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independência”
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, cuja “fronteira política é a separação entre duas soberanias”, segundo
Jean Baptist Duroselle em sua obra Todo Império perecerá (2000).
A Ilha de Fernando de Noronha, em 1956, início da presença americana no período
da Guerra Fria, apresentava em torno de 1300 habitantes (segundo relatório da Escola
Superior de Guerra (ESG). As pessoas que ali se encontravam não tinham a ideia dos
embates que aconteciam no continente em torno da cessão da ilha aos Estados Unidos, haja
visto que os instrumentos para que a informação e a comunicação circulassem no
continente não conseguiam repercutir ou, quem sabe, alcançar, aquele espaço no Oceano
Atlântico. Os informes trazidos pelos jornais construíam dois grupos significativamente
distintos em ação e objetivos: os “nacionalistas” e os “entreguistas”. Jorge Ferreira (2003)
configura esse quadro entre: os chamados de “nacionalistas de esquerda”, que defendiam a
soberania pelos trabalhadores sem se envolver com a ideologia do anticomunismo; os
“nacionalistas direitistas”, a exemplo de Goés Monteiro e Eurico Gaspar Dutra, simpáticos
ao nacionalismo, sem trégua ao comunismo e um terceiro grupo que formava a ala
“cosmopolita de direita”, radicalmente anticomunista, antitrabalhista e adversária do
nacionalismo. Estes últimos defendiam a abertura ao capital estrangeiro e o alinhamento
incondicional dos Estados Unidos.
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O fio que costura o que acontecia em Noronha ao que
acontecia no “mundo lá fora”
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, encontra-se nos argumentos em torno da segurança e
soberania nacionais e a defesa das águas do Atlântico e vai costurando o movimento da
política, e assim cria uma teia histórica com a relação Brasil X Estados Unidos, bem como
Estados Unidos X Noronha. O problema é: De que forma Noronha vai sendo introduzida
como um dos vértices para a salvaguarda do território brasileiro, contribuindo também para
a defesa do hemisfério? Por que ela entra como ‘moeda’ nos acordos militares?
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OLIVEIRA, Liziane Paixão Silva. O conceito de soberania perante a globalização. In: revista CEJ,
Brasília, n. 32, p. 80-88, jan/mar, 2006.
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FERREIRA, Jorge & DELGADO, Lucilia de Almeida Neves. O Tempo da Experiência Democrática: da
democratização de 1945 ao golpe civil-militar de 1964/ organização Jorge Ferreira e Lucilia de Almeida
Neves Delgado. – Rio de Janeiro: civilização Brasileira, 2003. – (O Brasil Republicano; v3). pp. 320.
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Expressão utilizada pelos que passaram pela Ilha, como também pelos que residem nela até hoje. Em 1944,
o capitão Rube Canabarro Lucas tentando ter uma idéia do isolamento vivido na Ilha de Fernando de
Noronha, percebia que os habitantes se referiam ao continente como “o mundo”. Em conversas sempre ouvia
esta expressão: “lá no mundo é assim; aqui não”, ou “quando voltar ao mundo” (Imbiriba; op. cit. pp. 37). Na
tese de doutorado, a antropóloga Janirza Cavalcante define duas categorias sociais em torno dos espaços
continental e insular: “os de fora” e o “homem insular fernandino”. Segundo ela, para “os de fora” (os
continentais), o arquipélago ainda é um espaço à margem, proscrito, distanciado e imaginariamente
transgressor. (DA ROCHA LIMA, op. cit. pp. 57 - 59). Para Clarice Peixoto, os termos “aqui dentro” em
contraposição ao “lá fora”, datam do tempo do presídio, quando a expressão mais utilizada para tratar o
continente era “o mundo”. (PEIXOTO, Clarice Ehlers. Fernando de Noronha: ilha de sonho e de
assombração. Dissertação de mestrado em Antropologia social – Rio de Janeiro, 1983. pp. 44).