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UNIVERSIDADE FEDERAL DE SÃO CARLOS
CENTRO DE EDUCAÇÃO E CIÊNCIAS HUMANAS
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO
Área de Concentração - Metodologia de Ensino
OS GÊNEROS DO DISCURSO E A PRÁTICA DA PRODUÇÃO TEXTUAL:
DIALOGANDO SOBRE OS CONHECIMENTOS NECESSÁRIOS AOS
EDUCADORES DOS ANOS INICIAIS DO ENSINO FUNDAMENTAL.
Stella de Lourdes Garcia
SÃO CARLOS – SP
2010
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2
UNIVERSIDADE FEDERAL DE SÃO CARLOS
CENTRO DE EDUCAÇÃO E CIÊNCIAS HUMANAS
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO
Área de Concentração - Metodologia de Ensino
OS GÊNEROS DO DISCURSO E A PRÁTICA DA PRODUÇÃO TEXTUAL:
DIALOGANDO SOBRE OS CONHECIMENTOS NECESSÁRIOS AOS
EDUCADORES DOS ANOS INICIAIS DO ENSINO FUNDAMENTAL.
Trabalho apresentado ao Programa de Pós-
Graduação em Educação, da Universidade
Federal de São Carlos, como parte dos
requisitos para a obtenção do título de Doutor
em Educação.
Orientadora: Profª Drª Claudia Raimundo
Reyes
SÃO CARLOS – SP
2010
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Ficha catalográfica elaborada pelo DePT da
Biblioteca Comunitária/UFSCar
G216gd
Garcia, Stella de Lourdes.
Os gêneros do discurso e a prática da produção textual :
dialogando sobre os conhecimentos necessários aos
educadores dos anos iniciais do ensino fundamental / Stella
de Lourdes Garcia. -- São Carlos : UFSCar, 2010.
247 f.
Tese (Doutorado) -- Universidade Federal de São Carlos,
2010.
1. Educação elementar. 2. Produção de textos. 3.
Gêneros discursivos. 4. Professores - formação. I. Título.
CDD: 372 (20
a
)
BANCA EXAMINADORA
Prof' D(l Maria Aparecida Mello
\
Prof' D(l Claudia Raimundo Reyes
Prof' D(l Soma Stella Araújo Oliveira
Prof' D(l Maria Rosa Rodrigues Martins de Camargo
Prof' D(l Rosa Maria Moraes Anunciato de Oliveira
~
,- _._--
6
AGRADECIMENTOS
Agradeço primeiramente ao meu filho Lucas por ter ressignificado todas as
experiências de minha vida. À minha mãe pela coragem e incentivo, pricipalmente nos
momentos em que pensei em desistir. À minha companheira de trabalho e amiga
Alessandra Marques da Cunha, por ter apostado que valeria a pena trabalhar comigo e por
dividir os momentos agradáveis de descoberta ao longo da realização deste trabalho. À
minha orientadora Claudia Raimundo Reyes, pela paciência e carinho com o trabalho
desenvolvido. Às minhas amigas Danielle Martins da Silva, Rosana Vieira, Rosângela
Bonater, Maria de Fátima Lopes da Silveira e Roselena Adão Florêncio pelos momentos
em que sempre me ouviram pacientemente, sugerindo e incentivando o término da
pesquisa. À Belzinha, pelo apoio técnico e pelos momentos de compartilhamento do
trabalho, nos ouvindo agitadas quando saíamos dos encontros com as educadoras e
educandos. Às integrantes de nosso Grupo de Pesquisa: Danitza, Esther e Aninha pelo
carinho e incentivo. Às professoras Roseli Rodrigues de Mello, Maria Rosa Martins de
Camargo, Sônia Stella Araújo-Oliveira, Maria Aparecida Mello, Rosa Maria Moraes
Anunciato de Oliveira e Eliana Prado Carlino, pelos momentos de conversas e pelas
valiosas contribuições dadas à pesquisa, durante os Exames de Qualificação e Defesa. Aos
educandos e educadoras participantes da pesquisa, pela contribuição que deram à minha
formação.
7
Resumo
O objetivo desta pesquisa foi o de verificar e analisar quais conhecimentos são
necessários aos educadores das séries/anos iniciais do Ensino Fundamental de Nove Anos
sobre os gêneros discursivos como objeto de ensino para que possam garantir a
aprendizagem dos educandos no tocante à prática da produção textual que considere além
das marcas do gênero, os elementos que assegurem a dinâmica discursiva. Tais
conhecimentos foram abordados durante um Curso de Extensão, em um processo
colaborativo dialógico entre pesquisadoras e educadoras, o qual se fundamentou no
desenvolvimento de uma sequência didática para o ensino de um gênero do discurso
escrito. Trata-se de uma investigação de natureza qualitativa, pautada na metodologia
colaborativa dialógica. A coleta de dados foi realizada durante um curso de formação
continuada realizado junto a educadoras e educandos de uma escola da rede municipal de
ensino da cidade de São Carlos-SP que integra o Projeto “Comunidades de Aprendizagem:
aposta na qualidade da aprendizagem, na igualdade de diferenças e na democratização da
gestão da escola”. Partimos de uma concepção de linguagem enquanto constitutiva dos
sujeitos e nos orientamos nos estudos de Freire, Bakhtin e em pesquisadores como
Schneuwly e Dolz. A análise dos dados, que se orientou pelo levantamento das temáticas
presentes nos encontros realizados junto às educadoras e nos encontros realizados junto aos
educandos de uma turma de ano do ensino fundamental, nos permitiu concluir que a
base de conhecimentos sobre o ensino, mais especificamente com relação ao conhecimento
de conteúdo específico - e aqui os referimos aos gêneros discursivos - das educadoras não
era o suficiente para garantir que os gêneros discursivos fossem concebidos como objeto
de ensino, embora estes estivem presentes na sala de aula nas atividades de leitura, não
garantia que os educandos se apropriassem do mesmo e passassem a produzi-lo
textualmente. Com relação aos conhecimentos construídos durante a realização do curso de
formação, acreditamos que as reflexões proporcionadas pela dinâmica colaborativa
dialógica possam ter contribuído para uma alteração nas práticas das educadoras
envolvidas. Ressaltamos a importância da definição do gênero a ser apreendido junto aos
educandos, assim como a necessidade de se contextualizar a escrita em uma situação
interlocutiva, ou seja, as crianças precisam saber o que, por que, como e para quem
escrevem. Sendo assim, podemos afirmar que o trabalho com a sequência didática para o
ensino de um gênero escrito configurou-se enquanto instrumental tanto para as educadoras,
quanto para os educandos. Para as educadoras, pois proporcionou orientações
metodológicas para o ensino sistematizado de um gênero do discurso escrito, contribuindo
para a construção de uma base de conhecimento para o ensino; e para os educandos, pois
permitiu a segurança na escrita uma vez que puderam apreender e vivenciar os
conhecimentos e os procedimentos que envolvem a prática da produção textual, se
considerando as características do gênero e a situação interlocutiva.
Palavras-chave: produção textual – gênero do discurso – ensino fundamental.
8
Abstract
The aim of this research was to verify and analyze which skills are necessary to
the educators of 9-year-old pupils at the discourse genres as a teaching subject so that they
can guarantee the pupilslearning regarding the textual production which covers beyond
the genre marks, i.e. the elements which ensure the discourse dynamics. Such skills were
approached during an Extension Course in a dialogic collaborative process between
researchers and educators, which was grounded in the development of a didactic sequence
for the teaching of the writing discourse genre. It is an investigation of qualitative nature
based on the dialogic collaborative methodology. The data collection was carried out
during a continuing education course attended by educators and pupils from a municipal
public school in São Carlos-SP which integrates the Project “Learning Communities:
betting on the learning quality, differences equality and democratization of the school
management”. We adopted a language conception which is constitutive of the individuals
and used the studies by Freire, Bakhtin and researchers such as Schneuwly and Dolz as
guidance. The data analysis, which was orientated by the assessment of themes present in
the meetings with the educators as well as in the meetings with a third-year group of
pupils, led us to conclude that the knowledge basis about teaching, more specifically the
one regarding the knowledge of specific contents – which refer to the discourse genres – of
the educators was not enough to guarantee that the discourse genres were conceived as a
teaching subject. Although they were present in the classroom in reading activities, such a
fact did not guarantee that the pupils appropriated them and started to produce them
textually. As for the knowledge built during the education course, we believe that the
reflections provided by the dialogic collaborative dynamics might have contributed to a
change in the practice of the educators in question. We highlight the importance of the
definition of the genre to be apprehended by the pupils, as well as the need to contextualize
the writing process in an interlocutive situation, i.e. the pupils need to know what, why,
how and to whom they write. Therefore, we can claim that using the didactic sequence to a
writing genre teaching worked as instrumental to both the educators and the pupils. As for
the educators, it provided methodological guidance to the systematized teaching of a
writing discourse genre, thus contributing to the construction of a teaching knowledge
basis; as for the pupils, it provided them with writing assurance, since they could learn and
experience the knowledge and procedures which the textual production practice entails,
taking into account the characteristics of the genre and the interlocutive situation.
Keywords: textual production - discourse genres - elementary school.
3
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ................................................................................................................ 9
CAPÍTULO I - CONTEXTUALIZAÇÃO DO PROJETO COMUNIDADES DE
APRENDIZAGEM E SUA RELAÇÃO COM A SOCIEDADE ATUAL ................... 18
1.1. O surgimento das Comunidades de Aprendizagem ..................................................... 21
CAPÍTULO II - CONCEPÇÃO DE LINGUAGEM ADOTADA NO TRABALHO.. 27
2.1. Concepção de Linguagem ........................................................................................... 27
2.2. Escola: espaço de múltiplas interlocuções ................................................................... 38
2.3. Alguns apontamentos sobre o ensino da língua materna e a prática da produção
textual ................................................................................................................................ 42
2.4. Sobre o objeto de ensino: os gêneros do discurso ........................................................45
2.5. Sobre o ensino: as sequências didáticas ...................................................................... 51
2.6. Educador – mediador ................................................................................................... 57
2.6.1. A formação inicial e continuada .................................................................... 63
2.6.2. Base de conhecimento para o ensino .............................................................. 64
2.6.2.1. Conhecimento de conteúdo específico ......................................................... 65
2.6.2.2.Conhecimento pedagógico geral ................................................................... 66
2.6.2.3. Conhecimento pedagógico do conteúdo ...................................................... 67
CAPÍTULO III – COMPOSIÇÃO DO PERCURSO TEÓRICO-METODOLÓGICO
............................................................................................................................................. 69
3.1. Procedimentos para a coleta e análise dos dados ........................................................ 74
3.1.1. As entrevistas .................................................................................................. 75
3.1.2. Gravações em áudio e vídeo ........................................................................... 76
3.2. Caracterização da educadora, participante da pesquisa.............................................. 76
4
3.3. Caracterização da Escola e das educadoras participantes da pesquisa......................... 77
3.4. Intervenções realizadas: o curso de formação para educadoras e a sequência didática
para os educandos .............................................................................................................. 79
3.4.1.O Curso de Formação para as educadoras...................................................... 80
3.4.2. A sequência didática para os educandos ........................................................ 82
3.4.3. Descrição das intervenções realizadas ........................................................... 85
3.5. Organização dos dados para a análise.........................................................................124
CAPÍTULO IV – NAS TESITURAS DO CAMINHO...: ANÁLISE DOS DADOS..125
4.1. Os conhecimentos sobre os gêneros discursivos enquanto objeto de ensino: as práticas
de produção textual ..........................................................................................................126
4.2.Conhecimentos construídos ao longo do curso de extensão ou conhecimentos
construídos no processo colaborativo dialógico .............................................................. 135
4.3. Conhecimentos partilhados ou diálogos em torno da prática ................................... 143
4.4. Sobre as aprendizagens dos educandos ..................................................................... 173
TECENDO ALGUMAS CONSIDERAÇÕES ............................................................... 183
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ........................................................................... 190
APÊNDICES .
Apêndice I – Primeira entrevista ........................................................................................ 195
Apêndice II – Segunda entrevista ...................................................................................... 202
Apêndice III – Pauta Primeiro Encontro educadoras ......................................................... 208
Apêndice IV– Produção textual das educadoras .............................................................. 204
Apêndice X– Tabelas para acompanhamento das produções dos educandos .................... 215
Apêndice XI – Pauta Oitavo Encontro Educadoras ........................................................... 217
5
ANEXOS
Anexo I- Descritores Provinha Brasil, Prova Brasil e SAEB .......................................... 224
Anexo II – Produção textual educadoras ......................................................................... 228
Anexo III – Exemplo de produções textuais .................................................................... 231
Anexo IV – Características dos gêneros discursivos ....................................................... 242
Anexo V – Versões das fábulas “A Cigarra e a Formiga” ............................................... 244
Anexo VI – Análise de fábulas impressas ........................................................................ 246
Anexo VII – Texto informativo sobre fábulas ................................................................. 247
9
INTRODUÇÃO
O objetivo desta pesquisa foi o de verificar e analisar quais conhecimentos são
necessários aos educadores das séries/anos iniciais do Ensino Fundamental de Nove Anos
1
sobre os gêneros discursivos como objeto de ensino para que possam garantir a
aprendizagem dos educandos no tocante à prática da produção textual que considere além
das marcas do gênero, os elementos que assegurem a dinâmica discursiva. Tais
conhecimentos foram abordados durante um Curso de Extensão, em um processo
colaborativo dialógico entre pesquisadoras e educadoras, o qual se fundamentou no
desenvolvimento de uma sequência didática para o ensino de um gênero do discurso
escrito.
De acordo com os Parâmetros Curriculares Nacionais de Língua Portuguesa
PCNs (BRASIL, 2001) o trabalho com a produção de textos tem como finalidades formar
escritores competentes capazes de produzir textos coerentes, coesos e eficazes.
O referido documento afirma que a escola, desde os primeiros anos deveria
oferecer condições para formar esses escritores, organizando o trabalho escolar de forma a
selecionar dentre os diferentes gêneros disponíveis, o mais apropriado na situação
enunciativa que desejam participar, planejando seus textos em função de seus objetivos e
dos leitores a que se destinam tais escritores, também deveriam utilizar-se da revisão
textual, verificando a adequação de seus textos, assim como recorrer a diferentes fontes,
selecionando informações pertinentes para sua produção.
Os Parâmetros Curriculares Nacionais de Língua Portuguesa concebem o texto
como a unidade básica do ensino da língua materna, constituindo um avanço para o
1
Utilizaremos a expressão séries/anos iniciais do Ensino Fundamental de Nove Anos, pois nos referimos à
alteração realizada no município de São Carlos-SP de acordo com a Lei 11.274/2006 que amplia de oito para
nove anos o ensino fundamental, a partir de seis anos de idade. Sendo assim, em cumprimento à Lei o ensino
10
processo de ensino e aprendizagem de leitura e produção de textos, uma vez que propõe
uma ruptura com o ensino antes realizado de maneira normativa e conceitual.
Contudo, nem sempre fica claro para os educadores das séries/anos iniciais do
Ensino Fundamental como formar escritores e leitores competentes, os próprios PCNs de
Língua Portuguesa, embora tragam importantes contribuições, não deixam explícitos os
conteúdos a serem trabalhados e nem as maneiras de garantir a prática com a produção
textual. Tal fato foi percebido após realizarmos a primeira etapa da pesquisa que integra o
projeto “Comunidades de Aprendizagem
2
: aposta na qualidade da aprendizagem, na
igualdade de diferenças e na democratização da gestão da escola”, financiado pela
FAPESP (Processo 2007/52610-6) e pelo CNPq (Processo 401985/2007-5), no eixo:
“aprendizagem da leitura e da escrita”.
Fazemos parte do grupo de pesquisa: “Aquisição da Escrita e da Leitura:
processo de ensino e aprendizagem”, coordenado pela Profª. Drª.Claudia Raimundo Reyes
- Departamento de Metodologia de Ensino - Dme - UFSCar. Em 2007, o grupo de pesquisa
foi convidado a atuar junto ao projeto Comunidades de Aprendizagem para planejarmos
junto aos educadores de três escolas da rede municipal de ensino da cidade de São Carlos-
SP descritores, conteúdos e estratégias de avaliação da língua materna em cada ano
escolar.
Durante o semestre de 2008, nosso grupo de pesquisa apresentou aos
educadores participantes do projeto Comunidades de Aprendizagem os descritores e
conteúdos a serem ensinados em cada ano escolar - 1º ao 5º ano do Ensino Fundamental de
Nove anos – elaborados a partir dos parâmetros das avaliações realizadas em âmbito
nacional: Provinha Brasil, Prova Brasil e SAEB Sistema de Avaliação da Educação
Básica - (ANEXO I). Estes descritores e conteúdos foram apresentados juntamente com
propostas de trabalho em sala de aula que privilegiaram o texto como unidade de ensino da
língua.
fundamental no município passou a ser de nove anos a partir de 2006.
2
Comunidades de Aprendizagem é um projeto elaborado pelo Centro Especial de Investigación em Teorías y
Prácticas Superadoras de Desigualdades (CREA)/Universidade de Barcelona, na década de 1990. Visa à
aprendizagem escolar de máxima qualidade para todos e todas, participação da comunidade de entorno e
familiares na escola e convivência na diversidade como valor positivo. A partir de 2003, passou a ser
difundido, reelaborado e desenvolvido em escolas públicas municipais de São Carlos, sob coordenação e
acompanhamento da Pro Drª Roseli Rodrigues de Mello - Departamento de Metodologia de Ensino -
UFSCar.
11
Em um segundo momento de atuação no projeto Comunidades de
Aprendizagem, foram elaborados instrumentos avaliativos para cada ano escolar, em um
processo de colaboração entre pesquisadores e educadores.
Para Magalhães (1994), no contexto educacional, a metodologia colaborativa
desenvolve a teoria e condução da prática de forma conjunta entre os profissionais
envoltos, conduzindo à auto-reflexão, análise crítica e transformação na aprendizagem
destes. O papel do pesquisador nesta metodologia se junta ao dos participantes, por ambos
serem co-participantes e sujeitos no ato de construção e de transformação do
conhecimento (p.72).
Durante a realização dessa etapa de trabalho junto ao projeto Comunidades de
Aprendizagem, ficaram evidentes as incertezas quanto ao trabalho educativo que privilegia
o ensino da língua materna nos primeiros anos do Ensino Fundamental pautado nos
diferentes gêneros discursivos que circulam socialmente.
Essa necessidade de clareza teórica e metodológica também foi sentida pelas
educadoras envolvidas, que solicitaram junto à Secretaria Municipal de Educação e Cultura
um curso de formação que contemplasse a temática.
Sendo assim, o grupo de pesquisa “Aquisição da Escrita e da Leitura: processo
de ensino e aprendizagem” organizou um Curso de Extensão - Programa de Extensão da
Universidade Federal de São Carlos PROEX- UFSCar com a seguinte temática:
“Produção textual nas séries anos/iniciais do Ensino Fundamental de Nove Anos:
dialogando com educadores e educandos”. Tal Curso de Extensão foi organizado por duas
pesquisadoras do grupo de pesquisa e coordenado pela Profa. Dra. Claudia Raimundo
Reyes, ele foi oferecido às educadoras de uma das escolas que integra o Projeto
Comunidades de Aprendizagem.
No contexto de realização do Curso de Extensão surgiram duas propostas de
pesquisas que foram desenvolvidas no curso de doutorado e que tiveram como tema os
conhecimentos elaborados por educadores e educandos sobre a prática da produção textual
pautada sobre o desenvolvimento de uma sequência didática para o ensino de um gênero
do discurso escrito.
A primeira pesquisa foi realizada por Cunha (2010) e tem buscado
compreender o que diziam os educandos do ano do Ensino Fundamental de Nove anos
12
sobre produção de texto e quais conhecimentos foram construídos a partir de mediações da
educadora, pesquisadora e demais educandos.
E a segunda, desenvolvida por mim e apresentada neste trabalho, teve como
foco de estudo os conhecimentos necessários aos educadores sobre os gêneros discursivos
como objeto de ensino, para que garantam a aprendizagem dos educandos no tocante à
prática da produção textual que considere, além das marcas do gênero, os elementos que
assegurem a dinâmica discursiva.
Tal foco de estudo foi desdobrado nos seguintes objetivos:
Verificar quais conhecimentos as educadoras possuíam sobre os neros discursivos
enquanto objeto de ensino;
Verificar quais conhecimentos foram construídos ao longo da realização do Curso
de Extensão que procurou enfocar a sequência didática como estratégia para o ensino
de um gênero do discurso escrito;
Relacionar os conhecimentos que as educadoras tinham e que afirmaram ter
aprendido;
Analisar o que as educadoras afirmaram sobre as aprendizagens dos educandos
durante e após a realização da sequência didática;
Mizukami et. al. (2002) ao analisar as contribuições de Shulman (1987, 1986,
1996 e 1986a) para a construção da base de conhecimento para o ensino, afirmam que as
pesquisas tem privilegiado os processos cognitivos gerais que transcendem às
particularidades das disciplinas e que oferecem pouca contribuição sobre o papel
desempenhado pela compreensão do conhecimento específico. As autoras indicam então, a
necessidade de que as pesquisas contemplem os conteúdos das áreas específicas de forma a
melhor conhecer os processos de construção dos diferentes tipos de conhecimentos.
Com base nesse pressuposto foram realizadas várias reflexões sobre a
formação de professores que lecionam no Ensino Fundamental, atentando para o ensino da
língua materna, mais especificamente para a base de conhecimento do conteúdo específico
e as relações do processo de ensino e aprendizagem.
Mello et. al, (2000) ao investigarem a base de conhecimento sobre a língua
materna com professoras da rede estadual de ensino concluíram, em sua primeira fase de
pesquisa, que as professoras dividiam o ensino da língua em dois momentos: alfabetização
13
e produção de textos, sendo que a alfabetização era compreendida como a aquisição
crescente dos elementos constitutivos da língua e a produção de textos como processo de
reprodução de modelos.
Na segunda fase da mesma pesquisa e intervenção, as professoras puderam
confrontar suas concepções com as propostas das políticas públicas, como os Parâmetros
Curriculares Nacionais de Língua Portuguesa e Sistema de Avaliação da Educação Básica
SAEB. As pesquisadoras observaram que ao entrarem em contato com tais documentos
as educadoras alteraram seus discursos. Quanto a isso, as pesquisadoras afirmam:
[...] o acesso aos documentos que divulgam as políticas públicas faz com
que as professoras transformem seu discurso - não afirmamos aqui que tal
transformação signifique, necessariamente, alteração das práticas. Quanto
ao produto coletivo da revisão das indicações feitas para cada série, a
partir dos descritores do SAEB, feita nos pequenos grupos, por série, foi
possível vivenciar um rico momento de formação das professoras. Na
condução dos trabalhos, as pesquisadoras questionavam o significado de
cada um dos itens, o que propiciou que as professoras declarassem não
saber vários dos termos e conceitos, mesmo tendo assinalado vários
deles. Então, tais termos e conceitos eram explicados pelas
pesquisadoras, dando-se e solicitando-se exemplos. Nesse momento, as
professoras pareciam tomar ciência do proposto pelas políticas atuais
para as séries iniciais do ensino fundamental. Interessante foi notar que,
mesmo tendo discutido os PCN’s de Português, elas o tinham
compreensão de vários aspectos da Proposta. O detalhamento dos
conteúdos favoreceu a aproximação
(MELLO, et. al., 2000, p. 04)
.
Sendo assim, as pesquisadoras buscavam, através da concepção de linguagem
como processo de constituição dos sujeitos e da reflexão fazer com que as educadoras e
elas próprias chegassem a uma compreensão do que pensavam para fazer e sobre o que
faziam, reconhecendo-se sujeitos constituídos e constituintes das práticas que viviam e
promoviam em sala de aula e fora dela (MELLO, et. al., 2000, p.05).
Quanto ao desenvolvimento do trabalho, as pesquisadoras ressaltaram:
Assim, produz, necessariamente, situações de confronto com concepções
nem sempre conscientes. Mudar maneiras de ensinar a língua pressupõe
mudar maneiras de concebê-la enquanto constitutiva, ou não, do sujeito,
dos pressupostos sociais e como matéria escolar. Portanto, implica exame
permanente e profundo sobre o que se pensa e o que pressupõe, propostas
governamentais, metodológicas, etc. Não se trata, portanto, de mera
14
exposição de professores e professoras ao discurso veiculado, seja por
meio da leitura de documentos e livros, seja por explanação de
especialistas, as ideias diferentes das que os professores possuem. É
preciso haver reflexão, debate, embate, mediação, para não se dissolver
qualquer tipo de proposta em palavras que servem apenas para proteger
professores e professoras do julgamento que especialistas e governantes
podem fazer de suas práticas
(MELLO, et. al., 2000, p. 13).
Em outro trabalho, Reyes (2000) investigou o processo de aquisição da escrita
por meio da interação e concluiu que o trabalho de colaboração entre pesquisadora e
professora favorecia a aprendizagem das crianças e também contribuía para o
desenvolvimento e reflexão dos conhecimentos de conteúdo específico em ambas.
A partir dessas pesquisas originou o grupo “Aquisição da Escrita e da Leitura:
processo de ensino e aprendizagem”, do qual comecei a fazer parte no início do curso do
mestrado em 2004.
Durante o último ano do curso de Licenciatura em Pedagogia da Universidade
Federal de São Carlos UFSCar –, interessei-me pela participação como professora
alfabetizadora de jovens e adultos no Programa Federal Brasil Alfabetizado, implantado no
município de São Carlos - SP em parceria entre UFSCar e Secretaria Municipal de
Educação e Cultura.
Durante o período de agosto a dezembro de 2003 atuei, juntamente com uma
companheira de turma, em uma sala de alfabetização de jovens e adultos, vivenciando
minha primeira experiência como professora alfabetizadora e me descobrindo enquanto tal.
A experiência vivida junto aos participantes da turma de alfabetização foi tão
intensa e desencadeadora de tantas aprendizagens ressalto que mais em mim do que para
eles que em minha dissertação de mestrado desenvolvi um estudo que contou com a
participação de seis educandos da referida turma e que investigou as experiências pessoais
e sociais que foram possíveis após o início do processo de alfabetização. Nesse trabalho,
discutimos a importância da aquisição da leitura e da escrita para o rompimento de muros
antidialógicos pessoais e sociais (FLECHA, 1997) e de como o domínio de aspectos
instrumentais da linguagem escrita, como o reconhecimento das letras e do próprio nome, é
importante e ressignificado nas vivências de adultos que sofrem o processo de exclusão
social por não dominarem a leitura e a escrita no contexto da sociedade informacional.
15
Após o término do Mestrado iniciei o trabalho como professora dos anos
iniciais do ensino fundamental em uma escola de ensino regular na periferia do município
de São Carlos. Concomitante, continuei minha atuação no grupo de pesquisa.
Tal grupo objetiva investigar os conhecimentos necessários ao ensino da língua
materna e as práticas de ensino e aprendizagem em um processo dialógico e dialético,
sendo orientadas por autores como Vygotsky, Bakhtin e Paulo Freire.
Os diálogos que tive oportunidade de participar no grupo de pesquisa
proporcionaram estudos, reflexões e reelaboração de conhecimentos que sempre busquei
desenvolver e praticar junto à turma de educandos com que trabalhei.
A oportunidade de aprofundamento teórico e prático sobre a atividade de
produção textual na escola me interessou, pois me preocupava com a qualidade das escritas
dos educandos, uma vez que a prática de produção textual, em sua maioria não
contemplava os gêneros do discurso escrito, baseavam-se em simples descrições. As
trocas, realizadas com as educadoras com quem trabalhava, consistiam unicamente em
diferentes comandas que buscavam, ilusória e momentaneamente, “inspirar” as crianças
para a escrita. Nós professoras pouco sabíamos sobre “como ensinar” as crianças a
produzirem os gêneros discursivos textualmente, algumas pistas nos eram indicadas, como
por exemplo: a produção e revisão coletivas, mas não conseguíamos desenvolver a
autonomia dos educandos para a escrita e nos frustrávamos quando a criança era convidada
a escrever sozinha.
De certa maneira, os gêneros do discurso sempre permearam as reflexões sobre
a língua desenvolvidas junto aos educandos, presentes principalmente nas leituras diárias
realizadas na sala de aula, porém, não havia garantias de domínio dos gêneros por parte das
crianças que os reconheciam, mas não sabiam produzir dentro do mesmo.
Dentro do já citado grupo de pesquisa, desenvolvíamos constantemente estudos
e reflexões em torno da aquisição da língua materna e mais recentemente estudamos com
afinco os textos de Mikhail Bakhtin, por ocasião da pesquisa desenvolvida por Giovani
(2006), que elaborou sua pesquisa de mestrado em torno da importância dos gêneros do
discurso para a aquisição da língua materna. Sua pesquisa não só demonstrou que as
crianças se apropriavam mais rapidamente e de forma contextualizada do sistema de
escrita, mas também que a produção textual era desenvolvida com mais autonomia e
qualidade, demonstrando a apropriação de algumas características do gênero estudado.
16
Outras pesquisas desenvolvidas pelo grupo, como Cunha (2004) e Silva (2008)
também sinalizavam que diferentes gêneros do discurso, orais e escritos perpassavam as
práticas de professoras alfabetizadoras, demonstrando mais uma vez que os gêneros do
discurso estão presentes na sala de aula e são utilizados nas práticas de alfabetização como
forma de contextualização da aquisição do sistema de escrita, sinalizando que essas
práticas vão ao encontro da união entre alfabetizar e letrar (SOARES, 2003).
Os textos de Schneuwly e colaborares (2004), juntamente com a proposta de
desenvolvimento de uma sequência didática para o ensino de um gênero do discurso nos
chegaram no início do trabalho com o Projeto Comunidades de Aprendizagem e, diante das
angústias e dúvidas apresentadas pelas educadoras e também presentes em nós, nos fez
colocar a proposta de pesquisa em prática.
Estrutura do Trabalho
O presente estudo encontra-se dividido em cinco partes. A primeira é
constituída de nosso referencial teórico, no qual tecemos uma relação entre a importância
do Projeto Comunidades de Aprendizagem na sociedade atual, contexto em que se realiza
nossa proposta de estudo. Ainda no mesmo capítulo apresentamos os princípios da
aprendizagem dialógica que são colocados em prática no interior do projeto Comunidades
de Aprendizagem.
A seguir, apresentamos nosso referencial teórico-metodológico, trazemos a
concepção de linguagem defendida e adotada em nosso trabalho, bem como a importância
do papel da escola na ampliação das interlocuções. Tecemos também algumas
considerações acerca das sequências didáticas para o ensino de um gênero do discurso
escrito, ressaltamos a importância do educador como mediador do processo de ensino e
aprendizagem, assim como apresentamos o papel da formação básica e continuada na
atividade docente e a base de conhecimento para o ensino.
Na terceira parte do trabalho apresentamos nossa metodologia de pesquisa que
se pauta na perspectiva colaborativa dialógica, os procedimentos de coleta e análise dos
dados. Ainda no terceiro capítulo apresentamos os procedimentos, neles descrevemos
como se constituíram as intervenções presentes nos encontros realizados junto às
educadoras e educandos, e que configuraram o Curso de Extensão Produção textual nas
17
séries/anos iniciais do Ensino Fundamental de Nove Anos: dialogando com educadores e
educandos.
Na quarta parte de nosso trabalho apresentamos as análises dos dados. Esse
capítulo está organizado em torno de quatro eixos: a) os conhecimentos que as educadoras
possuíam sobre os gêneros discursivos enquanto objeto de ensino; b) os conhecimentos
que foram construídos ao longo da realização do Curso de Extensão que procurou enfocar
a sequência didática como estratégia para o ensino de um gênero do discurso escrito; c) a
relação entre os conhecimentos que as educadoras tinham e que afirmaram ter aprendido;
d) a análise do que as educadoras afirmaram sobre as aprendizagens dos educandos durante
e após a realização da sequência didática;
A quinta e última parte do trabalho é constituída de nossas considerações finais
acerca da pesquisa desenvolvida.
18
CAPÍTULO I
CONTEXTUALIZAÇÃO DO PROJETO COMUNIDADES DE APRENDIZAGEM
E SUA RELAÇÃO COM A SOCIEDADE ATUAL
Educar e educar-se, na prática da
liberdade, não é estender algo desde a
“sede de saber”, até a “sede da
ignorância” para “salvar”, com este saber,
os que habitam nesta. Ao contrário, educar
e educar-se, na prática da liberdade, é
tarefa daqueles que sabem que pouco
sabem – por isto sabem que sabem algo e
podem assim chegar a saber mais – em
diálogo com aqueles que, quase sempre,
pensam que nada sabem, para que estes,
transformando seu pensar que nada sabem
em saber que pouco sabem, possam
igualmente saber mais (Paulo Freire,
Comunicação e Extensão, 1975, p. 25).
A relevância da presente proposta de pesquisa reside no fato de que as
principais exigências da sociedade atual, caracterizada como informacional, não têm sido
contempladas pelas nossas escolas, que além de não desenvolver os conhecimentos e
habilidades necessárias e exigidas pelo contexto, continuam legitimando práticas
excludentes. Nesse sentido, apostar em um novo modelo de escola, aberto à diversidade
das comunidades nelas envolvidas, bem como no diálogo igualitário, pode se configurar
em possibilidades para enfrentarmos os desafios impostos pela conjectura atual.
Frente às atuais desigualdades sociais, diferentes perspectivas tentam traçar
soluções de maneira a minimizá-las. inúmeras práticas educativas que são reforçadas
por políticas que objetivam a homogeneização realizada pela difusão crescente da cultura
dominante, como se o seu domínio fosse capaz, por si só, de por fim às desigualdades.
O único objetivo que unifica os diferentes setores da direita no terreno
cultural é o contínuo aumento de privilégios, cuja manutenção requer
19
uma desigualdade educativa. Dentre a pluralidade de opções disponíveis,
cada setor defende, em cada contexto temporal e/ou espacial a que
considera que melhor representa seus interesses
(FLECHA, 1994, p.
77).
Dentre as opções disponíveis o autor destaca três perspectivas apresentadas a
seguir.
A perspectiva tradicional acredita que a escola é a instituição privilegiada no
acesso de todos à cultura. Partindo de um enfoque etnocentrista, esta perspectiva assume
como cultura as expressões da classe dominante e que, portanto, são compreendidas como
superior às demais. Segundo Flecha (1994) as desigualdades são facilmente
reproduzidas, pois se acredita na possível neutralidade da cultura, que no sistema escolar
pertence e serve unicamente aos grupos dominantes.
A perspectiva relativista, muito presente em inúmeras propostas educativas
atuais, acredita na diversidade cultural e por isso elabora currículos diferenciados para
diferentes grupos. Esse enfoque não assume a diversidade, mas também a desigualdade,
uma vez que admite a adaptação a contextos desiguais.
A terceira perspectiva apontada pelo autor é a comunicativa, que desenvolve
um enfoque baseado no diálogo como forma de relações entre culturas e como caminho
para a superação das atuais desigualdades e exclusões. O enfoque comunicativo segundo
Flecha (1994), considera que a cultura dominante tem ocupado lugar de privilégio em
qualquer proposta educativa, porém não a concebe como as duas perspectivas
anteriormente citadas, porque pela via do diálogo são possíveis seus avanços e superações.
É nesse sentido que a igualdade é entendida como:
[...] o direito de todas as pessoas de escolher ser diferente e educar-se em
suas próprias diferenças (...) O objetivo da igualdade trata de superar as
atuais desigualdades educativas e culturais que, na sociedade da
informação, desempenham um papel cada vez mais importante na
reprodução e manutenção do conjunto das desigualdades sociais. Não se
trata de todas as pessoas terem as mesmas oportunidades de dispor de
uma cultura homogênea, mas sim de redistribuir os recursos humanos e
materiais de forma que se consiga que ninguém ocupe uma posição
inferior por não possuir determinados elementos culturais.
(id. ibid.,
p.77).
É no interior desta perspectiva, da comunicativa, que compreendemos o projeto
Comunidades de Aprendizagem, contexto que se desenvolverá nossa pesquisa.
20
O projeto Comunidades de Aprendizagem é uma resposta às principais
exigências do contexto social atual. De acordo com Elboj Saso (et. al., 2002), as teorias
dialógicas e os intelectuais críticos buscam explicar as atuais tendências sociais,
potencializando o aspecto dialógico, ou seja, esses autores explicam que o fenômeno da
globalização tem se caracterizado pela busca da homogeneidade, no entanto, inversamente,
isso tem causado ao mesmo tempo a reafirmação de identidades culturais.
Outra tendência atual apontada pelos autores tem sido a crescente crise dos
valores tradicionais e a participação das mulheres em diferentes espaços sociais, antes
restrito ao ambiente doméstico. Todos esses fatores são compreendidos como o giro
dialógico das sociedades modernas, uma vez que o novo panorama informacional não
afeta somente as relações de trabalho e produção, mas sim todos os âmbitos da vida,
levando as pessoas a tomarem decisões e acordos pela via do diálogo.
As teorias dialógicas objetivam analisar as dinâmicas comunicativas da
sociedade e estabelecer quais fatores promovem ou não o diálogo. As obras de Habermas e
Freire oferecem importantes contribuições a essas teorias, pois ambos tomam a questão do
diálogo como elemento central.
Los dos [Freire e Habermas] proponen una teoría que define como se
llevan a cabo las acciones dialógicas, basándose en principios y tipos de
acción que posibilitan el entendimiento, la creación cultural y la
liberación. A su vez, definen que tipos de acción niegan la posibilidad de
diálogo y promueven la distorsión de la comunicación y la reproducción
del poder
(ELBOJ SASO, et.al., 2002, p.40).
Habermas (1987) elaborou vários conceitos importantes em sua obra intitulada:
Teoria da Ação Comunicativa, dentre eles, o autor contrapõe os conceitos de racionalidade
instrumental e comunicativa. A racionalidade consiste no uso que fazemos do saber por
meio da linguagem e ão, no entanto, a racionalidade instrumental que consiste no uso
que se faz do saber para alcançar determinados objetivos acabou colonizando o
funcionamento da sociedade democrática. O autor defende a racionalidade comunicativa,
pois nela o saber é um entendimento que acessa e acesso ao mundo objetivo e à
intersubjetividade.
O autor descreve a ação comunicativa a partir da premissa que todos os atores
21
sociais são capazes de linguagem e ação e, portanto, capazes de expor argumentos e chegar
a entendimentos, aproximando-se da perspectiva freireana.
Para Paulo Freire (1987), o processo de conscientização permite que as pessoas
transcendam os limites da realidade opressora, uma vez que a compreendendo como fruto
da própria ação o ser humano se sente potencialmente capaz de transformá-la.
Não obstante, a dimensão conscientizadora se viabiliza por meio da
experiência dialógica, que no interior dessa teoria não é percebida como instrumento a ser
utilizado pelo educador, mas sim de uma exigência da própria natureza humana, que
através da linguagem que humanizamos o mundo e a nós mesmos.
No Capítulo II nos deteremos mais acerca do papel da linguagem no interior
desta perspectiva.
1.1. O surgimento das Comunidades de Aprendizagem
O projeto Comunidades de Aprendizagem tem sua origem na experiência da
escola de Pessoas Adultas La Verneda-Sant Marti Barcelona, Espanha. Nessa
experiência educativa, todas as pessoas envolvidas decidem juntas como deve ser a escola
que desejam. Por meio de assembléias os participantes opinam e tomam decisões para
concretizar o que haviam sonhado.
É nesse sentido que o projeto Comunidades de Aprendizagem procura
alicerçar-se sobre as bases da perspectiva comunicativa, sendo entendido como:
[…] un proyecto de transformación social y cultural de un centro
educativo y de su entorno, para conseguir una sociedad de la información
para todas las personas, basada en el aprendizaje dialógica, mediante la
educación participativa de la comunidad que se concreta en todos sus
espacios incluida el aula
(VALLS, 2000, apud. ELBOJ SASO, 2002,
p. 8).
E é sobre a tríade: comunicação diálogo educação, que se elabora e se
coloca em prática o conceito de aprendizagem dialógica:
22
Podemos definir el aprendizaje dialógico como el que resulta de las
interacciones que produce el diálogo igualitario, es decir, un diálogo en
que diferentes personas aportam argumentos em condiciones de igualdad,
para llegar a consenso, partiendo de que queremos entendernos hablando
desde pretensiones de validez
(ELBOJ SASO, 2002, p.92).
A aprendizagem dialógica possui sete princípios fundamentais que serão
brevemente descritos a seguir.
No princípio relacionado ao diálogo igualitário, o conceito de diálogo é
tomando em seu sentido comunicativo, sendo assim, o diálogo é igualitário quando as
colocações de cada participante são validadas em função de seus argumentos e não em
função da posição de poder que ocupam. Nesse sentido, nada está definidamente
constituído, o conhecimento pode ser reinterpretado e questionado a todo o momento por
todos os participantes.
Nesta perspectiva, são agentes do diálogo igualitário familiares, alunos,
professores e todas as pessoas envolvidas com o entorno escolar. O diálogo com esses
agentes é facilitado, uma vez que todos possuem um objetivo em comum: a melhoria da
aprendizagem e do funcionamento da escola.
O segundo princípio refere-se ao conceito de inteligência cultural, que de
acordo com Elboj Saso (ibid.) ameados do século XX o conceito de inteligência estava
diretamente vinculado à inteligência acadêmica, menosprezavam-se assim, os
conhecimentos que não haviam sido desenvolvidos neste meio, no entanto, muitas pessoas
demonstram possuir habilidades diferentes em diferentes contextos. Sendo assim, o
conceito de inteligência cultural envolve as dimensões da inteligência acadêmica, prática e
interativa.
La inteligencia cultural contempla la pluralidad de dimensiones de la
interacción humana y es la base del diálogo igualitario en el aprendizaje
y en las relaciones sociales
(id. ibid., p. 98).
En la inteligencia cultural utilizamos las habilidades comunicativas
como instrumento fundamental para resolver situaciones que una
persona en solitario no podria solucionar con la inteligencia práctica o
académica, o lo haría menos adecuadamente
(ELBOJ SASO, 2002, p.
100).
A partir do conceito de inteligência cultural compreende-se que cada educando
pode se reportar à sua própria cultura, isso é, às habilidades e modos de conhecer próprios,
23
conquistando uma maior auto-confiança. Pode-se, dessa maneira, refutar as teorias do
déficit educacional, uma vez que estas não compreendem as diferenças culturais dos
educandos e nem reconhecem as diferentes interpretações para os conhecimentos. É por
meio da inteligência cultual que se enriquecem os conhecimentos, pela compreensão da
diversidade de saberes em contextos diferentes:
En el transcurso de la interacción, unas y otros ponen en evidencia sus
saberes y habilidades académicas y prácticas, y movilizan sus destrezas
comunicativas con las que argumentar sus emisiones y alcanzar ele
conocimiento más profundo de una situación que pretenden resolver.
Tenemos capacidades y potencialidades que nos permiten alcanzar, con
la ayuda de los demás, un mismo puerto desde diferentes mares
(ELBOJ
SASO, ibid., p. 101).
Dessa forma, ganha-se mais conhecimento sobre a realidade, pois um mesmo
aspecto desta complexidade passa a ser visto por diferentes ângulos, dada a diversidade de
olhares sobre ele.
O princípio da transformação refere-se ao compromisso com a realidade da
qual os participantes da Comunidades de Aprendizagem sujeitos em diálogo tomam
parte, no sentido de transformá-la e não de adaptar-se a ela (FREIRE, 1997).
Essa transformação é possível pela afirmação da dialética entre sistema e
mundo de Habermas (1987), que através da ação comunicativa possibilita que nada se
imponha entre as pessoas e coletivos.
Com relação à dimensão instrumental, quarto princípio da aprendizagem
dialógica, esta se refere à aprendizagem daqueles instrumentos fundamentais que
constituem a base para ascender às demais aprendizagens e um requisito para obter uma
formação de qualidade. Nesse sentido acreditamos que a aprendizagem da leitura e da
escrita são um dos requisitos para a participação na sociedade informacional.
Quanto ao aspecto instrumental do ensino, Flecha (1997) afirma que no
modelo tradicional, desenvolve-se junto aos educandos um conhecimento que os adapta ao
contexto da sociedade atual, quando deveria contribuir para sua transformação. Na
aprendizagem dialógica todas as dimensões da aprendizagem são incluídas: a dimensão
comunicativa e a instrumental, a leitura do mundo e a leitura da palavra, desde que os
sujeitos envolvidos no processo concordem em aprendê-las.
24
El dialógico no se opone al instrumental, sino a la colonización
tecnocrática del aprendizaje. Es decir, evita que los objetivos y
procedimientos sean decididos al margen de las personas, escudándose
en razones de tipo técnico que esconden los intereses exclusores de unas
minorías
(FLECHA, 1997, p. 33).
Outro princípio da aprendizagem dialógica refere-se à criação de sentido,
Flecha (1997) afirma que no contexto da sociedade informacional observa-se a presença do
sentimento de insegurança e perda de sentido da existência humana, aqui o sentido é
compreendido como sendo a identificação simbólica que realiza um ator do objetivo de sua
ação. Tais processos, o de insegurança e perda de sentido, são frutos da redefinição do
modelo de família, religião, sociedade e da supremacia dos sistemas burocráticos sobre o
mundo do trabalho, político, social e espiritual. Sobre o tema, ELBOJ SASO, et.al., 2002,
também afirmam:
El sentido surge cuando la interacción entre las personas es dirigida por
ellas mismas, no como algo impuesto o preafigurado por las
circunstancias de clase, culturales o económicas o por las expectativas
ajenas a la misma persona
(p.105).
Sendo assim, o princípio da aprendizagem dialógica da criação de sentido
objetiva que as pessoas tomem em suas próprias mãos as decisões que se relacionam às
suas vidas, tornando-se protagonistas de suas experiências.
O princípio da solidariedade concebe a escola como um espaço solidário, no
qual todos participam em torno de um objetivo comum que gira em torno de práticas
educativas igualitárias que possam oferecer as mesmas oportunidades a todas as pessoas. A
aprendizagem dialógica concebe a crítica social em termos de transformação solidária, na
qual há a universalização e compartilhamento das oportunidades culturais.
O último princípio da aprendizagem dialógica e descrito por nós, refere-se à
igualdade de diferenças, compreendida como o direito à educação igualitária. O objetivo
desse princípio é o de chegar a uma igualdade de direitos e oportunidades a pessoas
diferentes, sem cair na homogeneização das práticas etnocêntricas ou no relativismo pós-
moderno. Trata-se de potencializar a diversidade de cultura que fazem parte do contexto
25
escolar e garantir que todos adquiram conhecimentos essenciais da sociedade atual.
Com base nesses princípios, brevemente apresentados por nós, é que se
desenvolve o projeto Comunidades de Aprendizagem no município de São Carlos- SP. O
projeto foi criado pelo CREA/UB/ES (Centro Especial de Investigação em Teorias e
Práticas Superadoras de Desigualdades) e vem sendo desenvolvido no Brasil pelo NIASE
(Núcleo de Investigação e Ação Social e Educativa - UFSCar) em parceria com a SME
(Secretaria Municipal de Educação), desde 2003.
O objetivo das Comunidades de Aprendizagem é a aprendizagem escolar de
máxima qualidade para todos, participação da comunidade de entorno e familiares na
escola e convivência na diversidade como valor positivo. Tal projeto vem sendo
desenvolvido em três escolas da rede pública municipal de educação e conta com a
participação de educandos, educadores, comunidades, voluntários, pesquisadores e
professores da Universidade Federal de São Carlos - UFSCar.
De acordo com Mello (2008), o projeto de pesquisa “Comunidades de
Aprendizagem: aposta na qualidade da aprendizagem, na igualdade de diferenças e na
democratização da gestão da escola”, tem como objetivo a máxima aprendizagem dos
educandos, ou seja, busca-se que se aprendam mais eficazmente os conteúdos, como forma
de garantir uma participação mais justa na sociedade informacional, sendo que todo o
trabalho desenvolvido no interior do projeto é orientado pelos princípios da aprendizagem
dialógica. A pesquisa centrou-se sobre os seguintes pontos: a) a aprendizagem da leitura e
da escrita em uma sala de cada série do primeiro ciclo do ensino fundamental das três
escolas; b) as práticas de aprendizagem dialógica (grupos interativos, biblioteca tutorada,
formação de familiares e pessoas da comunidade e tertrúlias literárias dialógica) como
promotoras do valor da diversidade; c) situações de participação da comunidade nas
decisões das escolas (conselho de escola, comissão gestora, comissões mistas) e d)
caracterização de necessidades formativas e potencialidades educativas da população de
entorno e dos familiares dos estudantes canalizando-as para a interlocução entre escolas e
comunidade de entorno.
É no contexto destas práticas que nossa pesquisa sobre produção textual se
desenvolve. A seguir, apresentaremos a concepção de linguagem adotada em nosso
trabalho e de que forma ela pode contribuir para a superação de tais práticas.
26
27
CAPÍTULO II
CONCEPÇÃO DE LINGUAGEM ADOTADA NO TRABALHO
Aprender a ler é ampliar as possibilidades
de interlocução com pessoas que jamais
encontraremos frente a frente e, por
interagirmos com elas, sermos capazes de
compreender, criticar e avaliar seus modos
de compreender o mundo, as coisas, as
gentes e suas relações. Isto é ler. E
escrever é ser capaz de colocar-se na
posição daquele que registra suas
compreensões para ser lido por outros e,
portanto, com eles interagir (João
Wanderley Geraldi, Linguagem e Ensino,
1996, p.71).
Viemos até aqui delineando o contexto em que se realizou nossa pesquisa,
apresentamos algumas características da sociedade informacional e como o projeto
Comunidades de Aprendizagem, pautado nos princípios da aprendizagem dialógica pode
se configurar em ações que objetivam a transformação das práticas de exclusão, sobretudo
das que se realizam e que são perpetuadas pela instituição escolar. A seguir,
apresentaremos a concepção de linguagem adotada por nosso grupo de pesquisa e que aqui
orientou-nos na realização de nossa pesquisa.
2.1. Concepção de Linguagem
Assumimos a concepção de linguagem inspirada em Bakhtin (2003 e 2004) e
que entende o sujeito constituindo-se como tal à medida que interage com os outros:
[...] sua consciência e seu conhecimento de mundo resultam como
“produto sempre inacabado” deste mesmo processo no qual o sujeito
28
internaliza a linguagem e constitui-se como ser social, pois a linguagem
não é trabalho de artesão, mas trabalho social e histórico seu e dos outros
e para os outros e com os outros que ela se constitui. Isso implica que não
sujeito dado, pronto, que entra em interação, mas um sujeito se
completando e se construindo nas suas falas e nas falas dos outros
(GERALDI, 1996, p. 19).
Dessa maneira, tanto ngua quanto sujeito constituem-se nos processos
interativos, pois, de acordo com Bakhtin (2004), a experiência discursiva individual de
cada pessoa se forma e se desenvolve em uma constante interação com os enunciados
alheios. Esse processo ocorre não pela assimilação de palavras da ngua, mas pelos
discursos alheios – assim como de toda a idelogia que os envolvem – sendo que os
assimilamos, os elaboramos e os reacentuamos.
Na realidade, não são palavras o que pronunciamos ou escutamos, mas
verdades ou mentiras, coisas boas ou más, importantes ou triviais,
agradáveis ou desagradáveis, etc. A palavra está sempre carregada de um
conteúdo ou de um sentido ideológico ou vivencial. É assim que
compreendemos as palavras e somente reagimos àquelas que despertam
em nós ressonâncias ideológicas ou concernentes à vida
(BAKHTIN,
ibid. p. 95).
Estamos, portanto, nos referindo a um sujeito heterogêneo e inacabado, que
nos processos interativos encontra-se com outros sujeitos, que também inacabados, unem-
se na esperança de encontrarem a fonte restauradora da totalidade, nunca alcançada,
construindo-se nas relações sociais, entendidas estas como espaço de imposições,
confrontos, desejos, paixões, retornos, imaginação e construções (GERALDI,1996, p. 20).
Tal abordagem assemelha-se à concepção freireana de sujeito e porque não
dizer também de linguagem.
A concepção de linguagem em Paulo Freire (1987, 1990, 1992, 1997 e 1996),
assim como a adotada neste trabalho é a que a concebe como o meio pelo qual nos
constituímos e constituímos os significados que comunicamos.
Segundo Geraldi (2005), Freire, Vygotsky e Bakhtin compartilham o mesmo
ponto de partida: a linguagem possui função constitutiva dos sujeitos. A dialogia ocupa
lugar central no processo de constituição do ser-humano, pois é no diálogo que
29
construção dos recursos expressivos sobre os quais os pensamentos são por nós
organizados e expostos, compreendidos e também modificados.
No núcleo da perspectiva freireana está o diálogo como ponto de encontro
entre os sujeitos, única via capaz de chegar à humanização.
Freire (1992) afirma que à medida que nos reconhecemos como seres
inacabados, alcançamos a humanização, é nesse sentido que os homens e as mulheres,
como seres humanos inconclusos, precisam saber da sua inconclusão (FREIRE, 1996, p.
65).
Percebendo-se como um ser inacabado, os seres-humanos almejam o
conhecimento, essa busca permanente pelo “Ser Mais”, humanizado, em contraponto com
o “Ser Menos”, desumanizado, não é solitária, os homens e as mulheres conhecem e
conhecem a si próprios por relacionarem-se com o mundo e com os outros através de uma
relação dialética e dialógica.
Nesta perspectiva, a educação, que se viabiliza pelo diálogo, tem como
tarefa o desvelamento da realidade opressora. É no diálogo que as situações de opressão
são tomadas como objetos de reflexão, permitindo sua apreensão mais crítica e sua
superação (FREIRE, 1987, p. 32).
Não obstante, a dimensão conscientizadora se viabiliza por meio da
experiência dialógica, que no interior dessa teoria não é percebida como instrumento a ser
utilizado, mas sim de uma exigência da própria natureza humana.
A experiência dialógica é fundamental para a construção da curiosidade
epistemológica. São constitutivos desta: a postura crítica que o diálogo
implica; a sua preocupação em apreender a razão de ser do objeto que
medeia os sujeitos dialógicos.
Preocupa-me a crescente distância entre a prática educativa e o exercício
da curiosidade epistemológica. Temo que a curiosidade alcançada por
uma prática reduzida à pura técnica seja uma curiosidade castrada, que
não ultrapassa uma posição cientificista diante do mundo
(FREIRE,
1996, p. 81).
É no diálogo que aprendemos e descobrimos que podemos oferecer novas
interpretações aos conhecimentos produzidos e tidos até então como verdadeiros. A
relação dialógica é o selo do ato cognoscitivo, em que o objeto cognoscível, mediatizando
os sujeitos cognoscentes, se entrega a seu desvelamento crítico (FREIRE, 1987, p. 116).
30
Consideramos importante transcrever esse excerto de Freire (1992) no qual
define o sentido do diálogo:
O diálogo tem significação precisamente porque os sujeitos dialógicos
não apenas conservam sua identidade, mas a defendem e assim crescem
com o outro. O diálogo por isso mesmo não nivela, não reduz um ao
outro. Nem é tática manhosa, envolvente, que um usa para confundir o
outro. Implica, ao contrário, um respeito fundamental dos sujeitos nele
engajados, que o autoritarismo rompe ou não permite que se constitua
(p.
118, grifos no original).
É assim, através do diálogo, que crescemos com o outro, isso implica dizer, que
nos constituímos com o outro. Assim como em Bakhtin (2003 e 2004), temos que a
linguagem é constitutiva do sujeito e de toda a atividade mental, uma vez que os sujeitos
constituem-se nas interações de que participa.
Vejamos o excerto abaixo presente em Marxismo e Filosofia da Linguagem:
[...] toda palavra comporta duas faces. Ela é determinada tanto pelo fato
de que procede de alguém, como pelo fato de que se dirige para alguém.
Ela constitui justamente o produto da interação do locutor e do ouvinte.
Toda palavra serve de expressão a um em relação ao outro. Através da
palavra, defino-me em relação ao outro, isto é, em última palavra em
relação à coletividade. A palavra é uma espécie de ponte lançada entre
mim e os outros. Se ela se apóia sobre mim numa extremidade, na outra
apóia-se sobre meu interlocutor. A palavra é o território comum do
locutor e do interlocutor
(BAKHTIN, 2004, p. 113).
Em Freire (1987), o sentido de palavra se une e se completa ao proposto por
Bakhtin (2004), pois além de permitir o encontro, propriamente dito, entre os sujeitos,
permite um novo pronunciar:
Quando tentamos um adentramento no diálogo como fenômeno humano,
se nos revela algo que já poderemos dizer ser ele mesmo: a palavra. Mas,
ao encontrarmos a palavra, na análise do diálogo, como algo mais que um
meio para que ele se faça, se nos impõe buscar, também, seus elementos
constitutivos.
Esta busca nos leva a surpreender, nela, duas dimensões: a ação e a
reflexão, de tal forma solitárias, em uma interação o radical que,
sacrificada, ainda que em parte, uma delas, se ressente, imediatamente, a
31
outra. Não palavra verdadeira que não seja práxis. Daí que dizer a
palavra verdadeira seja transformar o mundo
(FREIRE, 1987, p.77).
Sendo assim, é por meio da linguagem que é possível o encontro entre os
sujeitos, que no diálogo verdadeiro se transformam e transformam o mundo.
Nesse processo, é também por meio da linguagem que a constituição da
consciência, constituição esta, como vimos, em constante reformulação, pois os homens
e mulheres se sabem inacabados, têm, portanto, consciência de sua inconclusão.
Na verdade não há um eu que se constitua sem um não-eu. Por sua vez, o
não-eu constituinte do eu se constitui na constituição do eu-constituído.
Dessa forma, o mundo constituinte da consciência se torna mundo da
consciência, um percebido objetivo seu, ao qual se intenciona. Daí a
afirmação de Sartre, anteriormente citada: “consciência e mundo se dão
ao mesmo tempo”
(FREIRE, ibid., p. 71).
Sobre a formação da consciência, com base em Bakhtin, Geraldi (1996) afirma:
A monologização da consciência resulta do processo de esquecimento
das origens das palavras dos outros, para o sujeito inicialmente palavras
alheias, depois palavras próprias-alheias e, somente no esquecimento das
origens palavras próprias. E estas resultam das diferentes articulações que
com suas contrapalavras produziram uma interpretação das falas dos
outros
(p. 20).
Sendo assim, o sujeito se constitui nas interlocuções de que participa, mas
essas sempre trazem marcas da realidade a qual se referem:
Não pensamento que não esteja referido à realidade, direta ou
indiretamente marcado por ela, do que resulta que a linguagem que o
exprime não pode estar isenta destas marcas
(FREIRE, ibid., p. 70).
Dessa forma, os sujeitos se fazem historicamente humanos porque pronunciam
o mundo, o objetivam, esse pronunciar problematizado exige deles um novo pronunciar,
pois são capazes de pensar sobre sua própria situcionalidade, possuem consciência de sua
atividade no mundo, com o mundo e com os outros.
32
A palavra viva é diálogo existencial. Expressa e elabora o mundo, em
comunhão e colaboração. O diálogo autêntico reconhecimento do outro
e reconhecimento de si no outro é decisão e compromisso de colaborar
na construção do mundo comum. Não consciências vazias; por isso os
homens não se humanizam, senão humanizando o mundo
(FIORI, 1987,
p.20).
Berthoff (1990) afirma que a Pedagogia de Freire funda-se na compreensão
filosófica do poder gerador de linguagem, ou seja, no poder discursivo: dizemos e
significamos simultaneamente.
A linguagem nos poder de recordar significados, e desse modo,
podemos, não só interpretar uma aptidão animal como interpretar
nossas interpretações. Saber que garante que uma dimensão crítica da
consciência e nos desloca do comportamento instintivo, não mediado, do
tipo estímulo resposta, dos outros animais, para a construção de
significados para a atividade mediada, para a construção de cultura
. (id.
ibid., p. 16)
Sendo assim, é por meio da linguagem que podemos nomear o mundo,
nomeando-o podemos trazê-lo na mente e refletindo-o imaginar e construir um mundo
mudado, em constante transformação. Transformação: palavra tão singular nos
pressupostos freireanos.
Giroux (1990) também ressalta da obra de FREIRE a importância da
linguagem, no processo mesmo de transformação social:
Para Freire, a linguagem e o poder estão inextricavelmente entrelaçados e
proporcionam uma dimensão fundamental da ação humana e da
transformação social. A linguagem, como define Freire, tem um papel
ativo na construção da experiência e na organização e legitimação das
práticas sociais disponíveis aos vários grupos da sociedade. A linguagem
é o verdadeiro recheio’ da cultura e constitui tanto um terreno de
dominação quanto um campo de possibilidade
(id. ibid., p. 08).
Em Paulo Freire a linguagem deve ser compreendida como algo envolto em
ideologia, ela jamais deve ser compreendida unicamente como ferramenta de comunicação.
33
Sendo assim, uma educação que se propõe à emancipação deve considerar essa premissa,
uma vez que:
A língua dos alunos é o único meio pelo qual podem desenvolver sua
própria voz, pré-requisito para o desenvolvimento de um sentimento
positivo do próprio valor. Como afirma Giroux admiravelmente, a voz
dos alunos “é o meio discursivo para que se façam ouvir e para que se
definam como autores ativos do próprio mundo”. A autoria do próprio
mundo, que também implicaria a própria língua, significa o que Mikhail
Bakhtin define como “re-contar uma história em suas próprias palavras”
(MACEDO, 1990, p.99).
A concepção adotada então, compreende que não usamos a língua somente
para falar e expressar ideias ou experiências, mas sim por ela e através dela anunciamos o
mundo, tal como o concebemos e confrontamos diferentes maneiras de percebê-lo:
(...)
é um instrumento disponível de maneira equitativa e neutra, a todas
as partes envolvidas em intercâmbios culturais, podemos, então, começar
a examinar a língua tanto como uma prática de significação como
também como um sítio para a luta cultural e como um mecanismo que
produz relações antagônicas entre grupos sociais diferentes
(MACEDO,
ibid., p. 101, grifos no original).
Na pedagogia freireana uma relação dialética entre os seres humanos com o
mundo e entre a linguagem e a ação transformadora. práticas que legitimam a cultura
dominante, servindo-se de uma linguagem que atesta as relações de poder e, portanto de
opressão.
Paulo Freire, diferentemente das perspectivas anunciadas anteriormente – a
tradicional e a relativista elaborou um outro conceito para cultura, que não serve
unicamente à reprodução cultural e também para a alfabetização que é compreendida como
uma linguagem da possibilidade. Nas palavras de Giroux (1990):
Freire considera a cultura em termos dialéticos. Em outras palavras, no
núcleo de seu conceito de alfabetização, está a concepção de que a cultura
contém, não somente um momento de dominação, mas também a
possibilidade de que os oprimidos produzam, reinventem e criem os
dispositivos materiais e ideológicos de que necessitam para romper os
34
mitos e estruturas que os impedem de transformar uma realidade social
opressiva. Em essência Freire definiu e usou sua teoria da alfabetização
para criticar o processo de reprodução cultural enquanto,
simultaneamente, une a noção de reprodução cultural ao processo de
reflexão crítica e ação cultural
(p. 81, grifos nossos).
As formas tradicionais de educação, articuladas por concepções
homogeneizantes e elitistas, ignoram as expressões culturais e as habilidades das classes
oprimidas. A pedagogia crítica, por sua vez, promove a emancipação social, cultural e
pessoal que possibilita que os oprimidos se reconheçam como protagonistas de suas
histórias, oferecendo instrumentos necessários para o intercâmbio e a transformação do ser
humano e da sociedade.
Freire (1987) sempre considerou em sua proposta a concepção de que a
linguagem do educando deva ser o ponto de partida do processo educativo, pois nessa
linguagem estão presentes os conhecimentos e a visão de mundo dos educandos, sejam eles
crianças ou adultos. Sua proposta de alfabetização consiste em um exame crítico dessa
linguagem onde podem ser desveladas as inculcações da ideologia dominante.
A alfabetização é um ato criador. Eu estava convencido de que ninguém
ensina língua a ninguém. Ensina a gramática. Linguagem não se ensina.
Linguagem é uma produção social e é socialmente adquirida, portanto
não pode ser objeto de ensino de a” a “z”. Quando a criança vem para a
escola alfabetizar-se [assim como o adulto], já tem uma competência
linguística. Ela tem comando da oralidade. Então, o que ela vai aprender
são as técnicas de ler e escrever, simultaneamente à oralidade. Isso é o
que a gente ensina, a gente não ensina a linguagem. A linguagem a gente
apreende e aprende socialmente
(PELANDRÉ, 1993, apud. FREIRE,
p. 58).
O processo de alfabetização não se realiza em dicotomia com a linguagem,
com o discurso, com a oralidade do educando, ele resulta da leitura do mundo que precede
a leitura da palavra (FREIRE, 1993, p. 59). Assim, a voz dos educandos é o meio de
examinarem a experiência com o mundo, passando a refletir sobre ela de forma crítica.
Segundo Giroux (1990), a alfabetização na perspectiva da pedagogia crítica,
parte de uma análise completa de como se produz o conhecimento e de como se constroem
as subjetividades no interior das relações sociais. Quando os sujeitos dialogam,
35
possibilitam a construção de novos conhecimentos e subjetividades, que por meio do
diálogo e do exame crítico a produção de novos significados, de novas maneiras de
interpretação do mundo e, portanto, novas maneiras de anunciá-lo. Resultam desse
processo novos sujeitos, prontos para dialogarem, transformarem-se e transformarem o
mundo, em um processo contínuo.
É na linguagem dos educandos que está presente o ponto de partida do
processo educativo. Educandos e educadores expressam suas concepções e, em diálogo,
traçam novos sentidos para o mundo que lêem.
De acordo com Freire (1990), a reprodução da ideologia dominante implica na
ocultação de verdades muitas vezes presentes em nossa própria linguagem, ou seja, na
maneira como apreendemos e interpretamos o mundo. O desvelamento dessas verdades
está dentro do espaço das mudanças possíveis posto na pedagogia crítica.
O educador que assume o desenvolvimento de um trabalho no interior desta
perspectiva deve inventar e criar métodos que utilizem o universo cultural dos educandos
como ponto de partida fazendo com que sejam capazes de reconhecerem-se como
possuidores de uma identidade cultural específica e importante (FREIRE, ibid., p. 75).
Um trabalho educativo nessa ótica exige o respeito e a legitimação dos
discursos dos educandos, considerando-se que: (...) ninguém desvela o mundo do outro e,
ainda quando um sujeito inicia o esforço do desvelamento aos outros, é preciso que estes
se tornem sujeitos do ato de desvelar (FREIRE, 1987, p. 167).
Nesse sentido, a compreensão do conceito de síntese cultural, presente na
pedagogia crítica, torna-se indispensável. Sem a compreensão deste eixo de reflexão o ato
educativo se resume em ação cultural que contribui para a manutenção das desigualdades
sociais. Toda ação cultural é sempre uma forma sistematizada e deliberada de ação que
incide sobre a estrutura social, ora no sentido de mantê-la como está ou mais ou menos
como está, ora no de transformá-la (FREIRE, ibid., p. 178).
A ação cultural que se funda no diálogo verdadeiro pretende a superação das
contradições que causam a negação da humanidade, por isso é chamada por Freire de
síntese cultural.
A síntese cultural é a modalidade de ação com que, culturalmente, se fará
frente à força da própria cultura, enquanto mantenedora das estruturas em
36
que se forma.
Desta maneira, este modo de ação cultural, como ação histórica, se
apresenta como instrumento de superação da própria cultura alienada e
alienante
(FREIRE, 1987, p. 180).
Mesmo que os educadores estejam bem intencionados quanto ao seu papel de
“democratizadores da cultura”, levando conhecimentos e habilidades necessários ao
exercício da cidadania e da participação social, a aquisição da língua padrão dominante,
por ela mesma, apenas sustenta a ideologia que rejeita a expressão cultural de grupos que
não são constituídos pela classe hegemônica. É dessa forma que ressaltamos uma das
modalidades da ação antidialógica descrita por Freire (1987), conhecida como invasão
cultural.
A invasão cultural é a forma como a cultura do opressor, ou invasor, toma o
oprimido, ou invadido, impondo sua visão de mundo, freando a criatividade e reforçando
sua superioridade.
Na ação cultural, que se funda no diálogo, na compreensão de sujeitos que se
encontram para anunciarem e transformarem o mundo, portanto, na síntese cultural, o
enriquecimento das visões de mundo:
O saber mais apurado da liderança se refaz no conhecimento empírico
que o povo tem, enquanto este ganha mais sentido naquele. (...) A síntese
cultural não nega as diferenças entre uma visão e outra, pelo contrário, se
funda nelas. O que ela nega é a invasão de uma pela outra. O que ela
afirma é o indiscutível subsídio que uma à outra
(FREIRE, 1987, p.
181).
No entanto, embora deva sempre considerar como ponto de partida a
linguagem do educando, esta, por sua vez, não constitui o ponto de chegada. Não se trata
de simplesmente confirmar o pensamento do educando, Freire propõe que se parta dele,
para assim chegar à síntese cultural. A passagem do senso comum popular para o
conhecimento científico é um direito das classes populares:
Daí que, em nome do respeito à cultura dos camponeses, por exemplo,
não lhes possibilitar que vão mais além de suas crenças em torno de si-
no-mundo e de si-com-o mundo, revele uma ideologia profundamente
37
elitista. É como se desvelar a razão de ser das coisas e ter delas um
conhecimento cabal fosse ou devesse ser privilégio das elites
(FREIRE,
1992, p. 84).
Como afirma Freire (1987), não basta ao educando acreditar que o domínio dos
elementos linguísticos assegure por si só a transformação das estruturas que condicionam a
opressão.
Embora a noção de superioridade linguística seja uma imposição infundada, os
grupos que não dominam esses códigos necessitam dominá-los, que são sobre estes, que
alguns eixos de exclusão estão configurados, sem esquecer, no entanto, que a língua padrão
dominante não oferece os instrumentos críticos para a desmistificação da imagem
distorcida que temos de nós mesmos e do mundo.
O domínio da cultura dominante é ressignificado na perspectiva crítica, pois ela
se transforma em instrumento que pode potencializar a luta pela libertação. Sobre esse
ponto, consideramos interessante transcrever a fala de Paulo Freire extraída de um dos
diálogos com Donaldo Macedo em que comenta como a cultura dominante passa a ser lida
pelo dominado que se descobre também criador e detentor de cultura:
Quando era meramente cultura dominada, estava sujeita à doutrinação e
estava domesticada. Agora, porém, embora ainda dominada, ela quer
libertar-se. E, nesse processo de querer libertar-se, descobre também que
a cultura dominante, exatamente por ser dominante, foi obrigada a
desenvolver uma série de estratégias analíticas e científicas para alcançar
seus propósitos. A cultura dominante desenvolve essas estratégias para
analisar e explicar o mundo com vistas a dominá-lo. Quando a cultura
dominada percebe a necessidade de libertar-se, descobre que tem que
tomar a iniciativa e desenvolve suas próprias estratégias como utiliza as
da cultura dominante. A cultura dominada faz isso, não simplesmente
para ajustar-se, mas para lutar melhor contra a opressão
(FREIRE;
MACEDO, 1990, p. 131).
Quanto ao aspecto instrumental do ensino, Flecha (1997) afirma que não se
trata de desenvolver junto aos educandos um conhecimento que os adapta ao contexto da
sociedade atual. Segundo a dimensão instrumental da aprendizagem dialógica, elencada
anteriormente, os saberes instrumentais unem-se aos comunicativos para potencializar os
sujeitos.
Sendo assim, a perspectiva freireana não desconsidera a importância dos
38
saberes técnicos, principalmente devido à configuração da sociedade atual, porém não os
toma como um fim em si mesmos:
Para nós progressistas, não como pensar numa preparação técnica em
si mesma, que não se pergunte a favor de que, de quem e contra que se
trabalha. Do ponto de vista pragmatista, desde que não direita nem
esquerda, interessa tornar as pessoas mais competentes para enfrentar as
dificuldades com que se defrontam
(FREIRE, 1987, p. 42, grifos
nossos).
Depositar conteúdos nos educandos como se esses fossem capazes de despertar
a consciência crítica é cair em uma compreensão mágica do conteúdo na qual a leitura de
mundo deixa de ter importância.
A seguir, apresentaremos a importância das práticas discursivas desenvolvidas
no contexto escolar, como capazes de ampliar as possibilidades de diálogo em diferentes
esferas sociais, através da oralidade e da escrita, desenvolvendo e tornando reais a leitura e
a escrita do mundo.
2.2. Escola: espaço de múltiplas interlocuções
O ingresso na escola é entendido como a inserção ou presença em um novo
espaço de interlocução, espaço este diferente dos que a criança já participava, como em sua
casa, com sua família e/ou grupos de amigos. Segundo Geraldi (1996), embora sejam dois
mundos diferentes, pelas formas linguísticas que utilizam, nos conteúdos que transmitem,
assim como nos interesses de classes, que defendem, compartilhamos com o autor do ideal
de que a escola deve favorecer a maior diversidade possível de processos interativos, pois
será desses processos interativos que:
[...] a criança extrairá diferentes regras de uso da linguagem, porque
diferentes serão as instâncias. Nesse processo ela não passa de um mundo
a outro, sem correlacionar o novo que aprende ao que aprendeu antes [...].
Este privilégio da interlocução desloca a visão da linguagem como um
repertório pronto e acabado de palavras conhecidas ou a conhecer e de
39
um conjunto de regras a automatizar (uma linguagem a que o aluno teria
acesso)
(GERALDI, 1996, p. 41).
As aprendizagens fundamentais da escola estariam relacionadas às diferentes
instâncias e junto a essas aprendizagens, a compreensão da produção histórica de
diferentes sistemas de referências. E neste sentido, a aprendizagem da escrita se
concomitante à aprendizagem dos conteúdos referenciais associados à escrita. Sendo
assim, acredita-se que os processos interlocutivos da sala de aula sejam lugar
preponderante no processo de ensino e aprendizagem da língua.
Essa maneira de conceber a linguagem implica no deslocamento da noção de
representação para a noção de trabalho linguístico, exige que se incorpore o processo de
produção de discursos como essencial, de modo que não se trata mais de aprender as regras
de uma ngua para dela se apropriar, mas trata-se de usá-la e, usando-a, apreendê-la. Por
outro lado, a eleição do acontecimento enunciativo como o lugar de produção de língua faz
intervir a noção de movimento.
Nesta perspectiva, a unidade linguística básica para os processos de ensino e
aprendizagem da escrita não é a palavra, mas o discurso em sua materialidade social
(GERALDI, 1996, p. 50).
Sobre isso, Paulo Freire também nos indicou, ao explicitar seu método de
alfabetização, que ao selecionar as palavras geradoras, que seriam trabalhadas nos círculos
de cultura: (...) era preciso ir ao contexto de quem ia aprender a ler, para pesquisar o
discurso da cotidianidade e de retirar o vocabulário a ser utilizado no processo
(FREIRE, apud. PELANDRÉ, 2005, p. 59).
A proposta para o ensino de língua materna parte da consideração das
primeiras escritas das crianças como texto, ou seja, o discurso em sua materialidade social.
Das contribuições da pesquisa linguística contemporânea podem ser retiradas três grandes
contribuições para o ensino da língua materna: a forma de conceber a linguagem e, em
consequência, a forma como define seu objeto específico, a língua; o enfoque diferenciado
das questões das variações linguísticas e a questão do discurso, materializado em diferentes
situações sociais. Sendo assim, surgem propostas de ensino baseados em três atividades: a
prática de leitura de textos, a prática de produção de textos e a prática de análise
linguística.
40
Todas essas atividades interligam-se precisamente na unidade textual. A
compreensão adequada desses pressupostos permite aos sujeitos, envolvidos na relação de
ensino e aprendizagem, a construção criativa de situações interlocutivas no interior das
quais necessariamente emergem a leitura de mundo, sendo assim, esses sujeitos podem
distanciar-se da realidade, a objetivarem e expressarem sobre ela uma compreensão
materializada num texto oral ou escrito.
Quanto às concepções de linguagem, Geraldi (1996) afirma que se trata de ver
a linguagem para além da capacidade humana de construir sistemas simbólicos, ela deve
ser concebida como:
[...] uma atividade constitutiva, cujo locus de realização é a interação
verbal. Nesta relaciona-se um eu e um tu e na relação constroem os
próprios instrumentos (a língua) que lhes permitem a intercompreensão
(GERALDI, 1996, p. 67).
assinalamos em outro momento que a nossa consciência é a somatória de
palavras alheias que vão perdendo sua origem, e as utilizamos para construir a
compreensão de cada nova palavra e assim ad infinitum. É nesse sentido que a linguagem é
uma atividade constitutiva: é pelo processo de internalização do que nos era exterior que
nos constituímos como o sujeito que somos, e com as palavras de que dispomos,
trabalhamos na construção de novas palavras, aqui também trabalho ad infinitum, por isso
que a língua não pode ser vista como um sistema pronto e acabado.
Assim, uma língua é um conjunto de recursos expressivos, conjunto não
fechado e sempre em constituição. Estes recursos expressivos remetem a
um sistema antropocultural de referências, no interior do qual cada
recurso adquire significação. Este sistema, também ele certamente aberto
porque histórico, está sempre em modificação, refletindo as mudanças
que sobre o mundo vamos produzindo na história e nossas compreensões
desta mesma história
(GERALDI, ibid., p. 68).
Sendo a língua um conjunto de recursos expressivos que se remetem a um
sistema em constante modificação, temos que considerar a variedade linguística, pois ela é
apreendida no convívio social do grupo ao qual fazemos parte, sendo tão complexa como
qualquer outra expressão linguística, pois implica na apropriação de todo um sistema de
41
referência na qual se insere, ou seja, ela reflete um conjunto de valores de ordem cultural
que representam modos de conceber a realidade e suas relações.
Estudos linguísticos sobre a questão da variedade linguística demonstraram que
a noção de “erro” relaciona-se à eleição social de uma das variedades como a padrão.
Não por acaso, esta variedade é aquela falada pelo grupo social que detém o
poder - seja econômico, político e/ou social. Foi com base nesta variedade que houve a
construção da escrita, porque na história, somente aqueles que tiveram tempo disponível
para refletir, puderam debruçar-se sobre suas formas de falar e, num longo processo
histórico foram construindo a modalidade escrita.
No processo pedagógico, não se trata de substituir uma variedade por
outra, mas se trata de construir possibilidades de novas interações dos
alunos (entre si, com o professor, com a herança cultural), e é nestes
processos interlocutivos que o aluno vai internalizando novos recursos
expressivos, e por isso mesmo novas categorias de compreensão do
mundo. Trata-se, portanto, de explorar semelhanças e diferenças, num
diálogo constante e não preconceituoso entre visões de mundo e modos
de expressá-las
(GERALDI, 1996, p. 69).
Por isso, a escola deve ser vista com um local que privilegie o maior número
de interlocuções possíveis.
Com relação ao texto quer oral ou escrito, quer uma palavra ou obra
completa este é entendido como a unidade básica do ensino da língua materna. No
entanto, como nossa sociedade é complexa, diversas formas de texto disponíveis, pois
cada um é produzido no interior de um processo interlocutivo, por isso é marcado pelos
sujeitos nele envolvidos e pelas práticas históricas que foram constituídas ao longo do
tempo no interior de cada instituição social.
Embora nossa cultura seja predominante oral, através da escrita a
possibilidade de interlocução à distância no tempo e no espaço.
Aprender a ler é, assim, ampliar as possibilidades de interlocução com
pessoas que jamais encontraremos frente a frente e, por interagirmos com
elas, sermos capazes de compreender, criticar e avaliar seus modos de
compreender o mundo, as coisas, as gentes e suas relações. Isto é ler. E
escrever é ser capaz de colocar-se na posição daquele que registra suas
42
compreensões para ser lido por outros e, portanto, com eles interagir
(GERALDI, 1996, p. 71).
Diante disso, compartilhamos dos pressupostos apresentados da
aprendizagem dialógica, no sentido de que a tarefa primordial da escola seja a de
proporcionar educação de qualidade, garantindo a participação mais justa e igualitária de
todos. Nesse sentido aprendizagem da leitura e da escrita ganha considerável importância,
principalmente no contexto da sociedade informacional, cujas práticas de leitura e escrita
relacionam com o processo de participação social.
Alguns dos pressupostos relacionados à concepção de linguagem que viemos
apresentando estão presentes em documentos orientadores da prática de ensino da língua
materna.
2.3. Alguns apontamentos sobre o ensino da língua materna e a prática da
produção textual
Desde a década de 1980 o texto tem sido discutido como base de ensino e
aprendizagem de língua portuguesa no ensino fundamental. Porém, de acordo com Rojo e
Cordeiro (2004), a partir de discussões iniciais o texto foi tomado como objeto empírico de
uso, mas não de ensino e propiciava a leitura, a produção e análise linguística. Em um
momento posterior, o texto começou a ser tomado como suporte para as habilidades de
leitura e redação, sem ser considerado ainda um objeto de estudo. Até aqui as atividades
com o texto giravam em torno das atividades meta e epilinguísticas, sem haver ainda a
preocupação com o ensino propriamente dito das práticas de produção textual.
Ainda segundo as autoras, devido à necessidade de se estabelecerem
procedimentos, algumas propriedades dos textos começaram a ser referenciadas no ensino,
principalmente dos gêneros escolares por excelência, como a narração, a descrição e a
dissertação.
Contudo, os textos que circulam na sociedade, em situações comunicativas
reais, em nada se assemelham aos textos preconizados pela escola o que não contribui para
a formação de leitores e escritores competentes.
43
Essas discussões tiveram um novo rumo com a concretização e a formalização
de algumas propostas de trabalho principalmente nos programas curriculares oficiais
brasileiros, é o que se pode dizer dos Parâmetros Curriculares Nacionais de Língua
Portuguesa (BRASIL, 2001), que enfatiza a necessidade de ensino dos gêneros do
discurso, tanto com ênfase na oralidade, quanto na escrita.
Esse documento representa uma nova perspectiva de trabalho com o texto na
sala de aula, pois deposita o enfoque no ensino de gêneros orais e escritos, bem como
considera a situação de interlocução, enfatizando a importância dos contextos de uso e de
circulação dos enunciados produzidos.
Os textos organizam-se sempre dentro de certas restrições de natureza
temática, composicional e estilística, que os caracterizam como
pertencentes a este ou aquele gênero. Desse modo, a noção de gênero,
constitutiva do texto, precisa ser tomada como objeto de ensino
(PCNs
Língua Portuguesa, 3º e 4º ciclos do ensino fundamental, p.23).
Quanto à prática de produção de textos, o referido documento ressalta que um
escritor competente é aquele que ao produzir um discurso, sabe selecionar o gênero no
qual seu discurso de realizará escolhendo aquele que for apropriado a seus objetivos e à
circunstância enunciativa em questão (PCNs 1º e 2º ciclos do ensino fundamental, p.65).
A concepção de escritor que permeia os Parâmetros é daquele que deverá
realizar a revisão, a reescrita e saber recorrer e utilizar outras fontes para sua própria
produção.
Buscando incorporar os conhecimentos desenvolvidos nas últimas décadas, o
documento ainda pontua:
Hoje já se sabe que aprender a escrever envolve dois processos paralelos:
compreender a natureza do sistema de escrita da língua os aspectos
notacionais – e o funcionamento da linguagem que se usa para escrever
os aspectos discursivos
(PCNs Língua Portuguesa,1º e ciclos do
ensino fundamental, p.66).
Ganham destaque também as funções e o funcionamento da escrita, bem como
as condições nas quais é produzida: para que, para quem, onde e como se escreve.
44
No item relacionado ao tratamento didático para a implementação de uma
prática continuada de produção de texto, observamos nos Parâmetros a apresentação de
várias estratégias que podem ser planejadas pelo educador, como: o oferecimento de textos
impressos de boa qualidade, proporcionar situações de produção textual, mesmo antes dos
alunos saberem grafá-los, organizar as atividades de produção textual em pequenos grupos,
facilitação de diálogos entre professores e alunos para a explicitação das dificuldades.
Algumas situações didáticas também são apresentadas como fundamentais: a
realização de projetos, que situam a produção textual de forma contextualizada, além de
envolver outras atividades, como a leitura, o estudo e a pesquisa; a prática da escrita de
textos provisórios, permitindo o distanciamento e o olhar crítico do texto produzido;
produções com apoio, atividade que envolve o trabalho com os procedimentos de escrita,
dada a sua complexidade; e as situações de criação, que objetivam o oferecimento de
oportunidades de criação e avaliação do percurso criador.
Apesar de valiosas, essas orientações não têm sido suficientes para guiar o
trabalho do educador, ainda que coloque em prática tais aportes metodológicos não
consegue visualizar uma prática consistente com a produção textual, que de fato contemple
a proposta que é a de formar escritores competentes, capazes de produzir textos coerentes,
coesos e eficazes.
Embora os PCNs de Língua Portuguesa tenham incorporado consideráveis
avanços no tratamento do ensino da língua, a considerando como espaço de interação e
portanto atividade discursiva, todas as discussões em torno de novos referenciais e novos
objetos de ensino não vieram acompanhadas de reflexões e esclarecimentos aos educadores
de como encaminharem o ensino:
[...] as orientações e os referenciais novos que os PCNs puseram em
circulação nas escolas e nos programas de formação de professores à
medida que, como referenciais que são, não apresentaram propostas
operacionalizadas geraram inúmeras dúvidas quanto a como pensar o
ensino dos gêneros escritos e orais e como encaminhá-lo de maneira
satisfatória: dúvidas sobre o modo de pensar e o modo de fazer esse
ensino de novos objetos
(ROJO e CORDEIRO, 2004, p. 12).
Sendo assim, verificamos que os educadores buscam, de diversas maneiras,
incorporar às suas práticas o trabalho de ensino da língua materna que privilegia os gêneros
45
do discurso, orais e escritos que circulam na sociedade, buscando a seleção de inúmeros
gêneros para a contextualização das atividades de leitura e escrita, desde os primeiros anos
do ensino fundamental de nove anos (CUNHA, 2004 e SILVA, 2008).
Contudo, sinalizamos que nem sempre essas práticas garantem que o educando
se aproprie de um gênero do discurso escrito e de fato produza textualmente contemplando,
não só as marcas do gênero proposto, mas considerando as circunstâncias de interlocução.
Segundo Alves (2007), muitos professores que atuam em salas do ensino
fundamental não tiveram oportunidade de estudar, discutir e refletir sobre as teorias dos
gêneros discursivos em seus cursos de formação. Para essa autora, o basta unicamente
eleger um gênero para ser o objeto de estudo, mesmo porque essa opção a grande maioria
dos educadores fez, mas trata-se de saber como trabalhar diversos gêneros, analisando-
os e explorando-os de acordo com a perspectiva apresentada pela teoria e que envolva os
componentes de um texto: o conteúdo temático, estilo e construção composicional. Sendo
assim, é essa teoria que tomamos como referente para a construção da proposta
pedagógica: de ensino de um gênero do discurso escrito com base no desenvolvimento de
uma sequência didática.
Diante da necessidade de clareza metodológica em torno da questão do ensino
de um gênero oral e escrito, nos pautamos nos estudos e trabalhos de Bakhtin e Vygotsky e
seus desdobramentos por meio das atuais pesquisas na área da educação e linguagem,
representada, sobretudo pelos trabalhos dos pesquisadores do Grupo de Genebra. Tal
abordagem será descrita a seguir, que busca oferecer aportes teóricos e metodológicos para
o ensino de um gênero escrito.
2.4. Sobre o objeto de ensino: os gêneros do discurso.
A linguagem é compreendida, na presente pesquisa, enquanto espaço no qual
os sujeitos são constituídos e que a escola deve ampliar as esferas de interlocução em que a
criança já participa, envolvendo-na em situações de práticas com a linguagem oral e
escrita. Esses princípios estão incorporados em diferentes guias curriculares, dentre eles os
Parâmetros Curriculares Nacionais para o ensino da Língua Portuguesa, que concebem o
46
gênero do discurso, oral e escrito como objeto de ensino, sem, contudo, sinalizar aos
educadores orientações metodológicas consistentes para tal trabalho.
Foi nesse contexto de incertezas quanto às práticas de produção textual
sentidas pelas educadoras de uma escola e somadas às nossas que o interesse pela
realização de nosso estudo surgiu, sobre quais conhecimentos são necessários aos
educadores das ries/anos iniciais do ensino fundamental sobre os gêneros do discurso
enquanto objeto de ensino para que garantam a aprendizagem dos educandos, ou seja, para
que os educandos passassem a produzir textualmente considerando-se as marcas textuais
de um gênero estudado, assim como a situação interlocutiva em que o mesmo é utilizado.
Rodrigues (2004) afirma que muitas pesquisas vêm sendo desenvolvidas em
torno do conceito de gênero proposto por Bakhtin, no entanto, embora as vertentes teóricas
se aproximem a utilização dos termos gênero do discurso e gêneros textuais, a partir de um
olhar mais criterioso, permite observar que as configurações teóricas e metodológicas
mostram-se como não equivalentes.
Fora os problemas de traduções, os termos gênero do discurso e gênero de
texto, parecem ser flutuantes ao longo dos trabalhos de Bakhtin, porém isso não significa
falta de unidade conceitual. Segundo Rodrigues (ibid.), na obra El problema de los gêneros
discursivos manuscrito inacabado publicado em 1979, após a morte do autor pode-se
perceber:
O esforço teórico de Bakhtin em discutir a concepção, o lugar e o papel
dos gêneros na sua teoria, articulando-os à sua noção de enunciado.
Nesse texto a nomenclatura é menos flutuante, tendo a opção pela
expressão gênero do discurso/gêneros discursivos
(id. ibid., p. 422).
Tratam-se de gêneros do discurso as formas relativamente estáveis que
configuram os enunciados, sendo que estas são determinadas sócio-historicamente. Isso
implica que cada manifestação linguística, seja, na fala ou na escrita, é realizada através
dos gêneros do discurso, materializados sob a forma de enunciados. Dessa forma, os
gêneros estão intrinsecamente relacionados às situações sociais de comunicação.
Se não existissem os gêneros do discurso e se não os dominássemos; se
tivéssemos que criá-los pela primeira vez no ato da fala, se tivéssemos de
47
construir cada um de nossos enunciados, a comunicação verbal seria
quase impossível
(BAKHTIN, 2003, p. 283).
Para a compreensão do conceito de gêneros do discurso faz-se necessária a
compreensão do conceito de enunciação entendida como a unidade da comunicação
discursiva. Nesse sentido, o autor traça uma distinção entre enunciado, palavra e oração.
A palavra não comporta o ato de interação com o interlocutor, quando é
retirada do contexto, a palavra isolada possui uma conclusibilidade abstrata e, por isso,
pode não ser precisa. Quando a palavra está localizada em uma oração, ela terá autoria a
partir do momento em que se torne um enunciado, em uma dada situação discursiva,
permitindo assim a interação entre os interlocutores.
Assim, por exemplo, a palavra “água” isolada do contexto, possui vários
sentidos para o ouvinte ou leitor. Porém, quando se apresenta um contexto em que o
interlocutor acaba de chegar a um local em um dia quente de verão, o receptor, de posse do
pronunciamento da palavra em questão, é levado a tomar uma atitude responsiva, é nesse
sentido que a palavra torna-se um enunciado concreto, que pressupõe um ato comunicativo
entre o falante e o ouvinte.
Utilizamo-nos das escolhas das palavras de acordo com as especificidades do
gênero, podendo ser interpretadas pelo contexto discursivo, ou seja, a palavra pode refletir
o seu sentido através do gênero selecionado para o ato enunciativo.
O mesmo pode-se dizer da frase, que descolada do contexto em que é
pronunciada, não permite uma atitude responsiva do interlocutor, portanto, não pode ser
considerada enunciado.
No enunciado:
[...] o ouvinte, ao perceber e compreender o significado (linguístico) do
discurso, ocupa simultaneamente em relação a ele uma ativa posição
responsiva: concorda ou discorda dele (total ou parcialmente completa-a,
aplica-o, prepara-se para usá-lo, etc. essa posição responsiva do ouvinte
se forma ao longo de todo o processo de audição e compreensão desde o
início, às vezes literalmente a partir da primeira palavra do falante
(BAKHTIN, 2003, 271).
48
Dessa forma, toda a enunciação deseja a compreensão do ouvinte e espera que
este reaja ao discurso de alguma maneira.
Sendo o enunciado a real unidade da comunicação discursiva (BAKHTIN,
2003, p. 274), este sempre ocorre orientado pelos gêneros discursivos, orais e escritos.
Falamos apenas através de determinados gêneros do discurso, isto é,
todos os nossos enunciados possuem formas relativamente estáveis e
típicas de construção do todo. Dispomos de um rico repertório de gêneros
de discurso orais e escritos. Em termos práticos, nós os empregamos de
forma segura e habilidosa, mas em termos teóricos podemos desconhecer
inteiramente a sua existência
(id. ibid., p. 282).
Bakhtin afirma que os enunciados refletem as finalidades de cada campo de
utilização da língua através: do conteúdo temático (assunto), do plano composicional
(estrutura formal) e estilo (forma individual da escrita, vocabulário, composição das frases
e emprego da gramática).
Esses três elementos estão indissoluvelmente ligados no todo do
enunciado e são igualmente determinados pela especificidade de um
determinado campo da comunicação. Evidentemente, cada enunciado
particular é individual, mas cada campo de utilização da língua elabora
seus tipos relativamente estáveis de enunciados os quais denominamos
gêneros do discurso
(id. ibid. p. 262).
Para Bakhtin (ibid.) os gêneros sofrem alterações em consequência do
momento histórico em que estão inseridos. Dada a diversidade de gêneros existentes, o
autor os classificou em: primários e secundários.
Os gêneros primários se constituíram em circunstâncias de uma comunicação
verbal espontânea; os gêneros secundários não são controlados pela situação, não possuem
um contexto imediato, aparecem em circunstâncias de uma comunicação cultural, mais
complexa e relativamente mais evoluída, principalmente sob a forma escrita.
O domínio das relações espontâneas, cotidianas, imediatas está relacionado ao
domínio dos gêneros primários. O domínio das relações formais, mediadas pela
leitura/escrita, está relacionados aos gêneros secundários, estes introduzem uma ruptura
importante, pois não estão ligados a uma situação de comunicação, sendo tratados
49
relativamente independentes do contexto imediato. A sua apropriação não ocorre em
situações de comunicação, a motivação que leva o aprendiz a se confrontar com eles são
mais complexas.
A habilidade no uso dos gêneros do discurso em situações comunicativas está
diretamente relacionada ao domínio que temos em relação a eles, ou seja, quanto maior for
esse domínio, mais facilidade teremos em empregá-los de forma adequada às situações
comunicativas.
Os pesquisadores pertencentes ao Grupo de Genebra - Dolz, Schneuwly,
Pasquier e Bronckart - a partir da teoria de Bakhtin, basearam-se no pressuposto de que
comunicar-se oralmente e por escrito, pode e deve ser ensinado de forma sistemática no
contexto escolar.
Schneuwly (2004) compreende o gênero do discurso como ferramenta, isto é,
como um (mega)instrumento na perspectiva vygotskyana com o qual é possível exercer
uma ação linguística sobre a realidade. Para este autor, o uso de uma ferramenta resulta em
dois diferentes efeitos de aprendizagem: por um lado amplia as capacidades do usuário;
por outro, amplia o conhecimento a respeito do próprio objeto sobre o qual a ferramenta é
utilizada. Sendo assim, o gênero aparece como co-constitutivo de situações de
comunicação.
Conforme anunciamos, com base na perspectiva bakhtiniana, o gênero se
define em três dimensões essenciais: o conteúdo temático, a estrutura composicional e o
estilo. Sendo assim, a capacidade de linguagem evoca aptidões do aprendiz para a
produção de um gênero dentro de uma situação de interação determinada que se efetiva
em: adaptar-se às características do contexto e do referente - capacidade de ação; mobilizar
modelos discursivos - capacidades discursivas; dominar as operações psicolinguísticas e as
unidades linguísticas - capacidades linguístico-discursivas - que são reproduzidas a partir
dos modelos de linguagem disponíveis no ambiente social e que os membros da sociedade
dominam e adotam estratégias explícitas para que os educandos possam se apropriar deles.
Para tanto, a observação das capacidades de linguagem antes, durante e depois
são fundamentais para realização de uma sequência didática que possibilite intervenções
precisas do educador, que se concretizem em mudanças e evolução dos educandos em
relação à produção de textos, possibilitando a apropriação de elementos que garantam a
50
produção textual dentro das características do gênero trabalhado e das situações de
comunicação que lhes envolvem.
Nesse sentido, a noção de apropriação é fundamental, citando Marx e Engels
(1845-1846/1969), Schneuwly (2004), assim traz o conceito de apropriação:
A apropriação não é senão o desenvolvimento das capacidades
individuais correspondentes aos instrumentos materiais de produção. A
apropriação de uma totalidade de instrumentos de produção é o
desenvolvimento de uma totalidade de capacidades nos próprios
indivíduos
(p. 67)
.
O instrumento é aqui compreendido como um fator de desenvolvimento, isso
porque a ação é mediada por objetos específicos, elaborados pelas gerações precedentes,
através dos quais se transmitem e se alargam as experiências possíveis.
Os instrumentos situam-se entre o indivíduo que age e o objeto sobre o
qual ele age, sendo assim, eles determinam o comportamento, guiando e
diferenciando a percepção da situação na qual o indivíduo é levado a agir.
A intervenção do instrumento - objeto socialmente elaborado - nessa
estrutura diferenciada dá à atividade uma certa forma; a transformação do
instrumento transforma, evidentemente, as maneiras de nos
comportarmos numa situação
(id. ibid., p. 23).
O instrumento media a atividade, mas esse instrumento também representa a
atividade, materializando-a. As atividades existem nos instrumentos que as representam e,
logo, significam-nas.
O instrumento torna-se, assim, lugar privilegiado da transformação dos
comportamentos: explorar suas possibilidades, enriquecê-las, transformá-
las são também maneiras de transformar a atividade que está ligada à sua
utilização
(id. ibid., p. 24).
Schneuwly ( ibid.), afirma que o instrumento possui duas faces: por um lado há
o artefato material ou simbólico, produto material existente fora do sujeito; e por outro
lado - o do sujeito - os esquemas de utilização do objeto que articulam suas
possibilidades às situações de ações.
51
O instrumento, para se tornar mediador, para se tornar transformador da
atividade, precisa ser apropriado pelo sujeito; ele não é eficaz senão a
medida que se constroem, por parte do sujeito, os esquemas de sua
utilização
(SCHNEUWLY, 2004 p. 24).
O processo de apropriação do instrumento pode ser visto como um processo de
instrumentalização que provoca novos conhecimentos e saberes, que abre novas
possibilidades de ações, sustentando-as e orientando-as.
Nesse sentido, acreditamos que a apropriação de um gênero do discurso,
compreendido por nós como sendo um instrumento, possa gerar novas possibilidades para
a sua utilização, auxiliando o sujeito nas diversas situações de comunicação que
participará. Sendo assim, cremos que a escola possa oferecer atividades que desenvolvam a
apropriação de um gênero discursivo, oral ou escrito, potencializando os educandos na
participação de práticas interlocutivas e na ampliação das possibilidades de diálogo. Dessa
forma, saber ensinar é, assim, algo importante.
2.5. Sobre o ensino: as sequências didáticas.
Os estudos do Grupo de Genebra pautam-se no seguinte postulado: o de que é
possível ensinar a escrever textos e a exprimir-se oralmente em situações públicas
escolares e extra-escolares. Nesse sentido:
Criar contextos de produção precisos, efetuar atividades ou exercícios
múltiplos e variados: é isso o que permitirá aos alunos apropriarem-se das
noções, das técnicas e dos instrumentos necessários ao desenvolvimento
de suas capacidades de expressão oral e escrita, em situação de
comunicação diversas
(DOLZ, et.al., 2004, p.96).
Sendo assim, a escola deveria desenvolver um conjunto de atividades que de
fato pudessem garantir que os educandos se apropriarem dos gêneros do discurso, orais e
escritos. Esse conjunto de atividades organizadas de maneira sistemática em torno de um
gênero discursivo, dá-se o nome de sequência didática.
52
Uma sequência didática tem, precisamente, a finalidade de ajudar o aluno
a dominar melhor um gênero de texto, permitindo-lhe, assim, escrever ou
falar de uma maneira mais adequada numa dada situação de comunicação
(DOLZ, et. al., 2004, p.97).
Segundo os autores, os gêneros discursivos que produzimos diferenciam-se uns
dos outros de acordo com as condições em que foram produzidos. Dessa maneira, em
situações semelhantes, escrevemos textos com características semelhantes, conhecidos de
e reconhecidos por todos, e que, por isso mesmo, facilitam a comunicação (id. ibid., p. 97).
Os pesquisadores ainda indicam que uma sequência didática deveria ser
realizada sobre um nero que o educandos não dominam, ou que o realizam de maneira
insuficiente, as sequências permitiriam assim, o acesso às práticas de linguagem novas ou
dificilmente domináveis. A seguir apresentaremos as etapas de uma sequência didática.
Primeiramente acontece a apresentação da situação, trata-se na verdade de
uma exposição de uma projeto de comunicação, é portanto, o momento em que a turma
constrói uma representação da atividade de linguagem a ser executada. É aqui que a
atividade ganha significação, pois trata-se de uma situação em que se reflete sobre o que
escrever, como escrever, para quem escrever e que forma assumirá a produção.
A partir dessa discussão os educandos realizam a produção inicial, oralmente
ou por escrito. A primeira produção tem um papel central na regulação de todas as etapas
da sequência didática, tanto para educandos quanto para educador, pois ela permite a
visualização do ponto em que a turma se situa, revelando as dificuldades e o
direcionamento das próximas atividades.
A produção inicial é compreendida como o primeiro lugar da aprendizagem,
pois trata-se de uma atividade direcionada e realizada conscientemente. Educador e
educando possuem o ponto de encontro, delimitando o que será trabalhado nos próximos
módulos.
Os módulos constituem-se da instrumentalização dos educandos para superar
os problemas encontrados e visualizados na primeira produção. É interessante sinalizarmos
que a sequência didática vai do complexo para o simples, para posteriormente retornar ao
complexo, produção final.
53
Na produção de textos, os educandos se deparam com níveis diferentes de
dificuldades, como: a representação da situação de comunicação, a elaboração dos
conteúdos, o planejamento e a realização do texto. É por esse motivo que os módulos
devem trazer o maior número de atividades variadas possíveis, podendo permitir aos
educandos a observação e análises de textos, podendo ser colocado em evidência os
aspectos de funcionamento dos mesmos.
O educador pode sugerir atividades simplificadas de produção de textos,
facilitando a concentração dos educandos em um único aspecto da elaboração de um texto,
como por exemplos as atividades de revisão textual focada em um único aspecto.
Será nos módulos que a elaboração de uma linguagem comum entre educador e
educando ocorrerá para que se possa falar dos textos, criticá-los e melhorá-los.
Os educandos vão construindo, progressivamente, conhecimentos sobre os
gêneros. Esses conhecimentos são mobilizados durante a prática de revisão do próprio
texto ou uma melhor antecipação do que se deve fazer frente a uma produção oral. Esses
conhecimentos podem ser listados e afixados em cartazes, como um momento de síntese,
antes da produção final, cada módulo é finalizado com um registro, chamado pelos autores
de capitalização das aquisições.
É na produção final que o educando colocará em prática os conhecimentos
conquistados nos módulos. A produção final deve ser compreendida pelo educador como
uma avaliação somativa, pois significa um investimento nas aprendizagens compartilhadas
durante os módulos.
Dolz, et. al. (2004), também esclarecem alguns princípios teóricos que
orientam a adoção das sequências didáticas. Quanto ao aspecto pedagógico, o uso das
sequências didáticas possibilita a avaliação formativa, regulando o processo de ensino e
aprendizagem, verifica-se também uma motivação do educando para escrever ou tomar a
palavra, uma vez que desde o início, parte-se do pressuposto de que as atividades realizam-
se em um contexto de interação entre quem escreve e quem lê; também a diversificação
de atividades, contribuindo para a maximização das aprendizagens, respondendo às
exigências atuais da diferenciação do ensino.
Quanto aos aspectos psicológicos, o texto é tomado em sua complexidade,
incluindo a representação da situação de comunicação, a relevância consiste no fato de
que:
54
[...] o procedimento visa transformar o modo de falar e escrever dos
educandos, no sentido de uma consciência mais ampla de seu
comportamento de linguagem em todos os níveis (por exemplo: escolha
de palavras, adaptação ao público, colocação da voz, organização do
conteúdo etc)
(DOLZ, et. al., 2004, p. 109).
Com relação aos aspectos linguísticos, utiliza-se de instrumentos que permitem
compreender as unidades de linguagem, bem como favorece a reflexão sobre o uso da
língua de maneiras diversificadas, ela não é abordada como objeto único, que funciona
sempre de maneira idêntica (id. ibid., p. 109). Sendo assim, o procedimento favorece a
reflexão sobre os usos dos gêneros discursivos, o educando, portanto, reflete sobre quais
estruturas textuais e com quais meios linguísticos participará da interlocução.
Diante disto, a utilização das sequências didáticas oferecem aos educandos
instrumentos precisos para melhorar suas capacidades de escrever e falar, favorecem,
portanto, o desenvolvimento de uma relação consciente e voluntária.
O trabalho com as sequências didáticas insere-se na perspectiva textual, sendo
assim, é proposta uma série de atividades de observação, de manipulação e de análise de
unidades linguísticas. Como afirmam os autores:
Assim, o trabalho será centrado, por exemplo, nas marcas de organização
características de um gênero, nas unidades que permitem designar uma
mesma realidade ao longo de um texto, nos elementos de
responsabilidade enunciativa de modalização dos enunciados, no
emprego dos tempos verbais, na maneira como são utilizados e inseridos
os discursos indiretos
(id. ibid., p. 114).
Dessa maneira as reflexões relativas à sintaxe da frase, à morfologia e a
ortografia, não são tomadas como objetos do procedimento, embora apareçam como
questões pertinentes e até podendo ser abordadas ao longo dos módulos. Os erros
cometidos e presentes nas produções dos educandos constituem um forte indício para o
educador, pois sinalizam pontos importantes a serem trabalhados, é o que se pode dizer da
ortografia.
Levando-se em consideração que um dos pontos-chave das sequências
didáticas são a revisão e a reescrita de textos, espera-se que nesses momentos alguns
55
aspectos relacionados ao texto sejam trabalhados, por exemplo: a incoerência do conteúdo,
organização geral deficiente, falta de coesão entre as frases, inadaptação à situação de
comunicação, etc.
Entretanto, uma revisão fina, do ponto de vista estritamente ortográfico, é
necessária. Porém, ela deve ser realizada na versão final do texto. Deve-
se insistir, particularmente, na importância dessa higienização ortográfica
nos textos que serão lidos por outros, seja na sala de aula, seja fora dela
(DOLZ, et. al., 2004, p. 118).
Desta forma, o educador poderá elaborar diversas estratégias de colaboração
para que a revisão ortográfica seja realizada.
delineamos, no contexto de realização de nossa pesquisa, as exigências da
sociedade informacional, configuração social na qual a leitura e a escrita são práticas
capazes de garantir minimamente a participação social, uma vez que a demanda essencial é
a capacidade de lidar com a informação, ou seja, utilizar e agir sobre a informação.
Assim como a leitura, a produção de textos é uma prática social. Segundo
Bräkling (2003), em várias circunstâncias da vida escrevemos textos para diferentes
interlocutores, com distintas finalidades, organizados nos mais diversos gêneros, para
circularem em vários espaços sociais.
Cada ocasião de escrita implica no reconhecimento das finalidades para que
escrevemos; dos interlocutores para quem escrevemos; do lugar de circulação onde; e
dos gêneros do discurso – de que forma assumirá a produção.
Dessa forma, cada situação de escrita envolve o reconhecimento das condições
que determinam a produção dos discursos, representados pelos elementos postos acima e
também do reconhecimento do lugar do qual se escreve, pois desempenhamos diferentes
papéis na vida social, porém, na situação de produção textual a um que se sobressai em
função do lugar de circulação de nosso discurso e dos interlocutores a que se destina.
Tivemos a oportunidade de compreender, com base em Bakhtin (2004) que os
gêneros do discurso são formas de enunciados produzidos historicamente e que se
encontram disponíveis na cultura, podendo ser utilizada em cada manifestação verbal
quer seja escrita ou oral – em função do que se deseja dizer.
56
Portanto, saber selecionar o gênero para organizar o seu discurso implica
conhecer suas características para avaliar sua adequação às finalidades
colocadas para a situação comunicativa, ao lugar de circulação, e a todo o
contexto de produção determinado
(BRÄKLING, 2003, p.06).
Compartilhamos da hipótese de que a principal dificuldade vivenciada por
educadores no tocante à qualidade da produção textual de seus educandos refere-se à
desconsideração, por parte do contexto escolar, das condições que determinam a produção
escrita - reconhecimento do gênero à situação de interlocução: o quê, porque, para quem e
como escrever.
Verifica-se assim, que saber produzir discursos textualmente envolve
diferentes conhecimentos:
a) discursivos: relativos às características do discurso, como
conhecimento do gênero no qual o texto será organizado, do contexto
de produção, dos interlocutores da produção;
b) pragmáticos: relativos às especificidades da situação de comunicação e
às diferentes práticas sociais de escrita;
c) textuais: relativos à linearidade do texto, em si, como sintaxe,
pontuação, coesão e coerência;
d) gramaticais;
e) notacionais: relativos ao sistema de escrita
(BRÄKLING, 2003,
p.07)
.
Além desses conhecimentos, saber escrever envolve também o domínio de
alguns procedimentos:
a) saber planejar o que se vai escrever em função das características do
contexto de produção colocado;
b) saber redigir o que foi planejado;
c) saber revisar o que foi escrito – durante o processo mesmo de escrita e
depois de finalizado;
d)
saber reescrever o texto produzido e revisado (id.ibid.)
Sendo assim, acreditamos que os gêneros do discurso, bem como os
conhecimentos e procedimentos que envolvem a prática da produção textual devem ser
57
ensinados na escola, objetivando o desenvolvimento das capacidades discursivas, orais e
escritas dos educandos.
Temos apresentado até aqui uma proposta de trabalho, baseada na sequência
didática elaborada pela equipe de pesquisadores do Grupo de Genebra como uma
alternativa para o impasse gerado a partir da definição de que o gênero é objeto de ensino
da língua e de que as práticas de produção textual na escola devem ser redefinidas em
função da atividade de interlocução, na qual se privilegia a interação real entre escritor e
leitor dos textos produzidos.
Sendo assim, apresentaremos a seguir uma sessão destinada à função do
educador neste processo, na qual será resgatado o seu papel primordial, o de mediador
entre os educandos e os conhecimentos socialmente construídos.
2.6. Educador – mediador
Acreditamos e defendemos a importância da relação teoria-prática, no sentido
de que a teoria possa materializar-se em instrumentos da prática pedagógica, guiando e
trazendo segurança para o trabalho docente.
Segundo ARAÚJO (2000), o que se verifica na prática docente é que:
O professor consegue perceber a existência de um problema ou de uma
necessidade própria do processo ensino-aprendizagem, ainda que num
nível mais imediato, bem como chega a vislumbrar o que seria o
resultado ideal para aquela situação, isto é, onde seu aluno teria que
chegar tendo em vista os objetivos estabelecidos para a aprendizagem.
No entanto, as atividades para serem realizadas nesta situação não
convergem, na quase totalidade dos casos, para o resultado desejado,
porque acabam sendo determinadas sem que se verifique uma relação
entre o problema (a necessidade a ser satisfeita), as condições disponíveis
(conhecimentos, procedimentos pedagógicos, materiais didáticos, etc) e
as finalidades estabelecidas para o processo
(id. ibid., p. 9-10).
Segundo a autora, o trabalho docente tem sofrido de carência de significado e
sentido, carência esta fruto do próprio reflexo do esvaziamento da categoria de trabalho
58
humano, em um processo de desvirtuamento das bases ontológicas que serviriam para a
humanização do homem.
Para compreendermos essa lógica que inverte a função do trabalho docente
temos que resgatar algumas características dessa atividade.
Desde seu surgimento, o trabalho educativo tem como finalidade o
desenvolvimento do ser humano, ou seja, a sua humanização.
Pautadas em Paulo Freire, a educação tem justamente a função de unir,
aproximar os sujeitos, para que juntos se descubram inacabados e juntos busquem sua
interminável completude.
Os educadores precisam criar condições não cognitivas, mas também
afetivas e emocionais que levem o educando a dar sentido, significado e valorização aos
conhecimentos adquiridos para que o processo de apropriação-objetivação no trabalho
educativo se efetive de fato, como momento mediador do processo de humanização do
educando.
O educador configura-se então como mediador da atividade de aprendizagem
do educando, ele é quem orientará tal atividade criando, junto ao educando, necessidades
coerentes com o processo de humanização do homem.
Com origem no próprio processo de trabalho produtivo, a educação torna-se,
com a complexidade da sociedade, uma atividade específica através da qual cada indivíduo
apropria-se das objetivações humanas mais complexas que não conseguem ser apropriadas
na vida cotidiana.
Para a concretização do trabalho educativo é decisivo e indispensável a
consciência da consciência, ou, nas palavras de Freire (1980 e 1992): a consciência crítica.
É a consciência crítica que diferencia qualitativamente o trabalho educativo dos processos
educativos que se dão naturalmente e espontaneamente nas atividades cotidianas, bem
como em certos tipos de trabalhos que não exigem um nível mais elevado de conhecimento,
portanto, de maior elaboração da consciência (ARAÚJO, ibid., p. 40).
A atividade mediadora do professor nesse trabalho de possibilitar de
forma dosada e gradual a apropriação desse conhecimento é fundamental,
não no que diz respeito ao conteúdo propriamente dito desse
conhecimento, mas também no que se refere à definição de fins e a
escolha de valores para os quais esses fins servem, fins e valores estes
59
que deverão estar dirigindo intencionalmente a prática
(ARAÚJO,
2000, p.40).
Sendo assim, a atividade mediadora do professor a atividade intencional que
determina fins em função de valores, que determina os meios pertinentes a esses fins e
valores, bem como uma atividade que transmite o conhecimento sistematizado a ser
apropriado pelo educando é orientada por uma concepção de homem e, por conseguinte,
uma concepção de sociedade.
Faz-se então a necessidade da consciência dos valores nos quais o educador
acredita e projeta em seu trabalho, qual a concepção de homem que pretende ter como guia
de sua prática. Dessa forma, é imprescindível ao educador a consciência da consciência de
sua ação, pois esta é condição essencial da sua atividade mediadora, bem como a reflexão
permanente e intencional sobre as circunstâncias históricas e suas exigências. Essa reflexão
exige, por vezes, o rompimento com valores e conhecimentos anteriores consolidados
como características constituintes do modo de ser, pensar e agir deste educador.
Enquanto mediador da atividade de aprendizagem, o educador passa a intervir
intencionalmente no processo de apropriação-objetivação do educando, mediando os
conhecimentos historicamente construídos, criando necessidades coerentes com o processo
de humanização do homem e, assim auxiliando na concretização de uma sociedade
igualitária.
No entanto, a apropriação dos conhecimentos, não garante por si o processo de
humanização, nesse sentido ARAÚJO (2000) afirma:
O conjunto dos elementos, valores, concepções, motivos, finalidades, etc,
vão determinar o “teor” do produto da atividade desenvolvida pelo
indivíduo, pois o acesso àqueles conhecimentos (conteúdos), enquanto
objetivações humano-genéricas, não garantem a humanização
propriamente dita do homem se este não for capaz de fazer deles
instrumentos de sua objetivação enquanto ser social
(p.55, grifos
nossos).
A sistematização dos conteúdos e o acesso a eles não garantem a humanização,
esses conteúdos precisam tornar-se instrumentos de sua objetivação enquanto ser social,
ou seja, órgãos de sua individualidade (ARAÚJO, ibid., p. 108).
60
Sendo assim, não basta possuir o instrumento, é necessário saber utilizá-lo, se
apropriar do mesmo e pô-lo em uso. Nas palavras de Freire (1992), ensinar é valido
quando os educandos aprendem a aprender ao aprender a razão de ser do objeto ou
conteúdo (p.81).
Dentro deste contexto, o conceito de instrumento é necessário para a
compreensão do processo do ser humano tornar-se humano.
Segundo LEONTIEV (1978):
O instrumento é o produto da cultura material que leva em si, da maneira
mais evidente e mais material, os traços característicos da criação
humana. Não é apenas um objetivo de uma forma determinada, possuindo
todas as propriedades. O instrumento é ao mesmo tempo um objeto social
no qual estão incorporadas e fixadas as operações de trabalho
historicamente elaboradas
(p. 268).
Verifica-se assim, que o instrumento além de permitir a extensão das
capacidades físicas e mentais do homem, constitui-se na condição básica para o processo
de apropriação-objetivação das forças essenciais humanas.
Como meio da ação, o instrumento é a mediação indispensável da relação
apropriação-objetivação, uma vez que traz em si a soma dos valores, motivos,
conhecimentos, concepções e finalidades que:
[...]
permitem ao indivíduo apropriar-se não de uma mera ferramenta
de trabalho, mas de um modo de vida, de todo um conjunto de forças
essenciais humanas representativas de um processo histórico-social de
desenvolvimento humano, portanto trazem em si, não só as possibilidades
de se conhecer o homem, como as possibilidades de seu vir-a-ser
(ARAÚJO, 2000, p.107).
O instrumento, assim como seu uso, é moldado em função da consciência da
ação e de seu fim, de uma necessidade a ser satisfeita, mesmo no âmbito da consciência
elementar.
Nesse sentido, o instrumento humano é portador de uma função social,
portanto, sua criação e uso são mediados por uma finalidade, um para que e um porquê,
61
desde as atividades mais elementares e espontâneas, até aquelas em que a intencionalidade,
a ação consciente da consciência é a mediação fundamental.
Sendo assim, em relação ao trabalho docente, tornam-se instrumentos os
procedimentos, os métodos e técnicas, os valores, as concepções e de modo especial, o
conhecimento.
Portanto, o educando só se apropriará do conhecimento, quando passar a
utilizá-lo em suas funções e em suas atividades.
Nesse sentido, o conhecimento adquirido torna-se instrumento do seu
pensar e agir, um instrumento que lhe possibilita determinadas condições
para que possa objetivar-se enquanto ser social propriamente dito, como
sujeito de sua historicidade. Em outras palavras: esse conhecimento
(enquanto objetivo do processo educativo), se torna instrumento de
transformação da realidade, na medida em que seu processo de
apropriação chegar a um nível em que esse indivíduo o internalize de
modo tal que possa utilizá-lo adequadamente, enquanto um instrumento
que dirige seu ser, pensar e agir nessa transformação
(ARAÚJO, 2000,
p. 64).
É nesse sentido que defendemos o ensino de outras formas de interlocução,
diferentes daquelas apreendidas nas práticas de linguagem desenvolvidas em grupos
familiares e em outros próximos aos educandos. A apropriação de novas formas de
interlocução não significa a depreciação das formas anteriores, apreendem-se novas formas
para lutar contra as desigualdades.
Segundo Araújo (2000), o que foi verificado em sua tese é que a atividade
mediadora do educador esvazia-se, como reflexo das próprias relações de trabalho em
geral, essas esvaziam-se de sua função mediadora entre o ser humano e a natureza,
convertendo-se em seu contrário, ou seja o trabalho passa a ser um mero meio de garantir
ao sujeito um lugar dentro do processo produtivo. Dessa maneira, a atividade de trabalho
deixa de promover a humanização.
No interior deste contexto, o trabalho intencional do educador, que é o de
mediar o conhecimento espontâneo e elaborado, deixa de existir ou fica limitado,
distanciando-se de seu objetivo.
62
Neste processo, a partir das necessidades, entendidas como elemento propulsor
da atividade humana, estabelecem-se fins e meios de ação para satisfazê-las, gerando assim
novas habilidades e conhecimentos que, por sua vez geram novas necessidades.
Segundo a autora, o que se verifica é que a partir do educando tem se definido
o que e como ensinar, limitando assim, a satisfação de necessidades e a criação de novas.
Paulo Freire nos chama a atenção para que se parta dos saberes dos educandos,
porém isso não significa que ficaremos nele, mas em diálogo, construiremos novos
conhecimentos.
É nesse sentido que Freire (1992) afirma:
É preciso que o (a) educador (a) saiba que o seu “aqui” e o seu “agora”
são quase sempre o “lá” do educando. Mesmo que o sonho do(a)
educador(a) seja somente tornar o seu “aqui-agora”, o seu saber, acessível
ao educando, mas ir mais além do seu “aqui-agora” com ele ou
compreender, feliz, que o educando ultrapasse o seu “aqui”, para que este
sonho se realize tem que partir do aqui” do educando e não do seu. No
mínimo, tem que levar em consideração a existência do “aqui” do
educando e respeitá-lo. No fundo, ninguém chega partindo de lá, mas
de um certo aqui. Isto significa, em última análise, que não é possível ao
(à) educador(a) desconhecer, subestimar ou negar os “saberes de
experiência feitos” com que os educandos chegam à escola
(p. 59).
Sendo assim, o que é denunciado na tese de Araújo, é o encerramento do saber
dos educandos limitando-o ao seu entorno, as necessidades não são ampliadas, a atividade
docente pouco, ou nada contribui para o processo de humanização do homem.
Dessa forma, o saber dos educandos deve ser sim o ponto de partida do
processo educativo, contudo, em comunhão, em diálogo, educador e educando avançam,
descobrem juntos que podem saber mais. Será a partir do diálogo entre os sujeitos, que há a
produção de novos significados e de novas maneiras de anunciar e de conceber o mundo,
refletindo sobre o processo de humanização e da recuperação da humanidade roubada.
Tendo o papel do educador enquanto mediador do processo educativo
resgatado aqui, acreditamos também que o trabalho consciente com a sequência didática
para o ensino de um gênero discursivo de texto possa se configurar enquanto instrumento
da atividade docente para o trabalho com a produção textual. Produção esta que de fato
contemple as características de um gênero proposto, bem como possa ser capaz de tornar
63
contextualizadas as produções dos educandos em práticas de interlocução, considerando-se
produtores e leitores reais.
Diante da temática, consideramos de grande importância apresentarmos a
seguir algumas considerações acerca da formação inicial e continuada de professores,
assim como a apresentação dos conhecimentos necessários à prática educativa.
2.6.1. A formação inicial e continuada
Segundo Mello (1998) quando pensamos em qual condição é necessária para se
tornar um professor nos remetemos à formação básica, pois é ela que garantirá o acesso
sistematizado a um corpo de saber, saber-fazer, normas e valores da atividade docente.
Contudo, se a formação básica é a condição para ser um professor, não é ela
que encerrará a aquisição das competências necessárias à prática educativa. Intrínseca à
profissão está a evolução constante de conhecimentos, criando assim, a necessidade da
continuidade da formação. Dessa forma, ser professor é estar em contínua formação.
No entanto, verifica-se certo descompasso entre os conhecimentos adquiridos
nos cursos de formação inicial e continuada e a realidade que os professores vivenciam em
suas salas de aula. Isso porque tanto nos cursos de formação inicial, quanto nos cursos de
formação continuada, os educadores são vistos como técnicos que devem seguir modelos
prontos, esses cursos desconsideram a complexidade e a dificuldade da profissão.
Diante dos impasses de tal descompasso, verifica-se o surgimento de uma nova
tendência nos cursos de formação de professores que é a do professor reflexivo. Tal
tendência considera a indagação reflexiva como elemento propulsor, ou seja, como
estratégia para o desenvolvimento profissional, visto agora como um continum, que ocorre,
ao longo da vida, sem tempo e espaço determinados.
A reflexão é um processo de atribuição de significados que leva o
professor de uma experiência a outra seguinte, com um grau de
compreensão mais profundo de suas relações com a primeira e conexões
com outras experiências e ideais. É este o fio condutor que faz com que a
aprendizagem continuada seja possível e garanta o progresso da pessoa e,
em última instância, da sociedade
(REALI e REYES, 2009, p.28).
64
De acordo com as autoras, quer a formação inicial, quer a formação continuada
não podem ser concebidas de modo instrumental, ambas devem mobilizar diversos
conhecimentos dos educadores: os conhecimentos prévios, conquistados ainda enquanto
educandos e os conquistados ao longo do tempo.
Nesse sentido, os cursos de formação objetivam formar professores
competentes, capazes de mobilizar diferentes conteúdos, conhecimentos e habilidades que
conquistou para realizar as atividades relacionadas à sua profissão.
Ainda segundo as autoras, o ensinar e o ser professor são processos distintos,
porém inter-relacionados. Ensinar refere-se à transformação do conteúdo a ser ensinado em
conteúdo aprendido pelos alunos, isso implica em se considerar a grande diversidade dos
educandos e as diferentes maneiras de se abordar o conteúdo. Ser professor implica as
responsabilidades sociais e políticas, sua participação na escola e em seu entorno.
Em ntese, podemos dizer que ensinar está diretamente relacionado às
atividades dos alunos e dos professores nas salas de aula, considerando-se
os conteúdos. O ser professor relaciona-se ao desempenho de papéis, às
responsabilidades, ao pensamento e aos modos de atuação tendo em vista
um contexto de atuação profissional, geralmente a escola
(ibid., p.14).
Dessa forma, a base de conhecimentos para a docência, ou seja, os
conhecimentos necessários para ensinar e ser professor correspondem a uma gama muito
ampla de conteúdos, conhecimentos e habilidades, que, como já dissemos serão colocados
em prática durante a atividade docente, estando, portanto em constante alteração, levando-
se em consideração o caráter reflexivo do educador.
2.6.2. Base de conhecimento para o ensino
De acordo com Almeida e Biajone (2005), no final dos anos de 1980 houve um
movimento de reforma da formação inicial de professores da educação básica que começou
nos Estados Unidos e Canadá e posteriormente se estendeu a outros países, tal reforma
partiu do princípio de que a base de conhecimentos sobre o ensino permitiria estruturar a
educação do professor e instruiria diretamente as práticas de formação.
65
Para Mizukami (2004) a base de conhecimentos refere-se à compreensão dos
processos de aprendizagem profissional da docência. Para a autora, Shulman (1986)
acreditava que as pesquisas estavam ignorando um aspecto central do ensino na tentativa
de simplificar suas complexidades, elas ignoravam o conteúdo específico da disciplina que
os professores lecionam.
Esse aspecto central sobre o ensino refere-se diretamente à questão: “o que um
professor necessita saber para ser professor?”. Em nosso trabalho de pesquisa somos
levados a indagar então: “o que os professores das séries/anos iniciais do ensino
fundamental de nove anos precisam saber sobre os gêneros discursivos como objetos de
ensino de forma a ter um repertório mínimo que lhes possibilite novas construções e novos
conhecimentos?”
Citando Shulman (1986,1987), Mizukami (2004) afirma:
[...] a base de conhecimentos se refere a um repertório profissional que
contém categorias de conhecimento que subjazem à compreensão que o
professor necessita para promover aprendizagens dos alunos. Trata-se de
um modelo que foi desenvolvido considerando o conceito de ensino
como profissão, envolvendo delimitação de campo de conhecimento que
pode ser sistematizado e partilhado com outros: os profissionais de ensino
necessitam de um campo de conhecimento profissional, codificado e
codificável que os guie em suas decisões quanto ao conteúdo e à forma
de tratá-lo em seus cursos e que abranja conhecimento pedagógico quanto
conhecimento da matéria
(p.05).
As categorias da base de conhecimentos são: conhecimento do conteúdo
específico, conhecimento pedagógico geral e conhecimento pedagógico do conteúdo, essas
categorias serão descritas a seguir.
2.6.2.1. Conhecimento do conteúdo específico
De acordo com Almeida e Biajone (2005), pautados em Shulman (1987) o
conhecimento do conteúdo da matéria ensinada é a primeira fonte da base de conhecimento
para o ensino. Sendo assim, esse conhecimento refere-se aos conteúdos específicos da
matéria que o professor leciona, incluem, portanto as compreensões de fatos, conceitos,
66
processos, procedimentos de uma área, como a compreensão do contexto em que esses
conteúdos são gerados.
Dessa forma, o conhecimento do conteúdo da matéria ensinada:
[...] não se resume tão somente à detenção bruta dos fatos e conceitos do
conteúdo, mas também a compreensão dos processos de sua produção,
representação e validação epistemológica, o que requer entender a
estrutura da disciplina, compreendendo o domínio atitudinal, conceitual,
procedimental, representacional e validativo do conteúdo
(ALMEIDA e
BIAJONE, 2005, p. 07).
Mizukami (2004) realizou um panorama das contribuições de Shulman para a
compreensão da aprendizagem da docência e afirma que embora o conhecimento do
conteúdo específico e sua compreensão pessoal sejam importantes e necessárias aos
professores, isso não torna condição suficiente para que os conteúdos sejam ensinados e
aprendidos com sucesso.
Professores bem sucedidos não podem simplesmente ter uma
compreensão intuitiva ou pessoal e um conceito, princípio ou teoria
particular. De forma a fomentar compreensão, eles devem compreender
formas de representar o conceito para os alunos. Eles devem ter
conhecimento das formas de transformar o conteúdo considerando os
propósitos do ensino (...) que inclua compreensão pessoal do conteúdo
específico, assim como conhecimento das formas de comunicar tal
compreensão, a propiciar desenvolvimento do conhecimento da matéria
na mente dos alunos
(WILSON; SHULMAN; RICHERT, 1987, p.
110, apud. MIZUKAMI, 2004).
Os professores precisam encontrar formas de comunicar seus saberes, isso
envolve dois tipos de conhecimentos: conhecimento da área e conhecimento de como fazê-
lo compreensível aos outros.
2.6.2.2. Conhecimento pedagógico geral
Esse tipo de conhecimento, segundo Mizukami (2004), envolve vários outros,
como o conhecimento da teoria e princípios relacionados aos processos de ensinar e
aprender; conhecimentos dos alunos, de suas características e dos processos cognitivos de
67
como aprendem; conhecimento dos contextos micro e macro, que correspondem à sala de
aula e o grupo escolar com o qual trabalha e da comunidade, respectivamente;
conhecimento de outras disciplinas que se relacionam a sua; e compreensão do currículo
como política em relação ao conhecimento oficial.
Para Shulman (1986, apud. ALMEIDA e BIAJONE 2005), é do conhecimento
pedagógico geral que o professor retira suas ferramentas de ensino, assim como o leque de
conteúdos a serem ensinados, a forma como serão avaliados e a adequação dos avanços
dos alunos.
2.6.2.3. Conhecimento pedagógico do conteúdo
Esse tipo de conhecimento é construído constantemente pelo professor ao
ensinar a matéria e é enriquecido e melhorado quando se complementam com os outros
tipos de conhecimentos presentes na base de conhecimento para o ensino.
É uma forma de conhecimento do conteúdo, inclui compreensão do que
significa ensinar um tópico de uma disciplina específica, assim como os
princípios e técnicas que são necessários para tal ensino
(MIZUKAMI,
2004).
Trata-se de um novo tipo de conhecimento construído pelos professores, pois
incorpora os aspectos dos conteúdos mais relevantes para serem estudados, assim, como as
representações mais úteis, as melhores analogias, ilustrações, exemplos que podem garantir
um aprendizado eficaz, pois os professores conseguem visualizar os fatos que tornam os
conteúdos mais fáceis ou mais difíceis.
Influenciado tanto pelo conhecimento da matéria, quanto pelo
conhecimento pedagógico, o conhecimento pedagógico do conteúdo
emerge e cresce quando professores transformam seu conhecimento do
conteúdo específico considerando propósitos de ensino
(WILSON;
SHULMAN; RICHERT, 1987, p. 115, apud. MIZUKAMI, 2004).
Ainda segundo em Shulman (1987) a base de conhecimento para o ensino vai
gradualmente sendo construída a partir de quatro fontes básicas:
68
[...] os conteúdos das áreas específicas de conhecimento; os materiais e as
estruturas organizacionais; a literatura referente a processos de
escolarização e desenvolvimento humano, bem como sobre os
fundamentos normativos, filosóficos e éticos da educação e, pela
sabedoria da prática, a fonte menos codificada de todas
(MIZUKAMI,
2004, p. 10).
Considerando-se esse conjunto de conhecimentos que devem ser mobilizados
pelos educadores no tocante ao conteúdo e à forma de trabalhar a produção textual nas
séries iniciais do ensino fundamental que nosso trabalho buscará oferecer uma reflexão.
Viemos até aqui apresentando nosso referencial teórico, iniciamos com uma
apresentação do conceito de aprendizagem dialógica posta em prática no interior das
Comunidades de Aprendizagem e de como estas se configuram em valiosas alternativas
para que todos possam participar de forma mais igualitária na sociedade informacional.
Sendo assim, a escola deve assegurar a aprendizagem dos conhecimentos
imprescindíveis à participação na sociedade, potencializando-se o aspecto dialógico.
Nesse sentido, apresentamos nossa concepção de linguagem, compreendida
como constitutiva e constituinte do sujeito. No interior dessa concepção, os gêneros do
discurso, orais e escritos devem ser objetos de ensino, pois acreditamos que eles possam
ser utilizados como instrumentos nas diversas situações interlocutivas que o sujeito virá a
participar. Nesta perspectiva, defendemos que os gêneros discursivos devem ser
considerados como objetos de ensino da língua materna, daí a importância do papel de
educador-mediador do processo de ensino e aprendizagem do educando e dos saberes
necessários à prática educativa que de fato garanta que os educandos se apropriem dos
elementos constituintes dos gêneros discursivos de texto e passem a produzi-lo
textualmente, considerando-se suas características e a dinâmica discursiva.
No capítulo a seguir apresentaremos a configuração de nossa metodologia de
pesquisa.
69
CAPÍTULO III
COMPOSIÇÃO DO PERCURSO TEÓRICO-METODOLÓGICO
...uma das bonitezas de nossa
maneira de estar no mundo e
com o mundo, como seres
históricos, é a capacidade de,
intervindo no mundo, conhecer
o mundo (Paulo Freire,
Pedagogia da Autonomia,
1996).
Como anunciamos no início de nosso trabalho, nossa pesquisa centra-se na
seguinte questão: “Quais conhecimentos são necessários aos educadores das ries/anos
iniciais do Ensino Fundamental de Nove Anos sobre os gêneros discursivos como objeto
de ensino para que possam garantir a aprendizagem dos educandos no tocante à prática da
produção textual que considere, além das marcas do gênero os elementos que assegurem a
dinâmica discursiva?” Tais conhecimentos foram abordados durante um Curso de
Extensão, em um processo colaborativo dialógico entre pesquisadoras e educadoras, o qual
se fundamentou no desenvolvimento de uma sequência didática para o ensino de um
gênero do discurso escrito.
A presente questão foi desdobrada nos seguintes objetivos:
Verificar quais conhecimentos as educadoras possuíam sobre os gêneros discursivos
enquanto objeto de ensino;
Verificar quais conhecimentos foram construídos ao longo da realização do Curso
de Extensão que procurou enfocar a sequência didática como estratégia para o ensino
de um gênero do discurso escrito;
70
Relacionar os conhecimentos que as educadoras tinham e que afirmaram ter
aprendido;
Analisar o que as educadoras afirmaram sobre as aprendizagens dos educandos
durante e após a realização da sequência didática;
A metodologia adotada na realização do presente trabalho foi a colaborativa
dialógica, que procuramos delinear a seguir.
Segundo Ninin (2006), a colaboração pode ser definida como a ação de,
conscientemente, trabalhar com o outro, permitindo-se tanto ser por ele influenciado
quanto influenciá-lo em direção à transformação recíproca.
De acordo com a autora, a pesquisa colaborativa é caracterizada como um
sistema de atividade que propicia um importante contexto para a construção crítica-
colaborativa do conhecimento em ambientes educacionais. Nesse contexto, o propósito da
pesquisa colaborativa está na transformação a partir dos processos de intervenção vividos
por pesquisador e pesquisados.
Transformação relaciona-se às mudanças que envolvem a construção de
novos conhecimentos que passam necessariamente por conflitos do
indivíduo em relação ao objeto gerado pela própria evolução sócio-
histórica
(NININ, ibid., p. 13).
Dessa forma, os processos de interação surgidos no desenvolvimento da
colaboração podem gerar a negociação de significados, o compartilhamento de
conhecimentos prévios e sistematizados, contribuindo assim para o desenvolvimento de
processos cognitivos.
Segundo Magalhães (1994), a pesquisa colaborativa tem uma forte relação com
a Teoria da Atividade, uma vez que os participantes colaboradores se encontram
conscientemente em torno de um motivo que os impulsiona para a reflexão e compreensão
de um objeto. Nesse sentido, o trabalho colaborativo apóia-se em objetivos individuais e
comuns partilhados por todos os participantes e que são articulados pela reflexão e ação
constantes.
Contudo, acreditamos que na realização da presente pesquisa a metodologia se
configurou em colaborativa dialógica. Como vimos em nosso referencial teórico, partimos
71
da concepção de linguagem que é compreendida enquanto constitutiva do sujeito à medida
que este interage com outros. Sendo assim, pretendíamos que ao longo do desenvolvimento
deste estudo fosse criado um contexto de interação que favorecesse o encontro dialógico
entre educadoras e pesquisadoras, contribuindo assim para a reflexão em torno dos gêneros
discursivos enquanto objeto de ensino e da sequência didática como estratégia de ensino.
Conforme afirma Freire (1987), homens e mulheres, em comunhão, se
descobrem incompletos e se encontram para alcançarem a completude. Se juntos podemos
nos descobrir seres inacabados, juntos também, mediatizados pelo diálogo, podemos
refletir sobre as situações de opressão que vivenciamos e traçar metas para as possíveis
transformações.
Ainda segundo Freire (ibid.) a dialogicidade é a essência da educação como
prática da liberdade, é através do diálogo que os sujeitos se encontram para pronunciar o
mundo, refletir sobre esse pronunciar, transformá-lo e transformarem-se.
Nesse sentido, a reflexão e ação sobre a prática são elementos dessa
dialogicidade, que busca a transformação. o palavra verdadeira que não seja práxis.
Daí que dizer a palavra verdadeira seja transformar o mundo (id. ibid., p.77).
A dialogia presente em nossa metodologia de pesquisa implica a presença da
constante reflexão, do exame crítico que o educador realiza sobre a sua própria prática,
para voltar a ela, transformando-a. Conforme anunciamos em nosso referencial teórico a
reflexão é imprescindível aos cursos de formação inicial e continuada dos professores. É
através da reflexão realizada sobre a própria prática que é possível a sustentação da
aprendizagem contínua deste profissional.
Objetivando a transformação, nossa pesquisa configurou-se também em
momentos de intervenção realizados junto às educadoras e educandos às educadoras no
momento de realização do Curso de Extensão e aos educandos nos momentos em que
realizávamos o desenvolvimento da sequência didática em um processo colaborativo,
mas também dialógico.
Conforme anunciamos anteriormente, quando os sujeitos dialogam,
possibilitam a construção de novos conhecimentos e subjetividades, que por meio do
diálogo e do exame crítico a produção de novos significados, de novas maneiras de
interpretação do mundo, e, portanto, novas maneiras de anunciá-lo. Resultam desse
72
processo novos sujeitos, prontos para dialogarem, transformarem-se e transformarem o
mundo, em um processo contínuo.
Ressaltamos que no interior da perspectiva defendida por nós, esse processo de
conscientização das transformações que devem ocorrer necessita ser realizado em
comunhão entre os sujeitos, tal como pontua Freire (1987): (...) ninguém desvela o mundo
do outro e, ainda quando um sujeito inicia o esforço do desvelamento aos outros, é preciso
que estes se tornem sujeitos do ato de desvelar (p. 167).
É nesse sentido que retomamos o conceito de ão cultural, posto também
em nosso referencial. A ação cultural é compreendida como sendo uma forma
sistematizada de ação sobre a estrutura social que pode ser para mantê-la tal como é ou
para transformá-la.
Sendo a nossa opção a de transformação, desenvolvemos junto ao grupo de
educadoras um curso de formação que buscou apresentar e discutir aportes teóricos e
metodológicos que esclarecem e defendem a importância dos gêneros do discurso
enquanto objetos de ensino e a utilização da sequência didática para o ensino de um gênero
do discurso escrito como estratégia para que o educando de fato se aproprie do mesmo e
possa produzir textualmente, garantindo as marcas características do gênero, assim como
as condições de interlocução.
Acreditamos que é no contexto escolar que a criança entrará em contato com
novas formas de interlocução, sendo necessário o desenvolvimento do ensino
sistematizado dos gêneros discursivos para que seja garantida a ampliação de novas formas
de intercâmbio com a sociedade, sendo que nesse processo de desenvolvimento o papel do
educador enquanto mediador é fundamental.
Levando-se em consideração que os saberes necessários à prática educativa não
se encerram na formação inicial, sendo necessária ao educador sua contínua formação,
como forma de garantir a construção e reelaboração constantes dos conhecimentos
necessários à base de conhecimento sobre o ensino. Refletir sobre os conhecimentos
necessários aos educadores para que de fato garantam a aprendizagem dos educandos no
tocante à produção textual é um reclamo dos educadores.
É dessa forma que nossa metodologia de pesquisa, em consonância com nosso
referencial configura-se colaborativa dialógica, colaborativa no sentido de trabalho junto
ao outro e dialógica no sentido de que as aprendizagens se configuram no encontro dos
73
sujeitos envolvidos para a transformação, a melhoria da qualidade do ensino, a
democratização do conhecimento e em última instância na transformação social.
Conforme anunciamos na introdução foi no contexto de trabalho junto ao
Projeto “Comunidades de Aprendizagem: aposta na qualidade da aprendizagem, na
igualdade de diferenças e na democratização da gestão da escola”, financiado pela
FAPESP (Processo 2007/52610-6) e pelo CNPq (Processo 401985/2007-5) que as
educadoras de uma das escolas que integram o projeto manifestaram o desejo de
aprofundamento quanto às questões de trabalho em sala de aula que privilegiassem os
textos - os que circulam socialmente e os produzidos pelas crianças - como objetos de
ensino, expusemos também que essas questões estavam muito presentes em nosso grupo de
pesquisa “Aquisição da Escrita e da Leitura: processo de ensino e aprendizagem” quando
entramos em contato com as propostas de trabalho de Schneuwly e colaboradores.
Para a realização dos estudos, reflexões e práticas necessárias à temática
organizamos um Curso de Extensão intitulado dados do curso, oferecido pela Pró-Reitoria
de Extensão da Universidade Federal de São Carlos (PRO-Ex UFSCar), que foi
destinado às educadoras de ano à série, de uma Escola Municipal da cidade de São
Carlos, tal curso é que compôs a intervenção no interior da pesquisa realizada.
Salientamos aqui, que tal pesquisa foi possível, pois a escola a qual nos
referimos integra o Projeto Comunidades de Aprendizagem, sendo que as educadoras
participantes do Curso de Extensão, assim como a coordenação e direção da escola
estavam familiarizadas e inseridas em práticas dialógicas.
Conforme apresentamos, o conceito de aprendizagem dialógica, posto em
prática pelo Projeto Comunidades de Aprendizagem, se sustenta na comunicação, no
diálogo e na educação. De acordo com Elboj Saso (2002), a aprendizagem dialógica é o
resultado das interações que ocorrem entre diferentes pessoas que expõem seus argumentos
em condições de igualdade.
Seguindo os sete princípios que fundam a aprendizagem dialógica - diálogo
igualitário, inteligência cultural, transformação, dimensão instrumental, criação de sentido,
solidariedade e igualdade de diferenças as escolas da rede municipal de ensino de São
Carlos-SP que integram o Projeto objetivam a máxima aprendizagem dos educandos,
mobilizando escola e comunidade de entorno para que as crianças aprendam os conteúdos
escolares, garantindo assim a participação mais justa na sociedade informacional.
74
Sendo assim, a dinâmica do Curso de Extensão foi bem recebida pelas
educadoras participantes, que se apresentaram bastantes receptivas à proposta de trabalho.
Tal Curso de Extensão teve o objetivo de proporcionar reflexões baseadas em leituras,
discussões, análises de produções textuais e situações de trabalho em sala de aula que
privilegiaram os gêneros do discurso como objeto de ensino e o desenvolvimento da
sequência didática como estratégia para que os educandos se apropriassem do mesmo e
passassem a produzi-lo textualmente.
O Curso de Extensão foi realizado uma vez por semana, com duração de duas
horas e, concomitante, realizamos o acompanhamento das propostas de trabalho
desenvolvimento da sequência didática junto aos educandos para identificar também,
suas hipóteses e forma de produção textual em sala de aula, esse acompanhamento estava
planejado para ser realizado uma vez por semana, mas houve atividades que se
desenvolveram duas e até três vezes por semana.
Nesta atividade, várias educadoras da Unidade Escolar participaram, mas o
foco de pesquisa centrou-se em apenas uma turma de ano, em que, a educadora se
dispôs às estratégias e recursos propostos, bem como, os educandos.
O intuito foi sensibilizar as educadoras e educandos na perspectiva que ambos
possam dialogar sobre situações de ensino e aprendizagem proporcionando contribuições
significativas de como conceber os gêneros discursivos como objetos de ensino. Para isso,
houve o planejamento e desenvolvimento de uma sequência didática que objetivou a
apropriação do gênero estudado por parte dos educandos.
3.1. Procedimentos de coleta de dados
A fim de contemplarmos os objetivos propostos neste trabalho, utilizamos
como instrumentos de coletas de dados duas entrevistas semi-estruturadas realizadas junto
a uma educadora responsável por um Ano da unidade de ensino. Além das entrevistas,
realizamos filmagens gravadas em áudio e vídeo de cada um dos encontros, tanto os
realizados junto às educadoras, que totalizaram dez encontros, em média com quinze
educadoras presentes, quanto os realizados junto aos educandos, que totalizaram doze
75
encontros, em média com vinte e uma crianças presentes em uma turma de Ano do
Ensino Fundamental de Nove Anos.
3.1.1 As entrevistas
As entrevistas foram realizadas junto à educadora responsável pela turma do
terceiro ano do ensino fundamental de nove anos. Tal educadora era participante do Curso
de Extensão e esteve de acordo com a realização da sequência didática, comprometendo-se
a aplicar as propostas de atividades que deveriam ser realizadas junto à turma de
educandos que era responsável.
As entrevistas realizaram-se em dois momentos distintos, a primeira foi
realizada no dia 05 de Agosto de 2008, antes de iniciarmos os encontros do Curso de
Extensão. A realização da entrevista inicial - e que se encontra transcrita no APÊNDICE I
teve como objetivo principal apreender as concepções iniciais da educadora sobre a
concepção de trabalho que se centrava em torno dos gêneros do discurso, a temática da
produção textual, bem como compreender como eram encaminhadas as proposta de
produção textual realizadas junto à turma de educandos com a qual trabalhava.
A segunda entrevista foi realizada no dia 07 de Outubro de 2008, logo após o
término dos encontros realizados junto às educadoras no Curso de Extensão, essa
entrevista, também presente no APÊNDICE II, objetivou apreender os conhecimentos
construídos ao longo da realização das leituras, discussões, reflexões e aplicação da
sequência didática para o ensino de um gênero do discurso escrito, bem como compreender
o que a educadora considerava acerca das aprendizagens conquistadas pelos educandos.
A opção pela realização das entrevistas centra-se no fato de que partimos do
pressuposto de que é através da linguagem que comunicamos e refletimos sobre nossas
concepções, nossas formas de leitura do mundo, sendo assim, anunciamos bem mais do
que simples palavras, mas através da linguagem é possível compreender as concepções que
orientaram e passaram a orientar a prática da educadora entrevistada.
76
3.1.2. As gravações em áudio e vídeo
Foram realizadas gravações em áudio e vídeo de cada um dos encontros
realizados junto às educadoras, durante a realização do Curso de Extensão, ao todo foram
realizados dez encontros junto às educadoras.
Os encontros, por configurarem curso de formação, ocorreram nas segundas-
feiras, durante o Horário de Trabalho Pedagógico Coletivo HTPC, na própria unidade
escolar, das 18h30 às 20h30.
Os objetivos dessas gravações eram o de apreender as impressões das
educadoras participantes, bem como o momento de compartilhamento de dificuldades e
avanços percebidos pelos participantes.
Paralelamente a esse trabalho, realizávamos também gravações das atividades
colocadas em prática pela educadora junto à turma de educandos do terceiro ano. Essas
gravações além de consistirem na coleta de dados para a tese de Cunha (2010), cujo
enfoque centrou-se nas aprendizagens dos educandos, consistiam também em coleta de
dados para essa pesquisa, pois objetivavam apreender como a prática da educadora da
turma modificou-se ao longo da realização do referido Curso de Extensão, auxiliando-nos
na apreensão de cada intervenção realizada, assim como as impressões dos educandos.
A seguir apresentaremos a caracterização da educadora, responsável pela turma
do ano do ensino fundamental de nove anos, educadora esta, que compartilhou conosco
as ansiedades da pesquisa e acreditou, tanto quanto nós pesquisadoras, que a proposta teria
resultados positivos nos acolhendo gentilmente, permitindo-nos fazer parte de sua prática,
por isso mesmo juntas, pudemos compartilhar as aprendizagens dessa maravilhosa
experiência.
3.2. Caracterização da educadora, participante da pesquisa.
Como afirmamos, realizamos o Curso de Extensão sobre a produção textual
e acompanhamos, mais detidamente, uma turma de educandos da escola, assim, tivemos a
oportunidade de apreender como os conhecimentos e reflexões travadas ao longo da
realização do curso estavam presentes na prática da educadora e como os conhecimentos
77
eram utilizados e construídos junto aos educandos. Sendo assim, realizaremos agora uma
caracterização da educadora, junto a qual realizamos a pesquisa.
Denaide
3
tem 39 anos e é formada no magistério, o desejo em fazer o curso de
Licenciatura em História foi temporariamente adiado, mas não descartado.
A educadora tem clareza de que a formação inicial não conta de todos os
conhecimentos necessários ao educador, como ela mesma afirma:
O magistério deveria ter sido o início de uma formação acadêmica,
porque só o magistério, não me dá uma base muito segura, não. Fica bem
aquém do que eu precisaria dentro de uma sala de aula (Entrevista 1).
Como diria Paulo Freire: a consciência de seu inacabamento, condição para
que perceba a necessária busca pelo ser mais humanizado.
A educadora vivenciou, pela primeira vez o acompanhamento de uma turma
desde o início do ano letivo até o final. Devido ao fato de ser contratada como professora
eventual, não conseguia visualizar nas crianças o resultado do trabalho contínuo do
educador.
Pudemos perceber ao longo da realização do trabalho que a educadora, assim
como os educandos possuem um ponto em comum: sentem prazer em aprender e
aprenderam muito juntos. A dedicação e o compromisso são poucos para expressarem a
enorme paixão pelo educar presente na educadora com a qual tivemos o prazer em
trabalhar.
A seguir, apresentaremos a descrição de cada um dos encontros, realizados
junto às educadoras e educandos, durante o Curso de Extensão.
3.3. Caracterização da Escola e das educadoras participantes da pesquisa.
Os dados presentes nessa pesquisa foram coletados em uma Unidade Escolar
Municipal de Ensino Fundamental de Nove Anos da cidade São Carlos – SP.
3
O nome utilizado aqui é fictício.
78
A escola está situada na região sul da cidade de São Carlos, localizada no
bairro Pacaembu, pertencente a região 5, conforme organização da Secretaria Municipal de
Educação dessa cidade e, atende também os bairros vizinhos: Jardim Cruzeiro do Sul,
Jardim Monte Carlos, Belvedere, Jardim Santa Tereza e Jardim Gonzaga. No entanto, a
maior parte da demanda é oriunda do Jardim Gonzaga, bairro periférico e que carrega
estigma de “favela”.
O bairro Jardim Gonzaga, começou a ser ocupado entre os anos de 1977 a
1979, de maneira irregular tanto ao que se refere à ocupação de lotes, como quanto ao
caráter de novas construções que se localizam próximo a uma área de risco e de
preservação ambiental, por pessoas originárias das regiões: norte, nordeste e do sul do
Brasil.
Em decorrência dessa ocupação desordenada e de outros fatores, tal espaço
passou a ser considerado como “zona crítica”, de acordo com o perfil socioeconômico,
pois é um bairro carente, detentor dos maiores índices de vulnerabilidade social do
município (pobreza, violência, desemprego, drogas, baixa escolaridade e crianças em risco
pessoal e social).
A maior parte das crianças que vivem neste bairro estuda na unidade escolar
pesquisada e participam de Projetos Sócio-Educativos em período inverso ao de seu estudo
e muitas famílias vivem com a ajuda do benefício da Bolsa Família.
Dentro desse contexto, a escola pesquisada atendeu no ano de 2008,
aproximadamente 300 crianças de 6 a 10 anos divididas em salas do ano à série,
oriundas dessa comunidade que também sofre com o baixo índice de aprendizagem
refletido por avaliações externas como o IDEB - Índice de Desenvolvimento da Educação
Básica - decorrente dessa vulnerabilidade social que se reflete nos resultados desse sistema
de avaliação que se organiza por vários critérios dentre eles: evasões, repetências e baixo
rendimento nas avaliações de língua portuguesa e matemática, fato presente nessa
realidade.
As coordenadoras pedagógicas desta unidade de ensino solicitaram um curso
de formação com a temática da produção textual nas séries anos iniciais do ensino
fundamental, que se configurou no Curso de Extensão já citado.
Abaixo segue quadro com a caracterização profissional das educadoras
participantes do curso de formação. Apontamos que não foram todas as educadoras da
79
unidade de ensino que participaram do curso, uma vez que algumas delas cursavam ensino
superior noturno, sendo dispensadas do HTPC, sinalizamos também que no mesmo
período de realização do curso ocorreram alguns afastamentos do trabalho,como por
exemplo, licença maternidade.
Educadoras/Ano
série
Tempo de docência Formação Efetivo
/ ACT
1º Ano 8 anos Magistério e Licenciatura em Pedagogia Efetivo
2º Ano 10 anos Magistério e Licenciatura em Pedagogia Efetivo
2º Ano 10 anos Magistério ACT
2º Ano 10 anos Magistério e Licenciatura em Pedagogia Efetivo
3º Ano 8 anos Magistério e Licenciatura em Pedagogia Efetivo
3º Ano 3 anos Magistério ACT
3º Ano 4 anos Magistério e Licenciatura em Pedagogia Efetivo
3ª Série 4 anos Magistério e Licenciatura em Pedagogia Efetivo
3ª Série 2 anos Magistério e Licenciatura em Pedagogia Efetivo
4ª Série 8 anos Magistério e Licenciatura em Pedagogia Efetivo
4ª série 4 anos Magistério e Licenciatura em Pedagogia Efetivo
Coordenadora 4 anos Magistério e Licenciatura em Pedagogia Efetivo
Coordenadora 4 anos Magistério e Licenciatura em Pedagogia Efetivo
Assessora de
Direção
15 anos Magistério e Licenciatura em Pedagogia Efetivo
Diretora 15 anos Magistério e Licenciatura em Pedagogia Efetivo
Fonte: Ficha informativa da Unidade de Ensino.
As educadoras da unidade de ensino, assim como as coordenadoras e a direção
estavam envolvidas com a implantação e desenvolvimento do Projeto Comunidades de
Aprendizagem, cujo um dos principais objetivo é a máxima aprendizagem escolar para
todos os educandos, sendo assim, o grupo de trabalho formado pela equipe escolar do
quadro acima se encontrava, no momento de realização do Curso de Extensão bastante
receptivo e ansioso para a implementação da proposta.
3.4. Intervenções realizadas: o curso de formação para as educadoras e a sequência
didática para os educandos.
Conforme anunciamos no delineamento de nossa metodologia de pesquisa, que
se configurou em colaborativa dialógica, apresentaremos nesta sessão as intervenções
realizadas junto às educadoras, participantes do Curso de extensão e as realizadas junto aos
educandos sob a forma de desenvolvimento da sequência didática, pois objetivamos a
transformação das práticas tanto das educadoras, em suas formas de conceber os gêneros
80
discursivos como objeto de ensino, quanto dos educandos, em suas formas de produzir
textualmente.
3.4.1. O curso de formação para as educadoras.
Como forma de introduzir a discussão relacionada à produção textual tomando-
se os gêneros discursivos como objeto de ensino, assim como sensibilizar as educadoras
para as dificuldades das atividades de produção textual descontextualizadas, preparamos,
inicialmente, propostas de escrita que ressaltavam os pontos negativos destas propostas de
escritas que desconsideram a importância dos gêneros textuais e a própria situação
interlocutiva.
Buscamos também socializar junto às educadoras nossa concepção de
linguagem, proporcionar contato com a literatura que trata da importância dos gêneros
textuais escritos, assim conscientiza-las da importância do trabalho com a sequência
didática, como forma de assegurar a aprendizagem de um gênero pelo educando, bem
como dar indícios do trabalho que ainda estaria por vir, a ser realizado junto aos
educandos.
A seguir, apresentamos o esquema do desenvolvimento de uma sequência
didática, tal como a presente em DOLZ, et. al. (2004, p.98).
Esquema da sequência didática:
Cada uma das etapas da sequência didática foi estudada junto às educadoras, a
primeira etapa da sequência didática é a apresentação da proposta de trabalho com a
escrita, que chamaremos de projeto de escrita. Sendo assim, cada educadora deveria
realizar a proposta junto aos alunos, destacando junto às crianças que aprenderiam um
determinado gênero, para a composição de uma coletânea a ser entregue para cada
educando da turma.
No curso de formação foram oferecidos vários exemplos de produções textuais
de alunos das séries iniciais do ensino fundamental, o objetivo era dar continuidade à
Produção
inicial
Apresentação
da situação
Produção
final
Módulo
1
Módulo
2
Módulo
n
81
sensibilização quanto à importância do gênero textual como ponto de partida para o
processo de produção escrita.
O curso de formação também privilegiou a socialização das atividades que
vinham sendo realizadas junto aos educandos e momentos em que as educadoras pudessem
entrar em contato com diversos materiais que continham os gêneros selecionados para a
realização da sequência didática. O objetivo destes encontro era o de realizar o
levantamento sistematizado das características que compõem o gênero selecionado, tal
atividade também deveria ser realizada junto aos educandos, garantindo assim, que os
mesmos entrassem em contato com diversos portadores textuais e visualizassem as
características comuns ao gênero estudado, trata-se, portanto, de mais um módulo da
sequência didática.
Enfatizamos aqui que antes da realização das atividades da sequência didática,
as educadoras deveriam desenvolver as atividades de leitura e reconto dentro do gênero
selecionado para o trabalho, garantindo assim, que a criança entrasse em contato com mais
um tipo de texto dentro daquele gênero que estava sendo estudado.
Também durante a formação das educadoras, estas puderam assistir trechos das
entrevistas realizadas junto aos educandos do Ano turma de educandos que
acompanhávamos o trabalho desenvolvido mais de perto – bem como observarem as
escritas desenvolvidas pelos educandos, tanto a produção inicial e a última reescrita,
desenvolvida em duplas, como o objetivo de focarem quais elementos as crianças já
apresentavam domínio e quais elementos ainda precisavam ser desenvolvidos. Buscou-se
enfatizar a retomada constante do objetivo geral da proposta de trabalho que era a de
aprender a se expressar através de um gênero escrito para a produção da coletânea de
textos produzidos pelos alunos da turma.
Houve a discussão de conceitos que envolvem os elementos de coesão e
coerência, assim como a análise de algumas produções textuais à luz dos conceitos
estudados. Para a discussão desses conceitos foram utilizados dois encontros.
O curso de formação das educadoras dedicou os últimos encontros às reflexões
em torno das questões ortográficas e de como estas podem se transformar em objeto de
reflexão para os educandos.
82
3.4.2. A sequência didática para os educandos
Após a apresentação da proposta de trabalho realizada pelas educadoras
responsáveis pelas turmas, as crianças foram convidadas a realizarem a primeira produção
escrita da sequência didática, sendo assim, as educadoras, ainda sem desenvolver nenhuma
sistematização do gênero deveriam realizar uma proposta de reescrita junto aos educandos,
para isso, selecionam um texto dentro do gênero selecionado e realizaram a leitura para a
turma, em seguida as crianças reescreveram o texto.
Na sequência desenvolvida junto aos educandos, as professoras foram
orientadas a realizarem uma produção coletiva de um texto selecionado dentro do gênero
trabalhado. Essa atividade consistiu no primeiro módulo da sequência didática que partiu
do oferecimento de textos do gênero trabalhado, para a reflexão sobre as características dos
gêneros que deveriam aparecer na produção coletiva, esse levantamento foi realizado
oralmente, as professoras também foram sensibilizadas a valorizarem a atividade de
reconto, que consiste na produção oral do texto selecionado para o trabalho.
Nessa atividade, além da organização da narrativa, proporcionada pelo reconto,
as crianças também realizaram reflexões acerca do processo de escrita, uma vez que a
reescrita coletiva foi registrada pelas educadoras na lousa.
Um outro módulo da sequência didática consistia em um reescrita em dupla,
essa atividade objetivava que todas as crianças pudessem colocar em prática seus
diferentes conhecimentos quanto à produção textual, unindo esforços para que o texto de
fato contemplasse a proposta de escrita dentro de um gênero.
A atividade para ser desenvolvida no próximo módulo junto aos educandos
consistia em uma revisão coletiva de um texto produzido individualmente por um aluno. O
objetivo era de que os educandos refletissem sobre a escrita de forma a assegurar as
características do gênero, assim como deixar o texto interpretável, assegurando a presença
de elementos gramaticais que pudessem garantir a coesão e a coerência.
Para a realização de mais um módulo junto aos educandos, as educadoras
foram orientadas a organizarem os educandos em duplas para a realização de uma revisão
de um texto produzido por uma criança da turma, assim, cada dupla faria a revisão de uma
produção diferente, tendo como foco a observação dos elementos característicos do gênero.
Junto aos educandos foi desenvolvido mais um módulo da sequência didática:
os educandos deveriam criar coletivamente um texto dentro do gênero estudado, o objetivo
83
desse trabalho era o de atribuir autonomia às crianças, visto que até o momento o trabalho
havia sido desenvolvido com base em reescritas, que serviram de modalizações, importante
apoio para a prática da escrita. Em outro encontro as crianças foram convidadas a
produzirem em duplas e em seguida sozinhas.
O esquema a seguir, planejado previamente pelas pesquisadoras e pela
coordenadora do Grupo de Pesquisa, demonstra de forma sucinta o curso de formação
desenvolvido junto às educadoras e a sequência didática desenvolvida junto aos educandos.
84
Sensibilização: atenção para propostas
de escrita descontextualizadas.
Apresentação do referencial:
concepção de linguagem e dos
fundamentos para a realização da
sequência didática.
Apresentação da proposta de trabalho
e produção inicial.
Análise de produções e ênfase para o
gênero como ponto de partida apara a
produção. Destaque para a tríade:
leitura – reconto - produção.
Módulo 1: leitura reconto
produção coletiva e levantamento oral
das características do gênero.
Socialização das atividades
desenvolvidas junto aos educandos,
contato com portadores para o
conhecimento do gênero.
Módulo 2: Contato com portadores
textuais e diferentes exemplos do
gênero para o levantamento
sistematizado de suas características.
Visualização das entrevistas,
socialização das atividades
desenvolvidas, análises das produções.
Módulo 3: reescrita em duplas.
Módulo 4: revisão coletiva.
Análises das produções, visualização
de elementos que necessitam serem
trabalhados.
Módulo 5: revisão em duplas.
Estudo da coesão e coerência.
Módulo 6: Produção sem apoio
coletiva.
Estudo da coesão e coerência.
Módulo 7: Produção sem apoio em
dupla..
Estudo da ortografia.
Módulo 8: produção sem apoio
individual.
Encerramento
Discussão da coletânea: textos
selecionados, últimas alterações, tipo
de letra, etc.
E
D
U
C
A
D
O
R
A
S
E
D
U
C
A
N
D
O
S
85
3.4.3. Descrição das intervenções realizadas
Os encontros das educadoras foram realizados todas as segundas–feiras, das
18h30 às 20h30. Durante os encontros discutíamos assuntos referentes à produção textual e
também os encaminhamentos de trabalho que deveriam ser realizados durante a semana
com os educandos. Sendo assim, apresentaremos de forma concomitante os encontros das
educadoras e educandos.
Salientamos, que na primeira semana de trabalho, realizadas entre os dias 28 de
julho a 1 de agosto, houve a apresentação do projeto aos educandos, assim como, a
realização de entrevistas com a educadora e com a turma. Os dados da entrevista realizada
com a educadora serão analisados em outro momento deste trabalho, os dados
relacionados à entrevista com os educandos podem ser encontrados em CUNHA (2010).
Apenas na primeira semana não foram realizadas as atividades referentes aos
encontros com os educandos, pois estávamos aguardando as autorizações para as
filmagens
4
.
Enfatizamos que todas as educadoras que participaram do curso de formação
desenvolveram o trabalho referente a um gênero do discurso escrito junto a sua respectiva
turma de educandos.
A realização dessa pesquisa centrou-se em uma das turmas de ano, visto
que, segundo as coordenadoras, que solicitaram a realização do curso sobre a temática,
havia uma preocupação e dificuldade das educadoras em proporcionar situações
significativas para que os educandos pudessem produzir textos com qualidade. Sendo
assim, a pesquisa desenvolveu-se em uma turma do Ano do período da tarde, composta
de 25 crianças, ressaltamos também que o convite foi realizado a todas às turmas de
Ano, porém somente uma educadora disse sentir-se a vontade para a realização da
pesquisa.
Considerando que nesta etapa de ensino, final de ciclo, os educandos devem
não dominar o sistema de escrita, mas também, escrever textos, julgamos que seria uma
boa contribuição acadêmica aos profissionais da educação, este estudo pautado no processo
de ensino e aprendizagem de educadoras e educandos sobre a produção textual, à medida
4
O projeto de pesquisa, envolvendo o trabalho realizado foi submetido ao Comitê de Ética (kae
86
que as políticas públicas cobram a formação de leitores e escritores competentes, desde os
primeiros anos de escolarização, mas como educadoras, sabemos o quão difícil é
desenvolver práticas que sustentam essa proposta.
1ª Proposta de trabalho junto às Educadoras
Data: 28/07/08
Proposta de Trabalho: Atividade de produção textual em grupos, contemplando
diferentes propostas de escrita:
Grupo 1: escrever uma carta para um amigo que está fora do país contando as novidades
pessoais e os últimos acontecimentos no Brasil. Grupo 2: escrever uma história a partir de
uma gravura apresentada. Grupo 3: escrever uma crônica onde a frase Eu gosto de
macarrão” apareça no inicio ou no final do texto. Grupo 4: escrever um artigo de opinião
sobre a instalação de usinas nucleares no Brasil
5
. Grupo 5: fazer a reescrita do conto - A
Bela Adormecida
6
.
Cada grupo recebeu a seguinte orientação, um dos integrantes seria o observador e ficaria
responsável por anotar todos os procedimentos da produção.
Objetivo: Proporcionar uma reflexão sobre as seguintes questões:
Como foi o processo de produção?
O que facilitou ou dificultou a produção?
O que o professor queria ensinar com a proposta? E o que os alunos podem aprender
com a proposta feita?
Discutir a importância do trabalho com projetos de leitura
Procedimentos
Iniciamos o encontro com leitura em voz alta
7
do texto A Formigadinha, de
Rossana Ramos, e da pauta (APÊNDICE III) que seria trabalhada e, em seguida,
235.700.001.35-09, Parecer 261/2009).
5
Para contemplar a proposta foi oferecido a leitura de KAUFFMAN e RODRÍGUES (1995) que definem o
gênero.
6
Para contemplara a proposta foi oferecida uma versão do Conto.
7
Denomina-se leitura em voz alta aquela em que os participantes não tem o texto em mãos para acompanhar,
apenas a ouvem, não possui caráter de estudo, apenas de apreciação.
87
distribuímos às educadoras um questionário que contemplava alguns conceitos
relacionados à produção textual que tinha o objetivo de levantar quais conhecimentos os
educandos já tinham construído sobre a temática.
Esclarecemos a nossa opção de trabalho pautado em projetos diferenciando
conceitos que envolviam: atividades avulsas, permanentes, sequenciadas e projetos
8
,
ressaltando que este último tem como finalidade um produto final, que no nosso caso foi a
escrita em uma situação interlocutiva.
Posteriormente as educadoras se organizaram em grupos para desenvolverem a
atividade de produção textual diferenciada. Para a realização dessa atividade foram
utilizados vinte e cinco minutos, podendo ser escritas apenas vinte linhas.
O objetivo dessa atividade era sensibilizar as educadoras para a complexa
atividade de produção textual a que são submetidos os educandos no cotidiano da sala de
aula.
Passados os vinte e cinco minutos, cada grupo de educadoras socializou suas
produções (Anexo II) e os observadores relataram suas impressões acerca do processo, que
foram registradas na lousa. Em forma de síntese as educadoras sinalizaram dificuldades
relacionadas à necessidade de definição de gêneros discursivos, relataram que somente a
imagem/gravura não garante uma boa produção, caso o escritor, não tenha um repertório
amplo, que lhe possibilite escrever sobre o que vê, pois a escrita relaciona-se ao seu
conhecimento de mundo.
Em seguida, articularam-se os conhecimentos, sentimentos relatados pelas
educadoras a leitura que já havia sido disponibilizada “Escrever é preciso”, da autora
Rosauro Soligo, enfatizando a importância da escrita como função social, em que, as
questões: para que? por que? e como? as sustente. Sendo assim, definir a finalidade do
escrever é também, um dos aspectos fundamentais para que a escrita não fique escolarizada
e distante das situações de enunciação, que como vimos é condição para o ato
comunicativo entre os interlocutores.
8
Compreendemos por atividades avulsas aquelas que não foram previamente planejadas pelo educador.
Trata-se de episódios atuais surgidos ou não no contexto da aula e que se torna uma necessidade para o
grupo. As atividades permanentes são aquelas que ocorrem diariamente e que são independentes de outras
atividades ex: leitura em voz alta. as atividades sequenciadas requerem um planejamento organizacional
que vise a articulação de conhecimentos. Sendo assim, o projeto é a unidade maior que comporta as
atividades sequenciadas, que tem como produto a ação comunicativa.
88
Após esse diálogo sugerimos que por ano/série as educadoras selecionassem
quais gêneros gostariam de trabalhar em forma de projetos – sequências didáticas junto aos
seus educandos. Nos grupos que estavam constituídos as educadoras elencaram
diferentes gêneros que poderiam ser trabalhados e, dentre eles muitos que estavam
associados ao sistema e não a produção textual. Neste momento, foi necessário retomar o
que entendíamos por produção textual, ressaltando que escrever textos exige
conhecimentos que vão além da apropriação do sistema de escrita e das regras gramaticais.
Com base nos argumentos, as educadoras re-elaboraram suas escolhas:
1º ano – Cantigas para poesias;
2º ano – Contos folclóricos;
ano Escolheram inicialmente o gênero piadas, pois pretendiam enfatizar a
pontuação dos diálogos, depois mudaram para o gênero conto de fadas para
posteriormente selecionarem o gênero fábulas;
3ª série - Crônicas
4ª série
9
–Narrativas de aventura e/ou assombração.
Findamos o encontro disponibilizando as leituras que deveriam ser realizadas
para orientar as futuras discussões.
2ª Proposta de trabalho junto às Educadoras
Data: 04/08/2008
Proposta de Trabalho: A proposta consistia no estudo de dois textos: GERALDI, J.W.
(org.) “Concepções de linguagem e ensino de português”. In: O texto na sala de aula
leitura & produção. 2ª ed. Cascavel: ASSOESTE, 1990; e DOLZ, J.; NOVERRAZ, M.;
SCHNEUWLY, B. Sequências didáticas para o oral e a escrita: Apresentação de um
procedimento. In: Gêneros orais e escritos na escola/tradução e organização Roxane Rojo
e Glaís Sales Cordeiro. - Campinas, SP: Mercado das Letras, 2004. (Coleção As Faces da
Linguística Aplicada).
No mesmo encontro pretendíamos que as educadoras analisassem diferentes produções
escritas de educandos, agrupadas da seguinte maneira: - produção a partir de gravuras;
9
Em conformidade com a Lei 11.274/2006, o município de São Carlos, a partir de 2006 iniciou a
implantação do Ensino Fundamental de Nove Anos, sendo assim, no ano de 2008 as crianças que
frequentavam a 3ª e 4ª série eram crianças provenientes do Ensino Fundamental ainda de oito anos.
89
tema livre; sequências de gravuras; produção com roteiro; reescritas; gêneros definidos;
limitações X produções de qualidade.
Objetivo: O estudo dos textos propostos objetivava que as educadoras entrassem em
contato com a literatura acerca da concepção da língua enquanto forma de interação entre
os interlocutores e também com o conceito de sequência didática para o ensino de um
gênero.
As análises das produções escritas pretendiam proporcionar uma reflexão em torno das
seguintes questões: como foi o processo de produção?; o que facilitou ou dificultou a
produção?; o que o professor queria ensinar com a proposta?; o que os alunos podem
aprender com a proposta feita?; discutir a importância do trabalho com projetos de leitura
Procedimentos
O encontro foi iniciado com a leitura compartilhada
10
do texto: “A arte de
produzir fome” de Rubem Alves. Em seguida, foi lida a pauta contendo os
encaminhamentos propostos para o encontro.
Posteriormente, foi iniciado o estudo dos textos disponibilizados no encontro
passado: GERALDI (1990) e DOLZ (et.al., 2004). Os procedimentos para a realização
desse estudo partiram de uma apresentação de cada um dos textos. Primeiramente foram
trabalhados conceitos presentes no texto de João Wanderley Geraldi sobre concepções de
linguagem, em seguida as educadoras fizeram alguns destaques relacionados: ao para que
ensinamos o que ensinamos, a dimensão política da prática educativa e da constante
transformação da linguagem.
Dando continuidade, apresentaram-se os conceitos contidos no segundo texto
Dolz (et.al., 2004), relacionados às sequencias didáticas, enfatizando o respaldo teórico do
desenvolvimento do trabalho que seria realizado em sala de aula.
Para melhor compreensão, as educadoras relacionaram o texto estudado à
situações vivenciadas em sala de aula e explicitaram a importância do trabalho em que os
gêneros tenham função social, a partir de questionamentos proporcionados pelo educador
em torno das perguntas: para que serve o gênero?, onde é encontrado?
10
Denominamos leitura compartilhada aquela em que o leitor e todos os participantes possuem o texto em
90
Além disso, dialogou-se em torno do suporte e do portador textual
11
. Foi dado
destaque à questão da flexibilidade dos gêneros, embora alguns autores os classifiquem em
tipologias que seguem características semelhantes, é importante considerar que na
linguagem na sociedade podem desempenhar diferentes funções.
Terminados os estudos dos textos, as educadoras se organizaram em grupos e
foram distribuídas a eles diversas produções escritas de educandos que estavam agrupadas
da seguinte maneira: produção a partir de gravuras; tema livre; sequências de gravuras;
produção com roteiro; reescritas; gêneros definidos; limitações versus produções de
qualidade.
Reunidos os grupos, as educadoras iniciaram a análise sugerida e se
apresentaram envolvidos com a atividade, construindo reflexões aprofundadas sobre a
produção textual, porém o tempo foi insuficiente para socializar as reflexões, que ficaram
para o próximo encontro.
3ª Proposta de trabalho junto às Educadoras
Data: 11/08/2008
Proposta de Trabalho: Retomada das análises das produções textuais do encontro
anterior e apresentação e discussão dos seguintes conceitos presentes no texto de BALTAR
(2008): gêneros textuais; modalidades discursivas; sequências textuais; suportes textuais;
reconto; reescrita; produção textual; escrita de textos que se sabe de memória.
Objetivo: Os objetivos dessa atividade eram o de proporcionar elementos de reflexão junto
às educadoras para que as mesmas pudessem perceber que a maior parte das orientações
para que os educandos possam produzir textos, pautam-se no sistema de escrita e não na
produção textual significativa, que é aquela que possui uma intenção comunicativa e um
real leitor. Além disso, pretendíamos sensibilizar as educadoras para um olhar em que o
gênero fosse o ponto de partida para a escrita e não os elementos gramaticais, pois embora
importantes não garantem um texto de qualidade.
mãos para acompanharem ou estudarem elementos presentes no texto.
11
A discussão foi realizada com base na leitura do texto de BALTAR (2008).
91
Procedimentos
Iniciamos o encontro com a leitura do texto de Ruth Rocha: “A escola de
vidro”, a seguir demos continuidade à atividade do encontro anterior de análise de
propostas de produções de texto em que reunidos em grupo as educadoras analisaram e
dialogaram sobre as mesmas, os exemplos das produções podem ser encontradas no
ANEXO III.
Em um primeiro momento, as educadoras se organizaram em grupos menores
para discutirem cada situação de produção textual pautados nas seguintes questões:
- O que o professor queria ensinar com a proposta?
- O que os alunos puderam aprender com a proposta feita?
- Quais os saberes que o educador precisa ter para ajudar o aluno a avançar?
As educadoras iniciaram a socialização das discussões realizadas nos pequenos
grupos, apresentando as reflexões sobre cada bloco de produções.
Com base nas questões apresentadas acima, as educadoras ressaltaram, sobre as
produções analisadas do bloco gêneros definidos, que cada gênero possui suas
características próprias, portanto as educadoras devem dominá-las para ensiná-las.
Ressaltaram que os educandos puderam aprender a estrutura textual e o educador
objetivava a verificação de apropriação do sistema de escrita.
Com relação aos blocos de produções escritas realizadas a partir de gravuras,
as educadoras salientaram que quando o educando escreve com essa proposta sua produção
fica limitada, restringindo-se à descrição do observado na imagem, visto que a leitura
realizada da imagem depende de suas vivências e de seu conhecimento de mundo. o
educador, quando propõe tal atividade, mesmo que inconscientemente, foca-se novamente
no sistema de escrita, necessitando respaldar seu trabalho a partir das características do
gênero, para proporcionar avanços aos educandos.
Sobre a produção escrita realizada a partir do tema livre, as educadoras
afirmaram que os educandos escrevem sobre o que pensaram, imaginaram ou vivenciaram
e o educador tem como objetivo verificar a organização das ideias, bem como o sistema de
escrita. Em relação aos saberes que o educador deve ter para os educandos avançarem, as
educadoras sinalizaram a necessidade de clareza dos objetivos.
Quanto às produções realizadas com base nas sequências de gravuras, as
educadoras disseram que a proposta girava em torno da organização da produção textual
92
em começo, meio e fim, assim esperando que os educandos escrevessem em parágrafos a
partir da leitura da sequencia de imagens. E novamente as educadoras afirmaram a
necessidade de um trabalho pautado em gêneros.
A próxima análise, que foi sobre reescrita, as educadoras observaram que ao
escrever, o educando somente elencou os acontecimentos, sem a preocupação com as
características do gênero. Com essa atividade o educador tinha a atenção centrada na
apropriação do sistema e para fazer os educandos avançarem, o mesmo deveria favorecer a
reflexão sobre a leitura feita, para elucidar aos educandos elementos importantes que
deveriam estar contidos na reescrita.
Com relação à produção com roteiro, as educadoras ressaltaram que trata-se de
respostas às perguntas feitas, limitando a escrita dos educandos em parágrafos. Apesar da
intenção do educador em orientar a produção através de um roteiro, as educadoras
sinalizaram que esse tipo de atividade conduz o educando apenas às respostas curtas, sem
produção.
Para finalizar as reflexões, as educadoras socializaram as discussões acerca das
escritas do bloco limitações X produção de qualidade, em que observaram como diferentes
propostas de produções escritas podem gerar resultados diferenciados, pois uma mesma
criança ora pode produzir um texto de qualidade ora apenas limitar-se a descrições.
Paralelamente a esses diálogos, foram enfatizadas mais uma vez, a importância
da escrita com função social e comunicativa, em que o planejamento e o trabalho com o
gênero junto aos educandos são aspectos importantes para que ocorra a aprendizagem.
Além disso, o reconto é um forte aliado à produção, à medida que permite a articulação de
ideias, para serem posteriormente organizadas por escrito. Outro aspecto importante,
também salientado, refere-se à leitura de textos de qualidade, pois neles podemos encontrar
elementos de tematização, estilo e estrutura composicional envolventes, que servirão de
modelos para outras produções.
Após a reflexão dos blocos de produções textuais iniciamos uma explanação
sobre os conceitos presentes no texto de Baltar (2008): “Sobre os gêneros textuais”.
Foi realizado um diálogo em torno da questão: como produzimos
comunicação?”. Em resposta à pergunta, as educadoras afirmaram que a comunicação
ocorre através da linguagem, que pode ser tanto oral quanto escrita. Fundamentando-se em
Bakhtin, a pesquisadora salientou que a linguagem é enunciação. E questionou: “E o que
93
são enunciações?” E responde: unidades linguísticas. E torna a perguntar: “E o que são
unidades linguísticas? Qual é a menor unidade linguística?” “São as palavras, desde que,
no interior de um contexto comunicativo”.
Sendo assim, em todos os atos comunicativos produzimos gêneros do discurso,
sejam eles formais ou informais, primários ou secundários
12
.
A pesquisadora citou que os gêneros são compostos pela tematização, estilo e
estrutura composicional, explicando cada um deles. Em seguida, retomou alguns conceitos
presentes no texto: suporte/portador textual, modalidades discursivas e ambientes
discursivos. Além disso, explanou sobre a distinção de alguns conceitos como as
concepções de reescrita e/ou escrita com apoio e registros de textos que se sabe de
memória, reconto, escrita com autoria e/ou escrita sem apoio – e revisão
13
.
Finalizamos o encontro, mas não conseguimos realizar todas as atividades, ficando para o
próximo encontro a análise das produções iniciais dos educandos e a filmagem da
entrevista com os educandos sobre o que compreendiam acerca da produção textual.
Como tarefa, solicitamos a leitura diária a ser realizada junto aos educandos, de
um texto que se insere no gênero trabalhado com a turma. O trabalho de levantamento das
características do gênero poderá ser iniciado oralmente Após a realização da leitura, os
educandos deverão recontá-lo - todo ou parte dele. Em seguida deverá ser realizada uma
reescrita coletiva do mesmo, a mesma deverá ser trazida para o próximo encontro de
educadoras.
Indicamos como leitura para o próximo encontro: KAUFMAN, A. M.;
RODRÍGUEZ, M. H.. Escola, Leitura e Produção de Texto. Editora: Artmed, 1995, p. 20
– 43.
12
A explicação foi realizada segundo nosso referencial teórico.
13
Compreendemos por escrita com apoio a atividade de produção textual que consiste na escrita baseada em
um gênero, mas que não necessita ser idêntica a versão original. Nela o autor também pode deixar suas
marcas. Por registro de texto de que se sabe de memória, entende-se a escrita idêntica de sua versão original,
por exemplo, a escrita de parlendas, cantigas, provérbios, etc. O reconto é uma atividade realizada oralmente
sobre qualquer modalidade discursiva: relato, exposição, narração, etc. A escrita com autoria ou escrita sem
apoio denominamos como a escrita dentro de um gênero, mas de criação do próprio autor. a revisão
constitui-se nos momentos de verificação do que foi escrito e permite modificações referentes ortografia e à
coesão e coerência, até que, para o contexto apresentado propicie a interlocução com os leitores.
94
4ª Proposta de trabalho junto às Educadoras
Data: 18/08/2008
Proposta de Trabalho: Socialização das atividades desenvolvidas ao logo da semana
junto aos educandos: leitura diária, produção coletiva e ênfase dada ao reconto. Neste
encontro as educadoras analisariam diversos livros paradidáticos contemplando as
características dos gêneros selecionados para o trabalho.
Objetivo: O objetivo desta proposta era a realização de uma oficina de análise de
diferentes textos do mesmo gênero textual para o estabelecimento de comparações e a
identificação de características e elementos comuns ao gênero, tal oficina deveria ser
realizada também junto aos educandos.
Procedimentos
As educadoras socializaram as atividades realizadas durante a semana - leitura
diária, reconto e produção coletiva. Enfatizaram que a proposta com o trabalho de reconto,
mesmo com os educandos da quarta série foi um aspecto fundamental para motivar a
participação de todos, mesmo dos que possuem mais dificuldade. Compreender a
importância do reconto no processo de ensino e aprendizagem da língua materna é
proporcionar aos educandos a oportunidade de se expressar tanto na oralidade quanto na
escrita,
Sintetizando as socializações das educadoras a pesquisadora enfatizou que a
leitura, o reconto e a escrita devem ser trabalhados independentes da série/ano. O educador
deverá então, criar situações de envolvimento dos educandos nessas atividades, pois
somente lendo, escrevendo e refletindo sobre a língua poderão avançar em seus
conhecimentos.
Após a socialização as educadoras dividiram-se em grupos por série/ano para
analisarem os livros paradidáticos que foram previamente selecionados e trazidos pelas
pesquisadoras a fim de que os mesmos pudessem observar as características apresentadas
pelos gêneros selecionados por eles. Foi proposto que as educadoras criassem um quadro
para a categorização do gênero.
95
As educadoras levaram cerca de uma hora para analisar, conforme a proposta,
o material disponibilizado pelas pesquisadoras e, em seguida, socializaram as
categorizações que os grupos estabeleceram (ANEXO IV).
Sendo assim, partiu-se para os encaminhamentos do próximo encontro que
tinha como tarefa a continuidade do trabalho de leitura do gênero selecionado e o
oferecimento aos educandos de diferentes materiais, como livros ou outros portadores do
gênero selecionados para a sistematização das características do mesmo e realizar uma
reescrita em duplas. Ficou como leitura o texto: “O assunto é... produção de textos”. Kátia
Lomba Bräkling, disponível em: www.educarede.org.br.
5ª Proposta de trabalho junto às Educadoras
Data: 25/08/2008
Proposta de Trabalho: Análise das entrevistas realizadas com os educandos sobre o que
pensam sobre a produção textual; socialização das atividades aplicadas na semana e análise
das produções iniciais dos educandos.
Objetivo: O objetivo da análise das entrevistas realizadas junto aos educandos tinha como
objetivo socializar algumas impressões deixadas pelos educandos acerca do processo de
produção textual. A socialização das atividades tinha como objetivo verificar e oferecer
auxílio para as dificuldades encontradas no encaminhamento as atividades realizadas junto
aos educandos através do diálogo entre as educadoras e as pesquisadoras. A análise das
produções iniciais dos educandos tinha como objetivo verificar quais saberes possuíam
sobre o gênero proposto para o trabalho, assim como as dificuldades, processo que
auxiliaria no encaminhamento das próximas atividades da sequência didática.
Procedimentos
Após assistirem os vídeos com algumas entrevistas, as educadoras puderam
visualizar se suas expectativas estavam condizentes com o que se esperava dos educandos.
Após, projetamos algumas produções textuais dos educandos do Ano afim
de que todos pudessem comparar os elementos apontados nas entrevistas com os contidos
na produção textual.
96
Todas as educadoras foram sensibilizadas a perceberem que sua prática
pedagógica está refletida nas produções escritas dos educandos, assim, por exemplo,
constataram que quando enfatizam unicamente a pontuação o olhar dos educandos também
se volta somente para esse aspecto do texto, chegando a pensar que para se produzir, basta
pontuar. Terminadas as análises comparativas das produções textuais com o vídeo, cada
educador contou também como procederam e como os educandos responderam no decorrer
da semana com a proposta de trabalho a serem realizadas junto a eles.
Quando as educadoras terminaram as socializações das atividades realizadas ao
longo da semana, a pesquisadora entregou vários quadros
14
(APÊNDICE IV) que
contemplavam as características dos gêneros que estavam sendo trabalhados em cada
ano/série. Com base nesses quadros as educadoras deveriam selecionar uma das reescritas
iniciais e uma das reescritas realizadas em duplas, assinalando os elementos que haviam
sido contemplados das características contidas na tabela que faziam parte do gênero
estudado. Embora a proposta fosse a análise de duas reescritas, as educadoras acabaram
realizando de sua turma toda, pois estavam ansiosas para verificar quais elementos ainda
precisavam trabalhar para os educandos se apropriar do gênero que estavam aprendendo,
com isso levaram mais tempo do que era esperado.
Terminamos, orientando as educadoras a realizarem a revisão coletiva de um
dos textos reescritos em duplas e indicamos a leitura do texto: Parâmetros Curriculares
Nacionais: língua portuguesa. Brasília. MEC/SEF. 2001. p. 65-77.
6ª Proposta de trabalho junto às Educadoras
Data: 01/09/2008
Proposta de Trabalho: Retomada e socialização da análise de uma produção inicial
(diagnóstica) e de uma produção em duplas de acordo com a tabela de gêneros.
Socialização das atividades realizadas durante a semana; discussão e apontamentos sobre
os textos: O assunto é... produção de texto - Kátia Lomba Bräkling; Propuestas para el
aula” (EGB) Lengua série 2. Proposta nº7 e adaptado em tradução livre e Parâmetros
14
Os quadros que contemplam as características dos gêneros foram elaborados a partir das análises feitas
pelos educadores participantes desse Curso de Extensão e pelas pesquisadoras que se utilizaram de Kauffman
e Rodrígues (1995).
97
Curriculares Nacionais: língua portuguesa. Brasília. MEC/SEF. 1997. p. 107 à 116;
Reflexão sobre o vídeo e alguns apontamentos sobre o percurso desenvolvido.
Objetivo: A retomada e socialização da produção inicial tinham o objetivo de socializar o
que os educandos já sabiam, bem como o que precisavam saber sobre as marcas do gênero,
essa socialização também se referia à produção em duplas e o que a análise da mesma
demonstrou no tocante a alguns avanços.
Procedimentos
A pesquisadora sugeriu a retomada do quadro entregue no último encontro, no
qual se realizou a análise da primeira reescrita individual e da reescrita realizada em
duplas, visando um diagnóstico orientado pelas seguintes questões: quais conhecimentos
os educandos tinham sobre o gênero na primeira reescrita? Quais conhecimentos
precisavam saber? E quais conhecimentos já adquiriram após a realização das atividades da
sequência didática?
Algumas educadoras relataram que já haviam constatado mudanças na escrita e
na oralidade dos educandos ao que se referia aos gêneros trabalhados, perceberam mais
segurança dos educandos ao iniciarem a escrita e uma das educadoras enfatizou que as
reescritas auxiliam educandos que ainda não haviam se apropriado do sistema a
alfabetizarem-se.
A pesquisadora chamou a atenção das educadoras para a importância da
realização constante das atividades de leitura, reconto, escrita e revisão, pois essas
garantem a produção com qualidade. Foram retomados alguns conceitos como reconto,
reescrita, revisão e gênero. Refletiu-se sobre o fato de que muitas educadoras preocupam-
se com aspectos relacionados à gramática, garantindo que os educandos reproduzam esses
conhecimentos de maneira isolada, mas quando dentro de um contexto maior que é o texto,
não saibam empregá-los. Salientou-se que no processo de produção textual, deve-se
garantir inicialmente o ensino do gênero, pois dentro de cada instância social nos
utilizamos de diferentes modalidades discursivas, que são utilizadas de acordo com o
contexto e interlocutor.
Após esse diálogo, as pesquisadoras retomaram algumas leituras que haviam
ficado pendentes em encontros anteriores: O assunto é... produção de texto de Kátia Lomba
Bräkling e Parâmetros Curriculares Nacionais.
98
Em seguida, foram apresentados episódios selecionados pelas pesquisadoras e
que demonstraram como estava sendo o trabalho desenvolvido junto aos educandos do
Ano, visando demonstrar como os mesmos participavam das etapas da sequência didática
propostas.
As educadoras assistiram e comentaram o empenho dos educandos nas
propostas e relatavam que quando estavam envolvidas no contexto não conseguiam
visualizar a dimensão de participação dos educandos.
Como tarefa pessoal as educadoras deveriam propor aos educandos a revisão dos textos
que foram produzidos em duplas no primeiro momento, cada dupla analisa o texto de
outra dupla. Num segundo momento, os textos analisados retornarão com as observações
para que a dupla que o produziu faça os ajustes necessários.
Nesse encontro as pesquisadoras tentaram resgatar vários aspectos que haviam
sido planejados, mas não executados em outros encontros.
7ª Proposta de trabalho junto às Educadoras
Data: 08/09/2008
Proposta de Trabalho: Socialização das atividades realizadas ao longo da semana, que foi
a revisão de texto em duplas, análise e discussão de alguns conceitos presentes no texto de
MASSINI-CAGLIARI (2002) sobre a coesão e coerência; e análise de algumas produções
textuais à luz dos conceitos discutidos.
Objetivo: O objetivo desta proposta era sensibilizar as educadoras quanto às dificuldades
encontradas no encaminhamento das atividades, favorecendo o diálogo e
compartilhamento das experiências. Discutir alguns conceitos como: o que é Coesão? o
que é Coerência? Um texto pode ser coeso, mas o coerente? Quais elementos um texto
tem que abranger para ser coeso e coerente?
Procedimentos
O encontro iniciou com a socialização da atividade que foi desenvolvida
durante a semana com os educandos, que consistia na revisão em duplas de uma reescrita.
As educadoras explicitaram a forma como conduziram a atividade de revisão
em duplas, destacando os avanços, as dificuldades e algumas sugestões para superação
99
destas. Uma educadora relatou que para a realização da atividade construiu um quadro com
os educandos, este quadro era composto das características que contemplavam o gênero
trabalhado nas 3ªs séries, que no caso eram crônicas. A construção do quadro originou-se a
partir das dificuldades dos educandos em perceberem quais aspectos deveriam ser
contemplados na atividade de revisão.
Várias educadoras relataram que em diversos momentos, durante a realização
da atividade, tiveram que sinalizar aos educandos que o foco de análise de revisão
centrava-se sobre as características do gênero, pois muitos educandos insistiam em revisar
elementos gramaticais, como a ortografia e a pontuação.
Foi ressaltado que esse fato era previsto, porque até então o foco da
produção textual estava centrado nesses elementos.
Após a socialização das atividades realizadas nas diferentes turmas, as
pesquisadoras selecionaram fragmentos do vídeo que permitiam às educadoras
visualizarem como o processo de revisão ocorreu no ano, assim podendo refletir sobre a
sua própria prática, bem como o grau de envolvimento dos educandos na atividade.
Com essa proposta de trabalho realizada junto às educadoras foi possível
destacar a importância de se evidenciarem em quais elementos textuais os educandos
devem debruçar-se inicialmente para realizar o processo de produção textual. Ou seja, um
texto é composto por vários elementos da língua e cabe a cada educador ter clareza de qual
objetivo quer focar em cada atividade, para assim direcionar o olhar dos educandos.
Em seguida, foi realizado o estudo do capítulo 2, do livro Coesão e Coerência
–Gladis Massini-Cagliari, que foi direcionado pelas seguintes questões: O que é Coesão? O
que é Coerência? Um texto pode ser coeso, mas o coerente? Quais elementos um texto
tem que abranger para ser coeso e coerente?
Os conceitos trazidos pela autora foram apresentados e discutidos com
exemplos. Após entregou-se exemplos de produções textuais para que as educadoras
analisassem pautados nas seguintes questões: O texto é coeso e coerente? Justifique. O
texto não é coeso e nem coerente? Justifique.
Em grupos, as educadoras realizaram a atividade proposta e em seguida,
socializaram suas análises que foram sendo complementadas a cada colocação e com as
contribuições das pesquisadoras. No entanto, ao fim das mesmas ainda sentiu-se a
100
necessidade de aprofundamento da temática, pois na socialização das análises pode-se
perceber algumas dúvidas sobre os conceitos de coesão e coerência.
8ª Proposta de trabalho junto às Educadoras
Data: 15/09/2008
Proposta de Trabalho: Socialização das atividades realizadas ao longo da semana, que foi
a produção coletiva sem apoio, continuação das discussões acerca dos conceitos de coesão
e coerência, com base em GERALDI (1995) e com relação às concepções de texto
vinculadas às cartilhas presentes em MASSINI-CAGLIARI (2002), para essas reflexões
nos utilizamos de alguns exemplos.
Objetivo: A continuação de tal proposta de trabalho se deu a partir das dúvidas percebidas
pelas pesquisadoras com relação aos conceitos de coesão e coerência.
Procedimentos
Iniciamos o encontro com a socialização das atividades realizadas junto aos
educandos durante a semana.
Uma das educadoras do Ano relatou a dificuldade em desenvolver as
atividades propostas, pois percebia que os educandos, embora participassem das atividades
de reconto, ficavam cansados e desestimulados durante a realização da reescrita coletiva e
individual.
Após o relato da educadora, a pesquisadora sugeriu algumas alternativas para
desenvolver junto aos educandos no processo de reescrita coletiva e individual, visto que a
mesma percebeu que o relato da educadora indicava que sua turma estava no processo de
aquisição do sistema de escrita. Enfatizou que mesmo quando os educandos não estão
alfabetizados é possível desenvolver o trabalho com a produção textual, pois muito antes
de adentrarem na escola os mesmos produzem textos oralmente. Sendo assim, o
educador poderia tornar os textos produzidos oralmente em registros, em que, em um
primeiro momento, o educador é o escriba e os educandos os produtores das ideias que
serão registradas.
Foi salientado que as atividades de produção e revisão coletiva são
fundamentais para o desenvolvimento de habilidades que ultrapassam o sistema de escrita,
101
contribuindo para a formação de bons leitores e escritores. Portanto, a leitura, o reconto, a
reescrita e a revisão coletiva devem ser estimuladas e trabalhadas desde os primeiros anos
escolares a fim de instrumentalizar os educandos para a futura escrita individual sem apoio.
Para isso, as pesquisadoras sugeriram um trabalho com a reescrita junto aos educandos que
pudesse ser realizada ao longo da semana, sem a preocupação da cópia, pois esta seria
disponibilizada posteriormente aos mesmos.
O trabalho com a reescrita coletiva, assim como o de revisão, é importante
porque possibilitam ao educando visualizar diferentes aspectos, ou seja, independente do
conhecimento elaborado sobre a língua, a turma toda pode estabelecer reflexões
diferenciadas, pois na estruturação de um texto trabalhamos elementos da linguagem que
vão desde a relação fonema-grafema até análises mais aprofundadas da gramática que
abrangem a heterogeneidade de conhecimentos dos educandos. Nesse sentido é que o texto
se constitui como unidade de ensino da língua.
Além disso, dialogou-se sobre a importância da realização da leitura durante a
construção e revisão coletiva do texto, visto que esta possibilita, além do estabelecimento
das relações citadas anteriormente, a participação, a interação e a compreensão de um
contexto real de produção textual, considerando-se o gênero e o interlocutor.
Quanto à reescrita individual, foi ressaltado que no processo de aquisição da
escrita é importante que o educador esteja próximo para registrar toda a elaboração
construída pelo educando, além de auxiliá-lo na organização e resgate das ideias principais
contidas na produção escrita.
Após o diálogo estabelecido em torno das dificuldades e alternativas para
superação das mesmas, foi distribuído às educadoras o texto de João Wanderlei Geraldi
(1995) em que trata sobre coesão e coerência. Os mesmos leram o texto e em seguida
retomou-se a discussão do encontro anterior que centrou-se nas questões: O que é coesão?
O que é coerência? Um texto pode ser coeso, mas não coerente? Um texto pode ser
coerente, mas não coeso?
Em grupos, as educadoras discutiram os questionamentos e em seguida os
socializaram, os apontamentos foram registrados na lousa, de forma a sistematizar os
conhecimentos construídos, em que o conceito de coesão ficou sendo compreendido como
um conjunto de propriedades que amarram o texto e que estão diretamente relacionados
aos conectivos, pronomes, verbos, e outros. Já a coerência foi entendida como a unidade
102
global de sentido, ou seja, é adequada ao contexto em que o texto é produzido, possuindo
um porquê, um como e um para quem.
Com base nessas reflexões, foram entregues às educadoras três textos
presentes na pauta do encontro (APÊNDICE V) apresentados e analisados por Gladis
Massini-Cagliari (2002), em que são discutidos aspectos de coesão e coerência, com o
objetivo que as educadoras pudessem transportar os conhecimentos adquiridos para a
análise de outros três textos de educandos.
Em seguida houve a socialização da leitura e análises realizadas. Chegando-se
às seguintes conclusões: os educandos que foram alfabetizados a partir de cartilhas
15
apresentaram como produção textual a elaboração de frases, analisadas como sendo
incoerentes, pois não houve a elaboração de um contexto para sua produção; os textos de
educandos que não foram alfabetizados a partir de cartilhas apresentaram-se nas análises
com mais coerência, embora ainda, em ambos os casos não é possível verificar a
preocupação do escritor com a função social da escrita. Nas análises também foi ressaltado
que em todas as produções existem vários elementos a serem trabalhados, porém, cada um
deve ser tratado em diferentes momentos da sequência didática.
Como indicação para o trabalho a ser realizado junto aos educandos durante a
semana solicitou-se a produção em dupla sem apoio e a leitura do texto de Artur Gomes de
Morais: Ortografia: ensinar e aprender. Editora: Ática, 2002, capítulos 2 e 5.
9ª Proposta de trabalho junto às Educadoras
Data: 22/09/2008
Proposta de Trabalho: Socialização das atividades realizadas ao longo da semana, que foi
a produção textual em duplas e sem apoio, refletir sobre a natureza de alguns erros
ortográficos com base em MORAIS (2002).
Objetivo: O objetivo desta proposta era sensibilizar para as dificuldades encontradas no
encaminhamento das atividades, favorecendo o diálogo e compartilhamento das
experiências. Refletir sobre as questões ortográficas: por que os alunos cometem erros de
15
As educadoras com as quais trabalhamos não fazem uso das cartilhas para alfabetizarem seus alunos,
porém é comum entre as educadoras a opção por textos simples, como os presentes nas cartilhas para
trabalharem a leitura e a escrita durante e após a apropriação do sistema de escrita. Pretendíamos com essas
reflexões que as educadoras pudessem visualizar as diferenças qualitativas em se utilizar esses textos e os
que consideram a complexidade da dinâmica discursiva.
103
ortografia? Quais são as melhores estratégias didáticas para ensinar ortografia? O que o
educando pode compreender? O que ele precisa memorizar? Socialização das discussões.
Procedimentos
As educadoras socializaram a atividade que realizaram durante a semana, junto
aos educandos, que consistia em uma produção textual em dupla sem apoio. Uma das
educadoras, durante a socialização da atividade desenvolvida na semana, destacou que
quando os educandos dominam o gênero a ser produzido, os mesmos realizam a atividade
com maior tranquilidade e até mesmo demonstram a preocupação sobre as questões
ortográficas.
Após o relato da educadora acima, surgiu um questionamento relacionado aos
agrupamentos de educandos: esses devem ser sempre os mesmos ou se modificavam a
cada nova proposta?
A educadora que estava relatando a importância do conhecimento dos
educandos sobre os gêneros, argumentou que considerava pertinente que as duplas se
modificassem a cada atividade, visto que os educandos avançam em relação às suas
hipóteses de escrita.
Nesse momento surgiram algumas discussões em torno da importância da
aposta na autoria do educando, no trabalho que foi desenvolvido e na função social que a
escrita adquiriu, uma vez que os educandos se sentiam autores de textos que foram criados
por eles e que encontrariam interlocutores reais.
Foi comentado também que entre as educadoras, verifica-se um certo medo de
realizar atividades antes ainda não realizadas, sentem-se inseguros e se não forem
persistentes acabam desistindo, porém, quando se aposta no trabalho, percebe-se o
envolvimento e aprendizado de todos.
Outro aspecto que novamente foi enfatizado trata-se da cópia nos momentos de
produção e revisão coletiva, pois algumas educadoras relataram que os educandos não
gostam de copiar. A pesquisadora salientou que dependendo da proposta e objetivo da
atividade, a cópia não é indicada, pois inibe a participação na produção e na revisão
coletiva, a cópia, nesses casos, pode comprometer a qualidade do texto trabalhado.
Uma das educadoras comentou a importância da revisão de texto, visto que a
mesma acompanha todas as práticas de escrita, independente do momento da vida.
104
Terminado o diálogo e socialização de temas que envolvem a produção textual
significativa, a pesquisadora propôs às educadoras que em grupos refletissem, em torno das
seguintes questões, com base na leitura sugerida no encontro passado: Ortografia: ensinar e
aprender de Artur Gomes de Morais:
- Por que os alunos cometem erros de ortografia?
- Quais são as melhores estratégias didáticas para ensinar ortografia?
- O que o educando pode compreender?
- O que ele precisa memorizar?
Para as respostas relacionadas ao porquê os educandos cometem erros de
ortografia, as educadoras elencaram os seguintes motivos: desconhecimento das regras
ortográficas, escrevem de acordo com suas hipóteses e não de acordo com as regras,
regionalismo, falta de atenção, transcrição da fala e falta de leitura.
Com relação às melhores estratégias para ensinar ortografia, as educadoras
destacaram: a apresentação das regras ortográficas e a reflexão sobre as mesmas
observando palavras construídas e formuladas a partir do mesmo princípio.
Em relação ao questionamento sobre o que o educando pode compreender, as
educadoras apontaram as palavras que são escritas a partir de regras, e quanto ao que
precisam memorizar, sinalizaram as palavras que não possuem regras. Ainda foi
comentado pela pesquisadora que o melhor momento para se iniciar o ensino de ortografia
é quando os educandos já estão alfabetizados.
Após a socialização das reflexões suscitadas pelas questões acima, a
pesquisadora salientou que embora a leitura seja importante para o processo de ensino e
aprendizagem da língua, a mesma não garante a aprendizagem da ortografia, podemos até
memorizar a escrita correta de palavras, no entanto lemos por diferentes motivos, mas não
para refletir sobre a existência ou não de regras ortográficas.
A seguir foi proposta a leitura do anexo presente na pauta do encontro: Texto
adaptado do livro Ortografia: Ensinar e Aprender, de Artur Gomes de Morais, na qual se
destacou a ortografia como uma convenção social cujo objetivo é cristalizar na escrita as
diferentes maneiras de falar dos usuários de uma mesma língua, cabendo à escola ensiná-
la.
105
Com base ainda nos conceitos presentes no texto de Morais (2002), a
pesquisadora retomou as regularidades diretas, contextuais, morfológico-gramaticais e as
irregularidades ortográficas.
A partir das questões e reflexões sobre o texto acima, foi proposto às
educadoras um trabalho em grupo cujo objetivo era refletir e colocar em prática os
conceitos apresentados.
O encontro encerrou-se com a sugestão de trabalho a ser realizado junto aos
educandos, que consistia na produção individual do gênero trabalhado, sem apoio.
10ª Proposta de trabalho junto às Educadoras
Data: 06/10/2008
Proposta de Trabalho: Socializar as atividades desenvolvidas ao longo da semana, que
consistiam na reescrita de uma fábula conhecida e análise do trabalho desenvolvido com
base na sequência didática para o ensino de um gênero do discurso escrito.
Objetivo: O objetivo das socializações era o de apreender e avaliar a proposta de trabalho
com base na sequência didática de forma a verificar se o trabalho foi válido para as
educadoras e educandos participantes.
Procedimentos
No décimo encontro realizado, iniciamos com a leitura do Texto “As Cocadas”
de Cora Coralina, em seguida fizemos a leitura da pauta enfatizando que iríamos refletir
sobre a sequência didática que trabalhamos durante esse período.
A pesquisadora retomou o diálogo em torno da sequência didática focada no
processo de ensino e aprendizagem sobre os gêneros discursivos e recuperou a discussão
em relação ao trabalho com a ortografia tratada no encontro passado.
As educadoras iniciaram a socialização da atividade de reescrita individual que
realizaram no encontro passado junto aos educandos.
Salientaram uma transformação na produção dos educandos em relação aos
elementos de estrutura composicional, temática e estilo.
Foi enfatizado também pela pesquisadora que os conhecimentos sobre
gramática devem ser trabalhados, no entanto, quando estamos pensando na produção
textual, o primeiro elemento a ser desenvolvido é o gênero, pois é garantindo o como
106
escrever, o que escrever e o para quem escrever, focamos o olhar do educando para a
produção textual com função social e não somente para as regras que a constitui, os demais
elementos da língua serão objetos de reflexão posteriormente.
Com apoio das pesquisadoras, as educadoras relataram as etapas da sequência
didática percorrida ao longo da realização do Curso de Extensão. Enfatizaram que o
processo iniciou-se com o levantamento de quais conhecimentos os educandos possuem
sobre o gênero que iriam trabalhar, em seguida, constataram-se as lacunas existentes e
desenvolveram um trabalho que contemplou: leituras, recontos, desenvolvimento de
oficinas que objetivavam o estudo das características do gênero; reescritas coletivas, em
duplas e individuais; revisões coletivas, em duplas e individuas e produções sem apoio
coletivas, em duplas e individuais.
Dando continuidade, foi entregue às educadoras o artigo de POLATO, et. al.
(2008), que tratava de diversas sequências didáticas desenvolvidas com diferentes
conteúdos curriculares, com o objetivo de orientar os mesmos em relação ao uso das
sequências didáticas em contextos que não só privilegiem a língua materna.
Em seguida, as educadoras analisaram as sequências e de acordo com as
sugestões das pesquisadoras em grupos, planejaram o desenvolvimento de uma nova
sequência didática para o próximo mês, objetivando a apropriação de outro gênero.
Sendo assim, as educadoras planejaram uma nova sequência didática em que o
Ano focalizaria Fábulas; Ano Contos de Fadas; Ano e Série Contos de
Assombração e Série que sinalizou que havia dado início a uma nova sequência
didática para o ensino do gênero notícia.
Após, as pesquisadoras ressaltaram às educadoras a importância da
continuidade do trabalho desenvolvido, mesmo com o encerramento do Curso de Extensão
e agradeceram a colaboração de cada um. As pesquisadoras relataram que muitas
aprendizagens ocorreram durante esse processo e que seria interessante que socializassem
suas impressões sobre elas.
As educadoras a partir deste momento, socializaram que:
antes do Curso de Extensão trabalhavam com os gêneros, mas
pensavam que somente a realização de leituras diárias garantiriam as
aprendizagens;
107
agora, percebem a necessidade de um trabalho mais sistematizado,
organizado em sequências didáticas e aprofundado sobre as características do
gênero, para que os educandos possam também se apropriar do mesmo;
perceberam a importância de situações de escrita contextualizadas,
considerando-se a situação de interlocução de que a escrita é capaz;
observaram que o trabalho com o gênero fortaleceu a aprendizagem
dos educandos que estavam em processo de aquisição da linguagem escrita, pois o
trabalho com a reescrita permitiu que o mesmo refletisse sobre o sistema, porque a
estrutura composicional, a temática e o estilo já estavam construídos;
constataram a importância da atividade de revisão, porque os
educandos ao observarem a produção textual do colega, visualizaram em suas
próprias produções elementos que poderiam ser aprimorados, as produções não
eram mais entregues “limpinhas”, existiam marcas de revisão realizada pelo
próprio autor.
perceberam também que os educandos ao revisar tratavam de
elementos da língua que foram trabalhados no curso, obviamente que se utilizavam
de termos apropriados à sua linguagem, mas que estavam diretamente relacionados
aos conhecimentos que o educador refletia, apropriava-se e colocava em prática;
a prática de revisão da produção textual do outro proporcionou aos
educandos a apreciação da escrita do texto do colega;
relataram também que a sequência didática permitiu a visualização
inicial e final dos conteúdos a serem trabalhados como forma de garantir a
aprendizagem, o que proporcionou a segurança do educador para solicitar a
produção e a
do educando para produzir;
sinalizaram que antes do curso de Extensão concebiam a escrita
como uma habilidade que o educando poderia ter ou não, após o curso perceberam
que escrever não é somente uma habilidade, trata-se sim de algo que pode e deve
ser desenvolvido no processo de ensino e aprendizagem e que estas reflexões
deveriam ser ampliadas às educadoras que atuam nas séries finais do Ensino
Fundamental.
108
A pesquisadora chamou a atenção das educadoras para observarem seus
próprios processos de aprendizagem, pois à medida que conseguem compreendê-los,
também podem perceber os processos vivenciados pelos educandos, nada se constrói sem
um tempo necessário para que possamos elaborar, refletir e repensar o que está ao nosso
redor. A aprendizagem está associada ao sentido e à nossa significação.
No presente encontro, que foi o nosso último, definimos junto às educadoras,
como iríamos proceder para sistematizar os livros em coletâneas e após o mesmo foi
finalizado, ficamos de retornar junto aos educandos do Ano para revisar suas próprias
produções e formatação do livro.
A seguir apresentaremos as propostas de trabalho desenvolvidas junto aos
educandos.
1ª Proposta de trabalho junto aos Educandos
Data: 07/08/2008
Proposta de Trabalho: Reescrita de uma fábula, conforme o gênero selecionado pelas
educadoras dos 3ºs anos.
Objetivo: O objetivo da proposta era verificar quais conhecimentos os educandos
possuíam sobre o gênero para, a seguir, planejar as atividades da sequência didática que
pudessem assegurar a aprendizagem do mesmo. Para isso selecionamos uma fábula que
consideramos conhecida pelos educandos: A Tartaruga e a Lebre.
Procedimentos
A pesquisadora iniciou o encontro socializando aos educandos a proposta de
trabalho que havia sido planejada juntamente com as educadoras. Enfatizou-se que o
objetivo da atividade era verificar o que sabiam sobre a produção textual para que depois
pudessem planejar junto às educadoras novas atividades que os ajudariam a avançar em
seus conhecimentos, pois ao final do projeto faríamos uma coletânea de textos em que eles
seriam os autores. Neste dia compareceram ao encontro 24 educandos, que foram
organizados para sentarem individualmente.
Ainda em diálogo com os educandos, a pesquisadora ressaltou que se iriam
fazer uma coletânea de textos, estes deveriam ser escritos o melhor que pudessem, visto
que seriam posteriormente lidos pelo pai, mãe, irmãos e colegas.
109
A seguir a pesquisadora apresentou o autor da fábula que seria lida e perguntou
se já conheciam a mesma e os educandos comentaram que sim.
Mesmo os educandos afirmando terem conhecimento da história, foi solicitado
à pesquisadora que a lesse várias vezes. A leitura foi realizada com adaptações de vozes
conforme o aparecimento dos personagens e do narrador.
Em seguida, os educandos iniciaram a reescrita da fábula, alguns educandos
demonstraram dificuldade na realização da atividade, pois ainda não estavam
alfabetizados, sendo assim, o foco estava mais centrado no sistema e não na produção.
Nesse momento, pesquisadoras e educadora se aproximaram desses educandos e os
ajudaram a escrever o que estavam pensando.
Ao final da atividade três educandos listaram os nomes dos personagens e os
demais conseguiram reescrever a fábula. A duração dessa atividade foi de 2 horas.
2ª Proposta de trabalho junto aos Educandos
Data: 13/08/2008
Proposta de Trabalho: A segunda proposta de trabalho realizada junto aos educandos
consistiu na reescrita coletiva de uma bula gênero selecionado pelas educadoras do
ano. Para a realização desta atividade foram lidas aos educandos três versões da fábula “A
Cigarra e a Formiga” (ANEXO V)
Objetivo: O objetivo desta proposta era proporcionar aos educandos familiaridade
com o gênero, bem como das etapas de produção textual enfatizando as características da
fábula.
Procedimentos
Neste dia estavam presentes 21 educandos e a pesquisadora iniciou a aula
informando a eles sobre a proposta de trabalho que iriam realizar, explicou o que era
produzir um texto coletivamente, alguns educandos participaram do diálogo, afirmando
terem realizado esta atividade antes e que sabiam que era uma escrita para contar uma
história a outra pessoa.
A educadora da turma também interveio relembrando aos educandos sobre
atividades de reescrita que já haviam realizado.
110
Foi ressaltado pela pesquisadora que a reescrita que iriam produzir seria um
dos textos que comporiam a coletânea de textos, organizada em um livro, para que depois
os amigos, irmãos e pais pudessem compartilhar das histórias produzidas por eles, por esse
motivo, deveriam prestar atenção às versões que seriam lidas, para após produzirem uma
quarta versão que contemplasse as características do gênero fábula.
Em seguida, a pesquisadora apresentou o autor e o livro da primeira fábula,
BELLI (2005) e iniciou a leitura em voz alta. Durante a leitura a pesquisadora chamou a
atenção para as imagens contidas no livro e ia resgatando algumas ideias que compunham
a narrativa.
A segunda versão da fábula tratava-se da reescrita de LOBATO (1994), a
pesquisadora apresentou o autor e entregou uma cópia para que cada educando
acompanhasse a leitura, ao término da leitura foram estabelecidas algumas comparações da
primeira com a segunda versão lidas. O mesmo procedimento foi adotado com a leitura
compartilhada da terceira versão.
Terminada a leitura das três versões a pesquisadora orientou a atividade de
reconto, na qual os educandos relataram a história.
Foram realizadas três leituras diferenciadas com o intuito de proporcionar aos
educandos um repertório maior de elementos que constituem a fábula “A Cigarra e a
Formiga”, pois acreditamos que quanto mais informações obtiverem os educandos sobre a
narrativa, maior é a possibilidade de produzirem textos de qualidade, uma vez que os
textos lidos configuram-se em modalizações que auxiliam o que e como escrever.
Após a realização das leituras a educadora da turma assumiu a orientação das
atividades dando início ao registro da reescrita construída pelos educandos na lousa, tendo
o papel de escriba.
Os educandos dialogavam com a educadora da turma e com os demais colegas
até chegarem a um consenso de como ficaria a escrita. Muitas ideias, como expressões,
ações dos personagens, termos do narrador foram expostos, mas somente aqueles que
obtiveram consenso entre eles eram registrados na lousa.
A duração desta atividade foi aproximadamente três horas. Os educandos
permaneceram envolvidos, é evidente que em alguns momentos um grupo de educandos
participou mais que outro, mas todos deixaram suas marcas na reescrita coletiva.
111
Durante o registro da reescrita a educadora chamava a atenção dos educandos
tanto para aspectos relacionados à temática, estilo e estrutura composicional, quanto para
os elementos relacionados à gramática. Não deixando também de estabelecer comparação
da fábula com o conto de fadas, gênero este que os educandos mais dominavam até o
momento
16
.
3ª Proposta de trabalho junto aos Educandos
Data: 21/08/2008
Proposta de Trabalho: Os educandos deveriam analisar diferentes portadores textuais
com o gênero selecionado para o trabalho, estabelecendo comparações e o levantamento
das características comuns ao gênero.
Objetivo: A proposta do encontro do dia 21 de agosto objetivava que os educandos
entrassem em contato com portadores textuais do gênero fábulas, e observassem assim, as
características deste tipo de texto. Seguindo os mesmos encaminhamentos aplicados junto
às educadoras, a partir das observações dos educandos seria organizado um quadro que
contemplasse e ao mesmo tempo sistematizasse as características do gênero.
Procedimentos
A educadora da turma, já sabendo da proposta de trabalho previamente,
organizou as 23 crianças presentes em grupos compostos por três e quatro participantes, de
maneira que pelo menos um integrante dominasse a leitura fluente. Sendo assim, quando as
pesquisadoras chegaram os grupos já estavam organizados e prontos para desenvolverem a
atividade, pois a educadora já havia também dialogado sobre o que fariam.
Foram distribuídos alguns livros, previamente selecionados pelas
pesquisadoras e pela educadora da turma, que continham o gênero fábulas. A intenção era
que todos os educandos manipulassem, lessem, observassem as imagens e assim sem
nomear, percebessem a temática, o estilo e a estrutura composicional. Para que os
educandos se atentassem para esses elementos do gênero, foi solicitado que observassem o
título, os autores, a presença ou não de narrador, como iniciava e terminava a narrativa,
como se comportavam os personagens, etc.
16
Tal fato pode ser percebido através da realização das entrevistas com os educandos.
112
Os educandos apresentaram-se agitados no início da atividade, pois tratava-se
de um desafio diferente dos vivenciados na sala de aula. Todos queriam manusear o
material ao mesmo tempo, não respeitando os combinados iniciais, em que no centro da
mesa ficaria o livro e um dos componentes do grupo faria a leitura. Mas com a intervenção
das pesquisadoras e da educadora os educandos compreenderam a proposta e começaram a
realizar a atividade como planejada.
Em um segundo momento, foram entregues a cada educando fábulas impressas
(ANEXO VI), para também serem analisadas e organizadas em pastas - como uma
coletânea esta poderia ser levada para casa, ao contrário dos livros da biblioteca, pois
muitos responsáveis pelos educandos não haviam autorizado a retirada de livros, temiam
que os mesmos fossem perdidos ou estragados
17
.
Os educandos ficaram eufóricos com a entrega dos textos, liam, procuravam
identificar os personagens e as características orientadas para que observassem. A duração
desta etapa da atividade foi de 30 minutos. Depois a educadora chamou a atenção dos
educandos para a sistematização de alguns conceitos, oralmente. Perguntou aos educandos
o que entendiam por fábulas, os mesmos disseram tratar-se de histórias que possuem
moral, animais que falam como personagens e na moral tem uma ideia escondida, de um
ensinamento.
Após esse diálogo entre a educadora e os educandos em torno de algumas
características das fábulas, a educadora leu um texto informativo sobre o assunto, que
também foi distribuído aos educandos (ANEXO VII). Nele os educandos encontraram a
orientação para a elaboração de uma pesquisa que deveria ser realizada com os familiares
sobre o gênero.
Em seguida a educadora organizou um quadro, como o abaixo, que
contemplava alguns elementos característicos do gênero fábula.
A educadora combinou com os educandos que estes selecionariam duas fábulas
dentre todas as que já haviam lido para analisarem juntos, seguindo os aspectos do quadro,
este foi construído da seguinte maneira.
17
Tal fato também pode ser constatado a partir da realização das entrevistas com os educandos da turma.
113
Título Personagens Como
começa?
Como
termina?
Quando
acontece a
fábula?
Tem
narrador
Moral
A coruja e a
águia
Coruja, águia e
filhotes
A coruja e
a águia,
depois de
muita
briga...
...pois
olha, não
se
pareciam
nada com
o retrato
que deles
me fizeste.
Tempo
indeterminado.
Tem Quem ama
o feio,
bonito lhe
parece.
O galo e a
raposa
Galo e raposa. Numa
árvore...
... o galo
riu
sozinho.
Tempo
indeterminado.
Tem O prazer é
dobrado
quando se
vê o esperto
logrado.
A atividade do encontro encerrou-se com o término do preenchimento do
quadro.
4ª Proposta de trabalho junto aos Educandos
Data: 22/08/2008
Proposta de Trabalho: Reescrita de uma fábula em duplas.
Objetivo: A proposta de trabalho do dia 22 de agosto de 2008 objetivava que os
educandos em dupla reescrevessem uma fábula. Tínhamos a intenção de que todos
pudessem participar ativamente da atividade, mesmo para aqueles que ainda o foco era o
sistema de escrita, para alcançar tal objetivo, dividimos as duplas entre um escriba e um
relator, mas sempre ressaltando que ambos tinham a responsabilidade de organizar as
ideias que seriam registradas, nossa preocupação nesse momento era de que os educandos
pudessem produzir dentro das características do gênero já explicitado acima.
Procedimentos
No quarto encontro compareceram 21 educandos e a educadora os dividiu em
duplas para realizarem o trabalho proposto. Os educandos foram organizados de maneira
que um pudesse recontar e outro reescrever a fábula.
114
A proposta inicial era a de os educandos nas duplas negociassem a fábula que
iriam reescrever, mas em diálogo entre pesquisadoras e educadora, a última sugeriu que
alterássemos a proposta, pois acreditava que seria difícil ajudarmos os educandos na
sistematização de diferentes fábulas.
Sendo assim, a educadora solicitou aos educandos que elencassem os títulos de
três fábulas que gostariam de reescrever e eles sugeriram: “A galinha ruiva”, O leão e o
ratinho” e “Assembleia dos ratos”. Com base nesses títulos foi realizada uma votação entre
os educandos e a fábula “Assembleia dos ratos” foi selecionada pela maioria para ser
reescrita.
Para auxiliar os educandos a sistematizarem as ideias principais da fábula, bem
como de suas características, a educadora resgatou, do encontro anterior, o quadro com as
seguintes categorizações, que foram construídas oralmente pelos educandos:
Título Personagens Como
começa?
Como
termina?
Quando
acontece a
fábula?
Tem
narrador
Moral
Assembleia dos
ratos
Ratos e gato Um dia... ... e eles não
conseguiram
Tempo
indeterminado
Sim Falar é
fácil,
difícil é
fazer.
Após a construção do quadro, a educadora realizou a leitura da fábula:
Assembleia dos Ratos – versão de Roberto Belli - a pedido dos educandos.
Terminada a leitura os educandos iniciaram a reescrita da fábula, existiram
acordos entre eles de quem seria o escriba e quem seria o relator, observou-se que cada
dupla se organizou de maneira diferenciada, uns por meio do jogo “ímpar X par”
determinou quem seria o escriba e quem seria o relator, outros decidiram que ambos
escreveriam, mas trocariam de função a cada parágrafo, etc.
Assim, a atividade obteve seu desenvolvimento, durando cerca de duas horas,
todos participaram e conseguiram reescrever a fábula.
5ª Proposta de trabalho junto aos Educandos
Data: 27/08/2008
115
Proposta de Trabalho: A proposta de trabalho neste dia junto aos educandos era revisar
coletivamente um texto produzido individualmente por um dos educandos.
Objetivo: O objetivo era o de estimular os educandos a perceberem que para ser um bom
escritor é necessário também ser um bom revisor. Para concretizar a nossa proposta,
chegamos mais cedo na Unidade Escolar conforme combinado com a educadora da turma,
para selecionarmos o que seria revisado, explicitamos o que havíamos pensado e deixamos
que também sinalizasse suas impressões sobre a atividade. Juntas selecionamos o texto de
um educando para ser revisado, desde que o mesmo concordasse que seu texto fosse
utilizado na atividade.
Procedimentos
A pesquisadora iniciou o encontro ressaltando aos 24 educandos presentes que
a atividade de revisão faz parte do processo de produção textual, voltou a contextualizar a
escrita como processo social em que quando escrevemos temos que sempre pensar no
interlocutor, e para fazermos isso, é necessário que desempenhemos esse papel, verificando
se na escrita é possível a compreensão do que está registrado.
Para apoiar os educandos na atividade que seria desenvolvida, a pesquisadora,
mais uma vez realizou o levantamento oral das características do gênero trabalhado nos 3ºs
Anos, a fábula. Em seguida a pesquisadora pediu a autorização do educando para realizar a
revisão de sua produção e o mesmo consentiu, enfatizou-se que cada um de nós possui
habilidades e conhecimentos diferentes e isso não quer dizer que sabemos mais ou menos
do que o outro, mas sim que temos experiências únicas que se complementam dentro de
um contexto maior, assim, o que não se sabe fazer hoje, poderá vir a saber com a ajuda do
outro. Sendo assim, todos que participam deste processo terão a oportunidade de receber a
ajuda do colega da turma, quando chegar a vez de revisar o seu texto.
Após essa introdução à atividade, a educadora da turma registrou na lousa o
texto do educando na íntegra. Logo em seguida, iniciou a revisão do texto, optando pela
ênfase nos aspectos relacionados à pontuação e ortografia do que pela recuperação da
fábula e isso levou os educandos a visualizarem somente esses elementos, sem
preocupação ainda com a organização dos fatos.
116
As pesquisadoras ao perceberem a inversão da proposta inicial - que era a
organização das ideias para que ocorresse a interlocução - interviram no encaminhamento
da atividade, realizamos alguns questionamentos que favoreceram os educandos a
refletirem sobre a narrativa, reorganizando a apresentação dos fatos, para maior
entendimento.
A partir das intervenções das pesquisadoras, a educadora da turma percebeu
que havia perdido o foco inicial e reorganizou os encaminhamentos da atividade,
aproveitando as sugestões dos educandos para aprimorar o texto. Porém os educandos
acabavam se dispersando, pois não era realizada a leitura das alterações feitas no texto.
Novamente uma das pesquisadoras interveio, chamando a atenção para alguns
elementos que ainda não estavam entendidos, sugeriu-se então a leitura do texto, desde o
início e o fez por várias vezes, solicitando aos educandos que também a acompanhassem.
Com essa atitude a pesquisadora tinha por objetivo proporcionar a participação e
envolvimento de todos na atividade, mesmo para aqueles que não liam e nem escreviam
convencionalmente.
A atividade teve duração de aproximadamente duas horas e apesar de alguns
momentos de dispersão os educandos conseguiram atingir o objetivo proposto.
6ª Proposta de trabalho junto aos Educandos
Data: 02/09/2008
Proposta de Trabalho: A proposta de trabalho planejada para esse encontro junto aos
educandos consistiu na revisão da reescrita “Assembléia dos Ratos”. Os educandos seriam
organizados em duplas para analisarem a reescrita de outra dupla de educandos.
Objetivo: O objetivo desta proposta era sensibilizar os educandos para um novo olhar
sobre as reescritas, com o intuito de perceberem que não basta somente escrever, é preciso
ler e revisar, considerando o interlocutor do texto que se está produzindo. Para isso, a
educadora da turma selecionou previamente as reescritas considerando o perfil de cada
dupla em relação aos elementos da língua materna, permitindo assim, que cada um pudesse
oferecer sua contribuição ao processo de revisão.
Procedimentos
117
Com os 21 educandos já reunidos em 9 duplas e 1 trio, a pesquisadora explicou
os procedimentos da revisão. Os grupos deveriam ler a reescrita e, em uma folha a parte,
registrar suas percepções sobre a análise da mesma. A pesquisadora enfatizou que no
processo de revisão, os educandos deveriam se atentar para verificar se a reescrita
contemplava todas as características do gênero fábulas. Para isso, resgatou oralmente as
características da fábula “O Leão e o Ratinho”, destacando a presença: do título, como
iniciava a narrativa, o conflito, o desfecho, o narrador, quais outros gêneros se
encontravam dentro do gênero narrativo, como o diálogo, qual a lição de moral que esta
trazia etc.
Os educandos iniciaram a atividade de revisão, com a ajuda da educadora e da
pesquisadora, liam e registravam suas impressões na folha a parte.
Para a realização desta atividade foram aproximadamente duas horas.
7ª Proposta de trabalho junto aos Educandos
Data: 09/09/2008
Proposta de Trabalho: Produção coletiva de uma fábula sem apoio
Objetivo: A proposta de trabalho objetivou que coletivamente os educandos produzissem
uma fábula com a autoria, visto que até então o trabalho havia privilegiado produções com
apoio, as reescritas.
Procedimentos
Ao iniciarmos a atividade os 22 educandos presentes estavam sentados
individualmente, assim como a educadora considerou que fosse mais adequado para a
realização da produção coletiva sem apoio.
A pesquisadora explicou como a atividade seria realizada, enfatizando que se
tratava da construção de uma fábula ainda não existente, salientou-se que até então o que
haviam produzido eram reescritas de fábulas já publicadas e a presente proposta era
elaborarem um texto de autoria própria que se seria registrada para compor a coletânea da
turma.
118
Para iniciar a atividade a educadora da turma retomou alguns combinados junto
com os educandos para organizar e garantir a participação de todos, por exemplo: levantar
as mãos antes de sugerir, todos devem opinar, evitar falar junto com outros colegas, etc.
Foi realizado um resgate oralmente junto aos educados das características que
geralmente aparecem nas fábulas, visando que os mesmos se orientassem por elas na
elaboração da produção sem apoio.
A educadora da turma por orientação das pesquisadoras sistematizou na lousa
as sugestões que os educandos pontuaram para a elaboração de um roteiro que estruturasse
a narrativa, contemplando os elementos essenciais para compor a história que inventariam:
quem são os personagens que fariam parte, como iniciaria, como terminaria, qual o conflito
e o desfecho e outros. No momento da seleção dos personagens, foi necessário que a
educadora realizasse uma votação de quais animais fariam parte da fábula. Os educandos
sugeriram alguns animais que depois foram agrupados com características opostas corvo
e leoa, tartaruga e tigre, urso e coelho – sendo que, a dupla eleita foi o corvo e a leoa.
A partir das sugestões dos educandos a educadora começou a registrar a
história que a turma relatava, assim constituindo a mesma de forma que contemplava os
elementos já predefinidos anteriormente. Enfatiza-se que em cada parágrafo construído, a
educadora retomava a leitura do texto – com o uso de uma régua
18
–, permitindo que todos
educandos participassem da elaboração do mesmo, sem se dispersarem.
A participação dos educandos foi intensa e o diálogo estabelecido entre os
colegas e a educadora permitiram uma reflexão sobre o gênero e o texto foi construído
centrado na temática, estilo e estrutura composicional. Pela primeira vez observamos que
os elementos gramaticais ficaram em segundo plano, ou seja, eles estavam presentes no
texto, porém a educadora conduziu de maneira que o foco não centrou-se neles.
A atividade durou aproximadamente duas horas e meia.
8ª Proposta de trabalho junto aos Educandos
Data: 16/09/2008
Proposta de Trabalho: Produção em dupla sem apoio.
18
Ressaltamos que o destaque para a realização da leitura com o uso de uma régua torna-se fundamental para
localizar as palavras que estão sendo lidas, permitindo assim que o educandos possam estabelecer diferentes
relações, por exemplo a de fonema-grafema.
119
Objetivo: O objetivo desta proposta era verificar o quanto os educandos haviam se
apropriado do gênero estudado.
Procedimentos
Conforme combinado com a educadora da turma, ao chegarmos à sala, os 23
educandos estavam organizados em 11 duplas, sendo que uma criança desenvolveria a
atividade sozinha, pois apresentava autonomia para escrever uma fábula sem apoio.
A pesquisadora socializou junto aos educandos a proposta da atividade,
ressaltando a função que a produção ganharia, uma vez que a mesma faria parte da
coletânea de fábulas produzida pela turma. Resgatou oralmente as características do gênero
que iriam produzir e salientou a importância de decidirem em parceria quais personagens
fariam parte da narrativa, assim como o conflito, o desfecho e a moral da fábula.
Para exemplificar os conceitos de conflito e desfecho, a pesquisadora lembrou
junto aos educandos os episódios da fábula “O Leão e o Ratinho”, em que enfatizou o
problema a ser solucionado pelo leão que era o de se desvencilhar da armadilha e o
desfecho que estava relacionado a ajuda despendida pelo ratinho. Também exemplificou os
mesmos aspectos utilizando-se da fábula “A Tartaruga e a Lebre”.
Após a explanação dos elementos que as bulas deveriam conter, a
pesquisadora fez alguns combinados junto aos educandos, sobre quem iria registrar a
narrativa, sinalizando que o colega que não fosse escrever também participaria da mesma,
indicando os possíveis erros, além de ajudar o escriba a elaborar o texto.
Foi enfatizada também a importância da leitura durante o processo de
construção da fábula, tomando-se o cuidado de registrar os detalhes dos fatos para que o
leitor pudesse compreender o contexto e a mensagem da fábula.
Rapidamente os educandos compreenderam a proposta e foram se organizando
para a realização da mesma, tiraram par ou ímpar para decidirem quem escrevia e logo
iniciaram a produção.
Todos se envolveram, o que sinalizou-nos a apropriação do gênero trabalhado e
a função que esta escrita estava representando, liam, reliam, faziam correções, até mesmo
com o auxílio de uma régua, na tentativa de produzir para o outro.
A atividade teve aproximadamente a duração de duas horas.
120
10ª Proposta de trabalho junto aos Educandos
Data: 23/09/2008
Proposta de Trabalho: Produção escrita individual de uma fábula sem apoio.
Objetivo: O objetivo era constatar quais conhecimentos os educandos já haviam adquirido
sobre o gênero trabalhado. A solicitação de uma produção individual sem apoio deu-se
após a realização de várias leituras, reescritas e revisões coletivas e individuais. No início
do desenvolvimento da pesquisa, acreditávamos que a coletânea seria composta
unicamente de reescritas, no entanto, o envolvimento da educadora e dos educandos
sinalizava a construção de conhecimentos que superavam o esperado, por este motivo
propusemos a produção individual sem apoio.
Procedimentos
A educadora, já tendo conhecimento da proposta de trabalho a ser realizada
junto aos 21 educandos, iniciou o encontro socializando a atividade e a forma como se
organizariam para desenvolverem a mesma. Dialogaram sobre as características do gênero
fábulas, partindo do conhecido que havia sido construído até então. Os educandos
sinalizaram a importância de escreverem a narrativa contemplando os aspectos como título,
presença de animais, narrador, conflito, desfecho, moral e outros.
Salientamos que a cada elemento apontado na fala dos educandos, a educadora
questionava tentando apreender se de fato sabiam o que estavam destacando.
Por várias vezes a educadora explicou aos educandos que a atividade que
realizariam seria a de criação de uma fábula e não a de cópia ou reescrita, utilizando-se
para isso da exemplificação de outras atividades já realizadas.
A educadora também discutiu junto aos educandos a importância do processo
de revisão, para a constatação se de fato os elementos que caracterizam o gênero foram
contemplados, deixando de lado o foco gramatical, centrando-se na produção, o que
garantiu aos educandos trazer aos seus textos os elementos do gênero trabalhado.
Todos os educandos presentes conseguiram realizar a atividade, com um olhar
focado na produção e revisão, visto que tinham por objetivo a leitura do interlocutor.
Durante a produção escrita, a educadora e as pesquisadoras acompanharam o processo de
121
escrita dos educandos, bem como o de revisão, sugeriram sempre a leitura feita pelos
educandos e alteração quando ambos percebiam a existência de algo que dificultava a
compreensão do que estava sendo escrito.
Essa atividade foi realizada em um período aproximado de duas horas.
11ª Proposta de trabalho junto aos Educandos
Data: 30/09/2008
Proposta de Trabalho: Foram apresentados dois encontros seguidos junto aos educandos,
pois no dia 29 de setembro de 2008 as educadoras receberam na Unidade Escolar um
grupo de profissionais da saúde. A atividade proposta com os educandos neste dia foi a de
reescrita individual de uma fábula conhecida.
Objetivo: O objetivo da atividade era perceber como os educandos haviam se
desenvolvido em relação à primeira reescrita proposta. A ideia inicial era que as crianças
selecionassem, dentre as várias fábulas já conhecidas, uma para reescrever.
Procedimentos
Para a realização da atividade de reescrita individual, a educadora socializou a
proposta de trabalho aos 24 educandos presentes e organizou a sala de forma que as
carteiras foram separadas umas das outras, dando a visualização de um trabalho individual.
Em seguida, a educadora sugeriu à pesquisadora uma alteração no processo de
seleção das fábulas pelos educandos, indicando que considerava difícil a retomada de cada
fábula entre uma variedade de opções. Diante do argumento explicitado pela educadora, a
pesquisadora acatou a sugestão. Sendo assim, a educadora conduziu a escolha dos títulos,
sugerindo aos educandos que falassem alguns títulos de fábulas conhecidas, ouvidas e
lidas, para que listasse na lousa e para selecionarem, entre todas, apenas quatro e dessas
escolhessem uma para a atividade de reescrita.
Os educandos apontaram algumas fábulas e a educadora registrou os quatro
títulos correspondentes a elas: “A pomba e a formiga”, “A cigarra e a formiga”, “O leão e
o mosquito” e “A cadela e sua companheira”.
Dentre os títulos apontados pelos educandos os mesmos pediram que a
educadora os ajudassem a fazer o reconto da fábula “A cadela e sua companheira”. Após o
122
reconto os educandos iniciaram a reescrita, a educadora e as pesquisadoras ajudaram os
educandos que estavam no processo de aquisição do sistema de escrita.
Durante a realização da atividade foi possível perceber que alguns educandos
tiveram dificuldades em resgatar a fábula selecionada, visto que não foi feita a leitura e o
reconto de todas. Tal fato sinalizou a importância da leitura, mesmo quando o gênero é
conhecido pelos educandos, pois embora não seja cópia, a reescrita requer a paráfrase do
texto original.
Para essa atividade os educandos levaram aproximadamente duas horas.
12ª Proposta de trabalho junto aos Educandos
Data: 06/11/2008
Proposta de Trabalho: Apresentar a primeira versão da coletânea de fábulas aos
educandos, realizar a leitura e apresentação, para isso fizemos uso do Data Show.
Objetivo: O objetivo deste encontro era o socializar, discutir e revisar junto aos educandos
a organização da coletânea de fábulas, pretendíamos envolvê-los nesse processo final da
produção, destacando a importância da revisão e socializando algumas mudanças
realizadas por nós em seus textos, como a inserção de figuras.
Procedimentos
Após um mês de trabalho na sistematização da coletânea, as pesquisadoras se
reuniram junto aos 23 educandos para analisarem a organização da mesma. Para isso, o
encontro foi realizado na sala de deo da Biblioteca Escola do Futuro, na própria unidade
escolar. As pesquisadoras levaram computador e Data Show afim de que todos pudessem
visualizar a coletânea para revisarem e proporem mudanças à sua organização.
A pesquisadora iniciou a análise, projetando a imagem da coletânea de fábulas
na parede, fazendo a leitura de cada uma das páginas, já que os educandos se empenhavam
e participavam, propondo mudanças e reflexões sobre o que estava sendo apresentado.
Os educandos apresentaram-se ansiosos para verem suas produções projetadas
e em um certo momento da análise, os autores pediram para lerem suas produções.
Ressaltamos que o envolvimento era grande, todos se empenhavam em auxiliar o colega a
ler o que estava projetado. Antecipavam o título, dialogavam sobre concordâncias, para
chegarem às versões finais das produções.
123
Ao final da análise, a pesquisadora questionou os educandos sobre qual o tipo
de letra que gostariam que a coletânea fosse registrada, para isso, levou o livro formatado
nos dois tipos de letras: imprensas maiúscula e minúscula. Argumentando que seria
interessante que as crianças escolhessem o tipo de letra que mais auxiliariam na leitura dos
textos.
Os educandos se dividiram em relação às opiniões quanto ao tipo de letra,
percebendo e compreendendo o processo de aquisição da escrita, as pesquisadoras já
estavam encaminhando a discussão no sentido de possibilitar a impressão da coletânea nos
dois tipos de letras sugeridos. Porém, neste momento, a diretora da escola, iniciou uma
discussão junto aos educandos sobre o uso social da letra de imprensa minúscula na
impressão de livros, argumentando que como de fato haviam confeccionado um livro, este
deveria ser impresso, utilizando para isso o recurso da letra de impressa minúscula. A
diretora também enfatizou que a maioria dos livros são impressos com a letra minúscula.
Apesar dos argumentos apresentados pela diretora, os educandos ainda se
posicionaram a favor da utilização das duas propostas de escritas, porém, a educadora da
turma, também se posicionou a favor da diretora e sugeriu uma nova votação, nesta venceu
a impressão do livro com letra de imprensa minúscula, por um voto.
Embora as pesquisadoras tenham consciência de que a democratização do
conhecimento e das aprendizagens ocorra por meio do diálogo e não pelo voto, naquele
momento, a posição de poder, ocupada pela diretora, pode ter influenciado a opção da
professora e dos educandos.
Acreditamos que para a escrita no momento de discussão entre diretora,
professora, pesquisadoras e crianças assumiu dois significados distintos: o primeiro,
defendido pela diretora e posteriormente apoiado pela professora da turma era a de
formalização do livro, compreendido como um objeto que deveria obedecer a formatação
padrão, que é a escrita com letra de impressa minúscula; e o segundo, socializado pelas
pesquisadoras e apoiado pelas crianças que era de tomar mais uma vez a escrita enquanto
prática social, necessitando da interlocução entre leitor e escritor, para isso, os
interlocutores deveriam, minimamente ler o livro para interagir com ele, diante do fato de
que algumas crianças acabaram de se apropriar do sistema de escrita, a letra de impressa
maiúscula garantiria essa interação.
Para essa atividade foram utilizadas duas horas.
124
Findamos aqui a descrição dos encontros, realizados junto às educadoras e
educandos, que compuseram o Curso de Extensão sobre a temática da produção textual nas
séries/anos iniciais do ensino fundamental.
3.5. Organização dos dados para análise
Após a coleta dos dados, os mesmos foram organizados por temática de forma
a contemplar nossa questão de pesquisa e os objetivos traçados. Sendo assim, através das
transcrições das entrevistas realizadas com a educadora buscamos traçar um paralelo entre
as concepções prévias, relacionadas à temática da produção textual pautada nos gêneros
discursivos enquanto objeto de ensino e àquelas presentes após a realização do Curso de
Extensão.
Os encontros, os realizados junto às educadoras e educandos, juntamente com
as propostas de intervenção, foram filmados e gravados em DVDs e visualizados várias
vezes, destas gravações realizamos transcrições dos diálogos que aconteceram tanto no
curso de formação das educadoras, quanto dos encontros junto aos educandos, nestas
transcrições destacamos os diálogos por temáticas de forma a contemplar nossos objetivos
propostos, que são: a) verificar quais conhecimentos as educadoras possuíam sobre os
gêneros discursivos enquanto objeto de ensino; b) verificar quais conhecimentos foram
construídos ao longo da realização do Curso de Extensão que procurou enfocar a sequência
didática como estratégia para o ensino de um gênero do discurso escrito; c) relacionar os
conhecimentos que as educadoras tinham e que afirmaram ter aprendido; d) analisar o que
as educadoras afirmaram sobre as aprendizagens dos educandos durante e após a realização
da sequência didática.
A seguir apresentamos nossa análise dos dados.
125
CAPÍTULO IV
NAS TESSITURAS DO CAMINHO...: ANÁLISE DOS DADOS
A prática docente crítica, envolve o
movimento dinâmico, dialético, entre o
fazer e o pensar sobre o fazer [...]. Por
isso é que, na formação permanente dos
professores, o movimento fundamental é
o da reflexão crítica sobre a prática
(Paulo Freire, Pedagogia da Autonomia,
p. 38-39).
Conforme já sinalizamos em nosso referencial teórico, é de grande importância
a entrada da criança no ambiente escolar, pois as relações presentes neste ambiente
proporcionarão a ampliação das situações de interlocução que a criança participa. A escola
será responsável pelo desenvolvimento e adequação da linguagem, tanto oral, quanto
escrita às diversas situações interlocutivas que ela virá a participar.
Nesse contexto, chamamos a atenção para o fato de que embora os documentos
oficiais que tratam do ensino e da aprendizagem da língua materna enfatizem em suas
propostas a linguagem como atividade discursiva e os gêneros orais e escritos como
objetos de ensino, nem sempre ficam explícitas aos educadores as orientações
metodológicas que garantam o ensino da atividade de produção textual em consonância
com tais propostas.
Ainda em nosso referencial, destacamos o papel do educador enquanto
mediador entre os educandos e os conhecimentos socialmente elaborados. Enfatizamos que
os conhecimentos teóricos devam ser apropriados pelos educadores de forma a se tornarem
instrumentos de sua prática. Sendo assim, a partir das sinalizações das educadoras, que
participam da ACIEPE Comunidades de Aprendizagem, acerca das dificuldades sentidas
por eles quanto ao trabalho com a produção textual, elaboramos um Curso de Extensão
126
com a temática da produção textual nas séries/anos iniciais do Ensino Fundamental, no
qual enfocamos os gêneros discursivos como objetos de ensino e a utilização da sequência
didática como estratégia para que o mesmo seja apropriado pelo educando, levando-o a
produzir textualmente, contemplando as marcas características do gênero e se
considerando a situação interlocutiva.
Durante a realização do Curso de Extensão tivemos a oportunidade de discutir
sobre as diferentes concepções de linguagem que orientam a prática pedagógica
(GERALDI, 1990), bem como entrar em contato com os trabalhos mais atuais de
pesquisadores que enfatizam o trabalho com as sequências didáticas como uma alternativa
que possa garantir a aprendizagem de um gênero do discurso escrito (DOLZ, et.al., 2004).
A seguir apresentaremos em cada tópico constituinte do capítulo as diretrizes
de análise utilizadas que referem-se: a) aos conhecimentos que as educadoras possuíam
sobre os gêneros discursivos enquanto objeto de ensino; b) os que foram construídos ao
longo da realização do Curso de Extensão que procurou enfocar a sequência didática como
estratégia para o ensino de um gênero do discurso escrito; c) a relação entre os
conhecimentos que as educadoras tinham e os que afirmaram ter aprendido; d) e as análises
do que as educadoras afirmaram sobre as aprendizagens dos educandos durante e após a
realização da sequência didática.
4.1. Os conhecimentos sobre os gêneros discursivos enquanto objeto de
ensino: as práticas de produção textual.
Conforme sinalizamos em nosso referencial teórico, a prática de produção
textual que enfoca os gêneros discursivos enquanto objeto de ensino sistematizado é algo
recente. A escola, durante muito tempo, buscou transformar a língua em um objeto de
ensino, mas ao fazer isso descaracterizou-a ao não considerar a dinâmica dos processos
interlocutivos.
As análises presentes neste tópico referem-se aos conhecimentos sobre
produção textual antes da participação no Curso de Extensão sobre a temática, para isso
utilizamo-nos da primeira entrevista realizada junto à educadora da turma de 3º Ano
(APÊNDICE I).
127
Vejamos a seguir, a fala da educadora quando solicitamos que buscasse
relembrar a prática de produção textual no momento em que era aluna:
Olha, o que eu me lembro, do texto é que eles davam o título. O que eu
guardava, porque eu tenho uma dificuldade também para escrever, até
hoje, fica difícil. Então, às vezes você pensa legal, mas na hora de
escrever faltam algumas coisas, era assim: um dia na fazenda, um dia de
sol, um dia na piscina, as rias. Ah, eu vou dar um título e vocês vão
fazer uma produção, vão fazer uma história. E às vezes era a finalização
de uma história, eles davam a metade, davam o comecinho e você tinha
que terminar, nada diferente, que eu me lembre.
Com base no excerto acima, podemos afirmar que o processo de escolarização
vivido pela educadora, pautava-se no ensino normativo da língua, acreditava-se então, que
bastava conhecer as regras gramaticais para se escrever bem. Sendo assim, verificamos que
os textos produzidos não eram vistos ou tomados como objeto de ensino propriamente dito.
Segundo Rojo e Cordeiro (2004), foi a partir da década de 1980 que a ideia de texto como
objeto de ensino-aprendizagem da língua materna começou a circular no Brasil,
inicialmente em propostas e programas em diferentes estados do país.
Solicitamos à educadora que buscasse traçar um paralelo entre as suas
produções, quando ainda aluna e as de seus educandos, quanto a esse paralelo ela afirmou:
O meu texto era pobre, ele saía mais no prazo mesmo. Os dos alunos,
quando eu peguei uma 2ª série, você percebe que tem alunos que tem um
contexto legal, você percebe que além daquilo que você ensinou, ele
conseguiu ampliar. Hoje a criança fica mais livre para produzir, olha isso
daqui não pode, isso também não pode, então hoje não tem aquela
cobrança como era cobrado naquela época, porque assim, você tinha
que seguir regras, você tinha que seguir a norma. Nessa época aqui a
gente fica um pouco mais livre, o aluno pode se aproveitar daquilo que
conhece e colocar na folha, antigamente não, tinha que ser o
conhecimento do professor. Acho que hoje a criança está liberada para
poder se expressar.
Com relação ao período em que a professora estudou, a ngua era considerada
um código e a produção escrita uma combinação de palavras e frases para compor o texto
que focava as estruturas corretas, como emprego dos substantivos, verbos, pronomes, entre
outros. A liberdade a que a educadora se refere reside sobre o fato de que substancialmente
128
o foco do ensino da língua materna tem se alterado no sentido de não mais residir
unicamente sobre o ensino das nomenclaturas e regras gramaticais. Voltaremos a comentar
a percepção da educadora ao afirmar: Acho que hoje a criança está liberada para poder se
expressar, pois acreditamos que a principal dificuldade da prática da produção textual
reside no desconhecimento do que, como e porque escrever.
No excerto a seguir, retirado de uma das falas da educadora no momento da
realização da entrevista, é possível apreendermos sua concepção de produção textual.
A produção de texto, no meu entender hoje, seria o aluno que ou você
um texto, ou um título ou uma reescrita e que ele consiga por no papel,
com clareza, com coerência, aquilo que você está propondo, então vamos
fazer uma reescrita... e eu consiga entender essa reescrita, usando ou não
a paragrafação, a pontuação, porque isso é a estrutura. Então, eu acho
que produção de texto é quando a criança coloca aquilo que você pediu,
ou aquilo que é desejado no papel e que você entenda.
Observamos no destaque, que a concepção de produção textual não se distancia
muito daquela apresentada de quando ela era educanda: escrever aquilo que o professor
pede.
Concluímos, com base no excerto acima que a educadora sinalizou a
necessidade da coesão e da coerência como elementos essenciais para se ter um texto,
afinal o escritor escreve para ser compreendido pelo leitor, no caso a educadora. Além
dessa condição, a educadora também apontou a necessidade de escrever dentro de um
gênero proposto: desde que se tenha paragrafação e pontuação.
Verificamos assim, que a concepção de produção textual apresentada considera
o educador como interlocutor dos textos produzidos, ou seja, o educador é aquele que
solicita a produção e é também o único que a lê.
Com base em Araújo (2000) podemos afirmar que como mediador da atividade
de aprendizagem, o educador deve intervir intencionalmente no processo de apropriação-
objetivação do educando, contribuindo para seu processo de humanização. Parece-nos
então, que a atividade educativa tem se distanciado de seu objetivo, pois a prática de
escrita se apresentou como carente de significado e sentido, uma vez que não era
concebida enquanto atividade discursiva.
129
Quanto aos elementos da produção textual, a educadora pontuou durante a
realização da entrevista que:
É entender a mensagem da história, porque às vezes a criança conta pra
gente a história muito bem, mas na hora de passar para a escrita, fica
vago. Então “a menina dançou com um vestido rosa”, e chega para
escrever e ela diminui completamente o que era pra ser escrito. Como que
tem que ser pra ser uma boa produção, ver se ela sabe colocar o
parágrafo, a pontuação, ver se ela tem coerência e coesão, o início, o
meio e o fim, a forma que é um texto, se é receita, se é em forma de
parlenda, em forma de poesia, aí vai depender do que a pessoa propõe.
Os elementos como: fazer uso de parágrafo, pontuação, escrever com coesão e
coerência eram esperados na produção textual. Verificamos também que a forma do texto
assumia importância receita, parlenda, poesia porém, da forma como é expressa: vai
depender do que a pessoa propõe, nos levou a acreditar que tais propostas de escrita, as
que consideram o gênero discursivo, não eram solicitadas e trabalhadas pela professora.
Observamos, a partir da leitura do excerto a seguir, como a educadora da turma
costumava solicitar a produção textual em sua sala de aula.
é aquilo que eu acho que é. Porque eu fiz Letra e Vida, então um
pouquinho eu consegui captar, então, se eu vou fazer uma reescrita, eu
leio, não vou dar pra eles lerem, porque eu quero que eles escrevam, se
for uma parlenda eu leio três vezes, se for uma cantiga, eu procuro fazer
de coisas que eles conhecem, se for uma reescrita, tem a cantiga que
eles sabem de memória. Tem a produção escrita individual, em que eu
não interfiro, então eu tenho que colocar assim, ou um roteiro, ou com as
figuras, o que as pessoas estão fazendo, o que elas estão sentindo, no
início é uma descrição, então depois de fazer a descrição eles fazem a
produção de texto, então é dessa forma eu procuro trabalhar com os
alunos.
A partir da leitura, ficou-nos evidente a influência do Curso Letra e Vida,
tratou-se de um curso de formação continuada oferecido aos educadores da rede municipal
de ensino. Retomamos aqui o fato explicitado por Alves (2007), de que muitos
educadores não tiveram a oportunidade de discutirem e refletirem em torno do trabalho
com gêneros do discurso em seus cursos de formação inicial, portanto, as reflexões
130
suscitadas durante a realização do Curso de Extensão orientaram algumas práticas da
educadora entrevistada.
Com base em Mello (1998), o curso de formação inicial é condição necessária
para ser professor, contudo, a formação continuada cotidiana é que garantirá a aquisição de
competência e saberes necessários à prática educativa.
Segundo Mello (ibid.), Reali e Reyes (2007), os cursos de formação inicial e
continuada, na maioria das vezes, concebem o professor como um técnico que bastará
seguir modelos para que enfrentem as dificuldades e complexidades da profissão docente.
Esses modelos de formação não concebem o educador como um sujeito crítico e reflexivo
sobre a própria prática que desenvolve.
Nesse sentido, os cursos de formação que concebem o educador como
reflexivo, objetivam formar professores competentes, capazes de mobilizar diferentes
conteúdos, conhecimentos e habilidades que foram conquistadas ao longo da vida para a
realização das atividades relacionadas à sua profissão.
Ainda considerando o excerto acima, a educadora sinalizou a necessidade de
trabalho com textos que as crianças conhecem de memória, no caso das crianças que ainda
não se apropriaram do sistema de escrita, essa concepção de trabalho é uma das práticas
enfatizadas pelo Curso Letra e Vida, que dentre outros aspectos, buscou oferecer aos
educadores aportes metodológicos de como trabalhar com relação aos níveis de aquisição
da linguagem escrita, descritos por Emília Ferreiro.
Para o que a educadora chamava de produção escrita individual, observamos
que esse trabalho pautava-se na produção que se orientava por um roteiro e/ou pela
descrição de figuras. Propostas de produção textual como estas que fazem uso de
sequências de gravuras, produção a partir de uma única imagem e a produção com
roteiro, foram objetos de reflexão do primeiro e do segundo encontros realizados com as
educadoras. Nesses encontros tivemos a oportunidade de contrapor a concepção de
linguagem que orientam tais atividades, que desconsideram a ngua como forma de
interação (GERALDI, 1990).
Nesse sentido, é que retomamos Bakhtin (2004) e Freire (1987,1992 e 1996),
pois tanto sujeito quanto língua se constituem nos processos interativos, para esses autores
é no diálogo que construímos os recursos expressivos sobre os quais os pensamentos são
por nós organizados, expostos, compreendidos e transformados.
131
Durante a realização do Encontro com Educadoras, realizado no dia
11/08/2008 as educadoras manifestaram algumas reflexões. Com relação aos blocos
analisados das produções escritas realizadas a partir de gravuras, as educadoras
observaram que quando o educando escreve seguindo tal proposta sua produção fica
limitada, restringindo-se à descrição do observado na imagem, visto que a leitura realizada
da imagem depende de suas vivências e de seu conhecimento de mundo. Já o educador,
quando propõe tal atividade, foca-se novamente no sistema de escrita, necessitando
respaldar seu trabalho a partir das características do gênero, assim como explicitar e
garantir a contextualização da atividade em uma situação interlocutiva para proporcionar
avanços aos educandos.
Quanto às produções realizadas com base nas sequências de gravuras, as
educadoras disseram que a proposta girava em torno da organização da produção textual
em começo, meio e fim, assim esperando que os educandos escrevessem em parágrafos a
partir da leitura da sequência de imagens. E novamente as educadoras afirmaram a
necessidade de um trabalho pautado em gêneros.
Com relação à produção com roteiro, as educadoras ressaltaram que a
produção realizada a partir de tal proposta limitava-se a respostas às questões presentes no
roteiro, limitando a escrita dos educandos em parágrafos desconexos. Apesar da intenção
do educador em orientar a produção através de um roteiro, as educadoras sinalizaram que
esse tipo de atividade conduz o educando apenas às respostas curtas sem garantir uma
articulação entre os parágrafos produzidos.
Sendo assim, tais propostas de escrita revelaram um distanciamento do
trabalho com gêneros discursos, que de fato possam garantir o domínio de certa forma de
interlocução e que conceba a produção escrita considerando-se as marcas características de
cada gênero.
Tal distanciamento pode ser percebido também na fala a seguir, na qual a
educadora comentou as atividades que desenvolve com/sobre as produções dos educandos:
Quando ela é coletiva a gente faz a correção na lousa. Primeiro a gente lê,
quando é a produção de um aluno, então eu procuro pegar daquele aluno
que tem mais dificuldade, porque o que não tem dificuldade, às vezes fica
vago para o aluno: “mas porque isso?” Aquele que tem dificuldade tem
que ver da onde nós partimos para tentar melhorar.
132
Então através da correção coletiva, que eu ponho na lousa ou através de
cartaz, como o papel cenário e eu escrevo com canetinha o trecho que eu
quero analisar, às vezes é paragrafação, pontuação, mas às vezes aparece
o português.
Agora se for individual eu corrijo na sala, no momento, eu chamo e peço,
olha isso daqui é escrito de outra forma, precisa ser revisto.
Sendo assim, através da exposição da educadora, podemos perceber que os
elementos como: paragrafação, pontuação e ortografia parecem ser privilegiadas nas
atividades de revisão textual, sem serem consideradas as marcas textuais que caracterizam
o gênero escrito.
A educadora também apresentava uma preocupação com as crianças que ainda
não tinham se apropriado do sistema de escrita alfabética, durante a entrevista a educadora
afirmou que as dúvidas das crianças no momento da produção textual centravam-se na
maneira como grafar determinadas palavras, não revelando ainda a preocupação com a
estrutura textual.
Eles não ficam preocupados com relação à estrutura do texto, se eles o
escrever como uma poesia, eles ficam preocupados mesmo se eu posso
começar dessa forma, o que está faltando, como é tal palavra. Às vezes a
dificuldade não está em produzir, está em alfabetizar. Ele está alfabético
em palavras, mas com palavras não consegue produzir um texto, você
precisa de outros elementos.
Acreditamos que as crianças não demonstravam preocupação com a estrutura
textual por esta ainda não ter sido apresentada a elas, ou seja, ainda não foram tomadas
pela educadora como objeto de ensino. Voltemos a ressaltar a importância da escola na
sistematização de saberes e do papel do educador mediador, enquanto profissional que
deverá mediar aos educandos os conhecimentos historicamente constituídos.
Com relação às práticas da leitura, a educadora revelou não ser uma amante da
mesma, a culpada, segundo ela, foram as práticas impostas pelo processo de escolarização
que experienciou, no qual sempre cobravam-se conhecimentos proporcionados por aquela
leitura realizada. No interior deste modelo de ensino pouco se valorizava a leitura enquanto
prática prazerosa e constitutiva do sujeito, pois trata-se de interação entre escritor e leitor.
A educadora ainda sinalizou que buscava desenvolver nos educandos com os quais
trabalhou, o gosto pela leitura, desenvolvendo práticas constantes em sala de aula.
133
Então é assim, o professor tem que gostar para passar esse gostar para os
seus alunos, eu mesmo não gostando eu tento, na leitura, eu faço a leitura,
eu busco mudar a voz, faço uns teatrinhos. Toda terça-feira eles escolhem
um livro da biblioteca e eu leio, eu procuro passar pra eles uma verdade
que muitas vezes eu não faço, eu tento sim...
Eu procuro variar muito, porque eu percebo que a leitura dos alunos ela
ocorre mesmo na escola. Então às vezes eu pergunto vocês leram isso,
vocês conhecem isso, o gibi mesmo. Eu procuro ler textos assim de
jornal, então uma vez por semana a gente escolhe um texto de jornal, a
gente procura pegar assim o que não é de violência, porque eles tem
esta vivência, então eu procuro dar uma garimpada e trago, olha o que vai
acontecer, o que aconteceu aqui no jornal, poema, parlenda, cantiga, eu
procuro variar bastante, às vezes a criança traz de casa, eu proponho, a
criança faz uma leitura. É rotina, é rotina, de segunda a sexta, faz parte do
planejamento é leitura diária eu vou variando, se é narrativa, se é
informativa, se é poema, se é lenda, se é conto.
As falas da educadora nos indicaram, em diversos momentos da entrevista
inicial, que um reconhecimento da importância do trabalho com os gêneros discursivos,
orais e escritos, no entanto essa importância não era transplantada para a prática da
produção textual, permeando mais as práticas de leitura em sala de aula. Vejamos o excerto
a seguir:
No início nós fazíamos a leitura de receitas culinárias mesmo e falávamos
da importância da receita, porque não dava pra guardar de cabeça, então
era receita culinária ou mesmo para tomar um medicamento. Então eu
passo sim, hoje nós vamos ler o jornal, que é informativo. Hoje é
narrativo, vamos contar a história da Branca de Neve. Ou quando o aluno
traz, eu sempre informo o que é que é. Então o que é isso, é parlenda, é
lenda, é mito, é conto...
Contudo, sinalizamos que para que o educando se aproprie de um nero do
discurso, seja oral ou escrito, há a necessidade de um trabalho sistematizado sobre o
mesmo. Embora seja de extrema importância a leitura de diferentes gêneros, essa prática
somente não é capaz de garantir que o educando domine as habilidades necessárias para a
produção escrita que de fato contemple o gênero proposto.
Longe de ignorar a importância das práticas de leitura em sala de aula
acreditamos que a aprendizagem de um gênero do discurso envolva a necessidade de
práticas que vão além da leitura.
134
Verificamos assim, que o trabalho com os gêneros esteve presente na sala de
aula, contudo, o mesmo foi privilegiado nos momentos de leitura realizados junto aos
educandos da turma. A identificação das finalidades dos diferentes gêneros do discurso
também foi informada aos educandos. Contudo, ficou-nos evidente que o trabalho com a
produção textual não era perpassado pelas discussões dos elementos constituintes do
gênero discursivo, comprovando a dificuldade sentida pelos educadores em se colocar em
prática a metodologia que envolva de fato o ensino da produção textual pautada em gênero
e garanta a formação de escritores e leitores eficazes.
Dessa forma, o professor não pode ensinar o que ainda desconhece e o
educando não aprende aquilo que não lhe é ensinado. realizamos essa discussão acerca
que não foram todos os professores que tiveram oportunidade de refletir sobre os neros
do discurso enquanto objeto de ensino, ou seja, as fontes que a educadora possui sobre o
ensino da prática de produção de texto são as suas próprias experiências vividas enquanto
educanda, ou seja, as propostas de escrita lançadas para os educandos com que trabalha são
mais ou menos semelhantes às realizadas por ela enquanto estudante. Outra fonte de
conhecimento da educadora nos parece ser o Curso Letra e Vida, que como dissemos,
procura enfocar metologicamente práticas contextualizadas de alfabetização. Embora o
referido curso de formação trate o texto como objeto de ensino da língua, centra-se nas
fases de aquisição da linguagem escrita e no desenvolvimento de propostas de
intervenções, não oferecendo discussões e reflexões suficientes em torno da produção
textual pautada nos gêneros discursivos.
Dessa forma, faz-se necessária a construção e reflexão de conhecimentos
necessários à prática educativa que oriente o trabalho com gêneros discursivos, refletindo
assim na melhoria da qualidade dos textos produzidos pelas crianças. Com base em
Shulman (1986,1987), Mizukami (2004) afirma:
[...] a base de conhecimentos se refere a um repertório profissional que
contém categorias de conhecimento que subjazem à compreensão que o
professor necessita para promover aprendizagens dos alunos. Trata-se de
um modelo que foi desenvolvido considerando o conceito de ensino
como profissão, envolvendo delimitação de campo de conhecimento que
pode ser sistematizado e partilhado com outros: os profissionais de ensino
necessitam de um campo de conhecimento profissional, codificado e
codificável que os guie em suas decisões quanto ao conteúdo e a forma
135
de tratá-lo em seus cursos e que abranja conhecimento pedagógico quanto
conhecimento da matéria.
Foi com a intenção de contribuir para construção de uma base de conhecimento
sobre os gêneros discursivos como objetos de ensino que o Curso de Extensão realizou-se.
4.2. Conhecimentos construídos ao longo da realização do Curso de Extensão ou
conhecimentos construídos no processo colaborativo dialógico.
Na descrição dos encontros e das intervenções realizados junto às educadoras,
compartilhamos junto ao grupo os conhecimentos teóricos e travamos reflexões que
giraram em torno da elaboração de uma sequência didática para o ensino sistematizado de
um gênero do discurso, pois acreditamos que a teoria pode e deve se tornar um
instrumental que oriente a prática pedagógica, auxiliando o educador na complexa
atividade de mediação de que é responsável, assim como contribuir para construção e
reflexão de conhecimentos necessários à base de conhecimento sobre o ensino.
Sendo assim, a fala a seguir nos auxiliou na compreensão da importância dos
conhecimentos que foram refletidos e traduzidos para a prática docente, ao longo da
realização do Curso de Extensão:
Antes eu deixava as crianças muito libertas, elas produziam uma poesia,
ou vamos produzir um verso, ou um outro tipo de texto, mas eu não
definia para eles assim: “olha hoje nós vamos trabalhar um gênero fábula,
um gênero...” sabe assim, eu não tinha essa compreensão, sabe eu não
colocava na lousa para eles que cada texto produzido que tinha uma
caracterização, que tinha uma sistematização, e hoje eu tenho essa
consciência, antes que eles produzam mostrar, visualizar, não na
oralidade, mas visualizar o texto, como que é produzido, como que é
construído, quais as informações obtidas ali pra você também fazer um,
também de acordo com as características, então eu acho que a definição
está aí, e antes eu não mostrava, eu não dava o suporte
(Entrevista 2)
.
Podemos observar que a educadora visualizou pontos da sequência didática
desenvolvida como um importante instrumento em sua prática, instrumento este que
potencializa os educandos na prática de produção textual. Sendo assim, a educadora
136
estabeleceu uma comparação com a prática anterior, afirmando que as crianças pareciam
mais soltas, libertas, para escreverem, pois não se sabia o que, o como, o porquê e o para
quem escrever.
Acreditamos assim, que houve a atribuição de um novo significado à prática
educativa, através de uma alteração da concepção da educadora que visualizou a intenção
de sua prática. Concordamos com Araújo (2000), no sentido da necessidade da consciência
crítica dos educadores, pois esta diferencia qualitativamente o trabalho educativo que
ocorre de forma espontânea na sociedade, sendo assim a intencionalidade da prática foi
resgatada pela educadora, que sinalizou que antes não tratava o texto como um objeto de
ensino: como o texto é constituído, como é produzido.
Salientamos também que o excerto acima revelou a presença, durante a
realização da sequência didática, de planejamento para o ensino, sendo assim o gênero é
definido junto aos educandos, se reflete sobre sua sistematização e se estuda como o
mesmo aparece no texto, proporcionando a visualização destes elementos na própria
escrita.
Sinalizamos, no início de nossa análise, que a educadora diferenciou o texto
produzido por ela, quando aluna de primeiro grau, dos textos produzidos pelas crianças de
sua turma como: Acho que hoje a criança está liberada para poder se expressar. Na leitura
do excerto abaixo, percebemos certa negatividade da referida liberdade, uma vez que ela
indica a falta de parâmetro para se escrever:
Eu mostrava assim, eu sabia que eles sabiam ler e escrever, dentro do
possível, aí o resto eles é que tinham que fazer, mas não dava aquela base
mesmo pra eles: “hoje nós vamos produzir tal coisa e é assim que se
produz... é isso o que eu uso”. Eu dava menos informações, então a gente
define primeiro o gênero, qual gênero eu vou escrever, tento entender
também como ele foi criado, porque a gente também pode mostrar pra
eles que dentro daquilo produzir o que se pede. Então vai ter um
resultado melhor porque eles vão saber o que está sendo produzido, pra
que eles estão produzindo de acordo com o que a professora comentou,
então não fica aquela coisa aleatória
(Entrevista 2).
Não se trata de dominar a leitura e a escrita para dominar a prática de produção
textual. Escrever dentro de um gênero proposto, considerando o contexto, o interlocutor, as
137
formas de marcar essa escrita exige a sistematização do ensino, portanto trabalho
intencional do educador, mediador da aprendizagem dos educandos.
Podemos afirmar, com base no excerto acima que os gêneros discursivos
passaram a serem compreendidos enquanto objeto de ensino propriamente dito, pois a
educadora afirmou que antes dava menos informações sobre o gênero selecionado para o
trabalho.
A partir da compreensão da utilização de uma sequência didática para o ensino
de um gênero do discurso escrito, iniciou-se todo um trabalho aprofundado de estudo das
características dos diferentes textos produzidos dentro do gênero fábulas, permitindo que o
educando também se instrumentalizasse a ponto de produzir sua própria fábula
19
.
A liberdade para a escrita transforma-se em autonomia para a produção textual,
pois os educandos sabem quais conhecimentos devem ser mobilizados durante o processo
de escrita:
Então, percebi, percebi mesmo [melhoras na turma], é aquilo que eu falei
logo no início, toda a vez que eu ia pedir para produzir alguma coisa os
alunos comentavam: “ah, posso começar com era uma vez...” às vezes
não era um conto de fadas. Então é assim eles ficam comentando “é uma
fábula, é isso é aquilo”, então vai abrir um leque que eles possuem uma
certa liberdade, um conhecimento de como ele pode começar a escrever,
o que ele pode usar. Então a liberdade que eles têm em relação, um
conhecimento do que escrever (Entrevista 2).
Como afirma Freire (1996) a prática docente tem sentido em favor da
autonomia dos educandos, sendo assim, o fazer docente tem uma de suas funções
resgatadas, pois prática pedagógica objetiva e culmina na liberdade do educando em poder
utilizar os saberes conquistados.
Em um outro momento durante a realização da segunda entrevista, podemos
visualizar, como na ocasião da primeira entrevista, que a educadora continua apostando
nos conhecimentos necessários à sua prática educativa, pois comentou a imprescindível
questão da formação contínua do educador e do quanto essa formação auxilia na qualidade
da prática docente e nas aprendizagens dos educandos:
19
A análise sobre as produções, iniciais e finais dos educandos e as aprendizagens conquistadas pelos
mesmos podem ser conferidas em Cunha (2010).
138
Eu acho que sim, eu acho assim: a professora, no caso também tem que
melhorar, nesse conhecimento, porque é uma coisa nova assim, em tudo.
Então, se eu conseguir fazer com que o meu conhecimento também
melhore, que também consiga construir junto com os alunos, eu
acredito que eles também melhorem.
Eu acho assim, que o professor, não é que ele sabe tudo, mas às vezes não
sabe muito e acaba não passando isso para os alunos. Porque não dizem
que é uma construção, que tem que ser tijolinho por tijolinho, então acaba
faltando alguma coisa e acaba perdendo com o aluno.
No caso eu acho que preciso fazer uma reciclagem, mais. Procurar cursos
que me dêem esse aporte, um suporte, porque eu ofereço suporte para os
alunos, mais quem oferece suporte para mim? Por mais que eu tenha
trabalhado, acaba sendo uma coisa mecânica, às vezes a gente não pode
ficar nisso. As pessoas evoluem e eu acho que o conhecimento está
junto. Então se eu não for atrás de algumas coisas, se o tentar me
aperfeiçoar em algumas coisas que eu tenho dificuldade a prática acaba
também indo embora. Eu acho que é isso: eu tenho que melhorar, então
melhorou, dessa forma eu consigo fazer com que eles produzam mais.
Então eu também tenho que tentar me reciclar, para melhorar e passar
tudo isso junto com eles (Entrevista 2).
Retomamos novamente Freire (1996), para quem a segurança da autoridade
docente se funda na competência profissional. Nenhuma autoridade docente se exerce
ausente desta competência. O professor que não leve a sério sua formação, que não
estude, que não se esforce para estar à altura de sua tarefa não tem força moral para
coordenar as atividades de sua classe (p. 91-92).
De acordo com Franchi (1995) os saberes científicos dos educadores nem
sempre são suficientes para determinar a qualidade da prática educativa, interessa sim
como o educador gerencia as fontes de informação a que tem acesso para a construção de
um sistema coerente de conhecimentos que são postos em prática na sala de aula. Em
primeiro lugar, porque os conhecimentos são construídos a partir de sistemas de
referências que nem sempre permitem a continuidade entre os saberes e em segundo lugar,
os educadores devem visualizar com clareza os valores e concepções que movem sua
prática: para que, a quem, a favor de quem e contra quem ensinam o que ensinam.
A importância da continuidade e qualidade da formação continuada também foi
percebida pelas demais educadoras, participantes do Curso de Extensão sobre a produção
textual, que revelaram suas impressões durante um dos encontros:
139
Eu acho que uma das coisas mais difíceis é ensinar alguém a escrever um
texto, porque você passar para a criança um conhecimento que você tem
e fazê-la entender, compreender é uma tarefa difícil. A habilidade de
escrita também é meio que alguma coisa que a pessoa gosta, é uma
informação em casa que a facilita a escrever melhor do que a outra. O
que eu aproveitei muito nesse curso, nesses anos todos ensinando na
Série, eu gosto da 3ª Série, eu gosto de escrever, gosto de ensinar crianças
a ler e eu fico olhando que eu não me preocupava nisto do gênero.
Então eu acho isto interessante, porque a gente trabalhava, mas não com
essa sequência para que a criança tivesse realmente esse desenvolvimento
então eu trabalhava, eu queria que ela fosse assimilando essas diferenças,
então um ano é muito pouco, e na verdade nem todas conseguiam
assimilar e nem todas aprendiam aquele gênero que estava sendo
trabalhado.
Eu achei que esse curso foi muito importante para mim nesse sentido,
acho que foi clareando esse aspecto, para que eu saiba de fato empregar o
seu conhecimento nessa fábula, empregar em um outro tipo de texto
Se a gente for analisar o curso que prepara a gente, o magistério, ele não
prepara a gente a ensinar esse processo da criança a produzir um texto.
Não passa pela ideia o quanto que é importante, não é ensinado a você
fazer isso.
Eu me lembro que eu tive ótimos professores que me deram uma base,
mas eu não aprendi a usar aquilo para ensinar, aquele processo você vai
desenvolvendo depois. Mas você não aprende.
(Assessora de Direção 10º Encontro com Educador
06/10/08).
O magistério ensina você a produzir, a preparar uma aula, quando eu saí
era uma ótima substituta, mas aí, quando você tem uma sala, como é que
você faz? Eu dava uma aula e a outra? Como eu faço esse negócio
caminhar? E como eu chego ao final do ano com isso?
(Educadora do
1º Ano - 10º Encontro com Educador – 06/10/08).
Ao concordar com Geraldi, Franchi (1995) afirma que muitos professores
esperam - e alguns especialistas imaginam que podem satisfazer - que se ponha à
disposição um conjunto de saberes para que se concretizem os objetivos traçados para a
sala de aula. Nesse sentido:
Os professores não podem esperar que a ciência resolva todos os seus
problemas e ponha-lhes à disposição conhecimentos e procedimentos
infalíveis e absolutamente incontestáveis. [...] devem compreender que a
diversidade das opiniões e das reflexões teóricas é parte necessária de um
processo de desenvolvimento e que, pois, cada um tem de assumir riscos
indisfarçáveis das decisões provisórias baseados no que sabem aqui-
agora, esforçando-se por construir com seus colegas um conhecimento
140
sempre renovado que oriente a revisão constante de sua própria prática
(FRANCHI, 1995, p. 50).
É nesse sentido que voltamos a defender, apoiadas em REALI e REYES
(2007), que os cursos de formação continuada passem a conceber o educador enquanto
sujeito reflexivo, capaz de tomar sua prática como objeto de reflexão, consciente de sua
ação.
Quanto aos elementos que o educando precisa saber para que produza um
texto, a educadora da turma do ano sinalizou a necessidade de se definir inicialmente
qual gênero será escrito, definindo-se conjuntamente, educador e educando, o que, como,
por que e o para quem escrever. Sendo assim observamos que a concepção da educadora
alterou-se quando comparada com os dados presentes na primeira entrevista, realizada no
início do Curso de Extensão.
Na entrevista inicial, a educadora apontou que em uma produção textual deva
haver a coesão, a coerência, a utilização de parágrafos e pontuação.
Mas sem definir texto? Sem definir gênero? Um texto. Definindo um
gênero ela sabe, quer dizer já melhora. Olha, eu quero produzir um conto,
uma fábula, então se ela conhecer as características de cada gênero, fica
mais fácil dela produzir qualquer coisa (Entrevista 2).
A próxima fala da educadora nos revelou elementos importantíssimos da
relação ensino-aprendizagem, uma vez que nos indicam uma mudança substancial na
prática da educadora:
A prática não mudou só nos alunos, acabou mudando em mim. Porque eu
também comecei a ver que me um melhor resultado. Eles retornam
para mim aquilo que realmente eu pensava que eles me trouxessem. Não
é aquilo: “olha produza um texto, ah, mas você não fez isso, não fez
aquilo...” Mas eu também não defini. Mudou assim: eu tenho que
conhecer para poder pedir também (Entrevista 2).
Sendo assim, acreditamos que o melhor resultado, referenciado pela educadora
relaciona-se diretamente ao efeito de planejamento do conteúdo estudado, os gêneros
141
discursivos, organizados em forma de sequência didática para serem apreendidos pelos
educandos.
Retomamos o conceito de conhecimento do conteúdo específico, que se refere
aos conceitos básicos de uma área de conhecimento, o que implica a compreensão de
formas de pensar e entender a construção de conhecimentos de uma disciplina específica,
assim como sua estrutura. Assim, os conhecimentos conquistados pela educadora refletem
diretamente em sua prática e nos conhecimentos dos educandos, tal como afirmou Freire
(1992):
[...] ao ensinar, o professor ou a professora re-conhece o objeto
conhecido. Em outras palavras, refaz a sua cognoscibilidade na
cognoscibilidade dos educandos. Ensinar e assim é a forma que toma o
ato de conhecimento que o professor necessariamente faz na busca de
saber o que ensina para provocar nos alunos seu ato de conhecimento
também. Por isso, é um ato criador, um ato crítico, não mecânico. A
curiosidade do(a) professor(a) e dos alunos, em ação, se encontra na base
do ensinar-aprender
(p.81).
Nesse sentido, ao ensinar o educador também aprende, ou seja, ao articular o
conhecimento de conteúdo específico em função das aprendizagens dos educandos, os
professores constroem o conhecimento pedagógico do conteúdo.
Dessa forma, verificamos que a reflexão sobre a prática favoreceu a autonomia
dos educandos (FREIRE, 1996). A educadora apontou a necessidade de conhecer para
poder instrumentalizar, potencializar os educandos, como apontou Freire (ibid.): ensinar
não é transmitir conhecimento, mas criar as possibilidades para a sua produção e
construção (p. 22).
Apontamos que a participação no Curso de Extensão, que se configurou como
um curso de formação no qual se discutiu e refletiu sobre os gêneros discursivos enquanto
objetos de ensino e organizado em forma de sequência didática, configurou-se enquanto
lócus de reflexão sobre a própria prática das educadoras envolvidas, uma vez que
percebemos alterações nas concepções das mesmas. Conforme afirmou Freire:
A prática docente crítica, envolve o movimento dinâmico, dialético, entre
o fazer e o pensar sobre o fazer [...]. Por isso é que, na formação
142
permanente dos professores, o movimento fundamental é o da reflexão
crítica sobre a prática.
É pensando criticamente a prática de hoje ou de ontem que se pode
melhorar a próxima prática. O próprio discurso teórico, necessário à
reflexão crítica, tem de ser de tal modo concreto que quase se confunda
com a prática. O seu “distanciamento” epistemológico da prática
enquanto objeto de sua análise, deve dela “aproximá-lo ao máximo”.
Quanto melhor faça esta operação tanto mais inteligência ganha da
prática em análise e maior comunicabilidade exerce em torno da
superação da ingenuidade pela rigorosidade
(FREIRE, 1996, p. 39)
.
Quanto à concepção de leitura, observamos uma compreensão mais
aprofundada daquela apreendida na ocasião da realização da primeira entrevista, dessa
forma a educadora apontou um sentido mais amplo também do que é texto, aproximando-
se da concepção apresentada em nosso referencial teórico, a de que um texto é um todo
significativo, pode ser constituído de páginas ou de somente uma palavra:
Eu penso assim que a leitura ela está agregada à escrita. A gente
qualquer coisa, até um PARE, a placa, ela é um texto, você sabe que é
para você parar. Então o que me faz entender que a aquele PARE é para
parar? È através da leitura, eu acho que você combinar a leitura com a
escrita, você ir trabalhando junto, orientando, intervindo com os alunos,
acredito que aprendizagem em outras coisas facilita, quer dizer a leitura e
a escrita (Entrevista 2).
A educadora também sinalizou que embora sejam processos distintos, a leitura
e a escrita estão unidas, aproximando-se também da concepção freireana de linguagem,
com o sentido da palavra-mundo, sendo assim a leitura é concebida como além da simples
decodificação de códigos linguísticos, para referir-se à leitura do mundo.
A seguir, trataremos das impressões das educadoras durante a realização do
curso de extensão, apresentaremos para a análise algumas falas presentes nas gravações
dos encontros realizados com as educadoras. Trata-se de reflexões, compartilhamento de
dúvidas e sugestões de trabalho.
143
4.3. Conhecimentos compartilhados ou diálogos em torno da prática
Durante a realização do 1º Encontro com Educadoras, realizado em 28/07/08 as
educadoras foram convidadas a realizare diferentes propostas de produções textuais, que
como vemos, não levavam em conta a situação interlocutiva, ou seja, o consideram o
para que, o como e nem o porque escrever. O objetivo dessa atividade era sensibilizar as
educadoras com vivencias próximas às que são planejadas por eles aos educandos, para
perceberem suas dificuldades e angústias na complexa situação de produção textual.
Conforme descrevemos em nossa metodologia de pesquisa, no primeiro
encontro realizado junto às educadoras, as mesmas deveriam realizar algumas propostas de
escrita, que eram: grupo 1: escrever uma carta para um amigo que está fora do país
contando as novidades pessoais e os últimos acontecimentos no Brasil; grupo 2: escrever
uma história a partir de uma gravura apresentada; grupo 3: escrever uma crônica onde a
frase “ Eu gosto de macarrão” apareça no inicio ou no final do texto; grupo 4: escrever um
artigo de opinião sobre a instalação de usinas nucleares no Brasil; grupo 5: fazer a reescrita
do conto - A Bela Adormecida. Tais propostas de trabalho encontram-se no APÊNDICE
III, que se refere à pauta do primeiro encontro junto ao educador.
Diante dessas propostas as educadoras redigiram e socializaram a produção,
sendo que uma professora observadora, presente em cada grupo, socializou também como
foi organizado o trabalho e como foi o desenvolvimento de cada uma das propostas de
escrita.
A partir das questões orientadoras da discussão, que eram: Como foi o
processo de produção?; O que facilitou ou dificultou a produção?; O que o professor queria
ensinar com a proposta?; E o que os alunos podem aprender com a proposta feita?; e
discussão da importância do trabalho com projetos de leitura; as educadoras sinalizaram
diversas impressões sobre as atividades de produção textual:
Educadora: A escrita da carta não apresentou dificuldades em si, a
dificuldade foi elencar alguns acontecimentos no Brasil... muitas
coisas boas para serem lembradas, mas nós lembramos das tragédias.
Tivemos dificuldade em nomear alguns fatos que acontecem no Senado.
A facilidade foi colocar alguns fatos pessoais, que se tratava de uma
carta para uma amiga, aí o pessoal contribui mais...
144
Pesquisadora: Quais foram os encaminhamentos para se organizar o
texto?
Educadora: Então, a gente elencou alguns acontecimentos do país e
depois a gente escreveu com mais informalidade...
Pesquisadora: Então vocês fizeram um planejamento antes, do que
vocês iriam fazer, do que viria antes...
Educadora: Sim...
Pesquisadora: Então vocês contemplaram o gênero...
(Grupo cuja proposta foi a escrita de uma carta).
Educadora: Primeiro a gente definiu o gênero, se seria uma narrativa,
uma poesia... Então escolhermos a narrativa. Cada uma tinha uma ideia:
Alpes, Polo Norte, Papai Noel... risos...
A partir disso ficou definido Papai Noel...
Pesquisadora: E vocês revisaram, apagaram...?
Educadora: Sim, apagamos algumas coisas, retomamos a leitura do
texto várias vezes...
Pesquisadora: É fácil produzir com uma gravura dessas?
Educadora presente em outro grupo: Não, nossa, eu com uma gravura
dessas, não teria feito a metade do que vocês fizeram...
Pesquisadora: Por que então você acha que elas escreveram tão bem?
Isso tem a ver com o tal do letramento que a gente fala e dos
conhecimentos que a criança tem, porque dependendo de quem analisa
essa figura...
Educadora do grupo: Para mim o que mais me motivou foi o tema que a
gente definiu em torno da figura e não a figura...
Educadora de outro grupo: Quando eu dei uma produção dessas para
meus alunos fazerem, eu desisti... ficava na descrição de imagens. Eu
dei para eles desenharem, melhorou, porque eles tinham uma
história...
(Grupo cuja proposta solicitava uma produção a partir de uma
gravura).
Educadora: Primeiro fizemos o levantamento das características do
gênero crônicas, que o grupo foi fazendo...
Pesquisadora: Como vocês fizeram esse levantamento?
Educadora: Pelo o que o grupo já conhecia de crônicas mesmo...
Pesquisadora: Da onde? Qual o modelo?
Educadora: Principalmente do jornal... Então a gente tinha o modelo
mais ou menos direcionado... junto com o tema, que se baseou pela frase
da proposta: “Eu gosto de macarrão...”. Então fizemos o levantamento de
ideias de como poderíamos desenvolver... surgiram algumas experiências
pessoais na cozinha...
O grupo ia dando sugestões de como melhorar isto ou aquilo, tinham a
preocupação constante com a qualidade do texto... O tempo todo foi
havendo revisões...
(Grupo cuja proposta consistia na produção de uma crônica).
145
Educadora: Deus me livre! (risos). Quando a gente leu aqui a gente viu
que precisava ter conhecimento sobre o assunto.
Pesquisadora: Então, mas vocês tinham a Kauffman dizendo como se
escreve um artigo de opinião, (referindo-se ao anexo que o grupo tinha
acesso).
Educadora: Mas a gente não sabia direito como é isso... e não tínhamos
informação sobre o tema. Assim, como a gente tinha que entregar e tinha
uma professora pressionando... (risos).
O desenvolvimento foi mais ou menos assim: nós recorremos à leitura do
anexo, mas não entendemos. Diante da temática, a gente buscou levantar
o que sabíamos sobre a temática da implantação das usinas nucleares no
país. Eu trabalho pouco com isso na série, do consumo consciente e
dos riscos da implantação. Então, recorremos a esses pequenos
argumentos e conseguimos produzir um protótipo de um artigo. Os
problemas maiores foram realmente a questão do gênero, de como
colocar as ideias no papel, a correção das palavras...
(Grupo cuja proposta consistia na produção de um artigo de
opinião sobre a implantação de usinas nucleares no país).
Educadora: Em um primeiro momento a gente pensou: “ah, é uma
reescrita, então é fácil...”. Mas quando fomos ver o texto... “nossa, é um
texto longo...”
Organizamos uma leitura dinâmica, porque tínhamos pouco tempo e não
ia dar para chegar até o final. Quase que a princesa ficou sem beijo...
(risos). Então a gente começou a viver um conflito, porque a gente
conhece várias versões e tínhamos que nos prender a essa versão. A
facilidade é que conhecíamos a história, mas ela é muito cheia de
detalhes.
(Grupo cuja proposta consistia na reescrita da história “A Bela
Adormecida”).
A partir dessas impressões sobre as propostas de escrita solicitadas, as
educadoras sinalizaram dificuldades, como por exemplo, a proposta do grupo 2, que
consistia na escrita de uma história a partir da gravura apresentada. Nessa atividade os
educadoras apontaram a dificuldade na definição da gravura, da temática e do gênero.
A proposta de escrita do grupo 4, que consistia na escrita de um artigo de
opinião sobre a instalação de usinas nucleares no Brasil, também apresentou um grau
elevado de dificuldade sentido pelas educadoras, que sinalizaram a necessidade de
conhecimento prévio sobre a temática apresentada, embora a proposta trouxesse um anexo
contendo as características principais de um artigo de opinião, isso não foi suficiente para
garantir uma escrita que contemplasse o gênero proposto, pois não haviam sido trabalhadas
antecipadamente,contextualizadas em outros textos do mesmo gênero.
146
Vejamos a seguir a fala de uma educadora que sintetiza o momento de reflexão
sobre as propostas de produção textual que muitas vezes são feitas para os educandos:
Vocês fizeram isso para a gente sentir como nossos alunos se sentem
ao produzir um texto onde ele não tem conhecimento prévio quase que
nenhum e ele tem que produzir porque a professora quer que ele entregue
(Educadora do 2º Ano – 1º Encontro
28/07/08
).
Percebemos assim, que no momento de reflexão das propostas de produção
textual, as educadoras compreenderam a complexidade da atividade de escrita, pois esta
necessita da mobilização de diferentes conhecimentos, dentre eles o conhecimento de
mundo acerca do assunto a ser tratado na escrita, os conhecimentos sobre o sistema de
escrita, o gênero que se pretende escrever, a forma como as ideias serão organizadas e
expostas.
No segundo encontro, realizado junto às educadoras, em 04/08/2008, as
pesquisadoras apresentaram o referencial teórico que guiaram a proposta de pesquisa e de
trabalho junto às educadoras e educandos
20
. Sendo assim, com base em Almeida e Biajone
(2005), que se orientam em Shulman (1987) o conhecimento do conteúdo da matéria
ensinada é a primeira fonte da base de conhecimento para o ensino. Dessa forma, esse
conhecimento refere-se aos conteúdos específicos da matéria que o professor leciona,
incluem, portanto as compreensões de fatos, conceitos, processos, procedimentos de uma
área, como a compreensão do contexto em que esses conteúdos são gerados.
Dessa forma, o conhecimento do conteúdo da matéria ensinada:
[...] não se resume tão somente à detenção bruta dos fatos e conceitos do
conteúdo, mas também à compreensão dos processos de sua produção,
representação e validação epistemológica, o que requer entender a
estrutura da disciplina, compreendendo o domínio atitudinal, conceitual,
procedimental, representacional e validativo do conteúdo
(ALMEIDA e
BIAJONE, 2005, p. 07).
20
Texto 1: “Concepções de linguagem e ensino de português” de João Wanderley Geraldi (GERALDI,
1990) e texto 2: Sequências didáticas para o oral e a escrita : Apresentação de um procedimento, de Joaquim
Dolz, Michele Noverraz; Bernard Schneuwly (DOLZ, et. al. 2004).
147
Consideramos de extrema importância este encontro, pois nele buscamos
relacionar as práticas desenvolvidas em sala de aula pelas educadoras com o referencial
teórico estudado, no sentido de interpretarem a teoria como um instrumental que possa
apoiar e orientar o educador, oferecendo contribuições à elaboração de conhecimentos em
torno da base de conhecimento sobre o ensino, mais especificamente sobre o conhecimento
de conteúdo específico.
No primeiro texto trabalhado no referido encontro, buscamos resgatar o papel
político do professor de língua materna, assim como discutir algumas concepções de
linguagem e dentre elas a que é compreendida como forma de interação entre os
interlocutores. Como o próprio Geraldi (1990) ressalta:
[...] é preciso que se tenha presente que toda e qualquer metodologia de
ensino articula uma opção política - que envolve uma teoria de
compreensão e interpretação da realidade com os mecanismos
utilizados em sala de aula
(id. ibid., p. 40).
Dessa forma, a questão “para que ensinamos o que ensinamos” e para que as
crianças aprendem o que aprendem” merecem ser refletidas, podendo desvelar assim, a
opção política do educador, muitas vezes esquecida, mas nem por isso ausente em sua
prática.
Essa discussão nos leva a pensar o que está por trás de nossa prática
(Educadora responsável pelo ano Encontro Educador -
04/08/2008).
No segundo texto, buscamos realizar uma reflexão em torno dos conceitos
teóricos que subjazem o desenvolvimento de uma sequência didática para o ensino de um
gênero do discurso escrito:
Criar contextos de produção precisos, efetuar atividades ou exercícios
múltiplos e variados: é isso o que permitirá aos alunos apropriarem-se das
noções, técnicas e dos instrumentos necessários ao desenvolvimento de
suas capacidades de expressão oral e escrita, em situações de
comunicação diversas
(DOLZ, et. al., 2004, p. 96).
148
Sendo assim, as reflexões suscitadas pelo estudo e debate em torno do texto
selecionado para o encontro buscou oferecer contribuições à (re)elaboração dos
conhecimentos pedagógicos do conteúdo, pois como afirma Mizukami (2004), esse
conhecimento é construído constantemente pelo professor ao ensinar a matéria e é
enriquecido e melhorado quando se complementam com os outros tipos de conhecimentos
presentes na base de conhecimento para o ensino.
Conforme anunciamos em nossa metodologia de pesquisa, os encontros
realizados com os educandos aconteceram paralelamente aos das educadoras. Sendo assim,
no segundo encontro realizado junto aos educandos, em 07/08/08, a educadora da turma
nos pareceu um pouco insegura, pois embora tivéssemos combinado antecipadamente que
ela leria as versões da Fábula: “A Cigarra e a Formiga” ela preferiu que uma das
pesquisadoras a fizesse e posteriormente assumiu o encaminhamento da atividade que
consistia na reescrita coletiva.
A pesquisadora então socializou com os educandos presentes a proposta de
trabalho do encontro, que consistia na reescrita coletiva de mais uma versão da fábula “A
Cigarra e a Formiga”. Para esse encontro trouxemos três versões da fábula selecionada.
A pesquisadora iniciou comentando sobre a primeira versão, lida em voz alta,
presente no livro Fábulas Inesquecíveis, reescrita por Roberto Belli (2005). A educadora da
turma observou como a pesquisadora realizou a leitura, enfatizando as ilustrações contidas
no livro e realizando adaptações na voz, conforme as falas dos personagens.
Para as leituras das demais versões foram entregues cópias aos educandos, para
o acompanhamento da leitura realizada em voz alta pela pesquisadora, as versões
selecionadas foram de Monteiro Lobato (1994).
Após a leitura das versões, a pesquisadora também encaminhou a atividade de
reconto, realizada pelos educandos, para isso houve a retomada de alguns combinados do
grupo, como por exemplo, erguer a mão para participar e falar. Sendo assim, a
pesquisadora encaminhou a retomada das sequências das narrativas, realizando discussões
com os educandos do emprego de alguns termos selecionados pelos autores, como verão e
inverno, a pesquisadora também buscou contemplar todas as crianças que desejavam falar,
não privilegiando a fala de apenas alguns alunos, mas favorecendo a participação de todos.
149
Em seguida, a pesquisadora buscou que os educandos estabelecessem
comparações entre as versões lidas, para isso relembrou as diferenças e as semelhanças,
destacando as características do gênero, presentes nas três versões lidas: presença de moral,
personagens, narrador e animais que falam.
Em seguida, a professora encaminhou a atividade de reescrita coletiva,
enfatizando que se trataria da criação de uma nova versão para a fábula que ouviram.
Durante a realização da atividade, a educadora procurou não privilegiar as sugestões de
uma educanda bastante participativa, porém, a criança falava e os demais educandos
presentes repetiam o que a aluna dizia e a educadora registrava na lousa.
Educadora: Havia uma jovem cigarra...
Educanda: Que costumava cantar.
Educadora: Como eu ponho pessoal?
Vários educandos juntos: Que costumava cantar. (2º Encontro
Educandos - 16/08/2008-36 min.)
Em outros encontros com educandos, percebemos a perspectiva da educadora
quanto à mesma educanda. No 3º Encontro com os Educandos, 22/08/08, vários educandos
participam do processo de seleção da fábula que seria trabalhada na atividade de reescrita
em dupla, no entanto, a educanda em questão parece alheia às discussões, conversava com
o amigo que se sentava próximo a ela sobre uma figurinha.
Educadora: O que está acontecendo hoje? Ou você participa
demais ou participa de menos! (3º Encontro Educandos
22/08/2008).
Pareceu-nos que inconscientemente o foco da educadora centrava-se sobre a
participação desta educanda, que se destacava pela sua participação em detrimento dos
demais educandos tão participativos quanto a menina. Em alguns momentos da mesma
produção, observamos também que embora a educadora solicitasse a participação de todos
os educandos e muitos erguiam a mão, ela acabava privilegiando a participação dos
mesmos alunos.
150
Quanto a isso buscamos ocasionar uma reflexão por parte da educadora, com o
objetivo de se atentar para as demais crianças presentes na turma. No encontro com
educadoras do dia 01/09/2008, proporcionamos aos presentes a visualização das gravações
dos encontros realizados junto aos educandos, com o objetivo de visualizarem o
encaminhamento das atividades e como os educandos estavam reagindo a elas, procuramos
apresentar trechos que demonstravam o envolvimento das crianças nas atividades de
reescrita coletiva e em duplas.
Pesquisadora: Observem como todas as crianças querem
participar, sugerir coisas na produção...
Educadora: Nossa, eu não tinha ideia de como eles participam...
(6º Encontro Educadoras – 01/09/2008).
Acerca do texto que se produzia coletivamente, verificamos também que não
era realizada a retomada da leitura, verificamos que a leitura ocorria somente do parágrafo
sobre o qual se realizava a escrita.
O 4º Encontro junto às educadoras realizado no dia 18/08/2008, iniciou-se com
a socialização das atividades desenvolvidas ao longo da semana junto aos educandos.
Nessas socializações, podemos visualizar nas falas das educadoras a percepção da
importância de duas práticas essenciais ao processo de desenvolvimento da produção
textual: o reconto e a reescrita coletiva. Vejamos abaixo o destaque dado pelas educadoras
a essas duas práticas.
Foi impressionante, todos os alunos, mesmo os que não falam
participaram. Contaram direitinho, com detalhes... eu acho isso bem
legal!
(Educadora do 2º Ano B– 4º Encontro – 18/08/2008).
Realizamos a atividade duas vezes, a chamamos de criar outra versão, a
última não deu tempo de terminar de tão longa que ficou
(Educadora
do 3º Ano B – 4º Encontro – 18/08/2008).
O trabalho com crônicas tem sido difícil para eles. Fizemos o reconto e
depois a reescrita, eles se perderam, tinha muitos detalhes, percebi que
uma parte da turma estava empolgada e outra não, estavam preocupados
se teriam que copiar depois, mas no final o texto ficou bem bonito
(Educadora da 3ª Série A– 4º Encontro – 18/08/2008).
151
Estamos trabalhando com fábulas, mas eu fiquei surpresa porque chamei
cada um para falar, contar um pedaço da fábula e tiveram duas crianças
que não quiseram falar, disseram que estavam com vergonha, os colegas
acabaram dizendo palavras de encorajamento para deixarem de ser
tímidos, eu acabei nem realizando a reescrita para não perder o momento
(Educadora 3º Ano A - 4º Encontro – 18/08/2008).
Percebi que houve crianças que nunca haviam falado, deram opinião,
alunos tímidos participaram mesmo
(Professora Série A-
Encontro – 18/08/2008).
Eu tenho um aluno com muitas dificuldades e ele contou tudo direitinho,
deu muito certo, os alunos queriam corrigir, colocar mais detalhes nas
falas dos colegas, foi muito interessante, eu nunca tinha feito antes,
depois eu fiz a reescrita coletiva
(Professora Série B- Encontro
– 18/08/2008).
Uma aluna me surpreendeu e passou a ter outro brilho no olhar, ela nunca
esteve no contexto, aliás, sempre fora dele e isso me chamava a atenção,
ela participou do início até o fim da atividade, essa era a minha ideia
(Professora 2º Ano - 4º Encontro – 18/08/2008).
Essas falas vão ao encontro da necessidade constante de se criar situações em
que os educandos possam exercitar a oralidade e a escrita. Nesse sentido, as atividades de:
leitura, reconto, reescrita coletiva e individual devem ser práticas constantes nas atividades
em sala de aula. Tal trabalho precisa estar presente desde os primeiros anos do ensino
fundamental, os alunos que ainda não dominam o sistema de escrita alfabética podem ser
produtores de textos orais e o educador pode ser o escriba, registrando o texto produzido.
Como foi relatado em nossa descrição dos dados, o encontro do dia
21/08/2008, realizado junto aos educandos, Encontro, buscou disponibilizar diversos
suportes textuais de fábulas, com o objetivo dos mesmos estabelecerem comparações entre
o material lido, visualizando assim, algumas características deste gênero.
Os educandos foram orientados pela educadora da turma e pelas pesquisadoras
a se organizarem em pequenos grupos, para realizarem as leituras e as comparações entre
as fábulas entregues. Após esse momento, a educadora encaminhou um diálogo entre a
turma sobre as características das fábulas, parte desse diálogo está transcrito abaixo.
Educadora: Você sabe o que é uma fábula?
Educandos: É uma história que tem lição de moral.
152
Tem animais.
Tem um ensinamento.
Educadora: Que pode ser chamado de que?
Educandos: De moral.
Pode ser no meio ou no final da história.
É uma coisa que o autor fala, por exemplo, a Tartaruga e a Lebre.
Educadora: Mas olha, quando eu perguntei para vocês o que era moral,
não era onde está escrito moral. Mas o que quer dizer moral, que é
como a gente deve se comportar, ou como a gente gostaria de se
comportar
(3º Encontro Educandos – 21/08/2008, 32 min).
Em seguida, na lousa, a educadora escreveu alguns aspectos que seriam
observados nas fábulas lidas pelos educandos, como na tabela a seguir:
Título Personagens Como
começa?
Como
termina?
Quando
acontece
a fábula?
Tem
narrador?
Moral
A educadora leu para os educandos cada item da coluna enfatizando as
interrogações.
Educadora: Título. Personagens. Como começa? Como termina?
Quando acontece a fábula? Tem narrador? Moral.
Como a gente sabe que é uma pergunta?
Educandos: Pelo sinal.
Educadora: Tenho que ler como uma pergunta. A gente vai responder
isso com base nos textos lidos
(3º Encontro Educandos -
21/08/2008, 40min).
Ressalta-se assim, que a educadora da turma, tenta, em vários momentos,
enfatizar para os educandos o emprego dos sinais de pontuação, mesmo quando o foco é
outro, ou seja, os educandos deveriam se atentar para os elementos destacados que seriam
observados nos textos.
Observemos o trecho abaixo, no qual discutiu com os educandos a presença do
narrador no gênero estudado.
Educador: Nessa daqui tem narrador? (referindo-se à fábula “A Coruja e
a Águia”).
153
Quando eu leio, eu sou Monteiro Lobato? Tem uma parte que eu sou o
narrador. Quando eu li a fábula: “A Menina do Leite”, tinha partes que eu
fazia a voz mais fina, eu era o personagem, mas tinha partes que eu
fazia com a minha voz, então aí eu era o narrador.
Tem narrador?
Educanda: Sim.
Educadora: Como vocês perceberam?
Educanda: Quando não tem travessão...
Educadora: Isso, quando tem espaço (referindo-se ao parágrafo), mas
não tem travessão é o narrador. E quando tem travessão?
Mesma educanda: É o personagem...
(3º Encontro Educandos -
21/08/2008, 51min).
Neste trecho, a educadora afirma ter lido uma fábula para a turma modificando
a voz, sendo assim, percebermos que a mesma orientou-se pela leitura realizada pela
pesquisadora de nosso grupo de pesquisa, reproduzindo a mesma dinâmica de leitura
realizada no primeiro encontro junto aos educandos.
A discussão da presença ou não do narrador também nos pareceu ter girado em
torno da pontuação, com a identificação do emprego do travessão, contudo, acreditamos
que quando o educador, muitas vezes o único leitor para as crianças modificam as vozes de
acordo com o aparecimento dos personagens, isso pode auxiliar o aprendiz na própria
interpretação do texto lido em voz alta.
Gostaríamos de enfatizar que no encontro ocorrido no dia 25/08/2008,
Encontro realizado com as Educadoras, ao observarem algumas das entrevistas realizadas
junto aos educandos do Ano e analisarem algumas das produções escritas dos mesmos
educandos, as educadoras, participantes do encontro, refletiram sobre as suas expectativas
em relação à produção textual e como essas estavam presentes nas falas dos educandos.
A seguir trouxemos alguns exemplos das produções iniciais dos educandos,
atividade que foi realizada no dia 07/09/08, lembramos que a produção inicial é a primeira
etapa da sequência didática, ela ainda não conta com intervenções do educador e serve para
demonstrar quais conhecimentos sobre o gênero a criança possui:
Texto 1:
154
A Tartaruga e a Lebre
Naquele dia de verão a tartaruga queria apostar uma corrida
que a tartaruga falou para o coelho chamar todos os animais da
floresta e a tartaruga apostou uma corrida com a lebre e a tartaruga
estava na frente da lebre e a torcida da tartaruga ganhou a corrida da
tartaruga e da lebre.
155
Texto 2:
A Lebre e a Tartaruga
Era um dia de verão e a tartaruga estava voltando do açougue
e a lebre falou:
- Bom dia senhora tartaruga, desse jeito a senhora não chega
em casa.
156
Após observarem os textos produzidos, as educadoras assistiram trechos das
entrevistas realizadas junto aos educados. Procurávamos que as educadoras observassem as
respostas das crianças produtoras dos textos analisados.
Com relação às respostas dadas pelo produtor do texto 2, a criança afirmou
enfaticamente que para se produzir um texto necessitava usar a pontuação e a paragrafação,
sendo assim, observamos que seu texto traz diversas marcas de pontuação, sem contudo,
empregá-las adequadamente, observamos que a criança não se preocupa em esclarecer
alguns fatos para um possível leitor de seus texto.
-É, pois é, eu vou chegar na minha casinha. Também, eu não
tenho as pernas iguais às suas! – exclamou a tartaruga.
Então tá bom, domingo vamos s duas fazer uma aposta!
exclamou a lebre.
A tartaruga falou:
- Então tá bom.
Chegou domingo, que era o dia da aposta.
O juiz era a raposa e todos os animais felizes estavam
torcendo para a tartaruga.
E o veado falou:
- Até eu consigo ganhar da tartaruga.
E a lebre falou:
- Aí, pobre tartaruguinha, está ganhando de mim. Eu ganho até
do cachorro eu acho que o caçador vai pegar você tartaruga.
E com a rapidez, a lebre quase ganhou, mas os amigos da
tartaruga falaram:
- Lebre, vem cá comer um lanchinho.
A lebre foi, mas de tão cheia deitou-se em uma árvore.
A tartaruga esperta foi de fininho até a chegada, quando a
tartaruga estava na chegada a lebre acordou e a tartaruga ganhou.
157
Segundo Cunha (2010), a realização das entrevistas com as crianças revelou a
importância do educador enquanto o único leitor para muitos dos educandos presentes nas
salas de aula. Embora nas entrevistas muitos educandos dissessem possuir material de
leitura em casa, eles próprios afirmaram não possuir ninguém que os lesse. Isso evidencia
mais uma vez a importância do papel educador-leitor e da valorização constante das
práticas de leitura e escrita em sala de aula.
Com relação a isso, outro aspecto que nos chamou a atenção nas entrevistas
realizadas com os educandos e analisadas por Cunha, refere-se à prática de leitura diária
realizada pelo educador da turma. Ao perguntar aos educandos quais as histórias
conhecidas esses, em sua grande maioria, responderam ser Chapeuzinho Vermelho, os
educandos apresentaram dificuldade em se lembrar de outras histórias ouvidas e
conhecidas.
Acreditamos que a atividade de leitura, feita pelo educador da turma é uma
prática constante, contudo, ressaltamos a importância de um trabalho oral após o término
da leitura. O educador pode solicitar, por exemplo, a atividade de reconto oral, buscando
resgatar os principais elementos da narrativa, ou mesmo explorar a escolha de
determinadas expressões pelo autor e quais efeitos elas provocam no leitor.
Quanto ao trabalho sistematizado com as características de cada gênero, a
educadora responsável pelo 3º Ano afirmou:
[...] eu nunca tinha trabalhado as características. A gente sempre falava:
olha é um conto... Mas não definia assim com tanta precisão: Olha é
assim, a gente pode fazer assim, a gente começa assim... Eu não fazia
essa comparação, eu mostrava a diferença de um conto, mas eu não
mostrava as características do gênero, porque é esse gênero, que tempo
ele está, quais as diferenças em relação a um outro. E facilita realmente,
eles sabem o que colocar: eu posso começar assim? Posso usar o “Era
uma vez”?
(Educadora do Ano B Encontro Educadoras
25/08/2008, 50min).
Sendo assim, a educadora traça uma reflexão sobre a própria prática,
comparando a forma utilizada para o trabalho com o gênero do discurso e a que tem
buscado colocar em prática a partir das reflexões em torno do trabalho com a sequência
didática para o ensino de um gênero escrito.
158
Sendo assim, acreditamos que a elaboração, estudo e desenvolvimento da
sequência didática também contribuíram para a reelaboração dos saberes relacionados ao
conhecimento pedagógico do conteúdo, tal como afirmamos acima, com base em
Mizukami (2004), além da compreensão do que significa ensinar um conteúdo de uma
disciplina específica, exige também a compreensão dos princípios e técnicas para tal
ensino.
Visualizamos assim, que os gêneros do discurso estavam presentes na forma de
trabalho da educadora e das demais participantes do grupo do estudo. Contudo, o trabalho
sistematizado sobre as características e as formas de utilização do gênero não eram
explorados, tal como discutimos em nosso referencial teórico.
No Encontro, realizado junto aos educandos, em 27/08/2008, a proposta de
atividade consistia na revisão coletiva de uma fábula produzida por um dos educandos da
turma, a realização da atividade foi bastante produtiva, pois ficou evidente para a
educadora da turma a importância da leitura do texto que está sendo revisado como um
momento de retomada para a inserção de novas ideias no texto, permitindo assim a revisão
constante. Consideramos a revisão de extrema importância, pois permite que se assegure
no texto elementos essenciais para a compreensão do leitor.
Segundo Bakhtin (2003), os gêneros do discurso são formas relativamente
estáveis que configuram os enunciados, sendo que estas são determinadas sócio-
historicamente. Dessa forma, cada manifestação linguística, seja na fala ou na escrita, é
realizada através dos gêneros do discurso, materializados sob a forma de enunciados. Isso
implica afirmar que os gêneros do discurso estão intrinsecamente relacionados às situações
interlocutivas, ou seja, toda a enunciação deseja a compreensão do ouvinte e espera que
este reaja de alguma maneira ao discurso.
Com base em Bräkling (2003), podemos afirmar que saber produzir discursos
textualmente envolve diferentes conhecimentos:
a) discursivos: relativos às características do discurso, como
conhecimento do gênero no qual o texto será organizado, do contexto de
produção, dos interlocutores da produção;
b) pragmáticos: relativos às especificidades da situação de comunicação
e às diferentes práticas sociais de escrita;
c) textuais: relativos à linearidade do texto, em si, como sintaxe,
pontuação, coesão e coerência;
159
d) gramaticais;
e) notacionais: relativos ao sistema de escrita
(BRÄKLING, 2003,
p.07)
.
Além desses conhecimentos, saber escrever envolve também o domínio de
alguns procedimentos:
a) saber planejar o que se vai escrever em função das características do
contexto de produção colocado;
b) saber redigir o que foi planejado;
c) saber revisar o que foi escrito durante o processo mesmo de escrita
e depois de finalizado;
d)
saber reescrever o texto produzido e revisado (BRÄKLING, 2003, p.
07).
Sendo assim, acreditamos que os gêneros do discurso, bem como os
conhecimentos e procedimentos que envolvem a prática da produção textual devem ser
ensinados na escola, objetivando o desenvolvimento das capacidades discursivas, orais e
escritas dos educandos.
Vejamos a situação de revisão textual coletiva, presente no Encontro com os
Educandos, a professora redigiu na lousa o texto selecionado para ser revisado:
Exemplo da reescrita individual (antes da revisão coletiva):
A Menina do Leite
Era uma vez uma menina do leite, na madrugada a menina acordou era o dia de ir
para o mercado e foi ordenhar suas 4 ovelhas.
Quando terminou a menina falou:
- Nunca minhas ovelhas deram tanto leite. A menina colocou o jarro na cabeça e foi
para o mercado. No meio do caminho encontrou sua vizinha e falou:
- Nunca vi uma menina carregar o jarro de leite na cabeça, cantando alegremente.
Ela deu um salto e ela deixou o jarro de leite cair.
Em seguida, deu início a revisão, privilegiando os elementos gramaticais como
foco da atividade sem, contudo, retomar a leitura do texto:
Educadora: “Exclamou a menina em lágrima” O que eu ponho aqui?
Educandos: Dois pontos.
160
Educadora: E na outra linha? Quando a pessoa vai falar?
“- Adeus leite, adeus galinha...”
Educandos: Bezerros, porcos, dinheiro...
Educadora: E o que eu ponho para separar tudo isso?
Durante o andamento da atividade, nós pesquisadoras estávamos incomodadas,
pois o texto reconstruído não assegurava minimamente os elementos que proporcionariam
a compreensão de um suposto leitor. Nesse momento realizamos uma pausa solicitando a
leitura do texto:
“A menina deu um salto de deixou cair o jarro de leite. Exclamou a
menina em lágrima:
- Adeus leite, adeus galinha, bezerros, porcos, dinheiro...”
Pesquisadora após a leitura de toda a fábula produzida até então:
Mas quem vai ler a fábula? Será que vai entender? Assim, do jeito que
está parece que a menina está levando tudo isso na cabeça... De onde
surgiram essas coisas?
Educandos: Ela estava sonhando com tudo isso, no pensamento...
Pesquisadora: Então temos que mudar o texto, porque do jeito que está
não está dando para entender que é isso...
(4º Encontro Educandos–
27/08/2008).
Observamos aqui, mais uma vez, que mesmo após realizarmos vários
encontros com os educandos e com as educadoras, destacando que a sequência didática
privilegia o trabalho e reflexão sobre o gênero que esta sendo produzido, destacando a
situação de interlocução, ou seja, produzir textos considerando-se o que, como, para que e
para quem. A educadora em questão, na maioria das atividades desenvolvidas buscava que
os educandos refletissem sobre a pontuação e a ortografia. No exemplo que trouxemos
acima, esses aspectos se sobrepõem à própria compreensão do texto, distorcendo assim a
proposta inicial, que era a de revisão, considerando-se um leitor para o texto trabalhado,
uma vez que o mesmo faria parte da coletânea de fábulas.
Nos encontros com as educadoras buscamos novamente recuperar a proposta
inicial de trabalho, assim como a importância da contextualização das atividades de escrita
para os educandos, ou seja, as crianças eram convidadas a escreverem para a confecção da
coletânea de fábulas da turma.
161
Durante a atividade de revisão, constantemente devemos retornar à leitura do
texto, buscando assim articular melhor os elementos, objetivando o desenvolvimento da
coesão e da coerência.
Em outra passagem, ainda no mesmo encontro com os educandos, podemos
observar a importância dessa prática. Novamente, nós, pesquisadoras tivemos que retomar
a leitura do texto:
No meio do caminho encontrou a vizinha que disse:
- Nunca vi uma menina com um jarro na cabeça cantando
alegremente e continuou o caminho para o mercado...
Pesquisadora: Mas quem disse isso, foi a vizinha?
Educanda: Foi o homem, o narrador.
Pesquisadora: Então o que temos que fazer? Colocar em outro
parágrafo, porque é outra ideia.
Educadora: Olha como vocês não estão prestando atenção,
misturam parágrafos com falas das vizinhas... (4º Encontro
Educandos– 27/08/2008).
Para os educandos, principalmente os que ainda estão se apropriando do
sistema de escrita, é imprescindível a leitura dos textos inseridos na lousa, sejam eles
produções ou revisões coletivas, mesmo sem lerem convencionalmente os educandos
podem sugerir expressões e apontar a alteração de termos que causam dificuldades para a
compreensão do leitor.
A retomada do texto que está sendo produzido ou revisado é uma prática
utilizada pelos produtores de texto. Ao educador não cabe somente ser o leitor para os
educandos, mas um escritor que compartilha os processos, as estratégias e as dificuldades
de se escrever.
Em pesquisa realizada por Rizzati (2008) verificam-se os baixos níveis de
utilização da leitura e escrita por parte das educadoras e questiona-se como estes poderiam
formar leitores e produtores de texto. Segundo a autora:
Aqui, vale mencionar Vygotsky (1956/2000), para quem mediar a
informação de uma habilidade em outrem supõe -la desenvolvido
preliminarmente em si mesmo. Assim, professores que não são leitores
teriam condições de mediar a formação de leitores? E mais: não sendo
leitores, tais professores seriam efetivamente proficientes produtores de
162
texto? E, não o sendo, poderiam formar produtores de texto?
(RIZZATI,
2008, p. 57).
Acreditamos que tal problemática possa ser minimizada desde que os textos
produzidos no interior da escola deixem de sofrer a descaracterização que anunciamos, na
qual verificamos que a escola, pretendendo tornar a língua um objeto ensinável, retirou-a
do contexto em que é produzida e passou a considerá-la longe da dinâmica discursiva.
Vejamos a seguir a versão final do texto revisado coletivamente:
Revisão Coletiva – versão final: A menina do leite
Era uma vez uma menina do leite, na madrugada a menina acordou, era o dia de ir
para o mercado e foi ordenhar suas quatro ovelhas.
Quando terminou a ordenha ela falou:
- Nunca minhas ovelhas deram tanto leite!
A menina colocou o jarro na cabeça e foi para o mercado e no caminho encontrou
sua vizinha que disse:
Nunca vi uma menina carregar um jarro de leite na cabeça cantando alegremente.
A menina foi sonhando acordada e em voz alta:
- Quando chegar ao mercado venderei o leite por um bom preço, por ser bem
cremoso e fresquinho, a quantidade do dinheiro será tão grande que não caberá em minhas
mãos.
Ela deu um salto e deixou o leite cair no chão e exclamou em grimas porque seus
sonhos não seriam realizados:
- Adeus leite, adeus galinhas, porcos, bezerros, dinheiro, vestidos e palácio.
E a menina foi dizendo pelo caminho:
- Não siga meu exemplo, não seja ambiciosa, aproveite o que você tem, pois sua
vida será mais gostosa.
Voltamos a defender que os conhecimentos que envolvem a prática de
produção textual, tomando os gêneros discursivos enquanto objetos de ensino, assim como
os procedimentos que envolvem a escrita necessitam serem ensinados nas escolas, de
forma que o educando se aproprie dos mesmos, gerando novas possibilidades de
interlocução.
Retomemos o conceito de apropriação presente em Marx e Engels (1945-
1846/1969) citado por Schneuwly (2004), para o qual a apropriação de uma totalidade de
instrumentos corresponde ao próprio desenvolvimento de capacidades nos indivíduos.
163
Acreditamos que a apropriação de um gênero do discurso, compreendido
enquanto instrumento, possa auxiliar o sujeito nas diversas situações de comunicação que
participará.
Compartilhamos da hipótese que o educador possa ser o leitor e o escritor
modelo para os educandos, desde que este revele aos aprendizes os procedimentos que
envolvem as práticas da leitura e escrita, se aproximando de seu objetivo: favorecendo a
ampliação de situações interlocutivas, facilitando o diálogo em diferentes âmbitos sociais e
atuando no processo de humanização do educando.
No encontro com as educadoras, Encontro, realizado em 01/09/08, os
mesmos socializaram sobre a atividade de revisão coletiva. Muitas educadoras comentaram
as dificuldades sentidas durante a realização da atividade, que giraram em torno da
mudança completa do texto original e do enfoque em outros elementos do texto que não se
aproximavam das características do gênero, como podemos visualizar nos comentários das
seguintes educadoras:
Acabamos fazendo uma atividade de revisão coletiva, eles não tiveram
condições de fazer em dupla, fizemos em dupla e verificamos se a
crônica seguia ou não as características
(Educadora da 3ª Série A - 6º
Encontro – 01/06/2008).
Foi muito difícil a atividade de revisão, acho que eles o dão conta.
Então eu propus que eles criassem uma nova história, porque nós estamos
trabalhando contos folclóricos. Não dava para fazer a revisão, cada um
quis fazer a sua
(Educadora do Ano B - Encontro
01/06/2008).
Essa dificuldade consiste no próprio enfoque dado pelas educadoras aos
elementos como pontuação, ortografia e gramática e não à incorporação de informações
importantes para que o leitor compreenda os textos que são produzidos pelos educandos,
ou seja, a atividade não foi considerada como um procedimento da prática de escrita que é
concebida dentro da dinâmica discursiva: escrever para ser lido por alguém.
Sendo assim, é imprescindível ao educador focar os elementos do texto e neste
caso chamamos a atenção não para as características do gênero estudado, mas também
se considerando a dinâmica interlocutiva, levando os educandos a analisarem criticamente
164
– primeiro coletivamente, depois individualmente – os textos de seus colegas e seus
próprios, verificando se conseguiram contemplar a escrita dentro de um gênero proposto.
Acreditamos que tal dificuldade vivenciada pelas educadoras durante o
encaminhamento de algumas propostas de trabalho com a escrita, relaciona-se com o início
do trabalho com um novo objeto de ensino: os gêneros discursivos na escola, conforme
apontamos em nosso referencial e aqui em outros momentos de nossa análise.
Outra educadora, que trabalha com o gênero contos de assombração também
contou como havia sido a atividade de revisão.
Tinha uma aluna, ela produziu uma narrativa muito pobre, com poucas
linhas, a história teve que mudar porque teve que acrescentar, mas a
turma discutia e a autora escolhia o que iria acrescentar
(Educadora
série A- 6º Encontro – 01/06/2008).
Eu estava discutindo com uma aluna da turma dela que tem dificuldade
com o sistema de escrita, era uma história que tinha um tulo assim, A
Casa Assassina, então eu disse: “olha tem que criar um clima de
suspense, assim você já está dizendo para o leitor que é a casa que mata
das pessoas”, então a aluna sugeriu O Vento”, porque tinha mesmo um
vento na história [...] eu disse: isso, assim vontade de ler e saber
desse vento”. Eu acho que para essa aluna o gênero já escontemplado,
é mais o sistema mesmo, mas eu percebo que as histórias dela
contemplam o gênero
(Coordenadora Pedagógica- Encontro
01/06/2008).
Podemos perceber, assim, que algumas educadoras elaboram estratégias junto
aos educandos para refletirem e contemplarem a proposta de trabalho com as sequências
didáticas para o ensino de um gênero do discurso escrito. Levar os produtores a se
colocarem no lugar de leitor é um dos processos importantes na prática da escrita, sendo
assim, o comentário que partiu da coordenadora pedagógica da unidade de ensino, auxilia
as educadoras presentes a refletirem e elaborarem estratégias de trabalho junto aos seus
educandos.
Acreditamos que o ambiente escolar possa se tornar um local de permanente
reflexão, não somente na presença de pesquisadores que possam contribuir no processo de
interlocução e reinterpretação de pesquisas, mas entre as próprias educadoras, que podem
dialogar, refletir e transformar a prática pedagógica.
165
Voltamos a enfatizar as práticas de revisão textuais, enquanto processo da
própria atividade de escrita na qual se considera a situação interlocutiva, sendo assim, as
dificuldades encontradas pelas educadoras, demonstradas acima, indicam a pouca
frequência de tal atividade.
Ainda com relação às dificuldades encontradas no momento de se colocar em
prática a proposta de trabalho com a sequência didática para a aprendizagem de um gênero,
uma educadora do Ano sinalizou o fato de que nem todos os seus educandos
conseguiam registrar os textos que eram produzidos coletivamente, mesmo se tratando da
produção textual realizada individualmente os educandos encontravam dificuldades em
retomarem o que havia sido registrado.
A pesquisadora e as demais educadoras presentes sugeriram alternativas para
as dificuldades apresentadas. Sendo assim, durante a realização de uma produção ou
reescrita coletiva, os educandos não precisavam registrar a produção, enfatizou-se a
necessidade de participação dos mesmos, sugerindo, opinando sobre o texto registrado pela
educadora, essa produção poderá ser disponibilizada aos educandos em um outro
momento.
Quanto às produções realizadas individualmente, foi aconselhado que as
mesmas fossem coletadas na presença do educador, este deveria acompanhar o registro da
criança, auxiliando-a no resgate de sentido do que se pretende escrever, tratava-se de uma
atividade que demandava tempo, mas que não deve deixar de ser realizada.
Esse diálogo em torno das dificuldades de realização das atividades de
produção textual foi muito importante, pois houve o resgate da importância em se produzir
textos junto aos educandos que ainda não se apropriaram do sistema de escrita,
apresentando a eles e os envolvendo nas atividades de leitura, reconto, (re)escrita e revisão.
Dentro do espaço de realização do Curso de extensão sobre a produção textual,
verificamos a configuração de momentos de reflexão sobre a prática, pois as educadoras
encontram oportunidades de socialização de dificuldades, experiências bem sucedidas e
angústias sobre o trabalho. Nesses diálogos as educadoras visualizaram alternativas para a
superação das dificuldades.
Vejamos o que uma das educadoras participantes dos encontros relatou sobre a
atividade de reconto, sugerida dentro do Curso de Extensão:
166
O reconto, a gente não realizava o reconto, a gente conversava sobre, eu
lia as histórias e depois começou o reconto, com o curso eu comecei o
reconto e como aumentou o repertório dos alunos, foi maravilhoso,
melhorou muito...
(Educadora do Ano C, Encontro
08/09/2008).
Percebemos assim, que várias atividades sugeridas e discutidas como
alternativas para as dificuldades encontradas pelas educadoras durante a realização das
propostas de trabalho vão sendo incorporadas às suas práticas e apresentam-se como
melhoras significativas no processo de trabalho com o ensino sistematizado de um gênero.
Outro exemplo relacionado à incorporação das sugestões nas práticas das
educadoras pode ser percebido na realização do Encontro com os educandos no dia
09/09/2008, durante a produção coletiva de uma fábula, a educadora da turma retomou
várias vezes a leitura do texto que estava sendo produzido pela turma de educandos,
enfatizando a leitura pausada e acompanhada por uma gua, tal atividade auxiliou no
envolvimento dos educandos, pois a todo o momento o produto era retomado,
complementado e revisado.
“Em uma tarde de muito calor o corvo e uma leoa estavam brincando de
apostar uma corrida...
Professora para a turma e realiza uma rápida discussão para ver quais
os termos seriam utilizados, a sugestão fica:
“Em uma tarde de muito calor o corvo e a leoa estavam brincando de
apostar uma grande corrida valendo uma medalha.”
Este trecho foi lido bem pausadamente.
Educadora: Quem está falando até agora?
Educanda: O narrador.
Educadora: E aí... mas a gente vai escrever esse aí? A gente pode falar,
mas pode escrever?
Turma toda sugere, mas a educadora quer inserir a ideia de um educando
que não consegue ser ouvido.
Educadora: Gente, eu quero pegar a ideia dele também...
Turma faz silêncio e o educando fala modificando a voz, em um tom
mais fino:
Educando: Você acha que vai ganhar de mim?
(7º Encontro Educandos – 09/09/2008).
Esse trecho é duplamente interessante, em um primeiro momento por
apresentar a incorporação da prática da leitura enquanto retomada do texto que se está
167
produzindo, elemento essencial da verdadeira produção, apresentando-se assim, ao
educando mais uma etapa da complexa atividade da escrita; e também, em um segundo
momento, pela postura do educando em modificar a voz no momento em que aparece a
fala da personagem que estará presente na produção. Isso nos indica que essa atividade,
apresentada pela pesquisadora durante a leitura no primeiro encontro com os educandos,
foi incorporada pela educadora da turma, que possivelmente repetiu esse procedimento nos
momentos de leitura em voz alta.
Esse trabalho consistiu na primeira produção sem apoio da turma, ou seja não
se trata de uma fábula reescrita, mas sim, criada pela turma:
O CORVO APAIXONADO E A LEOA SORTUDA
Em uma tarde de muito calor o corvo e uma leoa estavam brincando de apostar uma grande
corrida, valendo uma medalha.
O corvo se achava mais veloz e inteligente do que a leoa.
A leoa de tão tímida e inteligente tinha um sonho que era ganhar a corrida.
Em uma outra tarde a leoa encontrou com o coelho e ela perguntou:
- Senhor coelho, gostaria de ser o juiz da nossa corrida?
- Adoraria minha querida amiga! Respondeu o coelho combinando o seguinte:
No sábado às treze horas em uma pista de corrida de formula um acontecerá a corrida.
As aves irão torcer pelo corvo e os animais terrestres irão torcer para a leoa.
Passaram os dias e chegou a hora da corrida e estavam lá todas torcidas, o coelho que era o
juiz iniciou com o tiro de largada.
Na hora da corrida o corvo viu um corvo fêmea e se apaixonou instantaneamente,
esquecendo totalmente da corrida.
A leoa saiu correndo em disparada vencendo a corrida, ganhando também a tão sonhada
medalha.
Moral: O sonho e a sorte sempre dão certo.
(Produção Coletiva Sem Apoio do 3º ano – D)
Nesse sentido, a leitura realizada durante o processo de produção textual, ou
seja, a leitura do próprio texto que se está produzindo permite que o mesmo seja observado
criticamente pelo autor/escritor, garantindo a inserção de informações importantes para a
compreensão de um suposto interlocutor, no caso o leitor do texto.
Ainda com relação à importância da retomada da leitura do texto que está
sendo produzido, a educadora da turma, durante o momento de produção, chama a atenção
dos educandos para tal prática:
168
Educadora: Vamos ler mais uma vez, será que está com sentido? Vamos
ver se dá para entender...
(7º Encontro Educando - 09/09/2008).
Podemos verificar, assim, que algumas práticas de produção textual foram
incorporadas tanto com relação às educadoras, quanto com os educandos que participaram
da proposta. Acreditamos assim, que o texto passou a ser tomado em sua complexidade, ou
seja, considerando-se a situação de produção e de interlocução que será objeto.
Apresentar aos educandos os procedimentos que envolvem a escrita é um dos
elementos que caracterizam o ensino de língua que considera a dinâmica discursiva,
portanto permite que os gêneros do discurso sejam concebidos realmente enquanto objeto
de ensino.
Podemos afirmar então, que o trabalho com a sequência didática
instrumentalizou tanto educadoras, quanto educandos, às educadoras, pois pode oferecer-
lhes uma reflexão sobre o ensino sistematizado de um gênero e aos educandos, pois os
potencializa para o difícil processo de produção textual.
Quanto à instrumentalização das educadoras, podemos afirmar isso pelas falas
das mesmas, presentes no último encontro, realizado em 06/10/2008. Percebemos a
presença da continuidade do trabalho na realização de uma nova sequência didática:
Eu levei várias notícias, todos eles viram que havia vários fatos
diferentes, tinha local, data, dependendo da extensão da notícia tinha
também depoimento, manchete. A gente comparou com os contos de
assombração quando tinha fala de personagem o que a gente coloca? Ah,
coloca o travessão. E no depoimento? vem entre aspas... O conto é
algo inventado e na notícia não, é um fato que acontece.
Depois dessa discussão a gente fez uma produção coletiva sobre a nossa
visita ao Centro de Cultura Afro Odete dos Santos, que nós fomos essa
semana. Pegamos e colocamos o depoimento de alguns alunos e eles
quiseram colocar o depoimento da moça que nos atendeu lá, eu disse que
o certo era a gente ter gravado, ter pedido autorização para isso, mas
como o teríamos muito tempo para isso, eu disse que a gente poderia
colocar algumas coisas que foram ditas. Então nós fizemos a coletiva.
Depois disso, eles fizeram a produção de uma notícia individual. Eu
trabalhei a leitura de um poema, somente para contextualizar a escrita da
notícia. Com poesia eu já tinha trabalhado antes, então eles já conheciam.
O poema falava do afogamento de um menino, só que em uma linguagem
mais romântica, então a sereia tinha levado o menino, os pais não o
veriam mais, porque a sereia não queria jóia, nem nada, então era uma
linguagem bem romântica.
169
Então a proposta era transformar aquilo em uma notícia, tinha que
imaginar uma cidade. Mas pode ser São Carlos? Não, porque São Carlos
não tem mar.
Eu não sei se isso pode ser certo, porque a notícia não pode ser inventada,
mas eu queria que eles escrevessem uma notícia mais orientada, que
pensassem na manchete, no local, na data, obedecendo a estrutura
mesmo. E eles fizeram, uns conseguiram fazer, outros não...
A gente ainda ficou de combinar para fazer a revisão individual, então a
gente seguiu mais ou menos essa sequência
. (Educadora da Série
A- 10º Encontro Educadoras - 06/10/2008).
Houve a ressignificação do instrumental, pois a educadora inseriu, na nova
sequência didática posta em prática, atividades diferenciadas, como a transformação de um
gênero em outro poesia para notícia -, contudo, a análise sobre os elementos
característicos do gênero permanece.
As falas abaixo nos levam a acreditar que o grupo de educadoras configurou-se
em um espaço aberto para socialização de experiências, bem como de atividades
produzidas pelos educandos e um facilitador de reflexões coletivas e colaborativas, é o que
podemos concluir a partir das seguintes passagens:
Eu achei interessante porque você fez as crianças entenderem as partes da
notícia. Eu percebi que nos textos dos seus alunos as crianças produzem
certinho o leedy e depois a notícia com maiores detalhes
(Educadora
do 2º Ano A - 10º Encontro Educadoras - 06/10/2008).
Eu percebi que a notícia foi mais fácil do que os Contos de Assombração
(Educadora da Série A- 10º Encontro Educadoras -
06/10/2008).
Talvez por ser um gênero que eles conhecem mais... porque eles noticiam
muitas coisas que acontecem na rua, no bairro...
(Educadora do
Ano A - 10º Encontro Educadoras - 06/10/2008).
Consideramos ao longo de nosso trabalho a reflexão sobre a prática elemento
essencial do ser professor. Sendo assim, a reflexão é compreendida como:
A reflexão é um processo de atribuição de significados que leva o
professor de uma experiência a outra seguinte, com um grau de
compreensão mais profundo de suas relações com a primeira e conexões
com outras experiências e ideais. É este o fio condutor que faz com que a
170
aprendizagem continuada seja possível e garanta o progresso da pessoa e,
em última instância, da sociedade
(REALI e REYES, 2007, p.28).
Somente essa análise crítica é capaz de nos direcionar para uma ação mais
consciente de nosso fazer docente. Sendo assim, consideramos que o trabalho com a
sequência didática e a realização do Curso de Extensão sobre a produção textual
configurou-se em um lócus de reflexão sobre a prática pedagógica, possibilitando a
reflexão crítica e um redirecionamento do caminho a ser percorrido, resgatando o
significado e o sentido da atividade docente.
Eu gostei muito do trabalho, refleti como eu coloco o gênero, que nem,
antes eu falava: “Olha, hoje eu vou ler mais uma fábula, hoje eu vou ler
uma poesia, hoje eu vou ler uma notícia...”. Então eu mostrava o material,
mas não o definia como era a estrutura, então através de vocês eu
melhorei, espero que a gente construa mais. Eu gostei sim, eu achei que
foi bom
(Educadora do Ano B - 10º Encontro Educadoras -
06/10/2008).
Quando eu trabalhava no Estado eu já tinha trabalhado a produção de
texto e aí me deu uma outra visão, então já fazia dois anos que eu
trabalhava no semestre eu tinha quatro turmas, duas de produção e
duas de alfabetização, 2ª. e era alfabetização e e 6ª era produção.
Então no ano passado teve muito mais produção e era realmente você
focar em um gênero, então pra mim eu achei muito interessante. Quando
eu cheguei e as meninas falaram que vai ter esse curso, então eu disse:
“Nossa!”. Então eu vi a diferença... deu pra ver onde eu estava errando,
você tem n caminhos, aqui ficou mais claro.
(Educadora do Série B - 10º Encontro Educadoras -
06/10/2008).
Quando vocês chegaram a gente trabalhava um pouco com as “Oficinas
de Texto”, foi interessante, porque além das oficinas nós apresentamos
os outros gêneros, focando no caso do Conto e o quanto eles
cresceram! Não nesse gênero, mas também nos outros gêneros. Hoje
mesmo eu trouxe um folheto informativo e eles souberam debater sobre
isso, alguns disseram: “Esse é um folheto informativo”. outros
disseram: “Espera um pouquinho que eu vou ler para me certificar”. Eles
leram, qualquer gênero novo que eu trago, não os Contos, porque a
gente caminha também com os outros, eles souberam observar quais o
as características, quais os elementos, souberam qual é o gênero, teve
uma aluna que falou: “Receita? Não, isso não pode ser uma receita. Um
poema? Nem pensar! Um poema nunca seria apresentado dessa maneira”.
Essa aluna consegue fazer esse levantamento e atinge ainda mais os
amiguinhos da sala, é muito interessante.
171
Essa sistematização que o curso trouxe ajudou ainda mais a oferecer
ainda mais condições para eles mostrarem tudo o que são capazes. Então
veio a acrescentar positivamente ao nosso trabalho
(Educadora do
2º Ano A -10º Encontro Educadoras - 06/10/2008).
Verificamos aqui que o trabalho com a sequência didática e a identificação das
características do gênero tornou-se, segundo as professoras participantes, um instrumental
para os educandos também, pois os conhecimentos conquistados permitiram-lhes
compreender outros gêneros que circulam socialmente.
Eu também achei que foi muito produtivo, eu mudei muito a minha
prática, claro que eles mudaram muito também, teve um acréscimo
significativo e eu vejo assim; é minha prática que vai refletindo neles,
quer dizer na produção dos alunos então hoje a produção deles está muito
melhor, teve um progresso ímpar, então eu estou muito satisfeita.
(Educadora da Série B - 10º Encontro Educadoras -
06/10/2008).
Eu queria comentar sobre a sala do Ano, teve um dia que eu cheguei e
a professora tinha trabalhado que podiam arrumar em tal texto. Então eles
falaram várias coisas: “está sem sentido, tem arrumar o título, faltou
explicar o final...”. Então eu vi que são várias coisas que foram
trabalhadas no curso, que com os termos deles, então tinha uns quatro
ou cinco itens que eles tinham levantado na lousa e eram exatamente o
que a gente tinha visto no curso. Na verdade a gente estava vendo tudo ali
na turma dela, pelo trabalho dela que eles estão aprendendo. Porque tudo
o que ela está aprendendo aqui eles estão aprendendo lá, eles também
percebem o que precisa ser melhorado
(Coordenadora Pedagógica -
10º Encontro Educadoras - 06/10/2008).
Dessa forma, a melhora significativa nas produções escritas dos educandos foi
percebida pelas educadoras como resultado de sua ação docente.
Eu compreendo hoje o que a Professora Claudia Reyes dizia que um
gênero para ser esgotado ele precisa ser extremamente trabalhado, então a
gente percebe que não é trabalhar: ler, ler, ler, ler. A criança não se
apropria por leitura, não é por osmose, não adiante você fazer a
leitura, ler todos os dias do ano o mesmo gênero, isso não garante que as
crianças vão compreender todas as características do que é uma fábula,
você precisa trabalhar toda uma série de sequências, senão a criança vai
se perder dentro do que é uma fábula.
172
Eu percebo assim, que mesmo que eu não consegui trabalhar muito bem a
escrita, eu consegui trabalhar muito a oralidade, muito, eu percebi que
eles conseguem estruturar dentro, com as características do gênero, coisa
que eles não faziam, então, assim, eu não tenho o fechamento da escrita,
mas eu tenho contos com tanta qualidade que eles produziram oralmente,
antes eles falavam assim: A Chapeuzinho saiu da casa dela e encontrou
com o lobo e acabou”. Agora eles se preocupam com tudo o que
aconteceu, com tantos detalhes, com tantas minúcias, eles perceberam
que não pode ser de qualquer jeito.
Eu entendi como ela dizia, tem que se esgotar o trabalho em cima de um
gênero. Eu fiquei lendo durante um mês um gênero e achei que tinha
esgotado...
Eu não sei se na ACIEPE Comunidades de Aprendizagem todo mundo
tem noção do que é isso? Eu percebi isso quando a gente foi fazer o
primeiro instrumento avaliativo. As professoras diziam que tinha
esgotado o gênero, mas tinha lido. Eu achei que tinha esgotado bilhete,
mas o, eu li bilhete, eu produzi bilhete, mas não o esgotei então eu
sinto isso, clareou bastante essa situação de esgotar um determinado
gênero
(Educadora do Ano A - 10º Encontro Educadoras -
06/10/2008).
O trabalho sistematizado para o ensino de um gênero, viabilizado pelo estudo e
compreensão da sequência didática, permitiu ao educador a percepção de seu papel
enquanto mediador do conhecimento para os educandos. No caso do desenvolvimento da
complexa atividade de produção textual, todas as etapas da produção devem ser
vivenciadas e colocadas em práticas, sendo assim, a leitura se revela como uma atividade
essencial para a formação de bons escritores, contudo, não é a única atividade a ser
valorizada.
No processo de produção textual, vários procedimentos devem ser ressaltados e
ensinados, em primeiro caso trata-se de tomar a escrita em sua complexa atividade de
interlocução, pensando-se inicialmente o que se quer dizer para o suposto leitor do texto a
ser produzido e que forma assumirá esta produção.
Então eu acho que pra mim, me deu muita segurança essa questão da
sequência mesmo, como trabalhar o gênero, então eu ficava meio perdida
nisso: e agora? Como eu faço para sair uma produção de texto? Eu ia
fazendo de forma aleatória, então uma sequência, não para os meus
alunos, mas para o meu trabalho também, facilita muito essa sequência
que a gente tem que seguir.
(Educadora da Série A- 10º
Encontro Educadoras - 06/10/2008).
173
Conforme salientamos no início de nosso trabalho, várias políticas públicas
enfatizam a importância do ensino da língua materna pautada no texto. Somos conscientes
da enorme discussão sobre a temática, principalmente no meio acadêmico, contudo
acreditamos que as discussões, estudos e resultados de pesquisas não são acessíveis a
muitas educadoras que encontram enormes dificuldades para garantir a produção textual de
seus educandos com mínima qualidade. Sendo assim, a disponibilização do estudo com o
trabalho pautado em sequências didáticas para o ensino sistematizado de um gênero
garantiu, como a educadora ressalta, a segurança no desenvolvimento do trabalho em sala
de aula.
4.4. Sobre as aprendizagens dos educandos.
Viemos até aqui tecendo algumas considerações acerca das vantagens
percebidas pelas educadoras que colocaram em prática o trabalho desenvolvido com a
sequência didática, bem como algumas alterações significativas na própria prática docente,
sobretudo no que se refere ao próprio tratamento dado à produção textual. Porém
percebemos que outras vantagens vão além da aprendizagem das características de um
gênero do discurso escrito.
O que eu percebi na sala da educadora do Ano é que tinha algumas
crianças que estavam estagnadas com relação ao sistema de aquisição da
escrita, nesse processo, em que ela esteve trabalhando com o gênero eles
melhoraram muito o sistema, crianças que estavam silábicas ficaram
silábico-alfabéticas, alfabéticas, em texto também, você a criança está
caminhando. Então, a gente viu que as crianças melhoraram muito com
relação a esses veis conceituais de escrita também, então foi muito
prazeroso ver esse processo e foi algo muito rápido
(Coordenadora
Pedagógica - 10º Encontro Educadoras - 06/10/2008).
Teve um dia que a gente sentou e viu: “Nossa, será que é isso mesmo?
Espera aí, vamos olhar direitinho. É isso mesmo!”.
(Educadora do
Ano A - 1 Encontro Educadoras - 06/10/2008, refere-se ao
avanço nos níveis conceituais de escrita).
174
O trabalho com a produção textual que considera o gênero do discursos
enquanto objeto de ensino, torna a produção textual contextualizada, pois se considera a
situação real de interlocução, dessa forma é necessário a mobilização de conhecimentos
que vão além da identificação das características do gênero que se estuda. Conforme
anunciamos com base em Bräkling (2003), saber produzir discursos textualmente implica
no conhecimento de elementos discursivos, pragmáticos, textuais, gramaticais e
notacionais.
Sendo assim, observou-se o avanço nos níveis conceituais de escrita
apresentados pelos educandos, pois o trabalho com as unidades menores da língua esteve
contextualizado graças ao trabalho com o texto.
É o calço. A criança não fica tão perdida no que ela vai produzir, ela
tinha uma dificuldade, então antes ela tinha que pensar em vários fatores
para escrever
(Educadora do 3º Ano B- 10º Encontro Educadoras
- 06/10/08).
É uma questão de segurança, então deu para observar esse avanço, então
como elas tem esse lado seguro, que é o conhecimento do gênero que
está sendo trabalhado, então elas se apegam em outras questões. O
desafio está em outra coisa, o que as permitem avançar
(Coordenadora
Pedagógica- 10º Encontro Educadoras - 06/10/08).
Não as unidades menores da língua foram contextualizadas, mas também os
diferentes procedimentos que envolvem a produção textual. Com base também em
Bräkling (2003), saber escrever envolve os conhecimentos relacionados aos procedimentos
da escrita que são: saber planejar o que se vai escrever em função das características do
contexto de produção; saber redigir o que foi planejado; saber revisar o que foi escrito; e
saber reescrever o texto produzido e revisado.
Sendo assim, as educadoras indicaram que ao longo do desenvolvimento da
sequência didática a prática de revisão ganhou sentido e significado, é o que podemos
observar ao longo das socializações abaixo:
Essa revisão que a gente fazia em dupla, como melhorou a revisão que
agora eles fazem sozinhos antes de me entregarem qualquer coisa, eles se
certificam daquilo antes de me entregar, então eles internalizaram isso,
eles fazem a revisão antes de me entregar, isso é importantíssimo,
175
principalmente na hora da produção individual
(Educadora do Ano
- 10º Encontro Educadoras - 06/10/2008).
Então, um fato que eu achei bem bacana, foi a questão deles estarem
analisando um texto do colega, então eu achei que isso contribuiu a fazer
a revisão do próprio texto, é mais fácil criticar o do outro, para depois
olhar o seu, eu achei que isso contribuiu bastante
(Educadora da
Série B- 10º Encontro Educadoras - 06/10/2008).
Quando eles estão revisando o texto do outro acontece aquilo que a gente
falou, eles sabem como ler e como rever os textos deles. “Mas você já leu
seu texto, viu se está tudo certinho antes de me entregar?”. “Já, li”.
Mas eles não liam, eles lembravam o que tinham escrito, agora não, como
eles tiveram que corrigir os textos dos colegas, para ver o que estavam
faltando eles agora leem.
Antes eu dava uma produção e ela vinha limpinha, não tinha nada
apagado, nada borrado, nada, agora eu vejo que as crianças trazem e
falam que fizeram a revisão. Então eu observo que eles tiveram uma
preocupação com a estrutura, qual é o gênero e também com a questão
ortográfica, que antes eles não tinham, então melhorou bastante
(Educadora da Série B- 10º Encontro Educadoras -
06/10/2008).
Essa primeira revisão que foi feita, eu pedi para que eles olhassem apenas
esses elementos da narrativa, orientei para que não se preocupassem com
palavras escritas erradas, mas eles queriam olhar tudo, tudo dentro
daquilo que eles tinham possibilidade.
(Educadora da Série B- 10º
Encontro Educadoras - 06/10/2008).
Nós fizemos duas atividades de revisão, mas com as mesmas duplas e era
interessante como eles elogiaram a produção: “Nossa, vocês estão de
parabéns, nessa vocês não esqueceram do título, vocês melhoraram
bastante”. Achei interessante isso, de uma dupla elogiando a outra
(Educadora do Ano A- 10º Encontro Educadoras -
06/10/2008).
É interessante relembrarmos que as atividades de revisão desenvolvidas ao
longo da sequência didática iniciaram-se coletivamente, a partir de um texto produzido por
um dos educandos, em um segundo momento, essa atividade foi realizada em duplas de
educandos e depois individualmente a partir de um texto produzido pela própria criança, ou
seja, ela mesma realizava a revisão de um texto produzido por ela. As atividades de revisão
objetivam verificar se o autor havia contemplado o gênero proposto, ou seja, se havia
escrito de acordo com as características do gênero estudadas até então.
176
Abaixo, podemos verificar alguns exemplos da atividade de revisão realizada
em duplas. As crianças haviam realizado uma reescrita em dupla e depois uma outra dupla
de educandos revisaram o texto, anotando alguns elementos que precisavam ser
explorados, apresentados e melhorados no texto:
Revisão de alguns elementos realizada por outra dupla de educandos com
relação ao texto 1, encontro do dia 01/09/2008.
Reescrita 1:
Um dia, em uma casa tinha um gato que tinha uma casa perto
da casa dos ratos. Os ratos estavam com fome e fizeram uma reunião
de ratos. Todo mundo teve uma ideia.
Um rato falou: “coloca um sino.”
O líder falou: “quem vai colocar o sino no pescoço do gato?”
Ficou um silêncio, ninguém quis colocar o sino.
Moral: Fácil é falar, difícil é fazer.
177
Reescrita 2:
1- Está falando muito a palavra casa;
2- Precisa falar quem mora perto da casa do rato;
3- Colocar o sino no gato para saber onde está o gato;
4- Precisa melhorar a história;
5- Os animais precisam falar na fábula
178
Podemos observar que as crianças que comentaram as fábulas reescritas dos
colegas demonstram conhecimentos com relação aos elementos característicos do gênero
fábulas. Com relação aos comentários presentes no levantamento dos elementos que
deveriam ser revisados na reescrita 1, os educandos ressaltam além das características do
gênero, como a presença dos animais que falam, elementos que garantiriam a
interpretabilidade do texto, como indicar aos leitores que um gato morava perto da casa
dos ratos e que a intenção era que o sino indicasse a presença ou não do gato.
Assembléia dos ratos
O ratinho queria colocar um sino no pescoço do gato.
Resolveram fazer uma reunião para ver quem ia colocar no pescoço
do gato. O ratinho falou que ele iria colocar no pescoço do gato.
É fácil falar mais difícil fazer.
1- Falta fazer o começo da fábula;
2- Faltou colocar o “ç” na palavra pescoço;
3- Faltou colocar os personagens;
4- Faltou colocar a moral.
179
Quanto aos comentários relacionados à reescrita 2, observamos que as crianças
indicam mais os elementos característicos da fábula, como o início, a presença de moral e
o delineamento dos personagens.
Ainda com relação à prática da reescrita, consideramos interessante o
comentário expresso por uma das coordenadoras pedagógicas da escola:
[...] quando a gente pedia para os alunos revisarem o texto: “olha vai
revisar seu texto e o que a gente pode arrumar...”. Eu até comentei
com a outra coordenadora: Se ele soubesse o que arrumar, teria
arrumado antes de nos entregar...”. Agora não, agora ele pode arrumar,
porque ele tem uma base do que arrumar. Então a gente calçou... a gente
calçou para que ele possa arrumar o texto
(Coordenadora Pedagógica
- 10º Encontro Educadoras - 06/10/2008).
Consideramos interessante este trecho, pois evidencia, mais uma vez, que os
educandos podem apresentar os conhecimentos como apreendidos, caso o educador
cumpra com sua tarefa primordial que é a de ensinar, a de mediar os conhecimentos
socialmente construídos, mas para isso, esses conhecimentos também precisam estar
presentes em sua base de conhecimento para o ensino.
A seguir, apresentamos algumas fábulas que compuseram a coletânea entregue
a cada educando da turma do terceiro ano ao término do trabalho desenvolvido junto à
turma com a sequência didática:
UM DIA DE BRINCADEIRAS
Um tigre estava correndo e encontrou uma onça que o convidou para brincar.
A onça ficou brincando de boneca e o tigre de skate. De repente, apareceu um leão
estranho e disse:
- Me deixa brincar com vocês?
E a resposta para o leão foi sim.
De repente eles estavam brincando e o leão desapareceu.
O tigre e a onça foram atrás do leão e o encontram bem longe do
lugar que estavam brincando dentro de uma armadilha feita por caçadores.
Eles tiveram que chamar vários animais para conseguir tirar o leão
da emboscada e combinaram nunca mais brincar longe.
Moral: Nunca brincar longe de casa.
(Produção individual sem apoio)
180
O HOMEM E AS FORMIGAS
Uma formiga estava pegando comida para seus filhotes e chegou um homem e
pisou na formiga e ela morreu.
Depois de um tempo o homem não sabendo pisou novamente no formigueiro e os
filhotes da formiga haviam crescido e picaram o pé do homem.
O homem não pisou mais no formigueiro.
Moral: Nunca pise nas formigas.
(Produção individual sem apoio)
O SOL E A LUA
O sol estava tomando um café e a lua passou.
O sol chamou a lua para tomar um café e falou:
- Cuidado lua, porque seu pai não gosta que você fique comigo e nem minha mãe.
Enquanto o sol e a lua conversavam a mãe do sol e o pai da lua, estavam
investigando e procurando seus filhos e acabaram descobrindo que eram grandes amigos
desde o passado.
Moral: A verdade sempre aparece.
(Produção individual sem apoio)
181
O CACHORRO, O CROCODILO E O COELHO.
Em uma linda manhã um cachorro e um coelho estavam brincando na beira do rio e
o cachorro então disse:
- Quanta saudade eu tenho do nosso amigo crocodilo!
Então perguntou o coelho:
- Por que ele não voltou, cachorro?
Então respondeu o cachorro:
- Não sei coelho!
Quando eles olharam para o rio, viram o crocodilo e falaram:
“Quantas saudades, amigo”.
Não percebendo que não era o seu amigo eles o abraçaram e o crocodilo os engoliu
inteiros.
Moral: A saudade pode ser triste, mas o mal pode ser maior.
(Produção em dupla sem apoio)
A CADELA E A TARTARUGA
Um belo dia uma cadela estava saindo com seus dois filhotinhos e se encontrou
com a tartaruga e a tartaruga falou:
- Aonde você vai dona cadela?
- Eu estou indo para a casa da minha amiga que está fazendo aniversário.
E a cadela convidou a tartaruga e chamou os seus dois filhotes e todos foram para o
aniversário.
Moral: Nunca fale muito para onde você vai, porque se não vai junto.
(Produção em dupla sem apoio)
Podemos visualizar, nos textos produzidos pelos educandos que participaram
do desenvolvimento dessa pesquisa, que se tratam de produções textuais, escritas sem
apoio, individualmente ou em duplas, sendo assim, podemos afirmar que o nero textual
estudado, no caso as fábulas, foram apropriadas pelos educandos, a ponto de produzirem
182
sua própria narrativa, seguindo os elementos característicos do gênero, e considerando-se a
situação interlocutiva.
Dessa forma, podemos afirmar, tal como expuseram as educadoras
participantes da pesquisa que os conhecimentos conquistados e refletidos pelas educadoras
transformaram-se em instrumentos de sua prática, contribuindo assim, para o
desenvolvimento das aprendizagens e da autonomia dos educandos necessárias ao processo
de produção textual.
183
TECENDO ALGUMAS CONSIDERAÇÕES
Nossa pesquisa teve início a partir do envolvimento do grupo de pesquisa do
qual faço parte, “Aprendizagem da leitura e escrita: processos de ensino e aprendizagem”,
no projeto Comunidades de Aprendizagem, que visa a máxima aprendizagem dos
educandos, ou seja, busca-se que se aprendam mais eficazmente os conteúdos como forma
de garantir uma participação mais justa na sociedade informacional. Sendo assim, atuamos
junto às educadoras das escolas que integram o Projeto no município de São Carlos-SP e
pesquisadores, apresentando e articulando os conhecimentos relacionados ao processo de
ensino-aprendizagem da língua materna - e que são cobrados em forma de descritores
presentes nas avaliações nacionais - com textos que circulam socialmente e os produzidos
pelos educandos.
Foi nesse contexto que as educadoras de uma das escolas participantes do
projeto sinalizam as dificuldades sentidas no trabalho relacionado à prática da produção
textual.
Diante dessas dificuldades, nosso grupo de pesquisa organizou um Curso de
Extensão PROEx-UFSCar intitulado: A produção Textual nas Séries/Anos Iniciais do
Ensino Fundamental: dialogando com educadoras e educandos, que buscou abordar os
gêneros discursivos de texto como objeto de ensino. Tal curso organizou-se em torno de
encontros realizados junto às educadoras e educandos de uma turma de Ano de Ensino
Fundamental de Nove Anos de uma das escolas que integra o Projeto Comunidades de
Aprendizagem.
Dessa forma, o grupo de professoras, assim com a coordenação e a direção da
escola já estavam familiarizadas e inseridas em práticas dialógicas, o que consideramos um
facilitador para o desenvolvimento da pesquisa, pois a comunidade escolar, apoiada no
conceito de aprendizagem dialógica e nos sete princípios que a guiam tinha claro o
objetivo da máxima aprendizagem dos educandos, mobilizando escola e comunidade de
entorno para que as crianças aprendessem os conteúdos escolares, garantindo assim a
participação mais justa na sociedade informacional.
Durante a realização do Curso de Extensão foram coletados dados, seguindo a
abordagem qualitativa com enfoque na metodologia colaborativo dialógica, para a
184
realização de duas teses de Doutorado, uma com enfoque nas aprendizagens dos educandos
relacionadas aos gêneros discursivos a partir das mediações entre professora,
pesquisadoras e demais educandos e outra nos conhecimentos necessários aos educadores
sobre os gêneros discursivos enquanto objeto de ensino. Essa pesquisa tratou do segundo
enfoque e se orientou pelo seguinte questionamento: “quais conhecimentos são necessários
aos educadores das séries/anos iniciais do Ensino Fundamental de Nove Anos sobre os
gêneros discursivos como objeto de ensino para que possam garantir a aprendizagem dos
educandos no tocante à prática da produção textual que considere, além das marcas do
gênero os elementos que assegurem a dinâmica discursiva?”.
Nossa análise dos dados permitiu-nos tecer algumas considerações que
buscaremos explicitar aqui.
Observamos que a base de conhecimentos sobre o ensino, mais
especificamente com relação ao conhecimento de conteúdo específico - e aqui referimo-
nos aos gêneros discursivos - recebeu influência da própria prática da educadora enquanto
aluna e do curso de formação continuada Letra e Vida, do qual a educadora entrevistada
havia participado. Sendo assim, retomamos a formação inicial e a continuada como pontos
importantíssimos para que as educadoras compreendessem a complexidade do objeto de
ensino em questão.
Dessa forma, chamamos a atenção para que os cursos de formação inicial e
continuada considerem o educador enquanto sujeito reflexivo, capaz de refletir e elaborar
conhecimentos oriundos de suas diversas experiências. Contudo, verificamos as
dificuldades das educadoras no tocante à participação em cursos de formação continuada,
visto que o próprio Curso de Extensão, contexto em que se realizou a presente pesquisa, se
desenvolveu durante os HTPCs Horários de Trabalho Pedagógico Coletivo, realizado na
própria unidade escolar.
Com base nos conhecimentos sobre os neros discursivos, observamos que os
mesmos não eram concebidos como objeto de ensino da língua materna, se distanciando,
na prática pedagógica, das propostas presentes nas políticas públicas. Mais do que o
distanciamento das políticas públicas nos preocupa o fato de que ao desconsiderarem os
gêneros discursivos enquanto objetos de ensino, não compreendem a importância da
dinâmica discursiva e a linguagem enquanto constitutiva dos sujeitos. Conforme já
anunciamos ao longo do trabalho, a escola, ao desejar transformar a língua em objeto
185
ensinavél, a afastou das interações de que é responsável, resultando assim em práticas de
escrita descontextualizadas que pouco contribuem para o desenvolvimento das
aprendizagens dos educados e das habilidades discursivas, necessárias à participação mais
justa na sociedade informacional.
Porém, muito se fala do final da redação escolar, mas será que os professores
sabem o que colocar no lugar?
Procuramos, com esse trabalho oferecer algumas contribuições à base de
conhecimento sobre o ensino, mais especificamente aos conhecimentos de conteúdo
específico da língua materna, nos referimos à concepção de gêneros do discurso enquanto
objeto de ensino.
Ao analisarmos as concepções das educadoras, participantes do Curso de
Extensão, observamos que as professoras enfatizavam como essenciais na prática de
produção textual o ensino das regras gramaticais e ortográficas, desconsiderando-se assim,
as marcas características do gênero e a compreensão da situação interlocutiva, afastando-se
mais uma vez da concepção de linguagem enquanto interação e portanto, constituição dos
sujeitos e dos gêneros discursivos como instrumentos dessa interação.
Além desse afastamento com relação à concepção de linguagem, observamos
também que não eram ensinados os conhecimentos sobre o escrever e nem os
procedimentos da escrita. Isso porque os conhecimentos das educadoras eram insuficientes
para que o gênero fosse concebido como objeto de ensino da língua.
Dessa forma, as educadoras apresentavam uma impressão de que os educandos
não tinham preocupação com a estrutura do texto produzido, preocupavam-se sim, com o
uso adequado da pontuação e a grafia correta das palavras.
Os gêneros discursivos parecem permear o ensino da língua materna, no
entanto, ganham maior destaque nas atividades de leitura realizadas em sala de aula.
Nessas atividades uma grande variedade de gêneros é contemplada, no entanto o mesmo
não acontece com as atividades de produção textual, que ainda são realizadas de forma
descontextualizada, ou seja, sem se considerar as condições de produção a situação de
interlocução.
As práticas de produção textual enfatizavam os aspectos gramaticais e
ortográficos da escrita, relegando a um segundo plano os procedimentos de escrita, assim
como: o que, para quem e como escrever.
186
Com relação aos conhecimentos construídos, acreditamos que as reflexões
proporcionadas pela metodologia colaborativa dialógica possam ter contribuído para uma
alteração nas práticas das educadoras envolvidas no Curso de Extensão, comprovando-se
alguns conhecimentos necessários aos educadores das séries/anos iniciais do Ensino
Fundamental de Nove Anos sobre os gêneros discursivos como objeto de ensino para que
possam garantir a aprendizagem dos educandos no tocante à prática da produção textual
que considere, além das marcas do gênero os elementos que assegurem a dinâmica
discursiva.
Ressaltamos a importância da definição do gênero a ser apreendido junto aos
educandos, assim como a necessidade de se contextualizar a escrita em uma situação
interlocutiva, ou seja, as crianças precisam saber o que, por que, como e para quem
escrevem.
Outro ponto fundamental pareceu-nos ser a visualização do educando de quais
processos estão envolvidos na escrita. Nesse ponto, assim como nos demais, o papel do
educador é fundamental, ele será o modelo visualizado pelos educandos e conduzirá as
reflexões em torno dos procedimentos: saber planejar o que se vai escrever em função das
características do contexto de produção colocado; saber redigir o que foi planejado; saber
revisar o que foi escrito, durante o processo mesmo de escrita e depois de finalizado; e
saber reescrever o texto produzido e revisado.
Com o desenvolvimento da sequência didática os neros discursivos puderam
ser visualizados para as educadoras como objetos de ensino, pois ofereceram contribuições
de como abordar esse conteúdo, auxiliando na sistematização do mesmo.
Dessa forma, as educadoras vislumbraram assim, a autonomia conquistada
pelos educandos no processo de produção textual.
Os conhecimentos que envolvem os gêneros discursivos escritos foram
apreendidos pelas educadoras, ressaltamos que esses conhecimentos são imprescindíveis
para a base de conhecimento sobre o ensino, pois sem ele o professor não garante a
aprendizagem dos educandos.
Se antes os educandos pareciam soltos para escreverem o que quisessem, sem,
contudo atingirem a qualidade em seus textos, agora são orientados dentro de uma proposta
de escrita e leitura reais, o que os permitiu uma escrita de melhor qualidade, ou seja,
187
escrevem de acordo com um gênero proposto, visando um produto final que contará com
leitores de fato.
O curso de formação em questão apresentou e buscou a reflexão em torno dos
conhecimentos específicos do conteúdo ao discutir a natureza do objeto de ensino os
gêneros discursivos escritos e também sobre o conhecimento pedagógico do conteúdo,
este último foi possível através do desenvolvimento da sequência didática que objetivou a
aprendizagem dos educandos, norteado pelas reflexões constantes em torno da prática
desenvolvida pelas professoras.
Sendo assim, podemos afirmar que o trabalho com a sequência didática para o
ensino de um gênero escrito configurou-se enquanto instrumental tanto para o educador,
quanto para os educandos. Para as educadoras, pois proporcionou orientações
metodológicas para o ensino sistematizado de um gênero do discurso escrito. E para os
educandos, pois permitiu a segurança na escrita uma vez que puderam apreender e
vivenciar os conhecimentos e os procedimentos que envolvem a prática da produção
textual, se considerando as características do gênero e a situação interlocutiva.
Os encontros proporcionados pelo Curso de Extensão configuraram-se em um
lócus de reflexão em torno das concepções e práticas da produção textual, pois pautaram-se
no diálogo entre pesquisadoras-educadoras, educadoras-educandos e pesquisadoras-
educandos. A realização dos encontros pode garantir o envolvimento para a escuta de
experiências, angústias, conflitos e sucessos da prática docente, sendo um ponto de
encontro que reuniu forças para o trabalho significativo com produção textual pautada
sobre o ensino de um gênero discursivo de texto.
Concordamos com Mello e Reyes (et. al., 2000), ao defenderem situações em
que os educadores podem confrontar concepções nem sempre conscientes. Uma alteração
significativa na prática de ensino da língua implica uma alteração na concepção de
linguagem como constitutiva dos sujeitos. Sendo assim, acreditamos que a configuração da
metodologia de pesquisa, denominada por nós de colaborativa dialógica favoreceu a
reflexão sobre a proposta de trabalho desenvolvimento da sequência didática para o
ensino de um gênero discursivo de texto – juntamente com a prática das educadoras.
Toda essa reflexão favoreceu a revisão da prática docente, observadas pela
incorporação de novas atitudes frente ao texto escrito, como foi o caso das leituras,
realizadas em voz alta pelas educadoras das turmas, a atividade do reconto feitos pelos
188
educandos e a prática de revisão textual focando inicialmente nos elementos que
caracterizam o gênero e ocorrendo de forma gradual, primeiro coletivamente, depois em
duplas para culminar na revisão do próprio texto produzido.
A incorporação dessas atividades à prática docente repercutiu qualitativamente
nas produções das crianças. Quando se melhora a prática docente as aprendizagens dos
educandos de fato se concretizam, pois os saberes dos educadores, transformados em
instrumentos da prática, são mobilizados.
Conforme afirmamos, a sistematização dos conteúdos e o acesso a eles não
garantem a humanização, esses conteúdos precisam tornar-se instrumentos de sua
objetivação enquanto ser social, ou seja, órgãos de sua individualidade (ARAÚJO, 2000,
p. 108).
Dessa maneira, não basta possuir o instrumento, é necessário saber utilizá-lo,
se apropriar do mesmo e pô-lo em uso. Nas palavras de Freire (1992), ensinar é valido
quando os educandos aprendem a aprender ao aprender a razão de ser do objeto ou
conteúdo (p.81).
Quanto às aprendizagens dos educandos, podemos afirmar ainda que elas
foram além da escrita de um gênero proposto, o trabalho com a sequência didática permitiu
que muitos educandos avançassem no próprio processo de aquisição da linguagem escrita,
isso se deve ao fato de que quando os educandos foram instrumentalizados no processo de
produção textual, no sentido de que dominavam o que, como e para quem escrever,
puderam debruçar-se no processo de registro daquilo que pretendiam produzir.
Destacamos também a ênfase que os professores depositaram na atividade de
revisão e acreditamos que esse procedimento da escrita tenha sido incorporado na prática
dos educandos.
Os gêneros discursivos são compreendidos como instrumentais que auxiliam os
sujeitos nas diversas situações interlocutivas de que participam. Conforme sinalizamos a
habilidade no uso dos gêneros em situações comunicativas está diretamente relacionada ao
domínio que temos em relação a eles, sendo assim, quanto maior for esse domínio, mais
facilidade teremos em empregá-los de forma adequada às situações comunicativas. Dessa
forma, acreditamos que proporcionar aos educandos, através do ensino, o domínio de um
gênero discursivo permite a ampliação da possibilidade de intercâmbio com a sociedade.
189
Dessa forma, os conhecimentos relacionados às estruturas do gênero precisam
ser ensinados e garantidos aos educandos, de igual importância, tais conhecimentos
precisam ser ensinados no interior de situações comunicativas.
Sinalizamos ainda que nosso trabalho debruçou-se sobre o ensino de um
gênero do discurso escrito, fazendo-se necessidade de pesquisas que contemplem as
sequências didáticas no ensino de um gênero oral, uma vez que a escola possui a tarefa de
ensinar os usos e formas da linguagem oral e escrita, como forma de garantir a participação
efetiva dos sujeitos na sociedade informacional.
190
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195
Apêndice I - Entrevista 1
Entrevista realizada em 05 de agosto de 2008
Professora – 3º Ano.
Comentários para o levantamento
das temáticas.
E: As perguntas vão girar em torno da produção de
texto. Mas antes vamos fazer uma contextualização,
vamos falar um pouco de você: a sua idade, a sua
formação...
P: Eu tenho 39. A minha formação é magistério,
ta. Ainda não deu pra fazer, na verdade eu queria
fazer História, mas aí, filhos, casamento, casa. O
magistério, deveria ter sido o início de uma
formação acadêmica, porque só o magistério, não me
uma base muito segura, não. Fica bem aquém do
que eu precisaria dentro de uma sala de aula.
E: E há quanto tempo você exerce o magistério?
P: Fazem 4 (quatro) anos. Agora na Prefeitura é a
primeira vez, no Estado eu peguei aula, mas como
ACT (Admissão por Contrato Temporário), não
tinha uma sala que fica assim, o ano todo, então era
15 dias, dez dias, então eu acabava não tendo aquela
construção desde o início, vendo como a criança está
depois, no finalzinho do ano, então você vai pegando
truncado as coisas, você o início, mas não a
finalização, ou vice versa. Mas uma experiência de
pegar as crianças desde o início do ano é a primeira
vez, aqui na Prefeitura.
E: E é a primeira vez que você pega um 3º Ano?
P: Seria a Série. Não, então, como ACT a gente
tem uma variedade, da até a Série, mas não era
todos os dia, então não tinha um acompanhamento
de como a criança começava, como ela se
desenvolvia e como ela conseguia chegar na pauta,
no padrão que você queria. Agora, de sala fixa, é a
primeira vez em tudo. A série, a responsabilidade ...
E: Professora, você se lembra quando e como foi,
como eram as produções textuais na época em que
você era aluna?
P: Risos, faz um tempinho, né? fazem trinta
anos, eu estou com 39. Olha, o que eu me lembro, do
texto é que eles davam o título. O que eu guardava,
porque eu tenho uma dificuldade também para
Formação: inicia com magistério,
tem consciência da necessidade da
continuidade da formação.
Experiência no acompanhamento
do trabalho da turma pelo ano
todo.
Prática em sala de aula.
Lembranças da produção escrita
na vida escolar.
196
escrever, até hoje, fica difícil. Então, às vezes você
pensa legal, mas na hora de escrever faltam algumas
coisas, era assim: um dia na fazenda, um dia de sol,
um dia na piscina, as férias. Ah, eu vou dar um título
e vocês vão fazer uma produção, vão fazer uma
história. E às vezes era a finalização de uma história,
eles davam a metade, davam o comecinho e você
tinha que terminar, nada diferente, que eu me
lembre.
E: E o que você entende por produção de texto? O
que seria um aluno que produz e um aluno que não
produz?
P: A produção de texto, no meu entender hoje, seria
o aluno que ou você um texto, ou um título ou
uma reescrita e que ele consiga por no papel, com
clareza, né, com coerência, aquilo que você está
propondo, então vamos fazer uma reescrita... e eu
consiga entender essa reescrita, usando ou o a
paragrafação, a pontuação, por que isso é a
estrutura né? Então, eu acho que produção de texto é
quando a criança coloca aquilo que você pediu, ou
aquilo que é desejado no papel e que você entenda
né?
E: E como deveria ser, quais elementos deveria
conter uma boa produção de texto?
P: É entender a mensagem da história, porque às
vezes a criança conta pra gente a história muito bem,
mas na hora de passar para a escrita, fica vago. Então
“a menina dançou com um vestido rosa”, e chega
para escrever e ela diminui completamente o que era
pra ser escrito. Como que tem que ser pra ser uma
boa produção, ver se ela sabe colocar o parágrafo, a
pontuação, ver se ela tem coerência e coesão, o
início, o meio e o fim, a forma que é um texto, se é
receita, se é em forma de parlenda, em forma de
poesia, aí vai depender do que a pessoa propõe.
E: E como você solicita uma produção de texto?
P: é aquilo que eu acho que é. Porque eu fiz Letra
e Vida, né, então um pouquinho eu consegui captar,
então, se eu vou fazer uma reescrita, eu leio, não vou
dar pra eles lerem, porque eu quero que eles
escrevam, se for uma parlenda eu leio três vezes, se
for uma cantiga, eu procuro fazer de coisas que eles
conhecem, se for uma reescrita, tem a cantiga que
Compreensão de produção textual.
Condições para a produção
textual, coerência e coesão.
Como são solicitadas as produções
textuais.
197
eles sabem de memória. Tem a produção escrita
individual, em que eu não interfiro, então eu tenho
que colocar assim, ou um roteiro, ou com as figuras,
o que as pessoas estão fazendo, o que elas estão
sentindo, no início é uma descrição, então depois de
fazer a descrição eles fazem a produção de texto,
então é dessa forma eu procuro trabalhar com os
alunos.
E: E o que você faz, o que você costuma fazer depois
com as produções do aluno?
P: Quando ela é coletiva a gente faz a correção na
lousa. Primeiro a gente lê, quando é a produção de
um aluno, então eu procuro pegar daquele aluno que
tem mais dificuldade, porque o que não tem
dificuldade, às vezes fica vago para o aluno, mas
porque isso, aquele que tem dificuldade tem que ver
da onde nós partimos para tentar melhorar.
Então através da correção coletiva, que eu ponho na
lousa ou através de cartaz como o papel cenário e eu
escrevo com canetinha o trecho que eu quero
analisar, às vezes é paragrafação, pontuação, mas as
vezes aparece o português.
Agora se for individual eu corrijo na sala, no
momento, eu chamo e peço, olha isso daqui é escrito
de outra forma, precisa ser revisto.
E: Então você sempre faz esse retorno para ele?
P: Ou coletivo ou individual.
E: E qual a impressão que os alunos transmitem
quando você solicita uma produção? Ou durante a
realização da produção?
P: Dúvidas. Ah, mas o que escrever? Quem que é? E
o nome, às vezes eles pensam em um nome que não
dá, Ah, mas eu posso escrever era uma vez? Porque
eu acho que foi contado era uma vez, era uma
vez....Então muitos perguntam se pode começar com
era uma vez... se for uma lenda, se for uma fábula.,
ultimamente dúvidas são várias.
E as vezes as dúvidas são até de como eu escrevo era
uma vez... são aquelas crianças que apresentam
dificuldade na escrita.
E: Então as dúvidas se resumem ao que e como
escrever?
P: Eles não ficam preocupados com relação à
Atividade de revisão textual:
privilégio da pontuação e
paragrafação.
Preocupação dos alunos em como
escrever e não o que escrever.
Tem que ser alfabetizado para
produzir textos.
198
estrutura do texto, se eles vão escrever como uma
poesia, eles ficam preocupados mesmo se eu posso
começar dessa forma, o que está faltando, como é tal
palavra.
E: As dificuldades ainda são de alfabetização?
É porque, eu acho que eles são jovens ainda, é uma
série que está iniciando, vai ser uma rie que na
frente já vão saber sobre produção de texto, porque o
trabalho na frente vai ser bem melhor pra eles.
Mas é difícil... Às vezes a dificuldade não está em
produzir, está em alfabetizar. Ele está alfabético em
palavras, mas com palavras não consegue
produzir um texto, você precisa de outros elementos.
E: Você percebe quais as diferenças da produção de
textos que era solicitado na escola, quando você
era aluna e agora? No contexto do ensino mesmo,
com o trabalho que você desenvolve na sala de aula,
você percebe que tem diferenças?
P: O meu texto era pobre, ele saia mais no prazo
mesmo. Os dos alunos, quando eu peguei uma 2ª
série, você percebe que tem alunos que tem um
contexto legal, você percebe que além daquilo que
você ensinou, ele conseguiu ampliar. Hoje a criança
fica mais livre para produzir, olha isso daqui não
pode, isso também não pode, então hoje não tem
aquela cobrança como era cobrado naquela época,
porque assim, você tinha que seguir regras, você
tinha que seguir a norma, né? Nessa época aqui a
gente fica um pouco mais livre, o aluno pode se
aproveitar daquilo que conhece e colocar na folha,
antigamente não, tinha que ser o conhecimento do
professor. Acho que hoje a criança está liberada para
poder se expressar.
E: Agora algumas perguntas relacionadas à leitura.
No geral, não pensando somente na professora
dentro da sala de aula, você gosta de ler?
P: se for indicada, eu não sou uma pessoa que lê.
Por vários motivos, primeiro é a vontade mesmo, é o
estímulo quando criança, eu vou ter que ler, porque a
professora pediu em uma semana, você tinha que ler,
mas não por prazer, somente para fazer prova. Então
ficou aquela coisa massante, você ter que ler porque
tem alguém te obrigando e acabou não me
Comparação com os seus textos e
os textos dos educandos.
LEITURA
Não é uma amante da leitura.
199
incentivando. De gibi eu gosto, porque é uma leitura
simples e tem as figuras. Mas falar assim, ah eu
adoro ler, eu li o livro tal, eu não leio, eu não gosto
de ler muito não.
E: E você lê para os seus alunos?
P: Então é assim, o professor tem que gostar para
passar esse gostar para os seus alunos, eu mesmo não
gostando eu tento, na leitura, eu faço a leitura, eu
busco mudar a voz, faço uns teatrinhos. Toda a terça-
feira eles escolhem um livro da biblioteca e eu leio,
eu procuro passar pra eles uma verdade que muitas
vezes eu não faço, eu tento sim...
E: Quais textos você costuma ler para a turma?
P: Eu procuro variar muito, porque eu percebo que a
leitura dos alunos ela ocorre mesmo na escola.
Então às vezes eu pergunto vocês leram isso, vocês
conhecem isso, o gibi mesmo. Eu procuro ler textos
assim de jornal, então uma vez por semana a gente
escolhe um texto de jornal, a gente procura pegar
assim o que não é de violência, porque eles tem
esta vivência, então eu procuro dar uma garimpada e
trago, olha o que vai acontecer, o que aconteceu aqui
no jornal, poema, parlenda, cantiga, eu procuro
variar bastante, às vezes a criança traz de casa, eu
proponho, a criança faz uma leitura.
E: E essa leitura é diária?
P: É rotina, é rotina, de segunda a sexta, faz parte do
planejamento é leitura diária Aí eu vou variando, se é
narrativa, se é informativa, se é poema, se é lenda, se
é conto.
E: E você vai falando essas diferenças, olha hoje nós
vamos ler um texto jornalístico, nós vamos ler uma
lenda...
P: Porque no início nós fazíamos a leitura de receitas
culinárias mesmo e falávamos da importância da
receita, porque não dava pra guardar de cabeça,
então era receita culinária ou mesmo para tomar um
medicamento. Então eu passo sim, hoje nós vamos
ler o jornal, que é informativo. Hoje é narrativo,
vamos contar a história da Branca de Neve. Ou
quando o aluno traz, eu sempre informo o que é que
é. Então o que é isso, é parlenda, é lenda, é mito, é
conto...
Prática constante de leitura em
sala de aula.
Variação de gêneros presentes na
leitura.
Identificação do gênero na leitura.
Conto de fadas utilizado como
modalizações para os educandos.
200
E: Eu não sei se o próprio Comunidades de
Aprendizagem já fez esse levantamento que tipo de
material escrito que há em casa?
P: Eu percebo que não há, porque no início, eu
queria propor a leitura diária com o próprio material
que eles trouxessem de casa, podia ser jornal, podia
ser revista, podia ser uma receita, podia ser uma
bula, ah professora eu estou tomando remédio então
eu trouxe a receita, então eu ia ler, quais os
componentes, mas assim livros deles não tinham,
fora os livros que eles traziam da biblioteca, fora
alguns gibis, Sesinha.
E: Qual o tipo de história que eles mais gostam, de
gênero, de texto, que eles mais gostam?
P: Eu acho que é dos Contos de Fadas, eu percebo
que são as que eles gostam mais. Eu percebo que as
fábulas, embora eu trabalho, eu percebo que eles não
fazem muita questão não, eu trabalho, mais eu
percebo que eles prestam mais a atenção quando eu
conto alguma coisa de mais fantasia.
E: Você acha que isto pode estar associado ao fato de
que eles podem prestar atenção pelo fato de ser o
tipo de texto que eles mais conheçam?
P: Eu percebo que eles conhecem bastante pelo fato
de sempre perguntarem se pode começar com era
uma vez... Pode ser que tenha sido de uma outra
série que talvez tenham lido bastante e eles acabaram
visando esse começo era uma vez, era uma vez...
Eu falo, será que não pode ser de uma outra forma,
certo dia. Pode ser porque é mais fácil, na biblioteca
também, não tem muita variedade de leitura e é algo
que é mais fácil, tem a figura grande, a leitura é bem
menor, entendeu? Porque quando eles vão escolher o
livro, eu percebo que quando tem bastante leitura,
eles devolvem, mesmo que eles já tenham lido
aquele outro, eles preferem pegar o mesmo, porque é
mais fácil, tem mais desenho e menos escrita.
E: Qual gênero você acha que eles dominam mais?
P: Cantiga, piada, adivinha, acho que são os gêneros
que eles dominam mais, quando a gente trabalha a
cantiga eles conseguem adaptar, por exemplo, com o
ritmo mas criando uma outra escrita, do Atirei o pau
no gato mesmo, como nós poderíamos fazer? Então
201
eu acho que estes eles me mostram mais resultados
do que ficar em uma posição assim de que era uma
vez... porque as vezes fica pobre
202
Apêndice II – Entrevista 2
Entrevista realizada em 07 de Outubro
Comentários para o levantamento das
temáticas.
Professora – 3º Ano
E: Eu vou pedir para você tentar estabelecer uma
relação, mais ou menos, com a produção que era
solicitada antes do início do curso e agora.
P: Como eu trabalhava com eles na sala? É isso? É
aquilo que eu tinha colocado no curso, eu acho,
antes eu deixava as crianças muito libertas, elas
produziam uma poesia, ou vamos produzir um
verso, ou um outro tipo de texto, mas eu não
definia para eles assim: “olha hoje nós vamos
trabalhar um gênero fábula, um gênero...” sabe
assim, eu não tinha essa compreensão, sabe eu não
colocava na lousa para eles que cada texto
produzido que tinha uma caracterização, que tinha
uma sistematização, e hoje eu tenho essa
consciência, antes que eles pr
oduzam mostrar,
visualizar, não só na oralidade, mas visualizar o
texto, como que é produzido, como que é
construído, quais as informações obtidas ali pra
você também fazer um, também de acordo com as
características, então eu acho que a definição aí,
e antes eu não mostrava, eu não dava o suporte. Eu
mostrava assim, eu sabia que eles sabiam ler e
escrever, dentro do possível, o resto eles é que
tinham que fazer, mas não dava aquela base mesmo
pra eles: “hoje s vamos produzir tal coisa e é
assim que se produz... é isso o que eu uso”. Eu dava
menos informações, então a gente define primeiro o
gênero, qual gênero eu vou escrever, tento entender
também como ele foi criado, porque a gente
também pode mostrar pra eles que dentro daquilo
produzir o que se pede. Então vai ter um resultado
melhor porque eles vão saber o que está sendo
produzido, pra que eles estão produzindo de acordo
com o que a professora comentou, então não fica
aquela coisa aleatória.
E: E você percebeu melhoras na sua turma?
P: Então, percebi, percebi mesmo, é aquilo que eu
falei logo no início, toda a vez que eu ia pedir para
produzir alguma coisa os alunos comentavam ah,
Comparação com a prática antes da
realização do Curso de Extensão.
Visualização da autonomia das crianças
para a produção textual.
Melhoria da qualidade na produção textual.
Melhoria dos conhecimentos dos
educadores significa melhoria na
203
posso começar com era uma vez...” às vezes não
era um conto de fadas. Então é assim eles ficam
comentando é uma fábula, é isso é aquilo”, então
vai abrir um leque que eles possuem uma certa
liberdade, um conhecimento de como ele pode
começar a escrever, o que ele pode usar. Então a
liberdade que eles têm em relação, um
conhecimento do que escrever.
E: Você acha que ainda falta algumas coisas para
serem melhoradas?
P: Eu acho que sim, eu acho assim: a professora, no
caso também tem que melhorar, nesse
conhecimento, porque é uma coisa nova assim, em
tudo. Então, se eu conseguir fazer com que o meu
conhecimento também melhore, que também
consiga construir junto com os alunos, eu
acredito que eles também melhorem.
E: Então você acredita muito nesta aposta de que o
professor...
P: Eu acho assim, que o professor, não é que ele
sabe tudo, mas às vezes não sabe muito e acaba não
passando isso para os alunos. Porque não dizem
que é uma construção, que tem que ser tijolinho por
tijolinho, então acaba faltando alguma coisa e
acaba perdendo com o aluno. Porque o aluno, cada
um é de um jeito né? Tem aquele que realmente
pega, sem ter que ficar labutando ali, muito. Mas
tem outros que tem que puxar muito, então você
tem eu mostrar para ele, como em uma receita, né?
Olha para você fazer uma receita, vai isso, mas se
você não mostrar os procedimentos desta receita,
vai sair do mesmo jeito?
E: E o que você acha que uma criança precisa saber
para produzir um texto?
P: Mas sem definir texto? Sem definir gênero?
Um texto. Definindo um gênero ela sabe, quer dizer
melhora. Olha eu quero produzir um conto, uma
fábula, então se ela conhecer as características de
cada gênero, fica mais cil dela produzir qualquer
coisa.
E: Você percebeu mudanças na sua prática?
P: Ah, sim. É aquilo que eu falei: a prática não
mudou nos alunos, acabou mudando em mim.
aprendizagem do educando.
Conhecimentos para se produzir um texto.
Alterações percebidas na prática educativa.
204
Porque eu também comecei a ver que me um
melhor resultado, né? Eles retornam para mim
aquilo que realmente eu pensava que eles me
trouxessem. Não é aquilo: “olha produza um texto,
ah, mas você não fez isso, não fez aquilo...” Mas eu
também não defini. Mudou assim: eu tenho que
conhecer para poder pedir também.
E: E você acha que você precisa alterar mais em
quê? Em qual sentido?
P: No caso eu acho que preciso fazer uma
reciclagem, mais. Procurar cursos que me dêem
esse aporte, um suporte, porque eu ofereço suporte
para os alunos, mais quem oferece suporte para
mim. Por mais que eu tenha trabalhado, acaba
sendo uma coisa mecânica, às vezes a gente não
pode ficar nisso. As pessoas evoluem e eu acho
que o conhecimento está junto. Então se eu não for
atrás de algumas coisas, se não tentar me
aperfeiçoar em algumas coisas que eu tenho
dificuldade a prática acaba também indo embora.
Eu acho que é isso: eu tenho que melhorar, então
melhorou, dessa forma eu consigo fazer com que
eles produzam mais. Então eu também tenho que
tentar me reciclar, para melhorar e passar tudo isso
junto com eles.
E: Eu gostaria que vo falasse um pouquinho
sobre o que você pensa da leitura e da escrita, tudo
o que você veio refletindo ao longo do curso:
P: Eu penso assim que a leitura ela está agregada à
escrita. A gente qualquer coisa, aum PARE, a
placa, ela é um texto, você sabe que é para você
parar. Então o que me faz entender que a aquele
PARE é para parar? È através da leitura, eu acho
que você combinar a leitura com a escrita, você ir
trabalhando junto, orientando, intervindo com os
alunos, acredito que aprendizagem em outras coisas
facilita, quer dizer a leitura e a escrita.
E: Porque a leitura e a escrita, são muito amplas,
elas podem ter vários sentidos...
P: Escrever... às vezes tem crianças que escrevem
mas não lêem o que escreveram. Então eles têm
que ter assim, a prática, não, não é a prática, mas o
poder da leitura é aquilo que ele quis fazer na
escrita.
Formação do educador.
Concepção de leitura e escrita, linguagem
próxima a de nosso referencial teórico.
205
Claro que para o conhecimento, a leitura. A escrita
para você transmitir comentários...
E: Sim, porque eu me lembro que na primeira
entrevista você havia comentado que você sempre
tentava ler para seus alunos e ressaltava: “ olha hoje
nós vamos ler uma fábula, uma receita...”.
P: Sim, esse trabalho não mudou. Eu enfoco, eu
mostro para eles, eu transmito. Eu falo o tipo de
gênero, para ir colocando neles essa
diferenciação na leitura. Porque nós podemos ler
várias coisas, mas um pode ser notícia, é de uma
forma diferente, uma notícia. Mas eu continuo
fazendo, não é que eu mudei não, eu continuo
fazendo. Tem a leitura prazerosa, para que eles
leiam e observem que não é só dentro da sala que a
gente pode ler, em casa, para você pegar um livro
de receita, um manual, para você ver como é que
liga um parelho. Quer dizer a leitura hoje é
essencial, para você pegar um ônibus, senão você
vai para outro bairro, até mesmo para que ela saiba
se locomover, para que ela saiba lidar na sociedade,
sem depender de outra pessoa, com seus próprios
conhecimentos. Então eu continuo aplicando esta
atividade de leitura e a escrita também temos se
baseado nela, né? Às vezes eu conto a história, a
gente a história, embora seja a maioria de textos
informativos, a escrita ela faz parte também desde
que ela tenha um contexto. A gente não vai ler em
História e ficar memorizando e registrando 100 mil
vezes a mesma coisa, porque não vai ter significado
para ele, que é importante o registro.
E: Você sempre foi uma das participantes do curso
que sempre socializava para o grupo as atividades
que ocorriam...
P: Isso, eu tentava falar das dificuldades e das
facilidades que tinham ocorrido na semana...
E: Então fala para mim, um pouquinho dessas
dificuldades e dessas facilidades que você disse que
sentiu...
P: As facilidades é que eram quatro numa sala e
como era uma sala com dificuldades assim, bem
diferentes, uns escrevem e outros não, então
imagina só, quando eu estou sozinha é muito
difícil. Às vezes a atividade não dá para acabar no
Facilidade percebida nas crianças.
206
mesmo dia. Porque acaba ficando cansativo de
você ficar ali... então é professora aqui, professora
ali... As facilidades... é assim: se você define o
gênero, as dificuldades elas ficam na escrita. Eu
achei que foi fácil nisso, quando a gente definiu
gênero a criança vai se preocupar em escrever, ela
tem assim, a história mesmo, então ela vai se
preocupar na escrita mesmo, na ortografia, qual
letra que usa. Então eu podia recorrer em relação a
isso. As facilidades também no conhecimento.
Então foram várias: crianças bem criativas, que
conseguiram eu achei que até iam fugir um
pouquinho, mas eles conseguiram, dentro das
possibilidades deles, criarem outras fábulas. As
dificuldades é isso que eu falei, sendo eu sozinha
fica mais difícil, né?
E: Você aconselharia uma outra professora a
vivenciar esse processo de ter esse
acompanhamento mais de perto mesmo. Como
você mesmo disse eram quatro dentro da sala de
aula, mas eram três observando as crianças,
observando o seu trabalho, né?
P: Eu falei sim, é claro que pode ter aquela que
tenha uma certa resistência, porque não é todo
mundo que fica a vontade. Eu, no início foi o que
eu falei, não tendo que preencher papelada, porque
às vezes acarreta mais trabalho. Você sabe: é
planejamento que tem que fazer, eu também tenho
apoio, então às vezes você tem que correr mais com
papelada do que com as próprias atividades dos
alunos. Eu até falei com outra professora inclusive
e ela disse que achava que não se sentiria a
vontade, “e elas ficam vendo como é o meu
trabalho, será que eu estou fazendo certo?”. Mas eu
também fiquei receosa, será que elas falam que está
bem, porque está bem, ou porque tem bastante
erros. Porque às vezes você foge um pouquinho,
professor não tem padrão. Então eu acho que o
professor fica receoso nisso: será que ela vai me
avaliar, ou será que ela ta vendo no contexto, como
que é. Mas eu indico esse tipo de trabalho, eu
acabei me sentindo a vontade, às vezes eu ficava,
será que era isso mesmo que era pra falar, eu ficava
insegura, mas dentro do possível você faz o seu
trabalho, se não estiver bom, a gente vai tentar
melhorar através de vocês, através dessas
207
explicações em relação ao curso, então eu acho que
é viável sim, eu acho que é legal.
E: Eu gostaria de te dizer para você ficar tranqüila
com relação a isso, porque o seu trabalho ele foi
muito bom, foi muito viável, a gente pode ver isso
pelas produções das crianças, o gênero está
contemplado, é claro que ainda crianças se
apropriando do sistema, é do processo mesmo de
alfabetização.
P: Isso você vê, são alunos que participam do apoio
escolar, mas que infelizmente não comparecem. A
Camila, que a outra pesquisadora falou que foi uma
aluna que começou de uma forma e terminou de
outra, ela participa do apoio. Então eles acabam
não aproveitando essas oportunidades é onde
dificulta, porque numa sala de 25, fica difícil eu ter
que retornar essas dificuldades.
208
Apêndice III – Pauta do 1º Encontro com Educadoras
Data do Encontro: 28 de julho de 2008.
“Quando alguém diz ou escreve algo,
tem uma razão para isso. Mesmo quando
se diz por dizer
, apenas para sustentar-
se um diálogo ou coisa parecida, esse
dizer por dizer
é, do ponto de vista da
lingüística, bastante comunicativo.”
(Luiz Percival Leme Brito)
Pauta
1) Leitura inicial:
2) Preenchimento do quadro para o levantamento das concepções iniciais dos
participantes;
3) Atividade de produção textual:
Encaminhamentos:
Dividir os participantes em grupos e propor que produzam textos seguindo as propostas
abaixo:
Grupo 1: escrever uma carta para um amigo que está fora do país contando as novidades
pessoais e os últimos acontecimentos no Brasil.
√ Grupo 2: escrever uma história a partir da gravura apresentada.
√ Grupo 3: escrever uma crônica onde a frase “ Eu gosto de macarrão” apareça no inicio ou no
final do texto.
Grupo 4: escrever um artigo de opinião sobre a instalação de usinas nucleares no Brasil.
Indicação sobre o gênero (anexo 2)
√ Grupo 5: fazer a reescrita do conto - A Bela Adormecida ( Anexo 1)
Discutir Procedimentos para ensinar a produzir textos;
Encaminhamentos:
209
Pedir que os participantes leiam os textos produzidos e que contem sobre o processo de
produção: contar se foi fácil, se tiveram que planejar, reescrever, revisar, ...
Discutir a natureza de cada proposta e a relação com as condições didáticas para a produção
de textos.
Fazer a discussão sobre as condições que favorecem a aprendizagem da linguagem que se
escreve e dos procedimentos do escritor.
4) Refletir sobre as seguintes questões:
Como foi o processo de produção; o que facilitou ou dificultou a produção.
O que o professor queria ensinar com a proposta? E o que os alunos podem aprender com a
proposta feita?
Discutir a importância do trabalho com projetos de leitura
5) Discussão do texto: “Escrever é preciso” – Rosaura Soligo.
6) Levantamento dos gêneros que serão trabalhados em cada ano, a partir da indicação do
educador.
Indicação de leitura para encontro no dia 04/08:
GERALDI, J.W. (org.) “Concepções de linguagem e ensino de português. In: O texto na sala de
aula – leitura & produção. 2ª ed. Cascavel: ASSOESTE, 1990.
DOLZ, J.; NOVERRAZ, M.; SCHNEUWLY, B. SCHNEWLY, B. Seqüências didáticas para o oral
e a escrita: Apresentação de um procedimento. In: Gêneros orais e escritos na
escola/tradução e organização Roxane Rojo e Glaís Sales Cordeiro. - Campinas, SP: Mercado
das Letras, 2004. (Coleção As Faces da Lingüística Aplicada).
Anexo 1
A BELA ADORMECIDA
Era uma vez, muito tempo, um rei e uma rainha jovens, poderosos e ricos, mas
pouco felizes, porque não tinham filhos.
— Se pudéssemos ter um filho! — suspirava o rei.
— E se Deus quisesse, que nascesse uma menina! — animava-se a rainha.
— E por que não gêmeos? — acrescentava o rei.
Mas os filhos não chegavam, e o casal real ficava cada vez mais triste. Não se
alegravam nem com os bailes da corte, nem com as caçadas, nem com os gracejos dos
bufões, e em todo o castelo reinava uma grande melancolia.
Mas, numa tarde de verão, a rainha foi banhar-se no riacho que passava no fundo
do parque real. E, de repente, pulou para fora da água uma rãzinha.
210
Majestade, não fique triste, o seu desejo se realizará logo: daqui a um ano a
senhora dará à luz uma menina.
E a profecia da rã se concretizou. Alguns meses depois nasceu uma linda menina. O
rei, louco de felicidade, chamou-a Flor Graciosa e preparou a festa de batizado.
Convidou uma multidão de súditos: parentes, amigos, nobres do reino e, como convidadas
de honra, as fadas que viviam nos confins do reino: treze. Mas, quando os mensageiros
iam saindo com os convites, o camareiro-mor correu até o rei, preocupadíssimo.
Majestade, as fadas são treze, e nós temos doze pratos de ouro. O que
faremos? A fada que tiver de comer no prato de prata, como os outros convidados,
poderá se ofender. E uma fada ofendida…
O rei refletiu longamente e decidiu:
Não convidaremos a décima terceira fada disse, resoluto. Talvez nem
saiba que nasceu a nossa filha e que daremos uma festa. Assim, não teremos
complicações.
Partiram somente doze mensageiros, com convites pare doze fadas, conforme o
rei resolvera.
No dia da festa, cada uma delas chegou perto do berço em que dormia Flor
Graciosa e ofereceu à recém-nascida um presente maravilhoso.
Será a mais bela moça do reino disse a primeira fada, debruçando-se sobre o
berço.
— E a de caráter mais justo — acrescentou a segunda.
— Terá riquezas a perder de vista — proclamou a terceira.
— Ninguém terá o coração mais caridoso que o seu — afirmou a quarta.
— A sua inteligência brilhará como um sol — comentou a quinta.
Onze fadas tinham desfilado em frente ao berço; faltava somente uma
(entretida em tirar uma mancha do vestido, no qual um garçom desajeitado tinha virado
uma taça de sorvete) quando chegou a décima terceira, aquela que não tinha sido
convidada por falta de pratos de ouro.
Estava com a expressão muito sombria e ameaçadora, terrivelmente ofendida por
ter sido excluída. Lançou um olhar maldoso para Flor Graciosa, que dormia tranqüila, e
disse em voz baixíssima:
— Aos quinze anos a princesa vai se ferir com o fuso de uma roca e morrerá.
E foi embora, deixando um silêncio desanimador. Então aproximou-se a décima
segunda fada, que devia ainda oferecer seu presente.
Não posso cancelar a maldição que agora atingiu a princesa. Tenho poderes
para modificá-la um pouco. Por isso, a Flor Graciosa não morrerá; dormirá por cem anos,
até a chegada de um príncipe que a acordará com um beijo. Passados os primeiros
momentos de espanto e temor, o rei, considerada a necessidade de tomar providências,
instituiu uma lei severa: todos os instrumentos de fiação existentes no reino deveriam
211
ser destruídos. E, daquele dia em diante, ninguém mais fiava, nem linho, nem algodão nem
lã. Ninguém além da torre do castelo.
Flor Graciosa crescia, e os presentes das fadas, apesar da maldição, estavam
dando resultados. Era bonita, boa, gentil e caridosa, os súditos a adoravam.
No dia em que completou quinze anos, o rei e a rainha estavam ausentes, ocupados
numa partida de caça. Talvez, quem sabe, em todo esse tempo tivessem até esquecido a
profecia da fada malvada.
Flor Graciosa, porém, estava se aborrecendo por estar sozinha e começou a andar
pelas salas do castelo. Chegando perto de um portãozinho de ferro que dava acesso à
parte de cima de uma velha torre, abriu-o, subiu a longa escada e chegou, enfim, ao
quartinho.
Ao lado da janela estava uma velhinha de cabelos brancos, fiando com o fuso uma
meada de linho. A garota olhou, maravilhada. Nunca tinha visto um fuso.
— Bom dia, vovozinha.
— Bom dia a você, linda garota.
— O que esta fazendo? Que instrumento é esse?
Sem levantar os olhos do seu trabalho, a velhinha respondeu com ar bonachão:
— Não está vendo? Estou fiando!
A princesa, fascinada, olhava o fuso que girava rapidamente entre os dedos da
velhinha.
Parece mesmo divertido esse estranho pedaço de madeira que gira assim
rápido. Posso experimentá-lo também?
Sem esperar resposta, pegou o fuso. E, naquele instante, cumpriu-se o feitiço.
Flor Graciosa furou o dedo e sentiu um grande sono. Deu tempo apenas para deitar-se na
cama que havia no aposento, e seus olhos se fecharam.
Na mesma hora, aquele sono estranho se difundiu por todo o palácio.
Adormeceram no trono o rei e a rainha, recém-chegados da partida de caça.
Adormeceram os cavalos na estrebaria, as galinhas no galinheiro, os cães no pátio
e os pássaros no telhado.
Adormeceu o cozinheiro que assava a carne e o servente que lavava as louças;
adormeceram os cavaleiros com as espadas na mão e as damas que enrolavam seus
cabelos.
Também o fogo que ardia nos braseiros e nas lareiras parou de queimar, parou
também o vento que assobiava na floresta. Nada e ninguém se mexia no palácio,
mergulhado em profundo silêncio.
Em volta do castelo surgiu rapidamente uma extensa mata. Tão extensa que, após
alguns anos, o castelo ficou oculto. Nem os muros apareciam, nem a ponte levadiça, nem
as torres, nem a bandeira hasteada que pendia na torre mais alta.
212
Nas aldeias vizinhas, passava de pai para filho a história de Flor Graciosa, a bela
adormecida que descansava, protegida pelo bosque cerrado. Flor Graciosa, a mais bela, a
mais doce das princesas, injustamente castigada por um destino cruel.
Alguns, mais audaciosos, tentaram sem êxito chegar ao castelo. A grande barreira
de mato e espinheiros, cerrada e impenetrável, parecia animada por vontade própria: os
galhos avançavam para cima dos coitados que tentavam passar: seguravam-nos,
arranhavam-nos até fazê-los sangrar, e fechavam as mínimas frestas. Aqueles que
tinham sorte conseguiam escapar, voltando em condições lastimáveis, machucados e
sangrando. Outros, mais teimosos, sacrificavam a própria vida.
Um dia, chegou nas redondezas um jovem príncipe, bonito e corajoso. Soube pelo
bisavô a história da bela adormecida que, desde muitos anos, tantos jovens procuravam
em vão alcançar.
Quero tentar eu também a aventura disse o príncipe aos habitantes de uma
aldeia pouco distante do castelo.
Aconselharam-no a não ir.
— Ninguém nunca conseguiu!
— Outros jovens, fortes e corajosos como você, falharam…
— Alguns morreram entre os espinheiros…
— Desista!
— Eu não tenho medo — afirmou o príncipe. — Eu quero ver Flor Graciosa.
No dia em que o príncipe decidiu satisfazer a sua vontade se completavam
justamente os cem anos da festa do batizado e das predições das fadas. Chegara,
finalmente, o dia em que a bela adormecida poderia despertar.
Quando o príncipe se encaminhou para o castelo viu que, no lugar das árvores e
galhos cheios de espinhos, se estendiam aos milhares, bem espessas, enormes carreiras
de flores perfumadas. E mais, aquela mata de flores cheirosas se abriu diante dele,
como para encorajá-lo a prosseguir; e voltou a se fechar logo, após sua passagem.
O príncipe chegou em frente ao castelo. A ponte levadiça estava abaixada e dois
guardas dormiam ao lado do portão, apoiados nas armas. No pátio havia um grande
número de cães, alguns deitados no chão, outros encostados nos cantos; os cavalos que
ocupavam as estrebarias dormiam em pé.
Nas grandes salas do castelo reinava um silêncio tão profundo que o príncipe ouvia
sua própria respiração, um pouco ofegante, ressoando naquela quietude. A cada passo do
príncipe se levantavam nuvens de poeira.
Salões, escadarias, corredores, cozinha… Por toda parte, o mesmo espetáculo:
gente que dormia nas mais estranhas posições. E todos exibiam as roupas que haviam
sido moda exatamente há cem anos.
O príncipe perambulou por longo tempo no castelo. Enfim, achou o portãozinho de ferro que
levava à torre, subiu a escada e chegou ao quartinho em que dormia Flor Graciosa. A princesa
213
estava tão bela, com os cabelos soltos, espalhados nos travesseiros, o rosto rosado e risonho.
O príncipe ficou deslumbrado. Logo que se recobrou se inclinou e deu-lhe um beijo.
Imediatamente, Flor Graciosa abriu os olhos e olhou a sua volta, sorrindo:
— Como eu dormi! Agradeço por você ter chegado, meu príncipe.
Na mesma hora em que Flor Graciosa despertava, o castelo todo também acordou.
O rei e a rainha correram para trocar os trajes de caça empoeirados, os cavalos na
estrebaria relincharam forte, reclamando suas rações de forragem, os cães no pátio
começaram a ladrar, os pássaros esvoaçaram, deixando seus esconderijos sob os
telhados e voando em direção ao céu.
Acordou também o cozinheiro que assava a carne; o servente, bocejando,
continuou lavando as louças, enquanto as damas da corte voltavam a enrolar seus
cabelos. Também dois moleques retomaram a briga, voltando a surrar-se com força.
O fogo das lareiras e dos braseiros subiu alto pelas chaminés, e o vento fazia
murmurar as folhas das árvores.
Logo, o rei e a rainha correram à procura da filha e, ao encontrá-la, chorando,
agradeceram ao príncipe por tê-la despertado do longo sono de cem anos.
O príncipe, então, pediu a mão da linda princesa que, por sua vez, já estava
apaixonada pelo seu valente salvador.
Anexo 2
O Artigo de Opinião
Texto retirado do livro: Escola, Leitura e Produção de textos –
Ana Maria Kauffman
Contém comentários, avaliações, expectativas sobre um tema da atualidade que, por sua
transcedência, no plano nacional ou internacional, é considerado, ou merece ser, objeto de
debate.
Nessa categoria, incluem-se os editoriais, artigos de análise ou pesquisa que levam o nome de
seu autor. Os editoriais expressam a posição adotada pelo jornal ou revista em concordância
com sua ideologia, enquanto que os artigos assinados e as colunas transmitem as opiniões de
seus redatores, o que pode nos levar a encontrar, muitas vezes, opiniões divergentes e até
antagônicas em uma mesma página.
Embora estes textos possam ter distintas superestruturas, em geral se organizam seguindo
uma linha argumentativa que se inicia com a identificação do tema em questão, acompanhado
de seus antecedentes e alcance, e que segue com uma tomada de posição, isto é, com a
formulação de uma tese, depois, apresentam-se os diferentes argumentos de forma a
214
justificar esta tese: para encerrar, faz-se uma reafirmação da posição adotada no início do
texto.
A efetividade do texto tem relação direta não com a pertinência dos argumentos expostos
como também com as estratégias discursivas usadas para persuadir o leitor. Entre estas
estratégias, podemos encontrar as seguintes: as acusações claras aos oponentes, as ironias, as
insinuações, as digressões à sensibilidade ou, ao contrario, a tomada de distância através do
uso das construções impessoais, para dar objetividade e consenso à análise realizada; a
retenção em recursos descritivos – detalhados e precisos, ou em relatos em que as diferentes
etapas de pesquisa estão bem especificadas com uma minuciosa numeração das fontes da
informação. Todos eles são recursos que servem para fundamentar os argumentos usados na
validade da tese.
A progressão temática ocorre geralmente através de um esquema de temas derivados. Cada
argumento pode encerrar um tópico com seus respectivos comentários.
Estes artigos, em virtude de sua intencionalidade informativa, apresentam uma preeminência
de orações enunciativas, embora também incluam, com freqüência, orações dubitativas e
exortativas devido à sua trama argumentativa. As primeiras servem para relativizar os
alcances e o valor da informação de base, o assunto em questão; as últimas, para convencer o
leitor a aceitar suas premissas como verdadeiras. No decorrer destes artigos, opta-se por
orações complexas que incluem proposições causais para as fundamentações consecutivas para
dar ênfase aos efeitos, concessivas e condicionais.
Para interpretar estes textos, é indispensável captar a postura ideológica do autor,
identificar os interesses a que serve e precisar sob que circunstâncias e com que propósito foi
organizada a informação exposta. Para cumprir os requisitos desta abordagem,
necessitaremos utilizar estratégias tais como a referência exofórica, a integração crítica dos
dados do texto com os recolhidos em outras fontes e a leitura atenta das entrelinhas a fim de
converter em explícito o que está implícito.
Embora todo texto exija para sua interpretação o uso das estratégias mencionadas, é
necessário recorrer a elas quando estivermos frente a um texto de trama argumentativa,
através do qual o autor procura que o leitor aceite ou avalie certas idéias ou crenças como
verdadeiras ou falsas, certas opiniões como positivas ou negativas.
215
Apêndice IV - Tabelas para acompanhamento das produções dos educandos.
Tabela gênero narrativa de suspense/assombração – 4ª Série
Aluno Apresenta
título
Personagens Existe a
descrição do
personagem/luga
r/tempo/sentimen
tos
Existe a
presença
do
narrador
Existe
conflito/tr
ama/suspe
nse
desfecho
Total
Tabela gênero crônicas – 3ª Série
Aluno
Apresenta
um título
O tema
abrange a
vida
cotidiana
atual
Apresenta uma
narrativa
informal/famili
ar/intimista
Utiliza linguagem
coloquial
Diz coisas
sérias por
uma
aparente
conversa
fiada
Apresenta
o uso do
humor
irônico
Total
Gênero Fábulas – 3º Ano
Aluno
Apresent
a um
título
Apresenta
elementos
essenciais
da
narrativa
Existe a
presença
do
narrador
Apresenta
diálogos
Os
personagens
são animais e
representam
as virtudes e
defeitos
humanas
Transmi
te um
ensinam
ento
Aprese
nta
moral
Utiliza
o
tempo
indeter
minad
o
Existe
conflito
desfecho
Total
Tabela gênero Contos Folclóricos – 2º Ano
Aluno
Apresenta
um título
Personagens
seres reais ou
imaginários
Utiliza
recursos
descritivos
para indicar
lugar/tempo
Presença
de
Mistério/ex
pectativa/h
umor
Apresenta
característica
da oralidade
(linguagem
coloquial)
Existe
conflito
Total
216
Tabela gênero contos de fadas – 1º Ano
Aluno
Apresen
ta um
título
Persona
gens
Utiliza
recursos
descritivos
para indicar
lugar/tempo
Presença
de vilão
ou vilã
Apresenta
diálogo
entre os
personag
ens
Presença
de magias
ou
encantam
entos
O narrador
apresenta
os fatos
Existe
conflito
Há um
desfech
o
Total
217
Apêndice V - Encontro Coesão e Coerência
8º Encontro – 15/09/2008
O diálogo tem significação precisamente porque os sujeitos dialógicos não
apenas conservam sua identidade, mas a defendem e assim crescem com o
outro. O diálogo por isso mesmo não nivela, não reduz um ao outro. Nem é
tática manhosa, envolvente, que um usa para confundir o outro. Implica, ao
contrário, um respeito fundamental dos sujeitos nele engajados, que o
autoritarismo rompe ou não permite que se constitua (FREIRE
21
).
1) Leitura inicial: O sonho dos ratos. Rubem Alves. Histórias de Bichos.
2) Socialização da atividade realizada: Produção textual sem apoio avanços, dificuldades, e
alternativas para superação.
3) Fragmentos da filmagem do 3º ano – Produção textual sem apoio – gênero – Fábula.
4) Retomando discussão sobre Coesão e Coerência
- Leitura em grupo do texto – Geraldi (1995) - define conceitos sobre coesão e coerência;
- O que é coesão? O que é coerência? Um texto pode ser coeso, mas não coerente? Um texto pode ser
coerente, mas não coeso? Justifique.
5) Socialização da discussão
6) Ler e discutir a situação abaixo explicitada por Gladis Massini:
A Concepção de “textos escritos” veiculada pela cartilha
22
Quando as crianças entram para a escola para aprender a ler e escrever, o primeiro e, na
esmagadora maioria das vezes, o único modelo de texto escrito que recebem para “copiar” é a cartilha.
Sabendo que estão na escola para aprender a lidar com a escrita (seja para ler ou para escrever) e
levando muito a sério o que fazem, as crianças, ao receberem os textos contidos na cartilha como um
único modelo de escrita, construirão uma concepção de “texto escrito” que combina com esse modelo
único.
Por uma análise dos textos das cartilhas (que constituem “o” modelo de escrita dos alunos) em
termos de sua coerência e coesão, fica bastante claro por que essas mesmas
crianças apresentarão
problemas sérios nas suas produções futuras. Veja –se, por exemplo, este texto extraído de uma
cartilha:
23
21
Pedagogia do Oprimido.
17ªed.
Rio de Janeiro: Paz e Terra, 198, p. 118.
22
Uma versão modificada do texto dos itens 2 e 3 deste capítulo pode ser encontrada em Massini-Cagliari (1996).
23
Todos os textos de cartilhas aqui analisados foram retirados da comunicação de Melo (1990), Cartilhas: quando o
texto é apenas pretexto”, apresentada no XXXVIII Seminário do Grupo de Estudos Lingüísticos do Estado de São
218
O peixeiro puxou o peixe da vara.
O peixe mexia, mexia.
O peixe caiu debaixo do caixote.
Ele abaixou e pegou o peixe.
Ele assou o peixe.
Ele comeu o peixe assado.
(No reino da alegria, p.67).
Logo à primeira vista, pode-se perceber que o texto acima apresenta alguns mecanismos de
coesão, embora muito mal explorados. Além disso, os poucos mecanismos utilizados são somente de
coesão referencial, não havendo utilização de mecanismos de coesão seqüencial.
24
na primeira linha, encontra-se os dois principais elementos de referência envolvidos nos
processos de coesão do texto: “o peixeiro” e “o peixe”. O elemento o peixe” será retomado, por
repetição, em todas as outras linhas do texto.
Na quarta linha, um segundo mecanismo de coesão é introduzido: a substituição por pronome
(no caso, ele). que ocorre um problema na utilização desse mecanismo. Quando o pronome ele”
aparece pela primeira vez, dos dois sintagmas nominais mais próximos e que concordam em gênero e
número com o pronome “ele” e, portanto, candidatos mais prováveis de referentes de “ele” são “o
caixote” e “o peixe”. Para saber que não se trata de “ele” = “o caixote” ou “ele” = o “peixe”, é necessário
ler toda a sentença em que se encontra este pronome e observar que as interpretações o caixote
abaixou e pegou o peixe” e “o peixe abaixou e pegou o peixe” são impossíveis, de acordo com o contexto.
Neste caso, excluído estes dois candidatos a referente, o único elemento de referência possível por
concordar com “ele” – é “o peixeiro”.
Paulo (GEL), no dia 9 de junho de 1990, na Faculdade de Arquitetura, Artes e Comunicações da Unesp de Bauru/SP.
Esse trabalho encontra-se publicado (Melo 1991), mas nem todos analisados no presente capítulo encontra-se nessa
versão.
24
Os mecanismos de coesão referencial são todos aqueles elementos do texto que fazem referência a outros
elementos do texto. A referência que os elementos de um texto podem fazer é, basicamente, de dois tipos:
referência à situação (exófora) e referência ao texto (endófora). Quando um elemento do texto faz referência a um
outro que apareceu antes, a operação recebe o nome de anáfora; se o elemento ao qual se faz referência aparece
depois do antecedente, ocorre a catáfora.
Os mecanismos de coesão seqüencial sbdividem-se em dois tipos: os de seqüências parafrástica e os de seqüências
frásticas. Enquanto na seqüenciação parafrástica é utilizada principalmente a recorrência (de termos, de estruturas
sintáticas, de conteúdos semânticos e de recursos fonológicos segmentais e supra-segmentais) como mecanismo
coesivo, na seqüenciação frástica a progressão se faz por meio de sucessivos encadeamentos, assinalados por um série
de marcas lingüísticas através das quais se estabelecem, entre os enunciados que compõem o texto, determinados
tipos de relação.
Outro ponto a salientar agora sobre o ‘texto’ – As aliterações produzidas pelo uso de sílabas grafadas com “X + vogal”
(som de “che” mais vogal) são apenas resultado das escolhas lexicais feitas, mas não funcionam como mecanismos de
coesão seqüencial pois são meramente acidentais. Neste exemplo, as aliterações não são um recurso de estilo, como
ocorre, freqüentemente, em poemas. (Massini, p.38,39, 42 e 66, 1991).
219
Este tipo de lapso no uso dos mecanismos coesivos pode não incomodar muito os leitores,
porque todos são falantes nativos e, por causa do conhecimento prévio de mundo, sabem de antemão que
“o peixe” ou “o caixote” não seriam referentes capazes de “abaixar e pegar o peixe”.
Além de não explorar bem os mecanismos de coesão, a coerência desse texto não atinge um
nível desejável. Uma vez que se propõe que o existe um texto incoerente em si
mesmo, mas
somente
textos coerentes para determinados interlocutores, falantes de uma determinada língua, em uma
determinada situação comunicativa, numa determinada época etc. a coerência do texto (1) é fraca,
porque se trata de um texto totalmente solto, totalmente descontextualizado e, por isso, sem razão de
ser. Não foi levado em consideração pelo autor nenhum fator importante para a construção da coerência
como: a situação, a intenção comunicativa, os objetivos, os destinatários, outros elementos da situação
de comunicação em que o texto é produzido, o uso dos recursos lingüísticos etc.
2º Exemplo:
Maroca viu a barata.
A barata comeu a abóbora.
A abóbora era amarela.
Lauro matou a barata.
(No reino da alegria, p. 49)
Pode-se observar que o texto (2) apresenta, como o texto (1) sérios problemas. Em termos da
utilização dos recursos coesivos, é muito pobre, pois conhece o mecanismo de repetição para retomar
a referentes. “A barata (linha 1) é retomada nas linhas 2 e 4 por meio de repetição; “a abóbora” (linha 2)
é repetida na linha 3. Além disso, a utilização desse mecanismo de repetição é sempre efetuada da
mesma maneira: o objeto da linha anterior é repetido como sujeito da linha seguinte I com exceção da
linha 4,iniciada pelo sujeito “Lauro”, que “caiu do céu” diretamente na quarta linha para arrasar ainda
mais a coerência desse texto).
3º Exemplo:
Fábio afiou o facão.
Fábio viu a foca.
Fábio feriu a foca.
- Fábio! Fábio!
Fábio é muito mau.
220
(No reino da alegria, p. 61)
Os primeiros problemas de coerência, que são observados em relação ao conhecimento de
mundo do leitor, dizem respeito à introdução à cena, sem cerimônia alguma, de uma “foca” em pleno
Brasil. E, ainda por cima, ferida por um menino “muito mau”.
Outro problema de coerência desse texto, ainda mais graves, refere-se à construção de um
mundo textual, por parte do leitor, a partir dos dados que lhe são fornecidos. Primeiro, aparece um Fábio
totalmente do nada e sem porquê algum com o seu facão. Ele uma foca, surgida também do nada (em
um país tropical), que, aparentemente, não tem qualquer relação com Fábio, até ser ferida por ele, sem
motivação explícita, na terceira linha. Na quarta linha, aparece um vocativo – “Fábio! Fábio!; não é dada ao
leitor qualquer indicação de qual personagem o teria enunciado. Por último, o julgamento: “Fábio é muito
mau”. Tamanha é a inverossimilhança do quadro apresentado acima que a construção de um mundo textual
por parte do leitor fica muito prejudicada e, conseqüentemente, a coerência do texto é afetada,ficando
muito fraca.
Os ‘textos’ apresentados passam a idéia de que a coerência e a coesão não o fatores
necessários para a construção de um texto, de que o texto escrito é apenas uma seqüência aleatória de
frases, sem nenhuma conexão lógica, semântica ou discursiva necessária.
A cartilha nunca leva em consideração que o texto não é uma mera seqüência de palavras ou
frases, mas envolve relações entre as palavras, as frases, trechos inteirosdo texto.
Após a leitura da análise feita por Massini sobre alguns textos de cartilha, retome a análise do
texto abaixo e tente responder as questões apoiando-se nas análises apresentadas.
A casa é bonita.
A casa é do menino.
A casa e do papai.
A casa tem uma sala.
A casa é amarela.
- Qual o principal problema do texto acima?
- Por que motivo teria a criança escrito um texto assim?
- Posso considerar que este texto tem coerência? Justifique.
-Posso considerar que este texto tem coesão? Justifique.
221
Uma concepção de “texto escrito” livre da cartilha
A partir de tudo o que foi dito acima, duas hipóteses se delineiam: ou as crianças não
conhecem nenhum mecanismo de coerência e coesão e a escola ensina somente uns poucos, ou delas
conhecem esses mecanismos (através da fala) e a escola faz com que elas desaprendam” a maioria deles
em relação à escrita.
Considerando-se a primeira hipótese, surgem as perguntas: Será que as crianças, quando
chegam à escola pela primeira vez, não têm nenhuma concepção de linguagem, de texto? Será que elas
não conhecem qualquer mecanismo coesivo ou de coerência? Será que elas produzem textos (orais) antes
de entrarem na escola?
A resposta parece óbvia para quem conhece a linguagem oral e o processo de sua aquisição: ao
chegarem à escola, as crianças possuem todos esses conhecimentos. Porém, se elas conhecem esses
mecanismos de coerência e coesão, por que não os aplicam em seus textos escritos? A resposta é
simples: porque escrevem textos conforme o modelo que lhes foi passado pelas cartilhas. Basta olhar
para textos escritos, produzidos por crianças que foram alfabetizadas por outro método, para perceber
que o resultado é diferente.
4º Exemplo:
Era uma vez uma bela ador mesida que
Chamava Elizabete apareseu umbripi
Abechou ti vagarinho e ossete anãodimirarão
É lalevãotou e falou quei é vose eu sou
o brisipi um brisipi o brisipi falou
euquérocaza comvose eu tabeiquéro cazar
comvoce viverão fezes para sebre
nocasté lo cazarão para sebre.
(José Luiz)
À primeira vista, pode-se levar um susto com a ortografia e a pontuação do texto de José.
Problemas desse tipo têm feito com que um texto como este seja considerado péssimo e posto de lado,
sem que se leve em conta o fato de que ele possui poucos problemas de coerência e coesão, me
comparação com os textos de cartilha analisados anteriormente. Para salientar essa virtude do texto de
José, ele foi reescrito sem problemas de ortografia e pontuação que apresentava. Porém, deve-se
ressaltar o fato de que erros de ortografia podem causar efeitos estranhos, prejudicando a coerência
222
do texto; é o caso da ortografia “fezes” (por felizes) na linha 7. O mesmo acontece com a pontuação
(diálogo entre a bela adormecida e o príncipe).
25
4º Exemplo:
Era uma vez uma bela adormecida que chamava Elizabete.
Apareceu um príncipe, a beijou devagarinho e os sete anões
admiraram e ela levantou e falou:
- Quem é você?
- Eu sou o príncipe.
- Um príncipe!
- O príncipe falou:
- Eu quero casar com você.
- Eu também quer casar com você.
Viveram felizes para sempre no castelo. Casaram para sempre.
Comparando com os textos de 1 a 3, o texto 4 apresenta uma riqueza muito maior de recursos
coesivos. Prova disso é a maneira como joga com a alternância da substituição dos referentes por
pronomes e por elipse. Basta ver, o exemplo, como o referente “uma bela adormecida” é substituído pelo
pronome relativo “que” (linha 1) , “a” (linha 2) “ela” (linha 3), a elipse antes do verbo “falou” (linha 3). “Um
príncipe” (linha 2) é substituído por elipse, antes de “a beijou”. “Um príncipe” e “uma bela adormecida”
são substituídos por elipse, nas duas últimas linhas antes dos verbos “viveram” e “casaram”.
Esses são um dos muitos elementos que poderíamos analisar neste texto.
Seguindo a análise da autora, tente retomar a análise do texto “O cavaleiro sem cabeça”:
O cavaleiro sem cabeça
Certa vez um jovem decidido a ser um aventureiro decidiu pegar três amigos com o mesmo
sonho foram fazer a primeira aventura.
A casa do defunto Robert esta casa é a pior casa mal assombrada de toda a Transilvânia.
Quando eles entraram se calaram, as pernas congelaram o próprio medo os conteve Alí o
líder da turma chamado Carlos disse:
- Podem voltarem se quiser.
25
É importante ressaltar que não era possível, naquele momento, “cobrar” do José que ele soubesse pontuar
devidamente um diálogo transposto para a linguagem escrita, já que ele não conhecia ainda esses recursos de
pontuação.
223
Eles fizeram isso foram embora deixando-o ele lá, depois de alguns minutos vasculhando a sala
ele encontrou a armadura do cavaleiro sem cabeça.
Ele vestiu a armadura e começou a gritar dizendo sendo possuído pelo fantasma do Robert na
noite seguinte um cavaleiro sem cabeça apareceu na colina
o povo diz que a cabeça que ele segura na mão representa a alma de Carlos que só poderá ser libertada se
matarem o cavaleiro tirando a armadura ele.
Trabalho Pessoal
Solicitar que em duplas os educandos produzam um texto sem apoio de acordo com o gênero estudado.
Indicação de Leitura
MORAIS, Artur Gomes de. Ortografia: ensinar e aprender. Editora: Ática; Capítulo 2 e 5; 2002.
224
Anexo I – Descritores Provinha Brasil, Prova Brasil e SAEB
PANORAMA DESCRITORES
PROVINHA BRASIL
Apropriação do sistema de escrita
D1. Diferenciar de letras de outros sinais gráficos, como os números, sinais de pontuação
ou de outros sistemas de representação.
D2. Identificar letras do alfabeto.
D3. Reconhecer palavras como unidade gráfica.
D4. Distinguir diferentes tipos de letras.
D5. Identificar sílabas de palavras ouvidas e/ou lidas.
D6. Identificar relações fonema/grafema (som/letra).
Leitura
D7. Ler palavras.
D8. Localizar informações em textos.
D9. Inferir informação.
D10. Identificar assunto de texto lido ou ouvido.
D11. Antecipar assunto do texto com base em título, subtítulos, imagens.
D12. Identificar finalidades e funções da leitura em função do reconhecimento do suporte,
do gênero e da contextualização do texto.
D13. Reconhecer a ordem alfabética.
D14. Estabelecer relações de continuidade temática.
Escrita
D15. Escrever palavras.
D16. Escrever frases.
D17. Escrever textos.
PANORAMA DESCRITORES
SAEB E PROVA BRASIL
TÓPICO I - PROCEDIMENTOS DE LEITURA
D1 – Localizar informações explícitas em:
D1a - textos que completam literalmente o enunciado da questão;
D1b- situações mais complexas, por exemplo, requerendo a seleção e a comparação de
dados do texto;
- diferentes gêneros, as características correspondentes a um personagem;
- textos da mesma tipologia (convite) identificando as diferenças entre eles;
- textos instrucionais de vocabulário complexo;
- glossário, verbete de dicionário ou texto informativo na compreensão ou interpretação de
um texto;
- textos narrativos mais longos, em textos poéticos, informativos e em anúncios de
classificados;
- paráfrases, a partir de texto expositivo extenso e com elevada complexidade vocabular.
D3 – Inferir o sentido de uma palavra ou expressão em:
- contexto imediato;
- casos de ausência do discurso direto;
225
- informações que tratam, por exemplo, de sentimentos, impressões e características
pessoais das personagens, em textos verbais e não verbais;
- informações, identificando o comportamento e os traços de personalidade de uma
determinada personagem a partir de texto do gênero conto de média extensão, de texto não
verbal ou expositivo curto;
- situações próprias da linguagem coloquial;
- texto poético (cantiga popular);
- textos longos com estruturas temáticas e lexicais complexas (carta e história em
quadrinhos), distinguindo de sentido metafórico do literal em uma expressão;
- relação de sinonímia.
D4- Inferir uma informação implícita em;
- fala de personagens, identificando o desfecho do conflito, a organização temporal da
narrativa e o tema de um poema;
- diferentes gêneros, as características correspondentes a um personagem.
D6 – Identificar o tema de um texto:
- de diferentes gêneros (da ordem de narrar, argumentar, descrever, relatar e expor);
- a partir da intenção do autor.
D11- Distinguir um fato da opinião relativa a este fato:
- identificando a finalidade de um texto.
TÓPICO II – IMPLICAÇÕES DO SUPORTE, DO GÊNERO E/OU ENUNCIADOR
NA COMPREENSÃO DO TEXTO:
D5- Interpretar texto com o auxílio de material gráfico diverso (propagandas, quadrinhos e
fotos etc.):
- e de elementos não-verbais (histórias em quadrinhos, tirinhas e poemas), identificando
características e ações de personagens;
- utilizando apoio de desenho ou foto na compreensão ou interpretação do texto;
- realizando inferências e antecipações em relação ao conteúdo e à intencionalidade a partir
de indicadores como tipo de texto e características gráficas.
D9 – Identificar a finalidade de diferentes gêneros:
- Texto instrucional, com linguagem pouco usual e com a presença de imagens associadas
a escrita;
-Fábula, demonstrando apurada capacidade de síntese;
-Texto humorístico (anedotas), distinguindo efeitos e humor mais sutis;
-Textos jornalísticos;
-Textos informativos longos e de estrutura mais complexa, característicos de publicações
didáticas.
- Diferenciar, por comparação ou identificação de características, textos de diferentes
gêneros.
TÓPICO III – RELAÇÃO ENTRE TEXTOS
D15 – Reconhecer diferentes formas de tratar uma informação na comparação de textos
que tratam do mesmo tema, em função das condições em que eles foram produzidos e
daquelas em que serão recebidos.
TÓPICO IV- COERÊNCIA E COESÃO NO PROCESSAMENTO DE TEXTOS
226
D2 – Estabelecer relações entre partes de um texto, identificando repetições ou
substituições que contribuem para a continuidade do mesmo.
Estabelecer relações entre partes de um texto a partir de:
-repetição ou substituição de um termo;
-mecanismos de concordância verbal e nominal;
-pelo uso do “porque” como conjunção causal.
Diferenciar:
-a parte principal das secundárias em texto informativo que recorre à exemplificação.
Identificar:
-substituições pronominais e lexicais.
Fazer uso de:
-concordância para dar clareza à mensagem;
-mecanismos básicos de concordância verbal e nominal.
D7 – Identificar conflito gerador do enredo e os elementos que constroem uma narrativa e
a solução do conflito do narrador.
D8 – Estabelecer relação de causa e conseqüência entre partes e elementos de textos:
-verbais e não-verbais, explícitas e implícitas, em diferentes gêneros.
D12 – Estabelecer relações lógico-discursivas presentes no texto marcadas por conjunções,
advérbios.
- Reconhecer:
-a relação lógico-discursiva marcada por locução adverbial de lugar, conjunção temporal,
conjunção comparativa ou advérbio de negação, em contos.
-as relações semânticas expressas por advérbios ou locuções adverbiais e por verbos;
TÓPICO V – RELAÇÃO ENTRE RECURSOS EXPRESSIVOS E EFEITOS DE
SENTIDO
D13- Identificar efeitos de ironia ou humor em textos variados:
- identificam, em anedotas, os efeitos de humor mais sutis;
- distinguem efeitos de humor e o significado de uma palavra pouco usual;
D14 – Identificar o efeito de sentido decorrente do uso da pontuação e de outras notações:
- Analisar efeito de sentido conseqüente do uso de pontuação expressiva (interrogação,
exclamação, reticências);
D14b - Compreender a utilização de notações como travessão, aspas, dois pontos e
reticências na construção de um texto;
- Analisar o efeito de sentido produzido pelo uso de recursos prosódios (rima, aliteração,
onomatopéia etc.) em um texto;
- Analisar o efeito de sentido produzido pelo uso de recursos sintáticos (inversão, repetição
etc.) em um texto;
- Analisar o efeito de sentido conseqüente de substituição de uma palavra por outra
(sinonímia, hiperonímia etc.);
- Inferem o sentido de uma expressão metafórica e o efeito de sentido de uma
onomatopéia;
- Identificam o emprego adequado de homonímias;
- Analisar o efeito de sentido conseqüente de substituição de uma palavra por outra
(sinonímia, hiperonímia etc.).
227
- Analisar o efeito de sentido conseqüente do uso de linguagem figurada (metáfora,
hipérbole, eufemismo, repetição, gradação etc.);
- Analisar o efeito de sentido conseqüente do uso de marcas lingüísticas na caracterização
de personagens;
- Analisar o efeito de sentido decorrente de uma seleção lexical;
- Utilizar, na produção textual, recursos como discurso direto ou indireto.
TÓPICO VI – VARIAÇÃO LINGÜÍSTICA
D10 Identificar as marcas lingüísticas que evidenciam o locutor e o interlocutor de um
texto:
- Identificar marcas lingüísticas que evidenciam o estilo de linguagem em textos de
gêneros distintos;
- Identificar locutor e interlocutor a partir de marcas lingüísticas presentes no texto (jargão,
gíria, expressões típicas, marcas fonéticas etc.);
- Identificar em um texto, ou em passagens de um texto, o dialeto característico de uma
região ou classe social;
- Identificar características típicas da fala em um texto escrito;
- Diferenciar, em um texto, registro formal de registro informal;
228
Anexo II Produções textuais das educadoras atividade realizada no Encontro do dia
28/07/2008
Grupo 1: Escrita de uma carta para uma amiga imaginária que está fora do país
contando as novidades pessoais e os últimos acontecimentos do país.
São Carlos, 28 de julho de 2008.
Saudações
Querida Rose,
Como tem sido esses últimos meses na Alemanha?
Quanto a nós, temos uma super novidade: a família ficará maior. Isso mesmo! A
Laura virá ocupar um lugarzinho neste planeta. Será mais uma brasileirinha na terra do Sol
e do Carnaval.
Se é que podemos continuar dizendo isso, baseados nos últimos acontecimentos
do país. A começar pela ação desregrada da polícia em relação ao cidadão, como foi
manchete alguns dias atrás. Inocentes sendo mortos por policiais sem serem perguntados se
são bandidos ou não.
Os crimes de colarinho branco que estão cada vez repercutindo na mídia e
enojando-nos enquanto brasileiros.
Agora, a idéia do biodiesel, produto nacional, que está virando uma febre nos
outros países, sem saberem se vai dar certo ou não.
Bem, por hora, ficamos por aqui.
Elaine, Maria do Carmo e Fernanda.
Grupo 2: Escrita de uma história a partir de uma gravura apresentada:
Sou Papai Noel e não desisto nunca.
Era uma vez, um bondoso velhinho que costumava distribuir presentes às
crianças num antigo trenó conduzido por graciosas renas de nariz vermelho. Todos os anos
ele enfeitava suas renas e seu trenó, enchia-ode presentes diversos: bonecas, carrinhos,
bolas, trenzinhos, piões, petecas, chinchas, quebra-cabeças e muito mais.
As crianças esperavam ansiosamente pela visita do bom velhinho, enfeitavam
suas casas com luzes, sapatinhos, meias, bonecos de neve e saiam às ruas a espera do trenó
com seu lindo espetáculo de luzes coloridas e pozinhos mágicos quando cruzava o céu.
Infelizmente essa magia chegara ao fim, agora que estamos no século XXI
sofremos um gravíssimo problema: o aquecimento global.
Por conta disso, as geleiras do Pólo Norte estão derretendo rapidamente e acabara
por encobrir o trenó do Papai Noel. Mas não se preocupem, os anões, ajudantes do Papai
Noel, resolveram esse problema. Construíram um barquinho com dois lindos remos que
eu alcançam uma velocidade incrível. Tudo isso para que o bom velhinho continue
entregando presentes na noite mágica de Natal.
Ah, e quanto às renas, o se preocupem elas aprenderam a nadar e vivem felizes
para sempre no fundo do mar.
229
Grupo 3: Escrita de uma crônica em que a frase: “Eu gosto de macarrão.”
Aparecesse no inicio e no final do texto:
O jantar
Pensando no jantar comecei a imaginar quanta coisa boa poderia cozinhar. Gosto
muito de macarrão, mas esse prato seria muito comum para a ocasião.
Sendo assim, resolvi fazer alguns testes: talvez um jantar oriental, quem sabe
português ou árabe.
Lembrei-me de certo dia a decepção que foi a tentativa de preparar um sushi,
arroz soltinho, algas quebradiças ... deixa pra lá.
Como mamãe cozinha bem bacalhau, as batatas ficam maravilhosas! Mas será
que saberei tirar o sal? E os espinhos? Melhor desistir.
Charutos, kibe cru, frango com gergelim, tudo muito bom, mas dá um trabalho...
Nada como um macarrão alho e óleo: simples, fácil e todo mundo adora!
De segunda a segunda faz parte do nosso cardápio. Eu gosto muito de macarrão!
Grupo 4: Escrita de um texto de opinião que tratasse da instalação de usinas
nucleares no país:
A instalação de usinas nucleares no Brasil
Dados aos problemas ocorridos com usinas deste tipo, não seria necessário o
consumo consciente de energia elétrica ao invés da implantação de novas usinas nucleares?
Sabemos que essas usinas oferecem um grande potencial de energia, entretanto a
população a consome indiscriminadamente, forçando a implantação de novas unidades,
aumentando o risco de contaminação de todo o ambiente.
Dessa forma, seria mais construtivo, investir na educação e conscientização da
população do que na implantação de novas unidades.
Grupo 5: Reescrita de um conto apresentado da Bela Adormecida:
A Bela Adormecida
Era uma vez um rei e uma rainha que viviam tristes por não terem filhos. Até que
um dia nasceu uma linda menina e a chamaram de Flor Graciosa.
Para a realização do batizado o rei convidou 12 das 13 fadas que conhecia, pois
possuía 12 pratos de ouro e para não ofender a 13ª com um prato de prata, decidiu não
convidá-la.
Cada fada ofereceu à menina um presente maravilhoso, como beleza, caráter,
riqueza e inteligência. A 12ª fada distraiu-se com o vestido sujo de sorvete e então a 13ª
ofendida lançou um feitiço, que aos 15 anos a princesa iria ferir o dedo com o fuso de uma
roca e com isso morreria. A 12ª fada não conseguiu anular o feitiço, mas o amenizou,
trocando a morte por um sono profundo.
No dia em que completou 15 anos, Flor Graciosa entediada, foi fazer um passeio
pelo castelo, encontrou uma torre e subiu, encontrou uma velha senhora que estava fiando,
admirada por não conhecer o fuso a menina quis experimentar, feriu o dedo e caiu em um
sono profundo junto com todos do reino.
230
Passados 100 anos, um príncipe que conhecia a história foi até o castelo e
encontrou Flor Graciosa adormecida.
O príncipe deu-lhe um beijo e imediatamente ela acordou e agradeceu por
desfazer o feitiço.
Todos acordaram, o príncipe pediu a mão da princesa em casamento que estava
apaixonada pelo seu salvador.
231
Anexo III – Produções textuais
1) Produções realizadas a partir de gravuras:
232
233
234
2) Tema Livre:
235
3) Produção realizada a partir de sequência de gravura:
236
4) Produção de texto com roteiro:
237
5) Reescritas
238
239
6) Gêneros Definidos
240
7) Limitações X Produções de Qualidade
241
242
Anexo IV Características dos gêneros organizadas pelas educadoras no encontro do dia
18/08/2008.
Contos de Fadas – 1º Anos
Envolvem princesas e príncipes;
Narrativa;
Herói, vilão que geralmente oprimem o personagem principal;
Personagens são príncipes, princesas, reis, bruxas, madrastas, fadas;
Tempo passado;
Inicia com era uma vez;
Trazem um ensinamento implícito;
Final sempre dá certo e todos vivem felizes para sempre;
O local pode ser uma floresta, um castelo;
Os personagens bons, são belos, os maus são sempre feios;
Conto Folclórico – 2º Anos
Origem popular;
Linguagem coloquial (do povo)
Possui características comuns aos contos, exemplo: narrativas diálogos;
Difere na forma de começar e terminar; focando um linguagem “divertida”;
Existe uma problemática, mas nem sempre o autor apresenta uma solução;
Apresenta elementos de outros gêneros (fábulas, contos acumulativos; contos de
ensinamento;
Personagens (seres reais ou imaginários;
Evolução apresenta vários momentos de “clímax”, envolvendo o leitor.
Fábulas – 3º Anos
Linguagem simples;
Narrativas curtas, vinculadas ao cotidiano;
Personificação de animais;
Tempo indeterminado;
Título não antecipa o assunto, tema;
Texto bem humorado;
Deixa uma mensagem, ou seja uma moral.
Crônica – 3ª Séries
Texto curto;
Discurso na 1ª ou 3ª pessoa;
Narração;
Descrição;
Comentários;
Reflexão;
Linguagem com duplos sentidos;
243
Jogos de palavras;
Conotações;
Utiliza a ironia;
Pontuação expressiva;
Aborda aspectos da vida cotidiana;
Apresenta episódios reais ou fictícios;
Narrativas de Aventura – 4ª Séries
Caracterização detalhada dos personagens, cenário (espaço);
Há sempre a presença de narrador (1ª ou 3ª pessoa);
Enredo;
Personagens;
Tempo;
Conflito;
Clímax.
244
Anexo V -
Versões Fábula “A Cigarra E A Formiga”
A CIGARRA E A FORMIGA
(La Fontaine 1621-1695)
A CIGARRA PASSOU TODO O VERÃO CANTANDO; POR ISSO SE VIU SEM
PROVISÕES QUANDO OS FRIOS VENTOS DO INVERNO COMEÇARAM A SOPRAR. NÃO
TINHA NA DESPENSA NEM UMA PERNA DE MOSCA, NEM UM PEDACINHO DE
MINHOCA. ELA FOI CHORAR MISÉRIA NA CASA FORMIGA, SUA VIZINHA: PEDIU
EMPRESTADOS ALGUNS GRÃOZINHOS PARA SOBREVIVER ATÉ A PRIMAVERA.
- PAGAREI TUDO E COM JUROS, ANTES DO PRÓXIMO VERÃO; PALAVRA DE
BICHO! – PROMETEU.
ORA, GOSTAR DE EMPRESTAR É UM DEFEITO QUE A FORMIGA NÃO TEM.
ELA PERGUNTOU À PEDINCHONA:
- O QUE VOCÊ FICOU FAZENDO NO ÚLTIMO VERÃO?
- PASSEI DIA E NOITE CANTANDO PARA QUEM QUISESSE OUVIR. POR
FAVOR, NÃO PENSE MAL DE MIM...
-AH, PASSOU CANTANDO? FOLGO MUITO EM SABER! POIS ENTÃO, AGORA
DANCE!
MORAL DA HISTÓRIA: OS PREGUIÇOSOS COLHEM O QUE MERECEM.
(TRANSCRITO DE LA FONTAINE: FÁBULAS DE LA FONTAINE. TRADUÇÃO
ROSEMARY COSTHEK ABÍLIO. SÃO PAULO: MARTINS FONTES, 1997).
A CIGARRA E A FORMIGA
(MONTEIRO LOBATO 1882-1948)
HAVIA UMA JOVEM CIGARRA QUE COSTUMAVA CANTAR PERTO DE UM
FORMIGUEIRO. PARAVA QUANDO ESTAVA CANSADINHA E SEU DIVERTIMENTO
ENTÃO ERA OBSERVAR AS FORMIGAS TRABALHANDO PARA ARMAZENAR
COMIDA.
QUANDO O VERÃO ACABOU E VEIO O FRIO, TODOS OS ANIMAIS
APREPIADOS PASSAVAM O DIA NAS TOCAS.
245
A CIGARRA, EM SEU GALHINHO SECO, QUASE MORTA DE FRIO E FOME,
DECIDIU PEDIR AJUDA ÀS FORMIGAS E, ARRASTANDO UMA ASA, LÁ SE FOI PARA O
FORMIGUEIRO. BATEU À PORTA E APARECEU UMA FORMIGA GORDA,
EMBRULHADA EM UM XALINHO.
- QUE QUER? – PERGUNTOU, EXAMINANDO A TRISTE MENDIGA SUJA DE
LAMA E A TOSSIR.
- VENHO EM BUSCA DE AJUDA, O MAU TEMPO NÃO PÁRA E EU...
A FORMIGA OLHOU-A DE ALTO A BAIXO.
- E O QUE FEZ DURANTE O BOM TEMPO, QUE NÃO CONSTRUIU SUA CASA? A
POBRE CIGARRA, TODA TREMENDO, RESPONDEU DEPOIS DUM ACESSO DE TOSSE:
-BEM, EU CANTAVA, SABE...
- AH! EXCLAMOU A FORMIGA, RECORDANDO-SE. ERA VOCÊ ENTÃO
QUEM CANTAVA, ENQUANTO NÓS TRABALHÁVAMOS PARA ARMAZENAR
COMIDA?
- ISSO MESMO, ERA EU.
- POIS ENTRE, AMIGUINHA! NUNCA PODEREMOS ESQUECER A BOAS HORAS
QUE O SEU CANTO NOS PROPORCIONOU. VOCÊ NOS DISTRAÍA E ALIVIAVA O
TRABALHO. DIZÍAMOS SEMPRE QUE ERA UMA FELICIDADE TER COMO VIZINHA
UMA TÃO GENTIL CANTORA! ENTRE, AMIGA, QUE AQUI TERÁ CAMA E MESA
DURANTE TODO O MAU TEMPO.
A CIGARRA ENTROU, SAROU DA TOSSE E VOLTOU A SER A ALEGRE
CANTORA DOS DIAS DE SOL.
MORAL: OS ARTISTAS (POETAS, PINTORES, MÚSICOS) SÃO AS CIGARRAS DA
HUMANIDADE.
(TRANSCRITO DE LOBATO, MONTEIRO. FÁBULAS. SÃO PAULO: BRASILIENSE, 1994)
246
Anexo VI - Análise de fábulas impressas:
247
ANEXO VII – Texto Informativo sobre Fábulas
CENPEC. Estudar pra Valer. Orientações para o professor. Módulo 3. São Paulo, 2004.
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