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Universidade Federal de Campina Grande
Centro de Humanidades
Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais
Alberto Jorge Santos Lima Carvalho
O NOVO COOPERATIVISMO: alternativa de trabalho e
renda ou mais um caminho para a precariedade das relações
de trabalho?
Campina Grande – PB
2010
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Alberto Jorge Santos Lima Carvalho
O NOVO COOPERATIVISMO: alternativa de trabalho e renda ou
mais um caminho para a precariedade das relações de trabalho?
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em
Ciências Sociais da Universidade Federal de Campina Grande
PPGCS/UFCG como requisito para a obtenção do título de
Mestre em Ciências Sociais, área de concentração Sociologia
do Trabalho, sob a orientação do Professor Dr. Roberto Véras
de Oliveira
Orientador:
Professor Doutor Roberto Véras de Oliveira
Campina Grande – PB
2010
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ALBERTO JORGE SANTOS LIMA CARVALHO
O NOVO COOPERATIVISMO: alternativa de trabalho e renda ou mais um
caminho para a precariedade das relações de trabalho?
Avaliado em 25 de Março de 2010.
BANCA EXAMINADORA:
______________________________________________________
Profº Doutor Roberto Veras de Oliveira
Universidade Federal de Campina Grande - UFCG
PPGCS-UFCG
_______________________________________________________
Profª. Doutora Leiliam Cruz Dantas
Universidade Federal de Campina Grande
UAECON-UFCG
_______________________________________________________
Prof° Doutor Rogério Humberto Zeferino Nascimento
Universidade Federal de Campina Grande – UFCG
PPGCS-UFCG
DEDICATÓRIA
Não poderia deixar de dedicar este estudo aos meus
pais Moisés Rafael de Carvalho e Waldina Santos
Lima Carvalho. Especialmente a você mainha, que em
todos os momentos apoiou e incentivou-me, sempre
proporcionando condições para que eu pudesse
desenvolver meus estudos e enfim alcançar mais esta
vitória. A você “Waldenísia” minha devoção, meu
respeito e incondicional amor. Sempre!
AGRADECIMENTOS
Não poderia deixar de registrar em forma de agradecimento àqueles que de alguma
forma me ajudaram no transcorrer deste curso que para mim foi um desafio, mostrando-
se por muitas vezes incerto, mas que finalmente teve seu desfecho favorável graças a
ajuda e apoio de vocês. Muito Obrigado!
À Deus por TUDO.
Aos meus irmãos: Divanna e André, pelo convívio, respeito e apoio irrestritos, sempre
ofertados em todos os momentos.
A Ranuzhya Montenegro (minha namorada), por me entender e me apoiar, mesmo
quando significasse momentos de distância um do outro.
A Roberto Véras, o grande responsável por tudo que fiz. Ao senhor professor, não posso
agradecer apenas pelo conhecimento adquirido, por ter me oferecido uma formação com
muita seriedade e comprometimento, pela competência nas atividades realizadas, pela
disponibilidade na orientação prestada, mas, agradecê-lo principalmente por ter se
mostrado um amigo que compreendeu os momentos vividos e os problemas pessoais
enfrentados durante esta jornada. Serei eternamente grato Professor!
As minhas queridas amigas Ivana Carla Barros e Josilene Félix Marinho que tiveram a
honra, junto comigo, de serem orientandos de Roberto Veras. A vocês meninas, minha
gratidão pela paciência e apoio a mim dispensados.
Ao professor Dr. Fernando Garcia, por ter aceitado o convite e participado da banca de
apresentação do projeto, assim como pelas ponderações e sugestões apresentadas.
Aos professores Dr. Rogério Humberto Zeferino Nascimento e Dra. Leiliam Cruz
Dantas, por aceitarem participar das bancas de qualificação e examinadora deste
trabalho, bem como pelas sugestões e correções apresentadas.
Aos amigos Rogério Cabral e Felipe Torres, diletos companheiros, que sempre me
entenderam e apoiaram, inclusive me substituindo em compromissos profissionais, que
tiveram de ser colocados em segundo plano para a conclusão desse estudo.
Aos diretores, colegas e amigos da Agência Municipal de Desenvolvimento AMDE,
bem como a Coordenação do Curso de Direito das FIP Faculdades Integradas de
Patos, pelo apoio e incentivo, sobretudo quando tiveram que conviver com alguns
momentos de ausências necessárias para conclusão desse Curso de Mestrado. A vocês a
certeza que os conhecimentos aqui adquiridos muito servirão para melhorar meu
desempenho funcional.
A todos que fazem parte do GT Trabalho, coordenado pelo Profº. Roberto, obrigado
pelo apoio, incentivo e orientações prestadas a este aprendiz nas Ciências Sociais.
A todos que fazem parte do Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais da UFCG,
professores e servidores que os faço representar na pessoa de Rinaldo, sem a ajuda e o
empenho de vocês não conseguiria encerrar este trabalho.
A todos que foram ouvidos na construção deste trabalho, entrevistados ou consultados,
sobre o tema aqui tratado, meu muito obrigado.
Aos órgãos e entidades que sempre se mostraram abertos a discussão e a pesquisa
desempenhada: AMDE, SEBRAE, UNISOL, Fórum Regional de Economia Solidária.
À COOPERNUT, representada por suas cooperadas, mulheres guerreiras, que não me
ensinaram apenas sobre economia solidária ou cooperativismo na prática, mas me
ensinaram sobre a vida e principalmente sobre e superação, a vocês “grupo de
mulheres”, meu respeito e admiração.
Enfim, a todos aqueles que de forma direta e indireta contribuíram para conclusão deste
ensaio, mas que não foram aqui citados nominalmente por questões das mais diversas.
Sintam-se contemplados. Obrigado a Todos!
RESUMO
No Brasil, destacadamente na década de 90, o processo de liberalização econômica do
país, que foi visto como solução possível de desenvolvimento e redução do chamado
risco Brasil, fortaleceu o setor informal que passou a ser visto sob bons olhos, e assim
encarado como oportunidade de ocupação em época de desemprego estrutural. A
Economia Solidária surge na tentativa de, além de lutar contra o desemprego que se
apresenta de forma estrutural, tentar inserir práticas fundadas na solidariedade e
igualdade entre os homens, visando superar a divisão entre capital e trabalho,
implantando por meios de práticas autogestionárias a consolidação de tais preceitos. O
Cooperativismo existente no mundo desde a revolução industrial e que no Brasil
enfrentou fases de intensa intervenção do Estado ressurge como principal pilar da
Economia Solidária, sendo modelo de oferta de trabalho e renda, bem como instrumento
de inclusão social. Com isso, objetivamos estudar de forma prefacial o Cooperativismo,
como fenômeno fundamental da economia social. E finalmente, tendo como uma
perspectiva teórica a sociologia do trabalho e o direito do trabalho, buscar analisar as
condições enfrentadas por este setor na nova ordem do mundo do trabalho, assim como
as implicações jurídicas do associado cooperado em relação aos seus direitos
trabalhistas, os encarando como conquista do cidadão. O Cooperativismo seria uma
arma eficaz a ajudar solucionar o desemprego ou diante das várias problemáticas
existentes se constitui em mais um meio de precarização das relações de trabalho?
PALAVRAS CHAVES: ECONOMIA SOLIDÁRIA - COOPERATIVISMO
DESEMPREGO - INCLUSÃO SOCIAL – PRECARIZAÇÃO.
ABSTRACT
In Brazil, mainly in 90’s, the economic liberalization process of the country, which was
considered a possible solution for development and decrease of the so called Brazil’s
risk, strengthened the informal sector which began to be well-seen and faced as a
opportunity of occupation in times of structural unemployment. The solidarity economy
emerges for trying to fight back against unemployment in its structural shapes, trying to
insert reasoned practices in solidarity and equality among men, aiming to overcome the
division between capital and work, implanting through self-maneged practices the
setting of these precepts. Cooperatives existent in the world since industrial revolution
which faced phases of intense intervention by the government rise again as the main
column of Solidarity Economy and as a model of job offer, finance and instrument for
social inclusion. Therewith, our objective is to study preferentially Cooperatives as a
fundamental phenomenon of social economy. Finally, holding as a theoretical
perspective the sociology of work and the labor law, we intend to analyze the legal
implications of the associated cooperated, focusing in their rights as employees,
considering it a citizen’s conquest. Would cooperatives be a effective weapon to solve
the unemployment or with to many problems existent nowadays it is only another way
of precarious labor relations?
KEY-WORDS: SOLIDARITY ECONOMIC COOPERATIVES
UNEMPLOYMENT – SOCIAL INCLUSION – PRECARIOUS LABOR
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO
CAPÍTULO I Cooperativismo e Capitalismo
1.1 – Origens a partir da Revolução Industrial
1.2 – O pioneirismo de Robert Owen
1.3 – A crítica marxista
1.4 - As perspectivas do cooperativismo foram redimensionadas ao
longo do Século XX
1.5 - Reemergência do Cooperativismo ao final do Século XX
CAPÍTULO II - Cooperativismo no Brasil
2.1 – Primeiras manifestações e evolução durantes o Século XX
2.2 – Cooperativismo: relação de emprego ou relação de trabalho.
2.3 – Crise do trabalho e reemergência atual: dois caminhos
CAPÍTULO III - Economia Solidária
3.1 - A Economia Solidária entra em cena
3.2 – Configuração: atores, experiências, propostas
3.3 – A Economia Solidária no Mundo Capitalista: contradições e impasses.
CAPÍTULO IV – A Experiência da COOPERNUT
4.1 - Análise da experiência
4.1.1 – COOPERNUT, como tudo começou.
4.1.2 – A construção de uma cultura cooperativista e a conquista da sede
4.1.3 – A organização interna e os mecanismos de decisão
4.1.4 – A remuneração dos cooperados
4.1.5 – COOPERNUT, parcerias.
4.1.6 Participação da COOPERNUT no Fórum de Economia Solidária
e a relação com outros empreendimentos solidários
4.2 – Questões para reflexão
CONSIDERAÇÕES FINAIS
REFERÊNCIAS
11
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17
21
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74
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84
88
90
91
96
INTRODUÇÃO
Este estudo tem como propósito principal analisar a experiência cooperativista, na
sua versão atual, particularmente referenciada na idéia da Economia Solidária. Surgida em
um contexto de crise do trabalho e do emprego, o cooperativismo solidário tem se
colocado nãocomo uma alternativa de trabalho mas, para além disso, como um embrião
de um novo modelo produtivo e de relações de trabalho. Na prática, no entanto, em que
medida vem contribuindo para possibilitar efetivas alternativas de trabalho e renda, diante
do desemprego e do subemprego? Ou, tão somente, tem conseguido ser mais um fator de
precarização das relações de trabalho? Nos debruçando sobre um estudo de caso, centrado
em uma experiência de cooperativismo situada no campo da Economia Solidária na região
de Campina Grande, Paraíba, é sobre tal problemática que trataremos aqui.
A idéia de cooperação
1
perpassa toda a história da humanidade, embora algumas
formas de sociedade tenham tornado mais evidente o espírito cooperativista. Entretanto, o
cooperativismo, como é conhecido nos tempos atuais, começou a se gestar com o
movimento operário dos séculos XVIII e XIX. Surgiu com as primeiras manufaturas
organizadas sob a forma de cooperativas, na Inglaterra de 1790. Há informações a respeito
de cooperativas na França desde o século XIX. Essas, sempre como formas de reação dos
trabalhadores franceses à Revolução Industrial, eram denominadas de cooperativas
operárias de produção. Charles Fourier sustentava na França a criação de comunas
agrícolas auto-suficientes, denominadas de falanstérios. Fourier entendia que as pessoas
nesses casos deveriam ser associadas e proprietárias, ao mesmo tempo. (MARTINS, 2006:
19).
Com a expansão desses movimentos, no início do Século XIX, somada à
inspiração trazida pelo “socialismo utópico” de Roberto Owen, Lassale, Charles Fourier,
Charles Gide, Pierre Proudhon e Louis Blanc, autores que vão do socialismo moderado ao
1
Aqui entendido como forma de associação para o trabalho em bases solidárias. Considere-se que a
cooperação em sentido mais amplo, nos termos de Marx (1988), está presente em todas as formas de
sociedade, não implicando necessariamente em ação solidária. O autor se refere mais especificamente,
inclusive, ao modo como o capitalismo se apropria desse recurso em benefício do lucro.
11
anarquismo (LIMA, 2002: 08), é que dá-se início ao cooperativismo visto nos moldes
atuais. Foi dentro deste contexto, influenciado por idéias de alguns dos expoentes do
socialismo utópico, que surgiu a Cooperativa de Rochdale
2
, considerada a matriz simbólica
e discursiva para a prática cooperativista no âmbito da sociedade moderna (MARTINS,
2006: 23).
Entretanto, quanto mais o capitalismo se estabeleceu como modo de produção
predominante nas sociedades industrialmente mais desenvolvidas, mais se tornaram
“sociedades salariais” (CASTEL, 1998), com o cooperativismo perdendo importância.
Apenas a partir das últimas décadas do Século XX, com as transformações que vêm
atingindo globalmente o mundo do trabalho, trazendo o fenômeno da “nova questão
social” (CASTEL, 1998), com a ampliação do número dos socialmente excluídos, que
perseguem sua sobrevivência no mercado informal de trabalho, a busca por processos de
inclusão social e geração de renda tem sido uma constante preocupação entre os próprios
atingidos por tais processos, assim como entre os gestores públicos. O cooperativismo
surge para muitos como uma das alternativas, pois pode propiciar ao desempregado
trabalho e renda, além de poder possibilitar-lhe retomar sua auto-estima e sua condição
cidadã.
Segundo estimativas da Organização Internacional do Trabalho (2006), cerca de
180 milhões de pessoas no mundo estão numa situação de desemprego aberto (procurando,
mas não achando, emprego) e cerca de um terço da mão-de-obra no mundo está
desempregada ou subempregada.
No Brasil, particularmente através das Missões Jesuítas constituídas no sul a partir
do século XVII, foram introduzidas as primeiras práticas cooperativistas do projeto
colonizador. Entretanto, o movimento cooperativista propriamente dito começou a ser
difundido no país somente em 1847, quando o francês Jean Maurice Faivre, sob inspiração
de Fourier, fundou no Paraná a Colônia Tereza Cristina, que apesar de sua breve história
muito contribuiu para o florescimento do ideal cooperativista no país (SILVA FILHO,
2002).
2
A Cooperativa de Rochdale surgiu, em 1844, como cooperativa de consumo, composta por 28 tecelões, na
cidade de Rochdale, na Inglaterra, cidade esta que contava na ocasião com 24.421 habitantes, tendo sido
registrada com a designação de Friendly Society (Veras Neto: 2002)
12
Com a proclamação da República, em fins de 1889, proporcionou-se um ambiente
mais favorável à liberdade de associação, começando a surgir em decorrência de tais
condições as primeiras organizações efetivamente intituladas de sociedades cooperativas, o
que se fortaleceu ainda mais em 1891, com a Constituição da República, que assegurou
liberdade de associação (art. 72, §8º). O Estado, a partir daí, começou a legislar sobre
associativismo rural e, posteriormente, no século XX, sobre cooperativismo. Ao longo
da maior parte do Século XX, com a tendência crescente ao assalariamento, primeiro
agrícola e depois nos setores industrial e de serviços, o cooperativismo se desenvolve como
uma opção secundária e, sobretudo, no setor rural, como forma disfarçada de empresa
(MARTINS, 2006).
Também no Brasil, somente a partir dos impactos da crise do trabalho e emprego,
desencadeada a partir dos países centrais do capitalismo, o tema do cooperativismo
ressurgiu. Destacadamente a partir da década de 1990, a economia brasileira tem passado
por profundas modificações, responsáveis, em grande medida, pela ampliação do
desemprego nacional, principalmente nos patamares que se manteve ao longo da referida
década até o início dos anos 2000.
A atual crise do desemprego resulta da atuação de fatores
muito conhecidos numa conjuntura em que os remédios testados
não funcionam mais A demanda por trabalhadores está se
contraindo em setores beneficiados por inovações tecnológicas,
entre os quais se destaca a indústria, mas que incluem
indubitavelmente boa parte do terciário. Os robôs, o computador e
a comunicação por satélite estão eliminando milhões de empregos
no mundo inteiro e de nada adianta lamentar-se por eles. Estes
ganhos de produtividade do trabalho beneficiam a todos e seria
uma luta inglória tentar o progresso técnico para manter seres
humanos fazendo coisas que máquinas fazem mais barato e
melhor. Além disso a Globalização da economia está modificando
a divisão internacional do trabalho. O perverso nisso é que os
capitais estão se deslocando para as áreas em que o custo da força
de trabalho é menor, onde não existem os benefícios sociais
consagrados em convênios internacionais, o que agrava a perda
de empregos nos países em que os direitos trabalhistas existem e
são respeitados” (SINGER, 2001: 118).
O acirramento da competitividade empresarial, a política devotada à estabilização
monetária, a desorganização do mercado de trabalho, a baixa qualificação dos
13
trabalhadores, a reestruturação produtiva, são motivos que, associados à globalização da
economia, levaram ao aumento do desemprego, da informalidade e da precariedade nas
relações de trabalho, problema que, no caso do Brasil, significou um agravamento de uma
situação que desde sempre esteve presente. O processo de liberalização econômica do país,
que foi visto como solução possível de desenvolvimento e redução do chamado “custo
Brasil”, fortaleceu o setor informal, que passou a ser visto sob bons olhos, e assim
encarado como “possibilidade de ocupação em tempos de desemprego estrutural(LIMA,
2002: 17).
Foi nesse contexto que emergiu a experiência da Economia Solidária, esta no
dizer de Silva Filho (2002:29) “considerada uma escola cidadã de participação e trabalho
associado e uma alternativa válida e eficiente de solução de problemas da comunidade”.
Acrescenta ainda o autor que do ponto de vista econômico as instituições que formam a
Economia Solidária podem ser consideradas “empresas”, já que administram seus recursos,
provêem-se de matéria prima, transformam, produzem serviços, entretanto o que as tornam
“protagonistas de primeiro nível de ação comunitária e das políticas sociais desenvolvidas”
seria o princípio de solidariedade a elas inerentes.
Mas a expansão do cooperativismo ocorreu para além da influência da própria
expansão da Economia Solidária. Isso, porque no lugar da contratação de empregados,
valendo-se da autorização legal (CLT, art. 442, parágrafo único)
3
, passou-se a partir de
1994 a se ter a possibilidade, em qualquer ramo de atividade, de contratos entre empresas e
sociedades cooperativas sem vínculo de emprego, entre as cooperativas e seus associados e
entre cooperados e empresa contratante.
Sob tais condições, o fenômeno cooperativista ganhou nova evidência, trazendo
inúmeras conquistas para o meio social. Ao mesmo tempo, a partir deste novo dispositivo
legal, vem causando grande celeuma entre lideranças sociais, políticos, juristas, estudiosos
do assunto, acrescentando uma brecha legal para empresários fraudadores, que visam, em
detrimento do trabalho, maximizar lucros a qualquer custo.
A partir deste modelo de “oferta de trabalho” e inclusão social, novos enfoques
têm sido buscados a respeito do tema. Na verdade, o cooperativismo visto como repositor
3
Não considera como sendo relação empregatícia a relação existente entre cooperados e cooperativas, nem
entre aqueles e as empresas que contratam as cooperativas.
14
de mão de obra ociosa ao mercado de trabalho, com a Economia Solidária, cerca-se de
muitas promessas indicadas pelos princípios que a norteiam. Mas, de outro lado, a
“salvação ao desemprego” trouxe atrelada a problemática da precarização.
Aqui, necessário se faz destacar que nosso estudo não tem o objetivo de pesquisar
as experiências de cooperativismo claramente voltadas à burla da legislação trabalhista,
mas, sim, aquelas que se situam no campo da Economia Solidária. Temos como
perspectiva do estudo um olhar centrado em uma experiência de cooperativismo que,
optando pelo campo da economia solidária, buscam combinar um sentido de justiça social,
na dimensão associativa, e a eficiência, na dimensão econômica. Nos voltando para uma
experiência imbuída de tais propósitos com o objetivo de nos perguntar em que medida
iniciativas como a estudada, ao mesmo tempo em que se colocam como alternativa de
geração de trabalho e renda, em um contexto de crise do emprego, não têm concorrido, de
algum modo, para a reprodução de um padrão precário de relações de trabalho.
Analisaremos em que medida uma cooperativa, situada e com atuação no município de
Campina Grande PB, tem alcançado um nível de efetividade social de modo a,
oportunizar a geração de trabalho, emprego e renda e a inclusão social, em termos de um
trabalho “decente”
4
, ou se, ao contrário, atua como mais um fator de precarização das
relações de trabalho.
Reconstituiremos os processos históricos de sua formação e identificaremos a
situação atual da cooperativa em foco, quanto aos aspectos social, organizacional e
produtivo, discutindo a efetividade social dessa iniciativa. Para isso desenvolveremos
indicadores de efetividade social, usando como parâmetro para tal as indicações da OIT
sobre “trabalho decente”, ao mesmo tempo problematizando-as. Orientaremos a construção
de tais indicadores quanto às seguintes dimensões: nível de renda propiciada aos membros;
condições de trabalho predominantes em seus ambientes; tipo e natureza de instituições
com as quais estabelece relações de contrato, apoio, parceria; tipo e natureza dos contratos
que têm celebrado; processo interno de decisão e gestão; processo de qualificação
profissional para os associados/cooperados.
4
Conceito utilizado pela OIT, utilizada igualmente na proposta de texto normativo das “Bases
Constitucionales para a América Latina Y el Caribe” , tendo sua construção apoiada em quatro pilares
estratégicos: os direitos e princípios fundamentais do trabalho, a promoção do emprego de qualidade, a
extensão da proteção social e o diálogo social"
15
A cooperativa estudada, como informado, inserida no campo da Economia
Solidária é a COOPERNUT. A COOPERNUT - Cooperativa de Produção de Suplementos
Naturais de Campina Grande Ltda., constituída em 06 de dezembro de 2002, se originou de
um grupo de mulheres ligadas à Pastoral da Criança, que trabalhava com medicamentos
caseiros e multi-mistura, na comunidade Presidente Médici, quando em uma assembléia
paroquial foi sugerida a criação de uma cooperativa que propiciasse condições de geração
de trabalho e renda. A cooperativa hoje conta com 32 cooperados e é uma realidade diante
de um mercado exigente e competitivo, adotando um novo paradigma de produzir,
consumir e conviver, onde o trabalho coletivado é o cerne do cooperativismo.
O texto se encontra dividido em quatro capítulos. No primeiro, busca-se situar o
surgimento do cooperativismo no contexto do nascimento do capitalismo industrial, como
um recurso de enfrentamento das dificuldades impostas aos trabalhadores pela nova
realidade político-econômica. No segundo capítulo, realiza-se um resgate histórico do
cooperativismo no Brasil, até o momento atual, quando sob o contexto de importantes
transformações no mundo do trabalho distinguem-se duas perspectivas: o cooperativismo
defendido pela economia solidária e o incentivado por empresas e gestores públicos como
recurso de burla da legislação trabalhista. No terceiro capítulo, foca-se a Economia
Solidária no Brasil, buscando identificar suas bases de constituição e seus principais
dilemas. No quarto e último capítulo, realiza-se a análise de uma experiência de
cooperativismo onde por meio de pesquisa empírica, utilizando análise documental e
entrevistas com os vários atores envolvidos, buscamos contextualizar o nosso objeto de
estudo e assim identificar possibilidades e limites quanto ao seu propósito de se constituir
em alternativa efetiva de geração de trabalho e renda e em espaço de exercício de
cidadania. Ao final, são elencadas algumas considerações não conclusivas.
16
CAPÍTULO – I
COOPERATIVISMO E CAPITALISMO
Práticas de solidariedade, associativismo e ajuda mútua podem ser identificadas
em diversos momentos históricos, isso por ser característico do ser humano a capacidade
de buscar viver em comunidade, por apresentar-se como um ser gregário.
Associações para garantir a caça, a pesca, a construção de habitações, enfim
garantir a sobrevivência são amplamente documentadas por nossa história, como prática
comum dos povos antigos. As civilizações da antiga Grécia e Roma também trazem relatos
de sociedades que prestavam auxílio mútuo para enterros e seguros para as famílias dos
mortos. (MARTINS, 2006).
Assim, percebe-se que a associação e cooperação são práticas genuínas e naturais
à essência humana. Entretanto, o cooperativismo como o conhecemos é um fenômeno da
modernidade, tendo surgido com a Revolução Industrial.
1.1 – Origens a partir da Revolução Industrial
Foi no final do século XIX que registrou-se o surgimento do cooperativismo, ao
menos nos moldes do cooperativismo que hoje se conhece. Registrou-se que tais
manifestações se deram na Inglaterra e Alemanha. A iniciativa que mais ganhou evidência,
tida como pioneira, foi a cooperativa de Rochdale (1844), com seus princípios fundadores
tendo se tornado referência para todo o movimento cooperativo internacional. Desde sua
gênese, o pensamento e a prática cooperativista desenvolveu-se como alternativa tanto ao
individualismo liberal quanto ao socialismo centralizado (SANTOS, 2005: 33).
Ou seja, foi no ambiente gerado com a emergência do capitalismo que surgiu o
fenômeno do cooperativismo. na Baixa Idade Média, principalmente com a formação
das cidades, surgem os grêmios de artesãos e de comerciantes (corporações de ofício),
movidos por uma necessidade de cooperação e de proteção mútua, ao mesmo tempo em
17
que não estavam isentos de hierarquização e de subordinação (entre aprendizes, oficiais e
mestres de ofício).
A partir do Século XIX, com a Revolução Industrial, quando a economia passou
por uma mudança radical, as corporações perderam seu lugar para o sistema fabril
capitalista. A existência de uma classe de capitalistas possuidora do capital e que em
virtude da propriedade deste capital aufere mais lucro, acumulando mais capital, e assim
cada vez mais, torna-se característica marcante do sistema econômico denominado
capitalismo. A busca de lucro e de acumulação de capital caracteriza o capitalismo.
Segundo Hunt (1989: 40), as quatro fontes mais importantes de acumulação inicial de
capital foram:
(1) o volume do comércio, que cresceu rapidamente; (2) o sistema
industrial de produção doméstica; (3) o movimento dos
cercamentos; (4) a grande inflação de preços. Havia muitas outras
fontes de acumulação inicial de capital, algumas das quais eram
menos respeitáveis e, muitas vezes, esquecidas por exemplo, a
pilhagem colonial, a pirataria e comércio de escravos.
O capitalismo, que surgiu assim a partir de uma “acumulação primitiva” de capital
- nos termos de Marx (1988) -, iniciou-se ainda na sociedade feudal.
Esta transição foi iniciada através da acumulação primitiva de
capital, pré-capitalista, induzida através do mercantilismo
absolutista e do processo de exclusão dos camponeses do campo
fornecendo mão-de-obra barata para os empreendimentos
industriais manufatureiros, principalmente com a criação de
ovelhas para a indústria têxtil, assim como da exploração das
colônias americanas e do melhor aproveitamento das rotas
comerciais com o Oriente e posteriormente o novo mundo
americano (VERAS NETO, 2002: 54).
Com estas mudanças, do ponto de vista econômico, uma nova classe de
trabalhadores se originou, o proletariado, totalmente destituída da posse dos meios de
produção, tendo perdido o controle sobre o processo de produção e forçada a uma situação
em que a venda de sua força de trabalho era a única possibilidade de sobrevivência. Aos
trabalhadores, homens, mulheres e crianças, foi imposta, na maioria das vezes, uma
18
situação de extrema precariedade, onde a exploração era desmedida, tudo em função da
obtenção de mais lucro.
Conforme Przeworsky (1995: 93), citando Marx, no capitalismo
“há um mercado de capital, onde os donos da riqueza produtiva
alocam seus recursos na procura de lucros, e um mercado de
trabalho, onde os proprietários de força de trabalho são forçados a
vender seus serviços para sobreviver. A produção ocorre quando os
trabalhadores trocam sua capacidade de trabalhar por um salário e
quando os capitalistas ou seus delegados, como organizadores do
processo de produção, extraem trabalho concreto da força de
trabalho.”
As mudanças advindas com a expansão do capitalismo, foram consideradas por
muitos uma verdadeira “catástrofe social” (POLANYI, 1980: 58). Crianças, a partir de
nove anos de idade, passaram a ter jornada de trabalho de 12 horas e os adultos chegavam
a trabalhar 16 horas diárias, sem nenhum sistema previdenciário ou segurança no trabalho.
Durante tal processo impõe-se uma desarticulação social resultante da expulsão dos
camponeses do campo para a cidade e com o desemprego urbano em massa, ocasionando
revoltas de setores como os artesãos organizados em corporações de ofício,
impossibilitados de competirem com a indústria manufatureira, a qual trouxe para o âmbito
laboral as máquinas-ferramentas, poupadoras do trabalho humano. É nesse contexto que
surge o movimento Luddita
5
.
A intranquilidade social tornou-se campo fértil para a formação das mais variadas
oposições ao liberalismo econômico. Foi neste período de transformações e mudanças,
quando a miséria se tornou inerente ao cotidiano europeu, que surgiram algumas iniciativas
que se colocavam como alternativas ao assalariamento e até ao próprio sistema capitalista.
Na Inglaterra, em plena Revolução Industrial, tendo em conta as precárias
condições vivenciadas pelos trabalhadores, um grupo de operários tecelões, da cidade de
Rochdale, próximo a Manchester, resolveu juntar suas economias, ainda restantes, para
montar um armazém cooperativo. Este armazém, chamado de Sociedade dos Probos
Pioneiros de Rochdale, foi fundado em 21 de dezembro de 1844, e tinha como objetivo a
melhoria das condições de trabalho e de vida dos seus sócios (MARTINS, 2006). Tal
5
Movimento contrário à mecanização do trabalho trazida com a Revolução Industrial (Hobsbawm, 1981).
19
empreendimento contou com a presença de 28 tecelões, com capital inicial de 28 libras,
representando uma libra cada cooperado. Com o passar do tempo o armazém prosperou,
tornando-se o famoso "Armazém de Rochdale", que dez anos mais tarde contava com
mais de 1.400 cooperados. Essa atitude tornou-se exemplo de cooperação, que mesmo
passados mais de 150 anos permanecem como referência desse movimento que se
expandiu por todo o mundo. (MARTINS, 2006)
A Aliança Cooperativa Internacional (ACI), organização mundial das
cooperativas, criada em Londres em 1895 com o objetivo de preservar os princípios de
Rochdale, aprovou no Congresso de Praga em 1948 que “será considerada como
cooperativa, seja qual for a sua constituição legal, toda a associação de pessoas que
tenha por fim a melhoria econômica e social de seus membros pela exploração de uma
empresa baseada na ajuda mútua e que observe os princípios de Rochdale.” (MARTINS,
2006:50)
Em 1966, em Viena, a Aliança Cooperativa Internacional fez uma releitura do
princípios de Rochdale, ficando assim elencados (MARTINS, 2006: 72):
1 – adesão livre;
2 – controle ou gestão democrática;
3 – distribuição das sobras;
4 – desenvolvimento da cooperativa;
5 – Serviços comuns;
6 – aos associados, pro rata das operações;
7 – juros limitados ao capital;
8 – constituição de um fundo para educação;
9 cooperação entre as cooperativas, em plano local, regional,
nacional e internacional.
Os princípios da cooperativa de Rochdale tornaram-se referência para configurar,
estabelecer, parâmetros e assim identificar as sociedades cooperativas, vigentes até hoje.
Tanto é assim que a ACI, segundo o art. dos seus Estatutos, não aceitam como filiadas
cooperativas que não apliquem tais princípios.
Se observarmos mais atentamente os posicionamentos de Hirst e Birchall,
reproduzidos por SANTOS (2005), os mesmos repetem os princípios cooperativistas que
surgiram dos Pioneiros de Rochdale,:
20
1 – vínculo aberto e voluntário;
2 – controle democrático por parte dos membros – um membro, um
voto;
3 - a participação econômica dos membros;
4 a autonomia e a independência em relação ao Estado e a outras
organizações;
5 – compromisso com a educação dos membros das cooperativas;
6 cooperação entre cooperativas através de organizações locais,
nacionais e mundiais;
7 contribuição para o desenvolvimento da comunidade em que
está localizada a cooperativa (BIRCHALL, 1997 apud SANTOS,
2005:34)
O associativismo surgiu, portanto, naquele contexto, como uma forma de
questionamento ao capitalismo que se fortalecia. O associativismo surge tanto como teoria
social quanto prática econômica.
Como teoria social, o associativismo é baseado em dois postulados:
por um lado, a defesa de uma economia de mercado baseada nos
princípios não capitalistas de cooperação e mutualidade e, por
outro lado, a crítica ao Estado centralizado e a preferência por
formas de organização política pluralistas e federalistas que deram
um papel central à sociedade civil (HIRST, 1994:15). Como prática
econômica, o cooperativismo inspira-se nos valores de autonomia,
democracia participativa, igualdade, equidade e solidariedade
(BIRCHALL, 1997:65 apud SANTOS, 2005: 33)
De algum modo referidos ao drama social configurado com o capitalismo
industrial, no seu nascedouro, especialmente na Inglaterra e na França, figuras de projeção
intelectual e política como John Bellers, Charles Fourier, Robert Owen, Charles Gide,
entre outros (LIMA, 2002. VERAS NETO, 2006), viam na cooperativa um embrião de
uma nova sociedade, onde as pessoas poderiam trabalhar conjuntamente, libertando-se do
jugo do capital e suprindo interesses pessoais e coletivos.
1.2 – O pioneirismo de Robert Owen
Com a Revolução Industrial, as máquinas-ferramenta e vapor, como fonte de
energia mecânica, converteram a manufatura na grande indústria moderna, tornando
possível o capitalismo industrial (MARX, 1988). A produção e a dinâmica social ganham
um ritmo que não possuiam antes, tornando-se mais acelerados. A sociedade polariza-se
21
cada vez mais entre capitalistas e proletários que nada possuem. Para estes últimos intala-
se a insegurança.
O novo modo de produção trouxe consigo uma série de graves calamidades
sociais: cidades superpovoadas e caóticas; dissolução dos laços tradicionais, dos costumes,
da submissão patriarcal e da família; prolongamento abusivo da jornada de trabalho, que
sobretudo entre as mulheres e as crianças trazia consequências dramáticas; desmoralização
em massa da classe trabalhadora, lançada de súbito a condições de vida totalmente novas -
do campo para a cidade, da agricultura para a indústria, de uma situação relativamente
estável para outra contentemente variável e insegura. (HUNT, 1989)
Os primeiros pensadores e idealizadores do que Singer (2001) chamou de
“cooperativismo revolucionário” foram os “socialistas utópicos”. Segundo Martin Buber,
esses lutavam “pelo máximo de autonomia comunitária possível, dentro de uma
reestruturação da sociedade” (BUBER, 1945, p. 27). Buber, para explicar a origem do
pensamento defendido pelos socialistas utópicos, apresenta três pares de pensadores,
divididos em gerações diferentes: o primeiro Saint-Simon e Charles Fourier, que nasceram
antes da revolução francesa e faleceram antes de 1848; o segundo Owen e Proudhon, que
morreram entre 1848 e 1870; e finalmente Kropotkin e Landauer, nascidos após 1870 e
falecidos pouco depois da primeira guerra mundial.
Roberto Owen, conforme Veras Neto (2002), teria aprendido com os filósofos
materialistas do século XVIII que o caráter do homem é tanto produto de sua organização
inata, como resulta das circunstâncias que o envolvem ao longo de vida, sobretudo durante
o período de seu desenvolvimento. Enquanto, para a burguesia a revolução industrial não
era senão uma ocasião propícia para se buscar enriquecer depressa, para Owen, ao
contrário, tratava-se de uma oportunidade adequada para o desenvolvimento de formas de
trabalho cooperativas. Em Manchester, fez a sua primeira tentativa em uma fábrica que
dirigia com mais de 500 operários. Na sequência, fez novas tentativas, tendo sido melhor
sucedido, ao ponto de ter se notabilizado em toda a Europa. Foi quando constituiu uma
grande fábrica de fios de algodão de New Lanark, na Escócia, atuando como sócio e
gerente. Enquanto, na maioria dos casos, a jornada de trabalho na indústria têxtil situava-se
acima das 13 horas diárias, na experiência de New Lanark mantinha-se no patamar de 10
horas e meia. Em um momento de crise, que se abateu sobre o setor, tendo levado à
22
suspensão das ativdadades da fábrica por quatro meses, os seus operários continuaram
recebendo integralmente seus salários. Ao mesmo tempo, a empresa prosperou. Entretanto,
Owen estava disposto a ir além em suas tentativas de incrementar uma nova maneira de
produzir e de repartir a riqueza. Era preciso aproveitar o imenso potencial inaugurado com
a Revolução Industrial e, com criatividade e determinação, tentar novos caminhos.
Em 1823, preocupado com a crescente miséria na Irlanda, Owen idealiza as
“colônias comunistas”, sempre primando por um rigoroso raciocínio técnico na elaboração
de seus projetos. A proposta baseva-se em 5 fundamentos principais:
1. filantropia patronal;
2. intervenção estatal mediante reformas legislativas;
3. criação de comunidades agrícolas sem propriedade privada;
4. socialismo mutualista e cooperativo;
5. messianismo social.
Conforme Silva Filho (2002), a proposições de Owen mais se aproximam do
reformismo liberal do que, propriamente, do socialismo, postulando a reforma social por
meio da educação e com independência em relação ao poder político. Entretanto, Owen
passa por uma decisiva inflexão em sua trajetória, quando desloca-se de uma referência
filantrópica, que o tornou popular entre os homens de negócios e governantes europeus,
para o horizonte do comunismo, quando advieram as tentativas de combatê-lo e isolá-lo.
Para ele, os principais obstáculos à reforma social estavam na propriedade privada, na
religião e na família. Mas, embora sob fortes bombardeios por parte dos segmentos
dirigentes da sociedade de então, Owen não abriu mão de suas convicções. Tendo sido
arruinado como empresário, passou atuar no seio do emergente movimento operário daí
por diante. O mesmo chegou a presidir o primeiro congresso em que as trade-unions
6
de
toda a Inglaterra fundiram-se numa grande organização sindical única. Foi um dos
principais articulador da aprovação de leis em favor dos trabalhadores, como a que limitou
o trabalho da mulher e da criança nas fábricas.
6
Sindicatos, na designação dos ingleses.
23
Para os assim denominados socialistas utópicos, com destaque para Robert Owen,
o cooperativismo aparece como uma importante referência em vista de uma nova ordem
econômica e social. De fato, mesmo com as críticas a estes teóricos, não como se negar
que foi baseado nos ensinamentos utopistas que se alicerçaram as primeiras formas de
cooperativismo, influenciados destacadamente por Owen.
1.3 – A crítica marxista
A forma socialista de ver as cooperativas tomou dois caminhos: um que via a
cooperativa como instrumento de luta com vistas à superação do capitalismo, em busca de
um sistema socialista, posicionamento de pensadores como o próprio Owen, Fourier e
Lassale; e um segundo, que propunha que todos os setores da economia deveriam ser
organizados num sistema cooperativista, onde a soberania seria do consumidor e as
relações do mercado, medidas pelas próprias cooperativas, beneficiariam a todos, tendo
como principal teórico Charles Gide (RECH, 2000). Contratos de trabalho abusivos,
exploração de mão-de-obra e os salários miseráveis fizeram com que as idéias
cooperativistas se tornassem por demais atraentes.
Marx não abordou o tema do cooperativismo especificamente, somente o fez de
uma maneira bastante pontual, nas ocasiões em que se dirigia mais diretamente ao
proletariado. Ao menos de início, identifica nas cooperativas uma iniciativa progressista,
por exemplo em sua Mensagem Inaugural ao Congresso da Associação Internacional
dos Trabalhadores, em 1864:
Mas o futuro nos reserva uma vitória ainda maior da economia
política dos proprietários. Referimo-nos ao movimento
cooperativo, principalmente às fábricas cooperativas levantadas
pelos esforços desajudados de alguns ‘hands` [operários] audazes
(...) Pela ação, ao invés de por palavras, demonstraram que a
produção em larga escala e de acordo com os preceitos da ciência
moderna pode ser realizada sem a existência de uma classe de
patrões que utiliza o trabalho da classe dos assalariados; que, para
produzir, os meios de trabalho não precisam ser monopolizados,
servindo como um meio de dominação e de exploração contra o
próprio operário; e que, assim como o trabalho escravo, assim
como o trabalho servil, o trabalho assalariado é apenas uma forma
transitória e inferior, destinada a desaparecer diante do trabalho
associado que cumpre a sua tarefa com gosto, entusiasmo e alegria.
Na Inglaterra, as sementes do sistema cooperativista foram
24
lançadas por Robert Owen; as experiências operárias levadas a
cabo no continente foram, de fato, o resultado prático das teorias,
não descobertas, mas proclamadas em altas vozes em 1848.
(MARX, apud HADDAD , 2003, 31)
7
Ou seja, para o autor, a experiência autogestionária, característica do
cooperativismo, estaria demonstrando na prática o quanto era supérflua a figura do patrão.
Esta se justifica pelo caráter intrinsecamente despótico da relação entre o capital e o
trabalho. Para além de um papel de simples organizador do processo produtivo, o
capitalista atual fundamentalmente no sentido de controlá-lo e, com isso, extrair lucro do
trabalho operário. Entre capitalistas e operários interpõe-se, na visão do autor, uma
coexistência antagonista.
De fato, nas cooperativas, as funções de gerenciamento são vistas, antes, como
uma necessidade de caráter organizativo, própria dos sistemas complexos de produção, do
que expressão da oposição entre trabalhadores e proprietários, como é próprio do modo de
produção capitalista. Neste caso, tais funções podem ser exercidas (e cada vez mais passam
a ser) por terceiros, contratados para esse fim.
Entretanto, para Marx, a ausência da figura do patrão não garante, por si só, a
superação do caráter despótico das relações de trabalho sob o capitalismo. Isso seria
possível, no cooperativismo, na medida em que o caráter antagônico entre a realização do
trabalho e a tarefa de dirigir o conjunto da produção seja efetivamente enfrentada, com
cada trabalhador vindo a ser encarregado, alternadamente, das funções diretivas da
empresa.
Para Marx, apesar da promessa, o cooperativismo, por si só, não seria suficiente
para a superação do capitalismo. Se contribui para a negação de um princípio caro ao
capitalismo, a propriedade privada individual, não se apresenta como alternativa ao caráter
anárquico do referido modo de produção, haja vista que as cooperativas atuam
concorrendo com as empresas capitalistas. Daí a centralidade da luta pela conquista do
poder político pelo proletariado.
7
MARX, Karl. Extracto da “Mensagem Inaugural” ao Congresso da Associação Internacional dos
Trabalhadores, em 1864 (MARX et al, 1979, p17).
25
Ao mesmo tempo, a experiência do período decorrido entre 1848 e
1864 provou acima de qualquer dúvida que, por melhor que seja
em princípio, e por mais útil que seja na prática, o trabalho
cooperativo, se mantido dentro do estreito círculo dos esforços
casuais de operários isolados, jamais conseguirá deter o
desenvolvimento em progressão geométrica do monopólio, libertar
as massas, ou sequer aliviar de maneira perceptível o peso de sua
miséria. (...) Para salvar as massas laboriosas, o trabalho
cooperativo deveria ser desenvolvido em dimensões nacionais e,
consequentemente, incrementado por meios nacionais. (...)
Conquistar o poder político tornou-se, portanto, a tarefa principal
da classe operária. (MARX, apud HADDAD, 2003, 36)
Por que apostar no cooperativismo se, em termos de eficácia, a luta pela conquista
do poder pelo proletariado se colocava em um patamar incomparável? Entre o
cooperativismo e o comunismo, Marx opta pelo segundo, acreditando que tudo o que o
primeiro pode realizar em favor da emancipação proletária não se equipara ao potencial do
comunismo. O cooperativismo, nos seus objetivos mais fundamentais, poderia se
realizar no comunismo (HADDAD, 2003).
Em alguns momentos, Marx chegou a formular duras críticas à experiência do
cooperativismo, sobretudo ao apoio estatal, sob o argumento de que as cooperativas
deveriam ser autônomas em relação ao Estado (burguês), se opondo assim à posição do
socialista alemão Fernand Lassale, que defendia a idéia de que as cooperativas, uma vez
abrangendo as atividades da indústria e da agricultura, e estimuladas pelo governo,
resultaria numa organização socialista da sociedade, e que isso poderia, nesses termos, ser
obtido pela via pacífica, sem conflitos de classes. Para tanto, o Estado poderia exercer um
papel decisivo (VERAS NETO, 2006).
A crítica de Marx aos socialistas utópicos se refere à ausência, nesses, de ações
mais propriamente políticas, limitando-se a experiências fechadas e isoladas de autogestão,
ignorando as relações deste micro universo (e utópico) com o resto da sociedade. Por isso,
os socialistas utópicos eram vistos como ingênuos e inócuos e estas doutrinas qualificadas
como sem fundamentação científica.. Marx e Engels entendiam que a lógica do capitalismo
somente poderia ser rompida através de mudanças estruturais no capitalismo sob a direção
26
do movimento operário. Isso, por meio de um processo de luta revolucionária, e não por
reformas graduais que buscasse transformar as estruturas do capitalismo ignorando a luta
de classes e a hegemonia histórica do modo de produção capitalista (VERAS NETO,
2002).
Também Rosa Luxemburgo, marxista alemã, em fins do século XIX, expressaria
uma posição crítica sobre o cooperativismo argumentando na mesma direção de Marx:
Praticamente, exprime-se isso o despotismo da produção
capitalista] pela necessidade de intensificar o trabalho o mais
possível, de reduzir ou prolongar as horas de trabalho conforme a
situação do mercado, de empregar a força de trabalho segundo as
necessidades do mercado ou de atirá-la na rua, em suma, de
praticar todos os métodos muito conhecidos que permitem uma
empresa capitalista enfrentar a concorrência das outras. Resulta daí,
por conseguinte, para a cooperativa de produção, verem-se os
operários na necessidade contraditória de governar-se a si mesmos
com todo o absolutismo necessário e desempenhar entre eles
mesmos o papel de patrão capitalista. É desta contradição que
morre a cooperativa de produção, quer pela volta à empresa
capitalista, quer, no caso de serem mais fortes os interesses dos
operários, pela dissolução (LUXEMBURGO apud VERAS NETO,
2002: 47).
1.4 – As perspectivas do cooperativismo foram redimensionadas ao longo do Século
XX
Para Rech (2000), apesar de muitas semelhanças quanto ao funcionamento das
cooperativas em quase todo o mundo, de um ponto de vista mais ideológico, tais
experiências costumam apresentar perspectivas muito diferenciadas. Do ponto de vista dos
chamados socialistas utópicos, era entendido como um dos caminhos para uma nova ordem
econômica social. Sob tal ótica, se colocaram aqueles para quem, como Owen, o
cooperativismo era visto como instrumento de luta para a superação do capitalismo, em
busca de uma socidade socialista; e aqueles para quem, como Charles Gide, o
cooperativismo deveria ser visto como alternativa ao próprio sistema capitalista,
almejando-se uma República Cooperativista.
27
Por um outro ângulo, em uma perspectiva mais afim com a ótica capitalista,
segundo Rech (2000), situam-se os ponto de vistas este defendidos pelos liberais e
fisiocratas capitalistas
8
. Para estes, as cooperativas devem ser vistas como um corretivo
dos defeitos do sistema capitalista, de modo a atenuar as características egoísticas e
concentradoras de capital do sistema vigente.
A Aliança Cooperativa Internacional, em sua declaração sobre a identidade
cooperativa, realizada em Manchester, no ano de 1885, definiu que uma cooperativa é uma
associação de pessoas que se unem de forma voluntária para satisfazer suas necessidades e
aspirações econômicas, sociais e culturais em comum, mediante uma empresa de
propriedade conjunta e de gestão democrática. (SILVA FILHO, 2002).
Para Silva Filho (2002), há, historicamente, cinco espécies diferentes de
experiências cooperativas: as cooperativas de consumo, associadas originalmente à
experiência de Rochdale; as cooperativas de crédito, cujo marco inicial atribui-se a
experiências na Alemanha; as cooperativas agrícolas, de origem dinamarquesa e alemã; as
cooperativas de serviço, habitacionais e de saúde, que surgiram em diversas partes da
Europa no final do século XIX; e as cooperativas de trabalho, que tiveram seus primeiros
impulsos na França.
O cooperativismo muitas vezes tem sido visto, por correntes políticas e por
estudiosos, como um instrumento de geração de trabalho e de distribuição de renda, um
modo de contornar os males do trabalho assalariado, proporcionando mais autonomia de
trabalho e mais segurança ao trabalhador associado, em um contexto marcado pela
competição.
A Organização Internacional do Trabalho OIT, que defende que a cooperativa
serve como forma de dar ocupação às pessoas, de dar trabalho”, compreende que essa
forma de organização do processo produtivo e do trabalho não deixa também de ser uma
forma de distribuição de renda. (MARTINS, 2006: 50).
8
Para quem o que está estabelecido como natural e individual é que deve prevalecer. O individualismo se
torna um valor em si.
28
Ao longo dos Séculos XIX e XX o cooperativismo conviveu, tensamente, por
dentro e em oposição ao capitalismo. Em geral adquiriu novos impulsos sempre que o
capitalismo entrou em crise. Foi tratada pelos governos ora como uma opção de política
pública de geração de trabalho e de distribuição de renda, ora como uma ameaça político-
ideológica à estabilidade do sistema, quando sobre tais experiências se abateu forte ação
repressiva (VÉRAS NETO, 2002).
A depressão econômica dos anos 1929-1932 alimentou no mundo inteiro uma
onda de intervenção do Estado na economia, dentro das propostas keynesianas,
implantando políticas econômicas e sociais. A combinação da adoção do taylorismo-
fordismo no processo produtivo com as referências keynesianas no âmbito das políticas
macroeconômicas produziu, no pós-Segunda Guerra Mundial uma era de prosperidade
denominada por alguns de a Era de Ouro do capitalismo. Nesses termos, a economia não
monetária (doméstica e de reciprocidade) ficou marginalizada pela expansão do mercado e
pela estatização das iniciativas associativas mais dinâmicas (particularmente nos países que
aderiram ao socialismo). O cooperativismo perdeu relevância.
1.5 - Reemergência do Cooperativismo no final do Século XX
O capitalismo vem transformando por completo as relações de trabalho atuais e
proporcionando o ressurgimento da informalidade, da flexibilização do trabalho e do
desemprego, trazendo com isso o aumento da exclusão social.
O desemprego é um processo histórico e característico, em certo grau, de todas as
sociedades no decorrer do seu desenvolvimento. Entretanto, fatores políticos e econômicos
têm ampliado sua dimensão, trazendo com isso mudanças abruptas no setor produtivo e na
política, acarretando uma crise mais profunda com acentuação de desníveis sociais e da
exclusão social.
A partir da segunda metade da década de 1970 do século XX, uma nova crise do
sistema capitalista trouxe o desemprego e o fechamento de empresas, e criou-se um quadro
dramático para a classe trabalhadora. Floresceu, então, a partir de 1977 e até 1984, uma
série de iniciativas para salvar ou criar empregos, através de empresas autogeridas pelos
29
próprios trabalhadores, e isto com o apoio de alguns sindicatos progressistas (SILVA
FILHO, 2002).
Entre 1980 e 1985 foram criadas em massa cooperativas de trabalhadores em toda
a Europa . Por outro lado, os inúmeros movimentos sociais e étnicos trouxeram uma nova
visão do social, da sua relação com o econômico e da relação do homem com o meio
ambiente. A queda do muro de Berlim, símbolo do fim de uma utopia, levou à produção de
novas utopias compostas por comunitarismo, ecologismo, solidariedade e voluntarismo.
(VERAS NETO, 2002: 73).
As cooperativas de trabalho ressurgem com um papel fundamental, mesmo dentro
do capitalismo, de eliminar os intermediários entre capital e trabalho, conseguindo assim
atingir, entre outros objetivos, o de enfrentar o desemprego sem recorrer à empresa
capitalista de moldes tradicionais.
João Eduardo Oliveira Irion (1997) tenta descrever este quadro desencadeado pela
inovação tecnológica apontando a economia social como forma de transformação social e o
cooperativismo como agente principal e capaz para propiciar meios para a resolução
setorial da questão do desemprego.
Assim, mesmo ingressando numa linha tão fluída, necessário se faz notarmos que
desemprego se diferencia de exclusão social, podendo a exclusão social ser a última fase,
ultima conseqüência do desemprego. Paul Singer demonstra o caminho provável do
desempregado rumo a exclusão social:
É sem dúvida incomum uma pessoa estar completamente excluída
ou incluída no tecido social. A exclusão social deve ser encarada
como uma questão de grau. Contudo, n os paíse de Terceiro
Mundo, existe uma forma de exclusão social que é fundamental: a
exclusão econômica. É a forma mais ampla, e suas vítimas estão
provavelmente excluídas da maioria das outras redes sociais.
(SINGER, 1998: 63)
Santos, em seu Produzir Para Viver, responde a questão do porque do
ressurgimento de cooperativas de trabalhos. O mesmo elenca quatro razões que entende
“fundamentais relacionadas às condições econômicas e políticas contemporâneas que
30
tornam o estudo e a promoção das cooperativas de trabalhadores uma tarefa prometedora
para a criação de alternativas de produção emancipadoras.” (SANTOS, 2005: 35).
Em primeiro lugar, estaria a condição de ser as cooperativas contrárias à
separação entre capital e trabalho e a subordinação do trabalho sobre o capital, portanto
baseada em princípios não capitalistas, mesmo inseridas em um mercado capitalista, com
alto grau de competitividade; o segundo motivo seria a capacidade que as cooperativas de
trabalhadores teria de enfrentar o mercado global contemporâneo e, para explicar tal
assertiva, Santos informa duas razões: a capacidade de produção, que seria maior que a das
concorrente capitalistas, devido ao maior incentivo econômico e moral de seus
trabalhadores-proprietários
9
e porque quando a cooperativa prospera, prosperando
diretamente todos os seus associados, diminuem os custos com supervisão, que em uma
empresa capitalistas são altíssimos. Em terceiro lugar seria a característica que tem as
cooperativas de serem estímulo não somente ao crescimento econômico mas também
forma de diminuição dos níveis de desigualdade, que além de trabalhadores os
cooperados também são proprietários de seu empreendimento. Por último, informa-nos o
professor, seria a capacidade que tem os empreendimentos cooperativos de trazer
benefícios que perpassam a pessoa de seus membros, que este tipo de empreendimento
também se preocupa em proporcionar benefício de natureza não-econômica, beneficiando
também a comunidade onde está inserida a cooperativa. (SANTOS 2005: 35-37).
A valorização da união entre as cooperativas existe desde o seu surgimento, e hoje
elas estão organizadas internacionalmente. A entidade que coordena esse movimento nos
cinco continentes é a Aliança Cooperativa Internacional - ACI.
Criada em 1895 e atualmente sediada em Genebra - Suíça, essa associação não-
governamental e independente reúne, representa e presta apoio às cooperativas e suas
correspondentes organizações, Objetiva a integração, autonomia e desenvolvimento do
cooperativismo. Em 1946 o movimento cooperativista representado pela A.C.I. - Aliança
Cooperativa Internacional foi uma das primeiras organizações não governamentais a ter
uma cadeira no Conselho da ONU - Organização das Nações Unidas
9
Bowles e Gintis 1998 in Santos: 2005: 36.
31
CAPÍTULO – II
COOPERATIVISMO NO BRASIL
2.1 – Primeiras manifestações e evolução durante o século XX
Como não é o nosso intuito nos aprofundarmos a respeito do surgimento do
cooperativismo no Brasil e tendo em vista que várias informações esparsas a respeito,
vamos nos ater a breves comentários.
notícias de que logo após a chegada dos portugueses no território brasileiro,
tiveram início experiências cooperativistas. Pode-se destacar por exemplo as Missões
Jesuítas, que foram introduzidas num primeiro momento no sul do país a partir do século
XVII. Essas experiências desenvolvidas pelos Jesuítas eram mais intensas nas regiões
abrangidas pela bacia dos rios Paraguai, Paraná e Uruguai, nas regiões Oeste de Santa
Catarina e Rio Grande do Sul e consistiam primordialmente em reduzir os indígenas a
aldeias separadas dos brancos e colonos, em geral exploradores. Eram justamente nessas
aldeias que encontravam práticas de cooperativas, que tudo era dividido, tudo era
comum. Assim, as ações dos Jesuítas se basearam no comportamento cristão de caridade
recíproca e no princípio do auxílio mútuo (mutirão), práticas encontradas entre os
indígenas brasileiros, assim como em todos os povos primitivos. (FURQUIM, 2001).
Entretanto, o movimento cooperativista propriamente dito começou a ser
verdadeiramente estabelecido somente em 1847 quando Jean Maurice Faivre, francês
seguidor dos ensinamentos de Fourier, fundou nos sertão do Paraná a Colônia Tereza
Cristina, que segundo MARTINS (2006: 30) “apesar de sua breve historia muito
contribuiu para o florescimento do ideal cooperativista no país”.
Foi no século XIX que podemos destacar o surgimento de sociedades
cooperativas, estas professando de forma consciente as práticas e doutrina cooperativistas
tendo com inspiração e incentivadoras as diversas colônias de europeus estabelecidas no
território brasileiro, destacando os alemães, holandeses, italianos e japoneses, que tentavam
aplicar em sua nova casa práticas vividas em seus países de origem.
32
No Brasil, assim como ocorrera na Inglaterra, o início do cooperativismo surgiu
no meio urbano, repetindo e assim privilegiando de igual forma, os grupos consumidores
das cidades, que a situação agrária brasileira, que tinha sua base trabalhadora formada
por escravos, não favorecia a reunião de pessoas. Era impossível a prática de
associativismo num regime eminentemente escravocrata.
Em 1888, com a abolição da escravatura e com a proclamação da República em
fins de 1889, proporcionou-se um ambiente mais favorável à liberdade de associação, tanto
é assim que na primeira Constituição da República em seu art. 72, §8º, estava
assegurado o direito de liberdade de associação, foi a partir daí que começou a surgir, em
decorrência desse novo ambiente político e institucional, as primeiras organizações
efetivamente intituladas de sociedades cooperativas, e o Estado de direito, que a partir daí
começou a legislar sobre o associativismo rural, e posteriormente, no século XX,
legislando especificamente sobre cooperativismo. (MARTINS, 2006)
Pode-se dizer que o período de consolidação das cooperativas no Brasil ocorreu
no ano de 1932, quando foi regulado pelo Decreto n.º 22.236, de 19 de dezembro do
mesmo ano, que também tinha o intuito de conceituar e disciplinar, em seu art. 24, as
cooperativas de trabalho. Diante deste novo contexto histórico Revolução de 1930, as
leis surgidas nessa época passam a ter uma função basicamente política, consolidando
como sua conseqüência direta uma intervenção ainda mais clara do Estado na economia,
sobretudo para favorecer uma transição de uma base produtiva de tipo agro-exportador
para outra urbano-industrial. (VERAS NETO, 2002)
Esta época caracterizou-se com um apoio maior do cooperativismo no meio rural.
O cooperativismo era um recurso para estabelecer um contraponto ao poder dos
latifundiários (segmento hegemônico na República Velha), com o fim de proporcionar o
surgimento de uma camada de pequenos proprietários. As cooperativas foram formalmente
reconhecidas pelo aparato legal do Estado, racionalmente elaborado a partir do governo do
então presidente Getúlio Vargas. Com este reconhecimento e ainda motivadas por
incentivos fiscais várias sociedades cooperativas buscaram a respectiva regularização
jurídica, sendo o estado do Rio Grande do Sul onde mais foram criadas cooperativas nesse
período (VERAS NETO, 2002).
33
O cooperativismo, neste contexto de racionalização, passa a ser uma alternativa
democrática ao processo de recrudescimento das tensões no campo, principalmente a partir
do contexto de criação de ligas camponesas revolucionárias dos anos 50, que se
organizavam como associações civis que buscavam uma reforma agrária radical,
controlada pelos trabalhadores. Estes movimentos eram influenciados pelos movimentos
socialistas marxistas da época, bem como pela empolgação advinda da revolução cubana.
Deste modo o movimento cooperativo fornecia um arcabouço
teórico de busca da solidariedade e cooperação entre seus
integrantes, visando à constituição de um movimento de moldes
liberais e humanistas, menosprezando a intervenção estatal e
privada na sua organização, defendendo slogans referentes a sua
condição independente e de neutralidade ideológico-político-
partidária, objetivando demarcar uma esfera de independência, em
relação ao paternalismo estatal, assim como sua colonização, por
uma mentalidade meramente empresarial e também pelo discurso
transformador socialista revolucionário, solidificando sua
intervenção através da elaboração de um instrumental de
propaganda de valores e princípios ideológicos, intitulado
formalmente de educação cooperativista (SEIBEL, 1994: 29-30).
Erni Seibel (1997) estabelece uma hipótese onde coloca o cooperativismo como
verdadeiro braço do aparato estatal, seria para autor uma espécie de aparato civil do estado.
Entende o sociólogo que o Estado deve ter um espaço de autonomia, em relação às classes
sociais dominantes, para que esta organização política possa se afirmar legitimamente
como Estado. O movimento cooperativista sob essa perspectiva, não estaria representando
uma forma clássica de representação política, mas teria possibilitado dentro do contexto
rural brasileiro, a garantia de unificação de setores ligados aos produtores agrícolas em
contraposição ao movimento formado pelo campesinato. O cooperativismo, em um
primeiro momento fortaleceu seu vínculo classista, com a burguesia rural, atuando como
um fomentador da união de classe, destes grupos.
Relata ainda o sociólogo, a respeito do interesse do governo militar, implantado
em 1964, em proporcionar e fomentar a expansão do chamado cooperativismo rural:
Especificamente ao nosso trabalho, lembramos a atitude do regime
militar de 1964, que eliminando todas as organizações
representativas das classes dominadas no campo, transforma o
cooperativismo e, portanto, a si próprio, no único canal político
34
efetivo de representação dos interesses das massas trabalhadoras
rurais... (SEIBEL, 1994: 25)
A participação estatal como fomentador do cooperativismo tinha o intuito de
tolher os movimentos sociais, sufocando as tensões utilizando-se de estratégias que iam
desde a coerção e a violência política direta, até, quando mais conveniente, a utilização de
mecanismos sutis de cooptação ideológica como a criação de políticas públicas específicas
que forneciam incentivos e privilégios direcionados para determinados setores, através,
inclusive, de instrumentos ligados a uma dinâmica de consolidação legislativa.
Sobre este momento de intervenção estatal no cooperativismo, que teve seu ápice
no governo Vargas, interessante destacarmos relato de Vergílius Perius:
Essa institucionalização terminou em 1938, quando outro
presidente da República, infelizmente gaúcho digo
“infelizmente” quanto ao seu decreto baixou o Dec. 581, que
tirou a liberdade e organização cooperativa e iniciou a fase do
intervencionismo estatal no processo. Foi o decreto de Getúlio
Vargas que deu origem a um período de 50 anos de interferência do
Estado na vida das cooperativas. Interferência negativa, tuteladora,
protecionista, paternalista, fiscalizadora, interventora e até
liquidadora de cooperativas. Foram 50 anos de luta e de presença
física do Estado como um braço alongado, tentando transformar,
muitas vezes, as cooperativas em programas e ações concretas do
Governo Federal. (PERIUS, 1995:87)
Sobre os momentos vividos pelo cooperativismo no Brasil, BUGARELLI (1998)
em seu “As sociedades cooperativas e a sua disciplina jurídica”, realiza estudo
interessante onde, com base na evolução legislativa identifica e traça as etapas de atuação
estatal em relação ao cooperativismo no Brasil. Vejamos como o autor classificou estas
etapas:
a) o de implantação:
Este período instaurou-se com o advento da Primeira Lei Orgânica de 1907, o
Dec. 1.637, de 05 de janeiro, que cuidava dentre outros temas, também dos sindicatos
rurais. Claramente influenciado pela Lei francesa de 1867, não determinava forma própria
às cooperativas. Estas poderiam se constituir tanto sob a forma de sociedades comerciais,
como em nome coletivo, em comandita ou anônima. Trazia ampla e total liberdade de
constituição e funcionamento, sem qualquer tipo de subordinação a órgão estatal, bastando
35
para regularizar seu funcionamento, o deposito em duplicata, na Junta Comercial dos seus
atos constitutivos, tendo apenas como obrigação, a de a cada seis meses realizar o
encaminhamento da relação de seus sócios e as alterações estatutárias verificadas.
Necessário se faz destacar que durante este período o então funcionário do
Ministério da Agricultura, Custódio Alfredo de Sarandy Raposo, sindicalista que em 1921
ajudado por um auxílio pecuniário do governo fundou a Confederação Sindical
Cooperativista do Brasil CSCB e que por sua forte ligação com os órgãos de governo
bem como com associações patronais recebeu intensa crítica do movimento operário
representado pela Confederação Operária Brasileira que em 1913 havia publicado nota
no jornal “A voz do trabalhador”, em 15 de março, contrária ao movimento cooperativista.
(SAMIS, 2010)
“Bem sabemos que os governos, para se tornarem populares, para
se mostrarem liberais costumam fomentar a propaganda destas
cataplasmas, destas iscas traiçoeiras, como o é o cooperativismo
ora propagado por influencia do ministério da agricultura e o
fazem justamente para desviarem, por uma enganosa melhoria
hipocritamente filantrópicos como são todos que vivem
parasitariamente com o fim de, distraindo os trabalhadores com
este chamariz, desviando-os do caminho traçado e que devem
continuar, implantar-lhes a discórdia, a desorientação, sabedores
como estão de que enquanto assim acontece mais se vai mantendo
a escravidão operaria e por conseguinte prolongando a orgia dos
que bacanalmente vivem.”
10
Os anarquistas não viam o cooperativismo com bons olhos, entendiam que elas
não resolveriam o problema social “servindo somente para insuflar em seus cooperados a
falsa crença na harmonia com os regimes de salariato e propriedade” (VAZ, apud
SAMIS, 2010)
Durante este período também foram promulgadas a Lei 4.894/25 e o Dec.
17.339/26, que tratavam respectivamente sobre Caixas Rurais Riffeisen e Bancos Luzzatti.
Foram esses as primeiras experiências legislativas que buscaram tratar especificamente o
tema cooperativas, trazendo claras evidências no sentido de se garantir liberdade e
desenvolvimento as novas experiências.
10
36
a) o de consolidação parcial:
Sob o aspecto legislativo, foi um período marcado por várias transformações,
principalmente em relação à manutenção do Dec. 22.239/32. Decreto este que, mesmo
sendo considerado casuístico e apresentando vários defeitos, tinha como principal
característica o de dar à cooperativa razoável liberdade de constituição e funcionamento
fazendo com que as mesmas se desenvolvessem rapidamente e de forma independente ao
aparato estatal, entretanto, sem contudo deixar de registrar que o poder público agia nesse
período como verdadeiro fomentador, proporcionando incentivos fiscais em alguns
Estados, sobretudo no Sul.
Promulgado antes do Congresso de Paris de 1937, da Aliança Internacional
Cooperativa o Dec. 22.239 de 1932, mesmo trazendo amplamente as características das
sociedades cooperativas, não as definia, pois as considerava “sui generis”, este ato
normativo reconhecia, e permitia a distribuição de dividendos em proporção ao capital, o
que somente veio a ser revogado pelo Dec.-Lei 581 de 01.8.1938.
O Dec. 22.239 de 1932 foi elaborado por uma comissão formada por Adolfo
Credilha, Saturnino de Brito e Luciano Pereira e introduziu na esfera legislativa os
princípios consagrados pela Cooperativa de Rochdale, sendo inclusive considerado como a
a primeira Lei “rochedaleana”, assim, apesar de certas falhas técnicas e de terminologia,
deu-lhe uma estrutura compatível com a sua verdadeira natureza cooperativa.
b) o de centralismo estatal:
É o período que se caracteriza a intervenção estatal. Com o surgimento da
Diretoria do Sindicalismo Cooperativista, o intuito do Estado era se buscar subordinar as
cooperativas nos moldes da ideologia corporativista. Em decorrência disto, em março de
1933, o Dec. 22.239 de 1932 foi colocado de lado e ficou sem aplicabilidade mesmo em
vigor, sendo somente revogado especificamente pelo Dec-Lei 24.627, de 10.07.1934, e
complementarmente o Dec. 23.611. Este decreto, que fora promulgado em dezembro de
1933, criara os consórcios, revogando a Lei 979 de 01.06.1903, sobre os sindicatos
agrícolas, forma como os Decs. 23.611 e o 23.647 procurou enquadrar o cooperativismo no
sindicalismo, dentro de uma orientação corporativa, através dos consórcios, atrelando a
37
criação de cooperativas a exigência de consórcios tudo segundo determinação do Dec-lei
24.647.
A partir de 1945, fase de redemocratização, as iniciativas legislativas inseridas no
ordenamento jurídico pela era Vargas foram anuladas, sendo necessário a criação de novas
normas para preencher a lacuna deixada, tais como: o Decreto-Lei 8.401, que revogou
os Decretos-Leis s 5.893, de 19/10/1943 e 6.274, de 14/02/1944, exceto as disposições
dos artigos 104 e 118 e seus parágrafos, revigorando o Decreto-Lei 581, de 01/08/1938,
e o Decreto 22.239, de 19/12/1932. Em 30/11/1964 onde foi promulgado o Estatuto da
Terra, Lei 4.504, que estabeleceu em seu art. 4º, VIII, como “Cooperativa Integral de
Reforma Agrária” (C.I.R.A) e Tratando especificamente o cooperativismo nos artigos 79 e
80. Em 21/11/1966 com o Decreto-Lei n.º 59, instrumento normativo que definiu as
políticas nacionais de cooperativismo, criando o Conselho Nacional do Cooperativismo e
submetendo o sistema cooperativista a um controle rígido do Estado e revogando o
Decreto-Lei nº 22.239, de 19/12/1932.
Talvez a única parte positiva do Dec.-lei 59 e seu regulamento
residia no fato de ter atentado, pela primeira vez para a parte
operacional das cooperativas. Em conseqüência, vários foram os
dispositivos que esclarecem as características operacionais das
cooperativas, até então confundidas em grande parte com a
atividade dos outros tipos de empresas não cooperativas.
(BULGARELLI, 1998: 70)
No ano seguinte o Decreto-Lei n.º 59, é regulamentado pelo Decreto-Lei n.º
60.597, de 19/04/1967.
c) a Renovação das estruturas:
Caracteriza-se este período como o momento em que se tornou desnecessário a
prévia autorização estatal para criação das cooperativas bem como a desnecessidade, ou
melhor, não sujeição do empreendimento cooperativo ao imposto de renda.
Com o fechamento do Congresso por força do Ato Institucional
5, não tiveram tramitação os projetos citados, sendo posteriormente
substituídos por um anteprojeto elaborado por sua entidade máxima
de representação, por força do que constava do acordo entre as
lideranças cooperativas, quando da união das duas entidades
maiores, a ABCOOP e a UNASCO e referendada pelo Governo,
38
através do Ministério da Agricultura. Vale a pena transcrevermos
itens desse documento que tem grande significação histórica e são
tão pouco conhecidos.
Pretendiam as lideranças cooperativas a Reforma da legislação
Cooperativista, onde, afirmava o documento, serão inscritos os
seguintes pontos:
a) possibilidade das cooperativas operarem com terceiros, com
limitação percentual a ser estabelecida, creditando os resultados
positivos a fundos destinados a serviços assistenciais aos
associados;
b) conceituação exata do processo de cobertura das despesas
operacionais das cooperativas, de forma a constar que tais
sociedades não produzem renda e, consequentemente, não são
sujeitas a Imposto de Renda;
c) liberdade de constituição e funcionamento imediato das
sociedades cooperativas, eliminando-se a exigência de autorização
prévia para seu funcionamento;
d) fixação da área de admissão de associados e de operações, a
inteiro critério do estatuto da cooperativa;
e) participação das cooperativas em empresas não cooperativas;
f) restabelecimento das atividades creditórias nas cooperativas
mistas;
g) permissão às cooperativas centrais para manterem associados
individuais. (BULGARELLI, 1998: 74)
d) período de liberalismo:
com a promulgação da carta constituinte em 1988, que fica estabelecida a
participação do Estado no dever de apoiar o cooperativismo, liberando-o do controle
estatal, estabelecendo também inovações como o adequado tratamento tributário do ato
cooperativo, assim como o estímulo ás cooperativas de garimpeiros e de crédito.
Vejamos o que diz a Constituição Federal a respeito:
Art. - Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer
natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes
no País inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à
segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
(...)
XVIII a criação de associações e, na forma da lei, a de
cooperativas independem de autorização, sendo vedada a
interferência estatal em seu funcionamento.
39
O estímulo trazido na Constituição Federal de 1988, também é observado em
Constituições de Estados. Vejamos como exemplo do aqui afirmado o que diz as
constituições de São Paulo e Rio Grande do Sul, respectivamente:
“O Estado apoiará e estimulará o cooperativismo e o
associativismo como instrumento de desenvolvimento sócio-
econômico, bem como estimulará formas de produção, consumo,
serviços, créditos e educação co-associadas, em especial nos
assentamentos para fins de reforma agrária.”
11
“Na hipótese de privatização de empresas públicas e sociedades de
economia mista, os empregados terão preferência em assumi-las
sob a forma de cooperativas.”
12
Marcelo Mauad (1999), que também realizou estudo específico sobre as etapas da
evolução legislativa do cooperativismo no Brasil, acrescenta a este período alguns
institutos normativos mais recentes, o Decreto n.º 356, que regulamentou a Lei n.º
8212/90, que dispunha sobre o custeio e o financiamento da Seguridade Social,
equiparando, em seu artigo 10, IV, c, n.º 4, o cooperado que presta serviços a terceiros ao
trabalhador autônomo bem como a Lei n.º 8.949 de 09.12.1995, que acrescentou o
parágrafo único ao artigo 442 da CLT, dispondo sobre a ausência de vinculo empregatício
entre a cooperativa e cooperado e entre este e o tomador de serviços daquela, este último
aporte legislativo, trouxe grande celeuma entre juristas e uma brecha legal perigosa que
vem sendo utilizada por empresários fraudadores, que visam maximizar lucros a qualquer
custo, que é inegável a diferença de contratação de um empregado e uma cooperativa
cerca de 18,8 % a mais de encargos sociais (MARTINS, 2006), para estes empresário a
cooperativismo surge como forma de aumentar o lucro, não importando que seja em
detrimento de direitos trabalhistas conquistados a tão duras penas.
Esta diferença se deu no intuito de incentivar as cooperativas não de substituir ou
retirar direitos conquistados pela classe trabalhadora entre eles o direito ao emprego. A
Constituição Federal, em seu art. 174, §2º, estabelece alíquotas diferenciadas da
contribuição previdenciária para as cooperativas o cooperado pagará a alíquota de 20%
sobre a remuneração, limitado ao teto de R$ 2.668,15. A vantagem pode-se observar, não é
para o que contrata as Cooperativas, mas também para o cooperado em si, do ponto de
vista social, podemos verificar que com o cooperativismo, estará abolido o trabalho
11
Art. 188 da Constituição do Estado de São Paulo.
12
Art.6º, §1º da Constituição do Estado do Rio Grande do Sul
40
assalariado, estará implantado uma justa divisão de rendimentos, além de garantida a
participação dos trabalhadores na gestão. (MARTINS, 2006)
Os dados da UNISOL Central de Cooperativas e Empreendimentos Solidários,
mostram que no Brasil, apesar de ter ganhado força no início do século passado, hoje o
cooperativismo aglutina mais de 80.000 (oitenta mil) cooperados, divididos em
cooperativas em todo o Brasil.
13
A partir dos anos noventa, o Brasil passou a conviver com o desemprego enquanto
fenômeno de massa. As taxas de desemprego elevaram-se independentemente de gênero,
etnia, grau de instrução ou classe econômica. Paralelamente, a taxa de informalidade
elevou-se a patamares impressionantes. Os empregos mais dinâmicos na década foram os
sem carteira, seguidos do trabalho doméstico e dos autônomos.
O Brasil nunca chegou a realizar uma reforma trabalhista ampla, como outros
países latino-americanos, apenas tendo estabelecido poucas atualizações no campo
contratual.
Porém, na prática, uma reforma precarizadora foi feita pelo mercado que passou a
adotar a terceirização, além de desassalariar e desindicalizar parte crescente da força de
trabalho, mesmo em setores tidos como mais dinâmicos e de maior produtividade, com
estas alterações, ao mesmo tempo surgiram mudanças pontuais na legislação,
particularmente entre 1995 e 2002. Um excedente expressivo de força de trabalho,
associado à busca incessante na redução de custos por parte das empresas em muitas das
vezes justificada pelas altas taxas de juros a elas impostas e pela forte e às vezes desleal
concorrência estrangeira, fez com que os trabalhadores se tornassem o elo mais frágil deste
ciclo de competitividade espúria.
Como se percebe, o nosso modelo cooperativista, em nada se compara ao
desenhado por Owen, Lassale ou Gide, verifica-se que o estado sempre teve papel
intervencionista buscando sempre controlá-las, assim, consolidado restou o modelo
conservador dos Pioneiros de Rochdale, atrelando-se ainda, uma forte intervenção estatal.
13
Dados cedidos no site: www.unisol.org.br, acesso em 21-10-2006.
41
2.2 – Cooperativismo: relação de emprego ou relação de trabalho?
Como visto, o cooperativismo brasileiro não teve origem atreladas a movimentos
populares, como aconteceu na Inglaterra. As primeiras experiências de cooperativas
surgiram por iniciativa de patrões ou pelo próprio incentivo/intervenção governamental.
A intervenção estatal, marco no cooperativismo brasileiro foi constitucionalmente
proibido a partir da Constituição Federal de 1988, período este, como mencionado,
indicado por Waldírio Bulgarelli de período de liberação.
Juridicamente, nos termos da legislação atual do país, podemos definir
cooperativas como “sociedades de pessoas de natureza civil, com forma jurídica própria,
não sujeitas à falência, constituídas para prestar serviços aos associados e que se
distinguem das demais sociedades pelas seguintes características” (Lei no 5.764, de 1971,
art. 4o):
1. voluntária, com número ilimitado de associados, salvo
impossibilidade técnica de prestação de serviços;
2. variabilidade do capital social, representado por cotas-partes;
3. limitação do número de cotas-partes para cada associado,
facultado, porém, o estabelecimento de critérios de
proporcionalidade;
4. inacessibilidade das quotas partes do capital à terceiros,
estranhos à sociedade;
5. retorno das sobras liquidas do exercício, proporcionalmente
às operações realizadas pelo associado, salvo deliberação em
contrário da assembléia geral;
6. quorum para o funcionamento e deliberação da assembléia
geral baseado no número de associados e não no capital;
7. indivisibilidade do fundos de reserva e de assistência técnica
educacional e social;
8. neutralidade política e indiscriminação religiosa, racial e
social;
9. prestação de assistência aos associados, e, quando previsto
nos estatutos, ao empregados da cooperativa;
10. área de admissão de associados limitada às possibilidades de
reunião, controle, operações e prestação de serviços.
É este também o entendimento encontrado no Código Civil
14
que traz capítulo
específico para tratar as sociedades cooperativas:
14
Lei nº 10.406, de 10.01.2002 - DOU 1 de 11.01.2002
42
CAPÍTULO VII
DA SOCIEDADE COOPERATIVA
Art. 1.093. A sociedade cooperativa reger-se-á pelo disposto no
presente Capítulo, ressalvada a legislação especial.
Art. 1.094. São características da sociedade cooperativa:
I - variabilidade, ou dispensa do capital social;
II - concurso de sócios em número mínimo necessário a compor a
administração da sociedade, sem limitação de número máximo;
III - limitação do valor da soma de quotas do capital social que
cada sócio poderá tomar;
IV - intransferibilidade das quotas do capital a terceiros estranhos à
sociedade, ainda que por herança;
V - quorum, para a assembléia geral funcionar e deliberar, fundado
no número de sócios presentes à reunião, e não no capital social
representado;
VI - direito de cada sócio a um voto nas deliberações, tenha ou
não capital a sociedade, e qualquer que seja o valor de sua
participação;
VII - distribuição dos resultados, proporcionalmente ao valor das
operações efetuadas pelo sócio com a sociedade, podendo ser
atribuído juro fixo ao capital realizado;
VIII - indivisibilidade do fundo de reserva entre os sócios, ainda
que em caso de dissolução da sociedade.
Na legislação trabalhista também verifica-se a preocupação do legislador em
resguardar os trabalhadores de possíveis usos indevidos do cooperativismo (falsas
cooperativas ou cooper-gatos), por parte de empregadores, com o fim de burlar os direitos
trabalhistas. A Consolidação das Leis Trabalhistas traz no parágrafo único do art. 442 o
seguinte:
“Qualquer que seja o ramo de atividade da sociedade cooperativa,
não existe vínculo empregatício entre ela e seus associados, nem
entre estes e os tomadores de serviços daquela.”
Mas a partir da interpretação deste dispositivo legal, inserido na CLT pela Lei n.º
8.949 de 09 de dezembro de 1994, introduziu-se como novidade, o afastamento do vínculo
de emprego do associado com o tomador de serviço da cooperativa. Assim como
sugerido nesse ensaio, verificou-se que em muitas situações, cooperativas se tornaram
forma eficaz de se buscar burlar a legislação trabalhista e assim indo de encontro a
intenção do legislador que é viabilizar a terceirização de serviços terceirizáveis e não de
atividades fim da empresa.
43
Assim, a partir de então, tendo em vista a cristalina vantagem econômica na
contratação de cooperativas, disseminou-se o recurso à esta forma como meio de baratear a
mão-de-obra sob o ponto de vista dos encargos, fazendo com que empregados percam seus
direitos e suas garantias.
É diante deste permissivo legal que surgem as falsas cooperativas, as chamadas
“Cooper-gatos”
15
, que atuam explorando a mão-de-obra e indo de encontro aos princípios
cooperativistas e característicos das relações de emprego, como a subordinação e o
pagamento de importância com características de salários, fraude esta que não atinge
apenas os trabalhadores, mas também o Estado por meio da Previdência Social.
O grande aumento de cooperativas vem desencadeando uma série de críticas
calcadas no fato de que essas surgem para descaracterizar o vínculo empregatício e se
permitir ao empregador se desobrigar de uma série de impostos e obrigações sociais para
com o trabalhador/empregado.
É com base nesse contexto que, mesmo entendendo não ser este o foco de nosso
trabalho e visto que tal entendimento, em muitos casos é o pertinente, resolvemos trazer o
embate com a exata compreensão do conceito, peculiaridades e finalidades das sociedades
cooperativas de trabalho. Para tanto, optamos por fazer uma sucinta análise dos aspectos
jurídicos que permeiam a questão, como também uma interpretação sistemática da
legislação vigente. É o que nos propomos a realizar a seguir.
Em primeiro lugar necessário se faz reafirmar que a finalidade precípua das
cooperativas de trabalho é organizar o trabalho do seu associado provendo-lhe de suas
necessidades, eliminando a figura do patrão e o conceito de lucro.
Neste quadro, o cooperativismo surge visando corrigir a distribuição da riqueza,
se inspirando em princípios de ordem ética e moral na busca de uma economia embasada
em princípios de solidariedade e humanidade.
15
Referência aos atravessadores (gatos) que no meio rural arregimentam trabalhadores para trabalharem nos
canaviais às expensas de práticas precarizadoras e sem qualquer amparo da legislação trabalhista.
44
A lei 5.764/71, que de acordo com a "Teoria da Recepção"
16
, formulada por
Kelsen
17
, continua a vigorar nos dispositivos que não são incompatíveis com a nova Carta
Magna de 1988, definiu a política nacional de cooperativismo e instituiu seu regime
jurídico consagrando a adesão livre, a gestão democrática com predominância da pessoa
sobre o capital, a ajuda mútua, mecanismos de retorno financeiro proporcionais às
transações dos membros, entre outros.
Vejamos o que preceitua o referido dispositivo legal:
"Art. - Celebram contrato de sociedade cooperativa as pessoas
que reciprocamente se obrigam a contribuir com bens ou serviços
para o exercício de uma atividade econômica, de proveito comum,
sem objetivo de lucro.
Art. - As cooperativas são sociedades de pessoas, com forma e
natureza jurídica próprias, de natureza civil, não sujeitas a falência,
constituídas para prestar serviços aos associados, distinguindo-se
das demais sociedades pelas seguintes características:
I - adesão voluntária, com número ilimitado de associados, salvo
impossibilidade técnica de prestação de serviços;
II - variabilidade do capital social representado por quotas-partes;
III - limitação do número de quotas-partes do capital para cada
associado, facultado, porém, o estabelecimento de critérios de
proporcionalidade, se assim for mais adequado para o cumprimento
dos objetivos sociais;
IV - incessibilidade das quotas-partes do capital a terceiros,
estranhos à sociedade;
V - singularidade de voto, podendo as cooperativas centrais,
federações e confederações de cooperativas, com exceção das que
exerçam atividade de crédito, optar pelo critério da
proporcionalidade;
VI - quorum para o funcionamento e deliberação da assembléia
geral baseado no número de associados e não no capital;
16
As normas anteriores a Constituição Federal terão que por ela ser recepcionada, ou seja terão que se
adequar aos preceitos da nova ordem constitucional.
17
Hans Kelsen , nasceu em 11 de outubro de 1881 em Praga e faleceu em Berkeley, em 19 de abril de 1973,
um dos mais importantes e influentes juristas do século XX. Autor da Teoria Pura do Direito.
45
VII - retorno das sobras líquidas do exercício, proporcionalmente
às operações realizadas pelo associado, salvo deliberação em
contrário da assembléia geral;
VIII - indivisibilidade dos Fundos de Reserva e de Assistência
Técnica Educacional e Social;
IX - neutralidade política e indiscriminação religiosa, racial e
social;
X - prestação de assistência aos associados, e, quando previsto nos
estatutos, aos empregados da cooperativa;
XI - área de admissão de associados limitada às possibilidades de
reunião, controle, operações e prestação de serviços.
Art. - As sociedades cooperativas poderão adotar por objeto
qualquer gênero de serviço, operação ou atividade, assegurando-se-
lhes o direito exclusivo e exigindo-se-lhes a obrigação do uso da
expressão "cooperativa" em sua denominação."
Essa transcrição, embora longa, constata que a legislação nacional positivou os
princípios cooperativistas oriundos dos "pioneiros de Rochdale" e, assim, fez com que
estes se tornassem não apenas uma referência do ponto de vista doutrinário, mas referência
na construção legislativa sobre cooperativismo. Então, os princípios trazidos pelos que
criaram o modelo de Rochdale foram recepcionados pelos legisladores do Brasil, em
referência clara à adoção daquele modelo de cooperativa.
O exposto nos permite concluir que o associado de uma cooperativa é proprietário
do empreendimento cooperativo e autogestor dos negócios comuns. Neste contexto, e
consoante com o disposto no artigo acima citado, não que se falar em lucro, pois tal
idéia seria incongruente, que não teria sentido o cooperado obter lucros de si mesmo. O
mesmo diploma legal, chamado de "Estatuto do Cooperativismo Nacional", dispõe em seus
artigos 90 e 91 sobre as relações entre o sistema trabalhista e as cooperativas.
"Art. 90 - Qualquer que seja o tipo de cooperativa, não existe
vínculo empregatício entre ela e seus associados.
Art. 91 - As cooperativas igualam-se às demais empresas em
relação aos seus empregados para os fins da legislação trabalhista e
previdenciária."
46
Como se percebe não de se falar na existência de vínculo empregatício entre a
cooperativa e seus associados, pois não subordinação, nem caracterização de um
contrato de trabalho (há sim controle democrático e a associação em torno de objetivos
comuns). Porém, nada impede a admissão de empregados e, neste caso, é evidente a
incidência dos direitos e obrigações oriundos da relação de emprego.
Vale aqui ressaltar que a própria Lei n.º 5.764/71, em seu artigo 31, informa a
possibilidade do associado aceitar e estabelecer relação empregatícia com a cooperativa,
entretanto, o dispositivo legal deixa claro que este, assumindo esta condição, perde o
direito de votar e ser votado, até a aprovação das contas do período em que foi empregado.
Isso porque, a condição de associado à cooperativa não se confunde com a situação de
empregado. O que significa a impossibilidade de concomitância entre as duas formas de
vinculação (empregado e associado).
A Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), no artigo 442, teve inserido um
parágrafo único, pela Lei 8.949/94, passando a vigorar com a seguinte redação:
“Art. 442 - Contrato individual de trabalho é o acordo tácito ou
expresso, correspondente à relação de emprego.
Parágrafo único. Qualquer que seja o ramo de atividade da
sociedade cooperativa, não existe vínculo empregatício entre ela e
seus associados, nem entre estes e os tomadores de serviços
daquela.”
Desta forma, verifica-se que o legislador tratou de reafirmar o disposto no
citado artigo 90 da Lei 5.764/71 e acrescentou também não existir vínculo empregatício
entre os associados e o tomador de serviços desta cooperativa. O intuito da referida Lei
8.949/94 nos parece claro: faz parte do processo de flexibilização das relações de trabalho
e da terceirização das atividades empresariais.
Por outro lado, não se pode negar o amparo e incentivo legal ao trabalho prestado
através de legítima sociedade cooperativa. Cumpridas as exigências da Lei 5.764/71,
como: adesão livre, gestão democrática, não auferimento de lucro e, constatando-se a
inocorrência de contratos de trabalho camuflados pela relação cooperado cooperativa, não
que se falar em burla à legislação trabalhista, mesmo porque, se percebe que as
verdadeiras cooperativas incluem em seus custos de serviços a serem prestados, na forma
47
de fundos legais, as taxas equivalentes aos direitos trabalhistas inexistentes para os
trabalhadores cooperados (férias, 13’ salário, FGTS, licença gestante, afastamento
remunerado em caso de acidentes de trabalho e outros).
Mesmo, não sendo este o objetivo principal de nosso estudo, necessário se faz
adentrarmos um pouco mais no campo do direito do trabalho para apenas diferenciar
juridicamente o que venha a ser relação de trabalho e relação de emprego, para assim
encerrarmos essa prolongada discussão. Não se trata aqui, de uma análise de institutos
jurídicos que, como dito, não é esse o intuito do presente estudo, mas sim apenas uma
tentativa de enquadramento do tema também no direito do trabalho, para assim buscar um
melhor entendimento do seu conteúdo.
A expressão Relação de Trabalho tem caráter genérico. Todas as relações jurídicas
caracterizadas por terem sua prestação essencial centrada em uma obrigação de fazer
consubstanciada em labor humano
18
, em troca de um valor pecuniário ou não-pecuniário,
consiste numa relação de trabalho.
Relação de Emprego, por sua vez, é espécie de relação de trabalho, firmada por
meio de contrato de trabalho. Segundo a CLT
19
, contrato de trabalho é o acordo tácito ou
expresso correspondente à relação de emprego. Portanto, o consentimento a que se refere
o artigo pode ser expresso ou subentendido.
Assim, existe clara distinção entre relação de trabalho e relação de emprego.
A primeira tem caráter genérico: refere-se a todas as relações
jurídicas caracterizadas por terem sua prestação essencial centrada
em uma obrigação de fazer consubstanciada em um labor humano.
Refere-se, pois, a toda modalidade de contratação de trabalho
humano modernamente admissível. A expressão relação de
trabalho englobaria, desse modo, a relação de emprego, a relação
de trabalho autônomo, a relação de trabalho eventual, de trabalho
avulso e outras modalidades de pactuação de prestação de labor
(como trabalho de estagiário, etc.). Traduz, portanto, o gênero a
que se acomodam todas as formas de pactuação de prestação de
trabalho existentes no mundo jurídico atual. (DELGADO, 2008:
285).
18
Toda modalidade de contratação de trabalho humano modernamente admissível
19
Art. 442, caput da CLT.
48
Relação de Emprego, por sua vez, compõe-se da reunião de cinco elementos
fático-jurídicos, quais sejam:
a) prestação de trabalho por pessoa física (pessoa jurídica prestadora de serviços
não pode ser contratada como empregada);
b) prestação efetuada com pessoalidade pelo trabalhador. O elemento fidúcia é
essencial, razão pela qual o trabalhador não pode se fazer substituir. É intuito personae
em relação à pessoa do empregado, ou seja o empregado não poderá ser substituído na
execução das suas tarefas por quem quer que seja (o que pode acontecer, é que o
empregador promova contratação de outro trabalhador, para executar tarefas idênticas, ou
mesmo permita que o empregado que necessite se ausentar por motivos particulares seja
substituído por um outro que execute função idêntica. Mas se trata de relação jurídica
distinta, firmada com o possível substituto);
c) prestação efetuada com não-eventualidade, de forma contínua, pois trabalho
eventual não consolida uma relação de emprego a ser protegida pela CLT (não constitui
relação de emprego a convocação de um mensageiro, autônomo, para enviar determinada e
específica mensagem, que encerrando sua tarefa considerar-se-ia cumprido o objetivo de
sua contratação);
d) efetuada sob subordinação ao tomador de serviços, cumprindo suas ordens
(inclusive o empregador tem poder para aplicar sanções disciplinares);
e) prestação de trabalho efetuada com onerosidade (há uma perspectiva de
contraprestação patrimonial e econômica. O trabalho prestado de forma voluntária, sem
pagamento de salário, descaracteriza a relação de emprego).
Assim, relação jurídica de trabalho resulta de um contrato de trabalho autônomo
ou subordinado, enquanto que a relação jurídica de emprego sempre resulta de um contrato
de subordinação.
Estabelecido a diferença entre relação de trabalho e relação de emprego, agora
entremos no dilema enfrentado ao estudar o caso específico das cooperativas. Como já dito
anteriormente em diversas etapas deste estudo a Lei 8.949, de dezembro de 1994,
49
acrescentou ao art. 442 da CLT, parágrafo único, que expressamente determina que
qualquer que seja o ramo de atividade da sociedade cooperativa não existe vínculo
empregatício entre ela e seus associados, nem entre estes e os tomadores de serviços
daquela. Tentou, desta forma, o legislador retirar do rol empregatício relação própria às
cooperativas, desde, é claro, que não seja ela utilizada com o intuito meramente
simulatório.
Entendemos que a relação de emprego resulta de um contrato social pelo qual o
empregador compra, durante a jornada diária de trabalho, a força de trabalho ou a
capacidade de trabalho do empregado, através do regime de assalariamento, o que de fato
não ocorre com o cooperativismo, onde se percebe de forma clara que esta prática não
existe.
2.3 – Crise do trabalho e reemergência atual do cooperativismo: dois caminhos
Com a globalização, destacadamente, na década de 1990, mais perdas trabalhistas
foram de certa forma impostas aos trabalhadores. Tudo sob a mascara da flexibilização,
meios de precarização das condições de trabalho se fizeram cada dia mais presentes no
cotidiano dos trabalhadores brasileiros. Práticas que vão desde a contratação sem carteira
de trabalho profissional devidamente registrada e sem qualquer vinculação previdenciária
(prática contrária ao amparo legal do estado), até o contrato de trabalho por tempo
determinado (sob o amparo legal do estado, justificado este como forma de combate ao
desemprego - flexibilização), fizeram com que o cooperativismo ressurgisse com mais
força no Brasil.
O cooperativismo ressurge como alternativa viável para combater a crise nas
relações de trabalho, a exclusão social, entre outros. Por outro lado, a geração de trabalho e
renda está sempre atrelada a perspectiva de construção de uma sociedade mais justa e
igualitária, tudo, dentro do conceito de Economia Solidária.
Para Singer (1999a), o novo cooperativismo no Brasil toma formas diferentes:
empresas autogeridas; pequenas e médias associações ou cooperativas de produção ou
comercialização; cooperativas agropecuárias formadas pelo Movimento dos Trabalhadores
Rurais Sem Terra (MST); cooperativas de trabalho e de serviços, formadas por
Incubadoras Tecnológicas de Cooperativas Populares; cooperativas de serviços de diversos
50
tamanhos, boa parte agrupadas nas Federações de Cooperativas de Trabalho estaduais.
Para este autor, um dos maiores obstáculos à difusão do cooperativismo é a falta de cultura
cooperativista entre os trabalhadores, pois estes não possuem a habilidade da autogestão.
Com a derrocada no desenvolvimento econômico do Brasil, que pode ser
observado com mais ênfase no início da década de 1990 fez com que as empresas tivessem
diminuídas as suas vendas sua produção e consequentemente a sua capacidade de
contratação, fatos que associados fizeram aumentar e muito as taxas de desemprego. “Os
desempregados, que outrora eram denominados de exército industrial de reserva,
desempenham o mesmo papel que as mercadorias que sobram nas prateleiras: eles evitam
que os salários subam” (SINGER, 1999b: 13). Assim, os desempregados que
desempenhavam um papel estabilizador da economia, atualmente, desequilibram cada vez
mais e ainda geram pressões sociais que afetam a estabilidade estatal.
É assim, dentro desse contexto que o cooperativismo ressurge e fazendo com que
conceitos como emprego e salário, percam espaço para conceitos como o de trabalho,
ocupação e renda, estes trazendo uma conotação descolada das organizações
cooperativistas populares, onde se pressupõe a inexistência de assalariamento,
característica do sistema capitalista.
O cooperativismo busca, dentre outras coisas, mostrar que o assalariamento, uma
das características da relação de emprego, na realidade, não atende mais a realidade por se
imposta na nova ordem mundial, o que se necessita é de ocupação e não de emprego
porque, conforme a análise de SINGER (1999b: 14) “ocupação compreende toda
atividade que proporciona sustento a quem a exerce”. Quebrar a cultura imposta no
mercado de trabalho brasileiro onde a noção de segurança é trazida com o emprego e o
salário, e a busca de se implantar novos conceitos como os acima vistos, é a grande
dificuldade do novo cooperativismo.
É assim que se coloca o cooperativismo hoje no Brasil, entretanto, esta luta, não é
fácil, como visto principalmente pela forma como foi tratada o movimento pelo Estado,
que sempre buscou controlá-lo restringindo a sua atuação impondo uma legislação
caracterizada pela intervenção estatal.
51
No Brasil, o modelo adotado e suas características apresenta uma cooperativa que
apenas venha resolver algumas distorções que o sistema capitalista apresenta, fazendo com
que, inclusive, em muitas situações, a prática cooperativista mais se pareça com a prática
de uma empresa meramente capitalista.
É este o enfrentamento travado pela Economia Solidária no Brasil, a tentativa de
implementação de práticas cooperativistas voltadas verdadeiramente para um projeto
autogestionário, participativo e democrático-popular.
É esta a situação que deve ser encarada como primordial para discussão que
como esboçado com a possibilidade jurídica que o estado busca incentivar os
empreendimentos cooperativos, dois caminhos ficam bem delimitados, os que se
aproveitam de um pseudo-modelo cooperativista e por meio destes buscam de forma
fraudulenta obter lucros as custas de empreendimentos fraudulentos, fazendo com que um
outro modelo, verdadeiramente voltado a economia solidária, seja colocado em cheque e
sob a desconfiança social e de instituições públicas, como Ministério Público do Trabalho,
e que para se firmarem, necessitam, a cada dia, demonstrar a realidade na adoção de um
regime verdadeiramente voltado a economia solidária.
CAPÍTULO – III
ECONOMIA SOLIDÁRIA
3 – A Economia Solidária entra em cena
O cooperativismo tem sua origem anterior a da economia solidária. Como
exposto nos capítulos anteriores o início do cooperativismo nos remete a Revolução
Industrial, ainda no século XIX e sofrendo as conseqüências da destituição de seus bens
de produção para empregar apenas a sua mão-de-obra nas fábricas.
52
A economia solidária, que comporta o cooperativismo, assim como o
associativismo e outras formas de trabalho coletivo caracterizados pela autogestão, é um
conceito criado na década de 1990 (GODOY, 2008, 17) que tem em seu bojo a discussão
das desigualdades sociais suscitadas pelo crescimento econômico que não proporcionou
bem-estar a todos.
O cooperativismo é, pois, encarado como um referencial da economia solidária,
que surgiu como invenção de operários em resposta a alta taxa de desemprego trazida
principalmente com o advento das máquinas de vapor no início da chamada fase industrial
do capitalismo.
Diante daquela nova realidade começou-se a verificar que as formas clássicas de
resistência dos trabalhadores, que consiste na utilização de vias de afrontamento de classe
como reclusão em modos de vida tradicionais e por tentativas de entrar individualmente no
mercado de trabalho, mostra-se cada dia mais impotentes frente ao poderio capitalista.
(GAIGER, 2004), assim tais medidas e tentativas individuais deram espaço a experiências
coletivas, trazidas pelos trabalhadores, ressurgindo como alternativa viável e que se
fortalecem a cada dia, não pelas exitosas experiências que surgem a cada dia mas por
terem associados a estas embasamento teórico e cientifico.
A associação produtiva surge como tentativa de colocar a força de trabalho a
serviço do trabalhador, em vez de aliená-lo em seu próprio jugo. O ressurgimento da
economia solidária, como afirma GAIGER (2004: 08) instaura as bases de uma economia
do trabalho que subverte a lógica de produção de mercadorias e converte a economia de
imperativo absoluto, em meio de realização de necessárias de fruição de bem-estar.
GAIGER destaca alguns fatores para justificar o atual ressurgimento da economia
solidária, um no cenário macroeconômico, que seria a redefinição do padrão de
acumulação capitalista, associado à crise que atinge o sistema assalariado, cujo reflexo
imediato seria a volta do desemprego massivo e a exclusão social; e no plano político,
acrescenta ainda o autor, com a derrocada da experiência socialista colocando em xeque as
pautas de intervenção social das organizações e das correntes políticas.
Esse fato, uma vez superado um momento inicial de perplexidade
e desorientação, estaria ajudando a desobstruir o caminho, em
53
direção a novas experiências sociais e a novos esquemas de
análise e de formulação estratégica. Assim, mesmo com alguma
hesitação, veio a reconhecer-se a compatibilidade entre a
economia solidária e a economia de mercado, no sentido de
admitir sua convivência e encontrar aí, ao menos
passageiramente, condições de expansão da primeira. (GAIGER,
2004: 08)
O aumento da economia informal também tem estimulado uma economia solidária
com várias vertentes e formada por diferentes instituições que agora configuram-se como
pólos geradores de renda e de emprego surgindo como uma alternativa gerada
espontaneamente pela sociedade civil em face da falta de emprego.
A economia solidária, segundo Singer, compõe a formação social capitalista, vez
que o capitalismo “não só é o maior dos modos de produção mas molda a superestrutura
legal e institucional de acordo com os seus valores e interesses.” (SINGER apud
SANTOS 2005: 86). E acresenta o mesmo autor:
Mesmo sendo hegemônico, o capitalismo não impede o
desenvolvimento de outros modos de produção, porque é incapaz
de inserir dentro de si toda população economicamente ativa. A
economia solidária cresce em função das crises sociais que a
competição cega dos capitais privados ocasiona periodicamente
em cada país. (SINGER apud SANTOS 2005:36)
A economia solidária, ainda segundo o professor Paul Singer, nega a separação
entre trabalho e posse dos meios de produção, reconhecidamente a base do capitalismo,
assim fica claro a diferenciação entre um empreendimento que siga a economia solidário
de empresas capitalistas.
Em estudo publicado no XXIII ENCONTRO ANUAL DA AMPOCS, realizado
em outubro de 1999 na cidade de Caxambu, Luiz Inácio Gaiger relata que o desemprego
muda de padrão pois tem forte concentração de desemprego industrial passa a assumir a
crescente condição de longa duração, refletindo de dificuldades na oferta de novas
oportunidades de emprego e trabalho” (VERAS NETO, 2002: 141).
Acrescenta Gaiger que o aumento das taxas de desemprego e o aumento da
precarização do trabalho farão com que aumentem a busca por alternativas de
sobrevivência, ante a dificuldade e restrição existentes para se adentrar e permanecer no
54
mercado formal de trabalho. Dentre essas experiências alternativas, incontestável é o
destaque da economia solidária, pois traz em seus empreendimentos, características
próprias que a diferenciam por demais dos empreendimentos puramente abrangidos pelos
ensinamentos e normas capitalistas.
Uma característica dos empreendimentos capitalistas é a existência de
investidores que financiam a aquisição dos meios de produção, e em consequencia deste
investimento fazem com que se busque a obtenção de maior lucro possível para se
compensar o capital investido. Consequentemente, a gerência na empresa capitalista, estará
nas mãos destes que financiam e dominam os meios de produção. nos empreendimentos
solidários, o capital dos que nela trabalham é apenas destes. Os trabalhadores são
proprietários do empreendimento solidário e ainda, não existe a possibilidade de
proprietários que não trabalhem no empreendimento. A propriedade do empreendimento é
dividida por igual entre todos os membros, tendo assim todos, o mesmo poder de decisão
sobre ela, não existindo concentração nas decisões. No cooperativismo, por exemplo, esta
regra é bem esclarecida em um dos seus princípios: um cooperado, um voto.
A responsabilidade para gerenciar as empresas solidárias é, em regra, determinada
por indicação/eleição onde todos os associados opinam e escolhem o sócio que ocupar a
função, entretanto, o indicado será mero gerenciador pois as diretrizes e objetivos do
empreendimento serão determinados e decididos em assembléia ou, diante da
impossibilidade de se realizar assembléia, devido à grande quantidade de associados, as
decisões serão tomadas por meio de delegados escolhidos pelos demais.
Como indicado, nota-se de forma cristalina que nos empreendimentos solidários
não existe a divisão de quem detem o capital e de quem detem oa força de trabalho, os
trabalhadores também são proprietários, assim, a finalidade básica não é apenas aumentar o
lucro mas a quantidade e a qualidade do trabalho. Na realidade, na empresa solidária, não
lucro porque nenhuma parte de sua receita é distribuída em proporção às cotas de
capital.
A economia solidária, a cada dia, com o aumento desta situação aqui
amplamente explorada vem tentando se colocar como contraponto à exclusão imposta pelo
mercado de trabalho entretanto, necessário se faz algumas ponderações, pois não é todo
55
modelo de economia solidária e, especialmente de cooperativas, que se prestam como
alternativa ao neoliberalismo.
O modelo de economia solidária, de empresas solidárias deverão se constituir a
partir da sociedade civil, pois como afirma SINGER (1999), é na sociedade civil que
encontramos o legítimo espaço de lutas de classes e, não apenas de interesses egoísticos de
produtores e consumidores.
Hoje pode-se distinguir entre o cooperativismo tradicional e o novo
cooperativismo, que traz as marcas da crise ideológica de esquerda
e a necessidade de enfrentar o neoliberalismo e a atual crises das
relações de trabalho. O novo cooperativismo constitui a
reafirmação da crença nos valores centrais do movimento operário
socialista: democracia na produção e distribuição, desalienação do
trabalhador, luta direta dos movimentos sociais pela geração de
trabalho e renda, contra a pobreza e exclusão social.(SINGER,
1999).
Mesmo quando trata-se de modelo de cooperativismo, inserido na economia
solidária, formado em princípios firmes e difundidos de forma igualitárea no mundo, o
cooperativismo está em momento acentuado de mudança, diferindo de país a país
(SINGER, 1999). Não basta o simples fato de uma organização adequar-se
estruturalmente e jurídicamente que a faz ser identificada como um empreendimento
inserido na economia solidária. O fundamental, para caracterizá-la, seria o respeito às
características autogestionárias. Autogestão que consiste na autonomia de cada
empreendimento e pela igualdade entre os seus associados, membros.
Como tentamos demonstrar em nosso estudo, no nascimento do capitalismo, o
modelo apresentado mostrava que o empregado era encarado como propriedade do
empregador, sempre visto separado das forças produtivas que detinha ou utilizava. Assim
na contra-mão desse entendimento, podemos destacar o conceito que pode ser empregado
pela economia solidária como:
o conjunto de empreendimentos produtivos de iniciativa coletiva,
com certo grau de democracia interna e que remuneram o trabalho
de forma privilegiada em relação ao capital, seja no campo ou na
cidade. Tolerar ou mesmo estimular a formação de
empreendimentos alternativos aos padrões capitalistas
56
normalmente aceitos, tais como cooperativas autogeridas é,
objetivamente falando, uma forma de reduzir o passivo corrente
que se materializa em ondas de crescentes de desemprego e
falências. (...) Tais empreendimentos encontram potencialmente no
trabalho coletivo e na motivação dos trabalhadores que os
compõem, uma importante fonte de competitividade reconhecida
no capitalismo contemporâneo. Enquanto no fordismo a
competitividade é obtida através das economias de escala e de uma
crescente divisão e alienação do trabalho associadas a linhas
produtivas rígidas automatizadas ou não -, na nova base técnica
que está se configurando, uma importante fonte de eficiência é a
flexibilização. (GAIGER, 2002: 64)
Singer observa a economia solidária sob um prisma, uma perspectiva, destacando
a relação entre o trabalhador e os meios de produção, sendo que:
A empresa solidária nega a separação entre trabalho e posse dos
meios de produção, que é reconhecidamente a base do capitalismo.
(...) A empresa solidária é basicamente de trabalhadores, que
apenas secundariamente são seus proprietários. Por isso, sua
finalidade básica não é maximizar lucro mas a quantidade e a
qualidade do trabalho (SINGER, 2002: 04)
Assim, a economia solidária apresenta-se como legítima forma de reconciliação
do trabalhador com seus meios de produção e fornece, de acordo com Gaiger (2003), uma
experiência profissional erguida sob parâmetros de eqüidade e na dignidade, na qual
poderá ocorrer um enriquecimento ao menos do ponto de vista humano.
... o interesse dos trabalhadores em garantir o sucesso do
empreendimento estimula maior empenho com o aprimoramento
do processo produtivo, a eliminação de desperdícios e de tempos
ociosos, a qualidade do produto ou dos serviços, além de inibir o
absenteísmo e a negligência (GAIGER, 2002: 34).
Outra característica que deve ser considerada, quando estudamos
empreendimentos solidários, é o do fortalecimento de uma perspectiva de desenvolvimento
do ambiente onde está inserido o empreendimento solidário. Com a iminencia de
crescimento de rendimento do trabalho associado, existe a busca para promover o
desenvolvimento local, deixando claro que este crescimento não poderá se dar apenas do
ponto de vista econômico mas também do ponto de vista social, entendendo
desenvolvimento local como o:
57
processo que mobiliza pessoas e instituições buscando a
transformação da economia e da sociedade locais, criando
oportunidades de trabalho e renda, superando dificuldades para
favorecer a melhoria das condições de vida da população local
(JESUS apud CATTANI, 2003:72).
Gaiger (2002) separa e indica quatro características econômicas como integrantes
e caracterizadoras do modo de produção capitalista, sendo a produção de mercadorias que
tem como objetivo a comercialização, a divisão dos trabalhadores e os meios de produção,
o assalariamento como forma pagamento no processo de transformação do trabalho em
mercadoria e por fim a existência do lucro e a consequente acumulação de capital por parte
do empregador que detém os meios de produção. Sendo assim, o modelo capitalista
proporciona, forte caráter de desigualdade. Enquanto parte dos trabalhadores é bem
sucedida, o restante perde suas qualificações e muitos se tornam miseráveis (SINGER,
2005).
A economia solidária, conforme Wautier, é orientada do ponto de vista
sociológico e:
acentua a noção de projeto, de desenvolvimento local e de
pluralidade das formas de atividade econômica, visando à utilidade
pública, sob forma de serviços diversos, destinados,
principalmente, mas não exclusivamente, à população carente ou
excluída (WAUTIER apud CATTANI, 2003: 110)
Pode-se dizer também que é fundada em relações nas quais as práticas de
solidariedade e reciprocidade não são utilizadas como meros dispositivos compensatórios,
mas sim fatores determinantes na realidade da produção da vida material e social.
3.2 – Configuração: atores, experiências, propostas
Como mencionado, a economia ressurge no Brasil devido a momentos de crise
vividos que aumentaram demasiadamente o desemprego. A crise econômica vivida entre
os anos de 1981 a 1990 marcou a falência de grandes empresas no cenário nacional que
levaram grande número de pessoas ao encontro do desemprego.
Em janeiro de 2001 foi realizado em Porto Alegre, capital do Rio Grande do Sul,
o I Fórum Mundial Social. Este evento reuniu mais de 16 (dezesseis) mil pessoas vindas de
58
117 países. Neste encontro o tema da Economia Solidária foi tratado como de grande
relevância tanto que foi necessário, a partir das discussões, constituir um Grupo de
Trabalho Brasileiro de Economia Solidária (GT Brasileiro)
20
, composto de redes e
organizações envolvidas com a temática.
O GT Brasileiro, era formado por redes e organizações de práticas associativas
do segmento popular solidário. As doze entidades e redes nacionais que em momentos e
níveis diferentes participavam do GT - Brasileiro eram: Rede Brasileira de Socioeconomia
Solidária (RBSES); Instituto Políticas Alternativas para o Cone Sul (PACS); Federação de
Órgãos para a Assistência Social e Educacional (FASE); Associação Nacional dos
Trabalhadores de Empresas em Autogestão (ANTEAG); Instituto Brasileiro de Análises
Sócio-Econômicas (IBASE); Cáritas Brasileira; Movimento dos Trabalhadores Sem Terra
(MST/CONCRAB); Rede Universitária de Incubadoras Tecnológicas de Cooperativas
Populares (Rede ITCPs); Agência de Desenvolvimento Solidário (ADS/CUT);
UNITRABALHO; Associação Brasileira de Instituições de Micro-Crédito (ABICRED); e
alguns gestores públicos que futuramente constituíram a Rede de Gestores de Políticas
Públicas de Economia Solidária.
21
O GT-Brasileiro buscou a unidade na diversidade, favorecendo a
construção da identidade do campo da denominada“Economia
Solidária”, graças à prática de respeitar as contribuições diversas de
cada região e especificidades de suas organizações. Não apenas
isso. Sabia que era necessário investir na divulgação, caracterizar
suas atividades e se constituir como uma articulação de dimensão
nacional. É a partir deste grupo que se propõe a constituição de um
fórum em dimensão nacional. Nisso, tanto a realização das
plenárias quanto a elaboração dos Princípios da Economia
Solidária foram decisivas para ampliar e, ao mesmo tempo,
caracterizar seu campo de ação. O movimento que vinha sendo
articulado pelo GT - Brasileiro era constituído principalmente por
entidades de assessoria/ fomento e por um segmento de gestores
públicos e apontava, desde o início, para a necessidade de
combinar a ampliação regional com o investimento em empresas e
empreendimentos do campo da denominada “Economia Solidária”.
Faltava uma política pública nacional de Economia Solidária e um
processo de enraizamento, constituído principalmente através de
empreendimentos de economia solidária e empresas de autogestão
20
Informação trazida no site: www.fbes.org.br
21
Informação contida no site: www.fbes.org.br
59
nas diversas regiões do país. (O Fórum Brasileiro de Economia
Solidária – www.fbes.org.br)
Foi a partir de discussões no GT, que se buscou viabilizar a constituição do Fórum
Brasileiro de Economia Solidária - FBES, em uma reunião realizada em novembro de
2002, reunião que tinha como objeto buscar traçar metas na organização do III Fórum
Mundial Social, decidiu-se elaborar uma Carta para o então Presidente eleito
22
, sugerindo a
criação de uma Secretaria Nacional de Economia Solidária - SENAES, onde também ficou
decidido a realização da 1ª Plenária Nacional de Economia Solidária.
23
A Plenária, que contou com a participação de mais de 200
pessoas, referendou a Carta produzida em novembro e decidiu
realizar a Plenária Nacional durante o III Fórum Social Mundial
para discutir a criação de um Fórum Brasileiro de Economia
Solidária - FBES. Além disso, essa plenária possibilitou o início do
debate e aprofundamento de uma plataforma política para o
fortalecimento da Economia Solidária no Brasil. Trata-se de um
conjunto de prioridades relacionadas às finanças solidárias, ao
marco jurídico para os empreendimentos econômicos solidários, à
formação e à educação, às redes de produção, comercialização e
consumo, à democratização do conhecimento e da tecnologia e à
organização social de economia solidária.
A Plenária Nacional foi realizada em janeiro 2003 e contou com
a participação de mais de 1000 pessoas possibilitando o
aprofundamento da plataforma política da Economia Solidária.
Nessa plenária foi tomada a decisão de constituir o FBES em uma
outra Plenária Nacional, sendo que esta deveria ser antecedida de
encontros estaduais que preparariam a discussão nacional e
elegeriam delegados para a mesma.
O FBES foi criado em junho de 2003 na Plenária, no mesmo
momento de criação da SENAES no Ministério do Trabalho e
Emprego.
(http://www.mte.gov.br/ecosolidaria/secretaria_nacional_historico.
asp)
O Fórum Brasileiro de Economia Solidária, surgia como verdadeiro interlocutor
entre empreendimentos solidários e a SENAES, no sentido de apresentar demandas,
22
Luiz Inácio Lula da Silva, eleito pelo Partido dos Trabalhadores – PT.
23
Informação contida no site: http://www.mte.gov.br/ecosolidaria/secretaria_nacional_historico.asp
60
sugerir políticas e acompanhar a execução das políticas públicas que envolvia o tema
economia solidária.
Segundo a Carta de Princípios do Fórum Brasileiro de Economia Solidária
FBES, são princípios gerais da Economia Solidária:
- A valorização social do trabalho humano;
- O reconhecimento do lugar fundamental da mulher e do feminino
numa economia fundada na solidariedade;
- A busca de uma relação de intercâmbio respeitoso com a
natureza, e os valores da cooperação e da solidariedade, um
caminho que valoriza os seres humanos, independente da sua cor
de pele, sexo, idade, orientação sexual, condição econômica ou
cultural.
Cabe ao Fórum Brasileiro de Economia Solidária entre outras demandas o de
garantir e articular a relação entre três segmentos envolvidos no movimento de Economia
Solidária. Sendo eles: empreendimentos solidários, entidades de assessoria e fomento, e
gestores públicos.
Quanto aos empreendimentos solidários, de se destacar que a economia
solidária abrange uma diversidade considerável, tendo em vistas o alcance em diversas
áreas de atuação, como por exemplo, as cooperativas (foco de nosso estudo), associações
familiares, grupos informais, agricultores familiares, empresas recuperadas com a
autogestão, dentre outras formas de manifestação. Estes empreendimentos solidários são os
principais protagonistas do FBES, tanto é assim que se fazem representar em todas as
searas de decisão do FBES.
Os gestores públicos seriam a representação do Estado, do poder público no
FBES. É composto por representantes de governos municipais e estaduais que tenham em
sua gestão programas explicitamente voltados à Economia Solidária.
As entidades de assessoria e fomento, tem o intuito, o objetivo de prestar serviços
de apoio e fomento aos empreendimentos solidários, seja na forma de ações de formação
(tanto técnica quanto econômica e política), seja na forma de apoio direto (em estrutura,
assessoria, consultoria, elaboração de projetos e/ou oferecimento de crédito) para a
incubação e promoção de empreendimentos, usualmente elas têm se organizado na forma
61
de associações sem fins lucrativos (ONGs) ou universidades (incubadoras tecnológicas e
grupos de extensão).
Geralmente, estas entidades se mostram vinculados a sindicatos. Os sindicatos,
oportunizados por uma legislação que possibilitavam aos trabalhadores o arrendamento ou
posse da massa falida ou o patrimônio dos antigos empregadores fez com que cooperativas
se ceassem e os postos de empregos fossem mantidos.
Garantir os postos de emprego por meio de cooperativas foi o primeiro passo dado
pelos sindicatos, entretanto uma dificuldade ficou estabelecida, “levar aos trabalhadores
os princípios da economia solidária, convencendo-os a se unirem numa empresa em que
todos são donos por igual, cada um com direito a um voto empenhados solidariamente em
transformar em patrimônio sucateado num novo empreendimento solvável.” (SINGER
apud SANTOS, 2005: 87)
Daí que surgiu a necessidade de se criarem institutos e entidades para que,
assessorando os trabalhadores possam proporcionar a criação e o desenvolvimento de
empreendimentos solidários, como é o caso da ANTEAG Associação Nacional dos
Trabalhadores em Empresas de Autogestão e Participação Acionária e a UNISOL Brasil
União e Solidariedade das Cooperativas.
Embora criadas com o mesmo objeto, qual seja, informar, formar e capacitar os
trabalhadores que ingressavam em experiências de autogestão, estas entidades surgiram em
momentos distintos e com retrospectivas próprias.
A ANTEAG tem suas raízes no movimento sindical, surgindo no dizer de Singer
“não para ajudar a luta dos trabalhadores pela preservação dos seus postos de
trabalho e ao mesmo tempo pelo fim de sua subordinação ao capital, mas também para
assessorar as novas empresas solidárias (SINGER apud SANTOS, 2005: 89). A
ANTEAG surge pois, com o papel de articular idéias, pessoas, instituições, democratizar
informações criando espaço de debate destas idéias até então novas para os trabalhadores
recém inseridos no mundo da economia solidária, no mundo da autogestão. (NAKANO,
62
2000). É uma entidade que representa e assessora empresas e empreendimentos de
autogestão em diversos setores em todo território brasileiro
Além de ter sido uma das entidades fundadoras do Fórum Brasileiro de Economia
Solidária esta entidade também integra o Conselho Nacional de Economia Solidária.
Apesar de ter sua origem dentro do movimento sindical (SINGER, apud SANTOS, 2005),
acabou se transformando numa entidade de apoio independente do sindicalismo, mas
envolvida com estes no sentido de apoiar e transformar empreendimentos capitalistas
falidos em bem sucedidos empreendimentos solidários.
A UNISOL Brasil - União e Solidariedade das Cooperativas Empreendimentos
de Economia Social do Brasil que tem objetivos análogos aos da ANTEAG, foi
fundada em março de 2000, originou-se também do movimento sindical, destacadamente
do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC e do Sindicato dos Químicos do ABC. A
UNISOL consiste em associação civil sem fins lucrativos, de âmbito nacional, de
natureza democrática, cujos fundamentos são o compromisso com a defesa dos
interesses reais da classe trabalhadora, a melhoria das condições de vida e de trabalho
das pessoas e o engajamento no processo de transformação da sociedade brasileira em
direção à democracia e a uma sociedade mais justa”.
24
3.3 – A Economia Solidária: impasses e contradições.
Uma maneira de contrapor-se ao capitalismo; uma forma que visa superar a
divisão entre capital e trabalho; uma forma que visa superar a propriedade individual e o
controle hierárquico dentro dos empreendimentos são estes, sem sombra de dúvidas as
metas a serem alcançadas pelas cooperativas, metas estas por demais demonstradas nos
princípios adotados pelo movimento cooperativista.
A Economia Solidária, nova forma de organização econômica, vem sendo
entendida, para os mais eufóricos como Singer, como um novo modo de produção.
Para Gaiger (2002: 03) modo de produção é:
24
Informação trazida no site: www.unisolbrasil.org.br.
63
a categoria mais fundamental e englobante, cunhada por Marx,
para expressar sinteticamente as principais determinações que
configuram as diferentes formações históricas. Essas
determinações encontram-se para Marx no modo como os
indivíduos, de uma dada sociedade, organizam-se no que tange à
produção, à distribuição e ao consumo dos bens materiais
necessários à sua subsistência; mais precisamente, na forma que
assumem as relações sociais de produção, em correspondência com
um estado histórico de desenvolvimento das forças produtivas.
Ainda na leitura de Gaiger (2002) sobre a visão de Marx, um modo de produção
constitui-se em um modo material de produção, ou seja, nos elementos e formas materiais
dos diversos processos de trabalho, com os quais a sociedade age sobre a natureza para
extrair os meios materiais necessários para produzir e reproduzir a sua existência social.
Estes modos materiais de produção podem repousar ou não sobre a mesma base
técnica, no entanto, a instauração de um novo modo de produção exige um novo modo
material de produção, que lhe seja apropriado” (GAIGER, 2002: 4). Por isso domina o
conjunto do processo de produção social e adapta as instituições as suas necessidades,
incluindo aqui a forma de produção e apropriação dos meios de produção e dos resultados
desta.
Pode-se notar que o capitalismo como está exposto constitui-se, em uma relação
social de indivíduos desiguais perante os meios de produção, que produzem mercadorias.
(LEMES, 2008: 60)
Sob esta análise será que poderíamos informar que, inclusive, a própria atividade
humana torna-se uma mercadoria?
É dentro dessa discussão que é inserida a economia solidária, que, diante da
grande problemática enfrentada no campo do trabalho marcada pelas altas taxas de
desemprego tem servido para inserir ou re-inserir no mercado de trabalho mão de obra
ociosa de forma a tentar combater os meios de exploração capitalista, mas mesmo para os
mais entusiasmados, a discussão de alguns temas não pode ser esquecido, e, um dilema, no
campo da economia solidária é sempre trazido à tona.
64
Rosa Luxemburgo, identifica o cooperativismo como instituições de natureza
híbrida pois traz uma forma solidária de produção dentro da economia capitalista.
Quanto às cooperativas, e antes de tudo, às cooperativas de
produção, são elas pela sua essência um ser híbrido dentro da
economia capitalista: a pequena produção socializada dentro de
uma troca capitalista. Mas, na economia capitalista, a troca domina
a produção, fazendo da exploração impiedosa, isto é, a completa
dominação do processo de produção pelos interesses do Capital, em
face da concorrência, uma condição de existência da empresa.
Praticamente, exprime-se isso pela necessidade de intensificar o
trabalho o mais possível, de reduzir ou prolongar as horas de
trabalho conforme a situação do mercado, de empregar a força de
trabalho segundo as necessidades do mercado ou atirá-la na rua,
em suma, de praticar todos os métodos muito conhecidos que
permitem a uma empresa capitalista enfrentar a concorrência das
outras. Resulta daí, por conseguinte, para a cooperativa de
produção, verem-se os operários na necessidade contraditória de
governar-se a si mesmos com todo absolutismo necessário e
desempenhar entre eles mesmos o papel de patrão capitalista, que,
no caso de serem mais fortes os interesses dos operários, pela
dissolução. São esses fatos que o próprio Bernstein constata, mas
que evidentemente não compreende quando, com a Sra. Potter
Webb, na falta de “disciplina” a causa do fracasso (como se o
problema fosse cultural, educacional, falta de consciência solidária
etc.) das cooperativas de produção na Inglaterra. O que aqui se
qualifica vulgar e superficialmente de “disciplina” outra coisa não
e senão o regime absoluto natural ao Capital, e que evidentemente
os operários não podem empregar contra si próprios
(LUXEMBURGO apud VERAS NETO, 2002: 41).
Mas a forma solidária encarada dentro dos empreendimentos solidários, não
podem ser vistos fora de um contexto imposto pela concorrência. Para se manterem no
mercado estes empreendimento solidários precisam conviver com práticas que garantam as
condições para se manterem vivos.
Nos empreendimentos capitalistas a exploração pelos que detêm o capital sobre os
trabalhadores é um fator facilmente identificado, nos empreendimentos solidários onde não
existe a divisão capital trabalho a exploração é identificada?
SINGER, reconhece a existência da auto-exploração realizada nos chamados
empreendimentos solidários entretanto entende ser bem diferente da exploração existente
nos empreendimentos capitalistas enfatizando como sendo bem menor.
65
Se as condições de trabalho na fábrica capitalista eram duras,
elas sempre seriam menos duras na cooperativa por duas razões
fundamentais: na fábrica capitalista os empregados têm de
produzir lucros proporcionais ao capital investido, obrigação que
os cooperados não têm, o que lhes permite se auto-explorar
menos; além disso, os cooperados têm a liberdade de escolher
quando e como trabalhar para tornar sua empresa competitiva, ao
passo que os trabalhadores assalariados têm de obedecer a
determinações da direção. (SINGER, 2000, 17)
Ainda, argumenta Singer, que as cooperativas são importante, primeiro porque
permite uma pedagogia, ainda dentro do capitalista, da prática da autogestão,
aprendizagem que é, segundo o autor, condição para se ter a possibilidade histórica de
superação do capital, segundo porque na cooperativa uma melhora das condições de
trabalho e em terceiro lugar elas diminuem o exército industrial de reserva, na medida que
gera trabalho e renda para os desempregados (SINGER, 2000).
Mesmo com a exposição do professor Singer, inegável a afirmação que de certa
forma os empreendimentos competem no mercado capitalista com empreendimentos
puramente capitalistas, sendo assim aqueles estão sempre inseridos dentro uma
organização onde a concorrência é quem dita o ritmo imposto pelos cooperados a si
próprios na auto-exploração.
Santos (2005), estudando o tema, evidencia que a economia solidária ressurge
como uma nova forma de socialismo, o qual denomina o autor como sendo um socialismo
de mercado, e é a partir das colocações de Boa Ventura entendemos um pouco as trazidas
por Luxemburgo e Singer, ambas já tratadas.
Como salienta Santos, pensar e lutar por alternativas econômicas e sociais é
particularmente urgente, tanto pelo grau de aceitação, hoje sem precedentes, da
inevitabilidade do capitalismo como opção única, quanto pelo descrédito irreversível da
alternativa sistêmica, oferecida nos séc. XIX e XX pelas economias socialistas
centralizadas (SANTOS, 2005: 24-25)
66
Segundo SANTOS, o socialismo de mercado é uma tentativa de diante da
inviabilidade do socialismo centralizado
25
, buscar relacionar o socialismo e o mercado, na
perspectiva de que a “afirmação fundamental do socialismo de mercado é que a forma
viável e adequada de perseguir os fins socialistas de solidariedade e igualdade é uma
combinação entre mecanismos de mercado e planejamento econômico na qual o mercado
tenha papel preponderante” (LE GRAND e ESTRIN apud SANTOS, 2005, 43).
De fato os empreendimentos solidários se colocam no mercado como uma forma
de se buscar fins socialistas firmados em bases de solidariedade e igualdade, entretanto
como neste mercado a presença de empreendimentos capitalistas concorrem com o
empreendimentos solidários, não podemos negar que em muitas das vezes a concorrência é
uma forma de se determinar ou não a auto-exploração, que em muitos dos casos a
concorrência é que determinará a sobrevivência do empreendimento.
CAPÍTULO – IV
A EXPERIÊNCIA DA COOPERNUT
Antes de adentra verdadeiramente na análise da pesquisa necessários se faz alguns
registros. O primeiro deles é em respeito a minha aproximação com o tema trabalhado.
Desde junho de 2004, ocupo o cargo de assessor jurídico da Agência Municipal de
Desenvolvimento AMDE, onde dentre muitas áreas de atuação existe um setor de apoio
ao associativismo e ao cooperativismo.
Na condição de advogado, me chamou a atenção a natureza em que se relacionava
cooperado e cooperativa, bem como os que contratam os serviço desta, tudo numa visão
25
Modelo adotado pela União Soviética.
67
jurídico embasada por normas de direito do trabalho. Em 2006, quando tive a oportunidade
de freqüentar na condição de aluno especial a disciplina de Sociologia do Trabalha
ministrada pelo Professor Roberto Véras, em conversa com o mesmo resolvemos
concentrar esforços para desempenhar um estudo sobre a Economia Solidária, tendo o
Cooperativismo como objeto central do estudo.
Na Paraíba bem como em todo o Brasil a Economia Solidária ainda se mostra de
forma tímida, vez que a cultura desenvolvida ao longo de nossa história se mostra contrária
a movimentos que pregam solidariedade nos meios de produção. Nossa cultura,
principalmente no campo do trabalho, se desenvolveu no seio de uma cultura puramente
capitalista.
A discussão sobre economia solidária é muito concentrada nas questões pontuais,
não sendo o tema tratado como questão de estado, nem ao menos tendo o governo do
estado política voltada as questões que envolvam diretamente a economia solidária.
Cabe aos Fóruns, Estadual e Regional de Economia Solidária, a função de atuarem
como fomentadores dos empreendimentos solidários em nosso estado no sentido de
fortalecê-los, buscando sempre a integração entre as diferentes experiências.
O Fórum Regional, que hoje agrega mais de 30 (trinta) empreendimentos
solidários, envolve não apenas o município de Campina Grande PB, mas todos que
formam o complexo da Borborema como, entre outros: Lagoa Seca, Lagoa Nova,
Fagundes, Queimadas, Lagoa de Roça, Esperança, Boa Vista. Segue a mesma organização
do Fórum Nacional e tem como seu Coordenador o senhor Hélio Pereira Bezerra, que foi
ouvido em nossa pesquisa e fez sob sua ótica, um panorama a respeito da economia
solidária em nossa região, identificando que o trabalho com economia solidária deve ser
um trabalho de formiguinha onde com o passar do tempo se buscará cada vez mais um
espaço maior, que trata-se de um trabalho cultural, ou seja tem que se buscar implantar
uma nova cultura.
De fato, do ponto de vista de empreendimentos solidários a COOPERNUT
Cooperativa de Produção de Suplementos Naturais de Campina Grande Ltda., vem se
68
destacando, sendo hoje para os que fazem parte do movimento cooperativista no município
de Campina Grande bem como no estado da Paraíba um exemplo a ser seguido e
disseminado.
É a COOPERNUT é um exemplo, porque a COOPERNUT é uma
cooperativa que hoje está em um patamar graças a deus um
patamar muito bom, tem se não me engano 30 (trinta) associados e
tem assim uma presidente que ela é uma pessoa muito esforçada,
trabalha muito que é a Avanir (entrevista de Hélio Pereira Bezerra,
coordenador do Fórum Regional de Economia Solidário, Campina
Grande – PB)
4.1 – Análise da Experiência
Como mencionado em nosso trabalho elegemos como objeto de nossa pesquisa
um empreendimento solidário situado no município de Campina Grande PB. De início a
pesquisa iria se em dois empreendimentos, entretanto diante da riqueza de informações
advindas quando do início da pesquisa realizada em um desses empreendimentos numa
reunião de orientação ficou delimitado que o estudo seria feito apenas em um
empreendimento para assim, melhor estudá-lo e fazer com que seja trazido para o trabalho
o máximo de informações possíveis, enriquecendo assim nossa pesquisa.
Para melhor estruturar e facilitar a leitura e entendimento resolvemos fazer uma
divisão no quando da análise da pesquisa sendo o primeiro ponto um breve relato
informando e demonstrando como se deu a criação da cooperativa.
De logo antes de adentrarmos propriamente dito em nossas análises reafirmamos
que o empreendimento estudado foi a COOPERNUT Cooperativa de Produção de
Suplementos Naturais de Campina Grande Ltda.
4.1.1 – COOPERNUT, como tudo começou.
Ainda no ano de 2000, em uma reunião paroquial, o pároco da Comunidade
26
,
padre Aparecido, preocupado com o alto nível de desemprego e desocupação organizou
26
Paróquia das Graças, em Campina Grande – PB.
69
uma palestra sobre cooperativismo e sugeriu aos membros das Pastorais que prestavam
serviço naquela comunidade para que se reunissem em associação ou cooperativas para
que assim pudessem, além de continuar a ajudar a comunidade ajudar a si próprios, pois, o
empreendimento iria proporcionar ocupação e renda.
E a pastoral preocupada com o desemprego chamou alguém para
uma palestra, e essa pessoa quando começou a a palestra
começou a dizer o que era uma pseudo-cooperativa que, aquilo não
dava certo e desistimulou todas as pessoas que estavam três
pessoas acharam que aquilo poderia certo e a partir daí o que
elas podem pensar em fazer, elas viram que como elas faziam a
multimistura e a multimistura elas tavam distribuindo podia ser um
meio de ganhar dinheiro. (entrevista de Vitória Victor, atualmente
técnica da UNISOL)
A COOPERNUT surgiu em uma assembléia paroquial onde foi
sugerido diante da necessidade ver tanto animador de comunidade
desempregado e faltando as reuniões, porque nem tinha como
participar nas reuniões porque geograficamente a paróquia das
graças ela é muito grande e muitas pessoas estavam deixando de
participar das reuniões porque não tinha dinheiro pra pagar os
transportes... (entrevista de Avani, fundadora e presidente da
COOPERNUT)
Pois bem, nessa assembléia paroquial marcada por uma palestra que tinha como
tema principal cooperativismo e associativismo foram convidados todas as pessoas
envolvidas nas pastorais sendo a partir daí o início da COOPERNUT.
... a COOPERNUT tem uma história bem interessante, porque esse
grupo ele nasceu, Avani ela conta muito, numa reunião que tinha
153 pessoas 03 pessoas conseguiram absorver o que foi dito
numa palestra porque uma pessoa queria formar uma
cooperativa se tivesse tudo dentro, aquela história do frango,
frango com tudo dentro. (entrevista de Vitória Victor, atualmente
técnica da UNISOL)
Na referida reunião, 03 (três) mulheres se interessaram pelo tema e viram a
possibilidade e resolveram com outras mulheres que formavam a equipe da pastoral da
criança, se reunir e tomando como base um produto que estas fabricavam, dar
continuidade ao trabalho que realizavam, agora adotando outro víeis, o de buscar
70
ocupação e renda aos que se dedicarem na fabricação da chamada “multi-mistura”
27
, este
foi o produto que uniu as senhoras.
Então agente começou na comunidade 8 (oito) pessoas e mais um
homem e uma sugestão minha “vamos fazer multi-mistura” porque
multi-mistura é uma coisa que eu sei fazer, sou capacitada e agente
tem como iniciar que temos os equipamentos da pastoral da
criança (entrevista de Avani, presidente da COOPERNUT)
Ai Avanir reuniu agente e disse gente agente ta vendo que as
reuniões ta ficando cada dia mais dispersas o que é que vocês
acham da gente tentar e investir que agente pudesse na farinha na
multi-mistura que é o que agente conhece.ai todo mundo se
empolgou (entrevista de Maria de Lourdes Santos Lima,
cooperada fundadora)
Interessante destacar é, que no início, às reuniões eram freqüentadas por pessoas
de poder aquisitivo maior, entretanto notou-se que com o passar do tempo estas pessoas
não mais freqüentaram as reuniões, restando ao grupo formado por mulheres da
comunidade, mulheres estas com características próprias que em sua maioria, não
trabalhavam e enfrentavam problemas financeiros.
Tendo em mãos a vontade de começar, com o domínio de uma técnica de
produção (multi-mistura) sete mulheres e dois homens que se reuniam no salão paroquial,
situado embaixo da igreja
28
, para fabricação da chamada multi-mistura, esta fabricada
graças a um fogão e de utensílios pertencentes a Pastoral da Criança.
... agente se encontrava na igreja do Presidente Médice, no salão da
igreja era que agente se encontrava e fazia os trabalhos das
farinhas que no início foi só as farinhas mult-mistura, (entrevista de
Maria de Fátima Barros da Silva, cooperada),
Para a realização da primeira produção necessitou comprar material que foi
comprado graças a um rateio feito entre os participantes que contribuíram com R$ 20,00
27
Farinha rica em nutrientes, composta de farelos de cereais, trigo e arroz (vitaminas do complexo B, niacina,
ferro, cálcio, zinco e fibras e outros nutrientes), pó de folhas-verdes escuras, como mandioca, pó de sementes
como gergilin, de casca de ovo. Originalmente elaborada pela Pastoral da Criança que era utilizado no
combate a desnutrição infantil.
28
Presidente Médice.
71
(vinte reais) cada membro do grupo, tendo na primeira fabricação um total de 80 (oitenta)
pacotes da farinha.
... agente se reunião as sete mulheres, que eu não digo com
certeza se eram sete se reuniu e veio a iniciativa de fazer a
multi-mistura dentro dessa multi-mistura pra a gente
começar a gente não tinha, como é que eu vou dizer, o
financeiro, a primeira verba, aí agente foi conseguiu R$ 20,00
cada uma e compramos a matéria prima pra fazer a
multimistura, vendemos na comunidade, só na
comunidade, lá no Médici, agente começou a adquirir mais
dinheiro com a venda e comprou equipamento e
botamos os equipamentos, passamos dois ou três meses sem
receber nenhum centavo, pra investir, agente trabalhava e
não recebia sem remuneração. (entrevista de Maria Elizete de
Oliveira, cooperada fundadora)
... algumas pessoas eu mesmo ganhei 20 reais da minha mãezinha
teve gente que entrou com a cara e a coragem (entrevista de Maria
de Lourdes Santos Lima, cooperada fundadora)
De início a farinha era distribuída nos mercadinhos e mercearias da comunidade,
com o passar do tempo, com a ampliação das vendas e a necessidade de se adentrar em
outros mercados, necessário se fez a organização de uma associação ou cooperativa, bem
como a procura de um espaço maior para fabricação da farinha.
Embalagem utiliza no início da cooperativa Embalagem atual
72
trabalhando em forma coletiva, a iniciativa das senhoras chamou a atenção da
imprensa que em 2001 noticiou a existência de uma Cooperativa formada por 09 pessoas
que estava realizando serviços e demonstrava a viabilidade do empreendimento, note-se
que aquela notícia continha uma falha pois a época ainda não se tratava de cooperativa, o
que levou ao questionamento dos responsáveis pelo movimento cooperativista na Paraíba,
que inclusive ameaçou de ingressar com ação judicial por utilização indevida do termo
cooperativa, fazendo com as mulheres buscassem se organizar como grupo e foi essa a
primeira forma de organização, em um grupo, que recebeu o nome de “grupo de
mulheres”.
... do grupo que agente chamava do grupo de mulheres, tinha um
homem, mas agente chamava de o grupo das mulheres. Porque
agente começou de chamar do grupo de mulheres? Porque saiu
uma nota agente tem isso no nosso material, colocar pra vocês vê,
isso tem datas, nossa caminhada estava bonita, agente tinha
um certo equipamento uma padronagem, quando a imprensa soube
de que (eu vou olhar especificamente a data pra te dizer:
11/02/2001) saiu na imprensa a matéria “COOPERATIVA GERA
EMPREGO E COMBATE A DESNUTRIÇÃO”, pessoas ligadas a
cooperativa, na época eu estava operada, e pessoas ligadas a
cooperativas, eu lembro muito bem o nome da pessoa foi o senhor
Raimundo ligou pra mim e disse “ vou processar vocês” e eu disse
“porque?” e ele disse “vocês não sabem que cooperativa é acima de
20 pessoas, se vocês tem 9 pessoas numa comunidade fazendo um
trabalho, porque é que vocês tão dizendo que é uma cooperativa?
Eu vou processar vocês” muito intransigente, muito ignorante.
Então eu cheguei na comunidade, o pessoal foi em casa porque
eu mandei chamar o povo, estressada e com medo, e disse “ gente é
o seguinte, agente vai mudar, qual é o nome que vai botar?” agente
resolveu colocar o nome GRUPO DE MULHERES (entrevista de
Avani, presidente da COOPERNUT)
Diante da necessidade pujante de se organizar formalmente e juridicamente,
aquele “grupo de mulheres” resolveu buscar ajuda do setor público, e assim foram à
prefeitura municipal, então governada pelo Partido dos Trabalhadores PT, na pessoa da
Senhora Cozete Barbosa que após ouvir o grupo o encaminhou até a Agencia Municipal de
Desenvolvimento – AMDE.
... quando agente chegou contou a ela a história ai ela se
encantou que era Cozete ficou feliz da vida deu os parabéns porque
geralmente as pessoas vai quer algo mas não sabe em que no sabe o
que quer fazer ai agente ia com algo pronto fazendo ela s[ó nós
ajudar ai ela foi mandou agente pra AMDE pra AMDE poder
73
indicar como agente poderia fazer. (entrevista de Maria de
Lourdes, cooperada)
Pesquisador a idéia de se reunir como cooperativa, de quem
surgiu?
... dum grupo de mulheres, agente não tinha mais espaço na
igreja, agente tava ocupando o espaço, como era um espaço que
tinha na igreja, no salão, e esse salão era pra todas as pastorais
agente como pastoral da criança fazendo nosso trabalho tava
tomando o espaço das outras pastorais e agente na necessidade
através duma, é primeiro, foi a reunião indicaram agente pra ir na
AMDE, foi de agente queria conversar com a prefeita que na
época era Cozete, ai foi onde teve a idéia de na AMDE que
tinha o pessoal da AMDE que iria assessoria e foi onde
começou o trabalho de cooperativa. (entrevista de Maria de Fátima
Barros da Silva)
Na AMDE, o “grupo de mulheres” foi encaminhado ao recém criado setor de
apoio ao associativismo e cooperativismo, tendo na pessoa de Vitória Vítor, a técnica
responsável, que as orientou e depois de cursos de capacitação sobre cooperativismo, e
muitas reuniões na comunidade, no dia 06 de dezembro de 2002, às 18:30 horas, no Clube
de Mães Nossa Senhora Rosa Mística, no bairro do Presidente Médice, foi realizado a
Assembléia Geral de Constituição da COOPERNUT Cooperativa de Produção de
Suplementos Naturais de Campina Grande Ltda..
Necessário destacar que analisando os arquivos da AMDE, verifica-se que não foi
a COOPERNUT assessorada pela autarquia municipal, verifica-se que quando ainda era
técnica da agência municipal, Vitória Victor informou que a AMDE apoiou mais de 10
(dez) empreendimentos inseridos no campo da economia solidária, sendo que muito devido
a questão cultural estes não conseguiram se desenvolver.
... dentro da AMDE, agente começou em 99, acabamos
implantando um setor de cooperativismo e associativismo, onde na
época agente trabalhou no apoio e constituição de 12 cooperativas
e 02 associações , isso eu ainda tenho muito claro, algumas
cooperativa fecharam as portas né, o pessoal por falta de apoio a
questão educacional, nós temos problemas culturais muito fortes,
inclusive em relação as cooperativas de trabalho com certeza elas
não dá para avançar muito. (entrevista de Vitória Victor)
4.1.2 – A construção de uma cultura cooperativista e a conquista da sede.
74
Após a constituição da Cooperativa, com a aprovação do seu estatuto social bem
como da eleição de sua diretoria e conselho fiscal, verificou-se que agora organizados,
outros desafios estavam à porta.
O primeiro deles, de cunho cultural, que o cooperativismo não era uma prática
muito usual na Paraíba, ,explicar aos cooperados que a relação que os unia não era uma
relação empregatícia mas sim uma relação de trabalho,marcada não pelo vínculo
caracterizado pela assinatura da Carteira de Trabalho mas sim pelo vínculo da
solidariedade onde todos eram responsáveis pelo empreendimento.
A tarefa de explicar tais diferenças advindas do cooperativismo foi num primeiro
momento da técnica em cooperativismo da AMDE Vitória Victor, hoje, percebesse
claramente, que é desenvolvida por todas as cooperadas.
Pesquisador alguém explicou a vocês o que seria uma
cooperativa como se constitui uma cooperativa?
Entrevistada explicou, Vitória ela é quem dava assessoria, foi
quem deu toda assessoria sobre cooperativa pra nós.
Pesquisador – então vocês fizeram um curso sobre cooperativismo?
Entrevistada fez, sempre tinha, e todas as reuniões ela sempre
falando em cooperativa porque agente não sabia nada do que era
cooperativa. (entrevista de Maria de Fátima Barros da Silva)
O empreendimento começou a crescer, as vendas aumentaram, agora (a partir de
2002), a COOPERNUT existia enquanto cooperativa, tinha CNPJ. O salão paroquial
onde a cooperativa inicialmente se reunia ficou pequeno e o cheiro proveniente da
produção das farinhas começou a encomendar as outras equipes, com isso, como não
poderia deixar de ser, a obtenção de um lugar para que elas se reunissem era o principal
objetivo: a COOPERNUT precisava de uma sede.
Em um primeiro instante, as cooperadas requereram da prefeitura a doação de um
terreno localizado em frente da igreja das Graças. A então prefeita Cozete, sugeriu, junto
com a diretoria da AMDE a utilização de um galpão da CINEP
29
, que graças a boa relação
política entre a prefeitura municipal de Campina Grande PB e o governo do estado da
29
Companhia de Desenvolvimento da Paraíba.
75
Paraíba, tudo foi organizado e o galpão situado no lote 19 e 20, da Quadra 03, à Av.
Juscelino Kubistchek, s/n, Distrito Industrial do Velame, Campina Grande – PB, foi cedido
em regime de COMODATO
30
, bem como a reforma do imóvel, tentando adequá-lo as
necessidades da cooperativa.
Sede da COOPERNUT (VISÃO DA FRENTE)
Sede da COOPERNUT (VISÃO DOS FUNDOS)
... vamos nós atrás disso e como sai da igreja também sabe ai
atrás de Vitória junto com a CINEP indicaram esses galpões que
agente passou um bom tempo pra receber uns 2 (dois) ou 3 (três)
anos pra receber nós estamos aqui como COMODATA que a cada
5 anos se renova que agente vai compra em nome do Senhor
(entrevista de Maria de Lourdes dos Santos Lima)
Hoje esta sede foi ampliada sendo cedido outro galpão onde foi reformado e
transformado em um salão onde a Cooperativa realiza eventos e encontros.
30
É o empréstimo gratuito de coisas não fungíveis, que se perfaz com a tradição do objeto. Esse contrato, real
e unilateral, determina que as coisas sejam devolvidas em espécie aoós o devido uso e no prazo
convencionado. (GUIMARÃES, Deocleciano Torrieri. Dicionário Técnico Jurídico. São Paulo: Reideel.
2004.
76
SALÃO DE FESTA COOPERNUT
4.1.3 - A organização interna e os mecanismos de decisão.
Verifica-se que desde o início o ainda “grupo de mulheres” preocupou-se com a
sua organização interna, e, principalmente tentavam deixar claro através de normas
singelas esclarecer situações do dia-a-dia, como problemas de saúde e faltas justificadas,
tanto é assim que mesmo antes de formarem a cooperativa propriamente dita tinham um
“ESTATUTO DO GRUPO DE MULHERES”, este singelo documento era composto por
seis artigos que tentavam organizar o grupo que iniciava-se.
Com o passar do tempo, até com a necessidade imposta pela legislação vigente,
enquanto cooperativa, foi elaborado um estatuto social, onde além de melhor elaborado
dispunha de toda estrutura organizacional do empreendimento, bem como seus objetivos e
a forma como serão tomadas as decisões.
No art. do estatuto social da COOPERNUT encontra-se o objetivo social do
empreendimento solidário recém constituído. Neste dispositivo, destacadamente em seu
parágrafo primeiro, veio a necessidade de se integrar ao estatuto os princípios
cooperativos, que ficaram dispostos da seguinte forma:
Art. - A cooperativa, baseada nos princípio e valores do
cooperativismo, tem por objeto a solução de problemas
econômicos e sociais de seus membros, buscando proporcionar-
lhes condições técnicas e financeiras para o exercício de suas
77
profissões, tendo sempre em vista o seu aperfeiçoamento, o
incremento de suas rendas e à melhoria de suas condições de vida.
Parágrafo primeiro: São princípios do Cooperativismo, que passam
a integrar o presente estatuto como normas de conduta para seu
funcionamento:
a) Adesão Voluntária e Livre A cooperativa é uma
instituição aberta a quantos estejam capacitados civil e
profissionalmente a utilizar os seus serviços e se comprometem a
cumprir as suas obrigações como sócio, sem discriminação de
sexo, social, racial, política ou religiosa;
b) Gestão Democrática A cooperativa é uma instituição
administrada e monitorada pelo seu próprio quadro social, que deve
participar de forma efetiva na fixação de suas diretrizes e tomadas
de decisão, homens e mulheres que podem ser eleitos para os
órgãos sociais, cada um tendo direito a apenas um voto;
c) Participação Econômica do Sócio Os sócios devem
participar, de forma eqüitativa, na formação do capital social, como
uma das condições para seu ingresso na Entidade, com direito a
uma remuneração módica, quando possível, sobre a parte
integralizada, destinando os excedentes ou sobras para o
desenvolvimento e estabilidade econômica-financeira da
cooperativa, retorno aos cooperados proporcional às operações que
cada um realizar com a cooperativa e apoio a outras atividades ou
projetos que forem aprovados pela Assembléia Geral;
d) Autonomia e Independência A cooperativa é uma
instituição autônoma e independente, administrada e monitorada
pelo seu próprio quadro social. Mesmo no caso de parcerias ou
assinaturas de acordos com outras instituições, inclusive o
Governo, ou levantamento de capitais de fontes externas, a
cooperativa deve fazê-lo de forma a preservar a sua gestão
democrática e a manutenção de sua autonomia;
e) Educação, Capacitação e Divulgação É
responsabilidade da cooperativa promover a educação e
capacitação dos dirigentes, associados e funcionários, de maneira
que eles possam contribuir, de forma efetiva, para o seu
crescimento, modernização e desenvolvimento, assim como
divulgar para a comunidade especialmente os jovens e os líderes
formadores de opinião, a natureza e os benefícios da mesma;
f) Cooperação Intercooperativa Para que a cooperativa
se torne mais efetiva na prestação de serviços aos seus cooperados
e contribua para o fortalecimento do sistema, deve ela integrar-se
social e economicamente, às outras da mesma categoria ou de
categorias diferentes, nos níveis local, regional, nacional e
internacional.
g) Interesse pela Comunidade Além do seu papel natural
de dar ênfase ao trabalho em busca de soluções para os problemas e
aspirações de seu quadro social, é também dever da cooperativa
preocupar-se com o desenvolvimento sustentável da comunidade
em que está inserida.
78
É através destes princípios que, somado com os dados alcançados na pesquisa que
poderemos no momento oportuno analisar se a COOPERNUT se enquadra ou não nos
moldes de um empreendimento verdadeiramente solidário, numa cooperativa verdadeira ou
em mais uma forma de precarização do trabalho.
A administração da cooperativa se dará através de órgãos distintos que segundo o
art. 22 do Estatuto Social serão: Assembléia Geral, Conselho de Administração e o
Conselho Fiscal.
A assembléia geral, é o órgão superior da cooperativa, formada por todos os
cooperados que como o próprio nome sugere em assembléia, tomarão decisões de interesse
da entidade que atingirá a todos os associados, mesmo se ausentes, a reunião que poderá se
dar de forma ordinária onde deverá ocorrer ao menos uma vez por ano sempre no decorrer
dos três primeiros meses após o exercício social; ou de forma extraordinária que poderá se
reunir a qualquer tempo, sempre mediante convocação editalícia para discutir sobre
qualquer assunto de interesse da cooperativa.
Assembléia geral realizada em fevereiro de 2010
79
A Assembléia Geral poderá ser convocada pelo Presidente, que também tem o
dever de dirigi-la, mas também poderá ser convocada pelo Conselho Fiscal ou por
solicitação de 1/5 (um quinto) dos membros da cooperativa. É na Assembléia Geral que
poderão ser tomadas decisões como a destituição de membros do Conselho Administrativo
ou Fiscal ou de outros Órgãos Estatutários.
O Conselho de Administração é o órgão superior, responsável pela administração
do empreendimento, ficando responsável por todo e qualquer assunto de ordem econômica
e social, de interesse da cooperativa ou de seus cooperados, sendo o mesmo composto por
05 (cinco) membros, todos eles em pleno gozo de seus direito enquanto cooperados, que
ocuparão os cargos de Diretor Presidente, Diretor Administrativo-Financeiro, Diretor de
Produção e Marketing e ficando os outros dois na condição de Conselheiros, este Conselho
terá mandato de 03 (três) anos, sendo obrigatoriamente renovado em 1/3 (um terço) a cada
início de mandato.
O Conselho Fiscal, será constituído por 06 (seis) membros sendo, 03 (três)
titulares e 03 (três) suplentes, com mandato de 01 (hum) ano permitida a reeleição para o
período imediatamente posterior de apenas 1/3 de seus membros, ou seja no Conselho
Fiscal a renovação será de 2/3, para cada mandato.
Cabe ao Conselho Fiscal exercer assídua fiscalização sobre as operações,
atividades e serviços da cooperativa. Segundo o art. 61 do Estatuto Social cabe ao
Conselho Fiscal as seguintes atribuições:
a) Conferir mensalmente o saldo do numerário existente em caixa,
verificando também se o mesmo está dentro dos limites
estabelecidos pelo Conselho Administrativo.
b) Verificar se os extratos de contas bancárias conferem com a
escrituração da cooperativa.
c) Examinar se os montantes das despesas e inversões realizadas
estão de conformidade com os planos e decisões do Conselho de
Administração.
d) Verificar se as operações realizadas estão correspondendo, em
volume, qualidade e valor, às previsões feitas e às conveniências
econômico-financeiras da cooperativa.
e) Certificar-se se o Conselho de Administração vem se reunindo
regularmente e se existem cargos vagos na sua composição.
80
f) Averiguar se existem reclamações dos associados quento aos
serviços prestados.
g) Inteirar-se se o recebimento dos créditos é feito com
regularidade e se os compromissos são atendidos com
pontualidade.
h) Averiguar se existem problemas com empregados.
i) Certificar se existem exigências ou deveres a cumprir junto as
autoridades fiscais, trabalhistas ou administrativas, bem assim
quanto aos órgãos do cooperativismo.
j) Averiguar se os estoques de produtos ou mercadorias estão em
boa guarda e se as suas quantidades e valores registrados estão
corretos, bem como se os inventários periódicos ou anuais são
feitos com a observação de regras próprias.
l) Estudar os balancetes e outros demonstrativos mensais, o balanço
anual e relatório do Conselho Administrativo, emitindo parecer
sobre estes para a Assembléia Geral.
m) Informar ao Conselho de Administração sobre as conclusões
dos seus trabalhos, denunciando a este, à Assembléia Geral ou
autoridades competentes, as irregularidades constatadas e convocar
a Assembléia Geral, se ocorrem motivos
Visto como se a organização da cooperativa, percebe-se que as atribuições são
bem definidas, entretanto verificou-se no quando da pesquisa que somente as decisões do
dia-a-dia são tomadas sem a necessidade de conhecimento das demais cooperadas,
conhecimento no sentido de deliberação, entretanto todas as demais decisões são tomadas
por todas as cooperadas que se reúnem com freqüência, mesmo sem previsão estatutária.
Entrevistada é dentro do grupo, tudo sempre do grupo, até hoje é
decidido assim sempre no grupo.
Pesquisador você disse: até hoje, então quer dizer que toda
decisão é tomada na diretoria ou no grupo e a diretoria faz
representar a voz de vocês.
Entrevistada tem coisas que precisam ser o grupo e tem coisas
que a diretoria mesmo pode decidir, agora tem coisas que chama o
grupo e conversa.
Pesquisador você poderia dar algum exemplo pra todo de uma
decisão?
Entrevistada por exemplo, vamos supor que as meninas querem
fazer alguma coisa a mais, maior dentro da cooperativa elas
não podem fazer, elas chamam o grupo, o grupo conversa e o
grupo decide com elas se é necessário mesmo fazer o que elas estão
pensando, uma compra grande, uma reforma, coisas grandes, agora
coisas pequenas elas decidem.
(entrevista de Maria de Fátima Barros, cooperada)
81
Toda decisão é tomada de forma coletiva, onde todos os cooperados participam.
Na Assembléia Geral, formalmente constituída, tudo conforme determinação estatutária, as
cooperadas se reúnem com o sentimento de satisfação claramente expresso nos atos e na
alegaria de se fazerem presentes, fica claro o sentimento de estarem se reunindo para
decidirem o futuro de um empreendimento que é de todos que ali estão.
A participação na última Assembléia que contou com quase a totalidade dos
membros do empreendimento, se destacou com a participação efetiva dos associados nas
discussões.
4.1.4 – A remuneração dos cooperados
Assim como tudo que é decidido de forma democrática, a discussão em relação a
remuneração dos cooperadas também se deu democraticamente.
A mesma se por meio de hora-trabalhada, valorizando segundo os cooperados
àqueles que mais trabalham em detrimento aos que menos trabalham.
Pesquisador em relação a remuneração de vocês, quando vocês
formaram a remuneração vocês foram informados se iriam receber
salários, se iriam receber, como iriam receber, como seria esse
pagamento?
Entrevistada no início agente dividia tudo, não sabia como era a
cooperativa era tudo dividido, comprava tudo, pagava tudo o resto
dividia com as pessoas que estavam trabalhando, depois, antes
mesmo da cooperativa agente tinha bolado um jeito de todo
mundo trabalhar e todo mundo ganhar por igual, agente fez horas
trabalhada pra todo mundo, isso foi o grupo desde o início, fizemos
trabalhado, se hoje todo mundo trabalhava era hora trabalhada se
amanhã faltava todo mundo, faltava uma pessoa ninguém seria
diferente porque pagava horas trabalhadas.
Pesquisador o pagamento seria em cima das horas trabalhadas, o
cooperado ganharia as horas que trabalhava?
Entrevistada isso mesmo se trabalhasse 100 horas ganharia por
100 horas trabalhadas, se também fosse cinquenta, ganhava por
cinqüenta, todo mundo a mesma coisa, se uma pessoa trabalhasse
300 horas recebia 300 horas e se outra trabalhasse 50 recebia 50
horas.
Pesquisador – tem limite de hora?
82
Entrevistada não, porque nós trabalhamos eventos e quem
trabalha eventos não tem limite de horas.
(Maria de Fátima Barros Silva, cooperada)
Segue ainda outra cooperada:
Pesquisador: e em relação a remuneração que vocês recebem aqui,
a senhora sabe como se dá, de que forma?
Entrevistada a gente recebe assim, através de horas trabalhadas,
se eu trabalhar mais e ganho mais, se eu trabalhar menos eu ganho
menos, como sempre eu trabalho menos ganho menos, e assim vai,
aí sempre quem trabalha mais ganha um dinheirinho bom.
......
Pesquisador: então a senhora poderia dizer que recebe melhor, a
senhora recebe menos que um salário mínimo aqui?
Entrevistada: recebo, tem mês que recebo, tem mês que eu trabalho
menos, como eu lhe disse sou mais preguiçosinha e recebo
menos.
(entrevista de Helena Costa de Macedo, cooperada COOPERNUT)
Interessante destacar a forma espontânea como o tema foi tratado na cooperativa,
sempre deixando claro a forma democrática para se decidir como seria a remuneração. A
diretoria que tem horário de trabalho integral tem uma remuneração diferenciada, sendo
remunerada não por horas trabalhadas mas por remuneração fixa.
Pesquisador Em termo de remuneração como se a
remuneração ?
Entrevistada É assim a diretoria tem um salário fixo a presidente
ganha 2,5 (dois e meio) salários os outros diretores 1,5 (hum e
meio) salário o conselheiro fiscal tinha uma porcentagem mais
agente conhece o sistema da cooperativa ai agente abre mão disso e
o cooperado é por horas trabalhadas o valor da hora agora no final
do ano passado agente deu uma diferenciada quem trabalha
torrando as farinha porque ta quente no fogo mas porque são
homens são ágeis desenvolve mais do que agente agente deu uma
subidinha mais na hora deles e o restante fica com o valor normal
que por sinal agora quem ta na manipulação R$: 4,36 a hora e o
restante a R$: 2,89 a hora quando é um evento o dia sai a R$:20,00
reais quando agente contrata um garçom ou até mesmo eu to
dirigindo ou lavando roupas e se eu for pro evento ganho também
R$:20,00 se for a noite é R$:30,00.
(entrevista de Maria de Lourdes, cooperada)
83
4.1.5 – COOPERNUT, parcerias.
De um grupo de mulheres a uma cooperativa, hoje a COOPERNUT segundo sua
presidente a senhora Avani de Araújo Pereira, ajuda de forma direta ou indireta mais de
500 (quinhentas) pessoas, esse número se levar em consideração as famílias dos
cooperados e as pessoas que são parceiros como os que fazem a Agricultura Familiar,
que todos os produtos de origem agrícula são adquiridos junto aos chamados produtores
familiares.
de se notar que a falta de incentivo por parte do órgãos públicos com políticas
voltadas diretamente para a economia solidária foi um problemas destacadamente
mencionado pelos entrevistados.
Pesquisador - Com relação a participação do setor Público,
Prefeitura, Governo do Estado, Governo Federal. Existe essa
participação dentro da economia solidaria pelo menos no município
de Campina Grande e nos outros municípios que abrangem o fórum
regional?
Entrevistado - Olhe veja bem, agente tem uma certa dificuldade do
nosso município né, mas é uma dificuldade que agente tem ajuda se
falar que num tem agente ta mentindo né, porque a prefeitura
através da AMDE agente tem os apoios em algumas feiras tem
algumas parcerias, o governo do Estado agente não tem muita
parceria com o governo do estado, o governo federal agente tem
que ele é o nosso grande parceiro porque existe a Secretaria
Nacional de Economia Solidaria que foi criada no governo Lula,
esse nosso criador mentor da economia solidaria que é o professor
Paul Singer e também a questão do incentivo maior na economia
solidaria do governo federal é a questão das feiras porque as feiras
são através de que nós nos fóruns fazemos os projetos, elaboramos
os projetos, mandamos é aprovado e agente recebe os recursos
através de nossos fiscais depois que a feira é realizada e são pagos
todos a questão de alimentação hospedagem as vezes transporte e
locação de matérias para a realização da feira. (entrevista
concedida pelo senhor Hélio Pereira Bezerra, Coordenador do
Fórum Regional de Economia Solidária)
Mesmo assim a COOPERNUT apresentam alguns parceiros que as cooperadas
sempre fazem questão de destacar, sejam do setor produtivo, do setor público ou do setor
privado, parcerias estas como as seguintes:
84
AMDE a Agência Municipal de Desenvolvimento, autarquia municipal que tem
como objetivo o de fomentar a economia no município, foi a primeira parcira da
COOPERNUT, foi a AMDE que coube o papel de buscar organizar o “grupo de
mulheres” e, através do setor de apoio ao Associativismo e Cooperativismo é que
desenvolveu atividades de assessoramento e capacitação, que possibilitaram a criação da
cooperativa, bem como a sua organização.
CINEP a Companhia de Desenvolvimento da Paraíba, sociedade de economia
mista, sendo o governo do Estado da Paraíba seu principal acionista e assim controlador,
foi acionado por meio da AMDE e firmou parceria no sentido de ceder a COOPERNUT,
um de seus galpões e além disso estruturá-lo para que ali se estabelecesse a sede da
cooperativa. Em 2009, outro fruto dessa parceria foi a cessão também por comodato de um
outro galpão para que sirva de espaço reservado a realização eventos, este espaço também
foi estruturado tudo a cargo da CINEP, que reformou o espaço e o entregou a cooperativa.
FUNDAÇÃO BANCO DO BRASIL a cooperativa foi beneficiada com
empréstimo junto ao programa DRS Desenvolvimento Regional Sustentável, obtendo
assim um veículo tipo VAN, bem como as cadeiras e mesas que equipam o salão de
eventos e o freezer, tudo a custo zero e a fundo perdido.
e também tivemos o Banco do Brasil, fizemos um projeto né, esse
do carro, agente ganhou o carro com projeto do Banco do Brasil,
tem, uma van, por causa do projeto.
(Maria de Fátima, cooperada)
85
VAN DA COOPERNUT, CONSEGUIDAS JUNTO A
FUNDAÇÃO BANCO DO BRASIL
CADEIRAS CONSEGUIDAS NO PROGRAMA DA
FUNDAÇÃO BANCO DO BRASIL
EMBRAPA a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária, situada em
Campina Grande PB, também desenvolve projetos de parcerias com a COOPERNUT. É
através da EMBRAPA que a cooperativa adquire alguns de suas matérias primas como
gergelim e, foi através da EMBRAPA que a cooperativa contatou os que fazem a
Agricultura Familiar. Além disso, desenvolve com a empresa pública um contrato de
prestação de serviços, onde tem como objeto o fornecimento de um café da manhã, para os
funcionários da EMBRAPA, contrato este firmado desde 2008.
SEBRAE – é este talvez o parceiro mais presente na cooperativa, além de cliente e
contratante dos serviços de bufê, cabe ao SEBRAE a elaboração de cursos de capacitação,
como o de boas práticas, o de manipulação de alimentos, o de vendas e o de gestão, além
de ser também o SEBRAE o responsável pela confecção e elaboração do plano de negócio
e no estudo de viabilidade econômica, que encontra-se em desenvolvimento.
UNISOL BRASIL como a AMDE não desenvolve mais o assessoramento ao
empreendimento solidário, cabe a UNISOL este papel, desempenhado aqui na cidade pela
técnica em cooperativa Vitória Victor. É a UNISOL que presta assessoramento ao
empreendimento, bem como também atua na área de capacitação e na busca para criar
prática interativas entre esta e outras cooperativas.
86
OCB a Organização das Cooperativas Brasileiras, hoje não apresenta nenhuma
parceria com a COOPERNUT, entretanto foi a primeira a realizar para as cooperadas o
curso de cooperativismo e associativismo, articulado pela AMDE através de Vitória, hoje
técnica da UNISOL.
UEPB a Universidade Estadual da Paraíba, vem desenvolvendo uma parceria
com a cooperativa no sentido de se buscar a atualização das tabelas nutritivas dos produtos
produzidos pela COOPERNUT. Esta parceria também envolve a UFPB, que a análie
está se dando no laboratório de Nutrição daquela Instituição de Ensino Superior na cidade
de João Pessoa.
FÓRUNS DE ECONOMIA SOLIDÁRIA não se trata de uma parceria, mas
necessário se faz um breve comentário, a COOPERNUT faz parte do fórum regional e do
fórum estadual de economia solidária tendo como representante a cooperada Maria de
Lourdes Santos Lima, que em seu depoimento, informou que participou a encontros
promovidos pelo fórum regional e a COOPERNUT participou de uma feira, destacando
ela, entre outras cooperadas que economia solidária elas fazem na prática.
Eu fui a 2 fóruns no ano passado a uma feira também ouve algumas
vendas o fórum eu gostei muito porque a economia solidária agente
sente na pele eu vivo ela porque do inicio era preciso ter economia
e agente se solidarizava com as outras pessoas. (Maria de Lourdes,
Cooperada)
PASTORAL DA CRIANÇA foi aí, onde tudo começou, e segundo as
cooperativas como Maria de Lourdes Santos Lima e a própria Avani, esta é uma parceria
que nunca irá acabar, pois é a COOPERNUT, que fornece toda a multi-mistura utilizada
pela pastoral, além de uma vez por mês, realizar um sopão para as pessoas atendidas pela
pastoral na comunidade Santíssimo Salvador, no bairro do Presidente Médice.
De fato, a ligação entre a COOPERNUT e a Pastoral da Criança é muito forte,
tanto é assim que as cooperadas fazem questão de ressaltá-la, sempre com depoimento
emocionados e recheados de experiências pessoais com a referida equipe pastoral, vejamos
um desses depoimentos:
87
Pesquisador Você diz que a cooperativa começou no grupo de
mulheres na pastoral, hoje vocês ainda tem ligação com a pastoral
da criança?
Entrevistada Nunca agente vai deixar de dizer que se não fosse a
pastoral da criança não existira COOPERNUT, porque a pastoral
da criança pra gente é tão importante que hoje agente doa multi-
mistura pra 5 comunidades da pastoral da criança, sendo que no
Médici e no Jardim Borborema agente da toda a multi-mistura pra
cada um acompanhando, a pastoral da criança pra mim Avaní, eu
passei 17 anos na pastoral da criança. Porque o pessoal
acompanhado pela pastoral da criança principalmente os
desnutridos, foi ai que minha pessoa Avaní eu vim pra pastoral da
criança porque a minha filha era desnutrida minha filha era uma
criança muito magra e eu era aquela super mãe e tinha muito medo
de perdê-la, ela é minha filha única, eu não podia ter outro filho,
então eu vim pra pastoral da criança e quando eu vejo uma criança
desnutrida isso me sensibiliza mais uma vez, então hoje nosso
compromisso como cooperativa é alem das comunidades que tem
pastoral da criança agente envia pra: Bairro das Cidades,
Catigueira, Jardim Borborema, Presidente Médici, essas
comunidades agente doa a multi-mistura pra todos os desnutridos
acompanhados pela pastoral da criança, alem disso na comunidade
do Jardim Borborema agente doa a multi-mistura pra todos os
desnutridos do PSF, acompanhados pelo posto de saúde, não pra
eles, também tem um grupo de pessoas portadoras do vírus HIV e
agente também doa pra eles. Pra gente é uma grande virtude, um
grande privilegio, é muito bom você poder ajudar, contribuir. No
Jardim Borborema agente doa a sopa da comunidade, o lanche, a
festa do dia das crianças, agente da o bolo do dia das crianças mais
o suco, balinha, tem também o trabalho com igreja evangélica
que ta fazendo o trabalho bem bonito com crianças, hoje agente
tem uma associada que cuida das crianças, da aulinha e ela é quem
trás pra gente assim a realidade, então multi-mistura agente não
doa, mas agente já doa lanches, não é uma coisa assídua, não é todo
mês, mas dia da criança, Natal, agente da essa contribuição
também, agente trabalha esse lado social isso é uma meta e vai está
sempre dentro do nosso contrato, isso vai ter que ser registrado é
uma obrigação da COOPERNUT
(entrevista de Avani, presidente da COOPERNUT)
4.1.6 Participação da COOPERNUT no Fórum de Economia Solidária e a relação
com outros empreendimentos solidários.
Como destacado a COOPERNUT é tida como exemplo a ser seguido para as
pessoas envolvidas com a temática da Economia Solidária. Entretanto necessário se faz
destacar que a Economia Solidária ainda é um tema mal trabalhado pelo menos do ponto
88
de vista teórico, cursos sobre o tema se faz necessário, pelo menos é o que ficou claro nas
visitas realizadas no empreendimento e nas entrevistas dadas pelas cooperadas.
Pesquisador sobre economia solidária, você sabe o que vem a ser
o empreendimento de economia solidário, foi feito cursos e sobre o
tema para vocês?
Entrevistada – aqui dentro mesmo, não estou lembrada não.
(entrevista de Josélia Luna de Almeida, cooperada)
Interessante relato foi dado pela senhora Mari de Lourdes (Maúde) também
cooperada ao informar da participação da cooperativa no Fórum de Economia Solidária:
Pesquisador E o fórum de Economia solidária a coopernut
participa?
Entrevistada Eu fui a 2 fóruns no ano passado a uma feira
também houve algumas vendas, o fórum eu gostei muito porque a
economia solidária agente sente na pele eu vivo ela porque do
inicio era preciso ter economia e agente se solidarizava com as
outras pessoas. (grifo nosso)
A alegria como é relatado a estória do empreendimento fica claro no olhar, no
jeito de falar de cada cooperada ouvida, principalmente quando falam da função que
assumem como incentivadoras do cooperativismo citando o exemplo da COOPERNUT
como exemplo viável.
Pesquisador Vocês fazem reuniões com outras cooperativas para
discutir o cooperativismo em Campina Grande?
Entrevistada Sim. Geralmente pra dar depoimentos, contar
história da COOPERNUT como iniciativa apoiar os que tão
começando.
(entrevista de Maria de Lourdes Santos Lima, cooperada)
Sempre são proporcionado encontros entre empreendimento, seja organizados
pelo Fórum como também pela UNISOL.
Pesquisador voltando um pouquinho: ECONOMIA
SOLIDÁRIA, como trabalhar economia solidária nesse grupo, na
COOPERNUT em especial, mas qual o papel da UNISOL no
trabalho da expansão da idéia da economia solidária?
Entrevistada esse papel da UNISOL é muito importante, de
trabalhar a auto-gestão politicamente de eles se fortalecerem
politicamente dentro do grupo eles começarem a entender que
89
sozinhos não conseguem avançar e não olhar pra dentro do
empreendimento, mas olhar pra outros empreendimentos que
também possam ta fazendo a inter-cooperação e levando as pessoas
a conhecerem a prática de economia solidária.
Pesquisador no município de Campina existe esse trabalho de
interação de cooperativas?
Entrevistada todos os empreendimentos filiados a UNISOL, nós
temos uma reunião por mês onde representante e alguns
cooperados se reúnem vindo de quase toda Paraíba, vem uma vez
por mês eles se reúnem e eles fazem esse intercambio, de discutir
entre eles como eles podem se fortalecer, então não é uma prática
assim, não é uma questão nossa assim de dizer agente vai fazer
essa atividade tudo é discutido com eles.
(entrevista de Vitória Victor, técnica da UNISOL)
Também participam das plenárias realizadas pelo Fórum.
Pesquisador - E em relação a plenária da regional, qual é a
freqüência de reunião de vocês?
Entrevistado - olha, nossa freqüência ela é em média entre 28 e 30
participantes, porque é assim, é uma forma meio complicada
porque agente não pode trazer todos os associados do
empreendimentos porque é uma manhã de trabalho, uma manhã de
mão de obra que eles perdem e quando eles estão na produção
raramente eles querem sair da produção, um é porque se ganha eles
ganham através do trabalho né, quando se trabalha se ganha.
Pesquisador – a COOPERNUT participa ativamente do fórum?
Entrevistado ela tem uma participação é, assim, ela teve um
tempo que ela afastou um pouco, mas hoje ela tem uma
participação mais ativa.
Pesquisador – e as reuniões se dão toda semana mensalmente?
Entrevistado – mensalmente, toda segunda terça feira de cada mês.
(entrevista de Hélio, coordenador do Fórum Regional de Economia
Solidária)
4.2 – Questões para reflexão
Diante dessa breve exposição a respeito do objeto de pesquisa aqui tratado alguns
pontos me chamaram a atenção e necessitam uma reflexão mais atenta.
90
Desde a sua criação enquanto cooperativa verifica-se que esta tem como sua
presidente a mesma pessoa, nada de ilegalidade já que o estatuto social do empreendimento
exige ao término de cada mandato a renovação de, no mínimo, 1/3 (um terço) de seus
componentes (art. 47, Estatuto Social), mas não veda a recondução ao cargo de uma
mesma pessoa.
Mesmo ficando claro a participação de todas as cooperadas nas decisões tomadas
na cooperativa, verifica-se que a opinião de sua presidente tem um peso decisivo frente às
demais, não como forma impositiva, mas deixando claro que na Cooperativa não existe ao
menos por enquanto pessoas que se coloquem contrárias as posições da mesma.
Outro ponto observado e que ficou claro foi a falta de participação por parte das
cooperadas em relação à ocupação dos chamados cargos diretivos e de fiscalização. Na
Assembléia Geral Ordinária realizada em janeiro de 2010, sendo a exigência do Estatuto
em renovar o conselho fiscal em 2/3 (dois terços) esta exigência quase não era atendida
diante do receio das cooperadas em participarem do Conselho Fiscal.
Este ponto também foi discutido com Vitória Vitor, técnica da UNISOL que
acompanha a COOPERNUT, que informou que sempre realiza trabalhos como cursos de
capacitação trabalhando a auto-estima das cooperadas e informando da importância das
mesmas participarem dos órgãos diretivos da cooperativa que são elas as proprietárias
do empreendimento.
91
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O cooperativismo é alternativa viável para combater a crise no mercado de
trabalho.
Após a realização de amplo estudo bibliográfico bem como dedicado estudo sobre
economia solidária e cooperativismo no micro universo de Campina Grande,
destacadamente estudando a experiência da COOPERNUT, não poderia me furtar em
iniciar as considerações finais com a afirmação acima.
O movimento cooperativista de fato, não é um movimento novo em nosso
ordenamento, entretanto ganha força pela crise imposta no emprego formal onde
92
alternativas antes existentes devem ser melhor trabalhadas sob novas perspectivas e
novas abordagens.,É o caso do cooperativismo que como vimos surgiu com o próprio
processo de capitalismo industrial, mas que retoma sua importância somente no final do
século XX.
No Brasil, o cooperativismo teve sua origem também atrelada ao movimento
sindical, entretanto este foi se afastando desde o início do século XX, destacadamente em
decorrência da aproximação deste movimento ao aparato estatal, marcada por meios
intervencionistas aqui amplamente tratados, que apenas cessou após o ano de 1988 com
o advento da nova Constituição Federal.
As cooperativas, empreendimentos que têm seus princípios fincados na
solidariedade e auto-gestão, vem se moldando e adaptando dentro do mercado capitalista,
sem, contudo, fugir de seus objetivos.
Em nossa pesquisa de campo ficou claro esta dificuldade em desenvolver um
empreendimento solidário em franca competitividade com os puramente capitalistas,
entretanto percebe-se que apesar das dificuldades enfrentadas este empreendimento
estudado permanece dentro dos ditames delineados pela economia solidária.
Fica claro que as características principais das empresas capitalistas - divisão do
capital e trabalho, hierarquia administrativa e a propriedade individual, encontram-se
afastados da estrutura do empreendimento solidário estudado.
Verifica-se também de forma clara que a participação estatal tão questionada por
Karl Marx e pelos anarquistas, se coloca agora apenas como forma de fomento, não mais
como forma intervencionista ou como forma de controle ante aos empreendimentos
solidários que, destacadamente em Campina Grande PB é bastante criticada pelos que
participam do movimento de economia solidária.
O movimento em Campina Grande, apesar de se fazer presente mais de seis
anos, encontra-se em fase embrionária de organização, sendo ainda visto como um
movimento em desenvolvimento. As dificuldades enfrentadas pela economia solidária,
93
como, inclusive, as pertinentes a obtenção de credibilidade pelos próprios envolvidos é
clara, mas podemos observar que se trata mais de uma questão cultural do que
propriamente organizacional.
A Economia Solidária que muito vem sendo estudada como alternativa ao
mercado excludente de trabalho formal, agora vem sendo tratada como política pública,
recebendo, inclusive, destaque na estrutura administrativa federal (Secretaria de Economia
Solidária).
Em Campina Grande este “apoio” estatal é ainda mais tímido, tendo apenas na
AMDE um aporte da estrutura administrativa municipal que apóia a economia solidária,
apoio este que sucumbiu e agora ressurge, ainda de forma fragilizada, tanto que ainda
não reconhecida por muitos que fazem o movimento de Economia Solidária.
A COOPERNUT desponta nesse campo em formação como o modelo a ser
seguido. Não por estar enquadrada a uma sistemática solidária perfeita, mas por ser um
empreendimento que ao menos buscar, com bases nos princípios de solidariedade, atingir
índices de competitividade satisfatório, com empresas puramente capitalistas.
A economia solidária é presente na COOPERNUT sem que suas associadas se
quer demonstre um entendimento sólido a respeito da temática. “Nós vivemos a economia
solidária” (Avani, Presidente da COOPERNUT).
A cooperativa estudada se constrói a cada dia, desde o seu nascedouro, e
demonstrou ser formada por pessoas aguerridas que excluídas do mercado de trabalho
utilizaram de uma experiência solidária (Pastoral da Criança), uma oportunidade de
inserção no mercado de trabalho, sem que com isso precisasse aderir a práticas puramente
capitalistas, mesmo que inseridas num mercado marcado pela competitividade. Optaram
pelo campo da economia solidária, e dentro de inúmeras dificuldades a elas apresentadas
vêm construindo sua realidade pautada em práticas solidárias, mas que ainda necessitam de
ajuda e de crescimento.
Princípios como: Adesão Voluntária e Livre, Gestão Democrática, Participação
Econômica do Sócio, Autonomia e Independência; Educação, Capacitação e Divulgação;
94
Cooperação Intercooperativa e Interesse pela Comunidade, princípios cooperativistas que
integram o Estatuto da COOPERNUT, são facilmente identificados no dia-a-dia do
empreendimento, entretanto a responsabilidade na administração e na fiscalização do
empreendimento é um problema que merece ser melhor trabalhado dentro da cooperativa.
Pesquisador e na COOPERNUT existe alguma dificuldade em
termo de escolha de direção, de conselho, participação deles
próprios enquanto cooperados, participação na gestão do
empreendimento solidário?
Vitória Victor sim, muitos deles ainda se sentem incapazes de
assumirem um cargo na diretoria, eles tem assim Avani como
referência mas pra minha surpresa nós tivemos uma reunião no
início desse mês e algumas pessoas se colocaram que não
Avani era capaz de assumir a direção e eu fiquei muito feliz com
isso, porque agente vê que está surgindo frutos.
Na última Assembléia realizada em 03 de fevereiro de 2010 ficou claro esse
problema, especificamente quando se buscava a renovação de 2/3 dos membros do
Conselho Fiscal, sentiu-se a dificuldade de indicação/eleição dos novos membros, trazendo
inclusive a necessidade de interferência da técnica presente no sentido de orientar e
intensificar explicações voltadas a importância e necessidade de participação nos órgãos
deliberativos do empreendimento.
Outro aspecto objeto de nosso trabalho foi a verificação das práticas internas do
dia-a-dia de trabalho do empreendimento para assim confirmar se o trabalho prestado pelos
associados estariam dentro dos parâmetros que caracterizam o trabalho decente. Para
chegarmos a um resultado utilizamos os parâmetros delimitados pela OIT que caracteriza
trabalho decente aquele prestado de forma a respeitar os princípios fundamentais do
trabalhador; a promoção do emprego de qualidade; a extensão da produção social e o
diálogo social.
Assim sendo, como se propunha a pesquisa, entendemos que o empreendimento
solidário, percebido em suas práticas cotidianas, segue os princípios que norteiam a
economia solidária, bem como os parâmetros que caracterizam o trabalho decente, estes,
naturalmente atendidos não como regras impostas que devem obrigatoriamente ser
seguidas, mas como práticas cidadãs adotadas, no sentido da solidariedade e do respeito à
dignidade humana como forma de reinserção no mundo de trabalho, sem, contudo, deixar
de ter a competição como uma referência (uma imposição do mercado capitalista?).
95
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