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Universidade de São Paulo
Faculdade de Arquitetura e Urbanismo
Wayne Almeida de Sousa
Arquitetura Industrial no Bairro da Mooca:
Análise e Diretrizes de Intervenção na Alpargatas
São Paulo
2010
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Arquitetura Industrial no Bairro da Mooca: Análise e Diretrizes de Intervenção na Alpargatas.
Wayne Almeida de Sousa
Wayne Almeida de Sousa
Arquitetura Industrial no Bairro da Mooca:
Análise e Diretrizes de Intervenção na Alpargatas
Dissertação apresentada à
Faculdade de Arquitetura e Urbanismo
da Universidade de São Paulo (FAU-USP)
para obtenção do título de Mestre
em Arquitetura e Urbanismo.
Área de Concentração:
História e Fundamentos da Arquitetura e do Urbanismo
Orientadora:
Professora Dra. Beatriz Mugayar Kühl
São Paulo
2010
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Arquitetura Industrial no Bairro da Mooca: Análise e Diretrizes de Intervenção na Alpargatas.
Wayne Almeida de Sousa
AGRADECIMENTOS.
Gostaria de manifestar meus sinceros agradecimentos à FAPESP, cujo apoio financeiro
foi fundamental para o desenvolvimento dessa pesquisa.
Agradeço também à Professora Doutora Beatriz Mugayar Kühl, pela orientação e
sugestões durante todo o trabalho, que se iniciou no ano de 2003 com a pesquisa de Iniciação
Científica, também com apoio da FAPESP.
Aos professores Maria Lucia Bressan Pinheiro e Antonio Soukef Júnior, que me
acompanham desde o Trabalho Final de Graduação.
Aos amigos Pablo e Thais, pelo grande interesse e apoio nas horas difíceis, à minha
família, por compreender minhas ausências e, finalmente, à Cris, por toda dedicação, ajuda e
paciência ao longo de todo o trabalho.
Arquitetura Industrial no Bairro da Mooca: Análise e Diretrizes de Intervenção na Alpargatas.
Wayne Almeida de Sousa
SUMÁRIO.
INTRODUÇÃO. 6
1. A ALPARGATAS NO CONTEXTO DE FORMAÇÃO E INDUSTRIALIZAÇÃO DO BAIRRO
DA MOOCA. 10
1.1. Apresentação. 10
1.2. Crescimento e Transformação da Cidade de São Paulo. 12
1.3. Notas Sobre a Industrialização do Bairro da Mooca. 25
1.4. O Problema da Especulação Imobiliária e a Atuação do Poder Público. 43
2. ALPARGATAS. CARACTERIZAÇÃO DE SEUS EDIFÍCIOS E TRANSFORMAÇÕES AO
LONGO DO TEMPO. 45
2.1. Apresentação. 45
2.2. A Alpargatas. 54
2.3. Análise dos Edifícios. 69
3. PROBLEMAS DE PRESERVAÇÃO DO PATRIMÔNIO INDUSTRIAL DO BAIRRO DA
MOOCA E SUA RELAÇÃO COM A ALPARGATAS. DIRETRIZES PARA SUA
PRESERVAÇÃO. 109
3.1. Apresentação. 109
3.2. Questões Ligadas à Arqueologia Industrial. 112
3.3. O Problema dos Critérios de Restauração. 121
3.4. A Intervenção na Alpargatas a partir dos Critérios de Restauração. 133
3.5. Propostas para Intervenções em Bens Industriais a partir da Análise da Alpargatas. 140
CONSIDERAÇÕES FINAIS. 146
ANEXO. 149
BIBLIOGRAFIA. 150
Arquitetura Industrial no Bairro da Mooca: Análise e Diretrizes de Intervenção na Alpargatas.
Wayne Almeida de Sousa
LISTA DE IMAGENS.
1 – Planta da Cidade de São Paulo – 1881. Bairro da Mooca. Arredores da Rua da Mooca. p. 18.
2 Sistema Cartográfico Metropolitano da Grande São Paulo 1/10.000 GEGRAN, 1974. A Alpargatas e outros
conjuntos industriais de importância. p. 24.
3 – Planta da Cidade de São Paulo – 1895. Bairro da Mooca. Primeiros arruamentos. p. 29.
4 – Planta Geral da Cidade de São Paulo – 1905. Bairro da Mooca. Alguns conjuntos industriais. p. 32.
5 – Planta da Cidade de São Paulo – 1913. Bairro da Mooca. Ocupação industrial próximo às ferrovias. p. 35.
6 Sistema Cartográfico Metropolitano da Grande São Paulo 1/10.000 GEGRAN, 1974. Bairro da Mooca. Rua
Borges de Figueiredo, conjuntos da IRF Matarazzo e Banco do Brasil. p. 51.
7 – Rua Borges de Figueiredo. IRF Matarazzo. Fotos do Autor. p. 52.
8 – Rua Borges de Figueiredo. Conjunto Pertencente ao Banco do Brasil. Fotos do autor. p. 53.
9 – Alpargatas. Fotos históricas. p. 66.
10 – Foto aérea – 1994. Bairro da Mooca e principais vias. Conjunto da Alpargatas. p. 67.
11 – Foto aérea – Conjunto da Alpargatas em detalhe. p. 68.
12 – Aparelhos de Tijolos. p. 72.
13 – Alpargatas – Edifício de 1907 – Planta, Corte e Fachada. pp. 76-77.
14 – Alpargatas – Edifício de 1908 – Planta, Corte e Fachadas. p. 78.
15 – Alpargatas – Edifício de 1909 – Planta, Corte e Fachada. p. 79.
16 – Alpargatas – Edifícios de 1907, 1908 e 1909 – Fotos do autor. pp. 80-86.
17 – Alpargatas – Edifício de 1907 – Arquivo Histórico Municipal Washington Luis. Processo op1907 000-401. pp.
87-88.
18 – Alpargatas – Edifício de 1908 – Arquivo Histórico Municipal Washington Luis. Processo op1908 000-665. pp.
89-91.
19 – Alpargatas – Edifício de 1909 – Arquivo Histórico Municipal Washington Luis. Processo op1909 000-740. pp.
92-93.
20 – Alpargatas – Edifício de 1921 – Cortes e Fachadas. pp. 96-97.
21 – Alpargatas – Edifício de 1921 – Fotos do autor. pp. 98-99.
22 Alpargatas Edifício de 1921 Arquivo Histórico Municipal Washington Luis. Processo doc4 / cx D4 1921.
pp. 100-103.
23 – Alpargatas – Edifício de 1942 – Fotos do autor. pp. 105-106.
24 – Alpargatas – Edifício de 1962 – Fotos do autor. p. 108.
Arquitetura Industrial no Bairro da Mooca: Análise e Diretrizes de Intervenção na Alpargatas.
Wayne Almeida de Sousa
RESUMO.
A pesquisa tem como tema a preservação do patrimônio industrial da cidade de São
Paulo a partir de um estudo de caso realizado no conjunto de edifícios da Alpargatas, um dos
mais importantes exemplares da arquitetura industrial produzida na cidade de São Paulo no
início do século XX, no bairro da Mooca, que se destaca por sua variedade e qualidade
arquitetônica, importância histórica, técnicas construtivas e materiais empregados. Trata-se de
tema complexo, a partir do qual se buscará discutir questões ligadas ao patrimônio industrial,
critérios de preservão e propor diretrizes de intervenção a partir da análise da Alpargatas,
procurando demonstrar que é possível adequar às necessidades atuais de um novo uso sem
descaracterizar o edifício.
Palavras Chave: Alpargatas, Arquitetura Industrial, Patrimônio, Preservação.
ABSTRACT.
This research deals with the preservation of industrial heritage in the city of São Paulo.
The Alpargatas complex was chosen as study case, because it is one of the most important
examples of industrial architecture in São Paulo of the beginning of Twenty Century, in the
Mooca district. The complex stands out because of its variety and architectural quality, historical
importance, construction techniques and materials used. It is an intricate subject; this research
will discuss questions related to industrial heritage and preservation criteria, and propose, taking
Alpargatas as a base, guidelines for interventions in industrial buildings, showing that it is
possible to adapt them to present needs, respecting their characteristics.
Keywords: Alpargatas, Industrial Architecture, Heritage, Preservation.
Arquitetura Industrial no Bairro da Mooca: Análise e Diretrizes de Intervenção na Alpargatas.
Wayne Almeida de Sousa 6
INTRODUÇÃO.
O interesse pela preservação do patrimônio industrial é relativamente recente e passou a
ter uma maior importância a partir de meados do século XX, principalmente na Inglaterra,
quando significativos exemplares da arquitetura industrial foram destruídos para dar lugar a
edifícios mais novos. Desde então, diversos países notaram a importância da preservação e
passaram a realizar estudos e levantamentos específicos dos seus edifícios.
Em São Paulo, esse patrimônio é testemunho do processo de industrialização do Estado
e da Cidade a partir de meados do século XIX, sendo fundamental o seu estudo para diversas
disciplinas, como a Arquitetura e Engenharia, pelas técnicas construtivas, materiais e
composições; até a História, Economia, Sociologia e Antropologia, devido a seu importante
papel no processo de transformação e desenvolvimento da cidade.
Localizando-se ao longo das ferrovias, grande parte do patrimônio industrial se situa
hoje, em áreas consideradas centrais e é alvo de discussões e projetos de requalificação urbana,
tornando-se urgente a realização de levantamentos sistematizados, estudos e análises para que se
possa identificar os exemplares mais significativos para preservação.
Dando seqüência aos trabalhos iniciados durante a pesquisa de Iniciação Científica,
financiada pela FAPESP no ano de 2003, e complementados no Trabalho Final de Graduação,
em 2004, essa pesquisa tem a intenção de oferecer uma contribuição ao estudo do patrimônio
industrial da cidade de São Paulo, a partir de um estudo de caso realizado no conjunto de
Arquitetura Industrial no Bairro da Mooca: Análise e Diretrizes de Intervenção na Alpargatas.
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edifícios da Alpargatas, localizado na Rua Dr. Almeida Lima, no bairro da Mooca, que é, sem
dúvida, um dos mais importantes exemplares da arquitetura industrial produzida na cidade de
São Paulo no início do século XX.
O conjunto, que foi vendido para uma Universidade no final dos anos de 1990, e passou
por uma grande intervenção de mudança de uso, se destaca por sua variedade e qualidade
arquitetônica, importância histórica para o bairro da Mooca e para a cidade de São Paulo,
técnicas construtivas e materiais empregados, participação de importantes arquitetos
reconhecidos pela história da arquitetura paulistana, etc.
De modo a fazer um estudo fundamentado das principais características do conjunto da
Alpargatas, no Primeiro Capítulo são tratados os processos de formação e industrialização da
cidade de São Paulo, dando especial atenção ao bairro da Mooca. É então feito um breve relato
sobre a formação de São Paulo, e o rápido processo de crescimento e transformação pelo qual
passou a Cidade a partir de meados do século XIX, impulsionado por rios fatores, entre os
quais, a gradativa substituição da cultura de cana de açúcar pela do café; extinção do tráfico de
escravos, que incentivou a vinda de uma grande quantidade de imigrantes; e a chegada da estrada
de ferro.
Também são apresentados temas relativos ao surto industrial associado a essa
transformação, tais como a instalação de instrias nas áreas de rzea próximas à ferrovia,
formação de bairros operários e a importante presença dos imigrantes italianos; e como todas
essas transformações afetaram o bairro da Mooca e a arquitetura ali produzida, no período que
vai de fins do século XIX até meados do século XX, quando se inicia o processo de transferência
de algumas indústrias localizadas no bairro para áreas próximas às rodovias.
Arquitetura Industrial no Bairro da Mooca: Análise e Diretrizes de Intervenção na Alpargatas.
Wayne Almeida de Sousa 8
O Segundo Capítulo é dedicado à Alpargatas. Depois de algumas notas sobre a
empresa, que abrange o período que vai desde sua crião, no ano de 1907, passando por suas
diversas fases, chega-se à década de 1990, quando os seus edifícios localizados na Rua Dr.
Almeida Lima são desativados e vendidos para a Universidade.
Ainda no Segundo Capítulo, é apresentado todo material obtido durante a pesquisa
documental, realizada nos arquivos municipais de processos, e nas visitas de campo. De todos os
documentos encontrados, destacam-se os projetos do primeiro edifício do conjunto, do ano de
1907, e da grande ampliação realizada na década de 1920, quando é comprado um terreno em
frente ao primeiro para a construção de um edifício para tecelagem e fiação.
A partir do material apresentado, é feita uma análise detalhada das características dos
edifícios da Alpargatas, que leva em consideração a organização espacial do conjunto, suas
principais características construtivas e intervenções realizadas ao longo do tempo,
principalmente as que adaptaram os edifícios ao novo uso.
No Terceiro Capítulo são apresentados os temas relativos ao patrimônio industrial e
as questões ligadas a sua preservação, abarcando a formação desse campo temático, suas
transformações, até a formulação, a partir das teorias de restauro e documentos internacionais
sobre o tema, de critérios de preservação e de princípios que deveriam guiar intervenções
realizadas em bens culturais.
Na seqüência do capítulo, são discutidos os problemas específicos da Alpargatas a
partir dos critérios de restauração e são propostas diretrizes que deveriam guiar intervenções
em edifícios industriais a partir da análise do caso da Alpargatas, demonstrando que é
Arquitetura Industrial no Bairro da Mooca: Análise e Diretrizes de Intervenção na Alpargatas.
Wayne Almeida de Sousa 9
possível fazer intervenções em edifícios do patrimônio industrial que respeitem as
características e os elementos que os identificam como exemplares merecedores de
preservação. As propostas levarão em consideração os princípios apresentados ao longo de
todo o trabalho teórico, que são baseados numa releitura crítica dos princípios estabelecidos
nas cartas de restauro e nos documentos internacionais sobre esse tema.
Arquitetura Industrial no Bairro da Mooca: Análise e Diretrizes de Intervenção na Alpargatas.
Wayne Almeida de Sousa 10
1. A Alpargatas no Contexto de Formação e Industrialização do Bairro da Mooca.
1.1. Apresentação.
A formação e inserção urbana do complexo formado pela São Paulo Alpargatas
relaciona-se ao quadro de grandes mudanças por que passou São Paulo, principalmente a partir
de meados do culo XIX, quando uma série de fatores de ordem econômica, social e cultural
aceleraram o processo de crescimento e desenvolvimento da Cidade.
Até então, a cidade permanecera, durante muito tempo, apartada em relação ao resto do
Brasil, sendo essa a característica mais marcante dos povoados que se estabeleceram na região
onde hoje está localizada a Grande São Paulo. A sociedade era marcadamente conservadora e
ligada às tradições rurais, e a importância da região era vista como derivada do fato de ser o
encontro de diversos caminhos que iam em direção ao interior e ao litoral. Mesmo com as muitas
mudanças introduzidas após a transferência da Corte Portuguesa para o Brasil, São Paulo não
passou por mudanças significativas durante muito tempo.
Entre os fatores que acabaram por acelerar a transformação, podemos citar: a gradativa
substituição da cultura de cana de açúcar pela do café como principal produto de exportação; a
extinção do tráfico de escravos e a adoção posterior do trabalho livre, que incentivou a vinda de
uma grande quantidade de imigrantes; e a chegada da estrada de ferro, primeiro a São Paulo
Railway, em 1867, ligando Santos a Jundiaí, seguida por várias outras que acabaram por tornar a
Cidade de São Paulo rota obrigatória de toda a produção de café, da riqueza trazida por esse
Arquitetura Industrial no Bairro da Mooca: Análise e Diretrizes de Intervenção na Alpargatas.
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produto e das novidades que chegavam da Europa pelo porto de Santos, que também teve papel
de destaque nesse processo.
Arquitetura Industrial no Bairro da Mooca: Análise e Diretrizes de Intervenção na Alpargatas.
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1.2. Crescimento e Transformação da Cidade de São Paulo.
Em seu notável estudo sobre a estruturão de São Paulo, Jurgen Richard Langenbuch
reitera o fato, sempre mencionado por numerosos historiadores da cidade, que São Paulo, em
meados do século XVIII, era “extremamente modesta” em tamanho, também se comparada com
outras cidades brasileiras da época.
1
A introdução da cultura da cana-de-açúcar em maior escala, ainda naquele século, foi
essencial para a mudança desse quadro, estabelecendo atividades que tiveram importância
fundamental para o futuro desenvolvimento e crescimento econômico de São Paulo. O transporte
de mercadorias, naquele período, era feito essencialmente através de tropas de burros, cavalos ou
carros de boi e, sempre retomando Langenbuch, São Paulo já era o “principal foco irradiador de
estradas da província, a ela convergindo as mais importantes.”
2
Apesar de sua crescente
importância para o desenvolvimento do comércio, esses caminhos eram de péssima qualidade,
sendo, na maioria dos casos, apenas resultado de reaproveitamentos ou readaptões de antigos
caminhos bandeirantes.
3
Não obstante essa situação precária, esses caminhos foram
fundamentais para o desenvolvimento da cana de açúcar e importantes agregadores de atividades
1
LANGENBUCH, Jurgen Richard. A estruturação da Grande São Paulo Estudo da geografia urbana. Rio de
Janeiro, Fundação IBGE, 1971, p. 8. O período da minerão agravou ainda mais esse problema. A região de São
Paulo, que passara por uma povoação lenta durante os dois primeiros séculos, foi reduzida a menos de um terço
de sua área original, fazendo com que a Capitania de São Paulo fosse extinta e anexada à Capitania do Rio de
Janeiro no ano de 1748. Somente no ano de 1765 a Capitania de São Paulo foi restaurada já com o território atual do
Estado de São Paulo. fazendo com que a Capitania de São Paulo fosse extinta e anexada à Capitania do Rio de
Janeiro no ano de 1748. Somente no ano de 1765 a Capitania de São Paulo foi restaurada já com o território atual do
Estado de São Paulo. Ver os dados existentes em: MATOS, Odilon Nogueira. Café e Ferrovias: a Evolução
Ferroviária de São Paulo e o Desenvolvimento da Cultura Cafeeira. São Paulo, Alfa-Ômega, 1974, p. 25
2
LANGENBUCH, op. cit, p. 30.
3
Idem, p. 29.
Arquitetura Industrial no Bairro da Mooca: Análise e Diretrizes de Intervenção na Alpargatas.
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complementares como, por exemplo, ranchos e pousos.
4
Sabe-se que a cana de açúcar trouxe para São Paulo um período de desenvolvimento
sem precedentes; contudo, um crescimento de maior consistência se deu realmente com a
chegada do café, que aos poucos foi tomando o lugar do açúcar como o principal produto de
exportação de São Paulo: “O açúcar, inicialmente o gênero de exportação por excelência da
província, cede paulatinamente seu lugar ao café, no decorrer do século XIX.
5
Araujo Filho nota também “a nítida liderança do café sobre o açúcar na exportação
santista a partir de meados da década de 1850. Daí por diante, houve um declínio na lavoura
canavieira e, conseqüentemente, uma diminuição cada vez maior da exportação do açúcar por
Santos”, que se torna o “porto do café”.
6
Odilon Nogueira de Matos evidencia ainda o fato de o ciclo do açúcar ser fundamental
para conseguir recursos e o de obra para o futuro desenvolvimento da cafeicultura em São
Paulo,
7
e cita uma passagem de Elis Júnior quando este afirma que sem a atividade açucareira
4
Dalva Elias Thomaz Silva enfatiza em seu estudo que essa rede de caminhos que transformou São Paulo em um
importante entreposto comercial era constituída, essencialmente, “por quatro grandes ramais: na direção norte, a
estrada para Bragança e sul de Minas; ao sul, o caminho para Santos; a oeste, a estrada para Sorocaba; e,
finalmente, para leste, passando pelo Brás, Penha e Moji das Cruzes, a estrada para o Rio de Janeiro. Tal sistema
viário repercutiu diretamente na organização do espaço de estabelecimentos e atividades correlatas ao seu
funcionamento: abrigos, alimentação de viajantes e dos animais; os tios e fazendas dedicados a criar e negociar
animais; as oficinas de seleiros e cangalhas; as vendas e botequins constituíram os núcleos denominados pousos de
tropas. A circulação por via terrestre veio a se intensificar a partir do culo XVIII, quando as comunicações por
via fluvial tenderam a se reduzir, em parte, talvez, por causa das constantes obras de retificação dos rios.” Ver:
SILVA, Dalva Elias Thomaz. Casa das Retortas, Prefeitura do Município de São Paulo, Secretaria Municipal de
Cultura, Departamento de Informação e Documentação Artísticas, Centro de Documentação e Informação sobre
Arte Brasileira, 1980, p. 34.
5
LANGENBUCH, op. cit, p. 34.
6
ARAUJO FILHO, J. R. de. Santos: O Porto do Café, Tese (Livre Docência), Rio de Janeiro, 1969, p. 52.
7
MATOS, op. cit, p. 27.
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“teria sido impossível a expansão cafeeira e a conquista dos sertões do oeste de São Paulo."
8
No seu início, a produção cafeeira pôde se sustentar somente com a mão de obra
escrava trazida do Nordeste, onde as fazendas passavam por um período de decadência. A
gradativa substituição do trabalho escravo pela mão de obra livre nas fazendas de café através
das poticas de incentivo à imigração,
9
fez com que São Paulo sofresse menos que outras
regiões do Brasil com a abolição da escravidão.
Além de contribuir para a produção cafeeira, a imigração também foi fundamental para
o aumento da população que até então era muito escassa. Teodoro Sampaio comenta que a
colonização e a imigração representam no progresso de S. Paulo uma solução não menos
importante do que essa dos transportes por via acelerada,”
10
e chama a atenção para o fato de
que no curto período de 1886 a 1896 a população da cidade triplicar, passando de 45.000 para
150.000, acarretando sérios problemas e prejuízos às condições de salubridade.
11
Muitos desses imigrantes, que chegando a o Paulo se instalavam na Hospedaria dos
Imigrantes destinados a trabalhar nas fazendas de café, mudavam seus planos e acabavam por
ficar na Cidade, onde novas oportunidades de trabalho se distribuíam entre o comércio, a
indústria e a construção civil.
12
Com isso, além do trabalho assalariado nas lavouras, os
imigrantes europeus tamm contribuíram com a formação do “início de classe dia” entre a
8
Idem, p. 26.
9
Sobre o incentivo à imigrão ver: SILVA, op. cit, p. 42; e VITORINO, Bruno Bonesso. Patrimônio ameaçado: os
grupos residenciais construídos até 1930 no Brás, Mooca e Belém. Dissertação de Mestrado, São Paulo, 2008, p.
34.
10
SAMPAIO, Teodoro. São Paulo no Século XIX. In: São Paulo no Século XIX e outros ciclos históricos.
Petrópolis, Vozes, 1978, p. 95.
11
Idem, p. 99.
12
VITORINO, op. cit, p. 34.
Arquitetura Industrial no Bairro da Mooca: Análise e Diretrizes de Intervenção na Alpargatas.
Wayne Almeida de Sousa 15
população de São Paulo.
13
A ferrovia também teve papel primordial no desenvolvimento de o Paulo, pois desde
cedo se tornou a principal responvel pelo escoamento da produção cafeeira do interior para o
porto de Santos. Essa nova e mais eficiente forma de transportar mercadorias resolveu os
problemas da distância, estimulou as plantações e incentivou os fazendeiros a ampliar seus
necios.
14
A produção cafeeira, impulsionada pela ferrovia, e, por sua vez, ajudando a impelir esse
meio de transporte, espalhou-se pelo terririo paulista e a riqueza trazida pelo café podia ser
vista tanto nas cidades quanto nas grandes fazendas. A ferrovia trouxe para São Paulo grandes
transformações, sendo muito mais do que um simples meio de transporte para a produção
cafeeira e dos imigrantes para as fazendas, pois transformou o modo de vida de toda a
população.
15
Vejam-se, por exemplo, esses dois textos, escritos com um século de distância, que
tratam do assunto:
“O admirável surto de progresso que tem sido a expansão econômica do Estado,
desde que o caminho de ferro se implantou em seu abençoado solo, proporcionando ao
factor primacial da produção as veias que lhe faltavam para vehicular sua riqueza.”
16
“Os investimentos ligados ao café determinaram a construção e consolidação de
toda a rede ferroviária do planalto. De maneira análoga, a expansão das importações e a
crescente importância adquirida pelo Porto de Santos como principal escoadouro da
13
MATOS, op. cit, p. 42.
14
Idem, p. 111.
15
Para maiores informações sobre as transformações por que passou a sociedade paulista da época ver: LEMOS,
Carlos A. C.. Casa Paulista: história das moradias anteriores ao ecletismo trazido pelo ca. São Paulo, EDUSP,
1999.
16
PINTO, Adolpho Augusto. História da Viação Pública de S. Paulo. São Paulo, Vanorden, 1903, p. 7.
Arquitetura Industrial no Bairro da Mooca: Análise e Diretrizes de Intervenção na Alpargatas.
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produção, impulsionaram melhorias e ampliações das instalações portuárias por onde
também chegavam algumas matérias primas importadas de que a indústria necessitava.
Dessa forma, o comércio do café custeou boa parte da infra-estrutura necessária para que
a manufatura nacional pudesse se estabelecer”.
17
A primeira ferrovia a cortar o planalto foi a São Paulo Railway (que mais tarde passaria
a se chamar Estrada de Ferro Santos-Jundiaí), que iniciou as atividades em toda sua extensão no
dia 16 de fevereiro de 1867, levando para o porto de Santos a produção agrícola e trazendo para
o planalto os imigrantes e todo o tipo de produtos manufaturados produzidos na Europa.
Seguiram-se várias linhas, a exemplo daquelas estabelecidas pela companhias Paulista, Mogiana
e Sorocabana, ainda nos anos 1870-1880.
18
Além de ter consolidado a cidade de São Paulo como a metrópole do café, Ernani Silva
Bruno mostra como a passagem da rede ferroviária valorizou certas áreas de várzea até então
desprezadas, fazendo com que nas décadas seguintes se edificassem nessas terras as primeiras
indústrias e bairros operários em São Paulo:
“A condição de metrópole do café, consolidada pela cidade de São Paulo
aproximadamente nas três últimas décadas do oitocentismo e nas duas primeiras do século
XX, se refletia através de traços particularmente sensíveis na transformação e no
17
RUFINONI, Manoela Rossinetti. Preservação do patrimônio industrial na cidade de São Paulo. São Paulo,
FAUUSP, Dissertação de Mestrado, 2004, p. 33.
18
Sobre o estabelecimento das linhas ferroviárias no Estado de São Paulo, ver o pioneiro e estudo de PINTO, op.
cit., e também o consagrado texto de MATOS, op. cit. No que respeita especificamente à São Paulo Railway, ver:
CYRINO, Fábio R. Pedro. Ferro e Argila. A História da Implantação e Consolidação da Empresa The San Paulo
Railway Company Ltd. através da Análise de sua Arquitetura. São Paulo, Landmark, 2004; MAZZOCO, Maria Inês
Dias; SANTOS, Cecília Rodrigues dos. De Santos a Jundiaí: Nos Trilhos do Café com a São Paulo Railway. São
Paulo, Magma, 2005. Sobre a Companhia Paulista e bibliografia complementar, ver: KÜHL, Beatriz Mugayar.
Arquitetura do Ferro e Arquitetura Ferroviária em São Paulo: Reflexões sobre a sua Preservação. São Paulo,
Ateliê-FAPESP, 1998; POZZER, Guilherme Pinheiro. A Antiga Estação da Companhia Paulista em Campinas:
Estrutura Simbólica Transformadora da Cidade (1872-2002). Campinas, UNICAMP, Dissertação de Mestrado,
2007. Sobre a Mogiana, ver: FRANCISCO, Rita de Cássia. As Oficinas da Companhia Mogiana de Estradas de
Ferro: Arquitetura de um Complexo Produtivo. São Paulo, FAUUSP, Dissertação de Mestrado, 2007. Sobre a
Sorocabana, ver: Sorocabana. Uma Saga Ferroviária. São Paulo, Dialeto, 2001.
Arquitetura Industrial no Bairro da Mooca: Análise e Diretrizes de Intervenção na Alpargatas.
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engrandecimento de suas atividades comerciais e industriais”.
19
São Paulo passa então por um período de crescimento e desenvolvimento nunca antes
visto. A cidade de taipa que pouco havia crescido para além do triângulo histórico, como relatam
diversos viajantes, dava lugar a uma nova cidade, com novas necessidades e novos gostos,
construída em alvenaria de tijolos com a ajuda dos imigrantes.
20
Como pode ser observado na Planta Geral da Cidade de São Paulo, de 1881, a cidade
começara a ter uma significativa expansão em direção a oeste, onde a aristocracia do café
procurava áreas afastadas e exclusivas; e também em direção a leste, para além do Tamanduateí,
onde se pode perceber a formação de um pequeno núcleo na região do Brás e a existência da Rua
da Mooca, ainda pouco ocupada.
Alfredo Moreira Pinto destaca que por volta de 1870, a cidade de São Paulo era uma
“pobre aldeia, completamente segregada do Rio de Janeiro”.
21
Bairros como o Brás, a Mooca e
o Pari não passavam de insignificantes povoados com algumas casas de sapê, que a medo
erguiam-se no meio de espessos matagaes.”
22
Passados trinta anos, aquela cidade puramente
19
BRUNO, Ernani Silva. Histórias e Tradições da cidade de São Paulo. São Paulo, Hucitec, 1984, ed. facsimilar a
partir da 2° ed. de 1954, v.3, p. 1131.
20
A respeito da participação dos imigrantes na arquitetura produzida em são Paulo durante esse período, Benedito
Lima de Toledo lembra que rios profissionais estrangeiros tinham posições de destaque e em seus trabalhos,
freqüentemente, se revelava a origem desses profissionais. Mesmo os arquitetos brasileiros tinham formação no
exterior, como, por exemplo, Otaviano Pereira Mendes, formado em Cornell, e Ramos de Azevedo, formado na
lgica. Ver: TOLEDO, Benedito Lima de. Victor Dubugras e as atitudes de inovação em seu tempo. Tese (Livre
Docência), São Paulo, 1985. Ainda sobre a arquitetura produzida em São Paulo nesse período ver: TOLEDO,
Benedito Lima de. São Paulo: três cidades em um século. São Paulo, Duas Cidades, 1983; e LEMOS, Carlos A. C..
Ecletismo em São Paulo. In: FABRIS, Annateresa (org.). Ecletismo na Arquitetura Brasileira. São Paulo, Nobel,
1987.
21
PINTO, Alfredo Moreira, A cidade de o Paulo em 1900. Impressões de viagem. Rio de Janeiro, Imprensa
Nacional, 1900, p. 7.
22
Idem, p. 8.
Arquitetura Industrial no Bairro da Mooca: Análise e Diretrizes de Intervenção na Alpargatas.
Wayne Almeida de Sousa 18
Arquitetura Industrial no Bairro da Mooca: Análise e Diretrizes de Intervenção na Alpargatas.
Wayne Almeida de Sousa 19
paulista” de 1870, havia se transformado em uma “cidade italiana.”
23
Assim como Alfredo Moreira Pinto, outros autores também chamam a atenção para a
grande quantidade de imigrantes italianos que vieram para São Paulo nesse período. Mino Carta,
em seu livro sobre histórias do bairro da Mooca, faz uma breve descrição da distribuição dos
imigrantes italianos por alguns bairros de São Paulo, inclusive na própria Mooca.
“Já no início do século, havia 800 mil italianos no Brasil, e na Mooca eram,
sobretudo campanos, enquanto a maioria no Bexiga era calabresa, e no Brás, se dava
muita mistura, sendo que os pugliesi, originários de boa parte de San Polignano al Mare e
chamados mais comumente de bareses, se concentravam nas proximidades do Mercado
Municipal.”
24
Segundo Dalva Elias Thomaz Silva, os primeiros cinco imigrantes italianos chegaram a
São Paulo no ano de 1874, “para em 1877 ser acrescidos de mais de dois mil dos treze mil que
entram no Brasil, e a partir daí, exceder notavelmente o número de portugueses.” Citando o
Boletim do Departamento de Imigração e colonização da Secretaria da Agricultura do Estado de
São Paulo v. 5 de 1950, a autora destaca que no período de 1890 a 1909 entraram no Estado de
São Paulo 604.877 italianos, 175.518 espanhóis, 116.108 portugueses e 815 japoneses.
25
Dentre esses italianos, grande parte dos que chegavam para trabalhar nas lavouras eram
provenientes do sul da Itália. Os provenientes do norte preferiam se dedicar a atividades urbanas
como, por exemplo, a instria e o comércio, ou eram pintores, pedreiros, marceneiros, ferreiros,
sapateiros, construtores, etc. Outro fator que contribuiu para o aumento da população nas cidades
23
Idem, p. 9.
24
CARTA, Mino. Histórias da Mooca (com a bênção de São Gennaro), Rio de Janeiro, Berlendis & Vertecchia
Editores, 1982, p. 35.
25
SILVA, op. cit, p. 42.
Arquitetura Industrial no Bairro da Mooca: Análise e Diretrizes de Intervenção na Alpargatas.
Wayne Almeida de Sousa 20
foi a fato de que os colonos depois que cumprissem suas obrigações no campo estavam livres
para se mudar para as cidades.
É nesse momento que alguns bairros próximos ao centro começam a se destacar pela
intensa concentração de atividades ligadas à industria como, por exemplo, Pari, Belém, Brás e
Mooca. Inicialmente distrito do Brás, o bairro da Mooca logo começa a receber uma série de
indústrias que, além de transformarem o bairro, participaram diretamente do desenvolvimento da
Cidade de São Paulo.
Dentre os edifícios indústrias que se instalaram no bairro da Mooca, no período que
compreende as últimas décadas do século XIX e primeiras décadas no século XX, na região
próxima à Alpargatas, destacam-se como conjuntos de grande interesse arquitetônico: a
cervejaria Bavária, por volta de 1890; o Cotonifício Crespi, 1897;
26
os Armazéns Gerais
Piratininga, por volta de 1912; os Armazéns Ernesto de Castro, de 1918; o Moinho Gamba,
década de 1920; os Armazéns das Indústrias Reunidas Francisco Matarazzo, de 1927/29.
Esses conjuntos aparecem no levantamento de Galpões Industriais Significativos que
foi realizado pela Empresa Municipal de Urbanização – EMURB
27
na década dos anos de 1970
e também no levantamento realizado entre os anos de 2003 e 2004 por Manoela Rossinetti
Rufinoni para sua dissertação de Mestrado, em que faz uma detalhada descrição do estado de
26
Ernani Silva Bruno, em seu clássico livro Histórias e Tradições da Cidade de São Paulo, faz uma importante lista
das primeiras indústrias que se instalaram na cidade de São Paulo. Em sua dissertação de Mestrado, Manoela
Rossinetti Rufinoni fez uma tabela das indústrias que se instalaram nos bairros da Mooca e do Brás durante esse
período, baseada na tabela elaborada anteriormente por Margarida Maria de Andrada em sua obra Bairros além do
Tamanduateí: O imigrante e a fábrica no Brás, Moóca e Belenzinho. Tese de doutorado. São Paulo, FFLCH/USP,
1990. Ver: RUFINONI, op. cit, p. 47.
27
Galpões Industriais Significativos. São Paulo, EMURB, s.d.
Arquitetura Industrial no Bairro da Mooca: Análise e Diretrizes de Intervenção na Alpargatas.
Wayne Almeida de Sousa 21
conservação desses edifícios naquele momento. A seguir serão apresentados alguns dados sobre
esses conjuntos.
A fábrica de cerveja Bavária, inaugurada em 1892, aparece no levantamento da
EMURB como sendo de propriedade da Cia Antarctica Paulista e em bom” estado de
conservação. Com uma área aproximada de 25.432 m² para o depósito de bebidas e 156.868 para
os gales e indústria de bebidas, sofreu poucas modificações ao longo do tempo.
O Cotonifício Rodolfo Crespi, localizado no quarteirão formado pelas Ruas Javari,
Taquari, dos Trilhos e Visconde de Laguna, ocupa uma área de aproximadamente 25.000 m², e,
segundo o levantamento da EMURB, se encontrava em “bom/médioestado de conservão. O
cotonifício foi fundado em 1897 pelos imigrantes italianos Rodolfo Crespi e Pietro Regoli com o
nome original de Regoli, Crespi & Cia, quando é constrdo o primeiro edifício do conjunto,
voltado para a Rua Visconde de Laguna. No ano de 1906, a empresa passa a se chamar Rodolfo
Crespi & Cia; e ,em 1909, se torna a Sociedade Anônima Cotonifício Rodolfo Crespi.
28
No
ano de 1910, o conjunto recebe a primeira ampliação nos terrenos voltados para a Rua Javari. O
principal edifício do conjunto, localizado na esquina das Ruas Javari e Taquari, foi construído
em 1920, pelo arquiteto italiano Giovanni Battista Bianchi. Por volta dos anos de 1950, a fábrica
começa a entrar em decadência, encerrando suas atividades no início da década de 1960, quando
os edifícios do conjunto o alugados para os mais diversos usos, sendo o mais invasivo deles a
transformação do conjunto em supermercado, no ano de 2005.
As ser alugado para o grupo Pão de Açúcar, o conjunto teve apenas duas fachadas
preservadas e todo seu interior demolido, afim de melhor adequá-lo ao novo uso. Um dos
28
RUFINONI, op. cit, p. 93.
Arquitetura Industrial no Bairro da Mooca: Análise e Diretrizes de Intervenção na Alpargatas.
Wayne Almeida de Sousa 22
argumentos utilizados para justificar tal demolição foi o fato da modulação dos pilares de aço
o se adequarem ao tamanho das gôndolas, quando a lógica da preservação deveria ser inversa,
as gôndolas deveriam se adaptar ao edifício.
29
Os Armazéns Ernesto de Castro aparecem no levantamento da EMURB como sendo
depósitos de produtos alimentícios de propriedade de Jo Alves Veríssimo Comércio e
Importão. Situados no número 81 da Rua André Leão e projetados por Ricardo Severo e
Ramos de Azevedo, ocupam uma área aproximada de 8.100 m². Os Armazéns foram construídos
no ano de 1918 para Ernesto de Castro, proprietário da Casa Ernesto de Castro, sócio e genro de
Ramos de Azevedo.
30
Os primeiros edifícios do conjunto dos Armazéns Piratininga, localizados entre as Ruas
da Mooca, Palmorino Mônaco e Avenida Alcântara Machado, ocupam uma área de
aproximadamente 10.100 e foram constrdos por volta de 1912 por encomenda dos Irmãos
Calfat e projeto de Victor Dubugras. Os edicios desse conjunto sofreram diversas intervenções
ao longo dos anos, alguns deles continuam sendo utilizados para estocagem, enquanto outros
receberam usos diferentes como, por exemplo, espaço para eventos.
O conjunto localizado na Rua Borges de Figueiredo, com uma área total aproximada de
45.000 m², de propriedade dos Moinhos Gamba, Grandes Indústrias Minetti-Gamba a partir de
1934, era utilizado para moagem do trigo, produção de sabão e óleo vegetal.
31
Esse conjunto foi
sendo desmembrado ao longo dos anos e cada edifício recebeu um tipo de uso diferente como,
por exemplo, estacionamento e casa noturna.
29
KÜHL, Beatriz Mugayar. Preservação do Patrimônio Arquitetônico da Industrialização: Problemas Teóricos do
Restauro. São Paulo, FAUUSP, Tese de Livre Docência, 2006, p. 178.
30
Idem, p. 80.
31
Idem, p.99.
Arquitetura Industrial no Bairro da Mooca: Análise e Diretrizes de Intervenção na Alpargatas.
Wayne Almeida de Sousa 23
Os Armazéns das IRF Matarazzo, localizados na Rua Borges de Figueiredo, aparecem
no levantamento da EMURB como sendo de propriedade da CEAGESP. Durante a Iniciação
Científica e o Trabalho Final de Graduação,
32
foram estudados alguns desses galpões
localizados nos números 1098, 1110, 1120, 1132, 1144, 1156, 1168 e 1180. Esse conjunto
formado por oito galpões, três construídos no ano de 1927 e os outros cinco no ano de 1929, tem
cada um 11 metros de frente por 64 de profundidade, totalizando aproximadamente 6.000 m².
Construídos originalmente em alvenaria de tijolos para estocagem de café, esses gales estavam
em bom estado de conservação durante o levantamento realizado para o TFG, e tinham sofrido
pequenas modificações ao longo dos anos, principalmente, troca de elementos da cobertura e
abertura nas fachadas para facilitar a entrada de veículos maiores. Esses galpões estão
abandonados desde a década dos anos de 1980.
32
A Iniciação Científica, realizada com financiamento FAPESP no ano de 2003, e o Trabalho Final de Graduação
para o curso de Arquitetura e Urbanismo da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de o Paulo
(FAU-USP), realizado no ano de 2004, ambos sob orientação da Prof. Dra. Beatriz Mugayar hl, serão descritos
detalhadamente no Segundo Capítulo desse trabalho.
Arquitetura Industrial no Bairro da Mooca: Análise e Diretrizes de Intervenção na Alpargatas.
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Arquitetura Industrial no Bairro da Mooca: Análise e Diretrizes de Intervenção na Alpargatas.
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1.3. Notas Sobre a Industrialização do Bairro da Mooca.
A dinâmica econômica impulsionada pelo café, como exposto por Warren Dean, foi
também marcada, numa primeira fase, por um comércio de importações dominado pelos
imigrantes, dada a restrita vida urbana da sociedade paulista da época e os contatos que esses
imigrantes tinham na Europa. A preponderância dos artigos importados foi apenas uma das
conseqüências do rápido crescimento do comércio de exportação do café, sendo que o setor
industrial era ainda incipiente.
33
Por esse motivo, percebe-se que entre os primeiros industriais
brasileiros, muitos iniciaram suas atividades como negociantes-importadores.
34
Dentre eles
aparecem figuras de importância fundamental para a futura transformação de o Paulo como,
por exemplo, Egydio Gamba, Ernesto Diederischen, Francisco Matarazzo e Rodolfo Crespi,
citados por Mino Carta:
“Matarazzo veio com um estoque de banha, em 1881, abriu uma casa de comércio
em Sorocaba e a partir daí criou o maior complexo industrial da América do Sul (...).
Conquistou as simpatias do diretor do British Bank of South America e conseguiu
financiamento para construir um moinho em São Paulo, em 1900. Ele próprio virou
banqueiro, abriu um cotonifício para fazer os sacos da sua farinha, estampou tecidos,
descaroçou algodão comprado na rama, produziu sabão e glicerina, comprou navios para
transportar as matérias primas de seus negócios crescentes e atracou-os no cais que ele
próprio construíra. Colheu o êxito em inúmeros ramos, desde conservas até gado de corte,
produziu engradados, açúcar, carne e couro.”
35
“(...) era um homem grande e forte que deu para raspar a cabeça a navalha ao lhe
ralearem os cabelos, e a sua calva iluminava as ruas da Mooca, quando visitava a sua
fábrica de óleos na Borges de Figueiredo, e outros cantos da cidade, inclusive as calçadas
33
DEAN, Warren, A industrialização de São Paulo (1880-1945). São Paulo, Difel, s.d., p. 11.
34
Idem, p. 36.
35
CARTA, op. cit, p. 68.
Arquitetura Industrial no Bairro da Mooca: Análise e Diretrizes de Intervenção na Alpargatas.
Wayne Almeida de Sousa 26
da avenida Paulista, pelas quais passeava, depois do jantar, fumando charutos, e as
reuniões do Centro das Indústrias de Fiação e Tecelagem, que mandava na economia de
São Paulo e do Brasil.”
36
“Rodolfo Crespi, contador formado era piemontês e veio para o Brasil em 1893
como vendedor de uma companhia de Milão, de tecelagem e exportação, na esteira do
irmão Giovanni, que se tornara sócio de ricos brasileiros na fábrica de tecidos Labor.
Rodolfo casou-se com Marina Regoli, filha de um comerciante de tecidos, e com este abriu
um restaurante na praça da Sé, onde, segundo a lenda, foi pago por um freguês de contas
atrasadas, com um tear usado, semente do cotonifício que marcaria profundamente a vida
da Mooca. Como marcariam os moinhos Gamba, a Tecelagem Três Irmãos Andraus, a
Clark, a Antártica, e também indústrias mais recentes, como a São Paulo Alpargatas, o
Frigorífico Anglo, a Fulgor, a União Refinadores, a Máquinas Piratininga e outras mais.”
37
Mesmo com a importante participação dos industriais ligados ao ramo das importões,
o café foi desde o princípio a base do crescimento industrial nacional e “custeou também grande
parte das despesas gerais, econômicas e sociais, necessárias a tornar proveitosa a manufatura
nacional.”
38
Isso aconteceu porque o crescente mercado cafeeiro exigia uma série de outros
empreendimentos paralelos, como destaca Dalva Elias Thomaz Silva:
“A cultura cafeeira exigia para sua produção e comercialização um sistema de
articulação que formou o chamado “complexo cafeeiro”, e as medidas exigidas por este
complexo fizeram com que o capital gerado pelo café fosse reinvestido em outros setores
fora da lavoura, mas vinculado a ela, tais como: a construção das estradas de ferro, a
criação de casas comissárias para exportação e a criação de um sistema bancário. Além
disso, possibilitou a monetarização da economia e a divisão social de classes: a
36
Idem, p. 68.
37
Idem, p. 70.
38
DEAN, op. cit, p. 14.
Arquitetura Industrial no Bairro da Mooca: Análise e Diretrizes de Intervenção na Alpargatas.
Wayne Almeida de Sousa 27
apropriação dos meios de produção por uma camada e a manutenção da força de
produção por outra camada social.”
39
É nesse momento, final do século XIX e início do século XX, que o processo de
industrialização se intensifica em São Paulo, como enfatizado no incontornável estudo de
Richard Morse:
“A concentração industrial de São Paulo começou a efetivar-se pouco antes de
1890, na época precisa em que pela primeira vez assumiram caráter agudo o crescimento
da população e a expansão física da cidade.”
40
Começam então a aparecer cada vez mais registros de novos estabelecimentos fabris.
Ernani Silva Bruno
41
destaca uma série de anúncios em almanaques da época que apontam uma
“multiplicação das fábricas de carruagens, das cocheiras e das oficinas de ferradores”. Em um
almanaque de 1888 registrava-se “as fábricas de carros e seges de Alberto Buhler e Cia, na Rua
25 de Março; a de Campos e Irmão Carroçaria Parisiense – no Largo de São Francisco; a de
J. Hinze, na Rua do Riachuelo”. Bruno ainda comenta que o Almanaque Paulista Ilustrado de
1896 menciona a existência de três fábricas de carros na cidade: as de Alberto Buhler & Pfing; a
de João Hinze e a de Rodovalho & Cia, esta na Rua da Mooca.
Bandeira nior, em seu pioneiro e fundamental estudo sobre a instria no Estado de
São Paulo, compara São Paulo com os outros Estados da República e afirma “ser ele o único que
mantém estabelecimentos fabris em todos os ramos, sendo que alguns deles só aqui existem. Não
39
SILVA, op. cit, p. 36.
40
MORSE, Richard M.. Formação Histórica de São Paulo (de comunidade a Metrópole). São Paulo, difusão
Européia do Livro, 1970, p?.
41
BRUNO, op. cit, p. 1069.
Arquitetura Industrial no Bairro da Mooca: Análise e Diretrizes de Intervenção na Alpargatas.
Wayne Almeida de Sousa 28
somente tratando-se de todo o Brasil, como também da América do Sul.
42
“A distribuição espacial das indústrias em 1901, além de evidenciar o aumento de
estabelecimentos no centro da cidade, aponta o avanço pelas terras ao longo das ferrovias
(...). Os novos bairros formados nas proximidades das ferrovias são escolhidos para
abrigar a expansão da indústria: Brás, Mooca e Belenzinho, na região Leste; Bom Retiro,
Barra Funda e Água Branca, para norte e nordeste. Neste momento, portanto, observamos
o início da grande transformação desses arredores em bairros marcadamente industriais e
operários; extensas áreas ainda não urbanizadas começam a ser ocupadas dando
prosseguimento a compartimentação das propriedades rurais que se observava desde
finais do século XIX.”
43
O processo de desmembramento das grandes chácaras existentes ao redor da Cidade de
São Paulo, que se acentuou entre o final do século XIX e início do XX, foi simultâneo ao início
da industrialização e disponibilizou grandes áreas próximas ao centro e à rede ferroviária para a
instalação de novos usos, muitos deles industriais, em um momento que São Paulo passava por
um crescimento extraordinário.
“com a Proclamação da República quase todos os donos de chácaras antigas
dos bairros de Santa Efigênia, Bom Retiro, Brás, Consolação, Liberdade e Cambuci,
mandaram abrir ruas, avenidas, alamedas e largos em suas terras. Não desses
bairros, podia-se dizer, mas também do Higienópolis, Avenida Paulista, Mooca, Pari,
Ipiranga, Barra Funda e Água Branca, onde enormes áreas descampadas foram
recebendo arruamento e loteação”.
44
Essa expansão da Cidade nas áreas próximas à ferrovia pode ser observada na Planta da
Cidade de São Paulo de 1895, onde aparecem muitos dos novos loteamentos que se formaram
42
BANDEIRA JUNIOR, A indústria no estado de São Paulo em 1901. São Paulo, Diário Oficial, 1901.
43
RUFINONI, op. cit, p. 35.
44
BRUNO, op. cit, p. 1027.
Arquitetura Industrial no Bairro da Mooca: Análise e Diretrizes de Intervenção na Alpargatas.
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Arquitetura Industrial no Bairro da Mooca: Análise e Diretrizes de Intervenção na Alpargatas.
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a partir do desmembramento das chácaras. O “cinturão de chácaras
45
, além de ter sido
penetrado pela extensão da cidade e de abrigar as primeiras fábricas, passou a acolher tamm
estabelecimentos de uso especial que necessitavam de grandes áreas como, por exemplo, o
Hidromo da Mooca, inaugurado em 1876 e a Hospedaria dos Imigrantes, inaugurada entre
1886 e 1888. Esse período de desmembramento das chácaras e início de ocupação da várzea
marcou profundamente o bairro da Mooca, tamm narrada pela saborosa prosa de Mino Carta:
“E mais de um século se escoara desde a época em que, em uma fazendo do alto da
Mooca, Rafael Aguiar Paes de Barros, urfman e grand-seigneur, desses da aristocracia
paulista que, ao viajarem a Paris, levavam vacas para garantia do seu abastecimento de
leite indiscutivelmente fresco, começara a criar puro-sangues importados da Inglaterra e
da França, preparando-os para as corridas do Hipódromo, primeiro Jóquei da cidade,
fundado em território mooquense em 1876. (...) O trem e os cavalos do Hipódromo
convocaram a cidade, com diversos apelos, para as áreas alagadiças situadas além do
Tamanduateí, ainda pouco tempo antes navegável. Contra as corridas do Jóquei,
propiciadoras de diversão e paixão nos fins de semana, mais valeu a potência das maria-
fumaças, cuja presença determinaria ali o nascimento da primitiva indústria paulistana.”
46
“por causa do hipódromo, surgiu uma linha de bonde a tração animal, linha Centro
- Mooca, e logo os quadrúpedes perderam a parada, obrigados à retirada pelo avanço de
um ramal da São Paulo Railway, a se esticar por uma rua que, logicamente, haveria de
chamar-se dos Trilhos.”
47
“os senhores do café, no fim do século passado, saíam das suas mansões do Campos
Elíseos, Vila Buarque, de Higienópolis, e iam de carroça ao Hipódromo da Mooca.
Depois, quando a São Paulo Railway construiu um ramal que, ao chegar à altura da atual
Radial Leste, se desviava para a esquerda e seguia pela rua dos Trilhos até a Bresser, os
45
LANGENBUCH, op. cit, p. 81.
46
CARTA, op. cit, p. 10.
47
Idem, p. 12.
Arquitetura Industrial no Bairro da Mooca: Análise e Diretrizes de Intervenção na Alpargatas.
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senhores passaram a freqüentar outro trajeto e a misturar diferentes meios de locomoção.
E iam de carroças até a estação da Luz, e de trem, dali até o destino.”
48
Além das indústrias, a ocupação dos terrenos ao longo das ferrovias
49
também atraiu os
operários que, em um primeiro momento, se instalaram próximos aos seus locais de trabalho.
Isso fez surgir um grande número de vilas operárias na região, sendo que as mais importantes
estavam localizadas à direita do Tamanduateí como, por exemplo, a Vila Maria Zélia, no Belém,
a vila das fábricas de Francisco Matarazzo no Brás, e a vila do Cotonifício Crespi, na Mooca.
50
Bandeira Junior comenta que no ano de 1901, o corpo de operários no Estado de São
Paulo “eleva-se a número superior a cincoenta mil entre homens, mulheres e crianças, quase em
sua totalidade italianos, e “os bairros em que mais se concentram, por serem os que contêm
maior número de fábricas, são os do Brás e do Bom Retiro.”
51
O autor ainda chama a atenção
para a qualidade de vida em alguns desses bairros operários, as casas são infectas, as ruas,
na quase totalidade, não são calçadas, falta de água para os mais necessários misteres,
escassez de luz e de esgotos.”
52
A diminuição de disponibilidade de terrenos e a crescente valorização das áreas junto
às indústrias obrigam os operários a se estabelecerem próximos às estações ferroviárias cada
vez mais afastadas do centro. Ernani Silva Bruno destaca que “ao longo das ferrovias e suas
48
Idem, p. 67.
49
Rufinoni destaca que “durante a primeira década do século XX, as edificações fabris concentraram-se nas
proximidades da via férrea ou de ramais secundários co mo aquele que percorria a atual rua dos Trilhos em
direção ao Hipódromo. A continuação desta tendência nas décadas que se seguiam, ocasionou a formação de
extensos aglomerados de edificações industriais.” Ver: RUFINONI, op. cit, p. 40.
50
Idem, p. 45.
51
BANDEIRA JUNIOR, op. cit.
52
Idem, p?.
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imediações era natural que se estabelecessem os bairros operários: Ipiranga, Cambuci,
Mooca, Brás, Pari, Luz, Bom Retiro, Barra Funda, Água Branca, Lapa.”
53
“As margens das ferrovias passaram a constituir o sítio específico mais procurado,
consolidando-se uma tendência que, como vimos, já existia. Destaca-se neste particular a
ferrovia Santos Jundiai, notadamente o trecho Mooca – Barra Funda, e a Sorocabana entre a
estação central e a da Barra Funda, onde as indústrias se adensaram. Nesta faixa se
estabeleceu, por exemplo, a fábrica de sapatos “Clarck Limited” na Mooca, com 300 operários
no ano de 1909.
54
As vésperas da Primeira Grande Guerra a expansão da cidade de São Paulo se acentua,
e bairros como Brás e Mooca se definem cada vez mais como bairros industriais de influência
dos italianos, que foram os grandes promotores da dinamização da atividade industrial e
urbana em São Paulo.”
55
“Como ‘capitães de indústria’ montaram as primeiras indústrias, e como operários,
constituíram a base do desenvolvimento econômico. Enquanto o poderio dos primeiros se
ditava, o dos segundos se reduzia, e o ambiente urbano assim o expressava: a Avenida
Paulista urbanizada pelas formas mais variadas de palacetes, e o Brás adensado pelas
mais humildes casas geminadas.”
56
Não se sabe exatamente a data de fundação do bairro da Mooca. Mino Carta destaca a
existência de dois documentos que se referem a esse tema, um deles assinala a existência do
Bairro da Mooca já no ano de 1898, enquanto outro, de 1896, ao falar da mesma área refere-se a
53
BRUNO, op. cit, p, v. 3, p. 1032.
54
Idem, p. 87.
55
SILVA, op. cit, p. 47.
56
Idem, p. 47.
Arquitetura Industrial no Bairro da Mooca: Análise e Diretrizes de Intervenção na Alpargatas.
Wayne Almeida de Sousa 34
uma Vila Figueiredo, freguesia do Brás.
57
Devido à proximidade e semelhança entre os seus habitantes, sempre foi muito difícil
separar os bairros do Brás e da Mooca, que se formaram a partir de dois antigos caminhos que
rumavam leste para além do Tamanduateí: um que passava pela Rua do Carmo, Tabatinguera e
seguia pela atual Rua da Mooca, conhecido como caminho da Mooca; e o outro, conhecido como
caminho do Brás, que passava pela atual Avenida Rangel Pestana e seguia para o Rio de Janeiro
passando pela Penha e pelo Vale do Paraíba.
58
Apesar dessa semelhança, o bairro do Brás sempre teve uma população maior que o
bairro da Mooca, por ter concentrado desde cedo indústrias em seu território. se pode dizer
que houve uma verdadeira separação entre esses bairros anos depois, com a construção do Met
e da Avenida Alntara Machado, mais conhecida como Radial Leste.
Afonso Moreira Pinto, retornando à cidade de São Paulo no ano de 1900, faz um relato
importante sobre a população do bairro do Brás, dizendo que “para quem desembarca na
estação Norte, da Estrada de Ferro Central do Brazil, o aspecto da cidade não impressiona
bem. Com efeito, o viajante depara logo com o Brás, arrebalde muito populoso, mas que não
prima pelo asseio, nem pela belleza de seus predios particulares; depois passa por uma extensa
várzea, muito maltratada, da qual avista a cidade em um alto com os fundos das casas voltadas
para os viajantes.”
59
Por “várzea maltrada” ele provavelmente se refere à rzea do rio Tamanduateí, onde
57
CARTA, op. cit, p. 39.
58
VITORINO, op. cit, pp. 28-30.
59
PINTO, A.M., op. cit, p. 24.
Arquitetura Industrial no Bairro da Mooca: Análise e Diretrizes de Intervenção na Alpargatas.
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se instalou a São Paulo Railway. Além de contar com a ferrovia, os bairros da Mooca e do Brás
dispunham de grandes áreas planas, pouco ocupadas pela cidade e com valor comercial baixo, o
que atraiu rapidamente as indústrias, que ainda podiam solicitar desvios ferroviários para
facilitar o escoamento da produção.
60
Além da proximidade com a citada Hospedaria dos Imigrantes, o bairro do Brás
sempre atraiu um grande número de imigrantes pela facilidade de transporte proporcionada pela
ferrovia, numerosas oportunidades de trabalho geradas pela instalação das primeiras indústrias
na região e o baixo preço dos terrenos, que eram considerados insalubres pela população de
maior renda devido às constantes inundações.
61
Mesmo antes da instalação da ferrovia se observa a instalação de pequenas indústrias
familiares na região.
62
Alfredo Moreira Pinto lista detalhadamente os estabelecimentos
industriais que se haviam estabelecido no bairro do Brás até o ano de 1900, incluindo tanto as
grandes indústrias, quanto as pequenas indústrias familiares. São elas duas (fábricas) de fumos,
quatro de moveis, uma de massas, uma de chocolate, duas de cerveja (inclusive a da Bavária),
seis de café, fubá, etc., uma de velas e sabão, três de bebidas, três de ferro e bronze, duas de
ferro, uma de peneiras, uma de machinas para lavoura, uma de carruagens, uma de funileiro,
uma de assucar e alcool (Companhia Industrial de S. Paulo), uma de catoeiros, uma officina
mechanica e uma serraria.”
63
Devido à proximidade entre esses dois bairros é certo que algumas dessas indústrias se
60
RUFINONI, op. cit, p. 19.
61
REALE, Ebe. Brás, Pinheiros, Jardins: três bairros, três mundos. São Paulo, EDUSP/Pioneira,1982.
62
ANDRADE, Maria Margarida de, Bairros além tamanduateí: o imigrante e a fábrica no Brás, Mooca e
Belenzinho. São Paulo, FFLCH/USP, Tese de Doutorado, 1991, p. ?.
63
PINTO, A.M., op. cit, p. 223.
Arquitetura Industrial no Bairro da Mooca: Análise e Diretrizes de Intervenção na Alpargatas.
Wayne Almeida de Sousa 37
localizassem no bairro da Mooca como, por exemplo, a Cervejaria Bavária, inaugurada em
Outubro de 1892 na Alameda Bavária, que a partir de 1912 passou a se chamar Avenida
Presidente Wilson. Mais tarde adquirido pela Antarctica, esse complexo chamava muita atenção
pelo seu tamanho e pela sua localização, em uma área de rzea ainda pouco ocupada e próxima
a ferrovia Santos - Jundi.
A partir da primeira década do século XX a industrialização se intensifica,
principalmente, nas áreas de várzea, significando mais do que apenas a mudança de um espaço,
significou também a transformação da paisagem, do tempo e da vida.
64
Fernando de Pádua
Laurentino destaca o contraste existente nesses bairros nas últimas décadas do século XIX e
início do século XX, quando o ambiente quase rural começa a se urbanizar, cedendo espaço para
as indústrias: “A ruralidade vai perdendo a sua força à medida que a cidade se industrializava.
A industrialização, num processo muito rápido, destrói os ritmos e as atividades de conotação
rural que permeavam a cidade, porque esta se torna locus da produção e reprodução dentro da
lógica capitalista.”
65
Pasquale Petrone continua:
“Dentro do perímetro urbano em zonas como o Brás, a Mooca e o Belenzinho quase
sempre térreas e sem nenhum jardim à frente, geralmente geminadas (duas a duas, quatro
a quatro), todas mais ou menos iguais, de estilo pobre ou indefinível. Estendem-se assim,
em sua monotonia e em sai humildade, em filas intermináveis, que chegam a ocupar
quarteirões inteiros. No meio delas, porém, surgem de quando em vez a pesada e
característica fachada de uma fábrica ou, então, pequenas oficinas ou fabriquetas. Estas
são muito numerosas aparecendo instaladas numa casa igual às demais em antigas
64
LAURENTINO, Fernando de Pádua, Várzea do Tamanduatei: industrialização e desindustrialização. São Paulo,
Dissertação (Mestrado) FFLCHUSP, 2002, p. 68.
65
Idem, p. 83.
Arquitetura Industrial no Bairro da Mooca: Análise e Diretrizes de Intervenção na Alpargatas.
Wayne Almeida de Sousa 38
garagens, em barracões ou simples telheiros, no fundo de quintais. as fábricas maiores
se destacam, quando não por suas chaminés, pelo menos pela grande extensão de suas
fachadas e seu amplo portão de entrada”.
66
Mesmo com a instalação das grandes indústrias nos bairros do Brás e da Mooca, esses
bairros nunca concentraram a riqueza nem tiveram moradores que fizeram parte da elite da
cidade, sempre foram bairros de população humilde, em sua maioria, operários das indústrias da
região, como relata Mino Carta:
“Os senhores do café não moravam na Mooca, tampouco os empresários italianos
que se tinham estabelecido no bairro com suas indústrias. Mooca e Brás foram o ABC
pioneiro dos começos do século, e poucos entre seus moradores ficaram ricos, e nenhum
rico a ponto de ganhar entrada no clube fechado dos donos do poder. Geremia Lunardelli,
Dante Ramenzoni e Nicola Scarpa são exemplos raros de imigrantes pobres que fizeram a
América, mas não se tem notícia de que tenham morado na Mooca, assim como Francisco
Matarazzo e Rodolfo Crespi, que chegaram equipados para subir na vida rapidamente,
emblemáticos de uma pequena leva de italianos que desembarcavam com algum dinheiro
no bolso, ou com estoques de mercadorias, ou com a tarefa de instalar uma filial de uma
firma estrangeira.”
67
Devido a essa desigualdade social, muito comum nos bairros operários, desde cedo se
observa a formação de organizações que tentavam melhorar as condições de trabalho e
sobrevivência dos trabalhadores. Nesse sentido, coube aos italianos,
68
que eram a maioria
absoluta dos operários na cidade de São Paulo, organizar e fazer as reivindicações sociais dessa
66
PETRONE, Pasquale. A cidade de São Paulo no século XX, Revista de História, 1955 (ano VI) n. 21 – 22.
67
CARTA, op. cit, p. 40.
68
Para Geni Sugai, “influenciados pelas idéias anarquistas do movimento operário europeu e pela revolução
soviética, os italianos tiveram participação decisiva na greve de 1917, cujas principais movimentações políticas
aconteceram na Mooca, Brás, e Belenzinho, e paralisaram toda capital paulista.” Ver: SUGAI, Geni.
Requalificação de Antigas Áreas Industriais: Novos Significados para o Bairro da Mooca, São Paulo, FAU USP,
Tese de Doutoramento, 2006, p. 64.
Arquitetura Industrial no Bairro da Mooca: Análise e Diretrizes de Intervenção na Alpargatas.
Wayne Almeida de Sousa 39
nova classe que se estava formando. As greves e os boicotes eram as principais ferramentas
desse “sindicalismo revolucionário”:
“Desde os primórdios da produção industrial os operários tentaram se defender dos
abusos do patronato, por meio das suas organizações. No Brasil, o pioneirismo nesta
organização e nas lutas pelas reivindicações sociais coube aos italianos, que constituíam
a base desta nova classe. Muitos deles haviam tomado parte, como operários que eram
em sua pátria, nas lutas sociais do Partido Socialista Italiano e, unindo-se aos poucos
brasileiros empregados na indústria de então, e aos espanhóis, constituíram o primeiro
núcleo de proletários urbanos em busca de uma organização.”
69
Durante esse período aconteceram numerosas greves com respostas, quase sempre,
repressivas. O início da Primeira Grande Guerra Mundial agrava o período de recessão que havia
se iniciado nos primeiros anos da década de 1910. As classes populares foram as mais afetadas,
sofrendo com os efeitos do desemprego e redução salarial, devido à grande oferta de mão-de-
obra e à especulação imobiliária, que elevou consideravelmente os preços das moradias. Esse
quadro só se altera em 1917 com a greve geral que “abre uma nova conjuntura histórica, cujos
limites vão se estender até a década de 20”:
O movimento é marcado pela emergência de um movimento social de base
operária, refletindo-se na realização de grandes manifestações de massa; no avanço da
sindicalização; no aparecimento de uma imprensa operária de maior amplitude e,
principalmente, na expectativa de uma mudança revolucionária do sistema social”.
70
Esse grande movimento operário se inicia logo nos primeiros meses de 1917. Em São
Paulo, o movimento se concentra, principalmente, no ramo têxtil, em que os operários do
69
SILVA, op. cit, p. 49.
70
Idem, p. 50.
Arquitetura Industrial no Bairro da Mooca: Análise e Diretrizes de Intervenção na Alpargatas.
Wayne Almeida de Sousa 40
Cotonifício Crespi reivindicavam aumento de salário e redução da jornada de trabalho.
No dia 9 de julho os piquetes vão da Mooca para o Brás, para a fábrica
Mariângela, a fim de arregimentar os operários para o movimento, conclamando-os a
abandonar o trabalho.
Um tumulto estoura à porta da fábrica e uma tropa armada de rifles da Força
Pública dirige-se para o Brás, avançando violentamente a tiros sobre a massa. feridos
de ambos os lados, em maior proporção entre os operários e, atingido por uma bala,
morre o sapateiro anarquista Antônio Martinez.
No dia 11 de Julho cerca de dez mil pessoas acompanham o cortejo fúnebre que sai
do Brás, da Rua Caetano Pinto, em direção ao cemitério do Araçá. O enterro simboliza a
passagem de uma grande greve para uma paralisação total da cidade de São Paulo.
O maior foco das manifestações, dos choques, da violência da repressão é o Brás,
onde está concentrada a maioria das fábricas e das residências operárias.
“No dia 15 de julho a greve prossegue, mas o comitê operário aceita a proposta dos
patrões e do governo e decide marcar para o dia seguinte três comícios para comunicar
aos operários o resultado das negociações e propor a volta ao trabalho.”
71
Os anos de 1917 a 1920 são marcados pela amplião do movimento operário, período
em que muitas greves foram deflagradas, “incentivadas principalmente pelo aumento do custo
de vida”.
72
A partir da década dos anos de 1920 esse movimento entra em decadência e vemos
cada vez menos manifestações dos trabalhadores. O crescimento industrial então se consolidara
e, aos poucos, São Paulo se torna o maior parque industrial da América Latina.
71
Idem, p. 50-51.
72
VITORINO, op. cit, p. 46.
Arquitetura Industrial no Bairro da Mooca: Análise e Diretrizes de Intervenção na Alpargatas.
Wayne Almeida de Sousa 41
Manoela Rossinetti Rufinoni destaca que a crise econômica no ano de 1929, provocada
pela superprodução de café e a quebra da bolsa de nova York, “marca o fim da supremacia
cafeeira e abre caminho para o desenvolvimento ainda maior da indústria”:
A crise na lavoura provoca uma grande corrente migratória do campo em direção
a São Paulo, aumentando ainda mais a população urbana. A partir de então, cada vez
mais apoiada pelo governo federal, principalmente durante o Estado Novo, a indústria
assume papel de destaque, sendo novamente impulsionada durante a Segunda Guerra
Mundial por motivos análogos ao conflito anterior.”
73
A partir dos anos 50, durante o governo Kubitschek que vai de 1956 a 1961, inicia-se a
era das multinacionais e do rodoviarismo. Com o surgimento desse novo modelo de transporte
baseado nas rodovias e no fortalecimento da instria automobilística, começam a surgir novos
pólos industriais, principalmente, ao longo das rodovias Dutra e Anchieta que foram constrdas
no final da década de 40.
74
Essa opção política do governo faz crescer os investimentos nas rodovias, e o transporte
de mercadorias passa a ser feito principalmente por caminhões.
75
Para Rolnik, essa medida tem
grande impacto sobre as áreas industriais centrais, pois as ferrovias entram em decadência e as
primeiras zonas industriais próximas a ela começam a passar por dificuldades:
“Antes estrategicamente situadas pelo fácil acesso à ferrovia e aos armazéns gerais,
as indústrias do Brás, Mooca, Belém e Pari vêem-se em situação desfavorável em relação
ao sistema rodoviário. As novas indústrias, as mais potentes e aquelas com maior
capacidade de investimentos instalam-se a partir de então nos novos pólos industriais
73
RUFINONI, op. cit, p. 36.
74
LAURENTINO, op. cit, p. 93
75
Idem, p. 93
Arquitetura Industrial no Bairro da Mooca: Análise e Diretrizes de Intervenção na Alpargatas.
Wayne Almeida de Sousa 42
principalmente ABC e Guarulhos, mas também outros bairros mais afastados da Zona
Leste, relacionando não mais com o sistema ferroviário, mas às avenidas e rodovias.”
76
Aos poucos os antigos bairros industriais começam a perder espaço para os novos
empreendimentos ao longo das rodovias, e grandes áreas centrais da Cidade de São Paulo
passam a esvaziar-se. Laurentino, citando uma passagem de Langenbuch, diz que, “as fábricas
mais antigas do eixo industrial de Beira-Linha haviam deixado pouco espaço livre, ocupando a
maior área possível para suas edificações. Dessa forma, sobrou pouco lugar destinado a
posteriores ampliações e a pátios de estacionamento para os automóveis do pessoal, o que hoje
é um complemento quase indispensável às fábricas um pouco maiores, mas que nem sequer era
imaginado por ocasião da pretérita implantação.”
77
“a vantagem de localização próxima à estrada de ferro desaparece e numerosos
ramos industriais passam a preferir as rodovias. Além disso, as fábricas, situadas em
áreas industriais antigas e à margem de ferrovia, que precisam enviar ou receber
mercadorias transportadas em caminhões, começam a ter prejuízos por estarem instaladas
em áreas com malhas viárias precárias, incompatível e que não foram projetadas para o
trânsito de tais veículos.”
78
Com a transferência de algumas atividades industriais para áreas próximas às rodovias,
houve a subutilização de muitos dos antigos complexos, fazendo com que vastas áreas, antes
associadas às indústrias, ficassem disponíveis para projetos de adensamento, muitas vezes
especulativos, que não levam em consideração a configurão espacial e social historicamente
estratificada naquele espaço. Esse será o tema tratado a seguir.
76
ROLNIK, Raquel. São Paulo Leste/Sudeste Reestruturação Urbana da Metrópole Paulistana: Análise de
Territórios em Transição. Relatório Final de Pesquisa, PUC Campinas, 2000.
77
LAURENTINO, op. cit, p. 95
78
Idem, p. 95
Arquitetura Industrial no Bairro da Mooca: Análise e Diretrizes de Intervenção na Alpargatas.
Wayne Almeida de Sousa 43
1.4. O Problema da Especulação Imobilria e a Atuação do Poder Público.
Apesar do bairro da Mooca ainda apresentar uma intensa atividade industrial, desde a
década dos anos de 1960 vem sofrendo com os problemas causados pela evasão das antigas
indústrias para outras áreas, o que fez com que grande parte dos gales fosse desocupada e,
posteriormente, abandonada.
Contudo, a partir da cada de 1980, com a melhoria do transporte metroviário e a
proximidade com o centro da cidade, inicia-se um intenso processo de valorização imobiliária e
verticalização dessas áreas,
79
processo que despertou o interesse de investidores que
encontraram nesses amplos espaços a possibilidade para empreendimentos lucrativos como
hipermercados e torres residenciais.”
80
Diante desses fatos, especialistas na área e parte da população do bairro se mobilizaram,
sugerindo a criação de um parque ecológico ao longo da ferrovia e a preservação de uma série de
edifícios, tanto no bairro da Mooca como em bairros adjacentes.
81
Essas sugestões foram encaminhadas para o Conselho Municipal de Preservação do
Patrimônio Histórico Cultura e Ambiental da Cidade de São Paulo CONPRESP. O Plano
Diretor Regional recomendou um mapeamento do patrimônio existente (conjuntos
arquitetônicos como vilas, fábricas e casario), para possível aplicação de instrumentos
79
RUFINONI, op. cit, p. 54.
80
MENEGUELLO, Cristina; VALENTIN, Fernanda; BERTINI, Giancarlo; RUFINONI, Manoela. Demolição de
galpões industriais na Mooca: descaso e impunidade, Minha Cidade 196, Novembro de 2007.
http://www.vitruvius.com.br/minhacidade/mc196/mc196.asp. (última consulta em 06 de dezembro de 2009).
81
Durante as plenárias para elaboração do Plano Diretor Regional Mooca, a população sugeriu a preservação do
edifício do antigo Cotonifício Crespi, a Tecelagem Labor, o Moinho Gamba, o Moinho Matarazzo, a Tecelagem
Mariângela, o Lanifício Paulista, o Gasômetro da Figueira, travessias da estrada de ferro na altura da estação Brás, a
Vila Maria Zélia entre outros. Ver: MENEGUELLO, Cristina; VALENTIN, Fernanda; BERTINI, Giancarlo;
RUFINONI, Manoela, op. cit.
Arquitetura Industrial no Bairro da Mooca: Análise e Diretrizes de Intervenção na Alpargatas.
Wayne Almeida de Sousa 44
urbanísticos que estimulem sua preservação e orientem a reconversão de uso”,
82
como, por
exemplo, as ZEPECs, Zonas Especiais de Preservação Cultural, que transferem para outros
terrenos o direito de construir dos proprietários de áreas preservadas; e o direito de preempção,
proposto pelo Estatuto da Cidade, queao poder público a prioridade de compra de um terreno
que está a venda dentro das áreas selecionadas.
Algumas dessas idéias apareceram no Plano Diretor, votado no ano de 2004, que
“delimitou Zonas Especiais de Preservação Cultural nas áreas sugeridas pela população e
demarcou também grande parte do eixo da estrada de ferro como área sujeita ao direito de
preempção.”
83
No entanto, essas medidas não foram suficientes para afastar a iniciativa privada,
que continua atuando fortemente no entorno das áreas protegidas.
Do ponto de vista do patrimônio industrial, esse crescente interesse por parte da
iniciativa privada pode trazer problemas ainda mais sérios. Por isso, o estudo detalhado desses
conjuntos se faz necessário e urgente. Exemplares únicos, que poderiam ser estudados hoje
o existem mais ou foram descaracterizados, e os que restaram sofrem uma pressão cada vez
mais forte por parte do mercado imobiliário.
82
Idem.
83
Idem.
Arquitetura Industrial no Bairro da Mooca: Análise e Diretrizes de Intervenção na Alpargatas.
Wayne Almeida de Sousa 45
2. Alpargatas. Caracterização de seus Edifícios e Transformações ao Longo do
Tempo.
2.1. Apresentação.
Antes de caracterizar o conjunto da Alpargatas, será feita uma breve apresentação de
dois outros complexos de edifícios industriais da área, já estudados anteriormente, para auxiliar
na caracterização do problema e no desenvolvimento das propostas.
Os complexos estão situados nos arredores das ruas da Mooca, Borges de Figueiredo e
Presidente Wilson, rego em que foi realizado um levantamento sumário para a pesquisa de
Iniciação Científica
84
a fim de se encontrar exemplares da arquitetura industrial de fins do
século XIX e início do XX que fossem relevantes e pudessem ser estudados com maior
profundidade.
As esse primeiro levantamento, foram selecionados para um estudo mais detalhado
dois conjuntos de edifícios localizados na Rua Borges de Figueiredo, o primeiro, um conjunto de
oito gales pertencentes às IRF Matarazzo, localizados nos atuais números 1098, 1110, 1120,
1132, 1144, 1156, 1168 e 1180;
85
e o segundo, um conjunto de edifícios construídos
84
Com financiamento FAPESP, a pesquisa de Iniciação Científica foi realizada no ano de 2003, sob o título de O
patrimônio industrial da Mooca - Estudo de caso (processo número). Todo o trabalho de pesquisa documental e
visitas de campo foi feito de modo articulado com Cristiane Ikedo Bardese, também aluna de graduação da
Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo.
85
Ver: Divisão de Arquivo Municipal de Processos, processos número 0.058.059/1929 e 0.005.832/1925.
Arquitetura Industrial no Bairro da Mooca: Análise e Diretrizes de Intervenção na Alpargatas.
Wayne Almeida de Sousa 46
originalmente para abrigar um moinho que foram comprados durante os anos de 1960 pelo
Banco do Brasil, localizado nos atuais números 1294 e 1358.
86
Desses dois conjuntos, foi feita uma análise detalhada de suas características técnico-
construtivas e arquitetônicas; assim como as alterações e acréscimos realizados no decorrer do
tempo, através de comparações entre o projeto original obtido no arquivo municipal e a situação
dos edifícios na época.
O conjunto pertencente às IRF Matarazzo é formado pela repetição de oito gales,
com aproximadamente 11 por 64 metros, construídos em duas etapas: três galpões no ano de
1927 e cinco galpões no ano de 1929. Originalmente construídos como depósito de café, esses
gales ainda foram utilizados durante muitos anos como depósito de tecido até serem
desocupados durante os anos de 1980.
Os oito galpões foram construídos em alvenaria de tijolos e em sete deles foi utilizado o
aparelho Inglês. Em apenas um foi utilizado o aparelho Losango.
87
Apesar de abandonados por
muito tempo, alguns elementos como a cobertura em madeira, coberta com telhas cerâmicas, e as
esquadrias em ferro da fachada voltada para a Rua Borges de Figueiredo ainda aparentavam um
bom estado de conservação. Aparentemente, não se percebeu nenhum tipo de intervenção mais
invasiva nesses elementos, a não ser pequenas obras de manutenção para reparo de telhas e
vidros quebrados.
Apesar do bom estado de conservação no geral, as partes mais deterioradas dos
edifícios eram as fachadas, onde podia se perceber os sinais da passagem do tempo nos tijolos
86
Ver: Divisão de Arquivo Municipal de Processos, processo número 0.034.361/1927. A análise detalhada desse
conjunto ficou a cargo da aluna Cristiane Ikedo Bardese, que os utilizou como base para a realização do seu
Trabalho Final de Graduação, no ano de 2004.
87
Ver: SEGURADO, João Emilio dos Santos. Alvenaria e Cantaria. edição, Lisboa, Bertrand, 19-?.
Arquitetura Industrial no Bairro da Mooca: Análise e Diretrizes de Intervenção na Alpargatas.
Wayne Almeida de Sousa 47
desgastados e sujos pela ação da chuva e da poluição. Além do desgaste natural, na fachada
frontal voltada para a Rua Borges de Figueiredo, ainda foram realizadas diversas alterações nos
os para possibilitar a entrada de caminhões. A fachada posterior, voltada para a ferrovia, ficou
praticamente abandonada depois que a ferrovia perdeu sua importância para o transporte de
mercadorias.
O outro conjunto estudado foi construído em duas etapas, a primeira durante década de
1940 e a segunda na década de 1950, com a finalidade de abrigar um moinho. Na década de
1960 todo esse conjunto foi vendido para o Banco do Brasil, que instalou neles um
supermercado e um arquivo de documentos.
O conjunto da década de 1940 é formado por dois edifícios. O edifício maior, que foi
transformado em supermercado, é formado por duas partes laterais de um pavimento e pé direito
alto, e uma parte central com dois pavimentos. Em todo pavimento inferior funcionavam os
armazéns e depósitos do moinho, enquanto que no pavimento superior funcionavam os setores
administrativos.
O edifício menor, localizado logo na entrada do terreno, foi construído para abrigar as
mulheres, pois, como era de costume na época, ficavam separadas dos homens durante o horário
de trabalho. Esses dois edifícios foram constrdos em alvenaria de tijolos e sua característica
mais marcante é a enorme quantidade de ornamentos existentes nas fachadas.
A outra parte do conjunto, construída na década de cinqüenta, é formada por dois
grandes edifícios que, assim como os da década de 1940, também foram construídos em
alvenaria de tijolos, com aparelho Flamengo em paredes de uma vez.
Arquitetura Industrial no Bairro da Mooca: Análise e Diretrizes de Intervenção na Alpargatas.
Wayne Almeida de Sousa 48
Apesar de serem utilizados para guardar documentos importantes, esses edifícios não
passavam por manutenções regulares e, por isso, encontravam-se em péssimo estado de
conservação. Esse problema ficava bem evidente na cobertura, pois em diversos pontos se notava
indícios de infiltrações, inclusive com a queda de algumas partes do forro de gesso.
Além desses edifícios mais importantes, outras construções menores foram sendo
realizadas ao longo dos anos, principalmente a partir dos anos de 1960, quando o Banco do
Brasil adquiriu os edifícios e fez uma série de modificações para adequá-los aos novos usos de
supermercado e arquivo de documentos.
O mais evidente desses acréscimos é uma pequena construção que funcionava como
restaurante, construído para ajudar na renda do supermercado e também para servir ao público
em geral.
Outras diversas alterações foram realizadas para atender as necessidades desses novos
usos como, por exemplo, uma série de pequenas intervenções que, assim como os diversos
acréscimos, dificultam muito a leitura do conjunto, tais como a construção de uma cobertura na
entrada do supermercado, que se estende por toda a fachada principal; a colocação de elementos
pré-fabricados na frente da fachada do térreo e a abertura de novos vãos, em quase todas as
fachadas.
Internamente não foi diferente. A fim de adaptar os edifícios dos anos de 1940 para o
supermercado, foi necessária a realização de uma série de intervenções que descaracterizaram o
edifício como, por exemplo, remoção de algumas paredes originais e construção de novas,
instalação de equipamentos de segurança, novos equipamentos para a cozinha e para as câmaras
frigoríficas do supermercado.
Arquitetura Industrial no Bairro da Mooca: Análise e Diretrizes de Intervenção na Alpargatas.
Wayne Almeida de Sousa 49
No pavimento superior ainda podia ser visto o piso original em madeira, muito
desgastado pela ação do tempo, e pelas intervenções que foram feitas para abrigar os novos
espaços de trabalho do setor administrativo do supermercado e novas instalações sanitárias.
Apesar da beleza, assim como aconteceu no conjunto de oito gales, a fachada
posterior voltada para a ferrovia ficou praticamente abandonada e também apresentava alto grau
de deterioração, principalmente a cobertura metálica que estava toda enferrujada e prestes a cair.
Esse trabalho de pesquisa e análise dos edifícios, realizado durante a Iniciação
Científica, foi complementado durante o Trabalho Final de Graduação no ano de 2004,
intitulado O patrimônio industrial da Mooca: Intervenção em um edifício industrial, quando foi
proposto um projeto de intervenção para o conjunto de oito galpões pertencente às IRF
Matarazzo.
A intenção do trabalho foi propor um novo uso para esses gales, muito tempo
abandonados e sem qualquer tipo de utilidade para o bairro onde estavam localizados.
Pensando nisso, o projeto de intervenção levou em consideração a disponibilidade e a
localização dos principais equipamentos públicos existentes no bairro da Mooca, principalmente
nas proximidades da Rua Borges de Figueiredo; e às necessidades dos moradores e dos
trabalhadores da região. Ficou bem clara a falta de locaisblicos para convincia como praças
e áreas de recreação e de lazer, assim como a necessidade de espaços específicos para atividades
culturais, educativas e a serviços públicos essenciais para a população.
A partir dessas observações, o projeto foi desenvolvido para funcionar como um grande
centro de reunião da população do bairro, proporcionando espaços que pudessem ser utilizados
durante o ano todo e de diferentes maneiras. O programa de atividades foi então dividido em
Arquitetura Industrial no Bairro da Mooca: Análise e Diretrizes de Intervenção na Alpargatas.
Wayne Almeida de Sousa 50
duas grandes áreas laterais com uma grande praça central onde, de um lado, se localizariam uma
série de serviços públicos e, do outro, espaços para lazer e cultura.
Além de interligar as diferentes atividades e abrir novamente o edifício para o lado da
ferrovia, a praça central também abrigaria uma série de atividades independentes, permanecendo
aberta ao público 24 horas por dia, como deveria qualquer praça pública da cidade. O fato de ser
coberta ainda daria uma maior flexibilidade e liberdade de uso, proporcionando para a população
da região um espaço para espetáculos de música, dança e teatro.
Para aumentar um pouco a área das áreas destinadas aos serviços públicos e aos espaços
de lazer e aproveitar melhor o pé direito dos gales, se propôs a construção de um mezanino em
estrutura metálica.
A partir das pesquisas realizadas para a Iniciação Científica e para o Trabalho Final de
Graduação, percebeu-se que a maioria desses conjuntos foi muito descaracterizada ao longo dos
anos, ou por acréscimos e remoções indevidas, ou por intervenções realizadas sem critério nem
preocupação com a preservação do bem como, por exemplo, são os casos do antigo Moinho
Gamba, utilizado por muito tempo como casa noturna e de eventos; e o Cotonifício Crespi, que
teve diversos usos, entre eles, estacionamento e supermercado.
outros conjuntos, como os armazéns das IRF Matarazzo, os edifícios do Banco do
Brasil e o conjunto da Alpargatas, que também sofreram grandes alterações ao longo dos anos,
ainda preservam muitas de suas características e são importantes fontes de estudo da arquitetura
industrial produzida no bairro da Mooca durante as primeiras décadas do século XX.
Arquitetura Industrial no Bairro da Mooca: Análise e Diretrizes de Intervenção na Alpargatas.
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Arquitetura Industrial no Bairro da Mooca: Análise e Diretrizes de Intervenção na Alpargatas.
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2.2. A Alpargatas.
A caracterização do conjunto e a identificação de suas principais fases construtivas foi
feita no Arquivo Histórico Municipal Washington Luis,
88
iniciando pela correta seqüência dos
nomes da rua onde se localiza o conjunto da Alpargatas.
89
Até o dia 8 de Outubro do ano de 1915, a atual Rua Dr. Almeida Lima chamava-se Rua
da Concórdia. A Rua da Concórdia, parte do Largo da Concórdia, no bairro do Brás, e segue em
direção sul até a Rua da Mooca.
Durante a busca preliminar,
90
foi encontrado todo tipo de material, desde o projeto para
construção do primeiro grande edifício do conjunto da Alpargatas, no ano de 1907, até simples
comunicados para pequenas reformas, regularização de um muro, pedidos de construção de
edifícios anexos e de uma caixa d’água, e também alguns pedidos para demolição de alguns
edifícios que deram lugar ao grande edifício construído na década de 1920.
88
O Arquivo Histórico Municipal Washington Luis localiza-se na Praça Coronel Fernandes Prestes, 152, bairro da
Luz, São Paulo.
89
Essa etapa foi indispensável para o bom andamento da pesquisa, pois os processos são arquivados pelo ano de
constrão/projeto e também pelo endereço.
90
Num primeiro momento, não foi possível examinar os processos referentes aos anos de 1907, 1908 e 1909, pois
estavam passando por um delicado processo de higienização, ficando indisponíveis para consulta pública. Devido a
essa impossibilidade, foi encontrado material sobre a Alpargatas a partir do ano de 1911, com um pedido para
aumento da fábrica situada no número 16 da Rua da Concórdia, tendo como interessado a São Paulo Alpargatas
Company. Na seqüência, foram encontrados processos nos anos de 1916 e 1917, respectivamente um pedido para a
constrão de uma caixa d’água, tendo como interessado a Companhia São Paulo de Alpargatas; e outro pedido
para aumento da fábrica situada no número 16, que agora já tendo como endereço a Rua Dr. Almeida Lima, de
propriedade da São Paulo Alpargatas Company. Nos anos de 1919 e 1920 foram encontrados processos relativos ao
aumento de uma oficina e aumento de fábrica, novamente no número 16 da Rua Dr. Almeida Lima, e propriedade da
São Paulo Alpargatas Company. Finalizando essa etapa de pesquisa preliminar, foram encontrados no ano de 1920
dois processos relacionados à Alpargatas: o primeiro, um pedido para demolição dos prédios localizados na Rua Dr.
Almeida Lima, do número 241 até o número 253; e o segundo, um pedido para a construção de uma fábrica de
tecelagem e fiação no quarteirão localizado entre as Ruas Dr. Almeida Lima, Frei Gaspar e Cons. Lafaite, tendo
como proprietário a o Paulo Alpargatas Company e Scott e Urner como construtores.
Arquitetura Industrial no Bairro da Mooca: Análise e Diretrizes de Intervenção na Alpargatas.
Wayne Almeida de Sousa 55
Os processos foram examinados conforme se tornavam dispoveis à consulta blica,
o necessariamente em ordem cronológica.
91
Por esse motivo, somente numa segunda etapa da
pesquisa documental, foi possível consultar os processos do ano de 1907, essencial por ser o
projeto referente à construção dos primeiros gales do conjunto, situados no número 14 da Rua
da Concórdia, de propriedade da Fábrica Brasileira de Alpargatas e Calçados e construídos por
Julio Micheli.
Nos anos de 1908 e 1909 respectivamente, foram ainda encontrados pedidos, um para a
construção de um novo pavilhão para tinturaria e outro para depósito de mercadorias. Ambos
também localizados no número 14 da antiga Rua da Concórdia, de propriedade da Fábrica
Brasileira de Alpargatas e Calçado e construídos por Julio Micheli.
92
Através da análise dos sucessivos anos, puderam ser localizados documentos de
fundamental importância para a dissertação. Destacam-se, por exemplo, o processo op 1907 -
000 401, do ano de 1907, que contém planta, cortes e fachada do primeiro grande edifício do
conjunto; os processos op 1908 - 000 665 e op 1909 - 000 740, dos anos de 1908 e 1909
respectivamente, que contém plantas, cortes e fachadas de dois edifícios importantes que foram
acrescidos ao conjunto original, no número 14 da Rua da Concórdia; e os processos Doc3 / cx
D4 – 1921 e Doc4 / cx D4 – 1921, do ano de 1921, inicialmente com um pedido de demolição de
91
Enquanto se buscava o restante da documentação, estava sendo realizada uma análise mais detalhada dos
processos encontrados durante a pesquisa preliminar, inclusive com a realização de pia fotográfica do material
mais significativo. Foi possível fazer a consulta dos processos dos anos de 1907, 1908 e 1909, depois de obtida uma
autorização especial com o responsável pelo Arquivo Histórico Municipal Washington Luis, que prontamente
entendeu a importância daqueles processos. Apesar dos processos ainda estarem separados dos demais, eles
haviam passado por todo o processo de higienização e finalmente puderam ser analisados. Essa autorização especial
foi fundamental para se trabalhar nos documentos do ano de 1907.
92
Concluindo os trabalhos de pesquisa no Arquivo Histórico Municipal Washington Luis, foram analisados e
registrados os processos dos anos de 1903, 1904, 1905, 1906, 1907, 1908, 1909, 1910, 1911, 1912, 1913, 1914 e
1915, relativos à Rua da Concórdia, e os anos de 1916, 1917, 1918, 1919, 1920 e 1921, relativos à Rua Dr. Almeida
Lima. Apesar do processo de pesquisa no arquivo ter sido demorado e trabalhoso, foi fundamental para a
continuação dos trabalhos, pois muito material importante foi encontrado.
Arquitetura Industrial no Bairro da Mooca: Análise e Diretrizes de Intervenção na Alpargatas.
Wayne Almeida de Sousa 56
alguns edifícios existentes e, na seqüência, o projeto para a construção de um novo edifício para
tecelagem e fiação, com planta, cortes e fachadas.
93
Além desses edifícios mais importantes, ainda foram encontrados pedidos para a
construção de outros acréscimos menores como, por exemplo, oficinas, caixa d’água, etc.. Nessa
pesquisa sentiu-se falta de um projeto de implantação mais completo do conjunto, pois nos
processos os edifícios são apresentados de forma individual, quase sem nenhuma refencia ao
restante das edificações do complexo, sendo difícil situá-las com exatidão.
94
Pode-se dizer que a Alpargatas começou a existir por volta de abril do ano de 1907,
quando um escocês chamado Robert Frasier, vindo da Argentina, associou-se a um grupo de
ingleses para construir uma fábrica no bairro da Mooca e produzir, entre outros artigos
populares, as alpargatas.
95
As alpargatas eram uma antiga forma de calçado de lona com sola de corda, criado
pelos árabes e levado para a Península Ibérica, logo se espalhando também pelo sul da França.
Na sua origem, as alpargatas eram feitas de fios de crina trançados e depois uma fibra conhecida
93
As plantas, as fachadas e os cortes dos edifícios encontrados nos processos pesquisados, quando posvel, foram
digitalizados com a ajuda de software. A primeira etapa desse trabalho de digitação foi inserir as imagens
fotográficas no software Auto CAD, depois de dada a escala correta, usando como referência as cotas existentes nas
pranchas, iniciou-se o trabalho de desenho.
94
Depois terminados os trabalhos no Arquivo Histórico Municipal Washington Luis, com a pesquisa indo até o ano
de 1921, o passo seguinte seria fazer uma pesquisa nos processos a partir do ano de 1922 na Divisão de Arquivo
Municipal de Processos. Nesse arquivo, os funcionários informaram que, de acordo com a lei, a pesquisa seria
possível mediante a apresentação de autorização por escrito dos proprietários dos imóveis a serem pesquisados.
Apesar de vários contatos com a Universidade, proprietária dos edifícios, essa autorização o foi conseguida e,
com isso, foi finalizada antes do previsto a etapa de pesquisa documental nos processos. Mesmo após a finalização
da pesquisa documental, as idas ao Arquivo Histórico Municipal Washington Luis continuaram sendo constantes,
pois em muitas ocasiões foi necessário consultar novamente alguns processos, ou para obtenção de novas
informações e esclarecimento de dúvidas ou para fazer novos registros fotográficos do material encontrado. A
Divisão de Arquivo Municipal de Processos está localizada na Rua da Balsa, 331, bairro da Freguesia do Ó, São
Paulo. A lista dos processos pesquisados encontra-se no final deste trabalho.
95
Segundo o site da Alpargatas, http://www.alpargatas.com.br, esse sucesso inicial do produto se deu porque as
alpargatas eram perfeitas para colher café, pois não machucavam os grãos.
Arquitetura Industrial no Bairro da Mooca: Análise e Diretrizes de Intervenção na Alpargatas.
Wayne Almeida de Sousa 57
por espartoou alpha”. O sistema de confecção desse calçado era artesanal até o ano de 1881,
quando na Escócia, a firma de Douglas Frasier e seus filhos, chamada Douglas Fraser & Sons,
desenvolveu uma máquina para trançar fios para pavio de vela, que logo foi adaptada para
trançar a juta em corda e fabricar em maior escala o solado utilizado nas alpargatas.
No ano de 1883, Robert e Norman Fraser, filhos de Douglas Frasier, foram para
Argentina em busca de novos negócios e se associaram ao espanhol Juan Etchegaray, fabricante
artesanal local de alpargatas, na firma Etchegaray & Fraser que no ano de 1885 se transformou
na Sociedad Anónima Fábrica Argentina de Alpargatas.
Cinco anos depois foi fundada uma filial no Uruguai e, em 1907, com a participação de
Edward Ashworth & Co e Robert Fraser é criada a Sociedade Anonyma Fábrica Brazileira de
Alpargatas e Calçado.
96
O projeto do primeiro edifício para a Fábrica Brasileira de Alpargatas e Calçados é do
ano de 1907 e ficou a cargo do Engenheiro Julio Micheli.
97
O edifício ocupou um terreno de
aproximadamente 12.000 metros quadrados no número 14 da antiga Rua da Concórdia, atual Rua
Dr. Almeida Lima.
98
Um pouco mais tarde foram adquiridos os terrenos ao fundo para permitir
a construção de um desvio ferroviário e facilitar o escoamento da produção.
96
Sobre a história da Alpargatas ver: Alpargatas: oitenta anos de nossa história. São Paulo, Mouro Ivan Marketing
Editorial, 1987.
97
Foram encontradas diferentes grafias se referindo a mesma pessoa nas diversas fontes consultadas como, por
exemplo, Julio de Micheli, Giullio Micheli e Julio Micheli. Para este trabalho foi adotada a grafia Julio Micheli, por
ter sido a utilizada nos processos encontrados no Arquivo Histórico Municipal Washington Luis.
98
Ver: Arquivo Histórico Municipal Washington Luis, processo número: op 1907 - 000 – 401.
Arquitetura Industrial no Bairro da Mooca: Análise e Diretrizes de Intervenção na Alpargatas.
Wayne Almeida de Sousa 58
Durante os anos seguintes, novos edifícios foram acrescentados ao conjunto original, no
ano de 1908 umnovo pavilhão para tinturaria
99
e no ano de 1909 um “pavilhão para
depósitos”;
100
também sob responsabilidade do Engenheiro Julio Micheli.
“Com o capital inicial de 800 contos de réis, foi adquirido um terreno de 12 mil
metros quadrados na antiga rua da Concórdia, atual Dr. Almeida Lima, na Moóca, região
industrial da cidade, a um custo total de pouco mais de 46 contos de réis, após despesas
de registro.
A construção da fábrica foi contratada com o arquiteto Júlio Michele por 130 contos
de réis. Através da venda de 600 ações ao preço unitário de 200 mil réis, num total de 120
contos de réis, adquiriram da Fábrica Argentina de Alpargatas ‘todos os direitos, acções e
privilégios constantes das patentes de invenção’, para seu uso na fabricação de
alpargatas. Máquinas e equipamentos foram encomendados na Europa. Logo depois,
anexavam uma faixa de terreno junto à fábrica para construir um desvio ferroviário,
ligado à São Paulo Railway, ao custo de 11 contos e 373 mil e 600 réis (RS 11:373$600).
O escritório foi instalado em uma dependência alugada na rua da Quitanda n°. 8, ali no
Triângulo.”
101
O engenheiro Julio Micheli, responsável pelos primeiros edifícios do conjunto da
Alpargatas, foi um dos protagonistas de um período de grande interesse para a arquitetura de São
Paulo. Como já foi visto no primeiro capítulo deste trabalho, a partir de meados do século XIX, a
Cidade passa por um período de crescimento e desenvolvimento jamais visto. Esse crescimento
se acelera a partir do ano de 1885, entre outros fatores, devido à imigração regular de
trabalhadores italianos, que se iniciou no ano 1874.
102
99
Ver: Arquivo Histórico Municipal Washington Luis, processo número: op 1908 - 000 – 665.
100
Ver: Arquivo Histórico Municipal Washington Luis, processo número: op 1909 - 000 – 740.
101
Alpargatas: oitenta anos de nossa história. São Paulo, Mouro Ivan Marketing Editorial, 1987, p. 16.
102
SALMONI, Anita e DEBENEDETTI, Emma. Arquitetura Italiana em São Paulo. São Paulo, Perspectiva, 1980.
p 22.
Arquitetura Industrial no Bairro da Mooca: Análise e Diretrizes de Intervenção na Alpargatas.
Wayne Almeida de Sousa 59
Entre os imigrantes não estavam apenas trabalhadores com pouca qualificação; muitos
eram artesãos, mestres de obras, arquitetos e engenheiros que vinham para o Brasil com a tarefa
de difundir as tendências arquitetônicas aprendidas em sua pátria.
103
E esse momento era
muito procio, pois o rápido crescimento populacional, o fortalecimento do comércio e o início
da industrialização proporcionaram uma enorme demanda por novas construções.
A repercussão da presença dos imigrantes na arquitetura da Cidade de São Paulo nesse
período foi muito intensa, e diversos autores escreveram sobre esse tema, principalmente no que
se refere à adoção do uso do tijolo e a utilização de linguagens variadas derivadas do ecletismo
trazidas da Europa.
os imigrantes definiram novos gostos, costumes e expectativas na tradicional
sociedade paulista e ajudaram a implantar uma nova arquitetura, mais requintada,
alterando por completo a fisionomia urbana das cidades. Eles também foram os
responsáveis pela generalização de novas técnicas construtivas, como a alvenaria de
tijolos, e pela vulgarização de estilos como o neoclassicismo e ecletismo na arquitetura
paulista.”
104
“Assim, e de repente, as cidades paulistas e a própria capital, viram-se repletas de
engenheiros, arquitetos, mestres-de-obras, pedreiros, marceneiros, carpinteiros, pintores e
estucadores de variada origem e conhecimentos. Primeiro vieram os alemães se
oferecendo para executar obras de tijolos nas fazendas. (...) Depois, italianos mais
italianos. A taipa tradicional resistiu o quanto pôde, e a cidade, um dia, foi toda
reconstruída em tijolos e refeita num novo estilo, ou melhor, em vários estilos. Era o
ecletismo.”
105
Salmoni e Debenedetti, em seu livro sobre a arquitetura italiana em São Paulo,
comentam que no início de 1900, tinha-se a impressão de estar andando por uma cidade italiana
103
Idem, p. 97.
104
ALAMBERT, Clara Correia d’. O Tijolo nas Construções Paulistanas do culo XIX. São Paulo, Dissertação de
Mestrado, FAUUSP, 1993, p. 10.
105
LEMOS, Carlos. Arquitetura brasileira. São Paulo, Melhoramentos, 1979.
Arquitetura Industrial no Bairro da Mooca: Análise e Diretrizes de Intervenção na Alpargatas.
Wayne Almeida de Sousa 60
do período neoclássico,
106
e, analisando as construções daquele momento, identificaram três
tipos de arquitetura produzida por estrangeiros. Um grupo de construções devidas aos alemães,
um segundo grupo com as obras de Bezzi, Pucci e seus seguidores, e o terceiro grupo, com a
arquitetura produzida pelos mestres de obra italianos.
Desse grupo formado pelos mestres de obra italianos surgiu uma série de pequenas
empresas construtoras e alguns engenheiros-arquitetos como, por exemplo, Calcagno e Irmão”,
Milanese e Marzo”, Rossi e Brenni”, Cavichioli e Irmão”, Luigi Saltini”, Pucci e Micheli”,
que além da arquitetura residencial, produziram trabalhos de “vulto e importância maiores”.
107
Julio Micheli era um conde florentino que chegou a São Paulo no ano de 1888, após ter
viajado pela Europa estudando o Ecletismo e também, em especial, obras do Art Nouveau.
Pucci, ao conhecê-lo, lhe ofereceu um cargo de sócio, e juntos realizam uma série de obras
importantes pela Cidade como, por exemplo, o edicio central e a capela da Santa Casa, e o
Viaduto Santa Ifinia, que logo se tornou uma das principais referências da arquitetura do ferro
em São Paulo.
Além de se associar a Pucci (“Pucci e Micheli”), Julio Micheli também se associou a
Chiapori (“Micheli e Chiapori”) e, este, ao arquiteto Aldo Lanza (Chiapori e Lanza”), em um
escritório de engenharia muito conhecido na época.
Em sua sociedade com Chiapori, desenvolveram uma série de projetos Art Nouveau, em
que as fachadas eram bem trabalhadas, com muitos ornamentos como guirlandas de flores, folhas
e frutos.
106
SALMONI e DEBENEDETTI, op. cit, p. 33.
107
Idem, p. 75.
Arquitetura Industrial no Bairro da Mooca: Análise e Diretrizes de Intervenção na Alpargatas.
Wayne Almeida de Sousa 61
Salmoni e Debenedetti destacam que se fossem retirados os ornamentos, seriam
encontradas nessas estruturas uma nítida partição de espaços, uma clara vontade de obedecer à
estrutura íntima, antes que ocultá-la ou falsificá-la, como foi feito por tanta arquitetura do
século XIX; uma racionalidade de plantas e de divisões em planos”,
108
e comentam que ao
introduzir as formas do estilo florealem São Paulo, os arquitetos Micheli, Chiapori e Bianchi
revelaram as “técnicas ousadas do ferro e do cimento.
109
Nessa São Paulo de finais do século XIX e início do XX, toda essa transformação só foi
possível graças à adoção do tijolo como material de construção principal, devido ao seu baixo
custo e a facilidade de transporte pelas ferrovias, que proporcionou construções mais rápidas e
seguras, sendo assim, mais fácil suprir a crescente demanda de edifícios exigidos pela
multiplicação de programas tais como, por exemplo, bancos, restaurantes, hotéis, lojas, teatros,
gales exigidos pela indústria, escolas, hospitais e estações ferroviárias.
110
Não se pode deixar de salientar que, apesar do tijolo ter se firmado como material de
construção principal, durante essa fase, o ferro também teve um papel importantíssimo, como no
caso do já citado viaduto de Santa Ifinia, de Julio de Michele.
O Ecletismo passou a ser sinimo de progresso em São Paulo, e a antiga cidade de
taipa de pilão foi reconstruída com tijolos. Vale lembrar, apesar das controvérsias envolvidas, a
classificação feita por Carlos Lemos
111
das obras do Ecletismo paulistano, em diversos grupos
estilísticos. O primeiro deles seria o neoclássico histórico, que apareceu em São Paulo por volta
108
Idem, p. 106.
109
Para uma lista de outras obras do Eng. Julio Micheli ver: SALMONI e DEBENEDETTI. op. cit, p. 174.
110
Nessa época, foi muito comum a utilização de manuais de construção que descreviam essa nova técnica de
alvenaria de tijolos e ensinavam a melhor forma de utilizá-la como, por exemplo, os de Alburquerque, Cloquet e
Segurado. Ver: ALBUQUERQUE, Alexandre. Construções Civis. São Paulo, Empresa Gráfica da Revista dos
Tribunais Ltda., 1952, 2.ed; CLOQUET, Louis. Traite d’architecture. Paris, Librairie Polytechnique, 1898; e
SEGURADO, João Emilio dos Santos. Alvenaria e Cantaria. 4ª edição, Lisboa, Bertrand, 19-?.
111
LEMOS, Carlos A. C.. Ecletismo em São Paulo. In: FABRIS, Annateresa (org.). Ecletismo na Arquitetura
Brasileira. São Paulo, Nobel, 1987.
Arquitetura Industrial no Bairro da Mooca: Análise e Diretrizes de Intervenção na Alpargatas.
Wayne Almeida de Sousa 62
de 1850/60, talvez por influência da corte, trazido pela colônia portuguesa. O segundo grupo é
formado pelas construções ditas neoclássicas, mas com ornamentão variada, principalmente
renascentista. No terceiro grupo aparecem construções diversas, edicios executados por
profissionais não especializados, marcados pela improvisação, recriação e invenção colagens
imaginosas”. O quarto grupo contém as obras do chamado Art Nouveau e, também, outras de
inspiração alemã. No quinto grupo aparecem as construções em estrutura convencional de tijolos
que recebem decoração Art Nouveau. O sexto grupo é formado por obras de estilos indefinidos,
com características tiradas dos chalés alpinos. O chamado Ecletismo Historicista aparece no
sétimo grupo, com construções inspiradas nos mais variados modelos da antiguidade, sendo o
Neogótico o mais comum deles. O oitavo e nono grupos são formados respectivamente pelas
obras do movimento Neocolonial e do chamado Neocolonial simplificado. Lemos ainda destaca
um último grupo, o das construções industriais e dos edifícios pré-fabricados em estrutura de
ferro, obras que segundo ele, não foram assimiladas pela população.
Em 1909, a companhia mudou seu nome para São Paulo Alpargatas Company, depois
que foi descoberta a existência de uma pequena indústria gaúcha chamada Fábrica Brasileira de
Alpargatas e Calçados.
Nesses primeiros anos de atividades, a empresa passou por algumas dificuldades,
inicialmente, devido à epidemia de gripe espanhola, que durante a Primeira Grande Guerra
deixou de cama metade dos operários da fábrica, e, depois, nos finais da década de vinte, foi
atingida pela quebra da bolsa de Nova Iorque, sendo obrigada a parar de produzir a alpargatas.
Apesar das dificuldades financeiras, na década de 1920 aconteceu uma grande
ampliação do conjunto com a compra de um lote do outro lado da rua, entre as ruas Dr. Almeida
Arquitetura Industrial no Bairro da Mooca: Análise e Diretrizes de Intervenção na Alpargatas.
Wayne Almeida de Sousa 63
Lima, Frei Gaspar e Conselheiro Laffaeytte, para a construção de um edifício,
112
onde, em 1922,
foi instalada uma a seção para o fabrico de sapatos de borracha.”
113
Esse novo edicio, que
ocupava quase todo o quarteirão, foi construído por Scott e Urner.
114
As esse período de crise, o controle acionário da empresa passou para a Fábrica
Argentina de Alpargatas nos finais da década de 1930. Somente durante os anos quarenta a
alpargatas volta a ser produzida e, assim, a empresa adota seu nome definitivo: São Paulo
Alpargatas S.A.. Essa mudança faz a empresa passar por uma grande reorganização, a tecelagem
é instalada no primeiro edicio e para facilitar a comunicação é construído um túnel sob a Rua
Dr. Almeida Lima.
No ano de 1942 foi adquirido, por cinco mil contos, o terreno vizinho à primeira
fábrica, de propriedade de Palaridade e Mortari, onde foi construído por Alfredo Mathias
115
um
edifício com dois blocos e sete andares. Esse edifício deu ao conjunto mais 13.600 metros
quadrados, e junto com ele foi projetado um layout da maquinaria. Tudo supervisionado pelo
americano John E. Mitchell que trabalhara na construção de algumas fábricas da Alpargatas na
Argentina.
“Não seria apenas a montagem de uma nova unidade e sim a edificação de uma
fábrica modelo, capaz de suportar até o seu 5° andar os teares e as trançadeiras em pleno
funcionamento, que fariam tremer toda a sua estrutura.”
116
Alfredo Mathias, filho de pais sírios estabelecidos em São Paulo no ano de 1904, entrou
para a Escola Politécnica em 1924, onde se formou engenheiro-arquiteto e civil no ano de 1929.
Iniciou sua vida profissional trabalhando como engenheiro da Diretoria de Obras do Palácio da
112
Alpargatas: oitenta anos de nossa história. op. cit, p.19.
113
Ver: Arquivo Histórico Municipal Washington Luis, processo número: Doc4 / cx D4 – 1921.
114
Antigos funcionários citam esse edifício de 1922 como sendo a Fábrica um”, e o edifício da década de 1940
como a “Fábrica dois”.
115
Alpargatas: oitenta anos de nossa história. op. cit, p. 24.
116
Idem, p. 25.
Arquitetura Industrial no Bairro da Mooca: Análise e Diretrizes de Intervenção na Alpargatas.
Wayne Almeida de Sousa 64
Justiça e da Faculdade de Direito do Largo de São Francisco.
117
No começo dos anos de 1950
fundou a Construtora Alfredo Mathias, que teve um papel muito importante para a construção
civil de São Paulo.
118
A partir da década de cinqüenta, com a decadência do transporte ferroviário e o
deslocamento das indústrias para áreas mais afastadas, ao longo das rodovias, a atividade
industrial no bairro da Mooca passa por um período de estagnação devido, principalmente, a
falta de espaço para expansão e, depois dos anos de 1970, decadência.
Com isso, as instalações de muitas das grandes instrias localizadas no bairro são
desocupadas e alugadas, geralmente recebendo novos usos. Com a Alpargatas não foi diferente;
seu cleo inicial na Mooca não comportava mais o crescimento da fábrica que começou a se
expandir, primeiro para o interior do Estado e, depois, para o Nordeste.
No ano de 1969 a Alpargatas adquire outro terreno na Rua Dr. Almeida Lima, com
2.000 metros quadrados, onde foi instalado o centro de processamento de dados. Em 1982 a
117
Sobre Alfredo Mathias ver: FICHER, Sylvia. Ensino e Profissão: O curso de engenheiro-arquiteto da Escola
Politécnica de São Paulo. Tese de Doutoramento, Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas -
Universidade de São Paulo, São Paulo, 1989, pp. 397-398; e sobre a Construtora Alfredo Mathias ver: PEREIRA
LEITE. Luiz Ricardo. Estudo das estratégias das empresas incorporadoras do Município de São Paulo no segmento
residencial no período 1960-1980, Dissertação de Mestrado, Faculdade de Arquitetura e Urbanismo – Universidade
de São Paulo, São Paulo, 2006.
118
Em sua fase inicial, a Construtora Alfredo Mathias executou obras residenciais e comerciais no centro da Cidade
como, por exemplo, as galerias Nova Barão, entre as Ruas Itapetininga e Sete de Abril e Grandes Galerias, na Rua
24 de Maio; o edifício Conde Prates, na Rua Líbero Badaró; o Edifício Princesa Isabel, na Avenida São Luís; o
Edifício Savoy, na Avenida Paulista; e os Edifícios Santa Sofia e Santa Odila, na Avenida Higienópolis. [PEREIRA
LEITE, op. cit. p. 194] Entre os anos de 1951 e 1956 as obras da Construtora Alfredo Mathias eram projetadas por
Giancarlo Palanti, profissional italiano que se estabeleceu em São Paulo no ano de 1947. [SALMONI e
DEBENEDETTI, op. cit, pp. 158-161] Durante os anos de 1952 e 1954, exercendo o cargo de diretor de projetos,
Palanti teve participação decisiva em obras como, por exemplo, os edifícios Chipre e Gibraltar e o Cinema Belas
Artes, na esquina da Rua da Consolação com a Avenida Paulista. [SANCHES, Aline Coelho. A obra de Giancarlo
Palanti em São Paulo, Arquitextos 031.01, Dezembro de 2002] Na cada de 1960, Alfredo Mathias foi pioneiro
iniciando a construção do primeiro shopping center brasileiro: o Shopping Center Iguatemi, que logo foi seguido de
outro em Salvador e outro em Campinas. Outras obras importantes da Construtora Alfredo Mathias durante as
décadas de 1960 e 1970 foram a Biblioteca Pública de Araras, os edifícios Gaivota, Capitânia, Náutilus e Caravela,
no Guarujá; e diversos edifícios residenciais financiados pelo BNH. [PEREIRA LEITE, op. cit. p. 195.] No início
dos anos de 1980, depois de uma série de negócios mal sucedidos, como dificuldades nas vendas em alguns
empreendimentos e uma tentativa de concorrência internacional, no Oriente dio, a Construtora Alfredo Mathias
não conseguiu se recuperar e pediu falência.
Arquitetura Industrial no Bairro da Mooca: Análise e Diretrizes de Intervenção na Alpargatas.
Wayne Almeida de Sousa 65
empresa compra da Alpargatas Sociedad Anónima Industrial y Comercial, da Argentina, o
último lote de ações e termina o processo de nacionalização, se tornando uma empresa de capital
100% nacional.
Esse processo de expansão para outras regiões do Brasil continua e se intensifica de tal
maneira que no final dos anos de 1990 os principais edifícios da Alpargatas, localizados na Rua
Dr. Almeida Lima, são desocupados e vendidos para uma Universidade que, depois de uma
grande intervenção para adaptá-los ao novo uso, ocupa o conjunto ahoje.
Muitas alterações foram realizadas para adaptar os edifícios ao novo uso como, por
exemplo, quebra de paredes internas, adição de novas paredes e construção de mezaninos em
estrutura metálica. Esse projeto de intervenção foi realizado pelo arquiteto Vicente Giffoni.
119
O único edifício do antigo núcleo da Rua Dr. Almeida Lima que ainda continua de
propriedade da Alpargatas é o edifício construído no final da década de 1960 para abrigar o
centro de processamento de dados. Esse edicio ainda funcionou durante algum tempo como
escritórios e hoje abriga uma loja de fábrica chamada Megga Shop, onde são vendidos inúmeros
produtos produzidos sob as diversas marcas registradas da Alpargatas.
119
RUFINONI, op. cit, p. 90.
Arquitetura Industrial no Bairro da Mooca: Análise e Diretrizes de Intervenção na Alpargatas.
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Arquitetura Industrial no Bairro da Mooca: Análise e Diretrizes de Intervenção na Alpargatas.
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2.3. Análise dos Edifícios.
A análise dos edifícios da Alpargatas foi feita através da pesquisa documental, citada
anteriormente e de pesquisa de campo, em processo com alguns percalços.
120
Apesar das
dificuldades, muito material importante foi conseguido e uma boa parte da parte interna dos
gales de 1907 de ser registrada. Nesse sentido, foi possível observar as intervenções
realizadas para adaptar o conjunto da Alpargatas ao novo uso, e ter uma idéia de como a
inserção desses novos elementos afetou a arquitetura produzida no início do culo XX.
Segundo o projeto encontrado no processo do ano de 1907,
121
os gales situados no
número 14 da antiga Rua da Concórdia, possuem cinco partes que podem ser separadas em três
volumes principais: dois volumes laterais, um a direita e outro a esquerda, com dois galpões cada
e um volume central, descoberto, que faz a ligação entre os outros dois volumes laterais.
Cada volume de dois galpões tem 29,72 metros de frente por 47,93 metros, e o volume
central tem 20,56 metros de frente pelos mesmos 47,93 metros. No total, o conjunto tem
120
A primeira aproximação com o objeto de estudo foi mais difícil do que o esperado, pois a Universidade que
atualmente ocupa o conjunto da Alpargatas tem uma rígida política e o autoriza que fotografias sejam tiradas
dentro de suas depenncias. De acordo com os funcionários responsáveis pela segurança, nem mesmo os
estudantes podem tirar fotografias dentro das dependências da Universidade sem autorização prévia. Somente depois
de uma série de conversas e novas visitas ao local foi possível conhecer brevemente o interior do edifício, no dia 22
de Julho de 2008, quando foram tiradas as primeiras fotografias da parte externa dos edifícios. Tudo sob atenta
vigilância dos seguranças da Universidade.
Nos meses seguintes as visitas foram um pouco mais produtivas e foi possível fazer um registro fotográfico
preliminar do interior. Depois de obtida uma autorização com a direção da Universidade, foi permitido conhecer
uma parte do campus, mais especificamente, o pavimento rreo da área ocupada pelos primeiros galpões de 1907
construídos pelo engenheiro Julio Micheli, como, por exemplo, o hall de entrada que faz a ligação entre os galpões e
o edifício construído na década de 1940, os corredores de circulação e a área onde se localizam algumas lojas e
lanchonetes. Também foi possível visitar o pátio que fica atrás dos edifícios e algumas outras áreas externas
próximas à ferrovia, onde estão localizadas quadras de esporte e espaços para lazer dos alunos.
Deve se deixar bem claro que essas visitas foram sempre muito bem acompanhadas por algum dos seguranças da
Universidade, instruído ao deixar que fossem tiradas fotos de nenhum tipo de cartaz, placa ou aviso que tivesse a
logomarca e o nome da Universidade.
Isso dificultou muito os trabalhos e fez com que muitos elementos arquitetônicos, tanto dos antigos galpões quanto
das intervenções realizadas durante os anos de 1990, não pudessem ser analisados com a devida acuidade e nem
registrados através de fotografias.
121
Ver: Arquivo Histórico Municipal Washington Luis, processo número: op 1907 - 000 – 401.
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aproximadamente 9 metros de altura, 80 metros de frente por 47,93 metros, com
aproximadamente 3.800 metros quadrados de área.
Assim como a maioria dos edifícios industriais daquele período, esses galpões também
foram construídos em alvenaria de tijolos e, na parte externa da fachada, voltada para a Rua Dr.
Almeida Lima, foi utilizado o Sistema Flamengo.
Em seu manual técnico sobre Alvenaria e Cantaria, muito difundido entre os
construtores da época, João Emílio dos Santos Segurado faz uma série de consideração a respeito
da maneira de se melhor construir em alvenaria de tijolos, e ainda faz detalhadas descrições dos
aparelhos de tijolos utilizados, inclusive o Sistema Flamengo, utilizado nos gales de 1907.
122
“Dá se o nome de alvenaria o conjunto dos materiais pedregosos em fragmentos de
grandeza apreciável, dispostos convenientemente de forma a constituírem maciços; ligam-
se entre si por meio de argamassa, formando a alvenaria ordinária, a alvenaria
hidráulica, a alvenaria de tijolo, etc., ou apenas se travam entre si, pela maneira como se
dispõem por sobreposição; é o caso da alvenaria insossa ou de pedra seca, etc.”
123
“(...) A espessura das juntas não deve exceder de ordinário um centímetro, devendo
a argamassa ser um pouco consistente e preencher completamente o intervalo entre os
tijolos; para esse fim deita-se uma chapada de argamassa sobre a qual se põe o tijolo,
carregando-o e esfregando-o levemente para a argamassa jorrar pelas juntas.
Deve haver o máximo cuidado em conservar as juntas horizontais e os paramentos
verticais (...).”
124
“No assentamento do tijolo devemos considerar dois casos: ou o tijolo fica à vista
ou não. No primeiro caso tem que ser cuidadosamente escolhido, pondo-se de lado todos
os tijolos fendidos, partidos, mal cozidos, queimados, os que tenham dimensões maiores
ou menores que as normais, etc. Os tijolos defeituosos reservam-se para a da parede que
122
SEGURADO, op. cit.
123
Idem, p. 3.
124
Idem, p. 71.
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não fica à vista. Se aquela é para rebocar, todo o tijolo serve e nem mesmo é preciso
regularizar as juntas pois a sua aspereza facilita a aderência do reboco.
Ao crescer parede nunca se deve deixar parte dela com altura superior a um metro
relativamente à construção anteriormente feita. Tendo de deixar por tempo ilimitado uma
parede por acabar devem as fiadas deixar-se em forma de degraus para que a parte nova
possa travar bem a antiga.
É conveniente, indispensável em tempo seco, molhar o tijolo para lhe tirar a poeira e
facilitar a aderência da argamassa, evitando que a humidade do tijolo seja absorvida pela
argamassa.
Ao assentar tijolo deve-se sempre matar junta, evitando-se, como para as pedras, a
continuidade das juntas verticais; há diferentes modos de dispor os tijolos nas paredes, em
satisfação àquela condição, dependendo tal disposição em grande parte da espessura da
parede. Esta indica-se quási sempre pelo número de tijolos nela incluídos, dizendo-se
assim parede de meia vez e uma vez tijolo, de vez e meia, duas vezes, etc.
A parede mais delgada é a de tijolo de cutelo, ou ao alto, isto é, assente segundo a
sua espessura. A esta parede, bem como à de meia vez e uma vez tijolo, se o nome de
pano de tijolo.”
125
“(...) Sistema Flamengo; em cada fiada, a uma travadoura seguem-se dois tijolos a
par, depois outra travadoura, outros dois tijolos a meia vez e assim por diante. Na fiada
seguinte as travadouras correspondem ao centro dos tijolos a par. Para começar uma
fiada, afim de obter o sobreposto, assentam-se dois tijolos cortados a par com três quartos
de comprimento apenas; em seu lugar pode adoptar-se a disposição do sistema inglês.
Êste sistema é considerado de melhor aspecto que os procedentes e preferido para
paredes exteriores, mas em resistência é inferior ao sistema inglês que apresenta melhor
travamento.”
126
125
Idem, p. 72.
126
Idem, p. 76.
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A fachada principal tem aproximadamente 40 centímetros de espessura e quase não
apresenta elementos decorativos, conta apenas com a presença de revestimento nos pilares, para
marcar sua modulação; um friso, que estende por toda a fachada; e óculo no frontão.
De acordo com o projeto encontrado, os volumes laterais eram iguais. Cada galpão
conta com a presença de seis janelas de formato retangular, fabricadas em ferro, agrupadas de
duas a duas e com um leve arco na parte superior.
Na parte interna desses gales não houve muita preocupação com a qualidade da
alvenaria nem com o aparelho de tijolos utilizado. Nela podem ser vistos diversos desenhos
diferentes, principalmente ao longo das fachadas, e nenhum deles se adéqua aos modelos de
aparelhos descritos por Segurado.
Por ser o acesso principal do conjunto, a fachada do volume central apresenta uma
configuração diferenciada das demais, é um pouco mais simples, não tem nem frontão e nem
óculo e possui três portas, sendo uma maior ao centro, com duas janelas de cada lado.
Na planta encontrada no Arquivo Histórico Municipal Washington Luis, os dois
volumes laterais estão identificados como “Sala das Machinas” e têm como característica
principal a planta livre, ou seja, grandes áreas delimitadas apenas pela alvenaria das fachadas. No
seu interior, a presença de pilares formando módulos de aproximadamente 5 metros por 3,5
metros de distância, dão suporte para a estrutura da cobertura.
A cobertura desses galpões é de duas águas e construída em madeira com a presença de
lanternim na faixa central, para melhor ventilação e iluminação zenital. De acordo com o projeto,
no volume da direita ainda podemos ver a presença de um pequeno anexo com duas salas e uma
área coberta avarandada na frente, onde estão localizados oDepósito” e o “Escriptório”.
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Sobre o atual estado de conservação desses gales, partes da fachada principal, voltada
para a Rua Dr. Almeida Lima, ainda se encontram em ótimo estado de conservação,
principalmente, as dos gales à esquerda. O volume central sofreu uma série de intervenções e
foi bastante alterado, as portas foram transformadas em janelas, e fechadas com placas de metal.
Os gales do volume à direita foram os que mais sofreram alterações, tiveram o
acréscimo de um segundo pavimento e a abertura de vãos maiores, possivelmente para a entrada
de veículos, que hoje são utilizados como entradas secundárias da Universidade.
No interior desses galpões, as intervenções foram ainda mais evidentes e tiveram como
objetivo principal adequar o conjunto de edicios às atividades de uma Universidade. Nesse
sentido, a principal linha do projeto foi construir diversos espaços segmentados sob a cobertura
dos gales, onde foram instaladas uma série de novas atividades, como pequenas lojas,
lanchonetes, salas de aula e outros espaços para usos variados.
É claro que toda essa flexibilidade de espaços foi possível gras à configuração
original dos gales, com um direito de aproximadamente quatro metros de altura e amplas
áreas livres em planta com a presença apenas dos pilares.
Esses espaços são muito agradáveis e se utilizam muito bem da iluminação natural
proporcionada pela cobertura. Entre esses espaços, além das áreas de circulação, ainda foram
deixados alguns pátios de convivência, com muita vegetação e alguns bancos para a utilização
dos alunos no intervalo das aulas.
Apesar das intervenções terem respeitado os edifícios em diversos aspectos como, por
exemplo, novas instalações elétricas, hidráulicas, ar condicionado e de incêndio aparentes, que
o agrediram os elementos originais dos edifícios; e salas de aula destacadas da estrutura
original dos galpões, seguindo o princípio da reversibilidade das teorias de restauro; foi dada
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pouca atenção para outros princípios, principalmente, os da distinguibilidade e respeito ao
conjunto da obra.
Todas essas intervenções prejudicam muito a visão geral do conjunto e, em muitos
casos, por também terem sido construídas em alvenaria de tijolos, tendem a se confundir com os
elementos já existentes da alvenaria original, dando a impressão de serem elementos de fases
anteriores do edifício.
Apesar de algumas intervenções, como a abertura de novas janelas e uma grande
passagem que faz a ligação com o edifício construído na década de 1940, a fachada lateral do
edifício de 1907 ainda se encontra em ótimo estado de conservação e é o elemento principal da
área externa da Universidade, utilizada para lazer e esportes.
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O edicio construído na década de 1920, entre as Ruas Dr. Almeida Lima, Frei Gaspar
e Conselheiro Laffaeytte; ocupa quase todo quarteirão, com exceção da parte voltada para a Rua
Ipanema, onde se localizam diversos edifícios menores de uso predominantemente residencial.
127
Assim como o conjunto da década de 1900, esse edifício também foi construído em
alvenaria de tijolos e sua fachada principal, voltada para a Rua Dr. Almeida Lima, tem
aproximadamente 40 centímetros de espessura. Diferentemente da fachada dos edifícios da
década de 1910, que tem como marca principal a simplicidade, essa fachada é muito mais
elaborada e impressiona pela qualidade e beleza dos elementos decorativos.
À primeira vista pode-se pensar que toda essa riqueza de detalhes estaria relacionada
com uma fase de prosperidade da empresa, o que não foi o caso, pois como já foi dito
anteriormente, nos anos de 1920, a empresa passava por rias dificuldades financeiras causadas
pela quebra da bolsa de Nova Iorque, tendo inclusive que parar de produzir as alpargatas.
Segundo o projeto encontrado no Arquivo Histórico Municipal Washington Luis,
128
as
fundações desse edifício são de pedra, medem 80x80 centímetros e estão a 1,40 metros do vel
do piso interno. A cobertura é uma mistura de estrutura metálica com madeira e, por isso, os
os entre os pilares são um pouco maiores que nos primeiros gales, chegando a 7,25 metros.
Construído originalmente para abrigar uma fábrica de calçados de borracha, hoje recebe
diferentes usos. Na fachada principal voltada para a Rua Dr. Almeida Lima, existe uma grande
127
Devido a uma mudança nos procedimentos da Universidade, não foi possível visitar e fazer o registro fotográfico
do interior desse edifício, o que impossibilitou uma análise mais detalhada de suas características construtivas,
arquitetônicas e das intervenções que foram realizadas para adaptá-lo ao novo uso.
128
Ver: Arquivo Histórico Municipal Washington Luis, processo número: Doc4 / cx D4 – 1921.
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portaria que acesso a outra ala da Universidade, onde também são administrados diversos
cursos.
A fachada voltada para a Rua Frei Gaspar é marcada por uma série de entradas de um
grande estacionamento que é utilizado, principalmente, pelos freqüentadores do campus e pelos
trabalhadores da região, pois o bairro ainda abriga diversas fábricas e uma série de pequenos
comércios como, por exemplo, bares e restaurantes.
Na fachada voltada para a Rua Conselheiro Lafaiete está localizada a clínica veterinária
da Universidade e na esquina com a Rua Frei Gaspar está sendo construído um hospital, tamm
de propriedade da Universidade.
129
Como já foi dito anteriormente, na época de sua construção foi feito um túnel
atualmente desativado
130
sob a Rua Dr. Almeida Lima para melhorar a comunicação e o
transporte de material entre esse novo edifício e os primeiros gales.
129
Informação obtida com funcionários que estavam trabalhando na obra durante uma das visitas ao local.
130
Sem ter autorização para visitar essa área, foi informado por um dos seguranças que esse túnel havia sido
desativado algum tempo, possivelmente devido a uma séria infiltrão, e não estava sendo utilizado pela
Universidade.
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O edifício da década de 1940 foi todo construído em estrutura de concreto armado, com
seis pavimentos mais o térreo, e se destaca na paisagem dominada por edifícios mais baixos e
pode ser visto de longe, quase sem nenhum obstáculo. Diferentemente dos outros edifícios das
décadas de 1910 e 1920, construídos em alvenaria de tijolos, esse edifício apresenta um número
muito maior de aberturas em sua fachada. Pode-se perceber que,
131
ao longo dos anos, ele sofreu
intervenções muito mais invasivas que os galpões da década de 1910. O fato dos gales serem
térreos, com pé-direito alto e amplas áreas livres delimitadas apenas pelas fachadas,
proporcionou grandes espaços livres que puderam ser aproveitados mais facilmente no projeto de
intervenção.
Apesar ter uma grande área de aproximadamente 13.000 metros quadrados, ela é
dividida em sete pavimentos, tornando seus espaços muito mais segmentados. Esse fato gerou
uma série de problemas para a adaptão ao novo uso, ainda mais um uso que não era
compatível com esse tipo de edifício. Um exemplo muito claro é o problema das escadas
rolantes, que para sua instalação foi necessária a demolição de algumas paredes e parte da laje
existente. No térreo desse edifício ainda foi instalada uma academia de ginástica e uma série de
outros espaços de lazer para uso dos alunos.
Além disso, tamm foram feitas diversas outras abertura no pavimento térreo para
fazer uma melhor ligação com o edifício de 1907 e com o pátio externo, que se localiza na parte
posterior do terreno, próximo à ferrovia.
131
Não foi possível visitar os pavimentos superiores.
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O único edicio da Rua Dr. Almeida Lima que ainda é de propriedade da Alpargatas é
o edifício da década de 1960, constrdo originalmente para abrigar um centro de processamento
de dados. Depois que os outros edifícios foram vendidos, ele passou a abrigar diversas funções
administrativas até ser transformado em uma loja de brica.
132
Além do pavimento térreo, esse
edifício ainda conta com um andar inferior no subsolo, onde funciona atualmente o estoque da
loja.
133
Externamente esse edifício está bem descaracterizado e todo o entorno está sendo
utilizado como estacionamento, com entradas pelas Ruas Dr. Almeida Lima e Frei Gaspar. Nesse
estacionamento ainda pode ser vista a construção de diversos anexos como, por exemplo,
guaritas de segurança e edifícios menores utilizados como depósitos. Com estrutura de concreto
armado e fechamentos em alvenaria de tijolos, toda fachada foi alterada e pintada com cores
vibrantes.
Internamente o edifício recebeu uma série de divisórias que delimitam os diferentes
setores da loja e a parte administrativa, onde estão localizados os escritórios dos funcionários.
Um desses escritórios foi instalado onde era o antigo cofre.
134
132
Ao contrário do que aconteceu nos edifícios de propriedade da Universidade, os funcionários que atualmente
trabalham na loja foram bem receptivos, autorizaram o registro fotográfico das áreas externas, deram permissão para
visitar todo o pavimento térreo, onde hoje funciona a loja e suas áreas administrativas; e ainda ajudaram no que foi
possível com informações sobre a Alpargatas. Sr. Roque, atual gerente da loja, e o Sr. Albino Brogini, funcionário
da empresa há muitos anos, ajudaram com interessantes informações sobre a Alpargatas.
133
Essa foi única área para a qual não foi autorizada a entrada, por motivos de segurança.
134
Durante todo o período de pesquisa tentou-se agendar novas visitas com o Setor de Patrimônio do Campus
Centro da Universidade Anhembi Morumbi e com a Pró-Reitora de Operações do campus, mas as conversas não
avançaram na velocidade necessária e, por esse motivo, não foi possível complementar o registro fotográfico dos
edifícios da década de 1920 e 1940.
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3. Problemas de Preservação do Patrimônio Industrial do Bairro da Mooca e sua
Relação com a Alpargatas: Diretrizes para sua Preservação.
3.1. Apresentação.
A análise do complexo de edifícios que formavam o conjunto da Alpargatas, na Rua Dr.
Almeida Lima, no bairro da Mooca, nos relaciona com a probletica do patrimônio industrial e
as questões ligadas à sua preservação. Conjuntos como este, só passaram a ser entendidos como
dignos de preservação há muito pouco tempo e, por serem temas ainda pouco explorados, para os
quais o reconhecimento do interesse para a preservação é problemático, correm riscos de
destruição ou de intervenções deformadoras.
Apesar da sua repercussão na prática da preservação ainda ser extremamente difícil, o
interesse pela arquitetura industrial vem de muito tempo. A expressão arqueologia industrial”,
que se consagrou somente em meados do culo XX, a partir de discussões ligadas à
historiografia britânica, surgiu ainda no século XIX, em Portugal, num estudo de Francisco de
Souza Viterbo, sobre moinhos.
135
No século XX, presenciamos no Brasil experiências pioneiras como, por exemplo, o
tombamento federal do que resta da Real Fábrica de Ferro São João de Ipanema, em 1964, no
135
Ver: POZZER, Guilherme Pinheiro. A Antiga Estação da Companhia Paulista em Campinas: Estrutura
Simbólica Transformadora da Cidade. Campinas, Unicamp, Dissertação de Mestrado, 2007, pp. 209-218. O Artigo
de Souza Viterbo é de 1896 e intitulado “Arqueologia Industrial Portuguesa: Os Moinhos”.
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atual município de Iperó, no Estado de São Paulo, quando aparece nas justificativas para o seu
tombamento a expressãoarqueologia industrial”:
“Remanescente de arqueologia industrial do primeiro complexo funcionante para
exploração e fabricação do ferro no Brasil. (...) Estas instalações funcionaram até o final
do século XIX, produzindo grades, equipamento agrícola e armas brancas”
136
Essa experiência não se traduziu numa política institucional de identificação e proteção
sistemáticas de remanescentes de indústrias, estendendo-se aos três níveis de proteção (federal,
estadual e municipal), mas a ela seguiram-se numerosos estudos sobre o problema da
industrialização no Brasil e sobre os edifícios a ela relacionados, que mais recentemente se têm
traduzido por vários estudos consistentes em âmbito universitário.
No Estado de o Paulo, podemos destacar as universidades estaduais USP,
UNICAMP e UNESP –, através de várias faculdades; o IFICH-UNICAMP, por sinal, foi
organizador e sede de importante evento científico em 2004 que resultou na criação do Comitê
Brasileiro do TICCIH (The International Committee for the Conservation of the Industrial
Heritage).
Infelizmente, na prática de atuação sobre o patrimônio industrial ainda não é possível
verificar um amadurecimento semelhante àquele que se no campo da historiografia, que
percorreu um belo caminho, apesar de ainda faltar muito a ser feito, tanto no que se refere a
estudos monográficos, quanto a releituras mais gerais a partir, justamente desses estudos
pontuais mais recentes.
136
CUNHA, Claudia dos Reis. O Patrimônio Cultural da Cidade de Sorocaba: Análise de uma Trajetória. São
Paulo, FAUUSP, Dissertação de Mestrado, 2005, pp. 107-108. É de interesse mencionar ainda a proteção dos
remanescentes do Engenho de São Jorge dos Erasmos, do século XVI, que era uma unidade de produção de açúcar,
tombada pelo IPHAN em 1963 e pelo CONDEPHAAT em 1974.
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Se analisarmos o que ocorre com as intervenções em bens industriais, a impressão que
fica é que a teoria e a prática caminham em sentido contrário: enquanto os estudos históricos,
com pesquisas, levantamento e registros, se tornam cada vez mais aprofundados, as intervenções
são cada vez menos fundamentadas. Basta verificar o que ocorre atualmente no bairro Mooca,
com numerosas destruições ou intervenções desastradas, como são os casos do antigo Moinho
Gamba, do Cotonifício Crespi e da Alpargatas, que não são de modo algum exceções em relação
ao que ocorre nesse campo, apesar de a Mooca se estar constituindo numa tima preferencial
desse tipo de ação, por ter passado por um intenso processo de valorização do solo nos últimos
anos e, portanto, ter se tornado zona de grande interesse por parte da especulação imobiliária.
A especulação imobiliária é algo com que o patrimônio industrial sempre teve e sempre
terá de se defrontar, porque, em geral, as construções ligadas ao processo de industrialização se
tornaram obsoletas, ou foram substitdas por novas construções ou ocupam grandes áreas que
na época de criação dos núcleos industriais estavam situadas na periferia de grandes cidades,
caso de São Paulo. Com o tempo, essas áreas acabaram sendo englobadas pelo processo de
crescimento dessas cidades e atualmente são zonas com enorme potencial para novos
empreendimentos, tornando-se áreas preferenciais para a atuação da especulação imobiliária.
Arquitetura Industrial no Bairro da Mooca: Análise e Diretrizes de Intervenção na Alpargatas.
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3.2. Questões Ligadas à Arqueologia Industrial.
O processo de destruição de conjuntos industriais para a execução de novos
empreendimentos, em âmbito europeu, que muitas vezes não enfrentou qualquer tipo de
resistência, acabou por gerar uma maior conscientização em relação à arqueologia industrial.
Manifestações públicas mais significativas ocorreram quando importantes exemplares foram
destruídos, como o caso da demolição do Mercado de Carvão e a Estação Euston em Londres, no
início dos anos 1960, e do Mercado Central de Paris, na década seguinte.
137
Essas destruições levaram a iniciativas mais consistentes de preservação em ambos os
países, com a realização de inventários e intensa produção científica a fim de se registrar
rapidamente a maior quantidade possível de exemplares ameaçados, na Inglaterra, e de
iniciativas para a criação de “ecomuseus”, na França, a exemplo do Musée de l’homme et de
l’industrie - Le Creusot, constitdo em 1972-1974.
138
137
Para esses temas ver: HL, Beatriz Mugayar. Preservação do Patrimônio Arquitetônico da Industrialização:
Problemas Teóricos de Restauro. Cotia, Ateliê-FAPESP, 2009, pp 40-42. Na p. 40: O tema ganhou maior vigor e
atraiu a atenção de público mais amplo sobretudo a partir do início dos anos 1960, quando importantes
testemunhos arquitetônicos do processo de industrialização foram demolidos, a exemplo da Estação Euston em
Londres destruída em 1962. Naquele mesmo ano foi também iniciada a demolição do Coal Exchange , para o
alargamento de uma avenida. Apesar dos protestos que levaram à paralisação temporária das obras, na tentativa
de preservar ao menos a cúpula do edifício, desmontando-a para remontá-la em outro lugar, não se chegou a um
acordo e esse importante testemunho da arquitetura do ferro foi destruído. Esses edifícios, ou inteiros complexos,
estavam (e estão) sob constante ameaça pela sua obsolescência funcional, pelo crescimento das cidades e pela
pressão especulativa imobiliária.” Na p. 42: “Durante os anos 1970 vários outros países passaram a atuar de forma
mais sistemática na arqueologia industrial, sendo um exemplo a França. Um fato crucial para desencadear o
processo foi a destruição do Mercado Central de Paris Halles Centrales –, de Victor Baltard no início daquela
década. Apesar da exisncia de grupos e associações que se ocupavam do tema, a conscientização em relação à
importância do patrimônio industrial levaria certo tempo para amadurecer. Maurice Daumas constatou, em
relação aos Halles, um dos principais símbolos da arquitetura do ferro no país, que, na época de sua destruição,
não despertou interesse de nenhum setor, sendo demolido sem maiores protestos. Depois de verificado o estrago
resultante desse feito, em pleno âmago da cidade, começou-se a adquirir uma consciência mais efetiva da barbárie
do ato. Houve um número crescente de manifestações em favor da salvaguarda do patrimônio industrial no
decorrer da década, com iniciativas concretas de grande envergadura, a exemplo da preservação, ainda nos anos
1970, das salinas de Chaux e do complexo do Le Creusot, organizado em 1972-1974.”
138
Para a análise dos ecomuseus e bibliografia complementar, ver: BARBUY, Heloísa. A conformação dos
ecomuseus: elementos para compreensão e análise, Anais do Museu Paulista, São Paulo, v. 3, 1995, pp. 209-236.
Arquitetura Industrial no Bairro da Mooca: Análise e Diretrizes de Intervenção na Alpargatas.
Wayne Almeida de Sousa 113
A expressão arqueologia industrial ganhou as primeiras definões mais consistentes na
Inglaterra, na década de 1950, e passou a receber cada vez mais estudo no decorrer das duas
décadas seguintes, em que há um grande esforço para tentar definir e conhecer melhor o
patrimônio industrial para se determinar o que e porque preservar. Uma definição de grande
interesse e que mantém muitos aspectos essenciais foi aquela enunciada por R. Angus Buchanan,
em 1972:
“(...) arqueologia industrial é um campo de estudo relacionado com a pesquisa,
levantamento, registro e, em alguns casos, com a preservação de monumentos industriais.
Almeja, além do mais, alcançar a significância desses monumentos no contexto da história
social e da técnica. Para os fins dessa definição, um 'monumento industrial' é qualquer
relíquia de uma fase obsoleta de uma indústria ou sistema de transporte, abarcando desde
uma pedreira de sílex neolítica até uma aeronave ou computador que se tornaram
obsoletos pouco. Na prática, porém, é útil restringir a atenção a monumentos dos
últimos duzentos anos, aproximadamente, tanto porque períodos anteriores são tratados
por todos mais convencionais da arqueologia e da história, quanto pela grande massa
de material datando do começo da Revolução Industrial.”
139
Essa visão do que é um monumento industrial é muito mais abrangente do que algumas
definições anteriores, como aquela que é considerada a primeira na Grã-Bretanha, elaborada por
um membro da Inspetoria de Monumentos Antigos do Ministério de Obras, em 1962:
“Um monumento industrial é qualquer edificação ou outra estrutura permanente,
especialmente do período da Revolução Industrial que, seja sozinha ou associada a
139
KÜHL, Beatriz Mugayar. Preservação do Patrimônio Arquitetônico da Industrialização: Problemas Teóricos de
Restauro. Cotia, Ateliê-FAPESP, 2009, p. 39.
Arquitetura Industrial no Bairro da Mooca: Análise e Diretrizes de Intervenção na Alpargatas.
Wayne Almeida de Sousa 114
instalação primária para equipamento, ilustra o começo e desenvolvimento dos processos
industriais e técnicos, incluindo meios de comunicação.”
140
Muitas das definições dos anos 1960 delimitam cronologicamente apenas o período da
chamada “revolução industrial” como sendo o principal objeto de estudo, apesar de algumas
manifestões, ainda naquela década, tentarem expandir o campo de ação com definições mais
abrangentes, a exemplo de Keneth Hudson:
“arqueologia industrial é a descoberta, registro e estudo dos resíduos físicos de
indústrias e meios de comunicação do passado.”
141
Um alargamento mais efetivo do campo de ação se mostrou necessário durante os anos
1970, a partir de confrontos internacionais das várias experiências, em que se destaca a criação
do The International Committee for the Conservation of the Industrial Heritage (TICCIH) em
1978, como conseqüência de vários congressos internacionais para a conservação de
monumentos industriais, o primeiro deles em 1973 em Ironbridge, Inglaterra, o segundo em 1975
em Bochun, na Alemanha, e o terceiro em 1978 em Estocolmo, Suécia, quando a instituição foi
formalizada.
Entendeu-se que o limite cronológico não podia ser tão gido, pois havia muita
diversidade de períodos de industrialização entre os vários países, assim como a existência de
atividades industriais muito antes da chamada “Revolução Industrial”, fato associado ainda à
140
RAISTRICK, Arthur. Industrial Archaeology. An Historical Survey. Frogmore, St. Albans, Paladin, 1973, p. 2.
141
HUDSON, Keneth. Industrial Archaeology. A New Introduction. London, Baker, 1976, 3ªed. (1ª ed. 1963), p. 21.
Arquitetura Industrial no Bairro da Mooca: Análise e Diretrizes de Intervenção na Alpargatas.
Wayne Almeida de Sousa 115
dificuldade em se estabelecer fronteiras precisas entre artesanato e indústria.
142
Nos muitos debates realizados nos anos 1970 e 1980 aparecem com freqüência também
outros problemas. Um deles é o próprio uso da palavra “arqueologia”, pois alguns autores
contestavam seu emprego por não serem necessárias técnicas de escavações.
Outros autores, como Maurice Daumas,
143
afirmaram que nem sempre são necessárias
escavações, mas que se poderia falar de arqueologia industrial quando houvesse
remanescentes materiais do processo de industrialização; na ausência deles, o problema recairia
no campo das pesquisas históricas tradicionais”. Manoela Rufinoni destaca uma passagem de
Daumas:
“A arqueologia industrial, que não deve ignorar nada do que ensina a história
tradicional, tem por objeto principal a pesquisa e o estudo dos sítios onde se desenrolaram
esses tipos de atividade, e os testemunhos artificiais, os artefatos, que aí permanecem.
Mas trata-se do primeiro passo da nossa nova disciplina. A pesquisa e a observação
permitem identificar o que não foi ainda destruído, determinar a sua historicidade,
apreciar seu interesse, provocar sua salvaguarda. Pois é nisso, sem dúvida, que convém
reconhecer o objetivo primordial da arqueologia industrial.”
144
Apesar de um relativo consenso sobre o tema, as discussões sobre arqueologia industrial
permanecem em aberto, sendo o uso da expressão arqueologia industrialmais freqüente em
142
Sobre esses temas ver: KÜHL, Beatriz Mugayar. Arquitetura do Ferro e Arquitetura Ferroviária em São Paulo.
Cotia, Ateliê-FAPESP, 1998, em especial pp. 221-230. Ver ainda RUFINONI, op. cit. e POZZER, op. cit.
143
Ver: DAUMAS, Maurice. L'Archéologie Industrielle en France. Paris, Laffont, 1980.
144
Ver: RUFINONI, op. cit. p. 126.
Arquitetura Industrial no Bairro da Mooca: Análise e Diretrizes de Intervenção na Alpargatas.
Wayne Almeida de Sousa 116
alguns países, e “patrimônio industrialem outros. Nesse sentido, Annette Laumon
145
propôs
que se voltasse às raízes etimológicas de arqueologia, que equivale a estudo do passado”,
146
o sendo, portanto necessárias nem escavações nem testemunhos materiais da atividade
industrial. A outra grande polêmica existente no período dizia respeito à tentativa de criação de
graduação específica sobre o tema e, inclusive com tentativas de definição da profissão do
arqueólogo industrial”, como proposta por Raistrick:
“O arqueólogo industrial os examinará [testemunhos de indústrias e organizações
industriais] como evidências contribuindo para nosso conhecimento da história e evolução
de determinadas indústrias e processos, e do desenvolvimento da indústria em geral. Seria
apropriado para o arqueólogo industrial fazer algumas escavações próprias em sítios
inteiramente industriais, mas isso necessitaria ser feito com o apuro, precisão e formação do
verdadeiro arqueólogo. Ele deveria, para tanto, ser um arqueólogo com interesse e
conhecimento especial de indústrias.”
147
Houve, porém, muita celeuma em torno dessas tentativas de considerar a arqueologia
industrial como uma disciplina autônoma e de que seja possível haver um profissional que
domine seus instrumentos, pois, na verdade, a arqueologia industrial é um grande campo
temático, que exige a participação de várias disciplinas, cada qual com os referencias teórico-
metodológicos que lhes são próprios. Ou seja, é um campo que só poderia funcionar bem de
maneira multidisciplinar; uma única figura profissional jamais poderia dominar os instrumentos
necessários, que provêm de vários campos disciplinares constitdos, como a história, sociologia,
economia, arqueologia, engenharia, arquitetura etc.
145
Ver: LAUMON, Annette. Tribulations d’une Expression em France. In: L’Etude ET La Mise em Valeur Du
Patrimoine Industiel, 4ème Conférence Internationale, Lyon-Grenoble, Sptembre 1981, Paris, CNRS, 1985.
146
Ver: KÜHL, Beatriz Mugayar. Arquitetura do Ferro e Arquitetura Ferroviária em São Paulo: Reflexões sobre a
sua Preservação. São Paulo, Ateliê/FAPESP/SEC, 1998, p. 224.
147
RAISTRICK, op. cit., p. 8.
Arquitetura Industrial no Bairro da Mooca: Análise e Diretrizes de Intervenção na Alpargatas.
Wayne Almeida de Sousa 117
Depois das discussões dos anos 1970 e 1980, aquilo que se verificou nas reuniões
científicas, dos anos 1990 e 2000 adentro, foi um número cada vez maior de estudos de casos
particulares, mas sem tentativas de estudos mais abrangentes ou polêmicas sobre as definições e
reflexões sobre resultados obtidos, para um efetivo e mais abrangente conhecimento do processo
de industrialização, bem como dos bens culturais ligados a esse processo.
Alguns temas, como o uso da expressão “arqueologia industrial”, por exemplo, se
consolidaram ao longo dos anos, e uma repercussão disso pode ser vista na Carta de Nizhny
Tagil, documento do TICCIH de 2003, realizado na Russia, em que transparece uma visão ampla
do tema:
“O patrimônio industrial compreende os vestígios da cultura industrial que possuem
valor histórico, tecnológico, social, arquitetônico ou científico. Estes vestígios englobam
edifícios e maquinaria, oficinas, fábricas, minas e locais de tratamento e de refinação,
entrepostos e armazéns, centros de produção, transmissão e utilização de energia, meios
de transporte e todas as suas estruturas e infra-estruturas, assim como os locais onde se
desenvolveram atividades sociais relacionadas com a indústria, tais como habitações,
locais de culto ou de educação.
A arqueologia industrial é um método interdisciplinar que estuda todos os vestígios,
materiais e imateriais, os documentos, os artefatos, a estratigrafia e as estruturas, as
implantações humanas e as paisagens naturais e urbanas, criadas para ou pelos processos
industriais. A arqueologia industrial utiliza os métodos de investigação mais adequados
para aumentar a compreensão do passado e do presente industrial.
O período histórico de maior relevo para este estudo estende-se desde os inícios da
Revolução Industrial, a partir da segunda metade do século XVIII até aos nossos dias, sem
negligenciar as suas raízes pré e proto-industriais. Para além disso, apóia-se no estudo
das técnicas de produção, englobadas pela história da tecnologia”.
Arquitetura Industrial no Bairro da Mooca: Análise e Diretrizes de Intervenção na Alpargatas.
Wayne Almeida de Sousa 118
Nessas colocações, amparadas em pelo menos três décadas de experiências e tentativas
de definições, podemos notar semelhanças em relação à proposta de Keneth Hudson como, por
exemplo, a ampliação do período de estudo, que nas primeiras propostas, dos anos 1950 e 1960,
se concentrava na chamada “Revolução Industrial” para as raízes proto-industriais do processo
de industrialização, mas sempre mantendo a ênfase da metade do século XVIII em diante.
No que se refere ao objeto de estudo em si, a ênfase da definição de Buchanan, por
exemplo, recaía na unidade de produção e no produto (apesar de, no livro, estudar tipologias
variadas de indústria e de meios de produção de energia, transportes e serviços públicos),
148
enquanto na Carta de Nizhny Tagil, menciona-se todo o complexo de atividades e de
equipamentos que dão suporte às indústrias, incluindo produção de energia e meios de
transporte; e os locais onde se desenvolvem as atividades sociais. Mas note-se que as atividades
sociais, em si, não são citadas como patrimônio “imaterial”.
Outro fato importante nessa carta é a menção da arqueologia industrial como um
método interdisciplinar”, afastando-se das mencionadas numerosas discussões e polêmicas
dos anos 1970-1980, que debatiam a qualificação da arqueologia industrialcomo disciplina.
149
Outro ponto a ser destacado é o fato de, apesar de vários textos ligados ao patrimônio
industrial citarem a importância de preservar esses complexos, não fazem menção de como fazê-
lo: Buchanan fala que é algo inerente à arqueologia industrial e apresenta levantamentos de
algumas regiões Britânicas em seu livro, mas não menciona quais os princípios deveriam
148
BUCHANAN, R. Angus, Industrial Archaeology in Britain. Harmondsworth, Penguin, 1972, pp. 7-8.
149
Para a polêmica daquele período, ver: KÜHL, op. cit., pp. 43-45.
Arquitetura Industrial no Bairro da Mooca: Análise e Diretrizes de Intervenção na Alpargatas.
Wayne Almeida de Sousa 119
orientar a atuação; a Carta Nizhny Tagil remete aos documentos do ICOMOS-UNESCO, em
especial à Carta de Veneza e à Carta de Burra, mas não aprofunda o tema. Nem menciona o fato
de os documentos terem status diferente na instituição; a primeira aprovada em Assembléia
Geral e ser o documento-base da instituição, a segunda, documento do ICOMOS-Austrália, não
ratificado na Assembléia Geral e com definições, no que respeita ao restauro, contraditórias em
relação à Carta de Veneza (e também por isso não é carta ratificada na Assembléia Geral).
Ou seja, um tema essencial nessa problemática, e que tem sido muito pouco explorado
na produção científica a ela relacionada, refere-se às formas de intervir nesses bens através de
processos de manutenção, de conservação e de restauraçãode maneira a realmente preservá-los
e respeitar aquilo que os caracteriza.
O interesse pela preservão de edifícios industriais ampliou e se consolidou ao longo
dos anos em vários outros países, que iniciaram uma série de estudos se esforçando em realizar
inventários e registros de seus principais edifícios e complexos industriais, como é o caso da
Suécia, onde a preservação da herança industrial tem larga tradição, fundamentada em
consistentes estudos históricos e num sempre presente interesse popular.
150
Na Itália, esse
trabalho vem sendo realizado com mais consistência a partir dos anos de 1970, com publicações
importantes e pioneiras que se sucederam desde meados da década.”
151
No Brasil, além do já
citado caso da Real Fábrica de Ferro São João de Ipanema no ano de 1964, um grande número de
autores provenientes de diversas correntes historiográficas abordam assuntos variados sobre o
150
KÜHL, Beatriz Mugayar, Preservação do Patrimônio Arquitetônico da Industrialização: Problemas Teóricos do
Restauro. São Paulo, FAUUSP, Tese de Livre Docência, 2006, p. 19.
151
Existe um número crescente de textos com enfoques variados, como conceituação da arqueologia industrial,
aspectos históricos e sociais ligados à industrialização, tecnologia, trabalho e os locais a ele dedicados, estratégias de
planejamento territorial, inventários regionais e estudos monográficos sobre intervenções e reflexões sobre
preservação. Ver: HL, Beatriz Mugayar, Preservação do Patrimônio Arquitetônico da Industrialização:
Problemas Teóricos do Restauro.op. cit., pp. 20-21.
Arquitetura Industrial no Bairro da Mooca: Análise e Diretrizes de Intervenção na Alpargatas.
Wayne Almeida de Sousa 120
tema, como os destacados por Kühl: Bandeira Junior, Edgar De Decca, Flávio A. Marques Saes,
Julio Roberto Katinsky, Maria Auxiliadora De Decca, Milton Vargas, Odilon Nogueira de
Matos, Pedro Cardoso da Silva Telles, Philip Gunn, Ruy Gama, Telma de Barros Correia,
Warren Dean, Margarida Andreatta e Ulpiano Bezerra de Meneses.
152
152
Ver: KÜHL, Beatriz Mugayar, Preservação do Patrimônio Arquitetônico da Industrialização: Problemas
Teóricos do Restauro. São Paulo, FAUUSP, Tese de Livre Docência, 2006, pp. 25.
Arquitetura Industrial no Bairro da Mooca: Análise e Diretrizes de Intervenção na Alpargatas.
Wayne Almeida de Sousa 121
3.3. O Problema dos Critérios de Restauração.
As intervenções realizadas no patrinio arquitetônico sempre existiram e, na maioria
das vezes, eram de ordem prática e não demonstravam a consciência cultural que o tema
adquiriu. Essas formas de atuação que seguiam as demandas do comitente, a vontade dos
arquitetos e o gosto da época eram contraditórias e as mais diversas possíveis chegando, em
alguns casos, a transformar o edifício por completo.
Somente a partir do Renascimento começa a surgir um distanciamento e auto-afirmação
em relação ao passado, fazendo com que a herança da antiidade passasse a ser encarada como
uma forma de saber. Verificou-se, a partir de então, uma lenta mudança de postura,
principalmente a partir de finais do século XVIII, quando as intervenções em bens considerados
de interesse cultural não mais fossem ditadas unicamente por questões de cunho prático e de uso,
e que passassem a ser regidas por queses de fundo ético, científico e cultural.
153
Tentativas incipientes de se formular princípios consistentes de conservação e restauro
surgem na Inglaterra e França, onde muitas construções medievais foram demolidas ou
descaracterizadas; surgem como expoentes John Ruskin
154
e Viollet-le-Duc.
155
A preocupação
pelo legado de outras épocas em ambos os países esteve ligada ao Iluminismo e à noção de
ruptura entre passado e presente, a fenômenos vinculados ao nacionalismo e à afirmação da
153
Para melhor entendimento da evolão e transformações ocorridas nas práticas de restauro ao longo dos séculos e
referências bibliográficas complementares, ver: Giovanni Carbonara, Jukka Jokilehto e Françoise Choay.
154
Para John Ruskin, os grandes edifícios tinham seu valor histórico e esse valor era dado justamente pelas marcas
da passagem do tempo. Ver: RUSKIN, John. A Lâmpada da Memória, Cotia, Ateliê, 2008, pp. 29-70.
155
Para Viollet-le-Duc, restaurar um edifício não é mantê-lo, repará-lo ou refazê-lo, é restabelecê-lo em um estado
completo que pode jamais ter existido em um dado momento. Ver: VIOLLET-LE-DUC, Eugene E., Restauração,
Cotia, Ateliê, 2000, p 29.
Arquitetura Industrial no Bairro da Mooca: Análise e Diretrizes de Intervenção na Alpargatas.
Wayne Almeida de Sousa 122
identidade, associada, na França, às destruições geradas pela Revolução Francesa e, na
Inglaterra, às rápidas transformações causadas pela Revolução Industrial.
As idéias antagônicas de Ruskin e Viollet-le-Duc, as múltiplas experiências realizadas
na prática, a crescente discussão de temas ligados à preservação, abriram caminho para o
surgimento de correntes mais moderadas e equilibradas na virada do século XIX para o XX,
como, por exemplo, Camillo Boito,
156
Alois Riegl,
157
e Gustavo Giovannonni, que reelaborou a
teoria da restauração de Boito dando maior importância aos valores históricos e documentais.
Depois da Segunda Guerra Mundial, frente ao grande volume de obras destrdas,
percebeu-se que as formulações de Boito e Giovannoni não ofereciam meios conceituais para se
enfrentar intervenções em massa, e que não se poderia mais enquadrar os edifícios em categorias
pré-determinadas levando em conta seu caráter documental. Para que essas obras
continuassem a transmitir seus valores, precisariam passar por uma série de intervenções com o
objetivo de melhorar sua leitura unidade potencial, ou seja, os valores artísticos passaram a ser
tão importantes, quanto os valores históricos.
Na tentativa de afastar a restauração do empirismo e de atos arbitrários e aproxi-la
dos princípios teóricos e das ciências, Cesare Brandi buscou uma unidade de métodos e
princípios de restauro, através de muitos experimentos e discussões em que os resultados eram
postos à disposição de todos. O processo de restauração passou a ser entendido essencialmente
156
As idéias de Boito deram origem ao que depois ficou conhecido como “restauro filológico ou “científico”.
Sobre a participação de Camilo Boito no Congresso dos Engenheiros e Arquitetos realizado em Roma em 1883 e os
sete princípios propostos ver: Beatriz M. Kühl, Os Restauradores e o Pensamento de Camillo Boito sobre a
Restauração, in: Camillo Boito, Os Restauradores, Cotia, 2002.
157
RIEGL, Alois, Le culte modern des monuments, son essence et sa genèse, Paris, Seuil, 1984. Para referências
bibliográficas complementares v. Beatriz M. Kühl. Preservação do Patrimônio Arquitetônico da Industrialização:
Problemas Teóricos do Restauro. São Paulo, FAUUSP, Tese de Livre Docência, 2006, pp. 46-50.
Arquitetura Industrial no Bairro da Mooca: Análise e Diretrizes de Intervenção na Alpargatas.
Wayne Almeida de Sousa 123
como um ato crítico, dirigido ao reconhecimento da obra de arte em seus aspectos materiais,
formais e documentais.
158
Segundo Rufinoni:
a partir de então, a preocupação com a manutenção dessas relações históricas,
estéticas, sociais assume lugar de destaque no debate sobre a preservação de bens
culturais. Na redação da Carta de Veneza, de 1964, essas questões são incorporadas de
forma bastante clara e objetiva.”
159
Atualmente, na Itália, que é o país em que se discute com maior consistência os
princípios teóricos que deveriam orientar as ações práticas de restauro, alguns autores apontam a
existência de três vertentes principais: Crítico-conservativa e criativa ou posição central que,
baseada nas teorias brandianas, faz uma releitura do restauro crítico fundamentando-se na
relação dialética entra as instâncias histórica e estética. Essa vertente não apregoa, de forma
nenhuma, o congelamento da obra e propõe, quando necessário, a utilização de recursos criativos
para tratar as diferentes questões do restauro da melhor maneira possível; Conservação integral
ou Pura conservação que privilegia a instância histórica, retomando discussões do século XIX
de autores como Ruskin, Morris, Boito e Riegl, e muita importância a passagem do objeto
pelo tempo e todas as suas fases, sendo a matéria preservada como chegou aos dias de hoje, ou
seja, o documento é conservado em sua integridade; e a Manutenção Repristinação ou
Hipermanutenção que se coloca contra o estado fragmentário do bem retomando o uso de formas
158
Ver: BRANDI, Cesare. Teoria da Restauração, Ateliê, Cotia, 2004.
159
RUFINONI, op. cit. p. 129.
Arquitetura Industrial no Bairro da Mooca: Análise e Diretrizes de Intervenção na Alpargatas.
Wayne Almeida de Sousa 124
e técnicas do passado para intervenções recentes, chegando ao ponto de ser considerada por
alguns como “falsificação.”
160
Pode-se dizer que os atuais princípios que orientam as intervenções em bens culturais
demonstram o amadurecimento das experimentações práticas, das formulações teóricas e das
experiências que se iniciaram há vários séculos. Como resultado desse processo, as várias
posturas são baseadas na visão do restauro como uma ação essencialmente cultural,
161
e o
principal documento internacional de referência para a preservação de obras arquitetônicas aos
dias de hoje é a Carta de Veneza, do ICOMOS-UNESCO, de 1964.
Vários autores apontam os princípios fundamentais, pensados de forma conjunta e o
isolada, que deveriam nortear as intervenções, a começar pelas colocações existentes na Carta de
Veneza, que retoma temas da teoria de Cesare Brandi e do chamadorestauro crítico” e
sintetizadas por Carbonara, que, em seus textos uma grande ênfase a essa problemática. Os
princípios, que receberão comentários um a um na seqüência, como enunciados por Kühl,
162
são: Distinguibilidade da Ação Contemporânea, Reversibilidade ou “Re-trabalhabilidade”,
Mínima Intervenção e Compatibilidade de Técnicas e Materiais.
Distinguibilidade da Ação Contemporânea.
160
KÜHL, Beatriz Mugayar. Preservação do Patrimônio Arquitetônico da Industrialização: Problemas Teóricos de
Restauro. Cotia, Ateliê-FAPESP, 2009, pp. 66-79. Os autores que propõe essas três vertentes são Carbonara e
Miarelli Mariani. Deve-se salientar a preponderância de textos italianos sobre a teoria da restauração, enquanto que
na França há muitas discussões gerais sobre preservação e temas como memória e história no campo da
antropologia, sociologia, etc., mas pouca discussão sobre princípios de restauro que deveriam nortear as atuações
práticas.
161
Idem, pp. 59-60; 72-78; 81-94. Para as tendências atuais nas formas de intervir em bens do passado, ver ainda:
CARBONARA, op. cit., pp. 393-439; MIARELLI MARIANI, Gaetano. I restauri di Pierre Prunet: un pretesto
per parlare di architettura”, Palladio, 2000, n. 27, pp. 65-92.
162
KÜHL, Beatriz Mugayar. Preservação do Patrimônio Arquitetônico da Industrialização: Problemas Teóricos de
Restauro. Cotia, Ateliê-FAPESP, 2009, p. 78.
Arquitetura Industrial no Bairro da Mooca: Análise e Diretrizes de Intervenção na Alpargatas.
Wayne Almeida de Sousa 125
Esse princípio é central para os desdobramentos do pensamento sobre o restauro na
atualidade. Provém de um longo processo de experimentações, de formas variadas de atuação.
Desde o Renascimento foram comuns, em intervenções feitas em obras do passado (arquitetura,
pintura ou escultura), formas miméticas de completamento.
163
Nas obras consideradas de grande
interesse, atuava-se segundo o “estiloda obra originária; ou melhor, na forma que um dado
presente histórico acreditava ser o estilo de uma época passada, com os conhecimentos e com o
gosto” que se tinha naquele momento,
164
apesar de haver algumas exceções de atuações
distintas do original já desde a Antigüidade.
165
No século XIX, esses completamentos em estilo atingem seu auge e eram normalmente
ligados a processos de construção de identidades locais, da nacionalidade, que faziam uso de
uma visão idealizada do passado e a projetavam nas obras. Esse tipo de ação, cujo mais notório
representante foi Viollet-le-Duc, acabou por gerar uma série de críticas, ainda naquele período,
pela forma invasiva de intervir que acabou por descaracterizar muitas obras, suprimindo várias
de suas estratificações, completando de maneira indevida, gerando resultados de obras “novas
em folha” nas quais muitas comunidades não mais se reconheciam. As críticas a esse tipo de
atuação, entre as mais ferrenhas as de John Ruskin e William Morris, para mencionar apenas o
163
Os modos de atuação em relação a obras de épocas passadas eram os mais variados, indo desde as destruições e
reaproveitamento de materiais, para obras consideradas menos significativas, até completamentos em estilo”. Para
esses temas e bibliografia complementar, ver: HL, Beatriz M. As transformações na maneira de se intervir na
arquitetura do passado entre os séculos 15 e 18: o período de formação da restauração. Sinopses, São Paulo, n. 36,
p. 24-36, 2001.
164
Como apontava Cagiano de Azevedo, o restauro como “espelho do gosto de um período. CAGIANO de
AZEVEDO, Michelangelo. Il gusto nel restauro delle opere d’arte antiche. Roma, Olimpus, 1948.
165
Por muito tempo foi associado à Antiga Roma um gosto exclusivo pelas intervenções ao idêntico”, atribuindo
àquelas que eram diversas a períodos de decadência”. No entanto, pesquisas recentes mostram que as ações eram
dos mais variados tipos, desde as miméticas, até aquelas que, ao que apontam os novos indícios, que possuíam
figuração distinta do original e integrações de fantasia. Esses fatos denotam um “gostoque aceitava variados tipos
de ações, inclusive aquelas dissonantes em relação ao original. Esses dados foram apresentados por Alessandro
Pergoli Campanelli em conferências na FAUUSP nos dias 3 e 4 de novembro de 2009. PERGOLI CAMPANELLI,
Alessandro. Antigos exemplos de restauros de cerâmicas gregas; Exemplos difusos de reparos e restaurações de
antigos pavimentos com mosaicos, Revista Pós, 2010, n. 27. (no prelo).
Arquitetura Industrial no Bairro da Mooca: Análise e Diretrizes de Intervenção na Alpargatas.
Wayne Almeida de Sousa 126
ambiente inglês, ocorreram em várias regiões e provinham de profissionais de formações
diversas.
As várias posturas críticas foram, de certo modo, sintetizadas mais para o final daquele
século por Camillo Boito, que enuncia uma série de princípios, entre eles a distinguibilidade da
ação contemporânea, de modo a não induzir o observador ao engano de confundir qualquer
acréscimo na obra com o que lá existia.
Ao analisar a postura de Viollet-le-Duc, Boito observa (grifo nosso):
“Existe uma escola, velha, mas não morta, e uma nova. O grande legislador da
velha foi Viollet-le-Duc, que com seus estudos históricos e críticos sobre a arte da Idade
Média na França fez progredir a história e a crítica também na Itália. Foi também
arquiteto, mas de valor contrastante, e restaurador, até pouco elevado aos céus por
todos, agora afundado no inferno por muitos pelas suas mesmas obras na antiga cidade de
Carcassonne, no castelo de Pierrefonds e em outros insignes monumentos. Eis a sua
teoria, da qual derivou sua prática: Restaurar um edifício quer dizer reintegrá-lo em um
estado completo, que pode não ter existido nunca em um dado tempo. Como fazer?
Colocamo-nos no lugar do arquiteto primitivo e adivinhamos aquilo que ele teria feito se
os acontecimentos o tivessem permitido finalizar a construção. Essa teoria é cheia de
perigos. Com ela não existe doutrina, não existe engenho que sejam capazes de nos salvar
dos arbítrios: e o arbítrio é uma mentira, uma falsificação do antigo, uma armadilha posta
aos vindouros. Quanto mais bem for conduzida a restauração, mais a mentira vence
insidiosa e o engano, triunfante.”
166
Boito, na verdade, ao fazer seus enunciados teóricos, retoma colocações que já haviam
sido enunciadas no século anterior, para a intervenção em obras arqueológicas, que haviam dado
166
BOITO, Camillo. Os restauradores. Cotia: Ateliê, 2002, p. 57-58. O texto original é de 1884.
Arquitetura Industrial no Bairro da Mooca: Análise e Diretrizes de Intervenção na Alpargatas.
Wayne Almeida de Sousa 127
resultados de interesse no século XIX.
167
Em especial, as colocações de J. Winckelmann, que
propunha que se estabelecesse uma metodologia científica rigorosa para os estudos e para as
próprias escavações, como estudos e documentações detalhadas do processo como um todo. Para
eventuais acréscimos, recomendava que fossem diferentes da obra original, para não levar o
observador ao engano. Essa atenção de Boito ao documento, respeitando suas várias
conformações e inserindo novos textos”, se necessário, de maneira distinta dos originais, foi
retomada também por Gustavo Giovannoni, na virada do século e ao longo das primeiras
décadas do século XX, numa forma de atuação que, exatamente por isso, ficou conhecida como
restauro filológico”. Essas preocupações aparecem na Carta de Restauração de Atenas, de 1931,
e, mesmo com todas as releituras do restauro no segundo s-guerra (principalmente no sentido
de associar o pensamento sobre a estética na discussão do restauro, procurando ir além dos
aspectos documentais da obra), é reiterada na Carta de Veneza:
“Artigo - A restauração é uma operação que deve ter caráter excepcional. Tem
por objetivo conservar e revelar os valores estéticos e históricos do monumento e
fundamenta-se no respeito ao material original e aos documentos autênticos. Termina
onde começa a hipótese; no plano das reconstituições conjeturais, todo trabalho
complementar reconhecido como indispensável por razões estéticas ou técnicas destacar-
se-á da composição arquitetônica e deverá ostentar a marca do nosso tempo.”
168
167
Os exemplos mais conhecidos são o das restaurações do Arco de Tito (1817-1824) e do Coliseu (1806-1825),
muito divulgados no século XIX. O Arco de Tito, em Roma, por exemplo, foi restaurado por Raffaele Stern e,
após a sua morte, por Giuseppe Valadier. Realizaram escavações, encontrando as fundações originais que
ofereceram os dados para a reconstituição das proporções primitivas. Existiam alguns elementos originais na parte
central do arco, que foram desmontadas e depois remontadas num novo arcabouço de tijolos. Nos elementos que
foram completados, como colunas e capitéis, usou-se o travertino e não o mármore grego original, e foram
empregadas formas simplificadas, permitindo a sua diferenciação das partes originais. Para esses temas, ver:
CARBONARA, op. cit., p. 70.
168
A versão da Carta que se utiliza nesta dissertação é a do portal do IPHAN:
http://portal.iphan.gov.br/portal/baixaFcdAnexo.do?id=236; último acesso em 07.12.2009.
Arquitetura Industrial no Bairro da Mooca: Análise e Diretrizes de Intervenção na Alpargatas.
Wayne Almeida de Sousa 128
Ambas as cartas trabalham de maneira a articular o respeito pelas rias estratificações
da obra
169
e a distinguibilidade da ão contemporânea. Ou seja, a distinguibilidade nunca deve
ser feita sacrificando os aspectos documentais e formais da obra como estratificada ao longo do
tempo, e deve ser feita de maneira harmoniosa, algo que pode ser evidenciado nos artigos mais à
frente:
“Artigo 12º - Os elementos destinados a substituir as partes faltantes devem
integrar-se harmoniosamente ao conjunto, distinguindo-se, todavia, das partes originais a
fim de que a restauração não falsifique o documento de arte e de história.
Artigo 13º - Os acréscimos poderão ser tolerados na medida em que respeitarem
todas as partes interessantes do edifício, seu esquema tradicional, o equilíbrio de sua
composição e suas relações com o meio ambiente”
Reversibilidade ou Re-trabalhabilidade.
O princípio da Reversibilidade, que nos últimos anos tem sido enunciado de um modo
mais preciso como Re-trabalhabilidade”, tem por intuito o inviabilizar intervenções futuras.
Muitas vezes, determinadas ações, especialmente no restauro arquitetônico, como algumas
consolidações estruturais, não são efetivamente reversíveis, pois removê-las implicaria um
169
Na carta de Veneza: Artigo1- As contribuições válidas de todas as épocas para a edificação do monumento
devem ser respeitadas, visto que a unidade de estilo não é a finalidade a alcançar no curso de uma restauração, a
exibição de uma etapa subjacente se justifica em circunstâncias excepcionais e quando o que se elimina é de
pouco interesse e o material que é revelado é de grande valor histórico, arqueológico, ou estético, e seu estado de
conservação é considerado satisfatório. O julgamento do valor dos elementos em causa e a decisão quanto ao que
pode ser eliminado não podem depender somente do autor do projeto. Na Carta de Atenas, isso comparecia logo na
abertura, em I. Doutrinas e princípios gerais: “(...) Nos casos em que uma restauração parece indispensável devido
à deterioração ou destruição, a conferência recomenda que se respeite a obra histórica e artística do passado, sem
prejudicar o estilo de nenhuma época.
Arquitetura Industrial no Bairro da Mooca: Análise e Diretrizes de Intervenção na Alpargatas.
Wayne Almeida de Sousa 129
trauma” muito grande para a obra. O que se deve ter em mente é que o altere o bem de tal
modo que o permita intervenções futuras, fazendo a intervenção de modo respeitoso aos
aspectos materiais, formais e documentais - em relação ao que lá está, conforme enunciado por
Brandi:
“É necessário, com efeito, considerar que o escopo essencial da restauração não é
apenas assegurar a subsistência da obra no presente, mas também assegurar a
transmissão no futuro; e dado que ninguém poderá jamais estar seguro de que a obra não
terá necessidade de outras intervenções no futuro, mesmo que simplesmente conservativas,
deve-se facilitar e não impedir as eventuais intervenções sucessivas.”
170
Apesar de se ter consolidado de fato apenas no século XX, esse princípio apareceu de
maneira embrionária, e pontual, no século XVII. Carlo Maratta, aconselhado por Giovan Pietro
Bellori – apesar de atuações mais incisivas que fizera anteriormente –, nos restauros dos afrescos
de Rafael, no palácio da Farnesina, em Roma, em 1693, estabeleceu um verdadeiro trabalho
multidisciplinar, com obras de consolidação, limpeza, retoques, tomando uma atitude deliberada
em fazer a sua atuação reversível (de fato) ao tratar os completamentos com lápis e pastel.
Apesar de ser um caso isolado no período, em que em geral se trabalhava de maneira análoga à
técnica original, foi um precedente muito importante que estabeleceu parâmetros depois
reinterpretados nas noções contemporâneas de restauro.
171
Mínima Intervenção.
170
BRANDI, Cesare. Teoria da Restauração. Cotia: Ateliê, 2004, p. 146.
171
Para esses temas, ver: JOKILEHTO, op. cit., p. 54.
Arquitetura Industrial no Bairro da Mooca: Análise e Diretrizes de Intervenção na Alpargatas.
Wayne Almeida de Sousa 130
Por nima intervenção deve-se entender fazer o nimo, mas que seja necessário e
suficiente, para enfrentar uma determinada situação, como exposto com clareza por Camillo
Boito, ainda no final do século XIX:
“O trabalho em torno de um monumento é uma tentação contínua: sabe-se onde
principia, mas não se sabe onde vai terminar. Existe uma força irresistível que impele a
fazer demais superando com a fé das próprias deduções e induções, além da realidade
sobre a observação direta e da necessidade estética e histórica. Nas restaurações o
problema consiste em encontrar primeiro, e não ultrapassar, depois, o limite mínimo dos
trabalhos indispensáveis para conservar o antigo, a revelá-lo sem destruir nada que
interesse à arqueologia e à arte, tampouco naquilo que foi acrescido ao monumento pelos
séculos mais próximos a nós. Ora, o ânimo do restaurador é um ânimo humano:
apaixona-se pelo objeto dos próprios pensamentos e arrisca exagerar, buscando a
perfeição; não fosse que, qualquer excesso em uma restauração, torna-se uma falsificação
de documento. Na dúvida, o sábio se abstém.”
172
Essa sempre foi uma tarefa difícil para restauradores, que tendem a ir além do
necessário. Um exemplo interessante de comedimento, dada a nica da época, foi a
transformação em igreja de parte das termas de Diocleciano, a igreja de Santa Maria dos Anjos,
iniciada em 1561; Michelangelo inseriu a nova função de modo adequado, com pleno respeito
pelo aspecto exterior da rna, pelas características espaciais da obra originária, ao mesmo tempo
em que introduz os novos elementos, apenas aqueles indispensáveis, para o funcionamento como
igreja segundo a linguagem arquitetônica de seu próprio tempo. Assim, na verdade, além de
estabelecer um exemplo de Mínima Intervenção, respeitou plenamente a leitura dos vários
172
BOITO, Camillo. Questioni Pratiche di Belle Arti. Milano: Hoepli, 1893.
Arquitetura Industrial no Bairro da Mooca: Análise e Diretrizes de Intervenção na Alpargatas.
Wayne Almeida de Sousa 131
estratos da obra, trabalhando segundo o preceito da distinguibilidade.
173
Essa questão aparece de maneira difusa na Carta de Veneza, a comar pelo fato de o
documento exigir a manutenção permanente para evitar intervenções mais incisivas (art. 4º),
174
e
o caráter de excepcionalidade que se confere à ação do restauro (art. 9º).
Compatibilidade de Técnicas e Materiais.
O enunciado desse princípio pareceria, à primeira vista, óbvio. Mas, na verdade, a
atenção dada a essa questão se tornou mais evidente a partir dos anos 1960, quando os problemas
das intervenções feitas com concreto armado, em especial nos anos 1930, época em que ainda
o se tinha o pleno domínio de seu emprego para a restauração, tornam-se mais evidentes. Isso
pode ser visto na diferença de redação entre a Carta de Atenas, em que transparece uma fé cega
nos novos materiais e na Carta de Veneza, em que há uma prudência muito maior nesse sentido.
Na Carta de Atenas, no item IV, Os materiais da restauração (e também nas
considerações sobre as intervenções na Acrópole de Atenas feita por Balanos):
173
Sobre esse projeto ver: CARBONARA, op. cit., p. 55. Ver ainda: FANCELLI, Paolo. Demolizioni e 'Restauri' di
Antichità nel Cinquecento Romano. In: FAGIOLO, Marcello (Org.). Roma e l'Antico nell'Arte e nella Cultura del
Cinquecento, Roma, Istituto della Enciclopedia Italiana, 1985, p. 390-395.
174
Isso aparecia na Carta de Atenas, no item I. Doutrinas e princípios gerais: “Qualquer que seja a diversidade
dos casos específicos e cada caso pode comportar uma solução própria a conferência constatou que nos
diversos Estados representados predomina uma tendência geral a abandonar as reconstituições integrais, evitando
assim seus riscos, pela adoção de uma manutenção regular e permanente, apropriada para assegurar a
conservação dos edifícios. Nos casos em que uma restauração pareça indispensável devido a deterioração ou
destruição, a conferência recomenda que se respeite a obra histórica e artística do passado, sem prejudicar o estilo
de nenhuma época” (http://portal.iphan.gov.br/portal/baixaFcdAnexo.do?id=232; acesso em 07de Dezembro de
2009).
Arquitetura Industrial no Bairro da Mooca: Análise e Diretrizes de Intervenção na Alpargatas.
Wayne Almeida de Sousa 132
“Os técnicos receberam diversas comunicações relativas ao emprego de materiais
modernos para a consolidação de edifícios antigos. Eles aprovam o emprego adequado de
todos os recursos da técnica moderna e especialmente do cimento armado.”
na Carta de Veneza a questão aparece enunciada de maneira muito mais prudente,
usando-se técnicas modernas quando as tradicionais não forem adequadas, e possuindo
conhecimento comprovado ao longo de vários anos:
“Artigo 10º - Quando as técnicas tradicionais se revelarem inadequadas, a
consolidação do monumento pode ser assegurada com o emprego de todas as técnicas
modernas de conservação e construção cuja eficácia tenha sido demonstrada por dados
científicos e comprovada pela experiência.”
Brandi também exs a questão de modo contundente:
“(...) o Instituto é terminantemente contrário ao uso de novos materiais sintéticos ou
mesmo de aglomerados, prensados e assim por diante, de que existe uma experiência de
apenas poucos qüinqüênios. Antes de substituir um material de longo uso de que se tenha
a experiência de séculos e de que, por isso, se conheçam bem tanto os defeitos quanto as
qualidades, deve-se ter certa prudência que não será jamais excessiva.”
175
Essas questões, colocadas com grande clareza décadas, não tem sido, infelizmente,
levadas em conta na prática de muitas intervenções, que fazem uso de materiais não testados por
tempo suficiente. Basta ver o emprego recorrente de pinturas a base de polímeros (látex e
acrílicas) em bens culturais com argamassa à base de cal ainda nos dias de hoje, apesar de seus
efeitos danosos serem conhecidos desde os anos 1970 e difundidos em artigos especializados em
especial a partir dos anos 1980.
175
BRANDI, op. cit., p.147-148. O texto, A Restauração da Pintura Antiga, foi publicado originalmente em 1958.
Arquitetura Industrial no Bairro da Mooca: Análise e Diretrizes de Intervenção na Alpargatas.
Wayne Almeida de Sousa 133
3.4. A Intervenção na Alpargatas a partir dos Critérios de Restauração.
Como já foi visto, desde os anos de 1960 as discussões sobre a preservação do
patrimônio industrial vem se intensificando e, a cada dia, vemos um aumento qualitativo e
quantitativo de estudos a esse respeito, em que são destacados sua importância histórica, seus
valores estéticos e significados sociais, apesar das dificuldades encontradas, principalmente,
devido ao fato dos complexos industriais ocuparem hoje grandes áreas próximas ao centro, muito
valorizadas pela infra-estrutura, que acabaram por se tornar alvo da especulação imobiliária.
Esse processo fica bem claro quando se estuda o bairro da Mooca, pois devido a sua
vocação industrial, resultante do processo de formação da cidade de São Paulo, hoje abriga uma
grande quantidade de exemplares ameaçados, não somente pelo problema da especulação
imobiliária, mas também por intervenções equivocadas que, visando adaptar os edifícios aos
novos usos, nem sempre o respeitam e acabam por descaracterizá-los.
O caso da Alpargatas não é diferente; depois que seus edifícios foram vendidos para
uma Universidade, no final dos anos de 1990, passou por uma série de intervenções para adaptá-
los ao novo uso, em que a forma como o programa foi desenvolvido o é compatível com os
edifícios existentes, que acabou por gerar uma série de problemas que veremos a seguir.
De acordo com os princípios da vertente Crítico-Conservativa, o restauro é um ato
crítico, feito de forma consciente baseado no entendimento das características do bem a ser
preservado, que leva em consideração seus valores estéticos e históricos. Com isso, entende-se
que não existem fórmulas pré-definidas para o restauro; antes de ser realizar qualquer tipo de
intervenção, deve-se fazer um estudo acurado das características do bem, para que sejam
Arquitetura Industrial no Bairro da Mooca: Análise e Diretrizes de Intervenção na Alpargatas.
Wayne Almeida de Sousa 134
observadas suas especificidades. O problema é que nem sempre as intervenções estão
preocupadas somente com os aspectos históricos e estéticos, ou seja, na maioria dos casos, as
intervenções não são de cunho cultural, pois as questões financeiras são o que garantem a
viabilidade dos empreendimentos e o retorno financeiro dos novos usos. E realidade, uma
intervenção bem feita não é mais cara, o é mais demorada e nem é inviável do ponto de visa
econômico. Em geral, pelos dados de estudos sérios que se tem sobre o assunto,
176
o que ocorre
é que a margem de lucros é menor; ou seja, uma restauração bem feita é menos interessante para
a especulação.
Como destaca Manoela Rufinoni, a prática nem sempre segue a teoria e vários projetos
de intervenção, que a princípio são voltados para a conservação do bem, apresentam-se alheios
a este debate teórico, propondo soluções que priorizam outros interesses e, em muitos casos,
deturpam a dimensão cultural do objeto, qualidade primeira a impulsionar o ato.
177
No caso da Alpargatas, devido à falta de compatibilidade entre o novo uso e os edifícios
existentes, ficou evidente que para atender o complexo programa de uma Universidade, que
exige uma série de espaços especializados, como salas de aula e laboratórios, foram realizadas
intervenções de cunho exclusivamente prático e funcional que, de maneira nenhuma, podem ser
entendidas como ações culturais voltadas para a preservação do bem. Nesse caso, o edifício foi
tratado como uma simples casca”, pronta a receber qualquer tipo de novo uso, comprometendo
completamente a leitura de suas características espaciais.
176
Sobre esse tema, ver o acurado estudo feito para o edifícios Pirelli em Milão, em que a restauração bem
conduzida da fachada custou 20% a menos do que a proposta anterior de transformação radical. Ver: Simona Salvo,
Arranha-céu Pirelli: crônica de uma restauração, Desígnio, 2006, n. 6, pp. 69-86.
177
RUFINONI, op. cit. p. 149.
Arquitetura Industrial no Bairro da Mooca: Análise e Diretrizes de Intervenção na Alpargatas.
Wayne Almeida de Sousa 135
Esse é um problema muito comum nesse tipo de intervenção pelo fato dos complexos
industriais proporcionarem uma grande versatilidade e liberdade para o projeto de novo uso. A
aparente liberdade para o projeto de intervenção, proporcionada pela grande área dos complexos
industriais, pode se tornar uma dificuldade extra para a sua preservação, pois além do já citado
interesse por parte da especulação imobiliária, acrescenta-se a dificuldade de estudar e
compreender todos os seus diversos e variados elementos. Isso é agravado pelo fato de grande
parte das formulações teóricas serem voltadas para a preservação de apenas um edifício.
O complexo da Alpargatas exemplifica bem esse problema. O conjunto é formado por
edifícios de diferentes períodos, com projetos de arquitetos diversos e realizados de acordo com
as necessidades da empresa, o que fez com que cada um deles tivesse características distintas,
desde o tipo de implantação e volumetria, passando pelo programa, técnicas construtivas e
materiais empregados.
Isso fica evidente ao se analisar o pavimento térreo do conjunto de gales de 1907 que
é ligado com o térreo do edifício da década de 1940. Esse conjunto, formado por quatro gales
divididos dois a dois por um acesso central, foi construído em alvenaria de tijolos, com cobertura
em estrutura de madeira, coberta com telhas cerâmicas e apoiada sobre pilares que seguem a
modulação de aproximadamente 5 por 3,5 metros.
A planta praticamente livre dos gales de 1907 proporcionou para o projeto de
intervenção uma ampla área coberta, delimitada apenas pelas fachadas, que foi utilizada para a
instalação de salas de aula, laboratórios, lojas, lanchonetes e áreas de lazer para utilização dos
alunos da Universidade. Esses acréscimos além de prejudicarem muito o entendimento do
conjunto, pois bloqueiam totalmente a visão das áreas mais distantes, foram construídos em
Arquitetura Industrial no Bairro da Mooca: Análise e Diretrizes de Intervenção na Alpargatas.
Wayne Almeida de Sousa 136
alvenaria e revestidos com tijolos aparentes. Por esse motivo, esses novos elementos tendem a se
confundir com a alvenaria original e dão a impressão de serem elementos de épocas anteriores do
edifício, não respeitando o princípio da Distinguibilidade da Ação Contemporânea.
Em alguns aspectos essas intervenções tiveram certo respeito pelo edicio, como é caso
das novas instalações elétricas, hidráulicas, ar condicionado e de incêndio que, por serem
aparentes, não agrediram os elementos anteriores dos edifícios; e as salas de aula que foram
pensadas como blocos destacados da estrutura dos galpões, podendo ser removidas em
intervenções futuras como sugere o princípio da Reversibilidade ou Re-trabalhabilidade.
Apesar do princípio da Reversibilidade ou Re-trabalhabilidade ter sido seguido nesses
exemplos citados, em outros casos, ele foi totalmente esquecido, como a abertura de novos vãos
na fachada principal dos edifícios de 1908 e 1909 e na fachada lateral do edifício de 1907; e a
instalação de uma escada rolante para fazer a ligação entre o térreo desses galpões com o
segundo pavimento do edifício da década de 1940, em que parte da alvenaria foi destruída.
A única parte do edifício de 1907 que não sofreu intervenções mais invasivas foi a
fachada principal do edifício de 1907, que é protegida pelo Conselho Municipal de Preservação
do Patrimônio Histórico, Cultural e Ambiental da Cidade de São Paulo - CONPRESP.
178
Nem
mesmo essa proteção impediu que muitos dos vãos fossem fechados com placas metálicas,
praticamente fechando o edifício para o exterior, o mesmo aconteceu com a fachada voltada para
a ferrovia.
178
Ver: RUFINONI, op. cit,. p. 92.
Arquitetura Industrial no Bairro da Mooca: Análise e Diretrizes de Intervenção na Alpargatas.
Wayne Almeida de Sousa 137
O edifício da década de 1920 também foi construído em alvenaria de tijolos, em um
terreno em frente ao edifício de 1907. Sua cobertura é uma mistura de estrutura metálica com
madeira e, por isso, os vãos entre os pilares são um pouco maiores que nos primeiros galpões,
chegando a 7,25 metros. Construído originalmente para abrigar uma fábrica de calçados, hoje
recebe diferentes usos ligados a Universidade. Na fachada principal, voltada para a Rua Dr.
Almeida Lima, que se encontra em bom estado de conservação, foi instalada uma grande portaria
que acesso a outra ala da Universidade, onde também são administrados diversos cursos. A
fachada voltada para a Rua Frei Gaspar é marcada por uma série de entradas de um grande
estacionamento que serve aos alunos e funcionários, enquanto que na fachada voltada para a Rua
Conselheiro Lafaiete, encontram-se a clinica veteriria da Universidade e um hospital em
construção.
O edifício da década de 1940 foi todo construído em estrutura de concreto armado, com
seis pavimentos mais o térreo, o que gerou uma série de outros problemas como, por exemplo, a
demolição de algumas paredes e parte da laje existente para a instalação de uma academia no
térreo e de uma escada rolante para fazer a ligação com o segundo pavimento. Esse edifício
ainda teve sua fachada posterior, voltada para a ferrovia, revestida com placas de cobre.
Apesar de não ter sido possível visitar o interior dos edifícios das cadas de 1920 e
1940, pelos motivos que já foram explicitados no segundo capítulo desse trabalho, o pouco que
pode ser observado e registrado indícios de que as intervenções novamente não seguiram os
princípios enunciados, sintetizados por Carbonara, pois em nenhum dos dois casos houve
respeito pelo conjunto e diversas partes dos edifícios foram removidas para a construção de
novos elementos.
Arquitetura Industrial no Bairro da Mooca: Análise e Diretrizes de Intervenção na Alpargatas.
Wayne Almeida de Sousa 138
O único edicio desse conjunto localizado na Rua Dr. Almeida Lima que ainda é de
propriedade da Alpargatas é o edifício da década de 1960, construído originalmente para abrigar
um centro de processamento de dados foi transformado em uma loja de produtos da Alpargatas.
Construído em estrutura de concreto armado com fechamento em alvenaria de tijolos, o edifício
foi totalmente descaracterizado, teve suas fachadas alteradas e o entorno utilizado como
estacionamento. Internamente não foi diferente, o edifício recebeu uma série de divisórias para
delimitar os diferentes setores da loja e a parte administrativa, que de modo algum respeitaram as
características do edifício.
Apesar de não ter as mesmas qualidades arquitetônicas dos edifícios anteriores, esse
edifício fez parte de um importante conjunto industrial da cidade de São Paulo, e, por isso, a
intervenções realizadas deveriam seguir as mesmas bases teóricas.
Todos esses exemplos nos mostram que em nenhum momento a intervenção esteve
preocupada com o bem propriamente dito, o que novamente nos indica o cunho exclusivamente
prático e funcional dessas intervenções. Como já foi demonstrado, além de prejudicar a visão
geral do conjunto, essas intervenções não seguem, em sua maioria, os princípios sintetizados por
Carbonara e enunciados no item 3.3 deste trabalho, que são: Distinguibilidade da Ação
Contemporânea, Reversibilidade ou Re-trabalhabilidade, Mínima Intervenção e
Compatibilidade de Técnicas e Materiais.
Um restauro bem realizado deve começar por um bom projeto, com soluções variando
de profissional para profissional que, diferente da concepção de um projeto novo, deve ser
pensado de modo a atender todas as complexidades do bem existente, partindo de condicionantes
pré-estabelecidas e fundamentado em análises críticas, onde a inserção de elementos
Arquitetura Industrial no Bairro da Mooca: Análise e Diretrizes de Intervenção na Alpargatas.
Wayne Almeida de Sousa 139
contemporâneos deve visar uma melhor leitura do bem de modo a respeitar suas várias fases e
características.
Deve-se deixar bem claro que em momento algum se propõe uma volta ao estado
original do bem, o que configuraria um falso histórico ou falso artístico, ou mesmo um
congelamento, onde todos os seus estratos seriam preservados, pois sabemos que para receber
o novo uso muitas alterações são necessárias, inclusive com a remoção de acréscimos que
prejudiquem a leitura do conjunto da obra.
Nesse sentido, é fundamental o aprofundamento das pesquisas sobre os conjuntos
industriais, através de levantamentos e análises detalhadas das características que os qualificam
como patrimônio a ser preservado, pois toda a restauração é um ato invasivo que deve ser
baseada em criteriosos estudos de modo a permitir escolhas fundamentadas, compatíveis com as
especificidades de cada bem.
Arquitetura Industrial no Bairro da Mooca: Análise e Diretrizes de Intervenção na Alpargatas.
Wayne Almeida de Sousa 140
3.5. Propostas para Intervenções em Bens Industriais a partir da Análise da
Alpargatas.
A partir da análise do caso da Alpargatas, baseada nas teorias e documentos
internacionais de restauro, serão elaboradas algumas propostas que deverão orientar intervenções
em bens industriais. Longe de querer estabelecer regras ou receitar procedimentos pré-
estabelecidos, essas propostas abrirão espaço para interpretações diversas que deverão ser
analisadas e aplicadas de acordo com a especificidade de cada exemplar.
Nesse sentido, a primeira proposta seria a realização de inventários sistemáticos, que
contenham informações sobre o bem, desde as mais básicas como localizão, data de projeto
e/ou construção e áreas, até características mais específicas como técnicas construtivas e
materiais empregados. Esse trabalho pode começar com a realização de fichas, seguidas de
pesquisas mais detalhadas caso haja necessidade. Se possível, as informações obtidas deveriam
ficar a disposição de um grande número de pessoas, para que o conhecimento não fique restrito a
apenas estudiosos desse campo.
179
Esse processo permite a identificação dos bens de interesse
para a preservação, para que se contemple um conjunto significativo de bens, nos quais as ações
deverão ser pautadas pelo rigor.
A partir dessas informações básicas, constantes nas fichas de inventário, deverão ser
feitas análises detalhadas e criteriosas, com a participação de profissionais de diferentes campos;
ou seja, é de fundamental importância a formação de uma equipe multidisciplinar, abrangendo
aspectos estruturais, formais, históricos, sociológicos, antropológicos e econômicos a fim de
garantir uma seleção criteriosa dos bens a serem preservados.
Segundo Rufinoni:
179
Ver: RUFINONI, op. cit., p. 160-162.
Arquitetura Industrial no Bairro da Mooca: Análise e Diretrizes de Intervenção na Alpargatas.
Wayne Almeida de Sousa 141
“(...) a preservação é um processo seletivo. Apenas uma parcela destes
representantes da indústria deverá ser efetivamente preservada. No caso de conjuntos
urbanos que ocupam externas áreas, como no bairro da Mooca, não somente edificações
excepcionais deverão ser alvo da preservação; estas devem estar inseridas neste contexto
maior: uma implantação que sugere especificidades de fabricação, relações únicas entre
volumes e vazios e claras repercussões sobre o entorno imediato.”
180
Para Kühl:
“(...) a preservação, quer se queira ou não, é um processo seletivo seja através de
escolhas conscienciosas e justificadas, seja por ausência de ação propositiva de
preservação, que resulta na destruição ou sobrevivência aleatória dos bens e somente
uma ampla análise pode fundamentar as escolhas, que devem ser justificadas.”
Em muitos casos, o apoio da população local é fundamental para o sucesso dos
trabalhos de seleção dos bens, porque além dos valores estéticos e históricos, os edifícios
apresentam valores afetivos e memoriais por fazerem parte da vida dos habitantes do local.
Como lembra Rufinoni, durante a elaborão do Plano Diretor Regional da Mooca, a população
se mostrou interessada na preservação de três edifícios industriais, o Cotonifício Crespi, a
Tecelagem Labor e o Moinho Gamba.
181
Nesses casos, devem-se fazer apenas intervenções
conservativas, pois o se justifica a alteração de um conjunto com grande qualidade figurativa,
que há muito se consolidou como parte da paisagem do bairro e da memória da população.
Segundo a Carta de Washington:
180
RUFINONI, op. cit., p. 161.
181
Idem, p. 162.
Arquitetura Industrial no Bairro da Mooca: Análise e Diretrizes de Intervenção na Alpargatas.
Wayne Almeida de Sousa 142
“A salvaguarda das cidades e bairros históricos deve, para ser eficaz, fazer parte
integrante de uma política coerente de desenvolvimento econômico e social, e ser
considerada nos planos de ordenamento e de urbanismo em todos os níveis.
Os valores a preservar são o caráter histórico da cidade e o conjunto de elementos
materiais e espirituais que lhe determinam a imagem, em especial:
- a forma urbana definida pela malha fundiária e pela rede viária;
- as relações entre edifícios, espaços verdes e espaços livres;
- a forma e o aspecto dos edifícios (interior e exterior) definidos pela sua estrutura,
volume, estilo, escala, materiais, cor e decoração;
- as relações da cidade com o seu ambiente natural ou criado pelo homem;
- as vocações diversas da cidade adquirida ao longo da sua história.
Qualquer ataque a estes valores comprometeria a autenticidade da cidade
histórica.”
182
Lembrando que é necessário reconhecer que exemplares de todas as épocas e as várias
fases de produção humana são merecedores de estudos. Isso não quer dizer que devemos
preservar todo e qualquer testemunho do passado, por isso a importância desses estudos e
análises, para que se possa reconhecer e selecionar os exemplares dignos de serem preservados
por seus valores históricos, estéticos, afetivos ou memoriais.
A segunda proposta diz respeito ao novo uso, em que se nota uma predomincia de
atividades culturais como, por exemplo, museus e teatros. Em muitos casos esses usos são
adequados, mas de maneira alguma devem ser considerados os únicos possíveis, principalmente
em casos mais complexos como grandes complexos industriais. Nesses casos, usos educacionais,
182
Para referência completa da Carta de Washington ver: portal do IPHAN -
http://portal.iphan.gov.br/portal/montarPaginaSecao.do?id=12372&retorno=paginaLegislacao
Arquitetura Industrial no Bairro da Mooca: Análise e Diretrizes de Intervenção na Alpargatas.
Wayne Almeida de Sousa 143
como no caso da Alpargatas, ou esportivos e lazer ou mesmo supermercados desde que
programa seja desenvolvido em acordo com as características dos bens, que tragam os edifícios
para o cotidiano da população local, podem ser a solução para muitos exemplares que hoje estão
ameaçados.
O artigo da Carta de Veneza também trata a respeito desse tema:
“A conservação dos monumentos é sempre favorecida por sua destinação a uma
função útil a sociedade; tal destinação é portanto, desejável, mas não pode nem deve
alterar a disposição ou a decoração dos edifícios. É somente dentro destes limites que se
deve conceber e se pode autorizar as modificações exigidas pela evolução dos usos e
costumes.”
Ou seja, deve-se primeiro analisar as características do bem a serem preservadas para,
depois, definir as funções e programas compatíveis com eles, e nunca o contrário, adaptar um
edifício a um uso pré-estabelecido que nem sempre está de acordo com suas particularidades, a
exemplo do que ocorreu na intervenção realizada no Cotonifício Crespi, transformado em um
supermercado, que teve todo seu interior demolido, afim de melhor adequá-lo ao novo uso.
183
“(...) muitos bens tem sido sistematicamente descaracterizados, invocando-se razões
de uso. Os perpetradores desses atos promovem essas razões como únicas e imperiosas e
desqualificam os princípios de preservação, considerando-os apenas restritivos, e que
inviabilizariam uma apropriação dos monumentos pelo presente.”
184
183
Sobre a intervenção realizada no Cotonifício Crespi ver: RUFINONI, op. cit., pp. 92-99.
184
KÜHL, Beatriz Mugayar, Preservação do Patrimônio Arquitetônico da Industrialização: Problemas Teóricos do
Restauro. São Paulo, FAUUSP, Tese de Livre Docência, 2006, pp. 196-197.
Arquitetura Industrial no Bairro da Mooca: Análise e Diretrizes de Intervenção na Alpargatas.
Wayne Almeida de Sousa 144
A última proposta diz respeito à utilização dos princípios fundamentais, sintetizados por
Carbonara a partir da teoria de Cesare Brandi e das colocações existentes na Carta de Veneza,
que deveriam pautar todas as intervenções atuais que são: Distinguibilidade da Ação
Contemporânea, Reversibilidade ou Re-trabalhabilidade”, Mínima Intervenção e
Compatibilidade de Técnicas e Materiais.
A Distinguibilidade da Ação Contemporânea visa evitar o falso histórico e o falso
artístico para que o observador o seja levado ao engano com intervenções contemporâneas na
forma de completamentos miméticos, que se confundem com o original. Segundo recomendam
os artigos 12 e 13 da Carta de Veneza, os elementos destinados a substituir partes faltantes
devem se distinguir dos originais e, ao mesmo tempo, se integrar de maneira harmoniosa com o
conjunto existente, já nos acréscimos, devem ser utilizadas técnicas e materiais contemporâneos,
respeitando as diversas fases do edifício e sem prejudicar a leitura do conjunto. No caso de
remoções, a Carta de Veneza recomenda que as contribuões de todas as épocas sejam
respeitadas, sendo aceitas quando for comprovado seu menor valor em relação ao que será
preservado.
O princípio da Reversibilidade ou Re-trabalhabilidade tem por objetivo garantir que as
intervenções respeitem os aspectos materiais, formais e documentais do bem existente, ou seja,
as intervenções devem facilitar e não impedir eventuais futuras intervenções caso sejam
necessárias.
Por Mínima Intervenção entende-se que somente deve ser realizado o nimo
necessário para resolver determinado problema, ou seja, introduzir apenas novos elementos
indispensáveis e nunca ultrapassar esse limite.
Arquitetura Industrial no Bairro da Mooca: Análise e Diretrizes de Intervenção na Alpargatas.
Wayne Almeida de Sousa 145
No que diz respeito à Compatibilidade de Técnicas e Materiais, deve-se empregar em
uma restauração materiais e técnicas que tenham eficácia comprovada, pois são vários os
exemplos onde a utilização de novos materiais, incompatíveis com os originais, acarretou uma
série de problemas para o bem.
Esses princípios, pautados na visão do restauro como ação cultural, são resultado de um
processo de experimentações práticas, de formulões teóricas e experiências legislativas que
amadureceram ao longo dos séculos, e deveriam guiar todas as intervenções realizadas em
edifícios industriais ou não.
Apesar dos princípios abrirem margem para diversas interpretões, pois cada caso deve
ser pensando individualmente, de acordo com os elementos e características particulares de cada
bem; o restauro nunca pode ser guiado por preferências ou gostos pessoais, deve acima de tudo
respeitar e ressaltar as características do bem para que ele seja transmitido da melhor maneira
possível para as futuras gerações.
Arquitetura Industrial no Bairro da Mooca: Análise e Diretrizes de Intervenção na Alpargatas.
Wayne Almeida de Sousa 146
Considerações Finais.
Exemplares do patrimônio industrial, como a Alpargatas, só passaram a ser entendidos
como dignos de preservação há muito pouco tempo e, por serem temas ainda pouco explorados,
para os quais o reconhecimento do interesse para a preservação é problemático, correm sérios
riscos de destruição. Basta verificar o que ocorre na Mooca, onde numerosos edifícios estão
ameaçados pela pressão exercida pela especulação imobiliária, interessada nessas áreas para a
construção de novos empreendimentos, ou por intervenções desastradas, que visando adaptar os
edifícios aos novos usos nem sempre respeitam suas características.
Apesar dessas dificuldades, vemos que cada vez mais se intensificam as discussões
sobre proteção do patrimônio industrial, em que são destacados sua importância histórica, seus
valores estéticos e significados sociais. Esse avanço tem efeitos qualitativos e quantitativos no
que diz respeito à produção de levantamentos e pesquisas, aonde é muito importante a
participação de equipes multidisciplinares, abrangendo aspectos históricos, sociológicos,
antropológicos e econômicos a fim de garantir uma seleção criteriosa dos bens a serem
preservados, pois devemos lembrar que nem todos os exemplares podem ou devem ser
preservados.
Não existem fórmulas pré-definidas ou modelos a serem seguidos, e sim princípios que
guiam as intervenções, provenientes de um processo de experimentações práticas, de
formulações teóricas e experiências legislativas que amadureceram ao longo de vários séculos.
Arquitetura Industrial no Bairro da Mooca: Análise e Diretrizes de Intervenção na Alpargatas.
Wayne Almeida de Sousa 147
Um restauro bem realizado começa por um estudo multidisciplinar acurado das
características do bem e passa necessariamente por um bom projeto, pensado de modo a atender
todas as suas complexidades, pois, diferentemente de um novo projeto, parte de condicionantes
de natureza diversa, pré-estabelecidas pelas próprias características do bem em suas várias
estratificações. O projeto deve ser fundamentado nos princípios estabelecidos que regem o
campo da restauração e em análises críticas, baseado no profundo entendimento das
características do bem a ser preservado, onde a inserção de elementos contemporâneos deve
sempre visar uma melhor leitura, para que suas características sejam respeitadas.
O problema é que nem sempre as intervenções estão preocupadas somente com os
aspectos históricos e estéticos da restauração, na grande maioria dos casos, passam longe de ser
um ato cultural, pois são meramente guiadas por questões financeiras, que garantem a
viabilidade dos empreendimentos e o retorno financeiro dos novos usos. Quando na verdade uma
intervenção bem feita não é mais cara, mais demorada nem inviável do ponto de vista
econômico, é apenas, às vezes, menos lucrativa.
Por esses motivos, cada vez mais, é fundamental o aprofundamento das pesquisas sobre
os conjuntos industriais, através de levantamentos e análises detalhadas das características que os
qualificam como patrimônio a ser preservado, pois deve se deixar bem claro que toda a
restauração é um ato invasivo e, por esse motivo, deve sempre ser embasada por criteriosos
estudos, de modo a permitir escolhas compatíveis com as características de cada bem.
O entendimento e o respeito pela obra são os primeiros passos para uma boa
intervenção. Nenhum edifício é igual ao outro, suas conformações, materiais e transcurso ao
longo do tempo são diferentes; ademais, as intenções dos arquitetos que realizam as intervenções
Arquitetura Industrial no Bairro da Mooca: Análise e Diretrizes de Intervenção na Alpargatas.
Wayne Almeida de Sousa 148
são únicas e o podem ser guiadas por preferência ou gostos pessoais, que não levem em
consideração os objetivos da preservação e os critérios para atingi-los, pois não serespeitada a
mais basilar condição: o próprio edicio.
Para concluir, uma passagem de Beatriz Mugayar Kühl:
“Preservar monumentos históricos tem o sentido, acima de tudo, de assegurar a
diversidade, de combater a intolerância um dos maiores males que aflige a humanidade
no presente que aniquila outras formas de expressão. Ou seja, deve-se impelir que haja
apenas algumas expressões hegemônicas que nulifiquem outras. É também um meio de se
opor à excessiva “presentificação” da existência, que leva a uma crescente alienação.
Preservar significa permitir, incentivar e assegurar que vários tipos de testemunhos da
operosidade humana, do passado e do presente, existam e permaneçam, oferecendo um
amplo e importante instrumental que pode ser percebido e atualizado, por uma
consciência individual ou coletivamente, de infinitas maneiras, no presente e no futuro
para a compreensão e apreensão da realidade, portanto, meios abrangentes para a ela se
adaptar e construir o futuro.”
185
185
KÜHL, Beatriz Mugayar, Preservação do Patrimônio Arquitetônico da Industrialização: Problemas Teóricos do
Restauro. São Paulo, FAUUSP, Tese de Livre Docência, 2006, p. 244.
Arquitetura Industrial no Bairro da Mooca: Análise e Diretrizes de Intervenção na Alpargatas.
Wayne Almeida de Sousa 149
Anexo.
Lista de Processos Pesquisados.
Arquivo Histórico Municipal Washington Luis.
Seção de Manuscritos: Pesquisa realizada na Rua da Concórdia, até 8 de Outubro de1915, e na
Rua Dr. Almeida Lima, até 1921.
ANO PROCESSO ENDEREÇO NÚMERO INFORMAÇÃO ASSUNPTO INTERESSADO
1907
op 1907
-
000 - 401 Rua da Concórdia, 14
s/n Construção de
prédio para
Fábrica
Júlio Micheli
(construtor) -
24/mai/07
Fáb
rica Brasileira de
Alpargatas e Calçados
1908
op 1908
-
000 - 665 Rua da Concórdia, 14
s/n
Novo Pavilhão
para Tinturaria
Julio Micheli
(construtor) -
22/ago/08
Fábrica Brasileira de
Alpargatas e Calçados
1909
op 1909
-
000 - 740 Rua da Concórdia, 14
s/n
Construção
Pavilhão para
Julio Micheli
(construtor) -
28/set/09
Depósito de
Mercadorias
Fábrica Brasileira de
Alpargatas e Calçados
1911 Rua da Concórdia, 16
Augmentar a
fábrica sito a Rua
da Comcórdia,
16
São Paulo Alpargat
as
Company
1916
Doc2a / cx
D2 - 1916
R. Dr. Almeida Lima,
16 s/n
Construção de
Caixa d'água
Companhia São Paulo
Alpargatas
26/ago/16
1917
Doc2 / cx
D2 - 1917
R. Dr. Almeida Lima,
16 s/n
Augmentar
fábrica
São Paulo Alpargatas
Company
9/mar/17
1919
Doc7 / cx
D3 - 1919
R. Dr. Almeida Lima,
16 218131 A 2870 a
Augmento de
uma officina
São Paulo Alpargatas
Company
1920
R. Dr. Almeida Lima,
16 230132 A 535 a
Augmento de
uma fábrica
G. Schmiti (São Pa
ulo
Alpargatas Com.)
1921
Doc3 / cx
D4 - 1921
R. Dr. Almeida Lima,
241 a 253 16754 A 939 a
Demolição de
prédios São Paulo Alpargatas
1921
Doc4 / cx
D4 - 1921
R. Dr. Almeida Lima,
241 a 253 e Frei
Gaspar e Cons.
Laffaeytte, 18 a 26
19754 A 1748 a
Construção de
uma fábrica de
tecelagem e
fiação
Scott e Urner -
Propriedade de São
Paulo Alpargatas
Company
Arquitetura Industrial no Bairro da Mooca: Análise e Diretrizes de Intervenção na Alpargatas.
Wayne Almeida de Sousa 150
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Universidade Anhembi-Morumbi: http://portal.anhembi.br/
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Revistas.
Alemanha.
Architektur Innenarchitektur Technischer Ausbau: 1997 números 1 a 12; 1998 números 1 a
12; 1999 – números 1 a 12; 2000 – números 1 a 12.
Intelligent Architektur: 1999 – números 13 a 17; 2000 – números 22 a 25.
Brasil.
Arquitetura e Urbanismo: 1997 – números 69 a 75; 1998 números 76 a 81; 1999números 82
a 87; 2000 – números 88 a 93; 2001 – números 94 a 99; 2002 – números 100 a 102.
Projeto & Design: 1997 – números 204 a 215; 1998 – números 216 a 227; 1999 – números 228
a 238; 2000 – números 239 a 250; 2001 números 251 a 262; 2002 números 263 a 271.
Espanha:
Arquitectura Viva: 1997 – números 52 a 57; 1998 – números 58 a 63; 1999 números 64 a 69;
2000 – números 70 a 73.
França:
D’Architecture d’aujurd’hui: 1997 números 309 a 314; 1999 números 318, 320 a 324; 2000
– números 326 a 331; 2001 – números 333 a 337.
Itália:
Domus: 1997 – número 789; 1998 – números 800 a 810; 1999 – números 811 a 821; 2000 –
números 822 a 828; 830 a 832; 2001 – números 833 a 843; 2002 números 844 a 846.
Instituições.
Arquitetura Industrial no Bairro da Mooca: Análise e Diretrizes de Intervenção na Alpargatas.
Wayne Almeida de Sousa 160
Bibliotecas.
Faculdade de Arquitetura e UrbanismoUniversidade de São Paulo – FAU
Faculdade de Arquitetura e Urbanismo (Pós-Graduação) – Universidade de São Paulo
FAU-PG
Escola Politécnica – Engenharia Civil – Universidade de São Paulo – EPEC
Escola Politécnica – Biblioteca CentralUniversidade de São Paulo – EPBC
Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas – Geografia – Universidade de São Paulo
– FFLCH-GE
Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas – História – Universidade de São Paulo
FFLCH-HI
Museu Paulista
Mário de Andrade
PREFEITURA DE SÃO PAULO. Secretaria Municipal de Gestão Pública - DAF-3 -
Departamento Administrativo Financeiro
PREFEITURA DE SÃO PAULO. Arquivo Geral de Processos
PREFEITURA DE SÃO PAULO. Arquivo Municipal Washington Luis.
Seção de Produção de Bases Digitais para Arquitetura e Urbanismo - CESAD/FAUSUP-
GOVERNO DO ESTADO DE SÃO PAULO SECRETARIA DO GOVERNO E
PLANEJAMENTO. Sistema cartográfico metropolitano da Grande São Paulo 1/10000,
GEGRAN, 1974.
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Planta Geral da Cidade de São Paulo – 1905.
Fonte: http://sempla.prefeitura.sp.gov.br/historico/img/mapas/1905.jpg (última consulta em
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Planta da Cidade de São Paulo – 1913.
Fonte: http://sempla.prefeitura.sp.gov.br/historico/img/mapas/1913.jpg (última consulta em
09 de fevereiro de 2010).
Planta da Cidade de São Paulo – 1916.
Fonte: http://sempla.prefeitura.sp.gov.br/historico/img/mapas/1916.jpg (última consulta em
09 de fevereiro de 2010).
Planta da Cidade de São Paulo – 1924.
Fonte: http://sempla.prefeitura.sp.gov.br/historico/img/mapas/1924.jpg (última consulta em
09 de fevereiro de 2010).
Planta da Cidade de São Paulo – 1943.
Fonte: http://sempla.prefeitura.sp.gov.br/historico/img/mapas/1943.jpg (última consulta em
09 de fevereiro de 2010).
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