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Se a Idéia da arte é a prosa, então, a crítica de arte é a exposição do núcleo prosaico da obra.
Benjamin explica: “O que desmorona sob o raio da ironia é apenas a ilusão, indestrutível
permanece, no entanto, o núcleo prosaico da obra, porque ele não repousa no êxtase, que pode
ser destruído, mas, antes, na intangível, sóbria, figura prosaica”
75
. Essa concepção romântica,
segundo Benjamin, tem sido historicamente fértil em conseqüências e, além de ser
fundamento da crítica moderna, também se introduziu nos princípios filosóficos de escolas
artísticas posteriores.
A obra de arte faz seu observador falar, por isso, a crítica é a exposição de seu núcleo
prosaico. Segundo Bernardo B. C. de Oliveira, o que distingue a obra de arte para os
românticos é sua capacidade de, através da precisão formal daquilo que a individualiza, incitar
o desdobramento de sua reflexão, sua destruição e renascimento, através da crítica. A obra
quer transcender a si mesma, ela “juntamente com suas críticas, se constela como um
medium-de-reflexão cada vez mais forte. A obra passa a ser também suas leituras, as quais
suscitam e intensificam o jogo iniciado por ela mesma”
76
.
A obra tem significado ontológico porque é transindividual. A poesia romântica é “universal
progressiva”, ou seja, infinitamente aberta mediante uma construção social sempre em vigor.
Sobre a vitalidade do conectar operado pela arte romântica o fragmento 116 da Athenäum é
paradigmático:
A poesia romântica é uma poesia universal progressiva. Sua determinação não é
apenas a de reunificar todos os gêneros separados da poesia e estabelecer um contato
da poesia com a filosofia e a retórica. Ela também quer, e deve, fundir às vezes, às
vezes misturar, poesia e prosa, genialidade e crítica, poesia artística e poesia natural,
tornar a poesia sociável e viva, fazer poéticas a vida e a sociedade, poetizar a
espirituosidade, preencher e saturar as formas de arte com toda espécie de cultura
maciça, animando-as com as vibrações do humor. Ela abrange tudo em que está o
poético, desde os maiores sistemas da arte – que em si contém vários outros – até o
suspiro, o beijo que a criança poetante exala em canção singela. [...] Outros gêneros
poéticos já estão prontos, podem ser completamente dissecados. O gênero da poesia
romântica ainda está em evolução – esta, aliás, é sua verdadeira essência, estar
sempre em eterno desenvolvimento, nunca acabado. [...] A poesia romântica é o
único gênero que é, mais do que um gênero, como que a própria arte poética: pois
num certo sentido toda poesia é, ou deveria ser, romântica.
77
A arte romântica revela o absoluto como medium-de-reflexão e a si mesma como centro deste
medium. As obras de arte, no sentido primeiro romântico, se definem pela sua criticabilidade e
75
BENJAMIN, 2002, p.108.
76
OLIVEIRA, 2006, p.46.
77
SCHLEGEL, 1994, p.99-101. Athenäum, fragmento 116.