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Universidade
Estadual de
Londrina
PATRICIA AYUB DA COSTA LIGMANOVSKI
A INSERÇÃO DA CLÁUSULA COMPROMISSÓRIA DE
ARBITRAGEM NA FORMAÇÃO DOS CONTRATOS
INTERNACIONAIS DO COMÉRCIO
Londrina
2010
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PATRICIA AYUB DA COSTA LIGMANOVSKI
A INSERÇÃO DA CLÁUSULA COMPROMISSÓRIA DE
ARBITRAGEM NA FORMAÇÃO DOS CONTRATOS
INTERNACIONAIS DO COMÉRCIO
Dissertação apresentada ao Curso de
Mestrado em Direito Negocial da
Universidade Estadual de Londrina; área
de Concentração em Direito e Relações
Empresariais; linha de pesquisa Estado
Contemporâneo: relações empresariais e
relações internacionais, como requisito
parcial à obtenção do título de Mestre.
Orientadora: Profª. Dra. Tânia Lobo
Muniz.
Londrina
2010
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PATRICIA AYUB DA COSTA LIGMANOVSKI
A INSERÇÃO DA CLÁUSULA COMPROMISSÓRIA DE
ARBITRAGEM NA FORMAÇÃO DOS CONTRATOS
INTERNACIONAIS DO COMÉRCIO
Dissertação apresentada ao Curso de
Mestrado em Direito Negocial da
Universidade Estadual de Londrina; área
de Concentração em Direito e Relações
Empresariais; linha de pesquisa Estado
Contemporâneo: relações empresariais e
relações internacionais, como requisito
parcial à obtenção do título de Mestre.
COMISSÃO EXAMINADORA
________________________
Profa. Dra. Tânia Lobo Muniz
Universidade Estadual de Londrina
________________________
Prof. Dr. Bianco Zalmora Garcia
Universidade Estadual de Londrina
__________________________
Profa. Dra. Maria Ligia Coelho Mathias
Londrina, 27 de abril de 2010.
A Deus pela luz, proteção e força.
A minha família pelo apoio incondicional.
Ao meu marido por toda compreensão e amor.
AGRADECIMENTOS
Agradeço a Deus por ter tanto e a tanta gente agradecer, pela vida, pela força,
pelo amor tão presente.
Aos meus pais, Jesus Candido da Costa e Ouzana Aparecida Ayub da Costa,
por serem o meu suporte de amor, dedicação e educação, por tudo o que me
ensinaram.
Aos meus irmãos, Ana Paula Ayub da Costa e Paulo Roberto Ayub da Costa,
companheiros incansáveis, amigos de todas as horas, presentes de Deus em
minha vida.
Ao meu amor, Fábio Maurício Pacheco Ligmanovski, pela paciência,
companheirismo, incentivo e presença nessa caminhada acadêmica desde o
seu início.
À orientadora, Profa. Dra. Tânia Lobo Muniz, mais que uma professora, uma
amiga, um ser humano formidável que teve a generosidade de ensinar, exigir e
amadurecer esse estudo comigo.
Aos Professores que compõe a banca examinadora, Prof. Dr. Bianco Zalmora
Garcia e Profa. Dra. Maria Ligia Coelho Mathias, pela presença, gentileza e
brilhantismo que contribuíram para a finalização e lapidação desse estudo.
Às Professoras Ms. Ana Cláudia Zuim Mattos do Amaral, Ms. Helena Aranda
Barrozo, Ms. Márcia Teshima e ao colega Carlos Eduardo Corrêa Crespi por
acompanharem meus passos nessa jornada e colaborarem com a revisão
desse trabalho.
Às amigas, Ana Cândida Ribeiro Falaguasta, Fernanda Hortense e Thaís
Amoroso Paschoal, que mesmo a distância, sempre estiveram próximas em
meus pensamentos, pelas palavras de carinho, coragem e ânimo.
Aos Professores do curso, colegas de mestrado e de escritório que
compartilharam momentos de agonia e felicidade, encorajando-me a sempre
continuar e lutar.
A todos que passaram por minha vida e deixaram um pouco de si, contribuindo
para a contínua construção do meu ser, muito obrigada!
LIGMANOVSKI, Patricia Ayub da Costa. A inserção da cláusula
compromissória de arbitragem na formação dos contratos internacionais
do comércio. 2010. 156fl. Dissertação (Mestrado em Direito Negocial)
Universidade Estadual de Londrina, Londrina.
RESUMO
Investiga a viabilidade da inserção de cláusula compromissória de arbitragem
em modelos jurídicos utilizados na formação dos contratos internacionais,
tendo em vista, a possibilidade do rompimento das negociações preliminares e
seus consequentes conflitos e prejuízos. Para tanto, estuda a relação do
Estado com os demais atores internacionais dentro do contexto empresarial
internacional, aborda o comércio internacional e os instrumentos utilizados para
seu regulamento: os contratos internacionais. Examina os princípios
informadores dos contratos internacionais e enfatiza sua fase de formação,
especialmente, a formação ex intervallo temporis por sua relevância jurídica e
econômica. Analisa os instrumentos jurídicos que podem ser utilizados nessa
fase a fim de dar garantias aos parceiros comerciais em caso de ruptura das
negociações preliminares ou conflitos, inclusive se sua natureza jurídica é ou
não obrigacional, ponto bastante controvertido. Identifica os meios mais
comuns de solução de conflitos, enfoque ao método extrajudicial
heterocompositivo: arbitragem. Enumera as vantagens da arbitragem comercial
internacional, especialmente da cláusula compromissória. Justifica a inserção
da cláusula compromissória completa nos modelos jurídicos obrigacionais
elaborados durante a formação dos contratos comerciais internacionais.
Palavras-chaves: Comércio internacional. Contratos internacionais.
Negociações preliminares. Cláusula compromissória de arbitragem.
LIGMANOVSKI, Patricia Ayub da Costa. Insertion of arbitration clause in the
formation process of international commerce contracts. 2010. 156fl.
Dissertation (Master in Negocial Law) Universidade Estadual de Londrina,
Londrina.
ABSTRACT
Investigates how viable it is to insert an arbitration clause in legal models used
in the formation process of international contracts, considering that disputes
between the parties can arise during the negotiation phase. Studies the
relationship between the State and the other international actors in the
international corporate scene. Approaches the international commerce and the
legal instruments to its regulation: the international contracts. Examines the
principles which inform the international contracts and stresses its formation
phase, with special regard to the formation ex intervallo temporis due to its legal
and economic relevance. Analyses the legal instruments that can be used in
order to grant certain guaranties to the parties in case of disputes and/or breach
of the preliminary negotiations, as well as if such instruments binds the parties
or not. Identifies the most common ways to resolve disputes, focusing the
hetero compositional extra-judicial method: arbitration. Numbers the
advantages of the international commercial arbitration, specially the arbitration
clause. Justifies the insertion of a complete arbitration clause in the legal
models prepared during the formation process of commercial international
contracts.
Keywords: International Commerce. International Contracts. Preliminary
negotiations. Arbitration clause.
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO.....................................................................................................9
1. CONTRATOS INTERNACIONAIS: INSTRUMENTOS DO COMÉRCIO
INTERNACIONAL.............................................................................................11
1.1.
O
E
STADO
C
ONTEMPORÂNEO E AS
R
ELAÇÕES
E
MPRESARIAIS
........................11
1.2.
C
OMÉRCIO
I
NTERNACIONAL
...........................................................................16
1.3.
A
REGULAMENTAÇÃO DAS
R
ELAÇÕES
E
MPRESARIAIS
I
NTERNACIONAIS
,
O
D
IREITO
I
NTERNACIONAL
P
RIVADO E A
L
EX
M
ERCATORIA
...................................... 18
1.4.
C
ONTRATOS
I
NTERNACIONAIS DO
C
OMÉRCIO
..................................................25
1.4.1. Considerações Gerais..........................................................................25
1.4.2. Conceito e Características dos Contratos Internacionais do
Comércio .........................................................................................................28
1.5.
P
RINCÍPIOS
I
NFORMADORES DOS
C
ONTRATOS
I
NTERNACIONAIS
.......................31
1.6. P
RINCÍPIO DA
A
UTONOMIA DA
V
ONTADE
........................................................34
1.6.1. Desdobramentos da Autonomia da Vontade......................................34
1.6.2. Autonomia da Vontade Interna e Internacional..................................36
1.6.3. Limitações à Autonomia da Vontade...................................................40
1.7.
P
RINCÍPIO DA
B
OA
-
O
BJETIVA
...................................................................45
2. FORMAÇÃO DOS CONTRATOS INTERNACIONAIS: NEGOCIAÇÕES
PRELIMINARES ..............................................................................................51
2.1.
O
FERTA OU
P
ROPOSTA
.................................................................................54
2.2.
A
CEITAÇÃO
..................................................................................................56
2.3.
N
EGOCIAÇÕES
P
RELIMINARES
.......................................................................58
2.4.
M
ODELOS
J
URÍDICOS DE
N
EGOCIAÇÃO
.........................................................66
2.4.1. Cartas de Intenção................................................................................69
2.4.2. Pré-contratos.........................................................................................77
2.4.3. Cartas de Conforto................................................................................79
2.4.4. Acordos de Segredo .............................................................................80
2.5.
C
ONSEQUÊNCIAS
J
URÍDICAS DO
R
OMPIMENTO DAS
N
EGOCIAÇÕES
P
RELIMINARES
....................................................................................................83
3. ARBITRAGEM: APLICAÇÃO DA CLÁUSULA COMPROMISSÓRIA NAS
NEGOCIAÇÕES PRELIMINARES DOS CONTRATOS INTERNACIONAIS DO
COMÉRCIO.......................................................................................................87
3.1.
C
ONFLITOS E
S
OLUÇÕES NAS
N
EGOCIAÇÕES
P
RELIMINARES
...........................92
3.1.1. Solução Judicial e Foro de Eleição......................................................94
3.1.2. Soluções Extrajudiciais.........................................................................98
3.2.
A
RBITRAGEM
C
OMERCIAL
I
NTERNACIONAL
..................................................
101
3.2.1. Conceito e Natureza Jurídica da Arbitragem....................................103
3.2.2. Principiologia da Arbitragem.............................................................105
3.2.3. Modalidades de Arbitragem................................................................112
3.3. C
ONVENÇÃO DE
A
RBITRAGEM
:
C
LÁUSULA
C
OMPROMISSÓRIA E
C
OMPROMISSO
A
RBITRAL
..........................................................................................................116
3.3.1. Compromisso Arbitral.........................................................................117
3.3.2. Cláusula Compromissória de Arbitragem.........................................119
3.4.
C
LÁUSULA
C
OMPROMISSÓRIA DE
A
RBITRAGEM E AS
N
EGOCIAÇÕES
P
RELIMINARES
...................................................................................................126
3.4.1. Vantagens da Arbitragem Comercial Internacional ........................127
3.4.2. A Inserção da Cláusula Compromissória Completa nas Negociações
Preliminares...................................................................................................134
CONSIDERAÇÕES FINAIS............................................................................137
REFERÊNCIAS...............................................................................................141
9
INTRODUÇÃO
Muitas são as vantagens de se relacionar comercialmente com
empresas de outros Estados, seja para compra de produtos mais baratos para
revenda no mercado interno, seja pela qualidade e preço competitivo de venda
de produtos/serviços no mercado externo, busca ou ampliação de mercado
consumidor diferenciado, conhecimento e aquisição de novas tecnologias,
formação de joint ventures etc.
No entanto, esse comércio globalizado, embora bastante
prático e regido por regras próprias, não fica à deriva da atuação, fiscalização e
dependência de Estados e organizações internacionais.
Esse panorama influencia as contratações internacionais e os
métodos de solução de conflitos que podem decorrer desse comércio por sua
magnitude, complexidade e número de envolvidos. O instrumento que
materializa a vontade das partes em uma negociação e serve de termômetro
para a economia é o contrato, tanto no âmbito interno como internacional; tal
acordo de vontades deve obedecer a alguns princípios: dignidade humana,
boa-fé objetiva, função social, autonomia da vontade e outros.
Dessa forma, como toda relação de interesses, conflitos podem
surgir e atrapalhar ou, até mesmo, inviabilizar a conclusão ou a execução do
contrato comercial.
Pela complexidade da formação dos contratos internacionais,
tanto pelo envolvimento de diversos sistemas jurídicos, negociadores de cultura
e estratégias distintas, longas análises e estudos para a conclusão,
investimentos para conquistar o parceiro negocial, bem como pela
interpretação e importância jurídica que cada Estado pode dar a essa fase,
muitos questionamentos surgem e requerem um estudo aprofundado dos
instrumentos que devem ser utilizados durante as negociações preliminares
desses contratos e qual o método adequado de solucionar os conflitos surgidos
nessa etapa. Ou seja, a relevância social, econômica e jurídica das
negociações preliminares justifica a preocupação com a segurança e eficiência
desse momento.
10
A fim de investigar se a inserção de cláusula compromissória
completa em instrumentos jurídicos obrigacionais utilizados na formação dos
contratos internacionais é o método mais seguro, eficaz e célere de resolver
conflitos comerciais internacionais, alguns questionamentos são apontados e
deverão ser respondidos ao longo dessa dissertação:
Qual o envolvimento do Estado contemporâneo nas relações
empresariais internacionais?
Quais os princípios informadores dos contratos comerciais
internacionais? Por quais fases passam esses contratos?
Qual a relevância jurídica das negociações preliminares, uma
vez que são consideradas pela doutrina sem caráter vinculativo?
Quais instrumentos jurídicos podem ser utilizados para auxiliar
os contratantes internacionais durante as negociações preliminares? Tais
instrumentos podem ser considerados fontes de obrigações?
Quais os métodos de solução de conflitos comerciais
internacionais mais utilizados? Quais as vantagens da arbitragem?
Visualizando-se esses questionamentos e diante da prática
internacional, não seria determinante para os negociantes internacionais que
inserissem uma cláusula compromissória de arbitragem que regulasse os
principais pontos de discussão, como lei aplicável, procedimento, árbitros,
língua e local de arbitragem em instrumentos jurídicos obrigacionais elaborados
durante a fase de formação dos contratos internacionais?
11
1. CONTRATOS INTERNACIONAIS: INSTRUMENTOS DO COMÉRCIO
INTERNACIONAL
1.1.
O
E
STADO
C
ONTEMPORÂNEO E AS
R
ELAÇÕES
E
MPRESARIAIS
I
NTERNACIONAIS
Profundas mudanças ocorreram no cenário econômico e
comercial internacional a partir do pós-guerra mundial, como a intensificação
da globalização, a criação de organizações multilaterais e regionais, o avanço
tecnológico dos transportes e das comunicações que estreitaram as relações
empresariais internacionais ao propiciarem o rompimento de fronteiras para a
circulação de mercadorias, serviços, investimentos e pessoas.
Essas transformações repercutiram na soberania estatal
1
, seja
por meio de seu relacionamento com tais organizações internacionais, seja
com as empresas transnacionais e até mesmo com seus nacionais em
decorrência da proteção aos direitos humanos. Com isso, já não se pode
estudar Direito Internacional e as relações blicas ou privadas entre seus
atores com o enfoque no Estado, mas sim na humanidade. É preciso fazer uma
releitura do Estado nas relações internacionais e de sua soberania com um
olhar crítico, considerando-se questões políticas, sociais, econômicas, culturais
e jurídicas que dizem respeito a toda sociedade internacional.
Nesse contexto, o direito,
[...] como ciência social aplicada, reguladora da sociedade, não
pode ficar à deriva dessas mudanças, mas pelo contrário, deve
atender às necessidades do Estado contemporâneo nas
relações internacionais, com a finalidade de garantir
estabilidade ao Estado e a todas as pessoas nele inseridas,
sejam naturais ou jurídicas. (COSTA
2
; MUNIZ, 2008, p. 218)
1
A mundialização da economia consagrada por meio do rompimento de fronteiras geográficas
clássicas, a fragilização da máquina estatal, o processo de integração em blocos regionais, a
flexibilização das relações de trabalho, o surgimento de grandes grupos econômicos com
poderes de fato maiores que de alguns Estados, a criação de organizações internacionais
paraestatais, assim como a extraordinária evolução das telecomunicações, foram fatos que
ocuparam o século XX e que exigiram um repensar do conceito de soberania” (NUNES
JUNIOR, 2003, p. 162). No entanto, Venilto Paulo Nunes Junior conclui que embora seja
necessário repensar a soberania, seu conceito não mudou, pois está vinculada a fatores reais
de poder que se modificam conforme a época e o lugar, revelando a força viva da sociedade
(2003, p. 165).
2
Ao longo deste trabalho serão utilizadas referências bibliográficas desta autora sozinha ou em
12
Tânia Lobo Muniz salienta que (2005, p. 146)
Temos que unir o corpo de normas surgidas das relações
privadas internacionais com a autoridade dos Estados, cuja
busca de interação social, econômica e política visa,
principalmente, o aprimoramento da sociedade internacional de
uma forma moderna e democrática, na qual predomine a
liberdade e independência, e que somente poderá ser
garantida pela atuação estatal.
Essa necessidade mostra-se muito clara atualmente. O mundo
está vivenciando uma crise
3
econômica e financeira
4
desde meados de 2008;
de forma surpreendente, assistiu-se a muitos fechamentos e concordatas de
empresas renomadas e transnacionais. Diversos foram os empréstimos
bilionários de governos a algumas empresas, ocorreram demissões em massa
e reduções de impostos a fim de incentivar o comércio e a produtividade
industrial, ou seja, houve forte intervenção estatal na economia.
Dentre essas intervenções, o governo dos Estados Unidos da
América agiu de forma significativa, por meio de ajuda financeira a instituições
privadas para evitar seus fechamentos e o agravo ainda maior da crise social
implantada naquele país. No entanto, essa crise não se restringe aos norte-
americanos, mas alcança a todos os Estados e instituições privadas que se
relacionam com aquele país e empresas ali sediadas, o que aumenta sua
conjunto com outros juristas, que o presente estudo é fruto da evolução da pesquisa da
autora desde a graduação na Universidade Estadual de Londrina-UEL.
3
O atual diretor-gerente do Fundo Monetário Internacional, Dominique Strauss-Kahn (2009)
“afirmou que a crise financeira global pode ser chamada de a "Grande Recessão" e que a
economia mundial vai se contrair neste ano”. O Diretor Geral da Organização Mundial do
Comércio (OMC), Pascal Lamy, aponta que um acordo na Rodada de Doha visando a
liberalização comercial serviria contra o protecionismo que tem se mostrado estratégia em
setores importantes das economias mundiais, mas que são extremamente prejudicias para o
enfrentamento da crise em âmbito global. A OMC fez uma projeção de que o comércio mundial
cairá 9% neste ano de 2009, o que será o pior resultado desde a Guerra Mundial (NINIO,
2009).
4
Ernesto Lozardo (2009) explica que essa crise é a mais grave para o aprofundamento do
capitalismo deste século, especialmente para os Estados Unidos da América que vem
passando por várias modalidades de crise. “A crise financeira global está solapando o
desenvolvimento das nações. Ela será lembrada como sendo a mais grave e a mais importante
para o aprofundamento do capitalismo neste século. A economia dos EUA apresenta várias
modalidades de crise (bancária, econômica, fiscal, previdenciária, creditícia e de identidade),
mas a do sistema financeiro é a mais nefasta. O sistema financeiro é responsável pela
intermediação entre os que ofertam e os que demandam recursos - empresas, famílias e
governos. A eficácia desse sistema é determinante na formação do capital e na prosperidade
econômica de qualquer nação. Trata-se, portanto, da ponte que conecta a micro com a
macroeconomia. Se esse sistema não for eficiente, transparente e crível nada poderá ser feito
no âmbito da política econômica para que uma nação se desenvolva com estabilidade
previsível e elevada produtividade dos fatores de produção”.
13
responsabilidade de atuação, como bem reconhecido por seu novo Presidente,
Barack Hussein Obama (2009) em seu discurso de posse.
What is required of us now is a new era of responsibility a
recognition, on the part of every American, that we have duties
to ourselves, our nation, and the world, duties that we do not
grudgingly accept but rather seize gladly, firm in the knowledge
that there is nothing so satisfying to the spirit, so defining of our
character, than giving our all to a difficult task.
5
Interessante notar que, diante desse quadro, configura-se uma
nova visão do papel do Estado, sendo necessária sua intervenção pontual para
evitar desequilíbrios nas relações econômicas. O posicionamento dominante
até então recente era de que os Estados necessitavam atrair as empresas
transnacionais e seus investimentos para sobrevivência de suas economias,
porém, o que ora se observa é uma inversão de valores, pois muitas dessas
empresas precisaram do socorro estatal para sobreviverem ao olho do furacão
da crise econômico-financeira atual. Nesse sentido, é possível concluir que os
atores internacionais, Estados e agentes empresariais são interdependentes e
necessitam coexistir em harmonia e equilíbrio para se autossustentarem.
Os Estados possuem a importante função de regular as
relações nacionais e internacionais, devendo evitar que ocorram abusos
expressados em protecionismo
6
ou em atuações de especulação de agentes
privados que possam prejudicar a economia e as relações sociais, gerando
mais falências, desempregos e redução de receita tributária.
Relembra-se que a instabilidade econômica e social gera
desconfiança e disputas entre os Estados e um cenário tão crítico foi o
apropriado para as duas guerras mundiais do século passado, demonstrando o
quanto é importante, em momentos de crise, que os Estados soberanos se
mantenham unidos com um propósito de paz e prosperidade conjunta.
A I Guerra Mundial (1914-1918) e a crise econômica de 1929
contribuíram para o fechamento dos mercados e o aumento
das barreiras tarifárias. As políticas do tipo beggar-thy-
5
Tradução livre: O que é exigido de nós é uma nova era de responsabilidade um
reconhecimento, por parte de todos os americanos, de que nós temos obrigações para com
nós mesmos, nossa nação e o mundo, obrigações que não aceitamos com rancor, mas que,
pelo contrário, abraçamos com alegria, firmes na certeza de que não nada tão gratificante
para o espírito, que defina tanto nosso caráter do que dar tudo de nós mesmos numa tarefa
difícil.
6
“O protecionismo, via de regra, protege os mais ricos e fortes, longe de fornecer uma malha
de legítima proteção social às populações mais carentes, que muito se beneficiariam se o
comércio mundial fosse de fato, livre, justo, harmônico e equilibrado”. (AMARAL, 2004, p. 52)
14
neighbour difundiram-se amplamente e desestimularam o
comércio internacional agravando assim a recessão econômica
da época e contribuindo para a eclosão da II Guerra Mundial
(1939-1944). (DI SENA JÚNIOR, 2006, p. 39)
Como na “teoria dos jogos”
7
desenvolvida por John Nash, o
Estado deverá optar em se retrair e proteger seu mercado, o que levará a um
aprofundamento da crise ou a buscar no princípio da solidariedade
internacional a chance de encontrar soluções comuns para a reconstrução de
pilares econômicos, jurídicos e sociais sólidos.
Os Estados deverão considerar a possibilidade de ganhos
mútuos, elevando a credibilidade nacional e internacional de suas instituições
sociais e financeiras, intervindo na medida do necessário, a fim de regular e
não de ser um ferrenho interventor como foi no período do Welfare State.
Esse momento de insegurança nas relações internacionais,
sejam privadas ou públicas, exige dos Estados um posicionamento estratégico
de cooperação e equilíbrio auxiliado por organizações internacionais como a
Organização das Nações Unidas, a Organização Mundial do Comércio, o
Banco Mundial e o Fundo Monetário Internacional, a fim de superarem de
forma conjunta a crise econômica e social instalada.
Ernesto Lozardo (2009) em análise da crise financeira global
conclui que
A globalização financeira deixou o mundo econômico mais
incerto, não menos próspero, mas poderá ficar mais desigual
se o sistema financeiro internacional não for reconstruído com
transparência, com padrões de governança e eficiência
operacional. Acredito na reforma do sistema financeiro
internacional. Ela possibilitará o surgimento de uma nação
americana financeiramente melhor estruturada e
economicamente mais fortalecida. Como produto dessa
reforma, teremos um novo capitalismo, distinto dos padrões do
Estado mínimo ou do capitalismo de economia mista entre o
Estado e setor privado. Surgirá o capitalismo corresponsável
compartilhado entre nações prósperas e emergentes, no qual,
cada sociedade será responsável pela sobrevivência
econômica, pela prosperidade social e pela preservação
ambiental das demais.
Celso Lafer (apud SABA, 2002, p. 59) explica que o Direito
Internacional Público acompanha esse momento de transformação, pois seu
7
“A teoria dos jogos é um método utilizado para representar e compreender as decisões
tomadas por agentes que interagem entre si. Também é correto afirmar que, a partir dessa
compreensão, constitui um meio para a adoção da melhor escolha nos casos de interação
estratégica”. (CARVALHO, 2007, p. 215)
15
foco deixou de ser os Estados e sua soberania para voltar-se para os
interesses da Humanidade.
O DIP não deixou de regular relações entre Estados soberanos
mas passou a preocupar-se com muito mais: com a
solidariedade e a justiça social entre os Homens e os Povos.
Por outras palavras, o DIP não deixou de assentar na
soberania dos Estados mas passou a considerá-la numa
relação de recíproca limitação com o princípio da solidariedade
internacional.
Nesse sentido, Tânia Lobo Muniz (2005, p. 147) ensina que
O estabelecimento de uma economia e comércio internacional
livre e uniforme universalmente, que possibilite a troca de
riquezas entre os Estados, sirva de instrumento de busca da
dignidade, da paz e da justiça social e proporcione igualdade
econômica, passa pela necessidade de utilização do direito
internacional como instrumento para a consecução desses
objetivos e, pelo conceito de soberania.
Assim, a atuação do direito, por meio do poder do Estado e das
organizações internacionais, é fundamental para inibir que os interesses
lucrativos de alguns seja a razão das relações internacionais empresariais em
detrimento do desenvolvimento
8
sustentável e da justiça social da maioria.
Caso não haja, nesse momento da história, uma cooperação global entre todos
os atores internacionais em razão do grau de interdependência existente,
poderá ocorrer um descrédito nas instituições econômicas, sociais e também
jurídicas, especialmente no direito internacional público e da integração.
O pano de fundo da reformulação do Estado, da globalização
econômica, do poder das empresas transnacionais e da formação de blocos
econômicos regionais é o comércio internacional, o que exige sua
harmonização, tendo em vista que cada Estado possui a soberania de
regulamentar a respeito de seu direito internacional privado.
Dessa forma, o equilíbrio que se espera das relações
internacionais entre os atores do direito internacional público também é
esperado nas relações comerciais entre particulares, pois os contratos
instrumentos desse comércio -, diante de uma visão contemporânea, devem
ser expressões da dignidade humana e da função social, fomentando o
desenvolvimento sustentável.
8
“Atualmente, desenvolvimento, numa abordagem humanista do termo, trata-se do
comprometimento dos países em promover a liberdade, o bem-estar e a dignidade dos
indivíduos.” (SILVA, A., 2006, p. 198)
16
1.2.
C
OMÉRCIO
I
NTERNACIONAL
O ser humano é um ser social, capaz de relacionamentos das
mais diversas formas: pessoais, sociais, políticos e comerciais. Essa
capacidade, aliada a uma série de outras, permitiu o acúmulo de riquezas e
trocas pelo que necessita e não é capaz de produzir. Assim, o comércio
9
primitivo evoluiu até chegar ao hodierno comércio virtual e global.
Paradoxalmente é uma forma de interação social que aproxima as diferentes
culturas visando o lucro. Ele não conhece fronteiras, pode ser real, virtual,
transnacional e é um grande fomentador de inovações no direito, como o direito
comunitário e a criação de inúmeros tipos de instrumentos contratuais.
Com o passar dos séculos, o comércio internacional
desenvolveu-se e expandiu-se por todas as partes do mundo, de modo que
nenhum país vive isoladamente, pois os intercâmbios de informações,
mercadorias e serviços são intensos e dinâmicos. Quando transação de
bens, materiais ou imateriais, entre as fronteiras dos Estados ou dos blocos
econômicos concretiza-se o comércio internacional por meio das operações de
importação ou exportação, regulamentadas por cada Estado ou bloco
econômico. Esse comércio conta com a contribuição da tecnologia, seja nos
meios de comunicação ou transportes, o que facilita a circulação e logística
desse intercâmbio, desencadeando ainda mais a globalização
10
nas suas
múltiplas facetas.
Irineu Strenger (1998b, p. 82) ensina que o comércio
internacional juridicamente constitui
o conjunto de operações, com fim lucrativo, que se realiza no
mundo, por meio de intercâmbio de bens visíveis
(mercadorias), ou de negócios invisíveis (referidos a serviços e
9
Rubens Requião (1998, p. 5) na linha de entendimento de Vidari, define o comércio como
sendo “o complexo de atos de intromissão entre o produtor e o consumidor que, exercidos
habitualmente com o fim de lucros, realizam, promovem ou facilitam a circulação dos produtos
da natureza e da indústria, para tornar mais fácil e pronta a procura e a oferta”.
10
Paula Christine Schlee (2004, p. 55) afirma que a globalização “é o conjunto de
transformações econômicas, políticas, sociais e culturais, em curso a partir de princípios da
década de 1980, ocasionado e facilitado pelo surgimento e desenvolvimento das tecnologias
de informação e da desregulamentação dos mercados mundiais de capitais, que resultaram na
interligação profunda desses mesmos mercados, com reflexos nos mercados mundiais de bens
e serviços e ocasionando uma nova divisão internacional do trabalho”.
17
transações), que ensejam transferências financeiras sem
movimento de mercadorias.
Esse comércio global não é totalmente livre, pois uma rie
de regras e procedimentos a serem cumpridos, desde a regulamentação e
cobrança de tributos até a fiscalização aduaneira.
Antonio Carlos Rodrigues do Amaral (2004, p. 53) pondera que
embora a globalização dos mercados apresente riscos e desafios, também traz
muitas oportunidades de expansão dos benefícios do livre comércio, desde que
sejam estabelecidas condições mais equitativas de trocas com a extinção de
barreiras injustificáveis aos produtos e serviços advindos de países em
desenvolvimento.
O comércio internacional pode e deve ser visualizado como um
agente capacitador da paz e do desenvolvimento humano, uma vez que a
aproximação, o conhecimento do outro e de seus costumes e a dependência,
deveriam ser utilizados para a cooperação; contudo, muito pouco tem sido feito
pelos atores internacionais nesse sentido. Trilhando esse raciocínio, Roberto Di
Sena Junior (2006, p. 49) reitera que, sob o ponto de vista teórico, o comércio
internacional objetiva promover o bem-estar dos povos por meio do aumento
da renda real proporcionada pela expansão do fluxo comercial.
Como o homem ainda não foi capaz de vivenciar essa
experiência, mas pelo contrário, provoca a partir das relações comerciais uma
série de conflitos, das mais variadas instâncias; impõe-se ao direito
internacional, portanto, a busca pela harmonização desse convívio. Assim, faz-
se mister a emergência de um novo arcabouço de Direito Internacional que
venha reger esta sociedade mundializada, “em cujo âmbito os processos de
elaboração normativa se dão no plano das interdependências sociais e
econômicas descentralizadas” (MARQUES NETO, 2002, p. 111-112), sendo
possível verificar que essa expansão não é apenas de natureza pública, mas
também mercatória.
Como ressaltado anteriormente, o comércio internacional está
estritamente ligado à cultura e à tradição dos povos, o que propicia conflitos a
serem resolvidos pelo direito. Carlos Maximiliano (1997, p. 157-159) alerta que
[...] não pode o direito isolar-se do ambiente em que vigora,
deixar de atender às outras manifestações da vida social e
econômica. (...) As mudanças econômicas e sociais constituem
18
o fundo e a razão de ser de toda a evolução jurídica; e o direito
é feito para traduzir em disposições positivas e imperativas
toda a evolução social.
Para tanto, nem sempre o direito interno é suficiente para sanar
eventuais conflitos, pois ao se alcançar novos parceiros e concluir negócios
com estrangeiros, possibilita-se o envolvimento de mais de um ordenamento
jurídico, limitando-se, por vezes, a atuação e competência do Estado pátrio das
partes envolvidas, o que justifica a preocupação com a harmonização e, até
mesmo, uniformização das normas internacionais do comércio.
1.3.
A
REGULAMENTAÇÃO DAS
R
ELAÇÕES
E
MPRESARIAIS
I
NTERNACIONAIS
,
O
D
IREITO
I
NTERNACIONAL
P
RIVADO E A
L
EX
M
ERCATORIA
O comércio dentro do território de um país exige a
regulamentação do direito, uma vez que os interesses do credor e do devedor
são conflitantes, riscos de inadimplência, de vícios do produto, regras legais
ou contratuais a serem seguidas, fiscalização governamental dependendo da
atividade, relações de trabalho e consumeristas envolvidas etc.
Entretanto, mesmo assim, esses conflitos são de menor
complexidade que os conflitos surgidos no âmbito comercial internacional, pois
além de todas as dificuldades citadas, tem-se ainda um agravante: o
envolvimento de dois ou mais sistemas jurídicos. Isto é, enquanto não se tem
dúvidas em relação à lei aplicável a um conflito decorrente de uma relação
comercial interna
11
, muitas são as dúvidas quando se apresenta um conflito
internacional privado, a iniciar-se por qual será a lei aplicável ao caso.
Os contratos internacionais são mais complexos que os
internos, pois envolvem direitos e sistemas jurídicos diferentes,
por vezes conflitantes, o que torna necessária a utilização de
instrumentos harmonizadores, papel esse desempenhado
pelas regras de conexão, que definem qual será o direito
aplicado na relação jurídica conflitante (FURLAN, 2004, p. 21).
11
Atualmente, o Código Civil Brasileiro abrange a regulamentação do comércio interno e das
relações empresariais com o auxílio de algumas leis esparsas para casos específicos, tais
como a Lei das S/A, n. 6.404/76 e a Lei da Recuperação Judicial, Extrajudicial e Falência do
Empresário e da Sociedade Empresária, Lei n. 11.101/2005. Cabe aqui ressaltar que o foco do
presente estudo são as relações empresariais e, por isso, não se discutirá a relação
consumerista regida pela Lei n. 8.078/90.
19
Assim, quem indica a solução desses conflitos é o Direito
Internacional Privado - DIPri -, ramo do direito que estuda o conflito
12
das leis
interespaciais, determinando dentro de cada Estado, qual o elemento de
conexão
13
adotado para a solução de determinado conflito.
Vários são os elementos de conexão que indicarão o caminho
a ser tomado diante de uma questão de Direito Internacional Privado: a
nacionalidade, o domicílio, a lei do lugar da execução da obrigação, a lei do
lugar do contrato, a lei pessoal do devedor, a lei do local do ilícito ou a lei
escolhida
14
pelas partes, um dos elementos de conexão mais utilizados
hodiernamente, mas ainda controvertido como se estudará adiante.
Para Irineu Strenger (2000b, p. 33)
O direito internacional privado nasce do desenvolvimento,
tomado pelas relações de ordem privada entre os diferentes
povos. Da diversidade de legislação surge o conflito de leis,
portanto, cada vez que se hesita na aplicação de leis dos
diversos países, põe-se em movimento o direito internacional
privado, a fim de determinar em que condições legais pode o
problema ser resolvido.
Na determinação do seu DIPri, cada Estado deve buscar
harmonizar sua legislação com as demais e com os tratados que regem o
assunto a fim de se evitar incertezas e inseguranças jurídicas.
Os Estados, ao formularem suas regras materiais de DIPri, ou
seja, aquelas que oferecem definição, em termos de vinculação
ou conexão com um princípio teórico que permita aplicar em
determinado caso a legislação estrangeira ou a nacional de um
país, procuram dotar as relações ultranacionais de uma
regulamentação em sintonia com as exigências internacionais
de certeza, segurança e justiça, tal como o Estado em questão
as conhece. (GARCEZ, 1999, p. 10)
12
“Nasce ai o que se convencionou chamar de conflito de leis, cuja causa é existirem
possibilidades de aplicação pela vigência espacial superposta de diferentes ordenamentos,
que convergem em uma determinada situação jurídica concreta”. (BAPTISTA, 1980, p. 87)
13
“No âmbito dos contratos internacionais, vários serão os elementos de conexão capazes de
ligá-los a um determinado sistema jurídico, por exemplo, o lugar de celebração do contrato, a
capacidade das partes, o lugar de cumprimento das obrigações, o domicílio ou a nacionalidade
das partes contratantes, ou ainda, os elementos de conexão poderão até mesmo ser
preestabelecidos pela própria vontade das partes, se estas tiveram a cautela de eleger a lei
aplicável, em caso de conflito, o que muitas vezes, ocorre, modernamente, pela inserção no
contrato de uma cláusula de arbitragem, pela qual se prevê que as questões oriundas do
contrato serão dirimidas por uma Corte de Arbitragem e decididas segundo um determinado
direito” (ROVIRA, 1995, p. 53).
14
A autonomia da vontade das partes, no direito internacional privado, significa que as próprias
partes podem escolher o direito aplicável. O elemento de conexão aqui é a própria vontade
manifestada pelas partes, vinculada a um negócio jurídico de direito privado com conexão
internacional. (RECHSTEINER, 2006, p. 149)
20
Vale ressaltar que o DIPri é conflitual, indireto e, em regra, não
solucionará o caso em discussão, mas apenas indicará qual o direito aplicável
para que se busque nesse direito a solução efetiva da questão.
Nesses termos, Nadia de Araujo (1997, p. 18) ensina que “um
problema de DIPr não é, portanto, um problema de justiça material, que o
papel da norma de conflito não é escolher a que melhor convenha, mas aquela
que se aplique em razão do caminho indicado pela norma de conflito”.
Irineu Strenger (2000b, p. 77) define o direito internacional
privado como
[...] um complexo de normas e princípios de regulação que,
atuando nos diversos ordenamentos legais ou convencionais,
estabelece qual o direito aplicável para resolver conflitos de leis
ou sistemas, envolvendo relações jurídicas de natureza privada
ou pública, com referências internacionais ou interlocais.
Por sua vez, José Maria Rossani Garcez (1999, p. 11) informa
que de forma abrangente
[...] o DIPr pode ser apresentado como o conjunto de normas
ou princípios aplicados ou admitidos por cada Estado,
destinadas a regular os direitos, atos ou fatos que tenham
conexão internacional e se destinem a ter efeitos sobre
pessoas naturais ou pessoas jurídicas privadas, ou entre estas,
ou, ainda, quanto a entidades públicas ou privadas no exercício
de atividades jusprivativas.
Luiz Olavo Baptista (1994, p. 3) apresenta duas características
do DIPri:
Esse ramo do direito apresenta a peculiaridade de que suas
normas têm, entre outras, uma função de coordenação entre as
sociedades nacionais (comunidades dotadas de autonomia
política e jurídica, logo formal). Mas tal coordenação outra
peculiaridade não se faz direta, senão indireta, através dos
Estados, a quem incumbe a função normativa, como reflexo da
sua soberania.
No Brasil, o DIPri está exposto no Decreto-Lei nº. 4.657/42,
conhecido como Lei de Introdução ao Código Civil nos artigos a 19, no
Código de Bustamante
15
e em algumas leis esparsas, como o Estatuto do
Estrangeiro (Lei n. 6.815/80).
E assim, por serem muitas as opções de elementos de
conexão a disposição dos Estados e as dúvidas acerca de qual é melhor para
15
Convenção de Direito Internacional Privado, de Havana foi sancionado pelo Decreto
5.647/29 e publicado pelo Decreto 18.871/29 e possui vigência no âmbito das Américas.
21
cada negócio internacional é que essa introdução ao direito internacional
privado é tão relevante:
Dependendo da ordem jurídica do país em que se decide a
lide, o direito aplicável à causa com conexão internacional
poderá variar. Assim, o conflito de leis no espaço, assinalado
pela doutrina, está fundamentado na possibilidade de o direito
aplicável não ser o mesmo nos diversos países, e justamente
essas normas resolutivas de conflito de leis no espaço,
indicadas pela lei do foro (lex fori), são as básicas da nossa
disciplina: o direito internacional privado (RECHSTEINER,
2006, p. 4).
João Grandino Rodas e Gustavo Ferraz de Mônaco (2007, p.
87) arrematam que
O direito internacional privado é ramo do direito público interno,
razão pela qual se explica a grande diversidade de normas
relativas a esta temática, podendo cada Estado, no exercício
de sua soberania, ditar as regras de solução de conflitos de lei
no espaço que entenderem mais consentâneas ao seu
ordenamento e aos ditames político-valorativos que desejarem
a ele imprimir.
Nisso se observa o papel soberano
16
de cada Estado ao
legislar sobre DIPri e ao mesmo tempo a insegurança que tantas legislações
diferentes podem causar aos players internacionais, o que justifica a
necessidade de haver uma harmonização acerca dessas legislações nacionais,
o que até o momento não foi concretizado, embora haja iniciativas de
organizações internacionais, como a UNIDROIT (Instituto Internacional para a
Uniformização do Direito Privado) e a UNCITRAL (Comissão das Nações
Unidas para o Direito Comercial Internacional)
17
.
A harmonização das normas que regem o comércio
internacional e os contratos internacionais dá-se no âmbito do Direito
16
“As leis fazem parte da expressão de soberania dos Estados, que as emitem como normas
de comportamento, tendo sua eficácia restrita ao território do Estado. Por outro lado, os
princípios de soberania dos Estados não admitem que um Estado soberano e independente
possa exercer jurisdição sobre outro igualmente soberano e independente, dentro do princípio
par in parem non habet jurisditionem.” O jurista continua “A verdade é que, ainda que
ultimamente se venha acentuando o fenômeno da abdicação ou enfraquecimento do conceito
de soberania entre os Estados, o DIPr encontra-se alicerçado nas regras da legislação interna
de cada Estado, que servem para orientar a aplicação da legislação, nacional ou estrangeira
aos casos conectados a mais de um sistema legal. (GARCEZ, 1999, p. 13)
17
“O UNIDROIT possui âmbito global de participação estatal, perseguindo assim uma
unificação entre todos os Estados que queiram participar de suas atividades e visa a adoção de
regras uniformes de direito privado material” (RODAS; MÔNACO, 2007, p. 94). No que se
refere à UNCINTRAL, em que pese apresentar a mesma vocação global, limita a sua atuação
a uma área do conflito de leis que se mostra tematicamente específica, o comércio
internacional” (RODAS; MÔNACO, 2007, p. 95).
22
Internacional blico, pois os Estados buscam harmonizar e até uniformizar
tais normas por meio de tratados
18
ou então da inserção das disposições das
Leis Modelos ou Princípios das Organizações Internacionais
Intergovernamentais em suas legislações nacionais. Ainda o
reconhecimento de certas regras implantadas por Organizações do Comércio,
como é o caso dos INCOTERMS
19
, organizados pela Câmara de Comércio de
Paris e exemplo da lex mercatoria.
Nesse sentido, um grande incentivo
20
para o
aperfeiçoamento e reconhecimento da lex mercatoria para regência do
comércio internacional e de seus conflitos. A lex mercatoria é resultado da
autonomia da vontade e dos usos e costumes dos comerciantes para diminuir
os conflitos decorrentes de suas diferenças ao longo dos séculos.
Irineu Strenger (1996b, p. 78) entende como lex mercatoria o
conjunto de procedimentos que possibilita adequadas soluções
para as expectativas do comércio internacional, sem conexões
necessárias com os sistemas nacionais e de forma
juridicamente eficaz.
Para Jorge Barrientos Parra (1992, p. 150)
18
A Convenção das Nações Unidas sobre os Contratos de Compra e Venda Internacional de
Mercadorias, firmada em Viena em 11 de abril de 1980, tem-se mostrado fonte bem sucedida
no escopo de permitir o desenvolvimento de um direito contratual internacional uniforme no
setor que pretende regulamentar. Cabe ressaltar que tal Convenção não foi adotada pelo
Brasil, mas pode ser aplicada caso o outro contratante seja domiciliado em Estado signatário
da Convenção.
19
Internacional rules for interpretation of trade terms ou em português: Regras internacionais
para a interpretação de termos comerciais. Os Incoterms definem minuciosamente a
responsabilidade do comprador e do vendedor: 1. Quando e onde as mercadorias estarão à
disposição do comprador; 2. Quem (comprador ou vendedor) deverá escolher o veículo de
transporte e quem deverá providenciá-lo; 3. Estabelece o momento preciso da transferência
dos riscos, do vendedor para o comprador; 4. Estabelece o momento preciso da transferência
de custos e das despesas adicionais de um para o outro. Atualmente existem treze
INCOTERMS, sendo eles: EXW, FAS, FOB, FCA, CFR, CPT, CIF, CIP, DAF, DES, DEQ, DDU
e DDP. São divididos em quatro categorias: E” o vendedor torna as mercadorias disponíveis
para o comprador em seu próprio estabelecimento de origem; no grupo “F” o vendedor é
argüido a entregar as mercadorias a um transportador designado pelo comprador; nos termos
“C” o vendedor deverá contratar o transporte, sem assumir riscos por perda ou dano às
mercadorias, ou custos adicionais devidos a eventos que ocorram após o desembaraço e
despacho; e por último, nos termos “D” o vendedor tem de assumir todos os custos e riscos
necessários em levar as mercadorias até o país de destino. A explicação quanto à divisão de
categorias foi retirada da apostila do curso de “Assistente de Comércio Exterior” da Aduaneiras,
organizada pelo professor Ricardo R. Pinheiro, 2003, p. 5.
20
O art. 10 da V Conferência Interamericana Especializada sobre o Direito Internacional
Privado (CIDIP V) adota o uso da lex mercatoria. Além do disposto nos artigos anteriores,
aplicar-se-ão, quando pertinentes, as normas, costumes e princípios do direito comercial
internacional, bem como os usos e práticas comerciais de aceitação geral, com a finalidade de
assegurar as exigências impostas pela justiça e a equidade na solução do caso concreto”.
23
“Lex Mercatoria” é uma doutrina cujas idéias básicas são, a
existência de um direito que governa as relações econômicas
internacionais criado pelos próprios comerciantes e aplicado
por árbitros que são designados de forma contratual para a
solução de seus litígios, semelhante ao corpo de regras
costumeiras que regia a comunidade internacional de
comerciantes na Idade Média.
No entendimento de José Carlos Magalhães e Agostinho Tofolli
Tavolaro (2004, p. 61)
pode-se considerar a lex mercatoria como as regras
costumeiras desenvolvidas em negócios internacionais
aplicáveis em cada área determinada do comércio
internacional, aprovadas e observadas com regularidade.
A nova lex mercatoria fundamenta-se sob os pilares dos usos
profissionais, dos contratos-tipo, das regulamentações profissionais ditadas nos
limites de cada profissão por suas associações representativas e pela
jurisprudência, principalmente a arbitral (STRENGER, 1996b, p. 21-22), e
assim tem sido aperfeiçoada pelos profissionais do comércio, pelas entidades
privadas e pelos organismos internacionais que formaram um código de regras
e princípios que os resguardam, independentemente da religião, regime político
ou costume da outra parte.
Embora a aplicação dos usos e costumes internacionais
possibilite maior segurança e autonomia aos agentes envolvidos em relação ao
ordenamento estatal a que estariam submetidos pelas regras de direito
internacional privado, deve-se ressaltar que não existe uma exclusão da
aplicação do direito estatal, pois, em algum momento, se não houver
voluntariedade, será necessário submeter o conflito ou cumprimento de sua
decisão a uma corte estatal para efetivação do direito tutelado.
Ana Paula Martins Amaral (1999, p. 73-74) defende que
Do confronto entre normas provenientes da lex mercatoria e o
direito estatal, este sempre irá prevalecer. A lex mercatoria não
pode existir fora de um ordenamento jurídico que lhe sirva de
suporte. A arbitragem internacional, seu principal veículo de
difusão, não pode estar alheia ao sistema estatal, seja como
estrutura organizada, seja como norma aplicável.
Ressalta-se que a arbitragem possui estreita ligação com a lex
mercatoria, pois ambas são frutos da autonomia da vontade. Alexandre
Tavares Guerreiro (apud AMARAL, 1999, p. 61) expõe que
A lex mercatoria pressupõe a existência de uma comunidade
de operadores do comércio internacional que possui interesses
24
próprios e que encontra na arbitragem comercial internacional
o mecanismo adequado para a aplicação de normas aptas a
resolver as pendências instauradas quanto aos contratos
celebrados, no âmbito dessa comunidade, pelas partes
respectivas. A jurisprudência arbitral integra, por sua vez, o
conteúdo da lex mercatoria, a qual, mesmo sem constituir
ordem ou sistema, tende a se institucionalizar, cada vez mais
superando a insuficiência do todo de conflitos (de leis e de
jurisdição) do direito internacional privado, para a disciplina dos
contratos internacionais, que o resultado da aplicação desse
método é exatamente a determinação de uma lei nacional, o
que não mais se coaduna com as necessidades
contemporâneas.
Assim, diversas são as formas de se harmonizar as normas do
comércio internacional e as relações empresariais internacionais, seja por meio
de tratados, de adoção das normativas das organizações internacionais ou
entidades privadas, bem como pela aceitação da lex mercatoria. O importante
é buscar tal harmonização a fim de que um dia se possa alcançar a
uniformização para que se evite ao máximo os conflitos interespaciais.
Segundo Nadia de Araujo (1997, p.4)
sem uma uniformização jurídica não se pode fazer a integração
econômica ou política, pois é preciso garantir aos atores desse
processo uma base normativa com regras comuns,
especialmente as regras conflituais de Direito Internacional
Privado.
Alexandre de Moura Marques (1999, p. 14) expõe:
A adesão dos países às regras uniformes tornou-se um
facilitador para as transações internacionais, pois se
entendermos que não existe um direito internacional”, a
aceitação por parte de cada estado-nação às normas
uniformes internacionais proporcionará aos seus participantes
a “legalização” efetiva de seus procedimentos como um
amparo legal, que servirá não como um fator
regulamentador em nível mundial, mas também como um
equacionador para a resolução de contendas que venham a
ocorrer durante uma transação entre dois países.
Contudo, Paulo Borba Casella (1996. p.100) alerta que mesmo
a consolidação de princípios ou a criação de regras uniformes não suprimem
os riscos de diversidade de interpretação de direito harmonizado ou uniforme
pelos diferentes tribunais nacionais.
Consequentemente, a maior parte dos instrumentos
internacionais apresentam inseridos em seu texto, ou à parte, a cláusula
compromissória de arbitragem para a solução desta diversidade de
interpretação.
25
Essa complexidade de questões acerca do comércio
internacional exige de seus operários um instrumento capaz de garantir-lhes
segurança, de permitir-lhes expressarem suas vontades, intenções e objetivos
em relação à negociação, à lei aplicável, à jurisdição competente, com o
mínimo de disparidade possível, tendo em vista o envolvimento de dois ou mais
sistemas jurídicos passíveis de aplicação e interpretação; o que será eficaz
por meio de documentos pré-contratuais e contratuais bem negociados e
redigidos.
1.4.
C
ONTRATOS
I
NTERNACIONAIS DO
C
OMÉRCIO
1.4.1. Considerações Gerais
O contrato comercial é o termômetro para a economia e alguns
são tão rápidos e rotineiros que são quase imperceptíveis. Por sua vez, outros
são tão complexos que exigem largos períodos de negociação e punctação,
altos investimentos e assessoria profissional de diversas áreas, bem como a
atenção dos juristas e dos operadores do comércio, especialmente, o
internacional. Como diz Waldirio Bulgarelli (1997, p. 25), os contratos são “o
centro da vida dos negócios”.
Paulo Luiz Netto Lôbo (1999) lembra que a “ordem econômica
se realiza mediante contratos. A atividade econômica é um complexo de atos
contratuais direcionados a fins de produção e distribuição de bens e serviços
que atendem às necessidades humanas e sociais”.
Para César Fiuza (2008, p. 383) “é na convenção, motivada
pela necessidade, com a finalidade de produzir efeitos jurídicos os mais
complexos e dinâmicos, que se situam os contratos.” O autor continua “o
contrato realiza um valor de utilidade social” (FIUZA, 2008, p. 402).
Para Caio Mário da Silva Pereira (2004, p. 11), “é o contrato
que proporciona a subsistência de toda a gente. Sem ele, a vida individual
regridiria, a atividade do homem limitar-se-ia aos momentos primários”.
26
Orlando Gomes (1996, p. 6) ensina que a partir do pensamento
econômico-jurídico liberal o contrato passou a ser o principal instrumento
jurídico da vida econômica. Pode-se, então, afirmar que o contrato é um
propulsor do comércio. O liberalismo teve fundamental importância para a
formação da concepção de contrato e consequentemente da própria teoria
geral dos contratos, pois ao defender a liberdade da economia vedou sua
organização e intervenção pelo Estado, fortaleceu o princípio da autonomia da
vontade e da plena liberdade contratual.
No entanto, pelo abuso ocorrido em decorrência da ampla
liberdade e da formal igualdade, essa concepção foi sendo modificada pela
então crescente intervenção do Estado na economia, resultando no dirigismo
contratual com extrema limitação da liberdade de contratar a fim de alcançar
um equilíbrio material nas relações negociais.
Porém, esse movimento de intervenção não resistiu aos altos
custos e à limitação criativa e dinâmica do Estado nas relações negociais
dando espaço ao processo de globalização calcado em idéias neoliberais,
retomando o contrato o caminho da autonomia da vontade, porém, com
intervenções estatais pontuais a fim de garantir a ordem pública, os bons
costumes, a boa-fé e a função social do contrato, tanto no âmbito nacional
quanto internacional, considerando sempre o princípio da humanidade como
seu objetivo.
Esse processo de transformação social e econômica repercutiu
no direito e a repaginação do contrato como instrumento de promoção social,
deve, hodiernamente, considerar não somente os interesses das partes, mas a
função que o contrato representa para toda a sociedade. Em razão disso, o
contrato, seja nacional ou internacional, deve obedecer aos princípios da boa-
fé, da função social, da igualdade, da justiça social e da autonomia da vontade.
Nesse sentido, cabe introduzir a conceituação de contrato
como um acordo de duas ou mais vontades, com vistas, seja a criar uma
relação de direito, isto é, dar nascimento a uma obrigação, ou a um direito real,
seja modificar ou extinguir uma relação preexistente. O contrato é,
precisamente, o acordo da pluralidade de vontades à qual a lei aplicável
confere efeitos de direito.
27
Orlando Gomes (1996, p. 12) explica que “na concepção
tradicional, o contrato é todo acordo de vontades destinado a constituir uma
relação jurídica de natureza patrimonial e eficácia obrigacional”.
Segundo César Fiuza (2008, p. 384), contrato é
ato jurídico lícito, de repercussão pessoal e socioeconômica,
que cria, modifica ou extingue relações convencionais
dinâmicas, de caráter patrimonial, entre duas ou mais pessoas,
que, em regime de cooperação, visam atender desejos ou
necessidades individuais ou coletivas, em busca da satisfação
pessoal, assim promovendo a dignidade humana.
Convém lembrar que contrato é palavra polivalente, ou seja,
expressa o acordo de vontade das partes e o instrumento escrito que
materializa esse acordo. Celso Barbi Filho (1996, p. 18) explica que “contrato
não se confunde com instrumento. O primeiro é acordo de vontades, enquanto
o segundo é simples meio de prova desse acordo e de suas condições”, pois
pode haver contrato sem instrumento, basta lembrar da existência dos
contratos orais.
Portanto, os elementos essenciais do contrato são o acordo de
vontades e a necessidade de subordinação do contrato à lei, que as partes
não estão obrigadas porque quiseram se obrigar, mas porque a lei consente
que o façam (BASSO, 1998, p. 17).
Pelo fato do contrato ser o instrumento de expressão da
vontade negocial das partes é preciso que alguns cuidados sejam tomados
desde a negociação até após a sua execução, atentando-se sempre para os
princípios que devem regê-lo e para o elemento de estraneidade que o ligará
ao direito aplicável no caso dos contratos internacionais.
28
1.4.2. Conceito e Características dos Contratos Internacionais do
Comércio
Quando se adiciona ao contrato o elemento internacional,
conceituá-lo passa a ser tarefa
21
ainda mais difícil, mas Irineu Strenger (1998b,
p. 84) o faz nos seguintes termos:
São contratos internacionais do comércio todas as
manifestações bi ou plurilaterais da vontade livre das partes,
objetivando relações patrimoniais ou de serviços, cujos
elementos sejam vinculantes de dois ou mais sistemas
jurídicos extraterritoriais, pela força do domicílio, nacionalidade,
sede principal dos negócios, lugar do contrato, lugar da
execução, ou qualquer circunstância que exprima um liame
indicativo de Direito aplicável.
Nadia de Araujo (1997, p. 19) defende que “o que caracteriza o
contrato internacional é a presença de um elemento de estraneidade que o
ligue a dois ou mais ordenamentos jurídicos nacionais”.
Luiz Olavo Baptista (1994, p. 24) conclui que contrato
internacional é aquele que “contendo elementos que permitam vinculá-lo a
mais de um sistema jurídico, tem por objeto operação que implica o duplo fluxo
de bens pela fronteira, ou que decorre diretamente de contrato dessa
natureza”.
Os contratos internacionais diferem dos contratos nacionais na
medida em que possibilitam às partes escolherem a lei aplicável a elas; algo
desnecessário em âmbito interno. Outrossim, os internacionais estão
envolvidos numa atmosfera política e econômica muito sensível às
modificações que geram conflitos e incertezas, exigindo instrumentos
harmonizadores por envolverem dois ou mais sistemas jurídicos.
Na linha desse pensamento, chega-se à convicção de que uma
das notas características dos contratos internacionais é a sua
vinculação a um ou mais sistemas jurídicos estrangeiros, além
de outros dados de estraneidade, como o domicílio, a
nacionalidade, a lex voluntatis, a localização da sede, o centro
21
Esta dificuldade se dá exemplificativamente em decorrência da “diferença legislativa interna
dos Estados, limitação do direito internacional privado como critério de indicação da lei
aplicável, inexistência de lei uniforme ou de direito próprio para regular a matéria, inexistência
de legislação adaptável à evolução das práticas comerciais contemporâneas, como
transferência de informações e créditos por via eletrônica e inadequação e lentidão excessiva
das vias judiciais para a solução dos dinâmicos problemas relacionados à contratação
internacional” (MELO, 1999, p. 29).
29
de principais atividades, e até a própria conceituação legal.
(STRENGER, 1996b, p. 111)
O art. 1º, §2º da Conferência Interamericana Especializada
sobre Direito Internacional Privado (CIDIP-V) de 1994, define ser internacional
o contrato “quando as partes no mesmo tiverem sua residência habitual ou
estabelecimento sediado em diferentes Estados Partes ou quando o contrato
tiver vinculação objetiva com mais de um Estado Parte”.
Espinar Vicente (apud STRENGER, 1996a, p. 111-112) propõe
da seguinte forma a conceituação do contrato econômico internacional:
a) “são contratos que desenvolvem o intercâmbio de
mercadorias, serviços e capitais, entre empresas pertencentes
a diferentes países”, b) “são contratos nos quais ao menos uma
das partes desempenha papel preponderante no meio
econômico internacional, no que concerne à matéria objeto do
acordo”; c) “são contratos que - devido à concentração
oligopolista dos bens e à atual estrutura do comércio mundial –
não afetam os Estados diretamente conectados à operação
que instrumentalizam, mas a todos os países que integram a
área do mercado dos bens ou serviços aos quais se referem”;
d) “são contratos que - em razão da organização transnacional
dos poderes econômicos privados - põem em jogo, direta ou
indiretamente, os interesses corporativos do conjunto de
empresas que se dediquem habitualmente ao setor de
atividades em que se inclua a operação”; e) “normalmente, a
forma desses contratos responde a caracteres peculiares, entre
os quais se destacam: a homogeneidade de suas disposições,
a existência de cláusulas de submissão, a arbitragem e o
emprego de terminologia unificada”.
Dessa tentativa de elaborar conceitos retiram-se as
características dos contratos internacionais: a declaração de vontade, a
autonomia da vontade, o elemento de negocialidade e a necessidade de dois
ou mais sistemas jurídicos afetados, além, é claro, da capacidade
22
das partes,
objeto lícito
23
, forma
24
e prova
25
dos contratos.
22
Em referência à capacidade das partes, faz-se necessário atentar para o disposto no art.
da Lei de Introdução ao Código Civil Brasileiro no que concerne à capacidade da pessoa
natural de se relacionar internacionalmente e no art. 11 que dispõe que a pessoa jurídica será
regida pela lei do Estado de sua constituição. Nesse sentido, Luiz Olavo Baptista (1980, p. 89)
ressalta a importância de se verificar se quem se apresenta como representante da sociedade
possui realmente poderes no contrato ou estatuto social.
23
Nem sempre o que é lícito em um país é no outro e isto importa no momento de solucionar
um conflito. Portanto, tal análise deve ser feita ao se escolher o foro competente e a lei
aplicável.
24
A Convenção de Viena sobre Contratos de Compra e Venda Internacional de Mercadorias de
1980 aceita a oralidade como forma do contrato de compra e venda internacional, pois “não
30
Irineu Strenger (1996a, p. 115-116) destaca que os contratos
internacionais: 1) são casualmente identificáveis, pois o formados de dados
extremamente sensíveis a todas as atividades operacionais do comércio
internacional; 2) são os únicos instrumentos de ação para o comércio
internacional, sem vínculos com esquemas legais geograficamente
circunscritos; 3) transcendem os limites estritos do direito para se converter em
instrumento multidisciplinar; 4) não são meros veículos convencionais, mas
fórmulas de elaborações conjunturais; 5) fundamentam-se em sistemas
principiológicos mais do que legais, como decorre da noção da lex mercatoria.
Maristela Basso (1998, p. 18) explica que nos contratos
internacionais, além do critério jurídico, ou seja, produção de feitos de direito
em mais de uma ordem jurídica, considera-se o critério econômico, isto é,
“fluxo e refluxo sobre as fronteiras com conseqüências significativas para mais
de um país”.
Alfonso-Luis Calvo Caravaca e Javier Carrascosa González
(2002, p. 311) relatam a importância do contrato internacional:
El contratro es el principal instrumento jurídico de circulación de
los valores patrimoniales y de la riqueza en el ámbito
internacional. Es un vehículo típico del cambio en la economía
de mercado internacional. Es el cauce legal más utilizado para
el desplazamiento de cosas, derechos y servicios entre los
sujetos que participan en el mercado.
Assim, o que diferencia um contrato internacional de um
contrato de direito interno é que aquele traz um elemento de estraneidade
relevante que pode ligá-lo de forma efetiva ou potencial a dois ou mais
sistemas jurídicos.
Com a conceituação e caracterização dos contratos
internacionais, faz-se necessário conhecer os princípios informadores
reconhecidos nos ordenamentos internos, em documentos de organismos
internacionais, na jurisprudência e na doutrina.
impõe qualquer requisito de forma para caracterizar o contrato, e admite seja ele provado por
qualquer meio, inclusive por testemunhas (art. 11)” (GREBLER, 1992, p. 311).
25
Denota-se a importância da escolha da língua e do foro, porque se houver a escolha de um
foro diferente da língua convencionada, o juiz acabará decidindo com base em provas e
argumentos que as partes produzirem na sua língua. “Daí, uma regra importante deve ser
extraída pelo advogado redator de contratos internacionais: a premissa de que a língua do foro
prevalecerá sobre qualquer convenção em contrário” (BAPTISTA, 1980, p. 94).
31
1.5.
P
RINCÍPIOS
I
NFORMADORES DOS
C
ONTRATOS
I
NTERNACIONAIS
Os princípios gerais do direito são considerados tanto fonte
interna no art. da Lei de Introdução ao Código Civil, quanto internacional no
art. 38, I, c, do Estatuto da Corte Internacional de Justiça.
Mauricio Godinho Delgado (2001, p. 88) explica que os
princípios gerais do direito são
princípios que se irradiam por todos os segmentos da ordem
jurídica, cumprindo o relevante papel de assegurarem
organicidade e coerência integradas à totalidade do universo
normativo de uma sociedade política. Nessa linha, esses
princípios gerais, aplicando-se aos distintos segmentos
especializados do direito, preservam a noção de unidade da
ordem jurídica, mantendo o direito como um efetivo sistema,
isto é, um conjunto de partes coordenadas.
Celso Antonio Bandeira de Mello (2001, p. 771) ensina que
princípio é por conceituação
[...] mandamento nuclear de um sistema, verdadeiro alicerce
dele, disposição fundamental que se irradia sobre diferentes
normas compondo-lhes o espírito e servindo de critério para
sua exata compreensão e inteligência exatamente por definir a
lógica e a racionalidade do sistema normativo, no que lhe
confere a tônica e lhe dá sentido harmônico.
Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho (2009, p. 27)
conceituam por princípios “os ditames superiores, fundantes e
simultaneamente informadores do conjunto de regras do Direito Positivo.
Pairam, pois, por sobre toda a legislação, dando-lhe significado legitimador e
validade jurídica.
Para César Fiuza (2008, p. 397) “os princípios informadores
são normas gerais e fundantes que fornecem os pilares de determinado ramo
do pensamento científico ou do ordenamento jurídico”.
Vale ressaltar que os princípios foram reconhecidos como
normas jurídicas com a doutrina do pós-positivismo
26
, que segundo Luis
26
Paulo Bonavides (2003) explica que o pós-positivismo corresponde aos grandes momentos
constituintes das últimas décadas do século XX e que se trata de uma doutrina propedêutica a
uma teoria dos princípios, que visa superar o jusnaturalismo e o juspositivismo, pois estas
velhas correntes de pensamento jurídico são impotentes para dilucidar a positividade do Direito
em todas as suas dimensões de valor e em todos os seus graus de eficácia. Ao dissertar sobre
os princípios, ensina que a juridicidade dos mesmos passou por três fases: a jusnaturalista
(esfera abstrata com normatividade basicamente nula e duvidosa, mas com dimensão ético-
32
Roberto Barroso e Ana Paula de Barcellos (2003, p. 336) é a superação do
jusnaturalismo e do positivismo
A superação histórica do jusnaturalismo e o fracasso político do
positivismo abriram caminho para um conjunto amplo e ainda
inacabado de reflexões acerca do Direito, sua função social e
sua interpretação. O pós-positivismo é a designação provisória
e genérica de um ideário difuso, no qual se incluem a definição
das relações entre valores, princípios e regras, aspectos da
chamada nova hermenêutica constitucional, e a teoria dos
direitos fundamentais, edificada sobre o fundamento da
dignidade humana. A valorização dos princípios, sua
incorporação, explícita ou implícita, pelos textos constitucionais
e o reconhecimento pela ordem jurídica de sua normatividade
fazem parte desse ambiente de reaproximação entre Direito e
Ética.
Nesse sentido, Nadia de Araujo (2007, p. 106) explica
Esta nova visão da hermenêutica jurídica não serve apenas
aos casos judiciais. Pode e deve ser utilizada para os litígios de
caráter comercial, porque sua solução depende mais da
análise de questões ligadas aos fatos concretos do caso,
baseadas em dados econômicos e conjunturais, do que em
regras jurídicas genéricas. Essa metodologia aparece cada vez
mais nos órgãos internacionais de solução de controvérsias
comerciais, que necessitam analisar em detalhes premissas
fáticas de grande complexidade e aplicar princípios jurídicos
gerais a situações específicas de caráter bastante particular.
Os contratos internacionais do comércio também o regidos
por princípios
27
- que aqui se entende princípio como norma jurídica que
são o fundamento do ordenamento jurídico, trazendo consigo uma carga
valorativa muito grande. Assim, César Fiuza (2008, p. 402) informa que Stein e
Shand, correlacionam os valores fundamentais da sociedade ocidental a
princípios que regem os contratos com o intuito de promover o bem comum, o
progresso econômico e o bem-estar social. Eles dividem esses valores em:
ordem (segurança), justiça e liberdade, e Fiuza ainda acrescenta a dignidade
humana
28
. Assim,
valorativa que inspirava o postulado da justiça), positivista (os princípios entram nos Códigos
como válvula de segurança, assinalam a carência de normatividade estabelecendo sua
irrelevância jurídica) e a pós-positivista (hegemonia axiológica dos princípios, convertidos em
pedestal normativo sobre o qual assenta todo edifício jurídico dos novos sistemas
constitucionais).
27
“Essa nova maneira de visualizar o direito, que aparece no direito constitucional de diversos
Estados, também tem sido seguida nas arenas internacionais e revela-se de maneira bastante
clara nas decisões dos órgãos internacionais de solução de controvérsias, como veremos nos
exemplos da OMC e do Mercosul” (ARAUJO, 2007, p.104).
28
O princípio da dignidade da pessoa humana vem estampado no art. 1º, III, da Constituição
Federal como fundamento da República brasileira e nos principais documentos internacionais,
33
[...] à liberdade, corresponde o princípio da autonomia privada.
À ordem (segurança), o princípio da boa-fé. À justiça, o
princípio da justiça contratual. À dignidade do homem,
correspondem todos eles e os princípios da dignidade humana
e da função social dos contratos.
Compreende-se que todas as relações humanas, sejam elas,
sociais, políticas, econômicas ou jurídicas, devem respeitar e ter como
parâmetro a dignidade humana
29
. As relações contratuais são essenciais para
a construção e efetivação desse objetivo, pois ao buscar o que é melhor
individualmente deve-se também atentar para o que é melhor para a
coletividade e para o parceiro negocial.
Assim, o contrato deve servir como instrumento da promoção
do ser humano pelo que ele é e não pelo que ele possui.
O respeito à dignidade princípio político- constitucional
impositivo – consubstanciou-se na postura de que, o exame de
qualquer cláusula contratual não poderia mais se prender
apenas à sua licitude ou exame da conformidade da avença
com os cânones legais ou sociais mas, aferir, primordialmente,
se a atividade privada estaria de conformidade com os valores
relevantes destacados pela Carta Magna; a boa-fé, os bons
costumes e, principalmente com a chamada função social da
convenção, sob a ótica constitucional que, em nome da
supracitada dignidade, além dos direitos dos contratantes, não
perderia de vista, também, o de terceiros. (BORGES, 2006, p.
150)
No que se refere à função social do contrato, tem-se que esse
princípio
[...] não reduziu, apenas, a força obrigatória de cumprimento do
convencionado, mas impôs, principalmente, um padrão de
comportamento que buscou coibir relações espoliativas e
injustas, tendo se valido de coordenadas e dispositivos
constitucionais, a par com os de comutatividade contratual,
considerada uma autêntica ferramenta de equilíbrio dos
negócios jurídicos (BORGES, 2006, p. 151).
Nesse sentido, faz-se necessário comentar que a função social
dos contratos reside no fato de serem instrumentos de movimentação da
cadeia econômica, gerando riquezas, empregos, oportunidades, tributos,
integração social e promoção humana.
como a Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948) e Declaração sobre o Direito ao
Desenvolvimento (1986).
29
“A noção jurídica de dignidade traduz um valor fundamental de respeito à existência humana,
segundo as suas possibilidades e expectativas, patrimoniais e afetivas, indispensáveis à sua
realização pessoal e à busca da felicidade” (GAGLIANO; PAMPLONA FILHO, 2009, p. 29).
34
Por sua vez, o princípio da justiça contratual complementa a
função social para o alcance do desenvolvimento comercial. O contrato deve
ser justo para todos os envolvidos para que possa ser adequadamente
cumprido. Assim, o negócio jurídico benéfico e justo possibilita o equilíbrio da
equação econômica prevista.
Segundo César Fiuza (2008, p. 407), justiça contratual “é a
relação de paridade que se estabelece nas relações comutativas, de sorte a
que nenhuma das partes mais ou menos do que o que recebeu.” Esse
princípio está estritamente ligado à equidade, ao tratamento justo das partes
em uma relação de paridade, onde deve haver equivalência entre a prestação
e a contraprestação e na distribuição dos ônus e dos riscos advindos da
relação contratual (FIUZA, 2008, p. 408).
Embora os princípios acima sejam informadores e essenciais
aos contratos internacionais, dois desses princípios são de extrema
importância para o presente estudo: o princípio da autonomia da vontade que
possui desdobramentos nos princípios da obrigatoriedade e da ordem pública e
o princípio da boa-fé objetiva.
1.6.
P
RINCÍPIO DA
A
UTONOMIA DA
V
ONTADE
1.6.1. Desdobramentos da Autonomia da vontade
O princípio da autonomia da vontade está diretamente
relacionado com os princípios da liberdade e da igualdade
30
, previstos, na
30
“O modelo reliberalizante de evolução do direito dos contratos responde às novas questões
propostas pela economia global recuperando o primado do voluntarismo. Mas não o faz por um
simples retorno ao modelo liberal, desconhecendo o contratante sem liberdade. Ao contrário,
revelando-se a síntese dos dois modelos que o antecederam, o reliberalizante prestigia a tutela
do economicamente mais fraco, ao mesmo tempo em que reafirma a importância da autonomia
da vontade entre contratantes iguais. Na verdade, a tecnologia dos contratos constata que, na
relação entre desiguais, nenhum dos contratantes é livre, porque não tem condições para
negociar amplamente o contrato. O débil, em razão das suas necessidades e insuficiências de
informações; o forte, pelo acréscimo de custos que a renegociação acarreta. Somente o
vínculo entre contratantes dotados dos mesmos recursos para arcar com os custos de
transação pode ser visto como o produto de livre manifestação de vontade” (COELHO, 2002, p.
35
Declaração Universal dos Direitos Humanos, bem como na Constituição
Brasileira, no art. , caput e em suas extensões em diversos incisos. O amplo
princípio da liberdade possibilita que as pessoas possam se relacionar da
forma que lhes for mais conveniente desde que não contrariem a lei, as
convenções anteriores ou a própria Constituição que possuem como fim a
proteção da sociedade.
Apenas o homem livre
31
é plenamente capaz de exercer seus
direitos e deveres, mas esse exercício de liberdade desdobra-se em dois
outros princípios no campo contratual: da obrigatoriedade contratual
32
e do
consensualismo
33
, pois para que se mantenha a ordem social é preciso que os
pactos feitos de forma livre sejam cumpridos (pacta sunt servanda) e que
passem a obrigar os envolvidos na medida em que haja consenso entre eles.
Os acordos de vontade concluídos livremente trarão ínsitos as
cláusulas de irretratabilidade e intangibilidade, considerando-se ainda que na
ausência do cumprimento contratual haverá execução patrimonial contra o
inadimplente.
Nesse sentido, Caio Mário da Silva Pereira (2004, p. 15)
informa
O princípio da força obrigatória do contrato contém ínsita uma
idéia que reflete o máximo de subjetivismo que a ordem legal
oferece: a palavra individual, enunciada na conformidade da lei,
encerra uma centelha de criação, tão forte e tão profunda, que
não comporta retratação, e tão imperiosa que, depois de
17).
31
ARAUJO, 1996, p. 31-32. A autora informa “ainda nas palavras de Sampaio Ferraz, é a nova
noção de liberdade da era moderna, que tem como princípio o livre-arbítrio, que seria uma
qualidade da vontade, e, se expressaria num querer e não querer, de que partilham todos os
homens, independentemente do seu status. A noção de livre-arbítrio serviu à generalização da
pessoa como elemento identificador do ser humano: o homem como pessoa ou como ser livre”.
32
A visão moderna da obrigatoriedade contratual “encontra seus fundamentos na Teoria
Preceptiva, segundo a qual as obrigações oriundas dos contratos obrigam não apenas porque
as partes as assumiram, mas porque interessa à sociedade a tutela da situação objetivamente
gerada, por suas conseqüências econômicas e sociais. A esfera contratual é espaço privado,
em que as partes, nos limites impostos pela Lei, podem formular preceitos (normas) para
regular sua conduta. A obrigatoriedade contratual também se baseia no princípio da confiança.
Baseado no valor social da aparência (Betti), o contrato vincula por razões sociais, ou seja, as
partes têm que ter a segurança ou a confiança de que o contrato será cumprido, mesmo que à
força” (FIUZA, 2008, p. 399-400).
33
Tal princípio pressupõe um consensualismo entre as partes para que haja o negócio jurídico,
pois caso não haja consenso entre elas, essa relação será eivada de vícios. Nos contratos
internacionais essa liberdade isenta de vícios é fundamental para o desenvolvimento do
negócio jurídico e econômico e traz ainda uma carga diferente daquela prevista em âmbito
interno, pois sua principal característica é autorizar às partes a escolha da lei aplicável ao
contrato, bem como o foro de eleição para solução de conflitos.
36
adquirir vida, nem o Estado mesmo, a não ser
excepcionalmente, pode intervir, com o propósito de mudar o
curso de seus efeitos.
Ressalta-se o estabelecido no art. 166 do Código Bustamante:
“as obrigações que nascem dos contratos tem força de lei entre as partes
contratantes e devem cumprir-se segundo o teor dos mesmos, salvo as
limitações estabelecidas neste Código”.
A obrigatoriedade contratual também está prevista nos
Princípios sobre os contratos comerciais internacionais do UNIDROIT em seu
art. 1.3 que estabelece que todo contrato validamente celebrado torna-se
obrigatório para as partes, somente podendo ser modificado ou extinguir-se
conforme o que nele estiver estipulado, por acordo das partes ou de algum
outro modo disposto nos princípios do UNIDROIT.
As exceções ao princípio da obrigatoriedade são as cláusulas
limitadoras de responsabilidade, as de força maior e a de hardship
34
, muito
comuns nos contratos internacionais (AMARAL, 1999, p. 115).
1.6.2. Autonomia da vontade interna e internacional
uma discussão doutrinária acerca da autonomia privada e
autonomia da vontade no contexto contratual nacional, sendo que para alguns
os termos são sinônimos e para outros cada qual tem seu significado e seu
âmbito de aplicação.
34
Ana Paula Martins Amaral (1999, p. 118) traz as semelhanças e as diferenças da força maior
e da cláusula hardship: “Tanto a cláusula de força maior quanto a de hardship referem-se a
eventos imprevistos e contra os quais as partes nada puderam fazer. Elas, no entanto, se
distanciam à medida que a força maior gera a impossibilidade do cumprimento da obrigação
pactuada, enquanto na cláusula hardship é possível a concretização do negócio, mas com um
peso exorbitante para uma das partes, ou seja, o contrato pode ser cumprido, mas a parte terá
que arcar com uma carga excessivamente onerosa. Na cláusula de força maior temos a
inexecução da obrigação, que será rescindida; na cláusula hardship temos a previsão de uma
renegociação total ou parcial, geralmente com a presença de árbitros, que irão estipular novos
prazos ou formularem um novo preço para o objeto pactuado”. Luiz Olavo Baptista (1983, p.
269) ensina que “o hardship assemelha-se à força maior no tocante à imprevisibilidade e à
inevitabilidade do evento, mas dela se distancia porque o evento gerador do hardship apenas
torna mais onerosa a execução do contrato”.
37
Fiuza (2008, p. 404) diferencia o termo autonomia da vontade
de autonomia privada, considerando que esse último seria a versão moderna
do primeiro, partindo-se da lei e não puramente da vontade.
Na autonomia privada, o contrato não vem, exclusivamente, de
dentro; não é fenômeno meramente volitivo. As pessoas não
contratam apenas porque desejam. A vontade é condicionada
por fatores externos, por necessidades, que dizem respeito aos
motivos contratuais.
Para Melissa Furlan (2004, p. 31-32) não se trata de uma
atualização, mas de momentos distintos da expressão da autonomia:
Considerando que a autonomia privada seja o poder normativo
conferido aos particulares pela Constituição, chegamos à
conclusão de que o exercício da autonomia da vontade só
ocorre em um segundo momento, quando o particular, valendo-
se da autonomia privada, seleciona os sujeitos, as condições,
os procedimentos que irá adotar no negócio jurídico pretendido.
Ou seja, o poder conferido aos particulares pela autonomia
privada manifesta-se com os atos de autonomia da vontade,
que seriam: a definição dos sujeitos que participarão do
negócio jurídico, a indicação da capacidade e dos limites do
exercício dessa capacidade, a escolha dos procedimentos e
formas que serão adotados.
Assim, Francisco Amaral (2000, p.327) defende que a
autonomia da vontade
35
“é o poder que os particulares têm de regular, pelo
exercício de sua própria vontade as relações de que participam,
estabelecendo-lhes o conteúdo e a respectiva disciplina jurídica”.
Para Maristela Basso (1994, p. 42), o princípio da autonomia
da vontade, no direito contratual
36
[...] se manifesta na liberdade propriamente dita de contratar,
de estipular o contrato e seu conteúdo. Significa aquela esfera
de liberdade de que gozam as partes, no âmbito do direito
privado, de auto-regência de seus próprios interesses, de
discutir livremente as condições do contrato pretendido, bem
como de escolher aquele mais conveniente. Por outras
palavras, é a faculdade das partes de regerem-se por suas
próprias leis, de praticar um ato jurídico determinando-lhe o
conteúdo, a forma, assim como os efeitos.
35
“Pela autonomia da vontade, o sujeito de direito contrata se quiser, com quem quiser e na
forma que quiser. A ordem jurídica reconhece os direitos e deveres gerados pela livre
manifestação de vontade das pessoas, conferindo validade e eficácia ao contratado entre elas”
(COELHO, 2002, vol. 3, p. 8)
36
Segundo Fiuza (2008, p. 398), exerce-se a autonomia da vontade internamente em quatro
planos distintos: a) contratar ou não contratar; b) com quem e o que contratar; c) estabelecer
as cláusulas contratuais, respeitados os limites legais; d) mobilizar ou não o Judiciário para
fazer respeitar o contrato.
38
Partindo-se da premissa de que todo homem é livre por
natureza (Declaração Universal dos Direitos Humanos, art. 1º) e, por isso, para
o direito internacional a autonomia privada é inerente ao homem, não há
preocupação com esse caráter da autonomia no DIPri que se ocupará, então,
da autonomia da vontade. Esclarece-se ainda que o âmbito de atuação da
autonomia da vontade no DIPri vai além da liberdade de escolher o conteúdo
do acordo, ela permite a escolha da lei aplicável ao caso, segundo os limites
impostos pelas normas de ordem pública.
Irineu Strenger (2000a, p. 83) leciona que a autonomia da
vontade no âmbito dos contratos internacionais
é a faculdade concedida aos indivíduos de exercerem sua
vontade, tendo em vista a escolha e a determinação de uma lei
aplicável a certas relações jurídicas nas relações
internacionais, exercendo-se no interior das fronteiras
determinadas de um lado pela noção de ordem pública e de
outro pelas leis imperativas.
Portanto, distingue-se o significado que o princípio da
autonomia da vontade possui em âmbito interno e internacional
37
e Nadia de
Araujo (1997, p. 39) o faz nos seguintes termos:
Na ordem interna, autonomia significa que as partes podem
fixar livremente o conteúdo dos contratos dentro dos limites da
lei, ou seja, em face das normas imperativas e da ordem
pública. É o poder reconhecido pela ordem jurídica aos
indivíduos de criar situações jurídicas. Por outro lado, na ordem
internacional, a autonomia da vontade significa a liberdade das
partes de escolherem outro sistema jurídico para regular o
contrato.
Luiz Olavo Baptista (1994, p. 39) também defende que
significação diferente de autonomia da vontade no direito interno e no
internacional.
[...] no Direito Internacional o significado é de liberdade para
escolher a lei aplicável ao contrato, ou seja, de localizarem-no
em determinado sistema jurídico, dentro do qual terão,
novamente, a autonomia da vontade – essa já de direito interno
– para estabelecer o conteúdo do contrato.
37
A teoria da autonomia da vontade em âmbito internacional foi propagada por Charles
Dumoulin no século XVI e posteriormente aceita por diversas legislações e convenções
internacionais. Essa teoria pretendia possibilitar que em relações contratuais conectadas a
mais de um sistema jurídico as partes pudessem determinar a lei aplicável àquela relação,
independentemente do que determinavam as regras de conexão do foro onde a questão
poderia vir a ser julgada, afirmando a existência de seus direitos subjetivos, ao mesmo tempo
que assegurava força obrigatória aos contratos. (ARAUJO, 1996, p. 32-33)
39
Nesse sentido, Nilton Rafael Latorre (2004, p. 82) ministra
sobre a importância da autonomia da vontade para dar certeza e segurança
aos operadores do comércio internacional.
Os operadores do comércio internacional almejam certeza e
segurança, que têm dificuldade de alcançar, dada a
imperfeição da ordem jurídica internacional, cheia de lacunas,
causadas pela falta de coordenação decorrente da disputa
entre várias soberanias no plano jurídico e econômico. Uma
alternativa que se lhes apresenta é a escolha
38
da lei aplicável,
cujas conseqüências podem avaliar e alcançam-na pelo
mecanismo chamado autonomia da vontade.
Nadia de Araujo (1997, p. 14) traz a teoria de Jacquet de que
existem três planos de visão da autonomia da vontade, primeira de que tal
princípio aparece como meio privilegiado de designação da lei estatal aplicável
a um contrato internacional, segunda, permite subtraírem o direito estatal e por
último serviria de instrumento de aperfeiçoamento do direito ao eliminar
conflitos de leis.
Interessante o questionamento acerca da possibilidade de
escolher uma lei aplicável sem que ela tenha qualquer relação com o contrato,
ou melhor, com os ordenamentos jurídicos envolvidos no contrato. Como
resposta a corrente que defende a plena autonomia, argumentando que se
tratando de um negócio importante, suas disposições devem ser razoáveis e a
escolha da lei aplicável deve ter um bom fundamento, então se as partes
escolhem uma lei sem aparente conexão com o negócio, algum motivo elas
tem para agirem assim. Por sua vez, a outra corrente defende que a lei
aplicável escolhida deve ter alguma relação com o contrato, inclusive para
evitar o forum shopping (AMARAL, 1999, p. 22-23).
Deve-se ressaltar ainda que por mais que se pratique a
autonomia de escolha da lei aplicável, os contratantes não podem estar alheios
às leis dos Estados envolvidos, pois em algum momento necessitarão aplicá-
las.
[...] não é possível fugir de todo a uma lei nacional aplicável ao
contrato internacional, lei esta que deverá ser determinada pelo
Direito Internacional Privado do Estado onde a questão estiver
sendo apreciada. Por isso, as partes de um contrato
38
Em âmbito econômico, Fábio Ulhoa Coelho (2002, p. 16), relata que na era da globalização
“quanto maior a liberdade reconhecida pela ordem jurídica para os próprios agentes
econômicos definirem, por contrato, seus direitos e obrigações, maior será a atração de
investimentos”.
40
internacional não podem deixar de levar em conta a posição a
ser tomada pelos tribunais porventura envolvidos na questão,
com base no Direito Internacional Privado daqueles países.
Como as regras de conflito variam de país para país, procurou-
se a sua harmonização através da criação de normas
conflituais internacionais uniformes. (ARAUJO, 1997, p. 19-20)
Embora a idéia de ampla e irrestrita autonomia da vontade seja
tentadora aos olhos dos agentes privados, deve-se lembrar que ela está
diretamente vinculada à liberdade e igualdade, acarretando responsabilidades
e limitações a fim de respeitar a ordem pública e as leis imperativas
39
do
Estado onde seaplicada com o intuito de proteger terceiros e a sociedade
como um todo.
1.6.3. Limitações
40
à Autonomia da Vontade
O ordenamento brasileiro no art. 17 da LICC ressalva a
soberania, a ordem pública e os bons costumes, limitando, nesses termos, as
declarações de vontade.
Art.17. As leis, atos e sentenças de outro país, bem como
quaisquer declarações de vontade, não terão eficácia no Brasil,
quando ofenderem a soberania nacional, a ordem pública e os
bons costumes.
Da mesma forma dispõe o parágrafo único do art. 2.035 do
Código Civil: “Nenhuma convenção prevalecerá se contrariar os preceitos de
ordem pública, tais como os estabelecidos por este Código para assegurar a
função social da propriedade e dos contratos”.
Guido Soares (1984, p. 122) conceitua ordem pública como
[...] o conjunto de normas e princípios de tal maneira inerentes
a ele, que não permitem serem afastados por outros de outros
sistemas. É a lei local, que se impõe de maneira absoluta,
39
Guido Soares (1984, p. 123) expõe a teoria de Mancini onde haveria três tipos de normas: a)
supletivas (somente agiriam se a vontade não tivesse se manifestado ou na sua manifestação
sem eficácia); b) imperativas (inafastáveis pela vontade dos contratantes, mas suscetíveis de o
serem por outra norma DIPri) e c) leis de ordem pública (não podem ser afastadas nem pela
vontade nem pelo DIPri).
40
Importante salientar que limitar a autonomia da vontade não significa diminuí-la ou extingui-
la, mas apenas delimitar seu espaço de atuação, que convive com os demais princípios e
dependendo do caso concreto, de se sobressair ou não diante de princípios como a ordem
pública.
41
impedindo que a vontade das partes ou leis estranhas ao foro
disponham sobre a matéria por ela regulada, de modo taxativo.
Conforme os ensinamentos de Irineu Strenger (1996a, p. 215),
pode ser conceituada como “o conjunto de normas e princípios que, em um
momento histórico determinado, refletem o esquema de valores essenciais,
cuja tutela atende de maneira especial cada ordenamento jurídico concreto”.
Ou seja, a ordem pública varia no tempo e no espaço.
Jacob Dolinger (2005, p. 386)
conclui que
[...] o princípio da ordem pública é o reflexo da filosofia sócio-
político-cultural de toda legislação, que representa a moral
básica de uma nação e que protege as necessidades
econômicas de cada Estado. A ordem pública encerra, assim,
os planos filosófico, político, jurídico, moral e econômico de
todo Estado constituído. (...) A ordem pública se afere pela
mentalidade e pela sensibilidade médias de determinada
sociedade em determinada época.
Deve-se considerar ainda que alguns autores distinguem
ordem pública interna de internacional. Franz Despagnet (apud AMARAL,
1999, p. 80) as diferencia na medida em que a ordem pública interna somente
é aplicada aos nacionais e a internacional tanto a nacionais quanto
estrangeiros, que visa o interesse coletivo do Estado por meio de legislação
que será aplicável a todos que estiverem em seu território.
Por outro lado, Maria Helena Diniz (2007, p. 426) defende que
“ordem pública é o conjunto de normas essenciais à convivência nacional” não
comportando dicotomia.
Pierre Lalive (apud AMARAL, 1999, p. 85-86) vai além da
dicotomia acima elencada para dissertar sobre ordem pública transnacional
que “seria invocada para salvaguardar a moralidade em relações comerciais
internacionais” relacionadas a questões de interesse da sociedade
internacional, como práticas contratuais destinadas a facilitar o tráfico de
drogas, de armas, seqüestros, assassinatos, ou, a subversão de leis
imperativas de um Estado soberano e violações aos direitos humanos.
Dessa forma, a autonomia da vontade deve se submeter às
questões de legalidade e constitucionalidade, bons costumes, soberania,
normas imperativas e de ordem pública, seja interna ou internacional, a fim de
que o contrato internacional e o contrato de arbitragem possam ser
devidamente cumpridos ou aplicados no Estado escolhido pelas partes.
42
Apesar do princípio da autonomia da vontade ser adotado pela
maior parte dos ordenamentos jurídicos nacionais, pelas organizações e
convenções internacionais, no Brasil ainda causa polêmica pelo que dispõe o
art. da LICC. Ao determinar em seu caput que “Para qualificar e reger as
obrigações, aplicar-se-á a lei do país em que se constituírem”, a maior parte da
doutrina brasileira considera que tal artigo está limitando
41
a vontade dos que
estão submetidos à regra de conexão brasileira, não permitindo que adotem lei
aplicável diversa, sob pena de se fraudar a lei. Ao se referir aos contratos
realizados entre ausentes, continua limitando a vontade em seu §2º “A
obrigação resultante do contrato reputa-se constituída no lugar em que residir o
proponente”.
No entanto, cabe mencionar o posicionamento de Jacob
Dolinger (2007, p. 100) de que a doutrina brasileira deveria proclamar a
autonomia da vontade presente na LICC a fim de influenciar a jurisprudência,
uma vez que defende a opinião de Valladão de que o verbo reputa-se presente
no §2º do art. 9º é sinônimo de presume-se.
Considerando que nosso comércio internacional é voltado
principalmente para a Europa e os Estados Unidos, e que em
ambos estes mercados, tanto por força de leis internas como
pelas convenções internacionais, a liberdade de escolha da lei
aplicável é princípio consolidado, cabe à doutrina brasileira
proclamar, em alto e bom som, que não será a lentidão
burocrática em remeter ao Congresso para aprovação a
Convenção do México por nós assinada, nem o desinteresse
do Congresso em aprovar uma nova lei sobre o Direito
Internacional Privado, que mormente quando a lei que temos,
de 1942, em seu artigo 9º, foi interpretado favoravelmente à
autonomia da vontade por aquele a quem o Brasil mais deve
no campo do Direito Internacional Privado.
Essa discussão ocorre porque na Lei de Introdução ao Código
Civil de 1916 existia a permissão expressa das partes escolherem a lei
aplicável no art. 13 que dispunha: “Regulará, salvo estipulação em contrário,
quanto à substância e aos efeitos das obrigações, a lei do lugar onde foram
contraídas”. Com a exclusão da expressão “salvo estipulação em contrário”, o
legislador que viveu a influência da guerra mundial quis limitar a autonomia da
41
A doutrina é bastante controvertida. Haroldo Valladão, Oscar Tenório, Georgette Nacarato
Nazo, Serpa Lopes, Jacob Dolinger e Guido Fernando Silva Soares entendem que existe
autonomia da vontade na LICC, enquanto João Grandino Rodas, Amílcar de Castro, Wilson de
Souza Campos Batalha, Maria Helena Diniz e Nadia de Araujo defendem que não
autonomia conforme disposto na LICC.
43
vontade, o que gera até hoje conseqüências jurídicas e comerciais
desfavoráveis ao Brasil.
Para sanar essa polêmica e contribuir para o desenvolvimento
comercial do Brasil foi inserido o princípio da autonomia na Lei de Arbitragem,
Lei n. 9.307/96, que será objeto de estudo mais a frente.
Cabe apenas salientar que para alguns, mesmo com a Lei de
Arbitragem, o art. 9º da LICC deve ser observado, sob pena da sentença
arbitral o poder ser executada em território brasileiro, por hipoteticamente
ferir a ordem pública. Para outros, no entanto, a Lei de Arbitragem (LA), por
meio de seu art. 2º, §1º, teria revogado referido artigo da LICC quando se
aplicar a arbitragem como método de solução de conflitos.
É nesta tendência que se insere o art. 2º, §1º da lei de
arbitragem, regra de conflito bilateral cujo elemento de conexão
é a própria autonomia da vontade, pelo que se encontra
revogado, no que tange aos aspectos contratuais da
arbitragem, o antiquado art. da Lei de Introdução ao Código
Civil (VALENÇA FILHO, 2000, p. 382).
Valença Filho (2000, p. 386) ainda conclui
[...] que a vontade das partes erigida à categoria de elemento
de conexão reveste-se da autoridade necessária à revogação
de leis imperativas. Somente quando os efeitos concretos
resultantes da aplicação das regras escolhidas pelas partes se
revelarem incompatíveis com a ordem jurídica do foro,
estaremos diante do limite à ordem pública ao qual se refere o
§1º do art. 2º da Lei de Arbitragem. Isto ocorreria, por exemplo,
se a lei escolhida pelas partes, não reconhecesse os princípios
básicos que constituem a ordem pública processual civil
brasileira, agrupados sob o manto do devido processo legal.
Jacob Dolinger (2007, p. 107) questiona o sentido
42
lógico de
se imaginar uma aplicação diversa do princípio da autonomia da vontade
apenas por se tratar de solução arbitral ou judicial. Para ele, após o advento da
LA, o legislador teria revelado seu integral respeito pelo princípio da lex
voluntatis.
Dessa forma, muitos são os posicionamentos acerca desse
assunto, mas observa-se, de um modo geral, que a LICC e a LA são
complementares no ordenamento jurídico brasileiro, pois, quando as partes se
submetem à arbitragem, entende-se que elas possuem liberdade de escolher a
42
“Qual seria a razão, o sentido lógico de que na arbitragem as partes têm o direito de fixar a
lei que será aplicada na solução de sua desavença e que não o possam fazer na hipótese da
solução judicial?” (DOLINGER, 2007, p. 107)
44
lei que será aplicada ao caso concreto, desde que guardada conexão com a
relação jurídica e que não haja desrespeito à ordem pública, enquanto que se
houver submissão ao Poder Judiciário, este deverá seguir o disposto no art.
da LICC, que é o elemento de conexão aplicável. Nesse caso, a LICC pode
remeter o juiz à aplicação da lei estrangeira, o que resulta em dificuldade ao
Judiciário que não é conhecedor do comércio internacional e da lei estrangeira
e também às partes que provavelmente terão uma resolução mais lenta da sua
controvérsia.
No que tange às convenções internacionais, tem-se que a
Convenção Européia sobre a lei aplicável aos contratos internacionais,
assinada em Roma, em 1980 e que entrou em vigor em 1991 permite a
autonomia da vontade; assim como a V Conferência Interamericana
Especializada sobre o Direito Internacional Privado (CIDIP-V), que se realizou
na cidade do México em março de 1994, assinada pelo Brasil, mas o
ratificada até o momento, que também consagrou a autonomia da vontade das
partes como princípio norteador da lei aplicável aos contratos internacionais.
O art. 7º, §1º
43
da CIDIP-V faculta que a escolha da lei
aplicável seja expressa ou cita que permite que se depreenda essa
escolha da conduta dos contratantes e das cláusulas contratuais. O art.
44
,
ainda possibilita que as partes modifiquem supervenientemente a lei aplicável
desde que não afete a validade formal do contrato nem direitos de terceiros. A
CIDIP-V adota subsidiariamente o critério de conexão dos vínculos mais
estreitos no art. 9, §1º
45
.
Na fase de formação dos contratos internacionais do comércio
a autonomia da vontade é princípio essencial para possibilitar o
desenvolvimento do comércio e a aproximação dos comerciantes que terão a
possibilidade de conhecer o produto e o produtor e refletir sobre a conclusão do
43
Art. 7º, §1º: O contrato rege-se pelo direito escolhido pelas partes. O acordo das partes sobre
esta escolha deve ser expresso ou, em caso de ausência de acordo expresso, depreender-se
de forma evidente da conduta das partes e das cláusulas contratuais, consideradas em seu
conjunto. Essa escolha poderá referir-se à totalidade do contrato ou a uma parte do mesmo.
44
Art. 8º: As partes poderão, a qualquer momento, acordar que o contrato seja total ou
parcialmente submetido a um direito distinto daquele pelo qual se regia anteriormente, tenha
este sido ou não escolhido pelas partes. Não obstante, tal modificação não afetará a validade
formal do contrato original nem os direitos de terceiros.
45
Art. 9, §1º: “Não tendo as partes escolhido o direito aplicável, ou se a escolha do mesmo
resultar ineficaz, o contrato reger-se-á pelo direito do Estado com o qual mantenha os vínculos
mais estreitos”.
45
negócio. Nessa etapa, os agentes econômicos com o auxílio de advogados
podem criar instrumentos jurídicos capazes de reger e dar segurança às
negociações. Sem dúvida, é um período de muita criatividade, autonomia e
risco e por isso precisa da proteção do direito.
Assim, o princípio da autonomia da vontade é essencial para a
teoria geral dos contratos internacionais ao possibilitar às partes escolherem a
lei aplicável com as limitações acima referidas e será em conjunto com o
princípio da boa-fé objetiva pedra fundamental para as negociações
preliminares e para a arbitragem.
1.7.
P
RINCÍPIO DA
B
OA
-
O
BJETIVA
O princípio da boa-fé objetiva é derivado do princípio da
dignidade da pessoa humana, pedra angular da Constituição Brasileira de 1988
e das Declarações Internacionais de Direitos Humanos. Para que haja
dignidade é preciso que haja paz e harmonia nas relações jurídicas e isso
pressupõe que as pessoas ajam com boa-fé em seus relacionamentos, sejam
eles em quais âmbitos forem.
Nesse aspecto
[...] a boa-fé, apesar de não estar expressamente textualizada
na norma constitucional, emana desta quando o legislador trata
no artigo 1º, III, da dignidade da pessoa humana ou ainda
quando determina que todos sejam tratados sem distinção,
sendo função do Estado garantir a harmonia social. A boa-fé
retrata os interesses sociais, agregando valores à efetivação da
dignidade da pessoa humana (COSTA; GOMES, 2008).
Historicamente, o Direito Romano seria a origem do conceito
e da expressão da boa-fé moderna, contendo em si o sentido de dever de
adimplemento, de palavra mantida.
A fides romana constitui a base lingüística e conceitual da boa
no direito moderno. É definida na antiguidade como “ser de
palavra”, “ter palavra”. (...) Lealdade esta que, como qualidade
de uma pessoa, representa uma “garantia”, uma “confiança”,
um “empenhamento” (VELASCO, 1992, p. 36).
O Direito Romano apresentava o princípio da honestidade
como preceito fundamental de todo o Direito. Assim, registrava as Institutas do
46
Imperador Justiniano, no Livro I, Título I,
§3º: “Os preceitos do direito são estes:
viver honestamente, não causar dano a outrem, dar a cada um o que é seu”
(JUSTINIANUS, 2000, p.22).
No entanto, foi no direito germânico que se consolidou a
boa-fé como obrigação de cumprir os deveres emergentes do contrato e a
necessidade de se considerar os interesses da outra parte. O parágrafo 242
do Código Civil Germânico concebe a boa-fé objetiva por meio de uma cláusula
geral: “§ 242: O devedor está adstrito a cumprir a prestação tal como a exija a
boa-fé, com consideração pelos costumes do tráfego.”
Boa-fé é uma expressão polissêmica que varia conforme a
cultura e história do país como se observa nos comentários de Luiz Olavo
Baptista (2003, p. 29).
Por exemplo, no direito japonês, onde, segundo Watanabe
Hiroyuki, a boa-fé é um princípio de direito segundo o qual,
numa relação jurídica concreta, deve-se agir sinceramente para
não trair a confiança naquilo que o outro espera. A tônica,
então parece-me residir em o contratante agir coerentemente
com seu discurso, seus atos correspondendo à manifestação
de vontade feita, e não frustrar a expectativa do co-
contratante, pois isto redundaria em trair a confiança nele
depositada. Autores alemães entendem que a boa-fé não
proíbe que a prestação seja cumprida de maneira que não é
desejável, mas, também, que deve proteger a confiança da
outra parte, numa relação jurídica leal, proibindo o exercício
abusivo do direito. Aqui, acredito, busca-se distinguir o
comportamento regular do abusivo, sem, todavia, chegar ao
abuso de direito. O que tornaria o comportamento abusivo seria
a violação da confiança pelo ato desleal.
No direito brasileiro, distinção entre a boa-fé subjetiva e a
objetiva, sendo que esta última será analisada com ênfase por ser padrão de
conduta essencial no comércio internacional. Quanto à primeira
tem o sentido de conhecimento ou de desconhecimento de
uma situação. Denota um estado de consciência, a intenção do
sujeito da relação jurídica, seu estado psicológico ou íntima
convicção. Às vezes pode ocorrer uma falsa impressão de
alguma característica do negócio jurídico celebrado e o
contratante é enganado por si mesmo, por ter convicção que
algo existe ou acontece, quando a verdade é que ela inexiste
ou não ocorre. (COSTA; GOMES, 2008)
Em relação à boa-fé objetiva, tem-se que com o declínio do
liberalismo privatista e a inclusão de conceitos como a ordem pública, a
dignidade da pessoa humana e a função social do contrato nos ordenamentos
47
jurídicos, esse princípio contribuiu para a passagem do formalismo para o
consensualismo entre as partes, dando sustento às relações jurídicas
(VELASCO, 1992, p. 40). Na busca pelo equilíbrio contratual que garantirá a
verdadeira autonomia da vontade, o Direito e o Estado devem agir em
consonância para que esse último confira certeza e estabilidade às relações
econômicas contando com um princípio que prima pelo respeito entre os
negociadores: a boa-fé objetiva. Sua previsão nacional vem disposta na análise
conjunta dos artigos 113, 187 e 422 do Código Civil e artigos 4º, III e 51, IV, do
Código de Defesa do Consumidor. Leandro Alegría (apud RUBIO, 1984, p. 11)
ensina que “a medida que los problemas surgen la inegotable virtud jurígena
del principio de buena fe brinda soluciones nuevas
46
.”
Esse princípio possui um papel fundamental na fase de
formação dos contratos, tanto nacionais, quanto internacionais, pois será a
boa-fé objetiva que direcionará a conduta dos negociadores nessa fase tão
sensível e controvertida para o direito. Também será essencial para o
cumprimento voluntário da sentença arbitral dando maior credibilidade ao
instituto, facilitando o desenvolvimento das relações empresariais
internacionais.
A bona fides chega onde não alcança a força vinculante da
forma e se expressa como lealdade no momento de contratar
e, posteriormente, lealdade à palavra dada. Nesse sentido, a
boa fé ganha relevância naqueles contextos – como direito
internacional nos quais falta a certeza que decorre de uma
formalização institucionalizada, de um ordenamento positivo
coercitivo. (VELASCO, 1992, p. 40)
Ainda sobre a fase pré-contratual, Fichtner Pereira (apud
FRITZ, 2005, p. 45-46) explana que
Na fase pré-contratual, contudo, os deveres jurídicos
decorrentes da incidência do princípio da boa-fé não terão
caráter acessório de um dever principal, já que esse dever
jurídico principal ainda não existe. Nessa fase, esses deveres
jurídicos assumirão o papel principal na regulação do
comportamento das partes, pois serão eles que definirão as
exigências de conduta de uma parte em relação à outra.
Ruy Rosado de Aguiar (1994) define boa-fé objetiva como
um princípio geral de Direito, segundo o qual todos devem
comportar-se de acordo com um padrão ético de confiança e
46
Tradução livre: “a medida que surgem os problemas a inesgotável virtude jurídica do
princípio da boa-fé consiste em brindar novas soluções.”
48
lealdade. Gera deveres secundários de conduta, que impõem
às partes comportamentos necessários, ainda que não
previstos expressamente nos contratos, que devem ser
obedecidos a fim de permitir a realização das justas
expectativas surgidas em razão da celebração e da execução
da avença.
Maurício Godinho Delgado (2001, p. 112) informa que o
princípio da boa-fé “é diretriz geral que instiga a valorização, no plano das
relações jurídicas, da sinceridade, retidão e honradez nas condutas dos
sujeitos de direito na vida social”.
Nesse mesmo sentido, Karina Cristina Nunes Fritz (2005, p. 34)
ressalta que Larenz sintetiza a boa-fé como
[...] o imprescindível mandamento da honestidade, o qual,
juntamente com a proteção da confiança, forma a base do
tráfico jurídico, razão pela qual sua aplicação não se limita às
relações obrigacionais, mas estende-se como princípio geral
onde haja vinculação especial, ou seja, onde haja uma relação
de proximidade entre pessoas.
Para Cláudia Lima Marques (2002, p. 180-181) “boa-fé é
cooperação e respeito, é conduta esperada e leal, tutelada em todas as
relações sociais”. Ou seja, esse princípio deve ser exercido pelos parceiros
comerciais na medida em que seu comportamento atenda à economia e à
finalidade do contrato a fim de conservar o equilíbrio material e formal entre as
obrigações estabelecidas.
Como explica Arnoldo Wald (2003, p. 42)
Trata-se de incluir nos contratos, em virtude da interpretação e
da construção, deveres secundários ou derivados de
informação, conselho e até cooperação, assim como a
proibição de certas omissões. Cria-se, assim, um dever de
lealdade na contratação e na execução do contrato que está
vinculado basicamente às noções de confiança e de equilíbrio.
Confiança entre as partes contratantes, que devem ter e
manter, uma em relação à outra, o comportamento do bom pai
de família e até, conforme o caso, do parceiro sério, diligente e
confiável, sob pena de responsabilidade se uma delas não
corresponder à expectativa da outra.
Nos ensinamentos de Judith Hofmeister Martins-Costa (2005)
Por este modelo objetivo de conduta levam-se em
consideração os fatores concretos do caso, tais como o status
pessoal e cultural dos envolvidos, não se admitindo uma
aplicação mecânica do standard. [...] o que vem a significar
que, na concreção da boa-fé objetiva deve o intérprete
desprender-se da pesquisa da intencionalidade da parte, de
nada importando, para a sua aplicação, a sua consciência
individual no sentido de não estar lesionando direito de outrem
49
ou violando regra jurídica. O que importa é a consideração de
um padrão objetivo de conduta, verificável em certo tempo, em
certo meio social ou profissional e em certo momento histórico.
Assim, o contrato nessa nova visão torna-se uma parceria
onde os parceiros devem agir em conformidade com a boa-fé para que ele seja
justo, equilibrado e dinâmico para sustentar as dificuldades que possam
acontecer antes, durante ou após sua existência.
Ao lado da função social do contrato, da ordem pública e
normas imperativas, o princípio da boa-fé objetiva limita a autonomia da
vontade. Além dessa função limitativa, possui também a função interpretativa
que será de grande importância no estudo dos instrumentos jurídicos utilizados
na formação dos contratos internacionais.
Nesse sentido Ignácio Velasco (1992, p. 35) retrata que
Modernamente, costuma-se analisar a boa-fé sob duas
perspectivas diferentes: a do interesse social de segurança
das relações jurídicas e da interpretação dos contratos. Em
relação à primeira, se espera que as partes atuem com
lealdade e confiança recíprocas; ou seja, que procedam de
boa-fé. Em relação à segunda se afirma que o sentido literal
da linguagem não deve prevalecer sobre a intenção inferida da
declaração de vontade das partes.
Para Silvio Rodrigues (2002, p. 60) “a boa-fé é um conceito
ético, moldado nas idéias de proceder com correção, com dignidade, pautando
sua atitude pelos princípios da honestidade, da boa intenção e no propósito de
a ninguém prejudicar.”
Segundo Miguel Reale (2003, p. 12),
a boa-fé não constitui um imperativo ético abstrato, mas sim
uma norma que condiciona e legitima toda a experiência
jurídica, desde a interpretação dos mandamentos legais e das
cláusulas contratuais até as suas últimas conseqüências.
Ensina Orlando Gomes (1996, p.42) que
[...] nos contratos, sempre interesses opostos das partes
contratantes, mas sua harmonização constitui o objetivo
mesmo da relação jurídica contratual. Assim, uma
imposição ética que domina a matéria contratual, vedando o
emprego da astúcia e da deslealdade e impondo a
observância da boa-fé e lealdade, tanto na manifestação da
vontade (criação do negócio jurídico) como, principalmente, na
interpretação e execução do contrato.
A Convenção das Nações Unidas sobre Venda Internacional de
Mercadorias também prevê a boa-fé como parâmetro de interpretação e
50
comportamento no comércio internacional em seu art. ao determinar: “Na
interpretação desta Convenção ter-se-á em conta seu caráter internacional e a
necessidade de promover a uniformidade de sua aplicação e assegurar a
observância à boa-fé no comércio internacional”.
Nesse sentido previsão no art. 1.7 dos Princípios sobre os
contratos comerciais internacionais da UNIDROIT: “(1) As partes devem atuar
com boa-fé e lealdade negocial no comércio internacional. (2) As partes não
podem excluir nem limitar este dever”.
O princípio da boa-fé objetiva é essencial para o negócio
jurídico, uma vez que garante a sustentação da vontade das partes em
parâmetros éticos, probos, de confiança. Tal princípio fomenta o ditado popular
de que “faça para os outros o que gostaria que fosse feito a você”, pois é esse
o padrão que se espera dos parceiros contratuais, não somente na conclusão e
execução do contrato, mas tão e principalmente em sua formação. Sua
ausência ou desrespeito podem gerar sérios danos que deverão ser
combatidos pelo direito a fim de gerar segurança aos envolvidos, mesmo e
principalmente não existindo contrato ainda.
Durante a formação dos contratos, o princípio da boa-fé deve
ser o padrão de comportamento a ser seguido, especialmente porque a
autonomia da vontade é o outro princípio regente dessa fase e a boa-fé tem a
função de delimitar o território da autonomia para evitar abusos e prejuízos.
51
2. FORMAÇÃO DOS CONTRATOS INTERNACIONAIS: NEGOCIAÇÕES
PRELIMINARES
Pode-se dizer que os contratos tanto internos quanto
internacionais possuem um ciclo vital. Adotar-se-á no presente estudo a
classificação proposta por Maristela Basso (1998, p. 23) de três fases
fundamentais: a formação (geração), a conclusão (aperfeiçoamento) e a
execução (consumação) contratual.
A formação tem seu início com as negociações preliminares
(formação sucessiva) ou com a proposta e efetiva-se com a aceitação.
Irineu Strenger (1998b, p. 96) elucida que diferença no
“olhar” dessa fase no plano interno e internacional.
No plano internacional, segundo as tradições prevalentes, a
fase preliminar do contrato geralmente tem força obrigatória, ao
contrário do que ocorre no plano interno, onde muitos
contestam essa circunstância, tendo como parâmetro de
decisão a natureza negocial do contrato definitivo.
Ao conceituar a formação do contrato internacional, Irineu
Strenger (1998b, p. 96) ainda esclarece:
[...] chamam-se formação do contrato internacional do comércio
todas as fases, a partir das tratativas iniciais, que têm por
finalidade a colocação de pressupostos do objeto consensual,
com força vinculativa, e eficácia jurídica, que prevalece para
todos os efeitos posteriores, salvo revogação expressa das
partes.
Já, no momento da aceitação o contrato se torna concluído, ou
seja, ele se aperfeiçoa. Conclusão designa “ato final ou ultimação de um
contrato ou de um negócio, em virtude do que se tem o mesmo por concluído
ou ajustado” (SILVA, 1982, p. 488).
Conforme De Plácido e Silva (1982, p. 240) a execução do
contrato
É o cumprimento das obrigações contidas nas cláusulas de um
contrato, ou seja, a satisfação, por parte da pessoa que está
obrigada, das prestações, objeto da obrigação. Tal quando é o
contrato cumprido voluntariamente. Quando a execução do
contrato entende-se forçada, o sentido da expressão execução
do contrato, é o meio de que se serve a pessoa para exigir
judicialmente o cumprimento ou satisfação das cláusulas
contratuais.
52
A conclusão e execução contratual são vastamente
regulamentados pelo direito e comentados pela doutrina, o que possibilita um
maior entendimento por parte dos juristas e dos contratantes. No entanto,
poucos conhecem os efeitos jurídicos decorrentes da formação dos contratos e
dos modelos jurídicos pré-contratuais que podem ser utilizados, tendo-se o
equivocado pensamento de que simplesmente esses instrumentos utilizados
nas tratativas não vinculam os contratantes. Em âmbito internacional há o
agravante de se envolver diversos sistemas jurídicos com compreensões
diferentes acerca dessa fase, o que justifica seu estudo com mais atenção.
A etapa de formação
47
dos contratos internacionais é
fundamental para o sucesso das demais etapas contratuais, especialmente da
execução, pois é nesse período que os futuros contratantes se conhecem e
expressam suas vontades, deixando o plano da cogitação para adentrar no da
existência da relação jurídica a fim de que se complementem e alcancem os
objetivos almejados. Não existe uma rmula ou prazo de duração certo para
tanto. Porém, dependendo da complexidade da futura transação comercial,
esse período poderá ser longo e exigir sucessivas tratativas e cuidados, uma
vez que ainda não contrato, mas os investimentos empreendidos pelos
negociadores podem ser altos.
Irineu Strenger (1998b, p. 95) explica que a formação dos
contratos internacionais do comércio é a etapa mais significativa em razão das
conseqüências jurídicas que gera e pela eficácia vinculativa dos
entendimentos.
Esse período de negociação acontece tanto nos contratos
nacionais como nos internacionais, sendo mais comum nesses últimos por
envolverem culturas e sistemas jurídicos distintos, movimentarem valores
expressivos, mercadorias e serviços variados e especializados. Assim, a
conclusão dos contratos internacionais geralmente é precedida de negociações
47
Baptista (1986, p. 157) afirma: “[...] no contrato internacional, muito mais que no contrato
interno, é importante a fase da formação. E nessa fase o papel que o Advogado desempenha é
de grande relevo porque quando conhece bem o seu sistema jurídico e a língua estrangeira, e
conhecer pelo menos razoavelmente, o sistema jurídico do outro país, funcionará como um
participante eficiente das negociações, resolvendo os problemas lingüísticos, semânticos,
jurídicos, equacionando a escolha de língua, lei e foro, tentando estruturar bem o contrato,
através dos conhecimentos técnicos que ele adquiriu previamente e ajudando e orientando o
cliente. o contrato estará bem conformado, e terá oportunidade de subsistir e ser executado,
cumprindo o seu ciclo de vida natural”.
53
preliminares exigentes de instrumentos jurídicos específicos para cada caso,
com cuidados jurídicos relativos à lei aplicável e ao método de solução de
eventuais conflitos.
Os contratos internacionais do comércio às vezes se oferecem
tão complexos que seria uma total irresponsabilidade das
partes concluírem-no sem passarem por uma fase de
negociações preliminares, as quais têm sua duração
determinada pela matéria do contrato pretendido. (COSTA;
MUNIZ, 2008, p. 182)
Para a formação de um contrato são necessárias
obrigatoriamente declarações convergentes de vontades das partes, ou seja,
que haja convergência entre a oferta
48
e a aceitação. Às vezes, é preciso uma
etapa de negociações preliminares para que se alcance a oferta apta a ser
aceita ou definitivamente rejeitada pelo parceiro comercial. Assim, até que haja
o encontro entre a oferta e a aceitação e se conclua o contrato, estar-se-á na
fase de formação que poderá iniciar imediatamente com a proposta, com um
convite a fazer oferta ou com as negociações preliminares que poderão ou não
culminar em uma oferta.
Orlando Gomes (1996, p. 10)
leciona:
O mecanismo de formação do contrato compõe-se de
declarações convergentes de vontades emitidas pelas partes.
Para a perfeição do contrato, requerem-se: em primeiro lugar, a
existência de duas declarações, cada uma das quais,
individualmente considerada, há de ser válida e eficaz; em
segundo lugar, uma coincidência de fundo entre as duas
declarações.
Caio Mário da Silva Pereira (2004, p. 37-38) destaca que a
formação de um pacto ocorre em três momentos que embora se interpenetrem
podem ser destacados. O primeiro momento depreende-se das negociações
preliminares (não vinculação das pessoas). O segundo é a oferta (vincula o
proponente) e por último a aceitação (vincula ambos nesse momento a oferta
se transforma em contrato). Como ressalta César Fiuza (2008, p. 437), na
prática pode ocorrer dessas fases se embaralharem ou se omitirem
dependendo do caso.
Tendo em vista essa subdivisão da fase de formação e pelas
negociações preliminares serem tidas pela doutrina brasileira como não
geradoras de vínculo entre as partes, causando uma discussão acerca das
48
Também denonimada de “proposta” e “policitação”.
54
conseqüências jurídicas advindas dessa etapa, elas serão objeto de maior
análise ao longo desse estudo, amesmo para se verificar como se resolvem
os conflitos surgidos nessa fase em âmbito internacional. Por sua vez, pela
oferta e aceitação vincularem as partes, não gerando grandes discussões em
relação aos seus efeitos, passa-se a examiná-las de forma mais sucinta.
2.1.
O
FERTA OU
P
ROPOSTA
A oferta é a “primeira manifestação de vontade que se dirige à
conclusão do negócio jurídico bilateral”. Deve “despertar na outra parte o
desejo de concluir o negócio. Não apenas o desejo, mas sua exteriorização, ou
seja, a manifestação de vontade coincidente, acorde, existente e válida”
(BASSO, 1998, p. 29-30). Enquanto a intenção de ofertar se mantiver apenas
na mente de quem pretende externá-la, o fato não possui valor jurídico.
Portanto, oferta é manifestação de vontade que deve ser clara e precisa e que
indique vontade inequívoca de contratar, uma vez que vinculará o proponente
ao seu cumprimento por um determinado período.
O Código Civil Brasileiro, no art. 427 é expresso nesse sentido:
“A proposta de contrato obriga o proponente, se o contrário não resultar dos
termos dela, da natureza do negócio, ou das circunstâncias do caso”. O art.
428 do mesmo diploma traz exceções à obrigatoriedade da proposta quando
feita sem prazo a pessoa presente e não for imediatamente aceita; ou quando
à pessoa ausente, mas transcorrer prazo suficiente sem que chegue resposta
ao conhecimento do policitante ou que tenha sido expedida fora do prazo; e por
último, se antes ou simultaneamente ao recebimento da resposta houver
retratação do proponente.
Para evitar discussões acerca do prazo de validade da
proposta e de sua obrigatoriedade, recomenda-se que a oferta tenha prazo
determinado para que o oblato a aceite. Em caso de indeterminação, o art. 18,
item 2, da Convenção de Viena sobre compra e venda internacional de
mercadorias solução semelhante ao Código Civil brasileiro, rezando que a
aceitação deve chegar ao proponente em
55
um prazo razoável, levando-se em conta as circunstâncias da
transação e, em particular, a rapidez dos meios de
comunicação utilizados pelo proponente. A aceitação das
ofertas verbais terão que ser imediatas a menos que das
circunstâncias resulte outra coisa.
A proposta deve ser feita por pessoa capaz, seja natural ou
jurídica, à pessoa determinada ou ad incertam personam, como sucede na
oferta ao público, necessitando também que o destinatário tenha capacidade
civil para aceitá-la e assim concluir o contrato. Mesmo sendo uma proposta ad
incertam personam deve conter os termos que limitem a vontade do
proponente e, portanto deve ser inequívoca, precisa, completa e determinada,
ou, como sustenta Joana Schmidt (apud BASSO, 1998, p. 31) “real, firme e
precisa”, contendo todas as cláusulas essenciais.
[...] diante disso, o melhor a fazer é apresentar uma oferta, o
mais completa e precisa possível, determinando de forma
inequívoca o objeto, com todas as suas características
essenciais: identificação, quantidade, qualidade, preço
(incluindo as modalidades de pagamento), tempo e lugar da
entrega e, se for um serviço, a determinação exata do mesmo,
o preço, a duração, os seus destinatários e prestadores.
(BASSO, 1998, p. 32-33)
Por consequência, não pode ser considerada proposta uma
declaração estapafúrdia, inconsistente, feita por brincadeira ou gracejo.
Oferta não se confunde com negociações preliminares, pois
aquela é uma declaração inicial e unilateral da vontade, objetivando a
realização do contrato e essas são entendimentos preparatórios que objetivam
criar circunstância capaz para o oferecimento da proposta definitiva, isto é, as
negociações são “atos meramente preparatórios e facultativos, ou seja, podem
ou não se fazer presentes na fase de formação do ajuste. Portanto, possuem
carga jurídica diferente da oferta e da aceitação”. (COSTA, 2004, p. 296)
Da mesma forma difere de convite a fazer uma oferta (invitation
to deal), pois nesse tem-se a abertura de negociação que vise determinado
contrato futuro; porém, nada há de concreto, capaz de vincular seu autor; não é
ato pré-contratual, nem assume relevância jurídica. Sua distinção está no
elemento subjetivo, na intenção, pois o convite para negociar não traz
determinação e clareza, justamente porque seu papel é convidar para discutir
as proposições necessárias para eventualmente se alcançar a proposta que
resulte no contrato definitivo. Para Orlando Gomes (1996, p. 62) quem faz o
56
convite a fazer oferta quer receber proposta, ficando, portanto, na posição de
oblato.
2.2.
A
CEITAÇÃO
Por sua vez, a aceitação constitui resposta afirmativa à
proposta formulada. “É o ato conclusivo da fase de formação do contrato,
impondo-se como a declaração de vontade que completa -consagra- o negócio
jurídico no qual ela se integra” (BASSO, 1998, p. 62). Pode ser expressa ou
tácita, desde que inequívoca, podendo, em certas circunstâncias, resultar do
silêncio (BASSO, 1998, p. 66).
O Código Civil Brasileiro corrobora esse entendimento no art.
432 “se o negócio for daqueles em que não seja costume a aceitação
expressa, ou o proponente a tiver dispensado, reputar-se-á concluído o
contrato, não chegando a tempo a recusa”.
Na hipótese de a aceitação chegar ao conhecimento do
proponente após a expiração do prazo por ele fixado, cumpre-lhe comunicar de
imediato o ocorrido ao aceitante, sob pena de responder por perdas e danos
(art. 430 do CC). No entanto, o proponente pode reconhecer como eficaz a
aceitação tardia, mas, como medida de prudência, deve comunicar o
reconhecimento desta como eficaz, embora o atraso (BASSO, 1998, p. 69).
a retratação do aceite é uma declaração facultativa do
oblato que retira os efeitos da aceitação anteriormente feita, sendo considerado
inexistente pelo Código Civil (art. 433). Segundo Maristela Basso, a retratação
“somente produzirá efeitos quando chegar ao conhecimento do proponente
antes da aceitação ou simultaneamente a ela; caso contrário, o contrato se
terá formado, e a retratação não mais o suspende” (BASSO, 1998, p. 69).
Orlando Gomes (1996, p. 67) explica que na primeira hipótese
o proponente pode ser responsabilizado pelos prejuízos que o oblato sofreu
acreditando que realizaria o contrato, tratando-se de responsabilidade pré-
contratual. Porém, se na segunda hipótese o contrato já houver sido formado, a
retratação será inválida e a responsabilidade será contratual por inexecução.
57
Assim, apresentada a oferta, o oblato pode aceitá-la pura e
simplesmente com todas as suas condições; aceitá-la modificando-a
49
,
acrescentando ou retirando algum elemento não essencial, secundário;
apresentar uma contraproposta ou recusá-la.
O efeito da aceitação é a formação do contrato pretendido,
fixando sua existência e seu conteúdo de forma irrevogável. Uma vez concluído
o contrato, não poderá ser modificado, a não ser por novo acordo de vontades.
Dessa maneira, a formação dos contratos internacionais é um
período de ajuste de vontade e interesses das partes, cujos atos o capazes
de produzir conseqüências jurídicas segundo as expectativas que geram e os
possíveis prejuízos que o rompimento arbitrário pode acarretar ao parceiro
comercial (BASSO, 1998, p. 25-26).
Considerando a variação do tempo existente entre esses atos –
tratativa, proposta e aceitação três tipos de formação de contratos,
segundo Maristela Basso: a instantânea, a ex intervallo e a ex intervallo
temporis.
Haverá formação instantânea quando inexistir intervalo
considerável entre a oferta e a aceitação. Entre uma e outra existe apenas o
tempo necessário para que a oferta seja entendida, assimilada e aceita pelo
oblato. Nesse caso não há contraproposta ou negociação. (BASSO, 1998,
p.82)
a formação ex intervallo demanda, entre a oferta e a
aceitação, um intervalo considerável entre ambas as manifestações de
vontade.
Requer-se, porém, que nesse intervalo de tempo, nenhum
outro ato jurídico seja praticado visando à conclusão do
negócio, ocorrendo apenas a oferta e a aceitação. Tal
procedimento é freqüente quando as partes, principalmente o
oblato, precisam de um período de tempo para amadurecer sua
intenção negocial e verificar suas reais condições de concluir o
contrato proposto. (BASSO, 1998, p. 103)
49
“Podemos considerar precisa e determinada a aceitação, mesmo quando ela apresenta
algumas variações, tais como: a) as palavras utilizadas na aceitação, mas não o seu sentido,
são diferentes daqueles expressos na oferta; b) a aceitação apresenta outros termos que não
aqueles expressamente enunciados na oferta, mas que, na verdade, estavam nela implícitos;
c) a aceitação apresenta outros termos que não estavam expressamente enunciados na oferta,
mas que, de acordo com a lei, estariam nela implícitos (idem, ibidem)” (BASSO, 1998, p. 66).
58
Na modalidade de formação ex intervallo temporis, também
denominada de formação sucessiva ou progressiva, negociação entre a
oferta e a aceitação, ou, antes da oferta.
Contratos de formação ex intervallo temporis são aqueles em
que entre a oferta e a aceitação existe um período de tempo,
que pode ser curto ou longo, no qual as partes trocam
propostas, até que a oferta de uma é aceita pela outra,
formando-se assim o contrato. Diz-se, também, que são
contratos de formação “progressiva” ou sucessiva” justamente
porque, no referido intervalo, os pontos de discordância entre
as partes são pouco a pouco aplainados e o contrato se
aperfeiçoa através de um processo sedimentar. (BASSO, 1998,
p. 111)
Nesse sentido, Irineu Strenger (1998b, p. 108) ressalta que
[...] no comércio internacional, nem sempre a definição dos
compromissos recíprocos a do objeto negocial permitem a
imediata formulação do contrato final, pois é muito comum que
ocorram circunstâncias de natureza preparatória,
caracterizadas por complexas operações, compreendendo a
formação de capitais, subcontratações, arregimentação de
pessoal técnico, preparação de projetos e planos sujeitos a
aprovação posterior, normalmente de longa duração.
Esse período de discussão de aspectos técnicos e jurídicos é
chamado de “negociações preliminares”, “entendimentos preparatórios” ou
“tratativas” e é importante porque muitos dos conflitos que surgem na execução
do contrato poderiam ter sido evitados no período de sua formação.
Assim, a formação sucessiva será objeto de estudo mais
aprofundado, pois é mais complexa e duradoura que as demais, necessitando
de uma análise detida da relação existente entre as partes nesse período, bem
como dos instrumentos capazes de auxiliarem na segurança e efetividade a fim
de se alcançar a conclusão dos contratos, ou na sua ausência, minimizar
eventuais prejuízos decorrentes de conflitos, especialmente da ruptura das
tratativas.
2.3.
N
EGOCIAÇÕES
P
RELIMINARES
Na concepção jurídica, negociação é um entendimento
preliminar dos parceiros comerciais que intencionam a formação e conclusão
59
de um contrato nacional ou internacional. Popularmente, negociação é técnica
de discussão que leva ao entendimento preliminar transpassando todos os
conflitos existentes até ali. Entende-se, porém, que os significados se
completam, pois é por meio dessa procedimentalização que se chegará a um
entendimento almejando o negócio jurídico; sendo, portanto, mais que uma
técnica, mas um período que antecede e objetiva a conclusão do contrato,
valendo-se das habilidades dos negociadores.
Negociação é palavra originada do latim negotiatio, de negotiari
e significa
Entendimento preliminar, de que possa resultar o contrato ou
de que possa resultar o negócio, que não se considera
acabado ou concluído, enquanto as partes não se ajustam nas
condições ou cláusulas, em que se possa realizar, e não
firmam, em definitivo, seu consentimento.
(SILVA, 1982, p. 238)
Pelo aspecto empresarial negociação denota
...um processo que visa o desenvolvimento de alternativas de
acordos capazes de atender aos participantes, pessoas físicas
e/ou jurídicas, cada um deles com necessidades e interesses
próprios. O objetivo é conseguir, no final, uma opção que
contemple as aspirações de todos os envolvidos (DIAS;
COSTA, 1999, p. 06).
Comparando as negociações preliminares com o “namoro” e a
conclusão do contrato com o “casamento”, pode-se inferir o seguinte
comentário publicado anteriormente:
Portanto, para evitar conflitos e dúvidas posteriores à formação
do contrato, é necessário um verdadeiro “namoro” entre as
partes, para que o “casamento” (efetivação do contrato) seja
harmônico, e em caso de turbulências, que essas sejam
passageiras, não impedindo uma relação comercial duradoura
e lucrativa. Faz-se necessário compreender que em
negociações internacionais, ambos os lados devem ter
disposição para, eventualmente, ceder e chegar a um ponto de
equilíbrio, onde ambos alcancem lucros e retorno de seus
investimentos. É necessário que o exportador fique satisfeito
por vender seu produto no mercado x a preço y e o importador
fique satisfeito ao comprar um produto de qualidade ao preço y.
(COSTA, 2008)
A negociação é um período de reflexão
50
essencial quando os
envolvidos não estão preparados para fechar o acordo ou se faz necessário um
50
“As negociações preliminares são discussões, um período de conversa e conhecimento das
partes, onde se avalia a utilidade e viabilidade da formação e conclusão contratual. Tais
negociações são notáveis na maior parte dos contratos internacionais porque sempre o
envolvimento de dois ou mais sistemas jurídicos com pessoas de cultura, língua, costumes e
60
período de conhecimento, pesquisas e projetos com a outra parte. (COSTA;
MUNIZ, 2008, p. 183)
Jean Marc Mousseron (apud
BASSO, 1998, p. 137) explica que
as negociações preliminares
[...] consistem em um conjunto de relações anteriores à
formação do contrato que tem por objeto identificar e resolver
os problemas que apresentará a relação econômica pretendida
e, em seguida, acordar as vontades das partes sobre a
disciplina que constitui o contrato. É o funil dentro do qual vão
se encontrar e se fundir as proposições, as preocupações das
diferentes partes. As propostas expressas oralmente ou por
escrito vão conduzir a inúmeras discussões que podem ser
assinaladas pelo estabelecimento de ‘protocolos de acordo
(procoles d’acord)’: a expressão possui múltiplos sentidos, e
nós mantemos aquele de documento de secretaria destinado a
fixar o estado da negociação e das proposições, concordantes
ou não, das partes num determinado momento das
negociações.
As tratativas e os instrumentos firmados nesse ínterim também
possuem a importante função de servir de referência à hermenêutica contratual
em caso de eventual conflito, já que a expressão da vontade das partes ocorre,
especialmente, nesse momento negocial.
Nesse período geralmente não há apenas uma oferta, mas
uma “troca de informações”, um amadurecimento da intenção contratual, que
permite às partes realizarem seus interesses progressivamente, até que
atinjam um ponto de equilíbrio, tornando-se, muitas vezes, difícil saber quem
de fato propôs o que foi aceito em consenso (BASSO, 1998, p. 113).
Assim, essa etapa pode começar a partir de um convite a
negociar ou uma oferta, quando uma parte faz a outra uma proposta clara,
precisa e determinada; porém, o oblato não se encontra em condições de
aceitá-la, nem de apresentar contraproposta, mas opta por não se recusar à
negociação que poderá se encerrar com a conclusão do contrato ou se exaurir
no seu próprio insucesso, bem como pode se desenvolver por meio de uma
série de ofertas e contrapropostas sucessivas até se chegar à proposta
ultimatum (BASSO, 1998, p. 136).
princípios diferentes, além de ocorrerem geralmente em negócios de maior vulto que devido
sua complexidade pode envolver terceiros como banqueiros, seguradoras, técnicos,
transportadores, administradores e advogados”. (COSTA, 2003, p. 371)
61
A oferta ultimatum significa que uma das partes chegou à
proposição que não está mais disposta a modificar e pela qual pretende
vincular-se. Por conseguinte, a aceitação do destinatário aperfeiçoa o acordo;
caso contrário, encerram-se as negociações sem a formação do contrato
(BASSO, 1998, p. 139).
O momento mais significativo da fase de negociação é o da
decisão, pois é momento conclusivo do debate e do diálogo entre as partes.
Negociar não significa ainda contratar, o que justifica a importância da
capacitação e experiência dos negociadores, bem como o desenvolvimento de
estratégias de negociação.
No Brasil impera o posicionamento de que as negociações
preliminares não criam nculos jurídicos entre as partes. Como assinala Caio
Mário, as negociações preliminares “são conversas prévias, sondagens,
debates em que despontam os interesses de cada um, tendo em vista o
contrato futuro. Mesmo quando surge um projeto ou minuta
51
, ainda assim não
há vinculação das pessoas” (PEREIRA, 2004, p. 37).
Segundo Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho
(2009, p. 91), “a característica básica desta fase é justamente a não-vinculação
das partes a uma relação jurídica obrigacional”.
Silvio Rodrigues (2002, p. 67) mantém o coro da doutrina
nacional
Em rigor, se as partes se encontram ainda na fase de
negociações preliminares, por definição mesmo não
contrataram, não se havendo estabelecido, entre elas, desse
modo, qualquer laço convencional. Pois se lançaram mão de
tais discussões vestibulares, foi justamente para decidir se lhes
convinha, ou não, contratar. De maneira que, se no curso do
debate uma delas apura o inconveniente do negócio, é justo
que dele deserte, recusando-se a prestar sua anuência
definitiva. Nenhuma responsabilidade lhe pode daí advir, pois
as negociações preliminares ordinariamente não obrigam os
contratantes.
Maria Helena Diniz (2005, p. 51)
também não admite a
vinculação das partes nas negociações preliminares.
Das negociações preliminares as partes podem passar à
minuta (puntuazione, como preferem os italianos), reduzindo a
escrito alguns pontos constitutivos do conteúdo do contrato
51
“Minuta é o documento escrito, em que as partes esboçam, com maior ou menor
completitude, o conteúdo do contrato a ser celebrado” (FIUZA, 2008, p. 442).
62
(cláusulas ou condições) sobre os quais já chegaram a um
acordo, para que sirva de modelo ao contrato que depois
realizarão, mesmo que nem todos os detalhes tenham sido
acertados. Ainda assim não se tem vínculo jurídico entre as
partes. Somente quando se obtiver o completo acordo sobre
todos os pontos essenciais da relação contratual é que surgirá
o contrato; portanto, acordos parciais, que forem
eventualmente estabelecidos, carecem de valor e de
obrigatoriedade.
Silvio de Salvo Venosa (2006, 509-510) ministra que em
princípio as negociações preliminares, mesmo com minutas
52
, não vinculam,
mas flexibiliza ao admitir que é preciso analisar caso a caso a vontade
expressa das partes:
As negociações preliminares não obrigam, enquanto não
firmado o contrato. As concordâncias paulatinas obtidas ainda
constituem tratativas; não são contrato. Essas tratativas podem
transcorrer unicamente sob a forma oral, mas também podem
ser documentadas, com correspondência entre os
interessados, anotações etc. Por vezes, interesse das
partes de se assegurarem por escrito nessa fase pré-
contratual, denominada pontuação, em que pode surgir um
esboço ou rascunho do contrato, ou uma carta de intenções.
Denomina-se geralmente minuta o esboço do futuro contrato. O
termo significa algo que é menor, leve. A minuta, em regra, não
obriga, mas serve de subsídio para a interpretação do futuro
contrato. Pode também servir de base probatória para o
exercício da ação de indenização pelo rompimento injustificado
das tratativas. (p. 509)
[...] Discute-se se a minuta assinada é vinculativa. A questão é
exclusivamente de exame do caso concreto. Se apenas uma
das partes firmou a minuta, poderá ela ter os efeitos de uma
proposta. Se firmada por ambos os contratantes, a questão é
de interpretação de sua vontade. Poderá valer como contrato
se a lei, ou a vontade das partes, não exigir escritura pública.
Por outro lado, se o contrato é apresentado à parte em
desacordo com a minuta e mesmo assim concluído, a questão
é transferida para os vícios de vontade, podendo ocorrer erro
ou dolo. (p. 510)
Assim, como se observa, a doutrina brasileira não enfrenta o
fato de que durante as negociações preliminares o princípio da autonomia da
vontade possibilita as partes pontuarem suas reflexões em diversos modelos
jurídicos, generalizando que simplesmente não as obrigam. Porém, no cenário
internacional tais instrumentos ainda pré-contratuais devem ser individual e
52
Maristela Basso esclarece que em alguns casos a minuta pode ser considerada uma carta
de intenção, o que dependerá do “conteúdo da minuta que se apresenta”. (BASSO, 1998, p.
206)
63
concretamente analisados por ser possível vincularem as partes ainda durante
as negociações preliminares como expõe Maristela Basso (1998, p. 187):
“Tudo depende, portanto, de como está redigida a carta de intenção, do seu
conteúdo, de sua forma e fundo. Por isso é difícil a generalização, que
estamos no reino da autonomia da vontade”.
Irineu Strenger (1998b, p. 103) é favorável a uma visão mais
aberta da negociação e por isso afirma que
[...] a negociação é tipicamente procedimento de força
vinculativa, à medida que a discussão dos problemas possa
concomitantemente gerar compromissos ou atividades
concernentes, que potencializem a possibilidade de danos em
face da ruptura negocial preliminar.
Dessa forma, as negociações preliminares são entendimentos
prévios entre as partes e devem sempre ser conduzidas por negociadores
profissionais que busquem agir em conformidade com o princípio da boa-fé
objetiva, pois como todo ato volitivo, elas produzem efeitos jurídicos, não
necessariamente o de obrigar as partes a contratarem o bem almejado, mas se
vincularem a tomarem certas atitudes esperadas pelos negociadores leais,
diligentes e probos.
Nas tratativas, os negociadores
53
buscarão entendimento tanto
nos aspectos técnicos, tais como qualidade, quantidade, logística do bem a ser
negociado quanto nos aspectos de cunho jurídico, exemplificando, forma e
local de pagamento e entrega, cláusula penal, lei aplicável, foro de eleição,
método de solução de conflito, idioma do contrato, prazos e formas de
notificação, assim como o cultural, social, pessoal, religioso e político. Assim o
é porque o homem é um ser complexo e ímpar que traz em si uma carga
valorativa influenciada por sua educação, costumes, crenças e meio social que
determinarão seu “olhar” sobre a negociação em andamento.
Compreender e respeitar a diferença do outro é receita para o
exercício do comércio exterior
54
. Nicola Minervini (2001, p. 99) explica que para
53
Os negociadores de contratos internacionais podem ser advogados, economistas,
administradores das empresas, representantes legais sem qualquer formação acadêmica
específica, enfim, a ou as pessoas que forem necessárias e capazes civilmente para que, de
uma discussão se chegue a uma conclusão de todos os aspectos técnicos e jurídicos do
instrumento contratual.
54
Se uma empresa brasileira quiser exportar carne para um país muçulmano terá que se
adaptar ao abate halal, senão não conseguirá alcançar aquele mercado; se houver deboche
das vestimentas ou do modo de cumprimentar de um indiano, africano ou árabe não haverá
64
concretizar negócios é preciso “socializar, estabelecer laços de amizade (em
alguns países como os latinos, por exemplo), é conhecer o perfil do
empresário, o protocolo e depois os detalhes”.
Tomando conhecimento desses fatores, o negociador deverá
fixar previamente quais são seus principais interesses e objetivos para traçar
sua estratégia considerando quais seriam hipoteticamente as do outro
negociador e em que pontos elas colidem; a seguir deverá se preparar para o
estágio de propostas e contrapropostas, no qual poderá fazer mais concessões
do que inicialmente pretendia, o que não significa que seja perdedor e; por fim,
atingirá um ponto em que não tenha mais disponibilidade de ceder ou alterar
seus pontos de vista, chegando-se ao momento crucial de celebrar o contrato
ou encerrar as negociações. (COSTA; MUNIZ, 2008, p. 185)
É aconselhável que durante as negociações preliminares se
resolva primeiro as questões cnicas para depois aproximá-las das
possibilidades jurídicas em conformidade com a autonomia da vontade e a boa-
fé. Na prática do comércio exterior brasileiro, as empresas, com poucas
exceções, dispensam a presença de um advogado nas negociações,
buscando esse profissional no momento em que algo de errado ocorreu,
dificultando ainda mais a resolução do problema, pois o vazio jurídico é
predominante em relação a questões essenciais. Essa situação pode acarretar
grandes prejuízos, tanto do ponto de vista do inadimplemento da outra parte,
quanto da responsabilidade administrativa perante o Banco Central Brasileiro,
restrição cadastral no Sistema Integrado de Comércio Exterior SISCOMEX,
pagamentos de adiantamentos feitos por programas de crédito e outros.
Como citado anteriormente, uma das funções da negociação é
produzir um contrato a ser executado sem dificuldades e isso exige equilíbrio
entre os responsáveis pelos aspectos cnicos e jurídicos, pois para qualquer
lado que essa balança pender, haverá, provavelmente, prejuízo para as partes,
seja decorrente da incompetência do jurista de fixar os pontos técnicos, seja na
do administrador em eleger as bases legais que deverão reger o futuro
contrato.
negociação; em caso de atrasos em uma reunião ou entrega de mercadorias para um norte-
americano provavelmente esse fornecedor será descartado de uma próxima negociação.
65
O conteúdo das discussões (pouparlers) gira em torno dos aspectos
técnicos e jurídicos das transações em questão. Comumente, os
aspectos técnicos vêm primeiro e deles dependerá a definição
mesma do produto (objeto do contrato) e seus aspectos jurídicos.
Para tanto, conforme a mercadoria que é objeto da negociação, as
partes discutem oralmente; trocam cartas, desenhos, plantas de
máquinas; realizam experiências físicas, químicas e/ou mecânicas
visando a assegurar-se da qualidade da mercadoria. (BASSO, 1998,
p. 133)
A busca pelo contrato equilibrado se mais trabalhoso e
demorado, mas certamente “seus resultados se projetarão no contrato
concluído, o qual será executado com eficiência e, na eventualidade de
inexecução, as partes não enfrentarão o problema de um vazio jurídico”
(BASSO, 1998, p. 134).
Nesse sentido cabe ressaltar que
Atuar no comércio internacional exige atenção dos
negociadores, tendo em vista o envolvimento de dois ou mais
sistemas jurídicos diferentes, a influência da cultura, tradição,
língua e nacionalidade das partes. Nesse sentido, é de vital
importância a sua preparação, atuando como instrumentos de
minimização de riscos nas relações empresariais. (COSTA;
MUNIZ, 2008, p. 182-183)
Considera-se fundamental e prudente que o negociador
conheça o direito do Estado do outro, buscando o parecer
55
de um ou mais
advogados dali, assegurando-se da validade e da legalidade do contrato
pretendido, bem como das normas internacionais aplicáveis à questão e as do
local de sua execução. (COSTA; MUNIZ, 2008, p. 187)
Nessas negociações pode-se chegar a certos momentos em
que o acordo não está absolutamente maduro, mas, as partes querem
consolidar o estágio em que se encontram, registrando o que foi acordado.
Para tanto, utilizam-se de instrumentos como as “cartas de intenção”, “acordos
de segredo”, “contratos preparatórios” ou “pré-contratos” etc. (COSTA, 2004, p.
298)
O negociador deve redigir muito bem os instrumentos
necessários para a formação do contrato e o contrato definitivo em si para que
eles possam ser executados sem maiores problemas. Para tanto, Maristela
Basso (1996a, p. 67) defende que “o contrato deve conter muitas cláusulas;
55
Celso Barbi Filho (1996, p. 21) chama estes pareceres de “legal opinions” que “são espécies
de pareceres prévios, emitidos por jurista ou advogado especialista dos países de origem dos
contratantes, sobre as condições de aplicabilidade do contrato, extensão, gravidade, e
responsabilidades envolvidas na transação”.
66
todas as possibilidades de litígio, as controvérsias entre as partes devem ser
minimizadas, previstas.” Dentre essas cláusulas cita-se: a) cláusula de lei
aplicável; b) de preço e modalidade de pagamento; c) penal e conseqüências
da inexecução; d) de garantias contratuais ou garantias pecuniárias; e) de força
maior e hardship; f) de foro competente para dirimir as controvérsias ou recurso
à arbitragem.
Nesse sentido, considera-se que algumas dessas cláusulas
deverão constar nos instrumentos que auxiliam a formação contratual a fim de
dar segurança jurídica aos envolvidos. Também é aconselhável a utilização de
documentos preparatórios quanto às responsabilidades e objetivos negociais e
quanto às questões jurídicas como lei aplicável e método de resolução de
eventuais conflitos existentes ainda nessa fase, como se passa a estudar.
2.4.
M
ODELOS
J
URÍDICOS DE
N
EGOCIAÇÃO
Considerando que as negociações preliminares não conduzem
obrigatoriamente as partes à conclusão do contrato, mas podem acarretar
investimentos
56
, tanto em viagens, como em pesquisas, projetos, contratação
de pareceres etc., o ideal é que haja a intervenção do direito para proteção de
seus interesses, especialmente, por meio de instrumentos que prevejam as
responsabilidades e os objetivos delas nas tratativas, com o intuito de servir de
prova em caso de eventual conflito ou de base para a interpretação do contrato
definitivo, podendo ser-lhe anexado.
se estudou que no direito nacional, há o entendimento que
as negociações preliminares não vinculam, mas esse posicionamento, de certa
forma simplista não resolve os conflitos existentes nas complexas negociações
internacionais. Os diversos modelos jurídicos nascidos da autonomia da
vontade e da dinâmica
57
do comércio criam situações que fogem à
56
“Quanto mais complexo for o objeto do futuro contrato, mais difíceis e longas serão as
tratativas, e maiores os riscos em caso de ruptura” (BASSO, 1998, p. 181).
57
“A regra da liberdade contratual é ampla e disso decorre naturalmente a grande variedade e
finalidade de modelos jurídicos pré-contratuais (formes contractuelles de pourpalers”),
67
generalidade de se dizer, por exemplo, que as cartas de intenção não possuem
natureza contratual e por isso não vinculam as partes.
Assim, em âmbito internacional, soma-se às dificuldades
existentes na fase pré-contratual nacional a complexidade de se envolver
sistemas jurídicos diversos e uma dose um pouco maior da aplicação do
princípio da autonomia da vontade, exigindo ainda mais atenção dos
negociadores e dos juristas.
Existem várias diferenças entre os diversos sistemas legais na
abordagem de alguns aspectos importantes dos contratos. Por
exemplo, se nos Estados Unidos as cartas de intenção ou
memorandos de entendimento (letters of intent ou memoranda
of understanding), ainda que se refiram a documentos
preliminares, encerram direitos e obrigações condicionais mas
exeqüíveis, são vistas em outros países como destituídas,
virtualmente, de força ou efeito. (GARCEZ, 1999, p. 144)
Os novos modelos jurídicos criados pela prática internacional
comercial consistem em instrumentos elaborados em face da necessidade e
autonomia das partes e, portanto, bastante influenciados pela lex mercatoria.
Justamente por serem fruto do binômio necessidade/autonomia podem ou não
gerar vínculos entre as partes, independente da denominação que dão ao
instrumento.
O tratamento que a nova lex mercatoria” dedica às cartas de
intenção é no sentido de que podem produzir conseqüências
jurídicas, mesmo quando as partes pensem o contrário.
Segundo Draetta (1984, p. 51), “a tendência dos órgãos
arbitrais chamados a decidir acerca da relevância de tais
´cartas´ é justamente aquela de conformar-se ao princípio geral
segundo o qual é de se presumir que as partes, se redigiram
um instrumento, o fizeram visando a algum efeito útil. (BASSO,
1998, p. 187)
Nesse sentido, importante observar o disposto no art. 112 do
Código Civil: “Nas declarações de vontade se atenderá mais à intenção nelas
consubstanciada do que ao sentido literal da linguagem”.
Quanto à estrutura jurídica desses novos modelos jurídicos,
Miguel Reale (1992, p. 166) disserta que
são concretos na medida e enquanto a normatividade neles
abstratamente expressa se correlaciona necessariamente com
fatos e valores, que são as outras duas dimensões estruturais
do direito: são, em suma, ´modelos operacionais´, e não meros
esquemas ideais.
inventados pela prática internacional para suprir os problemas do modelo atual” (BASSO, 1998,
p. 182).
68
Miguel Reale (1992, p. 169) destaca o papel da autonomia da
vontade e da capacidade inventiva dos interessados na formação desses
modelos jurídicos negociais esclarecendo que “é a forma de vida atual que
suscita e exige, ao lado dos modelos tradicionais, criações imprevistas no
plano negocial, engendrando uma multiplicidade de ´contratos inominados´”.
Ao indagar o direito como experiência, ainda afirma que
[...] possibilita o superamento das apontadas antinomias,
demonstrando que a irrecusável multiplicidade dos centros
reguladores dos comportamentos individuais e coletivos, tão
característica de nossa época, pelo menos nos países de
constituição democrática (pois, em última análise, quem diz
democracia, diz pluralidade de soluções políticas e jurídicas)
longe de excluir, antes exige a sua articulação em um sistema
complementar, não segundo uma unidade formal, -
determinada por meras referências de pura subsunção lógica, -
mas sim pelo reconhecimento de diversos graus de
positividade jurídica, correspondentes aos modelos jurídicos
que a vida real vai elaborando, em função de um complexo
variegado de fatores, com distintos índices de obrigatoriedade,
assim como diversificadas áreas de incidências. (REALE, 1992,
p. 170)
Irineu Strenger (1998b, p. 104) corrobora esse entendimento
[...] é preciso convir que no curso de uma negociação as partes
são compelidas a realizar certos acordos aos quais o direito
deve reconhecer a qualidade de contratos, que são concluídos
para facilitar a conclusão do acordo projetado ou organizar as
relações das partes durante o período das negociações.
Portanto, a prática do comércio internacional desempenha
papel significativo no curso do processo negocial ao criar a necessidade de
instrumentos jurídicos preparatórios que objetivem a conclusão do contrato
definitivo como cartas de intenção; cartas de conforto; acordos de segredo,
garantias e outros que se fizerem necessários.
Esses documentos preliminares possuem como finalidade
a) relatar como estão se desenvolvendo as tratativas; b) balizar
a negociação; c) obrigar as partes a negociar seriamente; d)
fazer balanço dos resultados obtidos; e) recordar pontos
importantes, com vistas a uma futura contratação; f) selar
acordos essenciais à conclusão do contrato definitivo; g)
evidenciar certos detalhes imprescindíveis às partes; h) revelar
a terceiros, possíveis interessados, que estão em curso as
negociações; i) salvaguardar segredos de comércio ou
indústria etc. (BASSO, 1998, p. 182)
José Maria Rossani Garcez (1999, p. 144) entende que
Em verdade, esses dispositivos, conforme abordados pelas
legislações ou jurisprudência dos diversos países destinam-se,
69
em última análise, a promover a estabilidade e a previsibilidade
das obrigações assumidas pelas partes contratantes,
encorajando a formação dos contratos e fazendo com que,
ante a impossibilidade de seu cumprimento e antes de sua
resolução, possam eles ser eventualmente revistos, em
circunstâncias anômalas e especiais, sendo honrado o seu
cumprimento.
Dessa forma, analisar-se-ão alguns desses modelos jurídicos
que podem ser utilizados durante as negociações preliminares dos contratos
internacionais e quais seus efeitos vinculativos e ainda se podem ou não portar
uma cláusula compromissória de arbitragem.
2.4.1. Cartas de Intenção
O instrumento jurídico mais utilizado
58
e controvertido
59
nas
negociações preliminares é a carta de intenção. Embora Luiz Olavo Baptista
(1994, p. 97) explique que “da amplitude da liberdade de negociar e de redação
decorre naturalmente a variedade de modelos e finalidades da carta de
intenção, que tornam difícil sua conceituação rígida”, ele ensina que a carta de
intenção é um acordo de vontade sujeito à condição suspensiva de que o
contrato “que se almeja ocorrerá se conseguir chegar a um acordo quanto a
todos os aspectos econômicos e jurídicos que o vão compor” (BAPTISTA,
1986, p. 154) e assim vão surgindo os aspectos jurídicos que até então
pareciam não existir nesse período de negociações preliminares.
Luis Fernando Franceschini da Rosa (informações verbais,
2002) denomina esse instrumento como memorando de entendimento
(memorandum of understanding), onde as partes estabelecem que estão
interessadas na negociação, delimitando as características genéricas para a
58
“O documento que nasce usualmente por ocasião da oferta de negociar e que,
corporificando-a, assegura-lhe forma e consistência é a carta de intenção, também conhecida
por outros nomes” (BAPTISTA, 1994, p. 97).
59
“O estatuto jurídico das cartas de intenção é incerto, até mesmo porque muitos negociadores
acreditam, ainda que lançando mão de tais instrumentos, que eles não geram conseqüências
juridicamente vinculantes. Entretanto, como diz Fontaine (1977, p. 77) “da grande diversidade
de situações e de fórmulas empregadas se depreende que certas cartas de intenção, ou certas
cláusulas contidas nestas cartas, criamobrigações jurídicas aos signatários”. (BASSO, 1998,
p. 187)
70
negociação do contrato, regulando os procedimentos, as consequências caso o
contrato definitivo não seja concluído, a responsabilidade das partes, a
obrigação de sigilo etc.
Maristela Basso (1999, p. 29) conceitua que as cartas de
intenção
são na verdade “contratos de negociação”, “documentos
preparatórios” ao contrato definitivo, nos quais as partes
procuram, por exemplo, fixar os pontos acordados,
consagrar acordos sobre os elementos essenciais do futuro
contrato, fixar o prazo dentro do qual as negociações devem se
realizar etc.
Segundo José Maria Rossani Garcez (1999, p. 146) as cartas
de intenção são comuns em negociações complexas ou que demandem fases
sucessivas, dependentes de eventos futuros e possuem conteúdo obrigacional
preliminar ou condicionado a eventos futuros, cuja redação como sempre,
exige cautela.
Assim, as cartas de intenção são muito utilizadas em
negociações longas que envolvem despesas de estudos, deslocamento,
salários dos negociadores e das equipes do projeto. Por meio delas, as partes
vão definindo pontos e superando obstáculos gradualmente, servindo muitas
vezes para fixar os pontos acordados, os prazos para encerramento das
negociações etc.
Luiz Olavo Baptista (1994, p. 97) explica que
O acordo preliminar ou carta de intenção pode nascer para
obrigar as partes a negociarem seriamente, para balizar as
etapas da negociação e para fixar o calendário das tratativas.
Outras nascem para fixar aspectos relevantes negociados e
que não deveriam mais ser discutidos, recordar pontos
acordados com vistas a uma futura contratação. Outras, ainda,
retratam o exaurimento da fase negocial ou de tratativas,
submetendo-a a uma condição suspensiva, qual seja a
aprovação por autoridades, por um conselho de administração,
ou a obtenção de um financiamento, ou outro evento.
Diante do fato de que “as cartas de intenção geram muitos
problemas quando analisadas no âmbito dos direitos internos, que não se dão
conta da riqueza nem da complexidade das relações jurídicas que nascem no
curso das negociações” (BASSO, 1998, p. 201) e do vazio jurídico que um
estudo de direito comparado revela, Maristela Basso (1998, p. 201) pontua, à
luz da prática comercial internacional, que:
71
tais documentos revelam a passagem do não-direito ao direito,
uma vez que, se as partes o redigiram, fizeram-no com alguma
finalidade, isto é, buscando determinar certos efeitos jurídicos,
pretendendo situar-se sobre o plano jurídico, visando à
proteção legal, o que torna lógico, portanto, interpretar o
documento preparatório, porque de seu conteúdo emergirão os
efeitos jurídicos.
Marilda Rosado de Ribeiro (1995, p. 234-235) afirma que a
carta de intenção deve ter boa redação, ser clara quanto aos objetivos e
obrigações; prever a negociação de boa-fé; excluir proposição inaceitável;
prezar pela confidencialidade; ser regida pela liberdade de contratar e prever a
exoneração de responsabilidade (salvo dolo); relata ainda, que sofre influência
da Common Law, e, portanto, são bastante minuciosas, prevendo lei aplicável
e até arbitragem.
Maristela Basso (1998, p. 199) ministra que
Quanto mais completo for o acordo preparatório, o instrumento
da negociação, melhor. A redação deve ser completa,
minuciosa e detalhada, a fim de evitar dúvidas e controvérsias
futuras. Não existe fórmula perfeita e acabada, cabendo aos
negociadores procurar, com base na experiência e na
observação, o modelo apropriado ao caso concreto.
Luiz Olavo Baptista faz distinção entre cartas de intenção
atípicas e típicas. Para ele (BAPTISTA, 1994, p. 98-99) são atípicas as cartas
que tomam a forma de uma promessa de contrato; que dessumem uma
obrigação efetiva, dissimulada sob uma redação imprecisa ou desfigurada pela
afirmação de que as partes não desejam contratar; pode ocorrer também em
certos contratos cuja consecução depende de eventos alheios à vontade das
partes e por último, os acordos firmados por pessoas que não podem obrigar o
sujeito.
as cartas típicas são aquelas cuja finalidade é estabelecer
as regras da negociação, as que registram as etapas ou acordos parciais da
negociação e as que retratam a completude da tratativa e o evento que dará
início a vigência do contrato. (BAPTISTA, 1994, p. 99)
Para Nicola Minervini (2001, p. 341) tais instrumentos podem
ser de quatro tipos:
A) Cartas que descrevem os objetivos das negociações entre
as partes e indicam o procedimento para conduzir a
negociação, fixando o prazo. B) Cartas mais simples que
mencionam somente alguns aspectos que as partes querem
colocar em negociação. C) Cartas que estabelecem deveres e
72
responsabilidades precisos de ambas as partes (como, por
exemplo, não negociar contemporaneamente com outros,
manter informações confidenciais e a mesma negociação). D)
Cartas que definem exatamente a que ponto chegou a
negociação.
Maristela Basso (1998, p. 188-200), por sua vez, informa que
mais categorias de cartas de intenção comumente encontradas na
negociação dos contratos internacionais, relatando dez tipos
60
que serão
apresentados de forma resumida:
1. que balizam as negociações em curso (documentam a negociação e visam a
boa-fé);
2. que fixam os pontos consensuais entre as partes (firmado o acordo acerca
de alguns pontos, ou elementos, do futuro contrato, a negociação somente
poderá ser rompida justificadamente, sobretudo se a razão do recesso estiver
vinculada aos pontos acordados);
3. que visam a repartição das despesas (diretas) da negociação (com projetos,
estudos, análises) que servirão de base durante as negociações para tomada
de decisões com vista à conclusão do contrato definitivo;
4. que estabelecem a obrigação das partes ou de uma delas de não
negociar com terceiros interessados acerca do mesmo objeto (pactos de
exclusividade);
5. que fixam os limites temporais dentro dos quais a negociação deve se
realizar;
6. que estabelecem um acordo de segredo;
7. que têm por base uma prestação que pode ser subdividida em partes ou
lotes (lots, tranches) a fim de conhecer o produto e o fornecedor e depois
concluir um novo acordo que envolva lotes sucessivos;
8. que, mesmo antes do encerramento das tratativas, as partes concordam em
iniciar a execução do contrato que estão negociando, sendo comum em casos
de construção e instalação de complexo industrial, pois, nesses casos, as
partes amadureceram e têm pressa de concluir o contrato definitivo, mas por
60
A autora (BASSO, 1999, p. 40) em artigo específico com o título As cartas de intenção ou
contratos de negociação comenta os 10 tipos exemplificados, mas ressalta que muitos outros
podem existir e que é muito comum as cartas de intenção mistas, abrangendo vários dos tipos
analisados.
73
ser muito complexo, encontra-se em fase de elaboração
61
e na hipótese de as
negociações não conduzirem ao contrato definitivo, aquela parte que deu início
aos trabalhos pode pedir ressarcimento dos custos diretos e indiretos sofridos
com relação às prestações cumpridas;
9. que consagram o acordo entre as partes acerca de todos, ou quase todos,
os elementos do contrato, mas limitam a eficácia do negócio jurídico a uma
condição suspensiva, a um evento futuro;
10. que determinam as responsabilidades das partes no que respeita às
despesas conexas (despesas de viagens, diárias etc.) à negociação.
Dessa forma, é possível observar que algumas cartas de
intenção, pelo objeto a que se destinam podem gerar obrigações jurídicas entre
as partes, como por exemplo, as que tratam da repartição das despesas diretas
da negociação “representam obrigação contratual assumida pelas partes no
decurso das tratativas que visam ao futuro contrato” (BASSO, 1998, p. 191), ou
ainda as que estabelecem acordo de segredo, uma vez que “são acordos cuja
violação enseja ressarcimento dos danos com base no interesse contratual
positivo” (BASSO, 1998, p. 194) e também as que determinam a
responsabilidade das partes quanto às despesas conexas à negociação. Todas
são tidas como obrigações contratuais, cuja inexecução gera direito à
indenização (BASSO, 1998, p. 199).
Luiz Olavo Baptista (1994, p. 104), ao se referir às cartas de
intenção que registram acordos parciais, informa que elas podem “registrar
aspectos marginais e acessórios, ou substanciais” e então podem constituir,
dependendo do caso, um verdadeiro contrato, mesmo que existam palavras
que expressem o contrário.
No tocante ao conflito de leis, Luiz Olavo Baptista (1994, p.
105) reflete que
[...] no sistema brasileiro onde se efetua a localização das
obrigações no lugar em que se constituem, em geral a tarefa é
reduzida à indagação sobre se ou não uma obrigação
nascida da “carta de intenção”, questão que pode ser
respondida no caso concreto. Em outros direitos, o problema é
61
Nesses casos, Maristela Basso (1998, p. 195) recomenda “que tais instrumentos tenham boa
redação, adequada e detalhada, e que prevejam expressamente as alternativas de
ressarcimento em caso de interrupção das tratativas”.
74
mais complexo em razão da maior dificuldade de determinação
da lei aplicável.
Na visão de José Maria Rossani Garcez (1994, p. 112) é
importante salientar que “a carta de intenção não é o contrato” e, portanto, terá
laços obrigacionais mais tênues ou estarão condicionados a eventos futuros.
No entanto, esses documentos ganham relevância no mundo jurídico, pois se
as partes os elaboram é geralmente com a finalidade de revestir-se de
segurança durante as negociações.
O documento deve encerrar obrigações preliminares que, se
chegarem a operar, possam ser resolvidas em perdas e danos
em benefício da parte prejudicada. É o caso, por exemplo, dos
efeitos que uma carta de intenção possa ter causado à parte
que, em virtude do futuro e possível acordo e através das
premissas nela contidas, mobilizou seus esforços para
conseguir novos recursos, adquirir matérias-primas, começar a
produzir, ou contratar pessoal ou, ainda, remover pessoas e
bens de um ponto para outro. (GARCEZ, 1994, p. 112)
Roberto Braga de Andrade (1992, p. 74-75) concorda que
determinar o grau de vinculação gerado por uma carta de intenção dependerá
do caso específico, pois a variedade de conteúdo (simples minutas a
obrigações de execução autônoma) desse documento impede a formulação
geral sobre os seus efeitos vinculantes.
Diante dessa incerteza, Maristela Basso (1998, p. 202)
aconselha que as partes enfrentem esses problemas e determinem
expressamente, qual a natureza de seu acordo e quais as consequências em
caso de inadimplemento, evitando, dúvidas e controvérsias.
Cabe, então, aos negociadores adequarem as cartas de
intenção ao caso concreto, pois não existe uma fórmula para se negociar, o
que se observa é que todas as cartas de intenção baseiam-se na figura de uma
negociação séria e de boa-fé, algumas gerando um vínculo maior ou menor
conforme a redação, o objeto e a vontade das partes.
Ao término das tratativas, os negociadores podem desistir de
concluir o contrato ou então optar por firmá-lo e então as cartas de intenção se
exaurem ou podem ser parte integrante do contrato ou ainda servir de
referência do que as partes almejavam, contribuindo para a hermenêutica
contratual.
75
Importante ressaltar que embora as cartas de intenção não
obriguem à conclusão do contrato definitivo, podem constituir instrumento
capaz de justificar ação de responsabilidade para reparação de eventual
prejuízo sofrido em caso de ruptura das negociações. Essa reparação pode
estar prevista na própria carta por meio de uma cláusula penal.
Essencial para o presente estudo é a análise de Maristela
Basso (1998, p. 206) no sentido de que as cartas de intenção podem prever o
recurso à arbitragem para soluções de conflitos.
A carta pode prever recurso à arbitragem ou ao juiz nacional.
No caso de inexistência de previsão, ambas as possibilidades
são possíveis. A primeira, recurso ao árbitro, torna-se mais
difícil porque existem países que dificultam a execução do
laudo arbitral.
Diante da inclusão de tantas cláusulas contratuais, na prática, é
difícil saber onde termina a carta de intenção e inicia o contrato definitivo
62
e
nesse sentido, Maristela Basso (1998, p. 207) afirma:
Nestas hipóteses, se faltar um elemento essencial do contrato,
temos uma carta de intenção e estamos no campo da
responsabilidade pré-contratual. Se, entretanto, todos os
elementos essenciais do contrato estão presentes, e faltam
detalhes ou elementos secundários, acessórios, o acordo faz
nascer o contrato e estamos no campo da responsabilidade
contratual.
Ou seja, a liberdade das partes e a influência da lex mercatoria
possibilitam diversos modelos de cartas de intenção e mesmo que as partes
não queiram, algumas, embora sejam documentos pré-contratuais, geram
vínculos e obrigações entre elas, não no sentido de obrigá-las a concluírem o
contrato definitivo
63
, mas estabelecendo deveres, seja em relação às despesas
acordadas, seja pela obrigação de sigilo de informações, outras, por sua vez,
62
Na análise feita por Maristela Basso (1998, p. 205) sobre os problemas jurídicos das cartas
de intenção, ela ressalta “é importante que não sejam confundidas com “promessa de contrato”
(vide 6.6.5) assim como com “contrato definitivo”. Vale observar que pode acontecer, na
prática, que as partes celebrem uma carta de intenção na qual acordam acerca de todos o
elementos essenciais do contrato, deixando para o futuro acordo somente os elementos
secundários. Nesses casos, não raros, cabe verificar se tais elementos secundários são de fato
marginais, ou seja, não representam, para uma das partes, pontos substanciais. Caracterizado
que são realmente secundários os pontos deixados para futuro ajuste, a carta de intenção
representa um acordo sobre a essentialia négotii, significando um verdadeiro contrato,
independentemente da terminologia usada pelas partes”.
63
O contrato definitivo é ato pelo qual as partes se comprometem definitivamente a assumir
certas obrigações determinadas. O contrato tem força obrigatória e abre, a cada uma das
partes, o direito de demandar em juízo a execução forçada das prestações prometidas, contra
o inadimplente”. (STRENGER, 1998b, p. 111)
76
por obrigações de informar. Todas estão submetidas ao princípio da boa-fé
objetiva que determina que as partes se tratem lealmente e que se estão
firmando um documento que este tenha validade e eficácia entre elas.
Assim, por esta nova e importante figura poder trazer tantas
conseqüências jurídicas é que se propõe que nelas existam, inclusive, a
previsão de solução de eventuais conflitos que dali podem surgir,
especialmente a inserção da cláusula compromissória de arbitragem pelas
vantagens que ainda serão consideradas neste estudo.
Maristela Basso (1998, p. 207-208)
se mostrou uma grande
estudiosa desta fattispecie e assim apresenta algumas sugestões:
a) os instrumentos devem ser redigidos de modo que tanto
os juristas como os não-juristas (p. ex. os próprios
empresários) possam entende-las e avaliar seus efeitos
práticos;
b) os direitos e deveres das partes devem estar muito
claros, evitando-se equívocos, contradições e pontos
discutíveis;
c) os recursos cabíveis, em caso de descumprimento,
devem estar previstos (se arbitragem, como deverá se realizar;
se recurso ao poder judiciário nacional, de qual país e qual a lei
aplicável);
d) qual será a base de cálculo da indenização em caso de
descumprimento;
e) quais as despesas reembolsáveis e como se dará o
reembolso;
f) mesmo que o instrumento isente as partes de
responsabilidade em caso de descumprimento ou ruptura,
que se considerar que a parte prejudicada poderá buscar
ressarcimento em caso de rompimento abusivo, injustificado,
violação dos deveres de negociar seriamente e em caso de
conduta dolosa;
g) o contrato definitivo, caso concluído, deve conter cláusula
acerca dos efeitos que reconhece à carta de intenção feita
durante o período de negociações.
Assim como esses instrumentos exemplificados, muitos
outros
64
modelos jurídicos são possíveis em conformidade com a experiência, a
necessidade do caso concreto e da autonomia da vontade de criar tais formas
de negociar que devem ser cada vez mais estudadas pelos juristas a fim de se
64
Apenas como nota, cabe informar que Irineu Strenger (1998b, p. 105) faz menção a três
tipos de contratos que podem surgir na fase de formação de um contrato internacional: a) os
contratos preparatórios; b) os contratos interinos; e c) os contratos parciais, o que demonstra a
grande gama de modelos jurídicos que podem surgir nessa fase e suas diversas
denominações.
77
acompanhar a evolução negocial, proporcionando maior segurança aos
negociadores.
2.4.2. Pré-contratos
O pré-contrato, também chamado de compromisso, contrato
preliminar ou contrato-promessa de contratar caracteriza a relação em que as
partes se comprometem
65
a concluir o contrato que é objeto de tratativas.
Esses instrumentos jurídicos são utilizados quando
as partes reconhecem que o negócio é vantajoso, mas ambas
ou uma delas não pode ou não quer de imediato celebrar o
contrato. Porém, têm interesse em assegurar o negócio e, ao
invés de concluí-lo desde logo, prometem realizá-lo mais
adiante (BASSO, 1998, p. 264)
.
Contrato preliminar, para Maria Helena Diniz (1998, p. 862) é
aquele pelo qual um ou ambos os contraentes obrigam-se a
celebrar determinado contrato no momento em que lhes
convier. Gera uma obrigação de fazer um contrato definitivo, ou
seja, a obrigação de um futuro contrahere, isto é, de contrair
contrato definitivo, contendo a possibilidade de arrependimento
e indenização das perdas e danos.
Para Maristela Basso (1998, p. 266-267), esse instrumento
compromissório é um negócio jurídico bilateral, por meio do qual, apenas uma
ou ambas as partes visam estabelecer a obrigação de concluir contrato futuro
empregando todo esforço necessário para esse fim.
Os pré-contratos
66
são reconhecidos e possibilitados pelo
princípio da autonomia da vontade que elabora figuras preliminares capazes de
65
“É inegável que o pré-contrato cria conseqüências jurídicas, se descaracterizado ou
inadimplido por uma das partes, mas a assinatura de um pré-contrato não significa que o
contrato definitivo deva fatalmente ser concretizado” (SANTOS, J., 1997, p. 42).
66
Cabe explicar que o contrato preliminar não se confunde com a opção. Segundo Orlando
Gomes (1996, p. 36) “Por esse negócio jurídico, uma das partes se reserva a liberdade de
aceitar proposta, completa e inalterável, da outra, com tal eficácia que, para formar o contrato
sucessivo, basta declarar a aceitação, necessária não sendo outra manifestação da vontade do
proponente ou policitante”. A opção “é um contrato segundo o qual uma das partes apresenta
proposta irrevogável de concluir um contrato, cabendo à outra parte aceitá-la ou não.
Aceitando-a, o contrato torna-se perfeito e acabado” (STRENGER, 1998b, p. 110-111).
Também se distingue do contrato de preferência, pois nesse “uma das partes se compromete a
“preferir”, mediante certas condições, a outra parte na estipulação de um futuro contrato”
(BASSO, 1998, p. 269)
78
criar vínculos obrigacionais. Para evitar conflitos deve ser bem redigido, prever
a lei aplicável e o foro competente para que em caso de alguém não cumprir
67
a obrigação assumida, poder-se recorrer à arbitragem ou ao juiz nacional,
conforme estabelecido. Para que a promessa seja viável é necessário que os
elementos essenciais que caracterizam o contrato sejam determinados ou
determináveis.
Validamente concluída, a promessa, cria para os negociadores
as seguintes obrigações:
1ª) devem manter sua oferta de contratar durante o período
convencionado, durante o período em que a outra parte deve
tomar decisão. Se nenhum prazo é previsto, o promitente pode,
a qualquer momento, retratar-se, mas com a condição de
colocar previamente ao beneficiário prazo razoável para que
tome a decisão; 2ª) devem abster-se de todo ato ou fato que
possa impedir a conclusão do contrato prometido: o
beneficiário da promessa pode assim premunir-se contra esse
risco, praticando atos conservatórios, agindo em juízo para
fazer respeitar a promessa ou mesmo tomando cautelas para
garantir a execução desta; 3ª) devem, enfim, lavrar o contrato
definitivo, chegando o momento. Se o promitente a isso se
recusa, o tribunal pode, em princípio, proferir julgamento com
força de contrato, em consonância com as condições
essenciais deste, previamente determinadas ou determináveis,
em razão da promessa (STRENGER, 1998b, p. 110-111).
Ao se efetivar o contrato almejado as partes se comprometem
definitivamente a assumir certas obrigações determinadas e dessa forma, o
acordo tem força obrigatória, possibilitando o direito de demandar em juízo a
execução forçada das prestações prometidas.
O contrato preliminar unilateral, ou promessa unilateral de
contrato, implica a manifestação de vontade dirigida a constituir
novo contrato, qual seja, o definitivo (o projetado),
determinando, desde logo, seus elementos essenciais.
Representa, pois, para uma das partes, uma obrigação de
fazer, um facere: o ulterior consentimento para a celebração do
contrato definitivo. (BASSO, 1998, p. 268-269)
Ao comparar o contrato preliminar e carta de intenção,
Maristela Basso (1998, p. 270) explica que embora sejam figuras pré-negociais
que visam dar segurança às partes durante a formação dos contratos, os
contratos preliminares possuem como traço característico o vínculo, a
obrigação de firmarem o contrato definitivo enquanto que as cartas de intenção
67
“Pode acontecer que uma das partes se recuse a cumprir a obrigação assumida. Nesses
casos, a parte que se prejudicada poderá recorrer à arbitragem ou ao juiz nacional,
conforme estabelecido no termo do pré-contrato”. (BASSO, 1998, p. 267)
79
têm como sinal marcante a eventualidade. No entanto, a jurista faz uma
ressalva: “certamente que se considerar, conforme visto anteriormente, que
as cartas de intenção podem ser mais ou menos vinculantes de acordo com
seu conteúdo”.
Aqui reside a grande diferença entre contrato preliminar e carta
de intenção. O contrato preliminar prevê a obrigação de se concluir o contrato
definitivo enquanto a carta de intenção, em regra, não obriga ao alcance do
contrato definitivo, mas pode prever obrigações (divisão de despesas, sigilo,
investimentos) que as partes devem respeitar até que se decidam pela
conclusão ou não do contrato definitivo, caracterizando em si, um contrato
antecessor do qual almejam e que talvez nem seja alcançado.
2.4.3. Cartas de Conforto
As cartas de conforto são
acordos preparatórios usados frequentemente durante as
negociações relativas a um contrato de mútuo ou
financiamento com bancos, agentes financeiros ou
asseguradoras, presentes ainda durante o processo de
formação de outros contratos nos quais existam compromissos
financeiros relevantes. Tais documentos preparatórios se
aperfeiçoam com a conclusão do contrato definitivo de mútuo
ou financiamento. (BASSO, 1998, p. 208)
As lettres de patronage, como são chamadas
internacionalmente, envolvem terceiros
68
nas negociações de contrato
internacionais de mútuo a fim de “confortar” o banco ou agente financeiro de
que existe uma outra sociedade, maior e mais poderosa, por trás daquela
empresa que lhe pede o mútuo. Importante salientar que as cartas de conforto
também podem variar
69
em seu conteúdo e efeitos jurídicos, pois podem ir
68
“Enquanto as cartas de intenção são firmadas diretamente pelas partes envolvidas e
interessadas na negociação do contrato definitivo, as lettres de patronage o emitidas por
terceiro (empresa controladora), estranho à negociação que está em andamento, fazendo-o
justamente para reforçar as tratativas e garantir o aperfeiçoamento do contrato definitivo entre
o banco e a empresa controlada. Todavia, a semelhança que existe entre as lettres de
patronage e as cartas de intenção é que as primeiras também podem gerar efeitos jurídicos,
mais ou menos vinculantes, segundo o seu conteúdo”. (BASSO, 1998, p. 210)
69
“O conteúdo das lettres de patronage é muito variado, oscilando desde o fornecimento de
simples informação ao banco, até a assunção de obrigações de fazer, no sentido de dar
80
desde uma simples correspondência da sociedade controladora informando
que a mutuária é do grupo econômico, como pode garantir o empréstimo.
As lettres de patronage são geralmente firmadas por uma
sociedade (empresa), chamada, na prática, de “sociedade
controladora”, em favor de um banco, ou outro agente
financeiro com a finalidade de que este último conceda um
mútuo, ou financiamento, a uma “sociedade controlada” pela
primeira (firmatária). Dessa forma, o banco se sente mais
seguro, talvez mais confortável, pela suposta credibilidade de
ter a empresa que pleiteia o empréstimo “alguém mais forte e
poderoso por trás”, mesmo que não haja, muitas vezes,
conseqüências na realidade, como se verá, mesmo consistindo
em medida mais política que prática. (BASSO, 1998, p. 209)
Assim, novamente aqui, vislumbra-se a importância de prever
nas cartas de conforto cláusulas de lei aplicável e compromissória de
arbitragem a fim de dar maior segurança aos envolvidos.
2.4.4. Acordos de Segredo
Há, ainda, os acordos de segredo que servem para preservar
informações sigilosas que possam dar dividendos à outra parte no decurso da
negociação (BASSO, 1998, p. 233), ou seja, representam uma obrigação de
não divulgar certas informações e conhecimentos confidenciais.
O dever de confidencialidade está previsto no art. 2.1.16 dos
Princípios da UNIDROIT nos seguintes termos:
Se uma das partes proporciona informação como confidencial
durante o curso das negociações, a outra tem o dever de não
revelá-la nem utilizá-la injustificadamente em proveito próprio,
independentemente de que no futuro se conclua ou não o
contrato. Quando for apropriado, a responsabilidade derivada
do inadimplemento desta obrigação poderá incluir uma
compensação baseada no benefício recebido pela outra parte.
Os acordos confidenciais são regidos pelo princípio da boa-fé
objetiva e constituem contratos temporários que criam obrigações de manter
sigilo sobre as informações a que se teve acesso durante as tratativas a fim de
não gerar danos ao parceiro e nem propiciar benefício ou enriquecimento ilícito
sustentação para que a empresa controlada honre seus compromissos com o banco, ou
agente financeiro”. (BASSO, 1998, p. 210)
81
para si. Geralmente, envolvem contratos de comunicação de conhecimento
tecnológico (know-how
70
) (BASSO, 1998, p. 233).
Na prática, quando as partes redigem o documento, o credor
da obrigação de segredo procura detalhar ao máximo o que
considera confidencial, ou seja, quais são as obrigações de
segredo da outra parte, precisando inclusive seu âmbito e
duração. Por outro lado, aquele que se compromete a manter
as informações em caráter confidencial (devedor), procurará
proteger-se da sua obrigação tanto ratione temporis, como
ratione materiae. (BASSO, 1998, p. 234).
Mauricio C. de Almeida Prado (1997, p.15-16) justifica a
necessidade das negociações preliminares nos contratos de transferência de
tecnologia.
Aos contratos internacionais de transferência de tecnologia
antecede, inevitavelmente, intensa fase de negociações, que
se justifica por se tratar de contratos internacionais de longo
prazo, que visam à transferência de um bem intangível, de
difícil identificação quanto ao conteúdo e à extensão: a
tecnologia.
Roberto de Oliveira Murta (1998, p. 147) expõe a situação num
caso hipotético durante a formação de um contrato internacional.
[...] nesta etapa, surge uma pequena dificuldade, que consiste
em fornecer ao importador uma idéia exata dos processos que
poderão ser cedidos, mas que por se tratar de processos
secretos não poderão ser transmitidos antes que ele adquira a
concessão. Exportador e importador, então, costumam utilizar-
se de uma convenção particular em que haja compromisso do
importador de guardar e não utilizar o segredo que lhe foi
transmitido.
Mauricio C. de Almeida Prado (1997, p. 49-50) explica que o
acordo de confidencialidade é um negócio jurídico de natureza contratual
inominada, podendo ser celebrado oralmente, mas consagrado na prática
contratual internacional na forma escrita pela relevância do objeto contratual,
para a proteção dos interessados durante a fase negocial e para prova de seu
alcance. O objeto do acordo consiste no compromisso de não divulgar a
terceiros as informações reciprocamente veiculadas, bem como de usar tais
70
“O contrato de know-how é um documento mediante o qual uma pessoa física ou jurídica
transfere a outrem a prerrogativa de partilhar dos direitos que ela possui sobre certas fórmulas,
técnicas ou processos próprios, exclusivos e secretos, reservando-se o direito de explorá-los,
utilizá-los e aperfeiçoá-los durante certo lapso de tempo e mediante determinada remuneração
a ser paga pela cessão. Esta remuneração é denominada royalty e consiste quase sempre
numa percentagem sobre o valor das vendas dos artigos obtidos através do know-how ou da
produção de serviços proporcionada por ele, ou sobre qualquer outra forma de resultados
obtidos com ele para a produção de um bem que reverta em lucro para quem o esteja
utilizando”. (MURTA, 1998, p. 143)
82
informações tão somente para o fim de avaliar a conveniência da celebração
do contrato definitivo.
As informações sigilosas são protegidas no Brasil, inclusive
pela Lei de Propriedade Industrial, a Lei nº. 9.279/96, em seu art. 195 que reza
sobre os crimes de concorrência desleal, enumerando dentre os autores, os
que prometem dinheiro a empregado de concorrente a fim de que ele falte ao
dever do emprego proporcionando vantagem ao seu pagador (inciso IX) e
também o empregado conivente (inciso X); quem divulga, explora ou utiliza,
sem autorização, de conhecimentos, informações ou dados confidenciais,
utilizáveis na indústria, comércio ou prestação de serviços, a que teve acesso
mediante relação contratual ou empregatícia, mesmo após o rmino do
contrato (inciso XI) e quem se aproveita das informações a que se refere o
inciso anterior, obtidos por meios ilícitos ou a que teve acesso mediante fraude
(inciso XII), dispondo ainda que a pena para este crime é de detenção, de 3
(três) meses a 1 (um) ano, ou multa.
Além dos modelos jurídicos acima expostos, muitos outros
podem nascer frutos da autonomia da vontade e da necessidade dos
operadores do comércio internacional.
Em resumo do estudo dos modelos jurídicos, Maristela Basso
(1998, p. 271) conclui:
a) que cada um deles gera seus efeitos próprios;
b) que visam a dar segurança às partes durante a importante
fase das negociações preliminares;
c) que buscam, com mais ou menos vigor, vincular as partes,
seja no que se refere aos efeitos das tratativas propriamente
ditas, seja no que diz respeito à conclusão do contrato
definitivo.
Deve-se então considerar que as negociações preliminares
podem originar diversos modelos jurídicos que, por sua vez, “são capazes de
produzir conseqüências jurídicas, segundo as expectativas que geram e os
possíveis prejuízos que o rompimento arbitrário pode acarretar à outra parte”
(BASSO, 1998, p. 273). o se pode esquecer que o princípio essencial das
tratativas ainda vigora, qual seja, a liberdade de contratar. Assim, mesmo
diante de tais modelos jurídicos, é notório que as partes entram em negociação
para conhecerem as vantagens e desvantagens do futuro e eventual contrato
por sua conta e risco, sendo atividade normal do comércio. Porém, a
83
autonomia encontra limite no dever de negociar de boa-fé
71
, de minimizar
prejuízos a outrem, necessitando de uma resposta do direito concernente ao
momento de globalização comercial, jurídica, econômica, social e cultural que
se vive e que não pode aguardar a conclusão do contrato para inibir práticas
abusivas e desleais.
Assim, embora não se tenha alcançado o contrato final, têm-se,
em alguns casos, ainda nos modelos jurídicos como algumas cartas de
intenção, verdadeiro vínculo obrigacional contratual que merece a atenção e
proteção do direito e por isso justifica a inserção da cláusula compromissória
para dar segurança e eficiência aos negociadores internacionais que não
podem ficar à mercê da insegurança e variação dos sistemas jurídicos aos
quais podem estar submetidos.
2.5.
C
ONSEQUÊNCIAS
J
URÍDICAS DO
R
OMPIMENTO DAS
N
EGOCIAÇÕES
P
RELIMINARES
A liberdade de negociação é um pressuposto ao
desenvolvimento do comércio, mas, essa liberdade sofre limitações, uma vez
que está submetida à moralidade decorrente do dever de agir de boa-fé. Os
negócios devem evoluir dentro de uma atmosfera de lealdade e correção, ainda
que não exista regra escrita. Assim, importante delimitar o vínculo decorrente
das negociações preliminares, pois pode ocorrer durante as negociações, a
percepção de uma ou ambas as partes sobre a inconveniência do negócio e
que não deve anuir definitivamente.
Dessa forma, Silvio Rodrigues (2002, p. 67)
explica que
“nenhuma responsabilidade lhe pode daí advir, pois as negociações
preliminares ordinariamente não obrigam os contratantes”.
71
“No âmbito do direito comercial internacional, na perspectiva atual de formação dos
contratos, as negociações preliminares devem evoluir em uma atmosfera de cooperação,
lealdade e correção. Certas regras devem ser respeitadas, ainda que não estejam escritas
são os requisitos do processo negocial, que, no contexto dos ordenamentos internos, se
poderia traduzir por boa-fé”. (BASSO, 1998, p. 278)
84
Porém, se a ruptura das negociações for arbitrária e
injustificada - baseada no capricho de uma das partes ou em descumprimento
de obrigação assumida em carta de intenção ou outro instrumento utilizado
pelas partes nesse período -, causando prejuízo ao outro contratante - que na
expectativa de um bom negócio realizou despesas, abriu mão de outros
negócios, alterou planos de sua atividade -, este deverá ser reparado.
No capítulo 2 dos Princípios do UNIDROIT sobre os Contratos
Comerciais Internacionais (destinado à formação dos contratos), art. 2.1.15,
encontra-se que
1. As partes tem plena liberdade para negociar os termos de
um contrato e não são responsáveis pelo fracasso em alcançar
um acordo. 2. Contudo, a parte que negocia ou interrompe as
negociações de má-fé é responsável pelos danos e prejuízos
causados a outra parte. 3. Em especial, considera-se má-fé
entrar em negociação ou continuá-la com a intenção de não
chegar a um acordo.
Como dito anteriormente, o art. 7º, §da Convenção de Viena
de 1980 sobre Contrato de Compra e Venda Internacional de Mercadorias
também ressalta a importância da boa-fé objetiva. Dessa forma, “a boa-fé
objetiva ganha relevo também no sentido de coibir qualquer abuso de uma
parte sobre a outra, orientando a conduta contratual a ser desenvolvida”
(AMARAL JUNIOR, 1993, p. 27).
Assim, a não celebração do contrato pode causar prejuízos,
muitas vezes difíceis de serem avaliados, uma vez que as tratativas também se
vislumbram no plano subjetivo, ou seja, envolvem as esperanças de um dos
negociadores de realizar o negócio vantajoso para o qual desprendeu esforços.
Porém, alguns prejuízos podem ser avaliados por meio de fatos concretos
72
,
como as despesas direcionadas à conclusão do negócio, sejam, estudos de
viabilidade, pesquisas, projetos, experiências, despesas com viagens dos
negociadores, diárias etc.
72
“O esquema para a formação do contrato internacional, segundo Frignani (1990, p. 49),
envolve geralmente o estudo de mercado e a exeqüibilidade, a elaboração de projetos, a
análise de documentos e balanços, o estudo do sistema legislativo (tributário, fiscal, comercial
e aduaneiro) do país da contraparte, a solicitação de autorizações administrativas, a concessão
de financiamentos (nacionais ou internacionais), o que, indubitavelmente, exige tempo,
despesas (inclusive com a contratação de pessoal especializado) e, sobretudo, riscos. Assim,
via de regra, em caso de ruptura das tratativas, o dano ou prejuízo de uma das partes é
“essencialmente material”, ou seja, fundamentalmente perda pecuniária que pode ser
ocasionada também pela violação de segredo de comércio ou indústria que tenha sido
revelado durante o período das negociações” (BASSO, 1998, p. 160).
85
Ocorre muitas vezes que, para se preparar para executar a
contento o contrato, a parte chega a mobilizar, desde logo,
recursos, pessoal, chega a adquirir e a mover equipamentos e
a praticar outros atos que depois se se frustrar a possibilidade
de materialização do contrato por culpa da outra parte, que
ocultou ou falseou dados ou criou falsas expectativas, podem
ser passíveis de pedido de indenização. (GARCEZ, 2003, p.
217-218)
Embora as tratativas geralmente sejam descritas
doutrinariamente sem força vinculante - caso fosse diferente não se negociaria
preliminarmente -, qualquer relação comercial deve observar o princípio da
boa-fé objetiva entre as partes e o não enriquecimento ilícito como determina o
Código Civil Brasileiro em seus artigos 186, 187 e 927. Assim, tudo que
conflita com a boa-fé objetiva deve ser declarado ilícito. Toda vez que o
contrato não for concluído em decorrência de comportamento desleal ou
abusivo de uma das partes os danos devem ser reparados.
Importante ressaltar que esta reparação será decorrente de
comportamento censurável, ou seja, dolo, negligência ou
imprudência, porque, se esta culpa não for analisada com
cautela acabará resultando em prejuízo aos contratos
internacionais, pois os contratantes se retrairão perante uma
ameaça de indenização proveniente da outra parte sempre que
participem de uma negociação. (COSTA, 2004, p. 301)
Assim, o que vem sendo reconhecido é que aquele que se
retira injustificadamente de uma negociação depois da outra parte ter feito
investimentos de qualquer monta ou natureza, fica obrigado a ressarcir os
prejuízos sofridos. Se essa reparação será pré-contratual
73
ou contratual
dependerá do grau de vínculo obrigacional entre elas
74
.
Isto é, as negociações preliminares não vinculam as partes à
conclusão do contrato, mas, muitas vezes, pela complexidade e importância
financeira do que está sendo negociado e dos investimentos necessários para
se conhecer o objeto e viabilidade de sua contratação, elas acabam por firmar
instrumentos jurídicos como as cartas de intenção, os pré-contratos, os
acordos de sigilo, que delimitam as responsabilidades e objetivos das tratativas
73
Karina Cristina Nunes Fritz (2005, p. 16-17) informa que a maior parte da doutrina reconhece
quatro hipóteses de manifestação da responsabilidade pré-contratual: 1) responsabilidade pela
celebração de contrato nulo ou anulável; 2) responsabilidade por danos oriundos da fase
negocial, na hipótese de contrato válido; 3) responsabilidade por danos oriundos da fase
negocial, na hipótese em que não celebração do contrato; 4) responsabilidade por ruptura
injustificada das negociações.
74
Não se fará maiores explanações acerca da responsabilidade contratual e pré-contratual por
não ser o objetivo deste trabalho.
86
e, consequentemente, o vínculo existente entre os envolvidos, como se viu no
anteriormente.
Dessa forma, se o modelo jurídico gerar obrigação de fazer,
não fazer ou dar, estar-se-á diante da responsabilidade contratual e vale
novamente relembrar que não se refere ao contrato definitivo, mas à obrigação
específica desejada pelas partes naquele momento preliminar a fim de alcançá-
lo. Se, por sua vez, o modelo jurídico apenas pontuar a negociação até aquele
momento ou não criar nenhuma obrigação, estar-se-á perante a
responsabilidade pré-contratual.
Como não propriamente o contrato principal em fase de
estudo pelas partes -, tem-se a insegurança de como e por quem será
resolvido eventual conflito surgido nessa fase, ainda mais não sendo do
quotidiano do Judiciário lidar com essas questões comerciais internacionais e
também pela existência do vínculo de dois ou mais sistemas jurídicos e o
envolvimento de terceiros, como seguradoras, bancos, transportadoras,
despachantes etc.
Nesse sentido é que se analisará a inserção, no modelo
jurídico escolhido anteriormente pelas partes, de uma cláusula compromissória
de arbitragem.
87
3. ARBITRAGEM: APLICAÇÃO DA CLÁUSULA COMPROMISSÓRIA NAS
NEGOCIAÇÕES PRELIMINARES DOS CONTRATOS INTERNACIONAIS
DO COMÉRCIO
O presente capítulo visa analisar o instituto da arbitragem, suas
características e sua importância para o desenvolvimento do comércio
internacional, por fim justificar seu uso durante a fase de formação dos
contratos internacionais, inseridos nos modelos jurídicos anteriormente
descritos, considerando-se o caso concreto e a possibilidade do uso da
cláusula compromissória de arbitragem. Para tanto, é importante destacar,
ainda que brevemente, sua história que demonstra a essência e utilidade do
instituto jurídico.
A arbitragem é um dos métodos mais antigos de solução de
conflitos, encontrando-se indícios de seu uso desde a Grécia Antiga com a
mitologia, quando Paris foi árbitro entre Atena, Hera e Afrodite que disputavam
a maçã de ouro, triunfo da mais bela mulher (CRETELLA JUNIOR, 1989, p. 8).
Segundo José Cretella Neto (CRETELLA NETO, 2004, p. 6), “a mais antiga
arbitragem teria ocorrido entre Messenia e Esparta, em 740 a.C.”.
Durante séculos a arbitragem foi muito utilizada como todo
de solução de conflitos entre Estados, encontrando-se informações de sua
utilização pelas polis gregas, pelos antigos hebreus e pelos impérios
europeus
75
.
A partir do século XII, especialmente no século XIV, a
arbitragem ganha maior ênfase comercial com o surgimento dos tribunais
marítimos em decorrência da intensificação desse comércio e dos
“descobrimentos” de novos continentes pelos europeus (CRETELLA NETO,
2004, p. 8).
Segundo Irineu Strenger (1996a, p. 23), a arbitragem “na Idade
Média era o método que regulava divergências entre os comerciantes, com
adoção de usos e costumes que permitiram o desenvolvimento da moderna lex
mercatoria”.
75
Vide CRETELLA NETO, 2004.
88
Por esse aspecto, vê-se a estreita ligação entre a evolução do
comércio e o uso da arbitragem. No entanto, após a Revolução Francesa em
1789, as corporações mercantis perderam um pouco de força, mas esse
método alternativo continuou sendo utilizado pela Assembléia Constituinte
Francesa, porém, com caráter obrigatório e a fim de combater os abusos
praticados pela realeza. A partir de então, outros Estados europeus e
americanos começaram a inseri-lo em suas legislações, porém, de forma
facultativa, respeitando a autonomia privada (CRETELLA NETO, 2004, p. 10-
11).
Esse instituto chegou ao Brasil com os portugueses por meio
das Ordenações Filipinas e foi incorporado à Constituição Federal de 1824.
Entre os comerciantes a arbitragem ganhou relevo com o Decreto 737 de 1850
e o Código Comercial de 1850, sendo obrigatória em questões como contratos
de locação mercantil, matéria societária, naufrágios e outros. Porém, a
obrigatoriedade não durou muito tempo, sendo modificada pela Lei 1.350 de
1866, uma vez que a autonomia da vontade é o princípio motor
76
da
arbitragem. (TIBURCIO, 2001, p. 80-81).
A legislação brasileira incorporou a arbitragem ao Código Civil
de 1916 que dispunha sobre o compromisso nos artigos 1.037 a 1.048 e no
Código de Processo Civil de 1939 que tratava do juízo arbitral, determinando
que o laudo arbitral deveria ser homologado pelo Poder Judiciário que fosse
competente para julgar o litígio, o que prejudicava o desenvolvimento desse
instituto.
Vê-se, portanto, que esse método de solução de conflitos está
totalmente vinculado ao comércio e ao interesse estatal de intervenção na área
econômica, pois durante o período de fechamento do Estado para as relações
comerciais internacionais e para a própria democracia, a arbitragem
permaneceu obsoleta na medida em que a sentença arbitral necessitava da
homologação do Judiciário e o Executivo não ratificava as convenções
internacionais que firmava.
Apenas com a abertura democrática e comercial do país é que
o Legislativo retomou a discussão sobre a modernização do instituto no Brasil.
76
“Porque contra a vontade das partes, só é possível a decisão judicial, nunca arbitral”.
(AZEVEDO, 1998, p. 11)
89
Isso ocorreu com a aprovação e promulgação da Lei 9.307 de 1996
77
, bem
como com o referendo e ratificação de tratados internacionais sobre o assunto,
tais como: a Convenção Interamericana sobre Arbitragem Comercial
Internacional de 1975
78
, a Convenção Interamericana sobre Eficácia
Extraterritorial das Sentenças e Laudos Arbitrais Estrangeiros de 1979
79
e a
Convenção de Nova Iorque de 1958
80
, o que colaborou sobremaneira para a
atualização e segurança jurídica que o país passou a transmitir para os
investidores internacionais nos últimos tempos.
José Carlos de Magalhães, ao prefaciar a obra de Irineu
Strenger, Comentários à lei brasileira de arbitragem (1998a, p.10), ressalta que
a arbitragem se fortalece com a mudança ocorrida no cenário internacional,
como a criação da ONU, da OMC, abertura dos países ao comércio
internacional, redução do Estado e aparecimento das empresas multinacionais.
De fato, enfraquecendo-se o Estado, com seu antigo conceito
de soberania abalado pelo convívio com outros atores na área
internacional, que lhe limitam a esfera de poder, é natural que a
comunidade procure mecanismos alternativos que afastem a
intervenção oficial.
José Carlos Magalhães continua a explicar (STRENGER,
1998a, p.11)
De fato, tanto a arbitragem, como o desenvolvimento da lex
mercatoria são fruto do fenômeno de modificação do papel do
Estado e, mais do que isso, da consciência de que o Estado
nada mais é do que a estrutura jurídica da comunidade
nacional e que a jurisdição, ou seja, a autoridade para declarar
o direito, quem a tem é a comunidade, ou a nação, e não o
Estado. Volta-se a considerar a necessidade de relembrar o
conceito da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão,
esquecido pelos regimes totalitários, inclusive no Brasil, de que
“a nação é essencialmente a fonte de toda a soberania; não
podendo qualquer indivíduo, nem qualquer corpo de pessoas,
assumir qualquer autoridade que não decorra expressamente
dela” (art. 3º). É a noção do Estado representativo de que fala
Norberto Bobbio, em que o Estado passa a ser “considerado
não mais como ex parte principis, mas ex parte populi. O
indivíduo vem antes do Estado. O indivíduo não é pelo Estado,
mas o Estado pelo indivíduo”.
77
A Lei 9.307/96 revogou os dispositivos do Código Civil e do digo de Processo Civil
referentes à arbitragem.
78
Promulgada pelo Dec. 1.902 de 09 de maio de 1996.
79
Promulgada pelo Dec. 2.411 de 02 de dezembro de 1997.
80
Promulgada pelo Dec. 4.311 de 23 de julho de 2002.
90
Se o indivíduo e, em conseqüência, a comunidade vem antes
do Estado, a jurisdição que este exerce é delegada e não
originada. (...)
Essa noção é fundamental para compreender o caráter
jurisdicional da atividade do árbitro. A jurisdição de que se acha
investido é a mesma do juiz estatal, com a diferença de que
sua autoridade jurisdicional decorre diretamente das partes,
enquanto a do juiz, da comunidade como um todo, expresso na
Constituição. (...)
Enquanto a arbitragem nacional ganha espaço entre juristas e
empresários, João Bosco Lee (2002, p. 37) lembra que no âmbito internacional
das relações comerciais a arbitragem é o meio mais comum de solução de
conflitos.
No âmbito internacional, não existe um órgão jurisdicional para
resolver os litígios entre os operadores privados do comércio
internacional. Assim, pode-se recorrer aos tribunais estatais ou
optar pela via arbitral. Se a arbitragem ainda é vista com uma
certa reticência no âmbito interno, onde o contencioso judicial
ainda prevalece, no comércio internacional a arbitragem é
considerada como o meio normal de solução de conflitos.
Embora seja possível constatar o quão cômodo seria para cada
parte se o contrato ou a negociação fossem julgados em seu próprio país, de
acordo com as suas leis, procedimentos, costumes e ngua; também é cil
perceber que a possibilidade de estar sob a égide da lei e/ou jurisdição alheia
causa desconforto. Para evitar essa situação de eminente desavença e
insegurança é que se utiliza a arbitragem no contexto comercial internacional.
Welber Barral (2000, p. 70) informa que se pode traçar uma
correlação direta entre o processo de globalização com uma maior demanda
pela arbitragem comercial internacional, pois nesse cenário as empresas
multinacionais pretendem uma maior segurança de que qualquer conflito será
julgado em um foro imparcial, livre da dúvida do nacionalismo dos tribunais
internos.
Micaela Barros Barcelos Fernandes (2005. p. 59) ministra que
as inseguranças geradas pela ausência de certeza sobre qual,
entre vários tribunais estatais, decidirá eventual questão
oriunda da relação contratual, e ainda, sobre quais normas de
direito processual e material serão aplicadas para dirimir a
controvérsia, conferem enorme instabilidade a um contrato,
fragilizando a relação e as próprias partes, que, em última
análise, podem inclusive perder competitividade no mercado
internacional.
91
Confirma-se a importância da arbitragem como método de
solução de conflitos alternativo às dificuldades de se encontrar uma solução
adequada referente às cláusulas de lei aplicável, foro de eleição e língua, o que
nem sempre é fácil diante da confusão feita pelo Judiciário nacional, como
afirma Nadia de Araujo (2002, p. 199).
A liberdade das partes de escolher o foro, que faz parte da
liberdade contratual, não se confunde com a liberdade de
escolher a lei aplicável, sendo a primeira permitida no Brasil e a
segunda não. A jurisprudência encontrada não esclarece esses
conceitos, tratando a liberdade de eleição de foro como
“autonomia da vontade” e ao mesmo tempo impedindo-a, por
considerá-la em desacordo com as regras de competência
internacional.
Para Maristela Basso (1996b, p.13) outro fator relevante para o
incentivo à arbitragem é a morosidade do Poder Judiciário que gera
insegurança e desestímulo ao comércio e ao desenvolvimento econômico.
A morosidade dos processos civis e comerciais repercute,
como é sabido, desfavoravelmente na produção e nos
investimentos de capitais, paralisando atividades, gerando
gastos improdutivos e ocasionando perdas econômicas
significativas. A justiça lenta deixa de ser justa. A morosidade
na tramitação das causas submetidas aos tribunais gera na
população sentimentos de insegurança jurídica e de desapego
frente às instituições públicas que devem garantir seus direitos.
O sentimento de cidadania se enfraquece e o resultado do
inconformismo nem sempre é o mais salutar. A justiça que
chega atrasada deixa de ser justa.
Nesse contexto, a Assembléia Geral das Nações Unidas em
1976 reconheceu o valor da arbitragem como meio de solução de litígios
comerciais internacionais ao sugerir que
[...] a implementação de sistemas de arbitragem aceitáveis nos
países de sistemas jurídicos, sociais e econômicos diferentes
contribuiria de maneira significativa ao desenvolvimento
harmonioso das relações econômicas. (apud LEE, 2002, p. 37)
Dessa forma, a arbitragem é instituto utilizado mundialmente
como solucionador de conflitos resultantes de negociações internacionais e o
Brasil com a evolução de sua legislação pode aplicá-la, até mesmo para
possibilitar às partes o exercício de sua autonomia da vontade. No entanto,
embora seja um dos todos de solução de conflitos pacíficos mais antigos e
tão comum em âmbito comercial internacional, falta à sociedade, aos
empresários e aos juristas brasileiros desmistificarem e utilizarem cada vez
mais esse instituto que se mostra moderno, ágil e eficiente.
92
Justificada sua utilização no comércio, principalmente no
internacional, passa-se a analisar a aplicação da cláusula compromissória para
a solução dos conflitos nascidos durante a fase de formação dos contratos,
onde a instabilidade do relacionamento é ainda maior pelo fato de não vincular
as partes à conclusão do contrato, mas importando em relevantes despesas e
efeitos jurídicos como visto anteriormente.
3.1.
C
ONFLITOS E
S
OLUÇÕES NAS
N
EGOCIAÇÕES
P
RELIMINARES
A vida humana é conflituosa. Muitas vezes é por meio do
conflito que se aprende e amadurece, pois nem todo conflito significa
rompimento dos relacionamentos e tampouco todas as controvérsias possuem
relevância para o direito. Nas relações empresariais internacionais o conflito
também é constante, pois os costumes, a língua, a diferença dos sistemas
jurídicos representam barreiras a serem contornadas pelas partes.
Morton Deutsch (2004, p. 34) ressalta que o conflito possui
funções positivas.
O conflito previne estagnações, estimula interesse e
curiosidade, é o meio pelo qual os problemas podem ser
manifestados e no qual chegam as soluções, é a raiz da
mudança pessoal e social. O conflito é frequentemente parte
do processo de testar e de avaliar alguém e, enquanto tal, pode
ser altamente agradável, na medida em que se experimenta o
prazer do uso completo e pleno da sua capacidade. De mais a
mais, o conflito demarca grupos e, dessa forma, ajuda a
estabelecer uma identidade coletiva e individual; o conflito
externo geralmente fomenta coesão interna.
Os conflitos ou diferenças são vivenciados com muita
intensidade na fase de formação dos contratos internacionais, justamente por
ser o momento oportuno para se conhecer, aparar as arestas e finalizar o
negócio ou verificar que sua conclusão não é a decisão acertada e se retirar
das negociações. Porém, se ocorrer um rompimento injustificado ou que gere
prejuízos a outrem esse conflito ganhará relevância jurídica e necessitará do
auxílio do direito para sua solução.
O conflito se manifesta como uma contraposição intersubjetiva
de direitos e obrigações, como um fenômeno que se produz
93
quando a respeito de um mesmo bem coexistem duas
pretensões conjuntas, ou melhor, uma pretensão por um lado e
uma resistência por outro (CAIVANO; GOBBI; PADILLA, apud
SANTOS, R., 2004, p. 13).
Assim, conflito
81
pode ser entendido como o que torna
incompatível o bom relacionamento das pessoas, sejam naturais ou jurídicas,
públicas ou privadas, no âmbito das relações pessoais, familiares,
profissionais, empresariais, sociais ou internacionais. Nesse sentido, Morton
Deutsch (2004, p. 41-42) salienta que o conflito é determinado pelo que é
valorizado pelas partes conflitantes e por quais crenças e percepções elas
detêm”.
Fábio Portela Lopes de Almeida (2003, p. 176), ao analisar a
teoria dos jogos e os métodos de resolução de disputa, informa que o conflito é
“a situação na qual duas pessoas têm que desenvolver estratégias para
maximizar seus ganhos, de acordo com certas regras pré-estabelecidas”,
ocorrendo, portanto, quando atividades incompatíveis entre pessoas, grupos ou
nações acontecem.
Para resolução dos conflitos decorrentes dos contratos
internacionais ou de suas negociações preliminares, as partes poderão optar
pelo método judicial, por meio da cláusula de eleição de foro, ou então por um
ou mais métodos extrajudiciais.
Se a escolha for pela submissão ao Poder Judiciário de um
determinado Estado, deve-se observar se aquele possui competência para
julgar a causa. Por sua vez, se tal opção recair sobre um método extrajudicial,
ter-se-á a possibilidade de utilizar-se de um ou mais métodos para a solução
do conflito, tais como a arbitragem, a mediação, a conciliação e a negociação
direta. Em alguns métodos será necessária a intervenção de um terceiro e ele
poderá decidir (heterocomposição) ou não (autocomposição) o conflito,
dependendo do que a lei ou as partes determinarem.
Assim, Ricardo Soares Stersi dos Santos (2004, p. 14)
diferencia as formas autocompositivas das heterocompositivas informando que
81
Morton Deutsch (2004, p. 31-32) assinala os fatores que afetam o conflito: 1. As
características das partes em conflito; 2. Os relacionamentos prévios delas; 3. A natureza da
questão que origem ao conflito; 4. O âmbito social em que o conflito ocorre; 5. Os
espectadores interessados no conflito; 6. A estratégia e a tática empregada pelas partes no
conflito e 7. As conseqüências do conflito para cada participante e para outras partes
interessadas.
94
as primeiras “são aquelas em que as próprias partes interessadas, com ou sem
a colaboração de um terceiro, encontram, através de um consenso, uma
maneira de resolver o problema”; enquanto nas segundas “o conflito é
administrado por um terceiro, escolhido ou não pelos litigantes, que detém o
poder de decidir, sendo a referida decisão vinculativa em relação às partes”.
Com essas noções gerais, passa-se a analisar os tipos de
solução de conflitos das relações empresariais durante as negociações
preliminares, objetivando diferenciá-los para se ater mais à frente à arbitragem,
objeto desse estudo.
3.1.1. Solução Judicial e Foro de Eleição
Dentre os métodos heterocompositivos tem-se a solução
judicial
82
, onde é permitido, em regra, às partes escolherem o foro, mas não o
julgador que é determinado e designado pelo Estado, sendo sua decisão
vinculativa. Se a sentença judicial tiver que ser executada em outro Estado, tal
decisum necessitará da homologação do Judiciário daquele Estado. Nesse
sentido, os Estados podem elaborar tratados de cooperação a fim de facilitar os
trâmites para a homologação e execução da sentença estrangeira.
Ricardo Soares Stersi dos Santos (2004, p. 23) elenca algumas
características do modelo de administração judicial dos conflitos:
a) a existência de um terceiro-juiz, indicado pelo Estado para
resolver conflitos submetidos pelas partes;
b) o poder atribuído ao juiz pela ordem jurídica para decidir
conflitos de maneira vinculativa e obrigatória para as partes;
c) a obrigatoriedade do juiz em proferir decisão, seja de mérito
ou extintiva;
d) o poder do juiz para tomar a decisão que coloque fim ao
conflito das partes advém do Estado (por delegação da
sociedade) e não das partes em conflito;
e) a tomada de decisão é realizada após o desenvolvimento de
processo e procedimento impostos pela ordem jurídica e não
fruto da escolha das partes;
82
ALMEIDA, 2003, p. 189-190. Numa análise de aplicação da teoria dos jogos, tem-se que o
processo judicial não é um jogo-cooperativo e caracteriza um jogo de soma zero, pois “a
cooperação implicaria a vitória do adversário” e o juiz deve considerar o direito e não os
interesses das partes.
95
f) a possibilidade do juiz de utilizar a força (coerção) para
garantir o cumprimento da decisão proferida.
No que se refere à escolha do foro, segundo Garcez (2003, p.
219),
é limitada pelas questões relativas a ordem pública interna
dos países, como é o caso, no Brasil, das questões sobre
imóveis, que devem ser julgadas, exclusivamente, pela
autoridade judiciária brasileira. De resto, o elemento geográfico
da escolha da jurisdição deve ter, em geral, algo a ver com a
estrutura do contrato, guardando conexão ou com o local de
domicílio de uma das partes ou com o local da execução do
contrato, conforme preceituam a doutrina e a jurisprudência
internacionais.
Luiz Olavo Baptista (1980, p. 95) informa que as cláusulas de
eleição de foro nos contratos internacionais são geralmente aceitas
universalmente, desde que o foro escolhido tenha alguma relação com o
contrato e que a escolha não tenha decorrido de tentativa de fraude à lei.
Celso Bastos e Eduardo Amaral Gurgel Kiss (1990, p. 04-05)
alertam que um dos critérios utilizados para a escolha do foro deve ser o local
onde o réu possui bens, “pois nenhum Estado gosta de ver suas decisões
desrespeitadas ou ineficazes. E é o que poderia acontecer quando proferisse
decisões cujo cumprimento dependesse de atos executórios a serem
praticados em outros países”.
A cláusula de eleição de foro determinará a qual jurisdição
estatal as partes estarão submetidas na eventualidade de um conflito. No
Brasil, o Código de Processo Civil em seus artigos 88 a 90 e a Lei de
Introdução ao Código Civil em seu art. 12 regulam a competência internacional.
O art. 88 do CPC permite eleger a competência brasileira quando: i) o réu,
independente de sua nacionalidade estiver domiciliado no país, ou ii) a ação se
originar de fato ocorrido ou de ato praticado no país.
Além da competência denominada relativa acima exposta, têm-
se alguns aspectos que a lei processual, em seu art. 89, de forma absoluta
exclui qualquer outra autoridade judiciária: i) para conhecer de ações relativas
a imóveis situados no Brasil; ou ii) para proceder a inventário e partilha de bens
situados no país, independente da nacionalidade e residência do autor da
herança.
96
Assim, ter-se-á a exclusão de outros métodos de solução de
controvérsias quando: a) houver opção pela autoridade judiciária para
resolução de todas as questões do contrato; b) estiver obrigatoriamente
submetida a ela; c) ou em caso de omissão no estabelecimento do foro de
eleição e não houver opção por uma forma alternativa de solução de conflito.
por outro vértice, a escolha pela solução judicial pode
ocasionar que cada parte busque o amparo do seu Judiciário
83
para a
resolução do conflito, o que causará um grande transtorno
84
na medida em que
o art. 90 do Código de Processo Civil brasileiro reza que “a ação intentada
perante tribunal estrangeiro não induz litispendência
85
, nem obsta a que a
autoridade judiciária brasileira conheça da mesma causa e das que lhe são
conexas”. Ou seja, até que se homologue a sentença estrangeira, o processo
nacional prosseguirá e pelo inverso, se houver sentença nacional transitada em
julgado, o STJ não homologará a sentença estrangeira para que não haja
conflito de sentenças a serem aplicáveis em território nacional.
Como se denota, muitas o as implicações decorrentes da
escolha da solução de conflitos e a opção pelo método judicial possui algumas
particularidades, especialmente por envolver a questão da soberania dos
Estados. Necessário observar, portanto, que nem sempre escolher o judiciário
nacional é o caminho mais apropriado para a solução de eventual controvérsia,
principalmente se houver a maior probabilidade de ser o credor, pois se
escolher seu próprio foro e seus pedidos forem julgados procedentes, terá que
inicialmente conhecer as normas imperativas e a ordem pública do país onde
deverá ser cumprida a sentença tida como estrangeira e posteriormente buscar
sua homologação e cumprimento conforme as regras do Estado onde estiver
localizado o devedor e seus bens para que alcance a efetividade e a
coercitividade necessárias.
83
Por questões de segurança e conforto, pois conhece os procedimentos que serão utilizados
por seu Judiciário nacional.
84
“O motivo principal para atribuir eficácia jurídica à litispendência internacional é o de evitar
julgados contraditórios, favorecendo assim a certeza de direito. Ademais, o reconhecimento da
litispendência internacional contribui para a realização da economia processual”
(RECHSTEINER, 2006, p. 314).
85
Nelson Nery Junior e Rosa Maria de Andrade Nery (2003, p. 475) ao comentarem o art. 90
do Código de Processo Civil: “À justiça brasileira é indiferente que se tenha ajuizado ação em
país estrangeiro, que seja idêntica a outra que aqui tramite. O juiz brasileiro deve ignorá-la e
permitir o regular prosseguimento da ação”.
97
Assim, na escolha do foro, as partes devem conciliar uma
justiça de acesso amplo, de linguagem conhecida para evitar problemas de
tradução e interpretação e que não dificulte a produção de provas.
Outra particularidade interessante e às vezes problemática
86
decorre da divergência entre a escolha da lei aplicável e do foro de eleição,
pois nesse caso, um juiz nacional terá que aplicar uma lei material estrangeira
para solução da lide, o que dificultará o próprio julgamento, já que tal legislação
lhe será desconhecida em seu conteúdo, hermenêutica e vigência,
necessitando as partes lhe proverem de provas do seu texto e vigência (art. 14
LICC). Além disso, as partes terão dificuldades de apresentarem as provas dos
fatos ocorridos no estrangeiro, pois, os tribunais pátrios, exemplificativamente,
não admitem provas que a lei brasileira desconheça (art. 13 LICC). Além dos
embaraços mencionados, pode-se acrescentar que nem sempre o juiz nacional
está preparado
87
para conhecer de assuntos de comércio exterior o que
dificultará ainda mais a solução razoável da lide.
Ressalta-se ainda que as considerações anteriores basearam-
se na solução de conflitos decorrentes de contratos internacionais concluídos,
ou seja, com um mínimo de disposições e cláusulas essenciais, documentação
etc, e mesmo assim, diversas são as peculiaridades e dificuldades.
Porém, o presente estudo trata da fase de formação dos
contratos internacionais, muitas vezes sem instrumentos jurídicos escritos, o
que torna a situação ainda mais complexa pela ausência ou deficiência do que
as partes pretendiam e das obrigações de cada uma. Não um acordo de
vontades formado, mas sim o rompimento de suas tratativas. A interpretação
do que pode ou não ser caracterizado como obrigação durante as negociações
preliminares, dano a ser reparado e o valor de sua fixação, podem variar muito
de Estado para Estado, de julgador para julgador.
86
Melissa Furlan (2004, p. 103) esclarece que quando um país declara-se competente para
julgar um dado litígio, são as leis desse país que irão reger todo o processo, seus aspectos
formais, procedimentais, pois a organização judiciária desse Estado deve ser respeitada,
mesmo que os aspectos de direito material desse litígio sejam regidos por lei diversa da
daquele país”.
87
As rápidas e qualificadas soluções de controvérsias exigidas pelas relações empresariais
internacionais, muitas vezes, são incompatíveis com a rotina árdua e volumosa de trabalho do
Poder Judiciário, pois o juiz nacional não é preparado durante sua carreira a identificar
elementos de conexão, lei aplicável, julgar provas em língua estrangeira e interpretar termos
técnicos próprios do comércio internacional.
98
No entanto, essa insegurança jurídica geralmente é sanada na
prática internacional por meio da escolha da arbitragem
88
como método de
solução de conflitos. Nesse sentido, José Maria Rossani Garcez (1999, p. 147)
esclarece que
[...] o comércio internacional vem, ao longo do tempo,
buscando e aperfeiçoando fórmulas alternativas, confiáveis e
mais rápidas, para a solução dos conflitos contratuais que os
façam escapar, em princípio, do congestionamento endêmico
das estruturas judiciárias dos Estados. Assim, nos contratos
internacionais, é conveniente e comum prever-se a solução
extrajudicial de disputas mediante métodos de mediação,
conciliação ou arbitragem.
Por todo o exposto é que, em âmbito das relações
empresariais internacionais opta-se pela exclusão de autoridades judiciárias
estatais e se busca o amparo das soluções extrajudiciais também sustentadas
pelo direito e com maior autonomia para as partes, atentando-se para a
convergência do local de eleição, lei aplicável e língua para facilitar a instrução
do processo.
3.1.2. Soluções Extrajudiciais
uma vasta gama de métodos alternativos ou extrajudiciais
de solução de conflitos, mas os mais utilizados são a negociação direta, a
mediação, a conciliação e a arbitragem, sendo os três primeiros
autocompositivos e o último heterocompositivo.
Lato sensu, a negociação divide-se em negociação direta,
mediação e conciliação. A negociação direta
89
é o método pelo qual as próprias
partes, sem intervenção de terceiros, e opcionalmente assistidas por seus
advogados, tentam solucionar os conflitos existentes em um clima de
88
Contudo, necessário alertar que a inserção de uma cláusula de eleição de foro não exclui a
arbitragem, pois, em alguns casos, mesmo devendo a solução ser dada por um árbitro, pode o
Judiciário ser chamado a auxiliar, seja para a elaboração da convenção arbitral, seja durante o
procedimento arbitral, como designação de oitiva de testemunha, concessão de cautelares etc.
89
A negociação direta ou a autocomposição caracteriza-se pela solução da controvérsia pelas
próprias partes, sem a intervenção de pessoa estranha. Cada uma delas renuncia aos
interesses ou a parte deles, concretizando-se pela desistência, transação ou pelo
reconhecimento, por parte da demandada da procedência do pedido, com o que se obtêm o
acordo, pondo fim ao litígio” (SZKLAROWSKY, 2006, p. 110).
99
cooperação, buscando a satisfação de suas necessidades. É o todo mais
usual e informal, pois faz parte do quotidiano das relações empresariais tanto
pela vantagem de ter custo ínfimo quanto por possibilitar a continuidade do
clima dos negócios. Porém, quando não é suficiente para solucionar a
controvérsia, recorre-se a outros métodos, seja judicial ou extrajudicial.
A mediação e a conciliação são formas de negociação
autocompositiva, pois as partes resolvem suas controvérsias com o auxílio de
um terceiro, mas não com a sua decisão final.
Moore (1998, p. 28) define mediação como
[...] interferência em uma negociação ou em um conflito de uma
terceira parte aceitável, tendo um poder de decisão limitado ou
não-autoritário, e que ajuda as partes envolvidas a chegarem
voluntariamente a um acordo, mutuamente aceitável com
relação às questões em disputa”.
Para Luiz Olavo Baptista (apud SANTOS, R. 2004, p. 19)
A mediação tem vantagens, porque ela faculta lidar com tudo
aquilo que está subjacente à disputa. Permite que as pessoas
criem um sentido de aceitação, sentindo que a decisão a que
chegaram foi própria, e não imposta de fora para dentro. Tem,
portanto, uma tendência de mitigar e eliminar as tensões,
criando compreensão e confiança entre os litigantes, evitando a
amargura que se segue a uma decisão judicial, para o vencido
e, muitas vezes, também para o vencedor.
Assim, as partes não atuam como adversárias, mas como
parceiras que por meio da sua vontade comum resolvem o conflito com o apoio
do mediador que empenha seu trabalho em obter o acordo ou aproximar as
partes. Esse terceiro necessitará conquistar a confiança das partes para que
lhes possa demonstrar “as vantagens e importância de buscarem uma decisão
construída, visando colocar fim no conflito instaurado” (SANTOS, R. 2004, p.
17). O mediador intervém a fim de
[...] alterar o poder e a dinâmica social do relacionamento
conflituoso, influenciando as crenças ou os comportamentos
das partes individuais, proporcionando conhecimento ou
informação, ou usando um processo de negociação mais
eficiente e, assim ajudando os participantes a resolverem
questões contestadas (MOORE, 1998, p. 28).
Dessa forma, Garcez (2003, p. 220) explica que o mediador
aproxima as partes com vistas a uma solução consensual e a conciliação
representa um passo além, em que o conciliador age com o intuito de estimular
as partes em direção à obtenção do acordo.
100
Ou seja, a conciliação é um acordo de vontade entre as
partes, obtido com o auxílio do terceiro conciliador - que propõe a solução
considerando os argumentos de ambas as partes, isto é, o conciliador terá um
papel mais interventor que o mediador porque fará a sugestão da proposição
de acordo, ainda que não seja obrigatória como na arbitragem.
Ricardo Soares Stersi dos Santos (2004, p. 20) chama a
atenção para o fato de que dependendo da condução da conciliação podem
persistir animosidades entre os envolvidos que na busca de convencê-los a
conciliar, o conciliador acaba se concentrando no objeto da disputa e não nos
motivos que geraram a controvérsia, podendo dessa forma, possibilitar
eventuais tensões futuras, o que diferencia esse método da mediação que
busca uma solução duradoura.
Para César Fiuza (1995, p. 56) “[...] a conciliação é processo
pelo qual o conciliador tenta fazer que as partes evitem ou desistam da
jurisdição, encontrando denominador comum, quer pela renúncia, quer pela
submissão ou transação”.
Carlos Alberto Carmona (1998, p. 45) ensina que
Embora não se confundam arbitragem, conciliação e mediação
o objetivo da primeira é a obtenção de uma solução imposta
por um terceiro imparcial, enquanto as duas últimas visam à
celebração de um acordo - , convém lembrar que existem hoje,
graças à popularidade que vêm alcançando os meios
alternativos de solução de controvérsias, variações que devem
ser levadas em consideração no momento de escolher o
mecanismo que mais convenha aos litigantes para a solução
de seus conflitos. Assim, especificamente quanto à arbitragem,
três variações vêm sendo empregadas com sucesso: a
primeira, denominada med/arb, leva os litigantes a estabelecer
as premissas para uma mediação que, não produzindo
resultados, autoriza o mediador a agir como árbitro e proferir
uma decisão vinculante; a segunda, conhecida como high-low
arbitration, procura reduzir os riscos de um laudo inaceitável,
estabelecendo as partes, previamente, limites mínimo e
máximo para a autoridade do árbitro, a terceira variação leva
as partes a optarem por uma arbitragem não vinculante, ou
seja, se a decisão é aceitável para os litigantes, eles a
cumprirão; em caso contrário, poderão utilizar o laudo em suas
negociações futuras.
Observa-se que enquanto na mediação e na conciliação as
partes resolvem o conflito apenas com o auxílio do terceiro; na arbitragem, as
partes se submetem ao árbitro para que ele o resolva, admitindo que o terceiro
escolhido resolva de forma definitiva e obrigatória o conflito.
101
3.2.
A
RBITRAGEM
C
OMERCIAL
I
NTERNACIONAL
A arbitragem é método de administração de conflito
extrajudicial porque afasta a jurisdição estatal e é heterocompositiva porque há
o envolvimento de um ou vários árbitros
90
que ditarão de forma obrigatória a
solução do conflito que lhes foi confiado pelas partes em decorrência da
liberdade contratual que possuem, presumindo-se que as partes cumprirão
voluntariamente a resolução dada pelo árbitro em decorrência do princípio da
boa-fé objetiva e da confiança que depositaram nele ao escolhê-lo.
Estatisticamente, José Maria Rossani Garcez (2000, p. 348)
informa que
[...] a arbitragem, sobretudo a internacional, é hoje reconhecida
mundialmente como o método empregado para solução de
80% ou mais dos conflitos oriundos dos contratos
internacionais. Em alguns deles como os contratos da indústria
do petróleo, dos transportes marítimos e das construções de
complexos industriais este nível aproxima-se de 100%.
Irineu Strenger (1996a, p. 68) traz a resposta de Serge Lazareff
ao seguinte questionamento: “Por que recorrer à arbitragem?”. A resposta
considera não somente o mundo do direito, mas sim o mundo dos negócios, é
a possibilidade de escolher alguém com expertise em comércio internacional
que move as pessoas a buscarem a arbitragem:
É que queremos ser julgados por qualquer um que não é
somente ativista do direito, mas que conhece além disso, os
negócios, suas leis, seus usos, pois a moral do comércio
existe. É diferente da moral tout court. E é certo que não se
pode realizar grandes contratos, grandes negócios, aplicando
regras muito estritas.
Assim, conclui-se que o objeto da arbitragem comercial
internacional possui natureza mercantil como dispõe o art. da Convenção do
Panamá, mas que pode ser contratual ou não, segundo o art. 2º, §1º da
Convenção de Nova Iorque e art. 7º da Lei da UNCITRAL.
Por sua natureza mercantil e por se tratar de um contrato, os
requisitos de validade da convenção de arbitragem dependerão do
ordenamento jurídico de cada Estado, mas dentre os mais comuns estão a
90
Observado o número ímpar. Importante ressaltar que quanto maior o número de árbitros,
mais cara será a arbitragem.
102
forma escrita, a capacidade civil e o consentimento das partes, licitude do
objeto e a arbitralidade, ou seja, quais matérias podem ser objeto de
arbitragem, estando no Brasil delimitada a direitos patrimoniais disponíveis
91
conforme art. 1º da Lei 9.307/96.
A arbitragem comercial pode ser utilizada quando os direitos
envolvidos são disponíveis
92
e patrimoniais
93
. Tânia Lobo Muniz (2005, p. 117)
explica que a expressão direito patrimonial disponível “alcança todos os direitos
ou bens que compõem o patrimônio das partes, os quais eles têm a
possibilidade de dispor livremente, de acordo com suas vontades”, uma vez
que disponíveis se refere à livre disposição em negócio jurídico.
Carlos Alberto Carmona (1998, p. 48), ao dissertar sobre o
tema, defende que
[...] são arbitráveis, portanto, as causas que tratem de matérias
a respeito das quais o Estado não crie reserva específica por
conta do resguardo dos interesses fundamentais da
coletividade, e desde que as partes possam livremente dispor
acerca do bem sobre que controvertem. Pode-se continuar a
dizer, apesar da mudança da lei, que são arbitráveis as
controvérsias a cujo respeito os litigantes podem transigir.
Quanto à denominação internacional significa que o seu objeto
é a arbitragem que apresenta conexão com dois ou mais sistemas jurídicos. No
entanto, para algumas legislações, como a brasileira, não importa a
internacionalidade da arbitragem, mas sim o local de seu proferimento para
determinar se é nacional ou estrangeira e assim, se necessitará ou não de
homologação do Superior Tribunal de Justiça para ser cumprida no país.
91
Diz-se que um direito é disponível quando ele pode ser ou não exercido livremente pelo seu
titular, sem que haja norma cogente impondo o cumprimento do preceito, sob pena de nulidade
ou anulabilidade do ato praticado com sua infringência. Assim, são disponíveis (do latim
disponere, dispor, pôr em vários lugares, regular) aqueles bens que podem ser livremente
alienados ou negociados, por encontrarem-se desembaraçados, tendo o alienante plena
capacidade jurídica para tanto”. (CARMONA, 1998, p. 48)
92
“No campo privado a disponibilidade é a possibilidade qualitativa da alienação a qualquer
título, de bens ou direitos individual ou coletivamente titulados. Derivado desta forma de se
dispor livremente de bens ou direitos é que a economia conceitua as disponibilidades
existentes em um acervo patrimonial, pela maior ou menor possibilidade de sua imediata
conversão em valores monetários”. (SALLES, 2000, p. 363)
93
Conforme Marcos Paulo de Almeida Salles (2000, p. 363), o conceito de patrimônio é bem
ilustrado por Sylvio Marcondes e Oscar Barreto Filho que “concluem pela universalidade de
bens e direitos que são passíveis de quantificação monetária e que constituem a garantia dos
credores da pessoa de seu titular”.
103
3.2.1. Conceito e Natureza Jurídica da Arbitragem
Embora a arbitragem seja um instituto conhecido milhares
de anos e inserida na legislação brasileira desde a Constituição de 1824, a
definição da sua natureza jurídica não é fácil, mas por sua relevância,
apresentam-se alguns conceitos.
Arbitragem nas palavras de J. Cretella Junior (1989, p. 12-13) é
o sistema especial de julgamento, com procedimento, técnica e
princípios informativos próprios e com força executória
reconhecido pelo Direito Comum, mas a este subtraído,
mediante o qual duas ou mais pessoas físicas, ou jurídicas, de
Direito Privado ou de Direito Público, em conflito de interesses,
escolhem de comum acordo, contratualmente, uma terceira
pessoa, o árbitro, a quem confiam o papel de resolver-lhes a
pendência, anuindo os litigantes em aceitar a decisão proferida.
René David (Apud SANTOS, R., 2004, p. 24) conceitua
arbitragem como
[...] técnica visando encontrar solução para uma questão, que
interesse à relação de duas ou mais pessoas, por uma ou
muitas outras pessoas o árbitro ou os árbitros -, as quais
retiram seus poderes de uma convenção privada, estatuindo
sobre a base dessa convenção, sem que sejam investidos
dessa missão pelo Estado.
Micaela Barros Barcelos Fernandes (2005. p. 26-27) define
arbitragem
como um instrumento jurídico específico para a solução de
conflitos de interesse, através da intervenção de uma ou mais
pessoas (chamadas de árbitros) que recebem seus poderes
das próprias partes interessadas na solução, através de um
acordo privado, que irá orientar a atuação dos árbitros e todo o
procedimento arbitral, cujo destino será a produção de uma
decisão laudo ou sentença arbitral -, que tem eficácia
mandatória entre as partes.
Tânia Lobo Muniz (2005, p. 40) conceitua-a como
procedimento jurisdicional privado para a solução de conflitos,
instituído com base contratual, mas de força legal, com
procedimento, leis e juízes próprios estabelecidos pelas partes,
e que subtrai o litígio da jurisdição estatal.
Para Carlos Alberto Carmona (1998, p. 27)
A arbitragem é técnica para a solução de controvérsias através
da intervenção de uma ou mais pessoas que recebem seus
poderes de uma convenção privada, decidindo com base nesta
104
convenção sem intervenção do Estado, sendo a decisão
destinada a assumir eficácia de sentença judicial.
Assim, arbitragem é um método de solução de conflitos com
extrema influência dos princípios da autonomia da vontade e da boa-fé
objetiva, uma vez que são as partes capazes civilmente, seja pessoa natural ou
jurídica, de direito público ou privado, que escolhem um ou mais árbitros ou
uma instituição arbitral para decidir a controvérsia futura ou existente, conforme
regras, procedimentos, lei aplicável, sede de arbitragem e língua, de interesse
delas, retirando a competência da jurisdição estatal e concedendo poderes
para que a decisão desse terceiro seja obrigatória e irrecorrível.
Em relação à natureza jurídica da arbitragem, tem-se a divisão
de quatro correntes doutrinárias. A primeira, conhecida como contratualista ou
privatista, defende que sua natureza jurídica está vinculada à convenção de
arbitragem que é um instrumento contratual de submissão de conflitos
presentes ou futuros ao árbitro ou árbitros escolhidos, cujo poder advém da
vontade das partes que não possuem o poder de delegar jurisdição (SANTOS,
R. 2004, p. 32).
Tânia Lobo Muniz (2005, p. 35) resume que
Os contratualistas privilegiam a convenção arbitral, na qual as
partes designam as diretrizes e o conteúdo da arbitragem,
estendendo para o juízo arbitral seus efeitos e retirando o
fundamento da obrigatoriedade do cumprimento da decisão da
própria vontade das partes, não considerando jurisdição por
estar despido o juízo arbitral da “coertio” e da “executio”.
para a corrente publicista ou jurisdicional, o elemento
essencial para conceituação da natureza jurídica da arbitragem é a sentença
que se constitui em prestação jurisdicional delegada ao árbitro pelo Estado e
não oriunda da mera obrigação estabelecida na convenção arbitral (SANTOS,
R. 2004, p. 33).
A corrente mista defende que sua natureza é tanto contratual
quanto jurisdicional, pois tem seu fundamento inicial na convenção arbitral, mas
sua sentença terá natureza pública e jurisdicional, reconhecida pelo Estado
(SANTOS, R. 2004, p. 33)
94
. Tânia Lobo Muniz (2005, p. 39) defende essa
94
Nesse sentido o posicionamento de José Cretella Neto (2004, p. 15-16) “A arbitragem tem
natureza jurídica mista, sui generis, contratual em seu fundmento, e jurisdicional na forma da
solução de litígios e nas conseqüências que provoca no mundo do Direito”.
105
teoria e sintetiza “o direito de opção foi dado ao indivíduo, o poder de dizer o
direito foi entregue ao árbitro, mas o uso da força permaneceu com o Estado”.
Irineu Strenger (1996a, p. 24) também é partidário da natureza
mista: convencional por sua origem e jurisdicional por sua função. O autor
ainda comenta que essas características se encontram na sua conceituação do
instituto:
arbitragem é instância jurisdicional praticada em função de
regime contratualmente estabelecido, para dirimir controvérsias
entre pessoas de direito privado e/ou público, com
procedimentos próprios e força executória perante tribunais
estatais.
Clávio Valença Filho (2000, p. 379-380) defende que a
arbitragem tem natureza híbrida.
Contratual em seus fundamentos, pois os poderes do árbitro
derivam, antes de tudo, de uma convenção de direito privado, a
arbitragem é igualmente jurisdicional em seus resultados, pois
a sentença prolatada pelo árbitro decide efetivamente um litígio
e se encontra equiparada a uma sentença judicial.
Por sua vez, existe uma quarta corrente que defende que a
natureza jurídica da arbitragem é autônoma com o fundamento de que ela se
desenvolve com base em suas próprias e específicas regras que embora
possam ter similaridades com determinados sistemas jurídicos estatais não
estão, necessariamente, vinculados a eles (FERNANDES, 2005, p. 34). Nesse
sentido, o posicionamento de Welber Barral de que “somente a compreensão
da impossibilidade de sua categorização é que permitirá a evolução da
arbitragem, resguardando concomitantemente os interesses coletivos”
(BARRAL, 2000, p. 66-67).
A natureza jurídica mista da arbitragem condiz com os
princípios regentes desse instituto, que são tanto de caráter processual quanto
contratual como se passa a expor.
3.2.2. Principiologia da Arbitragem
A arbitragem é regida por diversos princípios jurídicos, sejam
processuais, constitucionais ou contratuais, a fim de garantir sua identidade,
106
preservar direitos fundamentais dos que a escolhem como método de solução
de conflitos, bem como dar segurança jurídica de que o direito lhe assegurará o
cumprimento de seu resultado.
Anotam-se alguns princípios relacionados à função jurisdicional
da arbitragem, tais como a garantia do devido processo legal, do contraditório e
da ampla defesa, a igualdade das partes, a celeridade, o livre convencimento
do árbitro, sua imparcialidade e o princípio da obrigatoriedade da sentença.
Dentre os princípios da tutela jurisdicional, Selma Lemes (1992,
p. 77) enumera três fundamentais correspondentes ao art. 21, §2º da LA: “(1) o
da imparcialidade
95
do árbitro; (2) o do contraditório e igualdade das partes
96
;
(3) e o da livre convicção do árbitro
97
”.
Tânia Lobo Muniz (2005, p. 74-75) ministra que
Por um lado cabe ao(s) árbitro(s) o dever de respeitar as
partes, garantindo-lhes a posição de iguais, dando
oportunidade a ambas de se manifestarem e se defenderem, e
para tal é necessário que seja imparcial em relação a elas; por
outro lado, tem o direito à liberdade na formação de seu
raciocínio que o levará ao julgamento, não podendo as partes
imporem quaisquer regras ou pressões, que retirem do julgador
essa liberdade, é seu poder-dever de formar livremente seu
convencimento.
O árbitro pode ser qualquer
98
pessoa capaz civilmente, desde
que seja da confiança das partes para desenvolver sua função com
imparcialidade
99
, independência, competência, diligência e discrição
100
, velando
95
“A imparcialidade do árbitro é pressuposto para que o procedimento arbitral se instaure
validamente; o árbitro coloca-se entre as partes mas acima delas, igualando-se à posição do
juiz” (LEMES, 1992, p. 77).
96
“O princípio do contraditório equivale ao princípio da igualdade das partes no procedimento
arbitral. O princípio do contraditório encontra ressonância no aforismo romano audiatur et altera
pars, que equivale ao princípio da audiência bilateral ou do contraditório. O árbitro não pode
decidir sobre uma pretensão sem ouvir a outra parte. Às partes devem ser dadas a mesma
oportunidade para se manifestarem quanto às provas produzidas e documentos juntados pela
outra parte” (LEMES, 1992, p. 80).
97
Segundo Selma Lemes (1992, p. 83) “ao árbitro é permitido o poder de formar sua livre
convicção quanto à verdade apurada no procedimento arbitral. Efetuará livre apreciação das
provas produzidas, dos argumentos trazidos ao Tribunal pelas partes, bem como outras que
julgar oportunas para firmar sua convicção a respeito da demanda”.
98
“As pessoas jurídicas não poderão ser árbitros ante as mutações que podem sofrer seus
órgãos direcionais, incompatíveis com a confiança pessoal que as partes neles depositam.”
(DINIZ, 2005, p. 603).
99
Tânia Lobo Muniz (2005, p. 80) defende que o princípio da imparcialidade do árbitro é um
princípio ético e técnico. “Como princípio ético pauta a atuação do julgado em relação à sua
independência, competência, diligência e discrição, trazendo os casos de suspeição e
impedimento do julgador” e “como princípio técnico vai dar ao procedimento arbitral a
possibilidade de, através do devido processo, chegar à tutela jurídica, conseguindo propiciar
um julgamento justo, dando a cada um o que é de direito”.
107
pela igualdade das partes e reprimindo os atos contrários à lealdade e à
dignidade da justiça, bem como proferindo um laudo arbitral, nacional ou
estrangeiro fundamentado, garantindo-se assim sua homologação e execução,
quando necessárias.
Irineu Strenger (1996a, p. 125-126) enumera os princípios
fundamentais que devem ser respeitados pelos árbitros:
1) princípio audi alteram partem. Trata-se do direito que se
deve atribuir a uma e outra das partes a possibilidade de fazer
valer seus argumentos; 2) princípio do contraditório: as provas
oferecidas por uma das partes e sobre as quais o árbitro vai
fundar sua decisão, devem ser comunicadas à outra parte,
para que tenha possibilidade de, eventualmente, refuta-las; 3)
princípio da auto-convicção: o árbitro deve fundar sua decisão
levando em conta somente o seu próprio convencimento, e não
aquele de um outro.
Ressalta-se que o árbitro possui as mesmas limitações que o
juiz togado no que se refere ao impedimento e suspeição, mas mesmo diante
desses casos, as partes podem optar por ele para decidir a questão,
privilegiando novamente o princípio da autonomia da vontade ao renunciar ao
conflito de interesses. Tal dispositivo está inserido no Princípio Geral nº. 4
101
do
100
“Os árbitros, enquanto exercem suas funções ou atuarem em razão delas, equiparam-se
aos funcionários públicos, no tocante aos efeitos da legislação penal (art. 17), devendo
proceder com imparcialidade, independência, competência, diligência e discrição (§6.º do art.
13)”. (AZEVEDO, 1998, p. 19)
101
Princípio 4 - Renúncia pelas Partes. (a) Se, dentro de 30 dias após o recebimento de
qualquer divulgação realizada pelo árbitro ou após uma parte tomar conhecimento de fatos ou
circunstâncias que possam implicar um potencial conflito de interesses em relação a
determinado árbitro, tal parte não apresentar objeção expressa ao árbitro em questão,
observados os parágrafos (b) e (c) deste Princípio Geral, ficará caracterizada a renúncia tácita
de tal parte a eventual conflito de interesses que pudesse afetar o árbitro em função dos
aludidos fatos ou circunstâncias, não podendo a parte suscitar qualquer objeção com base em
tais fatos ou circunstâncias em um estágio posterior. (b) Entretanto, se houver fatos ou
circunstâncias conforme descrito no Princípio Geral 2 (d), a renúncia por uma parte ou a
anuência das partes em manter tal pessoa como árbitro serão consideradas inválidas. (c) Uma
pessoa não deve atuar como árbitro quando existir um conflito de interesses, tal como
exemplificado na Lista Vermelha de eventos renunciáveis. Entretanto, tal pessoa poderá aceitar
sua nomeação como árbitro ou continuar a agir como tal, se preenchidas as seguintes
condições: (i) todas as partes, todos os árbitros e a instituição arbitral ou outra autoridade
responsável pela nomeação (se houver) devem estar plenamente cientes do conflito de
interesses; e (ii) todas as partes devem expressamente reconhecer que tal pessoa poderá
atuar como árbitro a despeito do conflito de interesses. (d) O árbitro pode auxiliar as partes a
comporem-se amigavelmente em qualquer estágio do procedimento arbitral. Antes de assim
proceder, no entanto, o árbitro deve obter o consentimento expresso das partes de que tal
prática o o impedirá de continuar atuando como tal. Esse consentimento expresso será
considerado uma renúncia efetiva a eventual conflito de interesses que possa advir da
participação do árbitro em tal processo, ou das informações a que o árbitro possa ter acesso
durante o curso de tal assistência. Se a assistência prestada pelo árbitro não resultar em um
acordo definitivo para a demanda, a renúncia acima permanece vinculativa em relação às
108
Código de Ética para Árbitros Internacionais organizado pela Comissão de
Arbitragem e Mecanismos Alternativos de Solução de Controvérsias
(Alternative Dispute Resolution - ADR) da International Bar Association - IBA.
Em conclusão, Tânia Lobo Muniz (2005, p. 75) sintetiza:
[...] para que o procedimento arbitral seja válido e eficaz devem
as partes, no desenvolvimento da relação processual, respeitar
e garantir o devido processo legal para se chegar à tutela
jurídica efetiva. E, para tal, é necessário que prevaleçam os
princípios da garantia processual, cujo desrespeito ocasiona a
nulidade da sentença arbitral.
Relevante ainda destacar outro princípio norteador da
arbitragem que contribui para sua efetividade, qual seja, o princípio da
obrigatoriedade da sentença. Esse princípio deve ser respeitado para que não
lhe falte estabilidade e segurança. Sem obrigatoriedade a arbitragem seria
utilizada como método protelatório e se tornaria um verdadeiro empecilho à
justiça, quando na verdade pretende ser célere e eficaz (MUNIZ, 2005, p. 81).
na seara dos princípios ligados à função contratual tem-se a
autonomia da vontade e a boa-fé objetiva. São esses princípios que se
sobressaem no presente estudo, tendo em vista o âmbito de formação dos
contratos internacionais.
Tânia Lobo Muniz (2005, p. 66) ressalta que “tendo a
arbitragem natureza em parte contratual, predomina a autonomia da vontade,
que se constitui na essência do instituto”. Selma Lemes (1992, p. 83) ensina
que o esse princípio é a essência do juízo arbitral, desde a faculdade de dispor
desse meio de solução de controvérsias até os procedimentos que o regerão.
Para José de Albuquerque Rocha (2008, p. 5)
[...] a estrutura da arbitragem funda-se essencialmente na
liberdade dos indivíduos, pois, em sua base, estão dois
contratos que, como sabemos, são, até por definição, a
expressão da liberdade individual: um contrato entre as partes
litigantes pelo qual escolhem a arbitragem como forma de
solução do conflito; e outro, entre os litigantes de um lado e o
árbitro do outro, tendo por objeto a obrigação deste de decidir o
conflito em nome e por mandado das partes. Portanto, a
liberdade das partes é o elemento nuclear da arbitragem,
estando presente em três momentos essenciais de sua
estrutura: primeiro, na liberdade de escolher a arbitragem como
partes. Entretanto, em consonância com o Princípio Geral 2 (a) e o obstante tal acordo, o
árbitro apresentará sua renúncia se, em conseqüência de seu envolvimento no processo de
acordo, surgirem-lhe dúvidas quanto à sua capacidade de permanecer imparcial ou
independente no curso futuro do procedimento arbitral.
109
forma de solução do conflito; segundo, na liberdade de
escolher o árbitro; terceiro, na liberdade de estipular o
conteúdo dos contratos, isto é, regular todos os aspectos
relevantes da arbitragem, tais como: a escolha das questões a
serem decididas pelo árbitro, pois nem sempre as partes têm
interesse de submeterem à decisão todas as questões que
compõem o conflito; o procedimento a ser observado pelo
árbitro; o critério de julgamento, isto é, o critério em função do
qual o árbitro decidirá, se com base no direito em geral, ou em
um certo setor do direito, ou nos usos e costumes, ou nos
princípios gerais, ou na equidade, ou nas regras internacionais
do comércio etc.
Nesse sentido, Selma Lemes (1992, p. 84) conclui que
as partes têm a liberdade de institui-la ou não; de convencionar
livremente com a outra parte as regras aplicáveis ao
procedimento arbitral, lei aplicável (quando for o caso), escolha
e número de árbitros, local da arbitragem, concessão para
resolver por equidade, enfim, limitadas apenas às leis
imperativas e preceitos de ordem pública, que deve ser
observados para garantir a validade e executoriedade do laudo
arbitral, tanto para as arbitragens domésticas como
internacionais.
Assim, especificamente, a Lei 9.307/96 traz em seu bojo (art.
2º, §§1º e 2º) a previsão de que as partes podem escolher livremente as regras
de direito que serão aplicadas na arbitragem, podendo convencionar que se
realize com base nos princípios gerais do direito, nos usos e costumes e nas
regras internacionais do comércio.
Nesse aspecto, discute-se se tal autonomia se refere às
normas materiais e processuais ou se será restrita a alguma delas.
Carlos Alberto Carmona (1998, p. 27) posiciona-se favorável a
ampla liberdade de escolha do direito material e processual a ser aplicado na
arbitragem.
Segundo a nova lei, as partes têm liberdade de escolher o
direito material (material e processual) aplicável à solução da
controvérsia, podendo optar pela decisão por equidade ou
ainda fazer decidir o litígio com base nos princípios gerais de
direito, nos usos e costumes e nas regras internacionais do
comércio.
O jurista continua em sua tese:
Em sede de arbitragem, porém, muitos problemas são
resolvidos com a expressa escolha da lei aplicável pelas
próprias partes, de tal sorte que o árbitro não terá que recorrer
às regras de conflitos de leis para estabelecer a norma que
regerá o caso concreto. Faz-se mister frisar que as “regras de
direito” a que se refere o art. 2º, §1º, são tanto de direito
material quanto processual: nada impede que as partes criem
110
regras processuais específicas para solucionar o litígio,
reportem-se às regras de um órgão arbitral institucional ou
ainda adotem as regras procedimentais de um código de
processo civil estrangeiro. (CARMONA, 1998, p. 28)
Maristela Basso (2000, p. 313)
possui uma interpretação
mais restritiva do art. 2º, §1º da LA, observando que:
Acreditamos que o legislador está se referindo apenas às
regras de direito material, substancial, caso contrário, parece-
nos que haveria confronto com o art. 16 da LICC: “Quando, nos
termos dos artigos precedentes, se houver de aplicar a lei
estrangeira, ter-se-á em vista a disposição desta, sem
considerar-se qualquer remissão por ela feita a outra lei”.
Assim, quando as regras de procedimento da arbitragem não
forem suficientes e o árbitro ou árbitros, tenham que recorrer,
subsidiariamente, à legislação processual, essa deverá ser a
do local da sede da arbitragem.
Esse questionamento acerca da lei aplicável à arbitragem e a
autonomia da vontade das partes leva a reflexão da relação existente entre a
Lei de Arbitragem e a Lei de Introdução ao Código Civil novamente. Assim,
para alguns as leis convivem harmoniosamente, que no caso específico da
arbitragem, a Lei 9.307/96 prevalece sobre a LICC, enquanto que, quando não
houver disposição de arbitragem aplicam-se as regras de conflitos previstas na
LICC.
Não se deve ver aí nenhuma anomalia: a lei de arbitragem, que
preconiza maior autonomia da vontade das partes, supera a
rigidez do diploma de 1942, derrogando-o no que diz respeito
às causas submetidas ao juízo arbitral. Por conseqüência,
enquanto o juiz togado estará atado pelos preceitos do
Decreto-lei 4.657/42, o árbitro poderá ter outros parâmetros
para julgar. E é conveniente que assim seja, pois não são
poucos os contratos celebrados entre brasileiros no exterior (ou
entre brasileiro e estrangeiro, no exterior) para execução no
Brasil, de tal sorte que a aplicação de Lei de Introdução exigiria
a aplicação de lei estrangeira para reger o contrato, o que
talvez (rectius, muito provavelmente!) contrarie a vontade dos
contratantes. De outra parte, o dispositivo servirá para
tranqüilizar os estrangeiros que vierem a contratar no Brasil:
poderão, eles, também, evitar a aplicação da lei brasileira (que
quiçá não conheçam), apontando desde logo a lei material que
será empregada para qualificar e reger as obrigações que aqui
assumirem (e que talvez nem digam respeito a prestações que
devam ser aqui executadas). Tudo isso, é claro, está limitado
pelos princípios da ordem púbica e dos bons costumes, de
sorte a evitar que a escolha da lei a ser aplicada pelo árbitro
possa dar ensejo a fraudes e falcatruas, como temem os mais
conservadores. (CARMONA, 1998, p. 63)
111
Para Maristela Basso (2000, p. 313), no entanto, é preciso ter
cuidado para que não haja dificuldade de executar a sentença arbitral
estrangeira no Brasil.
Frente à imprecisão do dispositivo, recomenda-se que as
partes se pretenderem ver executada uma sentença arbitral
estrangeira no Brasil não violem, na escolha da lei ou “das
regras de direito a serem aplicadas na arbitragem”, as normas
constantes da Lei de Introdução ao Código Civil brasileiro
LICC, em especial seu art. 9º.”
Observa-se, portanto, que a matéria dos reflexos da autonomia
da vontade é bastante controvertida, mas de extrema importância prática para
a arbitragem.
Nesse sentido, Tânia Lobo Muniz (2005, p. 69) informa que
Tal princípio manifesta-se, na arbitragem, pela liberdade que
tem o indivíduo de extinguir o litígio surgido, por ato de sua
própria vontade, dentro dos casos permitidos e dos limites
estabelecidos pela lei. A aplicação do princípio inclui a
liberdade de escolher as diversas leis para reger o contrato,
inserir as chamadas cláusulas de estabilização, excluir ou
afastar, qualquer direito nacional e escolher as normas
aplicáveis (boa-fé, equidade, princípios gerais de direito, Lex
Mercatoria, ou cláusulas de escolha negativa total ou parcial de
certo direito estatal).
Segundo Fabio Morosini (2006, p. 69) a autonomia da vontade
traz como vantagens “a flexibilização das regras de conflito de leis, a
previsibilidade e consequente segurança jurídica”.
Carlos Alberto Carmona (1998, p. 61) ainda conclui
Resta claro que as partes podem escolher a via arbitral não
apenas para evitar a solução judicial dos conflitos, mas
especialmente para poderem selecionar a lei material aplicável
na eventualidade de litígio, o que é especialmente importante
no campo do comércio internacional.
No que se refere ao princípio da boa-fé objetiva
102
, sua
relevância se explicita em vários planos, seja na interpretação da cláusula
compromissória e do modelo jurídico, bem como no cumprimento
103
da
sentença arbitral pelas partes de forma voluntária, o que ocorre em sua
maioria.
102
Cabe ainda ressaltar que esse princípio es previsto no art. 2º, §1º da Lei Modelo da
UNCITRAL.
103
“A grande maioria das obrigações do comércio internacional utiliza-se da arbitragem, do
tribunal arbitral para solucionar amigavelmente suas dissenções. A escolha dos árbitros é
também domínio da autonomia das vontades. Importante, assim, a boa-fé das partes, inclusive
para aceitação do laudo arbitral que lhes é vinculativo”. (NAZO, 1986, p. 148)
112
A Câmara de Comércio Internacional (CCI) tem proferido
importantes decisões baseadas no princípio da boa-fé objetiva. Nesse sentido,
Maristela Basso (2000, p. 311) descreve algumas:
Na primeira delas, de n. 2.291, de 1975, proferida em
arbitragem sediada em Bruxelas, ficou decidido que as partes
devem estar perfeitamente conscientes de que somente “uma
colaboração leal, total e constante entre elas pode
eventualmente permitir a solução de numerosos problemas
resultantes da extrema complexidade de formulações e
confusões de contratos litigiosos”. É, em outras palavras, a
“obrigação de cooperação” que a doutrina moderna encontra
na boa-fé e que deve governar a execução de todas as
convenções.
Na segunda decisão arbitral, de n. 2.508, de 1976, em
Genebra, entendeu-se que as partes tem o “dever de minimizar
seus prejuízos”, e que “aquele que causa prejuízo (dano) por
ocasião de uma negociação, faltando com seus deveres de
diligência ou com os ditados pela boa-fé ou pela equidade,
deve reparar o dano”. E isso “vale tanto para as negociações
que visam o contrato propriamente dito, quanto, por exemplo,
para uma transação para resolver um litígio”.
A fim de se compreender melhor o instituto da arbitragem,
serão ainda analisadas suas modalidades.
3.2.3. Modalidades de Arbitragem
várias modalidades e classificações possíveis de
arbitragem. No entanto, elege-se tratar de algumas nesse tópico visando o
conhecimento do instituto para a avaliação de sua aplicação nas negociações
preliminares.
A primeira classificação atém-se à vontade das partes que
pode ser voluntária ou obrigatória. A voluntária ou facultativa é fundada na
vontade livre das partes de elegerem esse meio de solução para seus conflitos,
enquanto a obrigatória fundamenta-se na imposição legal de seu uso, sendo
bastante rara e não prevista no ordenamento jurídico brasileiro, uma vez que
viola os princípios da garantia de acesso ao Poder Judiciário prevista no art. 5º,
XXXV, da Constituição Federal
104
e a autonomia da vontade. Dessa maneira, a
104
Art. 5º, XXXV, da Constituição Federal: a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário
113
voluntária é a forma corrente nas negociações preliminares por se tratar de
opção de eficácia e segurança para os negociadores.
Quanto ao procedimento
105
, tem-se a ad hoc e a institucional,
pois as partes podem optar por elegerem ad hoc um ou mais árbitros para
resolverem seus conflitos mediante as regras de procedimento e de direito por
eles criadas ou escolhidas dentro dos limites impostos pela ordem jurídica
estatal onde ocorrerá; ou uma instituição arbitral pública ou privada, nacional
ou internacional, com regras e procedimentos próprios, pré-definidos em um
estatuto ou regulamento, com uma lista de árbitros anteriormente eleitos para a
solução dos conflitos a ela levados.
Welber Barral (2000, p. 75) informa que a arbitragem ad hoc
possibilita às partes uma maior gama de escolhas quanto às regras e
procedimento e um custo mais baixo por não ter que se pagar nenhuma taxa
de administração a uma instituição. Mas por outro lado, sua desvantagem é
que se houver vidas ou lacunas no momento do litígio, as partes dificilmente
alcançarão um acordo quanto ao procedimento a ser utilizado, sendo esse o
motivo da preferência pelas instituições arbitrais renomadas
106
, apesar de seus
custos.
Os tribunais arbitrais institucionalizados têm a seu favor a
experiência na realização de julgamento e a confiabilidade na
sua imparcialidade. Outro aspecto importante é a
independência da vontade das partes para sua constituição;
basta que tenha havido a opção, na contratação, pela atuação
do órgão. Eles atuam auxiliando as partes a superarem as
dificuldades na instituição do juízo arbitral, organizando,
facilitando o acesso a árbitros, estabelecendo normas
procedimentais próprias e administrando os procedimentos até
a entrega da sentença (MUNIZ, 2005, p. 162).
Os negociadores, ao optarem por alguma modalidade deve
considerar a especialidade e reputação dos árbitros, tanto ad hoc, quanto pela
lista de árbitros da instituição arbitral, os sistemas jurídicos envolvidos, a
novidade e complexidade dos conflitos que poderão surgir.
lesão ou ameaça a direito.
105
“Dando ampla liberdade aos interessados, possibilita a mesma lei que a arbitragem obedeça
ao procedimento por eles estabelecido em sua convenção arbitral. Podem as partes reportar-se
às regras de um órgão arbitral institucional ou entidade especializada ou, ainda, delegar ao
próprio árbitro ou tribunal arbitral a regulamentação do procedimento”. (AZEVEDO, 1998, p. 19)
106
Atualmente diversas câmaras internacionais de renome e com grande atuação, dentre
elas, a Câmara de Comércio Internacional de Paris (CCI), a American Arbitration Association
(AAA), a Comissão Interamericana de Arbitragem Comercial (CIAC), a London Court of
International Arbitration etc.
114
A arbitragem ainda pode ser de direito ou de equidade, a
critério das partes (art. 2º, caput, Lei 9.307/96), sendo que na primeira o árbitro
está vinculado a decidir com fundamento em normas de direito positivo que
podem ser escolhidas pelas partes, por ele ou indicadas pela ordem jurídica
aplicável; e a segunda lhe dá um poder subjetivo bastante relevante, que
poderá decidir conforme seu sentimento do que é justo e correto naquele caso
concreto, sendo facultativo o uso do direito positivo, necessitando, por isso, da
expressa concordância de todas as partes envolvidas.
Quanto à nacionalidade, a arbitragem pode ser nacional,
internacional
107
ou estrangeira e sua diferenciação não é pacífica, mesmo
porque nem todas as legislações as distinguem, como é o caso da lei brasileira
que optou pelo sistema monista.
João Bosco Lee (2002, p. 39-40) explica que “dois são os
critérios para definir a internacionalidade da arbitragem: o critério jurídico ou
objetivo e o critério econômico”. O jurídico seria aquele ligado aos elementos
de conexão que identificam se o contrato é internacional e o critério econômico
dependeria do fluxo e refluxo de bens e serviços através das fronteiras. Para
ele, o melhor critério é o misto, ou seja, “a arbitragem será internacional
quando uma das partes residir ou tiver o seu estabelecimento no estrangeiro,
ou se o litígio puser em jogo os interesses do comércio internacional” (2002, p.
44).
Guido Soares (1989, p. 32) ministra que a arbitragem nacional
é aquela que ocorre dentro de um determinado Estado, instaurada por partes e
árbitros nacionais ou ali domiciliados com regras de procedimentos e materiais
fixadas pela ordem jurídica interna e cuja sentença arbitral seja passível de
execução nesse Estado.
Por sua vez, são parâmetros da arbitragem internacional para
Irineu Strenger (1996a, p. 21-23):
[...] a nacionalidade distinta das partes, o fato do lugar da
arbitragem estabelecido pelas partes na convenção de
arbitragem situar-se em Estado diverso do da nacionalidade
das partes; a existência de lugar diverso do da nacionalidade
das partes para a execução de parte substancial das
107
“É “internacional” a arbitragem que se destina a gerar efeitos em duas ou mais ordens
jurídicas (Estados) ao mesmo tempo, por razão de domicílio das partes, sede das empresas,
localização do contrato objeto de análise etc.” (BASSO, 2000, p. 308).
115
obrigações decorrentes da relação contratual celebrada; a
existência de estreita conexão do objeto do litígio com lugar
diverso do da nacionalidade das partes e a existência de
acordo entre as partes, declarando que o objeto da convenção
de arbitragem tem conexão com a ordem jurídica de mais de
um Estado.
Clávio Valença Filho (2000, p. 380) explica que os poderes dos
árbitros derivam da convenção de arbitragem concluída pelas partes e pelo
receptum arbitri, onde o árbitro aceita a missão jurisdicional outorgada pelas
partes e toda vez que essa dupla convenção de direito privado apresentar
relevantes elementos de estraneidade estar-se-á submetido ao regime dos
contratos internacionais, logo, do direito internacional privado, suas regras de
conflito e seus elementos de conexão.
A Lei Modelo da UNCITRAL em seu art. 1º, §3º, estabelece
que a arbitragem é internacional quando
a) as partes de uma convenção de arbitragem têm, no
momento da celebração desse acordo, seus estabelecimentos
em Estados diferentes; b) um dos lugares seguintes está fora
do Estado em que as partes tenham seus estabelecimentos: i)
o lugar da arbitragem se foi determinado no acordo de
arbitragem ou em conformidade ao acordo de arbitragem ou ii)
o lugar do cumprimento de uma parte substancial das
obrigações da relação comercial ou o lugar com o qual o objeto
do litígio tenha uma relação mais estreita; c) as partes tiverem
expressamente convencionado que o objeto da Convenção de
Arbitragem está relacionada com mais de um Estado.
a lei brasileira em seu art. 34, parágrafo único, determina
que sentença arbitral estrangeira é aquela proferida fora do território nacional,
ou seja, a lei pátria não distingue a sentença nacional da internacional, pois
deixa esse critério para a autonomia da vontade das partes, preocupando-se
com o critério da territorialidade da prolação da sentença.
João Bosco Lee (2002, p. 39) critica essa opção legislativa
brasileira:
Ao unificar a arbitragem interna/internacional num mesmo
diploma legal, a Lei 9.307/96 submete a arbitragem
internacional a regras restritivas e arcaicas, fundamentadas na
prática judiciária e, por conseqüência, ignora questões
essenciais da arbitragem comercial internacional.
E por último, quanto às pessoas envolvidas, a arbitragem
pública e a privada, que se distinguem em relação aos seus sujeitos e fontes
normativas. Se os sujeitos de direito internacional público Estados e
116
organizações internacionais intergovernamentais estiverem exercendo seu
direito de império, independentemente do envolvimento de particulares tratar-
se-á de arbitragem pública que dependerá da liberdade de submissão deles.
Porém, se a relação for negocial, independente de envolver entes privados ou
sujeitos de direito internacional público tratar-se-á de arbitragem privada sujeita
às normas predefinidas por eles e necessita de incorporação ao
ordenamento interno se for internacional.
No âmbito do presente estudo, pode-se dizer que as
modalidades mais abordadas ou que aqui servem de referência são: i) a
facultativa que prima pela autonomia da vontade; ii) a institucional por ser a
mais comum e trazer maior segurança no contexto negocial internacional,
possibilitando que diante do caso concreto sejam eleitos árbitros especialistas
naquele determinado conflito; iii) a de direito pela segurança de se escolher
uma lei aplicável ao caso, sendo a de equidade mais subjetiva e rara; iv)
internacional por envolver dois ou mais sistemas jurídicos e v) privada.
3.3.
C
ONVENÇÃO DE
A
RBITRAGEM
:
C
LÁUSULA
C
OMPROMISSÓRIA E
C
OMPROMISSO
A
RBITRAL
A convenção de arbitragem é o acordo anterior ou posterior ao
conflito, onde as partes definem as regras que regerão a relação existente
entre elas e o árbitro. Se o a opção for anterior estar-se-á diante de uma
cláusula compromissória e se posterior, de um compromisso arbitral.
Para Ricardo Soares Stersi dos Santos (2004, p. 42)
A convenção de arbitragem pode ser definida como um acordo
de vontade, estabelecido por partes capazes, via de regra por
escrito, assumindo o compromisso de que os litígios presentes
ou futuros, oriundos das relações contratuais ou
extracontratuais venham a ser dirimidos através da arbitragem.
Assim, por convenção de arbitragem entende-se, segundo a lei
brasileira em seu art. 3º, tanto o compromisso arbitral quanto a cláusula
compromissória. A adoção de qualquer um deles tem o condão de excluir a
jurisdição estatal e de extinguir um processo judicial sem resolução de rito
117
(art. 267, VII, CPC) podendo ser arguido como preliminar de defesa pelo réu
(art. 301, IX, CPC). Dessa forma, a cláusula compromissória pode sofrer
execução específica a fim de ser exigido seu cumprimento diante do Poder
Judiciário nacional.
Pela convenção arbitral possuir natureza mista, ou seja,
contratual em sua essência, sua validade dependerá dos requisitos essenciais
aos contratos, como a capacidade das partes, livre manifestação de vontade
que deve ser expressa, com objeto lícito e forma não defesa ou prescrita em
lei, o que exige que seja firmada por escrito (MUNIZ, 2005, p. 68-86).
Para Álvaro Villaça Azevedo (1998, p. 20)
[...] a convenção arbitral é um verdadeiro instrumento
democrático, elaborado pelas partes, em pleno exercício de
sua liberdade contratual, escolhendo as regras que entendem
melhores para a solução de suas controvérsias. Essa
convenção é, na essência, a revitalização da lex privata, ditada
pelas próprias partes, na solução de seus próprios problemas
(a convenção faz lei entre as partes).
É importante esclarecer que diante da legislação brasileira,
convenção de arbitragem é gênero e cláusula compromissória e compromisso
arbitral são espécies; e dessa forma, diferença entre eles no que se refere à
aplicação do procedimento arbitral a um conflito, lembrando que nem todo
ordenamento faz tal distinção.
3.3.1. Compromisso Arbitral
O compromisso é um contrato entre as partes, um acordo de
vontades
108
, segundo o qual elas, diante de um conflito jurídico específico e
existente, estabelecem o pacto de confiar sua solução a árbitros.
Maria Helena Diniz (2005, p. 600) ensina que
[...] compromisso vem a ser o acordo bilateral, em que as
partes interessadas submetem suas controvérsias jurídicas à
108
Importante observar a limitação do compromisso às matérias dispostas no art. 852 do
Código Civil, ou seja, questões de estado, de direito pessoal de família e de outras que não
tenham caráter estritamente patrimonial.
118
decisão de árbitros, comprometendo-se a acatá-la, subtraindo
a demanda da jurisdição da justiça comum.
Álvaro Villaça de Azevedo (1998, p. 16) conceitua
compromisso arbitral como “acordo que as partes contratantes fazem para
dirimir, por meio de árbitro ou árbitros, problema ou dúvida, surgidos de sua
contratação, pendentes ou não de decisão judicial”.
Segundo a prescrição do art. da Lei 9.307/96 o
compromisso arbitral é a convenção através da qual as partes submetem um
litígio à arbitragem de uma ou mais pessoas, podendo ser judicial ou
extrajudicial”. Daí se tem que diante de um conflito existente e determinado que
pode até se encontrar submetido à jurisdição estatal, haverá a faculdade de se
optar por resolvê-lo pela arbitragem, elegendo um ou mais árbitros, obrigando-
se a aceitar sua decisão, devendo esse compromisso ser realizado por escrito.
Para Luiz Olavo Baptista (apud SANTOS, R., 2004, p. 49) “o
compromisso é negócio jurídico de características muito especiais, pois através
dele as partes deliberam, de modo irretratável, colocar a solução em mãos do
árbitro para pôr fim a um litígio já existente”.
A Lei 9.307/96 determina os requisitos obrigatórios no art. 10 e
os requisitos facultativos no art. 11 referentes ao compromisso arbitral. Os
obrigatórios são a qualificação das partes; qualificação dos árbitros;
especificação do objeto do litígio e o lugar da arbitragem, sob pena de nulidade
do negócio jurídico. Já os facultativos não geram sua nulidade, mas auxiliam no
bom funcionamento do instituto, sendo eles: o local onde se desenvolverá a
arbitragem; a autorização para julgar por equidade; prazo para decisão; opção
pela lei aplicável; responsabilidade pelo ônus da sucumbência. As causas de
extinção do compromisso arbitral são poucas e foram introduzidas no art. 12 da
Lei, devendo-se à recusa, impedimento, suspeição ou falecimento ulterior do
árbitro e que não seja possível ou desejado pelas partes a substituição ou pela
falta de prolação da sentença no prazo (MUNIZ, 2005, p. 92-94).
Carlos Alberto Carmona (1998, p. 29) defende que tanto a
cláusula compromissória quanto o compromisso são capazes de originarem
uma convenção de arbitragem. Nesses termos, ele afirma:
O compromisso será mera formalidade se a cláusula
compromissória for completa: nesse caso, por conta do
disposto no art. 5º da nova Lei, bastará acionar os mecanismos
119
predeterminados pelas partes na convenção de arbitragem
para que se instaure o juízo arbitral, que se considera instituído
com a aceitação, pelo árbitro, do encargo, independentemente
de compromisso, repita-se!
Quanto à natureza jurídica, o compromisso arbitral pode ser
judicial ou extrajudicial:
1º) Judicial, referindo-se à controvérsia ajuizada perante a
justiça ordinária, celebrando-se, então, por termo nos autos,
perante o juízo ou tribunal por onde correr a demanda. Tal
termo será assinado pelas próprias partes ou por mandatário
com poderes especiais (CC, arts. 851 e 661, §2º, CPC, art. 38,
com redação da Lei n. 8.952/94; Lei n. 9.307/96, art. 9º, §1º).
Feito o compromisso, cessarão as funções do juiz togado, pois
os árbitros decidirão.
2º) Extrajudicial, se ainda não existir demanda ajuizada. Não
havendo causa ajuizada, celebrar-se-á o compromisso por
escritura pública ou particular, assinada pelas partes e duas
testemunhas (CC, art. 851; Lei n. 9.307/96, art. 9º, §2º). (DINIZ,
2005, p. 602).
Diante desse breve estudo, de se ressaltar que o
compromisso é passível de utilização em conflitos decorrentes das
negociações preliminares, mas não é recomendável que se deixe para o
momento em que já existe o conflito para que as partes usem o bom senso
para elegerem o método de solução de conflitos. Por isso o enfoque deste
estudo é a inserção da cláusula compromissória de arbitragem nos modelos
jurídicos utilizados nas negociações preliminares, que a intenção é tratar do
âmbito preventivo da utilização da arbitragem.
3.3.2. Cláusula Compromissória de Arbitragem
A cláusula compromissória é compromisso de adoção da
arbitragem perante eventuais conflitos contratuais. Segundo Tânia Lobo Muniz
(2005, p. 86) é “acordo das partes pelo qual, voluntária e antecipadamente, se
obrigam a solucionar as divergências decorrentes de relação jurídica havida
entre elas por meio de juízo arbitral.” O art. da Lei 9.307/96 reza que “a
cláusula compromissória é a convenção através da qual as partes em um
120
contrato comprometem-se a submeter à arbitragem os litígios que possam vir a
surgir, relativamente a tal contrato”.
Adriana Noemi Pucci (1997. p. 65) ensina que
A cláusula compromissória, como seu nome indica, é um
dispositivo geralmente inserido como uma cláusula a mais no
contrato principal. No momento de sua estipulação em um
contrato ainda não surgiu qualquer conflito, as partes ainda não
têm conhecimento de qual será a controvérsia, e mesmo se o
conflito acontecerá, isto é, não têm sequer a certeza de que
haverá qualquer disputa.
Irineu Strenger (1996a, p. 110) explica que a cláusula
compromissória é preventiva: “as partes antes que intervenha entre elas
alguma dissidência, convencionam que, se qualquer divergência ocorrer na
execução do contrato, recorrerão, para resolvê-la, à arbitragem”.
Nesse sentido, a utilização dessa cláusula
permite às partes escolherem o procedimento, o(s) árbitro(s) ou
a instituição arbitral, o direito aplicável (material e processual),
o local da arbitragem, a língua a ser utilizada, retirando do
Poder Judiciário nacional, da parte ex adversa
109
ou até mesmo
de um terceiro sistema jurídico, desconhecido para ambas as
partes, a solução do conflito. (BARROZO; COSTA; MUNIZ,
2007, p. 243)
Desse contexto nasce a discussão se é mais conveniente
firmar um compromisso arbitral ou uma cláusula compromissória e nesse último
caso, completa ou vazia. Pela cláusula compromissória ser anterior ao litígio,
entende-se que será mais fácil de negociá-la porque as partes estarão em um
clima de cooperação, no entanto, traz consigo a dificuldade de delimitar e
prever a natureza, dimensão e conseqüência do litígio por não conhecê-lo,
diferentemente do que ocorre no compromisso arbitral.
A cláusula compromissória deve ser escrita e pode apresentar-
se inserida no contrato definitivo, no modelo jurídico obrigacional das
negociações preliminares ou ainda apartada, em instrumento anexo aqueles.
Estabeleceu a lei que a cláusula pode estar ou não inserida no
corpo de um contrato, de tal sorte que a avença será
contemporânea ao contrato ou posterior a ele: nesta última
hipótese, a cláusula será convencionada através de trocas de
109
“Por que a arbitragem vicejou tão frondosamente no campo das relações comerciais
internacionais? Porque é um meio de vencer as incertezas e inseguranças que naturalmente
surgem quando uma parte domiciliada em um país acerta um negócio com outra, domiciliada
em outro país. Em tais circunstâncias somente a arbitragem é capaz de assegurar que
nenhuma das partes incorrerá no risco de uma possível controvérsia sobre o negócio
contratado ser decidida por um tribunal do país da parte ex-adversa” (LOBO, 2003. p. 4).
121
cartas, telegramas, telex ou mesmo fac-símiles que se
reportem a um negócio jurídico, prevendo a solução de
eventuais e futuras controvérsias por arbitragem. (CARMONA,
1998, p. 29)
O momento e documento onde deve ser inserida a cláusula
compromissória são de extrema relevância, mas não discussão doutrinária
suficiente a respeito da permissão da sua inserção nos modelos jurídicos
utilizados nas negociações preliminares. Assim, relevante a análise da Lei
Brasileira, das convenções internacionais e da Lei Modelo da UNCITRAL a
respeito desse assunto.
Está consolidada sua inclusão nos contratos, como dispõe a
Lei de Arbitragem Brasileira em seu art. 4º, caput:
A cláusula compromissória é a convenção através da qual as
partes em um contrato comprometem-se a submeter à
arbitragem os litígios que possam vir a surgir, relativamente a
tal contrato.
Por sua vez, as convenções internacionais são mais flexíveis e
reconhecem que nem sempre, no comércio internacional, contratos
formalmente redigidos, sendo mais freqüente a troca de cartas, telex, e-mails e
documentos entre as partes, que resultam na obrigação contraída e por
conseqüência permitem a cláusula compromissória.
A Convenção de Nova Iorque de 1958 que trata do
Reconhecimento e Execução de Sentença Arbitral Estrangeira corrobora o
entendimento e determina em seu art. 2º, I, que não as relações contratuais
podem ser submetidas à arbitragem, mas também as não contratuais:
Cada Estado signatário deverá reconhecer o acordo escrito
pelo qual as partes se comprometem a submeter à arbitragem
todas as divergências que tenham surgido ou que possam vir a
surgir entre si no que diz respeito a um relacionamento jurídico
definido, seja ele contratual ou não, com relação a uma matéria
passível ou não de solução mediante arbitragem.
No inciso II, a Convenção de Nova Iorque ainda esclarece que:
Entender-se-á por “acordo escrito” uma cláusula arbitral
inserida em contrato ou acordo de arbitragem, firmado pelas
partes ou contido em troca de cartas ou telegramas.
Nesse sentido, reza o art. 1º da Convenção Interamericana
sobre Arbitragem Comercial Internacional realizada no Panamá:
É válido o acordo das partes em virtude do qual se obrigam a
submeter à decisão arbitral as divergências que possam surgir
ou que hajam surgido entre elas com relação a um negócio de
122
natureza mercantil. O respectivo acordo constará do
documento assinado pelas partes, ou de troca de cartas,
telegramas ou comunicações por telex.
A Lei Modelo da UNCITRAL sobre Arbitragem Comercial
Internacional de 1985 emendada em 2006 posiciona-se da mesma forma no
art.
110
, determinando que o acordo de arbitragem refere-se à relação jurídica
contratual ou não contratual (opção 2) e poderá adotar a forma de uma
cláusula compromissória incluída em um contrato ou a forma de um acordo
independente, devendo ser escrito, consignado em documento firmado pelas
partes ou em um intercâmbio de cartas, e-mails, telex, telegramas ou outros
meios de comunicação eletrônica onde haja mensagem de dados que
demonstre o acordo ou em uma troca de escritos de pedidos e contestações
em que a existência de um acordo seja afirmada por uma parte sem que seja
negada pela outra (opção 1).
Ou seja, pela análise dos textos, nota-se que a LA brasileira
não seguiu a tendência internacional, embora as Convenções de Nova Iorque e
do Panamá tenham sido ratificadas pelo país. Assim, cabe ressaltar que
embora não se tenha o contrato definitivo durante as tratativas, defende-se a
inserção da cláusula compromissória no instrumento obrigacional - de
denominações variadas conforme a autonomia da vontade - utilizado nessa
fase a fim de se alcançar o contrato internacional definitivo.
110
Opción I. Artículo 7. Definición y forma del acuerdo de arbitraje. “1) El “acuerdo de arbitraje”
es un acuerdo por el que las partes deciden someter a arbitraje todas las controversias o
ciertas controversias que hayan surgido o puedan surgir entre ellas respecto de una
determinada relación jurídica, contractual o no contractual. El acuerdo de arbitraje podrá
adoptar la forma de una cláusula compromisoria incluida en un contrato o la forma de un
acuerdo independiente. 2) El acuerdo de arbitraje deberá constar por escrito. 3) Se entenderá
que el acuerdo de arbitraje es escrito cuando quede constancia de su contenido en cualquier
forma, ya sea que el acuerdo de arbitraje o contrato se haya concertado verbalmente, mediante
la ejecución de ciertos actos o por cualquier otro medio. 4) El requisito de que un acuerdo de
arbitraje conste por escrito se cumplirá con una comunicación electrónica si la información en
ella consignada es accesible para su ulterior consulta. Por “comunicación electrónica” se
entenderá toda comunicación que las partes hagan por medio de mensajes de datos. Por
“mensaje de datos” se entenderá la información generada, enviada, recibida o archivada por
medios electrónicos, magnéticos, ópticos o similares, como pudieran ser, entre otros, el
intercambio electrónico de datos, el correo electrónico, el telegrama, el télex o el telefax. 5)
Además, se entenderá que el acuerdo de arbitraje es escrito cuando este consignado en un
intercambio de escritos de demanda y contestación en los que la existencia de un acuerdo sea
afirmada por una parte sin ser negada por la otra. 6) La referencia hecha en un contrato a un
documento que contenga uma cláusula compromisoria constituye un acuerdo de arbitraje por
escrito, siempre que dicha referencia implique que esa cláusula forma parte del contrato”.
Opción II. Artículo 7. Definición del acuerdo de arbitraje. “El “acuerdo de arbitraje” es un
acuerdo por el que las partes deciden someter a arbitraje todas las controversias o ciertas
controversias que hayan surgido o puedan surgir entre ellas respecto de una determinada
relación jurídica, contractual o no”.
123
Considera-se para esse estudo que os modelos jurídicos
utilizados durante as negociações preliminares com aspectos obrigacionais são
capazes de gerar contratos de arbitragem, pois a cláusula compromissória é
um contrato autônomo
111
de onde decorre o princípio da competência-
competência, ou seja, “o árbitro possui a competência para julgar sua própria
competência em apreciar o litígio que lhe é submetido” (SANTOS, R., 2004, p.
46).
[...] se aceita a autonomia de tal estipulação, dissociando-se a
convenção arbitral do próprio contrato, os árbitros estarão
habilitados a dirimir pretensões das partes acerca da nulidade
ou anulabilidade do contrato principal sem que sua
competência entre em jogo, salvo hipóteses excepcionais
(GUERREIRO apud SANTOS, R., 2004, p. 46).
O intuito de se firmar instrumentos jurídicos durante as
tratativas e inserir-lhe uma cláusula compromissória é prevenir lacunas ou
minimizar os efeitos dos conflitos eventualmente existentes antes da conclusão
do contrato, possibilitando maior segurança e eficácia aos negócios
internacionais. E para tanto, a inserção de uma cláusula vazia ou em branco
112
com a simples previsão de que todos os conflitos futuros serão resolvidos por
arbitragem não é suficiente, pois, se posteriormente, diante do conflito, as
partes não chegarem a um acordo sobre quem, onde, de qual forma, idioma e
lei serão aplicados, será necessária a intervenção
113
do Judiciário para que
aquela previsão inicial seja efetivada por meio do compromisso arbitral
(BARROZO; COSTA; MUNIZ, 2007, p. 245-246). A realização do compromisso
acarretará obstáculos à rápida solução e o rompimento do “equilíbrio
econômico do contrato ao incrementar os custos de transação” (PINTO, 2006.
p. 69-70)
Eleonora Pitombo ressalta que é preciso atentar para a não
submissão à cláusula compromissória patológica ou vazia que contêm vícios
111
Art. da Lei 9.307/96: “A cláusula compromissória é autônoma em relação ao contrato em
que estiver inserta, de tal sorte que a nulidade deste não implica, necessariamente, a nulidade
da cláusula compromissória”.
112
“Quando se limita a apontar a arbitragem como solução da controvérsia, sem identificação
ou designação de árbitros” (STRENGER, 1996a, p. 116).
113
Nesse sentido, aconselhável a previsão da cláusula de eleição de foro quando for
necessária a intervenção do Judiciário. A cláusula de eleição de foro nos contratos não afasta
e sequer colide com a cláusula arbitral, pois existem hipóteses em que a provocação do Poder
Judiciário é necessária, como quando a cláusula arbitral é vazia e quando nulidade da
cláusula arbitral ou da sentença arbitral”. (SCAVONE JUNIOR, 2008, p. 67)
124
que dificultam e inviabilizam o procedimento arbitral, pois elas são verdadeiras
barreiras para a boa condução da arbitragem (PITOMBO, 2006, p. 48).
Assim, segundo Luiz Antonio Scavone Junior (2008, p. 71) a
cláusula arbitral vazia ou em branco é aquela em que as partes não
estabelecem as regras mínimas para o desenvolvimento da solução arbitral e,
tampouco, indicam as regras de uma entidade especializada e então, quando
surgir um conflito, as partes necessitarão firmar um compromisso arbitral para
estabelecer tais regras e indicar um ou mais árbitros.
Irineu Strenger (1996a, p. 116) cita Eisemann para explicar
que a cláusula é patológica quando deixar de preencher suas funções
essenciais:
1) produzir efeitos obrigatórios sobre as partes; 2) descartar a
intervenção de tribunais estatais, ao menos antes da prolação
da sentença arbitral; 3) dar aos árbitros poder de regular os
litígios; 4) permitir a formação de procedimento que conduza
nas melhores condições o pronunciamento de uma sentença
eficaz.
As conseqüências das cláusulas patológicas, segundo Strenger
(1996a, p. 116-117), podem ser curáveis
114
ou incuráveis
115
. “Em certos casos,
a arbitragem de qualquer modo se realiza, apesar dos defeitos da cláusula
compromissória. Em outros, a arbitragem não terá condições de realizar-se”.
Assim, é recomendável que se utilize uma cláusula completa
ou não patológica, que contenha a determinação da lei aplicável, da sede da
arbitragem, do idioma a ser utilizado, do procedimento ou regulamento que
serão obedecidos, a indicação do árbitro ou da instituição arbitral.
Para Luiz Antonio Scavone Junior (2008, p. 69),
A cláusula arbitral cheia é aquela que contém os requisitos
mínimos para que possa ser instaurado o procedimento arbitral
(as condições mínimas do art. 10 da Lei de Arbitragem), como,
por exemplo, a forma de indicação dos árbitros, o local etc.,
tornando prescindível o compromisso arbitral.
A inserção da cláusula compromissória completa
114
Para Strenger (1996a, p. 118) “é sempre admissível que se tente “curar” a cláusula
patológica, quando esta não impeça a formulação nítida da vontade das partes, circunstância
em que se deve desprezar os vícios decorrentes de irregularidades formais”.
115
No que concerne às cláusulas patológicas incuráveis, a hipótese resulta de insuficiência na
redação, de modo a tornar ambígua e incompleta a vontade das partes, o mesmo acontecendo
quando pletora de precauções contratuais engendram contradições e incertezas” (STRENGER,
1996a, p. 118).
125
[...] nos instrumentos jurídicos elaborados durante as
negociações preliminares trará benefícios às relações
empresariais, sem a submissão de seus conflitos ao Judiciário,
seja nacional ou da parte contrária, não por incapacidade, mas
por maior agilidade na solução dos litígios, conhecimento
técnico e jurídico específico dos árbitros, tratamento equânime
dado às partes, autonomia da vontade.” (BARROZO; COSTA;
MUNIZ, 2007, p. 244)
A cláusula compromissória cheia corresponde à expressão da
liberdade de escolher o que é melhor para as partes, desde que não contrarie a
ordem pública. Nesse sentido, José Maria Garcez (1999, p. 148) assinala:
Pode a cláusula compromissória, assim, prever, por exemplo,
como o conflito surgido será denunciado, como serão
apresentados os sumários dos casos, inclusive com a fixação
de prazos para isto ser realizado, o número e a qualificação
prévia que os árbitros devem ter, o prazo para emissão da
sentença ou laudo arbitral, ou fazer referência às normas de
uma instituição arbitral existente que administre o procedimento
arbitral para as partes em conflito ou, ainda, adotar fórmulas
consagradas para aplicar diretamente a arbitragem pelas
partes, num sistema misto.
Para Luiz Antonio Scavone Junior (2008, p. 70) duas formas
de cláusula arbitral cheia: a) onde as partes pactuam todas as condições para
a instauração da arbitragem ou b) se referem às regras de uma entidade
especializada. Nesse último caso, ele aconselha que as partes anexem o
regulamento da entidade e vistem as folhas dando ciência das regras que
escolheram para resolver seu eventual conflito, especialmente porque as
instituições arbitrais podem alterar seu regulamento (p. 71).
Dessa forma, durante as negociações preliminares é
necessário que as partes estabeleçam quais os objetivos e deveres
decorrentes dessa fase, admitindo que se houver algum conflito entre elas,
esse será resolvido por meio de arbitragem, interpretando-se que os tratados
internacionais mencionados e ratificados pelo Brasil permitem essa
interpretação. Necessário que insiram uma cláusula compromissória não
patológica, tomando-se os cuidados acima expostos para que não seja
necessária a interferência do Judiciário com a finalidade das partes firmarem o
compromisso arbitral por ausência de previsões de árbitros ou instituição
arbitral, procedimentos, lei aplicável, língua e sede da arbitragem.
126
3.4.
C
LÁUSULA
C
OMPROMISSÓRIA DE
A
RBITRAGEM E AS
N
EGOCIAÇÕES
P
RELIMINARES
A importância da inserção da cláusula compromissória de
arbitragem em instrumentos jurídicos utilizados durante as negociações
preliminares consiste em possibilitar aos negociadores a liberdade de decisão
de como, onde e quem julgará o eventual conflito; e com isso gerar segurança
de que não haverá indecisões, vidas ou até vazios jurídicos acerca da
solução de eventual controvérsia na fase de formação dos contratos
internacionais, retirando do Judiciário a competência de julgamento, tanto por
se tratar de matéria complexa e distante da rotina dos juízes nacionais, bem
como pela especialidade dos árbitros ou da instituição escolhida.
Assim, muitas são as justificativas de se inserir uma cláusula
compromissória de arbitragem em um contrato internacional, o que se constata
nas estatísticas de uso da arbitragem no contexto comercial internacional. As
vantagens da arbitragem sob a jurisdição estatal no plano internacional são
variadas e podem ser visualizadas sob os aspectos jurídico e sócio-econômico,
que se confundem, uma vez que a arbitragem é instituto jurídico tipicamente
ligado às relações empresariais internacionais.
No entanto, o presente estudo não visa analisar os contratos
internacionais concluídos - onde a utilização da arbitragem está consolidada
na prática internacional - mas os que estão em fase de formação ex intervallo
temporis e, portanto, são muito mais frágeis, necessitando, por vezes, diante
de sua complexidade e custo, de se utilizar de modelos jurídicos criados pela
vontade das partes para desde esse momento se prevenirem de futuros
conflitos, que para se evoluir nas tratativas, às vezes, é preciso contrair
obrigações.
É nesse aspecto que se nota a relevância ainda maior de se
utilizar a arbitragem como método alternativo de solução de conflito em busca
de se evitar os problemas decorrentes do envolvimento de dois ou mais
sistemas jurídicos e ainda pelas diversas interpretações legislativas que se tem
a respeito das negociações preliminares e seu grau de vinculação entre os
127
negociadores, o que gera incertezas acerca das responsabilidades que podem
advir dessa fase.
3.4.1. Vantagens da Arbitragem Comercial Internacional
A arbitragem comercial internacional tem se mostrado o meio
de solução de conflitos mais utilizado nas relações empresariais internacionais,
inclusive conquistando a participação e respeito cada vez maior dos
empresários brasileiros.
Garcez (2003, p. 220) elenca as vantagens da escolha da
arbitragem nos contratos internacionais em relação à jurisdição estatal e tais
vantagens também se aplicam às negociações preliminares.
a) evitar o congestionamento crônico dos judiciários estatais,
proporcionando, somente por esta razão, maior celeridade na
solução do caso; b) evitar o intrincado e ramificado quadro dos
recursos judiciários, com o mesmo efeito de celeridade; c)
permitir que o caso seja decidido por sigilo, o que não ocorre
nas jurisdições estatais; e, sobretudo, na área internacional; d)
permitir muitas vezes um julgamento por especialistas em
questões técnicas ou mais específicas; e) permitir que a
questão seja julgada por normas genéricas, princípios gerais
do comércio internacional, normas gerais de direito, por
equidade, ou mesmo pela legislação do país que venha a ser
escolhido pelas partes; f) permitir que o julgamento ocorra em
país neutro, evitando, assim, os preconceitos e eventuais
restrições encontráveis no país de uma das partes.
Basicamente, as principais vantagens
116
e justificativas da
arbitragem internacional são celeridade, qualificação dos árbitros,
confidencialidade, custo, possibilidade de conciliação, garantia de tratamento
igualitário entre partes de nacionalidades diferentes, autonomia na escolha do
procedimento, da lei aplicável, da equidade e do árbitro, o
descongestionamento do Poder Judiciário com questões relativas ao comércio
internacional, a segurança e o desenvolvimento do comércio internacional com
instrumentos de solução de conflitos mais eficazes.
Um ponto interessante da arbitragem é que as partes podem
escolher o local de proferimento da sentença arbitral, o que influenciará na
116
Ver RECHSTEINER, 1997, p. 34 e BASSO, 1996b, p. 14-15.
128
necessidade ou não de sua homologação
117
se for considerada estrangeira no
local a ser cumprida. Embora o árbitro não esteja vinculado a uma jurisdição ou
a aplicar as regras processuais ou materiais do local eleito, é aconselhável que
haja no contrato ou modelo jurídico escolhido uma cláusula de eleição de foro
para o caso de se fazer necessária a intervenção do Poder Judiciário.
Micaela Barros Barcelos Fernandes (2005. p. 59-60) ressalta
que
...a vantagem da arbitragem reside justamente no fato de as
partes não estarem vinculadas a qualquer jurisdição, e desta
forma terem muito mais independência para debaterem num
local neutro, ou mais próximo do lugar da execução do
contrato, ou das provas referentes à relação jurídica que
instruirão o processo, ou ainda, realizarem o procedimento em
vários locais (através, por exemplo, da oitiva de testemunhas
em um lugar, e o exame de documentos em outro). Enfim, as
partes poderão optar pelo(s) local (is) que, de acordo com seus
exclusivos critérios seja(m) mais apropriado(s) para ambos.
Essa liberdade de escolha remete à autonomia da vontade,
que possui presença marcante no instituto de arbitragem combinado com os
modelos jurídicos utilizados nas negociações preliminares dos contratos
internacionais que possibilitam a determinação das regras do procedimento e
da lei aplicável conforme os anseios dos envolvidos, considerando sempre os
limites concedidos pelos Estados, como a ordem pública, os bons costumes e a
soberania. Sua manifestação ocorre em diversos momentos como esclarece
Almeida Santos (apud SANTOS, R., 2004, p. 40):
a) a possibilidade de escolha da arbitragem mediante
celebração da convenção de arbitragem, afastando a partir
deste instrumento a competência do Poder Judiciário para
dirimir o mérito do litígio e cuja competência será delegada ao
árbitro;
b) a possibilidade de escolha do árbitro, determinando o
julgador a partir de um critério de confiança quanto a sua
capacidade de administrar a resolução do conflito;
c) a possibilidade de escolha das regras do procedimento
arbitral, permitindo a adequação do procedimento aos
interesses das partes no que tange a melhor maneira de se
obter a consecução dos objetivos da arbitragem;
117
Adriana Braghetta (2006, p. 10) exemplifica que no Brasil “o expediente de homologação de
laudo arbitral estrangeiro perante o Superior Tribunal de Justiça pode levar mais de seis meses
e, até lá, o laudo estrangeiro não produzirá efeitos no território brasileiro. Algumas empresas
estrangeiras já reconhecem a vantagem, pois, de a sede ser no Brasil, caso se sagrem
vencedoras de uma demanda arbitral, para agilizar a execução do laudo arbitral no território
brasileiro”.
129
d) a possibilidade de escolha do direito a ser aplicado ao fundo
do litígio. As partes podem escolher, inicialmente, se a
arbitragem será de direito ou de equidade. Quando a escolha
recair em regras de direito, as partes terão que definir se
aplicam: a lei substancial de um determinado Estado; os
princípios gerais de direito; a lex mercatoria; os usos ou os
costumes. Quando a escolha recair na equidade utilizar-se-á o
parâmetro de justiça adotado pela sociedade naquele momento
histórico ao caso concreto.
Tânia Lobo Muniz (2005, p. 68-69) expõe que a autonomia da
vontade é limitada pelas restrições impostas pela lei e
[...] sendo assim, nem todos os atos jurídicos de cunho
obrigacional podem se utilizar da autonomia. Aqueles cujas
regras predominantes têm o caráter imperativo não caberá a
liberdade às partes (como nos contratos de seguro, bancários,
de trabalho, dentre outros). A lei busca, impondo tais
limitações, garantir o equilíbrio às partes, fazendo com que o
aspecto conjuntural da contratação possa ser suprido.
Assim, analisando o princípio da autonomia da vontade e o
instituto da arbitragem em conjunto com a legislação brasileira, tem-se que
esse princípio foi amplamente abarcado pela legislação pertinente, sofrendo
apenas a limitação das leis imperativas e preceitos de ordem pública que
garantirão a validade e executoriedade da sentença arbitral no território
brasileiro, independente de ser nacional ou internacional (MUNIZ, 2005, p. 72).
Como dito acima, a autonomia da vontade possibilita a decisão
por eqüidade, se as partes assim convencionarem mutuamente, o que permitirá
ao árbitro desenvolver o mesmo raciocínio lógico do juiz, porém sem obrigação
da aplicação do direito positivo. A grande liberdade de subjetividade dada ao
árbitro demonstrará a confiança depositada nele que desencadeará na
propensão a voluntariedade no cumprimento da sentença. Nesse caso, a
exigência de que o árbitro tenha uma reputação ilibada será ainda maior.
O sigilo também é ponto relevante, especialmente pelo âmbito
concorrencial internacional, pois evita o vazamento de informações
confidenciais, uma vez que o segredo envolve todo o procedimento arbitral que
ocorre de forma privada, inclusive a instrução de depoimentos verbais e outras
provas que não ficam expostas ao público como na justiça estatal. No entanto,
se a sentença arbitral condenatória não for voluntariamente cumprida, será
necessária a intervenção de autoridade judiciária e o processo de execução
não mais será protegido pelo sigilo, a priori. Ao mesmo tempo em que essa
130
exposição pública é um risco, pode ser um fator influenciador para o
cumprimento voluntário da sentença, caso o vencido não queira que essa
condição seja conhecida pela concorrência ou por fornecedores/consumidores.
Irineu Strenger (1996a, p. 297) ministra que o procedimento
arbitral é flexível e rápido em relação ao judicial e ainda apresenta diversas
outras vantagens:
Se desenvolve com discrição que, por razões mercantis e
fiscais, interessa às partes. Seu custo em termos relativos é
menor. A designação do árbitro para resolver um caso
concreto, feita pelos interessados ou encomendada a uma
instituição responsável é garantia de dedicação e perícia.
Eqüidistante dos tribunais dos Estados, sob cuja jurisdição se
encontram as partes, o árbitro se considera órgão neutro. Daí a
esperança no acerto de uma sentença, fruto de escrupulosa
atenção de profissionais versados e, por acréscimo,
comparativamente barato, que permite às partes continuar,
sem interromper suas relações comerciais.
Além disso, esse método propicia a conciliação por sua
essência ser baseada no princípio da boa-fé objetiva e por não ser um
procedimento essencialmente litigioso como a demanda judicial contribuindo
para a continuidade das relações empresariais e seu conseqüente
desenvolvimento. A arbitragem é tida como um método mais flexível que o
judicial por não estar envolvido por tantos procedimentos burocráticos.
Nesse aspecto, foi feita uma pesquisa
118
pela
PriceWaterhouseCoopers em conjunto com a Escola Internacional de
Arbitragem da Universidade de Londres comentada por Zínia Baeta no Jornal
Valor Econômico em 17/05/2006 (BAETA, 2010) e a pesquisa confirmou que as
empresas preferem usar a arbitragem quando discutem conflitos decorrentes
de contratos internacionais e relatou as vantagens apontadas que justificam a
preferência: a flexibilidade, o sigilo e a possibilidade de escolha do árbitro.
Outro aspecto de suma importância é a garantia de tratamento
equânime que afasta a natural incerteza quanto à isenção dos tribunais locais
em lides internacionais, sendo uma das justificativas mais plausíveis no âmbito
comercial internacional.
Nadia de Araujo (1996, p. 93) ensina que
118
A PriceWaterhouseCoopers elaborou em conjunto com a Escola Internacional de Arbitragem
da Universidade de Londres pesquisas acerca do assunto, a primeira em 2006, a segunda em
2008 e uma terceira esem andamento para este ano de 2010. Os resultados das pesquisas
estão disponíveis em http://www.arbitrationonline.org/research/index.html.
131
A escolha por um tribunal arbitral afasta boa parte da angústia
causada pela incerteza jurídica, pois este é considerado como
uma forma de evitar os problemas advindos da insegurança
ligada às soluções obtidas na justiça estatal de um Estado
nacional.
Na visão de Adriana dos Santos Silva (2006, p. 220), a
arbitragem é essencial para o processo de desenvolvimento, pois alia a
autonomia da vontade com princípios sociais como a boa-fé, a função social e
outros.
Existem indícios forte para acreditar que, nesta abordagem
justiça e desenvolvimento, a arbitragem preenche algumas
funções essenciais deste processo de desenvolvimento,
promovendo a condição de agente e sendo uma expressão de
liberdade individual com perfil social, pois integra a idéia de que
ao indivíduo é dada a autonomia para decidir qual o meio
melhor para solucionar seus conflitos, mas também a limita
segundo critérios sociais.
Uma das mais marcantes e polêmicas vantagens da arbitragem
é a celeridade que pode ser analisada tanto do ponto de vista jurídico como
sócio-econômico, pois com a resolução mais rápida da controvérsia, tem-se um
maior crédito no instituto que não admite recursos e possibilita o investimento
em novos projetos ao se desvencilhar da pendência. Diversos fatores
concorrem para a rapidez na solução arbitral em comparação à judicial
119
,
listando-se a possibilidade de escolha do procedimento e regras, de julgadores
com experiência na questão e a irrecorribilidade da decisão.
Por sua vez, Goulene e Racine (apud SANTOS, R., 2004, p.
31) apontam de forma crítica que o procedimento arbitral está perdendo sua
rapidez e flexibilidade, principalmente nos procedimentos institucionais que
acabam sendo muito formais e complexos, possibilitando práticas de obstrução
processual às partes e seus procuradores, o que exige avaliação das partes e
da própria instituição para que não prejudique a imagem e utilização desse
método de solução de conflitos. No entanto, a prática internacional demonstra
que as arbitragens duram em média 18 meses e uma ação judicial no Brasil
pode passar de 10 anos
120
.
119
A Lei n. 9.307/96 no art. 23 estatui que a sentença arbitral será proferida no prazo
estipulado pelas partes, ou em sua falta, no prazo de seis meses, podendo as partes e os
árbitros de comum acordo prorrogá-lo.
120
Ver comentários de Zínia Baeta sobre a pesquisa da PriceWaterhouseCoopers publicada no
Valor Econômico de 17/05/2006.
132
A qualificação profissional e técnica dos árbitros especializados
em decidir litígios com conexão internacional e relacionados ao comércio
resultam em economia de tempo, esforço e dinheiro (peritos) que seriam
despendidos com um tribunal não especializado, auxiliando no custo-benefício
da arbitragem em relação à solução judicial. Além disso, tal qualificação
permite maior segurança às partes e confiança nos procedimentos a serem
adotados pelo árbitro, o que também pode acarretar uma solução mais rápida e
rentável para os envolvidos.
“A arbitragem possibilita maior grau de justiça, na solução dos
conflitos particulares, por ser diretamente ligada aos interessados, que podem
escolher as normas e os árbitros para a resolução de seus problemas”.
(AZEVEDO, 1998, p. 20)
em relação ao custo, o do procedimento arbitral é
proporcionalmente menor que o do Judiciário considerando-se a economia de
tempo que se despende com os processos estatais e suas possibilidades de
recursos, o que proporciona maior rapidez na solução do conflito e a
conseqüente liberdade para outros investimentos a critério do empresário. Não
se defende a utopia de que o custo da arbitragem seja acessível à sociedade
em geral, mas nas relações empresariais internacionais se mostra bastante
vantajosa como esclarece Carlos Alberto Carmona (1990, p. 39)
A arbitragem tende a uma finalidade bastante específica:
resolver problemas decorrentes do comércio, especialmente do
comércio internacional e comercial como de costumes e praxes
do comércio. O custo, nestas hipóteses, é bem mais
suportável, e as vantagens decorrentes da solução arbitral são
mais visíveis.
Além da grande importância para a dinamização dos contratos
internacionais, a arbitragem colabora com o descongestionamento do Poder
Judiciário estatal, principalmente em um país como o Brasil, onde o Judiciário é
lento, caro, desgastante e despreparado para os conflitos comerciais
internacionais. Micaela Barros Barcelos Fernandes (2005, p. 57), ao tecer
comentários sobre o crescimento da arbitragem privada internacional no Brasil,
explica que em âmbito interno a importância da arbitragem é inegável diante da
sobrecarga do Judiciário; e na esfera internacional seu relevo é ainda maior
pelo fato da jurisdição estatal ter se mostrado inadequada como instrumento
133
de pacificação social nesses casos que envolvem a soberania e a competência
dos Estados.
Ailton Stropa Garcia (2000, p. 29) ensina que
[...] a solução de conflitos entre as empresas de países
diferentes pela jurisdição estatal, por envolver a delicada
questão da soberania entre os Estados, vinha se mostrando
inadequada, havendo necessidade do surgimento de um poder
supranacional de solução de conflitos, que seria a Arbitragem.
Depois de numerar as vantagens da arbitragem tanto para as
partes quanto para o Estado, Micaela Barros Barcelos Fernandes (2005. p. 73)
sopesa que esse instituto não pode ser sobrevalorizado sob pena de ser mal
utilizado e não alcançar seu objetivo de harmonia e paz social.
É necessário ter prudência e bom senso, pois, se utilizada
dentro dos limites de suas possibilidades, a arbitragem será um
valioso instrumento posto à disposição dos cidadãos para
dirimir seus conflitos de interesses e concretizar Justiça, não
concorrendo, mas agindo em colaboração ao Judiciário, que
assim ficará mais livre para julgar as causas que não podem
ser objeto de julgamento paraestatal. De outro lado, o excesso
de expectativas e o uso inadequado da arbitragem levarão ao
seu mau funcionamento, que acarretará a própria
desvalorização do instituto, reduzindo seu alcance como
instrumento jurídico capaz de contribuir para a obtenção da
harmonia e da paz social.
Por sua vez, Ricardo Soares Stersi dos Santos (2004, p. 31-32)
elenca algumas desvantagens trazidas pela doutrina, tais como os custos
econômicos, os excessivos meios de intervenção do Poder Judiciário, maior
possibilidade de serem proferidas decisões arbitrárias, bem como subtração da
aplicação do direito material do Estado sede da arbitragem e falta de atribuição
de poder coercitivo ao árbitro para dar cumprimento as suas decisões.
No entanto, pelo caráter da arbitragem internacional aqui
defendida, entende-se que essas desvantagens são insuficientes para o
impedimento ou diminuição desse instituto na solução de conflitos comerciais
internacionais, principalmente na fase de formação dos contratos, sobrepondo-
se, dessa forma, suas justificativas e vantagens.
Nesse sentido, confirma-se a importância da arbitragem como
método alternativo de solução de conflitos internacionais,
principalmente na fase de formação dos contratos
internacionais, pois uma grande dificuldade de se encontrar
uma solução adequada referente às cláusulas de lei aplicável,
foro de eleição e língua, diante da confusão feita pelo Judiciário
nacional. (BARROZO; COSTA; MUNIZ, 2007, p. 244-245)
134
O investimento em conscientização dos empresários, juristas e
autoridades judiciárias estatais nacionais permitirá o fortalecimento do instituto
da arbitragem e a conseqüente participação do Brasil com maior intensidade e
qualidade no mercado internacional, inspirando confiança e credibilidade aos
investidores e parceiros comerciais ao saberem que não empecilhos para a
escolha desse método para a solução de eventuais conflitos em qualquer fase
da contratação internacional envolvendo brasileiros.
Essa conscientização, aliada à modernização da legislação
brasileira e a ratificação de alguns tratados referentes ao tema, transformará o
país num mercado mais seguro para investidores e mais ativo no comércio
exterior; aumentando a receita das empresas, do Estado por meio da tributação
e da geração de trabalho, inclusive para os juristas, seja, atuando como
árbitros ou advogados, bem como ainda apresenta-se como vantagem para o
consumidor que terá uma gama maior de escolha de produtos e prestadores de
serviços.
3.4.2. A inserção da cláusula compromissória completa nas negociações
preliminares
Considerando as vantagens acima expostas, principalmente a
possibilidade de escolha da lei aplicável, da sede da arbitragem, do árbitro ou
instituição arbitral de confiança, da língua a ser utilizada durante o
procedimento arbitral e da garantia de tratamento equânime, justificada está a
utilização da arbitragem como método de solução de conflitos decorrentes de
contratos internacionais.
No entanto, o presente trabalho não se restringe a concluir as
vantagens da arbitragem, mas sim justificar a inserção da cláusula
compromissória completa no instrumento obrigacional firmado pelas partes
durante as negociações preliminares.
A fase de formação sucessiva dos contratos internacionais do
comércio gera insegurança para os negociadores, pois o contrato definitivo
ainda não foi alcançado e sequer se sabe se chegará ao mesmo, que as
135
negociações, em regra, não obrigam a conclusão do contrato, segundo os mais
tradicionais. Ao mesmo tempo, muitos investimentos podem ser empreendidos
com a finalidade de se concluir o acordo, tais como tempo, estudos, viagens,
contratação de profissionais e revelação de informações sigilosas e o Direito
não pode ficar alheio a essa dinâmica comercial.
Além disso, a insegurança se agrava na medida em que
diversas legislações e interpretações podem ser aplicadas no momento do
rompimento das tratativas ou do descumprimento de alguma obrigação
anterior à conclusão do contrato definitivo, aliada a imprecisão da lei aplicável,
do foro competente, da língua e do procedimento que podem ser empregados
diante de um conflito.
Tudo isso fez com que os próprios empresários e advogados
criassem modelos jurídicos para proteger essa fase, sendo que alguns, mesmo
antes da conclusão do contrato definitivo, trazem em seu bojo certas
obrigações, seja de guardar sigilo, de informar, de arcar com custos etc. São
nesses instrumentos que a arbitragem deve ser inserida por meio de uma
cláusula compromissória completa.
Ninguém melhor que um árbitro experiente e especializado em
comércio internacional para entender a necessidade das partes nesse
momento tão frágil, mas de grandes perspectivas e altos investimentos. um
árbitro escolhido com base em sua qualificação e na confiança das partes
poderá ter a liberdade de analisar a situação em conformidade com a prática
do comércio, desapegado do formalismo da jurisdição estatal. Necessário
relembrar que quanto mais qualificado o árbitro, maior a confiança das partes
nele, podendo, inclusive, submeterem-se ao julgamento por equidade.
Ainda, somente por meio da arbitragem as partes terão a
autonomia de regerem esse momento, escolhendo a lei aplicável, outro fator de
extrema relevância para dar uma maior segurança às negociações e às
soluções de seus conflitos.
Também vale ressaltar que a arbitragem propicia a conciliação
e é comum em âmbito comercial internacional que as partes queiram continuar
negociando, embora tenha surgido algum conflito entre elas. A postura da
litigância diante de um Judiciário desconhecido por uma ou ambas as partes
não propiciará um clima favorável à continuidade da negociação, o que mais
136
uma vez torna a arbitragem o meio mais indicado para a solução da
controvérsia.
Porém, não basta a inserção de uma cláusula compromissória
de arbitragem para que se alcance segurança e efetividade, é preciso que a
cláusula seja completa, ou seja, que traga a previsão dos requisitos que seriam
necessários para a constituição do compromisso arbitral, justamente para evitá-
lo, isto é, o número e qualificação do árbitro ou da instituição arbitral, a lei
aplicável, o local em que a sentença será proferida, o idioma, o procedimento
ou regulamento a ser seguido etc.
Esse cuidado evitará ou diminuirá a possibilidade de
intervenção do Poder Judiciário para a determinação da convenção arbitral, o
que contribuirá para uma decisão célere e para o exercício da autonomia da
vontade.
Tendo em consideração que conflitos podem ocorrer desde
esta fase e que a solução dos mesmos demandará grandes dificuldades e
inseguranças aos envolvidos diante das diferentes interpretações que as
legislações nacionais possuem acerca das negociações preliminares e dos
instrumentos utilizados nessa fase, bem como que a arbitragem é o todo de
solução de controvérsias mais utilizado no comércio internacional demonstra-
se a importância da inserção da cláusula compromissória de arbitragem nesses
modelos jurídicos obrigacionais nascidos durante a formação dos contratos
internacionais.
137
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Diante das reflexões acerca da presente proposta de estudo,
pode-se inferir que:
a) A evolução do comércio internacional é um fato relevante tanto para a
economia quanto para o direito, pois, além do envolvimento das empresas
nacionais ou transnacionais, estão presentes também os Estados e as
organizações internacionais. Pelo fato das relações empresariais
internacionais envolverem dois ou mais sistemas jurídicos com leis e
procedimentos distintos e por cada Estado regular esse conflito de leis por
meio do seu Direito Internacional Privado por ato de soberania-, faz-se
necessário avançar na harmonização de referidas normas, papel que
vem sendo desempenhado pelas organizações internacionais. Assim, o
envolvimento existente entre o Estado contemporâneo e os demais atores
internacionais deve ser regido pelo equilíbrio para que se alcance um
comércio internacional sustentável, desafio e norte para o
desenvolvimento no século XXI;
b) Os contratos internacionais do comércio são acordos de vontade ligados a
algum elemento de estraneidade e regidos por diversos princípios,
destacados nesse estudo, os da boa-fé objetiva e da autonomia da
vontade que também fundamentam o contrato de arbitragem. A autonomia
da vontade, significa em âmbito internacional, o exercício da liberdade de
escolher a lei que regerá a relação jurídica, flexibilizando as normas
jurídicas nacionais relativas ao Direito Internacional Privado para atender
com rapidez e criatividade à dinâmica comercial global. Apresentam três
fases: formação, conclusão e execução, cuja ênfase é a de formação que
pode ser instantânea ou prolongada. A formação prolongada é
denominada de tratativas ou negociações preliminares e não obrigam, em
regra, à conclusão do contrato, que são caracterizadas como período
de conhecimento a fim de se analisar a viabilidade da conclusão do
contrato almejado, respeitando-se, inclusive, a autonomia da vontade;
138
c) Embora as negociações preliminares não vinculem os negociantes a
concluírem o contrato que estão analisando a viabilidade o que seria
uma incongruência à autonomia da vontade deveres que surgem da
boa-fé objetiva, tais como agir com lealdade, probidade, informar o outro
do não interesse de continuidade nas negociações, não revelar os
segredos ou informações sigilosas a que teve acesso, não causar prejuízo
etc. Assim, mediante a necessidade de fazer altos investimentos e
despender tempo, profissionais, estudos, projetos e inclusive revelar
segredos, muitos negociantes se sentem inseguros e buscam o auxílio do
direito para criação de modelos jurídicos que lhes tragam um pouco mais
de segurança nessa fase. Mesmo assim, não é pacífico para a doutrina
que esses modelos gerem obrigações nesse momento;
d) Entende-se que modelos que realmente não geram obrigações, mas
tão somente firmam as intenções das partes, entretanto, outros
instrumentos que independente de sua denominação obrigam as partes
em relação a seu objeto - não a firmarem o contrato principal almejado,
exceto os pré-contratos. Dessa forma, as tratativas são importantíssimas
para o sucesso e execução contratual, pois é o momento de conhecer,
analisar e firmar o que realmente se almeja do outro. Sua relevância
jurídica é revelada no comércio internacional na medida em que a prática
cria novos modelos capazes de expressar a verdadeira necessidade das
partes, dando-lhes proteção, inserindo cláusulas de lei aplicável e método
de solução de conflitos, bem como ganhando o reconhecimento da
jurisprudência arbitral;
e) modelos jurídicos que criam obrigações às partes mesmo antes da
conclusão do contrato que almejam e por isso são passíveis de serem
resolvidas eventuais controvérsias por meio da arbitragem como disposto
nas Convenções Internacionais do Panamá e de Nova Iorque, assim
como na Lei Modelo da UNCITRAL sobre Arbitragem Comercial
Internacional;
f) Diversos o os métodos de solução de conflitos comerciais
internacionais, passando pelo judicial e pelos extrajudiciais, como a
negociação, conciliação, mediação e arbitragem, podendo, ainda utilizar-
se mais de um. A arbitragem é o método alternativo e heterocompositivo
139
de solução de conflitos mais utilizado no comércio internacional que
privilegia a autonomia da vontade das partes em possibilitar a escolha da
lei aplicável ao conflito, o idioma, o local de proferimento da sentença, o
árbitro e o procedimento a ser seguido por ele, além de ser mais célere,
sigiloso, possibilitar a conciliação e continuidade dos negócios, garante
tratamento equânime entre as partes, o que traz maior voluntariedade ao
seu cumprimento, desenvolvimento econômico, dinamização da
contratação, descongestionamento do judiciário e paz social;
g) A convenção arbitral pode ocorrer tanto antes do conflito, por meio da
cláusula compromissória quanto posteriormente através do compromisso
arbitral. Por se tratar o presente de um estudo preventivo, seu foco sea
cláusula compromissória. Concluiu-se que na fase das negociações
preliminares dos contratos internacionais do comércio o basta somente
a inserção da referida cláusula compromissória, o que pode acarretar em
um vazio que impossibilite ou dificulte a aplicação da arbitragem com
todas as suas vantagens. Assim, tal cláusula deve ser cheia, completa, ou
seja, trazer todos os requisitos autorizadores do início da solução do
conflito sem a intervenção do Judiciário;
h) Recomenda-se que durante as negociações preliminares de contratos
internacionais do comércio os negociadores firmem documentos
relacionando quais os objetivos, deveres e conclusões a que querem
chegar, bem como a responsabilidade de cada um no alcance ou não da
conclusão contratual, sendo pontuais em relação a deveres de sigilo,
colaboração com os investimentos a serem feitos, despesas com viagens,
reuniões, projetos, contratação de profissionais, pareceres etc. Além
disso, esses documentos devem prever qual a norma a que estão
submetidos e de que forma se resolvido qualquer eventual conflito. A
arbitragem por meio da cláusula compromissória completa - é o método
mais adequado de se solucionar eventual conflito negocial, pois as partes
podem eleger árbitros qualificados e com experiência em comércio
internacional e inclusive, se a arbitragem será baseada nos usos e
costumes do comércio ou até mesmo na equidade em decorrência da
confiança depositada no árbitro. A autonomia da vontade auxilia na
solução do conflito, pois dará oportunidade às partes de regerem as
140
regras aplicáveis a essa resolução, o que coaduna com a necessidade
comercial global, já que nem sempre a legislação e hermenêutica nacional
tradicional favorecem essa dinâmica.
Nesse esteio, a proposta da inserção da cláusula
compromissória completa nos instrumentos jurídicos utilizados na fase de
formação dos contratos internacionais objetiva o desenvolvimento do comércio
de forma mais segura e eficaz, minimizando prejuízos e discussões jurídicas
acerca dos procedimentos que envolvam a resolução dos conflitos nessa fase
contratual.
141
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Disponível em:
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VALENÇA FILHO, Clávio. Aspectos de direito internacional privado na
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VELASCO, Ignácio M. Poveda. A boa fé na formação dos contratos (direito
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VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: teoria geral das obrigações e teoria
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WALD, Arnaldo. O novo Código Civil e o solidarismo contratual. Revista de
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