatório da rede pública de saúde. Os objetivos específicos
foram definidos da seguinte maneira:
a. Descrever o conteúdo das representações sociais acerca da Aids
para os usuários soropositivos em acompanhamento ambulatorial
da rede pública de saúde;
b. Analisar a interface das representações sociais da Aids com o
cotidiano dos indivíduos que vivem com o HIV, especialmente no
que concerne à sua organização e ao processo de adesão ao
tratamento.
21
1 REFERENCIAL TEÓRICO
1.1 A Teoria das Representações Sociais - um breve histórico
A história da Teoria das Representações Sociais (TRS) insere-se na inter-
relação entre os atores sociais implicados, o fenômeno e o contexto que os rodeiam.
Constituem-se por processos sócio-cognitivos e têm implicações na vida cotidiana,
determinando a comunicação e os comportamentos que se estabelecem no dia-a-
dia. Desta forma, a representação pode ser considerada como um sistema de
interpretações da realidade, organizando as relações dos indivíduos com o mundo e
orientando suas condutas e os seus comportamentos no meio social.
A TRS é uma temática em construção que, décadas, vem sendo discutida
no meio científico. Destaca-se que não existe um conceito único de representações
sociais (RS). No entanto, o termo designa tanto um conjunto de fenômenos quanto o
conceito que os engloba e a teoria construída para explicá-los, identificando um
vasto campo de estudos psicossociológicos (SÁ, 1993). Um primeiro delineamento
formal do conceito e da teoria das RS surgiu no trabalho do psicólogo francês Serge
Moscovici intitulado La psychanalyse, son image et son public (1961, 1976), a
propósito do fenômeno da socialização da psicanálise na França na segunda
metade do século passado. (SÁ, 1993).
Durkheim, em 1898, distinguia a representação individual e coletiva. A
representação individual tem por substrato a consciência de cada um, enquanto as
coletivas, a sociedade em sua totalidade. Assim, estas não são o denominador
comum daquelas, mas antes sua origem, correspondendo à maneira pelo qual esse
ser especial, que é a sociedade, pensa as coisas de sua própria experiência.
Compreende-se que tal representação seja homogênea e vivida por todos os
membros de um grupo, da mesma forma que partilham uma língua. Neste sentido,
ela tem por função preservar o vínculo entre eles, prepará-los para pensar e agir de
modo uniforme. (MOSCOVICI, 2001).
Lévy-Bruhl, em 1951, em seu estudo sobre a sociedade e suas
representações, definiu a sociedade humana em dois pólos distintos, a sociedade
22
primitiva e a civilizada. Este autor considera o pensamento primitivo sem
consistência científico, voltado para o sobrenatural: os nculos que entrevê entre os
fenômenos são de natureza mística. O pensamento civilizado, por sua vez, se
orienta pela lógica das informações relativas a um fenômeno e às causas que
servem para explicá-lo. Estes pensamentos se diferem tanto no plano qualitativo
quanto em sua amplitude. (MOSCOVICI, 2001).
A dualidade que Lévy-Bruhl institui entre as duas culturas a primitiva e a
civilizada é restabelecida por Piaget no interior da nossa cultura como efeito de
uma espécie de história natural, que vai do mundo da criança ao do adulto
(MOSCOVICI, 2001). Do mesmo modo que o mundo primitivo e o civilizado se
distinguem por suas representações, elas servem para distinguir o mundo da criança
e do adulto. Neste sentido Piaget em 1972, descrevia esta temática:
As duas questões se tocam de perto, mas podem, sem muita arbitrariedade, ser
diferenciadas. Ora, a forma e o funcionamento do pensamento se desvelam cada
vez que a criança entra em contato com seus semelhantes ou com o adulto: é uma
maneira de comportamento social que pode ser observado de fora. O conteúdo, ao
contrário, se liberta ou não, segundo as crianças e os objetos de fora. (MOSCOVICI
apud PIAGET 2001, p. 53).
A antropologia e a psicologia da criança visam uma comparação e uma
genealogia das formas cognitivas, indo do pensamento mítico ao científico, do
conhecimento folclórico ao racional ou do ―pensamento operatório concreto ao
pensamento operatório formal‖. A revolução provocada pelos meios de comunicação
de massa e a difusão dos saberes científicos e técnicos transformam os modos de
pensamento e criam conteúdos novos. Entretanto, a própria noção mudou com as
representações coletivas cedendo lugar para as representações sociais.
(MOSCOVICI, 2001).
Moscovici propõe a criação de dois tipos de universos de pensamento: o
reificado que é caracterizado por objetividade, rigor lógico e metodológico,
compreendendo um mundo restrito e, no consensual, vêem-se as teorias do senso
comum e encontram-se as práticas interativas do dia-a-dia, onde são produzidas e
circulam as representações sociais sem limites especializados, menos sensíveis à
objetividade e mais a sentimentos compartilhados de plausibilidade. No reificado, a
sociedade é vista como um sistema de diferentes papéis e classes, cujos membros
são desiguais. No consensual, ela é percebida como um grupo de pessoas iguais e
livres, cada um com possibilidade de falar em nome do grupo. (MOSCOVICI, 2003;
SÁ, 1993).
23
Os mundos reificados aumentam com o desenvolvimento da ciência. Na
medida em que as teorias, informações e acontecimentos se multiplicam, os mundos
devem ser duplicados e reproduzidos a um nível mais imediato e acessível e estes
são transferidos aos mundos consensuais, circunscritos e re-apresentado. Dentro
deste contexto, Moscovici questiona que antes a ciência era baseada no senso
comum, mas agora o senso comum é a ciência tornada comum. Para ele e neste
contexto dinâmico da sociedade, os processos da ancoragem e da objetivação irão
gerar a representação social. (MOSCOVICI, 2003).
Nas sociedades modernas, o novo é normalmente gerado ou trazido à luz por
meio dos universos reificados da ciência, da tecnologia ou das profissões
especializadas. Uma realidade social, a partir das representações sociais, é criada
apenas quando o novo ou o não familiar vem a ser incorporado aos universos
consensuais. Como considera Sá (1993, p. 37), ―aí operam os processos pelos quais
ele passa a ser familiar, perde a novidade e torna-se socialmente conhecido e real‖.
A ancoragem é um processo que transforma algo estranho, perturbador e
intrigante em um sistema particular de categorias e os compara com um paradigma
de uma categoria que seja apropriada. Neste processo, classifica-se e dá-se um
nome a alguma coisa. Uma das lições que a epistemologia contemporânea ensina é
que todo sistema de categorias pressupõe uma teoria que o defina e o especifique e
especifique, inclusive, seu uso. (MOSCOVICI, 2003).
A ancoragem, segundo Jodelet (2001), consiste na integração cognitiva do
objeto, sejam ideias, acontecimentos, pessoas e relações a um sistema de
pensamento social preexistente e nas transformações implicadas (SÁ, 1993). Para
Nóbrega (2001, p. 68), ―a ancoragem está dialeticamente articulada à objetivação,
para assegurar as três funções fundamentais da representação: Incorporação do
estranho ou do novo, interpretação da realidade e orientação dos comportamentos‖.
A objetivação une a ideia de não familiaridade com a de realidade e torna-se
a verdadeira essência da realidade. Objetivar é desvendar a qualidade icônica de
uma ideia ou ser impreciso; é reproduzir um conceito em uma imagem. A
objetivação permite organizar os elementos constituintes da representação e ao
percurso através do qual tais elementos adquirem materialidade e se tornam
expressões de uma realidade pensada como natural. (MOSCOVICI, 2003; VALA,
2000).
24
Este processo envolve três momentos: construção seletiva, esquematização e
naturalização. A construção seletiva consiste em um processo, num primeiro
momento, onde as informações, crenças e ideias acerca do objeto da representação
sofrem um processo de seleção e de descontextualização. A esquematização
estruturante são noções que constituirão relações padronizadas e estruturadas de
conhecimento que irão formar a representação social. A explicação sobre um
determinado fenômeno vai se estruturando e se tornando socializada para
determinado grupo. Na naturalização, a percepção do grupo é encarada como
realidade e materialidade. Os grupos vão explicar os fenômenos que acontecem no
mundo, a partir das imagens e metáforas que este mesmo grupo tem sobre a
realidade. (VALA, 2000).
Pode-se considerar que o social gera as representações sociais. Este ponto
de vista coloca diferentemente os liames entre o psicológico e o social, porque os
intercâmbios e as interações sociais contribuem à estruturação do pensamento.
Desta forma, Jodelet (2001) define representações sociais como um conhecimento
socialmente elaborado e partilhado com um objetivo prático e que contribui para a
construção de uma realidade comum a um grupo social. Pode ser igualmente
designada como saber de senso comum ou ainda saber ingênuo, ou seja, natural. A
autora (p. 22) ainda aponta que ―reconhece-se que as representações sociais
enquanto sistema de interpretação que regem nossa relação com o mundo e com os
outros orientem e organizam as condutas e as comunicações sociais‖.
Wagner (2000), ao escrever sobre a representação social, adverte que alguns
pesquisadores empregam o conceito de forma mais pragmática, usando-o para
significar um conjunto estruturado de opiniões e atitudes, enquanto outros aderem a
uma posição mais teoricamente justificada. Esta diversidade é provavelmente devida
às múltiplas facetas do próprio conceito de representação social. Para este autor, a
―representação social é um conteúdo mental estruturado, isto é, cognitivo, avaliativo,
afetivo e simbólico sobre um fenômeno social relevante que toma a forma de
imagens ou metáforas e que é conscientemente compartilhado com outros membros
do grupo social‖. (WAGNER, 2000, p. 4).
Abric (2000), por sua vez, define representação social como uma forma de
visão global e unitária de um objeto, mas também de um sujeito. Esta representação
reestrutura a realidade para permitir a integração das características objetivas do
25
objeto, das experiências anteriores do sujeito e do seu sistema de atitudes e de
normas. Assim, pode-se considerar que ―a representação social é um guia para a
ação, ela orienta as ações e as relações sociais‖. (ABRIC, 2000, p. 28).
Wagner (2000), ao parafrasear Sperber e Wilson, explana que as
representações sociais referem-se apenas a objetos ou questões socialmente
relevantes, capazes de alterar o padrão de comportamento dos indivíduos ou de
grupos em sua presença. Abric (2000) afirma que o objeto está inscrito num contexto
concebido pela pessoa ou pelo grupo, pelo menos parcialmente, enquanto
prolongamento do seu comportamento, de suas atitudes e das normas às quais ele
se refere.
A definição do par sujeito-objeto de uma pesquisa, segundo Sá (1998),
precisa ter em mente que a representação que os liga é um saber efetivamente
praticado que não deve ser apenas suposto, mas sim detectado em comportamentos
e comunicações que de fato ocorrem sistematicamente. Nóbrega (2001) comenta
que as teorias psicológicas funcionalistas colocam em oposição sujeito e objeto,
interior e exterior, estímulo e resposta, para compreender os fenômenos relativos às
atitudes, opiniões e imagens. E acrescenta:
Toda representação é constituída na relação do sujeito com o objeto representado,
não existe, portanto, representação sem objeto. Desse modo, uma representação
social não pode ser compreendida enquanto processo cognitivo individual, que é
produzida no intercâmbio das relações e comunicações sociais. (NÓBREGA, 2001,
p. 62).
Ao refletir a natureza das regras e dos elos sociais, a representação é
prescritiva de comportamentos ou de práticas obrigatórias. Ela define o que é lícito,
tolerável ou inaceitável em um dado contexto social. Ela preserva e justifica as
diferenças sociais e pode estereotipar as relações entre os grupos, contribuir para a
discriminação ou para a manutenção da distância social entre eles. Abric (2000)
relembra Doise afirmando que as representações intergrupais m, por função
essencial, a justificativa dos comportamentos adotados face ao outro grupo.
O indivíduo tanto é um agente de mudança na sociedade como é um produto
desta sociedade, o que irá refletir nas condutas, escolhas e respostas a diferentes
situações e contextos sociais. Como bem ressaltam Marques, Oliveira e Gomes
(2004, p. 93),
uma estreita relação entre as representações sociais e o contexto de vida dos
sujeitos. O aspecto histórico, social, ideológico, as características individuais e todos
os fatores que influenciam o comportamento e o pensar dos grupos estão
diretamente relacionado à produção, circulação e estabilidade das representações
26
sociais. Assim, as representações sociais têm como fundamento o indivíduo e os
grupos sociais e só podem ser construídas a partir dos mesmos, enquanto vivenciam
a tensão entre sua objetividade e subjetividade, vivência esta contextualizada num
determinado meio histórico e social.
Jodelet (2001) destaca que as representações sociais se agrupam em
conjuntos de significados e, desta forma, os acontecimentos do cotidiano são
interpretados, gerando um sentido aos fatos novos ou desconhecidos e auxiliando
na classificação e ordenação dos fenômenos vivenciados na sociedade. Elas são
uma forma de conhecimento que se universaliza como senso comum,
desenvolvendo um saber geral e funcional para as pessoas. O que se denomina de
pensamento ingênuo ou espontâneo é estabelecido a partir das experiências e
conhecimentos que são recebidos e transmitidos através da cultura, da comunicação
social e da educação. (OLTRAMARI, 2003).
1.2 As representações sociais da Aids
Considerando a importância dos estudos sobre representações sociais das
doenças, considera-se que a AIDS apresenta-se como um fenômeno social
complexo no qual se envolve diversas variáveis que vão além dos aspectos
epidemiológicos (GALVÃO, 2000). A Teoria das Representações Sociais tem sido
muito utilizada para tentar explicar a problemática social da AIDS. Segundo Herzlich
(1991), a representação social dá sentido para uma doença que os sujeitos
representam. Para esta autora, as pessoas orientam suas condutas a partir das
representações que têm sobre as doenças que possuem. Isto acontece porque a
representação social da doença se inscreve em uma experiência humana que
possui uma série de significados.
Jodelet (2001) descreve a Aids como um fenômeno do início dos anos 80,
sendo portanto, a primeira doença cuja história médica e social se desenvolveram
simultaneamente. Sontag (2007), por sua vez, ressalta que, desde o seu surgimento
no ocidente, a Aids representou, para a sociedade, mais que uma simples doença,
mas tornou-se rapidamente um fenômeno social que veio a ocupar o lugar de uma
das doenças mais estigmatizante da sociedade, assim como foi o câncer e havia
sido a sífilis, a hanseníase e a peste, entre outras doenças infecto-contagiosas.
27
A ausência de referências médicas favoreceu uma caracterização social da
doença. Antes que a pesquisa biológica apresentasse esclarecimentos sobre a
natureza da Aids, as pessoas elaboraram teorias apoiadas nos dados de que
dispunham relativos aos portadores (drogados, hemofílicos, homossexuais e
receptores de transfusões) e aos vetores do mal (sangue e esperma). O
conhecimento elaborado socialmente sobre a transmissão do HIV e de suas vítimas
favoreceu a eclosão de duas concepções: Uma do tipo moral e social, outra do tipo
biológico. Tais concepções influenciaram sobremaneira os comportamentos, nas
relações íntimas ou para com as pessoas afetadas pela Aids. (JODELET, 2001).
O papel das representações na evolução histórica da epidemia da Aids no
Brasil é muito relevante, uma vez que primeiro apareceu como um fenômeno da
mídia e depois se tornou uma evidência médica (PARKER et al., 1994). Desta
forma, certamente, o primeiro impacto da Aids no Brasil ocorreu, especialmente no
imaginário social. Antes de registros médicos de qualquer caso de Aids, a imprensa,
sobretudo a sensacionalista, marcava o advento da ―peste gay‖ no Brasil como algo
inevitável. Este foi o recurso usado para se referir a uma epidemia ora real e distante
e, ao mesmo tempo, mortal, sexual, concreta e enigmática. Portanto, a Aids, no
primeiro instante, foi introduzida de fato como ―mal de folhetim‖, produzindo efeitos
materiais de longo alcance percebidos até hoje, quase três décadas após este
impacto. (DANIEL, 1991).
A caracterização inicial da Aids apresentada à população pela ciência médica
e amplamente reforçada pela mídia incluía domínios de fortes investimentos afetivos
configurados pela morte, pelo contágio e pelo sexo. No início, resumia em uma sigla,
uma convenção para designar uma doença, a Aids que, no entanto, ganha vida
própria no imaginário da população nos diversos contextos sociais. (BARBARÁ;
SACHETTI; CREPALDI, 2005).
No Brasil, os primeiros casos de Aids foram detectados em homossexuais
masculinos, muito dos quais moraram fora do país e suponha-se, em função disto,
que estes tivessem adquirido o vírus em outros países. Portanto, eram considerados
em geral, indivíduos relativamente ricos, que dividiam o tempo entre o Rio de Janeiro
e São Paulo e grandes cidades estrangeiras como Nova York e Paris. Além disso, os
mesmos foram caracterizados promíscuos, nas suas condutas sexuais e imorais, e
28
esta representação rapidamente se tornou central no imaginário social. (DANIEL,
1991).
Herzlich (1992) argumenta que à imprecisão dos meios de transmissão do
―câncer gay‖ ou da síndrome homossexual levou as pessoas a acreditarem somente
na homossexualidade como o único conteúdo explicativo da síndrome, desfazendo-
se dos meios sociais que os homossexuais pertencem e a diversidade dos modos de
vida pelos quais estruturam sua identidade.
Oliveira e Costa (2007) partiram da hipótese que as normas sociais em jogo
em determinado contexto podem determinar o mascaramento de certas facetas
contra-normativas na explicitação da representação social acerca de objetos mais
sensíveis, como a Aids. Desta maneira, optaram como estratégia metodológica a
técnica de evocação livre e a de substituição que objetiva a diminuição das pressões
normativas sobre o grupo estudado por meio do deslocamento dos sujeitos do
contexto marcado pela normatividade, o que permite uma redução da implicação
destes em relação ao discurso produzido. Os sujeitos do estudo foram 150
enfermeiros de um hospital universitário do município do Rio de Janeiro aos quais
foram solicitados que produzissem cinco palavras ou expressões ao termo indutor
―portador do HIV/AIDS‖.
Os autores identificaram como características centrais as cognições, cuidado-
precaução-profssional, o que remete à proteção do profissional diante da exposição
à infecção pelo HIV no trabalho, educação-saúde, em relação às práticas de
educação em saúde, e tratamento. Na forma de substituição foram observadas como
cognições centrais, homossexualidade, medo e preconceito, que incidem em termos
com caráter mais normativo, originado do sistema de valores dos indivíduos,
promulgando uma dimensão basicamente social, pois se ligam à historia e à
ideologia do grupo. Portanto, após quase três décadas da síndrome no Brasil a
imagem da Aids permanece associada a grupo de risco, principalmente os
homossexuais masculinos.
Para Joffe (2008), a Aids tem sido ligada à culpabilidade de determinados
grupos sociais; estes são representados como ―outros‖. As representações sociais
da Aids e a disseminação da epidemia são atribuídas à ―condição estrangeira e ao
outro‖. Nesta perspectiva, um determinado grupo que se considere imune de adquirir
o vírus, classificam os outros como de risco, rotulando-os como perigosos. Neste
29
estudo, a autora ressalta que as pessoas com Aids são estigmatizadas como
estando em falta ou dignas de acusação por terem adquirido o vírus.
Neste sentido, a autora acrescenta que a síndrome está representada em
termos de sexualidade inter-racial, portanto surge sempre como responsabilidade de
grupos externos ao seu próprio. Entende-se que a projeção da responsabilidade
sobre grupos estranhos é uma forma de defender e de afastar o próprio grupo e o eu
da aids, deixando intacta a sensação de controle. (JOFFE, 2008).
Oltramari (2003) diz que existe um consenso entre as representações sobre
a AIDS e os conhecimentos que cada grupo elabora através das relações sociais e
de comunicação e estas são elaborados historicamente através de objetos
simbólicos. As crenças, os valores, a cultura e as normas sociais são importantes
para o estudo das representações sociais, pois através deles os comportamentos
sofrem influências e transformam-se em ação. Desta forma, os preconceitos e as
normas sociais são fatores importantes para o campo de análise social.
Sontag (2007) classifica a Aids como uma peste, semelhante à sífilis, que se
transmite especialmente pela via sexual e que pode levar a morte. Para esta autora,
a Aids é uma doença maléfica como um castigo que afeta um grupo perigoso de
pessoas ‗diferentes‘ e que por elas é transmitido. Neste sentido, a síndrome ataca os
já estigmatizados numa proporção ainda maior, assim como ocorria com o câncer.
Marques, Oliveira e Gomes (2004), ao estudarem Aids e representações
socias em subgrupos de trabalhadores de um hospital universitário do estado do Rio
de Janeiro, cuja amostra totalizou 366 sujeitos, sendo 221 profissionais de
enfermagem e 145 da área técnico-administrativa. Neste estudo, utilizou-se a técnica
de evocação livre e o termo indutor utilizado foi Aids. Identificou-se que o significado
da Aids para estes servidores é fortemente marcado por elementos negativos, tais
como medo, morte, preconceito e sofrimento constituindo os elementos centrais da
representação.
Oltramari (2003), ao parafrasear o estudo de Avi, destaca que a
representação social de um determinado grupo não muda de imediato com a
informação . Essa pesquisa sobre as representações da AIDS para profissionais de
saúde identificou que mesmo para profissionais qualificados e capacitados para
trabalharem com a temática, as representações mais comuns, em relação à
infecção, foram atribuídas à morte e de que a AIDS ainda pertence a determinados
30
grupos de risco. Foi percebido que os entrevistados discriminam as pessoas que
contraíram o HIV e que esta possibilidade é nula em seu grupo. O medo surgiu como
figura de negação e apareceu de forma clara nas entrevistas, expresso de maneiras
diferentes por cada um dos entrevistados.
Thiengo, Oliveira e Rodrigues (2005) estudaram a representação social da
Aids entre adolescentes, alguns soropositivos e outros não. A pesquisa foi
desenvolvida no ambulatório de um Hospital universitário do estado do Rio de
Janeiro. A amostra constituiu de 15 sujeitos e foi utilizada a entrevista semi-diretiva
para a coleta dos dados. Os resultados apontaram que os adolescentes associam a
Aids como uma doença, ria, contagiosa, sexualmente transmissível, incurável e
que mata. Estão presentes também em seus discursos a palavra rejeição,
discriminação e preconceito. Quanto às formas de contágio, destacaram a relação
sexual, o uso de drogas injetáveis e a transfusão de sangue. No que tange à
prevenção, eles destacaram: evitar grupos de risco, a necessidade do uso de
preservativos, a realização de exame periódico e o uso de seringa descartável.
As representações sociais da Aids dependem do conhecimento elaborado por
cada grupo, que é influenciado pelas relações sociais, os meios de comunicação e a
cultura, estas são construídas historicamente através de objetos simbólicos. As
representações sociais emergem na vida cotidiana de forma dinâmica, influenciando
as normas sociais e a atitude dos grupos que se organizam de acordo com tais
representações. Como exemplo podemos citar as lógicas de prevenção da Aids, que
vem sendo incorporado pela sociedade a partir das representações sociais. Para
Oltramari (2003), as doenças serão reconstruídas de acordo com o momento
histórico e dos grupos sociais que formulam as suas representações sociais.
Torres e Camargo (2008) ressaltam que, para as pessoas que convivem com
outras que são portadoras do vírus HIV, a representação social da aids adquire o
conteúdo de doença crônica, incurável e, ainda, ligada à morte. para as pessoas
soropositivas assintomáticas entendem que existe a possibilidade de viver sem
manifestar a síndrome mediante o uso das medicações antirretrovirais.
31
1.3 HIV/Aids no Brasil: aspectos históricos, políticos e epidemiológicos
Desde a sua descoberta no início da década de 80, a epidemia de HIV/Aids
tem preocupado as autoridades do mundo inteiro. Em princípio, identificada como
uma síndrome que ficou conhecida mundialmente pela sigla em inglês AIDS
(Acquired Immunodeficiency Syndrome), esta epidemia ocasionou significativas
mudanças não na área da saúde como em outros campos, acarretando desafios
para a área científica, envolvendo novos atores sociais e emanando mecanismos
locais, nacionais e globais de elaboração, apropriação e disseminação de
conhecimentos relacionados a ela. (GALVÃO, 2000).
No Brasil, a Aids foi identificada pela primeira vez em 1982, quando sete
pacientes homo/bissexuais foram notificados. Se considerar o período de incubação
do vírus do HIV, podemos deduzir que a introdução deste vírus no país deve ter
ocorrido no final da década de 70. Em um primeiro momento, sua difusão na
primeira metade dos anos 80 se propagou para as principais áreas metropolitanas
do centro-sul, seguindo um processo de disseminação para as diversas regiões do
país. (CASTILHO; CHEQUER,1997; DANIEL,1991).
De acordo com o Boletim epidemiológico AIDS/DST 2007 (BRASIL, 2007a),
de 1980 a junho de 2007, foram notificados 474.273 casos de aids no país, 289.074
no Sudeste, 89.250 no Sul, 53.089 no Nordeste, 26.757 no Centro Oeste e 16.103
no Norte. Em todo o país e, em especial, nas regiões Sul, Sudeste e Centro Oeste, a
incidência de aids tende à estabilização. No Norte e Nordeste, no entanto, a
tendência é de crescimento. A diretora do Programa Nacional de DST e Aids,
Mariângela Simão, reconhece que os números refletem as desigualdades regionais.
Atualmente, 33,2 milhões de pessoas vivem com HIV em todo mundo. Só em
2007 ocorreram 2,5 milhões de novas infecções pelo HIV. O Brasil registrou 192.709
óbitos por Aids, de 1980 a 2006. É importante enfatizar que o Brasil tem um terço
das pessoas que vivem com HIV na América Latina. (BRASIL, 2007a).
No país, destaca-se a diminuição da prevalência em usuários de drogas
injetáveis (UDI), relacionada aos programadas de redução de danos e o aumento em
mulheres, cuja infecção é atribuída principalmente ao comportamento sexual de
seus parceiros. Em homens com mais de 13 anos, observa-se, na série histórica,
crescimento da epidemia em heterossexuais, estabilização entre homossexuais e
32
bissexuais e redução entre usuários de drogas injetáveis (UDI). Em homo/bissexuais
jovens, no entanto, a tendência é de crescimento. (BRASIL, 2007a).
Considerando dados preliminares, em 2006, foram registrados 32.628 casos
da doença, confirmando uma tendência de queda no número de casos, identificada
a partir de 2002, quando houve 38.816 notificados. Naquele ano, a taxa de
incidência da aids foi de 22,2 casos por 100 mil habitantes. Em 2005, foi de 19,5/100
mil e em 2006, de 17,5/100 mil. (BRASIL, 2007b).
A epidemia do HIV/Aids surgiu numa época em que as autoridades sanitárias
mundiais acreditavam que as doenças infecciosas estavam controladas pela
tecnologia e pela evolução da medicina moderna. Devido a isso e a outras
peculariedades, suscitou comportamentos e respostas coletivas, nos quais estão
inseridas as estratégias políticas oficiais em seus diversos contextos. As primeiras
respostas políticas ao HIV/Aids, no Brasil, iniciaram em torno de 1982, quando os
primeiros casos de Aids foram notificados. Estabeleceu-se um programa inicial de
mobilização no estado de São Paulo. Um grupo de militantes do movimento pelos
direitos dos homossexuais do estado em 1983 procurou a Secretária de Estado da
Saúde para cobrar uma posição diante do problema novo e inquietante. A resposta
da secretária foi imediata, constituindo um grupo de trabalho composto por técnicos
de diversas áreas da instituição, este grupo se constituiu de médicos sanitaristas,
infectologistas, especialistas da área de laboratório e social. (PARKER, 1997;
TEIXEIRA, 1997).
Teixeira (1997) ainda diz que, pelo pioneirismo e pela intensa divulgação
pública que recebeu, o programa do Estado de São Paulo tornou-se uma referência
para profissionais de saúde e cidadãos de todo o país. Porém, nem todas as
reações foram favoráveis às ações propostas e desencadeadas, existindo
divergência dentro do setor da própria saúde com parcelas de atores sociais,
sugerindo uma suposta importância exagerada que estava dando a um problema de
pequena dimensão e que pertencia a um grupo minoritário da população.
No Brasil, a Aids se caracterizou desde os anos 80 como um problema do
setor saúde, havendo portanto, um maior investimento deste setor nas políticas
públicas, executando quase a totalidade das ações programáticas de prevenção e
controle da epidemia (TEIXEIRA, 1997). O Ministério da Saúde até 1985 não se
manifestara de forma expressiva, apesar do impacto que a AIDS provocava na
33
opinião pública e da existência de programas organizados em onze estados do país
além de São Paulo, a saber: Alagoas, Bahia, Ceará. Minas Gerais, Paraná,
Pernambuco, Santa Catarina, São Paulo, rio Grande do Norte, Rio Grande do Sul e
Rio de Janeiro. Somente em maio de 1985, através da portaria 236 (02/05/1985),
estabelece as diretrizes para ―o programa de controle da Síndrome de
Imunodeficiência Adquirida, SIDA ou AIDS‖, sob a coordenação da Divisão Nacional
de Dermatologia Sanitária.
O recente programa nacional de AIDS, além de incorporar o referencial não
discriminatório e de defesa dos direitos dos usuários, ofereceu normatização nas
áreas clínica e epidemiológica e procurou organizar grupos de trabalho sobre os
aspectos sociais, legais e trabalhistas (GALVÃO 2002a; TEIXEIRA 1997). Somente
em 1988 foi consolidado o programa nacional de DST/Aids dentro da estrutura do
Ministério da Saúde. Este programa ficou formalmente integrado às doenças
sexualmente transmissíveis (DSTs). (GALVÃO, 2002b).
A notificação compulsória foi determinada em dezembro de 1986 através
da Portaria Ministerial 54, de 22/12/1986 e somente em 1988 através da Lei 7649,
de 25/01/88, tornar-se-ia obrigatória à triagem sorológica para o HIV em todo
território nacional. (TEIXEIRA, 1997). Apesar das contradições, em 1990 inicia a
distribuição gratuita de medicamentos antirretrovirais para pessoas com Aids no
Brasil, incluindo AZT, ganciclovir e pentamidina. Esta medida ou política que
reconhecia o direito das pessoas acometidas de ter acesso aos recursos
terapêuticos disponíveis nos países mais avançados, veio a contrariar as diretrizes
adotadas pelos próprios organismos internacionais, como a OMS e OPS que, para
estes órgãos, nos países pobres os recursos disponíveis deveriam ser investidos em
prevenção. Em 1996, foi implementada a política brasileira de distribuição gratuita e
universal de antirretrovirais, disposta na Lei 9.313, de 13 de novembro de 1996.
(GALVÃO, 2002b; TEIXEIRA, 1997).
34
1.4 HIV/Aids: aspectos sociais
A mídia exerceu um papel fundamental no início da epidemia ao apresentar
para a opinião pública aquela nova doença e, no caso brasileiro, ―importando o
modelo norte americano‖ de explicação de transmissão sexual da infecção pelo HIV
(GALVÃO, 2000, p.174). O início da década de 80 já dividia os soropositivos em dois
grupos, ―os culpados‖, que se contaminaram por via sexual ou por uso de drogas
injetáveis, e ―as vítimas‖, as crianças por sua condição de extrema vulnerabilidade,
os que se infectaram por transfusão de sangue e as mulheres que seriam vítimas
dos seus parceiros sexuais. (GALVÃO, 2000).
Galvão (2000) relembra o estudo de Mann que sugeriu a divisão da epidemia
da AIDS em três fases com características próprias que viriam a influenciar
posteriormente as representações sociais da AIDS. Segundo ele, a primeira
epidemia seria o crescimento silencioso da infecção pelo HIV entre diferentes
populações; a segunda seria constituída pelo adoecimento das populações com
AIDS, como consequência da infecção pelo HIV; e a terceira engloba as respostas e
as reações sociais, culturais, econômicas e políticas ao HIV e à Aids, sendo esta
fase marcada pelo preconceito e pela discriminação às pessoas com HIV/Aids.
Daniel (1994), ao descrever a discriminação presente no contexto do
HIV/Aids, a resume em ―morte civil‖. Para ele a morte civil é o pior tipo de morte, pois
esta situação instaurava em processo de morte/morrer ainda em vida e obriga as
pessoas com AIDS a viver de forma clandestina, quase como um guerrilheiro,
exilado em seu próprio corpo. Sendo assim, a principal luta da pessoa com HIV/Aids
era provar que estava viva e que tinha direito a continuar a viver.
Barbará, Sachetti e Crepaldi ( 2005, p.332) acrescentam:
O doente com aids continua a viver seu sofrimento de dupla forma, de um lado, o
sofrimento físico, causado por uma doença que mesmo com os avanços da
medicina com os chamados coquetéis antivirais, ainda é mortal. De outro lado, o
sofrimento social, causado pelo olhar excludente dirigido ao doente que, em muitas
ocasiões, podem ser ainda mais devastador.
A história social da epidemia da AIDS está agregada aos domínios do
estigma, pode-se entender como grupos e indivíduos sofrem de modo inexorável as
discriminações sociais que oprimem àqueles que são acometidos ou os mais
vulneráveis à infecção pelo HIV.
35
A associação da AIDS à homossexualidade se deu pelo fato dos
homossexuais terem sido os primeiros a adquirirem a síndrome no mundo ocidental.
Esta foi a primeira tentativa de explicação de um fenômeno para o qual a
comunidade científica não tinha resposta. Esta ligação entre aids e
homossexualidade, surgida na epidemiologia e difundida pela mídia, acabou sendo
disseminada e enraizada no imaginário da população, situação esta que culmina na
definição de ―grupo de risco‖, ligando a Aids a grupos específicos (como
pontuado, os homossexuais, as prostitutas e os usuários de drogas injetáveis e
aqueles conhecidos como vítimas que eram os hemofílicos). (BARBARÁ;
SACHETTI; CREPALDI, 2005; GALVÃO, 2000; NASCIMENTO; BARBOSA;
MEDRADO, 2005).
Neste este cenário era muito comum a Aids ser denominada como a
―pneumonia dos homossexuais‖, o ―câncer dos homossexuais‖, o câncer gay‖ ou a
―peste gay‖. (BARBARÁ; SACHETTI ; CREPALDI, 2005).
Em seu estudo Thiengo, Oliveira, Rodrigues (2005) constataram que os
sentimentos de culpa e de rejeição por parte do outro levam as pessoas acometidas
pelo HIV/aids ao isolamento social. Estes escondem a sua condição de
soropositividade e não querem ser visto pelos outros como portador do vírus, o que
contribui para a segregação social. Mesmo com a propalada pauperização, ―olhando
de forma especial a realidade africana‖, a feminização da epidemia de HIV/aids,
como apontado no caso brasileiro, não se conseguiu romper a identificação
homossexual, branco e de classe média à AIDS. (GALVÃO, 2000).
No entanto, sabe-se que atualmente acontece uma maior disseminação
proporcional em mulheres, no Brasil e em todo o mundo, com a razão de sexos
diminuindo sistematicamente. Em 1986 esta relação era de 15,1 homens por mulher
e, atualmente, encontra-se de 1,5 homens para cada mulher. (BRASIL, 2007b).
Algumas tendências no padrão de infecção no Brasil têm sido observadas.
Uma delas diz respeito ao comportamento espacial da Aids, a interiorização, e a
heterossexualização da epidemia. Na primeira década da história da AIDS (anos 80),
a epidemia era basicamente restrita às áreas metropolitanas da região Sudeste, aos
homossexuais masculinos, aos hemotransfundidos e aos usuários de drogas
injetáveis (UDI). Além da tendência heterossexual da epidemia, existe a feminização,
que aponta uma maior exposição da mulher, seja por uma maior vulnerabilidade
36
biológica ou uma menor detenção de poder nas decisões que envolvem a vida
sexual e reprodutiva. No início da epidemia, acreditava-se na invulnerabilidade
feminina, visto que a mulher não era incluída nos chamados "grupos de risco" e, por
isso, as intervenções neste grupo foram, de certa forma, negligenciada. Uma quarta
tendência trata-se da pauperização da síndrome, no sentido de haver uma
incidência maior de casos de AIDS nas populações de menor nível socioeconômico.
(BASTOS; SZWARCWALD, 2000; BRASIL, 2006; NASCIMENTO; BARBOSA;
MEDRADO, 2005; PARKER; CAMARGO JR., 2000).
Parker e Camargo Jr. (2000) contextualizam as tendências epidemiológicas
que têm sido identificadas na evolução da epidemia de HIV/aids no Brasil. Estas se
relacionam a padrões sociológicos e antropológicos mais amplos e, com base nisso,
pode-se definir agenda para pesquisa e intervenção que seja capaz de responder à
pauperização, à feminização e à interiorização da epidemia de AIDS, sem descuidar,
neste processo, de grupos que, embora minoritários na sociedade brasileira, ainda
permanecem particularmente vulneráveis à mesma.
Desta forma, podemos refletir sobre o conceito da ―vulnerabilidade‖ ao
HIV/Aids. Este reside no reconhecimento de que a infecção pelo HIV o depende
apenas de informações e da postura individual, mas de uma série de fatores
estruturais que afetam os indivíduos, independente de sua vontade, como a
desigualdade econômica, política, cultural e jurídica, dentre outros. A Aids foi, aos
poucos, mostrando o seu lado ―global‖, encaixando-se em uma lógica que, cada vez
mais, vai tendo seu sentido aprimorado em definições como saúde e
desenvolvimento, ―primeiro mundo‖ e ―terceiro mundo‖ , indústria e mercado, justiça
social e violência estrutural. (GALVÃO, 2000, 2002a).
Parker (2000) reflete que sobre mudanças essenciais no modo de pensar
sobre o HIV/Aids na década de 90 talvez tenha sido o esforço de superar esta
contradição (entre ―grupo de risco‖ e o ―público em geral‖), deslocando-nos da noção
do risco individual para uma nova percepção de vulnerabilidade social, crucial não
apenas para nossa percepção da dinâmica da epidemia, mas para qualquer
estratégia capaz de diminuir seu avanço. Este mesmo autor (2000, p. 103) acrescenta
ainda que
sem negar de maneira alguma, que todo ser humano seja biologicamente suscetível
a infecção pelo HIV, ou que transmissão realmente ocorra mediante atos
comportamentais individuais específicos, esse conceito expandido de fatores sociais
que colocam alguns indivíduos e grupos em situação de maior vulnerabilidade
permitiu-nos começar a perceber mais plenamente como a desigualdade e injustiça,
37
o preconceito e a discriminação, a opressão, exploração e violência da sociedade
aceleram a disseminação da epidemia em países pelo mundo.
As varáveis sociais determinam alterações na ecologia das doenças infecto-
contagiosas, ou seja, os extratos mais pobres e menos assistidos tornam-se mais
vulneráveis à difusão destes agentes por razões predominantemente biológicas
(como baixa imunidade), sociais (necessidades básicas deficientes, residências em
locais sem a mínima infra-estrutura), porém, na maioria das vezes, as razões são
simultâneas, sociais e biológicas (BASTOS; SZWARCWALD, 2000). Destaca-se
que, sem realizar mudanças de longo prazo na estrutura da sociedade e nas
relações de poder que sujeitam certas populações e comunidades à maior
vulnerabilidade diante da infecção por HIV, ao mesmo tempo em que protegem
outras, não pode haver uma esperança real de terminar ou até mesmo de frear a
epidemia. (PARKER, 2000).
Bastos e Szwarcwald (2000), em seu estudo sobre a pauperização do
HIV/Aids, acrescentam que as desigualdades a serem enfrentadas ultrapassam os
recursos materiais e humanos dos grupos e instituições que lutam contra a
epidemia, sejam eles organizações governamentais, grupo de defesa dos direitos
humanos, entidades não governamentais e/ou Igrejas, entre outras. Neste sentido,
existem barreiras de natureza estrutural e histórica consusbstanciadas na
exploração econômica, no racismo e no sexismo, além de vários outros aspectos.
Os autores (2000, p. 74) supracitados pontuam que
não existe expectativa, a curto e médio prazo, de reversão das tendências presentes
de maior vulnerabilidade à infecção pelo HIV (entre inúmeros outros agravos), de
assimetrias profundas na dinâmica da epidemia e, igualmente, de marcadas
assimetrias no que diz respeito ao acesso a recursos preventivos e terapêuticos.
É importante reconhecer que mudanças são necessárias para conter o
crescimento do HIV. É preciso efetivar políticas de maior abrangência com relação à
epidemia, com programas mais amplos de mudanças e reestruturação social e com
respostas de curto e longo prazo que serão possíveis se forem respeitadas as
diferenças de cada grupo que constitui a sociedade. Portanto, estes têm, em seu
bojo, uma construção cultural que inclui valores, crenças, limitações e tem
ancorada a representação social do HIV/Aids em sua vida cotidiano.
Segundo Galvão (2000) e Galvão et al. (2006), pode-se observar, até
mesmos pelos dados estatísticos, que o crescimento do conhecimento médico-
científico sobre o HIV/Aids não foi acompanhado pela redução do número de novos
38
casos. Reforçando que uma estratégia global para a diminuição da infecção pelo
HIV consiste na elaboração de materiais educativos com uma linguagem que
contemple as necessidades de grupos distintos, pois muitos conhecem o
essencial sobre a síndrome, mas ainda não se sentem ―tocados‖ pelas informações
divulgadas. As diferentes dimensões da epidemia de HIV/Aids como a cultural, a
social, a política, a médica e a econômica não podem ser tomadas de forma isolada
ou definitiva.
1.5 HIV/Aids: aspectos clínicos
No verão de 1981, a Aids foi reconhecida pela primeira vez nos EUA quando
o Centers for Disease Control and Prevention (CDC) relataram ocorrência
inexplicada de pneumonia por Pneumocystis carinii em cinco homossexuais
masculinos previamente sadios em Los Angeles e do sarcoma de Kaposi em 26
homossexuais masculinos, também previamente sadios, em Nova York e em Los
Angeles. Em pouco tempo, a Aids foi coligada em usuários de drogas injetáveis
(UDI) de ambos os sexos e logo depois em receptores de transfusões de sangue e
em hemofílicos. À medida que se descortinava o padrão epidemiológico da
síndrome, evidenciou-se que o agente etiológico mais provável da epidemia era um
agente transmissível por contato sexual (homossexual e heterossexual) e pelo
sangue ou hemoderivados. (FAUCI; LANE, 2006).
Isolou-se, em 1983, o HIV de um paciente com linfadenopatia e, em 1984,
demonstrou-se abertamente que este era o agente etiológico da Aids. Em 1985,
criou-se um ensaio de imunoabsorção ligada à enzima (ELISA) sensível, que
permitiu delinear o âmbito e a evolução da epidemia do HIV, em princípio nos países
desenvolvidos como os EUA e, por fim, nos países em desenvolvimento do mundo
inteiro. O crescimento mundial da pandemia do HIV foi seguida de uma explosão de
informações sobre o HIV nas áreas de virologia, patogenia (imunológica e virológica)
e tratamento da síndrome devida ao HIV, tratamento e profilaxia das doenças
oportunistas associadas à infecção pelo HIV, bem como o desenvolvimento de
vacinas. (FAUCI; LANE, 2006).
39
O HIV pertence a um grupo de vírus conhecido como retrovírus, o que indica
que o vírus carrega seu material genético no acido ribonucléico (RNA), não no ácido
desoxirribonucleico (DNA). O HIV-1 é um vírus circundado por um envelope de
glicoproteína. Esse envelope contém RNA e um núcleo protéico em formato de bala
truncada composto das proteínas virais p24 e p17 (SMELTIZER; BARE, 2002).
A síndrome acarretada pelo HIV é uma imunodeficiência profunda, primariamente
em consequência de deficiência quantitativa e qualitativamente progressiva do
subgrupo de linfócitos T designados como células T auxiliadoras e células T
indutoras. Esse subgrupo de células T é definido, em termos fenotípicos, pela
presença de molécula CD4 na sua superfície que atua como receptor celular
primário do HIV. (FAUCI; LANE, 2006).
Quando o número de células T CD4 + declina abaixo de um determinado
nível, existe uma variedade de doenças oportunistas que os paciente correm alto
risco de adquirir, particularmente as infecções e as neoplasias que constituem as
doenças que definem a Aids. Algumas revelações da Aids, como o sarcoma kaposi e
as alterações neurológicas, não podem ser explicadas integralmente pelos efeitos
imunossupressores do HIV, pois essas complicações podem surgir antes do início
da imunodeficiência grave. (FAUCI; LANE, 2006).
Neste sentido, o objetivo principal da terapia antiretroviral é evitar a
progressão da imunodeficiência e/ou restaurar, tanto quanto possível, a imunidade,
aumentando o tempo e a qualidade de vida da pessoa infectada. Entretanto, a
evolução natural da infecção pelo HIV caracteriza-se por uma replicação viral
acentuada e contínua em diversos compartimentos celulares e anatômicos, que
resulta, principalmente, na destruição e/ou disfunção de linfócitos T que expressam o
antígeno de membrana CD4 (linfócitos T-CD4+) e de outras células do sistema
imune. A depleção progressiva dos linfócitos TCD4+, em conjunto com outras
alterações quantitativas e qualitativas do sistema imune, leva à imunodeficiência,
que em sua forma mais grave manifesta-se por meio das infecções oportunistas e
neoplasias que caracterizam a Síndrome de Imunodeficiência Adquirida (AIDS).
Consequentemente, a supressão intensa e contínua da replicação viral é essencial
para que seja possível diminuir ou reverter o prejuízo imunológico. (BRASIL, 2003).
A compreensão progressiva e atualizada sobre a dinâmica viral e celular e o
aprimoramento quanto à evolução dos mecanismos de ação farmacológica dos
40
medicamentos antirretrovirais e de resistência viral a estas drogas têm consentido
substanciais avanços no controle clínico da imunodeficiência provocada pelo HIV.
Entretanto, a terapia antiretroviral é um campo extremamente complexo e dinâmico.
A elaboração de indicações e recomendações para o seu uso implica em constantes
reavaliações que consideram os progressos científicos e os aspectos operacionais
aclopados ao seu uso em larga escala, de modo que propicie, em termos individuais,
eficácia máxima e, para a Saúde Pública, resultados condizentes com o grande
investimento humano e material envolvido. (BRASIL, 2003).
Ressalta-se que as principais formas de transmissão do HIV são a sexual, por
relações homossexuais e heterossexuais, a sanguínea, em receptores de sangue ou
hemoderivados e em UDIV, e perinatal, abrangendo a transmissão da mãe para o
filho durante a gestação, o parto ou por aleitamento materno. Além destas formas
mais frequentes, existe ainda a transmissão ocupacional, relacionada a acidentes de
trabalho, principalmente os profissionais da área da saúde que sofrem ferimentos
perfuro-cortantes contaminados com sangue de pacientes com infecção pelo HIV.
Destaca-se que existem oito casos descritos na literatura de transmissão
intradomiciliar nos quais não houve contato sexual e nem exposição sanguínea
pelas vias classicamente descritas. (LIMA et al., 1996).
1.6 Adesão terapêutica: um desafio diário
A infecção pelo HIV hoje passou a ser vista como uma síndrome de caráter
evolutivo crônico e potencialmente controlável, considerando que após a introdução
e o uso do HAART (Highly Active Antiretroviral Therapy) é a combinação dos
inibidores de protease e de transcriptase reversa, capaz de reduzir carga viral
plasmática para níveis indetectáveis, melhorando o sistema imunológico de forma
efetiva (CARACIOLO, 2008). O uso adequado da terapia antiretroviral altamente
potente determinou importante redução da morbi-mortalidade de pessoas vivendo
com HIV/Aids e paralelamente proporcionou melhoras na qualidade de vida, além da
evolução da condição física e emocional (BRASIL, 2006). Entretanto, a adesão do
41
paciente a esquemas terapêuticos com múltiplas drogas tornou-se essencial no
manejo clínico dessa síndrome.
Sabe-se que a descoberta da zidovudina (AZT) como medicação aceitável e
eficaz no tratamento da AIDS ocorreu de forma quase acidental, sendo, portanto,
liberada para uso pelo Food and Drugs Administration (FDA) um ano depois, em
1987 (LIMA et al., 1996). Neste cenário evolutivo no contexto HIV/AIDS, salienta-se
o maior comprometimento de estudiosos e pesquisadores para o desenvolvimento
de outras medicações, além do AZT, quando, então, no início da década de 90, as
mesmas já foram agrupadas em duas classes distintas, quais sejam, os inibidores da
transcriptase reversa análogos de nucleosídeo (ITRN) e os inibidores da
transcriptase reversa o-análogos de nucleosídeo (ITRNN). Com a descoberta de
uma nova classe de medicamentos de alta potência, os inibidores da protease (IP), o
ano de 1996 destacou-se como um dos mais importantes no combate à AIDS.
(SCHAURICH; COELHO; MOTTA, 2006).
Os avanços tecnológicos favoreceram o conhecimento sobre a dinâmica do
vírus e suas implicações para a vida das pessoas que vivem com o HIV/Aids que,
em articulação com as descobertas no campo dos medicamentos, resultam em um
olhar otimista no que diz respeito ao seu enfrentamento. O desenvolvimento da
terapia antirretroviral é um dos fatores que se destaca na história do enfrentamento
da Aids na contemporaneidade e, embora, não represente a cura, é uma terapia
capaz de mudar a progressão do quadro mórbido, tornando a vida das pessoas que
vivem com o HIV/Aids mais próxima do normal (TEIXEIRA; SILVA, 2008). Neste
sentido, Feitosa et al. (2008) reforçam que é explícito o avanço no tratamento dessa
síndrome, pois com o advento dos antirretrovirais no tratamento da AIDS observou-
se uma melhora significativa na qualidade de vida dos pacientes. Com isto, a AIDS
passa a ter características de uma doença crônica.
Paralelamente a estes fatos, o Brasil, no mesmo ano, se sobressai entre os
primeiros países em desenvolvimento a viabilizar o acesso universal e gratuito aos
medicamentos antirretrovirais no Sistema Único de Saúde (SUS). Uma importante
estratégia da Política de Medicamentos do Programa Nacional de DST e Aids (PN-
DST/Aids) foi o estabelecimento de recomendações técnicas consensuais para a
sua concretização por meio de comitês assessores (Lei 9.313/96). Esta política,
além da assistência aos indivíduos infectados pelo HIV e/ou com Aids, inclui outras
42
modalidades assistenciais que almejam à redução das internações hospitalares, tais
como assistência ambulatorial especializada, hospital-dia e assistência domiciliar
terapêutica. (BRASIL, 2003; DOURADO et al., 2006).
Embora exista grande benefício gerado por esta terapêutica, restam ainda
muitas dificuldades a serem superadas, sendo uma delas a adesão do paciente ao
seu tratamento (FEITOSA et al., 2008). Faz-se necessário conhecer os vários
fatores que podem impedir, dificultar ou mesmo provocar a utilização inadequada
desses medicamentos e as consequências que esse fato acarreta aos indivíduos
para os quais a terapêutica foi indicada.
A adesão ao tratamento pode ser descrita como uma atividade conjunta na
qual o paciente não apenas cumpre as recomendações médicas, mas entende,
concorda e segue a prescrição estabelecida. É uma relação em que deve existir um
acordo entre a prescrição médica e o comportamento adotado pelo usuário, ou seja,
a tomada da droga correta, na frequência correta, na dose correta e no horário
recomendado. Resulta, portanto, em uma "aliança terapêutica" entre a equipe de
saúde e o paciente, na qual são reconhecidas não apenas as responsabilidades
específicas de cada um no processo, mas também de todos os que estão envolvidos
direta ou indiretamente no tratamento. (CARACIOLO et al., 2008; VITÓRIA, 1998).
Segundo Schaurich, Coelho e Motta (2006), o conceito de adesão à
terapêutica medicamentosa apresenta intrínseca relação com a cultura e com a
sociedade, bem como a história vivida pelo indivíduo. Quando se promove a adesão
em pessoas vivendo com o HIV/Aids percebe-se que esse conceito não envolve
apenas a simples ação de ingerir os medicamentos. Nestes processos estão
vinculados aspectos relacionados ao estilo e à qualidade de vida, bem como as
condições socioculturais, envolvendo um conjunto de ações como o protagonismo
do sujeito, a disponibilização de recursos para facilitar o acesso aos serviços, o
vínculo com os profissionais de saúde, a garantia de um serviço de referência e
contra referência eficaz, a regularidade nas consultas, a retirada dos medicamentos
na farmácia, a frequência e realização dos exames, as boas condições de
alimentação e higiene, a adequação aos bitos, do cotidiano, o acesso à
informação, o conhecimento e a aceitação da patologia e o incentivo ao uso de
medidas de prevenção secundária. (ACURCIO; GUIMARÃES, 1999; CARACIOLO et
al., 2008).
43
E em meio a esse complexo contexto em que a epidemia do HIV/Aids se
desenvolveu, destacam-se, principalmente a partir da década de 90, as ações de
organizações governamentais e não governamentais para o desenvolvimento de
políticas que facultassem a prevenção de novas infecções e a promoção de uma
vida com mais qualidade e cidadania aos portadores do HIV. Salienta-se, ainda, o
empenho da comunidade científica para a descoberta de alternativas que, uma vez a
infecção instalada, possibilitassem a redução e/ou o controle da quantidade viral;
desenvolvem-se, então, as medicações antirretrovirais, objetivando, em uma visão
mais filosófico-reflexiva, substituir a cultura Aids igual a morte por uma cultura que,
gradualmente, considera o viver com Aids sob a perspectiva da cronicidade.
(SCHAURICH; COELHO; MOTTA, 2006).
A Aids, por sua vez, não é uma síndrome misteriosa que escolhe suas vítimas
de modo aparentemente aleatório. Embora a construção social atribua a ela
sentimentos de vergonha por estar associada à atribuição de culpa, sendo assim a
expõe uma identidade que poderia ter permanecido oculta dos vizinhos, colegas de
trabalho, familiares e amigos. Esta situação faz com que a maioria dos indivíduos
infectados protele tanto quanto seja possível a divulgação de sua condição. Neste
sentido, portar e utilizar um antirretroviral configura um risco potencial de ter sua
condição descoberta por outros, o que pode levar à recusa ou dissimulação do uso.
(ACURCIO; GUIMARÃES, 1999).
Apesar do progresso terapêutico, estima-se que 10-20% dos pacientes que
iniciam o tratamento com os esquemas atuais não conseguem suprimir a viremia de
forma satisfatória após alguns meses de terapia (falha virológica primária) e cerca de
20-50% dos que possuem boa resposta inicial apresentarão falha virológica após um
ano de tratamento (falha virológica secundária), sendo a taxa de resposta virológica
aos tratamentos de resgate subsequente progressivamente menor. (BRASIL, 2003).
Deste modo, a falha terapêutica, especialmente por resistência às drogas
atualmente disponíveis, é um fenômeno esperado e um número cada vez maior de
pacientes se encontram sem alternativa de medicamentos antirretrovirais com
atividade comprovável clínica e/ou laboratorial, pelo teste de genotipagem e/ou
fenotipagem. Além disso, hoje em dia são conhecidos vários efeitos colaterais
significativos dos antirretrovirais que não eram evidentes quando se iniciou sua
utilização terapêutica. O desenvolvimento de neuropatia, hepatotoxicidade,
44
pancreatite, lipodistrofia, diabetes, dislipidemia, osteoporose e acidose láctica estão
entre as complicações ligadas à terapia que podem piorar consideravelmente a
qualidade de vida do indivíduo infectado pelo HIV. (BRASIL, 2003).
Portanto, a adesão é potencialmente capaz de reduzir o risco da transmissão
do HIV e de resistência aos medicamentos antirretrovirais. Um dos grandes
problemas hoje enfrentados pela saúde pública é a transmissão de cepas virais
resistentes fortemente relacionadas com a não-adesão ao tratamento, limitando,
inclusive, as suas alternativas. (BONOLO; GOMES; GUIMARÃES, 2007).
Caraciolo et al. (2008) corroboram ao enfatizar que a adesão terapêutica é
fundamental para alcançar os objetivos da terapia antirretroviral, a supressão viral
máxima em níveis indetectáveis, a reconstituição imunológica, a redução de doenças
relacionadas ao HIV/Aids e, consequentemente, a melhora da qualidade de vida dos
indivíduos. Outro benefício alcançado é a obtenção prolongada do esquema
prescrito, desta forma há uma preservação de opções terapêuticas.
Bonolo, Gomes e Guimarães (2007) evidenciaram, em suas pesquisas, que é
preciso investir em prescrições simplificadas, dosagens fáceis de serem lembradas e
interpretadas com o mínimo de efeitos colaterais, além da adequada disponibilização
da medicação. Antes de iniciar a medicação HARRT recomenda-se tratamento de
apoio a usuários de bebida alcoólica e/ou drogas ilícitas.
Estes mesmo autores concluíram que existe a necessidade do monitoramento
contínuo dos pacientes com o propósito de evitar a presença ou até mesmo a
instabilidade dos fatores de risco para não-adesão. Quanto ao foco das
intervenções, devem ser otimizadas as possíveis barreiras psicossociais e não
somente os fatores ligados ao paciente e ao tratamento. O início do
acompanhamento clínico é a fase considerada crítica e, para criar vínculo com o
usuário, é preciso atentar para um monitoramento individual e um suporte social
associado a um trabalho educativo com orientação sobre aids.
Gomes e Cabral (2009) reforçaram a tendência da cronificação da síndrome
decorrente da sobrevida. No estudo realizado por eles, abordou-se o cotidiano de
familiares cuidadores na implementação da oferta dos medicamentos à criança HIV
positiva. Deste modo, o enfermeiro desempenha um papel fundamental na
assistência a este público, englobando a prevenção de doenças oportunistas e a
promoção de sua saúde. Os autores enfatizaram que a educação em saúde na
45
perspectiva problematizadora e freireana é uma condição que favorece o processo
de empoderamento dos familiares e cuidadores, elevando a qualidade de vida e o
processo terapêutico daqueles que vivem com o HIV.
Neste sentido, Guaragna et al. (2007) ressaltam que a compreensão clara de
todo o processo é um dos fatores relacionados com a efetividade do tratamento.
Entender o que ocorre consigo e a maneira de resguardar sua saúde torna pacientes
e familiares sujeitos ativos na concretização de ações saudáveis e responsáveis,
permitindo, sobretudo a construção de sua autonomia e de não-dependência.
Vitória (1998), em contribuição sobre a temática, destacou que,
independentemente das estratégias adotadas, a forma mais efetiva de se obter uma
adesão adequada ao tratamento de qualquer doença de natureza crônica é motivar
e envolver o sujeito no seu próprio tratamento, esclarecendo as dúvidas e
minimizando as suas dificuldades, utilizando medidas práticas, de baixo custo e de
fácil execução, fazendo ajustes conforme as necessidades individuais em longo
prazo.
Destaca-se que a introdução de esquemas terapêuticos simplificados é o
recomendado, considerando que o perfil biopsicossocial do indivíduo, bem como
suas rotinas diárias, são indispensáveis para amenizar a adesão precária à
terapêutica antirretrovirais. Um aspecto importante a ser observado e que facilita a
adesão é a simplificação e adequação do esquema terapêutico à rotina de cada
indivíduo, sempre que possível. (GIR; VAICHULONIS; OLIVEIRA, 2005).
Uma das dificuldades associadas à não-adesão é o esquema terapêutico
prescrito, incluindo o número de medicamentos, suas formas e horários, mesmo
quando o medicamento é fornecido. Esse é um dos principais fatores relacionados
aos medicamentos que interferem no tratamento com antirretrovirais, pois os
esquemas terapêuticos normalmente são considerados pelos usuários como
complicados e exigem um grande empenho. Ressalta-se, ainda, que estes precisam
adaptar sua alimentação, seus horários e seu ritmo diário para cumprir o tratamento.
(TEIXEIRA; SILVA, 2008).
Considera-se que a grande quantidade de comprimidos ingeridos diariamente
constitui um dos principais fatores responsáveis pela má adesão à terapêutica ARV,
entre outras características associadas aos comprimidos. Uma solução possível para
amenizar esse importante impeditivo da adesão incide na associação de duas ou
46
mais medicações em um único comprimido (GIR; VAICHULONIS; OLIVEIRA, 2005).
Gomes e Cabral (2009) observaram que um dos motivos que dificulta a
implementação do cuidado medicamentoso e o oferecimento do medicamento no
momento da instituição da terapêutica farmacológica são os seus efeitos colaterais,
como a náusea e o vômito. Ressalta-se que esses efeitos são intensos, sendo
explicitados verbalmente através de adjunto adverbial de intensidade (muito).
Percebe-se que os efeitos colaterais intensos ou indesejáveis constituem
outra problemática da ARV e faz-se necessário que os profissionais de saúde
estejam comprometidos com a realidade da má adesão. Neste sentido, é preciso
que haja intervenção efetiva junto a esses indivíduos, através de esclarecimentos
sobre os efeitos colaterais potenciais de cada medicação prescrita e a
implementação de alternativas para reduzir a incidência de efeitos indesejáveis, tais
como orientações alimentares relacionadas aos medicamentos, orientações sobre os
horários mais apropriados para a ingestão do medicamento, respeitando o efeito
colateral mais relatado (por exemplo, em caso de efeitos sobre o sistema nervoso
central como cefaléia, insônia, tontura, sonolência), incentivar a ingesta
preferencialmente antes de dormir para amenizar tais efeitos e orientações sobre o
uso concomitante de outras medicações que possam potencializar efeitos
indesejáveis, devido à interação medicamentosa. (GIR; VAICHULONIS; OLIVEIRA,
2005).
O sentir-se bem foi apontado como razão para adesão no estudo de revisão
da literatura sobre a temática realizada por Colombrini, Lopes e Figueiredo (2006).
Embora a melhora dos sintomas, em alguns casos, possa levar à suspensão do
tratamento porque a pessoa avalia que não há mais necessidade da medicação
retornando ao uso ao sentir-se mal. O outro fator encontrado no mesmo estudo é
que o indivíduo, quando associa o fato de sentir-se mal aos medicamentos,
normalmente o estimula a interromper o tratamento. Em relação aos sintomas da
doença foi considerado algo, provavelmente, muito mais complexa do que revelado
nos trabalhos. Portanto, a melhora dos sintomas pode levar a sentimento que não
haja necessidade da medicação. Porém, a ocorrência de sintomas durante o
tratamento pode ser condicionada aos seus efeitos, levando à baixa adesão.
(COLOMBRINI; LOPES; FIGUEIREDO, 2006).
47
2 PERCURSO METODOLÓGICO
Trata-se de um estudo exploratório-descritivo, pautado na abordagem
qualitativa. A justificativa para a utilização desta abordagem pauta-se na
possibilidade de conformação a este estudo por trabalhar
[...] com um universo de significados, motivos, aspirações, crenças, valores e
atitudes, o que corresponde a um espaço mais profundo das relações, dos
processos e dos fenômenos, que não podem ser reduzidos à operacionalização de
variáveis [...]. (MINAYO,1994, p. 22).
Esta condição permite atender à propriedade e adequabilidade da pesquisa
qualitativa neste estudo, tendo em vista a necessidade em compreender e penetrar
na subjetividade dos dados gerados na possibilidade, em si, de que este método
expresse uma determinada realidade. Desta forma, entende-se que a construção
teórica das configurações e dos processos subjetivos que emergem do cotidiano,
tanto no âmbito social, como no individual, de ser observada dentro da própria
processualidade da constituição subjetiva do sujeito. Ressalta-se que a
compreensão do significado atribuído pelos sujeitos a partir das suas experiências é
importante quando o objetivo é a elucidação, a predição e a análise dessa mesma
realidade.
Tendo como base a Teoria das Representações Sociais, será utilizada a
abordagem processual complementar, tendo em vista que esta enfatiza o processo
de constituição das representações, embora também afirme a importância de seu
produto, qual seja, os conteúdos. (SÁ, 1998).
2.1 Campo de estudo
Para o cenário deste estudo foi selecionado um Hospital Público Municipal
localizado na cidade do Rio de Janeiro especializado e referenciado para clientes
soropositivos ao HIV. Esta instituição foi fundada em 1952 com um projeto
arquitetônico em sistema pavilhionar e, naquela época, tinha o objetivo de atender
as pessoas acometidas pela tuberculose, doença que até hoje é impregnada de
estigma e preconceito. A localização do mesmo se caracterizava por ser distante do
48
centro da cidade, o que proporcionava um clima favorável e contava com
profissionais de saúde capacitados para atender a estes usuários, além de médicos
especializados em tisiologia. Atualmente, o perfil é outro e o hospital atende à
comunidade em dois níveis de atenção: a básica, que engloba ambulatórios com
diversas especialidades, tais como ginecologia, pneumologia, infectologia, clínica
médica e pediatria, entre outros, e o de internação, que se caracteriza por ser de
média complexidade e com disponibilidade de 118 leitos, distribuídos para clínica
médica, infectologia, cirurgia geral, tisiologia, pneumologia, pediatria clínica e 4 leitos
para a unidade de hospital-dia, disponíveis para quaisquer casos de maior urgência
ambulatorial.
Este nosocômio possui, ainda, um serviço ambulatorial especializado para
pessoas soropositivas ao HIV/Aids, criado em 1988, com a finalidade de atender
estes usuários em um ambiente próprio e ―personalizado‖. O atendimento ocorre de
segunda a sexta-feira, das 08hs às 17hs, e os profissionais de saúde são
qualificados para atender a esta clientela. A equipe do programa conta com 2
enfermeiros, 2 médicos infectologistas, 1 clínico geral, 01 assistente social, 3
pediatras, 1 psiquiatra, 1 dentista, 1 obstetra, 1 ginecologista e 4 técnicos de
enfermagem, além de psicólogo e nutricionista, sendo que estes últimos não são
exclusivos do programa. Vale a pena destacar que a instituição é referenciada para
gestante HIV positivo e no atendimento ao recém-nato com suspeita da infecção.
O programa contabilizava (até outubro de 2009) aproximadamente 1.729
usuários adultos e 70 crianças cadastrados de ambos os sexos, com idade variando
desde o nascimento até a terceira idade. O atendimento ambulatorial acontece com
agendamento prévio e os médicos infectologistas acompanham os pacientes, sem
rotatividade; ou seja, os usuários criam vínculo e possui um profissional médico
como referência frente à sua patologia, além da equipe multiprofissional. Após a
confirmação do diagnóstico, a primeira consulta é realizada pelo profissional
enfermeiro. O mesmo faz toda a anamnese do cliente e solicita os primeiros exames,
para, então, ser encaminhado para um infectologista do programa.
É importante salientar que a escolha desta Instituição não aconteceu de forma
aleatória, mas foi baseada de acordo com a classificação do Ministério da Saúde,
que os considera como um Serviço de Assistência Especializada (SAE) em
HIV/Aids. Os SAE são serviços de saúde especializados implementados através de
49
uma equipe de saúde multiprofissional. Realizam atividades de assistência, de
prevenção e de tratamento às pessoas que vivem com HIV/Aids e seus familiares e
tem como objetivo prestar atendimento integral e de qualidade aos usuários deste
serviço. (BRASIL, 2008).
2.2 Aspectos éticos da pesquisa
Destaca-se que o estudo foi desenvolvido à luz dos dispositivos apresentados
como normas e diretrizes de desenvolvimento de pesquisa na Resolução 196, de 10
de outubro de 1996, do Conselho Nacional de Saúde (CNS), com base nos
princípios da inalienabilidade, da imprescritibilidade, da solidariedade, e da
irrenunciabilidade dos direitos humanos (BRASIL, 1998). O projeto foi submetido ao
comitê de ética da Prefeitura Municipal do município do Rio de Janeiro e aprovado
sob o protocolo 200/08 (Anexo A) e foi também avaliado pela direção da
instituição, sendo liberada a sua realização. A partir da autorização institucional foi
realizada a aproximação dos atores sociais do estudo, onde estes formalizaram a
sua participação e tomaram ciência dos aspectos éticos mediante a explicação e o
conhecimento do projeto.
Elaborou-se um termo de consentimento livre e esclarecido (Apêndice A) em
uma linguagem acessível, contendo a justificativa do estudo, os objetivos e os
procedimentos utilizados na pesquisa, bem como a garantia de esclarecimentos em
qualquer momento sobre a metodologia utilizada. Neste instrumento explicitou-se,
ainda, a liberdade do sujeito em se recusar a participar ou retirar o seu
consentimento em qualquer fase da pesquisa, sem nenhum ônus e/ou prejuízo à sua
pessoa e ao seu atendimento. Foi explicado, também, quanto à garantia do sigilo
que assegura a privacidade quanto aos dados confidenciados envolvidos no estudo.
50
2.3 Os sujeitos do estudo
Participaram do estudo 30 usuários do SAE da referida Instituição. Como
critério de inclusão delimitou-se englobar indivíduos maiores de 18 anos, de ambos
os sexos, em acompanhamento ambulatorial especializado para HIV/Aids, com, no
mínimo, 6 meses de diagnóstico e em uso dos antirretrovirais.
Moscovici, lembrado por (1998), salienta as condições que afetam a
emergência ou não de representações sociais de um determinado conjunto social,
como a implicação dos sujeitos com o objeto, o acesso à informação e o processo
de circulação das mesmas no grupo social. A forma e a intensidade de tais
condições podem variar amplamente de um objeto para outro dentro de um grupo,
bem como de um grupo para outro em relação ao mesmo objeto. Tendo em vista o
objeto deste estudo, é pertinente considerar as experiências vividas destes sujeitos
enquanto cidadãos soropositivos ao HIV em diversos contextos no qual estão
inseridos, seja o social, o familiar e o profissional, entre outros, inclusive aonde
fazem o acompanhamento e o controle da síndrome, considerando que faz parte da
rotina as consultas a diversos profissionais, a realização de diferentes
procedimentos e o processo de educação em saúde, por exemplo.
2.4 Coleta de dados
A aproximação inicial com o campo de estudo se deu mediante a carta de
apresentação com a explicação acerca do estudo proposto. A partir da aprovação do
Comitê de Ética da Prefeitura Municipal do Município do Rio de Janeiro e da
autorização institucional, procedeu-se ao levantamento dos possíveis sujeitos do
estudo.
A coleta de dados foi realizada em duas fases e, para tanto, utilizou-se dois
instrumentos; o primeiro (APÊNDICE B), se constituiu de um questionário de
caracterização dos sujeitos, com levantamento sociodemográfico, considerando que
estes dados o relevantes e podem influenciar de alguma maneira na
51
representação social construída acerca do objeto de estudo. O segundo instrumento
(APÊNDICE C) foi o roteiro de entrevista que foi criteriosamente elaborado visando
contemplar o objeto deste estudo.
Deve-se considerar que a metodologia de coleta e de análise dos dados pode
ser escolhida conforme a natureza do objeto estudado, o tipo de população e os
limites da pesquisa, bem como o referencial teórico adotado. Quando se utiliza as
representações sociais, particularmente, os instrumentos de coleta de dados
escolhidos determinam a qualidade dos estudos, pois a pertinência da informação
coletada influencia sobremaneira nos resultados obtidos e na análise realizada.
(OLIVEIRA, 2008).
A técnica utilizada foi a entrevista semi-estruturada por ser uma técnica
adequada para a abordagem processual da Teoria das Representações Sociais.
Esta técnica combina perguntas abertas e fechadas, pois construção de um
roteiro que irá orientar ou servir de guia para o andamento da interlocução (MINAYO,
2006). Esse modelo semi-aberto de entrevista facilita a abordagem e assegura que
as hipóteses ou pressupostos da pesquisa sejam cobertos e explorados em sua
estrutura de relevância. A autora refere que esta técnica de coleta de dados
necessita de um roteiro que permite flexibilidade nos temas e conversas trazidos
pelo entrevistador. Triviños (1987, p. 146), por sua vez, define esta técnica como
aquela que parte de certos questionamentos básicos, apoiados em teorias e
hipóteses, que interessam à pesquisa, e que, em seguida, oferecem amplo campo
de investigativas, fruto de novas hipóteses que vão surgindo à medida que se
recebem as respostas do informante. Desta maneira, o informante, seguindo
espontaneamente a linha de seu pensamento e de suas experiências dentro do foco
principal colocado pelo investigador, começa a participar na elaboração do conteúdo
da pesquisa.
Desta maneira, 30 sujeitos foram abordados pela entrevistadora, na grande
maioria, enquanto aguardavam a consulta médica em um espaço ora denominado
sala de espera. Após todos os esclarecimentos relativos à pesquisa e estes
acordarem em conceder o seu depoimento, os mesmos eram encaminhados para
um consultório que foi disponibilizado pela instituição, constituindo um ambiente
tranquilo e favorável para a técnica, de forma que se sentissem à vontade com o
entrevistador.
A pesquisadora, em seguida, expunha, para o sujeito, o termo de
consentimento livre e esclarecido, bem como os aspectos éticos relativos à
pesquisa. Após o consentimento do sujeito, o termo era assinado por ambos em
52
duas vias, sendo uma entregue ao entrevistado e a segunda arquivada pela
pesquisadora.
Antes de iniciar a entrevista propriamente dita, a pesquisadora preenchia o
questionário de caracterização dos sujeitos. Após esta etapa, passava-se então para
entrevista, com base no roteiro pré-determinado (Apêndice C). O roteiro foi
organizado a partir de indicações temáticas de maneira que o entrevistador pudesse
adaptar o seu sentido ao entrevistado, seu nível de formação e sua forma de
expressão, entre outras coisas. Neste sentido, a temática levantar os conceitos que
os usuários possuem acerca da Aids, buscando fazer uma comparação antes e
depois do diagnóstico‖ se desdobra, com a maioria dos sujeitos, nas seguintes
perguntas: O que é Aids para você? O que você pensava sobre a Aids antes do
diagnóstico? E depois do diagnóstico?
Seguindo o mesmo processo, a temática ―identificar os sentimentos que os
sujeitos possuíam com relação à Aids antes do diagnóstico; Identificar os
sentimentos surgidos durante o processo de descoberta diagnóstica e ao longo do
tempo de estado soropositivo, desde então‖ se concretizaram nas seguintes
interrogações: Quais os sentimentos você tinha em relação a Aids antes do
diagnóstico? Quais foram os sentimentos surgidos durante o processo da
descoberta? E desde então até agora?
Destaca-se, então, que o processo adotado na coleta de dados foi este e que
as perguntas foram formuladas baseando-se no roteiro exposto no anexo
suprarreferido. Como exemplo das mesmas, expomos as seguintes: E quais foram
as experiências que você teve com a Aids antes do diagnóstico? E depois do
diagnóstico quais foram as experiências que você teve? E quais as suas atitudes em
relação a Aids antes de você saber? E como você percebe as atitudes das pessoas
que estão próximas a você, em relação a Aids? Que tipo de comentários que
surgem, quando as pessoas sabem que alguém tem Aids? Como é que são as
atitudes das pessoas? O que você ouviu falar de mitos e crenças em relação a
Aids? Voacha que uma pessoa adquire o rus por quê? E sobre a origem da
Aids no mundo você acha que ela veio de onde? E o que significa ser soro positivo
para você hoje?
Como pontuado, ressalta-se que não são perguntas fixas, por se tratar de
entrevista em profundidade que normalmente são conduzidas de acordo com o
53
discurso do sujeito e são adequadas inclusive respeitando o grau de
esclarecimentos dos indivíduos, não perdendo de vista o objeto do estudo. Para
garantir uma maior fidedignidade, optou-se em gra-las em aparelho digital e,
posteriormente, foram transcritas. As entrevistas ocorreram nos meses de abril e
maio de 2009, e o tempo de cada uma variou de 30 minutos a 1 hora e meia.
2.5 Análise dos dados
Moscovici citado por Oliveira (2008) destaca que todas as palavras ditas e
escritas são susceptíveis de serem submetidas a uma análise de conteúdo e que
esta análise pode ser útil aos estudos da área de representações sociais. Neste
sentido, optou-se pela análise de conteúdo construída por Bardin (2000) e
sistematizada por Oliveira (2008) como uma maneira de apreender os conteúdos e
as dimensões das representações presentes nos discursos dos sujeitos.
A análise de conteúdo é uma das principais técnicas de análise de materiais
produzidos por entrevistas semi-estruturadas ou livres na atualidade, considerando
as suas diversas modalidades. Esta consiste em um conjunto de técnicas de análise
das comunicações que procura obter indicadores que permitam inferir
conhecimentos relativos às condições de produção e à recepção das mensagens
através de procedimentos objetivos e sistemáticos de descrição do conteúdo das
mesmas. (BARDIN, 2000).
Segundo a autora supracitada, para a efetivação da análise de conteúdo
podem ser utilizadas técnicas de análise categorial; de análise de avaliação, de
análise da enunciação; de análise das relações ou associações e análise do
discurso. Dessa forma, torna-se importante compreender o significado da
comunicação, mas também desviar o olhar para além da significação. Daí nasce a
visão multidimensional atribuída à análise de conteúdo que também considera a
pesquisa um trabalho semelhante à garimpagem, de busca, onde o pesquisador
busca, através de significantes ou de significados, atingir outros significados.
(SETÚBAL, 1999).
A aplicação da análise de conteúdo permite o acesso a diversos conteúdos,
54
expresso de forma clara ou não, presente em um texto e divulgados na axiologia
subjacente ao documento analisado. Procura-se, ainda, a implicação do contexto
político nos discursos, a exploração da moralidade de uma determinada época, a
análise das representações sociais sobre algum objeto, o inconsciente coletivo em
determinado tema, o repertório semântico ou sintático de determinado grupo social
ou profissional e análise da comunicação cotidiana, tanto a verbal como a escrita,
entre outros. (OLIVEIRA, 2008).
Deste modo, a análise de conteúdo é uma ferramenta metodológica que pode
ser utilizada em várias disciplinas e objetivos, considerando que tudo que se
transforma em texto é passível de ser analisado com a aplicação desta técnica ou
método.
A cnica para a aplicação da análise de conteúdo é constituída de algumas
etapas definidas por Bardin (2000) como pré-análise, exploração do material ou
codificação, tratamento dos resultados, inferência e interpretação.
Oliveira (2008) propõe uma sistematização de procedimentos estabelecidos
para a análise de conteúdo temático-categorial que também podem ser úteis em
outros tipos de técnicas. Tais procedimentos, bem como as suas etapas, constituem
em leitura flutuante, intuitiva ou parcialmente orientada do texto; a definição de
hipóteses provisórias sobre o objeto estudado e o texto analisado; a determinação
das unidades de registro; a definição das unidades de significação ou temas; a
análise temática das unidades de registro, a análise categorial do texto, o tratamento
e apresentação dos resultados e a discussão dos resultados e associações com o
objeto de estudo.
Portanto, ressalta-se que a operacionalização da análise deste estudo se deu
a partir das planilhas confeccionadas pela autora supracitada.
55
3 DESVELANDO A REPRESENTAÇÃO SOCIAL DA AIDS
O resultado do estudo será apresentado em dois momentos: no primeiro, foi
descrita a caracterização dos sujeitos com variáveis sociodemográficas; no segundo
momento, foi realizada a descrição qualitativa e quantitativa e a discussão de forma
simultânea dos dados coletados. As categorias emergiram da análise de conteúdo
manual. O corpus da pesquisa foi construído a partir dos dados empíricos fornecidos
por 30 entrevistados soropositivos ao HIV/Aids.
3.1 Caracterização dos sujeitos
Os atores sociais do estudo consistiram em 30 sujeitos usuários do SAE,
conforme exposto no percurso metodológico. Os mesmos foram abordados de forma
aleatória de acordo com a disponibilidade. Contudo, buscou-se uma homogeneidade
da população da pesquisa em relação à variável sexo. Foram entrevistadas 16
(53,3%) pessoas do sexo feminino e 14 (46,7%) do sexo masculino, conforme o
exposto na Tabela 1.
Tabela 1 Distribuição dos sujeitos do estudo de
acordo com o sexo. Rio de Janeiro, 2009
Sexo
Nº de Entrevistados
f %
Feminino
Masculino
16 53,3
14 46,7
Total
30 100
De acordo com o Boletim epidemiológico AIDS/DST, de 1980 a junho de
2007, foram notificados 474.273 casos de aids no país (BRASIL, 2007a). O Boletim
epidemiológico de 2008 relata que entre 1980 a junho de 2008 foram identificados
506.499 casos (BRASIL, 2008b), onde se observa um aumento importante de ano
para o outro. o Boletim epidemiológico de 2009 relata que de 1980 até junho de
56
2009, foram identificados 356.427 (65,4%) casos de aids no sexo masculino e
188.396 (34,6%) no sexo feminino.
Segundo Dourado et al. (2006), a partir dos anos 90 do Século XX, a
epidemia se difundiu entre heterossexuais, sendo hoje a subcategoria de exposição
sexual com o maior número de casos notificados da Aids. Como uma das
consequências, a incidência de Aids aumentou rapidamente entre as mulheres e a
razão de casos homem/mulher decresceu de 18,9:1, em 1984, para 1,5:1, em 2004.
Entretanto, o Ministério da Saúde (BRASIL, 2009) demonstrou que, entre homens, a
taxa de incidência em 2007 foi de 22 casos por 100 mil habitantes, enquanto entre
as mulheres, a taxa foi de 13,9 casos por 100 mil habitantes. A razão de sexo
(número de casos em homens dividido pelo número de casos em mulheres) no
Brasil vem diminuindo consideravelmente do início da epidemia para os dias atuais:
em 1986, a razão homem/mulher era de 15:1 e, a partir de 2002, a razão de sexo
estabilizou-se em 1,5:1. Porém, destaca-se a análise da razão de sexo entre
adolescentes de 13 a 19 anos. Nessa faixa etária, o número de casos de Aids é
maior entre as adolescentes. A inversão apresenta-se desde 1998, com 8 casos em
meninos para cada 10 casos em meninas. (BRASIL, 2009).
Desta forma, observa-se que uma das alterações do perfil epidemiológico da
epidemia aponta para uma feminização da Aids, por consequência da
heterossexualização. (BARBARÁ; SACHETTI; CREPALDI, 2005; BASTOS;
SZWARCWALD, 2000).
Em relação à faixa etária exposta na Tabela 2, a idade mínima foi de 22 anos
e a máxima de 58 anos. Pôde-se observar uma predominância dos sujeitos entre as
idades 30 a 39 anos (46,7%). Dados recentes do Ministério da Saúde revelam que
as maiores taxas de incidência se encontram na faixa etária de 25 a 49 anos em
ambos os sexos. as idades de 22 a 29 anos e 50 a 58 anos tiveram menos
destaques em termos quantitativos, 10% e 13,3%, respectivamente. Estes
resultados são semelhantes aos do Ministério da Saúde (BRASIL, 2009) onde
aponta que o primeiro caso de Aids em pessoas acima de 50 anos de idade foi
notificado em 1982. Desde então, até junho de 2008 identificou-se 47.437 casos o
que representa 9% do total de casos.
Porém, quando se ressalta o parâmetro idade segundo o sexo na Tabela 2,
nota-se uma maior concentração do sexo masculino na idade de 40 a 49 anos
57
(23,3%), enquanto no sexo feminino destacou-se a idade entre 30 e 39 anos,
representando 30% das entrevistadas.
Tabela 2 - Distribuição dos sujeitos do estudo segundo a idade e o sexo.
Rio de Janeiro, 2009
Idade (Anos)
N° Entrevistados
Total
M F
f % f %
f %
22 a 29
30 a 39
40 a 49
50 a 58
1 3,3 2 6,7
5 16,7 9 30,0
7 23,3 2 6,7
1 3,3 3 10,0
3 10,0
14 46,7
9 30,0
4 13,3
Total
14 46,6 16 53,4
30 100,0
Em relação ao estado marital exposto na Tabela 3, 15 sujeitos ou 50%
relataram que o casados, vive com companheiro ou possuem união estável e 10%
disseram que possui companheiro fixo, mas não vive com ele, o que demonstra que
60% dos sujeitos possuem relacionamentos afetivos e, possivelmente, uma vida
sexual ativa. No entanto, outros 30% declaram que estão solteiros ou não possui
namorado ou companheiro. Este resultado está relacionado a um aspecto complexo
no conviver com o HIV devido ao estigma no qual a Aids está submersa, ao medo da
rejeição e, consequentemente, do desenvolvimento de uma afetividade em novos
relacionamentos.
Atualmente, o Ministério da Saúde investiu em campanhas voltadas para a
integração social das pessoas soropositivas com o intuito de reduzir o estigma e o
preconceito em torno da síndrome, estimulando, inclusive, os relacionamentos
afetivos entre pessoas sorodiscordantes, o que representa uma conquista e um
avanço, pois, até então, as campanhas eram voltadas na prevenção considerando
as pessoas soronegativas, deixando uma lacuna relacionada àqueles que vivem
com o HIV.
58
Tabela 3 Distribuição dos sujeitos do estudo conforme o estado conjugal e
marital atual. Rio de Janeiro, 2009
No que concerne ao número de filhos, conforme a Tabela 4, 60% dos
entrevistados tem filhos, sendo que 13,3% possuem apenas 1 filho, 30% entre 2 e 3,
16,7% possuem 4 ou mais e 40% dos sujeitos não possuem filhos.
Tabela 4 - Distribuição dos sujeitos do estudo
conforme o número de filhos. Rio de Janeiro, 2009
Nº de filhos
N° de Entrevistados
f %
1
2 a 3
≥ 4
Não possui
04 13,3
09 30,0
05 16,7
12 40,0
Total
30 100,0
No que tange à situação de moradia, observa-se na Tabela 5, a seguir, que a
grande maioria vive com a família (76,7%), o que reflete, inclusive, os dados do
estado marital, pois 50% dos nossos sujeitos vive com o companheiro, 20% moram
sozinhos e apenas 1 sujeito ou 3,3% mora em habitação coletiva.
Estado Conjugal e Marital
N° de Entrevistados
f %
Solteira/ não possui namorado ou companheiro
Casada/ vive com companheiro/ união estável
Possui companheiro fixo, mas não vive com ele
Viúvo
09 30,0
15 50,0
03 10,0
03 10,0
Total
30 100,0
59
Tabela 5 Distribuição dos sujeitos do estudo de acordo com a
situação de moradia. Rio de Janeiro, 2009
Situação de moradia
N° de Entrevistados
f %
Mora sozinho
Mora com a família
Mora em habitação coletiva
06 20
23 76,7
01 3,3
Total
30 100,00
A Tabela 6 diz respeito ao número de pessoas que moram juntas. Ressalta-se
que estão inclusos neste quantitativo adultos e crianças. Observou-se que 50% dos
entrevistados dividem o espaço domiciliar no cotidiano com 2 e/ou 3 pessoas, 20%
moram com 4 a 6 pessoas, 10% moram com 7 ou mais e 20% moram sozinhos.
Tabela 6 Distribuição dos sujeitos do estudo conforme
número de pessoas que moram juntas. Rio de Janeiro,
2009
N° de pessoas que moram
juntos
Nº de entrevistados
f %
1
2 a 3
4 a 6
≥ 7
06 20
15 50
06 20
03 10
Total
30 100
A escolaridade dos sujeitos, na tabela a seguir, revelou que 36,6% possui o
nível médio completo ou superior incompleto, enquanto 26,7% tem o ensino
fundamental incompleto (1ª a 7ª séries); 20% estudaram até o fundamental completo
ou o dio incompleto. Destaca-se que apenas 13,3% dos sujeitos tem nível
superior completo, especialização, mestrado e/ou doutorado. Dentre o grupo,
destaca-se que uma mulher não é alfabetizada.
60
Tabela 7 Distribuição dos sujeitos conforme escolaridade. Rio de
Janeiro, 2009
Escolaridade
Nº de entrevistados
f %
Fundamental incompleto (1ª a 7ª série)
Fundamental completo e médio incompleto
Médio completo ou superior incompleto
Superior completo
Especialização
Mestrado/ Doutorado
Outros (Não é alfabetizada)
08 26,7
06 20,0
11 36,7
02 6,7
01 3,3
01 3,3
01 3,3
Total
30 100,0
De acordo com o Ministério da Saúde (BRASIL, 2009), os dados de
escolaridade em anos de estudo e ao longo da rie histórica apresentaram um
aumento proporcional de casos de Aids entre a população com 8 a 11 anos de
estudo, aumentando de 16%, em 1999, para 25% dos casos em 2006. O nível
educacional tem sido apontado como importante determinante da situação de saúde,
além de expressar diferenças entre pessoas em termos de acesso à informação,
perspectivas e possibilidades de se beneficiar de novos conhecimentos.
Evidencia-se um crescimento no número de casos de Aids entre os
segmentos da sociedade com baixa escolaridade e pior condição socioeconômica.
Este mesmo fenômeno foi observado entre residentes em cidades com menos de 50
mil habitantes. (DOURADO et al., 2006).
Em relação à variável situação de trabalho (Tabela 8, a seguir), a população
da pesquisa mostrou-se heterogênea, 26,7% trabalham com a carteira registrada,
20% informalmente, outros 20% encontram-se desempregados enquanto 13.3%
estão afastados com pensão, sendo que os mesmos não especificaram o motivo
exato do afastamento do trabalho. Apenas 3.3% está aposentado e 6.7% é
funcionário público.
61
Tabela 8 Distribuição dos sujeitos conforme situação no trabalho.
Rio de Janeiro, 2009
Situação no trabalho
N° de entrevistados
f %
Trabalho com registro em carteira
Funcionário público
Trabalho informal
Aposentado
Desempregado
Afastamento com pensão
Outros
08 26,7
02 6,7
06 20,0
01 3,3
06 20,0
04 13,4
03 10,0
Total
30 100,0
O quadro 1 descreve a profissão e a atuação profissional dos sujeitos do
estudo e pode-se notar que a maioria atua na profissão declarada. Dos 6 sujeitos
que estão desempregados, 4 são domésticas, 1 é vigilante e 1 recepcionista.
Apenas 3 sujeitos (10%) exercem profissões que exigem o nível superior, quais
sejam, 1 administradora e 2 professores. Outros 90% atuam em áreas que não
exigem nível superior, incluindo aqueles que estão desempregados.
Fonseca et al. (2000) compartilham da importância, no tocante à infecção pelo
HIV, da ideia de analisar a epidemia por uma perspectiva social, além das
tradicionais categorias de exposição definidas a partir de comportamentos
individuais. Assim, estes dados demonstram a pauperização e a baixa escolarização
da Aids, discutidos por diversos autores (BARBARÁ; SACHETTI; CREPALDI, 2005;
BASTOS; SZWARCWALD, 2000; BRITO; CASTILHO; SZWARCWALD, 2001).
62
PROFISSÃO
ATUAÇÃO PROFISSIONAL
ENTREVISTADOS
Doméstica
Professor
Vigilante
Auxiliar de serviços gerais
Doméstica
Técnico informática /psicólogo
Confeiteiro
Corretor de imóveis
Motorista de ônibus
Porteiro
vendedor autônimo
Recepcionista
Auxiliar de escritório
Servente de limpeza
Administradora
Aposentado
Manicura
Auxiliar de enfermagem
Cabeleireiro
Professor
Pintor
Auxiliar de serviços gerais
Desempregada
Diretor de escola do estado e
professor do município
Desempregado
Auxiliar de serviços gerais
Doméstica
Técnico informática
Confeiteiro
Corretor de imóveis
Motorista de ônibus
Porteiro
vendedor autônimo
Desempregada
(Afastado pensão)
(Afastado pensão)
Administradora
Aposentado
Manicura
(Afastada pensão)
Cabeleireiro
Professor de inglês
Pintor
(Afastada pensão)
4
1
1
2
3
1
1
1
1
1
1
1
1
1
1
1
1
1
3
1
1
1
Total
30
Quadro 1 Distribuição dos sujeitos conforme profissão e atuação profissional. Rio
de Janeiro, 2009.
Observa-se ainda, que a renda pessoal dos entrevistados, conforme Tabela 9,
a seguir, variou de nenhuma renda (6,7%) à R$ 4.000,00 (6,7%). Entretanto, 46,6%
possuem renda mensal de a 1 salário mínimo, destaca-se, que destes 10%
sobrevivem com menos de 1 salário mínimo e a maioria dos sujeitos, 36,6%, recebe
mensalmente 1 salário mínimo, seguido de 30% que ganham entre 2 e 4 salários,
10% entre 5 e 6 e apenas 6,7% possuem uma renda maior acima de 7 salários
mínimos mensais.
63
Tabela 9 Distribuição dos sujeitos conforme renda pessoal
mensal. Rio de Janeiro, 2009
Renda pessoal mensal
N° de entrevistados
f %
Até 1 salário, inclusive
2 a 4 salários
5 a 6
≥ 7 salários
Nenhuma renda
14 46,6
9 30,0
3 10,0
2 6,7
2 6,7
Total
30 100,0
Complementado os dados supracitados, foi constatado, ainda, que 66,7% dos
sujeitos possuem 2 a 3 adultos que vivem da renda familiar, 30% possui apenas 1
adulto e somente 3,3 ou 1 sujeito declarou que tem de 4 a 5 adultos que vivem com
o conjunto desta renda. Em relação ao número de crianças, 33,3% possuem 1
criança, 20% tem de 2 a 3 e 6,7% tem de 4 a 5 crianças. Contudo, 40% não
possuem crianças vivendo da renda familiar.
Em relação ao tempo de diagnóstico, a tabela 10 revela que 33,3% dos atores
sociais da pesquisa sabem do diagnóstico de 4 a 6 anos, seguido de 30% entre 7 a
10 anos, 13,4% de modo igual para as faixas entre 11 a 14 e 15 a 18 anos.
Destaca-se que 6,6% vivem com o HIV de 19 a 22 anos e apenas 1 sujeito ou 3,3%
sabe do diagnóstico menos de 3 anos. A grande maioria dos sujeitos do estudo
convive com o HIV mais de sete anos. Essa característica do grupo poderá
determinar particularidades às representações que serão analisadas.
Tabela 10 Distribuição dos sujeitos conforme o tempo de
diagnóstico. Rio de Janeiro, 2009
Tempo de diagnóstico
N° de Entrevistados
f %
< 3 anos
4 a 6 anos
7 a 10 anos
11 a 14 anos
15 a 18 anos
19 a 22 anos
1 3,3
10 33,3
9 30,0
4 13,4
4 13,4
2 6,6
Total
30 100,0
64
A variável tempo de atendimento na unidade de saúde da pesquisa conforme,
Tabela 11, mostra que 33,3% dos sujeitos fazem parte do programa de DST/Aids
nesta unidade de saúde entre 4 e 6 anos, seguida de 30% entre 7 e 10 anos,
aqueles que possuem de 11 e 14 anos e de 15 e 18 anos de atendimento
representam o mesmo percentual 13,4%, enquanto 6,6% são acompanhados entre
19 a 22 anos e somente 1 (3,3%) são atendidos há menos de 3 anos.
Observa-se que as Tabelas 10 e 11 são idênticas, o que sugere que os
sujeitos da pesquisa tiveram o diagnóstico positivo para o HIV nesta Instituição ou
logo que tiveram o diagnóstico foram encaminhados ou acompanhados na unidade
de saúde da pesquisa. Pode-se considerar um dado positivo, uma vez que quanto
maior o tempo deste usuário na unidade de saúde possibilita a aproximação dos
profissionais e, consequentemente, um vínculo entre profissionais e usuários,
favorecendo de, certa forma, a adesão ao tratamento.
Tabela 11 - Distribuição dos sujeitos conforme o tempo de
atendimento na unidade de saúde da pesquisa. Rio de Janeiro, 2009
Tempo de atendimento na unidade
em anos
N° de Entrevistados
F %
< 3 anos
4 a 6 anos
7 a 10 anos
11 a 14 anos
15 a 18 anos
19 a 22 anos
1 3,3
10 33,3
9 30,0
4 13,4
4 13,4
2 6,6
Total
30 100,0
Em relação ao tempo de utilização dos antirretrovirais, a Tabela 12, a seguir,
indica que 33,3 % faz uso das medicações entre 4 e 6 anos, seguido de 30% que
está entre 7 a 10 e outros 20% utilizam os ARV entre 11 e 14 anos. Já os que fazem
uso das medicações há menos de 3 anos e entre 15 a 18 anos ambos representam
6,7% . Somente 1 sujeito toma as medicações ARV de 19 a 22 anos. Percebe-se
que, para alguns entrevistados, o tempo de diagnóstico não representa exatamente
o tempo de utilização dos ARV ou por não terem tido a indicação clínica imediata ou
por, simplesmente, optarem a não aderirem ao tratamento medicamentoso no
momento do diagnóstico.
65
Tabela 12 Distribuição dos sujeitos conforme o tempo de
utilização dos antirretrovirais. Rio de Janeiro, 2009
Tempo de utilização dos ARV
N° de Entrevistados
f %
< 3 anos
4 a 6 anos
7 a 10 anos
11 a 14 anos
15 a 18 anos
19 a 22 anos
2 6,7
10 33,3
9 30,0
6 20,0
2 6,7
1 3,3
Total
30 100,0
A variável mudança terapêutica (Tabela 13) retrata uma realidade vivenciada
pelos entrevistados no que diz respeito à terapia medicamentosa e, de certa forma, à
dificuldade de adaptação às medicações, considerando que 46,7% dos
entrevistados já mudaram de 1 a 2 vezes o esquema medicamentoso, 16,7% alterou
de 3 a 5 vezes e 3,3 alterou de 6 a 8. Ressalta-se que 33,3% nunca mudaram a
terapêutica, o que sugere uma boa adesão e adaptação nesta parcela do grupo em
estudo.
Tabela 13 Distribuição dos sujeitos conforme mudança
na terapia medicamentosa. Rio de Janeiro, 2009
Mudança terapêutica
N° de Entrevistados
f %
Nenhuma
1 a 2
3 a 5
6 a 8
10 33,3
14 46,7
5 16,7
1 3,3
Total
30 100,0
No que concerne às principais fontes de acesso à informação sobre o
HIV/Aids conforme a Tabela 14, os sujeitos da pesquisa demonstraram que
possuem mais de uma alternativa. Destaca-se que, para o grupo, o principal meio de
informação se constitui do serviço de saúde onde são acompanhados (26,5%),
seguido da televisão (20,4%) e dos panfletos, folders e cartazes que somam 19,4%
e estes normalmente são distribuídos na unidade de saúde da pesquisa. Os sítios da
Internet, em geral, representam 10,2% das respostas, embora seja um dos meios
66
mais eficazes em termos fonte de informação e de conhecimento na atualidade.
Apresenta-se como uma alternativa de difícil acesso para as pessoas de baixa renda
e de baixa escolaridade, além de requerer conhecimento básico de informática, o
que pode justificar o baixo percentual apresentado.
Tabela 14 Distribuição dos sujeitos conforme as principais fontes de
acesso à informação sobre HIV/Aids. Rio de Janeiro, 2009
Fontes de acesso à informação
N° Respostas *
F %
serviço de saúde
televisão
panfletos/ folders/ cartazes
sítios em geral na Internet
revistas em geral
Jjornal
rádio
bula de medicação
livros em geral
26 26,5
20 20,4
19 19,4
10 10,2
7 7,2
6 6,1
5 5,1
3 3,1
2 2,0
Total
98 100,0
* Os valores correspondem ao número de respostas, e não ao quantitativo de sujeitos.
Dos 30 sujeitos entrevistados conforme a Tabela 15, a seguir, 16 foram do
sexo feminino e todas declararam ser heterossexual. Entre os 14 depoentes do sexo
masculino, 8 assumiram ser homossexuais, 3 bissexuais e os outros 3 são
heterossexuais. Segundo Pecoraro (2006), a vulnerabilidade de homem que faz
sexo com homem é ainda muito alta, sendo 18 vezes maior a chance de contrair o
vírus HIV em relação ao homem heterossexual.
Tabela 15 Distribuição dos sujeitos conforme a
tendência sexual. Rio de Janeiro, 2009
Tendência sexual
N° de Entrevistados
f %
Homossexual
Heterossexual
Bissexual
08 26,7
19 63,3
03 10,0
Total
30 100,0
67
Em relação à religião, 25 (83,3%) dos sujeitos declararam ter algum tipo de
religião e 5 (16,7%) afirmaram não possuí-la. Entretanto, a Tabela 15, retrata a
distribuição das diferentes religiões do grupo estudado, ressalta-se que nesta tabela
o número total dos sujeitos são 25 (aqueles que possuem religião). A religião
católica destacou com o maior percentual, 44%, seguida da evangélica 36%, 4% dos
entrevistados declararam ser umbandistas, 12% candomblecistas e 4% tem outro
tipo de religião. Raxach et al. (2007), em pesquisa realizada com homens que fazem
sexo com homens, um dos temas abordados foi a religião. Segundo os autores,
estima-se que mais de 70% da população brasileira se definem como católicos,
porém, os mesmos constataram em sua pesquisa que apenas 26% dos seus
entrevistados afirmaram ser católicos sugerindo algum tipo de exclusão relacionada
à homossexualidade nas doutrinas das Igrejas, principalmente, às Igrejas Católica e
Evangélica. Igualmente, o fato de 14.8% das pessoas se enquadrarem dentro das
religiões afro-brasileiras, como Umbanda e Candomblé, reforça a ideia de maior
concordância da homossexualidade nestas religiões devido à porcentagem
significativamente maior se confrontar a dados oferecidos pelo Censo de 2000 que
refere que somente 0,3% dos brasileiros se dizem praticantes de religiões afro-
brasileiras.
Neste sentido, ressalta-se que os dados estatísticos da nossa pesquisa têm-
se resultados próximos e características semelhantes ao do estudo supracitado.
Tabela 16 Distribuição dos sujeitos de acordo com a religião. Rio de
Janeiro, 2009
Religião
N° de Entrevistados
F %
Católica
Espírita Umbanda
Espírita Candomblé
Evangélica
Outras
11 44
01 4
03 12
09 36
01 4
TOTAL
25 100
As características sociodemográficas dos sujeitos do estudo em tela
revelaram uma homogeneidade do grupo principalmente nos aspectos relacionados
à baixa escolaridade, baixa renda e no processo de confirmação da feminização da
68
epidemia, considerando que, na instituição da pesquisa, o número de usuários
inscritos no programa do sexo masculino e feminino são semelhantes e, portanto,
não se encontrou dificuldades em equilibrar o quantitativo de sujeitos no que diz
respeito ao sexo. Destaca-se ainda, que os entrevistados possuem tempo de
diagnóstico semelhante ao tempo de atendimento na unidade o que parece indicar
uma boa adesão terapêutica do grupo.
3.2 O conteúdo da representação social da Aids
Neste capítulo apresentar-se-ão os resultados alcançados na análise de
conteúdo-temático-categorial, proposta por Bardin (2000) e operacionalizado por
Oliveira (2008). O corpus foi composto por 30 entrevistas gravadas e transcritas,
estas sofreram procedimentos analíticos, resultando nos temas que foram
distribuídos nas planilhas de operacionalização da análise de conteúdo (Apêndice
D).
Para a construção dos temas e posteriormente as categorias foi considerado
o objeto do estudo que buscou a representação social da Aids para indivíduos que
convivem com o HIV e são atendidos em ambulatório especializado no atendimento
ao HIV/Aids. Estas representações foram expressas através dos sentimentos,
atitudes, práticas e imagens construídas relacionadas ao fenômeno Aids ao longo de
quase três décadas da síndrome.
No processo da análise foram identificadas 2843 unidades de registro (UR), e
distribuídas em 265 temas, originando 6 categorias e 9 subcategorias, conforme a
sistematização da análise de conteúdo exposta no quadro 2
1
.
1
Quadro proposto por Oliveira (2008), como forma de operacionalização da análise de conteúdo a partir dos
pressupostos teóricos de Bardin (2000).
69
N°.
Cat.
Categorias
Subcategorias
Total de
UR
%
I
Elementos de memória da
Ancoragem da Aids e seu
processo de transformação
nas memórias e
representações
250
8.79
II
Transmissão e Prevenção
da Aids segundo as
pessoas que convivem com
o HIV.
Meios de transmissão do
vírus HIV segundo os
soropositivos
284
9,98
Comportamento de risco e
prevenção na perspectiva
das pessoas soropositivas
Mitos relacionados à
transmissão do vírus do
HIV para os indivíduos
soropositivos
III
O cotidiano dos indivíduos
soropositivos permeado
pelo processo de
vulnerabilidade ao HIV
190
6,68
IV
Discriminação e
ocultamento no conviver
com o HIV/Aids
Ocultamento como
estratégia de proteção
724
25,46
Preconceito e discriminação
no conviver com a Aids
V
O processo de adesão à
terapia medicamentosa
O tratamento como uma
arma contra a morte no
contexto da Representação
social da Aids
689
24,23
O Cotidiano e o processo
de adesão ao tratamento
vivenciado pelos sujeitos
soropositivo
Religião e no processo
da adesão
VI
O enfrentamento cotidiano
experiênciado pelos sujeitos
que convivem com o HIV
Enfrentando os sentimentos
negativos no conviver com
o HIV
706
24,86
Há vida depois da Aids
Total Geral
09
2843
100
Quadro 2 Quadro demonstrativo das categorias da análise de conteúdo. Rio de
Janeiro, 2009.
70
3.2.1 Elementos de memória da ancoragem da Aids e seu processo de
transformação nas memórias e representações
Esta categoria possui 250 UR distribuídas em 45 temas, representando 8,79%
da análise, onde os sujeitos revelaram como entendem a origem da Aids no mundo,
bem como as suas definições. Alguns dos temas que a constituem remetem ao
processo da formação da representação social, o já referido processo de ancoragem
que, embora discutido no referencial teórico, vale relembrá-lo para uma melhor
compreensão da discussão em tela.
Moscovi (2003) defende a existência de dois mundos ou universos, o reificado
e o consensual. O primeiro aumenta com o desenvolvimento e a difusão das
ciências. O segundo reproduz esta ciência em um nível mais imediato e acessível,
sendo, portanto, transferido a um mundo consensual, circunscrito e re-apresentado.
O mesmo autor acrescenta que, anteriormente, a ciência era baseada no senso
comum e fazia o senso comum menos comum, mas hoje senso comum é a ciência
tornada comum.
Vala (2000) descreve que as representações apresentam uma rede de
significados que concerne à ancoragem da ação e a atribuição de sentido a fatos,
comportamentos, pessoas, grupos e fatos sociais. Neste sentido, uma
representação social é um código de interpretação no qual ancora o não familiar, o
desconhecido, o imprevisto‖ (VALA, 2000, p.474). Moscovi (2003) classifica a
ancoragem como um processo que transforma algo estranho e intrigante, ―novo‖, em
um sistema particular de categorias e o compara com um paradigma de uma
categoria considerada apropriada. Ancorar é dar nome, classificar alguma coisa,
bem como atribuir sentido e, portanto, tornar familiar coisas que sejam estranhas e
ao mesmo tempo ameaçadoras.
Quando a Aids surgiu na década de 80, a mesma foi associada a outras
doenças que assumiram um caráter discriminatório, como descreve Sontag (2007).
A autora prossegue descrevendo que a sífilis, ainda no século XV, gerou uma
versão das metáforas que proliferam hoje em torno da Aids: a imagem de uma
doença que não apenas era repulsiva e punitiva, como também representava uma
invasão que atingia toda a sociedade.
71
Nesta perspectiva, pretende-se então, explorar neste momento, os sentidos
atribuídos pelos sujeitos do estudo na formação representacional do HIV/Aids. As
perguntas que nortearam a maioria das respostas quanto a origem do HIV/Aids,
foram: Como você entende sobre a origem da Aids no mundo? ; Para você de
onde surgiu a Aids? . Em que pese as variações apresentadas nas respostas,
chamou a atenção a presença das seguintes palavras na composição das
sentenças, ―eu ouvi falar‖, ―eu ouvi dizer‖ e ―as pessoas dizem‖, entre outras, antes
das respostas propriamente ditas.
Estas locuções traduzem umas das características das representações
sociais, defendida por Jodelet (2001), por serem socialmente elaboradas e
partilhadas, contribuindo para a construção de uma realidade comum a um
determinado grupo. A mídia, no entanto, exerce um papel fundamental por
influenciar sobremaneira na construção dos saberes. (1998) salienta sobre a
existência de uma modalidade de saber motivado através da comunicação ou dos
meios de comunicação na vida cotidiana, cuja finalidade prática seja de orientar os
comportamentos em situações sociais concretas.
Joffe (2008) considera que, desde a sua descoberta, a Aids tem sido
associada à nação estrangeira e a grupos marginais. No ocidente, a origem da Aids
normalmente está centrada na África. os africanos, por sua vez, tendem a
localizar a sua origem no Ocidente, relacionando-a com o colonialismo e o
imperialismo.
No presente estudo, a representação apreendida tende a colocar a origem da
Aids no outro e, inclusive, em outros povos, mesmo que, em um primeiro momento,
observa-se uma inespecificidade nesta origem. Dessa maneira, como no estudo
desenvolvido por Joffe (2008), ocorreu uma inclinação a localizar a origem da Aids
em países estrangeiros, principalmente no continente Africano, como descreveram
alguns sujeitos:
A aids surgiu, segundo o que eu to sabendo, que foi na... No país lá fora [...].
(Pedro, 55 anos)
Eu sei que essa doença veio de de fora, né? De países de fora, né? (Jéssica, 35
anos)
Os atores sociais deste estudo traduzem todo o feixe histórico e cultural que
entrelaçam a origem da Aids, sob forte influência dos meios de comunicação, como
72
mostra a construção cognitiva apresentada nesta categoria. A origem da Aids para a
maioria dos sujeitos está ancorada na transmissibilidade oriunda do macaco e da
África, que representa o continente mais pobre do mundo.
Bom eu ouvi falar que ela veio da áfrica, né? Através de macaco, num sei se é
verdade ou não, por que até por que eu não fui a fundos a isso, isso que eu sei.
(Roberto, 34 anos)
Bom eu vi numa revista, às vezes falando besteira, mas o que eu li, o vírus que
vivia dentro do macaco na África, né? O macaco verde. o homem chegou na
floresta e comeu o macaco. (Natália, 36 anos)
Gilman apud Joffe (2008) descreveu que a sífilis na cultura ocidental do
século XIX foi caracterizada como depravação moral e manteve uma relação entre
as mulheres negras e prostitutas e a transmissão da síndrome, por serem
associadas a uma sexualidade desenfreada. Em especial as mulheres negras
representavam a hipersexualidade e o exótico e, por vezes, as mesmas eram
consideradas possuidoras de um apetite sexual primitivo e de uma genitália ainda
primitiva. Imaginava-se, ainda, que elas copulavam com macacos.
A relação entre grupos estranhos, aberração e doenças reaparece na
representação social da Aids. Os meios de comunicação ocidentais, que vai além do
ocidente, consideravam o mundo subdesenvolvido, especialmente a África, o lugar
onde a Aids originou-se. No entanto, foi construído um elo entre África, macaco e
Aids que conquistou a atenção da sociedade, porque ele se adequada à pré-
concepção relacionada à natureza causadora de doenças da floresta africana, aos
comportamentos desviantes adotados neste cenário, como a zoofilia, por exemplo, e
à não civilidade socialmente construída que é atribuída à estas nações. (JOFFE,
2008).
A mesma autora, em seu estudo sobre a ancoragem do HIV/Aids, descreveu
que a sua origem está relacionada a um ―cocktel de pecado que envolve a
combinação de duas ou mais práticas sexuais aberrantes ligadas a um determinado
grupo. Este grupo seria o ‖outro‖, ao executarem práticas pecaminosas,
distanciando, desta forma, a Aids do respondente. Conclui-se desta forma que uma
das possíveis ancoragens do HIV encontra-se na bestialidade.
Entretanto, uma das representações sociais predominante assegura que a
Aids se originou e se disseminou a partir dos macacos verdes na África. Isto se
difundiu nos meios de comunicação em função da existência de um determinado tipo
73
de vírus HIV-símio que se assemelha ao vírus humano. A população, em geral, para
justificar e compreender como esse vírus passou do macaco para os seres
humanos, relaciona este processo a práticas aberrantes, quer seja por sua ingestão
ou por relações sexuais.
O Brasil na construção de sentidos representacional da Aids sofre influência
de todos as correntes de pensamentos construídos em torno da epidemia. Portanto,
a bestialidade também foi pontuada por um dos sujeitos deste estudo, não de forma
direta e única, ele associa a origem do HIV/Aids a experiências em laboratórios,
consumo de carne do macaco e ato sexual com animais.
Ih, eu não tenho a mínima ideia. estudos dizendo que foi uma experiência de
laboratório mal sucedida, mas é muito provável que realmente tenha surgido da
África através de contato ou de consumo de carne de macaco por humanos na
África; ou por contato até sexual entre seres humanos e animais como até acontece.
(Chico, 43 anos)
Um outro ator social, além de associar a origem da Aids ao macaco, compara
o vírus do HIV com a sífilis e a hepatite (associação talvez às doenças sexualmente
transmissíveis em geral), enfatizando, no entanto, ser a Aids a pior delas. Este
posicionamento pode ser devido ao caráter clínico da sífilis, considerando-a ser
menos grave, pois hoje em dia existe o prognóstico da cura da mesma,
diferentemente do HIV/Aids.
Olha, para falar a verdade eu num tenho noção, são tantas histórias, falam que veio
do macaco, foi espalhando, num tenho a menor noção de onde tenha vindo isso,
porque seria tão bom se pudesse transar sem ter, né? Porque não tem só o HIV, né?
tem outras doenças também, né? Que são tão severas quanto o HIV, tipo a hepatite
ou sífilis ou outras doenças que tem, mas o HIV é a pior delas, mas não tenho noção
de onde veio. A única história que eu conheço é que veio de um macaco africano
[...]. (João, 31 anos)
[...] fala pra mim agora que é da sífilis, por que eu não gosto desta palavra (Aids)
então fala sífilis. (Gabriela, 54 anos)
Todavia, percebe-se que a ancoragem para o HIV/ Aids para alguns, ainda
está enraizada em doenças estigmatizadas como a sífilis, que tem em seu bojo,
segundo Sontag (2007), a metáfora da peste, na qual a epidemia da Aids está
compreendida. Neste sentido, as epidemias consideradas pestes são reconhecidas
como doença coletiva e são encaradas como castigos impostos, refletindo a ―a ira de
Deus‖. Esta representação também foi expressa neste estudo, conforme os relatos
abaixo:
74
A Aids é uma doença que está escrita, é como uma das pestes, das pragas que
estavam escritas, a Aids é uma delas, uma dessas pragas, que viria nos fins dos
tempos, virou uma epidemia, a origem dela seria uma praga. (Ana, 38 anos)
Parece até uma praga que veio não sei de onde, e aconteceu... Como deve surgir
outras coisas piores, uma doença pior [...]. (Kaká, 41 anos)
[...] Para mim isso é uma doença que veio para dar um freio no ser humano, é mais
para frear o ser humano mesmo... Uma coisa que veio enviada por Deus para frear
ele,entendeu? (Gilsom, 48 anos)
A peste é inevitavelmente vista como uma condenação da sociedade, e
enquanto a metaforização da Aids a transforma de fato numa condenação, as
pessoas acostumam-se à ideia de que a doença consequentemente se espalhará
por todo o mundo. As doenças sexualmente transmissíveis possuíam esta
característica, qual seja, um castigo imposto a um determinado grupo identificado
como transgressor ou viciado. (SONTAG, 2007).
As imagens mais recorrentes na década de 80, em diversos países,
comparavam a Aids à peste negra e chamavam-na de ―peste gay‖, tendo, até
mesmo, respaldo de alguns cientistas para tal eufemismo (GALVÃO, 2000). O
surgimento dos primeiros casos da síndrome no início da década de 80 foram
associados a grupos populacionais específicos como homossexuais, usuários de
drogas e trabalhadoras do sexo e hemofílicos e estes seriam, então, denominados
de grupo de risco.
Considerando que as representações sociais da síndrome são construídas
através da ancoragem da Aids que circulam em uma determinada sociedade, este
conhecimento é construído com base em proposições que veiculam na comunidade
científica, nos diversos meios de comunicação e nas conversas do dia-a-dia. Neste
sentido, Sontag (2007, p. 114) corrobora ao declarar:
A Aids é concebida de maneira pré-moderna como uma doença provocada pelo
indivíduo enquanto tal e enquanto membro de algum ―grupo de risco‖ essa
categoria burocrática, aparentemente neutra, que também ressuscita a ideia arcaica
de uma comunidade poluída para a qual a doença representa uma Condenação.
De igual modo, Ribeiro et al. (2005) verificaram que, entre profissionais de
saúde, emergiram em suas falas elementos figurativos como descuido e
promiscuidade, evidenciando que a Aids está ancorada nas primeiras
representações, advindas de doenças contagiosas e das práticas sexuais
irresponsáveis, gerando, portanto, culpabilização.
Conforme o exposto, uma outra dimensão apresentada pelos sujeitos para a
ancoragem do HIV/Aids encontra-se relacionado a um determinado grupo social, os
75
homossexuais e à promiscuidade. Destaca-se que a associação da Aids ao
homossexualismo e às condutas sexuais ilícitas foram as primeiras explicações
expostas pelo mundo científico. Os temas que seguem reproduzem esta realidade:
A origem? Uns falam que é do homossexualismo, né? Outros dizem que vem do
macaco, né? As pessoas dizem assim, que um vem do homossexualismo e outro
surgiu o vírus do macaco, ne? É isto que as pessoas falam. ( Maria, 37 anos)
Olha, eu entendo, que eu escutei a primeira palavra Aids na minha vida foi quando
eu escutei uns comentários de pessoas, eles conversando e falando que foi da
experiência que eles fizeram com o macaco que nisso começou os homossexuais,
que o macaco passou para um homossexual, esse homossexual foi passando, e dali
foi passando de um para um. (Marta, 35 anos)
No entanto, percebe-se ainda de certa forma, um predomínio da
representação associado ao chamado ―grupo de risco‖, embora este conceito
tenha sido substituído pelo da ―vulnerabilidade‖, como defendido por diversos
autores como Ayres et al. (2006), Bastos e Szwarcwald (2000), Galvão (2000),
Mann, Tarantola e Netter (1993) e Parker et al. (1994). Os temas a seguir ficam bem
claro este posicionamento, mesmo para as pessoas soropositivos, porém eles
mesmos não os consideram como parte do grupo de risco.
Eu achava que a AIDS nunca ia chegar perto de mim, por que eu não me
enquadrava no grupo de risco, mas ela chegou, mas num era pra mim, normal, pra
mim aquilo ali era uma doença de travesti, de gay, uma pessoa normal que tinha um
namorado não ia ter AIDS. (Natália 36 anos)
[...] A minha tia disse que é doença de mulher vagabunda, a gente sofre com isso
[...]. (Glória 54 anos)
[...] Vem aquela coisa negativa também, né, porque relacionam a Aids com a
promiscuidade, com a prostituição, a mulheres fáceis e homossexuais... no meu
caso eu contraí a Aids dentro da minha casa convivendo com uma pessoa e eu
contraí a Aids dentro do meu lar com o meu marido. (Adriana 37 anos)
Uma outra corrente divulgada pela mídia foi à criação do vírus do HIV em
laboratório. Aggleton et al. apud Joffe (2008) citam este artifício em que a Aids foi
considerada como tendo sido fabricada em laboratórios de pesquisa pela CIA
(Central intelligence Agency) e FBI (Federal Bureau of Investigation) com a
finalidade de engenharia genética e guerra biológica. A ideia de fabricação do vírus
do HIV/ Aids em laboratório ainda é reproduzida nos discurso dos sujeitos, vejamos
alguns temas relacionados:
[...] o homem descobriu e fez o vírus dentro de um laborario de um tubo de ensaio
e fez um teste... a origem da AIDS é num laboratório, você pode ver que isso é fato
comprovado, que veio do laboratório, duma região da África. (Adriana 37 anos)
76
Ah, tem várias hipóteses, uma de que é criado em laboratório, né? o sei, tem
tantas possibilidades de contrair, a gente não sabe o certo de onde vem, por que
vem, entendeu? Não sei. Hipótese... dessa de laboratório, de que foi criado mesmo,
para exterminar um pouco, né, a população mundial que está muito grande.
que eles não pensavam que a doença fosse se propagar assim, como ela se
propagou [...]. (Nelson 44 anos)
Ah, eu acredito que através dos laboratórios, e depois eles levaram... Penso que
eles levaram pro continente africano onde teve uma epidemia danada, onde eles
fazem algumas pesquisas com relação a remédios com relação a coisas
laboratoriais. Hoje não se fala de laboratórios na áfrica, mas se falava antes [...].
(Carlos 33 anos)
Embora tenha quase três décadas da síndrome e algumas definições
comprovadas cientificamente, a sociedade imbrica em vários contextos para a
ancoragem da Aids, devido às suas características próprias baseadas no medo e
nas incertezas no que tange à sua origem, disseminação e o viver com a Aids. Spink
(2008, p 121), ao retraduzir o conceito de contexto social, considera que o mesmo
é marcado não apenas pelos fatores situacionais usualmente associado com o
metassistema social, incluindo aí as determinações estruturais e as relações sociais,
como também pelos diferentes tempos históricos que permeiam a construção dos
significados sociais.
Uma outra ancoragem para o HIV/Aids, apresentada pelo grupo em estudo,
foi à comparação da Aids com o câncer. Porém, de forma antagônica, com a
descrição proposta por Sontag (2007, p. 95) a autora descreve a Aids como o
câncer, não dá margem para idealizações românticas ou sentimentais, talvez por ser
demasiadamente forte a associação entre doença e morte‖. Conforme pode ser
observado nas falas seguintes.
O que soube, ouvi falar, é que as pessoas falam que sobre a epidemia, que é uma
doença muito grave, pior do que o câncer. E quando está ai, tem muitas pessoas
que descobre o câncer e morre logo, e HIV, não, você descobre, mas se você fizer o
tratamento, você vive muito tempo. (Vitória 58 anos)
Mas que hoje em dia é ainda bem melhor do que outras doenças por ai, como:
câncer né, que depois de 06 meses que a pessoa descobre a pessoa se entrega e
acaba morrendo rápido. (Valéria 22 anos)
É normal , não tenho o que pensar, é melhor ter uma doença assim do que ter uma
doença que você morre mais rápido, tipo câncer, porque o câncer você não tem
tratamento, você tem certo dia para sobreviver, você não tem que fazer
quimioterapia, e essa doença o, você tomar uns remédios e você tem que tomar.
(Lara, 29 anos).
Atrelado a este novo olhar para a Aids, pode ser pensado em uma nova
representação para o HIV/Aids, considerando que as pessoas que convivem com o
vírus ou com a síndrome estão mais otimistas e isto se deve aos tratamentos hoje
eficazes no controle da síndrome, inibindo a imagem da Aids associada à morte.
77
Especialmente no Brasil, devido à Lei Sarney implementada desde 1996 que
garante a distribuição gratuita das medicações antirretrovirais. Desta forma,
Schaurich et al. (2008) destacam que as medicações antirretrovirais do ponto de
vista mais filosófico-reflexiva, objetivam substituir a cultura em que Aids é igual à
morte, por uma cultura que, gradativamente, considera o viver com Aids sob a
perspectiva da cronicidade.
Neste contexto, a Aids passa a assumir um caráter crônico, não somente no
meio reificado, mas também no senso comum, afinal as pessoas que convivem
sentem cotidianamente as transformações deste perfil epidemiológico. A Aids,
portanto, hoje tem uma tendência a ser ancorada em doenças de caráter crônico
como a diabetes, que necessitam de tratamentos específicos e contínuos, ou seja,
necessitam de ―remédios‖ para o resto da vida. Os temas que seguem retratam a
sentença supracitada:
Uma doença crônica controlada, tem tratamento direitinho, mas como uma doença
que surgiu anos atrás, né? As pessoas iam a óbito, né? Hoje tem tratamento,
coquetéis, então a pessoas se cuidando tem uma qualidade de vida boa. (Nelson, 44
anos)
Mas a AIDS é uma doença que tem controle. Pra mim hoje em dia, é uma doença
que tem controle. (Jorge 43 anos)
[...] hoje para mim, significa... Ter uma doença crônica, como uma diabetes,
entendeu?. (Nelson, 44 anos)
[...] tomo os meus remédios todos os dias e sigo a vida, pra mim é como se fosse
uma pessoa que tem uma diabetes, ou outras doenças assim e você é obrigado a
tomar a medicação. (Gustavo 48 anos)
Ribeiro et al. (2005) corroboram os dados empíricos supracitados com o
estudo realizado com profissionais que trabalham diretamente com pacientes
soropositivos, como psicólogos, enfermeiros, médicos e assistentes sociais, além de
pacientes soropositivos. Os resultados apontaram uma superação de
representações sociais da Aids relacionado à morte, passando a ancorá-la em
doenças crônicas e incuráveis como a diabetes a hipertensão arterial.
Em relação à definição da Aids, os sujeitos a conceituaram de múltiplas
maneiras, nem sempre complementares. Os elementos temáticos variaram entre
doença como qualquer outra, doenças sexualmente transmissíveis, doença que não
tem cura, manifestação do vírus, doença perigosa e que prejudica a população,
prevalecendo aspectos negativos em torno da doença.
78
No entanto algumas observações são relevantes. Hoje, após quase trinta
anos da síndrome, imagina-se que esteja intrínseco na sociedade um conceito
básico sobre a Aids, que é considerá-la como uma doença sexualmente
transmissível (DST), porém, os atores sociais do estudo não pontuaram de forma
expressiva tal condição, apenas três (3) sujeitos, totalizando (10%) replicaram tal
assertiva, ressaltando-se que todos os sujeitos do estudo adquiriram o vírus do HIV
através de relação sexual.
Porém, declarar a Aids como uma DST para estes sujeitos que convivem
com o HIV, talvez os deixassem constrangidos, devido a todo o estigma que envolve
tais doenças. Como bem esboçou Sontag (2007), a transmissão sexual de uma
doença é encarada para a maioria das pessoas como um flagelo da qual a própria
vítima é culpada e mais recriminada que as outras, particularmente porque a Aids é
representada como uma doença causada não apenas pelos excessos sexuais, mas
também pela perversão deste ato.
Vejamos a produção cognitiva elaborada pelos sujeitos acerca desta temática:
A Aids é uma doença sexualmente transmissível, mas nunca me liguei muito nisso
não. (Valéria, 22)
Para mim é uma doença muito grave, ela significa uma doença muito grave [...].
(Rita 58 anos)
É uma doença que prejudica muitas pessoas..., que prejudica a população como
um todo. (Paulo 40 anos)
A Aids é uma doença que não tem cura. (Paulo 40 anos)
É uma doença comum, mas... Eu pensava que era uma coisa terrível pelo fato de
não ter cura, né [...]. (Maicon 32 anos)
Torres e Camargo (2008), em estudo realizado com pessoas soropositivos ao
HIV, constataram que a aids é representada como doença, diferente da
representação da soropositividade, a primeira com sintomas e a segunda,
assintomática. Entretanto, é preciso distinguir as muitas interfaces do processo
saúde-doença em que os indivíduos estão expostos, assim como os nexos
relacionais consigo, com os outros indivíduos e com o contexto cultural, que se faz
revelar a partir dos modos de ação e compreensão da sociedade, política, educação,
ciência, filosofia, economia, religiosidade e espiritualidade, entre outros.
(SCHAURICH; COELHO; MOTTA, 2006).
79
O fato da Aids não ter cura não implica na representação negativa que este
fato trazia antigamente, devido à existência de tratamentos potentes que reduzem
potencialmente o risco de morte das pessoas infectadas. Esta concepção, sobretudo
para uma nova dimensão da representação social do HIV/Aids, deixando o cenário
da morte para entrar em cena a vida e com ela a esperança.
Uma doença incurável, né, representa para todo mundo a morte, só que eu não vejo
assim não, devido hoje os tratamentos as coisas eu vivo normalmente, procuro me
cuidar tomar as medicações em dia e vou levando a vida. (Gustavo, 48 anos)
Aids hoje em dia é uma forma de a gente ir atrás dos nossos objetivos, já não passa
a ser mais aquele tabu, que antes, quem tinha AIDS, era uma pessoa que ia
morrer... Enfim, ia perder a vida, ia se privar... Ia ter uma vida para mim, não
tentar evoluir. Hoje em dia para mim a AIDS é evolução... É a vida, é a esperança. È
algo que para a gente que tem, é fundamental se tratar, estar se tratando. Então isso
nos gera a esperança de dias melhores. enfim... tudo pra mim. (Luca, 28 anos)
É vida, porque através do HIV, a gente passa a dar valor para coisas que a gente
não dava antigamente...É o que eu falei é vida, eu devo, a vida que eu tenho hoje eu
devo ao HIV, a vida que eu tenho hoje [...]. (Jefter, 37 anos)
Neste sentido, Cardoso e Arruda (2005) corroboram ao descrever que
aqueles soropositivos que conseguiram concretizar o processo de adesão
conseguiram ―ter uma vida normal‖. Porém, estes sujeitos tiveram que ―reaprender a
viver‖, sendo considerado fundamental a participação do próprio indivíduo como um
sujeito ativo neste processo. Apesar da Aids não ter cura, existe a ―cura paliativa‖,
pensamento positivo e vida saudável. Neste momento, não é o intuito aprofundar
este mérito explicitado por Cardoso e Arruda, pretende-se ainda neste estudo, em
outras categorias, trabalhar outras dimensões da representação social, dentre elas
as atitudes e práticas dos sujeitos adotadas no cotidiano como forma de
enfrentamento.
Jovchelovitch (2008), ao trabalhar o conceito das representações sociais,
intersubjetividade e a construção simbólica da realidade social, propõe que os
processos que engendram as representações sociais estão imersos na comunicação
e nas práticas sociais: diálogo, discurso, rituais, padrões de trabalho e produção,
arte e cultura. Neste sentido, foi destacada na análise em tela a objetivação da
representação social da Aids ancorado na imagem do cazuza. Os temas construídos
foram 2, contendo 15 UR., que são ―Aquilo é sangue de Cazuza‖ e ―imagem da
Aids associada a Cazuza‖.
80
O único que eu conheci foi Cazuza que pra mim é a maior referência de AIDS.
(Natália, 36 anos).
No meu bairro assim, se está magro demais, no meu bairro é, ah escom AIDS,
falam logo, aquilo é sangue de Cazuza. É assim. Porque o Cazuza é assim é
HIV, aí a pessoa te define como sangue de Cazuza. Esta falando que aquela pessoa
tem AIDS, para não dizer abertamente. (Marta, 35 anos)
É, assim antes do diagnóstico, eu nunca tinha tido experiência nenhuma com tal, a
não ser sobre reportagem que a gente escutava né? Cazuza mesmo, aquela coisa
toda. De pessoas que ficaram na história. (Maria, 37 anos).
Este cantor foi uma das primeiras figuras públicas a admitir, em 1989, que era
soropositivo e falar abertamente sobre sua vida sexual. Conforme a revista VEJA
(2008), na ocasião do diagnóstico, pesava 68 quilos e, em pouco tempo, chegou a
40, sendo o seu falecimento em julho de 1990. A imagem do Cazuza no Brasil
marcou de forma indelével a Aids e, quase 20 anos após a sua morte, ele ainda é
lembrado pela sociedade, como um símbolo da síndrome.
Jovchelovitch (2008) reforça que a objetivação e a ancoragem constituem as
formas peculiares em que as representações sociais estabelecem intercessão,
trazendo para um nível quase material a produção simbólica de uma sociedade e de
certa forma, dando conta de concreticidade das representações sociais na vida
social.
Deve-se, no entanto, destacar a dificuldade encontrada, na atualidade, no
resgate da ancoragem da síndrome, em que a sua delimitação encontra-se em uma
fronteira muito sutil com a presença de elementos constituintes da atual
representação da Aids, especialmente quando se observa um processo de
transformação da própria representação. Neste sentido, entende-se que o conteúdo
desta categoria mostra-se como uma aproximação a esta discussão e à
possibilidade de abertura de uma reflexão acerca deste difícil processo de
formação representacional.
81
3.2.2 Transmissão e prevenção da Aids segundo as pessoas que convivem com o
HIV
Esta categoria é composta por 284 UR, correspondendo a (9,98%) dos temas
construídos. Nesta categoria se discute a percepção dos sujeitos do estudo quanto
às formas de transmissão do vírus HIV, bem como os mitos relacionados a ele. As
respostas foram variadas, adequando em várias dimensões representacionais das
quais emergiram 3 subcategorias:
- Meios de transmissão do vírus HIV segundo os soropositivos;
- Comportamento de risco e prevenção na perspectiva das pessoas
soropositivas;
- Mitos relacionados à transmissão do vírus do HIV para os indivíduos
soropositivos.
Jodelet (2001) relata que as definições partilhadas pelos componentes de um
mesmo grupo estabelecem uma visão consensual da realidade para esse grupo,
mas, ao mesmo tempo, esta visão pode entrar em conflito com a de outros
grupamentos humanos. Desta maneira, observa-se como as representações
apresentam-se como guias para as ações e as trocas cotidianas, em um processo
dinâmico em que a construção social se dá nas interações travadas no dia a dia.
Nesta perspectiva, observa-se-á nesta categoria, que a construção cognitiva
dos sujeitos do estudo conterá a presença dos dois universos apresentados por
Moscovici (2003), o consensual e o reificado relacionados aos meios de transmissão
do HIV, além das atitudes e práticas dos sujeitos relacionadas aos aspectos
preventivos.
3.2.2.1 Meios de transmissão do vírus HIV segundo os soropositivos
Frente ao exposto, os sujeitos do estudo apresentaram quase todas as
formas cientificamente comprovadas quanto aos meios da transmissão do vírus HIV.
Os temas construídos foram: Transfusão de sangue, pega quando o corte no dedo
82
encosta-se em outro corte, relação sexual, através de seringa, pode-se contaminar
com perfurocortantes, acidente de trabalho e motivos de transmissão relacionados
às drogas.
Conforme os temas expostos acima, nota-se que os sujeitos demonstraram
algum conhecimento quanto aos motivos que levam as pessoas a se contaminarem
pelo vírus HIV. No conjunto das respostas foram pontuados vários meios de
transmissão, conceitos elaborados que compõem o universo reificado, ou seja,
conhecimento de natureza científica, conforme é explicitado nas unidades de
registro que seguem.
É com Relação sexual, pela transfusão de sangue, pelo menos o que eu sei são por
estes dois motivos. (Vitória, 58 anos)
Relações sexuais e transfusão de sangue [...]. (Kely, 32 anos)
Independente da relação sexual tem outras coisas, ? Tem as drogas, né? A
transmissão por via venosa, né? Que mais Meu Deus... Tem mais? (risos) (Paulo, 40
anos).
Assim, uma das principais... Sanguíneo, através do sexo, né? Sexo anal, oral... E eu
acho que é um dos principais, e alguns que podem ocorrer como usufruir a mesma
seringa... A pessoa que se droga, usar a mesma seringa... A pessoa que inala
cocaína com o mesmo papel... Eu não sei se isso é uma coisa que pode usar
como critério de se pegar, mas eu acredito que tenha condição sim, porque como eu
havia dito antes, não sei se eu cheguei a falar, mas a pessoa vai inalar o mesmo
papel sujo de sangue, e ela vai estar com uma lesão no nariz ou sangrando também,
pode ocorrer transmissão. (Lucas, 28 anos)
Relação sexual sem preservativo. E também é transfusão de sangue [...]. (Kaká, 41
anos)
Eu só acho que é por transfusão de sangue ou com corte assim, no caso.
Cortamos o dedo, meu filho corta o dedo, aí um coleguinha corta também, pegou
no mesmo lugarzinho, aí passar pro coleguinha. (Gabriela, 54 anos)
Relação sexual, pessoas que usam drogas, acho que só. (Valéria, 22 anos)
Eu conheço assim, relação sexual né, seringa, só sei isso. (Glória, 54 anos)
Os sujeitos declararam, na maioria das vezes, duas principais formas de
transmissão, embora tivessem algumas pessoas que falaram três ou mais. Destaca-
se que a relação sexual, que é um dos principais meios de transmissão do vírus HIV
e o mais conhecido e disseminado pela mídia, foi pouco expressiva no grupo em
foco, apenas 12 (40%) sujeitos a expuseram, embora na subcategoria em questão
foi o tema com o maior número de UR, 18 unidades de registro.
O fato das pessoas omitirem a via sexual como um dos meios de transmissão
do vírus HIV pode ser justificada por terem adquirido por esta via, o que muitas
83
vezes pode acarretar em sentimento de culpa e auto-punição, além de terem que se
sujeitar ao julgamento social impregnado de estigma e de preconceito, considerando
que a Aids implica em valores morais e sociais.
Segundo Fauci e Lane (2006), o principal meio de transmissão da infecção
pelo vírus HIV é a sexual, por ser predominantemente uma doença sexualmente
transmissível (DST), e considerada como tal no mundo inteiro. O risco pela infecção
existe tanto no sexo anal, vaginal e oral, o último com um número menor de casos
registrados.
Lima et al. (1996) reforçam que a principal forma de exposição ao vírus no
mundo inteiro é a sexual, sendo que a transmissão heterossexual por meio de
relações sexuais sem preservativos foi considerada pela Organização Mundial de
Saúde (OMS) como a mais frequente no ponto de vista global. Porém, em países de
primeiro mundo como EUA ainda é predominante a transmissão entre homens que
fazem sexo com homens, contudo, a incidência anual de novos casos de Aids
condicionados pela transmissão heterossexual está aumentando continuamente,
sobretudo, entre as mulheres. (FAUCI; LANE, 2006).
Francisco et al. (2004) ressaltam que as DST‘s são infecções transmitidas
através do contato sexual, durante relação oral, vaginal ou anal sem proteção.
Segundo Oltramari e Otto (2006), existe uma preocupação com os indicadores de
contaminação por via sexual entre homens e mulheres heterossexuais,
considerando que os índices tem aumentado cada vez mais no meio heterossexual
enquanto no meio homossexual tende a diminuir.
Marques, Oliveira e Gomes (2004), em estudo com profissionais de um
hospital de universitário do Rio de Janeiro, destacaram como um dos elementos do
núcleo central a palavra sexo, na periferia foram descritos outros elementos ainda
relacionados à transmissão, como transfusão, contaminação, sangue, drogas e
perigo. Estes elementos estão relacionados de forma direta aos meios de
transmissão do rus HIV. O sexo como núcleo central retraduz a dimensão
imagética e um conhecimento acerca da Aids, considerando a divulgação em massa
da via sexual como principal meio de transmissão do vírus HIV.
Os outros meios de transmissão do vírus HIV que se mostraram relevantes
para o grupo em estudo foram a transfusão de sangue, este tema concentrou 14 UR
e motivos de transmissão relacionados às drogas com 16 UR. Os motivos
84
relacionados a drogas, no entanto, chamou a atenção pelo fato das pessoas nem
sempre o definirem como compartilhamento de agulhas, mas resumia-se ao uso de
drogas. Porém, um dos sujeitos questionou o compartilhamento do papel contendo
cocaína em pó, considerando que pode conter sangue tanto na droga (substância)
como no papel e os usuários terem lesões nas narinas, culminando na aquisição do
vírus. Esta hipótese, no entanto, não foi confirmada em literatura.
Segundo a literatura científica, a associação do consumo de álcool e do uso
de substâncias entorpecentes a um comportamento sexual de risco, homossexual ou
heterossexual, eleva a possibilidade da transmissão via sexual do HIV (FAUCI;
LANE, 2006). Franco e Figueiredo (2004) consideram que a exposição ao HIV para
o segmento de usuários de drogas injetáveis (UDI) se via partilha de seringas e
de relações sexuais com seus parceiros. Esse segmento social pode ser
considerado de maior risco à infecção pelo HIV, dada a sua interação específica
mais intensa e seletiva que nas outras redes sociais. Bastos et al. (1993), Já advertia
quanto à transmissão por seringas e agulhas contaminadas compartilhadas por
usuários de drogas injetáveis, não devendo subestimar o papel da transmissão
sexual entre os próprios UDIs e entre estes e seus parceiros.
Brito, Castilho e Szwacwald (2001) defendem que o segmento de usuários de
drogas injetáveis (UDI) desde meados dos anos 80, já ocupava posição de destaque
entre os casos por transmissão sanguínea e tal situação mantém-se em expansão
em determinadas áreas geográficas no Brasil como nos municípios de pequeno e
médio porte, ao longo da faixa que conecta o Centro-Oeste ao interior paulista e,
mais recentemente, ao litoral sul do País. Neste sentido, Bastos et al. (1993) no
início da cada de 90 se posicionavam frente a este fato, ao observarem que,
desde os primeiros casos da epidemia da Aids, o papel de uso injetável de drogas
crescia de forma preocupante, ocupando um dos principais meios de transmissão do
vírus HIV.
Os atores sociais do estudo apresentaram ainda, em seus discursos o risco
da transmissão por transfusão sanguínea, embora o considerasse menos provável
entre os demais meios de transmissão, como demonstram os relatos abaixo:
[...] tem casos de hemofílicos que é raro mas antigamente era mais né, transfusão
de sangue, hoje em dia tem mais cuidado em relação a isso... (Ana, 38 anos)
É muita coisa, né? Não tem aquela precaução, está na balada, ai bebeu, ai
conhece alguém, fica com aquele alguém, e ai foi. Ai dança, né? Fora isso tem a
85
transfusão, de repente a pessoa está no hospital, tomar um sangue contaminado,
essa possibilidade também, mas ai é mais raro. (Nelson, 44anos)
Porque tem outros tipos de transmissão também, como transfusão de sangue, hoje
em dia é mais difícil [...]. (Marta, 45 anos)
Brito, Castilho e Szwacwald (2001, p. 211), em pesquisa realizada com
dados epidemiológicos, destacaram que
à categoria de transmissão sanguínea, anotaram-se alterações relevantes,
principalmente em hemofílicos e em indivíduos que receberam transfusão de
sangue. Segmentos populacionais intensamente atingidos no início da epidemia
apresentaram importante declínio ao longo do tempo. Essa queda explica-se pelo
controle do sangue e hemoderivados, principalmente com a disponibilidade dos
testes laboratoriais para detecção de anticorpos anti-HIV, a partir de 1986. Em
1984, essas subcategorias representavam 62% dos casos da categoria de
exposição sanguínea e, em 1999/2000, representam apenas 0,9%.
Em estudo recente realizado com 85 acadêmicos do primeiro ano do curso de
enfermagem de uma universidade privada, os resultados mostraram que os
estudantes consideraram na sua grande maioria a relação sexual como o principal
meio de transmissão do vírus HIV, visto que 97% destes assinalaram tal assertiva.
Os outros meios de transmissão citados foram: contato direto com secreções
genitais (74,1%); uso compartilhado de agulhas e seringas (96,4%); transfusão de
sangue contaminado (94,1%); transmissão da mãe contaminada para o filho, na
gestação (82,4%); e contato direto com sangue contaminado (75,3%), inclusive no
uso de instrumentos de manicure (60%) e odontológicos (57,6%). (MARTA et al.,
2008).
No estudo supracitado, percebe-se que os graduandos do curso de
enfermagem ainda apresentaram algumas dúvidas quanto aos meios de
transmissão, o que ganha importância à medida que se compreende que estes
sujeitos têm o segundo grau completo e estão inseridos no primeiro ano em um
curso superior da área da saúde. No entanto, alguns meios de transmissão
passaram desapercebidos para alguns estudantes, destacando-se instrumentos de
manicure e instrumentos odontológicos. Este resultado reforça a necessidade de
trabalhos educativos voltados para a temática, de amplo espectro, dentro e fora das
universidades.
Da mesma maneira, foi citado por alguns usuários deste estudo, o risco da
transmissão do vírus HIV por materiais/objetos perfuro-cortantes. Este tema incluiu
ainda os riscos ocupacionais que os profissionais de saúde estão expostos. Diante
da temática em questão, se faz importante reforçar que seria conveniente às
86
pessoas independentes de serem soropositivas ao HIV tivessem consciência de
terem alguns pertences de uso individuais e intransferíveis, como alicate de unha,
gilete, seringa descartável (no caso dos UDIs), considerando que não é somente o
HIV que se transmite por meio de objetos perfuro-cortantes, mas outras DSTs como
a hepatite B e C.
Nos relatos abaixo, os usuários abordam tal questão:
[...] tu vai no dentista, se ele não tiver esterilizado bem os materiais, ou o dentista
ou a manicura, essas coisas...coisas que ele usar contigo, mas as vezes pode
sangrar em algum lugar, e se o material não estiver correto, esterilizado você pode
pegar por aí. (Kaká, 41 anos)
Porque tem muitos meios, os outros falam que é pelo alicate, com gilete, tem uns
que não sei o que. Quer dizer são tantas coisas que a gente fica assim abismado.
(Flávia, 36 anos)
Hoje em dia tem muitos cuidados, claro que rola, uns acidentes né, ... hoje em dia
tem mais cuidado em relação a isso, acidente está aí, acontece, ainda mais para
quem trabalha em hospital, mexe com agulha por mais que use luvas, se espetar é
uma loucura, mas , sei lá, tem muito esclarecimento em relação a isso [...]. (Ana,
38 anos).
[...] Até mesmo alguns acidentes também como se furar com uma agulha, no caso
dos enfermeiros, ou se cortar com um bisturi. (Kely, 32 anos)
Fauci e Lane (2006) afirmam que existe o risco ocupacional pequeno, porém
concreto, de transmissão do HIV entre profissionais de saúde, estendendo-se a
todos os outros trabalhadores que manipulam materiais contaminados. No entanto,
existem normas técnicas preconizadas que são o uso dos EPI (equipamento de
proteção individual) que devem ser implementadas pelos profissionais de saúde na
rotina de trabalho.
Neste sentido, todos os profissionais de saúde devem se precaver em
situações consideradas de risco ocupacional, ou seja, independe do diagnóstico do
paciente. Salada e Marques (2006), em estudo realizado com profissionais de saúde
que cuidam de pessoas soropositivas ao HIV, observaram que ainda existem
profissionais que quando conhecem o diagnóstico positivo para o HIV, identificam o
paciente como sendo de ―risco‖, sendo, portanto, esta a sua proteção contra o
contágio. Embora, estes mesmos profissionais reconheçam ser ultrapassada tal
classificação.
Existe ainda um outro meio de contágio do vírus HIV que não foi explicitado
pelo grupo que é a transmissão vertical. Mas foi lembrado, por um dos sujeitos a
questão do aleitamento materno, onde o mesmo enfatizou que a mãe soropositiva
não poderia amamentar.
87
O bebê não pode tomar o leite materno porque pode se contaminar quando a mãe
é soropositivo. (Jorge, 43 anos)
Barroso e Galvão (2007) corroboram com esta temática ao destacarem que,
em função do aumento do número das mulheres infectadas em idade rtil, as
crianças vêm se tornando de forma crescente e involuntariamente um grupo de risco
para a infecção para o HIV. É possível uma redução importante na incidência da
transmissão vertical com a implementação de tratamento antirretroviral na gestação
e durante o trabalho de parto e o parto propriamente dito, bem como nos recém-
nascidos alimentados exclusivamente em fórmula infantil.
Brito, Castilho e Szwacwald (2001) destacaram quanto à transmissão vertical
do HIV, ou seja, a transmissão da mãe infectada para o feto durante a gravidez,
parto ou aleitamento materno, que houve aumento progressivo dessa categoria no
decorrer do tempo, como consequência/reflexo direta da maior participação feminina
em idade fértil entre os casos de AIDS no Brasil.
Ao refletir sobre a epidemia da Aids, bem como a sua disseminação, é preciso
considerar as transformações desta epidemia na sua história, especialmente nas
tendências quantitativas relativas às suas formas de transmissão e de instabilidade e
vulnerabilidade da síndrome. Apresenta-se como importante ainda considerar os
significados construídos para enfrentar a realidade. (BARBARÁ; SACHETTI;
CREPALDI, 2006).
3.2.2.2 Comportamento de risco e prevenção na perspectiva das pessoas
soropositivas
A subcategoria em tela possui 189 UR distribuídos em 19 temas. A mesma
traz em seu bojo uma temática de grande relevância no contexto do HIV/Aids. Falar
de prevenção é complexo na medida em que envolve comportamento individual e
coletivo; sexo e sexualidade; valores socioculturais, religião e religiosidade; e
investimento e intervenção política não na área da saúde, sobretudo na
educação, entre outras coisas.
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Nos últimos anos foi desenvolvida uma variedade crescente de programas
preventivos e atividades intervencionistas nos diversos cenários com o intuito de
responder ao impacto cada vez maior do HIV/Aids. Entretanto, grande parte desses
programas respondeu à epidemia de forma relativamente superficial e
essencialmente técnicas, como a disseminação de informações e material educativo,
a distribuição de preservativos e o fortalecimento dos serviços sobre DST‘s.
(PARKER, 2000).
Ao longo dos anos 80 e 90, diversas organizações não governamentais
estruturaram-se voltadas para a propagação de informações sobre a prevenção, a
ajudar às pessoas portadoras do HIV e a fiscalizar e críticar às alternativas
governamentais, tanto no âmbito da assistência aos pacientes como na elaboração
de estratégias eficazes de prevenção e ações no campo da educação em saúde.
(BASTOS et al., 1993).
Os atores sociais do nosso estudo ao dividir as suas experiências do antes e
do depois do diagnóstico positivo para o HIV declararam que algumas vezes tinham
um comportamento sexual que os comprometeram, o que culminou na
soropositividade. Entretanto, o sentimento de culpa é relatado por estas pessoas,
como observado a seguir.
Porque quando se esse diagnóstico nós mesmos nos acusamos, porque muitas
das vezes, né? Como eu e muito outros soropositivos, mesmo informados do vírus
HIV a gente se contaminou por falta de prevenção, por falta de cuidado, por erros
nossos mesmos, né? E muitas das vezes a gente, pra poder superar esse
problema, a gente procura outros artifícios, outras pessoas pra colocar a culpa.
(Carlos, 33 anos)
Mas o que chamou a atenção é que a ciência do diagnóstico não interfere nas
atitudes adotadas pelos sujeitos, uma vez que alguns indivíduos mantêm relação
sexual sem preservativo, expondo mais uma vez a sua vida e a de outras pessoas.
Os temas que seguem descreve tal situação, ―não me preveni/não usava
camisinha‖ possui 39 UR; ―tinha comportamento duvidoso/me arriscava‖ somam 25
UR e ―transava com homens e mulheres/tinha vários parceiros‖ tem 9 UR, acham
que a camisinha é chupar bala com papel‖, 5 UR. A somatória destes temas
corresponde a 41,26% desta subcategoria, o que os tornam relevantes
quantitativamente e de grande peso social, devido às consequências individuais e
coletivas frente à epidemia. Destacam-se algumas falas relacionadas:
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Eu o faço mais o que fazia antes. É a questão da camisinha mesmo, eu não era
muito de camisinha não (risos), por causa da camisinha que eu me arrasei. Por
causa da camisinha que eu me arrasei [...]. (Paulo, 40 anos).
[...] Eu tinha uma vida muito ativa sexualmente, né? É, saía com vários parceiros,
antes de descobrir... Tive vários parceiros.... Quando eu soube, eu já estava com
um companheiro fixo, estava morando com ele, e fiquei com ele, mas também
não contei para ele. Quando eu fiquei grávida dele, né? Ele teve que vir fazer o
exame, e ele deu negativo. Nós ficamos sete anos, e a gente nunca tinha usado
preservativo, e eu escondi, quando soube, mesmo assim não falei nada para ele, e
ele não adquiriu a doença. (Jéssica, 35 anos)
Ah sei lá, acho que com a camisinha né? Deve ser. Eu também num sei não, por
que quando eu fui saber também já era tarde de mais. Por que camisinha eu
também nunca usei mesmo, por que a tal de camisinha ô troço nojento. Mais assim,
quer dizer, eu não sei, eu não posso distinguir, como é, acho que é o fato da
pessoa não usar camisinha né? (Flávia, 36 anos)
[...] eu estava desconfiado que eu estivesse infectado devido aos meus
comportamentos duvidosos anteriores... Que eu tinha relação sem prevenção, eu
tinha contato físicos com pessoas sem o devido cuidado, mesmo sabendo que
havia o risco de ser infectado. botava camisinha quando via que tava muito,
muito, muito, fechado muito com dificuldade mesmo de passagem, eu botava a
camisinha o preservativo, né? Quando tava muito fechado, podia ser a relação
vaginal e podia ser a relação anal também. Anal mais com o homem né? Assim,
com homens e com mulheres, até porque eu tava tendo uma pratica assim, bem
constante,né? Foi uma época que eu estava praticando mais, bem ativa, sabe?
Então eu tinha que tomar esse tipo de cuidado, porque eu tive até outros sinais
como bolhas, secreção, pus né? Então eu tinha esse cuidado né? De não ter muito
atrito, muita força, mas mesmo assim eu achei que não ia acontecer comigo e
acabei me infectando. (Carlos, 33 anos)
O conteúdo da fala deste último colaborador retrata ainda a existência de uma
possível DST que, no entanto, passou desapercebido. Tal realidade foi pontuada por
Francisco et al. (2004) ao relataram que existe ainda uma dificuldade das pessoas
identificarem os sinais das DST‘s em que alguns sujeitos acreditam que a presença
de feridas, corrimentos ou verrugas nos órgãos genitais não é sinal de DST,
respostas que indicam um conhecimento precário do assunto.
Para Sontag (2007, p. 98), ―o comportamento perigoso que produz a Aids é
encarado como algo mais do que fraqueza. É irresponsabilidade, delinquência o
doente é viciado, em substâncias ilegais ou sua sexualidade é considerada
divergente‖. Para a maioria das pessoas, a Aids é percebida não somente pelos
excessos sexuais, mas também por sua perversão.
Sabe-se que um dos maiores desafios hoje é fazer com que as pessoas
façam uso do preservativo nas relações sexuais. A estratégia utilizada pelos órgãos
públicos são as campanhas contra a Aids realizadas em redes nacionais de
comunicação, porém, estas, na maioria das vezes, consideram as pessoas que não
tem o HIV, e tem como objetivo conscientizá-las da importância do uso do
preservativo para prevenir a infecção pelo vírus. Ressalta-se que existe uma lacuna
90
nestas campanhas, pois as pessoas soropositivas para o HIV precisam ser
estimuladas e orientadas quanto ao uso do preservativo não somente para a
autoproteção (evitar outras DST‘s), mas também para proteger seu parceiro.
No entanto, um dos fatores que estimulam as pessoas soropositivas a não
aderirem a nenhuma estratégia preventiva na transmissão sexual do HIV é a crença
da sua não transmissibilidade, que leva o indivíduo a acreditar que a terapia
antiretroviral e, principalmente a carga viral indetectável, impedem o risco de
transmitir o vírus. (REIS; GIR, 2009).
O relato abaixo retrata tal situação e sinaliza, de forma sintética, um problema
que é pouco discutido, porém, deve ser valorizado e repensado pelas autoridades de
saúde pública.
Bom, o mito pior que tem a crença pior que tem é que agora o coquetel faz com que
você fique imune. E se você zera a carga viral, "Ah, estou zerado!" Se eu estou
zerado é que eu não tenho mais. Então a pessoa sai, faz sexo sem camisinha sai
por contaminado um monte de gente e achando que está curado. E isso faz com
que as pessoas tenham de novo um comportamento irresponsável em relação a
sexo não seguro que se praticava até os anos oitenta. (Chico, 43 anos)
E aqueles que têm a condição de soropositivos, quando se vêem indetectável, acha
que não vai contaminar os outros, tem a relação também sem preservativo, e
mesmo com a defesa, com o sistema todo controlado e com a defesa boa,
possibilidade de contágio. (Carlos, 33 anos)
Segundo Barbará, Sachetti e Crepaldi (2006), as campanhas preventivas no
Brasil ainda são poucas, considerando que o calendário de prevenção da aids na
mídia envolve poucas inserções nos rádios e na televisão, normalmente na época do
carnaval e dirigidas ao público em geral. Um dos sujeitos faz uma colocação
complementar.
[...] Eu acho que se houver a prevenção, eu acho que tem que haver campanhas
preventivas, digo assim, em massa mesmo. Por que no Brasil existe campanha
de prevenção à AIDS no carnaval. Parece que as pessoas só fazem sexo no
carnaval, né? Aí o resto do ano todo, você esquece isto. (Jorge, 43 anos)
Conquanto, observa-se que a eficácia dos tratamentos contra o HIV/Aids tem
motivado as pessoas a reduzirem a aplicação de medidas preventivas contra a
AIDS, compreende-se que na medida que a sociedade se desmobiliza, novos casos
da infecção são registrados. (BRASIL, 2007b).
O problema ainda se torna mais visível no que tange às pessoas com
relacionamentos estáveis, conforme destaca Oltramari e Otto (2006) em estudo que
versa quanto ao uso de preservativo nos relacionamentos conjugais, os sujeitos do
91
seu estudo consideram que a partir do momento que existe confiança na relação, o
uso do preservativo passa a ser julgado desnecessário, por sentirem seguros em
relação ao risco de infecção pelo HIV.
Ao se falar dos casais sorodiscordantes, faz-se necessário atribuir uma
atenção especial por parte dos profissionais e serviços de saúde a estes indivíduos,
portanto, que proporcione atendimento integral e, contemple aspectos da vida
afetivo-sexual, incluindo também a(o) parceira(o) sexual, entende-se que estes
enfrentam dificuldades na manutenção do sexo seguro, o que sugere em repensar
as ações/ estratégias de prevenção da transmissão sexual do HIV/Aids. (REIS; GIR,
2005).
O relato que segue traduz esta realidade. Porém, neste caso, é uma relação
entre um casal sorodiscordante onde a mulher é soropositiva para o HIV.
Fomos transando de preservativo, preservativo até que você vê que a relação
chegou num momento de toca, cara eu tenho você, não somos um simples
namorando, a gente junto e tal, mas a gente acaba tendo contato, não tem mais
como mentir, ele queria transar sem preservativo, já, isso em curto prazo de três
meses no ximo, eu peguei e falei bom tiver que ser será, e nesse problema a
gente tem muito medo de receber uma rejeição, ser abandonada pela pessoa que a
gente gosta, a pessoa descobrir, então é por isso, que tem muitas pessoas que
acabam não contando, mas como eu não consigo mentir não é minha praia... com
o tempo ele aceitou super bem, vamos esquecer isso a gente tem relacionamento
com preservativo, mas nem sempre com preservativo porque ele não gosta, sou
sincera, mas ele não gosta sou sincera já insisti bastante. (a justificativa do parceiro
para o não uso do preservativo)...Eu com você eu amo você, não tem problema
nenhum, a minha vida é contigo. Rola mais ou menos assim, ...porque ama, porque
gosta, que vai ter que fazer sem, mas, quando a gente divide um teto, divide
alguma cama, tem que entrar em acordo, se eu quero usar e ele não quer usar, ah,
eu não gosto é aquela coisa de chupar bala sem tirar o papel. (Ana, 38 anos).
O companheiro da entrevistada supracitada, mesmo sabendo que a parceira
é soropositiva para o HIV, optou em fazer sexo sem o preservativo, se expondo ao
vírus HIV. Esta atitude remete à dimensão afetiva nas relações e, portanto, neste
momento, a afetividade apresenta-se como soberana na relação e capaz de superar
o risco de adquirir a infecção.
Não obstante, tal atitude remete a questão da cultura machista na qual a
nossa sociedade está inserida, onde se acredita que o homem heterossexual não
adquire o vírus através da relação sexual, o que pode resultar em um
comportamento de omissão frente aos riscos eminentes de contágio. Em contra
partida, a mulher, assume o papel de submissão, deixando de exigir o uso da
camisinha. Entende-se que para esta mulher entrevistada (Ana, 38 anos), deve
existir um mister de sentimentos, medo da rejeição, especialmente por ser
92
soropositiva, uma vez que é difícil encontrar um companheiro que aceite e
compreenda a sua condição. Portanto, persistir na negociação quanto ao uso do
preservativo para ela, pode resultar no fim da relação.
A representação social das relações de gênero reserva à construção
simbólica da masculinidade certa características que propicia ao homem um livre
acesso à sua sexualidade, considerando a própria exposição do homem no mundo.
―Ser homem na nossa cultura significa dispor de uma sexualidade em evidência,
donde pressupõe-se uma relação de intensa intimidade com o prazer e a liberdade
de seu exercício‖. (GUIMARÃES,1996, p. 93).
Neste sentido, Zampieri (2004) apud Oltramari e Otto (2006) relatam que os
homens geralmente se percebem sem probabilidade de contaminar-se com alguma
doença, por se considerarem uma fortaleza, como um ser masculinizado, que pode
tudo. Desta forma, Barbará, Sachetti e Crepaldi (2006) advertiam que a Aids está
diretamente relacionada à sexualidade, portanto, deve-se considerar as diferenças
sexuais entre os homens e as mulheres. Diversas crenças e valores relativos aos
gêneros masculino e feminino irão influenciar as representações sociais existentes.
Kallás (2002), ao discorrer sobre a temática, afirma que a transmissão do
vírus HIV pode ocorrer tanto do homem para a mulher, o que seria mais fácil de
compreender por ser a mulher mais receptiva em relação ao homem, quanto da
mulher para o homem. Se não houver uma barreira, neste caso, a camisinha
masculina ou feminina, pode ocorrer a transmissão do vírus numa única relação, não
fazendo diferença se do homem para a mulher ou da mulher para o homem. O risco
existe não só para a Aids, mas também para todas as DSTs.
Para Marta et al. (2008), existe uma preocupação preventiva por parte dos
jovens, mas é preciso reforçar as informações relacionadas às práticas sexuais mais
seguras, principalmente nas relações estáveis. Neste estudo, observou-se que a
maioria dos acadêmicos conhece as medidas preventivas da AIDS e usa
preservativo nas primeiras relações sexuais. Contudo, ainda existe a ocorrência de
comportamento de risco, considerando que a metade deles dispensa o seu uso
quando o namoro completa um mês, acreditando na fidelidade do parceiro. Destaca-
se ainda que a maioria mencionou ter um relacionamento estável, entretanto
informou também que teve relação sexual eventual, significando maior
vulnerabilidade à AIDS e exposição do parceiro fixo.
93
Foi observado ainda por Oltramari e Otto (2006) que as pessoas reconhecem
o preservativo como um elemento importante para os relacionamentos
extraconjugais. Ou seja, quando não se conhece a pessoa na qual se relaciona,
existe a representação de um ―outro‖ que seja mais perigoso do que aquelas
pessoas mais próximas. Este ―outro‖ induz muitas vezes a uma prevenção simbólica,
pois enquanto se preocupam com as outras pessoas, fazem um isolamento mesmo
que inconsciente, quanto ao risco de contrair o HIV.
Thiengo, Oliveira e Rodrigues (2005), em estudo com adolescentes,
encontraram um resultado próximo: os jovens ao se referirem às práticas de
proteção demonstraram que conhecer o parceiro representa de certa forma uma
barreira de proteção, sem, no entanto, especificar o significado desse conhecimento.
Conquanto, a camisinha seria adotada no início do relacionamento. Para estes
adolescentes, a partir do momento que se estabelece, com o parceiro, uma relação
de confiança, o uso da camisinha pode ser dispensado.
Resultados parecidos foram observados por Brêtas et al. (2009), em estudo
com adolescentes, sendo considerado como meio de prevenção e que mereceu
atenção o fato de passar a conhecer o parceiro elimina, em nível do imaginário,
todos os riscos de se adquirir uma DST/Aids.
Frente ao exposto, torna-se relevante considerar, as experiências dos atores
sociais em tela, nesta perspectiva. Os estudos supracitados não foram realizados
com pessoas soropositivas, portanto, estas pessoas ao optarem em fazer sexo sem
camisinha estão se expondo ao risco de se infectarem, aumentado a sua
vulnerabilidade. Os relatos que seguem, no entanto, são de pessoas que se
contaminaram ao optarem em não usar o preservativo e a confiarem inteiramente no
parceiro ou no destino.
[...] Foi um namorado que eu tive, que eu era viúva. Meu namorado também não
sabia que tinha, passou esse problema para mim. (Gabriela, 54 anos)
[...] nunca imaginava que ia pegar uma doença dessas. E terminou eu sendo
contaminada pelo meu parceiro né... com o parceiro, a gente nunca usa, pois a
gente está sempre confiando no parceiro, foi aonde eu levei, a gente confia então
nunca liguei para usar camisinha. (Glória, 54 anos)
E uma coisa que eu pensei, assim, eu pensei que isso jamais ia acontecer comigo,
devido eu estar casada. Eu achava que eu casada eu estava segura, entendeu? É
isso. (Maria, 37 anos)
[...] mas o mau estava dentro de casa e eu não sabia... eu fazia sexo sem
preservativo aqui em casa. (Pedro, 55 anos)
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No lugar do preservativo, as pessoas adotam como forma de prevenção à
fidelidade, a confiança e o conhecimento do parceiro. Nota-se o avanço da epidemia
devido às pessoas adotarem o uso do preservativo apenas como método
contraceptivo e não como estratégia de prevenção da infecção. (BRASIL, 2004;
OLTRAMARI; OTTO, 2006).
Entretanto, um dos grandes motivos que induzem as pessoas a optarem em
fazer sexo sem camisinha é acreditarem que não faz parte do grupo de risco, termo
muito utilizado e disseminado pela mídia no início da epidemia, na década de 80 e
90. As representações elaboradas e compartilhadas socialmente refletem até hoje
nas atitudes e práticas das pessoas, sobretudo para aqueles que mantém um
relacionamento estável. Mas necessita-se perguntar: o que seria estável? O tempo
de relacionamento, a valorização da fidelidade conjugal ou dividir o mesmo espaço?
Estas representações influenciam, sobremaneira, na decisão de usar ou não o
preservativo. Neste contexto, se a pessoa não se considera vulnerável, conclui que
―não faz parte do grupo de risco‖ e o uso do preservativo passa a ser desnecessário.
Este conceito, o de grupo de risco, foi também demonstrado por Oltramari e
Otto (2006), onde os sujeitos do seu estudo indicavam a perpetuação da concepção
de grupo de risco, fazendo-os acreditar, consequentemente, que estão isentos da
vulnerabilidade ao HIV/ Aids. Eles admitiram que não faziam parte do grupo de risco
e, portanto, não havia a possibilidade de serem contaminados pelo vírus HIV. Um
reflexo deste pensamento encontra-se no tema ―Acha que não vai acontecer consigo
próprio‖ que contém 48 UR, revelando o pensamento de 21 sujeitos e representando
70% do total.
Eu acho, assim naquela época, na década de oitenta, oitenta e um, oitenta e dois,
oitenta e cinco, eu achava que a AIDS era coisa de homossexual, piranha e
drogado, de repente, e eu não tava nesse grupo de risco que a televisão sempre
dizia, eu não tava nesse grupo de risco.... Eu achava que a AIDS nunca ia chegar
perto de mim, por que eu não me enquadrava no grupo de risco, mas ela chegou,
mas num era pra mim, normal, pra mim aquilo ali era uma doença de travesti, de
gay, uma pessoa normal que tinha um namorado não ia ter AIDS. (Natália, 36 anos)
Eles acham que "ah, isso nunca vai acontecer comigo!" Igual eu no meu caso... Ah
isso nunca vai acontecer comigo. Eu sou uma mulher casada, uma mulher decente,
direita. Eu casei com o meu primeiro namorado, aquela coisa toda... Então eu
achava que não podia acontecer comigo. No entanto aconteceu, né? (Maria, 37
anos)
Primeiro e principal é porque todo mundo acha que não vai acontecer consigo
próprio, ―Ah, acontece com os outros, mas não acontece comigo‖... Então o
principal motivo mesmo é esse ―Ah, porque vai acontecer com um com o outro, com
ele, com o que ta do meu lado, mas comigo não, tem que ser muito azarento pra
95
acontecer comigo e hoje eu to me tratando de uma infecção, que eu tinha a
informação, mas não me preveni. (Carlos, 33 anos)
Joffe (2008) observa que existe uma tendência das pessoas à negação de
que Aids possa se disseminar no interior do seu grupo. Desta forma, as pessoas
imediatamente reproduzem ―eu não‖ e ―não o meu grupo‖. Desta forma, a Aids é
uma doença do ―outro‖, do longe, portanto, do ―eu‖. Esta representação imbrica em
atitudes e práticas comprometedoras no enfrentamento da epidemia.
Mann, Tarantola e Netter (1993) concluíam que a responsabilidade pessoal é
a antíntese da vulnerabilidade, uma vez que a prevenção do HIV requer pessoas
investidas da responsabilidade de apreender e responder. O comportamento dos
sujeitos irá incidir diretamente no risco de adquirir o HIV. Um dos primeiros passos
hoje é fazer as pessoas compreenderem, de fato, o sentido da vulnerabilidade
individual e, consequentemente, até onde as suas atitudes, práticas, valores e a
forma de pensar sobre a Aids irão comprometê-los a ponto de colocá-los numa
situação de risco.
Percebe-se que as experiências dos sujeitos do estudo apontam para a
construção social e imaginária de atitudes de negligência em relação à Aids, o que
resultou na infecção do HIV. Destaca-se que quanto mais distante do eu ou do seu
grupo as pessoas posicionarem a Aids, mais ela pode se aproximar, pois o descaso
ou a aparência de não possibilidade de adquirir a síndrome faz com que as pessoas
se tornem ainda mais vulneráveis à infecção do HIV/Aids na medida que não adotam
nenhuma medida preventiva.
Gupta criticou os modelos comportamentalistas ao considerar que a mudança
de comportamento não é resultante necessária de ―informação + vontade‖, mas
dependente de coerções e de disponibilidade de recursos de natureza cultural,
econômica, política, jurídica e até policial, desigualmente distribuídos entre os sexos,
países, segmentos sociais, grupos étnicos e faixas etárias. (AYRES et al., 2006).
Nos relatos que seguem, percebe-se que os próprios indivíduos soropositivos,
atentam para o fato da conscientização das pessoas que convivem com o HIV
quanto ao risco de se contaminarem (por outras DST‘s) e a possibilidade eminente
de passarem o HIV para outras pessoas, necessitando, portanto, do uso do
preservativo nas relações sexuais.
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Tem pessoas que sabem e não estão nem se está passando para alguém [...].
(Marta, 35 anos)
Se eu fosse um cara que aceitasse qualquer parada eu tinha contaminado uma
porção de pessoas. (Pedro, 55 anos)
Eu vou evitar que outras pessoas se contaminem através disso... Como eu sei que
tenho, eu não vou doar sangue. (Lucas, 28 anos)
Você tem que fazer o possível para não passar para as outras pessoas porque
ninguém tem culpa de que você foi pego... a pessoa que me passou sabia que tava,
não me falou e eu peguei, eu nunca vou fazer isso com ninguém. (João, 31 anos)
Porque se você não se conscientizar que você tem que transar de camisinha, então
ali a cada dia, você vai morrer um pouco, porque se você transar ali sem camisinha,
você que é soropositivo, você cada vez vai estar se contaminando mais, entendeu,
então no meu entender foi isso que me explicaram. Então, se eu não quero
contaminar ninguém, ao mesmo tempo que eu posso estar contaminando, eu posso
estar me contaminando bem mais, né? (Marta, 35 anos)
Diante do exposto, é válido ressaltar quanto à importância de um
acompanhamento de perto destes sujeitos pelos serviços de saúde, em uma
dimensão do modelo biológico, mas considerando o contexto sócio-cultural no qual
este indivíduo está inserido, criando um vínculo e fazendo-os sentir parte do
processo de tratamento e do enfrentamento da epidemia. Neste sentido, Mann,
Tarantolla e Netter (1993) destacam que, além da vulnerabilidade biológica, uma
realidade epidemiológica fundamental: Para que ocorra a transmissão do HIV
necessita-se de ações (comportamento) específicos e identificáveis. Ou seja, para
tornar-se infectado pelo HIV ou para transmiti-lo devem ocorrer ações visíveis
envolvendo dois ou mais participantes. Justamente por ser visível, específica e
concreta, a transmissão do HIV também pode e deve ser evitada através de
comportamentos específicos.
Parker (2000) relata que no final da década de 80, a pesquisa conduzida por
teorias psicológicas e sociais demonstrou que tanto as abordagens cognitivo-
comportamentais, quanto às de influência social, podem causar mudanças
importantes no comportamento de risco em relação ao HIV/Aids por parte de
indivíduos e grupos. Contudo, ainda é uma tarefa árdua implementar uma estratégia
de intervenção eficaz que alcance todos os estratos sociais.
O mesmo autor traz, à baila, três modelos de intervenções que tem atraído a
atenção de forma crescente, quais sejam: Intervenções estruturais, estratégias
voltadas para a mobilização comunitária e, por último, uma das mais inovadoras,
está fundamentada na teoria de transformação social e de Empowerment Coletivo.
Este modelo, baseado no trabalho de Paulo Freire e de outros educadores
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populares, tem o objetivo de analisar questões relacionadas ao poder e à opressão
e, portanto, busca-se um processo educacional transformador, no qual os
participantes exploram, compreendem e questionam suas próprias vidas e
realidades e, através dessa exploração e questionamento, começam a experimentar
um processo de capacitação e de transformação coletiva a fim de reagir às situações
concretas que os ameaçam e oprimem.
Em suma, é válido destacar sobre a importância das pessoas que convivem
com o HIV apreenderem os reais meios de transmissão deste vírus para poderem
contribuir com a sociedade, desempenhando o seu papel social de forma segura,
não como multiplicadores do vírus do HIV, no qual se tornaram disseminadores”.
Embora, o termo utilizado pareça estranho, talvez agressivo, todavia é uma
realidade que pode ser encarada de forma positiva, uma vez que a história de vida
de cada um destes sujeitos pode servir como um incentivo de mudança de atitudes
frente aos riscos de transmissão, no qual todas as pessoas estão expostas e,
portanto, o vulneráveis, mas nem sempre a sociedade se posiciona de forma
responsável e consciente.
No que concerne à prevenção, uma parcela dos sujeitos também
demonstraram conhecimento quanto aos meios de prevenção e a adoção dos
mesmos no seu cotidiano. Nos últimos depoimentos supracitados, foi gerada uma
discussão em torno da importância destes sujeitos se preocuparem com a
prevenção com intuito de se proteger e proteger o parceiro.
Neste momento, descrever-se-á as práticas cotidianas voltadas para a
prevenção. Os temas que comportam estas representações são: ter uma
parceira, Só faço sexo com camisinha, no meio homossexual existe mais prevenção,
sou homossexual, mas nunca fui depravado e, por último, nunca fui promíscuo.
Na construção cognitiva dos sujeitos, percebe-se que ainda permanece a
representação da Aids, especialmente no que tange à sua dimensão preventiva,
atrelada ao grupo de risco, especialmente ao homossexualismo, e à promiscuidade.
Consiste ainda no imaginário dessas pessoas que o fato de não ser promiscuo, ou
seja, não ter vários parceiros como uma das formas de prevenir a síndrome.
Ah, que quem tem esse tipo de doença é homossexual, são pessoas
depravadas, e não é por aí, eu sou homossexual, mais nunca fui depravado, eu
tenho pra mim que eu contraí essa doença numa convivência a dois, entendeu?
(Roberto, 34 anos)
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Até mesmo pelo relacionamento que eu tive anteriormente, né? O companheiro que
eu tive, tinha morrido de AIDS, entendeu? Você entendeu? tinha morrido de
AIDS e tudo... Só que ele era muito promíscuo, entendeu? Eu não, nunca fui
promíscuo, nunca tive promiscuidade, nunca trabalhei com negócio... Nunca tive
com negócio de promiscuidade, essas coisas, o sei o quê que é isso. Então eu
achava que nunca ia acontecer comigo, eu não sabia que ele era assim. que eu
já esperava, porque eu tinha um relacionamento com ele, eu ainda falei, eu não sou
promíscuo, mas como eu sabia que ele tinha tido, né? Deve ter me contaminado
também, né? (Gilson, 48 anos)
Na representação construída em torno da epidemia ainda permanece forte a
ideia da homossexualidade, por serem os primeiros sujeitos abertamente
identificados com a Aids (ALMEIDA; LABRONICI, 2007). Este pensamento, que foi
bem aceito e justificado no início da epidemia, permanece no imaginário da
sociedade, como lembra Santos (1996), quando afirma que a síndrome
primeiramente foi relacionada à prática homossexual masculina. Desta forma, as
pessoas consideradas ―normais‖ não se preocupavam (e não deviam se preocupar)
com a Aids.
Uma importante mudança no modo de se pensar sobre o HIV/ Aids ocorreu
ainda na década de 90, onde se buscou superar a contradição entre ―grupo de risco‖
e o ―público em geral‖, deslocando-nos da noção do risco individual para uma nova
percepção de vulnerabilidade social, crucial não apenas para nossa percepção da
dinâmica da epidemia, mas para qualquer estratégia capaz de diminuir seu avanço
(PARKER, 2000). Neste sentido, a adoção de práticas sexuais seguras pelas
pessoas nos diversos contextos sexuais, inclusive pelas pessoas infectadas,
constitui de um grande avanço e ganho no combate à epidemia. Nas falas que se
seguem, os sujeitos reproduzem as suas ideias e suas práticas de prevenção
propriamente ditas.
acho que o principal hoje em dia é o uso de preservativo. Por que você, às vezes,
principalmente no meio homossexual... É eu acho que no meio homossexual acho
que existe até mais prevenção, do que no meio bissexual. Por que a maior parte
das pessoas que eu conheço transam com preservativo... a gente recebe no
Hospital e tudo mais. (Jorge, 43 anos)
Uso do preservativo, uma parceira só. (Paulo 40 anos)
Depois do diagnóstico eu tomei muita precaução porque os médicos dizem que a
gente tem que tomar cuidado com pessoas contaminadas... Me prevenia com
preservativo, e se as pessoas não aceitavam, eu também não aceitava nada,
programa, não aceitava nada não. Porque tem, as mulheres ainda insiste em fazer
sexo sem camisinha. (Pedro, 55 anos).
[...] as pessoas que sabem são poucas pessoas, são minhas amigas próximas que
sabem, pessoas casadas, pessoas que gostam de mim. na realidade é um alerta
para elas se cuidarem, elas são na maioria casadas, três são casadas e duas não
são, no casamento deve usar camisinha também ter cuidado não em relação a
99
aids, mas, com outra doença também, não tem aids também né, tem HPV, tem
outras coisas que a camisinha é o único meio de evitar. eu acho que é mais um
alerta para elas. (Maicon, 32 anos)
Na fala deste último sujeito, ele pontua a sua situação como um exemplo
positivo de enfrentamento da epidemia, mostrando para as colegas que existe, além
da Aids, outras DST‘s que podem ser transmitidas pela falta do preservativo.
Observa-se que um dos sujeitos acredita que, entre os homossexuais, existe mais
prevenção, reproduzindo a ideia de um grupo organizado, consciente da importância
quanto ao uso do preservativo como uma forma efetiva para o enfrentamento da
epidemia. Santos (1996) corrobora esta ideia ao pontuar que os meios
homossexuais masculinos, massacrados pelo estigma e pelo preconceito, tiveram
consciência do seu risco, o que motivou que se organizassem em grupos, ou mesmo
individualmente, para o enfrentamento da epidemia, enquanto o restante da
sociedade assistia inerte à doença ―do outro‖ aproximar-se aos poucos.
Marques, Oliveira e Gomes (2004) observaram em seu estudo com
trabalhadores de um Hospital Universitário, que a palavra prevenção foi um dos
componentes do cleo central no subgrupo com mais de 35 anos. Esta palavra
pode retratar a evitabilidade da síndrome e de suas consequências, além de
relacionar as informações e as práticas que tem sido disseminado pelos programas
de prevenção, expressando conhecimento sobre a temática. a palavra camisinha
compôs o núcleo central dos dois grupos do estudo, o que pode conotar uma
dimensão imagética da Aids e um conhecimento sobre a sua prevenção bem como
uma estratégia para evitar o risco da infecção.
Francisco et al. (2004) lembram que hoje, das DST, a epidemia da AIDS é a
mais alarmante e que a mesma trouxe consigo a imposição de limites à vida sexual,
como um fantasma que coloca em xeque a liberdade conquistada, antes mesmo,
por gerações anteriores. Considerando que as representações e as práticas estão
relativamente ligadas, determinando além dos comportamentos distintos, as atitudes
específicas diante do problema, portanto, entende-se que o sentido que o indivíduo
atribui à Aids pode determinar o incorporamento das práticas de prevenção
(BARBARÁ; SACHETTI; CREPALDI, 2005).
100
3.2.2.3 Mitos relacionados à transmissão do vírus do HIV para os indivíduos
soropositivos
Esta subcategoria representa de forma tímida o conteúdo fornecido pelos
sujeitos do estudo quanto aos meios de transmissão do HIV que não são reais, o
que serão considerados como mitos relacionados à transmissão. Embora não seja
quantitativamente expressiva, contudo, traduz uma realidade que faz parte do
cotidiano das pessoas que vivem com o HIV/Aids, realidade esta que gera
desconforto, constrangimento e, sobretudo, um sentimento de discriminação.
Esta subcategoria, possui 5 temas, somando 20 UR que são: cuidado com o
vaso/pode pegar no vaso; sabonete, escova de dente, Isso não pega no sabonete
ou na pasta de dente; não pega no beijo na boca; usando o mesmo tudo de todo
mundo (utensílios domésticos); pensavam que pega pela saliva, tem gente que não
acredita que pega através do sexo.
A elaboração cognitiva destes temas está relacionada diretamente ao que
Moscovici (2003) denominou de universo consensual. Jodelet (2001, p. 20) pontuou
que a comunicação social, sob seus aspectos midiáticos, aparece como condição de
possibilidade e de determinação das representações e dos pensamentos sociais. Em
relação à Aids, a mesma autora completa ―a falta de informação e a incerteza da
ciência favorecem o surgimento de representações que vão circular de boca em
boca ou pular de um veículo de comunicação a outro‖.
Umas destas representações estão relacionadas quanto aos meios de
transmissão do vírus do HIV, o que gerou medo por parte das pessoas socialmente
consideradas ―normais‖ de adquirirem o vírus, resultando em segregação social dos
infectados. Tal fato reflete até hoje na vida das pessoas soropositivas, mesmo após
quase 30 anos da síndrome, como mostram os depoimentos abaixo:
Não ia ter complexo de... Nem tiveram comigo e meu filho por que tive de trocar de
local de onde eu morava pra outro. É... Cuidado com o vaso, cuidado com as
escovas de dente, cuidado com o sabonete, com não sei o que... E isso não pega
no sabonete, não pega no beijo na boca, não pega numa pasta de dente, numa
escova. Esses foram os cuidados e como eu morava na casa com os filhos, com os
netos... Então eu preferi me mudar. (Gabriela, 54 anos)
Meu pai me perguntou se eu queria que ele fizesse um banheiro para mim... Eu
fiquei assim, um pouco espantada com a pergunta dele, mas se tratando de uma
pessoa ignorante, eu entendi até o que ele queria dizer, acho que ele tava com
medo. (Kely, 32 anos)
101
Você poderia pegar pelo vaso sanitário, que você poderia pegar pelo calor da
pessoa quando a pessoa levanta do ônibus, ou até mesmo por apertar a mão, suor,
um simples ato de carinho como um abraço, as pessoas ainda têm medo disso.
(Kely, 32 anos)
por que a AIDS pega né. Então eles acha que até o fato de se com você
acha que vai pega. Ah elas acha que deve pegar de qualquer maneira né. Mas é
claro que a gente bem informado que a AIDS num pega assim. É beijar na
boca, é como é que se diz? É usar o mesmo talher, é essas coisa toda, entendeu?
Então muitas pessoas tem mal informação sobre a AIDS. (Flávia, 36 anos)
A falta de conhecimento e informação sobre os reais meios da transmissão do
HIV contribui, sobremaneira, para que as pessoas adotem medidas exageradas e
sem base científica como forma proteção, ao se depararem com uma pessoa
soropositiva. Este medo faz com que as pessoas se afastem da ameaça, criando um
distanciamento como forma de proteção.
Sontag (2007) relembra que as doenças infecciosas alistadas à culpa sexual
sempre dão origem ao medo do contágio cil e a fantasias equivocadas sobre a
transmissão por meios não venérios em lugares públicos. A autora exemplifica que,
nas primeiras décadas do séc. XX, nos Estados Unidos, foram removidas todas as
maçanetas dos navios da marinha de guerra, dando lugar a portas de vaivém, foram
retiradas todas as canecas de metal que eram afixadas nos bebedouros públicos e
várias gerações de crianças de classe média aprenderam a forrar com papel os
assentos dos banheiros públicos como resquícios das histórias apavorantes sobre a
transmissão da sífilis dos poluídos para os inocentes. Compreende-se que todas as
epidemias alarmantes, essencialmente aquelas associadas a comportamentos
sexuais, geram distinção entre os transmissores potenciais e a população em geral.
Olha, para ser sincero, eu não tenho resposta para te dizer sobre isso não... Porque
eu não lembro... Assim, só uma coisa que as pessoas acham, que elas falam... Que
pelo contato da saliva, né? Até hoje alguns negócios de aperto de mão, que eu vejo
muito essas coisas falar... Ainda tem esse mito, ainda, entendeu? As pessoas não
conseguiram ainda entender que o beijo, a saliva em si, em contato com a pele da
pessoa não... Eu acho que é a única coisa que eu lembro assim por alto, que eu
vejo as pessoas ainda tendo preconceito [...].‖ (Lucas, 28 anos)
Um aspecto peculiar da Aids, desde o início da epidemia, acertou o público
em cheio, considerando a sua transmissão por sangue e esperma, criou-se uma
visão biológica da doença muito mais inquietante, portanto o contágio no imaginário
social poderia ocorrer também por meio de outros líquidos corporais, além do
esperma, particularmente a saliva e o suor. Semelhantemente acontece com a
doença mental, onde se acreditava que a degenerescência afeta os nervos, e o
102
sangue e a doença poderiam ser transmitidos pela saliva e suor, tal como seria com
a Aids e com a sífilis, que podem contaminar por meio do simples contato, com as
secreções corporais ou pelos objetos sobre os quais estão depositados. (JODELET,
2001).
O empoderamento social destes atores é algo que progressivamente está
sendo conquistado, porém de forma lenta. Identificar-se perante a sociedade como
soropositivo é uma atitude ainda constrangedora frente às dificuldades encontradas
e a desconfiança que a sociedade impõe sobre eles.
Segundo Bastos et al. (1994), o medo exacerbado do contágio revela que a
população possui informações a respeito da Aids e que esta informação nem sempre
colaboram no processo de enfrentamento da epidemia ou na construção cidadã dos
acometidos. Temores confundem-se com saberes, como o medo de pegar a Aids no
ar, nos corredores, nas maçanetas de portas, à mesa, beijando ou abraçando;
saberes diversos, misturam-se e baralham-se.
Neste contexto, o viver com o HIV, para estes sujeitos, considerando a
representação social da Aids seja permeada por estigma e discriminação, acarreta
uma pressão social, familiar e pessoal. O enfrentamento da síndrome, bem como a
aderência ao tratamento, fica comprometida quando falta apoio da família, dos
amigos, das instituições de saúde e até mesmo das instituições religiosas.
3.2.3 O cotidiano dos indivíduos soropositivos permeado pelo processo de
vulnerabilidade ao HIV
Moscovici define a Representação Social como uma forma de conhecimento
do senso comum, estando diretamente relacionada à maneira como as pessoas
interpretam os conhecimentos conduzidos socialmente. O processo de assimilação
do conhecimento é sempre ativo, já que as pessoas entendem e introjetam as
informações/conhecimentos de acordo com os referenciais que possuem. Porém, os
indivíduos vão reelaborar o saber científico segundo a sua própria conveniência, ou
seja, de acordo com os meios e recursos que têm. (CARDOSO; ARRUDA, 2005).
103
A epidemia do HIV e da Aids representa um fenômeno global, dinâmico e
instável e considera-se que as formas de ocorrências nas diversas regiões do
mundo dependem, entre outros determinantes, do comportamento humano
individual e coletivo. A Aids foi destacada entre as enfermidades infecciosas
emergentes pela grandeza dos agravos causados às populações e, desde o seu
surgimento, cada uma de suas características e repercussões tem sido
exaustivamente discutida pela comunidade científica e pela sociedade. (BRITO;
CASTILHO; SZWARCWALD, 2001).
A categoria em tela contém 14 temas e 190 UR e representa 6,68% do corpus
da análise. Os seus conteúdos abarcam uma dimensão que traduz os sentimentos,
as atitudes e as práticas dos sujeitos. Entende-se que o reconhecimento do risco
individual frente à epidemia irá influenciar, sobretudo, as práticas e os
comportamentos das pessoas. Portanto, obter informações concretas sobre o
HIV/Aids quanto aos meios de transmissão e de prevenção favorece, de forma
positiva, no enfrentamento da epidemia.
Desta forma, torna-se essencial compreender o conceito de vulnerabilidade,
bem como os seus fatores relacionados. Neste sentido, Ayres et al. (2006)
consideram que a vulnerabilidade corresponde à chance de exposição das pessoas
ao HIV e ao adoecimento pela Aids não somente como resultante de um conjunto de
aspectos individuais, mas incluem aqueles coletivos e contextuais, bem como o
acesso a recursos disponíveis de todas as ordens para se proteger de ambos.
Para os autores, a vulnerabilidade possui três dimensões, quais sejam, a
individual, a social e a programática. A dimensão individual parte da premissa de que
todas as pessoas são suscetíveis à infecção pelo o HIV. Contudo, são levados em
consideração os aspectos próprios ao modo de vida dos indivíduos que contribuam
para que se exponham ao vírus ou proteger-se dele. Ou seja, depende do grau de
informação que as pessoas possuem sobre o HIV ou a Aids, suas formas de
transmissão e de prevenção e a capacidade de incorporá-las no seu cotidiano, além
do interesse e as possibilidades efetivas de transformar esses insumos em práticas
preventivas.
A dimensão social da vulnerabilidade está relacionada aos fatores contextuais
que definem e constrangem a vulnerabilidade individual. Tal como a estrutura
jurídico-política e as diretrizes governamentais, as diferenças relacionadas ao
104
gênero, as relações raciais, as relações entre gerações, as atitudes frente à
sexualidade, a religião, a pobreza e, a cultura são alguns aspectos que possibilitam
uma maior compreensão dos comportamentos e práticas que se relacionam à
exposição dos indivíduos ao HIV.
E, por fim, a dimensão programática da vulnerabilidade busca avaliar como
em circunstâncias sociais citadas, as instituições, principalmente as de saúde,
educação, bem estar-social e cultura, operam como elementos que reproduzem e
aprofundam as condições sociais de vulnerabilidade. Portanto, a elaboração das
estratégias deve relevar a mediação exercida entre os sujeitos e seus contextos
sociais pelos programas e serviços disponíveis.
No entanto, destaca-se que as vulnerabilidades social e programática não
foram pontuadas de maneira relevante pelo grupo estudado, de onde se percebe um
enfoque do processo saúde-doença centrado no indivíduo, em suas ações, decisões
e atitudes. Este fato reproduz uma discursividade hegemônica de culpabilização dos
próprios indivíduos por sua saúde em que se tende a desconsiderar toda a
dimensão social e programático-institucional na assistência aos sujeitos e à
coletividade. Este fato mostra-se marcante no contexto da Aids pela presença de
elementos representacionais ou de memória social relacionados às ideias de grupos
e/ou comportamentos de risco.
Neste contexto, Mann, Tarantola e Netter (1993, p. 27), quando se
debruçaram sobre a temática de vulnerabilidade, conotaram:
A vulnerabilidade pessoal à infecção pelo HIV aumenta com a falta de informações
precisas, relevantes e abrangentes sobre a infecção pelo HIV. A vulnerabilidade
pessoal aumenta quando o individuo não está preocupado ou suficientemente
motivado com relação ao perigo da infecção pelo HIV. A vulnerabilidade pessoal
também aumenta quando o indivíduo carece de habilidades, acesso aos serviços
necessários, suprimentos ou equipamentos e o poder ou confiança para sustentar
ou implementar mudanças comportamentais.
Os autores pontuaram que a falta de informação sobre a infecção do HIV,
resulta em uma maior vulnerabilidade em nível pessoal e, igualmente, os sujeitos do
estudo apresentaram, em seu discurso, algo parecido. Quando foram indagados, o
conteúdo fornecido foi variado, porém, alguns temas destacaram pelas suas
consequências em nível individual e social, além de ter tido um quantitativo de UR
relevante. Dentre eles destacam-se: Ignorância de não saber o que era, falta de
informação e falta de conhecimento, que possuem 60 UR, com 20 sujeitos
expressando tais afirmações, correspondendo a 66,66% do total; Eu não tinha
105
sentimentos, não pensava nada, não me preocupava e ignorava o assunto contém
47 UR e foi dito por 15 pessoas, correspondendo a 50% dos participantes do estudo.
Segue alguns trechos das falas com tais representações:
Não, não tinha... Não tenho assim sentimento... Não sei, não tinha noção do que
realmente era, né? Aí não me importava, não me preocupava. (Silvia, 45 anos)
Ignorava, o queria saber disso, não tinha interesse em saber, porque sabia que
era uma coisa ruim. (Jéssica, 35 anos)
Bom antes, eu não tinha sentimento algum, pelo contrário, eu era uma pessoa que
eu não me importava muito, levava o meu dia-a-dia ali na minha casa, junto com
meus filhos, era trabalhar, eu não pensava, né? Nessas coisas.... porque eu quase
não sabia sobre isso, não me importava, não tinha assim experiência, então eu não
sabia, não sabia mesmo. (Marta, 35 anos)
Para falar a verdade eu não conhecia nada sobre a Aids antes disso....É como eu te
falei, sem informação a gente não tem como ter uma atitude ou não, a gente
escutava uma coisa ou outra como a gente escutou que o Cazuza morreu que a
Maria Zilda tem, que fulana tem, que um namorado largou o outro, fora isso não se
falava sobre a Aids. (Adriana, 37anos)
Nota-se um distanciamento considerável destes sujeitos frente à epidemia,
esta negação e desinteresse dessas pessoas, é reforçado pelo fator ―ignorância‖,
―não saber o que era‖ expressão pontuada pelos entrevistados. De fato percebe-se
que a falta de informação no que tange a Aids influenciou, sobretudo, nas práticas
desses sujeitos no que tange à prevenção, se a pessoa não sabe sobre a temática,
não conhece seus riscos individuais, logo não é o responsável pelo mal que hoje os
assolam, e sim vítimas do acaso, pois nunca esperavam ser contaminadas.
Cardoso e Arruda (2005) perceberam que existem pontos importantes em
comum entre as mulheres e os homens não aderentes à terapia antirretroviral. Estes
pontos são exatamente a vivência considerada perturbadora da soropositividade e a
questão da desinformação e o descuido relacionado à falta de prevenção nas
relações sexuais, originando o HIV. A auto-responsabilidade não aparece neste
cenário.
Os indivíduos, ao enfrentarem a pandemia do HIV/AIDS, muitas vezes
reagem distanciando-se do problema. Muitas acreditam que, mesmo hoje, o risco de
tornar-se soropositivo ou de ter algum familiar e/ou amigo infectado pode ser
essencialmente nulo (SEFFNER, 1998a). Esta visão foi estabelecida a partir da
percepção construída socialmente ao longo de quase três décadas da síndrome,
sendo a Aids considerada, em princípio, como uma doença de determinados grupos
que possuíam comportamentos desviantes, como já pontuado.
106
Os sujeitos deste estudo, entretanto, consideram a Aids como uma doença a
partir desta perspectiva, associado, portanto a comportamento de risco como foi
demonstrado na categoria anterior Transmissão e Prevenção da Aids segundo as
pessoas que vivem com o HIV - (alguns chegaram a apontar comportamentos que
os comprometeram), outros inclusive não se conformam em ter adquirido o vírus por
possuírem, no entendimento deles, práticas sexuais seguras, como ter um parceiro
fixo, ou serem casados.
As estatísticas demonstraram que a Aids atinge indivíduos fora dos grupos
de risco tradicionais, amplamente divulgados. Portanto, conclui-se que a Aids é de
todos, apresentando-se como uma epidemia democrática. Segundo Seffner (1998b),
a Aids atinge a todos que adotam comportamentos de risco, como manter relações
sexuais sem o uso do preservativo, compartilhar seringas, receber transfusão de
sangue não testado, etc. Entretanto, os evidentes avanços consideram que esta
forma de nomeação guarda com a anterior, um dos problemas é que ela apaga
determinados fatores que tornam alguns indivíduos mais vulneráveis à epidemia do
que outros, tais como questões econômicas, acesso a informações e existência de
serviços de saúde e aconselhamento.
Entende-se que a falta de conhecimento e de informação adequadas dos
sujeitos do estudo está diretamente associada ao descaso por parte das autoridades
públicas em criar estratégias de enfrentamento da epidemia, como proporcionar as
informações sobre a síndrome bem como os meios de preveni-la. Portanto, esta
situação indica um reflexo da falta de uma estrutura política consistente no
enfrentamento do fenômeno Aids, considerando que as primeiras iniciativas relativas
à síndrome ainda na década de 80, nem todas as reações governamentais foram
favoráveis, pois os setores da própria saúde declararam que existia uma importância
exagerada a um problema vista por eles de pequena dimensão e pertencentes a um
grupo minoritário. (DANIEL, 1991; TEIXEIRA, 1997).
No depoimento que segue, o sujeito demonstra a falta de conhecimento e a
falta de interesse na temática:
Antes? Eu nem pensava, eu num tinha informação, assim, até mesmo, não tinha
informação, eu não me preocupava com essa doença, fui me preocupar depois que
realmente depois do diagnostico, infelizmente. Por que se eu tivesse me
preocupado antes, talvez eu nem tinha me infectado. (Roberto, 34 anos)
107
Este sujeito ratifica um certo arrependimento pela sua desdenha em relação a
Aids, pois acredita que, se tivesse se preocupado antes ele poderia estar hoje livre
do HIV. Neste sentido, Seffner (1998b) indaga que o problema do conceito de
comportamentos de risco é que o trabalho de prevenção passa a ter uma ótica
individualista e culpabilizante. Se uma pessoa se infecta pelo HIV, é porque ela
realizou um comportamento de risco, consequentemente a ―culpa‖ é dela. Neste
aspecto, não é levado em conta, que os modos de transmissão de uma doença
muitas vezes tem razões mais sociais do que individuais. Esta questão não é
resolvida buscando culpar as pessoas por atitudes tomadas ou premiando outros
como modelos de comportamento, mas sim entendendo as razões que levam
pessoas e grupos a estarem em situação mais vulnerável à infecção pelo HIV.
Segundo Mann, Tarantola e Netter (1993), ao avaliar a vulnerabilidade, é
importante considerar a comunidade em que o indivíduo está inserido, assim como
os fatores nacionais e internacionais que possam influenciar a vulnerabilidade
pessoal durante o curso de uma vida. Parker (2000) corrobora considerando que,
como consequência da atenção dada aos aspectos da análise social e cultural,
existe hoje uma crescente conscientização sobre a preocupação com as forças
políticas e econômicas mais amplas que moldam a vulnerabilidade individual e
coletiva diante da epidemia e com as possibilidades de mobilização política em torno
de problemas relacionados ao HIV/Aids.
Entre os entrevistados aparece também à representação da vulnerabilidade
individual, em que estes consideram que todas as pessoas estão sucessíveis a
adquirir o vírus do HIV, como foi explicitado por Ayres et al. (2006). Os temas que
refletem esta percepção são: espalhou para a maioria dos brasileiros, com 2 UR;
tanto no pobre, como no rico, 4 UR; e qualquer um pode pegar hoje em dia,
mulheres casadas, idosos, crianças (já nascem), 23 UR. Estes temas, no entanto,
foram expressos por uma minoria dos entrevistados, o que pode indicar um
conhecimento ainda precário do grupo como um todo em relação à vulnerabilidade e
dos riscos pessoais e coletivos frente à síndrome.
A Aids espalhou em todo mundo, na maioria dos brasileiros, como no pobre, como
no Rico. (Gabriela, 54 anos)
Por que antigamente quando tinha a historia de um diagnóstico de positivo de HIV
era praticamente uma sentença. Se ele tem HIV ele é homossexual. Hoje em dia
acabou porque mulheres, crianças, heterossexuais e idosos também, se descobriu
que idoso também faz sexo através disso, né? Então é uma coisa interessante. Que
108
a sociedade se descobriu como um todo, muito através disso. Um diagnóstico não é
uma sentença: Você é gay ou você é hetero. È democrático é: todos podem ter este
problema de saúde. (Chico, 43 anos)
Ah que pegava pessoas promiscuas, pessoas drogadas, esse tipo de pessoas,
mas hoje me dia qualquer um pode pegar, donas de casa, mulheres casadas,
crianças que nasce com a doença, que é a doença do século, é a doença do
mundo hoje em dia, o HIV. (João, 31 anos)
Ah sim, conversar aqui com as pessoas tem muito homossexual, travesti, mas aqui
também tem um grupo de donas de casa, de pessoas normais, as pessoas que
estão de fora assim da AIDS que não têm, elas não conhecem essas pessoas,
pessoas que tem mãe, tem pai, tem marido, são pessoas normais, aí você conversa
e a dor de cada um e vai vendo, uma pessoa que ficou viúva, é muito legal.
(Natália, 36 anos)
Muita gente que tem e num sabe, e se espalhando, é uma coisa que se
espalhando em cada vez mais jovens e agora até idosos tão pegando, então é uma
coisa que tá aí, né?‘. (João, 31 anos)
Diante do exposto, embora apareçam outros grupos populacionais no cenário
do HIV/Aids, observa-se que a representação do grupo de risco permanece presente
e forte, ou seja, existem aqueles grupos que são permanentemente trazidos às
representações quando se aborda o maior risco de adquirir o HIV, que são os
homossexuais, os promíscuos e os usuários de drogas. Os temas que retratam esta
percepção são: Pessoas depravadas que têm a doença, 24 UR, e quem tem
esse tipo de doença é homossexual, 11 UR.
Só quem tem esse tipo de doença é homossexual, são pessoas depravadas.
(Roberto, 34 anos)
Tipo pessoas que faziam sexo com vários parceiros, que não tinham
relacionamentos estáveis e que se entregavam até outro dia e situações de sexo de
risco, ou seja, exposição a muitos parceiros sem nenhum tipo de controle. Por eu
nunca ter sido promiscuo, nunca ter feito troca de parceiro, sempre ter namorados
fixos durante muito tempo e eu acabar me contaminando, foi uma grande prova pra
mim que qualquer um vulnerável. Que não há pessoas melhores ou piores, todos
são iguais. (Chico, 43 anos)
Souza Filho (2000) justifica que, em função da rápida formação e
consolidação da representação da Aids em torno dos ―grupos de riscos‖
(homossexuais, bissexuais e pessoas promíscuas), as estratégias de prevenção
para algumas pessoas seriam evitar os grupos sexuais com práticas desviantes,
sem, no entanto, perceber a sua própria vulnerabilidade para adquirir o vírus. Neste
sentido, Ayres (2002, p. 20) afirma:
Migrar do risco para a vulnerabilidade, como foi apontado, é outro importante
desafio. Em termos bem sintéticos, trata-se de não centrar as políticas, programas e
ações tanto em grupos identitários, ou grupos de risco, mas nas relações
socialmente estabelecidas entre os diversos grupos populacionais e suas
interdependentes e cambiantes identidades. Por outro lado, não tratar as práticas
que expõem as pessoas ao HIV e ao adoecimento por Aids como fruto exclusivo da
109
vontade e do grau de esclarecimento dos indivíduos, mas ver os comportamentos
como a resultante final de um conjunto de condições estruturais e contextuais de
onde essas práticas emergem.
Atrelado a este conceito de grupo de risco, para alguns sujeitos, ainda existe
a representação de que homens heterossexuais são menos sucessíveis a adquirir o
HIV, porém as mulheres estão mais propícias a adquiri-la. Os temas que englobam
estes pensamentos são: Nós mulheres temos maior chance de contrair a doença
que o homem, Homens ativos não pegam DST´s, Ele era heterossexual, mas vivia
uma vida louca. Os relatos abaixo explicitam estes pensamentos:
Tinha um vizinho meu que morreu por causa da doença, ele era hétero, mas vivia
uma vida assim... arregrada, louca. (Roberto, 34 anos)
[...] então as pessoas ainda demonstram desconhecimento sobre doenças
sexualmente transmissíveis. Principalmente pelo fato de homens não pegam
doença sexualmente transmissível, porque eles são ativos; mulheres é que
pegam... Mas se pegam, são promiscuas. Tem muito isso. Tem muitas questões a
serem resolvidas nessa área [...]. (Chico, 43 anos)
Ah hoje eu tenho um outro tipo de visão por exemplo assim, nós mulheres a
gente tem maior parte, tem mais chance de pegar, de contrair a doença do que o
homem. O homem tem mais não é que ele não vai pegar, ele vai pegar também,
mais nós mulheres a gente tem mais possibilidade do que o homem. (Flávia, 36
anos)
Os relatos supracitados demonstram a representação da invulnerabilidade do
homem, como se o simples fato do homem ser heterossexual já o torna livre do
HIV/Aids. Guimarães (1996) contribui com esta discussão observando que a
associação da Aids à homossexualidade era tão alusiva que os relacionamentos
heterossexuais estáveis era considerado como um meio de prevenção.
A colocação da autora, no entanto, retrata duas realidades, a relação
heterossexual bem como a postura cômoda que os casais heterossexuais e em
especial as mulheres no início da epidemia adquiriram, pois se o parceiro é
heterossexual e considerado fiel, o casal não se enquadravam no ―grupo de risco‖,
logo, não são vulneráveis ao vírus HIV. Considerando que o conceito de ―grupo de
risco‖ se encontra intrínseco no contexto social destes sujeitos.
Parker e Camargo Jr. (2000) entenderam que, associado à pobreza e
vulnerabilidade ao HIV, existem alguns fatores politicoeconômicos que impulsionam
a epidemia do HIV/ Aids. Estes fatores estão fortemente acoplados à organização
social de estruturas de gênero e de sexualidade, cujas hierarquias fazem das
110
mulheres, sobretudo, as de baixa renda extremamente vulneráveis à infecção pelo
HIV.
A mais importante característica da dinâmica da epidemia hoje no Brasil, é a
via de transmissão heterossexual, constituindo uma expressão relevante em todas
as regiões. Houve incremento importante desta forma de transmissão: de 6,6% em
1988, para 39,2%, em 1998. Este caráter tem contribuído de modo decisivo para o
aumento de casos em mulheres, traduzido na progressiva redução da razão de sexo
(dada pela razão entre os casos do sexo masculino e os casos do sexo feminino), no
tempo e em todas as categorias de exposição. Os valores da razão de sexo
passaram de 24:1, em 1985, para 6:1 em 1990, situando-se em 2:1, desde 1997.
(BRITO; CASTILHO; SZWARCWALD, 2001)
Considerando ainda a relação de gêneros e vulnerabilidade ao HIV, as
mulheres são mais vulneráveis à infecção pelo HIV do ponto de vista biológico.
Devido à própria anatomia do aparelho genital feminino em que a superfície da
mucosa vaginal exposta ao sêmen é extensa, além do sêmen apresentar uma
concentração significativa de HIV livre no interior das células em comparação com o
líquido vaginal. (BASTOS; SZWARCWALD, 2000; FAUCI; LANNE, 2006).
Frente a este cenário onde a mulher é naturalmente vulnerável ao HIV, devido
aos aspectos biológicos, existiu ainda neste contexto uma negligência das
autoridades públicas no início da epidemia, pois acreditavam que as mulheres
estavam imunes ao risco, crença que, sem dúvida, foi difundida amplamente até
bem pouco tempo atrás. Guimarães (1996) pontua em seu estudo que as mulheres
possuíam informações muito limitadas acerca da síndrome, embora tivessem
mostrado um conhecimento básico sobre a epidemia e as formas corretas de evitar a
transmissão.
Pode-se entender que a pouca informação está em consonância ao retardo
da inclusão da mulher no contexto do HIV/Aids, não como vítimas, mas como
cidadãs conscientes, com poder de decisão frente à vulnerabilidade individual e
social. Sabe-se que esta não é uma meta cil de ser alcançada, porém deve ser
constantemente rebuscada e incentivada.
Compreende-se que o perfil da síndrome no Brasil aponta uma profunda
desigualdade da sociedade brasileira, a propagação da infecção pelo HIV no País
revela epidemia de múltiplas dimensões que vem, ao longo de sua trajetória,
111
sofrendo modificações significativas em seu perfil epidemiológico. De epidemia
inicialmente restrita a alguns círculos cosmopolitas das denominadas metrópoles
nacionais São Paulo e Rio de Janeiro e essencialmente masculina, que atingia
prioritariamente homens com prática sexual homossexual, e indivíduos hemofílicos,
encontra-se, hoje, com quadro assinalado pelos processos da heterossexualização,
da feminização, da interiorização e da pauperização. O avanço da transmissão por
contato heterossexual implica em um crescimento substancial de casos em
mulheres, o que vem sendo apontado como o mais importante fenômeno para o
atual momento da epidemia. (BASTOS; SZWARCWALD, 2000; BRITO; CASTILHO;
SZWARCWALD, 2001; PARKER; CAMARGO JR., 2000).
3.2.4 Discriminação e ocultamento no conviver com o HIV
As representações sociais, como fenômeno psicossocial, são responsáveis
pela formação e pelos modos de conduta aceitas pelos indivíduos no seu contexto
social. Essas condutas podem ser reveladas por meio das atitudes e das práticas
dos indivíduos e m, na comunicação social, o seu principal elemento gerador e
organizador. (MARQUES, 2002).
A categoria em tela versa sobre uma temática que engloba o cotidiano das
pessoas que convivem com o HIV, assinalando os diversos fatores positivos e
negativos que norteiam o seu dia-a-dia. Possui 64 temas distribuídos em 724 UR,
corresponde a 25,46% do corpus da análise, sendo, portanto a categoria com maior
relevância quantitativa.
Os dados empíricos desta categoria serão divididos em duas subcategorias
para um melhor entendimento:
Ocultamento como estratégia de proteção;
Preconceito e discriminação no conviver com a Aids.
112
3.2.4.1 Ocultamento como estratégia de proteção
Nesta subcategoria as pessoas soropositivas apresentam como estratégias
de sobrevivência social o ocultamento da soropositividade ao HIV. Assim podem
continuar a vida como pessoas consideradas normais, sem serem acusadas e
discriminadas, sejam no âmbito familiar, social ou no trabalho. Neste último, a
omissão do HIV constitui ainda como uma forma de manter o emprego, uma vez
que, tendo o seu segredo revelado, os indivíduos correm o risco de perderem o
trabalho.
Os temas que retratam o processo de ocultamento são 22, distribuídos em
217 UR. Os que apresentam maior relevância nesta subcategoria são: As pessoas
tentam esconder que são soropositivos/ tem vergonha; Minha família não sabe;
Meus amigos não sabem/ as pessoas não sabem; Não falo para poupar os meus
pais; Não sofro preconceito porque as pessoas não sabem (me tratam de igual para
igual); não falo para me poupar, tem pessoas que fazem de conta que não tem a
doença, no trabalho você fala que é soropositiva e é mandado embora; e as pessoas
se dão comigo sem saber que tenho a doença.
Nota-se que os sujeitos do estudo justificam a omissão da sua condição
soropositiva como uma forma de autoproteção. O poupar as pessoas constitui-se em
uma modalidade de poupar a si mesmo, devido ao estigma e ao preconceito que as
pessoas soropositivas ainda enfrentam no seu cotidiano.
Mas é... Eu acho que é isso coisa de poupar mesmo. Das pessoas não saberem é
de poupar. Tanto que eu não sofro nenhum preconceito até por conta das pessoas
não saberem. Eu acho que se soubessem, haveria preconceito sim. Eu acho que
eu me poupo também. Acho que eu me poupo também em relação a isso. (Jorge,
43 anos).
Ah, é horrível, ficar se escondendo dos outros, você nunca fala pra ninguém, você
nunca chega pra alguém, pra um amigo e fala, ah eu sou soropositivo, quem
sabe mesmo são pessoas que tem um convívio comigo, amigos meus mesmo,
meus amigos, tem amigos que nem sabem, às vezes até eles mesmo tem, e não
falam como eu tenho e não falo pra eles. (João, 31 anos).
[...] quer dizer por isso que eu prefiro que não saiba, que aí a pessoa vai me tratar
de igual para igual, não vai me tratar como uma doente. Tem muita diferença
quando uma pessoa sabe que a outra é soropositivo. Muito, por mais que fale que
não discrimine, que não tem, tem. (Marta, 35 anos)
113
Como pode ser observado, fica bem clara a dificuldade em se sentir aceito
pela sociedade. Neste caso, a omissão da soropositividade é justificada pelo medo
de ser julgado. Neste contexto, a Aids, para o sujeito abaixo, pode ser vista como
―castigo‖ e que ―a pessoa fez por merecer‖ que seriam aquelas pertencentes ao
―grupo de risco‖. Logo, a imagem da Aids continua está diretamente associada a
condutas desviantes.
Soropositivo? A palavra é escondida. É meio escondido ser soropositivo é muito
difícil, num pode falar que você é soropositivo se não você é discriminado, você se
sente discriminado, você é o doente, você é piranha, é o travesti safado, as
pessoas de fora acha que quem tem AIDS mereceu, ah ele deu muito, ele cheirou,
ele usou droga injetável, tá pagando o que ele fez . (Natália, 36 anos)
Limitações assim, de você não poder se abrir para as pessoas, você é um pouco
privado de falar de você, de você ter medo das pessoas descobrir o que você tem.
(João, 31 anos)
Almeida e Labronici (2007) constataram, em seu estudo, que sujeitos
soropositivos optaram pelo ocultamento da sorologia e não pela informação objetiva
de ter um vírus, uma vez que não é um vírus qualquer. Trata-se, neste sentido, do
HIV, que pela sua história metafórica acarreta um julgamento moral e reprovável e
interfere na vida privada. Revela um lado obscuro, ilícito e expõe os prazeres do
corpo que excederam ao controle da carne. ―E como o destino está inscrito aos
transgressores, sabem que serão punidos excluídos e deverão sofrer pelo ato que
cometeram‖ (ALMEIDA; LABRONICI, 2007, p.271). Neste sentido, em função dessas
possibilidades geradoras de sofrimento, elegem o ocultamento e até mesmo o
isolamento como proteção do meio externo (sociedade), pois enfrentar essas
situações significa ultrapassar as forças de que dispõem.
Desta forma, um dos sujeitos relata o seu sacrifício para resguardar a sua
soropositividade. Ela não faz o tratamento nas proximidades da sua residência e,
neste sentido, prefere deslocar-se para outro município e pegar três conduções para
fazer o acompanhamento ambulatorial (consultas de rotina). Tal descrição
caracteriza o medo de ter a sua condição revelada nas proximidades do seu lar. Esta
situação pode dificultar os serviços de saúde em estruturar a sua demanda seguindo
um dos regimes organizacionais do Sistema Único de Saúde (SUS), o princípio da
Regionalização, devido à relutância em efetuar o acompanhamento próximo de suas
residências, pois não querem que ninguém saiba que são soropositivos.
114
Porque hoje em dia eu vejo, assim oh, que as pessoas não sabem que eu sou
soropositivo, a não ser as que estão aqui no hospital, tanto que eu moro num lugar
e pego três ônibus para vir fazer tratamento no outro. (Marta, 35 anos)
Thiengo, Oliveira e Rodrigues (2005) observaram que os adolescentes
soropositivos guardam em segredo o seu status sorológico, uma vez que o medo da
rejeição resulta em um afugentamento do convívio social. Neste caso, o fato de o
revelarem a sua sorologia pode gerar uma segregação social. Entretanto, algumas
pessoas preferem se relacionar com outras possuindo a mesma condição
sorológica, constituindo como uma estratégia de enfrentamento e apoio mútuo. Isto
possibilita trocas de experiências frente à síndrome, além de não ter que se
submeter ao preconceito advindo das pessoas ditas normais.
[...] procurei ser amiga de pessoas, me relacionar mais com pessoas que também
têm o mesmo problema que eu, para trocar ideia, que eu também não me sentiria
tão só, porque essa pessoa também não iria me discriminar, porque ela também
está com o mesmo problema que eu. Entendeu, passei a pensar assim. (Marta, 35
anos)
Em relação a amigos quem sabe é quem tem o problema porque você acaba
fazendo uma amizade, pessoas que tem o mesmo problema, então você pode
trocar ideia e não tem problema nenhum. (Ana, 38 anos)
Por que eu acho que é mais cômodo (não falar). Por que você viver numa
sociedade hipócrita, né? E as pessoas têm... Existe o preconceito, não é com
relação a AIDS, qualquer doença que seja transmissível, tuberculose, tem
hanseníase. Qualquer coisa que as pessoas escondem apra se poupar. Pra não
precisar vivenciar isso, . Eu acho que é por conta disso, que as pessoas
escondem que são soropositivas. (Jorge, 43 anos).
Um dos sujeitos que já convive com a síndrome 22 anos declarou ser
homossexual e ter adquirido o vírus do parceiro que veio a falecer devido à Aids.
Este entrevistado, vivenciou todo o processo histórico e social do HIV. Segundo ele,
no começo da década de 80, quem tinha Aids eram somente os homossexuais.
Admitir a sua sorologia era assumir a sua tendência sexual. Esta situação gerava
medo e sofrimento conforme o depoimento que segue.
Ah, é o medo, entendeu? Da família vir a saber, de ser rejeitado pela família, sabe?
De ter esses complexos que o ser humano tem de achar que a AIDS era um
monstro na vida dessa pessoa, que os homossexuais que tinham AIDS, aquele
começo, que foi o começo da AIDS, né? (Gilson, 48 anos)
Um outro sujeito, também homossexual, faz uma declaração parecida com a
anterior, pontuando a associação da Aids à homossexualidade no início da
epidemia.
115
[...] é no caso de uma pessoa homossexual não assumida. a pessoa se revela
sem querer, né? Ainda tinha muito essa colocação. Por que antigamente quando
tinha a historia de um diagnóstico de positivo de HIV era praticamente uma
sentença. Se ele tem HIV ele é homossexual. (Chico, 43 anos)
Daniel (1991) destacou que, no final da década de 80, dos 9.555 casos de
Aids notificados no Brasil, foram expressivos os números ligados a homens
―homossexuais‖, somando 40%. Enquanto outros 20% do total nacional foram
relatados entre indivíduos classificados como homens ―bissexuais‖. As interações
sexuais entre indivíduos do mesmo sexo somaram quase 60% naquela época.
Outrossim, Terto Jr. (1997) alertava que a epidemia no Brasil apontava para a
heterossexualização como a principal forma de transmissão. Concomitante, outros
problemas de saúde pública, como as DST‘s aliadas à pobreza e a um sistema de
saúde pública deficiente, potencializaram a disseminação do HIV entre homens e
mulheres nos estratos mais pobres e menos favorecidos da sociedade.
Os sujeitos do estudo que vivenciaram ou buscaram saber como foi o início
da síndrome no país apresentaram esta representação nas suas falas, recordando
um momento histórico da Aids ou explicitando sua memória social. O fenômeno do
HIV/Aids vem passando por um processo de transformação social e epidemiológico.
Sabe-se que hoje, século XXI, depois de quase 30 anos da síndrome, os dados
epidemiológicos são outros e a representação social da Aids vem sendo moldada
em função de todo o contexto histórico, político, social e epidemiológico que a
envolve.
Entretanto, verifica-se que a representação social da Aids associada à
homossexualidade permanece forte na memória destas pessoas, como pode ser
percebido nesta categoria. Oliveira e Costa (2007), em estudo recente, utilizaram a
técnica de evocação livre tradicional e a de substituição diminuindo a pressão
normativa sobre os participantes -, cujos sujeitos eram enfermeiros de um hospital
universitário. Foram identificados homossexualidade e preconceito como elementos
provavelmente centrais no segundo momento da pesquisa.
O mesmo autor enfatiza que este grupo de pessoas continua a sofrer o
estigma e a discriminação devido à associação persistente Aids-homossexualidade.
Prossegue a lógica inicial de grupo de risco, embora, desde a década de 1990, o
grupo que representava o maior número de casos da doença era ocupado pelos
heterossexuais. (CASTILHO; CHEQUER, 1997).
116
Em geral, a representação negativa elaborada socialmente referente às
pessoas com HIV/Aids são reforçada pela linguagem e pelas metáforas que são
usadas para falar e pensar sobre o HIV e a AIDS. Este processo aumenta o medo, e,
sobretudo, o isolamento de pessoas afetadas. Não obstante, o estigma é estendido
à família e aos amigos. (PARKER; AGGLETON, 2001).
Cabe neste ponto, enaltecer a colaboração de Almeida e Labronici (2007, p.
272), uma vez que os seus achados muito se assemelham com a experiência de
vida apresentado pelos sujeitos do estudo em tela.
Como os colaboradores desta pesquisa não revelaram sua sorologia em público e
não portam os estigmas denunciados pelo corpo, como manchas na pele,
emagrecimento, queda de cabelo na medida em que são estes sinais físicos e o
sentido atribuído a eles que provocam reações salvo os de caráter que não
podem ser visíveis, conseguem por meio da estratégia de dissimulação, mentira,
isolamento e silêncio encobrir as marcas estigmatizantes para que não venham a
ser conhecidas pelos ‗normais‘ e se manterem na posição de desacreditáveis. Mas,
para sustentarem esta característica precisam a todo o momento manipular a
informação sobre seu defeito para que não se transforme em sinal de estigma. Por
conseguinte, as atitudes de negação, isolamento e ocultação da doença se
desenham como forma de se proteger e evitar a ‗execração pública‘, que se traduz
no plano das relações por meio de atitudes preconceituosas, discriminatórias,
culpabilizantes e excludentes, respostas provocadas pelo estigma.
Nesta perspectiva, existe ainda uma outra forma de ocultar a soropositividade
segundo o grupo estudado que é esquecendo que ela existe. Os sujeitos quando
revelaram esta ―negação da doença‖, procuram, de alguma maneira, naturalizá-la
em seus cotidianos.
Hoje, sentimento comum, como que não existisse, se eu não tivesse nada. (Vitória,
58 anos)
[...] converso com muita gente do dia das consultas a gente percebe que as
pessoas não têm ou umas fazem de conta que não tem, outras só lembram que
tem no dia de vir ao medico. (Jorge, 43 anos).
Castanha et al. (2006) também constataram este processo de naturalização
no que tange ao conviver com o HIV/Aids em estudo com pessoas soropositivas.
Outro motivo que justifica o ocultamento das pessoas que convivem com o
vírus da Aids está relacionado ao trabalho. Os sujeitos, no ambiente de trabalho, não
expõem a sua condição sorológica por medo de sofrerem discriminação, além da
possibilidade de perder o emprego, como pode ser observado nas falas que
seguem:
Minha patroa não sabe, porque ela é preconceituosa, ela não ia me aceitar
trabalhando na casa dela, porque ela tem preconceito e existe o preconceito, por
mais que você não queira. (Lara, 29 anos)
117
Quando você fala para uma pessoa principalmente no trabalho que você fala que
você é soropositivo, imediatamente você é mandado embora. aconteceu isso
comigo, não trabalho. Eu trabalhando estava com dois meses, falei com o meu
patrão que eu era soropositivo, porque eu tratava de duas crianças, no dia seguinte,
ela me mandou embora. (Vitória, 59 anos)
No trabalho, não sabe, não quero que saiba, porque, né? Porque eu acho que não,
pode rolar preconceito, as pessoas ali, não sei, tem uma relação de trabalho, só,
não é aquela amizade. No trabalho, não, aquela relação é profissional. Então, não
precisa entrar na minha vida, não precisa de eu abrir para eles, não é uma
precisão. (Nelson, 44 anos)
No setor trabalho, foram identificadas inúmeras atitudes preconceituosas
direcionada aos trabalhadores que possuem o vírus HIV ou com a sua suspeita, por
vezes pelo simples fato de serem homossexuais; medo injustificado de transmissão
no trabalho, discriminação, incapacidade de gerir trabalhadores soropositivos ou
recusa de co-participação nos custos de tratamento, foram vários os motivos que
levaram trabalhadores discriminados a recorrerem à justiça. (BASTOS et al., 1994).
Em função dos vários relatos sobre estigmatização e discriminação ao HIV e
à AIDS nos ambientes de trabalho, a ausência de uma intervenção eficiente e de
respostas políticas torna estes locais um dos contextos principais nos quais devem
ser implementadas ações que visam reduzir a estigmatização dos indivíduos.
(PARKER; AGGLETON, 2001).
3.2.4.2 Preconceito e discriminação no conviver com o HIV
De acordo com Moscovici (2009), preconceito designa toda crença mantida
sem uma reflexão sobre ela. Portanto, pode-se questionar a ideia usada para
esclarecer as relações entre os indivíduos, especialmente, a relação entre os
grupos, de que os homens têm uma propensão ao preconceito. O mesmo autor (p.
25) ao abordar preconceito na perspectiva da representação social afirma:
As representações sociais não apenas são relativamente difusas no senso comum
e concernem todos os aspectos da vida de uma minoria, como também se apóiam
na autoridade da tradição. Apóiam-se até mesmo, sobre a ciência, da qual se
reclamam as teorias do racismo, da diferença entre os homens e as mulheres,
estrangeiros e nacionais. Não é raro que estes preconceitos sejam enunciados ao
mesmo tempo na linguagem comum e na linguagem científica.
118
Neste contexto, verifica-se que desde os primórdios do HIV/Aids, o
preconceito foi e ainda se constitui como um dos grandes entraves sociais
enfrentados pelas pessoas que convivem com o HIV ou com a síndrome
propriamente dita. Desta forma, este fenômeno motivou diversas metáforas
poderosas em torno da doença que servem para reforçar e legitimar a
estigmatização. Como destacam Parker e Aggleton (2001, p. 19):
Elas incluem a AIDS vista como morte (por exemplo, por meio de imagens como a
Grande Ceifeira); AIDS como horror (fazendo com que os infectados sejam
endiabrados e temidos); AIDS como punição (por exemplo, por comportamento
imoral); AIDS como crime (por exemplo, em relação a vítimas inocentes e
culpadas); AIDS como guerra (por exemplo, em relação a um vírus que precisa ser
combatido); e, talvez mais do que tudo, AIDS como o Outro (no qual a AIDS é vista
como algo que aflige os que estão à parte).
A subcategoria em tela possui 40 temas e 443 UR. Nela os sujeitos explanam
acerca de um cotidiano repleto de preconceitos e discriminações no convívio social e
familiar e destaca-se que o próprio grupo em estudo assumiu que foram
preconceituosos, como revela alguns temas desta subcategoria: Eu tinha
preconceito, 27 UR; separação dos utensílios domésticos, 15 UR; as pessoas são
preconceituosas, 55 UR; as pessoas se afastam e te evitam/não tem a mesma
amizade, 38 UR; as pessoas não ficam perto, evitam contato físico (aperto de mão,
beijo no rosto) 50 UR; dentre outras. Nesta perspectiva, esta subcategoria será
descrita em dois momentos distintos, para uma melhor compreensão, quais sejam:
- O preconceito a partir do próprio sujeito soropositivo;
- Preconceito social vivenciado pelos sujeitos soropositivos.
3.2.4.2.1 O preconceito a partir do próprio sujeito soropositivo
Observa-se que alguns sujeitos em estudo assumiram que tinham atitudes
preconceituosas junto às pessoas soropositivas antes do diagnóstico. Estes
referiram a falta de conhecimento e informação sobre a Aids como justificativa para
tais atitudes.
Eu tinha preconceito, eu achava que nunca namoraria ninguém que tivesse a
doença.... Eu acho que antes do diagnóstico eu tinha algum preconceito. Eu
assumo que eu tinha. Até pela ignorância mesmo de não saber o que era. (Jorge,
43 anos)
119
Outro fato relevante foram os depoimentos em que os sujeitos admitiram que
procuravam evitar qualquer contato físico, bem como ambiente das pessoas
soropositivas. Nota-se que, por traz deste receio, existia ainda o medo de adquirir o
vírus ou alguma doença ―oportunista‖.
[...] mas ia evitar realmente qualquer contato fisco, qualquer contato assim mais
próximo, ou com a pessoa ou com as secreções as coisas das pessoas... O
ambiente também, eu ia evitar o ambiente, né? Por que eu tinha esse preconceito,
essa barreira, né? (Carlos, 33anos)
[...] Então havia em mim um preconceito, entendeu? Entrar naquele lugar e sair dali
com uma doença pior do que a que eu tive, né? Por ser também um portador... Por
que ali, a gente quando entra num lugar coisa... Tem pessoas com várias doenças
transmissíveis pelo ar, ou até mesmo pelo contato, então eu acho que havia da
minha parte um preconceito, eu via dessa forma. (Lucas, 28 anos)
É válido ressaltar que quando assumem as suas atitudes preconceituosas, os
sujeitos não se condenam, mas justificam a sua colocação. O fato de conviverem
hoje com pessoas soropositivas os fez ter um olhar diferente, principalmente por
possuírem hoje, depois da experiência, conhecimentos suficientes para o
enfrentamento da epidemia. Entretanto, foi observado que alguns sujeitos
apresentaram atitudes preconceituosas, mesmo depois do diagnóstico.
Eu acho que da minha parte... Antes disso, eu acho que havia um preconceito...
Havia o preconceito de... Até mesmo quando eu iniciei, havia esse preconceito... Eu
sabendo que eu tinha, havia. Porque eu não tinha informação adequada para
receber a AIDS, né? Eu não tinha [...]. (Lucas, 28 anos)
Desta forma, remete-se ao pensamento de Moscovici (2001) que considera
que o indivíduo sofre a pressão das representações dominantes na sociedade e é
nesta interface que o mesmo pensa e exprime seus sentimentos. Essas
representações diferem de acordo com a sociedade em que nascem, crescem e são
moldados. Sendo assim, cada tipo de mentalidade é distinto e satisfaz a um tipo de
sociedade, às instituições e às práticas que lhe são próprias.
Concordando com Moscovici, as atitudes e as práticas dos sujeitos do estudo
refletem aquelas impostas pela sociedade, uma vez que o HIV/Aids ainda é
permeado de estigmas e preconceitos. As pessoas adotam atitudes preconceituosas
muitas vezes de forma inconsciente, talvez como estratégia de defesa com o intuito
de se proteger da doença, tendendo a ser algo intrínseco, quase que involuntário,
conforme o depoimento.
120
Ah, eu acho que eu ia demonstrar não estar discriminando aquela pessoa, porque
você lidar com uma pessoa é uma coisa, e com uma pessoa que você sabe que
ela esdoente, você fica com o meio atrás, mas eu ia fazer de tudo para não
deixar entender que isto esacontecendo... Eu acho que a discriminação existe
dentro da gente mesmo... mas eu procuro nunca transparecer, que por mais que
dentro de si ta parecendo que você sente alguma coisa, mas nunca deixar
transparecer. (Kaká, 41 anos)
A pessoa soropositiva está inserida numa sociedade, que tem sua cultura,
normas e valores que se tornam por vezes uma imposição para as tomadas de
decisões em situações distintas. A pessoa que recebe o diagnóstico positivo para o
HIV passa a fazer parte de um grupo minoritário, que seria o grupo das pessoas que
convivem com o HIV/Aids. Porém, este sujeito mesmo com tal diagnóstico continua a
fazer parte da sociedade, entretanto adquire um olhar diferenciado no que tange às
pessoas soropositivas, já que agora também faz parte do grupo.
Todavia, neste período de transição, de aceitação do novo, alguns
sentimentos como o medo de relacionar ou aproximar de outros soropositivos,
sofrem uma transformação necessária, até mesmo para um posicionamento deste
indivíduo frente à epidemia que ora o acomete. Por conseguinte, estas mudanças
inferem nas atitudes e práticas relacionadas ao HIV/Aids, bem como na sua postura
frente ao preconceito e a discriminação.
Conotando mudança de atitude e de prática nos relatos que se seguem, os
sujeitos demonstram que depois do diagnóstico passaram a ver a Aids com outros
olhos. Uma destas mudanças de comportamento integra ao fato de o terem o
preconceito como parte do discurso após o diagnóstico.
[...] antes de eu ter o conhecimento que eu tenho agora. Eu acho que eu faria a
mesma coisa que as outras pessoas faz, me afastaria das pessoas que tivessem
essa doença, mas como eu tenho o conhecimento que eu tenho agora, jamais eu ia
fazer isso [...]. (Vitória, 58 anos)
Eu tinha preconceito sim. Entrar em contato, conversar, pensava que eu iria pegar a
doença por falar, apertar a mão, sentar no mesmo local que pessoa tava. Meu
preconceito era este. Agora não. Agora eu tenho mais contato com as pessoas,
já não tenho mais medo...entendeu? (Carla, 31 anos)
Para Goffman (2008 p. 14), ―as pessoas que não se afastam, negativamente
das expectativas particulares são consideradas normais‖. Desta forma, pode-se,
então perceber que a pessoa soropositiva vivencia um processo de transformação
diante do diagnóstico positivo para o HIV. De ―pessoas normais‖ passam para o
grupo ―dos soropositivos‖. Os dados empíricos revelam que as atitudes e práticas
121
preconceituosas antes do diagnóstico são substituídas pela consciência e o
reconhecimento do ―novo‖, uma vez que a maioria dos sujeitos justificou estas
atitudes devido à falta de conhecimento do que realmente era o HIV/Aids.
Jodelet (2001, p. 41) acrescenta que ―ao contrário do paradigma informático,
que recobre todo o esforço científico sob a capa de uma mesma fôrma, o modelo
das representações sociais impulsiona a diversidade e a invenção, e traz o desafio
da complexidade‖.
3.2.4.2.2 Preconceito social vivenciado pelos sujeitos soropositivos
Destacaram-se, na discussão anterior, as atitudes permeadas de
preconceitos dos próprios sujeitos soropositivos frente à síndrome. Nesta
subcategoria, analisa-se outro ponto importante no conviver com a Aids, que é o
preconceito sofrido advindo das ―pessoas ditas normais‖.
As atitudes preconceituosas da sociedade impostas às pessoas soropositivas
as prejudicam substancialmente, causando prejuízos, na maioria das vezes
irreversíveis, na vida desses sujeitos, como o isolamento social, a perda da vontade
de viver e, consequentemente, de buscarem razões para o tratamento. Originam,
ainda, processos relacionados à diminuição da auto-estima e à dificuldade de
desenvolverem um relacionamento afetivo.
Um dos temas mais relevante quantitativamente nesta categoria foi ―as
pessoas são preconceituosas‖, com 55 UR e incluindo 22 sujeitos, o que
correspondendo a 73.5% dos sujeitos.
O descaso, o preconceito, assim escabrosos de não querer comer, né, no prato da
pessoa, estar do lado da pessoa, o que quer dizer, agora, nem tanto, mas no início,
coisa de quinze anos atrás, era um absurdo, preconceitos assim, horríveis. É
relacionado de toque, de tudo, de beijo assim no rosto, as pessoas evitavam, né...
(Nelson, 44 anos)
No depoimento supracitado, o individuo considera que, 15 anos, o
preconceito sofrido era ainda pior, sugerindo que hoje tenha melhorado ou
diminuído. Porém, não foi observada tal conjectura nas falas dos demais indivíduos,
o que indica ser um processo lento reverter este cenário no qual existem dois lados,
122
as pessoas que sofrem e as pessoas que exercem as ideias e as atitudes
preconceituosas.
Que pra gente existe diferença, uma pessoa que tem preconceito ela nunca vai
admitir que você com esse problema e te aceitar, eu fui na casa dos outros
tomar café e quebraram o copo na minha cara, os vizinhos do lugar que eu moro
são preconceituosos, uma vizinha tentou me agredir falando que eu tava cheio de
aids, isso é doloros. (Lara, 29 anos).
Moscovici (2009) constata uma distinção entre categorias de sujeitos, aqueles
para os quais é legítimo se resguardarem do sofrimento e da humilhação; e os
outros, estes ao contrário, é totalmente aceitável, em função de seu sexo, raça,
religião, estado mórbido e/ou apresentação social, entre outras coisas, atribuir
sofrimentos e humilhações, os quais se podem discriminar sem reservas. O que
explica a preferência pelos seus semelhantes e o menosprezo e o aviltamento em
relação aos diferentes.
No que tange ao HV/Aids, esta realidade é identificada e justificada
reportando a forma como a mídia, no início da epidemia, a qualificou, com base nos
dados epidemiológicos e nas justificativas das ciências médicas diante de uma
doença que afligia um determinado grupo de pessoas, os homossexuais, os UDI, as
prostitutas e os hemofílicos, sendo estes últimos considerados como vítimas da Aids
e os primeiros os responsáveis em disseminarem o ―mal‖. Segundo Jodelet (2001, p.
19), esta ―visão moral faz da Aids uma doença carregada de estigma social, que
pode provocar ostracismo e rejeição‖.
Neste sentido, estigma é um termo usado em menção a um atributo
profundamente depreciativo; pode-se também ser considerado como um defeito,
uma fraqueza ou uma desvantagem, constituindo uma discrepância específica entre
a identidade social virtual e a identidade social real (GOFFMAN, 2008). Em relação
ao HIV/Aids, o estigma se construiu em torno da epidemia considerando o primeiro
impacto da doença no Brasil que ocorreu especialmente no imaginário social. Antes
mesmo que qualquer médico registrasse o primeiro caso no Brasil, a imprensa,
sobretudo a sensacionalista, assinalava a chegada da ―peste gay‖ no Brasil como
algo inevitável. (DANIEL, 1991).
Como consequência dessas expressões, um dos estigmas predominantes até
hoje é a relação direta do HIV/Aids ao homossexualismo, como descrevem os
sujeitos:
123
A elas o totalmente preconceituosas, por que quando assim sai o assunto,
elas falam besteira. Ah, que quem tem esse tipo de doença é homossexual, são
pessoas depravadas. (Roberto, 34 anos).
Preconceito, preconceito muito grande, muito grande, muito grande. Eu almoço
num lugar e tem um rapaz e ele é do banco do Brasil, da "quilomoto" e ele ta
magrinho, magrinho, magrinho, ele é homossexual, às vezes to na mesa, e falam
esse menino com AIDS, com certeza com AIDS, e num sei o que, num sei o
que, num sei o que, elas nem conhecem o cara nem sabem se é ou num é, e tem
preconceito. É lógico que o pessoal é preconceituoso, por isso que eu nunca revelei
e nem vou revelar. (Natália, 36 anos).
Parker e Aggleton (2001) confirmam quanto à associação do HIV/Aids à
homossexualidade e reforçam outras alvos de estigmatização, como a prostituição, a
promiscuidade e o desvio sexual, o que determinou toda a história da epidemia e
permanece ainda hoje como o aspecto mais enraizado do estigma, da
estigmatização e da discriminação relacionados ao HIV/Aids. Esses estigmas que
associam o HIV/Aids à homossexualidade, além de outros ―desvios sexuais são
tipicamente tolerados e implicitamente aceitos nas sociedades em todo o mundo.
Uma das consequências do preconceito vivenciado o pelos sujeitos é a
tendência ao isolamento social. Como foi pontuado nos depoimentos que seguem:
Eu tinha uma visão assim... De que se contaminou, seria excluída, seria isolada...
Para mim seria isso. Eu achava que não ia poder mais ter contato com os meus
sobrinhos, não ia poder casar, não ia poder ter mais relacionamento com as
pessoas, teria que ter uma vida mais particular, mais para mim, entendeu? Então
eu pensava assim. (Lucas, 28 anos)
[...] eu nunca tive uma atitude assim de farra, de passar a noite fora, viver bebendo,
essas coisas... eu era mais caseIra mesmo. E agora que eu descobri mesmo, agora
que eu fiquei mais caseIra ainda, não saio mais. Já não saía... agora mesmo que
eu não saio. (Carla, 31 anos)
Percebe-se, nas falas acima, que os sujeitos apresentaram uma tendência de
se resguardarem ou se excluírem do convívio social após a descoberta do
diagnóstico. Quando foi utilizada a expressão “não ia poder ter mais relacionamento
com as pessoas”, observa-se uma imagem de isolamento como algo determinado
pela sociedade ou como uma forma de punição por terem contraído o vírus do HIV.
Almeida e Labronici (2007) consideram que o maior grau de sofrimento
infringido aos sujeitos era o conviver com os constrangimentos impostos, não pela
dor infringida ao corpo doente, (ser ou o ser doente de AIDS), mas pela pungência
do preconceito e da discriminação estabelecido pelo meio externo. O sentimento de
culpa que reflete a metáfora estigmatizante da AIDS e que se abriga no imaginário
social e, portanto, permanece a conotação moralista que se faz em torno da AIDS,
124
castigando-os pelo comportamento divergente dos valores morais e sexistas da
sociedade tradicional. Os autores acrescentam que tal condenação os impede de se
relacionarem afetivamente com outras pessoas.
No presente estudo, foi observada experiência semelhante:
O preconceito está em cada um de uma forma, então você acaba se fechando, por
exemplo: você arruma um namorado, aí você acaba não querendo se envolver com
ele porque de repente ele vai te aceitar de repente não, aí você acaba se excluindo
daquilo ali, se fechando, entendeu é nesse sentido. (Adriana, 37 anos)
Segundo os depoentes é extremamente difícil revelar para o(a) parceiro(a) o
seu status sorológico, pois, na maioria das vezes, eles não aceitam a situação, o que
gera sofrimento e isolamento ou a omissão como consequência do medo da
descoberta e do abandono. Esta última situação expõe o parceiro(a) aos riscos
eminentes de infecção, caso não usem o preservativo nas relações sexuais.
Quando eu soube, eu estava com um companheiro fixo, estava morando com
ele, e fiquei com ele, mas também não contei para ele não. depois ele fez,
quando eu fiquei grávida dele, né? Ele teve que vir fazer o exame, e ele deu
negativo. Nós ficamos sete anos, e a gente nunca tinha usado preservativo, e eu
escondi, quando soube, mesmo assim não falei nada para ele, e ele não adquiriu a
doença. (Jéssica, 35 anos)
Este dado é extremamente importante e preocupante, onde se questiona se
os órgãos públicos estão investindo em estratégias de prevenção a partir dos
próprios sujeitos soropositivos. Neste contexto, investir em educação em saúde é
fundamental, uma vez que estes podem exercer um papel fundamental neste
processo, principalmente no que tange a autoproteção e, consequentemente, do
parceiro(a), haja vista que a via sexual consiste na principal via de disseminação do
vírus HIV.
Bem diferente do apresentado na fala anterior, outra justificativa que impede
ou dificulta o relacionamento seria o medo de contaminar o parceiro(a), pois, caso
aconteça, geraria um sentimento de culpa irreparável. No relato que segue, a
pessoa informa que, mesmo após explicações de médicos e psicólogos que o uso
do preservativo torna os relacionamentos seguros, apresenta um intenso processo
de resistência a qualquer envolvimento afetivo.
De eu não poder fazer as coisas que eu poderia fazer antes de eu ter esse
problema, como ter um companheiro, ter uma pessoa do meu lado. Isso hoje, eu
não posso fazer isso, porque eu tenho medo de contaminar essa pessoa. Os
médicos falaram para mim, mesmo a psicóloga, se eu usar camisinha não tem
problema, mas eu sei lá, eu fico, acho que eu vou ficar com a consciência muito
125
pesada, se eu tiver com uma pessoa, e aquela pessoa, depois descobrir que eu
contaminei ele. (vitória, 58 anos)
Bessa e Terto Jr. (1998) confirmam a afirmação anterior ao constatarem que o
medo da rejeição, a imprecisão da revelação da condição sorológica ao parceiro e a
imprecisão quanto à sua reação, induz, na maioria das vezes, uma fuga de
relacionamentos afetivos como forma de desviar-se de uma possível situação de
abandono.
Ainda assim, uma alternativa apresentada por outros atores sociais do nosso
estudo para o enfrentamento de tal situação foi a de buscar relacionamentos com
pessoas soropositivas como eles, conotando a ideia de que existem dois grupos
distintos, ―diferentes com diferentes‖ ou ―iguais com iguais‖, deixando em aberto,
para reflexão, que existe, de fato, diferenças entre os iguais, mesmo considerando
que todos são seres humanos e dividem o mesmo universo.
Eu namoro, namoro cinco anos, já. E hoje em dia eu to bem. Ele também é
soropositivo, inclusive eu conheci ele aqui. Tem cinco anos. Eu achei melhor lidar
com a situação de uma pessoa igual a mim, porque eu não suportaria saber que eu
sou soropositiva e pegar uma pessoa que não é, e sabe? Isso pra mim não seria
legal. Então eu procurei, desde o momento que eu soube... Eu falei, se algum dia
eu tiver que me relacionar depois, vai ser com uma pessoa que seja igual a mim,
entendeu? Poder não esconder nada. Não ter aquele sentimento de culpa mais
tarde, entendeu? (Maria, 37 anos)
Neste contexto, Oliveira e Costa (2007) ressaltam que os elementos
preconceito e discriminação, presentes em seu estudo, revelaram, de certa forma, o
contexto social em que se inserem os sujeitos soropositivos, bem como a falta de
conhecimento e as falsas crenças sobre o HIV/Aids, o que reflete diretamente nas
atitudes observadas diante das pessoas que vivem com a doença. Regato e Assmar
(2004) advertem que os sujeitos soropositivos sentem dificuldade de serem aceitos
socialmente, o que determina sentimentos de exclusão e de solidão.
Embora tenha discutido alguns mitos relacionados à forma da transmissão
do HIV, neste momento discutir-se-á o ponto de vista do estigma e do preconceito,
uma vez que estas atitudes estimuladas, sobretudo, pelo medo do contágio e pela
falta de informação suscitam desconforto e sofrimento nestes sujeitos que são alvos
do menosprezo social. Os temas que refletem esta representação o: As pessoas
se afastam, te evitam, não tem a mesma amizade, 38 UR; As pessoas não ficam
perto, evitariam qualquer contato físico (aperto de mão, beijo no rosto), 50 UR.
126
Ah pode passar tipo assim ah, aquelas pessoas bem ignorante que acha que pega
em perto de mão, em tossir, beber no mesmo copo, esse tipo de coisa, entendeu?
Que já aconteceu comigo. Ah aconteceu em caso de próprios conhecidos mesmo já
ouvi, lava o copo, lava o copo, por que ele tem aquela doença, esse tipo de coisa. E
na época foi um baque, até me afastei dessas pessoas, só tenho convívio pessoas
que me aceita como eu sou, entendeu? Se eu que tem algum tipo de
preconceito, entendeu? Me afasto logo. (João, 31 anos).
Ah, a gente começa a notar a diferença assim no cumprimentar, não, já, por
exemplo, não te abraça, não vem e te dá aquele beijo no rosto igual amiga
quando se encontra. Igual no ônibus, que eu vim quando as pessoas sabiam que
aquela moça era soropositivo, as meninas não chegavam, o abraçavam, não
davam mais beijinho no rosto, entendeu? começa assim a excluir do seu grupo,
entendeu? se vai pra uma festa, pra algum lugar não chama mais. começa
assim evitando, não é que a pessoa chegue assim e fale é soropositivo, você para
lá e eu para cá. A gente sente que a pessoa vai evitando, um meio de sair de perto,
entendeu, às vezes não senta mais do lado, procura sentar atrás, ou às vezes
prefere ir até em pé pra o ficar perto da pessoa sabe, é a gente vê. (Marta, 35
anos)
Existe um preconceito muito grande, porque muita gente não tem informação, então
um preconceito muito grande... Então eu acho que se eles souberem, eles vão
se afastar, vão ficar com medo de pegar tocando, pegando na mão, dando um beijo
no rosto... Eu creio que eles achem que pega, por isso eles não sabem. (Sílvia, 45
anos)
Destaca-se que o medo de contrair o HIV por meio de contato social com
pessoas infectadas é algo que já foi explicitado em outras pesquisas, como Garcia e
Koyama (2008). As autoras destacaram que, na medida em que existe a
possibilidade de aproximação, interação ou intimidade com pessoas soropositivas,
maior é a rejeição. E acrescentaram que situações como estas evidenciam a
desinformação e a falta de confiança nas informações obtidas no que tange à
exposição ao vírus pelo contato social, além de reafirmar o intenso estigma em torno
do HIV/Aids que culmina em isolamento e em afastamento daqueles que vivem com
o HIV e a sua consequente discriminação.
Os sujeitos deste estudo relataram que são vítimas de atitudes
preconceituosas até mesmo no convívio familiar. Neste contexto, destaca-se que a
omissão da sorologia não acontece somente nas relações sociais, entre os amigos,
trabalho, mas no próprio seio familiar que seria, a priori, o lugar onde estas pessoas
deveriam encontrar apoio, escuta e, sobretudo, o amor, requisitos básicos para
auxiliar no enfrentamento da doença que não se apresenta como uma tarefa fácil.
Contudo, estas pessoas carecem de uma rede social de apoio, além de uma
estrutura política adequada que é fundamental neste processo.
Minha família, por exemplo, eu não contei, até por que por preconceitos, eu tenho
certeza que eles não vão me apoiar, então eu optei pra isso e to vivendo bem pra
isso. (Roberto, 34 anos).
127
[...] e realmente é ignorância, falta de informação, as pessoas ainda tem medo,
dentro da minha própria casa a minha mãe, assim eu moro ao lado da minha mãe e
eu não posso utilizar o banheiro da minha mãe, porque se eu utilizar o banheiro da
minha mãe ela lava tudo com cloro ela desinfeta tudo. (Adriana, 37 anos).
Mas eu senti da parte de alguns parentes, tipo uma irmã minha e uma cunhada
minha, um certo preconceito no contato, entendeu?....Não deixava meus sobrinhos
mais como era antes de eu ter o diagnóstico... Estar mais próximo deles, ou pegar
dar um beijo, um abraço ficou aquela coisa mais distante... ou quando eu via que
ele vinha para me dar um abraço ou um beijo, ai tipo que segurava assim, mas não
deixava desconfiar, mas como a gente percebe logo, que há... E a minha irmã
quando às vezes eu brincava com ela, dava um dentadinha, morder, alguma coisa
assim... Eu sempre brinquei com ela desse jeito... Então eu vi que ela: "pára com
isso"... Alguma coisa assim, não deixava, não faz isso, entendeu? Então esses
gestos foram uma das coisas que na minha família teve, né? Nas pessoas que
convivem comigo dia-a-dia [...]. (Lucas, 28 anos)
De acordo com Bastos et al. (1994), no início da epidemia era comum o
próprio companheiro e os familiares das pessoas soropositivas evitarem a
proximidade destes, ficarem na porta do quarto do hospital e, à sua saída,
rejeitarem, abandonarem ou segregarem-nos. Além disso, uma das justificativas que
levam as famílias a rejeitarem os seus membros soropositivos não é condicionada
somente à associação do estigma ao HIV/Aids, mas também em virtude das
conotações de homossexualidade, de uso de drogas e de atitudes promíscua.
(PARKER; AGGLETON, 2001).
Almeida e Labronici (2007) evidenciaram que os seus sujeitos, de igual forma
e por escolha consciente, não informaram aos seus familiares a sua condição
sorológica. Entretanto, este fato pode ser esclarecido, pois se porventura um dos
membros de uma família for portador do HIV, este evento pode ser um elemento
desagregador que põe em risco a função da mesma como instância de controle
sobre os comportamentos, instalando-se a desordem.
Saldanha apud Castanha et al. (2006) adverte que o modo como as famílias
se apropriam da doença é um reflexo do seu relacionamento íntimo, de suas
histórias e do contexto sociocultural no qual estão inseridas. O nível de receptividade
e de compreensão se mais facilmente quando a estrutura familiar apresenta um
relacionamento satisfatório, trazendo ao membro que se encontra fragilizado diante
da doença, um fortalecimento através das relações de ajuda e afeto.
Sabe-se que em todas as sociedades e de maneira especial na maioria dos
países em desenvolvimento, as famílias exercem uma responsabilidade no que diz
respeito ao cuidado dos doentes. Existem claras evidências de seu papel
128
fundamental no apoio e no cuidado às pessoas com HIV/Aids. (PARKER;
AGGLETON, 2001).
Outro aspecto revelado pelos sujeitos do estudo está relacionado ao
distanciamento do HIV/Aids do seu grupo social. Os mesmos revelaram que não
conheciam ou não tinham contato com pessoas soropositivas antes do diagnóstico,
situação esta expressa por 16 sujeitos, mais de 50% dos indivíduos participantes do
estudo. Destaca-se, ainda, que este tema foi composto por 27 UR.
Eu pensaria que eu nunca iria ter esta doença, nunca iria ter contato com alguém.
Eu nunca tive amizade com ninguém com esta doença e nunca quis saber se um
dia iria ter. (Carla, 31 anos)
Eu não conhecia ninguém com Aids até então. (Kely, 32 anos)
Thiengo, Oliveira e Rodrigues (2005) encontraram algo parecido em seu
estudo, apontando que quando os adolescentes foram indagados se conheciam
alguém com Aids, a maioria admitiu não conhecer casos concretos, comprovando
que a Aids é uma doença distante para o grupo e que não implica em um
envolvimento pessoal com a doença. Joffe (2008) propôs, como uma das formas das
pessoas se defenderem de medos associados à Aids, a projeção da
responsabilidade por sua origem e o seu desenvolvimento em outros (conforme visto
na categoria anteriormente discutida e que se refere ao processo de ancoragem da
representação). Distanciando-se, desse modo, da situação ameaçadora, a
representação hegemônica da Aids consiste na afirmação, ―eu não‖, ―o meu grupo
não‖.
3.2.5 O processo de adesão ao tratamento na cotidianidade de indivíduos
soropositivos
Esta categoria possui 689 UR distribuídos em 50 temas, correspondendo a
24,23% do corpus da análise. Destaca-se que a formação desta categoria emergiu
do cotidiano dos atores social relacionado ao conviver com o HIV. Os entrevistados
traziam à baila este cotidiano com naturalidade e com uma certa propriedade da
temática em tela.
129
Ressalta-se que todos os sujeitos do estudo fazem uso da TARV mais de
seis meses. A categoria será divida em três subcategorias:
- O tratamento como uma arma contra a morte no contexto da
Representação social da Aids;
- O Cotidiano e o processo de adesão ao tratamento vivenciado pelos
sujeitos soropositivo;
- Religião e fé no processo da adesão.
3.2.5.1 O tratamento como uma arma contra a morte no contexto da Representação
social da Aids
A subcategoria retrata como os sujeitos representam o tratamento para o
HIV/Aids. Observa-se que, em princípio, este consiste no uso do antiretroviral e na
realização de exames de rotina necessários para o acompanhamento da carga viral.
Tais proposições foram expostas em 17 temas e 220 UR.
Embora a Aids seja uma doença incurável, existem, hoje, tratamentos
eficazes que aumentam a expectativa e a qualidade de vida das pessoas que
convivem com a síndrome. Um dos grandes motivadores da adesão, neste cenário,
consiste no fato dos usuários acreditarem no resultado positivo da terapêutica. Os
temas que refletem esta realidade são: Se não tomar os remédios fica doente (3
UR), Se não tomar os remédios/se não se tratar morre (13 UR), Se você não se
cuidar fica doente (10 UR), Se você se cuidar está bem (3 UR); Se eu não me cuidar
morro (4 UR); Se eu me cuidar vivo bastante (3 UR).
Os temas supracitados demonstram a dicotomia que existe em torno da
terapêutica da Aids. Para os sujeitos, depois do HIV, a vida e a saúde dependem do
uso das medicações e do tratamento. Não obstante, o abandono deste último tem
como consequência a progressão da doença e, consequentemente, a morte. O
autocuidado também está relacionado a viver muito e estar bem e a falta dele de
igual forma resulta em doença e morte.
A Aids não mata, o que mata é você deixar de tomar o remédio. (Lara, 29 anos)
130
Agora a partir do momento que você está infectado, você tem que tomar todos os
cuidados e não dar bobeira, se você quer viver mais alguns anos, não dar bobeira.
(Kaká, 41 anos)
Você sobrevive se você se medicar, se você não se medicar ela te destrói.
(Paulo, 40 anos)
Tem hora que, assim, que paro um pouco de tomar o remédio. eu volto a tomar
por que se eu não tomar eu vou cair doente, até morrer [...]. (Gabriela, 54 anos)
Então eu tive que escolher entre viver, tomar a medicação ou morrer. Então é uma
escolha muito difícil, então acho que para mim, é a luta para viver, porque se você
quer viver, você tem que lutar. Porque eu acho que no meu entender o soropositivo
é isso. Você tem que lutar, porque se você desistir, você pode colocar na sua
cabeça que você vai morrer. (Marta, 35 anos)
Silva (2006) evidenciou, em sua análise, que a perceptibilidade sobre os
objetivos do tratamento torna-se um fator favorável à adesão a TARV. Portanto, a
manutenção da vida está relacionada ao uso da medicação. Este esclarecimento é
uma construção social na qual as informações sobre as drogas, os resultados dos
exames, os efeitos favoráveis observados em si mesmos e as conversas cotidianas
com outros pacientes se conjugam para se definir os objetivos do tratamento.
Neste sentido, espera-se que o paciente acredite no tratamento, fonte de
esperança, apesar da inquietação atrelada aos efeitos secundários e aos fracassos
terapêuticos. Entretanto, a adesão ao tratamento nunca pode ser avaliada e tida
como definitivamente estabelecida, pois cada dia em diversas situações o paciente
pode ter seu comportamento desestabilizado por inúmeras razões, tanto de ordem
prática quanto de ordem psicológica. (VASCONCELLOS; PICARD; ICHAI, 2003).
No que concerne ao abandono do tratamento, dois temas retratam esta
representação, quais sejam: Não toma os remédios, com 9 UR e Abandona o
tratamento com 4. No entanto, somente 5 sujeitos (16.6%) relataram situações de
abandono do tratamento, resultado que sugere uma boa adesão do grupo em
estudo, considerando que 19 entrevistados (63.3%) construíram o tema tomo o
remédio que possui 44 UR e o tema fazer/manter o tratamento com 36 UR com
53,3% dos entrevistados inclusos.
Os sujeitos do estudo parecem que compreendem a importância do uso
correto da TARV, porém, existem diversos fatores que influenciam no uso adequado
dessas medicações, levando, muitas vezes, ao abandono do tratamento. Cardoso e
Arruda (2005) afirmam que os principais motivos pelos quais os pacientes como um
todo relatam haver abandonado seu tratamento com os ARV o: os efeitos
131
colaterais (principal motivo), as perdas afetivas/problemas em família e o conflito
entre tomar remédios e os hábitos da vida cotidiana.
No estudo em tela, um dos motivos que levam ao abandono do tratamento, de
igual modo, está relacionado aos efeitos colaterais dessas drogas, especialmente à
alteração da imagem corporal que pode caracterizar as pessoas soropositivas como
―aidéticos‖.
Porque sempre quando tem que mudar medicação pra mim, é uma tortura, porque
muda com o meu metabolismo todo, né. As medicações foi mudando meu corpo,
que antes eu e olhava no espelho eu era bonita, tinha uma corpo definido, e
conforme fui tomando medicação, a medicação, ela vai deixando meu corpo
completamente diferente então, cada medicação que eu tomava, que eu tinha que
mudar, pra mim era uma luta, eu chorava, porque eu sabia que aquele remédio, eu
ia tomar, eu tinha que fazer uma escolha: ou viver ou parar o remédio e ficar com
um corpo bonito e morrer, né? Então tive que colocar na minha cabeça, não eu,
mas como os médicos também que procuraram me explicar. Igual que assim, que
eu tive medicação que estava tomando e estava me deixando com as veias do
corpo toda alta. Eu não podia usar um bermuda, porque minhas veias, elas, ai ela
suspendeu minha medicação e passou para outra. Essa outra que eu comecei
tomar no começo, eu chorava, porque eu fiquei osso e pele, por causa do remédio
[...]. (Marta, 35 anos)
[...] porque aqui eu conheço muitas meninas, aqui, que elas fazem tratamento, e o
remédio está fazendo mal, está mudando o corpo, elas param, elas não continuam.
E além de não continuar, elas não m um pingo de amor à vida delas. (Kelly, 32
anos)
O estudo de Tunala et al. (2000) mostra os fatores psicossociais que
dificultam as mulheres portadoras do HIV a aderirem ao tratamento e aos cuidados
de saúde. Foi ressaltado que os efeitos colaterais dos coquetéis como a lipodistrofia
é extremamente estigmatizante, principalmente pelo fato destas mulheres
acreditarem que os outros percebem seu status sorológico através da aparência
física ou simplesmente pelos efeitos da autoimagem. Igualmente, a revista Época
em 2006, em sua edição especial sobre o tema Aids, descreve que um dos maiores
receios das pessoas acometidas pelo HIV é que a lipodistrofia volte a provocar o
estigma que marcou a doença nos primeiros anos.
No entanto, uma depoente revela certo desestímulo com a vida e com o
conviver com a Aids e, consequentemente, com o tratamento: ―estou cansada da
Aids‖ (Gabriela, 54 anos). Vasconcellos, Picard e Ichai (2003) consideram a auto-
estima como o ponto de articulação invisível que organiza as respostas apropriadas
para o estabelecimento de relações de apoio na luta contra a depressão e no
processo de assegurar o controle do comportamento, particularmente a adesão
terapêutica.
132
A mesma entrevistada completa:
ela fala (a médica): seu CD4 estão muito altos, tu não tomando os remédios.
Tu acha melhor tomar cerveja do que tomar os remédios‖. eu digo: Não tomei
mesmo não, to tomando não. Tem um mês que eu não tomo remédio. Eu digo pra
ela, não, eu fico sem tomar. Tem hora que, assim, que paro um pouco de tomar o
remédio. (Gabriela, 54 anos)
Tal situação é um dos grandes impasses encontrados na terapêutica com os
antiretrovirais, pois o ato de parar e reiniciar o tratamento, além de não propiciar o
efeito terapêutico desejado, pode contribuir para o desenvolvimento de resistência
viral às drogas utilizadas. O desenvolvimento de resistência e a subsequente perda
da ação dos fármacos contra o HIV constituem a barreira primária para a eficácia do
tratamento. que se considerar que o vírus tem a capacidade de produzir mais
cópias de si mesmo e, ao fazer isso, gerar mutações espontâneas do genoma viral.
(BRASIL, 2003).
Bonolo, Gomes e Guimarães (2007), em estudo de revisão de literatura sobre
a temática, observaram que, entre as dificuldades da adesão à TARV, encontram-se
aquelas relacionadas à complexidade da vida cotidiana das pessoas portadoras do
HIV, aos contextos socioeconômicos desfavoráveis, ao acesso limitado à terapia
pelas populações menos favorecidas e à falta de intervenções eficazes para ajudar
os pacientes a alcançar e manter níveis adequados de adesão.
Seguir corretamente o tratamento não é uma tarefa fácil e exige muito dessas
pessoas. Entretanto, Ceccato et al. (2008) enfatizam diversos fatores que
influenciam no cumprimento terapêutico, destacando que a falta de compreensão do
tratamento e da síndrome pelo paciente tem sido fortemente associada com a não-
adesão. Os pacientes com conhecimento precário sobre seu próprio regime
terapêutico e sua entidade mórbida podem ser menos envolvidos com seu próprio
cuidado, não sendo capaz de compreender as instruções para o regime terapêutico
e pode ter maior probabilidade de não-adesão. Coelho (2006) observou que a
inclusão do tratamento na vida cotidiana é uma fase difícil para as pessoas que
convivem com o HIV. Esse momento é marcado pela ansiedade e pelas dificuldades
em adaptar-se à medicação, principalmente pelos efeitos colaterais da TARV.
Vitória (1998) recomenda que se deva iniciar a terapia quando os objetivos
e a necessidade de adesão ao tratamento sejam compreendidos e aceitos pelo
paciente. É importante certificar se o mesmo realmente sabe como tomar a
133
medicação e entende as consequências da não adesão para o sucesso do
tratamento.
O fato da imagem da Aids estar associada a uma doença incurável e mortal
pode influenciar de forma decisiva no seguimento do tratamento a partir da seguinte
lógica: ―se eu vou morrer, vou me cuidar para quê?‖. Coelho (2006) dispõe que a
ideia de proximidade da morte pode ser um fator para a não-adesão ao tratamento,
visto que, alguns dos entrevistados, especialmente os do sexo masculino, vêem a
morte como inevitável e o uso do medicamento não significa a cura, ao mesmo
tempo em que o início do tratamento pode representar a confirmação da sentença
de morte em função da objetivação da doença. O entrevistado seguinte expõe a sua
ansiedade, quando iniciou o tratamento.
[...] eu pensei que fosse morrer, num queria tomar remédio, pra mim aquilo é uma
doença incurável. (João, 31 anos)
Portanto, logo no início do tratamento as pessoas soropositivas precisam ser
devidamente orientadas pelos profissionais envolvidos neste processo e
esclarecidas todas as vidas relacionadas ao tratamento. Silveira e Ribeiro (2005)
destacam que a adesão ao tratamento inclui fatores terapêuticos e educativos
direcionados aos pacientes, envolvendo aspectos pautados no reconhecimento e na
aceitação de suas condições de saúde, além de uma adaptação ativa a estas
condições, bem como saber identificar fatores de risco no estilo de vida, ao cultivo
de hábitos e atitudes promotores de qualidade de vida e ao desenvolvimento de
consciência para gerir o autocuidado.
Teixeira e Silva (2008) relatam que a utilização da terapia com antirretrovirais
vem apresentando resultados positivos em todos os países nos quais os indivíduos
infectados pelo HIV têm tido acesso a esses medicamentos e aderido ao programa
de tratamento. Assim, foi observado por Cardoso e Arruda (2005) que, para os
pacientes aderidos ao tratamento, o viver a soropositividade no dia a dia está
fortemente associado a "tomar remédios".
Neste estudo, os sujeitos, de igual modo, retratam o compromisso e a
necessidade em estar tomando a medicação corretamente.
Eu sigo corretamente todo o tratamento, né? Eu faço os exames na época certa.
Tomo a medicação corretamente. (Jorge, 43 anos)
134
Tem que tomar remédio, tem fazer exame de rotina, anual tem que tomar remédio,
pra mim é uma coisa normal. (Maicon, 32 anos)
[...] procuro me cuidar tomar as medicações em dia e vou levando a vida. (Gustavo,
48 anos)
Nota-se que, para estes usuários, o tratamento não consiste apenas em
tomar as medicações, mas também na realização dos exames de rotina para o
acompanhamento da carga viral. A construção cognitiva em torno dessa temática
está imbricada em um conhecimento prático (senso comum), mas também em um
saber com um fundamento científico (universo reificado), conforme pode ser visto
nas falas seguintes:
O CD4 que nós vamos fazer agora. A carga viral, tudo faz parte dos exames da
AIDS, né? (Gabriela, 54 anos)
Eu acho que a AIDS é uma doença, que apesar de não ter cura, tem tratamento....
Existe os coquetéis, o tratamento. (Jorge, 43 anos).
É uma doença crônica controlada, tem tratamento direitinho. Hoje tem tratamento,
coquetéis, então a pessoas se cuidando tem uma qualidade de vida boa.... tem
tratamento, para si viver, ter uma qualidade de vida boa, desde que você cuide.
(Nelson, 44 anos)
Jordan et al. (2000) destacam que a história de superação das dificuldades
relaciona-se não somente aos complexos esquemas terapêuticos, mas, sobretudo
às dificuldades enfrentadas no seu cotidiano, estilo de vida e ao estigma da Aids.
Concomitantemente, percebe-se a influência marcante dos aspectos culturais de
determinado espaço social e o contexto histórico em que o indivíduo soropositivo
está inserido, especialmente no que tange às questões referentes à adesão ou à
não-adesão ao tratamento antiretroviral.
3.2.5.2 O cotidiano e o processo de adesão ao tratamento vivenciados pelos sujeitos
soropositivos
A subcategoria retraduz parte da realidade do cotidiano das pessoas que
convivem com o HIV, com ênfase no processo de adesão. A construção cognitiva
sobre a temática versa em torno das dificuldades encontradas diariamente neste
135
processo, as estratégias elaboradas para superá-los e a incorporação de novos
hábitos de vida.
Para tanto, foi construído 31 temas abarcando 346 UR. Entre os temas
destacam-se Passa a viver normalmente/ tiro de letra/ tenho problema nenhum 69
UR, dito por 22 (73.3%) entrevistados; Tem que se cuidar/ ter mais cuidados 44 UR,
expresso por 20 (67%) sujeitos; Força de vontade 11 UR e Eu vou lutar/ eu luto 20
UR; Temos uma vida limitada, somos privados de fazer algumas coisas 21 UR.
Os atores sociais do estudo tende a naturalizar o conviver com o HIV/Aids ao
declararem: Passa a viver normalmente/tiro de letra/tenho problema nenhum, esta
construção cognitiva não foi percebida como fuga do problema, mas como uma
adaptação e aceitação do viver com o HIV e do tratamento com a TARV. As falas
foram complementadas com a realidade diária no que dizer respeito aos cuidados
necessários para viver bem e consequentemente diminuir a vulnerabilidade ao
adoecimento. Tal conjetura sugere ainda a conscientização dos mesmos em relação
ao tratamento, considerando que seja para o resto da vida, semelhante a uma
doença crônica, tal como a diabetes. A fala a seguir expressa esta ideia:
você está fazendo um tratamento... É uma doença como qualquer outra, como você
ser... Ter aquele negócio... Diabetes, que você tem que fazer um tratamento, é pro
resto da vida, mas que você tem que tratar. (Jéssica, 35 anos).
Castanha et al. (2006) observaram que a Aids está ancorada nas doenças
crônicas, dentre as quais a diabetes e o câncer. Este fenômeno é decorrente da
introdução dos antiretrovirais e os resultados progressivos dos mesmos, que
permitiu que a Aids assumisse um caráter de cronicidade, tornando-se ―normal‖ com
o passar do tempo, semelhante a tantas outras doenças. Esse processo de
cronicidade permitiu aos soropositivos, principalmente para aqueles com um maior
tempo de diagnóstico, o processo de naturalização da Aids.
Ah, hoje eu tiro de letra. Não... Eu tento não pensar nisso, eu sigo corretamente
todo o tratamento, né? Eu faço os exames na época certa. Tomo a medicação
corretamente. Hoje eu tenho... É uma doença como se... eu tenho a AIDS hoje pra
mim como se eu tivesse uma dor de cabeça que não passa nunca, que eu vou ter
que tomar o remedinho todo o dia para ela diminuir. Mas consigo levar numa boa.
Tenho problema nenhum. (Jorge, 43 anos)
É uma doença como outra qualquer, que tem que ter cuidado. (Maicon, 32 anos)
Ser soropositivo para mim é aquele negócio... você não... Não é porque você é
soropositivo que você está com a vida findada... Não, você tem direito a viver
normalmente, não é um bicho de sete cabeças. (Kaká, 41 anos).
136
No relato que se segue, o sujeito entende que, para viver bem com o
HIV/Aids, é preciso querer, como um processo opcional entre morrer ou viver. Relata
sobre a importância do auto cuidado e da necessidade do tratamento e que a vida
deve continuar normalmente, trabalhar e ser independente, porém com cuidado.
Você sabe que tem que ter um certo cuidado na sua vida, mas não precisa deixar
de viver, deixar de fazer o que você gosta, ou estar com a pessoa que você gosta...
A vida continua normalmente, hoje em dia você tem essa noção, né? Que você se
tratando, depende de você, ou você quer morrer, se quer morrer para com tudo,
larga tudo, se tranca num quarto e espera morte chegar. Ou se não você vai viver
sua vida normalmente, trabalhar, independente, ser uma pessoa independente, e
deixar a vida rolar solta, mas com todo o cuidado possível. (Kaká, 41 anos)
Percebe-se que este processo de naturalização vem atrelado ao sucesso do
tratamento. Porém, este depende, sobretudo, de disciplina e exige alguns cuidados,
o que os estimulam a incorporar hábitos saudáveis na rotina diária, como dormir
cedo, alimentar bem, fazer exercício físico, não beber, não fumar e associar, a tudo
isto, uma alimentação balanceada. Os entrevistados explanam:
Uma pessoa absolutamente normal. Não tenho nenhum problema com relação a
isso. Levo minha vida tranquilamente, normal. Lógico, você tem que ter os cuidados
normais que todo mundo tem. Você não uma pessoa que não tem perna subir
escada, precisa da cadeira de rodas. Eu preciso da minha medicação e preciso ter
os cuidados normais que... Eu evito sair à noite, eu evito perder noites de sono,
evito ter uma alimentação ruim, enfim. Tenho que evitar o cigarro que eu to
tentando (risos). E tenho uma vida normal, dentro de limitações que eu acho que
tem que ter... Doenças que são crônicas têm que ter remédios de toda forma. Mas
vivo tranquilamente, normalmente. E acho que as pessoas deveriam viver assim
também. Sem se esquentar muito pra aquilo e manter o tratamento. (Jorge, 43
anos)
Bom, a minha situação de ser soropositivo significa que eu tenho que ter mais
cuidado comigo, eu tenho que ter uma vida bem mais disciplinada, né? (Carlos, 33
anos)
[...] saber se cuidar, se tratar, se alimentar, ter uma disciplina, entendeu? Tem que
ter essas coisas... Eu cheguei até aqui hoje, cheguei, mas não foi a toa... Eu tenho
disciplina, sabe? Eu durmo cedo, eu acordo cedo, eu caminho, eu faço ginástica, eu
procuro ter uma alimentação na medida do possível, entendeu? Eu não fumo, eu
não bebo, eu não tenho vício, então quer dizer, são certas coisas que vão colaborar
[...]. (Gilson, 48 anos)
Hoje em dia não, hoje em dia eu encaro melhor, eu sou mais positiva. Eu vivo
minha vida normalmente, entendeu? Eu trabalho, eu faço academia, eu tenho
aquela vida agitada que é vida de mãe, entendeu? (Maria, 37 anos)
A adesão a um regime terapêutico solicita da pessoa mudanças no seu estilo
de vida para realizar atividades específicas que promovam e mantenham a saúde.
Essas atividades envolvem tomar as medicações prescritas regularmente, manter
137
uma dieta balanceada, automonitorar os sinais e sintomas da doença e fazer o
acompanhamento correto para avaliações periódicas. (FEITOSA et al., 2008).
Teixeira e Silva (2008) descrevem que os indivíduos soropositivos acreditam
que os resultados das medicações é a única forma de se continuar a viver e relatam
ser também importante associar os medicamentos a mudanças de hábitos e, para
tal, foram identificadas as expressões: Eu vou me cuidar mais, não pegar friagem,
não beber e não fumar. Os autores acrescentaram ainda, outro ponto encontrado
para a adesão ao tratamento medicamentoso, que está relacionado à vontade de
continuar a viver e de lutar pela vida.
De igual modo, um fator relevante no processo da adesão à terapia
medicamentosa a ser destacado, consiste na vontade do próprio sujeito de superar a
doença e os obstáculos diários, traduzidos nos temas, força de vontade com 11 UR
e Eu vou lutar/ eu luto com 20 UR.
É viver, lutar, né. Porque pra mim hoje a minha vida se tornou uma luta, eu luto todo
dia pra mim sobreviver, tudo que o médico fala pra mim fazer, eu faço, entendeu,
medicação.‖ então acho que para mim, é a luta para viver, porque se você quer
viver, você tem que lutar. Porque eu acho que no meu entender o soropositivo é
isso. Você tem que lutar. (Marta, 35 anos)
[...] E tenho outros que são fortes, que você olhando não parece ter AIDS, mas que
lutam... Todo momento é... A cada dia é como se você matasse sete coelhos com
uma cajadada só... Você tem que superar cada dia. (Kely, 32 anos)
Vou vivendo a minha vida, lutando para viver, lutando pela minha saúde. (Carla, 31
anos)
Porque se a pessoa não tiver uma cabeça não tiver uma paciência, não tiver assim
uma força de vontade também, acaba se entregando, né? (Carlos, 33anos)
Além disso, a Aids é representada pelos usuários como uma luta constante.
Esses sujeitos compreendem a necessidade de saírem do campo de contemplar o
que antes parecia não viver, para acreditarem na possibilidade de derrotar a doença.
Com todas as dificuldades, eles conseguem apreender que o tratamento com os
antiretrovirais traz benefícios quando realizado corretamente. (TEIXEIRA; SILVA,
2008).
Ressalta-se que a instituição escolhida como cenário do estudo realiza
mensalmente uma reunião intitulada ―Grupo de adesão‖ com tema livre e a presença
dos seguintes profissionais: Assistente social, enfermeiros e médicos. Estes trazem
novas informações relacionadas às medicações e direitos sociais, além esclarecem
as dúvidas dos usuários no que concerne ao viver com o HIV/Aids. Portanto, este é
138
um espaço importante para estes indivíduos, onde a experiência positiva do outro é
um motivador no processo da adesão, principalmente para aqueles com diagnóstico
recente.
O contato com as pessoas aqui do hospital....Aqui do hospital dia... Com os
médicos, com os pacientes e as amizades que eu fiz com pessoas que também são
soropositivas como eu....Foram experiências que me ajudaram a aceitar. Porque eu
conheci pessoas que são soropositivas muito antes de mim, descobriram muito
antes. E fazendo o tratamento, tomando a medicação, fazendo os exames e não
faltando as consultas, tem uma sobrevida muito boa e longa, e isso me ajudou
muito. (Sílvia, 45 anos)
[...] agora o contato é muito melhor. Porque eu venho pro grupo aqui, aí já converso
com outras pessoas, as pessoas explica, os seus problemas, conversam, o dia a
dia, o que a gente faz em casa, o jeito do remédio. (Carla, 31 anos)
Após o diagnóstico, foi destacado que existe uma certa necessidade de
ocultarem a sua condição sorológica, devido ao medo da rejeição e de serem
julgados, assim como do estigma ainda persistente em torno da Aids. Administrar a
ingestão das medicações nos horários corretos associada à rotina de trabalho e da
vida social sem revelar ―o segredo‖, requer destes indivíduos criatividade e
persistência para não desistirem do tratamento.
[...] de você ir a algum lugar de você ter que tomar o remédio na hora e você tem
tomar escondido ou deixar de tomar o remédio por vergonha ou que eu acho
babaquice, apesar que isso aconteceu comigo, de eu levar o remédio, às vezes
eu vou a algum lugar, a uma festa, num clube, alguma coisa, eu levo o remédio, ou
eu deixa de tomar esse dia, ou eu tomo no horário errado. Por que assim, eu num
vou tirar o remédio, a pessoa vai falar assim, pra que isso, às vezes eu falo to com
dor de cabeça, aí eu tomo o remédio, esse tipo de coisa, entendeu? Essas coisas
assim. Por que o remédio você vai ter que tomar pra sempre e isso eu tava
cansado de tomar. (João, 31 anos)
Por que eu sou uma pessoa normal, eu chego no meu trabalho eu tomo café, eu
tomo meu remédio no mesmo horário do café, junto com o café. Isso é remédio?
Vitamina. É meio escondido, ser soropositivo é muito difícil. (Natália, 36 anos)
Teixeira e Silva (2008) advertem que, quando o soropositivo inicia o
tratamento medicamentoso, ele pode estar admitindo para a sociedade que está
infectado e que necessita se tratar para continuar a viver. Portanto, essa percepção
pode levá-lo a assumir de fato sua condição sorológica, ou esconder os remédios e
o tratamento das outras pessoas ou, ainda, abandonar o tratamento, acreditando
que tal revelação pode ocasionar situações de preconceito.
Desta forma, Coelho (2006) esclarece que o segredo vem escoltado pelo
medo da morte social, do preconceito e do estigma que traz para os sujeitos a
necessidade de ocultar sua condição. Ser ‗clandestino‘ torna-se uma condição,
139
muitas vezes, necessária para o convívio com o HIV/Aids, pois resguardar sobre a
situação sorológica para amigos e familiares é uma forma de afastamento da
condição estigmatizante relacionada ao viver com HIV/Aids.
Outro aspecto relevante para os sujeitos do estudo foi a vontade de manter a
vida o mais próximo do normal possível, inclusive a atividade laboral, sendo
imprescindível, no mundo capitalista, a capacidade de realizar atividades das quais
possam sobreviver ou se manter. O tema quis continuar trabalhando, com 11 UR,
retrata este posicionamento. Neste sentido, para os sujeitos soropositivos, o trabalho
representa muito mais que um meio de subsistência, mas uma forma de provar, para
eles mesmos e para a sociedade, que estão vivos e são capazes de vencer,
independente da Aids.
É ser como eu sou, levar a minha vida normalmente, trabalhar cuidar da minha
família, estudar, ter expectativa de crescer mais. (Jefter, 37 anos)
A gente pensa em fazer alguma coisa concreta na vida, por exemplo trabalhar,
guardar dinheiro, nunca se sabe o dia de amanhã [...]. (Kaká, 41 anos)
Quando veio a certeza que eu tava com a AIDS, eu quis uma coisa, continuar
trabalhando. (Flávia, 36 anos)
Castanha et al. (2006) relatam que o trabalho na sociedade capitalista fez
emergir novos papéis e valores sociais: provedor, utilidade, positividade, capacidade,
força e eficiência, entre outros. A representação do trabalho associa-se ao ato de
viver, proporcionando as condições materiais e morais de sobrevivência própria e da
família. Deste modo, as limitações trazidas pelo adoecimento significam não
corresponder às suas expectativas, as da família e as da sociedade, corroborando
para a frustração e a interrupção de um projeto de vida pessoal, familiar e
profissional, cujos padrões têm sustentação social.
Para estes autores, o trabalho encontra-se vinculado a vários atributos e
funções morais. É através dele que o indivíduo confere significado e sentido à
própria existência. Tendo o trabalho uma definição ampla e estruturante na vida das
pessoas, qualquer incapacidade que impeça de exercer uma atividade produtiva,
provoca alterações profundas em sua vida, tornando o indivíduo doente mais
sujeitado e sem direitos.
140
3.2.5.3 Religião e fé no processo da adesão
Teixeira e Silva (2008) ressaltam que a religião é mencionada como um fator
importante de motivação para a adesão, pois a busca da espiritualidade fornece uma
base de sustentação para que as pessoas vivam suas vidas e até modifiquem sua
forma de levá-la. Esta subcategoria representa um lado prático e subjetivo no
conviver com o HIV/Aids. A religião e a é algo que faz parte da vida cotidiana de
grande parte dos sujeitos do estudo, sendo que 83.5% declararam ter religião e esta
se apresenta como um amparo e um suporte para o enfrentamento da situação de
mudanças, bem como na forma de encarar a realidade cotidiana inclusive no
convívio social.
Esta subcategoria possui 44 UR distribuídas em 4 temas.
Quando eu soube, fiz os exames, e soube da doença, eu pirei. Acho que todo
mundo pira. E, mas logo depois, eu acho que nesse momento foi importante, é
importante se ter uma religião, você acreditar em alguma coisa, e eu consegui
numa boa. (Jorge, 43 anos)
Hoje, eu penso que com o tratamento você tem vida prolongada... Pode viver
bastante com o problema... Tratar, com cuidado... E até hoje, sendo evangélica, eu
creio também na cura... Na cura Divina.... Agora eu tenho fé em Deus, que Deus vai
me dar muita vida, tenho vontade de viver, e de nunca deixar o tratamento [...].
(Jéssica, 35 anos)
Que Jesus cura, que Jesus cura, que faz e acontece... Mas o problema é o
seguinte, eu acho que Cristo ajuda a gente, né? Ele faz que nem ele ta fazendo
comigo aí, ele me uma tremenda força, eu sinto uma força estranha me
ajudando, eu creio que essa força é Cristo. Então, ele faz isso, porque, no
momento, ele dizendo pra gente, pelo menos pra mim, porque AIDS não tem
cura, mas tem como fazer por onde, né? Pra ele te ajudar, a gente faz a nossa
parte, e ir no médico, sempre se comunicar, fazer sempre contato com o médico,
tomar o remédio, fazer tudo que o dico mandando, e a outra parte é a parte
espiritual, fazer a ligação que tem que fazer [...]. (Pedro 55 anos)
Silva (2006) constatou, em seu estudo, que as crenças religiosas expressas
nos discursos dizem mais respeito aos aspectos positivos da explicação pela fé, tais
como as possibilidades de cura e a esperança para se submeterem aos desígnios
de Deus e, de alguma forma, saírem vitoriosos ao final. Tais representações não
estão inteiramente relacionadas à frequência à Igreja, à participação em alguma
religião específica, mas justificam, como a fé, que Deus ou a religião constituem-se
em fontes de incentivo na manutenção da terapia antiretroviral.
Percebe-se que a religião e a em Deus são apreciadas como um
importante suporte para enfrentar as diversas circunstâncias da vida e os
141
empecilhos sociais que surgem após a confirmação do diagnóstico de infecção pelo
HIV. A oração torna-se um instrumento de agradecimento por manter-se vivo,
possuir assistência médica e pedir por si e pelos familiares. (COELHO, 2006).
No entanto, a religiosidade pode ser fundamental na vida dessas pessoas
influenciando na forma de conduzir o tratamento, levando muitas vezes a desistirem
da terapêutica por acreditarem que estão curados. O objetivo aqui não é julgar as
crenças, as opções e as escolhas desses sujeitos, e sim refletir nas possíveis
consequências das mesmas, considerando que tal atitude pode comprometer o
tratamento e deixá-los mais vulneráveis ao adoecimento. O trecho abaixo relata um
fato importante e real entre os soropositivos.
[...] as pessoas muito também se colocam se trancam muito em religião e eu canso
de ouvir aqui no hospital, pessoas que são evangélicas principalmente que: ‗Ah
Jesus cura, Jesus isso, Jesus aquilo‘. Às vezes abandona o tratamento, por conta
dessa possível cura divina. E eu acho que, Deus existe, eu acredito nele, mas eu
acho que o médico também existe, e o tratamento existe e o remédio existe pra
você tomar, entendeu? Você não pode abandonar e achar que Deus vai descer na
terra e vai te curar se o você vai morrer. Você vai encontrar com ele, mas
rápido. (Jorge, 43 anos)
Desta forma, Teixeira e Silva (2008) pontuam que as crenças religiosas é algo
respeitável, porém, não se pode desconsiderar a hipótese do portador sentir-se tão
protegido pela religião que resolva abandonar o tratamento ou acreditar que o
tratamento seja dispensável, pois será abençoado com a cura. A assistência de
enfermagem deve garantir o devido respeito às crenças e à individual, exercitado
através do fortalecimento e da valorização de práticas e atitudes relacionadas à vida
espiritual das pessoas.
3.2.6 O enfrentamento cotidiano experienciado pelos sujeitos que convivem com o
HIV
Esta categoria possui 44 temas e 706 UR e, consequentemente, representa
24,86% do corpus em análise. A temática abordada reflete no cotidiano dos sujeitos,
na forma como se organizam para o enfrentamento da síndrome. A construção
cognitiva da temática em tela foi norteada a partir da concepção do HIV/Aids
considerando o antes e o depois do diagnóstico.
142
Percebe-se que o enfrentamento da síndrome pelos sujeitos está relacionado
à forma como os mesmos ancoraram a Aids e a objetivaram. Desta forma, foi visto
na categoria que abarcou a temática da ancoragem que os entrevistados
apresentaram uma tendência de compreender e, talvez, de superar o paradigma da
aids através do fenômeno de colocá-la como sinônimo de morte, dando lugar para
um novo olhar e construindo uma perspectiva frente à síndrome que aparece como
possibilidade de uma nova vida, gerando um ciclo de morte-renascimento simbólico
e metafórico.
Um aspecto a ser discutido nesta categoria são os sentimentos negativos
relacionados à síndrome. Contudo, estes sentimentos foram substituídos de forma
gradativa pelos sentimentos positivos ao longo do tempo de vivência da Aids na
cotidianidade dos sujeitos. Esta transformação se a partir do processo de
aceitação e entendimento do que seja o HIV/Aids e o conviver com ela. Ressalta-se
que o resultado positivo do uso da TARV contribui sobremaneira nesta transição
e/ou transformação de ―sentimentos negativos para positivo‖, possibilitando, ao
mesmo tempo, uma nova vida, assim como a aceitação da condição de ―ser
soropositivo‖, e como este processo pode contribuir na adesão ao tratamento.
Neste sentido a categoria será divida em duas subcategorias, quais sejam:
- Enfrentando os sentimentos negativos no conviver com o HIV;
- Há vida depois da Aids.
3.2.6.1 Enfrentando os sentimentos negativos no conviver com o HIV
Esta subcategoria foi moldada atrelada aos temas sentimentos negativos
relacionados à Aids, que tem 151 UR referidas por 26 sujeitos, o que corresponde a
86.6% do total, e a Aids relacionado à morte, com 94 UR foi expressada por 25
entrevistados (83.3%), sendo que estes temas se destacaram no corpus como os
mais expressivos em termos quantitativos. Os demais trazem uma dimensão prática
desses sentimentos, como o medo da rejeição, o medo da aids, o medo da morte, a
depressão, eu queria me matar, falta de esperança, vivia chorando e depressão,
dentre outros.
143
A imagem negativa da Aids e os diversos sentimentos gerados são refletidos
na vida das pessoas soropositivas no momento do diagnóstico e, na maioria das
vezes, o primeiro impacto é associá-la à Morte. Desta forma, Ferraz (1998, p. 122)
considera que, para as pessoas que recebem o diagnóstico, o começo de uma
jornada de convivência incômoda e aflitiva com a ideia de morte imediata, pois,
como consta do imaginário socialmente construído, a aids ainda é tida como
sinônimo de morte. Este é então o momento de se ver face a face com a morte‖.
A morte, para alguns sujeitos, esteve bem próxima ao relatarem as
experiências de amigos ou do próprio parceiro(a) devido à síndrome. Esta
experiência, segundo os mesmos, tem um lado positivo, pois os motivaram a se
cuidarem e a não se entregarem, estimulando a luta pela vida.
Até mesmo pelo relacionamento que eu tive anteriormente, né? O que eu tive, tinha
morrido de AIDS, entendeu? Já tinha morrido de AIDS. (Gilson, 48 anos)
Eu tive alguns amigos que morreram com a AIDS, porque não quiseram se cuidar,
que desanimaram, se entregaram mesmo. (Kely, 32 anos)
[...] antes mesmo de eu saber um mês antes, um amigo meu morreu de AIDS, e eu
não sabia que ele tinha. (Alessandra, 36 anos)
No presente estudo, o primeiro impacto do diagnóstico para os sujeitos foi a
relação direta do HIV/Aids à morte. Para eles, a Aids era o fim e aquele resultado
positivo representava a sua sentença de morte. Porém, a fala a seguir desmistifica a
Aids como morte e observa-se a tendência de uma representação da Aids ligada à
vida e a novas perspectivas, superando, ao menos parcialmente, a sua
representação como morte.
[...] é uma doença que assustava, que você tinha um diagnóstico de soropositivo,
você achava que estava condenado à morte, que você ia morrer e acabou, né?
Depois que eu descobri isso, de eu ter o vírus, em informei através dos médicos,
minhas buscas, e informações e vi que não, tem tratamento, para se viver, ter
uma qualidade de vida boa, desde que você cuide... É que tem tratamento, que não
é o fim do mundo, você não está condenado à morte, entendeu? Sua vida
prossegue normalmente desde que você se cuide, você não está condenado à
morte. (Nelson, 44 anos)
[...] no início foi um monstro, assim que eu pensava que ia me matar de imediato,
depois fui vendo que não é nada disso... Eu pensava que era uma doença que
aparecesse acabou, morreu, era o fim, o fim de tudo. (Roberto, 34 anos)
[...] no começo eu achava que ia morrer no dia seguinte, fazia tudo como se
estivesse despedindo da vida, festa, vamos fazer é aniversário da minha filha e
amanhã eu posso estar morta, a eu vou fazer isso porque eu vou morrer amanhã,
na verdade isto se estende por nada mais nada menos que 18 anos e já vai para 20
anos, 18 anos indo para 19 anos graças a Deus estou super bem, nunca tive
nenhuma intervenção,nenhum problema, pelo menos relacionado a Aids [...]. (Ana,
38 anos)
144
Em estudo recente foi destacado pelos sujeitos, como fator significante, o
medo perante o limiar da vida, pressentido pela proximidade da morte. A sua
imagem parece ser descortinada com a descoberta da sorologia positiva para o HIV,
caindo por terra à sensação de imortalidade. (ALMEIDA; LABRONICI, 2007).
Silva (2006) ressalta que a representação social da aids como morte está
ancorada nas lembranças do passado recente, anterior ao advento da TARV, bem
como da mídia anunciando a confirmação da soropositividade de personalidades
como Fred Mercury, Hebert de Souza, Renato Russo e Cazuza, entre outras, e, logo
a seguir, o seu falecimento em consequência da Aids. Portanto, no início da
epidemia a expectativa de vida era mínima, mas hoje, com o advento das
medicações, existe um importante prolongamento de vida que caracteriza a Aids
como uma doença crônica.
Torres e Camargo (2008) observaram, em seus estudos, que os pacientes
que faziam uso da TARV e se declaravam aderentes, o tratamento era representado
como fonte geradora de vida, ao mesmo tempo em que exigia autodisciplina e boas
condições, incluindo hábitos saudáveis de vida e alimentação adequada com o
intuito de garantir uma boa adesão. Entretanto, os mesmos autores partindo das
entrevistas com profissionais das áreas de ciências humanas e da saúde, relatam
que, para ambas, a eficácia dos medicamentos pode ser representada na esperança
de uma maior expectativa de vida. Neste sentido, contrapondo-se à ideia de Aids
associada à morte, a síndromes passa a ser caracterizada como luta pela vida.
Observa-se, entre os nossos sujeitos, um processo de superação da
associação Aids/morte e, portanto, a adesão a TARV contribui de fato para esta
tendência representacional. de se convir que a proximidade dos sujeitos com o
objeto em estudo pode fomentar para uma nova perspectiva na dimensão prática no
campo da Aids.
Eu achava que a AIDS era igual à morte, era uma equação: AIDS = morte. Hoje em
dia não, eu acho que é fácil de você conviver com a doença, é fácil você manter
controlado, existem os coquetéis, o tratamento e você, mantendo o tratamento,
você consegue tranquilamente conviver com a doença, sem problema nenhum.
(Jorge, 43 anos)
É que tem tratamento que não é o fim do mundo, você não está condenado à
morte, entendeu? Sua vida prossegue normalmente desde que você se cuide.
(Nelson, 44 anos)
Uma doença incurável, né, representa para todo mundo a morte, que eu não
vejo assim não, devido hoje os tratamentos as coisas eu vivo normalmente.
(Gustavo, 48 anos)
145
[...] que antes, quem tinha AIDS, era uma pessoa que ia morrer... Enfim, ia perder a
vida, ia se privar... Ia ter uma vida só para mim, não tentar evoluir. Hoje em dia para
mim a AIDS é evolução... É a vida, é a esperança. È algo que para a gente que
tem, é fundamental se tratar, estar se tratando. Então isso nos gera a esperança de
dias melhores. Enfim... tudo pra mim. (Lucas, 28 anos)
Coelho (2006) declarou que a representação de morte iminente está presente
no momento do diagnóstico, considerando que seja o instante de confrontação com
a situação fronteiriça entre a vida e a morte e colocando as pessoas em uma
circunstância na qual não conseguem distinguir o que é concreto e o que é abstrato,
se a vida ou a morte. A confirmação da fragilidade da vida torna-se o centro de tudo,
pois não se sabe como agir e essa confrontação com uma realidade não-concreta
pode gerar muito sofrimento.
Este sofrimento torna-se real quando este sujeito depara com uma realidade
irreversível, pois a Aids não tem cura. O que determina sentimentos negativos
centralizados no medo da Aids, no medo da morte e no medo da rejeição, como nas
falas que se seguem:
Agora não. Agora assim, eu entendo melhor, eu sei como me cuidar. Assim, como
lidar diante da situação. Hoje em dia eu me sinto muito melhor, eu não tenho
mais medo. Eu tinha muito medo de morrer. Achava que a qualquer momento eu
iria morrer, sabe? (Maria, 37 anos)
[...] no começo eu tive muito medo, muito medo....Medo de morrer, eu entrei na
síndrome do pânico por causa da morte, você não tem informação então pensa
que morrendo, automaticamente morrendo, e a AIDS pelo que a gente sabe
ela não mata, ela te deixa vulnerável a ter outras doenças e o engraçado é que eu
sempre tive a imunidade baixa, mesmo sem a AIDS, então quer dizer juntou uma
coisa com a outra, e acaba a gente tendo um medo dobrado, e olha que hoje eu
não tenho mais medo da AIDS e não tenho medo de morrer. (Adriana, 37 anos)
O fim, a morte, a desgraça, pior coisa que podia acontecer na vida de uma pessoa
para mim era a AIDS, eu via o Cazuza como o fim, num existia luz [...]. (Natália, 36
anos)
Diferentemente do que acontece com outras doenças, foi destacado que a
Aids não oferece às suas vítimas nenhuma esperança de cura e sua incurabilidade
tornou-se um ponto central na concepção social mais básica da doença (senso
comum). A Aids foi entendida (e ainda o é em determinadas dimensões), apouco
tempo, como uma síndrome inevitavelmente fatal e, portanto, o diagnóstico inicial
traduz imediatamente em uma sentença de morte. (DANIEL, 1991).
Esta concepção, amplamente enfatizado pela mídia, instituiu, no imaginário
popular, a proximidade de morte daqueles que vivem com a síndrome, o que justifica
o medo da Aids antes do diagnóstico. Daniel (1994), no início da década de 90,
146
pontuava que, para a medicina, a Aids era uma doença definida a partir de uma
triologia antiquada qual seja, a sua transmissibilidade, incurabilidade e mortalidade,
sendo esta caracterização reafirmada monotonamente durante toda a década de 90,
nas propagandas oficiais ou não-oficiais sobra a síndrome.
Medo, pavor, tudo de ruim, eu tinha muito medo dessa doença, acho que de tanto
ter medo dela que ela veio pra mim. (Natália, 36 anos)
Medo, medo, mais eu não me preocupava, como eu te falava, eu tinha medo mas
não me preocupava, mas eu tinha medo. (Roberto, 34 anos)
Eu tinha pavor dela. Tinha pavor. Sabe o que é pavor? Eu lembro que maio de
noventa e três eu trabalhava no Hospital, que foi que teve os primeiros comentários
assim sobre esse tipo de doença. Então a primeira vez que eu lembro que eu
escutei, eu me arrepiei dos pés a cabeça... Sentimento, sentimento, o
sentimento de medo, eu tinha muito medo. (Maria, 37 anos)
Daniel (1994, p.09) em uma das suas afirmações sobre o viver com a Aids, a
definia como uma doença como outras, permeada de tabus e preconceitos, e
prossegue: ―quanto a morrer não morri: sei que a Aids pode matar, mas sei melhor
que os preconceitos e a discriminação são muito mais mortíferos. Quanto a morrer,
que a morte me seja leve, mas não vou me deixar matar pelos preconceitos. Estes
matam em vida, de morte civil, a pior morte‖.
De acordo com Sontag (2007), a Aids leva as pessoas a serem consideradas
doentes antes de adoecerem, produzindo uma série inumerável de doença-sintoma
para a qual só há paliativos, culminando, para muitos, em uma espécie de morte civil
que precede a de morte física. Para a autora (p. 104), a Aids origem a uma
situação semelhante à experiência pré-moderna da doença e acrescenta: ―se a
doença é o maior sofrimento, o maior sofrimento da doença é a solidão; quando o
caráter infeccioso da doença impede a vinda daqueles que poderiam ajudar, mesmo
o médico, mal ousa a vir... é uma proscrição, uma excomunhão para o paciente‖.
Neste sentido, as falas seguintes dos sujeitos destacaram que convivem com
o medo da rejeição, o que justifica ocultarem a sua condição sorológica. Porém, este
medo é conectado a outros sentimentos, como angústia e tristeza.
O jeito de pensar assim, a tristeza. Porque a pessoa fica muito triste. Fica com
muita angústia, a pessoa acha rejeitada, né? A pessoa se acha rejeitada pelas
outras pessoas. Entendeu? (Carla, 31 anos)
A gente também tem medo um pouco das pessoas, a reação das pessoas e fora
que a gente não quer expor... Medo assim, porque a gente não quer expor né, esse
diagnóstico, devido ao preconceito, a essa descriminação, aquela separação, ou
147
seja, a gente tem medo é da rejeição, né? A gente tem medo de rejeição. (Carlos,
33 anos)
Esta condição favoreceu, de certa forma, para a dimensão afetiva abordada
nesta categoria em estudo, devido aos conflitos interiores suscitados na vida dessas
pessoas diante do diagnóstico. Castanha et al. (2006) pressupõem que o
preconceito afeta profundamente os indivíduos, influenciando-os na percepção de
sua doença e no comportamento de outras pessoas frente a ela. Como
consequência, foi observado, em seu estudo, sentimentos de ansiedade e
sofrimento no conviver com o HIV/Aids.
Neste estudo, foram evidenciados sentimentos semelhantes.
Desespero total... Até mesmo desânimo, falta de esperança. (Kely 32 anos)
AIDS pra mim! Como que eu vou te dizer isso? É uma doença terrível, por quer não
tem cura, no inicio era o fim, era o fim. (Roberto 34 anos)
São vários sentimentos que a gente confunde né? depressão, medo, terror,
angústia, solidão, isso tudo aparece na gente que nem todo mundo aceita ?,
saber que você tem uma doença muitas pessoas afastam né? e você fica meio
perdido. (Jorge, 43 anos)
Foi identificado que o quadro depressivo é comum entre estes sujeitos, sendo
que 10 (33.3%) deles declaram que tiveram ou têm depressão sem, no entanto, ter
sido realizado uma pergunta neste sentido. É importante destacar que Castanha et
al. (2005) encontrou um índice bem maior (64 %), utilizando uma metodologia
apropriada direcionada para este fim.
Depois do diagnóstico, caí em depressão [...]. (Gustavo, 48 anos)
Fiquei com uma depressão muito profunda, fiquei muito triste, me afastei de todo
mundo e queria morrer, queria morrer, num queria me tratar, achava que num tinha
[...] de vez em quando entro em depressão, uma choradeira [...]. (Glória, 54 anos)
[...] quando eu descobri que eu era soropositivo eu achei que ia morrer, achei que
num ia ter jeito eu entrei em depressão fiquei uma semana em depressão, aí depois
eu disse não, tem que haver um jeito. (Roberto, 34 anos)
Castanha et al. (2006) revisaram o estudo de Maj (1996) em que foi pontuado
que a depressão em pacientes soropositivos está associada a vários fatores:
[...] (1) impacto psicológico da descoberta da infecção, início dos sintomas físicos,
progressão da doença e das limitações por ela impostas e as complexas questões
psicossociais envolvidas; (2) pode estar diretamente relacionada com a invasão do
sistema nervoso central pelo HIV, por infecções oportunistas ou por tumores
intracranianos; (3) a infecção, por atingir populações com maior incidência de
quadros depressivos (homossexuais e usuários de drogas intravenosas), pode
148
precipitar o quadro em indivíduos predispostos; (4) pode existir uma associação ao
acaso entre a infecção e a depressão. (MAJ apud CASTANHA et al., 2006, p.52).
A sintomatologia da depressão é plural e complexa e, em geral, vem
acompanhada por sentimento de tristeza, desmoralização, solidão, desesperança,
inutilidade, desejo de estar morto, dificuldade para dormir, choro, sentimento de que
tudo é um esforço e ser incapaz de seguir. Em virtude de diversos fatores, a
sintomatologia depressiva pode estar presente na vida dos soropositivos e, entre
alguns, pode-se destacar a falta de apoio, o preconceito, as limitações e as
dificuldades enfrentadas pelos mesmos. (CASTANHA; ARAÚJO, 2005).
Paralelo a este cenário de depressão, ou como sua consequência, existem
ainda aqueles sujeitos que declararam o desejo de morrer ou de se suicidar ao
receberem o diagnóstico.
Eu atravessei na frente de um carro, ele me atropelou, quebrei um braço. Eu
atravessei na frente de um carro, o carro me atropelou, quebrei um braço e eu
queria morrer para não passar pelo mesmo sofrimento que o meu parceiro passou
[...]. (Glória, 54 anos)
Ah, foi a loucura, eu tentei me matar, quis me suicidar, eu quis sumir, fazer muita
besteira, pensei em fazer muita besteira.(Vitória, 58 anos)
Ah, no primeiro instante eu chorei, fiquei muito triste, pensava em me matar... E
depois... É, no primeiro instante foi isso, desespero, vontade de se matar [...].
(Jéssica, 35 anos)
No estudo de Castanha et al. (2006), a Aids ancorou-se nas doenças
psicoafetivas apresentando a depressão como elemento figurativo associado à ela.
Esse tipo de ancoragem ocorre provavelmente em função do alto índice de
depressão que vem sendo observado nos soropositivos e serve de alerta tanto para
o sofrimento psíquico ao qual esses atores sociais estão submetidos, quanto para a
necessidade de um suporte psicológico adequado, atentando para o tratamento nos
casos mais graves. Para tanto, os profissionais precisam estar preparados e em
alerta, pois o profissional treinado somente para procurar doenças orgânicas está
fadado a perder as nuances e os dramas da experiência humana, valorizando mais
as doenças do que os pacientes que sofrem dela.
Outro aspecto relevante no enfrentamento da síndrome a ser destacado
constitui a representação do HIV/Aids associada a limitações. O tema que retraduz
esta imagem da Aids é: Temos uma vida limitada e somos privados de fazer
149
algumas coisas, possuindo 21 UR. Esta limitação, às vezes, é traduzida de forma
negativa no cotidiano destes sujeitos.
[...] porque a pessoa começa se ver privada de muitas coisas, ? perante os
outros. Eu por exemplo eu olho as pessoas fazendo as coisas... eu fazia
constantemente o que era prazeroso, que era a minha alegria, né? Coisas assim
que eu não posso hoje fazer. Porque a AIDS ela deixa a gente muito vulnerável,
então a gente se diminuído, se assim inferior aos demais, né? (Carlos, 33
anos)
[...] significa ser privado de muitas coisas, significa é você não conseguir parceiros,
é parceiros você gosta de uma pessoa, para aquela pessoa não importa o que você
é que ela vai te aceitar, limita você a relacionamentos, acho que é isso, limitações,
limitações, limitações. Tem tantos. Limitações assim, de você não poder se abrir
para as pessoas, você é um pouco privado de falar de você [...]. (João, 31 anos)
Você tem que ter sua vida ali regrada, direitinho‖. (Nelson, 44 anos)
Sinceramente, ser soropositivo não é nada bom... A vida da gente fica reduzida... A
vida da gente fica regulada... Você não pode mais ter a liberdade que você tinha
antes de saber que você é soropositivo... Você não pode mais, eu, por exemplo,
tenho minhas fraquezas, né? Eu não faço mais o que fazia antes. (Paulo, 40 anos)
Os limites impostos após o diagnóstico do HIV são resultados de diversos
fatores, como consequência do estigma ainda persistente em relação ao HIV/Aids,
reforçando o ocultamento mantido pelos sujeitos soropositivos. Ainda tem aquelas
limitações necessárias para obter resultados satisfatórios no tratamento, como
mudança de alguns hábitos na vida cotidiana. Para Castanha e Araújo, (2005), o
sofrimento determinado pela Aids pode ser proveniente de múltiplos fatores dentre
os quais pode-se destacar: o diagnóstico, o processo do adoecer, a iminência da
morte, a discriminação social, as limitações e as perdas decorrentes da mesma.
3.2.6.2 Há vida depois da Aids
Herbert Daniel foi grande militante na luta pelos direitos sociais das pessoas
que convivem como HIV/Aids no final da década de 80. Uma de suas obras sobre a
temática destaca-se a ―Vida antes da morte‖, editado pela primeira vez em 1989. Ele
afirmou, em um momento frágil da sua vida
dizer... que a Aids pode ser evitada, que pode ser vencida. Dizer também que pode
ser vivida sem pavor ou preconceitos; que pode ser vivida como se vive qualquer
dificuldade do existir. Dizer ainda que a solidariedade é uma força política a única
capaz de transformar o mundo. (DANIEL, 1994, p. 7).
150
Esta subcategoria retrata as diversas formas dos sujeitos soropositivos
encararem a existência depois do HIV, assim como as expectativas de vida frente à
síndrome. Os temas que destacaram foram: Eu passei a dar mais valor à vida e a
mim mesma (conotando enfrentamento/atitudes positivas frente à vida) expresso por
23 sujeitos (76.6%), com 81 UR; Me sinto vitoriosa/estou vencendo com 20 UR;
Passei a estudar/conhecer sobre o assunto, 30 UR; Depois que fiquei doente passei
a ver a vida com outros olhos possui, 17 UR; dentre outras que serão abordadas,
uma vez que estão interligadas, como parte do cotidiano desses sujeitos.
As falas que se seguem abordam esta realidade e o novo olhar que estes
sujeitos adquiriram perante a vida após o diagnóstico.
Desde de então eu estou sobrevivendo, agora eu posso disser que eu sou uma
pessoa feliz. Que antes eu não era feliz, pelo contrário, eu não tinha AIDS, mas não
era feliz. Depois que eu fiquei soropositivo, que eu me separei, procuro aí continuar
minha vida. Estou dando mais valor a tudo e agora eu procuro a minha felicidade.
Então, agora, eu me acho mais feliz, depois que eu fiquei doente. (Marta 35 anos)
AIDS hoje em dia é uma forma de a gente ir atrás dos nossos objetivos, já não
passa a ser mais aquele tabu [...]. (Lucas, 28 anos)
Para mim, mim sinto vitoriosa, né? Porque eu venci muitas barreiras, e estou
vencendo ahoje. venci a doença, porque eu acho que esta doença não era para
mim, nem para outras pessoas entendeu? Eu mim sinto vitoriosa. (Carla, 31 anos)
Eu consegui superar... A Aids hoje vamos dizer assim, ela faz parte da família [...].
(Kely, 32 anos)
Compreende-se que a doença, em especial neste caso a AIDS, desvela-se
como uma das possibilidades de existência do homem, levando-os a repensar a si
mesmo e, consequentemente, a coletividade no que se refere a hábitos, a crenças, a
prioridades e a valores, além do próprio modo de ser no mundo como herança
cultural arraigada no processo histórico-social. É necessário, então, lançar um olhar
que transcenda o conceito de doença como um fato meramente biológico, para
entendê-la como vinculada, também, à cultura, ou seja, como um estado transitório
ou permanente sentido pela pessoa que se encontra localizado no ínterim entre o
biológico e o cultural. (SCHAURICH; COELHO; MOTTA, 2006).
Desta forma, o grupo em estudo declarou necessário buscar informações
sobre o HIV/Aids após o diagnóstico. Nota-se que é um mundo novo no qual estes
sujeitos passaram a fazer parte, conhecer sobre a patologia, bem como
compreender como o tratamento contribui no processo de aceitação e superação
151
dos diversos medos ora experienciados nos primeiros momentos após o diagnóstico
e estendido para a vida cotidiana.
Pires (2007), ao falar sobre o cuidado humano, enfatiza que a politicidade do
cuidado está calcada na reconstrução da autonomia dos sujeitos por meio da gestão
da ajuda-poder. Essa concepção se fundamenta pelo que se denomina triedro
emancipatório do cuidar: conhecer para cuidar melhor, cuidar para confrontar, cuidar
para emancipar.
Neste sentido, é importante, para estes sujeitos, conhecerem sobre seu
estado atual, o que é um facilitador no desenvolvimento de habilidades para
administrar o seu autocuidado no contexto de sua rotina diária de forma consciente,
principalmente no processo da adesão a TARV, como se observa nos relatos que se
seguem:
É a única coisa que eu fiz, foi pegar mais informação para eu poder ter uma
qualidade de vida melhor, tomar os medicamentos, e continuar, não tem outro jeito.
Você tem que continuar a vida. (Alessandra, 36 anos)
Ah, depois do diagnóstico, eu procurei ler tudo, a me informar, porque no começo
eu achava que eu ia morrer. (Marta, 35 anos)
No começo, de pavor, né? No início eu tinha pavor... Depois eu comecei a me
instruir, procurar saber o quê que era com o apoio dos médicos aqui... e eu procurei
ler bastante, e eu aprendi muita coisa e acho que hoje dá para lidar com ela.. Com
a minha doença no caso, eu comigo mesma. (Silvia, 45 anos)
Portanto, quando a doença se manifesta, pode estabelecer não somente as
modificações na organização concreta da vida, mas colocar ao mesmo tempo em
curso o sentido da existência dos indivíduos, da imagem que eles elaboram deles
mesmos e as explicações que eles dão à doença. (TEIXEIRA; SILVA, 2008).
Diante das novas possibilidades em relação à vida e ao enfrentamento da
doença, os entrevistados apresentaram, no conteúdo de suas falas, atitudes
positivas frente à síndrome, como revelam os temas: tenho que aceitar/tento aceitar;
ser soropositivo não precisa se desesperar e não é o fim do mundo, o que conota
que existe um esforço para a aceitação da sua condição sorológica, sendo, portanto,
fundamental esta condição no enfrentamento da Aids.
Tem tratamento, nada de bicho de sete cabeças, não... por que tem tratamento não
é o fim do mundo... você ai vendo que não que aquilo ali, não é tão assim
assustador, né? Então,é isso, ai você vai relaxando, né? (Nelsom, 44 anos)
Uma experiência? É de ver como tem gente bem, que superou, como eu, que
realmente tem superação, de ver as pessoas bem, as pessoas estão ótimas, eu
152
estou ótimo, as pessoas melhoraram bastante, a experiência que eu tenho é essa.
Que há melhora nisso tudo, no final das contas. (João, 31 anos)
Depois da depressão a superação, pois que eu to me superando, é eu num vejo
isso mais como uma coisa que vai em consumir, que vai me matar, eu não, eu
acredito, que por mais que não tenha cura hoje, possa até morrer, mais vai existir
uma cura entendeu? E eu vou buscar da forma que eu sei, estando bem comigo, eu
acho que é por isso que eu não contraí doença nenhuma, não fiquei doente, por
que eu sempre procuro estar de bem comigo, é isso. (Roberto, 34 anos)
Esta aceitação ou adaptação no viver com o HIV/Aids pode ainda ser
identificado nos temas: Me ensinou a viver, o que quero e espero da vida; me fez
crescer como ser humano e aconteceu na hora certa em minha vida.
Eu me acho uma pessoa muito melhor agora, como pessoa, como ser humano, eu
escuto, eu num brigo, eu num brigo na rua por que o ônibus num pára na porta, eu
num to nome mais...eu queria ter tido alguma coisa pra eu poder enxergar a
família que eu tenho, mais infelizmente foi essa que apareceu num posso lutar
contra, mas eu acho que como pessoa eu melhorei muito, cresci muito. (Natália, 36
anos)
A AIDS para mim foi o princípio de toda a minha vida, de conhecer realmente quem
sou, tudo meu que estava oculto, escondido, entendeu? Comecei a me respeitar
mais, a ter mais disciplina, entendeu? Mais obediência, me conhecer mais
profundamente, até no lado profissional também, nas coisas que eu quero, o que eu
quero da vida, o que eu espero da vida... Para mim a AIDS foi... Para mim foi... Não
vou dizer que foi tudo, assim... A AIDS foi maravilhoso, me ensinou a viver, ter
experiência da vida, sabe? Respeitar o direito das pessoas... Eu mal eu não tenho o
que falar, tenho que falar que isso foi... Para mim aconteceu na hora certa,
entendeu? Foi na hora certa que aconteceu na minha vida, me ensinou muita coisa,
me fez crescer muito como gente, como ser humano, entendeu? (Gilson, 48 anos)
Berlinguer apud Teixeira e Silva (2008) citam onde a percepção da condição
de ser soropositivo parece representar uma oportunidade de revisão não somente
da vida pessoal, mas também das atitudes e dos comportamentos em relação ao
outro. É como se, nesse contexto, muitas vezes conflituoso, surgissem forças
capazes de alterar a direção para uma tomada de posição em relação à vida, ou
seja, a possibilidade de sair de um estado em que não havia forças de mobilização
para mudanças. Os sujeitos revelam suas forças mobilizadoras para a tomada de
posição em relação à doença e à vida.
Foram percebidos, também, nas falas dos sujeitos temas relacionados à rede
social de apoio, como família, amigos e parceiro(a), por se tratarem de elos
importantes na construção de um cotidiano mais solidário e solícito. Ao mesmo
tempo, o tema os amigos que sabem apóiam contém 16 UR, como 8 sujeitos
mencionando este tipo de apoio, correspondendo a 26,6% do total dos
colaboradores. Para as pessoas que convivem com o HIV/Aids, estes amigos
153
(normalmente são os mais íntimos) não têm atitudes preconceituosas, procuram
ajudar ou simplesmente os aceitam sem julgá-los, como pode ser identificado a
seguir:
Alguns amigos meus muitos íntimos sabem. Me dão maior apoio, maior respeito
sabe? Não tem discriminação nenhuma não. (Maria, 37 anos)
Tem uns dois ou três amigos que sabem, mas também não demonstraram nada
diferente, pelo contrário, tive um apoio que com alguns familiares eu não tive.
(Lucas, 28 anos).
Destaca-se que apenas 6 seis sujeitos (20%) relataram apoio da família após
a revelação sorológica, sendo, no entanto, fundamental para eles este apoio no
enfrentamento da síndrome em seu cotidiano. Ressalta-se que é um dado
preocupante, considerando ser a família fundamental neste processo.
Bom, eu tive assim... A minha família em si me apoiou muito... Foi o meu ponto
forte nisso tudo depois que eu tive o diagnóstico correto... Então foi o meu apoio
principal, e onde eu me apeguei mais... Primeiro em Deus, né? Depois em família,
que foi o ponto principal. (Lucas, 28 anos)
[...] quando a gente tem o apoio da família, aí tudo fica normal, a gente vai levando
a vida normalmente, trabalhando, cuidando de casa, cuidando de filho, e assim vai.
(Valéria, 22 anos)
Minha mãe sabe, me trata super bem, meu irmão sabe, ele tem um amor muito
grande por mim. (Lara, 29 anos)
Olha, vou ser bem franca com você que a minha família sabe do meu problema. A
minha família! Pessoas de fora o! Porque hoje em dia você sabe que existe um
forte preconceito em relação, ne? (Maria, 37 anos)
Uma possível justificativa deste resultado talvez seja a consequência do
ocultamento dos próprios sujeitos da sua condição sorológica. Acurcio e Guimarães
(1999) relataram que a Aids não é uma doença misteriosa que seleciona as suas
vítimas de modo aparentemente aleatório. A vergonha está agregada à atribuição de
culpa e ter o HIV expõe uma identidade que poderia ser conservada oculta dos
vizinhos, colegas de trabalho, familiares e amigos. Essa situação faz com que a
maioria dos indivíduos infectados protele, tanto quanto seja possível, a divulgação
de sua condição.
Neste contexto, o apoio tanto dos familiares como dos amigos são essenciais
para o enfrentamento e a superação da doença, sobretudo no processo da adesão.
Castanha et al. (2006) enfatizam que a família é descrita como essencial na
conquista da qualidade de vida para os pacientes soropositivos. Os mesmos autores
mencionam o estudo de Saldanha (2003) que afirma que o modo como as famílias
154
se vivenciam a doença é um reflexo do seu relacionamento íntimo, de suas histórias
e do contexto sociocultural em que estão arraigados. Quando a estrutura familiar
apresenta um relacionamento satisfatório, o nível de receptividade e de
compreensão se mais facilmente, dispondo ao membro que se encontra
fragilizado diante da infecção pelo HIV, um fortalecimento através das relações de
ajuda e afeto.
Destaca-se ainda que o tema teve apoio do meu companheiro, com 8 UR, foi
dito por 6 sujeitos (20%) que não adquiriram o vírus HIV do parceiro atual.
Fiquei muito triste, chorei muito, achei que iria morrer, mas depois que eu tive o
apoio da minha família, do meu marido. (Valéria, 22 anos)
Aí eu... No começo eu fiquei muito nervosa, fiquei apavorada, mas eu tive um apoio
muito grande do meu marido... E hoje eu acho que é uma doença que se você
tratar você tem uma vida bem longa, é só tratar, ? Tem que tratar. (Silvia, 45
anos).
Eu to morando com um companheiro né, esse companheiro me ajuda pra caramba,
me dá todo apoio. (Flávia, 36 anos)
Nota-se que o apoio do companheiro ameniza e acalenta o momento de dor e
sofrimento vivenciado por estes indivíduos, principalmente no momento do
diagnóstico. Neste sentido, Silva (2006) identifica em seu estudo que, no centro das
representações sobre a AIDS, está a imagem de que o (a) paciente poderia ter sido
abandonado(a) pelo companheiro(a) ao revelar-lhe a soropositividade para o HIV.
Embora exista o medo de que a reação seja de repulsa, pela transmissibilidade, de
vergonha, pelo julgamento moral sobre a situação, e pelo sentimento de ter sido
traído, além do medo maior de que o parceiro também esteja infectado, todos se
sentem na obrigação de revelar sua condição ao parceiro.
A mesma autora acrescenta que o núcleo central no qual se ancora esse
medo é, pois, o do estigma/preconceito/rejeição, havendo, a partir do momento que
a relação se conserva, um sentimento de gratidão em relação ao parceiro por ele
não tê-lo abandonado e -lo apoiado no tratamento. Além disso, chamou a atenção
no estudo o fato de que a qualidade das relações do casal parece ser essencial para
o autocuidado, para a aceitação de sua condição de infectado e para a continuidade
do tratamento, que está ancorado na representação social de que o outro, na
relação amorosa, dá identidade à pessoa.
Arruda (2009) reflete sobre a dimensão afetiva das representações sociais e
pontua que o afeto é um artífice do possível, que estimula e reorienta para outro
155
estado de ser, incitando para a ação ou revela, ainda, um mundo inesperado que é
preciso elaborar. A autora (p. 88) complementa:
Neste quadro fica evidente que os afetos não são entidades encapsuladas, vividos
pelo indivíduo apenas em função dos seus humores ou disposições mentais
próprios e exclusivos, não existem como uma produção do indivíduo solitário, mas
acontece no cotidiano, na relação com o mundo e com o outro, que a vida diária
é o espaço por excelência do convívio humano. Eles são, portanto, criaturas e
criadores desse convívio, ao menos em parte. Este por sua vez, se operacionaliza
na comunicação, que se igualmente impregnada de afetos. Fato qual, aliás, os
veículos de comunicação sabem perfeitamente tirar proveito. Isso complementa a
ideia de que os afetos também não se situam na mera interação entre indivíduos
face a face, mas se manifestam por trilhas e formas de expressão culturalmente
marcadas.
A afetividade observada nesta categoria é resultante de tudo que foi discutido
até o presente momento sobre o fenômeno do HIV/Aids e, portanto, observa-se que
as atitudes e as práticas dos atores sociais do presente estudo não são isoladas,
mas permeadas de emoções construídas em torno de uma realidade ora vivida e
sentida pelos sujeitos. A forma que se organizam para o enfrentamento da síndrome
reflete tal realidade.
Portanto, a doença é um momento de transição na vida da pessoa,
acarretando alguns transtornos em seu ser, suas relações e seus ajustamentos à
vida em sociedade, e, precisamente, possui relação com aqueles que estão mais
próximos, como a família, o trabalho, os amigos, o lazer e as paixões. Essa
constatação traz em seu bojo muitas incertezas, gerando ansiedade, insegurança,
medo e sentimento de perda de uma situação por ora caracterizada por um porvir
desconhecido e assustador. É no confronto com essa nova realidade que a pessoa
passa a vivenciar momentos de grande sofrimento. (ALMEIDA; LABRONICI, 2007)
156
4 CONSIDERAÇÕES FINAIS
O presente estudo permitiu uma reflexão acerca da representação social da
Aids a partir das experiências das pessoas soropositivas. Destaca-se que desde o
processo da formação (ancoragem) desta representação, foram percebidas diversas
nuances peculiares ao grupo, uma vez que estes sujeitos convivem com o HIV e
estão intimamente envolvidas com o objeto em estudo.
Neste sentido, os entrevistados explanaram a forma como entendem a origem
da Aids no mundo. Para tanto, foi observado nos dados empíricos apresentados que
esta teve relação direta com o pensamento socialmente construído ao longo de
quase três décadas do fenômeno Aids. Neste contexto, a reconstrução cognitiva
elaborada pelos atores sociais do estudo teve respaldo na memória social que
permanece viva nas conversas cotidianas e,de alguma maneira, protege, ao menos
em parte, o núcleo figurativo da Representação Social da Aids construída no início
da epidemia.
Deste modo, o processo da ancoragem da Aids para estes sujeitos consiste
naquelas ideias amplamente divulgadas pela mídia na década de 80 e 90 do século
passado. Além disso, a Aids está relacionada a doenças sexualmente transmissíveis
como a sífilis e a hepatite, sendo, porém, considerada a pior delas, pelo fato de não
ter cura.
Outra ancoragem destacada pelo grupo foi de doença crônica, como o
diabetes, o que indica uma tendência de transformação desta representação social,
substituindo aquela centrada como sinônimo de morte, entrando em cena a
representação de uma vida longa. Este posicionamento pode ser justificado devido à
introdução dos coquetéis antirretrovirais que, desde o ano de 1996, vem sendo
disponibilizado pelos serviços públicos de saúde através do programa de DST/Aids.
Portanto, a sobrevida destes pacientes aumentou substancialmente, o que permite
configurar, de fato, a Aids como uma doença crônica que depende de tratamento
específico e contínuo.
No entanto, de forma paradoxal, a imagem da Aids ainda está fortemente
relacionada aos denominados grupos de risco (em que pese a superação deste
conceito nesta área de estudo), como os homossexuais, os drogadictos e pessoas
157
com atitudes promíscuas, entre outros. Desta forma, nas representações sociais
desses indivíduos, a sociedade seria dividida em grupo de pessoas consideradas
normais e, portanto, não vulneráveis ao HIV e a grupos definidos como
merecedores da Aids, implicando a representação da epidemia como castigo
divino.
Ao mesmo tempo, a imagem da Aids para estes sujeitos está intimamente
associada à vida, considerando que existe a opção entre viver e morrer. Este fato
gera a ideia de um poder sobre a Aids, principalmente porque, atualmente, se tem o
controle sobre a mesma e este depende, quase exclusivamente, do uso das
medicações. Caracteriza-se, assim, a dicotomia em torno da Aids, ou seja, quem
toma as medicações corretamente é representado como quem vive muito e aquele
que o faz o uso adequado está sujeito ao adoecimento e, consequentemente, à
morte. Considera-se, ainda, que a representação da Aids como vida e/ou viver pode
estar relacionada ou possivelmente enraizada no fato e na sensação de segurança
oferecida pela existência e pela disponibilidade de uma arma (os fármacos), que se
apresenta eficaz contra a manifestação orgânica da síndrome, o emagrecimento
acentuado característico dos primeiros pacientes, a necessidade de internação e a
proximidade com o processo de morrer.
Destaca-se que os sujeitos se organizam no cotidiano de diversas formas
para manterem o tratamento e superarem as dificuldades encontradas. Um aspecto
apresentado pelos entrevistados no que tange à adesão centra-se nas mudanças de
hábitos em função do tratamento que obriga a manutenção de uma vida saudável.
Contudo, esta mudança foi considerada positiva e inclui atividades como dormir e
acordar cedo, manter uma alimentação balanceada e fazer exercício físico, entre
outras.
Um dos fatores identificados que dificulta o processo da adesão consiste na
adaptação dos horários das medicações à sua rotina diária como o trabalho e ainda
ter que ingerir os medicamentos escondidos de outras pessoas, como os próprios
familiares, para não serem flagrados e terem a sua sorologia revelada. Além disso,
foi pontuada a alteração da imagem corporal, mais especificamente a lipodistrofia,
como um motivador para o abandono do tratamento.
Percebe-se, ainda, que a realidade trazida à baila pelos sujeitos nem sempre
foi a desejável devido às atitudes preconceituosas ainda persistentes no meio social.
158
Estes indivíduos, na maioria das vezes, vivem com o seu problema de forma
―clandestina‖, como afirma Daniel (1994). O medo da discriminação e da rejeição
leva estas pessoas a resguardarem a sua condição sorológica dos amigos e da
própria família.
Desta forma, a rede de apoio a estes indivíduos deixa de existir e até mesmo
pode interferir de forma negativa no processo da adesão ao tratamento. Os sujeitos
do estudo relataram que, muitas vezes, deixam de ―tomar a medicação‖ se estiverem
em um ambiente com vários amigos, como em uma festa. Uma justificativa
elaborada para ocultarem a sua sorologia consiste no receio de sofrerem
preconceito, além de serem rejeitados e julgados. Destaca-se que o estigma social
no qual a Aids está imersa pode resultar, muitas vezes, em isolamento social e,
consequentemente, na morte civil.
Apesar disso, um aspecto importante destacado pelo grupo encontra-se no
fato deles assumirem que já foram preconceituosos antes de ter o diagnóstico
positivo para o HIV. Outrossim, eles tinham receio de se aproximar de pessoas
soropositivas, dividir talheres, sentar no mesmo local, abraçar e beijar. Porém,
houve mudança por parte destes sujeitos nas concepções pré-existentes no que
concerne à transmissão do vírus e aos mitos co-relacionados. Foi pontuado, pelo
grupo, que o principal motivo que os induziam a ter atitudes preconceituosas era a
falta de informação.
Destarte, a falta de informação seria uma das grandes causas que levam as
pessoas a adquirirem atitudes preconceituosas, ocasionando, na maioria das vezes,
medo de se relacionarem com pessoas infectadas, o que pode resultar em
segregação social. Uma estratégia que os indivíduos acometidos pelo vírus utilizam
para evitar constrangimento, além do ocultamento da síndrome, é a de se
organizarem em grupo, ou seja, fechar o círculo de amizade, tendendo a se
aproximarem das pessoas que são soropositivas como eles para se relacionarem
não como amigos, mas também em uma relação de maior cumplicidade e
intimidade, o que traduz uma das dimensões afetivas da representação social
específica do grupo em estudo.
Entretanto, caso a TARV seja interrompida, existe o risco deste indivíduo
desenvolver resistência aos fármacos criando cepas virais cada vez mais
resistentes, o que dificulta sobremaneira o tratamento. Por conseguinte, a adesão
159
terapêutica deveria ser perseguida por todos envolvidos, especialmente a família e
os amigos, que constituem a rede social de apoio para os sujeitos soropositivos. Os
profissionais de saúde têm um papel singular neste processo, constituindo um elo
entre o usuário e o familiar, além de orientar e estimular o uso adequado da TARV
através de uma escuta ativa e interativa, sendo capaz de identificar, sobretudo, os
fatores que podem resultar em uma adesão ineficaz da terapêutica. Porém,
questiona-se: será que os profissionais de saúde, de fato, estão preparados para o
enfrentamento da epidemia, atentando, especialmente, para as dificuldades trazidas
por esta clientela relacionada à terapia medicamentosa?
Considera-se relevante, ainda, a formação acadêmica destes profissionais
que, na maioria das vezes, prevalece o modelo biomédico da assistência. Am
disso, estes profissionais devem ser motivados para abraçar esta causa com
compromisso e responsabilidade em prol daqueles que vivem com o HIV, com um
olhar ampliado ao considerar os aspectos biopsicossociais de cada indivíduo e o
respeito às suas singularidades, efetuando de fato uma assistência de saúde
humanizada.
As falas dos atores sociais nos diversos contextos abordados estavam
permeadas de afetividade - sentimentos e emoções - seja ela individual ou coletiva,
constituindo, portanto, um diferencial em relação a outros estudos. Os sentimentos e
as emoções negativas foram explicitados no medo da morte, da Aids e da rejeição,
associadas a expressões como sofrimento, angústia, depressão e choro. Porém, os
sujeitos, na sua grande maioria, superam tais sentimentos, principalmente no que
tange à morte, dando vazão para os sentimentos e as atitudes positivas que
consubstanciam estratégias de enfrentamento da síndrome.
Portanto, os sentimentos positivos abordados no estudo, bem como as
emoções presentes nos discursos, moldaram a forma como os sujeitos se organizam
para enfrentar a síndrome. Estes sentimentos foram pontuados de formas distintas e
interligados, considerando que a aceitação do HIV contribui de forma objetiva e
subjetiva na relação deste indivíduo com ele mesmo e com a sociedade. Expressões
como: passei a me cuidar mais, dar mais valor a vida, hoje sou mais feliz, passei a
estudar sobre o assunto e me fez crescer como ser humano denota mais do que
uma simples aceitação do vírus ou do ser que o alberga, mas revelam, sobretudo,
160
uma redescoberta da vida e, com ela, novas perspectivas. Destaca-se que este
posicionamento frente à sua condição, favorece o processo de adesão à TARV.
Assim, a forma como os sujeitos organizam o seu cotidiano para enfrentar e
conviver com o HIV reflete diretamente em suas atitudes e em suas práticas, tanto
no processo da adesão, como nas relações sociais (o outro) e, principalmente, na
relação individual (o eu). Estes sentimentos e emoções retratam de forma singular a
representação da Aids para um grupo de pessoas que tem vida, esperança e lutam
por um espaço no mundo, no combate contra o estigma, o preconceito e a
discriminação. Ter Aids, para eles, não significa ser diferente ou anormal, significa,
sobretudo, ter forças para lutar, para viver e ter uma vida normal.
Os depoentes demonstraram que possuem algum conhecimento quanto aos
motivos que levam as pessoas a se contaminarem pelo vírus HIV e foram pontuados
vários meios de transmissão, conceitos estes que compõem o universo reificado ou
o conhecimento de natureza científica. Portanto, a transmissão do vírus para o grupo
consiste basicamente pela transfusão de sangue, contato com ferimentos e/ou
secreções orgânicas, relações sexuais, materiais perfurocortantes e acidente de
trabalho.
Um dos motivos que levaram à contaminação pelo HIV, justificado pelo grupo,
consiste na falta de informação, o que resulta no aumento da vulnerabilidade
individual e social. Portanto, é necessário que haja investimentos por parte dos
órgãos públicos voltados em informações concisas sobre o HIV, fazendo valer as
dimensões programáticas da vulnerabilidade que busca, sobretudo, a emancipação
dos indivíduos tornando-os capazes de gerir a sua autonomia, principalmente nas
suas escolhas para que sejam feitas de forma consciente. O controle da epidemia do
HIV nos dias atuais depende, sobretudo, da eficácia dos antirretrovirais e de uma
assistência à saúde qualificada e considera-se que esse controle também depende
essencialmente da construção de uma cultura preventiva ainda mais universalizada,
sustentada, plural e versátil e que atenda toda sociedade. (AYRES, 2002).
Percebe-se frente à realidade exposta pelos entrevistados que as autoridades
públicas investem na maioria das vezes em campanhas preventivas contra a Aids
voltadas mais no aspecto da transmissão do vírus, sendo um dos focos da sua
atenção e preocupação. Porém, no que concerne às pessoas que vivem com o HIV,
se faz necessário investir em políticas públicas que buscam melhorar a qualidade de
161
vida destes indivíduos, com o intuito de diminuir o preconceito e o estigma social ora
vivenciado na cotidianidade dos sujeitos infectados, bem como as dificuldades e
barreiras encontradas na adesão à terapia medicamentosa.
É preciso avivar ações de saúde, ações educativas e ações comunitárias que
vislumbrem a humanização no atendimento às pessoas soropositivas, preservando
as suas identidades, independente da sua tendência sexual, cor, raça e posição
social, proporcionando, desta forma, novas perspectivas e compreendendo-os como
sujeitos plenos, nos seus aspectos biológicos, sociais e culturais.
A representação social da Aids para os atores sociais da pesquisa foi descrita
de diversas maneiras. Embora os sujeitos estudados sejam pessoas que vivem com
o HIV, as representações aqui explicitadas não diferem daquelas que circulam na
sociedade em geral, como a associação da Aids a grupo de risco e a comportamento
de risco, termos que para o conhecimento reificado está em desuso, porém no
conhecimento consensual prevalece, estabelecendo, inclusive no imaginário social,
a representação de dois grupos distintos, aqueles que são suscetíveis a adquirirem
o vírus do HIV, e os que não seriam vulneráveis por não se enquadrarem no
tradicional grupo de risco.
Conclui-se, então, que o grupo possui mais de uma representação para a
Aids, mesmo que elas apresentem, entre si, íntima relação. Neste sentido, além das
citadas no parágrafo anterior, a Aids, para o grupo, é vida e não mais sinônimo de
morte, o que gera estímulo e vontade de lutar para continuar vivendo. Outra
representação elaborada pelo grupo consiste na de doença crônica, necessitando,
portanto de cuidados semelhantes à de outras doenças consideradas comuns e não
fatais.
O fato de possuírem um relacionamento estável também determina para
alguns a representação de invulnerabilidade ao HIV, o que gerou sentimento de
revolta ao descobrirem o seu estado soropositivo e maior dificuldade de aceitação
deste estado. Neste sentido, a Aids é uma doença do outro e do vizinho, mas não
para eles ou para o seu núcleo relacional.
Considera-se que os objetivos do estudo em tela foram alcançados no
decorrer de toda a descrição e discussão dos dados empíricos. A representação
social da Aids foi desdobrada nas seis categorias do estudo e nas subcategorias
agregadas, apresentando-se multifacetada e dependente do contexto histórico e
162
social no qual o indivíduo está inserido, seus valores, cultura, nível de informação e
conhecimento. Percebeu-se que até mesmo a religiosidade interfere na fala dos
sujeitos, no viver com o HIV e na sua forma de enfrentamento.
O estudo mantém-se ainda aberto, uma vez que existem questões a serem
repensadas no que diz respeito às representações sociais da Aids e nas implicações
destas na vida social e, essencialmente, para aqueles que vivem com a
soropositividade, considerando que estas representações podem influenciar na
aceitação do viver com o HIV, na adesão terapêutica, nas relações sociais e no
continuar a vida.
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176
APÊNDICE A - Termo de Consentimento de Livre e Esclarecido
Projeto Principal: Análise do cuidado de enfermagem no contexto do HIV/Aids:
Representações Sociais e memórias de enfermeiros e portadores nos 25 anos da
síndrome.
Após a leitura deste documento, das explicações sobre o Projeto Institucional de
pesquisa intitulada: A REPRESENTAÇÃO SOCIAL DO CUIDADO DE
ENFERMAGEM PARA CLIENTES SOROPOSITIVO AO HIV/ AIDS INTERNADOS
EM INSTITUIÇÃO HOSPITALAR e da compreensão que obtive sobre o objeto de
estudo: A representação social do cuidado de enfermagem para o cliente
soropositivo ao HIV/Aids, e de seus respectivos objetivos, sob a responsabilidade de
Érika Machado Pinto da Silva aluna do curso de Mestrado do Programa de Pós
Graduação em Enfermagem da UERJ, estou de pleno acordo em participar deste
estudo respondendo as questões propostas, bem como em autorizar que os dados
fornecidos no depoimento sejam apresentados em estudos de cunho científico
subsequentes.
Estou ciente e de acordo que:
1- Posso desistir da participação em qualquer fase do estudo;
2- Não terei nenhuma despesa financeira na participação;
3- Serei orientado sempre que tiver qualquer dúvida;
4- Não serei obrigado a qualquer tipo de procedimento, além da entrevista;
5- Tenho o direito de rever, corrigir e alterar o texto de entrevista concedida em
qualquer momento;
6- Estou resguardado quanto ao anonimato;
7- Os dados da entrevista serão apresentados apenas em eventos e periódicos
científicos,
8- Estou resguardado de quaisquer riscos e ônus.
EM CONFORMIDACDE COM O EXPOSTO, DECLARO ESTAR CIENTE E
ESCLARECIDO QUENTO A MINHA PARTICIPAÇÃO NO PROJETO DE ESTUDO,
BEM COMO COM A LIBERDADE EM ASSINAR, JUNTAMENTE COM A
RESPONSÁVEL PELO ESTUDO ESTE TERMO DE CONSENTIMENTO.
Rio de janeiro,______de ______________________ de 2008
_____________________________________________________
Participante do estudo
_____________________________________________________
Érika Machado Pinto da Silva
Enfermeira, aluna do curso de Mestrado do Programa de Pós Graduação em
Enfermagem da Universidade do Estado do Rio de Janeiro- UERJ
Tel- 21- 88157721
177
APÊNDICE B - Instrumento de Caracterização dos Sujeitos
UNIVERSIDADE DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO
CENTRO BIOMÉDICO
FACULDADE DE ENFERMAGEM
Programa de Pós-graduação em Enfermagem
PROJETO:
DENIZE CRISTINA DE OLIVEIRA
ANTONIO MARCOS TOSOLI GOMES
ANÁLISE DO CUIDADO DE ENFERMAGEM NO CONTEXTO DO HIV/AIDS:
REPRESENTAÇÕES SOCIAIS E MEMÓRIAS DE ENFERMEIROS E
PORTADORES NOS 25 ANOS DA SÍNDROME
SUB-PROJETO:
DISSERTAÇÃO ÉRIKA MACHADO PINTO DA SILVA
Caracterização dos Sujeitos
1- Entrevista n° _______ 2- Data:______________________
3-Pseudônimo: ______________________
4- Hora do início: _____________ 5- Hora do término:_______
6- Sexo: F ( ) M ( ) 7- Idade:__________
8- Residência (Bairro): __________________
9- Religião (marcar todas as referidas pela entrevistada ordenando, de 1 a 3, da
mais para a menos importante)
( ) Católica ( ) Sem religião
( ) Espírita, especificar: ( ) Kardecista ( ) Umbanda ( ) Candomblé
( )Evangélica, denominação: ________________________
( )Outras, especificar:_______________________________
10- Situação de moradia: ( ) Mora sozinho
( ) Mora com a família.
( ) Mora com amigos
( ) Mora em habitação coletiva. Qual____________
178
11- Estado conjugal e marital atual:
( ) solteira / não possui namorado ou companheiro
( ) casada / vive com companheiro / união estável
( ) possui companheiro fixo, mas não vive com ele
( ) Viúvo (a)
12- Filhos: Sim ( ) Não ( ) Quantos ______
13- Número de pessoas da família/ou amigos que moram juntos: ___________
14- Escolaridade: ( ) Fundamental incompleto (1ª a 7ª série)
( ) Fundamental completo e Médio incompleto
( ) Médio completo e Superior incompleto
( ) Superior completo
( ) Especialização
( ) Mestrado/Doutorado
( ) Outros. Qual? __________________________
15- Profissão:_______________________________
16- Atuação profissional atual________________________________
17- Situação no trabalho: ( ) Trabalha com registro em carteira
( ) funcionário público
( ) Trabalho informal
( ) ―Faz bicos‖ (trabalhos eventuais)
( ) Aposentado
( ) Desempregado
( ) Afastamento com pensão
( ) Outros Qual?__________________________
18 - Renda pessoal mensal: R$___________________________
19- Renda familiar mensal: R$___________________________
20- Quantas pessoas vivem desta renda? ( ) crianças ( ) adultos
21- Tempo de Diagnóstico: _______ 22-Número de internações: _______
23- Setor de Internação: _______________
179
24- Tempo de Atendimento na Unidade: _______ anos _______meses
25- Tempo de utilização dos Anti-retrovirais?______________________
26- Mudança terapêutica: ( ) SIM ( ) NÃO
Quantas vezes? ______
27- Antirretroviraisutilizados atualmente?
( )Abacavir
( )Dinanosina
( )Estavudina
( ) Lamivudina
( ) Zidovudina
( ) Tenofovir
( ) Efavirenz
( ) Nevirapina
( ) Amprenavir
( ) Indinavir
( ) Nelfinavir
( ) Ritonavir
( ) Lapinavir +
ritonavir
( ) Saquinavir
( ) Enfuvirtida
(fusion)
28- Principais fontes de acesso à informação sobre HIV/AIDS (marcar as 3 principais
ordenando, de 1 a 3, por maior frequência de acesso):
( ) televisão ( ) rádio
( ) bula de medicação ( ) panfletos/ folders/ cartazes
( ) livros em geral ( ) livros científicos
( ) revistas em geral ( ) jornal
( ) sítios em geral na internet ( ) cursos
( ) conversas no cotidiano ( ) serviço de saúde. Qual?__________
( )outra: ______________________
29- Tendência sexual (Perguntar no fim da entrevista ou verificar durante a sua
realização:
( )Homossexual ( )Heterosexual ( ) Bissexual
180
APÊNDICE C - Roteiro de Entrevista com Usuários
UNIVERSIDADE DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO
CENTRO BIOMÉDICO
FACULDADE DE ENFERMAGEM
Programa de Pós-graduação em Enfermagem
PROJETO:
DENIZE CRISTINA DE OLIVEIRA
ANTONIO MARCOS TOSOLI GOMES
ANÁLISE DO CUIDADO DE ENFERMAGEM NO CONTEXTO DO HIV/AIDS:
REPRESENTAÇÕES SOCIAIS E MEMÓRIAS DE ENFERMEIROS E
PORTADORES NOS 25 ANOS DA SÍNDROME
SUB-PROJETO:
DISSERTAÇÃO ÉRIKA MACHADO PINTO DA SILVA
Temática: A Representação e a Memória da Aids
Levantar os conceitos que os usuários possuem acerca da Aids, buscando fazer
uma comparação antes e depois do diagnóstico; Identificar os sentimentos que os
sujeitos possuíam com relação à Aids antes do diagnóstico; Identificar os
sentimentos surgidos durante o processo de descoberta diagnóstica e ao longo do
tempo de estado soropositivo, desde então; Expor as experiências que os sujeitos
tiveram com a Aids antes e depois do diagnóstico; Levantar as atitudes que o sujeito
possuía com relação à Aids antes do diagnóstico; buscar também as atitudes que o
seu grupo social possuía e ainda possui frente à síndrome; Levantar os mitos e as
crenças que o sujeito e seu grupo social possuem (relacionar especialmente com o
que era circulado pela mídia, os comentários feitos, etc); Levantar os motivos pelos
quais as pessoas se contaminam pelo rus; Procurar como o sujeito entende a
origem da Aids no mundo (laboratório, castigo, macaco, etc.); trabalhar as metáforas
e imagens pontuadas pelo sujeito em sua fala; Verificar as fontes de informação que
o paciente possuía antes de ser soropositivo e atualmente; Levantar o que significa
ser soropositivo para o sujeito.
181
APÊNDICE D Quadro de operacionalização da análise de conteúdo
Temas/ Unidades de
significação
E
E
E
E
E
E
E
E
E
E
E
E
E
E
E
E
E
E
E
E
E
E
E
E
E
E
E
E
E
E
T
1
2
3
4
5
6
7
8
9
10
11
12
13
14
15
16
17
18
19
20
21
22
23
24
25
26
27
28
29
30
Ur
Apoio religioso
1
3
3
1
1
5
1
1
2
1
4
23
Sobreviver anos com a
doença
2
2
1
1
1
1
8
Força de vontade
1
2
1
2
1
2
1
1
11
Larguei o trabalho para
cuidar de mim e do meu filho
2
2
Não tive contato com
pessoas soropositivo antes
do diagnóstico
1
3
3
3
2
2
1
1
2
1
2
1
1
1
1
2
27
contaminado pelo parceiro(a)
2
1
3
Engravidei
1
1
2
4
Ele preferiu morrer
3
2
1
1
1
8
Não quis se cuidar
3
1
1
1
2
1
1
1
11
Eu vou lutar/ eu luto
2
2
5
1
3
3
1
2
1
20
Eu não iria ter complexo/ iria
tratar normal
1
1
2
2
4
3
4
6
1
2
26
Tiveram complexo comigo e
meu filho
1
1
Tive que mudar de onde eu
morava
2
2
Cuidado com o vaso / pode
pegar no vaso, sabonete,
escova de dente
4
1
5
Isso não pega no sabonete
ou na pasta de dente
2
2
Não pega no beijo na boca
1
1
1
1
1
5
Usando o mesmo tudo de
todo mundo (utensílios
domésticos)
2
2
Transfusão de sangue
1
2
1
1
2
1
2
1
1
2
14
182
2Pega quando o corte no
dedo encosta em outro corte
4
1
1
6
Se machucar na escola corre
e lava a mão
1
1
Se machucar fala com o
responsável
5
5
Veio da África
4
1
2
4
1
2
1
2
1
1
1
1
1
2
24
Espalhou para a maioria dos
brasileiros
1
1
2
Como no pobre, como no rico
2
2
4
Cansada da Aids e do HIV
2
2
Não fala Aids fala sífilis
3
3
Eu não gosto desta palavra
1
2
2
5
Realização de exames
relacionados a Aids
1
2
1
4
1
2
1
1
1
3
17
Não toma os remédios
7
1
1
9
Abandona o tratamento
1
1
1
1
4
Se não tomar os remédios
fica doente
1
2
3
Se não tomar os remédios/
se não se tratar morre
1
1
1
2
2
1
1
1
2
1
13
Não vou deixar meus filhos
para os outros cuidarem
1
1
1
1
4
Tomo o remédio
1
5
2
6
3
1
1
1
2
2
2
2
1
1
1
3
4
4
2
44
Esta vivência não deveria
existir
2
2
1
5
Tantas doenças que matam
4
1
5
Tem que se cuidar/ ter mais
cuidados
1
2
1
1
5
2
2
1
3
2
3
2
4
1
1
2
2
2
4
3
44
O câncer relacionado a morte
1
1
1
1
1
3
8
É uma doença
4
2
2
2
1
1
2
14
Acham que Deus vai curar
1
1
2
1
2
3
1
1
12
Doença que não tem cura
2
1
1
1
1
1
1
2
1
1
12
Existe os coquetéis/
medicação
2
1
1
1
1
6
(Continuação)
183
Não acredito que os
laboratórios inventarão a
cura/ se encontraram
escondem por causa do lucro
com os remédios
1
1
3
2
2
9
Aids é uma doença que tem
controle
3
1
1
5
Aids relacionado à morte
7
7
5
5
4
1
1
3
4
8
1
1
4
4
2
1
1
2
6
8
3
5
5
5
1
94
É fácil conviver
tranquilamente com a
doença/ manter controlado
3
1
3
1
1
1
1
1
12
Existe tratamento
4
5
2
1
1
1
2
1
1
18
Eu tinha preconceito
6
8
2
1
3
6
1
27
Pensei que não namoraria
alguém com a doença
1
2
2
5
Imagem da aids associada a
Cazuza
3
2
1
3
1
1
11
Sentimentos negativos
relacionados a Aids
2
7
8
8
2
5
5
4
9
4
2
4
3
9
3
7
6
7
7
10
4
9
13
8
3
2
151
Passa a viver normalmente /
tiro de letra / tenho problema
nenhum
14
1
1
4
3
3
1
1
2
8
3
1
1
7
5
2
1
3
2
2
2
2
69
Ainda vou viver muito/ pode
viver muito tempo
1
2
1
1
1
1
1
8
Tento não pensar nisso
1
2
2
1
1
7
Fazer / manter o tratamento
5
2
1
1
1
2
7
2
1
1
3
3
1
1
4
1
36
Ignorância de não saber o
que era, falta de informação
e falta de conhecimento
3
4
7
3
1
3
1
1
3
3
2
3
2
2
1
10
2
1
5
3
60
Separação dos utensílios
domésticos
1
1
4
1
2
2
4
15
Convivo com amigos
soropositivos / maioria daqui
mesmo do hospital
(conversas e trocas de
experiências)
1
7
2
2
1
4
1
1
1
1
2
1
24
As pessoas tentam esconder
que são soropositivos / tem
vergonha
2
5
4
1
1
1
2
1
6
1
1
7
4
3
1
2
3
2
47
Passei a estudar/ conhecer
sobre o assunto
1
7
5
3
1
2
3
1
2
1
4
30
Minha família não sabe
2
3
1
1
2
1
1
1
12
(Continuação)
184
Meus amigos não sabem/ as
pessoas não sabem
1
1
1
2
1
1
1
1
1
3
1
1
1
2
18
Tenho medo de falar
1
1
2
1
1
1
2
1
10
Não falo para poupar os
meus pais
2
1
1
4
Todo mundo morre em algum
momento
1
3
4
As pessoas acham que quem
tem Aids morre rápido
1
1
1
1
4
Não sofro preconceito porque
as pessoas não sabem (me
tratam de igual)
3
1
2
3
1
2
2
1
15
As pessoas são
preconceituosas
2
2
4
1
3
3
3
1
2
1
3
3
3
2
1
2
2
3
6
1
1
6
55
Não falo para mim poupar
5
2
2
9
Vivemos numa sociedade
hipócrita
1
2
2
5
Certo cuidado com aqueles
infectados
1
3
1
2
1
8
Existe o preconceito para
qualquer doença
transmissível (tuberculose,
hanseníase)
3
1
4
Mito relacionado a cura/
medicamento cura
1
3
1
1
3
1
10
As pessoas se trancam em
religião
2
2
Abandonar ou não o
tratamento acreditando em
cura divina
2
1
2
2
7
Não me preveni/ não usava
camisinha
4
2
1
3
3
3
2
8
1
1
3
1
5
1
1
39
As pessoas se contaminam
por falta de cuidado
4
2
3
1
3
2
2
1
1
19
Uso do preservativo para
prevenir a doença
7
1
1
1
1
1
1
2
7
5
4
31
No meio homossexual existe
mais prevenção
4
4
Campanhas Preventivas
Contra a Aids
3
3
O vírus sempre existiu,
estava encubado
1
1
Poluição e mudanças
climáticas facilitou que o
vírus se propagasse
1
1
(Continuação)
185
Alimentar bem
2
2
2
1
2
1
10
Evito sair à noite
2
1
1
4
Evito o cigarro/ não fumar
1
1
1
1
3
1
8
Temos uma vida limitada,
somos privados de fazer
algumas coisas
1
8
1
1
4
3
3
21
Síndrome que baixa
imunidade
1
2
3
6
A maioria das pessoas
contaminadas não tem
estrutura para viver com ela
1
1
Tem pessoas que fazem de
conta que não tem a doença
1
1
2
1
1
1
7
Tem pessoas que
lembram que tem a doença
no dia da consulta
1
3
4
Aids é a manifestação do
vírus, quando aparecem
doenças.
5
5
Falta de esperança
6
1
7
Aids agride o psicológico
8
1
3
2
2
1
17
Nós mesmos nos acusamos
2
2
Não beber
1
1
1
1
1
5
Discriminação
2
3
1
1
1
8
Medo da rejeição/ rejeição
mata
1
6
2
3
4
5
4
2
27
Medo da Aids
1
1
6
3
3
5
1
1
3
4
1
5
34
Tinha comportamentos
duvidoso/ mim arriscava
5
4
1
1
1
2
2
5
1
3
25
Eu tinha relação sem
prevenção
0
Imagem corporal alterada
4
5
4
1
6
2
1
2
25
Comprometimento da saúde
1
6
1
1
2
4
12
2
29
Eu passei a dar mais valor a
vida e a mim mesma
(conotando enfrentamento
atitudes positivas/ frente a
6
1
7
7
6
3
1
3
7
1
3
2
7
3
3
2
1
5
2
3
1
5
2
81
(Continuação)
186
vida)
Desejo fazer ainda uma
faculdade
1
2
3
Já presenciei falecimento
3
3
2
1
4
2
1
2
2
1
2
1
1
25
Presenciei soropositivos
desistindo da luta
1
1
2
Eu não chegaria muito perto,
evitaria qualquer contato
físico (aperto de mão)
4
5
1
4
14
Acha que não vai acontecer
consigo próprio
5
3
2
2
1
2
1
2
1
2
3
3
3
3
3
4
2
1
2
1
2
48
Tem soropositivo que se
vêem indetectável e transam
sem preservativo, pois
acham que não vão
contaminar os outros
1
1
2
Eu transava com homens e
mulheres, era bem
constante/tinha vários
parceiros
2
2
3
1
1
9
A aids existe há muito mais
tempo do que falam
2
2
Não vai morrer de HIV/ não
está condenado à morte
1
2
1
1
1
1
7
Vai acontecer com o outro/
vizinho
4
1
2
1
2
10
Chegou a um ponto que
perderam o controle
1
2
3
Não divulgaram muita gente
infectou e morreu
2
2
Aids veio de laboratório
4
2
3
1
10
O HIV veio das países
desenvolvidos
3
3
Não veio da África
1
1
2
Na áfrica virou epidemia
2
1
3
Falam que vem do macaco
1
2
1
4
1
1
1
2
2
3
4
1
1
1
1
1
1
2
30
Ser soropositivo não precisa
se desesperar/ não é o fim do
mundo
1
3
3
3
3
2
1
1
1
18
(Continuação)
187
Mim sinto vitoriosa/ estou
vencendo
4
8
2
1
2
1
2
20
Tive medo de passar a
doença para os meus filhos
1
1
Eu não tinha sentimentos/
não pensava nada/ não mim
preocupava/ ignorava o
assunto
1
7
5
1
2
13
7
2
1
1
1
1
1
3
1
47
Nunca fui de farra/ passar
noite fora
3
1
4
Não saio mais
5
5
Tive/ entrei em depressão
1
2
2
1
1
2
1
1
1
2
14
Não sentava no mesmo local
que a pessoa tava
1
1
2
1
5
Eu posso ter um machucado
e a pessoa entrar em contato
comigo, então eu falo o que
tenho
1
1
Conversamos sobre o jeito
dos remédios (com pessoas
soropositivos)
1
1
(pessoas próximas) não
converso isso com eles, não
entro em contato.
4
4
Ouvia falar longe, na época
não era tão divulgado/ era
raro
2
2
As pessoas tem que se
conscientizar e tomar
cuidado para não se
contaminar e nem
Contaminar os outros
2
1
3
6
Eu acreditava na minha
inocência
2
2
Isto era uma doença que se
transmitia através dos gays
3
3
Depois que fiquei doente
passei a ver a vida com
outros olhos
1
1
2
5
1
5
2
17
Medo da morte
1
2
1
1
6
2
1
14
Hoje eu sou mais feliz
3
1
1
5
Antes eu não tinha Aids e
não era feliz.
2
2
4
(Continuação)
188
Só vivia chorando
3
11
1
1
1
1
18
Acredito que um dia terá a
cura
1
1
1
3
Moro em um lugar e faço
tratamento em outro
1
1
Pessoas no ônibus não tem a
mínima vergonha de dizer
que são soropositivos
1
1
As pessoas se afastam, te
evitam, não tem a mesma
amizade
7
1
1
1
1
5
5
1
2
3
2
1
3
4
1
38
Tem muita diferença quando
as pessoas sabem que você
é soropositivo
2
1
1
4
8
As pessoas não ficam perto,
evitariam qualquer contato
físico (aperto de mão, beijo
no rosto)
10
1
3
4
1
5
4
2
4
2
1
1
5
2
3
2
50
Não quero contaminar
ninguém
1
2
1
4
Quem é soropositivo e transa
sem camisinha se contamina
bem mais
2
4
6
Conheço meninas que
quando a medicação está
mudando o corpo elas param
1
1
Comentam aquela menina
ali, olha o destino dela ficou
daqui pra ali, está com Aids
1
1
Aquilo lá é sangue de
Cazuza (igual a ter Aids)
4
4
Os crentes dizem que é o fim
do mundo
1
2
1
4
Tenho esperança que vão
encontrar a cura
1
1
3
1
6
Motivos de transmissão
relacionados às drogas
1
2
2
1
1
4
1
1
1
2
16
Tem pessoas que tem e não
estão nem aí se vão passar
1
1
É uma doença muito grave e
perigosa
4
4
Relação sexual
1
2
1
1
3
1
1
1
3
1
1
2
18
No trabalho você fala que é
soropositivo e é mandado
embora (já passei por isto)
1
2
3
(Continuação)
189
Nunca tive nenhum resfriado
/pneumonia/ tuberculose
3
1
1
5
Nunca tive problema
nenhum/ nunca tive nada
2
2
5
9
Se você não se cuidar fica
doente
1
1
1
5
1
1
10
Se você se cuidar está bem
1
1
1
3
Eu queria mim matar
5
1
2
1
4
1
1
1
16
Ainda não aceitaram
(pessoas soropositivos)
1
2
1
2
6
É pior do que o câncer
1
1
2
Não posso ter um
companheiro porque tenho
medo contaminar a pessoa
4
1
3
8
É uma doença crônica
2
1
3
6
O vírus foi criado para
exterminar um pouco a
população mundial
1
1
A minha família sabe
1
1
2
1
1
1
7
O meu companheiro sabe
2
1
1
2
1
7
No trabalho não sabem
2
1
3
Tem poucos amigos e
familiares que sabem
2
1
1
3
4
2
1
1
1
1
1
1
6
1
26
Ter uma doença crônica
como diabetes
1
1
1
3
Se eu não me cuidar morro
2
2
4
Se eu mim cuidar vivo
bastante
1
1
1
3
Se eu tivesse mim
preocupado talvez não teria
pegado
1
1
Ele era heterossexual mas
vivia uma vida louca
1
1
Faço exercício físico
2
2
2
1
2
9
faço sexo com camisinha
1
12
2
1
4
20
Só quem tem esse tipo de
doença é homossexual
1
1
4
1
2
1
1
11
(Continuação)
190
Pessoa depravadas (que tem
a doença)
1
3
6
5
2
2
5
24
Sou homossexual mas nunca
fui depravado
1
1
Através de seringa
1
2
2
4
1
10
A doença não transparece
2
3
3
3
1
1
13
As pessoas falam, apontam,
zombar de quem tem Aids
3
1
2
2
1
1
1
3
14
Pode se contaminar com
perfuro-cortantes (agulha,
bisturi)
2
1
4
1
1
1
10
Doença mundial que
prejudica a população
1
2
3
Só ter uma parceira
1
1
O tratamento já melhorou
muito
1
1
1
3
O que as pessoas pensariam
de mim se soubessem que
sou soropositivo
1
1
2
Minha família mim apoia
1
3
1
2
1
2
10
É uma DST
1
1
1
3
Não contei par o meu
companheiro
3
3
Vai ter pena de mim
3
5
1
2
1
12
Veio de países de fora
2
1
3
Aids é a vida / viver
1
1
2
2
6
Aids é esperança
2
2
Para mim quem se
contaminasse tinha que viver
isolado, excluído
4
4
Pensava que não ia poder
mim relacionar com ninguém,
casar
2
2
Acredita que pode pegar uma
doença pior dos outros
soropositivos
1
1
2
Atitudes de preconceito da
família
1
1
4
2
1
1
3
3
1
17
(Continuação)
191
Os amigos que sabem
apóiam / não discriminam
1
1
2
1
3
3
3
2
16
Pensavam que pega pela
saliva
2
2
Eu sei que tenho não vou
doar sangue
1
1
Mim ensinou a viver, o que
quero e espero da vida
4
2
6
Mim fez crescer como ser
humano
4
5
2
1
12
Aconteceu na hora certa em
minha vida
2
2
melhor Aids que câncer
1
1
1
2
5
O meu companheiro morreu
de Aids
1
1
O meu ex era promíscuo
1
1
nunca fui promíscuo
5
1
1
1
8
Medo da família saber
2
2
Atitudes do meu grupo social
são positivas
1
1
2
2
1
3
3
3
2
18
Ter disciplina
5
5
Aids é liberdade
1
1
É tudo de bom
3
3
6
Aids é uma praga /do
diabo/por causa da
promiscuidade/ veio para
frear o homem
5
1
1
1
1
9
Deve surgir ainda coisa pior
que a Aids
2
1
3
Antigamente era o câncer /
as pessoas achavam que
estava com câncer
2
1
1
1
5
Pensei que fosse uma coisa
boba como uma gripe
1
1
Aids é uma coisa séria
3
3
Rotina do paciente HIV
positivo
2
1
3
Continuar trabalhando,
guardar dinheiro e deixar
4
3
1
1
1
2
1
13
(Continuação)
192
alguma coisa
Fulano pegou aids porque
errou e não ligava para a vida
2
2
Eu demonstrar não está
discriminando a pessoa
4
4
as pessoas tem temor de não
pegar
4
4
Você pode estar (relacionar)
com a pessoa que você
gosta
1
1
2
Tive apoio do meu
companheiro2
1
1
1
2
1
2
8
Tem gente que não acredita
que pega através do sexo
2
2
4
Quis continuar trabalhando
2
3
1
1
1
1
1
1
11
Depois que decobri não quis
arrumar homem
5
5
Nós mulheres temos maior
chance de contrair a doença
que o homem
1
4
1
6
Queria ficar sozinha/ me
isolar
5
1
2
1
5
14
fumo cigarro
3
1
4
Agora o que os outros vão
pensar de mim não importa
1
1
Para mim é como se tivesse
com tuberculose/ resfriado
1
1
2
Aids é um grande problema
1
1
1
3
6
as se dão comigo sem saber
que tenho a doença
1
3
1
5
as vezes tenho vontade de
contar para as pessoas que
tenho isso
1
1
Aids veio do Rock in Rio
4
4
Pensava que não ia
acontecer comigo porque eu
era casada (tinha um
companheiro fixo) estava
segura
2
1
1
1
2
7
se algum dia eu mim
relacionar será com alguém
igual a mim
3
1
4
(Continuação)
193
acham que a camisinha é
chupar bala com papel
1
1
2
1
5
veio do homossexualismo
2
2
qualquer um pode pegar hoje
em dia mulheres casadas,
idosos, crianças (já nascem)
1
5
5
1
9
21
muita gente tem, e não
sabem, e ta espalhando
2
2
4
HIV é pior que a hepatite e
sífilis/ pior doença do mundo
1
1
2
fazia sexo sem preservativo
em casa/confia no parceiro/
contraí em casa
3
1
4
2
10
gostam de beber
1
2
3
perdem noite de sono
1
1
tenho que aceitar / tento
aceitar
3
1
1
1
6
Fiquei intolerante com as
pessoas que reclamam por
tudo
3
3
eu não merecia ser
soropositivo, ser castigada
assim tão pesadamente
4
1
5
eu não estava no grupo de
risco
3
1
2
1
7
doença de mulher vagabunda
1
1
2
1
5
companheiro abandonou/
difícil aceitar
7
2
1
10
difícil de aceitar porque não
procurei
1
2
1
4
queria matar meu marido,
isto não é coisa que se faça
2
2
Homossexuais se revelavam
sem querer (quando
descobriam a doença)
2
2
Homens ativos não pegam
DST´s
1
1
contato sexual entre seres
humanos e animais
1
1
não deixei de fazer nada que
eu gosto
2
2
quem adquire Aids hoje é
burro
1
1
(Continuação)
194
do homem que cavaca a
terra coisa lá de baixo de
bilhões de anos atrás
1
1
falam que não tem
preconceito que hoje é
normal.
2
2
TOTAL
2843
Quadro de síntese das unidades de registro e temas da análise de conteúdo. Rio de janeiro, 2009 (Conclusão)
195
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