Download PDF
ads:
UNIVERSIDADE CATÓLICA DE PERNAMBUCO
PRO-REITORIA ACADÊMICA
COORDENAÇÃO GERAL DE PÓS-GRADUAÇÃO
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM PSICOLOGIA CLÍNICA
LABORATÓRIO DE PSICOPATHOLOGIA FUNDAMENTAL E PSICANÁLISE
Reflexões sobre o processo de Vínculo na Filiação Adotiva
LICÉLIA MARTINS SIQUEIRA PINTO
EDILENE FREIRE DE QUEIROZ (Orientadora)
RECIFE/PE
2010
ads:
Livros Grátis
http://www.livrosgratis.com.br
Milhares de livros grátis para download.
UNIVERSIDADE CATÓLICA DE PERNAMBUCO
PRO-REITORIA ACADÊMICA
COORDENAÇÃO GERAL DE PÓS-GRADUAÇÃO
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM PSICOLOGIA CLÍNICA
LABORATÓRIO DE PSICOPATHOLOGIA FUNDAMENTAL E PSICANÁLISE
Reflexões sobre o processo de Vínculo na Filiação Adotiva
LICÉLIA MARTINS SIQUEIRA PINTO
EDILENE FREIRE DE QUEIROZ (Orientadora)
Dissertação para defesa pública como requisito
ara obtenção do título de mestre, no Programa de
Pós-Graduação em Psicologia Clínica, da
UNICAP. Linha de Pesquisa: Psicopathologia
Fundamental e Psicanálise. Esta pesquisa contou
com recurso de Bolsa de Mestrado da Fundação
de Amparo à Ciência e Tecnologia do Estado de
Pernambuco – FACEPE.
RECIFE/PE
2010
ads:
4
Aos meus pais, sempre.
5
Agradecimentos
Aos meus pais que acreditaram e confiaram, mais uma vez, de forma
incondicional em meu desejo profissional e me deram todo o apoio necessário
para que pudesse realizá-lo;
A Wilson Júnior, Pascalle e João, que com muito amor, carinho e
dedicação conseguiram amenizar a minha saudade de casa, mesmo quando
parecia impossível;
Ao meu esposo, por compreender e respeitar as minhas escolhas e às
minhas filhas, Ana Thereza e Alícia, a quem devo também pedidos de
desculpas pelos momentos de ausência;
À minha orientadora, Edilene, que sabiamente compreendeu minhas
limitações e, hoje, merece ainda mais a minha admiração.
7
Sumário
Introdução .........................................................................................................8
Capítulo 1
Vínculos ...........................................................................................................11
1.1. Algumas noções de Vínculos......................................................................11
1.2. Vínculo de Filiação......................................................................................19
1.3. Fragilidades do Vínculo na Contemporaneidade........................................40
Capítulo 2
Vínculo na Filiação Adotiva ...........................................................................45
2.1. O valor atribuído ao vínculo de sangue......................................................48
2.2. O desejo de ter filhos como motivação para adoção..................................57
2.3. O vínculo de filiação na adoção de crianças maiores.................................65
2.4. Considerações do vínculo no texto da Lei..................................................72
Capítulo 3
Considerações sobre a Clínica da Adoção...................................................78
3.1. Os impasses do vínculo na filiação adotiva................................................78
3.2. Uma clínica preventiva................................................................................84
Considerações Finais .....................................................................................88
Referências Bibliográficas .............................................................................90
Anexos
Texto da Nova Lei 12.010
6
Resumo
Do ponto de vista psicológico, nem sempre a adoção configura-se como uma solução
para o problema do abandono. Muitas vezes, a adoção resulta em um fracasso,
comprometendo o desenvolvimento saudável da criança e causando um mal estar e
infelicidade que acometerá a todos envolvidos nesse processo. Vários são os fatores
responsáveis por tal fracasso. Um dos mais identificados na clínica é a falha ou
inexistência do estabelecimento de nculo de filiação entre pais e filhos adotivos.
Assim, o objetivo desse estudo é refletir sobre os impasses e fatores que dificultam
e/ou impedem a formação do vínculo na filiação adotiva. Trata-se de uma pesquisa
teórica na qual discutimos a noção de vínculo em autores de diferentes correntes:
francesa, americana e argentina. Em seguida problematizamos a formação do nculo
na adoção, considerando os fatores que dificultam ou impedem a formão desse
vínculo. Apresentamos algumas vinhetas clínicas no sentido de contextualizar os
impasses vividos quando o desejo de adotar não está associado ao de ter filho. Vimos
que o valor atribuído ao nculo de sangue, as expectativas inadequadas em torno da
nova constituição familiar através da adoção, os mitos e fantasias e a não elaboração
dos lutos anteriores estão entre os fatores que dificultam ou impedem a formação
vincular entre pais e filhos adotivos. O desejo de um filho pelos candidatos à adoção e
o desejo das crianças de serem filiadas são essenciais na constituição do vínculo.
Palavras – Chaves: Pais, Adoção, Vínculo, Filiação
Resumen
Desde el punto de vista psicológico, la adopción no siempre aparece como una
solución para el problema del abandono. A menudo, los resultados de la adopción en
un fracaso, poniendo en peligro el desarrollo saludable de los niños y que causa
malestar y la infelicidad que relámpago a todos los involucrados en este proceso. Son
varios los factores responsables de este fracaso. Uno de los más señalados en la
clínica es la insuficiencia o la falta de unión entre los padres de miembros y los niños
adoptados. El objetivo de este estudio es reflexionar sobre los dilemas y los factores
que obstaculizan y / o prevenir la formación de enlaces en la filiación adoptiva. Se trata
de una investigación teórica en la que debatir el concepto de autores de diferentes
corrientes empate: francesas, estadounidenses y argentinos. Luego problematizar la
formación del enlace en la adopción, teniendo en cuenta los factores que dificultan o
impiden el cincel de este enlace. Hemos visto que el valor asignado a los lazos de
sangre, las expectativas inadecuadas sobre la nueva Constitución mediante la
adopción de la familia, los mitos y las fantasías y la ausencia de duelos anteriores se
encuentran entre los factores que dificultan o impiden el nculo entre la formación de
los padres y los niños adoptados. El deseo de un niño por los candidatos para la
adopción y el deseo infantil de ser afiliado son esenciales en la creación de la relación.
Palabras - Clave: Los padres, adopción, de unión, de afiliación
8
Introdução
Desde 2005, atuando em Psicologia Clínica Infantil, recebo algumas
famílias envolvidas no processo de adoção que buscam acompanhamento
psicológico para seus filhos por apresentarem indisciplina na escola e/ou em
casa, dificuldade de socialização ou rebeldia ou por limitações próprias dos
adotantes no que se refere ao estabelecimento dos vínculos. Os filhos aos
quais os pais referem-se são crianças adotadas e em seus discursos atribuem
todas as dificuldades apresentadas por estas crianças às experiências
pregressas de abandono, institucionalização e adoção. Percebo que, de um
modo geral, esses pais compartilham do pensamento de que crianças
adotadas, mais cedo ou mais tarde, apresentariam problemas de
comportamento, sem se darem conta de que as dificuldades apresentadas
pelos seus filhos adotivos também são identificados em crianças que o são
adotivas.
Em 2006, desenvolvi ao longo do curso de Especialização em Psicologia
Clínica na instituição psicanalítica Espaço Psicanalítico (EPSI/PB) um estudo
de caso de uma criança adotada, intitulado Um estudo teórico-clínico em torno
do processo de adoção, apresentado como trabalho de conclusão de curso. A
análise desse caso clínico possibilitou a compreensão de que a criança não
assumia, perante a adotante, o lugar de filho. O imaginário da mãe não lhe
reservava esse lugar. Nesse caso, estamos falando de uma adoção com falhas
no processo de filiação.
9
Assim, percebe-se que, do ponto de vista psicológico, nem sempre a
adoção é bem sucedida. Muitas vezes, ao invés de consistir em uma solução
ao problema do abandono ou de corresponder a uma alternativa ao desejo do
casal de ter um filho, a adoção configura-se em uma tentativa equivocada de
solucionar problemas pessoais ou do casal.
Do ponto de vista psicológico, inúmeras seriam as possíveis causas que
levariam a um fracasso na adoção, mas algo é certo: a inexistência de vínculos
afetivos entre adotantes e adotados implicará, necessariamente, no fracasso e
insucesso do processo de adoção. Isso porque tais vínculos constituem um dos
alicerces para a formação de uma filiação. Assim, o objetivo desse estudo
consiste em refletir sobre os impasses e fatores que dificultam e/ou impedem a
formação do vínculo na filiação adotiva.
O primeiro capítulo consiste em uma breve apresentação da noção de
vínculo, considerando autores como Pichon-Rivière, Bowlby e Winnicott, Puget
e Berenstein, conhecidos por trabalharem a formação vincular na relação
grupal e na relação primitiva mãe e filho. O primeiro capítulo traz ainda
algumas reflexões acerca dos vínculos na contemporaneidade, tendo como
característica principal a fragilidade.
O segundo capítulo trata especificamente sobre a formação vincular no
contexto da adoção, considerando os principais aspectos influentes nesse
processo, como o valor atribuído ao vínculo sanguíneo, as motivações para a
prática da adoção, o vínculo entre pais adotivos na adoção de crianças
maiores, sempre com o objetivo de promover a compreensão dos fatores que
interferem direta ou indiretamente na formação vincular entre pais e filhos
adotivos. Nos detemos no desejo de adotar e no desejo de ter filho, discutindo
10
sobre os avanços propostos na Lei 8.069/09 que reflete a preocupação de
assegurar à criança condições adequadas ao seu desenvolvimento
psicossocial e prestar ajuda e orientação psicológica aos candidatos a adoção.
No terceiro capítulo, então, focaremos a clínica da adoção, realçando os
impasses vividos por pais e filhos na filiação adotiva. Apresentaremos e
discutiremos alguns fragmentos clínicos, contribuições que consideramos
valiosas para os profissionais que atuam no contexto da adoção e para a
importância de se trabalhar sob o viés de uma clínica preventiva. Essa
pesquisa é segmento de um projeto sobre Pais Adotivos: perfil psicológico e
processo de vínculo, coordenado pela Profa. Dra. Edilene Freire de Queiroz,
pesquisadora do Laboratório de Psicopatologia Fundamental e Psicanálise da
UNICAP e do CNPq, cujo objetivo é traçar o perfil psicológico de pais adotivos
e de candidatos à adoção de crianças e adolescentes brasileiras, tentando
identificar seu modo de pensar, estilo de vida, hábitos, atividades e
temperamento, considerando os seguintes segmentos: adoção por casais,
adoção por solteiros, adoção por homossexuais, estrangeiros, adoção precoce,
adoção tardia, adoção de crianças com necessidades especiais. Com os
resultados dessa pesquisa poder criar um banco de dados sobre pais adotivos
que ficará disponível à pesquisas e aos setores que trabalham com adoção,
sobretudo para, cada vez mais, otimizar o trabalho de assistência a pais
adotivos, facilitando o processo de vínculo da criança a seus pais adotivos.
Para desenvolvimento deste segmento, contou com recurso de bolsa de
mestrado da Fundação de Amparo à Ciência e Tecnologia do Estado de
Pernambuco – FACEPE.
11
Capítulo 1
Vínculos
O termo vínculo tem a sua origem no latim vinculum, que significa união,
ligadura de características duradouras. O termo pode ser compreendido ainda
como atadura ou junção (Puget e Berenstein, 1993). Na primeira parte deste
capítulo apresentaremos algumas noções de vínculos. Em todas elas, de certo
modo, implicam-se relação intersubjetiva e investimento afetivo, mas cada
autor as conota de forma diferente. quem prefira utilizar o termo “apego”,
como a escola americana de Bowlby, ou então o termo “laço”, como assim
preferem os franceses. Pichon-Rivière é um dos autores importantes sobre a
teoria do vínculo, atento aos processo de formação de vínculos nas relações
grupais.
1.1. Algumas noções de vínculo
Segundo Puget e Berenstein (1993), o conceito de vínculo, também
considerado uma relação intersubjetiva, diferencia-se do conceito de relação
intra-subjetiva ou relação objetal. Consoante os autores, para que ocorra uma
relação intersubjetiva ou seja, para que se estabeleça uma relação vincular,
faz-se necessário um referencial externo, o que caracteriza sua
extraterritorialidade. É também característico da relação vincular, sua
12
bidirecionalidade, pois ambos os egos “terão de ser, alternativamente, fonte de
desejo e objeto desejado e de ação, um para o outro” (p. 22). Na relação
objetal, ou relação intra-subjetiva, por sua vez, o desejo circula de forma
unidirecional, “um ego desejante de um outro funcionando como objeto intra-
subjetivo”.
Pichon-Rivière (1980), também estabelece uma relação entre o conceito
de vínculo e da relação entre sujeito e objeto proposta por Freud (1915),
objetivando uma ampliação do conceito de relação com o objeto. Vejamos o
que diz Freud (1915, p. 143) acerca das relações objetais:
O objeto de um instinto é a coisa em relação à qual ou através da qual
o instinto é capaz de atingir sua finalidade. É o que de mais variável
num instinto e, originalmente, não está ligado a ele, só lhe sendo
destinado por ser peculiarmente adequado a tornar possível a
satisfação
.
Lacan (1956-57, p. 13) completa assegurando que:
Freud nos indica que o objeto é apreendido pela via de uma busca do
objeto perdido [...] o objeto reencontrado do primeiro desmame, o
objeto que foi inicialmente o ponto de ligação nas primeiras satisfações
da criança
.
A partir de tais explanações teóricas acerca do conceito psicanalítico
freudiano de objeto ou relação objetal, podemos inferir ou pressupor que trata-
se de um investimento libidinal do sujeito em algo externo ou interno, ao tratar
sobre investimento narcísico, em busca de satisfação. Pressupõe-se, assim,
tratar-se de uma relação linear, unilateral, na qual o objeto se “eleito ou
capturado pelo sujeito a fim de proporcionar-lhe prazer. Trata-se de uma
possível relação de um sujeito com o objeto sem levar em conta o retorno ou
mutualidade da relação do objeto para com o sujeito, tratando-se de uma
13
relação linear. Pichon-Rivière (1980), por sua vez, propõe o estudo da relação
como uma espiral dialética no qual tanto o sujeito como o objeto se
realimentam mutuamente. Assim, formula a noção de vínculo como sendo uma
estrutura complexa que inclui um sujeito, um objeto e sua “mútua inter-relação
com processos de comunicação e aprendizagem” (Pichon-Rivière, 1980, p.66).
Trata-se, assim, de uma estrutura dinâmica, em contínuo movimento.
O vínculo para Rivière (1980) implica a existência de um emissor que
emite uma mensagem a um receptor, que procura decodificá-la. Por envolver
um processo comunicacional, o vínculo inclui a presença de um objeto real
externo (material), assim como o compromisso deste em uma relação dialética
com o sujeito, que se retroalimentando mutuamente, possibilitando uma
internalização dessa estrutura relacional, passa, por sua vez, a caracterizar-se
como um vínculo "bom" ou "mau".
Pichon-Rivière (1980) considera ainda vínculos normais e os vínculos
patológicos. O vínculo normal, segundo o autor, compartilha com a relação de
objeto uma de suas principais (se não a principal) características: a existência
do objeto diferenciado. Pichon-Rivière considera vínculo normal aquele que se
firma entre o sujeito e um objeto quando ambos têm a possibilidade de fazer
uma livre escolha de objeto, o que pressupõe haver uma boa diferenciação
entre eles. Nessa perspectiva, na relação simbiótica ainda não haveria vínculo.
Assim, segundo o autor, nas situações extremas de relações parasitárias
ou simbióticas e de relações de diferenciação total não é possível o
estabelecimento de vínculos saudáveis. No primeiro caso, a extrema não
diferenciação impede a identificação de limites precisos entre eu e o outro, não
havendo, por conseguinte, investimento objetal. A primeira relação do be
14
com o seio materno, por exemplo, é caracterizada por esta não diferenciação,
porém espera-se que, gradativamente, objeto e sujeito sejam delimitados por
uma distância, caso contrário, poderá se estagnar numa situação simbiótica
que indica vínculo patológico. No segundo caso, a extrema diferenciação, leva
a um distanciamento o grande entre o sujeito e o objeto que este ultimo
passa a ser indiferente sua ausência ou presença, conseqüentemente
impossibilidade de investimento.
Percebe-se, portanto, que para o estabelecimento de vínculos, segundo
Pichon-Rivière (1980), faz-se necessário uma diferenciação moderada, entre o
sujeito e o objeto, afim de que se possa, ao mesmo tempo, preservar o respeito
pela subjetividade e manter uma afinidade com o objeto.
A diferenciação entre sujeito e objeto também é considerada na teoria do
desenvolvimento emocional formulada por Winnicott (1951) que assegura como
essencial a função da mãe e do ambiente neste processo de individualização
ou diferenciação. Este autor teoriza, especificamente, sobre a relação primitiva
mãe-bebê, mostrando como se o processo de diferenciação do bebê da sua
mãe e quais os requisitos necessários, ou seja, as atitudes que devem ser
tomadas pela mãe para que isso aconteça. Para ele, a mãe inicialmente deve
agir de forma “suficientemente boa” e isso ocorre quando ela se dispõe a fazer
uma adaptação ativa e quase perfeita às necessidades do bebê, nos primeiros
momentos de vida. Essa adaptação quase integral ao bebê dá a ele a ilusão de
que o seio da mãe é parte dele. “Psicologicamente, o bebê mama num seio
que é parte dele mesmo, e a mãe leite a um bebê que é parte dela mesma”.
(Winnicott, 1951, p. 328). O autor assegura, entretanto que, tão importante
quanto proporcionar a possibilidade de tal ilusão, é a tarefa de desiludir. Esta
15
acontece quando a adaptação ativa diminui, ou seja, quando a mãe percebe
que o sujeito assegurado de sua permanência é capaz de tolerar suas
ausências, então ela passa a faltar ao bebê. Comenta Winnicott (1951, p. 326)
que “uma adaptação ativa gradualmente diminui, de acordo com a crescente
capacidade do bebê suportar as falhas na adaptação e de tolerar os resultados
da frustração”. É isso, portanto que caracteriza uma “maternagem
suficientemente boa”, proposta por Winnicott: uma adaptação quase total às
necessidades do seu bebê acompanhada de uma gradual desadaptação de
acordo com a capacidade do bebê de lidar com as suas falhas. Somente
assim, através de uma maternagem suficientemente boa, o bebê iniciará um
relacionamento com o mundo, pois terá a possibilidade de diferenciar-se do
seio e da mãe, construindo uma individualidade e diferenciando-se dos objetos
externos.
Percebe-se, portanto, que tanto para Pichon-Rivière (1980), quanto para
Winnicott (1951), é de fundamental relevancia o processo de diferenciação
para que o sujeito seja percebido em sua individualidade e, a partir daí, interaja
e estabeleça vínculos com o meio externo.
Bowlby (1984), que também teorizou sobre a relação mãe-bebê, não fala
especificamente de vínculo e sim de apego. Seu conceito de apego foi
construído considerando que o bebê precisa se apegar á sua mãe em função
da sua necessidade de sobrevivência. Em outras palavras, trata-se de um
sentimento consequente de uma relação na qual a mãe responde com
aprovação as necessidades do bebê, oferecendo-lhe amor e proteção e o bebê
prende-se a ela.
16
O comportamento de apego somente poderá ser identificado quando se
pode reconhecer comportamentos específicos no bebê que objetivam atrair a
figura materna e mantê-la sempre próxima. Alguns comportamentos são: sorrir,
chorar, seguir, agarrar-se, chamar, entre outros. Sendo o bebê muito imaturo
no nascimento, a expressão do apego vai surgir gradualmente, conforme o
desenvolvimento do bebê lhe permita. Segundo Bowlby (1984, p. 193).
O vínculo da criança com sua mãe é um produto da atividade de um
certo número de sistemas comportamentais que têm a proximidade
com a mãe como resultado previsível.
Vê-se que Bowlby (1984), mesmo preferindo trabalhar com a noção de
apego ele utiliza o termo “vínculo” como sinônimo o que nos leva a crer que,
mesmo de corrente diferente (corrente americana) o sentimento de apego
guarda relação com a noção de vínculo propostas pelos autores anteriormente
apresentados.
É importante ressaltar ainda que, para Bowlby (1984), o bebê participa
ativamente e influencia na formação do apego, uma vez que os próprios
comportamentos iniciais do bebê o responsáveis pela forma como a e
responde à eles e, consequentemente possibilita a proximidade e formação do
apego. Ele (1984) entendeu que tanto a morte ou separação prolongada da
mãe quanto a própria atitude emocional da mãe para com o bebê nos primeiros
anos de vida têm influência marcante no desenvolvimento de características de
personalidade posteriores.
Por fim, Bowlby (1984) ressalta que o sentimento de apego não é
exclusividade da relação mãe/pai bebê. Ao longo do desenvolvimento, o
comportamento de apego passa a se voltar também para pessoas de convívio
social, bem como para grupos e instituições.
17
Essa extensão do sentimento de apego para grupos e instituições vai de
encontro à definição de vínculo proposta por Puget e Berenstein (1993), que
consideram o vínculo uma relação estabelecida entre egos, excluindo a
utilização deste termo para designar relações entre pessoas e coisas. Isso
porque para esses autores o vínculo se faz mediante pactos e acordos
inconscientes entre sujeitos, havendo simultaneidade do desejo. Ou seja,
ambos os egos precisam desejar para que o vínculo se estabeleça. Portanto,
não será considerado vínculo quando houver interesse e desejo por parte de
somente um dos sujeitos envolvidos. Assim, “ambos os egos são
simultaneamente ou sucessivamente (pacto, acordo) lugar do desejo e da
realização do desejo do outro” (Puget e Berenstein, 1993, p. 21). E continua:
Um acordo inconsciente seria uma apropriação mútua e compartilhada de
aspectos de cada ego. De qualquer maneira, haveria uma parte do ego
incompartilhável, e partir de onde, igualmente para se manter o vínculo, a única
coisa que cabe é a criação de pactos como, por exemplo, a tolerância
.
(Puget
e Berenstein, 1993, p. 21)
Percebe-se, assim, que os pactos e acordos inconscientes têm a função
de impedir que os vínculos se desfaçam em decorrência de inevitáveis
contradições entre os egos. Tal afirmativa, portanto, revela que, havendo falha
ou, principalmente, não havendo o desejo de ambos os egos de construírem
pactos, o vínculo será rompido. “Quando surge uma clivagem profunda na
estrutura vincular, um se erige monopolisticamente em portador de um desejo,
e o outro será sempre pensado como objeto a serviço do desejo do ego.”
(Puget e Berenstein, 1993, p. 22). Essa é também a posição apresentada por
18
Pichon-Rivière (1980), ou seja, é condição para o estabelecimento de um
vínculo, que ambos desejem e invistam neste fim.
Assim, tais estudos revelam que os conceitos de apego, relações
objetais e vínculo têm em comum a porposta de enfatizar sentimentos entre
dois sujeitos e toma a relação mãe-bebê, como modelo paradigmático desse
conceito, sobretudo por se dar em um estágio primitivo do desenvolvimento
humano, no qual os investimentos pulsionais são necessários para a
sobrevivência do be e que, ao mesmo tempo, geram as primeiras
experiências de satisfação. A experiência de vínculo pressupõe também um
processo de diferenciação, do contrário não se teria dois sujeitos que se
vinculam e sim um que se torna apêndice do outro. Convém lembrar que
paralelo ao investimento no outro o investimento libidinal no próprio sujeito
(investimento narcísico).
Para efeito deste estudo utilizaremos o termo, “vínculo ao tratar do
investimento afetivo necessário para se constituir a filiação adotiva. Primeiro
porque os autores concordam quando indicam ser um movimento mútuo, ou
um caminho de mão dupla entre o bebê e os pais e que, ultrapassa a dimensão
da necessidade, ele passa a ser constituído pelo desejo de estar próximo e de
manter uma relação. Segundo por se sustentar em investimentos inconscientes
de ambos os egos envolvidos. E terceiro por estar implícito na noção de vínculo
o processo de diferenciação entre sujeitos como pressupõem Pichon- Rivière
(1980) e Winnicott (1951).
Deste modo, vínculo não corresponde somente a uma ligação; nele se
implicam em posicionamentos subjetivos entre um sujeito e outro que, não só é
produzido na interação como é produtor de subjetividade.
19
1.2. Vínculo de Filiação
Ao tratar dos nculos entre membros da família, Puget e Berenstein
(1993, p. 27) distinguem os vínculos de sangue e os vínculos de aliança. Os
primeiros correspondem às relações nas quais a transmissão se opera através
do componente biológico, ligando a mãe e o pai ao filho, ou os irmãos entre si,
também chamado de vínculos consangüíneos. O nculo de aliança, por sua
vez, se baseia em compromissos recíprocos entre as pessoas da família, em
que não consangüinidade como, por exemplo, o vínculo entre marido e
mulher ou pais e filhos por adoção. Quando aos vínculos consangüíneos nada
se tem a fazer, pois o elo é de ordem genética e praticamente tudo é inato.
as alianças requerem construções, investimentos. O paradoxal é que a
consangüinidade, por si não faz laço afetivo, portanto, mesmo havendo
vínculo consangüíneo é preciso que haja compromissos recíprocos entre os
membros de uma família.
Na constituição familiar, o sentimento de pertença, segundo Eiguer
(1985) é um dos componentes essenciais para a organização do eu familiar
instancia organizadora de uma estrutura familiar. Pertencer ao grupo familiar ou
estabelecer um vínculo com os membros da família, para Eiguer (1985),
independe da existência de consangüinidade, mas sim de uma sensação única
de proximidade entre seus membros. O sentimento de pertença familiar, por
sua vez, se alimenta de percepções inconscientes.
Dentre os nculos intra-familiares, nos debruçaremos, neste estudo,
sobre os vínculos entre pais e filhos ou vínculo de filiação.
20
Etimologicamente, a palavra filiação é derivada do latim filiatio e
designa uma relação de parentesco estabelecida entre pessoas que
concederam a vida a um ente humano (Grunwald, 2003). Mas será que o
simples fato de ter gerado um filho é suficiente para que se tenha uma relação
de filiação?
Durante algum tempo, do ponto de vista jurídico, a filiação somente era
reconhecia quando originária na relação do casamento. Os filhos havidos fora
do casamento não faziam parte do núcleo familiar e nem eram registrados com
o nome do pai, ou seja, eram ignorados pelo ordenamento jurídico que os
consideravam filhos ilegítimos. Para Plácido da Silva, citado por Grunwald
(2003), filiação ilegítima “é o que decorre do nascimento de pessoa concebida
por pais que não se encontram em casamento legal”.
Delinski (1997) lembra que as configurações familiares sofreram
alterações ao longo do século XX, sendo uma delas a representação do
casamento, que deixa de configurar-se como uma estrutura patriarcal e
hierarquizada até então vigente, e passa a constituir-se em uma “parceria
sentimental” (p. 18). A partir daí, o sistema de filiação do Código Civil sofre
alterações através da Constituição da República de 1988, passando a não
haver discriminação ou consideração de ilegitimidade aos filhos concedidos
fora do casamento.
A evolução biotecnológica, através do estudo do DNA, possibilitou
determinar-se, agora, os vínculos de filiação sob o aspecto biológico. “A
investigação da paternidade surge como meio de instituir os laços de filiação”
(Grunwald, 2003). Sob o ponto de vista biológico, é considerado filho aquele
que detém os genes do pai.
21
Percebeu-se, entretanto, que a simples identificação biológica não
estabelece os laços de filiação esperados. Mais do que a descendência
genética, passou-se a atribuir relevância aos laços afetivos. Concedem-se sim
direitos, mas não afeto essencial para o desenvolvimento de qualquer ser
humano (Delinski, 1997).
Grunwald (2003) reconhece que a autêntica relação de pai e filho requer
mais que a mera determinação de descendência genética, atribuindo-se
finalmente, relevância a noção subjetiva dos laços afetivos.
A partir do reconhecimento do afeto como valor jurídico, a própria noção
de família assume novos contornos, deixando de restringir-se a vínculos
jurídicos e matrimônio legal e assumindo a feição afetiva. A concepção de
filiação, do mesmo modo, passa a ser reconhecida também através dos laços
afetivos. Por fim, a paternidade se estabelece atualmente de duas formas: 1)
Se havido dentro do casamento, opera-se a presunção pater is est quem
nuptias demonstrant, deste modo, o marido é tido como pai dos filhos gerados
pela esposa, presume-se e se aceita este fato; 2) Reconhecimento por
sentença judicial ou voluntária, neste caso, para filhos havidos fora do
casamento ou união. Caso não haja interesse do pai em reconhecer
legalmente o filho, o mesmo pode se través da investigação de paternidade,
no qual o mesmo será obrigado ou forçado a reconhecer a paternidade. “Pode-
se obrigar quem quer que seja a responder patrimonialmente pela sua conduta,
mas não pode obrigar alguém a assumir uma paternidade que não deseja”
(Delinsk, 1997, p. 26). Tal citação nos faz pensar, mais uma vez, que o
reconhecimento legal não implicará necessariamente em um reconhecimento
subjetivo ou inscrição subjetiva do filho, assim como acontece em relação à
22
filiação biológica. O reconhecimento podenão existir na cadeia inconsciente
e o sujeito permanecer sem ocupar o lugar de filho.
Nogueira (2001) concorda com tal assertiva e define como ilusória a
garantia de que o amor a um filho decorre dos laços de sangue ou meios
legais. Trata-se de vínculos, segundo o autor, invisíveis aos olhos científicos.
“Esse vínculo, por certo, nem a lei nem o sangue garantem” (Nogueira, 2001, p.
84). Ferreira (1999) também ratifica tais pensamentos garantindo que, na
década de 90, ganha contorno a idéia de que a relação de filiação ultrapassa a
relação jurídica e biológica, sendo fundamental a presença do afeto. Fala-se,
portanto, em dois momentos referentes à filiação: um fisiológico e outro
psicológico ou afetivo. Acrescenta-se que, para que haja verdadeiramente
filiação afetiva, é necessário que a criança assuma ou “tome posse do estado
de filho”. Sendo assim, pesa mais no processo de filiação entre pais e filhos o
vínculo simbólico, que dará um lugar de filho a uma criança, do que os laços
sanguíneos.
Do ponto de vista psicanalítico, “filiação” corresponde à ligação simbólica
de um ser humano a outro a partir do reconhecimento da paternidade ou
maternidade do mesmo, ou seja, a ligação do filho com seus pais, seja
biologicamente ou por adoção. Para que uma criança seja filha, do ponto de
vista simbólico, não basta que seja educada e sustentada financeiramente
pelos pais. Sendo assim, o termo “filiação” ou “processo de filiação” será
utilizado ao longo deste estudo para nos referirmos ao ato de reconhecer e
legitimar, do ponto de vista simbólico, uma criança como filho.
Mattei (1997, citado por Levinzon, 2004, p. 17) afirma que “toda filiação
é, antes de tudo, uma adoção. A história em comum, o jogo de identificações
23
entre pais e filhos, as alegrias e os desafios, os medos e os ódios
momentâneos, tudo isso faz parte do intrincado processo de ser pai e mãe”. A
autora acrescenta que:
[...] o desejo de um filho surge no quadro da evolução normal do
processo edipiano, no qual a identificação com o genitor do mesmo
sexo, por meio da possibilidade de exercer um papel similar ao dele,
escolhendo e investindo o filho como objeto de amor. A construção
imaginária do filho baseia-se na possibilidade de compartilhar com ele
as recordações do passado, os desejos do presente e as expectativas
do futuro.
Tal processo ocorre, e deve ocorrer, em todas as relações parentais
quer biológica ou não. Entretanto, nem sempre isto é possível, afinal de contas,
conforme dito anteriormente, somente o fato de gerar não é suficiente para que
a criança ocupe o lugar de filho do imaginário dos pais, e vice versa, nem
garante, entre eles, a existência do amor.
Sobre isso, Dolto (1996) assegura ser ilusório e pretensioso o amor
incondicional e inato pelo filho ou a perfeição associada à mãe. Badinter
(1985), do mesmo modo, recusa o sentimento de amor pelo filho como sendo
inscrito na natureza feminina e considera um mito o amor de mãe ser inato.
Para esta, o amor materno é apenas um sentimento humano como outro
qualquer e como tal, incerto e que “uma mulher pode ser normal sem ser mãe,
e que toda mãe não tem uma pulsão irresistível a se ocupar do filho” (Badinter,
1985, p. 11).
As mães que doam ou abandonam seus filhos são evidências de tais
afirmativas, na medida em que, não interessadas na criança gerada, vão de
encontro como o pensamento do amor inato entre e-filho, difundido por
Rousseau no século XVIII. Segundo as idéias rousseauneanas, “mulher é feita
24
para ser mãe, e mais, uma boa mãe. Toda exceção à norma será
necessariamente analisada em termos de exceções patológicas. A mãe
indiferente é um desafio lançado à natureza, e anormal por excelência”
(Rousseau citado por Badinter, 1985, p. 15).
Para Santos (2001), embora a justificativa por parte das mães para o
abandono ou a entrega dos filhos seja de ordem sócio-econômica, este não
corresponde a um fator suficiente por si só para esclarecer e justificar a prática,
pois nem todas as mulheres doadoras são pobres, bem como, nem todas
sofrem por perder os filhos e por não poder materná-los. Tal discurso advém da
necessidade de apresentar justificativas socialmente aceitas para um ato que
desperta julgamentos morais.
O abandono também é comum em famílias de classe média alta quando
as mães relegam ou delegam a cuidadores a responsabilidade de acompanhar
e maternar seus filhos e argumentam a falta de tempo para fazê-lo. Em alguns
casos, o que falta na verdade é o desejo de envolver-se com os próprios filhos
e temendo a censura social, os abandonam disfarçadamente. “O filho vai
crescendo sem nunca ter conseguido estabelecer com sua e biológica uma
relação que mereça o nome de materna” (Diniz, 1994, p. 109).
Por fim, consideraremos neste estudo, o vínculo de filiação como sendo
algo que ultrapassa a simples relação e convivência, ou seja, estar junto ou
relacionar-se não equivale a estar vinculado. Estabelecer um vínculo
corresponde, sim, a estabelecer contrato inconsciente mediante acordos e
pactos conforme idéias apresentadas por Puget e Berenstein (1993).
A idéia de vinculação entre pais e filhos não é tão simples e objetiva
como parece, e não pode ser, segundo Sluckin, Herbert e Sluckin (1990)
25
confundida com a ligação entre a criança e a mãe através de comportamentos
como sorrir, gestos faciais e carinhos. Tais comportamentos não passam de
indícios de vinculação.
Klaus, Kennel e Klaus (2000) definem o vínculo entre pais e filhos como
sendo o mais forte e a mais importante ligação humana.
Sluckin, Herbert e Sluckin (1990), por sua vez, consideram o vínculo na
filiação como sendo uma ligação através de um relacionamento que implica
amor incondicional, auto-sacrifício, e atitudes de carinho e afeto, por parte da
mãe, que perdurará a vida inteira. Tal pensamento contradiz as afirmativas de
Puget e Berenstein (1993) e Pichón-Rivière (1980), pois para ambos a duração
ou permanência do vínculo está condicionada ao desejo de ambos os egos
envolvidos e, caso haja falha na construção de pactos inconscientes, o vínculo
será rompido.
Com o objetivo de explorar o vínculo pais-filhos e o estabelecimento de
um contexto de cuidados que favorecem a formação do mesmo, Klaus, Kennel
e Klaus (2000) buscam compreender quais os processos pelos quais um pai e
uma e torna-se apegados a um filho. Em outras palavras, descobrir o que
promove o vínculo dos pais com seu bebê.
Dentre os estudos desenvolvidos acerca da formação vincular entre
pais e filhos, podemos destacar o psicanalista René Spitz, que mostrou a
essencial relevância deste vínculo. Segundo Klaus, Kennel e Klaus (2000),
“Spitz observou que as crianças de orfanato com alimentação adequada, mas
sem atenção amorosa e sem cuidados não cresciam nem se desenvolviam e,
com freqüência, morriam” (Klaus, Kennel e Klaus, 2000, p. 18).
26
Sluckin, Herbert e Sluckin (1990), ao expor sobre a formação vincular,
apontam os primeiros cuidados da mãe para com o bebê como sendo de
primordial importância para o desenvolvimento do relacionamento entre eles.
Segundo ele, a teoria ambientalista defende que são as experiências do dia-a-
dia que moldam a personalidade da criança, diferentemente da nativista, que
atribui à personalidade, características inatas. Rousseau, por exemplo, como
ambientalista, defendia veementemente o papel da mãe sobre a formação
emocional dos filhos.
Com o objetivo de evitar infecções, as maternidades mantinham uma
separação física entre as áreas obstétricas e pediátricas, ou seja, os bebês
recém-nascidos eram mantidos durante seus primeiros dias de vida, em
isolamento, evitando-se qualquer contato com familiares. “As regras rígidas da
enfermaria de recém-nascidos foram mantidas até o começo da década de 70,
quando tiveram início os cuidados centrados na família” (Klaus, Kennel e Klaus,
2000, p.19). Gradualmente, na década de 80, as mães foram estimuladas a
ficarem com seus filhos por períodos prolongados com o objetivo de estimular a
lactação, bem como promover a relação entre mãe-bebê. Atualmente, além da
curta permanência em hospitais (de 24 a 48 horas) as unidades obstétricas
comportam a e o bebê dividindo o mesmo espaço. O reconhecimento da
importância do estabelecimento do vinculo entre mãe bebê, possibilitou o
surgimento do Método Canguru também conhecido como "Cuidado Mãe
Canguru" que consiste em uma proposta alternativa ao cuidado neonatal
convencional para bebês de baixo peso ao nascer.
O contato entre a mãe e o bebê nos primeiros dias de vida proporciona
uma transição suave para a vida extra-uterina com o objetivo principal de
27
utilizar o corpo da mãe como fonte de calor. O nome do método foi adotado em
referência às espécies cangurus marsupial. As fêmeas deste grupo possuem
uma bolsa onde as suas crias prematuras completam o tempo de gestação,
sendo aquecidas e alimentadas até se fortalecerem e amadurecerem.
A proposta do método preconizou que, assim como os cangurus, as
mães de bebês prematuros carregassem seus filhos até quando os recém-
nascidos tivessem condições clínicas, gástricas e respiratórias que
viabilizassem uma situação estável. Constatou-se que o contato íntimo do
bebê com o corpo materno, ajudou na regulação da temperatura corporal da
criança, na promoção do aleitamento materno e na diminuição da incidência de
infecções hospitalares. “Além disso, o Método Canguru propiciou o apego entre
mãe e filho” (Martins e Santos, 2008, p. 2).
Embora os autores não afirmem a impossibilidade da mãe vincular-se ao
bebê e vice-versa após o terceiro mês de vida, ambos colocam esse intervalo
como sendo um período sensível e, portanto favorável para o estabelecimento
do mesmo. Vejamos o que dizem Sluckin, Herbert e Sluckin (1990), a este
respeito:
um conjunto de outros fatores adicionais ao contato precoce que
atuam no relacionamento mãe-filho. Entre os fatores que podem
influenciar o modo como uma mãe age e relaciona-se com seu filho
estão na própria formação cultural e social, sua própria experiência
como filha, sua personalidade, sua experiência anterior com bebês e
suas experiências durante a gravidez e o parto. (p. 58)
Assegurar, de fato, os dias e meses de vida como sendo de primordial
relevância para a formação vincular entre pais e filhos, nos permitiria refletir
28
sobre as relações entre pais e filhos até o final do século XVIII quando, em sua
maioria, os filhos eram relegados a amas de leite que se responsabilizavam
não pela amamentação, mas pelos cuidados com o bebê logo após o parto.
Nesse sentido, vê-se, em muitas histórias de vida um vínculo duplo da criança
com duas mulheres que lhe maternam. Esse modelo de investimento duplo
permanece nos dias atuais, pois, cada vez mais se percebe a necessidade da
mãe delegar às babás ou às enfermeiras os cuidados primários e durante
longos períodos das vidas de seus filhos. Inseridas no mundo de trabalho,
dedicam pouco tempo aos filhos, pois tem que se dividir entre mãe e
profissional.
Gonçalves (2006) cita Bolsanallo e Bolsanallo (1993) que indica o medo
que os pais sentem ao se depararem com a grande responsabilidade sobre a
vida dos filhos e afirma ainda que, atualmente, há um desejo bem mais
evidente por parte das mães de também se realizarem como mulher e como
profissional. Ricardo Landeira, um psicanalista uruguaio recebeu para análise
uma mulher que questionava o valor da maternidade. Relatou ela que, durante
toda sua vida sempre teve a impressão que se realizaria, como mulher,
através da maternidade. De fato ela casou, teve filhos e no momento que
procurou análise se perguntava se isso era tudo, pondo em questão as suas
certezas. Esse é um bom exemplo da mudança de foco da mulher, antes
preparada e investida do lugar de mãe, para a mulher que pode desejar outras
aspirações. Com isso ela divide o investimento.
A pesquisa realizada por Gonçalves (2006), cujo objetivo é compreender
os impactos que a mudanças sociais características da contemporaneidade
causam na constituição da maternidade, revela que as mães, ainda durante o
29
período correspondente aos primeiros meses de vida do bebê, mostram-se
consideravelmente preocupadas com o retorno ao trabalho. Algumas delas,
segundo a autora, mostravam-se mais preocupadas com tal retorno do que
com os próprios cuidados dispensados ao bebê.
Segundo Gonçalves (2006, p. 118):
O que foi percebido nas mães entrevistadas coincide com a proposição
de Gomes e Resende (2004), segundo o qual, o modelo de família,
anteriormente organizado com base na hierarquia regido pela
severidade de princípios, tem sido substituído na atualidade por formas
diferenciadas de organização.
A autora conclui que a mulher contemporânea tem conseguido
restabelecer seu lugar e repensar modelos que lhe permite dedicar-se aos
filhos sem alienar-se de si e de seus diferentes lugares na sociedade, embora
seja esta uma dificuldade, segundo elas.
Ainda sobre a assunção de vários papéis pela mulher contemporânea,
de um modo geral, as mulheres sentem a dificuldade ao dividirem-se entre dois
desejos: a maternidade e o sucesso profissional. Tal sentimento de culpa e
dificuldade que chega a paralisar algumas mulheres pode ser atribuído ao fato
de estarem as mesmas presas a um modelo tradicional de organização
familiar, no qual às mulheres cabiam somente os cuidados ao lar e aos filhos.
Podemos pensar que, priorizar de forma incondicional e exagerada a
ascensão profissional poderá resultar em uma “maternagem narcísica”, definida
por ele como sendo o comportamento das mães de privar a criança dos
cuidados necessários, agindo sempre de acordo com seu próprio interesse e
desejo. Segundo o autor, esta é uma forma de violência bastante comum
independentemente da camada social, causada pela necessidade dos pais de
30
impor seus próprios valores à criança. As conseqüências de tais relações de
filiação narcísica é a impossibilidade do estabelecimento de um vínculo seguro
entre pais e filhos, o que certamente comprometerá a sociabilidade destas
crianças.
Armelin (2001) também estabelece relações entre o narcisismo
contemporâneo e o vínculo de filiação, no entanto, propõe novas reflexões
acerca do tema. Após retomar o cenário edípico postulado por Freud, no qual a
menina abandona o desejo de um pênis e coloca em seu lugar o desejo de um
filho, a autora questiona: “até que ponto o desejo de um filho envolve o objeto-
criança como um ser distinto, ou envolve o desejo da mulher tornar a si mesma
mãe, essa figura que suplanta a castração pelo poder da criança e, retoma a
completude sonhada e há muito restringida?”. Em outras palavras, o
questionamento é: “seria então o desejo pela maternidade a expressão de um
sintoma narcísico?”. Neste caso, o filho não receberia por parte da mãe o
estatuto de sujeito, mas sim de objeto a ser possuído.
Entretanto, Armelin (2001) cita ainda algumas motivações equivocadas
para a maternidade, como por exemplo, mulheres que em idades avançadas
recorrem a avanços da medicina para realizar a maternidade a fim de
conservar ou recuperar a capacidade reprodutora perdida. Cita ainda casos de
mulheres que buscam a maternidade em produção independente e se
equivocam achando que poderiam “saber ser pai e mãe”. Não podemos
esquecer que, em contraponto às mulheres que adiam ou conciliam a
maternidade com a ascensão profissional ou demais interesses e desejos,
existem aquelas que são privadas da maternidade em decorrência da
31
infertilidade, encarada por estas, de um modo geral, como algo que contraria a
natureza.
Procedimentos de procriação assistida como inseminação artificial e
fertilização in vitro, entre outros, foram criados para responder a uma
demanda referente a uma problemática pessoal e social, ou seja, o
desejo e a necessidade de ter filhos e a impossibilidade de realizá-los.
(Braga, 2005).
A mesma autora afirma que a apropriação do saber médico acerca da
fecundidade fortalece o mito de que a infertilidade é estritamente uma falha
biológica. Tal concepção contrapõe-se ao “olhar psicológico” acerca da
fertilidade, que atribui ao desejo um papel essencial. Diante disto, propõe uma
reflexão acerca do olhar da medicina sobre a dificuldade de procriação. Através
da medicina, encontra-se alternativa para a gestação do filho e esta se
sobrepõe ao desejo de tê-lo. Nesse sentido, é de fundamental importância
distinguir desejo de demanda, mas o médico nem sempre está atento a isto,
então atende a demanda por gestar sem questionar onde está o desejo de ter
filho.
Dolto (1996) lembra que o desejo ou sentimento materno é transmitido
inconscientemente e fruto das experiências infantis de ser cuidada e assistida
por uma mulher adulta, resultando em uma possibilidade de identificação com a
posição ser mãe.
Braga (2005, p. 150) convida a uma reflexão entre a relação entre o
desejo de ter filhos e a característica do consumo e aquisição que marcam a
cultura atual.
A qualquer preço, dos sonhos que não podem ser frustrados nem
adiados, coloca em pauta uma reificação da criança e a confusão de
32
demandas por direitos pro criativos, da maneira como vêem sendo
engendradas com demandas por objetos.
Nestes casos, a eficiência da medicina e a realização desta vontade de
ter um filho poderão implicar em oferecer um objeto ao consumidor, ou seja,
em promover o lugar de objeto ao filho que seposse, e não fruto de um
desejo inconsciente necessário para o estabelecimento de uma relação
saudável entre mãe e filho.
Na verdade, é inegável que tornar-se mãe ainda é visto por alguns como
sendo uma maneira de ser incluída no universo feminino familiar. Nesse
sentido, a ciência tem disponibilizado uma série de recursos para procriação -
como, por exemplo, a fecundação in vitro -, dando oportunidades às mulheres
antes inférteis, poderem também procriar. Assim temos diversos modos de
procriação e também diversos modos de filiação que nem estão associados à
procriação como a adoção; tipo de filiação buscado pelas famílias
monoparentais e pelas homoparentais.
Ceccarelli (2002) centra suas discussões em torno da homopaternidade
e suas influências no processo de filiação. Segundo o autor, contradições
entre psicanalistas frente à questão da homopaternidade. Por um lado, alerta-
se quanto ao perigo psíquico que a criança estaria sujeita em decorrência da
opção sexual dos pais, o que compromete o processo de subjetivação ou
acesso ao simbólico. Sobre isso, Ceccarelli (2002) assegura: “as
argumentações não procedem”. Sustentado pelo princípio de que a
diferenciação sexual não passa pela anatomia dos pais, o autor critica tais
posições extremas: “tomando a família tradicional, baseada no ‘poder paterno’,
como referencia de normalidade e detentora das condições ideais de
33
organização psíquica, todo modo de filiação que escape a este modelo traria
perturbação psicossexuais”.
O autor conclui que as mudanças nos modos de filiação, responsável
pela falada “crise das referências simbólicas” não alteram ou comprometem
os processos de subjetivação. “Utilizar os pressupostos psicanalíticos para ditar
os caminhos “normais” do desenvolvimento psíquico a partir dos modos de
filiação tradicionais e seculares, equivale a esquecer que as construções
teóricas da psicanálise se baseiam em um terreno diferente da organização
social: pulsões, desejos, complexo de Édipo, relações de objeto,
identificações”.
Enfim, qualquer que seja o tipo de organização familiar, o processo de
vínculo é construído paulatinamente e requer investimentos. A chegada de um
filho numa família, qualquer que seja a intensidade do desejo de tê-lo ele chega
como um estrangeiro. Sobre isso Queiroz (2004), utiliza o termo “estrangeiro”
para falar do estranhamento dos pais diante do filho, tanto por pais biológicos,
quanto pelos pais adotivos. Ela retoma de Freud (1908), o termo Unheimlich
que abriga tanto o Heimlich, que significa familiar, como o seu contrário
Unheimlich, portanto, algo que não se sabe como abordar, o familiar.
Tratando-se das mães de filhos biológicos, tal sentimento de algo não familiar,
estranho, mas que ao mesmo tempo é familiar pode ocorrer durante a
gestação, na qual as mulheres vivem o enjôo, revelando a presença de um
“corpo estranho” (óvulo fecundado) e que, gradativamente, vai sendo
assimilado pelo organismo materno, tornando-se familiar. Tal sentimento
também ocorre após o parto, onde o filho, estrangeiro do corpo materno, torna-
se estranho até que a familiarização ocorra novamente. Podemos ressaltar,
34
assim que o sentimento de estranhamento consiste em algo que integra o
processo de vinculação, somente possível quando o bebê passa de estranho à
familiar, e mais do que isso, a sujeito e filho.
Aragão (2004) também faz referências ao processo de familiarização
entre mães e filhos, porém centra suas discussões em torno do
reconhecimento enquanto familiar ainda durante o período gestacional.
Segundo a autora,
[...] é como se de início o bebê se apresentasse para a mãe como um
estrangeiro, constituindo um enigma que ela não conhece nem decifra.
[...] Nesse tempo da gestação tratar-se-ia, então, para a mãe, de
realizar o trabalho de transformar o estrangeiro em familiar.
Segundo Aragão (2004) o processo de familiarização se a partir da
atribuição de características por meio de projeções e idealizações,
sustentadas, sempre, pela história infantil da própria mãe. Atribui ainda ao
período gestacional a possibilidade de formação de um espaço psíquico
materno, essencial para que o sujeito possa “advir como um ser subjetivado, e
não mais somente como um ser biológico”.
Por fim, a autora afirma: “o tempo do crescimento do feto é também o
tempo da criação do be imaginário no psiquismo materno”. Tal afirmativa
revela que o filho precisa não de ser gerado biologicamente, como também
constituir-se imaginariamente pelos pais e ter um lugar na economia psíquica
destes. Entretanto, convém considerar que o bebê imaginário es presente
nas brincadeiras diárias das crianças e reflete o bebê que a mãe foi para a sua
mãe.
Borsa (2006), do mesmo modo, ênfase ao período gestacional e ao
puerpério como sendo privilegiado para formação vincular entre mãe-filho. “É
35
neste período que a mulher depara-se com inúmeras mudanças físicas e
emocionais. A troca de papéis, as mudanças na rotina diária, as abdicações e
preocupações, as atenções dedicadas ao bebê são algumas das
características deste período, que estão diretamente relacionadas à qualidade
do vínculo que será formado entre a mãe e seu bebê.”
A relação da mãe com seu filho começa na gestação e será a base da
relação a qual se estabelecerá depois do nascimento e ao longo do
desenvolvimento da criança. Afirma-se ainda que os resultados do presente
estudo apóiam a idéia de que no período pré-natal os pais constroem a
noção de individualidade do bebê.
Toda essa importância atribuída ao período de gestação como
formadora do vínculo leva a por em questão a consistência do vínculo quando
a filiação é adotiva. A clínica da adoção como está sendo pensada pelo Groupe
de Recherche sur Adoption, Filiation et Problème de Société, de Paris, mostra
que todo processo de filiação repousa sobre o tripé: da lei, da biologia e da
certeza psíquica dada pelo sentimento de filiação a ser fundado. Evidente que
na filiação por adoção o biológico não está presente, logo ela se apóia em dois
únicos pilares: o da Lei e o do Psíquico, nos seus componentes conscientes e
inconscientes. O eixo biológico o sentimento narcísico de segurança de “ser
pai” o qual tem como representante um imaginário associado à transmissão
biológica e à gravidez. Mas as leis sobre a adoção sempre assumiram o papel
de compensação desta ausência por meio da consolidação dos fundamentos
legais da adoção, assegurando uma descendência simbólica.
Outros autores mais radicais como Mattei (1997, citado por Levinzon,
2000) diz que o desejo de ter um filho está diretamente relacionado à criança
36
imaginária, excluindo a necessidade do período gestacional para que isto
ocorra. A criança que habita o imaginário dos futuros pais, aos poucos passa a
ter uma identidade, embora não corresponda necessariamente à criança real.
Werner (2002) concorda com tal afirmativa e garante que “antes mesmo de
nascer ou de ser adotada, uma criança é “inventada” no desejo, no lugar de
“falta-a-ser” experimentada pelos pais. A partir daí, é através dessa “invenção”
que os pais vão lidar com sua criança na realidade” (Werner, 2002, p. 1).
Piera Aulagnier (1999, citado por Aragão, 2004) denomina essa criação
do imaginário como sendo a construção do “eu antecipado” e, somente a partir
daí o bebê passa a ser inserido em um sistema de parentesco.
Tais discussões e afirmativas rompem qualquer diferenciação entre a
filiação adotiva e a biológica. Sendo a “invençãoou o bebê imaginário comum
no processo de filiação biológica ou não, significa dizer que não distinção
quanto ao sentimento e investimento materno nos processos de filiação. Torna-
se questionável, portanto, a atribuição feita por alguns autores de que o
período gestacional seria essencial para o processo de familiarização do bebê.
Por fim, compreendemos a função materna, nos moldes como nos
ensina Ducatti (2004), como sendo “a capacidade de ocupar o lugar da mãe, o
que significa narcisar o corpo do bebê e decodificar o que o corpo desse bebê
quer informar”.
Diversas são as formulações teóricas em torno do vínculo materno ou
ligação entre mãe-bebê, mas e o vínculo paterno, ou seja, entre a criança e o
pai?
Sluckin, Herbert e Sluckin (1990) citam algumas razões pelas quais a
ligação paterna parece ser menos intenta do que a ligação da criança com sua
37
mãe. A primeira delas decorre do fato de “a sensibilidade geral do homem em
relação a crianças tende a ser menos acentuada” (Sluckin, Herbert e Sluckin,
1990, p. 116). Os autores justificam tal afirmativa citando a influência cultural,
costumes e convenções. Segundo ele, até tempos recentes, não se esperava
que o homem executasse certas tarefas domésticas, em especial as
relacionadas aos cuidados com os filhos. “Pode ser que sem esta cobertura
cultural, os sentimentos do homem e sua sensibilidade para com bebês não
fosse tão diferente dos da mulher” (Sluckin, Herbert e Sluckin, 1990, p. 116).
A segunda justificativa atribuída pelo autor refere-se à quantidade de
tempo destinada pelo pai e pela mãe ao bebê. A mulher destina maior
quantidade de tempo ao bebê, especialmente durante os primeiros meses de
vida e, portanto, favorecem o contato íntimo e formação vincular entre eles,
mais do que com os pais.
Ora, estamos diante de duas justificativas bastante questionáveis
considerando as mudanças sociais e de papéis que vivemos na sociedade
contemporânea. De fato, durante um largo período, eram atribuídos às
mulheres os cuidados domésticos e a criação dos filhos. No entanto, hoje
vivemos “a reformulação radical dos papéis femininos e masculinos e o homem
divide com a mulher, dentre outras atribuições, os cuidados e educação dos
filhos.
“A delimitação das tarefas que se espera que homens e mulheres
desempenhem vai se extinguindo progressivamente e não se tem
clareza a respeito de que afazeres são específicos, próprios de uns e
de outros (...). As atribuições que durante tanto tempo foram definidas
pela natureza se tornaram difusas” (Ramos, 2003, p. 58).
38
Do ponto de vista psicanalítico, através das formulações teóricas
Winnicottianas, mais precisamente, o pai é apontado como de grande
importância para a mãe, permitindo o estabelecimento de uma relação mãe-
filho saudável. “Deste modo, o bebê poderá integrar-se com auxílio da
presença paterna [...] Além do suporte moral que oferece à mãe, o pai deverá,
ainda, enriquecer o universo da criança com seu conhecimento e sobreviver a
seus ataques, para que o filho possa sentir-se como vivo e real”. (Ferreira e
Aiello-Vaisberg, 2006, p. 141).
Ceccarelli (2002) lembra o percurso de tais mudanças sociais cujo início
deu-se no séc. XVIII com a Revolução Industrial, e em decorrência da
Guerra Mundial, quando muitas mulheres foram inseridas em atividades fora de
casa enquanto seus maridos estavam na guerra. Em seguida, lembra o autor, a
sociedade viveu uma discussão completamente nova sobre a sexualidade,
incentivada, com o avanço tecnológico e científico, em especial através do
surgimento da pílula anticoncepcional. Tal discussão rendeu a separação da
sexualidade e procriação. “Concomitantemente, a fim de fazer circular o capital,
foi necessário incrementar o consumo, o que exigia um aumento da renda
familiar. Este aumento foi possível com a participação das mulheres que
passaram a ser cada vez mais convocadas a juntarem-se às fileiras da força de
trabalho” (p. 88).
Este foi, portanto, o contexto da “revolução sexual” dos anos sessenta,
cujas conseqüências exerceram grandes influencia sob vários aspectos sociais,
bem como nas relações vinculares entre membros da família. A liberação, em
alguns países, do abordo, a prática da relação sexual sem a necessidade do
39
casamento, os divórcios cada vez mais freqüentes, bem como relações entre
pessoas do mesmo sexo, agora faziam parte do cenário social.
O autor prossegue a discussão defendendo que o sexo masculino tem
sofrido mais abertamente as conseqüências desta “crise de referências
simbólicas”, acarretando de igual intensidade, a crise da masculinidade ou
ainda o “declínio do poder paterno”. O que está, de fato, em crise, o que vem
sendo reavaliado, é aquilo que desde tempos imemoriais tem sido aceito como
única possibilidade de subjetivação: a referência do pai. A ocupação por parte
do homem de um lugar central na organização social passou a ser
questionado.
Segundo o ele, o homem tem sido cada vez menos convocado a exercer
a condição fundamental para que o sujeito se constitua: a separação narcísica
mãe-filho.
Vale lembrar que, para a psicanálise, “o pai biológico o se superpõe
ao pai simbólico. Sua dimensão transcende a contingência do homem real”.
Monteiro (2001) corrobora com isso ao afirmar que: “a função paterna não é um
ato ou um papel atrelado ao desempenho de um indivíduo biologicamente
macho”. Portanto, não é preciso que haja um homem, para que haja um pai,
desde que um terceiro mediador do desejo da mãe e do filho, realize o
cumprimento desta função.
Paradoxalmente, é neste contexto cultural do declínio do poder paterno
que vemos surgir demandas de homens para ocupar o lugar paterno. Aumenta
a incidência de homens solteiros e de casais homoafetivos que demandam
adoção. Aumenta os processos de guarda dos filhos pelos homens. Uma
recente pesquisa feita no Programa de Pós-graduação em Psicologia Cognitiva
40
da Universidade Federal de Pernambuco (2008), feita por Fabiana Silva sobre
a representação cognitiva que diferentes configurações familiares fazem da
adoção, mostra a necessidade dos homens de também serem reconhecidos
como capazes de manifestar um “amor incondicional” por seus filhos, um
atributo visto como feminino.
1.3. Fragilidades do Vínculo na Contemporaneidade
Num contexto em que novos arranjos familiares são possíveis e em que
as organizações familiares não se pautam por hierarquias bem definidas
verticalmente, de se esperar que a formação de nculos também tenha
sofrido mutação. Do mesmo modo que o pai deixa de ser referência de poder,
os ideais que norteavam o funcionamento social também deixaram de ser
referências. Com isso o homem volta-se para si mesmo e não para o coletivo.
Fuks (2008) sugere pensarmos sobre um neonarcisismo próprio do
sujeito contemporâneo que cultiva a própria imagem e ideal e desinveste na
relação com o outro.
Devemos pensar esse desinvestimento como uma dês-ligação
(entbindung) da relação com o outro (objeto), desunião do conjunto, o
que reforça a voltar-se sobre o ego e principalmente sobre o corpo
como objeto narcísico primário. (Fuks, 2008, p. 37).
Embora a autora reconheça o narcisismo como necessário, pois motiva
o investimento na saúde, na beleza e na valorização do prazer vital, ela
assegura que o individualismo exacerbado pelos ideais desta época tem
41
comprometido as relações com os objetos e com o outro e, conseqüentemente
um esvaziamento dos vínculos.
A autora, assim, corrobora com a idéia apresentada por Puget e
Berenstein (1993) de que o vínculo será possível a partir da disponibilidade
simultânea de dois egos, mas acrescenta um terceiro elemento, segundo ela,
também essencial no estabelecimento da relação vincular. Para Verhaege
(2001, citada por Fuks, 2008), o vínculo intersubjetivo é possível mediante a
existência do eu, do outro e da falta, contrapondo-se ao predomínio de uma
relação dual narcísica, onde não há reconhecimento da falta e o eu se vê
compelido a suprir a falta no outro de forma total. “O triangular através da
aceitação da falta, permite ao outro ser diferente e construir o novo em cima
dessa diferença. Essa forma de amor parte da falta e se abre para a criação”
(Fuks, 2008, p. 61).
Bauman (2006), também oferece oportunidades de reflexão acerca da
formação vincular na contemporaneidade. O autor faz uma associação entre a
globalização e demais características da sociedade contemporânea e a forma
como o vínculo tem se estabelecido, em especial nas relações amorosas.
Utiliza-se do termo “amor líquido” para descrever as relações atuais nas quais
predomina a falta de solidez ou concretude. São relações frouxas, flexíveis,
frágeis e incertas, segundo o autor.
Vive-se o conflito entre o desejo de escolher um parceiro, e ao mesmo
tempo rever ou reverter o rumo da relação de forma muito breve e imediata.
Isso, segundo ele, é fruto das múltiplas escolhas e trocas por outras mais
atualizadas e modernas em um curto intervalo de tempo, modalidade
42
funcionamento determinada pela exigência de consumo que marca a
sociedade contemporânea.
A partir de reflexões sobre do conceito de “amor líquido” de Bauman
(2006), pode-se questionar se, de fato, deve-se falar de amor nos casos em
que prevalece tal superficialidade de relação marcada pela velocidade e
variedade nas relações. Segundo ele, “é um tipo de relação que funciona para
dar a ilusão de que se têm tudo ao mesmo tempo: a liberdade de ficar com
qualquer pessoa – e o prazer garantido pela presença do outro”. O autor
sugere que as relações se caracterizam pela dificuldade de estabelecimento de
vínculos e por uma angústia primitiva, ligada ao narcisismo:
[...] a presença do outro, e das trocas com ele, são sentidas como
constantemente ameaçadoras para o ego do próprio sujeito, que teme
se esvair por completo ao dirigir seu investimento para o mundo
externo. O objeto, mais do que meio de descarga, passa a ser fonte de
angústia. (Zuanella, 2006).
Logo, a sensação de unidade é dada ao ser humano contemporâneo
pelo investimento no próprio ego, característica narcísica. Entretanto, o
investimento narcísico reforça a necessidade de satisfação imediata e a
evitação constante do desprazer. O homem de hoje não suporta a dor, a perda
e a separação. Ora, aqueles que não têm condições internas de suportar a
perda ou a dor da separação, certamente não conseguirão usufruir o prazer da
presença, pois ela, necessariamente evoca uma falta, razão pela qual a
presença do outro é tão ameaçadora quanto a sua perda.
Birman, 2007, propõe algumas reflexões acerca dos nculos
contemporâneos, levando em conta a nova ordem familiar. Diferentemente da
família nuclear moderna, as famílias são caracterizadas por casais que já
43
possuem proles frutos de relacionamentos anteriores, famílias monoparentais,
pela redução do número de filhos, as mulheres, assim como os homens,
inseridos no mercado de trabalho, dentre outras. “As creches e as escolas
maternais entraram em parte na transmissão da socialização primária, que
outrora era atribuição exclusiva da família” (p. 57).
“Esse conjunto de transformações incidiu na economia do narcisismo
das crianças inicialmente e dos adolescentes em seguida, produzindo
novas modalidades de subjetivação e de transtornos psíquicos, que
passaram a caracterizar a subjetividade na contemporaneidade”
(Birman, 2007, p. 57).
O autor cita aumento vertiginoso dos casos de Autismo, por exemplo,
como tendo uma relação direta com o “anonimato nos cuidados das crianças e
sobretudo dos infantes (babás, creches, escolas maternais)”. “O
desinvestimento narcísico daqueles seria aqui a condição concreta de
possibilidade desta modalidade de dor psíquica” (Birman, 2007, p. 58).
Birman (2007) vai um pouco mais adiante à discussão acerca da escolha
de casais pela ausência ou número cada vez menor de filhos. “A ausência e a
diminuição flagrante da prole denota um não-desejo de crianças, na atualidade
de nossa tradição [...] não querer ter mais filhos e crianças, pois estes
perturbam e impedem a nossa possibilidade desejante de existir. Enfim, as
crianças passariam a atrapalhar a nossa liberdade e mobilidade, de existir e de
desejar” (Birman, 2007, p. 59).
Tais questões são importantes de serem pensadas quando refletimos
sobre o processo de vínculo na filiação adotiva. Se a adoção é um fenômeno
milenar presente na civilização grego-romana e nas referências míticas, é na
contemporaneidade que ela adquire reconhecimento e legislação própria,
44
refletido no número de inscritos para adotar. No Cadastro Nacional de Adoção,
segundo informações obtidas em Janeiro/2010, têm-se atualmente 26.143
pretendentes inscritos e 3.606 crianças e adolescentes disponíveis para
adoção
1
. Isso significa que a demanda por adoção aumentou
significativamente. Será que a fragilidade dos vínculos sociais e dos
acasalamentos tem mobilizado a busca por vínculos mais primitivos como os
de pais e filhos? O individualismo tem gerado homens sós, e filiar alguém pode
ser um caminho de minimizar a solidão. A exacerbação no investimento
narcísico produz sujeitos que não admitem falhas com incapacidade de gerar e
a adoção surge como uma suplência necessária.
Para evitar demandas de adoção equivocadas o Estatuto da Criança e
do Adolescente, Lei 8.069/90, sublinha que a adoção deve acontecer quando
atende às necessidades da criança e não as do adotante. A nova legislação
brasileira sobre adoção é ainda mais rigorosa nesse atendimento e considera a
necessidade de orientação e assistência ao adotante e às mães doadoras.
Logo, considerando a fragilidade dos vínculos na contemporaneidade convém
também prestar atenção ao modo de vínculo na filiação adotiva, como um dos
riscos para uma adoção mal sucedida.
1
Dados fornecidos em 11/01/2010 pelo Departamento de Tecnologia da Informação – DTI do Conselho
Nacional de Justiça.
45
Capítulo 2
Vínculo na Filiação adotiva
Após as considerações acerca do vínculo de filiação, passaremos a
refletir sobre as especificidades da vinculação entre pais e filhos adotivos.
A adoção constitui, ou pelo menos deveria constituir uma das medidas
de proteção à infância, uma forma legítima de dar uma família a crianças em
risco social e psíquico, garantindo a elas o direito de se desenvolver dentro de
um núcleo familiar. Este, segundo o Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei
No. 8.069/1990) é um dos direitos de toda criança e adolescente:
Art. 19
Toda criança ou adolescente tem direito a ser criado e
educado no seio da sua família e excepcionalmente, em família
substituta, assegurada a convivência familiar e comunitária, em
ambiente livre da presença de pessoas dependentes de substâncias
entorpecentes.
Entretanto, infelizmente nem sempre a inserção de uma criança em uma
família substituta, através da adoção, possibilita que este direito lhes seja
garantido, pelo menos do ponto de vista psicológico (Ghirardi, 2009).
Segundo Eiguer (1985), pertencer a uma família independe da existência
de consangüinidade ou de garantias legais, mas sim de uma sensação única
de proximidade entre seus membros.
Retomando algumas considerações apresentadas acerca do vínculo
de filiação, pode-se compreender que tornar-se filho consiste em reconhecer e
46
legitimar, do ponto de vista simbólico, a criança como filho, inserindo-o em uma
cadeia inconsciente. Deve-se ressaltar ainda que, o estabelecimento do vínculo
requer também um investimento recíproco da criança, ou seja, o desejo de
vincular-se deve estar presente não nos pais, mas também nos filhos
(Berenstein, 1993). Convém ressaltar que o processo de filiação, do ponto de
vista psíquico, independe do vínculo sanguíneo, pois ele está mais ligado ao
vínculo imaginário.
Entretanto, mesmo ciente de que o processo de filiação independe de
laços biológicos, a ausência de um período gestacional interfere na formação
vincular?
Levy-Shiff e Har-Even (1991, citado por Costa e Rosseti-Ferreira, 2007)
refere-se ao processo de filiação como sendo uma transição para a
parentalidade e afirma que particularidades quando se trata de uma relação
sem vínculos biológicos. Segundo o autor, os pais adotivos tendem a ter mais
dificuldades, pois são submetidos a mudanças abruptas nas relações sociais
através da adoção e, ao contrário, na fecundidade biológica um
envolvimento gradual dos pais com seus papéis parentais. Além disso, no
imaginário social permanece o mito de que os laços sanguíneos são garantia
de vínculo e ligação permanente entre seus membros.
Aragão (2004) afirma que o período gestacional é essencial para o
processo de familiarização, criação do bebê imaginário no psiquismo materno e
construção do “eu antecipado” do mesmo.
Teixeira (2000) corrobora com a relevância do período gestacional como
essencial para a formação vincular entre pais e filhos e afirma que durante a
gestação, a mãe pode elaborar os sentimentos de cuidados e rejeição ao bebê,
47
possibilitando, assim, a preparação do casal para receber o filho, enquanto que
no casal adotivo, há um comprometimento da elaboração de tais sentimentos
ambivalentes, o que favorece a intensificação do sentimento de estranheza
frente à criança adotada.
A concepção de Ducatti (2004) segue outra linha: ela reconhece que as
modificações físicas ocorrem, de fato, após o início da gestação, porém, além
das modificações físico-químicas, decorrentes da gravidez, algo de outra
ordem se inicia antes mesmo da gestação, a partir do momento em que o
desejo se põe em movimento.
Nessa mesma linha Schettini, Amazonas e Dias (2006), afirmam que,
assim como na filiação biológica, o filho adotivo é também “gestado”
psiquicamente.
Werner (ano) acrescenta que, independentemente de biológico ou não, o
filho necessariamente é concebido no imaginário da mãe. Assim, “o lugar que a
criança é convocada a ocupar como filho, vai encontrar suas coordenadas
simbólicas no terreno de um projeto estruturado regido pela falta enigmática
que o desejo materno representa”.
Logo, o período gestacional, embora relevante para a construção
vincular entre pais e filhos biológicos, não se configura algo essencial para que
a formação imaginária do bebê se dê. Nos casos em que as mulheres não
apresentam um desejo de ter filho, tampouco de maternar, o período
gestacional pode nada representar para tais mulheres, ao contrário, ser vivido
como incômodo.
Segundo Levinzon (2004, p. 132), “o grande desafio da família adotiva
encontra-se na aquisição e fortalecimento do sentimento de filiação”. Mas,
48
porque o estabelecimento do vínculo de filiação é considerado um desafio?
Que fatores contribuem ou ameaçam a formação vincular entre pais e filhos
adotivos?
Consideraremos as motivações, os medos, mitos e fantasias que
compõem o processo de adoção a fim de revelarmos o que se esconde por trás
das relações na família constituída através da adoção e, principalmente, de que
modo tais aspectos estão relacionados à formação do vínculo de filiação.
2.1. O valor atribuído ao vínculo de sangue
Segundo Ducatti (2004), em casos de filiação cujo vínculo biológico está
presente, a criança se encontra inserida no grupo familiar, sendo este um
vínculo considerado incontestável. Vimos que à paternidade, atualmente,
opera-se a presunção pater is est quem nuptias demonstrant, através da qual
se presume a paternidade pelo fato de a gestação se dá dentro da relação de
casamento. Podemos pensar, do mesmo modo, na utilização de uma
presunção no que diz respeito ao vínculo na relação consangüínea, ou seja,
aos pais e filhos com laços sanguíneos, pressupõe-se a existência de vínculos,
muito embora esta realidade não possa ser aplicada necessariamente a todas
as relações de filiação. No caso da adoção, onde não há o vínculo biológico,
faz-se necessário um investimento maior por parte da família (não do casal)
para que o vínculo de filiação ou de aliança seja constituído. A família deve,
segundo a autora, “construir uma história a fim de que essa mulher e esse
homem que receberam essa criança obtenham o status de mãe e pai. O
mesmo ocorre com todos os elementos de parentesco” (Ducatti, 2004, p. 22).
49
Percebe-se, assim, a necessidade de compensação da ausência do vínculo
sanguíneo.
A autora estende a discussão para o processo de familiarização nos
casos de adoção tardia, nas quais a criança ou adolescente se encontra
portadora de uma história decorrente de suas experiências primeiras,
anteriores à adoção. Segundo Ducatti (2004) observa-se, nestes casos, uma
dificuldade em aceitar os novos membros familiares em seus papéis.
“Denominar um homem ”pai” ou uma mulher “mãe” se mostra muito difícil”
(Ducatti, 2004, p. 23). Muitas vezes, esse fato é associado à inscrição dos pais
biológicos quando essa dificuldade pode também aparecer nos casos de uma
segunda adoção, pois a criança construiu uma imago parental dos primeiros
pais e tem dificuldade de incluir esses novos membros na sua história.
2
Um aspecto de grande relevância a ser considerado, ainda relacionado
ao fator biológico, diz respeito às influências do processo de adoção e suas
peculiaridades sob o narcisismo dos pais e da criança.
Do ponto de vista da criança, podemos pensar que as idéias pré-
concebidas de não ter sido desejada e amada consiste em um golpe em seu
narcisismo. Segundo Mendes (1994) esta é a razão pela qual crianças e
adolescentes adotivos desejam saber mais sobre os pais biológicos ou
simplesmente alimentam a esperança de que os mesmos tiveram razões
aceitáveis para o abandono. De fato, existe a possibilidade de que o
rompimento do contato com a mãe biológica não venha a configurar-se como
um golpe no narcisismo da criança, mesmo que permaneça na criança o
desejo de saber sobre as razões dessa renuncia. Falamos das situações em
2
Voltaremos a tratar especificamente do processo de filiação na Adoção Tardia.
50
que a criança foi doada e não rejeitada pela mãe. Vejamos o que Hamad
(2002, p. 87) diz a este respeito: “o abandono não é equivalente a rejeição, a
não-desejo. Um desejo de criança pode chegar ao abandono”. Segundo o
autor, algumas mães renunciam à maternidade e entregam seus filhos como
forma de protegê-los.
Devemos lembrar que Freud (1909) fala sobre fantasias de crianças e
adolescentes de serem filhos adotivos. Deste modo, além de defenderem-se de
seus desejos edípicos incestuosos, podem recuperar os pais idealizados da
infância, que os pais “reais” não mais correspondem às suas expectativas.
No caso de crianças adotadas, a existência de dois casais de pais, o biológico
e o adotivo, oferece à fantasia traços de realidade. A criança ou adolescente, a
partir desta possibilidade, sustentará os pais biológicos como sendo bons,
podendo acreditar que teria sido melhor caso tivesse permanecido sob seus
cuidados. Levinzon (2004, p. 67), interpretando Freud, acrescenta que tais
fantasias podem vir à tona como forma de vingança aos castigos aplicados
pelos pais. A criança fantasia que teria sido ‘muito mais feliz’ com seus pais
biológicos, que estes a teriam compreendido mais e frustrado menos”.
Ao tratarmos sobre a influência do processo de adoção sob o narcisismo
dos pais, por outro lado, devemos considerar que se faz necessário suportar o
golpe ao narcisismo desde a identificação da impossibilidade de gerar, nos
casos de casais inférteis. Do mesmo modo, a não transmissão genética pode
configurar-se como uma possibilidade de proteger-se narcisicamente.
Teixeira (2000) lembra que, a partir do conceito de narcisismo, “o filho é
sentido como uma continuação natural da expressão do self dos pais” (p. 42). É
comum ainda que maus comportamentos identificados nos filhos sejam
51
atribuídos ao ambiente como forma de garantir a preservação do narcisismo
familiar. A impossibilidade de gerar os filhos, assim, afronta o narcisismo dos
pais e os obriga a vivenciar o luto de suas próprias crianças narcísicas, e
assim, dar possibilidade para que a criança adotiva constitua-se como tal.
Entretanto, ao tratar-se da relação de filiação por adoção, segundo a autora,
podem-se identificar comportamentos defensivos nos pais que, ao deparar-se
com dificuldades inerentes ao desenvolvimento do filho, atribuem à filiação
biológica as suas causas. Desse modo, os pais adotivos defendem-se
narcisicamente. Nesses casos, percebe-se o argumento do vinculo biológico
como sendo mais forte e genuíno e nele se sustentam como forma de defesa
narcísica.
Hamad (2002, p. 82) corrobora com tal idéia e afirma:
“Os pais adotivos podem não se reconhecer no que ele faz,
particularmente quando seu fazer é vivido negativamente por eles. É
que reside a dificuldade com a qual os adotantes podem se defrontar.
Quando não se reconhecem nos problemas da criança porque ela é
geneticamente outra, eles podem se preservar narcisicamente; isso os
torna estranho às manifestações de vida da criança”
Por outro lado, podemos pensar que, justamente a prevalência do valor
do vínculo biológico sob o emocional amedronta os pais adotivos, fazendo-os
pensar que os pais de nascimento são “os verdadeiros”. Tal fator pode justificar
a atitude dos pais de esconder a existência da família biológica aos filhos ou
transmitirem aos mesmos uma versão negativa dos pais biológicos como forma
de, em seu imaginário, assumirem finalmente o status de pais verdadeiros,
uma vez que a família biológica não ameaçará este lugar. Segundo Werner
52
(2002), “é como se tivessem que destruir esta imagem de origem para se
afirmarem como pais “verdadeiros” perante sua criança”.
Outro fator justificado pela fantasia da força do vínculo biológico são as
dificuldades no processo de filiação decorrentes do medo ou fantasias dos pais
adotivos de que a criança foi “roubada” da família biológica e que, portanto, os
pais biológicos reivindicarão e exigirão a criança de volta à sua família de
origem. “Neste caso, a mãe biológica fica sendo considerada a mãe “real”,
que se refere à “mãe de sangue”. (Levinzon, 2000, p. 27).
Ainda segundo Levinzon (2000), alguns pais adotantes buscam enfrentar
tais fantasias e medos assumindo-se como sendo a família biológica, negando
à criança a sua história real e selecionando, no momento de escolha para
adoção, crianças com características semelhantes às suas e recém-nascidas,
cuja probabilidade de conhecimento de sua história pregressa é menor.
Outra possível justificativa para a escolha de características
semelhantes durante o processo de adoção de um bebê corresponde, segundo
a autora, a uma dificuldade em aceitar o fato de que a criança não foi gerada e
esconder de si mesmo a realidade da adoção, ou seja, uma dificuldade do
casal em aceitar uma possível esterilidade que motivou a prática da adoção.
Criança com características bastante diferentes lembraria a todo o momento a
infertilidade do casal. Fica evidente que, nesses casos, a esterilidade não foi
elaborada pelo casal e este, certamente será um fator dificultador no
estabelecimento do vínculo entre pais e filho.
Ducatti (2004) lembra que não a mãe, mas também o pai necessita
elaborar o luto decorrente da infertilidade. Embora o homem o o faça pela
esterilidade em si, e sim pela transmissão genética, implicando, segundo a
53
autora, em uma vivência de morte vista através do enfoque genético e da
perpetuação do patronímico. Na adoção, embora o homem ao bebê o seu
sobrenome, re-significar a impossibilidade de gerar biologicamente parece algo
mais difícil, pois aquela criança terá uma origem genética que não a sua.
A dificuldade de aceitar a infertilidade está diretamente relacionada ao
mito do vínculo sanguíneo que permeia não só o universo da adoção.
“as pessoas estão fortemente marcadas por concepções de
maternidade, paternidade e família que valorizam o modelo biológico
de parentalidade, os vínculos consangüíneos e de alguma forma
procuram mimetizar essas relações através da adoção” (Costa e
Rosseti-Ferreira, 2007).
Segundo a referida autora, o mito de que o vínculo de consangüinidade
predomina ou é mais forte do que os vínculos de aliança (como casamento e
adoção) dificulta as relações entre os membros da família por adoção. (Costa e
Rosseti-Ferreira, 2007; Levinzon, 2004).
Teixeira (2000) afirma que a genética e a consangüinidade constrói uma
representação inconsciente de um elo e de um vínculo que os protege contra
qualquer possibilidade de quebra. Em contrapartida, os pais adotivos ficam
inseguros por acreditarem que os filhos, impulsionados pela força do laço
sanguíneo, os abandonarão e partirão em busca de seus pais biológicos
(Schettini, Amazonas e Dias, 2006).
O privilégio ao laço sanguíneo, segundo observa Hamad (2002) é
verificado nos próprios profissionais que trabalham com crianças, famílias e
adoção. Cita o exemplo de juízes de menores que permitem ou impõem o
convívio da criança com a família biológica apesar dos relatórios técnicos que
atestam um descuido ou desinteresse emocional dos pais para com os filhos.
54
Basta, segundo o autor, que esses pais recorram e manifestem o desejo de tê-
los de volta para que a autorização seja dada e a criança volte a conviver com
a família originária.
Dolto (1995, citado por Hamad, 2002, p. 97) afirma que a criança deve
ser afastada da família originária quando a mesma representa risco físico ou
moral e a sua possibilidade de convívio com essa família pode ser dada
quando a criança for capaz de fugir a tais agressões. Além da fuga física,
tem-se a fuga emocional na qual “fugir significa que ela ultrapassou a economia
masoquista que faz com que a criança maltratada ame os maus tratos como
sinônimos de amor dos pais” (Hamad, 2002, p. 97).
Não devemos esquecer que o mito da força do laço sanguíneo também
faz parte do imaginário da criança, ou seja, a criança também sofre influências
de tal concepção acerca da filiação biológica e sentir a dificuldade em aceitar
ou legitimar os pais adotivos em seu inconsciente, reservando um lugar de
original e legítimo aos pais biológicos, mesmo quando desconhecidos.
Atuando como psicóloga clínica, tive a oportunidade de acompanhar
uma criança, de 8 anos que, embora ainda convivesse com a mãe biológica,
fora abandonada pelo pai biológico e adotada pelo novo companheiro de sua
mãe desde os 2 anos de idade. A mãe relata que, ao longo dos 6 anos de
convivência, percebeu várias situações em que o filho buscava semelhanças
físicas com seu pai adotivo, mesmo quando elas eram inexistentes. Dizia, por
exemplo, que a sua cor de pele era igual à de seu pai adotivo, bem como o seu
jeito de andar. O desejo de pertencimento e filiação a esse pai era tão grande
que a criança precisava inventar que também os outros reconheciam essas
55
semelhanças físicas entre ele e o pai. A mãe, por sua vez não conseguia ver
que não se tratava de mentira e sim desejo de pertencimento.
Nesse caso, fica clara a necessidade da criança de garantir a sua
filiação junto ao pai, compartilhando características físicas, afinal de contas as
crianças costumam falar, entre eles, de semelhanças e diferenças deles e os
pais. Ducatti (2004, p. 49) confirma tal necessidade através da seguinte
afirmativa:
“O primeiro indicativo de pertinência ao grupo familiar é,
indubitavelmente, a semelhança física traduzida pelo reconhecimento
de pertença com algum elemento significativo [...]. Dizer a alguém que
aquilo que ele realiza é “igual” ou “faz lembrar” alguém traz em si, já
nesse momento, uma idéia de ser parte integrante da constelação
familiar.”
Têm-se a certeza de que as semelhanças físicas se restringem à esfera
do biológico, quando se sabe, por outro lado, que muitas características físicas
(fenotípicas) são também influenciadas por fatores externos, diferente do
genótipo, e a convivência estabelece traços de semelhanças adquiridos por
identificação. Assim o sujeito tem uma cor e formato de olho determinado
geneticamente, porém o seu jeito de olhar é adquirido.
Portanto, a influência dos laços consangüíneos na formação vincular é
forte e, embora possamos considerar o vínculo de aliança como necessário ao
estabelecimento de vínculos de familiarização, conforme sugere Berenstein
(1993), ainda dificuldade de reconhecê-la como prevalente. O vínculo por
laços consangüíneos é tido como sendo o verdadeiro.
Tal dificuldade não constitui uma mera fantasia por parte dos pais ou das
crianças adotivas, trata-se de um valor cultural. Isso termina por influenciar, na
56
decisão de destituição do pátrio poder mesmo nos casos em que fica claro que
a criança é tima de maus tratos ou abandono por parte dos pais biológicos.
Somente esgotadas todas as possibilidades de manutenção do vínculo com os
genitores é que se destitui o pátrio poder.
Vejamos o que diz o Parágrafo do Artigo 39 da Lei 8.069/90, incluído
pela Lei n. 12.010, de 2009:
§ . A adoção é medida excepcional e irrevogável, à qual deve se
recorrer apenas quando esgotados os recursos de manutenção da
criança ou adolescente na família natural ou extensa, na forma do
parágrafo único do Art. 25.
Nesse caso, ao referir-se à família natural, fala-se em família biológica.
Esse fato revela o quanto o vínculo biológico predomina na sociedade de um
modo geral e tais valores influenciam diretamente também as famílias
constituídas por adoção.
Schettini, Amazonas e Dias (2006) vão um pouco mais além e afirma
que há uma tendência cultural a equiparar a família adotiva à biológica ou fazê-
la constituir-se como se fosse natural, no sentido biológico. A utilização de
termos como “gestação” e “nascimento” no contexto da adoção, por exemplo,
tem como fim efetuar uma substituição completa da família biológica pela
adotiva. Tudo isso, segundo Schettini, Amazonas e Dias (2006) decorre da
negação de que a parentalidade e a filiação adotiva são diferentes e da crença
de que o vínculo biológico é mais verdadeiro. “Há uma única possibilidade de
construir a diferença, e ela está necessariamente relacionada à exclusão”
(Schettini, Amazonas e Dias, 2006, 8), eis, portanto, a necessidade de
“normalizar” a adoção.
57
A dificuldade dos pais em aceitar a filiação por adoção como sendo
verdadeira pode advir ainda, conforme discutido anteriormente, de uma
necessidade de defesa narcísica, nas quais os pais preferem sustentar a
família biológica como sendo mais “forte” para que possam atribuir a elas a
responsabilidade por todas as dificuldades apresentadas pelas crianças, e
assim, protegerem narcisicamente.
O valor atribuído ao vínculo de sangue, por fim, poderá interferir de
forma negativa nos relacionamentos intra-familiares, comprometendo,
definitivamente a formação vincular entre pais e filhos e, conseqüentemente, o
processo de adoção como um todo. O sentimento de pertença familiar,
conforme apresentado por Eiguer (1985) como essencial na constituição da
família poderá não existir em relação à família adotiva e a criança permanecerá
no lugar de abandono, impossibilitando a formação do vínculo de filiação com
seus pais adotivos.
2.2. O desejo de ter filhos como motivação para a adoção
Diante do que foi visto, não resta dúvida de que é possível o
estabelecimento de um vínculo de filiação entre pais e filhos sem que haja
relação sanguínea. A adoção é um ato voluntário: os pais adotam porque
desejam conscientemente ter uma criança. O que nem sempre está explícita
são as razões inconscientes.
Ducatti (2004) afirma que, assim como o trabalho de formação do sonho,
a manifestação desejante dos pais por um filho também resulta de vários
processos psíquicos, de aspectos inconscientes. Assim, embora a adoção seja
um ato voluntário, não é fruto, necessariamente, de um desejo consciente, pois
58
em seu cerne estão presentes manifestações inconscientes às vezes
contrárias. Algumas vezes, fatores de ordem inconsciente, impossibilitam que
aquela criança escolhida seja acolhida como filho (a). Quando retiradas de
abrigos, passam a compartilhar o ambiente familiar, a rotina do lar, no entanto
é impedida de fazê-lo como filho (a). É possível que se estabeleça um vínculo
afetivo, porém inexista um vínculo de filiação entre eles. Retornando ao
conceito de Nogueira (2001), às vezes não é possibilitado à criança “tomar
posse do estado de filho”, permanecendo sem lugar, ou ocupando um lugar
inadequado no núcleo familiar. Esta criança permanece abandonada, pois no
que diz respeito as aspecto psicológico, a adoção não aconteceu. Afinal de
contas, o que é adotar se não atribuir ao sujeito um lugar de filho através do
verdadeiro vínculo parental?
Cabe aqui um alerta quanto à distinção entre adaptação e familiarização
ou filiação. Uma criança adotada pode adaptar-se facilmente ao contexto
familiar, aos costumes e hábitos da família constituída, mas isso não implica
que tenha se estabelecido o “sentimento de familiaridade”. Eiguer (1983, citado
por Teixeira, 2000, p. 33) ao falar sobre tal sentimento, diz: “um dos aspectos
mais interessantes desse sentimento é a impressão de que o outro me percebe
como alguém que faz parte da família, e isto geralmente não acontece com
aqueles que não são membros dela”. Do mesmo modo, como vimos
anteriormente, manter uma relação afetivamente positiva com os pais adotivos
também não consiste na garantia por si do estabelecimento de um vínculo
de filiação entre eles.
59
Freud (1910) refere-se a mães frustradas que substituíram o marido pelo
filho, exemplificando assim a possibilidade que a criança não ocupe o seu lugar
devido no contexto familiar.
Minha experiência clínica com famílias adotivas permitiu que eu
identificasse motivações equivocadas para a prática da adoção com
conseqüências no processo de vinculação. Lembro de um caso em que uma
criança de 4 anos fora adotado aos 2 anos de idade, por uma mulher solteira. A
mãe adotiva buscou acompanhamento psicológico por observar o filho ansioso,
nervoso e com mudanças freqüentes de sentimentos em relação a ela: ora
mostrava-se carinhoso, afetivo, ora manifestava agressividade e expressava o
desejo de ir embora. A mãe dizia ainda que ele sentia falta do pai, e ela não
compreendia como isso era possível se ele nem chegou a conhecê-lo. Em uma
das sessões com a mãe, ao falar sobre os motivos que a levaram a adotar,
revela: “ele é como um marido pra mim. Não tenho marido, minha filha vai
casar...” A criança não assumia, perante a adotante, o lugar de filho, pois a
mãe não lhe reservava esse lugar. Neste caso, os sintomas manifestados pela
criança refletiam a ambigüidade de um lugar outorgado pela mãe, mas de um
lugar usurpado e a criança demandava a presença de um pai que o libertasse.
Bernardino (1994) resume:
[...] encontramos muitos casos em que a criança adotada ocupa um
lugar determinado na estrutura familiar, mas que não corresponde a um
lugar de filho. Nestes casos, somos levados a interrogar este desejo
outro, que motiva o ato da adoção. (Bernardino, 1994, p. 56)
Conforme alerta Weber (n.d., 2), “a esterilidade dos pais é a mais
consciente dessas motivações”. Sendo assim, faz-se necessário, mais uma
vez, retomarmos a questão da infertilidade para compreendermos uma das
60
mais comuns justificativas para o processo de adoção. Alguns recorrem à
adoção logo após a verificação da esterilidade do casal adotivo, e outros
buscam somente após inúmeros tratamentos, sendo a adoção o último recurso
para a realização do desejo de maternidade e paternidade.
Deparar-se com a impossibilidade de gerar filhos, coloca o casal diante
da possibilidade de reviver e atualizar a angústia de castração vivida na fase
fálica. “Angústia essa, que coloca ambos frente à quebra da ilusão narcísica de
ser preenchido, do ser inteiro e completo” (Teixeira, 2000).
Embora Badinter (1985) afirme que atualmente o modelo rousseauniano
– a mulher que nasceu para a maternagem - já esteja em vias de perder-se sob
os golpes feministas, pode-se considerar que muitas mulheres ainda são
influenciadas pelo pensamento de que para se realizarem como mulher, devem
ser mães e insistem em realizar a maternidade sob pena de condenação moral.
Motivadas por esta “dívida social” e impossibilitadas de gerar uma criança
optam pela adoção quando, psicologicamente, não estão aptas a concretizar tal
objetivo. Podemos pensar, inclusive, na infertilidade como sendo uma
manifestação desta inaptidão ou da falta do desejo de maternar.
Os distúrbios funcionais de natureza orgânica, enquanto
desencadeadores da esterilidade e infertilidade são efetivamente existentes,
entretanto, a sua análise exclusiva não é suficiente para compreendermos
estes casos em sua totalidade. É preciso, portanto, considerar-se os aspectos
da dinâmica psíquica dos casos de esterilidade. Teixeira (2000, p. 50) resume
através da seguinte afirmativa acerca de casais estéreis ou inférteis:
[...] é possível observar em suas histórias de identificações com as
figuras parentais, motivações internas que os predispõem a uma
dificuldade de assumir funções de pai e de mãe. [...] O que denunciam
61
é muito mais do que uma esterilidade ou uma infertilidade, mas sim
uma dificuldade de estabelecer vínculos afetivos que implica em uma
doação de si mesmos e uma capacidade de acolher o outro.
Complementando tal citação, diríamos que, mais do que vínculos
afetivos estamos diante da impossibilidade de estabelecer vínculos de filiação.
Smith e Miroff (1987, apud Levinzon, 2004) citam três fases que
caracterizam o processo de aceitação da condição de infertilidade: a negação,
reação de raiva e luto e, finalmente, a aceitação. A primeira fase, como o
próprio nome define, caracteriza-se pela negação da realidade. Neste período,
busca-se diversas alternativas em clínicas de fertilização para concretizar a
gestação biológica.
A segunda fase, ou fase da reação de raiva e luto tem como
característica fundamental o sentimento de ódio por parte dos pais diante da
real impossibilidade de gerar o filho. Sentem-se injustiçados e normalmente,
segundo os autores, punidos por algum erro cometido no passado.
A terceira e última fase denominam-se “aceitação”, identificada no
momento em que o casal compreende que, embora não possam realizar a
maternidade/paternidade no sentido biológico, poderão realizar-se de outro
modo sem filhos ou com filhos através da adoção.
Somente com a aceitação, a adoção poderá ser efetuada com
possibilidades de sucesso, uma vez que o casal conseguiu reconhecer a
impossibilidade de gerar biologicamente, porém a possibilidade de estabelecer,
por meio do processo adotivo, uma relação parental com uma criança.
Ainda ao tratar de casais que decidem adotar uma criança após
inúmeras tentativas de gerá-la, Hamad (2002, p. 84) afirma:
62
“Adotar uma criança não é somente a seqüência lógica dos
procedimentos médicos; é um ato que deve ser relacionado a uma
certa maturidade, uma certa disponibilidade psíquica que permite ao
casal abrir-se para acolher em seu seio uma criança que não viria mais
reparar uma injustiça ou suprir uma falta, mas, antes, em seu lugar no
desejo de um casal.”
Levinzon (2004) também acredita ser essencial que os pais adotivos
possam lidar com os seus sentimentos de perda, decepção e luto antes que
eles se proponham a criar uma criança que não está ligada biologicamente a
eles. “Desta forma, podem evitar que suas fantasias inconscientes e o
sentimento de raiva atuem de forma velada, ou seja, projetados no filho
adotado” (Levinzon, 2004, p. 43).
Assim, é importante ressaltar, que a mãe infértil não esta
impossibilitada de obter sucesso na relação de filiação com a criança adotada,
nem tão pouco impossibilitada de materná-la de forma bastante efetiva. Basta
que a mesma consiga elaborar verdadeiramente o luto do filho biológico e
aceitar a criança adotiva como legítima e ocupando o seu lugar próprio na
dinâmica familiar (Hamad, 2002; Ghirardi, 2009).
Um outro fator identificado como motivador para a prática da adoção,
corresponde ao desejo de salvar a vida de uma criança, ou oferecer-lhes
melhores condições de vida. Levinzon (2004) alerta, no entanto, que apenas o
desejo de ajudar não é o suficiente para o estabelecimento do vínculo parental.
Acrescenta que para que consigam superar os desafios e buscarem ao longo
da vida a integração uns com os outros “é preciso que os pais tenham claro
que desejam um filho” (Levinzon, 2004, p.17).
63
As campanhas publicitárias, portanto, devem ser vistas com bastante
cautela, pois a decisão por adotar não deve ser tomada a partir da
sensibilização com imagens e histórias de abandono apresentadas por
algumas delas.
Sendo assim, somente através de um desejo genuíno de serem pais, as
crianças sentirão que tem um lugar escolhido dentre de uma família, e que não
represente simplesmente a prova da “bondade” de seus pais. Este seria um
fardo bastante pesado para a criança, e possivelmente insuportável. Além
disso, deverão ser grato aos pais pelo ato de “bondade” praticado através da
adoção sentirão culpa diante das agressões, rivalidade e competição inerente
às relações parentais.
Percebe-se, por fim, que inúmeros são as motivações para a prática da
adoção e que as mesmas exercem fortes influencias sobre o processo de
vinculação entre pais e filhos. A discussão sobre as motivações inadequadas e
sua relação com possíveis fracassos no processo de adoção é bastante
evidente na literatura sobre adoção. Podemos pensar, entretanto, que
“motivações inadequadas” para a maternidade não é algo que permeia
somente o universo da adoção. Conforme visto no primeiro capítulo,
controversas são também algumas motivações que conduzem à maternidade
biológica. Podemos afirmar, portanto, que as crianças geradas por seus pais
também estão correndo riscos quanto a possíveis impossibilidades de
assumirem perante eles, o lugar de filho. Trata-se, assim de uma discussão
que deve ultrapassar os limites da adoção, mas que nem por isso tem
comprometida ou reduzida a sua relevância em nosso contexto. Afinal de
64
contas, o desejo de ter filho na adoção é de fundamental relevância para a
inserção do filho no espaço psíquico da família.
Tendo em vista tais aspectos, Levinzon (2004) coloca como sendo de
fundamental relevância para o sucesso do estabelecimento do vínculo entre
pais e filhos adotivos, que os mesmos se questionem sobre as motivações para
a prática da adoção.
“A função que uma criança tem para uma família determina inúmeras vezes
estereótipos e caminhos traçados inconscientemente que podem representar
posteriormente um fardo para a criança e para a família de modo geral”
(Levinzon, 2004, p. 16).
Podemos pensar ainda que, em muitos casos, a adoção inicialmente
motivada por algo considerado inadequado, pode ser bem sucedida desde que
a experiência emocional vivida no ato de adotar seja muito forte e capaz de
transformar as possíveis inadequações em desejo de inclusão, do novo ser, no
seio da família. Esta posição, partilhada por Hamad (2002) e por Weber (1998),
mostra que o sentimento de paixão é capaz, de transformar e tornar possível
uma nova relação que, a princípio não daria certo.
Por fim, independentemente do motivo pelo qual o casal propõe-se a
adotar, faz-se necessário pensar que, para que se obtenha “sucesso” nesta
nova constituição familiar, deve haver um sentimento de filiação com raízes
profundas e suficientes para superar medos, ansiedades e preconceitos que
permeiam esta prática.
Quando a adoção se dá a partir de um desejo genuíno dos pais ou
quando os pais biológicos desejaram realmente a concepção de um filho,
certamente poderão receber de forma suficientemente adequada às angústias
65
e necessidades do bebê, a partir da qual serão estabelecidos, possivelmente,
vínculos afetivos e de filiação (Villa, 2001).
Werner (2002) complementa afirmando que: “antes mesmo de nascer ou
de ser adotada, uma criança é “inventada” no desejo, no lugar de “falta-a-ser
experimentada pelos pais” (Werner, 2002, 5). Através desta afirmativa,
Werner (2002) promove a igualdade entre as famílias adotivas e biológicas sob
o ponto de vista da “invenção” da criança no desejo.
2.3. O vínculo de filiação na adoção de crianças maiores
Na literatura sobre adoção aparece o termo “adoção tardia”, para
designar a adoção de crianças com mais de 2 anos de idade. Atualmente, ele
tem caído em desuso por conotar a idéia de uma adoção fora do tempo ideal.
Assim como as crianças negras e portadoras de necessidades
especiais, as crianças maiores são, na maioria das vezes, preteridas pelos
candidatos a adotar (sobretudo os brasileiros), ou seja, elas não correspondem
ao perfil idealizado. As crianças que permanecem por mais tempo em
instituições são justamente as negras e as portadoras de necessidades
especiais que geralmente são preteridas. Logo o fator idade representa mais
um aspecto negativo.
Segundo Dias, Silva e Fonseca (2008), um dos motivos pelos quais tais
adoções, em especial a de crianças maiores, são menos procuradas pelos
candidatos é o medo por parte do casal que procura adoção: “muitos
66
candidatos acreditam que os bebês teriam mais facilidades para se adaptar à
família” (Dias, Silva e Fonseca, 2008, p. 30).
Pensamos que o processo de filiação, necessário para que a criança
seja simbolicamente inscrita pelos pais na família, vai além de um processo de
adaptação. Mais do que adaptar-se, faz-se necessário que a criança
desenvolva o sentimento de pertencimento à família, em especial, o sentimento
de parentalidade com os pais adotivos. As crianças podem adaptar-se ao
contexto e hábitos familiares, porém permanecer sem tal sentimento de
pertencimento.
De fato, a adoção de crianças maiores difere da de bebês. As crianças
maiores possuem uma vivência anterior com as suas famílias de origem ou
de abrigamento. Muitas delas foram, possivelmente, afastadas de suas famílias
biológicas em uma idade não tão precoce após consideráveis períodos de
convivência familiar marcada por maus tratos, negligência e violência. Em
outros casos, a criança foi afastada de seus pais biológicos ou abandonada por
eles em um período primitivo do desenvolvimento e permanecera durante um
longo período de tempo em instituições, o que certamente deixam marcas em
seu desenvolvimento emocional (Levinzon, 2004; Dias, 2008).
Sabemos que todas as crianças adotivas trazem, inevitavelmente,
marcas de suas origens. No caso das crianças adotadas após os dois anos, as
experiências, normalmente traumáticas, são ainda mais evidentes, o que pode
dificultar a possibilidade de inserção em um novo contexto familiar.
Elena Andrei (2001, citada por Dias, Silva e Fonseca, 2008) refere-se a
períodos distintos de adoção das crianças maiores. Dentre tais distinções, têm-
se as crianças adotadas entre 2 e 6 anos, por exemplo, que, segundo a autora,
67
apresentam disponibilidade em receber amor. As crianças entre 7 e 10 anos,
apresentam, de um modo geral, sentimentos de revolta decorrentes das
esperanças construídas e desconstruídas ao longo do período de espera por
uma família adotiva. Estas, segundo a autora, necessitam ainda mais de amor
e disponibilidade dos pais.
Vargas (n.d.) realça a relevância de alguns aspectos a serem
considerados durante o processo de adoção de crianças maiores. Pontua que
é essencial, por exemplo, que a criança deseje a adoção. “É importante que a
criança deseje ir viver com a família, que esteja disposta a aceitá-la” (p. 1).
Essa idéia corresponde, de fato, ao que Puget e Berenstein (1993)
apresentam como sendo essencial na formação vincular entre duas ou mais
pessoas: a reciprocidade do desejo no estabelecimento do vínculo. Assim,
conforme visto anteriormente, não será considerado vínculo quando houver
interesse e desejo por parte de somente um dos sujeitos envolvidos.
Isso, segundo a autora, nem sempre acontece nas primeiras semanas
ou até meses de convivência entre pais e filhos adotivos. A criança que resiste
a chamar o casal adotivo de pai/mãe pode revelar que o processo de
vinculação parental ainda não está concluído.
A clínica psicanalítica de famílias envolvidas no processo de adoção
mostra que essa é uma das grandes dificuldades dos pais adotivos. Tomados
pelo desejo de adotar, entendem que este será necessariamente recíproco e
espera que, a partir dos primeiros dias de convivência, o vínculo de filiação seja
estabelecido entre ambos. A ansiedade por parte dos pais ou a falta de
informação acerca do universo da adoção e suas vicissitudes poderá
configurar-se como um fator comprometedor do vínculo.
68
Em acompanhamento psicológico a uma criança adotiva de sete anos,
cuja adoção havia se dado duas semanas, percebi uma considerável
frustração por parte da mãe adotiva com a “indiferença” da criança. A mãe
queixava-se pelo fato de não ser chamada de “mãe” e, principalmente, por não
perceber na criança gestos de amor e gratidão pela família que lhe estava
sendo ofertada. De fato, era assim que a mãe compreendia: a oferta de uma
família para uma criança abandonada. A criança não era compreendida como
sujeito ativo no processo de nculo com a família e deveria, desde o início,
expressar sentimentos de gratidão e amor pelo casal que se propôs a adotá-la.
Neste caso, especificamente, além da dificuldade da mãe adotiva em
compreender a adoção e a filiação como sendo um processo gradativo,
construído ao longo do período de convivência, pode-se questionar o motivo
pelo qual o casal resolveu adotar. A exigência por parte da mãe de que a
criança manifestasse sentimentos de gratidão, nos leva a pensar que “fazer o
bem” foi a motivação da adoção.
Ajuriaguerra (s/d, citada por Levinzon, 2000) afirma, ao tratar sobre o
desenvolvimento emocional das crianças adotadas, que tal desenvolvimento
“depende de múltiplos fatores, entre os quais se destacam, sobretudo, a atitude
dos pais adotivos” (p. 23). Do mesmo modo, Ferreira (2003), ao tratar sobre
crianças com dificuldades na adaptação à família adotiva, atribui aos pais a
responsabilidade pelos cuidados e amor: “[...] a disponibilidade, o amor, a
lucidez e empreendimento dos pais no cuidar da criança adotada tardiamente
potencializam o convívio.” (Ferreira, 2003, p. 13)
De fato, não dúvidas acerca da importância do papel dos pais no
processo de filiação, bem como, do desejo genuíno de adotar, em especial nos
69
casos de crianças maiores. No entanto, convém considerar que a história de
vida da criança e sua própria aceitação da condição de adotada podem
favorecer ou não a formação vincular com seus pais.
Atribuir somente aos pais a responsabilidade por este processo
corresponderia a exercer sobre eles uma pressão equivalente ao que acontece
no que diz respeito ao mito do amor materno, no qual as mulheres que não
amam ou maternam seus filhos são consideradas anormais ou doentes. Assim,
lançam nas mulheres “que efetivamente não podem ou não desejam maternar
seus filhos, o sentimento de culpa e o dever de manter, a qualquer custo,
sobretudo para a criança, o filho sob seus cuidados” (Santos, 1998). Promover
nos pais o sentimento de culpa frente ao insucesso da adoção e atribuir-lhe
exclusivamente a responsabilidade por este fato pode representar algo
bastante doloroso para o casal.
Deste modo, assim como os pais precisam elaborar psiquicamente a
impossibilidade da gestação ou compreender suas motivações mais primitivas
para a prática da, as crianças adotivas também precisam viver o luto dos pais
de nascimento e ou da instituição a qual pertenciam.
“A criança também adota e, por isso, aqueles que cuidam do processo
têm que zelar para que os candidatos à adoção e as crianças se
inscrevam mutuamente num projeto em que cada um é tanto portado
como portador” (Hamad, 2002, p. 23).
Por esta razão, o autor prefere falar de criança adotiva, e o de criança
adotada. A esse movimento de adoção recíproca entre pais e crianças Hamad
(2002) denomina “adoção recíproca”, colocando a criança também como
“autor” e relativamente responsável pelo processo.
70
O amor e a disponibilidade dos pais à criança pode não ser o suficiente
para evitar ou superar as possíveis adversidades. “Embora estes ingredientes
sejam de fato essenciais, em muitos momentos criar crianças que sofreram
privações importantes representa um desafio de ampla magnitude” (Levinzon,
2004, p. 25), razão pela qual na clínica da adoção tem que ser considerado os
riscos desse processo. Crianças inadotáveis e candidatos incapacitados a
funcionarem como pais para determinadas crianças são pontos importantes a
serem analisados.
Hamad (2002) vai mais além, e afirma que, além do desejo dos pais e
das crianças, o processo de filiação satisfatório necessita que toda a família
compartilhe tal aspiração. assim a criança será inserida em uma linhagem
familiar. O autor atribui relevância, por exemplo, ao lugar dos avós adotivos.
“Eles inscrevem a criança adotada na cadeia das gerações” (p. 48).
Outro aspecto, enfatizado por Vargas (s/d) diz respeito ao modo pelo
qual a mesma foi afastada de sua família biológica.
“Crianças que estão ainda em intenso sofrimento pela perda dos
vínculos com a família biológica, estão mais vulneráveis a dificuldades
de adaptação num novo ambiente familiar. As dificuldades para
estabelecer novos vínculos afetivos, para adotar, de fato, os novos
pais, podem ser bem maiores, ou até intransponíveis, naquele
momento com aquela família, ou mesmo, permanentes”.
Assim, conforme dito anteriormente, a elaboração das perdas anteriores
é um importante fator na avaliação das condições da criança para assumir seu
lugar de filho em uma nova família. O luto deverá ser vivido, portanto, não
pelos pais impossibilitados de gerar um filho, nos casos de infertilidade, mas
pela criança.
71
Por fim, Vargas (s/d) cita o tempo e as condições em que a criança ficou
abrigada como bastante influentes na formação vincular da criança na família
adotiva. Weber (1998) corrobora com tal assertiva e acrescenta sobre as
crianças que permanecem por um tempo demasiado em abrigos:
“O abandono sofrido pelas crianças e adolescentes institucionalizados
levam ao sentimento de rejeição, baixa auto-estima e expectativas de
futuro negativas” (Weber, 1998, p. 86).
Portanto, assim como os casais que se propõem a adoção temem adotar
crianças maiores, as mesmas também compartilham deste sentimento. Afinal
de contas, estarão inseridas em um contexto familiar novo, e possivelmente
serão tomadas por fantasias e medos. O temor que um novo abandono venha
a acontecer é um dos receios experimentados por tais crianças. Este medo, em
alguns casos, faz com que elas pratiquem o que Levinzon (2004) denomina
“teste de aceitação”. Segundo a autora, trata-se de um mecanismo de defesa
utilizado pela criança que age de forma provocativa a fim de testar o vínculo
estabelecido com os pais adotivos. Tal mecanismo é uma forma de enfrentar a
angústia da separação dos pais biológicos e a forma como os pais adotivos
acolherem e resistirem ao teste de aceitação determinará o desfecho da
adoção.
Melissa, adotada aos 09 anos de idade, apresentava incansavelmente
comportamentos provocativos. Após 07 meses de inúmeras discussões e
desentendimentos, os pais adotivos, através do acompanhamento
psicanalítico, compreenderam as dificuldades apresentadas pela criança ainda
relacionadas ao abandono praticado pela mãe biológica e o medo de ser
abandonada novamente. A partir daí, os pais assumiram uma postura tranqüila,
paciente e acolhedora, acima de tudo, possibilitando um espaço para o diálogo
72
e elaboração da criança dessas vivências. Este medo do abandono também
pode decorrer do fato de elas testemunharem a devolução de companheiros de
instituição quando tomados para adoção. Logo, o medo de serem devolvidas
ou abandonadas está baseado em fatos e não uma mera fantasia.
Ghirardi (2009) lembra que a única possibilidade prevista na lei, é o
retorno da criança durante o estágio de convivência, período que antecede a
decretação da sentença da adoção. Entretanto, a irrevogabilidade da adoção
após essa sentença poderá tramitar judicialmente, “pois se entende que a lei
muitas vezes não é suficiente para conter certos rompimentos do vínculo
afetivo e, sobretudo, para evitar a permanência da criança no núcleo familiar
que a rejeita” (Ghirardi, 2009, p. 2).
A prática da devolução, portanto, está diretamente relacionada à
dificuldade ou impossibilidade do estabelecimento de vínculos de filiação entre
pais e filhos adotivos. A elaboração psíquica das perdas intrínsecas à
experiência adotiva, tanto pelos pais quanto pelas crianças, é apontada por
Ghirardi (2009) como essencial para a reafirmação da parentalidade entre eles
e, assim, superarem as dificuldades que poderiam conduzir à prática da
devolução da criança adotada.
2.4. Considerações do vínculo no texto da Lei
A preocupação com o processo de vinculação no contexto da família
adotiva, conforme discutida até o presente momento, não se limita aos
profissionais de psicologia. A nova legislação sobre a adoção no Brasil (Lei
12.010/09) reflete também esta preocupação razão pela qual especial
73
atenção aos aspectos que podem promover, de modo mais satisfatório, o
vínculo de filiação entre as crianças e seus pais.
Uma das preocupações diz respeito a algumas preocupações com as
mães doadoras, permitindo-nos pensar que o ato da doação da criança poderá
ser uma prática cada vez mais aceitável, ou, pelo menos, sem julgamentos
morais e legais. A legislação atual prevê assistência psicológica obrigatória às
mães doadoras, antes, durante e posterior ao parto. Define o intervalo de pelo
menos um mês entre o parto e a doação. Reconhece-se o direito de não filiar a
cria, mas assegura às mães a possibilidade de refletir e maturar o desejo de
doar. Assim, o § do Artigo da Lei 8.069/90 (incluído pela Lei 12.010, de
2009) garante a assistência psicológica no período pré e pós-natal para
gestantes ou mães que manifestem interesse em entregar seus filhos para
adoção.
Ao discutirmos em um primeiro momento acerca das mães doadoras, a
partir das considerações de Santos (2001) vimos que a justificativa para a
doação dos filhos, na maioria das vezes, envolve dificuldades de ordem cio-
econômica. Tal discurso, segundo a autora, advém da necessidade de
apresentar justificativas socialmente aceitas para um ato que desperta
julgamentos morais. A atualização da lei e inserção de novas considerações
acerca das mães doadoras poderá configurar-se como uma alternativa a tais
julgamentos identificados na sociedade contemporânea.
Uma maior aceitação da prática da doação de filho poderá permitir, por
exemplo, que as es os façam sem julgamentos e culpa e a rejeição poderá
dar lugar à entrega de crianças à adoção o que, conforme também discutido
anteriormente, configurar-se-á como medida protetora ao narcisismo infantil.
74
Deste modo, podemos destacar a relevância desta nova inserção ao contexto
da filiação, uma vez que as crianças poderão elaborar o afastamento ou
rompimento dos laços com suas famílias biológicas de modo mais satisfatório,
sem que este aspecto promova feridas narcísicas que comprometam possíveis
novas vinculações.
Outra inclusão que também merece comentários corresponde ao § do
Artigo 19, que diz:
“A permanência da criança e do adolescente em programa de
acolhimento institucional não se prolongará por mais de 2 (dois) anos,
salvo comprovada necessidade que atenda ao seu superior interesse,
devidamente fundamentada pela autoridade judiciária. (Incluída pela
Lei n. 12.010, de 2009).
Assim, as crianças somente deverão permanecer em abrigos por até 02
anos. Após este período, sem obtenção de sucesso na reintegração da criança
ou adolescente à sua família biológica, a perda do poder familiar se
decretada e a criança, disponível para adoção.
Tal consideração legal partiu, possivelmente, da realidade em que
vivemos na qual as crianças permanecem em instituições por um longo
período, sem que a destituição do poder familiar seja decretada e sem,
portanto, a possibilidade de inserção desta criança no Cadastro Nacional para
Adoção. Conforme dados apresentados, têm-se atualmente somente 3.606
crianças disponíveis, enquanto a maioria delas encontra-se institucionalizadas,
entretanto, sem a disponibilidade para adoção. A institucionalização além de
promover rompimentos de vínculos familiares e comprometimentos ao
desenvolvimento infantil reduz dia-a-dia a possibilidade de a criança encontrar
uma nova família. Ou seja, as crianças que permanecem em instituições por
75
um período prolongado têm suas idades avançadas, o que torna o processo de
adoção cada vez mais difícil, afinal de contas, os pretendentes à adoção optam
por bebês e preterem crianças maiores.
Esta medida, embora tenha como uma de suas preocupações, evitar
que as crianças permaneçam por um tempo considerável em instituições e
assim, dificulte cada vez mais a sua possível inserção em família substituta,
não atende as crianças negras ou portadoras de deficiências, que por serem
preteridas permanecem nas instituições. Portanto, embora as formulações
legais tenham como objetivo amenizar os prejuízos sócio-emocionais das
crianças, somente mudanças de ordem cultural poderão promover a igualdade
de direitos para crianças e adolescentes. As formulações legais, portanto, não
são suficientes e não acabam com a necessidade de contínuas reflexões
acerca das motivações para adoção e da determinação do perfil das crianças a
serem adotadas. Entretanto, deparamo-nos com mais uma tentativa ou
alternativa oferecida pela Lei à questão da vinculação e processo de filiação.
A Lei 12.010/2009, também inclui, no § do Artigo 28, a determinação
da realização de acompanhamento por equipe inter-profissional à criança,
antes e após o processo de adoção.
A importância do processo pré e pós-adoção é algo bastante
considerado na literatura sobre o tema, não a fim de promover o bem estar
das crianças, mas também prevenir falsas expectativas e sofrimentos para os
pais e a criança.
“Com relação à preparação para adoção, os pais precisam de tempo
para examinar e refletir sobre suas motivações. Desta forma, eles
podem identificar e avaliar questões importantes que poderão interferir
no vínculo com a criança”.
76
A busca por auxílio psicológico, segundo Levinzon (2004) deve se a
partir dos primeiros desejos dos candidatos em relação à prática da adoção e,
nesse sentido, a lei garante isso. Trabalhar as motivações, as expectativas e
possíveis dificuldades durante o processo, certamente promoverá de forma
mais breve, o processo de filiação. Vimos que o processo de vinculação
consiste em um movimento recíproco, mútuo entre pais e filhos. Portanto, o
auxílio psicológico deve ser extensivo à criança, ou seja, uma atenção
oferecida somente aos pais ou candidatos à adoção, não será suficiente por si
só.
Talvez esse tipo de pensamento esteja fundado na idéia de que os pais
são adultos, e os únicos responsáveis pelo comportamento da criança,
e pelo rumo da família, porém, essa perspectiva tem sentido em
termos jurídicos, já que não se apóia na realidade das interações
humanas. (Luchi, 2009).
A criança, do mesmo modo, pode alimentar expectativas errôneas
sobre a família substituta, bem como medos, fantasias e fragilidades que
merecem uma atenção especializada.
Percebe-se, portanto, que a recente legislação evidencia as
preocupações com o processo de vinculação das crianças e suas famílias,
biológica ou adotiva. Este fato deve-se, possivelmente, à necessidade
apresentada pela própria sociedade de legislar e formalizar procedimentos
identificados ao longo do tempo na cultura da adoção. A lei, portanto, consiste
em um reflexo das práticas sociais e vem oferecer a legitimação das atuações.
Juntamente com reflexões de ordem psicológicas e sociais, a lei buscará
garantir, de forma efetiva que as crianças, através da inserção em famílias
77
substitutas, estabeleçam vínculos verdadeiros e essenciais para o seu
desenvolvimento emocional.
78
Capítulo 3
Contribuições à clínica da Adoção
O estudo em questão foi desenvolvido com o propósito de compreender
o processo de vinculação entre pais e filhos adotivos, dando especial atenção
aos impasses vividos que põem em risco o estabelecimento de uma filiação.
Consultando a literatura da adoção e, mais especificamente, a relativa ao
processo de vínculo, vimos que o sucesso da adoção está diretamente
relacionado à maneira como se opera o vínculo entre adotante e adotado,
também ao lugar que o adotante reserva para o adotado. Alguns aspectos
podem interferir negativamente sobre a relação e impedir que esse vínculo se
estabeleça. Isso significa que adotar uma criança requer atenção, pois
subjacente à demanda para adoção existem as motivações inconscientes que
mobilizam tal ato e que precisam ser identificadas pelas equipes técnica que
qualificam e selecionam os candidatos a adotar e as crianças em condições de
adoção. Os riscos não devem ser subestimados na ilusão de que dar uma
família a uma criança é melhor do que mantê-la institucionalizada. Sabemos
que nem toda criança ou adolescente é adotável, como nem todo candidato
está preparado para adotar, melhor dizendo, para filiar alguém.
3.1. Os impasses do vínculo na filiação adotiva
79
Adotar requer cuidados, afinal de contas, nem sempre o motivo pelo qual
os candidatos adotam uma criança corresponde a um desejo genuíno de ter
filhos. Pode ser uma tentativa de substituir um filho morto, um companheiro,
um amigo, preencher uma solidão ou simplesmente representar um gesto
solidário na erradicação de menores abandonados. Adotar significa filiar
alguém numa linhagem, inserí-la numa organização familiar dando a ela um
lugar específico de filho. Ser substituto de outros e prótese não confere um
lugar próprio e identidade; tampouco ações humanitárias darão à criança o
sentimento de pertencimento e sim de “um pobre coitado” digno de pena e
ninguém se desenvolve sadiamente tendo tal sentimento de base.
A responsabilidade social para com as nossas crianças exige que
estejamos atentos aos riscos, pois não basta erradicar a situação de menores
de rua, significa garantir a formação de um vínculo de filiação. A clínica da
adoção requer conhecimentos psicanalíticos e jurídicos em torno da questão de
filiação, parentalidade e formação de vínculo para que o profissional possa ter
uma escuta diferenciada da demanda por adoção e dos problemas que por
ventura dela decorram.
Em nossa experiência como clínica tivemos oportunidade de constatar
alguns equívocos cometidos ao partir para adoção, justamente pelos
candidatos não terem sido escutados nos seus desejos de adotar, gerando
inadaptações e problemas na formação vincular. Recebemos uma menina
adotada aos 7 anos de idade, que desde os primeiros dias de inserção no novo
contexto familiar, passou a despertar na mãe “estranhos” sentimentos de raiva.
A mãe queixava-se, freqüentemente, de que a criança recusava-se a manter
80
qualquer relação com ela, no entanto a menina conseguia manter um bom
relacionamento com seu esposo o que gerava nela sentimentos de ciúme. Ela
também sentia dificuldade em se dedicar aos cuidados diários com a menina
por reconhecer, segundo ela, suas limitações físicas decorrentes da idade
avançada. Por exemplo, após dar banho na filha queixava-se de dores nos
braços e pernas. Passadas algumas semanas de atendimento, a mãe revelou
que a decisão de adotar na verdade foi iniciativa do seu esposo: ela descobriu
que o marido a traía com uma mulher mais nova e ele, para preservar a relação
de ambos e demonstrar o seu amor, propôs adotar uma criança e satisfazer um
antigo desejo da esposa de ter filho. Nesse contexto, não havia desejo
partilhado de ter filho e sim o desejo do marido de compensá-la pela traição
dele. A menina ao ocupar um lugar outro o de tamponar a traição na
realidade reeditava os ciúmes vividos pela mulher ao se sentir preterida pelo
marido. Ao apegar-se ao “pai” ela, como o ele preteria a “mãe” e isso era
doloroso para a mulher. Ao reconhecer sua impossibilidade de assumir a
criança como filha a mulher preferiu devolvê-la à instituição. Se esses pais
tivessem sido acompanhados anteriormente de forma adequada, ter-se-ia
evitado tal transtorno, sobretudo para a criança que se vê mais uma vez
recusada.
Hamad (2002) nos permite compreender que as motivações
inadequadas para a prática da adoção são riscos que podem ser revertidos e
não comprometer o processo como um todo. A adoção, ainda assim, pode ser
bem sucedida desde que os pais tenham a oportunidade de rever o lugar
reservado à criança e permitir que ela seja inserida, de fato, numa filiação. No
caso em questão cremos que filiar alguém quando o casal vive rupturas é
81
sempre problemático. Muitas vezes os casais partem para ter filho na ilusão de
que ele podeunir o casal. Nesses casos ou se desloca o desamor de um
para com o outro no filho ou faz dele o ponto de investimento de ambos, mas
não se resgata o vínculo do casal. Num e noutro contexto o filho não esta no
lugar de filho como assim define Hamad: fruto de dois desejos que se cruzam.
A crença de que o verdadeiro filho é aquele com o qual se mantém um
vínculo de sangue pode também representar um risco para o processo de
vínculo na adoção, pois este filho terá menos valor para os pais e familiares.
Por conseguinte, isso repercutirá nos direitos que a criança gozará junto à
família. Esconder a origem do filho e alimentar a idéia de que foram eles que o
procriaram pode ser uma forma de não esconder a ferida narcísica deixada
pela impossibilidade de procriar como também camuflar o valor menor que eles
atribuem ao filho.
Os trabalhos desenvolvidos pelo Groupe de Recherche sur Adoption,
Filiation et Problème de Société, de Paris, têm mostrado a importância de o
se esquecer do tripé que sustenta todo processo de filiação: a filiação biológica,
a filiação jurídica e a filiação psicológica. Portanto, não se trata de negar a
vinculação biológica como um laço importante nesse processo de filiação, sua
ausência, porém pode ser compensada ao se reforçar os dois outros vínculos.
Nesse sentido, os juristas têm valorizado o laço de filiação por adoção e tem
construído leis que dêem mais consistência a ele. Como tivemos oportunidade
de discutir no capítulo anterior, a nova lei da adoção traz avanços significativos
no sentido de fortalecer o reconhecimento desse tipo de filiação.
Do ponto de vista psicológico vimos que, definitivamente, o processo de
vinculação independe de relações consangüíneas. Ou seja, o processo de
82
filiação, seja por adoção, seja por gestação, será necessariamente marcada
pela subjetividade dos pais e por determinações inconscientes. A existência de
um vínculo biológico deveria resguardar a criança e assegurar um lugar
psíquico no inconsciente dos pais, o que nem sempre acontece justamente
porque o lugar psíquico no inconsciente dos pais é um lugar simbólico. Nas
filiações adotivas compensa-se a ausência do fator biológico, dando a ela
consistência legal.
A filiação adotiva não repousa sobre a base do tripé de apoio: da lei, da
biologia e da certeza psíquica dada pelo sentimento de filiação a ser
fundado, mas sobre dois únicos pilares: a Lei e o Psíquico nos seus
componentes conscientes e inconscientes. O eixo biológico não está
presente, nesse contexto, com o sentimento narcísico de segurança de
“ser pai” que representa o imaginário associado à transmissão biológica
e à gravidez. (Levy-Soussan, 2009).
A necessidade de incluir o vínculo biológico na filiação faz com que a
maioria dos casais inférteis busque desmedidamente os recursos que a
medicina oferece para reverter o quadro. As repetidas tentativas de fertilização
além de serem invasivas e incômodas muitas vezes em em risco a saúde
dos envolvidos. Nesse sentido, a ciência ao oferecer recursos cada vez mais
avançados para reverter o problema de infertilidade corrobora com a idéia de
que filho é aquele gerado.
A busca por adoção, após inúmeras tentativas de fertilização, pode,
segundo Paiva (2004), representar um risco no sucesso da adoção quando o
luto do filho biológico não for elaborado. A criança que não carrega
geneticamente a característica dos pais pode sentir dificuldades de obter o
reconhecimento de filho e corre o risco de permanecer como estranho no
contexto familiar.
83
Por sua vez temos que considerar a força do desejo de ter filho mesmo
depois de reiteradas situações de fracasso de fertilização. Se tais fracassos
não foram suficientes para que os casais desistam de ter filho, significa que o
desejo de ter filho está para além do desejo de gestar, ou seja, renunciam o
gestar quando desistem de tentar fertilização, mas não renunciam terem filho.
Isso pode ser um dado positivo para a formação do vínculo na filiação adotiva,
significa que um filho idealizado, primeiro passo para inscrição de filho na
cadeia simbólica dos pais. Cada caso terá que ser visto na dinâmica do casal,
considerando sempre que são dois desejos que se cruzam formando um
terceiro.
O Serviço de Orientação à Filiação Adotiva –SOFIA, da Clínica de
Psicologia da Universidade Católica de Pernambuco recebeu um casal
candidato a adoção cujo marido desejava intensamente ter um filho biológico e
resistia a de adotar, intenção que a mulher manifestava. Haviam feito tentativas
de fertilização e a mulher chegou a engravidar, mas não conseguiu sustentar.
Ela dizia que o marido nunca fora bem aceito pelo pai dele que mantinha a
esperança de ter um neto. O marido via, então, no nascimento do filho, um
recurso para provar sua potência (os problemas de infertilidade estavam mais
ligados a insuficiências físicas dele) e para conquistar um lugar junto ao pai ao
dar-lhe o neto que tanto desejava. Ela, por sua vez, não via com bons olhos
essa maneira de pensar do marido e comentava: ele não quer um filho comigo,
ele quer um filho para dar para o pai. Como a gravidez não acontecia o marido
concordou em adotar, não porque tivesse renunciado o desejo de ter o filho
biológico, mas porque acreditava que a mulher tendo o filho que queria
relaxaria e poderia engravidar e dar a ele o filho que queria dar ao pai. A
84
mulher mais engajada no processo psicoterápico deu continuidade ao trabalho
adiando a decisão de adotar, a contragosto do marido. Nesse ínterim ela
encontrou uma maneira de gradativamente afastar-se do marido, indo trabalhar
em outra cidade (passou num concurso público), e com isso, evitar o risco de
engravidar. Neste caso o desejo de ter filho existe, mas para o homem o filho
adotivo era apenas um meio para se atingir outro fim. Cremos que nesse caso
no desejo de ter filho estava implicado o desejo de ser filho. O
acompanhamento do casal foi de fundamental importância para se re-significar
tal desejo.
3.2. Uma clínica preventiva
A devolução da criança à instituição após tentativa de adoção pode ser
traumatizante para a criança e representa um novo golpe no narcisismo dela. O
receio de repetir o abandono a torna insegura em novas tentativas e algumas
delas chegam a pensar que, de fato, não são capazes ou não merecem a
convivência em família.
Para os adotantes, devolver a criança significa serem frustrados no
desejo de adotar e também gera um sentimento de terem sido incapazes de se
exercer como pais, por mais que atribua as dificuldades às resistências e
atitudes da criança. Além disso, vem a culpa de ter sido protagonista de mais
um abandono e temem não serem mais chamados para nova tentativa. Evitar
tais constrangimentos é objetivo de todos envolvidos no processo de adoção.
Os juristas, certamente, compreenderam isso e colocaram como
exigência legal o acompanhamento psicológico dos candidatos antes que a
85
adoção aconteça. Vejamos o que diz o § 4º do artigo 50, do ECA, incluído pela
Lei 12.010/2009:
§ 4º. A inscrição de postulantes à adoção será precedida de um período de
preparação psicossocial e jurídica, orientado pela equipe técnica da Justiça da
Infância e da Juventude, preferencialmente com apoio dos técnicos
responsáveis pela execução da política municipal de garantia do direito à
convivência familiar.
A clínica da adoção ao se preocupar em identificar os possíveis
impedimentos à formação vincular trabalha para acontecimentos como este
seja cada vez mais menos freqüente e que quando for inevitável seja
acompanhado e significado pelos envolvidos.
Inserir simbolicamente a criança numa linhagem familiar, dando a ela
um lugar de filho significa tirá-la da condição de estrangeiro. Sabemos que
relação vincular de um modo geral, e em especial, o vínculo de filiação,
consiste em uma relação tua entre a criança e seus pais adotivos. No caso
de adoção de crianças maiores o trabalho preventivo é de fundamental
importância no preparo para a convivência. Por parte da criança entraves
naturais, a despeito do desejo manifesto de querer ter uma família. O medo de
que o abandono possa se repetir, os traços inscritos e lembranças da relação
com a família de origem, as fantasias em torno da nova família são alguns dos
elementos presentes que podem funcionar como fortes resistências ao
processo de familiarização. O conhecimento prévio das histórias familiares dos
adotantes e do adotado é fundamental.
O SOFIA foi solicitado a “preparar” um jovem de 7 anos para conhecer
seus futuros pais adotivos italianos, que vinham ao Brasil para conhecê-lo. Na
realidade houve uma única entrevista com a criança antes do encontro e
nenhuma com os candidatos. De fato faltou uma preparação, conhecimento
86
das duas histórias. A criança não conseguia se aproximar da futura “mãe” e
nem permitia que a mesma tomasse qualquer iniciativa nesse sentido.
Conseguiu interagir bem com o futuro “pai” com quem se manteve apegado,
quase que pedindo proteção. Após uma semana de convívio os candidatos,
frustrados com o insucesso da convivência com a “mãe”, desistiram da adoção.
Posteriormente, soube-se que a criança foi institucionalizada e separada da
mãe biológica devido aos maus tratos sofridos e um deles era o de ser
freqüentemente queimada com ponta de cigarro. A “mãe adotiva” era fumante,
logo a reedição dessa história deve ter sido uma das razões da resistência da
criança.
Será possível, através do acompanhamento dos pais e das crianças,
principalmente nos casos das crianças maiores, prepará-los para o encontro e
para que a adoção psíquica aconteça de forma satisfatória. Além disso, faz-se
necessário compreender que todas as crianças não são adotáveis e nem todos
podem adotar. “A adoção significa algumas crianças para alguns pais”. (Levy-
Soussan, 2009, p. 5).
O acompanhamento psicológico antes da adoção, nem sempre era uma
prática freqüente em até bem pouco tempo. Tal demanda representava uma
iniciativa particular de alguns pais durante e após o período de convivência
quando identificavam dificuldades nessa convivência. Nesses casos a
interrogação sobre a relação dos problemas e a herança genética aparece em
primeiro plano, se eximindo de considerar sua implicação no processo de
formação do sintoma dos filhos.
A clínica da adoção é hoje uma realidade oferecida por serviços como o
SOFIA ou por profissionais de psicologia interessados pelas questões da
87
adoção ou mesma pela equipe técnica dos setores de adoção das Varas da
Infância e Adolescência que de acordo com a nova legislação são obrigados a
preparar os candidatos para a adoção. Escutar o desejo de adotar, identificar
como o significante da adoção se insere naquela família possibilita
intervenções precoces e, conseqüentemente, mudanças no rumo nefasto que
algumas adoções podem tomar.
Uma clínica psicanalítica preventiva, não significa dar soluções
definitivas aos problemas de adoção, mas certamente, identificará riscos e
preparará melhor os pais a ocuparem os lugares de pai/mãe e minimizará os
insucessos na adoção.
88
Considerações Finais
O objetivo desse estudo foi refletir sobre os impasses e fatores que
dificultam e/ou impedem a formação do vínculo na filiação adotiva. Os
conceitos de vínculo propostos e a análise da formação vincular entre pais e
filhos, nos permitiu destacar a filiação como sendo essencial para sucesso do
processo de adoção como um todo, ou seja, sem a formação do vínculo de
filiação entre ambos, certamente a adoção não será bem sucedida, resultando
em sofrimentos psíquicos para o casal e para a criança ou até a devolução da
mesma à instituição após tentativa frustrada de inseri-la no contexto familiar.
Alguns fatores foram identificados como sendo bastante influente no
processo de vínculo, dentre eles a legitimidade atribuída exclusivamente ao
vínculo sanguíneo. Este, certamente, impedirá que o casal insira
verdadeiramente a criança adotiva na linhagem familiar, que a mesma não
traz consigo características genéticas comuns e isso implicará na permanência
da criança no lugar de estrangeiro ou não familiar.
As motivações para a adoção também mereceram uma análise especial,
uma vez que somente o desejo genuíno de ter filhos possibilitará que o vínculo
de filiação se estabeleça entre pais e filhos adotivos. Motivações inadequadas
poderão fazer com que a criança adotada ocupe um lugar diferente do lugar de
filho e permaneça na condição de abandonado.
Uma clínica preventiva foi proposta no sentido de enfatizar a relevância
de uma escuta especial aos casais ou candidatos à adoção. Identificando
possíveis inadequações nas motivações ou mitos e fantasias nas crianças e
89
candidatos, o processo de adoção pode ser resguardado de possíveis
impedimentos através de intervenções profissionais. Os cuidados preventivos
deverão ser ainda mais evidentes tratando-se da adoção de crianças maiores.
A lei da adoção, através de recentes formulações também tem um papel
de grande relevância para o sucesso do processo de adoção, afinal de contas,
o respaldo jurídico e psicológico, conforme discutido ao longo do estudo,
compensará a ausência do vínculo biológico nas relações de adoção. Os dados
recentemente revelados sobre o mero de candidatos à adoção e de crianças
disponíveis, por exemplo, mostra que somente através da aplicação da lei
obteremos mudanças e avanços. Têm-se atualmente 26.143 pretendentes
inscritos e 3.606 crianças e adolescentes disponíveis para adoção. Sabe-se,
entretanto, que o número de crianças institucionalizadas que aguardam a
conclusão de processos jurídicos de destituição de poder familiar ultrapassa
consideravelmente esse número. Assim, as crianças permanecem em
instituições por longos períodos, e somente a celeridade dos processos
jurídicos oferecerão às mesmas a oportunidade de inserção em contextos
familiares através da adoção.
O presente estudo, portanto, não dispensa, mas ao contrário, convida
demais formulações teóricas e discussões psicológicas e jurídicas de modo a
prevenir impasses no processo de adoção e, em especial a devolução de
crianças e suas conseqüências, um tanto comprometedoras para o psiquismo
infantil e dos candidatos.
90
Referências Bibliográficas
Aragão, R. O. (2004). Narcisismo materno e criação do espaço psíquico para o
bebê. In R. O. Aragão (Org.), O bebê, o corpo e a linguagem (pp. 91-101). São
Paulo: Casa do Psicólogo.
Armelin, L. B. G. A. (2001). "Desejo de ser mãe, nem sempre é o desejo de
criar um filho". Seminário: A constituição do eu o narcisismo. Instituto Sedes
Sapientae, Departamento de Psicanálise. São Paulo.
Badinter, E. (1985). Um amor conquistado: o mito do amor materno / Elisabeth
Badinter; tradução de Waltensir Dutra. – Rio de Janeiro: Nova Fronteira.
Bauman, Zigmund (2006). Amor Líquido: sobre a fragilidade dos laços
humanos. Trad. Carlos Alberto Medeiros. Rio de Janeiro: Zahar.
Berenstein, I. e Puget, J. (1993). Psicanálise do Casal. Porto Alegre: Artes
Médicas.
Bernardino, L.M. F. (1994). Mãe é uma só? Contribuições psicanalíticas ao
estudo da adoção. Palavração Revista de Psicanálise,Temática, 2 (2).
Birman, J. (2007). Laços e desenlaces na contemporaneidade. Jornal de
Psicanálise. V. 40, n. 42, São Paulo. Disponível em: <http://pepsic.bvs-
psi.org.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0103-
58352007000100004&lng=pt&nrm=iso>. Acesso em: 11/01/2010.
Bolsanallo, A.; Bolsanallo, M. A. (1993) Conselhos: Análise do comportamento
humano em psicologia. São Paulo: Editora Educacional Brasileira.
Borsa, J. C. 2006 Considerações acerca da relação Mãe-Bebê da Gestação ao
Puerpério. Trabalho realizado em Porto Alegre. Disponível em:
http://www.contemporaneo.org.br/artigos/artigo89.pdf
Bowlby, J. (1984).Apego. Martins Fontes, São Paulo.
Ceccarelli, P. (2002). Configurações Edípicas da Contemporaneidade:
reflexões sobre as novas formas de filiação. in Pulsional Revista de
Psicanálise, São Paulo, ano XV, 161, 88-98.
Costa, N. R. A.; Rosseti-Ferreira, M. C. (2007). Tornar-se pai e mãe em um
processo de adoção tardia. Psicologia Reflexão e Crítica, Vol 20, nº 3, 351-160.
Delinski, J. C. (1997). O novo direito da filiação. São Paulo: Dialética.
Dias, C. M. S. B.; Silva, R. V. B.; Fonseca, C. M. S. (2008). Adoção de crianças
maiores na perspectiva dos pais adotivos. Contextos Clínicos. 1(1): 28-35.
Diniz, J. S. (1994). Aspectos Sociais e Psicológicos da Adoção. Em F. FREIRE
(Org), Abandono e adoção: contribuições para uma cultura da adoção II (pp.
105-120). Curitiba: Terra dos Homens.
Dolto, F. (1995). Destinos de crianças: adoção, famílias de acolhimento,
trabalho social. São Paulo, SP: Martins Fontes.
91
Dolto, F. (1996). No jogo do desejo: Ensaios clínicos. São Paulo: Editora Ática.
Ducatti, M. A. G. (2004). Diálogos sobre adoção. o Paulo: Casa do
Psicólogo.
Eiguer, A. (1985). Um divã para a família. Porto Alegre: Artmed.
ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE (1990). Lei Federal 8069
de 1990, São Paulo, Saraiva.
Ferreira, L. M. T. (1999). Tutela da filiação. Em T. S. Pereira (Org.), Tânia da
Silva (Coord). O melhor interessa da criança: um debate interdisciplinar. Rio de
Janeiro: Renovar.
Ferreira, M. C.; Aiello-Vaisberg, T. M. J. (2006). O pai ‘suficientemente bom’:
algumas considerações sobre o cuidado na psicanálise winnicottiana.
Mudanças – Psicologia da Saúde. 14(2), jul-dez, 2006, 136-142p.
Ferreira, R.P. (2003). Adoção tardia e adaptação à vida em família na
perspectiva dos pais. Recife, PE. Dissertação de Mestrado em Psicologia
Clínica – UNICAP, 168 p.
Freud, S. (1908) Romances Familiares. Em S. Freud (0rg). Obras Completas.
Tradução de Jayme Salomão. Rio de Janeiro: Imago.
Freud, S. (1909) “Romance familiar”. Em: Edição Standard Brasileira das Obras
Psicológicas Completas de Sigmund Freud. Vol. IX. RJ: Imago, 1986.
Freud, S. (1910). Leonardo da Vinci e uma lembrança da sua infância. Em S.
Freud (Org). Obras Completas. Rio de Janeiro:Imago.
Freud, S. (1915). A pulsão e suas vicissitudes. Em: Edição Standard Brasileira
das Obras Psicológicas Completas de Sigmund Freud. Vol. IX. RJ: Imago.
Fuks, L. B. (2008). Narcisismo e nculos. Clínica Psicanalítica. São Paulo:
Casa do Psicólogo.
Ghirardi, M. L. M. (2009). A devolução de crianças adotadas: ruptura do laço
familiar. Revista Brasileira de Medicina. 66-70
Gomes, A. J. S.; Resende, V. R. (2004). O pai presente: o desvelar da
paternidade em uma família contemporânea. Psicologia: Teoria e Pesquisa,
Universidade de Brasília, v. 20, p. 119-125.
Gonçalves, D. M, et al. (2006). O vinculo mãe-bebê na atualidade. Boletim de
Iniciação Científica em Psicologia. Universidade Presbiteriana Mackenzie. 7(1):
112-122.
Grunwald, A. B. (2003). Laços de família: critérios identificadores da filiação.
Jus Navigandi, Teresina, ano 7, n. 112. Disponível em:
http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=4362.
Hamad, N. (2002). A criança adotiva e suas famílias. Rio de Janeiro:
Companhia de Freud.
Klaus, M. H., Kennel, J. H., Klaus, P. H. (2000). Vínculo: construindo as bases
para um apego seguro. Editora Artmed.
92
Lacan, J. O Seminário, Livro 4:A relação de objeto. [1956-57].Rio de Janeiro:
Jorge Zahar, 1995.
Levinzon, G. K. (2000). A criança adotiva na clínica psicanalítica. São Paulo:
Ed. Escuta, 2ª Ed.
Levinzon, G. K. (2004). Adoção. São Paulo: Casa do Psicólogo.
Levy-Soussan (2009). Projeto de estruturação do I colóquio Franco-Brasileiro
sobre psicanálise, filiação e sociedade. Texto cedido pela organização do
evento.
Luchi, Tânia. (2009). Por que as crianças abrigadas devem ser preparadas
para a inserçãona família adotiva? Disponível em
<http://gafap.zip.net/arch2009-01-25_2009-01-31.html>
Martins A. J. V. S., Santos I. M. M. (2008). Vivendo do outro lado do método
canguru: a experiência materna. Rev. Eletr. Enf. [Internet]. 10(3):703-10.
Mendes, M. A.; Tavares, B. F.; Botelho, J. P.; Cunha, G. P. S.; Miuch, L. I.
(1994). Adoção e Doença Mental. Revista UCPEL. Vol 4, nº 2, Educat.
Monteiro, D. A. (2001). A função paterna e a cultura. Teoria e Pesquisa. 2005.
Disponível em:<http://pepsic.bvs-
psi.org.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1519-
94792001000100006&lng=en&nrm=iso>
Nogueira, J. F. (2001). A filiação que se constrói: o reconhecimento do afeto
como valor jurídico. São Paulo: Memória Jurídica Editora.
Paiva, Leila Dutra de (2004). Adoção: Significados e Possibilidades. São Paulo:
Casa do Psicóloga.
Pichon-Riviére, E. (1980). Teoria do Vínculo. Trad. Eliane T. Zamikhouwski.
3.ed., São Paulo: Martins Fontes.
Queiroz, E. F. (2004). O “estranho” filho adotivo: uma leitura clínica do
Unheimlich na adoção. Revista Latinoamericana de Psicopatologia
Fundamental, VII (4), 100-111.
Ramos, M. (2003). Novas parcerias, novos conflitos. Em Gomes, P. B. (Org.),
Vínculos Amorosos Contemporâneos. (pp. 57-76). São Paulo: Callis.
Santos, L. S. (1998). Adoção: da maternidade à maternagem: uma crítica ao
mito do amor materno. Revista Serviço Social e Sociedade, 57.
Santos, L. S. (2001). Mulheres que Entregam seus Filhos para Adoção:Os
vários lados dessa História. Em F. FREIRE (Org.), Abandono e adoção:
contribuições para uma cultura da adoção III (pp. 189-196). Curitiba: Terra dos
Homens.
Schettini, S. S. M. Amazonas, M. C. L. A. Dias, C. M. S. B. (2006). Famílias
adotivas: identidade e diferença. Psicologia em Estudo. Vol 11, nº 2.
Sluckin M, Herbert M, Sluckin A. (1990). Vínculo Materno. São Paulo: Edições
Paulinas;
Teixeira, A. C. P. (2000). Adoção: Um estudo das motivações inconscientes.
São Paulo: Ed. Stiliano.
93
Villa, F. (2001). A Adoção: O desejo e a necessidade. Em F. FREIRE (Org.),
Abandono e adoção: contribuições para uma cultura da adoção III (pp. 25-32).
Curitiba: Terra dos Homens.
Weber, L. N. D. (1998). Laços de ternura: pesquisas e histórias de adoção.
Curitiba: Editora Santa Mônica.
Weber, L. N. D. (n.d.). Famílias adotivas e mitos sobre laços de sangue.
Disponível em: <http://lidiaw.sites.uol.com.br/mitossangue.htm>
Werner, A. B. (2002). O que a psicanálise pode dizer sobre a adoção de
crianças pequenas? Ano 4, Col LEPSI IP/Fe-USP; Disponível em:
<http://www.proceedings.scielo.br/scielo.php?pid=MSC0000000032002000400
002&script=sci_arttext>
Winnicott, D. W. (1951). Objetos e fenômenos transicionais. In: ____. Da
pediatria à psicanálise: textos selecionados. Rio de Janeiro: Francisco Alves,
1978.
Zuanella, A. B. (2006). Amor e nculo: para além das fronteiras da
feminilidade. In: Associação Universitária de Pesquisa em Psicopatologia
Fundamental. Seção Congressos de Psicopatologia Fundamental, Anais 2006.
Disponível em: <http://www.fundamentalpsychopathology.org/>. Acesso em
26/06/2009.
94
Anexos
95
Presidência da República
Casa Civil
Subchefia para Assuntos Jurídicos
LEI Nº 12.010, DE 3 DE AGOSTO DE 2009.
Vigência
Dispõe sobre adoção; altera as Leis n
os
8.069, de
13 de julho de 1990 - Estatuto da Criança e do
Adolescente, 8.560, de 29 de dezembro de 1992;
revoga dispositivos da Lei n
o
10.406, de 10 de
- Código Civil, e da Consolidação
das Leis do Trabalho - CLT, aprovada pelo
Decreto-Lei n
o
5.452, de 1
o
de maio de 1943; e dá
outras providências.
O PRESIDENTE DA REPÚBLICA Faço saber que o Congresso Nacional
decreta e eu sanciono a seguinte Lei:
Art. 1
o
Esta Lei dispõe sobre o aperfeiçoamento da sistemática prevista para garantia do
direito à convivência familiar a todas as crianças e adolescentes, na forma prevista pela Lei n
o
8.069, de 13 de julho de 1990, Estatuto da Criança e do Adolescente.
§ 1
o
A intervenção estatal, em observância ao disposto no caput do art. 226 da
Constituição Federal, será prioritariamente voltada à orientação, apoio e promoção social da
família natural, junto à qual a criança e o adolescente devem permanecer, ressalvada absoluta
impossibilidade, demonstrada por decisão judicial fundamentada.
§ 2
o
Na impossibilidade de permanência na família natural, a criança e o adolescente
serão colocados sob adoção, tutela ou guarda, observadas as regras e princípios contidos na
Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990, e na Constituição Federal.
Art. 2
o
A Lei n
o
8.069, de 13 de julho de 1990, Estatuto da Criança e do Adolescente,
passa a vigorar com as seguintes alterações:
“Art. 8
o
.............................................................................
........................................................................................
§ Incumbe ao poder público proporcionar assistência psicológica à gestante e à mãe, no
período pré e pós-natal, inclusive como forma de prevenir ou minorar as consequências do
estado puerperal.
§ 5
o
A assistência referida no § 4
o
deste artigo deverá ser também prestada a gestantes ou
mães que manifestem interesse em entregar seus filhos para adoção.” (NR)
“Art. 13. ...........................................................................
Parágrafo único. As gestantes ou mães que manifestem interesse em entregar seus filhos para
adoção serão obrigatoriamente encaminhadas à Justiça da Infância e da Juventude.” (NR)
“Art. 19. ...........................................................................
96
§ 1º Toda criança ou adolescente que estiver inserido em programa de acolhimento familiar ou
institucional terá sua situação reavaliada, no máximo, a cada 6 (seis) meses, devendo a
autoridade judiciária competente, com base em relatório elaborado por equipe interprofissional
ou multidisciplinar, decidir de forma fundamentada pela possibilidade de reintegração familiar
ou colocação em família substituta, em quaisquer das modalidades previstas no art. 28 desta
Lei.
§ 2
o
A permanência da criança e do adolescente em programa de acolhimento institucional
não se prolongará por mais de 2 (dois) anos, salvo comprovada necessidade que atenda ao
seu superior interesse, devidamente fundamentada pela autoridade judiciária.
§ 3
o
A manutenção ou reintegração de criança ou adolescente à sua família terá preferência
em relação a qualquer outra providência, caso em que será esta incluída em programas de
orientação e auxílio, nos termos do parágrafo único do art. 23, dos incisos I e IV do caput do
art. 101 e dos incisos I a IV do caput do art. 129 desta Lei.” (NR)
“Art. 25. .........................................................................
Parágrafo único. Entende-se por família extensa ou ampliada aquela que se estende para
além da unidade pais e filhos ou da unidade do casal, formada por parentes próximos com os
quais a criança ou adolescente convive e mantém vínculos de afinidade e afetividade.” (NR)
“Art. 28. .........................................................................
§ 1
o
Sempre que possível, a criança ou o adolescente será previamente ouvido por equipe
interprofissional, respeitado seu estágio de desenvolvimento e grau de compreensão sobre as
implicações da medida, e terá sua opinião devidamente considerada.
§ 2
o
Tratando-se de maior de 12 (doze) anos de idade, será necessário seu consentimento,
colhido em audiência.
§ 3
o
Na apreciação do pedido levar-se-á em conta o grau de parentesco e a relação de
afinidade ou de afetividade, a fim de evitar ou minorar as consequências decorrentes da
medida.
§ 4
o
Os grupos de irmãos serão colocados sob adoção, tutela ou guarda da mesma família
substituta, ressalvada a comprovada existência de risco de abuso ou outra situação que
justifique plenamente a excepcionalidade de solução diversa, procurando-se, em qualquer
caso, evitar o rompimento definitivo dos vínculos fraternais.
§ 5
o
A colocação da criança ou adolescente em família substituta será precedida de sua
preparação gradativa e acompanhamento posterior, realizados pela equipe interprofissional a
serviço da Justiça da Infância e da Juventude, preferencialmente com o apoio dos técnicos
responsáveis pela execução da política municipal de garantia do direito à convivência familiar.
§ 6
o
Em se tratando de criança ou adolescente indígena ou proveniente de comunidade
remanescente de quilombo, é ainda obrigatório:
I - que sejam consideradas e respeitadas sua identidade social e cultural, os seus costumes e
tradições, bem como suas instituições, desde que não sejam incompatíveis com os direitos
fundamentais reconhecidos por esta Lei e pela Constituição Federal;
II - que a colocação familiar ocorra prioritariamente no seio de sua comunidade ou junto a
membros da mesma etnia;
97
III - a intervenção e oitiva de representantes do órgão federal responsável pela política
indigenista, no caso de crianças e adolescentes indígenas, e de antropólogos, perante a equipe
interprofissional ou multidisciplinar que irá acompanhar o caso.” (NR)
“Art. 33. ...........................................................................
.......................................................................................
§ Salvo expressa e fundamentada determinação em contrário, da autoridade judiciária
competente, ou quando a medida for aplicada em preparação para adoção, o deferimento da
guarda de criança ou adolescente a terceiros não impede o exercício do direito de visitas pelos
pais, assim como o dever de prestar alimentos, que serão objeto de regulamentação
específica, a pedido do interessado ou do Ministério Público.” (NR)
“Art. 34. O poder público estimulará, por meio de assistência jurídica, incentivos fiscais e
subsídios, o acolhimento, sob a forma de guarda, de criança ou adolescente afastado do
convívio familiar.
§ 1
o
A inclusão da criança ou adolescente em programas de acolhimento familiar terá
preferência a seu acolhimento institucional, observado, em qualquer caso, o caráter temporário
e excepcional da medida, nos termos desta Lei.
§ 2
o
Na hipótese do § 1
o
deste artigo a pessoa ou casal cadastrado no programa de
acolhimento familiar poderá receber a criança ou adolescente mediante guarda, observado o
disposto nos arts. 28 a 33 desta Lei.” (NR)
“Art. 36. A tutela será deferida, nos termos da lei civil, a pessoa de até 18 (dezoito) anos
incompletos.
.............................................................................” (NR)
“Art. 37. O tutor nomeado por testamento ou qualquer documento autêntico, conforme previsto
no parágrafo único do art. 1.729 da Lei n
o
10.406, de 10 de janeiro de 2002 - Código Civil,
deverá, no prazo de 30 (trinta) dias após a abertura da sucessão, ingressar com pedido
destinado ao controle judicial do ato, observando o procedimento previsto nos arts. 165 a 170
desta Lei.
Parágrafo único. Na apreciação do pedido, serão observados os requisitos previstos nos arts.
28 e 29 desta Lei, somente sendo deferida a tutela à pessoa indicada na disposição de última
vontade, se restar comprovado que a medida é vantajosa ao tutelando e que não existe outra
pessoa em melhores condições de assumi-la.” (NR)
“Art. 39. ...........................................................................
§ 1
o
A adoção é medida excepcional e irrevogável, à qual se deve recorrer apenas quando
esgotados os recursos de manutenção da criança ou adolescente na família natural ou
extensa, na forma do parágrafo único do art. 25 desta Lei.
§ 2
o
É vedada a adoção por procuração.” (NR)
“Art. 42. Podem adotar os maiores de 18 (dezoito) anos, independentemente do estado civil.
.......................................................................................
§ 2
o
Para adoção conjunta, é indispensável que os adotantes sejam casados civilmente ou
mantenham união estável, comprovada a estabilidade da família.
98
........................................................................................
§ 4
o
Os divorciados, os judicialmente separados e os ex-companheiros podem adotar
conjuntamente, contanto que acordem sobre a guarda e o regime de visitas e desde que o
estágio de convivência tenha sido iniciado na constância do período de convivência e que seja
comprovada a existência de vínculos de afinidade e afetividade com aquele não detentor da
guarda, que justifiquem a excepcionalidade da concessão.
§ 5
o
Nos casos do § 4
o
deste artigo, desde que demonstrado efetivo benefício ao adotando,
será assegurada a guarda compartilhada, conforme previsto no art. 1.584 da Lei n
o
10.406, de
10 de janeiro de 2002 - Código Civil.
§ 6
o
A adoção poderá ser deferida ao adotante que, após inequívoca manifestação de
vontade, vier a falecer no curso do procedimento, antes de prolatada a sentença.” (NR)
“Art. 46. ............................................................................
§ 1
o
O estágio de convivência poderá ser dispensado se o adotando estiver sob a tutela ou
guarda legal do adotante durante tempo suficiente para que seja possível avaliar a
conveniência da constituição do vínculo.
§ 2
o
A simples guarda de fato não autoriza, por si , a dispensa da realização do estágio de
convivência.
§ 3
o
Em caso de adoção por pessoa ou casal residente ou domiciliado fora do País, o estágio
de convivência, cumprido no território nacional, será de, no mínimo, 30 (trinta) dias.
§ 4
o
O estágio de convivência será acompanhado pela equipe interprofissional a serviço da
Justiça da Infância e da Juventude, preferencialmente com apoio dos técnicos responsáveis
pela execução da política de garantia do direito à convivência familiar, que apresentarão
relatório minucioso acerca da conveniência do deferimento da medida.” (NR)
“Art. 47. ..........................................................................
.......................................................................................
§ 3
o
A pedido do adotante, o novo registro poderá ser lavrado no Cartório do Registro Civil do
Município de sua residência.
§ 4
o
Nenhuma observação sobre a origem do ato poderá constar nas certidões do registro.
§ 5
o
A sentença conferirá ao adotado o nome do adotante e, a pedido de qualquer deles,
poderá determinar a modificação do prenome.
§ 6
o
Caso a modificação de prenome seja requerida pelo adotante, é obrigatória a oitiva do
adotando, observado o disposto nos §§ 1
o
e 2
o
do art. 28 desta Lei.
§ 7
o
A adoção produz seus efeitos a partir do trânsito em julgado da sentença constitutiva,
exceto na hipótese prevista no § 6
o
do art. 42 desta Lei, caso em que terá força retroativa à
data do óbito.
§ 8
o
O processo relativo à adoção assim como outros a ele relacionados serão mantidos em
arquivo, admitindo-se seu armazenamento em microfilme ou por outros meios, garantida a sua
conservação para consulta a qualquer tempo.” (NR)
99
“Art. 48. O adotado tem direito de conhecer sua origem biológica, bem como de obter acesso
irrestrito ao processo no qual a medida foi aplicada e seus eventuais incidentes, após
completar 18 (dezoito) anos.
Parágrafo único. O acesso ao processo de adoção poderá ser também deferido ao adotado
menor de 18 (dezoito) anos, a seu pedido, assegurada orientação e assistência jurídica e
psicológica.” (NR)
“Art. 50. ...........................................................................
........................................................................................
§ 3
o
A inscrição de postulantes à adoção será precedida de um período de preparação
psicossocial e jurídica, orientado pela equipe técnica da Justiça da Infância e da Juventude,
preferencialmente com apoio dos técnicos responsáveis pela execução da política municipal de
garantia do direito à convivência familiar.
§ 4
o
Sempre que possível e recomendável, a preparação referida no § 3
o
deste artigo incluirá o
contato com crianças e adolescentes em acolhimento familiar ou institucional em condições de
serem adotados, a ser realizado sob a orientação, supervisão e avaliação da equipe técnica da
Justiça da Infância e da Juventude, com apoio dos técnicos responsáveis pelo programa de
acolhimento e pela execução da política municipal de garantia do direito à convivência familiar.
§ 5
o
Serão criados e implementados cadastros estaduais e nacional de crianças e
adolescentes em condições de serem adotados e de pessoas ou casais habilitados à adoção.
§ 6
o
Haverá cadastros distintos para pessoas ou casais residentes fora do País, que somente
serão consultados na inexistência de postulantes nacionais habilitados nos cadastros
mencionados no § 5
o
deste artigo.
§ 7
o
As autoridades estaduais e federais em matéria de adoção terão acesso integral aos
cadastros, incumbindo-lhes a troca de informações e a cooperação mútua, para melhoria do
sistema.
§ 8
o
A autoridade judiciária providenciará, no prazo de 48 (quarenta e oito) horas, a inscrição
das crianças e adolescentes em condições de serem adotados que não tiveram colocação
familiar na comarca de origem, e das pessoas ou casais que tiveram deferida sua habilitação à
adoção nos cadastros estadual e nacional referidos no § 5
o
deste artigo, sob pena de
responsabilidade.
§ 9
o
Compete à Autoridade Central Estadual zelar pela manutenção e correta alimentação dos
cadastros, com posterior comunicação à Autoridade Central Federal Brasileira.
§ 10. A adoção internacional somente será deferida se, após consulta ao cadastro de pessoas
ou casais habilitados à adoção, mantido pela Justiça da Infância e da Juventude na comarca,
bem como aos cadastros estadual e nacional referidos no § 5
o
deste artigo, não for encontrado
interessado com residência permanente no Brasil.
§ 11. Enquanto não localizada pessoa ou casal interessado em sua adoção, a criança ou o
adolescente, sempre que possível e recomendável, será colocado sob guarda de família
cadastrada em programa de acolhimento familiar.
§ 12. A alimentação do cadastro e a convocação criteriosa dos postulantes à adoção serão
fiscalizadas pelo Ministério Público.
§ 13. Somente poderá ser deferida adoção em favor de candidato domiciliado no Brasil não
cadastrado previamente nos termos desta Lei quando:
100
I - se tratar de pedido de adoção unilateral;
II - for formulada por parente com o qual a criança ou adolescente mantenha vínculos de
afinidade e afetividade;
III - oriundo o pedido de quem detém a tutela ou guarda legal de criança maior de 3 (três) anos
ou adolescente, desde que o lapso de tempo de convivência comprove a fixação de laços de
afinidade e afetividade, e não seja constatada a ocorrência de má-fé ou qualquer das situações
previstas nos arts. 237 ou 238 desta Lei.
§ 14. Nas hipóteses previstas no § 13 deste artigo, o candidato deverá comprovar, no curso do
procedimento, que preenche os requisitos necessários à adoção, conforme previsto nesta Lei.”
(NR)
“Art. 51. Considera-se adoção internacional aquela na qual a pessoa ou casal postulante é
residente ou domiciliado fora do Brasil, conforme previsto no Artigo 2 da Convenção de Haia,
de 29 de maio de 1993, Relativa à Proteção das Crianças e à Cooperação em Matéria de
Adoção Internacional, aprovada pelo Decreto Legislativo n
o
1, de 14 de janeiro de 1999, e
promulgada pelo Decreto n
o
3.087, de 21 de junho de 1999.
§ 1
o
A adoção internacional de criança ou adolescente brasileiro ou domiciliado no Brasil
somente terá lugar quando restar comprovado:
I - que a colocação em família substituta é a solução adequada ao caso concreto;
II - que foram esgotadas todas as possibilidades de colocação da criança ou adolescente em
família substituta brasileira, após consulta aos cadastros mencionados no art. 50 desta Lei;
III - que, em se tratando de adoção de adolescente, este foi consultado, por meios adequados
ao seu estágio de desenvolvimento, e que se encontra preparado para a medida, mediante
parecer elaborado por equipe interprofissional, observado o disposto nos §§ 1
o
e 2
o
do art. 28
desta Lei.
§ 2
o
Os brasileiros residentes no exterior terão preferência aos estrangeiros, nos casos de
adoção internacional de criança ou adolescente brasileiro.
§ 3
o
A adoção internacional pressupõe a intervenção das Autoridades Centrais Estaduais e
Federal em matéria de adoção internacional.” (NR)
“Art. 52. A adoção internacional observará o procedimento previsto nos arts. 165 a 170 desta
Lei, com as seguintes adaptações:
I - a pessoa ou casal estrangeiro, interessado em adotar criança ou adolescente brasileiro,
deverá formular pedido de habilitação à adoção perante a Autoridade Central em matéria de
adoção internacional no país de acolhida, assim entendido aquele onde está situada sua
residência habitual;
II - se a Autoridade Central do país de acolhida considerar que os solicitantes estão habilitados
e aptos para adotar, emitirá um relatório que contenha informações sobre a identidade, a
capacidade jurídica e adequação dos solicitantes para adotar, sua situação pessoal, familiar e
médica, seu meio social, os motivos que os animam e sua aptidão para assumir uma adoção
internacional;
III - a Autoridade Central do país de acolhida enviará o relatório à Autoridade Central Estadual,
com cópia para a Autoridade Central Federal Brasileira;
101
IV - o relatório será instruído com toda a documentação necessária, incluindo estudo
psicossocial elaborado por equipe interprofissional habilitada e cópia autenticada da legislação
pertinente, acompanhada da respectiva prova de vigência;
V - os documentos em língua estrangeira serão devidamente autenticados pela autoridade
consular, observados os tratados e convenções internacionais, e acompanhados da respectiva
tradução, por tradutor público juramentado;
VI - a Autoridade Central Estadual poderá fazer exigências e solicitar complementação sobre o
estudo psicossocial do postulante estrangeiro à adoção, já realizado no país de acolhida;
VII - verificada, após estudo realizado pela Autoridade Central Estadual, a compatibilidade da
legislação estrangeira com a nacional, além do preenchimento por parte dos postulantes à
medida dos requisitos objetivos e subjetivos necessários ao seu deferimento, tanto à luz do que
dispõe esta Lei como da legislação do país de acolhida, será expedido laudo de habilitação à
adoção internacional, que terá validade por, no máximo, 1 (um) ano;
VIII - de posse do laudo de habilitação, o interessado será autorizado a formalizar pedido de
adoção perante o Juízo da Infância e da Juventude do local em que se encontra a criança ou
adolescente, conforme indicação efetuada pela Autoridade Central Estadual.
§ 1
o
Se a legislação do país de acolhida assim o autorizar, admite-se que os pedidos de
habilitação à adoção internacional sejam intermediados por organismos credenciados.
§ 2
o
Incumbe à Autoridade Central Federal Brasileira o credenciamento de organismos
nacionais e estrangeiros encarregados de intermediar pedidos de habilitação à adoção
internacional, com posterior comunicação às Autoridades Centrais Estaduais e publicação nos
órgãos oficiais de imprensa e em sítio próprio da internet.
§ 3
o
Somente será admissível o credenciamento de organismos que:
I - sejam oriundos de países que ratificaram a Convenção de Haia e estejam devidamente
credenciados pela Autoridade Central do país onde estiverem sediados e no país de acolhida
do adotando para atuar em adoção internacional no Brasil;
II - satisfizerem as condições de integridade moral, competência profissional, experiência e
responsabilidade exigidas pelos países respectivos e pela Autoridade Central Federal
Brasileira;
III - forem qualificados por seus padrões éticos e sua formação e experiência para atuar na
área de adoção internacional;
IV - cumprirem os requisitos exigidos pelo ordenamento jurídico brasileiro e pelas normas
estabelecidas pela Autoridade Central Federal Brasileira.
§ 4
o
Os organismos credenciados deverão ainda:
I - perseguir unicamente fins não lucrativos, nas condições e dentro dos limites fixados pelas
autoridades competentes do país onde estiverem sediados, do país de acolhida e pela
Autoridade Central Federal Brasileira;
II - ser dirigidos e administrados por pessoas qualificadas e de reconhecida idoneidade moral,
com comprovada formação ou experiência para atuar na área de adoção internacional,
cadastradas pelo Departamento de Polícia Federal e aprovadas pela Autoridade Central
Federal Brasileira, mediante publicação de portaria do órgão federal competente;
102
III - estar submetidos à supervisão das autoridades competentes do país onde estiverem
sediados e no país de acolhida, inclusive quanto à sua composição, funcionamento e situação
financeira;
IV - apresentar à Autoridade Central Federal Brasileira, a cada ano, relatório geral das
atividades desenvolvidas, bem como relatório de acompanhamento das adoções internacionais
efetuadas no período, cuja cópia será encaminhada ao Departamento de Polícia Federal;
V - enviar relatório pós-adotivo semestral para a Autoridade Central Estadual, com cópia para a
Autoridade Central Federal Brasileira, pelo período mínimo de 2 (dois) anos. O envio do
relatório será mantido até a juntada de cópia autenticada do registro civil, estabelecendo a
cidadania do país de acolhida para o adotado;
VI - tomar as medidas necessárias para garantir que os adotantes encaminhem à Autoridade
Central Federal Brasileira cópia da certidão de registro de nascimento estrangeira e do
certificado de nacionalidade tão logo lhes sejam concedidos.
§ 5
o
A não apresentação dos relatórios referidos no § 4
o
deste artigo pelo organismo
credenciado poderá acarretar a suspensão de seu credenciamento.
§ 6
o
O credenciamento de organismo nacional ou estrangeiro encarregado de intermediar
pedidos de adoção internacional terá validade de 2 (dois) anos.
§ 7
o
A renovação do credenciamento poderá ser concedida mediante requerimento
protocolado na Autoridade Central Federal Brasileira nos 60 (sessenta) dias anteriores ao
término do respectivo prazo de validade.
§ 8
o
Antes de transitada em julgado a decisão que concedeu a adoção internacional, não será
permitida a saída do adotando do território nacional.
§ 9
o
Transitada em julgado a decisão, a autoridade judiciária determinará a expedição de
alvará com autorização de viagem, bem como para obtenção de passaporte, constando,
obrigatoriamente, as características da criança ou adolescente adotado, como idade, cor, sexo,
eventuais sinais ou traços peculiares, assim como foto recente e a aposição da impressão
digital do seu polegar direito, instruindo o documento com cópia autenticada da decisão e
certidão de trânsito em julgado.
§ 10. A Autoridade Central Federal Brasileira poderá, a qualquer momento, solicitar
informações sobre a situação das crianças e adolescentes adotados.
§ 11. A cobrança de valores por parte dos organismos credenciados, que sejam considerados
abusivos pela Autoridade Central Federal Brasileira e que não estejam devidamente
comprovados, é causa de seu descredenciamento.
§ 12. Uma mesma pessoa ou seu cônjuge não podem ser representados por mais de uma
entidade credenciada para atuar na cooperação em adoção internacional.
§ 13. A habilitação de postulante estrangeiro ou domiciliado fora do Brasil terá validade
máxima de 1 (um) ano, podendo ser renovada.
§ 14. É vedado o contato direto de representantes de organismos de adoção, nacionais ou
estrangeiros, com dirigentes de programas de acolhimento institucional ou familiar, assim como
com crianças e adolescentes em condições de serem adotados, sem a devida autorização
judicial.
103
§ 15. A Autoridade Central Federal Brasileira poderá limitar ou suspender a concessão de
novos credenciamentos sempre que julgar necessário, mediante ato administrativo
fundamentado.” (NR)
“Art. 52-A. É vedado, sob pena de responsabilidade e descredenciamento, o repasse de
recursos provenientes de organismos estrangeiros encarregados de intermediar pedidos de
adoção internacional a organismos nacionais ou a pessoas físicas.
Parágrafo único. Eventuais repasses somente poderão ser efetuados via Fundo dos Direitos
da Criança e do Adolescente e estarão sujeitos às deliberações do respectivo Conselho de
Direitos da Criança e do Adolescente.”
“Art. 52-B. A adoção por brasileiro residente no exterior em país ratificante da Convenção de
Haia, cujo processo de adoção tenha sido processado em conformidade com a legislação
vigente no país de residência e atendido o disposto na Alínea “c” do Artigo 17 da referida
Convenção, será automaticamente recepcionada com o reingresso no Brasil.
§ 1
o
Caso não tenha sido atendido o disposto na Alínea “c” do Artigo 17 da Convenção de
Haia, deverá a sentença ser homologada pelo Superior Tribunal de Justiça.
§ 2
o
O pretendente brasileiro residente no exterior em país não ratificante da Convenção de
Haia, uma vez reingressado no Brasil, deverá requerer a homologação da sentença estrangeira
pelo Superior Tribunal de Justiça.”
“Art. 52-C. Nas adoções internacionais, quando o Brasil for o país de acolhida, a decisão da
autoridade competente do país de origem da criança ou do adolescente será conhecida pela
Autoridade Central Estadual que tiver processado o pedido de habilitação dos pais adotivos,
que comunicará o fato à Autoridade Central Federal e determinará as providências necessárias
à expedição do Certificado de Naturalização Provisório.
§ 1
o
A Autoridade Central Estadual, ouvido o Ministério Público, somente deixará de
reconhecer os efeitos daquela decisão se restar demonstrado que a adoção é manifestamente
contrária à ordem pública ou não atende ao interesse superior da criança ou do adolescente.
§ 2
o
Na hipótese de não reconhecimento da adoção, prevista no § 1
o
deste artigo, o Ministério
Público deverá imediatamente requerer o que for de direito para resguardar os interesses da
criança ou do adolescente, comunicando-se as providências à Autoridade Central Estadual,
que fará a comunicação à Autoridade Central Federal Brasileira e à Autoridade Central do país
de origem.”
“Art. 52-D. Nas adoções internacionais, quando o Brasil for o país de acolhida e a adoção não
tenha sido deferida no país de origem porque a sua legislação a delega ao país de acolhida,
ou, ainda, na hipótese de, mesmo com decisão, a criança ou o adolescente ser oriundo de país
que não tenha aderido à Convenção referida, o processo de adoção seguirá as regras da
adoção nacional.”
“Art. 87. ..........................................................................
......................................................................................
VI - políticas e programas destinados a prevenir ou abreviar o período de afastamento do
convívio familiar e a garantir o efetivo exercício do direito à convivência familiar de crianças e
adolescentes;
VII - campanhas de estímulo ao acolhimento sob forma de guarda de crianças e adolescentes
afastados do convívio familiar e à adoção, especificamente inter-racial, de crianças maiores ou
de adolescentes, com necessidades específicas de saúde ou com deficiências e de grupos de
irmãos.” (NR)
104
“Art. 88. ...........................................................................
.......................................................................................
VI - integração operacional de órgãos do Judiciário, Ministério Público, Defensoria, Conselho
Tutelar e encarregados da execução das políticas sociais básicas e de assistência social, para
efeito de agilização do atendimento de crianças e de adolescentes inseridos em programas de
acolhimento familiar ou institucional, com vista na sua rápida reintegração à família de origem
ou, se tal solução se mostrar comprovadamente inviável, sua colocação em família substituta,
em quaisquer das modalidades previstas no art. 28 desta Lei;
VII - mobilização da opinião pública para a indispensável participação dos diversos segmentos
da sociedade.” (NR)
“Art. 90. ...........................................................................
.......................................................................................
IV - acolhimento institucional;
.......................................................................................
§ 1
o
As entidades governamentais e não governamentais deverão proceder à inscrição de
seus programas, especificando os regimes de atendimento, na forma definida neste artigo, no
Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente, o qual manterá registro das
inscrições e de suas alterações, do que fará comunicação ao Conselho Tutelar e à autoridade
judiciária.
§ 2
o
Os recursos destinados à implementação e manutenção dos programas relacionados
neste artigo serão previstos nas dotações orçamentárias dos órgãos públicos encarregados
das áreas de Educação, Saúde e Assistência Social, dentre outros, observando-se o princípio
da prioridade absoluta à criança e ao adolescente preconizado pelo caput do art. 227 da
Constituição Federal e pelo caput e parágrafo único do art. 4
o
desta Lei.
§ 3
o
Os programas em execução serão reavaliados pelo Conselho Municipal dos Direitos da
Criança e do Adolescente, no máximo, a cada 2 (dois) anos, constituindo-se critérios para
renovação da autorização de funcionamento:
I - o efetivo respeito às regras e princípios desta Lei, bem como às resoluções relativas à
modalidade de atendimento prestado expedidas pelos Conselhos de Direitos da Criança e do
Adolescente, em todos os níveis;
II - a qualidade e eficiência do trabalho desenvolvido, atestadas pelo Conselho Tutelar, pelo
Ministério Público e pela Justiça da Infância e da Juventude;
III - em se tratando de programas de acolhimento institucional ou familiar, serão considerados
os índices de sucesso na reintegração familiar ou de adaptação à família substituta, conforme o
caso.” (NR)
“Art. 91. .........................................................................
§ 1º Será negado o registro à entidade que:
......................................................................................
105
e) não se adequar ou deixar de cumprir as resoluções e deliberações relativas à modalidade de
atendimento prestado expedidas pelos Conselhos de Direitos da Criança e do Adolescente, em
todos os níveis.
§ 2
o
O registro terá validade máxima de 4 (quatro) anos, cabendo ao Conselho Municipal dos
Direitos da Criança e do Adolescente, periodicamente, reavaliar o cabimento de sua
renovação, observado o disposto no § 1
o
deste artigo.” (NR)
“Art. 92. As entidades que desenvolvam programas de acolhimento familiar ou institucional
deverão adotar os seguintes princípios:
I - preservação dos vínculos familiares e promoção da reintegração familiar;
II - integração em família substituta, quando esgotados os recursos de manutenção na família
natural ou extensa;
.......................................................................................
§ O dirigente de entidade que desenvolve programa de acolhimento institucional é
equiparado ao guardião, para todos os efeitos de direito.
§ 2
o
Os dirigentes de entidades que desenvolvem programas de acolhimento familiar ou
institucional remeterão à autoridade judiciária, no máximo a cada 6 (seis) meses, relatório
circunstanciado acerca da situação de cada criança ou adolescente acolhido e sua família,
para fins da reavaliação prevista no § 1
o
do art. 19 desta Lei.
§ 3
o
Os entes federados, por intermédio dos Poderes Executivo e Judiciário, promoverão
conjuntamente a permanente qualificação dos profissionais que atuam direta ou indiretamente
em programas de acolhimento institucional e destinados à colocação familiar de crianças e
adolescentes, incluindo membros do Poder Judiciário, Ministério Público e Conselho Tutelar.
§ 4
o
Salvo determinação em contrário da autoridade judiciária competente, as entidades que
desenvolvem programas de acolhimento familiar ou institucional, se necessário com o auxílio
do Conselho Tutelar e dos órgãos de assistência social, estimularão o contato da criança ou
adolescente com seus pais e parentes, em cumprimento ao disposto nos incisos I e VIII do
caput deste artigo.
§ 5
o
As entidades que desenvolvem programas de acolhimento familiar ou institucional
somente poderão receber recursos públicos se comprovado o atendimento dos princípios,
exigências e finalidades desta Lei.
§ 6
o
O descumprimento das disposições desta Lei pelo dirigente de entidade que desenvolva
programas de acolhimento familiar ou institucional é causa de sua destituição, sem prejuízo da
apuração de sua responsabilidade administrativa, civil e criminal.” (NR)
“Art. 93. As entidades que mantenham programa de acolhimento institucional poderão, em
caráter excepcional e de urgência, acolher crianças e adolescentes sem prévia determinação
da autoridade competente, fazendo comunicação do fato em até 24 (vinte e quatro) horas ao
Juiz da Infância e da Juventude, sob pena de responsabilidade.
Parágrafo único. Recebida a comunicação, a autoridade judiciária, ouvido o Ministério Público
e se necessário com o apoio do Conselho Tutelar local, tomará as medidas necessárias para
promover a imediata reintegração familiar da criança ou do adolescente ou, se por qualquer
razão não for isso possível ou recomendável, para seu encaminhamento a programa de
acolhimento familiar, institucional ou a família substituta, observado o disposto no § 2
o
do art.
101 desta Lei.” (NR)
106
“Art. 94. .............................................................................
.........................................................................................
§ 1
o
Aplicam-se, no que couber, as obrigações constantes deste artigo às entidades que
mantêm programas de acolhimento institucional e familiar.
..............................................................................” (NR)
“Art. 97. ..........................................................................
.......................................................................................
§ 1
o
Em caso de reiteradas infrações cometidas por entidades de atendimento, que coloquem
em risco os direitos assegurados nesta Lei, deverá ser o fato comunicado ao Ministério Público
ou representado perante autoridade judiciária competente para as providências cabíveis,
inclusive suspensão das atividades ou dissolução da entidade.
§ 2
o
As pessoas jurídicas de direito público e as organizações não governamentais
responderão pelos danos que seus agentes causarem às crianças e aos adolescentes,
caracterizado o descumprimento dos princípios norteadores das atividades de proteção
específica.” (NR)
“Art. 100. ........................................................................
Parágrafo único. São também princípios que regem a aplicação das medidas:
I - condição da criança e do adolescente como sujeitos de direitos: crianças e adolescentes são
os titulares dos direitos previstos nesta e em outras Leis, bem como na Constituição Federal;
II - proteção integral e prioritária: a interpretação e aplicação de toda e qualquer norma contida
nesta Lei deve ser voltada à proteção integral e prioritária dos direitos de que crianças e
adolescentes são titulares;
III - responsabilidade primária e solidária do poder público: a plena efetivação dos direitos
assegurados a crianças e a adolescentes por esta Lei e pela Constituição Federal, salvo nos
casos por esta expressamente ressalvados, é de responsabilidade primária e solidária das 3
(três) esferas de governo, sem prejuízo da municipalização do atendimento e da possibilidade
da execução de programas por entidades não governamentais;
IV - interesse superior da criança e do adolescente: a intervenção deve atender prioritariamente
aos interesses e direitos da criança e do adolescente, sem prejuízo da consideração que for
devida a outros interesses legítimos no âmbito da pluralidade dos interesses presentes no caso
concreto;
V - privacidade: a promoção dos direitos e proteção da criança e do adolescente deve ser
efetuada no respeito pela intimidade, direito à imagem e reserva da sua vida privada;
VI - intervenção precoce: a intervenção das autoridades competentes deve ser efetuada logo
que a situação de perigo seja conhecida;
VII - intervenção mínima: a intervenção deve ser exercida exclusivamente pelas autoridades e
instituições cuja ação seja indispensável à efetiva promoção dos direitos e à proteção da
criança e do adolescente;
107
VIII - proporcionalidade e atualidade: a intervenção deve ser a necessária e adequada à
situação de perigo em que a criança ou o adolescente se encontram no momento em que a
decisão é tomada;
IX - responsabilidade parental: a intervenção deve ser efetuada de modo que os pais assumam
os seus deveres para com a criança e o adolescente;
X - prevalência da família: na promoção de direitos e na proteção da criança e do adolescente
deve ser dada prevalência às medidas que os mantenham ou reintegrem na sua família natural
ou extensa ou, se isto não for possível, que promovam a sua integração em família substituta;
XI - obrigatoriedade da informação: a criança e o adolescente, respeitado seu estágio de
desenvolvimento e capacidade de compreensão, seus pais ou responsável devem ser
informados dos seus direitos, dos motivos que determinaram a intervenção e da forma como
esta se processa;
XII - oitiva obrigatória e participação: a criança e o adolescente, em separado ou na companhia
dos pais, de responsável ou de pessoa por si indicada, bem como os seus pais ou responsável,
têm direito a ser ouvidos e a participar nos atos e na definição da medida de promoção dos
direitos e de proteção, sendo sua opinião devidamente considerada pela autoridade judiciária
competente, observado o disposto nos §§ 1
o
e 2
o
do art. 28 desta Lei.” (NR)
“Art. 101. .........................................................................
.......................................................................................
VII - acolhimento institucional;
VIII - inclusão em programa de acolhimento familiar;
IX - colocação em família substituta.
§ 1
o
O acolhimento institucional e o acolhimento familiar são medidas provisórias e
excepcionais, utilizáveis como forma de transição para reintegração familiar ou, não sendo esta
possível, para colocação em família substituta, não implicando privação de liberdade.
§ 2
o
Sem prejuízo da tomada de medidas emergenciais para proteção de vítimas de violência
ou abuso sexual e das providências a que alude o art. 130 desta Lei, o afastamento da criança
ou adolescente do convívio familiar é de competência exclusiva da autoridade judiciária e
importará na deflagração, a pedido do Ministério Público ou de quem tenha legítimo interesse,
de procedimento judicial contencioso, no qual se garanta aos pais ou ao responsável legal o
exercício do contraditório e da ampla defesa.
§ 3
o
Crianças e adolescentes somente poderão ser encaminhados às instituições que
executam programas de acolhimento institucional, governamentais ou não, por meio de uma
Guia de Acolhimento, expedida pela autoridade judiciária, na qual obrigatoriamente constará,
dentre outros:
I - sua identificação e a qualificação completa de seus pais ou de seu responsável, se
conhecidos;
II - o endereço de residência dos pais ou do responsável, com pontos de referência;
III - os nomes de parentes ou de terceiros interessados em tê-los sob sua guarda;
IV - os motivos da retirada ou da não reintegração ao convívio familiar.
108
§ 4
o
Imediatamente após o acolhimento da criança ou do adolescente, a entidade responsável
pelo programa de acolhimento institucional ou familiar elaborará um plano individual de
atendimento, visando à reintegração familiar, ressalvada a existência de ordem escrita e
fundamentada em contrário de autoridade judiciária competente, caso em que também deverá
contemplar sua colocação em família substituta, observadas as regras e princípios desta Lei.
§ 5
o
O plano individual será elaborado sob a responsabilidade da equipe técnica do respectivo
programa de atendimento e levará em consideração a opinião da criança ou do adolescente e
a oitiva dos pais ou do responsável.
§ 6
o
Constarão do plano individual, dentre outros:
I - os resultados da avaliação interdisciplinar;
II - os compromissos assumidos pelos pais ou responsável; e
III - a previsão das atividades a serem desenvolvidas com a criança ou com o adolescente
acolhido e seus pais ou responsável, com vista na reintegração familiar ou, caso seja esta
vedada por expressa e fundamentada determinação judicial, as providências a serem tomadas
para sua colocação em família substituta, sob direta supervisão da autoridade judiciária.
§ 7
o
O acolhimento familiar ou institucional ocorrerá no local mais próximo à residência dos
pais ou do responsável e, como parte do processo de reintegração familiar, sempre que
identificada a necessidade, a família de origem será incluída em programas oficiais de
orientação, de apoio e de promoção social, sendo facilitado e estimulado o contato com a
criança ou com o adolescente acolhido.
§ 8
o
Verificada a possibilidade de reintegração familiar, o responsável pelo programa de
acolhimento familiar ou institucional fará imediata comunicação à autoridade judiciária, que
dará vista ao Ministério Público, pelo prazo de 5 (cinco) dias, decidindo em igual prazo.
§ 9
o
Em sendo constatada a impossibilidade de reintegração da criança ou do adolescente à
família de origem, após seu encaminhamento a programas oficiais ou comunitários de
orientação, apoio e promoção social, será enviado relatório fundamentado ao Ministério
Público, no qual conste a descrição pormenorizada das providências tomadas e a expressa
recomendação, subscrita pelos técnicos da entidade ou responsáveis pela execução da política
municipal de garantia do direito à convivência familiar, para a destituição do poder familiar, ou
destituição de tutela ou guarda.
§ 10. Recebido o relatório, o Ministério Público terá o prazo de 30 (trinta) dias para o ingresso
com a ação de destituição do poder familiar, salvo se entender necessária a realização de
estudos complementares ou outras providências que entender indispensáveis ao ajuizamento
da demanda.
§ 11. A autoridade judiciária manterá, em cada comarca ou foro regional, um cadastro
contendo informações atualizadas sobre as crianças e adolescentes em regime de acolhimento
familiar e institucional sob sua responsabilidade, com informações pormenorizadas sobre a
situação jurídica de cada um, bem como as providências tomadas para sua reintegração
familiar ou colocação em família substituta, em qualquer das modalidades previstas no art. 28
desta Lei.
§ 12. Terão acesso ao cadastro o Ministério Público, o Conselho Tutelar, o órgão gestor da
Assistência Social e os Conselhos Municipais dos Direitos da Criança e do Adolescente e da
Assistência Social, aos quais incumbe deliberar sobre a implementação de políticas públicas
que permitam reduzir o número de crianças e adolescentes afastados do convívio familiar e
abreviar o período de permanência em programa de acolhimento.” (NR)
“Art. 102.
..........................................................................
109
........................................................................................
§ 3
o
Caso ainda não definida a paternidade, será deflagrado procedimento específico
destinado à sua averiguação, conforme previsto pela Lei n
o
8.560, de 29 de dezembro de
1992.
§ 4
o
Nas hipóteses previstas no § 3
o
deste artigo, é dispensável o ajuizamento de ação de
investigação de paternidade pelo Ministério Público se, após o não comparecimento ou a
recusa do suposto pai em assumir a paternidade a ele atribuída, a criança for encaminhada
para adoção.” (NR)
“Art. 136. .........................................................................
.......................................................................................
XI - representar ao Ministério Público para efeito das ações de perda ou suspensão do poder
familiar, após esgotadas as possibilidades de manutenção da criança ou do adolescente junto
à família natural.
Parágrafo único. Se, no exercício de suas atribuições, o Conselho Tutelar entender necessário
o afastamento do convívio familiar, comunicará incontinenti o fato ao Ministério Público,
prestando-lhe informações sobre os motivos de tal entendimento e as providências tomadas
para a orientação, o apoio e a promoção social da família.” (NR)
“Art. 152. .....................................................................
Parágrafo único. É assegurada, sob pena de responsabilidade, prioridade absoluta na
tramitação dos processos e procedimentos previstos nesta Lei, assim como na execução dos
atos e diligências judiciais a eles referentes.” (NR)
“Art. 153. .....................................................................
Parágrafo único. O disposto neste artigo não se aplica para o fim de afastamento da criança
ou do adolescente de sua família de origem e em outros procedimentos necessariamente
contenciosos.” (NR)
“Art. 161. .....................................................................
§ 1
o
A autoridade judiciária, de ofício ou a requerimento das partes ou do Ministério Público,
determinará a realização de estudo social ou perícia por equipe interprofissional ou
multidisciplinar, bem como a oitiva de testemunhas que comprovem a presença de uma das
causas de suspensão ou destituição do poder familiar previstas nos arts. 1.637 e 1.638 da Lei
n
o
10.406, de 10 de janeiro de 2002 - Código Civil, ou no art. 24 desta Lei.
§ 2
o
Em sendo os pais oriundos de comunidades indígenas, é ainda obrigatória a intervenção,
junto à equipe profissional ou multidisciplinar referida no § 1
o
deste artigo, de representantes do
órgão federal responsável pela política indigenista, observado o disposto no § 6
o
do art. 28
desta Lei.
§ 3
o
Se o pedido importar em modificação de guarda, será obrigatória, desde que possível e
razoável, a oitiva da criança ou adolescente, respeitado seu estágio de desenvolvimento e grau
de compreensão sobre as implicações da medida.
§ 4
o
É obrigatória a oitiva dos pais sempre que esses forem identificados e estiverem em local
conhecido.” (NR)
“Art. 163.
O prazo máximo para conclusão do procedimento será de 120 (cento e vinte) dias.
110
Parágrafo único. A sentença que decretar a perda ou a suspensão do poder familiar será
averbada à margem do registro de nascimento da criança ou do adolescente.” (NR)
“Art. 166. Se os pais forem falecidos, tiverem sido destituídos ou suspensos do poder familiar,
ou houverem aderido expressamente ao pedido de colocação em família substituta, este
poderá ser formulado diretamente em cartório, em petição assinada pelos próprios
requerentes, dispensada a assistência de advogado.
§ 1
o
Na hipótese de concordância dos pais, esses serão ouvidos pela autoridade judiciária e
pelo representante do Ministério Público, tomando-se por termo as declarações.
§ 2
o
O consentimento dos titulares do poder familiar será precedido de orientações e
esclarecimentos prestados pela equipe interprofissional da Justiça da Infância e da Juventude,
em especial, no caso de adoção, sobre a irrevogabilidade da medida.
§ 3
o
O consentimento dos titulares do poder familiar será colhido pela autoridade judiciária
competente em audiência, presente o Ministério Público, garantida a livre manifestação de
vontade e esgotados os esforços para manutenção da criança ou do adolescente na família
natural ou extensa.
§ 4
o
O consentimento prestado por escrito não terá validade se não for ratificado na audiência
a que se refere o § 3
o
deste artigo.
§ 5
o
O consentimento é retratável até a data da publicação da sentença constitutiva da
adoção.
§ 6
o
O consentimento somente terá valor se for dado após o nascimento da criança.
§ 7
o
A família substituta receberá a devida orientação por intermédio de equipe técnica
interprofissional a serviço do Poder Judiciário, preferencialmente com apoio dos técnicos
responsáveis pela execução da política municipal de garantia do direito à convivência familiar.”
(NR)
“Art. 167. ...................................................................
Parágrafo único. Deferida a concessão da guarda provisória ou do estágio de convivência, a
criança ou o adolescente será entregue ao interessado, mediante termo de responsabilidade.”
(NR)
“Art. 170. ...................................................................
Parágrafo único. A colocação de criança ou adolescente sob a guarda de pessoa inscrita em
programa de acolhimento familiar será comunicada pela autoridade judiciária à entidade por
este responsável no prazo máximo de 5 (cinco) dias.” (NR)
“Seção VIII
Da Habilitação de Pretendentes à Adoção
‘Art. 197-A. Os postulantes à adoção, domiciliados no Brasil, apresentarão petição inicial na
qual conste:
I - qualificação completa;
II - dados familiares;
111
III - cópias autenticadas de certidão de nascimento ou casamento, ou declaração relativa ao
período de união estável;
IV - cópias da cédula de identidade e inscrição no Cadastro de Pessoas Físicas;
V - comprovante de renda e domicílio;
VI - atestados de sanidade física e mental;
VII - certidão de antecedentes criminais;
VIII - certidão negativa de distribuição cível.’
‘Art. 197-B. A autoridade judiciária, no prazo de 48 (quarenta e oito) horas, dará vista dos
autos ao Ministério Público, que no prazo de 5 (cinco) dias poderá:
I - apresentar quesitos a serem respondidos pela equipe interprofissional encarregada de
elaborar o estudo técnico a que se refere o art. 197-C desta Lei;
II - requerer a designação de audiência para oitiva dos postulantes em juízo e testemunhas;
III - requerer a juntada de documentos complementares e a realização de outras diligências
que entender necessárias.
‘Art. 197-C. Intervirá no feito, obrigatoriamente, equipe interprofissional a serviço da Justiça da
Infância e da Juventude, que deverá elaborar estudo psicossocial, que conterá subsídios que
permitam aferir a capacidade e o preparo dos postulantes para o exercício de uma paternidade
ou maternidade responsável, à luz dos requisitos e princípios desta Lei.
§ 1
o
É obrigatória a participação dos postulantes em programa oferecido pela Justiça da
Infância e da Juventude preferencialmente com apoio dos técnicos responsáveis pela
execução da política municipal de garantia do direito à convivência familiar, que inclua
preparação psicológica, orientação e estímulo à adoção inter-racial, de crianças maiores ou de
adolescentes, com necessidades específicas de saúde ou com deficiências e de grupos de
irmãos.
§ 2
o
Sempre que possível e recomendável, a etapa obrigatória da preparação referida no § 1
o
deste artigo incluirá o contato com crianças e adolescentes em regime de acolhimento familiar
ou institucional em condições de serem adotados, a ser realizado sob a orientação, supervisão
e avaliação da equipe técnica da Justiça da Infância e da Juventude, com o apoio dos técnicos
responsáveis pelo programa de acolhimento familiar ou institucional e pela execução da política
municipal de garantia do direito à convivência familiar.’
‘Art. 197-D. Certificada nos autos a conclusão da participação no programa referido no art.
197-C desta Lei, a autoridade judiciária, no prazo de 48 (quarenta e oito) horas, decidirá acerca
das diligências requeridas pelo Ministério Público e determinará a juntada do estudo
psicossocial, designando, conforme o caso, audiência de instrução e julgamento.
Parágrafo único. Caso não sejam requeridas diligências, ou sendo essas indeferidas, a
autoridade judiciária determinará a juntada do estudo psicossocial, abrindo a seguir vista dos
autos ao Ministério Público, por 5 (cinco) dias, decidindo em igual prazo.’
‘Art. 197-E. Deferida a habilitação, o postulante será inscrito nos cadastros referidos no art. 50
desta Lei, sendo a sua convocação para a adoção feita de acordo com ordem cronológica de
habilitação e conforme a disponibilidade de crianças ou adolescentes adotáveis.
112
§ 1
o
A ordem cronológica das habilitações somente poderá deixar de ser observada pela
autoridade judiciária nas hipóteses previstas no § 13 do art. 50 desta Lei, quando comprovado
ser essa a melhor solução no interesse do adotando.
§ 2
o
A recusa sistemática na adoção das crianças ou adolescentes indicados importará na
reavaliação da habilitação concedida.’”
“Art. 199-A. A sentença que deferir a adoção produz efeito desde logo, embora sujeita a
apelação, que será recebida exclusivamente no efeito devolutivo, salvo se se tratar de adoção
internacional ou se houver perigo de dano irreparável ou de difícil reparação ao adotando.”
“Art. 199-B. A sentença que destituir ambos ou qualquer dos genitores do poder familiar fica
sujeita a apelação, que deverá ser recebida apenas no efeito devolutivo.”
“Art. 199-C. Os recursos nos procedimentos de adoção e de destituição de poder familiar, em
face da relevância das questões, serão processados com prioridade absoluta, devendo ser
imediatamente distribuídos, ficando vedado que aguardem, em qualquer situação, oportuna
distribuição, e serão colocados em mesa para julgamento sem revisão e com parecer urgente
do Ministério Público.”
“Art. 199-D. O relator deverá colocar o processo em mesa para julgamento no prazo máximo
de 60 (sessenta) dias, contado da sua conclusão.
Parágrafo único. O Ministério Público será intimado da data do julgamento e poderá na
sessão, se entender necessário, apresentar oralmente seu parecer.”
“Art. 199-E. O Ministério Público poderá requerer a instauração de procedimento para
apuração de responsabilidades se constatar o descumprimento das providências e do prazo
previstos nos artigos anteriores.”
“Art. 208. ..........................................................................
........................................................................................
“IX - de ações, serviços e programas de orientação, apoio e promoção social de famílias e
destinados ao pleno exercício do direito à convivência familiar por crianças e adolescentes.
...........................................................................................” (NR)
“Art. 258-A. Deixar a autoridade competente de providenciar a instalação e operacionalização
dos cadastros previstos no art. 50 e no § 11 do art. 101 desta Lei:
Pena - multa de R$ 1.000,00 (mil reais) a R$ 3.000,00 (três mil reais).
Parágrafo único. Incorre nas mesmas penas a autoridade que deixa de efetuar o
cadastramento de crianças e de adolescentes em condições de serem adotadas, de pessoas
ou casais habilitados à adoção e de crianças e adolescentes em regime de acolhimento
institucional ou familiar.”
“Art. 258-B. Deixar o médico, enfermeiro ou dirigente de estabelecimento de atenção à saúde
de gestante de efetuar imediato encaminhamento à autoridade judiciária de caso de que tenha
conhecimento de mãe ou gestante interessada em entregar seu filho para adoção:
Pena - multa de R$ 1.000,00 (mil reais) a R$ 3.000,00 (três mil reais).
113
Parágrafo único. Incorre na mesma pena o funcionário de programa oficial ou comunitário
destinado à garantia do direito à convivência familiar que deixa de efetuar a comunicação
referida no caput deste artigo.”
“Art. 260. ...........................................................................
.........................................................................................
§ 1º-A. Na definição das prioridades a serem atendidas com os recursos captados pelos
Fundos Nacional, Estaduais e Municipais dos Direitos da Criança e do Adolescente, serão
consideradas as disposições do Plano Nacional de Promoção, Proteção e Defesa dos Direitos
de Crianças e Adolescentes à Convivência Familiar, bem como as regras e princípios relativos
à garantia do direito à convivência familiar previstos nesta Lei.
........................................................................................
§ 5
o
A destinação de recursos provenientes dos fundos mencionados neste artigo o
desobriga os Entes Federados à previsão, no orçamento dos respectivos órgãos encarregados
da execução das políticas públicas de assistência social, educação e saúde, dos recursos
necessários à implementação das ões, serviços e programas de atendimento a crianças,
adolescentes e famílias, em respeito ao princípio da prioridade absoluta estabelecido pelo
caput do art. 227 da Constituição Federal e pelo caput e parágrafo único do art. 4
o
desta Lei.”
(NR)
Art. 3
o
A expressão “pátrio poder” contida nos arts. 21, 23, 24, no parágrafo único do art.
36, no § do art. 45, no art. 49, no inciso X do caput do art. 129, nas alíneas “b” e “d” do
parágrafo único do art. 148, nos arts. 155, 157, 163, 166, 169, no inciso III do caput do art. 201
e no art. 249, todos da Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990, bem como na Seção II do Capítulo
III do Título VI da Parte Especial do mesmo Diploma Legal, fica substituída pela expressão
“poder familiar”.
Art. 4
o
Os arts. 1.618, 1.619 e 1.734 da Lei n
o
10.406, de 10 de janeiro de 2002 - Código
Civil, passam a vigorar com a seguinte redação:
“Art. 1.618. A adoção de crianças e adolescentes será deferida na forma prevista pela Lei n
o
8.069, de 13 de julho de 1990 - Estatuto da Criança e do Adolescente.” (NR)
“Art. 1.619. A adoção de maiores de 18 (dezoito) anos dependerá da assistência efetiva do
poder público e de sentença constitutiva, aplicando-se, no que couber, as regras gerais da Lei
n
o
8.069, de 13 de julho de 1990 - Estatuto da Criança e do Adolescente.” (NR)
“Art. 1.734. As crianças e os adolescentes cujos pais forem desconhecidos, falecidos ou que
tiverem sido suspensos ou destituídos do poder familiar terão tutores nomeados pelo Juiz ou
serão incluídos em programa de colocação familiar, na forma prevista pela Lei n
o
8.069, de 13
de julho de 1990 - Estatuto da Criança e do Adolescente.” (NR)
Art. 5
o
O art. 2
o
da Lei n
o
8.560, de 29 de dezembro de 1992, fica acrescido do seguinte
§ 5
o
, renumerando-se o atual § 5
o
para § 6
o
, com a seguinte redação:
“Art. 2
o
.................................................
.........................................................................................
§ Nas hipóteses previstas no § 4
o
deste artigo, é dispensável o ajuizamento de ação de
investigação de paternidade pelo Ministério Público se, após o não comparecimento ou a
recusa do suposto pai em assumir a paternidade a ele atribuída, a criança for encaminhada
para adoção.
114
§ 6
o
A iniciativa conferida ao Ministério Público não impede a quem tenha legítimo interesse de
intentar investigação, visando a obter o pretendido reconhecimento da paternidade.” (NR)
Art. 6
o
As pessoas e casais inscritos nos cadastros de adoção ficam obrigados a
frequentar, no prazo máximo de 1 (um) ano, contado da entrada em vigor desta Lei, a
preparação psicossocial e jurídica a que se referem os §§ 3
o
e 4
o
do art. 50 da Lei n
o
8.069, de
13 de julho de 1990, acrescidos pelo art. 2
o
desta Lei, sob pena de cassação de sua inscrição
no cadastro.
Art. 7
o
Esta Lei entra em vigor 90 (noventa) dias após a sua publicação.
Art. 8
o
Revogam-se o § 4
o
do art. 51 e os incisos IV, V e VI do caput do art. 198 da Lei
n
o
8.069, de 13 de julho de 1990, bem como o parágrafo único do art. 1.618, o inciso III do
caput do art. 10 e os arts. 1.620 a 1.629 da Lei 10.406, de 10 de janeiro de 2002 - digo
Civil, e os §§ 1
o
a 3
o
do art. 392-A da Consolidação das Leis do Trabalho, aprovada pelo
Decreto-Lei n
o
5.452, de 1
o
de maio de 1943.
Brasília, 3 de agosto de 2009; 188
o
da Independência e 121
o
da República.
LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA
Tarso Genro
Celso Luiz Nunes Amorim
Este texto não substitui o publicado no DOU de 4.8.2009 e retificado no DOU de 2.9.2009
115
Livros Grátis
( http://www.livrosgratis.com.br )
Milhares de Livros para Download:
Baixar livros de Administração
Baixar livros de Agronomia
Baixar livros de Arquitetura
Baixar livros de Artes
Baixar livros de Astronomia
Baixar livros de Biologia Geral
Baixar livros de Ciência da Computação
Baixar livros de Ciência da Informação
Baixar livros de Ciência Política
Baixar livros de Ciências da Saúde
Baixar livros de Comunicação
Baixar livros do Conselho Nacional de Educação - CNE
Baixar livros de Defesa civil
Baixar livros de Direito
Baixar livros de Direitos humanos
Baixar livros de Economia
Baixar livros de Economia Doméstica
Baixar livros de Educação
Baixar livros de Educação - Trânsito
Baixar livros de Educação Física
Baixar livros de Engenharia Aeroespacial
Baixar livros de Farmácia
Baixar livros de Filosofia
Baixar livros de Física
Baixar livros de Geociências
Baixar livros de Geografia
Baixar livros de História
Baixar livros de Línguas
Baixar livros de Literatura
Baixar livros de Literatura de Cordel
Baixar livros de Literatura Infantil
Baixar livros de Matemática
Baixar livros de Medicina
Baixar livros de Medicina Veterinária
Baixar livros de Meio Ambiente
Baixar livros de Meteorologia
Baixar Monografias e TCC
Baixar livros Multidisciplinar
Baixar livros de Música
Baixar livros de Psicologia
Baixar livros de Química
Baixar livros de Saúde Coletiva
Baixar livros de Serviço Social
Baixar livros de Sociologia
Baixar livros de Teologia
Baixar livros de Trabalho
Baixar livros de Turismo